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O Papel da Mulher na Sociedade Moçambicana


Introdução
Durante muito tempo se confundiu género com mulher, falar de género significou falar de
mulher. Mas na saída do século XX começou a ficar claro que género não significa mulher, mas
sim uma categoria relacional. Tanto que hoje se fala de equilíbrio de género nos emancipadores
do feminismo e não mais da igualdade entre homens e mulheres.
Na actualidade há papeis outrora tidos como femininos que, dependendo de sociedade,
transitaram e passaram a ser unisexos; há igualmente características que eram tidas como
especificamente femininas (como cuidar de crianças), hoje os homens já transam e põem brincos
sem constituir algo estranho.

As informações estatísticas do Censo de 2007 mostram que a mulher ocupa maior parte da
sociedade moçambicana, revelando uma diferença substancial na ordem dos 7% relativamente
aos homens. Entretanto, esses valores não se reflectem na igual distribuição das oportunidades
sociais que lhes são inerentes. Grosso modo, a mulher hoje em dia ainda encontra-se submissa
apesar de uma ligeira diferença comparativamente aos períodos passados.

Justificativa
Homens e mulheres são dois grupos sociais engajados em uma relação social específica que tem
como base material a divisão sexual do trabalho. Essa divisão social do trabalho tem dois
princípios organizadores – o da separação (que separa trabalho de homens e de mulheres) e o da
hierarquização, em que o trabalho do homem vale mais que o da mulher. Esses princípios
permanecem os mesmos mas suas modalidades mudam significativamente no tempo e no espaço.
O debate dos últimos tempos em relação ao papel da mulher aponta para uma grande mudança
nas relações de género quando incorpora a divisão sexual do trabalho como estruturante no modo
de produção capitalista. Isso significou a naturalização do trabalho de reprodução da vida e
estabeleceu uma redução do conceito de trabalho àquele executado na esfera mercantil. Dessa
forma, considera-se uma externalidade ao modelo a grande quantidade de trabalho doméstico e
de cuidados realizados pelas mulheres no âmbito da família.

No entanto, esta condição, esta inferiorização da mulher nos meandros sociais tem na sua
natureza a base da sua explicação. Desde as comunidades de caçadores e recolectores esta mulher
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era encarada como o responsável pela educação e segurança dos filhos, passando para a
antiguidade onde, através de Xenofonte esta era vista como o garante pela gestão e prosperidade
da família, incumbindo-lhe ainda o papel de educador da família na ausência do marido.

Esta questão de inferiorização da mulher ganhou espaço até aos períodos modernos e começa-se
a romper com o advento dos primeiros ideais feministas em oposição ao papel que era atribuído à
mulher na sociedade.

Problematização
Em Moçambique, o papel da mulher no seio da família, da sociedade e do Estado, tem registado
importantes marcos, desde os tempos da luta de libertação nacional. Durante a luta de libertação
nacional, promoveu-se e incentivou-se a integração e participação activa da mulher, não só em
actividades produtivas, educativas e de âmbito social, como também em frentes de combate. Esta
participação impulsionou a criação da Organização da Mulher Moçambicana (OMM), estrutura
de enquadramento e orientação da mulher na batalha pela sua emancipação.
Moçambique tem vindo a conhecer progressos assinaláveis no domínio das relações de género, o
que tem contribuído para fortalecer o papel da mulher na sociedade e no aparelho do Estado,
sendo de realçar o crescimento da sua representatividade no parlamento, com 37% dos deputados,
no Conselho de Ministros, com 28%, ao nível de Governadores Provinciais, com 18%, de
Administradores Distritais, com 15%, de Secretários Permanentes, com 31% e no sector da
justiça, com 37% dos magistrados.

