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1 Centro de Estudos da Saúde Abstract This article analyzes the issue of workers’ health in the context of productive reorgani-
do Trabalhador e Ecologia
zation, based on the sexual division of labor and gender relations. The author begins with a dis-
Humana, Escola Nacional
de Saúde Pública, Fundação cussion of cross-cutting issues and moves on to analyze current trends: the increase in female la-
Oswaldo Cruz. bor, its incorporation by multinational companies in the so-called Third World countries, an in-
Rua Leopoldo Bulhões 1480,
crease in differences and greater vulnerability vis-à-vis the process involving underemployment
Rio de Janeiro, RJ
21045-900, Brasil. and suspension of social labor clauses. Finally, two examples of female labor (in industry and
the school system) foster reflection on the effect of productive reorganization on working
women’s health, highlighting the issue of excessive workloads for women.
Key words Female Labor; Women’s Health; Occupational Health; Gender Relations
Resumo Neste artigo procura-se analisar a questão da saúde dos(as) trabalhadores(as) frente à
reestruturação produtiva, tomando-se, como eixo, a divisão sexual do trabalho e as relações de
gênero. Para isso, em um primeiro momento, emprega-se o paradigma da transversalidade. Pos-
teriormente discutem-se as atuais tendências de aumento do trabalho feminino, de sua incorpo-
ração pelas empresas multinacionais nos países de terceiro mundo, de acirramento de suas dife-
renças e de sua maior vulnerabilidade diante do processo que torna precários o emprego e o tra-
balho. Ao final, dois exemplos de trabalho feminino – na indústria e no setor de educação – con-
tribuem para a reflexão acerca dos efeitos da reestruturação produtiva na saúde da mulher tra-
balhadora, apontando a problemática do tempo extenso de trabalho.
Palavras-chave Trabalho Feminino; Saúde da Mulher; Saúde Ocupacional; Relações de Gênero
essas zonas industriais de países de terceiro (DARES, 1993): o trabalho das mulheres nas in-
mundo empregam grande parcela de mulheres dústrias é caracterizado pela repetitividade,
jovens, solteiras e com alto nível de educação. monotonia e pelo ritmo intenso. No que se re-
Outros exemplos são dados por Antunes (1997), fere ao Brasil, a reorganização produtiva é ain-
como a produção de tênis Nike na Indonésia, da marginal e pouco significativa, identifican-
que emprega mulheres recebendo US$ 38 por do-se a emergência de novos modelos de orga-
mês, com jornada de 60 horas semanais, en- nização do trabalho nas grandes empresas, de
quanto em Bangladesh, para idêntica jornada, setores competitivos da economia e que em-
o salário não chega a US$ 30. pregam mão-de-obra masculina (Hirata, 1993).
Uma contribuição importante para a análi- No entanto, cabe aqui também apresentar
se da divisão internacional e sexual do traba- uma reflexão de Armstrong (1995) a respeito do
lho é feita por Le Doaré (1984). A autora mostra que tem significado a feminização da força de
que a exportação de parcela do processo de trabalho com base em dados do Canadá. Sua
produção por meio da terceirização em escala análise indica um movimento simultâneo e
mundial ocorre simultaneamente à transferên- distinto do que foi exposto acima, que parece
cia das modalidades de divisão sexual dos paí- estar ocorrendo nesta complexa roda viva. A
ses dominantes para os periféricos. A terceiri- globalização tem eliminado alguns dos empre-
zação ao nível internacional corresponde a gos masculinos e alterado os postos tradicio-
processo de replicação da dominação das mu- nalmente ocupados por homens, fazendo com
lheres, pois o que é exportado e explorado é o que estes se aproximem dos femininos, em par-
caráter tradicionalmente desvalorizado do tra- ticular, quanto à precariedade. Para a autora, o
balho feminino. trabalho de mulheres e homens tem se torna-
Certamente, esse é um dos fatores explica- do similar em virtude de que menor número de
tivos das “persistências, continuidades e simi- pessoas de ambos os sexos têm conseguido es-
laridades” existentes na divisão sexual do tra- colher o tipo de trabalho que desejam realizar,
balho em países que ocupam posições contras- restando assumir postos não valorizados.
