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CIMAD 11 – 1º Congresso Ibero-LatinoAmericano da Madeira na Construção, 7-9/06/2011, Coimbra, PORTUGAL

Análise do processo produtivo de janelas venezianas de


madeira de eucalipto. Caso: Marcenaria coletiva (Itapeva-
SP/Brasil).

Thaisa M. Leite Ana Karina B. Romero


MSc, Arquiteta e Urbanista, Professora do Graduanda, Dep. Arquitetura e Urbanisno
Curso de Arquitetura, UNIEURO (Brasilia-DF/Brasil) EESC-USP (São Carlos-SP/Brasil)
thaisa.leite@gmail.com ninabromero@yahoo.com.br

Everton R. Gavino Akemi Ino


Mestrando, Arquiteto e Urbanista, Dep. Arquitetura PhD, Professora Associada, Dep. Arquitetura
e Urbanismo EESC-USP (São Carlos-SP/Brasil) e Urbanismo EESC-USP (São Carlos-SP/Brasil)
evertonrandalgavino@yahoo.com.br inoakemi@sc.usp.br

Palavras-chave - Esquadrias de madeira de eucalipto, folhas venezianas, marcenaria coletiva,


habitação social.

Keywords – Windows of sawed eucalyptus, shutter leaves, collective joinery, social housing.

RESUMO

O objetivo do presente artigo é analisar o processo de produção das janelas venezianas em


madeira de plantios florestais em uma marcenaria coletiva com transição para a autogestão,
localizada no Assentamento Rural Pirituba II(Itapeva-SP/Brasil). Como estratégia de pesquisa,
adotou-se o estudo de caso com o suporte do método da pesquisa-ação participativa. A coleta de
dados foi realizada por meio de registros escritos (planilhas de monitoramento da produção,
relatórios de atividades, entrevistas), fotos, filmagens e, principalmente, a partir da observação
direta e participante dos pesquisadores-assessores do grupo Habis (EESC-USP, São Carlos-
SP/Brasil). Com os dados obtidos foi possível: desenvolver estudos de desenhos das folhas
venezianas, que se adaptassem ao contexto da marcenaria coletiva; analisar o processo
produtivo; identificar quais foram os gargalos encontrados durante o processo produtivo;
descrever as estratégias adotadas para dar continuidade à produção; e fazer a composição dos
custos das 106 janelas venezianas. A importância desse artigo está na criação de um banco de
dados relativo à produção de janelas de madeira de plantios florestais, no contexto de uma
marcenaria com infraestrutura básica e marceneiras em constante fase de capacitação para os
serviços técnicos e de autogestão do próprio empreendimento.
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CIMAD 11 – 1º Congresso Ibero-LatinoAmericano da Madeira na Construção, 7-9/06/2011, Coimbra, PORTUGAL

ABSTRACT

The main objective of this paper is to analyze the process of production of the shutters windows
in reforestation wood in a collective joinery with transition for the self management, located in the
Rural Settlement Pirituba II (Itapeva-SP/Brazil). As research strategy, it was adopted the study
case with the support of the research-action method. The data was collected through the written
registers, like the spread sheets of production monitoring, photos, videos and the direct and
participant comment of the researcher-assessors of the Habis group (EESC-USP, São Carlos-
SP/Brazil). With the gotten data it was possible: to develop studies of drawings of the shutters
leaves, that adjust to the context of a collective joinery; to analyze the productive process; to
identify the problems found during the productive process; to describe the adopted strategies to
give continuity to the production; and to make the composition of the costs of the 106 shutters
windows. The importance of this paper is in the creation of a relative data base to the windows
production in reforestation wood, in the context of joinery with basic infrastructure and joiners in
constant phase of qualification for the technician services and self management of the proper
enterprise.