Porém, apesar destes progressos, ainda existem desafios na consolidação do papel da mulher no
desenvolvimento político e socioeconómico do país. As preocupações das políticas nacionais vão
no sentido de definir medidas que alterem este quadro social e económico e promovam condições
de inserção profissional e de desenvolvimento de carreiras em igualdade de circunstâncias para
homens e mulheres. Mesmo com o progresso verificado ao nível da sua participação na sociedade
moçambicana em diversos níveis estes valores não assumem tamanha dimensão olhando para
aquilo que constitui a sua efectividade percentual no resto da população moçambicana. Esse
contexto suscita a seguinte inquietação: ate que ponto a mulher constitui um segmento
fundamental na sociedade moçambicana?
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Hipóteses
Principal
A mulher moçambicana ainda se encontra em níveis baixos de participação a nível dos
aspectos económicos, políticos e socioculturais.
Secundarias
A participação social da mulher moçambicana está circunscrita ao contexto histórico em
que vem vivendo ao longo dos tempos;
A mulher moçambicana participa em diversos contextos sociais atendendo as diferenças
biológicas e naturais que lhes são inerentes;
A capacidade física e intelectual da mulher (moçambicana) determina o seu nível de
influência na sociedade actual.

Objectivos
Geral
Compreender o nível de participação da mulher na construção da sociedade
moçambicana.
Específicos
Identificar o quadro legal que dá ênfase à mulher para intervenção dos diversos sectores
da nossa moçambicanidade;
Mencionar as políticas bem como os mecanismos institucionais adoptados pelo Estado
moçambicano em relação à situação da mulher;
Explicar a relevância da intervenção da mulher nos diversos sectores sociais, e;
Propor estratégias de participação da mulher para a construção da sociedade
moçambicana.

Metodologias de pesquisa
De abordagem
Dedutivo - segundo LAKATOS & MARCONI (1992:106), “[…] partindo das teorias e leis
gerais, este método na maioria das vezes, prediz a ocorrência de fenómenos particulares, numa
conexão descendente”. Assim, este método pressupõe a forma na qual o projecto será abordado e
estruturado.
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Com base neste método a pesquisa irá seguir uma linha de pensamento e uma abordagem dos
assuntos a partir do seu contexto geral e de forma descendente para o caso particular. Há que
aclarar que o caso específico aqui referido trata-se da amostra das mulheres e homens
entrevistados no âmbito da materialização do trabalho de campo

De procedimento
Os métodos de procedimentos serão indubitáveis para realização da pesquisa, e segundo
LAKATOS & MARCONI (1992:106), “os métodos de procedimento constituem etapas
concretas da investigação com finalidade mais restrita em termos de explicação geral dos
fenómenos abstractos […] e estão limitadas a um domínio particular”.
Constituem, no entanto, passos concretos a serem seguidos ao longo da realização da pesquisa,
com seus inúmeros detalhes e verificações. Assim, esta pesquisa auxiliou-se nos seguintes
métodos de procedimentos:

Comparativo, e;
Estatístico.

Método comparativo – consiste no estabelecimento de um padrão a partir do qual são feitas


diversas comparações entre a mesma realidade. No presente estudo, este método materializou-se
a partir da altura da realização de trabalho de campo. Por outras palavras a realização do trabalho
de campo suscitou diversas comparações, sistematizações e sintetizações dos resultados obtidos
com os resultados das investigações contidas nas diversas bibliografias.

Estatístico – com maior enfoque no tratamento de dados recolhidos no trabalho de campo, o


método estatístico foi fundamental para a pesquisa pois facilitou a análise dos resultados através
do seu agrupamento em ordens, qualidade e quantidade relativamente às frequências numa
determinada questão.

Técnicas de recolha de dados


Inquérito - o inquérito é uma técnica de colecta de dados com base em perguntas fechadas
elaboradas pelo pesquisador e respondidas pelo pesquisado. No presente trabalho o inquérito foi
devidamente preenchido pelo pesquisador em conformidade com as respostas que ia obtendo no
diálogo com o pesquisado.
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Entrevista – esta técnica consistiu em perguntas padronizadas e dirigidas a uma determinada


amostra da população previamente delimitada para a prossecução da pesquisa. Estas perguntas
foram dirigidas através de uma conversa dialogada, metódica e em observância dos princípios
gerais para o estabelecimento das entrevistas nas ciências sociais.