tantes no cenário da divisão internacional do Para entender o que representam estes mo-
trabalho e no nível de desenvolvimento econô- vimentos contraditórios na saúde das trabalha-
mico e tecnológico (Hirata, 1993). Tanto nos doras e trabalhadores lembrar-se-á Berlinguer
países centrais quanto nos periféricos, os mé- (1980), que salienta: “no plano sanitário é notó-
todos e técnicas tayloristas são aplicados ma- rio que a maior freqüência de distúrbios e doen-
joritariamente às mulheres, ao passo que a ges- ças profissionais ocorrem entre as categorias
tão taylorista é predominante nas fábricas em menos qualificadas” (Berlinguer, 1980:6). Ou-
que é grande o número de operárias. A divisão tros autores mostraram igualmente que as
sexual do trabalho atravessa a reestruturação doenças associadas ao trabalho das mulheres
produtiva, implicando a coexistência de um se- neste quadro de divisão social do trabalho ca-
tor flexibilizado masculino e de um setor taylo- racterizam-se por serem do tipo insidioso,
rizado feminino (Kergoat, 1992). De fato, as muitas vezes inespecíficas e não indenizáveis
comparações internacionais referentes à divi- (Volkoff, 1985), inexistindo normas apropria-
são sexual do trabalho têm sido importantes das às condições do trabalho feminino. Para
para evidenciar que os modelos teóricos utili- Frigul et al. (1993), as mulheres encontram-se
zados na análise da restruturação produtiva es- inseridas nos ângulos mortos do sistema previ-
tão referenciados a determinado arquétipo de denciário com a acumulação de agravos não
trabalhador qualificado e polivalente (Hirata, específicos. É considerando esta dificuldade de
1994), uma vez que, na outra extremidade, o apreender os riscos do trabalho das mulheres
taylorismo continua sendo prevalente nos se- que Messing et al. (1997) sustentam que, para
tores de produção que mais empregam mulhe- analisar os aspectos físicos do trabalho femini-
res, as quais até aqui não têm sido requalifica- no, é necessário tomar em conta o somatório
das para os novos equipamentos de base mi- de esforços realizados durante uma jornada, a
croeletrônica. A persistência da divisão sexual qual, em muitos casos, é superior a um único
do trabalho é claramente demonstrada, para o esforço não repetitivo referente a uma ativida-
caso da França, quando as conclusões alcança- de masculina. Esses autores mostraram que o
das pelo trabalho pioneiro de Madeleine Guil- trabalho leve das mulheres as expõem a postu-
bert, desenvolvido em 1966 (Guilbert, 1966), ras forçadas, com relação às quais não há crité-
são reafirmadas pela pesquisa realizada por rios para estabelecer limites.
Danièle Kergoat, em 1982 (Kergoat, 1982), e pe- Associa-se também às funções repetitivas e
las subseqüentes análises estatísticas do Mi- que exigem cadência elevada e postura estática
nistério do Trabalho desse país no ano de 1993 – desempenhadas majoritariamente por mu-
lheres na indústria e que se intensificaram com cipais argumentos para sua expansão seja a
a introdução das novas formas de organização possibilidade de conciliação com trabalho do-
do trabalho – o conjunto de lesões osteoarticu- méstico, Vedel & Gunnarsson (1985, apud Soa-
lares, as quais incluem distúrbios que atingem res, 1992) ressaltam que os períodos de pique
dedos, punhos, antebraços, cotovelos, ombros, dessas atividades coincidem com os momen-
pescoço e regiões escapulares; resultantes do tos em que as mulheres deveriam estar à dis-
desgaste muscular, tendinoso, articular e neu- posição das crianças, sugerindo que o teletra-
rológico. Observa-se que a incidência dessas balho interfere diretamente nos relacionamen-
lesões, cuja nomenclatura é bastante diversifi- tos familiares. No que se refere ao isolamento,
cada entre os países, está relacionada, além de um de seus efeitos é a desorganização emocio-
a fatores etiológicos – exigências físicas e men- nal dos(as) trabalhadores(as) e a dificuldade ou
tais do trabalho –, a fatores agravantes, como a impossibilidade de constituição, através da
forma de organização do trabalho – o número identificação com o outro, de grupos infor-
excessivo de horas trabalhadas e o ritmo de tra- mais; grupos de resistência e de defesa da saú-
balho –, a insuficiência de repouso e relaxa- de e da vida.
