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1 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Even3 Publicações, PE, Brasil)

Sxxxs Costa, Luiz Claudio; Aguiar, Denison


Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia
[Recurso Digital] / organizado por Luiz Claudio Pires Costa
e Denison Melo de Aguiar – 1. ed. – Manaus: Editora Amazônia
Et Al., 2021.

DOI 10.29327/553011
ISBN 978-65-5941-470-3

1. Amazônia. 2. Direito Ambiental . 3. Meio-ambiente.


I. Costa, Luiz. II. Aguiar, Denison. III. Título.

CDD xxx.xx

Elaborado por Amanda Rodrigues – CRB-4/1241

A reprodução parcial ou total desta obra, por qualquer meio, somente será permitida
com a autorização por escrito da editora. (Lei nº 9.610 de 19.02.1998).
Luiz Claudio Pires Costa
Denison Melo de Aguiar
Organizadores

TEMAS ATUAIS DO DIREITO


AMBIENTAL NA AMAZÔNIA
1.ª Edição - Copyright© 2021 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Amazônia Et Al.
DOI: 10.29327/553011

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respectivo(s) autor(es). As normas ortográficas, questões gramaticais, sistema
de citações e referencial bibliográfico são prerrogativas de cada autor(es).

Editor-Chefe: Mariana Baldoino


Revisão: Erison Soares e autores
Capa e Projeto Gráfico: Franklin Carioca Cruz

Conselho Editorial
Presidente
Dr Wagner de Deus Mateus
Sec. de Educação do Amazonas (SEDUC, Manaus/AM)
Membros
Dra Aldeniza Cardoso de Lima
Universidade Federal do Amazonas (UFAM, Manaus/AM)
Msc Denison Melo de Aguiar
Universidade do Estado do Amazonas (UEA, Manaus/AM)
Msc Eduardo Costa
Faculdade Estácio do Amazonas (Manaus/AM)
Dra Klenicy Kazumy de Lima Yamaguchi
Universidade Federal do Amazonas (UFAM, Coari/AM)
Dra Klaudia Sadala
Universidade da Amazônia (Unama, Belém/PA)
Dra Rosilene Gomes da Silva Ferreira
Universidade do Estado do Amazonas (UEA, Manaus/AM)
Dra Rubia Alegre Ferreira
Universidade do Estado do Amazonas (UEA, Manaus/AM)
Sumário

PREFÁCIO .................................................................................................................................................. 06

1 A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E O DIREITO AMBIENTAL .............................................. 08


DOI: 10.29327/553011.1-1

2 A DENOMINADA MATRIZ ECONÔMICA-AMBIENTAL DO AMAZONAS


E A CONSECUÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ................................................ 27
DOI: 10.29327/553011.1-2

3 REPERCUSSÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS NO TERRITÓRIO DA REGIÃO


CENTRO-NORTE (SINOP)/MT, AMAZÔNIA LEGAL: UMA ANÁLISE DA DINÂMICA
DEMOGRÁFICA E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL ............................................................ 40
DOI: 10.29327/553011.1-3

4 MORADIA PERIFÉRICA NA AMAZÔNIA: CONSEQUÊNCIA


DE UMPROCESSO HISTÓRICO DE EXPLORAÇÃO .................................................................... 62
DOI: 10.29327/553011.1-4

5 OS REFLEXOS DA LEI SANSÃO E AS CRÍTICAS AO ESPECISMO


LEGISLATIVO APLICADO NA LEI Nº 14.064/2020 ........................................................................ 81
DOI: 10.29327/553011.1-5
Prefácio

A cada dia que passa fica mais evidente a necessidade de preservação do nosso
ambiente. A mídia notifica várias alterações dos recursos naturais mundialmente, ou
seja, o aumento da temperatura climática, seja nas alterações do solo, das florestas
ou na redução de nossas águas. Alterações essas que trazem em diversas situações
prejuízo para toda a população.
Dessa feita, se apresenta cada vez mais obrigatório trazer a toda população o
conhecimento das causas dessas alterações, bem como as medidas que podem ser
tomadas no sentido de evitar que ocorram, que continuem ou aumentem sua abrangência.
Uma grande arma contra todos esses problemas no meio ambiente é o
conhecimento, que precisa ser produzido com comprometimento, verdade e com a
profundidade necessária para se tornar ponto de apoio para a melhoria da qualidade de
vida de todos os seres humanos.
Sua disseminação é essencial para que mentalidades possam ser mudadas e,
consequentemente, as atitudes de todos, pois o mínimo de cuidado ou de atenção ao
ambiente pode trazer resultados benéficos e impedir sua maior e mais rápida degradação,
mesmo que a longo prazo.
Conceitos como sustentabilidade, precaução, preservação, dentre outros, devem
ser disseminados de forma simples e objetiva, de forma que as pessoas de todos os níveis
de escolaridade possam tomar conhecimento de que suas atitudes podem melhorar ou
piorar o meio ambiente em que vivemos, preservando os recursos naturais necessários
para nossa sobrevivência. A propagação desse conhecimento reforça a execução da
educação ambiental como instrumento auxiliar na preservação e manutenção dos
nossos recursos naturais.
É com esse intuito de auxiliar na produção e propalação desse conhecimento
especializado para a proteção do meio ambiente e com ênfase específica no Direito
Ambiental, confeccionado de forma fundamentada e realista que surge a presente obra.

6 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Temas como a caracterização da improbidade administrativa ambiental
como meio de moralização das atividades de fiscalização exercidas pelo Estado,
principalmente naquelas mais danosas ao meio ambiente é fator de importância para
o desenvolvimento da proteção na Amazônia. Também discute-se o desenvolvimento
sustentável como mecanismo de implantação da matriz econômica ambiental, auxílio
na manutenção da circulação de mercadorias e serviços na área amazônica como
possibilidade de manter a economia combinando a proteção ambiental.
Tendo em vista a grandiosidade do território amazônico, nem sempre há a
compatibilização das políticas públicas em toda a sua área, quanto à sua ocupação
e desenvolvimento da região, sendo necessário estudos sobre o tema para auxílio ao
poder público. Essa ocupação influi diretamente na ocupação urbana, influenciando na
construção de moradias e influenciado pelos processos históricos de cada local.
Finalmente, é necessário acompanhar a evolução das necessidades da população,
as modificações da legislação, evitando a exploração das espécies animais, tendo em
vista sua proteção constitucional.
É com a certeza de que estas discussões servirão de base para a continuidade de
estudos, aprofundamento de temas atuais e apoio àqueles que estejam iniciando seus
passos na vida acadêmica, que os apresentamos, apostando na efetividade do Direito
Ambiental e na melhoria da qualidade do meio ambiente, os quais podem trazer uma
grande melhora para as nossas e as futuras gerações.

Luiz Claudio Pires Costa


Denison Melo de Aguiar
(Organizadores)

7 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


1.
A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
E O DIREITO AMBIENTAL

COSTA, Luiz Claudio Pires1

INTRODUÇÃO

A improbidade administrativa é caracterizada pela execução do serviço público


ou atividade de responsabilidade do Estado de forma a desviar-se da moralidade, do
interesse público e até mesmo da legalidade.
A improbidade não é exclusividade do Direito Administrativo, como tal, vários
autores já se referem à Lei nº 8.429/92, como sendo a Lei Geral de Improbidade
Administrativa, sendo a mesma de observância obrigatória para toda a Administração
Pública, independentemente de sua área de atuação.
As bases do Direito Administrativo são de observância obrigatória à toda
Administração Pública, principalmente na execução das atividades determinadas pela
Constituição Federal de 1988, a qual também define os princípios a serem observados
na execução dessas atividades.
Por isso, há a necessidade de que a conduta dos agentes das diversas esferas do
Serviço Público seja pautada por esses princípios e bases, atendendo às determinações
constitucionais implícitas e explícitas, mantendo o foco sempre no interesse público,
na moralidade e na probidade, fazendo, assim com que a legalidade dos atos da
administração a mantenham imaculada na execução de suas atividades.
1 Advogado, Mestre em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas – UEA
e docente do curso de Graduação em Direito da UNINORTE e da UNIP. http://lattes.cnpq.
br/7515847616332301. https://orcid.org/0000-0003-2547-2648. E-mail: luizcpcosta@hotmail.com

8 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


O DIREITO ADMINISTRATIVO E A PRESERVAÇÃO AMBIENTAL

O Direito Administrativo é um sistema jurídico de princípios, normas e


regulamentos que surgiu com o Estado, quando este passou a ter uma organização
específica para execução de suas atividades, a fim de disciplinar as relações entre a
Administração Pública e seus administrados e desta com os cidadãos.
Ele é um corpo de regras e princípios próprios, constituindo um sistema que ganha
autonomia, se diferenciando do Direito Privado por resolver problemas que não são
propostos, mas também os propostos, dando-lhes soluções adversas das que são atribuídas
pelo Direito Civil.
Conforme definição de Di Pietro (2012), Direito Administrativo é o ramo do
direito que tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas que
integram a Administração Pública, a atividade jurídica não contenciosa que exerce e os
bens de que se utiliza para a consecução de seus fins, de natureza pública.
A Administração Pública pode ser entendida em dois sentidos específicos, no
primeiro que compreende todos os órgãos e agentes existentes e necessários para
realização da função estatal, ou seja, a função administrativa, e o outro que confunde
a administração com sua própria função administrativa, aquelas inerentes ao Poder
Executivo, o planejamento e a execução das atividades necessárias à consecução de
seus objetivos.
Subjetivamente devemos considerar as três funções precípuas do Estado, a legislativa,
a judiciária e a executiva ou administrativa, sempre lembrando que, apesar das divisões
de poderes, a própria Constituição Federal limitou essa independência, determinando a
harmonia entre os mesmos, isso implica dizer que deu a cada Poder a predominância de
uma atribuição. Dessa forma, assegura a todos a possibilidade de execução limitada de cada
atribuição inerente ao outro, visando a manutenção dessa independência e possibilitando a
auto administração de cada um.
Assim, cada um dos Poderes, além de exercer sua função típica com predominância
sobre os demais, também poderá executar suas funções atípicas de forma reservada e
específica. Um exemplo disso é que, apesar da função típica do legislativo de legislar,
também tem necessidade de se administrar, a fim de que possa executar corretamente
suas atividades, licitando, contratando, pagando, demitindo, também possuindo
necessidade de utilizar internamente parte da função típica do judiciário, iniciando
processos disciplinares, Comissões Parlamentares de Inquérito, para investigar ou
punir administrativamente seus próprios integrantes.

9 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Como Administração Pública é o objeto de estudo do Direito Administrativo,
concordamos com Di Pietro (2012, p. 55) quando diz que: “a Administração Pública
abrange as atividades exercidas pelas pessoas jurídicas, órgãos e agentes incumbidos de
atender concretamente às necessidades coletivas; corresponde à função administrativa,
atribuída preferencialmente aos órgãos do Poder Executivo.”
A Administração Pública é a responsável pela execução direta ou indiretamente do
Serviço Público, visando a satisfação das necessidades da coletividade que representa,
abrange atividades essenciais ou de grande relevância que podem ser exercidas com
exclusividade pelo Estado.
Sua composição não está restrita somente ao executivo, como vimos anteriormente.
Predominantemente cada Poder exerce sua função típica, que será restrita somente
àquele Poder com toda sua plenitude e abrangência. Com a administração não é diferente,
pois os demais poderes também exercem, além de suas atribuições típicas, algumas
funções exclusivamente administrativas, necessárias para a gestão do próprio Poder.
Essas funções serão exercidas pelos órgãos administrativos que compõem os Poderes
Legislativo e Judiciário, que poderão ser compostos pelos próprios parlamentares e
magistrados para a confecção dos atos administrativos necessários à execução de sua
atividade típica.
Dessa forma, é correto afirmar que a Administração Pública é composta por todos
os órgãos integrantes das pessoas jurídicas de direito público interno (componentes
da união, dos estados, Municípios e Distrito Federal) que a lei confere diretamente o
exercício das funções administrativas, dela fazendo parte todos os Poderes, bem como
àquelas pessoas jurídicas de direito público ou privado, criadas pelo Estado para realização
de atividade específica (autarquias, empresas públicas, sociedade de economia mista e
fundações públicas) e mais flexível.
O nascimento do Direito Administrativo foi concebido baseado em duas ideias
opostas, uma delas referente à proteção dos direitos individuais dos cidadãos do Estado,
a outra delas referente à necessidade de satisfação dos interesses coletivos, que recebe
poderes para limitação de direitos individuais a fim de alcançar o bem estar coletivo ou
a melhor execução dos serviços públicos.
A fim de alcançar esses objetivos, como toda ciência, há necessidade de alicerça-
lo em bases sólidas, estruturando-se nos princípios as condições fundamentais, suas
proposições básicas, sendo alguns próprios de outros ramos do direito, entretanto,
alguns específicos do próprio ramo.
Três desses princípios são específicos para o nosso estudo, são: os da legalidade,

10 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


da supremacia do interesse público sobre o particular e o da moralidade, dos quais,
dois são mencionados expressamente no texto da Constituição Federal de 1988 em seu
art. 37, como sendo de submissão obrigatória pela Administração Pública, seja direta
ou indireta.

O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Este é um princípio limitador do Estado, tendo nascido com o Estado


Democrático de Direito, pois a lei ao defini-lo também determina seu limite, para
que a Administração Pública exerça suas atividades e tais direitos com a finalidade de
beneficiar a coletividade.
A Administração Pública fica limitada a somente executar algo que a lei permita
e até o limite que ela determine, diferentemente do Direito Privado, onde é permitido
ao particular executar tudo o que a lei não proibir. Corrobora tal entendimento Di
Pietro (2012), quando ensina que a Administração Pública não pode, por simples
ato administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor
vedações aos administrados; para tanto, ela depende de lei.
É a diretriz básica que deve pautar a conduta do agente da administração, tendo
em vista ser a lei o autorizador e o limitador das atividades da Administração, visando
a manutenção dos direitos do cidadão e servindo como controle para a correção das
condutas executadas em dissonância da lei, eliminando, dessa forma, qualquer tipo de
ilicitude.
Tal princípio expressa uma relação de vinculação do Poder Executivo ao
Poder Legislativo, tendo em vista que a função específica do legislativo é criar a lei,
necessária à concessão ou da determinação da forma de execução de direitos, os quais,
geralmente correspondem à um serviço público. Este serve como ordem para que o
Poder Executivo ao efetuar a atividade administrativa proporcione a sua execução
dentro dos parâmetros instituídos por aquele Poder, sendo por isso, o princípio da
legalidade uma legitimação da atividade administrativa a ser executada dentro dos
limites determinados.
Há uma tendência atual de alargamento desse princípio visando o englobamento
não somente da lei, mas também de princípios e valores, limitando ainda mais a
discricionariedade e dotando de uma maior ampliação o controle judicial. Tal tendência
toma assento principalmente pelos dispositivos iniciais da Constituição Federal de
1988, os quais contemplam vários princípios e valores que se dirigem a todo o Estado,

11 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


não só ao Poder Executivo, mas a todos os Poderes da União, exigindo dos mesmos
uma submissão ao Direito.
Também se encontra no princípio da legalidade o fortalecimento da participação
do cidadão, que nem sempre é efetivo mas possui uma previsão constitucional,
enaltecendo a democracia participativa através de vários instrumentos nele inseridos,
dentre eles o atual direito à informação.
A processualização do Direito Administrativo também demonstra tal alargamento
e o atendimento a preceitos constitucionais que visam à proteção de direitos individuais,
sendo exigida sua observância em tais processos para manutenção de sua legalidade,
direitos como a ampla defesa, o contraditório, bem como o da publicidade. Assim,
garantem a manutenção da legalidade, criando procedimentos para uniformização dos
processos administrativos, mantendo a segurança administrativa.
Esses são somente alguns pontos que demonstram tendências atuais referentes a
um dos princípios básicos, não só do Direito Administrativo, mas do Direito como um
todo e do próprio Estado.

PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO

Esse princípio deve ser usado como inspiração para o legislador no momento
da elaboração da lei, também deve orientar o administrador público em sua atuação na
execução do Serviço Público.
Diferentemente do conteúdo do Direito Privado que normatiza o interesse
individual, no Direito Público as normas visam resguardar o interesse público, o bem
estar coletivo, se este objetivo não estiver presente nas atuações do Estado, esta atuação
estará configurada no desvio de finalidade.
Demonstra esse princípio que o destinatário final da atividade administrativa não
é o Estado ou o indivíduo, mas o grupo social como um todo. E é claro que nas relações
sociais entre o Estado e o particular poderão ocorrer conflitos, contrapondo interesse
privado e público, havendo de prevalecer o interesse público, para representação da
manutenção de um grupo, em que o indivíduo é também parte integrante.
O exemplo de sua utilização pode-se demonstrar através da utilização do Poder
de Polícia do Estado, que tem o poder de restringir algumas atividades individuais em
detrimento da manutenção de um direito extensivo a uma coletividade.
Como a Administração Pública tem por objetivo a criação e a manutenção das
mínimas condições de convivência em sociedade, podemos também exemplificar essa

12 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


supremacia do interesse público quando, para construção de um Posto de Saúde ou uma
Escola em determinada localidade, visando o atendimento das necessidades básicas
daquela parcela da população, torna-se necessária a desapropriação de um terreno ou
imóvel de um particular, a fim de que possa ser construído ou implementado o Posto
ou a Escola. Nesse sentido, a necessidade de uma coletividade está acima do interesse
de um só indivíduo.
Já no final do século XIX, dentre algumas transformações ocorridas quanto ao
interesse público, ocorreu uma ampliação do conceito de serviço público. Também
surgiram no plano constitucional preceitos que autorizam a interferência do Estado
na vida econômica e no direito de propriedade, reafirmando a supremacia do interesse
público, principalmente com a crescente preocupação com os interesses difusos, como o
meio ambiente e o patrimônio histórico e cultural.
Carvalho Filho (2012, p. 32) orienta:.
A existência de direitos fundamentais não exclui a densidade do princípio.
Este é, na verdade, o corolário natural do regime democrático, calcado, como
por todos sabido, na preponderância das maiorias. A “desconstrução” do
princípio espelha uma visão distorcida e coloca em risco a própria democracia;
o princípio, isto sim, suscita “reconstrução”, vale dizer, adaptação à dinâmica
social, como já se afirmou com absoluto acerto.

Se o interesse público é incumbido ao Estado tutelar, tal princípio também deve


inspirar o legislador como antes já dito, a fim de que crie mecanismos para sua utilização
e seu controle, corroborando tal entendimento citamos os ensinamentos de Di Pietro
(2012, p. 67):

Se a lei dá à Administração os poderes de desapropriar, de requisitar, de


intervir, de policiar, de punir, é porque tem em vista atender ao interesse
geral, que não pode ceder diante do interesse individual. Em consequência,
se, ao usar de tais poderes, a autoridade administrativa objetiva prejudicar
um inimigo político, beneficiar um amigo, conseguir vantagens pessoais para
si ou para terceiros, estará fazendo prevalecer o interesse individual sobre
o interesse público e, em consequência, estará se desviando da finalidade
pública prevista na lei. Daí o vício do desvio de poder ou desvio de finalidade,
que torna o ato ilegal.

Dessa forma fica reafirmado que a prevalência do interesse público não pode se
dissociar de seu objetivo, pois visa regular uma harmonia entre Estado e indivíduo.

13 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


PRINCÍPIO DA MORALIDADE

Segundo Di Pietro (2012, p. 77):

Nem todos os autores aceitam a existência desse princípio, alguns entendem


que o conceito de moral administrativa é vago e impreciso ou que acaba por
ser absorvido pelo próprio conceito de legalidade.
No entanto, antiga é a distinção entre moral e direito, ambos representados
por círculos concêntricos, sendo o maior correspondente à moral e, o menos,
ao direito. Licitude e honestidade seriam os traços distintos entre o direito e
a moral, numa aceitação ampla do brocardo segundo o qual non omne quod
licet honestum est (nem tudo o que é legal é honesto).

Tal princípio é referido expressamente no texto constitucional, tendo sido


muito bem recepcionado pela coletividade, que assistia por diversas vezes, mandos
e desmandos na administração da coisa pública, verificando que a existência de maus
administradores na busca de seus interesses pessoais e que começou a ser reduzida
com sua ênfase, fazendo com que os preceitos morais retornassem ao primeiro plano e
não ficassem relegados ao esquecimento.
Grandes doutrinadores como Mello (2007, p. 115) explicam que:

De acordo com ele, a Administração e seus agentes têm que atuar na


conformidade de princípios éticos. Violá-los implicará violação do próprio
direito, configurando ilicitude que sujeita a conduta viciada à invalidação,
porquanto tal princípio assumiu foros de pauta jurídica, na conformidade do
art. 37 da Constituição.

Meirelles (2008) corrobora tal entendimento quando afirma que o certo é que a
moralidade do ato administrativo, juntamente com a sua legalidade e finalidade, além
da sua adequação aos demais princípios, constituem pressupostos de validade, sem os
quais toda a atividade pública será ilegítima. E termina orientando (2008, p. 92):

O inegável é que a moralidade administrativa integra o direito como elemento


indissociável na sua aplicação e na sua finalidade, erigindo-se em fator de
legalidade. Daí porque o TJSP decidiu, com inegável acerto, que ‘o controle
jurisdicional se restringe ao exame da legalidade do ato administrativo; mas
por legalidade ou legitimidade se entende não só a conformação do ato com
a lei, como também à moral administrativa e com o interesse coletivo’. Com
esse julgado pioneiro, a moralidade administrativa ficou consagrada pela
justiça como necessária à validade da conduta do Administrador Público.

Podemos adotar um conceito de que há uma moral institucional que vem imposta
pela lei que é confeccionada pelo legislativo, mas também há uma moral administrativa

14 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


imposta pela própria Administração para sua atuação, seja interna ou externa, inclusive
na sua discricionariedade.
Isso é exemplificado pela lei n° 1.171, de 22 de junho de 1994 que aprovou o
Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil Federal, reafirmando tal princípio
quando dispõe que “o servidor público não poderá jamais desprezar o elemento ético de
sua conduta”. Continua explicitando: “Assim, não terá que decidir somente o legal e o
ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno,
mas principalmente entre o honesto e o desonesto, consoante a regras contidas no art. 37,
caput e § 4° da Constituição Federal”.
Ensina ainda, Meirelles (2008, p. 93):

De certa forma, a moralidade se compara à “boa fé objetiva” do Direito


Privado, na qual é vista como uma “norma de comportamento leal” ou um
“modelo de conduta social, arquétipo ou standard jurídico”, ao qual cada
pessoa deve ajustar a própria conduta.

Concluindo, somos obrigados a citar a afirmação de Di Pietro:

A imoralidade administrativa surgiu e se desenvolveu ligada à ideia de desvio


de poder, pois se entenderia que em ambas as hipóteses a Administração
Pública se utiliza de meios lícitos para atingir finalidades metajurídicas
irregulares. A imoralidade estaria na intenção do agente (DI PIETRO,
2012, p. 78).

A ideia antiga de que por ser a moralidade administrativa uma disciplina interna,
somente poderia seu controle ser feito internamente caiu, pois foi verificado que a
moralidade, com todas as suas nuances foi inserida no próprio conceito de legalidade
administrativa, entretanto o próprio texto constitucional se incumbiu de tratá-los
como autônomos, caracterizando a improbidade administrativa como motivadora das
penalizações que impliquem em ofensa à moralidade administrativa.
Podemos resumir dizendo que, quando em matéria administrativa encontrar
comportamento da administração ou do administrado na relação jurídica existente,
mesmo dentro da legalidade, que ofenda à moral, aos bons costumes, às regras de boa
administração, aos princípios de justiça e de equidade e a ideia de honestidade, estará
incorrendo em ofensa ao princípio da moralidade administrativa.
Afirma Di Pietro (2012, p. 79) que: “Embora não se identifique com a legalidade
(porque a lei pode ser imoral e a moral pode ultrapassar o âmbito da lei), a moralidade
administrativa produz efeitos jurídicos, porque acarreta a invalidade do ato, que pode

15 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


ser decretada pela própria administração ou pelo Poder Judiciário”.
Ao efetuar uma comparação entre moralidade e probidade, em um primeiro
momento podemos achar que significam a mesma coisa, mas na maioria das doutrinas
são referidas separadamente, quando se refere à improbidade como infração determinada
pelo ordenamento jurídico distancia-se essa igualdade, pois a improbidade possui um
sentido muito mais amplo e preciso, abrangendo não somente os atos desonestos ou
imorais, mas principalmente os ilegais, sendo verificado na lei n° 8.429, de 2 de junho
de 1992 (Lei de Improbidade Administrativa), que a lesão à moralidade administrativa
é apenas uma das diversas hipóteses de atos de improbidade previstos.

