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Qual a importância de

diferenciar derrame
pleural exsudativo do
transudativo?

8.1 ETIOLOGIAS E DEFINIÇÕES


O derrame pleural é definido como o acúmulo anormal de líquido
no espaço pleural. Normalmente, existe de 0,1 a 0,2 mL/kg de
líquido entre as pleuras visceral e parietal, com produção e
reabsorção contínuas, mantendo uma dinâmica equilibrada.
Normalmente, o fluido entra no espaço pleural pelos capilares da
pleura parietal e é removido pelos linfáticos da própria pleura
parietal. Os fluidos em menor monta podem também entrar via
espaços intersticiais na pleura visceral e pela cavidade peritoneal
via diafragma. Os linfáticos têm capacidade de absorver 20 vezes
a quantidade de líquido que normalmente perpassa pelo espaço
pleural. Dessa forma, qualquer doença que modifique essa
dinâmica pode promover a formação de derrame pleural,
conforme os mecanismos demonstrados a seguir.
Inúmeras doenças, sistêmicas ou restritas ao aparelho
respiratório, podem ter esse derrame como manifestação clínica.
São mecanismos do derrame pleural:
▶ Aumento da pressão hidrostática capilar pulmonar —
insuficiência cardíaca;
▶ Redução da pressão coloidosmótica do plasma —
hipoalbuminemia grave, síndrome nefrótica;
▶ Aumento da permeabilidade vascular pleural — processos
inflamatórios;
▶ Negativação excessiva da pressão intrapleural — atelectasias
grandes;
▶ Passagem de líquido da cavidade peritoneal — hidrotórax
hepático;
▶ Acúmulo de sangue ou quilo no espaço pleural — trauma.
Não se dispõe de estatísticas nacionais, mas dados dos Estados
Unidos estimam a ocorrência de cerca de 1,5 milhão de casos por
ano, sendo as etiologias mais frequentes a insuficiência cardíaca
congestiva, o derrame parapneumônico e o derrame neoplásico.
Entretanto, é importante lembrar que nos países
subdesenvolvidos, especialmente o Brasil, existe uma incidência
considerável de tuberculose pleural, o que não é analisado pelos
dados norte-americanos, não sendo possível adaptar esses
números à nossa realidade.
Em uma visão simplista, a principal diferenciação entre os tipos de
derrame pleural é feita avaliando o grau de inflamação do fluido,
classificando-os como transudatos — pouca inflamação — ou
exsudatos. Essa diferenciação pode ser equivocada em até 25%
dos casos. A seguir, estão demonstrados tipos de derrame pleural
e suas características, assim como estão listadas as causas mais
relevantes de derrame pleural transudativos e exsudativos.
Figura 8.1 - Derrame pleural moderado à esquerda
Nota: observar o aspecto “em parábola” da opacidade no pulmão esquerdo,
característico da doença.
Fonte: Puwadol Jaturawutthichai.

São conceitos importantes relacionados ao derrame pleural:


▶ Derrame parapneumônico: associado a infecção pulmonar,
sobretudo, pneumonia bacteriana;
▶ Empiema: pus na cavidade pleural;
▶ Hemotórax: acúmulo de sangue no espaço pleural, geralmente
de origem traumática;
▶ Quilotórax: acúmulo de linfa na cavidade pleural;
▶ Urinotórax: acúmulo de urina, geralmente por nefropatia
obstrutiva;
▶ Hidrotórax hepático: acúmulo de líquido proveniente da
cavidade peritoneal.
Classificação das principais causas de derrame pleural:
▶ Transudatos:
▷▷ Insuficiência cardíaca;
▷▷ Cirrose hepática;
▷▷ Síndrome nefrótica;
▷▷ Síndrome da veia cava superior;
▷▷ Mixedema;
▷▷ Diálise peritoneal;
▷▷ Embolia pulmonar;
▷▷ Urinotórax;
▷▷ Hipoalbuminemia grave.
▶ Exsudatos:
▷▷ Pneumonia;
▷▷ Tuberculose;
▷▷ Neoplasia — primária ou metastática;
▷▷ Embolia pulmonar;
▷▷ Colagenoses;
▷▷ Pancreatite;
▷▷ Hemotórax;
▷▷ Quilotórax;
▷▷ Síndrome de Meigs — fibroma ovariano;
▷▷ Ruptura esofágica;
▷▷ Uremia;
▷▷ Pós-cirurgia;
▷▷ Asbestose;
▷▷ Sarcoidose;
▷▷ Síndrome de Dressler;
▷▷ Síndrome das unhas amarelas.
As doenças relacionadas aos derrames transudatos e exsudatos
são bastante recorrentes nas provas de concursos médicos. Uma
regra fácil para sua diferenciação é que os transudatos decorrem
de alguma doença sistêmica que se manifesta com acúmulo de
líquido no tórax, ou seja, que gera mudança da dinâmica da pleura,
seja formação ou absorção do líquido pleural. A principal causa de
derrame pleural transudativo — insuficiência cardíaca congestiva
— ilustra bem esse processo, já que o volume de líquido entrando
pelos espaços intersticiais da pleura visceral supera e muito a
capacidade de absorção linfática. Os exsudatos são causados por
uma doença que está acontecendo ativamente na pleura. Ou seja,
fatores locais influenciam diretamente na alteração da formação
e absorção de líquido pleural.
8.2 QUADRO CLÍNICO E EXAMES
RADIOLÓGICOS
O quadro clínico dependerá da doença de base e do volume do
derrame pleural. Assim, cada morbidade que se associa ao
derrame pleural apresenta tanto dados clínicos inerentes ao seu
processo patológico — edema periférico e dispneia paroxística
noturna na insuficiência cardíaca, por exemplo — quanto relativos
à presença de líquido no espaço pleural, gerando compressão do
parênquima pulmonar adjacente.
A presença de derrame pleural gera sintomas como dispneia aos
esforços e tosse, seca ou produtiva. Em casos de derrames
volumosos, pode ser referida pelo paciente a piora da dispneia,
conforme o decúbito lateral que adote, o que caracteriza a
trepopneia. Dor torácica pode estar presente por inflamação
pleural — incomum nos transudatos — e, habitualmente, é bem
localizada, piorando com a inspiração profunda — dor tipo
pleurítica.
Achados ao exame físico são redução da expansibilidade,
macicez à percussão torácica, frêmito toracovocal diminuído ou
abolido e redução do murmúrio vesicular. Destes, o achado mais
precoce é a macicez à percussão.
A principal confusão diagnóstica ao exame físico deve-se à
presença de atelectasia. Existem dois sinais clínicos que, quando
presentes, ajudam a diferenciar derrame de atelectasia pelo
exame físico: sinal de Signorelli — macicez à percussão da coluna
torácica, característica de derrames pleurais — e sinal de Lemos
Torres — abaulamento do espaço intercostal à expiração.
Os exames de imagem são fundamentais para o diagnóstico. O
exame mais simples e prático é, como na grande maioria das
vezes, a radiografia de tórax. Porém, para identificar a presença
de líquido, é necessário acúmulo não desprezível: mínimo de 250
a 500 mL de líquido na radiografia em posteroanterior e de 75 a
100 mL no perfil.
O aspecto clássico do derrame pleural é de opacidade
homogênea nos segmentos inferiores, com conformação “em
parábola”, ou curva de Damoiseau, o que caracteriza líquido livre
na cavidade pleural.
Entretanto, há uma situação especial de derrame pleural livre: o
derrame subpulmonar, que se caracteriza por acúmulo de líquido
abaixo do pulmão, gerando um aspecto semelhante à elevação da
hemicúpula, sem velamento do seio costofrênico ou conformação
“em parábola”. Em situações normais, a curvatura da cúpula é
mais acentuada medialmente; no derrame subpulmonar, ocorre
mais lateralmente. Para confirmar o diagnóstico, basta solicitar a
radiografia em decúbito lateral com raios horizontais — incidência
de Hjelm-Laurell —, em que será observada a mudança de
conformação do líquido.
Figura 8.2 - Derrame pleural bilateral, sendo subpulmonar no hemitórax direito
Fonte: Investigation of a unilateral pleural effusion in adults: British Thoracic
Society Pleural Disease Guideline 2010, 2010.