mento – importante no caso das mulheres, ten- De fato, conforme Lerolle (1995), as moder-
do-se em vista a alternância trabalho assalaria- nizações técnicas e organizacionais não são
do e doméstico – e a certas predisposições in- simplesmente melhorias de eficácia, mas se re-
dividuais – idade, estado geral de saúde, força metem diretamente às relações de trabalho an-
muscular, habilidade profissional etc.–, que teriormente construídas. A autora procura mos-
não devem ser enfatizadas em detrimento de trar a importância da vitalidade dos coletivos
outros fatores (Ono et al., 1987). de trabalho para a (re)construção da saúde di-
Sob o ponto de vista da psicossomática, en- ante das mudanças organizacionais, que se ca-
tende-se que a ausência de significado dos mo- racterizam: pelo desconhecimento dos valores
vimentos realizados nos trabalhos repetitivos e regras de trabalho nos quais repousam os co-
não pode deixar de representar fonte de pato- letivos; pela destruição do equilíbrio anterior-
logia. Esses movimentos seguem ritmos que mente conquistado pelos(as) trabalhadores(as)
foram interiorizados pelas mulheres desde a e por grande dificuldade de instaurar um deba-
infância, levando-as a manter o aparelho mo- te relacionado aos riscos dessas mudanças. Re-
tor em hiperatividade. Ou seja, o aparelho mo- fletindo acerca de suas experiências de inter-
tor é utilizado como sistema de defesa privile- venção, Lerolle (1995) sinaliza que a aceitação
giado (Peze, 1997). Nessa relação de escravidão da modernização produtiva por parte dos(as)
que as trabalhadoras mantêm com o tempo é trabalhadores(as) e a preservação da saúde de-
que se desenvolvem – e se realimentam – as pendem da possibilidade de reconstrução de
atividades do trabalho repetitivo. valores e do sentido do trabalho nos quais se
Cabe sinalizar que as lesões por esforços re- apoiam o desenvolvimento das identidades
petitivos estão também fortemente associadas subjetivas e coletivas. O autor destaca a contra-
às atividades de processamento de informa- dição entre os discursos que valorizam a auto-
ções, sobretudo a entrada e manipulação de nomia e a ausência de meios para exercê-la
dados, cuja mão de obra empregada é princi- efetivamente, citando o exemplo das operárias
palmente feminina. Com a tecnologia das tele- de uma confecção que foram organizadas, de
comunicações, essas atividades têm sido orga- forma autoritária e sob forte exigência de pro-
nizadas sob o regime da subcontratação ou dução, em “grupos autônomos” e restabelece-
mesmo internacionalizadas mediante a trans- ram rapidamente a mesma divisão do trabalho
ferência para os países periféricos. Se as lesões taylorizada anterior. Diante de tantas pressões,
por esforços repetitivos, a deterioração da ca- essa era a solução menos desgastaste para elas.
