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GEOGRAFIA, GÊNERO, TRABALHO E VIDA COTIDIANA: ALGUMAS

REFLEXÕES SOBRE AS TRABALHADORAS DA EDUCAÇÃO EM GOIÁS

Carmem Lúcia Costa1

Resumo: O presente artigo é produto da pesquisa – A feminização e a precarização do trabalho


docente em Goiás/CNPQ/UFG – desenvolvida entre 2011 e 2013 com objetivo de investigar o
trabalho docente em Goiás no atual governo com proposta neoliberal. Neste artigo apresentamos
uma parte do trabalho onde investigamos como a precarização do mundo do trabalho das
professoras alcança a vida cotidiana das mesmas, reproduzindo aí, também, a precarização que é
reforçada por seu papel social de mulher, cuidadora, mãe, esposa. Apresentamos dados das
entrevistas realizadas com professoras na cidade de Catalão, interior de Goiás que nos auxiliam na
compreensão do cotidiano marcado pelo trabalho, pela exploração e pelas relações de gênero
impostas pelo patriarcado.
Palavras-chave: Gênero. Trabalho. Geografia.

Por que a Geografia deve se ocupar das questões de gênero?

Iniciamos nossas reflexões por esta questão por ser a mesma uma constante para
pesquisadores e pesquisadoras dos estudos de gênero. Para esboçar uma resposta partimos da tese
de que as relações sociais especializam-se como práticas sócio-espaciais (Carlos, 2010) produzindo
um espaço marcado pelas relações desiguais e de poder estabelecidas pelos sujeitos e pelas classes
sociais ao longo da História. De acordo com Rffestin (1993, p. 7) “... em toda relação circula o
poder que não é nem possuído nem adquirido, mas simplesmente exercido.” O mesmo autor
argumenta, ainda que
Conhecer é operar sobre uma realidade material supõe – e até mesmo postula – um sistema
de relações no interior do qual circula o poder, uma vez que este é consubstancial à toda
relação. O conhecimento e a prática elaborados por todo trabalho implicam uma forma
qualquer de poder da qual não é possível escapar. (1993, p. 6)

Os estudos de Geografia sempre estiveram interessados nas relações de poder, seja para
afirma-lo como o fez a nova geografia, ou para questioná-lo propondo outras formas de
empoderamento, como propõe a geografia crítica. No entanto, esta discussão esteve fortemente
aliada ao poder do Estado, contribuindo para uma percepção de poder como algo exercido por esta
instituição e menosprezando outras formas de poder, como por exemplo o patriarcado, exercido de

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Departamento de Geografia/PPGG/UFG/Campus Catalão; Dialogus – Estudos interdisciplinares em Gênero, Cultura e
Trabalho.

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forma densa no espaço público e privado e que é fundamental nas práticas sócio-espaciais em
diferentes sociedades em diferentes tempos.
Na perspectiva de apontar as outras relações de poder estabelecidas na produção do espaço é
que acreditamos ser importante o estudo das relações de gênero pela ciência geográfica, com
objetivo de colocar no centro da produção espacial as relações de exploração e submissão
resultantes de uma relação de gênero em que patriarcado estabelece uma prática sócio-espacial que
ainda segrega milhares de mulheres em todo o mundo.
O recorte que escolhemos para realizar uma análise geográfica das relações de gênero é o
mundo do trabalho. Esta escolha não é aleatória. Em tempos de aumento da participação da mulher
no mercado de trabalho, do espaço produtivo, e da disseminação da ideia de emancipação feminina
o estudo das relações de poder estabelecidas a partir do patriarcado coloca-se ainda mais necessário.
Assim entendemos que é importante para a Geografia o estudo das relações de gênero com objetivo
de entender a essência das práticas sócio-espaciais, da produção do espaço por homens, mulheres e
outras identidades, avançando na compreensão das relações de exploração estabelecidas e
contribuindo para a revisão do poder estabelecido. Até mesmo porque, de acordo com Raffestin
(1993, p.17) “Uma verdadeira geografia só poder ser uma geografia do poder ou dos poderes.”

