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ANAIS

ANAIS
IX Encontro Regional da ANPAE Sudeste e
XIII Encontro Estadual da ANPAE-SP

“Gestão de sistemas e de instituições de ensino:


políticas e práticas profissionais”

Organizadoras
Angela Maria Martins
Margaréte May Berkenbrock Rosito
Sandra Lúcia Ferreira

Realização
ANPAE - Regional Sudeste
ANPAE - São Paulo
ANPAE - Nacional
Universidade Cidade de São Paulo - UNICID

Produção Editorial
Natália Tripoloni Tangerino Silva
Viviane Lorena Buttros
Sistema de Bibliotecas do Grupo Cruzeiro do Sul Educacional

A532 Anais do IX Encontro Regional da Anpae Sudeste e XIII


Encontro Estadual da Anpae - SP.
Organizadoras Angela Maria Martins, Margarete
May B. Rosito, Sandra Lúcia Ferreira Acosta. São
Paulo: Cruzeiro do Sul Educacional. Campus
Virtual, 2014.
00 p.

Inclui bibliografia
ISBN: 978-85-65238-38-0 (e-book)

1. Associação Nacional de Política e


Administração da Educação. 2. Administração dos
sistemas de ensino. 3. Práticas educativas I.
Martins, Angela Maria, org. II. Rosito, Margarete
May B., org. III. Acosta, Sandra Lúcia Ferreira, org.
IV. Título.

CDD371.1
Comissão Organizadora

Coordenadora - Profa. Dra. Angela Maria Martins – Vice-Presidente da Anpae-Sudeste-


Unicid-Fcc
Prof. Dr. Adolfo Ignácio Calderón – PUCcamp
Profa. Dra. Celia Maria Haas – Unicid
Prof. Dr. Eduardo Augusto Moscon Oliveira-Ufes-Diretor da Anpae- ES
Prof. Dr. Marcelo Soares Pereira da Silva-UFU-Diretor da Anpae – MG
Profa. Dra Márcia Ângela Aguiar – Presidente da ANPAE - UFPE
Profa. Dra. Maria Angélica Rodrigues Martins – Unisantos
Prof. Dr. Pedro Ganzeli – Diretor da AnpaeSão Paulo – Unicamp
Profa. Dra. Sandra Ferreira Acosta – Unicid – PUC/SP
Profa. Dra. Teise de Oliveira Guaranha Garcia – Vice-diretora da Anpae - São Paulo –
USPRp
Profa. Dra. Vanda Mendes Ribeiro – Unicid – Cenpec
Prof. Dr. Waldeck Carneiro – Diretor da Anpae – RJ – UFF

Secretaria Executiva do Evento

Coordenadora: Profa. Dra. Margaréte May Berkenbrock-Rosito – Unicid


Equipe de apoio:
Ayéres Brandão
Marli Aparecida Herrera
Maria de Belém Andrade
Natália Tripoloni Tangerino Silva
Viviane Lorena Buttros

Apoio e Parcerias

FAPESP
PUCCAMP
UNICAMP – Faculdade de Educação
UNINOVE - PPGE
UNISANTOS – PPGE
USP-Rp – PPGE
Coordenadoras Comitê Científico
Profa. Dra.Theresa Maria de Freitas Adrião – Unicamp
Profa. Dra. Sandra Lúcia Ferreira – Unicid
Profa. Dra. Angela Maria Martins – Unicid/FCC

Comitê Científico

Profa. Dra. Adelina de Oliveira Novaes – Unicid – FCC


Profa. Dra. Adriana Bauer – USP – FCC
Prof. Dr. Afrânio Mendes Catani – USP
Profa. Dra. Ana Paula Ferreira Silva - Unicid
Profa. Dra. Bianca Cristina Correa – USP/Rp
Prof. Dr. Donaldo Bello de Souza - Uerj
Profa. Dra. Ecleide Cunico Furlanetto – Unicid
Prof. Dra. Eliza Bartolozzi Ferreira - Ufes
Prof. Dr. Elmir de Almeida – USP/Rp
Profa. Dra. Maria de Fátima Ramos de Andrade – Unicid
Profa. Dra Gilda Cardoso de Araujo – Ufes
Profa. Dra. Graziela Zambao Abdian – Unesp-Marilia
Prof. Dr. Júlio Gomes de Almeida – Unicid
Prof. Dr. José Marcelino de Rezende Pinto – USP/Rp
Profa. Dra. Lívia Maria Fraga Vieira – UFMG
Profa. Dra. Luciane Muniz Ribeiro Barbosa – Unifesp
Prof. Dr. Luis Enrique Aguilar – Unicamp
Profa. Dra. Maria Aparecida Guedes Monção - Unicid
Profa. Dra. Maria Celi Chaves Vasconcelos – Uerj – UCP
Profa. Dra. Maria de Fátima Barbosa Abdalla – Unisantos
Profa. Dra. Maria Cecília Luiz – Ufscar
Profa. Dra. Maria Vieira Silva- Ufu
Prof. Dr. Miguel Henrique Russo – Uninove
Profa. Dra. Raquel Fontes Borghi – Unesp/Rio Claro
Prof. Dr. Romualdo Luiz Portela de Oliveira – USP
Prof. Dr. Rubens Barbosa de Camargo – USP
Profa. Dra. Sabrina Moehlecke - UFRJ
Profa. Dra. Sandra Maria Zakia Lian Sousa – USP
Profa. Dra. Selma Borghi Venco – Unicamp
5

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ......................................................................................................... 26

COMUNICAÇÕES E RELATOS DE EXPERIÊNCIA ................................................. 27

Os RANKINGS na educação superior brasileira: um estudo sobre o estado da


questão ........................................................................................................................... 27

Adolfo Ignacio Calderon

Mariana Pfister

Carlos Marshal França

A educação a distância e seu impacto nas políticas públicas: formação de


professores. .................................................................................................................... 39

Ailton Ferreira Pietri

Julio Gomes Almeida

Necessidades formativas detectadas em novos lugares educacionais ...................... 47

Alda Junqueira Marin

O planejamento educacional brasileiro: da tecnocracia à ação pública ................. 57

Alessandra Martins Constantino Cypriano

Elisangela dos Santos de Oliveira

As fragilidades do sistema de proteção escolar do estado de São Paulo .................. 68

Alessandra Simão da Costa

Formação continuada de gestores escolares: experiências e processos do Programa


Nacional Escola de Gestores ........................................................................................ 82

Alexsandra dos Santos Oliveira

Financiamento da educação na Secretaria de Estado da Educação de São Paulo -


1995 a 2010 .................................................................................................................... 95

Alfredo Sérgio Ribas dos Santos

Edmundo Francisco Vieira

Renée Coura Ivo Vituri


6

Política nacional de formação de professores: as atribuições dos fóruns.............. 106

Ana Fanny Benzi de Oliveira Bastos

Gestão da escola, qualidade do ensino e avaliação externa: representações sociais


no cotidiano escolar .....................................................................................................118

Ana Lúcia Garcia Parro

Da teoria à prática: a formação do licenciando em geografia no interior do


Amazonas através do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência -
PIBID ........................................................................................................................... 130

Ana Paula Moraes

Reginaldo Luiz Fernandes de Souza

O atendimento das crianças de 0 a 5 anos nas creches e pré-escolas no período de


abrangência do PNE 2001-2010 – o que pode ser alterado com novo PNE? ........ 139

Ana Paula Santiago do Nascimento

(Re) visitando o papel do gestor escolar de escolas do ensino médio: o sujeito em


tempos de incertezas. .................................................................................................. 150

Andréia Cristina Nagata

Ecleide Cunico Furlanetto

Leis orgânicas municipais e regime de colaboração ................................................ 156

Andréia Silva Abbiati

Sérgio Ricardo Evangelista

Planos de Educação e Regime de Colaboração na Articulação dos Sistemas de


Ensino: por onde andam os estados? ........................................................................ 168

Andreza Alves Ferreira

O Projeto Político Pedagógico como articulador da gestão democrática: o caso da


Escola do Campo 25 de Maio, Fraiburgo - SC ........................................................ 180

Angélica Kuhn

A atuação do gestor escolar democrático e sua influência no clima organizacional


...................................................................................................................................... 189

Aparecida Dias de Oliveira Torres


7

Projeto tutoria e Conversas do Elpídio: elementos potencializadores para


formação de professores............................................................................................. 201

Bianca dos Santos Torres

Políticas curriculares no espaço escolar: o trabalho e o papel dos educadores como


intelectuais ................................................................................................................... 212

Branca Jurema Ponce

Sanny S. da Rosa

(Re) pensando o espaço escolar como forma de sensibilização da cultura do ouvir


...................................................................................................................................... 225

Carlos Eduardo de Almeida Sá

Movimento Cidades Educadoras: políticas públicas locais e a participação de


instituições da sociedade civil .................................................................................... 236

Carolina Martin

Curso de formação presencial de conselheiros de escola na política educacional do


município de São José dos Campos ........................................................................... 248

Cileda Perrella

Conselhos escolares e recursos financeiros: algumas reflexões do papel dos


dirigentes escolares frente ao sistema de prestação de conta dos recursos
financeiros no município de Cariacica-ES ............................................................... 258

Cisenando Antonio dos Santos

Eduardo Augusto Moscon Oliveira

Wilson Camerino dos Santos Junior-Ifes

As políticas públicas de ações afirmativas e o trabalho docente na universidade


federal do Espírito Santo ........................................................................................... 268

Claudenice Maria Véras Nascimento

Elizabete Bassani

Ivone Martins de Oliveira

Educação superior privada mercantil e a transformação de alunos em


consumidores ............................................................................................................... 278
8

Claudia Mara Stapani Ruas

O ensino fundamental paulistano: para o povo, mas não do Povo ........................ 289

Clóvis Edmar Paulino

Necessidades formativas de alfabetizadores atuantes na rede municipal de ensino


do município de Aracruz/ES ...................................................................................... 301

Cristiane Lozer Piol

Wirla Santana Fachetti

Rita de Cássia Mitleg Kulnig

Contribuições da avaliação externa para a reflexão sobre qualidade do ensino e


trabalho docente ......................................................................................................... 312

Cristiane Machado

Ocimar Munhoz Alavarse

O percurso formativo do professor de classe hospitar, narrativas e práticas. ...... 323

Cristiane Nobre Nunes

Plano de Formação Continuada de Professores e Gestores: pressupostos e


problemas .................................................................................................................... 334

Cristina de Cassia Mabelini da Silva

Ângela Maria Martins

Gestor escolar, você concorda com o IDESP? .......................................................... 345

Daniela Guerreiro Casanova

Miguel Henrique Russo

Roberta Gurgel Azzi

A língua inglesa nas Escolas de Tempo Integral: diretrizes e práticas de ensino . 355

Daniela Morales Monteiro

A educação de jovens e adultos e sua dimensão política: o caso de campinas, sp. 366

Debora Cristina Jeffrey

A comunicação na gestão de pessoas na escola .................................................... 378

Débora Oliveira Diogo


9

Espaço europeu de ensino superior (EEES): Instrumento de regulação na gestão


das instituições de educação superior brasileiras? .................................................. 390

Egeslaine de Nez

Antonio Bosco de Lima

Formação de coordenadores pedagógicos: integração para a gestão democrática


...................................................................................................................................... 403

Elenise Pinto de Arruda

Maria Lília Imbiriba Sousa Colares

A formação docente a partir de políticas organizacionais do mec: uma análise


sobre o PARFOR no estado do Pará ......................................................................... 414

Eliane Gracy Lemos Barreto

Anselmo Alencar Colares

Formação de professores em São Paulo: entre o efetivado e o prescrito –............ 425

Elianeth Dias Kanthack Hernandes

Ana Clara Bortoleto Nery

Formação continuada de gestores escolares: o diálogo e a problematização na


construção da prática escolar democrática .............................................................. 437

Elianeth Dias Kanthack Hernandes

Graziela Zambão Abdian

Recuperação da Aprendizagem nas Escolas Prioritárias ....................................... 449

Elides Assumpção

Patricia Aparecida Bioto-Cavalcanti

A atuação do coordenador pedagógico no contexto escolar: construindo saberes 461

Elisabete Ferreira Esteves Campos

As contribuições do PIBID na formação inicial de professores ............................. 473

Eveline Ignácio da Silva Marques

Marina Graziela Feldmann

Educação infantil: princípios, organização e gestão ............................................... 485


10

Fabiana Silva Fernandes

A formulação do programa nacional de inclusão de jovens (PROJOVEM): a


trajetória de uma política de juventude entre os anos 2004-2011 .......................... 497

Fábio Pereira Nunes

Pesquisas relacionadas ao sinaes no banco de teses da CAPES – de 2004 a 2011 –


...................................................................................................................................... 509

Fernanda de Cássia Rodrigues Pimenta

Celia Maria Haas

O gerencialismo na atual organização de trabalho docente universitário ............ 534

Fernando Henrique Protetti

Atuação dos fóruns estaduais permanentes de apoio ao programa de formação de


professores (PARFOR) nos estados do Amazonas e do Piauí ................................. 546

Francinete Massulo Corrêa

Rosilda Maria Alves

Miguel H. Russo

Gestão de resultados do índice de desenvolvimento da educação do estado de São


Paulo (IDESP) na Diretoria Regional de Ensino de Itaquaquecetuba/SP. ........... 558

Francisco Lindoval de Sousa

Marcos Pedro Rezende

Organização e volume de trabalho de docentes dos anos finais do ensino


fundamental no Brasil: evidências a partir do Censo da Educação Básica de 2013
...................................................................................................................................... 566

Gabriela Moriconi

Nelson Gimenes

Lisandra Marisa Príncepe

Diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em fisioterapia: uma


compreensão da estética da humanização e dignidade humana nos processos
formativos .................................................................................................................... 578

Gilmar Talarico e Silva


11

Margaréte May Berkenbrock Rosito

Gestão educacional e formação continuada: a disciplina projeto vivencial e a


gestão democrática ..................................................................................................... 590

Glaucilene Sebastiana Nogueira Lima

Maria Lília Imbiriba Sousa Colares

Representações sociais associadas ao componente curricular educação física e ao


professor de educação física: uma proposta de intervenção .................................. 602

Guilherme Rocha Savarezzi

Roberto Gimenez

Gestão escolar e a emancipação do estudante. ......................................................... 613

Helena Machado de Paula Albuquerque

Juliana Cristina Barbosa do Amaral

Estágio de qualificação para adaptação acadêmica de alunos estrangeiros na escola


naval ............................................................................................................................. 623

Hercules Guimarães Honorato

Teoria e Prática da Gestão Democrática na escola pública: conquistas e desafios da


EMEF Pres. Campos Salles (SP) ............................................................................... 636

Isis S. Longo

O uso do blog como ferramenta de ensino e aprendizagem por professores


participantes do Programa Melhor Gestão, Melhor Ensino. ................................. 646

Jeanny Silva

Silene Kuin

Efetividade da escola e condicionantes do desempenho escolar de alunos: a teoria e


a pesquisa .................................................................................................................... 659

José Camilo dos Santos Filho

PCNEM-ENEM: a área de história nas políticas públicas de educação no Brasil -


2009 a 2012 .................................................................................................................. 672

José Gilberto de Andrade Silva

Yone de Carvalho
12

Das necessidades formativas às possibilidades de formação: um estudo com


professores do Ensino Fundamental ......................................................................... 682

Josefina Valentini de Santi

A ineficiência do IDESP como indicador de qualidade diante dos efeitos do


território. ..................................................................................................................... 693

Juarez Bernardino de Oliveira

Francisco Lindoval de Sousa

Alessandra Simão da Costa

Sobre políticas públicas e gestão voltadas à educação profissional no Brasil ....... 705

Júlio Penna Fedre

O Processo Avaliativo na Formação de Professores ................................................ 716

Karla Eleutéria Cavalcanti Silva de Lima

Yonara de Albuquerque Camurça

Processos formativos: professores e gestores ........................................................... 726

Katsue Hamada e Zenun

Adriana Mendes dos Santos Silva

Clarissa Kato de Oliveira Ramalho

Paloma Adriana Nunes

Rafael Santos Campelo

Silvio Pereira Andrade

Suzana Cardoso dos Santos Siqueira

O Sistema Mineiro de Avaliação e suas repercussões na organização do trabalho


da escola e da sala de aula .......................................................................................... 736

Keila Fernanda Silva

Maria Simone Ferraz Pereira Moreira Costa

Criação e desenvolvimento de softwares institucionais na Universidade do Estado


da Bahia: o caso do Sistema Integrado de Planejamento (SIP) ............................. 748

Kellen Lima Gomes


13

Pedro Alejandro Herrera Ramirez

Tânia Maria Hetkowski

Formação continuada de professores no contexto de trabalho: do prescrito ao


executado ..................................................................................................................... 760

Laurinda Ramalho de Almeida

Vera Maria Nigro de Souza Placco

O olhar estético como desafio ao aprendizado: a leitura do espaço como


experiência no Centro Velho do Município de Santos/SP ...................................... 771

Leide Patricio Monteiro

Formação continuada de coordenadores pedagógicos: avaliação de expectativas e


novas propostas ........................................................................................................... 780

Ligia Elliot

Patricia Regina Santos

Gestão de práticas pedagógicas em um centro de estudos supletivos: a visão da


equipe gestora ............................................................................................................. 794

Luciana Bandeira Barcelos

Experiência na escola: programa educação em valores humanos / Projeto Escola


Sustentável................................................................................................................... 806

Luciana Pimentel Rhodes Gonçalves Soares

Formação do professor: perfil desejado, desafios necessários ............................... 818

Luís Alípio Gomes

Elenise Pinto de Arruda

Organização do trabalho na escola pública paulista em função do absenteísmo


docente ......................................................................................................................... 830

Luiz Carlos Gesqui

Adolescentes em liberdade assistida e escola: um encontro possível? ................... 841

Luziane de Assis Ruela Siqueira

Vania Carvalho de Araújo


14

As movimentações inerentes ao processo de implantação do programa de avaliação


de desempenho individual produzidas na escola ..................................................... 850

Márcia Aparecida Rodrigues Silva

Natália Rigueira Fernandes

Heloisa Raimunda Herneck

Gestão de cursos à distância ...................................................................................... 862

Margarete Bertolo Boccia

A democratização da gestão nas instituições de educação infantil: a participação


das famílias no conselho de escola ............................................................................. 875

Maria Aparecida Guedes Monção

Indicadores de desempenho dos sistemas de ensino e determinantes da qualidade


de ensino: análise da gestão educacional de municípios no interior paulista........ 888

Maria Eliza Nogueira Oliveira

Violência e indisciplina em uma escola de território vulnerável: análise


exploratória de relatos de livros de ocorrências ...................................................... 901

Maria Helena Bravo

Claudia Lemos Vóvio

Vanda Mendes Ribeiro

A avaliação de desempenho em minas gerais: uma análise de seus efeitos no


trabalho docente ......................................................................................................... 914

Mariane Gomes Pereira

Lucia de Fatima Valente

Implantação das diretrizes nacionais para educação nas prisões no estado de São
Paulo ............................................................................................................................ 927

Marieta Gouvêa de Oliveira Penna

Andressa Baldini da Silva

Desafios oferta pública e obrigatoriedade do ensino médio no estado do Espírito


Santo em 2016 ............................................................................................................. 939

Michele Pazolini
15

Eduardo Augusto Moscon Oliveira

Os anos finais da Educação Básica em busca de uma identidade histórica:


Reinventando o Ensino Médio? ................................................................................. 949

Mislene de Fátima Sebastião

Cristiane Aparecida Baquim

Os conselhos escolares e a gestão das escolas públicas entre os anos de 1997 e 2007
...................................................................................................................................... 961

Nadia Pedrotti Drabach

Livro digital acessível ................................................................................................. 973

Nancy Rigatto Mello

A gestão na formação do pedagogo após a instituição das diretrizes curriculares


nacionais ...................................................................................................................... 983

Nathália Delgado Bueno da Silva

Graziela Zambão Abdian

A semana de atividades científicas – SEAC - como espaço educacional e trabalho


meritório. ..................................................................................................................... 995

Nilza M. Macario

Luci Hildenbrand

Angela M. da S. Campos

Movimentos identitários de alunas do curso de letras de uma instituição privada de


São Paulo ................................................................................................................... 1005

Rafael Conde Barbosa

Selma O. Alfonsi

Vera M. N. S. Placco

Helena M.M. Lima

Avaliação educacional no Brasil: a construção de conhecimento a partir de textos


paradigmáticos .......................................................................................................... 1016

Regilson Maciel Borges1016


16

José Carlos Rothen

Grupo de referência: articulações entre formação e práticas gestoras ............... 1030

Renata Maria Moschen Nascente

Marcia Cristina Castellen Vella

A formação de professores no contexto escolar ..................................................... 1041

Ricardo Alexandre Marangoni

Os Conselhos Municipais de Educação da Região Metropolitana de Campinas e o


Regime de Colaboração ........................................................................................... 1050

Roque Lucio

Antônio Carlos Will Ludwig

Formação Continuada de Professores: um estudo dos Programas para


Alfabetização e Letramento. .................................................................................... 1062

Rosana Ramos de Souza

Anselmo Alencar Colares

Gestão Escolar: a formação continuada tecendo a gestão educacional coletiva. 1075

Roseli Trevisan Marques de Souza

O sistema nacional de educação em Anísio Teixeira e a organização da educação


nacional: o que fizemos nós? .................................................................................. 1086

Rosenery Pimentel do Nascimento

A contribuição do IDEB para o estudo do papel da democratização da escola


pública na melhoria da qualidade do ensino. ......................................................... 1097

Sandra A.Riscal

José R. Riscal

O Novo Plano Nacional de Educação: ganhos e perdas para a educação de jovens e


adultos ......................................................................................................................... 1110

Sandra Fernandes Leite

A contribuição da formação continuada para a atuação dos coordenadores


pedagógicos da Educação Infantil ............................................................................1122
17

Sandra Regina B. de Macedo

A desvalorização da carreira do magistério : um contexto de uma categoria no


Brasil atual .................................................................................................................1134

Sebastião Monteiro Oliveira

Políticas da educação infantil e a prática docente ..................................................1146

Simone de Oliveira Andrade Silva

Clarilza Prado de Sousa

A crise nos cursos de formação de professores: dos vestibulandos aos concluintes


.....................................................................................................................................1156

Simone Santos Pereira

Transdisciplinaridade e Currículo Integrado: uma proposta para EJA .............1165

Steve Ramos

Sistemas Municipais de Educação e os desafios na oferta da educação pública,


gratuita e de qualidade ..............................................................................................1177

Suely Ferreira

Luís Gustavo Alexandre da Silva

Normatização das funções dos Coordenadores Pedagógicos da rede estadual de


ensino do Estado de São Paulo .................................................................................1190

Valéria Flores de Souza

O “tempo integral” na educação infantil: uma análise de suas práticas no estado do


Espírito Santo............................................................................................................ 1201

Vania Carvalho de Aráujo

Edson Maciel Peixoto

Luziane de Assis Ruela Siqueira

Marcela Gama da Silva Gomide

Relações entre o público e o privado na educação: o projeto jovem de futuro do


instituto Unibanco .....................................................................................................1211

Vera Maria Vidal Peroni


18

Maria Raquel Caetano

Aprendizagem de habilidades gráficas em crianças da educação infantil: as


possíveis influências do mobiliário escolar ............................................................. 1222

Victor Vedovelli Ojeda

Rafael do Nascimento Soares

Evandro Felício de Carvalho

Roberto Gimenez

Educação Financeira: visão de alunos do Ensino Técnico sobre a sociedade


consumo. .................................................................................................................... 1234

Wagner Pagliato

Pôsteres ....................................................................................................................... 1244

Representações sociais de professores sobre o ensino médio integrado: a


ressignificação da prática docente dos níveis secundários de ensino ................... 1244

Adriana Cristina Ruescas Santana

Entre a responsabilização e a responsabilidade: possibilidades de uma experiência


compartilhada entre adultos e jovens em uma instituição de ensino médio ....... 1251

Adriana Gomes Silveira

Narrativas de crianças de seis anos que estão entrando no primeiro ano do ensino
fundamental .............................................................................................................. 1257

Aline de Souza Medeiros

Edgar Morin na formação do professor de geografia: romper com o pensamento


fragmentado utilizando a literatura como ferramenta para o ensino do espaço
geográfico. ................................................................................................................. 1262

Ana Carolina Robles de Cara Ramos

Formação inicial de professores e práticas gestoras de formação docente em


serviço ........................................................................................................................ 1270

Ana Maria Falsarella

Inclusão escolar: o que pensam os professores? Uma análise do município de Rio


Claro - SP .................................................................................................................. 1279
19

Ana Paula Abdalla

LDB: foco na gestão democrática. .......................................................................... 1287

Anderson Dias Batista

Sandra Lúcia Ferreira

Gestão escolar: políticas e práticas profissionais ................................................... 1292

Andréia Nunes Militão

Tensão entre a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva e a


Inclusão implementada nas escolas ......................................................................... 1300

Ayéres Brandão

Educação a distância e formação docente: estudos preliminares dos processos


pedagógicos e do gerenciamento de uma AVA no curso de pedagogia ................. 1307

Carlos Adriano Martins

Carlos Fernando de Araújo Jr

Avaliação e trabalho pedagógico: tendências e concepções em escolas da rede


municipal ................................................................................................................... 1315

Carolina do Nascimento Gremelmaier Moreira

Julio Gomes de Almeida

O Proeja e o Plano de Desenvolvimento da Educação – desafios da implementação


no processo de expansão do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de
São Paulo ................................................................................................................... 1320

Carolina Machado d´Avila

Representações sociais de professores universitários sobre a popularização do


ensino superior .......................................................................................................... 1327

Cláudia Terra

Adelina de Oliveira Novaes

Avaliação Institucional: a participação dos funcionários nos processos avaliativos


da escola ..................................................................................................................... 1332

Cristiane Aparecida Ferreira Passos Bueno

Indisciplina Escolar e os profissionais da educação .............................................. 1337


20

Cristina Munhaes

Adelina de Oliveira Novaes

Plano de desenvolvimento da escola: limites e perspectivas para a gestão da escola


pública no município da Serra/ES .......................................................................... 1344

Cybele Barbosa Brahim

Andreza Alves Ferreira

Mestrado em educação sociocomunitária: a formação do professor pesquisador


.................................................................................................................................... 1350

Deise Becker Kirsch

Estudantes do parfor, gestores das escolas em que atuam e qualidade da educação


infantil: possíveis convergências e fortalecimento da identidade profissional.... 1359

Domeiver Elias Santiago Verni

Maria Angélica Rodrigues Martins

Formação continuada de professores do ensino técnico no estado de São Paulo –


Centro Paula Souza .................................................................................................. 1367

Elaine Cristine de Sousa Luiz

A formação de educadores ambientais em um curso de pedagogia: primeiras


análises ....................................................................................................................... 1374

Eliane Aparecida Toledo Pinto

Jandira Liria Biscalquini Talamoni

Estratégias de formação de professores no contexto de trabalho: o papel do


Coordenador Pedagógico como formador. ............................................................ 1383

Elisa Moreira Bonafé

Laurinda Ramalho de Almeida

Impactos nos currículos e na identidade dos pedagogos após as diretrizes


curriculares nacionais para o curso de Pedagogia (2006) ..................................... 1391

Elisângela Lisboa Micheletti

Centros de ciências: desafios e possibilidades no atendimento ao público infantil


.................................................................................................................................... 1396
21

Erika Milena de Souza

Definições das Políticas Públicas de Avaliação da Educação Básica: relações entre o


global e o local ........................................................................................................... 1402

Fabio Perboni

Gestão pública escolar de qualidade: ações que desencadeiam a melhoria do Ideb


no Estado do Maranhão ............................................................................................1411

Felix Barbosa Carreiro

Avaliação da qualidade na educação e federalismo brasileiro: uma análise das


políticas públicas no estado do Espírito Santo ....................................................... 1419

Flávia Costa Lima Dubberstein

O atual currículo oficial do estado de São Paulo: pressupostos políticos e


pedagógicos ............................................................................................................... 1427

Flordenice Tavares de Longui Silva

A carreira docente no estado de São Paulo à luz da literatura e das fontes legais:
um breve panorama.................................................................................................. 1435

Gabriela Rodrigues Nery

O professor como intelectual: limites e possibilidades .......................................... 1443

Gilvonete Schimitz do Prado Rodrigues

Como circulam as políticas de formação na visão de diretores escolares: caso


PARFOR (Baixada Santista/SP).............................................................................. 1451

Gisele Santos Fernandez

Formação de EDUCADOR musical infantil: em busca da compreensão da estética


na perspectiva de Paulo Freire ................................................................................ 1456

Isabela Ventreschi

As apropriações dos professores perante o programa ler e escrever ................... 1465

Ivana Santiago Bueno

Trajetórias de formação docente ............................................................................. 1472

Jefferson Riule

O tempo e a formação integral nas reformas curriculares: a literatura produzida


22

nos últimos anos. ....................................................................................................... 1479

Jocinete Figueiredo

O direito à educação no município da Serra do estado do Espírito Santo: análise do


processo de judicialização do programa “PRÓ-ESCOLA”.................................. 1487

Jucilene Batista da Rocha

Márcia Helena Siervi Manso

Sobre a formação de professores e saberes docentes para educação de jovens e


adultos em tempos de modernidade líquida ........................................................... 1494

Juliana Bárbara Camargo

Júlio Gomes Almeida

A dimensão estética na educação física: narrativas docentes ............................... 1502

Jusselma Ferreira Maia

Formação de professores para educação de jovens e adultos: em busca de uma


melhoria significativa ............................................................................................... 1509

Kátia Maria Silva Gonçalves

Ângela Maria Martins

A emenda constitucional nº. 59 de 2009 e a educação infantil: os dilemas entre


qualidade e quantidade ............................................................................................ 1516

Kelly Lucas Silva

Educação e pobreza: uma análise sobre o conteúdo educativo das Cartilhas do


Programa Bolsa Família (2006 - 2013) ................................................................... 1522

Marcela Alvares

Contratados e efetivos: uma análise das práticas de acolhimento do professor no


cotidiano escolar ....................................................................................................... 1530

Margaret Jann

O professor de geografia e sua formação ............................................................... 1535

Maria Angélica Nastri de Carvalho

Narrativas Infantis: Algumas Reflexões Das Crianças Sobre A Escola Na


Contemporaneidade ................................................................................................. 1543
23

Maria de Belém Brandão Andrade Ferreira

A dimensão da educação estética nos processos (auto) formativos no curso de


pedagogia: um estudo sobre o lugar das narrativas discentes.............................. 1549

Maria Lucinalva da Silva

Narrativas infantis: experiências de crianças que frequentam a sala de


atendimento educacional especializado (AEE), em uma escola da rede pública
estadual de São Paulo ............................................................................................... 1556

Marli Aparecida Herrera

Qualidade na educação básica: um estudo sobre o desempenho dos alunos egressos


da educação básica. .................................................................................................. 1563

Miguel Angelo Schincariol –

A relação dos gestores escolares com a interdependência competitiva entre escolas


.................................................................................................................................... 1570

Natália Tripoloni Tangerino Silva

Vanda Mendes Ribeiro

O oferecimento de matrículas no pós Fundeb para a educação infantil no estado de


São Paulo ................................................................................................................... 1578

Patrícia Adriana Abdalla

Ensino Médio Integrado: Um campo de tensão no exercício da docência .......... 1587

Priscila Martins Diniz

Reorganização dos ciclos no município de São Paulo no ano de 2014 e a prática


pedagógica: algumas considerações ........................................................................ 1593

Rafaela de Barros Souza

Marieta Gouvêa de Oliveira Penna

Breves considerações sobre o programa institucional de bolsa de iniciação à


docência na formação do docente em geografia - Parintins-AM ......................... 1601

Reginaldo Luiz Fernandes de Souza

Ana Paula Moraes

Novo Plano Nacional de Educação, antigos desafios ............................................. 1607


24

Roseli Maritan de Aboim Costa

Alzira Batalha Alcântara

O impacto das questões sociais no contexto escolar: a formação do professor na


educação do adolescente em conflito com a lei....................................................... 1615

Rosimeire Souza de Oliveira

Subprojeto Pibid: Aprendendo e Ensinando com o Linux educacional .............. 1621

Sérgio Santos Silva Filho

Natália Tripoloni Tangerino Silva

A Formação Continuada e o impacto na prática dos professores que realizaram o


Curso: Melhor Gestão, Melhor Ensino – Professores de Ciências....................... 1627

Sidney Cabral Lourenço

Formação inicial de pedagogas (os) para a concepção e gestão do currículo ..... 1635

Silvana Alves Freitas

Marcos Tarciso Masetto

Trajetórias Escolares de Filhos de Funcionários da Universidade Federal de


Viçosa, Cotista, Ingressos no Ensino Superior. ...................................................... 1643

Simone Glycério Carmo

Wania Maria Guimarães Lacerda

A crise nos cursos de formação de professores: dos vestibulandos aos concluintes


.................................................................................................................................... 1650

Simone Santos Pereira

Critérios de seleção das crianças do tempo integral na educação infantil:


universalidade x vulnerabilidade ............................................................................ 1659

Telmy Lopes de Oliveira

A dimensão da educação estética nas narrativas discentes: uma compreensão do


desenvolvimento da autonomia e emancipação dos sujeitos no curso de pedagogia
.................................................................................................................................... 1665

Thailla Fabiane Kataoka Lopes

O acompanhamento de egressos como indicador de qualidade na avaliação


25

institucional do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES


.................................................................................................................................... 1670

Viviane Lorena Buttros

Celia Maria Haas

O Sistema de avaliação em larga escala brasileiro e a sua relação com o


gerencialismo e a responsabilização ........................................................................ 1679

Wilmara Alves Thomaz


26

APRESENTAÇÃO

O IX Encontro Regional da Anpae Sudeste e o XIII Encontro Estadual da


Anpae-SP – realizados na Universidade Cidade de São Paulo - consolidam um processo
de atuação da entidade nos estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e
Espírito Santo. Os eventos têm particular importância tendo em vista a recente
aprovação do novo Plano Nacional de Educação. Embora avanços tenham ocorrido,
muitas conquistas e desafios a serem enfrentados ainda se impõem. Dentre elas, não se
pode deixar de destacar que as polêmicas e controversas relações entre diferentes
esferas de governo, ainda permanecem um desafio a ser superado.
Registre-se a necessidade de elaboração (ou reelaboração) dos Planos Estaduais
e Municipais de Educação, principais instrumentos de planejamento das políticas
públicas de educação, tendo em vista que são inúmeros os fatores que interferem nesse
processo – muitas vezes cumprido de forma burocrática, pouco expressando as reais
necessidades e interesses da maioria da população que frequenta a escola pública.
Precisamos somar esforços para romper com essa cultura política sacralizada,
participando de todos os canais institucionalizados: conselhos; fóruns de educação;
entidades científicas e sindicais, enfim, nos mobilizando de todas as formas. Apenas por
meio da tolerância, da ética na política e na convivência cotidiana, do diálogo
permanente, do respeito ao outro e da participação vigilante, conseguiremos superar
esse cenário.

Comissão Organizadora
27

COMUNICAÇÕES E RELATOS DE EXPERIÊNCIA

Os RANKINGS na educação superior brasileira: um estudo sobre o estado da


questão

Adolfo Ignacio Calderon


PUC-Campinas
Mariana Pfister
PUC-Campinas
Carlos Marshal França
PUC-Campinas
Grupo de Pesquisa Gestão e Políticas Públicas em Educação
PUC-Campinas

Resumo: O artigo discute o estado da questão sobre rankings na educação superior


brasileira, a partir da análise de artigos pertencentes às bases de dados Scielo e Educ@.
Os textos foram agrupados em três grandes eixos: o primeiro, marcado por iniciativas
pioneiras na construção de rankings (1995-1997); o segundo aborda o fenômeno dos
rankings no âmbito das políticas públicas de avaliação da educação superior brasileira
(2003-2011); e o terceiro destaca a emergência de estudos da dinâmica dos rankings no
contexto da universidade de classe mundial (2008-2013). O resultado evidencia que,
após um período em que a temática dos rankings era discutida a partir de parâmetros
estabelecidos com base na evolução das políticas públicas de avaliação da educação
superior no Brasil, os estudos mais recentes tem remetido a discussão acerca dos
rankings para uma dimensão global, uma vez que eles vem sendo apontados como
elementos diretamente relacionados à emergência da chamada universidade de classe
mundial.
Palavras-chave: Educação superior; rankings; avaliação educacional.

Introdução
Este artigo discute o estado da questão sobre rankings na educação superior
brasileira. Os trabalhos denominados como “estado da questão” (Nóbrega-Therrien &
Therrien 2004, p. 7) procuram “levar o pesquisador a registrar, a partir de um rigoroso
28

levantamento bibliográfico, como se encontra o tema ou o objeto de sua investigação no


estado atual da ciência ao seu alcance”.
Para a produção desse trabalho, efetuou-se um levantamento bibliográfico junto
às bases de dados do Scielo – Scientific Eletronic Library Online e do Educ@
Publicações online de Educação, tendo como descritores as palavras chave “ranking” e
“rankings”. O material levantado foi analisado na tentativa de compreender como o
fenômeno do ranqueamento vem sendo tratado na literatura educacional brasileira.
Para apresentar a maneira como se encontra o estado da questão sobre rankings na
educação superior brasileira, os artigos analisados foram agrupados em três grandes
momentos: o primeiro deles, marcado pelas iniciativas pioneiras na construção de
ranqueamentos para as universidades brasileiras (1995-1997); o segundo momento, que
aborda o fenômeno do ranqueamento no âmbito das políticas públicas de avaliação da
educação superior brasileira (2003 – 2011); e o terceiro e último momento, que permite
visualizar a emergência de estudos da dinâmica dos rankings internacionais no contexto
da emergência da universidade de classe mundial (2008-2013).

Iniciativas pioneiras na construção de ranqueamentos para as universidades


brasileiras (1995-1997)
Os primeiros estudos relacionados a rankings na educação superior, encontrados
na literatura educacional brasileira, remontam a meados dos anos de 1990.
Schwartzman (1995) propõe a construção de um ranking de qualidade para 92
universidades brasileiras. A proposta baseia-se na elaboração de indicadores que
permitam aferir qualidade a partir das três principais atividades de uma universidade
(pesquisa, graduação e pós-graduação).
Os indicadores foram construídos a partir de informações relacionadas ao perfil
docente das universidades, por meio do foi criado um Índice de Qualificação do Corpo
Docente (IQCD); informações obtidas com base na avaliação dos cursos de graduação
efetuada à época pelo Guia do Estudante da Editora Abril; e da avaliação dos cursos de
Pós-Graduação realizada pela CAPES. Em seu trabalho, o autor indica a necessidade de
melhoria da qualidade das estatísticas brasileiras e de estímulo à geração de novos
dados que contribuam para a construção de sistemas de avaliação mais confiáveis.
Em 1997 Schwartzman e Oliveira Junior retomam a discussão ensejada no texto
anteriormente citado e apontam duas formas de se avaliar a educação superior no Brasil.
A primeira, o IPEAD/UFMG, envolve uma metodologia de avaliação testada em 1996
29

para os cursos de Administração, Economia e Ciências Contábeis do Estado de Minas


Gerais e analisa os insumos do processo de educação, ou seja, alunos, docentes e
infraestrutura. A segunda é o Exame Nacional de Cursos – ENC, aplicado pelo
Ministério da Educação a partir de 1996 junto aos concluintes de cursos de graduação.
A metodologia do IPEAD/UFMG baseou-se na escolha de algumas variáveis
tradicionais nos processos de avaliação. A coleta informações foi feita por meio de
questionários enviados às instituições. As variáveis escolhidas relacionam-se à
qualidade do corpo discente; qualidade do corpo docente; e infraestrutura. Esta
metodologia tem como pressuposto fundamental a correlação entre
quantidade/qualidade dos insumos e qualidade do processo/resultado.
Schwartzman e Oliveira Junior (1997) encontraram correlação positiva entre os
desempenhos dos cursos de administração a partir do ENC e do IPEAD/UFMG.
A análise dos artigos acima aponta a emergência, àquela altura, de estudos que
subsidiassem a construção de métodos para ranquear as universidades brasileiras, tendo
como objetivo a busca de aprimoramento da qualidade no ensino superior.

O ranqueamento no âmbito das políticas públicas de avaliação da educação


superior brasileira (2003 – 2011)
O período compreendido entre os anos 2003–2011 é marcado por artigos que
remetem o fenômeno do ranqueamento ao âmbito das políticas públicas de avaliação da
educação superior o Brasil. Pode-se agrupar os artigos produzidos nesse período em três
subgrupos. No primeiro, os artigos analisam os rankings como um fenômeno negativo,
relacionado a uma dimensão mercadológica, midiática, que emergem a partir da
construção de uma política de avaliação governamental de caráter regulatório, que
ganha impulso a partir da criação do Exame Nacional de Cursos. No segundo subgrupo
encontram-se textos publicados a partir 2008, em que prevalecem críticas a
desvirtuamentos pelos quais passou o processo de implantação do SINAES. Estes
trabalhos focalizam o ranqueamento como um mecanismo neutralizador da proposta
inicial do SINAES, articulada a um processo de avaliação de natureza emancipatória e
formativa e não classificatória e regulatória. Por fim, no último subgrupo, estão
trabalhos que buscaram observar e analisar as políticas educacionais que estavam se
desenhando no cenário brasileiro, compreendendo positivamente o papel dos rankings
nesse processo, à luz da possibilidade que os mesmos possuem de gerar maior
transparência e contribuir para o processo de melhoria da qualidade da educação.
30

Vários textos discutem as relações entre avaliação, regulação e ranqueamento, e


remetem essa discussão a aspectos relacionados ao papel do Estado na formulação e
implementação de políticas de educação superior e enfatizam o que seus autores
denominam de dimensão mercadológica do ensino superior.
Souza e Oliveira (2003) discutem as transformações ocorridas no papel do Estado,
nas últimas décadas, e as relações entre tais modificações e a oferta e gestão da
educação. A privatização de empresas estatais, a desregulamentação econômica, o
acréscimo de investimentos privados e a criação de parcerias com o setor empresarial
para ampliação da oferta de serviços públicos, transformam o papel do Estado e sua
relação com a oferta e gestão da educação. Acentuam-se funções de natureza mais
reguladora, com ênfase em processos de avaliação do sistema, que passam a operar
numa lógica chamada pelos autores de quase mercado.
Para evidenciar esse processo, Souza e Oliveira (2003) apresentam as iniciativas
de avaliação direcionadas à educação básica e superior: o Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica (SAEB), o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e
o Exame Nacional de Cursos (ENC). Tais avaliações, longe de funcionarem como
mecanismos indutores da qualidade, teriam como desdobramento um processo de
naturalização das desigualdades, legitimando valorações úteis à indução de
procedimentos competitivos entre escolas para melhorar pontuações nos rankings.
Dias Sobrinho (2004) trata da vinculação da avaliação às reformas da educação
superior e suas relações com o Estado. Sustenta que a avaliação tem papel não só
técnico, mas, sobretudo ético e político de grande importância nas transformações e da
educação superior e da própria sociedade, o que permite compreender a avaliação a
partir de dois paradigmas distintos: num deles a avaliação desenvolve-se como controle
e tem como objetivo a verificação e a medida de conformidade; no outro a avaliação é a
ação de atribuição de valor e produção de sentidos – um projeto aberto sobre o futuro.
Dias Sobrinho (2004) efetua uma crítica ácida a essa tendência de educação como
mercadoria e, por consequência, ao papel dos rankings como escalas de avaliação
característicos dessa tendência.
Gouveia et al. (2005) analisam a trajetória das políticas de avaliação da educação
superior no Brasil a partir da década de 1980. Enfatizam o caráter regulatório já
apontado acima, e destacam em particular o papel que o Exame Nacional de Cursos teve
como estímulo ao ranqueamento de instituições no Brasil e as limitações desse processo
enquanto implementação de uma política de avaliação efetiva. Publicado logo após a
31

promulgação da lei que instituiu o SINAES – Sistema Nacional de Avaliação da


Educação Superior, os autores tinham grandes expectativas de que essa nova sistemática
de avaliação recuperasse a dimensão formativa necessária a uma lógica de avaliação
menos regulatória e que fortalecesse a função social da educação superior.
Meneghel, Robl e Freitas da Silva (2006) buscam estabelecer relações entre
avaliação e regulação na educação superior. A partir de uma análise comparativa dessas
políticas no Brasil, na França, na Espanha, em Portugal e na Argentina, evidencia-se
que a avaliação tem sido vista, nestes países, como forma de promover a qualidade da
educação superior. Tais procedimentos de avaliação vêm se subordinando a
procedimentos de supervisão, denominados pelas autoras com o termo de regulação. Em
quase todas essas situações, a delimitação entre a fronteira entre avaliação e regulação é
tênue, não estando clara nem mesmo para os próprios agentes governamentais
envolvidos nesses processos. Consideram auspicioso, entretanto, o processo de
avaliação brasileira deflagrado com o SINAES, entendido àquela altura como elemento
que permitiria estabelecer relações mais claras e coordenadas entre esses processos.
Rothen e Schulz (2007), após traçar um breve histórico da avaliação da educação
superior, com ênfase nos mecanismos de controle governamental e de mercado
representados pelo estímulo à competição interinstitucional representada pelo antigo
“Provão” e pela divulgação de rankings dele decorrentes, os autores apresentam as
principais características SINAES, com destaque para o caráter sistêmico e integrado da
nova legislação.
A partir do ano de 2008 verifica-se a publicação de diversos artigos relacionados à
avaliação da educação superior que abordam desdobramentos posteriores à criação do
SINAES, destacando o que pode ser chamado de desvios ou descaracterizações de seus
princípios fundamentais, relacionados à ideia de uma avaliação de natureza formativa.
Esses artigos compartilham de uma visão crítica dos processos de ranqueamento
de instituições de ensino superior, processos estes que viriam a ser estimulados a partir
dos desvios de rota da proposta original do SINAES. Ao estimular processos de
ranqueamento, a sistemática de avaliação da educação superior no Brasil voltou a
estimular a competição entre as instituições.
Leite (2008) e Limana (2008) enfatizam em seus textos a descaracterização do
SINAES, posta em evidência pela perda de importância dos processos de auto-avaliação
instituicional, que perderam importância diante da proeminência do ENADE e dos
rankings produzidos a partir da divulgação de seus resultados.
32

Barreyro (2008) e Polidori (2009) analisam o processo de descaracterização do


SINAES, há pouco apontado, destacando em particular o aparecimento de dois novos
indicadores que se prestaram a propósitos midiáticos e que favoreceram um processo de
ranqueamento oficial na estrutura da educação superior brasileira: o Índice Geral de
Cursos (IGC) e o Conceito Preliminar de Curso (CPC). Tais indicadores não
responderiam apenas a questões de natureza técnica, mas sim estariam conduzindo
novamente “ao tempo dos rankings, das avaliações mercadológicas e simplificações
midiáticas, mais próximos de uma visibilidade publicitária do que da verdade da
avaliação da qualidade”. (Barreyro, 2008, p. 867).
Brito (2008), por sua vez, efetua uma análise da evolução do ENADE entre 2004
e 2007. Seu parecer final é o de que as alterações verificadas ao longo desse período
representam uma regressão, uma vez os novos indicadores criados (CPC e IGC) pouco
contribuíram efetivamente para o aperfeiçoamento do sistema, e acabaram despertando
e incentivando questões de natureza midiática ao propiciar processos de ranqueamento.
Dias Sobrinho (2010 e 2010a) discute o conceito de qualidade na educação
superior, estabelecendo relações entre os processos de avaliação da qualidade e de
acreditação na educação superior. A partir desse pano de fundo, critica as
transformações pelas quais passou o processo de avaliação da educação superior no
Brasil, a partir de 1995, particularmente no que se refere às alterações sofridas ao longo
do processo de implantação do SINAES. As principais objeções do autor relacionam-se
ao processo de crescente importância atribuída a índices de qualidade produzidos com
base em indicadores estanques e à crescente centralidade das notas do ENADE como
elementos aferidores da qualidade, em detrimento dos processos mais abrangentes de
avaliação, presentes por ocasião da implementação do SINAES. Estas modificações
culminaram numa cultura de competitividade, eficiência e performatividade, cujos
objetivos são o controle, a comparação, a hierarquização e o rankeamento.
Rothen e Barreyro (2011) corroboram o conjunto de argumentos apresentados
pelos autores acima citados, no que se refere aos desdobramentos pelos quais passou o
SINAES, e que acabaram por descaracterizar sua proposta original.
O terceiro e último subgrupo refere-se a trabalhos que analisam os rankings de
modo mais positivo. Andrade (2009) também discute o fenômeno do ranqueamento
da educação superior brasileira à luz das políticas públicas, do papel do Estado e
igualmente tomando como um de seus parâmetros principais de análise o ENADE.
33

Entretanto, de modo bastante diverso dos autores examinados há pouco, não


considera os ranqueamentos produzidos a partir dos resultados desse exame de larga
escala como um fenômeno negativo, atrelado a um processo pejorativo de
mercantilização e midiatização.
A análise de Andrade (2009) enfatiza as possibilidades de efetiva melhoria na
qualidade do ensino que podem ser induzidas por meio dos exames e ranqueamentos.
Isto porque, para esse autor, a divulgação de rankings pode ser benéfica, na medida em
que emprestam maior transparência em relação a oferta de serviços educacionais aos
diversos públicos internos e externos da universidade. O impacto midiático da
divulgação dos rankings, da mesma maneira, contribui para um processo de
publicização de informações que são, em última análise, de interesse público.
Durham (2010) efetua uma análise da política educacional brasileira durante os
governos de FHC na qual, entre outros aspectos, destaca a criação de um sistema
nacional de avaliação da educação como um todo e da educação superior em particular,
e de suas relações com a qualidade da educação. Nesse contexto, aponta como aspecto
positivo a criação do ENC, exame semelhante ao ENADE. A ampla divulgação dos
resultados dos exames em larga escala não constituiriam em prejuízo ou ferramentas
mercadológicas, mas sim instrumentos de melhoria da qualidade da educação.
Calderón, Poltronieri e Borges (2011) discutem o papel dos rankings na educação
superior brasileira entendendo-os muito mais como políticas de Estado do que como
meras políticas de um ou outro governo. Para tanto, efetuam uma análise do papel que
os rankings desempenharam ao longo dos governos de FHC e de Lula. Considerados
como instrumentos que podem ser elementos indutores da qualidade, os rankings
vieram a ganhar crescente respeito e legitimidade no seio de governos com projetos
políticos distintos, o que permite considera-los parte de uma política de Estado.

Os rankings internacionais no contexto da emergência da universidade de classe


mundial (2008-2013).
Os últimos artigos a seguir apresentados permitem visualizar a emergência de
estudos da dinâmica dos rankings internacionais no contexto da emergência da chamada
universidade de classe mundial.
Lima, Azevedo e Catani (2008) analisam o Acordo de Bolonha, processo político
e institucional que visa a construção de um espaço europeu de educação superior.
Enfatizam a centralidade que a discussão acerca da qualidade ocupa nesse processo e a
34

emergência do que denominam “Universidade Nova”. Uma das características mais


importantes desse reordenamento das universidades europeias está relacionado ao
entendimento da avaliação como ferramenta de melhoria da qualidade nos moldes das
atividades empresariais, com ênfase tecnocrática e gerencial. Esse processo aponta para
modelos de avaliação em que predominam aspectos quantitativos, fundados na busca de
padronização e padrões de comparabilidade. Nesta lógica de qualidade ganham
destaque as agências de avaliação externa responsáveis pela construção de indicadores
que permitem a produção/divulgação de rankings.
López Segrera (2008) destaca as principais tendências e desafios da educação
superior no mundo e na América Latina e Caribe: massificação; crescimento da
importância das tecnologias de informação e comunicação; maior mobilidade
internacional de estudantes; aceleração do processo de privatização; desvalorização
profissional dos professores; iniquidade de acesso; redução dos investimentos públicos;
desatualização e inflexibilidade curriculares; emergências de “pseudouniversidades”,
marcadas exclusivamente pela preocupação com o lucro; e a intensificação do debate
sobre as chamadas universidades de classe mundial, dentre outras.
No âmbito dessas tendências, López Segrera (2008) destaca a importância
crescente dos rankings, fenômeno cada vez mais na moda e que se constituem numa
das bases do modelo de universidade de classe mundial, assentado fundamentalmente
na sua capacidade de produção científica, típica do universo anglo-saxão e que
privilegiam sobremaneira as chamadas ciências duras. Num mundo marcado por
crescente competitividade e dominado por regras de mercado, os rankings são um
fenômeno inevitável e eventualmente até mesmo necessários no universo acadêmico.
Théry (2010) desenvolve um estudo que poderia ser chamado de uma cartografia
dos principais rankings universitários internacionais. Tomando como base as
classificações de universidades a partir de quatro tradicionais rankings mundiais (Arwu
– Academic Ranking of Word Universities; Classificação da École dês Mines de Paris;
Ranking THE; e Webometrics Ranking), transfere seus resultados sobre um mapa-
mundi, construindo uma geografia mundial das universidades. A análise dos resultados
produzidos pelos quatro rankings mencionados, permite ao autor construir mapas
geográficos, que revelam enormes semelhanças: todos eles concentram as “boas” ou
“melhores” universidades em três regiões claramente definidas no globo, irradiadas a
partir de três pontos: os Estados Unidos, a Europa e o Japão.
35

Moura e Moura (2013) apontam que o prestígio das instituições universitárias


vem sendo influenciado cada vez mais pela publicação dos sistemas de ranqueamentos
nacionais ou internacionais. Este prestígio, aferido por meio desses processos de
ranqueamento, cada vez é menos dependente da tradição, e vem se assentando em
processos cada vez mais quantificáveis e verificáveis a partir de procedimentos que
permitam mensurar o desempenho das instituições a partir de determinados indicadores.
Levantamento efetuado pelos autores identificou dezenas de sistemas de
ranqueamentos nacionais e globais atualmente. Esse processo tem como um de seus
efeitos nocivos o reordenamento dos investimentos institucionais, voltando-os
prioritariamente para o atendimento de indicadores que são contemplados pelos
rankings, em detrimento de outras atividades universitárias que eventualmente seriam
prioritárias no sentido de uma efetiva qualidade. Priorizam-se elementos de natureza
muito mais midiática e que gerem retorno em melhoria da imagem da instituição, além
de apontar para um processo de crescente hegemonia das universidades de classe
mundial, num processo de padronização e de exportação de modelos dos países centrais.

Considerações finais
O levantamento do estado da questão acerca dos rankings na educação brasileira
evidencia uma trajetória interessante em relação às tendências a partir das quais o
fenômeno tem sido estudado.
Além da diversidade de matiz teórico conceitual tomada como ponto de partida
das análises dos diversos autores, constata-se que, após um período em que a temática
dos rankings era discutida a partir de parâmetros estabelecidos com base na evolução da
política de avaliação da educação superior implementada pelo Estado brasileiro (como
decorrência, em boa parte, da implementação inicialmente do ENC e, posteriormente,
da sistemática de avaliação do SINAES), os estudos mais recentes tem remetido a
discussão acerca dos rankings para uma dimensão global, internacional, uma vez que
eles vem sendo apontados como elementos diretamente relacionados à emergência da
chamada universidade de classe mundial.
36

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39

Comunicação

A educação a distância e seu impacto nas políticas públicas: formação de


professores.

Ailton Ferreira Pietri1


UNICID
Julio Gomes Almeida²
UNICID

Resumo: Este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa que investigou a presença
da Educação a Distância nos processos de formação de professores e tendo como
objetivo principal entender como o estado brasileiro vem utilizando essa modalidade de
ensino na formação dos professores que atuam ou que virão a atuar na educação básica.
Para desenvolvimento da pesquisa foi escolhida a abordagem qualitativa e os dados
foram produzidos por meio de análise bibliográfica e documental a partir da literatura
sobre o tema e de leis e normas que vem organizando essa modalidade no sistema
educacional brasileiro. Os dados revelam que a Educação a Distância vem sendo
assumida como inovação tecnológica importante para o campo da educação. Assim é
cada vez mais utilizada nos processos formativos, tanto pelas instituições privadas
quanto pelo próprio ministério da educação que criou importantes programas de
formação utilizando essa modalidade de ensino.
Palavra chave: Educação a Distância, Formação de Professores, Inovação Tecnológica
e Políticas Públicas.

Introdução
Este trabalho tem como objetivo apresentar os dados de uma pesquisa que buscou
estudar a Educação a Distância no Brasil, buscando entender a presença desta
modalidade de ensino na formação de professores. A ideia de estudar esse tema surgiu
da minha experiência como professor e sociólogo que, no trabalho cotidiano busca
entender o contexto em que está inserido. Assim entender a presença dessa modalidade

1. Mestre em Educação pela Universidade Cidade de São Paulo (UNICID), Especialista na área de
Política Internacional pela Escola Pós-Graduada de Ciências Sociais de São Paulo (EPG/FESPSP).
Graduado em Sociologia e Ciência Política pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo
(FESPSP), Professor de Sociologia e Filosofia para Ensino Médio. ailtonpietri@ig.com.br
2. Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da USP, Supervisor Escolar da Rede Pública
Municipal de São Paulo e Professor do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Cidade de
São Paulo.
40

nos contextos formativos emergiu como uma necessidade relacionada com minha
prática enquanto educador preocupado em desenvolver meu trabalho considerando o
contexto social e tecnológico e os recursos que deles fazem parte.
O estudo revela que a educação a distância é cada vez mais presente nos cursos
de formação de professores tanto na formação inicial quanto na formação continuada.
Essa presença é evidenciada não apenas pela quantidade de cursos e programas que
utilizam a educação à distância como ferramenta, mas também como esforço do
Governo Federal no sentido de ampliar o acesso à escolarização e melhorar a formação
de professores já formados utilizando-se deste recurso. Neste sentido destaca-se no
estudo três programas que integram a política de formação de professores que vem
sendo implementada no Brasil. São eles: Universidade Aberta do Brasil (UAB),
Proformação e Pró-Licenciatura.
Para desenvolvimento da pesquisa optei pela abordagem qualitativa e os dados
foram produzidos por meio da análise bibliográfica e documental feita a partir do estudo
da literatura da área e de documentos oficiais por meio do qual o governo brasileiro vem
buscando normatizar essa modalidade de ensino no nosso sistema educacional. A opção
por esse procedimento decorre da constatação que ele é adequado ao objeto de estudo e
aos objetivos da pesquisa. Estudar a questão pareceu bastante relevante, pois ao
examinar a literatura pertinente facilmente constata-se que apesar do vasto material
produzido sobre esse assunto, muitas dúvidas pairaram no ar em relação a essa
modalidade a começar pela falta de consenso na definição do conceito educação à
distância. A definição deste conceito é controversa e, embora na Lei 9.394 seja
empregada a expressão Educação a Distância, há autores como Chaves (1999) que
consideram esse termo impróprio.
Hoje, através da internet, das tecnologias, dos livros, filmes, programas
educativos, de televisão, etc é possível ensinar a distância a todo tempo e a todo o
momento, onde quer que o indivíduo se encontre. Percebe-se a superação de muitas
barreiras geográficas antes impossíveis de ser transpostas sem os recursos tecnológicos
hoje disponíveis. Neste sentido vale atentar para Chaves (1999) quando afirma que
ensinar a distância é algo perfeitamente normal e possível graças a essas facilidades que
têm contribuído para isso, pois com esforço, empenho e dedicação é possível aprender.
Segundo Chaves (1999),
Ensinar a distância, porém, é perfeitamente possível e, hoje em dia,
ocorre o tempo todo -- como, por exemplo, quando aprendemos
através de um livro que foi escrito para nos ensinar alguma coisa, ou
41

assistimos a um filme, um programa de televisão, ou um vídeo que


foram feitos para nos ensinar alguma coisa, etc. A expressão "ensino a
distância" faz perfeito sentido aqui porque quem está ensinando -- o
"ensinante" -- está "espacialmente distante" (e também distante no
tempo) de quem está aprendendo -- o "aprendente". (O termo
"distância" foi originalmente cunhado para se referir ao espaço, mas
pode igualmente bem ser aproveitado para se referir ao tempo).
(CHAVES, 1999, p.1).

Embora os termos Educação a Distância e Ensino a Distância sejam recorrentes


nas leituras, eles não são sinônimos entre si. Talvez a ênfase dada a um termo em
relação a outro, seja a compreensão e o entendimento que seus defensores tenham sobre
o tema. De modo, que nenhum deles sobrepõe ao outro, mas acabam se
complementando. A realização da pesquisa possibilitou o diálogo com autores que vêm
se dedicando ao estudo dessa modalidade, também permitiu analisar a legislação
pertinente.
A pesquisa revela que a educação a distância é cada vez mais presente nos
cursos de formação de professores na modalidade inicial e continuada. Tanto nos cursos
oferecidos pelas instituições privadas quanto em cursos e programas de formação
oferecidos pelas instituições públicas. A pesquisa revela também que o estado brasileiro
vem investindo bastante na educação a distância como instrumento de facilitação do
acesso à escolarização e também como mecanismo que possibilita melhoria da
capacidade dos profissionais já formados. Dentre as várias iniciativas do governo
federal neste sentido destaquei três programas que pela leitura de documentos oficiais
percebe-se que tem sido objeto de investimentos significativos: a Universidade Aberta
do Brasil (UAB), o Proformação e o Pró-Licenciatura, programas que serão
apresentados como exemplo da utilização do Ensino a Distância na formação de
professores por parte do estado brasileiro.
1 – Universidade Aberta do Brasil (UAB)
O sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) é composto por ações
interligadas de universidades públicas que oferece cursos de nível superior e constitui-se
em instrumento importante na ampliação do acesso a esse nível de ensino com
utilização da tecnologia da educação a distância. É voltado para os professores que
trabalham na educação básica e têm prioridade de formação, seguidos dos dirigentes,
gestores e trabalhadores em educação básica dos estados, municípios e do Distrito
42

Federal. O sistema de Universidade Aberta (UAB)2 foi instituído pelo Decreto 5.800, de
8 de junho de 2006.
O sistema se volta prioritariamente para a formação de professores tanto no que
se refere à modalidade inicial quanto à continuada. Essa opção revela o entendimento de
que o poder público acredita que melhorar a formação dos professores constitui passo
importante no processo de melhoria da qualidade da educação.
O Decreto estabelece também o regime de colaboração entre os entes
federativos como metodologia adotada para que o sistema cumpra suas finalidades e
objetivos, “mediante a oferta de cursos e programas de educação superior a distância
por instituições públicas de ensino superior, em articulação com polos de apoio
presencial” (Art. 2º).
Além disso, é também estabelecido pelo referido decreto os critérios para
organização do sistema, a necessidade de garantia de padrão de infraestrutura e recursos
humanos adequados e a fonte de recursos necessários ao seu desenvolvimento.
2- Proformação
Outro programa governamental que merece destaque quando se refere às
políticas públicas de formação de professores é o Proformação3. Este programa tem
como foco a formação, a capacitação de professores que se encontram no exercício da
docência sem a titulação mínima legalmente exigida, os chamados professores leigos.
Foi criado como estratégia para aprimorar o desempenho do sistema de Educação
Fundamental em todas as regiões do país.
Para desenvolvimento do programa é utilizada a educação a distância e conta
com material impresso, videográficos e encontros presenciais. As atividades do
programa são concentradas nos períodos de férias e aos sábados e também utiliza no
processo de formação atividades de práticas pedagógicas desenvolvidas nas escolas
onde os professores atuam. Oferece aos participantes, habilitação para o magistério na
modalidade normal.
Sua criação teve início em 1997, a partir da articulação entre a Secretaria de
Educação a Distância do Ministério da Educação e Cultura – SEED/MEC, e o Fundo de
Fortalecimento da Educação – FUNDESCOLA e, além desses órgãos, envolve também
os Estados e Municípios, onde sugeriram, por meio de celebração de parcerias, o

2Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5800.htm> acesso


em 17 de julho de 2014.
3 Disponível em < http://proformacao.proinfo.mec.gov.br/> acesso em 17 de julho de 2014.
43

desenvolvimento deste programa. Tendo iniciado nas regiões Norte, Nordeste e Centro-
Oeste do país. A implantação das primeiras turmas – o chamado Grupo I – aconteceu
em 1999, como um Projeto Piloto, nos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul,
capacitando em junho de 2001, cerca de 1.323 professores.
Já no ano de 2000, foi implantado o Grupo II, abrangendo outros Estados como
Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí,
Rondônia, Sergipe e Tocantins, onde mais de 22.056 professores foram habilitados.
Este programa foi financiado pelo Fundescola que administra recursos
provenientes do Banco Mundial. Desde o lançamento do Proformação, o Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), tem sido parceiro da Secretaria de
Educação a Distância (SEED), na sua execução.
Para concretização deste programa foi muito importante à utilização das novas
tecnologias que permitiram que o programa fosse concretizado por meio da Educação a
Distância. O desafio que hoje se coloca para o MEC é consolidar o programa e expandi-
lo, transpondo as barreiras regionais encontradas na área educacional em nosso país.
No proformação4, o funcionamento ocorre pela modalidade de Educação a Distância,
utilizando materiais de autoinstrução (vídeo e impresso), produzidos especialmente para
o curso com atividades individuais e coletivas, além de um serviço de apoio ao
aprendizado realizado pela equipe de professores formadores e por tutores.
3- Pró-Lincenciatura
Finalmente destaco outro programa criado pelo Ministério de Educação e
Cultura (MEC), e que também exemplifica a utilização da educação a distância como
ferramenta de formação pelo estado brasileiro que é o Pró-Licenciatura. Esse programa
foi criado em 2005, com objetivo de oferecer formação inicial à distância a professores
em exercício nos anos/séries finais do ensino fundamental ou ensino médio dos sistemas
públicos de ensino, que não possuíssem habilitação legal, ou seja, licenciatura para o
exercício da função.
Por meio deste programa o governo procura implementar uma política pública
de formação inicial em parceria com as instituições de Ensino superior com objetivo de
superar as deficiências da formação dos professores que atuam nos sistemas públicos de
ensino.

4
Disponível em <http://proformacao.proinfo.mec.gov.br/estrutura.asp> acesso em 17 de julho de 2014.
44

O Pró-Licenciatura5 - Programa de Formação Inicial voltado para Professores


dos Ensinos Fundamental e Médio trava uma luta constante pela melhoria da qualidade
do ensino oferecido na Educação Básica de nosso país. Foi criado pelo Governo Federal
por meio do Ministério da Educação e Cultura (MEC), com a coordenação das
Secretarias de Educação Básica (SEB) e de Educação a Distância (SEED) e com ajuda e
participação das Secretarias de Educação Especial (SEESP) e Educação Superior
(SESU).
Os documentos oficiais colocam como objetivo do Pró-Licenciatura está em
aprimorar a qualidade de ensino na educação básica através de formação inicial sólida e
contextualizada do professor em sua área de atuação.
A participação das secretarias estaduais e municipais nesse programa acontece
por meio da adesão dos interessados. Para participar, o professor precisa estar
lecionando há pelo menos um ano na escola pública, e não possuir a licenciatura exigida
por lei para lecionar. A formação é inteiramente gratuita e os professores selecionados
pelas instituições em processo seletivo, recebem bolsa de estudos. Esse programa pode
ser desenvolvido somente no âmbito da Universidade Aberta do Brasil (UAB).
Dentro do contexto apresentado, algumas ações foram sugeridas para enfrentar
esses desafios, tendo como base os seguintes eixos:
• a formação consistente e contextualizada do educador nos conteúdos de sua
área de atuação;
• a formação teórica, sólida e consistente sobre educação e os princípios
políticos e éticos pertinentes à profissão docente;
• a compreensão do educador como sujeito capaz de propor e efetivar as
transformações político-pedagógicas que se impõem à escola;
• a compreensão da escola como espaço social, sensível à história e à cultura
locais;
• a ação afirmativa de inclusão digital, viabilizando a apropriação pelos
educadores das tecnologias de comunicação e informação e seus códigos;
• o estímulo à construção de redes de educadores para intercâmbio de
experiências, comunicação e produção coletiva de conhecimento.

Ao estabelecer esses eixos, o governo tenta construir um programa dinâmico e


sólido, que atenda os anseios dos professores que não possuem um curso de licenciatura
e de quebra, atende também a determinação do MEC.
Para que ocorra esse programa é necessária parceria com as instituições que
oferecem cursos de licenciatura a distância, sendo que a duração de seus cursos não
pode ser inferior aos cursos presenciais, deverá, sim, ser igual ou superior, permitindo
ao professor-aluno manter sua atividade como docente.

5 Disponível< http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/proli_an3.pdf> Acesso em 17 de julho de 2014.


45

Considerações Finais
Embora seja um tema hoje muito estudado, a educação à distância ainda desperta
muita polêmica, pois reforça as discussões sobre inovação em um campo marcado pelo
tradicionalismo. A ideia de inovação associada à utilização de novas tecnologias nos
processos educativos tem sido um dos princípios organizadores das propostas de
educação a distância. A pesquisa fez emergir uma questão importante que me fez
refletir: É possível o oferecimento de Educação de qualidade na modalidade à distância?
Os dados da pesquisa revelam que podemos sim, ter a oferta de uma educação à
distância com qualidade, muito embora essa modalidade seja vista com certa
desconfiança.
A pesquisa revela ainda que a educação a distância vem se consolidando no
campo da formação acadêmica e profissional. Hoje, aquele que atua em qualquer área
dificilmente poderá exercer sua profissão sem recorrer às novas tecnologias e à
possibilidade de receber e transmitir informações a distância. Essa situação vem
forçando professores a se aperfeiçoarem cada vez mais, inclusive para utilização desse
recurso no exercício da profissão.
Com relação à presença do ensino a distância na formação de professores
criação dos programas é possível perceber que o estado brasileiro por meio do
Ministério da Educação e das Secretarias Estaduais e Municipais de educação vem
investindo nesta modalidade por meio do incentivo ao surgimento de cursos que a
utilizem e também por meio da criação de programas que utilizam as tecnologias para
proporcionar o ensino a distância, como acontece com os programas Universidade
Aberta do Brasil (UAB), Proformação e Pró-Licenciatura.
A criação e a implantação desses programas na área educacional têm
demonstrado amadurecimento e coragem dos governos nas políticas de formação e
aperfeiçoamento dos nossos professores, em todo o país. Há que ressaltar o empenho e a
disposição deles nessa luta, mas ainda há um longo caminho a percorrer.

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1999.

BRASIL. Lei Federal nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e


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<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm> acesso em 17 de julho de 2014.
46

CHAVES, Eduardo. O.C. Tecnologia na Educação: Conceitos Básicos. São Paulo,


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3ª. ed.Campinas, SP: Autores Associados, 1995.- ( Coleção educação contemporânea).

MERCADO, L.P.L.; KULLOK, Maísa B.G. (Orgs.). Formação de Professores: política


e profissionalização. – Maceió: EDUFAL, 2004.
2
Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
2006/2006/decreto/d5800.htm> acesso em 17 de julho de 2014.
3
Disponível em < http://proformacao.proinfo.mec.gov.br/> acesso em 17 de julho de
2014.
4
Disponível em <http://proformacao.proinfo.mec.gov.br/estrutura.asp> acesso em 17 de
julho de 2014.
5
Disponível em< http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/proli_an3.pdf> acesso em
17 de julho de 2014.
47

Comunicação

Necessidades formativas detectadas em novos lugares educacionais

Alda Junqueira Marin


Centro Universitário de Araraquara-UNIARA
Grupo de Pesquisa Organização e Gestão de Instituições Educacionais
Financiamento: FUNADESP

Resumo: Este estudo aborda necessidades formativas de alunos de um curso de


mestrado profissionalizante na área de educação. O objetivo central foi o de sistematizar
informações relativas ao tema. Por suas características (cenário empírico não
investigado quanto a tais focos) considerou-se tratar de um estudo exploratório. Foi
desenvolvido no primeiro semestre de 2014 em um curso recém aprovado. Ao longo do
semestre, em diversas situações, instalou-se, deliberadamente, o debate com os alunos
sobre as angústias, preocupações e necessidades de enfrentar problemas vigentes no dia
a dia de suas funções, oportunidades preciosas para a coleta das informações dos 25
alunos. O teor das manifestações esteve o tempo todo voltado para o aspecto
pedagógico seja para o desenvolvimento profissional deles próprios, seja para que
possam desempenhar suas funções voltadas para o desenvolvimento profissional de
profissionais aos quais eles precisam ajudar no desempenho de suas funções de ensino e
gestão.
Palavras chave: necessidades formativas; ensino e gestão escolar; mestrado
profissionalizante

Introdução
Desde a década de 1960, o tema das necessidades formativas dos profissionais da
educação vem ganhando relevo, sobretudo devido à divulgação das necessidades dos
educandos, tanto crianças e jovens quanto adultos, assim como em função da
multiplicidade de reformas educacionais realizadas nos diferentes países. A principal
área de desenvolvimento de estudos e ações sobre as necessidades formativas, sobretudo
nas décadas de 1980 e 1990, tem sido a da formação de professores no conjunto
denominado de educação continuada (RODRIGUES e ESTEVES, 1993) e, mais
48

recentemente, passou a ser conceituada como desenvolvimento profissional


(MARCELO, 1999).
Nessa mesma publicação citada, as autoras Rodrigues e Esteves (1993) abordam
as diferentes formas de caracterizar as necessidades humanas demonstrando a
polissemia do termo educação continuada na Europa, bem como Marin (1995) analisa,
no Brasil, a mesma temática quase simultaneamente abordando o amplo espectro que
cerca tal tema tanto na bibliografia quanto nas ações políticas voltadas ao atendimento
das necessidades formativas dos professores. No conjunto dessas abordagens, as autoras
portuguesas situam a análise das necessidades de formação de professores como
estratégia de planificação fornecendo informação “para decidir sobre os conteúdos e as
atividades de formação” (p.20), conceito ao qual se pode acrescentar que se torna válido
não só para professores, mas também para todos os demais agentes atuantes nas redes
escolares do ensino básico e superior do país.
Marcelo (1999) apresenta, em um longo capítulo, o conceito de desenvolvimento
profissional, considerado mais avançado em relação à educação continuada,
incorporando parte do que já era abordado anteriormente, mas considerando as
necessidades que surgem em face das constantes mudanças que passam a ocorrer em
diversos países.
As formações referidas, em geral, são realizadas com os profissionais em
diferentes momentos de suas carreiras, embora com possíveis, e desejáveis,
consequências para os cursos de formação inicial ao considerar que as necessidades
deixem de se repetir anos a fio.
Um pequeno e rápido levantamento feito sobre o tema permitiu identificar, nos
sites especializados de busca acadêmica e periódicos, a indicação de muitos títulos
sobre formação continuada de professores e de gestores dentro os quais citam-se, aqui,
apenas alguns que fazem certos balanços e análises mais globais principalmente
voltados para a área de gestão (LUCK, 2000; VIEIRA, 2007; GATTI, 2008; PARO,
2009).
Este, portanto, é mais um texto nessa direção de apontar as necessidades de
profissionais que estão em serviço. Porém, este pequeno estudo tem o diferencial de
relatar uma análise inicial de necessidades formativas de profissionais que buscam
formação junto a um curso de Mestrado Profissional stricto sensu na área da educação.
Trata-se, portanto, de um estudo novo no sentido do campo empírico de sua coleta de
informações.
49

Inicialmente são apresentadas algumas bases que forneceram condições à


realização do estudo: o suporte jurídico como expressão de ação política para a criação
do tipo de curso citado considerado necessário na realidade brasileira e alguns
princípios teóricos relativos ao tema das análises de necessidades e das etapas de vida
profissional na área da educação. Na sequência estão: a descrição do cenário da
pesquisa, explicitação dos procedimentos e os resultados obtidos nessa primeira
abordagem sobre esse lugar de formação.

1. O cenário legal e alguns princípios orientadores


Os cursos de mestrado profissionalizante compõem parte do que está expresso na
Lei 9394/96 (BRASIL, 1996) em seu artigo 44, inciso III que regulamenta os cursos de
pós-graduação abertos a candidatos diplomados em cursos de graduação atendendo as
exigências das instituições.
Além dessa regulamentação genérica, a Portaria nº 17, de 28 de dezembro de 2009
(BRASIL, 2009) regulamenta especificamente a criação de tais cursos
profissionalizantes estabelecendo seus contornos: desenvolver atividades e trabalhos
técnico-científicos em temas de interesse público bem como áreas e demandas latentes
na formação, atender áreas mais diretamente vinculadas ao mundo do trabalho cuidando
da natureza e especificidade de conhecimento científico e tecnológico a ser produzido
também com relevância social.
A partir dessa regulamentação, o número e a variedade de cursos desse tipo, em
diferentes áreas do conhecimento, passaram a crescer em propostas por todo o país,
dado que parece ser um indicador de que se trata de uma resposta política a
necessidades formativas latentes, de fato, na sociedade brasileira, incluindo a área da
educação que por muitos anos foi resistente à sua implantação, o que não cabe discutir
neste momento. Interessa, aqui, a explicitação de uma amostra das necessidades
formativas apresentadas pelos candidatos aprovados e de que modo, mediante suas
manifestações, se pode, entre outros pontos, identificar a concordância ou discordância
em relação a tais princípios legais.
Outros princípios relativos às necessidades formativas podem ser identificados no
trabalho de Rodrigues e Esteves (1993) os quais, apesar de abrangerem situações
relativas a professores, são adequados ao material de que se dispõe, pois, como será
visto, são profissionais, muitos deles professores, envolvidos com atividades educativas
não apenas as da docência.
50

Um ponto de partida inicial apresentado pelas autoras é a relevância do aspecto


pedagógico quando das análises de necessidades formativas mais do que instrumento
técnico de planejamento, embora este não esteja descartado. O foco principal está na
formação necessária a ser garantida, uma formação conceituada como contínua devido
ao fato de os sujeitos da formação serem profissionais já em exercício, objetivo que
pode ser facilitado em sua consecução devido ao mapeamento dessas necessidades.
Como decorrência, são centrais as situações para possibilitar as manifestações dos
interessados.
Marcelo (1999), após citar diferentes definições sobre o desenvolvimento
profissional, faz uma síntese de aspectos principais a partir da contribuição de Howey1.
Dentre eles também considera o desenvolvimento pedagógico como aquele que deve
estar em primeiro lugar, embora em perspectiva diversa daquela defendida pelas autoras
portuguesas. Elas falam do aspecto pedagógico pela sua relevância aos profissionais,
mais do que pelos detalhes, importantes, mas secundários sobre o planejamento.
Marcelo fala do pedagógico colocando no centro do processo as questões relativas ao
aperfeiçoamento dos professores para o ensino considerando as questões de currículo, as
competências instrucionais e de gestão (p. 138). Além do princípio citado, são ainda
relevantes para este estudo, devido ao seu ambiente de formação no curso aqui
focalizado, outras funções do processo: conhecimento e compreensão de si mesmo,
desenvolvimento cognitivo, desenvolvimento teórico, desenvolvimento profissional e
desenvolvimento da carreira (p. 138).
Nesse sentido é possível acrescentar que a proposta do curso responde a vários
princípios ao ofertar possibilidades em duas entradas que vêm se manifestando cruciais
na área da educação no Brasil – ensino e gestão em relação à inovação – nas quais,
apesar da quantidade de produção acadêmica relatada na introdução, há um cenário bem
crítico tanto na educação básica quanto na superior.

2. O cenário do estudo, procedimentos e alguns resultados preliminares


2.1. O curso
O estudo aqui relatado baseia-se em dados obtidos com alunos de um curso
recentemente aprovado de Mestrado Profissionalizante em Educação criado em 2013 no
Centro Universitário de Araraquara. Destinado a formar profissionais da área

1
Trata-se do texto de Howey, K. Six major functions of staff development: an expanded imperative.
Journal of Teacher Education, vol. 36, n. 1, p. 58-64, 1985.
51

educacional com foco nos processos de ensino, gestão e inovação, o curso teve sua
primeira turma constituída no início de 2014, quando foram aprovados vinte e cinco
candidatos para tais vagas ofertadas. Até o momento (julho de 2014) cursaram duas
disciplinas obrigatórias, uma das quais se dedica ao estudo de algumas bases para
elaboração dos projetos de pesquisas.
No decorrer do semestre, em diversas situações instalou-se, deliberadamente, o
debate com os alunos sobre as angústias, preocupações e necessidades de enfrentar
problemas vigentes no dia a dia de suas funções, oportunidades preciosas para a coleta
das informações de acordo com os princípios apresentados no item anterior para
possibilitar o atendimento às necessidades formativas de modo a que se garanta o
esforço pedagógico próprio para a solução.

2.2. Procedimentos para coleta e análise


Neste estudo, a abordagem para a coleta se aproxima muito da proposta relatada
por Rodrigues e Esteves (1993) quando explicitam perspectivas daqueles que exprimem
suas necessidades. Trata-se da abordagem pela procura da formação, embora de modo
um pouco diferente. As autoras referem-se às instituições que recebem os interessados
na formação e aos arquivos a serem disponibilizados à pesquisa enquanto, neste caso,
foram os próprios interessados a manifestar seus interesses e características sem a
mediação institucional. No trabalho das autoras portuguesas, entretanto, os sujeitos da
pesquisa eram professores, sujeitos que já povoam outros estudos sobre necessidades
educativas a ponto de haver toda uma produção sobre modelos de investigação e
concepções variadas. Neste estudo não temos tal aporte e, portanto, pode-se considerá-
lo um estudo de natureza exploratória tanto pelos profissionais que acorreram ao curso
quanto pelo cenário da pesquisa, ainda inexplorado como lócus de investigação. Estou
aceitando, neste caso, as considerações de Selltiz et al.(1965) no primeiro dos objetivos
que apontam para um estudo exploratório: adquirir familiaridade com um fenômeno ou
obter novos discernimentos sobre o foco até mesmo para formular problemas mais
precisos ou desenvolver hipóteses futuras (p. 61).
Com tais definições, foram colhidas informações por meio de relatos verbais e
pequenos textos escritos de forma livre a partir de estimulação verbal. Os relatos
ocorreram em várias circunstâncias ao longo do semestre, inclusive após algumas
leituras de base sobre pesquisa educacional.
52

Após as coletas sobre tipos de atuação profissional, tempo de atuação e os


problemas enfrentados que constituem interesses como focos de estudo – uma
característica nuclear desse tipo de curso – as informações foram analisadas e agrupadas
em conjuntos explicitados em um quadro básico cujas análises são apresentadas na
sequência.

2.3. Resultados
A primeira análise realizada permitiu a constituição de oito grupos com atuação
profissional similar. Tais grupos estão caracterizados no Quadro 1 em relação à
frequência de incidência e tempo de exercício. As demais informações estão articuladas
nas análises gerais com as inquietações manifestas.

Quadro 1: Caracterização dos alunos quanto às funções e tempo de atuação

Grupo Atuação profissional N Tempo de magistério


1 Funções administrativas 4 15 a 20 anos
2 Assessoria pedagógica 2 mais de 20 anos
3 Ações com alunos da escola pública 2 4 e 5 anos
4 Docência na ed. Básica 2 5 e 15 anos
5 Docência na ed. Básica e no ens. Superior 2 5 e 15 anos
6 Gestão da ed. Básica 8 de 5 a mais de 20 anos
7 Gestão e docência na ed. Básica 2 5 e 10 anos
8 Gestão da ed. Básica e docência no ens. Superior 3 mais de 20 anos
Fonte: informações coletadas pela autora

Verifica-se, nesse Quadro 1, a principal incidência de funções, qual seja a gestão


da educação básica, com profissionais experientes entre cinco a mais de vinte anos, o
que significa pessoal não iniciante, segundo os critérios apresentados por Huberman
(1992) em seu texto sobre ciclo de vida profissional de professores.
Na sequência estão “funções administrativas” variadas presentes nas
manifestações de quatro dos sujeitos, profissionais experientes com 15 a 20 anos de
exercício profissional.
O terceiro grupo é composto por três profissionais que exercem, ao mesmo tempo,
gestão na educação básica e docência no ensino superior com tempo de exercício desde
5 até 20 anos. A seguir vêm cinco grupos com atuações variadas em todos eles está a
incidência de duas experiências. O que varia nesse grupo, além do tipo de atuação é o
tempo de exercício profissional, pois existem sujeitos com 4 a 5 anos de experiência até
alguns com mais de 20 anos.
53

Esses dados são importantes para pensarmos em algumas possibilidades de


hipóteses a serem aventadas ao final considerando que não há nenhum agrupamento que
possa se considerar totalmente iniciante; o que mais se aproxima são dois alunos que
desenvolvem algum tipo de ação2 com alunos na escola pública durante 4 e 5 anos e
alguns que se dedicaram a funções de docência, também com 5 anos de experiência.
Esses alunos estão distribuídos pelas faixas dos 30 aos 50 anos de idade. Suas
formações iniciais estão apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1. Formação inicial dos alunos


Formação inicial N
Pedagogia 5 alunos
Letras 2 alunos
Educação Física 2 alunos
Geografia 1 aluno
Diversas graduações 15 alunos
Fonte: Informações coletadas pela autora.
Como se pode observar nessa Tabela 1, as formações são extremamente variadas
com poucas que se repetem isoladamente: Pedagogia com incidência de cinco alunas,
Letras com incidência de duas alunas, Educação Física com incidências de dois alunos e
Geografia com uma aluna. As demais formações têm incidências baixas, alguns com
combinações variadas e por isso nem podem ser chamadas de formações iniciais porque
se mesclam chegando ao extremo de um aluno que possui cinco cursos superiores.
Dentre esses temos: Administração (4), Engenharia (1), Processamento de dados (2),
Tecnologia em Informática (2), Biologia (1), Filosofia (1), Direito (2), Tecnologia em
Processamento de Dados (1), várias licenciaturas (1). Vários dentre esses 15 com baixa
incidência têm mais de uma formação, alguns com 5, como é o caso de um aluno com
várias licenciaturas.

Principais inquietações descritas pelos participantes dos grupos


Após as várias possibilidades de manifestação dos alunos sobre suas
inquietações e necessidades de solução dos problemas enfrentados foi possível fazer
uma síntese apresentada a seguir.

2
Um aluno desenvolve ações relacionadas a atividades esportivas e outro aluno atua como orientador
educacional na mediação entre escola e instituições que abrigam alunos infratores.
54

O grupo 1, dedicado a funções administrativas, manifestou ter conhecimento


limitado da estrutura, do funcionamento ou da avaliação institucional do local em que
atuam, mesmo com tanto tempo de serviço, indicando interesse, portanto, em estudar
focos relativos a esse tema.
Já o grupo 2 apontou dificuldades na condução da formação continuada dos
professores sob sua responsabilidade devido ao conhecimento limitado de ações ou
projetos implantados nas redes em que atuam e que se encontram sob sua
responsabilidade, pois atuam na assessoria pedagógica de escolas.
O grupo 3, composto por duas pessoas, conduzem ações desenvolvidas, em sua
maioria, com alunos da rede pública e apresentam conhecimento limitado da legislação
e ou objetivos dessas ações nas áreas em que atuam precisando, portanto, desenvolver
estudos para melhor condução das atividades.
O grupo 4 é composto por duas pessoas que atuam na docência da educação
básica, as quais manifestaram dificuldade diversa. Uma das professoras disse ter
conhecimento limitado do segmento em que atua e a outra está com dificuldade, mas
tem interesse, para sistematizar um procedimento que utiliza há mais de quinze anos.
Conhecimento limitado da finalidade de algumas ações centrais desenvolvidas na
escola e necessidade de se “aperfeiçoar” os materiais didáticos que utiliza são as
questões apontadas por dois professores que atuam simultaneamente na educação básica
e no ensino superior, embora sejam de áreas distintas. Eles compõem o grupo 5.
Algumas políticas educacionais; formação em serviço de professores; gestão dos
recursos estruturais da escola e gestão das pessoas, no caso a equipe de professores, são
as preocupações do maior grupo de alunos, qual seja, o grupo 6, pois todos eles atuam
na área da gestão da escola básica e reclamam acréscimos de conhecimentos, pois os
deles são limitados.
O grupo 7 conta com dois alunos que atuam simultaneamente na gestão e na
docência da escola básica. Um deles se ressente de conhecimento limitado para
elaboração de materiais didáticos e o outro precisa de maior conhecimento sobre
algumas políticas educacionais para o desenvolvimento de seus trabalhos.
O grupo 8 também trabalha com gestão e docência: gestão na escola básica e
docência no ensino superior. Apresentaram como necessidades formativas o parco
conhecimento limitado sobre avaliação institucional; conhecimentos para a formação
em serviço da equipe de professores sob sua responsabilidade e necessidade de
conhecimento relativo ao destino dos alunos do curso de Pedagogia.
55

Essas manifestações feitas nesse período inicial do curso serão orientadoras da


continuidade no segundo semestre do curso para dar suporte à elaboração final do
projeto a ser desenvolvido. Nesse momento passarão a ter seus orientadores definitivos
para que, com essa base inicial, possam caminhar mais rápido e com maior segurança.

Algumas considerações
Um estudo caracterizado como exploratório não exige considerações finais de
encerramento. Sua natureza é a de explorar, como o próprio nome está esclarecendo.
Neste caso considerou-se que poderia ser uma forma de adquirir maior familiaridade
com o tema básico num curso novo que focaliza o ensino e a gestão na relação com a
inovação, ou seja, no combate aos problemas enfrentados pelas escolas. Desse modo,
percebeu-se o potencial das ações para tal finalidade, qual seja, a de descobrir idéias e
discernimentos para o desenvolvimento dos trabalhos de pesquisa. Como se verificou na
síntese apresentada, o teor das manifestações esteve o tempo todo voltado para o
aspecto pedagógico seja para o desenvolvimento profissional deles próprios seja para
que possam desempenhar suas funções voltadas para o desenvolvimento profissional de
profissionais aos quais eles precisam ajudar no desempenho de suas funções de ensino e
gestão.
Assim, os que procuram os cursos constituem parte fundamental no conjunto, pois
o princípio de que as questões deles compõem o núcleo acadêmico profissional do curso
é representativo das reais dificuldades enfrentadas pela educação brasileira mediante as
quais se buscam fundamentos para a reflexão e proposição de soluções e de auxílios.
Com tais ações de formação e envolvimento, se apropriam do processo de produção de
seu próprio trabalho desenvolvendo tecnologia por seu próprio esforço no
enfrentamento de suas tarefas.
Além disso, a análise das necessidades formativas submetidas à reflexão pode
permitir a constituição de um inventário de problemas, de dificuldades e suas soluções a
partir de dentro das instituições, na esteira das expectativas presentes na portaria
anteriormente citada permitindo identificar que há concordância com os objetivos da
mesma. A partir da continuidade das ações previstas para o curso de mestrado
profissional em educação, e com base nessa primeira coleta de informações, várias
hipóteses e estudos podem ser desencadeados como os que investiguem razões pelas
quais gestores educacionais ou assessores pedagógicos – que têm como uma de suas
principais atribuições a formação em serviço dos profissionais sob sua responsabilidade
56

– manifestam limitações para tal apesar de longa experiência ou, porque a maioria dos
alunos afirmam ter conhecimento limitado da políticas educacionais ou ações centrais
em seu cotidiano.

