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Introdução
Redes, neste contexto, deixam de ser reduzidas à mera existência dos serviços
estatais ou eventualmente de instituições filantrópicas. Como nos aponta Ventura (2005),
as redes devem ser pensadas como uma forma de agir e conceber o cuidado, ou seja, o
que indica a existência de uma rede é muito mais a sincronia com a qual os seus
trabalhadores lançam-se ao compartilhamento de objetivos comuns (KINOSHITA,
2015) e não necessariamente a dimensão estrutural dos edifícios nos quais trabalham
seus operadores, ainda que o seu componente material não possa de maneira alguma ser
negligenciado (COUTO; DELGADO, 2016). Nas redes, são concretas as relações que
os trabalhadores estabelecem entre si, mesmo atravessadas por tensionamentos,
discordâncias e impasses. Em outras palavras,
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Novo Hamburgo, cidade próxima a Porto Alegre no Rio Grande do Sul, onde acontece a ação.
Entra em cena aqui o conceito de tecnologias do cuidado propostas por Merhy
e Feuerwerker (2009), nesse processo de invenção/produção de cuidado e inclusão aptas
a gerar protagonismo e pertencimento das crianças e adolescentes que habitam um
determinado território. Trilhamos as reflexões seguintes a partir dos escritos destes
autores, que nos emprestam o conceito de caixa de ferramentas e seus respectivos tipos
de tecnologias no contexto da produção de cuidados de saúde.
Por sua vez, o trabalho vivo em ato é a tarefa de criar, que possibilita a
fabricação de um novo produto. O processo produtivo, assim, demanda do homem uma
certa autonomia sobre os elementos que já estão dados e esse autogoverno está marcado
pela ação do seu trabalho vivo em ato sobre o que lhe é ofertado como trabalho morto e
às finalidades perseguidas.
Nosso olhar aqui pousa sobre o campo das relações do trabalhador com o seu
ato produtivo e o resultado do exercício do seu ofício, e com outros trabalhadores e
possíveis usuários de seus produtos. O lugar social do trabalhador, seus valores
culturais, seu pertencimento ou não ao processo produtivo vai ser crucial para
determinar se aquele trabalho se tornará um composto de atos cuidadores/educadores ou
uma sequencia de atos mecânicos e desimplicados.
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Ainda que a ideia de invenção das ferramentas pareça interessantíssima, pensamos que as ferramentas
são sim produzidas. Há o trabalho vivo de produzi-las este se apropria do trabalho morto de quem as
inventou. É como se fosse a 2ªgeracao: alguém inventou (trabalho vivo), alguém copiou (saber morto,
mas trabalho vivo de produzi-las) e o 3º na fila pegou a ferramenta pronta e fez novos produtos...
materiais e imateriais, e tais ferramentas fazem sentido de acordo com o lugar que
ocupam nesse encontro e conforme as finalidades almejadas.
Um dos autores fez uso da palavra para apresentar brevemente como seriam os
trabalhos. Os participantes leram e assinaram o termo de consentimento autorizando o
registro de suas falas. Em seguida, exibimos o vídeo “The Eyes of a Child” (os olhos de
uma criança3) o qual exibe uma situação onde pais e filhos são convidados a
“mimetizar” caretas feitas por outras pessoas numa tela projetada. Na cena final, uma
criança com deficiência é retratada fazendo careta e apenas as crianças reproduzem a
cena, focando o constrangimento dos pais e valorizando a naturalidade do olhar da
criança sobre a questão da deficiência. Por um problema operacional, as falas foram
registradas apenas em papel, não havendo uma gravação do áudio a partir do qual
pudesse haver transcrição ipsis literis.
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Ddisponível em https://www.youtube.com/watch?v=WB9UvjnYO90
Destacamos a seguir algumas narrativas que emergem nesta “reunião de rede” a
partir do vídeo disparador, pensando as formações discursivas e os efeitos dos atos
produtivos dos trabalhadores destas redes de sustentação e cuidado de crianças e
adolescentes, na busca da produção de lugar social para/com estas pessoas por meio do
imperativo do cuidado e da afirmação da vida como contraponto para as diversas
barreiras erguidas sobre as bases da exclusão em diferentes espaços da sociedade.
As falas ecoam o fazer da rede em movimento, autênticas vozes de cuidado e
produção de lugar social fundidas aos saberes da interdisciplinaridade. Destacamos este
mover que sustenta o trabalho vivo em ato de tecnologias de cuidado leves. Vozes de
diferentes profissionais se entrecruzam:
Considerações finais
REFERÊNCIAS
AMARANTE, Paulo Saúde mental e atenção psicossocial. [s.l.] SciELO - Editora
FIOCRUZ, 2007.
BRASIL. Caminhos para uma política de saúde mental infanto-juvenil. 1a. ed ed.
Brasília, DF: Editora MS, 2005.
COUTO, Maria Cristina Ventura; DELGADO, Pedro Gabriel Godinho. Presença viva
da saúde mental no território: construção da rede pública ampliada de atenção para
crianças e adolescentes. In: LAURIDSEN-RIBEIRO, E.; LYKOUROPOULOS, C. B.
(Eds.). in. O CAPSi e o desafio da gestão em rede. 1. ed. São Paulo: Hucitec Editora,
2016. p. 161–192.
DELEUZE, Gilles Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo: Editora 34,
2000.
MERHY, Emerson Elias. FRANCO, Túlio Batista. Por uma composição técnica do
trabalho em saúde centrada no campo relacional e nas tecnologias leves: apontando
mudanças para modelos técnico-assistenciais, Revista Saúde em Debate, 27(1), 316-
323,2003.