pacidade visual, o estresse e a fadiga, as der- Lerolle (1995) chama a atenção para o fato de
matoses e os problemas reprodutivos são a- que o trabalho individualizado e a precariza-
pontados como conseqüências, em geral, des- ção tornam difícil a estruturação de coletivos e
sas atividades (Pearson, 1995), o estudo especí- que, no caso das mulheres, seus valores/regras
fico de Soares (1992), a respeito de teletrabalho são muito distantes daqueles impostos pela ge-
e comunicação em centros de processamentos rência e mesmo daqueles defendidos por orga-
de dados, no Brasil, indica que o isolamento nismos sindicais, o que dificulta a configura-
social é seu aspecto mais problemático. Para o ção de forma de resistência aberta/explícita.
autor, a imposição cultural de que as mulheres
sejam responsáveis pela socialização das crian-
ças contribui para que o teletrabalho seja am-
plamente feminizado. E, embora um dos prin-
tam 70% do 1,3 bilhão de pessoas que vivem da transversalidade das relações sociais de se-
em condições de pobreza absoluta no mundo. xo. Nessas empresas – sejam fábricas de produ-
O conceito de feminização da pobreza procura tos de plásticos sejam laboratórios farmacêuti-
explicitar a grande presença de mulheres entre cos – as condições de trabalho são precárias,
os pobres, seu aumento progressivo e os con- persistindo inclusive o uso de maquinários tra-
dicionantes dessa realidade (Anderson, 1994). dicionais. A informalidade das relações sociais
Esse conceito foi introduzido pela primeira vez de trabalho presente nesses estabelecimentos
em 1978, nos Estados Unidos. Estudos na Áfri- torna mais difícil para os(as) trabalhadores(as)
ca mostraram a persistência de quatro grupos a recusa de trabalhar em situação de risco. Por
entre a população pobre: os órfãos, os que es- um lado, problemas alérgicos, respiratórios, re-
tão física e mentalmente incapacitados, as viú- nais, ginecológicos, dermatológicos e de colu-
vas e os velhos, que são representados, com na foram mencionados com freqüência pelas
maior freqüência, pelas mulheres em função operárias. Por outro lado, elas mostraram per-
da sobrevida feminina. No Brasil, 20% das fa- ceber a relação entre a saúde e o trabalho de
mílias é chefiada por mulheres. As que traba- forma inespecífica, citando como resultantes
lham por conta própria chegam a ficar até 14 do processo de trabalho: esgotamento físico,
horas vendendo na rua ou em casa e colocam nervosismo e problemas visuais. É importante
seus filhos para ajudá-las ou substituí-las nas salientar que entram em contato direto com
tarefas domésticas. substâncias químicas e outros riscos nas ativi-
Outros fatores que interferem no quadro de dades manuais e periféricas que realizam em
pobreza e de precarização, segundo Anderson função da divisão sexual do trabalho, em parti-
(1994), são os ativos sociais – todos os salários, cular, nos pequenos laboratórios farmacêuti-
bens e serviços a que tem acesso um indivíduo cos. A precariedade de suas condições de tra-
através de seus vínculos sociais – e os ativos balho é agravada por serem muitas vezes sub-
culturais – educação formal e conhecimento contratadas pelas chamadas agências de em-
cultural que permite um indivíduo desenvol- prego – modalidade aplicada à mão de obra fe-
ver-se em seu ambiente – de que se dispõe. Al- minina já há muito tempo no Brasil e que não
gumas análises destacaram que a liberdade é alterada com a reestruturação produtiva.
masculina para deslocar-se contribui para que Pode-se perceber, através desses elemen-
os homens estabeleçam vínculos com ampla tos, a reprodução do cenário descrito anterior-
variedade de indivíduos, grupos e associações, mente:
assim como para que aprendam os procedi- • a permanência da divisão sexual do traba-
mentos formais e informais para lidar com ins- lho (as trabalhadoras que ocupam os postos
tituições e com a burocracia pública ao acu- taylorizados, repetitivos e “desqualificados”);
mular ativos culturais. • a invisibilidade dos riscos e agravos que
Destaca-se também que as mulheres reali- acometem essas trabalhadoras (os organismos
zam grande quantidade de trabalho não pago, de vigilância à saúde raramente atuam nessas
não só o chamado trabalho doméstico, mas empresas; o processo crônico de adoecimento
também o trabalho de cuidar da família, que não chega normalmente a emergir);
apresentam componentes emocionais impor- • as relações de trabalho existentes dificul-
tantes e que consomem muito tempo. Esse fa- tam a estruturação de um coletivo capaz de re-
to deve ser analisado pela sua importância na sistir abertamente às pressões/condições de
reprodução do quadro de pobreza e precarie- trabalho.
