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Copyright © 2018 by Glenio Fonseca Paranaguá

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Projeto Gráfico e Diagramação:


Flávio Sousa Gomes
Revisão:
Carmen Charles Malafaia Paranaguá
Dorival Zemuner

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Bibliotecária: Zoraide Gasparini CRB/91529

P242s
PARANAGUÁ, Glenio Fonseca
A salvação da alma / Glenio Fonseca Paranaguá. —
Londrina : IDE, 2018.
128p. ; 14 x 21cm.

ISBN: 978-85-88540-57-6

1. Teologia da salvação. 2. Salvação. 3. Alma. 4. Fé. I. Título


CDD: 234

2018

Todos os direitos desta edição são reservados à


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SUMÁRIO

Introdução, 7
A Salvação da Alma I, 13
A Salvação da Alma II, 21
A Salvação da Alma III, 29
A Salvação da Alma IV, 37
A Salvação da Alma V, 43
A Salvação da Alma VI, 51
A Salvação da Alma VII, 59
A Salvação da Alma VIII, 67
A Salvação da Alma IX, 73
A Salvação da Alma X, 79
A Salvação da Alma XI, 87
A Salvação da Alma XII, 95
A Salvação da Alma XIII, 103
A Salvação da Alma XIV, 111
A Salvação da Alma XV, 119
APRESENTAÇÃO

Durante 15 domingos em nossa comunidade estive-


mos abordando o tema sobre a salvação da alma. Foi desafiante
tratar deste assunto em seus vários aspectos e ver como mui-
tos foram impactados por esta abordagem singela e caseira.
A nossa escolha pedagógica foi marcada pela repeti-
ção, para que o assunto se tornasse bem ruminado, a fim de
ser melhor assimilado.
Procuramos mostrar que a salvação não é um inciden-
te acidental ou um simples remendo para consertar um acon-
tecimento não previsto. Antes da criação a Trindade já havia
visto, previsto e predeterminado soberanamente todo o pro-
cesso da criação, bem como todos os meios da redenção sob
os efeitos do pecado, já conhecido de antemão.
Não há surpresas para Deus em qualquer enfoque e a
salvação do ser humano caído foi preordenada antes da cria-
ção do mundo. T. Z. Koo disse: “O reino de Deus não existe
8 A SALVAÇÃO DA ALMA

pelos seus ou pelos meus esforços. Ele existe porque Deus


reina. Nossa parte é entrar nesse reino e colocar nossa vida
debaixo da vontade soberana dele.”
Para o teólogo americano J. Blanchard, “a soberana
eleição de Deus é o molde em que todo o universo está en-
quadrado. Ponha de lado a gloriosa verdade da eleição incon-
dicional de Deus, e não somente todos os cristãos sairão da
igreja como também todas as estrelas cairão do céu e todas as
páginas da Bíblia serão tiradas!”
“A base para a discriminação entre os homens é so-
mente a vontade soberana de Deus; mas a base para a conde-
nação dos réprobos é o pecado, somente o pecado”, dizia João
Calvino. E é bom recordar que o pecado não tem origem em
Deus, mas foi previsto pela Trindade, pois o Cordeiro de Deus
foi imolado antes da fundação do mundo.
Portanto a salvação começa na eternidade passada, pas-
sa pela história e culmina nos fins dos tempos na consuma-
ção da obra de Cristo, ora, agindo monergicamente, onde
apenas a Trindade opera, ora, sinergicamente, quando o ser
humano corresponde à ação Divina. Para Watchman Nee,
“não há necessidade de inventarmos meios de chamar aten-
ção para nosso trabalho. Deus, em sua providência soberana,
pode assumir tal responsabilidade.”
Assim podemos afirmar que neste processo histórico
há três tempos para a nossa salvação. Fomos salvos da conde-
nação do pecado em nosso espírito pela Obra de Cristo, na
cruz, estamos sendo salvos do poder do pecado em nossa alma
APRESENTAÇÃO 9

pela Vida ressuscitada de Cristo e seremos salvos da presença


do pecado no corpo pela Vinda gloriosa de Cristo.
A salvação do espírito é monérgica. Deus nos vivifi-
cou sozinho pelo Espírito Santo através da obra suficiente de
Cristo. A salvação da alma é sinérgica. Deus age e o salvo
reage de modo voluntário e confiante. A salvação do corpo é
também monérgica. A Trindade nos dará corpos glorificados
e isentos da interferência do pecado.
Durante este período de 15 domingos estivemos en-
volvidos na sinergia da nossa salvação e é isto que estamos
repetindo aqui neste livro. Muitos irmãos e amigos pediram-
me para que fosse publicada esta obra, afim de que outros
pudessem ter acesso. Assim, fizemos pequenos ajustes e agora
a estamos disponibilizando, pedindo ao Pai que o Seu nome
seja exaltado, o Seu povo edificado e o maior número de
vidas salvas para a glória da Trindade Santa, que opera em
nós de eternidade a eternidade.
A alma consegue camuflar os seus reais sentimentos e
fingir que está alegre por instantes, contudo há um vulcão
interior que jorra suas lavas de angústia. - Como poderei con-
viver comigo se eu mesmo não me aceito? Perguntou-me um
suicida frustrado. A alma tem fome de aceitação incondicio-
nal. A minha alma carece do amor furioso de Deus.
O salmista entendeu o drama existencial: Somente em
Deus, ó minha alma, espera silenciosa; dele vem a minha salvação.
Salmo 62:1. Da solidão à solitude em busca da verdadeira
identidade pessoal. Sozinho comigo, eu me desespero, mas a
10 A SALVAÇÃO DA ALMA

sós com Deus a minha alma descansa por ter encontrado o


amor sem fronteiras.
“A Trindade é a rocha sólida debaixo dos meus pés; é
um espaço para a minha alma respirar; é castelo invencível:
não há como eu ser derrotado.” Se Abba for de fato o nosso
refúgio seguro, não seremos dependentes da companhia das
pessoas para amenizar a nossa solidão, pois em solitude te-
mos plena comunhão de Emanuel.
Mas, a minha alma aspira mais do que Deus conosco.
Ela aspira a Ele. A fome é íntima. A alma tem fome de Deus
nela. Eu o quero internalizado para não correr o risco do
Éden, quando Adão perdeu a comunhão com o Criador. Lá,
Deus estava fora, agora Ele faz em mim Sua morada. Jesus
disse: Se alguém me ama, guardará a minha palavra; e meu Pai o
amará, e viremos para ele e faremos nele morada. João 14:23.
Não precisamos de uma chupeta dos elogios e não
precisamos temer a crítica severa. Temos leite que nos mata
a fome todos os dias de nossa caminhada. Deus nos ama e
isto é suficiente, basta que acalme e aquiete a sua alma, como
criança amamentada no colo da mãe. Sim, minha alma dentro de
mim é como essa criança amamentada. Salmo 131:2.
A salvação da alma é a nossa história diária na obra
da redenção. Você aqui está sendo convidado para examinar
esta obra e também para nos ajudar a ver outros aspectos que
não foram abordados neste livro ou ainda corrigir algo que
exija uma revisão no futuro quando formos fazer uma
reedição. Agradeço a sua participação.
APRESENTAÇÃO 11

Como disse, este é um esboço caseiro e singelo, mas


pode de alguma maneira ajudar alguns. Não se trata de um
trabalho acadêmico, com todas as regras e formalidades de
um texto bem estruturado, embora obedecemos as normas
básicas de comunicação. Assim, louvo ao Senhor por sua gra-
ça e oro para que o Seu povo seja ricamente abençoado.
No amor do Amado.

VITÓRIA SOBRE A MORTE - GFP

No cocho rústico esteve o Rei dos reis,


e um jumento foi o seu veloz transporte.
Foi numa cruz que o Rei cumpriu a lei
e neste trono vil, venceu ali a morte.

Em seis horas pendurado no madeiro,


o Rei divino sofria em torpe enxame,
mas sabendo que tal golpe morteiro
era o fim da morte jogada no tatame.

Onde está, ó morte, teu algoz ferrão?


Onde está, ó inferno, teu império vil?
Foi na rude cruz que a morte se esvaiu

perdendo a sua gana de um poder sutil,


nas gotas do sangue que no chão caiu,
a fim de salvar a alma na ressurreição.
12 A SALVAÇÃO DA ALMA

ORAÇÃO

Salva a minha alma, ó Pai!


Assim como salvaste meu
espírito morto no pecado,
salva a minha alma de mim.
Deste-me a vida espiritual
quando eu estava esgotado,
sem um pingo do Teu gozo
e sem qualquer rumo certo.
Salva a minha alma travessa
que tenta ser aceita com seu
jeito animado, portando-se
bem como se fosse eterna e
espiritual, mas ensimesmada.
Ó Espírito Santo, tira o manto
dessa ilusão hipocritamente sutil
que me faz agir como se fosse
um santo, quando sou apenas vil.
Salva a minha alma presunçosa,
arrogante, insidiosa, que só quer
ser como se eu fosse o Senhor.
Salva a minha alma, ó Senhor!
A SALVAÇÃO DA ALMA I

Jesus Cristo, a quem, não havendo visto,


amais; no qual, não vendo agora, mas
crendo, exultais com alegria indizível e
cheia de glória, obtendo o fim da vossa fé:
a salvação da vossa alma. 1 Pedro 1:8-9.

A Trindade é Deus. Deus é o Criador. O Criador não


pode ser criado, pois, se criado fosse, se tornaria uma mera
criatura. Deus, o Criador, criou o ser humano à Sua imagem
e semelhança, mas, como uma criatura, nunca, jamais como
o Criador. Contudo, a criatura criada com uma vontade li-
vre, não aceita ser meramente uma simples criatura e decide
que quer ser como o Criador.
Deus criou o ser humano, mas não criou o pecado.
Criou o homem com uma capacidade de querer, embora,
esse querer, por mais que quisesse, não poderia ser como o
Criador. Nenhuma criatura poderá ser como o Criador, pois
Este, jamais terá um Criador.
14 A SALVAÇÃO DA ALMA

O pecado surge no desejo indomável dos desejos hu-


manos sem medida. Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou tentado
por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo
a ninguém tenta. Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria
cobiça, quando esta o atrai e seduz. Então, a cobiça, depois de
haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consuma-
do, gera a morte. Tiago 1:13-15.
Deus criou o ser humano, não o seu pecado. A cria-
ção do homem é divina, mas o seu pecado é humano. Não
foi Deus o autor do pecado. Alguém, então, indaga: Ele não
poderia ter criado o ser humano que não pecasse? Só se Ele o
criasse destituído de sua volição, como um mero robô, por
exemplo. Se tivesse livre arbítrio poderia querer ser como o
Criador, ainda que nunca, em tempo algum, pudesse ser como
Deus, o Criador, mesmo assim, poderia intentar.
O pecado é a rebeldia da criatura que quer ser como o
Criador. Esta rebeldia é a matriz de todo o caos do mundo
caído. Por trás da catástrofe dos relacionamentos e da perda
de energia no mundo material, há uma desordem universal
que chamamos pecado.
Os seres humanos foram criados por Deus num pla-
no tridimensional, mas com uma viva capacidade de se co-
municar na esfera espiritual, em outra dimensão além da ter-
ceira. Foi criado, também, tricotômico, isto é, em três partes
distintas. Então, formou o SENHOR Deus ao homem do pó da
terra e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a
ser alma vivente. Gênesis 2:7.
A SALVAÇÃO DA ALMA I 15

O homem foi feito com um corpo, do pó da terra, em


que o Criador lhe soprou o fôlego ou espírito das vidas e este
se tornou uma alma vivente; corpo, alma e espírito. Todavia,
por causa do pecado, o ser humano passou a se manifestar
neste mundo de forma dicotômica, perdendo a sua vida espi-
ritual. Somos uma raça morta espiritualmente.
O espírito era a parte imaterial e imperceptível da
criação que se ligava com Deus; o corpo a parte material que
se conecta com o mundo físico e a alma uma realidade inter-
mediária que servia de conexão entre o mundo espiritual
invisível e o mundo material e visível.
A partir da queda, nós vivemos biológica e psicologi-
camente sob a ditadura da morte e separados da intimidade
com Deus, pois todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus,
Romanos 3:23. Neste estado desconectado de Deus a huma-
nidade vive uma realidade de autoconfiança e autodetermi-
nação que lhe causa muitos males.
Não há vida espiritual no ser humano caído. Toda a
sua pseudoespiritualidade é construída pela sua alma, que em
sua origem tem um toque de transcendência, embora esteja
completamente contaminada com o pecado. Além do que,
essa “espiritualidade” da alma encontra-se baseada nos senti-
mentos e na razão limitada ao mundo físico.
Toda religiosidade humana é fabricada num diâme-
tro da mente encurtada e na mística dos sentimentos sobre-
carregados de superstições, enigmas esotéricos, controles su-
tis de gerenciamento do medo, da culpa, da vergonha, dos
16 A SALVAÇÃO DA ALMA

interesses e deveres, tudo sob o comando da alma desterrada


do jardim do Éden.
A alma pós-pecado tornou-se a sutil governanta da
religiosidade humana, todavia, sem a menor evidência de vida
espiritual. Todas as religiões são construídas a partir dos em-
penhos animados da psique destituída de real identificação
com o espírito. A religião é almática.
Sem o novo nascimento ou nascimento do alto, nin-
guém poderá ter acesso à vida espiritual ou, ao Reino de Deus.
Assim, tudo começa com um milagre. Deus precisa regene-
rar o ser humano caído e torná-lo novamente tricotômico,
ou seja: corpo, alma e espírito.
A salvação do ser humano começa de dentro para fora.
Primeiro, o Espírito Santo vivifica o nosso espírito com a vida
espiritual gerada pela Palavra de Deus. A minha alma está
apegada ao pó; vivifica-me segundo a tua palavra. Salmo 119:25.
A alma e o pó da terra ou a alma e o corpo caído estão im-
pregnados uma no outro e precisam da vida de Deus para
poder se conectar com o Reino espiritual de Deus. É preciso
o milagre da regeneração.
Sem a vida espiritual a alma fica sempre amoldada ao
mundo caído. É preciso, antes de tudo, da regeneração do
espírito, para que a alma possa ganhar a dimensão das reali-
dades do alto. Não há a mínima aspiração das coisas de cima
numa alma sem o novo nascimento produzido pelo Espírito
Santo. Pois a nossa alma está abatida até ao pó, e o nosso corpo,
como que pegado no chão. Salmo 44:25.
A SALVAÇÃO DA ALMA I 17

Depois de sermos regenerados em nosso espírito co-


meça então a salvação da nossa alma. A salvação do espírito é
um ato monérgico da graça de Deus, onde Deus age só, mas
a salvação da alma é um processo sinérgico em que Deus age
e o crente reage, obedientemente.
De modo sobrenatural o incrédulo é convencido pelo
Espírito Santo através da pregação da Palavra de Deus e rece-
be os efeitos da obra de Cristo na cruz, em seu favor. Neste
momento ele se torna um crente, uma nova criação em seu
espírito, mas precisa ainda de uma operação divina para sal-
var a sua alma de toda uma cultura pregressa nele enraizada.
A alma apegada ao pó teve toda a sua memória afeta-
da pelos efeitos de sua história e pelos hábitos e costumes
deste mundo caído. Por isso, é imperiosa sua libertação e o
salmista entendeu muito bem este ponto quando orou: pre-
serva a minha alma, pois eu sou piedoso; tu, ó Deus meu, salva o
teu servo que em ti confia. Salmo 86:2.
Vemos aqui que não se trata da regeneração do espíri-
to, pois o salmista já é um piedoso que confia no Senhor, mas
da salvação da sua alma que ainda traz algumas marcas dolo-
ridas de uma história comprometida com este mundo caído.
Tiago diz em sua carta como se dá a regeneração do
nosso espírito: pois, segundo o seu querer, ele nos gerou pela pala-
vra da verdade, para que fôssemos como que primícias das suas
criaturas. Tiago 1:18. Fomos gerados de novo em nosso espí-
rito a partir da pregação soberana da Palavra, todavia não
acabou aí a obra da salvação.
18 A SALVAÇÃO DA ALMA

Três versículos depois ele diz algo mui interessante:


portanto, despojando-vos de toda impureza e acúmulo de maldade,
acolhei, com mansidão, a palavra em vós implantada, a qual é
poderosa para salvar a vossa alma. Tiago 1:21. Antes Tiago falou
da geração de uma nova criatura, agora ele aborda a salvação
da alma, no despojamento do lixo acumulado em sua alma.
Este desapossamento se processa progressiva e gradualmente.
Fomos salvos no nosso espírito, através da nossa mor-
te com Cristo; estamos sendo salvos na alma pela vida de
Cristo e seremos salvos em nosso corpo pela vinda de Cristo.
Só os salvos no espírito podem vir a ser salvos na alma ou
santificados. A salvação da nossa alma também é denomina-
da de santificação. E apenas os que estão sendo santificados
terão os seus corpos glorificados, quando, então, se completa-
rá a plena salvação integral.
Aqueles que foram vivificados ou regenerados, espiri-
tualmente pelo Espírito Santo, têm a condição espiritual de
se envolver na salvação da sua alma, e, portanto, estão assim
capacitados a perseverar, por meio da graça, até o fim, quan-
do receberão corpos glorificados.
Todos os regenerados serão habilitados a serem santi-
ficados e todos que estão sendo santificados um dia serão glo-
rificados. A nossa pátria está nos céus, de onde também aguarda-
mos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, o qual transformará o nosso
corpo de humilhação, para ser igual ao corpo da sua glória, segundo
a eficácia do poder que ele tem de até subordinar a si todas as
coisas. Filipenses 3:20-21.
A SALVAÇÃO DA ALMA I 19

A salvação do ser humano integral é o objetivo final


da revelação bíblica. Todo este processo teve o seu começo na
eternidade passada e vai no tempo até a eternidade futura,
passando pela regeneração do nosso espírito, que ainda im-
plica na salvação da alma, e esta, na salvação do corpo. A
salvação do espírito e do corpo são feitos unilaterais da Trin-
dade, entretanto a salvação da alma tem a cooperação huma-
na reagindo à ação Divina. Nestes capítulos aqui trataremos
com mais ênfase sobre a salvação da alma.
Nossa caminhada será sempre através de uma didáti-
ca repetitiva para termos uma melhor e mais fácil absorção.
Que o Senhor seja louvado e que o maior número de pessoas
sejam libertas e edificadas.

RECONHECIMENTO (Cantor Cristão - 307)


Letra: Daniel Webster Whittle
Tradução: Henry Maxwell Wright

Não sou meu! Por Cristo salvo,


Que por mim morreu na cruz,
Eu confesso alegremente
Que pertenço ao bom Jesus.

Não sou meu! Por Cristo salvo,


Pois seu sangue derramou
E da pena do pecado
A minha alma resgatou.
20 A SALVAÇÃO DA ALMA

Não sou meu! A ti confio


Tudo quanto chamo meu;
Tudo em tuas mãos entrego,
Pois, Senhor, sou todo teu.

Não sou meu! Oh, santifica


Tudo quanto sou, Senhor;
Da vaidade e da soberba
Livra-me, meu Salvador.

CORO:
Não sou meu, oh, não sou meu!
Bom Jesus, sou todo teu!
Hoje mesmo e para sempre,
Bom Jesus, sou todo teu!
A SALVAÇÃO DA ALMA II

Portanto, despojando-vos de toda impureza e


acúmulo de maldade, acolhei, com mansidão, a
palavra em vós implantada, a qual é poderosa
para salvar a vossa alma. Tiago 1:21.