Figura 8.3 - Radiografia de tórax em decúbito lateral esquerdo com raios


horizontais, mostrando líquido livre na cavidade pleural
Eventualmente, o líquido pode não estar livre na cavidade pleural,
recebendo a denominação de derrame pleural loculado. A
confirmação diagnóstica, usualmente, depende de outros
métodos de imagem, já que o exame em decúbito lateral não
modifica a conformação desse tipo de derrame.
Figura 8.4 - Derrame pleural loculado à direita

Fonte: Tomatheart.

Exames mais sofisticados, como ultrassonografia ou tomografia


de tórax, podem ser úteis em casos duvidosos ou para a avaliação
adicional de massas, pneumopatias, mediastino ou loculação do
derrame.
8.3 INDICAÇÕES DE TORACOCENTESE
A toracocentese pode ser diagnóstica ou de alívio. Na Figura 8.5,
seguem as recomendações universais para realização de
toracocentese.
Figura 8.5 - Indicações de toracocentese

Fonte: elaborado pelo autor.

Na suspeita de insuficiência cardíaca e outras causas de derrame


transudativo, não realizar toracocentese, nem diagnóstica nem de
alívio; deve-se tentar manejo de terapia clínica e reavaliar. Em
caso de dúvida diagnóstica, sempre realizar toracocentese, pois,
na maioria das vezes, a análise do líquido pleural é a principal
ferramenta diagnóstica. Para alívio de sintomas nos derrames
exsudativos também sempre se deve realizar a toracocentese.
Independentemente da modalidade, deve ser reservado um local
limpo e destinado para pequenos procedimentos, exceto em
situações emergenciais. O local da punção deve ser delimitado
por meio do exame físico, com percussão e ausculta da voz, e
confirmado com uma radiografia de tórax. Em pacientes com
suspeita de derrame pleural loculado, pode ser necessária a
realização do procedimento guiado por ultrassonografia de tórax.
A técnica de punção deve sempre ser com a agulha em posição
perpendicular à pele e tangenciando a borda superior do arco
costal inferior, de modo a evitar punção acidental do feixe
vasculonervoso, que percorre a margem inferior de cada uma das
costelas (Figura 8.6). Deve ser realizada limpeza apropriada da
pele com solução antisséptica, e deve ser utilizado campo estéril;
anestesia da pele e subcutâneo, assim como da pleura parietal,
deve ser feita com anestésico local antes do procedimento.
Atingindo o espaço pleural com saída de líquido, deve-se retirar a
agulha e introduzir o Jelco®, com retirada posterior do mandril,
mantendo apenas o cateter plástico. Pode-se retirar todo o
líquido, mas é prudente não ser mais de 1.500 mL por vez, pela
possibilidade de edema pulmonar de reexpansão. Para a retirada
do líquido, podem ser utilizados frascos comuns ou a vácuo, com
o cuidado de garantir débito lento.
Figura 8.6 - Sequência da toracocentese
Legenda: (A) anestesia local; (B) punção do hemitórax; (C) drenagem do derrame
pleural.
Fonte: acervo Medcel.

8.3.1 Ultrassonografia para guiar a toracocentese


É indiscutível o impacto do uso de ultrassonografia para guiar
intervenções para garantir maior segurança, especialmente num
cenário de doenças pleurais com intervenções comumente
necessárias (Thoracic ultrasound competence for ultrasound-
guided pleural procedures, 2019).
8.3.2 Radiografia após a toracocentese
Em uma série de 506 toracocenteses, apenas 18 pacientes
tiveram complicações com pneumotórax. Na ausência de tosse,
dispneia, dor após punção, saída de ar ou redução do frêmito
toracovocal na parte superior do hemitórax puncionado, menos
de 1% teve pneumotórax. Por isso, não é recomendada a
realização de radiografia de tórax de rotina após uma
toracocentese, exceto na presença de sinais e sintomas já
referidos (The Value of Chest Roentgenography in the Diagnosis
of Pneumothorax after Thoracentesis, 1999).
Por outro lado, quando a toracocentese é de alívio (retirada de 1 a
1,5 L), uma radiografia após a punção pode mostrar lesão
parenquimatosa subjacente, embora seja necessária muita
cautela na interpretação dos achados, uma vez que são comuns
atelectasias decorrentes de compressão extrínseca pelo
derrame.
8.4 ANÁLISE DO LÍQUIDO PLEURAL
Derrames pleurais exsudativos geralmente são causados por
doenças pleuropulmonares, como tuberculose, pneumonia,
tromboembolismo pulmonar, neoplasia pulmonar primária ou com
metástase pulmonar, enquanto os transudatos são causados por
doenças sistêmicas, como insuficiência cardíaca, cirrose e
síndrome nefrótica.
O objetivo principal da análise do líquido pleural é a diferenciação
entre exsudato e transudato. Há mais de 30 anos, Richard Light
validou critérios aceitos até hoje como extremamente acurados
para o diagnóstico diferencial, utilizando, basicamente, dosagem
de proteínas e de desidrogenase láctica (DHL) no líquido pleural e
no sangue do paciente. A lógica desses marcadores serem
utilizados é o fato deles estarem associados à inflamação quando
elevados. Com isso, reflete diretamente presença de inflamação
pleural que ocorre nos exsudatos, já que, como vimos, este se
relaciona à presença de doença presente na pleura. Outros
critérios, como dosagem de colesterol pleural, gradiente de
proteína pleural sérico e relação proteína sérica-pleural também
são utilizados na tentativa de diferenciação entre exsudato e
transudato. A seguir, estão os critérios de Light para exsudato:
▶ Relação proteína do líquido pleural-proteínas séricas acima de
0,5;
▶ Relação DHL do líquido pleural-DHL sérica acima de 0,6;
▶ DHL do líquido superior a dois terços do limite do laboratório.