A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Hoje a improbidade já é considerada como uma das espécies de má gestão


pública, podendo ser tanto dolosa quanto culposa. A atuação do agente administrativo,
desviando-se de uma conduta ética e proba, normalmente o faz incorrer em ato de
improbidade.
Apesar de gozarem de direitos fundamentais, por também serem cidadãos,
direitos como a intimidade e à privacidade, os agentes públicos podem até praticar atos
imorais, desde que os mesmos não invadam os limites da ética privada. Entretanto, sob
a ótica da ética pública, pela qual deverá ser analisada a improbidade administrativa, o
não cumprimento de valores inerentes à Administração Pública e aos serviços públicos
é que a caracterizaria. Nesse sentido, a improbidade não pode ser considerada uma
mera imoralidade, mas sim uma imoralidade qualificada pelo Direito Administrativo.
Essas exigências éticas mais intensas para o setor público ingressaram no
ordenamento jurídico brasileiro, explicitamente com a Constituição Federal de 1988
que tutelou a Administração Pública criando diretrizes que fundamentaram o Estado e
orientaram para a forma de tratamento dos bens públicos como um todo, o que alcançou
os agentes públicos.
Sua tentativa de coibir ilegalidades e abusos de poder também inseriu
mecanismos na Carta Constitucional, ampliando as fontes de deveres públicos quanto
à improbidade, preceitos dos art. 5°, LXVIII, LXIX, LXXIII, art. 37 caput, § 4°, art.
52, I e 85, V, aduzem a ética institucional, ou seja, moralidade administrativa, além
de outros preceitos que o fazem de forma indireta, sendo dessa forma demonstrada a
intenção e a preocupação do constituinte em resguardar o nível moral daqueles que
devem ocupar os cargos estatais, incluindo, inclusive, exigências de idoneidade moral

16 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


e reputação ilibada para ocupação desses postos.
Nesse sentido, explica Medina Osório (2005, p. 89):

Anote-se que a moral administrativa é considerada pela doutrina, fonte do


dever de probidade administrativa, que se encontra no art. 37, § 4°, da CF,
porque se trata – esse dever – de uma espécie de moralidade. Probidade é
espécie do gênero moralidade administrativa. Improbidade é imoralidade
qualificada. Essa é uma assertiva doutrinária bastante comum e geralmente
aceita, salvo algumas exceções.

Todas as nossas constituições desde o início da República contemplaram o crime


de responsabilidade do Presidente e alguns servidores do Estado de alto escalão, já
demonstrando a preocupação com a coisa pública. Desde logo, os abusos e omissões
tiveram sua proibição regulada teorizando a responsabilidade pessoal dos homens
públicos, sendo mantida tal regulação também nas constituições subsequentes,
denotando a preocupação da manutenção da probidade administrativa no Serviço
Público, bem como no Estado.
Mas foi com a Emenda Constitucional n° 1/69 que surgiu a previsão de Lei
Complementar para estabelecer as condições de elegibilidade, considerando a probidade
administrativa e a moralidade para o exercício da função pública, prevendo também
mecanismos de combate à corrupção.
Foi com a Constituição Federal de 1988 que foi utilizado um modelo mais
alicerçado no Direito Administrativo. O que nas constituições anteriores era tratado
como fenômeno político-penal, não havendo crimes contra a probidade administrativa
pública. A partir de 1988 seu tratamento passou a ser ilícito de responsabilidade e
extrapenal.
Apesar de somente em 1988 a improbidade haver adquirido status constitucional,
infra constitucionalmente a matéria não é nova. Claro que o tratamento não é totalmente
igual, mas desde 1892, através do Decreto n° 30, de 8 de janeiro de 1892, já apontava
no seu quinto capítulo atos de improbidade administrativa, considerando como conduta
ímproba a “desídia habitual no exercício das funções, em 1950 a Lei n° 1.079, de 10 de
abril de 1950 define com crime de responsabilidade a prática de atos contra a probidade
na administração, tipificando ilícitos de responsabilidade em atos de improbidade.
Em 1958, a Lei n° 3.502 ateve-se aos casos de enriquecimento ilícito e corrupção,
prevendo como sanção apenas a perda dos bens adquiridos ilicitamente, numa clara
tentativa de tornar-se mecanismo de combate à corrupção no sistema brasileiro.
Surge em 2 de junho de 1992 a Lei n° 8.429, para regulamentar o art. 37, §

17 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


4°, da Constituição Federal de 1988, substituindo uma legislação que se preocupava
exclusivamente em combater o enriquecimento ilícito, ampliando seu objeto e
apresentando três grandes tipos sancionadores: as condutas de enriquecimento ilícito;
as condutas de lesão ao erário e condutas de lesão aos princípios que regem a gestão
pública. Mesmo com uma grande amplitude, tal regramento veio para melhor municiar
os órgãos fiscalizadores e, consequentemente, coibir determinadas condutas de
improbidade administrativa de forma mais abrangente.
Essa definição da lei é meramente exemplificativa, deixando com que qualquer
ato que atente contra os princípios da Administração Pública seja sancionado pela lei,
não somente contra o princípio da moralidade, mas de qualquer um deles, sendo tal ato
configurado pela lei como de improbidade administrativa.
Seu objetivo é sancionar, evitar que o agente atue com falta de probidade, de
forma desonesta ou incompetente, de forma incapaz de administrar a coisa pública
ou de utilização de suas competências funcionais. Os agentes na execução de suas
atividades devem observar os deveres de cuidado, de diligência e de correção ética e
jurídica, ou seja, dever de meio ou de atividade e não de resultado.
Entende dessa forma Medina Osório (2007, p. 127):

A ilicitude é globalmente considerada desde distintas valorações, inclusive


tendo em conta as diversas dimensões de responsabilidades: penal,
administrativa, civil, política. Além disso, dentro do direito administrativo,
já o dissemos, existem várias modalidades de controle da Administração
Pública e de seus agentes. A ilicitude administrativa tem que ser valorada em
níveis distintos.

Alega o autor que a simples ilegalidade ou o desvio do poder são mais superficiais
e não igualáveis à improbidade administrativa, asseverando que tais atos de ilicitude
deveriam ser sancionados com mais gravosidade a fim de exigir um mínimo de
preservação da ética na Administração Pública.
Conforme determinado na Lei n° 8.429/92 em seu art. 4°: “os agentes públicos
de qualquer nível ou hierarquia estão obrigados a velar pela estrita observância dos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos
que lhes são afetos”. Sendo citados de forma somente exemplificativa, verificamos que
outros princípios também se encontram interligados a estes e que juntos, presidem à
Administração Pública, criando um conjunto de deveres de grande complexidade.
Ensina Medina Osório (2007, p. 177), ainda:

A Improbidade Administrativa não guardaria relação com a dimensão puramente

18 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


objetiva da moral administrativa, tanto que nem toda a imoralidade administrativa
seria uma improbidade, mas sim com seus aspectos de censura ética e de
valoração de comportamentos proibidos, quer dizer, com a dimensão subjetiva
da imoralidade administrativa.

Isso faz com que seja necessário surgir o dever de lealdade administrativa,
institucional, trazendo consigo a censura desse ato ou comportamento, de forma urgente,
a fim de que seja juridicamente sancionada essa conduta contrária aos preceitos éticos
e legais, na tentativa de extinguir ou reduzir tais atos a níveis mínimos.
Lembrando o velho ditado popular: “errar é humano”, fica explícito não existir
o agente público perfeito, mas apesar de cometer erros, pode o agente dessa forma,
mesmo não sendo exemplar, mostrar-se digno de probidade, mesmo sendo considerado
profissionalmente deficiente. O agente público leal, de acordo com a visão de probidade,
não é aquele que jamais infringiu seus deveres públicos, mas aquele que não chega a
determinado nível de agressão, culposa ou dolosa à probidade.
A Lei de Improbidade Administrativa tem sido considerada por alguns como um
Código Geral de Conduta para os Agentes Públicos, pois é de caráter nacional e segue
os preceitos determinados pela Constituição Federal de 1988 em seu art. 37, § 4°,
possuindo abrangência a todos os agentes do setor público, não sendo feita qualquer
tipo de ressalva.
Essa lei, conforme Medina Osório (2007, p. 198):

Regula as penas aplicáveis aos agentes públicos nos casos de má gestão


pública com enriquecimento ilícito, lesão material ao erário ou lesão formal às
normas da Administração Pública, no exercício de mandato, cargo, emprego
ou ofício na Administração Pública direta, indireta ou institucional e dispões
sobre outras providências.

A lei autoriza com amplitude uma tipificação de atos de improbidade que


ultrapassa o campo do enriquecimento ilícito, permitindo o alcance de atos culposos
e não somente os dolosos, tendo um objeto muito mais amplo que somente o combate
à corrupção, tornando-se um verdadeiro instrumento de combate às desonestidades e
ineficiências funcionais dos executores de serviços públicos.
Visando a proteção do Estado em sentido amplo, todos aqueles que executam
serviço público necessário para o bem comum, estabeleceu tal determinação em seu
art. 1° e seu parágrafo único, não deixando dúvidas de sua abrangência.
Embora seu foco seja a esfera administrativa, pode-se entender que a aplicabilidade
da Lei n° 8.429/92, se estende à todos os Poderes do Estado, em suas atividades típicas,

19 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


ou seja, além da administrativa, a legislativa e a judiciária.
Sua amplitude se inicia na gestão, que é considerada como toda atividade
executada, seja de forma temporária ou permanente, remunerada ou não, efetuada
em nome do Estado ou à seu serviço, isso caracteriza a ação de administrar tanto
os negócios quanto os interesses públicos, considerando também as competências
discricionárias e suas peculiaridades.
Isso não quer dizer que os funcionários ou servidores dos escalões hierarquicamente
inferiores não sejam atingidos pela lei, apesar de não possuírem poder de mando, suas
competências determinadas e seus atos devem considerar a estrita legalidade e supõem os
demais deveres que se integram também ao dever de probidade na execução de seus atos.
Medina Osório (2007), corrobora o entendimento de tal amplitude do que chama
de “Lei Geral de Improbidade Administrativa” (lei n° 8.429/92) ensina:

Em todo caso, note-se que, ao apanhar a gestão pública, a LGIA tutela todos
os seus possíveis e previsíveis desdobramentos, em todos os seus níveis e
patamares hierárquicos. Isto equivale a dizer que estará sujeito aos rigores
da LGIA desde o mais humilde dos servidores até o mais alto cargo do Poder
Público. Tal constatação está longe de significar passaporte às distorções
hermenêuticas, com equiparações descabidas entre agentes públicos dotados
de atribuições e responsabilidades marcadamente diferenciadas. O que
se está a frisar é que, ao abrigar a repressão à gestão pública, a LGIA não
tipifica apenas condutas de administradores ou gestores, mas também de
funcionários e agentes menos aquinhoados nos degraus hierárquicos do setor
público. Quem pode o mais, pode o menos, essa foi a lógica desse diploma,
que ensejou uma universalização do princípio da responsabilidade.
(MEDINA OSÓRIO, 2007, p. 204)

Nesse sentido, podemos entender que independente do poder ou do grau de


hierarquia do servidor ou agente público, todos, sem qualquer restrição, estão sob a
égide da Lei de Improbidade Administrativa, pois todos devem ter em sua conduta
profissional a ética e a legalidade pautando-a e limitando-a.

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA AMBIENTAL

Os agentes públicos dos órgãos públicos da administração direta ou indireta,


bem como os funcionários de empresas formadas com recursos públicos ou entidades
que desenvolvem algum tipo de atividade ambiental ou ligada ao meio ambiente é que
são objeto desses atos de improbidade ambiental.
A lei visa tutelar o patrimônio público, não só o das entidades, mas também

20 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


e principalmente, o de uso comum a todos os cidadãos e sob a responsabilidade do
Estado, a fim de que não sofram efeitos negativos de condutas ímprobas dos agentes
responsáveis pela sua guarda e manutenção.
Henriques Filho (2010) sobre o assunto, compreende que no caso das atividades
envolvendo os interesses ambientais, teremos como sujeitos ativos do ato de improbidade,
aqueles agentes desempenhando a função ambiental em nome do Estado. Se a atuação
desse agente não é “prestante à proteção dos interesses” ambientais “tutelados em lei”,
configura-se o ato de improbidade administrativa ambiental e o agente deve sofrer as
sanções fixadas em lei.
O certo é que todos aqueles que são responsáveis pela execução de serviço
público, sendo servidores ou agentes, responderão pelos atos de improbidade que
executarem. Qualquer que seja o objeto ou o dano causado, certo é que se o dano é
exclusivamente administrativo e causado o dano somente à Administração, ou se o
dano vem a ser ambiental, por ato executado pela Administração, seja ambiental ou
não, poderá ser caracterizado um ato de improbidade administrativa ambiental.
A improbidade administrativa é configurada com ato único de imoralidade
administrativa por ação ou omissão de sua conduta, independentemente desta conduta
encontrar-se tipificada na lei nº 8.429/92, tendo em vista que as tipificações daquela
legislação são meramente exemplificativas, não esgotando outras situações que poderão
ser enquadradas genericamente.
Tendo dito isso, analisamos à luz da lei nº 8.429/92, os dispositivos que
estabelecem a configuração da improbidade administrativa, iniciando pelo art. 9º no
qual encontramos as espécies que importam em enriquecimento ilícito do agente:

Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento


ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do
exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades
mencionadas no Art. 1º desta lei.

Facilmente podemos configurar a improbidade administrativa ambiental,


exemplificando através de qualquer ato de agente ambiental que, por ação ou omissão,
traga a ele qualquer tipo de vantagem que a lei não autorize expressamente.
Dentro dos doze incisos do referido artigo, também encontramos adequações
específicas ao caso ambiental, por serem alguns genéricos e utilizáveis a vários ramos
da Administração Pública, demonstrando, assim, que a intenção do legislador não
foi contemplar esse ou aquele âmbito do Poder Público, mas expurgar totalmente a
improbidade do Serviço Público.

21 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


No art. 10 encontramos as improbidades que causam prejuízo ao erário:

Art. 10 Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário


qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial,
desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das
entidades referidas no art. 1° dessa lei.

Aqui é considerado pelo legislador o aspecto econômico e financeiro, referente


ao patrimônio público, tendo em vista a necessidade do mesmo para a consecução
dos fins atribuídos ao Estado e à execução dos diversos serviços públicos sob sua
responsabilidade. Nesse item, apesar de o agente não obter qualquer vantagem pessoal
ilícita, causa dano a um patrimônio que pertence a todos os cidadãos e que é usado para
satisfação de suas necessidades básicas de convivência em sociedade. Nesse sentido é
que tanto o dolo quanto a culpa são requisitos para a tipificação dessa conduta ímproba.
No caso ambiental, pela discussão doutrinária quanto às expressões “erário”
e “patrimônio público”, que tecnicamente são consideradas diferentes, podemos e
devemos considerar que a lesão ao erário exigida pelo art. 10, pode ser considerada
de forma indireta, ou seja, quanto às lesões ambientais que demandam pesados
investimentos públicos para sua recuperação, indiretamente estão causando lesão
aos cofres públicos e sua relevância nem por isso será menor. Noutro sentido, não
há qualquer restrição na norma quanto à lesão direta ou indireta, já que o patrimônio
ambiental é parte integrante do patrimônio público, bem de uso comum do povo,
também quando causada pelo particular que não efetue sua recuperação.
Também entende dessa forma Henriques Filho (2010, p. 126) quando explica:

A repercussão financeira da degradação ambiental perpetrada pelo particular


é, para o Estado, indireta e só pode ser afastada se o responsável pela lesão
puder promover a adequada recuperação do meio ambiente. Não podendo
o particular fazê-lo, repita-se, cabe ao Estado, por expressa determinação
constitucional, cumprir esse objetivo, a fim de resguardar os legítimos
interesses das gerações presentes e futuras.

Fundamenta, dessa forma, o autor, nosso entendimento quanto ao dano indireto


ao erário, pela obrigação do Estado em efetuar a manutenção do meio ambiente,
independentemente da responsabilização do particular que tenha dado causa ao dano e
que não possa ou não suporte sua reparação.
Já o art. 11 possui uma maior amplitude, visto que o mesmo trata de atos que
atentem contra os princípios da Administração Pública, que condensam os deveres
básicos dos agentes públicos, de observância obrigatória.

22 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


A redação do art. 11 determina: “Constitui ato de improbidade administrativa
que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que
viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições,
e notadamente:”
Como determinado no próprio caput do artigo, o mesmo abarca todos os
princípios constitucionais atinentes à Administração Pública, tanto aqueles explícitos
no art. 37 da Constituição Federal de 1988, quanto os que se encontram implícitos no
regramento constitucional.
A regra determinada no art. 11 denota que todas as improbidades que não
constituem enriquecimento ilícito ou que não acarretem lesão ao erário estarão
compreendidas aqui e nele poderão ser enquadradas.
Lembre-se que, em matéria ambiental, a violação de princípios e deveres,
conforme entendimento do próprio artigo, além da responsabilização do agente público,
leva à declaração de nulidade do ato administrativo por ele executado, por encontrar-se
contrário à finalidade e acometido de ilegalidade.
A atividade relacionada às questões ambientais tem íntima relação com a
atividade administrativa, no que diz respeito aos atos autorizatórios ou licenciadores,
bem como os fiscalizatórios da atividade que seja potencialmente causadora de dano
ao meio ambiente. Na execução dos mesmos, devem ser observados os princípios
constitucionais, normatizações e regulamentos, importando sua não observação em
atos de improbidade administrativa.
Devemos compreender que os tipos sancionadores são abertos visando uma maior
abrangência da norma, e é em virtude dessa abertura a possibilidade de integração à
Lei de Improbidade Administrativa e legislações de outros ramos do direito, inclusive
o ambiental.
Medina Osório (2007, p. 204) também entende dessa forma e explica:

Deve-se destacar que a natureza aberta e permeável das normas sancionadoras


de improbidade constantes da LIA tem o condão de facilitar o trabalho dos
operadores jurídicos. Assim, ao jurista se reserva um papel eminentemente
criativo e criador, municiando-lhe com instrumentos capazes de acompanhar
a veloz dinâmica da improbidade. Atos ímprobos são formatados mais
pelo direito dos juristas do que pelo direito legislado, se pudermos usar
essas categorias. O legislador abriu espaços mais amplos aos juristas.
E, por isso, as cláusulas gerais, os termos indeterminados, os princípios
jurídicos empregados pela LIA constituem instrumentos vagos e elásticos,
permitindo-se aos intérpretes espaços de criação das normas. De um lado,
aumentam, inevitavelmente, as incertezas e as inseguranças dos destinatários
das normas sancionadoras, que não se veem garantidos previamente pelos

23 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


comandos certeiros do legislador. De outra banda, ampliam-se os poderes
dos advogados, membros do Ministério Público e juízes, outorgando-lhes
espaços de manobras e de criação, com maior velocidade, para acompanhar
a dinâmica dos fatos sociais. Nesse contexto, o legislador já não prevê todos
os comportamentos ilícitos. Ao contrário, prevendo núcleos básicos de
proibições, o legislador deixa as portas abertas aos intérpretes, aos juristas,
a fim de que estes possam criar normas para os casos concretos, dentro de
certos limites de mínima previsibilidade conceitual e proibitiva.

Nesse sentido, caberá ao juiz evitar qualquer construção infundada de tipos


coibitivos pelo estabelecimento de tipos abertos a fim de coibir comportamentos
lesivos aos interesses ambientais.
Tudo isso demonstra que a Lei de Improbidade Administrativa tem uma amplitude
que abrange a toda a Administração pública, independente de sua atividade, devendo
ser verificado seu enquadramento específico para cada ramo do direito ou atuação
específica, que pode ser efetuada em um ou mais desses ramos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na atualidade, diversos casos de desvio de conduta têm evidenciado a


improbidade administrativa. Os desvios cometidos pelos agentes de diversas áreas da
administração têm causado, além de prejuízo ao erário e à coletividade, uma mácula
quanto a probidade e a credibilidade de diversas instituições públicas.
Visando a otimização do patrimônio público e a fim de evitar quaisquer tipos de
desvios é que foram criados mecanismos para a garantia de utilização correta dessas verbas.
A Lei de Licitações e Contratos Administrativos, bem como a Lei de Improbidade
Administrativa são exemplos desses mecanismos específicos, tendo sido antecedidos
por inserção no texto constitucional de princípios de observância obrigatória por toda
a Administração Pública.
Como o Estado é o responsável pela satisfação das necessidades básicas da
coletividade para sua convivência em sociedade, demonstrado na execução dos serviços
públicos, os quais possuem várias áreas de atuação, também assumiu grande parte da
responsabilidade pela proteção do meio ambiente.
Com isso, criou legislações e órgãos com responsabilidade de normatização,
licenciamento, fiscalização e controle das atividades que possam afetar ao meio
ambiente, a fim de evitar o dano ambiental, sendo consagrado em seu ordenamento
o princípio da prevenção. Entretanto, para o correto funcionamento desses órgãos e

24 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


de toda a estrutura preservacionista há necessidade do fator humano para executar as
diversas atribuições.
As regras do Direito Administrativo, dessa forma, são utilizadas por toda essa
estrutura, tendo em vista tratar-se, também, de órgãos e pessoal do Estado, prestadores
de serviços públicos, sujeitando todos os seus agentes à Lei de Improbidade
Administrativa, no caso de incorrerem em qualquer desvio de conduta, exigindo,
dessa forma, dos agentes o desempenho de suas atribuições de forma a cumprir as
determinações legais com eficiência, honestidade e probidade, auxiliando o Estado a
atender aos seus objetivos finais.
Apesar da improbidade administrativa ser um delito próprio do serviço público,
não é exclusividade do executivo. Sua abrangência não se restringe somente a ele,
podendo e devendo ser utilizado dentro dos demais ramos de atuação do estado e do
direito, facultado pela redação ampliativa dos seus artigos, conforme o texto da lei.
A não observância dos princípios da administração pública na execução de suas
atividades, mesmo que não configure ilegalidade, ferirá a moral administrativa, podendo
ser configurada em ato de improbidade. Para estas situações é que foi concebida a
Lei de Improbidade, pela preocupação do Estado em resguardar o patrimônio público
daqueles que o utilizem em interesse próprio, desviando-se da finalidade do Estado.

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www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc_anterior1988/emc01-69.
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do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal. Presidência da República. Link:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d1171.htm. Acesso em 15 MAR 2013.
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BRASIL. Lei n° 1.079, de 10 de abril de 1950. Define os crimes de responsabilidade
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de bens nos casos de enriquecimento ilícito, por influência ou abuso do cargo ou
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emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras
providências. Presidência da República. Link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
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CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, São Paulo:
Editora Atlas, 25ª Ed., 2012.
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MEDINA OSÓRIO, Fábio. “O dever de Probidade Administrativa e a proteção do
meio ambiente: reflexões sobre ‘improbidade ambiental”. Direito Ambiental na Visão
da Magistratura e do Ministério Público, Coordenadores: Jarbas Soares Jeremias e
Fernando Galvão, Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2003.
________________. Teoria da Improbidade Administrativa: má gestão pública:
corrupção: ineficiência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.
MEIRELLES, Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Editora
Malheiros, 34ª Ed., 2008.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo:
Malheiros, 22ª Ed., 2008.