Pesquisa bibliografia - esta técnica consistiu na obtenção de informações sobre o papel da


mulher na sociedade com recurso a diversas obras e manuais que tratam do assunto. No entanto,
maior parte dessas informações colhidas nesses livros estão citadas, ora no corpo do texto, ora
nas notas bem como na bibliografia final do trabalho.
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Revisão bibliográfica
Na sociedade moderna, a mulher está cada vez mais conquistando seu espaço no ambiente
profissional e participando das mudanças ocorridas na contemporaneidade. Aos poucos as
habilidades e características femininas começam a ser valorizadas pela sociedade, deixando a
mulher, aos poucos de ser uma mera coadjuvante em determinados segmentos sociais e
profissionais, possibilitando cada vez mais o seu acesso às posições estratégicas em suas
profissões.

Em relação ao trabalho, tais mudanças são ainda mais visíveis. Isto porque com o processo de
reestruturação produtiva e com o crescente número de mulheres no mercado de trabalho, a mão-
de-obra feminina tem sido cada vez mais aceita e solicitada. Contudo, este contingente feminino
ainda tem sido sujeito a algumas limitações, ou tem sofrido dificuldades quanto ao seu acesso a
cargos que exigem maior qualificação ou que oferecem maiores possibilidades de ascensão na
carreira, especialmente no que se refere a dinâmica de conciliação das demandas familiar e
profissional.

Ao longo das últimas décadas do século XX, as conquistas sociais femininas e no mercado de
trabalho foram muitas, no entanto ainda está aquém do ideal. As mulheres têm hoje maior
participação, não só no mercado de trabalho, como também nas esferas política e económica e
elas já estão mais à vontade e escolhem de forma mais livre com quem e como querem
estabelecer suas relações conjugais.

Na realidade, as mulheres foram da esfera doméstica à ocupação de diferentes funções na


sociedade moderna, mas estas conquistas sociais têm sido alcançadas e assimiladas de forma
diferente pelas mulheres. O alcance e assimilação das conquistas sociais femininas variam de
acordo com a classe social, o grau de escolaridade e a possibilidade real para superar as
desigualdades de oportunidades entre homens e mulheres que ainda existem e persistem na
sociedade actual, tanto na família como nas mais diferentes esferas sociais.

Outro ponto importante a salientar é que as mulheres ainda ocupam menos cargos de poder e
prestígio e continuam a ser vistas como as principais responsáveis pela casa e pela família. Na
sociedade actual a mulher vem aprendendo a lidar com os problemas e aos poucos vem
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aprendendo e sabendo discernir as dificuldades encontradas na dupla e algumas, na tripla jornada


de trabalho, no lar e fora dele. As mulheres vêm ao longo dos anos participando para a construção
de uma sociedade mais justa, de um mundo melhor e mais equilibrado, no qual se desenha um
novo papel para a mulher moderna.

A Mulher e o acesso a Educação


Para CHAMO (2006:71), a educação é “um direito humano básico, reconhecido pela
Constituição, e a ministração justa de educação às raparigas tanto quanto aos rapazes é uma
grande responsabilidade política que deve ser devidamente integrada no PARPA II”.
Assim, os benefícios da educação das raparigas e das mulheres são bastante óbvios, tais como um
maior poder de rendimento para as famílias, aumento do recurso aos serviços de planeamento
familiar, redução da desnutrição, redução da mortalidade infantil e materna e melhoria da saúde
pública, o que por sua vez pode mudar as relações de género existentes.

Desde a independência a alfabetização de adultos tem aumentado quer para os homens quer para as
mulheres, mas Moçambique ainda possui um dos níveis de alfabetização de adultos mais baixos da
região da SADC: a taxa de alfabetização das mulheres é de 37.5% comparada com a dos homens
de 67%. As taxas de alfabetização correlacionam-se com residência (localização) e riqueza. A
alfabetização entre as mulheres urbanas é três vezes mais alta que entre as mulheres rurais (65% vs
21.6%) – embora menos marcantes são também significativas as discrepâncias entre as taxas de
alfabetização masculina urbana e rural (84% vs 55%). A taxa de alfabetização das mulheres das
famílias mais abastadas tende a ser quase oito vezes superior à das mulheres das famílias mais
pobres (Ibid, p.72).

A educação universal tem sido um objectivo primário desde a independência. O Plano


Estratégico para o Sector da Educação (1999-2005) focalizou a expansão do acesso, melhoria da
qualidade e relevância da educação, e o fortalecimento da capacidade para gerir e entregar
serviços de educação apropriados. O Plano Estratégico para o Sector da Educação e Cultura
(2006-2010) mantém estas prioridades mas também coloca maior ênfase na melhoria da
qualidade da educação e em medidas que encorajem os alunos e estudantes a continuar a sua
educação para além do ensino primário.

