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JOVENS E ADULTOS
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Caro(a) aluno(a),
Dispensem tempo específico para a leitura deste material, produzido com muita
dedicação pelos Doutores, Mestres e Especialistas que compõem a equipe
docente da Faculdade Anísio Teixeira (FAT).
Leia com atenção os conteúdos aqui abordados, pois eles nortearão o princípio
de suas ideias, que se iniciam com um intenso processo de reflexão, análise e
síntese dos saberes.
Atenciosamente,
Setor Pedagógico
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ........................................................................................................................4
CAPÍTULO 1 – DIDÁTICA:........................................................................................................5
CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS E CONCEPÇÕES DE PROFESSORES ............................5
DISCUTINDO A DIDÁTICA ..........................................................................................................................6
HISTÓRICO.................................................................................................................................................9
CAPÍTULO 2 – TEORIA E PRÁTICA DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
NOBRASIL E A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES ...........................................................25
Breve história da Educação de Jovens e Adultos no Brasil .....................................................................25
Tendências teóricas e práticas da EJA: um olhar sobre a perspectiva da corporeidade naEducação de
Jovens e Adultos .....................................................................................................................................32
CAPÍTULO 3 ...............................................................................................................................36
ORGANIZAÇÃO GERAL DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ...........................36
ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO PRESENCIAL DE JOVENS E ADULTOS.....................................................37
Orientações metodológicas e conteúdos da educação presencial de jovens e adultos ........................38
Alunos da educação presencial de jovens e adultos: acesso, matrícula, idades, níveis, cursos.............44
Docentes da educação presencial de jovens e adultos: requisitos legais, nível de escolaridade dos
docentes..................................................................................................................................................45
Mecanismos de avaliação, promoção e certificação. Acesso ao ensino médio e superior ....................45
CAPÍTULO 4 - METODOLOGIAS DE ENSINO, DIVERSIDADES E RELAÇÃO
PROFESSOR X ALUNO NA EJA.............................................................................................47
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................................53
REFERÊNCIAS...........................................................................................................................54
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APRESENTAÇÃO
Este módulo é uma compilação de vários artigos sobre a temática Didática da Educação de
Jovens e Adultos. Para isso, será feita uma reunião de ideias de autores que apresentam diferentes
abordagens.
Ao longo do módulo, serão apresentadas as principais vertentes sobre a didática e a
formação de professores, relacionando com a teoria e prática na EJA, além das definições sobre o
assunto.
Este é um momento importante para que, além das leituras de trabalhos aqui apresentados,
o estudante tenha iniciativa e interesse em pesquisar outros temas, lendo as obras na íntegra destes
autores, portanto, espero que tomem este guia como uma espécie de porta de entrada para outros
estudos a fim de conhecer e aprimorar ainda mais os conhecimentos.
Bons estudos!
Rúbia Gertrudes de Melo
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CAPÍTULO 1 – DIDÁTICA:
CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS E CONCEPÇÕES DE PROFESSORES
O que é Didática? Será que todos os professores conhecem realmente a suaessência, seus
verdadeiros objetivos e propostas de estudo? Esta é uma questão muito importante e que deveria
ser levada em consideração, pois a didática é um dos “pilares” mais importantes da prática
pedagógica do professor. Suas primeiras abordagens surgem a partir dos estudos de Comênio e
Ratíquio:
COMÊNIO escreveu, entre outras obras, a Didática Magna, instituindo a nova
disciplina como “arte de ensinar tudo a todos”. Dessa ambição participa também
RATÍQUIO, e ambos, pautados por ideias ético-religiosos, acreditavam ter
encontrado um método para cumprir aqueles desígnios de modo rápido e agradável
(CASTRO, 2006, p. 16).
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professor base teórica sobre estudos da arte do ensino demodo que estes possam fundamentar sua
prática pedagógica.
A didática e as metodologias específicas das disciplinas, apoiando-se emconhecimentos
pedagógicos e científico-técnicos, são disciplinas que orientam a açãodocente partindo das
situações concretas em que se realiza o ensino (LIBÂNEO, 1994,p.33).
Há ainda outro aspecto muito importante que a didática engloba, a responsabilidadeque o
professor assume diante do ato de ensinar, pois sua função não é meramente ser um transmissor
de conteúdos, mas sim, de se colocar como sujeito que propicia conhecimentoscom bases
científicas e reflexões para a formação de cidadãos onde, seus conteúdos epostura devem ser
reflexos do contexto social e da realidade.
A didática abrange ainda muitos outros conceitos que se fazem presente na práticado
professor e sobre a arte do ensino, somente desenvolvendo estudos aprofundados eminuciosos será
possível desvendá-los e refletir sobre eles de modo que possam contribuircomo fundamentos
pedagógicos.
Na atualidade, encontramos uma variedade de definições para o “fazer” doprofessor, tais
como, prática pedagógica, prática de ensino, metodologia, ensino, didática,estratégias de ensino,
procedimento de ensino, competência pedagógica, ação pedagógica,método de ensino, etc.Diante
de tantos nomes qual é de fato o conceito de Didática? Quais seusfundamentos? Qual sua
importância no processo ensino-aprendizagem?
Outro aspecto que nos pareceu importante diante dos problemas do ensino brasileiroseria
qual a concepção que os professores têm sobre a Didática?Nesse sentido, o presente trabalho tem
como objetivos desenvolver uma análiseteórica sobre a didática, explicitando seus principais
fundamentos para a atuação docente,verificar a concepção de professores sobre este tema e
posteriormente confrontá-las a fimde que possam trazer contribuições significativas para o ensino.
A fundamentação teórica (referencial) deste trabalho será apoiada em autoresbrasileiros
que nas últimas décadas têm publicado sobre essa temática, tais como, JoséCarlos Libâneo, Regina
C. CazauxHaidt, Ilma P. A Veiga, Amélia D. Castro, Selma G.Pimenta, Michel Saint-Onge e Vera
Maria Candau, que possuem diferentes visões econtribuições sobre o assunto, complementando
assim, as informações do estudo emquestão.
DISCUTINDO A DIDÁTICA
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A didática é um campo de estudo que se ocupa da busca do conhecimentonecessário para
a compreensão da prática pedagógica e da elaboração de formas adequadasde intervenção, de
modo que o processo de ensino e aprendizagem se realize de maneiraque viabilize a aprendizagem
de toda a população. Quando falamos toda a população,referimo-nos também àqueles que se
encontram entre os baixos níveis socioeconômicos nasociedade, mas que tem direito à educação e
de qualidade, para que possam adquirir,segundo Libâneo (1994, p.35) “um entendimento crítico
da realidade através do estudo dasmatérias escolares...”, e assim os alunos podem expressar de
forma elaborada osconhecimentos que correspondem aos interesses prioritários da sociedade e
inserir-seativamente nas lutas sociais, ou seja, defender seus ideais de acordo com sua realidade.
O aluno aprende e compreende que a educação é fundamental para a suainserção na
sociedade, bem como a dimensão crítica e política que ela adquire quandodesvendada sua
ideologia. Para que o aluno, futuro cidadão, consiga absorver essa visãocrítica e política da
realidade, é necessário que seu percurso na escola seja repleto deconteúdos, atitudes e
aprendizagens significativas, ou seja, contextualizadas em suarealidade social, como afirma
Candau (1982, p.15), “[...] se todo processo de ensino-aprendizagemé ‘situado’, a dimensão
político-social lhe é inerente”.
O principal responsável por articular todos esses fatores no processo educativo seráo
professor. Neste ponto, chegamos ao auge de nossa “discussão”, o professor está preparado para
aplicar e buscar novos conhecimentos (bem como os que possuem) de modo a intervir no processo
de ensino, possibilitando as melhores maneiras para ocorrer à aprendizagem, bem como permear
nessas atitudes as dimensões críticas e política, que didática possui o professor? Muitos outros
aspectos participam destas questões, como formação, realidade, compromisso profissional e
político, amor, enfim, a didática é regida por todas essas dimensões entre outras, caracterizando-
a. A formação do educador se constitui num dos principais pontos, pois é por meio dela que o
professor buscará subsídios para o exercício de sua função.
A frustração é o mais comum sentimento que o professor iniciante tem quandoentra em
uma sala de aula. Este percebe não se sentir (na verdade não está) preparado suficientemente para
lecionar, e que a realidade (prática) está muito distante do que aprendeu em sua formação (teoria).
Há casos em que o professor possui somente o conhecimento científico, e outros que conhecem
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apenas as técnicas de ensino, como afirma Candau (1982, p. 20) “[...]se um enfatiza o processo, o
outro, o produto”.
Há uma dicotomia das dimensões da Didática, a teoria versus prática, no decorrerdeste
trabalho demonstraremos à supervalorização de outras dimensões da didática. Inicialmente essa
separação gerou críticas em torno da teoria, alegando-se que nos cursos de formação de professores
aprendiam-se “muitos conteúdos e nenhuma prática”. Devido a essas alegações o foco da formação
docente recaiu sobre a prática o que gerou uma concepção de que o bom professor seria aquele
que aprendesse a “dominar as técnicas e métodos pedagógicos”, pois estaria preparado para o
mercado de trabalho.
O professor necessita dominar as técnicas e métodos de ensino, mas tambémprecisa de uma
formação concreta com subsídios teóricos e práticos, e que um permeie o outro. A prática pela
prática torna-se vazia, o processo de ensino não contextualizado tornasse não significativo para o
aluno (para o professor também, às vezes ele próprio não percebe), não despertando seu interesse
e muito menos proporcionando reflexões críticas que os levem aos seus posicionamentos políticos
futuros.
O próprio professor acentua o processo precário e ideológico em que a educaçãobrasileira
se encontra, e muitas vezes nem possui consciência disso. Luckesi (1982, p.32) diz que “[...]a
didática como vem sendo ministrada e praticada, creio eu, acentua o senso comum ideológico
dominante”, o que constatamos ser verdade. Acrescenta ainda que “aprende-se o caminho que
conduz a algum lugar, sem saber para onde ir”. Quando o professor não questiona o “como fazer"
e o “porque fazer”, mergulha num equivoco teórico/prático muito grande.
O professor deve compreender e aprender que sua didática faz parte de um todo,base
teórica, ações práticas, visão crítica e política, organização e planejamento etc., e que essas
dimensões devem caminhar juntas, pois a caracterizam e visam um significado real ao seu corpo,
norteando seu trabalho. Luckesi (1983) diz que a “didática, ao exercer o seu papel específico,
deverá apresentar-se como elo tradutor de posicionamentos teóricos em práticas educacionais”
(p.34).