26 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


2.
A DENOMINADA MATRIZ ECONÔMICA-AMBIENTALDO
AMAZONAS E A CONSECUÇÃO DO DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL

BARROS, Carlos Augusto Alvarenga de1

SILVA, Michele Lins Aracaty e2

INTRODUÇÃO

A legislação federal ambiental brasileira apresenta o conceito de desenvolvimento


sustentável na lei 6.938/81 – Política Nacional de Meio Ambiente, a qual em seu art.
2º, dispõe: “A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação,
melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar,
no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança
nacional e à proteção da dignidade da vida humana”. E no art. 4º: “A Política Nacional
do Meio Ambiente visará: I – à compatibilização do desenvolvimento econômico-
social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico.”
Em 1988 a Constituição Federal em seus artigos 170 e 225 abraçou o conceito
de desenvolvimento sustentável dado pela Lei 6.938/81: art. 225: “Todos têm direito
ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial
à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.” e no art. 170: “A ordem
econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem
1 Mestrando em Segurança Pública, Cidadania e Direitos Humanos (UEA). Advogado. Link do
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5450563092901472.
2 Doutora em Desenvolvimento Regional (UNISC). Economista. Docente do Departamento de
Economia e Análise da UFAM. Link do Lattes: http://lattes.cnpq.br/9852711626925841. ORCID:
0000-0002-8939-3220 E-mail: michelearacaty@yahoo.com.br

27 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


por fim assegurar a todos, existência digna, conforme os ditames da justiça social,
observados os seguintes princípios: VI – defesa do meio ambiente;”
Conforme leciona o José Afonso da Silva (2004), considerando tais mandamentos
constitucionais exsurge ao Poder Público deveres que lhe são inerentes à saber: “O art.
225 da Constituição impõe ao Poder Público o dever de defender e preservar o meio
ambiente para as presentes e futuras gerações. A ele incumbe também tomar todas as
providências e medidas indicadas nos incisos do § 1º do mesmo art. 225 para assegurar
a efetividade do direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. “Poder
Público” é expressão genérica que se refere a todas as entidades territoriais públicas,
pois uma das características do Estado Federal como o nosso, consiste, precisamente,
em distribuir o Poder Público para todas as entidades autônomas que o compõem, para
que cada qual o exerça nos limites das competências que lhe foram outorgadas pela
Constituição”.
Internacionalmente, o termo Desenvolvimento Sustentável aparece em 1987,
tendo sido definido no Relatório Nosso Futuro Comum da “Brundtland Commission”, e
sua definição foi dada pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento:
“o desenvolvimento que atende às necessidades do presente, sem comprometer a
capacidade das futuras gerações atenderem às suas próprias necessidades.”
Localmente, a Lei 4.266 de 1º de dezembro de 2015, que institui a Política
do Estado do Amazonas de Serviços Ambientais e o Sistema de Gestão dos Serviços
Ambientais, cria o Fundo Estadual de Mudanças Climáticas, Conservação Ambiental e
Serviços Ambientais, altera as Leis Estaduais n. 3.135/2007 e 3.184/2007, e dá outras
providências; consigna no artigo 3°, II, o princípio do desenvolvimento sustentável
no Estado como sendo: “consubstanciado na adoção de incentivos aos provedores de
serviços ambientais como uma ferramenta para a melhoria das condições econômicas
e sociais das presentes e futuras gerações em harmonia com a conservação do meio
ambiente.”
No mesmo diploma legal, ao artigo 2°, XXVIII, é explicado que os serviços
ambientais, ou ecossistêmicos, são: “processos e funções ecológicas relevantes
gerados pelos ecossistemas, em termos de manutenção, recuperação ou melhoramento
das condições ambientais, em benefício do bem-estar de todas as sociedades humanas
e do planeta.”
Estabelece-se ainda, mais modalidades de serviços ambientais como sendo:
a) serviços de provisão: são relacionados com a capacidade dos ecossistemas em
prover bens, sejam eles alimentos (frutos, raízes, pescado, caça e mel); matéria-prima

28 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


para a geração de energia (lenha, carvão, resíduos e óleos); fibras (madeira, cordas e
têxteis); fitofármacos; recursos genéticos e bioquímicos; plantas ornamentais e água;
b) serviços de suporte: são os processos naturais necessários para a existência
dos outros serviços, como a ciclagem de nutrientes, a decomposição de resíduos, a
produção primária, a manutenção ou a renovação da fertilidade do solo, a polinização,
a dispersão de sementes, o controle de populações de potenciais pragas e de vetores
potenciais de doenças humanas, a proteção contra a radiação solar ultravioleta, a
manutenção da biodiversidade e do patrimônio genético, entre outros que mantenham
a perenidade da vida na Terra;
c) serviços de regulação: são os benefícios obtidos a partir de processos naturais que
regulam as condições ambientais que sustentam a vida humana, como a purificação do ar,
regulação do clima, purificação e regulação dos ciclos das águas, controle de enchentes e
de erosão; tratamento de resíduos, desintoxicação e controle de pragas e doenças;
d) serviços culturais: os que provêem benefícios imateriais, educacionais,
recreacionais, estéticos e espirituais;
Complementando a espécie serviços ambientais, no inciso XXIX, especifica-se sobre
os serviços ambientais urbanos que seriam: “processos e funções ecológicas relevantes,
gerados pela interação entre os ecossistemas e os ambientes urbanos, em termos de
manutenção, recuperação ou melhoramento das condições ambientais, em benefício do
bem-estar e segurança das populações urbanas e demais populações do planeta.”

ANÁLISE DO TEXTO LEGAL

Como visto, para fins da legislação local, o Desenvolvimento Sustentável


apresenta características mais restritas, do que as positivadas na legislação nacional, e
ainda se distancia da mais abrangente concepção supranacional. Tal elemento deve ser
analisado sob a perspectiva de se verificar se é suficiente, tanto ao desenvolvimento,
quanto à sustentabilidade, a adoção de incentivos aos chamados provedores de serviços
ambientais, para a consecução dos ditames dos interesses ambientais das presentes e
futuras gerações.
Antes da análise do texto legal da Lei Estadual 4.419, e elaborar a conclusão
crítica, há de se fazer um levantamento histórico mínimo de sua formação, com o
estabelecimento do que seria a denominada “Matriz Econômica-Ambiental do
Amazonas”.

29 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


O COMITÊ EXECUTIVO DA MATRIZ ECONÔMICA AMBIENTAL DO
AMAZONAS

O CEMEA (Comitê Executivo da Matriz Econômica Ambiental do Estado do


Amazonas) é formado por sete pessoas, conforme Decreto n° 37.300, de 7 de outubro
de 2016. Ao CEMEA cabe a construção, implantação e acompanhamento da Matriz
Econômica Ambiental do Estado do Amazonas. Não há ônus financeiro, sendo todos
os integrantes de secretarias de estado conforme se verá.
O decreto, de lavra do Governador do Estado no exercício da competência que
lhe confere o artigo 54, VI, da Constituição Estadual, considera o disposto no artigo
3°, II da Lei n° 4266/2015, que consigna o princípio do desenvolvimento sustentável
no Estado do Amazonas, como citado no introito. Ademais, alude à necessidade de
promover o desenvolvimento socioeconômico no Interior do Estado, tomando por base
a exploração sustentável dos ativos ambientais, e ainda a imperiosidade de conciliar
o desenvolvimento socioeconômico do Estado com a preservação do meio ambiente.
No tocante à construção principiológica que rege as normas positivas no processo
construtivo do Direito Ambiental, Jair Teixeira dos Reis ensina (2007): Princípio é
uma proposição que se coloca na base da ciência, normatizando-a, informando-a e
orientando-a.
Princípios são enunciados genéricos que devem iluminar tanto a elaboração
das leis, quanto a criação de normas jurídicas autônomas e a estipulação de cláusulas
contratuais, como a interpretação e a aplicação do direito. No mesmo sentido, os
princípios de Direito Ambiental ou de Proteção Ambiental formam-se como concepções
básicas, elementos instrutores para as ações políticas visando à conformação de uma
política ambiental racional.
Com tal formação principiológica, estabelecem-se os objetivos do CEMEA
em: I - propor as ações estratégicas e definir prioridades para a construção da matriz
econômica ambiental do Amazonas; II - discutir e definir metas de execução; III -
coordenar e incentivar estudos com vistas à elaboração da legislação que regulará
a Matriz Econômica Ambiental do Amazonas; IV - estabelecer as bases técnicas,
políticas e institucionais da matriz econômica ambiental do Amazonas; V - acompanhar
a execução das políticas programas, projetos e metas estabelecidas; VI - avaliar,
periodicamente, a eficácia das soluções adotadas.
Compete ao Comitê Estratégico de Gestão do Governo do Estado (CEAG) a coordenação
executiva do CEMEA, cuja intenção conforme se depreende, seria implantar políticas

30 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


públicas de produção sustentável no interior do Estado. Ponto relevante, é o fato de que
o decreto que institui o CEMEA não especifica o que é a Matriz Econômica Ambiental.
Quanto à composição, os 7 (sete) membros titulares são assim distribuídos: 1
(um) representante do Comitê Estratégico de Gestão do Governo do Estado - CEAG; 2
(dois) representantes da Secretaria Estadual de Planejamento Desenvolvimento, Ciência
e Tecnologia do Amazonas - SEPLANCTI; 2 (dois) representantes da Secretaria de
Estado do Meio Ambiente - SEMA; 2 (dois) representantes da Secretaria de Estado de
Produção Rural Sustentável – SEPROR.
A participação da sociedade civil é tímida, eis que o artigo 4° especifica que
apenas poderão e não deverão ser convidados para participar e contribuir com os
estudos e atividades do CEMEA, outros setores da Sociedade, tais como: organizações
não-governamentais, movimentos sociais, outros órgãos governamentais, instituições
de ensino e pesquisa, além do setor empresarial ligado à temática.
O Comitê Executivo deu suporte técnico e administrativo para implementação
das determinações contidas na Lei Estadual 4.419, funcionando até a efetiva instalação
do Comitê Técnico criado por esta legislação.

A MATRIZ ECONÔMICA AMBIENTAL DO AMAZONAS

A instituição da chamada Política Econômica Ambiental do Estado do Amazonas


para o Desenvolvimento Sustentável, é denominada Matriz Econômica-Ambiental
do Amazonas, e faz parte do texto legal da Lei 4.419 de 29 de dezembro de 2016.
Lembrando que o inciso III do Decreto n° 37.300, de 7 de outubro de 2016, tinha
como objetivo do CEMEA coordenar e incentivar estudos com vistas à elaboração da
legislação que regularia a Matriz Econômica Ambiental do Amazonas. Temos que o
trabalho foi desenvolvido em menos de 90 dias.
Neste período houve a construção, com base nas contribuições apresentadas
pelas próprias secretarias de governo, bem como sociedade civil e organizações não
governamentais ligadas à área ambiental, como também agentes parceiros das áreas da
pesquisa e academia. Aproveitou-se o legado do Fórum Estadual da Matriz Econômica-
Ambiental, ocorrido em março do mesmo ano e realizaram-se diversas oficinas, tendo
como pauta os eixos da matriz, tais como: a piscicultura, atividade de base florestal,
fármacos, biocosméticos e mineração. Nestas oficinas, foram coletadas as contribuições
de todos os participantes envolvidos para elaboração do diploma legal.
Este estabelece que a Matriz Econômica-Ambiental do Estado do Amazonas

31 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


é constituída por orientações estratégicas e programáticas para o desenvolvimento
econômico e social do Estado, em bases sustentáveis e de baixa emissão de
gases de efeitos estufa, transmutando-se em processo permanente e integrado de
desenvolvimento sustentável do Estado. Tais premissas visariam à consecução dos
objetivos do Desenvolvimento Sustentável, sendo instrumento de contribuição do
Estado do Amazonas para o atendimento de compromissos globais, sem, contudo, citar
quais seriam tais compromissos e nem a que mensuração ou metas estariam adstritos.
O desenvolvimento, reza a lei, deverá privilegiar as riquezas naturais, a partir
da valoração e valorização de ativos ambientais do território amazonense, como fonte
de geração de novos negócios, inclusão produtiva, processos industriais e cadeias
produtivas sustentáveis.
Os objetivos macro, seriam no sentido de: I - promover a valoração,
valorização e monetização dos recursos naturais, renováveis e não renováveis, com
potencial mercadológico; II - fortalecer a conservação e preservação ambiental com
a utilização dos sistemas modernos de monitoramento, instrumentos econômicos e
aperfeiçoamento das abordagens de comando e controle; III - fortalecer e ampliar as
atividades econômicas no interior do Estado, de forma a favorecer as oportunidades
de negócios e reduzir a dependência econômica das atividades estatais; IV - priorizar
a utilização de áreas antropizadas, como forma de reduzir a pressão sobre áreas de
florestas nativas e proteger a biodiversidade e os corpos d’água; V - buscar a ampliação,
diversificação e consolidação do Polo Industrial de Manaus (PIM), de forma a torná-
lo menos vulnerável às instabilidades políticas e econômicas, buscando promover
maior participação dos recursos naturais, disponíveis em seus atuais e novos processos
produtivos; VI - aprimorar, ampliar e modernizar a infraestrutura de transporte,
comunicação e energia, visando melhorar o acesso da população a bens e serviços em
geral e aumentar a competitividade de produtos e serviços do Estado nos mercados
nacional e internacional.

OS INSTRUMENTOS DA MATRIZ ECONÔMICA AMBIENTAL DO


AMAZONAS

Os instrumentos de planejamento do Estado do Amazonas observarão, na


definição das políticas setoriais, além das diretrizes previstas na Constituição Estadual,
os seguintes princípios: I - responsabilidade na gestão econômico-ambiental; II -
valorização dos serviços ambientais que o bioma Amazônia oferece à humanidade; III -

32 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


comprometimento com a segurança alimentar e a segurança hídrica; IV - reconhecimento
da importância dos bens naturais para a diversificação da economia; V - respeito,
valorização e integração dos saberes e direitos dos povos tradicionais, quilombolas e
indígenas; VI - empoderamento das comunidades locais e seu engajamento no processo
de desenvolvimento; VII - compromisso com a geração equânime de oportunidades
econômicas e sociais; VIII - imposição de contrapartidas econômicas, sociais e
ambientais ao Polo Industrial de Manaus, como vetor de desenvolvimento sustentável;
IX - predominância do interesse público; X - fortalecimento do empreendedorismo
da iniciativa privada, em todos os níveis da economia familiar ou empresarial; XI
- utilização de Ciência, Tecnologia e Inovação para modernização e capacitação
competitiva dos segmentos econômicos vitais para a economia do Estado; XII - redução
das desigualdades econômicas e sociais, com ampliação e modernização do sistema
estatal na saúde, na educação, na cultura e na segurança; XIII - fortalecer a produção
rural de base sustentável.
Para consecução de tal elenco de diretrizes propositivas e programáticas, haverá
instrumentos econômicos e financeiros de sustentabilidade da Matriz Econômica-
Ambiental, no sentido de especificar os meios de capitalização que adviriam de I -
recursos orçamentários anuais; II - incentivos econômicos, fiscais, administrativos e
creditícios concedidos à iniciativa privada; III - fundos públicos e privados, nacionais
e internacionais; IV - recursos provenientes de ajustes, contratos de gestão e convênios
celebrados com órgãos e entidades da administração pública federal, estadual e
municipal; V - recursos provenientes de acordos bilaterais ou multilaterais ou de
cooperação internacional sobre clima, desenvolvimento sustentável, meio ambiente,
comércio, biodiversidade, indústria, dentre outros; VI - doações realizadas por entidades
nacionais e internacionais, públicas ou privadas; VII - recursos provenientes de
compensação e comercialização de créditos relativos a serviços e produtos ambientais;
VIII - investimentos privados; e IX - outros estabelecidos em regulamento.
A partir do financiamento, o eixo estratégico da Matriz Econômica-Ambiental e
suas respectivas orientações programáticas, perseguiria o desenvolvimento da economia
dos recursos naturais, buscando a valorização do capital natural, pela implementação
de conservação ambiental produtiva; ativos deste capital natural; empreendimentos
econômicos garantidores dos serviços ambientais; mineração de baixo impacto e
inclusiva. Ademais, deve-se primar pela interiorização do desenvolvimento, por meio
de desenvolvimento e integração territorial; promoção e Fortalecimento da Gestão
Municipal; produção rural sustentável, de baixo carbono, com inclusão socioeconômica,

33 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


priorizando a utilização das áreas antropizadas; turismo sustentável, como ferramenta
de preservação e conservação dos recursos naturais e da inclusão social e da valorização
da cultura local.

O MODELO DA ZONA FRANCA DE MANAUS

No sentido dos termos da legislação ora analisada, até o artigo 6° inciso I, se


poderia supor que com a Matriz Econômica Ambiental, estar-se-ia a implementar uma
política de Estado, com vistas a buscar alternativa de crescimento econômico para
a região à guisa da Zona Franca de Manaus. Tal seria coerente com os ditames de
interiorização e ainda com a valorização do capital natural como se viu, e se esperava
a implantação de uma nova economia sustentável, focada no desenvolvimento de
projetos voltados para as riquezas naturais do Amazonas, tais como a piscicultura,
fruticultura, fármacos, cosméticos, entre outros.
Ademais, todo o bojo dos ditames legais no sentido de que deverá se privilegiar
as riquezas naturais, a partir da valoração e valorização de ativos ambientais do território
amazonense, como fonte de geração de novos negócios, inclusão produtiva, processos
industriais e cadeias produtivas sustentáveis, levaria a crer que o que se busca é oferecer
alternativas econômicas para diversificação da economia e redução da dependência do
modelo Zona Franca de Manaus (ZFM).
Porém, no inciso II, é previsto o fortalecimento do modelo Zona Franca de Manaus
e de seu Polo Industrial (PIM), buscando assegurar segurança jurídica, caracterizada por
definição do marco legal do ICMS, e ainda incremento da competitividade produtiva,
mitigando os efeitos da Guerra Fiscal. Ademais, persegue-se a diversificação produtiva,
por intermédio de adensamento das cadeias produtivas, atração de novos segmentos e
promoção do empreendedorismo. Almeja-se o acesso a novos mercados por parte do
PIM, especialmente o pan-amazônico.

DO ARRANJO INSTITUCIONAL DE GESTÃO, EXECUÇÃO, PARTICI-


PAÇÃO E CONTROLE SOCIAL

A liderança política e institucional da Matriz Econômica-Ambiental será exercida


pelo Governador do Estado, com apoio direto das Secretarias de Estado. Foi instituído
o seguinte arranjo de gestão e execução da Matriz Econômica-Ambiental: I - Conselho
Estratégico; II - Comitê Técnico; III - Órgãos executores; IV - Fórum Estadual da

34 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Matriz Econômica-Ambiental.
O Conselho Estratégico, sem qualquer ônus financeiro, exercerá a coordenação
estratégica da Matriz Econômica-Ambiental, com a finalidade de estabelecer as
prioridades e articular a viabilização dos objetivos e interesses desta política estadual
junto a todos os entes dos governos federal, estadual e municipal, iniciativa privada,
sociedade civil organizada, instituições de ensino e pesquisa, dentre outros, e zelar pela
eficiência da execução da Matriz.
A eficiência da Matriz seria garantida a partir de ações do Conselho Estratégico
no sentido de avaliar, periodicamente, a eficácia das soluções adotadas; e recomendar
aos órgãos de fomento do Estado as medidas necessárias de apoio ou de correção às
iniciativas propostas. Ainda, ao Conselho Estratégico caberia aprovar os indicadores
definidos pelo Comitê Técnico e estabelecer as respectivas metas.
O Conselho Estratégico é presidido pelo Governador do Estado e composto
pelos seguintes membros: titular do Comitê de Articulação Institucional (CAI); titular
da Secretaria de Estado da Casa Civil; titular da Secretaria de Estado de Produção
Rural (SEPROR); titular da Secretaria de Estado de Planejamento, Desenvolvimento,
Ciência, Tecnologia e Inovação (SEPLANCTI); titular da Secretaria de Estado do Meio
Ambiente (SEMA); titular da Secretaria de Estado da Fazenda (SEFAZ); titular da
AMAZONASTUR; e um representante de instituições de ensino e pesquisa, designado
pelo Governador do Estado; como também um representante da Sociedade Civil; e
o titular da Associação Amazonense dos Municípios, com dois representantes da
iniciativa privada, designados pelo Governador do Estado.
Já o Comitê Técnico, também sem qualquer ônus financeiro, é presidido pelo titular
do CAI, sendo o órgão operacional responsável pela coordenação do processo de
implementação da Matriz Econômica-Ambiental, devendo gerenciar o desenvolvimento
dos programas, ações e projetos especiais, nos termos definidos pelo Conselho
Estratégico da Matriz. O Comitê Técnico será composto por 02 (dois) representantes
dos seguintes órgãos e entidades: Secretaria de Estado de Produção Rural (SEPROR);
Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA); Secretaria de Estado da Fazenda
(SEFAZ); Secretaria de Estado de Planejamento Ciência, Tecnologia e Inovação
(SEPLANCTI); Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM).

DO FÓRUM ESTADUAL DA MATRIZ ECONÔMICA-AMBIENTAL

O Fórum Estadual da Matriz Econômica-Ambiental é órgão de natureza

35 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


consultiva e de acompanhamento da implementação da política e instrumento de
participação e controle social e será composto por representantes dos poderes públicos
federal, estadual e municipal, além de representantes de outros fóruns e conselhos
relacionados ao objetivo da Lei. É previsto no artigo 12 do diploma legal.
O primeiro Fórum, contudo, precedeu tanto a lei de regência, quanto o
decreto que criou o Comitê Executivo da Matriz Econômica Ambiental do Estado
do Amazonas, tendo se realizado em março de 2016. E teve como chamada “Fórum
Matriz Econômica Ambiental: construindo um novo modelo de desenvolvimento
sustentável”. No evento foram anunciados como objetivos a discussão de bases
sustentáveis para o desenvolvimento econômico, com respeito ao meio ambiente e aos
povos e comunidades tradicionais, residentes no território amazonense, a partir dos
princípios estabelecidos pela Política Estadual de Serviços Ambientais.
Aconteceu no hotel Amazônia Golf Resort, no quilômetro 64 da rodovia AM-010,
e contou com a presença de 90 convidados, incluindo representantes de organizações
não governamentais (ONGs) e instituições públicas, secretários de Estado, técnicos,
embaixadores, além de representantes da Agência Alemã de Cooperação Internacional
(GIZ). O evento, conforme anunciou-se, foi criado a partir dos encontros da
equipe administrativa do Amazonas com personalidades brasileiras e estrangeiras na
21ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP 21), realizada em
Paris, França, em dezembro de 2015.
Três eixos foram discutidos durante o Fórum. O primeiro foi uma matriz
econômica sustentável para o Amazonas, que seria implantada em áreas degradadas
do Estado, com projetos sustentáveis de produção rural, como a criação de peixe em
cativeiro e fruticultura. Um segundo eixo foi o asfaltamento e manutenção da BR-
319, com as garantias de preservação do meio-ambiente. Por fim, o terceiro eixo foi
o viés da ciência e tecnologia, buscando mecanismos para trazer o conhecimento de
pesquisas sobre a Amazônia.

DO MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO

A previsão legal, contida no artigo 13°, é no sentido de que a administração


pública adotará um Sistema de Monitoramento e Avaliação de resultados e impactos
que gere informações, relatórios de monitoramento, avaliação e análise crítica da gestão
e implementação da Matriz Econômica Ambiental, de seus programas estruturantes,
projetos especiais, produtos e serviços, com a finalidade de subsidiar a tomada de

36 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


decisão pelo Poder Público.
Para consecução de tal monitoramento dos programas, ações e resultados da
Matriz, serão adotados indicadores e metas, conforme os seguintes temas: I - bem-
estar humano; II -inclusão de mulheres, idosos e jovens no protagonismo político,
socioambiental e produtivo; III - industrialização e agregação de valor a produtos
regionais; IV - geração e ampliação de emprego, trabalho e renda a partir dos ativos,
produtos, bens e serviços ambientais e da produção rural sustentável de baixo carbono;
V - redução do desmatamento e mensuração da cobertura florestal; VI - estoque e
redução de emissões de carbono; VII - energia limpa, renovável, inclusiva e acessível,
de baixa emissão de carbono; VIII - eficiência dos processos e serviços públicos; IX -
desenvolvimento biotecnológico; X - qualidade dos ambientes urbanos; XI - formação
de capital intelectual para o desenvolvimento sustentável.

