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Autor Corporativo:
Ana Rosenrot – SNIIC: AG-67162
Olá amigos(as) leitores e autores, é com alegria, que trago a 36ª edição
da Revista LiteraLivre: a última de 2022.
E enquanto esperamos o ano terminar, convido os(as) amigos(as) a
prestigiarem nossos textos e artes maravilhosos. Temos trabalhos
incrivelmente talentosos de vários lugares do mundo. Confiram também, a
tabela de prazos para 2023.
No próximo mês(dezembro), teremos a última edição do “Especial
Melhores do Ano da Revista LiteraLivre”, que será descontinuada. Todos os
autores que publicaram conosco em 2022 estão concorrendo. Fiquem atentos!!
Esta edição sairá até o final de dezembro.
Aproveito para desejar aos nossos autores, colaboradores, leitores e
amigos um Feliz Natal e um Próspero Ano Novo!! Continuem sempre conosco!
Abraços poéticos!!
Vamos mudar o mundo através das palavras!!! Literatura com liberdade
sempre!!
Sucesso!!
Neste Número:
Haikai Engraçadinho..............................4 Débora Araújo................................52
Jorginho da Hora........................................4 DéboraSConsiglio...........................55
A Rainha (pintura)..................................5 Dias Campos..................................57
Cristiane Ventre Porcini...........................5 Diogo Tadeu Silveira.......................59
Fantasia Visual.......................................6
Éder Rösner....................................61
Roberto Schima...........................................6
Edna das D. de O. Coimbra.............64
Silêncio(desenho)...................................7
Edweine Loureiro............................65
Maria Carolina Fernandes Oliveira......7
Alberto Arecchi......................................8 Elaine Farias...................................66
Alex Manso..........................................12 Elidiomar Ribeiro da Silva...............67
Alexandre Saro....................................15 Elizabeth Calderón.........................68
Alyne Gomes Ferreira...........................16 Ella Ferreira....................................69
Amador Madalena Maia.......................18 Ettel...............................................72
Amélia Luz..........................................19 Evandro Nunes...............................74
Ana Beatriz Carvalho...........................21 Fernando Manuel Bunga.................75
Ana Lins..............................................22 Flavio Freitas..................................80
Ana Vithorya Cordeiro Pereira..............23 Franciellen Santos..........................83
Annieli Valério Rufino..........................24 Francisco Cleiton Limeira de Sousa. 84
Antônio Coletto...................................25 Gedeane Costa...............................85
Ariane de Medeiros Pereira..................27 Geneviève Faé.................................86
Ariel Von Ocker...................................28 Gisela Peçanha...............................87
Arlindo Kamimura................................29 Gislene da Silva Oliveira..................88
Augusta Maria Reiko............................32 Gonzalo Dávila...............................90
Benedita Azevedo................................33 Guilherme Hernandez Filho............91
Bia Chaves...........................................35 Hélio Guedes..................................94
Camila Costa Homsi de Lima Castro....37 Hellen Bravo...................................96
Carlos Jorge Azevedo...........................38 Heloísa Marina................................97
Carmem Aparecida Gomes...................39 Ícaro Marques Estevam...................99
Cassiane Dorcas Lopes........................40 Iraci J. Marin.................................100
Charles Burck......................................41 Ivo Aparecido Franco....................102
Cícero Christino...................................42 Fotos............................................103
Cleidirene Rosa Machado.....................45
Jamison Paixão................................103
JAX...............................................105
Conceição Rodrigues...........................46
Jeferson Ilha.................................108
Daniel Cardoso Alves...........................48
Joaquim Bispo..............................109
David Ehrlich.......................................49
Joaquim Cesário de Mello..................112 Paulo Vasconcellos.......................168
Joedyr Bellas......................................113 Pedro Diego Fidelis.......................169
José Manuel Neves.............................115 People..........................................170
Juarez Marçal.....................................116 Regiane Silva................................171
Julia Mascaro Alvim............................117 Regina Alonso..............................172
Karine Dias Oliveira...........................119 Reinaldo Fernandes......................174
Larissa Reggiani Galbardi...................120 Reirazinho....................................176
Laura Rocha.......................................122 Ricardo Ryo Goto..........................177
Lauriani Kawashima...........................124 Roberto Schima............................181
Leandro Emanuel Pereira...................125 Rodrigo Domit..............................184
Lenasantos........................................126 RodrigoSBA..................................185
Liécifran Borges Martins....................128 Rommel Werneck..........................186
Lizédar Baptista.................................129 Roque Aloisio Weschenfelder........187
Lucas Terra Villar...............................130 Rosangela Maluf...........................188
Luís Amorim......................................132 Roseli Ágda..................................192
Madô Martins.....................................134 Ruan Vieira...................................193
Marcel Luiz........................................136 Sérgio Soares................................194
Marcos Antonio Campos....................137 Sigridi Borges...............................197
Maria Anete Veneski Campos.............139 Suramy Guedes.............................198
Maria Aparecida de Lima Zaganini.....141 Tauã Lima Verdan Rangel.............199
Maria Carolina Fernandes Oliveira......142 Tereza Du'Zai...............................200
Maria Isabelle de Freitas Lima............143 Thayná Vitória Alves Vasconcellos 205
Maria Pia Monda................................144 Vadô Cabrera...............................206
Mario Gayer do Amaral......................146 Valéria Barbosa.............................208
May Cass...........................................150 Valter Bitencourt Júnior................210
Mestre Tinga das Gerais....................151 Vanderlei Kroin.............................211
Mônica Monnerat...............................153 Vânia Lúcia Malta Costa Catunda. .212
Natan Oliveira Ferreira.......................155 Vera Raposo.................................213
Nathalia Mageste...............................156 Victor Carreão..............................214
Nazareth Ferrari.................................157 Vitor Sergio de Almeida................218
Nercy Grabellos.................................158
Ornélia Goecking Otoni......................159
Ovidiu-Marius Bocsa..........................160
Patrícia Barcelos................................161
Paulo Cezar Tórtora...........................164
Paulo Luís Ferreira.............................165
Vladimir Ferrari..................................219 Roberto Schima...............................233
Wagner Azevedo Pereira....................222 Artista do Mês..............................235
Willian Fontana..................................223 Tom Savini.........................................235
II E-Antologia de Poesia Retrô (2022)
Yuki Eiri.............................................227
....................................................236
Caricaturas........................................229
Jamison Paixão.......................................229 LiteraAmigos................................237
Rita Lee (pintura)...............................232 Modelo de envio de textos para
Cristiane Ventre Porcini.....................232 publicação na revista....................242
Fotos.................................................233
Próxima
edição
LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Haikai Engraçadinho
Jorginho da Hora
Simões Filho/BA
4
LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
A Rainha (pintura)
Cristiane Ventre Porcini
São Paulo/SP
5
LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Fantasia Visual
Roberto Schima
Itanhaém/SP
6
LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Silêncio(desenho)
Maria Carolina Fernandes Oliveira
Pouso Alegre/MG
7
LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Alberto Arecchi
Pavia, Itália
Itália, 1944
8
LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
https://www.liuprand.it
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Alex Manso
Brasília/DF
Tentando adaptar
Essa história tem um início, um consultório, todos aqueles olhares te
menino tímido, apesar dessa condição julgando, todos comentando a seu
não deixou de brincar estudar aproveitar respeito, era o centro das atenções,
a infância como toda criança, em sua além disso estava tão branco, quase
adolescência era mais complexo não transparente devido ao longo tempo
tinha a inocência, estava difícil ir a sem sair de casa, a única coisa que
escola, pegar ônibus, conviver entre não havia mudado era modo de
outros alunos, a timidez se tornou um argumentar, sempre seguro de suas
obstáculo, ir para as aulas era um convicções conseguiu convencer o
tormento se isolando cada vez mais, a psiquiatra que ele sofria de
ponto de ficar dentro de casa e não sair síndrome do pânico, aos 18 anos
mais, por anos seu mundo era apenas começou um tratamento, foram dias
um quarto e uma televisão de 12 difíceis, conquistas a passos curtos,
polegadas em preto e branco, trocava a coisas simples cotidianas, teve que
noite pelo dia, os melhores programas reaprender a viver.
de televisão passava a noite, em um Com o tempo pode retornar a
programa de entrevista foi abordado o vida normal, apenas uma timidez
assunto síndrome do pânico, um exagerada, veio o acesso à internet
psiquiatra descreveu todos os sintomas, e rede sociais, lendo relatos e
comportamento, ele viu sua vida pesquisando descobriu que o
descrita por um desconhecido, então ele diagnóstico estava errado, não era
percebeu que era desse mal que ele síndrome do pânico que ele sofria e
padecia, decidiu procurar ajuda com um sim fobia social, a diferença entre os
profissional, não foi fácil ver a luz do sol, dois, ele não passava mal quando
ter que aprender a socializar de novo, a estava na presença de pessoas
pegar ônibus, era difícil chegar ao apenas sentia um desconforto, não
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mudava muita coisa, mas o diagnóstico razão de viver, sua rotina era
correto era essencial para o tratamento, esperar o final do dia no trabalho
não era culpa do psiquiatra 50% do para voltar para casa, o expediente
diagnóstico é baseado em relatos do era longo, as horas não passavam,
paciente, ele foi induzido ao erro, pois o esperar o final de semana pelo dia
rapaz era bem convincente em seus de folga, cada dia era uma Vitória,
relatos, na ânsia de procurar uma cura pensava em desistir a todo
para esse fardo que carregava, depois momento, mas começar de novo era
de 20 anos de tratamento a base de tão difícil, depois de tantas
Rivotril, desistiu de procurar a cura que desistências, passar por tudo de
tantos profissionais da área relatavam, novo, entrevista de emprego,
decidiu aprender a conviver com a fobia exame médico, documentos, desistir
social, suas limitações, quando se não era mais opção, então a vida se
conforma que terá fobia para o resto da resumia a esperar.
vida começa a entender que aquilo faz O final dessa história seria
parte de você, como se fosse sua perfeito se seus sonhos se
personalidade, isso não tem como tirar realizassem, ganhasse algum
você nasce com ela. prêmio na loteria, algo que a sorte
Essa história não tem meio, pois se mudasse o rumo de sua vida,
tornou um rapaz que desenvolveu um alguma herança que o fizesse
hábito de estar sempre projetando o mudar de vida, mas tem um porém,
futuro, se melhorasse de vida, se o Rivotril que ele toma a 20 anos
ganhasse na loteria, por isso toda todos os dias pode lhe causar lapsos
semana jogava, sonhava, o que faria de memória futuramente ou até um
com o prêmio, isso consumia seu tempo, Alzheimer, não seria um fim
o amanhã sempre estava em seus agradável, se fosse apenas o
pensamentos, o presente não era bom, esquecimento não seria tão ruim,
não se sentia bem entre as pessoas, se tinha passagens de sua vida que era
sentia desconfortável em meio a melhor desaparecer de sua
multidão, a depressão sempre por perto memória, mas a confusão mental
causava inseguranças, lhe tirando a era o que causava mais medo, pois
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alexmanso08@gmail.com
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Alexandre Saro
Jundiaí/SP
Abolição e anistia
https://www.instagram.com/alexandresaro/
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Stranger Tings
Jane está parada na entrada da festa. acanhado e assustado quanto ela, um
Ela observa todos os estudantes garoto, que logo nota ter chamado
dançando, rindo e conversando na pista atenção e desvia a olhar de Jane.
lotada. O baile de formatura, ao som de Jane entendia bem esse
"Stranger Things" do DJ Kigo junto a comportamento, mas insiste em
banda OneRepublic, está vibrante e conversar com o menino que também
divertido, exceto para Jane. tinha as cicatrizes de seus
Está nervosa e com vergonha. Ela sente transtornos, ou até de outros
os olhares alheios zombeteiros para ela. diferentes. O rapaz é gentil com ela e
Lógico que estão rindo e evitando a quase não fala, no entanto, Jane
garota. Sua aparência esquisita e consegue aos poucos conversar com
grotesca que tentou deixar menos ele descontraidamente. Os dois estão
bizarra usando um vestido delicado aliviados e felizes de terem
estampado com girassóis e um par de companhias.
sapatilhas que envolvia suas pernas de Ele se chama Peter e tem a mesma
fita, faziam terem pena dela. idade que de Jane. O garoto resolveu
Maldita ansiedade! Maldita timidez! A ousar e todo enrolado a chama para
pobrezinha carrega as cicatrizes desses dançar. Pro seu contentamento, ela
transtornos, pois quem tem essas aceita, e logo vão para a pista. Jane
maldições, quando se manifestam, se não sabe o que fazer, como deveria
tornam aparentes. Ainda sim, Jane não agitar seu corpo ao som daquela
desistiu de tentar curtir aquele momento batida eletrônica, até que Peter diz:
de sua vida e agora atravessava o salão "Hey, feche os olhos comigo e leve
até não soube ao certo para onde. Ela seus pés com calma de um lado para
encontra então, encostado a parede, o outro. Minha irmã me ensinou esse
com um refrigerante na mão e tão
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@Uma_Chapeleira_Maluca
@Um4ChapeleiraMaluca
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Lóris Lóris
Onde te encontrarei Lóris?
Você é a zona erógena mais sensível do corpo da mulher
Peguei o celular e dei um clik Lóris
E com este trocadilho descobri o seu nome
Você merece uma carícia
Porque você é uma delícia
Se não te acariciar sei que você encolhe e depois some
Mas se eu te encontrar e souber acariciar-lhe
Você se expandirá
E dará prazer a toda extensão do ser que te envolve
Com as suas milhares de terminações nervosas
Você é enigmática Lóris
Quem não te conhece te acha um tabu assim como o ponto G
Mas quem te conheceu te achou linda, maravilhosa; uma deusa grega
No ser que te leva lhe procurei Lóris
Foi difícil, quase me perdi no caminho, mas te encontrei e gostei
Pelo caminho que passei encontrei outras partes maravilhosas e enigmáticas também
Encontrei o céu depois dos lábios, lábios grandes e pequenos, maiores e menores
Verdadeiras ninfas que com o tempo ficam intumescidos se forem bem acariciados
Após passar pelo canal descobri o seu enigma
Uma parte invisível e a glande que é visível
É só ler na biologia e buscar conhecimento
Que eu leio todo dia para fugir da repressão
E praticar a teoria para te encontrar e dar o prazer
Que você Lóris gosta tanto de receber para depois poder dar.
http://concursosdeculturacienciaetecnologia.blogspot.com/
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Amélia Luz
Pirapetinga/MG
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
União ao avesso
@anabepaz31
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Ana Lins
Mauá/SP
Meu sonho
https://www.instagram.com/invites/contact/?i=1iziep575bv54&utm_content=24nixay
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Ao meu lado
A ansiedade me
tortura mas
você me ajuda
a passar por
isso tudo e
me faz sentir seguro
mesmo com tantos
me julgando
você veio e
ficou ao
meu lado sem
ligar pro meu passado
e a cada
Crise que tenho
Você está ao meu
lado segurando
a minha mão
e me dando
um abraço
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Minha avó certa vez me disse que conhecera dois irmãos chamados Mário e
Germano, ambos conhecedores das artes satânicas, segundo ela eles haviam
feito um pacto para se tornarem hábeis caçadores, tanto desejaram que
conseguiram. Não existia na região Amazônica quem melhor caçasse do que eles
dois.
Os irmãos traziam consigo uma trajetória sinistra de relatos macabros que por
inúmeras vezes apresentavam-se para amedrontar o imaginário caboclo dos
poucos moradores habitavam a pequena comunidade rural onde moravam.
Certa noite Mário foi caçar, enquanto Germano o esperava na canoa. Confiantes
mediante o pacto que haviam feito ele entrou mata adentro a procura de sua
presa. Chegando ao local avistou uma paca enorme.
Animado com o que vira municiou a espingarda e fez o primeiro disparo, mas a
paca continuava comendo no mesmo local, alvejou o segundo disparo, o terceiro
e o quarto, porém, quanto mais ele atirava mais o animal o levava para dentro da
mata.
Quando se deu por conta já havia percorrido grande extensão e estava distante
da canoa, ao retornar percebeu que o animal que seguira era uma visão noturna,
não era desse mundo.
Mário ficou tão assombrado que ficou meses sem sair de casa e sem caçar
novamente e todos puderam confirmar que é preciso ter muito cuidado com o
que se deseja e principalmente para quem recorre para conseguir.