dade das mulheres. O valor do trabalho dessas mulheres, ex-
presso nos baixos salários que recebem (entre
1,5 e 3,8 salários mínimos), representa custo
Configurações específicas da particularmente elevado para a saúde das che-
relação gênero, saúde e trabalho fes de família, de quem podem depender várias
no contexto de reestruturação pessoas, entre filhos, irmãos, mães e compa-
produtiva e globalização nheiros desempregados. Em algumas situa-
ções, as trabalhadoras são forçadas a desempe-
Ao realizar um estudo relativo à saúde das ope- nhar atividades remuneradas ininterruptas,
rárias de indústrias químicas localizadas no sem tempo para descanso, emendando a jor-
subúrbio do Rio de Janeiro, a tendência encon- nada na fábrica com a jornada em atividade in-
trada de emprego de mão de obra feminina formal.
nos estabelecimentos de menor porte – empre- Quando se desloca o foco para outro setor
sas de “fundo de quintal” – despertou a aten- da economia – a educação –, os problemas de
ção, parecendo ser esse um aspecto concreto saúde coletiva relacionados à reestruturação
produtiva neoliberal ganham contornos dife- de saúde mental – tensão, irritabilidade, insô-
rentes e, ao nosso ver, ainda mais obscuros. No nia etc. – estão fortemente relacionadas às
caso do Brasil, o sistema educacional público condições precárias de trabalho. São indicado-
tem sido levado a um quadro de precarização e res desse quadro as readaptações freqüentes
degradação em que, paradoxalmente, sua pro- entre esses(as) trabalhadores(as) por motivo
dutividade encontra-se na improdutividade de saúde. Sem condições de permanecer no
(Frigoto, 1984). O quadro de sucateamento das desempenho das mesmas atividades ou de
escolas públicas revela-se no abandono dos continuar realizando-as com a mesma intensi-
equipamentos e instalações, assim como na dade, estes são colocados em readaptação pe-
crescente depreciação dos (das) trabalhadores lo serviço de perícia – embora tal readaptação
(as) via rebaixamento salarial e precárias con- não ocorra de fato, na medida em que rara-
dições para a realização de suas atividades. mente há redução de carga de trabalho. Con-
Neste mesmo movimento, importou-se a ópti- forme levantamento feito, utilizando dados re-
ca empresarial e seu discurso gerencial para a lativos ao período de 1993 a 1997 da Superin-
Escola Pública, com “novas” propostas e expe- tendência de Saúde Ocupacional do Estado, o
riências racionalizadoras, como a da terceiri- número de readaptações para o conjunto dos
zação de algumas funções. Se ocorreu, em um educadores (as) cresceu 50% durante o perío-
primeiro momento, a drástica redução com do. Entende-se que semelhante incremento é
gastos em educação, em um segundo momen- o reflexo de processo de deterioração das con-
to tende a emergir (Salm, 1991) a revalorização dições de trabalho e de vida desses (as) traba-
da escolaridade, com a introdução de novas lhadores (as), que se manifesta em desprazer e
técnicas e tecnologias que alteram o conteúdo em patologias.
e a forma de trabalho, inclusive da organização
de trabalho.