CONCLUSÃO

Notadamente, Programas e Projetos Governamentais não passam de manifestos


de intenções. Ainda mais quando se mostra tímido o envolvimento da sociedade que
o cerca e envolve. Ainda, quando não se demonstram bases sólidas destes programas
e projetos, que se manifestem a partir de efetivas dinâmicas econômicas, potenciais
produtivos, gargalos das cadeias produtivas, ou seja, soluções para problemas reais
e presentes a partir de incentivos a atores do ciclo econômico, trata-se apenas de
planejamento estatal sem respaldo no âmbito social.
O que se vê com a chamada Matriz Econômica- Ambiental, fruto da administração
José Melo, é semelhante ao que se verificou com programas e projetos governamentais
passados, à exemplo do chamado Terceiro Ciclo, na ulterior administração de Amazonino
Mendes, e ainda a batizada Zona Franca Verde, na administração de Eduardo Braga.
Não há diálogo com atores sociais, como associações de produtores, movimentos
sociais, pequenos empreendedores, universidades e institutos de pesquisa.
Ponto relevante no objeto tratado é a recuperação da BR-319. Porém, trata-se de
rodovia federal. A rodovia em si, não pode ser transformada em eixo de desenvolvimento,
eis que asfalto é meio, não fim. O desenvolvimento sustentável almejado, advirá da
presença do poder público, que será propiciado quando da trafegabilidade da rodovia,
eis que haverá, então, como reprimir a grilagem e a extração de madeira. Ademais, há
um problema em transformar em eixo de desenvolvimento como dito, mas apenas ao
sul do estado, relegando outros vetores, como o Solimões, que pode ligar a região ao

37 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


pacífico, por exemplo.
Outra questão é a evidente falta, na citada política, de reconhecimento dos saberes
locais. Não há, ou houve, qualquer diálogo com populações que estão esquecidas no
interior e que guardam uma forma de viver que pode nos salvar a todos, no despertar de
formas de desenvolvimento realmente sustentáveis, pois operaram a partir de elementos
genuínos da região. Não havendo previsão de capitalização, ou de inserção no meio
econômico, dos saberes dos povos antigos ou nativos- o que se prova, empiricamente,
que efetivamente se desenvolvem de modo sustentável-, não se respeitam as tradições
e se deixa à margem do desenvolvimento populações inteiras.
Ademais, quando há financiamento ou facilitação apenas das formas que degradam,
de alguma maneira, o meio ambiente – seja o natural ou o do trabalho, – como no caso
de grandes instalações fabris, em detrimento dos pequenos negócios locais, a partir de
incentivos econômicos, fiscais, administrativos e creditícios concedidos à iniciativa
privada, o Estado regulador confisca o risco do empreendimento (SCRUTON, 2016)
e ao diminuir a resiliência humana se expulsa – de nossa experiência social – o fator
essencial para a proteção das futuras gerações, o chamado senso de responsabilidade,
a consciência de eu, neste exato momento, tenho a responsabilidade por outros, que
viverão no futuro.

38 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


REFERÊNCIAS

BRANDÃO, Júlio Cezar Lima. Organização e Notas. Vade Mecum: Legislação


Ambiental do Estado do Amazonas. Procuradoria Geral do Estado do Amazonas, 2017
REIS, Jair Teixeira dos. Resumo de Direito Ambiental. 2ª Edição. Niterói: Editora
Impetus, 2007.
SCRUTON, Roger. Filosofia Verde: como pensar seriamente o planeta. Tradução
Maurício G. Righi. 1ª. Edição – São Paulo. É Realizações, 2016.
SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 3 ed. São Paulo: Malheiros
Editores Ltda., 2004
EMBRAPA: AM discute sua matriz econômica com base no respeito ao ambiente e
aos povos tradicionais. Disponível em: < https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/
noticia/10233250/am-discute-sua-matriz-economica-com-base-no-respeito-ao-
ambiente-e-aos-povos-tradicionais>. Acesso em: 17 dez. 2018.
IDAM Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado
do Amazonas: Em fórum com ambientalistas e ONGs, governador José Melo defende
BR-319 e nova matriz econômica ambiental para o Estado. Disponível em: <http://
www.idam.am.gov.br/em-forum-com-ambientalistas-e-ongs-governador-jose-melo-
defende-br-319-e-nova-matriz-economica-ambiental-para-o-estado/>. Acesso em: 17
dez. 2018.ZITZKE, V. A. Estudo socioeconômico e cultural das famílias ribeirinhas do
Médio Rio Tocantins. Interface, v. 2, p. 32-39, maio 2005.

39 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


3.
REPERCUSSÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS
NO TERRITÓRIO DA REGIÃO CENTRO-NORTE (SINOP)/
MT, AMAZÔNIA LEGAL: UMA ANÁLISE DA DINÂMICA
DEMOGRÁFICA E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Alcione Talaska 1
Almir Arantes 2
Aumeri Carlos Bampi 3
José Antônio Assumpção Farias 4
Natalício Pereira Lacerda 5

INTRODUÇÃO

O Brasil, inserindo-se tardiamente e de forma subordinada no modo de produção


capitalista, em todos os seus circuitos, com a conivência da elite rural que dominava
e, relativamente, ainda exerce grande força política sobre os destinos do país (bancada

1 Geógrafo, Mestre e Doutor em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do


Sul (UNISC). Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Catarinense (IFC) – Campus
Concórdia. https://orcid.org/0000-0003-0761-3793
2 Graduado em História (UEL), Mestre em História e Sociedade (UNESP) e Doutor em
Desenvolvimento Regional (UNISC). Professor da UNEMAT – Sinop. https://orcid.org/0000-0003-
4793-2908
3 Filósofo, Doutor em Filosofia e Ciências da Educação pela USC, Espanha. Docente da Pós-
Graduação em Ciências Ambientais (PPGCA) e Geografia (PPGGEO) da UNEMAT. https://orcid.
org/0000-0002-3410-9376 email: aumeri@unemat.br
4 Graduado em Ciências Econômicas (PUC-RS), Mestre em Desenvolvimento Regional pela
Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). http://lattes.cnpq.br/2016269971655724
5 Administrador, Mestre em Ciências Ambientais (UNEMAT) e Doutor em Desenvolvimento
Regional (UNISC). Professor adjunto da UNEMAT - Campus Universitário de Sinop https://orcid.
org/0000-0002-1923-5403
Estudo apresentado no Seminário Internacional de Desenvolvimento Regional: Processos, Políticas
e Transformações Territoriais, Santa Cruz do Sul, RS, Brasil, 2019.

40 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


ruralista), construiu o seu projeto de desenvolvimento a partir de um modelo que o
coloca tradicionalmente como exportador de produtos agropecuários e importador de
produtos manufaturados.
Tal orientação política e econômica cobrou, ao longo da história, um alto
custo social, promovendo dinamismo econômico apenas em determinadas porções
territoriais: basicamente nas regiões Sudeste e Sul do país, mantendo isolado o restante
do território.
A partir dos governos de Getúlio Vargas, foram traçadas diretrizes para a
industrialização brasileira, assim como, para a incorporação do restante do território
brasileiro do Centro-Oeste e Amazônia ao modelo de produção capitalista e, desde
então, esse modelo avança, consolidando-se sobre a parte do território nacional que não
possuía interligação direta com as regiões Sul e Sudeste, onde ocorria a conformação
do processo urbano-industrial. Mesmo com essas novas diretrizes, no entanto, o grande
vetor desse modelo continua a ser a expansão da fronteira agropecuária rumo ao Centro
e Norte do país como fronteira de recursos.
Entre 1964 a 1985, quando o país foi governado pelos militares, a chamada
fronteira agropecuária, sofreu um incremento de políticas públicas, com a incorporação
do Centro-Oeste e com o aceleramento da inserção da região Amazônica às estratégias
de desenvolvimento nacional. Essa política foi acentuada com a opção do governo
de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002), quando esse presidente aderiu a um
receituário neoliberal, implicando na abertura da economia brasileira ao capital
internacional, impondo cortes drásticos nos investimentos públicos, aumentando
impostos, ampliando as privatizações e fazendo concessões de incentivos fiscais à
expansão da fronteira agrícola (Lei Kandir – Lei Complementar n 87, de 13 de setembro
de 1996, Brasil, 1996).
Contudo, tais ações, além de se mostrarem insuficientes para conduzir o
país ao desenvolvimento, contribuíram ainda mais para que o Estado brasileiro
ficasse dependente dos investimentos do capital externo. Internamente a situação de
descapitalização dos estados da federação agudizou a guerra fiscal entre os mesmos,
os quais, passaram a tentar, a qualquer custo, atrair para seus territórios, empresas que,
aparentemente, contribuiriam para dinamizar suas economias através da instalação de
atividades do agronegócio.
Nesse sentido, houve uma corrida para abertura de novas áreas agrícolas,
principalmente da soja, na região da Amazônia Legal, com uma atuação branda por
parte do Estado quanto à questão ambiental do desmatamento, envolvendo agressivas
políticas de desenvolvimento regional. Assim, em especial a partir da década de 1990,
o agronegócio, ligado às corporações internacionais, adquiriu enorme importância

41 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


econômica e tornou-se uma das principais fontes de divisas (moedas estrangeiras,
obtidas pelas exportações) do país ao lado do capital especulativo, que maneja e aufere
as altas taxas de juros pagas no país.
A guerra socialmente não equitativa contra o déficit público e os altos índices
da inflação tomaram todos os espaços das políticas públicas, além de empurrar o país,
ainda mais, para o fosso da desigualdade social. Nesse contexto, questionando os rumos
políticos, econômicos e sociais do país, a grande maioria da população brasileira fez a
opção, nas eleições presidenciais de 2002, por uma nova proposta, representada pelo
candidato Luiz Inácio Lula da Silva, oriundo da classe trabalhadora. O novo paradigma,
capitaneado por Lula, centrou-se na realização de um pacto político, econômico e
social, que recolocou o Estado como centro decisivo do desenvolvimento nacional, o
qual passou a ser identificado como neodesenvolvimentismo.
Lula, portanto, buscou, nesse sentido, um equilíbrio entre a ortodoxia
econômica e os investimentos em políticas sociais, dando um novo encaminhamento
para o desenvolvimento regional, muito embora não interrompesse o fortalecimento
do agronegócio. Nesse contexto, o presente artigo objetiva, através da consideração
das políticas públicas planejadas pelo Estado, no início do século XXI, para
alavancar processos de desenvolvimento na Amazônia Legal, identificar as principais
transformações socioterritoriais, com ênfase à dinâmica demográfica da região Centro-
Norte (Sinop)/MT.
Desse modo, num primeiro momento, comentamos sobre o processo de
reorientação do Estado brasileiro no início do século XXI, em que o Brasil buscou
avançar nas questões socioeconômicas regionais, através do desenvolvimento de planos
e projetos que afetaram diretamente a Amazônia Legal e o território mato-grossense,
contribuindo para transformações regionais. Na sequência, enquanto resultados da
análise das repercussões territoriais dessas políticas e projetos de desenvolvimento
implementados na Amazônia Legal, caracterizamos e contextualizamos essas
transformações socioterritoriais na região Centro-Norte (Sinop)/MT, em especial,
aquelas relacionadas com a dinâmica demográfica regional.
Assim, conjuntamente à identificação de importantes transformações de conteúdo
no território, através da análise da intensidade do dinamismo territorial exercido pela
região, hipóteses e questionamentos são apontados em relação à eficiência e eficácia
das políticas públicas engendradas em prol do desenvolvimento e da sustentabilidade
ambiental para a região.

42 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


A REORIENTAÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO E SUAS PROPOSTAS
PARA O DESENVOLVIMENTO REGIONAL NA AMAZÔNIA LEGAL

Apoiado por forças populares que reivindicavam novos rumos na política


nacional, Lula foi eleito presidente (2003-2006) e reeleito (2007-2010), tendo entre
outras frentes políticas, uma nova postura naquilo que se refere ao desenvolvimento
regional, indicando que o mesmo tem:
o duplo propósito de reduzir as desigualdades [econômicas e sociais]
regionais e de ativar os potenciais de desenvolvimento das regiões brasileiras,
explorando a imensa e fantástica diversidade que se observa em nosso país
de dimensões continentais. O foco das preocupações incide, portanto, sobre a
dinamização das regiões e a melhor distribuição das atividades produtivas no
território. (BRASIL. PNDR I, 2009, p. 01).

Nesta direção, o governo constrói planos e propõe


A viabilização de um modelo de desenvolvimento na região Amazônica,
baseado na inclusão social, na redução das desigualdades socioeconômicas,
no respeito a diversidade cultural, na viabilização de atividades econômicas
e competitivas que gerem emprego e renda e no uso sustentável dos recursos
naturais, com a valorização da biodiversidade e a manutenção do equilíbrio
ecológico desse importante patrimônio brasileiro. (BRASIL, Plano BR163
Sustentável, 2006, p. 01).

Ou seja, a fim de garantir governabilidade, Lula adotou uma política de


conciliação entre o capital e o trabalho, buscando avançar nas questões sociais,
fortalecendo o papel do Estado, sem, contudo, frear o avanço do capital. Logo, a despeito
de fortes investimentos em serviços públicos, neste governo, o agronegócio ampliou-
se exponencialmente, principalmente com o avanço do cultivo da soja, atendendo à
demanda internacional, especialmente da China.
Neste cenário, a Amazônia Legal, com destaque para o estado de Mato Grosso,
apresentou-se de forma privilegiada para a execução desta agenda política. O Estado
brasileiro, nesta direção, através de uma série de Políticas Públicas, encaminhou
planos e projetos de cunho regional e nacional, que afetaram e afetam diretamente o
território mato-grossense. Entre estes: Plano Amazônia Sustentável (PAS), Plano de
Desenvolvimento Sustentável para a Área de Influência da Rodovia BR-163 no Trecho
Cuiabá/MT Santarém/PA (Plano BR-163), Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC) e Programa de Aceleração do Crescimento II (PAC 2)6.

6 Estes projetos foram debatidos em: ARANTES et al (2015).

43 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


A CONTRIBUIÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS FEDERAIS PARA
TRANSFORMAÇÕES SOCIOTERRITORIAIS NA REGIÃO CENTRO-
NORTE (SINOP)/MT, INTEGRANTE DA AMAZÔNIA LEGAL

Embora nem todos os objetivos delineados pelos planos e programas tenham sido
materializados, naquilo que se refere à indução de atividades econômicas dinâmicas
para a região da Amazônia Legal e para a região Centro-Norte (Sinop)/MT (Figura 01),
em específico, é possível afirmar que as políticas públicas referenciadas, que foram
efetivadas, contribuíram para transformações importantes de conteúdo no território.

Figura 01. Localização da Amazônia Legal Brasileira e da região em estudo.

Fontes: (A) Atlas Interativo do MacroZEE da Amazônia Legal, 2018; (B) Elaborado pelos autores,
a partir da Base cartográfica IBGE, 2007b.

Neste sentido, os Índices de Desenvolvimento Humano Municipais (IDH-M)


alcançados no período demonstram uma melhoria substantiva da qualidade de vida da
população residente na Região Centro-Norte (Sinop)/MT (QUADRO 01).

44 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Quadro 01. IDH-M dos municípios que compõem a região Centro-Norte (Sinop)/MT
UNIDADES ESPACIAIS 2000 2010 Variação (%)
Cláudia 0,563 0,699 24,2
Feliz Natal 0,515 0,692 34,4
Itaúba 0,511 0,690 35,0
Marcelândia 0,573 0,701 22,3
Nova Santa Helena 0,497 0,714 43,7
Santa Carmem 0,579 0,715 23,5
Sinop 0,626 0,752 20,1
União Do Sul 0,525 0,665 26,7
Vera 0,563 0,680 20,8
Estado De Mato Grosso (IDH) 0,601 0,725 20,6
Brasil (IDH) 0,669 0,726 8,5
Fonte: IBGE Cidades, 2016.

O estado de Mato Grosso apresentou no período 2000-2010 evolução de 20,6%


no IDH, enquanto que a evolução média nacional foi de apenas 8,5%. Categoricamente,
praticamente todos os municípios que compõem a região Centro-Norte (Sinop)/MT
apresentaram variações no IDH-M superiores ao verificado em Mato Grosso e no
Brasil. Destacou-se o município de Nova Santa Helena, que no ano de 2000 apresentava
IDH-M baixo (0,497), passando a apresentar IDH-M médio (0,714), bastante próximo
do IDH alto (0,799). Também apresentaram evolução do IDH-M superior a 30% no
período, os municípios de Itaúba e Feliz Natal, com evolução respectiva de 35,0% e
34,4% entre os anos 2000 e 2010. Nesse aspecto, tal mudança também impulsionou
índices econômicos, fortalecendo, dessa forma, o entendimento de que a região é, de
fato, um polo econômico ligado à produção de soja (Tabela 01).

Tabela 01. Evolução do PIB, PIB per capita e plantio de soja no período 2003-2012
Território/ PIB per Soja: área Soja: produção
Ano PIB (Mil R$)
Variável capita (R$) plantada (ha) (Ton.)
2003 1.699.947.694 9.612,21 18.527.544 51.919.440
Brasil 2012 4.392.093.997 22.323,25 25.090.559 65.848.857
Var.% 158,3% 132,2% 35,4% 26,8%
2003 27.888.658 10.518,72 4.414.496 12.965.983
Mato Grosso 2012 80.830.108 25.826,47 6.980.690 21.841.292
Var.% 190% 145,5% 58,1% 68,4%
2003 1.348.452 8.987,88 114.623 359.056
Centro-Norte
2012 4.398.337 24.356,25 508.198 1.582.014
(Sinop) Var.% 226,1% 170,9% 343,3% 340,6%
Dados: IBGE Cidades, 2016. *Var.% (Variação percentual)

Há que se observar na Tabela 01 que, embora o Brasil e o estado de Mato


Grosso, como um todo, tenham vivenciado, no período 2003-2010, um crescimento

45 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


do PIB e do PIB per capita, também naquilo que diz respeito ao plantio de soja, a
região Centro-Norte (Sinop), proporcionalmente, teve um dinamismo muito além das
médias estadual e federal, o que sugere que houve incentivos setoriais significativos
para esse território. Nesse contexto, é importante destacar que a política de créditos
e financiamentos subsidiados pelos governos contribuiu, sobremaneira, para que
produtores se engajassem na exploração intensiva da terra, pois o agronegócio tem sua
sobrevivência ligada intimamente aos financiamentos bancários.
Nesse contexto, como elemento não menos importante para ser analisado, está
a intensidade do dinamismo territorial exercido por esta região em comparação com
o estado de Mato Grosso e, propriamente, com o Brasil. A variação do percentual de
população entre os anos 2000 a 2010, ilustrado pelo Gráfico 01, expõe um processo que
chama a atenção: a sua dinâmica demográfica amparada no aumento da população rural.
Contrariando tanto a tendência do Brasil como um todo, quanto do estado de Mato
Grosso, a região Centro-Norte (Sinop)/MT, no período compreendido entre os Censos
Demográficos de 2000 e 2010, apesar de ter aumentado a área destinada para o plantio
intensivo de soja (Tabela 01) – o que se compreende como fator que historicamente
retira a população do campo –, teve sua população rural aumentada em mais de 55%
(Gráfico 01). Não obstante, também se pode inferir que o aumento proporcional
da população rural na região Centro-Norte (Sinop)/MT destoa dos índices de Mato
Grosso, que foi de 6,9%, e do país, que mostrou uma regressão da sua população rural
em 6,32%. Este fato permite levantar a hipótese de que políticas de financiamento para
a agricultura familiar, programas como o “Luz para Todos”, além de legislações que
favoreceram a regularização da posse da terra e de políticas públicas para a compra
de produtos agropecuários oriundos de pequenas, médias ou grandes propriedades
rurais, aliados a outras medidas, favoreceram que pessoas permanecessem ou, então,
retornassem e/ou fossem atraídas para o campo, na região.

46 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Gráfico 01. Dinâmica demográfica e prevalência da população rural na região Centro-Norte (Sinop)/
MT:2000 2010

Dados: IBGE Cidades, 2016; SIDRA, 2016a.

No que diz respeito à população urbana, a região Centro-Norte (Sinop)/MT


demonstrou um crescimento de 26,2%, frente à 24,9% da média estadual e de 16,6%
do Brasil. Observa-se, ainda que, no cômputo geral, o aumento populacional da região
foi de 31,5% frente a 21,2% de Mato Grosso e 12,3% do país, o que implica dizer que
a região mostrou-se atrativa no período, tanto para a população rural quanto para a
população urbana, o que permite também afirmar que as políticas públicas engendradas
nesse território contribuíram para tal fenômeno; contudo, é importante analisar com
maior profundidade essa questão, inclusive, destacando como a dinâmica demográfica
se estabelece intrarregionalmente.

A DINÂMICA DEMOGRÁFICA DA REGIÃO CENTRO-NORTE (SINOP)/


MT, SUA RELAÇÃO COM AS ATIVIDADES AGROPECUÁRIAS E O
DESENVOLVIMENTO REGIONAL 

Como já destacado, o processo de ocupação não tradicional da região Centro-Norte


(Sinop)/MT tem relação direta com o formato de expansão da fronteira agropecuária
vivenciado no Brasil após 1960. Com o crescente desenvolvimento da agricultura
moderna e científica, em função do aparato tecnológico estabelecido pela chamada
Revolução Verde, e, propriamente, pela constituição do meio técnico-científico-
informacional, considera-se eminente, via de regra, a existência de um processo de
redução no quantitativo da população rural. O Gráfico 02, nesse sentido, mostra que,
embora a população total da região tenha apresentado aumento em seu quantitativo no
período 1991-2010, a população rural configura-se com especificidades.

47 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Gráfico 02. Evolução do quantitativo da população na região do Centro-Norte (Sinop)/MT: 1990-
2010

Elaborado pelos autores a partir de: SIDRA, 2016a.

No período 1991-2000, a população rural da região apresentou decréscimo de


14% em seu quantitativo. Após o início do século XXI, já em um contexto de modificação
da conjuntura política nacional, com a ascensão Lula à presidência da República, e
em virtude das implicações e reflexos das políticas públicas de incentivo à produção
agropecuária no território, essencialmente, vinculadas à agricultura familiar, intensiva
em mão de obra, mas que também incorporou a agricultura patronal, verificou-se que
o contingente de pessoas que vivem no meio rural da região teve um aumento de 55%,
chegando a 36.975 habitantes no ano de 20107.
Por conseguinte, a análise da variação do quantitativo da população no período
2000-2010, com base nas informações demográficas municipais (Tabela 02), possibilita
a compreensão de que a dinâmica demográfica regional é caracterizada pelo aumento do
número de habitantes residentes no meio rural, essencialmente, por meio da ampliação
da população rural localizada nos municípios de Vera (279%), Sinop (171%), Feliz
Natal (70,7%) e Cláudia (7,9%).

7 Em estudo na Região de Rio Verde, Goiás, verificou-se o mesmo cenário: o fator explicativo
encontrado pelos pesquisadores para justificar o aumento da população rural após o ano de 2000 foi
a instalação de um novo conjunto de atividades econômicas, no caso, as chamadas granjas de suínos,
que permitiram um novo arranjo territorial em que os pequenos empresários são inseridos e fixados
no campo novamente (OLIVEIRA, 2016).

48 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Tabela 02. Variação da população rural nos municípios da região Centro-Norte (Sinop)/MT: 2000-2010
Rural
Município
2000 2010 Variação absoluta Variação relativa
Cláudia 2.397 2.586 189 7,9%
Feliz Natal 1.646 2.810 1.164 70,7%
Itaúba 3.689 861 -2.828 -76,7%
Marcelândia 5.287 4.580 -707 -13,4%
Nova Santa Helena - 1.480 - -
Santa Carmem 1.457 1.004 -453 -31,1%
Sinop 7.125 19.346 12.221 171,5%
União do Sul 1.425 1.422 -3 -0,2%
Vera 761 2.886 2.125 279,2%
TOTAL 23.787 36.975 13.188 55,4%
Elaborado pelos autores a partir de: SIDRA, 2016a.

Os demais municípios apresentaram, no período 2000-2010, diminuição no


seu contingente populacional residente no meio rural. Destacam-se, com reduções
mais expressivas, os municípios de Itaúba (-76,7%), de Santa Carmem (-31,1%) e
de Marcelândia (-13,4%). Convém ressaltar, entretanto, que alguns municípios da
região também apresentaram decréscimo no seu quantitativo total de habitantes, em
um reflexo que não apenas é relacionado à redução da população rural, mas também
urbana. São eles: Itaúba, Marcelândia e União do Sul.
Assim, o fato a explicar é: Quais os motivos que influenciaram ou determinaram
o aumento da população rural nesses municípios (especialmente: Vera, Sinop e Feliz
Natal), em um contexto de modernização e tecnificação das atividades vinculadas ao
setor agropecuário?
A investigação que pode revelar indícios que contribuam para a resolução desse
questionamento passa, necessariamente, pela avaliação das taxas de nascimentos e de
óbitos nos municípios citados. Na região, como um todo, 33.401 nascimentos foram
registrados no período 2000-2010, sendo que, desse total, 23,9% eram de residentes no
meio rural. O número de óbitos ocorridos na região no período foi de 6.138 pessoas,
totalizando, assim, uma diferença de 27.263 pessoas entre o número de nascimentos
e de óbitos no período analisado, segundo dados disponibilizados pelo IBGE e pelo
Sistema de Informações sobre Mortalidade (DATASUS, 2016). Para os municípios
listados com aumento da população rural no período 2000-2010, verificou-se que o
aumento populacional foi de 21.240 pessoas, sendo 1.772 em Vera, 2.406 em Feliz
Natal e 17.062 em Sinop.
Se considerada a diferença entre o número de nascimentos (registrados) e o
número de óbitos (registrados) com relação à variação da população total da região
no período 2000-2010, verifica-se, na Tabela 03, que apenas dois municípios (Sinop e

49 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Feliz Natal) apresentaram saldo demográfico positivo.