#importante
Os critérios de Light devem ser
memorizados, pois sempre estão
presentes nas provas, e auxiliam na
resolução de inúmeras questões.
A relação proteína sérica-pleural tem sido utilizada no seguinte
contexto: paciente com exsudato pelos critérios de Light e
quadro clinicamente compatível com transudato. Sendo essa
relação acima de 3,1 g/dL, a caracterização de exsudato pelos
critérios de Light deve ser ignorada e o derrame pleural encarado
como transudato. Perceba que a relação é sérica-pleural e não
pleural-sérica, como no critério de Light. É justamente o inverso.
Tal problema ocorre classicamente em pacientes com
insuficiência cardíaca congestiva que receberam diurético, o que
torna o líquido um pouco mais “concentrado”, alterando as
concentrações de DHL e proteínas no fluido.
Outro parâmetro que pode auxiliar nesse mesmo contexto é o
cálculo do gradiente de albumina soro-líquido pleural; este,
quando superior ou igual a 1,2, na situação citada, define
transudato. É importante ponderar que o uso isolado da albumina
pode gerar equívocos diagnósticos e não é indicado a situações
diferentes da descrita.
É sempre bom termos em mente que a principal causa de
derrame pleural é insuficiência cardíaca; a principal causa de
transudato, por conseguinte, também é insuficiência cardíaca. A
principal causa de exsudato é pneumonia bacteriana.
A análise do líquido não se restringe à sua caracterização como
transudativo ou exsudativo. Deve-se buscar o diagnóstico
etiológico. Para tanto, avaliam-se as características
macroscópicas, bioquímicas e bacteriológicas do líquido. É
interessante ressaltar que todos esses parâmetros devem ser
solicitados sempre que possível para uma análise completa do
derrame pleural.
O algoritmo diagnóstico é apresentado na Figura 8.7, e depois de
estudá-lo, vamos ver como avaliar cada dado do derrame pleural
e tecer algumas considerações sobre as principais causas de
derrame pleural na nossa prática clínica.
Figura 8.7 - Algoritmo diagnóstico na análise de derrame pleural

Fonte: elaborado pelo autor.

8.4.1 Características macroscópicas


A aparência e o odor do líquido pleural podem sugerir a etiologia.
Dessa forma, o aspecto inicial do líquido pleural pode ser o
relatado de acordo com os exemplos a seguir:
▶ Hialino: característico dos transudatos;
▶ Amarelo-citrino espumoso: característico dos exsudatos;
▶ Serossanguinolento ou sanguinolento: neoplasia, trauma ou
embolia pulmonar — raramente, pode ocorrer em derrame
parapneumônico ou tuberculose;
▶ Leitoso: quilotórax ou empiema;
▶ Purulento com odor fétido: empiema;
▶ Achocolatado: abscesso amebiano;
▶ Odor de urina: urinotórax.

8.4.2 Bacterioscópico
Na suspeita de derrame exsudativo, deve-se sempre solicitar uma
bacterioscopia — Gram — e inocular, à beira do leito, o líquido
pleural em meios de cultura para aeróbios e anaeróbios.
Dependendo do caso, podem-se pedir culturas para fungos e
micobactérias; o micológico direto pode mostrar algum fungo,
mas a pesquisa de micobactérias no esfregaço tem baixíssimo
rendimento, exceto na AIDS ou no empiema tuberculoso.
8.4.3 Citologia
Mais do que a contagem absoluta de células no líquido, é
importante a avaliação diferencial.
Quadro 8.1 - Celularidade no líquido pleural
No líquido pleural, via de regra, são encontrados mesoteliócitos,
que têm maior importância prática quando estão ausentes, o que
é um estigma de pleurite tuberculosa.
A citologia oncótica pode diagnosticar um derrame pleural
neoplásico. A sensibilidade é baixa, e sua ausência nunca exclui o
diagnóstico de neoplasia, mas vale ressaltar que a sensibilidade
do método está diretamente relacionada à expertise do
laboratório que faz a análise. Tem maior utilidade em derrames
com predomínio de linfócitos e monócitos. Quanto a pacientes
com suspeita de derrame neoplásico e citológico negativo, deve-
se realizar uma videotoracoscopia. As principais neoplasias
associadas ao derrame pleural maligno — acima de 75% dos
casos — são, em ordem decrescente de frequência, cânceres de
pulmão, de mama e linfoma.
Quadro 8.2 - Positividade da citologia oncótica
Na presença de derrame sanguinolento, deve-se solicitar o
hematócrito do líquido: quando acima de 50% do hematócrito do
paciente, define-se hemotórax, indicando-se drenagem torácica,
sendo a etiologia mais comum o trauma; quando abaixo de 1%,
não tem significado; quando entre tais valores, define-se o líquido
como sero-hemorrágico — observado em neoplasias, embolia etc.
8.4.4 Bioquímica
8.4.4.1 pH

Quando pH abaixo de 7,2, é compatível com derrame


parapneumônico complicado, artrite reumatoide, ruptura
esofágica, tuberculose, neoplasia ou urinotórax — este último, a
única causa de transudato com pH baixo.
8.4.4.2 Glicose

Útil quando acima de 60 mg/dL, pode acontecer em derrame


parapneumônico complicado, neoplasia, pleurite lúpica ou
reumatoide. Empiema e pleurite reumatoide podem cursar com
níveis extremamente baixos de glicose — abaixo de 20 mg/dL.
8.4.4.3 Adenosina deaminase (ADA)
Trata-se de um marcador de atividade linfocitária, com baixo
custo, e importante como auxílio diagnóstico a casos suspeitos de
tuberculose pleural em regiões com alta incidência da doença.
Além da ADA, podem ser solicitados alfainterferona ou reação em
cadeia da polimerase (PCR) no líquido pleural. O valor de corte foi
recentemente revisado e adotado como 35 UI, sendo valores
acima destes indicativos de tuberculose pleural (Pleural Fluid
Adenosine Deaminase (Pfada) in the Diagnosis of Tuberculous
Effusions in a Low Incidence Population, 2015; Pleural
tuberculosis: A concise clinical review, 2018; Diagnostic
Performance of Pleural Fluid Adenosine Deaminase for
Tuberculous Pleural Effusion in a Low-Incidence Setting, 2018).
Outras causas de ADA elevada são empiema, pleurite reumatoide,
mesotelioma e linfoma.