Adão foi criado um ser tricotômico, isto é: corpo, es-


pírito e alma. O corpo se relaciona com o mundo físico, na
terceira dimensão; o espírito com a esfera espiritual em ou-
tra dimensão além da terceira e a alma é uma realidade exis-
tencial intermediária entre os dois planos de nossos relacio-
namentos. Então, formou o SENHOR Deus ao homem do pó da
terra e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a
ser alma vivente. Gênesis 2:7.
Muitos acreditam que a alma e o espírito são a mesma
realidade, mas a Bíblia mostra que há uma diferença entre
eles, que apenas a Palavra de Deus pode destacá-la. Porque a
palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer
espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e
22 A SALVAÇÃO DA ALMA

espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e


propósitos do coração. Hebreus 4:12.
O apóstolo Paulo também vê esta distinção, claramen-
te, entre alma e espírito, quando afirma de modo categórico:
O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo; e o vosso espírito,
alma e corpo sejam conservados íntegros e irrepreensíveis na vinda
de nosso Senhor Jesus Cristo. 1 Tessalonicenses 5:23. Tudo faz
crer que há diversidade aqui, sim.
Maria, a mãe de Jesus, expressa ainda esta desse-
melhança, ao dizer no seu cântico: A minha alma engrandece
ao Senhor, e o meu espírito se alegrou em Deus, meu Salvador,
Lucas 1:46-47. Não nos parece aqui que alma e espírito sejam
a mesma coisa. Creio que o espírito é o canal espiritual que
nos liga intimamente a Deus que é espírito, enquanto a alma
nos conecta especialmente com as pessoas em seu modo de
ser racional e emocional.
O ser humano criado por Deus não tinha a vida eter-
na em si mesmo. O seu espírito se conectava com Deus pela
comunhão, mas a vida eterna encontrava-se na Árvore da
Vida que deveria ser ingerida de modo deliberado pelo ho-
mem. Mas o que ele acabou comendo foi da Árvore do Co-
nhecimento do Bem e do Mal, e isso o desconectou do espíri-
to de Deus, gerando morte e dando à alma a excelência de
sua primazia e o comando de todas as ações humanas nos
seus relacionamentos pessoais.
Dentro de minha percepção limitada, o ser humano
foi criado tricotômico: corpo, espírito e alma, mas com a
A SALVAÇÃO DA ALMA II 23

entrada do pecado na história humana, o espírito foi desco-


nectado da sua fonte divina tendo uma morte relacional. Daí
para frente, passamos a viver numa dicotomia feroz de corpo
e alma, onde esta assume o papel geral de gerente e também
de mentora de uma pseudoespiritualidade.
A alma desterrada do Éden age como se fosse “espíri-
to” em certas ocasiões, mas a sua real performance é o engo-
do da queda. A dissimulação é uma das características do ser
humano pós-pecado. Então, a alma sujeita, ao pecado, viven-
cia uma imposturice de vida espiritual, e, nesta simulação, se
autoengana e ainda ludibria a muitos que se iludem com as
suas ilusões místicas. A alma, por melhor que pareça, encon-
tra-se destituída da glória de Deus.
Assim, o sujeito caído nada tem de apetite espiritual e
todo seu envolvimento resume-se ao aqui e agora. A sua alma
se deleita com o mundo e as coisas que lhe dão prazer. É
evidente a sua falta de interesse por Deus e pelo Seu Reino,
até que ele seja regenerado, de modo sobrenatural, por meio
do Espírito Santo, sendo feito filho de Deus.
Uma vez renascida, espiritualmente, esta pessoa pre-
cisa passar agora por uma obra radical e progressiva de sal-
vação da sua alma, já que ela viveu, durante tanto tempo,
numa cultura totalmente perversa e mundana governada
por instintos carnais. Tudo o que a alma sabia era uma moral
inculcada para controlar as tendências psicossomáticas de sua
história. A alma caída está depravada e desconectada do espí-
rito, vivendo por conta própria.
24 A SALVAÇÃO DA ALMA

O primeiro versículo aqui abordado, fala de um pro-


cesso que visa desmontar a acumulação do lixo moral e de
todo tipo de sujeira que está na nossa memória. Trata-se do
despojamento de tudo aquilo que marcou a nossa história
neste mundo. Diz-nos o texto: despojando-vos de toda impureza
e acúmulo de maldade, ou, removendo todo esse cultivo dos
velhos costumes maliciosos, imorais e até mesmo aqueles que
nos enobrecem chamando a atenção especialmente. A alma
se orgulha dos seus feitos.
Apenas os nascidos de novo podem exercer esta cola-
boração na salvação da sua alma. Despojar é espoliar um
morto. É retirar do cadáver os seus pertences, pois ele, agora,
não é mais proprietário de coisa alguma. Uma vez que o ve-
lho Adão foi crucificado com Cristo, somos exortados, como
novas criaturas, a retirar do caminho todo entulho do passa-
do enxovalhado de nossas vaidades: no sentido de que, quanto
ao trato passado, vos despojeis do velho homem, que se corrompe
segundo as concupiscências do engano, Efésios 4:22.
Quem pode fazer esta terraplanagem na sua trajetó-
ria? Aquele que, mediante a operação do Espírito Santo, dá
acolhida à Palavra de Deus, que lhe foi implantada, uma vez
que, só a obediência à Palavra pode gerar este processo: acolhei,
com mansidão, a palavra em vós implantada, a qual é poderosa
para salvar a vossa alma.
Este alojamento na Palavra de Deus com mansidão,
nos capacita a desempenhar aquilo que redunda em nossa
libertação do amontoado de resíduos sórdidos de nosso
A SALVAÇÃO DA ALMA II 25

passado. Todo crente tem, em si, o poder íntimo do Espírito


Santo para esta tarefa contínua e permanente de desaloja-
mento de tudo aquilo que compromete o seu processo dinâ-
mico de santificação.
O apóstolo Pedro faz a seguinte afirmação: Despojan-
do-vos, portanto, de toda maldade e dolo, de hipocrisias e invejas e
de toda sorte de maledicências, desejai ardentemente, como crian-
ças recém-nascidas, o genuíno leite espiritual, para que, por ele, vos
seja dado crescimento para salvação, se é que já tendes a experiên-
cia de que o Senhor é bondoso. 1 Pedro 2:1-3.
Quem tem a Palavra de Deus implantada em si mes-
mo, pelo Espírito Santo, ao experimentar a sua morte e res-
surreição com Cristo, tem as condições de desejar intimamente
como a criança recém-nascida o verdadeiro leite espiritual,
que é a Palavra de Deus.
Porém é bom que se diga aqui e agora: esta colabora-
ção do crente com a operação feita por Deus, através de Sua
graça, também é um processo gracioso movido pelo Espírito
Santo. Porque, se viverdes segundo a carne, caminhais para a mor-
te; mas se pelo Espírito, mortificardes os feitos do corpo, certamente,
vivereis. Romanos 8:13.
A pura verdade é esta: tudo, na vida cristã, de A a Z, é
pela graça. Não é apenas a justificação que é pela graça, mas
também todo o processo de santificação. Tudo é feito por
Deus e para Deus, porque Deus é quem efetua em vós tanto o
querer como o realizar, segundo a sua boa vontade. Filipenses 2:13.
Porém, isto não significa passividade do crente.
26 A SALVAÇÃO DA ALMA

Como ensinava muito bem Jonathan Edwards: “na


graça eficaz nós não somos meramente passivos, nem ainda
Deus faz uma parte e nós o resto. Mas é Deus quem faz tudo,
e nós fazemos tudo. Deus produz tudo em nós e nós agimos
tudo. Por isso, é Ele mesmo quem produz, nossos próprios
atos. Deus é o único autor e fonte adequada; nós somos so-
mente os atores desta fonte. Nós somos em diferentes aspec-
tos, totalmente passivos e totalmente ativos”, ou seja, Deus
efetua em nós tanto o querer como o realizar.
Depois que nosso espírito foi recriado pelo nascimen-
to do alto, estamos agora habilitados para o processo da re-
novação de nossa alma, pelo mesmo poder do Espírito Santo
que regenerou nosso espírito e habita em nós. E não vos con-
formeis com este século, mas sede transformados pela renovação da
vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e
perfeita vontade de Deus. Romanos 12:2.
A alma esteve muito tempo só ligada ao corpo num
relacionamento de total codependência. Neste período sua
história foi construída pela cultura do pecado e em sua me-
mória reside “feitos que não foram bons”, bem como costu-
mes e cacoetes aprendidos sob uma mentalidade caída e de-
pravada. A alma do regenerado ainda tem um sotaque de
outra linguagem, portanto, será preciso uma transformação
profunda em sua articulação.
A salvação da alma tem a ver com a maneira como
Deus a chama a responder a Ele em obediência. Fomos regene-
rados em nosso espírito, para que, mediante a nossa conexão
A SALVAÇÃO DA ALMA II 27

com Deus possamos obedecer a Palavra de Deus e responsa-


velmente atirar no lixo o acúmulo de maldade que foi sedi-
mentado em nossa alma, por muito tempo.
O Senhor vai usar as situações da vida, nossas lutas e
fracassos para que nós percebamos nossa incapacidade e im-
possibilidade de nos manter adequados e, desse modo, possa-
mos nos voltar totalmente para Ele. Assim, a salvação da alma
vai apontar para a nossa plena dependência da suficiência de
Cristo, em nosso modo de viver.

MADALENA (Natalino Gregório dos Santos)

Perdida, num céu sem nuvens


Onde a esperança não existe
Nem para os olhos do poeta
Podemos encontrá-la.

E se alguém puder encontrá-la


Sem estar com pedras nas mãos
Lá numa praia distante
Com as asas dos sonhos
Por uma multidão ou um profeta,

Quem poderá conhecê-la,


Antes das pedras voarem
Arremessadas pelos santos
Hipócritas sem pecados e sem perdão?
28 A SALVAÇÃO DA ALMA

E transformar sua vida


Como uma página em branco?
À espera de palavras eternas
Escritas por Deus para ela
Como uma canção numa voz silenciosa
Proferindo o perdão
Num novo dia em que o sol
Que Deus fará para o seu caminho.

E então regozijante ela dançará, correrá


Após ouvir a voz sussurrada
Ouvida na alma,
Recebida no coração
Pela boca do carpinteiro
Que transformou sua vida
Em vida sagrada.

Como uma página em branco


À espera de palavras eternas
Como uma canção em busca da voz silenciosa
Que Deus comporá para o seu caminho
Em sua nova vida.
À serviço do carpinteiro
Que transformou sua vida
Em vida sagrada.
A SALVAÇÃO DA ALMA III

Deus é espírito; e importa que os seus


adoradores o adorem em espírito e
em verdade. João 4:24.

Deus criou a humanidade tricotômica, isto é, corpo,


espírito e alma. É isto que percebemos no texto de Gênesis
2:7 – Então, formou o SENHOR Deus ao homem do pó da terra e
lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser
alma vivente. Tudo nos mostra que o pó movido a fôlego divi-
no torna-se alma vivente.
Deus não soprou em nenhum animal o seu fôlego ou
espírito. Todas as coisas e os animais foram criados pela Sua
palavra, mas ao corpo do ser humano, feito do pó da terra ou
a natureza terrena, foi-lhe soprado o espírito das vidas, pas-
sando este a ser uma alma vivente. Assim, a humanidade foi
criada com três esferas de comunicação.
O corpo movido pela vida bios comunica-se com o
mundo físico; o espírito em sua espiritualidade, com Deus, e
30 A SALVAÇÃO DA ALMA

a alma, estimulada pela vida psique, constituía-se num elo


entre os dois, corpo e espírito, falando as duas linguagens, a
biológica e a espiritual.
O gênero humano vivia em perfeita harmonia com a
Trindade. O espírito do ser humano comunicava-se espiritu-
almente com o Espírito de Deus e transferia todos os seus
conhecimentos para a integralidade do seu ser. Não havia
discrepância ou desarmonia.
Mas, quando a serpente seduziu a alma do casal, na-
quilo que seria o desejável para dar entendimento, houve
uma ruptura entre o espírito do ser humano e o Espírito de
Deus e a raça humana entrou em colapso, na esfera espiritu-
al. Daí em diante temos uma humanidade desconectada es-
piritualmente de Deus, porém vivendo por sua alma caída e
caótica, fingindo ‘espiritualidade’. Não há vida espiritual no
ser humano pós-pecado.
Morta, espiritualmente falando, a humanidade ca-
minha morro acima em sua saga psicológica na busca de
um reencontro com o Espírito de Deus. Mas isto é inútil.
Deus é espírito e fala de modo espiritual com o espírito do
homem. Separada de Deus, a raça adâmica fomentou a re-
ligião anímica na tentativa de se religar com o seu Criador,
porém destituído de vida espiritual.
Temos que perceber que as religiões são os caminhos
inadequados da alma, na presunção de religar-se com Deus,
no topo da montanha. Todas porém, sem sucesso. Deus é
espírito e só se comunica com o espírito do ser humano;
A SALVAÇÃO DA ALMA III 31

por isso, é preciso antes de tudo, que a pessoa seja vivificada,


por Deus, para que possa se relacionar com Deus.
A vivificação do espírito precede qualquer relaciona-
mento com Deus. Apenas os regenerados no espírito podem
buscar a Deus espiritualmente. Sem o nascimento do alto
não haverá vida espiritual do alto. Mas o novo nascimento é
apenas a primeira parte da obra salvadora, onde Deus realiza
sozinho essa obra em favor do seu povo.
Para David W. Dyer, “quase a maioria dos crentes hoje,
equipara a palavra ‘salvação’ a ser ‘nascido de novo’. Para
eles, estas palavras são sinônimos em seu significado e uso.
Eles tomam as expressões ‘ser salvo’ e ‘ser nascido de novo’
como tendo exatamente o mesmo significado.” Concordo com
ele. A salvação vai mais adiante.
Como temos visto aqui, nestes estudos de modo
repetitivo, cremos que a salvação de Deus tem três tempos:
passado, presente e futuro. Eu fui salvo no meu espírito da
condenação do pecado, por meio da obra de Cristo. Eu estou
sendo salvo na minha alma do poder do pecado, por meio da
vida de Cristo, em mim, e eu serei salvo da presença do peca-
do, por meio da vinda de Cristo, quando Ele me der um
novo corpo glorificado. Fui, estou sendo e serei salvo.
“Ser nascido de novo é o primeiro evento em uma
genuína experiência cristã. Este passo inicial envolvendo fé,
arrependimento e a recepção da Trindade, em Cristo, é a
maneira de entrarmos na família eterna de Abba.” Depois
vem a salvação da alma.
32 A SALVAÇÃO DA ALMA

Uma vez regenerados em nosso espírito, a Trindade


vem morar nesse espírito, porém a alma e o corpo ainda re-
querem os efeitos da salvação. Se nós fomos salvos da con-
denação do pecado, em nosso espírito, precisamos ainda da
salvação do poder do pecado em nossa alma, agora, no pre-
sente, e isto é um processo contínuo.
O escritor aos hebreus nos diz: Nós, porém, não somos
dos que retrocedem para a perdição; somos, entretanto, da fé, para
a conservação da alma. Hebreus 10:39. A palavra conservação
no grego é peripoiesis que tem o sentido de manter salvo. É
assim... eu fui salvo no meu espírito, mas eu preciso estar
sendo salvo na minha alma.
A alma tem um histórico, tem uma memória, como
um software. Tudo o que aconteceu em nossa existência está
registrado nesse dispositivo anímico. Além do que, nós so-
mos muito complexos, trazendo uma memória celular de
muitas gerações passadas.
O salmista diz que sua alma encontrava-se profunda-
mente perturbada e ele clama: Volta-te, SENHOR, e livra a
minha alma; salva-me por tua graça. Salmo 6:4. Estava pedindo
a salvação da sua alma, que sofria com as tribulações da sua
história e com a cultura do seu povo. Ele era um salvo que
clamava por salvação da sua alma.
O espírito do salmista estava salvo, mas a sua alma
ainda estava no processo de salvação. O cristão também pode
dizer que o Espírito Santo habita no seu homem interior,
mas o seu homem exterior precisa ser desconstruído pela obra
A SALVAÇÃO DA ALMA III 33

da cruz e refeito pelo poder da ressurreição. Nós fomos sal-


vos, mas carecemos ainda de ser salvos.
A salvação do nosso espírito foi unilateral, pois o Espí-
rito Santo a realizou sem nossa participação efetiva, mas a
salvação da nossa alma implica em nossa obediência. Fomos
salvos pela graça, mas agora precisamos crescer em graça, e,
para crescer em graça, temos que crescer para baixo, em hu-
mildade e dependência do Espírito Santo.
Deus é espírito e só se comunica com o nosso espírito,
para que pelo Espírito Santo nós sejamos salvos na alma, de
nossa autoconfiança. Os maiores problemas do pecado em
nossa alma são a autodeterminação, a autoestima e a auto-
confiança que nos mantêm soberbos, arrogantes, afoitos, atre-
vidos e desobedientes a Palavra de Deus.
O processo da salvação da alma será percebido pelo
quebrantamento interior e pelo nível de obediência voluntá-
ria, na vida dos filhos de Deus. Quanto maior for o seu pra-
zer em obedecer à vontade de Deus revelada, mais claramen-
te se percebe a evolução na salvação da sua alma.
A melhor evidência de que uma alma está em proces-
so de salvação não são os êxtases, mas a obediência humilde e
sincera à Palavra de Deus. Não estamos nos referindo aqui,
neste texto, a nenhuma forma de obediência por constrangi-
mento, porém, livre e voluntária.
“Obediência é conformidade com a vontade revela-
da. Divina obediência é conformidade com a vontade revela-
da de Deus”. Isto é reflexo da salvação da alma.
34 A SALVAÇÃO DA ALMA

“Cristo reivindica a nossa obediência, passo a passo,


na medida em que nos revela a Sua vontade e nos dá o Seu
comando. Os seus mandamentos não são penosos. 1 João 5:3.
Isto quer dizer: eles podem ser cumpridos por nós”, os Seus
filhos, que têm prazer em obedecer.
“Todos os Seus seguidores foram redimidos e postos
em liberdade para este propósito: para que possam segui-Lo.
Seguir a Cristo é obedecê-Lo. Seguir a Cristo não é o mesmo
que ter uma religião, ou participar de um sistema moralista.
Seguir significa pertencer a uma Pessoa,” diz-nos, com muita
propriedade, Evan H. Hopkins.
A salvação da alma é um processo de esvaziamento
contínuo que acontece quando nós incorporamos o morrer
de Jesus em nosso modo de viver. O apóstolo Paulo disse as-
sim: trazendo sempre e por toda parte a mortificação do Senhor
Jesus no nosso corpo, para que a vida de Jesus se manifeste também
em nossos corpos. 2 Coríntios 4:10.
Quando levamos os efeitos permanentes da cruz em
nosso estilo de vida, a vida de Jesus se expressa dia a dia em
nosso modo de ser. Foi nesta via que Thomas Brooks afir-
mou: “quanto mais a alma estiver amoldada a Cristo, mais
confiante estará de seu interesse nEle.”
A salvação do ser humano é semelhante ao modelo do
tabernáculo que tinha três compartimentos: o santíssimo, o
santo e o átrio. O santíssimo é como o espírito, o santo, a
alma e o átrio, o corpo. No sacrifício de Jesus o véu que sepa-
rava o santíssimo do santo se rasgou; isto pode significar que
A SALVAÇÃO DA ALMA III 35

a vida do Espírito, no espírito do crente, se infunda na alma,


trazendo a santidade divina para esta alma, que está sendo
salva do seu estilo carnal.
Aquele que teve o espírito vivificado e a Trindade veio
morar no homem interior tem as condições espirituais de
corresponder em obediência ao processo da salvação de sua
alma, obtendo o fim da sua fé: a salvação da sua alma. 1 Pedro
1:9. É isto aí! Há uma mente renovada.

ELE MORREU POR MIM (Natalino Gregório dos Santos)

Sabemos que o prego não era tão pontiagudo


E trabalhado como o é agora
O algoz também sabia disso.

A madeira não era tão macia


Mas tosca, dura e cheia de nós
O sinédrio também sabia disso.
Afinal, quantos já haviam sentenciado
Sob o jugo romano àquela aflição.

Embora Ele não estivesse só,


Foi assim que se sentiu.
Afinal, que diferença faz
O homem para Aquele que
É infinito e se basta
Senão para condená-lo?
36 A SALVAÇÃO DA ALMA

Só há vazio e solidão
Quando rompida uma comunhão.

E quando é que existe comunhão


Entre o Santo e o pecador?

“Eli, Eli, lamá sabactâni?”


(“Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?”)

A comunhão, algo fora rompido.


Por um momento...

Um véu rasgado, rochas fendidas,


Túmulos abertos...
Fenômenos.
Os céus, proclamadores da Sua glória
Foram testemunhas
Do quanto custou
A redenção do pecador.

Santidade, bondade, mansidão, graça...


Tudo isto numa cruz.

Separado, desprezado, abandonado.


Por causa daqueles
Que O fizeram maldito:
Pecadores como eu e você.
A SALVAÇÃO DA ALMA IV

Volta-te, SENHOR, salva minha alma; salva-me


por tua graça. Salmo 6:4.