Referências
BRASIL. Lei 9394/1996 que Institui as Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Brasília, 1996.

BRASIL. Portaria nº 17 que Regulamenta a Criação de Cursos de Mestrado


Profissionalizantes. Brasília, 2009.

GATTI, B. A. Análise das políticas públicas para formação continuada no Brasil na


última década. Revista Brasileira de Educação, vol.13, no.37, p.57-70, Abr/2008.

HUBERMAN, M. O ciclo de vida profissional dos professores. In: NÓVOA, A. Vidas


de professores. Porto: Porto Editora, 1992, p. 31- 62.

LÜCK, H . Perspectivas da gestão escolar e implicações quanto à formação de seus


gestores. Em Aberto, Brasília, v. 17, p. 11-34, 2000.

MARCELO, C. Formação de professores- para uma mudança educativa. Porto: Porto


Editora, 1999.

MARIN, A. J. Educação continuada: introdução a uma análise de termos e concepções.


Cadernos Cedes, n. 36, p. 13-20, 1995.

PARO, V.H. Formação de gestores escolares: a atualidade de José Querino Ribeiro.


Educação & Sociedade, vol.30, no.107, Campinas, Mai/Ag. 2009

RODRIGUES, A.; ESTEVES, M. A análise de necessidades na formação de


professores. Porto: Porto Editora, 1993.

SELLTIZ, C. et al. Métodos de pesquisa das relações sociais. São Paulo:


Herder/EDUSP, 1965.

VIEIRA, S. L. Política(s) e gestão da educação básica: revisitando conceitos simples.


Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v. 23, p. 53-69, 2007.
57

Comunicação

O planejamento educacional brasileiro: da tecnocracia à ação pública

Alessandra Martins Constantino Cypriano


Elisangela dos Santos de Oliveira
UFES/PPGE/NEPE/CAPES

Resumo: Desdobramento da pesquisa de Mestrado em Educação, este texto evidencia o


caráter da regulação operada sobre a prática do planejamento educacional no contexto
ambíguo do início do século XXI sinalizando a emergência de múltiplos atores em torno
do PNE (2011-2020). Para tanto, adota a orientação teórico-metodológica de que para
investigar a “coisa em si” e compreendê-la, é necessário considerar a lógica da
totalidade. Leva-se em conta, para efeito de análise, os anos 1990 e 2000. Nesse
entendimento, recupera a trajetória de construção do Plano Nacional de Educação
(PNE) no Brasil e destaca os atores envolvidos nesse processo com enfoque nos anos
2000. Conclui que, no atual momento, embora o país vivencie uma relevante
experiência democrática, o planejamento das políticas educativas demonstra um caráter
profundamente fragmentário e complexo em virtude dos diferentes atores, e
consequentemente dos diversos interesses, muitas vezes díspares, envolvidos nesse
processo.
Palavras-chave: Planejamento Educacional; Plano Nacional de Educação; Ação
Pública.

1 INTRODUÇÃO
Este texto tem por objetivo analisar a prática do planejamento educacional, o qual inclui
formas de participação de diversos atores sociais na ação de planejar a educação, no
início do século XXI. Considera, para tanto, em linhas gerais, o período de 1930 a 1985
tendo em vista a trajetória de construção do Plano Nacional de Educação. Reconhece
que tal movimento de formulação das políticas públicas não se dá de maneira unívoca
de/para, mas se coaduna às lutas, às resistências e às formas de produção objetiva da
existência humana.
Como já fora sinalizado, trata-se de parte de uma pesquisa bibliográfica e documental
mais ampla realizada em função do Mestrado em Educação apoiada em fontes
58

secundárias e primárias. Para análise das fontes, apoiou-se nas contribuições de Kosik
(1976) de que para investigar a “coisa em si” e compreendê-la é necessário considerar a
lógica da totalidade. Tal procedimento articulou-se, dentre outros critérios, à perspectiva
de análise das políticas educativas de Barroso (2004); Delvaux (2009); Maroy (2011);
perspectiva esta que salienta a emergência de novos marcos regulatórios.
Sendo assim, o ponto de partida para a análise aqui empreendida assenta-se no conjunto
de reformas implantadas na educação brasileira nos anos 1990 e 2000, período em que
ocorrem transformações importantes no campo político, econômico, social e
educacional que sinalizam, de alguma forma, modificações estruturais no processo
produtivo da sociedade. Estas transformações, por seu turno, incidiram sobre o
planejamento educacional tendo em vista a inserção do Brasil no projeto econômico
capitalista global.
Sob esta lógica, tornou-se mais acentuado a presença de discursos pautados na
eficiência e na produtividade como forma de modernizar o Estado brasileiro
combinados com políticas de cunho democráticas, como a expansão da oferta escolar,
sobretudo do ensino fundamental; a celebração da diversidade em suas diferentes
clivagens1 (étnicas, sexistas, culturais e etc.); as conquistas no que diz respeito à
participação da sociedade civil na experiência de elaborar um Plano Nacional de
Educação por meio de fóruns e conferências. Ao mesmo tempo, observa-se o fomento
de políticas que buscam a inserção do país no contexto da globalização, sob o apelo de
modernizar a gestão pública e privada para atender à nova reestruturação do capital.
Nessa configuração, Ferreira e Oliveira (2009) advogam que a expansão do ensino
fundamental sofreu um processo de massificação, pois, imputou-se à escola, dentre
outras incumbências, a responsabilidade de gerenciar a pobreza e garantir às famílias
pobres acesso aos programas de assistência à pobreza via matrícula e outros
condicionantes.

2 REGULAÇÃO E AÇÃO PÚBLICA: APONTAMENTOS E CONCEPÇÕES


Tal qual ponderou Moraes (2009), testemunha-se um contexto que relativiza a ciência e
a verdade. Entretanto, sustenta-se a existência de uma base uma base material e objetiva

1
As discussões sobre essas clivagens, obviamente, são importantes; todavia, acredita-se que tais aspectos
devam ser analisados sob a lógica da totalidade e da justiça na perspectiva radical, considerando a
prioridade ontológica do trabalho e, portanto, do humano. Parte-se do pressuposto de que é impossível ao
ser humano exercer seus direitos políticos e civis, de modo pleno, se antes não lhe estiverem assegurados
os direitos econômicos (ESTÊVÃO, 2004).
59

sobre a qual o ser humano se apoia para produzir e tecer todas as suas relações. Sobre
esta base situa-se uma dimensão superestrutural, sob a qual se fixam dois grandes
planos como destaca o pensador italiano Gramsci (1982): a sociedade civil (forjada por
um conjunto de organismos denominados “privados”) e a sociedade política ou Estado
(marcada por sua função “hegemônica” em que o grupo dominante exerce sobre toda a
sociedade). Enquanto instância política que expressa as ambiguidades e os conflitos das
relações sociais desiguais e de exploração, o Estado ajusta as relações buscando
minimizar os desequilíbrios que emergem das relações sociais, fundamentalmente,
desiguais.
A constatação da emergência de um novo contexto regulatório se assenta nessa
perspectiva. Desse modo, no cenário contemporâneo, enquanto se contempla o
surgimento de grandes grupos econômicos, de nações e de pessoas tentando exercerem
o domínio uns sobre as outros, celebra-se, em certa medida, a diversidade, haja vista um
intenso processo de migração e de circulação de pessoas pelo mundo. Não obstante, a
globalização do capital, a fragmentação e a focalização vividas pela sociedade desde o
último quartel do século XX, culminaram em um contexto de profundas incertezas
decorrentes do estranhamento do homem em relação aquilo que o constitui: o trabalho.
Diante das mudanças estruturais ocorridas especialmente nos últimos 20 anos no que
concerne à relação entre Estado e sociedade civil, os conceitos de regulação2 e ação
pública ganham destaque face o caráter complexo e flexível decorrente da
multiplicidade de atores em torno de processos decisórios. Na ação pública são
consideradas, simultaneamente, as ações das instituições públicas e as de uma
multiplicidade de atores, públicos e privados, provenientes tanto da sociedade civil
quanto da esfera estatal agindo conjuntamente, em ritmo de múltiplas interdependências
em nível local, nacional e global a fim de produzirem formas de regulação das
atividades coletivas (MAROY, 2011; DELVAUX, 2009).
Gohn (2003) evidencia esta assertiva. Para autora, ao final dos anos 1990 emergem
vários movimentos sociais no país: movimentos dos caminhoneiros, dos homossexuais,
dos afro-brasileiros, dos indígenas, dos ecologistas, dos moradores de rua, movimento

2
O conceito de regulação é imprescindível à categoria ação pública, salienta Maroy (2011). Oriundo da
biologia, o termo regulação ganhou precisão conceitual nos anos 1970 sob a influência do pensamento
estrutural-marxista na Escola Francesa. A sociedade é vista como um corpo autorregulável. Nessa lógica,
a ideia não precede às interações e produções humanas, a sociedade também não segue a mesma dinâmica
do corpo biológico, mas existe uma dinâmica conflituosa na produção das regras do jogo social.
60

contra a violência urbana, movimentos populares de natureza heterogênea (moradia,


saúde, educação), além dos movimentos internacionais anti-globalização3.
Amalgamados aos novos movimentos sociais, destaca-se a configuração do federalismo
no Brasil e as discussões relativas à educação escolarizada. Nessa lógica, o processo do
planejamento tornou-se profundamente complexo, uma vez que pressupõe a negociação
e a tomada de decisões políticas entre os entes federados e os setores sociais.
Deste modo, a ação pública apresenta uma feição de não ser conduzida somente pelo
Estado unificado, mas sob uma multiplicidade de atores que apresentam interesses
díspares oriundos tanto da esfera pública quanto da esfera privada. O Estado não é mais
o único ator público, no sentido de que também não é só estatal, pois se apresenta como
um parceiro da relação. Por isso, entende-se que o planejamento das políticas educativas
é o resultado de um conjunto de conflitos, de arranjos, de compromissos onde intervém
uma diversidade de atores públicos e privados evidenciando novas formas de relação
entre Estado e sociedade civil. Em que pese o fato destes espaços serem requeridos pela
sociedade civil, é nesse cenário que os fóruns de cidadãos e dispositivos de participação
ganham relevo e importância.

2.1 O PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DA REGULAÇÃO


BUROCRÁTICA: A PREVALÊNCIA DA TECNOCRACIA
Ferreira (2013), estudiosa da temática no Brasil, tece considerações relevantes acerca do
planejamento estatal brasileiro, suas implicações no campo educacional e as
configurações assumidas no contexto do século XX e XXI, especialmente no período de
reforma do Estado brasileiro. Na análise, aborda o planejamento segundo as seguintes
premissas: o planejamento é um mecanismo de intervenção do Estado; o planejamento,
além de ser uma técnica de alocação de recursos, revela a correlação de forças do
sistema capitalista; as possibilidades da ação de planejar ou de se criar um plano são
dadas mediante caráter técnico-administrativo, fiscal e político do Estado e,
especialmente, pelo grau de participação da sociedade civil.
Sob este olhar, entende-se que um plano (seja de organização ou de desenvolvimento da
educação) além de ser um instrumento técnico, traz consigo orientações político-

3
Segundo Gohn (2003) uma das características marcantes dos movimentos sociais anti-globalização
ocorridos entre 1998 e 2002 foi a heterogeneidade. Destacam-se, dentre as entidades que participaram das
manifestações: organizações religiosas, organizações ambientalistas, movimentos anarquistas,
movimentos pelos direitos humanos, ONGs, movimentos rurais, sindicatos, organização de empresários e
movimentos estudantis.
61

ideológicas. As metas de um plano de governo, nem sempre se sustentam devido a


própria natureza do planejamento, a qual é perpassada e constituída de ocorrências
conjunturais imprevisíveis, oriundas da economia, dos mercados interno e externos, e
também pela interferência de grupos organizados da sociedade civil que reivindicam
seus interesses. Assim, um plano nacional de educação [e o movimento de discussão e
preparação desse plano, seja mais ou menos participativo] confronta-se com questões
referentes à organização federativa e aos processos geográficos, socioeconômicos e
culturais distintos entre os entes federados. Em suma, o planejamento é uma das
estratégias utilizadas para imprimir racionalidade ao papel do Estado e institucionalizar
as regras do jogo na administração das políticas governamentais (FONSECA, 2013).
Nessa esteira conceitual, observa-se a trajetória de construção de um plano nacional de
educação reputando-se ao “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, de 1932. A
proposta dos educadores alertava que a educação devia ser abordada como problema
nacional. Propôs-se, então, a criação de um “plano científico” para executar a política
educacional, demanda incorporada na Constituição Federal de 1934. Esta incumbiu o
Conselho Nacional de Educação de elaborar o primeiro Plano Nacional de Educação,
sendo enviado um anteprojeto à Presidência da República em maio de 1937. Com a
instalação do Estado Novo, momento de profunda centralização política, o projeto
sequer chegou a ser discutido.
A tentativa seguinte de elaboração de um Plano Nacional de Educação se deu por
determinação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 4.024, em
1961, atribuindo ao Conselho Federal de Educação a responsabilidade por sua
elaboração. Dessa maneira, segundo Horta (1982), em 1962, o Conselho Federal de
Educação apresentou um documento com metas quantitativas e qualitativas a serem
executadas em oito anos. Porém, a ditadura de 1964 e a instauração de um período
fundamentalmente centralizador promoveram a revisão do documento e interferiram na
materialização do Plano Nacional de Educação.
À luz de Maroy (2011), entende-se que desde os anos 1930 até início dos anos 1990
vigorou no Brasil o desenvolvimento de uma regulação burocrático-profissional. Nessa
conjuntura, a oferta educativa foi organizada de forma preponderantemente centralizada
e apoiada em normas mais ou menos uniformes para todos os componentes do sistema
por parte de um Estado centralizador. A ausência de participação da população
brasileira nos processos decisórios também pode ser observada no período destacado.
Durante quase um século, o país vivenciou sua primeira experiência democrática em um
62

curto espaço de tempo, de 1946 a 1964, com a ressalva de que analfabetos não votavam
e de que o país vivenciara média de três séculos de escravidão (CUNHA, 1991;
MARTINS, 2011).
Endossando a perspectiva dos autores supracitados, Ferreira (2013), Trigueiro (1976),
Horta (1982) destacam a preponderância de uma estrutura tecnocrática na organização
pública nos anos 1930 e especialmente no período da ditadura militar. A estrutura
tecnocrática era composta de um corpo de especialista, cuja função principal era
analisar, planificar e controlar o trabalho dos outros elementos da organização pública a
fim de contribuir para acumulação do capital.

2.2 O PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO E OS MÚLTIPLOS ATORES NO


LIMIAR DO SÉCULO XXI
A outra ocasião em que se empreendeu um movimento no que tange à elaboração do
Plano Nacional de Educação se deu no contexto da abertura democrática e fora
ratificada pela Constituição Federal de 1988. Esta, por seu turno, no Artigo 212, indicou
que os recursos financeiros para a educação deveriam ser distribuídos nos termos do
plano nacional de educação. Visando à articulação e ao desenvolvimento do ensino em
seus diversos níveis e à integração das ações do Poder Público, a mesma Carta Magna,
no Artigo 214, determinou que o plano nacional de educação, de duração plurianual,
deve ser estabelecido por lei.
Assim, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9.394 de 1996 no
Artigo 9º estabelece enquanto competência da União a elaboração do Plano Nacional de
Educação em colaboração com os Estados, com o Distrito Federal e com os Municípios.
Estabeleceu-se, ainda, no bojo da LDB que a União deveria encaminhar o Plano ao
Congresso Nacional um ano após a publicação da citada lei, com diretrizes e metas para
os dez anos posteriores, registra o Artigo 87.
Apesar dos antagonismos entre o projeto da sociedade civil e o projeto do governo no
contexto de participação restrita dos anos 1990, em 2001, o presidente Fernando
Henrique Cardoso sanciona a Lei nº 10.172. Institui-se, desse modo, o Plano Nacional
de Educação com vigência de 10 anos. O documento apresenta um histórico da
educação brasileira seguido pela definição de objetivos e prioridades gerais com quase
três centenas de metas a serem alcançadas durante os dez anos de vigência.
A implementação, o monitoramento e a avaliação das metas do PNE/2001 se deu na
gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010). Desta maneira, oito dos dez
63

anos de vigência do PNE/2001 transcorreram nos dois mandatos do governo Lula.


Apesar dos programas criados nesta gestão apresentarem caráter focalizado aos mais
vulneráveis e receberem profundas críticas da comunidade acadêmica, não se pode
negar que iniciou-se nesta gestão um processo de transferência de renda aos mais
carentes. Além disso, no âmbito político, tal gestão imprimiu um caráter mais
democrático às relações sociais, abrindo espaço para o diálogo.
A título de exemplo destaca-se a Conferência Nacional de Educação (CONAE). Para
tanto, criou-se uma comissão organizadora, composta pela representação de 34
entidades civis4, cujos membros foram designados pelo ministro da educação Fernando
Haddad. Por ocasião da Conferência instalou-se no país um ciclo de conferências
municipais e estaduais no primeiro e segundo semestre de 2009 que deu início ao
processo participativo resultando na realização da CONAE no período previsto
(CONAE, 2010).
Enquanto deliberação da CONAE/2010, criou-se também o Fórum Nacional de
Educação, instituído pela Portaria nº 1.407/2010 como um espaço de interlocução entre
Estado e sociedade civil, sendo este, por sua vez, produto de reinvindicação histórica da
comunidade educacional e fruto de deliberação da CONAE. Conforme a Portaria nº
1.407/2010, em seu Art. 2º, incisos I a VII, (MEC, 2010, p. 24), o Fórum tem, dentre
outros funções, a responsabilidade de:
I - Participar do processo de concepção, implementação e avaliação da
política nacional de educação;
II - Acompanhar, junto ao Congresso Nacional, a tramitação de projetos
legislativos referentes à política nacional de educação, em especial a de
projetos de leis dos planos decenais de educação definidos na Emenda à
Constituição 59/2009;
III - Acompanhar e avaliar os impactos da implementação do Plano Nacional
de Educação;

Face à profunda fragmentação vivenciada nos dias atuais, este Fórum é composto por 35
segmentos da sociedade civil, entre eles: a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays,
Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT); a Associação Brasileira das
Universidades Comunitárias (ABRUC); a Comissão Assessora de Diversidade para
Assuntos Relacionados aos Afrodescendentes (CADARA); a Comissão Nacional de
Educação Escolar Indígena (CNEEI); a Confederação Nacional da Indústria (CNI); a

4
Dentre os segmentos que participaram da CONAE, destacam-se: as Centrais Sindicais dos
Trabalhadores, a Confederação dos Empresários e do Sistema “S”, o Movimentos de Afirmação da
Diversidade, a Entidades de Estudos e Pesquisa em Educação, a Representação Social do Campo e
Órgãos e Secretaria do governo.
64

Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC); a Comissão


de Educação, Cultura e Esporte - Senado Federal (CEC); Conselho Nacional de
Educação (CNE); a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE); a
Confederação Nacional das Associações de Pais e Alunos (CONFENAPA); o
movimento Todos Pela Educação (TPE) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST).
Embora o país esteja experimentando o início de um processo democrático, testemunha-
se a profunda fragmentação da sociedade vivenciada nas últimas décadas. Entende-se
que o processo de fragmentação das relações humanas na atualidade provém da própria
segmentação do humano. Nesse sentido, impulsionada pelas indagações de Oliveira
(2011b), reflete-se: que razões levaram amplos setores da sociedade civil, com
interesses tão díspares - do público ao privado, do laico ao religioso, do profissional ao
patronal, entre outros - a se conectarem na defesa da construção de um Sistema
Nacional de Educação? A resposta a tal questão não pode ignorar os processos de
exploração e de conflitos que se desenvolveram no projeto de sociedade criado pela
humanidade; os obstáculos que o regime federativo - tal qual o brasileiro - impõe à
gestão e à organização da educação; a insistência da desigualdade e dos desequilíbrios
históricos entre regiões.
No cenário globalizado, o multiculturalismo e a diversidade ganharam centralidade nas
discussões atuais ao invés da justiça radical, haja vista a preponderância do acentuado
discurso relativista e ceticista. A esse respeito, parte-se da premissa que o estágio de
alienação sob o qual o homem se encontra, interfere também em sua ação criativa e na
relação que estabelece com a natureza e com o outro. O fato de o homem não se
reconhecer naquilo que produz, porque não tem chance de se apropriar dos bens
históricos e simbólicos produzidos historicamente, promoveu uma espécie de ruptura
entre o criador (o gênero humano) e criatura (o objeto, a coisa em si). A criatura passa a
definir o criador e ganha vida própria.
Tal processo alcança também o gênero humano, pois submetidos a esta lógica (criada
por nós), a relação com o outro também se altera fundamentalmente. O outro também se
transforma em coisa. Assim, não nos percebemos mais como produtos da natureza e da
relação com o outro, portanto, seres produzidos na cultura e produtores de cultura. No
fundo, o homem parece ter se perdido de si mesmo. Tal análise não implica em dizer
que a igualdade pressupõe o abafamento da diversidade. Pelo contrário, a reconhece,
65

mas não ignora as condições objetivas necessárias à subsistência e, portanto,


imprescindíveis à ação criadora do homem (DELLA FONTE, 2007).
Apesar da instauração dos novos marcos regulatórios evidenciar mudanças na relação
entre Estado e sociedade civil dadas as transformações no sistema econômico, a
CONAE/2010 constituiu-se em um importante espaço para participação social, pois,
não se observou na história do planejamento educacional brasileiro iniciativas similares
a esta conduzidas pelo Estado em articulação com a sociedade civil. Sob o objetivo de
construir o Plano Nacional de Educação (2011-2020), este espaço fora e tem sido
utilizado como objeto de estudo e deliberações, incluindo, portanto, o debate de todos
os níveis, etapas e modalidades em um Fórum de mobilização nacional.
Em suma, nesse movimento contraditório, não se pode perder de vista que o processo de
mudança reside na ação criadora do humano e nem mesmo ignorar que o conhecimento
que circula na produção e na elaboração das políticas educativas não é um mero
instrumento nas mãos dos atores mais poderosos. Existe um movimento de interseção
entre diversos fatores, os quais se interpenetram ao conhecimento validado.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No período compreendido entre as décadas de 1930 a 1980, durante o regime de
acumulação mais rígido do capital, com predomínio de um Estado centralizador,
evidenciou-se a permanência de uma regulação burocrático-profissional com restritos
espaços de participação social.
A partir dos anos 1990 é possível observar a emergência de uma regulação pós-
burocrática haja vista o caráter compósito, fragmentário e complexo na elaboração das
políticas educativas. A CONAE e o Fórum Nacional de Educação, enquanto espaços
democráticos de discussão e proposições, confirmam tal caráter. Nesse sentido, a
relativização do impacto nos momentos decisórios apresenta uma feição de não ser
conduzida somente pelo Estado unificado, mas sob uma multiplicidade de atores que
apresentam interesses díspares, atores oriundos tanto da esfera pública quanto da esfera
privada. Trata-se de uma ação que se desenvolve, simultaneamente, em cenas
interdependentes, entre atores públicos e não públicos, em cenário local, nacional e
global.
Se por um lado, verifica-se os mecanismos em voga como elementos que tendem a
mascarar as relações de classe, por outro, considerando os períodos selecionados para
análise, certifica-se que no processo de elaboração das políticas educativas, o
66

conhecimento presente nos documentos examinados - em especial nas fontes primárias


ligadas à CONAE (2010) - não se reflete como um mero objeto que se desloca em
sentido único, “de cima para baixo”, dos “produtores para os utilizadores”, mas como
um movimento contínuo de circulação, de transformação, de negociação, de conflito, de
tensão, de junção, de conexão, de interseção, de divisão e de recomposição que integra
elementos dos movimentos sociais, da academia, dos órgãos do governo, das agências
internacionais.
Nessa esteira, concluiu-se que o planejamento das políticas educacionais brasileiras tem
sido marcado por políticas governamentais e não por políticas de Estado desde os anos
1930, quando segmentos da sociedade civil se organizaram em torno de melhorias na
educação nacional, destacando-se os Pioneiros. Os limites à instalação de políticas de
Estado prosseguiram, pois o autoritarismo do Estado Novo (1937-1945), a centralidade
conferida ao pensamento tecnocrático durante a ditadura militar (1964-1985), a
descontinuidade política dos anos 1980 e início dos anos 1990, as medidas neoliberais
consumadas e levadas a termo no governo FHC (1995-2002), indicam esta constatação.
Tendo em vista o momento político atual, seus limites e possibilidades, inclusive
conjunturais com a aprovação do Plano Nacional de Educação (2011-2020), entende-se
que o país está vivenciando uma experiência democrática, embora ainda em sua gênese.
Tal processo representa um caminho na busca de romper com a tradição histórica
autoritária e aponta à possibilidade de construção, por meio da efetiva participação e
articulação entre sociedade civil e sociedade política, de políticas de Estado, as quais
devem promover o acesso pleno à apropriação das condições objetivas da vida humana.

4 REFERÊNCIAS

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regulação dos sistemas a sistema de regulações. In: Educação em Revista, Belo
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Federativa do Brasil, Brasília, 20 dez. 1996. Disponível em: <
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67

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sistema nacional de educação articulado: o plano nacional de educação, diretrizes e
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campo da educação. In: Educação e Sociedade, Campinas, vol. 30, n. 107, p. 585-607,
2009.
68

Comunicação

As fragilidades do sistema de proteção escolar do estado de São Paulo

Alessandra Simão da Costa


UNINOVE/SP

Resumo: Em meio a muitos casos de conflito e violência que tomou conto do cotidiano
escolar a Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo (SEE/SP) lança, por
meio da Resolução SE 19/10, o Sistema de Proteção Escolar, inserindo nas escolas
públicas estaduais o Professor Mediador Escolar e Comunitário (PMEC) com função de
resolver pacificamente os conflitos e desenvolver ações preventivas com foco na
educação para a paz. Foram também formulados documentos impressos para auxiliar na
implantação do sistema, bem como disponibilizado um sistema on-line de registro de
ocorrências escolares. Com base em experiência profissional, enquanto gestora do
projeto na Diretoria de Ensino de Itaquaquecetuba, observação do trabalho realizado
pela equipe de PMECs, conteúdo programático do Curso de Mediação Escolar, revisão
bibliográfica e de legislação pretendo aqui fazer uma ponderação entre teoria e prática e
demonstrar as fragilidades do Sistema de Proteção Escolar.
Palavras-chave: mediação, professor mediador, proteção escolar.

INTRODUÇÃO
Vivemos em uma sociedade dilacerada pela violência que vem fazendo parte de
nossas vidas cotidianas. Desde uma palavra ofensiva até uma agressão física que causa
não só um trauma físico, mas também psicológico, convivemos diariamente com uma
diversidade de formas de violência. Passamos a viver na insegurança, o medo tem nos
levado ao isolamento, pois confiamos cada vez menos no próximo e isso tem minado as
relações humanas.
A violência se tornou algo comum e, para Tavares dos Santos (2009, p.25), “... a
sociedade parece aceitar a violência, ou resignar-se, incorporando-a como prática social
e política normal e coletiva...”.
A sociedade atual tem vivido uma violência generalizada onde as crianças e
jovens são facilmente atraídos para o mundo do crime, encantados por uma vida fácil.
São crianças e jovens normalmente de lares socialmente vulneráveis e convivem com as
69

drogas, o alcoolismo, a violência física e moral, o abuso sexual e com a privação de


direitos primários – relações afetivas, instrumentos de lazer, saúde, segurança. Tavares
dos Santos (2009, p. 51) aponta que “... os jovens no Brasil atual representam uma
geração vitimizada, sem esperanças em relação às promessas de futuro...”.
Pinheiro e Almeida (2009, p. 35) afirmam que “... as pesquisas sobre violência no
Brasil mostram que, entre meados e fins dos anos 70, ocorreu uma mudança no padrão
da criminalidade urbana, [...] nesse período firmaram-se as redes de tráfico com alto
poder de atração sobre os jovens...”.
Porque a nossa sociedade vem se tornado tão violenta? Os processos de migração
e a urbanização acelerada com um crescimento desordenado das cidades, a
marginalização das classes mais desprovidas, a precarização do trabalho, a crise agrária,
a desigualdade social, a exclusão social, a falta de perspectivas e o desemprego
associados à ineficiência e/ou inexistência de políticas públicas de segurança são
algumas das situações comuns e responsáveis por esse processo.
A escola, como espaço de reprodução dos valores da sociedade, não se viu livre
da violência que tomou conta do seu cotidiano e vem vitimando todos os atores que ali
se encontram. Além disso, a própria
[...] massificação da educação trouxe para dentro do universo escolar um
conjunto diferente de alunos, sendo certo que a escola atual – da maneira
como está organizada e da maneira como foram formados os professores – só
está preparada para lidar com alunos de formato padrão e perfil ideal. [...]
Isso acarretou uma desestabilização da ordem interna histórica, criando assim
um campo propício aos conflitos [...] (CHRISPINO E CHRISPINO, 2011, p.
11).

Não é raro observarmos na mídia notícias de atos de vandalismo contra as


instituições de ensino, agressões verbais e físicas entre os alunos, alunos e professores,
entre professores e demais funcionários, bullying, preconceito e exclusão, tráfico de
drogas, uso de bebidas alcoólicas, entre outros.
[...] O reconhecimento da violência no espaço escolar como uma das novas
questões sociais mundiais parece ser um caminho interpretativo fecundo
desse fenômeno social caracterizado com um enclausuramento do gesto e da
palavra. Esta nova questão social mundial [...] vem evidenciando que estamos
em face de uma conflitualidade que coloca em risco a função da escola na
socialização das novas gerações [...] (OHZAKO, 1997; CHARLOT, 1997,
apud TAVARES DOS SANTOS, 2009, p. 45).

Contudo, a despeito de toda problemática envolvendo a violência escolar, a escola


ainda se constitui como o principal espaço possível para o desenvolvimento de ações
capazes de fazer alguma mudança significativa nesse cenário. “... Se quisermos,
entretanto, construir a cidadania na escola devemos reconhecer, e superar, a violência
70

institucional que passa por regulamentos, estruturas organizacionais, relações de poder


institucionalizadas...” (DEFRANCE, 1992, apud TAVARES DOS SANTOS, 2009, p.
47).
A instituição escolar, principalmente da rede pública estadual e situada em bairros
de baixa renda, há muito deixou de ser um local exclusivo de desenvolvimento
cognitivo. Hoje a escola exerce também um papel social importantíssimo: o
desenvolvimento do cidadão para o trabalho e para a vida em sociedade. “... A própria
família, em crise e em transformação, passou a delegar à escola funções educativas que
historicamente eram de sua própria responsabilidade, o que acarretou uma mudança no
perfil de comportamento do aluno...” (CHRISPINO E CHRISPINO, 2011, p. 11). No
entanto, a instituição pública de ensino vem sendo alvo de constantes críticas dos meios
de comunicação e da sociedade em geral, pois não tem obtido êxito no cumprimento do
seu papel e isso se deve, entre outros, ao fato de ter a violência presente no seu âmago.
“... Assim, de instituição encarregada de socializar as novas gerações, a escola passa a
ser vista como o ambiente que concentra conflitos e práticas de violência...” (RUOTTI;
ALVES E CUBAS, 2007, p. 26).
Mas não se pode atribuir a onda de violência escolar somente a fatores externos,
há que se considerar as condições precárias de funcionamento escolar e o clima escolar
ao qual estão submetidas as crianças e jovens – salas superlotadas, poucos ambientes de
socialização, reprodução dos modelos tradicionais de ensino, autoritarismo,
desvalorização do protagonismo juvenil, falta de espaços para discussão e diálogo,
imposição de regras e valores, aplicação de punições excludentes, professores e gestores
despreparados, desvalorizados e cansados, falta de professores e funcionários,
excessivas demandas burocráticas, defasagens idade/série, indiferença dos professores e
gestores frente aos casos de violência, falta de mediação adequada dos conflitos gerando
desde pequenas incivilidades até a violência exacerbada. “... A escola é autora, vítima e
palco da violência...” (CHRISPINO E CHRISPINO, 2011, p. 14), contudo, de acordo
com Caballero (2000) apud Chrispino e Chrispino (2011, p. 15), “... não é justo culpar a
escola pelos problemas de violência escolar – da qual é também vítima –, mas podemos
responsabilizar a instituição escolar pelas respostas que dá a estes problemas...”.
A nova realidade é que os ambientes escolares não são mais locais seguros a
quem os pais confiavam a segurança e educação de seus filhos. Nesse panorama surge o
Sistema de Proteção Escolar e Comunitária (SPEC) que passou a integrar oficialmente
os projetos da pasta da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEE/SP).
71

Com a implantação do projeto pode-se afirmar que a SEE/SP enfim admitiu que o
conflito e a violência imperam nos espaços escolares e que eles afetam diretamente os
processos de ensino e aprendizagem. Desse modo,
[...] Reconhecer a conflitualidade e a agressividade como elementos
dinâmicos do espaço escolar significa propor intervenções sobre os atos de
violência, as quais podem se dar pela satisfação da necessidade das crianças e
jovens, criando um ambiente cooperativo e humanista, induzindo
relacionamentos positivos e duradouros [...] (TAVARES DOS SANTOS,
2009, p. 49).

Com base em experiência profissional, enquanto gestora do projeto na Diretoria


de Ensino da Região de Itaquaquecetuba, observação do trabalho realizado pela equipe
de PMECs, conteúdo programático do Curso de Mediação Escolar oferecido pela
SEE/SP para os PMECs iniciantes, revisão bibliográfica e de legislação pretendo aqui
fazer uma ponderação entre teoria e prática e demonstrar as fragilidades do sistema de
proteção escolar, que parece ter sido implementado pela SEE/SP como medida
paliativa, se não uma resposta um tanto floreada à sociedade em relação às medidas
tomadas para minimizar os problemas de conflito e violência escolar. Para tanto serão
analisados os três eixos do sistema: Professor Mediador Escolar e Comunitário, o
Registro de Ocorrências Escolares e os Manuais de Apoio.

O SISTEMA DE PROTEÇÃO ESCOLAR


Oficialmente instituído pela Resolução SE 19/2010 (SÃO PAULO, 2010a), o
Sistema de Proteção Escolar passa a integrar os projetos da pasta com objetivo,
expresso no artigo 1º da citada resolução, “ de proteger a integridade física e
patrimonial de alunos, funcionários e servidores, assim como dos equipamentos e
mobiliários que integram a rede estadual de ensino, além da divulgação do
conhecimento de técnicas de Defesa Civil para proteção da comunidade escolar”.
Com a implementação do Sistema de Proteção Escolar surgiu a função do
Professor Mediador Escolar e Comunitário (PMEC), também foram elaborados e
disponibilizados manuais para auxiliar a implantação do projeto dentro das escolas –
Normas Gerais de Conduta Escolar e Manual de Proteção Escolar e Promoção da
Cidadania –, bem como um sistema on-line de Registro de Ocorrências Escolares
(ROE) onde os gestores devem apontar as ocorrências mais significativas ocorridas no
ambiente escolar.
72

A SEE/SP oferece aos PMECs iniciantes um curso on-line de Mediação Escolar e


Comunitária com o objetivo de capacitar e preparar os docentes selecionados para o
exercício das atribuições de PMEC com relação aos temas e às técnicas que compõem
as práticas relacionadas ao Sistema de Proteção Escolar, cujos tutores são os próprios
Gestores Regionais do SPEC e a carga horária total é de 78h.

O Professor Mediador Escolar e Comunitário – PMEC:


O PMEC deve exercer suas funções dentro de uma carga horária prevista em
legislação. Todas as resoluções e instruções relativas ao projeto publicadas até o
presente momento – Resolução SE 19/2010 (SÃO PAULO, 2010a), Instrução Conjunta
CENP/DHRU de 09/04/2010 (SÃO PAULO, 2010b), Resolução SE 01/2011 (SÃO
PAULO, 2011a), Resolução SE 18/2011 (SÃO PAULO, 2011b) e Resolução SE
07/2012 (SÃO PAULO, 2012a) – previram cargas horárias de trabalho possíveis de
serem compatibilizadas com as aulas regulares, já que não foi aberta a possibilidade do
professor se afastar das aulas para assumir a função de PMEC.
A Resolução em vigência atualmente – Resolução SE 07/2012 (SÃO PAULO,
2012a) – prevê as cargas de 19 horas/aulas, possibilitando ao PMEC ter mais 13 aulas
atribuídas, e 32 horas/aulas, nas quais o PMEC trabalha por hora/aula correspondente a
50 minutos cada, e não mais hora relógio como previa as resoluções anteriores,
perfazendo, respectivamente, um total de 15h50min e 26h40min distribuídos ao longo
dos cinco dias úteis da semana.
A organização da carga horária de trabalho do PMEC impossibilita ao mesmo a
dedicação exclusiva às suas funções, exceto no caso daqueles que conseguem se
adequar à carga de 32 horas/aulas, já que necessita completar a jornada com aulas e
assim, se dividir entre as duas funções. Além disso, o número de horas trabalhadas é
extremamente reduzido, assim, como dar conta de tantas demandas sabidamente
existentes, em se tratando de conflito e violência na escola, dentro de unidades escolares
com três períodos de funcionamento, abertas todos os dias por um período de 16 horas
consecutivas com uma carga horária, sem descontar aqui o período destinado às
orientações técnicas, que varia de 3h10min a 5h30m de trabalho diário?
Para tentar contornar tal situação, a SEE/SP previu, na Instrução Conjunta
CENP/DRHU de 09/04/2010 (SÃO PAULO, 2010b), a possibilidade de atribuição da
função a um segundo PMEC na mesma escola, entretanto, somente naquelas que
apresentarem no mínimo 10 turmas em funcionamento em cada um dos três turnos
73

(manhã, tarde e noite), desconsiderando que poucas escolas atendem tal perfil e que
muitas concentram quantidades maiores de turmas nos períodos manhã e tarde,
ultrapassando inclusive as 30 turmas previstas, porém, com distribuição desigual nos
três turnos. E por qual motivo a SEE/SP faria tal limitação? Não seria mais justo que a
limitação se baseasse apenas no número total de turmas sem contar os turnos?
Com relação à seleção dos PMECs, de acordo com o parágrafo 1º do artigo 7º da
Resolução SE 19/2010 (SÃO PAULO, 2010a), estes devem ser selecionados entre os
professores da rede estadual de ensino por meio de análise do perfil mais adequado à
função. Todavia, a mesma resolução impôs uma ordem que priorizava os titulares de
cargo adidos1 e os docentes readaptados2, com isso, a SEE/SP demonstrou estar mais
preocupada em promover uma ocupação para os professores que, por algum motivo
estavam sem aulas, considerando que tais professores receberiam seus proventos
normalmente, do que propriamente em selecionar candidatos com perfil adequado ao
desempenho da função de PMEC, pois ainda que os professores passassem por todo
processo de avaliação de perfil, ao serem classificados de acordo com a prioridade
prevista na resolução não era garantia de que o professor adido ou readaptado teria
perfil mais adequado que os demais.
Além disso, a citada resolução, limitando a escolha entre os professores da rede,
sem possibilidade de participação de outros profissionais no projeto, acabou levando os
Gestores Regionais e Diretores de Escola à escolha de professores que até pouco tempo
estavam envolvidos nos conflitos da sala de aula, que relatavam não estar mais
suportando ter que lidar com alunos, sem experiência ou conhecimento acerca dos
processos de mediação de conflitos e sem perfil para desenvolver uma função tão
complexa.
Percebendo talvez a necessidade de diminuir as limitações de escolha e melhorar
o perfil dos PMECs, a SEE/SP apontou na Resolução SE 01/2011 (SÃO PAULO,
2011a), em seu artigo 3º, uma nova ordem de prioridade, acrescentando em primeiro
lugar o titular de cargo docente da disciplina de Psicologia que se encontre na condição
de adido. Contudo, tal medida continua caracterizada como uma forma de alocar
aqueles professores que estão sem aulas, considerando não haver na grade curricular do
Estado de São Paulo a disciplina de Psicologia e, por isso, a existência de alguns
(poucos) professores desta disciplina adidos. Tal mudança não parece ter alcançado

1
De acordo com Decreto Estadual nº 42.966/98 (SÃO PAULO, 1998).
2
De acordo com Lei 10.261/68 (SÃO PAULO, 1968).
74

êxito em se tratando de escolha de melhor perfil para o desempenho das funções de


PMEC.
A Resolução SE 01/ (SÃO PAULO, 2011a) comprova também o afirmado
anteriormente, sobre a preocupação da SEE/SP em alocar os docentes sem aulas, ao
destacar no parágrafo 1º do artigo 3º que os professores deveriam primeiro participar do
processo de atribuição, sendo obrigados a pegar um número mínimo de aulas, e só
depois, não estando com a carga completa, é que poderiam participar dos processos de
seleção de PMEC, reduzindo ainda mais as chances de se conseguir selecionar PMECs
com perfil adequado às funções. Já o artigo 4º da mesma resolução obriga o gestor
escolar a atribuir as aulas que surgirem ao longo do ano ao PMEC, caso este tenha a
necessária habilitação para lecionar a disciplina, e assim ele deixa de exercer suas
funções, desconsiderando todo o trabalho de seleção e formação pelo qual este professor
passou e a importância de tal profissional dentro da unidade escolar.
Por fim, na Resolução SE 07/2012 (SÃO PAULO, 2012a), a SEE/SP estendeu a
possibilidade da participação no projeto de professores titulares de cargo efetivo que
estivessem enquadrados na jornada reduzida (9 horas/aulas) há mais de um ano letivo,
aumentando as chances de ter um número maior de candidatos e a possibilidade de
escolher aqueles com melhor perfil, contudo, em 2013, com a publicação da Resolução
SE 75 (SÃO PAULO, 2013a), mais uma vez a SEE/SP diminui tais chances, pois impõe
a necessidade de atribuição aos docentes não efetivos de uma carga horária mínima de
20 horas/aulas. Ora, se para participar do processo de seleção de PMEC o professor só
pode ter até 13 horas/aulas atribuídas e se todos os professores foram obrigados a ficar
com o mínimo de 20 horas/aulas, quem sobraria então para participar do processo de
seleção? Os últimos da lista de classificação para os quais não sobrariam aulas e para
completar a jornada se inscreveriam nos projetos da pasta, dentre eles o PMEC. E
assim, como garantir uma seleção baseada em perfil adequado em meio à uma
quantidade mínima de candidatos, que em muitos casos era inferior ao número de vagas,
candidatos estes oriundos de um processo de atribuição onde não lhes sobraram aulas
obrigando-os à candidatura aos projetos da pasta?
Ainda na Resolução SE 19/2010 (SÃO PAULO, 2010a), em seu artigo 7º, foram
elencadas as atribuições a serem desempenhadas pelo PMEC e, dentre elas, o que
chama a atenção é a atribuição de “adotar práticas de mediação de conflitos no ambiente
escolar e apoiar o desenvolvimento de ações e programas de Justiça Restaurativa”, pois
como já citado, os professores selecionados, em sua grande maioria, não possuem
75

formação específica, tampouco cursos afins na área de mediação de conflitos e/ou


justiça restaurativa, o que causa inclusive certa preocupação, considerando que, de
acordo com Vinyamata (2005, p. 24) “... a mediação faz parte dos recursos utilizados
pela conflitologia, contudo, a prática da mediação sem conhecimento suficiente em
conflitologia pode ser perigoso ou pelo menos inconveniente...”.
“Normalmente os conflitos representam situações delicadas que podem ter
graves consequências, principalmente se o profissional conhece unicamente a mediação
como sistema de intervenção e busca de solução para os conflitos” (VINYAMATA,
2005, p. 24).
Mais uma vez a SEE/SP, já sabendo disso, lança um paliativo para a situação,
promovendo o curso on-line de Mediação Escolar para todos os PMECs iniciantes,
contudo, ainda que válido, duas situações o tornam um tanto inadequado: a primeira é o
fato de que os tutores do curso são os próprios gestores regionais, para o qual não
recebem a devida formação; a segunda é o fato de que os conteúdos do curso estão
voltados às questões que podem gerar conflitos na escola, promovendo a possibilidade
do PMEC identificar as situações e desenvolver ações para preveni-las, entretanto, o
curso não promove o desenvolvimento de conhecimentos acerca de técnicas de
mediação de conflito ou justiça restaurativa. Além do curso inicial está prevista a
formação em serviço que se dá por meio de orientações técnicas oferecidas pela própria
Gestão Regional que, para tanto, deve procurar por conta se apropriar de conhecimentos
afins para serem desenvolvidos durante tais orientações, uma vez que a SEE/SP também
não tem um programa de formação para os gestores.
A capacitação dos PMCs foi prevista, de forma simplória, na Resolução SE
19/2010 (SÃO PAULO, 2010a). Já as Resoluções SE 01/2011 (SÃO PAULO, 2011a) e
SE 07/2012 (SÃO PAULO, 2012a) apontam que, na distribuição da carga horária de
trabalho do PMEC, deve haver a previsão de até quatro horas semanais ou oito horas
quinzenais, a cada mês, para reuniões de planejamento e avaliação juntamente com a
Gestão Regional, mas não utiliza aqui a palavra ‘formação’. Ambas as resoluções
apontam que os PMECs serão capacitados e, como atividades de supervisão e formação
em serviço, a necessidade de apresentação de relatórios sobre as atividades
desenvolvidas e a participação em cursos e orientações técnicas centralizadas
(desenvolvidas pela supervisão central) e descentralizadas (desenvolvidas pela gestão
regional), denotando que a questão da formação continuada fica sob a responsabilidade
da gestão regional, ainda que aponte também a supervisão central como corresponsável,
76

mas na prática esta se coloca mais como um órgão regulador do que formador. Como
formador, a supervisão central tem promovido anualmente, desde 2012, o Seminários de
Proteção Escolar, onde são realizadas palestras e discussões diversas acerca de conflito
e violência escolar e, em 2013, em parceria com a Secretaria de Segurança Pública,
ofereceu o curso de Justiça Restaurativa aos PMECs, no entanto, apenas um número
limitado pode participar, pois não havia vaga para todos, o que gerou certa indisposição
entre os PMECs e Gestores Regionais, os responsáveis pela escolha dos participantes.
Ora, se todos desempenham a mesma função e têm as mesmas necessidades de
desenvolvimento de competências próprias ao bom desempenho das funções, porque a
SEE/SP, em mais uma clara demonstração de total descaso para com o projeto, não
estendeu o curso a todos os profissionais atuantes, inclusive aos gestores do programa?
Vale salientar que os gestores foram impedidos de participar do curso, apesar de toda
sua carga de responsabilidade em relação à formação dos PMECs.
A despeito de toda problemática envolvida na questão da seleção de PMECs com
perfil adequado, a falta de conhecimentos específicos e necessários ao bom desempenho
da função e a formação deficitária oferecida, a SEE/SP resolve, por meio da Resolução
SEE 54/2013 (SÃO PAULO, 2013b), reduzir o número de encontros para orientações
técnicas descentralizadas, que antes eram dois encontros quinzenais de quatro horas ou
um encontro mensal de oito horas, para no máximo oito encontros anuais com carga
horária de seis a oito horas, denotando mais uma vez descaso para com a questão da
formação e para com o Sistema como um todo.

Registro de Ocorrências Escolares – ROE


O Registro de Ocorrências Escolares é uma ferramenta on-line, instituída dentro
do Sistema de Proteção Escolar e disponibilizada pela SEE/SP para o registro de
situações que afetem sobremaneira a organização e o andamento das atividades
pedagógicas e administrativas dentro da unidade escolar, dano ao patrimônio público,
situações de risco à segurança da comunidade escolar e ações que correspondam a
crimes ou atos infracionais contemplados na legislação vigente.
De acordo com a Resolução que o institui – SE 19/2010 (SÃO PAULO, 2010a)
– “... as informações registradas e armazenadas neste sistema serão utilizadas para fins
exclusivos da administração pública, cabendo ao Diretor da unidade escolar a
responsabilidade pela inserção e proteção dos dados registrados...”.
77

Apesar de ser uma ferramenta útil para o acompanhamento da situação da


violência na escola, o ROE tem se mostrado obsoleto, pois não há um registro contínuo
das ocorrências e isso se dá por vários motivos, dentre eles o fato de que os
responsáveis não têm uma clareza do que devem registrar, o que provoca certa
insegurança; falta de delegação de responsabilidades, levando o gestor a centralizar
senha de acesso, somado à isto as excessivas demandas burocráticas e prioridades que o
impedem de fazer os registros dentro do prazo estipulado – 30 dias a partir da data da
ocorrência –; subutilização dos dados por parte da SEE/SP; falta de objetivos claros
para o registro das ocorrências, uma vez que os registros de nada servem a não ser para
alimentar um banco de dados sobre a violência na escola que, na prática, não auxilia o
gestor escolar nas questões cotidianas.
Apenas para dar ideia da dimensão do sub-registro, no documento submetido
pela gestão central do SPEC (GRAEFF E ANGELI, 2011, p. 5) ao Prêmio Mario
Covas3, consta que “... desde sua implantação, O ROE contabiliza uma média de 1400
registros mensais...”. Se em 2011, segundo este mesmo documento, havia 1607 escolas
contempladas com o Sistema de Proteção Escolar, isso significa que na média não
chegava a um registro por escola no ROE, contabilizando apenas as escolas
participantes, mas há que se considerar que o ROE pode ser utilizado por todas as
escolas.

Manuais de apoio:
As Normas Gerais de Conduta Escolar (SÃO PAULO, 2010c) estão contidas em
uma cartilha impressa e foi distribuída às escolas da rede a partir de 2010. O documento
apresenta os direitos, deveres e responsabilidades dos alunos, bem como a conduta em
ambiente escolar.
Já na introdução do documento, à página 05, uma afirmação da SEE/SP chama
atenção:
Esta busca do pleno desenvolvimento é um processo dinâmico, ao longo do
qual, com frequência, eclodem conflitos complexos que podem causar
perplexidade e insegurança aos jovens, uma vez que ainda não
desenvolveram plenamente as habilidades sociais indispensáveis para
enfrentar tais situações. Não raro, surgem insatisfações e frustrações
decorrentes dessas experiências negativas, o que pode deflagrar
comportamentos indesejáveis – ou até mesmo inadmissíveis – em um
ambiente escolar apropriado para a construção de suas personalidades.

3
Tem por objetivo promover práticas inovadoras que aprimorem a qualidade dos serviços públicos.
78

Tal afirmação leva a crer que os jovens recebem uma formação para o
desenvolvimento de competências e habilidades necessárias ao enfrentamento dos
conflitos, contudo, essa não é a realidade das escolas públicas da rede estadual de
ensino, não havendo no currículo oficial do estado de São Paulo a previsão do estudo de
tal assunto, “... a violência e o conflito são temas banidos do universo escolar ou mesmo
do universo social...” (CRHISPINO E CHRISPINO, 2011, p. 32). “... Parece-nos
importante que as escolas incorporem progressivamente os conceitos e as habilidades de
resolução de conflitos no currículo...” (VINYAMATA, 2005, p. 52).
Além disso, a própria formação dos professores é deficitária tanto com relação
ao desenvolvimento das competências e habilidades em seus alunos quanto ao próprio
enfrentamento das questões de conflito e violência aos quais estão diariamente expostos,
de forma que Jarez (2001, p. 59) questionou “como é possível que, na formação inicial e
continua dos professores, esta situação (a natureza conflituosa da escola) não seja objeto
de análise nem eles sejam formados na perspectiva de um contexto de conflito...?”.
O que causou mais polêmica à época do lançamento do documento foi o
apontamento das medidas disciplinares de suspensão por cinco dias letivos e suspensão
por seis a dez dias letivos, à página 13 do referido documento. Ora, se o aluno tem
pleno direito à educação, conforme previsto no artigo 205 da Constituição Federal de
1988 (BRASIL, 1988), e artigo 53 do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei
8069/90 (BRASIL, 1990), ao aplicar tais penalidades não estariam os gestores
incorrendo no direito do aluno? Além disso, o Parecer CEE 67/98 (SÃO PAULO, 1998)
foi bastante claro com relação a essa questão, ao apontar, no parágrafo único do artigo
25, que “A escola não poderá fazer solicitações que impeçam a frequência de alunos às
atividades escolares...”.
Assim é que o documento lançado pela SEE/SP, contrariando suas orientações e
a própria legislação, causou grande impacto entre os gestores, sendo que para uns trouxe
alívio, pois encontraram respaldo em um documento oficial para uma ação costumeira,
para outros trouxe problemas, pois sendo contra a aplicação de tal medida disciplinar, se
viram coagidos pelo grupo docente que exigiam a aplicação da medida a qualquer
tempo e por qualquer motivo. Diante da polêmica gerada a Gestão Central do SPEC
informou que o documento seria revisado e uma nova edição lançada, no entanto, tal
documento continua circulando e sendo utilizado livremente nas escolas como
parâmetro legal para aplicação de medidas disciplinares, ainda que tal documento não
possa sobrepujar a lei.
79

O Manual de Proteção Escolar e Promoção da Cidadania (SÃO PAULO, 2010d)


foi outro documento lançado juntamente com as Normas Gerais de Conduta Escolar.
Trata-se de um documento norteador para resolução dos vários problemas que se
apresentam no cotidiano escolar. Nesse documento também está apontado, à página 27,
que “... as medidas disciplinares variam desde a advertência verbal ao aluno até a
suspensão da participação nas aulas ou atividades extraordinárias...”. Ou seja,
corroborando a informação apontada no primeiro documento citado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Sistema de Proteção Escolar se mostra como mais um programa paliativo da
SEE/SP que parece ter sido criado para dois propósitos: dar uma resposta aos anseios da
sociedade sobre a questão da violência escolar que só vem avançando e alocar os
professores adidos. Contudo, parece estar tendo mais êxitos com relação a este do que
àquele.
Para que a resposta à sociedade não seja apenas floreada, como parece estar
acontecendo, há que se considerar as reais necessidades da escola e prover um programa
expressivo de resolução pacífica dos conflitos e combate à violência, com uma seleção
que verdadeiramente contemple os perfis adequados dos candidatos, com abertura à
participação de outros profissionais, com quantidade de profissionais e carga horária de
trabalho mais condizente às necessidades da escola, com possibilidade de afastamento
do professor das aulas regulares para se dedicar exclusivamente ao projeto,
considerando sua complexidade e peculiaridades, com oferecimento de treinamento e
formação adequadas à função e estendida a todos os envolvidos com o projeto.
Já está se completando o quinto ano da implantação do projeto na rede estadual
de ensino. Como os PMECs estão garantindo a solução pacífica dos conflitos e a
diminuição dos índices de violência na escola? Aliás, isso está de fato ocorrendo? A
SEE/SP tem feito a avaliação dos resultados do projeto? Com base em que? Estaria a
SEE/SP acreditando ingenuamente nos dados do ROE ou os sub-registros lhe são
convenientes? Tais inquietações motivam esta pesquisadora a continuar com a pesquisa
da qual faz parte este artigo.
80

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Professor Mediador Escolar e Comunitário do Sistema de Proteção Escolar. Disponível
em <http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/18_11.htm>. Acesso em
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sobre o exercício das atribuições de Professor Mediador Escolar e Comunitário do
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sobre o processo anual de atribuição de classes e aulas ao pessoal docente do Quadro do
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______. Secretaria de Estado da Educação. Resolução SE 54/2013 de 23/08/2013b.


Altera dispositivo da Resolução SE Nº 07/2012, que dispõe sobre o exercício das
atribuições de Professor Mediador Escolar e Comunitário do Sistema de Proteção
Escolar. Disponível em: <http://www.profdomingos.com.br/estadual_resolucao_
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______. Conselho Estadual de Educação. Parecer CEE 67 de 18/03/1998. Dispõe


sobre as Normas Regimentais Básicas para as Escolas Estaduais. Disponível em
<http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/notas/parcee67_98.htm>. Acesso em
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TAVARES DOS SANTOS, J. V. Violência e conflitualidade. Porto Alegre: Tomo


Editorial, 2009.

VINYAMATA, E. Aprender a partir do conflito: conflitologia e educação. Porto


Alegre: Artmed, 2005.
82

Comunicação

Formação continuada de gestores escolares: experiências e processos do


Programa Nacional Escola de Gestores

Alexsandra dos Santos Oliveira


ale2013oliveira@gmail.com
UFSC/UFES

Resumo: Este artigo constituí-se parte de um trabalho de monografia apresentado à


Especialização Gestão e Docência na EaD e da continuidade dos estudos no
doutoramento em educação. Os objetivos passaram por discutir a configuração do
Programa Nacional Escola de Gestores com base na implantação, organização e
realização do Programa em três estados da federação (Paraná, Acre e Goiás).
Metodologicamente, trabalhou-se com critérios de uma pesquisa bibliográfica. Sendo
possível discutir a formação de gestores a partir do perfil, da avaliação e da produção
acadêmica de gestores que participaram da especialização em diferentes contextos:
geográfico, político, econômico e acadêmico. Os resultados indicam para a continuidade
de pesquisas voltadas a formação de gestores escolares no Brasil, seja ela inicial,
continuada, presencial e ou a distância.
Palavras-chave: Formação continuada de gestores; Programa Nacional Escola de
Gestores; EaD.

1. Introdução

O contexto da formação de gestores escolares poderá ser apresentado como uma


das ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e da criação da
Universidade Aberta do Brasil (UAB), com o objetivo de expandir a oferta de cursos e
programas no ensino superior e na modalidade da Educação à Distância (EaD) em nosso
país.
De acordo com Saviani (2009), as ações da UAB e da nova Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) afirmam a preocupação com a
formação dos profissionais da educação básica (professores, gestores e funcionários).
83

Ação legitimada por parcerias com as universidades públicas e com os estados e


municípios da federação, visando uma consolidação de metas e apoio financeiro.
O PDE apresenta-se como um plano ambicioso que em março de 2009 já era
constituído por 41 ações, denominado pelo autor como “um grande guarda-chuva, que
abriga praticamente todos os programas em desenvolvimento pelo MEC” (SAVIANI,
2007, p.1233).
Com base na literatura, tornou-se recorrente os apontamentos dos oito anos de
mandato do Governo Lula, como um cenário apropriado para destacarmos algumas
questões da política educacional.
Na concepção de Oliveira (2009) o Governo Lula desenvolveu Programas e
estabeleceu o regime de colaboração entre os entes federados, apontando medidas
destinadas a consolidar um novo modelo de gestão de políticas públicas e sociais.
Apresentando um crescente apoio das Organizações Não Governamentais (ONGs),
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), instituições privadas
sem fins lucrativos, que estrategicamente assumem a configuração de Associação Civil
e de interesse público, como educação e saúde, passando a receber financiamento
parcial ou total do Estado.
O trabalho também se constitui de reflexões da autora a partir de um
envolvimento existencial com a temática. No ano de 2010 quando cursou a
Especialização Escola de Gestores, oferecida pela Universidade Federal do Espírito
Santo (UFES), participando como cursista/gestora e no ano de 2013 quando cursou a
Especialização Gestão e Docência na EaD, oferecida pela Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC). Não deixando de se fazer presente o interesse acadêmico e
profissional, que de forma simultânea, dialogou com os estudos em desenvolvimento de
um projeto de doutoramento em Educação em andamento na UFES.
Sendo assim, a questão geradora desta pesquisa passou por compreender: como se
configura na literatura acadêmica e na política educacional, a formação continuada à
distância de gestores escolares, a partir do Programa Nacional Escola de Gestores em
nosso país?
Em relação à configuração metodológica adotada pela pesquisa, buscamos de
acordo com Gil (2002), adotar estratégias de uma pesquisa bibliográfica.
O artigo apresentará o diálogo e algumas implicações do Programa Nacional e
Escola de Gestores em três estados da federação (Paraná, Acre e Goiás). Tópico
construído pelos apontamentos de pesquisadores como: Souza e Teixeira (2010) que
84

analisam a experiência do Programa no estado do Paraná; Elias e Alves (2010) que


apresentam questões mais pontuais em relação à experiência do Programa no estado de
Goiás e Damasceno, Melo e Souza (2013) que fazem reflexões sobre a efetividade do
Programa no estado do Acre. Tentado a autora trazer sua leitura/interpretação dos
dados.
A seguir, de forma sintetizada, informações da Proposta Pedagógica do Curso de
Especialização em Gestão Escolar.

2. Programa Nacional Escola de Gestores

A construção deste tópico é marcada principalmente pelo acesso ao Projeto do


Curso de Especialização e suas Diretrizes, como uma maneira de apresentarmos a
configuração do Programa Nacional Escola de Gestores.
No ano de 2005, a primeira versão do Programa sob a coordenação do Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira (INEP), desenvolveu um
projeto piloto oferecido a 10 estados da federação (Ceará, Pernambuco, Bahia, Piauí,
Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e
Tocantins), buscando formar quatrocentos gestores.
A formação neste momento foi oferecida com a configuração de uma carga
horária de 100 horas, vinculada ao ambiente e-Proinfo, Ministério da Educação e
Secretaria de Educação a Distância (MEC/SEED)1. Sua estrutura curricular estava
estruturada em cinco módulos, bem como na utilização de recursos tecnológicos
considerados capazes de viabilizar a participação, a integração e a capacitação dos
diretores das escolas públicas, com a proposta de três encontros presenciais.
Seu objetivo foi analisar de forma comparativa, cinco programas voltados
para a formação de gestores escolares, indicando suas principais
características em relação às novas tendências educativas. São eles: Programa
de Capacitação a Distância para Gestores Escolares – PROGESTÃO;
Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública;
Programa de Formação Continuada de Gestores da Educação Infantil e
Fundamental – PROGED, Centro Interdisciplinar de Formação Continuada
de Professores –CINPOP, Programa de Formação de Gestores da Educação
Pública – UDJF (BRASIL, 2007, p.5).

1
Importante destacar a extinção da Secretaria de Educação a Distância (SEED). Ação que implicou
na vinculação dos programas e ações oferecidos pela SEED à Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização, Diversidade e Inclusão - SECADI, conforme informações vinculadas ao site do MEC.
85

Em 2006, o Programa passou por mudanças e sua coordenação é assumida pela


Secretaria de Educação Básica (MEC/SEB), passando por reformulações, dentre elas a
de assumir as características de um curso de Pós-graduação, lato sensu, em gestão
escolar, sob a responsabilidade acadêmica das Universidades Federais, contando
também com a participação de órgãos da sociedade civil como ANPEd, ANDIFES,
CNTE, CONSED, UNDIME e UNICEF.
A nova edição do Programa passou a ser configurada por uma carga horária de
400h, estruturada a partir da plataforma Moodle para atender a uma proposta curricular
dividida em seis salas-ambientes: 1) Fundamentos do Direito à Educação; 2) Políticas e
Gestão na Educação; 3) Planejamento e Práticas da Gestão Escolar; 4) Tópicos
Especiais; 5) Oficinas Tecnológicas e 6) Projeto Vivencial. A proposta curricular está
interligada a três eixos centrais da especialização: a) o direito à educação e a função
social da escola básica; b) políticas de educação e a gestão democrática da escola e c)
Projeto Político Pedagógico e práticas democráticas na gestão escolar.
De acordo com Brasil (2007) a estrutura curricular da Especialização culminará na
produção, por parte de cada cursista/gestor de um Trabalho Final de Conclusão de curso
– TCC. Para o qual algumas sugestões temáticas são eleitas: a) Conselhos Escolares; b)
Qualidade da Educação Básica; c) Saúde na Escola; d) Plano Nacional de Educação; e)
Plano de Desenvolvimento da Educação; f) Plano de Ações Articuladas.
Após expor, de forma sintetizada, informações da Proposta Pedagógica da
Especialização, passaremos a dialogar no tópico a seguir, com os resultados de três
experiências de organização, estrutura e implantação do Programa Nacional Escola de
Gestores em diferentes contextos geográficos, políticos, econômicos e acadêmicos.

3. Programa Nacional Escola de Gestores: Implicações com a pesquisa

Este tópico estabelecerá o diálogo entre três pesquisas a fim de subsidiar um


maior aprofundamento a respeito da formação de gestores em nosso país. Passaremos a
conhecer algumas características do Programa Nacional Escola de Gestores, pela
mediação de pesquisadores como: Elias e Alves (2010); Damasceno, Melo e Souza
(2013) e Souza e Teixeira (2010).
Nesta perspectiva, o contexto de uma das edições do Programa Nacional Escola
de Gestores em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), será
86

apresentado por Souza e Teixeira (2010) em uma pesquisa que analisou se os objetivos
da formação foram realmente alcançados.
O contexto da organização e da oferta do Programa em parceria com a
Universidade Federal do Acre (UFAC), será apresentado por Damasceno, Melo e Souza
(2013), pesquisa que analisou a efetividade da especialização e seu papel de formação.
Já o contexto da realidade do Programa Nacional Escola de Gestores em parceria
com a Universidade de Goiás (UFG), será apresentado por Elias e Alves (2010),
pesquisa que se preocupou com avaliação dos títulos dos trabalhos de conclusão de
curso dos cursistas/gestores.
A primeira evidencia que emerge nesse diálogo é apontada por Souza e Teixeira
(2010) e Damasceno, Melo e Souza (2013), autores que apresentam o perfil dos
cursistas/gestores do estado do Paraná e do estado do Acre de maneira a refletirmos
sobre o Programa Nacional Escola de gestores.
No estado do Paraná, 21,5% dos profissionais que participaram da formação
possuíam entre 10 e 15 anos de experiência atuando na educação e 51,6% mais de 20
anos.
Com base nos dados do SAEB 2007, Souza e Gouveia (2010) apresentam
informações do Programa Escola de Gestores no Paraná:
[...] 63,5% dos diretores de escola no Brasil já possuem uma especialização.
Entre os cursistas da Escola de Gestores um percentual alto (45%) já possuía
formação. Curioso é que no caso da rede estadual, 63% dos cursistas
possuíam especialização, contra apenas 25% dos cursistas das redes
municipais (SOUZA E GOVEIA, 2010, p.182).

No estado do Acre, 25% dos gestores/cursistas tinham menos de 1 ano de


experiência como gestores da escola que atuavam e 18% eram gestores de escolas
rurais. Em relação à formação continuada, 48% dos cursistas já possuíam uma
especialização lato sensu e 38% cursavam pela primeira vez uma especialização.
Esses dados aparecem em parâmetros nacionais, quando contemplados por
pesquisa realizada pela Fundação Victor Civita no ano de 2009. A pesquisa traçou o
perfil dos gestores escolares brasileiro, partindo de uma amostra de 400 gestores
entrevistados em todo o território nacional. Os resultados indicaram que 72%2 dos
gestores já realizaram algum tipo de Pós-graduação. Sendo 69% Especialização; 4%
Mestrado e 1% doutorado.

2
FUNDAÇÃO VICTOR CIVITA. Perfil dos diretores de escola da rede pública. Apresenta vários
estudos voltados à area educacional. Disponível em: http://www.fvc.org.br/pdf/diretores.pdf. Acesso em
18 de março de 2014.
87

Estabelecendo um paralelo com outros países como possibilidade de


ampliarmos as discussões a respeito da formação de gestores no Brasil, buscamos em
Martins (2011) alguns apontamentos. A autora após a realização de uma pesquisa,
resultado de seu Estágio de Pós-doctor, apresenta que em países como Portugal a
escolha de diretores escolares está amparada pelo o Decreto n. 75/2008, que configura a
transição legal das diretrizes de gestão e de autonomia das escolas portuguesas. Neste
país, para atuar como diretor escolar o candidato deverá ser professor de qualquer área
do conhecimento, podendo pertencer à rede particular, deve apresentar experiência em
mandato de gestão e cursado mestrado em Administração Escolar.
Analisando os dados da experiência do Acre, foi também possível identificar
outras questões recorrentes à experiência do estado do Paraná, a exemplo das evidencias
que indicam dificuldades dos gestores/cursistas em corresponderem academicamente à
proposta do Programa.
O “tempo” aparece na proposta da especialização como condição essencial para o
sucesso do curso. Porém, as condições de trabalho versus condições de estudo (acessos
à plataforma Moodle, leituras, comentários, postagem de atividades, intervenção na
escola e a construção de um TCC) tornam-se incompatíveis com o cotidiano do gestor
escolar.
Na experiência do Paraná, o fator “tempo” também aparece como um dos
inviabilizadores do sucesso do Programa. De acordo com Souza e Teixeira (2010),
46,8% dos cursistas alegaram falta de “tempo” para o desenvolvimento do curso, dado
que superou inclusive, as dificuldades com o uso da plataforma 32,8%, não sendo
apontada pelos autores os desdobramentos dessa informação.
Damasceno, Melo e Souza (2013) apontam que na experiência do Acre o
“tempo” de dedicação aos estudos é substituído pelo “tempo” dedicado à família e às
atividades do cargo. A administração do “tempo” foi anunciada por 70% dos
gestores/cursistas como estando relacionada à família. Cerca de 89% dos gestores neste
estado, declararam que o “tempo” de dedicação ao estudo tem sido uma das principais
dificuldades de acompanhamento do curso.
Outra incompatibilidade anunciada pelas autoras aparece relacionada à carga
horária de trabalho do gestor escolar. Os dados mostram que 95% dos gestores atuam
em 2 ou 3 turnos diariamente. Sendo que 45% declararam possuir uma jornada de
trabalho de 40 horas semanais e 27% declararam possuir uma jornada de trabalho com
88

mais de 40 horas semanais. Dado contemplado em pesquisa pela Fundação Victor


Civita. Conforme
Figura 01. Perfil nacional da carga horária semanal de trabalho dos diretores escolares.

Fonte:(FUNDAÇÃO VICTOR CIVITA, 2009, p.50)3.

Os dados apresentados indicam incompatibilidades entre a proposta do Projeto da


Especialização (Brasil, 2007) e a realidade dos gestores que participaram da formação.
Os apontamentos indicaram a necessidade de investigações mais pontuais em relação à
formação continuada de gestores escolares em nosso país e até mesmo a necessidade de
falarmos de uma formação continuada de gestores voltada para cada contexto,
geográfico, econômico e político. Aspecto ressaltado tendo em vista a ausência de uma
regulamentação que atenda a complexidade do provimento de gestores escolares em
nosso país.
Estabelecendo outro paralelo com a experiência do estado do Paraná e com a
experiência do estado de Goiás, destacamos implicações acadêmicas relacionadas à
qualidade da formação continuada dos gestores/cursistas.
A experiência no estado do Paraná também contou com uma análise dos
temas abordados pelos cursistas em seus TCCs, o que na análise de Souza e Teixeira
(2010) foram também um ponto frágil desta formação.

3
FUNDAÇÃO VICTOR CIVITA. Estudos e pesquisas educacionais. Perfil dos diretores de escola da
rede pública. Apresenta estudos voltados para a área educacional. Disponível em:
http://www.fvc.org.br/pdf/Apresentacao_Diretores.pdf. Acesso em 18 de março de 2014.
89

Tabela 1. Temas abordados pelos TCCs dos cursistas no Estado do Paraná.

Quantidade Temática
14 Gestão Democrática
13 (In)Disciplina
11 Evasão Escolar
10 Avaliação Escolar
08 Relação Escola-Família
07 Conselho Escolar
05 Dificuldades de Aprendizagem
Diretor Escolar
Participação
04 Violência
03 Educação e Ambiente
Projeto Político Pedagógico
Fracasso Escolar
02 Aluno
Relações Humanas e Afetividade
Educação Especial
Leitura
Qualidade
01 Pedagogo
Jogos
Grêmio Estudantil
Formação Continuada
Associação de Pais e Mestres
Fonte: Souza e Teixeira, 2010, p.8, adaptado pela autora.

Os pesquisadores salientam a fragilidade das investigações em relação aos


parâmetros que configuram a construção da pesquisa acadêmica. De acordo com os
autores, o tema gestão democrática foi “insipiente”, tendo os gestores/cursistas
apresentado preocupação em encontrarem “receitas” para a consolidação da gestão
democrática nas escolas públicas do estado. Os TCCs apresentaram basicamente “[...]
as dificuldades para a sua implementação [...]” (SOUZA; TEIXEIRA, 2010, p.5).
O tema Avaliação foi destacado nos TCCs, contemplando predominantemente as
avaliações externas (SAEB, ENEM, IDEB). A análise dos autores aponta para a
incompreensão dos cursistas/gestores, a respeito do tema. O tema in(disciplina) foi
agregado ao trato com a violência, outra incompreensão. Os autores consideram que a
proposta da especialização não consegue dar conta de formar gestores pesquisadores.
A experiência do estado de Goiás, também irá contemplar a análise dos TCCs dos
cursistas/gestores. De acordo com Elias e Alves (2010), os temas abordados ao final da
especialização foram:
90

Tabela 2. Temas abordados nos TCCs dos cursistas no estado Goiás.


QUANTIDADE
87 TCCs se referiram ao projeto político
pedagógico, enfatizando sua reformulação
71 TCCs apresentaram a expressão gestão
seguida, ou não, das expressões:
democrática, participativa e compartilhada
32 TCCs apresentaram preocupação com a
temática família.
21 TCCs apresentaram interesse em estudar a
temática (in)disciplina escolar.
18 TCCs utilizaram a expressão comunidade
não sendo possível, segundo as autoras,
avaliar se esse tema também aborda o
segmento familiar
07 TCCs apresentaram problemática das
políticas de inclusão.
03 TCCs abordaram a formação continuada
de Professores
Outros TCCs que abordaram: desmotivação dos
alunos na aprendizagem; defasagem do
ensino aprendizagem: causas e
alternativas; dificuldades de aprendizagem
em matemática; dificuldades de
aprendizagem; o resgate do interesse do
aluno na construção de uma aprendizagem
significativa.
Fonte: elaborado pela autora.

Para Elias e Alves (2010) o que chama a atenção em primeira instância é a escolha
de temas muito pedagógicos, que na análise das autoras dificilmente são trabalhados
pela gestão da escola: “[...] dificuldade de aprendizagem, processo de ensino-
aprendizagem, leitura e escrita, dificuldade em matemática [...]”. Para essa análise as
autoras evidenciam três hipóteses
No transcorrer do curso, houve eleições para os cargos executivos, tanto na
esfera estadual como na municipal. Como, em muitos municípios de Goiás, a
escolha dos gestores escolares ainda se dá por meio de indicação política,
muitos cursistas que ocupavam esses cargos retornaram às suas práticas
docentes, o que pode ter mobilizado um conjunto de problemáticas de caráter
mais pedagógico. Outra hipótese é a de que a dimensão pedagógica tenha
sido considerada pelos gestores-alunos uma problemática premente nas
instituições escolares exigindo uma intervenção rápida e adequada. Ainda é
possível considerar uma terceira hipótese, que não descarta a anterior, de que
os alunos do curso, ainda que ocupando cargos de gestão, entendessem que
suas funções na escola estivessem relacionadas, também, às práticas
pedagógicas ali desenvolvidas e, nesse sentido, considerariam ter uma
contribuição a dar à instituição escolar em que atuam em relação a estas
questões [...] (ELIAS; ALVES, 2010, p. 328).

As hipóteses mencionadas assumem uma perspectiva de análise contrária


quando relacionada a outros aspectos da Política educacional que configuram as
atribuições do gestor escolar e principalmente por ser o Programa Nacional Escola de
91

Gestores um programa instituído para diretores e vice-diretores de escolas públicas


brasileiras com baixo IDEB.
Outra referência nos ajuda a dialogar com Elias e Alves (2010) é Programa de
Desenvolvimento da Escola (PDE escola) 4. Programa que destaca o processo de ensino
aprendizagem como um dos critérios de eficácia escolar. Autores como Oliveira, Pinel e
Silva (2013), apresentam a nova versão do Programa a partir do ano de 2012, quando o
PDE Escola assume a configuração do PDE Interativo, vinculado à plataforma do
SIMEC/MEC, como proposta de realizar um “raio X” das escolas no Brasil.
Na concepção de Paro (2009), a escola deve ser pensada como um processo em
busca de um fim e não como um meio. Postura que interfere na formação dos gestores
escolares, colocando em dúvida uma formação de gestores que vise desenvolver
habilidades, competências, como se a partir deles a escola fosse se constituir como um
direito, configuração de um pensamento hegemônico e neoliberal de educação.

Esta é uma forma de pensar a formação dos educadores escolares que não
toma o pedagógico como objeto de estudo da administração, e com isso deixa
o processo incompleto, alijando o pensamento administrativo escolar de uma
de suas partes mais importantes, porque não pensa a atividade-fim, o
processo pedagógico, como realmente é, como atividade adequada a
objetivos que precisam ser racionalmente mediados (PARO, 2009, p. 465).

Para o autor, o percurso deverá ser o contrário, do pedagógico para o


administrativo, o que implicaria em uma nova concepção de gestão/administração de
escola, pautada em princípios democráticos de participação.
Ao consultarmos a proposta curricular do curso (Brasil, 2007), identificamos que
nem sempre as orientações curriculares e/ou sugestões do Programa são contempladas
em sua totalidade. Conforme apresentado na experiência do Programa no estado do
Paraná e a experiência no estado de Goiás, os TCCs apresentam pouca ênfase ou
nenhuma, em temas como: política educacional, saúde na escola, avaliação institucional
e uso das tecnologias. Temas que configuram a proposta curricular do Programa
Nacional Escola de Gestores associados a formação dos cursistas/gestores.

4
O Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE Escola) previa o planejamento estratégico para organizar
as ações das escolas brasileiras. O programa até o ano de 2005 atendia exclusivamente "Zonas de
Atendimento Prioritário" (ZAPs) das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, áreas com baixos Índices
de Desenvolvimento Humano (IDH). Após a publicação no ano de 2005, dos primeiros resultados do
IDEB, o MEC identificou a necessidade de criar estratégias para envolver as escolas com baixo IDEB a
melhorarem seus índices. Momento que opta pela adoção do PDE Escola, visando ampliar o
financiamento, por meio do Fundescola, com objetivos de melhorar a gestão escolar, a qualidade do
ensino e a permanência dos alunos na escola. Disponível em: http://pdeescola.mec.gov.br/index.php/o-
que-e-pde-escola. Acesso em 04 de abril de 2014.
92

Os resultados indicados por esta pesquisa apresentam a necessidade de uma


aproximação entre o saber político e o saber acadêmico no âmbito da formação de
gestores em nosso país. Dados que evidenciaram tensões a serem avaliadas por este
Programa em suas próximas edições. Avaliação que de acordo com a legislação e com o
Projeto do Curso (Brasil, 2007) é responsabilidade do MEC/SEB, da CAPES,
juntamente com a Coordenação Geral do Programa em cada Universidade, com foco na
melhoria da qualidade do Programa.

4. Considerações

Acreditamos que além dos apontarmos para a necessidade de novas pesquisas


voltadas a categoria gestor escolar e formação de gestores, reafirmamos a necessidade
de investigações que contemplem outras categorias que direta e/ou indiretamente,
influenciam na formação de gestores, seja ela inicial, continuada, presencial e/ou à
distância.
Gracindo (2009) realiza algumas reflexões a respeito da gestão escolar e das
práticas desse profissional que contemplam o cotidiano das escolas públicas:
Quem é esse gestor escolar? Qual o perfil desejado para ele? Qual a estrutura
curricular adequada a sua formação? Quais as formas diferenciadas dessa
formação? Qual seria o lócus presencial onde deveria ocorrer essa formação?
(GRACINDO, 2009, p. 141).

Nesta perspectiva, deixamos evidente à necessidade de falar da gestão e do gestor


de maneira qualitativa, enfatizando a experiências dos sujeitos envolvidos no processo:
o que pensam da política educacional, da formação, da escola e da sua gestão, abertura à
complexidade do cargo de gestor.
Essas entre outras questões continuam em “aberto” quando o assunto em pauta é a
formação de gestores escolares em nosso país. Questões que ainda permearão algumas
das novas edições da formação oferecida pelo Programa Nacional Escola de Gestores
oferecida na modalidade à distância em nosso país.

5. Referências

BRASIL. MEC/SED. Escola de Gestores da Educação Básica. Projeto curso de


especialização em gestão escolar (lato Sensu). Brasilía2007. 2007. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12337:escol
93

a-de-gestores-da-educacao-basica-apresentacao&catid=300:escola-de-gestores-da-
educacao-basica&Itemid=693. Acesso em 20 de novembro de 2013.

DAMASCENO, Ednaceli Abreu. MELO, Lúcia de Fátima. SOUZA, Maria do Socorro


Neri Medeiros de. Política de formação continuada de gestores da educação básica no
estado do Acre: reflexões sobre a efetividade. CD. VII Encontro Rede Estrado.

ELIAS, Carime Rossi. ALVES, Miriam Fábia. Formação continuada em EaD: sobre o
que escrevem os gestores de escolas públicas de Goiás. Inter-Ação, Goiânia, v. 35, n. 2,
p. 323-340, jul./dez. 2010.

GIL.Antônio Carlos. Como elabora projetos de pesquisa. 4. Ed. São Paulo: Atlas,
2002.

GOMES, Alfredo Macedo. SANTOS. Ana Lúcia Felix dos. MELO, Darci Barbosa Lira
de. Escola de gestores: política de formação em gestão escolar. RBPAE – v.25, n.2, p.
263-281, mai./ago. 2009.

GRACINDO, Regina Vinhaes. O gestor escolar e as demandas da gestão democrática:


exigências, práticas, perfil e formação. Revista Retrato da Escola, Brasília, V.3, nº 4,
p.135-147, jan/jun.2009. Disponível em:
http://www.esforce.org.br/index.php/semestral/article/view/107. Acessado em 18 de
novembro de 2013.

MARTINS, Ângela Maria. Gestão e autonomia escolar: um estudo comparado


Brasil/Portugal. Revista Brasileira de Educação v. 16, pg 69-98, n. 46 jan/abr. 2011.

PARO, Vitor Henrique. Formação de Gestores escolares a atualidade de José Querino


Ribeiro. Revista Educação e Sociedade, Campinas, Vol. 30, n.7, p. 453-467, maio/ago.
2009. Disponível em http://www.cedes.unicamp.br . Acessado em 08 de dezembro de
2013.

SAVIANI, Dermeval. PDE. Plano de desenvolvimento da educação: analise critica da


política do MEC. Campinas, SP: Cortez: Autores Associados, 2009.

________, Dermeval. Plano de desenvolvimento da educação: Análise critica do projeto


do MEC.Educação e Sociedade, Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial, p. 1231-1255,
out. 2007. Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br. Acessado em 05/02/2014.

SOUZA, Ângelo Ricardo de. TEIXEIRA, Marilza Aparecida Pereira. O programa


escola de gestores: análise da experiência no estado do Paraná. Educere et Educare –
Revista de Educação n - ISSN: 1981-4712 (eletrônica) — 1809-5208 (impressa). Vol.
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______, A.R.; GOUVEIA, A.B. Diretores de escolas públicas: aspectos do trabalho


docente.Educar em Revista, Curitiba, Brasil, n. especial 1, p. 173-190, 2010. Editora
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http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/educar/article/view/20471/13749. Acesso em15 de
fev. de 2014.
94

OLIVEIRA, Alexsandra dos Santos; PINEL, Hiran; SILVA, Dulcinéia Campos. Do


PDE escola ao PDE Interativo em uma unidade de ensino do sistema municipal de
educação de Cariacica. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE POLÍTICA E
ADMINISTRAÇÃO DA EDUCAÇÃO,26.2013, Recife. Anais eletrônico. Disponível
em: http://www.anpae.org.br/simposio26/1comunicacoes/AlexsandradosSantosOliveira-
ComunicacaoOral-int.pdf . Acesso em 02 de dezembro de 2013.

OLIVEIRA. Dalila Andrade. As políticas educacionais no governo Lula: rupturas e


permanências. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação/RBPAE
– v.25, n.2, p. 197-209, mai./ago. 2009.
95

Comunicação

Financiamento da educação na Secretaria de Estado da Educação de São Paulo -


1995 a 2010

Alfredo Sérgio Ribas dos Santos


Secretaria de Estado da Educação de São Paulo
Centro Universitário Ítalo Brasileiro (UniÍtalo)
Edmundo Francisco Vieira
Centro Universitário Ítalo Brasileiro (UniÍtalo)
Renée Coura Ivo Vituri
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)

RESUMO: O presente estudo analisa o volume de recursos financeiros utilizados pela


Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, no período de 1995 a 2010, em
manutenção e desenvolvimento do ensino. Justifica-se a escolha desse período em
decorrência da sequência de 1995 a 1998; 1999 a 2002; 2003 a 2006 e 2007 a 2010 dos
governos geridos pelo PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira), no referido
estado. Para tratar das informações, utilizou-se da técnica da análise documental,
especificamente, dos balanços orçamentários do governo do estado de São Paulo no
mencionado período. Foram analisados os gastos da referida secretaria no contexto dos
gastos gerais do governo estadual paulista e os gastos dos diversos órgãos da própria
secretaria, sendo possível evidenciar uma tendência histórica de aumento quantitativo
da aplicação dos recursos financeiros em manutenção e desenvolvimento do ensino na
citada secretaria no período de tempo indicado.
Palavras-chave: Balanço orçamentário; Secretaria de Estado de Educação de São
Paulo; Gastos em manutenção e desenvolvimento do ensino.

INTRODUÇÃO

No estudo em tela, apresenta-se uma analise do volume de recursos financeiros


utilizados pela Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEESP) no período de
1995 a 2010, em manutenção e desenvolvimento do ensino. Justifica-se a escolha dessa
96

secretaria em decorrência do volume de recursos financeiros que a envolvem e da


importância estratégica desse órgão, responsável pela rede estadual de ensino de São
Paulo, dentro do contexto das políticas públicas educacionais do governo do estado
paulista. Quanto ao período de análise, de 1995 a 2010, este foi selecionado pela
permanência sequencial, nesse período histórico, do Partido da Social Democracia
Brasileira (PSDB) no comando do governo do estado de São Paulo, a saber:
•1995 a 1998 – Mário Covas
•1999 a 2002 – Mário Covas, sucedido por Geraldo Alckmin1
•2003 a 2006 – Geraldo Alckmin
•2007 a 2010 – José Serra.
Cabe ressaltar ainda, que o período de 1995 a 2010 compreende profunda
mudança no processo de financiamento da educação no Brasil, com a definição e
implantação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério (Fundef)2 de 1996 a 2006, e do Fundo de Desenvolvimento
da Educação Básica e de Valorização do Profissionais da Educação (Fundeb)3, de 2007
a 2020.

1
Importante mencionar que o governador Mário Covas Júnior, faleceu no dia 6 de março de 2001. Com a
sua morte assumiu o governo do estado, o então vice-governador Geraldo Alckmin, passando a pasta da
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, a partir de 2002, aos cuidados do professor Dr. Gabriel
Chalita.
2
O Fundef foi instituído pela Emenda Constitucional n.º 14, de setembro de 1996, e regulamentado pela
Lei n.º 9.424, de 24 de dezembro do mesmo ano e pelo Decreto nº 2.264, de junho de 1997. Foi
implantado, nacionalmente, em 1º de janeiro de 1998, quando passou a vigorar a nova sistemática de
redistribuição dos recursos destinados ao Ensino Fundamental. A maior inovação do Fundef consiste na
mudança da estrutura de financiamento do Ensino Fundamental no país (1ª a 8ª séries do antigo 1º grau),
ao subvincular a esse nível de ensino uma parcela dos recursos constitucionalmente destinados à
Educação. A Constituição de 1988 vincula 25% das receitas dos Estados e Municípios à Educação. Com a
Emenda Constitucional nº 14/96, 60% desses recursos (o que representa 15% da arrecadação global de
Estados e Municípios) ficam reservados ao Ensino Fundamental. Além disso, introduz novos critérios de
distribuição e utilização de 15% dos principais impostos de Estados e Municípios, promovendo a sua
partilha de recursos entre o Governo Estadual e seus municípios, de acordo com o número de alunos
atendidos em cada rede de ensino. Genericamente, um fundo pode ser definido como o produto de
receitas específicas que, por lei, vincula-se à realização de determinados objetivos. O Fundef é
caracterizado como um fundo de natureza contábil, com tratamento idêntico ao Fundo de Participação dos
Estados (FPE) e ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM), dada a automaticidade nos repasses de
seus recursos aos Estados e Municípios, de acordo com coeficientes de distribuição estabelecidos e
publicados previamente. As receitas e despesas, por sua vez, deverão estar previstas no orçamento, e a
execução contabilizada de forma específica (BRASIL. MEC, sítio eletrônico).
3
O Fundeb foi criado pela Emenda Constitucional nº 53/2006 e regulamentado pela Lei nº 11.494/2007 e
pelo Decreto nº 6.253/2007, em substituição ao Fundef, que vigorou de 1998 a 2006. É um fundo
especial, de natureza contábil e de âmbito estadual (um fundo por estado e Distrito Federal, num total de
vinte e sete fundos), formado, na quase totalidade, por recursos provenientes dos impostos e
transferências dos estados, Distrito Federal e municípios, vinculados à educação por força do disposto no
art. 212 da Constituição Federal. Além desses recursos, ainda compõe o Fundeb, a título de
complementação, uma parcela de recursos federais, sempre que, no âmbito de cada Estado, seu valor por
aluno não alcançar o mínimo definido nacionalmente. Independentemente da origem, todo o recurso
gerado é redistribuído para aplicação exclusiva na educação básica. Com vigência estabelecida para o
período 2007-2020, sua implantação começou em 1º de janeiro de 2007, sendo plenamente concluída em
97

Tais mudanças promoveram nova forma de estruturar e organizar o financiamento


da educação no Brasil, nos aspectos de ordem política, técnica, legal e financeiro, desta
forma pode-se considerar o processo de financiamento da educação no Brasil antes e
depois dos referidos fundos.
A partir dessas duas escolhas específicas, situadas no contexto histórico e político
paulista, quais sejam: a dimensão e importância da SEESP e os diversos governos do
mesmo partido, no caso o PSDB, no comando do estado, realizou-se uma análise da
tendência histórica desses governos e, consequentemente, desse partido político com
relação ao financiamento da educação no estado de São Paulo, designadamente no
tocante as despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino.
Para essa apreciação, fez-se uso da técnica da análise documental, utilizando-se,
especificamente, dos balanços orçamentários do governo do estado e respectivos valores
alocados pela SEESP, no período de 1995 a 2010, tendo como objetivos: a) identificar a
tendência histórica de aplicação de recursos financeiros na Secretaria de Estado da
Educação de São Paulo; b) analisar os gastos da referida secretaria no contexto dos
gastos gerais do governo estadual paulista e os gastos dos diversos órgãos dessa
secretaria.
A bibliografia do financiamento da educação no Brasil apresenta diversas
abordagens do tema, com ênfase nas abordagens do Fundef e Fundeb, porém se verifica
que não existem estudos específicos a respeito dos balanços orçamentários e suas
dimensões nos órgãos administrativos do ministério da educação, das secretarias da
educação dos estados, do distrito federal e dos municípios.
Os estudos a respeito do financiamento da educação no Brasil, a seguir
apresentados, corroboram a preocupação com a dinâmica desse processo apesar das
limitações em não abordarem determinados temas, em especial, os relacionados aos
balanços orçamentários nas diversas esferas de governo, federal, estadual e municipal:
(CALLEGARI, 2002 e 2008; CALLEGARI; CALLEGARI, 1997; CASTRO, 1998;
COSTA, 1999; DAVIES, 1999, 2000, 2001a, 2001b, 2004, 2008; DOURADO, 1999;
DUARTE; FARIA; NASCIMENTO, 2010; FARENZENA, 2006; FRANÇA, 2005;
GOUVEIA; SOUZA; TAVARES, 2006; LIMA; DIDONET, 2006; MAZDA; BASSI,

2009, quando o total de alunos matriculados na rede pública foi considerado na distribuição dos recursos
e o percentual de contribuição dos estados, Distrito Federal e municípios para a formação do Fundo
atingiu o patamar de 20%. O aporte de recursos do governo federal ao Fundeb, de R$ 2 bilhões em 2007,
aumentou para R$ 3,2 bilhões em 2008, R$ 5,1 bilhões em 2009 e, a partir de 2010, passou a ser no valor
correspondente a 10% da contribuição total dos estados e municípios de todo o país (BRASIL. FNDE,
sítio eletrônico).
98

2009; MELCHIOR, 1997; MONLEVADE, 1997; OLIVEIRA; ADRIÃO, 2001;


PEREIRA, 2000; PINTO, 2000; POLO, 1999; RAMOS, 2003; ROSSINHOLI, 2010;
SOUZA, 2008).