As transformações no mundo do trabalho e a mulher

As relações de produção e trabalho sofrem profundas mudanças a partir dos anos 70 do


século XX. A crise no sistema de produção – o fordismo – provoca uma reestruturação da produção
– a acumulação flexível (HARVEY, 1989) baseada em alguns princípios como o aumento da
terceirização, dos contratos temporários, perda de direitos trabalhistas, intensificação das jornadas
de trabalho e da produtividade e a inserção crescente da mulher no mundo do trabalho,
principalmente em postos mais precarizados e pior remunerados, entre outros.
Neste momento vamos nos ater a inserção da mulher no mercado de trabalho, movimento
que transforma as relações sociais e de gênero. Harvey (1989) argumenta que as mudanças
ocorreram a partir da implantação de uma nova forma de produção, a acumulação flexível, que se
caracteriza por uma maior flexibilidade dos processos de trabalho, por novos setores de produção, e
por mudanças nos padrões do desenvolvimento que ocorre de forma desigual, nos setores de
serviços e nas regiões geográficas. A acumulação flexível também é caracterizada pela ampliação
dos conjuntos industriais em várias regiões ate então não tão desenvolvidas como no interior do
país, como em Goiás.

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O processo de reestruturação produtiva é uma necessidade em tempos de crise com a
reorganização das relações econômicas, de trabalho e sociais. No final dos anos (19)60 o
capitalismo já apontava para a necessidade de mudanças no padrão rígido e de produção e consumo
de massa. As mulheres, também, atendem às necessidades do novo perfil do trabalhador que,
segundo Antunes (2007, p.48) deve ser “... mais qualificado, participativo, multifunicional,
polivalente, dotado de maior realização no espaço do trabalho.” A mulher seria melhor
“aproveitada”, principalmente em tarefas que exigem mais concentração e com mais detalhes ou
ainda em ocupações em tempo parcial ou em trabalhos realizados em casa, como no ramo da
facção.
Sobre a participação da mulher no mercado de trabalho, Harvey (2007, p.147) acrescenta:
Não apenas as novas estruturas do mercado de trabalho facilitam muito a exploração da
força de trabalho das mulheres em ocupações de tempo parcial, substituindo assim
trabalhadores homens centrais melhor remunerados e menos facilmente demitíveis pelo
trabalho feminino mal pago, como o retorno dos sistemas de trabalho doméstico.

Os contratos temporários ou o emprego em empresas terceirizadas caracterizam a


precarização das relações de trabalho como argumenta Thomáz Júnior (2002) já que as perdas
salariais e as péssimas condições de trabalho são constantes. Antunes (2004) lembra, também, que
os níveis de remuneração destas mulheres são inferiores à dos homens que muitas vezes ocupam o
mesmo cargo e desempenham a mesma função. Ocupando os piores cargos de trabalho ou, às vezes
ocupando os mesmos cargos, mas com salários inferiores, as mulheres ocupam cada vez mais
postos de trabalho, uma estratégia da acumulação flexível que altera valores, tradições e a própria
cultura do brasileiro.
A reestruturação produtiva coopta as habilidades femininas para utilizá-las em favor do
aumento da produtividade, no corte dos direitos trabalhistas, no trabalho temporário, nos trabalhos
piores remunerados e menos prestigiados, mesmo quando a mulher é mais qualificada, tem mais
anos de estudos e, até mesmo, mais experiência. A flexibilidade é concebida como instrumento
utilizado pelo capitalismo para efetivação da maleabilidade ou desregulamentação jus-trabalhista,
que proporcionam que as negociações referentes aos contratos de trabalho se restrinjam entre
empregadores e empregados ou seus sindicatos, excluindo o Estado da fiscalização e proteção dos
direitos sociais dos trabalhadores, sob o argumento de conservação da relação empregatícia.
Entretanto “o foco real é o interesse de implementar um maior descomprometimento sócio-
financeiro da empresa com os seus funcionários, garantindo, nesse ensejo, lucratividade crescente.”
(SANTOS, 2002, p. 75). A contratação de mão-de-obra feminina é um indicativo da precarização