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HISTÓRICO
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tentar desenvolver reflexões e métodos que auxiliassem noprocesso de ensino e aprendizagem,
bem como querer que todos usufruíssem dele.
As ideias de Comênio, infelizmente não obtiveram repercussão imediata naquelaépoca
(século XVII), o modelo de educação que prevalecia era o ensino intelectualista, verbalista e
dogmático, os ensinamentos do professor (centro do ensino) eram baseados na repetição mecânica
e memorização dos conteúdos, o aluno não deveria participar do processo, o ensino separava a
vida da realidade.
Com o passar dos anos e o desenvolvimento da sociedade, da ciência e dos meios
deprodução, o clero e a nobreza foram perdendo aos poucos seus “poderes”, enquanto crescia o da
burguesia. Essas transformações fizeram crescer a necessidade de um ensino ligado ás exigências
do mundo atual, que contemplasse o livre desenvolvimento das capacidades e dos interesses
individuais de cada um. Jean Jacques Rousseau (1712–1778) foi um pensador que percebeu essas
novas necessidades e propôs uma nova concepção de ensino, baseada nos interesses e necessidades
imediatas da criança, sendo esse o centro de suas ideias.
Enquanto Comênio, ao seguir as “pegadas da natureza”, pensava em “domar aspaixões das
crianças”, Rousseau parte da ideia da bondade natural do homem, corrompido pela sociedade
(CASTRO, 2006, p. 17).
Rousseau não colocou em prática suas ideias, nem chegou a elaborar uma teoria deensino,
apesar de ter contribuído expressivamente para esse novo foco da educação, quem desenvolveu
suas ideias foi Henrique Pestalozzi (1746–1827), pedagogo suíço, que dedicou sua vida à educação
de crianças pobres e a instituições dirigidas por ele próprio. Pestalozzi demonstrou grande
importância ao ensino como meio de educação e desenvolvimento das capacidades humanas, como
o cultivo do sentimento, da mente e do caráter, valorizava também a psicologia da criança como
fonte do desenvolvimento do ensino.
As ideias de Comênio, Rousseau e Pestalozzi influenciaram muitos outrospedagogos, um
deles foi Johann Friedrich Herbart (1766 – 1841), pedagogo alemão que exerceu influência
relevante na didática e na prática docente, foi e continua sendo o grande inspirador da Pedagogia
Conservadora (Tradicional). Para Herbart, o fim da educação é a moralidade, atingida por meio da
instrução educativa. O ensino é entendido como um repasse de ideias do professor para a mente
do aluno, a aprendizagem se torna mecânica e automática.
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Segundo Castro, Herbart defendia a:
[...] educação pela instrução, bem como pela relevância do aspectometodológico em sua
obra. O método dos “passos formais” celebrizou o autor, que o considerava próprio a toda
e qualquer situação de ensino (CASTRO, 2006, p.17).
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ideais burgueses, suprimem-se o ensino religioso nas escolas públicas, passando o Estado a
assumir a laicidade.
A Pedagogia Tradicional começa a penetrar no Brasil como uma vertente leiga quepossui
pressupostos da “pedagogia de Herbart” e seus cinco passos formais, caráter dogmático aos
conteúdos, métodos universais e o professor como centro do processo de ensino e aprendizagem,
o aluno é considerado um ser passivo e receptivo, como afirma Veiga (2006a, p.36), a atividade
docente é entendida como inteiramente autônoma em face da política, dissociada das questões
entre escola e sociedade. Uma didática que separa teoria e prática.
Essa vertente pedagógica refletia-se nas disciplinas do currículo das EscolasNormais,
desde o início de sua criação em 1835. A inclusão da disciplina “didática” nos cursos de formação
de professores ocorreu somente em meados de 1930.
Nesta década o Brasil sofre profundas transformações devido à modificação do modelo
socioeconômico e a crise mundial da economia. Devido a todas estas transformações, ocorre no
Brasil à Revolução de 1930 que indica o início de uma nova fase na história da República
Brasileira.
Vargas constitui o Ministério da Educação e em 1932 ocorre o Manifesto dosPioneiros da
Escola Nova, com a liderança de Anísio Teixeira (entre outros que o apoiaram), que buscava
mudanças no campo educacional. As novas mudanças na educação nesse período baseavam-se nas
ideias do educador americano John Dewey (1859–1952), precursor do movimento
“escolanovismo” ou “Escola Nova”. Essa nova vertente educacional se opunha a concepção
Herbatiana (tradicional), há o predomínio do aspecto psicológico sobre o lógico, a criança é o
centro do ensino, sendo considerada um ser ativo e que deve ter liberdade, iniciativa e autonomia
no processo de ensino.
Para Veiga (2006a, p.38) dada a predominância da influência da pedagogia nova
nalegislação educacional e nos cursos de formação para o magistério, o professor absorveu seu
ideário.
O professor passa a entender a didática como um conjunto de ideias e
métodos,privilegiando a dimensão técnica do processo de ensino, não considerando os aspectos
sociais, políticos e econômicos, ou seja, o professor se transforma em um “técnico” que não
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considera a realidade. Este modelo pedagógico requeria muitos recursos, que infelizmente só a
classe dominante dispunha, o que acentuou mais ainda a exclusão da maioria da população.
Ainda em 1932, podemos citar como pontos importantes para a educação à criaçãoda
primeira faculdade brasileira, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras daUniversidade de São
Paulo, onde se aspiravam esperanças na mudança da formação através magistério, buscando-se a
renovação do ensino, dando origem á disciplina didática nos cursos de formação, por volta de
1934.
Em 1937, Vargas com o apoio de grupos militantes e da classe burguesa(conquistada pela
ideologia), implanta o Estado Novo ditatorial que persistirá até 1945. A educação sofre a influência
política, e os educadores condicionando-se as respectivas posições políticas. Por força do artigo
20 do Decreto-lei nº1.190/39, a didática foi instituída como curso e disciplina, com duração de um
ano. A legislação educacional foi introduzindo alterações para que em 1941, o curso de didática
ser considerado um curso independente, realizado após o término do bacharelado, esquema três
mais um. A didática começa a ser percebida como disciplina fundamental na formação do
educador, mas seu foco está somente na dimensão técnica, nos métodos.
A partir de 1945, o país sofre novas mudanças econômicas e políticas, há umaabertura
maior para as importações diversificadas e a introdução do capital estrangeiro, o modelo político
é baseado nos princípios de democracia liberal, é o “Estado Populista”, representado pelo setor
empresarial e os setores populares contra a oligarquia, mas esta união não durou muito, o poder
conquistado fez com que ambas se separassem em busca dos interesses particulares de cada grupo.
A política que rege a educação fica inserida neste contexto de divisão dos grupos no poder, sendo
assim influenciada por elas.
Segundo Veiga(2006a):
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no qual, sua principal preocupação era com os métodos e técnicas de ensino. Começava a se
desenvolver dessa forma uma nova linha pedagógica para o ensino á partir da escola nova, é o
enfoque“renovador-tecnicista” ou tecnicismo, que crescia na base doescolanovismo. Entre 1948 e
1961, desenvolveram-se lutas ideológicas em torno da oposição entre escola particular e
defensores da escola pública, a didática se situava neste contexto inspirando-se no liberalismo e
no pragmatismo, enaltecendo os métodos e técnicas de ensino.
A década de 60 foi marcada pela crise na pedagogia nova e a articulação datendência
tecnicista, o país foi assumido pelo grupo militar e tecnocrata, era a época da ditadura militar, que
se instalou no ano de 1964. O sistema educacional era marcado pela influência dos acordos
MEC/USAID (influência estrangeira) que serviram de base às reformas do ensino superior e
posteriormente do ensino de 1º e 2º gruas.
O modelo pedagógico que se instalava era o tecnicismo, sua base estava calcada
naneutralidade científica, inspirada também nos princípios de racionalidade técnica, eficiência e
produtividade, semelhante a uma fábrica, assim o ensino deveria funcionar. No tecnicismo a
desvinculação entre a teoria e prática acentua-se, o professor torna-se mero executor de objetivos
instrucionais, de estratégias de ensino e avaliação, sem questioná-los, como afirma Libâneo (1994,
p.68), “[...] o professor é um administrador e executor do planejamento, o meio de previsão das
ações a serem executadas e dos meios necessários para se atingir os objetivos”.
Neste período de ditadura, podemos dizer que o sistema educacional brasileiro seestagnou,
somente a partir de 1974 tem início a abertura gradual do regime político vigentee começam a
surgir estudos empenhados em fazer a crítica da educação dominante, sua ideologia e o caráter
reprodutor da escola. Em 1972 ocorreu o I encontro Nacional de Didática, realizado na
Universidade de Brasília que buscava construir a identidade da didática.
Esses novos estudos foram denominados por Saviani (2003, p.16) “teorias crítico-
reprodutivistas”,ou seja, teorias não críticas verdadeiramente. A didática infelizmente seguiu este
mesmo caminho reprodutivista, e o quadro que se instalou foi o de uma total crítica ao sistema
educacional vigente.
A visão de consciência política estava implícita na educação, mas ao mesmo temponasceu
uma repulsa pela dimensão técnica, ou seja, a teoria passou a ser mais valorizada do que à prática.
Este quadro se instalou também nos cursos de formação de professores, onde a didática sofreu
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“distorções” comprometendo sua identidade e especificidade, como afirma Candau (1982, p.22)
“competência técnica e política se contrapõe”. Alguns autores chegaram até a negar a dimensão
prática no processo de ensino, considerando-a a vilã do caráter reprodutor da escola.
No entanto, como diz o ditado “há males que vem para o bem”, se por um lado à teoria
crítico reprodutivista, gerou certas distorções na concepção de ensino, por outro fez com que
começassem a germinar a semente da “crítica” na formação dos educadores etambém nos
professores, de modo que começassem a repensar sua prática pedagógica e considerassem o
contexto, a realidade em que o processo de ensino, alunos e eles próprios estão inseridos, surgem
então, as “teorias críticas da educação”.
Somente a partir dos anos 80 é que essa nova visão crítica de educação começa a
sedisseminar, com o fim da ditadura militar, a instalação da nova república e a constante luta da
classe operária (incluindo os professores), os ideais educacionais são novamente retomados. Um
marco importante dessa nova década foi o I Seminário A Didática emQuestão,realizado na
Universidade do Rio de Janeiro no ano de 1982 que buscava, entre outras propostas, a discussão e
disseminação dessa nova concepção crítica de educação que estava confusa até o presente
momento.