1. Introdução

A madeira já ocupou um papel de destaque na produção de esquadrias, mas a revolução


industrial e a obtenção do aço em larga escala, a um custo acessível, fez com que os metais
ganhassem espaço na produção de janelas e portas.
Na medida em que a tecnologia construtiva evoluía e novos estilos arquitetônicos eram
introduzidos no Brasil, perceberam-se mudanças nas tipologias, nas dimensões, quantidades e
detalhes das esquadrias de madeira. Partiu-se da rusticidade e simplicidade de uma janela como
o escuro [1], até chegar às venezianas, às janelas de correr, às basculantes ou outros tipos
(Miotto, 2002). A partir do momento em que se pode dispor de materiais como o vidro, o ferro e o
aço, a grande maioria de janelas e portas foram reformuladas para poder receber a novidade.
Segundo Ino et al (1998), em moradias populares brasileiras, da década de 70, a janela
tradicional feita de madeira desapareceu dos empreendimentos habitacionais, devido ao elevado
custo das janelas de madeira bem feitas e a má qualidade das janelas competitivas. Assim, hoje,
este segmento industrial fornece produtos basicamente para edificações de usuários de alto
padrão aquisitivo. Ainda segundo os autores, diversas são as causas relacionadas a este cenário,
como a estagnação tecnológica do setor madeireiro no Brasil, o desenvolvimento acelerado na
produção seriada na indústria metal-mecânica e o esgotamento das florestas nativas.
A possibilidade de se investir em plantios florestais voltados para a produção de componentes
para habitação social, com custos e qualidade compatíveis, pode recolocar o segmento industrial
de esquadrias de madeira em uma perspectiva de mudança de seu caráter predador para um
patamar de sustentabilidade a ser viabilizada por tecnologias já disponíveis no país. (Della Noce
et al, 1998).
Diante desse contexto, de possibilidades do uso da madeira de plantios florestais para produção
de componentes para habitação social, o grupo Habis (grupo de pesquisa em habitação e
sustentabilidade – EESC-USP, São Carlos-SP/Brasil), iniciou sua atuação na região sudeste
paulista com o projeto “Habitação social em madeira de reflorestamento como alternativa
econômica para usos múltiplos da floresta”, com financiamento da Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo, FAPESP. Em 2003, com recursos do Programa
FINEP/Habitare, o projeto obteve continuidade com o trabalho “Projeto INOVARURAL - Habitação
rural com inovações no processo, gestão e produto: participação, geração de renda e sistemas
construtivos com recursos locais e renováveis”.
Nesse trabalho de pesquisa e extensão, deu-se o inicio do projeto de construção de 49 moradias
rurais, no Assentamento Rural Pirituba II, localizado no município de Itapeva-SP. A região
escolhida deve-se ao fato de apresentar um grande potencial florestal, pois apresenta maiores
áreas de plantios de eucalipto no Estado de São Paulo e, também, por apresentar baixos índices
de desenvolvimento socioeconômico.
Como forma de aproveitar o potencial florestal da região e, também, de gerar trabalho e renda
para moradores do assentamento, surgiu a marcenaria coletiva do Assentamento Rural Pirituba II.

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No período de 2004 a 2006, a marcenaria produziu componentes de esquadrias e sistema de


cobertura, para o projeto das 49 moradias rurais, com uso da madeira de pinus e eucalipto. O
inicio dos trabalhos da marcenaria foram importantes no sentido de viabilizar o uso da madeira de
plantios florestais para habitação social, que apresentasse redução do custo das moradias e que
proporcionasse oportunidades de geração de trabalho e renda para as famílias do assentamento.
Já no período de 2006 a 2009, o grupo Habis assumiu a assessoria da construção de 77
moradias no Assentamento Rural Sepé Tiaraju (Serra Azul-SP/Brasil), o que proporcionou a
continuidade dos trabalhos da marcenaria coletiva de Itapeva-SP. Para suprir essa demanda por
77 moradias, foram produzidas 462 janelas de madeira de eucalipto, com folhas de vidro,
mexicanas e venezianas.

2. Objetivo

Este artigo tem como objetivo analisar o processo de produção de 106 janelas venezianas em
madeira de plantios florestais na marcenaria coletiva, localizada no Assentamento Rural Pirituba II
(Itapeva-SP/Brasil), de forma a caracterizar o processo de produção (desenhos, realização de
protótipos, definir etapas de produção), analisar os gargalos encontrados durante a produção e a
solução adotada, assim como, analisar o custo apropriado. Tal produção destinou-se a atender a
demanda gerada pela construção de 77 moradias rurais no Assentamento Rural Sepé Tiaraju
(Serra Azul-SP/Brasil).