Estamos caminhando aqui na busca do entendimen-


to da salvação da alma. Este é um ponto e um processo muito
importante para a maturidade cristã.
Já vimos nos estudos anteriores, que o Criador nos fez
tricotômicos, ou seja: corpo, espírito e alma, mas, por causa
do pecado, o espírito foi desconectado de Deus e teve morte
espiritual instantânea, passando o ser humano, daí pra fren-
te, a manifestar-se dicotomicamente, isto é: corpo e alma,
sendo esta a governanta daquele.
A alma apegada ao corpo; no dizer bíblico, apegada ao
pó, torna-se carne, e, a carne, sem a vida espiritual, é carnal,
tanto no que faz de mal como naquilo que faz de bem. O ser
humano carnal é dirigido por sua alma, tanto para o bem,
como para o mal.
38 A SALVAÇÃO DA ALMA

O ser humano, sem o nascimento do alto ou nasci-


mento do espírito, é carnal em tudo o que fizer, seja isto bom
ou ruim. A pessoa ética, sem a vida de Cristo, é carnal em
toda a sua moralidade e a pessoa rude e maliciosa é carnal em
sua rusticidade pessoal e ignorância.
A carnalidade se define pela procedência. Tudo o que
fazemos pelo governo da alma caída, através do corpo, é car-
nal por mais elevado que seja. Por exemplo, cantar na igreja
hinos, apenas pra satisfazer os desejos do ego, é tão carnal
como participar do carnaval. Tudo o que visa a nossa exaltação
pessoal cheira à vaidade da carne.
Os desejos da alma vinculados aos instintos do corpo,
quer sejam positivos ou negativos, acabam se expressando em
carnalidade, ora com o estilo de pura vaidade, ora com uma
fisionomia pálida de vergonha. Tanto a exibição dos talentos
que enaltecem a alma, como o aviltamento moral que a de-
nigre, é carnalidade de fio a pavio.
Jesus disse com clareza: o que foi nascido da carne é car-
ne e o que foi nascido do Espírito é espírito. João 3:6. Todos nós
nascemos neste mundo caído como carne e em razão da
prevalência da alma sobre o corpo, nos tornamos carnais em
tudo o que fazemos. Mas, se pelo Espírito Santo formos nas-
cidos do alto, recebemos uma natureza espiritual que pode
mudar todo o processo aviltante da queda.
Quando o Espírito Santo vivifica o nosso espírito que
encontrava-se morto, do ponto de vista espiritual, nós somos
salvos da condenação do pecado ou regenerados em nosso
A SALVAÇÃO DA ALMA IV 39

espírito e aí começa o processo dinâmico e evolutivo da salva-


ção da alma ou a santificação pessoal.
Do ponto de vista histórico, a regeneração é o primei-
ro tempo da salvação do crente. Há um novo nascimento e o
Espírito Santo vem habitar no espírito regenerado, de onde
inicia a salvação da sua alma. A salvação do espírito é
monérgica, isto é, o Espírito Santo faz isto sozinho, mas a
salvação da alma é sinérgica, uma vez que o Espírito Santo
age e o ser humano regenerado reage coparticipativamente
em confiança e obediência à Palavra de Deus.
O apóstolo Paulo fala assim sobre estes dois lados da
salvação: Mas Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo
fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores. Logo,
muito mais agora, sendo justificados pelo seu sangue, estaremos
sendo salvos da ira através dEle. Romanos 5:8-9.
A morte de Cristo, em favor do pecador, tinha como
objetivo salvá-lo da condenação do pecado, do poder do peca-
do e da presença do pecado. É a salvação que envolve três
etapas: o espírito, a alma e o corpo, nesta ordem. No texto
acima vemos os efeitos da salvação em duas áreas, no espíri-
to, por meio do sacrifício de Cristo, no passado, e na alma,
pela Sua vida no crente, no presente.
No Antigo Testamento havia o Tabernáculo de Moisés
que era uma realidade física, com três compartimentos, fa-
lando de algo espiritual e que tipificava a excelência da Trin-
dade, bem como, o ser humano, criado à imagem e seme-
lhança da Trindade, tricotomicamente.
40 A SALVAÇÃO DA ALMA

Nele havia o átrio, representando o corpo, o santo,


apontando para a alma e o santíssimo, falando do espírito. O
lugar da habitação de Deus era no santíssimo. Quando o pe-
cador é regenerado o Espírito Santo vem habitar no espírito
do homem, que representa o santíssimo.
O Templo de Salomão, também, tinha a mesma con-
figuração. No dia em que Jesus foi crucificado houve algo
inusitado. E o véu do santuário rasgou-se em duas partes, de alto a
baixo. Marcos 15:38. Este véu era grosso e espesso separando
o lugar santo do lugar santíssimo, mas agora tudo ficou
devassado. Houve uma comunicação entre eles que nos faz
pensar numa conexão que há entre o espírito e a alma.
O véu rasgado de cima para baixo implica numa ação
sobrenatural e abre o espaço entre o lugar santíssimo e o
santo. Isto é muito interessante, porque nos permite ver a
ação divina agindo de dentro para fora; do lugar, onde o Es-
pírito habita, no espírito do crente, viabilizando a salvação
da sua alma, por meio da vida ressuscitada de Cristo.
Creio que este episódio do véu rasgado aponte para
a operação do Espírito Santo, no espírito regenerado do
crente, gerando o poder da vida de Cristo, capaz de salvá-lo
de dentro pra fora do poder do pecado que contaminou a
história de sua alma caída.
Só depois que recebemos a salvação do nosso espírito,
podemos participar da salvação de nossa alma poluída pelo
pecado da raça adâmica e da prática existencial. Irmãos, venho
lembrar-vos o evangelho que vos anunciei, o qual recebestes e no
A SALVAÇÃO DA ALMA IV 41

qual ainda perseverais; por ele também estais sendo salvos se


retiverdes a palavra tal como vo-la preguei, a menos que tenhais
crido em vão. 1 Coríntios 15:1-2.
Eu percebo, claramente, aqui, que os crentes já havi-
am recebido no espírito o evangelho da sua salvação, mas
ainda estavam num processo de salvação da sua alma.
De acordo com alguns tradutores das Escrituras, as
palavras “ser salvo”, em muitos textos, deveriam ser também
traduzidas como “estar sendo salvo”, por causa do tempo ver-
bal passivo; vejamos, por exemplo, o seguinte versículo: por-
que todo aquele que invocar o nome do Senhor estará sendo salvo.
Romanos 10:13. Isto pressupõe uma salvação contínua no
presente, ou seja, a salvação da alma do crente.
Outro texto bem conhecido é o da salvação do carce-
reiro de Filipos, que pode ser, com toda segurança muito bem
traduzido assim: crê (definitivamente) no Senhor Jesus e estarás
sendo salvo, tu e a tua casa. Atos 16:31.
O Espírito Santo deu, pela graça plena, vida espiritu-
al, fé e arrependimento ao carcereiro e porque veio habitar
em seu espírito, deu-lhe a possibilidade de ser partícipe do
processo da salvação de sua alma, por meio de sua vivência
obediente à Palavra.
A pregação da Palavra e o Espírito Santo geram vida
espiritual no incrédulo; o Espírito e a Palavra, agora, implan-
tada no crente, criam as condições de desenvolver a salvação
da alma na vida da nova criatura, do espírito regenerado pela
graça. Portanto, despojando-vos de toda impureza e acúmulo de
42 A SALVAÇÃO DA ALMA

maldade, acolhei, com mansidão, a palavra em vós implantada, a


qual é poderosa para salvar a vossa alma. Tiago 1:21.
A salvação da alma, também nomeada de santificação, é
vista como processo dinâmico, evolutivo e permanente da mani-
festação da vida de Cristo no crente até que todos cheguemos à
unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita
varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo, Efésios 4:13.
Quando nós nascemos de novo, nosso espírito é vivifi-
cado e é salvo da condenação do pecado. Agora, pois, já nenhu-
ma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. Romanos
8:1. Todavia, a nossa alma e o nosso corpo continuam sob os
efeitos vigentes da queda e precisam da salvação efetiva do
poder do pecado e da sua presença.
Fixando: fomos salvos no nosso espírito pelo sacrifício
de Cristo. Isto ocorreu de uma vez para sempre, totalmente
feito por meio do Espírito Santo. Uma vez salvos, no espírito,
começa a salvação da alma, por meio da vida de Cristo agindo
em nós. Este processo envolve o Espírito Santo que habita no
espírito do crente e a obediência deste à Palavra de Deus nele
implantada. Nesta segunda parte da salvação há uma sinergia
viva, onde o Espírito age e o crente reage obedecendo à Palavra.
Resta ainda a terceira parte da salvação, quando o
Senhor Jesus vier buscar a Sua igreja e os corpos dos crentes
forem glorificados. Este modo operante da salvação, pela fé,
é assim: fui salvo no espírito, unicamente por ação divina;
estou sendo salvo na alma, cooperativamente, e, serei salvo
no meu corpo, pelo poder unilateral de Deus. Ok?
A SALVAÇÃO DA ALMA V

E minha alma se regozijará no SENHOR e


se deleitará na sua salvação. Salmo 35:9.

Deus criou o mundo do nada e do nada fez tudo o que


existe, embora tudo o que existe nada venha a acrescentar
qualquer sentido ao Seu eterno e soberano ser. O nada para
Ele foi o tudo de Sua criação, mas o tudo da criação continua
sendo nada diante de tudo que Ele é.
Deus não precisa de nada e de ninguém para fazer
tudo que Ele quiser. Ele criou do nada o universo e do pó da
terra fez o ser humano à sua imagem e semelhança. Deus é o
Criador de tudo e nada, nem ninguém pode impedir aquilo
que Ele quiser fazer. O vidente via assim: ainda antes que hou-
vesse dia, eu era; e nenhum há que possa livrar alguém das
minhas mãos; agindo eu, quem o impedirá? Isaías 43:13.
A Trindade fez o ser humano do pó da terra e soprou
nas suas narinas o fôlego das vidas e ele foi feito uma alma
44 A SALVAÇÃO DA ALMA

vivente. Temos visto aqui nestes estudos sobre a salvação da


alma, que o homem foi criado tricotômico, corpo, espírito e
alma, mas por causa do seu pecado ele acabou se tornando
dicotômico, separado de Deus em razão da morte espiritual.
O apóstolo Paulo mostra claramente este fato com as
seguintes palavras: Ora, o homem natural não aceita as coi-
sas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode
entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente. 1
Coríntios 2:14. O termo natural, no grego, é , isto é,
psíquico, anímico, almático – governado pela alma que ja-
mais poderá compreender as realidades espirituais.
Somos uma raça caída e incapaz de ter comunhão com
Deus por nós mesmos. O ser humano natural vive por suas
capacidades biológicas e psicológicas, podendo se tornar uma
pessoa digna, moralmente, e com grande instrução, mas en-
contra-se, espiritualmente morta.
O bebê nasce neste mundo com um corpo e uma alma
caídos e embrionários e requer alimento, cuidado e educação
para que se desenvolva como ser humano. Todavia ele não
tem vida espiritual em si mesmo. O ser humano natural en-
contra-se desprovido, totalmente, de vida espiritual. A raça
adâmica está desconectada da comunhão com Deus.
A existência humana caída se manifesta através dum
sujeito rebelde, incrédulo, depravado, ensimesmado, egoísta
e sem a menor inclinação para a Pessoa de Deus. Só depois
do milagre da vivificação espiritual ou do novo nascimento,
o espírito pode ser reconectado à Deus e gozar da vida divina
A SALVAÇÃO DA ALMA V 45

em sua existência humana. Agora temos um ser humano ou-


tra vez tricotômico e capaz de reagir espiritualmente para o
processo da salvação de sua alma.
Quando o Espírito Santo vem habitar em nosso espí-
rito vivificado, inicia-se uma fase nova em nosso ser: a salva-
ção progressiva de nossa alma. A vida e o poder do Espírito
que vivem em nosso espírito começam a limpar nossa alma
de todo o lixo acumulado e curar as feridas e traumas que
marcaram a nossa história. Aqui acontece algo muito especi-
al: o Espírito de Deus age e o crente reage em submissão e
obediência cada vez mais prazerosas.
A salvação da alma ou “o crescimento espiritual rumo
à maturidade é obra de Deus, do começo ao fim, e a glória
deverá ser somente dEle. O mesmo Deus que do nada criou
o universo e que pode contar os fios de cabelo de sua cabeça,
agirá em sua vida do modo que lhe aprouver em todas as
coisas,” e lhe fará reagir voluntariamente.
Vejamos como o apóstolo Paulo entendia este proces-
so progressivo da graça: assim, pois, amados meus, como sem-
pre obedecestes, não só na minha presença, porém, muito
mais agora, na minha ausência, desenvolvei a vossa salvação
com temor e tremor; porque Deus é quem efetua em vós
tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade.
Filipenses 2:12-13.
A boa vontade do Espírito Santo faz com que a nossa
vontade fraca e indisposta queira, também, fazer a vontade
de Deus, de boa vontade. A. W. Pink disse com precisão:
46 A SALVAÇÃO DA ALMA

“O Espírito Santo faz algo mais em cada um dos eleitos de


Deus do que faz nos não eleitos. Ele opera neles ‘tanto o
querer como o realizar segundo a sua boa vontade’”.
A eleição do crente só pode ser entendida pela salva-
ção da alma e esta pelo vigor da santidade de Deus. Sem a
santificação em nossa alma, ninguém verá o Senhor e sem a
obra do Senhor, em nossa alma, ninguém verá a santificação.
Se a Trindade veio viver em nosso espírito e se o Espí-
rito Santo se manifesta em nossa alma, então o poder de
Deus vem nos capacitar a fazer de boa vontade a Sua vontade
e, neste caso, crescer em graça sobre graça neste processo da
varonilidade de Cristo Jesus.
Louve a Deus por sua graça plena! Ao contrário do
senso comum, o crescimento espiritual não depende de nos-
sa obediência pessoal em si mesmo, mas a nossa obediência
pessoal depende da operação da graça de Deus agindo em
nós. Creio que hoje eu estou tão maduro, quanto a graça me
tem possibilitado estar, mas isto não significa que eu esteja
tão maduro, quanto a graça ainda irá me levar, pois é pela
graça que eu sou o que sou.
Há um entendimento errado que pode nos levar a
muita ansiedade se tentarmos prover a santidade espiritual
a partir do nosso esforço pessoal, esquecendo que na fé cristã,
tanto o querer como o realizar vem pelo mover da graça de
Deus, em nosso homem interior.
Cremos que a vida cristã começa com a vivificação
espiritual operada pela graça soberana do Senhor, por meio
A SALVAÇÃO DA ALMA V 47

do Espírito Santo. Cremos que a santificação se processa pela


vida ressurreta do Senhor, desenvolvida em nós pelo poder
Espírito Santo. Cremos que este processo de desenvolvimen-
to da vida espiritual é um dom preciso da graça que nos mo-
tiva, de um modo prazeroso a corresponder, voluntariamen-
te, a vontade do Senhor, em nosso modo de viver.
Mas quero que fique bem claro. O nosso crescimento
espiritual não quer dizer a mínima passividade de nossa par-
te, e, por outro lado, nenhum ativismo da carne. É a ação
motivadora do Espírito Santo correspondida por uma reação
voluntária e deliberada do crente.
Não há vida espiritual sem o novo nascimento realiza-
do unilateralmente pela Trindade divina, bem como não há
santificação sem o agir responsivo do crente. Sabemos que já
passamos da morte para a vida porque amamos ao Senhor,
os irmãos e há o anseio da santidade de Cristo em nosso modo
de andar, mesmo que ainda seja algo incipiente.
Este processo de santificação ou salvação da alma não
é peso, obrigação ou uma imposição divina, mas alegria de
viver segundo a vontade do Pai. O processo normalmente é
lento, embora progressivo e irreversível, pois trata-se duma
obra financiada e sustentada pelo Senhor. Estou plenamente
certo de que aquele que começou boa obra em vós há de
completá-la até ao Dia de Cristo Jesus. Filipenses 1:6.
O crescimento espiritual ou a salvação da alma, ainda
que seja visível, consiste mais no crescimento da raiz que
está fora do alcance da vista, do que no crescimento da copa
48 A SALVAÇÃO DA ALMA

que pode ser percebida pelos observadores. Um dos perigos


daquilo que é visto é o orgulho que gera, quando o crente é
elogiado pelo seu progresso na fé.
Precisamos avançar em nossa vida espiritual, mas pre-
cisamos avançar mais fora dos holofotes e dos aplausos. A
santificação é sempre progressiva, mas sempre desapegada à
louvação dos outros. Quem busca admirador acaba perden-
do a sua função de adorador. O crescimento espiritual é an-
tes de tudo diante do trono de Deus.
Gosto muito deste pensamento de A. W. Pink: “assim
como a desesperança do pecador de receber qualquer ajuda
de si mesmo é o primeiro requisito para uma conversão real,
também a perda de toda confiança em si mesmo é o princi-
pal fator para o crescimento do crente na graça.” Aqui não
há lugar para autoconfiança e autoestima.
Para Thomas Watson: “um cristão adequado não é
como o sol de Ezequias, que recuou, nem como o sol de Josué,
que permaneceu imóvel, mas como aquele que está sempre
avançando em santidade e elevando-se no crescimento de
Deus.” Crescer em Deus é crescer diariamente na graça e no
descanso da suficiência de Cristo.
Jesus foi categórico neste ponto da vida cristã: tomai
sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e
humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma.
Mateus 11:29. A salvação da alma é, portanto, o repouso no
sacrifício de Cristo. O jugo onde Jesus e o pecador estiveram
unidos foi a cruz, logo, é da nossa morte na cruz que advém a
A SALVAÇÃO DA ALMA V 49

certeza de que Cristo é nossa nova vida, na ressurreição.


Desta substituição da vida da alma (psique) pela vida
da ressurreição (zoe) é que advém o processo progressivo da
salvação da alma. Assim, o crescimento espiritual não é o
produto do esforço psíquico de alguém esforçado, mas da ma-
nifestação da vida de Cristo, de modo solidário.
Por isso, “a maneira correta de crescer é crescer me-
nos aos seus próprios olhos” e crescer sempre para a glória de
Deus. Aquele que nasceu de novo cresce em santidade.

Quando Deus quer preparar um homem,


dar visão a um homem e adestrar um homem
Quando Deus se decide a moldar um homem
dar forma a um homem, e fazer dele um homem
que desempenhe o maior papel;

Quando Aquele cujo nome é o grande EU SOU


cria, redime, e agracia um homem
para que toda a terra ouça a Palavra
e continentes adormecidos despertem,
olhem com atenção as obras de Deus!

Como Ele implacavelmente aperfeiçoa


Seu servo, sim Seu eleito amado.
Com marteladas Ele o vai ferindo,
com poderosa graça o convertendo
em formas torturadas de barro.
50 A SALVAÇÃO DA ALMA

E quando seu coração partido suplicar


que cálices passem e espinhos morram
e noites terminem, e brilhe nova luz
para que “meu amado seja realmente meu”,
seu Pai entenderá.

E se ele adormece Deus o acorda


e o dobra, mas nunca o despedaça.
E Deus usa aquilo que escolhe,
e por todo e cada meio nele induz
a semelhança de Cristo – o alvo.

Este Regente soberano dos céus,


que é sempre gracioso, e sempre sábio
mantém nas mãos o tempo do homem
e todas as coisas estão a Seu dispor,
bem sabe Ele o que irá fazer.

E morte e pragas grassam à volta desse homem


mas não pode morrer até que Deus assim ordene,
e flecha alguma o atingirá
até que o Deus de amor assim o determine,
e nessa promessa esse homem, sim, descansará.

(Poema de autoria anônima. Tradução de Carlos


Oswaldo Ribeiro Pinto e adaptação de seu filho, Dr.
Carlos Osvaldo Cardoso Pinto, ambos já com o Senhor).
A SALVAÇÃO DA ALMA VI

O Senhor terá piedade do fraco e do


necessitado e salvará as almas dos
indigentes. Salmo 72:13.