Devido a essa nova concepção de ensino surgemduas novas correntespedagógicas que
buscavam contemplar esses novos ideais, a Pedagogia Libertadora e a Pedagogia Crítico-Social
dos Conteúdos. A primeira trabalha com a proposta de Educação Popular, são discutidos temas
sociais e políticos referentes à realidade dos alunos. O ensino não se centra nos conteúdos
sistematizados, mas no processo de ativas discussões e nas ações práticas sobre questões da
realidade social imediata, valorizando temas geradores, relatos de experiências vividas, entre
outros pontos de interesse geral importantes na formação e vida dos alunos.
Libâneo (1994, p.69) afirma que “é uma didática que busca desenvolver o
processoeducativo como tarefa que se dá no interior dos grupos sociais [...]”, ou seja, é uma
corrente que visa trabalhar diretamente com o povo, suas necessidades, direitos e condições reais.
Na segunda corrente, a Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos, para
Libâneo(1994,p.70)“(...) a escola pública cumpre sua função social e política, assegurando a
difusão dos conhecimentos sistematizados a todos, como condição para a efetiva participação do
povo nas lutas sociais.”
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Para o referido autor, a escola deve fornecer o conhecimento (conteúdossistematizados) a
todos de forma igual, para assim assegurar o acesso aos mesmos e garantir que cada aluno possa
interiorizá-lo confrontando com suas experiências e realidade, sendo capaz de interpretá-los e usá-
los a favor dos interesses de sua classe.
A pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos atribui grande importância a didática,cujo
objetivo de estudo é o processo de ensino inserido em suas relações com o meio e ligações com a
aprendizagem, pois ela direciona esse processo (intenções), visando fins sociopolíticos e
pedagógicos.
Finalizando esta década e baseados nestas novas correntes pedagógicas, podemoscitar uma
frase de Veiga 2006a que nos leva a refletir sobre a função da didática hoje: Nesse sentido, a
didática crítica busca superar o intelectualismo formal doenfoque tradicional, evitar os efeitos
dospontaneísmoescolanovista,combater a orientação desmobilizadora do tecnicismo e recuperar
astarefas especificamente pedagógicas, desprestigiadas pelo discursoreprodutivista. Procura,
ainda, compreender e analisar a realidade ondeestá inserida a escola.
As teorias críticas da educação buscam uma didática que proponha mudanças nomodo de
pensar e agir do professor, bem como o ideal de democratização da escola pública, através da
aprendizagem dos conteúdos sistemáticos, realidade social e interesses e direitos da “população”.
Na caminhada em nossa retrospectiva histórica, analisaremos desde a década de 90até os
dias atuais, que nos aponta um novo foco em nossa realidade educacional: “o mundo
contemporâneo é marcado pela hegemonia do projeto neoliberal, consolidando-se no contexto
internacional e nacional, dominado pelo pensamento técnico-científico” (VEIGA, 2006a, p.45).
Acentuam-se e ampliam-se as formas de exclusão social e cultural, o individualismoe a
ideologia de classe dominante através do neoliberalismo. O mundo globalizado traz novas regras
econômicas de grande impacto social, e isso reflete também sobre a educação. Novas medidas e
leis são impostas sobre o sistema educacional, nossos processos avaliativos são submetidos à
modelos e exigências externas coordenados por interesses políticos globalizados.
Neste novo período na educação, é discutido e questionado o papel da ditadura sobduas
visões segundo Veiga: [...] “a primeira voltada para a formação do tecnólogo de ensino; a segunda
procura favorecer e aprofundar a perspectiva crítica, voltada para a formação do professor como
agente social”(2006a, p.46).
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Percebemos que esta conclusão de Veiga não é positiva na evolução educacional, adidática
modernizadora baseada na legislação de ensino vigente, buscam formar um profissional com base
em uma pedagogia por competências e ligada a avaliação e controle de resultados. Há uma grande
junção de diferentes partes de várias correntes pedagógicas e enfoques teóricos, com cita Veiga
(2006a, p.47), o “neobehavionismo”, que são impostos ecobrados dos professores.
Nessa concepção, a didática é desvinculada do contexto social mais amplo,possibilitando
a formação do professor como um técnico, mero executor de atividades rotineiras, impostas,
automáticas e burocráticas. Desenvolve-se então, uma concepção de formação pragmatista em que,
o processo de ensino tem por base a aprendizagem por competências com valorização dos métodos
e técnicas, o educador acaba por fazer, mas não conhece os fundamentos deste fazer,
empobrecendo cada vez mais sua formação e ação. O sistema de avaliação exigido dos professores
é classificatório, autoritário e discriminatório, acentuando a exclusão e marginalização dos
indivíduos do sistema educacional.
A influência neoliberalista permeia essas concepções que distorcem a busca de umaescola
democrática, ligada ao contexto social e a formação comprometida dos professores, e esta
influência, segundo autores da atualidade, é também um dos grandes desafios presentes em nosso
sistema educacional nos dias de hoje.
Com isso podemos concluir que nestas duas últimas décadas, (que ainda
estamosconstruindo) o esforço de educadores, pesquisadores e autores giram em torno da
concepção política e crítica da didática, percebe-se que há uma maior preocupação da “ampliação
do enfoque crítico” e preocupação da “educação como prática social”, compromisso com a
democratização da escola pública e qualidade de ensino, formação consciente de nossa realidade
e desenvolvimento de pesquisas na área de didática. Busca-se então, uma reconfiguração da
didática crítica, realizada na perspectiva de uma visão “contextualizada e multidimensional do
processo pedagógico, não enfatizando ou reduzindo nenhuma dimensão, mas sim as articulando,
e tendo o ensino como prática social concreta".
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A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E A DIDÁTICA
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assim a necessidade de formação de professores, que na verdade ocorreu, mas de forma
quantitativa apenas.
Naquela época a escola normal era destinada exclusivamente aos homens, pois afunção da
mulher era ser “dona de casa”, essa situação começa a mudar somente no século XX. A partir deste
século o número de escolas normais cresce, mas não atende à demanda do país, em 1945 o país
contava apenas com 540 escolas.
Na década de 1930 o país passa por profundas transformações políticas, econômicase
sociais com a crise internacional e há mudanças no sistema de produção do país, gerandoa
necessidade de maior qualificação operária, ou seja, que tenham o mínimo de instrução escolar. A
população também reivindica a escolaridade mínima, percebendo a complexidade e exigências
deste novo contexto, e a tem como fator de “ascensão social”.
Segundo Gonçalves e Pimenta (1992, p 97), “[...] nessa sociedade comdesenvolvimento
econômico configurado, a educação escolar atua com coadjuvante, não primeiro, mas
imprescindível”. É este o valor que a educação começa a ganhar, não como direito de todo cidadão
para seu crescimento e desenvolvimento, mas para os interesses políticos e de mercado.
A reivindicação da população encontra resposta por parte dos políticos nos anos daditadura
de Vargas (1937 a 1945), com a organização do sistema de ensino do país através das Leis
Orgânicas, em abrangência nacional e não mais estadual como antes.
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conteúdos, como afirma Gonçalves e Pimenta (1992, p.100), “[...] relegar somente para a 4ª série
a inclusão de disciplinas que visam a preparação para a docência indica claramente esse descaso”.
O professor preparado se encontra diante de um sistema seletivo e elitista, querefletia as
contradições sociais daquele momento, de um lado uma escola reivindicada pelo povo, mas que
era somente profissionalizante, de outro a que visava a formação do dominante, mantendo em seu
conteúdo o cunho literário e acadêmico.
Neste contexto, com a expansão das escolas “profissionalizantes”, a formação
deprofessores recaiu neste mesmo aspecto, sendo considerada uma profissão de “nível burguês”,
onde as mulheres tomaram sua frente, pois se considerava que o “professor (a)”deveria agir como
uma “mãe” para seus alunos.
Somente a parcela das mulheres que não conseguissem, por ventura se casar, é que
seriam professoras – profissão digna, socialmente falando, que requeria
“vocação”, abnegação e carinho para trabalhar com as crianças. Uma profissão na
qual o salário pouco ou nada contava, uma vez que ser professora era quase uma
extensão do lar (GONÇALVES, PIMENTA, 1992, p.101).
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de baixa renda, formava-se (forma-se) professores que não eram capazes de ensinar o aluno pobre,
sendo este o mais necessitado de um ensino de qualidade.Não podemos esquecer também a parcela
que as universidades (pedagogias e licenciaturas) possuem nesta situação, a formação oferecida
por estes cursos superiores não os preparavam plenamente, pois não possuíam vínculo com a
realidade escolar, não formavam os futuros professores com bases concretas sobre as disciplinas
gerais e específicas de ensino, o que refletia na formação da habilitação do magistério. A
alfabetização, por exemplo, é umas das funções mais importantes e significativas do professor
primário, se elenão receber uma formação que o capacite plenamente para esta atividade, seu
desenvolvimento se refletirá diretamente na aprendizagem dos alunos, gerando repetência,
exclusão e evasão escolar.
No ano de 1982, a Lei 7.044/82 acabou por determinar a não obrigatoriedade
daprofissionalização no ensino de 2º grau, ou seja, primeiro houve um grande incentivo
(obrigatoriedade) e depois descaso pela formação de professores, gerando a desvalorização
profissional do magistério.
Na Lei de Diretrizes e Bases (BRASIL,1996b) é cobrado que os professores possuam
cursos superiores de pedagogia (licenciatura plena), mas é aceita também a modalidade em nível
médio do magistério, no entanto, não é citado nenhuma melhoria significativa ou benefício que
incentive a formação superior:
Art. 62º - A formão de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível
superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e
institutos de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do
magistério infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida
em nível médio, na modalidade Normal. (BRASIL, 1996b, p. 22).
22
Refletindo sobre este breve histórico sobre o processo de formação de
professoreschegamos a outro ponto deste capítulo, a relação da didática com formação de
professores.
A didática deve ser uma disciplina na formação do professor que possui o objetivo de estudar o
processo de ensino em seu conjunto, ou seja, suas finalidades, princípios, condições reais, meios,
organização, objetivos sobre conteúdos, métodos, aprendizagem, avaliação, enfim, todos os
aspectos que fazem parte deste processo e que o determinam.
Segundo Libâneo (1994):
A didática, assim, oferece uma contribuição indispensável á formação
doprofessores, sintetizando no seu conteúdo a contribuição de conhecimentos de
outras disciplinas que convergem para o esclarecimento dos fatores condicionantes
do processo de instrução e ensino, intimamente vinculado com a educação e, ao
mesmo tempo, provendo os conhecimentos específicos necessários para o
exercício das tarefas docentes (p.74).