Tabela 03. Saldo demográfico entre a variação populacional e a diferença entre o número de
nascimentos e número de óbitos: 2000-2010
Saldo Demográfico entre a Variação
Diferença entre número Variação da
da População Total e a Diferença
Município de Nascimentos e o População Total
entre o número de Nascimentos e o
número de Óbitos 2000-2010
número de Óbitos
Cláudia 1.738 779 -959
Feliz Natal 2.406 4.164 1.758
Itaúba 627 -3.990 -4.617
Marcelândia 1.797 -2.442 -4.239
Nova Santa Helena 496 - -
Santa Carmem 682 425 -257
Sinop 17.069 38.268 21.199
União do Sul 676 -436 -1.112
Vera 1.772 1.180 -592
TOTAL 27.263 41.416 14.153

Elaborado pelos autores a partir de: SIDRA, 2016b. DATASUS, 2016.



Os dados indicam que a maioria dos municípios da região Centro-Norte (Sinop)/
MT apresentou variação da população total menor que o saldo da relação nascimentos
versus óbitos. Tal constatação indica a hipótese de que, embora tenha havido um ganho
populacional por meio do número de nascimentos, a variação da população total da
região foi impactada por fatores que culminaram na perda de população. Nesse caso,
para além do número dos óbitos, o fator explicativo estaria vinculado com os processos
migratórios, essencialmente, de saída de pessoas desses municípios. Entretanto,
contrariamente a isso, os municípios de Sinop e Feliz Natal, em específico, estariam
atraindo pessoas.
Esse fato pode ser atestado pela consideração desses fluxos migratórios a partir
da identificação do lugar de nascimento da população residente na região e nesses dois
municípios, em específico. A Tabela 04, nesse sentido, mostra que a maior parcela da
população que vive na região Centro-Norte (Sinop)/MT tem origem na própria Região
Centro-Oeste do país, o que, em última instância, implica afirmar que a mobilidade das
pessoas na região pode-se configurar como um processo de migração inter-macrorregional.

50 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Tabela 04. Região Centro-Norte (Sinop)/MT: população residente por macrorregião de nascimento
2000-2010
Proporção
Macrorregião de em relação à Proporção em relação à Variação
2000 2010
nascimento população total de população total de 2010 2000-2010
2000
Região Norte 2.132 1,6% 4.115 2,4% 93,0%
Região Nordeste 10.184 7,8% 13.493 7,9% 32,5%
Região Sudeste 11.930 9,1% 13.403 7,8% 12,3%
Região Sul 51.388 39,2% 54.047 31,5% 5,2%
Região Centro-Oeste 55.451 42,3% 86.454 50,4% 55,9%

Fonte: Elaborado pelos autores a partir de: SIDRA, 2016c.

O contingente populacional residente na região com origem nos estados


do Sul do país, por sua vez, apresenta quantitativo expressivo: totalizavam 54.047
habitantes em 2010, o que representava 31,5% da população total da região. Em
termos relativos, entretanto, verificou-se uma ampliação proporcional do número de
habitantes originários da Região Norte do país que passaram a viver na região Centro-
Norte (Sinop)/MT no período 2000-2010. Essa ampliação foi de 93% no período, com
destaque para o aumento relativo da participação da população oriunda dos estados de
Roraima, Amapá, Tocantins, Acre, Amazonas e Rondônia na formação do contingente
populacional da região estudada. Embora o quantitativo de pessoas oriundas dos
estados da Região Norte do país não seja muito expressivo (2,4% da população total),
a variação relativa verificada nesse período indica um fluxo migratório em ampliação
para a região. Em efeito contrário, verifica-se também uma redução proporcional de
habitantes originários da Região Sul e da Região Sudeste do país, que passaram a
representar uma proporção menor em 2010, com relação à apresentada em 2000.
Assim, destaca-se, principalmente, o aumento da presença na região Centro-
Norte (Sinop)/MT de pessoas que nasceram nas regiões Norte e Nordeste do país e que
passaram a residir nos municípios estudados (aumentos de 93 e 32%, respectivamente),
confirmando que os migrantes provenientes das regiões Norte e Nordeste do país ainda
são significativos nas regiões próximas ao norte mato-grossense. Esse movimento
já tinha sido sinalizado por Girardi (2008) quando do desenvolvimento do Atlas da
Questão Agrária Brasileira, ao analisar os dados referentes ao período 1991-2000. Os
municípios que tiveram maior atração de pessoas nascidas no Norte e Nordeste do
país, no período 2000-2010, foram Sinop e Feliz Natal.
Ressalta-se também que a presença de residentes nascidos no Sul do país foi
reduzida, quando se comparam os dados de 2000 e 2010. Esses dados refletem uma
diminuição no fluxo migratório de sulistas para a região, resultado da consolidação

51 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


da ocupação da fronteira agropecuária na região em estudo. Contudo, essa hipótese,
não explica o aumento de sulistas residentes nos munícipios de Sinop e Feliz Natal,
fato que necessita ser mais bem analisado, mas, enquanto hipótese, pode-se indicar e
existência de uma migração especializada na produção agropecuária, por exemplo, de
técnicos agropecuários, agrônomos e outros.
Adicionalmente, a consideração da População Economicamente Ativa (PEA) na
região, e nos municípios de Sinop e Feliz Natal, ajuda a revelar a própria dinamização
da economia regional. Na região Centro-Norte (Sinop)/MT, a PEA predominante
é urbana, contudo, no período 2000-2010, verificou-se que existiu um aumento na
representatividade da PEA rural (Tabela 05).

Tabela 05. Região Centro-Norte (Sinop)/MT: PEA 2000-2010


Proporção da PEA no total da Variação da proporção da
Total
População PEA, residente no meio
Municípios rural em relação ao total da
Total Total Rural população do município.

2000 2010 2000 2010 2000 2010 2000-2010


Cláudia 10.249 11.028 49,5% 52,7% 10,4% 11,7% 11,9%

Feliz Natal 6.769 10.933 44,6% 49,9% 8,9% 11,4% 27,6%


Itaúba 8.565 4.575 45,0% 47,5% 18,7% 8,7% -53,3%
Marcelândia 14.448 12.006 45,0% 50,6% 13,5% 18,6% 37,3%
Nova Santa Helena - 3.468 - 50,0% - 22,5% -
Santa Carmem 3.660 4.085 44,0% 49,5% 17,4% 11,9% -31,6%
Sinop 74.831 113.099 48,1% 55,5% 4,1% 8,7% 110,5%
União do Sul 4.196 3.760 50,3% 49,2% 15,8% 16,8% 5,7%
Vera 9.055 10.235 48,5% 47,9% 3,9% 12,1% 209,9%
TOTAL 131.773 173.189 47,4% 53,6% 7,6% 10,5% 38,4%

Elaborado pelos autores a partir de: SIDRA, 2016d.

Em 2000, a proporção da PEA rural, na região, era de 7,6%. Já em 2010, esse


contingente chegou a 10,5%, totalizando 18.156 pessoas. Os municípios que tiveram
maior variação na PEA rural no período 2000-2010 foram: Vera (209,9%), Sinop
(110,5%), Marcelândia (37,3%) e Feliz Natal (27,6%). Cabe destacar que, no município
de Marcelândia, o aumento da representatividade da PEA rural em 2010 em relação
a 2000, decorre, sobretudo, da redução da PEA total no município, essencialmente,
da PEA urbana. Assim, os municípios que se destacaram na evolução relativa da
proporção da PEA rural foram, mais uma vez, Sinop e Feliz Natal, com o município de
Vera apresentando variação na proporção bastante significativa.
Convém destacar que os municípios de Vera e de Sinop também apresentaram,
no período 2000 a 2010, as maiores variações relativas nas taxas de masculinidades em

52 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


relação ao total da população municipal: Vera, com variação de 208,7% no período,
apresentando taxa de masculinidade de 14,8% em 2010; e Sinop, com variação de
80,77% no período e taxa de masculinidade de 9,2% em 2010. A taxa de masculinidade,
essencialmente se considerada em relação aos residentes no meio rural, pode contribuir para
explicar a predominância de atividades rurais braçais, como a lida com o gado, o cultivo
e desflorestamento, contribuindo também para explicar o próprio aumento da população
rural nos municípios da região, à medida que essas atividades ganham importância.
Outro fator importante a ser considerado para explicar o aumento da população
rural em determinados municípios da região é o vínculo existente entre o contingente
populacional residente no meio rural e as relações de produção tidas no espaço agrário
regional e propriamente com as características das propriedades rurais da região. Nesse
contexto, o Censo Agropecuário de 2006 considerou pela primeira vez a distinção
entre a agricultura familiar e a agricultura patronal, de modo a disponibilizar essas
informações estatísticas, possibilitando a realização de um retrato de como a mão de
obra é ocupada no espaço agrário brasileiro e, por conseguinte, na região (Tabela 06).
Regionalmente, o pessoal que se ocupa com a agricultura familiar é 107,8%
superior ao número de pessoas que trabalham na agricultura patronal/empresarial.
Já os municípios da região que apresentaram aumento expressivo no quantitativo
da população rural no período 2000-2010 (Vera, Sinop e Feliz Natal) apresentaram
também, via de regra, quantitativo de pessoas trabalhando na agricultura familiar
superior em 60% ao quantitativo de pessoas que se dedicam à agricultura não familiar.
O destaque fica por conta do município de Sinop, no qual a ocupação na agricultura
familiar é 173% maior do que a observada na agricultura patronal/empresarial.

53 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Tabela 06. Região Centro-Norte (Sinop)/MT: pessoal ocupado na Agricultura Familiar (AF) e
Agricultura Não Familiar (ANF) em 2006
% em
% em relação % em relação % em relação
relação ao Pessoal
Pessoal ao total ao total ao total
total das ocupado na
ocupado na das pessoas das pessoas das pessoas
pessoas agricultura
Município agricultura ocupadas na ocupadas na ocupadas na
ocupadas na não
familiar agricultura agricultura agricultura
agricultura familiar
(Pessoas) (AF e ANF) (AF e ANF) (AF e ANF) no
(AF e ANF) (Pessoas)
no município na região município
na região

Cláudia 590 4,51% 59,66% 399 3,05% 40,34%


Feliz Natal 457 3,49% 61,84% 282 2,15% 38,16%
Itaúba 215 1,64% 37,79% 354 2,70% 62,21%
Marcelândia 2.223 16,97% 69,27% 986 7,53% 30,73%
Nova Santa 567 4,33% 55,48% 455 3,47% 44,52%
Helena
Santa Carmem 488 3,73% 58,03% 353 2,70% 41,97%
Sinop 2.435 18,59% 73,21% 891 6,80% 26,79%
União do Sul 531 4,05% 60,14% 352 2,69% 39,86%
Vera 956 7,30% 62,98% 562 4,29% 37,02%
TOTAL 8.462 64,62% 64,62% 4.634 35,38% 35,38%
Elaborado pelos autores a partir de: SIDRA, 2016e.

Assim, verifica-se que o dinamismo demográfico vinculado com as atividades


agropecuárias na região estabelece-se, em grande parte, devido à importância que o
setor representa nos municípios de Sinop e Feliz Natal, e também de Vera, os quais,
além de apresentarem aumento no contingente de população rural no período 2000-
2010, em um contexto mundialmente conhecido como sendo causador de êxodo rural,
apresentam maior proporção da PEA rural. Igualmente, pelo maior número de pessoal
ocupado na agricultura familiar, que faz parte de uma política pública do Governo
Federal, a Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares
Rurais, criada por meio da Lei nº 11.326/2006.
Embora se faça necessário verificar como a maior riqueza da região, a terra,
foi distribuída ou redistribuída no período, há que se destacar que qualquer processo
de desenvolvimento só se sustenta se as bases materiais da sociedade estiverem
direcionadas de forma que contemplem a maioria da população, em um processo de
desconcentração de riquezas. Chamando a atenção para esse foco, é possível destacar
na Tabela 07, que, segundo dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (INCRA), as diversas políticas de ordenamento e ocupação territorial tiveram
papéis de destaque na região, pois, além de contribuírem para um aumento da população
no campo, contrariando tendências históricas de Mato Grosso e do Brasil, também

54 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


possibilitaram que os números de imóveis rurais, classificados como minifúndios,
pequenas e médias propriedades, tivessem aumentos relativos em sua quantidade, na
comparação dos dados de 2003 com 2014.

Tabela 07. Série histórica da classificação fundiária dos imóveis rurais na região Centro-Norte
(Sinop)/MT: 2003-2014
Classificação Número Total de Imóveis Rurais Área Total dos Imóveis Rurais (ha)
Fundiária 2003 % 2014 % 2003 % 2014 %
Minifúndios 2.184 40,3% 4.144 43,2% 85.642,6 2,5% 148.547,9 2,8%
Pequena Propriedade 1.654 30,5% 2.874 29,9% 321.483,0 9,5% 559.742,5 10,7%
Média Propriedade 952 17,5% 1.589 16,6% 714.014,2 21,1% 1.164.984,0 22,3%
Grande Propriedade 592 10,9% 876 9,1% 2.159.391,0 63,9% 3.248.233,0 62,3%
Não Classificados 44 0,8% 114 1,2% 98.224,5 2,9% 92.895,8 1,8%
Total 5.426 100,0% 9.597 100,0% 3.378.756,0 100,0% 5.214.403,0 100,0%
Elaborado pelos autores a partir de: INCRA, 2010; INCRA, 2014.

É possível identificar que os números absolutos dos imóveis rurais classificados


como grandes propriedades indicam aumento da concentração de terras na região. Essa
constatação afere que essas grandes propriedades incorporaram ao seu domínio um
número superior a 1.000.000 de hectares, ao passo que os minifúndios, pequenas e médias
propriedades, em maior número, incorporaram apenas 750.000 hectares no período 2003-
2014. Assim, quando se esmiúçam os dados apresentados pelo órgão oficial, é possível
verificar que o Estado brasileiro não conseguiu alcançar completamente os objetivos que
dizem respeito ao ordenamento e legalização plena dos imóveis rurais da região, ponto
basilar para se conseguir desenvolvimento econômico, mas também social.
Ao se comparar a soma das áreas ocupadas pelos imóveis rurais da região Centro-
Norte (Sinop)/MT no ano de 2014, de 5.214.402,77 ha, com a área territorial total da
região, de 4.982.530,10 ha, se verifica que a área declarada ao INCRA (teoricamente
de posse dos proprietários dos imóveis rurais) se apresenta significativamente maior
que a soma da área total de todos os nove municípios da região: Eis, um indicador
de grilagem de terras. A área total ocupada pelos imóveis rurais em 2014 na região,
portanto, excede em 231.872,67 ha a área territorial dos municípios, conforme
divulgação do IBGE (Tabela 08).

55 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Tabela 08. Relação entre a área ocupada pelos imóveis rurais, estabelecimentos agropecuários e área
territorial dos municípios integrantes da região Centro-Norte (Sinop)/MT.
Área Área Área Total
Área
Territorial Estabelecimentos Imóveis Área Total Imóveis
Município Territorial
IBGE Agropecuários Rurais 2003 Rurais 2014 (ha)
IBGE (ha)
(km2) 2006 (ha) (ha)
Cláudia 3.849,991 384.999,1 274.773 240.805,3 402.226,72
Feliz Natal 11.462,462 1.146.246,2 176.046 372.499,6 587.544,61
Itaúba 4.529,581 452.958,1 330.442 400.565,0 622.827,94
Marcelândia 12.281,254 1.228.125,4 647.658 785.239,6 1.374.407,45
Nova Sta. Helena 2.359,823 235.982,3 199.891 11.860,0 150.679,54
Sta. Carmem 3.855,362 385.536,2 203.156 197.968,6 354.437,81
Sinop 3.942,231 394.223,1 268.494 726.204,7 819.062,62
União do Sul 4.581,91 458.191,0 164.705 151.349,4 299.032,71
Vera 2.962,687 296.268,7 177.101 492.263,5 604.183,37
Região 49.825,301 4.982.530,10 2.442.266,0 3.378.755,70 5.214.402,77
Elaborado pelos autores a partir de: INCRA, 2010; INCRA, 2014; IBGE, 2015.

A leitura da tabela indica que deve existir sobreposição de matrículas de imóveis


rurais no sistema cadastral do INCRA e que esse subterfúgio permanece, uma vez
que a área total dos imóveis rurais em 2014 é superior àquela verificada em 2003.
Os principais municípios com esse grave problema, que somam mais de 100.000 ha
inconsistentes na área ocupada pelos imóveis rurais, são: Sinop (+ 424.839,52 ha),
Vera (+ 307.914,67 ha), Itaúba (+169.869,84 ha) e Marcelândia (+ 146.282,05 ha).
Sobre esse tema é importante lembrar que:

a grilagem das terras públicas da Amazônia sempre veio alimentada pelas


políticas públicas dos diferentes governos nos últimos cinquenta anos [...].
Em 2003, o INCRA possuía na Amazônia Legal mais de 60 milhões hectares
[...]. Entretanto, os grileiros do agrobanditismo “cercaram e se apropriaram
privadamente” de tudo, pois, os funcionários corruptos do INCRA “venderam”
para eles ilegalmente todo este patrimônio público. No final do ano de 2005,
conseguiram através do artigo 118 da Lei nº 11.196 de 21/11/2005 (a chamada
“Medida Provisória do bem”) alterar a lei de licitações públicas (Lei nº 8.666,
de 21/06/1993) conseguindo a permissão para regularizar, através da venda, a
aqueles que tinham grilado as terras públicas do INCRA na Amazônia Legal
com área de até 500 hectares. [...] Era o início da farra da legalização da
grilagem. (OLIVEIRA, 2011, p. 01).

Desse modo, aponta-se para uma falha na coleta de informações territoriais


por parte do Estado, podendo-se, ainda, assinalar que há sobreposições e fraudes nos
registros de terras, resultando em uma fragilização do território naquilo que diz respeito
às ações engendradas via políticas públicas, em razão do caráter rural da região Centro-
Norte (Sinop)/MT. Com essa discrepância dos dados apresentados (ou seja, apesar
do desajuste dos dados, e em razão disso também), a propriedade da terra na região
Centro-Norte (Sinop)/MT está em um processo de disputa, que envolve interesses

56 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


avessos a um processo de desenvolvimento regional sustentável sob o ponto de vista
social, tornando o território tensionado.
Concorre ainda para se colocar em questionamento a sustentabilidade desse
movimento, o índice significativo de desmatamento na região, o que põe em risco
uma parcela da riqueza ambiental, importante ao desenvolvimento sustentável. A
verificação da variação da área desmatada entre 2002 e 2012 (Quadro 03), revela um
problema que é emblemático para a região Centro-Norte (Sinop)/MT, que apresentou
um aumento de 63,8% na área desmatada, proporção superior ao aumento verificado
no estado de Mato Grosso, de 29,6%.

Quadro 03. Desmatamento na região Centro-Norte (Sinop) e no Mato Grosso 2002-2012


ANO CENTRO NORTE (Sinop) MATO GROSSO
Área desmatada (ha) em 2002 984.415,18 27.823.980,22
Área desmatada (ha) em 2012 1.612.582,25 36.074.089,12
Variação (%) 2002-2012 63,81% 29,65%

Elaborado pelos autores a partir de: SEPLAN-MT, 2013.

A manutenção dessas práticas segue a lógica da incorporação do território


ao agronegócio em detrimento da riqueza ambiental, como a floresta em pé e sua
biodiversidade correlata, por exemplo, a qual, se manejada sustentavelmente, poderia
fortalecer economia regional, sob uma racionalidade contra-hegemônica.
Há que se pontuar ainda que, da mesma forma que as informações quantitativas
sobre a posse e propriedade da terra apresentam problemas, os dados do Quadro 03,
sobre os desmatamentos, também podem ser questionados. Os números apresentados
significam apenas aqueles registrados oficialmente. Como há indícios de desmatamentos
ilegais na região, também é possível indicar que o índice real ainda é maior do que
o apresentado, colocando em dúvida a eficiência e a eficácia das políticas públicas
engendradas em prol do desenvolvimento e da sustentabilidade ambiental para a região.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao se propor avaliar as repercussões territoriais de políticas públicas estatais


de desenvolvimento da Amazônia Legal, com ênfase em um determinado território, é
preciso explicitar que suas confecções e materializações representam o direcionamento
político que o governo deu ao país. Nesse sentido, no início do século XXI, especialmente
no governo de Lula, o Estado brasileiro buscou se tornar indutor e promotor do
crescimento econômico do país, bem como, patrocinador de políticas distributivas e

57 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


redistributivas de cunho social. Assim, esse Estado buscou o crescimento do país, sem
desconsiderar que a nação é desigual e a maioria da população ainda carece de suas
necessidades básicas, tais como saúde, educação, moradia, lazer, renda, entre outras.
Nesse mesmo processo, se reconhece também que no Brasil existem desigualdades
sociais entre as regiões e que a Amazônia Legal requer olhares diferenciados, dadas às
suas especificidades étnicas, culturais, econômicas, ambientais, sociais, entre outras.
É a partir dessas implicações, então, que o Estado neodesenvolvimentista, traz para
seu interior a responsabilidade de buscar promover o desenvolvimento regional; mas,
contudo, sem provocar rupturas sociais e sem questionar as tradicionais estruturas
sobre as quais a sociedade se assenta e tenta desenvolver-se, bem como segue
apostando em um modelo de produção econômica que resulta em fortes desequilíbrios
socioambientais na Amazônia.
A região Centro-Norte (Sinop)/MT, localizada na Amazônia Legal, se enquadrou
no perfil a ser contemplado com esse modelo de se fazer política. Mais de uma década
depois do início desse processo, a economia se dinamizou e a população, tanto urbana
e, especialmente, a rural, demonstrou credibilidade no processo e fixou-se no território.
Ao mesmo tempo em que as políticas públicas estatais foram sendo engendradas
ao território, foi possível notar que repercussões territoriais positivas, do ponto de vista
socioeconômico eram materializadas: observou-se: melhoria substantiva dos índices de
qualidade de vida da população residente na região; crescimento do PIB e do PIB per
capita, relacionado com a ampliação das áreas de plantio e, propriamente, da produção
da soja; aumento do contingente da população rural, situação inversa ao processo de
êxodo rural verificado no país, oportunizando, a ampliação da PEA rural, principalmente,
através da importância da ocupação de pessoal na Agricultura Familiar.
Outras questões tornam-se evidentes, enquanto fatores de preocupação para se
pensar em desenvolvimento regional, tais como: o aumento da taxa de masculinidade
no campo; a elevada concentração fundiária, aliada à existência de processos de
grilagem de terras e processos de desmatamento e, consequente, intensa perda da
riqueza ambiental pela modificação drástica do uso do solo (floresta para terra nua).
Assim, ponderamos que, para afirmar que esse movimento se caracteriza, de
fato, como desenvolvimento regional, é necessário apontar algumas questões para
ampliação do debate futuro: a) a economia dessa região, no bojo desse movimento,
passou a conviver intensamente com a lógica da agricultura comercial de larga escala
(agronegócio), o que a torna altamente dependente do circuito do capitalismo globalizado
por intermédio da venda da matéria-prima (especialmente, soja) para o mercado
externo e importação de insumos, máquinas e tecnologia; b) a vitalidade do arranjo
produtivo da soja desenvolvido na região dá-se via inserção maciça de financiamentos e

58 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


subsídios ou desonerações que são um incentivo fiscal privilegiado do Estado Brasileiro
e do próprio Estado de Mato Grosso ao agronegócio (Lei Kandir, incentivos fiscais
estaduais e Fundo Constitucional do Centro-Oeste) que privilegia grandes produtores
e conglomerados internacionais; c) a participação no comércio internacional de
commodities sujeita os negócios locais e o desenvolvimento regional às oscilações do
mercado financeiro global e suas demandas; d) a principal referência material de riqueza
desse território-ambiente, a terra, apesar de avanços distributivos, apresenta índice
de alta concentração nas mãos de produtores capitalistas e, recentemente, de grandes
grupos empresariais, muitos deles sediados em outras regiões do país e no exterior; e)
os agravos à natureza (florestas, recursos hídricos, biodiversidade, fauna, flora) foram
imensos e geraram um passivo socioambiental em prol do avanço do cultivo intensivo
da soja que se faz presente em toda a região e que se tornou visível com a supressão
do bioma, com o avanço do desmatamento e intensa modificação do uso do solo, com
mudanças no clima e mudanças nos ciclos hidrológicos; f) a dinâmica socioespacial
na região está diretamente relacionada ao processo do avanço do agronegócio, que,
por vezes, atrai e territorializa momentaneamente populações, quando da abertura e
instalação das atividades, quanto desterritorializa quando de processo de concentração
de terra, tecnificação do campo e produção de larga escala, situação que se manifesta no
êxodo rural e ocaso de pequenas cidades; g) a fixação de populações rurais tem relação
ainda com assentamentos rurais, que, entretanto, não negam o avanço do agronegócio,
pelo contrário, carregam a possibilidade de serem incorporados e atuam na cadeia
de produção de modo complementar como fornecedores de mão de obra temporária,
locação de terra e amansadores de áreas de floresta não abertas.
Isto posto, é possível afirmar que a busca do desenvolvimento regional no
território em estudo se dá a partir de forças contraditórias. Logo, qualquer processo de
construção de desenvolvimento regional que dependa de lógicas externas, como a da
internacionalização da divisão do trabalho materializada localmente pelo agronegócio,
é (e será), eivada de tensões, afirmações, contradições e fragilidades. Nesse contexto,
o Estado brasileiro também reflete esse movimento, contudo, a partir das políticas
públicas orientadas para a região Centro-Norte (Sinop)/MT, torna possível que a
maioria da população passe a acreditar que na região existem condições concretas para
se ter uma vivência satisfatória.
Isto implica em dizer que, apesar das políticas públicas engendradas no período
estudado serem ricas em contradições de ordem social e econômica, apontando
inclusive para a possibilidade de uma sociedade menos desigual, também são ricas em
apontar os limites de um Estado que busca promover desenvolvimento sem questionar
o status quo.