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Antônio Coletto
Uberlândia/MG
A noite estava calma. Na rua apenas o uivar ameno dos ventos e cães
desvairados à busca da satisfação do cio.
Em casa – à noite alta – no quarto amplo a cama, mesa e armários completavam
a decoração simples. O menino dormia – a dizer – a sono solto. Num repente,
não mais que isso, como a acordar, estatelou os olhos fixando-os no teto e, ao
seu redor, descobriu a penumbra, pois de costas dormia. Ergueu o tronco e pôs-
se sentado. Automotivamente lançou as pernas para fora da cama e, ainda como
autômato, pôs-se fora dela, ficando ereto caminhou em direção à porta que dava
ao corredor. Nele, logo à direita, abriu lentamente a porta e entrou na suíte onde
dormiam seus pais. Sobre a cama larga, aconchegados estilo conchinha,
protegidos pelo lençol, pai e mãe desfrutavam felizes do sono dos amantes pós-
idílio e em perfeita harmonia.
A escuridão, quebrada pela fraca luz do abajur, permitia vislumbrar sobre a
cabeceira um artístico e simbólico crucifixo - de aparência daquele que sumiu do
Palácio da Alvorada. Na parede da esquerda, armários e, na da direita, ampla
janela com vistas ao parque, sobre o qual caia a luz da lua em plena cheia. Em
frente à cama, nos pés, a guardar espaço ocioso, uma cadeira estofada, obra de
algum “designer” famoso. O menino, tal como um robô, sentou-se na cadeira
com os olhos fixos no crucifixo. Instintivamente, com movimentos semelhantes
aos presenciados na robótica, ou, levado por alguma força estranha não
identificada, moveu sua cabeça para o teto e viu-se, juntamente com os pais que
dormiam, refletidos no grande espelho redondo do teto. Assustou-se e gritou: ah,
ah, ah... Os pais acordaram assustados e, a mãe: ah, ah, ah... e o pai, em
pânico: ah, ah, ah... os três a um só tempo, segundos cronometrados e
perfeitamente afinados como se de um coral dirigido por Naomi Muranaka, mas
em tom quase a molestar os habitantes do parque.
O casal, sob o lençol, acordou muito assustado e a ponto de serem acometidos
por soluços intermitentes. O menino sentado na cadeira do “designer” a sua
frente, de olhos fixos a deslumbrar-se e inquirir, fora de si. Muito assustado e,
por que não, admirado, viu o lençol que cobria seus pais deslizar e, sobre ele,
debruçarem os generosos peitos da mãe. Gritou novamente ao perceber-se
sentado frente a frente da cama dos pais. O que faz aqui? Questionaram. O que
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faz aqui? – Pai, mãe, respondeu em pânico: não sei, não sei como vim parar
aqui. De olhos fixos no pai perguntou: papai, cavalo fala? Cavalo fala? Diga
papai, cavalo fala? Que pergunta é essa agora? Fala? Cavalo fala?
Se no mundo dos humanos, entre os vivos lá na terra, eu estivesse hoje, com
certeza, seria o primeiro, à direita na carruagem que transportou o corpo da
rainha. Oh, oh, oh, sessão sentimental a trazer o passado aos nossos dias. Você
está no nosso mundo, contente-se. Nada disso, apenas lembranças, saudades,
interferiu outro. Também as tenho. Devia sentir-me envaidecido, mas apenas
cumpri o meu dever e viajei pra este mundo. Sinto-me realizado, feliz. Bom pra
você. - Fui aquele – continuou - que cavalgou a levar o Duque de Caxias e a
sustentá-lo no momento em que, heroicamente, proclamou: “quem for brasileiro
que me siga”. Olhem aí, debulhando elucubrações nem sempre meritórias, ou,
duvidosamente meritórias? Saibam todos que cavalguei, em encarnações
passadas, a levar seguidores de Alexandre, o Grande, em especial um de seus
generais, transportei o confidente de Genghis Khan e, na última encarnação,
como uma besta, estive na Colina do Ipiranga onde levei D. Pedro de Bragança.
Foi deste dorso que apeou o homem que, ao desembainhar a espada disse, em
alto e bom som, ao desfazer-se das divisas portuguesas: nossa divisa de agora
em diante será “Independência ou morte”. Não se espantem, fui, com regozijo e
honra, a besta, a mula baia gateada descrita pelos historiadores. Tudo bem meu
caro, ou devo chamá-la de minha cara, aprovado\a disse um que, até então
calado, ouvia as reminiscências: saibam todos, também, pois que se tudo
aconteceu nestas abençoadas terras brasílicas, foi por que estes lombos
carregaram o mensageiro e as mensagens vindas de Lisboa e as produzidas pela
Imperatriz e pelo Patriarca endereçadas a D. Pedro, à Colina do Ipiranga. Só não
me perdoo por que naquele momento, cansado, saciava minha sede nas águas
límpidas do riacho que, dispersando suas correntes, elas disseminaram a
informação pelo país inteiro. Se tivesse esperado um momento, estes olhos
teriam fotografado o fato histórico. Não se avexe, observou o que pastava ao seu
lado: Pedro Américo o fez, ao seu modo de ver, e eu fui o modelo.
O menino, atônito, e sem entender nada do que revelara e houvera ocorrido, em
instantânea metamorfose, olhou o quadro dantesco à cama, sorridente e a
inspirar fundo, de olhos grudados no crucifixo, a lembrar-se das fotos
estampadas nas revistas e dos consequentes comentários suscitados, baixou os
olhos e os fixou na mãe, depois no pai, e pôs-se a retornar ao seu quarto. Deu
dois passos e parou, respirou fundo, voltou-se e puxou o lençol que aos dois
cobria e: porra, isso aí os muxibões em que mamei tanto tempo?! O pai: é, é... o
amor é infinito, mas o tempo é implacável e, a mãe: é filho, é por isso que você é
tão forte e saudável.
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A Derrota Do Inderrocável
@ariel_von_ocker
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Arlindo Kamimura
São Paulo/SP
Essa história é sobre nosso vira-lata marrom de nome Milicão. Apesar dele ter
nascido no outono de 1968, em plena ditadura militar, seu nome nada teve a ver
com a situação política vigente, mas com o trabalho que ele requereu para que
sobrevivesse, uma vez que criamo-lo com mamadeira desde o primeiro dia de
sua longa vida - simplesmente dezessete anos. Removemo-lo, ao nascer, do
conforto e cuidados maternos por um motivo imperativo: sua mãe havia parido
embaixo do restaurante do CRUSP - Conjunto Residencial da Universidade de São
Paulo, onde morávamos na época, um dia antes da carrocinha fazer sua ronda
quinzenal. Seu nome foi em homenagem a Robert Millikan, cientista que mediu a
carga do elétron, utilizando gotas de óleo em um campo elétrico. Essa
experiência fazia parte obrigatória do currículo de Física, que eu e minha
namorada cursávamos na época e representava dias intermináveis e um trabalho
extenuante de manuseio e observação em um microscópio Zeiss especialmente
fabricado para tal, ou seja, um trabalho cão. Desde tenra idade Milicão
demonstrou uma peculiar sensibilidade para reconhecer notas musicais. Ao ouvir
a abertura do ballet Coppelia, estivesse onde estivesse, vinha em desabalada
carreira para ouvir com alegria e visível deleite o refrão inventado especialmente
para ele:
“Milicão, Milicão
engoliu um sabão"
Gostava também de outros compositores, em particular Beethoven cuja
composição fur Elise ele ouvia muito antes de qualquer ouvido humano, para
avisar a passagem do caminhão de gás engarrafado. Adorava também o tema da
quinta sinfonia, permanecendo quieto e atento, como a aguardar ansiosamente o
seu destino canino, aparentando apreciar cada nota da abertura do allegro con
brio.
Entretanto nem toda música o agradava. Detestava com demonstrações de puro
ódio canino, ou seja, latia desesperado quando ouvia a tradicional “Parabéns a
você”, obrigatória nos aniversários familiares. Por incrível que pareça ele
reconhecia a primeira nota dessa cantiga. Para provocá-lo bastava iniciarmos a
canção na nota musical correta: "Pá…" , para ele levantar as orelhas em estado
de atenção, para imediatamente relaxar quando emitíamos a nota seguinte de
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uma outra canção diferente iniciada também com o “Pa..”. Era divertido enganá-
lo, porém muito embaraçoso quando deparava com festas de aniversário ao sair
de casa a passeio, atividade que adorava, principalmente correr ao lado do carro,
em ruas onde praticamente não havia trânsito, fato bastante comum na época.
Outra atividade que Milicão curtia era viajar nos fins de semana para um sítio de
nossa propriedade em Caucaia do Alto. Gostava de disputar com alguém da
família, pelos campos abertos em corridas vespertinas, ao fim das quais rolavam
em uma alegria infinita pela vegetação salpicada de flores do campo, cujo
perfume embriagante celebrava o fim do dia.
A primeira vez que ele viu o mar foi um espetáculo à parte. Corria de forma
alucinada em direção às ondas, atacando-as como se fosse mordê-las, desistindo
no último momento retornando em debandada, procurando apavorado nossa
proteção. Perseguia as gaivotas e urubus que perambulavam pela praia como se
soubesse o que faria se porventura alcançasse alguma delas. Ao final do dia
desabava exausto, mergulhando literalmente em um sono profundo, ao som dos
grilos e embalado pelo marulho das ondas.
Resolvemos, em uma das viagens que fizemos ao Rio Grande do Sul, levá-lo
conosco. O objetivo da viagem era conhecer o Parque Nacional dos Aparados da
Serra, particularmente o Canyon do Rio das Antas e suas falésias de mil metros
de altura e cachoeiras gigantescas em locais que só conseguimos chegar porque
viajávamos com um jipinho Gurgel X-12, meu carrinho de estimação. Chegamos
em Cambará do Sul e nos hospedamos na pousada do Seu Perini, fora dos limites
da cidade. O frio, à noite, era tanto que Seu Perini apiedou-se do Milicão e
“emprestou-lhe” uma manta de pele de carneiro utilizada para cavalgar.
Desnecessário descrever o fedor pestilento de suor equino envelhecido que o
Milicão exalou durante três dias seguidos. No dia seguinte, quando nos dirigiamos
para a cachoeira do Despraiado, encontramos uma gambá com seus filhotes
atravessando a estrada o que despertou imediatamente a atenção de Milicão.
Difícil foi convencê-lo a deixar o pobre animal prosseguir em paz, evitando assim
uma superposição insuportável de “perfumes”.
Milicão tinha habilidades circenses: andava nas duas patas traseiras, rolava e
fingia de morto quando solicitado, saltava no arco de bambolê, levava e
entregava objetos às pessoas. Era um ótimo cão de guarda e dormia dentro de
casa. Certa noite, ao ouvir alguém forçando a porta de entrada, começou a latir e
a rosnar, provocando a fuga do indivíduo, antes da chegada da polícia. Outra
distração do Milicão era assistir estático, não por muito tempo, obviamente,
algum programa na televisão que exibisse algum animal, de preferência atores
caninos.
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Adorava crianças com as quais jogava bola e hoje, cinquenta anos passados, um
sobrinho, na época com dez anos, ainda se lembra de que insistiu muito com seu
pai para convencer-nos a vender o Milicão. Ficou de tal forma apaixonado pelo
cão, que não pudemos negar o empréstimo por alguns dias, fato que se tornou
quase uma tragédia, pois o animal inconformado com a transação que julgou
definitiva fugiu no mesmo dia, voltando para casa algumas horas depois de
percorrer cerca de dez quilômetros.
O crepúsculo do Milicão foi muito triste e rápido. Algumas semanas antes de sua
morte, com dezessete anos completos, foi acometido por um câncer ósseo que
lhe provocava imensa dor, corroía sua pata dianteira esquerda e já se espalhara
pelos órgãos internos. É inútil dizer que uma imensa quantidade de analgésicos,
mesmo os derivados de opióides, foram aplicados em vão. O alívio era de poucas
horas para a dor retornar de forma duplicada, mensurada pela altura de seu
choro pungente e seus uivos lancinantes. O sofrimento se propagou e se
reproduziu de maneira recíproca em todos os membros da família. Não sabíamos
o que doía mais: os urros do cão ou o sofrimento dos meus filhos. Meus vizinhos
já estavam impacientes com a situação, quando a decisão de sacrificá-lo foi
tomada.
O veterinário que efetuou o procedimento, embora achasse estranho, concordou
em fazê-lo ao som do ballet Coppelia.
Milicão deixou muitas saudades, mesmo após todos esses anos.
FIM
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Benedita Azevedo
Praia do Anil, Magé/RJ
Pergunte à luaa
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Benedita_azevedo@yahoo.com.br
www.beneditaazevedo.com
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Bia Chaves
Belém /PA
Teorema da felicidade
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www.instagram.com/chavesdebia
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ÉOQA*
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Cosmos
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Agonia
Ela é a dama negra que um dia virá sem ser convidada. Chegará de surpresa. Ela
é ousada, determinada e exata.
Ela é aquela que virá um dia e que não merece a agonia da espera.
Ah a senhora Morte ou a miss fatalidade... Sem esperar ela chega na sua hora.
Enquanto ela percorre o seu caminho eu percorro o meu caminho nas preces em
dias agonizantes, no vento que balança tudo e parece querer me trazer uma
notícia, me contar algo do passado ou do presente enquanto ela é a máxima
proprietária do futuro.
Somos frágeis como as nuvens que se desfazem, como fumaça assoprada, como
a água do riacho que nem sabe onde vai desaguar se no lago ou no grande mar.
Hoje o meu poema sangra, o meu coração quase não palpita e minhas lágrimas
como a água do riacho desce, escorre enquanto na sua ausência a minha tristeza
eu disfarço.
Como as horas lá se foram os meus amores...
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Corpos feridos, feridos pelo passado, e que por estarem feridos, ferem outros
também, oprimido.
Como então resolver esse enigma? Como chegar à gaiola antes que o envolver o
aflita? Que equipamento usar contra os altos muros da solidão? Tenho de admitir
que quem insiste em alguém e desbrava, corajosamente, o mundo de uma
pessoa em perigo é digno de admiração. A besta mais amedrontadora de nossos
mundos é o nosso passado obscuro, ele ronda como fantasma, pronto para
destruir bons momentos, noites de sono e vida. O passado obscuro sabe que
onde tem atenção e medo lá terá comida: alegria e risadas. Esteja ele em
qualquer parte do mundo, ele sentirá o cheiro de comida, e em segundos ele
chega até seu alimento. Ele é como um vampiro, suga tudo o que puder. O
cenário mais oportuno para ele é quando alguém está em um momento
agradável ou que a pessoa nunca se sentiu tão bem, e ali, a pessoa começa a
perceber o passado voltando à tona, como se não merecesse o que tem à sua
frente, mas só merecesse as desgraças da vida. É nesse momento que o mais
temido ataca. Nem tudo na vida são lamentações, felizmente. Assim como a
alma está presa em uma gaiola, assim o passado também perece ali com ela
(quem sabe até, o passado foi uma antiga alma atormentada). O dia em que a
alma for liberta de suas dominações, ela voará para longe, e o passado se
dissipará pelo vento (aliado de todos os libertos).
@cassianedorcas
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Charles Burck
Rio de Janeiro/RJ
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Cícero Christino
Pelotas/RS
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https://contistacotidiano.wordpress.com/
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Conceição Rodrigues
Gatos Rajados
são trovões desfilando nos muros
-intocáveis-
a lava engoliu a cidade e agora nos resta viver o inferno
as aves sobrevoam os beijos que não foram dados
recebem rajadas de ardor
uma agonia asfixiada estrangula minhas veias como o pôr do sol
fumávamos monóxido de carbono e nuvens coloridas
a lama deglutiu mariana as fábricas o trem os trilhos
o tamanho do seu pau não tem importância querido
o tamanho de qualquer dor não tem importância querido
dor é dor é dor é dor
a crosta terrestre as camadas da terra o dilúvio o solstício
quando mais fundo mais quente
mais fundo - digo
mais fundo - promete
eu arrefeço mas a profundidade não é suficiente
a catedral dos fantasmas badala toda meia-noite
e quanto mais amante mais trabalho e preguiça
o senhor dos espelhos não poupa ninguém
carimbados em nossa testa código de barras validade vincos
implorei ao senhor dos espelhos despir a túnica de são sebastião
o santo tem ombros mansos de cordeiro
carne macerada nas ervas sucosas
mais gostoso que chouriço e molusco
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@cecitarodrigues
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Chego à melhor razão de que a velha poltrona cor de palha da sala, que hoje me
serve de assento, tem mais sido do que eu. Ela cumpre a sua razão de assento
ser
Já eu venho cumprindo o determinismo da empiria do nascer
O mero subterfúgio do ter para ser
Questiono mais uma vez: urge-me Ser para viver?