Alguém me perguntou uma vez: - a Trindade é onipo-


tente? Ela tem todo o poder para salvar totalmente o peca-
dor? Se tem, por que não salvou de uma vez por todas? Por
que a salvação não é um fato definitivo? Por que temos uma
salvação em etapas? Por quê?!
Foi uma descarga de indagações e precisei de algum
tempo para respirar e tentar fazer as minhas considerações.
Vou procurar repeti-las aqui de modo raso, como é próprio
do meu saber, mas vou me empenhar em alguma resposta
para estas perguntas.
A Trindade é onipotente. Sinto firmeza quando leio
Samuel Rutherford (séc. 17) dizendo: “a minha fé não tem
leito em que possa dormir, a não ser na onipotência.” En-
tão, escuto C. H. Spurgeon (séc. 19) afirmar com uma voz
52 A SALVAÇÃO DA ALMA

de trovão: “a glória da Onipotência é atuar mediante impro-


babilidades.” Deus é onipotente, sim, e age com perfeita sa-
bedoria e soberania, mas a minha mente encontra-se muito
aquém do entendimento sobre Ele.
Deus pode salvar totalmente e de uma vez por todas,
mas, se não o fez, é porque tem Suas razões, que a nossa razão
finita e tridimensional não pode compreender. O salmista
nos dá uma boa pista segura: no céu está o nosso Deus e tudo faz
como lhe agrada. Salmo 115:3.
E o que de fato e verdadeiramente O agrada? De fato,
sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que
aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que se torna
galardoador dos que o buscam. Hebreus 11:6.
O mundo espiritual de Deus só será percebido pela fé
e a fé só será manifestada por meio da Palavra de Deus. Se
vivemos por fé, podemos ver as perfeições divinas. “Nossa
teologia jamais estará correta enquanto em nossos corações
não investirmos Deus de infinito poder e perfeição,” disse
William S. Plumer, (séc. 19) – mas isto é apenas pela fé.
Dentro da sabedoria e perfeições divinas temos a sal-
vação em etapas, e creio que isto tem a ver com a participa-
ção efetiva do crente no processo da salvação. Deus salva o
ser humano em três tempos: passado, presente e futuro. A
salvação é definitiva e progressiva.
Ele salvou o espírito, no passado, unilateralmente, por
meio da obra de Cristo, no Calvário. Salva a alma, no pre-
sente, de modo compartilhado, através da vida de Cristo
A SALVAÇÃO DA ALMA VI 53

manifesta pelo Espírito, onde o crente responde, voluntaria-


mente. Salvará o corpo no futuro, também unilateralmente,
quando da vinda de Cristo, para buscar os seu povo.
A queda da raça adâmica foi um ato voluntário do ser
humano e a salvação dos filhos de Deus é um processo, em
que o Espírito Santo regenera o espírito caído pela graça, de
modo unilateral, mas salva a alma dos regenerados de modo
sinérgico, isto é: o Espírito Santo age e o crente reage, volun-
tariamente, obedecendo à Palavra de Deus.
A salvação da alma é progressiva, contudo, não se tra-
ta de uma salvação que nos conduza, aqui e agora, à nossa
perfeição pessoal, pois, com certeza, estaríamos em grande
perigo de nos orgulhar desta perfeição. A salvação da nossa
alma é um processo que nos conduz à dependência da perfei-
ção de Cristo, para nos levar à humildade e submissão.
O espírito foi salvo definitivamente, mas a alma do
salvo precisa ser salva dia a dia de tudo que a envaideça. Há
um grande perigo de exaltação rondando a vida daqueles que
creem em Cristo. A soberba da fé é realidade que viceja nos
corações mais insuspeitos. É preciso um quebrantamento do
ego. Deus salvará as almas dos indigentes.
Sem o quebrantamento ou o esvaziamento da alma
não há nenhum crescimento da vida espiritual. Não há vida
espiritual no homem velho, o velho Adão, e não há um ho-
mem novo sem o esvaziamento permanente de sua alma. A
plenitude da vida de Cristo só acontece quando se experi-
menta, diariamente, o morrer de Cristo em nossa alma.
54 A SALVAÇÃO DA ALMA

Um dia meu espírito foi vivificado, pois o Espírito


Santo veio habitar no meu espírito, mas a minha alma preci-
sa ser salva dia a dia. Jesus dizia a todos: qualquer que quiser vir
após mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me.
Lucas 9:23. Este levar a cruz e segui-lo é diuturno e não tem
feriado, férias ou vacância.
Entretanto, só pode querê-Lo quem foi realmente
querido por Ele. Só pode negar-se quem foi aceito por Ele.
Só pode tomar sua cruz, dia a dia, aquele que tem a vida dEle
em seu espírito. Só pode segui-Lo quem for conduzido pelo
Espírito Santo a isto, de modo voluntário.
A alma caída encontra-se marcada por uma história
de lembranças frustrantes e traumas adoecedores, que a man-
tém asfixiada e cheia de reações e pitis inadequados. Por isso,
é necessária uma obra permanente e insistente do Espírito
Santo, para desconstruir todo este amontoado de incoerênci-
as que habita a alma humana desterrada do Éden.
O apóstolo Paulo propôs assim: se já morrestes e res-
suscitastes juntamente com Cristo... fazei, pois, morrer a vossa
natureza terrena: prostituição, impureza, paixão lasciva, desejo
maligno e a avareza, que é idolatria; por estas coisas é que vem a ira
de Deus [sobre os filhos da desobediência]. Colossenses 3:5-6.
Quem pode fazer morrer a natureza terrena? Somen-
te quem já foi vivificado em seu espírito, por meio do Espíri-
to Santo. Sem a vida de Cristo agindo em nosso íntimo, so-
mos incapazes de promover a desestima do nosso ambicioso
egoísmo. A mortificação da carne só será possível pelo poder
A SALVAÇÃO DA ALMA VI 55

sobrenatural da vida de Cristo agindo permanentemente em


nosso ser. Não há mortificação sem a vida de Cristo.
A salvação do espírito é instantânea; a salvação da alma
é contínua. Enquanto não tivermos um corpo glorificado,
não teremos uma alma totalmente madura e perfeita. A per-
feição do crente, neste mundo, é o crescimento na suficiên-
cia de Cristo. Quanto mais dependermos da plenitude da graça
em Cristo, mais aperfeiçoados seremos na vida cristã.
O crente maduro não é uma pessoa autônoma e inde-
pendente. Crescer na vida espiritual é crescer em subordina-
ção à vontade de Deus. O ser humano natural maduro é
alguém que se autodirige. O crente maduro é o indigente
dirigido pelo Altíssimo. O índice que avalia o crescimento
natural é de 0 a 10; de totalmente dependente à totalmente
independente, enquanto, na salvação da alma a escala é de
10 a 0 – totalmente inversa, em direção à dependência total.
A oração, o Senhor salvará as almas dos indigentes, tem a
ver com a total dependência do crente. O pecado tem como
proposta a independência do ser humano e a sua elevação,
mas a salvação da alma propõe a humilhação em submissão
obediente e dependência completa.
A nossa alma não será salva pela obediência em si
mesmo, embora obedecer seja essencial no processo, toda-
via, é bom lembrar que esta obediência só terá sentido, se ela
for movida pela vida de Cristo, que opera em nós. Obediên-
cia de ególatra é egolatria pura e incapaz de nos manter fora
do altar. É impossível ao ego obedecer e não se vangloriar.
56 A SALVAÇÃO DA ALMA

Na verdade nós somos salvos pela obediência de Cris-


to, que a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte
e morte de cruz, Filipenses 2:8, e, assim, nos fez participantes
de Sua obediência, para que por esta obediência pudéssemos
obedecer de coração Àquele que nos salvou da rebeldia car-
nal do pecado, tornando-nos submissos a Ele.
Podemos dizer como Barbara R. Duguid: “de uma for-
ma amorosa, Deus abre os nossos olhos para que possamos
nos arrepender e nos maravilhar com o fato de Cristo ter
desejado deixar as glórias do céu para morrer por grandes
pecadores como nós. Quando estamos no deserto, a obediên-
cia de Cristo em nosso favor pode se tornar uma doutrina
estimada.” De fato, é a obediência de Cristo por nós que des-
perta a nossa obediência a Ele.
Quando vejo quão pecador sou e quão indigno da gra-
ça de Deus, vejo ainda quão grande é essa graça que me man-
tém seguro, ainda que totalmente fracassado. O fracasso e a
fraqueza são dois ingredientes indispensáveis para o processo
da salvação da alma, pois um dedal de autossuficiência seria
necessário para anular a minha dependência do Senhor.
Nunca poderei dizer: eu sou um cristão maduro, evo-
luído e sarado, porém, pela graça de Deus eu poderei dizer
que tudo o que sou, sou pela graça. Sei que o meu fracasso
me faz perceber o quanto sou amado e cuidado pela suficiên-
cia do Senhor. É Ele quem me basta.
Glória a Deus pelo nosso fracasso. Isso parece sem sen-
tido, mas o poder de Deus está na nossa fraqueza. A Sua vida
A SALVAÇÃO DA ALMA VI 57

está em nossa morte. O Seu tudo está em nosso nada. É ma-


ravilhosa a forma como Deus age. Os santos de Deus nascem
da impotência. Agradeça a Deus por sua fraqueza, incapaci-
dade e até pelo pecado que o leva a depender dEle.
“O pecado é a declaração de independência de Deus
feita pelo homem”, mas a salvação da sua alma é promovida
por uma renúncia de si mesmo em busca de uma vida de per-
manente e total dependência de Deus em seu viver diário.
Soli Deo gloria!

SATISFAÇÃO (Cantor Cristão - 383)


Letra: Frances Ridley Havergal
Tradução: João C. da Costa

Senhor Jesus, eu te amo mais


Que o mundo e seu prazer;
Pois deste-me perfeita paz,
Que nunca irei perder.

Senhor, de mim mais perto estás


Que amigos meus aqui!
Oh, quanto à alma satisfaz
O só pensar em ti!
58 A SALVAÇÃO DA ALMA

E de prazer meu coração


Eu sinto transbordar;
Sem ti comigo, os dias são
Quais noites sem luar.

Ó meu precioso Salvador,


Que gozo é caminhar
Aqui contigo, e sem temor
Teu rosto contemplar!

CORO:
Metade nunca se contou
Do amor de Deus Jeová!
Metade nunca se contou
Da paz que aos salvos dá!
A SALVAÇÃO DA ALMA VII

Salva-me, ó Deus, porque as águas me


sobem até à alma. Salmo 69:1.

Este Salmo fala dos sofrimentos do Messias ante o ter-


ror da morte. É uma figura do Seu batismo na cruz, focalizan-
do a salvação da alma e a libertação de um povo que Ele veio
assumir do meio desta humanidade caída e separada de Deus,
por causa da arrogância do pecado. É algo que transcende os
limites da compreensão humana.
O clamor de Jesus no Getsêmani tem tudo a ver com
um grito sufocado da sua alma em profunda tristeza ou an-
gústia existencial. Como disse John Trapp: “O Filho de Deus
viveu sem pecado, mas não sem tristezas.” Então, lhes disse:
A minha alma está profundamente triste até à morte; ficai aqui e
vigiai comigo. Mateus 26:38. Aqui Jesus vivia a sua grande
crise de depressão ao assumir o pecado do seu povo escolhi-
do desde a eternidade passada.
60 A SALVAÇÃO DA ALMA

A alma pós-pecado é uma entidade destituída de co-


munhão com o seu Criador e que vive criando meios para
tentar satisfazer o vazio de identidade, que passou a existir
em seu interior. A morte do Messias fala da conquista sobre
o poder da morte e a libertação da alma escravizada pelos
efeitos ensoberbecidos da rebeldia edênica, cultivada com
ardis. É um milagre extraordinário.
No processo da revelação bíblica há um fato bem
instigante. Ao falar do aumento da linhagem dos homens,
que creio seja a descendência de Caim, houve uma miscige-
nação dos filhos de Deus com as filhas dos homens ou um
casamento de duas linhagens: vendo os filhos de Deus que as
filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres, as
que, entre todas, mais lhes agradaram. Gênesis 6:2.
Sei que o texto tem sido interpretado com outras ver-
tentes, mas, para mim, isto se trata do casamento dos descen-
dentes de Sete, a família dos filhos de Deus, com algumas
mulheres descendentes de Caim, a família dos filhos dos ho-
mens. Vejo aqui um casamento misto e a mistura de duas
culturas, gerando uma espécie de gigantes físicos e psíquicos.
Este cruzamento fez surgir um tipo, definido pela pa-
lavra hebraica gibbowr, que é traduzida por valente ou pode-
roso. Este tipo não desapareceu no dilúvio, pois o vemos ou-
tra vez na descendência de Cão, encarnado em Ninrode, um
caçador diante do Senhor.
O que alguém poderia caçar diante do Senhor? Não
me parece que seriam leões ou elefantes, mas almas. A grande
A SALVAÇÃO DA ALMA VII 61

caçada do humanismo é por almas vinculadas à cultura anti-


cristo, que busca a entronização do ser humano ao panteão
da serpente teomânica. Aqui reside uma pista que dá origem
aos pódios, palanques, palcos, plataformas e púlpitos.
Os caçadores de almas são alpinistas do poder, arqui-
tetos de pirâmides, torres e de tudo que os eleve e os notabi-
lize. Esta cultura sutil da meritocracia tem sido a disciplina
das elites nos cursos de pós-doutorado na captura das almas
carentes. Toda criança nasce caída e vazia de significado nes-
te mundo, mas aspirando aos cumes, topos e cúpulas.
Todos nós desembarcamos na terra com uma inclina-
ção ao trono e ao cultivo dos altares, facultando o ingresso
imediato dos bebês aos cursos de dominadores do planeta. A
vida na terra é governada por ambições cósmicas e a alma
vive construindo plataformas de lançamento para se atirar
como pipa em busca dos lugares altos e, deste modo, tornar-
se, de alguma forma visível e notável na arquibancada do seu
show bizarro de ser como Deus.
A alma poderosa é fruto da proposta da serpente e da
altivez cultural ninrodiana do zigurate, que investe na ascen-
dência hierárquica e na celebridade humana. Nossa alma se
inquieta pela ideia de grandeza, notoriedade, importância e
poder. A alma encontra-se embriagada pela glória.
Somos uma raça caída, mas caiada. Somos pó, raste-
jando no pó e ambicionando o céu. Somos alimento de ser-
pente vivendo a mitomania da idealização. Fingimos ser o que
jamais fomos e vivemos na hipótese apolínea da perfeição.
62 A SALVAÇÃO DA ALMA

Somos sapos enlameados com a pretensão de viver como prín-


cipes encantados. Isto é um conto de fadas da alma altiva.
Foi bem aqui neste pântano lamacento das ambições
elevadas que Cristo Jesus se encarnou. Estou atolado em profun-
do lamaçal, que não dá pé; estou nas profundezas das águas, e a
corrente me submerge. Salmo 69:2. O que Ele está fazendo neste
mundo caído e depravado? Veio salvar as almas ensoberbeci-
das pelo pecado. Veio salvar-nos de nós mesmos.
A geração das almas iludidas, narcísicas e alucinadas
tem se afogado no poço da imaginação, contemplando sua
imagem idealizada. O egoísmo asfixiante vem atolando na
lama do barro cada alma que nasce neste mundo governado
pela cultura do alpinismo, mas Deus, em sua graça, decidiu
salvar um povo exclusivamente Seu, zeloso de boas obras.
Então, Jesus se encarna num barro lamacento e toma
a causa destes pigmeus terrenos, administrados pela morte,
mas com alma de gigante, e vai, voluntariamente, até a cruz
para desfazer todo o processo de envenenamento da serpen-
te. A morte de Jesus tem o poder de vencer o poder da morte
e desintoxicar do veneno de altar, as almas do Seu povo.
O ser humano criado tricotômico: corpo, espírito e
alma acabou dicotômico com a queda. O espírito foi desco-
nectado do Criador e a alma atolada, no corpo barrento,
aspira ao pódio em sua epopeia de divinização... como Deus
sereis... serei Deus... sou Deus.
Jesus vai até à cruz e desfaz o encantamento da cobra,
anulando o poder sutil da morte e, em seguida, da sua tumba
A SALVAÇÃO DA ALMA VII 63

escancarada, dá vida ao espírito morto, habitando nele por


meio do Espírito Santo. Com esta vivificação espiritual, a
Trindade inicia, na história, a salvação de um povo que foi
projetada por Ela na eternidade.
Alguém já disse: “a graça está especialmente associada
com os homens em seus pecados; a misericórdia está geral-
mente associada com os homens em sua miséria”, e Santo
Agostinho procura trazer luz a este quadro trágico: “a graça
de Deus não encontra homens aptos para a salvação, mas
torna-os aptos a recebê-la.”
O apóstolo Paulo vê esta fase assim: Vocês, porém, não
estão na carne, mas no Espírito, se, de fato, o Espírito de Deus
habita em vocês. E, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal
não é dele. Romanos 8:9. Se já fomos regenerados, o Espírito
Santo tem seu endereço no nosso espírito. O problema é
este: alma e corpo ainda estão sob os efeitos da queda e preci-
sam de salvação de dentro para fora.
Agora, há algo interessante aqui nesta vivificação.
Vejamos: Se, porém, Cristo está em vocês, o corpo, na verdade, é
algo mortal por causa do pecado, mas o espírito é vida, por causa da
justiça. Romanos 8:10. O corpo que é o vaso de barro da
alma, encontra-se ainda sob o domínio da morte. Aliás, o
corpo sem alma é cadáver.
Mas a questão vai mais adiante. Se habita em vocês o
Espírito daquele que ressuscitou a Jesus dentre os mortos, esse mes-
mo que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os mortos vivificará tam-
bém o seu corpo mortal, por meio do seu Espírito, que habita em
64 A SALVAÇÃO DA ALMA

vocês. Romanos 8:11. Aqui vemos o Espírito Santo em sua


habitação, em nosso espírito, salvando o corpo mortal, isto é,
a psique e o soma. Nós já vimos que corpo (soma) sem a alma
(psique) é um cadáver ou defunto.
A salvação da psique é um processo permanente, onde
o Espírito Santo age e a alma encarnada reage voluntaria-
mente em viva obediência. Não se trata de uma ação unilate-
ral, como no caso da vivificação do espírito, mas numa
coparticipação do crente, espiritualmente salvo, cooperando
com o Espírito Santo de Deus, no propósito da purificação
de todo o lixo acumulado nos esconderijos da memória de
sua alma em todo o tempo de sua história.
D. W. Dyer, no seu livro, De Glória em Glória, diz:
“Como você já deve ter suposto, este processo contínuo de
salvação é algo que está acontecendo em nossa ‘segunda par-
te’, nossa alma. Quando nascemos de novo, nossa ‘primeira
parte’, nosso espírito, é salvo. No futuro, quando Jesus voltar
em glória, nossa ‘terceira parte’, nosso corpo, será salvo. Mas
hoje, Deus está fazendo um trabalho contínuo em nossa ‘se-
gunda parte’, nossa alma.” E esta etapa é sinérgica, isto é:
Deus e o crente trabalham juntos.
Nós podemos ver como este processo se desenvolve
adequadamente na vida cristã, nesta versão das Escrituras:
Portanto, meus irmãos, nós temos uma atribuição, que é a de não
vivermos de acordo com a nossa natureza humana caída. Porque,
se vivermos de acordo com esta natureza, estaremos dominados pe-
los efeitos da morte; mas, se pelo Espírito Santo, nós mortificarmos
A SALVAÇÃO DA ALMA VII 65

os feitos pecaminosos, com toda certeza, viveremos espiritualmente


sadios em Cristo. Romanos 8:12-13.
“O plano de Deus é substituir, pouco a pouco, nossa
vida terrena e corrupta por Sua gloriosa Vida eterna. Isto é o
que o termo ‘a salvação da alma’ quer dizer”. Fui salvo no
meu espírito, estou sendo salvo na minha alma e serei salvo
no meu corpo. Amém.

AMOR SUBLIME (Cantor Cristão - 22)


Letra: Edmund S. Lorenz
Tradução: Ida Scott Taylor

Qual ave que, buscando os céus,


O mundo deixa e seus troféus,
Minha alma vem a Ti, Senhor,
Pra conhecer teu terno amor.

Amor sublime, amor real,


Amor eterno e sem igual,
Sobre uma cruz por mim morrer
E me salvar por seu poder!
66 A SALVAÇÃO DA ALMA

Teu Nome, ó Deus, publicarei,


A tua graça, a tua lei,
O teu poder e o teu amor!
Minha alma adora-te, Senhor!

CORO:
Divino amor, sublime amor,
Dos grandes temas o maior!
Minha alma quer fruir, gozar
De Cristo o tão sublime e amor.
A SALVAÇÃO DA ALMA VIII

Salvou-se a nossa alma, como um pássaro


do laço do passarinheiro; quebrou-se
o laço, e nós nos vimos livres.
Salmo 124:7.