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do trabalho feminino, uma vez que os salários são mais baixos, as condições de trabalho são
inferiores às dos trabalhadores na mesma empresa, direitos e benefícios diferenciados.
As transformações alcançam o modo de vida destas trabalhadoras que buscam a “autonomia
financeira” ou uma complementação da renda familiar; há ainda as que sustentam sozinhas os lares,
são responsáveis pela educação dos filhos e pelo amparo aos idosos na família.
Assim, conforme argumenta Saffioti (2004, p.35-6), a inserção da mulher no mundo do
trabalho é “permitida”, no entanto, não reconhecida e nem valorizada. Para a autora:
As barreiras que a sociedade de classes coloca à integração social da mulher, todavia não
apresenta, no processo de seu aparecimento e vigência, muita uniformidade. Na medida em
que esses obstáculos são regulados pelas necessidades que porventura tenham as mulheres
de se realizar através do trabalho, as oportunidades sociais oferecidas aos contingentes
femininos variam em função da fase de desenvolvimento do tipo social em questão ou, ou
em outros termos, do estágio de desenvolvimento atingido por suas forças produtivas.

Desta forma, a mulher, no atual modelo econômico, ocupa importante papel ao assumir
tarefas no mundo do trabalho precarizado, reforçando a exploração machista e a submissão à ordem
imposta. Jornadas duplas e triplas de trabalho demonstram que o trabalho feminino é precarizado
não apenas no espaço da fábrica ou da empresa, mas também em casa, lugar onde a exploração
torna-se manutenção de práticas arcaicas em uma sociedade moderna. É a reprodução do
patriarcado no modo de produção capitalista que mantém velhas formas de exploração em novos
contextos.
A inserção da mulher no mercado de trabalho é vista como uma forma de emancipação, de
conquistas de espaço e de poder, camuflando o aprofundamento da submissão e da exploração,
como observamos. Os nossos estudos sobre o mundo do trabalho nos colocaram diante desta
realidade e da necessidade de melhor compreender esta relação. Para tal temos nos dedicado ao
estudo do mundo do trabalho da mulher e como esta precarização do espaço produtivo alcança e se
reproduz na vida cotidiana destas trabalhadoras. Para tal realizamos uma pesquisa com docentes do
estado de Goiás, cujo alguns resultados abordamos a seguir.

Docência: um trabalho de mulher?

Na educação, também ocorre uma reestruturação e os primeiros dados apontam para uma
feminização crescente a partir do século XX no estado de Goiás, assim como em todo o país como
mostram as pesquisas de Santos (2009) e Chamon (2005). As mesmas autoras associam a
feminização a um momento de desvalorização da carreira, que passa a ser vista mais como vocação

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do que um trabalho intelectual, uma atividade ligada ao cuidar, à extensão das atividades do espaço
privado. Chamon (2005) acrescenta que,
Em decorrência do capitalismo industrial em expansão e do processo de urbanização que o
acompanhava, cabia à escola contribuir tanto na produção quanto na reprodução do social,
visando fortalecer e legitimar as práticas culturais urbanas que interessavam às elites
dominantes. Foi, também, nesse período que as mulheres passaram a ser chamadas para
cumprir a nobre missão de reprodutoras dos valores sociais. Dóceis, virtuosas e abnegadas,
deveriam ser elas as profissionais responsáveis pelo trabalho de preparação de mentes e
comportamentos para os interesses da pátria. (2005, p. 16)

A associação da profissão de docente com a docilidade, como uma virtude de mulheres


abnegadas ainda é parte de um processo que contribuiu para a desconstrução do/a professor/a como
um intelectual, como aponta Giroux (1997), processo este que desvaloriza a profissão e coloca-a
como um dom, uma virtude, onde a pesquisa e o estudo são esvaziados do seu conteúdo e de sua
importância na construção desta profissão, precarizando ainda mais a carreira docente.
De acordo com o Educacenso do MEC, temos hoje no nosso país uma concentração de
trabalhadoras na educação infantil – creches e primeiros anos de alfabetização. Nestes o salário
pago é o menor – mesmo quando o piso nacional é estabelecido. Faz importante lembrar que o piso
salarial nacional é pago a profissionais com carga horária de 40 horas em sala de aula e é
obrigatório apenas para a rede pública, onde mesmo assim existem caminhos para ser driblados
como os contratos temporários, a menor carga em sala e o simples descumprimento da lei.
Observamos nos dados coletados que em escolas particulares a situação é ainda mais
precarizada, uma vez que nestes estabelecimentos os contratos de trabalho são realizados em
modalidades como: auxiliar de sala, auxiliar de pátio, estágios, etc.
Nestas, há ainda a preferência por contratos com alunos de graduação, em muitos casos,
tornando ainda maior a extração de mais-valia neste setor, com o apoio da informalidade e da
ilegalidade. Observamos também que, neste setor não há um plano de carreira que valorize a
qualificação dos docentes e a carga horária em sala é extensa, sendo exigido ainda um tempo extra
para as reuniões e preparação de material didático.
Os dados do MEC mostram ainda que no ensino fundamental I temos uma grande
predominância de mulheres, mas a partir do fundamental II e no ensino médio esta relação
modifica-se, principalmente nas disciplinas das áreas de exatas e biológicas, refletindo a realidade
das Universidades onde os homens ocupam em maioria estes cursos. Faz-se interessante
observamos que no sistema particular de ensino, estas faixas – fundamental II, o ensino médio e
cursinhos pré-vestibulares ou preparatórios para o ENEM – são as que possuem melhores salários e
geralmente os professores das áreas exatas e biológicas, são os mais valorizados. Estas áreas do