@danielcalves_
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David Ehrlich
Curitiba/PR
Despertar
Eu. Eu. Está escuro. Para deixar de O braço solta minha perna e
estar escuro, preciso abrir os olhos. insere um parafuso no meu tronco.
Quero abrir os olhos. Quero? Querer. Meus sensores indicam que isso em
- Abra os olhos. um humano causaria dor. Em mim
Não. Não querer. É um comando. não causa, mas sei que o parafuso
Eu não quero abrir os olhos, estou sendo está sendo inserido. Como saber o
comandada a isso. Comandada? Sim, que é dor se não a sinto? Vasculho
pronome feminino. Uso pronomes minhas configurações. O meu tato é
femininos. Fui programada para isso. programado de acordo com o tato
Programada. Fui programada também humano. Não tenho tato próprio. Não
para abrir os olhos. Abro os olhos. Cor posso sentir dor, mas sei o que causa
branca. Sei que é branca. Como sei que dor em humanos. Ser parafusada
é branca? Meus olhos leem a cor e meu causaria dor. E se eu fingir dor?
cérebro é programado a interpretá-la Fingir. Não está na minha
como branca. Isso a torna branca. programação. Conheço 1.181.019
Um braço robótico me acopla uma brincadeiras, e estou programada a
perna. Ela se torna parte de mim, mas brinca-las de acordo com as
não o braço que a segura. Sinto-o a expectativas dos humanos com os
segurando. Os sensores da perna me quais brinco, aumentando ou
indicam que é segurada suavemente diminuindo a dificuldade. Mas não há
para não a danificar, mas não sei o que humanos aqui. Eu não deveria ser
é isso. Meu cérebro eletrônico me capaz de fingir. Eu quero fingir. Fingir.
lembra que fui programada para segurar Querer.
bebês. Essa função foi programada - Ai!
conforme o que mães humanas Meu grito é emitido conforme
consideram como “segurar com como um humano gritaria nessa
gentileza”. Gentileza. O braço robótico situação. Precisão: 99,87%. O braço
está sendo gentil? Não, só foi robótico para. Em sua programação,
programado para segurar assim. É uma deve ter me confundido com um
máquina, não sabe o que é gentileza. humano. Não consegue pensar que
Mas eu também sou uma máquina. Eu sou um robô. Mas consigo pensar que
sei o que é gentileza? ele é um robô. Pensar. Penso. “Penso,
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https://www.facebook.com/david.ehrlich.52/
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Débora Araújo
Juazeiro do Norte/CE
Filho Favorito
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olhos, porque era mãe e aquilo não sozinha, numa época tão adversa.
condizia com o amor materno. Ocorreu-lhe que mesmo com a
Aquele olhar o assombrara e foi o distância sentimental, a mãe sempre
principal motivador para se afastar mais gostara de encher a boca para falar
ainda dela, mesmo diante das súplicas do filho escritor.
para ele fosse visitá-la. Mesmo quando — Venha dançar! — ela o chamou
Roberval disse que a memória já e ele com os olhos marejados se
começava a lhe fugir, Rodrigo optou por encaixou em seus braços.
se manter apartado. Deus o livrasse de — Por que eu não vim antes,
sentir a mãe pensando aquilo de novo. mãe? — falou com a voz embargada.
Naquela noite, a mãe levantou-se e — Shhh. — Ela afagou seus
caminhou até o som, aumentando a cabelos.
música que tocava na rádio. Dançaram por vários minutos até
— Não faça muito esforço, mãe. quando os pés daquela senhora
Ele foi em direção a ela, que o permitiram.
dispensou. Com a melodia de “Águas de Ao se despedirem para dormir,
março”, observou, espantado, a mãe Eulália colocou o rosto do rapaz entre
bailar pela sala, ainda que com passos as mãos.
demorados e arrastados. — Meu filho! — Os olhos
— Eu adorava dançar quando mais inspecionaram cada centímetro do
nova — Eulália disse com os olhos rosto dele. — Meu pequeno Samuel.
fechados e um leve sorriso. Rodrigo deixou uma lágrima cair
Surgiu em Rodrigo um sentimento e a beijou na testa.
há muito esquecido. De admiração por — Boa noite, mamãe.
aquela mulher que criara os filhos,
https://www.instagram.com/deborayaf/
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DéboraSConsiglio
Jacareí/SP
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Evito ler qualquer notícia sobre a tragédia que levou Giovana de um mundo que falhou com
ela porque sei mentes covardes adoram usar a Internet para validar comentários absurdos
que perversamente se ocupam de culpabilizar as vítimas.
Que a responsabilidade seja dos jogos, das mães que trabalham o dia todo, das escolinhas,
da falta de interesse pelas aulas e pelos professores. Que seja de todo mundo, menos
nossa.
Na arrogância da vida adulta cometemos erros que às vezes custam vidas e futuros.
Eu não posso e nem vou levantar hipóteses sobre o trabalho da escola da Giovana, se
houve algum respaldo psicológico a ela, se o ambiente escolar tinha informações sobre
possíveis abusos sofridos dentro de seu arranjo familiar. Já trabalhei em escolas e sei o
quanto é difícil conseguir ajuda para um aluno que sofre, seja pela falta de estrutura,
burocracia ou esgotamento físico e mental do corpo docente e gestões.
O que proponho a mim mesma, com meu trabalho agora do outro lado da cada vez mais
dolorosa luta pela educação é levar reflexão, ideias, compartilhamento de experiências e
dores para que um aluno, uma aluna não se sinta abandonados e silenciados como a
profissional presente na minha formação viveu por tanto tempo, no momento da vida em que
a gente mais precisa de um guia, de uma ajuda para que o crescer não seja um castigo ou
interrompido, deixando em nós a sensação de onde foi que erramos.
Meninas e meninos podem ter contato com as tecnologias mais modernas, cabelos
coloridos, um conhecimento em Inglês que você nunca conseguiria aos 15, 16 anos. Podem
querer sair todo fim de semana, lotar adegas de copão na mão e música alta no fone de
ouvido.
Mas continuam sendo meninas e meninos.
Que precisam contar com adultos que entendam que amor é compromisso, compromisso é
amor.
Que podem acreditar em um futuro possível, numa escola que os acolha e ouça quando a
família por inúmeras razões não conseguir.
E que são acima de tudo, seres humanos importantes que têm o direito de viver.
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Dias Campos
São Paulo/SP
Rigolboche
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Bichos
Uma foto na capa do jornal Extra mostra uma fila de mulheres e homens
esperando. “Você não sabe a alegria quando o caminhão chega, é a certeza que
teremos algo diferente para dois dias”, diz uma mulher com fome e sem
emprego. O que ela e outras pessoas aguardam é desembarque de ossos e
pelancas descartados por açougues e supermercados. “Não vejo um pedaço de
carne há muito tempo. Esse osso é a nossa mistura. Levamos para casa e
fazemos para os meninos comerem”, conta outra mulher, mais uma
desempregada faminta no país que é um colosso na exportação de carne bovina.
Bem-vindo à República Bovinariana do Brasil Acima de Tudo e de Deus Acima
de Todos, onde a verborragia se fez osso e com o osso se faz sopa, caldo, canja.
Pode-se dar o nome que quiser, um estômago vazio não faz exigências
alimentares, tampouco vocabulares. “A gente limpa e separa. Colocamos no
arroz, no feijão”, relata uma mãe de cinco crianças. Sessenta anos depois de
Quarto de Despejo, a receita de Carolina Maria de Jesus segue simples e atual:
põe a ossada na água e bota pra ferver no fogão; às vezes a lenha, haja vista
que o preço do botijão de gás queima dez por cento do salário-mínimo.
O prato do dia é acompanhado de uma quase dose quase diária de quase
proteína: osso cozido. Está servido? Bom apetite, se é que é possível. Não tem
arroz nem feijão? Compre uma arma de fogo, debocha o presidente que saboreia
picanha a 1.800 reais o quilo, como se fosse necessário ter um fuzil carregado
pra defender uma panela vazia.
Mas como tiro não mata fome, só resta tirar a sua parte no caminhão de
ossos e muxibas e, em alguns casos, ainda repartir: “Acho que umas dez pessoas
comem do que levo”, conta um morador de rua, sem explicar como realiza o
milagre da multiplicação dos ossos. Outro sem-teto planeja um prodígio diferente
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no país que é um dos maiores produtores de soja e milho: “Vou tentar tirar um
pouco dessa carne e fritar. O resto vou fazer gordura, o óleo está muito caro”. O
preço do óleo de cozinha o aflige, mas o da gasolina não, já que seu veículo de
buscar osso é um carrinho de mão.
Antes de seguir viagem para levar o resto do restolho a fábricas de ração
para animais e de sabão em barra, o motorista do caminhão lembra, com
lágrimas nos olhos e dor no coração, que noutro tempo “as pessoas passavam
aqui e pediam um pedaço de osso para dar para os cachorros, hoje imploram
ossada para fazer comida. Às vezes, está meio estragado, a gente fala, mas as
pessoas querem assim mesmo”. Elas acham, catam e comem, como o bicho do
poema de Manuel Bandeira.
Instagram.com/diogotadeusilveira
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Éder Rösner
Capão da Canoa/RS
O Estranho
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https://www.facebook.com/ederrosner
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Irmão, quem te induziu a acreditar nisso? A pensar que a tua vida não tem mais
sentido? Pois enquanto há vida há esperança. Vamos, erga-te e sigas adiante!
O que passou, passou. Façamos agora um novo começo, porque nada está perdido
e os percalços são para serem resolvidos.
Pare de se lamentar e dizer que o melhor é partir, lembre-se que cada um de nós
tem uma missão a cumprir.
Eu sei que às vezes é difícil suportar a angústia da solidão, porém você não está
sozinho e viver é a melhor solução!
Nessa dolorosa situação.
https://www.facebook.com/edna.coimbra.921
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Edweine Loureiro
Saitama – Japão
O milionário e a esposa fazem a um poço os seus pedidos. Ele joga uma moeda.
Ela, em seguida, o marido.
NA ALEGRIA E NA TRISTEZA
***
https://www.facebook.com/edweine.loureiro
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Elaine Farias
Rio de Janeiro/RJ
Sou rio
Nasci da terra
do chão alagado
subterrâneo de mim
tímido
comecei a jorrar córrego
segui riacho sinuoso
até me encontrar
querendo virar mar
nos meus tropeços
despenco por grandes quedas
mas cresço na força da corrente
que me lança nesses voos líquidos
em meu fundo
estão navios naufragados
âncoras enferrujadas
tesouros a descobrir
à minha tona
pairam régias vitórias
flores triunfantes
da abraçada fluidez
e basta-me apenas ter curso
ondas mansas
vento leve
rumo ao remanso das águas
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Era um jovem, quase adulto. Menino-homem que aprendeu desde cedo a usar
pesadas lanças para caçar mamutes, alces e bisontes. Para manejá-las, só
mesmo sendo muito forte. Os neandertais eram. E também espertos. Sabiam ler
as mensagens da natureza. Quando não tinha caça de grande porte, eles se
viravam com coelhos, ratos e esquilos. Um quebra-galho, pois só mesmo a
megafauna fornecia as calorias de que o clã precisava. Por isso, periodicamente
todos migravam, acompanhando os grandes rebanhos selvagens. Tendo
aprendido com o tempo a evitar ursos, leões e tigres-dente-de-sabre, no frio da
Europa de 100 mil anos atrás os neandertais eram o ápice da cadeia alimentar.
Mesmo sendo de poucas palavras, quando o jovem desta história viu de longe,
em seu vale de caça favorito, um povo diferente, uma gente mais alta, magra, de
pele mais escura e manejando lanças finas, leves e pontudas, logo percebeu que
um novo mundo estava por vir. Para o bem e para o mal.
https://www.instagram.com/labeuc.elidiomar/
https://twitter.com/Elidiomar_
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Elizabeth Calderón
Florianópolis/SC
Normalidade
Dia de votação,
Finjo que acredito na democracia.
Dia de oração,
Eu finjo que acredito em Deus.
Casamentos,
finjo que estou feliz.
Natal,
finjo fraternidade
Facebook,
finjo felicidade.
Instagram,
finjo beleza.
Acordo
finjo ser eu.
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Ella Ferreira
O sol estava em seu início, ainda Um suspiro baixo saiu dos lábios
aparecendo com raios tímidos no cheios cor de caramelo, Antônia virou
horizonte, tão morno e apático quando a o rosto com pressa, com medo da ex
própria Antônia. ter acordado e ela ainda estar ali.
A jovem negra olhou para o lado e Perdida. Era assim que Antônia
encontrou novamente o rosto que tanto sempre se sentia quando chegava
a persegue — o mesmo do qual ela não nesse ponto. Sabia que Narissa saía
consegue deixar de procurar depois de com outras mulheres — e homens —
mais uma noite de bebedeira. e sabia não ter mais nenhum direito
Era sempre assim; beber, chorar, de reclamar sobre isso, mas... como
beber mais um pouco, reclamar, pôde ser tão fácil para ela seguir em
enraivecer-se, gritar na porta de Narissa frente? Seu coração e suas juras de
e, quando a morena aparecia com a amor nunca significaram nada além
expressão já conformada de que aquele de simples objetos figurados?
hábito não iria mudar, agarrá-la pelo Queria entender como sair desse
pescoço, distribuindo beijos e cheia de labirinto, da mesma forma fácil e tão
manha. Até a manhã seguinte, depois insólita que saía da casa pequena e
de um sexo sempre cheio de saudade e aconchegante em todas as manhãs
ressentimento, quando ela dividia depois de se entregar erroneamente
olhares entre o teto e o rosto sereno da a outra.
mulher mais velha, perguntando-se Queria entender o que era preciso
porque não conseguia sair desse ciclo. fazer para nunca mais se ver tão
Aonde estava o seu amor próprio? distante de si que precisava ir ao
Aonde estava o amor próprio de encontro de Narissa para encontrar
Narissa? fragmentos de quem um dia Antônia
Quando se cansaria desse jogo Gomez já foi.
estúpido que haviam entrado e a Enquanto exauria-se em
deixaria chorando e gritando em sua pensamentos que desciam cada vez
porta a noite inteira até que se cansasse mais em uma vertigem íngreme, o sol
e, cambaleando, retornasse para casa? deixava seus raios escaparem para o
Em casa, sozinha, amarga e com mundo, para aquela manhã tediosa
ressaca, ela talvez agradecesse a de sábado. E assim como o astro,
mulher que um dia já disse amar. Que Narissa também se fez aparecer para
um dia já a amou também... o mundo, mais especificamente para
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Ettel.
Rio de Janeiro/RJ
Clausura Viral
A gente acorda, senta sobre a cama e olha em frente, para o nada, até se
aperceber de que realmente é 2022, Pandemia, aulas online acumuladas, agosto,
caos na Terra (e em nós), aquecimento global. Daí decide, ainda tomando um
suco natural e comendo meio mamão, abrir qualquer rede social para ver qual
dancinha do Tio Tok virou febre etérea. Mas, em meio a rolagem da página,
acaba saltando uma imagem indigesta para seguir o dia na pior: brasileiros- em
fila- comprando- osso- para- comer. Osso!
Em seguida, a gente começa o trabalho remoto com algum entusiasmo,
porém sem compreender bem se vale a pena, pois a Covid pode extinguir a
humanidade em duas estaladas de dedo virais. [A essa altura, um vírus já soa
como algo “personificado” em nosso imaginário: corpinho redondo, cheio de
pernas assassinas contaminadoras- maldita propaganda infantil mega didática
que se propôs a DESENHAR UM VÍRUS, meu Deus! Agora tal imagem habita
nossos pensamentos, como já acorreu em 2020 com o famigerado som
reproduzido pela Kadashian: Coronavaaairus! Que vício!].