3. Metodologia e estratégia geral da pesquisa

O estudo de caso foi a estratégia de pesquisa adotada para esse artigo, que de acordo com Yin
(2001), contribui para a compreensão que temos dos fenômenos individuais, organizacionais,
sociais e políticos e que, ao mesmo tempo, apresenta-se adequado às nossas perguntas de
pesquisa, que são do tipo explanatórias – com a forma de como e por quê; focalizam
acontecimentos contemporâneos. Assim sendo, o estudo de caso busca esclarecer um conjunto
de decisões, processos, programas, ou melhor, o motivo pelo qual foram implantados, como foram
implantados e quais foram os resultados.
Além disso o estudo de caso teve suporte no método da pesquisa-ação participativa, que
segundo Thiollent (2002) é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e
realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo no
qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão
envolvidos de modo cooperativo ou participativo. Dessa forma, os pesquisadores-autores também
são agentes envolvidos na ação, pois além das atividades de pesquisa, como coleta de dados e
sistematização, são assessores nas questões técnicas relativas à produção e gestão na
marcenaria.
Para a coleta de dados, utilizou-se como fonte de evidências relatos escritos, fotográficos e em
vídeos, documentação existente formal e informal (relatórios, planilhas orçamentárias, cronograma
de execução de produtos, projetos) e a observação participante (vivência dos pesquisadores-
autores como assessores técnicos na marcenaria coletiva do Assentamento Rural Pirituba II).

3.1. A marcenaria coletiva do Assentamento Rural Pirituba II (Itapeva-SP/Brasil)

No momento da produção de esquadrias para a demanda


das 77 moradias no Sepé, a marcenaria coletiva era
formada por 04 mulheres-agricultoras, de baixa renda, com
idade, em torno de 50 anos, cujo histórico inicial era de não
apresentar qualificação técnica para os serviços de
marcenaria. O aprendizado dessas mulheres-marceneiras
tem ocorrido na prática do dia-a-dia, com o apoio inicial de
um instrutor e, posteriormente, com o apoio dos
pesquisadores-autores do grupo Habis.
Além disso, naquele momento da produção das folhas Figura 1 – Marcenaria Coletiva do
Assentamento Pirituba II, Itapeva-SP.
venezianas, a marcenaria contou com o apoio dos jovens Fonte: acervo Habis, 2005.

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do próprio assentamento rural, que segundo Gavino (2010) veem na marcenaria uma alternativa
ao trabalho do campo e uma possibilidade de alcançar oportunidades de ensino e aprendizagem,
além de fixá-los no assentamento.
Em relação a infraestrutura da marcenaria, conta com o espaço de um barracão e contem
equipamentos como: serra esquadrejadeira de mesa, plaina desengrossadeira, plaina
desempenadeira, tupia, lixadeira de mesa, furadeira de eixo horizontal, respigadeira e
destopadeira de eixo horizontal (máquina adquirida para a produção das folhas venezianas).
Conta também, com ferramentas e equipamentos manuais. Na figura 1, tem-se uma vista externa
do barracão da marcenaria e na figura 2, vistas internas da marcenaria, com seus equipamentos,
marceneiras e jovens aprendizes.

Figura 2 – Imagens internas da marcenaria, visualizando maquinários disponíveis, marceneiras e jovens aprendizes.
Fonte: acervo Habis, 2007.

4. O processo produtivo das folhas venezianas

O processo de produção das folhas venezianas, que será abordado nesse artigo, faz parte da
encomenda de 462 janelas de madeira de eucalipto para o assentamento Sepé Tiaraju. Em etapa
anterior, houve reuniões com as famílias do assentamento, juntamente com os pesquisadores do
grupo Habis e, também, as marceneiras da marcenaria coletiva de Itapeva, para definir quais as
tipologias de janelas a serem produzidas, que entre elas estavam as janelas com folhas de vidro e
folhas mexicanas. Nessa mesma reunião, pode-se firmar a parceria entre os dois assentamentos
e, surgiu uma proposta das famílias do assentamento Sepé Tiaraju, em viabilizar a produção de
uma terceira tipologia que seria a janela com folhas venezianas.
Assim, pesquisadores e marceneiras uniram esforços para viabilizar a produção de janelas
venezianas, estudando desenhos e realizando protótipos. As etapas desse processo são: a) visita
técnica a uma marcenaria próxima a região do assentamento Pirituba II; b) proposta de desenho e
realização de protótipo; c) identificação dos gargalos encontrados; d) produção em escala das
folhas venezianas.

