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Resumo
As práticas sociais de cuidado são marcadas por mudanças e permanências, especialmente considerando a articulação entre
mercado de trabalho e família. Se, nas últimas décadas, as mulheres consolidaram a presença em atividades remuneradas, as
famílias (e, dentro delas, as mulheres) seguem responsáveis pelo atendimento das necessidades do cuidado e a articulação
de outras estratégias de provisão. O objetivo do presente artigo é investigar o papel que o Estado vem assumindo (ou
deixando de assumir) na provisão dessas necessidades, contribuindo para fomentar novas práticas sociais de cuidado ou,
DRUHYpVSDUDDFLRQDUSUiWLFDVWUDGLFLRQDLVDLQGDTXHUHVVLJQL¿FDGDV'DQGRYLVLELOLGDGHDRLPSDFWRTXHHVVHVSURFHVVRV
JHUDPQDLQVHUomRGDVPXOKHUHVQRPXQGRGRWUDEDOKRFRQVLGHUDUHPRVDVWUDQVIRUPDo}HVHFRQWLQXLGDGHVHPGLIHUHQWHV
paradigmas, ilustrando a responsabilização do Estado brasileiro pelo cuidado através da política de creches.
Palavras-chave: Divisão sexual do trabalho. Políticas públicas. Práticas sociais do cuidado.
Abstract
Social care practices are marked by both change and permanence, especially if considering the relationships between the
labor market and the family. If, in recent decades, women have consolidated their presence at work, families (and within
them the women) remain responsible for meeting social care needs as well as for coordinating the provision strategies.
The aim of this paper is to investigate the role that the State has taken (or failed to take) in providing these needs, helping
to foster new social care practices or, to the contrary, reusing traditional practices, though under a different name. Giving
visibility to the impact that these processes generate with the insertion of women in the workplace, we consider the
changes and continuities in different paradigms, illustrating the accountability of the Brazilian state for social care by
examining public nursery school policies.
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intervenção normalizadoras – com um conjunto 1991). Sua pauta – que abarcava a cidadania, o pleno
articulado de saberes (Luz, 1979). emprego e a proteção social (Pereira-Pereira, 2009) –
É nesse contexto que se coloca o objeto que projetou-se em um horizonte global bastante extenso,
pretendemos analisar nesse artigo: de que forma a ainda que sua presença, em diversos países, tenha se
provisão estatal vem assumindo a responsabilidade materializado menos nas práticas efetivas e mais no
pelo cuidado, contribuindo para fomentar novas discurso político – fosse como retórica de dominação
práticas sociais de cuidado ou, ao revés, reproduzindo ou como armas argumentativas de luta contra a
práticas tradicionais? Nossa hipótese é que o dominação. No caso brasileiro, a modernização
Estado é um ator relevante na construção de novas conservadora característica do período combinava
práticas sociais, mas que a sua corresponsabilização processos decisórios antidemocráticos com a
limitada tende a acionar práticas tradicionais, fragmentação e seletividade das políticas sociais
TXH VH UHVVLJQL¿FDP HP QRYRV FRQWH[WRV VHQGR %HKULQJ %RVFKHWWL
determinantes para a inscrição das mulheres no O paradigma do Welfare State Keynesiano,
mundo do trabalho (produtivo e reprodutivo). E, ainda fundado na realização dos direitos sociais por meio
que haja diferenças entre uma sociedade e outra, os GH SROtWLFDV S~EOLFDV VLJQL¿FDULD XP GLYLVRU GH
processos de reprodução da vida se vêm realizando, águas entre um sistema de proteção social arcaico
sobretudo, por meio do cuidado familiar, sendo esse e outro, moderno, industrial e próspero (Pereira-
o espaço que organiza a gestão, organização e a Pereira, 2009). Em decorrência do acirramento do
sustentabilidade da vida (Carrasco, 2001). FRQÀLWRHQWUH&DSLWDOH7UDEDOKRR(VWDGRDVVXPLXD
Consideraremos, nesse percurso, três diferentes atribuição de mediação social e política (Idem).