A didática é uma disciplina que permeia todas as outras, sendo interdisciplinar, poisserá a
“base comum” para que o professor busque a melhor forma de desenvolver sua função. Podemos
perceber que é clara a importância da didática na formação e ação docente, no entanto, notamos
que no desenvolver histórico desta profissão, a didática não obteve (e ainda não têm) esta mesma
relevância, e quando ministrada só enaltecia sua distorção e visão técnica, acentuando a distância
entre teoria e prática.
Atualmente, percebemos que esta situação não mudou muito, existem pesquisas eestudos
que buscam e apontam contradições e poucas melhorias neste processo, mas o que percebemos na
“didática prática” (na sala de aula) é que muitos professores, tanto no decorrer de sua formação,
quanto em sua atuação não possui os conhecimentos necessários para atuar e muito menos
compreende o aspecto didático de todo este processo, pois também não aprendeu sobre sua
importância e conteúdos.
23
Muitos autores e pesquisadores reconhecem que não é suficiente apenas cobrar doprofessor
atitudes didáticas e pedagógicas ou ainda condena-los por não dominar a teoria e a prática.
Percebem que é necessário intervir na raiz do problema, ou seja, na formação do futuro professor,
pois será através dela que se poderá buscar transformações que refletirão na postura do professor
e consequentemente na sala de aula.
A formação do futuro professor deve fundamentar-se com uma base teórica nasdisciplinas
de Filosofia, História e Sociologia da Educação e paralelamente devem ocorreràs disciplinas de
aspectos práticos, sendo desenvolvidas conjuntamente, teoria e prática (incluindo o estágio), assim
será possível que a teoria subsidie a prática e vice-versa, bem como expor as contradições e
aproximações que ambas possuem, construindo uma nova visão sobre o processo de ensino-
aprendizagem e a realidade onde estão inseridos.
A didática é uma disciplina fundamental na formação do educador, juntamente coma
Metodologia de Ensino, a Prática de Ensino e o Estágio Supervisionado e as disciplinas de base
teórica prepararão o futuro professor a estar apto a trabalhar na sala de aula (dependendo é claro
de como forem ministradas), pois ele dominará os conteúdos científicos e práticos, e
principalmente já estará diante da realidade de sala de aula (através do estágio) para poder perceber
se o que aprende é realmente válido ou não, e poderquestionar e cobrar seus aprendizados.
Há que se superar também o enfatizar de uma única dimensão no processo de ensinoe
formação, tanto no aspecto teórico como no prático, que gera seu reducionismo, e perceber que
todas as disciplinas são fundamentais, pois formam um conjunto e separadas não possuem
significados educativos. Concluindo, a didática como afirma Luckesi (1982, p.33), “[...] deverá
ser um elo fundamental entre opções filosófico-políticas da educação, os conteúdos
profissionalizantes e o exercício diuturno da educação”, ou seja, formação teórica e prática
contextualizada e amor pela profissão.
24
CAPÍTULO 2 – TEORIA E PRÁTICA DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS NOBRASIL E A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES
Segundo Moura (1999, p. 23), a história das ideias em torno da alfabetização deadultos no
Brasil acompanha a história da educação como um todo que, por sua vez, acompanha a história
dos modelos econômicos e políticos e consequentemente a história das relações de poder, dos
grupos que estão no poder. Partindo das diferentes classes de educação e do desenvolvimento
econômico e cultural de cada fase histórica da humanidade – caracterizando as sociedades
escravista, feudal e moderna – Pinto (1991, p. 77) também conclui que a educação em cada fase
de sua evolução histórica é sempre produto cultural da sociedade, refletindo os interesses nela
dominantes. O tipo de homem que cada espécie da educação visa formar é variável com a
respectiva constituição social, ou seja, o homem que cada sociedade deseja formar é aquele capaz
de desenvolver ao máximo as potencialidades econômicas e culturais desta forma social. Como
nenhuma sociedade é imóvel, as realizações materiais alteram significativamente seu conteúdo e
a fazem ser outra. A educação, por sua vez, é contraditória nesse sentido, porque, visando
conservar a sociedade que a distribui, é levada a modificá-la por outra forma social mais adiantada.
Muitos autores consideram que a Educação de Jovens e Adultos formal surgiu no Brasil
apenas com a vinda dos jesuítas. Sabe-se que o sistema educacional jesuítico surgiu
aproximadamente em 1549 com a chegada desses padres da Companhia de Jesus ao Brasil, quando
do início da colonização portuguesa. Seu principal objetivo era catequizar os gentios.
Teve 210 anos de duração, sendo que no século XVI era dirigido essencialmente
àcatequização dos índios nas ditas “escolas de ler e escrever”, em que os indígenas e seusfilhos
eram catequizados. Cabe destacar quanto a este último aspecto que, segundo Paiva (2000), esta
forma de alfabetização se distanciava do sentido que a reforma protestante deu ao termo, tanto
25
que, posteriormente, a educação dirigiu-se unicamente aos filhos das famílias abastadas,
principalmente porque a base do sistema econômico colonial era diferente do sistema vigente nos
países do norte da Europa e não cabia naquele a educação estritamente popular. Posteriormente,
no século XVII, o sistema expandiu-se, a ponto de, já no século XVIII, consolidar-se com a
construção dos Seminários.
Do ponto de vista pedagógico, fundava-se em um sistema de ensino de cunhohumanista,
aristotélico-tomista, em que o aluno era convidado a comentar apenas os pontos em estudo e não
a apresentar uma postura crítica, pois se partia do pressuposto de que averdade absoluta pertencia
a Deus; cabia, então, ao homem procurar a retidão em suas ações, fugindo do pecado. Educavam-
se os pequenos indígenas e os órfãos como uma forma de estender a catequização a todo o povo,
ou seja, a educação dos adultos tinha uma função ideológica bastante importante. Verifica-se que
o jesuíta buscava o aluno, porém levava apenas a sua visão de mundo como correta.
Entende-se que esse ensino teve papel fundamental na manutenção do territóriobrasileiro
como colônia portuguesa dentro do contexto do surgimento do mercantilismo europeu e da
reforma protestante, portanto preconizando valores anteriores a essa reforma. O sistema
educacional jesuítico era composto por uma estrutura escolar (prédios, escola, organização interna,
etc.), uma teoria pedagógica com uma visão de homem bem delineada, voltada para a sociedade
colonial.
Paiva (2000) destaca que a realidade brasileira da época era permeada por
sangrentasguerras (lutas, escravização dos negros e índios, etc.) e a vida no colégio jesuíta
continuava naturalmente, como se não estivesse envolvida por esse ambiente. Não havia percepção
de incoerência entre o discurso proferido (o que se aprendia de fato na escola) e a prática realizada.
Nesse caso, verifica-se o formalismo pedagógico como uma das formas de legitimação da cultura,
ou seja, o contraste entre a prática e os princípios, validados pela aprovação social, correspondendo
à interpretação que a sociedade fazia de seus comportamentos. Assim, a subversão da ordem é
concedida ainda que se mantenha o statusquo. Quando da pressão social, os colonizadores
buscavam apoio dos letrados e canonistas no sentido de legitimar argumentos que promovessem a
continuidade da escravização e da guerra. O formalismo pedagógico se justificava no contexto da
época, pois não era interessante à sociedade portuguesa uma transformação do ponto de vista
estrutural na colônia. A religião e a vida social tinham a marca da formalidade.
26
Esse aspecto se consolida na questão do currículo. Segundo Azevedo (1996, p. 509),
aRatiostudiorum, publicada em 1599, corporificava as regras pedagógicas de Santo Inácio e as
experiências no campo da educação, no que diz respeito ao plano completo de estudos da
Companhia. Ele deveria abranger o curso de letras humanas, o de filosofia e ciências e o de teologia
e ciências sagradas.
Assim, como pontua Tânia Maria de Melo Moura (1999, p. 24), no período emquestão
verifica-se uma concepção instrumental da educação de jovens e adultos, em que a alfabetização
tinha por objetivo dotar a população com os rudimentos da leitura e da escrita (leitura do catecismo,
catequização). Não há ainda uma política de formação dos professores, mas pode-se perceber
claramente um ideal de professor para este tipo de ensino, como uma espécie de pregador (ou até
mesmo “desconvertor”, cabendo-lhe o papel de representante de Deus) e, como tal, a importância
dada aos métodos de memorização e de educação pela palavra.
Neves (2007) destaca que no início do século XIX a educação primária assume opapel de
convertora das classes subalternas ao trabalho disciplinado, por meio do Método Lancaster,
instituído oficialmente por D. Pedro I, com a Lei de 15 de outubro de 1827. A principal função
desta escola é “disciplinar homens indisciplinados”, de modo que a difusão da instrução elementar
às massas trabalhadoras exige a racionalização do ato pedagógico, pela rapidez de ensinar, pelo
baixo custo, pelo uso de poucos professores e vários alunos-mestres (BASTOS, 2005). O Estado
ainda não assume a formação do professor e este adquire papel secundário no método mútuo.
Do ponto de vista econômico, Vanilda Paiva (1987, p. 54), verifica que por volta de1870
houve um surto de progresso na economia brasileira, com consequências sobre sua organização
social, e a introdução de ideias liberais; apareceram também os primeiros pronunciamentos em
favor da educação do povo num sentido semelhante ao encontrado com vigor a partir de 1915. Não
se tratava, entretanto, de um movimento, mas de pronunciamentosisolados de indivíduos
interessados no problema. Um exemplo é o parecer do projeto de RuiBarbosa de 1882, o primeiro
diagnóstico da educação popular no país. É importante considerar, ainda, que, neste período da
história da educação brasileira, a autora trata a educação de adultos como parte da educação
popular, [...] pois a difusão da escola elementar inclui as escolas noturnas para adultos que, durante
muito tempo, foram a única forma de educação de adultos praticada no país. Mais tarde, quando
ganha autonomia e pretende-se que sua duração seja menor que aquela oferecida à população em
27
idade escolar, ela passa a ser tratada como alfabetização e educação de base [...] (PAIVA, 1987,
p. 47).
Além disso, as principais ideias e debates sobre a educação popular durante o
Impérioabarcaram a questão do artigo 10 do Ato Adicional. Os debates dos projetos de reforma
do ensino no Município da Corte apresentados à Assembleia Legislativa concentraram-se na busca
de uma estratégia através da qual o Governo Central pudesse auxiliar as províncias na difusão da
instrução popular. Outra discussão mais antiga era aquela referente ao ensino obrigatório.