#importante
Convém lembrar que adenosina
deaminase é sugestiva de tuberculose
pleural, porém, o marcador não é
patognomônico.

8.4.4.4 Amilase

A principal causa de sua elevação é a neoplasia. Classicamente,


entretanto, está aumentada na presença de pancreatite e ruptura
esofágica. Lembrando que na ruptura esofágica a amilase
presente é a salivar.
8.4.4.5 Triglicérides

Triglicérides acima de 110 mg/dL definem a presença de


quilotórax. Se o aspecto for leitoso, com pH normal e triglicérides
abaixo de 50 mg/dL, com colesterol elevado, define-se
pseudoquilotórax — aspecto de derrame pleural antigo. Quando
entre 50 e 110 mg/dL, deve-se solicitar a dosagem de
quilomícrons, para tentar caracterizar o quilotórax.
8.4.4.6 Ureia e creatinina

Seus aumentos no líquido pleural sugerem a presença de


urinotórax.
8.4.4.7 Testes imunológicos

Fator reumatoide, fator antinuclear e células LE podem ser


encontrados no líquido pleural de pacientes com derrame
associado a colagenoses.
São pistas no diagnóstico diferencial do derrame pleural:
▶ Derrame bilateral: sugere doença sistêmica, geralmente com
derrame transudativo;
▶ Derrame maciço: o hemitórax opaco é mais frequente em
derrames neoplásicos;
▶ Líquido sero-hemorrágico: neoplasia, embolia, pneumonia; é
incomum na tuberculose;
▶ Líquido leitoso: quilotórax;
▶ Exsudato com predomínio de linfócitos: em pacientes com
menos de 40 anos, a tuberculose é o mais provável; em pacientes
com mais de 60 anos, a neoplasia é o mais provável;
▶ ADA elevada: causas possíveis são tuberculose, linfoma, artrite
reumatoide, empiema, mesotelioma.
8.5 BIÓPSIA DE PLEURA
A biópsia de pleura é indicada aos derrames exsudativos, sem
etiologia definida pela análise bioquímica ou bacteriológica.
Alguns grupos realizam a biópsia transtorácica com agulha de
Cope no momento da toracocentese inicial, na presença de
estigmas clínicos de exsudato ou na compatibilidade da aparência
macroscópica do líquido. A biópsia transtorácica tem excelente
acurácia para o diagnóstico de pleurite tuberculosa, pois o
envolvimento pleural é difuso e homogêneo, mas apresenta
rendimento baixo para neoplasia, em que, frequentemente, os
fragmentos retirados correspondem a áreas de pleura parietal
sem infiltração neoplásica. Assim, nos casos a que se indica
biópsia, se a transtorácica for negativa, o próximo passo será
indicar uma videopleuroscopia com biópsia dirigida.
Todas as características bioquímicas e citológicas do derrame
pleural estão presentes nas questões de concursos médicos.
8.6 CAUSAS ESPECÍFICAS
8.6.1 Derrame pleural por insuficiência cardíaca
A insuficiência ventricular esquerda é a principal causa de
derrame pleural em geral e, por conseguinte, principal causa de
derrame pleural tipo transudato. Geralmente é bilateral e maior à
direita. Toracocentese deve ser sempre realizada na presença de
situações que causem dúvida quanto a etiologia do derrame estar
relacionado à insuficiência cardíaca, como paciente com febre e
derrame pleural unilateral que não melhora após terapia com
diurético. Um marcador que ajuda a definir derrame pleural por
insuficiência cardíaca, é o N-terminal peptídio natriurético pró-
cerebral (NT-pró-BNP); quando está acima de 1.500 pg/mL, é
virtualmente diagnóstico.
8.6.2 Derrame pleural por tuberculose
A tuberculose é uma causa frequente de derrame pleural em
nosso meio e deve sempre entrar no diagnóstico diferencial de
exsudatos.
Na maioria das vezes, o derrame pleural tuberculoso decorre de
uma reação de hipersensibilidade da pleura ao bacilo. Os
antígenos podem entrar no espaço pleural após ruptura de foco
caseoso pulmonar na região subpleural, por contiguidade da lesão
pulmonar, por ruptura do gânglio mediastinal ou pela via linfo-
hematogênica. Por esses motivos, tem-se uma baixíssima
positividade da pesquisa de bacilos álcool-ácido resistentes
(BAARs) e da cultura do líquido pleural — há crescimento em
menos de 30% dos pacientes. Bem mais raramente, pode haver
ruptura de cavitação subpleural, provocando o que se chama de
empiema tuberculoso, com pesquisa de BAAR e cultura
habitualmente positivas.
Os pacientes costumam buscar auxílio médico com tosse seca —
eventualmente com secreção —, febre e dispneia. Na maioria das
vezes, o quadro é agudo, simulando infecção pulmonar
bacteriana. O quadro clínico pode ser arrastado — perda de peso,
sudorese noturna, febre vespertina —, principalmente na
presença de envolvimento de outros órgãos na apresentação
inicial.
O aspecto do líquido pleural é geralmente amarelo-citrino ou
turvo, sendo incomum a apresentação hemática. O derrame
pleural é unilateral, habitualmente de tamanho pequeno a
moderado, mas podendo ocupar todo um hemitórax.
Deve-se suspeitar de tuberculose se houver predomínio de
linfócitos no líquido pleural, mas, em pacientes com sintomas há
menos de 15 dias, é possível o predomínio de neutrófilos,
caracterizando a fase aguda da inflamação. A porcentagem de
células mesoteliais é geralmente inferior a 5% — pela inflamação
difusa da pleura —, e pacientes com mais de 5% dessas células no
derrame pleural tuberculoso sugerem diagnóstico alternativo.
Outro dado contrário ao diagnóstico é a presença de mais de 10%
de eosinófilos no líquido, a menos que o paciente tenha realizado
múltiplas punções ou pneumotórax.
O PPD é negativo em um terço dos pacientes, ao passo que o
parênquima pulmonar, à radiografia de tórax, é normal na maioria
dos casos, podendo mostrar sinais de tuberculose prévia.
Como se trata de reação de hipersensibilidade na pleura, mesmo
se a tuberculose pleural não for tratada, pode ocorrer cura
espontânea, embora 50% dos pacientes acabem desenvolvendo
tuberculose ativa em outro sítio nos próximos anos.
A positividade da baciloscopia direta do líquido pleural é muito
baixa: menor do que 5% na maioria das séries. A positividade da
cultura em meio de Löwenstein-Jensen varia de 10 a 35% para o
líquido pleural e de 39 a 65% em submetidos a biópsia pleural.
Além de pesquisa direta e cultura, há outras possibilidades
diagnósticas, descritas a seguir.
8.6.2.1 Reação em cadeia da polimerase para M. tuberculosis