Gastos da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (1995 a 2010)

Os gastos da SEESP, no período de 1995 a 2010, apresentados na Tabela 1,


demonstram o volume e a tendência das despesas e a relação entre o Balanço Geral do
Estado de São Paulo e a participação percentual da referida secretaria, conforme segue:

Tabela 1
Exercício Valor Total geral BG* Educação % **
1995 2.737.160.245,92 19.640.204.403,00 13,9365%
1996 3.551.628.966,00 31.588.879.776,42 11,2433%
1997 3.701.335.092,00 90.135.744.095,72 4,1064%
1998 5.676.613.846,00 40.661.383.578,67 13,9607%
1999 6.116.616.193,00 42.321.644.125,33 14,4527%
2000 6.913.458.119,00 45.421.278.152,00 15,2207%
2001 7.620.700.297,00 48.738.834.884,31 15,6358%
2002 8.349.898.473,00 54.206.996.666,00 15,4037%
2003 9.156.780.984,00 59.561.447.000,00 15,3737%
2004 9.872.987.984,00 68.357.582.883,50 14,4431%
2005 10.926.946.592,00 77.751.538.936,00 14,0537%
2006 12.422.047.245,00 88.111.182.566,00 14,0982%
2007 13.183.969.201,00 98.859.243.136,00 13,3361%
2008 15.595.523.466,00 123.900.581.935,90 12,5871%
2009 16.293.683.651,00 136.135.828.130,00 11,9687%
2010 19.072.896.811,00 155.085.671.393,00 12,2983%
Fonte: Secretaria da Fazendo (sítio eletrônico) - Dados coletados em: 02/01/2012.
* Total Geral BG (Total Geral do Balanço Geral do Estado de São Paulo).
** Participação percentual da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo no Balanço Geral
do Estado de São Paulo.

É importante dizer que nos gastos apresentados na tabela acima, com relação aos
gastos dos órgãos da SEESP, no período de 1995 a 2010, é possível verificar uma
tendência de aumento gradativo de aplicação de recursos em Administração Superior
Secretaria e Sede, Conselho Estadual de Educação, Departamento de Suprimento
Escolar, Coordenadoria de Ensino da Região Metropolitana da Grande de São Paulo,
99

Coordenadoria de Ensino do Interior, Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas,


Departamento de Recursos Humanos e Fundação para o Desenvolvimento da Educação.
No balanço orçamentário de 1995 a 1998, relativo ao governo Mário Covas,
sendo Secretária Estadual de Educação a professora Teresa Roserley Neubauer da Silva,
evidencia-se gastos da SEESP, no Balanço Geral do Estado (BGE) e a participação
percentual da secretaria referida no mencionado balanço. Verifica-se que os gastos
gerais da SEESP tiveram variações significativas durante o período de 1995 a 1998,
oscilando percentualmente de 13,9365% em 1995, para 11,2433% em 1996, para
04,1064%, em 1997 e com 13,9607% em 1998. Contudo, em termos de valores
monetário-financeiros houve aumentos significativos na seguinte conformidade, no ano
de 1995 (R$ 2.737.160.245,92), 1996 (R$ 3.551.628.966,00), 1997 (R$
3.701.335.092,00) e em 1998 (R$ 5.676.613.846,00).
Os valores apresentados referem-se ao período de 1995 como o último ano, antes
da aprovação da Lei do Fundef (Lei nº 9.424/96). Percebe-se que apesar da variação
negativa em termos percentuais de 13,9365% em 1995 para, 11,2433% em 1996,
ocorreu aumento monetário-financeiro e com a promulgação da mencionada lei,
assistiu-se, no ano de 1996, significativa alteração do processo de financiamento da
educação no Brasil.
Já no ano de 1997, na vigência do Fundef como novo parâmetro de redistribuição
dos recursos monetário-financeiros para a educação pública, houve a redefinição da
subvinculação dentro dos padrões constitucionais de vinculação de recursos financeiros
para a manutenção e desenvolvimento do ensino. A aplicação de 04,1064%, dos gastos
do Balanço Geral do Estado de São Paulo, em 1997, na SEESP, evidencia que foi o
único ano, no período de 1995 a 2010, que os gastos ficaram abaixo 11% (onze por
cento). Todavia, no ano de 1997, do total geral do Balanço Geral do Estado de São
Paulo no montante de R$ 90.135.744.095,72 ocorreram gastos na SEESP no valor de
R$ 3.701.335.092,00, superando em torno de R$ 149.700.000,00 (cento e quarenta e
nove milhões e setecentos mil reais), com relação ao ano de 1996 que foi de R$
3.551.628.966,00.
No ano de 1998, quando se inicia a efetiva implantação do Fundef a aplicação de
gastos na SEESP alcançou o valor de R$ 5.676.613.846,00, em termos percentuais
13,9607% do total do Balanço Geral do Estado de São Paulo.
A partir dos dados analisados verifica-se que durante o governo Mário Covas
(1995 a 1998) houve a aplicação na média de 10,8112%, no âmbito da SEESP. Média
100

esta que corrobora com o estabelecido na constituição do estado de São Paulo no artigo
255. O artigo define que o Estado aplicará, anualmente, na manutenção e no
desenvolvimento do ensino público, no mínimo, 30% (trinta por cento) da receita
resultante de impostos, incluindo recursos provenientes de transferências, sendo que
para a consecução do previsto na constituição estadual paulista, no tocante aos 30% por
cento das receitas resultantes de impostos, deve ser considerado os gastos com a
SEESP, Secretaria de Ciência e Tecnologia e as Universidades Estaduais Paulistas
(USP, UNESP e UNICAMP), e todas as outras áreas/despesas que envolvam gastos
com a função orçamentária da educação.
No segundo governo Mário Covas, após sua reeleição em 1998, e continuidade da
professora Teresa Roserley Neubauer da Silva como principal gestora da Secretaria
Estadual de Educação, evidencia-se gastos da SEESP no balanço orçamentário de 1999
a 2002, no Balanço Geral do Estado (BGE) e a participação percentual da referida
secretaria. Nos mencionados balanços verifica-se que nos gastos gerais da SEESP não
existiram variações significativas durante o período de 1999 a 2002, com percentuais de
14,4527% em 1999 para, 15,2207% em 2000, 15,6358%, em 2001 e com 15,4037% em
2002. Todavia, em termos de valores monetário-financeiros, houve aumentos
significativos perfazendo os seguintes números: 1999 (R$ 6.116.616.193,00); 2000 (R$
6.913.458.119,00); 2001 (R$ 7.620.700.297,00); e 2002 (R$ 8.349.898.473,00).
No ano de 1999, segundo ano de vigência efetiva do Fundef, confirmou-se e
reiterou-se o parâmetro de redistribuição dos recursos monetário-financeiros para a
educação pública, com volume de recursos superiores aos verificados nos anos de 1995
a 1998, em especial a este último. Em termos percentuais foram aplicados 14,4527% do
total de recursos do Balanço Geral do Estado de São Paulo.
No ano de 2000, terceiro ano de efetiva implantação do Fundef, houve a aplicação
de gastos na SEESP no valor de R$ 6.913.458.119,00, perfazendo 15,2207%, com
substancial aumento de valores monetário-financeiros e percentuais quando comparados
ao ano de 1999. Nos anos de 2001 e 2002, constatou-se que os gastos com a SEESP
somaram R$ 7.620.700.297,00 e R$ 8.349.898.473,00, respectivamente, com variação
percentual de 15,6358% em 2001, para o gasto geral do Balanço Geral do Estado de São
Paulo de R$ 48.738.834.884,31 e 15,4037% em 2002, de um total de R$
54.206.996.666,00.
Os dados analisados permitem dizer que durante o governo Mário Covas/Geraldo
Alckmin (1999 a 2002) a aplicação média foi de 15,1750%, no âmbito da SEESP, o que
101

evidencia a continuidade de aplicação do estabelecido no artigo 255 da constituição do


estado de São Paulo.
No governo Geraldo Alckmin, de 2003 a 2006, após sua eleição em 2001, tem-se
a continuidade do professor Gabriel Chalita como secretário da educação,
posteriormente substituído pela professora Dra. Maria Lucia Marcondes Carvalho
Vasconcelos.
Nesse período, de 2003 a 2006, é possível identificar que o gasto geral da
SEESP apresenta variações percentuais negativas, sendo: 15,3737% em 2003;
14.4431% em 2004; 14,0537% em 2005 e 14, 0982% em 2006. Contudo, em termos de
valores monetário-financeiros houve aumentos significativos, a saber: 2003 (R$
9.156.780.984,00); 2004 (R$ 9.872.987.984,00); 2005 (R$ 10.926.946.592,00); e 2006
(R$ 12.422.047.245,00).
Ainda, nesse ciclo, momento de plena efetivação do Fundef percebe-se o
aumento dos valores monetário-financeiros para a educação pública, com volume de
recursos superiores aos verificados nos anos de 1999 a 2002. De 2003 a 2004 é possível
constatar uma oscilação com a alteração de 15,3737% e 14.4431%, respectivamente.
Todavia, nos anos de 2005 e 2006 assiste-se uma variação no padrão de percentual dos
gastos com 14,0537 e 14,0982, nesta ordem, e ocorreu, nos mencionados anos, aumento
em termos monetário-financeiros.
Diante dos números, é razoável inferir que no governo Alckmin (2003 a 2006) a
aplicação média foi de 14,4875% na esfera da SEESP, permanecendo a tendência de
aplicação do estabelecido no texto constitucional paulista.
A partir de março de 2006, Cláudio Lembo, então vice-governador do estado,
assumiu o governo de São Paulo, em substituição a Geraldo Alckmin, que, por sua vez,
concorreu à presidência da república.
Em 2007, José Serra tomou posse como governador do estado, permanecendo no
comando do poder executivo paulista até abril de 2010, quando foi substituído por
Alberto Goldman, à época vice-governador do estado, para concorrer à presidência de
república. Na Secretaria de Educação, inicialmente assume a gestão a professora Dra.
Maria Helena Guimarães de Castro, em substituição a professora Dra. Maria Lucia
Marcondes Carvalho Vasconcelos. Em julho de 2007, o professor Dr. Paulo Renato
Costa Souza, assume o posto de secretario da educação, no qual permaneceu até o dia
31/12/2010.
102

Nesse período, 2007 a 2010, de plena efetivação do Fundeb, constata-se que os


gastos gerais da SEESP apresentam variações percentuais negativas, a saber: 13,3361%
em 2007; 12,5871% em 2008; 11,9687% em 2009; e 12,2983% em 2010. Em termos de
valores monetário-financeiros notam-se aumentos significativos aplicados na educação
pública paulista na seguinte conformidade: 2007 (R$ 13.183.969.201,00); 2008 (R$
15.595.523.466,00); 2009 (R$ 16.293.683.651,00); e 2010 (R$ 19.072.896.811,00).
Constata-se que durante o governo José Serra (2007 a 2010) houve a aplicação na
média de 12,54%, na esfera da SEESP, permanecendo a tendência verificada nos
governos anteriores de aplicação do estabelecido no texto constitucional paulista com
relação à manutenção e desenvolvimento do ensino.

Considerações Finais

No texto ora apresentado buscou-se, a partir de duas escolhas específicas, quais


sejam, a dimensão e a importância da SEESP e os diversos governos do mesmo partido,
no caso o PSDB, no comando do estado, realizar uma análise da tendência histórica
desses governos e, consequentemente, desse partido político no tangente ao
financiamento da educação no estado de São Paulo. Para isso, utilizou-se,
principalmente, dos balanços orçamentários do governo do estado e respectivos valores
alocados pela SEESP, no período de 1995 a 2010, tendo como objetivos: a) identificar a
tendência histórica de aplicação de recursos financeiros na Secretaria de Estado da
Educação de São Paulo; b) analisar os gastos da referida secretaria no contexto dos
gastos gerais do governo estadual paulista e os gastos dos diversos órgãos dessa
secretaria.
O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCesp) publicou no Suplemento
do Diário Oficial, de 20/11/2012, “Pareceres Prévios do Tribunal em Contas de
Prefeitura e o Julgamento pelas Câmaras Municipais” com a descrição, dentre outras
informações, àquelas relativas às aplicações no ensino e do Fundeb, referente aos anos
de 2007 e 2008. Dos 644 municípios paulistas, 71 tiveram pareceres desfavoráveis com
relação às aplicações no ensino e 43 relativas ao Fundeb, especificamente no ano de
2007. No ano de 2008, dos 644 municípios do estado de São Paulo, tiveram as contas
reprovadas pelo referido tribunal de contas: 36 municípios no que tange às aplicações
no ensino e 31 municípios referentes ao Fundeb. Dados que expressam a necessidade de
103

maior acompanhamento e controle social, por parte dos recursos financeiros relativos à
educação paulista.
Conclui-se da análise dos dados dos balanços orçamentários da SEESP, no
contexto do Balanço Geral do Estado de São Paulo, que ocorreu aumento nominal dos
valores monetário-financeiros, no período de 1995 a 2010, durante os governos do
PSDB, no comando do poder executivo paulista.
Ocorreu o cumprimento dos percentuais constitucionais previstos, nas
constituições federal e paulista, 25% e 30%, respectivamente, em manutenção e
desenvolvimento do ensino, tanto que as contas do poder executivo estadual paulista e
dentre essas, as relativas a SEESP foram aprovadas pelo Tribunal de Contas e a
Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.
O fato de ocorrer aumento quantitativo dos recursos financeiros investidos na
SEESP, no período de 1995 a 2010, durante os governos do PSDB, na chefia do poder
executivo paulista e o consequente atendimento do previsto nas constituições federal e
estadual paulista, não resultou necessariamente na melhoria da qualidade de ensino, da
carreira do magistério oficial paulista e das condições estruturais e de funcionamento
das escolas estaduais paulistas.
Em suma, o estabelecimento de mínimos constitucionais para aplicação em
manutenção e desenvolvimento do ensino não assegura, de forma efetiva a garantia de
uma educação pública, gratuita e de qualidade social.
Estudos como o de Santos (2013), corroboram a necessidade de ampliar o escopo
de pesquisa e análise a respeito do financiamento da educação no Brasil para além da
vinculação constitucional para manutenção e desenvolvimento do ensino, do Fundef e
do Fundeb e temas congêneres e correlatos.
Existe uma diversidade de assuntos e temáticas que interferem no processo de
financiamento da educação no Brasil, contudo não são contemplados nos livros, artigos
e nos periódicos acadêmico-científicos da área de educação.

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106

Comunicação

Política nacional de formação de professores: as atribuições dos fóruns

Ana Fanny Benzi de Oliveira Bastos


Universidade Estadual de Campinas – Unicamp
Laboratório de Políticas Públicas e Planejamento - LaPPlanE

Resumo: Esse trabalho é parte de uma pesquisa em andamento, problematiza-se a


atuação dos Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente, na região
norte. Trata-se de uma análise documental, envolvendo a legislação, relatórios de gestão
e as atas dos fóruns no período de 2009-2011. Inicialmente, destaca-se o processo de
definição da Política Nacional de Formação dos Profissionais do Magistério da
Educação Básica, em seguida, apresenta-se a análise da atuação dos fóruns no
desenvolvimento de ações voltadas à formação de professores. Os Fóruns são órgãos
colegiados criados para dar cumprimento aos objetivos da Política Nacional de
Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica uma das atribuições é a
elaboração do Plano Estratégico de Formação Inicial e Continuada. Sua ação parte do
regime de colaboração entre a União, Estados e Municípios. Tendo com eixo basilar
uma melhor integração para a formação de professores que atuam na Educação Básica.
Palavras-chave: Política Educacional. Formação de Professores. Fórum Permanente de
Apoio à Formação Docente.

Introdução

Ao investigar a Política, e posteriormente o Plano Nacional de Formação dos


Profissionais do Magistério da Educação Básica (PARFOR), que parece ser uma das
principais políticas do governo federal para a formação de professores, sem deixar de
considerar o “Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais”
(REUNI) e a expansão dos “Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia”
(IFETs), que tem como uma das principais prerrogativas a abertura e ampliação de
vagas nos cursos de licenciatura. Conforme a tabela 1, dos 68% de profissionais com
formação em nível superior, cerca de 10% não possui licenciatura. Esse percentual,
somado ao número de docentes sem formação em nível superior, totaliza mais de 40%
107

de profissionais que ainda carecem de formação específica para atuação na educação


básica.

Tabela I
Escolaridade dos Professores da Educação Básica – Brasil - 2007
Professores de Educação Básica
Escolaridade
Ensino Médio Superior
Total
Fundamental Normal/ Ensino
Com Licenciatura Sem Licenciatura
Magistério Médio
1.882.961 15.982 474.950 103.341 1.160.811 127.877
Fonte: INEP (BRASIL, 2009d).

O plano é executado em regime de colaboração entre a Coordenação de


Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), o Ministério da Educação
(MEC), as secretarias de educação dos estados e municípios e as instituições públicas e
comunitárias de ensino superior. Assegurado na Lei nº 12.056 que acrescenta o seguinte
parágrafo ao art. 62 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996:
Art. 62. § 1º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios, em
regime de colaboração, deverão promover a formação inicial, a continuada e
a capacitação dos profissionais de magistério. [...] (BRASIL, 2009b).

O PARFOR é destinado aos professores em exercício nas escolas públicas


estaduais e municipais, sem formação adequada às exigências da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDBN), oferecendo cursos superiores públicos e gratuitos
em municípios dos estados da Federação, por meio de 76 instituições públicas de
educação superior.
Por meio deste plano, o docente sem formação adequada poderá graduar-se nos
cursos de primeira licenciatura, de segunda licenciatura para professores que atuam fora
da área de formação e de formação pedagógica, para bacharéis sem licenciatura. Esses
cursos podem ser ofertados nas modalidades: presencial ou à distância, com exceção da
segunda licenciatura, ofertado exclusivamente na modalidade presencial.
Em apresentações da Diretoria de Educação Básica do MEC, a mesma
apresentou um contexto sobre a relação entre matrículas e concluintes nas licenciaturas,
neste contexto, explicitava que em 2005, existia 1.248.404 matrículas e 257.053
concluintes, em 2006, existia 1.234.789 matrículas e 235.393 concluintes, em 2007
108

existia 1.190.882 matrículas e 231.231 concluintes, em 2008 havia 1.147.889 matrículas


e 227.131 concluintes, e por fim, em 2009 quando é publicada a regulamentação do
PARFOR, tem-se 978.061 matrículas e 188.807 concluintes nas licenciaturas do país.
Não é necessária nenhuma grande análise para constatar o déficit futuro de professores
da educação básica com devida formação superior como preconiza a LDBN.
Mas, por outro lado sem maiores reflexões, sobre as causas que desencorajem
que estes estudantes terminem as licenciaturas, ou mesmo quando concluintes não
insirem no mercado de trabalho como professores, em relação à situação, o que se
percebe insistentemente até o momento atual, já era retratado pelos autores Garcia,
Hypollito e Vieira, (2005, p.47) quando dizem que:
São diversos os veículos desse discurso e alto o poder de penetração das
demandas oficiais em jornais, nos comentários educacionais veiculados pela
mídia, nos periódicos especializados, etc. Enunciados sobre a escola e os
docentes são recorrentes e povoam o universo simbólico acerca da educação,
das instituições escolares e dos seus agentes, autorizando expectativas e
produzindo uma demanda por determinado tipo de identidade. Na última
década, segundo os discursos educacionais, os professores têm sido
apontados como os grandes responsáveis pelo fracasso do sistema escolar
público e pelo insucesso dos alunos. Esse discurso interpelou e vem
interpelando os docentes da escola pública dos ensinos fundamental e médio
(Anadon; Garcia, 2004; Hypolito et al., 2003), produzindo uma demanda que
vem justificando as políticas de formação e certificação profissional
propostas nos últimos anos.

Cabe ressalta nesse momento que o cenário nacional, copiando recomendações


de instituições transnacionais marcadamente reitera a necessidade de uma qualidade,
num contexto polissêmico, e que no bojo residual marca a presença constante da
responsabilização pelo ensino na figura do professor faz se necessário lembrar que a
mudança educativa não depende exclusivamente do professor, da sua competência
técnica, política e humana, esse dizeres se reforçam quando afirma Fernandes (2000,
p.83) que “o sucesso da mudança depende, também, de escolhas que envolvem relações
de poder e de autoridade, valores e finalidades éticas e políticas que transcendem o
individual”.
Há dentro do quadro normativo, precisamente o Decreto nº 6.755, que cria os
Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente que são órgãos
colegiados, para dar cumprimento aos objetivos do Plano Nacional de Formação de
Profissionais do Magistério da Educação Básica (PARFOR). E é possível perceber na
regulamentação que o sucesso desse plano dependerá diretamente de Estados e
Municípios no cumprimento do seu papel na liberação dos profissionais participantes do
109

Plano para a frequência às aulas presenciais e para se dedicar ao estudo no caso dos
cursos a distância. Esse é um grande desafio dos Fóruns, cuja criação é condição para a
participação das Unidades Federadas no referido Plano.
Os 26 Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente estão
encarregados, segundo o decreto, das funções de: elaborar e acompanhar a execução de
um plano estratégico; definir prioridades e metas do programa em cada estado;
coordenar as ações de formação de professores e de propor ações específicas para
garantia de permanência e rendimento satisfatório dos professores da educação básica.
A pesquisa aborda justamente como se dá os encaminhamentos nos Fóruns para
o cumprimento da função de coordenar as ações de formação de professores e garantir
ou não da permanência e rendimento dos mesmos. Para isso, a metodologia se pautará a
análise das atas das reuniões dos fóruns e dos relatórios produzidos pela CAPES.
Esses Fóruns, compostos por representantes de diversos segmentos envolvidos
na execução do Plano, serão responsáveis pela elaboração de Planos Estratégicos, e
sendo uma das imputações à definição de ações a serem desenvolvidas para o
atendimento das necessidades de formação inicial e continuada, nos diferentes níveis e
modalidades de ensino, e também, a definição das responsabilidades de cada partícipe,
com especificação dos compromissos assumidos, inclusive financeiros. (BRASIL,
2009c).
O plano estratégico de cada Estado está circunscrito pelo decreto nº 6.755, de 29
de janeiro de 2009, que em seu Art. 5º aponta o que deve ser observado:
I - diagnóstico e identificação das necessidades de formação de
profissionais do magistério e da capacidade de atendimento das
instituições públicas de educação superior envolvidas; II - definição de
ações a serem desenvolvidas para o atendimento das necessidades de
formação inicial e continuada, nos diferentes níveis e modalidades de
ensino; e III - atribuições e responsabilidades de cada partícipe, com
especificação dos compromissos assumidos, inclusive financeiros.

A intencionalidade é que os planos elaborados em cada estado possam


contemplar as reais necessidades formativas dos profissionais da educação, visando
garantir tempo remunerado de estudo durante o período em que se dedicar aos cursos
ofertados pelo Plano Nacional de Formação dos Profissionais da Educação Básica,
aspecto esse que ao longo da investigação verifica-se problemático e dado pouca ênfase
nos encaminhamentos.
Nos tempos atuais parecem se confirma o pronunciamento de Freitas (2007,
p.1212) apontando que:
110

Nesse contexto, as universidades perdem sua autonomia didático-científica


quanto à definição do caráter e da concepção do projeto, pois não têm
participação na elaboração das Propostas Conceituais e Metodológicas do
Programa. Assim entendido, os objetivos e os conteúdos das licenciaturas, a
serem oferecidos pelas instituições de ensino superior, passarão a ser
definidos fora delas, tendo como referência os objetivos de formação da
educação básica, centrados exclusivamente nos processos de aprendizagem
dos conteúdos escolares, na avaliação e gestão do trabalho e da formação. A
sólida formação teórica de base, científica, nos fundamentos das Ciências da
Educação e nas teorias pedagógicas, encontra-se comprometida, pela retirada
desses estudos dos cursos de formação.

A ênfase nos conteúdos de ensino prevalece e se aprofunda pelo caráter


pragmático que impregna a Proposta Conceitual e Metodológica do Programa, cabendo
às IES proporem a estrutura operacional e a estrutura curricular, envolvendo a formação
dos tutores e a elaboração do material didático, à luz das concepções elaboradas pela
SEB/MEC. Contudo, como salienta a autora Freitas (p.1217) “a CAPES, juntamente
com o FNDE, no financiamento, e o INEP, na avaliação da educação básica, compõe o
tripé das agências reguladoras no campo da educação”.

Os encaminhamentos dos Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação


Docente

Considerando o contexto acima exposto, verifica-se que a partir da adesão as


Instituições de ensino superior disponibilizam, variando de Estado para Estado, diversas
possibilidades de formação para o docente da educação básica. Há cursos clássicos de
Licenciatura em Pedagogia, Matemática, Letras, Filosofia, e outros diferenciados tais
como Licenciatura em Letras Materna Indígena, no PARFOR em Rondônia.
Pressupondo o regime de colaboração entre os entes federados, o PARFOR é
executado mediante Termos de Cooperação firmados entre o governo federal, os estados
e municípios, além da adesão as esses termos pelas instituições de ensino superior, cada
um assumindo determinadas atribuições. O regime de colaboração é estabelecido na
Constituição Federal de 1988 (caput, art. 211), que postula “A União, os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas
de ensino”.
A LDBN, em seu artigo 8º, reitera o disposto na Constituição Federal. Já o Plano
Nacional de Educação (PNE), estabelecido pela Lei Nº 10.172/01, define o
aperfeiçoamento desse regime, quando dispõe, no seu Capítulo V “Aperfeiçoar o regime
de colaboração entre os sistemas de ensino com vistas a uma ação coordenada entre
111

entes federativos, compartilhando responsabilidades, a partir das funções


constitucionais próprias e supletivas e das metas deste PNE”.
Nesse sentido, estados e municípios brasileiros são parceiros do MEC e das IES
na operacionalização do programa emergencial que é o PARFOR, no entanto,
observando os registros realizados nos relatórios da CAPES, é possível inferir que esses
entes federados apresentam dificuldades na efetivação de ações para viabilizá-lo.
Conforme alertava Vieira (2006, p. 33) ao descrever que “construir uma agenda de
colaboração mútua entre as instâncias de Poder Público, portanto, é um desafio a ser
incorporado por todos os que fazem a educação, independentemente da esfera em que se
insiram”.
Uma das formas de efetivação do regime de colaboração já estabelecido seria a
garantia, por estados e municípios, do cumprimento da Lei nº 11.738, de 16 de julho de
2008, que no seu Art. 2o § 4o prevê: “Na composição da jornada de trabalho, observar-
se-á o limite máximo de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das
atividades de interação com os educandos”. (BRASIL, 2008a). Isso implica que 1/3 da
carga horária contratual do professor poderá ser utilizada para investimento em sua
formação, situação essa que em vários meios de comunicação têm registrado o não
cumprimento legal, por alguns Estados, da decisão proferida no Supremo Tribunal
Federal que reafirma a constitucionalidade de um terço da jornada para a hora-atividade.
Neste contexto, percebem-se dificuldades de articulação nos fóruns de alguns
estados, como o registrado na ata do fórum do Estado de Rondônia, na fala da
coordenação do PARFOR, e relatado pela secretária do fórum:
(...) informou estar com dificuldade em relação à validação das inscrições na
Plataforma Freire, particularmente com relação aos professores inscritos pela
UNDIME, pois existe um grande número de professores inscritos, porém,
sem encaminhamento de documentação. O que não permite a efetivação da
matrícula dificultando a definição do orçamento e consequentemente o início
dos cursos, assim como a manutenção dos pólos estabelecidos quando da
inscrição dos futuros cursistas nas licenciaturas (Ata da primeira reunião do
Fórum Permanente de Apoio à Formação Docente do Estado de Rondônia,
07/05/2010).

Esse registro descreve as dificuldades no contexto da logística de aglutinar as


matrículas, realmente apontar quem são os cursistas e suas correspondentes escolhas de
licenciatura e acompanhar suas necessidades específicas de formação. Parece-nos como
sempre nos programas a eterna emergência fruto de uma expectativa de fazer a qualquer
custo, porque no cotidiano das instituições há a crença de que pior que está não vai
ficar.
112

Nos fóruns percebe-se que houve o esclarecimento do papel dos mesmos, e a ata a
seguir representa bem os registros existentes nos vários fóruns:
Aspectos formais do Plano Nacional de Formação de Profissionais do
Ministério da Educação Básica, destacando suas etapas: a primeira etapa
inclui diagnóstico da situação dos professores e planejamento; a segunda
etapa inclui inscrição e validação na Plataforma Paulo Freire, e a terceira
etapa seria a construção do sistema de formação com o respectivo
acompanhamento e avaliação. (Ata da Reunião de Implementação do Fórum
de Apoio a Formação Docente – Acre, 23/02/2010)

A terceira etapa descreve a necessidade de construir um sistema de formação


incluindo o acompanhamento e avaliação, nos registros das atas praticamente inexistem
os consensos estabelecidos dentro dos fóruns. Parece que essa ação é postergada frente a
outras ações a serem resolvidas. Alguns elementos nos permite induzir que os cursos
mesmo sendo articulados por uma coordenação geral do PARFOR em cada Estado, em
diferentes intensidades, não conseguiram articular nas instituições de ensino superior os
espaços representativos (conselhos de departamento, conselhos universitários) que
permitissem maiores inovações nas propostas de pedagógicas, em bom termo,
adequações curriculares as demandas específicas deste estudante que é professor. Em
alguns casos percebem-se propostas pedagógicas sendo aprovadas nos conselhos das
instituições após metade do curso ter sido realizado. Assim, identifica-se uma
abordagem menos preocupada com a qualidade deste ensino, e mais com a certificação
destes professores.
Certificação esta que não significa manter-se no trabalho já que não há garantias
para uma fatia significativa que está com contratos temporários que os estados e
municípios manterão os contratos ou farão concursos públicos para enquadrá-los como
funcionários púbicos de carreira. Não se pode negar que outras frentes se articulam
(como Proposta de Emenda à Constituição (PEC) relacionada ao bônus e avaliação
nacional de professores da educação básica, mas essa é uma problemática ainda não
concluída no cenário político educacional.
Neste contexto, há como apontado anteriormente, aspectos logísticos que
canalizam os esforços e estes são refletidos, por exemplo, na região norte quando na
reunião se aponta:
A realidade do Amazonas é bem complexa, pois a dificuldade de acesso e
debilidade dos canais de comunicação tem inviabilizado o repasse de
informações aos professores e em muitos municípios as informações não são
repassadas aos docentes. A professora lembrou ainda que a CAPES foi mais
flexível para o Estado do Amazonas no que se refere à questão da declaração
que o professor tem que apresentar, comprovando que está atuando ou atuou
em áreas diferentes da sua área de formação (Ata da reunião ordinária do
113

Fórum Permanente de Apoio à Formação Docente do Estado do Amazonas,


04/05/2010).

Aparentemente, as sínteses das reuniões dos fóruns estão muito mais canalizadas
para discorrer ou ratificar sobre assuntos operacionais, do que propriamente amadurecer
consensos sobre as intencionalidades dos planos estratégicos a partir de sua elaboração e
acompanhamento até sua execução. Não há menção sistemática sobre uma preocupação
entorno das assertivas das políticas curriculares. O foco se reflete muito dentro do
fragmento:
Passou-se à definição dos critérios que nortearão a construção do documento,
ficando, portanto, para a segunda licenciatura: a) Que o professor/candidato
esteja atuando fora da sua área de formação; b) Que tenha no mínimo dois
anos de docência e, c) Pertencer, preferencialmente, ao quadro efetivo,
podendo ser atendidos (Ata da reunião ordinária do Fórum Permanente de
Apoio à Formação Docente do Estado do Amazonas, 04/05/2010).

Complementando a análise percebe-se no Relatório Gestão CAPES 2010, as


preocupações levantadas frente ao desconhecimento dos sistemas sobre a real situação
da demanda por formação. A demanda por formação foi identificada a partir do
Educacenso do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas - INEP, todavia os dados
apresentados, em função da metodologia utilizada não permitiram indicar com precisão
a quantidade de professores em exercício na rede de educação básica sem graduação,
fora de sua área de formação e sem habilitação em licenciatura.
Observa-se, também, que os próprios sistemas estaduais e municipais não
possuem diagnósticos precisos sobre as necessidades e a situação da formação dos seus
docentes. Tudo isso contribui para um desconhecimento da real necessidade e demanda
por formação dos docentes em exercício.
Descreve-se que a ausência de planejamento e articulação dos sistemas. As
secretarias estaduais e municipais necessitam dialogar com as unidades escolares no
sentido de realizar um plano de capacitação que identifique quem necessita de
formação, em que disciplina e o quantitativo de profissionais que podem ser liberados
para participar dos cursos de formação. E afirmam que somente esta articulação pode
garantir a efetividade do Plano.
Os dois aspectos acima elencados podem justificar a evidenciada
incompatibilidade entre os números apresentados quanto oferta e matrícula no
PARFOR, observa-se que o número vagas ofertadas é alto, todavia o de matrículas é
relativamente baixo.
114

O relatório indica a necessidade de um de parte das secretarias estaduais e


municipais de apresentarem um diagnóstico mais preciso da demanda e elaboração de
um planejamento que possa orientar a oferta de cursos e vagas pelas Instituições de
Ensino Superior (IES).
A também a menção a evasão, e afirma que é desencadeada, especialmente, pela
inexistência de condições socioeconômicas do professor para permanecer frequentando
o curso. Além dos baixos salários recebidos por grande parte dos professores, muitos
têm que arcar com os custos de sua hospedagem e alimentação e com o descolamento
para as localidades onde os cursos são implantados. Assim, o impacto financeiro no
orçamento dos professores os conduz a desistir de frequentar os cursos.
Apontam para uma divulgação ineficiente e, assim identificando a necessidade
promover a divulgação do PARFOR, especialmente nos municípios mais interiorizados
das distintas regiões do País. Esclarecendo que houve dificuldade de acesso à
Plataforma Freire, no que diz respeito à pré-inscrição dos candidatos nos cursos de
formação inicial, que nesse sistema informatizado criado e gerido pelo MEC para a
captação da oferta e da demanda por formação no âmbito do PARFOR.
Neste sistema, as IES disponibilizam os cursos e as respectivas vagas, para que
os professores em exercício na rede pública de educação básica realizem sua pré-
inscrição. Esta, por sua vez, deverá ser validada pela Secretaria de Educação do ente
federativo ao qual o professor pertence. Depois de validada a inscrição, o candidato é
chamado pela IES para realizar o processo de seleção, e posteriormente, para a
matrícula, se selecionado. Todavia, observou-se que em muitas localidades o acesso às
tecnologias de comunicação é extremamente precário, o que impede ou dificulta o
acesso, especialmente dos candidatos, à Plataforma Freire, o que tem prejudicado a
captação da demanda.
Há por parte desta regulação e de outras que disciplinam as estruturações das
licenciaturas um encaminhamento que leva a retirada da autonomia das instâncias
colegiadas das instituições superiores de ensino, em destaque as federais, que de alguma
maneira são responsáveis pelo atendimento de boa parte das políticas das regiões norte,
nordeste, centro-oeste, perfazendo 45% da distribuição do PARFOR, sem contar a
região sudeste e sul em que há maior aderência de entidades estaduais e comunitárias,
no que tange o seu exercício de definir encaminhamentos de natureza curricular.
Atualmente, os projetos dos cursos de licenciaturas devem ser aprovados pela
CAPES, assim fica a questão qual será a autonomia das instituições de ensino superior
115

na formulação e aprovação dos projetos políticos pedagógicos dos cursos de licenciatura


e da organização do seu ensino.

Considerações Finais

As ações desenvolvidas por muitas das Instituições de Ensino Superior e pelas


redes de ensino estadual e municipal apresentam obstáculos técnicos e metodológicos
que dificultam a viabilização da participação e permanência dos docentes nos cursos
presenciais e a distância, vinculados ao PARFOR. Provavelmente, há uma análise
superficial das reais demandas e o processo de divulgação e acesso aos docentes, sem
formação inicial, não atende as reais necessidades desses professores.
Há pouco envolvimento dos municípios, principalmente os mais distantes dos
centros de formação e com menor Índice de Desenvolvimento da Educação Básica –
IDEB, e isto, se refletem na participação dos professores nos cursos, pois a organização
dos tempos e espaços apropriados ao acesso desse professor a essa formação não se
efetivam.
O Relatório Gestão CAPES 2010, descreve problemas encontrados na
implementação do PARFOR, e que parecem estar diretamente ligados à atuação dos
fóruns, um refere-se ao desconhecimento dos sistemas sobre a real situação da demanda
por formação. Segundo o relatório a demanda por formação foi identificada a partir do
Educacenso do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP), todavia os dados
apresentados, em função da metodologia utilizada não permitiram indicar com precisão
a quantidade de professores em exercício na rede de educação básica sem graduação,
fora de sua área de formação e sem habilitação em licenciatura. Adverte que os próprios
sistemas estaduais e municipais não possuem diagnósticos precisos sobre as
necessidades e a situação da formação dos seus docentes. Tudo isso contribui para um
desconhecimento da real necessidade e demanda por formação dos docentes em
exercício.
A ausência de planejamento e articulação dos sistemas consta como outro
problema, no relatório a menção de que as secretarias estaduais e municipais necessitam
dialogar com as unidades escolares no sentido de realizar um plano de capacitação que
identifique quem necessita de formação, em que disciplina e o quantitativo de
profissionais que podem ser liberados para participar dos cursos de formação. Somente
esta articulação pode garantir a efetividade do Plano.
116

Os aspectos acima elencados podem justificar a evidenciada incompatibilidade


entre os números apresentados quanta oferta e matrícula no PARFOR. Observe-se que o
número vagas ofertadas é alto, todavia o de matrículas é relativamente baixo. Isso indica
a necessidade de um de parte das secretarias estaduais e municipais diagnóstico mais
preciso da demanda e elaboração de um planejamento que possa orientar a oferta de
cursos e vagas na Instituição de Ensino Superior, neste caso, a Universidade Federal de
Rondônia.
Os Fóruns Estaduais são órgãos colegiados, com pouco tempo de criação,
vinculados a uma estrutura estatal que apresenta pouca experiência de colaboração
efetiva entre entes federados. Assim, ajustar os caminhos para o cumprimento aos
objetivos do PARFOR ainda requer amadurecimento das perspectivas de cada ente, pois
o plano é executado em regime de colaboração entre a CAPES, o MEC, as secretarias
de educação dos estados e municípios e as instituições públicas e comunitárias de
ensino superior.

Referências

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Apoio à Formação Docente do Estado de Rondônia. Realização em 07/05/2010.

BRASIL. MEC. PDE. Plano Nacional de Formação de Professores da Educação


Básica. Brasília, DF: MEC, 2009a

BRASIL. MEC/INEP. Sinopse Estatística sobre o Professor – Censo Escolar 2007.


Brasília, DF, INEP, 2007. Disponível em:
www.inep.gov.br/download/censo/2009/sinopse_professor.zip. Acesso em: 20/09/2009.

BRASIL. Ministério da Educação. DECRETO nº 6.755. Institui a Política Nacional de


Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, disciplina a atuação da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES no fomento a
programas de formação inicial e continuada, e dá outras providências. Brasília, DF, 29
de janeiro de 2009.

BRASIL. Ministério da Educação. PORTARIA Nº. 883. Estabelece as diretrizes


nacionais para o funcionamento dos Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à
Formação Docente. Brasília, DF, 16 de setembro de 2009.

FREITAS, Helena C. L. A (Nova) Política de Formação de Professores: A


Prioridade Postergada. Revista Educação & Sociedade, Campinas, vol. 28, n. 100 -
Especial, p. 1203-1230, out. 2007. Disponível em http://www.cedes.unicamp.br
117

HARGREAVES, Andy. Uma introdução: compreender a educação na era pós-


moderna. In: FERNANDES, Margarida Ramires. Mudança e Inovação na Pós-
Modernidade: perspecyivas curriculares. Portugal: Porto Ed., 2000.

GARCIA, M.M.A., HYPOLLITO, A.M. , VIEIRA, J.S. As identidades docentes como


fabricação da docência. Revista Educação e Pesquisa. São Paulo, v.31, n.1, pp. 45-56,
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PORTARIA NORMATIVA Nº 9, DE 30 DE JUNHO DE 2009. Institui o Plano


Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica no âmbito do Ministério da
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Universidade Federal Piauí. Competências da Coordenação de Currículos.


Disponível em:www.ufpi.br/cc/materias/index/mostrar/id/4907. Acesso em: 06/06/2011

VIEIRA, S. L. Educação e gestão: extraindo significados da base legal. In: LUCE, M.


B.; MEDEIROS, I. L. P. Gestão escolar democrática: concepções e vivências. Porto
Alegre: UFRGS, 2006.
118

Comunicação

Gestão da escola, qualidade do ensino e avaliação externa: representações sociais


no cotidiano escolar

Ana Lúcia Garcia Parro


Universidade Estadual Paulista – UNESP, Marília
Centro de Estudos e Pesquisas em Administração da Educação – CEPAE

Resumo: Inserindo-se no âmbito das pesquisas que se preocupam com a qualidade da


escola e suas finalidades, este trabalho tem por objetivo identificar as representações
sociais dos diferentes integrantes de escolas públicas paulistas a respeito da gestão,
qualidade do ensino e avaliação externa. Parte-se de um referencial que compreende a
escola como produtora de políticas apesar de inserida em um contexto de
implementação de programas marcados pela valorização do controle e dos resultados de
aprendizagem. Dentre os procedimentos metodológicos, destacam-se a observação de
três escolas públicas da rede estadual paulista e a realização de entrevistas semi-
estruturadas. O estudo indicou que o cotidiano das instituições está marcado pela
construção de regras e acordos próprios de cada grupo e, diante disso, busca-se
contribuir com a discussão das reais possibilidades de a escola vir a desenvolver uma
formação de qualidade.
Palavras-chave: Gestão Escolar. Qualidade do Ensino. Avaliação Externa.

Introdução
O texto que se apresenta integra-se ao projeto de pesquisa em rede, intitulado
“Indicadores de Qualidade e Gestão Democrática”1 cuja problemática é discutir a
qualidade da escola básica referente aos indicadores de desempenho, gestão
democrática e avaliação em larga escala. Os estudos que integram o projeto têm a
finalidade de investigar a avaliação institucional e da aprendizagem, os indicadores de
desempenho dos sistemas de ensino e determinantes da qualidade do ensino das escolas
públicas.
Nesse contexto, os objetivos desta pesquisa são desenhados a partir da
seguinte questão: quais as representações sociais de diferentes membros da escola

1
Projeto Observatório da CAPES – Edital n.038/2010.
119

acerca da gestão escolar, qualidade do ensino e avaliação externa? O problema da


pesquisa recai sobre a discussão das reais possibilidades de a escola contribuir com a
formação do indivíduo e com a construção de uma outra escola, considerando,
sobretudo, que a mesma encontra-se em um contexto de implementação de políticas e
programas externos a ela, marcado pela supervalorização do controle por resultados de
aprendizagem.
A análise deste trabalho se baseia nos estudos que defendem a especificidade
da escola e da gestão escolar e nos subsídios da teoria das representações sociais
(JODELET, 2001; MOSCOVICI, 2001, ALVES-MAZZOTTI, 2008). O conteúdo das
entrevistas realizadas revelam conhecimentos e opiniões pessoais mais ou menos
elaboradas, impressões de quem está dentro da escola, as concepções vivenciadas pelo
cotidiano escolar, as representações sociais do grupo em questão (JODELET, 2001;
MOSCOVICI, 2001). Ao definir o conceito representações sociais, Jodelet (2001, p.22)
destaca o seu reconhecimento e validade enquanto forma de conhecimento.
É uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um
objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum a
um conjunto social. Igualmente designada como saber do senso comum ou
ainda saber ingênuo, natural, esta forma de conhecimento não é diferenciada,
entre outras, do conhecimento científico. Entretanto, é tida como um objeto
de estudo tão legítimo quanto este, devido à sua importância na vida social e
à elucidação possibilitadora dos processos cognitivos e das interações sociais.

A investigação das concepções vivenciadas na escola acerca da qualidade e


gestão escolar faz sentido ao entender a escola enquanto espaço de produção de saberes,
práticas e regras. Neste sentido, autores como Lima (2003), Canário (1996), Nóvoa
(1995), Derouet (1996) contribuem com seus estudos sobre a escola ao valorizá-la como
espaço de produção, enquanto sujeito na organização do trabalho e oferecem subsídios
para a realização de novas pesquisas.
Ao estudar a concretização das reformas na realidade da prática escolar
brasileira, Silva Jr e Ferretti (2004) trazem à tona três faces da instituição escolar as
quais refletem sua especificidade e síntese: o institucional, a organização e a cultura.
Por esse viés, os autores se propõem a entender e pesquisar a contribuição da escola
para a construção do pacto social vigente. Os autores apontam, igualmente, que a escola
não é uma agência reprodutora que, por meio de suas três faces, no momento de
implantação das reformas se torna possível a contra hegemonia.
Este texto apresenta, inicialmente, uma análise das categorias da pesquisa –
gestão, qualidade e avaliação-, tendo como objetivo explicitar as contribuições teóricas
120

que nortearam o desenvolvimento da pesquisa. Em seguida, são apresentadas as falas


dos integrantes das escolas, fruto da realização e transcrição das entrevistas. Por fim,
são tecidas algumas considerações que pretendem endossar as discussões acerca da
temática.

1- Gestão da Escola, Qualidade do Ensino e Avaliação

As reflexões a seguir explicitam parte do referencial que aborda questões


relacionadas à gestão, qualidade e avaliação que vão ao encontro da construção desta
pesquisa e de que forma essas categorias estão inter-relacionadas no cotidiano escolar.
Importa destacar que, neste texto, gestão e administração escolar são termos
utilizados como sinônimos, embora se reconheça estudos que apontam a diferença do
significado dos termos, como em Silva Jr (2002).
A gestão escolar com origem nos moldes da Teoria Geral de Administração
(TGA) tem autores (PARO, 1986; RUSSO, 2005; SILVA JR, 2002) que defendem uma
administração que considera a especificidade do processo pedagógico escolar para
organizar-se. Desse modo, destaca-se uma recusa ao paradigma da administração
empresarial como referência para a gestão no cotidiano escolar. De acordo com Paro
(1986, p. 136), “a Administração Escolar precisa saber buscar na natureza própria da
escola e dos objetivos que ela persegue os princípios, métodos e técnicas adequados ao
incremento de sua racionalidade”.
Em defesa de uma administração escolar diferente dos moldes empresariais,
Russo (2005) assinala uma mudança dos paradigmas que foram dominantes para a
administração escolar até meados da década de 1980, quando se passou a questionar a
transposição mecânica dos princípios e métodos da TGA para a escola. Para o autor,
essa mudança de paradigmas justifica-se pela
incompatibilidade entre o fundamento capitalista da teoria geral de
administração produzida para mediar o sistema de exploração da força de
trabalho e maximizar a extração da mais-valia e a natureza e método de
atualização cultural das novas gerações que, em última instância, representa a
produção e continuidade da humanidade (RUSSO, 2005, p.29).
Diante do exposto, é preciso esclarecer, então, o significado atribuído ao termo
gestão ou administração escolar. Em seu estudo sobre a administração escolar, Paro
(1986) a defini e reafirma em estudos posteriores (Paro, 2008), “como a utilização
racional de recursos para a realização de fins determinados”. Se a administração é a
121

utilização de meios, então, pode-se afirmar, com Russo (2005), que a gestão é mediação
entre os recursos (meios) e os resultados (fins).
A especificidade da administração escolar ocorre justamente porque a
administração enquanto mediação não é um fim em si mesma, seus objetivos são os
objetivos do que é administrado e, no caso, a administração deve organizar-se em torno
de suas finalidades, os objetivos da escola. Nas palavras de Russo (2005, p. 37), a
educação, como prática humana de formação de sujeitos históricos, “exige formas de
organização do trabalho que priorizem as relações solidárias e cooperativas, fundadas
nos princípios do diálogo e da persuasão, isto é, de relações entre iguais”.
Ora se a gestão é mediação, vale destacar quais são os meios e os fins da
educação. Caminhando nessa perspectiva, Paro (1986) reserva à educação dois papéis
fundamentais: transmitir o saber historicamente acumulado e desenvolver uma
consciência crítica da realidade. É importante assinalar que, assim como Paro (1986),
Saviani (2008), ressalvadas suas especificidades, enfatiza a necessidade de transmitir o
saber historicamente acumulado na escola. Reconhecer a existência de um
conhecimento que precisa ser socializado não anula a atividade do aluno e a importância
da construção de novos saberes além do que fora historicamente produzido.
Vale ressaltar que, dessa forma, a qualidade da educação não está diretamente
relacionada a uma medida que pode ser verificada externamente ou a metas
estabelecidas de cima para baixo. A qualidade relaciona-se a uma formação que está
além de conhecimentos quantificáveis, que envolve valores e atitudes, relações
pedagógicas humanas e democráticas. Nesse ponto, cabe ressalvar a importância da
avaliação externa para o sistema de ensino, para avaliar, para conhecer e servir de
parâmetro para reorganizar o ensino, embora sejam reconhecidas suas limitações em
qualificar o que não pode ser quantificado.
Nesse ponto, é preciso introduzir algumas considerações referentes ao
procedimento de avaliação em larga escala. Diferentes autores abordam a avaliação
externa, seus resultados e/ou efeitos para as escolas e questionam certos aspectos. Sobre
os problemas atrelados à avaliação externa, Martins (2002, p.163) destaca que
É inegável que realizar a avaliação em larga escala sobre os resultados
obtidos pela escola constitui um importante indicador para que os gestores do
sistema de ensino possam corrigir os problemas do fluxo escolar e reorientar
as decisões e medidas legais. No entanto, esses mecanismos podem limitar
sobremaneira as possibilidades para a ampliação do exercício da autonomia
da escola, caso continuem desconsiderando o incentivo à auto-avaliação, bem
como a possibilidade de gestão de seus recursos.
122

Essa mesma autora enfatiza ainda que a avaliação tal como é realizada “não
parece captar a complexidade da dinâmica intra-muros escolares e tampouco suas
características qualitativas, isto é, sua cultura, seus valores, a interação e os conflitos
entre os pares e entre estes e a comunidade” (MARTINS, 2002, p. 136).
Tendo em vista que os resultados obtidos são indicadores do desempenho dos
alunos, é preciso compreender que a avaliação em larga escala não é ruim ou prejudicial
em si mesma. Em outra pesquisa (GARCIA, 2010) foi apontado que as críticas
relacionadas a essa avaliação residem na utilização equivocada desses parâmetros, tanto
pela escola como pelo Estado, o que provoca a disputa no interior e entre as escolas via
criação de rankings educacionais e incentivos financeiros. O que poderia se constituir
em um referencial para melhorar e aglutinar esforços visando à melhoria da qualidade
termina por responsabilizar, culpando ou punindo quando metas não são atingidas.
No que se refere às políticas de avaliação da educação e sua apropriação pelas
escolas, Sousa e Oliveira (2003, p.883) acrescentam que
Não se pretende, com as considerações aqui esboçadas, desprezar o valor da
avaliação externa, onde se situa a apreciação do trabalho escolar pelas
instâncias administrativas do sistema, a qual, no entanto, não deve se traduzir
na aplicação de testes de rendimento escolar. Potencializar a dimensão
educativa/formativa da avaliação certamente supõe a promoção da autonomia
pedagógica e didática da escola e não a sua conformação, que se realiza
quando se delimita que conhecimento deverá ser legitimado pela escola, cujo
cumprimento é condição para sua premiação.

A seguir apresenta-se uma análise das entrevistas realizadas em três escolas


públicas da rede estadual com o objetivo de compreender como pais, professores e
gestores concebem a gestão, a qualidade e a avaliação externa no interior da escola.

2- As representações sociais do cotidiano escolar

As entrevistas foram realizadas em três escolas da rede estadual de São Paulo,


sendo uma delas com maior IDESP2, que será identificada como Escola A; outra que
havia apresentado maior IDESP, mas devido à acusação de fraude na avaliação do
SARESP – Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo, passa
por um processo de reavaliação e teve seus gestores e professora afastados, identificada
como Escola B, ambas escolas de Ensino Fundamental – Ciclo I; e, uma terceira escola,
Escola C, de Ensino Fundamental – Ciclo II e Médio, que apresentou o menor IDESP.

2
Os dados do IDESP utilizados como referência foram os de 2011, ano de início da realização desta
pesquisa.
123

Após o contato inicial por telefone e autorização para a realização da pesquisa


pelas Diretorias de Ensino e gestores das escolas, foi realizada uma observação da
unidade escolar e entrevistas com pais, professores, diretores, vice e professores
coordenadores. É importante mencionar algumas características: embora tenham prédios
diferentes entre si, as três escolas têm em comum o mobiliário escolar e o material
didático; as escolas de Ensino Fundamental Ciclo I participam dos mesmos cursos
oferecidos pela rede e que foram mencionados nas entrevistas, o Plano Nacional de
Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) e o Programa Ler e Escrever que, além de
oferecer material de atividades para o aluno, oferece textos de reflexão para os
professores nas reuniões de HTPC.
A escola A localiza-se em uma área central no município de Araras, com 390
alunos provenientes de diferentes bairros, atende a uma clientela bem diversificada em
termos socioeconômicos, segundo a diretora da escola. Os alunos realizam as aulas de
Educação Física no pátio da escola pois não há quadra. Também não possuem biblioteca
e sala de informática por falta de espaço físico.
Já a escola B está localizada em um distrito industrial do município de
Sorocaba, em uma rua sem asfalto. As casas ao redor da escola são modestas, muitas
feitas de madeira. Os moradores, em sua maioria, segunda a vice diretora da escola,
tomaram posse das terras, não são trabalhadores das indústrias próximas que não
oferecem emprego a essas pessoas devido ao casos de assaltos cometidos pelos
moradores. A escola possui quadra, computadores com acesso à internet para uso dos
alunos e uma sala de leitura. Atende 46 alunos divididos em quatro turmas, sendo duas
no período da manhã (3º e 5º anos) e duas no período da tarde (1º e 2º anos).
A escola C, pertence ao município de Itu, mas está localizada em um bairro
periférico a 20 km da área urbana. A maioria dos professores reside em Sorocaba,
município mais próximo que o centro de Itu. Os carros dos professores e funcionários
são guardados no interior a escola o que foi necessário, de acordo com a diretora,
devido aos furtos e danos provocados pelos moradores da região. A escola com cerca de
500 alunos possui quadra coberta, sala de informática e biblioteca.
O contato com as três realidades traz à tona a necessidade de um olhar para as
peculiaridades de cada organização escolar e suas dificuldades para implementar aquilo
que é proposto oficialmente. Apesar das diferenças, nas entrevistas muitas falas são
semelhantes.
124

Com relação à gestão escolar, nota-se que há uma divisão das funções nas
escolas, uma separação hierárquica, na qual o diretor, assume o topo da hierarquia e
aparece como responsável pela gestão escolar: “[...] É tudo bem separadinho. [...] A
gente tem uma diretriz, mas eu como vice, sou diferente da diretora e da coordenadora.
Eu acho assim, que no fim, elas são as chefes entre parênteses.” (Vice, Escola A, 2013);
“Ela (a diretora) direciona, é como se fosse a nossa luz [...] porque tudo tem uma
hierarquia também” (Professora, Escola A, 2013).
Na Escola B, a vice diretora do Programa Escola da Família que atua como
coordenadora durante a semana mencionou sobre o diretor que “a parte burocrática ele
que vai atrás” (Coordenadora, Escola B, 2013).
Já na fala da vice diretora de Itu, a equipe gestora, composta pela diretora, vice
e coordenadora, assume essa função de direção: “A gente toma as decisões juntas. As
três.” (Vice, Escola C, 2013).
Apesar de as falas indicarem o diretor ou a equipe gestora como responsáveis
por tomar as decisões na escola, é comum falas que defendem que a gestão escolar é
democrática. A palavra democrática foi mencionada por todos os entrevistados das
Escolas B e C quando indagados sobre a gestão escolar ou a organização do trabalho:
“Eu procuro sempre assim... tomar as decisões democraticamente, tanto na parte
financeira, dos recursos financeiros que a gente recebe da Secretaria da Educação e do
MEC, vejo com os colegiados, a APM [...]” (Diretora, Escola C, 2013). E, na Escola B,
a coordenadora enfatizou que: “Nós temos uma gestão bem democrática,
participativa...”. Quando questionada sobre o que seria essa gestão democrática,
mencionou que ocorre “porque o diretor é uma pessoa muito transparente, ele dá
espaço” (Coordenadora, Escola B, 2013).
Cumpre assinalar nessa fala que a gestão dita democrática depende de uma
concessão do diretor. Nas palavras de Paro (2008, p.18-19) “se a participação depende
de alguém que dá abertura ou que permite sua manifestação, então a prática em que tem
lugar essa participação não pode ser considerada democrática, pois democracia não se
concede, se realiza: não pode existir ‘ditador democrático’”.
Cabe ressaltar que, na Escola A, com maior IDESP, nenhum entrevistado
mencionou a palavra democrática quando questionado sobre a organização do trabalho,
a gestão escolar ou a função do diretor na escola.
Por meio das entrevistas, buscou-se uma relação entre a gestão e a qualidade do
ensino com a finalidade de investigar de que forma a organização do trabalho escolar
125

pode contribuir com a qualidade. Entretanto, a questão da qualidade não apareceu


diretamente relacionada à gestão escolar, mas à aprendizagem dos alunos ou a
problemas que estariam externos à escola.
Na escola A, foi comum nas falas dos entrevistados a relação da qualidade com
a aprendizagem dos alunos: “O objetivo comum de todos é que todos aprendam!”
(Diretora, escola A, 2013); “A parte pedagógica é excelente. [...] Ela – a escola, foca no
aprendizado do aluno” (Mãe, Escola A, 2013); “Qual é o nosso foco? Eu sempre falo
para eles: aprendizagem de todos os alunos” (Professora, Escola A, 2013). É possível
identificar, uma linguagem próxima de diferentes membros da escola ao enfatizar a
aprendizagem dos alunos e, por esta razão, defender que se trata de uma escola de
qualidade.
Já na Escola B, quando questionada sobre o que seria uma escola de qualidade,
uma das falas ressalta a importância de um ambiente prazeroso na organização escolar
e, de certo modo, sobrepõe esse aspecto à aprendizagem dos alunos: “seus filhos podem
sair daqui sem saber ler, mas o que eu mais quero é que eles gostem da escola como eu
gosto” (Professora, Escola B, 2013).
Ainda sobre a questão da qualidade, na Escola C, foram identificados
diferentes aspectos que afetam negativamente a qualidade do ensino oferecido. A
diretora e a vice da escola deram ênfase à falta de comprometimento dos pais com a
educação dos filhos e até de alguns professores; e a coordenadora da escola mencionou,
além da falta de professor, a evasão e indisciplina dos alunos. Por meio da observação
realizada, é possível afirmar que a Escola C enfrenta problemas diferentes em seu
cotidiano, apesar de possuir uma estrutura física melhor, atende alunos de uma faixa
etária maior, sofre com a indisciplina, falta de acompanhamento dos pais, rotatividade e
falta de professor, uso de drogas e prostituição como fora mencionado pela Professora
Mediadora em conversa informal.
Em nenhum momento a questão da qualidade apareceu relacionada aos
resultados em avaliação externa, apesar de ter sido criado, no estado de São Paulo, em
2007, o Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo (IDESP)3
como um indicador de qualidade para cada unidade escolar. O principal objetivo do
índice é fornecer um diagnóstico da qualidade do ensino oferecido, apontando o que
precisa ser melhorado a cada ano. É um diagnóstico para direcionar e encaminhar ações

3
Lei Estadual Nº 7.030, de 30 de julho de 2007
126

visando à melhoria da qualidade da educação. Para isso, metas são criadas e


estabelecidas pela Secretaria da Educação para as escolas da rede estadual. Essas metas
devem ser superadas a cada ano e, assim, pretende-se atingir até 2030 os seguintes
índices: 7 para o ciclo de 1ª a 4ª série; 6 para o ciclo de 5ª a 8ª série; e 5 para o Ensino
Médio4.
Com relação à avaliação externa em larga escala, embora algumas falas
indiquem que essa avaliação não representa o trabalho realizado, nas três escolas
investigadas há um preparo, uma organização do trabalho pedagógico com o objetivo de
atingir as metas estabelecidas. O que se verifica nas falas que seguem:
Eles passam tudo pra gente e, quando tem uma prova assim, antes... uma
simulação, entendeu? Para depois, fazer no dia em que é marcado. Então, eles
não ficam com medo, eles já estão preparados [...] porque eles fazem mesmo
antes. Tem a prova do SARESP, eles fazem uma prova antes, é um simulado,
sabe? Aí, depois, no dia, vai tranquilo. (Mãe, Escola A, 2013).

Lógico que a gente fica numa super ansiedade! Mas a gente está trabalhando
desde o início do ano. A gente trabalha diariamente. Isso está na nossa cabeça
diariamente e, fora isso, fora as avaliações semanais, tem as avaliações que a
gente troca os professores na escola. (Professora, Escola A, 2013)
Ah, a gente faz vários simulados, a gente vem preparando os alunos.
(Coordenadora, Escola B, 2013)

Eu xeroco as provas anteriores [...] Já dei 5 ou 6. (Professora, Escola C,


2013)

No ano passado, a gente não conseguiu atingir a meta estabelecida pela


Secretaria, então, nós tivemos algumas ações: trabalhar com a prova do ano
passado, com o simulado para que este ano a gente consiga atingir a meta.
(Diretora, Escola C, 2013)

Eu procuro trabalhar bastante com as questões do SARESP, da Prova Brasil...


que são bastante cobradas... simulados do SARESP... Todos são cobrados
[...] Aqui, a gente prepara mesmo. (Professora, Escola C, 2013)

Merece destaque, além das ações como preparar os alunos para a avaliação
externa por meio de simulados, uma cultura de avaliação que foi construída na Escola
A. Semanalmente, todos os alunos da escola são avaliados nos moldes da avaliação
externa. Os professores, com o auxílio da coordenadora da escola, tabulam os
resultados, quantificando os alunos que atingiram ou não as competências que serão
avaliadas pelo SARESP com o objetivo de direcionar e, quando necessário, replanejar, o
trabalho pedagógico da escola.
A seguir, são tecidas algumas considerações acerca da temática e das
entrevistas realizadas nas escolas.

4
A esse respeito ver a Resolução – 74, de 6-11-2008, a qual institui o Programa de Qualidade da Escola
(PQE) e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDESP).
127

Considerações Finais

Ao analisar a organização educativa em Portugal, Lima (2003) afirma que a


escola está formalmente organizada em um contexto imposto para todo o país de
maneira uniforme, mas os estudos das e nas escolas mostram a diferença entre a
administração central e o funcionamento concreto das escolas. A esse contexto, o autor
atribui a expressão “infidelidade normativa”, uma oposição ao conformismo normativo-
burocrático, reconhecendo na escola um espaço de (auto) organização para a produção
de regras.
Com a observação e realização das entrevistas nas escolas, é possível afirmar
que a escola é um espaço de produção de regras, de política e pode vivenciar uma
“infidelidade normativa” (LIMA, 2003). Entretanto, embora os entrevistados não
tenham apresentado uma relação direta entre qualidade e resultados de avaliação
externa, essa infidelidade normativa e os espaços de autonomia que a escola pode
construir na produção de suas próprias regras aparecem a serviço do alcance das metas
estabelecidas externamente. Essa afirmação se verifica pela realização de simulados e
direcionamento do trabalho pedagógico em função da avaliação externa e dos conteúdos
que serão verificados.
Fora apresentado nesse texto que a escola não é mera reprodutora de regras
impostas (SILVA JR e FERRETTI, 2004), pode existir uma distância entre aquilo que é
prescrito e aquilo que é efetivamente realizado na escola, todavia, essa distância revela
meios que as escolas buscam para atingir os resultados propostos e a superação do
índice.
No que ser refere à gestão, embora exista um discurso a favor da gestão
democrática, esse é um exercício ainda a ser efetivado, para Paro (2008), o caminho se
faz ao caminhar. Nas palavras de Russo (2005, p. 37), a educação, como prática humana
de formação de sujeitos históricos, “exige formas de organização do trabalho que
priorizem as relações solidárias e cooperativas, fundadas nos princípios do diálogo e da
persuasão, isto é, de relações entre iguais”. Caminhando nessa perspectiva, espera-se
que, cada organização escolar, na construção de suas regras, nas margens de autonomia,
atue na contribuição com uma formação crítica e consciente de sua realidade (PARO,
1986) e que leve em consideração uma formação do indivíduo para-si (SILVA JR e
FERRETTI, 2004) voltada para a emancipação social num processo de apropriação e
128

objetivação do gênero humano. Nesse caminho, a gestão da escola é embalada


(MACHADO, 1998) para construir a qualidade negociada, na qual os fins não estão
determinados previamente, mas construídos pelo coletivo da escola.

REFERÊNCIAS:

CANÁRIO, R. O estudo sobre a escola: problemas e perspectivas. In: BARROSO, J.


(Org.). O estudo da escola. Portugal: Porto Editora, 1996.

DEROUET, J. L. O funcionamento dos estabelecimentos de ensino em França: um


objeto científico em redefinição. In: BARROSO, J. (Org.). O estudo da escola.
Portugal: Porto Editora, 1996.

GARCIA, A. L. Gestão da Escola, Qualidade do Ensino e Avaliação Externa:


desafios na e da escola. 2010. 97f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de
Filosofia e Ciências, UNESP, Marília, 2010.

JODELET, D. Representações sociais: um domínio em expansão. In: JODELET, D.


(Org.). As representações sociais. RJ: UERJ, 2001.

LIMA, L. C. A escola como organização educativa: uma abordagem sociológica. 2ª


ed. São Paulo: Cortez, 2003.

MACHADO, L. M. Quem embala a escola? In: MACHADO, L. M.; MAIA, G. Z. A.


Administração e Supervisão Escolar: questões para o novo milênio. São Paulo:
Pioneira, 1998.

MARTINS, A. M. Autonomia da Escola: a (ex)tensão do tema nas políticas públicas.


São Paulo: Cortez, 2002.

MOSCOVICI, S. Das representações coletiva às representações sociais: elementos para


uma história. In: JODELET, D. (Org.). As representações sociais. RJ: UERJ, 2001.

NÓVOA, A. Para uma análise das instituições escolares. In: NÓVOA, A. (org). As
organizações escolares em análise. Lisboa, Portugal: Publicações Dom Quixote 1995.

PARO, V. H. Administração escolar: introdução crítica. SP: Cortez, 1986.

________. Gestão democrática da escola pública. 3ª ed. São Paulo: Ática, 2008.

RUSSO, M. H. Escola e paradigmas de gestão. Ecos. São Paulo, v. 6, n. 1, p. 25-42,


2005.

SAVIANI, D. Pedagogia Histórico-Crítica: primeiras aproximações. 10ª ed. rev. –


Campinas, SP: Autores Associados, 2008. – (Coleção Educação Contemporânea).
129

SILVA JR, C. A. O espaço da administração no tempo da gestão. In: MACHADO, L.


M.; FERREIRA, N. S. C. (orgs.). Política e gestão da educação: dois olhares. Rio de
Janeiro: DP&A, 2002, p. 199 – 212.

SILVA JR., J. R.; FERRETTI, C. J. O institucional, a organização e a cultura da


escola. São Paulo: Xamã, 2004.

SOUSA, Sandra Zákia Lian de; OLIVEIRA, Romualdo Portela de. Políticas de
avaliação da educação e quasemercado no Brasil. Educ. Soc. 2003, vol.24, n.84, p. 873-
895.
130

Relato de experiência

Da teoria à prática: a formação do licenciando em geografia no interior do


Amazonas através do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência -
PIBID

Ana Paula Moraes1


UEA
Reginaldo Luiz Fernandes de Souza 2
UEA

Resumo: A formação docente divide-se em inicial e continuada, assim o Programa


Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) por intermédio da Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) vem propiciar ao
acadêmico de geografia durante a formação inicial o contato direto com a sala de aula e
vivenciar a realidade do processo ensino/aprendizagem dessa ciência no Centro
Educacional de Tempo Integral Deputado Gláucio Gonçalves na cidade de Parintins-
AM. A metodologia baseou-se em levantamento bibliográfico, realização de oficinas e
observações. Como resultado foi possível notar a importância desse programa na
formação inicial do professor de geografia, pois a realidade vivenciada no ambiente
escolar com seus desafios diários colabora para uma formação mais adequada do
Licenciado em Geografia.
Palavras chave: Formação Docente. PIBID. Ensino de Geografia.

INTRODUÇÃO

A prática docente é fundamental para consolidar a formação acadêmica do


indivíduo na licenciatura, visto que a graduação está intimamente ligada à inter-relação
dos saberes, de um lado a teoria adquirida na academia e do outro os conhecimentos
adquiridos no cotidiano da sala de aula.

1
Acadêmica do 6º período do Curso de Geografia Universidade do Estado do Amazonas – UEA/CES-
Parintins e bolsista do PIBID/CAPES.
2
Professor do Curso de Geografia da Universidade do Estado do Amazonas – UEA/CES-Parintins e
Coordenador do subprojeto PIBIB/CAPES.
131

O papel do professor na sala de aula tem sido discutido constantemente entre os


estudiosos e pesquisadores, pois influencia diretamente na qualidade da educação, e
ensinar vai além da transmissão de conteúdo. Assim, a formação do professor requer
amplo conhecimento sobre os diversos temas que permeiam a relação professor/aluno,
aluno/aluno no cotidiano da sala de aula. O professor é instigado a lidar com alunos de
realidades socioculturais distintas, atuar em ambientes escolares exige do professor uma
prática reflexiva, um visão de mundo e postura frente aos problemas escolares e não
escolares que interfere no processo de ensino/aprendizagem do aluno.
Assumir uma sala de aula é um comprometimento envolto de responsabilidade, é
ser integrante na construção de vidas. Nesse contexto, a Iniciação à Docência
promovida pelo PIBID por intermédio da CAPES é um dos degraus da vida docente,
transpondo o conhecimento adquirido na graduação à prática escolar, através do contato
direto com professores, alunos, pais, agentes escolares, e nos diversos momentos
entrada e saída de alunos, intervalos, projetos educacionais e outros.
Vivenciar o cotidiano da escola com os discentes, docentes e demais
funcionários constitui um momento ímpar para a formação do Licenciado em Geografia,
pois através do PIBID foi possível delinear um olhar particular sobre o ensino de
geografia na escola, os recursos utilizados pelo professor, a receptividades e
aprendizagem dos alunos frente aos conteúdos.

2. DIDÁTICA: UM PROCESSO DE CONSTRUÇÃO E RECONSTRUÇÃO

A Didática norteia a prática de ensinar agregando ações e estratégicas com vistas


à eficiência e eficácia da ação educativa em sala de aula, fazendo com que o aluno se
interesse pelo conteúdo a ser ministrado. Nesse sentido, Celso Antunes (2002), define a
Didática como sendo:
Etimologicamente refere-se à parte da Pedagogia que cuida das questões
relativas ao ensino. O termo é mais utilizado como o conjunto de atividades
escolares que tem em vista a transmissão de conteúdos. Parte da Pedagogia
voltada para o ensino e seus métodos. Direção e arte da aprendizagem. Tudo
que diz respeito ou tem por fim o ensino.

Didaticamente ensinar seria o uso de técnicas, uma verdadeira arte, é estimular a


curiosidade existente de seres em formação, fazê-los pensar e refletir a realidade de seu
cotidiano. O ensino aprendizagem não estagnou no tempo, a visão de sala de aula
132

ganhou novos horizontes, as diferentes didáticas foram se moldando ao ensino, ensinar


hoje é deixar de lado pragmatismo de ditadura ou força bruta.
Partindo destas premissas, cada professor age de modo particular para ensinar,
esbarrando nas deficiências promovidas pelo sistema educacional pautado em números,
índices positivados em nome de um desenvolvimento teórico e menos prático.
Compreender a realidade da sala de aula é vivenciar as teorias, conceitos e
métodos aprendidos na academia, e a aplicabilidade das didáticas para o ensino-
aprendizagem, e por que não formular novas didáticas, atrativas para o aluno-professor
e sociedade em geral, a educação não é uma via de mão única, é necessária a
participação de todos neste processo, reconhecer o professor como um dos profissionais
mais importantes na formação de cidadãos.

3. METODOLOGIA

De acordo com os princípios da metodologia, o presente Relato de Experiência


adota uma perspectiva qualitativa que segundo Haguette (2003), fornece uma
compreensão profunda de certos fenômenos sociais, apoiados no pressuposto de maior
relevância do aspecto subjetivo da ação social, visto que focaliza fenômenos complexos
e/ou fenômenos únicos.
O presente Relato de Experiência constitui de dados colhidos no Centro
Educacional de Tempo Integral Deputado Glaúcio Gonçalves (CETI/PIN) no período
vespertino, com alunos do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental. Os discentes do
PIBID/licenciados em Geografia acompanham os alunos três vezes por semana
realizando as ações propostas no subprojeto de geografia.
Após levantamento bibliográfico sobre formação docente, processos de ensino
aprendizagem e didática, foi utilizada como técnica a observação durante o
acompanhamento das ações propostas. Sendo, a observação “uma das técnicas mais
utilizadas nas pesquisas em ciências humanas [...]. Embora seja uma técnica espontânea,
exige uma sistematização de métodos como delimitação, planejamento e registro dos
dados” (TOZONI-REIS, 2009).
133

4. A EXPERIÊNCIA NA SALA DE AULA OS DESAFIOS NO ENSINO DE


GEOGRAFIA

Para compreender o espaço geográfico é de suma importância ao aluno


identificar-se como parte formadora deste conceito, visto que este é concebido e
construído intelectualmente como um produto social e histórico, que se constitui em
ferramenta que permite analisar a realidade em sua dimensão material e em sua
representação (CAVALCANTE, 2008), caracterizando o papel fundamental da
geografia de criticidade, retratando o conhecimento em múltiplas dimensões, apoiados
neste pensamento propomos aos educandos uma atividade que abarcaria elementos
concretos das aulas expostas o qual foi realizada individualmente resultando na
confecção de mapas representando o caminho percorrido pelos discentes de casa até a
escola como mostra a figura 01.

Figura 01: Mapas elaborados pelos discentes do 7º ano do ensino fundamental

Fonte: Moraes, 2014.

Neste processo foi perceptível o retorno demonstrado pelos alunos com a


atividade proposta desempenhada com perspicácia, levando a crer que o intuito da
proposta foi executado com sucesso, a assimilação dos conceitos de paisagem,
orientação e produção de mapas mentais ocorreu como o previsto, o que mais nos
despertou foi à curiosidade dos alunos.
Sobre os desafios no ensino de geografia, com a experiência proporcionada com o
PIBID foi possível verificar à falta de materiais didáticos, livros que se adequem as
necessidades do professor, bem como diferentes tipos de objetos os quais poderiam
auxiliar os discentes na compreensão do ensino de mapas e globo. O mais preocupante
foi sem dúvida o fato de estarmos em um centro de educação integral e saber que os
134

discentes não podem levar seu material didático para casa, ou seja, os livros são
utilizados apenas em sala, assim nos perguntamos se isso tem coerência, nos foi
explicado que os alunos por adentrarem às 7 da manhã e saírem as 16horas da tarde de
segunda a sexta, deveriam desenvolver todas as atividades no recinto da escola, o que
nos indignou por sabermos que a educação, o conhecimento e o estudo é uma extensão
da escola e deve ser uma prática continua e diária principalmente nesta fase de
construção de saberes intelectuais e sociais na formação dos indivíduos.
Reinventar o profissional foi importante para achegar-nos ao alunato e dar uma
nova cara ao ensino de geografia, visto que há anos atrás a geografia ensinada não atraía
os alunos; não havia uma consciência da importância dos conteúdos ensinados por essa
matéria, o saber por ela veiculado era inútil e sem significado para os alunos
(CAVALCANTE, 2008). Foi na tentativa de refrear essa visão maçante e ultrapassada
do ensino que ousamos a dizer que fizemos a diferença no ensino de uma geografia para
a vida, a cada encontro os alunos eram incentivados a trazer notícias e relacioná-las com
a realidade e a geografia.
Em cada atividade proposta em sala de aula os discentes abordavam diferentes
contextos sociais, em que comentavam as notícias, localizando o lugar onde ocorria o
fato, o continente entre outros aspectos que nos permitiu incentivá-los a geografar fora
dos muros da escola relendo seu mundo e buscando opiniões próprias dos fatos sociais.
A atividade no primeiro dia foi cumprida mediante indicação de quem teria o
compromisso de trazer a notícia nas aulas, subsequentes eles (os alunos),
desempenharam de forma autônoma o solicitado tendo uma aprendizagem significativa,
pois, nas palavras de Ausubel (1982), para que o aprendizado seja significativo são
necessárias duas condições a primeira o aluno precisa ter disposição para aprender e em
segundo, o conteúdo deve ser significativo, cada indivíduo faz uma filtragem do que
tem importância para si próprio, o que nos levou a compreender que o aprendizado
ocorre pela forma que o discente se sinta atraído, ou seja, deve-se estimulá-lo a gostar
do que se propõe a ele.
Cada momento na prática de ensino foi revelador e marcante, em uma exposição
sobre o conteúdo relevo o qual foi divido em três etapas, no primeiro dia ao final da aula
propusemos no término do conteúdo construir exemplos de relevo em maquete, grande
foi à surpresa na segunda aula, os discentes trouxeram o material para fazer suas
maquetes, mesmo estes sabendo que a atividade era para o encerramento do conteúdo.
135

Com os materiais recolhidos pelos alunos iniciamos a confecção das maquetes


como mostra a Figura (02), unindo assim os conhecimentos teóricos e práticos no
ensino, o real sentido da educação. Interagir com o aluno e fazê-lo interagir com a
matéria é o desafio diário do professor, momentos como estes no qual o discente assume
a postura na sua formação superando suas dificuldades pessoais.

Figura 2: Maquete confeccionada pelos alunos do 7º do ensino fundamental sobre o


conteúdo relevo

Fonte: Moraes, 2014.

O material visual foi um dos recursos utilizados nos encontros com os alunos, o
uso de filmes, slides, maquetes, jornais e jogos fomentaram a socialização
aluno/professor, munidos da proposta do subprojeto Formação de professor: Priorizando
o ensino de Geografia. Assim foram elaboradas as dinâmicas envolvendo a coletividade
discente, o estudo de grupo para os jogos de perguntas e respostas dos conteúdos de
geografia o que resultou no comprometimento dos alunos com a disciplina
exteriorizando a aprendizagem.
Estas atividades possibilitaram um olhar especial em relação ao ensino e quão
importante é conscientizarmo-nos durante a formação acadêmica da necessidade do
ensino/aprendizagem, sermos críticos e reflexivos não apenas no ensino de geografia,
mas como um todo.
136

A Figura (03) mostra através do jogo de tabuleiro a cada jogada do dado uma
pergunta era feita e diante da resposta certa se avançava a quantidade de casas
referenciada no dado, está dinâmica envolveu o grupo docente e promoveu um destaque
especial para o Ensino de Geografia.

Figura 03: Socialização através de jogos e situações problema

Fonte: Moraes, 2014.

A mediação aluno/professor não se restringe a sala de aula é exteriorizada além


dos portões da escola, querendo ou não se cria laços, nesse caminho trilhado e não há
nada mais prazeroso nesta profissão. Esta experiência propiciada pelo PIBID através da
CAPES resultou na tomada de decisão de continuarmos a graduação com o intuito de
fazermos parte de algo maior que a formação pessoal e profissional que buscamos na
academia, temos a total certeza que devemos firmar um compromisso maior com as
futuras gerações, é dever enquanto educando e como educador, somos parte desta e da
futura sociedade que ajudamos a formar hoje.

CONSIDERAÇÕES

A vivência em sala de aula proporciona um aprendizado em relação ao trabalho


do docente tanto na expectativa como facilitador de saberes sociais quanto no sentido de
tornarmos competente como educadores. Fica a certeza que para nós licenciados a
importância de conhecer a realidade de uma instituição escolar onde o professor não
seja um mero agente de transmissão de conhecimento, mas sim um mediador
pedagógico, ou mesmo um orientador de aprendizagem do discente.
As ações observadas na prática desmistificam que para o aprendizado acontecer
não basta somente o esforço do mestre em ensinar, cabe também ao aluno o papel de
137

sujeito em querer aprender, onde a recompensa é aquisição de habilidades na produção


do conhecimento.
Este conhecimento adquirido na escola mostrou-nos o valor da formação inicial
consolidada à experiência em ambientes escolares, e do constante aprimoramento dos
conhecimentos na área, dos problemas sociais que permeiam a escola, da investigação
da própria prática e a reflexão de temas atuais. Por conseguinte, foi satisfatório
compreender a dimensão prática em que ora nos encontramos na condição de aluno
encarando dificuldades de aprendizagem, outrora na condição de futuros profissionais
de ensino enfrentando momentos angustiantes no ato de ensinar.
Através da prática pedagógica acompanhada em sala de aula, espera-se do
professor em formação excelência nos conhecimentos teóricos e metodológicos, bem
como o domínio dos modos de fazer docente através da didática propiciando uma
orientação mais eficaz para o trabalho profissional de educador assegurando à classe
discente o domínio do conhecimento, não temporário, mas duradouro, além de gerar
meios que desenvolvam as habilidades intelectuais visando à autonomia do indivíduo no
processo de aprendizagem e formação da personalidade.
Assim, o educador em processo de formação ainda é um aprendiz assimilando o
conhecimento e domínio de habilidades que implicaram no ensino prático que ainda está
por vir. Portanto, espera-se uma maior eficácia dos futuros profissionais para o
aperfeiçoamento do processo educativo, ao mesmo tempo, melhores condições de
trabalho, pois a escola não tem mais o direito ao fracasso, é mais eficiente fazer
progredir o ensino e aderir à causa da instrução comprometida com a ascensão dos
alunos.
Por conseguinte, as novas competências exigidas estão relacionadas tanto a
didáticas pontuais, baseadas nas técnicas pedagógicas, quanto a enfoques transversais
que aliam ao ensino-aprendizagem. Ser professor não é apenas está munido de material
didático, livros ou conteúdos pré-fabricados, é uma construção de saberes em que a
prática se adquire com o tempo, visto que estamos em constante aprendizado. Os
desafios são muitos, mas não suficientes para que não sejam superados, pois educar é
uma necessidade de ontem, hoje e amanhã.
138

REFERÊNCIAS

ANTUNES, Celso. Glossário para educadores. 2.ed.Petrópolis (RJ):


Vozes,2002.p.104-105.

AUSUBEL, D. P. A aprendizagem significativa: A teoria de David Ausubel. São


Paulo: Moraes, 1982.

CAVALCANTE, Lana de Souza. A geografia escolar e a cidade: Ensaios sobre o


ensino de Geografia para a vida urbana cotidiana. Campinas, SP: Papirus, 2008.

HAIDT, Regina C. Cazaux. Curso de Didática Geral. São Paulo, Ática, 2003.

KAERCHER, Nestor André. Se a geografia escolar é um pastel de vento o gato como


a geografia crítica. Porto Alegre: Evangraf, 2014.

LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica 1 Marina de Andrade


Marconi, Eva Maria Lakatos. - 5. ed. - São Paulo : Atlas 2003.

PONTUSCHKA, Nídia Nacib. Professores de geografia-Formação profissional. São


Paulo- Contexto 2010.

TOZONI-REIS, Marília Freitas de Campos. Metodologia da Pesquisa. 2.ed. Curitiba:


IESDE S.A., 2009.

VEIGA. Ilma Passos Alencastro (org.). Didática: O ensino e suas relações / –


Campinas, SP. Papirus, 1996 – (Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico).
139

Comunicação

O atendimento das crianças de 0 a 5 anos nas creches e pré-escolas no período de


abrangência do PNE 2001-2010 – o que pode ser alterado com novo PNE?

Ana Paula Santiago do Nascimento


FEUSP – CNPq

Resumo: O presente texto faz uma análise da expansão da rede de Educação Infantil
durante a vigência do Plano Nacional de Educação 2001-2010. Analisa o atendimento
dessa etapa da educação básica nas creches e pré-escolas no Brasil e sua expansão
durante os anos de 2001 a 2010. Após essa análise relaciona essas tendências as “novas”
metas do Plano Nacional de Educação 2014 e traz um exercício de quantidade de vagas
a serem criadas e custo dessas novas vagas caso as metas sejam atingidas.
Palavras-chave: Atendimento a demanda; Educação Infantil; Plano Nacional de
Educação.

Introdução
O presente trabalho1 traz dados sobre a oferta de vagas para as crianças de 0 a 5
anos de idade em creches e pré-escolas nos anos 2000 a 2010 e faz uma relação dessa
situação com as metas de atendimento da Lei nº 13.005 de 26 de junho de 2014 que
aprova o Plano Nacional de Educação que vigorará pelos próximos dez anos. A análise
dos dados de oferta dessa etapa da Educação Básica nos possibilita uma discussão dos
novos esforços que deverão ser realizados pelos governos para garantir que todas as
crianças, das quais suas famílias assim desejem, frequente uma educação infantil de
qualidade.
A análise será apresentada faz uma separação didática no que se refere o
atendimento em creches – de crianças de 0 a 3 anos de idade – e em pré-escolas – de
crianças de 4 e 5 anos de idade – visto que cada uma dessa instituições tiveram no
Brasil percursos históricos distintos. Faz-se importante ressaltar que as creches
brasileiras sempre atenderão as crianças de 0 a 6 anos de idade e só recentemente essa

1
Esse trabalho articula parte da dissertação de mestrado apresentada pela autora no programa de pós-
graduação da Universidade de São Paulo no ano de 2012 com as propostas do Plano Nacional de
Educação publicado em junho de 2014.
140

divisão de atendimento – 0 a 3 anos em creches e 4 e 5 anos em pré-escola – iniciou-se


no Brasil, ainda sendo encontradas creches que atendam toda a faixa etária da Educação
Infantil2. Por esse motivo as analises a seguir discutem o atendimento de crianças de 0 a
3 anos e de 4 e 5 anos tanto nas creches como nas pré-escolas.
Após a análise de como se comportou a expansão desse atendimento na década
do Plano Nacional de Educação (PNE – 2001-2010) – Lei nº 10.172 de 91/2001 – o
presente artigo faz uma discussão sobre as metas de atendimento do novo PNE 2014 e
das possibilidades que essa nova lei apresenta.

O atendimento das crianças de 0 a 3 anos e de 4 e 5 anos de idade nas creches e


pré-escolas brasileiras
No ano de 2001, o PNE 2001–2010 definiu como meta para essa etapa da
educação infantil atender, até 2010, 50% das crianças de 0 a 3 anos de idade. No final
dessa década, tinha-se uma taxa líquida de atendimento no Brasil de 11,6%. Obteve-se
no período de 2000 a 2010 um crescimento nas vagas disponíveis em creches de
125,2% – taxa bruta – e um aumento no atendimento de crianças na faixa de 0 a 3 anos
de idade de 66,3% – taxa líquida –, o que permite concluir que, caso esse ritmo se
mantivesse, a meta do PNE 2001–2010 de atender 50% das crianças nesta idade só seria
alcançada após o ano de 2020, tendo como padrão a taxa bruta e, no ano de 2030,
considerando a taxa líquida. A tabela a seguir faz uma projeção utilizando-se dados
populacionais do IBGE e partindo da matrícula em creche e na faixa etária desta no ano
de 2010, acrescentando, a cada dez anos, 125,2% e 66,3% de novas matrículas.

2
Existe uma discussão na área de educação infantil a respeito dessa divisão e alguns municípios discutem
a possibilidade de existir apenas uma instituição para atender toda a educação infantil.
141

Tabela 1 – Taxa líquida e bruta de atendimento de crianças na creche e de 0 a 3 anos de idade a


partir das estimativas da população na faixa etária e das matrículas atendidas pela educação
infantil – 2000 a 2040

População Projetada Matrícula na idade (0 Taxa Bruta Matrícula na idade (0 a


Taxa Líquida de
IBGE 0 a 3 anos de a 3 anos) e Estimativa de 3 anos) e Estimativa de
atendimento
idade (em mil) de matrícula (em mil) atendimento matrícula (em mil)
20003 13.737 917 6,7% 917 6,7%
2010 12.136 2.065 17,0% 1.525 12,6%
2020 10.142 4.651 45,9% 2.536 25,0%
2025 9.853 7.563 76,8% 3.376 34,3%
2030 9.344 10.475 112,1% 4.217 45,1%
2035 8.613 17.033 197,7% 7.012 81,4%
2040 7.954 23.592 296,6% 9.336 117,4%
Fonte: Elaborada pela autora com dados da Projeção da População do Brasil por sexo e idade: 1980–2050
– Revisão 2008 do IBGE, dados da Sinopse do Censo Escolar de 2000 e Microdados do Censo Escolar de
2010 INEP/MEC e projeção de matrículas a partir da análise de série histórica construída pela autora.