Com relação à educação dos adultos, ela se desenvolve – de forma precária eirregular – a
partir de 1870, quando quase todas as províncias criam escolas noturnas. A criação de tais escolas,
entretanto, estava (com algumas exceções) ligada à valorização da educação em si mesma, sem
considerar o seu aspecto instrumental e sem adequação às reais necessidades de ensino para a faixa
da população à qual eram destinadas. Também o ensino profissional defendido e preconizado na
época era em grande parte fruto de ideias humanitaristas; tratava-se da multiplicação das escolas
para 'desvalidos'. (PAIVA, 1987, p. 75)
Para Vanilda Paiva (1987, p. 78), a passagem do regime monárquico para a
Repúblicarefletia as modificações na composição da sociedade brasileira. O progresso, que se
intensificara a partir de 1870, possibilitara o surgimento de novos setores sociais e novos grupos
econômicos ligados ao surto de industrialização que passaram a atuar na defesa dos preceitos
liberais e do industrialismo. A República, proclamada em meio ao enfraquecimento dos grupos
ligados à agricultura pelas crises do final do Império e pela própria Abolição, integra tais elementos
em seus quadros. Os ideais republicanos são liberais e há nos primeiros governos elementos que
pretendem favorecer a industrialização do país. Porém, esses setores não se sustentam por muito
tempo no poder, não sobreviveram às crises financeiras e às primeiras dificuldades comerciais do
café no final do século. Além disso, o domínio oligárquico estadual, facilitado pelo federalismo e
tendo à frente os fazendeiros de café, caracteriza o quadro político da Primeira República, que só
será alterado com a PrimeiraGuerra.
No âmbito educacional, os primeiros 25 anos do regime republicano não diferem dasduas
últimas décadas do Império. Assiste-se ao crescimento da demanda por educação popular, e seu
precário atendimento, apenas nas cidades maiores. A população do campo (maior parte da
população brasileira), ligada por laços paternalistas às oligarquias estaduais, não sentia a instrução
28
como uma necessidade imediata nem pressionava no sentido de sua difusão. A interpretação
beletrista da instrução pública presente na Carta Constitucional de 1891 perpetuou o estado de
precariedade do sistema elementar de ensino brasileiro. A Proclamação da República provocou a
recolocação do problema do funcionamento da democracia liberal com base no voto, pois a partir
de 1882, o alistamento eleitoral passava a inscrever apenas os que dominassem as técnicas da
leitura e da escrita. Dessa forma, até o final do Império não se havia colocado em dúvida a
capacidade do analfabeto.
A instrução não era condição para que o indivíduo participasse da classe dominante oudas
principais atividades do país. “Somente quando a instrução se converte em instrumento de
identificação das classes dominantes (que a ela têm acesso) e quando se torna preciso justificar a
medida de seleção é que o analfabetismo passa a ser associado à incompetência.” (PAIVA, 1987,
p. 83) Essa ideia se difunde no país e estará presente na história da educação popular posterior.
Ainda nesse período a autora destaca a inexistência de qualquer organismo nacional encarregado
da coordenação do sistema de ensino.
O final da Primeira República, contudo, constitui um importante período. Nele sedelineiam
características mais claras da educação popular e das ideias pedagógicas que irão orientar sua
evolução. Em um primeiro momento, há uma verdadeira cruzada contra os altos índices de
analfabetismo e esta discussão se desenvolve em ligação com os temas do serviço militar
obrigatório e da nacionalização do ensino nos Estados do Sul (momento definido como
“entusiasmo pela educação”). Em seguida, observa-se o arrefecimento deste entusiasmo, em
função do final da guerra e da atuação conseguida pelos “profissionais da educação” nos anos
1920, bem como a ênfase do aspecto qualitativo do ensino, deixando de lado a relação entre o
sistema educacional e o conjunto da sociedade e sua evolução histórico-social: são introduzidos
os ideais da Escola Nova e sua transformação em “otimismo pedagógico”.
O desencadeamento da Primeira Guerra Mundial provocou no Brasil a eclosão de umsurto
de nacionalismo. O grupo industrial-urbano recebe um forte estímulo para se expandir e fortalecer,
ampliando sua capacidade de luta pela hegemonia política. O nacionalismo dosanos 1910 traz os
ideais democráticos e republicanos, aos quais se ligam aos anseios de universalização do ensino
elementar e de ampliação das oportunidades educacionais para o povo. O “entusiasmo pela
educação” não sobrevive com o mesmo caráter logo após os primeiros anos da década seguinte,
29
quando foi se tornando claro para os grupos em luta no poder que, através da educação, a conquista
da hegemonia política era problemática e demandava muito tempo.
Os primeiros profissionais da educação são exatamente os responsáveis pelas reformas
educativas da década de 1920. Deste modo, as leituras de Valdemarin (1998) e Souza (2005)
também permitem considerar que a escola na Primeira República adota um viés cientificista,
abrindo novos rumos para a formação do professor. A nova cultura escolar em marcha
(fundamentada no método intuitivo) valoriza a missão de instruir e, principalmente, o
enciclopedismo, isto é, o conhecimento da ciência como meio de formação para a cidadania.
Moura (2007) entende que a Proclamação da República não alterou significativamenteo
quadro educacional, porque o modelo de educação continuou privilegiando as classes dominantes,
mantendo alto o percentual da população adulta analfabeta. Assim, até os anos 1940, a educação
de adultos no Brasil era entendida como uma extensão da escola elementar. Gadotti e Romão
citados por Moura (2007, p. 03) afirmam que a história recente da educação de adultos no Brasil
pode ser dividida em três períodos: de 1946 a 1958, onde foram realizadas campanhas nacionais
de iniciativa oficial; de 1958 a 1964 – quando da realização do 2º Congresso Nacional de Educação
de Adultos com a participação de Paulo Freire (momento em que as proposições de Paulo Freire
demarcam uma revolução conceitual para a área); pós 1964, quando o governo militar insistia em
campanhas como a “Cruzada ABC” e o MOBRAL (promovendo a hegemonia da concepção
instrumental de alfabetização). Com relação à Lei 5692/71, Haddad (1997, p. 107) afirma que,
apesar de ser reproduzida por um governo conservador, ela estabeleceu pela primeira vez, um
capítulo específico para a educação de jovens e adultos, o capítulo IV, sobre o ensino supletivo.
Na década de 1980, com a abertura política, as manifestações nos diversos setores da sociedade
trouxeram avanços legais no campo da educação de jovens e adultos, consubstanciados nos
princípios estabelecidos pela nova Constituição Federal, promulgada em 1988.
Contudo, para Haddad (1997, p. 112), a LDB 9394/96 vem completar esse movimentode
transformar a educação de pessoas jovens e adultas em uma educação de segunda classe. O autor
considera importante uma leitura bastante atenta da atual lei de ensino, pois a seçãodedicada à
educação de jovens e adultos e a aparente flexibilidade podem enganar o leitor desavisado.
Portanto, a análise minuciosa e cuidadosa da LDB 9394/96 permite considerar, assimcomo
afirma Haddad (1997, p. 116), que a lei aprovada reafirma o conceito de educação de adultos que
30
o regime militar consolidou, isto é, o do ensino supletivo. Com relação à formação do professor,
não foi considerada também a ideia de professores especializados para este tipo de ensino e a
menção explícita de uma organização escolar diferente, não marcado pelo modelo escolar regular.
O ponto fundamental é o fato de a lei ter desconsiderado a importância de uma atitude ativa por
parte do Estado no sentido de criar condições de permanência de um grupo social que tem de
realizar um esforço redobrado para frequentar qualquer programa educacional. “[..] o Estado abre
mão da sua responsabilidade da formação, garantindo apenas mecanismos de creditação e
certificação. [...]” (HADDAD, 1997, p. 117)
Outro problema refere-se à diminuição das idades mínimas para os exames supletivos, o
que, segundo o autor, deve criar um impacto bastante negativo na qualidade do ensino para jovense
adultos e, ao mesmo tempo, uma “supletivação” do ensino regular. Além disso, a criação do Fundo
de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF – Lei 9424/96) apresentou
um grande problema, pois não contempla recursos para os alunos jovens e adultos das redes
estadual e municipal.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos (2008), porsua
vez, destacam que a formação do professor para a EJA se dará em nível médio ou superior. Destaca
que os métodos, conteúdos e processos devem ser diferentes dos utilizados na educação básica. A
diretriz estabelece a necessidade de formação específica, o que cabe unicamente às instituições
formadoras de professores. Verifica-se, como postulado por Moura (1999), uma carência de
propostas teóricas criativas e decisões políticas sérias realmente comprometidas com a Educação
de Jovens e Adultos e a Formação do Professor. Questiona-se se as ações propostas nas Diretrizes
são suficientes para promover uma Educação de Jovens e Adultos com qualidade no Brasil.
Ainda sobre este aspecto, Tanuri (2000, p. 85) considera que, apesar de todas asiniciativas
registradas nas duas últimas décadas, o esforço ainda se configura bastante pequeno no sentido de
investir de modo consistente e efetivo na qualidade da formação docente. As falhas na formação
se fazem acompanhar de ausência de ações governamentaisadequadas pertinentes à carreira e
remuneração do professor, o que acaba por se refletir na desvalorização social da profissão
docente, com consequências drásticas para a qualidade do ensino em todos os níveis.
31
TENDÊNCIAS TEÓRICAS E PRÁTICAS DA EJA: UM OLHAR SOBRE A
PERSPECTIVA DA CORPOREIDADE NAEDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
32
Dessa maneira, ao libertar o corpo da interdição que o sufoca, a educação como práticada
liberdade, realiza a pedagogia do oprimido que é uma pedagogia para a liberdade. O corpo se
constrói socialmente; é influenciado pelo ambiente social e político em que está inserido e,
portanto, absorvemideias, expectativas, intenções desse meio. Ou seja, não é constituído por uma
universalidade das vontades, como diria Foucault; “não é o consenso que faz surgir o corpo social,
mas a materialidade do poder se exercendo sobre o próprio corpo dos indivíduos.” (FOUCAULT,
1979, p. 146).
A preocupação com o poder levou também a descoberta do corpo como objeto e alvodo
mesmo. A atenção dedicada ao corpo para torná-lo hábil e útil, se manifesta pelas ações de
manipulação, modelagem, treinamento, regramento e disciplina que se impõe sobre o corpo. Mas
há de se lembrar que o poder não somente tem a função de repressão, pois agindo somente assim
tornar-se-ia frágil. Foucault (1979) ressalta este ponto quando distingue a existência da consciência
do efeito de poder sobre o corpo na situação de trabalho na perspectiva marxista e na perspectiva
dos paramarxistas. Estes, [...] dão à noção de repressão uma importância exagerada. Pois se o poder
só tivesse a função de reprimir, se agisse apenas por meio da censura, da exclusão, do
impedimento, do recalcamento, à maneira de um grande superego, se apenas se exercesse de um
modo negativo, ele seria muito frágil. Se ele é forte, é porque produz efeitos positivos no nível do
desejo – como se começa a conhecer – e também no nível do saber. O poder, longe de impedir o
saber, o produz. Se foipossível constituir um saber sobre o corpo, foi através de um conjunto de
disciplinas militares e escolares. (FOUCAULT, 1979, p. 148)
Portanto, ao mesmo tempo em que se busca a formatação de corpos para o trabalhotambém
se preza pela valorização dele, mas de uma maneira a escravizá-lo, tirar-lhe a liberdade sem que
isso seja consciente à pessoa. Um exemplo disso seria o culto ao corpo, que reina até os dias atuais.