Ainda apresenta grande variação na acurácia, dependendo do


laboratório estudado. A literatura relata grandes variações na
sensibilidade e na especificidade, com estudos com sensibilidade
abaixo de 20% e outros acima de 90%; em média, a sensibilidade
é de cerca de 70%. Regra geral: um teste de PCR positivo indica
tuberculose pleural com mais de 90% de especificidade.
8.6.2.2 Adenosina deaminase
Trata-se de uma enzima em grande quantidade em linfócitos e
monócitos ativados, sobretudo em linfócitos T-helper. É
proveniente do catabolismo das purinas, que, catalisando a
conversão da adenosina em inosina e da desoxiadenosina em
desoxiinosina, é importante para a diferenciação de linfócitos,
principalmente da população T. A primeira descrição dessa
enzima para uso diagnóstico foi feita em 1970 em pacientes com
câncer de pulmão, mas só em 1978 se descreveu o seu uso para o
diagnóstico de tuberculose.
A sensibilidade e a especificidade da ADA para o diagnóstico de
tuberculose no derrame pleural dependem do cut-off usado, que
varia conforme o estudo e a metodologia usados. Atualmente, o
cut-off recomendado é de 35 UI/L, que teve um Valor Preditivo
Negativo (VPN) de 99,7% — IC de 95%; 98,2 a 99,9% — para a
exclusão de tuberculose pleural e sensibilidade de 85,7% — IC de
95%; 42,2 a 97,6% — com uma área sob a curva de 0,88 — IC
95%; 0,732 a 1.000, segundo o estudo Pleural Fluid Adenosine
Deaminase (Pfada) in the Diagnosis of Tuberculous Effusions in a
Low Incidence Population (2015). Por outro lado, quanto maior for
a prevalência da tuberculose em determinada região, maior será o
valor preditivo positivo do exame.
Níveis superiores a 60 UI/L têm valor preditivo positivo ainda
maior, raramente encontrado em outras condições. Em algumas
situações que não a tuberculose, pode haver elevação da ADA no
líquido pleural, especialmente em linfomas e raramente em
empiema pleural, mesotelioma e artrite reumatoide. Em derrames
pleurais exsudativos com predomínio de linfócitos e ADA elevada,
na ausência de estigmas clínicos de linfoma, empiema e artrite
reumatoide, o diagnóstico de tuberculose pleural é bastante
provável e o tratamento está indicado.
8.6.2.3 Gamainterferona
Semelhante à ADA, quando aumentada, sugere tuberculose
pleural. Entretanto, em nosso meio, não está facilmente
disponível para uso rotineiro. Utilizando um ponto de corte de 140
pg/mL, a sensibilidade pode variar de 86 a 97%, enquanto a
especificidade tem sempre valores acima de 90%. A meta-análise
Adenosine deaminase and interferon gamma measurements for
the diagnosis of tuberculous pleurisy: a meta-analysis (2003)
demonstrou que, devido ao custo, a dosagem da ADA apresenta
melhor relação custo-benefício para o diagnóstico de tuberculose
pleural.
8.6.2.4 Biópsia pleural fechada

Recomenda-se a coleta de dois a três fragmentos para a


realização do exame anatomopatológico e outro para a cultura. A
sensibilidade pode chegar a 60%. Múltiplas biópsias aumentam o
rendimento diagnóstico — busca de granulomas ou cultura da
pleura. A formação do granuloma requer imunidade celular bem
preservada, a qual é prejudicada na imunodepressão causada
pelo HIV, de forma que se perde a sensibilidade nesses pacientes.
8.6.2.5 Lisozima