4.1. Visita técnica a uma marcenaria próxima à região do Assentamento Rural Pirituba II

Para a produção do protótipo da folha veneziana, as marceneiras, jovens aprendizes e os


pesquisadores assessores do grupo Habis contaram com a parceria de uma marcenaria
experiente, localizada na cidade de Itararé-SP. Nessa marcenaria foi possível conhecer o método
de produção de uma folha veneziana, utilizando maquinários como uma destopadeira de eixo
horizontal, que apresenta um custo menor de aquisição, se comparada a uma furadeira de
veneziana.
Na visita técnica, foi possível entender a etapa de execução de cortes na máquina destopadeira
de eixo horizontal, cujos cortes serviriam de encaixe das palhetas das venezianas. E, também, foi
possível acompanhar a etapa de execução dos cortes inclinados a 45º das palhetas, com o auxílio
de um gabarito. Na figura 3, tem-se alguns dos registros realizados durante essa visita.

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(a) (b) (c) (d)


Figura 3 – Visita técnica à marcenaria de Itararé-SP. (a) Exemplo de uma porta com venezianas, (b) capacitação
para execução dos cortes nos montantes de borda, com o uso da máquina destopadeira de eixo horizontal, (c)
capacitação para execução das palhetas inclinadas a 45° e (d) exemplo de um montante de borda com os c ortes
que servirão para o encaixe das palhetas. Fonte: acervo Habis, 2007.
4.2. Desenho da janela com folha veneziana e realização de protótipo

Como resultado dessa visita 118


3 6 3
2.8

técnica, foi possível desenvolver 1.2

7 2.5

7
o desenho da folha veneziana,

4
do tipo portuguesa, onde há um
trespasse da palheta no

58.3
63.3
montante, ou seja, a palheta

56.3
não é embutida no montante,
mas sim encaixada. Na figura 4,

109.6

109.6
115

tem-se a proposta desenvolvida

11.9
para a produção do protótipo da

7
folha veneziana, composta por 2

27.4
32.3
montantes de borda, 2

39.3
travessas de borda, 1 travessa

11.9
interna, palhetas e o gabarito
para garantir os distanciamentos Corte AA Régua gabarito
Vista Externa
na execução dos cortes.
118
Segundo especificações do
42.6 6 7 42.6 7
projeto das moradias do Sepé, o
12

vão destinado às janelas era de 56.8

1.20m x 1.20 e as medidas Corte BB


externas das janelas, Figura 4 - Desenho da folha veneziana para a realização do protótipo.
considerando os batentes, Fonte: acervo Habis, 2007
foram de 1.18m x 1.15m.
A produção do protótipo foi realizada em um dia e dividiu-se nas etapas de preparação para
produção, com a explicação do processo produtivo e de realização da produção. No primeiro
momento da produção do protótipo da folha veneziana, levantaram-se as seguintes etapas para o
processo produtivo: processamento primário, processamento secundário (montantes, travessas e
palhetas), montagem, processamento final e armazenagem da folha.
Para o protótipo foram utilizadas tábuas de 3 x 9 x 260cm, de eucalipto grandis (palhetas) e
eucalipto urophylla (montantes e travessas).
No segundo momento da realização do protótipo, dividiu-se em dois turnos. Como os montantes
de borda já estavam processados, fez-se a execução dos cortes para o encaixe das palhetas, na
marcenaria de Itararé-SP, visto que a marcenaria coletiva não dispunha da máquina destopadeira
de eixo horizontal. E o processamento das travessas e palhetas fez-se na marcenaria coletiva
pelo período da manhã. No período da tarde, fez-se a execução dos encaixes nas palhetas, com o
auxílio de formão e montagem da folha veneziana. A figura 5, apresenta o protótipo da folha
veneziana finalizado.

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Figura 5 - Protótipo da folha veneziana finalizado. Fonte: acervo Habis, 2007.