Ambos os planos estratégicos prestaram atenção específica a quatro factores: acesso (entrada na
escola), permanência na escola, aprendizagem e aproveitamento. No que se refere ao acesso,
dados de 2003 indicam que 60% de todas as crianças com idades compreendidas entre 6-12
frequentam presentemente a escola primária (EP1 e EP2). Dados de 2005 indicam que 3,4
milhões de crianças estavam no EP 1 (dos quais 46,4% são raparigas), e que apenas 470 000
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crianças frequentam o EP 2 (dos quais 41% são raparigas). Estima-se que em 2005, 660 000
crianças entre 6-10 anos de idade não frequentavam a escola.

A Unidade de Género do sector no Ministério da Educação e Cultura tem identificado


constrangimentos na educação das raparigas. Estes incluem o baixo valor atribuído à educação
das raparigas comparado com a educação dos rapazes tendo em conta que não se espera que as
raparigas arranjem empregos; a carga do trabalho doméstico e o trabalho sazonal das raparigas; a
pobreza; a falta de professoras que possam ser vistas como modelos a seguir e para supervisionar
as raparigas; a violência e o abuso sexual das alunas na escola; a distância entre a casa e a escola
e poucos estabelecimentos residenciais (lares) para as raparigas que vivam mais longe. Isto é
especialmente importante para as raparigas mais velhas que estão no EP2 e no ensino secundário,
uma vez que a maior parte das escolas secundárias está localizada nas cidades. As escolas mistas
constituem a norma, mas os internatos não têm instalações para raparigas.

Nas áreas rurais das províncias do norte há um conflito entre a educação tradicional e a educação
formal. Práticas tais como casamentos e gravidezes prematuros implicam frequentemente que os
pais valorizam a instrução alternativa tais como ritos de iniciação e escolas corânicas/islâmicas
em detrimento da educação formal. Para enfrentar esta situação estabeleceram-se Conselhos
Escolares, em que participam os pais e o pessoal da escola. Estes conselhos têm permitido a
algumas comunidades marcar os ritos de iniciação para o período das férias escolares; noutras os
pais assumiram um papel activo na definição de uma parte do currículo. Espera-se que estas
iniciativas ajudem a melhorar a aprendizagem.

A escassez de mulheres no ensino superior está relacionada com o papel reprodutivo das
mulheres que muitas vezes é considerado incompatível com os estudos superiores e, em certa
medida, com estereótipos de género e talvez em alguns casos com a falta de confiança das
próprias mulheres (CHAMO, 2006, p.76).

Estereótipos de género também se reflectem na escolha das áreas de estudo. Os Institutos


Comerciais que oferecem cursos de secretariado, administração e contabilidade registam até 60%
de estudantes do sexo feminino, enquanto institutos de formação industrial e agrícola têm um
número significativamente baixo de estudantes do sexo feminino. No ano 2000 foi criado o
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Ministério do Ensino Superior, Ciências e Tecnologia dirigido por uma Ministra mas este
ministério foi extinto em Janeiro de 2005.

Mecanismos e políticas institucionais para a promoção da igualdade de género em


Moçambique
De acordo com CHAMO (2006:61), “a instituição do Governo que tem actualmente o mandato
de promover a igualdade de género é o Ministério da Mulher e da Acção Social (MMAS)”.
Historicamente, a função de promover a igualdade de género tem sido atribuída a diferentes
instituições, começando com um Secretariado Nacional para a Acção Social no Ministério da
Saúde.
Em 1995, segundo LOFORTE (2003:55), esta função foi atribuída ao então recém-criado
Ministério de Coordenação da Acção Social (MICAS), em particular ao Departamento da Mulher
na Direcção Nacional da Acção Social. No ano 2000 o Ministério foi transformado no Ministério
da Mulher e Coordenação da Acção Social (MMCAS), tendo resultado na criação de uma
Direcção Nacional da Mulher separada. Em 2005 o Ministério foi transformado em Ministério da
Mulher e da Acção Social (MMAS), continuando a Direcção Nacional da Mulher a existir dentro
do MMAS.