Temos andado aqui na via da salvação da alma, sob a


compreensão de que o ser humano foi criado em três partes
distintas: corpo, espírito e alma. Mas, em consequência do
pecado, a humanidade tornou-se dicotômica, em face da sua
morte espiritual. (Corpo e alma).
O corpo de Adão foi feito do pó da terra. Deus lhe
soprou o espírito das vidas e o ser humano se tornou em
alma vivente. O corpo biológico se relacionava com o mun-
do físico; o espírito com Deus e a alma servia de intermediá-
ria entre as duas esferas, física e espiritual. Com o advento do
pecado, o ser humano foi desconectado de Deus, perdendo a
sua função espiritual. E com o espírito morto, a alma tenta
desempenhar esta função.
68 A SALVAÇÃO DA ALMA

Em razão disto, muito frequentemente consideramos


os seres humanos como compostos de uma parte material e
outra imaterial. Esses dois componentes são muitas vezes cha-
mados de corpo e alma ou corpo e mente, num enfoque dico-
tomizado, amplamente aceito.
O ser humano, neste estado caído, não compreende
a realidade espiritual. Sua mente natural ou psíquica não
entende aquilo que é espiritual e não há vida espiritual no
espírito morto do ser humano, desterrado do Éden. A alma
caída, neste caso, encontra-se separada de Deus e profunda-
mente caótica, cheia de lixo. Por isso, antes que se inicie a
salvação da alma, é preciso haver a vivificação do espírito,
através do Espírito Santo.
O ser humano foi criado corpo, espírito e alma, mas
por causa do pecado, o seu espírito morreu, passando, daí pra
frente, a ser corpo e alma. Com a regeneração espiritual há a
vivificação do espírito e a ordem da salvação muda todo o
processo de entendimento, fazendo com que o ser humano
seja visto como espírito, alma e corpo.
O apóstolo Paulo percebeu este processo da revelação
do Espírito Santo, ao descrevê-lo deste modo, de dentro pra
fora: O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo; e o vosso espí-
rito, alma e corpo sejam conservados íntegros e irrepreensíveis na
vinda de nosso Senhor Jesus Cristo. 1 Tessalonicenses 5:23.
Antes, a compreensão era de fora pra dentro, do con-
creto para o abstrato, mas não chegava ao espírito, pois esta-
va desconectado, morto, e agora é de dentro pra fora, do
A SALVAÇÃO DA ALMA VIII 69

espiritual para o racional, e então, para a vivência física. As-


sim, o crente vive do espírito para a alma e desta para a ex-
pressão corporal, em seu modo de ser existencial.
O Espírito Santo vem habitar no íntimo do espírito
vivificado do crente, e de lá age por meio da Palavra para
produzir a reação do crente, no sentido da salvação da sua
alma. A vida ressurreta de Cristo se torna a matriz para a
santificação do salvo.
“A salvação da alma não é um ato isolado ou um úni-
co evento. É um processo ao qual todos nós devemos prestar
séria atenção.” Não é algo que Deus fez sozinho, como na
criação do mundo ou na regeneração do espírito, porém uma
obra em que o crente responde, do seu espírito regenerado,
de dentro para fora, à ação divina.
Os nossos pais pecaram quando estavam fora da inti-
midade com Deus. Foi num momento de desatenção, ao re-
ceberem a visita da cobra. Eles foram seduzidos pelo desejo
de entendimento, como mostra o texto: Vendo a mulher que a
árvore era boa para se comer, agradável aos olhos e árvore desejável
para dar entendimento, tomou-lhe do fruto e comeu e deu também
ao marido, e ele comeu. Gênesis 3:6.
Examinando a agenda do casal, parece que esta visita
se deu no crepúsculo do dia e o Senhor tinha comunhão com
eles na manhã, pois logo que ouviram o som do Senhor Deus
subindo e descendo no jardim à brisa do dia, o homem e a sua
esposa se esconderam da face do Senhor Deus no meio das árvores
do jardim. Gênesis 3:8.
70 A SALVAÇÃO DA ALMA

A história do pecado tem um enredo de esconderijos. A


alma, daqui pra frente, é a protagonista das máscaras e papéis,
buscando ocultar sua identidade esfarrapada com os seus mode-
litos de figurantes idealizados no drama falacioso da serpente.
Tudo faz crer que há uma noite escura da alma entre
a desobediência do casal e o acerto de contas na manhã se-
guinte. A alma degredada da presença de Deus sofre com as
trevas angustiantes da incerteza. Aqui reside o desespero exis-
tencial e o ser humano busca amenizar o seu sofrimento com
as velas bruxuleantes das religiões.
A alma sem a presença divina vive a mitomania da
serpente de ser como Deus. Há uma síndrome de onipotên-
cia, autonomia e independência gerenciando a conduta de
alguém que não sabe o que fazer na noite tenebrosa. Neste
quadro sombrio se instala a confusão desastrosa de uma biru-
ta tonta. A alma vive num perfeito caos existencial.
O ser humano pós-pecado é um tabuleiro de comple-
xidade idealizada, além do que, as tendências genéticas, tradi-
ções culturais e traumas pessoais fomentam todo tipo de rea-
ções confusas que deixam a alma sem condições de um diag-
nóstico sadio. A alma do gênero adâmico, em geral, sofre de
alguma dúvida, desordem ou doença psíquica.
As estatísticas podem variar, mas, sem qualquer erro
na avaliação, podemos dizer com certeza que 100% da popu-
lação mundial tem alguma anomalia séria na sua personali-
dade. Não existe ninguém perfeitamente saudável, psicologi-
camente falando. Parece exagero, mas é real.
A SALVAÇÃO DA ALMA VIII 71

Vejam o diagnóstico do profeta sobre a alma do povo


de Israel, povo de Deus: Por que vocês seriam ainda atingidos? Se
vocês continuarão revoltados? Toda a cabeça está doente, e todo o
coração está enfermo e fraco. Isaías 1:5. (LITV).
Este é o diagnóstico preciso que precisa ser encarado
para a salvação da alma. Quando o nosso espírito é vivificado
pelo Espírito Santo de Deus, temos agora as condições viá-
veis para processar o desentulho de todo o lixo que foi arma-
zenado em nossa história psíquica.
Vamos supor que eu seja portador de transtorno de
personalidade narcisista e fui regenerado no meu espírito.
“Esse tipo é caracterizado por uma visão exagerada de si mes-
mo (quadro clínico chamado grandiosidade)”. Como isso vai
ser tratado? Como serei liberto dessa egolatria que me faz
um pavão no palco da vida?
“Pessoas com esse transtorno esperam ser tratadas com
deferência e podem explorar outras por suporem que sua
superioridade justifica isso. Seus relacionamentos são carac-
terizados por uma necessidade de admiração e elas normal-
mente pensam que os outros têm inveja ou ciúmes delas”.
Como o Espírito Santo vai limpar tudo isto?
Agora que fui salvo no meu espírito, tenho o poder
da vida de Cristo em meu ser, capacitando-me a crer e obede-
cer à Palavra de Deus. No jardim do Éden o espírito de Adão
podia se comunicar com o Espírito de Deus, porém, a Trin-
dade não habitava no homem. Portanto, houve uma brecha
ou espaço para a queda e a separação de Deus.
72 A SALVAÇÃO DA ALMA

Mas com o nascimento do alto, a Trindade tem ende-


reço certo no espírito do ser humano regenerado, e, de lá
deflagra uma operação capaz de ser correspondida pelo cren-
te carente. Todo aquele que tem sua alma fraca, todavia de-
pendente inteiramente do Todo-Poderoso, tem condições de
corresponder perfeitamente no processo da salvação.
No Salmo 72:13 o salmista diz – Ele tem piedade do
fraco e do necessitado e salva a alma aos indigentes. Se esta alma
ainda não chegou à perfeita consciência de sua fraqueza, Deus
vai humilhá-la, para que chegue neste ponto, por meio da
obra da cruz. “Aqueles que são muito orgulhosos, Deus preci-
sa humilhar. Ele vai trabalhar continuamente em suas vidas
para expor suas fraquezas de várias formas.”
Se já fomos salvos no espírito, pela obra de Cristo cru-
cificado, seremos salvos em nossa alma pela vida ressuscitada
de Cristo, manifesta em nosso homem interior, por meio da
nossa comorte com Cristo, expondo nossa fraqueza. Vamos
sempre nos envolvendo com a morte do Senhor Jesus no nosso corpo,
para que também a vida de Jesus seja revelada em nosso corpo
mortal. 2 Coríntios 4:10. (LITV).
A salvação da nossa alma é uma estrada de quebran-
tamento permanente até que cheguemos à plena dependên-
cia do Pai. Deus em Sua graça vai nos demovendo de toda auto-
confiança e fazendo-nos inteiramente dependentes dEle. “Nossa
entrada em tudo aquilo que Jesus comprou para nós, requer
nossa fé e obediência. Ele fez Sua parte, pagou o preço que
era necessário”. Agora, só precisamos crer e obedecer. Amém.
A SALVAÇÃO DA ALMA IX

E digo isto a vós outros que conheceis o


tempo: já é hora de vos despertardes
do sono; porque a nossa salvação está,
agora, mais perto do que quando no
princípio cremos. Romanos 13:11.

Muitos acreditam que a salvação é apenas o novo nas-


cimento. De fato, o novo nascimento é salvação, sim, mas é a
primeira fase da salvação na história do homem caído. Não
devemos encarar a salvação apenas como o novo nascimen-
to, pois há outras áreas do ser humano que carecem de salva-
ção. Temos que vê-la em sua maior abrangência.
Nestes estudos aqui abordamos a salvação em três tem-
pos: passado, presente e futuro, ou seja, a salvação do espíri-
to, da alma e do corpo. Fomos salvos em nosso espírito da
condenação do pecado, por meio da obra de Cristo crucifi-
cado. Estamos sendo salvos do poder do pecado, em nossa
alma, através da vida ressurreta de Cristo e seremos salvos da
74 A SALVAÇÃO DA ALMA

presença do pecado, em nosso corpo, quando o Senhor vier


buscar o Seu povo.
Aqui neste texto, Paulo, falando a igreja de Roma,
“encoraja uma vida de alerta espiritual e pureza moral. O
tempo é curto. A Dispensação da Graça está chegando ao
fim. O atraso da hora exige que toda letargia e inatividade
sejam afastadas. Nossa salvação está mais próxima do que
nunca. O Salvador vem nos levar para a casa do Pai”.
O apóstolo está falando a crentes, isto é, aos salvos no
espírito, para estarem de fato bem alertas em suas almas, pois
a salvação completa está se cumprindo. Ele se refere ao tem-
po como o kairós divino, um tempo qualitativo que está se
completando no processo de amadurecimento e adverte: Vai
alta a noite, e vem chegando o dia. Deixemos, pois, as obras das
trevas e revistamo-nos das armas da luz. Romanos 13:12.
Vemos nesta advertência que a era presente é como
uma noite de pecado que acabou de seguir seu curso. O dia da
glória eterna está prestes a amanhecer para os crentes em
Cristo. Isso significa que devemos descartar todo o lixo acu-
mulado da nossa história, isto é, todo tipo de coisa que nos
mantém escravos da cultura deste mundo pervertido.
Todos os regenerados têm histórias com lembranças
e costumes que aprisionam suas almas. Fomos salvos da con-
denação do pecado, em nosso espírito, mas não fomos ainda
salvos, totalmente, em nossa alma, do poder do pecado, por
isso, o Espírito Santo nos habilita, pela graça, a participar
deste processo de erradicação de traumas e pecados.
A SALVAÇÃO DA ALMA IX 75

Nós temos uma alma forte e, muitas vezes, queremos


nos autodirigir. Esta alma altiva costuma resistir à dependên-
cia do Espírito Santo. Agimos por conta própria e não nos
submetemos ao governo do Senhor, por isso, precisamos de
quebrantamento do alto e de uma boa disciplina. A Trinda-
de vai agir em nosso espírito e nós vamos, paulatinamente,
abrindo mão das obras das trevas com o objetivo de reves-
tirmo-nos das armas da luz.
Então o apóstolo afirma: andemos dignamente, como em
pleno dia, não em orgias e bebedices, não em impudicícias e disso-
luções, não em contendas e ciúmes; mas revesti-vos do Senhor Jesus
Cristo e nada disponhais para a carne no tocante às suas concupis-
cências. Romanos 13:13-14.
Este texto que estamos abordando da carta aos Roma-
nos foi a passagem que o Espírito Santo usou para salvar Agos-
tinho de Hipona. Este jovem tinha uma mãe piedosa e um
pai pervertido, mas o pior era a sua natureza perversa. Ele
era um pecador sórdido. Há pecadores que são nobres, gente
fina, embora estejam irremediavelmente perdidos, fazem
parte de uma elite moral, porém há um bando de deprava-
dos que não tem nada favorável.
Agostinho fazia parte deste grupo carnal e promíscuo
da raça caída mais suja, e um dia ouviu umas crianças canta-
rem uma cantiga de roda que dizia: tolle et lege ou tome e lê.
Foi aí que se lembrou de um manuscrito da carta de Paulo
aos Romanos que havia recebido de presente e abriu-o bem
neste texto. Leu-o e o Espírito Santo o regenerou.
76 A SALVAÇÃO DA ALMA

Daí para frente começou um processo dinâmico da


salvação de sua alma sob as bases do mesmo texto. O Espírito
começou a movê-lo progressivamente para remover o lixo
acumulado em sua alma e o jovem passou a obedecer a voz
do Espírito, dirigida pela Palavra de Deus.
Paulo exorta aqui aos crentes em três áreas que se li-
vrem dos entulhos da alma e que caminhem a passos firmes
com a luz do dia. Nada de sombras e esconderijos. Nada de
exageros e falta de sobriedade. Nada de festas movidas à
embriaguez e galhofaria. Nada de ilicitude sexual. Nada de
excesso e libertinagem. Nada de luxúria e ultrajes. Nada de
troça, provocação, disputa, porfia, partidarismo, rivalidades,
competições, contendas e ciúmes.
Toda impureza do trato passado, toda a sujeira dos
costumes antigos, todos os resíduos da velha cultura precisam
ser despojados dos almoxarifados da alma. É preciso uma fa-
xina diária e permanente neste processo da salvação da alma.
Não há mais lugar em nosso ser para coisas mofadas e cheias
de ácaros. Precisamos sempre de ares renovados.
A salvação da alma implica numa renovação da men-
te. Não se conformem com a secularização desta época, mas sejam
transformados pela renovação de uma mentalidade do alto, a fim
de que vocês possam vivenciar diariamente qual seja a boa, agradá-
vel e perfeita vontade de Deus. Romanos 12:2.
O termo grego renovação “denota um processo contí-
nuo pelo qual o ser humano se torna mais parecido com Cristo,
em cujo processo ele é um cooperador com Deus”.
A SALVAÇÃO DA ALMA IX 77

O Cristo que vive em nosso espírito quer viver tam-


bém através de nossa alma, então, há um processo de descons-
trução e reconstrução se estabelecendo em nosso ser, cada
dia. Somos permanentemente renovados em nossa mente,
por meio de uma parceria, onde o Espírito Santo age e nós
reagimos obedecendo à Palavra de Deus.
O problema é a dureza de nossa alma. Em razão de
nossa vida pregressa, a alma traz um histórico de autossufi-
ciência e independência, que não é fácil de ser apagado. Todo
aquele que aprendeu a viver pelo poder da alma, não desa-
prende de uma hora pra outra. É preciso que o Senhor o frus-
tre e o leve a desconsiderar-se a si mesmo como independente.
Aquelas almas que são mais autossuficientes, Deus
precisa humilhá-las com um maior rigor. Neste caso Ele vai
trabalhar continuamente em suas vidas, para quebrantá-las.
Aquelas que são mais capazes, Ele vai frustrá-las insistentemen-
te para que elas acabem por depender totalmente da sufici-
ência de Cristo. Essa salvação requer o nosso despojamento.
Tiago diz que Deus resiste aos soberbos. Ele não diz que
Deus é indiferente, nem deixa isso pra lá. Há uma forte opo-
sição de Deus ao estilo arrogante da alma. “Ele vai tratar o
orgulho deles com um golpe atrás do outro, até que cheguem
ao pó. Só depois é que eles irão se tornar vasos úteis para o
serviço dEle.” Nunca desconsiderem isto!
A salvação da nossa alma implica no quebrantamento
do ego. Não mais eu, mas Cristo é a chave do processo. É preciso
que nossa própria força, nossa capacidade, nossas habilidades,
78 A SALVAÇÃO DA ALMA

nossa autoconfiança cheguem ao fim, para que possamos ser


usados em plenitude para a glória do Pai. Enquanto houver
algum resquício de ego em nós, o Senhor estará trabalhando
para nos quebrantar, a fim de nos salvar de nós mesmos.
A salvação no espírito visa nos salvar da condenação
do pecado, mas a salvação na alma, vai nos salvando do poder
do pecado em nosso modo de viver. Salvos de nós.
Saulo depois de sua conversão tentou trabalhar para
Deus. Ele já saiu da casca do ovo piando e querendo conver-
ter os judeus, de Damasco, a Cristo, na força da sua alma: Saulo,
porém, mais e mais se fortalecia e confundia os judeus que mora-
vam em Damasco, demonstrando que Jesus é o Cristo. Atos 9:22.
Logo em seguida veio a caçada e teve que fugir. Saulo
(o desejado) sai do mapa por uns 3 anos e quando reaparece
como Paulo (o menor) voltou com outra cara e postura. Ago-
ra não quer mais trabalhar pra Deus, pois percebe Deus tra-
balhando nele e por meio dele. A sua alma havia se tornado
pequena, menor. Saulo sumiu, Cristo aparece em Paulo.
Vejamos o que ele disse: o que agora sou, porém, deve-se
inteiramente à graça que Deus derramou sobre mim, e que não foi
inútil. Trabalhei com mais dedicação que qualquer outro apóstolo
e, no entanto, não fui eu, mas Deus que, em sua graça, operou por
meu intermédio. 1 Coríntios 15:10.
A salvação da alma tem este propósito. Talvez João Ba-
tista nos dê a pista. Ele deve se tornar cada vez maior, e eu, cada vez
menor. João 3:30. “Quanto mais elevado estiver o homem na
graça, menor ele será a seus próprios olhos.” C. H. Spurgeon.
A SALVAÇÃO DA ALMA X

O Senhor protege os simples e ingênuos.


Achava-me em profunda depressão,
mas o Senhor salvou a minha alma.
Volta, minha alma, ao teu sossego,
pois o Senhor tem sido generoso
para contigo. Salmo 116:6-7.