59 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Quanto aos impactos sociais, econômicos, culturais e ambientais externalizados
no território, são indicadores de que a sociedade está em movimento. Se essas ações
promoverão bem-estar social de forma mais duradoura e consistente, ainda é prematuro
afirmar, mesmo porque, tanto as afirmações desse processo quanto suas contradições
estão explicitamente colocadas.

REFERÊNCIAS

ARANTES, Almir; SCROCZYNSKY, Claudete Inês; TALASKA, Alcione; LACERDA,


Natalício. Análise de processos de desenvolvimento em regiões funcionais do agronegócio:
uma proposta metodológica. In VII Seminário Internacional sobre Desenvolvimento
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Meio Ambiente. I3Geo. 2018. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/
atlaszeeamazonia>. Acesso em: 04 jul. 2018.
BRASIL. Lei n° 11.326, de 24 de julho de 2006. [Lei da Agricultura Familiar].
Estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar
e Empreendimentos Familiares Rurais. Presidência da República, Brasília, 2006.
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influência da Rodovia BR-163 Cuiabá-Santarém (Plano BR-163 Sustentável).
Brasília, 2006.
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Brasília, 2009. Disponível em: www.integracao.gov.br/politica-nacional-de-
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GIRARDI, E. P. Proposição teórico-metodológica de uma cartografia geográfica
crítica e sua aplicação no desenvolvimento do atlas da questão agrária
brasileira. Tese (Doutorado em Geografia). Universidade Estadual Paulista, UNESP,
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60 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


(SNCR)/INCRA, 2010. <www.incra.gov.br>. Acesso em: 02 out. 2015.
INCRA. Estatísticas cadastrais 1992, 1998, 2003 e 2014. Brasília: Sistema
Nacional de Cadastro Rural (SNCR)/INCRA, 2014. 1 CD-ROM
OLIVEIRA, A U. de. Tragédia e farsa, a compra de terras por estrangeiros. Le
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OLIVEIRA, B. S. de. 2016. Cidade média do agronegócio: os efeitos da
reestruturação produtiva no município de Rio Verde, GO. Tese (Doutorado em
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(consultado em: nov.2016).
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e tipo de registro de nascimento, segundo domicílio e a idade. <www.sidra.ibge.gov.
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segundo agricultura familiar e não familiar – FAO. 2016e. <www.sidra.ibge.gov.br>.
(consultado em: nov.2016).
SIDRA. 2016d. Tabela 616: pessoas de 10 anos ou mais de idade por grupos de
idade, atividade na semana de referência, sexo e situação do domicílio. <www.sidra.
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SIDRA. 2016e.Tabela 631: população residente, por sexo e lugar de nascimento.
<www.sidra.ibge.gov.br>. (consultado em: nov.2016).

61 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


4.
MORADIA PERIFÉRICA NA AMAZÔNIA:
CONSEQUÊNCIA DE UM PROCESSO HISTÓRICO DE
EXPLORAÇÃO

BATISTA, Berenice Miranda1

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo retratar de maneira sistemática as alterações


estruturais, habitacionais e sociais dos processos econômicos na Região Amazônica.
Não há como tratar de estruturas de habitação sem colocar em pauta o direito social à
moradia, previsto na Constituição Federal em seu artigo 6º, dispondo de forma clara o
compromisso em dar este acesso de forma digna e de subsistência.
Elencando a promoção da dignidade humana e para obtenção da efetividade
dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais, não se pode deixar de
mencionar a importância dos direitos sociais aludindo às situações que representam as
desigualdades da sociedade que sejam supridas em si, com dignidade e qualidade de
vida (BUZINARO, 2013).
Ao falar de Amazônia, são percebidas características únicas, que através delas,
moldam toda uma estrutura social, econômica, cultural, habitacional e política. Por
isso, o direito à moradia é direito de igualdade. Em outras palavras, é direito social de
acesso, consagrado pelo simples fato de o indivíduo existir.
Não obstante, revela-se através do contexto histórico os motivos pelos quais
as populações ficaram dispersas de grandes centros, por não estarem em visibilidade
quanto às políticas públicas habitacionais. E principalmente as tentativas de ocupação
territorial na região que se escondem em meios de ocupação de território. Ademais,
1 Advogada, graduada em Direito pela Universidade Paulista – UNIP. http://lattes.cnpq.
br/6930779959483496 E-mail: berenice-m-batista@hotmail.com

62 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


traz a discussão sobre como o crescimento econômico não veiculado a medidas de
políticas públicas influencia diretamente no modo de vida e habitação das pessoas.
O Estado Democrático de Direito exige a garantia dos direitos fundamentais e,
para tanto, deve estar centrado na dignidade da pessoa humana, já que os direitos são
postos a serviço da realização do homem como pessoa. Nessa perspectiva, a dignidade
da pessoa humana deve figurar como valor jurídico supremo, pois ela é a base das
pretensões essenciais e o fundamento de uma constituição operante.
Tão logo, evidenciar a atuação do Poder Público na figura do município, ao
tratar especificamente na atuação que observam os regimes adotados nos artigos 182 e
183 da Constituição Federal, com o objetivo diretamente de dispor das funções sociais
da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

AMAZÔNIA

A Amazônia é um importante bioma e abrange nove estados brasileiros:


Tocantins, Amazonas, Roraima, Rondônia, Pará, Amapá, Acre, Maranhão e parte do
Mato Grosso. Além de nove países: Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Venezuela,
Guiana, Guiana Francesa, Peru e Suriname, sendo nosso bioma mais famoso e mais
extenso, conforme orienta a EMBRAPA.
Segundo o próprio governo do Estado, especificamente no estado do Amazonas
encontra-se uma área terrestre de 1.559.149. 074 km², que comporta 62 municípios,
abrigando um elevado número de comunidades tradicionais dispersas ao longo dos
rios, igarapés e interior da floresta, além das imediações das cidades.
O principal rio, o Amazonas, é o maior do mundo em volume de água e em
extensão, atingindo o patamar de 6.992,06 km. Um de seus principais afluentes, o
rio Negro, se lança ao rio Solimões nas proximidades de Manaus (Capital do Estado
do Amazonas) definindo toda uma estrutura econômica, social, habitacional e de
subsistência segundo consta na biblioteca Blanche Knopf da Fundação Joaquim
Nabuco.
Conforme Oliveira (2015, p. 24) quanto ao processo histórico de ocupação dessa área:

A ocupação da região amazônica teve início em 1540. No século XVII, havia


apenas as missões religiosas e pequenas vilas e fortificações ibéricas que se
instalaram na extensa planície de inundação dos rios Amazonas e afluentes,
acompanhando os sítios de maior densidade de população indígena. Estes
pequenos núcleos pouco contribuíram para a gênese do urbano na região
Amazônica.

Nas palavras de Antônio Carlos Witkoski, quanto ao espaço social do camponês

63 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


amazônico (“ribeirinho”), a ocupação dispersa da Amazônia possui antecedentes na
Revolução Comercial com transição econômica das grandes potências, ocorridas na
Idade Moderna:

A primeira forma de inserção da Amazônia no mundo moderno, com o advento


das grandes navegações foi a de exploração das chamadas drogas do sertão;
logo a seguir veio à afluência das matérias-primas industriais oriundas da rica
vegetação amazônica: essências, resinas, cascas, látex, etc.; e, juntamente
com essa afluência, aparecem à concepção da Amazônia como um imenso
espaço sonegado à solução de problemas do excesso de populações de outras
latitudes. Nesse sentido, a grande seca dos anos 1870 no Nordeste brasileiro,
foi causa de migração de centenas de milhares de sertanejos dessa região para
a Amazônia, atraídos pelo fascínio da borracha. Com a crise da economia
baseada na extração do látex, essa onda migratória tenderia a esvaecer.
Contudo, na segunda década do século XX, ocorreria uma reanimação
durante a Segunda Guerra Mundial com a chamada batalha da borracha,
e ganhar novo impulso, com o Programa de Integração Nacional. Nesse
novo contexto, mediante a abertura da Transamazônica e de outras estradas
formando eixos rodoviários estruturantes, incentiva-se a transferência de
homens sem terra para terras sem homens (MARTINS, 1990). Logo a seguir,
grandes massas de sulinos iriam do mesmo modo orientar-se para algumas
áreas da Amazônia (Witkoski, 2010 p. 23).

A produção do látex teve grande importância na ocupação da Amazônia. Nesse


sentido, sobre a formação de Manaus como a segunda maior cidade responsável pela
interiorização das frentes exploradoras de borracha, depois de Belém, afirma Kampel:

Esta estrutura ocasionou o surgimento da forma-cidade assim como dos grandes


contrastes entre o centro, com infraestrutura, e a periferia com população
residindo em casas de palha e madeira. A estrutura sócio-político-institucional
excluiu a população de seus benefícios diretos tais como melhor remuneração
e diversificação da oferta de emprego, e ainda benefícios indiretos como a
presença de equipamentos de uso coletivo, caracterizando uma urbanização
incompleta, típica de países periféricos (KAMPEL, 2010, p.8).

Em função da difícil demarcação de territórios e da desmobilização populacional


da Amazônia, nos ambientes de várzea, as populações tradicionais que vivem nas
proximidades dos municípios supracitados, atenuados pelo projeto colonizador,
demonstram a imensidão de uma Amazônia, distante dos grandes centros, dispersa ao
longo dos rios com uma organização social e estrutural própria (DUTRA, 2018).
A região amazônica é formada por dois grandes tipos de ecossistemas: as áreas
inundáveis, compostas pelas terras de várzeas, os igapós e os furos; e as florestas de
terra firme, tais como as florestas altas e densas, as baixas, as savanas, os cerrados e
os campos naturais. Na terra firme, vivem as populações tradicionais denominadas

64 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


caboclas e, à margem dos rios do complexo estuário amazônico, as populações
ribeirinhas. A convivência nesse ecossistema define o modo de vida de tais grupos
(SILVA, 2011).
Em função disto, estas populações vivem em agrupamentos comunitários
com várias famílias, localizados, como o próprio termo sugere, ao longo dos rios e
seus tributários (lagos), tendo em vista que na Amazônia os rios carecem de maiores
investimentos e as populações não dispõem de muitas opções de modais terrestres
(Bueno, 2013).

POVOS TRADICIONAIS DA AMAZÔNIA

As populações tradicionais seguem prismas adequáveis à natureza e através


delas, os mantêm. Não obstante, as moradias, em sua maioria, são erguidas a partir
da madeira como principal matéria prima de construção, ou seja, são as chamadas
palafitas. Estas não possuem, na maioria dos casos, energia elétrica, água encanada e
saneamento básico. Por isso, situam-se metros acima do nível do rio para evitar que
sejam inundadas em período de cheia, através da tecnologia de uso de tábuas para
elevação do piso (MORIM, 2014).
Não somente as palafitas são utilizadas, mas há na Amazônia o uso de casas
flutuantes, que acompanham todo o mecanismo do rio (seca e cheia), possibilitando que
a moradia se adeque a cada período. Uma característica comum entre as comunidades
está na utilização do recurso natural mais próximo disponível, como por exemplo,
casas de tábua, taipa ou de palha. Desta forma, ao residirem em um ambiente onde a
natureza oferece recursos naturais, aprendem desta forma a viver em um meio repleto
de limitações e desafios impostos pelo rio e pela floresta. A relação desse povo com as
mudanças naturais fez com que eles adaptassem o seu cotidiano, seu modo de morar e
de buscar meios para sua sobrevivência (MORIM, 2014).
O rio é outro recurso natural que possui um papel fundamental. É através dele que
são estabelecidas as ligações entre as localidades com a utilização de canoas e barcos
como principal meio de transporte, assim como a prática de uma das principais atividades
que lhes proporcionam fonte de renda e de sobrevivência: a pesca (LIRA, 2015).
Para as mulheres, a base de suas atividades, se concentra em trabalhos domésticos
do dia a dia, cuidado dos filhos e responsabilidade com a roça, dentre os quais: capinar,
roçar e colher. Já para os homens, a responsabilidade gira em torno da caça e pesca.
Ademais, são grandes detentores de conhecimentos sobre aspectos da fauna e da
flora locais; o uso de plantas medicinais; o ritmo e o caminho das águas; os sons da
mata; as épocas da terra. Esse convívio alimenta a cultura e os saberes envolvendo a

65 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


ancestralidade (WITKOSKI, 2010).

ASPECTOS DA ZONA RURAL E URBANA NO AMAZONAS

O Estado do Amazonas é o maior em área territorial do País, com 1.559.161,682


quilômetros quadrados, o equivalente ao território de cinco países, somados: França,
Espanha, Suécia e Grécia. O Estado detém um dos mais baixos índices de densidade
demográfica do país, com 2,23 habitantes por quilômetro quadrado, conforme dados
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A população do Estado, de acordo com o Censo 2010, tem 3.483,985 habitantes,
dos quais 2.755.490 vivem na área urbana e 728.495 na área rural. A capital Manaus,
um dos 62 municípios do Amazonas, é a cidade mais populosa da Região Norte, com
1.802.525 habitantes (IBGE, 2010).
O IBGE identificou 65 grupos indígenas no Estado, que detém a maior população
de índios do País, no total de 168.680, de acordo com o Censo 2010. O Amazonas
detém, ainda, 98% de sua cobertura florestal preservada, além de um dos maiores
mananciais de água doce. Sofrendo influência de vários fatores como precipitação,
vegetação e altitude, a água forma na região a maior rede hidrográfica do planeta.
A maioria dos rios amazonenses é navegável durante todo o ano. O rio Amazonas é
internacionalmente conhecido como o maior do mundo, possuindo um curso calculado
em 6.300 quilômetros. Seu arco atlântico tem a extensão de 400 quilômetros. Nasce
presumivelmente na lagoa Santana (Andes Ocidentais), onde sua bacia de recepção é
um rio de geleira.

INFLUÊNCIA ECONÔMICA

Segundo SILVA (2013, p.767):

O imperativo de existência digna a todos, de que resulta a igualdade das


pessoas em dignidade, pode ser ainda captado a partir do princípio fundante
do Estado brasileiro, previsto no art. 1º, III, da Constituição, e dos direitos
fundamentais individuais e sociais, insculpidos na Carta Magna, conforme
os artigos 5º, caput, 6º, 7º e 14º. A soberania nacional significa que a ordem
econômica é pautada por um modelo de desenvolvimento nacional, autônomo,
sem ingerências externas. Modelo esse que visa reequilibrar a posição de
inferioridade das pessoas menos favorecidas econômica e socialmente.
(RESENHA ELEITORAL, 2005)

As figurações sociais possibilitam a análise dos processos de apropriação de


recursos naturais enquanto projetos territoriais, que são as estratégias políticas que

66 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


envolvem atores e instituições sociais que tentam legitimar e/ou institucionalizar
modelos de regulação, de acesso e de uso desses recursos. Para compreender as tensões
entre os diferentes projetos territoriais, numa figuração específica, e se distanciar das
propostas pautadas na descontinuidade e unilateralidade, uso o conceito de processos
de territorialização (CUNHA, SILVA e NUNES, 2008).
A Ecologia Política aqui proposta, portanto, parte da ideia de que mudança
ambiental e os processos de territorialização são equivalentes, pois refletem
transformações nas relações entre sociedades e naturezas. A diferença entre as
duas categorias analíticas é que os processos de mudança ambiental focalizam as
transformações ambientais provocadas pelas práticas dos atores sociais, ao passo que
os processos de territorialização centram-se no entrelaçamento das práticas dos atores
sociais e seus efeitos sobre o espaço (CUNHA, SILVA e NUNES, 2008).

CRESCIMENTO ECONÔMICO DA REGIÃO AMAZÔNICA

Houve várias tentativas de povoamento e desenvolvimento econômico na


região amazônica. Na colonização, a preocupação portuguesa era estratégica, tendo a
intenção de efetuar a ocupação das terras do seu território a fim de evitar as invasões
estrangeiras, para isso estabeleceu colônias na região norte, baseada na economia
extrativista, permanecendo assim até o século XIX, quando a borracha passou a ter uma
maior procura devido ao fortalecimento da indústria, principalmente automobilística.
Por quase quatro décadas foi a exploração da borracha que manteve a economia da
região, e para atender a grande demanda extrativista do látex foi atraída para a região
a mão-de-obra do nordeste e uma maior interiorização das extrações.
No século XX perdemos o status de principal exportador internacional de látex
para a borracha asiática, quando então entrou em crise sua atividade extrativa no Brasil.
Entre os anos 50 e 70 ocorreram alguns empreendimentos isolados de desenvolvimento
da região, mantendo mesmo assim sua cobertura florestal quase intacta, sendo iniciado
o desmatamento da área para a abertura de estradas, principalmente a transamazônica,
que deveria cortar a região de leste à oeste, iniciando o Plano de Integração Nacional
(PIN) que também promoveu uma campanha de criação de agrovilas para assentamento
de aproximadamente 6.000 famílias às margens da rodovia.
Esse povoamento, a exploração madeireira e o avanço da pecuária junto com a
agricultura, tiveram como consequência um maior desmatamento da região, fazendo
com que a população amazônica passasse de 7,3 milhões de habitantes para 21 milhões
de habitantes no período entre os anos de 1970 e 2000. A formação de cidades e a
especulação imobiliária na área também foi responsável pelo aquecimento da economia

67 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


e o aumento do desmatamento.
A indústria foi também atraída para a região visando os benefícios com incentivos
fiscais e créditos a juros mais baixos nesse mesmo período, em virtude de programas
promovidos pelo governo para incentivo, tanto da ocupação, quanto para incentivo da
economia na Amazônia Legal.
A formação de médios e grandes latifúndios de agricultura mecanizada,
criação de gado e exploração de madeiras nobres foram os principais responsáveis
pelo aumento do desmatamento e, consequente degradação da floresta, concentrando
também a renda econômica nas mãos de uma minoria e fazendo com que a maioria da
população sobreviva em um precário sistema de subsistência.

OS ASSENTAMENTOS

Segundo Santos (1978), as cidades são os nódulos dos sistemas de fluxos, que
por sua vez, dinamizam a rede urbana e estruturam o território. Na era das cidades
industriais, as redes urbanas se organizavam a partir da influência primordial dos
fluxos materiais. Com a revolução científica e informacional, os fluxos simbólicos
se tornaram mais decisivos na definição das hierarquias urbanas e da capacidade de
polarização de cada um de seus nódulos.
A diversificação das atividades econômicas e as mudanças populacionais
resultantes reestruturaram e reorganizaram a rede de assentamentos humanos na região.
A visão da Amazônia no início do século 21 apresenta padrões e arranjos espaciais de
uma Amazônia diferente: em meio a floresta tropical um tecido urbano complexo se
estruturou, levando a criação e o uso do termo “floresta urbanizada” pelos pesquisadores
que estudam e acompanham o processo de ocupação da região (BECKER, 1995).
O processo histórico de ocupação humana e urbanização da Amazônia não
se deu linearmente e o contexto político e econômico ao longo do tempo foram
determinantes destas flutuações. Atualmente, a urbanização da região encontra-se em
fase de estruturação, caracterizando-se ainda como uma região de “fronteira”, onde a
dinâmica das cidades ainda é muito intensa e estável, incluindo o surgimento de novos
assentamentos urbanos.

IMPACTOS DA ZONA FRANCA DE MANAUS

A Zona Franca de Manaus foi criada na década de 60 com a finalidade de


incentivar a industrialização do Amazonas, o que representou um alavancamento no
desenvolvimento econômico do Estado que até então possuía poucas indústrias para

68 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


atendimento do seu consumo interno como: alimentação, vestuário, calçados, tecidos,
utilidades públicas, madeiras, etc., sendo o setor quase inexistente.
Junto com a Zona Franca de Manaus também foi criado o distrito Agropecuário
do Amazonas – DAM, com a finalidade de incentivar o setor primário na região, tendo
ambos representando um marco divisório no desenvolvimento econômico do Estado
do Amazonas.
Os impactos causados pela criação da Zona Franca têm seus aspectos positivos
e negativos, a constituição desse importante polo industrial de toda região não trouxe
somente consequências benéficas. Na sua implantação já houve uma redução da
atividade agrícola e pecuária, deixando o meio rural de atender às necessidades da
população, reduzindo a base da produção e afetando a economia. Em contrapartida, o
início das atividades da Zona Franca pela necessidade de mão de obra criada trouxe
dos municípios amazonenses e até de outros estados, uma grande migração para a
localidade. Naquele momento não havia condições de oferecer ou melhorar a qualidade
de vida de seus habitantes, que aumentaram no período de existência da Zona Franca.
Ela centralizou a economia do Estado em Manaus, fazendo com que a capital do
Estado arrecadasse anualmente, mais de 90% do total das receitas tributárias do estado
todo, sendo cada vez mais reduzida a participação do interior no total do PIB estadual.
Com o aumento da população na capital para que fosse atendida a demanda de
mão de obra, houve necessidade de uma reestruturação das atividades econômicas do
Estado, tendo em vista que o crescimento populacional do Amazonas foi multiplicado
por quatro desde a implantação da Zona Franca (IBGE, 2002).
Apesar do Distrito Agropecuário possuir uma grande área, cerca de 590.000
hectares, ele é situado em área de terra firme, possui mais de duzentos projetos aprovados
e que rendem atividades para mais de quatro mil pessoas. Entretanto, não atingiu
a eficácia pretendida, considerando que o melhor solo para cultivo no Amazonas é
localizado na várzea e não na terra firme onde é situado o Distrito. Também contribuiu
para essa baixa eficiência a necessidade de grande quantidade de fertilizantes e adubos
a fim de tentar corrigir o solo para utilização, bem como a falta de tradição agrícola
no Estado, ficando a participação agrícola no PIB do Estado em declínio desde a
implantação da Zona Franca.

DIREITO À MORADIA

Trata-se de direito social de acesso, consagrado pelo simples fato de o indivíduo


existir. Através dele, faz-se a justiça distributiva, repassando bens à sociedade por meio
do capital produzido pela mesma (BARIN, 2006).

69 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


A propriedade privada constitui um dos alicerces da ordem econômica. Consiste
no direito subjetivo conferido a uma pessoa de explorar com exclusividade um bem e
de fazer valer esta faculdade contra outrem que queira a ela se opor. Esta é condicionada
à sua função social. Disso decorre que deve ser respeitado o direito exclusivo do dono
sobre determinado bem. Porém, exige-se que a sua utilização seja voltada ao bem-estar
geral da sociedade, nos termos dos arts. 182, § 2º, e 186 da Constituição (RESENHA
ELEITORAL, 2005).
É notável que, apesar das diversas definições, uma visão prevalece: o direito
à moradia é inerente a todo indivíduo, “[...] em face da natureza de direito essencial
referente à personalidade humana” (SOUZA, 2004, p.46). Logo, apresenta um conjunto
de garantias indispensáveis à promoção da dignidade humana, em uma sociedade livre,
justa, solidária e ecologicamente equilibrada.

JURISDIÇÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

Consta do Preâmbulo da Constituição que a justiça é um dos valores supremos


da sociedade, tal qual a harmonia social e a liberdade. Segundo Gebran Neto (2002),
apesar de destituído de grande concretude, o Preâmbulo presta-se como norte
interpretativo de todo o texto constitucional. Daí resulta a importância do valor justiça
estar consagrado também em sede preambular. Por outro lado, o valor justiça, quando
expresso em algum artigo da Constituição, costuma estar sempre associado à ideia de
Justiça social.
Nesses termos, o primeiro inciso do art. 3º da Constituição estabelece que a
construção de uma sociedade que seja justa é um objetivo fundamental da República
Federativa do Brasil. Ao circunscrever a justiça ao espaço da sociedade, o texto
legal refere, em síntese, que a promoção da justiça na sociedade é um fim do Estado
brasileiro. Semanticamente, isso equivale a dizer que se constitui em meta da República
Federativa do Brasil a promoção da justiça social.
Inicialmente é possível destacar e decompor do caput do art. 170 da Carta
Magna as seguintes locuções: ordem econômica, valorização do trabalho humano,
livre iniciativa, existência digna, justiça social e princípios. Examinando-as da
perspectiva do sentido em que são empregadas, observa-se que a expressão justiça
social condiciona todas as demais. Ou seja, tanto a ordem econômica, a valorização do
trabalho humano, a livre iniciativa e a existência digna devem ser desenvolvidas para
realizar a justiça social, de acordo com os seus ditames. Em outros termos, é a justiça
social que conforma o fim da ordem econômica de assegurar existência digna a todos.
O direito interno não está isolado no contexto global. A Constituição brasileira

70 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


reflete o desenvolvimento do direito internacional no reconhecimento e respeito às
diferenças étnicas, culturais e sociais das sociedades nacionais (GOMES, 2012).
As Declarações servem como “princípios jurídicos” que orientam instrumentos
e ações, as Convenções, por serem Tratados, geram obrigações, vinculando os países
na ordem internacional e impondo sanções em caso de descumprimento das normas
acordadas (SHIRAISHI, 2007).
A essencialidade do direito à moradia é caracterizada por termos como alojamento,
na forma que se apresenta na Declaração Universal dos Direitos da Pessoa, no art. 25:1,
ou também como deve ser regulada através de moradias adequadas, demonstrado no
Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, no art. 11: 1, assim
como a uma melhoria contínua de suas condições de vida (CASTILHO, 2018).
Aos Estados membros que, estendeu-se ao elaborarem as suas Constituições
Estaduais a partir de 1989, reconheceram de forma explícita as diversas situações
envolvendo povos e comunidades tradicionais existentes em seus territórios
(SHIRAISHI, 2007).
Direitos econômicos, sociais e culturais são veiculados por normas que
estabelecem diretrizes ou deveres aos órgãos estatais, ao passo que direitos civis e
políticos podem ser simplesmente enunciados como proposituras ao indivíduo
(CASTILHO, 2018).
Elencando a promoção da dignidade humana e para obtenção da efetividade
dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais, não se pode deixar de
mencionar a importância dos direitos sociais aludindo às situações que representam as
desigualdades da sociedade que sejam supridas em si, com dignidade e qualidade de
vida (BUZINARO, 2013).
Para tanto, ou seja, para que a Justiça social possa ser atingida, é necessária a
observância de alguns princípios. Isso equivale a dizer que os princípios, previstos nos
nove incisos do art. 170, também são vinculados à realização da Justiça social.
O Brasil é um país de contrastes econômicos e sociais. Enquanto determinadas
regiões e setores brasileiros desfrutam de grande desenvolvimento econômico e
social, a maioria da população convive em meio à miséria, à falta de serviços públicos
adequados e à míngua, até, de perspectivas de vida.
No entanto, na Amazônia, a despeito de toda legislação vigente, a questão da
sobrevivência sobrepuja as questões preservacionista e legal. A região tem propiciado,
ao mundo, elementos de bem-estar material e espiritual, contudo, não têm sido criadas,
na mesma proporção, condições existenciais para as próprias populações amazônicas
(LIRA, 2015).

71 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


POLÍTICAS SOCIAIS DE MORADIA

Expressões como “desenvolvimento local sustentável” e “participação


comunitária” são recorrentes e passam a funcionar como formas adjetivadas sejam no
discurso das entidades multilaterais, seja naquele dos aparatos governamentais. Em
contrapartida, segundo Shiraishi (2007), a expressão “conflitos socioambientais” ganha
corpo nas agendas oficiais, que paulatinamente vão incorporando uma nova linguagem
característica das formas renovadas de reivindicação dos movimentos sociais.
A Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais tem por objetivo específico promover o citado “desenvolvimento
sustentável” com ênfase no reconhecimento, fortalecimento e garantia dos seus
direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos e culturais. Preconiza também o
respeito e valorização da identidade de povos e comunidades tradicionais, bem como
de suas formas de organização e de suas diferentes instituições. A referida Política está
estruturada a partir de quatro eixos estratégicos: Acesso aos Territórios Tradicionais
e aos Recursos Naturais; Infraestrutura; Inclusão Social e Fomento e Produção
Sustentável (SHIRAISHI, 2007).
Esta compreensão acerca da relação entre política e ação pública revela uma
importante distinção: a de que política pública e decisão política não são a mesma
coisa. A política pública é o resultado de um conjunto de diferentes decisões e ações
estratégicas selecionadas ou demandadas para implementar aquilo que foi decidido ou
deliberado. Já a decisão política tem a ver com a escolha feita dentre uma diversidade
de possibilidades. Tem a ver também com a hierarquia das referências dos atores
envolvidos, expressando uma certa adequação entre os fins pretendidos e os meios
disponíveis. “Assim, embora uma política pública implique decisão política, nem toda
decisão política chega a constituir uma política pública” (Idem, 2007, p. 232).

ESTATUTO DA CIDADE E O DESAMPARO HABITACIONAL

A Constituição Federal de 1988 tratou, pela primeira vez na nossa história, do direito
urbanístico e dedicou um capítulo à política urbana. Colocou para a propriedade urbana a
necessidade de cumprir sua função social. A ação dos municípios passou a depender da
edição de uma lei federal de diretrizes gerais da política urbana (ARRUDA, 2011).
Desta forma, o Estatuto da Cidade foi criado com o objetivo de garantir o Direito
à Cidade para todos, definindo os instrumentos que devem ser aplicados ao município
para organizar seus territórios e respeitar a função social da propriedade. Assim

72 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


como define o Plano Diretor, que aplica as regras do Estatuto em cada município,
considerando as características de cada um, sendo obrigatória sua implementação. É
ele que detalha e desenvolve os artigos 182 e 183 do capítulo de política urbana da
Constituição Federal (SENADO FEDERAL, 2011).
O Estatuto foi elaborado levando em conta a mudança do campo para as cidades
de 80 milhões de pessoas, entre as décadas de 1940 e 1980. No início da década de 80,
foi proposta a Lei de Desenvolvimento Urbano. A discussão em torno dela repercutiu
na Assembleia Nacional Constituinte e, em 1989, já em vigor a nova Constituição, o
senador Pompeu de Souza apresentou um projeto de Estatuto da Cidade. Anos mais
tarde, coube-me a relatoria e a apresentação de substitutivo ao antigo projeto, finalmente
tornado lei em 2001 (SENADO FEDERAL, 2011).
De acordo com Mendes (2015), a natureza do direito à moradia apresenta-se em
prestações fáticas e normativas que se traduzem em medidas de proteção de caráter
organizatório e procedimental. Ademais, o exemplo para tal tratativa, está disposta no
Estatuto da Cidade, ao traçar diretrizes gerais de política urbana, garantindo o direito à
moradia digno no Brasil e implementar subsídios para sua concretização.
O Estatuto da Cidade desta forma estabelece que ao instrumento do Plano Diretor,
aprovado por lei municipal, torna-se essencial e básico a política de desenvolvimento
regional e expansão urbana. Ele confere aos municípios a função de formular diretrizes
de planejamento urbano (BARTOLI, 2018).
O Estatuto da Cidade determina que o Plano Diretor é obrigatório para os
municípios que: têm mais de 20 mil habitantes; fazem parte de regiões metropolitanas;
são turísticos ou têm grandes obras que colocam o meio ambiente em risco ou que
mudam muito a região, como gasodutos, aeroportos, rodovias, grandes áreas de
mineração, barragens e hidrelétricas.
No estado do Amazonas os seguintes municípios precisam fazer o Plano Diretor:
Autazes, Barcelos, Barreirinha, Benjamin Constant, Boca do Acre, Borba, Carauari,
Careiro, Coari, Eirunepé, Fonte Boa, Humaitá, Iranduba, Itacoatiara, Jutaí, Lábrea,
Manacapuru, Manaus, Manicoré, Maués, Nova Olinda do Norte, Parintins, Santo
Antônio do Içá, São Gabriel da Cachoeira, São Paulo de Olivença, Tabatinga, Tapauá,
Tefé, Nhamundá, Novo Airão, Presidente Figueiredo, Rio Preto da Eva, Anamã, Anori,
Caapiranga, Codajás (PLANO DIRETOR NA AMAZÔNIA, 2010).
A parte mais importante do Plano Diretor está na definição de princípios,
diretrizes e objetivas para a política territorial, pois reconhecem os direitos, tais como
o direito à moradia digna e a terra, à cidade, ao meio ambiente, às cidades sustentáveis,
às diversidades culturais, entre outros que devem ser utilizados para todas as decisões
e ações tomadas na gestão da sua cidade. Os instrumentos urbanísticos, ferramentas

73 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


que ajudam no cumprimento dos objetivos dos planos diretores, devem ser pensados a
partir dos princípios do Plano, nesses casos são exigidos pela população que orientarão
a gestão democrática do Plano que será fiscalizado pelo Ministério Público, por
meio do promotor de justiça. Se as ações da Prefeitura não estiverem obedecendo
a esses princípios, elas podem ser questionadas na Justiça (PLANO DIRETOR DO
AMAZONAS, 2003).
Desta forma, a principal ideia do Plano é promover o direito às cidades
sustentáveis. Ou seja, uma cidade sustentável desde que determine e implemente as
funções sociais da cidade, da terra e da moradia, de forma a assegurar a todos o direito
a uma vida digna, reduzindo a discriminação, as desigualdades sociais e a pobreza
e fazendo a justiça social; não comprometa as futuras gerações, garantindo a cidade
para as gerações futuras, que possibilite que todos tenham acesso a um padrão de vida
digna, ao trabalho, ao lazer, à cultura, ao transporte público, aos recursos básicos (água,
energia, etc.), à educação, aos serviços de saúde, alimentação, segurança, entre outros;
possibilite que todos participem do desenvolvimento econômico, social, cultural e
político, de forma a poderem contribuir e também desfrutar desse desenvolvimento;
promova uma melhor distribuição de renda. Assim, dizer que o Plano Diretor deve
promover o desenvolvimento sustentável significa que ele deve ter princípios, diretrizes,
objetivos e instrumentos para que tudo isso aconteça.
Em contrapartida, segundo Bartoli (2018), a maioria das cidades, por terem
experimentado apenas um surto de crescimento econômico, não alteraram seus
conteúdos, estrutura e complexidade, permanecendo na condição de lugares centrais,
não possuindo estrutura habitacional organizada. Também sinaliza que, ao contrário do
estabelecido pela teoria dos lugares centrais, o processo de consolidação dessas cidades
não leva à regularidade espacial da influência desses fluxos, onde as condições naturais
das cidades na Amazônia provavelmente criam localizações de núcleos dispersos,
enquanto que diferenciações sociais para o comércio podem criar padrões regionais de
agrupamentos de cidades.
Desta forma como conceituam Costa et al. (2014), nos países de economia
periférica os agentes não capitalistas - tais como os proprietários fundiários e,
principalmente, os invasores e ocupantes de terrenos - têm uma participação importante
na estruturação das cidades, assim como o Estado.
O processo de urbanização na Amazônia não se dá necessariamente pela presença
de cidades na paisagem regional (urbanização do território), mas principalmente
pela difusão da sociedade urbana, que expande, igualmente, a influência urbana. A
generalização do fenômeno urbano na Amazônia é discutida a partir da identificação
de processos contraditórios, baseados num tripé: a destruição de formas espaciais

74 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


existentes, a criação de resistências e a reconstrução de formas e conteúdos espaciais
dotados de novas dimensões e significados. O autor concebe que a prática sócio
espacial, lugar geográfico da ação social, é reveladora de constituir alternativas de
liberação de relações na cidade (BARTOLI, 2018).
De acordo com o Censo IBGE de 2010, mais de 80% da população da Amazônia
Legal vive em cidades de diferentes dimensões. Em 2000, 27% da população urbana
vivia em 639 cidades (com menos de 20 mil habitantes), as quais representavam,
aproximadamente, 84% do total de 760 cidades sedes dos municípios localizados na
Amazônia Legal (COSTA et al., 2014). Em 2010, essa porcentagem diminuiu para
82%; entretanto, as pequenas cidades continuam predominando.
No entender de Costa e Brondizio (2011), essas pequenas cidades, apesar de
possuírem economia frágil, forte dependência do repasse dos subsídios do governo
federal e baixa competência em oferecer serviços e equipamentos urbanos, tais como
educação, saúde e infraestrutura, cumprem um papel importante na rede urbana da
Amazônia. Para os autores, essas cidades funcionam como salvaguarda para as famílias
rurais acessarem os serviços urbanos e oportunidades de emprego, que são precárias
ou inexistentes nas áreas rurais.
No processo de crescimento urbano, no que ensinam a lógica do mercado
imobiliário propicia a divisão da cidade em cidade legal e cidade ilegal (MARICATO,
2002). A cidade legal é aquela parte da cidade que é contemplada pelo poder público
que busca suprir as necessidades de infraestrutura, além de ser valorizada pelo
mercado imobiliário. Ao mesmo tempo, a “cidade ilegal” se refere à porção irregular
da cidade, não reconhecida pelo poder público em termos de planos urbanísticos, sendo
caracterizada como o “lugar fora das ideias”.
Monte-Mór (2009), aponta ainda situação de fragilidade das redes urbanas
amazônicas devido à existência de uma série de impedimentos como: as grandes
distâncias que separam as capitais das demais cidades, a carência de infraestrutura
(transporte e comunicação), e a grande proporção de população desprovida de recursos
materiais e educacionais decisivos para sua participação ativa nos diversos tipos de
fluxos. Para o autor, os fluxos não podem se realizar se não há uma rede de comunicações
adequada às suas características, sendo assim, um impedimento para uma propagação
mais rápida de inovações exógenas.
O Estado desempenha múltiplos papéis em relação à produção do espaço. Essa
multiplicidade decorre do fato de o Estado constituir uma arena em que diferentes
conflitos se enfrentam (CORRÊA, 2011). De acordo com o autor, as possibilidades de
ação do Estado incluem, dentre outras: a) estabelecer o marco jurídico (leis, regras,
normas, posturas) de produção e uso do espaço; b) taxar a propriedade fundiária, as

75 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


edificações, o uso da terra e as atividades produtivas: diferenciais espaciais dessa
taxação refletem e condicionam a diferenciação sócio espacial no espaço urbano;
c) controlar o mercado fundiário, tornando-se, sob certas condições, proprietário de
glebas que poderão ser permutadas com outros agentes sociais; d) tornar-se promotor
imobiliário, investindo na produção de imóveis residenciais em determinados locais
do espaço intra urbano para determinados grupos sociais. (COSTA; MENDES; LIMA;
MOREIRA, 2013).
Estimula-se desta forma, a atualização do direito de propriedade, de forma a torná-
lo mais receptível à proteção do meio ambiente, isto é, reescrevendo-o sob a marca da
sustentabilidade. Dessa maneira então, em escalas variáveis, uma nova dominialidade
dos recursos naturais, seja pela alteração direta do domínio de certos recursos ambientais
(água, por ex.), seja pela mitigação dos exageros degradadores do direito de propriedade,
com a ecologização de sua função social (CANOTILHO, 2015).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Amazônia passou por diversas transformações econômicas, políticas e


sociais, desde os primórdios da exploração portuguesa em suas terras. A distribuição
populacional na região amazônica, causa de processos econômicos desproporcionais
às necessidades da sociedade, oriunda de fatos exploratórios difusos que a tornam
única e complexa.
Não há como citar a conquista da Amazônia sem citar a ocupação histórica da
região, a partir das condições exploratórias que dizimaram populações, distanciaram
sociedades de grandes centros urbanos, atreladas a uma economia predatória
essencialmente ligada aos projetos de ocupação territorial da região.
Ainda nos dias atuais, tem-se a região amazônica como um grande espaço vazio,
com a necessidade única e exclusiva de habitá-la e comercializá-la, sem ao menos
levar em consideração a necessidade iminente da população, que em sua maioria vive
em condições precárias e distantes dos grandes centros comerciais.
O reflexo desta estrutura organizacional social e econômica dá-se em como a
população está distribuída na região. A maioria das famílias que foram mandadas ao
interior da Amazônia, com a necessidade da atividade laboral para sobrevivência, acabou
por sofrer com as quedas dos ciclos econômicos da região, sejam elas o extrativismo, o
regime exploratório da borracha, assim como a industrialização da região, acabou por
permanecerem isoladas nessas localidades.
São encontrados na região acessos restritos de políticas públicas e direito desigual
de ordenamento do território, percebido pela diferença notada entre as zonas rural

76 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


e urbana, atrelada diretamente ao contingente habitacional. Há uma má distribuição
de renda e políticas de moradia, quando se considera de forma direta a atuação
conjunta dos entes municipal e federal. Nota-se a quebra de preceitos fundamentais
da Constituição Federal, subordinados aos direitos sociais, intimamente ligados ao
princípio da dignidade humana.
É preciso o respeito à identidade cultural, sem esquecer que a Amazônia comporta
o maior bioma do mundo, e que as políticas de moradia devem ser saneadoras de
intervenções ambientais drásticas que não consideram a complexidade natural da região.
Desta forma, é necessária a análise espacial para compreender os processos
na Amazônia, sendo os mesmos muito complexos, tais como, projetos de veiculação
urbana e trabalhos de melhoria dignos de moradia. É preciso falar de comunidade, com
a comunidade, para que haja o atendimento das necessidades da mesma. Trazê-la para os
bancos de discussões e propostas e colocá-las em seus lugares de falas e oportunidades.
O Brasil é um país de contrastes econômicos e sociais. Enquanto determinadas
regiões desfrutam de grande desenvolvimento econômico e social, a maioria da
população convive em meio à miséria, à falta de serviços públicos adequados e sem o
devido tratamento digno. Ademais, na Amazônia, a despeito de toda legislação vigente,
a questão da sobrevivência e condições dignas de moradia sobrepuja as questões
preservacionistas e legais.

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80 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


5.
OS REFLEXOS DA LEI SANSÃO E AS
CRÍTICAS AO ESPECISMO LEGISLATIVO APLICADO NA LEI
Nº 14.064/2020

Goreth Campos Rubim1


Denison Melo de Aguiar2

INTRODUÇÃO

Diante de tantas atrocidades praticadas contra os animais, a Lei nº 14.064/2020


(BRASIL, 2020) que alterou o art. 32 da Lei nº 9.605/98 (BRASIL, 1998), trouxe
um novo ar de esperança, ao qualificar o crime de maus tratos praticado contra cães
e gatos, definindo a pena de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos de reclusão, multa
e proibição da guarda do animal, no art. 32, §2º, da Lei nº 9.605/98 (BRASIL, 1998).
Entretanto, observou-se que a alteração legislativa que qualificou o crime de
maus tratos contra cães e gatos, excluiu as demais espécies da fauna brasileira dos
benefícios processuais penais relacionados a pena de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco)
anos de reclusão, de maneira que se indaga: o qual motivo do especismo ter sido
aplicado na circunstância qualificadora de pena prevista no art. 32, §1º da Lei nº
9.605/98 (BRASIL, 1998)?

1 Advogada. Mestre em Segurança Pública, Cidadania e Direitos Humanos pela Universidade do


Estado do Amazonas. Professora de Direito Penal e Processual Penal do Centro Universitário do
Norte – UNINORTE. Membro da Clínica de Direito dos Animais (YINUAKA-UEA). E-mail:
goreth.rubim.adv@hotmail.com
2 Advogado.. Graduado em Direito pela Universidade da Amazônia. Mestre em Direito Ambiental
pelo Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas
(PPGDA-UEA). Professor da Universidade do Estado do Amazonas (UEA). Doutorando pelo
Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Estado de Minas Gerias
(PPGD-UFMG). Coordenador da Clínica de Direito dos Animais (YINUAKA-UEA). Lattes:
http://lattes.cnpq.br/9956374214863816 ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5903-4203 E-mail:
denisonaguiarx@hotmail.com

81 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Nesta pesquisa, busca-se abordar a evolução histórica do protecionismo animal
no Brasil, assim como as vertentes do protecionismo animal; a importância do aumento
de pena aos crimes de maus tratos para todos os animais; os reflexos processuais penais
provenientes da Lei Federal nº 14.064/2020 (BRASIL, 2020).
O objetivo principal deste estudo, é retratar as os perigos do pensamento
especista que protege apenas alguns animais em detrimento de outros, colocando toda
a fauna brasileira em risco a atos cruéis e até mesmo de extinção de algumas espécies
de animais. Diante deste anseio, a sociedade brasileira precisa, visando garantir um
meio ambiente saudável para as futuras gerações, exigir de nossos legisladores, leis
mais severas, que garantam maior proteção aos animais contra atos cruéis e que lhes
ocasionem qualquer tipo sofrimento.
A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e legislativa. Num primeiro
momento, foi feito o levantamento de artigos científicos e livros que abordam sobre a
temática de maus-tratos e o caso sanção no Brasil, bem como documentos que tratem
sobre a repercussão no caso, num segundo momento houve o levantamento e relação
entre as leis do Brasil que evidenciam o caso concreto do Sanção. É importante destacar
que houveram várias mudanças quando se trata do tema, por exemplo, modificações
legislativas sobre a punibilidade dos crimes contra animais. Dessa forma, a pergunta
científica deste é sintetizada no seguinte: Quais são os reflexos da lei sansão? Quais
são as críticas ao especismo legislativo aplicado na lei nº 14.064/2020?

A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DO DIREITO DOS ANIMAIS E O DIREITO


A UMA VIDA DIGNA LIVRE DE ATOS DE CRUELDADE

Em 27 de janeiro de 1978, a Organização das Nações Unidas para a Educação,


Ciência e Cultura (UNESCO, 19978), em uma reunião realizada em Bruxelas - Bélgica,
através de uma proposta legislativa em âmbito internacional criada por ativistas da causa
animal em 1977 em Paris, que lutavam contra a utilização de animais para prática de
experiências laboratoriais, ocasionando-lhes sofrimento indiscriminado, estabeleceu a
Declaração Universal do Direito dos Animais.
Quase todos os países do mundo, inclusive o Brasil, tornaram-se signatários desta
declaração, com o objetivo de não ignorar o respeito à vida dos animais. Entretanto,
mesmo sem ter força e imponência de lei, a Declaração Universal ao Direito dos
Animais tornou-se um marco na legislação dos países signatários, no qual passaram a
posteriormente a criar leis que visassem o respeito à fauna.
A Declaração Universal do Direito dos Animais (UNESCO, 1978) foi uma obra
capaz de mostrar ao mundo em plena década de 70, uma nova filosofia de vida, ao

82 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


reconhecer a importância do valor da vida de todos os seres vivos, propondo ao ser
humano mais respeito à dignidade dos animais.
Conforme (Rodrigues, 2013, p. 209 e 2010):

Em outras palavras; é obrigatório compreender o direito à vida dos Animais


não-humanos igualmente ao direito dos não humanos, ou seja, há de ser
reverenciada a vida em sua existência até os limites naturais. Seres sensíveis,
com capacidade de sofrer, independentemente do grau da dor ou da capacidade
da manifestação, devem ser respaldados pelo princípio da igualdade e fazem
jus a uma tal consideração ética. Infligir dor aos Animais não- humanos não
desculpa qualquer tese de domínio dos interesses do homem, sobretudo
quando o fim é a lucratividade.