Exame pouco utilizado, é uma enzima bacteriolítica decorrente,


principalmente, da decomposição dos leucócitos. Níveis elevados
dessa enzima são encontrados no líquido pleural por tuberculose
e nos empiemas. O valor da relação líquido pleural-sangue acima
de 1 pode ser utilizado no diagnóstico diferencial com exsudatos
de outras etiologias. Aumentos significativos — acima de 50 UI/L
—, excluindo empiema, apresentam alta probabilidade de
tuberculose. É um exame pouco solicitado na prática diária em
virtude da sua acurácia limitada.
8.6.2.6 Videotoracoscopia com biópsia
Método mais sensível do que a biópsia pleural “às cegas” — com
sensibilidade de 95% —, possibilita o diagnóstico de outras
doenças com manifestações semelhantes, como o câncer.
Eventualmente, a tuberculose pleural pode manifestar-se como o
denominado empiema tuberculoso. Representa uma forma de
derrame pleural decorrente da ruptura de um foco caseoso para o
espaço pleural. O diagnóstico deve ser realizado por meio da
pesquisa e/ou da cultura de BAAR, cultura para bactérias e/ou
biópsia de pleura.
A ADA pode estar elevada, acima de 40 UI/L, não podendo,
entretanto, ser utilizada como critério diagnóstico diferencial, pois
está aumentada no derrame pleural parapneumônico complicado.
A citologia demonstra grande número de neutrófilos, a glicose é
baixa, o nível de DHL é elevado, e o pH é inferior a 7,2.
Diferentemente do que ocorre na tuberculose pleural habitual, o
rendimento da pesquisa de BAAR e da cultura para tuberculose
no empiema tuberculoso é alto, servindo de parâmetro para a
monitorização da efetividade do tratamento enquanto há líquido.
É necessário fazer drenagem pleural em sistema fechado.
Posteriormente, pleurostomia ou drenagem aberta — por dreno
ou próteses — podem estar indicadas, e pleuroscopia, para lise de
aderências, deve ser realizada em pacientes com espessamento
pleural significativo.
O tratamento segue as orientações gerais para casos de
tuberculose pulmonar ou extrapulmonar, com esquema básico
com rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol por dois
meses, seguindo-se quatro meses com rifampicina e isoniazida.
Não há indicação de uso de corticosteroides, tampouco de
drenagem pleural, desde que não exista empiema.
Na tuberculose, o líquido pleural possui características
exsudativas, predomínio linfocitário, abaixo de 5% de células
mesoteliais e abaixo de 10% de células eosinófilas, cor amarelo-
citrino, derrame unilateral e ADA acima de 40. O tratamento é
similar ao da doença pulmonar — 2RHZE/4RH.
Dentro dos diagnósticos de derrame pleural, a tuberculose pleural
é uma das mais cobradas em provas de concursos médicos.
São dados diagnósticos da tuberculose pleural:
▶ O quadro é subagudo e pode simular pneumonia — tosse seca e
febrícula;
▶ Em exame de imagem, habitualmente há derrame sem
consolidação;
▶ O líquido é exsudativo, com predomínio de linfócitos, embora
nos primeiros 15 dias possa ocorrer predomínio de neutrófilos;
▶ A ADA não é específica, mas indica o tratamento se não há
dados clínicos que sugiram empiema, artrite reumatoide, linfoma
e mesotelioma;
▶ A biópsia de pleura transtorácica tem alto rendimento
diagnóstico.
8.6.3 Derrame pleural parapneumônico
Principal causa de derrame pleural exsudativo. O derrame pleural
associado à infecção do trato respiratório inferior — pneumonia,
abscesso ou bronquiectasias — é chamado de parapneumônico.
Na maioria das vezes, é pequeno, sem a necessidade de
intervenção específica, remitindo com o tratamento da infecção,
caracterizando um derrame pleural não complicado. Entretanto,
pode haver infecção da cavidade pleural com inflamação
exuberante e presença de germes na pleura, caracterizando
derrame pleural parapneumônico complicado. Os fatores que
predizem pior prognóstico e se relacionam a derrame pleural
parapneumônico complicado são: derrame pleural loculado, pH
abaixo de 7,2 do derrame, glicose pleural abaixo de 60 mg/dL,
Gram ou cultura bacteriana positiva no derrame pleural e
presença de empiema. Este último é definição conceitual e
refere-se a derrame pleural grosseiramente purulento. Na
presença de derrame pleural complicado, devemos estar atentos
para a possível necessidade de drenagem do líquido pleural junto
a antibioticoterapia. Como é uma cavidade fechada, muitas vezes
o antibiótico não consegue acessar o derrame pleural e, com isso,
há necessidade de drenagem do líquido pleural.
As decisões a serem tomadas acerca de derrame pleural
parapneumônico dependem da análise do volume de líquido, da
presença de loculações, do pH, da DHL, da glicose e da presença
de germes. A indicação clássica de drenagem pleural fechada se
faz no estágio de derrame fibrinopurulento, para evitar
progressão para empiema e sepse ou encarceramento pulmonar.
A antibioticoterapia segue as orientações de tratamento da
pneumonia e deve ser ajustada conforme o germe isolado em
culturas. Assim, deve-se seguir um sumário de condutas no
derrame parapneumônico, mostrado a seguir:
▶ Quando realizar toracocentese?
▷▷ Espessura acima de 10 mm no decúbito lateral;
▷▷ Presença de derrame loculado — toracocentese guiada por
ultrassonografia.
▶ Quando drenar?
▷▷ Bacterioscopia ou cultura positivas;
▷▷ pH abaixo de 7 ou glicose abaixo de 40 mg/dL;
▷▷ pH 7 a 7,2, com aumento progressivo da DHL.
▶ Quando indicar toracoscopia ou decorticação?
▷▷ Presença de loculações;
▷▷ Piora clínica, apesar da drenagem.
Figura 8.8 - Algoritmo diagnóstico de pacientes com infecção pleural
Fonte: Management of pleural infection in adults: British Thoracic Society pleural
disease guideline, 2010.

8.6.4 Derrame pleural neoplásico


O derrame pleural é uma complicação frequente entre os
pacientes com neoplasia pulmonar e uma apresentação inicial
comum desses pacientes.
Entre as neoplasias, as que mais evoluem com comprometimento
pleural, em ordem decrescente de frequência, são neoplasia
pulmonar, neoplasia de mama e linfoma. Esses três respondem
por 75% dos casos de derrame pleural de causa neoplásica. O
derrame pleural é de volume variável, podendo ter velocidade de
acúmulo rápida. É um exsudato, amarelo-citrino ou hemático, com
predomínio de linfócitos e níveis de glicose e pH reduzidos em
cerca de 20% dos casos. Eosinofilia é incomum. Os derrames
neoplásicos são a principal causa de elevação de amilase em
líquido pleural, entretanto, níveis de amilase estão elevados em
apenas 10 a 20% dos casos.
As principais queixas clínicas são dispneia e dor torácica, e são,
muitas vezes, desproporcionais ao volume do líquido pleural
acumulado.

#importante
O líquido pleural neoplásico tem
característica exsudativa, cor amarelo-
citrino ou hemático, predomínio
linfocitário e pH e glicose reduzidos em
20% dos casos. Pode apresentar, ainda,
elevação da amilase em 10% dos casos.
A citologia oncótica tem baixa sensibilidade, que é um pouco
maior nos casos de adenocarcinoma; sempre deve ser solicitada,
pois, se positiva, define o diagnóstico. Quanto aos pacientes ainda
sem diagnóstico de neoplasia, é importante realizar um exame de
imagem logo após a toracocentese, para visualizar por completo
o parênquima pulmonar.
Uma vez confirmado o derrame pleural maligno em paciente com
carcinoma pulmonar, está caracterizada doença avançada, com
estádio, no mínimo, IIIb, apresentando tratamento paliativo. Nesse
caso, o objetivo do tratamento é a melhora da dispneia. Os
derrames pleurais malignos de pequeno volume, minimamente
sintomáticos, não progressivos e não recidivantes, podem ser
acompanhados somente com observação clínica. A
toracocentese é o procedimento de escolha para o alívio da
dispneia em pacientes com sobrevida curta, de três a seis meses.
A taxa de reacúmulo de líquido pleural, após 30 dias da
toracocentese, está próxima de 100%, e deve-se evitar a retirada
de mais de 1,5 L por punção devido ao risco de edema de
reexpansão, embora não seja comum.
Uma opção de tratamento, para pacientes em que não ocorre
expansão pulmonar após a toracocentese, é a drenagem pleural,
usando cateter de fino calibre. A pleurodese representa uma
opção para o tratamento definitivo. O uso de substâncias
esclerosantes determina reação inflamatória aguda das
superfícies pleurais, que resulta em intensa fibrose e sínfise do
espaço pleural. Tal processo pressupõe aposição das pleuras
visceral e parietal, mediante a drenagem de todo o líquido
acumulado e a reexpansão pulmonar. Algumas condições são
necessárias para o sucesso do procedimento: melhora clínica
com toracocentese com remoção parcial ou total do volume,
natureza maligna do derrame bem determinada e reexpansão
pulmonar com a toracocentese, a qual pode não acontecer em
pacientes com obstrução brônquica, encarceramento neoplásico
do pulmão e linfangite carcinomatosa.
8.6.5 Outras causas
8.6.5.1 Tromboembolismo pulmonar