Este cântico é uma profecia alegre diante da obra rea-


lizada pelo Messias. Depois da ressurreição do Cristo há um
novo horizonte para o Seu povo. A alma, que antes estava
deprimida, pode voltar ao seu lugar de descanso. A graça está
plenamente disponível ao depressivo.
Após a queda de Adão, a alma tomou o rumo das
montanhas. Somos uma raça de alpinistas em busca de cu-
mes como se fossem tronos. A toxina que corre nas veias do
ser humano caído é vírus de altar: como Deus sereis. Estamos
infectados por um desejo sutil de grandeza e, se não o alcan-
çamos, nos deprimimos e caímos na fossa.
80 A SALVAÇÃO DA ALMA

Vivemos entre o topo almejado e a vala existencial,


sofrendo sempre com o vazio de significado. Somos uma es-
pécie descontente em busca do arco-íris eterno, por isso, mais
susceptíveis aos desencantos. Então, a nossa história acaba
sendo um conto de príncipes que viraram sapos e vivem coa-
xando, na maioria das vezes, nos brejos da depressão.
Nascemos aqui no planeta azul com almas ambicio-
sas, mas muito propensas aos reveses da vida, frequentemen-
te ressentidas e magoáveis. Ainda que aspiremos aos pódios
mais insuspeitos, padecemos nos bastidores de baixa estima
estressante. A alma caída no Éden sofre de um medo crônico
de rejeição e chama a atenção das plateias o tempo todo.
Esse grito sufocado, em busca de aplausos, é a expres-
são mais gritante de um ser perdido em si mesmo, que não
acha contentamento em nada no mundo caído, restringido
à fria e dura lápide de granito do aqui jaz. Se tudo acaba aqui,
a vida não tem sentido.
Foi por isso que o salmista disse: Volta, minha alma, ao
teu sossego, pois o Senhor tem sido generoso para contigo. Depois
que a sepultura foi escancarada e o corpo do defunto saiu
andando no frescor da madrugada, não há mais história li-
mitada ao simples – “aqui jaz”. Há esperança para o falido e a
alma deprimida pode dançar na festa.
O medo, o primeiro sintoma de uma alma desterra-
da, perdeu a sua fúria. Nossa timidez, que antes nos fazia tre-
mer nos lugares escuros, pode sair para a luz radiante da ma-
nhã. Há cura real para a alma fóbica. Jesus Cristo a aceitou
A SALVAÇÃO DA ALMA X 81

na cruz e pagou todos os seus débitos. Não precisa mais men-


digar qualquer aceitação dos seus pares, pois foi aceita por
Aquele que é o Ímpar.
Sim, tem verdadeira cura para a alma medrosa. Se
antes nos escondíamos do julgamento alheio, porque temía-
mos não ser aceitos, podemos agora sair da nossa toca e entrar
na sala do trono, para receber os cuidados especiais dAquele
que nos ama incondicionalmente, com amor eterno.
A salvação da alma é um programa de recuperação do
crente. Após a salvação do espírito se tem a garantia de que
Aquele que começou a boa obra há de concluí-la.
Jesus não salva apenas as almas altivas com quebran-
tamento, salva também as almas depressivas, com a abertura
dos portões em glória. Para aqueles que vieram para a casa do
Pai com uma alma soberba, o Senhor vai quebrá-la totalmen-
te, mas para aqueles que vieram com sua alma mutilada e
ferida, Ele vai sará-la completamente.
O salmista disse em seu canto: Achava-me em profunda
depressão, mas o Senhor salvou a minha alma. Todos os que fo-
ram regenerados espiritualmente podem ter a certeza de que
o Senhor os pode salvar psicologicamente. Se a minha alma
curte algum tipo de timidez, porque não foi aceita por meus
cuidadores ou porque foi violentada nos sentimentos, preci-
sa sair à sala do banquete para celebrar de modo pleno a sua
aceitação em Cristo Jesus.
Quero retornar à estrofe do salmo: Volta, minha alma, ao
teu sossego, pois o Senhor tem sido generoso para contigo. O salmista,
82 A SALVAÇÃO DA ALMA

aqui, faz um diálogo com a sua própria alma e a manda re-


gressar ao lugar seguro do seu descanso, porque ele percebe a
magnanimidade do Senhor para com a sua alma. Este local
seguro é o seio de El-Shadai.
Em outro Salmo o poeta, após ter dito não ser sober-
ba a sua alma, sinaliza com a paz de seu ser, nestes termos:
pelo contrário, fiz calar e sossegar a minha alma; como a criança
amamentada se aquieta nos braços de sua mãe, como essa criança
é a minha alma para comigo. Salmo 131:2.
Nestes dois Salmos nós temos duas percepções. A pri-
meira é a generosidade de Deus para com a alma angustiada.
A segunda é o aquietar-se da alma angustiada, como um bebê
que matou a sua fome no seio de sua mãe. As duas visões são
imprescindíveis, pois é preciso saber que Deus quer nos liber-
tar e que nós queremos ser libertos.
Se Deus é generoso com a minha alma, querendo
curar-me do viver medonho, por que eu devo cultivar uma
timidez que me foi implantada pelas circunstâncias da vida?
Não! Não precisamos ter medo dos outros, se já fomos acei-
tos pela graça de Deus.
O argumento é válido não só para a timidez ou medo,
mas, também, para a culpa e a vergonha. Muitos vivem ento-
cados nos porões da alma nutrindo culpa e vergonha, sem
perceber que o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mun-
do, já consumou a Sua obra.
Há um grande grupo de crentes que não prega o Evan-
gelho porque tem medo de falar e ser motivo de chacota.
A SALVAÇÃO DA ALMA X 83

Porque tem pavor do que outros possam dizer a seu respeito.


Este silêncio fóbico e culposo revela a alma saturada de ver-
gonha por causa de uma estima distorcida, fruto de uma cul-
tura repleta de conceitos e preconceitos maliciosos.
Na hinódia cristã há um cântico que diz: “Sabeis falar
de tudo, que neste mundo há, mas nem sequer palavra de
Deus, que tudo dá?” – Por que este mutismo? Por que este
constrangimento? Somos carentes de salvação na nossa alma
temerosa, a fim de podermos testemunhar da grandiosidade
desta graça inigualável. Precisamos sair da nossa toca.
A salvação da alma tem que tratar com maior preci-
são, tanto da altura do monte, como da depressão do vale,
pois o profeta foi bem categórico em sua metáfora: Todo vale
será aterrado, e nivelados, todos os montes e outeiros; o que é tortu-
oso será retificado, e os lugares escabrosos, aplanados. Isaías 40:4.
Aqui vemos que será preciso, tanto o aterramento dos rebai-
xados como o nivelamento dos elevados.
A Bíblia mostra que o Senhor é contra todo o porte
altivo e toda alma cheia de si, que pretende dar as cartas na
obra do Senhor. Mas, também, é contra essa erva rasteira ou
a alma envergonhada que deixa de participar na missão da
evangelização, por causa do medo de ser criticada ou descar-
tada como gentinha fanática e irrelevante.
O Senhor fala a nós, em nosso Espírito, mas fala por
nós, através de nossa alma. Assim ao cultivarmos a timidez,
com medo da rejeição alheia, criamos impedimento para que
o Senhor fale através de nossas vidas. Este pecado da alma
84 A SALVAÇÃO DA ALMA

precisa ser erradicado por meia da obra eficiente da cruz de


Cristo. Isto não é algo insignificante e requer libertação.
A salvação da alma tem o propósito de salvar o crente
tanto do estilo esnobe de gente pedante, que se acha distinta
e elevada, como daquela alma encolhida que se esconde nas
sombras, com pavor de ser exposta, em suas fraquezas. Tanto
os montes altos, como os vales profundos precisam passar
pela motoniveladora da cruz de Cristo.
No Reino de Deus não há lugar para cedros do Líba-
no, tampouco para maliças sensitivas que se melindram com
toques periféricos. Tanto a alma empinada que se gaba dos
seus dotes, como a deprimida que se esconde precisam da
obra radical e permanente da cruz de Cristo, nivelado os ex-
cessos, pra cima ou pra baixo, e, limpando os escombros.
O clamor de Davi foi: Volta-te, SENHOR, e livra a mi-
nha alma; salva-me por tua graça. Salmo 6:4. Nossa alma deve
ser liberta das baixarias da arrogância e da baixeza da inferio-
ridade, pois o pecado da projeção é tão perverso como o da
omissão. Nem o cume da liderança pernóstica, nem a supres-
são deste acanhamento complexado. Na casa de Abba não
há lugar nem para os astutos convencidos, nem para introver-
tidos astuciosos, que gostam de chamar a atenção.
Salva Senhor a alma soberba que quer ser vista no
palco, bem como a que some como medo de assumir a sua
missão. Salva a alma que busca se destacar, a fim de ser bem
aceita, assim como a alma que se distancia com o medo de ser
rejeitada. Salva a alma da sua saliência ou da sua fossa.
A SALVAÇÃO DA ALMA X 85

“Uma grande parte de nossa transformação, nestas


áreas, requer fé. Agir e falar, quando nos sentimos inadequa-
dos, requer fé em Deus. Precisamos crer que, quando Ele
está nos guiando a dizer ou fazer algo, Ele nos sustentará,
sejam quais forem os resultados. Precisamos aprender a ou-
vir Sua voz e, então, obedecê-Lo pela fé, encarando todos os
medos e fraquezas que possamos ter dentro de nós,” diz D.
W. Dyer. Salva, Senhor, a minha alma!
Volta, minha alma, ao teu sossego e descansa unicamen-
te no seio de El-Shadai. Amém.

CONTENTAMENTO (Cantor Cristão - 387)


Letra: Edwin Othello Excell
Tradução: William Edwin Entzminger

Minha alma deleita-se em Cristo;


Afável é ele para mim;
Viver na sua intimidade
Dá gozo real e sem fim.

Por sua bondade admirável,


Eu vivo a fruir seu amor;
A sua presença conserva
Minha alma na fé, com fervor.
86 A SALVAÇÃO DA ALMA

Um dia serei semelhante


A Cristo, meu reto Senhor;
Com ele terei eu morada,
Oh, graças a meu Salvador!

CORO:
Muito contente estou,
Pois que Jesus me amou,
Pra si me chamou,
Por filho tomou,
Feliz, tão feliz eu sou.
A SALVAÇÃO DA ALMA XI

Compadece-te de mim SENHOR, pois me


sinto atribulado; de tristeza os meus
olhos se consomem, e a minha alma
e o meu corpo. Salmo 31:9.

Se não for, de fato, uma força de expressão, o salmista


aqui se expressa nas três esferas: espírito, alma e corpo. Este
é um Salmo de Davi, mas a oração é do Messias. Talvez
Davi tenha composto este poema quando estava sendo per-
seguido pelo rei Saul, mas o Espírito Santo revela aqui o
sofrimento do Cordeiro de Deus, quando estivesse, no futu-
ro, sendo imolado no Getsêmani.
No verso 5 vemos uma profecia do Jesus histórico ren-
dendo o seu espírito: Nas tuas mãos, entrego o meu espírito; tu
me remiste, SENHOR, Deus da verdade. Salmo 31:5, mas no
verso 9 – sua alma e corpo estão atribulados, sendo consumi-
dos em lágrimas. Neste salmo percebemos a tricotomia na
composição do ser humano.
88 A SALVAÇÃO DA ALMA

Corpo, espírito e alma é a ordem do modelo da cria-


ção, no Éden. Em razão do pecado, a raça adâmica se tornou
dicotômica por causa da desconexão do espírito. Alma e cor-
po passaram a governar o homem natural. Então, o Espírito
vem e vivifica o espírito do Seu povo e o ser humano regene-
rado torna-se num modelo inverso: espírito, alma e corpo.
Esta ordem inversa é uma nova perspectiva da or-
dem humana transformada por meio da obra de Cristo cru-
cificado. Há um novo homem com o seu espírito vivo go-
vernando o seu interior.
Adão e Eva, antes de pecar, tinham comunhão com
Deus através do seu espírito, mas, depois do pecado, com o
espírito morto, a alma tomou conta do processo e Deus ficou
de fora das suas cogitações, uma vez que, sendo Ele espírito só
se relaciona espiritualmente com o ser humano no espírito.
Sem a vida espiritual não há intimidade com Deus.
O ser humano pós-pecado não tem relacionamento
com Deus. Ele não tem vida espiritual que o ligue espiritual-
mente ao Espírito de Deus. Há vida biológica e psicológica
em qualquer pessoa que nasce neste mundo, mas nenhum
sinal de vida espiritual em seu íntimo.
Vamos tentar ilustrar. Um ovo de galinha é composto
de três partes: casca, clara e gema. Há galinhas poedeiras que
são criadas somente para pôr ovos. Elas não convivem com o
galo e seus ovos não tem o esperma gerador de vida. Por ou-
tro lado, há galinhas que são criadas para gerar pintinhos e
os seus ovos têm o esperma do macho.
A SALVAÇÃO DA ALMA XI 89

Os ovos de uma galinha de granja e os ovos da gali-


nha que tem o galo cruzando-as são iguais, no que diz respei-
to à sua composição e nutrição, porém, um não gera pintos,
o outro, sim. Os dois têm casca, clara e gema, mas só um tem
a semente da vida, o outro não.
O ovo da galinha de granja ilustra o ser humano
desconectado de Deus. Sem a vida de Cristo o espírito está
morto. Não há vida espiritual no homem natural. A sua alma
caída é quem dá as cartas da aparente espiritualidade, por
isso, é preciso que o ser humano seja regenerado, pelo Espíri-
to de Deus, para que possa ter a vida espiritual.
Os dois tipos de ovos, aparentemente, são idênticos,
mas um tem vida e o outro, não. Assim, não podemos julgar
as pessoas pela aparência, senão pela vida de Cristo que se
encontra nelas. Ter uma vida moral inatacável não significa
ter a vida de Cristo, mas ter a vida de Cristo, com certeza,
significa ter uma vida moral, justificada e santa, em processo
de santificação permanente.
O ovo galado faz gerar um pintinho; o crente regene-
rado faz crescer o caráter de Cristo. O apóstolo Paulo afirma
assim aos vivificados pelo Pai: meus filhos, por quem, de novo,
sofro as dores de parto, até ser Cristo formado em vós. Gálatas 4:19.
Uma vez regenerado, começa o processo da santifi-
cação ou da salvação da alma, também visto como a for-
mação do caráter de Cristo. A vida de Cristo no homem
interior se expande, por meio do Espírito Santo, do nosso
espírito vivificado, para a nossa alma. Aqui, duas coisas são
90 A SALVAÇÃO DA ALMA

imprescindíveis: o agir do Espírito Santo no espírito do rege-


nerado e o reagir obediente do crente.
A salvação da alma, conhecida ainda como a mortifi-
cação da natureza terrena, é processada sempre de dentro
para fora, levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que
também a sua vida se manifeste em nosso corpo. 2 Coríntios 4:10.
Vem de dentro, da habitação do Espírito Santo, e se concre-
tiza na experiência vivencial da nova criatura.
Este processo é como o esperma na gema. A forma-
ção do pintinho só acontece quando a galinha faz seu ninho,
cobrindo seus ovos com suas asas. Semelhantemente, a for-
mação de Cristo em nossa alma só acontecerá pela cobertura
do Espírito Santo, bem como, pelos meios da graça, através
da igreja, que nos levam a obedecer o agir divino.
Os meios da graça podem ser vistos assim: perseveran-
ça na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas
orações. Atos 2:42. A instrução na Palavra, a koinonia da igre-
ja, a ceia do Senhor e as orações na vida comunitária.
Fomos regenerados pelo Espírito de modo unilateral.
Ele gerou vida espiritual em nosso espírito soberanamente,
salvando-nos da condenação do pecado, todavia, Ele vai mais,
operando em nós o querer e o efetuar, para que desenvolva-
mos a salvação da nossa alma, do poder do pecado. Esta obra
é processual e progressiva, na comunhão da igreja.
Quando cremos em Cristo, como Salvador, viemos a
Ele com uma alma cheia de lixo, traumas, feridas, culpa, ver-
gonha e uma cultura pervertida. Muitos de nós tivemos um
A SALVAÇÃO DA ALMA XI 91

histórico complicado de abusos sociais, sexuais e seviciais vári-


os que marcaram nossas mentes.
“A solução de Deus para ferimentos profundos é trazê-
los para a luz. Precisamos abrir nossas vidas a Jesus e deixá-Lo
ver o que nos aconteceu. Precisamos deixá-Lo tocar e curar
nossos ferimentos mais profundos. Mais uma vez, a fé é
requerida. Precisamos saber e confiar que Deus nos ama com-
pletamente e sem reservas. Precisamos crer que Ele nos tra-
tará, com a mais terna bondade. Precisamos ter fé que, por-
que Ele nos fez, sabe como curar nossas feridas e que o fará
com o mínimo de sofrimento,” diz David W. Dyer.
Quando o salmista disse, no texto que encabeça este
estudo, compadece-te de mim, e, foca especialmente, em sua
alma atribulada de tristezas, estava suplicando pela salvação
dela e do seu histórico de feridas, mágoas e contusões, que a
mantinha dolorida e solitária.
Uma vez que recebemos a Cristo como nosso Salva-
dor, já somos novas criaturas, e, neste caso, temos a vida eter-
na. Se temos a vida eterna, não há mais perigo de perdê-la,
pois a vida é eterna e é uma dádiva divina irrevogável. Deus
não dá agora e toma depois. A questão é a inadequação de
nossa mente (alma) com as lembranças de nossa história.
Todos os que creem em Cristo foram perdoados dos
seus pecados, porém muitos ainda precisam perdoar aqueles
que lhes ofenderam. Volto a citar Dyer, quando diz: “Em al-
guns casos, indivíduos feridos emocionalmente sepultaram tão
profundamente sua ferida que mesmo suas próprias mentes
92 A SALVAÇÃO DA ALMA

‘esqueceram’ o que aconteceu. Eles reprimem os sentimen-


tos tão severamente – tornando-se um aleijado emocional,
no processo – que encobrem completamente o que aconte-
ceu. Isto pode ser especialmente verdadeiro em casos de estu-
pro ou abuso sexual de criancinhas.” E aqui, a igreja verda-
deiramente tem que ser um hospital.
A alma ferida pode até desconfiar da salvação de Deus
em seu espírito. Este grito do poeta insinua o gemido da alma
hesitante. Até quando, Senhor, ficarás olhando? Livra-me a alma
das violências desses leões ferinos... Salmo 35:17. Os golpes e
lanhos de unhas afiadas deixam cicatrizes doloridas que só o
Médico ferido pode aliviar.
Muitos cristãos levam anos chorando as dores cruéis
de seus estigmas. William Cowper, poeta inglês do séc. 18,
um dos melhores hinólogos da igreja, sofreu a vida toda com
um forte esgotamento em face dos abusos em sua infância.
Ele penou com depressão.
O pai, um advogado influente que ficou viúvo, pediu
a William, com 8 anos, que defendesse a tese do suicídio, pois
ele queria que o filho morresse para se casar com uma jo-
vem, sem o menino. Aos 11 anos ele foi abusado no colégio
por alguém do sapato grande, foi tudo o que conseguia se
lembrar. Daí para frente, sempre nos aniversários com final
1, isto é 21, 31... até 61 – ele tentou suicídio. Morreu de mor-
te natural em 1800, aos 69 anos.
Nestes intervalos Cowper escreveu vários hinos ma-
ravilhosos. Um deles diz: “Achei a fonte carmesim, que meu
A SALVAÇÃO DA ALMA XI 93

Jesus abriu. Na cruz morrendo ali por mim, minha alma


redimiu. Eu creio, sim, eu creio, sim, Jesus por mim morreu;
e sobre a cruz, pra me salvar, castigo padeceu.” Temos aqui
uma alma ferida, violentamente, sendo salva, lentamente.
Faz parte do impostor, o falso eu, viver nos bastidores
com medo de dizer quem é e ser rejeitado, mas o Cristo do
Calvário já realizou uma obra de aceitação tão perfeita e com-
pleta, que precisamos torná-la clara, para que desapareça esse
impostor enganoso e cruel, que vive em nós.
Tu és o manancial da vida; na tua luz, vemos a luz. Salmo
36:9. Deus não só perdoa e esquece nossos atos vergonhosos,
mas ainda transforma as trevas em luz.

VERA PÁSCOA (Cantor Cristão - 144)


Letra: Anônimo

Ó Jesus! Ó vera Páscoa,


Suspirada dos antigos!
Ó Cordeiro eterno e meigo,
Digna-Te assistir aqui!
94 A SALVAÇÃO DA ALMA

Bom Jesus, ó pão divino!


Pela fé Te apropriamos;
És nas almas o alimento
Que sustenta o nosso amor.

Bom Jesus, ó vinho puro,


Fonte de perene gozo!
Faze que nossa alma viva
Para Ti, de Ti, em Ti.
A SALVAÇÃO DA ALMA XII

Àquele lugar chamou Jacó Peniel, pois disse: Vi


a Deus face a face, e a minha alma
foi salva. Gênesis 32:30.

