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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Graduação em Psicologia - Unidade Ituiutaba


Psicologia nas Organizações

Análise de Entrevista – O Futuro do Trabalho Pós-Pandemia

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Docente: Dra. Fabiana Batistucci De Lima
Discente: Rebeca Moraes Reis Dias.

ITUIUTABA/MG
2021
O professor Ricardo Luiz Coltro Antunes é professor de sociologia na Universidade
Estadual de Campinas, possuindo diversas obras publicadas acerca do trabalho e suas
relações sociais.

Falando acerca de um possível cenário pós pandemia, o professor Ricardo Antunes,


acredita que o futuro do trabalho é condicionado necessariamente ao futuro da sociedade
e, sendo o futuro da sociedade imprevisível, torna-se esse futuro também imprevisível.
De acordo com ele, se no mundo do trabalho, as tendências prosseguirem como estavam
sendo pré estabelecidas no período antecessor à hecatombe pandêmica, o dinamismo
dominante será um cenário onde se inter-relacionem diferentes esferas de produção,
indústria, agroindústria, tecnologia e comunicação a um processo de aumento dos índices
de informalidade trabalhista ou mesmo, a formalização do trabalho em condições
adversas, através dos processos de pejotização (contratar o trabalhador que é uma pessoa
física, como pessoa jurídica), terceirização, empreendedorismo e atividades que assumam
formas distintas de um trabalho explicitamente. Esse processo pode resvalar em outros
setores, afetando a percepção acerca de diversos profissionais, como médicos, advogados,
professores, jornalistas e aos relacionados à produção de serviços mais ampla, o que
resultará consequentemente no fenômeno da Uberização do Trabalho, onde esses
profissionais passam a ser categorizados dentro da condição de prestadores de serviço e,
devido essa condição, podem sofrer ruptura do sistema ou legislação social protetora do
trabalho. Esse processo já tem se mostrado com o aumento de casos de trabalhadores
autônomos que sobrevivem através da popularização de serviços por aplicativos.

Levando em conta também, o que o professor denomina Indústria 4.0, com o limite
da internetização no mundo produtivo (internet das coisas, inteligência artificial, big data,
impressão 3D. rede 5G), há o risco de haver a internalização de trabalho altamente
avançado utilizando-se de um mundo tecnologicamente avançado, mas com abordagens
arcaicas de trabalho e informalidade massiva, resvalando na saúde e proteção do
trabalhador.

Já ouve, segundo Antunes, um aumento do desemprego formal e um aumento das


formas de trabalho sem amparo jurídico. Como tentativa de desviar do déficit econômico
ocasionado pela diminuição expressiva de produção, muitas empresas tomam como
alternativa o corte de trabalho, redução de jornada, redução de trabalho e a utilização de
mecanismos burocráticos, como a terceirização, a termitência e a pejotização.
Mesmo nos espaços mais qualificados, segundo o professor, citando Bourdieu, os
espaços que dispõem de mais capital, maior bagagem intelectual ou que participam da
esfera de tecnologias de informação e comunicação, ainda que possam ter maior chance
de sobrevivência diante de um cenário incerto, aplicando determinadas medidas de
contingência como a diminuição do salário, da jornada de trabalho, entre outros
processos, ainda podem ser afetados. A preocupação torna-se então, como a grande massa
de trabalhadores irá sobreviver sendo exposta ao mesmo cenário, estando à margem do
mundo das máquinas, informacional e digital. Um exemplo dado pelo professor é o
chamado “trabalho uberizado”, que, de acordo com ele, têm crescido exponencialmente
durante o momento pandêmico, onde as necessidades básicas de quem está em reclusão
doméstica tornam-se oportunidade de trabalho para entregadores, e outros profissionais
informais participantes do universo digital. O cenário mostra que, há uma tendência de
expansão de tais processos para outras áreas empregatícias, sendo uma alternativa viável,
emergencial, mas que traz certas debilidades com relação à regulamentação e às
condições de emprego.

O professor Ricardo Antunes, acredita que, o mundo do trabalho deva ser


repensado, pois a desigualdade poderá se ampliar nesse cenário e muitos dos setores
querem que os trabalhadores prossigam trabalhando ainda em meio ao cenário de
pandemia.