paradigmas: o welfare state keynesiano, o neoliberal O Estado, nesse cenário, passou a responder
e a realidade atual (que combina, no caso brasileiro, por parte da provisão social e, embora a questão
elementos neoliberais e novos arranjos de distribuição do cuidado não fosse colocada como um problema
GHULTXH]DVHMXVWLoDVRFLDOH[HPSOL¿FDQGRDDQiOLVH político central, os serviços públicos de acesso à
teórica com a trajetória da política de creches – uma educação, à saúde e à assistência social transferiam
demanda histórica dos movimentos feministas e parte do cuidado para a esfera pública. A provisão do
de mulheres que volta, na atualidade, à agenda de bem-estar materializava-se através de duas camadas
SROtWLFDVS~EOLFDV3RU¿PDSUHVHQWDUHPRVDVOLQKDV (Paterman, 2007): a primeira abarcava o bem-estar
gerais para uma agenda política de democratização provido no espaço público, por meio de políticas
do cuidado. S~EOLFDV RX VHUYLoRV RIHUHFLGRV SHOR PHUFDGR D
segunda tinha como unidade de produção as famílias
Os arranjos institucionais e práticas sociais e, dentro delas as mulheres. Esse padrão de provisão
de cuidado no paradigma do Welfare State do bem-estar era determinante das práticas sociais de
Keynesiano cuidado.
A proteção social do welfare state keynesiano
fundava-se no breadwinner system, que consistia
O intitulado paradigma do welfare state keynesiano
na estruturação de um sistema de proteção social
compreende a formação de uma agenda política
FDOFDGR QD LGHQWL¿FDomR GRV KRPHQV ± HQTXDQWR
que emerge no pós-guerra, na trilha da denominada
LQGLYtGXRV LQVHULGRV HP UHODo}HV GH HPSUHJR
questão social, representando um afrouxamento
formal –, como provedores e titulares de direitos
contraditório da lógica capitalista em relação à força
sociais (vínculo principal), cujos benefícios eram
de trabalho como mercadoria (Esping-Andersen,
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a ajuda mútua, sendo essa prática social do cuidado O Estado assumia, em tese, o compromisso com a
permeada pelos valores da tradição, da solidariedade provisão do cuidado, seja por meio do oferecimento
e da caridade (Mioto, 2009). A maior valorização de serviços públicos, seja por meio da regulação das
GR PHUFDGR PDWHULDOL]DVH QDV UHODo}HV GH WURFD empresas para que elas oferecessem. Nesse último
sejam elas compreendidas na impessoalidade de caso, a Lei 5.692/71 – que previa as diretrizes e bases
DOJXQVVHUYLoRVSULYDGRVRXQDVUHODo}HVIDFHDIDFH para o ensino – determinava que os sistemas de ensino
– e muitas vezes pautadas pela afetividade (Idem) –, estimulassem empresas que tivessem contratadas
como no caso do trabalho doméstico. O protagonismo PmHV GH ¿OKRV PHQRUHV GH DQRV D RUJDQL]DU RX
da provisão estatal reconhece, em algum nível, o PDQWHULQVWLWXLo}HVGHHQVLQRDLQGDTXHHPSDUFHULD
cuidado como um problema político, realizando- FRPLQVWLWXLo}HVS~EOLFDV0DVDVVDQo}HVVLPEyOLFDV
se mediante oferta de serviços sociais (ex.: saúde, H D LQVX¿FLrQFLD GH ¿VFDOL]DomR UHVXOWDULDP QD
educação, assistência, etc.). LQREVHUYkQFLD GHVVDV OHJLVODo}HV SHOR HPSUHVDULDGR
Em relação ao Brasil, notamos que o período de (Rosemberg, 1984).
modernização conservadora, que traria para a agenda Essa responsabilização era subsidiária. Nesse
política os direitos e políticas sociais, apresentaria VHQWLGR DV &RQVWLWXLo}HV )HGHUDLV GH H D GH
alguns importantes avanços em relação ao papel do 1946 previam o cuidado da infância como um dever
Estado no atendimento das necessidades de cuidado. da família, cabendo ao Estado o dever de colaborar
Emblemática é a política de creches, que se tornaria TXDQGRRVDUUDQMRVSULYDGRVQmRIRVVHPVX¿FLHQWHV
um assunto em pauta, embora predominasse um ou seja, quando as famílias não dispusessem de
FDUiWHUDVVLVWHQFLDOLVWDSDUDTXHRVDV¿OKRVDVGDV UHFXUVRVSDUDFRQWUDWDUHPLQVWLWXLo}HVTXHR¿]HVVHP
PmHVWUDEDOKDGRUDVWLYHVVHPRQGH¿FDU5RVHPEHUJ e não pudesse fazer per si2.