Nessa projeção pode-se observar que até o ano de 2030 a taxa líquida de
atendimento não alcança a meta do PNE 2001–2010. Na projeção realizada com a taxa
bruta, esses valores seriam atingidos após 2020 (45,9%). Essas projeções permitem
constatar que será necessário um esforço político e financeiro muito maior do que o que
se tem realizado até agora para atingir a taxa de atendimento desejável em curto prazo.
Apesar dessa projeção pouco animadora, não se pode ignorar os avanços
ocorridos na década de 2000 a 2010 no que se refere ao atendimento dessa faixa etária.
Analisando os dados desse período pode-se constatar um aumento de 88,8%
nessas matrículas. As matrículas em creche, que em 2001 eram de cerca de 1,09 milhão,
atingiram em 2010 mais de 2 milhões. Analisando o comportamento das redes públicas
juntas e da rede privada, percebe-se uma contínua expansão desde 2001, com apenas
uma diminuição de 4,6% na rede privada no ano de 2006, que não causa impacto
negativo no total das matrículas nessa etapa, visto que a rede municipal – a maior nessa
etapa do ensino – continuou crescendo no período.
O gráfico 01 demonstra o comportamento das matrículas nas redes pública e
privada em creches, por dependência administrativa, no período de 2001 a 2010,
possibilitando perceber a trajetória dessa etapa da educação infantil.

3
Os dados de matrículas na etapa e na creche referente ao ano de 2000 foram considerados os mesmos,
como se a totalidade das matrículas estivesse ocupadas com crianças de 0 a 3 anos de idade.
142

Gráfico 01 – Matrículas em creches por dependência administrativa – Brasil (2001– 2010)

2.500.000

2.000.000

1.500.000

1.000.000

500.000

0
20 20 20 20 20 20 20 20 20 20
01 02 03 0 4 05 06 07 08 09 1 0

Federal Estadual Municipal Privada Total

Fonte: Elaborado pela autora com dados do EDUDATA/INEP/MEC.

Através da análise dos dados, pode-se concluir que o atendimento em creches,


ao longo da década estudada, foi oferecido sob a responsabilidade das redes municipais
e privadas. Sendo que em 2010 a rede municipal foi responsável por 65,2% das
matrículas nessa etapa, ficando a rede privada com 34,4% das matrículas.
A participação das esferas federal e estaduais no atendimento a creches foi
praticamente nula. As duas redes somadas, para o ano de 2010, não atingiram 0,5% das
matrículas e, se computadas apenas as redes públicas, essas duas esferas juntas
atenderam, em 2010, 0,6% das matrículas, ficando os municípios com 99,4% do
atendimento público. Essa situação era prevista como horizonte após a promulgação da
Constituição Federal de 1988 (CF/88) que determinou que este ente ficasse responsável
por essa etapa da educação básica.
Observa-se que nos últimos anos analisados, 2006 a 2010, o número de matrículas
em creches na rede municipal sofreu uma forte expansão, passou de 898.945 em 2006
para 1.345.180 em 2010, um aumento de 49,6% em quatro anos.
No que se refere às pré-escolas o PNE 2001–2010 determinou como meta
atender, até 2010, 80% das crianças de 4 a 6 anos de idade. O que se atingiu em 2010,
final da década de abrangência do Plano, foi uma taxa bruta de 47,5% de crianças na
educação infantil e somando com as crianças de 5 e 6 anos no ensino fundamental uma
taxa de 83,3%. A priori essa taxa parece razoável, pois ultrapassa os percentuais
pretendidos no PNE 2001–2010. Porém a análise é preocupante quando realizada tendo
como base os dados da taxa líquida de matrícula, ou seja, do número de crianças na
faixa etária atendida. Independente da instituição – creche ou pré-escola –, essa
porcentagem passa a 45,6%. Um valor muito baixo para um país que se propõe através
da Emenda Constitucional nº 59 de 2009 atender até 2016 100% das crianças e
adolescentes na faixa etária de 4 a 17 anos de idade.
143

Observa-se no período estudado uma redução no número de matrículas na ordem


de 2,6%, passando de 4.818.803 matrículas em 2001 para 4.692.045 matrículas em
2010.
Destaca-se que, também nessa etapa da educação infantil, foi a rede municipal
que garantiu esse atendimento. O gráfico 02 apresenta os dados de matrículas em pré-
escolas por dependência administrativa para os anos de 2001 a 2010 e possibilita uma
análise de tendência.
Gráfico 02 – Matrículas em pré-escolas por dependência administrativa – Federal, Municipal e
Estadual – e Púbica, Privada e Total – Brasil (2001 – 2010)
7.000.000
6.000.000
5.000.000
4.000.000
3.000.000
2.000.000
1.000.000
0
2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Federal Estadual Municipal Privada Total

Fonte: Elaborado pela autora com dados do EDUDATA/INEP/MEC.

Existem, para os anos analisados, alguns períodos de diminuição das matrículas


em relação aos anos anteriores – 2006, 2007, 2009 e 2010 –, sendo que a maior delas
ocorreu no ano de 2007, diminuindo mais de 11% as matrículas em relação a 2006.
Caso essa análise seja realizada para o período de 2005 a 2007, essa diminuição chega a
15% do total das matrículas. Uma possível explicação para essa diminuição no número
de matrículas das crianças na pré-escola pode ser a aprovação da Lei nº 11.114, de 16 de
maio de 2005, que alterou a idade de ingresso no ensino fundamental para os 6 anos de
idade com um prazo de cinco anos para ser implementada.
Essas crianças estavam historicamente matriculadas na educação infantil, como
indica o documento do próprio Ministério da Educação (MEC) sobre a implementação
dessa Lei e da Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, que alterou a duração do ensino
fundamental de 8 (oito) para 9 (nove) anos. Com o cumprimento dessa legislação, as
redes municipais e privadas podem ter iniciado um processo de transferência das
crianças de 6 anos das pré-escolas para as escolas de ensino fundamental, sem substituí-
las por outras crianças menores, o que acarretou na diminuição do número dessas
matrículas.
144

Conforme recentes pesquisas, 81,7% das crianças de seis anos estão na


escola, sendo que 38,9% frequentam a Educação Infantil, 13,6% as classes
de alfabetização e 29,6% já estão no Ensino Fundamental (IBGE, Censo
Demográfico 2000). Esse dado reforça o propósito de ampliação do Ensino
Fundamental para nove anos, uma vez que permite aumentar o número de
crianças incluídas no sistema educacional. (BRASIL, 2007, p. 17)

Ao analisar os dados de matrículas das crianças de 6 anos ou mais no ano de


2010, observa-se que ele representava cerca de 30% do total das matrículas na pré-
escola, indicando que, se essa transferência ocorre, ela ainda está em processo.
A diminuição ocorrida em 2010 também pode ser decorrente dessa adequação
das redes ao ensino fundamental de 9 (nove) anos, visto que o ano de 2010 era a data
limite estipulada pela legislação para implementação total da lei. É importante ressaltar
que o montante representado pela diminuição de 3,6% (174.223) das matrículas em pré-
escolas no ano de 2010 não atinge 1% do total das matrículas no ensino fundamental I
para o mesmo ano (16.755.708 matrículas), consequência do tamanho de cada rede.
Quando se observam os dados da rede pública por dependência administrativa,
nota-se que, assim como nas creches, são as redes municipais que atendem as crianças
de 4 a 6 anos de idade. Estas eram responsáveis pelo atendimento de 74,8% do
atendimento em 2010.
As redes federal e estaduais juntas passaram de 6,6% de atendimento em 2001
para 1,4% de atendimento em 2010. A queda do atendimento nas redes estaduais foi
contínua desde 2001 e seu atendimento representava menos de 1,5%. O atendimento na
rede federal sempre foi inexpressivo (em média 0,03% em todo o período).
Os números de matrículas das redes municipais passam por uma leve expansão
no período de 2001 a 2005, passando de 3.275.405 matrículas em 2001 para 4.026.681
em 2005, uma expansão de 22,9% em quatro anos. O número de matrículas dessa rede
passou por quatro anos de quedas no período, que pode ser considerado como uma
tendência de diminuição no conjunto desses anos, visto que estão concentrados no final
da década estudada. O início dessa diminuição acontece em 2006, no qual a rede
municipal diminui em 2,6% em relação ao ano anterior e continua caindo no ano de
2007, diminuindo mais 4,9%.
No ano de 2008 houve um sutil aumento de 0,8% no número dessas matrículas,
porém com novas quedas nos anos de 2009 e 2010. Analisando o período todo – 2005 a
2010 –, as matrículas da rede municipal passaram de 4.026.681 para 3.508.581, uma
diminuição de 12,9% em cinco anos.
145

Como constatado através dos diferentes dados apresentados, a situação de acesso


das crianças de 0 a 5 anos à educação infantil passou o período do PNE 2001-2010 com
uma expansão longe de ser considerada satisfatória não conseguindo atingir as metas
propostas. Pesquisadores da área de financiamento da educação, (DAVIES, 2004;
VALENTE E ROMANO, 2002) alertavam já no inicio da década do PNE 2001-2010
que isso aconteceria visto que o presidente Fernando Henrique Cardoso vetou todas as
metas que acrescentavam recursos financeiros à educação e que possibilitaria o êxito no
que se refere a expansão das redes. Essa ação, segundo Davies (2004, p. 139) a “[...]
debilidade de um PNE-Lei que estabelece metas de expansão para todos os níveis e
modalidades de ensino, mas não prevê nem os custos nem a fonte de recursos adicionais
para o financiamento de tais metas”.
Segundo Valente e Romano (2002) o PNE 2001-2010 “[...] é uma espécie de
salvo-conduto para que o governo continue implementando a política que já vinha
praticando. [...] este PNE já estava claramente comprometido, em sua validade, pelo
traço de carta de intenções”. (p. 11)
Após os dez anos do Plano o que se pode constatar foi o esforço dos municípios
para cumprir a meta de acesso, porém sem sucesso visto que faltaram recursos
financeiros para tal. Lembrando que essa etapa da educação básica possui custos
elevados, os municípios procuram diferentes formas para expandir o seu atendimento
com custos menores. Como alternativas, vê-se salas superlotadas e a utilização de
espaços privados, geridos por instituições filantrópicas, religiosas ou comunitárias,
conveniadas às prefeituras, prestando esse atendimento. Essas são possibilidades
comumente utilizadas pelos municípios para baratear os custos desse atendimento.
Essas alternativas trazem em seu bojo outra discussão: a das condições
necessárias para que seja garantido de fato o direito da criança de 0 a 5 anos de idade de
frequentar uma instituição educacional que possibilite seu desenvolvimento pleno e
sadio necessita de investimentos de todos os entes federados.

O que o Plano Nacional de Educação 2014 traz de novo?


O novo Plano Nacional de Educação, aprovado pela Lei nº 13.005/2014, coloca
como meta de atendimento para essa etapa da Educação Básica a de
146

universalizar, até 2016, a educação infantil na pré-escola para as crianças de 4


(quatro) a 5 (cinco) anos de idade e ampliar a oferta de educação infantil em
creches de forma a atender, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das
crianças de até 3 (três) anos até o final da vigência deste PNE. (BRASIL,
2014)

Essa meta significa que o país fará um esforço coletivo para que em 2 (dois) anos
todas as crianças de 4 e 5 anos estejam matriculadas em pré-escolas e em 10 (dez) anos
50% das crianças estejam matriculadas em creches.
Atingir essa meta significa matricular até 2024 cerca de 10,7 milhões de crianças
de 0 a 5 anos de idade, segundo dados do IBGE4. Em 2013 tínhamos matriculadas 2,7
milhões de crianças de 0 a 3 anos de idade e 4,8 milhões de 4 e 5 anos de idade,
totalizando 7,6 milhões de matriculas na Educação Infantil.
Para atingir a meta em 2016 de 100% de matrículas de crianças de 4 e 5 anos de
idade precisamos matricular 1,1 milhão de crianças na pré-escola e para atingir 50% de
matriculas até 2024, mais 2,5 milhões de crianças nas creches. A tabela abaixo sintetiza
esses dados e faz uma previsão de quanto o Brasil necessita investir na educação infantil
para atingir as metas do Plano.

Tabela 02: Dados de população de 2016 e 2024, Matrícula de 2013, diferenças para atingir as
metas do PNE 2014 e estimativa de valores gastos para atingir a meta com valores de gastos por
aluno de 20115.
0 a 3 anos – 4 e 5 anos – Pré- 0 a 5 anos – Educ.
Creche escola Infantil
Matriculas em 2013 2.730.119 4.860.481 7.590.600

População Projetada 2016 11.563.648 6.004.425 17.568.073

População Projetada 2024 10.525.348 5.434.160 15.959.508

Metas de atendimento do PNE 2014 –


-- 6.004.425 --
2024 (em 2016)
Metas de atendimento do PNE 2014 –
5.262.674 5.434.160 10.696.834
2024 (em 2024)

Diferença entre as matrículas de 2014 e


-- 1.143.944 1.143.944
as metas PNE 2014 – 2024 (em 2016)

Diferença entre as matrículas de 2014 e


2.532.555 2.532.555
as metas PNE 2014 – 2024 (em 2024)

4
Dados de população retirados das projeções populacionais realizadas pelo IBGE.
5
Foi utilizado os valores de 2011 pois são os mais recentes divulgados pelo INEP.
147

Estimativa para gasto


em 2014 com os
Recursos
valores de 2011 12.061.665.742 21.473.605.058 33.535.270.800
(valor gasto por
necessários para
aluno em 2011 foi de
o atendimento
R$ 4.4187)
das matrículas
que faltam para Estimativa de gastos
atingir as metas para atingir a meta de -- 5.053.944.592
do PNE 2014 no 2016
ano corrente com
16.242.772.582
valores de 2011
corrigidos6 Estimativa de gastos
para atingir a meta de 9.568.674.293
2024

Fonte: Construído pela autora com dados da Sinopse Estatística – Censo 2014, Projeções do IBGE e
dados do INEP sobre gasto per capita.

Segundo os dados do INEP, o país investiu R$ 4.418 em cada aluno da Educação


Infantil, desta forma (e utilizando esse valor) se tivéssemos que atingir as metas do PNE
2014 neste ano, necessitaríamos de mais de R$ 16 bilhões. Sendo R$ 5 bilhões para
atender as crianças de 4 e 5 anos em pré-escolas e R$ 9,5 bilhões para as de 0 a 3 anos
em creches.
Caso tivéssemos que atingir as metas do PNE 2014 – 100% das crianças de
4 e 5 anos e 50% das crianças de 0 a 3 anos de idade - no ano corrente (2014)
necessitaríamos incluir na Educação Infantil cerca de 12 milhões de crianças. Fazendo
um exercício com os valores per capitas realizados em 2011 (R$ 4.418) teríamos que
dispor de 1,1% do PIB brasileiro (que em 2013 segundo o IBGE foi de R$ 4,84 trilhões)
para essa etapa da Educação Básica.
Com esse exercício podemos perceber que os entes federados devem trabalhar
juntos para que as metas de atendimento sejam alcançadas.
Tem-se como perspectiva, com o novo PNE, que essas metas sejam atingidas
visto que o Plano prevê em sua meta 20 ampliar o investimento público em educação
para atingir o patamar de, no mínimo, 7% do Produto Interno Bruto (PIB) do país no 5º
ano de vigência do PNE e o equivalente a 10% do PIB no final do decênio.
Tem como estratégias a definição do regime de colaboração entre União,
Estados, Distrito Federal e Municípios para a expansão das redes de educação Infantil
segundo os padrões de qualidade (estratégia 1.1) e a complementação da União de
recursos financeiros aos Estados e Municípios que não conseguirem atingir os valores

6
Utilizou-se a Calculadora do Cidadão, disponível em http://www.bcb.gov.br/?CALCULADORA com
índices de atualização do INPC - 06/2014.
7
Dado retirado da tabela “Histórico da Estimativa do Investimento Público Direto em Educação por
estudante, por Nível de Ensino - Valores Nominais - Brasil 2000 – 2011” disponível no site
http://portal.inep.gov.br/indicadores-financeiros-educacionais. Acessado em 02/08/2014.
148

de CAQi e CAQ (estratégia 20.10).

Bibliografia
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado Federal, 1988.

BRASIL. Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da


Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez.1996.

BRASIL. Lei n. 10.172, de 9 de janeiro de 2001. Estabelece o Plano Nacional de


Educação. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 jan. 2001.

BRASIL. LEI n. 11.114 de 16 de março de 2005. Altera os arts. 6o, 30, 32 e 87 da Lei
no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com o objetivo de tornar obrigatório o início do
ensino fundamental aos seis anos de idade. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17
mar. 2005.

BRASIL. LEI n. 11.274, de 06 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29, 30,
32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases
da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino
fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 7 fev. 2006.

BRASIL. Ensino Fundamental de nove anos – orientações gerais. Brasília: Ministério


da Educação (MEC), 2007.

BRASIL. Emenda Constitucional n. 59, de 11 de novembro de 2009. Acrescenta § 3º


ao art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias para reduzir, anualmente,
a partir do exercício de 2009, o percentual da Desvinculação das Receitas da União
incidente sobre os recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino de
que trata o art. 212 da Constituição Federal, dá nova redação aos incisos I e VII do art.
208, de forma a prever a obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos e ampliar
a abrangência dos programas suplementares para todas as etapas da educação básica, e
dá nova redação ao § 4º do art. 211 e ao § 3º do art. 212 e ao caput do art. 214, com a
inserção neste dispositivo de inciso VI. Brasília, 2009

BRASIL. LEI n. 13.005, de 25 junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação.


Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 jun. 2014.

DAVIES, Nicholas. Financiamento da educação: Novos ou velhos desafios?. São


Paulo: Xamã, 2004.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Projeção da População do


Brasil por sexo e idade para o período: 1980-2050 – revisão 2008. Rio de Janeiro,
2008. Disponível em:
www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/projecao_da_populacao/2008/projecao.pdf
Acesso em: 06/12/2011.
149

VALENTE, Ivan e ROMANO, Roberto. PNE: Plano Nacional de Educação ou Carta de


Intenção?. Educação e Sociedade, Campinas, v. 23, n. 80, setembro/2002, p. 96-107.
Disponível em: www.scielo.br/pdf/es/v23n80/12926.pdf
www.scielo.br/pdf/es/v23n80/12926.pdf.

Sites Consultados
www.inep.gov.br

http://economia.terra.com.br/pib-brasileiro-cresce-23-em-2013-e-chega-a-r-48-
trilhoes,9629af8624274410VgnCLD2000000ec6eb0aRCRD.html
150

Comunicação

(Re) visitando o papel do gestor escolar de escolas do ensino médio: o sujeito em


tempos de incertezas.

Andréia Cristina Nagata


Grupo de Pesquisa: Sujeitos, Formação e Aprendizagem
Universidade da Cidade de são Paulo
Ecleide Cunico Furlanetto
Grupo de Pesquisa: Sujeitos, Formação e Aprendizagem
Universidade da Cidade de São Paulo

Resumo: O presente trabalho tem o objetivo de investigar os novos desafios


enfrentados pelos gestores de ensino médio ao exercer sua função e os recursos que
estão eles estão disponibilizando para enfrentá-los. O solo pedagógico sendo um espaço
de interação entre educadores e estudantes e por todos que participam, direta e
indiretamente, do processo escolar, sofre as consequências das mudanças do novo
século. No presente texto revisitaremos o papel do gestor escolar do ensino médio na
contemporaneidade.
Palavras chave: Gestor Escolar, Sujeito, Identidade Docente.

Introdução
O solo pedagógico é um espaço de interação de histórias vividas por educadores,
estudantes e por todos que participam, direta e indiretamente, do processo escolar. A
escola, palco da educação, assume uma relação dialógica com a comunidade; ela
reproduz a sociedade e a cultura e, ao mesmo tempo em que a questiona e a transforma.
E essas transformações decorrem da conjugação de vários fatores e acontecimentos
cujos efeitos refletem, diretamente, no reduto educacional. A movimentação vista na
política, economia, cultura e na sociedade traduz a rapidez com que a mudança se
manifesta nessas áreas. A tecnologia, assim como as redes sociais de comunicação,
representa uma ameaça e um benefício constante na construção dos conhecimentos. A
escola, muitas vezes, atordoada em meio a tantas transformações, sofre as
consequências por não compreender e não conseguir acompanhar o processo acelerado
das mudanças e se adaptar aos novos padrões de vida e con (vivência).
151

As transformações pelas quais a sociedade em geral, vive, perpassa por vários


setores devido a sua complexidade e amplitude. Desse modo, o solo pedagógico
também sofre as ações e reações desse processo assim como os sujeitos envolvidos. O
gestor escolar confirma a sua presença nesse contexto, como componente responsável
pela condução do projeto político pedagógico da escola. Até poucos anos, a atuação do
gestor escolar estava relacionada à concepção de escola estática, controlada e fiscalizada
por um administrador escolar, gerente de operações escolares. As suas ações estavam
associadas às competências técnicas, de caráter normativo, orientada pelos princípios da
racionalidade limitada com visão objetiva de quem atua sobre a unidade e nela intervém
de maneira distanciada, até mesmo para manter a autoridade. (Lück, 2000, p.13)
Repassava informações, controlava e dirigia a unidade escolar, consequentemente,
permanecia distante dos resultados acadêmicos da escola. As preocupações pedagógicas
eram voltadas para a valorização dos resultados quantitativos, de se fazer o máximo,
contrapondo-se ao trabalho para a obtenção de resultados qualitativos, de se fazer o
melhor e o diferente, de se pensar o aluno. Referência em educação era sinônimo da
efetiva administração dos recursos financeiros oriundos do Estado, do controle da
disciplina organizacional sendo que, os personagens principais do solo pedagógico eram
pensados como consequência desse processo administrativo.
Na Sociedade do Conhecimento, um espaço de movimentação e produção de
informações, a sociedade é vista com nova configuração na qual a humanidade passa
das bases da economia agrária, para a fase da produção e industrialização e,
posteriormente para a economia de informações. O gestor escolar enquanto agente
integrador da escola assume esta nova configuração com base em mudanças
significativas no campo conceitual, procedimental e atitudinal das ciências da educação.
Como representante legal da escola e agente integrador das ações administrativas e
pedagógicas, o gestor está diante de organizações vivas (Lück, 2000). O seu papel é
complexo. Como um articulador das ações humanas e das ações administrativo-
pedagógicas da escola ele escreve, junto de seus pares, a identidade da escola. Segundo
Lück (2000 p.16),

Um diretor de escola é um gestor da dinâmica social, um mobilizador e


orquestrador de atores, um articulador da diversidade para dar-lhe unidade e
consistência na construção do ambiente educacional e promoção segura da
formação de seus alunos.
152

Nesse sentido, o gestor escolar, torna-se um agente da dinâmica social, a partir


do momento em que participa da construção da identidade da escola. É um profissional
que outrora internalizava a função de guardião e gerente de operações escolares e
passou a ser por força da mudança na sociedade acadêmica, agente de transform (ação),
um articulador de conflitos e da diversidade com a função de dar consistência e unidade
na construção do projeto pedagógico da escola. Como o tecelão que alinha e tece o seu
tecido, o gestor escolar entrelaça as histórias dos profissionais da escola, paralelamente
ao olhar administrativo da gestão, ele escreve o enredo presente na história da escola.
As mudanças provocadas pelas transformações citadas têm exigido dos profissionais da
educação revisitar a sua prática, seus conceitos e sua postura profissional. Lück (2000,
p.15) sinaliza que “não existe nada mais forte do que uma ideia cujo tempo chegou, em
vista do que se trata de um movimento consistente e sem retorno. Vivemos às margens
do futuro. A evolução científica e tecnológica, a reestruturação do sistema econômico e
de produção, as mudanças nas organizações sociais e familiares repercutem em diversos
ambientes e, consequentemente, na escola também. Bauman (2009), ao referir-se aos
novos tempos, descreve uma sociedade líquida- moderna, onde as condições sob as
quais agem seus membros mudam num tempo mais curto do que aquele necessário para
a consolidação, em hábitos e rotinas, das formas de agir. Uma sociedade fragmentada
em sua forma organizacional, social, econômica e cultural.
O espaço escolar sente o impacto desses novos tempos e depende de todos os
atores, principais e coadjuvantes, na construção do projeto político pedagógico escolar.
A escrita pedagógica, ou seja, o fazer pedagógico, a partilha de conhecimentos e
sentimentos, a unidade de objetivos dentro de um mesmo ambiente contribui para a
formação da imagem da escola, a sua identidade, e diante dessa configuração exposta, o
gestor assume a função de tecelão da educação. Nesse sentido, percebe-se que a
identidade de uma escola não existe em si mesma, nem a priori, ela é incessantemente
(re) construída por meio das relações estabelecidas. (Hoff, 2008). O gestor escolar
ocupa um lugar desafiador no processo de (re) construção da proposta educativa da
escola. Ele observa, tece, escreve, age e senti os movimentos dialógicos existentes na
escritura do projeto escolar. O gestor faz as conexões entre as relações e as ações
presentes no âmbito escolar.
Paralelamente a esse contexto, a escola está recebendo um aluno também
impactado por essas novas mudanças, pelas novas tecnologias, pela presença das redes
sociais no dia a dia e que não se adapta tão facilmente às gerações anteriores, ao
153

ambiente escolar e suas rotinas. A escola, liderada pelo gestor escolar, administra
ambientes de tensão e conflitos de geração. Para lidar com a complexidade
contemporânea, o gestor necessita resignificar seus conceitos e sua prática, diariamente.
Além de processar as informações, interpretar dados e administrar a dimensão
pedagógica da escola espera-se que a sua administração seja sustentável, atinja os
primeiros lugares nos rankings educacionais, motive seu corpo discente e docente com
base no Projeto Político Pedagógico institucional. É visto a necessidade da incorporação
de múltiplos saberes, de novas habilidades e novas competências amparadas pelo
contexto social e cultura. Consignar as expectativas do aluno que adentra a escola às
expectativas do corpo docente requer um esforço incontestável para os gestores. Nessa
perspectiva, considera-se importante explorar como os gestores de escolas de ensino
médio estão se movimentando no solo pedagógico contemporâneo.

Objetivos da Pesquisa
O principal objetivo desta pesquisa é:
Investigar os novos desafios enfrentados pelos gestores de ensino médio ao
exercer sua função e os recursos que estão eles estão disponibilizando para
enfrentá-los;
Como objetivos específicos, a pesquisa se propõe a:
Estabelecer um diálogo teórico com os autores que investigam o papel do
gestor escolar na sociedade contemporânea;
Realizar entrevistas narrativas com diretores de escola de Ensino Médio, da
região da Zona Leste;

Metodologia
Para alcançar os objetivos propostos a pesquisa pautar-se-á na abordagem
qualitativa, o procedimento de coleta de dados será a entrevista narrativa. Essa técnica
deriva da palavra latina narrare que significa relatar, contar uma história. A EN
(entrevista narrativa) é considerada uma forma de entrevista não estruturada, de
profundidade, com características específicas. (Bauer, 2013, p. 95). É uma técnica que
recolhe histórias. Contar histórias implica estados intencionais que aliviam, ou ao
menos tornam familiares, acontecimentos e sentimentos que confrontam a vida
cotidiana normal. (Bauer, 2013).
Ao contar a sua história os atores sociais põem em forma os seus “pedaços” de
vida semeados e dispersos ao longo dos anos (Pineau, 1987), as rupturas e
continuidades e a própria construção dessa história. Assim sendo, o professor dá sentido
154

às suas experiências que se tornam significativas e transformam-se em história de vida.


Sarmento (2009, p. 306) revela a dinamicidade das abordagens narrativas quando expõe
que as narrativas
[…] permitem o acesso à compreensão da complexidade de enredos entre
tempos e espaços configuradores das identidades singulares, construídas nas
múltiplas interações entre o passado, o presente e o futuro, o herdado e o
projetado, as continuidades e as rupturas, as ligações e os confrontos do
sujeito consigo próprio e com os atores que povoam os contextos em que se
move.

O movimento dialógico existente entre as experiências pessoais e as


experiências de trabalho reforça a concepção de que a profissão docente é relacional. É
compreendida a existência de um eixo integrador entre a vida pessoal e a vida
profissional; os eixos comunicam-se e condicionam-se entre si.
É importante pontuar o caráter interativo entre os participantes priorizado por
esse tipo de procedimento que permite correções, esclarecimentos e adaptações que o
tornam eficaz na obtenção das informações desejadas... a entrevista ganha vida ao se
iniciar o diálogo entre o entrevistador e o entrevistado. (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 34).
Os sujeitos entrevistados serão gestores escolares que atuam em Escolas de
Ensino Médio da Zona Leste da cidade de São Paulo. Pretende-se por meio da entrevista
narrativa obter informações claras dos acontecimentos que expressem a perspectiva
específica do objeto de pesquisa. Para isso, a entrevista narrativa seguirá alguns critérios
como, a conversão dos dados por meio das entrevistas, a análise das narrativas,
propostas por Schütze (1977; 1983), análise temática que é a redução do texto
qualitativo, seguindo da análise estruturada que pontuará os elementos formais das
narrativas e por fim, a análise da narrativa final.
Pretende-se entrevistar cerca de quatro gestores de escolas da região da Zona
Leste da cidade de São Paulo que tenham experiência na função de diretor de escola. A
ideia básica é (re) visitar e investigar o papel do gestor, como participante da construção
da identidade da escola inserida numa sociedade de mudanças e incertezas.

Referências

BAUMAN, Z. Vida Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2007.

BAUER, M.W. GASKELL, G. (orgs) Pesquisa Qualitativa com texto, imagem e som:
Um manual prático. 11ª Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.
155

HOFF, B.M.E. Escritura de si e identidade: o sujeito-professor em formação. Campinas:


Mercado de Letras, 2008.

LÜCH, H. Perspectivas da Gestão Escolar e Implicações quanto à Formação de seus


Gestores. Em aberto, Brasília, v. 17, p. 11- 33, fev-jun, 2000

LÜDKE, M. e ANDRÉ, M. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo:


Editora pedagógica e universitária, 1986.

PINEAU, G., 1987 apud SARMENTO. T. Contextos de vida e aprendizagem da


profissão. In: FORMOSINHO, João. (Coord.) Formação de Professores: aprendizagem
profissional e ação docente. 1ª ed. Porto, Portugal: Porto Editora, 2009. (Coleção
Currículo, Políticas e Práticas; v. 32)

SARMENTO, T. Contextos de vida e aprendizagem da profissão. In: FORMOSINHO,


J. (Coord.) Formação de Professores: aprendizagem profissional e ação docente. 1ª ed.
Porto, Portugal: Porto Editora, 2009. (Coleção Currículo, Políticas e Práticas; v. 32);

SCHÜTZE, F. 1977; 1983 apud BAUER, M.W. GASKELL, G. (orgs) Pesquisa


Qualitativa com texto, imagem e som: Um manual prático. 11ª Ed. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2013.
156

Comunicação

Leis orgânicas municipais e regime de colaboração1

Andréia Silva Abbiati


UNICAMP/Brasil
Sérgio Ricardo Evangelista
UNICAMP/Brasil
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)

Resumo: O regime de colaboração no Brasil, instituído pela Constituição Federal de


1988, responsabiliza, mutuamente, os entes federados na garantia do direito à educação.
Diante desta determinação, a presente comunicação tem como objetivo compreender a
forma como o regime de colaboração foi contemplado nas leis orgânicas dos municípios
pertencentes à Região Metropolitana de Campinas (RMC). Utilizamos como
procedimento metodológico a análise documental das legislações municipais. A análise
realizada demonstrou que há uma tendência, nas diversas leis orgânicas, de tangenciar a
expressão “regime de colaboração” por meio do uso de termos que remetem, quase
sempre, à materialização desse regime.
Palavras-chave: Leis Orgânicas Municipais; Regime de Colaboração; Região
Metropolitana de Campinas.

A Constituição Federal de 1988 prevê o regime de colaboração entre os entes


federados ao definir, em seu Artigo 23, as competências comuns da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios. A Emenda Constitucional n. 53/2006 reconheceu
a necessidade de regulamentação deste regime, ao afirmar: “Leis complementares
fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito
nacional”.

1
O presente trabalho é desdobramento da pesquisa “Políticas Educacionais na Região Metropolitana de
Campinas: regime de colaboração”, desenvolvida pelo Laboratório de Gestão Educacional (LAGE) da
Faculdade de Educação/UNICAMP, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo (FAPESP), no período de outubro de 2012 a outubro de 2014, coordenada pelo Prof. Dr. Pedro
Ganzeli.
157

No Capítulo III da Lei Maior, que trata da educação, o regime de colaboração foi
contemplado no Artigo 211 possibilitando à União, aos Estados, ao Distrito Federal e
aos Municípios a organização dos seus sistemas de ensino. Da mesma forma, o
parágrafo 4º deste Artigo reafirma a necessidade de colaboração dos entes federados “de
modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório”.
A partir do ordenamento legal, mas carecendo de uma regulamentação própria, o
regime de colaboração entre os entes federados “passou a ser defendido como um
mecanismo de apoio/cooperação entre a União, estados e municípios na definição e
implementação das políticas educativas voltadas para o efetivo usufruto da educação
com qualidade” (AZEVEDO, SANTOS, 2012, p. 564).
No entanto, há que se ressaltar, conforme afirmam Luce e Farenzena, que:

a atuação dos governos em regime de colaboração na área da educação é,


mais do que prescrição, criação política. A prática das relações
intergovernamentais é que traça ações mais ou menos colaborativas ou
coordenadas. E essa prática é marcadamente de cunho político, não
obedecendo, sempre ou em linha de continuidade e cumulatividade, à lógica
mais formal da legislação (LUCE e FARENZENA, 2007, p.10).

Desse modo, a presente comunicação objetiva analisar as Leis Orgânicas dos


dezenove municípios integrantes da Região Metropolitana de Campinas (RMC),
buscando compreender a forma como o regime de colaboração, na área de educação, foi
contemplado nas legislações municipais.

1. Leis Orgânicas Municipais


A existência da Lei Orgânica Municipal está prevista na Constituição Federal de
1988, a qual, segundo o Artigo 29, afirma:
O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o
interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da
Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos
nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado [...] (BRASIL,
1988).

De acordo com o Artigo 11 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias,


as Constituições Estaduais devem ser elaboradas no prazo de um ano após a
promulgação da Lei Maior. Em relação às Cartas Municipais, o parágrafo único do
mesmo artigo, determina: “promulgada a Constituição do Estado, caberá à Câmara
Municipal, no prazo de seis meses, votar a Lei Orgânica respectiva, em dois turnos de
discussão e votação”.
158

Aprovada em 05 de outubro de 1989, a Constituição do Estado de São Paulo


cumpriu o prazo estabelecido pela Lei Maior. Desse modo, as Leis Orgânicas dos
Municípios que compreendem a Região Metropolitana de Campinas (RMC), objeto
desta pesquisa, teriam até 5 de abril de 1990 para serem promulgadas.
Por tratar-se de um estudo documental, optamos por analisar as legislações
disponíveis para download nos sites das Prefeituras e das Câmaras Municipais dos
municípios integrantes da RMC, no entanto, nem sempre a legislação procurada se
encontrava disponível. Tivemos também dificuldades em relação ao texto legal que
recebeu emendas, pois nem sempre estava disponibilizada a redação original, estando
disponível apenas a redação atualizada.
O Quadro 1 apresenta o levantamento das datas de promulgação e da última
alteração das Leis Orgânicas dos dezenove municípios que integram a RMC.

Quadro 1 - Leis Orgânicas Municipais – data da promulgação e alterações (1990-2013)


Município Promulgação Inicial Última alteração
Americana 04 de abril de 1.990 16 de dezembro de 2010
Artur Nogueira 10 de Abril de 1990 21 de dezembro de 2005
Campinas 31 de março de 1990 13 de abril de 2009
Cosmópolis 30 de março de 1990 2011 (não consta a data completa)
Engenheiro Coelho 13 de junho de 1993 (sem informação de outra data)
Holambra 24 de fevereiro de 1994 27 de junho de 2013
Hortolândia 09 de julho de 1993 04 de dezembro de 2012
Indaiatuba 10 de março de 1.992 (Emenda disponível) 14 de dezembro de 2010
Itatiba 04 de abril de 1990 13 de Outubro de 2009
Jaguariúna 05 de abril de 1990 24 de junho de 2009
Monte Mor 24 de março de 1990 (sem informação de outra data)
Nova Odessa 05 de abril de 1990 21 de Novembro de 2000
Paulínia 04 de novembro de 1998 (Emenda disponível) 14 de dezembro de 2010
Pedreira (data não disponível) (data não disponível)
Santa Bárbara d´Oeste 05 de abril de 1990 5 de dezembro de 2006
Santo Antônio de Posse 30 de setembro de 2004 (Emenda disponível) 13 de junho 2007
Sumaré 18 de junho de 1990 (sem informação de outra data)
Valinhos 05 de abril de 1990 17 de maio de 2007
Vinhedo 02 de abril de 1990 (sem informação de outra data)
Fonte: Leis Orgânicas dos Municípios de Americana, Artur Nogueira, Campinas, Cosmópolis, Engenheiro Coelho,
Holambra, Hortolândia, Indaiatuba, Itatiba, Jaguariúna, Monte Mor, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa
Barbara D’Oeste, Santo Antônio de Posse, Sumaré, Valinhos e Vinhedo.

A análise do Quadro revelou que 12 (doze) municípios promulgaram suas Leis


Orgânicas em 1990, cumprindo o prazo determinado pela Lei Maior no que diz respeito
à promulgação das Leis Municipais.
Os municípios de Engenheiro Coelho e Hortolândia tiveram suas LOMs
aprovadas em 1993, enquanto Holambra aprovou sua Lei em 1994. Justifica-se tal
159

informação pelo fato de estes três municípios terem sido criados somente no ano de
1991.
Podemos constatar que em todas as legislações foram encontradas emendas à
redação original. No que diz respeito à educação, foram detectadas emendas nas leis dos
seguintes municípios: Campinas, Cosmópolis, Holambra, Hortolândia, Jaguariúna,
Santo Antonio de Posse e Vinhedo.

2. Regime de Colaboração nas LOMs


O termo “colaboração” foi encontrado nas LOMs aplicado a diferentes setores
do poder executivo e legislativo. Considerando que a presente pesquisa focaliza o
regime de colaboração na área da educação, neste campo centraremos nossas
preocupações. A análise realizada incluiu, quando disponível, as emendas que alteraram
as respectivas Cartas Municipais.
Na LOM de Americana, o termo colaboração relacionado à área da educação,
não foi encontrado de forma explícita, no entanto, o Artigo 185 remete ao mesmo, ao
determinar: “Cabe ao Município, em conjunto com o Poder Público Estadual e Federal,
assegurar o ensino público, gratuito, laico e de igualdade, acessível a todos sem
discriminação por motivos econômicos, ideológicos, culturais, sociais e religiosos”.
Na legislação de Artur Nogueira, foi possível identificar termos correlatos à
expressão “regime de colaboração”, tais como: “conjunto”, “cooperação”, “convênio”,
“programas de utilização” e “transferências”.
Campinas (art. 4º) prevê o regime de colaboração ao prescrever:

VII – manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado,


programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental;
(...)
XXII – participar e integrar, através de consórcio ou outra forma de
organização, com outros municípios, para o estudo e a solução de problemas
comuns;
XXIII – participar da região metropolitana e outras entidades regionais na
forma estabelecida em lei.

NA LOM de Cosmópolis a expressão “regime de colaboração” também não foi


explicitamente empregada, utilizando os termos “cooperação técnica e financeira” e
“participação” para a consecução deste regime. A Lei prevê a materialização do
trabalho integrado por intermédio do estabelecimento de convênios, consórcios, acordos
e contratos com a União, com o estado, com outros municípios e com entidades
públicas e particulares. Estas possibilidades estão presentes na área da educação, da
saúde, da agricultura, nos direitos da mulher e no combate à violência.
160

De acordo com Oliveira e Ganzeli (2013, p. 1043), a utilização destes


mecanismos no relacionamento intergovernamental “nem sempre concorrem para o
preceito constitucional do regime de colaboração”. Para os autores,

Apresentam-se como mecanismos integradores entre os signatários, mas são,


entretanto, fragmentários, conjunturais e não concorrem para a construção do
Sistema Nacional de Educação, comprometendo a garantia da efetivação da
educação como direito (OLIVEIRA & GANZELI, 2013, p. 1043).

A legislação de Engenheiro Coelho supõe uma relação de dependência técnica e


financeira do município em relação aos demais entes federados, ao determinar “manter,
com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação e
de ensino fundamental”.
Holambra não utiliza a expressão regime de colaboração no texto de sua LOM,
no entanto, são empregados termos correlatos tais como: transferência de recursos (Art.
218), comum acordo (Art. 221), competência comum da União, Do Estado e do
Município (Art. 222), convênio (Art. 228).
Da mesma forma, na legislação do município de Hortolândia não foram
encontradas referências diretas ao regime de colaboração. Encontramos na legislação
analisada, palavras e frases indicativas nesse sentido, tais como “integração”,
“cooperação” e “cooperação técnica”. A LOM apresenta, ainda, elementos que
favorecem o aspecto da colaboração com o nível estadual, federal, com outros
municípios, com setores do próprio município e com o setor privado.
Na lei orgânica do município de Indaiatuba, na subseção IV Da Educação,
encontramos alguns artigos que remetem às relações intergovernamentais.
Art. 169 – O Município manterá:
I – Educação Infantil, atendendo crianças de 0(zero) a 6(seis) anos, em creche
e Pré-escolas, respeitando as características próprias dessa faixa etária (NR).
Parágrafo único – O Município priorizará o ensino fundamental, após
atendimento pleno e satisfatório do ponto de vista quantitativo da demanda a
que se refere o inciso I, deste artigo, devendo, no entanto, cooperar de
maneira suplementar, na forma do art. 173, desta Lei, mediante (NR).
(...)
Art. 173 – O Município não manterá e nem subvencionará estabelecimentos
de ensino superior ou cursos do ensino médio, enquanto não cumprir o
disposto no art. 169 desta Lei (NR).
O texto da norma apresenta-se genérico uma vez que não define a quem se
destina a “cooperação” mencionada no parágrafo único do artigo citado.
Na legislação de Itatiba, encontramos duas formas de entendimento do regime
de colaboração. No caput do artigo 5º, foi mencionada a ‘competência administrativa’
161

dos entes federados; da mesma forma, a ‘cooperação técnica e financeira’ foi tratada no
inciso IV do mesmo artigo, assim:
Artigo 5º – É da competência administrativa do Município, como também da
União e do Estado, observadas as legislações Federal e Estadual, o exercício
das seguintes medidas, entre outras:
(...)
IV – manter programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental,
inclusive alfabetização de adultos, com a cooperação técnica e financeira da
União e do Estado.
Na LOM de Jaguariúna encontramos a preocupação do legislador em garantir o
regime de colaboração entre os entes federados no atendimento à educação no
município. Embora a expressão regime de colaboração não esteja presente de forma
explícita na Lei, foram encontrados artigos que remetem ao entendimento da mesma,
assim:
Artigo 11 – Ao Município compete privativamente:
(...)
II – manter cooperação técnica e financeira com a União e Estado em
programas de educação pré-escolar, de ensino fundamental, de saúde, de
assistência social e segurança.
Da mesma forma, os Artigos 232, 235 e 236 remetem à consecução do regime
de colaboração na área educacional.
Art. 232 - É da competência comum da União, do Estado e do Município
proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência.
(...)
Art. 235 - O Município manterá com a União e o Estado, convênios que
visem à erradicação do analfabetismo em seu território.
(...)
Art. 236 - O Município, considerando-se as necessidades locais e regionais
do mercado de trabalho, implantará política de educação profissionalizante e
semi-profissionalizante, permitindo-se, para consecução desse fim, a
celebração de convênios com os governos federal e estadual e empresas
particulares.
No município de Monte Mor, tanto o termo “colaboração”, quanto expressões
como “suplementar a legislação federal e estadual no que couber”, “cooperação técnica
e financeira”, “formas de colaboração”, sugerem a materialização do regime de
colaboração.
Também no caso de Nova Odessa, os artigos da LOM que se referem à
educação, fazem referência ao regime de colaboração, porém sem utilizar o termo
propriamente dito, amplificando a tendência observada nos demais municípios:
Art. 193. O Município promoverá a educação infantil e o ensino fundamental,
ambos gratuitos, com a colaboração da sociedade e a cooperação técnica e
financeira da União e do Estado, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho.
162

Art. 194. O Município desenvolverá políticas educacionais no sentido de


proporcionar:
VI – parcerias com Municípios e instituições educacionais da região, voltadas
à profissionalização do educando.
(...)
Art. 201. O plano municipal de educação plurianual referir-se-á ao ensino
fundamental, infantil e especial, incluindo, obrigatoriamente, todos os
estabelecimentos de ensino público municipais.
Parágrafo único. O plano de que trata este artigo será elaborado em conjunto
ou de comum acordo com a rede escolar mantida pelo Estado, na forma
estabelecida pela legislação vigente.
Em Paulínia, o artigo 81 da Carta Municipal dispõe sobre o fato de que o
Município manterá seu sistema de ensino em colaboração com a União e o Estado,
atuando, prioritariamente na educação infantil e no ensino fundamental. Prevê ainda, no
§ 3º, que na organização de seu sistema de ensino o Município definirá com o Estado as
formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório. Ou
seja, a lei informa a necessidade de cooperação entre os entes federados na oferta da
educação, mas se restringe à formulação de uma incipiente introdução ao tema,
obrigatória na medida em que remete ao estabelecido nas leis “maiores”, Constituição
Federal e Estadual. Como na maioria dos municípios, parece ser uma regulamentação
pró-forma, à espera de leis complementares que regulamentem, de fato, a inserção do
regime de colaboração enquanto política pública.
Um dado novo aparece no município de Pedreira, onde o estudo realizado aponta
a distinção que o legislador fez entre o termo “colaboração”, utilizado na relação entre o
poder público municipal e a sociedade e o termo “cooperação”, para a relação entre os
entes federados. Entendeu-se, nesse caso, que se buscou enfatizar a ação conjunta dos
entes federados para a garantia do direito a educação. Quanto ao que se refere à
educação, propriamente dita, a Lei Orgânica do Município no capítulo VIII (da
Educação), em seu artigo 168 define que:

O Plano Municipal plurianual de educação referir-se-á ao ensino de 1º grau e


a educação pré-escolar, incluindo obrigatoriamente todos os estabelecimentos
de ensino público sediados no Município.
PARÁGRAFO ÚNICO – O plano de que trata este artigo, deverá ser
elaborado em conjunto ou de comum acordo com a rede escolar mantida pelo
Estado, na forma estabelecida em Lei.

Desse modo, foi verificado na pesquisa desta Lei Orgânica que houve
preocupação do legislador em garantir o regime de colaboração entre o município e o
estado, indicando a necessidade de trabalho em conjunto para a elaboração do Plano
Municipal de Educação.
163

Inédito no caso dos municípios da RMC é a referência detectada no estudo da


Lei Orgânica de Santa Bárbara do Oeste, que prevê a existência de colegiado municipal
de educação e dentre suas atribuições há a que se refere à interação com outras
entidades. O legislador empregou a expressão “Comissão” e não “Conselho”, o que se
deu, muito provavelmente, em função das experiências anteriores de municípios
paulistas que, por não terem até então, delegações do Conselho Estadual de Educação,
davam aos colegiados a denominação de Comissões, como segue:

Artigo 233 – A Lei criará a Comissão de Educação do Município.


§ 1º - São atribuições da Comissão de Educação do Município:
(...)
III – fixar critérios para o emprego de recursos destinados a educação
provenientes do Município, do Estado, da União ou de outra fonte,
assegurando-lhes aplicação harmônica, bem como pronunciar-se sobre
convênios de qualquer espécie;

Além disso, na referida lei o regime de colaboração não se limitou à educação,


fazendo referências também a outras áreas. Dentre estas a experiência mais abrangente
se dá no campo da saúde com o SUS – Sistema Único de Saúde, detendo-se o
documento na relação de competências municipais, na política agrícola e na área da
cultura.
Portanto, concluiu-se que a Lei Orgânica Municipal contemplou a questão da
integração regional, no trabalho conjunto e colaborativo com outros entes federados e
com entidades particulares, zelando para o encaminhamento democrático das decisões,
envolvendo “Comissão de Educação”, “órgãos representativos” e “participação
popular”, respectivamente nas questões da educação, da saúde e da cultura, bem como a
Câmara Municipal na autorização de convênios e consórcios e instrumentos que
viabilizem ações conjuntas. Há nitidamente um avanço nestas formulações se
compararmos com outros municípios estudados, na medida em que aprofunda os
mecanismos de colaboração à disposição do poder executivo.
Em Santo Antonio de Posse, verificou-se que, ao tratar da questão da educação
municipal, a Lei Orgânica Municipal utilizou o termo “regime de colaboração” apenas
no artigo 177, quando se refere à organização do sistema municipal de ensino em
conjunto com o Estado. No entanto, em outros itens, utilizou-se de termos aos quais já
nos referimos neste artigo, como intercâmbio e convênio, que sugerem a possibilidade
de trabalhos colaborativos com outros órgãos ou entes federados. Nos demais itens da
Lei, quando trata de outros setores como cultura, saúde, proteção ambiental e segurança
pública, foram utilizados termos como intercâmbio, consórcio e convênio.
164

Sumaré amplifica a tendência de prever convênios e colaboração na Lei


Orgânica do Município, mas não se referindo ao regime de colaboração de maneira
clara, o que, em nosso entendimento, pode comprometer a compreensão e efetivação
deste em nível municipal. O Capítulo II, Da Educação, estabelece:

O município promoverá a Educação Pré-Escolar e o ensino de 1º grau, e a


educação especial com a colaboração da sociedade e a cooperação técnica e
financeira da União e Estado, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa
humana, podendo atuar em nível mais elevado.

Da análise da Lei Orgânica do município de Valinhos, encontramos termos como


“participação”, “auxilio da comunidade”, “transferências de recursos destinados à
educação” e “transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino”. Portanto,
uma vez mais, o termo “colaboração” não se faz presente, pelo menos de forma
explícita.
A Lei Orgânica de Vinhedo prioriza o atendimento educacional das crianças de
zero a cinco anos de idade, especialmente as creches e pré-escolares. Conforme o Art.
176, vinte e cinco por cento da receita líquida de impostos são destinados ao
desenvolvimento do ensino, respeitando-se, portanto, o que dispõe a Constituição
Federal. Entretanto, os outros níveis de ensino ficam descentralizados.

Art. 170. O Município responsabilizar-se-á, prioritariamente, pelo


atendimento, em creches e pré-escolas,
Parágrafo Único - O atendimento às pessoas deficientes poderá ser oferecido
mediante o estabelecimento de convênios com instituições sem fins
lucrativos, com a prévia autorização legislativa e sob a supervisão do Poder
Público.
(...)
Art. 174. O Sistema de Ensino do Município compreenderá obrigatoriamente:
(...)
II - entidades que congreguem pais de alunos, professores e outros
funcionários com o objetivo de colaborar para o funcionamento eficiente de
cada estabelecimento de ensino.
Art. 176. Anualmente o Município aplicará, no mínimo, 25% (vinte e cinco
por cento) da receita resultante de impostos, inclusive a proveniente de
transferências, na manutenção e no desenvolvimento do ensino nos termos
definidos no Artigo 212 da Constituição Federal.

Participação, auxílio da comunidade, transferência de recursos destinados à


educação, entre outros, que regulamentam a Lei Orgânica de Vinhedo, são exemplos
das referências, ainda que indiretas, à existência de um regime de colaboração, o que,
em nossa compreensão, não garante a sua efetivação.
165

3. Considerações finais
De modo geral, as Leis Orgânicas municipais analisadas não se referem
diretamente à expressão “regime de colaboração”. Os termos mais utilizados que
remetem à temática, são: conjunto, cooperação, cooperação técnica e financeira,
convênios, consórcios, transferências.
No campo educacional, a referência à colaboração se vislumbra quando da
necessidade de assegurar o ensino público, laico e de igualdade, acessível a todos. Ou
seja, as diversas Leis Orgânicas analisadas observam a Lei Maior, Constituição Federal
de 1988, não apresentando ainda o aprofundamento do tema regime de colaboração.
Em vários municípios, não foram encontrados artigos específicos que se
referissem ao regime de colaboração. Vários destes artigos expressam termos que
podem indiretamente transmitir a ideia de que possa existir colaboração entre os entes
federados. A sistematização dessa colaboração é superficialmente mencionada, não
havendo detalhamento de algumas das ações propostas. Em alguns artigos analisados,
há referência ao percentual de gastos devidos a cada ente federativo, apenas
reproduzindo as prescrições da Constituição Federal.
Termos como colaboração, suplementar à legislação federal no que couber,
cooperação técnica e financeira, formas de colaboração, denotam regime de colaboração
neste nível de aprofundamento próprios dos termos em si mesmos, uma vez que, uma
vez mais, não há referência específica ao termo “regime de colaboração”.
Os municípios, por meio das Leis Orgânicas promulgadas, contemplam diversas
áreas da administração em que há referências ao trabalho em colaboração, como obras
públicas, sistemas municipais de saúde, etc, sempre enfatizando a possibilidade de
celebração de convênios e sistemas de consórcio entre os entes federados.
Notadamente há uma tendência nas diversas leis orgânicas municipais analisadas
de tangenciar a questão do regime de colaboração, em que se compreende e menciona a
necessidade de trabalho em conjunto entre os entes federados.

4. Referências
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<http://www.americana.sp.gov.br/americanaV5/americanaEsmv5_Index.php>. Acesso
em: 03 jun. 2013.

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<http://camaraarturnogueira.net/layout-over-40-positions/organica.html>. Acesso em:
10 jun. 2013.
166

AZEVEDO, J. M. L. de.; SANTOS, A. L. F. dos. Influências do poder central no


planejamento da educação dos municípios da Região Metropolitana do Recife.
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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 06
mai. 2013.

________. Emenda Constitucional 53, de 19 de dezembro de 2006. Dá nova redação


aos Arts. &º, 23, 30, 206, 208 211 e 212 da Constituição Federal e dá nova redação ao
Art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais transitórias. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc53.htm>. Acesso
em: 16 mai. 2013.

CAMPINAS (Município). Prefeitura Municipal. Disponível em


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VALINHOS. Prefeitura Municipal. Disponível em:


http://www.valinhos.sp.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id
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VINHEDO (Município). Câmara municipal. Disponível em:


<http://www.camaravinhedo.sp.gov.br/arquivos/downloads>. Acesso em: 11 jun. 2013.
168

Comunicação

Planos de Educação e Regime de Colaboração na Articulação dos Sistemas de


Ensino: por onde andam os estados?

Andreza Alves Ferreira


UFES-PPGE

Resumo: Este trabalho é parte de nosso projeto de pesquisa de doutorado em que


objetivamos analisar como os estados vêm se articulando junto aos seus municípios com
vistas ao estabelecimento da cooperação na implementação das políticas educacionais.
Nesta comunicação buscamos analisar, a partir do levantamento de estudos sobre o tema
do federalismo cooperativo em educação e da análise documental (capítulo da educação
das Constituições dos estados brasileiros), o papel dos estados junto aos seus municípios
no contexto de seus sistemas e planos de educação. Na nossa avaliação, o atual cenário
aponta para uma fragilidade institucional dos SEE, denotando o atual padrão de relações
intergovernamentais vigente no País, assinalado pela indefinição do papel dos estados,
pela relação direta da União com os municípios e pela ausência de arenas de pactuação
entre os entes federados. Expõe, portanto, as dificuldades de construção de um
federalismo cooperativo em educação que, conforme procuramos demonstrar neste
trabalho, além dos motivos expostos, padece pela ausência de regulamentação do
regime de colaboração.
Palavras-Chave: Planos de educação, Sistemas de educação, Regime de colaboração.

INTRODUÇÃO

Os Planos de Educação são documentos, com força de lei, que estabelecem metas para
que a garantia do direito à educação de qualidade avance em um município, estado ou
país, portanto, partimos do suposto de que estes devem se constituir no principal
instrumento da política pública educacional.
Todavia, a história nos mostra que este é um desafio ainda por se alcançar,
principalmente no âmbito dos estados. Impõe-se ainda como parte deste desafio, a
instituição de um Sistema Nacional de Educação (SNE). Consoante a isto temos que no
Brasil, mais de 60% dos estados ainda não possuem planos de educação, já em relação
169

aos municípios, este dado apresenta-se um pouco melhor, apenas 30%. Contudo, muitos
dos que possuem, não o utilizam para planejar suas políticas, mantendo-os
desconhecidos da população1.
Sem nos atermos aos processos que envolveram as tentativas, tanto de formulação
quanto de implementação dos planos de educação ao longo da história da educação
brasileira2, cumpre assinalar que do ponto de vista legal, somente teremos um PNE a
partir do disposto na Constituição Federal (CF) de 1988 que resultou na Lei nº. 10.172
de nove de janeiro de 20013. Na definição desta Lei, estiveram em disputa duas
propostas: a da sociedade brasileira, encaminhada pelo Deputado Federal Ivan Valente
(PT/SP) sob o nº. 4.155/1998 e a do Executivo nacional, de nº. 4.173/1998 sob a
relatoria do Deputado Federal Nelson Marchezan (PSDB/RS). Sendo o seu resultado
uma síntese dos dois projetos, mas contendo, segundo Aguiar (2010) quarenta e sete
vetos do Presidente Fernando Henrique Cardoso relacionados às questões de
financiamento.
Neste sentido, pode-se afirmar que o plano se transmutou em instrumento de introdução
da racionalidade financeira (SAVIANI, 2011), corroborando os limites assinalados por
meio da EC 14/1996, antes da conclusão da própria LDBEN 9.394/96, em estabelecer o
direito universal à educação. Priorizando dessa forma, a escolarização obrigatória
restrita à faixa etária de 7 a 14 anos, sendo esta colocada sob a responsabilidade dos
municípios, com baixa participação do poder central. A cooperação federativa ganhou,
portanto, limites estritos da escolarização obrigatória.
Conforme avaliação do Congresso Nacional da Educação Básica (CONEB) em 20084, a
aprovação do PNE, em 2001, não se fez acompanhar de planos estaduais e municipais,
em todo o País, que dessem consequência às metas e prioridades nele estabelecidas,
tampouco considerado no planejamento e nas ações educacionais em curso. Prova disso,
é que ainda no período de sua vigência (2001-2010), em 2007, foi lançado o Plano de
Desenvolvimento da Educação (PDE) por meio do Decreto Presidencial nº 6.094 de
20075, pelo então Secretário de Educação Fernando Haddad.
Quando ressaltamos a importância do estabelecimento de Leis no âmbito das políticas
de educação, estamos reforçando o papel das políticas de Estado em detrimento das

1 (FNCE, de Olho nos Planos, 2014).


2
Para uma análise detalhada sobre esse processo, ver Cury (1998) e Saviani (2011).
3
A Lei 10.172/2001 estabeleceu que cada estado brasileiro deveria ter o Plano Estadual de Educação,
articulado com os de seus municípios até 2002.
4
Ver Documento Referência em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/conferencia/documentos/doc_final.pdf
5
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Decreto/D6094.htm.
170

políticas de governo6. Conforme é sabido, durante este período em que os estados não
aprovaram seus planos de educação, outros planos7, projetos e ações foram
implementados com vistas à consecução das políticas de governos que por eles
passaram.

O CONTEXTO ATUAL DE APROVAÇÃO DO PNE 2014-2024


Após três anos de tramitação, foi sancionada pela presidente Dilma Roussef, em junho
do corrente ano, a Lei Federal Nº 13.005 que aprova o Plano Nacional de Educação
(PNE) para o decênio 2014-2024. Em seu último artigo (13), esta lei estabelece que, no
prazo máximo de dois anos, o poder público deverá instituir, por meio de lei específica,
o Sistema Nacional de Educação (SNE), responsável pela articulação dos sistemas de
ensino, em regime de colaboração, para a efetivação das diretrizes, metas e estratégias
do PNE.
Em seu artigo 7º, a referida Lei estabelece que a “União, os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios atuarão em regime de colaboração, visando ao alcance das metas e à
implementação das estratégias objeto deste Plano”. E ainda que, poderão ser criadas, em
âmbito local, medidas adicionais - além das previstas nas estratégias do PNE – ou
instrumentos jurídicos que formalizem a cooperação entre os entes federados. No
parágrafo 5º prevê também que será criada uma instância permanente de negociação e
cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
Nesta mesma linha de argumentação, o parágrafo 6º do referido artigo aponta que o
“fortalecimento do regime de colaboração entre Estado e respectivos Municípios
incluirá a instituição de instâncias permanentes de negociação, cooperação e pactuação
em cada Estado”. Reforçando, portanto, o princípio de que em um contexto federativo, a
articulação interfederativa na implementação das políticas educacionais torna-se um

6
Compreende-se por políticas de governo, aquelas de iniciativa do Executivo que têm a marca da gestão,
são pontuais e, em geral, envolvem pouca discussão, com muita possibilidade de descontinuidade. Já as
políticas de Estado são resultantes de processos que envolvem interlocutores diversos, são portadoras de
propostas mais amplas e que vão além do período de gestão, resultando em mudanças de outras normas
ou disposições pré-existentes, com incidência em setores mais amplos da sociedade (OLIVEIRA, 2011, p.
329).
7
No estado do ES, por exemplo, foi instituído no período de 2003 a 2010, um plano de governo baseado
na metodologia do planejamento estratégico, como parte das ações do “Plano de Desenvolvimento
Espírito Santo 2025”, para a educação, denominado “Ensinando e Aprendendo: Oito Anos da Nova
Escola no Espírito Santo – 2003-2010” (GOVERNO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, 2010). O
estado do ES até os dias atuais não conta com PEE.
171

imperativo. Por isso, a necessária inclusão desta estratégia nos planos estaduais e
municipais de educação (artigo 8º, inciso IV8).
Em suma, o atual projeto de instituição do SNE parece propor que a organização
sistêmica da educação dependa da articulação entre os entes da federação, que devem
dispor de um órgão próprio para a sua gestão, de instrumentos de planejamento das
políticas e de instâncias participativas. Este movimento expressa, portanto, a
importância de coordenação da União, na indução de reformas que abrangem todo o
território nacional no que diz respeito às políticas educacionais.
A partir do movimento atual de aprovação do PNE e instituição do SNE em atenção ao
disposto na Constituição Federal em seu artigo 214, em que o plano nacional de
educação tem como objetivo articular o sistema nacional de educação em regime de
colaboração, levantamos o seguinte questionamento: qual o papel dos estados neste
processo junto aos seus municípios constituintes? Como os estados vêm se articulando
junto aos seus municípios com vistas ao estabelecimento da cooperação na
implementação de seus planos?
Partimos do suposto de que além do movimento ensejado pelo governo federal com
vistas à articulação nacional, faz-se necessária também uma articulação regional entre
os entes subnacionais.

O ORDENAMENTO CONSTITUCIONAL E LEGAL DOS SISTEMAS ESTADUAIS


DE EDUCAÇÃO NOS ESTADOS DA FEDERAÇÃO BRASILEIRA PÓS LDBEN
9.394/96

O processo de municipalização do Ensino Fundamental desencadeado a partir de


meados dos anos 1990, tendo como forte componente indutor, o Fundef, influenciou a
ação dos estados em duas direções: na desobrigação com esta etapa da educação e na
retração de movimentos de articulação interfederativa.
Como resultado deste processo, temos que os municípios se mobilizaram em torno da
instituição de seus sistemas próprios de ensino9, enquanto que os estados, em sua

8
Art. 8o Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão elaborar seus correspondentes planos de
educação, ou adequar os planos já aprovados em lei, em consonância com as diretrizes, metas e
estratégias previstas neste PNE, no prazo de 1 (um) ano contado da publicação desta Lei. IV - promovam
a articulação interfederativa na implementação das políticas educacionais.
9
Conforme informa a pesquisa Perfil de Informações Básicas Municipais (BRASIL, IBGE, 2010), até o
ano de 2009, em apenas 20,1% das cidades brasileiras não foram criados CMES. Sendo que destes, 79,
172

maioria, tampouco o fizeram na forma da Lei, prevalecendo em nossa avaliação, uma


lógica de redes. Ou em outra interpretação, o sistema (estadual) como algo dado pelo
dispositivo normativo, inclusive porque já previsto na primeira LDB, Lei n.º 4.024 de
1961 e também na Constituição de 1967.
Essa interpretação por parte dos estados, contudo, pode ser alvo de questionamentos
haja vista que as Constituições estaduais foram reformuladas após a Constituição de
1988 tendo em vista as mudanças, sobretudo do regime político até então vigente.
Requerendo, portanto, mudanças significativas no campo das políticas sociais,
declaradas como direitos sociais, com primazia para a educação.
Ainda que tenha sido ofertada aos municípios a possibilidade de instituírem seus
sistemas de ensino, os estados, além de não ficarem isentos de organizarem os seus
sistemas, poderiam prever em suas Constituições e/ou demais leis, ações colaborativas
no que tange à oferta educacional em seus territórios. Principalmente motivados pela
responsabilidade compartilhada em relação ao Ensino Fundamental.
Além disso, temos que os sistemas municipais de educação são instituídos por meio de
Leis específicas e, mais recentemente, por meio da Lei 13.005/2014, que o Sistema
Nacional de Educação também deverá ser instituído por meio de Lei específica. Já os
Sistemas Estaduais de Educação (SEE), em sua maioria, não contam, para a sua
organização, com a presença de um aparato normativo legal, criado com esta finalidade.
Ou seja, a instituição de uma legislação específica que disponha sobre as diretrizes para
a organização do Sistema Estadual de Educação, conforme pode ser observado no
quadro abaixo.

QUADRO. OS SISTEMAS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS PÓS 1989

REGIÃO U.E CARACTERIZAÇÃO DO SEE LEI DO CEE LEI DO SSE

Sistema Estadual de Ensino em regime


SIM
GO de colaboração com a União e os Lei 4009/1962
LC - nº 26/1998
Municípios

MT Sistema Único de Ensino Lei 1.815/1963 NÃO


CENTRO OESTE
Decreto-Lei nº 8/1979,
MS Não faz referência NÃO
Lei 1460/1993
Lei 4.751/2012
DF LEI ORGÂNICA Dec. 171/1962 Sistema de Ensino e
Gestão Democrática

7% correspondem a pequenos municípios com até 20 mil habitantes. A mesma pesquisa informa que
50,1% dos municípios brasileiros constituíram sistemas municipais de ensino próprios.
173

AC Orga. Articulada Lei nº 04/1963 LC 162/2006


Lei 108/1955, Lei nº
AM estabelecimentos estaduais e municipais Lei 1.989/1990
62/1961
Sistema Estadual Hierarquizado e
PA Descentralizado - os Sistemas municipais Lei nº 2840/1963 Lei 6170/1998
integrarão o SEE
NORTE
RR Sistemas de Ensino Estadual e Municipal NÃO
Sistemas de Ensino Estadual e
RO Decreto nº 11/1981 NÃO
Municipal, descentralização
Sistema Estadual Hierarquizado e
AP SIM
Descentralizado -

TO Sistemas estadual e municipal NÃO


Sistemas estadual e municipal, formas
PR Lei nº 4.978/1964 NÃO
de colaboração
SIM –
SC
LC nº 170/1998
SUL
Decreto Lei nº
RS SEE e SME 1163/1946, Lei nº NÃO
2950/1956

Sistema Público Estadual de Educação,


SIM
BA abrangendo as redes estadual e Lei nº 172/1842
Lei 7.308/1998
municipais
MA Não faz referência Lei nº 2235/1962 NÃO
Lei nº 2498/1963 e Dec.
PI Não faz referência NAÕ
10.661/2001

SEE e SME, mas com as mesmas regras NÃO


CE Lei nº 11.014/1985
para as escolas dos dois sistemas normas gerais

PE SEE Lei nº 4.591/1963 NÃO


NORDESTE
RN SEE e SME Lei nº 7.897/2000 NÃO

SIM - Lei de diretrizes e


Lei nº 2.847/1962, Lei nº bases da educação
PB SEE e SME
4.872/1986 estadual - LC - Decreto
S/Nº de 1971

AL SEE e SME - Sistema Público de Ensino Lei nº 2511/1962 NÃO

SE Não faz referência Lei nº 1190/1963 NÃO


MG Descentralização por cooperação NÃO

SP SEE e SME - Sistema Público de Ensino Lei nº 7940/1963 SIM

SUDESTE SIM
RJ Sistema Estadual Integrado de Ensino
Lei nº 3.155/1998
Lei 1735/1962 e LC nº
ES Sistemas estadual e municipais NÃO
401/2007
TOTAL 27 9
Fonte: Constituições Estaduais e Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais de Educação (FNCE).
Elaboração da autora.

Dos vinte e seis estados da federação, sete previram em suas Constituições que os
Sistemas Estaduais de Educação seriam regulamentados por meio de lei específica.
Destes sete, apenas cinco o fizeram, sendo que a maioria das legislações foi editada a
174

partir de meados da década de 1990, ou seja, pós LBDEN 9.394/96. Os estados do Acre,
do Amazonas e do Pará, apesar de não previrem em suas Constituições, possuem
legislações específicas que dispõem sobre a organização de seus sistemas de ensino. No
Acre e no Pará, os sistemas municipais são integrados aos sistemas estaduais de ensino.
As informações concernentes à lei de criação dos Conselhos Estaduais de Educação
(CEE) foram obtidas por meio da pesquisa realizada pelo FNCE10. Nesta pesquisa, foi
solicitado aos CEE que indicassem as legislações relativas à sua instituição e também a
do Sistema. A maioria respondeu indicando a Lei de criação do próprio Conselho. Os
CEE estabelecem, pois uma relação entre o marco legal de sua criação, e a instituição
do SEE. Assim, conforme pode ser observado no quadro acima, a maioria dos CEE foi
criada pós 1961, ou seja, por indicação da LDB 4.024/61. Ocorre que as leis editadas
para a instituição dos CEE têm seus conteúdos limitados as suas composições,
atribuições e funcionamentos, não abrangendo as normas gerais sobre a organização do
SEE. Além disso, as resoluções e pareceres dos CEE, em geral, versam sobre matérias
muito específicas, não contemplando também as normas que orientam a organização do
SEE.
A partir do exposto, poderíamos nos perguntar: existem sistemas estaduais de ensino?
Como eles estão organizados? Como os seus CEE estão situados neste sistema? A
pesquisa aponta para a existência de leis específicas sobre os CEE e em alguns estados
há também legislação que dispõe sobre a Gestão Democrática do ensino, conforme
disposto no texto da Constituição em seu artigo 206, inciso VI: “gestão democrática do
ensino público, na forma da lei”. E ainda na LDBEN, artigo 3º, inciso VIII, “gestão
democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de
ensino”. O que nos leva a crer que a maioria dos estados se comportou, considerando as
disposições legais explicitadas nestas legislações.
O mesmo pode ser verificado em relação à elaboração e aprovação de seus planos de
educação por meio de Leis que, conforme aponta Saviani (2011, p. 6), as “exigências de
intencionalidade e coerência implicam que o sistema se organize e opere segundo um
plano”, envolvendo uma estreita relação entre sistema de educação e plano de educação.
A ausência de planos estaduais de educação reforça o vácuo de atuação do estado
enquanto ente coordenador e articulador da política educacional junto aos seus
municípios bem como a impossibilidade dos sistemas serem organizados em regime de

10
Disponível na página do FNCE – www.fnce/informações/CEEs.
175

colaboração, conforme advoga o artigo 211 da Constituição: “A União, os Estados, o


Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas
de ensino”. Essa ausência também impede a contemplação do artigo 11 da LDBEN,
inciso I que preconiza que os municípios incumbir-se-ão de “organizar, manter e
desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os
às políticas e planos educacionais da União e dos estados”. Considerando que a maioria
dos estados não possui Plano, como poderão os municípios promoverem essa
integração?
A experiência dos municípios vem apontando11 que apesar de os seus conselhos
antecederem aos seus sistemas de ensino, estes estão sendo instituídos por meio de leis
específicas. As legislações destinadas à instituição dos Sistemas Municipais de
Educação (SMEs), geralmente dispõem sobre sua organização e funcionamento. Além
de preverem sobre a gestão democrática (incluindo dispositivos sobre os conselhos de
escola e eleição de diretores, dentre outros itens), sobre os níveis, etapas e modalidades
de ensino, também, em alguns casos, dispõem sobre o regime de colaboração com o
estado.
Se por um lado esse movimento é resultado da autonomia que os municípios adquiriram
pós Constituição de 1988; por outro, ele resulta do processo de descentralização, mais
precisamente, da municipalização do ensino fundamental que ocorreu a partir de 1997
com o FUNDEF. Esse processo possibilitou aos municípios a ampliação de suas redes,
mas também exigiu deles maior capacidade institucional para gerir a política de
educação no nível local. Assim, os municípios foram construindo as instituições para
dar conta dessa demanda. Porém, esse processo parece indicar que não houve atenção
ao dispositivo legal que prevê que os sistemas estaduais e municipais deveriam se
organizar em regime de colaboração.
Em estudo realizado junto aos municípios do estado do Rio Grande do Sul, Sari (2009
apud, LUCE e SARI, 2010, p. 248-249) constatou no texto de suas leis orgânicas
(amostra de 25 municípios), que 88% delas regulam aspectos relativos ao regime de
colaboração. As autoras destacam nesta análise que as dimensões mais contempladas na
colaboração educacional na legislação foram: “planejamento integrado com os outros
entes federados consubstanciados no plano municipal de educação e na definição de

11
Ver livro “Mapa dos Conselhos Municipais de Educação no Brasil” organizado por Donaldo Belo de
Souza, São Paulo, Edições Loyola, 2012.
176

políticas, e articulação no recenseamento dos educandos para o ensino fundamental, na


sua chamada escolar e no controle da frequência”.
As dimensões apontadas pelas autoras também foram observadas na pesquisa que
realizamos no capítulo sobre a educação das Constituições estaduais, sendo as mais
recorrentes. Foram ainda identificados nas constituições, os termos formas de
colaboração e cooperação, principalmente ao definirem que o estado prestará
assistência técnica aos municípios na garantia da oferta educacional na educação infantil
e ensino fundamental. Assim, em relação à provisão da educação básica, além das
dimensões apontadas por Luce e Sari (2010), algumas constituições fazem menção à
cooperação em relação à formação docente e à avaliação discente (sistemas de
avaliação). Porém, a maioria reproduziu o disposto na Constituição Federal sobre o
regime de colaboração, versando sobre este instituto de maneira pouco específica.
Analisando o estatuto dos entes federados dentro do sistema de competências, conforme
disposto na CF de 1988, Souza (2005, p. 111) aponta dois fatores que influenciaram
tanto o texto das Constituições dos estados quanto os seus comportamentos no que diz
respeito à edição de leis extraconstitucionais. O primeiro é que as regras sobre as
competências, recursos e políticas públicas das entidades subnacionais são capítulos
detalhados da Constituição, deixando pouca margem de manobra para iniciativas
específicas. Segundo, a maioria das constituições estaduais é “uma mera repetição dos
mandamentos federais”, haja vista que o STF - Supremo Tribunal Federal atua no
sentido de que as “constituições estaduais e as leis devem ser subsumidas pelo que
dispõe a legislação federal”.
Alguns pesquisadores (ARAUJO, 2010; CASSINI, 2011; DOURADO, 2013;) do tema
da cooperação federativa na educação avaliam que em razão da ausência de
regulamentação do regime de colaboração/cooperação, a coordenação vem sendo
constantemente utilizada como forma de suprir a falta de cooperação. Essa situação
ocorre, por exemplo, quando o Governo Federal induz aos entes subnacionais políticas
como o Plano de Ações Articuladas.
Contrariamente aos argumentos dos autores citados, outros pesquisadores (ABRUCIO,
2010; FRANCESE, 2010; LICIO, 2012; SYDOW, 2012) vêm defendendo que a
intensificação das atividades de coordenação federativa movimentada pelo Governo
Federal a partir do final da década de 1990 no Brasil, tende a fortalecer a cooperação
entre os entes federados no tocante às políticas sociais, impactando positivamente no
padrão de relação intergovernamental caracterizado até então pela
177

compartimentalização. Avaliam que este padrão tende a ser alterado para um padrão de
cooperação, corroborando a tese do federalismo cooperativo.
Na análise de Franzese (2010, p. 193), a política educacional carece de fóruns de
negociação intergovernamentais, pois sua ausência compromete a interação entre as
esferas de governo e faz com que eles se reúnam apenas para discutir questões ligadas
ao compartilhamento de recursos, por força da existência do FUNDEB. Para a autora,
nesse caso, a constituição de um sistema na área talvez ajude os atores a enfrentar a
necessidade de “operacionalização do tão citado regime de colaboração, que pode, por
sua vez, auxiliar na consolidação de uma visão sobre como deve ser a educação no
país”.
Observa-se na citação acima, que o regime de colaboração para esta autora deve ser
operacionalizado, requerendo, dessa forma, a criação de estratégias e ações por meio
das quais sua concretização se tornará possível. Conforme elucidamos anteriormente,
para outros autores (ARAUJO, 2010; DOURADO, 2013; OLIVEIRA e GANZELI,
2013), o regime de colaboração é um instituto que deve ser regulamentado, haja vista
que não pode ser apenas concebido como um instrumento que possibilita a pactuação
entre os entes para a oferta da educação, mas como “instituto delineador da atuação
conjunta para a consecução da competência educacional comum”. Isto significa que ele
deve ser conduzido pela “compulsoriedade”, determinada pelos organismos de
deliberação conjunta, tais como os conselhos (CASSINI, 2011, p. 127).
Os mecanismos de cooperação são responsáveis por promover a articulação entre os
agentes/atores, as políticas, sua implementação e, consequentemente, seus resultados.
Sendo assim, a articulação é um pressuposto da organização sistêmica (SAVIANI,
2011). Ocorre que esta articulação é um movimento que se dá de forma intencional,
sendo promovido pelos atores por meio das instituições que compõem o Sistema. Dessa
forma, o que confere materialidade ao instituto da cooperação são os atores, as arenas e
as instituições que o conformam. Isto coloca, portanto em questão, as regras que
delimitam o campo de atuação dos grupos posicionados na disputa pela sua definição.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O cenário descrito neste trabalho apontou que, a despeito de o governo federal
desprender um esforço visando estabelecer cooperação técnica junto aos estados e
municípios na elaboração de seus Planos de educação, a maioria dos estados não conta
com lei aprovando os seus Planos Estaduais de Educação, tampouco dispondo sobre os
178

seus SEE. Na nossa avaliação esse quadro ilustra a fragilidade institucional dos SEE,
denotando o atual padrão de relações intergovernamentais vigente no País, assinalado
pela indefinição do papel dos estados, pela relação direta da União com os municípios e
pela ausência de arenas de pactuação entre os entes federados. Expõe, portanto, as
dificuldades de construção de um federalismo cooperativo em educação que, conforme
procuramos demonstrar neste trabalho, além dos motivos expostos, padece pela
ausência da regulamentação do regime de colaboração.
E, por fim, lançando expectativas futuras, o movimento ensejado nacionalmente com a
recente aprovação do PNE e previsão de instituição do SNE no contexto de ampla
participação por meio das conferências e fóruns de educação, parece indicar que este
cenário tende a ser alterado. Ou seja, em pouco tempo todos os estados e municípios
brasileiros formularão e aprovarão seus planos de educação. Não restam dúvidas de que
esses instrumentos representam um avanço necessário à efetivação do direito à
educação. Porém, há muito que se construir para que estes sejam efetivamente
apropriados por todos os cidadãos como instrumento que darão materialidade a uma
educação de qualidade social.

REFERÊNCIAS

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e propostas de aperfeiçoamento. In. OLIVEIRA, Romualdo Portela e SANTANA,
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diversidade. Brasília: Unesco, 2010. p. 39-70.

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brasileira a partir do regime de colaboração. Educação e Sociedade, Campinas, v. 31,
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dá outras providências, Brasília, Diário Oficial da União, 26-06-2014.

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179

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Empresas de São Paulo, São Paulo, 2012.
180

Comunicação

O Projeto Político Pedagógico como articulador da gestão democrática: o caso da


Escola do Campo 25 de Maio, Fraiburgo - SC

1Angélica Kuhn
USP

Resumo: O presente artigo busca analisar o processo de construção da gestão


democrática praticada no Projeto Político Pedagógico de uma escola inserida nas
diretrizes que norteiam a Educação do Campo. A partir da análise dos princípios
filosóficos e pedagógicos que fundamentam o Projeto Político Pedagógico (PPP) da
Escola do Campo 25 de Maio, localizada no Assentamento Vitória da Conquista,
Fraiburgo – SC, buscamos identificar os elementos do próprio processo de constituição
da escola, que se deu através da luta coletiva dos trabalhadores rurais, organizados no
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Verificamos que o processo
de construção coletiva se expressa através de uma identidade própria da Escola, que
leva em consideração as especificidades e realidade dos seus sujeitos.
Palavras Chaves: Educação do Campo. Projeto Político Pedagógico. Gestão
democrática. Educação e Trabalho.

Introdução
Qual o papel do Projeto Político Pedagógico (PPP) na instituição escolar? Qual
sua relevância e função? Qual a sua importância para a gestão escolar? Quanto a isso
não há dúvida, o mesmo busca dar a ela direção e uma melhor organização interior.
Contudo, este direcionamento não está isento de opções teóricas e metodológicas. Em
razão disso, todo o projeto pedagógico da escola é também um projeto político.
Os componentes teóricos, metodológicos e administrativos direcionam as ações
da escola e não podem ser vistas de forma isolada. São partes de um mesmo processo.
Estas ideias ganham força a partir dos movimentos educacionais da década de sessenta,

1
Doutoranda pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Educação: História, Política, Sociedade,
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professora da Faculdade Sumaré e da Pós-graduação
em Gestão Escolar da Unicid. Pesquisa educação e movimentos sociais.
181

particularmente das ideias de Paulo Freire, de que todo ato educativo é também um ato
político.
De acordo com Vale “na verdade, a ação educativa enquanto ação política não
pode prescindir de uma visão de mundo, de um compromisso de classe que
condicionará, inclusive, a escolha dos conteúdos a serem transmitidos. (Vale, 2001, pg.
71)
O PPP ganha mais sentido quando inserido em práticas democráticas, onde todos
vivem, avaliam e propõe novos caminhos para a proposta, da qual se sentem parte
integrante, pois colaboram desde a sua construção.

Educação do Campo
A Escola 25 de Maio insere-se em um movimento mais amplo, encampado pelos
movimentos sociais do campo, particularmente o Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST), a partir do final da década de 70, e sua consequentes conquistas no
âmbito das políticas públicas para a educação do campo, a partir da década de 90.
Um importante aceno das mudanças na histórica exclusão dos trabalhadores do
campo dos direitos, protagonizadas pelos movimentos sociais, já é dado pela Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 9394\96 e fortalecida com a aprovação das
“Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo” (Parecer no
36/2001 e Resolução 1/2002 do Conselho Nacional de Educação). Esse instrumento de
luta, junto às ações de diversos movimentos sociais e sindicais do campo vem
pressionando sua inclusão na agenda de governos municipais, estaduais e também na
esfera federal.
Após a aprovação das Diretrizes Operacionais para Educação Básica nas escolas
do campo, vem se desencadeando um processo de mobilização e envolvimento social,
na busca de fortalecimento da construção de políticas públicas que garantam o acesso e
permanência à educação de qualidade para os povos do campo.
Anísio Teixeira, um dos Pioneiros da Educação Nova denunciara nas décadas de
60 e 70, a dualidade da educação brasileira, uma escola para os mais favorecidos e outra
para as camadas populares (ou mesmo a negação da escola pública para estas), e a
necessidade de pensar-se a educação sob a ótica do direito e não do privilégio.
De acordo com o autor “a educação sempre se apresentou como a alternativa
para a revolução e a catástrofe, mas, para isto, é necessário que não se faça ela própria
um caminho para o privilégio ou para a manutenção de privilégios.” (Teixeira, 1976, pg.
182

107)
Nesse sentido, o movimento Por uma educação do campo, busca garantir o
direito à educação pública e de qualidade aos trabalhadores do campo, historicamente
excluídos desse e de outros direitos, entre eles o acesso a terra.
A referência educação do campo pressupõe uma mudança de postura frente à
antiga educação rural ou para o meio rural, a qual historicamente privilegiou as elites
latifundiárias do país e privou os trabalhadores do acesso a este direito inalienável, que
é a educação.
O batismo desta nova referência se concretizou em 1998, quando da 1ª
Conferência Nacional por Uma Educação Básica do Campo, consequência de debates
realizados a partir da luta concreta dos movimentos sociais organizados no campo
naquele contexto.
Passou-se a utilizar esta expressão, e não mais a usual, meio rural, com o
objetivo de incluir no processo de reflexão o sentido atual do trabalho no campo e das
lutas sociais dos grupos que hoje tentam sobreviver deste trabalho: camponeses,
indígenas, comunidades quilombolas, agricultores familiares etc.
No Brasil, há diversas denominações para as pessoas que trabalham no campo,
de acordo com a diversidade de cada região, como caipora, corumbá, tabaréu, colono,
caboclo, trabalhador rural, camponês etc.
De acordo com Caldart (1998), esses termos, nos dicionários, trazem tanto um
conteúdo valorativo, quanto depreciativo. As expressões são carregadas de sentidos
pejorativos, que classificam esses sujeitos como atrasados, preguiçosos, ingênuos e
incapazes. Ao mesmo tempo, definem-nos como matutos, como aqueles que refletem,
que são prudentes, que desconfiam, que são espertos.
O que é certo é que seus significados jamais são confundidos com fazendeiros,
latifundiários, coronéis, empresas transnacionais presentes no campo. As palavras
exprimem as diferentes classes sociais, possuem significados históricos e políticos que
perpassam as principais lutas de resistência no campo.