A Direcção Nacional da Mulher (DNM) é responsável pela definição e promoção de diversos


programas concebidos para prestar apoio material bem como para empoderar as mulheres.
Embora a DNM implemente algumas actividades, a sua função primária é manter ligações com
OSCs e outros parceiros activos neste campo e coordenar intervenções sensíveis ao género. Este
papel da DNM é reproduzido ao nível provincial através das Direcções Provinciais do Ministério.

A DNM é composta por dois departamentos, nomeadamente o Departamento da Mulher e


Família e o Departamento de Género e Desenvolvimento. Desde 1999 a DNM tem sido em
grande medida financiada através do Programa de Capacitação Institucional em Género
encabeçado pelo UNFPA e pelo UNIFEM. Este programa fornece apoio para alguns aspectos
operacionais da DNM, assistência técnica de longo prazo e várias formações. O programa é
executado tanto ao nível central como numa província, a Zambézia. O programa é implementado
pelo MMAS (i.e. através da DNM) e pela sociedade civil (i.e. através do Fórum Mulher).

O Departamento da Mulher e Família tem, entre outras, as funções de (CHAMO, 2006, p.62):
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 Conceber e promover a implementação de programas de assistência social destinados a


mulheres e famílias vulneráveis (especialmente a famílias chefiadas por mulheres);
 Prestar assistência técnica às dimensões de género do plano sectorial do Ministério para o
combate ao HIV/SIDA;
 Conceptualizar programas de educação cívica para disseminar informações sobre os
direitos das mulheres e a prevenção da violência doméstica.

O Departamento de Género e Desenvolvimento é responsável por (CHAMO, 2006, p.62):

 Monitorar até que ponto as questões de género é integrado de forma adequada nos planos
sectoriais do Governo;
 Promover a implementação do Plano Nacional de Acção Pós-Pequim (PNAM);
 Coordenar e implementar campanhas de advocacia sobre os direitos das mulheres;
 Promover a implementação da legislação que protege os direitos das mulheres.

Em 2004 o Conselho de Ministros criou o Conselho Nacional para o Avanço da Mulher


(CNAM). Os membros do CNAM incluem vários Ministros e Vice-Ministros, duas Organizações
da Sociedade Civil (OSCs) que trabalham em prol da igualdade de género, um representante de
organizações religiosas, um representante dos sindicatos e um representante do sector privado.
Embora o CNAM seja presidido pela Ministra da Mulher e da Acção Social, o CNAM não é
parte do MMAS/DNM ou subordinado ao MMAS. Funciona antes como um mecanismo
institucional e órgão de consulta autónomo que permite ao MMAS/DNM coordenar as questões
de género com várias partes interessadas na vida pública.

O CNAM tem um Secretariado Executivo que é responsável pela gestão técnica. Para apoiar o
Secretariado Executivo foi formado um Conselho Técnico que é composto por Pontos Focais de
Género e representantes de instituições públicas. À luz dos esforços para descentralizar a tomada
de decisões e permitir às autoridades locais tornar-se mais pró-activas na promoção do
desenvolvimento local, cada província deve criar o seu próprio Secretariado Executivo e
Conselho Técnico (CHAMO, 2006, p.63).

A função principal do CNAM é promover e monitorar a implementação das políticas de género


do Governo em todos os programas e planos do Governo, com particular referência ao Plano
Nacional para o Avanço da Mulher (PNAM) 2002-2006 e à Política de Género e Estratégia de
Implementação (PGEI). Logo após a Conferência de Pequim, o Governo elaborou um plano
nacional de acção (PNAM) mas sem um quadro de políticas. A inexistência de uma política
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nacional de género representou uma lacuna crítica, uma vez que alguns sectores não ficaram
convencidos da necessidade de nomear PFGs e criar UGs sem uma base legal formal.