4.3. Análise da realização do protótipo para viabilização da produção em escala

Dessa experiência da produção do protótipo da folha veneziana, percebeu-se a necessidade de


adquirir a máquina destopadeira de eixo horizontal, fresas e serra oscilante para tupia, para
facilitar os cortes nas palhetas. Além disso, seria importante um gabarito para execução dos
encaixes inclinados a 45° na tupia, para as palheta s.
Com o protótipo da folha veneziana finalizado, foi possível apresentar às famílias do Sepé.
Assim, como o resultado final da escolha das tipologias, tem-se que de 462 janelas de madeira de
eucalipto, 106 janelas seriam de folhas venezianas.
Assim, a etapa seguinte foi de viabilizar a aquisição do maquinário e dos equipamentos
necessários para a realização da produção em escala.

4.3.1 A produção de janelas com folhas venezianas em escala

Para a produção em escala das folhas venezianas, não houve alteração do desenho proposto no
momento da realização da produção do protótipo. Portanto, considerando o mesmo desenho, tem-
se que seriam necessários 7,65m³ de eucalipto grandis, para a produção de 212 folhas
venezianas. Em etapa anterior, os batentes das folhas já haviam sido produzidos com o uso da
madeira de eucalipto saligna.
As etapas para a produção de folhas venezianas são: processamento primário (destopo,
desempeno e desengrosso); processamento secundário - execução de montantes de borda,
travessa de borda, travessa interna e palhetas (execução dos furos nos montantes e das espigas
nas travessas, grosagem de espigas, execução dos cortes nos montantes e nas palhetas,
lixamento das peças); montagem da folha veneziana (pré-montagem, colocação das palhetas e
montagem final); processamento da folha veneziana (destopo da folha e execução do batedor); e
armazenamento da folha.
Na produção do protótipo da folha veneziana, a etapa referente aos cortes nas palhetas para o
encaixe nos montantes, foi realizada com o uso do formão. Para reduzir o tempo gasto com o uso
do formão, foi desenvolvido um gabarito para efetuar esses cortes na tupia, com a utilização de
uma serra oscilante, a fim de aperfeiçoar a etapa de cortes das palhetas (ver figura 6).

(a) (b) (c)


Figura 6 - Realização dos cortes das palhetas para a produção das 212 folhas venezianas. (a) gabarito com
inclinação de 45°, (b) Realização dos cortes das pa lhetas na tupia, com a serra oscilante e (c) palheta pronta.
Fonte: acervo Habis, 2007.

Outro teste realizado foi relativo ao uso da destopadeira de eixo horizontal para a execução dos
cortes nos montantes de borda, cujos cortes permitem o encaixe das palhetas. No momento da
produção do protótipo, os cortes nos montantes de borda foram realizados na marcenaria de
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Itararé-SP. Com a orientação e capacitação, para a execução dos cortes dos montantes, dada
pelos marceneiros chefes (marcenaria de Itararé-SP), a equipe de pesquisadores-assessores do
grupo Habis buscou seguir as mesmas especificações de máquina, rotação do motor e fresa
utilizadas por essa marcenaria, para a compra da destopadeira de eixo horizontal, a fim de
viabilizar a produção das folhas venezianas na marcenaria Madeirarte.
Com a compra da máquina, a partir de recursos próprios da marcenaria, iniciaram-se os testes
em montantes de eucalipto grandis [2], no mês de dezembro de 2007, a fim de verificar os
espaçamentos entre os cortes, assim como, fazer com que os integrantes da marcenaria se
habituassem à utilização da máquina destopadeira. Como resultado do teste, percebeu-se que o
montante em eucalipto grandis apresentava uma alta facilidade de lasquear, como mostra a figura
7, letra c.

(a) (b) (c)


Figura 7 - Realização de testes na execução dos cortes ou fresas no montante de borda, na destopadeira,
para as folhas venezianas. (a), (b) execução dos cortes dos montantes na destopadeira e (c) detalhe do
montante de borda, com defeitos na finalização dos cortes. Fonte: acervo Habis, 2007.