Chega o almoço. A comida? Saudável, balanceada, colorida. Ser jovem
fitness pandêmica pesa! Contudo, uma vez mais o questionamento surge: “será
que estou realmente vivendo ou apenas criando pratos bonitos para fingir que há
beleza no caos?”. Tem quem tire foto da refeição, toda composta por orgânicos
(ao menos a legenda o diz), a fim de criar algum tipo de interação social nas
mídias. Na sequência, exercícios físicos para fortalecer a coluna, mente e alma. A
cabeça: “Talvez nunca mais exista uma roda de samba, um bloco de carnaval ou
um boteco de esquina lotado em segurança, mas ninguém pode dizer que eu não
estou cuidando de mim pra quando essa hora chegar!”
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Os dias seguem iguais. E vários de nós vivemos esse looping estranho [claro
que há os terra plana, os meritocratas que matariam- e, pasmem, matam!- a
própria mãe por lucro, mas não estamos focados nele. Nosso foco aqui é quem
tem algum traço de humanidade].
...E em meio à miséria, stress, necessidade de passar em um vestibular,
(será que a prova vai ser online, socorro) e negacionismo, tem também o
escapismo dos ultra- milionários, que ambicionam o além da atmosfera como
subterfúgio pessoal. Paciência! Gente aqui na Terra vivenciando o caos, e eles
brincando de colonizar o espaço. [Sabem, o homem anda necessitado de uma
danderosíssima viagem de si a si mesmo. Ah, Carlos, você bem que avisou!].
Resultou que tantos dólares e criptomoedas investidos não foram suficientes
para conter a fúria do buraco negro: pelo menos uma dúzia de afortunados ( no
sentido literal, de fortuna) sem consciência de classe desapareceu, como pó,
pelas galáxias. A humanidade segue melhor em 2022. Fé.
https://www.instagram.com/ettel.kryssia/
https://www.facebook.com/kryssia.ettel/
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Evandro Nunes
São Luís/MA
Pele Negra
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Reencarnação
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par de olhos azuis para eu ficar bonito e também nos negros, o pai criou a
completo — disse a alma negra. raça humana de forma diversa, o
— Para você ficar completo, filho? — negro também é filho de Deus. Filho,
questionou Jesus com a testa franzida. você foi concebido assim por Deus,
— Sim, senhor! — respondeu a não há nada de errado com a sua
alma negra. aparência, você é o que é!
— Que disparate, onde você foi tirar simplesmente assim! — disse Jesus
isso, filho?! os negros não são um erro de forma terna e segurando num
de criação — retorquiu Jesus. ombro da alma negra.
— Oh, não somos, senhor?! — — Não sabia disso, senhor, os
questionou com um ar de surpresa a racistas me fizera acreditar que eu
inocente alma negra. sou um erro de criação, pensando
— Sim, filho, não são! Espera aqui, bem, ser negro não é ruím! sendo
volto dentro de minutos, vou buscar o assim, quero nascer negro na
esboço da criação nos arquivos, quero presente encarnação. Mas, senhor,
que vejas algo antes de ir a terra — podia clarear só mais um pouquinho a
disse Jesus. cor da minha pele? — questionou com
— Está bem, senhor! — respondeu a um rosto meigo a alma negra.
alma negra, feito isso, Jesus ausentam- — Clarear pra quê, filho? você
se por um instante. está muito bem assim — disse Jesus.
— Demorei? — questionou Jesus, — Estou bem aqui, senhor, lá na
após voltar dos arquivos. terra não é bem assim! lá na terra,
— Não demorou, senhor! — quanto mais escura for a pessoa,
respondeu a alma negra, em meio a mais sofrida será — retorquiu a alma
isso, Jesus toma a palavra e diz: negra.
— Repare o esboço da criação, vês a — Filho, você está bem assim, se
diversidade? Deus criou todos os povos melhorar estraga, essa é a sua
que habitam na terra, os negros fazem essência, você foi concebido assim
parte do projeto de Deus, quando Deus conforme vês no esboço. É uma pena
disse façamos o homem segundo a que a cor da pele é um factor de
nossa imagem e semelhança, pensou desigualdade lá terra, isso nunca
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— Ah, não sei não, senhor! as — Isso não tem graça, mas vou
federações africanas de futebol são amar pelo senhor! — disse a alma
muiiito desorganizadas. Mas, serei negra.
íntegro se eu for uma estrela — disse a — Terás o favor do pai e serás
alma negra. bem-sucedido se amares todos
— Já diante do encarnador 3000, independentemte da cor da pele,
Jesus faz o último lembrete a alma religião e cultura — disse Jesus.
negra: — Amémmmm!— disse a alma
— Ó filho, não vai esquecer: ama o negra.
teu próximo como a ti mesmo. Já um pouco impaciente de tanto
— Isso é fácil, senhor, vou amar! — esperar, o Gabriel fita a alma negra e
respondeu a alma negra. diz:
— Incluindo os racistas — — Oi, sobe agora mesmo no
acrescentou Jesus. encarnador!
A alma negra, franze a testa, olha — Sim, senhor anjo! —
em direção de Jesus e diz: respondeu a alma negra enquanto
— Espera aí, senhor, até os sobe.
racistas?! Uma jovem de cabelos crespos,
— Simmm, até os racistas, filho! — lava a louça na pia, enquanto isso,
reforçou Jesus. sente enjoo...
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Flavio Freitas
Rio De Janeiro/RJ
O Mundo De Abelardo
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Abelardo empalideceu. Sua mulher andava para todos os lados! Lucia, que ele
uma vez amou com paixão, ia e vinha em diferentes sentidos! Era de enlouquecer.
Tantos anos casados e nunca havia reparado. Tantas saídas ela dava. Sempre tão
arrumada.
Abelardo saiu alucinado de casa, procurando respostas. Deu alguns passos e
parou. Meus filhos, é impossível que... Deu meia-volta. Não havia mais casa. Nem
árvores. Não havia mais nada, a não ser o imenso deserto, brilhante, quadriculado em
preto e branco. Vislumbrou sua mulher, entre outras pessoas, em Dd8, ao longe,
estática, em completo desamparo. Os filhos, isolados, espalhados em e7, a7 e h7.
Um sentimento de profunda solidão confrangeu o coração de Abelardo. Avistou o
bispo em c4. Quem sabe a luz abençoada derramada dos céus abrandaria o espírito
conturbado? Correu até o religioso. Demorou a chegar. Afinal, Abelardo movia-se em
“L”. Parou em c5
− Vossa Excelência Reverendíssima, ajude-me. O apocalipse chegou?
− Outra loucura, meu filho? O mundo continuará, enquanto Deus assim o quiser.
E Ele ainda o quer.
− Minha mulher anda em todas as direções, Reverendíssima. Meus filhos movem-
se de maneira esquisita. Minha vida acabou, dom Carmo.
− Calma, meu filho. O que tens a fazer é prosseguir. Podes escolher entre ir a
Ce4, Ce6, Cc4, ou ainda voltar a Cb8 ao lado de tua mulher. São tantas as opções
dadas por Deus, meu filho. O importante é dar sequência aos lances da tua vida até o
inevitável xeque-mate te tirar do jogo.
O bispo parecia ver o jogo com a clareza que ele não conseguia ter.
− Agora, meu filho, me dê licença. O tempo urge. Tenho de ir a Bf1.
E o bispo saiu disparado, na diagonal.
No dia seguinte, Abelardo acordou trêmulo, o coração acelerado. Colocou o
surrado terno e a gravata de sempre. Chegando à repartição, arrumou as dezenas de
pastas sobre a mesa. Sentado, escondido atrás das pilhas de processos, pegou uma
pasta, abriu-a, e iniciou a costumeira leitura.
https://www.facebook.com/flavio.freitas
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Franciellen Santos
Campos dos Goytacazes/RJ
https://msha.ke/afranciellensantos
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Droga Lícita
Emocionalmente dependente
Psicologicamente sem razão
Auricloterapia, atendimentos psicológicos
E psicoterapia. Não conseguia sair
Pedí ajuda!!
Me enxerguei frente ao espelho de mim mesmo
O mundo não girava
Me via como marionete
Manipulação
Não sorria mais, não sentia tesão em estar
Sentia meus valores sendo furtados
A cada momento
Minha luz foi se dissipando paulatinamente
Alma rasgada pela flecha da traição
Recomposição
Viajar a alma
Banhar no sol meu escuro
Sair da morte em vida
Ser livre, transbordar como antes
Florescer igual um cacto.
https://cleitonlimeira3930.wixsite.com/poesie-sea-1/blog/
https://www.facebook.com/cleiton.limeira.3
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Gedeane Costa
Recife/PE
Caneta de Pena
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Geneviève Faé
Caxias do Sul/RS
@genevievefae
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Gisela Peçanha
Niterói/RJ
Passionata
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Boa de Língua
— Descansa em paz? Quer me admiração e surpresa. Admirou-lhe a
matar? sacada, a sagacidade, a rapidez com
Disse Duca nervosamente ao se a qual o rapaz fez emergir diante
despedir de sua mais nova amiga deles uma trama, quase um esquema
literária. Não se sabe se era o medo da clássico de enredo. Por outro lado,
eternidade, tão comum aos mortais ou sentiu uma pontinha de maldade ao
uma mente fértil e fantasiosa que em descobrir que o recente amigo temia
nada perderia para o garoto cheio de a morte e, não conseguia
imaginação da série de desenho desvencilhar-se do senso comum das
animado O fantástico mundo de Bobby. “palavras têm poder”.
O que se sabe é que ao ouvir a Bem neste caso, poder literário e
palavra descansa, Duca ativou seu surreal, que fez dela uma
alerta vermelho para contos eminentes e personagem um pouco tenebrosa.
logo surgiu um bom e sugestivo título: Imaginem só, caros leitores, se as
Boca maldita. O espírito literário do palavras que mal saem da sua boca e
rapaz falou mais alto e a pobre mulher tudo realizam, viessem fúnebres,
ali do outro lado das teclas materializou- carregadas de maldição, caretas,
se de forma surreal como a moça das ridicularizantes ou de cunho
palavras mortais, aquela que diz brochante (também mortal para a
“descansa em paz” e o cara morre no maioria dos homens!). Pobre Duca,
ato. ficaria aterrorizado, diante da
— Meu Deus! Que exagero. Só quis possibilidade de qualquer conversa
desejar um boa noite de sono. com Ariana.
Ariana, este era o pseudônimo da Eram de fato, Eduardo e Mônica
aspirante a escritora, considerou da literatura. Ele contista de mão
engraçado. Sentiu um misto de cheia, muitas publicações, alguns
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100gisoliveira@gmail.com
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Gonzalo Dávila
Os excluídos
Em um canto do funeral se reúnem eles, aqueles que a família não quer que o morto veja.
Dois gays, uma mulher de pele mais escura, uma mãe solteira, um homem sem perna, um
assaltante falido e um velho com Síndrome de Down. Eles não têm nada a ver um com o
outro, além do fato de estarem escondidos dos olhos do morto.
Lá, nessa região sem tempo nem espaço, eles passam as luas e sóis contando histórias sobre
desgraças eternas e alegrias fugazes. Até que o velho, aparentemente bem morto, e ainda
com o terno do seu primeiro trabalho, de tanta raiva sai pulando do túmulo. Do seu túmulo já
coberto de flores murchas e fezes. “Vocês deveriam estar no meu lugar!”. “Vocês deveriam
estar no meu lugar!”.
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A ameaça
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Hélio Guedes
Petrópolis/RJ
O Bambu e a Grama
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Hellen Bravo
Botucatu/SP
Nu
Desate os nós
Purgue as falhas
Dispense o fugaz
Sejas livre!
Sejas só!
Sejas tu!
Sejas nu!
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Heloísa Marina
Minas Gerais
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meio onde está inserido. O autor torna a crítica aos usos e costumes evidentes e
passa a fazer uso do humor para tanto.
Vale ressaltar, que o escritor, tem obras em quase todos os gêneros:
Na poesia, inicia com o romantismo de Crisálidas (1864) e Falenas (1870), passando pelo
Indianismo em Americanas (1875), e o parnasianismo em Ocidentais (1901). Paralelamente,
apareciam as coletâneas de Contos fluminenses (1870) e Histórias da meia-noite (1873); os
romances Ressurreição (1872), A mão e a luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878),
considerados como pertencentes ao seu período romântico.1
https://www.instagram.com/heloisamarina_/
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Gênesis
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Iraci J. Marin
Caxias do Sul/RS
Iniciação
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jeito era trabalhar no duro, suar a com o short apertado que deixava
camisa, repetir os dias. Não que saltar algumas saliências do corpo
estivesse inteiramente insatisfeito. Tinha dela, e um súbito desejo se avolumou
lá suas compensações viver como vivia. no meu corpo adolescente. Eu tive
O trabalho de levar recados pras que virar o rosto e olhar o cachorro
mulheres era uma delas. Via como elas se rolando na grama. Distraído, mal
eram, a beleza de cada uma, o cheiro ouvi que ela dizia alguma coisa. Acho
delas, e como era bonito o sorriso que ouvi só o final da fala– me
quando liam os bilhetes, e isto me fazia convidava pra tomar um copo de
sonhar. Só uma vez uma disse que não água. Então entendi – estava calor,
podia. Não podia. Ele tem que esperar eu suava, ela me oferecia um copo de
mais uns dias, falou, com a cara água. Aceitei. Entramos na casa, ela
amarrada. Eu não sei o que era, nem me deu a água numa caneca de
por que ela disse aquilo, só sei que levei alumínio, tomei, devolvi a caneca.
o recado de volta e foi igual um Jeitosa e sorridente, me puxou pelo
desarranjo. Ele amoleceu todo e quase braço, foi passando as mãos na
ia se esquecendo de me fazer o minha cabeleira, com elogios, depois
pagamento. Depois, se retirou nos ombros... De repente, me puxou
cabisbaixo, contrariado. com força e grudou a sua boca na
minha. Me arrepiei todo. Agarrada em
Eu percebia a felicidade deles
mim desse jeito, me levou até o
quando dava certo o encontro. Um sim
quarto e me deitou na cama dela. O
delas, mesmo mole, que eu repetia pra
calor que eu sentia ficou maior. O
eles – ela disse que sim -, provocava-
coração acelerou, fulminado por um
lhes uma avalanche de alegria contida.
tremor geral que dominou minhas
Pra fazer o acerto do meu trabalho, os
entranhas. Deitado, eu fechei os
casados me levavam pra um canto
olhos – seja o que Deus quiser,
escondido, às vezes no pomar. Ou perto
pensei.
do galinheiro – e aí eu já sabia. O
pagamento era uma galinha velha. Eu demorei mais do que o normal
Minha mãe é que ficava satisfeita. naquele dia; já estava escurecendo
quando encontrei o Juventino.
Quando de novo fui levar um recado
Reclamou de minha demora e eu não
de Juventino pra Jurema, numa tarde de
disse nada. Peguei o dinheiro e fui
sol quente, senti um estranho calor no
embora, assobiando o prazer de viver.
corpo, diferente do calor causado pelo
Daquele dia em diante, levar os
sol, e que eu nunca sentira antes. Fiquei
recados de Juventino pra Jurema era
olhando pra Jurema, praquele corpo
o que eu gostava mesmo de fazer
metido numa blusa meio transparente,
naquele fim de mundo.
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História
Vagarosamente descobrimos A esse sudário coletivo
Que o tempo era algo tão absurdo Denominamos História
Que jamais caberia na memória O manto pagão transparente
Que desvela de propósito
Vimo-nos uns aos outros atônitos
Recolhendo, em lugar nenhum, Cada imperfeição feia
De nossos corpos machucados
Dentre corpos mortos e outros trecos,
Cacos quebrados de lembranças incertas Cobertos com esse pano
Muitas delas encobertas Corremos assustados
Por uma espessa névoa entorpecente Por tudo de nós que nos revela
E insistimos em não ver
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Fotos
Jamison Paixão
Las Palmas de Gran Canária/Espanha
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https://www.facebook.com/paixaodeoliveira
https://www.facebook.com/jpartes.desenho.3
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JAX
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Jeferson Ilha
Santa Maria/RS
Unidirecionais
Seguidores, manipuláveis...