Essa base legal é agora fornecida pela Política de Género e Estratégia de Implementação (PGEI)
que foi aprovada pelo Conselho de Ministros a 14 de Março de 2006. A PGEI focaliza as mesmas
áreas críticas identificadas pelo PNAM (LOFORTE, 2003, p.57). Estas incluem a criação de
mecanismos institucionais para assegurar a integração do género nos planos sectoriais, o
empoderamento económico, a segurança alimentar, a educação, a redução da mortalidade
materna, a eliminação da violência contra as mulheres, a participação das mulheres na vida
pública e nos processos de tomada de decisão, e a protecção dos direitos das raparigas. A PGEI
ainda tem de ser aprovada pela Assembleia Nacional.

Quadro legal para a igualdade de género e a não-discriminação


LOFORTE (2003:59) refere que “as Constituições de 1975, 1990 e 2004 defendem o princípio
da igualdade de género e proíbem a discriminação com base no sexo. Considerando que a
Constituição é a lei mais alta do país, toda a restante legislação deve submeter-se aos princípios
constitucionais, o que implica que a legislação discriminatória deve ser revista e modificada”.
Os princípios da igualdade e não-discriminação são ainda reforçados pelo facto de Moçambique
ter ratificado a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as
Mulheres (CEDAW) a 2 de Junho de 1993, que em Moçambique entrou em vigor como lei a 16 de
Maio de 1997. A CEDAW com efeito requer que toda a legislação nacional seja domesticada, i.e.
revista e harmonizada de acordo com a CEDAW (LOFORTE, Op, Cit, p.61).

Todos os países que ratificaram a CEDAW devem apresentar relatórios regulares às Nações
Unidas sobre o ponto de situação da implementação da CEDAW. Embora tenha elaborado tarde o
seu relatório, Moçambique cumpriu os requisitos quando apresentou quer o seu relatório inicial
quer o seu segundo relatório. Ambos serão analisados pela Comissão do Estatuto das Mulheres
(CSW) das Nações Unidas na 38ª sessão da Comissão em Maio de 2007.141 Moçambique ainda
não aderiu ao Protocolo Opcional, que entrou em vigor no ano 2000, pelo qual os Estados
individuais aceitam que a CWS possa receber queixas de indivíduos, se o Estado não estiver a
cumprir a CEDAW.

Reforma legal
O relatório da CEDAW reconhece que o processo da reforma da legal é lento e que a maior parte
da legislação interna tem ainda de ser “domesticada” e alinhada com a CEDAW. Em 1997 foi
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criada uma Comissão de Revisão da Lei, funcionando sob a supervisão do Ministério da Justiça.
Em 2002 foi criada uma Unidade Técnica da Reforma Legal (UTREL) para apoiar a Comissão de
Revisão da Legislação. Dado que grande parte da legislação data do tempo colonial, o propósito
da comissão é harmonizar e ajustar a legislação às presentes realidades socioeconómica, política
e cultural.
Apesar de a igualdade de género não estar explicitamente mencionada nos termos de referência
da comissão, pontos focais e juristas do sexo feminino estão na comissão criando assim uma
janela de oportunidade para assegurar que a análise de género seja integrada nas propostas da
legislação. Até à data, as leis que foram revistas e têm um impacto nas relações de género
incluem a Lei de Terras (1997), a Lei do Trabalho (1998), a Lei da Família (2005) e o Código
Comercial (2005).

Para o EGFE (2009), Após uma longa campanha da sociedade civil para incorporar os princípios
de igualdade entre os homens e as mulheres na Lei da Família e após muita controvérsia entre os
membros do comité de redacção e o Parlamento, a nova Lei da Família entrou em vigor em
Fevereiro de 2005. Do lado positivo, a lei define direitos específicos para as mulheres e introduz
numerosas inovações.

Durante os debates parlamentares a lei gerou uma controvérsia acalorada sobre a questão da
poligamia, com uma oposição firme por parte dos defensores de género ao reconhecimento
formal da poligamia. A lei acabou por estipular que o casamento é uma união monogâmica. Os
casais são livres de escolher o tipo de casamento que pretendem (civil, religioso ou tradicional).
A idade legal para o casamento para ambos os sexos é de 18 anos e a lei requer o pleno
consentimento de ambos os nubentes, o que significa que ninguém será forçado a casar contra a
sua vontade.