Jacó era um tipo típico do ser humano caído. Alma


obesa, forte e enganosa que lhe deu uma identidade de legíti-
mo trapaceiro. Seu nome Jacó – significa suplantador – e a
sua história é o registro marcante do perfil de alguém que
pode ser considerado 171.
Há pecadores nobres e pecadores sórdidos. Os nobres
são a elite de uma raça trôpega, passando na passarela com
uma imagem de ilustres, mas estão fora do banquete, tanto
quanto os sórdidos, embora, estes, devam padecer de fome
mais severa. Ambos estão do lado de fora da casa de Abba e
ambos estão condenados à punição perpétua.
A categoria de pecadores nobres e sórdidos é apenas a
escala no que diz respeito aos conceitos e valores deste mundo
96 A SALVAÇÃO DA ALMA

falido. A vantagem de um destes times é psicológica, já que


os nobres têm, neste mundo, alguns benefícios morais a mais.
Porém, um e outro estão excluídos da festa, no céu. Na casa
de Abba só tem permissão de festejar a família.
Jacó jogava no time dos sórdidos e sua característica
no jogo era trapacear. Em todas as partidas em que atuava,
tinha sempre um jogador lesado por seus golpes baixos. Sua
tática camuflada era passar os outros pra trás, sem dó nem
piedade. Passou os pés no irmão mais velho, no pai ceguinho
e no espertalhão do sogro. Jacó era lutador astucioso.
O texto, que estamos examinado, trata-se de uma luta
entre Jacó e alguém que se encontra numa outra dimensão.
Aqui ele estava numa quarta partida, lutando com um ser
extraterreno, um “homem” celestial, possivelmente um anjo
ou o próprio Senhor.
Esta foi a sua principal luta e a Bíblia a descreve como
sendo um combate duro e solitário: ficando ele só no acampa-
mento, veio um homem que lutou com ele, até ao romper do dia.
Gênesis 32:24. Percebe-se que Jacó dispensou a plateia e ficou
sozinho no campo de peleja. Eu acredito que a batalha da
alma só se pode guerrear quando desassistido do público. Nada
de apupos, nem de aplausos. Somente o pugilista e Deus.
Quando o homem viu que não poderia vencer, tocou a arti-
culação do quadril de Jacó e a deslocou. Gênesis 32:25. O enfren-
tamento foi tenso, a pugna foi longa, mas o golpe foi certei-
ro. O combatente atingiu o ponto nevrálgico, o nervo da
perna do fugitivo, pois sempre que Jacó ludibriava alguém,
A SALVAÇÃO DA ALMA XII 97

saía de fininho do perímetro. Era um profissional das fugas,


mas agora fora nocauteado em cheio, na sua tática.
As almas robustas demoram a se render, pois, elas se
bastam. O pecado torna-as pejadas de si mesmas, cheias de
vaidade e não é fácil demovê-las do controle da vida. É mais
descomplicado contar as estrelas do céu, do que contar com a
participação da alma na desconstrução de sua soberba e auto-
confiança. Jacó precisou ir a knock down.
O próximo round foi marcado por este diálogo de
contestação apelativa: O homem disse: Deixe-me ir, pois está
amanhecendo! Respondeu, porém, Jacó: Não o deixarei ir enquan-
to não me abençoar. Gênesis 32:26. A luta da alma na escuri-
dão da noite só perde sua intensidade com a bênção fulgu-
rante na madrugada da ressurreição.
Mas sem a luz da aurora não é possível enxergar os
traumas da alma. As pessoas magoadas escondem tão inti-
mamente suas feridas e as sepultam tão profundamente, que
é impossível diagnosticá-las e curá-las sem os holofotes da res-
surreição de Cristo. Precisamos da luz da vida.
Ainda que ferido o lutador não estava rendido, pois
havia força suficiente para que ele continuasse pelejando. Jacó
queria a bênção, todavia a queria do seu jeito e com as suas
condições, porquanto, permanecia pretendendo dar as car-
tas no jogo. Há muitos que recebem o novo nascimento, em-
bora não abram mão do controle. Querem a salvação de Deus,
mas também, querem comandar a santificação a seu modo e
com as suas regras e expectativas.
98 A SALVAÇÃO DA ALMA

A salvação da alma só pode ser efetuada com a pre-


sença do Médico Ferido. Nós precisamos abrir as nossas cha-
gas a Jesus e deixá-Lo tocar nelas. As minhas dores carecem
do bálsamo do Calvário e serei curado apenas pelas mãos
feridas pelos meus pecados. Isto requer, de fato, a negação de
minha própria identidade. Não mais eu, mas Cristo.
No caso do paciente de nossa narrativa, houve um
momento crucial. O homem que lutava com Jacó perguntou-
lhe, pois: Como te chamas? Ele respondeu: Jacó. Gênesis 32:27.
Aqui reside um quebra-cabeça. Este nome é a sua alcunha,
mas é ainda a sua confissão de réu penitente. Jacó se declara
um transgressor – eu sou um trapaceiro na cena. Nada me-
lhor do que a luz da aurora celestial e a verdade para identifi-
car a verdadeira identidade das pessoas.
Naquela manhã radiante chegou o fim de um fugiti-
vo histórico. Então, disse: Já não te chamarás Jacó, e sim Israel,
pois como príncipe lutaste com Deus e com os homens e prevaleces-
te. Gênesis 32:28. A vitória aqui é definida como uma pessoa
que foi conquistada e vencida e o troféu honroso foi dado ao
lutador prostrado na lona.
O velho Jacó, o superatleta das trampas, morreu ao
passar o Jaboque e daí pra frente, temos apenas a história de
um príncipe manco, fazendo parte da paraolimpíada da vida,
que ainda tentou dar uma cartada de mestre. Tornou Jacó:
Dize, rogo-te, como te chamas? Respondeu ele: Por que perguntas
pelo meu nome? E o abençoou ali. Gênesis 32:29. A alma do
lutador, mesmo nocauteado, é insistente.
A SALVAÇÃO DA ALMA XII 99

Jacó, já vencido, queria saber ainda quem é o seu Se-


nhor. Felizmente só temos a nota de que aquele lugar da luta
foi denominado de Peniel – Deus se conhece face a face. Não
é a academia que explica a identidade Divina, mas a intimi-
dade relacional com Ele. Deus sempre se revela ao espírito
dos seus filhos e do espírito, se comunica, face a face, com
nossa alma, num processo permanente, onde somos salvos,
dia a dia, de nossa velha história.
A luz já raiava no horizonte quando Israel cruzou
Peniel. Nasceu-lhe o sol, quando ele atravessava Peniel; e man-
quejava de uma coxa. Gênesis 32:31. A revelação legítima da
pessoa de Deus e a nossa iluminação pessoal vêm da Luz de
Deus que é o próprio Cristo. Pois em ti está o manancial da
vida; na tua luz, vemos a luz. Salmo 36:9.
Israel é o nome de Jacó depois de seu nascimento do
alto e, ele disse, que a sua alma foi salva em Peniel, isto é,
diante de Deus, face a face com Ele. Esta salvação da sua alma
não foi um único ato, mas um processo permanente de sua
comunhão pessoal com Deus.
“Somente quando vemos a nós mesmos em Sua luz,
revelando as tolices daquilo que somos, poderemos ver as
mudanças em nossa psique.” A iluminação do Espírito Santo
e a revelação da Palavra do Altíssimo desobstruem as barrei-
ras do medo existencial e abrem a porta do espírito, onde
reside a vida de Cristo, para a nossa alma ferida, a fim de nos
libertar totalmente de toda vergonha e culpa, patrocinado-
ras de nossas tolices e manias adoecedoras.
10 A SALVAÇÃO DA ALMA
0
“Então, Ele nos mostra Sua verdade, que irá nos liber-
tar da escravidão sob a qual estávamos vivendo. Esta ‘renova-
ção’ do nosso jeito de pensar conduz nossa mente, mais e
mais, debaixo do controle do Espírito Santo. Quanto mais
nossos pensamentos estão sob Seu controle, mais nós pode-
mos ser uma exibição dEle mesmo. Realmente, isto é o que
cada cristão necessita experimentar,” mostra com clareza D.
W. Dyer, em seu livro: De Glória em Glória.
O manancial da vida ressuscitada de Cristo é que ope-
ra a libertação da nossa alma e a iluminação do Espírito San-
to à nossa reação em obediência. A Trindade age e o crente
reage em obediente confiança, manifestando a vida de Cris-
to em seu interior, para a glória de Deus.
Se você se apegar à vida de sua alma, você a perderá. Mas,
se abrir mão da vida de sua alma por minha causa, você encontrará
a verdadeira vida. Mateus 16:25. (Paráfrase). Jesus veio para
salvar o espírito, da condenação do pecado e a alma do poder
do pecado. Veio para remover a mancha original do pecado
e para renovar a mente avariada pelos trancos e barrancos
de um história traumatizada.
De Jacó pra Israel foi só um ato. Um golpe certeiro.
De Israel pra frente vemos um príncipe aleijado manquejan-
do até o fim da sua existência. Na salvação da alma, o proces-
so claudicante do salvo, espiritualmente, será sempre a cura
das feridas e contusões de sua história dorida e traumatizada,
sendo de cada vez, uma. Mas aquele que começou a boa obra,
vai concluir, no final das contas.
A SALVAÇÃO DA ALMA XII 101

“Jesus veio para salvar completamente nossas almas.


Ele deseja que nos tornemos uma expressão viva dEle mes-
mo sem impedimento ou barreira. Não há escravidão,
ferimento, montanha ou vale que seja difícil demais para Ele
curar ou mudar. Seu poder é mais do que suficiente. Seu amor
é irrestrito. Sua graça é suficiente, mesmo para os casos mais
difíceis”. Por isso, também pode salvar totalmente os que por ele se
chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles. Hebreus
7:25. Quem foi salvo no espírito, o será na alma.

JESUS COMO GUIA (Cantor Cristão - 356)


Letra: Fanny Jane Crosby
Tradução: Salomão Luiz Ginsburg

Meu Jesus me guia sempre


Que mais posso desejar?
Duvidar do meu Amado?
Do meu Deus desconfiar?
Paz perfeita, gozo infindo
Tenho, e sua proteção;
Pois eu sei que por mim vela
Seu bondoso coração.
10 A SALVAÇÃO DA ALMA
2
Meu Jesus me guia sempre,
Ensinando-me a viver,
Concedendo graça e força
Para me desenvolver.
Perecer jamais eu posso,
Pois quem pode resistir
Ao Deus forte, Pai eterno,
Que minha alma quis remir?

Meu Jesus me guia sempre,


Pelo seu tão terno amor!
Vida santa, glória eterna
Me garante o Salvador.
Oh, mui breve vem o dia,
O da grande redenção,
Quando salva, transformada,
Há de ser a criação!
A SALVAÇÃO DA ALMA XIII

Tal homem se apascenta de cinza; o seu coração


enganado o iludiu, de maneira que não pode
livrar a sua alma, nem dizer: Não é mentira
aquilo em que confio? Isaías 44:20.

Temos caminhado lentamente neste assunto da salva-


ção da alma. Nosso método é sempre repetitivo, numa peda-
gogia interativa para fixar bem este ponto. O ser humano é
uma unidade, porém é composto de três partes, assim como
o ovo, visto em outro estudo.
O ser humano foi feito, no Éden: corpo, alma e espí-
rito, mas em razão do pecado o espírito foi desagregado de
Deus e a raça tornou-se dicotômica, corpo e alma. Tentamos
explicar isto com o ovo galado da galinha e o da galinha de
granja. Ambos são compostos de três partes, casca, clara e
gema e ambos nutritivos, mas, só um tem vida na clara.
O bebê quando nasce neste mundo vem dicotomizado.
Ele tem seu corpo 100% governado pela vida bios, ainda que
104 A SALVAÇÃO DA ALMA

imaturo, dependente de seus pais e tem sua almazinha em-


brionária, em que a vida psique encontra-se muito limitada.
A criancinha é um serzinho frágil e indefeso tanto biológica
como psicologicamente falando.
Numa criança sadia, o corpo e a alma passam por um
processo dinâmico de crescimento harmônico. O corpo e a
alma, da criancinha, vão de zero de autonomia até a presun-
ção de 100% de sua potência. Este é o caminho rumo à matu-
ridade. Mas este bebê é portador de uma natureza caída e
incrédulo. Corpo e alma são, na Bíblia, denominados de na-
tureza terrena, enquanto o corpo, a alma e o espírito morto
são apelidados de velho homem.
Jesus, por exemplo, nasceu com uma natureza terrena
sob os efeitos da queda, porém seu espírito estava vivo, pois
ele não foi gerado pelo esperma de Adão, por onde o pecado
entrou na raça humana. Jesus não manifestava o velho ho-
mem em Seu viver. (Romanos 5:12).
O ser humano natural saudável é alguém que tem
corpo sadio e alma, de certo modo, controlada, tentando
controlar da melhor maneira possível, a sua existência caída.
O problema é que não tem vida espiritual, encontra-se mor-
to, espiritualmente, e, sua alma, não consegue viver adequa-
damente, por causa do seu velho homem, o servo do pecado.
O salmista, algumas vezes, fez a seguinte pergunta: por
que estás abatida o minha alma, e por que te perturba dentro de
mim? Salmo 42:5 e sua resposta foi sempre: espera em Deus,
pois Ele é a minha salvação. Sem a realidade divina, no espírito
A SALVAÇÃO DA ALMA XIII 105

do ser humano, não haverá a menor condição de equilíbrio


para a alma humana.
As criancinhas já nascem neste mundo portando o
velho homem que governa a sua natureza terrena caída. Esta
designação bíblica se refere ao ser humano sob os efeitos da
rebeldia do pecado e, que, portanto, precisa ser crucificado
com Cristo, para dar lugar a expressão da vida de Cristo, no
espírito do ser humano regenerado.
Os bebês crescem e se tornam crianças e estas ficam
adultas, mas se não houver o nascimento do alto, a regenera-
ção do espírito, a alma e o corpo podem até ter uma vida
humana correta, ética e virtuosa, mas falta-lhe o significado e
o valor da sua existência.
A alma, sem a vida de Cristo agindo no espírito, fica
sem perspectiva do eterno, e sem esperança após a morte. O
ser humano natural é marcado pelas realidades terrenas, vi-
vendo o aqui e agora sob a ansiedade existencial relacionada
ao futuro, um forte controle quanto ao presente e uma ten-
dência culposa, no que diz respeito ao passado.
Uma alma fóbica, culpada e envergonhada, sem a
perspectiva da eternidade, é o caos encarnado, causando todo
tipo de complexo que a mantém prisioneira de si mesma.
Este ser caótico, erotizado, mitômano e rebelde é o velho
homem, o servo do pecado.
Precisamos mais do que horizonte. A alma contida no
corpo grita para algo além das três dimensões, clamando pelo
infinito, mas, infelizmente não consegue entendê-lo e, por
106 A SALVAÇÃO DA ALMA

isso, se angustia com este mundo que termina na inscrição da


sua lápide: – aqui jaz. Sem o nascimento de cima o ser huma-
no torna-se uma alma vazia e um cadáver de pé.
Alguém já disse muito bem que, a eternidade é para o
espírito do crente como um dia que não tem crepúsculo, mas
para a alma do incrédulo é como uma noite que não tem
alvorada. A falta da perspectiva eterna obscurece os olhos da
alma e a deixa presa num cubo sem portas e janelas, como o
Huis Clos de Sartre ou a Mônada de Leibniz.
Assim, destituída da visão do imperecível, a alma cons-
trói pra sua elucubração, ídolos, que, segundo o profeta Isaías,
são formas sutis de se apascentar de cinzas. A idolatria é o menu
cinzento da alma vesga, que ao ver o ícone tem a imagem de
que viu o transcendente no altar. O espírito vê o espiritual,
mas a alma só percebe o venerável ao contemplar uma figura
que represente a sua imaginação deformada pela queda. A
alma é idólatra por natureza.
Todas as religiões do planeta terra são construídas na
perspectiva da alma caída, sob os trilhos dos sentimentos e da
razão limitada. Na religião, o adepto sente ou encaixa o fenô-
meno na caixola, mas no Evangelho, se crê espiritualmente
na Palavra. A fé encontra-se além dos sentidos e bem acima
da razão. Ela não é irracional; é “arracional”, pois vai mais
longe que o limite do pensamento tridimensional, apropri-
ando-se do eterno imperceptível.
A criancinha nasce com um corpinho limitadíssimo e
uma alma minúscula, mas com tempo, alimento, conhecimento
A SALVAÇÃO DA ALMA XIII 107

e todas as motivações do meio ambiente, ela cresce e se de-


senvolve, passando, normalmente, a ter um corpo forte e
uma alma ensoberbecida.
Como já vimos, por causa do pecado, a natureza
terrena, corpo e alma, privada da vida espiritual, transfigu-
rou-se no velho homem, o servente do pecado, e, deste modo,
ficou incapaz de participar de qualquer relacionamento com
Deus. É por este motivo que o Senhor incluiu os seus eleitos
na Sua morte, para levá-los a morrer juntamente com Ele.
O apóstolo Paulo vê com clareza assim o propósito
retentivo: sabendo isto: que foi crucificado com ele o nosso velho
homem, para que o corpo do pecado seja destruído, e não sirvamos
o pecado como escravos; Romanos 6:6.
Creio que o nosso velho homem foi crucificado. A
Bíblia não está blefando. Não há chance de engodo na Pala-
vra de Deus, mas tem algo que precisa de luz quando lemos:
fazei pois morrer a vossa natureza terrena... Colossenses 3:5a. Se
o meu velho homem já foi crucificado com Cristo, por que
tenho que fazer morrer a natureza terrena?
Aqui sou levado a admitir que velho homem e natu-
reza terrena não são de fato a mesma coisa. Mesmo porque,
Jesus teve uma natureza terrena, mas nunca evidenciou ter o
velho homem. Sendo assim, creio que na cruz o meu velho
homem foi crucificado com Cristo, todavia a minha nature-
za terrena, alma e corpo caídos, precisa de salvação ainda.
Como temos visto, Jesus realizou a salvação do espíri-
to por meio de sua morte na cruz. Lá Ele crucificou o velho
108 A SALVAÇÃO DA ALMA

homem do Seu povo e na ressurreição veio dar vida ao espí-


rito de todo aquele que crer. Porém, há uma natureza terrena
caída, que requer do Pai o poder da vida de Cristo, para ser
salva do domínio do pecado.
Voltando ao bebê. Ele nasce frágil, dependente, inde-
feso e com o tempo se torna um ser humano forte, com uma
alma vigorosa e dominadora. Neste momento ele crê em
Cristo; crê que seu velho homem foi crucificado, o seu espíri-
to é regenerado, mas sua alma ainda é prepotente e resisten-
te à ação do Espírito Santo. Por isso, precisa de salvação.
Agora, esta pessoa encontra-se salva da condenação
do pecado, contudo, carece ser salva de sua alma autoritária,
dominante. A alma que aprendeu a ser mandona devagar,
lentamente, não desaprende de uma hora pra outra, pois, já
que viveu como uma senhora autocrata muitas vezes, não
consegue ser uma serva dependente, tão rapidamente.
A salvação da alma tem a ver com a desconstrução
desta cultura pecaminosa e dos traumas e pecados que foram
cultivados por algum tempo. Por isto, aqueles que foram re-
generados mais novos, como crianças, e tiveram acesso a uma
igreja mais adequada têm mais condição de serem libertos do
lixo de sua história no processo da santificação.
Concluindo este estudo, quero voltar ao texto inici-
al do profeta Isaías. O maior impedimento para a salva-
ção da alma é o cultivo de qualquer tipo de idolatria. E
quero que vocês saibam – ídolo é qualquer coisa que esfria
o nosso amor a Cristo ou que o coloque em segundo lugar.
A SALVAÇÃO DA ALMA XIII 109

Não pense em ídolo só construído de algo material. Nossa alma


é idólatra por excelência.
“Quando inventamos nossas próprias ideias sobre
Deus, estamos simplesmente criando nossa própria imagem.”
Então, salvar a alma de si mesmo é fundamental: aos que de
antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à
imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre
muitos irmãos. Romanos 8:29.

A SALVAÇÃO DA ALMA

A alma não é salva num parto,


ou na vida do novo nascimento,
pois sua história caiada é caída.
Não há alma perfeita e sem nó,
e muito menos santidade vapt-vupt,
instantânea como leite em pó
misturado com o café solúvel.
A salvação da alma é mui lenta,
porém, é progressiva e feita a
duas mãos: - a divina agindo
e a humana sempre reagindo
em puro obedecer voluntário,
com o gozo da graça aceita
para a glória do Deus trinitário.

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110 A SALVAÇÃO DA ALMA

SALVANDO MINHA ALMA (Natalino Gregório dos Santos)

Desfigurado, salvou-me no meu espírito


E, neste tenebroso mundo tem de mim cuidado
Salvando minha alma
Das danuras do pecado.

Com cuidados mil, separado


Santificando com Sua vida em mim
Até as portas da cidade de ouro
O céu enfim.

Salvará meu corpo, morada corruptível


Desprezível vaso de barro
Onde tem habitado.

Da condenação eterna
Me transportará para celestial alvorada
Preparada por Ele para Sua Igreja amada.
A SALVAÇÃO DA ALMA XIV

Quem acha a sua vida perdê-la-á; quem, toda-


via, perde a vida por minha
causa achá-la-á. Mateus 10:39.