Análise do Projeto Político Pedagógico da Escola 25 de Maio


De acordo com Ana Maria do Vale,
A educação que deve permear o ensino público em todos os níveis deve ser
entendida de forma contextualizada, ou seja, deve ser vista numa relação
dialética entre o homem e as circunstâncias sociais. Nesse sentido, a
educação é colocada no seu lugar próprio, isto é, nem como única
responsável pela transformação social nem tampouco como reprodutora e
183

perpetuadora de toda uma ordem social. A escola não é um corpo isolado,


fazendo parte do movimento histórico-social, ela deve ser vista como palco
de uma dimensão da luta de classes. (VALE, 2001, pg.76)

Logo no início do PPP da Escola 25 de Maio, na primeira parte intitulada


“Diagnóstico da realidade”, constam os significados que expressam a luta de classes
presente no contexto ao qual se insere a escola.
O nome da Escola demonstra sua identidade com o MST, pois faz referência ao
dia 25 de maio de 1985, quando ocorreu a primeira grande ocupação de terras em Santa
Catarina, no município de Abelardo Luz, com a participação de 2.000 famílias.
O curso de Ensino Médio Integrado à Educação Profissional Técnico em
Agroecologia é um dos grandes diferenciais da escola. Atende estudantes de diversas
áreas de assentamentos do Estado de Santa Catarina, filhos de pequenos agricultores e
jovens que não possuem alternativas de escolarização em suas comunidades de origem.
Estes jovens permanecem alojados na escola e participam da organização interna da
mesma.
O curso funciona na metodologia da alternância, ou seja, existem momentos em
que o aluno permanece no espaço escolar e outros em que a formação se dá nas
comunidades de origem. A estes distintos momentos que se completam, sendo cada um
uma continuidade do processo de formação do outro, dá-se o nome de Tempo Escola –
TE e Tempo Comunidade - TC.
Esta forma de organização dos tempos escolares é coerente com um dos
princípios pedagógicos da Escola que é a relação entre a teoria e a prática, segundo o
qual a organização do currículo deverá trazer situações que exijam respostas práticas
relacionadas com os conhecimentos já adquiridos, possibilitando a articulação do maior
número de saberes diante dos momentos da realidade.
Verifica-se que há possibilidades de propor e reorganizar os tempos, espaços e
currículo da escola, quando há clareza dos objetivos, gestão participativa, clareza sobre
a legislação e vontade política de propor, inclusive no âmbito das políticas públicas,
escolas adequadas à realidade dos alunos.
A definição social cristalizada daquilo que constituem formas legítimas de
escola, sala de aula, etc. , e a estreita regulamentação estatal dos modos de
educação limitam, conformam e determinam as possíveis transformações dos
arranjos educacionais existentes, particularmente os referentes à currículo.
(Silva, 1992, pg. 84)

A Pedagogia da Alternância, ao recusar-se a seguir uma forma cristalizada de


organização curricular, além de garantir a troca entre a teoria e a prática, ampliando a
184

práxis dos sujeitos envolvidos no projeto, propõe uma nova forma de pensar a educação,
para além dos limites da sala de aula.
Nesse sentido, essa forma de organização possibilita outro princípio pedagógico
da Escola que é o desenvolvimento de habilidades de pesquisa. Ao compreender que “o
processo educativo incentivará a pesquisa no sentido de investigar e analisar a realidade
para poder executar proposições mais adequadas a uma intervenção nela.” (PPP da
Escola de Educação Básica 25 de Maio)
As concepções de educação, formação humana entre outros, se evidencia nos
demais princípios filosóficos e pedagógicos que fundamentam o Projeto Político
Pedagógico são: Educação para a transformação social; Educação para o trabalho e a
cooperação; Educação voltada para as várias dimensões da pessoa humana; Educação
como um processo permanente de formação e transformação humana; A realidade como
base da produção do conhecimento; Conteúdos formativos socialmente úteis; Educação
para o trabalho e pelo trabalho; Vínculo orgânico entre processos educativos e processos
políticos; Vínculo orgânico entre processos educativos e processos econômicos;
Vínculo orgânico entre educação e cultura; Gestão democrática; Auto-organização dos
educandos; Criação de coletivos pedagógicos e formação permanente dos
educadores/das educadoras; Habilidades de pesquisa; Combinação entre processos
pedagógicos; coletivos e individuais; Educação voltada à Agroecologia. (Projeto
Político Pedagógico da Escola 25 de Maio).
Ao analisar tais princípios evidencia-se que a escola aproxima-se da teoria
marxista da relação entre educação e trabalho. O trabalho pressupõe uma relação com a
natureza e com o outro. Marx, nos Manuscritos Econômicos e nos Grundrisse, deixa
claro que o trabalho é a essência da natureza histórica do homem. O homem transforma
o mundo por meio do trabalho. Trabalho visto em duas dimensões, em relação ao valor
de uso e de troca.
O trabalho como princípio educativo ganha nas escolas a feição de princípio
pedagógico, que se realiza em uma dupla direção. Sob as necessidades do
capital de formação da mão de obra para as empresas, o trabalho educa para a
disciplina, para a adaptação às suas formas de exploração. Sob a contingência
das necessidades dos trabalhadores, o trabalho deve não somente preparar
para o exercício das atividades laborais, mas também para a compreensão dos
processos técnicos, científicos e histórico-sociais que lhe são subjacentes e
que sustentam a introdução das tecnologias e da organização do trabalho.
(Frigotto, 2011, pg. 750)

Parece que essa concepção de trabalho a partir de um olhar mais amplo para as
relações do mundo do trabalho estão presentes no PPP, ao definir que “a escola deve
185

possibilitar a compreensão do funcionamento do mercado e dos processos produtivos e


a reflexão sobre a distribuição e consumo dos bens e serviços da sociedade.” (PPP da
Escola 25 de Maio)
As relações entre educação, trabalho, cultura, política e produção não são
lineares. De acordo com Sposito, “uma cultura escolar voltada para a formação de
sujeitos incorporaria, certamente, a dimensão mais ampla do trabalho na construção da
vida humana.” (Sposito, 1992, pg. 108)
Nesse sentido, a proposta da Escola 25 de Maio é uma forma de resistência ao se
contrapor à redução da educação à técnicas e valorizar a relação entre educação e
trabalho.
Para que estes princípios e objetivos sejam vivenciados na prática cotidiana da
escola, o PPP tem na gestão democrática a sua principal força.
Não basta o estudo da democracia, mas sim sua vivência prática. Isto deverá
ser experimentado através da direção coletiva e pela participação de todos os
envolvidos em cada processo pedagógico. Estudantes, professores,
funcionários, pais, comunidade, direção. Todos devem aprender a tomar
decisões, respeitar decisões tomadas em conjunto, executar o que foi
decidido, avaliar o que está sendo feito e repartir os resultados de cada ação.
(PPP da Escola 25 de Maio)

A formação permanente dos professores também é contemplada, com ênfase na


organização dos espaços coletivos e individuais de formação, a partir da reflexão sobre
a prática.
Criação de coletivos pedagógicos e formação permanente dos educadores/das
educadoras. Os coletivos pedagógicos serão espaços de auto-formação
permanente, através da reflexão sobre a prática do estudo, das discussões e da
própria preparação para outras atividades de formação.
A Coordenação Escolar fomentará a participação dos educadores em
processos de formação que condizem com a proposta da escola, colaborando
no que tange à substituição de educadores para este fim.
O afastamento de educadores para capacitações deverá ser discutido pelo
Coletivo de Educadores.
Os dias de estudo organizados na Escola deverão priorizar temas apontados
pelo conjunto dos educadores. (PPP da Escola 25 de Maio)

Além da questão da formação e organização dos professores, as demais questões


administrativas constam de forma detalhada, como: definição dos papeis do Diretor, da
Coordenação Pedagógica, dos pais, da comunidade, carga horária, calendário escolar,
matriz curricular (onde constam as tabelas com as disciplinas propedêuticas e técnicas,
no caso do Ensino Médio, que é integrado ao curso técnico em Agroecologia).
Destaca-se a forma de avaliação constante no PPP, pois envolve todas as
instâncias da escola, com o objetivo de contribuir para o avanço contínuo das propostas
elaboradas coletivamente.
186

A avaliação tem um papel central no processo de planejamento pedagógico e


das ações educativas. Sua função primeira será a de revelar aos integrantes
até que ponto os objetivos propostos estão sendo atingidos, identificando os
progressos e as dificuldades individuais e coletivas, buscando alternativas
para o avanço contínuo.
A avaliação será feita de forma periódica através de todas as instâncias que
participam da sua gestão; coletivo da turma de educandos, coletivo de
educadores, e coordenação escolar. O período de realização de atividades
específicas de avaliação integra o seu planejamento anual.
Na avaliação serão considerados todos os aspectos de funcionamento da
escola e a atuação de todos os segmentos na concretização do projeto
pedagógico, tendo como principais objetivos:
-Dar elementos para que todas as pessoas envolvidas no processo possam ser
desafiadas a superar suas dificuldades e melhorar seu desempenho;
-Promover os ajustes necessários no desenvolvimento do conjunto de práticas
que integram o projeto pedagógico do curso.
A avaliação dos educandos é um processo sistemático, cumulativo e
participativo de acompanhamento de todos os tempos e espaço educativos
que são vivenciados no ambiente da escola ou por seu intermédio. .(PPP da
Escola 25 de Maio)

Além do tempo aula destinado ao estudo dos componentes curriculares previstos


no projeto da escola, conforme horário escolar, a escola oferece regularmente outros
tempos educativos, principalmente nos horários de intervalo de almoço, noturno e de
finais de semana, quais sejam: Tempo Trabalho Educativo: Tempo destinado a
realização de pequenas tarefas como: recolher os lixos devidamente separados e
depositar nos locais corretos, varrer as salas no intervalo do almoço, lavar a louça do
almoço, (lavar seu prato). Estas atividades têm por finalidade garantir que os educandos
valorizem o trabalho prático sem distinção de sexo, deixando claro a importância da
divisão de tarefas e o trabalho coletivo; Tempo Oficina: tempo destinado ao
aprendizado de habilidades específicas tais como marcenaria, inclusão digital,
artesanato, e outras; Tempo Reflexão Escrita: tempo destinado ao registro, em caderno
pessoal e específico, das vivências e reflexões sobre o dia a dia de cada educando(a).
Estes Cadernos são recolhidos regularmente pela unidade escolar, para leitura e
orientações devidas; Tempo Leitura: tempo semanal destinado à leitura dirigida
individual ou coletiva, conforme orientação do(a) educador(a) responsável pela
atividade. É importante que seja priorizado este momento, dando preferência a temas da
conjuntura atual.
A Escola também prioriza a cultura, a partir do que denomina Tempo Atividades
Culturais: destinado a atividades culturais, apresentações de místicas, roda de capoeira,
demais apresentações culturais locais e regionais; Tempo Seminário: destinado para
debates, palestras, conferências sobre assuntos de interesse da coletividade; Tempo
Núcleo de Base: destinado para discussão, avaliação e encaminhamentos gerais da
187

escola. Neste tempo, os educandos(as) em seus referidos núcleos de base tem a


liberdade de opinar sobre os diversos assuntos referentes ao dia-a-dia da escola, bem
como avaliar a participação dos componentes de seu grupo. Será realizado
semanalmente e organizado registros das discussões feitas, apresentado ao coletivo de
educadores; Tempo Comunidade: Etapa em que os educandos estarão diretamente
envolvidos com os processos produtivos e organizativos de sua comunidade e de sua
família. Sua vivência social deve ser visto como um processo contínuo de formação do
ser humano; Tempo Práticas Agroecológicas: tempo destinado às práticas e
experimentos com vistas à pesquisa agroecológica e contribuindo com a produção de
alimentos para escola.
Anísio Teixeira, na década de 70, apontava para a necessidade de organização
escolar, que continua atual para a análise da educação brasileira. Em relação à Escola 25
de Maio, são contemplados vários tempos educativos que buscam ampliar e acessar o
conhecimento sistematizado e valores da auto-organização dos alunos.
A organização da escola, em termos de escola-comunidade, com um
currículo de aprendizagem por participação não é difícil, embora exija
abundantemente material de ensino e professores bem preparados de forma
mais acentuadamente profissional. A escola se organizará como um local de
atividades adequadas às idades, dentro de três setores, que se conjugarão
entre si, mutuamente complementares e integrados: o do jogo, recreação e
educação social e física; o do trabalho, em formas adequadas à idade; e o do
estudo, em atividades de classe propriamente ditas. (Teixeira, 1976, pg. 85)

A auto-organização dos alunos é outro elemento da proposta da Escola, que se


dá através de Núcleos de Base. Trata-se de um espaço destinado para discussão,
avaliação e encaminhamentos gerais da escola. Neste espaço, os alunos organizados em
seus referidos núcleos de base opinam sobre os diversos assuntos referentes ao dia a dia
da escola, bem como avaliam a participação dos componentes do seu grupo em relação
às decisões tomadas coletivamente. Posteriormente, esses pontos são discutidos na
Coordenação dos Núcleos de Base da Turma (CNBT), ou em plenária na forma de
assembleia para o delineamento de ações futuras.

Considerações Finais
De acordo com a análise realizada percebe-se que o Projeto Político Pedagógico
é o elemento articulador da gestão democrática. Observa-se que ele é tido como um guia
e indicador que dá firmeza e segurança à escola. Os seus princípios filosóficos e
pedagógicos estão muito bem delineados, com clara opção pela gestão democrática.
188

Sua concepção de educação é fruto do processo de organização coletiva que


garantiu a construção da escola. Dentro dos seus limites, a Escola 25 de Maio, ao formar
jovens numa perspectiva integral, se distancia da instrumentalização acelerada, voltada
para o mercado de trabalho. Trata-se de uma experiência importante de reorganização
dos tempos e espaços escolares e que tem muito a contribuir para a construção políticas
públicas adequadas às especificidades da educação dos trabalhadores do campo.

Bibliografia

CÂNDIDO, Antônio. A estrutura da escola. IN: PEREIRA, Luiz & FORACHI,


Marialice M. Educação e Sociedade. São Paulo, Editora Nacional, 6ª Ed. 1971.

FRIGOTTO, Gaudêncio. Dicionário da Educação do Campo. São Paulo. Expressão


Popular, 2011.

PEREIRA, LUIZ. A escola numa área metropolitana . São Paulo, Pioneira, 2 Ed.,
1976, p.11-18;45-48;101-105;106-120;121-141;152-154

SAVIANI, Demerval. Escola e Democracia. 41ª Ed. São Paulo: Autores Associados.
2009.

SILVA, Tomaz Tadeu da. O que produz e o que reproduz em educação. Porto
Alegre, Artes Médicas, 1992, p.75-93.

SPOSITO, Marília Pontes. O povo vai à escola: a luta popular pela expansão do
ensino público em São Paulo. São Paulo, Loyola, 1992, p.209-241

TEIXEIRA, Anísio. A educação no Brasil. São Paulo, Editora Nacional; Brasília, INL,
2ª Ed., 1976.

VALE, A. M. Educação popular na escola pública. 4ª Ed. São Paulo: Cortez, 2001.
189

Comunicação

A atuação do gestor escolar democrático e sua influência no clima organizacional

Aparecida Dias de Oliveira Torres


UFOP/MG1

Resumo: O presente trabalho analisa o clima organizacional de uma escola pública


municipal situada numa cidade mineira de médio porte. O objetivo geral desse trabalho
é identificar as causas dos conflitos e antagonismos que geram no ambiente escolar e
propor um projeto de intervenção para trabalhar os problemas detectados. Para tanto
foram realizadas pesquisas bibliográfica e descritiva. A primeira possibilitou esclarecer
conceitos sobre cultura, clima organizacional, comportamento humano, liderança e
relacionamentos interpessoais e gestão escolar. A segunda possibilitou a coleta e análise
de dados por meio de questionário fechado para conhecimento do clima organizacional
da instituição educacional. Os resultados revelaram que a escola pesquisada apresenta
um considerável número de pessoas com o comportamento assertivo e um equilíbrio
entre comportamento passivo e agressivo. A proposta de intervenção sugerida visa
melhorar o relacionamento entre as pessoas e consequentemente o clima escolar.
Palavras-chave: Gestão escolar. Clima organizacional. Relações pessoais.

Introdução
Educação se faz com interação entre pessoas e gestão escola se faz com
democracia. Considerando que Educação é um todo integrado: setor administrativo,
pedagógico, financeiro e de pessoas, percebe-se que o gestor deve estar atento a todos
os efeitos de sua gestão, portanto o relacionamento interpessoal no ambiente de trabalho
é fator decisivo no desenvolvimento de todos os envolvidos no processo de ensino e
aprendizagem. A satisfação na realização da tarefa deve ser acompanhada da satisfação
do relacionamento com outro.
Sabendo – se que a escola é um ambiente de formação de pessoas e por esta
razão deve ser vista para além dos prédios e sua estrutura física, é que esse estudo
propõe debruçar sobre a problemática de uma escola a fim de analisar as causas e

1
Artigo extraído da Monografia apresentada como Trabalho de Conclusão do curso de Especialização em
Gestão Escolar na UFOP. Ouro Preto - MG , março 2014.
190

possíveis formas de solução dos problemas detectados. No caso da escola pesquisada,


foram detectados problemas nas relações interpessoais devido intolerância à cultura do
outro.
Uma das formas de combater o preconceito contra a cultura do outro é
desenvolver o convívio democrático dentro da escola, pois promove o crescimento
pessoal de todos os sujeitos na instituição, desenvolvendo o respeito e a ética. Para isso
é preciso conhecer o dia a dia da escola, as reações e relações dos agentes educacionais
da instituição de ensino.
Nesse sentido, a forma de conduzir os trabalhos na organização escolar e mediar
os conflitos está estreitamente ligada à forma de gestão da escola. Segundo Lück (2011,
p. 67) “a escola tem a cara do seu diretor”. Dessa forma, o gestor escolar deve
reconhecer os conflitos e ajudar a todos, dentro da escola, e encará-los positivamente.
Carvalho (2001, p. 53), orienta que “primeiramente deve-se identificar as origens dos
conflitos e em seguida desenvolver estratégias que tenham como base a comunicação,
para que todos se entendam”.
Tendo como base do trabalho o reconhecimento da diversidade cultural, a gestão
democrática da escola, a gestão e mediação do conflito organizacional, e a possibilidade
de utilizar o conflito como crescimento da organização escolar é que coloca-se aqui os
questionamentos que envolvem a problemática na escola pública pesquisada: O que
determina o clima dessa escola? Que natureza o clima dessa escola expressa? O que cria
e determina o clima existente? Como as pessoas agem e reagem diante desse clima?
Para responder a esses questionamentos propõe-se aqui uma pesquisa de clima
organizacional. Os resultados serão analisados e servirão como indicadores para
melhoramentos na gestão escolar.

Dimensões da gestão escolar


Toda a dinâmica da educação escolarizada acontece no ambiente escolar. É
nessa instituição que as interações acontecem. E pensando que a aprendizagem se faz
por meio das interações e que as pessoas aprendem a todo o tempo, nos diferentes
grupos e por meio de diferentes formas, inclusive por meio de exemplos é que esse
trabalho foca na gestão escolar e nas interações pessoais no âmbito da escola. Portanto
faz-se necessário compreender esta dinâmica que acontece na escola, os sujeitos líderes
e liderados e como se conduz esse processo.
191

O estudo desenvolvido busca revelar qual é o espaço que a escola pesquisada está
construindo nas relações pessoais com os professores e alunos.
Segundo Lück (2009, p. 25) “A gestão escolar constitui-se em uma estratégia de
intervenção organizadora e mobilizadora, de caráter abrangente, orientada para
promover mudanças e desenvolvimento dos processos educacionais.” Para que esse
processo se efetive, a gestão escolar perpassa por todos os setores da instituição, uma
vez que o objetivo da escola é a formação dos alunos e desenvolvimento da equipe para
obter bons resultados. A autora acrescenta que “Como tal, ela envolve áreas e
dimensões que, em conjunto, tornam possível a realização desses objetivos.” Assim,
Lück (2009) descreve 10 dimensões, e as agrupam em duas áreas, de acordo com sua
natureza: organização e implementação:
As dimensões de organização se apresentam em quatro dimensões: 1.
Fundamentos e princípios da educação e da gestão escolar; 2. Planejamento e
organização do trabalho escolar; 3. Monitoramento de processos e avaliação
institucional; 4. Gestão de resultados educacionais. As dimensões de
implementação são aquelas mais diretamente vinculadas à produção de
resultados: 5. gestão democrática e participativa; 6.gestão de pessoas;
7.gestão pedagógica; 8.gestão administrativa; 9.gestões da cultura escolar;
10. Gestão do cotidiano escolar. (LÜCK, 2009, p. 27).

Lück (2009) ao descrever as dimensões da gestão escolar, explica a inter-relação


dessas dimensões destacando a interdependência entre as mesmas e defende que uma
ação isolada de outra, empobrece o processo de gestão.

As relações humanas no âmbito escolar


A escola, talvez seja o ambiente onde mais se trabalha com o ser humano. A
formação de pessoas desde a infância até a idade adulta. É um ambiente onde se
trabalha o desenvolvimento da criança, do adolescente, do servidor e da comunidade.
Todo o trabalho realizado no âmbito escolar tem o objetivo de melhorar a sociedade.
Por isso é que a escola é essencialmente o lugar de relacionamento de pessoas. E ser
gestor escolar não é burocratizar essas relações, mas sim torná-las mais humanas com as
interações sociais.
Conforme Lück (2009, p.n82) a “educação é processo humano de
relacionamento interpessoal e, sobretudo, determinado pela atuação de pessoas”. Para a
autora são as pessoas que promovem a diferença em qualquer lugar em que atuam.
Gadoti (2007), ao falar sobre a visão de Paulo Freire nas escolas, destaca as
relações humanas como a principal característica que faz cada escola ter sua
especificidade na transformação social. Segundo o autor:
192

A escola é um lugar bonito, um lugar cheio de vida, seja ela uma escola com
todas as condições de trabalho, seja ela uma escola onde falta tudo. Mesmo
faltando tudo, nela existe o essencial: gente. Professores e alunos,
funcionários, diretores. Todos tentando fazer o que lhes parece melhor. Nem
sempre eles têm êxito, mas estão sempre tentando. (...) A escola é um espaço
de relações. Neste sentido, cada escola é única, fruto de sua história
particular, de seu projeto e de seus agentes. Como lugar de pessoas e de
relações, é também um lugar de representações sociais. Como instituição
social ela tem contribuído tanto para a manutenção quanto para a
transformação social. Numa visão transformadora ela tem um papel
essencialmente crítico e criativo. (GADOTTI, 2007, p. 11).

Nesse sentido, a responsabilidade do gestor é enorme ao liderar essas relações.


Sendo cada escola única, e tendo as relações como determinantes de sua cultura, a
escola tende a ser um espaço de exercício de cidadania ou um espaço opressor. Por
isso, liderar é mais do que estar à frente. Torna-se necessário conduzir o grupo
envolvendo todos no compromisso com o objetivo do projeto da escola.
Segundo Lück (2009, p. 83), a escola necessita de uma liderança clara e efetiva
para se constituir em uma organização de aprendizagem. Essa liderança é feita com e
em “estreita co-liderança com seus colaboradores”. O diretor torna-se o líder que
mobiliza e orienta a comunidade escolar para o desenvolvimento da instituição e de
todos os sujeitos dela. Esse desenvolvimento é fruto do esforço conjunto, das
responsabilidades compartilhadas e da formação de uma cultura de aprendizagem. O
sucesso dependerá da ética, da integridade e da justiça expressas no trabalho de equipe.
Muitas vezes a diversidade de formas de pensar e agir geram conflitos na
organização. Segundo Carvalho (2001, p. 51) “o conflito está presente em todos os tipos
de interação humana e assume várias formas e dimensões: de idéias, interesses, gostos,
aspirações, gerações e muitas outras.” Para a autora os conflitos surgem porque nem
sempre nossas percepções e vontades se convergem para o mesmo ponto, mas o conflito
não é de todo uma situação negativa:
Os conflitos não têm, necessariamente, uma feição negativa e destruidora, e a
ausência de conflitos não revela, por si só, um ambiente sadio. No conflito
nos desenvolvemos, progredimos e aprendemos a conviver com o que é
diferente de nós. (...) o respeito às diferenças e o estímulo ao pensamento
divergente desenvolvem a criatividade e podem fazer do convívio escolar um
exemplo de convívio democrático. A intolerância ao conflito pode se
transformar em violência ou antagonismo (CARVALHO, 2001, p.51).

O gestor escolar, conforme descreve Carvalho (2001), deve reconhecer os


conflitos e ajudar a todos, dentro da escola, e encará-los positivamente. Carvalho
orienta que primeiramente deve-se identificar as origens dos conflitos e em seguida
desenvolver estratégias que tenham como base a comunicação, para que todos se
193

entendam. É possível perceber que a gestão democrática da escola requer mudança de


atitude na forma de fazer e desenvolver a liderança no âmbito escolar.
Baseando-se no pressuposto de que é por meio das relações interpessoais e do
diálogo que é possível realizar todo o trabalho, todo o processo de gestão e da dinâmica
escolar é que o gestor necessita estar atento ao comportamento das pessoas no âmbito
escolar.
O presente trabalho foca nesses comportamentos interpessoais e nas reações das
pessoas, analisando o que os leva a envolver em conflitos e como esses conflitos são
resolvidos.
Sobre a resolução de conflitos, Neto (2005) destaca que o gestor é quem
identifica na organização comportamentos que geram conflitos. O autor apresenta
alguns tipos de comportamentos que, segundo ele, foram descritos por Gillen (2001), a
seguir;
Os tipos de comportamento são quatro: 1) passivo – é o indivíduo que
procura evitar o conflito, mesmo que sofra com isso; via de regra, apresenta
voz hesitante, atitude defensiva, contato visual mínimo, e, geralmente, é uma
pessoa é quieta; 2)agressivo – é o indivíduo que aspira fervorosamente
vencer, mesmo à custa de outras pessoas. Tende a ser individualista, uma vez
que está mais interessado nos próprios desejos do que com os dos outros. Tal
comportamento apresenta voz alta e máximo contato; 3) assertivo – é o
indivíduo que aspira a defender seus direitos, bem como aceita que as outras
pessoas também os tenham. Este comportamento apresenta tom de voz
moderado, as pessoas deste tipo de comportamento são neutras, possuem uma
postura de prudência e segurança.(NETO, 2005,p.9)

Neto (2005) diz ainda que para compreender como o conflito surgiu é preciso
compreender também o comportamento das pessoas e o que leva tal pessoa a comportar
dessa ou de outra maneira. Para o autor, o comportamento de uma pessoa é o resultado
de vários fatores que se juntam: os medos que ela possui, as emoções vivenciadas, suas
experiências adquiridas no dia-a-dia, suas crenças, as preocupações que a afligem; sua
auto-estima, entre outros.

Desenvolvimento e análise da pesquisa de clima organizacional


A Escola investigada é uma instituição pública, mantida pelo município de
Itabira – MG que oferece a Educação Básica nos seguintes níveis e modalidades do
Ensino: Educação Infantil (1° e 2° Período) e o 1º Ano do Ensino Fundamental num
total de 209 alunos, sendo 93% de alunos do bairro e 7% de alunos das comunidades
rurais.
194

A comunidade escolar da instituição pesquisada é formada pelos 209 (duzentos e


nove) alunos, 15 (quinze) professores, 02 (duas) cozinheiras, 04(quatro) auxiliares de
serviços gerais, 04 (quatro) vigilantes e 04(quatro) monitoras de educação Infantil. A
equipe gestora é composta por 01(uma) diretora, duas vice-diretoras e duas pedagogas.
O objetivo da pesquisa é desenvolver um olhar crítico para os problemas
internos da instituição e identificar as causas dos conflitos e antagonismos que geram
desequilíbrio e negatividade no ambiente escolar, buscando caminhos para as soluções
dos problemas.
Por tais razões, a pesquisa desenvolvida leva o indivíduo a identificar seu tipo de
comportamento diante de um conflito e a refletir sobre ele, traçando metas para
melhorias do seu trabalho no grupo. A proposta de trabalhar com os conflitos internos
do indivíduo exige um envolvimento maior da equipe gestora, principalmente na
elaboração do Plano de Gestão de Desenvolvimento Individual (PGDI) dos servidores e
alianças com outras instituições e especialistas que atuam com Relações Humanas (RH).
Essa prática leva os envolvidos a se envolverem na busca de mudanças de
comportamento conquistando relações mais saudáveis e deve implementar o Projeto
Político Pedagógico no desenvolvimento da Cultura da paz.
A seguir será apresentado um resumo dos dados coletados na pesquisa
(comportamentos positivos e negativos). Das quinze questões apresentadas, no
questionário, quatro abordam comportamentos positivos (C, E, G, K) enquanto as outras
onze questões abordam um comportamento negativo de acordo com o apresentado na
Tabela 1.
Comportamentos Frequência com que o comportamento acontece
Raramente Às vezes Muitas vezes
A Posso ser influenciado pelo ponto de vista de outra pessoa? 14 12 01
B Desligo-me das pessoas com quem discordo? 17 09 01

C Dirijo-me à questão diplomaticamente, sem atacar o indivíduo? 04 09 14


D Penso que os outros tentam impor-me os seus pontos de vista? 09 14 04
E Expresso as minhas idéias e crenças com tato quando diferem 02 12 13
daquelas que são expressas pelo outro?
F Guardo para mim a minha opinião quando discordo de alguém? 11 13 03
G Ouço os pontos de vista da outra pessoa com a mente aberta? 00 08 19
H Deixo as minhas emoções apoderarem-se de mim? 12 11 04
I Levanto a voz para prevalecer o meu ponto de vista? 22 03 02
J Tenho tendência para menosprezar as outras pessoas quando 23 04 00
mostro o meu ponto de vista?
K Procuro formas de negociar e comprometer com outras 09 07 11
pessoas?
L Foi –me dito que sou muito insistente? 14 08 05

M Certifico-me que a minha opinião foi ouvida em qualquer 10 13 04


195

controvérsia?
N Penso que o conflito em reuniões é necessário? 08 17 02

O Eu levanto o tom de voz, para expressar os meus pontos de 14 10 03


vista?
TOTAL 169 150 86
Tabela 1- Frequência dos comportamentos

Após responder às quinze questões, a pessoa deve separar as respostas em dois


grupos: Grupo1 (A, B, D,F,H,I,J,L,M,N.O) e Grupo 2: (C,E, G,K). Em seguida é
preciso somar os pontos de cada grupo separadamente. Após as somas feitas, subtrai o
Grupo2 do Grupo1. O valor obtido corresponde ao comportamento conforme descrito
por Gillen (2001): passivo (valor de 01 a 04), assertivo (valor de 05 a 10) e agressivo
(valor acima de 11).
Na pesquisa realizada, após realizar as somas e descobrir o seu perfil, cada
pessoa teve a oportunidade de fazer uma reflexão2 orientada e traçar metas para um
curto período de tempo que deverá ser constantemente renovada.

Análise dos dados e problemática


Os dados coletados no questionário são apresentados em forma quantitativa para
análise de cada item, conforme gráfico 1 e 2. O gráfico 1 apresenta a quantitativo dos
comportamentos positivos.
Gráfico 1 – Comportamentos positivos

Fonte: Dados de pesquisa – janeiro 2014

É possível observar que no grupo, a maioria das pessoas respondeu que ouve os
pontos de vista dos demais com a mente aberta, assim como mais da metade das pessoas
desse grupo se diz dirigir ao outro diplomaticamente para discutir as questões do dia a

2
A reflexão proposta faz parte do instrumento de pesquisa do Guia de Resolução de Conflito Interno da
Empresa de treinamento de pessoas Dale Carneguie, disponível no endereço:
http://www.dalecarnegie.pt/assets/240/7/ConflictResolution_pr.pdf
196

dia. Quanto a expressar as ideias com tato, há um equilíbrio entre as respostas muitas
vezes e às vezes, o que não se torna negativo, pois um número muito pequeno revela
que raramente tem esse tato ao expressar suas ideias. Já a questão que envolve
comprometimento com o outro demonstra certa preocupação, pois um número muito
grande apresenta resistência quanto a esse comportamento.
Gráfico 2 – Comportamentos Negativos

Fonte: Dados de pesquisa – Janeiro 2014

As respostas às questões sobre comportamentos negativos apresentam resultados


que não são freqüentes nas reações dos servidores. Observa que a maioria dos
entrevistados respondeu que “às vezes” apresentam os comportamentos negativos, mas
nas questões “D” “F” o número de servidores que revelaram comportar-se de tal
maneira “às vezes” é maior do que aqueles que responderam “raramente”. Isso torna-se
fator negativo na instituição. Já os comportamentos revelados nas respostas das
questões “M” e “N” promovem o equilíbrio nas relações.
A análise das respostas revela o perfil obtido de cada servidor. Tal perfil é
apresentado na tabela 2.
Comportamento Comportamento Comportamento
Passivo Assertivo Agressivo
Quantidade de
servidores 06 16 5
entrevistados na
Fonte: Dados de pesquisa – janeiro 2014
escola
Total de servidores 27
entrevistados
Tabela 2- Tipos de comportamentos revelados por meio da Entrevista
Fonte: Dados de pesquisa – Janeiro 2014
197

O comportamento passivo foi revelado nas respostas relacionadas a guardar a


opinião quando discorda, ser muito influenciado pelas opiniões dos outros, não se
certificar que sua opinião foi ouvida e pensa que conflitos não são necessários.
Revelou-se assertivamente os servidores que demonstram comportamento
equilibrado quando dirigem ao outro diplomaticamente sabendo ouvir, não alterando a
voz ao dar suas opiniões, reconhecendo a necessidade do conflito, porém de forma não
antagônica, expressando ideias e crenças com tato, ouvindo o ponto de vista dos outros
com a mente aberta, não menosprezando quem tem opiniões contrárias e procurando
muitas vezes negociar e comprometer com as outras pessoas.
O comportamento agressivo está presente nas respostas em que raramente dirige
ao outro diplomaticamente, não consegue expressar as ideias com tato na maioria das
vezes, desliga-se das pessoas com quem discorda, está sempre pensando que o outro
quer lhe impor as opiniões, não têm controle das emoções, levanta a voz para prevalecer
o seu ponto de vista, menospreza a opinião do outro e se classifica como insistente.
O percentual de cada tipo de comportamento pode ser analisado conforme dados
no gráfico 3.
Gráfico 3 – Tipos de Comportamento revelados na pesquisa

Fonte: Dados de pesquisa – Janeiro 2014

A escola pesquisada apresentou um considerável número de pessoas com o


comportamento assertivo e um certo equilíbrio entre comportamento passivo e
agressivo. Embora tanto o comportamento negativo quanto o agressivo impeça o
crescimento do grupo, o presente projeto, busca realizar uma intervenção no
198

comportamento agressivo. Tal intervenção propõe formas de amenizar as tensões no


local de trabalho e proporcionar um clima mais agradável e satisfatório.

Trabalhando conflitos internos na escola


Os comportamentos revelados na pesquisa de clima organizacional, revelam
reações que geram conflitos na instituição escolar. Tais comportamentos têm gerado um
clima negativo na escola não se caracterizando como comportamento modelo a ser
seguido pelos alunos. O que preocupa é que os alunos aprendem por exemplos, e, sendo
assim, leva de seu tempo escolar muito mais do que vivenciou do que o que leu. E mais,
na condição de educadores, só se pode ensinar aquilo que se sabe. Caso não souber lidar
com os conflitos, como ensinar as crianças, ávidas por aprender que têm o professor
como seu mentor?
A partir da pesquisa bibliográfica e dos dados analisados na pesquisa descritiva
propões-se aqui um trabalho de intervenção diretamente com cada servidor num
primeiro momento, e, posteriormente com o grupo.
Após responder as questões do questionário, cada pessoa traçou seu perfil que foi
revelado conforme soma dos pontos das respostas, como sendo “passivo”, “assertivo”
ou “agressivo”. Em seguida os servidores tiveram a oportunidade de fazer uma reflexão
sobre cada comportamento diante das diversas situações com as quais se deparam no dia
a dia do seu trabalho. Essas reflexões podem ser escritas para melhor orientação no seu
plano individual de intervenção no comportamento. Nesta etapa são analisados os
conflitos de papéis, processo de conflitos, conflitos interpessoais, conflitos de direção e
conflitos externos e então são traçadas estratégias para reduzir o conflito.
O próximo passo será criar o Plano de Resolução do Conflito. Para isso é
preciso identificar o seu maior conflito, quando ele acontece , com quais pessoas e em
que circunstâncias, traçar um plano e definir os resultados esperados. As pessoas não
irão resolver tal conflito sozinhas, é necessário que se defina um parceiro de
responsabilidade. Nessa etapa há um comprometimento consigo mesmo e com o grupo,
além de ter uma pessoa para ser seu apoio diário.
A proposta de trabalho em grupo envolve parceria com instâncias superiores e
outras instituições para realização de palestras e dinâmicas de grupo, na própria escola
ou juntamente com outras escolas.
Espera-se que o trabalho de intervenção posa trazer resultados positivos, no que
tange a desenvolver um clima harmonioso na instituição escolar e que o trabalho
199

pedagógico desenvolvido vise o crescimento do grupo assim como dos alunos e


comunidade. Nesse sentido a escola cumprirá seu papel de formação de pessoas para o
pleno exercício da cidadania.

Considerações finais
A partir da análise das entrevistas, a escola pesquisada apresentou um
considerável número de pessoas com o comportamento assertivo e um equilíbrio entre
comportamento passivo e agressivo. A presença desses dois últimos comportamentos
revela impasses no desenvolvimento do grupo, uma vez que foi possível perceber que
na escola pesquisada há dificuldades de ouvir pontos de vista diferentes. O
comportamento passivo revelou a presença de pessoas que não expressam suas idéias no
grupo e o comportamento agressivo revelou presença de pessoas que se alteram ao
expor seus pontos de vista e que ignoram o ponto de vista do outro. Embora o número
de pessoas com comportamento assertivo seja maior, há que se preocupar com a
quantidade de comportamentos agressivos e passivos, pois são esses que geram o clima
negativo no ambiente de trabalho.
Partindo da concepção de gestão escolar democrática e de liderança na escola foi
possível entender que a dinâmica escolar é resultado da gestão que é realizada na
instituição. Entende-se que o gestor escolar precisa ser dinâmico e que seu trabalho deve
abranger as dimensões da gestão escolar que são: gestão de resultados, gestão
participativa, gestão pedagógica, gestão administrativa e também gestão de pessoas e
gestão de clima e cultura escolar. Nessa perspectiva o gestor busca o desenvolvimento
da escola assim como da comunidade local.
A proposta de intervenção sugerida visa melhorar o relacionamento entre as
pessoas da instituição pesquisada, mas é preciso muito mais do que trabalho técnico. As
relações pessoais são fruto de ações do cotidiano. Nesse sentido como é possível fazer o
dia a dia para obter um clima organizacional que contribua para o crescimento do
grupo? Esse é o constante desafio da comunidade escolar.

Referências bibliográficas

CARVALHO, Maria Celeste da silva. Como construir e desenvolver os princípios de


convivência democrática na escola? Progestão - Módulo V. Brasília: CONSED, 2001.
200

GADOTTI, Moacir. A escola e o professor: Paulo Freire e a paixão de ensinar. 1. ed.


– São Paulo: Publisher Brasil, 2007.

LUCK, Heloísa. Gestão da cultura e do clima organizacional da escola. 2. ed.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2011. 190p.

_______Concepções e processos democráticos de Gestão Educacional. 7. ed.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2011. 132p.

_______ Dimensões da gestão escolar e suas competências Editora Positivo, Curitiba:


2009.

NETO, Álvaro Francisco Fernandes. Gestão de Conflitos. THESIS, São Paulo, ano II,
v.4, p. 1-16, 2º Semestre, 2005.
201

Relato de Experiência

Projeto tutoria e Conversas do Elpídio: elementos potencializadores para


formação de professores

Bianca dos Santos Torres


Bolsita CAPES/PARFOR

Resumo: Muitos estudos demonstram que a educação básica pública é atingida por
diversos fatores que prejudicam o desenvolvimento cognitivo e social dos alunos.
Desta forma, esse relato de experiência descreve o Projeto Tutoria, uma experiência
elaborada, implantada e implementada pelos próprios autores escolares em uma escola
pública da rede paulista de ensino e sua inteligação com a série Conversas do Elpídio,
fundamentada na teoria social cognitiva. Desta forma, procura-se demonstrar que essa
inteligação é um elemento potencializador do processo formativo docente, considerando
a escola como um locus privilegiado para construção do processo de ensino-
aprendizagem do educando e do educador. Nessa perspectiva, o trabalho de formação
contínua, com a junção do Projeto Tutoria e Conversas do Elpídio, visa pensar e
repensar a prática docente com o intuito de diminuir índices de evasão e retenção dos
educandos, promovendo o acesso ao direito de uma educação pública de qualidade.
Palavras-chave: Tutoria, Formação de Professores e Teoria Social Cognitiva.

INTRODUÇÃO
No ano de 2009, após análise dos dados de desempenho e frequência escolar dos
alunos matriculados nos 9º anos do Ensino Fundamental – Anos Finais, a equipe
gestora e os professores da unidade escolar depararam-se com um elevando índice de
retenção. Antes de buscar ações paliativas, o grupo escola retomou o Projeto Político
Pedagógico para constatar o perfil dos alunos atendidos. Nesse momento, averiguou-se
que a escola continha um grande número de alunos oriundos de famílias, em sua
maioria, enquadradas no conceito contemporâneo de família tentacular. Assim, em
primeiro lugar, os responsáveis são avós e avôs, havendo casos de jovens que são
criados por outros familiares, como: tios, tias e irmãos. Em segundo, são os casos de
mães que acumulam a tríplice funções (pai, mãe e chefe de família), bem como
situações de longas jornadas de trabalho.
202

Notou-se nesse momento, que tal fato promove um distanciamento destes


responsáveis para com o acompanhamento da vida escolar e, principalmente,
socioafetiva e cognitiva dos jovens e adolescentes. Identificou-se um dos fatores que
podem constituir um quadro de baixo rendimento, frequência irregular às aulas e
comportamento escolar e social inadequados, contribuindo para quadros mais sérios de
retenção e a evasão escolar, reproduzindo, assim, um sistema de exclusão educacional e,
logo, social desses educandos. Nessa realidade a escola elaborou uma ação denominada
Projeto Tutoria que ao longo dos anos de 2009 a 2012, buscou colaborar com o
desenvolvimento cognitivo, social e afetivo dos educando. No entanto, no ano de 2013,
o grupo percebeu que era preciso repensar a ação de tutoria, e nesse momento houve um
aprofundamento da formação contínua e uma aproximação com a teoria social
cognitiva, por meio do Projeto Conversas do Elpídio. Agora, era preciso trabalhar a
autorregulação da aprendizagem no grupo de professores e com os alunos inseridos no
Projeto Tutoria.

Projeto Tutoria: O que se entende por tutoria e tutor

Sabe-se que o conceito de tutoria é extremamente amplo nos estudos teóricos


sobre o assunto, assim é preciso expor três pontos fundamentais: o que se entende por
tutoria, o se entende por tutor e as características dessa figura dentro do Projeto Tutoria
nessa unidade escolar.
Desta forma, acredita-se que a definição de tutoria que o Projeto Tutoria almeja
está descrita na legislação educacional mexicana que expõe

“ A tutoria é um espaço curricular de acompanhamento, gestão e orientação


grupal, coordenado por um mestre ou mestres que contribuem ao
desenvolvimento social, afetivo, cognitivo e acadêmico dos alunos, assim
como a sua formação integral e a elaboração de um projeto de vida”. (
MEXICO, 2006, p. 13)

Logo, no cronograma de ação do projeto, os alunos indicados pelos professores


após devido diagnóstico são acompanhados por professores das diversas áreas do
conhecimento, sendo que esses estão diretamente ligados à vida escola dos alunos.
Outro ponto fundamental para compreensão é o que entende-se por tutor, assim
apresenta-se o exposto pelo autor Argüis, 2002 “ o tutor é um orientador da
203

aprendizagem, dinamizador da vida socioafetiva da sala de aula e orientador pessoal,


escolar e profissional do aluno” ( ARGÜIS, 2002, p.17)
Ademais, o estudioso destaca as qualidades fundamentais que devem fazer parte
do perfil do tutor, são elas:
- As qualidades humanas ( o ser tutor) . A empatai, maturidade
intelectual-volitava e afetiva, a sociabilidade, a responsabilidade e a
capacidade de aceitação.

- As qualidades científicas ( o saber ). Conhecimento da maneira de ser


do aluno, conhecimentos dos elementos pedagógicos para conhecer e ajudar
o aluno.

- As qualidades técnicas ( o saber fazer ). Trabalhar com eficácia e em


equipe, participação de projetos e programas definidos em comum acordo
para a formação dos alunos. ( ARGÜIS, 2002, p. 17).

Percebe-se nesse ponto que as qualidades inerentes ao perfil do tutor devem ser
concatenadas com as concepções de educação ao longo da vida, baseada em quatros
pilares: 1. Aprender a conhecer, 2. Aprender a fazer, 3. Aprender a viver junto e 4.
Aprender a ser. (DELORS, 2003)
Nessa perspectiva que os docentes no ano de 2013 ao avaliar o desenvolvimento
do projeto, perceberam e indicaram que este necessitava de mudanças para alcançar e
ampliar os objetivos propostos em sua elaboração no ano de 2009.

Projeto Tutoria: trajetória, desafios e mudanças


A trajetória

Ao longo dos anos de implantação o Projeto Tutoria definiu-se como um projeto


de apoio e acompanhamento, sendo que o objetivo principal era: estabelecer um
processo de acompanhamento em forma de tutoria como meio para superação do
fracasso escolar, em busca da redução do processo de exclusão social.
Nesse período, o projeto teve como objetivos os descritos a seguir:
“1. Estabelecer o acompanhamento intensivo dos alunos do ciclo II do ensino
fundamental e ensino médio, nos aspectos da freqüência, rendimento e
comportamento;
2. Acompanhar e otimizar o rendimento escolar nas diversas disciplinas da
grade curricular, por meio de rotinas e orientações ao estudo;
3. Acompanhar e orientar o comportamento destes educandos, no que tange a
cultura de paz e respeito mútuo entre colegas, professores e funcionários da
escola;
204

4. Elevar a auto-estima dos educandos através da tutoria do professor, pois


esta é a demonstração da importância destes jovens pelo trabalho
desenvolvido na escola;
5. Estimular o hábito da organização para os estudos, por meio do adequado
uso da agenda escolar, pois este se constitui em registro das tarefas e
compromissos estudantis;
6. Estabelecer reuniões de formação e planejamento para ação de tutoria;
7. Desenvolver expediente para as trocas de experiências do tutores com os
demais professores da unidade escolar, no expediente das ATPCs
quinzenalmente;
8. Promover leituras e espaços de ampliação do conhecimento desses
educandos”. (Projeto Tutoria, 2009)

Para o desenvolvimento desses objetivos, definiu-se que a metodologia de


trabalho do professor deveria ser orientada por um processo de aproximação e diálogo
ente o professor-tutor e os alunos, promovendo uma relação professor-aluno
profissional e saudável, com a esperança de que os jovens e adolescentes encontrassem
em seus professores-tutores os referenciais necessários para que se sentissem
confortáveis a receber orientações comportamentais e educacionais com vistas a
contribuir na superação de angústias, fragilidades e inquietações educacionais.
Os resultados positivos do Projeto Tutoria, no ano de 2013, são expressos pelo
quadro que representa quantativamente os últimos 07 anos.

QUADRO 1 – Resultados quantitativos expressos pelo Índice de Fracasso Escolar ( IFE)

2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

IFE IFE IFE IFE IFE IFE IFE


Série
Dados % Dados % Dados % Dados % Dados % Dados % Dados %

6º 28 34,6 25 22,5 43 18,4 26 17,8 16 14,3 13 12,6 7 7,0

7º 38 46,3 20 24,7 18 18,6 19 9,0 18 13,7 14 12,5 13 15,2

8º 29 22,8 14 22,6 22 27,5 16 16,2 15 7,7 12 9,4 4 3,9

9º 48 35,6 63 51,2 34 33,3 22 29,7 11 10,7 35 19,7 16 12,8

1º 62 42,2 40 33,1 19 25,7 25 34,7 4 9,5 18 20,5 6 4,1

2º 13 20,3 17 28,3 8 10,7 2 5,7 7 15,6 10 15,9 4 6,2

3º 14 48,3 7 16,7 5 14,3 15 20,3 2 5,1 5 12,5 1

1º N 44 44,9 35 52,2 29 67,4 59 60,2 23 51,1

2º N 32 35,6 30 33,7 17 37,0 9 22,0 8 23,5

3º N 37 36,6 28 34,1 17 25,4 22 41,5 5 12,8


Nota explicativa: *IFE – Índice de fracasso escolar. Índice criado pela pesquisadora para quantificar o número de alunos excluídos do processo
educativo em um ano letivo, entendido como a somatória dos números referentes à evasão e retenção escolar ( TORRES, 2012, p. 74)

Destaca-se os resultados positivos da inserção do Projeto Tutoria em todas as


séries ao longo dos anos, sendo um aumento no percentual do IFE em 2013,
205

principalmente nas 8ª série/9º ano e 1º ano do Ensino Médio. Tal dado comprova
estudos que apontam essas séries como um “gargalo” educacional, por caracterizarem-
se como o fechamento e a abertura, respectivamente, de ciclos distintos de ensino e
aprendizagem. Além desse fator, destaca-se um aumento percentual no IFE nos 7º anos
do Ensino Fundamental – Anos Finais, fato que despertou o interesse, na perspectiva da
promoção de ações preventivas nos 6º anos.

Isto posto, ressalta-se a que o Projeto Tutoria também apresenta resultados


positivos, na esfera qualitativa, os professores tecem comentários positivos em relação
ao alunos que apresentam dificuldades de aprendizagem, conforme relatos coletados na
unidade escolar.

Os desafios

Apesar dos resultados positivos, as discussões de avaliação do projeto apontavam


para um desgaste das ações de apoio e acompanhamento da forma que estavam. Logo,
percebeu-se a necessidade de reformulação, uma vez que os professores-tutores
apontavam constantemente que para, além disso, era preciso um material de apoio para
o desenvolvimento das ações. Ou seja, notou-se que, apesar das discussões, orientações,
era preciso um material que subsidiasse o trabalho pedagógico da tutoria, possibilitando
aos educados propostas sobre organização e gerenciamento do tempo, das rotinas de
estudo e estratégias de estudos, conforme as demandas das aprendizagens propostas por
diferentes professores das áreas de conhecimento. Além disso, era necessário uma
formação contínua que promovesse aos atores do processo a análise e discussão sobre
teorias que pudessem ajudar os alunos.

Nessa altura, era preciso pensar, estudar e reformular o Projeto Tutoria com vistas
a continuar promovendo o apoio e acompanhamento que o educando necessita, porém
com ampliação das ações de tutoria, com formação de todos os professores da unidade
escolar e com um material teórico e prático adequado. Assim, encontrou-se no material
do projeto Conversas do Elpídio e a Teoria Social Cognitiva.

As mudanças: A busca teórica

Nessa fase do Projeto Tutoria era preciso pesquisar como superar os desafios
apresentados. Assim, deparou-se com o projeto Conversas do Elpídio. É uma série de
livros que faz parte de um projeto desenvolvido para o Ensino Médio pelo Núcleo de
206

Estudos Avançados em Psicologia Cognitiva e Comportamental (NEAPSI) da


Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). O
NEAPSI é um grupo de pesquisas associado à Faculdade de Educação (FE) da
UNICAMP, nesse grupo buscam estudar vários assuntos, a maior parte deles a partir de
uma teoria da Psicologia denominada Teoria Social Cognitiva, formulada por Albert
Bandura. No conjunto dessas pesquisas, dedicam-se ao Ensino Médio e por conta
desta linha de investigação que criaram a Série Elpídio. Pode-se sintetizar que o projeto
é protagonizado por um personagem criado para a série cujo nome é Elpídio, este
conversa com os estudantes com a proposta de auxiliar os estudantes a refletirem sobre
o processo de estudo e aprendizagem, bem como sobre as perspectivas o longo da
escolaridade.

Assim, a aproximação com a série Conversas com Elpídio, promoveu uma


aproximação com a teoria que subjaz a série de livros. Desta forma, com a idéia de
mudanças nas ações docentes no Projeto Tutoria em busca a apoiar, acompanhar e
implementar as ações de Recuperação das aprendizagens dos alunos, buscou-se
embasamento junto à Teoria Social Cognitiva e um de seus conceitos, o conceito de
autorregulação para assessorar os alunos nesse projeto de desenvolvimento e
recuperação de aprendizagens.

Logo, destaca-se que com a Teoria Social Cognitiva o funcionamento psicológico


do indivíduo é determinado por interações externas (ambiente) e pessoais. “Perante as
múltiplas influências a que se encontram sujeitas, as pessoas revelam uma considerável
capacidade de auto-direção”(BANDURA, 1986, p.385). Sob esta perspectiva a teoria
destaca a função de autorregulação, ou seja, o indivíduo pode exercer controle sobre
determinado comportamento. Nessa perspectiva, a literatura explica que a
autorregulação é “um processo consciente e voluntário de governo pelo qual
possibilita a gerência dos próprios comportamentos, pensamentos e sentimentos,
ciclicamente voltados e adaptados para obtenção de metas pessoais e guiadas por
padrões gerais de conduta”. (POLYDORO & AZZI, 2009,p.75). Logo, a interação
conjunta dos fatores ambientais, pessoais e comportamentais determina e regula o
comportamento.

Segundo Bandura, o comportamento humano é “produto de fatores externos e de


influências auto-geradoras” (BANDURA, 1986, p. 454). As influências externas
207

afetam o comportamento não de forma direta, mas essencialmente através de processos


cognitivos, os quais exercem um papel fundamental na regulação do comportamento e
da aprendizagem.
No entanto, não se podia esquecer que trabalhamos com crianças, e, em muitos
casos, em situações vulneráveis, bem como desamparadas, então era preciso promover
condições para que os alunos desenvolvessem estratégias e mecanismos que
minimizassem os fatores externos negativos, bem como desenvolvessem influências
auto-geradoras no desenvolvimento do processo de auto-regulação da aprendizagem.
Além disso, era preciso formar os professores para o trabalho com a auto-regulação.

O processo
Era preciso mudar, assim no ano letivo de 2014, o Projeto Tutoria foi
reorganizado, conforme o quadro a seguir:
Quadro 2 - Projeto Tutoria – Metodologia de trabalho

Ações Objetivos da ação Público atendido Metodologia


centrais

Ação ações específicas e Alunos retidos, Leitura do Livro “ Conversas do Elpídio sobre o
reparatória transformadoras de promovidos pelo estudar”
(Grupo I) hábitos junto aos conselho e com Ações com alunos
alunos retidos e com dificuldades - uso de caderno de tutoria (do aluno) – cada terá um
dificuldades extremas expressas caderno no qual fixará as atividades direcionadas
extremas de após avaliação daquela semana;
aprendizagem; diagnóstica; - pasta de tutoria (do professor tutor) identificação e
relatos sobre a participação do aluno;
Ação de formação Professores-tutores; - a leitura do livro será realizada nas aulas de tutoria;
dos professores - as cópias prévias das fichas serão providenciadas pela
tutores; Coordenação Pedagógica;
- Discussão sobre as notas e a freqüência bimestrais.

Ações com professores


- Reunião quinzenais de discussão, leitura e formação

Ação ações introdutórias e Todos os alunos do Leitura adaptada do Livro “ Conversas do Elpídio
preventiva formadoras de 6º ano do ensino sobre o estudar”
( Grupo II) hábitos junto aos fundamental; Ações com alunos
alunos do sexto ano - Trabalho introdutório pelo Coordenação sobre como
do ensino estudar
fundamental II; - A leitura deverá ser adaptada
(com trechos pré selecionados pela coordenação) com
Todos os uso de dicionários e estratégias diversificadas.
Ação de formação professores da -Separar uma matéria no Caderno – Orientação aos
geral sobre estudar ; unidade escolar nas estudos;
reuniões de ATPC - uso de fichas adaptadas para formação do hábito dos
estudos.
- Discussão sobre as notas e a frequência bimestrais.

Ações com professores


- Reuniões mensais com base em leituras do Conversas
com Elpídio
208

Ação ações de análise de Sala a ser definida


Leitura do Livro “ Conversas do Elpídio sobre o
analítica resultados, junto a após avaliação
estudar”
(Grupo III) um grupo de institucional – 1º
Ações com alunos
referência. Grupo bimestre. - Coleta das notas e média da sala na avaliação
único selecionado institucional do 1º bimestre.
após resultados da - questionário introdutório sobre a prática e hábitos de
avaliação estudos;
institucional do 1ºProfessores - análise das notas e a construção de paralelos.
bimestre. coordenadores das A partir do segundo bimestre
salas selecionadas;
Ação de formação Ações com professores
específica. - Reuniões quinzenais com professores coordenadores
Quadro criada pela pesquisadora para a definição do eixos norteadores do Projeto Tutoria em 2014.

Projeto Tutoria e a Formação contínua de professores


O trabalho do Projeto Tutoria, nessa nova perspectiva, exige a necessidade de
formação do grupo docente, sempre considerando as três perspectivas destacadas por
Antonio Nóvoa (1997) em relação ao processo de formação docente, são elas: o
desenvolvimento pessoal (produzir a vida do professor), o desenvolvimento
profissional (produzir a profissão) e o desenvolvimento organizacional (produzir a
escola).
Com foco nesses pontos, buscou-se inserir na metodologia de trabalho do Projeto
Tutoria momentos de formação que resgatassem a gestão de aprendizagem do próprio
docente, possibilitando o conhecimento sobre si, vislumbrando uma aproximação com o
desenvolvimento pessoal desse educador. Desta forma, em ATPCs, resgataram-se as
formas de estudo da fase de infância e adolescência dos professores, sendo que o
trabalho foi conduzido por professores-tutores que estão desde Janeiro/2014 estudando
com o livro Conversas do Elpídio. Vide imagens:

Imagem 1 – Professores discutindo com base em fichas adaptadas do livro.


209

Imagem 2 : Síntese no quadro negro das informações discutidas nos grupos em relação as
experiências de estudos dos docentes

Desta forma, pode-se promover junto a todos os professores momentos de


formação contínua com o uso do material, uma vez que afirma-se que a formação
contínua em serviço, focada em projetos e nas reais necessidades da unidade escolar é
elemento mobilizador da ação de tutoria, pois é imprescindível que o docente
compreenda o processo de autorregulação da aprendizagem, não só pela leitura, mas
também pela prática para, dessa forma, atender ao educando que tenha dúvidas e
necessite de orientação. Nesse ponto, pode-se dizer que nessa realidade escolar a
formação aproxima-se do proposto por Feldmann (2008)
“ (a formação contínua) entendia como uma dimensão dereconstrução
permanente da identidade pessoal e profissional não pode mais ser vista
como um processo de acumulação de conhecimentos dispostos de forma
estática ( cursos, teoria, técnica), desvinculados da concepção e da análise da
cultura escolar na qual os professores interatuam. Nessa perspectiva o
processo de formação contínua de professores caminha junto com a
construção e reconstrução da cultura escolar. Dentre os outros vários
atributos, revela a importância do desenvolvimento pessoal e profissional
mesclados pela dimensão coletiva do ensinar e do aprender, pela autonomia
compartilhada entre os educadores envolvidos”.( FELDMANN, 2008, p.
172).

Desta forma, observamos a (Figura 1) sobre a importância do professor-tutor, no


entanto nesse momento amplia-se tal perspectiva, conforme disposto na Figura 2, com
finalidade de reforçar outros pontos essenciais na formação contínua em serviço.
210

Figura 1 Figura 2

Fonte: Figura construída pela pesquisadora Bianca dos Santos Torres, Fonte: Figura construída pela pesquisadora Bianca dos Santos
com base nos referenciais teóricos e nas análises do Projeto Tutoria. Torres para esse artigo.
TORRES, 2012, p.81

Ressalta-se que as características de articulação e dinamização do processo de


ensino-aprendizagem direcionados ao professor-tutor ao longos dos últimos anos, foi
ampliado aos demais docentes que estão envolvidos com os alunos.

Considerações Finais
Desta forma, percebe-se nesse relato de experiência o processo formativo
implantado e implementado em uma escola da rede pública paulista. Sendo possível
ressaltar a escola como locus privilegiado para a formação contínua docente, bem como
a necessidade de ressignificar o processo formativo desse profissional, por meio de
discussões sobre projetos da própria realidade escolar. Isto posto, conclui-se que o
Projeto Tutoria e Conversas do Elpídio, e as teorias que subjazem essa série, são
elementos capazes de potencializar o processo de ensino-aprendizagem do aluno, bem
como do docente ampliando a perspectiva de formação contínua dentro do espaço
escolar.
211

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARGUIS, Ricardo; A tutoria: com a palavra, o aluno. Porto Alegre, 2002.

AZZI, Roberta Gurgel; POLYDORO, Soely Aparecida Jorge. Autorregulação da


aprendizagem na perspectiva da teoria cognitiva: introduzindo modelos de
investigação e intervenção. In: Psicologia da Educação, São Paulo, 29, 2° sem. De
2009, pp.75-94.

BANDURA, Antony; Social Foundations of Thought and Action. A Social Cognitive


Theory. Englewood Cliffs; NJ: Prentice Hall. (1986).

DELORS, Jacques; Educação: um tesouro a descobrir. 8a. Ed. Brasília. DF: MEC:
UNESCO, 2003.

FELDMANN, Marina G.; Formação de professores e a escola na


contemporaneidade. São Paulo: SENAC, 2008.

NÓVOA, Antonio. Os professores e sua formação. Lisboa: Quixote, 1997.

TORRES, Bianca dos Santos. Projeto Tutoria: element mobilizador para a


formação continua de professors e superação do fracasso escolar na escola pública.
São Paulo: 2012.
212

Comunicação

Políticas curriculares no espaço escolar: o trabalho e o papel dos educadores como


intelectuais

Branca Jurema Ponce1


Sanny S. da Rosa2
Pontifícia Universidade Católica/ SP
Grupo de Pesquisa Políticas de Educação: Currículo

Resumo: Este texto apresenta e discute resultados obtidos em estudos recentes (2010-
2012) desenvolvidos no âmbito de um projeto de pesquisa no Programa de Pós-
graduação em Educação: Currículo da PUC-SP sobre políticas curriculares
empreendidas pelo Estado brasileiro (especialmente na esfera estadual de São Paulo)
para a educação básica. Considerando que a preocupação comum a todos os trabalhos
colocou no centro do debate o lugar ocupado pelos sujeitos nos processos de
formulação, gestão e execução das políticas por meio de suas práticas educativas, este
texto visa, particularmente, colocar em relevo elementos que contribuam para ampliar e
atualizar a discussão sobre o papel dos educadores como intelectuais, na perspectiva
gramsciana, no contexto das atuais políticas educacionais, orientadas pelos princípios
neoliberais em esfera global Os resultados das pesquisas locais, ao apontarem para
posições ambivalentes assumidas pelos educadores em relação às prescrições que
restringem o seu espaço de autonomia, exigem uma reinterpretação sobre o papel das
diferentes posições ocupadas pelos sujeitos como intelectuais orgânicos desse processo.
Palavras-chave: políticas curriculares – trabalho docente - intelectuais orgânicos–
espaço escolar

Introdução
As pesquisas vinculadas ao projeto “Políticas curriculares para a educação básica
propostas pelo Estado e sua ressonância na prática pedagógica” (PUC-SP, 2010-2012)
permitem afirmar que, no que se refere às políticas de currículo, os sistemas de ensino
têm empreendido iniciativas por meio de duas modalidades básicas: a primeira, por

1
Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Educação: Currículo (PUC-SP)
2
Pesquisadora integrante do Grupo de Pesquisa Políticas de Educação: Currículo (PEC-PUC-SP)
213

meio da produção de material apostilado/padronizado pelos próprios sistemas públicos


de educação, como é o caso do estado e também do município de São Paulo; a segunda,
pela compra, por parte das administrações públicas, de sistemas padronizados de ensino
de empresas privadas de educação ou de organizações não-governamentais
(CHIZZOTTI; PONCE, 2012). Os dados obtidos corroboram (Ibid.; 2012; CÁRIA,
2012.) o que outros estudos recentes já vinham sinalizando (PERONI, 2003;
ARELARO, 2008; ADRIÃO et al., 2009): a intensificação das parcerias público-
privadas para a oferta educacional na educação básica.
Este fenômeno, que expressa uma tendência à “privatização” da educação pública,
revela a faceta mais evidente de uma das três “tecnologias” descritas por Stephen Ball
(2008) das reformas educacionais globais: a “forma de mercado” (market form), que se
manifesta também por meio dos rankings escolares, impulsionados pelas políticas de
avaliação de larga escala. No interior dos sistemas e das escolas outras duas
“tecnologias” são empregadas: a ação vigilante dos “gestores” (gerencialismo) e a
busca por resultados (performatividade). Esse conjunto compõe a “fórmula” advogada
pelos organismos internacionais (especialmente a OCDE) para pôr em curso os ideais de
educação da economia/sociedade do conhecimento (knowledge economy).
Bem antes dessa nova dinâmica educacional ter se estabelecido no Brasil – a partir
da segunda metade da década de 1990 - essa realidade já vinha transformando a
organização das escolas e o trabalho docente nos países “exportadores” dessas
“tecnologias”, particularmente a Inglaterra e os Estados Unidos (ROSA, 2012). Nas
duas últimas décadas, a literatura nacional e internacional sobre o tema colocou à
disposição dos pesquisadores da área da educação um farto material sobre as intenções
políticas, modos de operação e repercussões das políticas orientadas pelo e para o
mercado. Desde o final da década de 1980, estudos e reflexões produzidos sobre a
realidade de outros países, como os de Apple (1989), Popkewitz (1991), Giroux (1997)
e Contreras (2002), têm informado educadores e pesquisadores brasileiros nessa
perspectiva de análise.
Contudo, a despeito de toda essa produção, ainda estamos a caminho de construir
uma compreensão mais consistente a respeito das mudanças que as novas práticas
escolares têm operado sobre os sentidos atribuídos à educação e ao papel dos
educadores no cenário das transformações do mundo contemporâneo. Arriscamos dizer
que as pesquisas realizadas no Brasil carecem de uma maior aproximação com a
“intimidade” das escolas, a partir de uma de uma perspectiva de análise aberta a
214

reelaborações teóricas que deem conta de apreender as transformações operadas no


interior dessas instituições como efeito das políticas educacionais.
Um ponto comum e central aos estudos desenvolvidos no âmbito de nosso projeto
de pesquisa sobre políticas curriculares foi a preocupação com o lugar destinado aos
professores e gestores na implementação dos programas oficiais. Esta é, vamos dizer
assim, a questão de “fundo” dos trabalhos, não apenas porque entendemos que o
professor é figura-chave do processo educativo e do desenvolvimento do currículo, mas
sobretudo porque as crescentes restrições à sua autonomia pedagógica e intelectual
evidencia uma descrença, por parte dos formuladores das políticas, na capacidade
profissional do professor. Sem deixar de reconhecermos as insuficiências e fragilidades
na formação inicial de professores no Brasil, é extremamente preocupante a inequívoca
intenção de institucionalizarem-se práticas curriculares “à prova de professor” (APPLE,
1989).
De tais constatações decorre a necessidade de aprofundar essas reflexões, o que
justifica este esforço de reunir elementos empíricos para, a partir deles, formular uma
compreensão teórica mais consistente sobre o tema.

Os lugares dos educadores no discurso e nas práticas das políticas curriculares


As pesquisas contempladas neste texto referem-se aos programas curriculares
implementados nas redes públicas estadual e municipal de São Paulo, especificamente o
Programa São Paulo Faz Escola da SEE/SP, que instituiu em 2007 um currículo único
para todas as escolas do Ciclo II do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio; e o
Programa Ler e Escrever – implantado em 2006 na rede municipal de São Paulo e, a
partir de 2007, também na rede estadual – cujo foco é o processo de alfabetização e
letramento ao longo do Ciclo I do Ensino Fundamental.
A reforma curricular promovida pelo São Paulo Faz Escola foi o cenário de
pesquisa de Leite (2011) e Freitas (2011). O primeiro trabalho foi um estudo de caso
que analisou o impacto das orientações curriculares nas práticas pedagógicas dos
professores de uma escola com histórico institucional de intenso trabalho coletivo dos
docentes. Apesar de, a princípio, a escola ter oferecido resistência ao programa oficial,
mantendo-se fiel ao projeto político-pedagógico construído pela equipe e negando-se,
por exemplo, a organizar os alunos “por desempenho” para cumprir as “metas”
estabelecidas pela SEE/SP, o estudo conclui que a reforma acabou por provocar “uma
ruptura na história democrática da escola, que teve seu trabalho coletivo dificultado, sua
215

autonomia docente ferida e seu projeto político-pedagógico escanteado” (PONCE;


LEITE, 2012).
A pesquisa de Freitas (2011) procurou apreender, por meio da análise do
discurso, a concepção de Professor Coordenador emergente nos documentos da
Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE/SP). Um dos documentos
analisados, denominado, curiosamente, de “Proposta Curricular da Secretaria da
Educação do Estado de São Paulo” (2008, grifo nosso), esclarece os fundamentos e
princípios dessa política operacionalizada nos “Cadernos dos Gestores”, nos “Cadernos
dos Professores” (e dos Alunos) nos quais são descritos os conteúdos, a metodologia e
as formas de avaliação a serem seguidas. O caráter prescritivo – e não “propositivo”-
dos materiais pode ser demonstrado no seguinte trecho de palestra de Maria Inês Fini,
então Coordenadora Geral da Proposta Curricular da SEE/SP, endereçada aos
professores-coordenadores:
O Caderno do Professor, ele traz na sua organização uma sugestão de
trabalho para o professor, organizada em sequências didáticas. As sequências
didáticas são maneiras de abordar os temas dos assuntos do conteúdo mínimo
que os alunos devem aprender. Então, vejam, são sugestões de trabalho para
o professor que já́ trazem embutida uma metodologia (SÃO PAULO, 2009,
apud FREITAS, 2011, grifos nossos).

Neste outro trecho da mesma palestra, porém, evidencia-se, com mais precisão o
lugar efetivamente atribuído ao professor na execução da “proposta”:
[...] o nosso foco, até mesmo o foco das sequências didáticas, é o
desenvolvimento de competências e habilidades que estão claramente
indicadas em cada Caderno do Professor. Então, vejam. Suponhamos que o
professor diga pra vocês que ele não quer usar o Caderno do Professor; ora,
ele não tem liberdade para fazer o que ele quer, ele pode trabalhar com suas
fontes, com seus recursos, o seu material, desde que ele garanta que os alunos
desenvolverão aquelas competências e habilidades previstas no currículo [...]
(Ibid., grifos nossos.)

Ou seja, fica claro que as sequências didáticas não são exatamente meras
“sugestões”, mas modelos a serem seguidos, sob o olhar atento do “gestor”. No
segmento seguinte do mesmo discurso, captado, com perspicácia, por Tavares (2012),
evidencia-se, então o lugar e o papel do professor-coordenador na arquitetura da
“proposta”:
[…] é claro que ele [o PC] não vai fiscalizar as aulas, embora seja super
recomendado que ele assista algumas, e ele poderá monitorar o trabalho do
professor para saber o que é que está acontecendo, o que está sendo ensinado,
como se dão as relações sociais dentro da sala de aula […]. É este
monitoramento, esta é a essência da função estratégica de mediação. (SÃO
PAULO, 2009 apud TAVARES, 2012).

Esta pesquisadora, ao estudar o trabalho do professor-coordenador no contexto do


216

Programa Ler e Escrever na rede estadual paulista, observa a função esperada desse
ator colocado no centro de uma lógica supostamente “perfeita”: a de ser os “olhos
visíveis” do sistema, cuja eficácia depende, de um lado, do exercício controlador de um
poder disciplinar, nos termos propostos por Foucault (2002) e, de outro, da sua atuação
como representante de um discurso que, enfatizando a importância da “autonomia” e da
“criatividade” dos educadores, apazigua possíveis espíritos “rebeldes” em relação às
políticas oficiais. A mesma fórmula discursiva, ambígua e contraditória, se aplica,
portanto, ao PC, desde que não transgrida o que é preconizado pelo sistema. Conclui-
se, assim, como também observou Freitas (2011) que a Proposta Curricular do Estado
de São Paulo apresenta uma reorganização social do trabalho pedagógico pautada na
adesão, no qual o papel do PC é o de “articulador de consensos” entre os formuladores
e os executores da “proposta”.
Em trabalho anterior (ROSA, 2010), onde analisamos o Programa Ler e Escrever
implantado no município de São Paulo, chamamos a atenção para a contradição
“epistemológica” existente entre o referencial das orientações didáticas do programa e
seus objetivos políticos. Observamos que a mesma teoria (a psicogênese da língua
escrita) havia sido utilizada no início da década de 1980 para fundamentar uma
experiência pioneira na rede estadual paulista: a do Ciclo Básico, que estendia o tempo
destinado à alfabetização a fim de respeitar o ritmo de aprendizagem de alunos
provenientes das classes populares. O mesmo referencial é usado, agora, no Ler e
Escrever para “acelerar” resultados.
A consequência desse conflito pesa sobre as costas das professoras, cujas práticas,
apontam para “soluções” pouco ortodoxas como o uso, por uma professora, de dois
cadernos: um oficial e outro extraoficial. O caderno oficial (construtivista) é trabalhado
em classe de modo a “satisfazer” a coordenadora (e as prescrições do Guia do
Programa); mas é com o extraoficial (com o be-a-bá das cartilhas, trabalhado “só em
casa”) que ela consegue os “resultados”. De acordo com a professora, “essa foi a
maneira com que sempre trabalhei”(ROSA, 2010, p.10). O exemplo ilustra como, no
contexto institucional, o exercício da autonomia é vivido como “transgressão”.
Em outra etapa do mesmo estudo, identificamos que 40% das professoras
entrevistadas, de um total de 30, representantes de 7 Coordenadorias de Ensino do
município de São Paulo, preocuparam-se em demonstrar sua “adesão” ao discurso
oficial. Alguns depoimentos são ilustrativos: “existe um perfeito entrosamento entre
professores e coordenação ; “[...] só existem aspectos positivos [no programa], tornando
217

professores unidos para o sucesso das metas estabelecidas”. O discurso de


“responsabilização” dos pares também foi observado, em afirmações como estas: “A
articulação fica meio prejudicada, pois nem todos os professores fazem a formação...”;
“falta comprometimento profissional” [de alguns professores que] “não levam a sério e
continuam atuando como se nada estivesse acontecendo” (ROSA, 2013).
Quanto à receptividade dos “materiais de apoio”, chamou-nos a atenção que, com
exceção uma professora para quem o Programa “é mais uma coisa imposta de cima
para baixo e não passa de seguir um manual”, todas as demais declararam que os
“guias” ajudam a “organizar” (o trabalho) e “esclarecem pontos importantes para o
professor”, tanto em relação ao “conteúdo” como ao “tratamento didático” específico.
Essa adesão praticamente unânime é aspecto que não pode ser desprezado em futuras
pesquisas, pois talvez “fale” sobre uma lacuna que o Programa acaba por “preencher”.
Posicionamentos mais céticos em relação à “proposta” aparecem quando está em
jogo a “responsabilização” do professor em relação aos resultados nas avaliações. Sobre
as metas do programa, por exemplo, 67% das entrevistadas apontaram questões
intervenientes no trabalho que as tornam “irrealistas”. Merece destaque à referência
frequente aos alunos de “inclusão”, cujo fraco desempenho escolar “impede” que os
resultados sejam mais satisfatórios. Percebe-se claramente que tal posicionamento não
expressa exatamente uma formulação crítica às políticas, mas, antes, uma posição
defensiva dos professores (a nosso ver compreensível) que, em alguns casos, revela-se
abertamente conservadora: “(...) temos muita inclusão, muitos bolivianos, muitos
desafios sociais para enfrentar” (ROSA, 2013, p.13).
Outras duas pesquisas qualitativas sobre o Programa Ler e Escrever (ZOCCAL,
2011; ZANITI, 2012), desenvolvidas no contexto da rede estadual de São Paulo,
analisaram a relação de professoras-alfabetizadoras com os saberes do Programa. Por
meio de discussões em grupos focais com professoras alfabetizadoras foi possível
constatar que suas histórias de vida e de formação contribuem, em grande parte, para
uma posição de “submissão” à autoridade e às “prescrições” de um programa
fortemente diretivo. Nestes estudos destacou-se aspectos da subjetividade do professor,
e também os histórico-culturais e institucionais intervenientes no modo como as
políticas são colocadas em prática, entendidas, aqui, na perspectiva de estudo das policy
enactments destacadas por Ball, Maguire e Braun (2012)
Em síntese, este breve panorama de nossas pesquisas demonstra que as atuais
políticas curriclares “quase sempre geram a desvalorização dos sujeitos no processo
218

curricular” CHIZZOTTI, PONCE, 2012, p.34), traduzindo-se, também, numa relação


cada vez mais pragmática e imediatista [dos sujeitos educadores] com o conhecimento,
com os alunos e com a própria finalidade da educação (ROSA, 2012). A partir desses
elementos empíricos já podemos colocar em pauta uma discussão teórica que nos ajude
a (re)orientar a reflexão sobre o papel dos professores no processo educativo atual. É o
que nos propomos a esboçar no próximo tópico.

O papel dos educadores a partir dos lugares que ocupam nas políticas curriculares
É possível afirmar que, na cena da educação contemporânea, o binômio avaliações
de larga escala e políticas curriculares padronizadas assumiram centralidade na
regulação do processo educativo que se passa no âmbito da instituição escolar. Esses
novos elementos participam da criação de uma nova cultura institucional que
transcende os limites da escola e, seguramente, tende a definir os papéis assumidos por
professores e gestores, tendo em vista também uma outra concepção de “qualidade” da
educação. Esta tem sido reduzida aos “ranqueamentos”, que se multiplicam e geram
uma disputa cega por melhores colocações num pódio que ignora o trabalho
efetivamente realizado na escola. Essa corrida se tornou a obsessão educacional do
nosso tempo e o impacto desse processo sobre as práticas dos educadores tem sido
devastador.
Assim, se quisermos avançar na discussão sobre o papel dos professores é
preciso considerar os lugares efetivamente ocupados pelos professores neste novo
cenário, o que pressupõe questionar, inclusive, se os lugares que lhes são atribuídos (nos
discursos e intenções dos programas oficiais) correspondem àqueles que de fato ocupam
no interior das instituições escolares. Daí a importância de olharmos atentamente para o
que dizem as pesquisas já realizadas e também de considerar este ponto específico em
novos estudos.
As pesquisas realizadas no âmbito do projeto analisado neste texto indicam que,
no contexto das políticas curriculares empreendidas pelo Estado brasileiro – tanto em
sistemas estaduais como municipais de ensino –, é possível classificar o papel
desempenhado pelos educadores em categorias distintas, em função do grau de
“organicidade” de suas atribuições. Ao fazermos tal afirmação, tomamos a noção
gramsciana de “intelectual orgânico”, para nortear as reflexões atinentes ao lugar e ao
papel desempenhado pelos diferentes agentes nos processos de formulação, gestão e
execução das propostas curriculares em curso.
219

Vale ressaltar que, para Gramsci, “não existe atividade humana da qual se possa
excluir toda intervenção intelectual, não se pode separar o homo faber do homo sapiens”
(1968, p.7). Nessa passagem dos seus Quaderni del carcere, o que o autor nos ensina é
que a vulgar separação entre trabalho físico e intelectual utilizada como critério para
distinguir os intelectuais dos não-intelectuais diz respeito a um erro metodológico que
precisa ser superado:
O erro metodológico mais difundido, ao que me parece, consiste em se ter
buscado este critério de distinção no que é intrínseco às atividades
intelectuais, ao invés de buscá-lo no conjunto do sistema de relações no qual
estas atividades (e, portanto, os grupos que as personificam) se encontram, no
conjunto geral das relações sociais. (Ibid., p. 7, grifos nossos)

Esta perspectiva de análise opera uma mudança teórica e metodológica importante


no que diz respeito às relações entre as estruturas socioeconômicas e a superestrutura
política-ideológica. Com a noção de organicidade, o pensador e militante político
italiano rompeu com a visão comum de independência e neutralidade atribuída a
atividade intelectual, tradicionalmente associada à filosofia, às ciências e às artes. Os
intelectuais, nessa concepção, não constituem um grupo social autônomo, mas se
articulam com o projeto econômico e político da classe social a que pertencem.
Cada grupo social, nascendo no terreno originário de uma função essencial
no mundo da produção econômica, cria para si, ao mesmo tempo, de um
modo orgânico, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão
homogeneidade e consciência da própria função, não apenas no campo
econômico, mas também no social e no político (...). (GRAMSCI, 1968, p.3)

É preciso enfatizar, porém, que esta função orgânica não se restringe aos grandes
intelectuais, mas se distribui, hierarquicamente, entre diferentes categorias de acordo
com o lugar que ocupam na superestrutura e “segundo o valor qualitativo de sua função,
do grande intelectual ao intelectual subalterno: na cúpula, os criadores da nova
concepção de mundo (...); no escalão inferior, aqueles que estão encarregados de
administrar ou divulgar essa ideologia” (Ibid., p.97). Em seu conjunto, porém, cumprem
a função primordial do conjunto das superestruturas das quais são funcionários porque
com suas ações buscam “assegurar a hegemonia ideológica e cultural da classe
fundamental sobre o conjunto da sociedade.” (GRAMSCI, 1968, p.10)
Essas ferramentas conceituais oferecem pistas valiosas para refletir sobre a
temática que estamos discutindo. Do topo para a base, é possível identificar os
“intelectuais criadores” das políticas curriculares prescritas pelo Estado. No caso
brasileiro, não raro, tais intelectuais têm nome e sobrenome e ocupam posições de
destaque no interior das melhores universidades do país, ou são representantes da
220

sociedade civil, organizada em ONGs, muitas das quais subsidiadas pelo setor privado
(com declarado “interesse público”!). Um mapeamento cuidadoso dos autores dos
materiais de referência aos docentes permitiria reconhecer, com clareza, a relação de
“organicidade” desses intelectuais com os sistemas de ensino oficiais, com o que é
também possível identificar as rotas ideológicas, materializadas em guias e manuais,
dirigidos às escolas. Da perspectiva do produto desse trabalho intelectual, professores e
gestores são, respectivamente, “executores” e “articuladores” no cumprimento das
políticas.
O limitado espaço destinado aos educadores se revela, como vimos, nos vãos e
deslizes dos discursos oficiais e nos “pacotes curriculares” carregados de prescrições
didático-pedagógicas, prazos e metas, travestidos de “propostas”. A viabilização desse
projeto depende em grande parte, como vimos, dos “gestores”, agentes (intelectuais)
intermediários encarregados de administrar e divulgar a ideologia dos grupos
hegemônicos, a partir de uma fórmula supostamente “perfeita”, como observou Tavares
(2012). Convictos do poder de “persuasão” (mediação, no discurso oficial) do gestor,
aposta-se nesse “herói cultural” do novo paradigma do serviço publico (BALL, 2008, p.
47) como responsável (accountable) pela vigilância e controle de novas relações
institucionais dentro da escola, como evidenciam as pesquisas de Freitas (2011) e
Tavares (2012) sobre o papel desempenhado pelo PC nos programas curriculares da
rede estadual paulista.
Quanto aos professores, nossas pesquisas indicam que, incomodados ou não, eles
têm assumido, no chão da fábrica das escolas, a função de executores de um projeto
educativo de cuja elaboração não participam e que, não raro, pouco compreendem.
Paradoxalmente, porém, limitados por uma formação muitas vezes insuficiente, que não
lhes permite uma leitura mais profunda das políticas, os professores nem sempre
executam “ao pé da letra” o que lhes é prescrito, participando, sem saber, de uma
“resistência” involuntária ao sistema. Essa ambivalência em relação às políticas oficiais,
de um lado, e, de outro a insistência do próprio modelo em apostar em “propostas”
curriculares “à prova de professor” deixa em aberto a discussão sobre se, em tais
condições, os docentes cumprem, ou não, o papel de “intelectuais orgânicos” do projeto
ideológico neoliberal em curso.
221

Considerações finais
Frente a algumas evidências proporcionadas por nossas pesquisas até então, quer
nos parecer que há, no espaço de tensões resultante das contradições do próprio modelo,
possibilidades a serem exploradas na direção da autonomia dos professores e de seu
papel como intelectuais “orgânicos” de um projeto contra-hegemônico. Pois, como
lembra Contreras (2002, p.128), são eles que “em última instância, decidem a forma
com que planejam suas aulas, por meio das quais as tentativas de influência externa são
transformadas em práticas que nem sempre têm muito a ver com a essência das
mudanças pretendidas” Em nosso entendimento, ao fazer uso de “dois cadernos” (o
oficial e o extraoficial) aquela professora não estava apenas preocupada em garantir sua
“sobrevivência institucional”, mas (mesmo que clandestinamente) em fazer valer os
saberes de sua profissão na condução de seu próprio trabalho, o que nos parece um
indício importante tanto da capacidade de “resistência” (política) dos educadores, como
de uma disposição (criativa) para o exercício da dimensão intelectual do seu trabalho.
Não há dúvida de que necessitamos de profissionais da educação que saibam
fazer leituras profundas das políticas públicas e que, coletivamente, como parte de sua
formação continuada na escola, discutam as suas intencionalidades de modo a
participar efetivamente do processo educativo. Este é o caminho para fazer com que os
profissionais da educação se apropriem efetivamente de seu processo de trabalho que,
fragmentado como está, os desorienta. A questão problemática é: como? Uma vez mais
a ponderação de Contreras contribui para dar continuidade a esse projeto:
Não poderemos compreender as possibilidades que a reflexão tem em si
mesma para detectar os interesses de dominação da prática escolar, e para
transcender os limites que esta impõe à emancipação, se não tivermos em
conta a forma em que professores e professoras, no contexto da instituição
escolar, constroem o seu papel. (CONTRERAS, 2002, p.149, grifos nossos).

Isso sugere que precisamos avançar em pesquisas que se disponham a explorar o


modo como os professores apreendem as ideias propostas pelas reformas políticas
através das lentes de seus valores, conhecimentos e práticas pré-existentes. Isto é,
investir em estudos que busquem entender como esses educadores lidam, interpretam e
traduzem, em práticas cotidianas, as demandas curriculares e pedagógicas endereçadas
pelos órgãos reguladores centrais. Nessa direção, pesquisas recentes desenvolvidas na
Inglaterra por Ball, Maguire e Braun (2012) nos dão pistas interessantes sobre a
necessidade de discutir essa problemática considerando as complexidades e
incoerências de políticas e reformas que, se de um lado submetem os sujeitos impondo-
222

lhes prescrições, de o outro, de alguma maneira, podem levá-los a tornarem-se agentes


“criativos” do trabalho escolar.
Por fim, é preciso dizer que uma reflexão que se pretenda rigorosamente “crítica”
a este respeito pressupõe um duplo desafio: o primeiro, é escapar da tentação de
posicionar os professores como “vítimas” do sistema; o segundo é considerá-los
potencialmente como “heróis”. Pois, em ambos os casos, corremos o risco de cair na
armadilha de reducionismos e simplificações que conduzem, igualmente, a caminhos
sem saída. No primeiro caso, a tendência seria aderir a um discurso de denúncia,
sobejamente percorrido em muitos estudos; no segundo, restaria apostar num idealismo
ingênuo que costuma virar as costas à realidade. Escapar de ambos é tarefa que se
impõe, ao menos como tentativa.

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189fls. Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Católica de Santos,
Santos, 2011.
225

Comunicação

(Re) pensando o espaço escolar como forma de sensibilização da cultura do ouvir

Carlos Eduardo de Almeida Sá


Universidade Nove de Julho

Resumo: A produção deste texto advém de uma parte da pesquisa de doutorado sobre a
Cultura do Ouvir em salas de aula do ensino médio realizada na Universidade Nove de
Julho. Tendo em conta que vivemos um momento da história em que a polifonia e o
excesso de ruídos invadem os diversos ambientes da cidade (inclusive a escola) e, por
outro lado, evidenciando que alguns sujeitos são mais sensíveis aos sons do que outros,
discorremos neste artigo sobre a necessidade de (re) pensarmos o espaço da escola para
que alunos e professores possam se ouvir e tirarem benefícios dessa escuta.

O silêncio, não existe isso. (Pausa de trinta segundos e ouçam).


Murray Schafer

Uma famosa atriz americana, nos últimos anos da sua vida, comentou certa vez numa
entrevista que gostava de sair para jantar e conversar com suas amigas em alguns
restaurantes. Ela se recusava, no entanto, frequentar aqueles que tocassem piano ou
qualquer outro tipo de música. Se fosse para ouvir música ela preferia ficar em casa, já
que seu intuito maior em sair era para conversar com suas amigas, precisando para isso,
ouvi-las. O depoimento da atriz pode soar estranho ou até mesmo extremo para nossos
ouvidos bastante habituados aos ruídos das grandes cidades. Um fato, porém, requer
uma análise mais cautelosa em relação a essa fala.
Muitos idosos apreciam conversas. Gostam de contar e ouvir vastas histórias, relembrar
os fatos que marcaram suas vidas e, acima de tudo, apreciam muito quem os ouça
atentamente. Ironicamente, para grande parte dos idosos, a audição é muitas vezes
comprometida em função dos problemas do próprio envelhecimento. Mesmo assim, eles
não deixam de apreciar o diálogo. Assim, ouvir está relacionado nem sempre com
escutar bem, mas em compreender o mundo, as pessoas, seus dilemas e situações, por
meio das próprias experiências.
226

Uma escuta com admiração é o que preza grande parte desses idosos. Gostam de ouvir e
serem ouvidos com atenção e admiração. É o que Plutarco1 (2003, p.18-22) aconselha
em seus escritos:
Por isso é mister que, quem pelo gosto de ouvir, em prol do desejo de se
valorizar, escute com benevolência e indulgência aquele que fala como se
fosse admitido em um banquete sagrado ou nas primícias dum sacrifício. A
admiração, certamente, se opõe ao desdém e é própria das naturezas mais
generosas e sem dúvida também das mais brandas.

Outro dado sobre esses ouvintes é que a passividade que requer ouvir, nesse caso – para
compreender – condiz com uma energia menor ou mais reduzida que a própria idade
lhes reservou. O homo consumans queimou muito dessa energia em décadas anteriores,
correu riscos, aventurou-se e brindou demasiadamente. O homo faber, por sua vez,
plantou, colheu, produziu e contribuiu para a sociedade e para a espécie. Como
consequência disso, o depósito de energia agora é seletivo, pela própria natureza.
Ansiedade e passividade, dessa forma, não acordam. Diz a composição de Renato
Teixeira: Ando devagar porque já tive pressa.
Pensando no piano que a atriz se recusava a ouvir enquanto estivesse com sua amiga
nos jantares, convém conceituarmos o ruído. Para o canadense Murray Schafer (1991, p.
68-9), pesquisador da área sonora e um dos principais compositores do seu país:
[...] Ruído é o som indesejável. Ruído é a estática no telefone ou o
desembrulhar balas do celofane durante Beethoven. Não há outro meio para
defini-lo. Às vezes, a dissonância é chamada de ruído; e para os ouvidos
tímidos até pode ser isso. [...] Ruído é qualquer som que interfere. É o
destruidor do que queremos ouvir. [grifos meus]

Estamos habituados a ouvir, antes do início de cada sessão de cinema e de teatro, um


aviso para nos mantermos em silêncio. Cinema e teatro requerem a atenção dos seus
espectadores para que ocorra uma imersão na história que será exibida. Nas igrejas, a
tradição de séculos também convida ao silêncio para que os cultos ou missas sejam
ouvidos (e apreendidos) pelos seus fiéis. Nos hospitais, a solicitação de silêncio está nos
corredores e no comportamento dos visitantes, a fim de auxiliar na recuperação dos
enfermos. Silêncio, entre outras coisas, pode ser curativo, já que auxilia no descanso,

1
Plutarco escreveu no ano 100 d.C, para os aprendizes da filosofia, uma breve dissertação sobre o modo
de ouvir. Para ele, ao ouvir, aprendemos mais a pensar do que a falar, pois essa audição é feita da própria
substância das palavras, tendo a retórica, por assim dizer, apenas uma função reguladora e exterior. À
retórica autorizada do orador profissional, Plutarco opõe a confusão adolescente e a mania compulsiva
que dela deriva. Mas não se deve pensar que os costumes em voga nas sociedades de consumo do
Ocidente sejam tão estranhos ao mundo helenístico (MARÉCHAUX, p.IX). Plutarco descreve os diversos
ouvintes, do desconfiado ao malévolo, do tímido ao mais falante, do invejoso ao cuidadoso, na relação da
escuta.
227

pode aliviar as tensões e promove o repouso resultando em energia e,


consequentemente, mais saúde. Na escola, professores apelam para as mais diversas
formas de comportamento, dos discursos ríspidos, passando para as expressões sisudas,
para que a sala se mantenha em silêncio.
Quase sempre os educadores relacionam o estresse das salas de aula ao comportamento
“indisciplinado” dos alunos e à quantidade desmedida de tarefas a serem
desempenhadas ao longo do ano letivo. Poucos professores, no entanto, relacionam seus
altos níveis de estresse e a irritabilidade dos próprios alunos com os ruídos excessivos a
que são submetidos. Para Schafer (ibidem, p. 71) o homem gosta de fazer sons e rodear-
se com eles. O homem teme a ausência de som como teme a ausência de vida. O
silêncio, ao contrário, tornou-se cada vez mais precioso, à medida que o perdemos para
os vários tipos de ruídos, como os sons industriais, automóveis e construções civis.
Schafer (ibidem, p. 125), ao pesquisar ainda na década de 1960, sobre o ambiente
sônico em diferentes épocas da humanidade, contribuiu com algumas informações
acerca desse fato:
[...] descobrimos que a princípio, quando havia poucas pessoas e elas
levavam uma existência pastoril, os sons da natureza pareciam predominar:
ventos, água, aves, animais, trovões. As pessoas usavam seus ouvidos para
decifrar os presságios sonoros da natureza. Mais tarde, na paisagem urbana,
as vozes das pessoas, seu riso e o som de suas atividades artesanais, parecem
assumir o primeiro plano. Ainda mais tarde, depois da Revolução industrial,
os sons mecânicos abafaram tanto os sons humanos quanto os naturais, com
seu onipresente zunido.