O tromboembolismo pulmonar (TEP) faz parte do diagnóstico


diferencial de derrames transudativos ou exsudativos. Nos
Estados Unidos, 50% dos TEPs cursam com derrame pleural —
ocorrem 150 mil derrames por ano devido ao TEP. Em 95% dos
pacientes, o derrame é unilateral; cerca de 80% são exsudatos e
20% transudatos. O derrame tem volume pequeno a moderado e
nem sempre é hemorrágico, o que ocorre quando há infarto
pulmonar. Caso seja puncionado muito precocemente, haverá
predomínio de neutrófilos; logo em seguida, o predomínio passa a
ser de linfócitos. O derrame exsudativo habitualmente ocorre por
pleurite reacional à área de infarto periférica; o transudativo
associa-se a eventos com algum grau de repercussão
hemodinâmica, já que resulta de elevação significativa e rápida
das pressões em câmaras direitas, transmitidas às vênulas do
espaço pleural, que têm sua drenagem prejudicada. Definida a
presença de embolia pulmonar e iniciada anticoagulação,
devemos estar atentos em relação ao aumento do tamanho do
derrame pleural. Caso aumente, podemos estar diante de
hemotórax pós-início de anticoagulação.
8.6.5.2 Pleurite reumatoide

Apenas 5% dos pacientes com artrite reumatoide têm derrame


pleural. É mais frequente em homens, idosos, 80% deles com
nódulos subcutâneos e artrite reumatoide de longa data. Febre,
tosse e dor torácica são comuns. O derrame costuma ser de
tamanho pequeno a moderado e bilateral em 25%. Pode haver
regressão espontânea do derrame de um lado e, em seguida,
surgir do outro. Em um terço, há manifestações pulmonares
associadas. A pleura costuma tornar-se espessada e apresenta
vários nódulos.
São características do líquido pleural: glicose — abaixo de 30
mg/dL —, pH diminuído — abaixo de 7,2 —, DHL aumentado e alto
título de fator reumatoide — acima de 1:320. No início, a glicose
do líquido pleural pode estar normal, mas, com o tempo, diminui.
Concentração de colesterol aumentada é comum, assim como a
formação de cristais. O prognóstico é pouco conhecido. Alguns
têm remissão em três meses, outros evoluem com espessamento
pleural, necessitando de decorticação. Não há estudos do efeito
de anti-inflamatórios ou drogas indutoras de remissão na pleurite
reumatoide. Curiosamente, não costuma responder a
corticosteroides.
8.6.5.3 Pleurite lúpica

Os pacientes com lúpus podem ter derrame pleural associado à


própria doença ou relacionado a drogas. Estima-se que 40% dos
lúpicos terão um derrame pleural ao longo da vida. Geralmente,
artrite e artralgia precedem as manifestações pleurais, mas, em
até 30%, as manifestações pleurais podem preceder as
articulares. A pleurite lúpica costuma fazer parte de uma
exacerbação sistêmica da doença. Em geral, o derrame pleural é
pequeno e, em até 50% dos casos, bilateral. A pleurite lúpica deve
ser considerada hipótese diagnóstica em todos os derrames
pleurais exsudativos de causa indeterminada.
As características do líquido pleural são exsudativo, glicose
normal ou baixa e possibilidade de predomínio de PMN
precocemente, evoluindo com predomínio linfomononuclear. O
achado de fator antinúcleo positivo no líquido pleural não
costuma fornecer informação adicional à obtida pelos testes
sorológicos, e essa pesquisa não mais é recomendada de rotina. O
diagnóstico é feito por meio de dados clínicos e marcadores
séricos de atividade lúpica. Sempre se deve descartar uma
etiologia infecciosa. Ao contrário da artrite reumatoide, a pleurite
lúpica responde bem a corticosteroides, mas só estão indicados a
casos cujos sintomas são exuberantes.
8.6.5.4 Doenças abdominais

Podem ser oligossintomáticas e causar derrame pleural, o que


pode dificultar o diagnóstico. Algumas particularidades são:
▶ Cirróticos: mesmo sem ascite, podem apresentar derrame
pleural — são transudatos —, que acontece pela passagem do
líquido peritoneal para o espaço pleural por fenestras
diafragmáticas, mais comumente unilaterais à direita. O
diagnóstico é definido comparando as características dos líquidos
peritoneal e pleural colhidos simultaneamente. Frequentemente,
esses pacientes apresentam derrame pleural volumoso, gerando
intensa dispneia;
▶ Pancreatite crônica com fístula pleural: exsudato, derrame
pleural mais frequente à esquerda; o diagnóstico é confirmado
com a dosagem de amilase no líquido pleural;
▶ Infarto esplênico: causa exsudato; pode cursar com dor na base
do hemitórax esquerdo ou do hipocôndrio esquerdo, algumas
vezes com elevação de cúpula frênica esquerda. O derrame
pleural pode ser rico em PMN. As causas habituais são leucemia
mieloide crônica, endocardite, sepse ou hemoglobinopatias;
▶ Abscesso subfrênico: exsudato, muitas vezes, devido à reação
diafragmática — líquido estéril —, mas também pode ser uma
extensão do processo infeccioso. Normalmente, há predomínio
de PMN; os pacientes podem ser oligossintomáticos. Porém, a
presença de febre persistente, derrame pleural com predomínio
de polimorfonuclear e parênquima pulmonar normal no exame de
imagem deve chamar atenção para essa etiologia. Diante disso,
solicitar uma ultrassonografia e/ou tomografia de abdome;
▶ Amebíase e equinococose: semelhantes ao abscesso
subfrênico, também podem causar derrame pleural. Na amebíase,
o líquido pleural pode ser cinza ou de cor achocolatada e
dificilmente se isola o parasita. Já na equinococose, os escóleces
do parasita podem ser encontrados.
8.6.5.5 Quilotórax

Ocorre por acúmulo de quilo, líquido linfático rico em gorduras na


forma de quilomícrons, recém-absorvidos no trato gastrintestinal.
O fluido é transportado pelo ducto torácico, que tem trajeto
abdominal adjacente à aorta, até passar pelo hiato aórtico no
diafragma e seguir em direção à cava. Lesões traumáticas —
causa mais comum — ou obstrutivas, como as neoplasias, podem
interromper seu transporte e resultar em extravasamento de
líquido para o espaço pleural. A aparência leitosa nem sempre é a
regra, principalmente se transcorridas mais de 2 horas após a
última refeição, já que as gorduras, que conferem o aspecto ao
líquido, mesmo no espaço pleural, são absorvidas e
metabolizadas. A dosagem de triglicérides habitualmente é
elevada — acima de 110 mg/dL —, mas pode estar um pouco mais
baixa — entre 50 e 110 mg/dL —, sendo, às vezes, necessária a
dosagem de lipoproteínas para definir o diagnóstico. O
tratamento de escolha para a maioria dos quilotórax é a
administração de octreotida via tubo torácico. Caso esta primeira
opção não seja efetiva, realizar bloqueio do ducto torácico via
percutânea transabdominal. Tratamento alternativo seria a
ligadura do ducto torácico. Em casos neoplásicos, considerar a
possibilidade de pleurodese, já que as toracocenteses repetidas
espoliam muitos nutrientes (gordura) desses pacientes.
8.6.5.6 Síndrome das unhas amarelas