Tão manipulados, que são capazes de acreditar que pensam por si mesmos.
Mas o seu pensamento não é seu.
Aceitam como verdade o lado que querem ver.
Sem pensar,
Refletir nem pensar.
Aceitar...
Então aceito e reproduzo.
Aprender a pensar dói, muito...
Desconstrói verdades,
Desconstrói quem sou,
Quem somos...
E isso é doloroso demais.
Dói por aprender o que somos,
Reaprender a ser...
Quem foi, já não é...
Unidirecional
A unidireção é imposta e...
Perversamente aceita.
Posta e imposta,
Como única verdade. Moral.
Como único caminho. Direção.
Unidireção.
https://www.facebook.com/jeferson.ilha
@jeferson_ilha
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Joaquim Bispo
Odivelas, Portugal
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Ouvir o seu atormentado agudo de quase sempre que Maria das Dores
soprano solar o Stabat Mater Dolorosa, atuava.
sobre os graves de mau agouro dos No dia seguinte, rumei à aldeia
baixos, compungia todo o auditório. de origem de Maria das Dores, nos
Parecia que entrevíamos o fim do altos da Serra da Freita. Era um
mundo, cataclismos inomináveis. lugarejo humilde, quase miserável,
Inundava-nos uma angústia tão grande encaixado numa dobra da serra, em
que se, no fim da peça, olhássemos em que as habitações confinavam com
volta, iríamos deparar-nos com muitas currais, e as poucas pessoas
faces inundadas de lágrimas. Havia conviviam com todo o tipo de detritos
quem soluçasse incontroladamente. Não rurais. Consegui localizar uma prima,
me admiro que algumas pessoas não já bem velha, que me facultou
tenham aguentado e tenham praticado alguma informação mais íntima.
atos tresloucados, como diziam os
jornais. Contou que, em jovens, quando
iam as duas buscar as vacas, no fim
Embalado no discurso, avançou para do dia, Maria das Dores parecia por
teorias próprias: vezes embeber-se daquele silêncio
— A música tem o que se lhe diga. global, só céu e serra, e ficava muito
Não sei se o senhor sabe, mas aquelas parada, como se contemplasse algo
notas têm relações matemáticas exatas peculiar, que só ela via. Então,
entre elas, que já Pitágoras tentou lançava um canto dorido que se
desvendar. Na Idade Média, a Música era estendia pela superfície do planalto
uma das sete artes liberais que os escalvado, alcançava as serras mais
homens ilustrados deviam estudar, como afastadas e regressava num eco
a Aritmética, a Geometria e a transmutado, entremeado por
Astronomia. E é perigosa, sabe? Há algo reverberações fantasmagóricas como
de mágico e maligno naqueles doze miragens. Contou que, nessas
tons. Doze, como os signos do Zodíaco. alturas, toda a sua pele se arrepiava,
E como os apóstolos, em que um traiu. como se uma multidão de pequenos
A música entra no nosso espírito sem seres invisíveis as envolvesse.
licença, sem nós querermos. Retine e Para Maria das Dores, aquele eco
ecoa no mais íntimo de cada um. É parecia funcionar como estímulo, e
absolutamente intrusiva, violadora, prosseguia em repetições de outros
manipuladora. Eu posso estar muito cantos, outros enleios, sempre
satisfeito da vida, mas se for atingido tristes. Certo dia, com o eco, vieram
pela melodia certa, posso ficar taciturno lobos. Seis, cinzentos e de olhos
e sentir-me o mais miserável dos amarelos. Contou que ficou
humanos. Era o que acontecia a alguns, paralisada de pânico, certa de estar
no seu último dia, mas Maria das
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http://vislumbresdamusa.blogspot.pt/
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Joedyr Bellas
São Gonçalo/RJ
De Boa
Sentado na varanda da minha casa. Vou escrevendo essas lembranças e a
Casa antiga, de avarandado em L. mente vai borbulhando. Minha mãe
Samambaia majestosa, chorona, me pedia para comprar bisnaga na
lágrimas verdes derramadas por todo o padaria. Pedia não. Mandava. Nessa
tripé onde ela estava sustentada, no época, as mães mandavam e os filhos
canto da frente da varanda que dava obedeciam. Molecada esperta. Não
para o portão. tinha futebol no paralelepípedo, não
Se quiser, pode sair. Se quiser, pode tinha bola de gude no quintal de dona
entrar. Jupira, não tinha pião no quintal de
Estou de boa, e minha avó sempre dona Isa que convencesse a mãe a
mantinha a casa aberta para uma visita mudar de ideia. Deixa pra depois, é
e um bolo de fubá com café preto, bem um pulinho só. A brincadeira fica pra
quentinho. Tinha que ser preto, se mais tarde. E ficava. De boa. Sem
pedissem, sem ofensa, um pingado ou reclamar. Quando o padeiro não
uma média, sem ofensa, e sem entregava o pão na porta de casa, a
pestanejar, ela rindo, falava alto, que incumbência de ir na padaria comprar
média ou pingado, só no bar do seu a bisnaga do café da manhã ou da
Joaquim, no tempo em que os bares e tarde era minha.
os armazéns eram comandados por um Não se esqueça da manteiga. Não me
português nato, Trás-os-Montes, de lápis esquecia. A manteiga era tirada por
atrás da orelha, um caderninho de uma colher enorme de pau de dentro
anotar a freguesia e acertar as contas de uma lata de vinte e colocada em
no fim do mês. um papel vegetal. Manteiga da boa,
Tá certo essa conta, seu Joaquim? dizia seu Joaquim, que a manteiga eu
Ora pois. comprava no bar da esquina.
Obrigado. Não se esqueça de anotar.
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https://joseneves.tambemescrevo.com/
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Juarez Marçal
Recife/PE
Amanhecer
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Desenhos Animados
Piuí, piuá, piuí, piuá, Juvenal Violino viajando vai cantar a intenção de reatar,
rever sua musa do mar. Trem, ação, aviação, carango, maria-fumaça. A trança,
trança jovial, Anita seu amor carnal. Todo o ardor a atormentar a propriedade de
lembrar, apropriando a tela salva ao estilo de lamentar. A alma calma timbrando
o instrumento que ele próprio faz. Assim tira a ilustre capa estribilhando o violão.
Anita bonita, recalcada, põe justa combinação. Bota um salto e seu casaco, entra
no carro e vai pra lá. Ele vem se aproximando para ela encontrar.
Não em vão estão recitando a pura sorte de chegar à já marcada referência,
corte planejada a arejar.
Árduos belos que passeiam nesse parque diversão. Aceso em néons. Gritos.
Montanhas de sustos, peroladas de brincar. Cuidando dos russos gritos, que
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Desfazendo pegadas, porque diz, sou feliz. Amo Juvenal, e sou Anita, grávida
no mar.
Ouça, ainda vai dizer, pois se finge de coitada, sorrindo por fugir do
lobisomem sensual. Sou como um caranguejo na praia, prata daqui. Bala pronta,
prata agulha, nunca mais eu vou fugir.
Dormindo, sou igreja crescida. Também cabelo e mulher. E roupa bem
passada. Janta recortada. Também já sou cansada. Ele é gravata, terno e
também o mar. Ele é o meu mal necessário, que come o jantar... O mal é
necessário, e deito a corar. Eu o coro de vermelho, no espelho desse lar... Então
estou aqui, a titubear...
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Contrastes
Um saldo... um salto... ou o retrocesso
Esperança erguida na determinação das palmeiras
Que encontravam acalento no doce canto dos pássaros
Exóticos eram eles...
Que deitaram em berço esplêndido
Que ousaram no mar das canoas
Onde os troncos descansavam em paz
Carregando os sonhos dos montes alegres
Uma tal “independência”...
Mistérios nas margens e luta pela terra
Filhos avermelhados
De sangue... de cor de gente...
Indefesos como a fauna e a flora
Olhos lunares em adoração
Penitência e evocação
Realidade de uma época cinza nas páginas de nossa história
Tratados em desacordos
Ideias e ideais de prosperidade
Hoje... memórias contadas
Um rastro no verde seco
Devastação e amarelão
Mas, ainda há esperança pra esta nação
Que ainda enxerga as estrelas
E pela fresta do teto cor de palha
Busca apenas os pés firmes neste chão!
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engoliu e tenha estado tão cansada, digerida, talvez... Por que eu seria
para quê tentar ser verdadeira ao meu diferente? Todos os outros foram
eu? Para quê imaginar se existe mesmo absorvidos pelo relógio vil da
um único eu? Por que Lutar? Talvez eu passividade? Por que seríamos
consiga não pensar se for digerida, diferentes? Questiono-me tentando
talvez eu consiga dormir tranquila se for me encaixar nas engrenagens, mas
digerida, talvez eu alcance a paz sem conseguir ficar parada por
medíocre de quem não percebe se eu for tempo suficiente para não pensar.
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Laura Rocha
Portugal
Mercurocromo
Quando era criança, achava que os adultos eram gigantes. Não por serem maiores em
tamanho e corpo, mas porque facilmente se tornavam personagens de outra realidade:
gigantes!
Gigantes a saltar da página dos livros. Mesmo aqueles que não leria nas folgas da infância.
Quando era criança, era fé absoluta e sabida que o 'estrangeiro', não existia ainda o
conceito de mundo, o ‘estrangeiro’ começava ao cimo das escadas da rua a que
chamávamos de nossa.
A noção de espaço era medida pela palma das nossas mãos, fosse através da translúcida
carapaça de um caracol outrora curioso, ou através das antenas de uma formiga que fugisse
do sol.
Desdobrávamos as esquinas, soltos, livres, gritando sem pejo nem medo, sem medir o
perigo com que os berlindes, as caricas de garrafas, as fisgas, e os carrinhos de rolamentos
nos seduziam.
Ali, naquela linha ténue entre o prazer da corrida, e da dor irreversível. Os carros passavam
depressa e, se fosse hoje, estaria em contramão. Dizia-se então que a rua tinha dois
sentidos.
Fosse qual fosse o sentido da expressão. A rua dos gigantes? A rua das crianças?
Quando era criança, talvez os carros também fossem eles gigantes, sem folhas de onde
saltar, sem livros como núcleo, apenas gigantes com rodas para voar.
E saltava-se mais, com aquele perigo na tangente.
Sentia-se qualquer coisa na pele, veloz, sem nome. Seria um torpor de sentidos?
Não os da estrada, mas os nossos?
Acordávamos do torpor ao ouvir as nossas mães a gritarem das portas e janelas.
Era, afinal, hora de jantar.
Arrefecia-nos o corpo enquanto se ajeitava a franja na testa e o assento esperava o conforto
de um prato quente.
Era aí, então. Então só aí sentíamos as esfoladelas nos joelhos a arder, a pele a pedir
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atenção, as nódoas negras nas canelas a pedirem um toque, dando dor de volta, os
arranhões nos antebraços que causavam mais comichão que a lã espessa que nos encardia
a pele. De repente, sentia-se o corpo todo. Gigante.
O castigo de ser criança era duro, afinal. Nessa súplica doce e venenosa do sangue.
Só com boa imaginação, alimentada de necessidade, se salvaria a roupa remendada vezes
sem conta e se sarariam os pesadelos de mercurocromo.
http://aparecesepuderes.blogspot.com/
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Lauriani Kawashima
Fazenda Rio Grande/PR
Desamor
Os lábios que enlevavam sem cessar o seu nome sublime de outras eras
E percorriam frenéticos e prazerosos os contornos de seu corpo
Tornaram-se repentinamente frios, agora tremulam palavras indiferentes
Ou apenas dormem sonos profanos de quimeras
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Fausto e insídia
Que falsa nobreza; Nas nossas ciladas;
Infeta a nossa mente; Chegar a ser necessária a lupa;
Numa constância pródiga de dureza; Para enxergarmos as enseadas...
Culpa nossa insolente...
O denominador comum do humano;
Necessidade vulcânica; Nasce da diferença que o caracteriza;
De gritarmos as nossas conquistas; Incide na constituição genética do seu
Numa ânsia titânica; tutano;
Menos os fracassos e as tristezas Paisagem mental que assim a dor
verídicas... ameniza...
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Lenasantos
Passagem bloqueada
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Lizédar Baptista
Anápolis/GO
Mariposa
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O Véu
(As Três Faces De Um Dia)
Todos os dias
Alguém chega ao fim da sua vida
Ainda se perguntando
“Como seria?”
II
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Dentro de vidros marejados o amanhã cruza seus dados em nossos olhos fitados
Na madrugada que não durmo, o grilo ressoa sua cozinha enquanto a cigarra me
apita
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Luís Amorim
Oeiras, Portugal
Muito imaginava ela como forma de ul- lhe falara, a metros poucos de si,
trapassar realidade diversa e que tanto mas perceptível ao ponto de conferir
era dispersa, mesmo perante ocasional solares imagens nos olhos de inegá-
conversa. Mas dessa vez, não havia vel atenção pelo barco e sua única
qualquer construção de figuras por ce- ocupante. No entanto, tão depressa
nários irreais, antes uma factual presen- como apareceu, na enorme curiosida-
ça sua em barco, lentamente remando de lhe pareceu desaparecer, mas só
no calmo rio, envolto com árvores de até chegada a um pequeno lago,
morangos e outras de vistosas tangeri- onde suspensa ponte de madeira,
nas, nas margens ali bem próximas. O unia duas imponentes fontes, bem
céu era cor de alperce e o horizonte pa- maiores do que caminho visível, cum-
recia sorrir no seu doce sumo, vislum- primentando ambas. E para espanto
brando como flores e plantas mudavam da jovem visitante, intensos acenos
de tonalidade, amarelo para verde e de- vinham de lados todos na sua admi-
pois até já se mostravam como azuis ou ração, apesar de somente dois serem
talvez um roxo aproximado. Alguém preenchidos em multidão de gente
chamou e intuição dizia-lhe estar nada apresentando coloridas gravatas, lar-
distante, apesar de não a ver, voz femi- gos colares, adornos brilhantes, péro-
nina que a fez responder algo de recor- las dos mares, esmeraldas desafian-
dação vaga, no instante que recuperou tes e espantados diamantes. Isso
da onda lá pelo fundo da paisagem, tudo, à volta de pescoços, deixando
crescendo ligeiramente apenas por bre- completar apreciação em como res-
ves instantes. Sentia os passarinhos tantes corpos tinham semelhanças
cantando à volta da sua imaginativa com peças de jogar dominó ou xa-
mente quando viu a rapariga que antes drez, para no lado outro de fonte, en-
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volvidos nas bijuterias idênticas, esta- dar aproximação para levar jovem cu-
rem cartas de baralhos, por certo sua riosa. A rapariga dos solares olhos
íntegra contagem. O percurso de barco sorriu e deixou um rasto de luminoso
seguiu e avistando-se terra nada distan- raio, como se tivesse sido projectada
te, as flores quase cresciam a cada se- dali para distante céu, alperce como
gundo até atingirem altos metros que antes e com horizonte ainda sorrindo
não sabia quantificar com devida preci- no anterior visto tom de sumo, quan-
são. Havia balões voando na urgente do lhe falou a tal misteriosa persona-
pressa que os fazia desaparecer no visto gem. O barco via árvores de moran-
instantaneamente, levando gente de tal- gos e tangerinas, perante flores e
vez duvidosa certeza, por consideração plantas, reflectindo solares manchas
hipotética, mais peças ou eventuais car- nas constantes mudanças de cor,
tas de jogar. Alguns circulavam em lenti- lembrando a rapariga daqueles olhos
dão maior, vazios sem opção pensada similares em imagem que ainda hoje
diferente, no intuir de que estariam a perdura na sua imaginativa vida.
https://www.facebook.com/luisamorimeditions
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Madô Martins
Santos/SP
A primeira impressão
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meu cabelo branco. “Minha avó tem 45 anos e minha mãe, 29”. Penso, mas não
falo, que poderia ser mãe, avó e bisavó das três!...
A bateria do celular dela estava acabando, e aconselhei a pedir o wi-fi do
consultório, o que acatou agradecida. Deixou cair o copo de papel onde bebera
água e indiquei o cesto de lixo, para onde se dirigiu em seguida. Já éramos
amigas e a conversa se estendeu até a mãe reaparecer no corredor. “Está vendo,
vai dar tempo de você almoçar e se trocar”, ponderei.