A palavra aqui traduzida como vida, neste texto, é psi-


que (no grego ) – que pode ser descrita como alma ou
vida. É a vida da alma, a vida psicológica do ser humano ou a
vida da pessoa, da personalidade humana, vida que está no
sangue, segundo a descrição da Bíblia.
Corpo e alma fazem parte da natureza terrena caída.
O corpo é movido a sangue e este a ar, água e alimento. A
vida bios regula as células que, alimentadas pelo transporte
sanguíneo, corroboram com a ordem funcional, todavia, a
vida da alma é que dá valor e significado à existência huma-
na, e esta vida, também, está no sangue.
Portanto, o sangue é o elemento principal no desen-
volvimento da vida bios, bem como na expressão da vida psi-
que. Porque a vida da carne está no sangue. Eu vo-lo tenho dado
112 A SALVAÇÃO DA ALMA

sobre o altar, para fazer expiação pela vossa alma, porquanto é o


sangue que fará expiação em virtude da vida. Levítico 17:11. (Ou
a expiação pela alma).
Corpo sem sangue é cadáver. Corpo com sangue, mas,
sem a mente, a vontade e as emoções funcionando é estado
comatoso. A alma precisa de sangue e ordem física para se
manifestar. Mas, a alma encontra-se dominada pela preten-
são de ser como Deus. Há uma espécie de vírus de altar e oni-
potência correndo nas veias do ser humano caído.
Neste caso, o homem precisa passar por uma recons-
trução total. Temos visto por aqui, nestes estudos, que fomos
criados tricotômicos, mas por causa do pecado, o espírito foi
desligado de Deus e nos tornamos dicotômicos, sob o gover-
no da uma alma prepotente.
A alma desterrada do Éden é soberba e busca, por
todos os meios, ser o centro do planeta, quiçá do cosmos em
sua síndrome de onipotência, denominada de teomania. É
bem possível que o texto que estamos examinando fale aqui
da salvação desta alma altiva.
Talvez possamos fazer uma versão ampliada deste
versículo assim: aquele que se achar o tal, com a vida da sua
própria alma, com certeza vai se perder, eternamente, mas aquele
que abdicar da vida da sua alma, por minha causa, tem toda a
condição de perceber-se adequado por toda a eternidade.
A questão é: como essa alma ensoberbecida, cheia de
si, pode querer abdicar de sua autossuficiência? Só se houver
um milagre. Felizmente o milagre existe na vivificação do
A SALVAÇÃO DA ALMA XIV 113

espírito ou na regeneração dos eleitos de Deus. Só a nova cria-


tura tem as condições, da graça divina, para negar-se a si mes-
ma. Só o crente em Cristo pode abdicar-se de si.
O discípulo de Cristo é alguém que decidiu segui-lo,
negando a si mesmo e levando a sua cruz diariamente. Então,
disse Jesus a seus discípulos: Se alguém quer vir após mim, a si
mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me. Mateus 16:24. E isto
só será possível, porque houve a morte do velho homem, na
cruz, com Cristo, no Calvário.
O ser humano se tornou pecador quando comeu do
fruto proibido e a morte veio ao seu espírito, no Éden. Sem
vida espiritual, a alma assume o comando e surge algo, um
princípio de hostilidade, denominado na Bíblia, de velho
homem, o executivo do pecado.
Este executivo a serviço do egoísmo humano governa
os impulsos da alma em discórdia, desobediência, orgulho,
mentira, ódio, ciúmes e tudo que vá de encontro à boa e
saudável filiação do gênero humano com Deus. Esta é uma
cultura anticristã de rebeldia e inimizade à graça de Deus. O
velho homem é inimigo de Deus e contrário ao Evangelho.
Assim, quando Jesus foi à cruz, como o substituto per-
feito em favor dos Seus, Ele os incluiu em Seu corpo, para
que estes participassem da Sua morte para o pecado, e, deste
modo, tivessem o velho homem, o servo do pecado, crucifi-
cado com Ele, solidariamente.
Uma vez que nossa união com Cristo se assemelhou à
sua morte, assim também nossa ressurreição é semelhante à dEle.
114 A SALVAÇÃO DA ALMA

Sabemos que nosso velho homem foi crucificado com Cristo, para
que o pecado não tivesse mais poder sobre nossa alma e dele deixás-
semos de ser escravos. Pois, mortos com Cristo, ficamos libertos da
condenação do pecado e, assim, o pecado não terá mais domínio
sobre os que foram justificados. Romanos 6:5-7. (Paráfrase).
Agradeço-te Pai, pois o que quer que seja o meu velho
homem, ele foi crucificado com Cristo na cruz. Seja o que
for, ciúme, orgulho, pensamentos imundos, mente errante,
preocupação ou desejos carnais – Cristo pôde me livrar de
tudo isso. Louve-te Senhor!
Contudo, eu vejo que ainda tenho muita dificuldade
com o pecado que reina no mundo, bem como, com a mi-
nha alma com sua história caída e lembranças ardidas. Talvez
seja isto que Jesus esteja se referindo com o perder a vida. Va-
mos dar uma olhada.
Quando o Senhor disse: Não penseis que vim trazer paz
à terra; não vim trazer paz, mas espada. Mateus 10:34. Que tipo
de espada é esta? Não creio que Ele estivesse se referindo a
um armamento bélico, nem que as lutas seriam ganhas se eu
fosse capaz de matar e vencer o adversário. Creio que há algo
mais profundo nesta estratégia.
Ao falar que os inimigos do homem serão os da própria
casa e que Ele veio causar divisão entre o homem e seu pai; entre a
filha e sua mãe e entre a nora e sua sogra, Mateus 10:35-36, Jesus
estava apontando para a guerra das almas, em face de alguns
familiares O terem recebido como Salvador e Senhor de suas
vidas. É o conflito do incrédulo com o crente.
A SALVAÇÃO DA ALMA XIV 115

Neste caso, aqueles que quiserem vencer a batalha em


seu viver têm que perder a vida da sua alma e, para tanto,
tinham que experimentar o golpe da espada em sua própria
alma. Teriam que morrer. É isto que me parece ter aconteci-
do naquela última estocada do soldado, quando lancetou o
corpo de Jesus na cruz do Calvário. Mas um dos soldados lhe
abriu o lado com uma lança, e logo saiu sangue e água. João 19:34.
Jesus não estava morrendo na cruz isoladamente. Ele
morria uma morte coletiva e compartilhada com Seu povo
eleito desde a eternidade. Era uma morte solidária em que a
espada traspassaria Sua alma, e, consequentemente, a alma
de todos aqueles por quem Ele estava morrendo na cruz. O
que aconteceu com Ele acontece com os que creem.
A meu ver foi o que Simeão profetizou: Eis que este
menino está destinado tanto para ruína como para levantamento
de muitos em Israel e para ser alvo de contradição (também uma
espada traspassará a tua própria alma), para que se manifestem os
pensamentos de muitos corações. Lucas 2:34-35.
Jesus morreu em favor do Israel de Deus composto
por gente de todas as tribos, povos e nações. Os efeitos de
Sua morte estão partilhados com todos os crentes, por todo
lugar e em todos os tempos. O golpe que traspassou a Sua
alma tinha a ver com a exposição dos pensamentos de mui-
tos que encontraram com Ele na cruz. O sangue derramado
foi dEle, os corações abertos são nossos.
Creio que o velho homem de todo aquele que crê em
Jesus já foi crucificado, mas é preciso que este que crê, leve o
116 A SALVAÇÃO DA ALMA

morrer de Jesus, em seu corpo sempre e por todo lugar. O


crente é um parceiro da morte de Jesus e a salvação da sua
alma se efetua pela condução deste morrer diário, em seu
modo de viver. C. S. Lewis disse: “morra antes de morrer.
Não há nenhuma chance depois”. Talvez seja melhor: creia
que você já morreu antes de morrer.
Posso dizer, sem receio de incoerência, que eu já mor-
ri com Cristo, mas também, preciso levar o morrer de Jesus,
em minha alma, para que a Sua vida se manifeste em meu
modo de viver, diariamente. As duas experiências são indis-
pensáveis, uma vez que já fui salvo, em meu espírito, da con-
denação do pecado, mas ainda estou sendo salvo, em minha
alma, do poder do pecado, portanto, devo crer, dia a dia, no
morrer da minha alma na cruz.
Gosto muito deste raciocínio de A. W. Tozer: “O re-
cém-convertido é semelhante a um homem que aprendeu a
dirigir em um país cujo tráfego orienta-se pelo lado esquerdo
da rodovia e repentinamente encontra-se em outro país, for-
çado a dirigir à direita. Ele precisa desaprender o velho hábi-
to e aprender o novo e, o que é mais sério, precisa aprender
isso no meio do trânsito pesado.” Negar-se a si mesmo e viver
a vida de Cristo é o viver cristão.
Alguém me perguntou - como posso saber que a mi-
nha alma está sendo salva? Vou apenas ressaltar isto que es-
tou chamando de teste da alma em processo de salvação.
A alma precisa deste teste radical dia a dia. Pois perder
a vida da alma implica em levar a cruz por causa de Cristo,
A SALVAÇÃO DA ALMA XIV 117

diariamente. Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim
não é digno de mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do que
a mim não é digno de mim; e quem não toma a sua cruz e vem após
mim não é digno de mim. Mateus 10:37-38. Se estivermos sen-
do salvos na alma estaremos nos desapegando de tudo o que
for provisório e nos apegando a tudo que é permanente.
Portanto, não estamos desistindo. Como poderíamos? Ain-
da que por fora pareça que tudo está se acabando, por dentro, onde
Deus está criando a nova vida, não há um só dia em que sua graça
reveladora não se manifeste. Os tempos difíceis nada são compara-
dos com os bons tempos que estão por vir, a celebração sem fim
preparada para nós. Há muito mais do que podemos ver. As coisas
que agora vemos estão aqui hoje, mas desaparecerão amanhã. Mas
as coisas que não vemos agora irão durar para sempre. 2 Coríntios
4:16-18. (Bíblia A Mensagem).
Quando a Palavra de Deus, a espada do Espírito, sepa-
ra a alma do espírito, uma nova realidade se instaura pro-
gressivamente e até os pensamentos mais ocultos do nosso
ser vêm à tona, desentulhando todo lixo de nossa história.
Este processo dinâmico tem a ver com a salvação da alma,
que vai até à maturidade de Cristo. Louvado seja o Senhor!

LUZ DA MINHA ALMA (HCC - 77)


Letra: John Keble

Luz da minha alma és tu, Senhor;


noite não há se perto estás.
118 A SALVAÇÃO DA ALMA

Dissipa as nuvens do temor,


e tenho em ti descanso e paz.

Qual brando orvalho, o sono vem


minha alma e corpo refrescar.
Em ti, Jesus, supremo bem,
quão suave e doce é descansar!

Vive em meu ser, ó Salvador;


só tenho vida em teu amor.
Do dia esvai-se toda a luz;
tu me diriges, ó Jesus.

Com os enfermos vem estar,


os pobres vem alimentar;
aos que no leito sofrem dor,
dá teu alívio animador.

Sê tu conosco ao despertar
e nosso passo vem guiar;
na imensidão do teu amor
dá que habitemos, ó Senhor.
A SALVAÇÃO DA ALMA XV

Assim diz o Senhor: Ponde-vos à margem no


caminho e vede, indagai pelas veredas antigas,
qual é o bom caminho; andai por ele e achareis
descanso para a vossa alma; mas eles dizem:
Não andaremos. Jeremias 6:16.

A Bíblia deve ser interpretada sempre pela bitola de


Cristo. O crivo para explicar qualquer texto é verificar a
medida da revelação de Cristo que nele estiver, portanto, o
bom caminho, na minha visão, é o próprio Cristo, a vereda
antiga, o lugar do descanso da alma.
O Pai criou cada ser humano sedento por algo que
somente a Trindade pode saciar completamente. O filósofo
francês Blaise Pascal chamou isto do vazio no formato de Deus
que existe no coração de cada pessoa e, somente Cristo pode
preencher de modo pleno. Ou, como propôs Agostinho: “nos-
sas almas permanecem insatisfeitas e inquietas até que en-
contrem descanso em Ti”.
120 A SALVAÇÃO DA ALMA

Quando o Espírito Santo regenera alguém, esta pes-


soa vem para o reino de Deus com seu histórico, suas lem-
branças e mazelas. Não há amnésia do passado, nem ninguém
deletou a sua memória. Nascemos de novo, mas não fomos
desligados de nossa história. O nosso espírito foi vivificado,
todavia, a nossa alma não teve um apagão do seu passado.
A alma sempre traz o seu currículo por trás e este vai
além do nascimento físico. Todos nós temos, em nossa vida
celular, certas informações genéticas e códigos de dados cole-
tivos que superam os conhecimentos que temos adquirido
até agora; bem como, os memorandos da vida uterina. A
alma é muito mais complexa do que podemos concebê-la.
Uma vez salvos em nosso espírito, precisamos agora
da salvação da nossa alma, e, isto é progressivo e permanen-
te, até termos os nossos corpos glorificados, quando Jesus vier
buscar o Seu povo, a Sua igreja triunfante. (Eu fui... estou
sendo... e serei salvo).
A salvação da alma propõe, no final das contas, o seu
pleno descanso. Por causa do pecado, a nossa alma se tornou
o centro da ação humana, e, consequentemente, tornou-se
ansiosa e agitada para ter o controle da vida. Temos uma
alma inquieta e preocupada com o seu destino, encontrando-
se, frequentemente, temerosa com relação ao seu futuro e
intimamente cansada de se manter no governo das coisas.
Isso é exaustão existencial.
Em razão da descrença de seus compatriotas, Jesus dis-
se, certo dia: Por aquele tempo, exclamou Jesus: Graças te dou, ó
A SALVAÇÃO DA ALMA XV 121

Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos


sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos. Mateus 11:25. A
salvação da condenação do pecado é um milagre da sobera-
nia do Pai, manifesto aos Seus filhos.
Segundo A. A. Hodge, séc. 19, “a revelação provém
do Pai, mediante o Filho, pelo Espírito. A redenção é para o
Pai, pelo Filho, mediante o Espírito.” Sendo assim, o homem
não consegue encobrir o que Deus revela, e Ele revela aos
insignificantes, por Sua graça.
A Trindade soberana age soberanamente na obra da
salvação do espírito. Jesus foi bem enfático com a sua missão:
Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém conhece o Filho, senão
o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho
o quiser revelar. Mateus 11:27. Parece que está bem claro, não?
A Trindade oculta-se de meros teólogos, estes puros
amantes do saber, e revela-se aos simples teófilos, aqueles que
foram feitos, pela graça, amigos de Deus. Mas, essa amizade
com Deus pressupõe uma obediência sincera, por parte da-
quele que foi feito amigo de Deus.
C. H. Spurgeon, falando aos seus alunos, disse: “meus
queridos amigos, tenham como regra geral que o Espírito de
Deus não faz por nós aquilo que nós mesmos podemos fa-
zer.” Fomos feitos amigos de Deus, para fazer a vontade de
Deus. Jesus foi no alvo ao afirmar: vós sois meus amigos, se
fazeis o que eu vos mando. João 15:14.
Uma vez salvos, no espírito, somos habilitados a coo-
perar, realmente, em todo o processo da salvação de nossa
122 A SALVAÇÃO DA ALMA

alma. Como amigos de Cristo somos chamados a participar


no envolvimento de Sua obra, na redenção da nossa alma.
Neste caso, vamos ao descanso.
O esforço do crente é no âmbito da confiança. O seu
trabalho mais desgastante é perseverar na fé. A vida do justi-
ficado pela graça é uma vida por meio da fé. Viver pela fé
coloca a alma sempre em dependência da soberania de Deus,
que é algo provocante.
Jesus mostrou claramente onde devemos gastar nos-
sa energia neste mundo caído de tantas exigências. Veja na
tradução da Bíblia A Mensagem, em João 6:27-29: Não gas-
tem energia, lutando por comida perecível (como aquela que vocês
comeram). Trabalhem pela comida que permanece, comida (esta)
que sustenta a vida eterna, comida que o Filho do Homem provi-
dencia. Ele e o que ele faz são permanentes, porque têm a garan-
tia de Deus, o Pai. - Então, eles disseram: Muito bem, o que
temos de fazer, então, para realizar as obras de Deus? - Jesus
respondeu: Confiem naquele que Deus enviou. Se passarem a
segui-lo, ele os envolverá na obra de Deus.
A grande luta da alma, no processo da salvação, é crer
na Palavra de Deus. Não é fácil ser desconstruído da autocon-
fiança e confiar apenas no que Deus diz. Há um cântico que
mostra Deus dizendo para a nossa alma, assim: - “Não tenhas
sobre ti um só cuidado, qualquer que seja, pois um, somente
um, seria muito para ti. É Meu, somente Meu, todo traba-
lho, e o teu trabalho é descansar em Mim.” - Como a alma
consegue descansar nEle?
A SALVAÇÃO DA ALMA XV 123

O trabalho para o descanso da alma é hercúleo. Há


um grande paradoxo aqui, já que o seu descanso gera um
desempenho nela, que a deixa cansada. Abrir mão do agir
por conta própria e confiar na ação divina é uma loucura. A
alma foi sempre executiva – e agora? Talvez João Calvino te-
nha razão ao dizer. “Não podemos descansar nas promessas
de Deus sem obedecer a seus mandamentos.” E obedecer re-
quer fé. E crer não é tão fácil.
Ainda que a fé seja simples para o espírito, porque ele
vê o invisível, não é fácil para a alma acostumada às evidênci-
as. Somente pela graça divina é que o ser humano pode obe-
decer à vontade divina. Aqui reside a grande luta entre o
homem interior e o exterior.
Esta batalha é exaustiva ao extremo e precisamos de
perseverança. Portanto, não olhamos para aquilo que agora pode-
mos ver; em vez disso, fixamos o olhar naquilo que não se pode ver.
Pois as coisas que agora vemos logo passarão, mas as que não pode-
mos ver durarão para sempre. 2 Coríntios 4:18.
Entrar no descanso não significa ausência de esforço,
mas ausência de ansiedade quanto ao comando. Antes a alma
exercia o controle das suas ações, mas agora ela age sob o
comando da ação do Espírito Santo, de dentro para fora.
Antes ela se autodirigia, agora ela é dirigida pelo poder do
alto, que reside no espírito vivificado.
A alma foi sempre o capitão do navio e nunca se con-
forma em ser o estafeta. O nosso cansaço vem sempre de
nossa alma executiva, que pretende continuar no comando.
124 A SALVAÇÃO DA ALMA

Orar é mais complicado do que trabalhar. Esperar no Se-


nhor é mais difícil do que agir. E o descanso da alma é uma
batalha gigantesca e extenuante, por isso o povo de Israel
nunca entrou no descanso. O Senhor os convidou ao sosse-
go, mas eles rejeitaram.
O povo de Israel entrou em Canaã, mas nunca en-
trou no descanso. Entrou na terra prometida, contudo ja-
mais entrou no repouso. Ora, se Josué lhes houvesse dado des-
canso, não falaria, posteriormente, a respeito de outro dia. Portan-
to, resta um repouso para o povo de Deus. Hebreus 4:8-9. Este
repouso aqui é o próprio Cristo.
A Palavra diz que este povo não transpôs o perímetro
da quietude espiritual, por causa da ausência do verdadeiro
exercício da fé, e nós, que nos dizemos crentes, corremos o
mesmo risco deles, hoje em dia. Porque também a nós foram
anunciadas as boas-novas, como se deu com eles; mas a palavra
que ouviram não lhes aproveitou, visto não ter sido acompanhada
pela fé naqueles que a ouviram. Hebreus 4:2.
O descanso da alma é a real dependência de Cristo
em nosso espírito. “A pressa destrói o descanso; o ritmo rápi-
do, a paz,” mas, esperar com paciência pela ação do Senhor
é, ao mesmo tempo, o início do descanso e o mover da agita-
ção da alma. Aqui precisamos da ação do Espírito Santo nos
levando ao quebrantamento, para podermos aquietar.
O Espírito convence o pecador a crer em Jesus, mas,
também, precisa convencer o santo a entrar no descanso. Ele
convence o incrédulo a crer, estando ainda do lado de fora,
A SALVAÇÃO DA ALMA XV 125

todavia, ao convencer o crente a entrar no descanso, age do


lado de dentro, gerando sadia obediência, depois de levá-lo
ao fim de si mesmo. O seu convite aos exaustos é: Tomem
sobre vocês o meu jugo. Deixem que eu lhes ensine, pois sou manso
e humilde de coração, e encontrarão descanso para a alma. Mateus
11:29. Amém. Amém.

VEM JESUS HABITAR MEU SER* (HCC - 112)


Letra: Emily Elizabeth Steele Elliott

Tu deixaste, Jesus, o teu reino de luz,


e desceste a este mundo tão vil,
um presépio, em Belém,
tu, Jesus, Sumo Bem,
escolheste por berço infantil.

Vem, Jesus, habitar meu ser*,


em minha alma há lugar; oh, vem já!
Vem, Jesus, habitar meu ser*,
em minha alma há lugar; oh, vem já!

Alegraram-se os céus
com os santos de Deus,
sim, por teres nascido, Jesus,
vindo ao mundo trazer
salvação ao que crer
na mensagem bendita da cruz.
126 A SALVAÇÃO DA ALMA

Tu vieste, Senhor,
revelar-nos amor,
e te aprouve do mal nos salvar.
Tu provaste do fel,
sofrimento cruel;
morte, enfim, te fizeram provar.

Outra vez tu virás


e por mim chamarás,
rodeado dos anjos de Deus.
Que alegria pra mim,
ao dizeres assim:
“Um lugar te darei eu nos céus!”

* Sugestão do autor, mudar COMIGO por MEU SER (Emanuel é Deus conosco,
mas a vida cristã é Cristo em nós a esperança da glória).
ESTÁGIOS DA DIVISÃO ANTROPOLÓGICA:
DA GERAÇÃO À REGENERAÇÃO

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