Ademais, intimamente relacionado ao direito à vida é a proteção ao direito ao


não sofrimento, uma vez que analisado à luz do princípio de igualdade de interesses, se
ao ser humano é garantida a proteção contra atos de crueldade e sofrimento, por qual
motivo este direito não deveria ser estendido e garantido aos animais?
Segundo (DIAS, 2000, p.333), a Declaração Universal do Direito dos Animais
“esse documento é um convite para o homem renunciar à sua atual conduta de exploração
dos animais e, progressivamente, ao seu modo de vida e ao antropocentrismo, para
ir de encontro do biocentrismo. Por essa razão, representa uma etapa importante na
história da evolução humana”. Por exemplo, um dos Direitos mais importantes é o
Direito à vida.
A Declaração Universal do Direito dos Animais apesar de ter sido criada na
década de 1970, serviu e ainda serve de embasamento jurídico para a criação de leis
que visem a aplicação do protecionismo animal, protegendo a fauna e punindo quem
pratica atos de crueldade contra os animais.
Alguns países como Bruxelas, Espanha, Portugal, França, Nova Zelândia,
Alemanha, Áustria e Suíça já reconheceram a senciência animal, que é o termo aplicado
à capacidade do sujeito em receber e reagir a estímulos externos de forma consciente,
demonstrando sensações de bem estar e de sofrimento.
Nos países acima elencados, a legislação local de cada um deles, deixou de tratar
os animais não humanos como objetos, vindo a tratá-los como seres vivos dotados de
sensibilidade, conferindo-lhes o status de sujeitos de direitos perante a sociedade.

O PROTECIONISMO ANIMAL NO BRASIL

A primeira legislação de proteção aos animais no Brasil foi criada em 1924,


através do Decreto Lei nº 16.590 (BRASIL, 1924), que determinava a proibição de

83 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


rinhas de galo e canário, assim como proibiu as corridas de touros, novilhos e garraios,
dispondo também sobre o funcionamento dos estabelecimentos de distração pública.
Em 1934, no período da ditadura militar, foi criado pelo Presidente Getúlio
Vargas, o Decreto Lei nº 24.645 de 1934 (BRASIL, 1934), chamado de Lei dos Animais,
que reforçava a proteção jurídica dos animais definindo condutas que configuravam o
tipo penal de maus tratos, além de regulamentar a utilização de animais em tração
de veículos, com algumas exigências legislativas em favor dos animais. Ademais, a
referida lei determinava a prisão para o sujeito que fosse reincidente, ou ocasionasse
a morte ou mutilação de algum animal, além do confisco do animal e a aplicação da
pena de multa. Ao Ministério Público cabia a responsabilidade de assistir os animais
em juízo, na qualidade substitutos legais.
No de 1941, a foi revogado pelo Decreto Lei nº 24.645 de 1934 (BRASIL, 1934),
após a criação da conduta típica de maus tratos aos animais no art. 64 do Decreto Lei
nº 3.688 (Lei de Contravenções Penais) (BRASIL, 1941), que estipulava a pena de
prisão simples, de 10(dez) dias a 1(um) mês, ou multa, de cem a quinhentos mil réis
para quem viesse a praticar atos cruéis contra os animais ou os submetesse a trabalho
excessivo. Em fevereiro de 1967, foi criado o Decreto Lei nº 221 (BRASIL, 1967),
conhecido como Código de Pesca, com o objetivo de garantir a proteção dos animais
aquáticos e disciplinar a atividade de pesca.
Em 1964, foi criado o art. 19 da Lei Federal 4.591 (BRASIL, 1964), que somando-
se aos dispositivos do Código Civil de 1916 (BRASIL, 1916), passou a garantir
amparo aos animais que vivem em condomínio de apartamentos, a referida legislação
sobrepunha-se às convenções condominiais com cláusulas de proibição de animais em
apartamentos, uma vez que o referido artigo dispõe a garantia do condômino usar e
usufruir, com exclusividade a sua unidade autônoma.
No ano de 1973, o Brasil tornou-se signatário da Convenção sobre o Comércio
Internacional de Espécies de Flora e Fauna Selvagem em Perigo de Extinção (BRASIL,
1973), elaborada Washington, cujo objetivo principal era impedir o comércio ilegal
de animais silvestres, bem como regulamentar o comércio internacional de animais,
principalmente quanto a saída e entrada deles em território brasileiro. Em 8 de maio de
1979, foi criada a Lei nº 6.638 (BRASIL, 1979), diante das discussões quanto ao uso de
animais vivos para estudos científicos sobre a sua fisionomia anatômica, disciplinando
sobre a prática da vivissecção.
Na data 31 de setembro de 1981, foi dada uma nova redação à Lei de Política Nacional do
Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) (BRASIL, 1981), sendo apresentada uma definição de fauna
como parte do meio ambiente, determinando a criação de políticas públicas governamentais,
além de disciplinar a responsabilidade civil e administrativa do dano ambiental.

84 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


No ano de 1985, entrou em vigência a Lei nº 7.347 (BRASIL, 1985), cuja
finalidade era proteger os interesses difusos, e consequentemente a fauna, instituindo a
ação civil pública por danos ocasionados ao ambiente.
No dia de 18 de fevereiro de 1987, a Lei nº 7.643 (Lei de Proteção à Baleia)
(BRASIL, 1987) determinou a proibição a pesca de toda a espécie de cetáceos,
ocasionando a alteração no Código de Pesca (Decreto Lei 221/67), pela Lei 7.679/88
(BRASIL, 1988).
Com a vigência da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988 a), foi criado
no capítulo VI, disposições relacionadas ao meio ambiente. O art. 225, § 1º, inciso VII,
da Carta Magna brasileira prevê o seguinte:

Art.225 da CF/88. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente


equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e gerações futuras.
§1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies
ou submetam os animais à crueldade.

A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), foi a primeira carta


constitucional que passou a se preocupar com as questões ambientais, incumbido ao
Poder Público e a própria sociedade brasileira a responsabilidade e a proteção do meio
ambiente para as futuras gerações, obrigando ao Estado a cuidar e proteger a fauna e
flora, além de combater os maus tratos aos animais.
No ano de 1998, foi criada a Lei Federal nº 9.605 (BRASIL, 1998), conhecida
como Lei de Crimes Ambientais, passou a definir os tipos penais praticados contra
o meio ambiental, bem como passou a tutelar os direitos básicos dos animais,
independentemente se eles estão classificados como silvestres, domésticos ou
domesticados, dispondo em nove artigos dos seus oitenta e dois, sobre a conduta típica
de crimes contra a fauna. Além disso, a referida lei dispõe também sobre as sanções
penais e administrativas para as condutas que resultam de atividade lesivas ao ambiente.
Conforme os ensinamentos do professor Canotilho (2004), é importante que as
legislações sempre estejam em constante atualização em conformidade com os anseios
da sociedade visando garantir a proteção dos bens jurídicos mais relevantes.

A doutrina salienta que as normas-fim ecológicas e ambientais


constitucionalmente consagradas têm um caráter dinâmico que implica
um permanente actualização e aperfeiçoamento dos instrumentos jurídicos
destinados à proteção do ambiente perante os novos perigos de agressões
ecológicas (CANOTILHO, 2004, p.182).

85 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Em 29 de setembro de 2020, foi incluído o §1º-A, no art. 32 da Lei 9.605/98
(BRASIL, 1998), por meio da Lei nº 14.064/2020 (BRASIL, 2020), que passou a
prever a penalidade de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, além da multa e proibição
da guarda, para quem vier a maltratar cães e gatos.
Essa grande conquista foi proveniente do projeto de Lei nº 1.095/2019, de autoria
do Deputado Federal Fred Costa, que ganhou força junto ao Congresso Nacional, após
a grande comoção nacional, relacionada ao caso de maus tratos ao cachorro Sansão,
um pitbull jovem, que teve as patas traseiras decepadas por dois indivíduos na cidade
de Confins -Minas Gerais.
Infelizmente, os animais silvestres e domesticados, não foram beneficiados
com essa circunstância qualificadora do delito, em decorrência ideologia especista da
bancada ruralista do Congresso Nacional brasileiro, que visou preservar os interesses
dos empresários da atuantes no ramo da agropecuária, que anualmente faturam milhões
de reais com criação de gado, plantações de soja e oleaginosas, com investimentos nas
empresas de exportação de carnes e de couro. Além da cultura de sofrimento animal de
rodeios e vaquejadas, como forma de entretenimento.

A IMPORTÂNCIA DO AUMENTO DE PENA NO CRIME DE MAUS TRATOS


PARA TODOS OS ANIMAIS

O Conselho Federal de Medicina Veterinária, por meio da Resolução 1.236,


em novembro de 2018 (CFMV, 2018), definiu condutas que configuram os atos maus
tratos contra animais, como por exemplo: abandonar, espancar envenenar; não dar água
e comida diariamente; manter o animal preso em corrente, em local sujo ou pequeno
demais para que o animal possa andar ou correr; deixar o animal sem ventilação ou
luz solar; negar assistência veterinária ao animal doente ou ferido; obrigar o animal
a trabalho excessivo ou superior a sua força; capturar animais silvestres; zoofilia;
promover atos de violências como rinhas de galo, farra de boi, rinhas de pit bulls entre
outros atos.
Diante deste contexto, percebe-se que o ato de maltratar animais é proveniente
de uma ação ou omissão capaz de ocasionar um sofrimento desnecessário física e
psicologicamente a eles.
Exemplos de maus tratos, conforme o entendimento (RODRIGUES, 2013, p.100):

(...) é o homem que muitas vezes atropela cães e gatos e os deixa agonizando
nas vias públicas. O que se vê, são Animais abandonados ou perdidos, muitas
vezes recolhidos pelo Poder Público e submetidos à morte dolorosa e quase

86 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


imediata, muito embora seja clara a obrigação de proteger os animais, imposta
ao Estado é ditada pela Constituição Federal... Isso sem contar a criação de
Animais para venda, em que os filhotes são gerados incessantemente e a
fêmea perde seu ‘valor’ no momento que deixa de procriar.

Através da Lei Federal nº 14.064/2020 (BRASIL, 2020), que incluiu uma


modalidade qualificada no crime de maus tratos aos animais, conforme o art. 32, §1º-A,
da Lei nº 9.605/98 (BRASIL, 1998), somente os animais domésticos cães e gatos foram
beneficiados com o aumento na pena de 2 (dois) a 5 (cinco) anos de reclusão, percebe-
se que os animais silvestres e domesticados, foram lamentavelmente excluídos, caso
venham a ser vítimas de maus tratos, sendo ainda aplicado à eles a regra, do art. 32, caput,
da Lei nº 9.605/98 (BRASIL, 1998), que define a penalidade de detenção de 3 (três)
meses a 1 (um) ano de reclusão, além da pena de multa. Facilitando assim, a exploração
de animais como burros e cavalos com o uso indevido das carroças e charretes, rinhas de
galos, vaquejadas, tráfico de animais silvestres, dentre outras atrocidades.
A qualificadora que gerou o aumento na pena para quem pratica o crime de maus
tratos contra cães e gatos, teria sido um grande avanço legislativo e social no Brasil se
tivesse se estendido a todos os animais e não apenas a duas espécies, pois contribuiria
para a sociedade brasileira a refletir sobre suas condutas e como educar as crianças
com relação ao respeito aos animais não humanos, intimidando quem viesse a pensar
em praticar esse tipo de delito, atingindo a assim a finalidade educativa, repressiva e
preventiva da pena.

OS PRINCIPAIS MOTIVOS PARA QUE O AUMENTO DE PENA NO CRIME


DE MAUS TRATOS FOSSE APLICADO PARA TODOS OS ANIMAIS

Um dos principais motivos para os ativistas do protecionismo animal exigirem


do Poder Legislativo penas maiores para quem maltrata os animais é a impunidade dada
ao autor deste delito. O art. 32 da Lei 9.605/98 (BRASIL, 1998) dispõe da seguinte
forma sobre os maus tratos: “Art.32. Praticar ato de abuso, maus – tratos, ferir ou
mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: Pena –
detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa”.
O fato do autor do crime de maus tratos, que infringe o caput do art. 32 da
Lei nº 9.605/98 (BRASIL, 1998), ser punido apenas com a pena detenção, garante
ao criminoso inúmeros benefícios processuais, principalmente quando se enquadra na
condição de réu primário.

87 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


A primeira medida despenalizadora concedida ao acusado é direito a transação
penal, presente no art.76 da Lei 9.099/95 (BRASIL, 1995), pelo fato do crime de maus
tratos ser considerado infração de menor potencial ofensivo, por sua pena máxima em
abstrato ser inferior a 2 (dois) anos. Nos locais em que não existe a Vara Especializada
em Crimes contra o Meio Ambiente, a prática de maus tratos aos animais é julgada
pelos Juizados Especiais Criminais, e na maioria das vezes termina com a transação
penal oferecida pelo Ministério Público, quando o réu é primário, e não se utilizou deste
benefício no período dos últimos 5 (cinco) anos, permitindo a prestação de serviço
comunitário ou pagamento de cesta básica para instituições de beneficentes.
O segundo benefício concedido ao réu é a aplicação da suspensão condicional do
processo, também conhecida como sursis processual, prevista no art.89 da Lei 9.099/95
(BRASIL, 1995), na qual sendo o autor do crime primário, com bons antecedentes,
não respondendo a nenhum outro processo, pelo fato da pena mínima em abstrato ser
inferior ou igual a um ano, a ele é concedido tal benesse, que suspenderá o processo
de 2 (dois) a 4(quatro) anos, desde que sejam atendidos todos os requisitos legais.
Após o cumprimento das formalidades exigidas no art.89 da Lei 9.099/95, durante o
prazo estipulado pelo magistrado, sem nenhum descumprimento por parte do réu, é
considerada extinta a punibilidade do agente sem o julgamento do mérito no processo.
Outro benefício aplicado ao réu que não esteja na condição de reincidente
específico, é a conversão da pena de detenção em penas alternativas de restritivas de
direitos ou multa, em caso de condenação, conforme o art. 44, §2º, do Código Penal
brasileiro (BRASIL, 1940). Logo, o autor do crime de maus tratos animais, no mínimo
prestará serviço comunitário ou pagará uma cesta básica.
Além dos benefícios expostos acima, caso o crime de maus tratos demore muito
tempo para ser julgado por conta da inércia do Estado diante do seu dever de punir, o
processo criminal poderá prescrever no prazo de 3 (três) anos, se pena for inferior a 1
(um) ano; ou no prazo de 4 (quatro) anos, se pena for igual a 1(um) ano, como prevê o
art. 109, incisos V e VI do CPB (BRASIL, 1940).
Cabe ressaltar que se o criminoso, for menor de 21 (vinte e um) anos na época
do fato ou maior de 70 (setenta) anos na data da sentença, o prazo prescricional será
reduzido pela metade, segundo dispõe o art. 115 do CPB, facilitando a impunidade do
delinquente.
De acordo com (Rodrigues, 2013, p.74):

O Código Penal Brasileiro é deficitário em normas que visem a regulamentar


e reprimir os abusos contra a natureza e os direitos dos Animais, pois
o elemento central do direito penal constitucional é a prévia prescrição
normativa, conforme determina nossa Carta Magna. Há que se considerar,

88 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


também, que, antes da promulgação da Lei dos Crimes Ambientais em 1988,
existia tremenda dificuldade na imposição de sanções devido à existência de
lacunas da lei, ou em outras palavras, ausência de lei para o caso concreto.

Com a criação do Acordo de Não Persecução Penal, previsto no art. 28-A, que
entrou em vigência do Código de Processo Penal Brasileiro, em 24 de dezembro de
2019, por meio da Lei nº 13.964 (BRASIL, 2019), ao investigado, nas hipóteses de não
arquivamento do inquérito policial, e desde que ele tenha confessado formalmente o
delito, é garantido a realização do Acordo de Não Persecução Penal entre o acusado,
representado por seu defensor e o Ministério Público, desde que o crime praticado não
envolva violência ou grave ameaça, e a pena mínima do delito seja inferior a 4 (quatro)
anos, e a medida processual seja suficiente para a reprovação e prevenção do crime.
Em decorrência ao fato dos animais ainda não terem sido reconhecidos no Brasil
como seres sencientes, estando apenas disciplinados na condição de coisas, não é possível
restringir a aplicação do Acordo de Não Persecução Penal, uma vez geraria uma analogia
in malam partem, devido legislador ter deixado uma lacuna quanto ao requisito de que o
crime praticado não envolva do emprego de violência ou grave ameaça, que em regra o
delito não deve ser praticado contra a pessoa humana, e não se estende a atos de violência
contra os objetos ou coisas, excluindo desta forma os animais.

REFLEXOS PROCESSUAIS PENAIS DA LEI FEDERAL Nº 14.064/2020 COM


RELAÇÃO AO CRIME DE MAUS TRATOS CONTRA CÃES E GATOS

Através do projeto de Lei nº 1.095/2019 (BRASIL, 2019), a luta pela causa


animal no Brasil teve um grande avanço legislativo, com a criação da circunstância
qualificadora, presente no §1º -A do art. 32 da Lei 9.605/98 (BRASIL, 1998), que
estabeleceu o aumento de pena para quem viesse a maltratar cães e gatos, a partir do
dia 29 de setembro de 2020, cuja penalidade passou a ser de 2 (dois) a 5 (cinco) anos de
reclusão, além de multa e proibição da guarda, não aplicando-se mais a regra prevista
no caput, do art. 32 da Lei nº 9.605/98 (BRASIL, 1998).
Destaca-se que o projeto de Lei nº 1.095/2019 (BRASIL, 2019), inicialmente
previa o aumento de pena para quem praticasse maus tratos a todos os animais viventes
em território brasileiro. Porém a bancada ruralista, presente no Congresso Nacional
visando proteger os seus interesses econômico provenientes da agropecuária, não
permitiu essa abrangência, limitando- se assim a qualificadora somente aos cães e
gatos, em razão do maior índice de registros policiais atos de crueldade da prática do

89 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


crime de maus tratos perante a Polícia Civil ser contra caninos e felinos.
Com a sanção presidencial da Lei nº 14.064/2020 (BRASIL, 2020), passou a
ser incluído o §1º A, no art. 32 da Lei nº 9.605/98 (BRASIL, 1998), permitindo novas
regras processuais penais passassem a ser aplicadas contra quem viesse a praticar maus
tratos contra cães e gatos no Brasil.
A primeira regra processual benéfica em favor de cães e gatos proveniente do
aumento de pena trazido pela Lei nº 14.064/2020 (BRASIL, 2020), é a possibilidade da
conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva para quem for pego praticando
o crime de maus tratos aos animais contra caninos e felinos, haja vista que o tipo
penal trata-se de um crime doloso, com pena máxima em abstrato superior a 4 (quatro)
anos, como prevê o art. 313, I, do Código de Processo Penal (BRASIL, 1941), desde
presentes os requisitos autorizadores desta medida cautelar, ou seja, fumus comissi
delict e o periculum in libertatis, previstos no art. 312 do CPP (BRASIL, 1941).
Além disso, nas hipóteses de uma prisão em flagrante legal antes de ser convertido
o flagrante em prisão preventiva, não caberá a autoridade policial arbitrar o pagamento
da fiança, haja vista que o pena máxima do crime de maus tratos a cães e gatos é
superior a 4 (quatro) anos, cabendo apenas a autoridade judiciária o arbitramento do
valor da fiança, após o pedido da liberdade provisória com fiança pelo advogado do
preso, conforme o art. 322 do Código de Processo Penal (BRASIL, 1941).
Quando o crime de maus tratos aos animais for praticado contra cães e gatos,
o autor do delito não terá direito às medidas despenalizadoras aplicada aos crimes de
menor potencial ofensivo como a transação penal, prevista no art.76 da Lei nº 9.099/95
(BRASIL, 1995), uma vez que a pena máxima em abstrato por esse delito é superior a
2 (dois) anos, ou seja, é de 5 (cinco) anos de reclusão, conforme o art. 32, §1º, da Lei nº
9.605/98 (BRASIL, 1998), aplicando assim o procedimento processual penal ordinário.
Ressalta-se que também não será possível a aplicação da suspensão condicional
do processo (sursis processual), presente no art. 89 da Lei nº 9.099/95 (BRASIL,
1995), devido a pena mínima em abstrato do crime de maus tratos aos animais contra
cães e gatos, ser de 2 (dois) anos de reclusão, divergindo da regra para aplicação deste
benefício que exige a pena mínima em abstrato igual ou inferior a 1 (um) ano.
Por fim, outra alteração importante com relação aos maus tratos praticados
contra cães e gatos, diz respeito ao direito material, quanto a causa de extinção da
punibilidade da prescrição, em decorrência o crime de maus tratos contra caninos
e felinos passar a ter um prazo prescricional maior quanto ao reconhecimento da
prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, em razão da pena máxima em
abstrato pela prática do crime de maus tratos contra cães e gatos ser de 5 (cinco) anos.
Logo, o fato criminoso prescreverá em 12 (doze) anos, conforme o art. 109, III, do

90 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Código Penal Brasileiro (BRASIL, 1940). Enquanto que para os outros animais, o
crime de maus tratos prescreverá em 4 (quatro), de acordo com o art. 109, V, do CPB
(BRASIL, 1940), devido à pena máxima em abstrato do caput do art. 32 da Lei nº
9.065/98 (BRASIL, 1998) ser de 1 (um) ano de detenção.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao observarmos o contexto histórico do protecionismo animal constatamos que


com o passar do tempo a nossa sociedade passou a modificar sua mentalidade passando
a criar legislações que protegessem os direitos desses seres, fazendo com os animais
deixassem de serem vistos como meros objetos e cobaias humanas, e viessem a ser
reconhecido como seres vivos com sensibilidades biológicas e emocionais.
A Declaração Universal de Direito dos Animais (UNESCO, 1978) , que mesmo
não tendo força de lei, influenciou as legislações de diversos países signatários, inclusive
o Brasil, para a criação de leis que buscassem garantir mais proteção aos animais, uma
vez que no final da década de 1970, muito já se discutia quanto a utilização de animais
em experimentos humanos, principalmente relacionados a indústria farmacêutica e de
produtos de beleza.
No Brasil, somente no ano de 1988, a proteção aos animais foi incumbida
ao Poder Público por meio da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), e no
ano de 1998, foi que a conduta de maus tratos aos animais deixou de tratada como
contravenção penal para ser considerado como crime previsto no art. 32 da Lei nº
9.605/98 (BRASIL, 1998), que trata dos crimes ambientais.
Infelizmente, mesmo com a tipificação legal da prática do crime maus tratos
aos animais, esta conduta ainda continua desmoralizada em nossa sociedade, em
decorrência do art. 32, caput, da Lei nº 9.605/98 (BRASIL, 1998), prever a apenas a
pena de detenção de 3 (três) a 1 (um) ano, e multa para quem maltrata os animais.
Em razão da pena ser tão ínfima, e amparada ainda por tantos benefícios
processuais penais, como por exemplo a transação penal, suspensão condicional do
processo (sursis processual), conversão da pena de detenção em restritivas de direito
e prescrição, é que o crime de maus tratos continua a ser praticado diariamente por
diversas pessoas.
Após a sanção presidencial, 29 de setembro de 2020, o art. 32 da Lei nº 9.605/98
(BRASIL, 1998), sofreu alteração por meio da Lei nº 14.064/2020, que incluiu o
parágrafo primeiro neste artigo, qualificou e definiu a penalidade de 2 (dois) a 5 (cinco)
anos de reclusão para quem vier a maltratar cães e gatos, além de multa e proibição da
guarda, não sendo estendida essa regra aos animais silvestres e domesticados

91 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia


Com relação a este crime de maus tratos aos animais praticado contra a animais
silvestres e domesticados, a pena não aplicada ao criminoso não atinge a sua devida
finalidade, ou seja, o caráter repressivo e preventivo do delito, para que outros
indivíduos não pratiquem o crime; assim como não atinge o caráter educativo, devido
a penalidade aplicada a um cidadão deve servir de exemplo aos outros, em razão de
pequena a pena aplicada, que consequentemente não intimida o delinquente.
Ressalta-se que a vida, a liberdade e a dignidade de um ser vivo, não vale apenas
uma pena de detenção de 3 (três) a 1 (um) ano, assim como não deveria existir a
diferença de penas para espécies de animais, devendo ser aplicada para todos eles
a penalidade de 2 (dois) a 5 (cinco) anos de reclusão, além da multa e proibição de
guarda, uma vez que todos os animais também sentem medo, dor, e sofrimento, sendo
considerados pela ciência como seres sencientes.

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94 Temas Atuais do Direito Ambiental na Amazônia

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