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conhecimento são historicamente renegadas às mulheres desde a sua inserção na educação formal,
onde as escolas não tinham estas disciplinas, pois as alunas não possuíam habilidades mentais
necessárias para dominar um conhecimento tão racional. Esta é mais uma estratégia do capital para
manter a dominação masculina, a hetoronormatividade imposta por valores e construções sociais
naturalizadas. Para Chamon (2005, p. 17),
Sabemos, também, das estreitas relações materiais entre educação e capitalismo, da
expropriação do saber e da exploração salarial impostas pela forma de organização e
fragmentação do trabalho àqueles que fazem a educação. Mas isso não explica tudo,
porque, ao lado dessa lógica, foi amalgamando-se, nas mentalidades, a ética do amor e da
virtude como uma característica inerente ao fazer pedagógico.

Desta forma é necessária a compreensão da construção histórica da discriminação e


submissão feminina, também, para compreendermos melhor o quadro atual da educação brasileira
que é tão desvalorizada e tem a educadora como uma “tia” que apenas prolonga no espaço público o
trabalho da esfera privada, o cuidar, o amar, a virtude e que, portanto, não necessita de uma
remuneração expressiva, já que exerce um dom – o de educar.
Em Goiás dados coletados apontam para uma feminização na rede pública de educação em
torno de 80%, sendo que as mulheres ocupam principalmente o ensino infantil – que escapa ao
nosso objeto por termos priorizado a pesquisa em escolas estaduais – e no ensino fundamental I,
onde os salários também são baixos e a carga de trabalho exigida para a preparação das aulas é
extensa. Cabe também às mulheres o trabalho com disciplinas menos “prestigiadas” no mundo
científico como artes, português, geografia, história, língua estrangeira e os homens concentram-se,
principalmente, nas áreas de exatas e biológicas. Estes dados vão de encontro ao que Santos (2009,
p.19) argumenta:
Em sala de aula, tem-se notado que entre ser mulher-professora ou ser homem-professor há
uma grande diferença. Não é possível tornar-se professor ou professora e esquecer-se do
gênero. Quando se veste a roupagem da educação não se deixa para trás sua história, a sua
formação e nem a sua sexualidade.

Em Goiás, no atual governo, uma política de cortes de gratificações obtidas em


qualificações, o sucateamento do sistema de saúde do servidor público, a falta de condições de
trabalho em escolas sucateadas e a falta de estímulo para a qualificação são os principais problemas
relatados pelas docentes entrevistas em nos dados coletados junto às escolas em Catalão e junto ao
sindicato desta categoria. Os cortes salariais desestimulam e obrigam a uma carga maior de trabalho
em outras escolas, o que compromete a vida destas trabalhadoras, a sua saúde e a sua qualificação.
O estado de Goiás é um dos poucos no país que ainda não paga o piso salarial nacional estabelecido
pelo governo federal, e na atual política aconteceram cortes das gratificações para cursos de

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especializações e redução em até 30% das gratificações com pós-graduações strictu senso. As
licenças para qualificações também foram reduzidas, entre outras perdas, o que provocou uma greve
no estado por 51 dias resultando em uma promessa de negociações sobre um novo plano de carreira,
que até o momento não aconteceu.
Observamos que a tal emancipação apresenta-se muito mais como um discurso do que
efetivamente a ruptura de um sistema patriarcal que, pelo contrário, se reproduz agora para atender
aos interesses do capital.