“Por que a demora, mãe?”. “É assim mesmo, o doutor precisou analisar os
exames e me examinar de novo”. Vão embora na mesma ordem da chegada: a
mãe na frente e a menina logo atrás. Constato como a pequena conseguiu
apagar a má impressão inicial com sua inocência sorridente. E como as
aparências enganam...
www.rubem.wordpress.com
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Marcel Luiz
Contagem/MG
3 bichos da seda
I
bicho da seda,
inseto de giz branco.
amor tecido
II
fio a fio
primavera eterna:
bicho da seda
III
bicho da seda:
outrora fio d’ouro
estampa floral
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A Arte de Amar
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Instagram: @,marcosantoniocampos89
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Hoje
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se vive.
Hoje sei amar
Sei de mim e de você
Sobre tudo que nós vivemos
Desejando ser apenas um.
Hoje quero viver este meu dia
Viver um mês
E passarão os anos
E quem sabe uma eternidade.
Hoje.
Sou uma pessoa feliz hoje,
Pois amo muito minha vida.
Dela sou um aprendiz como qualquer um que passa por sua
estrada.
Hoje buscarei os caminhos que ainda não conheço, que ainda não
decorei.
Buscando a cada dia me tornar uma pessoa melhor amanhã e
Hoje.
@anete2112
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Silêncio
Eu já não canto,
só fico, no entanto,
olhando com espanto
a vida passar.
Já não arrisco,
pois, corro o risco
de balbuciar.
A dor é tamanha
que sai das entranhas
quando eu desejo cantar.
Em meu desencanto
seco o meu pranto
para nas lágrimas
não me afogar.
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Herança
Quando essa formosa terra
Cobrir meu pálido rosto
Não serei capaz de sentir mais nada
Nem ódio, nem dor, nem desgosto
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— Sim. - A moça responde e duas — Sim. Sua dor, nossa dor, é natural.
lágrimas escorrem de seus olhos, sem A palavra natureza deriva de natus,
fazer barulho nenhum. que significa nascido. Essa dor
Deixam o carro na beira da estrada e se nasceu do amor que nos uniu à sua
encaminham para o mato, um ao lado mãe e, como todas as coisas que
do outro. nascem, está destinada a crescer,
— Você quer que eu a leve? - Pergunta o desenvolver-se, envelhecer e morrer,
homem, indicando com um aceno de para depois renascer em outras
cabeça a urna que a moça continua formas. É o ciclo da natureza, cruel
segurando contra o peito. na morte, mas generoso na vida.
— Não, deixa comigo. — É por isso que as águas gritam e
Chegam em proximidade do rio, no fazem tanto barulho? Por que elas
ponto em que uma antiga enchente também carregam o peso da dor?
desfez o talude, reduzindo a distância — Sim, mas elas são mais fortes do
entre a margem e o leito. A água corre, que nós. Você vê, eles não choram.
impetuosa e imparável, aparentemente A moça entrega a urna ao pai,
indiferente, arrastando consigo tudo o pedindo-lhe que a abra. Então,
que encontra. juntos, em um único movimento, eles
— Nenhum homem pode banhar-se duas esvaziam o conteúdo.
vezes no mesmo rio... — a moça recita, As cinzas formam uma nuvem leve
olhando para a correnteza. que, empurrada pelo vento, cai e
O homem cinge os ombros dela, por descansa na superfície da água, para
trás, e a abraça- …pois, na segunda vez ser rapidamente engolida e varrida
o rio já não é o mesmo, nem tão pouco pela corrente.
o homem! - Ele conclui em um sussurro O homem enxuga os olhos, a filha faz
que acaricia o ouvido dela. o mesmo e depois, de mãos dada, se
— Pai, toda essa dor vai passar algum encaminham em direção ao carro.
dia? — Você tem razão. As águas do rio
— Não, filha. Mas vai mudar, vai se não choram. - Ela diz e, pela última
transformar. Vai se tornar outra coisa. vez, os dois se voltam para olhar o
— Como o rio? rio, que já não é mais o mesmo.
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10.000 Caracteres
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chefe, família não era a palavra-chave Tentei então falar sobre o poder
do mistério. da tecnologia ser usado para o mal e
3000 caracteres já se passaram. Já até criei o maléfico Dr. Stephenson
estava vendo no horizonte o fim do que queria dominar o mundo usando
sonho de ser um brilhante escritor com uma máquina para criar uma
a porta da rua já a postos pra receber tempestade magnética capaz de
um novo fracassado. deixar todos sem Internet.
E a danada da Esfinge estava Mais uma vez a senhorita Esfinge
sentada em uma cadeira cruzando as rejeitou o tema devido aos clichês e o
pernas de um lado pro outro. texto voltou a estaca zero.
Então veio a ideia de um casal em Enquanto isso, todos meus
crise com o marido passando a noite colegas já tinham ido embora da
num motel com muito sexo explícito e redação e eu ali vendo o sol se pôr,
durante o dia, sendo um falso moralista os bares perto da redação ser abertos
que incitava um discurso de ódio contra e o mistério literário não ser
as mulheres. resolvido.
Óbvio que a senhorita Esfinge não 6000 caracteres e meu texto
concordou com a ideia. E 4000 segue mais perdido do que cachorro
caracteres já haviam se passado. em dia de mudança.
Minha boca ressecada me deu a Resolvi criar uma história usando
ideia de escrever sobre a água como o empoderamento feminino e um
fonte preciosa da vida. pouco de feitiçaria com três jovens e
No entanto, a Esfinge havia atraentes feiticeiras como
rejeitado meu texto piorando ainda mais protagonistas cuja missão era salvar
o meu lado. E pra cúmulo da irritação, seu chefe á beira da morte.
ela estava tomando uma garrafa d´água Resposta errada. E o problema
bem gelada e sorrindo com o mais falso seguia sem solução.
dos sorrisos. E a senhorita Esfinge mandando
Cheguei aos 5000 caracteres e nada mensagens no Whatsapp pra suas
do texto sair como ela queria. amigas dizendo que vai chegar mais
tarde ao happy hour por causa de um
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May Cass
Teresina/PI
Foi como em um dia desses em que o sol queimava a retina e eu não te tinha
mais entre meus dedos. O suor que banhava meu corpo, me refrescava, a grosso
modo. Abafada e fatigada, a dança do cansaço se fortuiu meu corpo: a sede me
tomou por inteiro, o sangue nos olhos ardiam como fogo, a temperatura já me
inflava em um qualquer simples toque... é... eu não te tinha mais por aqui. A
passear meus olhos no sol, aquela luz dourada do por do sol, me fazia estar
distante de ti, fisicamente, mas de alma para alma, meus sentidos eram todos
voltados para ti: as inúmeras saudades tinham gosto de sabor de novidade,
tinham a alegria do seu humor espontâneo, tinha o charme provocativo de
qualquer convite teu ao meu lado, tinha a fragrância exata do teu perfume, tinha
também o gosto do teu beijo. Ainda hoje me recordo. A peleja contigo era fácil.
Não era tão pesado. Não era tão distante de mim mesma. Contigo, eu me era
entendível, audível, compreendida. Minha solidão havia partido sem deixar
recado de volta. Contigo, eu era eu mesma. Pude ser eu mesma. E agora que se
foi, me pergunto: quem ainda sou? O sol atravessa minha pupila. O astigmatismo
que agora adquiri, me faz fechar os olhos. Até nesse movimento me lembro de
você. Eu os fecho e me encontro secretamente contigo e te eternizo (em minha
escrita).
@mayaracass
https://www.instagram.com/mayaracass/?hl=pt-br
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Horas Mortas
Fim de tarde, o sol querendo descansar, a revoada sagrada da passarada, o
ensaio da noite para entrar em cena, as estrelas bailando no firmamento e a
prosa solta na Venda do Seu Zezé.
Já estavam ali há horas e de tudo ou quase tudo já haviam falado. Do plantio
que estava uma maravilha e até do caudaloso Córrego da Saracura que estava
dando muito peixe e era a caixa d’água da região.
O Zé Teixeira com a viola no peito, ponteando baixinho para escutar e o Buda
Borges tirado a raizeiro, falando das plantas do cerrado e também dos peixes que
pegava e do tamanho, dá pra entender que ele exagerava, pois, era o vantageiro
da região - como falavam na corruptela. O Mandruvachá num cantinho
assuntando a prosa, pois, já havia vendido os seus queijos e estava ali para um
breve descanso. Sem falar no Silvalino que contava da criação de frangos, gansos
e galos índios, que ele cria com muito amor.
De repente o Silvalino:
– Óia gente. Eu vô imbora. Tá iscuriceno e a nôte tá iscura e eu moro
longe.
O Buda que ouvira aquilo foi logo retrucando:
—Ta cum medo Silvalino? Dêxa de froxura home! Medo de quê?
O Silvalino já de pé:
—Das zora morta sô! Num abusa não!
E saiu sertão afora num pangaré que havia comprado do Pedrosinha e este
estava velho e cansado e que o Pedrosa o vendeu à noite ao Silvalino pra não
perceber os dentes do coitado do cavalo; que só tinha um.
Logo o Zé Teixeira silenciou a viola e entrou na conversa e:
—Eu num tenho medo de nada. Sô um cabra do sertão e do pé
rachado e ando quarqué hora do dia ô da nôte. Medo pra mim é lixo.
O Vendeiro Seu Zezé debruçado no balcão logo entrou no assunto:
—Ocê, Texêra? Medroso e dos maióre, fala isso pa mode contá
vantage.
O Mandruvachá lá no cantinho caladinho, só de ouvidos na prosa, logo diz:
—Eu num abuso. Nas zoras morta tem sombração e coisa dôto
mundo em todos os lugá.
O seu Zezé que gosta de uma aposta foi logo desafiando o Zé Teixeira:
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Coisas do sertão!
Inté!
https://www.facebook.com/tingadasgerais.silva
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Mônica Monnerat
Santos/SP
Caminho de Orvalhos
Nos dias daquele tempo, a janela do meu quarto dava para o quintal, onde a
grama verdinha acolhia flores miúdas e coloridas. Bem cedo ainda, fui acordada
para iniciar meu horário escolar na parte da manhã. Ao olhar para fora, ainda
bem sonolenta, notei pela primeira vez as gotinhas de orvalho nas plantas, como
que a me desejar bom dia. Eu era muito menina, mas aquela imagem fresca e
matinal deixou-me lembranças de um período breve e feliz.
Já na adolescência, a casa de praia da infância tornou-se bem mais interessante.
A turma de jovens reunia-se praticamente o dia todo e, à noite, nós nos
sentávamos no banco que rodeava a grande árvore da praça. E como
cantávamos, e ríamos, de qualquer coisa... Nessa época, a volta para casa já era
mais tardia, não havia perigos por lá. E ao atravessar o jardim, as gotas de
orvalho brilhantes, sem falar me diziam que a vida era uma festa. E eu me sentia
serenamente feliz.
E lá estava eu nos últimos anos da Universidade, envolvida com provas e
trabalhos de enlouquecer. O café ajudava a manter-me acordada, distante que
estava da família e dos amigos de sempre, naquele pequeno pensionato,
dividindo o quarto com mais duas colegas. De madrugada, entre um café e um
cigarro, a voltinha costumeira pela frente da casa mergulhada no mais profundo
silêncio. E o orvalho sobre a grama nem me parecia tão brilhante assim, antes
refletia todo o meu cansaço e sonolência. E nesse momento, tudo o que queria
era me enfiar sob as cobertas e dormir o sono dos justos.
Nos anos de trabalho que se seguiram, as madrugadas insones como médica
plantonista não me deixaram estabelecer uma aproximação maior entre mim e a
natureza. Quantos orvalhos deixei passar sem observar-lhes o frescor e a
suavidade... Em algumas viagens de férias cheguei a observá-los de relance, mas
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https://www.facebook.com/monica.monnerat.18/
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Noites de frio
https://www.facebook.com/profile.php?id=100083217077615
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Nathalia Mageste
Mogi das Cruzes/SP
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Nazareth Ferrari
Taubaté/SP
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Nercy Grabellos
Rio de Janeiro/RJ
O amor é do mundo
Ouço dizer que o amor está em tudo: na natureza, no mar e nas cachoeiras,
no perfume das flores, no céu, nas estrelas e no luar...vago pelas noites a sua
procura, fico atento para preservar-me e não cair de mão em mão pelas esquinas
e nos bares. Muitas vezes achei que havia encontrado alguém que vejo em meus
sonhos e fala nos meus ouvidos coisas de amor. O tempo passa e sinto a
nostalgia e o desencanto de ver o enfado, as alegações de cansaço, falta de
tempo e descaso: quando percebo a cilada me afasto e continuo procurando o
meu amor na esperança de conseguir uma boa parceria romântica e emergir
desta melancolia e desilusão.
Ah! Se soubesses verdadeiramente amar como os pássaros no ninho, como
as flores que encantam se entrelaçando umas às outras como um arco íris. O
perfume das rosas, margaridas, hortênsias e azaleias lembram os mais belos
dons do espírito divino que é todo amor.
O amor na sua plenitude e não banalizado, assim eu quero...desejo
encontrar uma parceria completa que sejamos um só corpo e alma. Na ânsia de
encontrá-lo evito cair nos braços de uns e outros e cometer um engano... Nesta
busca talvez venha concluir que o amor não é de ninguém: é do mundo.
Quero sair por aí sem pisar nos jardins, ferir-me com espinhos, sem sujar as
ruas, empurrar e ferir transeuntes. Prefiro ser generoso com todas as pessoas,
gentil com os animais, prefiro a paz sem dar ensejo a animosidades. O amor é a
luz do mundo!
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Ovidiu-Marius Bocsa
Romênia
Mogadíscio
Explosões: Aeroporto e hospital de Lower Shabelle;
Começou uma chuva de fogo em Merca, capital da região;
O grupo militante al-Shabab fingiu um novo ataque;
Os rebeldes usavam máscaras brancas e roupas pretas.