Diante de tal situação, o desafio da equipe de pesquisadores-assessores do grupo Habis e da


marcenaria era buscar soluções para adequar o tipo de madeira, eucalipto grandis, à máquina
destopadeira e ao tipo de fresa para realização dos cortes nos montantes. Além da busca por
profissionais experientes na capacitação para realização das folhas venezianas, com o uso da
máquina destopadeira, como foi o caso do apoio da marcenaria de Itararé-SP, buscou-se também
orientações de pesquisadores especializados na área de processamento da madeira
(Unesp/Itapeva-SP) e, também, de marceneiro instrutor que pudesse viabilizar a produção e a
capacitação das marceneiras, na ausência dos pesquisadores-assessores do grupo Habis.
Em discussão com os pesquisadores especialistas da Unesp de Itapeva-SP, chegou-se a
algumas alternativas que poderiam ser utilizadas, na substituição da máquina destopadeira de
eixo horizontal, que está presente na Tabela 1.

ALTERNATIVAS PARA EXECUÇÃO DOS CORTES NOS MONTANTES DAS FOLHAS VENEZIANAS
Equipamento, Serra
Fresa com Serra tico-tico Máquina Furadeira
máquina e esquadrejadeira Serra oscilante
riscador manual e fresa para veneziana
ferramenta de mesa/fresa
Passar a peça
primeiramente na Fazer os rasgos
Execução
serra Fazer os rasgos Fazer os rasgos iniciais (os limites
automática dos
esquadrejadeira de das peças com o uso da serra dos rasgos) com a
rasgos, em dois
Operação mesa, nos limites utilizando fresa oscilante (anexar à serra manual e
montantes de
dos rasgos e c/riscador destopadeira) depois retirar o
borda,
depois retirar o (destopadeira) miolo na fresa
simultaneamente
miolo na fresa (destopadeira)
(destopadeira)
Execução mais
Máquina e Execução mais Máquina e
rápida e precisa
Vantagem equipamento rápida e menor Execução mais equipamento
dos rasgos para
existentes na possibilidade de rápida existentes na
encaixe das
marcenaria lasquear a peça marcenaria
palhetas
Custo da máquina
Desvantagem Maior tempo de Custo da fresa com Custo da serra Maior tempo de
furadeira para
execução riscador oscilante execução
veneziana
Tabela 1 – Alternativas para execução dos cortes, para o encaixe das palhetas, nos montantes.

As soluções como a substituição da fresa de corte reto pela fresa com ranhura ou serra
oscilante, seria inviável para marcenaria em função do custo dos equipamentos. Segundo
pesquisas em lojas de equipamentos específicos para marcenaria, no estado de São Paulo, o
custo de um conjunto de fresa com ranhura era de, aproximadamente, R$ 800,00. Outra opção
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que garantiria maior rapidez e qualidade na produção das folhas seria adquirir uma máquina
furadeira para veneziana. O custo de uma máquina nova era de R$ 10.000,00 e de máquina
usada era de, aproximadamente, R$ 4.800,00. Esses valores são referentes à pesquisa de preço
realizada no período de abril de 2008, em lojas especializadas em máquinas e equipamentos,
novos e usados, para marcenarias, tanto no estado de São Paulo quanto no estado do Paraná.
Só seria viável a compra de uma máquina furadeira para veneziana para a marcenaria
Madeirarte, se houvesse encomendas constantes de folhas venezianas, de forma a compensar o
custo do equipamento. Como a marcenaria não tem essa proposta de especialização na produção
de componentes para folhas venezianas em madeira e, também, naquele momento, não dispunha
de sobras no fundo de reserva para aquisição de novos equipamentos e máquinas, não foi
possível adotar essas propostas para a produção de folhas venezianas, para o Sepé.

5. Conclusões

Diante da inúmeras interrupções na produção das folhas venezianas, na marcenaria coletiva


devido aos problemas encontrados, principalmente, com o uso da máquina destopadeira, foi
necessário adaptar a serra esquadrejadeira de mesa para a realização dos cortes dos montantes
de borda, para o encaixe das palhetas (ver figura 8 e 9). Apesar de ser uma opção que envolve
maior tempo de execução, foi a solução encontrada perante ao contexto da marcenaria, que
envolve a indisponibilidade financeira para adotar outras soluções citadas na tabela 1;
marceneiras que estão em constante fase de capacitação, o que seria mais viável utilizar
maquinários que essas mulheres já estivessem habituadas; e o prazo de entrega dessas folhas no
assentamento Sepé Tiaraju.