Aprecia-se o corpo sadio, magro, esbelto e tudo gira em torno desse estereótipo de beleza. A mídia
propaga essa ideia e procura vender todos os produtos imagináveis para que as pessoas alcancem
esse ideal corporal, negligenciando até mesmo questões físicas e psicológicas.
Segundo Foucault (1987), em qualquer sociedade a questão do corpo remete-se aquestão
do poder. O corpo que pode ser modelado em favor de interesses de determinadas pessoas ou
classes seria o que Foucault chama de corpos dóceis. Corpos que podem ser adestrados,
manipulados. “É dócil um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser
33
transformado e aperfeiçoado.” (FOUCAULT, 1987, p. 118) Essa disciplina corporal que busca
padronizar os corpos e tirar-lhes a liberdade, destruindo, assim suas capacidades expressivas,
inventivas, comunicativas corporal, carregada de séculos de preconceitos quanto aos gestos,
exposição e até mesmo percepção e consciência de si próprio, afastou do âmbito escolar uma
educação corporal, com foco na expressividade, na comunicação e criação individual, ou seja,
desconsiderou o corpo como processo, produto e objeto da arte e da educação em arte. Disciplina
tida como uma fórmula geral de dominação.
Mas uma disciplina que domina os corpos em favor da utilidade e consequência da
obediência e vice-versa. Foucault compara e distingue a forma de dominação por meio da
docilidade dos corpos com a escravidão, com a domesticidade, vassalidade e o ascetismo. É
interessante observar essa distinção e ver que o corpo que agora é dócil, não se conscientiza de sua
situação porque é iludido pelos resultados que seu corpo produz, por se sentir útil, capacitado e
com aptidão para realizar o que lhe é proposto acaba não percebendo que é ao mesmo tempo,
dominado devendo submeter-se às exigências alheias a si próprio. Nas palavras de Foucault:
Diferentes da escravidão, pois não se fundamentam numa relação de apropriação dos
corpos; é até a elegância da disciplina dispensar essa relação custosa e violenta obtendo
efeitos de utilidade pelo menos igualmente grandes. Diferentes também da
domesticidade, que é uma relação de dominação constante, global, maciça, não analítica,
ilimitada e estabelecida sob a forma da vontade singular do patrão, seu “capricho”.
Diferentes da vassalidade que é uma relação de submissão altamente codificada, mas
longínqua e que se realiza menos sobre as operações do corpo que sobre os produtos do
trabalho e as marcas rituais da obediência. Diferentes ainda doascetismo e das disciplinas
de tipo monástico, que têm por função realizar renúncias mais do que aumentos de
utilidades e que, se implicam em obediência aoutrem, têm como fim principal um
aumento do domínio de cada um sobre seu próprio corpo. O momento histórico das
disciplinas é o momento em que nasce uma arte do corpo humano, que visa não
unicamente o aumento de suas habilidades, nem tampouco aprofundar sua sujeição, mas
a formação de uma relação que no mesmo mecanismo o torna tanto mais obediente quanto
é mais útil, e inversamente. (FOUCAULT, 1987, p. 119)
A disciplina irá fabricar corpos submissos, “dóceis”, que lhes tirará também
suassingularidades; não saberão mais quem realmente são, seus gestos e movimentos serão
pensados por outras pessoas, por outras instâncias de poder. Não tem mais consciência própria,
agem em função de objetivos, de sua capacidade de produzir. Toda essa manipulação se dá através
de técnicas minuciosas, sutis, muitas vezes imperceptíveis.
Ana Maria Freire (2001, p. 32), em seu livro sobre o analfabetismo no Brasilestabelece
relações interessantes sobre o analfabetismo e a prática da interdição do corpo. Segundo essa
34
autora, desde a época dos jesuítas essa ideologia da interdição do corpo nos atinge e é justificadora
das diferenças existentes na sociedade brasileira. Portanto o período jesuítico foi o início da
interdição do corpo. “[...] A preocupação pela educação surgiu como meio capaz de tornar a
população dócil e submissa, atendendo à política colonizadora portuguesa [...]” Ou seja, a
preocupação com o corpo também se fazia necessária para a educação, nesse contexto. População
dócil e submissa, precisa de corpos dóceis e submissos e para isso; necessário se faz promover
uma educação corporal.
Já na Pedagogia Sociocultural, assim denominada por Mizukami, que possui
muitascaracterísticas semelhantes à Pedagogia Dialógica, defendida por Paulo Freire, há uma
busca pela interação entre homem e mundo. Paulo Freire é um pensador comprometido com a
vida, não pensa ideias, pensa a própria existência. Esse educador existência um pensamento para
uma prática libertadora. Percebe a educação como comunicação, diálogo, encontro de pessoas que
procuram a razão de ser dos acontecimentos (FREIRE, 1977, p. 77), pois, para ele, a educação é
diálogo; do contrário não é educação.
Por isso, nessa concepção, que tem em seu cerne as bases do pensamento freireano, osujeito
é entendido como elaborador e criador de conhecimentos, ele mesmo é o sujeito do conhecimento.
E por isso, na ação educativa fundada no diálogo, as figuras de professor e aluno são substituídas
pela de educandos, pois, ninguém ensina ninguém, os homens se educam uns com os outros.
O corpo não pode ser conformado, impedido de expressar-se de maneira criativa
eautônoma no processo educativo. Dessa maneira, ao libertar o corpo da interdição que o sufoca,
a educação como prática da liberdade, realiza a pedagogia do oprimido que é uma pedagogia para
a liberdade. Por tudo isso, destaca-se aquele professor que, consciente de sua dimensão de
constante reconstrução pessoal e profissional, trabalhe de forma a articular conhecimentos e
saberes, ciente de sua contribuição para a formação integral do educando.
35
CAPÍTULO 3
ORGANIZAÇÃO GERAL DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
36
de jovens e adultos é oferecida em cursos presenciais, semipresenciais e não-presenciais (a
distância), além da oferta de exames supletivos.
A estrutura do ensino presencial, semipresencial e não-presencial pode variar de acordo
com as opções de cada sistema de ensino. Tanto a estrutura e a duração dos cursos de educação de
jovens e adultos como dos exames supletivos devem ser definidas pelos próprios sistemas de
ensino, respeitadas as normas da legislação educacional.
O ensino presencial pode ser oferecido anualmente, correspondendo à duração do ensino
regular, embora com enfoque e metodologias diferenciadas. Pode também ser oferecido
semestralmente, ou seja, cada semestre na educação de jovens e adultos corresponderia a um ano
do ensino regular. Qualquer que seja a forma dos cursos presenciais de educação de jovens e
adultos, os alunos são avaliados no processo.
Os cursos não-presenciais podem ser oferecidos sob as mais variadas formas, inclusive
mediante estudos modulares, e avaliados em exames supletivos. Os cursos semipresenciais são de
frequêncianão-obrigatória e, também, são avaliados em exames supletivos.
A Resolução n.º 1/2000, do CNE, define que «no caso de cursos semipresenciais e a
distância, os alunos só poderão ser avaliados, para fins de certificados de conclusão, em exames
supletivos presenciais oferecidos por instituições especificamente autorizadas, credenciadas e
avaliadas pelo poder público, dentro das competências dos respectivos sistemas, conforme a norma
própria sobre o assunto e sob o princípio do regime de colaboração» (art. 10).
No Brasil, não existem ainda dados sistematizados sobre o ensino não-presencial. Por
isso, os dados limitam-se ao ensino presencial.
Enquanto modalidade de ensino, a educação de jovens e adultos está inserida nos mesmos
preceitos dos respectivos níveis de ensino aos quais está associada: o ensino fundamental e o
ensino médio.
37
Apesar das diversidades existentes na educação brasileira, de uma forma geral, a
educação de jovens e adultos pode ser oferecida em instituições públicas ou privadas,
estabelecimentos estes que podem atuar:
Segundo o Parecer n.º 11, de 10 de maio de 2000, do CNE, a educação de jovens e adultos
possui três funções: reparadora, equalizadora, qualificadora.
A função reparadora refere-se não só à entrada dos jovens e adultos no circuito dos
direitos civis pela restauração de um direito negado – o direito a uma escola de qualidade –, mas
38
também o reconhecimento da igualdade de todo e qualquer ser humano quanto ao acesso a um
bem real, social e simbolicamente importante. A função equalizadora relaciona-se à igualdade de
oportunidades que possibilitarão aos indivíduos novas inserções no mundo do trabalho, na vida
social, nos espaços da estética e nos canais de participação. A função qualificadora é a função
permanente e, mais que uma função, o próprio sentido da educação de jovens e adultos; refere-se
à educação permanente, com base no caráter incompleto do ser humano, cujo potencial de
desenvolvimento e de adequação pode se atualizar em quadros escolares ou não-escolares.
De acordo com as recomendações internacionais (Conferência Internacional de Educação
de Adultos – Confintea), a educação de jovens e adultos deve ter como princípios:
• Sua inserção num modelo educacional inovador e de qualidade, orientado para a
formação de cidadãos democráticos, sujeitos de sua ação, valendo-se de educadores que
tenham formação permanente como respaldo da qualidade de sua atuação.
• Currículo variado, que respeite a diversidade de etnias, de manifestações regionais e da
cultura popular, cujo conhecimento seja concebido como uma construção social fundada
na interação entre a teoria e a prática e oprocesso de ensino e aprendizagem como uma
relação de ampliação de saberes.
• A educação de jovens e adultos deve abordar conteúdos básicos, disponibilizando os
bens socioculturais acumulados pela humanidade.
• As modernas tecnologias de comunicação existentes devem ser colocadas à disposição
da melhoria da atuação dos educadores.
• A articulação da educação de jovens e adultos à formação profissional, no atual estágio
de desenvolvimento da globalização da economia, marcada por paradigma de
organização do trabalho, não pode ser vista de forma instrumental, mas exige um
modelo educacional voltado para a formação do cidadão e do ser humano em todas as
suas dimensões.