Em pesquisa desenvolvida junto com o Sin- Considerações Finais
dicato Estadual dos Profissionais de Educação
(SEPE-RJ), dirigida a uma parcela feminizada Neste artigo procura-se apresentar alguns ele-
de educadores cuja presença quase invisível mentos que contribuem com a reflexão acerca
contrasta com a importância social do traba- das relações de gênero, da saúde e da reestru-
lho que realizam – as merendeiras e serventes turação produtiva, indicando suas diversas ar-
–, percebe-se quão incompleta permanecem as ticulações e possibilidades de abordagens. Ao
análises relativas ao tema que têm privilegiado final, procura-se dar concretude à discussão
o setor industrial com mão de obra majorita- por meio de exemplos, um referente ao traba-
riamente masculina. Essas análises, que mui- lho industrial e outro ao trabalho em escolas
tas vezes se baseiam em estudos de caso relati- públicas, onde questões similares foram evi-
vos às mudanças ocorridas em grande empre- denciadas. O setor industrial tem sido objeto
sa, mostram a tendência, não universal, de fle- privilegiado de estudos concernentes à rees-
xibilização/modernização de processos produ- truturação produtiva e de investigações no
tivos, deixando em aberto mundos de trabalho campo da saúde do trabalhador. Entretanto,
precarizados. esses estudos são limitados no que tange a
No entanto, um contingente de mais de mostrar a heterogeneidade de processos pro-
10.000 merendeiras e serventes – atomizado dutivos existentes no Brasil ao tratarem de ca-
em mais de 3.000 escolas públicas existentes sos específicos, normalmente indústrias de
no Rio de Janeiro – percebe a degradação de ponta e com perfil masculino de mão de obra.
suas condições de trabalho e de vida decorren- Por intermédio do exemplo do trabalho de mu-
tes da nova ordem econômica e produtiva. lheres na indústria química indica-se a persis-
Com a redução do número de merendeiras e tência de processos de trabalho taylorizados e
serventes em cada escola, somada ao tempo sua precariedade. Ao analisar o que vem ocor-
exíguo para a realização de suas atividades e à rendo com as trabalhadoras da indústria e da
falta de investimentos em instalações e equi- educação, observa-se que a forma de precari-
pamentos nesses ambientes de trabalho, a so- zação de trabalho nos dois casos é aquela sina-
brecarga gerada tem acarretado o adoecimen- lizada pela presença simultânea dessas mulhe-
to de número relevante de trabalhadoras. Des- res no setor formal e informal e, consequente-
taca-se que a maioria delas também comple- mente, pelo emprego de grande parte do tem-
menta a remuneração por intermédio de uma po cotidiano em atividades de trabalho. A divi-
terceira jornada no mercado informal. As são sexual do trabalho, produzida pela organi-
queixas relativas às lesões por esforços repeti- zação do trabalho, impõe-lhes jornada ilimita-
tivos, às doenças do coração e aos problemas da, a qual, associada ao trabalho familiar e aos
menores recursos de que dispõem, representa balho não remunerado para a apreensão do
esforço excessivo, podendo contribuir para a conjunto de atividades desempenhadas pelas
deterioração progressiva da saúde dessas mu- trabalhadoras. Isso significa que não basta
lheres (Acevedo, 1997), incluindo problemas li- considerar a inserção formal das mulheres no
gados à saúde mental. As relações sociais de trabalho – quando existe – para analisar a si-
sexo implicam, ao mesmo tempo, uma sobre- tuação de saúde e doença. Aponta também a
carga no trabalho doméstico e uma sobrecarga problemática do tempo extenso de trabalho e
no trabalho remunerado. seus efeitos no quadro de saúde das mulheres
Esta análise mostra a importância das no- pobres de países como o Brasil. Quando se tra-
ções de trabalho remunerado – e não apenas ta de mulheres, o tempo de trabalho parece ser
“trabalho assalariado”, uma vez que o trabalho elemento importante para tornar visível a di-
formal e o informal não são excludentes – e tra- nâmica saúde-trabalho em transformação.
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