1984). $ LQVX¿FLrQFLD GD SURYLVmR HVWDWDO UHD¿UPDYD
2SURFHVVRGHPRGL¿FDomRGDVIURQWHLUDVHQWUHR a centralidade das famílias nas práticas sociais de
mercado de trabalho e as famílias – com a progressiva cuidado. Seria central, nesse contexto, o familismo,
compreensão de que o espaço do assalariamento compreendido como o regime de provisão do bem-
poderia ser ocupado pelas mulheres –, seria estar que remete à unidade familiar enquanto principal
indissociável das demandas pelos serviços públicos e responsável (Mioto, 2009). O familismo era acionado
privados de creche nesse momento. pelo Estado para que parte expressiva dos custos
A CLT (Decreto-Lei 5.452/43) ilustra com da reprodução social da vida fosse assumido pelas
propriedade esse quadro, já que seu texto original mulheres, de forma invisível e não remunerada. E,
previa diversos dispositivos referentes às creches, no caso de famílias que pudessem pagar por serviços
FDEHQGR UHVVDOWDU D GHWHUPLQDomR GH LQVWLWXLo}HV privados, que fosse o mercado acionado por elas.
S~EOLFDVFRQVWUXtUHPPDQWHUHPH¿QDQFLDUHPFUHFKHV $ UHD¿UPDomR GD WUDGLomR QR TXH GL] UHVSHLWR j
HDSRVVLELOLGDGHGHLQVWLWXLo}HVS~EOLFDVFRQFHGHUHP identidade estabelecida socialmente entre mulheres
diplomas de benemerência aos empregadores e cuidado, com centralidade das práticas familiares,
que organizassem e mantivessem creches. A CLT é determinante para formatar o que Bubeck (2002:
restringia, contudo, a obrigatoriedade das creches às
empresas privadas que empregassem mulheres em 2 A CF-37 era especialmente imbuída dessa compreensão.
$¿UPDYDTXHDLQIkQFLDGHYHULDVHUREMHWRGHFXLGDGRVHJDUDQWLDV
idade fértil, orientando-se mais pela amamentação do estatais (art. 127), mas a educação integral da prole seria dever
que pela educação infantil (Rosemberg, 1984). e direito naturais dos pais, devendo o Estado colaborar, de
forma principal ou subsidiária, para suprir lacunas da educação
particular (art. 125), sobretudo quando faltassem os recursos
QHFHVViULRVjHGXFDomRHPLQVWLWXLo}HVSDUWLFXODUHVDUW
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O contexto neoliberal, em decorrência da das creches e pré-escolas. A inscrição das creches no
limitação da abrangência e do volume de recursos dos VLVWHPDGHHQVLQRIRLUHD¿UPDGDSHOD/HLGH'LUHWUL]HV
SURJUDPDVHDo}HVHVWDWDLVOHYRXDXPPRYLPHQWRGH Básicas da Educação Nacional – LDB (Lei 9394/96).
devolução da responsabilidade pelo cuidado para as Mas a falta de prioridade conferida à educação
famílias (Kittay, 2002), que deveriam gerir e executar infantil – tanto pela compreensão ideológica do
essas demandas. papel do Estado, quanto pela maior ênfase no
No caso brasileiro, esse projeto político se colocava ensino fundamental (Rosemberg, 2001) –, não
na contramão do processo de redemocratização permitiram que o projeto constitucional se realizasse
e, especialmente, do pacto compromissório a contento. Em relação à compreensão ideológica,
estabelecido pela Constituição Federal de 1988, que podemos destacar que o Governo Federal, conforme
preconiza, segundo se depreende dos art.1º e 3º do preconizado no Plano Diretor de Reforma do
texto constitucional, a transformação da realidade Aparelho do Estado (Brasil, 1995), privilegiava, no
socioeconômica, fundando-se na dignidade da caso dos serviços sociais (ou serviços públicos não
pessoa humana, no desenvolvimento nacional e na essenciais), a focalização na pobreza e, ainda, o dito
construção de uma sociedade livre, justa e solidária. setor público não-estatal. Essa opção política levaria a
Essa contradição de projetos de Estado pode ser um movimento de “ongnização” dos serviços públicos
H[HPSOL¿FDGDSHODSROtWLFDGHFUHFKHV1DVGpFDGDV (Gama, 2008), com transferência da execução às
GH H D UHLYLQGLFDomR SRU FUHFKHV XQL¿FRX LQVWLWXLo}HV SULYDGDV DLQGD TXH ¿QDQFLDGDV FRP
o movimento feminista, que elegeu o tema como recursos públicos.