O professor Antunes coloca em questão o aspecto de que o trabalho informal é um


fenômeno normalizado, enquanto que observando as empresas, há todo um processo de
formalização que é exigido para sua existência. Além de fazer uma crítica acerca do
processo de domesticação do trabalho, onde as empresas “enxugam” seus gastos e
externalizam os serviços, algo similar ao processo de terceirização que algumas empresas
vinham adotando. Segundo ele, o trabalho dentro de casa dessociabiliza o indivíduo do
mundo externo, isolando-o das relações sociais e dos vínculos sindicais, tal característica
foi enfatizada por Goffman (1974) quando versou acerca da totalidade de algumas
instituições, nas quais, a inserção do indivíduo em suas atividades integrativas, destituía
a natureza individual e pessoalidade dos sujeitos em diferentes esferas laborais:

“Uma disposição básica da sociedade moderna é que o


indivíduo tende a dormir, brincar e trabalhar em diferentes
lugares, com diferentes coparticipantes, sob diferentes
autoridades e sem um plano racional geral. O aspecto central das
instituições totais pode ser descrito como a ruptura das barreiras
que comumente separam essas três esferas da vida. Em primeiro
lugar, todos os aspectos da vida são realizados no mesmo local
e sob uma única autoridade. Em segundo lugar, cada fase da
atividade diária do participante é realizada na companhia
imediata de um grupo relativamente grande de outras pessoas,
todas elas tratadas da mesma forma e obrigadas a fazer as
mesmas coisas em conjunto. Em terceiro lugar, todas as
atividades diárias são rigorosamente estabelecidas em horários,
pois uma atividade leva, em tempo predeterminado, a seguinte,
e toda a sequência de atividades é imposta de cima, por um
sistema de regras formais explícitas a um grupo de funcionários.
Finalmente, as várias atividades obrigatórias são reunidas num
plano racional único, supostamente planejado para atender aos
objetivos oficiais da instituição” (GOFFMAN, 1974, p.17).

Esse mesmo processo tem ocorrido durante o período de pandemia, no qual, as


diferentes esferas humanas parecem encontrar-se face à reclusão doméstica, que precisa
abarcar todas as atividades do indivíduo, não apenas as ações da vida privada, mas
também atividades de ordem pública, como o trabalho e as interações pessoais à distância.

No caso das mulheres, há ainda a amplificação do trabalho, as quais precisam


dividir-se entre os afazeres domésticos, auxílio ao estudo dos filhos (agora em condição
de regime escolar à distância) e executar as atividades trabalhistas.

Os trabalhadores informais enfrentam o dilema de se verem como necessários


enquanto prestadores de serviços, mas destituídos dos mesmos direitos trabalhistas de
outros trabalhadores. Sobre isso, Antunes explica que, houve um processo de
individualização no trabalho e dessa forma, muitos dos direitos e da dignidade intrínsecos
à condição humana de trabalhador passaram a ser desfalcados. Como alternativa a este
cenário, o professor sugere que haja uma diminuição na carga horária de trabalho, além
de readequar os trabalhadores aos seus devidos direitos. De acordo com ele, é possível
nesse período questionar ainda, a essencialidade das ações de trabalho e ao mesmo tempo
refletir acerca de qual futuro de trabalho se quer legar para as próximas gerações.

A instauração da pandemia também trouxe outros acontecimentos mais positivos;


com a diminuição das atividades do setor industrial, por exemplo, a poluição diminuiu
exponencialmente, possibilitando um contato mais saudável com ar. Antunes faz um
alerta acerca da possibilidade de aumento da criminalidade em função da diminuição de
alternativas para as populações mais pobres, relembra o conceito grego antigo de “revolta
da plebe”, em função da amplificação da desigualdade econômica e social, agravada pela
inadimplência em relação ao regime CLT.

Por fim, como solução aos trabalhadores informais, o professor Antunes prevê uma
aplicação dos direitos trabalhistas de forma integral, ou seja, os mesmos que o restante da
sociedade trabalhadora pode usufruir e, ainda que muitos desses direitos tenham perdido
a forma essencial de uso, é necessário lutar para readquiri-los, assim como reatribuir o
valor ao trabalho, inserindo novamente dignidade à atividade trabalhista, além de pensar
acerca das gerações futuras através de uma forma mais adequada e consciente de se
utilizar da natureza, do meio em que se vive e da estruturação das relações de trabalho no
universo pós pandemia.
Referências

ANTUNES, R. L. C. O Futuro do Trabalho Pós Pandemia – Entrevista. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=ZuPKv_C7uZw Acesso em: 08/03/2021.

GOFFMAN, E. Manicômios, Prisões e Conventos. Tradução: Dante Moreira Leite.


Editora: Perspectiva. São Paulo: 1974.

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