No período pós-moderno, os excessos, portanto, não chegam apenas ao sentido visual,


mas a todos os sentidos, inclusive o sentido auditivo. Para tentar estabelecer algum
controle sobre isso, as grandes cidades se empenham em atribuir a lei do ruído que
impede e constitui infração, a ser punida na forma dessa lei, a produção de ruído, capaz
de prejudicar a saúde, a segurança ou o sossego público.
Essa lei, também conhecida como Lei do silêncio, elucida ainda que 70 a 75 decibéis
equivalem à altura da voz de um palestrante falando para trinta pessoas e, acima de 90
decibéis, o ruído cuja exposição prolongada afeta as células sensórias podendo causar
estresse, aumento da pressão arterial e dos batimentos cardíacos, gastrite, dores de
cabeça e distúrbios do sono, além de outros danos à saúde humana. Noventa decibéis
equivalem ao som máximo que é capaz de produzir a laringe humana, de acordo com a
Polícia Militar.
228

Para se ter uma ideia dos resultados causados pelos altos índices de estresse causados
em função disso, em maio de 2013, um homem de 62 anos, empresário e morador de
um condomínio de luxo no bairro de Alphaville, em São Paulo, matou um casal – de 40
e 37 anos – e em seguida se matou após discutirem diversas vezes por causa dos ruídos
que tinham origem no apartamento do casal. Essa é uma entre tantas ocorrências
causadas pelo excessivo ambiente de ruído aos ouvidos humanos.
Os ruídos excessivos coincidem, deste modo, com o período pós-moderno. Nesse
sentido, Schafer também exemplifica, por meio de uma tabela, como os sons se
transformaram com o passar do tempo. Acreditamos que o autor tenha levantado os
dados para sua análise sobre o Canadá até a década de 1960, época em que foi
publicado seu livro. Assim, podemos pensar que os sons de utensílios e tecnologia em
mais de cinco décadas após sua análise tenham aumentado de forma desproporcional
com a crescente aceleração do desenvolvimento urbano.
Tabela 2 – Correlação entre sons e as épocas
Sons Sons Humanos Os Sons de Utensílios e
Naturais Tecnologia
Culturas Primitivas 69% 26% 5%
Culturas Medieval,
Renascentista e Pré- 34% 53% 14%
Industrial
Culturas Pós- 9% 25% 66%
Industriais
Década de 1960 6% 26% 68%

De forma geral, com o passar do tempo, perdemos o respeito ao silêncio e à sua


valorização nos mais diversos ambientes. Assim, voltemos a falar do cinema. O seu
funcionamento foi projetado como forma de contemplação da arte fílmica e, para isso,
pensou-se nesse espaço como um local para imersão. O escuro, as confortáveis
poltronas, a dimensão da tela, o áudio dos filmes e a distribuição das caixas de som
pelas salas. Tudo foi pensado para que o espectador tivesse a possibilidade de imergir
na projeção diante de si. Ainda é hábito, em muitas salas de cinema, chamar a atenção
de alguém que possa estar perturbando a atenção e o silêncio de outro espectador.
Aguardamos o silêncio para que possamos imergir na trama. No entanto,
229

evidentemente, em função do lucro milionário que recebem os donos dessas salas, as


docerias e seus mais diversos produtos não deixam nunca de serem vendidos. Potes
imensos de pipocas e litros de refrigerantes são os alimentos preferidos dos
espectadores que sugam canudos e roçam os imensos sacos de guloseimas enquanto
assistem aos filmes. Em outras palavras, a impressão que se tem é que dividimos o
espaço que deveria – por respeito à própria natureza de sua linguagem – ser imersivo
com dezenas de roedores-espectadores.
Sobre as igrejas e outros ambientes onde se buscava o silêncio, antes mesmo de o
deixarmos escapar com o decorrer do tempo, Schafer (1991, p. 129) comenta em
comparação:
Antigamente, havia santuários silenciosos onde qualquer pessoa que estivesse
sofrendo de fadiga sonora poderia se refugiar para recompor a psique. Podia
ser no bosque, ou em alto-mar, ou numa encosta de montanha coberta de
neve, no inverno. Olhar-se-ia para as estrelas ou para o planar silencioso das
aves e ficar-se-ia em paz. Estava subentendido que cada ser humano tinha o
inalienável direito à tranquilidade. Este era um artigo de grande valor, num
código não escrito de direitos humanos. [grifos meus]

E, brilhantemente continua:
Até mesmo no coração das cidades havia reservatórios de quietude. As
igrejas eram esses santuários, e também as bibliotecas. Na sala de concerto,
ainda hoje o silêncio toma conta da plateia quando a música está para
começar, para que esta possa ser carinhosamente depositada num
receptáculo de silêncio. [grifos meus]

Algumas bibliotecas parecem também estar perdendo esse respeito ao silêncio. No


início da década de 1980, quando estudava as séries iniciais do extinto “primeiro grau”
em uma escola pública na periferia da cidade de São Paulo, frequentemente eu e meus
colegas da turma éramos levados para a biblioteca. Na atividade, escolhíamos um livro
e tínhamos que contar sua história para a professora na aula seguinte. Muitos que não
conseguiam permanecer lendo eram convidados a cruzar os braços na mesa de leitura e
simplesmente dormir. Os que se recusavam, eram advertidos pelo olhar da professora,
que não permitia que nem mesmo sua voz atrapalhasse a leitura dos demais colegas.
Nos dias atuais, é possível constatar uma diferença (por que não dizer, uma indiferença)
em relação a esse mesmo espaço. Algumas instituições de ensino e até mesmo espaços
culturais que dispõem de bibliotecas parecem também ter perdido a noção em relação ao
precioso e necessário silêncio. Algumas dessas instituições utilizam divisórias de
material compensado, com alto nível de penetração dos ruídos e baixa acústica, para
230

separar a biblioteca de outros ambientes, como salas de aula, corredores e até pátios
internos.
Embora estejamos falando do silêncio como algo positivo e necessário numa cultura do
ouvir2, um mundo absolutamente silencioso, além de ser impossível,3 não é agradável.
Sobre isso, comenta Schafer (1991, p. 130):
Mas, contemplar um silêncio absoluto, isso é negativo e aterrorizante. Assim,
quando o telescópio de Galileu sugeriu a infinidade do espaço pela primeira
vez, o filósofo Pascal ficou profundamente assustado com a perspectiva de
um silêncio infinito e eterno. [...] Quando se entra numa câmara anecóica –
isto é uma sala completamente à prova de som – sente-se um pouco mesmo
de terror. Fala-se e o som parece despencar dos lábios para o chão. Os
ouvidos se apuram para colher evidências de que há vida no mundo.

Como docente de comunicação, ao levar os alunos para o laboratório de rádio pela


primeira vez (um estúdio com mesa de som e edição e placas acústicas que dividia o
som ruidoso dos corredores da faculdade com aquele ambiente) alguns, de início,
expressavam um estranho incômodo pelo silêncio do ambiente, enquanto outros
gostavam muito, mas, já nas aulas seguintes, praticamente todos eles se adaptavam com
o silêncio e não raramente comentavam que o espaço ali era uma forma de “refúgio do
mundo”. A expressão utilizada tentava refletir a necessidade desse “refúgio” para quem
havia passado horas no transito caótico e nas ruas da cidade de São Paulo até chegarem
ao laboratório. Uma necessidade de só se ouvirem ou ouvirem os colegas mais
próximos em suas relações afetivas e interpessoais.
Na atualidade, no entanto, prevalece um intenso empenho por parte das indústrias da
imagem em aperfeiçoá-las. As tecnologias e o investimento para o aprimoramento das
imagens em todas as telas não cessam. São aparelhos de celular, aparelhos de televisão,
telões e computadores em diversas formas de acesso para que as imagens fiquem mais
sedutoras aos olhares já anestesiados. Em relação ao áudio, contrariamente, o mesmo
parece não ocorrer. As tecnologias frequentemente são pensadas em função de uma
cultura da visualidade4 enquanto ouvir - em nosso tempo - não tem sido o mais
importante em diversos setores da indústria e da sociedade.

2
Cultura do ouvir foi o tema de uma palestra proferida por Norval Baitello Junior no seminário A Arte da
Escuta, em 1997, na ECO/UFRJ, Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(Zaremba; Bentes,1999). A palestra, revisada e atualizada, foi publicada em A Era da Iconofagia
(BAITELLO JUNIOR, 2005).
3
Tampe seus ouvidos e o mínimo que você ouvirá será sua respiração.
4
Para Wulf (2007) essa predominância se estende, inclusive, para as áreas científicas e acadêmicas. A
hierarquia dos sentidos com a dominação e a hipertrofia da vista é um resultado do processo de
civilização. As condições na origem desse desenvolvimento encontram-se na passagem do oral para a
escrita, no tempo de Platão, na extensão da escrita, seguida da invenção da imprensa e na invenção e
extensão das novas mídias. A predominância da vista encontra-se igualmente confirmada nos esforços
231

Baitello Junior (2005, p. 99) também nos faz pensar sobre essa valorização:
[...] Se fizermos uma avaliação sobre o que vale mais hoje: a palavra ou o
documento? O que custa mais caro, a televisão ou o rádio? O que tem maior
valor, o que se fala ou o que se publica? – em todas as esferas da atividade e
da cultura contemporâneas detecta-se um predomínio do visual sobre o
auditivo. [...] Os sistemas de avaliação são todos fundados sobre a escrita,
que pertence ao reino da visualidade, a mesma escrita que nasceu das formas
mais arcaicas de conservação da informação.

Embora a natureza tenha concedido à grande parte da população mundial dois ouvidos e
a extraordinária capacidade de audição, torna-se oportuno aqui pensar sobre uma
questão feita pelo autor: “[...] não estamos nos tornando surdos intencionais? Surdos
que ouvem. Surdos que têm a capacidade de ouvir, mas que não querem ouvir, não têm
tempo ou então não dão atenção ao que ouvem? Literalmente não dão ouvidos ao que de
fato ouvem?” (op. cit.) Em relação às escolas, essa situação também não foge à regra.
Ouvir no ambiente escolar pode se tornar parte fundamental de uma relação de
aproximação ou distanciamento entre as partes que ali estão. Segundo Menezes (2010,
p. 24):
O estudo da cultura do ouvir nos desafia a compreendermos alguns elementos
dos processos de abstração. Tais processos permitem uma aproximação do
homem com as coisas e com os outros homens, ou melhor, permitem a
própria constituição do homem como um animal simbólico, histórico, capaz
tanto de tomar distância como de vincular-se às coisas e os outros. [grifos
meus]

Wulf (2007), nessa perspectiva, também atesta a importância do aprendizado do ouvir:


Ouvir [...] é a condição para entender e falar. Sentimentos de segurança e
pertença se formam pela percepção da interpelação. O sentido do ouvido é o
sentido social. Nenhuma comunidade social se forma sem que os membros
aprendam a se escutar. Crescemos em uma cultura com a ajuda da percepção
dos barulhos, das sonoridades, das tonalidades e das palavras.

Sabemos que as salas de aula de muitas escolas são repletas de alunos, locadas
geralmente em ambientes altamente ruidosos que misturam os sons da própria sala de
aula com outros ruídos externos, como o corredor da escola, as falas, gritos lúdicos dos
alunos, as campainhas, o trânsito das ruas da região, entre outros. Alguns professores
(não raramente já apresentando algum problema vocal em impor diariamente sua voz na
tentativa de ser ouvido), imersos nesse ambiente altamente polifônico, iniciam sua aula
muitas vezes despejando o conteúdo da disciplina como uma espécie de vômito

para desenvolver as ‘realidades virtuais’. Quase todos os projetos de pesquisa e de desenvolvimento


concentram-se sobre a elaboração de “realidades virtuais” orientadas pelo visual, cuja simulação da
realidade está, contudo, mantida pela atenção posta aos outros sentidos.
232

incontido sobre seus alunos. As questões que aportam, primeiramente são: o professor –
de fato – ouviu os alunos? Os alunos – de fato – ouviram o professor?
[...] Para ouvir sons, basta que sejamos passivamente receptivos –
aprendemos a ser passivos. Já para a recepção da imagem, somos obrigados
a ser ativos, a direcionar o nosso olhar para algum objeto. [...] Temos que
considerar ainda outra coisa deste par ativo/passivo. Passivo vem de passion,
passione, que significa paixão e que está associado à sensação e sentimento.
Está associado a sentir. Ativo vem de ação e está associado a agir, a fazer.
Temos aí dois grandes universos que evidentemente se complementam, que
interagem e que são ambos importantes. Mas quando houver o desequilíbrio
entre os dois universos, o ativo e o passivo, será nossa percepção e nossa
relação com o mundo que estará vivendo em desequilíbrio.

Se o ambiente de sala de aula deveria ser o momento de troca de informações, de


conteúdos e de conhecimento, torna-se importante reconhecer que o saber se faz
também dessa passividade no momento em que professores e alunos se dispõem a ser
receptivos, uns aos outros, cada um em seu momento mais apropriado. E o que deveria
ser levado também em conta: no espaço ideal ou apropriado.
Muitas escolas foram projetadas e construídas décadas (ou séculos) atrás, muito antes
que os arquitetos ou engenheiros pudessem imaginar o desenvolvimento desordenado e
caótico das cidades ao redor delas. Inúmeros professores são afastados anualmente de
suas funções com sérios problemas vocais ou em razão dos altos níveis de estresse,
como apontamos anteriormente, e que estão relacionados diretamente também com o
excesso dos ruídos. Muitos alunos se dispersam igualmente em razão de não ouvir o
professor como deveriam. Algumas escolas e professores mais atentos que tentam
acompanhar o desenvolvimento dos alunos frequentemente estabelecem alguma relação
entre o mau desempenho e a capacidade visual desses alunos. Em alguns casos, exames
oftalmológicos são realizados nas próprias escolas ou é solicitado o encaminhamento do
aluno para um médico oftalmologista até que sejam providenciados os óculos para
enxergar melhor e, consequentemente, obter melhor desempenho. Dento do que
pesquisamos, no entanto, não constatamos qualquer cautela por parte da rede pública ou
privada de ensino no sentido de se investigar as possíveis relações entre o mau
desempenho dos alunos ligados também à sua audição, que nem sempre são de alunos
com deficiências auditivas, mas de alunos com uma sensibilidade maior ao áudio. Nesse
sentido, torna-se evidente o descaso em relação ao ouvir
Há que se considerar também que algumas pessoas são mais sensíveis aos sons do que
outras. O ruído que pouco incomoda alguns pode incomodar e até mesmo agredir a
audição de muito outros. Assim, Schafer (1991, p. 69), ao relacionar a música com
outros sons ruidosos nos lembra:
233

Schopenhauer disse que a sensibilidade do homem para a música varia


inversamente de acordo com a quantidade de ruído com a qual é capaz de
conviver. Ele quis dizer que, quanto mais selecionamos os sons para ouvir,
mais somos progressivamente perturbados pelos sinais sonoros que
interferem (por exemplo, o comportamento de um auditório barulhento num
concerto).
Para os insensíveis, o conceito de ruído não é válido. Alguém que dorme
como uma pedra não ouve nada, A máquina é indiferente ao ruído porque não
tem ouvidos. Explorando essa indiferença, a música de fundo foi inventada
para homens sem ouvidos. [...] Para o homem sensível aos sons, o mundo
está repleto de ruídos. [grifos meus]

Nesse contexto, podemos pensar no aluno com maior dificuldade em se concentrar no


que está sendo explicado pelo professor. Se houver interesse na fala deste, haverá
proporcionalmente uma alta intensidade empregada por esse aluno na tentativa de ouvi-
lo, comparado aos alunos com menor sensibilidade aos ruídos.
Plutarco já mostrava sua preocupação sobre os efeitos dos ruídos na audição dos jovens
daquela época:
Assim como na guerra, também nas conferências há muitas coisas frívolas.
Com efeito, os cabelos brancos do conferencista, a modulação da sua voz, a
sua gravidade, jactância e, sobretudo os gritos, os barulhos, os saltos dos
presentes deixam aturdido o ouvinte inexperiente e jovem, como se fosse
arrastado por uma correnteza. (2003, p. 24) [grifos meus]

Idealmente, espera-se que o som que preencherá o silêncio deve ser um som mais
seletivo e menos ruidoso. Dessa forma, um processo de ensino/aprendizagem obteria
mais êxito se repensássemos o próprio ambiente escolar (em sua estrutura física) nesse
quesito.
Há décadas o vídeo entrou em salas de aula como um importantíssimo recurso de
tecnologia educacional, substituindo outros antigos, como a cartolina, o slide ou o filme
de oito milímetros. Ampliavam-se, também, a quantidade e a qualidade de outros
suportes que chegavam às escolas, como os aparelhos de televisão, telões, aparelhos de
data-show, microcomputadores, notebooks, lousas digitais interativas etc. Salas e
laboratórios de vídeo foram pensados, planejados e construídos nas escolas como
espaços estratégicos para uso do professor em suas aulas. Embora há de se considerar a
valiosíssima contribuição em todos os níveis e áreas do ensino, todos esses recursos são
audiovisuais, que privilegiaram muito mais o ver do que o ouvir na educação.
A cultura do ouvir ao ser pensada no espaço educacional passa pela necessidade de
olharmos para os ruídos externos, para a sensibilidade do ouvir inteligente dos nossos
alunos, mas também, e inclusive, para a estrutura física das salas de aula. Numa cultura
do ouvir, a prioridade deve ser o diálogo, a voz dos alunos e a voz dos professores, a
fim de que vínculos possam existir nesses espaços e de que os conteúdos educativos
234

possam ser melhores absorvidos. Os ruidosos das britadeiras, entre outros inúmeros
aparatos das construções civis, juntamente com o trânsito perturbador ao redor dessas
escolas, em muito atrapalham nesse processo.
Embora seja conhecida as dificuldades – em muitos casos, quase a impossibilidade – de
remanejamento de salas de aula para que o professor possa experimentar (ou degustar)
do silêncio preenchido sabiamente apenas pela voz dos seus alunos, a sugestão é
também um apelo à melhor forma de respeitar a audição dos mais sensíveis e propor aos
insensíveis uma nova forma de ouvir e ser ouvido. Nesse sentido e diante do fato de que
as escolas também se articularam nas últimas décadas em detrimento do visual, o
planejamento e a construção de um espaço do ouvir nas escolas seria o idealizado para a
sensibilização de uma cultura do ouvir. Não se trata de um estúdio ou de um laboratório
de áudio, mas de uma sala com uma acústica apropriada para o ouvir. Como sugestão,
uma sala simples com paredes preparadas acusticamente e um aparelho de som onde o
professor possa trabalhar com peças de áudio, por exemplo. Em muitos casos, os níveis
de dispersão diminuem significativamente em aulas que são ministradas em espaços
pensados para a escuta de todos os presentes. O isolamento do ambiente externo
favorece não apenas uma maior sensibilidade, percepção e imersão no que está sendo
tratado, mas possibilita uma seleção (bem) menos “arenosa” acerca dos sons que, dessa
forma, passam a ser ouvidos livremente.
Além dos próprios diálogos entre alunos e professores sobre a unidade didática
ministrada nesse local, um aparelho de som e peças sonoras como áudio livro,
radiojornalismo ou documentários radiofônicos são excelentes oportunidades de
trabalhar o sentido auditivo e a importância de uma cultura do ouvir numa era arraigada
apenas ao visual e que tem demonstrado frequentemente os efeitos dessa crise na pós-
modernidade.
Embora não entramos aqui nos méritos dos investimentos para a construção dessas
“salas do ouvir”, sabemos que tanto a forração acústica das paredes de uma sala como
um aparelho de som em muitos casos têm custos bastante inferiores à grande parte de
outros recursos audiovisuais, o que também justificaria o experimento e o benefício para
a escola.
235

Referências

BAITELLO JUNIOR, Norval. A era da Iconofagia. São Paulo: Hacker, 2005.

MENEZES, José Eugênio de O. CARDOSO, Marcelo (organizadores). Comunicação e


cultura do ouvir. São Paulo: Plêiade, 2012.

PLUTARCO. Como ouvir. Prefácio e notas Pierre Maréchaux. Trad. (grego e francês)
João Carlos Cabral Mendonça. Revisão da tradução Henrique F. Cairus, Tatiana
Ribeiro. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

SÁ, Carlos Eduardo de Almeida. O ouvido educado: a audição de documentários


radiofônicos em salas de aula de ensino médio sob o prisma da cultura do ouvir e
da teoria da complexidade. São Paulo. 2014 – tese de doutorado.

SCHAFER, Murray. O ouvido pensante. Trad. Marisa Trenc de O. Fonterrada, Magda


R. Gomes da Silva e Maria Lucia Pascoal. São Paulo: Fundação Editora da UNESP,
1991.

WULF, Christoph. O Ouvido. In: Revista GHREBH. São Paulo: 2007, n.9. Disponível
em: <http://www.cisc.org.br/revista/ghrebh9/artigo.php?dir=artigos&id=WulfPort>.
Acesso em 09 out. 2013.
236

Comunicação

Movimento Cidades Educadoras: políticas públicas locais e a participação de


instituições da sociedade civil

Carolina Martin
UNIMEP/CNPq

Resumo: A comunicação se baseia em uma pesquisa sobre o Movimento Cidades


Educadoras, o qual propõe políticas públicas urbanas voltadas à democracia e à
educação ao longo da vida, por meio de iniciativas formais, não-formais e informais.
Dentre os aspectos desse Movimento, é tratado em específico o papel dos governos
locais e de instituições públicas, privadas e filantrópicas, nos municípios paulistas
associados - Santo André, Santos, São Bernardo do Campo, São Carlos, São Paulo,
Sorocaba - no ano de 2012. Os dados revelaram que, no geral, a participação das
instituições está em consonância com o Movimento, entretanto verificou-se que há
considerável variação da quantidade e tipo de instituições que tomam parte dessa
política pública em cada município estudado.
Palavras-chave: Cidade Educadora; Política Pública; Participação da Sociedade Civil

Introdução
A presente comunicação se baseia em uma pesquisa acerca do Movimento
Cidades Educadoras, o qual visa, a partir de políticas públicas locais, proporcionar uma
melhora da qualidade de vida nos espaços urbanos, por meio de ações com cunho
pedagógico. As premissas e princípios do Movimento estão voltados à implantação de
um conjunto de iniciativas educacionais formais, não-formais e informais, com o intuito
de alcançar uma educação ao longo da vida tanto para os habitantes em geral, quanto
para grupos específicos. A intenção é que governos locais, habitantes e instituições se
envolvam no planejamento e desenvolvimento de planos e projetos, os quais trabalhem
sob diferentes frentes as desigualdades e exclusões urbanas1.

1
Carta das Cidades Educadoras. Disponível em <http://www.cm-
evora.pt/NR/rdonlyres/00004ead/awtuvhezgywlwffaxvjxllxizxmcnmct/Cartadascidadeseducadoras.pdf>
Acesso em 20 jul. 2008.
237

A comunicação objetiva evidenciar quais são as propostas do Movimento


Cidades Educadoras, acerca do papel do governo local e de instituições no
desenvolvimento de uma ampla e complexa política pública educacional urbana. O texto
se estrutura em três seções, a primeira contextualiza o Movimento Cidades Educadoras,
a segunda especifica as particularidades do governo local no desenvolvimento dessa
política pública educacional, e a última caracteriza a participação de instituições da
sociedade civil e traz uma análise do papel destas nas ações dos municípios paulistas
associados ao Movimento - Santo André, Santos, São Bernardo do Campo, São Carlos,
São Paulo, Sorocaba - no ano de 2012.
Como a pesquisa trata de questões sociais e educacionais, os procedimentos
metodológicos se valem de dados quantitativos e qualitativos para a exploração do
objeto e conceitos que concernem à temática. Assim, foram utilizadas tanto pesquisa
bibliográfica por meio de consulta a livros e textos (impressos e on line), quanto análise
documental realizada a partir do portal da Associação Internacional das Cidades
Educadoras - AICE na internet2.
No decorrer da leitura dos documentos e textos, foi verificado que as Cidades
Educadoras são definidas, como Projeto, Programa ou Movimento, optei por utilizar o
último termo, no sentido de ser um conjunto de ações políticas, culturais e sociais
instituídas por diversas cidades do mundo, que têm um objetivo em comum. Também
julguei pertinente utilizar o termo Cidade Educadora, designação oficial da Associação
Internacional das Cidades Educadoras - AICE, organizadora do Movimento. Outra
questão diz respeito ao termo “cidade” utilizado pelo Movimento, o qual foi empregado
ao longo da pesquisa, embora ciente de sua incompletude para o caso brasileiro. Posto
que, no Brasil, a divisão administrativa territorial tem como elemento local o município
(OLIVEIRA, 1992), o qual é constituído pela zona urbana e rural; embora raros;
apresente casos em que a constituição do mesmo é urbana sem possuir zona rural.
Entendo que o estudo de políticas públicas locais se mostra pertinente, pois
representa a interpretação do município frente às suas necessidades e problemas, os
quais também são influenciados por questões maiores, como globalização,
financeirização das relações, políticas nacionais e estaduais. O estudo do local, então,
não se encerra no local. Sem desconhecer essas influências externas, é interessante
verificar como localmente são encontradas respostas aos problemas enfrentados, bem

2 Disponível em <http://www.edcities.org> Acesso em 20 nov. 2012.


238

como iniciativas que têm como objetivo, a melhoria das condições de vida dos
habitantes e o desenvolvimento e exercício da cidadania.
A identificação de escasso conjunto literário acerca das Cidades Educadoras, da
falta de consenso sobre a temática no decorrer da revisão de literatura e da importância
da relação entre educação e os espaços sociais e territoriais das cidades, no que tange ao
desenvolvimento integral dos cidadãos, suscitou a relevância do estudo desse
Movimento internacional. Dessa forma, espera-se que essa comunicação, considerando
seus limites, contribua para discussões referentes às reflexões e ações, que agregue
elementos os quais possam colaborar para uma concepção plural a respeito de
transformações no plano local.

Cidades Educadoras
O Movimento Cidades Educadoras se consolidou no fim do século XX com
pressupostos calcados em uma visão de educação, que entremeia as modalidades
formais (escolares e universitárias), não-formais (com cunho pedagógico, mas sem
regras, conteúdos e condutas rígidas) e informais (educação cotidiana, baseada na
relação entre os habitantes e suas culturas e normas vigentes). A ideia central é
desenvolver um modelo democrático de educação ao longo da vida nos espaços
urbanos, por meio de um maior envolvimento possível dos habitantes e instituições nas
políticas públicas.
As primeiras noções e ideias que culminaram no Movimento Cidades
Educadoras, surgiram de forma organizada no relatório da UNESCO "Aprender a Ser: a
educação do futuro" (1973). Este documento traça a trajetória da história da educação,
até os tempos modernos e propõe que por meio da democracia, os problemas sociais
sejam trabalhados a partir de ações educativas diversas, traçadas por políticas e
estratégias que gerem reformas, inovações e buscas de alternativas, as quais respeitem
as particularidades nacionais e locais, ao fazer uso principalmente da solidariedade e
cooperação.
De acordo com Canário (2006), o relatório inicia um "[...] movimento da
educação permanente, reorganizador de todo processo educativo" (p.18) e estabelece
um marco de mudanças no pensamento, onde a educação passa a ser vista como
presente em todas as etapas da vida. O cerne está em quem aprende, baseado na
diversidade e globalidade de cada pessoa, dentro de uma "[...] dimensão cívica,
239

indissociável da construção de uma cidade educativa" (p.18), onde a etapa escolar é a


exceção e não a regra.
Nos anos 1980 as discussões acerca do tema continuaram, ao focar a relação da
educação e sociedade com as novas tecnologias e a globalização. E em 1989, Barcelona
(Espanha), foi a primeira cidade a implantar os pressupostos de uma Cidade Educadora.
Essa primeira experiência, despertou o interesse de outros governos locais, assim, em
1990, 63 cidades de várias localidades do mundo se reuniram, para o primeiro
Congresso Internacional das Cidades Educadoras. Após mais de duas décadas de
existência, o Movimento conta com uma associação internacional, que tem se
expandido continuamente ao oferecer para seus membros apoio técnico, trocas de
experiências, vínculos com outras organizações, um banco internacional de dados,
congressos e redes territoriais e temáticas.
No ano de 2012 - período delimitado para a pesquisa - constavam no Banco
Internacional de Dados das Cidades Educadoras – BIDCE3 445 cidades, pertencentes a
35 países divididos em quatro blocos - América, África, Europa e Ásia-Pacífico. No
tópico referente ao Brasil, estavam elencados treze municípios: Belo Horizonte/MG;
Campo Novo do Parecis/MT; Caxias do Sul/RS; Dourados/MS; Jequié/BA; Porto
Alegre/RS; Santiago/RS; Santo André/SP; Santos/SP; São Bernardo do Campo/SP; São
Carlos/SP; São Paulo/SP; Sorocaba/SP.
Os pressupostos do Movimento partem do princípio de que a proximidade entre
governo e habitantes, no espaço territorial circunscrito das cidades, pode possibilitar a
construção de relações e valores, políticos e educacionais, baseados na equidade social.
"O potencial educativo de uma cidade corresponde tanto ao que se refere à oferta e à
organização de estruturas sociais e culturais urbanas, como quanto à quantidade e à
qualidade dos relacionamentos que os sujeitos estabelecem" (CARRANO, 2003, p.161).
Em suma, foi constatado que nos principais elementos constituintes das
propostas referentes às Cidades Educadoras, pode ser identificada uma intencionalidade
com caráter democrático, inclusivo, pedagógico, social, cultural e político na formação
de um território urbano educativo. O Movimento é composto basicamente do governo
local, habitantes e instituições, tendo como base o associativismo, a solidariedade e as
educações formais, não-formais e informais, que agem por meio de ações específicas e
gerais. As proposições referem-se a um projeto educativo de cidade, cujo processo de

3 Disponível em <http://w10.bcn.es/APPS/eduportal/pubPaisosAc.do#Brasil> Acesso em 04 nov. 2012.


240

desenvolvimento tem como sustentáculo a ideia de se adaptar constantemente às


transformações globais mundiais, contudo visando sempre as especificidades locais, ao
manter sua premissa principal, a educação ao longo da vida, sem, no entanto
desconsiderar eventuais resistências.

Políticas Públicas Locais: iniciativas dos governos municipais


Nessa proposta de política pública local, espera-se que habitantes e instituições
sejam impulsionados, por meio de iniciativas com cunho pedagógico, a desenvolver
novas formas de participar da organização e soluções para diferentes necessidades e
problemas. Nesse processo, a administração pública deve "incrementar a contribuição
das diversas organizações sociais com uma maior implicação de cidadania na gestão
descentralizada de serviços e equipamentos, como alternativa para avançar para uma
sociedade mais democrática" (VILLAR, 2007, p.38).
Uma das principais premissas das Cidades Educadoras, é que o governo local,
eleito democraticamente, seja o representante oficial da cidade, se comprometendo
administrativamente a ir além de suas obrigações usuais na implantação de ações e
iniciativas as quais promovam aos habitantes uma educação ao longo da vida. A ideia é
que as administrações locais se comportem como catalisadoras das diversas
necessidades sociais, econômicas, culturais e educacionais, por meio de uma visão
política global, a qual propicie a participação de habitantes e instituições na elaboração
e execução de programas e projetos voltados a incentivar a cidadania, a partir de
diferentes esferas e modalidades de educação (BELLOT, 2000).
Como o governo local é o principal protagonista dessa política pública, para que
uma cidade possa participar do Movimento Cidades Educadoras, o governante deverá
ter sido eleito democraticamente, formular e enviar um documento para aprovação no
órgão democrático local - que no caso do Brasil é a Câmara de Vereadores - se
comprometer com as premissas e propostas contidas na Carta das Cidades Educadoras,
a qual contém os princípios básicos a serem desenvolvidos e ser membro ativo da AICE
- Associação Internacional das Cidades Educadoras.
Considero que, para entender o papel do governo local na proposta das Cidades
Educadoras, é preciso analisar aspectos e perspectivas gerais de como essas esferas de
poder adquiriram a condição e posição que tiveram ao findar do século XX. Assim, a
partir da visão do teórico Alexis de Tocqueville (FREY, 2000) acerca da democracia e
do poder local, foi possível identificar que historicamente, o protagonismo dos governos
241

locais passou a ocorrer quando houve a constatação por parte das administrações
nacionais de que estavam diante de um acúmulo de responsabilidades com as quais não
eram capazes de lidar sozinhas.
Segundo Tocqueville (FREY, 2000), as pequenas comunidades políticas têm
maior probabilidade de propiciar ações solidárias necessárias a estimular o civismo e
preservar a liberdade política dos habitantes. O contexto no qual as sociedades
modernas se inserem representa para os governos locais uma complexidade de
contraposições na tarefa de integrar os habitantes, entre as diversidades e necessidades
sociais. Pressupõe-se assim, que para vencer as adversidades caberia ao governo
democrático de uma dada localidade, agir como educador e envolver os habitantes nas
questões públicas.
Para que as Cidades Educadoras possam viabilizar todos os pressupostos e
princípios, seus membros, educadores e teóricos, elaboraram diretrizes e estratégias com
a intenção de orientar as atuações dos governos locais. Dentre elas está a formação de
um sistema administrativo de múltiplas esferas, o qual coordene informações sobre o
que precisa ser executado, por meio de medições quantitativas, geradoras de discussões
públicas e conclusões qualitativas (RECE, 2010).
De Acordo com o site4 da AICE, na página que define as Cidades Educadoras,
devido à abrangência da proposta, as relações e as estruturas de trabalho entre os que
constituem a equipe de governo, devem ocorrer de forma que os planos e ações sejam
desenvolvidos sob uma visão conjunta e geral. Para os pressupostos serem colocados
em prática, um dos fatores necessários é a organização e intencionalidade política.
Todavia, ainda há muitos casos, onde o executivo local continua deixando a organização
da cidade como educadora à cargo do órgão responsável pela educação formal. Segundo
a AICE, seria adequado haver um departamento ou secretaria que organizasse as ações
da cidade como educadora, o qual estabelecesse contato com os outros órgãos locais,
regionais, nacionais e internacionais, além da sociedade civil, para possibilitar que as
iniciativas alcancem as metas propostas pelo Movimento.
Dessa forma, ao gestor oficial da cidade cabe a tarefa de promover estudos,
avaliações, discussões e colocar a cargo do gerenciamento das ações, uma equipe que
tenha contato ao mesmo tempo, com todas as áreas administrativas e representantes de
instituições e grupos sociais, a partir de uma visão global do que ocorre na cidade.

4
Disponível em <http://www.bcn.cat/edcities/aice/estatiques/espanyol/sec_educating.html> Acesso em 20
jan. 2013.
242

Participação de Instituições da Sociedade Civil: estado de São Paulo


O Movimento Cidades Educadoras propõe o desenvolvimento de um processo
de sensibilização, para que haja responsabilidade compartilhada, entre habitantes,
instituições e governo em um projeto educativo integrador, dinâmico e em constante
evolução, o qual possibilite o aprendizado de saber agir e participar no cotidiano da vida
em sociedade.
As ações educativas que visam uma formação ao longo da vida voltada à
cidadania, podem encontrar nas associações uma forma de materializar a representação
dos interesses comuns, ao dar mais ênfase à solidariedade do que à aspectos
econômicos. Os coletivos, em geral, sem fins lucrativos, como ONGs, instituições
filantrópicas, religiosas e associações de bairro, têm a característica de ter projetos
próprios, o que possibilita, conforme o caso, serem inseridos nas iniciativas das Cidades
Educadoras. Os conjuntos organizados, formados por entidades que atuam em nome de
grupos de indivíduos, possibilitam a configuração "de novas propostas recolhendo o
sentimento dos cidadãos e redefinindo permanentemente os elementos que configuram o
interesse geral" (VILLAR, 2007, p. 37).
As empresas e instituições privadas, também são convidadas a participar da
elaboração de projetos e programas nas Cidades Educadoras, não só em relação aos
recursos financeiros, mas assumindo uma postura cívica e social no que diz respeito à
educação para a cidadania com seus trabalhadores, clientes e fornecedores. "As
empresas, por sua parte, devem assumir verdadeiramente o conceito de
Responsabilidade Social no sentido pleno da palavra e não, como uma estratégia a mais
de marketing" (OLIVERES, 2008, p. 94).
As ações ou experiências desenvolvidas pelas Cidades Educadoras apresentam
diferentes características, dentre elas, segundo diretrizes da AICE, está a orientação aos
governos locais de estabelecerem o máximo possível de parcerias, tanto no sentido de
envolver diferentes setores - empresas, indústrias, associações, ONGs - quanto de
garantir um serviço de melhor qualidade aos habitantes. Assim, julgamos procedente
analisar esse aspecto nas ações dos municípios paulistas associados - Santo André,
Santos, São Bernardo do Campo, São Carlos, São Paulo, Sorocaba - no ano de 2012.
De um total de 103 ações desenvolvidas no ano de 2012 pelos municípios
estudados, foram identificadas 30 ações que exploram parcerias com instituições
diversas, conforme indica o Quadro nº1.
243

Quadro nº1: Parcerias nas ações das Cidades Educadoras no estado de São Paulo - ano
de 2012.
Município Ação – Descrição
Santo André Programa "Pé no Parque" - FEFISA (Faculdades Integradas de Santo André) - orientação nas atividades
físicas + Secretaria de Esporte
Santo André Curso de Promotoras Legais Populares - organizações da sociedade civil: Feminina, Negra Sim, PROLEG
(Promotoras Legais de Santo André) e Associação Viva Melhor + Secretaria de Assuntos Jurídicos
Santo André Trabalho Educativo com Crianças em Situação de Vulnerabilidade Social - Rede de proteção social do
menor do município + entidades que trabalham em temas de proteção social do menor + demais órgãos
implicados nos temas de garantia de direitos da infância e juventude.
Santos Projeto Vou Volto / Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmo - Secretaria de Educação (Equipe
Interdisciplinar) + Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da Universidade de São Paulo
Santos Projeto Integrar Arte e Vida - Parceiros: ANE – Associação Nacional de Esportes + Secretaria de Educação
+ UNIMED + NET + Translitoral + SESC - Patrocínio: COMGÁS – Companhia de Gás de São Paulo +
Carrefour + Lorenzetti
Santos Projeto Bom de Bola, Bom na Escola - ANE - Associação Nacional de Esportes + Secretaria de Educação
Santos Campanha da Boa Visão - Lar das Moças Cegas + Secretaria de Educação
Santos Projeto De Olho no Óleo - MARIM Resíduos + Secretaria de Educação
Santos Projeto Ecoviver - Concessionária ECOVIAS + Secretaria de Educação
Santos Educação Patrimonial - CONDEPASA + CONDEPHAAT + IPHAN + Secretaria de Educação
Santos Projeto Entre na Roda - Fundação Volkswagen + CENPEC (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação
Cultura e Ação Comunitária) + Secretaria de Educação
Santos Projeto Esporte Para Todos - Viação Piracicabana + SEMES + Secretaria de Educação
Santos Projeto Horta - Secretaria de Educação + Jardim Botânico + Casa da Agricultura
Santos Projeto Jornal Escola - Secretaria de Educação + Jornal A Tribuna

Santos Programa de Leitura da Petrobrás - Petróleo Brasileiro S.A. + ONG Leia Brasil + Secretaria de Educação
Santos Olimpíada de Matemática - Diretoria de Ensino + Escolas particulares (Carmo, UNIVERSITAS e São José)
+ Secretaria de Educação
São Carlos Escola de Vida e Trabalho - SENAI + Prefeitura
São Carlos Programa de Inclusão Digital - prefeitura (diferentes secretarias) + fundações + entidades + empresas
São Carlos A Gestão Democrática de Escola Pública e o Conselho da Escola - Secretaria de Educação e Cultura +
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)
São Carlos São Carlos de Todos Nós: educação para preservação de bens materiais e imateriais do Município -
Secretaria de Educação e Cultura + Fundação Pró-Memória
São Paulo Ruas de lazer - Secretaria de Bem Estar Social + SESC
São Paulo Programa Ação Família / viver em comunidade - 12 Secretarias + 47 organizações não governamentais
São Paulo Selo Diversidade Cidade de São Paulo - Secretaria do Trabalho + Comissão Interdepartamental para a
Monitoração e Gestão de Gênero e Raça + organizações empresariais + sindicatos + terceiro setor
São Paulo Pedagogia Hospitalar em São Paulo - Hospital do Câncer A. C. Camargo + Secretaria de Educação
São Paulo Semana da Criança e do Adolescente: por uma Cidade Educadora - 10 instituições e organizações de caráter
público (escolas, universidades, serviços de promoção de saúde) + nãogovernamentais + Universidade de
São Paulo +Instituto Ayrton Senna + prefeitura
São Paulo Oldnet - Associação Cidade Escola Aprendiz + prefeitura
São Paulo Escola / Restaurante - Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social + Secretaria de Trabalho + ONGs
São Paulo Oficinas do Prosedis - Prosedis (OSCIP) + empresários + profissionais + Secretaria da Educação
Sorocaba Projeto Novo Tempo / Reinserção de egressos e familiares do sistema prisional - prefeitura + Fundação
Professor Manuel Pedro Pimentel (FUNAP)
Sorocaba Universidade do Trabalhador Empreendedor / Capacitação Cidadã - Secretaria da Educação + SENAI +
SESI + SEST-SENAT + Universidades + sindicatos + empresas privadas+ Fundo Social de Solidariedade +
Oficina de Emprego + Associações de Artesania
Fonte: Quadro elaborado pela autora a partir de dados disponíveis em
<http://w10.bcn.es/APPS/edubidce/pubExperienciesAc.do?accio=avansada&pubididi=2> Acesso em 10
abr. 2013.; e <http://www.portal.santos.sp.gov.br/seduc/page.php?> Acesso em 01 nov. 2013.

Observa-se que, o percentual de participação dessas entidades é de 29,12% do


total de ações, e por isso não podem ser consideradas numericamente expressivas. O
município de São Bernardo do Campo não consta nesse quadro, devido a prefeitura
estar reformulando suas ações como Cidade Educadora e, portanto não havia
informações disponíveis no período estudado. Dentro das informações concedidas pelos
municípios, algumas especificam quais são os parceiros e outras apenas indicam de
forma generalizada, diante disso foi possível identificar nessas ações o trabalho
244

conjunto de 7 diferentes órgãos municipais com 14 empresas ou indústrias, 11


instituições como ONGs, associações, fundações e entidades sociais, 2 órgãos federais e
5 estaduais.
Dentre os municípios estudados, o que mais se destaca em relação à participação
de instituições é Santos, ao representar 43,33% das parcerias identificadas, no total
trabalha com 29 entidades, além de em dez ações estabelecer vínculo com mais de uma
instituição, num mesmo projeto ou programa. Outro município que também tem um
número expressivo em relação às outras Cidades Educadoras estudadas é São Paulo,
com oito ações (26,66%) que estabelecem vínculo de diversas secretarias junto à
aproximadamente sessenta instituições. Duas ações se destacam nesse município devido
a magnitude da quantidade de órgãos da prefeitura e instituições envolvidas são:
Programa Ação Família / viver em comunidade - 12 Secretarias + 47 organizações não
governamentais; e Semana da Criança e do Adolescente: por uma Cidade Educadora -
10 instituições e organizações de caráter público (escolas, universidades, serviços de
promoção de saúde) + instituições não governamentais + Universidade de São Paulo +
Instituto Ayrton Senna + Prefeitura Municipal.
Em relação aos outros três municípios analisados, observa-se que ainda há muito
que ser desenvolvido no aspecto das parcerias com instituições, posto que Santo André
apresenta apenas 3 ações, São Carlos 4 ações e Sorocaba 2 ações nesse quesito. No
geral, a análise revelou que a proposta do Movimento referente às parcerias de setores
do governo local com instituições da sociedade civil nos municípios paulistas
associados no ano de 2012 é atendida com considerável variação proporcional entre os
governos e também, em relação à quantidade e tipo de entidades.
É possível perceber assim, que na implantação de um projeto educativo de
cidade, tanto as instituições sem fins lucrativos, quanto as com fins lucrativos têm
condições de participar. Contudo, considero que é preciso atentar, no caso das
instituições que não são voltadas à aspectos econômicos, para o fato de que há tendência
de algumas se sobressaírem e terem mais influências sobre as decisões acerca da
elaboração de políticas. Nesse caso, é preciso criar formas de dar apoio às associações
ainda não estruturadas, inclusive com trocas de experiências entre esses tipos de
coletivos. E em relação às instituições privadas, com fins lucrativos como expôs
Oliveres (2008), o governo e habitantes, devem estar atentos para que realmente haja
um engajamento dentro das proposições pedagógicas e não usar um plano ou projeto
para angariar mais dinheiro, ou fazer propaganda.
245

Considerações Finais
As Cidades Educadoras constituem um movimento internacional educativo,
político, social e cultural, que propõe o desenvolvimento dos potenciais educacionais no
espaço urbano, com o intuito de alcançar um modelo de educação ao longo da vida.
Seus princípios básicos estão calcados na democracia, por meio de ações as quais
representem alternativas que abarquem as especificidades próprias de cada sociedade. O
Movimento sugere, que a partir de uma política pública de caráter pedagógico,
embasada em distintas modalidades educacionais - formais, informais e não-formais -
diferentes questões sejam trabalhadas em iniciativas, nas quais a sociedade participe da
elaboração e execução e que sejam voltadas tanto para os habitantes em geral, quanto
para grupos populacionais específicos.
Diante das propostas do Movimento, entendo que em algumas sociedades a
implantação das premissas será mais demorada e complicada, pois em muitas culturas,
apesar do governo ser eleito democraticamente, não há o costume dos habitantes e
instituições tomarem parte na definição da pauta de políticas públicas. Sob essa
perspectiva, os governos locais devem ir além dos serviços públicos básicos, a partir de
estudos e pesquisas, ampliar as ações educativas por meio de planos e medidas, os quais
atentem às demandas peculiares dos habitantes.
Como o governo local está no cerne do Movimento entendo que ainda cabe
considerar a complexidade e porte de suas responsabilidades e o fato da troca periódica
de governantes, os quais dificultam o alcance dos objetivos. Quanto a isso, considero
que o estabelecimento do Movimento como política de estado e não de governo é a base
da continuidade de sua existência por mais de duas décadas.
Em relação à participação de habitantes e instituições na elaboração e execução
de políticas públicas, concordo com as diretrizes das Cidades Educadoras, nas quais os
contextos próprios de cada localidade fazem com que não haja possibilidade de modelos
universais. Pois, a meu ver na implantação de ações educativas de ampla abrangência,
como as propostas pelo Movimento, a escala de representatividade e participação está
vinculada às peculiaridades de cada sociedade. No que diz respeito às parcerias de
instituições no desenvolvimento das ações educativas, considero que deve haver o
cuidado para as sem fins lucrativos, principalmente as de cunho educativo e social,
tenham prioridade em relação às com fins lucrativos, quanto a essas últimas entendo,
que é preciso atenção para que não utilizem suas contribuições para as ações, sejam elas
246

técnicas ou financeiras, apenas como uma estratégia de marketing e/ou de imposição de


uma visão mercantilista na administração pública. Por fim, compreendo que a
diversidade de instituições no espaço circunscrito do meio urbano, representa um grande
desafio quanto ao desenvolvimento de projetos conjuntos.
Ao ponderar acerca dos quatro principais elementos que compõem o Movimento
Cidades Educadoras - educação ao longo da vida; educação formal, não-formal e
informal; iniciativas do governo local; participação de habitantes e instituições –
observa-se que estes estão imbricados, ao exercerem influência uns sobre os outros
concomitantemente.
Na análise das ações dos municípios paulistas associados ao Movimento em
2012, frente à percentagem de parcerias com instituições (29,12%), foi possível
constatar que esse quesito ainda é pouco desenvolvido. Se considerar, que o
atendimento às premissas das Cidades Educadoras pelos associados ao Movimento está
atrelado à suas características históricas, educacionais, econômicas, sociais e culturais,
pode-se ponderar que os municípios analisados ainda têm muito a trabalhar nessas
questões, para alcançar o ideal de um projeto educativo de cidade. Todavia, apesar da
constatação da pouca ênfase aos principais princípios do Movimento, entendemos que,
de modo geral, as ações desenvolvidas atendem às premissas.
Entendo assim, que as políticas públicas voltadas à mudança de comportamento
tanto de governantes, quanto de habitantes e instituições, devem ser planejadas a partir
do entendimento de que esse é um processo de longo prazo. Devido a isso, considero
que a ideia de transformar os espaços e relações sociais, por meio de iniciativas de
cunho educativo, se mostra uma alternativa pertinente, ao possibilitar resultados os
quais influam permanentemente no modo de vida das gerações futuras.

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VILLAR, Maria Belén Caballo. A Cidade Educadora - Nova Perspectiva de


Organização e Intervenção Municipal. 2ed. Lisboa: Instituto Piaget, 2007. (Coleção
O Homem e a Cidade)
248

Relato de Experiência

Curso de formação presencial de conselheiros de escola na política educacional do


município de São José dos Campos
Cileda Perrella
Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
Laboratório de Estudos em Políticas Públicas/LEPP/IPPRI/UNESP-SP
Município de São José dos Campos/Estado de São Paulo-Brasil
UNIFESP: Cileda.perrella@gmail.com

Resumo: O texto tem por objetivo relatar a experiência do curso de formação de


conselheiros de escola na modalidade presencial. Tendo em vista que, não basta a
criação dos espaços democráticos de participação para que a gestão democrática
preconizada no campo legal se efetive, o referido curso vem sendo desenvolvido como
parte da política educacional do município de São José dos Campos/SP. A ação, voltada
à democratização da gestão escolar, articula-se com os demais processos formativos do
município desenvolvidos a partir da parceria entre o Laboratório de Estudos de políticas
Públicas (LEPP) da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP) e a Secretaria
Municipal de Educação. Recorrendo aos preceitos da pesquisa qualitativa, a partir de
observações e registros, evidenciamos que o curso vem se revelando como espaço de
formação, informação, revelação de inquietações e apresentação de demandas ao poder
público por parte dos conselheiros, constituindo-se para além de ser um espaço de
formação, também de exercício do diálogo.
Palavras Chave: conselheiros de escola, política educacional, conselho de escola,
formação

Introdução
Após as décadas de 1970 e 1980, marcadas pela ditadura militar e também pela
atuação dos movimentos sociais e populares, entre eles o da educação, tivemos
conquistas legais voltadas à democratização da gestão escolar, como a criação de
conselhos escolares com caráter deliberativo. No entanto, a inscrição legal não bastou
para que a ocupação desse espaço democrático garantisse o direito constitucional da
participação ativa da comunidade nas tomadas de decisões da escola.
Alguns municípios vêm desenvolvendo processos formativos de conselheiros de
249

escola, a exemplo daquele desenhado na política de participação democrática do


município de São José dos Campos no Estado de São Paulo, a partir de 2014, com
ênfase na proposta de formação na modalidade presencial. Essa iniciativa oferece
elementos para serem analisados em diferentes perspectivas, por exemplo, a partir da
forma como se apresenta aos conselheiros de escola. A partir de estudo da proposta de
ação do referido município, à luz da teoria freireana que referencia a participação
política como aquela necessária à prática democrática, este artigo tem por objetivo,
destacar algumas questões dessa iniciativa que fomenta a participação da comunidade
na escola. Para tanto, trazemos algumas considerações sobre conquistas legais,
seguimos apresentando o incentivo à participação da comunidade na escola a partir da
proposta de formação de conselheiros de escola na modalidade presencial como ação da
política educacional do município de São José dos Campos do Estado de São Paulo. Por
fim, tecemos algumas considerações sobre a especificidade desse tipo de formação.

1 A Gestão Democrática no campo legal


Com o processo de democratização do país, da gestão do ensino e da escola,
avanços legais são firmados na Constituição Federal de 1988. Pela primeira vez, surge
num texto legal o termo Gestão Democratica. Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1996, a Gestão Democrática é tratada como princípio no item VIII do
artigo 3º. Também está presente no Plano Nacional de Educação (PNE) de 2001 e no
recém-aprovado PNE de junho de 2014. A persistência de tal princípio no campo legal
representa “avanço”, além de reforçar sua importância e urgência, demonstrando
também que muito ainda tem por se fazer.
Sobre esses avanços, Camargo e Adrião (2002, p. 70) afirmam que “a simples
presença no texto legal de quaisquer medidas democratizadoras não implica a sua
execução. Eis parte da ambiguidade que acompanha as conquistas no plano da lei: as
contradições entre o proposto e o implementado”. Nesse contexto, a democratização da
gestão da escola ainda não se firmou como uma realidade prática. A ocupação
qualificada de espaços como o dos conselhos sugere o investimento em políticas
educacionais preocupadas com a formação para e na participação.
Na luta por direitos, acompanhando as transformações sociais e políticas, a
institucionalização dos espaços de participação surge como novo desafio na perspectiva
da garantia de direitos e do estabelecimento de relações pautadas pelo diálogo e por
práticas democráticas. Como afirma Ângela Maria Martins,
250

[...] a implementação do conjunto legal e normativo que regulamenta a gestão e a


organização escolar pode se transformar num ritual de cumprimento de normas
burocráticas, resultando numa tensão que dificulta à escola reconstruir sua dinâmica
de funcionamento configurada por uma cultura singular [...] Ao elaborar as diretrizes
políticas para a educação, o executivo estabelece metas cujo sucesso dependerá do
grau de adesão formal, de compreensão ou de convencimento dos atores alocados no
interior dos órgãos responsáveis pela implementação dos programas de governo
(Martins, 2011, pp. 25-26, grifo nosso).

Nesse cenário, a elaboração de diretrizes políticas para a educação, bem como


as propostas delas decorrentes, não podem se furtar de ações permeadas pelo diálogo,
pela participação popular, pela prática democrática.

1 O incentivo à participação através do Curso Presencial de Formação de


Conselheiros de Escola
Após vinte anos de gestão municipal identificada com o conservadorismo,
elitismo da cidade, centralismo e hierarquismo no poder público, em 2014, no segundo
ano da gestão do Partido dos Trabalhadores à frente do executivo do Município de São
José dos Campos/SP1, no campo da educação, a partir do convênio firmado entre a
Secretaria Municipal de Educação e o Laboratório de Estudos em Políticas Públicas
[LEPP] da Universidade Estadual Paulista [UNESP], inicia entre outras ações de
formação o “Curso de Formação Presencial de Conselheiros de Escola – CFPCE”.
Trata-se de uma formação na perspectiva da democratização da gestão escolar
que objetiva o fortalecimento da atuação dos conselheiros de escola, principalmente dos
familiares dos estudantes, segmento historicamente distante das tomadas de decisões da
escola.
Mesmo com a possibilidade de desenvolvimento do curso proposto pelo PNFCE
na modalidade EaD2, a proposta da formação presencial surgiu como importante
possibilidade de espaço de discussão diretamente com os envolvidos da escola. Nesse
sentido, foi importante considerar a construção de uma proposta a partir da realidade
local, construída com os interessados e não para eles. Ouvir suas demandas, suas
1
O referido município está localizado a 100 km da capital paulista. Tem uma população de 632 mil
habitantes e é considerado um importante polo tecnológico do país. Seu perfil econômico e social lhe
confere status de um município historicamente bem sucedido, na voz de muitos de seus munícipes.
Politicamente é evidenciado por integrantes da SME como tendo perfil conservador, elitista, com ênfase
na individualidade e competitividade. Nesse cenário, discutir o “Projeto Educação e Democracia”,
pautado na democratização da gestão e da participação popular, firmado entre a parceria SME/UNESP
torna-se um grande desafio para todos: poder público, sociedade civil e universidade parceira.
2
Amplo material sobre a proposta de formação de conselheiros do Programa Nacional de Fortalecimento
dos Conselhos Escolares, na modalidade EaD está disponível no endereço: www.mec.gov.br
251

expectativas e interesses nesse processo de construção permite envolvê-los mais


diretamente na própria construção da política não só da escola, mas também da cidade.
Em tal perspectiva, a questão da presença física é indispensável (HARDT; NEGRI,
2014).
Ouvir e observar as manifestações de mães, pais, demais familiares responsáveis
pelos estudantes, docentes, gestores, funcionários das escolas em encontros em que
diferentes pontos de vistas sobre uma mesma questão podem ser apresentados,
debatidos, questionados, sugeridos, refutados, traz possibilidades de um processo
formativo dificilmente alcançado pela modalidade EaD. A mediação desse processo na
perspectiva da participação popular, realizada pelos pesquisadores da universidade,
também se constitui numa possibilidade de diálogo interessante, uma vez a formação
oferecida pelo PNFCE na modalidade EaD, tem a perspectiva de ser fomentada
geralmente pelo setor de supervisão de ensino da Secretaria Municipal de Educação
[SME], setor amplamente conhecido e reconhecido pela rede como responsável pela
fiscalização e garantia da legalidade das ações na escola, ocupando cargos que
representam o topo da hierarquia da SME, portanto representando a verticalização do
sistema e, possivelmente, verticalização nos encaminhamentos das propostas e ações.
Nesse sentido, a proposta do curso presencial como parte da política educacional, a
partir da SME, e não especificamente de um setor dela se apresenta como um
diferencial da proposta. As demandas que surgem desse exercício de elaboração e
organização da proposta, da estrutura para sua realização, do deslocamento dos
participantes envolve uma logística que mostra necessidades, possibilidades, obstáculos
para a participação de todos, por vezes camufladas quando essa proposta é apresentada
apenas na modalidade EaD. Considerar que a participação de todos na escola deve se
dar presencialmente, seja na forma direta ou representativa, o curso se apresenta como
desafio à política educacional, à escola e à comunidade.

1.1 A organização do Curso de Formação Presencial de Conselheiros de Escola


(CFPCE)
Com a preocupação em atender e facilitar a participação dos conselheiros
residentes nos distantes pontos da cidade, o CFPCE está organizado para ser realizado
em seis polos regionais, atendendo em média 30 a 40 participantes por turma, podendo
acontecer mais de uma turma por polo. Após ampla consulta aos 1.800 conselheiros
252

eleitos para a gestão 2014, ocorrida em abril, o sábado foi o dia escolhido pelos
conselheiros para a participação no curso.
A SME orientou para que cada escola de educação infantil e do ensino
fundamental tivesse para a primeira turma do curso de cada polo pelo menos um
representante de cada segmento, a saber: um da equipe gestora, um docente, um
funcionário do quadro de apoio, um representante familiar3.
Foi criado um e-mail específico para a realização das inscrições e um estagiário
da SME foi designado para fazer esse acompanhamento. Outra preocupação quando da
elaboração da proposta foi consultar os interessados se estariam ou não com crianças,
filhos. Entende-se que as crianças não podem constituir entrave para a participação por
não ter com quem ficar, enquanto o responsável estivesse em curso. Nesse sentido, após
ampla conversa com integrantes da SME, foi providenciado o atendimento lúdico e
pedagógico às crianças presentes em cada polo, a partir de educadoras estagiárias que
deveriam atuar com as crianças enquanto os responsáveis fizessem o curso.
Outra preocupação foi com a alimentação a ser oferecida aos participantes.
Optou-se por, proporcionar um coffe break oferecido pela SME para a aula inaugural,
com a indicação de construção coletiva dos participantes para os demais dias do curso.
Para as crianças, alimentação garantida pela SME para todos os dias que estivessem
presentes.
A SME realizou reunião prévia com os gestores das escolas polos para definição
dos encaminhamentos necessários para a realização da ação.
Quanto às pessoas formadoras que deveriam atuar em cada polo, a prioridade foi
compor um quadro de pessoas que tinham como destaque de afinidades, a defesa pela
escola pública e pela gestão democrática da escola. Trata-se de pessoas atuantes direta
ou indiretamente na defesa da escola pública, com experiência em movimentos sociais,
com interesse na pesquisa acadêmica da área educacional, maioria com experiência em
propostas formativas dessa natureza, não escolarizadas, em que o diálogo, a escuta, o
humano são fundamentais. Mas como iniciar uma proposta dessa natureza? De onde
partir? Quais os conteúdos a serem priorizados?

3
Para os alunos participantes do CE, a formação é oferecida junto com a formação dos Grêmios
Estudantis.
253

1.2 A estruturação do CFPCE


O CFPCE surge como uma das ações da proposta do projeto Educação e
Democracia na perspectiva da participação popular. Trata-se de um curso pensado na
perspectiva do empoderamento dos conselheiros de escola com vistas à democratização
da gestão escolar. Nesse sentido, traz semelhanças com o PNFCE, porém oferecido na
modalidade presencial. Esta é uma diferença importante, uma vez que o curso pode ser
pensado e repensado com os seus participantes diretamente envolvidos.
A história do país e da cidade, calcada em mandos e desmandos, clientelismo,
patrimonialismo, autoritarismo, centralismo, a observação cotidiana da dinâmica das
escolas, por parte da equipe de formadores e de integrantes do quadro da SME, a
vivência de parte desses formadores em experiências da mesma natureza em um
município vizinho, as manifestações das crianças e adolescentes na proposta de
formação com os Grêmios Estudantis, com os docentes das escolas e com a equipe de
gestores, formações em andamento, foram relevantes para se organizar o que chamamos
de Módulo I do CFPCE.
Essas situações trouxeram à tona questões importantes para serem consideradas
no início dessa proposta formativa. Discutir, debater, temas como direitos, democracia,
participação, representação e atribuições dos conselheiros de escola, questões de gênero
e de etnia foram destacadas como relevantes, pela equipe de pesquisadores e da SME,
para a constituição do programa do que se chamou de Módulo I. A partir daí, fazendo
uso da metodologia dialógica, fica previsto o surgimento de outros temas de interesse
desses participantes, a serem organizados e abordados na continuidade do curso
[Módulo II].
Tendo uma mesma dinâmica organizada para cada um dos 6 polos, o relato
resumido de um desses encontros, realizado por uma formadora A, que discutiu a
questão dos direitos, é ilustrativo da abordagem adotada, uma vez que traz
manifestações que foram recorrentes nos demais polos.

O encontro: O primeiro momento do encontro se deu a partir das apresentações dos


participantes e combinados para o grupo. Esse encontro contou com a participação
de 30 conselheiros, representantes de seis escolas municipais. Havia representantes
dos vários segmentos, sendo 2 diretoras, professores/as, secretários/as de escola e
mães e pais dos estudantes. A disposição dos cursistas na sala logo de início deu
indícios para algumas discussões que ocorreram ao longo da oficina. Em uma das
laterais do “U” estavam apenas mães, enquanto na outra lateral, professores/as,
secretária e diretora de uma das escolas municipais. A oficina foi permeada por
alguns debates acerca da participação das mães, pais e familiares nas escolas.
254

Durante a apresentação dos cursistas notei risadas, sobretudo ao abordarem


como foram “escolhidos” / eleitos para serem conselheiros. Ao final da oficina
abordei a participação como um processo de construção. No momento dos
combinados duas dúvidas foram levantadas, sendo elas: qual a data dos próximos
encontros e se os cursistas deverão contribuir com o café servido durante as oficinas.
Foi comentado que no próximo semestre as escolas terão sábados letivos e o ideal
seria que o curso não ocorresse no mesmo dia do sábado letivo. Cada escola que
escolherá quais sábados serão letivos. A representante da escola A já informou os
sábados letivos. Os cursistas solicitaram também mais informações sobre o curso,
como as ementas das oficinas e as apresentações em PowerPoint e textos para
estudar até o próximo encontro.
Os conselheiros estavam bastante dispostos e interessados na realização das
atividades propostas. Todas as atividades foram realizadas, sendo que houve pouco
tempo para o quarto momento, em especial para a montagem dos dois painéis com
os cursistas (direitos conquistados e direitos ainda não alcançados) a serem
retomados no próximo encontro.
Após a apresentação das telas do livro “Zoom” a leitura do excerto do
“Todo ponto de vista é a vista de um ponto” do livro de Leonardo Boff - “A águia e
a galinha” iniciamos uma conversa sobre “as diferentes possibilidades de se ver e
interpretar uma mesma coisa e que isso está relacionado com nossas experiências
pessoais e coletivas, com a educação que recebemos, nossa história”. A primeira
rodada de falas foi mais tranquila, sendo que todos demonstraram apreço pela
participação e a necessidade de se respeitar os diferentes pontos de vista. Após
algumas falas, uma das mães trouxe a dificuldade de acessar a escola, por conta da
desigualdade de valorização dos diferentes saberes, e que muitas vezes a valorização
do conhecimento pedagógico, da experiência profissional e da direção escolar acaba
dificultando a participação das mães e familiares. Outra mãe aproveitando a deixa
reafirma essa análise e comenta do medo que muitas vezes possuem de falar na
escola o que pensam. As diretoras presentes saíram na defensiva, reafirmando os
princípios da participação e que a escola é aberta. No entanto, nas entrelinhas foi
possível perceber algumas questões que precisarão ser novamente retomadas,
tais como: valorização do conhecimento pedagógico e da legislação e
desvalorização dos saberes das comunidades, a exigência de que para se
apresentar uma crítica é necessário apresentar a solução e que a escola é
“aberta”, mas os pais que não querem entrar, ficam no portão para criticar,
sem saber o que está acontecendo...
A partir dessa tensão, problematizei o porquê dessa diferença na visão das
mães e da direção escolar, pedi que levantassem os fatores que explicam esse
conflito/os obstáculos para esse diálogo que todos estavam defendendo. Foram
levantados alguns fatores como a dificuldade de se colocar no lugar do outro; o fato
de se querer uma solução imediata para os problemas; a questão cultural, onde está
presente um autoritarismo no interior das famílias; o fato dos pais e mães esperarem
até o limite para trazerem os problemas; o medo e insegurança para falar; e a
dinâmica de se procurar culpados enquanto ninguém assume a sua própria
responsabilidade. Novamente aqui apareceu certa tensão entre o que é de
“responsabilidade” das famílias e o que é da escola. Vários desses temas foram
problematizados, mas ficaram latentes durante toda a oficina.
Após o intervalo retomamos com a discussão sobre direitos. Foram
perguntados aos cursistas quais são nossos direitos, se todos temos os mesmos
direitos, quando os direitos sugiram e qual a diferença entre direito e privilégio. Vale
relatar que sobre esse último ponto as mães logo de imediato responderam que não
temos os mesmos direitos e os professores e direção escolar afirmaram que temos os
mesmos direitos estabelecidos em lei, mas nem todos assegurados a todos.
Apresentei de forma resumida a história dos direitos civis, políticos, sociais
e humanos. Eles se mostraram bem interessados, sobretudo algumas mães que
registravam o que eu falava. Após a apresentação do panorama de forma mais geral,
passamos a discutir esse processo de luta e conquista dos direitos aqui no Brasil.
Interpretamos juntos a pintura sobre a escravidão no país e a partir dessa
interpretação conversamos sobre a situação da desigualdade brasileira e seu impacto
no acesso aos direitos. Ao abordar o modelo liberal, logo percebi certa resistência
255

de parte do grupo, sobretudo professores, funcionários e gestores. Esse é um ponto


que precisaria ser retomado.
Em seguida, passamos a montar os dois painéis sobre os direitos
educacionais conquistados e aqueles que ainda não foram alcançados. Iniciamos essa
atividade, mas foi bem difícil manter o foco na pergunta realizada. Primeiro tentei
montar o primeiro painel e o único direito mencionado foi o da educação
inclusiva. Como eles só levantavam direitos ainda não efetivados, passamos a
montar o segundo painel. Dois aspectos apareceram com bastante ênfase: a falta de
vagas em escolas próximas a da residência o que exige o transporte escolar, e o
crescimento da população em algumas áreas que não possuem escolas
municipais. Discutiram que a legislação abre brecha para que quando não houver
vagas, as crianças sejam matriculadas em escolas não tão próximas a da residência.
Comentaram que ao mesmo tempo em que faltam vagas e a prefeitura está
implementando a educação integral e que para eles era mais importante que as
crianças estudassem próximo da residência. Foi apontado que essa política de
educação integral era eleitoreira. Tentei problematizar, em especial a questão da
educação integral, a inter-relação dos direitos (ex: educação, moradia, cultura) e as
diferentes instâncias de participação na política educacional (escola, município,
estado, discussões nacionais, como o Plano Nacional de Educação) e a importância
do acesso e transparência da informação. Também apareceu a culpabilização das
famílias por terem muitos filhos. Não deu tempo para discutir essa questão.
Ao final conversamos sobre os desafios na garantia dos direitos, a
importância da participação e a relação disso com a atuação nas escolas. Foi possível
realizar a dinâmica com as bexigas, o que foi bom para dar uma descontraída no
grupo. Finalizamos com uma rápida avaliação, sendo listados os seguintes termos:
superação das expectativas, troca, valiosa equipe, desafio, leveza, acesso a
informação, aprendizado e prazer.
(SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, 2014 - grifos nossos)

Os destaques grifados indicam manifestações reveladas que se considera ter


ocorrido dada a modalidade presencial do curso, nele a possibilidade de questionar a
política educacional do município, a exemplo das inquietações manifestadas em todos
os polos de desenvolvimento do curso sobre a “escola de tempo integral”4 e “a escola
interativa”5. Para além de ser um espaço de formação, o curso constitui-se em um
espaço de reivindicação, de manifestação de demandas, de insatisfações com os
encaminhamentos políticos adotados, mas também de diálogo aberto, de manifestação e
não ocultação de conflitos, de solicitações de mais materiais para estudo, de leitura de
propostas pedagógicas, de manifestação de afeto, etc questões que revelam a
emergência de outros temas a serem abordados na sequência dessa proposta formativa.
A situação evidenciada revela, em grande medida, a importância da realização do curso
na modalidade presencial, por proporcionar o debate, o exercício do diálogo que
envolve questões locais e globais, particulares e coletivas, gerais e específicas
colocando desafios para todos, poder público e sociedade civil.

4
A Escola de Tempo Integral vem sendo debatida e gradativamente ampliada como uma ação de governo
que visa a educação pensada também com base na territorialidade a partir da intersetorialidade.
5
A Escola Interativa é uma proposta da política educacional de investir no uso da tecnologia em todas as
escolas, fazendo parte das ações a entrega de tablets para todos os alunos e a lousa interativa.
256

2 Considerações finais
Entende-se que não basta a criação de espaços democráticos de participação
política, como os CE, para que a democratização da gestão da escola se efetive e todos
se percebam fortalecidos nesse processo. Fortalecer os conselhos de escola e a própria
escola exige considerar que, além da relevância da articulação da proposta formativa
com diferentes fatores, como a preocupação com a forma de ocupação de cargos dos
dirigentes de escola, a organização didática, os diferentes mecanismos coletivos de
participação na escola que envolva alunos, pais, professores, pessoal técnico
operacional e de gestão da escola (Paro, 2011), também se faz necessário um processo
formativo construído com e para a comunidade escolar e local que leve em conta suas
demandas, suas especificidades da unidade e locais. Essa articulação exige a
participação presencial.
A histórica distância dessas comunidades dos processos participativos e
formativos que visam partilha de poder na escola requer sua presença direta de todos
nessa construção. Nesse sentido, defende-se que a preocupação prioritária deve ser com
o fortalecimento daqueles que historicamente estiveram e continuam distante dos
processos decisórios, particularmente familiares, alunos e comunidade local, devendo
ter suas demandas ouvidas pelos elaboradores de políticas educacionais.
Nesse cenário, torna-se relevante a forma como as propostas formativas são
elaboradas e organizadas. Entende-se que a participação direta, presencial em propostas
formativas é altamente relevante para a explicitação de conflitos e construção de
consensos. Destaca-se a importância de se ter como preocupação da política educacional
os elementos considerados facilitadores ou dificultadores à participação dos
conselheiros, explicitados por eles próprios, tanto nesses processos formativos quanto
na sua atuação direta na proposta de democratização da gestão da escola.
Envolver a comunidade escolar e local em discussões que são de seus interesses
diretos, na elaboração do Projeto Político Pedagógico da escola, exige do poder público
posicionamento e enfrentamento às questões conjunturais locais, transparência nos
encaminhamentos adotados, revisão à elaboração de políticas centralizadas que
desconsideram as especificidades dos sistemas e das escolas.
Ao fortalecimento do conselho de escola, faz-se necessário ressaltar seu
importante papel político nas tomadas de decisões da escola, no processo de
democratização de sua gestão. Rechaça-se o papel burocratizado e mecanizado do
257

conselho de escola, minimizado a mero espaço de encaminhamentos de cunho


gerencialistas para a garantia de recebimento de recursos financeiros.
Em suma: O fortalecimento do conselho de escola exige ação presencial,
sensível, dialogada diretamente com seus participantes.

Referências Bibliográficas

BRASIL. Ministério da Educação. Programa de fortalecimento dos conselhos


escolares. Brasília, DF, 2012. Disponível em: <www.mec.gov.br/seb/conselhoescolar>.
Acesso: 01/02/2013.

CAMARGO, R. D. de & ADRIÃO, T.. A gestão democrática na Constituição Federal de


1988. In: T. Adrião e R. P. Oliveira (Org.). Gestão, Financiamento e Direito à
Educação: Análise da LDB e da Constituição Federal. (2a. ed.). São Paulo: Xamã, p.
69-78, 2002.

FREIRE, Paulo. Política e Educação (5ed). São Paulo: Cortez, 2001.

HARDT, Michael & NEGRI, Antonio. Declaração: Isto não é um manifesto. São
Paulo: N-1 edições. 2014

MARTINS, Ângela Maria (Org.). Estado da Arte: gestão, autonomia escolar e órgãos
colegiados (2000-2008). Brasília, DF: Anpae, 2011.

PARO, V. H. Crítica à estrutura da escola. São Paulo: Xamã, 2011.

SÃO JOSÉ DOS CAMPOS. Relatórios do Curso de Formação de Conselheiros de


Escola. São José dos Campos, 2014.

TIRAMONTI, G. Los imperativos de las políticas educativas de los 90. Revista da


Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, v. 23 n. 1, p. 49-69,
1997.

Sites:

www.mec.gov.br

www.prefeitura.sjc.sp.gov.br
258

Comunicação

Conselhos escolares e recursos financeiros: algumas reflexões do papel dos


dirigentes escolares frente ao sistema de prestação de conta dos recursos
financeiros no município de Cariacica-ES

Cisenando Antonio dos Santos


Prefeitura Municipal de Cariacica (ES)

Eduardo Augusto Moscon Oliveira


Universidade Federal do Espírito Santo

Wilson Camerino dos Santos Junior-Ifes


Instituto Federal do Espírito Santo

Resumo: O trabalho discute as modalidades do financiamento da educação no Brasil e


o papel do gestor escolar na distribuição centralizada/descentralizada destes recursos,
para manutenção do direito a educação. A metodologia utilizada foi estudo de caso,
elencando uma instituição, por meio dos documentos do caixa escolar. Em nossos
resultados observamos uma situação binária na escola: centralização e descentralização.
As unidades de ensino recebem recursos por meio da unidade executora, mas
permanece a dificuldade da participação dos conselheiros fiscais. A descentralização
significou democratização dos recursos financeiros, mas em contrapartida, permanece a
centralização das decisões na figura do gestor. Dificultando a gestão democrática.
Palavras-chave: Financiamento. Conselho escolar. Caixa escolar.

1 INTRODUÇÃO

A pesquisa tem por objetivo propor ações que dinamizem a participação da comunidade
escolar no âmbito dos recursos financeiros. Estudaremos a luz dos recursos financeiros,
a gestão democrática, tomando em pesquisa os recursos destinados a Escola Municipal
de Ensino Fundamental Martim Lutero. No contexto deste trabalho, a reflexão será
conduzida em três aspectos específicos, a saber, o financiamento, a descentralização dos
recursos recebidos pela escola e ações democráticas que colaboram com os mecanismos
de prestação de conta.
259

2 FINACIAMENTO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

No século XVI o processo da educação no Brasil surge em função da chegada em 1549


do primeiro governador geral do Brasil e os cincos religiosos denominados Companhia
de Jesus. Vieram com a finalidade de fundar o primeiro colégio no Brasil, na cidade de
São Salvador. Esta ação é uma estratégia da Coroa Portuguesa, para manter seu projeto
de colonização. A educação brasileira era gratuita, sendo mantida a princípio pelos
jesuítas que posteriormente seriam ressarcidos pela Coroa Portuguesa; esse foi o acordo
entre a Coroa e os jesuítas, apesar de serem instáveis os recursos régios, mesmo assim
os jesuítas asseguraram o ensino com sua autogestão por meio do trabalho da mão - de
obra dos indígenas ampliavam os próprios empreendimentos viabilizando por
intermédio dos lucros adquiridos.
Logo em 1772, foi instituída pela colônia a cobrança do “subsídio literário”, com o
objetivo de substituir o modelo jesuítico e garantir um financiamento mais estável, por
meio das câmaras municipais eram arrecadados impostos sobre as atividades
econômicas ligadas aos alambiques de cachaça, fábricas de vinho e açougues para
custear as escolas.Mesmo com implantação do novo sistema, o ensino continuava
precário, as aulas régias consolidam uma nova tendência brasileira perdurando até 1810.
Esse cenário irá mudar com a chegada da Família Real, o Estado vai expressar certo
compromisso com a educação pública, é implantado o ensino superior financiado pela
coroa portuguesa, por meio do recolhimento do “quinto”.
Em 1823 é discutida então a necessidade de se criar um novo modelo para financiar o
sistema educacional, tendo em vista o crescimento populacional. Com o crescimento
demográfico lento e gradual da população brasileira, passa a haver mais pressões pela
ampliação do ensino, especialmente a partir de 1810, o que leva o modelo até então
adotado a entrar em colapso. Os debates acirrados na Assembléia Nacional Constituinte
de 1823 sobre a educação e a questão da universidade refletem essa necessidade de
mudança dos parâmetros de política educacional e de financiamento da escola pública.
Somente em 1824 passando o Brasil a possuir a primeira legislação educacional, o que
contribuiu para adoção de medidas no que tange ao financiamento escolar, tendo
inclusive de ser adotado o mecanismo da descentralização dado a sobrecarga que
ocorreu referente a necessidade do processo de escolarização no país. O século XX,
conhecido pelas lutas dos reformistas pela educação, tais como Anísio Teixeira,
Lourenço Filho e Fernando de Azevedo também configuraram expressivas ações na
260

organização da educação nacional, por exemplo, a vinculação dos recursos financeiros


para educação.
Para Esteves (2003, P.6)

Os anos 1930 são marcados por relevantes transformações decorrentes da


ruptura política, social e econômica com o Estado Oligárquico, transição esta
que não pode ser compreendida de forma linear, mas como processo repleto
de continuidades e descontinuidades. As crises na economia primária
exportadora e as crises do capitalismo mundial revelavam as limitações da
dependência econômica brasileira, motivando os debates nacionalistas sobre
os problemas do país, incluindo-se, aí, o sistema nacional de ensino e os
recursos a ele destinados. A Constituição Federal de 1934, a segunda da era
republicana, na qual os princípios liberais são integrados, dá o primeiro passo
no sentido da vinculação de recursos voltados exclusivamente para o
financiamento da educação, visando assegurar, de forma efetiva, a obrigação
do Estado para com o ensino primário obrigatório e gratuito. Nela é
preconizado que a União, os estados e municípios não poderão deixar de
aplicar menos 6 de 10% (a primeira) e 20% (os dois últimos) da receita de
seus impostos na educação escolar.

Com a constituição de 1988 os percentuais são definidos em seus valores mínimos a


serem destinados para as atividades educativas bem como articulação entre diversos
níveis de governo objetivando ações integradas do poder público em geral. Ainda na
década de noventa com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases ocorreu alterações
dos valores que compõe o mínimo a ser gasto com a educação, apesar de este
financiamento abarcar escolas filantrópicas, confessionais e comunitárias
descaracterizando o financiamento público da educação, também na década de noventa,
o Fundo de desenvolvimento da educação básica revelou o importante mecanismo de
financiamento da educação brasileira permitindo uma redistribuição dos valores
destinados a educação, de forma a atender as peculiaridades regionais.
No ano de 2001 foi aprovado o Plano Nacional de Educação, que de acordo com
Martins (2010) introduziu mudanças no financiamento de educação, tais como:
Vinculação de recursos como diretriz básica, gestão de recursos por meio de natureza
contábil, repasse de recursos a partir do nº de matrículas, valores mínimos por alunos,
controle social e descentralização da gestão financeira. Em 2006 foi implementado o
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica cujos recursos passaram por
maior abrangência garantindo a busca da universalização da educação básica e em 2010
com o novo Plano Nacional de Educação, as despesas no que se refere à garantia da
universalização terá mais aumento tendo em vista a luta para que seja destinado
aproximadamente 10% do PIB para educação, garantindo os compromissos da
constituição e das Leis de Diretrizes de Base.
261

3 FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO: UM ESTUDO DE CASO NA ESCOLA


MARTIM LUTERO

A Escola Martim Lutero, localizada no bairro Flexal II, em Cariacica, tem sua história
demarcada pela luta dos moradores que residiam naquele bairro desde sua ocupação na
década dos anos oitenta, o bairro não havia nenhum equipamento de lazer, escolas e
outros. E a partir da necessidade dos moradores que foi construída escola. A escola
pertencia à rede estadual no ano de 2006 ela foi municipalizada.

3.1 FINANCIAMENTO MUNICIPAL: ORIGENS DOS RECURSOS

O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) foi criado para prestar assistência
financeira, em caráter suplementar, às escolas públicas da educação básica das redes
estaduais, municipais e do Distrito Federal e às escolas privadas. O recurso é repassado
uma vez por ano e seu valor é calculado com base no número de alunos matriculados na
escola segundo o Censo Escolar. O dinheiro destina-se à aquisição de material
permanente, manutenção, conservação e pequenos reparos da unidade escolar, aquisição
de material de consumo necessário ao funcionamento da escola; avaliação de
aprendizagem, implementação de projeto pedagógico e desenvolvimento das atividades
educacionais.
As escolas públicas de educação básica devem criar unidades executoras para receber
diretamente recursos do PDDE. Nas escolas com até 50 alunos, é facultada a criação de
unidade executora. Caso ela não seja formada, a escola pode receber o recurso por meio
da entidade executora a que esteja vinculada. No caso das escolas privadas da educação
especial, os depósitos são realizados nas contas de suas entidades mantenedoras. Os
repasses dos recursos são feitos em parcela única anual, por meio de depósito nas contas
bancárias abertas pelo FNDE, em banco e agência com os quais a autarquia mantém
parceria.
As unidades de ensino recebem o programa de dinheiro direto na escola federal (PDDE
Federal) com fins na utilização de materiais permanente, consumo e merenda federal.
Também são repassados os recursos oriundos do programa de dinheiro direto na escola
municipal (PDDE Municipal), onde são redefinidos em materiais permanente, material
de consumo e merenda municipal.
262

3.2 CARACTERIZAÇÃO E A FINALIDADES DOS RECURSOS NA EMEF


“MARTIM LUTERO”

As despesas com recursos destinados pelo Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE)
obedecem às categorias econômicas de custeio e capital e segue a classificação definida
pela Portaria 448, da Secretaria do Tesouro Nacional, não devendo, dessa forma, seguir
outra legislação, pois se trata de recursos federais. Portanto, o processo de
descentralização acontece quando o município repassa o valor para unidade executora o
Caixa Escolar, onde segundo o gráfico acima representado indica o valor total recebido
no primeiro semestre, doze mil quinhentos e cinquenta e sete reais e trinta centavos.

GRÁFICO 01

VE R B A S P .D .D .E F E D E R A L
R $ 40.000,00

R $ 34.578,60
R $ 35.000,00

R $ 30.000,00
R $ 27.276,03

R $ 25.000,00

R $ 20.000,00

R $ 15.000,00
R $ 12.557,50

R $ 10.000,00

R $ 5.254,93
R $ 5.000,00

R $ 789,32
R$ -
S A L D O A NT E R IO R V A L O R R E C E B ID O R E ND IME NT O D A V AL O R G A S T O S AL D O AT UA L E M
AP L IC A Ç Ã O 01/07/2011

FONTE: CAIXA ESCOLAR EMEF MARTIM LUTERO

Esse valor é somado ao resíduo anterior e mais o rendimento da aplicação. É necessário


ressaltar que toda verba é aplicada, sendo resgatada só após a efetivação da compra.
Subdividido em capital e custeio há uma variação ao que tange com relação ao
percentual as duas rubricas. Quarenta por cento do total desta verba Federal caracteriza
o Capital, para aquisição de materiais permanentes, tais como equipamentos
dependendo da orientação do sistema central, Secretaria Municipal de Educação. O
restante do recurso, ou seja, os sessenta por cento é o consumo, destina-se a compra de
material escolar e material de limpeza. Anteriormente os recursos Federais eram
encaminhados à Unidade Executora o Conselho Escolar, de acordo com o repasse do
FNDE a Secretaria Estadual de Educação.
263

O Programa Mais Educação foi instituído pela Portaria Interministerial n.º 17/2007 com
o objetivo de integrar ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), mais
uma estratégia do Governo Federal para melhorar o resultado do IDEB e também
induzir a ampliação da jornada escolar. O Programa Mais Educação é assessorado pela
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), em parceria
com a Secretaria de Educação Básica (SEB).
GRÁFICO 02

VE R B A S P .D .D .E F E D E R A L
MA IS E D UC A Ç Ã O
R $ 35.000,00
R $ 32.021,31

R $ 30.000,00

R $ 25.000,00
R $ 22.198,79

R $ 20.000,00

R $ 15.000,00

R $ 9.822,52
R $ 10.000,00

R $ 5.000,00

R $ 1.022,07
R$ -
R$ -
S A L D O A NT E R IO R V A L O R R E C E B ID O R E ND IME NT O V AL O R G A S T O S AL D O AT UA L E M
D A AP L IC A Ç Ã O 01/07/2011

FONTE: CAIXA ESCOLAR EMEF MARTIM LUTERO

Os recursos recebidos por meio do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) do


Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), especificamente para as
unidades que desenvolvem o Programa, por isso nem todas as escolas recebem esse
recurso. E os mesmos são destinados as atividades desenvolvidas que são:
acompanhamento pedagógico, esporte e lazer, direitos humanos, cultura e arte e cultura
digital. Estas oficinas são realizadas através de monitores que são ressarcidos por meio
do recurso do custeio e o capital para aquisição de equipamentos permanente.
O Programa Escola Aberta é realizado dentro do espaço escolar, perpassando por toda a
comunidade e o processo educacional é definido por uma proposta pedagógica que
evidencia a socialização dos saberes como promoção de autonomia e de participação
social, o que é assegurado por um conjunto de recursos e serviços especiais,
organizados institucionalmente, visando inserir a comunidade no ambiente da escola,
respeitando suas singularidades e diferenças, garantindo seu desenvolvimento
intelectual, cultural bem como o aprimoramento de talentos. Observe o gráfico:
264

GRÁFICO 03

VE R B A P .D.E .E F E DE R A L
E S C OL A A B E R T A
R $ 18.000,00

R $ 16.366,11
R $ 16.000,00

R $ 14.000,00
R $ 12.448,47
R $ 12.000,00

R $ 10.000,00

R $ 8.000,00

R $ 6.000,00

R $ 3.917,64
R $ 4.000,00

R $ 2.000,00

R$ - R $ 231,74
R$ -
S AL DO ANT E R IO R V AL O R R E C E B IDO R E NDIME NT O DA V AL O R G AS T O S AL DO AT UAL E M
AP L IC AÇ ÃO 01/07/2011

FONTE: CAIXA ESCOLAR EMEF MARTIM LUTERO

Os recursos recebidos para o desenvolvimento do Programa também são distribuídos


em 40% do recurso permanente e 60 % do consumo, para aquisição de insumos para
funcionamentos das oficinas (cabeleireira, manicure, contador de história, costureira,
capoeira e dança). Os oficineiros são ressarcidos com o recurso de consumo. Os valores
do PDDE municipal depositados são complementares aos valores repassados pelo
Governo Federal.
Portanto, a Constituição Brasileira de 1988 assegura que a União aplicará, anualmente,
nunca menos de dezoito por cento, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos arrecadados,
compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e no desenvolvimento do
ensino. Sendo que os programas suplementares de alimentação assistência à saúde serão
financiados com recursos provenientes de contribuições sociais e outros recursos
orçamentários.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este relato de experiência aponta os hiatos que colaboram com a baixa participação da
comunidade escolar nos conselhos fiscais das unidades executoras, se dão devido à falta
de conhecimento nos próprios processos de prestação de conta dos conselheiros das
265

escolas. A própria escola necessita de realizar o exercício dos gastos públicos com a
educação. Por exemplo nas notas fiscais e questões técnicas contábeis, certidões
negativas, entre outros aspectos burocráticos que fazem parte do financiamento e
prestação de conta escolar. As baixas participações nas convocações para as reuniões
nos processos decisórios de aquisição de bens de consumo, capital, entre outros.
O conselho fiscal tem como base as assembleias constituídas pelos segmentos onde as
discursões apontarão os caminhos bem como aspectos de cunho financeiro e educativo
ligado à comunidade escolar, porém não há participação dos profissionais do
magistério, devido a jornada de trabalho da categoria o que torna a participação do
professor escassa por falta de tempo no movimento político. No que se refere membros
da comunidade, há grande falta de interesse pelo zelo dos recursos públicos, pois
reuniões são realizadas para informar à comunidade a importância de acompanhamento
dos recursos da escola, porém, a baixa participação e pouco interesse ser for discutido
com a comunidade questões da gestão dos recursos financeiros.
A comunidade escolar trata como responsabilidade do gestor, se isentando dos
processos de gestão, dos processos consultivos e/ou deliberativos em torno do
financiamento educacional. Aparece nos discursos dos membros da comunidade
escolar, há necessidade de um incentivo financeiro para a participação nos conselhos
escolares. Seja conselho de escola ou fiscal.
Com base no estudo feito percebe se a complexidade que representa o processo da
gestão democrática no âmbito do financiamento escolar e a participação dos conselhos
escolares em no âmbito da gestão financeira. O orçamento de uma escola representa os
objetivos e as diretrizes do sistema local em termos financeiros. Por muito tempo os
recursos financeiros escolares eram centralizados, o Governo Federal por meio do
Ministério de Educação - MEC determinava as prioridades e as despesas das unidades
de ensino, assim asseguravam os serviços e as demandas escolares em todo País sem a
participação das comunidades escolares. O material permanente, móveis, equipamentos
em geral, construções e ampliações eram realizadas pela administração local.
Eram enviadas dentre outros materiais para os Estados, o material de consumo, tais
como material escolar do aluno, cadernos, lápis, canetas, canecas, pratos e livros. O
material de limpeza, alimentação dentre outros serviços eram redistribuídos pelos
Estados para os Municípios, por meio das secretárias de Educação. Com a
democratização e a descentralização, as unidades de ensino passaram a receber os
recursos por meio dos conselhos escolares e demais entidades fiscais executoras de cada
266

município. A unidade executora de cada unidade de ensino, no município de Cariacica,


esses recursos diretamente são direcionados as diversas categorias de despesas, não
podendo ser transferidos para outras necessidades emergentes.
A burocratização para aquisição dos produtos para escola dificulta todo processo, os
recursos destinados a merenda escolar, além de ser muito pequeno o valor per capta por
aluno, também há uma determinação de aquisição de determinados produtos
alimentícios não há possibilidades de outros que não esteja pré-estabelecido.
Percebemos que mudou o processo de distribuição dos recursos. No passado não havia
dinheiro direto na escola, hoje apesar das unidades receberem diretamente suas rubricas,
as escolas ainda não são autônomas. Permanecem executando determinações sem a
participação da comunidade local e não respeitando as necessidades coletivas.
Com base na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) no
artigo 14, nos incisos I e II, temos assegurado à participação das comunidades escolares
e conselhos na gestão financeira das unidades de ensino. No entanto percebemos que a
participação do conselho de escola é muito precária, muitos representados pelos
diversos segmentos pais, alunos, funcionários, associação de moradores e professores de
forma frágil e com indicadores de indiferença ao significado público da gestão dos
recursos públicos. Quando convocados para definir algumas ações financeiras ou de
cunho pedagógico, por não haver quórum, a definição acaba nas mãos do dirigente
escolar tornando assim uma ação centralizadora. Não colaborando para materialidade da
gestão democrática e seus princípios.
A participação popular em nosso trabalho é apresentada como responsabilização de
todos no zelo pela coisa pública, em especial os recursos financeiros, em nosso caso, os
recursos financeiros escolares. Também possibilita ao sujeito fazer a reflexão da tomada
de decisão de acordo com as necessidades de todos. Na democracia representativa, a
participação torna-se o mais importante instrumento; portanto devemos fazer o uso
desta participação nos conselhos escolares, objetivando materializar o consultivo e
deliberativo, que é são as bases da participação na comunidade escolar no âmbito da
gestão democrática.
267

5 REFERÊNCIAS

ANDRÉ, M. E. D. A. Estudo de caso em pesquisa e avaliação educacional.