uma de suas prioridades, fato que concorreu para A permanência do cuidado como um problema
torná-las uma das principais políticas sociais de familiar resultaria em diferentes estratégias para que
corresponsabilização do Estado, ou, ainda, a mais DV PXOKHUHV SXGHVVHP DUWLFXODU D YLGD SUR¿VVLRQDO
GLIXQGLGD 5LFROGL &RPR D¿UPD 5RVHPEHUJ e familiar, nesse enredo de dupla presença, em que se
(1984: 77), reivindicar creches era, naquele momento, passa a vivenciar a incindibilidade do mundo do trabalho
uma palavra de ordem consensual. FRPR XPD H[LVWrQFLD WRWDO %UXVFKLQL /RPEDUGL
A creche como um direito projetou-se no debate R TXH GH¿QH SDSpLV GXSORV WmR LQFRQFLOLiYHLV
da constituinte por meio de grande mobilização, quanto irrenunciáveis (Gómez, 2010).
valendo citar a campanha do Conselho Nacional de $ LPSRUWkQFLD GDV IDPtOLDV H[WHQVDV DYyV ¿OKDV
Direitos da Mulher – CNDM: Filho não é só da mãe vizinhas etc.) e a sobrecarga são realidades que aproximam
7KXUOHU %DQGHLUD$&RQVWLWXLomRGH as mulheres mais ricas das mulheres mais pobres. Dupla
recepcionou essa luta social, conferindo à política jornada, busca de carreiras públicas ou jornadas parciais
de creches um inédito e importante destaque. Por são formas que as mulheres encontram para seguirem
um lado, as creches e pré-escolas foram previstas nas duas esferas do mundo de trabalho. Um exemplo
como um direito social de trabalhadores urbanos e disso é a jornada de trabalho de mulheres e homens.
UXUDLVTXHFRQVLVWHQDDVVLVWrQFLDJUDWXLWDDRV¿OKRV Quando consideramos a jornada referente à ocupação
e dependentes desde o nascimento até os 5 anos de remunerada, a jornada média semanal masculina
idade4 (art, 7º, XXV). Por outro, as creches, conforme corresponde a 42,4 horas, enquanto a feminina é da
RDUW,9IRUDPGH¿QLGDVFRPRGHYHUGR(VWDGR ordem de 35,1 horas. Entretanto, a jornada total (jornada
e direito de crianças de 0 a 5 anos à educação através remunerada + afazeres doméstico) apresenta resultados
inversos: os homens dedicam 51,9 horas semanais ao
4 Em verdade, o texto original previa até 6 anos de idade, mas o
dispositivo normativo foi revisto pela Emenda Constitucional n. WUDEDOKRWRWDODVPXOKHUHVKRUDV,3($
53/2006.
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Mas a condição de classe (assim como as relativo baixo custo, as trabalhadoras domésticas –
desigualdades raciais) mais afasta do que aproxima GLIHUHQWHPHQWHGHRXWUDVSUR¿VVLRQDLVGRFXLGDGRHP
DV PXOKHUHV QHVVH FHQiULR GH FRPSOH[L¿FDomR GRV sentido amplo – assumem, com frequência, não apenas
arranjos de cuidado. No caso das mulheres que não os cuidados objetivos, mas também os subjetivos,
SRVVXHP FRQGLo}HV ¿QDQFHLUDV SDUD FRQWDU FRP atendendo às demandas de afeto de quem é objeto
serviços privados, restam-lhes apenas o acúmulo de GR FXLGDGR (VVH KtEULGR GH UHODomR SUR¿VVLRQDO ±
WDUHIDV H D SUiWLFD GR ³VH YLUDU´ +LUDWD .HUJRDW referente à prestação de um serviço remunerado – e
2008). Já as mulheres que pertencem às famílias com FDULFDWXUD GH UHODo}HV IDPLOLDUHV H DIHWLYDV UHVXOWD
PHOKRUHV FRQGLo}HV ¿QDQFHLUDV SRGHP UHFRUUHU QR para as trabalhadoras domésticas, em um contexto de
todo ou em parte, aos serviços privados de cuidado, exploração ainda mais perverso.