Tríade de mudança da coloração das unhas, derrame pleural e


linfedema. O derrame é habitualmente pequeno e assintomático,
mas pode ser grande; é bilateral em 50%, exsudativo, rico em
linfócitos, com pH e glicose normais. Devem-se excluir outras
causas de derrame pleural antes de atribuir a essa síndrome a
etiologia do derrame. Acredita-se que a causa subjacente seja
uma hipoplasia do sistema linfático. As unhas costumam estar
pálidas, amareladas ou esverdeadas, além de encurvadas, e
podem estar espessadas ou separadas do leito ungueal —
onicólise.
8.6.5.7 Reação medicamentosa

Pode ocorrer como parte de uma síndrome lúpus-like: hidralazina,


isoniazida, procainamida, fenitoína, clorpromazina, metildopa; ou
não: nitrofurantoína, amiodarona, dantroleno, bromocriptina,
procarbazina, metisergida. Deve ser sempre suspeitada quando
diante de derrame pleural eosinofílico iniciado após início do uso
de medicação.
8.6.5.8 Síndrome de Meigs

A tríade clássica consiste em ascite, derrame pleural e tumor


benigno de ovário. Mais recentemente, também tem sido descrita
com tumores benignos de útero, e mesmo tumores malignos de
ovário de baixo grau de agressividade. A ascite origina-se da
hiperprodução de fluido pelo tumor. Acredita-se que o derrame
pleural decorra de passagem direta do líquido ascítico para a
cavidade torácica. O diagnóstico pode ser sugerido pelo achado
de massa pélvica. O derrame pleural é do lado direito em 70% dos
pacientes e bilateral em 20%. As características do líquido pleural
são: exsudativo; baixa celularidade (menos de 1.000 células),
possibilidade da citologia oncótica sugerir o diagnóstico e
confirmação da doença pela laparoscopia com biópsia. Tanto o
derrame pleural quanto a ascite desaparecem após o tratamento
da causa-base.
8.6.5.9 Sarcoidose

É muito raro a sarcoidose apresentar-se com derrame pleural,


mas, quando presente, pode ser confundida com tuberculose. O
derrame pleural é pequeno e pode ser bilateral em um terço, além
de ser exsudativo e rico em linfócitos. A biópsia pleural mostra
granulomas não caseosos. Os pacientes costumam ter
sarcoidose pulmonar extensa, inclusive extratorácica. Costuma
responder bem a corticosteroides.
8.6.5.10 Miscelânea

Mesotelioma maligno se apresenta com derrame pleural rico em


ácido hialurônico. Está associado à exposição ao asbesto e cursa
com dor torácica intensa junto a dispneia importante. Presença
de placas pleurais na radiografia de tórax indicam grande
possibilidade de exposição ao asbesto.
Infecção viral é causa de derrame pleural muitas vezes de origem
não definida. É geralmente exsudativa e se resolve
espontaneamente sem gerar resíduo em longo prazo.
Cirurgia de by-pass coronariano comumente cursa com derrame
pleural. Na primeira semana, é tipicamente unilateral à esquerda e
sanguinolento, rico em eosinófilos e responde geralmente a uma
ou duas toracocenteses terapêuticas. Após a primeira semana, é
unilateral à esquerda, porém, com coloração amarelo-clara, com
predomínio de linfócitos e tendência a recorrência.

Qual a importância de
diferenciar derrame
pleural exsudativo do
transudativo?
A diferenciação de derrames pleurais exsudativos e
transudativos é realizada a partir da avaliação dos
critérios de Light. Essa diferenciação auxilia muito na
investigação diagnóstica. Derrames pleurais
exsudativos representam causas diretamente
relacionadas com acometimento pleural, como
pneumonia, derrames pleurais neoplásicos, tuberculose
pleural e outros. Já os transudativos são aqueles em que
o derrame pleural é formado em consequência de causa
não pleural, mas sim em reverberação de desajuste
gerado por doença em outro sistema, como
insuficiência cardíaca, cirrose e outras.
Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade
Estadual Paulista
Para a primeira etapa da FMB-UNESP, o candidato precisa realizar
uma prova de 100 questões de múltipla escolha, com quatro
alternativas cada. Já na segunda etapa será avaliado o currículo
do candidato.
Para a prova, é importante estudar as especialidades de Pediatria,
Saúde Coletiva, Ginecologia e Obstetrícia, que são as áreas de
conhecimento mais cobradas. Considere que as áreas de Clínica
Médica, Cirurgia Geral e Medicina Preventiva e Social também
farão parte das avaliações.
A dica é prestar uma atenção especial em Neonatologia, Sistema
Único de Saúde (SUS), doenças estruturais do sistema
cardiovascular, medidas de frequência, estudos epidemiológicos,
Medicina Legal, leis orgânicas de saúde, atenção primária à saúde
e Estratégia Saúde da Família, doenças infecciosas, infecções
sexualmente transmissíveis e AIDS. Esses temas foram os mais
recorrentes nas últimas edições da prova.
FMB-UNESP | 2020
Mulher de 64 anos apresenta dispneia aos grandes esforços e
emagrecimento há 1 mês. Radiografia de tórax: velamento do 1/3
médio e inferior do hemitórax direito. Realizada toracocentese
diagnóstica. Exames do líquido pleural: pH 7,28; DHL 890 U/L;
glicose 85 mg/dL; proteína 4,2 g/dL; celularidade 90% de
linfócitos; adenosina deaminase: normal e citopatológico negativo
para neoplasia. Exames séricos: DHL 650 U/L; proteína 5,5 g/dL.
Após a análise do derrame pleural, a conduta é:
a) biópsia de pleura
b) drenagem pleural fechada
c) pleurodese
d) observação
Gabarito: a
Comentários:
a) Paciente preenche critérios de Light para exsudato. Há
predomínio de linfócitos no líquido pleural e ADA negativo. Dessa
forma, é mandatária a confirmação etimológica por biópsia, sendo
neoplasia e tuberculose — apesar do ADA negativo — as
principais hipóteses.
b) A drenagem “em selo d'água” está indicada para pacientes com
derrames pleurais de repetição, traumáticos ou em pacientes
com derrame pleural parapneumônico complicado, empiema
pleural.
c) A pleurodese é procedimento definitivo indicado em pacientes
com derrame pleural de repetição de etiologia conhecida e
refratariedade aos outros tratamentos, maioria de pacientes com
derrames neoplásicos.
d) Paciente não tem diagnóstico estabelecido para o derrame
pleural, deverá prosseguir investigação.

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