Para CHAMO (2006:65), o princípio estabelecido pela lei é que o agregado familiar é chefiado
por ambos os cônjuges; por esta razão os cônjuges devem apoiar-se mutuamente e são
reciprocamente obrigados a contribuir para as despesas da casa e a participar na gestão da vida
familiar. Ambos os parceiros têm o direito de administrar as propriedades do casal de forma
igual.
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Violência doméstica, adultério e abandono do lar por mais de um ano constituem matéria
suficiente para divórcio. Contudo, um homem não se pode divorciar da sua esposa se ela estiver
grávida ou durante o primeiro ano de vida do filho. Todas as crianças têm o direito de ser
registadas à nascença e o poder parental deve ser exercido de forma igual pelo pai e pela mãe; em
caso de divórcio os pais devem decidir com quem a criança irá viver e quem irá assegurar o
sustento (LOFORTE, 2003, p.65).

Embora a lei esteja a contribuir assim para uma maior igualdade de género, a prática parece
mostrar que a lei não tem sido capaz de resolver todos os problemas das mulheres. A Liga
Moçambicana dos Direitos Humanos (LDH) reporta que muitas das mulheres beneficiárias
procuram assistência legal para resolver disputas conjugais e conflitos relacionados com a Lei da
Família (por exemplo, divórcio, pensão de alimentos, processos de paternidade, pagamento de
mensalidade para os filhos, registo de nascimento, etc.).

A lei também introduz um novo conceito, segundo CHAMO (2006:66): a união de facto. O
reconhecimento das uniões de facto implica direitos a pensão de alimentos e herança por parte
dos fi lhos, que têm de ser pagos do património/dos bens que o falecido tinha em conjunto com a
esposa legal, o que cria potenciais conflitos entre as diversas parceiras do homem. Outra coisa:
pode-se considerar que os homens que não estão casados mas têm várias amantes vivem em
uniões de facto, o que significa que se tolera uma forma velada de poligamia.

A Liga Moçambicana dos Direitos Humanos também reporta que apesar das campanhas de
consciencialização pública muitas mulheres particularmente das áreas rurais continuam a não
estar informadas sobre a lei, pelo que aspectos importantes da lei não são aplicados. Um exemplo
disto é o problema de casamentos forçados e casamentos prematuros que continua a existir.

Outros assuntos que ainda requerem regulação através de uma legislação apropriada incluem
violação da esposa, assédio sexual, aquisição de nacionalidade e discriminação económica contra
as mulheres. A violação é legalmente proibida mas a lei não reconhece a violação dentro do
casamento, i.e. a violação pelo esposo ainda não é considerada um crime. A violação é punida
nos termos da lei com pena de prisão que vai de 2 a 12 anos, dependendo da idade da vítima. Tal
como acontece com a violência doméstica e o estupro das raparigas na escola, a lei sobre a
violação não é cumprida efectivamente e poucos casos são julgados em tribunais, dado que
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muitas famílias preferem resolver tais problemas em foro privado através de remuneração
financeira em vez de recorrer ao sistema formal de justiça. Embora o assédio sexual seja ilegal e
generalizado, poucos casos são levados à atenção pública e à justiça pelas mulheres.

Outras áreas de discriminação incluem a nacionalidade: ao abrigo da lei actual, é concedida a


cidadania a uma mulher estrangeira casada com um moçambicano mas não a um homem
estrangeiro casado com uma cidadã nacional. Diferenças salariais, pelas quais as mulheres
auferem salários inferiores aos dos homens pelo mesmo trabalho, também deverão ser abordadas
na presente revisão da Lei do Trabalho. Outro assunto crítico é a viuvez. Em muitas partes do
país a morte é associada a forças malignas; ela é vista como resultado do feitiço da mulher
(LOFORTE, 2003, p.69).

Neste contexto, tanto a viúva como a família precisam de um tratamento especial através de
rituais de purificação que purificam a viúva e a família de influências negativas. Outras regiões
adoptaram o levirato ou o sororato com vista a conservar os recursos da família e evitar a
fragmentação dos bens do falecido.