tais como os jardins de infância e os/as cuidadores/as A sobrecarga das mulheres, especialmente
SUR¿VVLRQDLV daquelas que estão no beco sem saída dos arranjos
A solução mais comum no Brasil é, contudo, de cuidado predominante, determina a diferenciação
a contratação de trabalhadoras domésticas, o que de acesso e da permanência no mercado de trabalho,
UHPHWH jV WUDGLo}HV HVFUDYRFUDWDV H SDWULDUFDLV tornando-as “adaptadas” às diversas formas de
combinadas com o atual baixo custo dessa solução. SUHFDUL]DomR &DUORWR *RPHV KDMD YLVWD D
Vale destacar que, em 2009, apenas 26,4% das necessidade de combinar a jornada de trabalho dentro
trabalhadoras domésticas tinham carteira assinada, e fora do âmbito doméstico. Como relatam Bruschini
sendo que o rendimento médio aferido por elas estava 5LFROGL DR SHVTXLVDUHP DV SROtWLFDV GH
abaixo do salário mínimo (aquelas que não possuíam apoio às trabalhadoras:
carteira assinada recebiam, em média, R$ 321,10 por
mês) (IPEA et al., 2011). Essa realidade é, inclusive, Não foram poucos os relatos daquelas que abriram mão
de bons empregos, com todos os direitos assegurados,
induzida pela omissão do Estado brasileiro em relação PDV FRP H[WHQVDV MRUQDGDV SDUD ¿FDU FRP RV ¿OKRV
à equiparação de direitos dessas trabalhadoras aos(às) pequenos em casa ou para trabalhar em outra atividade,
como autônomas. (op. cit.: 114).
demais trabalhadores(as) (artigo 7º, parágrafo único
da CF-88).
Independente da classe social ou da qualidade da
As trabalhadoras domésticas são as bases de
inserção das mulheres no mercado de trabalho, as
VXVWHQWDomRGDUHODomRTXH+LUDWD .HUJRDW
IDPtOLDV UHD¿UPDPVH QR SDUDGLJPD QHROLEHUDO FRPR
denominam de delegação, que se materializa nas
LQVWLWXLomRFHQWUDOHDUWLFXODGRUDGDVGHPDLVLQVWLWXLo}HV
hipóteses em que as mulheres de classes médias e
e arranjos das práticas sociais de cuidado. Em verdade,
DOWDV EHQH¿FLDPVH GRV VHUYLoRV GDV WUDEDOKDGRUDV
nessa conjuntura há um recrudescimento do familismo
domésticas, transferindo a essas a execução do
como ideologia, o que consiste, como assevera
trabalho de cuidado de suas famílias, além das
Gama (2008), na reprivatização do bem-estar, com a
atividades de suporte ao cuidado. A capacidade
consequente indução das famílias a se responsabilizarem
de delegar o trabalho doméstico a terceiros (ou, no
com os cuidados das crianças, idosos e doentes. E o
FDVR D WHUFHLUDV SDVVD D VHU QD QRYD FRQ¿JXUDomR
familismo não pode ser atribuído apenas a uma omissão
da divisão sexual do trabalho, uma variável relevante
inconsciente do Estado, pois, como vimos anteriormente,
para ampliar ou diminuir as oportunidades de acesso
é da não-ação consciente do Estado brasileiro – no que
a postos de trabalho que oferecem boa remuneração e
diz respeito à ampliação de direitos trabalhistas –, que a
proteção social.
solução do trabalho doméstico remunerado se torna tão
Além de se tratar de uma solução vantajosa, pelo
vantajosa, a título de exemplo.
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do trabalho no universo familiar quanto no público Essa radicalidade potencial da questão do cuidado
(Bandeira, 2010). D¿QDVHFRPDSRVVLELOLGDGHGDFRQVWUXomRGDHIHWLYD
A democratização do cuidado é, na verdade, dotada igualdade de gênero, pois, como observa Beck (2010),
de potencialidade para gerar impactos mais profundos a igualdade concretizada entre mulheres e homens
do que a formulação de políticas públicas. Com efeito, não será alcançada nas estruturas sociais atuais, cuja
como o cuidado está associado à reprodução social e EDVH GH VXVWHQWDomR SUHVVXS}H D GHVLJXDOGDGH GH
à sustentabilidade da vida humana, sua compreensão gênero, mas apenas na medida em que todo o tecido
como problema político assume forte radicalidade, na institucional da sociedade for concebido e alterado de
medida em que questiona os paradoxos do cuidado DFRUGRFRPDVFRQGLo}HVQHFHVViULDV
e permite conceber um projeto político que liberte
mulheres e homens do círculo do cuidado.
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