CAMINI, Lucia. A politica educacional do PDE e do Plano de Metas Compromisso


Todos Pela Educação. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação,
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CURY, C. R. J. A educação como desafio na ordem jurídica. Em: 500 anos de


educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

CURY, C. R. J. – Gestão democrática da educação: Exigências e desafios. Revista


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DIAS, Lenilda Cordeiro de Macêdo Adelaide Alves – A Politica de Financiamento da


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ESTEVES, L. C. G. - Fundef no RJ: a ótica os perdedores. 2005. Tese (Doutorado


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MELCHIOR, J. C. de A. – O financiamento da educação no Brasil. São Paulo:


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MENEZES, J. G. de C – Uma contribuição para a memória da ANPAE. Revista


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OLIVEIRA, Maria Auxiliadora Monteiro- Gestão Educacional. Novos Olhares, novas


Abordagens: Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.
268

Comunicação

As políticas públicas de ações afirmativas e o trabalho docente na universidade


federal do Espírito Santo

Claudenice Maria Véras Nascimento


UFES
Elizabete Bassani
UFES
Ivone Martins de Oliveira
UFES
Agência financiadora:
Fundação de Amparo à Pesquisa do Espírito Santo (FAPES)

RESUMO: Discutir os efeitos das políticas públicas de ações afirmativas sobre o


trabalho docente no ensino superior brasileiro, nos leva, a refletir sobre as estruturas
globais atuais. Nesse cenário, nossa investigação tem como objetivo responder à
seguinte questão: quais os efeitos das políticas de Ações Afirmativas, em particular a de
reserva de vagas/cotas sobre o trabalho docente na Universidade Federal do Espírito
Santo? Trata-se de uma pesquisa de base qualitativa, caracterizada como estudo de caso.
Para obtenção dos dados utilizamos documentos e coleta de depoimentos feitos com
professores. Os dados coletados nos permitem dizer que, as políticas de ações
afirmativas, na Universidade Federal do Espírito Santo não tem atingir o objetivo maior,
que é minimizar o problema das desigualdades sociais e muitas vezes, inviabiliza o
debate sobre outras questões que afetam a exclusão social.
Palavras-chave: Política de Ação Afirmativa. Trabalho Docente. Educação Superior.

INTRODUÇÃO

Discutir os efeitos das políticas públicas de inclusão social sobre o trabalho docente no
ensino superior brasileiro nos dias de hoje, nos leva, obrigatoriamente, a refletir sobre as
estruturas globais atuais. Para isso, consideramos ser fundamental ir à raiz do amplo
projeto de reestruturação da produção, da reorganização da economia, da política
educacional, da reforma do estado e da mudança social/cultural. Nesse cenário, nosso
269

trabalho tem como objetivo analisar os efeitos das políticas de ações afirmativas, em
particular a de reserva de vagas/cotas sobre o trabalho docente na Universidade Federal
do Espírito Santo. Trata-se de uma pesquisa qualitatica, caracterizada como estudo de
caso. Tivemos com técnica de coleta de dados a análise documental e a entrevsita com
professores dos cursos de Medicina e de Artes Visuais. Nosso críterio de escola dos
sujeitos de pesquisa, se deu pelo fato do curso de Medicina ser o mais concorrido e o
curso de Artes Visuais ser o menos concorrido no processo seletivo de 20013. Nesse
movimento de investigação, entendemos que tal política pública de ação afirmativa, por
um lado, apresenta um discurso amplamente difundido de “democratização do ensino
superior”, por outro, desconsidera as contradições que atingem os pilares fundamentais
do exercício do papel universitário, ou seja, a autonomia, a capacidade crítica/criativa e
a busca de atender as reais necessidades sociais. É importante destacar que essa política
se apresenta como resposta ao problema das desigualdades sociais, discriminação
(étnicas, raciais, religiosas ou de gênero) e exclusão de diferentes grupos sociais.
Nesse espaço/tempo, procuramos inicialmente entender a crise que aflige a educação
superior brasileira. Essa crise vem sendo revelada em inúmeras pesquisas realizadas nos
últimos anos, onde podemos perceber que a universidade pública brasileira vive em
constante ameaça de se tornar obsoleta em nome da “modernização”. Trata-se de uma
crise constituída desde suas raízes. A universidade brasileira nasce fora de nossa
realidade e por isso foi (e ainda é) julgada retardatária e atrofiada em muitas de suas
funções. Isso porque nasce ligada às experiências de outros países, como os Estados
Unidos, a Inglaterra e a França, com seu modelo napoleônico. Ou seja, nossa
universidade “foi pensada para ser resposta a problemas de outras regiões que possuíam
uma realidade própria e peculiar” (CASSIMIRO; GONÇALVES, 1986, p. 81). Aliado a
essas raízes, atualmente encontramos diversas políticas neoliberais sob o discurso de
modernização e racionalização, objetivando a superação das mazelas do mundo
contemporâneo e de adaptação às novas demandas do processo de reestruturação
produtiva em curso. Nesse sentido, buscaremos no movimento de nossa pesquisa,
discutir a constituição das políticas de Ação Afirmativa no Brasil.
270

A CONSTITUIÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS


NO BRASIL

A reflexão sobre essas questões leva-nos, inicialmente, a examinarmos a constituição


das políticas de ações afirmativas no Brasil. Assim sendo, faz-se necessário explicitar,
primeiro, as influências da Conferência de Durban (2001), nas áreas da saúde, educação
e até no Centro do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que passou a
utilizar a autodeclaração de Cor/Raça como critério em suas entrevistas. Dessa
Conferência, emergiu vigorosos debates sobre o problema da discriminação racial,
xenofobia e intolerância correlatas. Esses debates revelaram uma aproximação entre os
argumentos focados na economia e no aspecto cultural. O que nos leva a perceber que,
durante a referida Conferência predominou a linha de pensamento que entende o
problema da desigualdade como econômica e não racial e que exige do Estado à criação
de meios que permitam aos descriminados a ascensão social. Conforme estabelecido no
texto final da conferência, que assim, descreve:

Insta os Estados a estabelecerem, com base em informações estatísticas,


programas nacionais, inclusive programas de ações afirmativas ou medidas
de ação positivas, para promoverem o acesso de grupos de indivíduos que são
ou podem vir a ser vítimas de discriminação racial nos serviços sociais
básicos, incluindo, educação fundamental, atenção primária à saúde e
moradia adequada (ALVES, 2002, p.45).

A partir dessa premissa, os movimentos negros passaram a reivindicar políticas de


correção da desigualdade racial histórica, o que consolidou na agenda brasileira a
implementação de políticas de ação afirmativa, como o Programa Nacional dos Direitos
Humanos – PNDH (tinha como objetivos, dentre outras coisas, desenvolver ações
afirmativas para o acesso dos negros em cursos profissionalizantes, apoiar ações da
iniciativa privada que realizem discriminação positiva); o Projeto de Lei nº 3.198 de
autoria do Deputado Paulo Paim, que institui o Estatuto da Igualdade Racial;
implantação, no ensino público superior, de reserva de vagas para negros na
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), na Universidade Estadual do Norte
Fluminense (UENF) e na Universidade do Estado da Bahia (UNEB), de onde se deriva
o poderoso instrumento de inclusão social, as cotas para negros em concursos públicos,
vagas universitárias, benefícios financeiros, dentre outros programas.
271

Nesse movimento da história, adentramos na década de 1990, com a Marcha Zumbi dos
Palmares, a qual se torna um marco quando os movimentos negros entregam ao governo
um Programa de Superação do Racismo e da Desigualdade Racial, cujo foco era o
trabalho. No referido programa, destacavam-se a implantação de incentivos fiscais às
empresas que adotassem programas de promoção de igualdade racial. Nessa ocasião, o
Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso (o mesmo governo que
potencializou a ideologia neoliberal em prol da reforma da educação superior
brasileira), institui por decreto o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), composto
por membros do governo e por representantes de movimentos sociais, com o objetivo de
desenvolver políticas de valorização da população afro-brasileira. Esse grupo realizou
“[...] dois seminários, em Salvador e Vitória, o que resultou na elaboração de 46
propostas de ações afirmativas em áreas como educação, trabalho, comunicação e
saúde” (MOEHLECKE, 2004, p. 206). Mas o que é a política de ação afirmativa?

[...] a denominação “políticas de ações afirmativas” é um substitutivo


semântico para “políticas compensatórias”, que encontraram em décadas
anteriores na América Latina uma grande resistência dos movimentos sociais
para serem aceitas e adotadas. Atualmente, tais políticas aparecem travestidas
de ações afirmativas, defendidas fortemente pelo Estado e por boa parte dos
movimentos sociais organizados (FIGUEIREDO, 2008, pág. 49).

Como podemos observar o termo ação afirmativa é utilizado com diferentes


significados, mas os que mais se destacam são aqueles que primam pela busca por
amenizar as desigualdades sociais, reflexo do processo de formação injusta das classes
populares.

O TRABALHO DOCENTE SOB O CONTEXTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS


DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA UFES

O trabalho docente é por definição, um trabalho a serviço da emancipação, do


desenvolvimento humano, da crítica da realidade, da produção do conhecimento para
transformação da vida social. E nesse sentido, estabelece inúmeras contradições quando
relacionado às políticas de ações afirmativas, sobretudo, porque, percebemos no interior
dessas políticas, uma educação estritamente conformista e uma transformação nas
funções socioculturais em um espaço de acumulação do capital, antes mesmo se uma
inclusão social.
272

Essa discussão se coloca ao longo de nossa história, quando o trabalho assumiu


diferentes significados. Contudo, de todos eles, o mais potente ainda é aquele ligado à
exploração, ao esforço físico e à dominação. De acordo com (CUNHA, 2010, p. 406),
etimologicamente trabalhar é uma palavra que vem do latim “tripaliare” e significa
torturar, derivado de um instrumento chamado “tripalium” que era composto por três
paus e servia para torturar.

Na Idade Média, o trabalho dividiu a sociedade estamental (clero, nobres e servos) entre
exploradores e explorados. Dessa forma, o trabalhador não era considerado propriedade
do senhor feudal, o que o obrigava retirar parte de sua produção para ajudar os outros
estamentos. Com o crescimento da circulação monetária e com as trocas, a economia de
subsistência dos feudos foi substituída pelo artesanato e pelo comércio. Assim sendo, é
possível considerar que, na passagem do feudalismo para o capitalismo, o capital passou
a predominar sobre a propriedade das terras e a produção passou a se organizar em
manufaturas, fortalecendo a burguesia com o modelo mercantil e empreendedor. Nesse
espaço/tempo, os homens viviam no campo e do campo. Ou seja, viviam da atividade
agrícola e sua forma de trabalho não era mais escravo e sim servil. De onde pode se
aferir que, o trabalho, enquanto processo educativo produziu a existência dos servos e
de seus senhores, caracterizando-se não mais como sofrimento e subordinação e sim
como forma do homem com sua própria ação, regular e controlar seu intercâmbio
material a natureza.

Nessa perspectiva, Marx em (“O capital” tomo I), nos remete ao trabalho como uma
atividade essencialmente humana em que, através da ação do seu corpo e da sua mente o
homem se apropria da natureza de forma útil para a sua existência e a partir daí, ao atuar
sobre a natureza o homem a modifica, modificando também a si próprio. Nesse
movimento, é importante destacar que Marx ao mesmo tempo em que trata a categoria
trabalho de forma historicizada nos chama atenção para o fato de que o trabalho
independe da forma social. Atenta a essas questões, Aranha e Dias nos ajudam a olhar o
trabalho sob duas dimensões:

“[...] uma primeira dimensão construtora, emancipadora. É o trabalho


concreto de Marx, voltado para a satisfação das necessidades humanas,
contribuindo para a realização do indivíduo enquanto criador e transformador
273

do seu meio. [...] outra dimensão alienante, opressora” (ARANHA & DIAS,
2009, p. 116).

A partir do olhar das autoras, entendemos ser necessário focar o trabalho sob as
perspectivas abstrata e concreta, tendo em vista que, se por um lado, focarmos somente
a dimensão abstrata do trabalho correremos o risco de enxergá-lo, somente como
produto de mercadorias. Por outro lado, se focarmos o trabalho somente no sentido
concreto, correremos o risco de não visualizarmos as possibilidades de superação de sua
forma alienada. Diante disso, buscamos uma terceira dimensão, isto é, a dimensão do
trabalho enquanto princípio educativo, ligado a um processo de socialização de caráter
solidário, fundamental no processo de superação capitalista e da ideologia das
sociedades de classe que cindem o gênero humano. Portanto, pautados na terceira
dimensão, é possível compreender o trabalho docente como uma atividade orientada
para um fim, que segue uma ordem social/legal que regula organicamente a vida
recíproca humana, “[...] ordem que deve ser respeitada por conversão espontânea e não
apenas por imposição externa, por necessidade reconhecida e proposta pelos próprios
homens como liberdade e não por simples coação” (GRAMSCI, 1991, p. 130).

Nessa perspectiva, como compreender o trabalho docente na Universidade Federal do


Espírito Santo? Para responder tal indagação, reportando-nos ao Plano Diretor
Institucional da UFES, onde vemos em suas diretrizes, que o trabalho docente na UFES
segue os preceitos da Constituição Federal de 1988, no que se refere às atividades
simétricas entre ensino, pesquisa e extensão. Conforme descrito abaixo:

Todas as modalidades de ensino da Universidade devem ser voltadas para a


busca, produção e socialização de conhecimentos e técnicas, e serão
utilizadas como recurso de educação destinado à formação ética, crítica,
técnica, científica, cultural e artística. Em conformidade com o Artigo 74, do
Estatuto da Universidade, o ensino na UFES é ministrado na forma de cursos
ou programas de: Graduação; Pós-graduação; Extensão (PDI, 2010-2014, p.
39).

Essa simetria, ensino-pesquisa-extensão tem por base os fundamentos de democratizar,


expandir, fortalecer e integrar os diferentes seguimentos do conhecimento acadêmico
para formar cidadãos capazes de implementar mudanças, muitas vezes demandadas pela
própria sociedade capixaba. Nesse contexto, a UFES, no papel de interlocutora e
catalisadora das ações necessárias ao seu crescimento, definiu, a partir de seu
Planejamento estratégico de 2005/2010, que a assistência social ficaria separada do
274

conceito de extensão, mesmo entendendo que as atividades de assistência social são


viabilizadas juntamente com as ações de ensino e pesquisa. A seguir, descrevo algumas
características das ações de extensão e de assistência social na UFES:

Interdisciplinaridade - caracterizada pela interação de modelos e conceitos


complementares, de material analítico e de metodologia, com ações inter-
profissionais e interinstitucionais, com consistência teórica e operacional que
permita a estruturação das diversas ações de extensão propostas em um
programa abrangente;

Impacto na formação do estudante – formação técnico-científica, pessoal e


social, realizada segundo projeto didático--pedagógico que facilite a
flexibilização e a integralização curricular, com atribuição de créditos
acadêmicos, sob orientação docente/tutoria e avaliação;

Impacto Social – pela ação transformadora sobre os problemas sociais,


contribuição à inclusão de grupos sociais, ao desenvolvimento de meios e
processos de produção, inovação e transferência de conhecimento e à
ampliação de oportunidades educacionais, facilitando o acesso ao processo de
formação e de qualificação (PDI, 2010-2014, p. 42).

Contudo, a proposta de assistência social no âmbito da UFES, assim como no âmbito


das demais universidades brasileiras, ganha destaque na expressão das agências
financiadoras (Banco Mundial, FMI, Unesco, entre outras) ao relacionar a educação
superior ao crescimento econômico, considerados fundamentais para a superação da
pobreza. Tal fato é um indício de que o Brasil não conseguiu resolver o problema das
desigualdades sociais e com isso, é possível que tenhamos saído do processo de “[...]
alienação pelo autoritarismo, pela violência explícita, para cairmos numa nova
alienação, a alienação simbólica. [pois] Atuar sobre o explícito tem mais consequência
do que sobre o implícito, o imaginário, o inconsciente” (LEMOS, 2007, p. 86).
Trata-se, portanto, de um cenário que inviabiliza o debate sobre outras questões que
afetam a própria existência da universidade, como por exemplo, financiamento,
autonomia e assistência estudantil. Nessa mesma linha de pensamento, vai se perdendo
a possibilidade da participação do professor nas discussões sobre as políticas de ações
afirmativas, criadas à luz das diretrizes financeiras, o que muitas vezes, fragmenta o
planejamento e a execução, o pensar e o agir, alienam o trabalho docente tendo em vista
que o docente não participa de sua criação. Nesse momento que o trabalho docente se
torna coisa e o professor tem limitadas suas possibilidades de ser agente da própria
história, como ocorreu o processo de implementação da lei de cotas na UFES? Quais as
percepções dos professores sobre a referida lei e seus efeitos sobre o trabalho docente?
275

Muitas foram das discussões realizadas por meio de reuniões, pesquisas e audiências
públicas para se chegar a um consenso final sobre como promover um processo seletivo
mais inclusivo e ao mesmo tempo condizente às especificidades locais. Nesse
movimento, em outubro de 2012, o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE)
da UFES aprovou a reserva de, no mínimo, 50% das vagas para estudantes que tenham
cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, por meio da Resolução nº.
35/2012. Com relação aos efeitos dessa política sobre o trabalho docente, buscamos nas
falas de dois professores (um do curso de Medicina e outro do curso de Artes Visuais),
responder a seguinte questão: você percebeu alguma mudança em seu trabalho
acadêmico depois da chegada dos alunos cotista no espaço da UFES?

Desde que entrei na UFES, a cada semestre, tenho modificado minha conduta
acadêmica repensando e modificando as metodologias de ensino, no sentido
de auxiliar os alunos a aprender a estudar. Aumentei o número de atividades
avaliativas na tentativa dos tópicos a serem estudados ficarem menores e
mais fáceis de serem sedimentados, diminuindo o conteúdo para cada
atividade avaliativa adotada. Não atribuo essas mudanças exclusivamente aos
cotistas, que para ser bem sincera, nem procuro saber quem são e, nem
tampouco diferenciá-los e, sim por causa do nível de conhecimento de todos
os ingressantes na disciplina que ministro (PROFESSORA DO CURSO DE
MEDICINA).

A fala da professora (1) nos revela que não mudou o perfil dos alunos que ingressam na
UFES e que é necessário mudar suas práticas acadêmicas, tendo em vista as
dificuldades apresentadas pelos alunos. O que nos leva pensar que o problema está na
“qualidade” da educação básica, confirmando dados achados de pesquisa anterior
(BASSANI, 2012). Ou seja, o nível dos alunos que chegam à universidade é reflexo da
precária educação básica no Brasil, inclusive a oferecida pela rede particular. Outro
aspecto que podemos destacar na fala da professora é seu entendimento sobre sua
prática docente. Dito de outra forma, a referida professora, ao falar de seu trabalho, o
entende exclusivamente como prática de ensino, desconsiderando a simetria entre
ensino, pesquisa e extensão, defendida na Constituição Federal de 1988. Nessa mesma
linha de pensamento, temos a fala da professora (2) , quando perguntada se percebeu
alguma mudança em seu trabalho acadêmico depois da chegada dos alunos cotista no
espaço da UFES, assim responde:

Não. De um semestre para outro costumo fazer alguns ajustes em meu plano
de ensino. Mas, essa prática, não tem nada a ver com os alunos cotistas.
276

Mesmo porque, os alunos que decidem cursar as Licenciaturas, em geral são


alunos marcados por carências econômicas e sociais. Ou seja, são alunos com
o mesmo perfil de dos alunos cotistas (PROFESSORA DO CURSO DE
ARTES VISUAIS).

A fala da professora (2) nos apresenta um dado diferente da fala da professora (1). Isto
é, nos permite perceber que o público alvo dos cursos de Licenciatura é formado por
pessoas menos favorecidas social e economicamente. O que corrobora com
(FIGUEIREDO, 2008, pág. 49) ao dizer que “[...] o processo em curso de destruição do
modelo universitário, tenta articular ensino-pesquisa-extensão no Brasil e dá acesso às
camadas mais pobres da população à educação superior por via dos cursos de
Licenciaturas”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossa investigação revelou (provisoriamente) que as políticas de ações afirmativas, em


especial de reserva de vagas/cotas na UFES, pouco avançou no problema das
desigualdades sociais. Assim sendo, em nosso capo de pesquisa, percebeu-se que a
política de ação afirmativa (reserva de cotas), muitas vezes tende a inviabilizar o debate
sobre outras questões que afetam a exclusão social, como as contradições entre o
discurso oficial, subjacente às políticas públicas, e a sua concretização, especialmente,
no que se refere à quantidade de vagas insuficientes para absorver a demanda por este
nível de educação.
Além do exposto, é importante destacar que a política pública de ação afirmativa
(reserva de vagas/cotas), em nosso campo de pesquisa foi criada à luz das diretrizes
financeiras. O que produz, por uma lado, a impossibilidade da participação do docente
em seu processo de criação. Por outro lado, a fragmentação do seu planejamento, do seu
pensar e do seu agir, tonando-o um sujeito “alienado” em relação ao seu trabalho.

REFERÊNCIAS

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responsabilidade de todos. In: Revista Brasileira de Política Internacional (online).
Vol. 45, nº 2. pp. 198-223. Brasília: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais,
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GRAMSCI, A. Os intelectuais e a organização da cultura. Tradução de Carlos Nelson


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LEMOS, D. V. da S. Alienação no trabalho docente? O professor no centro da


contradição. 2007. 280f. Tese (doutorado) – Faculdade de Filosofia e Ciências
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Capítulo V - Processo de trabalho e processo de valorização. São Paulo: Abril Cultural,
1983.

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Pesquisa, nº. 117, p. 197-217, novembro, 2004.

PROJETO DE LEI N. 3.198 de 2000, de autoria do Deputado Paulo Paim. “Institui o


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______. PDI: Plano de Desenvolvimento Institucional. 2010-2014. Vitória/ES: UFES.


Disponível em:<
http://www2.daocs.ufes.br/sites/daocs.ufes.br/files/field/anexo/anexo_i_28_10.pdf >.
Acesso em 23 nov. 2013.
278

Comunicação

Educação superior privada mercantil e a transformação de alunos em


consumidores

Claudia Mara Stapani Ruas1


Universidade Católica Dom Bosco

Resumo: Neste artigo analisa-se a expansão da educação superior privada mercantil, no


sentido de compreender os motivos que levaram à formação de grandes oligopólios, até
a formação da mega fusão entre Kroton e Anhanguera S.A. Investigou-se como os
empresários impulsionam os investimentos no setor formando os oligopólios
constituídos pela ampliação, compra/fusão das Instituições de Educação Superior (IES)
privadas; a abertura de capitais dessas empresas nas bolsas de valores e a transformação
dos alunos em consumidores,. Para dar suporte a tais analises foram utilizadas as
pesquisas exploratória e a bibliográfica. Os resultados mostram que os oligopólios estão
contribuindo para a transformação da educação em mercadoria, na busca desenfreada
para ampliar seu capital por meio de fusões e aquisições abocanhando, cada vez mais,
esses consumidores, hoje pertencentes prioritariamente pertencentes à classe C brasileira.
Palavras-chave: Educação superior privada mercantil. Formação dos oligopólios. Aluno-
consumidor

Introdução

Este artigo teve como objetivo analisar um segmento específico da educação


superior: o privado mercantil. Buscamos compreender os motivos que o levaram à
expansão da educação superior e à formação dos grandes oligopólios. O procedimento
metodológico utilizado foi pesquisa exploratória com levantamento dos documentos
produzidos pelo Grupo Kroton e Anhanguera, tais como: relatórios diversos e
informações veiculadas no site oficial e a bibliográfica. Baseado em leituras e análises

1
Mestre em Desenvolvimento Local (UCDB) e Doutoranda em Educação (UCDB). Professora da
Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) e Pesquisadora do GEPPES-UCDB. E-mail:
claudia@ucdb.br.
279

desse material, o trabalho foi formatado em duas partes: A primeira aborda o setor
privado mercantil até a formação de oligopólios da educação superior, focando a análise
do empresariamento da educação e sua mercantilização, iniciados em 2000 com a
liberalização e desregulamentação do setor privado, após a aprovação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), marco para a mercantilização da
educação superior. Os novos contornos, após 2007, quando empresas do setor
educacional abriram seu capital na bolsa de valores consolidando sua mercantilização
por meio de aquisições/fusões de IES brasileiras.
A segunda parte descreve a mega fusão2 entre a Kroton-Anhanguera que, apesar
de recente, comprova o momento ímpar em que vive o Brasil na história da educação
superior. Esta negociação comprova o início de uma nova fase que, do ponto de vista
econômico, fez surgir uma das maiores empresas de educação superior do mundo,
abocanhando 15% de todos os alunos do Brasil e classificada como a 17ª maior
companhia da Bovespa em valor de mercado, com R$ 14,48 bilhões (GUTIERRES,
2014).
As abordagens aqui realizadas sugerem uma reflexão sobre a transformação do
aluno em consumidor, sobre os fatores que influenciam a decisão de compra,
contextualizando estes conceitos dentro do segmento da educação superior privada.
Conhecer os estímulos que influenciam o consumidor é fundamental ainda para
entender como o aluno é visto, hoje, como um consumidor potencial dos serviços
ofertados pelos grandes oligopólios da educação superior privada mercantil.

1. A formação de oligopólios: uma nova face da privatização da educação superior

Na segunda metade do século XX, o sistema capitalista brasileiro fortaleceu-se,


notadamente na educação superior, que começou a ser encarada pela lógica mercantil e
privatista. De acordo com Rodrigues (2007, p. 2) a educação superior, passou: “[...] a
ser um negócio regido pelo signo da economia globalizada na qual se comercializam os
mais variados produtos, de sanduíches a cursos de graduação”.
Esse cenário vivido pela educação superior passou a ser observado a partir da
expansão quantitativa no segmento privado3 provocou a disseminação, na educação

2
Termo utilizado por Braga (2011), Presidente da Hoper Consultoria em educação superior.
3
Segundo Frèmeaux (2001) o setor privado observa a abertura de um mercado potencialmente colossal,
quando sabemos que o numero de estudantes passou, ao nível mundial, de 6,5 milhões em 1950 para 51
280

superior, de uma mentalidade empresarial com o propósito de transformá-la em


mercadoria, seguindo à lógica do capital financeiro, deflagrado, conforme explica
Oliveira (2009, p. 741), “[...] pelo aumento da demanda, resultante da regularização do
fluxo no ensino fundamental e do subsequente crescimento do ensino médio”.
Esta expansão passou a ser fomentada, ainda mais, pela reestruturação da
educação superior, sob a influência neoliberal, que aconteceu a partir de 1995,
possibilitando o surgimento de uma multiplicidade de estabelecimentos acadêmicos
como, por exemplo, os centros universitários que se organizaram como empresas
imbuídas de objetivos mercantilistas, sem a necessidade de investimento em pesquisa.
Essa mercantilização contou com o aval do governo de Fernando Henrique Cardoso
(1995-2002), por meio do Ministério da Educação, que implementou políticas indutoras
do modelo “universidade de ensino, sem pesquisa e extensão” (SGUISSARDI, 2008, p.
1000).
Com isso a oferta do produto “educação superior” aumentou. De acordo com
Chaves (2010, p. 488) no período de “[...] 1996 a 2007 houve um crescimento de 161,2%
no conjunto de alunos matriculados no ensino superior brasileiro. No setor privado, esse
crescimento foi de 221,2%, quase quatro vezes mais que o apresentado pelo setor
público, que cresceu 68,7%”. Esse crescimento fez com que o Brasil figurasse como um
expoente no processo de mercantilização da educação superior, com mais de 70% das
matrículas em instituições privadas.
Essa oportunidade foi aproveitada pelas IES privadas que abriram, em 2007, seu
capital na bolsa de valores, com objetivo de captar recursos a juros mais baixos do que os
oferecidos pelos bancos brasileiros e captar novos players em sua composição acionaria,
para continuar seu planejamento de crescimento e expansão no território brasileiro.
Nesse cenário, o Grupo Anhanguera foi o pioneiro em participar do mercado de
capitais, seguido depois pelas IES, Estácio de Sá, Kroton e Sociedade Educacional
Brasileira (SEB), a partir de 2007, intensificando o processo de compra e venda de IES
brasileiras que continua até os dias de hoje. Essa movimentação fez com que o Grupo
Anhanguera, de acordo com Chaves (2010, p. 492-493) se tornasse, em 2010 a “[...]
empresa líder em aquisições e fusões de IES, ocupando a posição de destaque no setor”.
Este movimento mercantil foi responsável pela formação de três grandes grupos
atuantes no Brasil: a) Anhanguera Educacional, com sede em São Paulo e 52 unidades;

milhões em 1980 e, sem dúvida, mais de 90 milhões nos dias de hoje.


281

b) Estácio de Sá, com sede no Rio de Janeiro e 23 unidades; c) Kroton Educacional,


com sede em Minas Gerais e 25 unidades.
Na busca desenfreada para crescer e ganhar mercado, o Brasil assistiu, em 22 abril
de 2013, o início de um novo ciclo. A Anhanguera, maior empresa do país em
faturamento e número de alunos e a Kroton, maior empresa de ensino universitário do
mundo em valor de mercado, à frente da Chinesa New Oriental4, anunciaram sua fusão
por meio de uma troca de ações estimada em 5 bilhões de reais. Coube à Kroton 57,48%
das ações e 42,52% à Anhanguera. De trajetórias bem parecidas, os dois oligopólios são
apoiados por grupos financeiros e lideraram uma expansão agressiva, nos últimos anos,
em meio a incentivos governamentais para o ensino privado. Nasceu, assim, a maior
companhia de ensino privado do país, a maior empresa da América Latina e uma das
maiores empresas educacionais mercantis do mundo, com valor de mercado próximo a
12 bilhões, abocanhando 15% de todos os alunos do Brasil, prioritariamente
pertencentes à classe C.
Em 2014, após a aprovação pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica
(CADE)5, a empresa resultante da fusão ocupa a 17ª lugar, como a maior companhia da
Bovespa em valor de mercado, com R$ 14,48 bilhões (GUTIERRES, 2014). Juntas,
Kroton e Anhanguera formaram um conglomerado com quase um milhão de alunos,
receita de R$ 4,3 bilhões e presença em 835 cidades brasileiras.
Kroton e a Anhanguera assemelham-se, tanto no quesito ensino em massa
quanto no quesito público-alvo, e possuem complementaridades geográficas e de
categoria. Uma das estratégias de crescimento da nova empresa será focar a região
Nordeste, dado que existem menos pessoas com nível superior naquela região e mais
pessoas pertencentes às classes C e D, conforme matéria veiculada pelo jornal o Globo
do Rio de Janeiro:
Com mensalidades em torno de R$ 500,00 no curso presencial e R$ 250 no
ensino a distância, a empresa quer buscar novos alunos das classes C e D em
regiões como o Norte e Nordeste. Uma das táticas é ampliar o percentual de
estudantes que têm estudos custeados pelo programa de financiamento ao
estudante do governo federal (FIES). Na Kroton, 40% dos 500 mil alunos
recorreram ao FIES, e na Anhanguera, 20% (CM CONSULTORAI, 2013).

4
O faturamento da New Oriental é da ordem de US$2,9 bilhões.
5
De acordo com o site www.cade.org.br, esse órgão é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério da
Justiça, com sede e foro no Distrito Federal, que exerce, em todo o Território nacional, as atribuições
dadas pela Lei nº 12.529/2011. Tem como missão zelar pela livre concorrência no mercado, sendo a
entidade responsável, no âmbito do Poder Executivo, não só por investigar e decidir, em última instância,
sobre a matéria concorrencial, como também fomentar e disseminar a cultura da livre concorrência.
282

O mercado reagiu positivamente à fusão, uma vez que as ações das duas
empresas valorizaram-se. A consolidação da Kroton (KROT3) e Anhanguera (AEDU3)
confirma a criação, da maior empresa brasileira educacional do mundo, atingindo mais
de 1,1 milhão de alunos nas modalidades presencial e a distância.
Com esta fusão o segmento das instituições privadas mercantis segue as
demandas do mercado e tem, no ensino, sua fonte de lucro. Sobre o assunto Bittar
(2002, p. 55) comenta que “é nítida a imagem da educação superior associada à ideia de
produto, consumo, ou seja, é preciso influenciar, atrair, envolver os consumidores na
aquisição do produto denominado educação”.

2. A mercantilização e a transformação em aluno em consumidor

A mercantilização do ensino superior trouxe à tona uma nova nomenclatura para


um dos principais alvos das instituições. O aluno passou a ser denominado de cliente,
aluno-cliente ou aluno-consumidor. Desta forma, desponta concomitantemente a
necessidade de analisar todo o processo de consumo que envolve a escolha por
determinada organização educacional, bem como os fatores que influenciam esta
decisão.
Quando se fala em mercado ou em mercadorização, sugere-se que haja alguém
querendo vender para alguém. Conforme mencionam Pindycke e Rubinfeld (2005), um
mercado “é, pois um grupo de compradores e vendedores que, por meio de suas reais ou
potenciais interações, determinam o preço de um produto ou de um conjunto de
produtos”. Já para Kotler e Fox (1994), o mercado seria um conjunto de consumidores
reais e potenciais de uma oferta de mercado.
Ambas as definições mencionam dois blocos diferentes, porém, que interagem
por meio da oferta de produtos. Quando transferimos este conceito para a educação
superior, percebemos que existe um mercado formado pelas instituições de ensino
(vendedores) e um conjunto de consumidores dispostos a adquirir os serviços ofertados
por elas (alunos).
Quando se fala em consumo, há um consenso de que este envolve questões
como necessidades, relações sociais, fatores emocionais e racionais. Todos esses
aspectos definem o próprio ser humano e motivam o seu comportamento para
determinadas atitudes. Isto se aplica para a decisão de compra. O aumento da oferta, a
sofisticação da logística, a inovação tecnológica e o aparecimento de concorrentes com
283

qualidade similar ou superior levou a uma necessidade mais densa de conhecer o


consumidor.
Las Casas (2006, p. 18) ressalta que esta preocupação das empresas com o
comportamento do cliente ocorreu devido à orientação do processo de comercialização
para o marketing. “As empresas passaram, na década de 50, [...] a se preocupar com os
consumidores, procurando entendê-los e avaliá-los para elaborar planos de marketing
que fossem mais adequados”.
A ciência do comportamento do consumidor possibilita que haja uma
compreensão ou uma tentativa, no mínimo, de entender preferências, necessidades e
desejos. Os mercados atuais não são os mesmos das décadas passadas. O cliente que
consome hoje não é o mesmo que consumia ontem. As motivações são semelhantes,
porém, o contexto no qual elas se apresentam é diferente.
Quando observamos a mercantilização do ensino superior, especialmente nos
últimos cinco anos, entendemos que há este esforço, esta tentativa de percepção de
atitudes e preferências, já que o aluno deixou de ser denominado e tratado apenas como
aluno para exercer o papel de cliente. E ainda, embora o mercado da educação superior
particular seja formado por oligopólios, as práticas concorrenciais são acirradas. Existe
uma forte competição na busca pelo aluno-cliente.

2.1 A nova classe média e o novo consumidor

O Plano Real, programa de estabilização econômica implantado em 1994, pelo


então Ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, diferente da então conturbada
década de 1990, trouxe estabilização para economia e acabou com a era da
superinflação. Com o tempo, o poder de compra da população aumentou os setores
econômicos nacionais e os baixos índices de inflação facilitaram o acesso ao crédito.6
Essas mudanças, especialmente na economia, fizeram surgir um consumidor
com um perfil diferente, mais disposto a investir e a consumir produtos que antes
estavam com acesso limitado. E este novo consumidor começou a definir as regras do
mercado.

6
De 2003 até 2008, mais de 24 milhões de pessoas no Brasil saíram da pobreza, estas geraram um
aumento da proporção da classe baixa e da classe média de 43% em 2003 para 53,6% em 2009.
Disponível em: <http://www.controlrisks.com/webcasts/studio/foco/foco_issue_10/portuguese/article_3.
html>. Acesso em: 15 jun. 2013.
284

O florescimento de uma nova classe média brasileira, ou uma nova classe C,


como vem sendo denominada esta camada da população que, imbuída pela maior
possibilidade de crédito e aumento de renda, passou a ter acesso a serviços que, antes,
pertenciam às classes com maior poder aquisitivo, especialmente no segmento de
prestação de serviços.
Em 2012, o site do Governo Brasileiro publicou reportagem na qual divulgava
dados essencialmente importantes sobre a classe C. Segundo o texto, em 2011, 27
milhões de pessoas saltaram das classes D e E para integrar a classe C que se tornou
maioria da população no país. Além disso, o texto cita ainda a passagem de 230 mil
brasileiros da classe C para as classes A e B. Isto confirma o aumento considerável do
poder econômico (PORTAL BRASIL, 2012).
O que se vê hoje é uma classe média com poder de consumo, que almeja acesso a
serviços e produtos antes exclusivos das classes superiores, porém que não deixou de
dar atenção ao fator preço. Muitos mercados, inclusive o da educação superior, atentos a
isto, criaram modelos de serviços que atendessem às necessidades deste novo perfil.
As políticas implementadas a partir deste período procuravam responder a esse
mercado que criava uma nova clientela, concorrente às vagas no mercado de trabalho,
um mercado que crescia e que estava ávido por mão de obra mais qualificada. Educação
superior era fundamental. De acordo com Sampaio (2000, p. 53) “[...] o diploma de
ensino superior passou a significar garantia de acesso a esse mercado”.
Houve então uma facilitação do acesso ao ensino superior, quando as faculdades
passaram a oferecer cursos com mensalidades que eram possíveis de serem inseridas no
orçamento familiar. Ter o diploma de graduação superior permite que o indivíduo
aumente as possibilidades de obter um emprego no mercado no trabalho.
As instituições educacionais privadas perceberam que, inseridos neste novo
contexto social e econômico, os integrantes da nova classe média poderiam se
transformar em clientes, consumidores de curso superior.
Este desenvolvimento foi impulsionado ainda pelo próprio avanço da internet e
pela procura de cursos superiores à distância, com preços ainda menores, cujas
mensalidades se adequam muito bem ao orçamento do aluno. Trata-se de um novo
panorama da educação: existem vagas disponíveis, existe um consumidor disposto a
preencher estas vagas, mesmo quando a qualidade do ensino é questionada. Outro
detalhe que chama a atenção do aluno-consumidor são os preços das mensalidades dos
cursos das IES brasileiras, que atualmente são bem acessíveis. Dessa forma é bem maior
285

a possibilidade dos alunos das classes emergentes adentrarem ao ensino superior


(GUTIERREZ, 2014).
O público alvo dos grandes oligopólios brasileiros é o aluno trabalhador, como
explica Carbonari Netto, em entrevista ao professor José Dornelles, quando comenta a
respeito da missão do Grupo Anhanguera:
[...] não poderia privilegiar a classe A, ou seja, mestres, doutores e PhD’s
com missão de fazer pesquisa para auxiliar no desenvolvimento do país, pois
isso outras universidades fazem melhor do que a minha. A missão do Grupo
Anhanguera foi definida para promover cursos superiores de boa qualidade
para auxiliar no desenvolvimento do projeto de vida do aluno de classe C7.

A princípio, a ideia de Carbonari era fugir às missões de universidades federais,


estaduais e prestigiar uma classe com poucas opções para inserção em cursos superiores
no Brasil. Segundo Ricardo Scavazza8 “a chance de crescimento das IES está nas
camadas populares, que apostam em um diploma de nível superior para melhorar de
vida”. Dessa forma, comprovada, o público da Anhanguera, sempre foi o:

[...] trabalhador jovem que estuda à noite. É evidente que temos cursos de
medicina, farmácia, veterinária, direito e administração, diurnos, mas 85%
dos nossos estudantes estudam de noite e trabalham de dia. Com esse foco,
conseguimos ampliar as matrículas, em dez anos, numa média de 100% ao
ano. É um número absurdo, mas é real. Se contarmos os 14 anos de
existência da Anhanguera, podemos falar numa média de 65% de
crescimento ao ano no número de matrículas.

Confirmando o público-alvo dos grandes grupos educacionais, Mautone (2007)


acrescenta que além de serem alunos da classe média e média baixa que trabalham
durante o dia, eles também não podem contar com a ajuda da família para pagar os
estudos. Por isso, mais de 80% dos cursos são noturnos e custam, em média, uma
mensalidade de R$ 400 reais, em geral, 50% mais barata que a das principais
concorrentes. Tal fato torna o acesso mais fácil para esta classe de trabalhadores do
nicho social que tem maior urgência na expectativa de melhoria pessoal e profissional.

7
Entrevista concedida para o Prof. Jose Dorneles em 17.10.2011. Video youtube. Disponível em:
<http://www.youtube.com/watch?v=SP6ThzLM32k>. Acesso em: 7 jan. 2013
8
Ricardo Scavazza além de diretor de relações com investidores da Anhanguera é também sócio do Pátria
Investimentos, gestora de recursos que, por meio de um de seus fundos, associou-se à rede em 2003 e,
logo depois, assumiu seu controle (MAUTONE, 2007) e segundo o relatório Bovespa (2009, p. 202)
Ricardo Leonel Scavazza: é Diretor Vice-Presidente Operacional e graduou-se em Administração pela
Universidade do Texas e pela Fundação Getulio Vargas. Foi Diretor Financeiro da operação do Rio de
Janeiro da Diagnósticos da América S.A. em 2001, responsável pela área de fusões,aquisições e
desenvolvimento de novos negócios. Ingressou como sócio do Pátria Investimentos S.A., em 2005.
286

Considerações finais

Pelo perfil da expansão na educação superior brasileira, parece ser impossível


refrear o avanço da formação de grandes redes, bem como seu processo de
mercantilização. Bittar (2002, p. 54) afirma que “[...] há um vale tudo nesse nível de
ensino”.
A educação superior transformou-se num grande supermercado, em cujas
prateleiras, produtos e serviços disputam a atenção e o desejo dos consumidores. No
entanto, a educação superior deveria ter, como preocupação central, à formação humana
e não o privilégio do fator econômico. Trata-se de um momento de grandes desafios
para a política de educação superior no Brasil, diante da transformação do saber em
mercadoria.
As IES privadas mercantis atendem à pressão do modelo capitalista neoliberal,
regido pela busca incessante do lucro. Os oligopólios que consagram a educação
superior como mercadoria distanciam-se do pensamento de Mészarós (2005, p. 9), de
que “[...] a educação não deve apenas qualificar para o mercado de trabalho, mas
também para a vida [...]”. Consequentemente, estão longe de contribuir com a
possibilidade emancipadora da educação, principalmente quando deve atender às
demandas do mercado.
A educação superior, como um direito de todos, deve contribuir para o
desenvolvimento e transformação do próprio homem e da sociedade. Somente dessa
forma poderá se colocar como estratégia de emancipação, vislumbrando uma proposta
de mudança social e pessoal.

Referências

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predomínio privado/mercantil e desafios para a regulação e a formação universitária.
Educação e Sociedade, Campinas: CEDES, v. 29, n. 105, p. 991-1022, set-dez., 2008.
289

Comunicação

O ensino fundamental paulistano: para o povo, mas não do Povo

Clóvis Edmar Paulino


Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FEUSP)

Resumo: Este estudo qualitativo buscou verificar a presença ou não dos compromissos
da Educação Popular do Secretário de Educação Paulo Freire (1989 a 1991) em uma
escola da Rede Municipal de São Paulo; quais dos compromissos, do 1° ao 6°, de
maneira razoavelmente explícita, estava sendo mediado para algumas crianças pelos
professores e pelas professoras em uma escola da rede pública paulistana em 2012, em
período de transição do Ensino Fundamental de 8 para 9 anos. Foram examinadas as
produções de textos espontâneos de 17 crianças. Foram envolvidas as três 4as séries
(turmas regulares do Ensino Fundamental de 8 anos) e os três 3°s anos (do Ensino de 9
anos), dos quais uma turma se tornou a referência devido uma regência de sala/turma
declaradamente freiriana. Verificou-se diminuta presença dos compromissos da
Educação Popular nas produções de textos das crianças, com a indicação da necessidade
de intensificar e ampliar a defesa dos princípios da Educação Popular.

Introdução
Já há anos do período em que a equipe do Secretário de Educação do Município
de São Paulo Paulo Freire (1989 a 1991) pôde experimentar disposição para o diálogo, e
tentar “Mudar a cara da escola”, numa perspectiva democrática e participativa, que
viabilizasse projetos políticos pedagógicos para chamar o povo à escola, para participar
coletivamente da construção de um saber que considerasse as suas necessidades e
transformasse esses projetos em instrumentos de luta, dando ao povo possibilidade de
transformar-se em sujeito de sua própria história. Paulo Freire queria a participação
popular na criação da cultura e da educação para romper com a tradição de que só a elite
tem a competência e os saberes de quais são as necessidades e interesses de toda a
sociedade, com uma escola centro irradiador da cultura popular, à disposição da
comunidade, criando e recriando esta cultura; portanto, a escola, também, como um
espaço de organização política das classes populares, no qual o espaço de ensino-
aprendizagem passasse a ser centros de debates de ideias, soluções, reflexões, no qual a
290

organização popular iria sistematizando sua própria experiência, e assim: "O filho do
trabalhador deve encontrar nessa escola os meios de auto-emancipação intelectual
independentemente dos valores da classe dominante (...)" (FREIRE, 1991, p.16). Mas o
que aconteceu com essa construção da educação pública popular e democrática ? O que
aconteceu com os pressupostos da educação popular? A Educação Popular que era
definida por Paulo Freire
[...] a educação popular cuja posta em prática, em termos amplos, profundos
e radicais numa sociedade de classe, se constitui como um nadar contra a
correnteza é exatamente a que, substantivamente democrática, jamais separa
do ensino dos conteúdos o desvelamento da realidade. É a que estimula a
presença organizada das classes sociais populares na luta em favor da
transformação democrática da sociedade, no sentido da superação das
injustiças sociais. É a que respeita os educandos, não importa qual seja sua
posição de classe e, por isso mesmo, leva em consideração, seriamente, o seu
saber de experiência feito, a partir do qual trabalha o conhecimento com rigor
de aproximação aos objetos. É a que trabalha [...] a boa qualidade do ensino,
a que se esforça em intensificar os índices de aprovação através de rigoroso
trabalho docente e não com frouxidão assistencialista, é a que capacita suas
professoras cientificamente à luz dos recentes achados em torno da aquisição
da linguagem, do ensino da escrita e da leitura.
[...] É a que, em lugar de negar a importância da presença dos pais, da
comunidade, dos movimentos populares na escola, se aproxima dessas forças
com as quais aprende para a elas poder ensinar também. [...] É a que supera
os preconceitos de raça, de classe, de sexo e se radicaliza na defesa da
substantividade democrática. [...] É a que não considera suficiente mudar
apenas as relações entre educadora e educandos, amaciando essas relações,
mas, ao criticar e tentar ir além das tradições autoritárias da escola velha [...]
(FREIRE,1993, p.101,102 e103).

Uma Educação Popular que é uma opção política por uma educação crítica, na
qual há o plano de educação segue o compromisso com: 1. princípios de solidariedade e
justiça social; 2. o estímulo à gestão democrática da educação; 3. a luta pela qualidade
social da educação; 4. a abertura da escola à comunidade; 5. a construção do currículo
participativo, autônomo e coletivo; 6. o respeito ao saber e competência dos educandos;
7. e uma formação dos educadores condizente com os 6 compromissos anteriores. Este
estudo procurou responder: o que restou, ficou, na Rede Municipal de São Paulo do
plano de educação, da proposta de educação popular de Paulo Freire e seus
colaboradores? Mas, foi necessário um recorte: o que desses compromissos ainda é
mediado para as crianças pelos professores e pelas professoras na rede pública
paulistana? E, assim, outro recorte se fez necessário dada as dimensões qualitativas e
exploratórias desse estudo: quais desses compromissos, de maneira razoavelmente
explícita, do 1° ao 6°, estava sendo mediado em 2012 para algumas crianças pelos
professores e pelas professoras em uma escola da rede pública paulistana?
291

Alicerçando o estudo: a escrita no Ensino Fundamental


Ao analisar duas produções elaboradas por estudantes do 6° ano (5a série do
Ensino Fundamental de 8 anos) Adriana Santos Batista (2012) assevera que a escrita
resultante do Ensino Fundamental é um resquício de texto do qual só se reconhece o
formato. Como professor da rede municipal de São Paulo concordo com a autora: o tipo
de escrita que estamos alcançando com uma apropriação simbólica de padrões de ensino
não parece ter como direção o desenvolvimento das crianças e dos adolescentes, e sim
sua necessidade de se prender algo previamente dado.
A situação é preocupante, pois como conclui Batista (2012) a ausência, ou a pouca
existência de uma base escrita consistente priva as crianças e adolescentes de, ao
escrever, ultrapassar a sombra dos modelos ensinados. Como argumenta a Professora
Claudia Rosa Riolfi, guardando as proporções, quando encontramos uma escrita ela é a
escrita cosmética, já que é inócua e não um ato que transmuda. "Esmagados" tanto
pelas demandas, internas e externas à escola, daqueles que pedem a produção de textos,
quanto pelo opaco sistema linguístico-discursivo no qual o escrito se tece, nossas
crianças e adolescentes, no processo de aprender a escrever, tentam maquiar uma
superfície com palavras de modo a torná-la bela aos olhos de quem se dignificar a ler
(RIOLFI, 2011). Na rede municipal de São Paulo, os passos para esta situação são
delineados pela discussão realizada por Thomas Massao Fairchild (2012), que evidencia
a adoção das perspectivas dos gêneros discursivos (ou textuais). E, assim para ler e
escrever textos, tornou-se comum a escolha de um determinado grupo de gêneros com
os quais os alunos teriam contato no decorrer do ano para que fossem capazes de
reconhecê-los e produzi-los (BASTISTA, 2012). Dos meados da década de 1980 até
hoje, dos esquecidos pressupostos dos aspectos de textualidade, tais como coesão e
coerência, o ensino da escrita em língua portuguesa, presentes em documentos oficiais
como as Orientações Curriculares e proposição de expectativas de aprendizagem para
o ensino Fundamental (PMSP, 2007), tem como primazia a importância do formato do
texto ser ou estar ou não adequado às características dos gêneros ensinados.
É neste Ensino Fundamental (até 2015 de 8 e de 9 anos), com tal escrita, que
propõe-se a observação de produções de textos que possam revelar ou não a presença da
Educação Popular proposta por Paulo Freire, isto pelo compromisso com: princípios de
solidariedade e justiça social; o estímulo à gestão democrática da educação; a luta pela
qualidade social da educação; a abertura da escola à comunidade; a construção do
292

currículo participativo, autônomo e coletivo; e o respeito ao saber e competência dos


educandos.

O estudo e suas circunstâncias


Este estudo é qualitativo, não procura validade estatística, pois, entre outras
considerações, não apresenta precisão na amostragem. Busca, especificamente, verificar
a presença ou não dos compromissos da Educação Popular proposta por Paulo Freire em
uma escola da rede municipal. Para tanto, examinei a produção de texto de 17 crianças.
Analisei textos espontâneos, no qual a criança recebeu uma folha em branco para
escrever livremente. Decidi que, sem amparo em nenhum estudo, para a escrita de cada
texto, a criança teria uma hora/aula (45 minutos), período que é bastante característico
dos tempos escolares brasileiros e paulistanos. Cabe informar que as produções de texto
espontâneo ocorreram nos dias 18, 19, 22 e 24 de outubro de 2012 em momentos
possíveis dentro da grade de horários de cada turma e a minha disponibilidade. O estudo
envolveu as três 4as séries (do Ensino Fundamental de 8 anos) da escola, que denominei
4a X, Y e Z. Turmas regulares de uma EMEF (Escola Municipal de Ensino
Fundamental), que como atividade lúdica só vivenciam o recreio, que é o momento
destinado ao lanche e às brincadeiras, num período de 20 minutos; e que as professoras
das turmas pouco ou quase nada participam de formações que pudessem contribuir para
"aulas" mais temperadas com os compromissos da Educação Popular proposta por
Paulo Freire. Também foram envolvidos os três 3°s anos (do Ensino Fundamental de 9
anos), dos quais dois foram denominados 3° S e 3° T, turmas regulares, como das 4as
séries. E o 3° R, uma turma que foi mantida a mesma do 2° para o 3° e que eu, como
professor polivalente, tentei trabalhar com as práticas e conceitos da Educação Infantil,
com a preocupação de alcançar uma apropriação simbólica de padrões de ensino que a
direção contemple o desenvolvimento integral da criança e, sempre que possível,
levando e resgatando para as "aulas" e no trabalho com os responsáveis das crianças os
compromissos da Educação Popular proposta por Paulo Freire. Por isso, me permiti
denominar a "minha" turma como turma de referência, com a hipótese da constatação de
melhorias alcançadas não detectadas nas outras turmas, principalmente, quanto ao
envolvimento delas com os compromissos. Da minha turma trabalhei com crianças em
que já era sabida a produção de textos "aceitáveis", e das demais turmas solicitei às
professoras de cada turma que, para o estudo, fossem escolhidos os melhores
"escritores", meninos ou meninas, numa tentativa de evitar o relatado por Batista
293

(2012), textos que caracterizassem uma escrita colada a modelos estipulados e a pouca
precisão no traçado, ou textos previamente apoiados em modelos, seja na forma de
moldura ou pela reprodução de outras propostas do cotidiano escolar. Esta opção foi
uma tentativa de minimizar grandes estragos na percepção dos compromissos nas
produções de textos.

As opções deste estudo para a percepção dos compromissos nas produções de texto
Cláudia Riolfi (e grupo) trabalha com estudos e pesquisas preocupados, entre
várias responsabilidades e curiosidades científicas, em responder como formar novas
gerações para que possam se servir do conhecimento universal para escrever textos que
coloquem no mundo a invenção de sua singularidade (RIOLFI, 2012, p. 10). Como é
esperado que os compromissos apresentem uma relação com a singularidade e que a
escrita traduz a escolaridade mais que a fala, preferi analisar textos que entrevistas, pois,
em tempos de programas "ler e escrever", parece bastante interessante ver o que o
"escrever" pode oferecer dos compromissos freireanos.

As produções de textos coletadas


Os quadros de Quadro 1 ao Quadro 17 apresentam as produções de escritas
datilografadas.
Quadro 1. Produção da criança 2, de 18/10/2012, do 3°ano S

Título Minha vida


1 EU SOU RAQUEL E ESSA É A MINHA VIDA
2 SEMPRE COM ALGUMA COISA PARA FAZER.
3 MAIS DO MESMO GEITO EU ME ESFORSO PARA
4 FAZER TUDO, E AINDA MAIS.
5 MAIS NÃO É DIFÍCIO PORQUE SE ACONTESE ALGUMA
6 COISA SEMPRE MINHA FAMILIA ME CONSOLA.
7 EU SÓ TENHO QUE ESTUDAR O QUE É FACIL PARA MIM.
8 QUE SEMPRE ADORA ESTUDAR PORQUE É A COISA
9 QUE EU MAIS FAÇO MAIS SEMPRE FELIZ POR
10 PODE ESTUDA DE GRAÇA.
294

Quadro 2. Produção da criança 3, de 24/10/2012, do 3°ano T


Título Historias
1 Eu gosto de escreve historias por que e mui-
2 to bom escreve historias por que nos a
3 prede mais..

Quadro 3. Produção da criança 1, de 18/10/2012, do 3°ano S


Título Hora de ficar doente.
1 No mês de agosto foi o aniversário do meu pai.
2 Nós fizemos um churasco para ele com tudo que é
3 carne ele gostou muito. No outro dia eu fiquei muito
4 doente com a bronquiti asmatica avançada e
5 eu e minha mãe fomos a médico e demoramos
6 muito para chegar, Nós passamos ao mecador
7 para comprar algumas coisas.

Quadro 4. Produção da criança 4, de 18/10/2012, do 3°ano R


Título Minha vida
1 Eu me chamo Alessandra. Tinha 8 irmãs e irmãos quando um
2 menino morreu quando era bebê. Não cheguei a conheçelo. Fiquei
3 com 6 irmâs e 1 irmão esse meu irmão foi para a Bahia. Vou escrever
4 o nome delas: Vanessa, Andressa, Adriana, Amanda e Sônia. Minha mãe se chama
5 Sônia e meu pai Genildo. Na escola eu aho que o parquinho precisa
6 de brinquedos. Hoje é anivesario da minha irmã Adriana. Essa é quase a minha
7 vida toda. Se eu contar a minha vida toda não vou terminar. Fim

Quadro 5. Produção da criança 5, de 19/10/2012, do 3°ano R

Título ESPORTE
1 O BRAIL EO PAIS QUE REVELO MAIS
2 ESTRELA NO FUTEBOL NO VOLEI NA
3 NATASÃO NA CORIDA NA FORMULA 1
4 NO ATLETISMO O BRASIL TEM O MELHOR
5 JOGADO DE FUTEBOL DO PLANETA QUE É
6 O PELÉ MAS A ARGENTINA TEM O LIONEL
7 MESSI E O PORTUGAU TEM O C. RONALDO
8 O NEYMAR TEM O ESTILO JOGO BONITO
9 MARO JOGADO DA INGLATERRA O RONEY
10 OTIME BRRASILEIROS OS MELHORES SÃO
11 NEYMAR P.H.GANSO L. FABIANO LUCAS R.CENI
12 D. SOUZA BERNAR.
295

Quadro 6. Produção da criança 6, de 19/10/2012, do 3°ano R


Título NO DIA QUE EU ENTREI NO 3 ANO C
1 FUI NO 3º ANO C EVI QUE ERA O PROESSOR
2 CLÓVIS NO PRIMERO DIA EUVI QUE ELE ERA
3 LEGAL COMQUEN ERA LEGAL QUEN ERA
4 BAGUSSERO ELE ERA BRAVO DAVA AS RECRAS BUCHADAS
5 PELO NARIZ NO CEGUNDO DIA O PROFESSOR CLÓVIS
6 EVENTOU A AMARELINHA E EU VI EVALEI EU
7 ADOREI ESSA PRIANCADERA EU NÃO COECIA
8 PULEI CHUTINHO MALHEI PIEEI É COMPRA DE
9 CASA NO QUARTO DIA ELE INVENTOU A
10 QUEIMADA A GENTE NÃO CABIA BRINCAR
11 ELE ERA TAAAAALEGAL ELE ATE VALOU
12 AS REGRAS NO QUARTO DIA ELA FALOU
13 TIVE UMA IDEIA É FALOU FIM.

Quadro 7. Produção da criança 7, de 18/10/2012, do 3°ano R


Título Como era a minha escola
1 (*1) Entrei na pré-(*2) quando tinha 4 anos, era a a-
2 luna mais comportada e calada da turma.Minha escola
3 era assim:tinha o refeitório, depois da entrada prin-
4 cipal, a quadra, o parquinho, as salas, os banheiros, os bebe-
5 douros, a diretoria, a sala dos professores e a secretaria,
6 essa duas últimas sala que eu disse eram dentro da dire-
7 toria. As salas tinham cadeiras coloridas (Amarelo, rosa, azul e
8 verde).A lousa grande e verde escura e azul.As parede todas
9 pintada de branco.Tive 4 anos de estudo naquela escola.As mi-
10 nhas professoras se chamavam Ana e Maria Clara.Quando eu
11 entrei na sala da profª Ana ela me pareceu bem chata, mas
12 com o tempo fui vendo que ela era bem le(*3) a profª Maria
13 Clara me pareceu bem legal.E meus quatro anos de aula
14 com elas duas foi bem legal...Mas outro dia bem chatos.
15 Um dia teve um festa na quadra, nossa aquela festa foi
16 muito, mais muito legal mesmo, porém aquela festa foi para come-
17 morar o fim de ano.E aí acabou o ano escolar.
O bservaçãoes: (*1) Apaga para deixar parágrafo; (*2) intenção de escrever pré-escola
(*3) rasurado

Quadro 8. Produção da criança 8, de 19/10/2012, do 3°ano R


Título MELHORES AMIGOS
1 EU E O MATHEUS SAMOS MELHORES AMIGOS
2 § DES DE A CREGE MELHORES AMIGOS ATÊ
3 AGORA DES DE CRIANÇA NO 1º 2º E 3º ANO
4 E N 4º 5º E 6º E NÃO VIA MODAR COMSERTEZA
5 COMSERTEZA O MATHEUS E EU SAMOS MELHORES
6 AMIGOS DO MUNDO EMTEIRO E DO UNIVERSO SAMOS
7 UMA DUPLA DINAMICO QUENEM BATMAN E ROBEM.
296

Quadro 9. Produção da criança 9, de 19/10/2012, do 3°ano R

1 EU PREFERIA QUE EU EM TRASSE NA ESCOLA


2 COM 7 ANOS PRÉ AGENTE BRINCA MAIS
3 NÓIS DOR ME LA E MUINTO BOM MAS JÁ
4 QUE EU ENTREI COM 6 ANOS JA TA BOM POR
5 QUE EU JA SEI LER ESCREVER E O MEU
6 PROFESSORES MUINTO BOM.

Quadro 10. Produção da criança 10, de 19/10/2012, do 3°ano R


1 EU PERDI 4 ANOS INTEIROS E TAMBEM QUAN-
2 DO EU ERA DO MACHADO DE ACIS ERA MUITO
3 LEGAL E EU TINHA UM A MIGO MUITO LE-
4 GAL E ELE SICHANMAVA KAUAN ALVES E ELE
5 TABEM É COMIGO ATE HOJE NO 3º ANO C
6 ELE TAMBEM COTINUA LEGAL AS VESES AGENTE
7 BRIGA UMPOCO MAS DE POIS AGENTE SEAN-
8 TENDE E TAMBEI EU CONHESI UM AMIGO
9 MUITO LEGAL ELE SICHAMA KAYKY E FOI ISSO
10 QUE EU COMTEI FIM.

Quadro 11. Produção da criança 11, de 22/10/2012, do 3°ano R


Título EU VO CONTA A MINHA VIDA
1 EU NÃO FICO NA RUA EU SÓ FICO EM
2 CASA EU NÃO BRICO COM NINGUEM
3 EU AJUDO A MINHA MÃE EU BRINCO
4 COM MEU IRMÃO EU AMO AMINHA
5 FAMILIA EU BRINCO SOZINHA EU AJUDO
6 A MINHA MÃE A ARRUMA A CASA A
7 MINHA VIDA NÃO É FACIL DE NINGUEM
8 É FACIL AS VEZES EU VO A CASA DA
9 MINHA TIA EU BRINCO COM A MINHA PRIMA
10 QUE ESTUDA AQUI O NOME DELA É MARIA
11 EDUARDA EU TAM BEM TENHO MAIS
12 3 PRIMO QUE ESTUDA AQUI O NOMA
13 DELES É SILAS E ISAIAS E O EZEQUIEL
14 BOM ESSA É A MINHA VIDA.

Quadro 12. Produção da criança 12, de 18/10/2012, do 4°ano X


Título O lobisomem
1 Éra uma Vez Dizer Que já Viro O lobisomen
2 ele é Pelodo gosta de carne de humano Dizer Que ele
3 Só aparece Só de Noite. Dizer Que noum cimiterio Quadro
4 crianças Só para Bacumsa e aparéce O lobisomem. E
5 Matou Dizer Você Voro la no cimiterio Você Não Vai
6 Vou
297

Quadro 13. Produção da criança 15, de 18/10/2012, do 4°ano Y

Título O meu almoço


1 No meu almoço Gosto de de tudo menos carne
2 Gosto De arroz, feijão, batata frita. Se tiver carneeu
3 não como de jeito nenhum Sempre que tem carne
4 eu pesso a minha mãe pra tirar porque eu
5 jogo fora no meu almoço é assim sem carne
6 eu cam cam carne eu não como.

Quadro 14. Produção da criança 13, de 18/10/2012, do 4°ano X


Título O começo da minha historia
1 Ouado lu nasci lu já estava pençando lm
2 arrumar angus anigos lm tão fis 3 anos
3 e minha mal teve uma ideia de por lu
4 Na creje lu fiz Muito aniguinhos como
5 queria lu Binqulm muito lu adorem
6 a minha nova creje quamdo jegem comtem
7 para minha mal qul lu arrunen varios
8 anigo e tanbrem comtem para meu pai
9 meu pai comveço com migo qul daqul
10 1 ano lu vom sair daninha escolinha
11 lu fiqulm triste e fui a provreita nilha
12 escola e acabrom o 1 ano e medispedi
13 dos meus anego e daninha professora.

Quadro 15. Produção da criança 14, de 18/10/2012, do 4°ano Y


Título A Viagem para Salvador.
1 Tem uma história que até hoje eu lembro,
2 a minha madrinha me chamou para eu passar
3 umas férias em Salvador - Ba.
4 La eu a minha madrinha, meu padrinho, e a
5 fiha deles e a família fomos a praia base Naval
6 ao chope a praia barra, piatá Elevador, ao Bonde.
7 Mas o que eu achei mais engraçado foi o preço
8 das coisas.O elevador por mais de 30,5 metros só 0,15
9 centavovos o bomde de 20,0 metros por 0,15 isso e
10 incrivel. Fomos tambén no zológico.
11 eu conheci tambem o chopingg Lacerda. Os binque-
12 dos que tinha era só R$1,00. A passagem de ônibus por
13 apena s R$2,00. Gostei muito desse passeio espero que
14 sembe se repita. No fim do ano talvez vou de novo.
298

Quadro 16. Produção da criança 16, de 18/10/2012, do 4°ano Z

Título Por que eu gosto?


1 gosto de melancia por que é uma fruta com
2 bastante água e é meio docinho, a escola
3 tem chão quadriculado pela formas geometricas,
4 a escola é cheias de formas geométricas,
5 tem bastante crianças, tem professores bem
6 legais, tem teatros, tem gimcanas, tem sala
7 de vides. Por isso que eu gosto.

Quadro 17. Produção da criança 17, de 2210/2012, do 4°ano Z

Título Minha escola é legal


1 Na minha escola é muito
2 legal tem quadra, auditorio, sala de
3 informàtica, sala de inglês, sala de
4 artes, e etc
5 Mas tambem tem alguns alunos
6 que as vezes dão muito trabalho
7 pros pofessores (a) e tambe eu gosto muito
8 de brincar com os meus colegas
9 É por isso que eu gosto dos meus
10 colegas é da Minha escola.

Verificação da presença (razoavelmente explícita) dos compromissos ou não


Foi considerado que todas as crianças tinham e têm os mesmos ou as mesmas
professoras especialistas, muitas crianças são aparentadas, moradoras do mesmo bairro,
pertencendo à mesma realidade, em toda a sua totalidade e complexidade, na qual o
tempo escolar no máximo representa apenas um quarto do dia. Verificando os 17
quadros de produções de escrita, mesmo na turma de referência (3° ano R), nas
produções de textos espontâneos, os compromissos da Educação Popular proposto por
Paulo Freire não aparecem de maneira a convencer que são elementos apropriados
integralmente pelas crianças. Ainda em relação ao 3°R fica a curiosidade científica de
qual seria o resultado se os responsáveis fossem os "informantes", dada a crescente
presença deles nas reuniões da escola, que alcançou a presença com participação atuante
de 30 de um total de 34; como hipótese os compromissos estariam muito mais presentes
na informação dos responsáveis. Procurando pela presença razoável dos compromissos
obtemos a Tabela 1 que sumariza os resultados, no geral sinalizam uma presença
299

diminuta em apenas 8 das 17 produções de texto, e, ainda, como ideia e não


argumentações diretas dos compromissos.
Tabela 1. Presença razoável dos compromissos
1. Princípios de 2. O estímulo 3. A luta 4. A 5. A construção do 6. O respeito
solidariedade e à gestão pela abertura da currículo participativo, ao saber e
Ano/
Criança justiça social democrática qualidade escola à autônomo e coletivo competência
Série
da educação social da comunidade dos educandos
educação
Por pode
2 3° S - - estudar de - - -
graça
Na escola eu aho que o
4 3°R - - - - parquinho precisa de -
brinquedos
Ele era legal comquen
era legal quen
erabagussero ele era
6 3°R - - - - bravo dava as recras -
buchadas pelo nariz

Eu e o Matheus
8 3°R samos melhores - - - -
amigos
Eu preferia que eu em
trasse na escola com 7
anos pré agente brinca
9 3°R - - - - -
mais nóis dor me la e
muito

Tema da amizade
10 3°R ao longo do texto - - - - -

Eu ajudo minha
11 3°R mãe a arruma a - - - - -
casa

Tema da amizade
13 4a X ao longo do texto - - - - -

Considerações finais

Esta diminuta presença dos compromissos nas produções de textos das crianças,
tanto pode ter origem sistêmica com o não trabalho destes pelas secretarias que
assumiram depois da equipe de Paulo Freire, uma opção política, quanto como a falta de
persistência e resistência daqueles professores e professoras que tinham apoiado as
transformações freireanas. Teríamos, então, uma pergunta a responder: aconteceu uma
desmobilização política? Sabendo que a realidade escolar apresenta-se bastante
assemelhada em toda a rede municipal, que é no "escrever" que aparece a escola que
está sendo feita, este estudo parece indicar a nós que acreditamos na Educação Popular
(como um plano de educação competindo politicamente com outras opções), a
necessidade de não parar, intensificar e ampliar a defesa dos princípios de solidariedade
e justiça social; bem como estabelecer o estímulo à gestão democrática da educação;
insistir na luta pela qualidade social da educação; assegurar a abertura da escola à
300

comunidade; fazer a construção do currículo participativo, autônomo e coletivo;


fomentar o respeito ao saber e competência dos educandos; e principalmente, a defesa
de uma formação dos educadores condizente com os 6 compromissos anteriores.

Referências

BATISTA, A. S. Sombras de textos: a escrita no ensino fundamental; In: BARZOTTO,


V. H.; RIOLFI, C. R. (Orgs.) Sem choro nem vela: cartas aos professores que ainda
vão nascer. São Paulo: Paulistana, 2012.

FAIRCHILD, T. M. Velas que não iluminam: texto, gênero e a invenção do professor


genérico; In: BARZOTTO, V. H.; RIOLFI, C. R. (Orgs.) Sem choro nem vela: cartas
aos professores que ainda vão nascer. São Paulo: Paulistana, 2012.

FREIRE, Paulo. A educação na cidade. São Paulo: Cortez Editora, 1991.

FREIRE, Paulo. Política e educação. São Paulo: Cortez Editora, 1993.

PMSP. Secretaria Municipal de Educação. Diretoria de Orientação Técnica.


Orientações Curriculares e proposição de expectativas de aprendizagem para o
ensino Fundamental: Ciclo I. São Paulo: SME/DOT, 2007.

RIOLFI, C. R. Lições de Coragem; In: BARZOTTO, V. H.; RIOLFI, C. R. (Orgs.) O


inferno da Escrita. Campinas: Mercado de Letras, 2011.

RIOLFI, C. R. Idioglossias partilhadas: cartas de amor ao professor que ainda vai


nascer; In: BARZOTTO, V. H.; RIOLFI, C. R. (Orgs.) Sem choro nem vela: cartas
aos professores que ainda vão nascer. São Paulo: Paulistana, 2012.
301

Comunicação

Necessidades formativas de alfabetizadores atuantes na rede municipal de ensino


do município de Aracruz/ES

Cristiane Lozer Piol


FAACZ/FAPES1
Wirla Santana Fachetti
FAACZ/FAPES2
Rita de Cássia Mitleg Kulnig
FAACZ3

RESUMO: Este estudo objetivou caracterizar os professores que atuam no Ciclo de


Alfabetização de escolas públicas de Aracruz/ES; conhecer suas condições de trabalho e
processo de formação; e mapear suas necessidades formativas relacionadas ao processo
de ensino da leitura e da escrita. Participaram 14 escolas e 51 professores. Os dados
produzidos por meio da aplicação de um questionário foram organizados nas categorias
perfil socioprofissional; condições de trabalho; processos de formação e necessidades
formativas para o ensino da leitura e da escrita. Os resultados apontam a elaboração de
estratégias de ensino que atendam a diversidade de ritmos de aprendizagem dos alunos
em uma mesma turma e o domínio de conhecimentos e estratégias de ensino em relação
à leitura e à produção de textos escritos como necessidades formativas desses
professores. Conclui-se que a escuta das necessidades apontadas pelos professores deve
ser um requisito básico na elaboração de políticas públicas de formação.
PALAVRAS-CHAVES: Necessidades formativas. Alfabetizadores. Aracruz.

1
Graduanda do curso de Pedagogia das Faculdades Integradas de Aracruz – FAACZ; Bolsista de
Iniciação Científica da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo – FAPES;
crislozer@hotmail.com
2
Graduanda do curso de Pedagogia das Faculdades Integradas de Aracruz – FAACZ; Bolsista de
Iniciação Científica da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo – FAPES;
wsfachetti@hotmail.com
3
Professora do curso de Pedagogia das Faculdades Integradas de Aracruz – FAACZ; Doutoranda do
curso de estudos pós-graduados em Educação: Psicologia da Educação, da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo - PUCSP; rdecassia@hotmail.com
302

Introdução

A leitura e a escrita constituem-se em pré-requisitos para que o indivíduo possa vencer


os desafios do cotidiano em uma sociedade letrada, tendo em vista que essas habilidades
são indispensáveis ao pleno exercício da cidadania. Para viver neste tipo de sociedade,
não basta apenas decifrar o código escrito, é necessário interpretá-lo, compreendê-lo e
estabelecer relações a partir desse código para que efetivamente ocorra um processo
pleno de cidadania.
Dentro deste contexto, como ressalta Cagliari (2009), a apropriação da leitura e da
escrita torna-se um dos processos mais importantes na formação escolar de uma pessoa.
Porém, essa aprendizagem, apesar de ser reconhecida como essencial na vida de um
cidadão, bem como para o desenvolvimento de uma sociedade, apresenta-se, ainda hoje,
como um dos grandes desafios do sistema educacional brasileiro como vem apontando
os relatórios sobre as desigualdades na escolarização brasileira, apresentados pelo
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social – CDES (2006; 2007; 2009; 2010;
2014)4 .
O CDES aponta, em seus relatórios, a alfabetização como pré-requisito para a maioria
das habilidades necessárias para vencer os desafios do cotidiano na sociedade brasileira.
Embora tenhamos praticamente todas as crianças entre 6 a 8 anos de idade (Ciclo de
Alfabetização5) matriculadas nas escolas, um dado alarmante em relação ao quadro
atual do ensino da leitura e da escrita revelado no último relatório (BRASIL, 2014) é
que cerca de 15% das crianças brasileiras, aos 8 anos de idade, não são bem sucedidas
nesta aprendizagem. Se detalharmos este dado por região, o Espírito Santo, com um
percentual de 10%, é o estado da Região Sudeste que apresenta a maior taxa de crianças
não alfabetizadas aos 8 anos de idade. Já a Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios – PNAD (BRASIL, 2013) aponta que, no Brasil, para as crianças residentes
em áreas rurais essa proporção é de 21%, enquanto que para as residentes em áreas
urbanas a taxa é de 7,6%.
Os dados apresentados nestes dois relatórios refletem-se na Meta 5 do Plano Nacional
de Educação (Lei no 13.005/14) que é alfabetizar todas as crianças até, no máximo, 8
anos de idade. Esse panorama fez com que o governo federal lançasse em 2012, o Pacto
Nacional para Alfabetização na Idade Certa – PNAIC, um programa de ações
4
Os relatórios encontram-se disponíveis no site < http://www.cdes.gov.br/conteudo/6808/publicacoes-do-
cdes.html > Acesso em 20 jul. 2014
5
Entende-se por Ciclo de Alfabetização os três primeiros anos do Ensino Fundamental.
303

coordenado pelo MEC que visa garantir a qualidade do ensino da leitura e da escrita. O
PNAIC, como explicado no site oficial6 “é um compromisso formal assumido pelos
governos federal, do Distrito Federal, dos estados e municípios de assegurar que todas
as crianças estejam alfabetizadas até os oito anos de idade, ao final do 3º ano do ensino
fundamental.” As ações propostas pelo pacto apoiam-se em quatro grandes eixos:
formação continuada; material; avaliação e gestão.
Para os formuladores do PNAIC, as ações voltadas para a formação continuada devem
embasar-se no pressuposto de que o professor alfabetizador precisa ter clareza sobre
qual concepção de alfabetização está subjacente a sua prática. Dessa forma, o professor
não deve ser visto como um mero reprodutor de métodos de alfabetização, mas de
alguém que tenha clareza sobre o que ensina e como ensina.
Ou seja, para se ter clareza sobre o que ensinar e como ensinar, o professor precisa ter
clareza das necessidades que essa tarefa impõe. Essas necessidades surgem, portanto, de
uma situação objetiva, considerada a partir do trabalho do professor, tendo em conta
suas concepções, valores, bem como suas expectativas em relação à prática cotidiana.
Porém, conhecemos esses professores alfabetizadores? O que sabemos sobre os desafios
e as expectativas que enfrentam em seu cotidiano? Que necessidades formativas
apresentam em relação ao ensino da leitura e da escrita?
Esses questionamentos nortearam o Projeto de Iniciação Científica desenvolvido com
alunas do curso de graduação em Pedagogia das Faculdades Integradas de Aracruz –
FAACZ e levaram-nos a pensar em um estudo que possibilitasse conhecer melhor quem
são os alfabetizadores do município onde atuamos (Aracruz/ES). Um estudo que
permitisse uma caracterização desses profissionais, o conhecimento sobre suas
condições de trabalho e processo de formação, e um mapeamento das necessidades
formativas relacionadas ao processo de ensino da leitura e da escrita apontadas por esses
sujeitos.
Nesta comunicação, apresentaremos os resultados de uma das etapas deste projeto.

Método

Nesta etapa do projeto, foi aplicado um questionário aos professores que atuam em
turmas do Ciclo de Alfabetização das escolas públicas da rede municipal de ensino de
Aracruz. A elaboração deste questionário teve como base a pesquisa realizada por

6
Disponível em http://pacto.mec.gov.br Acesso em 10 jul. 2013.
304

Yamashiro (2008), no município de Presidente Prudente/SP, cujo objetivo foi identificar


as necessidades formativas dos professores do Ciclo I do Ensino Fundamental daquela
rede de ensino.
O questionário foi organizado em sete dimensões: dados pessoais, perfil
socioeconômico, perfil sociocultural, carreira profissional, formação inicial, condições
de trabalho e formação continuada. Para validação do instrumento, foi realizado um pré-
teste com um grupo de professores de duas redes de ensino.
Concomitante à elaboração do questionário, a proposta deste estudo foi apresentada à
Secretaria Municipal de Educação de Aracruz – SEMED, que, apoiando a realização da
pesquisa e reconhecendo a relevância de seus resultados para a elaboração de políticas
de formação de professores, autorizou a aplicação do questionário nas instituições de
ensino fundamental pertencentes à Rede Municipal.
Durante um encontro de formação realizado pela SEMED, além da apresentação dos
objetivos da pesquisa aos professores, foram entregues os questionários a um
representante por escola para que fossem distribuídos aos professores do Ciclo de
Alfabetização.
Das 27 escolas que ofertam turmas do Ciclo de Alfabetização, participaram desta
pesquisa 14 escolas, em um total de 51 professores, o que representa 30% da totalidade
dos docentes que atuam na rede municipal de ensino em turmas do 1o , 2o e 3o anos do
Ensino Fundamental, sendo que 34% dos docentes respondentes ao questionário
exercem a docência em turmas do 1o ano, 36% em turmas do 2o ano e 30% em turmas
do 3o ano.

Resultados e discussão

Dividimos a apresentação dos dados produzidos por meio da aplicação do questionário


em quatro categorias: perfil socioprofissional; condições de trabalho; processos de
formação e mapeamentos das necessidades formativas em relação ao ensino da leitura e
da escrita.

Perfil socioprofissional das professoras que participaram dessa pesquisa

Confirmando o cenário de feminização do magistério nos anos iniciais do ensino


fundamental, todos os professores que responderam ao questionário são do sexo
305

feminino. Possuem uma experiência de mais de cinco anos no magistério, sendo que
16% dessas professoras já poderiam requerer a aposentadoria por possuírem mais de 25
anos de atividade na carreira docente e 43% delas declararam estar atuando na docência
por um período entre 11 a 20 anos, tendo a grande maioria (90%) iniciado sua carreira
na rede pública de ensino. A idade média das professoras respondentes ao questionário é
de 41 anos. Esses dados sugerem um quadro de docentes com experiência.
Ao compararmos os dados de escolarização das professores, com os dados de
escolarização de seus pais, percebemos uma mobilidade intergeracional educacional
bastante acentuada. Enquanto 58% dos pais e 55% das mães concluíram apenas os anos
iniciais do Ensino Fundamental, 96% das professoras concluíram o ensino superior.
Questionadas quanto à classe social, 73% declarou-se pertencer à classe média, com
uma renda média familiar em torno de R$ 4.294,00. Apenas 6% afirmou exercer outra
atividade remunerada, além do magistério.
Em relação à situação conjugal, mais da metade das professoras (68%) declarou-se
casada; 6% em uma relação estável; 12% separada e 4% viúva. Apenas 6% das
professoras declararam-se solteiras.
Em relação à leitura, as professoras apontaram o jornal (61%) como o suporte lido com
maior frequência, seguido por revistas (55%) e livros de ficção (12%).
Entre as mídias eletrônicas, o computador foi a mídia mais citada pelas professoras em
relação à frequência de uso, sendo que 75% das professoras o usam para acessar e-mails
e 57% das professoras para navegarem na internet ou utilizarem algum software de
entretenimento. A Televisão aparece em segundo lugar, apontada por 35% das
professoras e o rádio em terceiro, com 16% das professores afirmando que o ouvem
com muita frequência.
A atividade física não faz parte da rotina da maior parte destas professoras, com apenas
24% afirmando praticar algum tipo de esporte ou ginástica com frequência.

Condições de trabalho

De acordo com o Parecer CNE/CEB no18/2012, ao professor é garantida a contratação


“[...] com base em um determinado número de aulas, independentemente da duração de
cada aula para efeito do que assegura ao estudante a LDB (BRASIL, 2012, p.21).” Essas
horas, como esclarece o referido parecer, deverão ser divididas em atividades de
interação com educandos e atividades extraclasse, respeitando-se a proporção de 1/3 da
306

carga horária total contratada para as atividades extraclasse, compreendidas como


atividades que envolvem estudo, planejamento e avaliação.
Em relação à situação funcional, 78% das professoras que responderam ao questionário
declararam ser efetivas e 22% contratadas. Quando questionadas sobre o regime de
trabalho contratado, 49% das professoras declararam possuir um regime parcial de
trabalho, 39% um regime integral e 12% declarou assumir mais de 40 horas-aulas em
atividades de interação com os alunos. A média de horas destinadas para as atividades
extraclasse declarada pelas professoras foi de 6,1 horas.
Apesar das horas destinadas às atividades extraclasses garantidas em seu regime de
trabalho, 37% das professoras declararam não serem essas horas suficientes para a
realização do planejamento das atividades a serem trabalhadas com os alunos.
A infraestrutura disponível nas escolas possui uma importância fundamental no
processo de ensino e aprendizagem. É recomendável que uma escola mantenha bons
padrões de infraestrutura física e pedagógica para oferecer ao professor condições
adequadas ao exercício profissional e “[...] ao aluno instrumentos que facilitem seu
aprendizado, melhorem seu rendimento e tornem o ambiente escolar um local
agradável, sendo, dessa forma, mais um estímulo para a sua permanência na escola
(BRASIL, 2013, p.35).”
Questionadas sobre os recursos didáticos disponíveis na instituição de ensino, 67% das
professoras afirmaram serem suficientes para apoiá-las no trabalho realizado. Porém,
em relação à infraestrutura física das escolas, 71% declarou não ser adequada. Embora
70% das professoras tenham declarado trabalhar com menos de 25 alunos por turma, a
maior queixa em relação à infraestrutura física foi em relação à adequação do tamanho
dos ambientes para o quantitativo de alunos por turma, seguida pela falta de espaço
adequado para as professoras realizarem a jornada de trabalho extraclasse e a falta de
acessibilidade para os portadores de deficiência física.

Processos de formação

Comparado com o cenário nacional, o nível de escolarização das professoras


responsáveis pela docência das turmas do Ciclo de Alfabetização nas instituições de
ensino da rede pública municipal de Aracruz é mais elevado que a taxa nacional.
Enquanto a taxa nacional de professores nos anos iniciais do Ensino Fundamental com
307

formação superior é de 75%7, as professoras participantes desta pesquisa apresentam


uma taxa de 96% com formação neste nível. Pedagogia foi o curso que 80% dessas
professoras declararam ter concluído.
Se considerarmos o fato de que 80% das professoras declararam que sua formação
inicial para o exercício do magistério ocorreu em nível médio, no antigo curso de
magistério, e que atualmente 96% dessas professoras, além de terem complementado
esta formação inicial com um curso em nível superior, também buscaram uma
complementação em nível de pós-graduação, podemos afirmar que há indícios de um
movimento em busca de uma melhor qualificação para o trabalho nesta rede de ensino.
Ainda em relação aos cursos de pós-graduação, 32% declarou já ter realizado duas
especializações e 8% três especializações. As especializações mais citadas pelas
professoras foram Psicopedagogia; Educação Infantil e Séries Iniciais; Alfabetização e
Letramento.

O que pensam as professoras sobre os processos de formação continuada

Quando questionadas sobre que tipo de formação já haviam participado nos últimos
cinco anos, as professoras mencionaram, além da formação atual do PNAIC, oferecida
pela secretaria municipal de educação em parceria com o MEC, dois outros programas
de formação específicos na área do ensino da leitura e da escrita, também realizados em
parceria com o MEC: Pró Letramento8, com participação de 17 professoras e PROFA9,
com participação de 07 professoras.
De um modo geral, as professoras avaliam positivamente os cursos de formação
continuada que já realizaram. Quando questionadas sobre os benefícios proporcionados
por esses cursos, apontam a troca de experiências, o aperfeiçoamento da prática e a
aquisição de novos conhecimentos como as contribuições mais relevantes dessas
experiências.

7
Dados do Censo Escolar – ver referências bibliográficas
8
O Pró-Letramento - Mobilização pela Qualidade da Educação - é um programa de formação continuada
de professores para a melhoria da qualidade de aprendizagem da leitura/escrita e matemática nos
anos/séries iniciais do ensino fundamental.
9
O Programa de Formação de Professores Alfabetizadores é um curso de aprofundamento, destinado a
professores e formadores, que se orienta pelo objetivo de desenvolver as competências profissionais
necessárias a todo professor que ensina a ler e escrever.
308

Em relação aos pontos a serem melhorados nas experiências de formação já realizadas,


apontam a necessidade de tutores mais qualificados, da capacitação ser realizada dentro
da jornada de trabalho e preferencialmente na própria escola onde trabalha.

Mapeamento das necessidades formativas

Galindo e Inforsato (2008) apontam a análise das necessidades formativas dos


professores como um elemento potencializador no processo de
planejamento/implementação de programas da formação profissional por esta análise
estar “[…] relacionada ao conhecimento endêmico das dificuldades laborais dos
sujeitos, refletindo, portanto, a construção de representações sociais contextuais dos
docentes, suas aspirações e/ou desejos de efetivar mudanças (p.64).”
Essas dificuldades laborais podem ser traduzidas nos desafios que são postos ao
professor em relação a sua prática. Os dois desafios mais apontados pelas professoras
no exercício do magistério foram o trabalho com crianças portadoras de necessidades
especiais, apontado por 90% das professoras e a dificuldade em trabalhar com crianças
que apresentam algum tipo de dificuldade de aprendizagem, apontado por 86% das
professoras. Além desses dois desafios, manter a disciplina entre os alunos e a relação
com as famílias também foram apontados como desafios por 78% e 71% das
professoras respectivamente.
Esses desafios refletem nas necessitam formativas apontadas pelas professoras. Ao
serem questionadas sobre o que acham importante ser abordado nos cursos de formação,
as professoras destacaram as estratégias de ensino que atendam à diversidade de níveis
de aprendizagem em uma mesma turma e às necessidades de alunos portadores de
necessidades educativas especiais como um dos tópicos mais relevantes a serem
trabalhados nos cursos de formação, reforçando, assim, a ideia de que as necessidades
formativas surgem de uma situação objetiva.
Os desafios apontados pelas professoras em relação ao ensino da leitura e daescrita
Ao serem questionadas sobre os desafios enfrentados na docência, as professoras não
apontaram dificuldades específicas, seja em relação ao domínio de conteúdos sobre a
língua Portuguesa, seja em relação à compreensão do processo de apropriação da
linguagem escrita pelas crianças. De um modo geral, parece que para as professoras
participantes da pesquisa, o domínio dessas questões não se apresenta como um desafio.
309

Perguntadas sobre se sentem preparadas para o ensino da leitura e da escrita, 96% das
professoras declararam que sim, 4% não se manifestou. Porém, quando questionadas
sobre os objetivos e conteúdos relacionados ao ensino da leitura e da escrita que
apresentam maior dificuldade em trabalhar, as respostas das professoras apontaram,
com maior frequência, objetivos e conteúdos relacionados à dimensão da produção de
textos escritos e do ensino de estratégias leitoras.
Essas dificuldades apontadas pelas professoras refletem-se no trabalho desenvolvido nas
turmas do Ciclo de Alfabetização, pois, quando perguntadas mais especificamente sobre
quais objetivos norteiam o planejamento das atividades desenvolvidas em sala,
relacionadas ao ensino da leitura e da escrita, percebe-se que um trabalho mais
sistematizado envolvendo a produção de textos escritos aparece com menos frequência
nas respostas das professoras, bem como objetivos relacionados ao desenvolvimento de
estratégias que possibilitem ao aluno o desenvolvimento de uma maior proficiência
leitora.