(a) (b) (c)


Figura 8 – Solução adotada para a produção em escala da folha veneziana. (a) execução dos cortes nos
montantes, na serra esquadrejadeira, com o auxilio de um gabarito à 45º; (b) montantes já com os cortes inclinados;
(c) montagem das palhetas nos montantes. Fonte: acervo Habis, 2009.

(a) (b) (c)


Figura 9 – Solução adotada para a produção em escala da folha veneziana. (a) montagem da folha veneziana; (b)
montagem da folha veneziana finalizada; (c) exemplo de uma casa do Sepé com a folha veneziana instalada. Fonte:
acervo Habis, 2009.

Em relação a apropriação de custo, foi possível fazer uma estimativa, visto que houve inúmeras
interrupções da produção como um todo (462 janelas de madeira), devido à outras encomendas
que a marcenaria coletiva teve que atender, ausências das próprias marceneiras nas atividades
da marcenaria, rotatividade dos jovens aprendizes, além dos gargalos já citados sobre a produção
das folha venezianas. Portanto foi possível fazer uma estimativa de custo, considerando que a
madeira adquirida, eucalipto grandis [3], teve um custo de R$ 700,00m³ (secagem em estufa +
transporte até a marcenaria); a valor do serviço técnico das marceneiras foi de R$ 3,30/h, chegou-

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se ao custo estimado de R$ 110,94, uma janela com batente e duas folhas venezianas, sem
considerar os impostos embutidos em notas fiscais. Com os impostos, esse valor passaria para
R$ 143,40. No gráfico 1 é possível observar os valores que mais impactaram na estimativa de
custo da folha veneziana. Entre eles estão, em ordem de maior participação: madeira, mão-de-
obra, fundo de reserva da marcenaria e o tratamento com a pintura stain.

Grafico 1 – Participação (valores em porcentagem) de cada item na formação do custo estimado da janela
veneziana de madeira de eucalipto. Fonte: Leite (2009).
Mesmo com algumas dificuldades encontradas durante a produção em escala das folha
venezianas, como o não acompanhamento do cronograma de produção geral das 462 janelas de
madeira que, consequentemente, gerou atrasos na produção e na entrega dos produtos, o custo
estimado dessas janelas apresenta-se com valor competitivo em relação às janelas metálicas
comumente utilizadas em projetos de habitação social.
Com a experiência de produção das folhas venezianas foi possível observar alguns pontos
importantes para a viabilização da produção de componentes de madeira de plantios florestais em
uma marcenaria coletiva, com marceneiras e jovens aprendizes em constante fase de
capacitação:
• Considerando o contexto da marcenaria coletiva do Assentamento Rural Pirituba II (Itapeva-
SP) é importante a capacitação contínua dos seus integrantes, seja por meio de visitas
técnicas em marcenarias experientes, seja pela presença de um marceneiro instrutor ou dos
pesquisadores do grupo de pesquisa Habis (EESC-USP). A capacitação contínua ajudará na
formação e aprimoramento do conhecimento técnico, fazendo com que marceneiras e
aprendizes desenvolva produtos diversificados;
• Ainda dentro do contexto da marcenaria, é importante observar a infraestrutura existente. Com
isso é possível prever melhor as possibilidades de produção, no caso das folhas venezianas,
com os equipamentos e maquinários existentes e, também, com o conhecimento adquirido
pelos integrantes no uso desses maquinários. A aquisição da máquina destopadeira trouxe um
certo receio de uso pelas marceneiras;
• Em relação a matéria-prima, verificar sempre a qualidade das peças adquiridas, pois presença
de defeitos (nós, desbitolamentos, entre outros) podem acarretar em perdas significativas. No
caso da produção das folhas venezianas, nos montantes e nas palhetas foi utilizada a madeira
de eucalipto grandis, cujo o processo de secagem ocorreu em estufa. E além disso essas
peças foram previamente selecionadas de acordo com a quantidade de defeitos. Na questão
sobre os lasqueamentos, ocorridos no processo de cortes na máquina destopadeira, é preciso
verificar os equipamentos utilizados, verificando se fresas e velocidade de rotação da mesma
estão de acordo com as propriedades da matéria-prima;
• Quanto ao custo estimado apropriado, percebeu-se que mesmo com inúmeras interrupções
causados pelos gargalos encontrados durante a produção, o custo estimado final se encontra
compatível com os valores de janelas metálicas comumente utilizadas em habitação social.