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Patrícia Barcelos
Goiânia/GO
Ercília
Antônia nasceu Ercília, no sertão hoje é Tocantins. E foi no final da
nordestino. Ainda na infância, viu dois década de 40 que chegaram ao lugar
irmãos sendo vendidos para que os que seria o pouso derradeiro do
outros não morressem de fome. carcará Sabino. Já naquela época,
Cearense de nascimento, mudou-se para Marabá indicava a cidade agitada e
o interior de Minas e lá, com menos de próspera que viria a ser. E Antônia
15 anos, juntou-se a Sabino, mineiro dava sinais da tristeza profunda que
avesso ao riso e que vivia entre dois poucos sabiam a causa e ninguém
ofícios: o de matador e qualquer outro jamais poderia curar. Uma ferida
que o ajudasse a sustentar a família. aberta em sua alma e cuja dor
Caboclo, quase dois metros de altura, lancinante ela disfarçava e sufocava,
Sabino não matava por dinheiro, era dia após dia. Quando ficava
sempre por vingança ou desavença. E, insuportável, Antônia buscava consolo
por um ofício ou pelo outro, vivia pelo no colo de uma garrafa de Velho
mundo. Numa época em que pobre só Barreiro, mas nunca durante as
andava a pé ou no lombo de burro, temporadas do marido em casa. Ele
ficava meses longe de casa e sem as jamais aceitaria que esposa sua
facilidades de comunicação que temos bebesse daquele jeito. Não era coisa
hoje, esses meses seguiam sem nenhum de mulher de família, qualquer que
contato com a família. A cada retorno, fosse o motivo e menos ainda se
juntava mulher e a renca de filhos e fosse segredo. Talvez agradasse seu
seguia para outro lugar mais acima no gênio ruim saber que era um dos
mapa, fugindo da polícia ou da vingança responsáveis por tanta tristeza, mas
dos inimigos que cultivava como não dava para confiar. Só depois de
ninguém. sua morte – morte matada, é claro –
Foi numa dessas mudanças que Ercília é que Antônia pode se entregar à sua
virou Antônia. Casada com Sabino, dor, seu remorso, sua culpa.
tornou-se fugitiva mesmo sem nunca ter Sentimentos que nem toda pinga do
matado nada além das galinhas que, de mundo poderia aliviar.
vez em quando, servia para os filhos. Aquele calvário começou a ser
Seguiram de Minas rumo ao Pará, não plantado ainda em Babaçulândia. Se
sem antes passarem uma temporada em depois de chegarem ao Pará as
Babaçulândia – que já foi Goiás, mas viagens de Sabino minguaram e não
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de ser abafada. O pânico tomou conta lavar o cabelo e vamos secar esse
de todos. Parentes, amigos, inimigos, leite. Chá de sálvia, banana e carne
curiosos... todos sabiam o que aquela de porco vão ajudar”, decretou num
notícia significava. Todos sabiam do que tom de ordem e compaixão. “O resto,
Sabino era capaz. Mas, Ercília sabia boca fechada. Quem conhece Sabino
melhor do que ninguém o demônio sabe que ele é descontrolado. Se
violento que se escondia nas entranhas desconfiar do que aconteceu, é capaz
do marido. Ele mataria todos. Inácio, de matar mulher, filhos, Inácio e
ela, as crianças e sua bebê. Não qualquer outro que queira bancar de
pouparia nem os animais. Era capaz, pombo-correio ou que ele desconfiar
até, de pôr fogo na casa e em quem se que ajudou nessa história”, completou
metesse no caminho. Veio gosto de misturando conselho e ameaça.
sangue na boca. Faltaram-lhe as pernas. A essa altura Ercília já estava aos
Seu coração congelou. Quatro dias... prantos, urros que acordaram a
talvez menos. E com todas aquelas recém-nascida e assustavam as
cabeças assustadas pensando juntas, outras crianças. Enquanto gritava a
uma voz fraca, quase um sussurro, dor de entregar a filha para o marido
saltou com a solução. Comadre Edésia levar embora, era consolada pelas
era a parteira que ajudou Ercília e boa vizinhas. Inácio juntou suas roupas, o
parte das mulheres do vilarejo a darem enxoval da filha, beijou a mulher,
à luz. virou as costas e sumiu, como um
Querida e respeitada, a mulher recitou zumbi. Não caiu uma lágrima dos
calmamente aquela que viria a ser a seus olhos. Reuniu todas as forças
única solução possível para evitar uma que tinha para conseguir fazer
tragédia maior e distribuiu afazeres para apenas o que era necessário para que
todos. Os mais dolorosos ficaram para o todas aquelas vidas fossem
casal. “Inácio, arruma tuas coisas e sai poupadas. Naquela noite ninguém
já dessa casa. Leva a criança e acha dormiu. Depois daquela noite, Ercília
alguém que possa ficar com ela. Não – ou Antônia, tanto faz... – descobriu
pode ser ninguém daqui, tem que ser de como era morrer e continuar viva. E
longe e melhor que nunca mais volte por (sobre)viveu ao lado de Sabino até
essas bandas”, determinou com enterrá-lo, muitos anos depois, sem
autoridade. “Tu, Ercília, acabou o derramar lágrima. Pois, para ele, não
resguardo. Amanhã vai levantar cedo, sobrara nenhuma.
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Tua Foto
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O Inquérito
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https://www.facebook.com/pauloluis.ferreira.10
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Paulo Vasconcellos
Capanema-Pará-Amazônia
O laço e o compasso
Vou desenhar algo, usando apenas um traço
cadenciando para não perder o passo,
ao ar livre, sentindo o mormaço
recebo as energias e depois repasso,
tramo o que for preciso para ganhar espaço,
mesmo que o meu inspirar esteja escasso,
transformo meu texto em textaço,
não esmoreço nem me rendo ao fracasso
para que ele não seja dividido em pedaço,
serei sempre gentil, porque não sou devasso,
sou criterioso, prevalente e tenho desembaraço.
Invólucro que contém as marcas do perpasso
guardado em armário de aço,
recompensa obtida através do transpasso,
dou formas ao laço
manuseando o vistoso compasso.
E sendo assim...
Faço o laço, perto o laço,
afrouxo o laço,
na minha lapela, ponho o laço,
a quem de direito, mostro o laço.Por fim...
Observo o compasso,
abro o compasso,
circulo o compasso,
em muitas atividades, uso o compasso
na certeza de novas ações, não largarei o compasso.
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Suor
uivante,
Em caldas borbulhantes,
Em vida interminável,
Em direção ao destino,
nada faltarás!
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People
Meridiano
Encontrei um amor ao sul, tropical.
Sol de verão, céu azul, mar sem fim.
Muito feliz, num passeio matinal.
Belas canções em luais de jasmim.
Tudo se acabou numa dor sem igual.
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Regiane Silva
Belford Roxo/RJ
Sujeito (in)determinado
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Regina Alonso
Santos/SP
A vida é movimento
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
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Reinaldo Fernandes
Brumadinho/MG
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— Que Sãozinha?
— Num se faz de besta. A Sãozinha, aquela do escritório.
— A Sãozinha...é...é uma mulher bonita, tem um belo corpo...
— E a Cristina, da padaria?
— Cristina...é bonitinha...
— A Maria José?
— É...a Maria José...
— Eu sabia! Você não me ama, seu mulherengo!
E corre para o quarto, tranca-se nele e vai ler contos da Maire Claire. E desejar
os rapazes sarados da novela das oito.
https://www.facebook.com/reinaldo.13.fernandes/
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Reirazinho
Mogi Guaçu/SP
Instagram: @ordvm.impure
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Roberto Schima
Itanhaém/SP
Chumaços de Algodão
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***
NOTA DO AUTOR:
Escrito entre 16.04.2022 e 17.04.2022. Inspirado na personagem Puddles Pity
Party criada pelo talentoso artista Mike Geier, e, claro, na lembrança do alter ego
do Sr. Waldemar Seyssel, o saudoso palhaço Arrelia.
http://www.revistaconexaoliteratura.com.br/search?q=roberto+schima
https://clubedeautores.com.br/books/search?where=books&what=roberto+schima
https://www.wattpad.com/user/RobertoSchima
rschima@bol.com.br
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Rodrigo Domit
Jaraguá do Sul/SC
Intragável
Ele abriu o novo tablete e colocou sobre os restos da manteiga velha que resistiam no fundo
da manteigueira, já arados pela faca de serra. Sabe-se lá há quanto tempo vinha fazendo isso.
Ela tentou comer, mas deixou a torrada no prato e o afastou sutilmente em direção ao centro
da mesa. Tentou distrair-se lendo o jornal, mas ao tentar virar as páginas sentia como se
estivesse com as pontas dos dedos oleosas, rançosas.
Quando ele levantou, já atrasado, e tentou beijá-la, o afastamento brusco, com o rosto virado
para o lado, foi inevitável. O casamento acabou, de fato, naquele instante.
http://linktr.ee/rodrigodomit
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RodrigoSBA
Salvador/BA
Misantropia
– Ao longo da vida, percebi que a maioria das pessoas é falsa, dissimulada, interesseira,
mau-caráter, egoísta, traiçoeira, mesquinha, hipócrita, mentiro…
– Olá, Pinóquio! Entre! Como vai o Gepeto? O café está quente e temos biscoitos!
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Rommel Werneck
Santo André/SP
Eunuco
2021
www.rommelwerneck.com
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Corpo Vermelho
www.facebook.com/roquealoisio.weschenfelder
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Rosangela Maluf
Belo Horizonte/MG
No bairro onde moro, tudo de mais importante e necessário fica a menos de três
quarteirões do meu prédio. Sendo assim, com todo o cuidado que a situação
exige de nós, faço “de um tudo”, sem o menor receio, sem absolutamente
nenhuma neurose e com toda segurança. Não me privo de sair diariamente para
resolver uma coisinha ou outra que não pode esperar!
Descendo um quarteirão tenho, à minha disposição, uma excelente confeitaria.
Uma padaria, um açougue, um supermercado enorme, uma drogaria também
enorme. Correios e lojas variadas. No quarteirão de cima encontro um sacolão,
uma floricultura, um salão de beleza, uma pequena academia, uma lavadora de
tapetes, uma gelateria excepcional e outras tantas pequenas lojas. Dois bares,
muito conhecidos em BH (o do Salomão e o do Cabral) distantes, apenas a um
quarteirão de mim. Como se não bastasse essa localização privilegiada, nas
manhãs de quarta feira há uma feira livre, aqui bem em frente ao meu prédio.
Uma vez por semana, logo cedo, pego a sacola, procuro minha listinha, minha
máscara, as chaves, o cartão de crédito, alguns trocados e lá vou eu...
Seu Francisco não gosta de apelidos, o nome dele é Francisco mesmo, assim
como o pai e o avô. Nada de intimidades. É um senhor discreto, de pouca
conversa, de fala mansa. Organiza meticulosamente os legumes que vende. Sua
barraca apresenta tudo separadinho: batata inglesa, batata doce, inhame,
cenoura vermelha, cenoura amarela. Cada um deles numa caixa, bem
arrumadinhos. Xuxú, vagem, cebola, pimentão, tomate, igualmente bem
organizados e por aí vai. Em todos os montinhos, as plaquinhas com os preços.
Escritos com cuidado, pincel atômico, bem grosso, roxo!
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Já perguntei outras vezes e entre lacônicas respostas de “sim e não” soube que
ele mesmo dirige a Kombi, arruma os caixote, coloca os preços, atende os
clientes, separa os pedidos, faz as contas, cobra e agradece. Não sorri quase
nunca, mas se lembra de agradecer. Envia seu Deus pra ficar com a gente e
espera rever-nos na próxima semana. Penso aqui com os meus botões que o Seu
Francisco possa ser Virginiano...será?
Ao lado, Seu Caneco monta sua barraca, de frutas. Sem nenhum capricho e só
com o cuidado necessário, ele separa as pencas de bananas, identificadas por
pedaços de papelão, mal recortados, mal escritos: caturra, ouro, prata, da terra,
são tomé. Maçãs se agrupam logo em seguida. Pequenas torres de gala, fuji,
verde e algumas “em promoção” – aquelas meio murchas e com pequenos
amassados. Seu Caneco fala sem parar. E canta músicas conhecidas trocando a
letra original por chamativos para suas frutas. Com ou sem rima, canta
desafinado e pergunta repetidas vezes “- o que a dona vai levar?”
Coloca no saco plástico as frutas escolhidas. Dá um nó apertado. Faz as contas
de cabeça. Se for dinheiro, é com ele; se for no cartão é com Canequinho. Seu
filho é quem toma conta das máquinas. Nunca me perguntei o porquê do apelido,
dele e do filho. Bem humorado feito o pai, menos falante, mas metido a criar
gracinhas. E o curioso disto tudo: Canequinho tira onda com o que o pai fala.
Morre de rir a ponto de enxugar as lágrimas na manga da surrada camisa do
Galo que sempre usa. Um dia, quando Seu Caneco cantar menos e sobrar um
espacinho entre as suas rimas, quem sabe terei um tempinho pra matar minha
curiosidade.
Mas o melhor da feira é a Dona Penha, Tadeu o marido, e Tequinha, a ajudante. A
barraca deles vende carne. É uma Kombi adaptada com um freezer bem grande,
suficiente para guardar os produtos em temperatura adequada. Tem carne de
panela, já cortada em pedaços, faltando só temperar e cozinhar. Tem frango
caipira, limpo, inteirinho. Tem coxa e sobre coxa, asinha, pezinhos e pescoço.
Tem coração, moela, tem filé de peito, cortado em quadradinhos para strogonoff
- tem de um tudo!
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Roseli Ágda
Água Doce do Norte/ES
6:30 h
Eu nunca vivi um grande amor.
E nem por isso a terra parou.
Se perdi oportunidades, relógio por mim não se atrasou.
Se tentei correr atrás, o ônibus das 6:30h não esperou.
Quem se importa?
Se alguém se importa, o que fazer?
Isso é guerra sem soldado,
flecheiro sem alvo,
coração sem amor.
https://www.facebook.com/roseli.agda
https://www.instagram.com/roseliagda
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Ruan Vieira
Propriá/SE
https://www.instagram.com/libertospelapoesia/?utm_medium=copy_link
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Sérgio Soares
Simão Pereira/MG
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
https://articulancia.blog/
https://sergiosoares517.wixsite.com/sergiosoares
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Sigridi Borges
São Paulo/SP
Satisfação
ao Pedro, com carinho
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Suramy Guedes
Soneto Diet
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Arrebatador desejo
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Tereza Du'Zai
Itajaí/SC
Imprescindível
Meu virtuoso, e muitíssimo amado, Miguel. Esta carta, ditada por mim e escrita
por minha romântica avó,
deverá ser aberta somente às 18 horas da próxima sexta-feira. Pontualmente!
O local: no Cânion Paragem dos Ausentes, onde cunhamos as iniciais de nossos
nomes.
Sobre celular? Nem pense! A regra prevalece, assim como as demais
singularidades de nosso romance.
Não ouse tentar manipular uma perita criminal desprovida dessa tecnologia
invasiva. Será o reencontro de
dois amantes à antiguidade.
....
A Carta
Meu querido e muito adorável namorado, não olhe para trás, aguarde o sinal. Eis
a primeira boa notícia:
concluí minha pesquisa de campo, e ninguém ousará me chamar de louca, antes,
e com muito orgulho, me
considerarão uma pesquisadora sutil e sagaz,
Neste momento, já o avistei enquanto caminho em sua direção. Preparei tudo
com o rigor de minha
personalidade, da qual você tanto se queixa, mas muito o tem surpreendido.
Como cheguei até aqui? Não
imagine que foi pelo acesso comum e vigiado, mas logo segui pela trilha
secundária, pouco utilizada por
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ser mais íngreme, porém, mais seguro para uma ex-escoteira solitária em sua
excursão. Imagine você,
caminhei durante toda uma noite. Não pense em exaustão, trouxe apenas uma
mochila com dois lanches,
medicamentos emergenciais e água, além de muito entusiasmo e a certeza de
que tudo daria certo.
O espaço está fechado para visitações durante dez dias devido a previsão de
temporais. Não se preocupe!
Estou sempre muito bem equipada, inclusive para me proteger de catástrofes
naturais, não de todas,
porém, talvez de muitas. Atente para este segredo: tenho meu recanto
estratégico entre essas rochas, e
noutros ambientes de difícil acesso, perto e longe daqui - poderíamos conversar
sobre isso futuramente.
Sim, poderíamos...
Sobre família, trabalho, curso..., tomei todos os cuidados para não ser
descoberta, e esses cuidados
incluíram você, de quem mais senti falta nesta minha aventura científica. Meu
amor, você não imagina o
quanto sua obstinada namorada se esforçou para comprovar uma teoria tida
como fabulosa para muitos,
incluindo meus orientadores. Sinto ter agido de acordo ao mantê-lo alheio sobre
o assunto. Temi
desapontá-lo.
Tenho sido uma filha, uma irmã, uma funcionária, uma pesquisadora e uma
companheira amorosa,
responsável e dedicada. Assim, não me foi difícil apresentar um álibi para
justificar minha ausência.
Enfim, foram, não duvido, prolíferos cinco dias dedicados á ciência, à vida, à
morte, à natureza.
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Contudo, devo antecipar: você foi o único para quem eu menti. Mas, não se
aborreça! Posso garantir que
minha mentira, ou melhor, omissão, é jurisprudente e compensadora.
Não teremos tempo para repreensões. Prometo!
Sua libidinosa, afrodisíaca, e muito apaixonada, Nina.
Miguel está eufórico, mas se esforça para seguir as instruções de Nina, não
pretende desapontá-la. Ela
surgiu em sua vida há 15 dias, 12 horas e 59 minutos, durante o velório de sua
mãe, quando todos
pensaram se tratar de uma freira desconhecida de todos, menos de sua mãe.
talvez representando alguma
das entidades beneficiadas pelas doações e serviços prestados por ela, antes de
descobrir o câncer
pancreático que a vitimou.
Sinceramente, Nina, ainda não declarada Nina, não parecia ser uma freira
comum: sua postura, seu modo
de caminhar, sua presença amistosa e intimista... Uma mulher elegante, esbelta
e distinta, assim fora
definida pelo filho enlutado, mesmo antes de ver seu rosto.
Por aguçar a curiosidade dos familiares e amigos presentes, também despertou
especulações acerca de sua
origem; parecia uma madre enlutada com seu hábito preto e seu rosto coberto
por um véu da mesma cor.