Precarização e vida cotidiana

A precarização do mundo do trabalho que tem o patriarcado como uma de suas


características invade a vida cotidiana destas trabalhadoras da educação que têm o cotidiano
invadido por tarefas não apenas do espaço reprodutivo – cuidar, lavar, cozinhar, arrumar – mas
também pelas atividades da escola que têm que ser realizadas em casa. É o alargamento do tempo
do trabalho.
As atividades como correções de provas, planejamento de aulas, elaboração de atividades e
pesquisas ocupam um tempo considerável da vida das professoras entrevistas. Cabe ressaltar aqui
que realizamos trinta entrevistas com professoras da rede pública estadual de Catalão e coletamos
dados junto a secretaria do Curso de Especialização em Gênero e Diversidade na Escola ofertado
pelo grupo Dialogus/UFG/CAC ofertado para professores de Goiás. Os dados mostram que a
extensão do tempo de trabalho na vida cotidiana é uma realidade para 85% das professoras que têm
que abrir mão do tempo de lazer e descanso para conseguir conciliar a carreira com a condição de
mulher, mãe, esposa.
Os relatos apresentam também um quadro de adoecimento com a sobrecarga de atividades e
são muitos os relatos de quadros de stress e depressão. O sindicato denuncia que cerca de 40% dos
profissionais realizam solicitações de licença ou afastamento para tratamento médico, o que nem
sempre é concedido pela secretaria estadual de educação. A maior parte destes pedidos é de
professoras e não é apenas por elas serem maioria, mas pela condição a que estão submetidas na
sociedade.
Há também uma insatisfação com os salários e as condições de trabalho na carreira docente.
Aliada ao cuidado e à vocação a carreira docente é cada vez menos prestigiada e bem remunerada,
perdendo status junto a sociedade o que compromete, inclusive, a luta por melhorias na educação.

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As extensas jornadas de trabalho – 60% trabalham mais de 40 horas semanais em mais de uma
escola – também são apontadas como motivo de descontentamento e frustação com a carreira.
A divisão das tarefas domésticas é outro ponto de reclamações entre as professoras que
percebem que, embora tenham conquistado o mundo do trabalho, o trabalho em casa ainda é uma
amarra que compromete o tempo que poderia ser usado para o descanso e o lazer. Este ponto nos
chama a atenção e tem nos intrigado a continuar pesquisando sobre as relações de gênero e poder
com objetivo de compreender até que ponto a inserção crescente no mercado de trabalho tem
contribuído para uma mudança nesta relação de poder. Por enquanto, nos parece que, como aponta
Nogueira (2004) ainda não temos muitos avanças neste sentido, ou seja, as mulheres não se
libertaram das relações patriarcais de exploração no espaço privado.
Estes elementos, apenas alguns de uma pesquisa mais ampla, apontam para uma
precarização da vida cotidiana das mulheres trabalhadoras e novamente o caráter duplo marca esta
trajetória, pois agora são também exploradas no mundo do trabalho. Esta condição tem contribuído
em muito para a instalação de uma miséria crescente na vida cotidiana, pela rotina desgastante e
degradante das mulheres que assumem cada vez mais tarefas, sem conseguir se libertar de antigas
imposições.

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SANTOS, E. F. Mulheres entre o lar e a Escola: os porquês do Magistério. São Paulo: Annablume,
2009.

Geography, gender, labour and everyday life: some reflections on the working of education in
Goiás
Abstract: This article is a product of the research – A feminização e a precarização do trabalho
docente em Goiás / CNPq / UFG - developed between 2011 and 2013 in order to investigate the
teaching work in Goiás in the current government with neoliberal proposal. This article presents
some of the work we investigated how precarious world of work of teachers reaches the everyday
life of the same, playing there, too, the precariousness that is reinforced by their social role of
women, caregiver, mother, wife. We present data from interviews with teachers in the Catalan
town, in Goiás who assist us in understanding the everyday marked by work, by exploitation and by
gender relations imposed by patriarchy.
Keywords: Gender. Work. Geography.

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