Agradecimentos
Os autores agradecem à marcenaria coletiva do Assentamento Rural Pirituba II (Itapeva-SP),
aos pesquisadores-assessores do grupo HABIS (EESC-USP, São Carlos-SP) e InCoop (UFSCar),
à marcenaria Alberti (Itararé-SP) e aos pesquisadores consultados da UNESP/Itapeva-SP. Além
disso, os autores agradecem à FAPESP pelo apoio no desenvolvimento da pesquisa.

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CIMAD 11 – 1º Congresso Ibero-LatinoAmericano da Madeira na Construção, 7-9/06/2011, Coimbra, PORTUGAL

Referências Bibliográficas

Associação Brasileira de Normas Técnicas (2002). “NBR 14806: madeira serrada de eucalipto – requisitos”.
Rio de Janeiro, RJ;
Della Noce, L. G. et al (1998). “Análise da viabilidade técnica e econômica para fabricação de janelas de
eucalipto na região sul. VII Encontro Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído, ENTAC 98,
Florianópolis, SC;
Gavino, E. R. (2010). “Um outro desenvolvimento de produtos e processos inovadores em
empreendimentos coletivos autogestionários. Caso: Marcenaria de mulheres do Assentamento Rural
Pirituba II, Itapeva/SP”. 6º Seminário acadêmico Internacional. Comité Académico sobre Procesos
Cooperativos e Iniciativas Económicas Asociativas, PROCOAS, La Plata, Argentina;
Ino, A. et al (1998).”Otimização do processo de fabricação de esquadrias de madeira no centro produtor da
região sul e desenvolvimento de janelas de baixo custo para habitação social”. Relatórios de Pesquisa
FINEP. São Carlos, SP. EESC-USP;
Leite, T. M. (2009). “Análise da viabilidade técnica e econômica da produção de janelas de madeira de
eucalipto em uma marcenaria coletiva autogestionária para projetos de habitação social rural”. Dissertação
(Mestrado), Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, SP;
Leite, T. M; Gavino, E. R; Ino, A. (2008). “Análise da produção de 462 janelas de madeira de eucalipto numa
marcenaria coletiva com transição para autogestão. Caso Múltiplo: Marcenaria Madeirarte (Itapeva-SP) e
Assentamento Sepé Tiaraju (Serra Azul-SP)”. XI Encontro Brasileiro em Madeira e Estruturas de Madeira.
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Miotto, J. L. (2002). “Evolução das esquadrias de madeira no Brasil”. UNOPAR Científica: Ciências exatas e
tecnologia, Londrina, v.1, n.1, p.55-62;
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habitação de interesse social”. Relatório parcial nº 1. IPT, São Paulo, SP;
Yin, R. K. (2001). Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre. Bookman;
Thiollent, M. (2002). Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo. Cortez.

Infografia

[1] Denominação para janelas que possuem vergas, peitoris e ombreiras de madeira, rusticamente cortados,
com uma folha de madeira que abre para o interior do ambiente (Rabbat, 1998), largamente utilizadas em
moradias no inicio do período colonial no Brasil.

[2] O lote de madeira adquirido para a fase inicial da produção era proveniente da região de São Miguel
Arcanjo-SP. Esse lote passou pelo processo de secagem em estufa e não se optou pelo uso de tratamento
químico. Apesar de ter passado pelo processo de secagem em estufa, no momento da entrega na
marcenaria, a umidade se encontrava incompatível para o inicio dos trabalhos, necessitando finalizar o
processo de secagem pelo método natural. Além disso, não houve uma seleção adequada das peças após
o processo de secagem. Portanto, o lote apresentava peças com rachas no topo e no sentido longitudinal.

[3] O lote utilizado para a produção em escala das folhas das janelas venezianas foi adquirido na região de
Telêmaco Borba-PR. Foram entregues lotes de 1ª, 2ª e 3ª qualidade, que passaram pelo processo de
secagem em estufa. As peças que apresentaram defeitos após o processo de secagem foram descartadas,
sendo entregues, na marcenaria, somente peças que estivessem de acordo a classificação de qualidade
(ABNT, 2002). Mesmo as peças de 3ª qualidade apresentaram quantidade de nós e rachas inferiores ao lote
anterior, utilizado para a primeira fase da produção.

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