A crise das relações de género ou crise do masculino


A então falada crise do masculino tem levado a um maquiamento (no sentido figurado) de
construções identitárias masculinas com elementos contemporâneos que supostamente tornam os
homens mais femininos, sem, no entanto, questionar o sistema de género hierárquico que
estrutura as relações.
Na linha de pensamento de SCOTT (Op, Cit, p.65), a crise nas relações de género é “uma crise
em torno da distribuição do poder, e a balança tem pendido para as mulheres, embora ainda
esteja longe do estado de equilíbrio”. Uma parte da luta feminista se dá no sentido de conter a
violência masculina sobre as mulheres. Mas não podemos deixar de reconhecer que a perda de
poder dos homens tem gerado, em algumas situações, mais violência, o que causa preocupação.

Outro aspecto é que determinados grupos de homens têm questionado o privilégio de outros
grupos de homens. Homens negros têm lutado por uma justa distribuição de oportunidades
quando concorrem com homens brancos por uma vaga no mercado de trabalho, por exemplo
(BUTLER, 2003, p.29). Ou para ingresso no ensino superior público, juntamente com as
mulheres negras, como no caso da discussão dos regimes de cotas. Homens homossexuais têm
lutado para que sua orientação sexual não lhes impeça o exercício de direitos reservados até agora
aos homens heterossexuais (SCOTT, 1990, p.67).
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Também mulheres empregam estas técnicas e estratégias na construção de suas identidades e na


ocupação do espaço social, na medida em que se masculinizam e participam deste sistema. Da
mesma forma, outras construções identitárias em certos casos conseguem ascender e ocupar
posições sociais de destaque na era do politicamente correcto, ainda quando milhões de pessoas
seguem sendo excluídas, marginalizadas e violentadas por estarem fora de determinados padrões.

Cronograma das actividades

Período (mês) 2014 2015


Actividades 11 12 01 02 03 04 05 06
Apresentação da 1ª versão do projecto
Apresentação da 2ª versão do projecto
Recolha de dados junto a comunidade
Analise dos dados
Montagem da monografia
Entrega da 1ª versão da monografia
Entrega da 2ª versão da monografia
Entrega da 3ª versão da monografia
Entrega da versão final da monografia
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Bibliografia
CASACA, Sara Falcão. As (des) igualdades de género e a precarização do emprego. In:
FERREIRA, Virginia (org). A igualdade de mulheres e homens no trabalho e no emprego em
Portugal: Políticas e circunstâncias. Lisboa, 2010.

CHAMO, Ernesto. Para a Igualdade de Género em Moçambique: Um Perfil das Relações de


Género. Edição Actualizada, Maputo, Janeiro de 2006.

DUBY, Georges & PERROT, Michelle. História das mulheres: a Antiguidade. Porto, Edições
Afrontamento, 1990.

EGFE - Estatuto Geral dos Funcionários e Agentes do Estado. Imprensa Nacional de


Moçambique Maputo, 2009.

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Antropologia, Maputo, 2003.
19

Índice

O Papel da Mulher na Sociedade Moçambicana..............................................................................3

Introdução.........................................................................................................................................3

Justificativa.......................................................................................................................................3

Problematização...............................................................................................................................4

Hipóteses..........................................................................................................................................5

Principal............................................................................................................................................5

Secundarias.......................................................................................................................................5

Objectivos.........................................................................................................................................5

Geral.................................................................................................................................................5

Específicos........................................................................................................................................5

Metodologias de pesquisa.................................................................................................................5

De abordagem...................................................................................................................................5

De procedimento..............................................................................................................................6

Técnicas de recolha de dados...........................................................................................................6

Revisão bibliográfica........................................................................................................................8

A Mulher e o acesso a Educação......................................................................................................9


20

Mecanismos e políticas institucionais para a promoção da igualdade de género em Moçambique

........................................................................................................................................................11

Quadro legal para a igualdade de género e a não-discriminação...................................................13

Reforma legal.................................................................................................................................13

A crise das relações de género ou crise do masculino....................................................................16

Cronograma das actividades...........................................................................................................17

Bibliografia.....................................................................................................................................18

Jolita Eugénio Aboo

O papel da mulher na sociedade moçambicana


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Universidade Pedagógica
Beira
2015

Jolita Eugénio Aboo

O papel da mulher na sociedade moçambicana

Departamento Ciências Sociais

Curso de HIPOGEP, 2º Semestre,


4º Ano

Trabalho de Culminação do Curso

Docente: dr. Rui de Sousa


22

Universidade Pedagógica
Beira
2015

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