• O respeito aos conhecimentos construídos pelos jovens e adultos em sua vida cotidiana.
39
conteúdos; a aprendizagem significativa que deve partir dos conhecimentos prévios dos alunos; a
interação entre os pares e com parceiros mais experientes.
Os alunos constroem conhecimentos na interação com o contexto social, mesmo sem ter
passado pelo processo de escolarização. Valorizar esses conhecimentos e relacioná-los com novos
conteúdos é imprescindível para uma aprendizagem significativa, possibilitando ao professor o
planejamento de situações de aprendizagem para ampliá-los e/ou transformá-los. Quanto maior a
profundidade e qualidade das relações, maior a significatividade da aprendizagem.
Os novos conteúdos devem ser significativos, cientificamente bem construídos, ter
funcionalidade, considerando-se as capacidades dos alunos, suas possibilidades cognitivas e
afetivas.
Tais conteúdos devem ser resinificados, resgatando-se sua importância no processo de
ensino e aprendizagem, entendendo-se como saberes culturais: conceitos, explicações,
habilidades, linguagens, fatos, valores, crenças, sentimentos, atitudes, interesses, condutas,
raciocínios, etc., para o desenvolvimento do educando e sua formação integral. Resinificar os
conteúdos pressupõe entender o que o educando deve saber, o que deve saber fazer e como deve
ser.
As experiências realizadas por Paulo Freire na década de 60 indicam uma valorização dos
conhecimentos construídos fora da escola pelos jovens e adultos e a consideração destes como
pontos de partida para novos conhecimentos. Nessas experiências havia uma preocupação com o
repertório linguístico dos alunos, afirmando que «a leitura do mundo precede a leitura da palavra».
Estes conhecimentos são pontos de partida para a produção de novos conhecimentos.
Sendo assim, quando se dirigem a uma escola, os jovens e adultos não se encontram «vazios»,
como muitas vezes a escola acredita.
A escrita, como toda criação humana, é um objeto de cultura. Ela é a consequência de
necessidades surgidas no enfrentamento dos homens no mundo. O analfabeto é também um
produtor de cultura, e assim deve ser considerado no processo de alfabetização. Este deve ser
realizado não como mero exercício de memorização, mas como uma aprendizagem ativa que se
realiza através do ato de pensar.
40
Como produtor de cultura e portador de conhecimentos, o alfabetizando é o sujeito que
aprende a escrever a partir da “leitura do mundo” que já era capaz de fazer, mesmo quando
analfabeto.
Educador e educando, ambos têm um saber, mas nunca estarão prontos e acabados, não
sabem tudo. Esta situação coloca o educador e o educando em uma posição de igualdade
indispensável para a existência do diálogo. É no diálogo que o saber do educador e do educando
se trocam, se provocam na busca dos objetivos de cada um: aprender a escrever e ensinar.
O modelo autoritário distancia o educador do educando, dificultando a produção do
conhecimento porque dificulta o diálogo, permitindo apenas ordens que, vindas «de cima», não
estimulam a reflexão que cria o conhecimento.
A educação definida por Paulo Freire vê o conhecimento como um instrumento para a
ação mais eficaz dos homens sobre o mundo. Esta ação tem sempre uma marca: mudança ou
continuidade. Portanto, não é nunca um ato neutro. A alfabetização que serve aos mais pobres é
aquela que dá a força e a capacidade de aprender aos alfabetizandos, que usa a língua e a escrita
para a reflexão da realidade e para o desvelamento do que ainda não é do conhecimento deles.
Na década de 80 temos as contribuições dos estudos de Emília Ferreiro e Ana Teberosky,
que apresentam uma nova forma de entender o processo de aquisição da escrita pelos alunos. E,
também, uma pesquisa de Ferreiro que trouxe conhecimentos sobre o sistema de escrita de adultos
pouco escolarizados ou não-alfabetizados.
É importante salientar que a educação de jovens e adultos comporta a atuação de grande
diversidade de entidades governamentais e não-governamentais, o que possibilitou muitas
experiências bem-sucedidas, em âmbito nacional.
A partir das diretrizes e orientações metodológicas apresentadas, no que se refere aos
conteúdos, a educação de jovens e adultos deve atender aos preceitos curriculares referentes a cada
nível de ensino ao qual está associada (ensino fundamental e ensino médio), tanto em termos de
elaboração dos cursos presenciais como semipresenciais e não-presenciais.
Sendo assim, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, os
currículos da educação básica (no ensino fundamental e no ensino médio) compreendem uma base
nacional comum, a ser adotada por todos os sistemas de ensino, e uma parte diversificada que
41
contemple as características regionais e locais (relativas à sociedade, à cultura, à economia e à
clientela), referentes aos respectivos sistemas de ensino (art. 26).
A base nacional comum deve «abranger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa
e da matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política,
especialmente do Brasil». Abrange ainda o ensino da arte, cujo objetivo está na promoção do
desenvolvimento cultural dos alunos; a educação física, embora seja «facultativa nos cursos
noturnos» e deva ajustar-se «às faixas etárias e às condições da população escolar»; o ensino de
História do Brasil, devendo-se levar em conta «as contribuições das diferentes culturas e etnias
para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e europeia» (art.
26, § 1º ao 4º).
A existência da parte diversificada do currículo é obrigatória a partir do quinto ano do
ensino fundamental; ela deve ser definida pelo respectivo sistema de ensino, sendo obrigatório, no
entanto, «o ensino de pelo menos uma língua estrangeira moderna, cuja escolha deve ficar a cargo
da comunidade escolar» (art. 26, § 5º).
De acordo com a LDBEN, os conteúdos curriculares desenvolvidos no ensino
fundamental e no ensino médio, tanto na base nacional comum como na parte diversificada, devem
observar as seguintes diretrizes:
I. a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos,
de respeito ao bem comum e à ordem democrática;
II. consideração das condições de escolaridade dos alunos em cada estabelecimento;
III. orientação para o trabalho;
IV. promoção do desporto educacional e apoio às práticas desportivas não-formais. (art. 27)
Ainda de acordo com a LDBEN (art. 32), o ensino fundamental deverá ter «por objetivo
a formação básica do cidadão, mediante»:
I. o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio
da leitura, da escrita e do cálculo;
II. a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes
e dos valores em que se fundamenta a sociedade;
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III. o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista à aquisição de
conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores;
IV. o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de
tolerância recíproca em que se assenta a vida social.
43
são utilizados como referência os PCN de 5ª a 8ª série, com as áreas de Língua Portuguesa, Língua
Estrangeira, Matemática, Ciências Naturais, Geografia, História, Artes e Educação Física.
Para o ensino médio, os PCN estão organizados em quatro partes: Bases Legais;
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias;
Ciências Humanas e suas Tecnologias.
A matrícula na educação de jovens e adultos é destinada a todos aqueles que não tiveram
acesso ao ensino fundamental e médio em idade escolar própria e desejam dar continuidade aos
seus estudos.
Em termos de acesso a essa modalidade, a legislação educacional define que a idade
mínima para o ingresso nos cursos de educação de jovens e adultos e a participação nos exames
supletivos é de 15 anos completos para o ensino fundamental e de 18 para o ensino médio.
A tabela 63 aponta para uma concentração da matrícula da educação de jovens e adultos
no ensino fundamental (67%), sendo o maior montante no segundo segmento (63%), o que indica
uma elevação da conclusão das etapas anteriores. Os cursos presenciais com avaliação no processo
são predominantemente públicos (89%). Destes, 33% são municipais e 67%, estaduais (tabela 64).
A oferta privada inclui, principalmente, cursos profissionalizantes promovidos por organizações
não-governamentais (ONGs) e não ultrapassa 11%.
A respeito da ampliação da oferta de educação de jovens e adultos, cabe destacar as ações
do MEC no sentido de garantir essa modalidade de ensino a todos os que não tiveram acesso ao
ensino fundamental e médio na idade própria, como é o caso do Programa Recomeço. Esse
programa consiste na transferência de recursos financeiros a Estados e municípios destinados a
ampliar a oferta de ensino fundamental público a jovens e adultos. Dele participam Estados e
municípios que tenham Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) abaixo de 0,5% e que, por isso,
se enquadram nos esforços de minimização das desigualdades regionais atualmente existentes.
44
DOCENTES DA EDUCAÇÃO PRESENCIAL DE JOVENS E ADULTOS: REQUISITOS
LEGAIS, NÍVEL DE ESCOLARIDADE DOS DOCENTES
45
• Avaliação contínua e cumulativa, com prevalência dos aspectos qualitativos.
• Possibilidades de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação do aprendizado.
Fonte: http://www.oei.es/quipu/brasil/educ_adultos.pdf
46
CAPÍTULO 4 - METODOLOGIAS DE ENSINO, DIVERSIDADES E
RELAÇÃO PROFESSOR X ALUNO NA EJA
47
o aprendizado torna-se mais atraente, significativo despertando assim o interesse e o prazer,
levando-os a transformação da sociedade e de sua própria identidade.
A educação de jovens e adultos deve ser constantemente uma educação de qualidade e
multicultural que desenvolva a aprendizagem, integração e interação na diversidade cultural
desenvolvendo assim as relações inter e intrapessoal. O jovem e o adulto esperam e querem ver
resultados imediatos da suas habilidades e competências, para resgatarem a sua autoestima, pois a
sua “ignorância” que muitas vezes os tornam leigos perante as informações e inovações levá-los a
sentirem ansiedade, angústia e ao mesmo tempo “complexo de inferioridade” perante o contexto
social. Com base em Snyders (1990) ”O professor não deve abster de estudar, o prazer pelo estudo
e a leitura deve ser evidente, senão não irá conseguir passar esse gosto para seus alunos, em suma,
o professor não aprende com prazer, não ensinará com prazer”.
Sendo assim se faz necessário que aqueles que se dizem educadores tenham plena
convicção e consciência de que cada sujeito que passa por uma sala de aula, levará consigo, para
toda sua vida, as marcas benéficas e maléficas de suas lições. É imprescindível que os educadores
sejam realmente mestres, no verdadeiro sentido do termo. E que nas suas práticas saibam: valorizar
a aprendizagem do educando ouvindo suas experiências, relatos e incluindo esses saberes nas suas
práxis pedagógicas, dialogar constantemente com a linguagem e tratamento propicio ao público
alvo, indagar a opinião dos educandos em relação aos temas a serem trabalhados antes mesmo de
abordá-los cientificamente, demonstrando ao educando que a leitura de mundo faz parte de seu
cotidiano e do processo das habilidades do ensino e aprendizagem, entender e compreender que o
promover jovens e adultos é um ato político e, no entanto ele deve saber propiciar e estimular
ações para o exercício da cidadania. Portanto um educador somente troca conhecimento a partir
do momento que ele está adquirindo a aprendizagem através de pesquisas, pois o verdadeiro
educador é aquele que aprende e passa para ao educando o que aprendeu, contudo não se pode
repassar qualquer tipo de informação ao um ser humano sem antes ajudá-lo a encontrar essa
informação dentro de si.