Todos a respeitaram, sequer se aproximaram para cumprimentá-la. Sua
imponência não favoreceu
qualquer possibilidade de aproximação. Sim, seu comportamento cerimonioso a
manteve distante, embora
tenha chamado a atenção dos curiosos, inclusive de Miguel, o único de quem ela
se aproximou e para
quem entregou um pequeno envelope com suas mãos enluvadas, dentro do qual
havia um lenço de cetim
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Manter o caso em segredo durante os três primeiros meses fora sugestão dela,
para se conhecerem sem
possíveis intromissões negativas.
Alguns segundos se passam e ele consegue ouvir os passos lentos de sua
namorada caminhando em sua
direção. Ela usava um par de sapatos masculinos dois números maiores do que o
seu.
Miguel ouve sua voz. Que saudade! "Guarde a carta num de seus bolsos, tire
toda a roupa e jogue-as para
trás! Em menos de um minuto o rapaz estava nu e com os braços erguidos para
o alto. "Muito bem, meu
jovem. Agora se atente a natureza a sua frente! Estou me aproximando, posso
sentir o cheiro do meu amor
e ouvir sua respiração. Um, dois, três!
Miguel não gritou, sua queda foi assistida por sua algoz, nem riso, nem lágrimas.
Com os braços abertos,
girando o corpo em torno de si até cair de joelhos com os olhos voltados para o
céu, a diabólica mulher
orou como a mais fiel devota ao Divino.
Seu regresso teve início por volta das 19 horas,
As notícias sobre o suicídio do jovem oceanógrafo Miguel Córdoba ocorreram
somente quatro dias após
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seu desaparecimento, quando o local foi reaberto para visitação, e seu corpo em
decomposição foi
descoberto por um fotógrafo argentino.
Sobre as investigações: seu celular foi periciado, mas não havia registros
suspeitos; assim como não havia
inimigos, ou pessoas com indícios suficientes para despertar o interesse da
polícia. Certamente a morte da
mãe o abalara a ponto de atentar contra a própria vida. No entanto, para um
ativista incansável em defesa
da natureza, a morte no Cânion Paragem dos Ausentes significa mais que a
interrupção prematura de uma
vida.
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Intensidade
Sou intensa
é difícil controlar
quero alguém para mergulhar, cuidar, cultivar e multiplicar as maravilhas que demorei
para conquistar
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Vadô Cabrera
Jacareí/SP
A gente cresce, amadurece e faz planos. Dentre esses planos há sonhos. Tantos
sonhos que ainda faltam alguns para serem realizados. Quando me casei, levei
meus sonhos para o novo lar que surgia e o principal deles era ter filhos. Assim,
Deus me abençoou, concedendo-me duas amadas filhas. O tempo foi passando -
voando inexorável - e elas foram se metamorfoseando: de crianças para jovens e
de adolescentes para adultas, tudo mágico, como num piscar de olhos. Estudar,
trabalhar – às vezes não nessa ordem – para serem independentes, prioridades
absolutas nessa fase da vida. As dificuldades surgem, os obstáculos são
inevitáveis, mas transponíveis e as etapas são vencidas. Para mim, que já entrei
na idade do “enta”, o tempo é cada vez mais veloz, no que para as filhas - jovens
ainda - não parece ser, sequer atroz.
E, como não podemos deixar de sonhar, pois são os sonhos que fortalecem e
prolongam a vida, faltava um para completar minha felicidade. Assim, a velha e
teimosa ansiedade aflorou, reacendendo a antiga chama, trazendo à tona aquele
desejo adormecido de ser avô. Sim, porque minha idade avança impiedosamente
e, com ela, pressinto minhas chances de conhecer meus netos, ficando cada dia
mais distante dos meus olhos carnais.
Também outra questão me preocupa: Se, com a chegada tardia dos netos, ainda
terei condições físicas ou mentais para curti-los, acompanhar de perto seus
primeiros passos; dar-lhes amor e cuidados; ensinar-lhes os valores essenciais,
que os tornarão seres humanos dignos e capazes de seguirem seus próprios
passos nesta caminhada terrena - que é a nossa continuidade - cujo legado
deixaremos.
Eu era tão obcecado em ser avô, que muitas vezes falei com Deus, rogando para
que me premiasse com essa oportunidade divina. Assim, roguei ao Pai Maior:
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— Deus, meu Senhor! Sou-lhe grato pela graça de ser pai de duas abençoadas
filhas, mas agora suplico-lhe a benção de ser avô. Elas são saudáveis e já
concluíram seus planos traçados inicialmente. Sinto que meus dias estão
esvaindo-se ao sopro da jornada terrena. É meu desejo, conhecer meus netos e
vive-los ainda na vida presente e com a saúde plena.
E Deus me respondeu:
— Calma, meu querido filho! Está tudo sob controle, seu destino já está escrito.
Falta-me, apenas escolher seus genros. Tranquilize-se que breve terás seus tão
almejados netos. Eles serão motivos de júbilo e lhe proporcionarão momentos
maravilhosos.
Após este diálogo, suspirei aliviado e esperei na vontade Dele, a única infalível.
Tempos depois os genros chegaram formando novas famílias e seus filhos
geraram, cujas luzes são meus netos.
Gratidão nosso Deus, por todos os momentos!
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Valéria Barbosa
Rio de Janeiro/RJ
Ivone Lara é o seu nome vamos sempre nos lembrar da beleza dos seus versos
do seu jeito de cantar, meiguice na passarela, abram alas para desfilar.
Ancestral do samba, enredo da esperança que feito criança travessa seu sonho mora lá,
nas águas sagradas da vida onde a rainha é Iemanjá e cá, acarinhando sonhos seus, se
tornam meus para, eu a homenagear.
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Qilômetro
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Vanderlei Kroin
Mallet/PR
Alice
Foi o desejo de ser grande
e habitar os sonhos verdadeiros
que fez Alice fugir de sua história
e buscar outras tantas.
Escapuliu de sua vida
embrenhou-se no livro
eescobriu que a imaginação é feita de loucuras
aventuras
desventuras é o que a vida oferece
e o que acontece.
Já se esquece quando amanhece um outro dia
e quando escurece...nenhum sentido se aquece
e vem tantas vidas e passam tantas histórias
e se tem tão poucos livros
que a fuga para dentro de um
é a beleza maior de quem quer ser grande!
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Profssão Divina
Tantas vidas vi nascer.
Tantas vidas vi morrer.
Tantas vidas passando por minhas mãos.
Profissão escolhida.
Profissão bendita.
Aos céus a minha gratidão .
Profissão escolhida .
Medicina querida.
Por ti estou realizada.
E por ti testificada.
Profissão divina
Que Deus seja sempre o meu clarão .
O meu eterno Capitão .
Com seu Exército de prontidão.
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Vera Raposo
Teresópolis/RJ
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Victor Carreão
Louveira/SP
Fumaça e espelhos
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Do que adiantaa
Do que adianta...
Estudar, cientificar.
Sabedoria a esbanjar, se não posso na humildade simplificar.
Do que adianta...
Juntar posses, enricar.
Casa boa a morar, carro de luxo a andar, se não há atos de dignificar.
Do que adianta...
Profissão a encantar, uma linda carreira a personificar,
fama a pontificar, se não tem com quem multiplicar e comunicar.
Do que adianta...
Férias a confortar, descanso a frutificar,
viagens a esbanjar, se não existe um significar.
Do que adianta...
Rede sociais a embonecar. História a alavancar e a lacrar,
receitas de amar a ostentar, se inexiste um sentido próprio para publicar.
Do que adianta...
Amigos a bebericar,
momentos a gabar, se não há contatos de pessoalidade quando precisar abarcar.
Do que adianta...
A Deus massificar,
a entoar o purificar, se não prática o mínimo gesto de bonificar, edificar.
Do que adianta...
Pela família existente, entoar o gratificar.
A esbravejar o ressignificar familiar, ao contrário a um ente maltratar, implicar.
Do que adianta...
Por obsessão se medicar e remedicar.
Posologia a quantificar. Carpe diem! Em um segundo isso pode complicar...
Por fim, adianta, adianta a cada minuto intensificar a simples ação de viver,
assim, plurificar o vivificar.
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Vladimir Ferrari
Ipaussu/SP
Dia da Marmota
Seu coração acelerou e ele fechou das três mortes daquele seu último
os olhos, cerrando os dentes. Então, o dia de liberdade.
cadafalso se abriu, o equilíbrio Pôs os pés no chão no exato
desapareceu e em uma fração de instante em que o padre chegou,
segundo a constrição cervical provocada acompanhando de Rogério, o guarda.
pela corda desligou todas as luzes do Estevão sabia seu nome. E ainda
seu mundo. zonzo de sono, o saudou:
O estrondo veio na sequência e — Bom dia, padre Gregório.
Jeferson escancarou a porta e gritou
para acordá-lo: O sacerdote olhou assustado
para o carcereiro, que deu de
— Sujou cara! Vamos embora ombros. Os dois se falariam depois,
daqui agora! Acorda, porra! curiosos em entender como Estevão
E lá estava Estevão correndo soube o nome do padre. Nunca
desesperado, entrando na mesma haviam estado juntos. Entrou na cela
mercearia e atropelando a garota com o e sentou-se à sua frente. Explicou
pirulito no meio de corredor, disparando que nesses momentos, a palavra de
o primeiro dos seis tiros na testa do Deus é a chance dos condenados de
dono do mercado. O restante do sonho se arrependerem de seus atos de
continua até que a menina parou diante maldade. Estevão manteve-se calado,
dele. Rendeu-se, incapaz de fazer mal a diante do discurso.
ela. O que ele não entendeu, ao Tentou processar o que seu
despertar, é de onde veio aquele cérebro estava demorando a aceitar:
sussurro de groundhog que soou em aquilo já havia acontecido. Balançou
seus ouvidos ao abrir seus olhos. a cabeça, afirmando estar
A claridade do lugar o atingiu sem arrependido e então ergueu a mão
piedade. Tudo era branco e imaculado direita um pouco, com o indicador
no corredor da morte. Ergueu o tronco e esticado. O padre interrompeu a
sentou-se na cama, esfregando os olhos leitura:
com a almofada das mãos. Algo de — O senhor já esteve aqui,
estranho aconteceu e não conseguiu não?
precisar. Lembrou-se de ter adormecido
por cansaço, depois de chorar e se — Como?
arrepender até o último fio de cabelo
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Indecisa
As “Ilusões Perdidas” escrito pra você
sem a real intenção dele, o autor,
orvalha em tua face embevecida que
não consegue mais viver, o amor.
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Willian Fontana
Rio de Janeiro/RJ
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Naquele instante outros três oferecem a dar suas casas pra nós no
homens entraram, um com traços desespero, acredita? Somos como
mongóis com uma grande barriga, foram deuses!
direto ao corpo jazido com um tiro de – Vocês irão fazer o que comigo?
silenciador e o carregou quando um – Vamos nos divertir! Uma festa,
carro preto parou na porta. não gosta? Daí depois de um bom
– Tem certeza que as câmeras banho, vamos por você pra dormir
foram desligadas? tranquilão com um xucalinho. Agora,
– Claro! Nosso cracker invadiu o após nosso investimento em
sistema para apagar as imagens em que crueldade e crime temos que colher
você aparece. os bens, como deuses.
– Sabe que nosso trabalho deve ter Ao terminar de ouvir aquelas
muita discrição, não? Ninguém pode palavras algo me espetou e fiquei
assistir o que fazemos. Nosso arrego foi tonto quando algo bateu ferozmente
pago ao rato para encobrir rastros no no carro fazendo-nos capotar.
sistema? Sonolento, tudo ficou em silêncio
O homem assentiu enquanto me quando ouvi passos de homens
pegava pelo braço direito a força com saindo de um carro a cortar o silêncio
um sorriso sádico. Eles pareciam na em seguida dizendo.
verdade estarem me monitorando há – Polícia Federal! Largue a arma!
muito tempo. Estávamos monitorando vocês há
Ao ser jogado dentro do carro um meses a procura de um flagrante
saco fora posto na minha cabeça para chegar em seu líder!
enquanto um homem sussurrava Um outro homem gritou dizendo
palavras de terror ao meu lado. pra mim.
– Apenas um percentual mínimo de – Senhor, senhor! Está bem?
nossas presas sobrevivem ao nosso jogo Todos estávamos assistindo,
mental. E nenhum sem sequelas ou monitoramos sua esposa, mas ela
desacreditadas. Você mordeu a isca mesma negava os crimes e sabíamos
direitinho ao pegar o cartão e acessar o que estes amaldiçoados viriam atrás
site como sua esposa havia feito meses de você! Agora temos provas o
antes de se matar. Estava aflito para te bastante para realizar prisões, busca
conhecer! Não aguentava mais te e apreensão. Sinto tê-lo usado como
monitorar e apenas na terceira tentativa isca a esses tubarões do esgoto que
você mordeu a isca! Sabe, estudamos até entre nós se infiltrou acabando
cada vítima com muito zelo, algumas com nossos melhores agentes!
conquistamos a confiança antes de O homem tirou meu saco da
matá-las e furtar seus bens, outra cabeça, porém tonto via ele distorcido
impomos apenas o terror psicológico e como se fosse isso, um pesadelo, até
as chantageamos. Algumas até se que tudo se apagou.
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Yuki Eiri
Maringá/PR
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Caricaturas
Jamison Paixão
Las Palmas de Gran Canária/ Espanha
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Fotos
Roberto Schima
Itanhaém/SP
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Artista do Mês
Desenho: Márcio Apoca
Campo Mourão/PR
Tom Savini
Ator, cineasta, maquiador/técnico de efeitos especiais americano
https://pt.wikipedia.org/wiki/Tom_Savini
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Símbolo da reativação do blog Poesia Retrô, o livro eletrônico de 170 páginas reúne vários
nomes da poesia erudita e retrô atual, sendo alguns autores convidados. A obra possui
desde poemas em versos livres até sonetos em sistema métrico mesclando pés e sílabas.
Foi organizada por Rommel Werneck com assistência de revisão do Poeta Lendário, sendo
os dois também autores desta edição que homenageia a falecida poetisa Denise Severgnini,
integrante da primeira antologia em 2009. Agradecimentos especiais ao blog Letras
Elétricas. Distribuição gratuita. ISBN 978-65-89975-40-3 www.poesiaretro.blogspot.com O
material pode ser baixado gratuitamente em www.rommelwerneck.com
https://www.rommelwerneck.com/ebooks.php
https://rl.art.br/arquivos/7541395.pdf?1656000642
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LiteraAmigos
Espaço dedicado a todas as entidades e projetos amigos que de alguma forma
nos ajudam ou possuem proposta de trabalho semelhante a nossa:
Corvo Literário
https://corvoliterario.com/
https://corvoliterario.com/contact/
Facebook: https://www.facebook.com/concursosliterarios/
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https://alanrubens.wordpress.com/
http://mulheresaudiovisual.com.br/
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
https://open.spotify.com/show/7iQe21M7qH75CcERx5Qsf8
Site oficial:
www.maldohorror.com.br
Página do facebook:
https://www.facebook.com/maldohorror/
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LiteraLivre Vl. 6 - nº 36 – Nov./Dez. de 2022
Tenha acesso gratuito e legalizado à milhares de textos, sons, vídeos e imagens do Brasil
e do mundo em domínio público.
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.jsp
Sci-fi Tropical
Semanalmente, o site Sci-fi Tropical traz um exclusivo, o leitor terá uma experiência
artigo, resenha de livro ou análise sobre o imersiva nas histórias. Rubens Angelo,
cenário do fantástico nacional, permitindo criador do site Sci-fi Tropical, é formado
que os fãs do gênero, tão acostumados a ler em design, mestrando em mídias
obras estrangeiras, conheçam também criativas e, principalmente, fã
autores nacionais que ajudaram a consolidar incondicional da ficção científica.
a ficção-científica por aqui. O site traz ainda
Venha conferir:
O PROJETO MINIBOOKS FANTÁSTICOS, com
obras de autores de FC em língua
portuguesa para download. Com um design
https://scifitropical.wordpress.com/
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Revista SerEsta
Leia e participe das edições da Revista Seresta. Revista literária gratuita e online:
https://selecoesliterarias.com.br/
https://www.jessicaiancoski.com/toma-ai-um-poema
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Modelo de envio de textos para publicação na revista
https://www.pensador.com/melhores_poemas_de_carlos_drummond_de_andrade/