Segundo Knowles:
48
Assim para que se compreenda este estudante jovem e adulto se faz necessário salientar
que a busca de conhecimento é imprescindível para conhecer a realidade e experiência que
integram o seu cotidiano. O estudo da EJA, andragogia, oportuniza para os jovens e adultos que
se permitem aprender a aprender, compartilhar ativamente e pessoalmente de sua própria formação
e identidade com intervenção e hábitos nas suas rotinas e programações, bem como nas realizações
e evoluções de suas atividades educativas, em condições de igualdade e inclusão com seus
companheiros participantes e com seus professores.
Assim, a inclusão de jovens e adultos nas instituições escolares necessita estar dentro de
uma proposta de ensino que seja significativa e de qualidade, onde o sujeito seja o principal
objetivo do currículo escolar, portanto as aulas devem ser prazerosas e atrativas com atividades
inovadoras e concretas que levem o aluno a pensar e questionar, resolvendo problemas advindos
do seu cotidiano.
Neste contexto a escola deve estar entrelaçada dentro de um projeto voltado para a
autonomia e liberdade do sujeito, garantindo através do orientador o processo de estigar a pensar,
saber comunicar-se, pesquisar, ter raciocínio lógico matemático, fazer sínteses e elaborações
teóricas, saber organizar seu próprio trabalho, ter disciplina, ser independente, saber articular o
conhecimento com a prática, ter o discernimento das escolhas, procurando nos quatro pilares da
educação a base sólida do conhecimento, aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a ser,
aprender a conviver.
Contudo, propor um ensino de qualidade é importante na vida do cidadão, criar o interesse
e o entusiasmo pela participação e organização coletivo, produzir, construir e reconstruir
conhecimento elaborado, envolvendo todos os sujeitos do processo de ensino e aprendizagem. Mas
o ensino deve estar interligado com a educação para a vida, sentir ter sentido, para cuidar e cuidar-
se, portando sujeito, não é só pensamento, depende da ação mediadora, inserindo sentimentos
valorizados na ética moral em prol da plena cidadania.
Sendo assim, vale salientar que a Educação perpassa por diversas transformações ao
longo dos anos, principalmente no que diz respeito à didática de Ensino. Podemos dizer que essas
mudanças ocorreram de uma forma que seguiu às tendências de atendimento a diversas
necessidades de uma reformulação e de várias adaptações adequadas ao contexto mundial e
nacional e à sociedade de forma geral. A Educação passou a ser dessa forma um conjunto dinâmico
49
de ensino que envolve diversas áreas sociais, didáticas, culturais, econômicas e, até mesmo
políticas.
Assim, a demanda pela qualificação dos profissionais da educação é mais ampla, pois
passa hoje em dia por questões ligadas ao preconceito, fruto de grande exclusão social nas escolas,
em especial, dos alunos portadores de necessidades especiais. Desta forma vale ressaltar que a
Constituição é bem explicita no seu artigo 23, inciso II, quando coloca que “cuidar da saúde e
assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência”, é uma das
responsabilidades básicas da União, dos Estados, do Distrito federal e dos Municípios, lembrando
assim que as constituições estaduais e as leis orgânicas municipais quando feitas devem por lei
buscar respaldo na nossa Constituição, para o cumprimento das leis e dos objetivos da nossa nação.
Entretanto estas garantias asseguram em nossa Constituição, no artigo 203, que trata da
Assistência Social e em seu inciso IV que destaca a “habilitação e reabilitação das pessoas
portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária”, sendo um dos
objetivos dessa assistência assegurada. Dessa maneira o artigo 208, chama a atenção em relação
ao dever do Estado que será efetivado mediante algumas garantias, entre elas o inciso III coloca
da seguinte forma: “atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino”. Assim, a demanda pela qualificação dos
profissionais da educação é mais ampla, pois perpassa hoje em dia por questões ligadas ao
preconceito, fruto de grande exclusão social nas escolas, em especial, dos alunos portadores de
necessidades especiais.
Portanto estes sujeitos passaram muitos anos sem atenção especial na Educação, sendo
até mesmo alguns anos atrás tratados com certa polêmica e o assunto excluído das políticas
públicas de Ensino se não esquecido. Diferente dos tempos atuais entendia-se por “pessoas
especiais”, aquelas com “defeito”, que necessitavam de cuidados especiais, porém reclusos.
Enfim, a andragogia vem para incluir, reparar, equalizar e qualificar de maneira adequada
os jovens e adultos que tiveram uma trajetória totalmente excludente, não precisando de
educadores que os ensinem a dar os primeiros passos, mas, de profissionais especializados para
atuar de forma transformadora e diferenciada nesse processo de construção de autonomia e
identidade onde ambos se coloquem como eternos aprendizes.
50
Sujeitos com necessidades especiais, como todos os outros seres humanos, têm suas
capacidades, dificuldades pessoais e limitações. Algumas se desenvolvem com facilidade, outras
demoram mais, algumas recebem grandes doses de estimulação e poucos progridem porque sua
história biológica lhes impõe limites, outras recebem pouca estimulação e mesmo assim se
desenvolvem bem. Atualmente, graças aos avanços científicos e tecnológicos, associados às
mudanças de comportamento da sociedade temos muitos meios de facilitar a vida dos portadores
de necessidades especiais para que se sintam parte do mundo e vistos como pessoas que têm
capacidade de viver como outra qualquer apesar de suas limitações.
Entretanto estes portadores não devem gostar de ser vistos como “coitadinhos” e muito
menos viver sob limites, principalmente sob superproteção de pais, amigos, educadores e outros
membros de nossa sociedade, querem conquistar a própria autonomia. Mas felizmente estes
paradigmas que os exclui estão mudando aos poucos. Em anos anteriores e não muito distantes,
por exemplo, era considerado um tabu no âmbito social, um assunto pouco discutido devido ao
fato da falta de recursos de diversas áreas para saber lidar com os portadores. Estes contavam
apenas com a força de vontade e o amor da família para poder conviver de forma digna, e é sabido
que muitos sempre conseguiram ultrapassar as conhecidas barreiras de sobrevivência.
Assim, educadores devem agir de forma atuante e com uma visão de ciência e técnica, tendo
uma visão mais ampla onde o ser humano cada vez mais deixa de ser percebido como um ser
essencialmente biológico para ser concebido, segundo uma visão mais abrangente, na qual se
consideram os processos sociais, históricos e culturais. No entanto graças aos avanços, podemos
observar que a vida dos portadores de necessidades especiais pode melhorar, pois agora contamos
com recursos que não só promovem o rompimento de barreiras, mas também incentivam, chamam
as famílias, os amigos e vários profissionais para que abracem causas que contribuam para a maior
inserção possível dos portadores dentro do convívio social de forma geral.
É necessário que para obter um ensino de qualidade nas instituições escolares e atender a
grande diversidade da EJA, precisa de profissionais qualificados que atendam as diversas
necessidades, bem como: professores que recebam os alunos em contra turnos (apoio) para sanar
as dificuldades e dúvidas detectadas no aluno pelo professor de sala, sala multifuncionais com
professor também “multi” para suprir as limitações dos alunos multi, mas é preciso no ato da
matrícula dos alunos com alguma necessidade especial requerer um diagnóstico emitido pelo
51
médico, onde específica a limitação do educando com o objetivo de proporcionar melhores
condições de aprendizado, para que desperte estímulos nas habilidades e competências a serem
descobertas, materiais personalizados e adequados a necessidade desse público, recursos didáticos
(livros, jogos diversificados) para cada aluno, com a finalidade de permitir o acompanhamento e
o reforço do estudo e aprendizado, biblioteca com recursos especializados para o primeiro
segmento e funcionário (bibliotecário) qualificado para atender a grande demanda do público alvo
e disciplinaridade em relação ao horário e uniforme a fim de que possam prepará-los para as
exigências do contexto social.
Diante de todos esses campos abordados em prol de uma educação de qualidade para
todos, onde cada sujeito na sua totalidade conheça na integra os seus direitos e deveres e viva
realmente em um mundo democrático se faz necessário reflexões e ações tanto do sistema quanto
dos profissionais da educação, diante disso algumas indagações se fazem pertinente tais como:
Qual é o tipo de cidadão que se pretende formar? Alienado ou realmente incluso dentro de um
mundo mais justo sem preconceito? Será que a educação está realmente incluindo, preparando este
cidadão para ser autônomo ou apenas incluindo em levantamentos contra o analfabetismo?
Reflexões como essas podem causar impactos na maneira de como avaliar esses
processos, pois a avaliação é uma atividade inserida e indispensável da dinâmica de ensino-
aprendizagem, que propicia acompanhar passo á passo o avanço dos educandos e educadores, pois
detecta as dificuldades corrigindo e orientando no processo de ensino - aprendizagem.
Portanto avaliar não é excluir e sim acompanhar e recuperar, visando orientar nas tomadas
de decisões e superar as dificuldades advindas assegurando os objetivos almejados. Em síntese é
de suma importância que os educadores que se propõem em ensinar tenham em mente que devem
mediar com sabedoria, entusiasmo, sensibilidade, humildade e alegria. Que exemplifiquem a
confiança, a paz, a amizade, o companheirismo e o respeito, pois todo professor deverá ter sempre
em mente que a sua profissão é uma das mais nobres, porque é a grande responsável por iluminar
consciências e formar cidadãos de bem.
Fonte: http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=1968
Sobre as autoras:
Dacilvania Laurentino Nobre - Ji-Paraná-Ro. Pedagoga pelo ICE - Instituto Cuiabano de Educação. Pós-graduada
em Alfabetização e Educação Infantil - ICE. Educação de Jovens e Adultos - ICE e Educação Especial com ênfase
em Libras e Surdocegueira. Mestre em Educação pela UTDC - Universidade Técnica de Comercialización Y
Desarrollo.
Gloria Abadia Silva Maia - Cuiabá-MT. Pedagoga pelo ICE - Instituto Cuiabano de Educação. Pós-graduada em
Alfabetização e Educação Infantil - ICE. Educação de Jovens e Adultos - ICE.
52
CONSIDERAÇÕES FINAIS
53
REFERÊNCIAS
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