Considerações finais

Como apontado no Plano Nacional de Educação – PNE, a qualidade do ensino está


intimamente ligada à valorização dos profissionais do magistério, valorização esta
condicionada a uma política global capaz de articular a formação inicial, as condições
de trabalho, o salário, a carreira e a formação continuada. Dessa forma, podemos
afirmar que a melhoria da qualidade da educação básica depende da formação de seus
docentes, o que decorre diretamente das oportunidades de formação oferecidas a eles.
Como afirma Sacristán (2005, p. 34)
Formar o professor para que ele seja capaz de contribuir conscientemente
para o processo educacional é, primeiro, valorizá-lo como agente social cuja
ação é fundamental para a construção da sociedade; e, segundo, é
proporcionar meios formativos para que ele próprio constitua e reconstitua
constantemente a sua identidade, a sua função e os seus ideais profissionais,
pessoais e coletivos dentro do contexto social no qual atua.

Um dos caminhos possíveis para a elaboração de políticas de formação continuada que


valorize o protagonismo do professor é a análise de necessidades, que tem como
pressuposto básico a identificação, por parte dos professores das necessidades
intrínsecas ao seu trabalho.
No caso das professoras alfabetizadoras que participaram desta pesquisa, as
necessidades apontadas centram-se na elaboração de estratégias de ensino que atendam
310

à diversidade de ritmos de aprendizagem dos alunos em uma mesma turma, bem como,
o domínio de conhecimentos e estratégias de ensino em relação à leitura e à produção de
textos escritos.
Partindo do princípio que é na fase da alfabetização que um indivíduo se apropria de
conhecimentos que lhe serão necessários para toda sua vida escolar, é necessário que os
órgãos responsáveis pela Educação enxerguem que a formação de alfabetizadores é uma
das principais ferramentas para se adquirir uma educação de qualidade, isto é, uma
educação que garanta o direito das crianças a uma condição de indivíduos leitores, de
fato.
Os resultados desta pesquisa revelam fragilidades concernentes às práticas docentes das
alfabetizadoras do município de Aracruz-ES que participaram deste estudo, fragilidades
estas que se transformam em necessidades formativas. Esperamos que estes resultados
possam potencializar a elaboração das políticas de formação continuada do município,
para que, em um futuro próximo possamos obter resultados de pesquisas mais
satisfatórios e motivadores em relação ao domínio da leitura e da escrita pelas crianças.

REFERÊNCIAS
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desigualdades na escolarização no Brasil: relatório de observação n° 5. Brasília:
Presidência da República, Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social – CDES,
2014. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/observatoriodaequidade/> Acesso em:
24 Jun. 2014.

BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. CÂMARA DE EDUCAÇÃO


BÁSICA. Reexame do Parecer CNE/CEB no 9/2012, que trata da implantação da Lei
no 11.738/2008, que institui o piso salarial profissional nacional para os profissionais do
magistério público da Educação Básica. Parecer normativo, n. 18/2012, de 2 de outubro
de 2012. Relator Maria Izabel Azevedo Noronha. D.O.U. de 1°/8/2013, Seção 1, p.17.

BRASIL. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS


ANÍSIO TEIXEIRA
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INEP, 2013.

BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. SECRETARIA DE


EDUCAÇÃO BÁSICA. Pró-Letramento: programa de formação continuada de
professores dos anos/séries iniciais do ensino fundamental: alfabetização e linguagem.
ed. rev. e ampl. incluindo SAEB/Prova Brasil matriz de referência. Brasília: MEC/SEB,
2008

BRASIL. MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO.


INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Síntese dos
indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira. Rio de
311

Janeiro: IBGE, 2013.

CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e linguística. SP: Scipione, 2009.

GALINDO, Camila José; INFORSATO, Edson do Carmo. Manifestações de


necessidade de formação continuada por professores do 1o ciclo do ensino fundamental.
Dialogia. São Paulo, v.7, n. 1, p. 63-76, 2008.

SACRISTÁN, J. G. Tendências investigativas na formação de professores. In:


PIMENTA, S. G.; GHEDIN, E. (org.). Professor reflexivo no Brasil: gênese e crítica
de um conceito. 3. ed., São Paulo: Cortez, 2005.

YAMASHIRO, Carla Regina Calone. Necessidades formativas dos professores do


ciclo I do Ensino Fundamental de Presidente Prudente – SP. Presidente Prudente,
SP: [s.n], 2008. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de
Ciências e Tecnologia.
312

Comunicação

Contribuições da avaliação externa para a reflexão sobre qualidade do ensino e


trabalho docente

Cristiane Machado
Univás - Gepaq
Ocimar Munhoz Alavarse
Feusp - Gepave

Resumo: As iniciativas de avaliação externa na política educacional, ampliadas


principalmente a partir da década de 1990, acarretaram diversas consequências para o
contexto educacional, entre elas, a intensificação do debate sobre qualidade do ensino.
A criação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), em 2007,
apresentado pelo governo federal como indicador da qualidade da educação ao integrar
resultados da Prova Brasil com taxas de aprovação, fortaleceu esse debate. Nessa
avaliação externa, além do desempenho dos alunos estimado por meio de provas
padronizadas, são coletados dados por meio de quatro “questionários contextuais” que
objetivam possibilitar estudos de fatores associados ao desempenho dos alunos. O
objetivo deste estudo é explorar as contribuições da Prova Brasil, especialmente os
resultados da prova padronizada e do questionário do professor, como exercício de
reflexão sobre possíveis relações entre qualidade do ensino e trabalho docente.
Palavras-chave: Avaliação externa, Qualidade do ensino; Trabalho docente; Prova
Brasil.

Apresentação
Há muito tempo o debate sobre a qualidade do ensino no país ocupa as agendas
educacionais, mas foi, sem dúvida, com a ampliação das iniciativas de avaliação
externa, principalmente desde início da década de 1990, e a divulgação de seus
resultados que o tema adquiriu ganhou maior dimensão e popularidade.
Em 2007, a criação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb),
apresentado pelo governo federal como indicador da qualidade da educação, amplificou
e respaldou esse debate. O Ideb combina os resultados de desempenho dos alunos na
313

Prova Brasil com taxas de aprovação e sintetiza, a cada dois anos, esses resultados em
um só indicador.
A Prova Brasil, além de estimar as proficiências dos alunos, também
denominadas de desempenho, por meio de provas padronizadas com itens de múltipla
escolha nas áreas de língua portuguesa (foco em leitura) e matemática (foco em
resolução de problemas), coleta outros dados sobre a educação nacional por meio de
quatro “questionários contextuais”. O objetivo desse levantamento é o de possibilitar “o
desenvolvimento de estudos dos fatores associados ao desempenho dos alunos”
(BRASIL, 2013). São reunidas informações em questionários individualizados a
respeito dos alunos, professores, diretores e escolas, sendo que os dados obtidos com os
três últimos questionários referentes à Prova Brasil 2011 estão disponibilizados no sítio
do Inep. São questionários com itens de múltipla escolha que tentam captar as
condições das escolas e a percepção dos profissionais da educação sobre diversas
dimensões que compõem o cotidiano escolar e educacional. O questionário da escola
possui 61 itens; o do professor 152 e o do diretor 212.
O objetivo deste estudo é explorar as contribuições da Prova Brasil, especialmente
dos resultados de proficiências e do questionário do professor, para o exercício da
reflexão sobre possíveis relações entre qualidade do ensino e trabalho docente.
São tomados como ponto de partida os resultados dos anos iniciais do ensino
fundamental da Rede Municipal de Ensino de São Paulo (RME-SP) na Prova Brasil e as
respostas dadas pelos professores do 5° ano do ensino fundamental no questionário
contextual do ano de 2011.
Concordamos com Dourado (2007, p. 09) que qualidade da educação é “um
fenômeno complexo, abrangente e que envolve múltiplas dimensões”, portanto, os
resultados das avaliações externas não podem ser vistos como a única expressão da
qualidade da escola. No entanto, os indicadores que compõe o Ideb, aprovação e
desempenho dos alunos em provas padronizadas, não são alheios ao ensino que se
pretenda de qualidade. Em Alavarse (2013) e Machado (2012) encontramos aportes que
procuram atenuar o peso excessivo atribuído aos resultados de avaliações externas como
fonte exclusiva de indicação da qualidade e, ao mesmo tempo, indicativos da
necessidade de ampliar no âmbito das escolas o movimento, necessário e incontornável,
de busca de entendimento e uso desses resultados.
314

O questionário respondido pelos professores é composto de 152 itens e para


efeito deste estudo selecionamos 47 itens que podem mais diretamente serem associados
ao trabalho docente e aos resultados dos alunos na Prova Brasil.

Dados e análises da Rede Municipal de Ensino de São Paulo e do


Questionário do Professor
Dados do Censo Escolar de 2011 mostra que a RME-SP é uma das maiores
redes públicas do país. No ano de aplicação da Prova Brasil em análise, possuía 236.865
alunos na educação infantil, sendo 55.218 na creche e 181.647 na pré-escola, e 452.666
no ensino fundamental, sendo 210.391 nos anos iniciais e 242.275 nos anos finais.
No Quadro 1 a seguir são destacados os dados Ideb e a meta para a RME-SP,
bem como detalhamentos dos componentes desse indicador, nas quatro aferições já
realizadas que estão disponibilizados no site do Inep.
Quadro 1 - Ideb, Meta, Taxa de aprovação, Nota Padronizada na
Prova Brasil e Proficiências em Matemática e Língua Portuguesa.
Anos iniciais do ensino fundamental. Rede Municipal de Ensino
São Paulo. 2005 a 2011
2005 2007 2009 2011
Ideb 4,1 4,3 4,7 4,8
Meta - 4,1 4,5 4,9
Aprovação 94,9% 92,6% 94,7% 95,4%
Nota padronizada 4,29 4,60 4,96 5,03
Língua Portuguesa 166,40 168,61 177,67 181,55
Matemática 172,80 186,97 197,50 197,53
Fonte: MEC/Inep

Uma primeira análise revela que, de 2005 a 2011, o aumento do Ideb, de 0,7 ou
17,1%, foi contínuo, embora a RME-SP tenha chegado em 2011 com 4,8 pontos, sem
atingir a meta estipulada pelo governo federal de 4,9. Para esse incremento, verificado
na série histórica das aferições, contribuíram os acréscimos em leitura e resolução de
problemas, que chegaram a compensar oscilações nas taxas de aprovação,
principalmente de 2005 a 2007 quando a aprovação caiu 2,3 pontos percentuais (pp).
Os professores dos anos iniciais do ensino fundamental da RME-SP, em 2011,
totalizavam 10.091 profissionais, destes, 3.438 eram professores do 5° ano do ensino
fundamental e 2.083 responderam corretamente os questionários. O fato da Prova Brasil
ser aplicada em salas com no mínimo 20 alunos pode explicar a diferença entre o
315

número total de professores do 5° ano do ensino fundamental e o dos professores


respondentes.
Os 47 itens do questionário selecionados para este estudo foram agrupados nos
seguintes temas: recursos didáticos e tecnológicos utilizados e quantidade de conteúdo
do currículo desenvolvido (13 itens); prática pedagógica em língua portuguesa (9 itens);
prática pedagógica em matemática (11 itens) e razões das dificuldades de aprendizagens
dos alunos (14 itens).
As informações dos questionários contextuais respondidos pelos professores de
5° ano de ensino fundamental mostram que, como recursos didáticos, foram utilizados
livro didático para 96% dos professores, livros e literaturas em geral para 94% e jornais
e revistas informativas para 88%. O meio de reprodução do material utilizado é, para
grande parte, a máquina copiadora (84%). Mais de 90% dos professores da RME-SP
indicam usar os recursos como computadores, internet, fitas de vídeo e DVD, jornais e
revistas informativas, revistas em quadrinhos e livro didático.
Em relação ao conteúdo estimado e o efetivamente trabalhado durante o ano de
2011 previsto no planejamento do professor, apenas 45% disseram ter trabalhado mais
de 80% do currículo estabelecido; 42% afirmaram ter desenvolvido entre 60 e 80% do
conteúdo previsto e, a grande maioria, 87% dos professores disseram ter trabalhado
mais da metade do que estava previsto.
A biblioteca ou sala de leitura são utilizadas para “momentos de leitura literária
e estudos em geral” por 41% dos professores e por 32% dos professores para “leituras e
pesquisas individuais ou em grupo”.
As práticas pedagógicas mais utilizadas semanalmente pelos professores em
língua portuguesa com seus alunos são: ler contos, crônicas, poesias ou romances
(82%); conversar sobre contos, crônicas, poesias ou romances (75%) e discutir um
texto, explorando as diferenças entre fatos e opiniões (67%). Outras práticas como:
copiar textos do livro didático ou lousa, fazer exercícios sobre gramática relacionados
com textos de jornais ou revistas e fixar nomes de conceitos gramaticais ou linguísticos
são desenvolvidas algumas vezes por mês para, respectivamente, 32 %, 38% e 40% dos
professores. Ainda, 34% dos professores afirmaram utilizar o recurso de “copiar textos
do livro didático ou do quadro negro ou lousa” algumas vezes por mês e 27%
semanalmente.
Em relação à matemática, as práticas pedagógicas semanalmente mais
desenvolvidas pelos professores são: falar sobre soluções de problemas, discutindo os
316

caminhos utilizados para encontrá-las (81%); experimentar diferentes modos de resolver


um problema ou de efetuar um cálculo (80%); incentivar e estimular o aluno a analisar
criticamente se os resultados obtidos na resolução de um problema são plausíveis (79%)
e interpretar resultados numéricos obtidos para dar uma resposta adequada ao problema
(73%).
Quando perguntados sobre as razões das dificuldades de aprendizagem dos
alunos, 90% dos professores concordam que elas “estão relacionadas à falta de
assistência e acompanhamento da família nos deveres de casa e pesquisas dos alunos”,
76% concordam que “são decorrentes do meio em que o aluno vive” e 75% que elas
“ocorrem devido ao desinteresse e falta de esforço do aluno”.
Com o objetivo de obter mais elementos para aproximar a qualidade expressa no
Ideb com algumas práticas do trabalho docente na RME-SP, selecionamos três escolas
que alcançaram as maiores notas no Ideb de 2005 (escolas A, B e C) e três que tiveram
as notas mais baixas (escolas D, E e F), e desenvolvemos uma análise comparativa entre
as trajetórias destas escolas e algumas práticas pedagógicas a elas associadas. A série
histórica destas escolas em todas as aferições do Ideb consta na Tabela 1.

Tabela 1 –Ideb, Rendimento e Nota Padronizada na Prova Brasil das Escolas. 2005-2011
Ideb R N Ideb R N Ideb R N Ideb R N
Escola
2005 2005 2005 2007 2007 2007 2009 2009 2009 2011 2011 2011
A 5,9 0,99 5,97 5,1 0,91 5,55 5,8 0,97 6,03 5,8 0,96 5,99
B 5,4 1,00 5,37 5,2 0,92 5,63 5,0 0,94 5,33 5,3 0,97 5,52
C 5,4 1,00 5,40 5,1 0,96 5,29 5,3 0,95 5,61 5,3 0,97 5,44
D 3,0 0,84 3,54 4,6 0,92 5,03 4,9 0,97 5,02 5,0 0,98 5,07
E 2,9 0,83 3,46 3,3 0,86 3,76 3,7 0,93 4,01 4,1 0,98 4,16
F 2,8 0,79 3,59 3,2 0,82 3,91 4,0 0,92 4,32 3,9 0,89 4,38
Fonte: MEC/Inep

É importante destacar que as escolas A, B e C, que tinham altos Ideb em 2005,


mantêm um padrão mais estável, sem ampliar o seu Ideb após a primeira aferição,
diferentemente do que ocorreu com as escolas D, E e F, que obtiveram baixos índices
em 2005, mas desenvolveram um crescimento importante no período. As notas
padronizadas das escolas A, B e C oscilaram para menor no decorrer das aferições,
diferentemente das escolas D, E e F nas quais houve um crescimento contínuo, exceto
na escola D, que praticamente teve o mesmo desempenho em 2007 e 2009, mas voltou a
crescer em 2011.
Analisamos as respostas dos professores de 5° ano do ensino fundamental dessas
escolas no questionário da Prova Brasil de 2011 tentando apreender a ocorrência de
317

diferenças ou não nas respostas que pudessem sinalizar eventuais fatores associados.
Longe de buscar generalizações, esse exercício objetivou perceber contrastes
significativos, até porque o número de professores é bem pequeno perto do universo da
RME-SP, conforme Tabela 2.
Tabela 2 – Escolas e número de professores 2011
Questionários
Escola Professores de 5° ano
respondidos
A 3 2
B 3 2
C 5 5
D 3 3
E 8 4
F 8 5
Fonte: QEdu e MEC/Inep

Nesse sentido, cabe destacar que todos os professores da escola D disseram não
utilizar máquina copiadora porque a escola não tem esse recurso. A prática pedagógica
de “copiar textos do livro didático ou do quadro negro ou lousa” é o recurso utilizado
semanalmente por 1 professor da escola D, 1 da escola E e 3 da Escola F; das escolas
com mais altas pontuações em 2005, apenas na escola C 2 professores disseram usar
esse recurso toda semana.
A essas informações agregamos o debate sobre a relação entre desempenho
escolar e nível socioeconômico (NSE). Tema este muito importante nas pesquisas
educacionais, especialmente a partir da década de 1960, após o clássico relatório de
Colleman et al. (1966) que identificou uma forte correlação positiva entre os fatores
extraescolares e o desempenho das escolas, evidenciando o impacto das desigualdades
sociais nas escolares.
Para este estudo, consideramos o indicador de NSE das escolas de educação
básica do país criado por Alves e Soares (2012) e disponibilizados no QEdu (2013),
como referência para as análises das escolas da RME-SP com os maiores e menores
Ideb. Conforme os autores (Op. cit., p. 5) o NSE “é um construto teórico que sintetiza as
características dos indivíduos em relação à sua renda, ocupação e escolaridade,
permitindo a criação de estratos ou classes de indivíduos semelhantes em relação a estas
características”. A sua construção se deu a partir dos dados das avaliações em larga
escola realizadas pelo Inep nos últimos anos (Saeb 2001 a 2005, da Prova Brasil 2005 a
2009 e Enem 2007 a 2009), que englobam testes padronizados e questionários
contextuais sobre os atributos sociodemográficos dos alunos e seus familiares.
318

Ancorado neste banco de dados, os autores afirmam que “o índice de NSE produzido
reflete uma ordenação que descreve de forma fidedigna a realidade socioeconômica das
escolas incluídas na base de dados” (Op. cit., p. 28).
No trabalho de Alves, Xavier e Soares (2013), a escala de –3 a +3, expressa em
desvios padrão, foi convertida para outra que varia de 0 a 10. Não obstante, é preciso
advertir, que o escore 0 em tal escala não corresponde ao grupo cujo NSE é nomeado
como Mais baixo, pois, como ressalvam os autores, é improvável que as escolas tenham
seu NSE médio situados nos extremos da escala, visto que tal situação só seria possível
se todos os alunos tivessem os valores máximos ou os mínimos dos itens pesquisados,
que tratam de bens de consumo, renda familiar, escolaridade e ocupação dos pais.
Para ampliar as possibilidades de análises e comparações, ao considerar o nível
socioeconômico médio (NSE) de cada uma das escolas, temos na Tabela 3 a seguinte
relação entre as escolas e NSE.
Tabela 3 – NSE médio, Ideb, Rendimento e Nota
Padronizada na Prova Brasil das Escolas
Ideb
Escola NSE R 2011 N 2011
2011
A Alto (6,3) 5,8 0,96 5,99
B Médio-Alto (6,2) 5,3 0,97 5,52
C Médio-Alto (6,0) 5,3 0,97 5,44
D Médio (5,1) 5,0 0,98 5,07
E Médio (4,9) 4,1 0,98 4,16
F Médio (5,0) 3,9 0,89 4,38
Fonte: QEdu e MEC/Inep

Observando os dados apresentados é possível perceber indícios de correlação


positiva entre o desempenho dos alunos, e, por conseguinte, da escola e o seu nível
socioeconômico, o que ratifica a literatura sobre desigualdade social e desigualdade
escolar. Essa relação pode explicar, em parte, fatores que contribuíram para as escolas
A, B e C terem um bom resultado no Ideb em 2005; no entanto, o alto e os médio-altos
NSE não foram suficientes para ampliar a pontuação das escolas nas aferições seguintes
do Ideb. Já as escolas D, E e F, embora apresentem NSE médio, conseguiram manter
uma constância na ampliação dos seus Ideb, conforme mostramos na Tabela 1 (ver
anexo).
As informações da Prova Brasil selecionadas para este estudo não são suficientes
para apontar possíveis fatores que explicariam estes movimentos. Para verificar como as
práticas pedagógicas impactaram na trajetória das escolas com NSE alto e médio-alto e
nas com médio é importante um aprofundamento nos cruzamentos possíveis nos dados
319

fornecidos pelo Inep bem como uma imersão nas escolas para buscar explicações in
loco deste fenômeno.
Ainda assim, vale destacar a importância dos sistemas, redes de ensino e escolas
se debruçarem sobre os dados e informações produzidos pelas avaliações externas para
conhecer melhor o contexto no qual a aprendizagem, e consequentemente a qualidade
do ensino, se efetivam. A reflexão, de forma associada, sobre os dados e resultados
produzidos e disponibilizados pelo Inep pode potencializar análises e explicações sobre
o trabalho das escolas contribuindo, assim, com a construção de uma escola pública que
busca viabilizar o sucesso de todos os alunos.

Notas finais
Estudos exploratórios e analíticos sobre os resultados das redes e das escolas
com base nos dados disponibilizados pelo Ideb, principalmente quando observados nas
suas séries históricas longitudinais, podem fazer a diferença para a escola cumprir seu
papel de ensinar com qualidade todos os seus alunos.
As apreciações dos dados da RME-SP aqui examinadas apontam, de um lado, a
evidência da drástica diferença de aproveitamento escolar dos alunos de uma mesma
rede e, por outro, a possibilidade de, a partir do conhecimento e estudo das informações
da Prova Brasil e dos resultados do Ideb em todas as aferições já elaboradas,
desencadear um enfrentamento político pela efetiva eliminação de um processo de
escolarização seletivo e excludente.
Mesmo considerando as restrições dos itens do questionário do professor da
Prova Brasil utilizados neste estudo, podemos assinalar algumas problematizações a
partir da análise empreendida. A primeira delas é que mais de 90% dos professores do
5º ano indicam, em 2011, a utilização de diversificados recursos pedagógicos e
didáticos, sendo que 73% apontam a biblioteca como um lócus de aprendizagem. No
entanto, o crescimento das proficiências não parece corresponder a tal disseminação de
recursos. Uma hipótese para esse crescimento relativamente pequeno estaria assentada
na constatação de que menos da metade dos professores afirmam terem cumprido mais
de 80% do conteúdo que haviam programado para ser desenvolvido com seus alunos
durante o ano e 40% sustentam que ficaram no patamar entre 60 e 80% do previsto.
Evidentemente, as proficiências medidas no final de 2011 são produto de 5 anos de
ensino fundamental e não apenas do desenvolvido no ano de aplicação da Prova Brasil;
contudo, não menos importante é o que se pode apreender do processo curricular do
320

último ano dos anos iniciais do ensino fundamental. Há, também, que se aventar a
hipótese de que esse nível de consecução das atividades previstas, abaixo do esperado
para o ano, pode estar acontecendo nos anos anteriores, o que, se confirmada, colocaria
o conjunto dos anos iniciais com um déficit curricular acumulado de grandes
proporções.
Na busca de fatores que possam estar associados ao desempenho dos alunos da
RME-SP, outro dado que chama a atenção é a prática pedagógica de lançar mão de
cópia da lousa, a qual foi indicada por 60% dos professores, considerando sua
frequência semanal ou algumas vezes no mês. De certa forma, corroborando as
preocupações alinhavadas por Nunes (2008), essa prática parece não dialogar com as
evidências de estudos que apontam a ineficiência deste recurso pedagógico como fator
de motivação dos alunos e menos ainda como fonte de aprendizagem e conhecimento.
Aprofundando a investigação de elementos que possam elucidar a trajetória de
desempenho dos alunos, avulta a posição dos professores para as causas da mesma,
pois, praticamente, para 76% deles os problemas de aprendizagem são decorrentes do
meio em que o aluno vive e ocorrem devido ao desinteresse e falta de esforço do aluno.
Se, por um lado, isso é coerente com pesquisas que procuram correlacionar desempenho
dos alunos com NSE das suas famílias, por outro, pode significar um tipo de
descompromisso de ensinar todos ou uma resignação diante das condições que os
alunos apresentam, como se à escola restasse “consagrar” as diferenças que são
delineadas fora dela.
No entanto, a título de demarcar as limitações de resultados de avaliações
externas, apesar de todas suas potencialidades, encontramos em Alavarse, Machado e
Oliveira (2013) ponderações sobre as ilusões da divulgação e ênfase nas médias de
proficiências de escolas, pois isso pode eclipsar a variabilidade de aprendizagem no
interior das mesmas, ou seja, dos alunos.
Nesta análise, um obstáculo emergiu quando procedemos à investigação desses
fatores por escola, pois ficou patente que não havia nem a reverberação do quadro
esboçado pelo conjunto das escolas da rede, nem uma coerência entre a posição das
escolas quanto aos seus NSE. O estudo indica que a disponibilização de dados pelo Inep
pode apontar alguns fatores explicativos para a Rede, mas que esses não se reproduzem
por escola, restringindo as análises dos possíveis fatores que podem ser associados aos
resultados dos alunos por escola.
321

Estatisticamente, pode-se sustentar que não se encontra em cada elemento da


população a reprodução da totalidade, isto é, que cada escola isoladamente seja uma
amostra representativa da população. Contudo, mesmo que não seja uma prática usual, a
disponibilização dos dados por escola, seguida de uma tentativa de suas equipes
escolares de apropriação dos dados, poderia produzir análises extremamente distorcidas
no sentido de associar fatores que contribuíssem para o entendimento de seus
resultados. Nestes termos, parece-nos que as indicações mais produtivas seriam aquelas
no sentido das equipes escolares tentarem analisar as trajetórias dos alunos desde o
ingresso no ensino fundamental, efetuando, por exemplo, o cotejamento de resultados
das avaliações internas com os das avaliações externas. Assim, turmas de respondentes
da Prova Brasil seriam estudadas como coortes de alunos, com pelo menos cinco anos
de escolarização. Com isso não se abandonaria as avaliações externas, apenas que
seriam postas em contextos de análises mais amplas, ademais de envolver um leque
mais diversificado de professores, levando em consideração o trabalho de outros
professores e não apenas daqueles que lecionaram no ano de aplicação da prova.
Assim, sem desconsiderar a importância da aplicação de questionários para
professores, as análises nas quais se apoia este trabalho indicam que a qualidade da
educação passa pelo trabalho docente, sobretudo, quando esse também se manifesta nas
tentativas de problematizar os resultados, o que se contrapõe à tendência de apenas
responsabilizá-los pelos resultados.
Destacamos, aqui, algumas possibilidades reflexivas, com base nos dados
gerados e disponibilizados pela Prova Brasil e pelo Ideb, que as escolas e sistemas
podem empreender nos espaços pedagógicos e no cotidiano da escola para lançar luzes
sobre o trabalho que é realizado com o objetivo de analisá-lo e avaliá-lo e, a partir desse
movimento, estabelecer as metas e prioridades para a continuidade das ações coletivas
da escola na constante busca da melhoria da sua qualidade.
Esmiuçar os resultados do trabalho das escolas objetivando compreendê-los
significa oportunizar mudanças importantes e necessárias a busca do aprimoramento da
qualidade da escola pública e democrática, que é aquela que é para todos e que se
organiza para assegurar o ensino-aprendizagem para todos.
322

Referências

ALAVARSE, O. M. Desafios da avaliação educacional: ensino e aprendizagem como


objetos de avaliação para a igualdade de resultados. Cadernos Cenpec, São Paulo, v. 3,
n. 1, p. 135-153, jun. 2013.

ALAVARSE, O. M.; MACHADO, C.; OLIVEIRA, A. S. Quais as fronteiras da


qualidade do Ideb?: um estudo sobre a Rede Municipal de Ensino de São Paulo.
Trabalho apresentado na 36ª Reunião Anual da Anped. Goiânia. 29 setembro a 02
outubro 2013.

ALVES, M. T. G; SOARES, J. F. O nível socioeconômico das escolas de educação


básica brasileiras. Disponível em: <http://www.todospelaeducacao.org.br/biblioteca/
1468/o-nivel-socioeconomico-das-escolas-de-educacao-basica-brasileiras>. Acesso em:
12 dez. 2012.

ALVES, M. T. G; XAVIER, F. P.; SOARES, J. F. Conversão da escala do NSE


médio das escolas e criação de grupos. Disponível em:
<https://www.dropbox.com/s/mkl41g5vtw0lkc7/Nota%20T%C3%A9cnica.pdf>.
Acesso em: 28 mar. 2013.

BRASIL. Ministério da Educação – MEC; Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas


Educacionais Anísio Teixeira – Inep. Microdados Prova Brasil 2011- Manual do
Usuário. Disponível em: <ftp://ftp.inep.gov.br/microdados/microdados_prova_brasil_
2011.zip>. Acesso em: 05 jan. 2013.

COLEMAN, J. S. et al. Equality of Educational Opportunity. Washington: US


Government Printing Office, 1966.

DOURADO, L. F. (Coord.). A qualidade da educação: conceitos e definições.


Brasília: MEC/Inep, 2007.

MACHADO, C. Avaliação externa e gestão escolar: reflexões sobre o uso dos


resultados. Revista @mbienteeducação, São Paulo, v. 5, n. 1, p. 70-82, jan./jun. 2012.

NUNES, D. R. P. Teoria, pesquisa e prática em educação: a formação do professor-


pesquisador. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 34, n. 1, p. 97-101, jan./abr. 2008.

QEDU: aprendizado em foco. Disponível em: <http://www.qedu.org.br>. Acesso em:


01 mar. 2013.
323

Comunicação

O percurso formativo do professor de classe hospitar, narrativas e práticas.

Cristiane Nobre Nunes


UNICID

Resumo: A pesquisa partiu do pressuposto que a classe hospitalar constitui uma


necessidade e um direito adquirido pelas crianças que estão internadas e
impossibilitadas de frequentar a escola regular. O objetivo foi investigar a trajetória de
formação dos professores de classe hospitalar da escola Schwester Heine, no Hospital
AC Camargo, com vistas a ampliar a compreensão a respeitos das necessidades de
formação dos docentes que atuam em classes hospitalares. A pesquisa pautou-se na
abordagem qualitativa e os dados foram coletados por meio da técnica do grupo focal.
Os dados apontaram para a importância da formação anterior e continuada para o
exercício da docência. Sugere-se que a formação do docente para atuar neste contexto
seja repensada, considerando as especificidades dessa atuação. Destacaram o valor das
parcerias estabelecidas com os pares e com a equipe multiprofissional que possibilitam
a criação de grupos de referência que se transformam em espaços reflexivos e
formativos.
Palavras Chave: Classe Hospitalar, Pedagogia Hospitalar, Narrativas de Formação.

Introdução
Embora a Pedagogia Hospitalar seja uma modalidade de atendimento
educacional reconhecida por lei como um direito da criança e adolescente
hospitalizados e, portanto distantes da escola, o Brasil ainda conta com poucos hospitais
que desenvolvem esse tipo de atendimento e em sua maioria prestado por profissionais
que não possuem formação especifica para esse fim.
A classe hospitalar constitui uma necessidade para o hospital e um direito
adquirido pelas crianças que estão internadas e impossibilitadas de frequentar a escola
regular. A criação de classes hospitalares é uma questão social e deve ser vista com
seriedade e engajamento pelas políticas públicas brasileiras.
A infância, cerceada de possibilidades de desenvolvimento cognitivo social e
emocional, durante o período de internação hospitalar, pode romper a identidade de ser
324

criança em sua amplitude. Para Fontes (2007, p. 277), “a identidade de ser criança é
muitas vezes diluída numa situação de internação hospitalar, na qual ela se vê imersa
numa realidade diferente de sua vida cotidiana”. A hospitalização distancia as crianças
de suas atividades diárias, dos amigos e parentes. O sentimento de impotência diante da
enfermidade, a ausência ou e/ou falta de estímulos maternos podem provocar na criança
o que Spitz1 (1965) denominou hospitalismo, Nessa direção, a vulnerabilidade dos
parentes, a falta de perspectiva e o medo do desconhecido afetam sua autoestima,
dificultando muitas vezes sua recuperação.
Além das mudanças físicas e emocionais decorrentes das patologias, crianças e
adolescentes internados sofrem também pelo distanciamento do ambiente familiar, dos
amigos e do ambiente social. Em casos de doenças graves, nas quais a internação
acontece por longo tempo, existe uma ruptura no processo de aprendizagem curricular.
A classe hospitalar consiste em uma tentativa de recuperar a socialização da criança e
do adolescente e de dar continuidade à escolarização com a valorização do processo de
aprendizagem de cada um.
Com base em revisão de literatura, pode-se constatar que existem poucos trabalhos
publicados que discutem o preparo do pedagogo, profissional habilitado para o
atendimento necessário à educação de crianças e adolescentes hospitalizados, entre eles
destacam-se: Matos (2003); Schilke (2008), Medeiros da Silva (2010/2011).
Autores como Ceccim (1997), Paula e Marcon (2001) e Wolf (2007) abordam a
necessidade da análise mais criteriosa das atividades desenvolvidas no âmbito hospitalar
e suas repercussões para as, crianças e adolescentes enfermos que são encaminhados a
instituições hospitalares.
Foram encontradas, também, algumas publicações como: Fontes (2005) e
Schilke (2007) que evidenciam a historia da Pedagogia Hospitalar definindo-a como um
novo campo de atuação do pedagogo. Segundo Fonseca (2012), o número de classes
hospitalares no Brasil é ainda pequeno, atualmente, oficialmente, há 141 hospitais, que
oferecem a oportunidade de crianças e jovens prosseguirem com seus estudos se
considerarmos a imensidão do país.

1
Renne Spitz (1965) observando crianças em hospitais de caridade denominou de hospitalismo o
conjunto dos fenômenos apresentados por elas. Observou que nas crianças pequenas, a ausência e/ou falta
de estímulos maternos são causadores de perturbações emocionais. Tais perturbações podem se
manifestar por intermédio de três reações: a primeira, de protesto violento, choro intenso e agitação; a
segunda, de desespero, revelado pelo silencio e aparente tranquilidade da criança; e a terceira, de
resignação melancólica, resultado de uma adaptação patológica.
325

Na busca de orientar os profissionais de educação para trabalhar na classe


hospitalar foi publicado um documento do Governo Federal, em 2002, denominado
“Classe hospitalar e atendimento pedagógico domiciliar: estratégias e orientações”,
com a finalidade de orientar e estruturar os educadores acerca das ações de atendimento
educacional, em ambientes hospitalares e domiciliares. O documento reafirma a
importância do atendimento em classe hospitalar, a sua implantação abordando os
aspectos físicos, equipamentos, a integração com a escola regular e com o sistema de
saúde, e a necessidade de formação do profissional de educação para atuar na classe
hospitalar. Além disso, designa como classe hospitalar de acordo com o Ministério da
Educação (2002):
O atendimento pedagógico-educacional ocorre em ambientes de tratamento
de saúde, seja na circunstância de internação, como tradicionalmente
conhecida seja na circunstância do atendimento em hospital-dia e hospital-
semana ou em serviços de atenção integral à saúde mental. (BRASIL, 2002,
p.13).

O documento faz referência à estrutura organizacional da classe hospitalar,


definindo como necessária a presença de um professor coordenador, que deve conhecer
a dinâmica e o funcionamento desse trabalho, além das técnicas e terapêuticas que dele
fazem parte, assim como as rotinas de assistência, da enfermaria e ambulatórios, tendo
ainda como atribuição a articulação com a equipe de saúde da instituição com
Secretarias de Educação e com a escola de origem da criança e/ou adolescente.
Ainda como recomendação, o documento enfatiza que o professor deverá ter
preferencialmente a formação em Educação Especial ou em cursos de Pedagogia ou
licenciaturas. Além disso, o profissional responsável pela classe hospitalar precisa ter
noções das patologias apresentadas pelos educandos, e os problemas emocionais
decorrentes da hospitalização. Além de ser capaz de considerar o quadro de saúde,
adaptando e flexibilizando as atividades e os materiais, planejando diariamente,
registrando e avaliando o trabalho pedagógico desenvolvido.
As estratégias e orientação do Ministério da Educação (2002) indicam que
devem ser levados em consideração os processos de integração da escola com o sistema
de saúde, buscando um diálogo entre os seus profissionais, de modo que ocorra um
duplo acompanhamento – hospitalar e escolar – que tragam significado para as crianças
e adolescentes hospitalizados.
326

“Classes Hospitalares e Atendimento Pedagógico Domiciliar – Estratégias e


Orientações” é o único documento elaborado pelo MEC/SEESP que esclarece os
objetivos e a estrutura organizacional do serviço de classe hospitalar no Brasil.
Apesar de esse serviço estar inserido na Educação Inclusiva, a classe hospitalar
não tem tido muita expressão nessa área. Muitas vezes é esquecida pela própria Política
Nacional de Educação Especial, a exemplo disso, em seu documento mais recente,
denominado “Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva” de 2008, não contempla a situação das crianças e adolescentes
hospitalizados.
Como se pode constatar essa modalidade de ensino está em desenvolvimento,
procurando garantir a continuidade dos estudos e minimizar o sofrimento por parte dos
alunos pacientes, apesar das imensas dificuldades encontradas pelo caminho. Para que
esse caminho possa ser trilhado com mais consistência, é necessário que haja, além da
abertura de novas classes, a realização de pesquisas que ofereçam subsídios para o
desenvolvimento de atividades educativas no contexto dos hospitais.
Nessa perspectiva, nasceu o interesse pela elaboração de uma pesquisa cujo
objetivo principal foi investigar a trajetória de formação dos professores de classe
hospitalar da escola Schwester Heine, no Hospital AC Camargo, com vistas a ampliar a
compreensão de seus processos formativos e dessa forma oferecer subsídios para a
formação de docentes que atuam nas classes hospitalares .

O traçado da pesquisa
Para alcançar o objetivo proposto, a pesquisa pautou-se na abordagem
qualitativa, considerando que tal delineamento é recomendado quando se deseja
conhecer os fatores que afetam o comportamento humano, tais como: atitudes, crenças,
sensações, imagens e motivos (NOHARA e ACEVEDO, 2007, p. 52).
Os sujeitos de pesquisa foram 07 professores que atuam na classe hospitalar na
Escola Schwester Heine. Os professores participaram de dois grupos focais. Ambos os
grupos foram compostos de professores que participaram de formação específica para
atuar em classe hospitalar e de professores que não participaram de formação específica
para atuar na classe hospitalar.
Segundo Gatti (2005):
O grupo focal é uma técnica empregada há muito tempo, no qual se privilegia
a seleção dos participantes segundo alguns critérios – conforme o problema
em estudo -, desde que eles possuam algumas características em comum que
327

os qualificam para a discussão que será o foco do trabalho


interativo/expressivo. Os participantes devem ter alguma vivência com o
tema a ser discutido, de tal modo que sua participação possa trazer elementos
ancorados em suas experiências cotidianas. (GATTI, 2005, p. 07)

Dessa forma, o trabalho com grupos focais permite compreender processos de


construção da realidade por determinados grupos sociais, compreender práticas
cotidianas, ações e reações a fatos e eventos, comportamentos e atitudes, constituindo-se
uma técnica importante para o conhecimento das representações, percepções, crenças,
hábitos, valores, restrições, preconceitos, linguagens e simbologias prevalentes no trato
de uma dada questão por pessoas que partilham alguns traços em comum, relevantes
para o estudo do problema visado.
A pesquisa foi realizada na Escola Especializada Schwester Heine, no Hospital
A.C Camargo, na cidade de São Paulo sendo que os dados foram coletados no período
de abril a junho de 2013.

O diálogo com os dados


Com base na análise das falas professoras, foi possível inicialmente perceber que
elas estão cientes das condições em que seus alunos, crianças e adolescentes
hospitalizados se encontram.
[...] No dia a dia a gente se depara com situações que são chocantes e cada um
tem que vivenciar isso, porque as suas experiências são experiências de vida,
cada um vai enriquecendo seu currículo e amadurecendo. O que cada uma
adquire no decorrer do trabalho, vai melhorando a prática, vai focando e
mudando seu olhar, errando e acertando. [...] Prof.ª Adriana.

Os alunos são portadores de doenças graves que os aproximam de sofrimentos


físicos e psíquicos que fazem com que tenham necessidades educativas específicas
decorrentes de seu quadro de saúde, situações essas que deslocam os professores de sua
zona de conforto e que os obrigam a rever constantemente suas práticas.

A importância da formação anterior


Nessa perspectiva, todas as participantes da pesquisa consideram de vital
importância a formação anterior focada no preparo para atuar nas classes hospitalares,
pois ela cumpre a função de aproximar os professores interessados em trabalhar nos
hospitais, do campo de atuação e de prepará-los para iniciar um trabalho educativo
diferenciado,
[...] O professor quando decide qual área de atuação quer seguir, seja educação
infantil, educação de jovens e adultos tem que buscar formação nesta área, se
você quiser trabalhar com Pedagogia Hospitalar, também se você não tiver
328

formação como você vai entrar no hospital, como vai conseguir trabalhar com
essas crianças? Prof.ª Paula.

Continuando, a professora diz que se sentiu protegida pela formação, pois a


realidade que enfrentou, ao se deparar com o cotidiano de um hospital que acolhe
crianças com câncer, seria difícil de enfrentar se não tivesse tido formação anterior.
[...] A formação me protegeu, aqui no hospital. A doença te impacta, a criança
te impacta, com a formação você chega mais segura, mais tranquila pra
trabalhar. Prof.ª Paula.

Para elas, é evidente que uma formação genérica em Pedagogia ou mesmo em


Educação Especial não é suficiente. A hospitalização modifica a vida da criança e do
adolescente. Ao serem hospitalizados, encontram um espaço desconhecido tanto para
eles como para seus familiares. As rotinas são modificadas, surgem necessidades como
tomar medicamentos, submeter-se a exames clínicos, dietas, manipulações, cirurgias e
tantas outras situações que determinam uma rotina diferente da vida cotidiana.
Sobrepondo-se a isso, a doença, também, afasta as crianças e adolescentes da
convivência social e familiar o que os deixa ainda mais fragilizados.
Cumpre destacar também que as crianças internadas têm idades diferentes
quadros clínicos específicos que requerem procedimentos e tempos de internação
diferenciados, o que faz com que a rotina do hospital seja muito diferente da rotina
escolar, na medida em que o grupo de alunos se refaz com regularidade sendo composto
por crianças/adolescentes, cada qual com diferentes ritmos e interesses, o que torna o
processo de ensino aprendizagem não linear o que requer uma formação específica.
[...] eu não tinha formação nenhuma quando ingressei, cai de paraquedas, a
Adriana também não teve formação, o indicado seria ter uma noção, já chegar
sabendo o que vai encontrar, eu vim da classe regular, fui convidada, achei
lindo o trabalho e comecei a trabalhar sem saber ao certo o que fazer, e muito
importante a formação antes de começar. Prof.ª Soraia.

Para atuar nesse cenário que requer flexibilidade, dinamismo e capacidade de se


inserir na rotina hospitalar, o professor necessita estar preparado. Para os professores
que não tiveram formação anterior esse processo torna-se muito mais difícil.

A continuidade da formação
As participantes da pesquisa são unânimes ao dizer que a formação continuada,
também, cumpre um papel fundamental, pois o exercício da docência nas classes
hospitalares faz com surjam perguntas e dúvidas que demandam dos professores novos
estudos e reflexões.
329

[...] A formação vem para enriquecer sua prática, te dá fundamentos para


melhorar todos os dias. Prof.ª Adriana
[...] É importante potencializar o momento que você está com a criança, você
não sabe quando vai poder estar com ela novamente. Deve ser criativo e você só
e criativo a partir de repertorio, ninguém cria do nada, ai falamos de novo da
importância da formação. Prof.ª Eduarda

Refletindo sobre a formação, as professoras salientam que essa não se reduz aos
cursos frequentados, mas pode se dar de diferentes maneiras.
[...] Na minha concepção a formação está também num grupo de estudo, na
academia, na quantidade de leituras individuais, o que não aguento é o
professor que não faz nada, não lê, acha que só o movimento dele de ação já
basta. Prof.ª Eduarda

Levando em conta que cada aluno é único e se encontra enfermo, situação que o
singulariza ainda mais, é necessário, também, que pedagogo hospitalar desenvolva um
olhar diferenciado e uma escuta sensível capaz de acolher e lidar com as especificidades
e o momento de cada aluno e isso só se torna possível por meio da formação.
[...] Cada dia é uma surpresa, a gente planeja uma atividade e no mesmo dia
pode acontecer alguma coisa que impeça a criança de continuar as atividades.
Um planejamento de lição agendada às vezes não dá certo. Prof.ª Soraia
[...] Na classe hospitalar todo dia é um novo dia. Logo cedo a gente verifica
quem esta internado, quem teve alta, quem faltou e porque. Ai sim a gente vai
ver o que pode ser trabalhado com cada criança. Não da para ser muito
rigoroso com o conteúdo. Prof.ª Paula

Neste sentido, um dos desafios enfrentadas no exercício da docência no contexto


hospitalar refere-se à concepção, função e adaptação do currículo o que requer rever
objetivos, conteúdos, atividades e avaliação. Nesse contexto, estratégias de registro do
processo educativo e reflexão ganham importância.
Diante de tantas situações inusitadas, muitas delas distantes do contexto
educacional conhecido, o professor vê a rotina de seu trabalho ser dissolvida o que
requer aprendizagens constantes. Nesse contexto, ganha especial destaque a capacidade
de refletir. Para Arroyo (2000), todo educador e todo ato educativo por ele realizado
comporta um dever-ser que não se apoia somente no domínio teórico, mas sim na
capacidade de construir novas respostas com base na bagagem existencial de cada
educador. Para outra professora é por meio da reflexão que a prática deixa-se fertilizar
pela teoria.
[...] A gente tem uma discussão de a prática ensina muito, sim ela
ensina quando ela é uma prática reflexiva, uma prática pensada, prática pela
prática ela é mecânica, se eu tenho uma discussão reflexão eu vou ter a práxis
que é a teoria e a prática junto. A teoria e a fonte para beber, para te dar
suporte para sua reflexão, ninguém reflete do nada e ninguém reflete em cima
do seu trabalho, só posso refletir pela teoria. A prática ensina, mas só se eu
tenho a teoria. Prof.ª Eduarda
330

As parcerias são reconhecidas pelos professores como fundamentais.


Consideram que poder contar a ajuda do colega que vive experiências semelhantes é
fundamental para o bom exercício do trabalho docente. Nesse sentido, procuram criar
em seus próprios locais de atuação, espaços para troca e discussão com seus pares.
[...] A amizade da equipe também é importante, todos dão apoio a todos, a
equipe tem que ser harmonioso, a gente troca muito informação até fora do
hospital. Prof.ª Ana Clara.
[...] A formação fui muito importante, mas o mais importante e o apoio que as
professoras dão, orientações que me deram, agora foi mais fácil porque eu já
tinha uma ideia do que iria encontrar diferente de quem não teve formação.
Prof.ª Elza

Destacam também a importância da formação que ocorre nos grupos


multidisciplinares, pois a troca com profissionais de outras áreas amplia o horizonte de
compreensão das situações vividas no hospital. Para Ceccim (2001) o trabalho em
equipe torna a criança o centro é nesse contexto que ela pode deixar de ser um paciente
e tornar-se uma pessoa que necessita de diferentes cuidados que se complementam em
defesa da vida. Nessa perspectiva a Pedagogia Hospitalar, encontra-se numa zona de
intersecção entre a Educação e a Saúde que interagem para criar condições para que a
trajetória de cada sujeito possa ter continuidade durante o tempo de internação.

Considerações em aberto
Com base na pesquisa realizada, pode-se dizer então, que os desafios
enfrentados pelo pedagogo no ambiente hospitalar são inúmeros e de diferentes ordens.
Fica claro que esse processo para muitos é intenso, exigindo inúmeras superações, o que
requer que o professor esteja em constante processo de formação.
Para atuar em Classes Hospitalares, o estudo ressaltou a importância de uma
formação anterior específica para atuar nesse contexto, No entanto, a formação anterior
não foi considerada suficiente, as participantes da pesquisa enfatizam que a rotina a qual
estão submetidos as desloca constantemente de sua zona de conforto demandando que
busquem novos conhecimentos e nessa perspectiva a formação continuada assume um
papel importante. Cumpre salientar, no entanto, que a formação continuada, para eles,
desdobra-se em inúmeras possibilidades. Ela pode se dar por meio de cursos de
especialização, bem como a partir de leituras. Enfatizam que a reflexão cumpre um
papel fundamental nesse processo por parecer ser o elemento que articula as
experiências vivenciadas às teorias propostas nos contextos de formação. Destacam
também a importância dos grupos de formação compostos por pares, bem como aqueles
331

formados por profissionais de outras áreas na medida em que se transformam em grupos


de referência que apoiam e potencializam a formação.
Relatando suas experiências, as professores apontaram para a necessidade de
rever os currículos de formação inicial e continuada no sentido de preparar, mais
adequadamente, os docentes para atuar no hospital. Considerando a complexidade que
envolve a aprendizagem das crianças/adolescentes em contextos hospitalares é possível
dizer que a formação dos professores poderia ocorrer em perspectiva interdisciplinar,
melhor dizendo, além de fornecer os saberes de diferentes disciplinas, possibilitaria que
os professores fossem capazes de articular diferentes saberes no sentido de elaborar
respostas que atendam às situações singulares que emergem no contexto das classes
hospitalares.
Levando em conta que cada aluno é único e se encontra enfermo, situação que o
singulariza ainda mais, é necessário, também, que pedagogo hospitalar desenvolva um
olhar diferenciado e uma escuta sensível capaz de acolher e lidar com especificidades de
cada aluno. Nesse sentido, as professoras fizeram menção à necessidade de adquirir
conhecimentos de ordem pedagógica que possibilitem a organização de planejamentos,
rotinas pedagógicas flexíveis e registros que atendam e respeitem as características do
trabalho desenvolvido nas classes hospitalares. Referiram-se também a conhecimentos
de ordem disciplinar advindos da biologia, psicológica, sociológica e filosofia que deem
suporte para lidar com questões presentes no cotidiano hospitalar tais como: as
enfermidades que acometem as crianças e os adolescentes e suas decorrências como a
morte, luto, bem como com as emoções tais como: medo, raiva a ansiedade que
envolvem essas situações. Destacam a importância de aprender a lidar com as relações
que são estabelecidas nos contextos hospitalares entre profissionais de diferentes áreas,
entre pares, com os alunos-pacientes com seus familiares, relações essas permeadas por
tensões advindas da natureza das situações enfrentadas. Os objetivos comuns podem ser
mais bem alcançados quando a equipe multidisciplinar, as famílias e os pacientes
estabelecem relações que permitam avançar em busca de soluções coletivas para os
desafios enfrentados.
Finalizando, é importante salientar que esse estudo ressaltou que para atuar em
Classes Hospitalares, requer que o Pedagogo Hospitalar esteja capacitado para trabalhar
com diversidade humana e com as diferentes vivências culturais, identificando as
necessidades educacionais especiais dos educandos impedidos de frequentar a escola e
para isso definindo, implantando e adaptando o currículo. Pode-se dizer então, que os
332

desafios enfrentados pelo pedagogo no ambiente hospitalar são inúmeros e de diferentes


ordens. Fica claro que esse processo para muitos é intenso, exigindo inúmeras
superações, o que requer que ele esteja em constante processo de formação.
A atuação do professor em classe hospitalar confirma que não há um modelo
pronto ou acabado, mas sim o desafio de se construir uma ação pedagógica que
contemple esta diversidade e especificidade.

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em: o1 out. 2012.
334

Comunicação

Plano de Formação Continuada de Professores e Gestores: pressupostos e


problemas

Cristina de Cassia Mabelini da Silva


Unicid
Ângela Maria Martins
Unicid

Resumo: Este artigo é parte integrante de pesquisa maior que investigou a participação
de diretores escolares da rede estadual de ensino, em ações de formação continuada
implementada pelo Plano de Formação Continuada de Professores e Gestores, com foco
na opinião desses atores sobre possíveis desdobramentos do Plano no âmbito escolar.
Neste texto discutem-se os pressupostos que norteiam o documento oficial, assim como
a política educacional da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, no que se
refere à formação continuada de gestores.
Palavras- chaves: Formação Continuada, Gestores. Participação, Pesquisa-ação

Introdução

A rede pública estadual paulista surge em 1834, com o Ato Adicional à


Constituição Imperial, que transfere às províncias a responsabilidade com a educação.
São Paulo, beneficiado pela cultura do café, consegue manter rede educacional própria.
A Secretaria de Estado da Educação e da Saúde Pública é criada no governo
de Getúlio Vargas, pelo Decreto 4.917, de 3 de março de 1931, e, ao longo dos anos, vai
se estruturando, na perspectiva de atender às demandas de educação para os filhos da
aristocracia e, com o passar dos anos, para a formação de mão de obra para a indústria
nascente.
Mudanças na estrutura econômica do País, principalmente nas décadas de
1960 e 70, transformam a escola em instituição fundamental da sociedade moderna e
medidas são tomadas para democratizar o acesso. Para acompanhar tais mudanças e
organizar a educação no Estado de São Paulo, de forma a atender aos interesses
335

econômicos e políticos, reformas na estrutura da Seesp fizeram-se necessárias. Assim,


em 29 de janeiro de 1976, a Seesp é reorganizada pelo Decreto 7.510.
A estrutura da Seesp passa a ser composta pelo Gabinete do Secretário,
Assessoria Técnica de Planejamento e Controle Educacional, Grupo de Controle de
Atividades Administrativas e Pedagógicas, as Coordenadorias de Ensino da Grande São
Paulo e do Interior (COGSP e CEI), de Ensino e Normas Pedagógicas (Cenp) e os
Departamentos de Recursos Humanos (DRHU) e Suprimento Escolar (DSE), além da
Comissão Estadual de Moral e Civismo.
Segundo Martins (2001, p. 159), a análise desse decreto e da legislação
posterior, que o normatiza, demonstra que:
(...) as funções políticas da burocracia estatal foram definidas em programas
técnicos, organogramas sofisticados e funções básicas de organização
empresarial, empregadas em nome da racionalidade administrativa e das
teorias tidas como científicas na área de administração. Na realidade,
estabeleceu-se uma prioridade nas atividades-meio em detrimento das
atividades-fim devido à predominância da noção que norteou a formação da
estrutura burocrático-administrativa baseada em princípios que regem o
mercado privado de trabalho.

Essa estrutura, implantada em 1976, dura 35 anos, tornando-se obsoleta com


o passar do tempo.
Desde a década de 1980, já vinham sendo estruturadas propostas para a
nova reorganização da Seesp. Tais propostas contemplavam as novas demandas e
organização da educação no Estado de São Paulo, assim como das tendências mundiais
de reorganização da economia capitalista, das funções e da gestão do estado. Assim,
com vistas a adequar a máquina estatal às necessidades da globalização, da utilização
racional de recursos físicos e financeiros, da eficiência e da eficácia, da formação
humana e, ancorada no discurso da modernização, nas tecnologias de informação, nas
avaliações em larga escala, na meritocracia, com foco nas atividades-fim, como
caminhos para promover uma educação de qualidade, a Seesp é reorganizada pelo
Decreto 57.141, de 18 de julho de 2011, que substitui o antigo modelo.
Nessa nova forma de organização, que é apresentada, nos documentos
oficiais, como “gestão de resultados com foco no aluno”, e que objetiva a atividade-fim,
com entrega de produtos, a COGSP, a CEI e a Cenp, assim como o DRHU e o DSE são
extintos. Por sua vez, são criadas a Escola de Formação e Aperfeiçoamento de
Professores (Efap) Paulo Renato Costa Souza, e as Coordenadorias de Gestão da
Educação Básica (CGEB); de Informação, Monitoramento e Avaliação Educacional
(Cima); de Infraestrutura e Serviços Escolares (Cise); de Gestão de Recursos Humanos
336

(CGRH); e de Orçamento e Finanças (Cofi). A secretaria passa a ter como órgãos


vinculados o Conselho Estadual de Educação (CEE) e a Fundação para o
Desenvolvimento da Educação (FDE), além de 91 DEs, espalhadas por todo o Estado de
São Paulo.
Sem detalhar a formação inicial de professores e profissionais de suporte
pedagógico, oferecida por instituições públicas e particulares, o Estado de São Paulo
institui políticas compensatórias de formação continuada dos profissionais (RIGOLOM,
2012), propondo cursos presenciais e a distância, orientações técnicas centralizadas e
descentralizadas, seminários, fóruns, dentre outros. Assim, como responsáveis pelo
currículo oficial e pela formação continuada dos profissionais da Seesp, a CGEB e a
Efap desenvolvem orientações técnicas e cursos.
Observados os indicadores de avaliações externas, como o Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb)1 e o Índice de Desenvolvimento da
Educação do Estado de São Paulo (Idesp), considerados aqui como instrumentos
necessários, mas insuficientes, para a melhoria da qualidade de ensino (OLIVEIRA,
2005), nos últimos três anos, percebe-se que os resultados apresentados estão aquém de
demonstrar progressos qualitativos na educação pública paulista.
Sem entrar na discussão a respeito do Saresp, e considerando seus resultados
como um dos aspectos na análise da evolução da qualidade da educação no estado,
percebe-se que os avanços nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática são
baixos, na passagem de um nível de aprendizagem para outro, nos três últimos anos da
aplicação do Saresp. Em todos os anos escolares avaliados, é significativa a
porcentagem de estudantes classificados como abaixo do básico, com destaque para o
Ensino Médio. Considerado o número de estudantes matriculados em escolas da Seesp,
essa porcentagem significa milhares de crianças e jovens com aprendizagem defasada.
Situação agravada no Ensino Médio: um terço dos alunos conclui o ensino básico sem
ter atingido o nível básico de conhecimento.
Assim, embora ações de formação continuada sejam consideradas, pela
literatura da área, como fundamentais para o desenvolvimento de profissionais da

1
Para Oliveira e Araújo (2005, p. 18), “as políticas de avaliação mediante testes padronizados, como o
Saeb, constituindo indicadores de sucesso/fracasso escolar, se, por um lado, aferem competências e
habilidades requeridas para um ensino de qualidade, por outro não possuem efetividade, visto que pouca
ou nenhuma medida política ou administrativa é tomada a partir dos seus resultados, ou seja, não possuem
validade consequencial. Dessa forma, os testes padronizados são instrumentos necessários, mas
insuficientes para a melhoria da qualidade de ensino”.
337

educação, e a Seesp fazer uso da modalidade em forma de cursos e orientações técnicas,


com a utilização de videoconferências, palestras, seminários, dentre outros, elementos
contraditórios também são apontados sobre seus limites. Para Lück (2000, p. 30),
a maioria de cursos promovidos por órgãos centrais tem seus programas
pautados por generalizações, apresenta um distanciamento entre teoria e
prática ao focalizar conteúdos formais em detrimento do desenvolvimento de
habilidades (o saber fazer) e enfoca o indivíduo, desconsiderando a
necessidade de desenvolvimento do trabalho em equipe.

O Plano de Formação Continuada de Professores e Gestores (Comunicado


CENP de 11 de julho, publicado no Diário Oficial de 12 de julho de 2011), toma como
marcos legais, a LDBEN (Lei 9.394/1996), a Resolução SE 62/20052 e a Portaria
Conjunta Cenp/DRHU3, de 27 de setembro de 2005,.
Em linhas gerais, as orientações para a ação organizacional (SEESP/CENP,
2011) propostas pelo órgão central apoiam-se nos aspectos legais (legislação vigente e
normatizações), nos saberes teoricamente construídos por profissionais da rede pública
estadual, assim como no dia a dia das equipes escolares, sobretudo nas relações da
escola com a comunidade.
O Plano de Formação Continuada de Professores e Gestores (SEESP/CENP,
2011) assinala a necessidade da “gestão democrática e participativa para que os
processos formativos nas escolas sejam revitalizados e transformados”, compreendendo
a escola como o principal “lócus” de formação, desenvolvida por meio da “discussão,
análise e reflexão”.
Os participantes do processo de formação continuada são os supervisores de
ensino, Professores Coordenadores das Oficinas Pedagógicas (PCOP), diretores de
Escolas, professores coordenadores, um integrante do órgão central e um representante
da universidade.
Os locais de formação, apontados no Plano, em São Paulo, são a Escola de
Formação de Professores e/ou outros espaços da Secretaria de Estado da Educação e,
nas regiões do estado, Núcleos de Formação, Diretorias de Ensino e Escolas
(SEESP/CENP, 2011).
As experiências vivenciadas nas Diretorias de Ensino e Escolas constituem
objeto de discussões sobre o fazer e o pensar, a prática e teoria, a ação e reflexão,

2
Resolução SE 62/2005: Dispõe sobre procedimentos para implementação das ações de formação
continuada, nas modalidades Curso e Orientação Técnica.
3
Portaria Conjunta Cenp/DRHU, de 27 de setembro de 2005: Dispõe sobre a uniformização da
implementação de Cursos e de Orientações Técnicas, desenvolvidas por órgãos da Secretaria da Educação
e/ou com sua aprovação.
338

criando condições para que ocorram transformações nas práticas curriculares e de


gestão escolar: “(...) relatos das experiências vivenciadas nas Diretorias de Ensino e
Escolas, serão objetos de análises e discussões” (SEESP/CENP, 2011), com a proposta
de exercício reflexivo das realidades e necessidades locais, o estudo teórico e a
proposição de novas formas de atuação. Porém, como afirma Lima (1996), discutir
contextos e situações julgados conhecidos profundamente não é uma tarefa fácil:
Descobre-se, em suma, que interrogar, procurar definir e caracterizar, aquilo
que profundamente conhecemos e vivenciamos em termos de práticas sociais
recorrentes, em contextos e situações em que fomos socializados e que hoje
parecem desprovidos de segredos para nós, representa um exercício mais
difícil do que poderíamos supor e, em todo o caso, um exercício por vezes
incômodo (LIMA, 1996, p. 1).

Por ser incômodo, torna-se um desafio permanente refletir sobre a prática e


reorganizar o trabalho, de modo a vivenciar a construção de um processo democrático e
participativo, bem como elaborar coletivamente propostas de gestão escolar que sejam
coerentes com as necessidades da comunidade e dos profissionais que nela trabalham.
É reconhecido que, no campo educacional, a pesquisa-ação não tem sido
privilegiada enquanto abordagem metodológica, porém, o Plano de Formação
Continuada de Professores e Gestores indica essa linha de pesquisa como referência
para o trabalho a ser desenvolvido. Franco (2005) aponta para o fato de que os autores
são unânimes em afirmar que a pesquisa-ação tem suas origens nos trabalhos do
psicólogo alemão Kurt Lewin (1890-1947), apresentados no ano de 1946.
Suas pesquisas iniciais tinham por finalidade a mudança de hábitos
alimentares da população e também de atitudes dos americanos em relação aos grupos
étnicos minoritários. Pautava-se por um conjunto de valores, como a construção de
relações democráticas; a participação dos sujeitos; o reconhecimento de direitos
individuais, culturais e étnicos das minorias; a tolerância a opiniões divergentes; e,
ainda, a consideração de que os sujeitos mudam mais facilmente quando impelidos por
decisões grupais. Suas pesquisas caminhavam paralelamente a seus estudos sobre a
dinâmica e o funcionamento dos grupos. Sua forma de trabalhar a pesquisa-ação teve
especial desenvolvimento nas empresas em atividades ligadas ao desenvolvimento
organizacional.
Para Engel (2000, p. 182),
A pesquisa-ação surgiu da necessidade de superar a lacuna entre teoria e
prática. Uma das características desse tipo de pesquisa é que através dela se
procura intervir na prática de modo inovador já no decorrer do próprio
339

processo de pesquisa e não apenas como possível consequência de uma


recomendação na etapa final do processo.

Na concepção original, a pesquisa-ação tem quatro perspectivas: a pesquisa-


ação diagnóstica, a participante, a empírica (que acumula dados como nos casos
clínicos) e a experimental (controlada).
Pode-se apontar para quatro temáticas centrais, a serem examinadas na
pesquisa-ação: a identificação do problema e a contratualização; o planejamento e a
realização em espiral; as técnicas de pesquisa-ação; a teorização, a avaliação e a
publicação dos resultados.
O espírito mesmo da pesquisa-ação consiste em uma abordagem em espiral
(grifo do autor) (...). Significa que todo avanço em pesquisa-ação implica o
efeito recursivo em função de uma reflexão permanente sobre a ação.
Inversamente, porém, todo segmento de ação engendra ipso facto um
crescimento do espírito de pesquisa. Nada de pesquisa sem ação, nada de
ação sem pesquisa, como dizia Lewin (BARBIER, 2007, p. 117).

O Plano não especifica qual perspectiva deve ser adotada. Aponta que o
trabalho de formação dos GRs, nos Núcleos de Formação, deve partir da pesquisa-ação,
de forma colaborativa. Para Pimenta (2005, p. 523),
A pesquisa-ação torna-se colaborativa na medida em que proporciona a
criação, nas Diretorias e nas escolas, de uma “cultura de análise e reflexão
das práticas que são realizadas, a fim de possibilitar que os seus professores
(...) transformem suas ações e as práticas institucionais”.

É importante destacar que, em todas as perspectivas da pesquisa-ação, a


presença de um pesquisador oficial não é descartada, assim como a avaliação e a
publicação coletiva dos resultados alcançados podem ser prerrogativas no processo.
Apesar de o Plano apoiar-se em um tripé formado pelo representante do
órgão central, integrantes do GR e um professor universitário, não caracteriza nenhum
deles como coordenador do processo, função do pesquisador oficial na pesquisa-ação
(BARBIER, 2007).
Para a formação de gestores, a estrutura está organizada considerando o
número de supervisores de ensino, diretores de escolas e professores coordenadores,
totalizando aproximadamente 17 mil gestores, segundo base de dados da CRHU4; a
extensão territorial do estado; as realidades locais; a localização geográfica das 91 DEs;
das Escolas; o número de alunos; e a quantidade de escolas prioritárias5.

4
Disponível em: <http://drhu.edunet.sp.gov.br/a_principal/index.asp.>. Acesso em: 28 set. 2013.
5
São consideradas prioritárias, pela Seesp, as escolas que, no Saresp, apresentam percentual acima do
definido para o nível básico de aprendizagem nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática.
340

Desse estudo, resultou a divisão das DEs em 27 espaços, denominados


Núcleos de Formação, agrupando de duas a sete DEs, a saber: 12 Núcleos de Formação
na Capital e Grande São Paulo e 15 Núcleos de Formação no Interior.
O documento define os núcleos como espaços de formação continuada dos
gestores escolares, onde se reúnem os gestores das Diretorias de Ensino Regionais que o
integram, os GRs, e um representante do órgão central, o CEPQM.
Denomina-se de GR aos gestores indicados pelo dirigente regional, a partir
de perfil definido no Plano para participar do processo de formação nos 27 Núcleos de
Formação espalhados pelo Estado de São Paulo, com o objetivo de se apropriar da
metodologia e desenvolver um trabalho orientado por essa metodologia e pelos
objetivos das Diretorias de Ensino. A representação dos GRs nos Núcleos de Formação
varia de quatro a sete integrantes por DER, com a predominância dos gestores das
escolas, conforme orienta o referido plano.
Registrem-se contradições entre o discurso democrático expresso no Plano e
a indicação dos membros que compõem os GRs nas DEs.
Na sua concepção, as ações de formação estão voltadas para a construção do
conceito de “liderança distributiva”, conforme aponta Lima (2011, a partir de
FUSARELLI, KOWALSKI; PETERSEN, 2011, p. 14), num contexto educativo que
ensaia a democracia deliberativa, a participação ativa, a partilha de poderes, numa
perspectiva sociocomunitária.
Contudo, a forma de indicação dos membros das DEs feita pelos dirigentes
regionais de ensino, aponta para a direção contrária dos princípios democráticos e
participativos do referido Plano de Formação Continuada de Professores e Gestores que,
pela própria concepção, deveria apontar para uma indicação democrática, pelos pares,
de forma coletiva. Segundo análise de registros disponibilizados pelo CEPQM, em
agosto de 2011, a Seesp deu início à implantação do Plano de Formação Continuada de
Gestores. O processo de formação previa, a princípio, três instâncias físicas para o
desenvolvimento do processo: Núcleos de Formação, DEs e Escolas.
A análise de registros fornecidos pelo CEPQM (2011) demonstra que, nos
primeiros encontros dos Grupos de Referência, nos Núcleos de Formação, realizou-se o
levantamento das expectativas dos gestores, que desencadeou a construção do Plano de
Formação do Núcleo, e a disseminação de 27 planos de formação para todo o Estado de
São Paulo.
341

Para promover a reflexão a respeito das práticas desenvolvidas pelo GR nas


Diretorias de Ensino, a equipe propunha que, em cada reunião nos Núcleos de
Formação, fosse garantido um tempo para que os integrantes do GR, de cada DER,
socializassem suas práticas. As atas e os relatórios fornecidos pelo CEPQM
demonstram que, dentre as propostas de ações para serem desenvolvidas pelos GRs, nas
DEs, estavam a reconstrução e reorganização dos planos de ação desenvolvidos nas DEs
e escolas – quando necessário –, os estudos das temáticas levantadas pelas DEs, por
meio de palestras, seminários, leitura e discussão de textos e a análise das
demandas/ações da SEE: implantação, implementação, impacto, dentre outros, além da
proposição de encaminhamentos de novas práticas de gestão, no mesmo movimento já
descrito anteriormente.
Ou seja, esperava-se que a metodologia de trabalho desenvolvida no
Núcleo de Formação fosse adaptada de acordo com as realidades e necessidades locais
em cada uma das 91 DEs, bem como se desdobrasse nas escolas cujos diretores
fizessem parte do processo formativo, com a elaboração de planos de ação, estudo de
temáticas relacionadas às necessidades de cada DE e Escolas e proposição de novas
práticas.
Muito embora a proposição de temas, pelos órgãos centrais, não esteja
descartada no Plano de Formação Continuada de Professores e Gestores (Seesp/CENP,
2011), a análise dos registros demonstra que esse processo não foi bem aceito pelos
GRs, uma vez que trazia em seu bojo contradição entre a proposta de ação descrita no
referido Plano, com o processo formativo realizado a partir das realidades e
necessidades locais e a proposição de temas pelo órgão central.
Em suma, a implantação e implementação do Plano de Formação
Continuada de Professores e Gestores (Seesp/CENP, 2011) apresenta elementos
complexos e dinâmicos, oferecendo possibilidades de outros estudos, mais detalhados e
aprofundados.
A pesquisa dos registros do trabalho efetuado pela equipe do CEPQM
aponta importantes intervenientes na formação continuada de gestores, pois
influenciaram o processo e os resultados dos trabalhos, conforme se identificou.
Uma questão interferiu diretamente na organização, implantação e
implementação desse processo: a política de afastamento de servidores do quadro do
magistério nos órgãos centrais, o que gera perdas salariais, como verba de
342

representação, transporte (10% do salário-base para os diretores de Escola e 20% do


salário-base para supervisores de ensino) e adicional noturno.
O somatório das perdas representa significativo valor no salário desses
profissionais6.
Por esse motivo, muitos foram os desligamentos dos integrantes da equipe
de Gestão: 11, no ano de 2011. Vários Núcleos de Formação tiveram seus
representantes trocados entre duas a quatro vezes no ano de 2011. O problema persistiu
em 2012, e foi atenuado, em 2013, devido à expectativa da oferta de gratificação para os
profissionais do quadro do magistério afastados em órgão central para trabalhos
pedagógicos.
A reorganização da Seesp, a partir do Decreto 57.141, de julho de 2011,
promoveu mudanças em sua estrutura. A Cenp foi extinta e suas atribuições foram
absorvidas pela CGEB. O Grupo de Gestão passou a fazer parte do CEPQM.
Nas atribuições descritas, para o CEPQM, no Decreto 57.141/20117, não
aparece explícita a formação continuada de gestores como atribuição do referido Centro.
Tal fato gerou muitas discussões e a divisão da equipe no órgão central. A ação de
formação de gestores deixou de ser consenso na equipe.
As discussões internas sobre as funções do CEPQM ainda não se esgotaram.
As diferentes concepções e posições sobre o referido decreto revelam movimentos e
interesses diversos, dentro da própria Seesp, e interferem na participação e não
participação dos integrantes das equipes centrais nas ações formativas do Plano de
Formação de Gestores. Como aponta Martins (2002 a ).
(...) não basta aprender novas técnicas ou apenas frequentar alguns cursos de
capacitação para compreender, introjetar novos referenciais teórico-
metodológicos e, sobretudo, transformá-los em práticas criativas de
construção do cotidiano.

6
No período da pesquisa, mais precisamente em agosto de 2013, foi publicada a Resolução Conjunta SE-
SGP 2, de 3 de agosto de 2013, que regulamenta a Lei complementar 1.192/2012, Gratificação de
Atividade Pedagógica, regulariza a situação dos integrantes do quadro do magistério afastados nos órgãos
centrais.
7
Decreto 57.141/2011. Dispõe sobre a reorganização da Secretaria de Estado da Educação e dá outras
providências.
343

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SÃO PAULO (Estado). Decreto n. 54.297, de 5 de maio de 2009, publicado no Diário


Oficial de 9 maio 2009. Cria a Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores e
dá outras providências.
344

SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Estado da Educação. Comunicado Cenp de 11 de


dezembro de 2011, publicado no Diário Oficial de 12 jul. 2011. Plano de Formação
Continuada de Professores e Gestores, Cenp, 2011.

SÃO PAULO (Estado). Decreto n. 57.141, de 18 de julho de 2011, publicado no Diário


Oficial de 19 jul. 2011. Reorganiza a Secretaria de Educação e dá providências
correlatas.

SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Estado da Educação. Resolução n. 74, 8 nov. 2013.
Dispõe sobre a reorganização do Ensino Fundamental em Regime de Progressão
Continuada, oferecidos pelas escolas públicas estaduais e dá outras providências.

SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Estado da Educação. Coordenadoria de Gestão de


Educação Básica 2003/2007: Documentos de Trabalho: Grupo de Referência. São Paulo
2011, 2012, 2013.

SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Estado da Educação. A nova estrutura


administrativa da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo: por uma gestão
de resultado com foco no desempenho do aluno/Secretaria da Educação: coordenação e
execução, Sebastião Aguiar; edição final, César Muin Silva. São Paulo: SE, 2013.
Disponível em:
<http://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/572.pdf>.
Acesso em: 17 mar. 2014.

THIOLLENT, Michel. Metodologia da pesquisa-ação. 12. ed. São Paulo: Cortez, 2003.

TRIPP, David. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Educação e Pesquisa, São


Paulo, v. 31, n. 3, p. 443-466, set./dez. 2005. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ep/v31n3/a09v31n3.pdf>. Acesso em: 18 nov. 2013.
345

Comunicação

Gestor escolar, você concorda com o IDESP?

Daniela Guerreiro Casanova


Universidade Nove de Julho – UNINOVE
Miguel Henrique Russo
Universidade Nove de Julho – UNINOVE
Roberta Gurgel Azzi
Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP

Resumo: Este estudo teve como objetivo identificar as razões que levavam gestores
escolares a concordarem, ou não, com a política de avaliação da Secretaria de Educação
Estadual contemplada pelo Índice de Desenvolvimento da Educação de São Paulo
(IDESP). Participaram 45 gestores escolares, advindos de 17 escolas públicas da rede
paulista de ensino. Destes, 14 gestores escolares declararam concordar com a política
contemplada pelo IDESP e 27 declararam não concordar. Dentre as razões explicitadas,
pôde-se verificar que alguns acreditavam no potencial diagnóstico e norteador conferido
àquele índice. Já a maioria revelava não concordar com a política meritocrática
associada ao IDESP, bem como à desconsideração do contexto escolar. Outros
atribuíram o insucesso da escola aos estudantes que supostamente não valorizavam as
avaliações externas. Essas percepções assemelham-se ao que tem sido apresentado na
literatura sobre o tema, a qual subsidia a discussão aqui apresentada.
Palavras-chave: avaliação externa, diretores escolares, coordenadores pedagógicos

Introdução

Com o intuito de proporcionar melhoria da qualidade e a equidade do sistema de


ensino nas escolas estaduais, em 2008 a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo
lançou o programa Qualidade da Escolar. Tal programa é realizado por meio de
avaliações do rendimento escolar (Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do
Estado de São Paulo - SARESP) realizadas nas últimas séries de cada ciclo,
346

considerando-se, também, o fluxo escolar relativo à cada escola, cujos dados integrados
dão origem ao Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo
(IDESP). A partir desse índice, cada unidade escolar recebe metas de desempenho a
serem cumpridas na próxima edição, as quais visam estabelecer padrões de
desenvolvimento ao longo de um ano letivo, bem como guiar a evolução das escolas, de
modo que estas possam atingir nota 5,0 no IDESP em 2030. O cumprimento das metas
anuais possibilita que gestores escolares e professores recebam um bônus financeiro,
como reconhecimento do êxito alcançado no decorrer do ano letivo. Ciente das muitas
controvérsias relativas ao referido programa, este estudo1 teve como objetivo identificar
as razões que levavam os gestores escolares à concordarem, ou não, com a política de
avaliação da Secretaria de Educação Estadual contemplada pelo Índice de
Desenvolvimento da Educação de São Paulo (IDESP).
Por um lado, alguns pesquisadores destacam como aspectos positivos associados
ao IDESP, o caráter diagnóstico que tal índice pode desempenhar, auxiliando a
promover melhorias nas práticas escolares e a conduzir as políticas educacionais
(SOUSA e OLIVEIRA, 2010). Os resultados divulgados por níveis de proficiência
constituem-se como um dos elementos que podem fundamentar intervenções
pedagógicas, objetivando-se, inclusive, evitar a exclusão de alunos com dificuldades
(SOARES, 2009). Ainda por meio dos possíveis diagnósticos, advindos dos resultados
do IDESP, pode-se reestruturar os processos internos das unidades escolares e as
práticas de ensino, bem como subsidiar programas de formação continuada (ALVES,
2014; SOUSA e OLIVEIRA, 2010).
Por outro lado, os aspectos negativos associados ao IDESP aparecem com maior
frequência, não pelo índice em si, mas pelo modo como tal índice tem sido utilizado
(FREITAS, 2007; PARO, 2011; SOUSA e OLIVEIRA, 2010). Aparentemente, ao invés
de se utilizar as possibilidades diagnósticas para orientar novas práticas pedagógicas
que possam enriquecer a formação e o processo de aprender dos estudantes, o IDESP
tem provocado uma mudança no modo de ensinar, visando apenas instrumentalizar os
estudantes a responderem testes, os quais deixam de ser meios para se tornarem fim.
(NETO, 2014; PARO, 2011; RAVITCH, 2011; SOUSA e OLIVEIRA, 2010)

1
Este estudo integra a pesquisa Crenças de Eficácia de Gestores Escolares e de Docentes no Ensino
Médio paulista, realizada com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo,
processo nº 2010/51657-1.
347

Desconsidera-se o papel formativo da escola, que não pode ser de todo


contemplado em um teste (NETO, 2014; PARO, 2011; SOUSA e OLIVEIRA, 2010).
Também, desconsideram-se a diversidade e as adversidades contextuais nas quais as
escolas estão inseridas e o equívoco de tomar ausência de reprovação como qualidade
escolar, o que parece possibilitar uma nova forma de exclusão escolar, que mantem o
estudante dentro dos muros da escola mas não o integra aos saberes da cultura
(FREITAS, 2007). Ao responsabilizar as escolas pelo fracasso, pode-se impulsionar um
fenômeno perceptivo que leve os envolvidos nos processos escolares (gestores,
professores, estudantes e pais) a agirem de acordo com os resultados obtidos. Isto, no
entanto, faz-se perigoso quando se trata de resultados negativos, que podem
desencadear ações conformistas com o papel de fracassados e, assim, manter as
desigualdades escolares (RAVITCH, 2011; SOUSA e OLIVEIRA, 2010; ZAMBO e
ZAMBO, 2008).
Há ainda aspectos negativos associados ao IDESP, que sugerem certa intenção
de monitorar e limitar a autonomia das escolas, bem como avaliar os profissionais da
rede, além de avaliar os estudantes (SOUSA e OLIVEIRA, 2010). Esse aspecto ganha
força quando associado à política meritocrática do IDESP, que concede bônus aos
profissionais das escolas que atingiram as metas previamente estabelecidas e se
contrapõe à ideia de que a satisfação com o trabalho pode ser decorrente de um salário
digno, realizado com condições laborais adequadas e valorizado socialmente
(OLIVEIRA, 2010).
As controvérsias sobre o tema, aqui brevemente apresentadas, também podem
ser verificadas nas percepções de educadores que vivenciam o cotidiano escolar sob a
perspectiva das avaliações externas. Como exemplo, citamos o estudo de Vieira e
Fernandes (2011) que realizaram uma pesquisa cujo objetivo, dentre outros, era
identificar as percepções de professores sobre a avaliação externa da rede de ensino de
Minas Gerais. Os professores entrevistados pelas autoras, demonstraram acreditar que a
avaliação externa além de avaliar alunos, avalia professores, e que passaram a ser mais
cobrados pelos gestores. Relataram que a prática pedagógica foi alterada de modo a
adequá-la ao modo como o conteúdo é solicitado nas provas. Alves (2014) realizou um
pesquisa em duas escolas estaduais de São Paulo e verificou que os professores
desconheciam o resultado detalhado que obtiveram no IDESP, só sabiam se atingiram a
meta ou não. Para esse pesquisador, esse fato parece sugerir que há pouco entendimento
sobre os relatórios advindos do IDESP, o que pode inviabilizar o processo diagnóstico e
348

a discussão deste na formação continuada realizada na própria escola. Com o intuito de


ampliar o conhecimento sobre as percepções dos gestores escolares em relação às
avaliações externas com as quais lidam, este estudo teve como objetivo identificar as
razões que levavam os gestores escolares de escolas da rede pública estadual de São
Paulo à concordarem, ou não, com a política de avaliação da Secretaria de Educação
Estadual contemplada pelo Índice de Desenvolvimento de Educação de São Paulo
(IDESP).

A pesquisa

Considerando-se a facilidade de acesso dos pesquisadores às escolas, delimitou-


se como municípios de interesse as cidades de Campinas, Pedreira, São Bernardo do
Campo e São Caetano do Sul, localizadas no Estado de São Paulo. Após a obtenção de
autorização das Diretorias de Ensino, responsáveis pelas áreas de interesse, os
pesquisadores convidaram, por meio de contato telefônico, os diretores escolares à
participarem da pesquisa. Quando do aceite, foram combinados data e horário para a
realização da coleta de dados, os quais foram obtidos por meio de um questionário
impresso, contendo perguntas sobre aspectos de caracterização dos gestores escolares
(como idade, histórico de formação, entre outras) e a pergunta de interesse para este
estudo: Você concorda com a política de avaliação da Secretaria de Educação Estadual
contemplada pelo Índice de Desenvolvimento de Educação de São Paulo (IDESP)? Por
quê?
As respostas obtidas foram analisadas qualitativamente. Após a análise de
conteúdo das razões apresentadas pelos gestores escolares, foram estabelecidas três
categorias: aspectos positivos, política, alunos.

Os participantes

Oriundos de 17 escolas públicas da rede de ensino estadual de São Paulo, 45


gestores escolares participaram desta pesquisa. Como características pessoais 14
participantes declaram ser do sexo masculino e 31 do sexo feminino. Os gestores
escolares participantes tinham 46 anos em média, sendo 32 a idade mínima e 63 a idade
máxima verificadas. Como características profissionais, os gestores escolares
participantes atuavam na função há 6,75 anos em média. Esses profissionais atuavam na
349

mesma escola há 2 meses, no mínimo, e há 28 anos, no máximo. Em relação à


formação, 7 gestores escolares declaram ser formados em pedagogia, 15 em alguma
licenciatura e 22 tinham algum curso de especialização.

Resultados

Dos 45 participantes desta pesquisa, 14 declararam concordar com a política de


avaliação contemplada pelo IDESP; 27 afirmaram não concordar e 4 não responderam a
essa pergunta. Dos participantes que responderam, apenas 39 responderam a questão
aberta, explicando as razões que os levavam à concordar ou não com a política de
avaliação relativa ao IDESP.
Como já anteriormente indicado, as categorias que serão aqui descritas foram
estabelecidas após análise das respostas emitidas pelos gestores escolares. Estas foram
estabelecidas por meio de padrões identificados entre as diversas respostas.
Na categoria Aspectos Positivos, foram agrupados os comentários que
demonstravam concordar com a política de avaliação contemplada pelo IDESP. Nesta
categoria, pode-se perceber que alguns dos gestores escolares concordavam com o
IDESP porque acreditam que os resultados obtidos nesse sistema avaliativo podem
servir como parâmetro a fim de orientar possíveis intervenções a serem realizadas pelos
profissionais da escola, de modo a guiar o planejamento do processo de aprendizagem
dos estudantes. Algumas respostas inseridas nesta categoria podem ser observadas no
Quadro 1.

Participante Resposta emitida


1 É através de avaliações que obtemos resultados e assim intervimos
com ações significativas
6 Quando se avaliam as habilidades e competências você consegue
"mensurar" de forma mais significativa o que o aluno sabe
realmente e o que ele não sabe, assim a retomada com uma
recuperação contínua fica muito mais fácil e transparente para o
aluno. O que ele não sabe, é que ele deve rever para aprender
7 Porque as pessoas são movidas por desafios, e o IDESP é um grande
desafiador para atingir as metas.

18 Acredito que o referido índice contribui muito com mecanismos de


diagnóstico que interfere diretamente na proposta pedagógica da
escola, promovendo o replanejamento das ações.
Quadro1. Algumas respostas inseridas na categoria Aspectos Positivos.
350

As respostas expostas no Quadro 1 auxiliam a demonstrar que alguns gestores


escolares declararam uma utilidade diagnóstica para o IDESP. Tais percepções parecem
ser semelhantes ao discurso utilizado pelos órgãos oficiais.
A categoria Política acolhe as respostas cujos conteúdos demonstraram não
concordar com o modo pelo qual o IDESP é elaborado e/ou utilizado. Há referências ao
caráter punitivo do IDESP e à desconsideração da diversidade contextual em que as
escolas estão inseridas. Alguns exemplos de respostas incluídas nesta categoria são
apresentados no Quadro 2.

Participante Resposta emitida


3 A forma como consideram este índice em relação a nossa escola não
nos tem beneficiado isso porque temos alto índice
16 Estes dados são um recorte muito especifico de todo processo de
aprendizagem e os índices não levam em consideração questões
mais amplas como a realidade socioeconômica do aluno.

20 Não concordo em relacionar o IDESP com o Bônus para os


profissionais da Educação, pois a responsabilização punitiva recai
para os professores e diretores.
28 Porque não avalia a mesma turma.
Quadro2. Algumas respostas inseridas na categoria Política.

Como pode ser observado no Quadro 2, alguns gestores escolares demonstraram


não concordar com o IDESP, devido o caráter punitivo atrelado à política meritocrática,
a qual confere direito à bônus financeiro aos profissionais que atingiram as metas
estabelecidas para a escola. Esses gestores escolares parecem também não concordar
com o fato de que condições sociais que não podem ser alteradas pelos gestores
escolares e afetam os aspectos considerados para se mensurar o fluxo escolar, de modo
que se sentem punidos por situações que se encontram além dos muros das escolas por
eles dirigidas.
A categoria Alunos refere-se a comentários que parecem responsabilizar os
estudantes do ensino médio pelos resultados negativos obtidos no IDESP. No Quadro 3
podem ser conferidas alguns exemplos desta categoria.
351

Participante Resposta emitida


5 Não concordo porque aparentemente leva em conta apenas o aluno
e nem sempre ele tem interesse ou percebe a importância das
avaliações externas. É um fator negativo.
9 Considero complicado sermos avaliados por um instrumento que
não tem significado algum para a maioria dos alunos
11 A escola é avaliada em apenas dois dias e contamos com a
consciência e responsabilidade do aluno em fazer a prova. Sabemos
que os professores fazem muito mais, porém nesses dias, os alunos
não colaboram com boa vontade. Isso faz com que a avaliação
despenque. Na mídia, o governo associa o desempenho dos alunos
com o bônus dos professores e os alunos usam dessa informação
para não fazerem a prova de forma consciente e mostrem realmente
o que eles sabem.
39 Os alunos não dão valor pois essa avaliação não indica o rendimento
individual. Com isso existe a dificuldade de conhecimento em
realizar a avaliação com responsabilidade.
Quadro3. Algumas respostas inseridas na categoria Alunos.

Os comentários expostos no Quadro 3, demonstram que alguns gestores


escolares parecem atribuir os índices indesejáveis obtidos no IDESP a uma suposta
conspiração realizada por parte do aluno. Comentam que os alunos não demonstram
seus conhecimentos nas provas que são utilizadas para a obtenção do índice do IDESP
intencionalmente para prejudicar os professores ou por não reconhecerem a importância
dessas provas. O fato dessas provas não indicarem o desempenho individual dos
estudantes, parece, como comentado pelo participante 39, contribuir para que os
estudantes não se interessem e não se empenhem pelas avaliações que fundamentam o
cálculo do IDESP.
É importante registrar que seis participantes que declaram concordar com a
política de avaliação relativa ao IDESP, no momento de explicar as razões fizeram
considerações restritivas, demonstrando que concordavam em parte. Tal
posicionamento pode ser identificado, por exemplo, no seguinte comentário: Concordo
com o IDESP, porém não concordo com a política de comparação que não leva em
conta a diversidade do contexto social no qual a escola está inserida... (participante 14,
vice-diretor escolar). Outro exemplo pode ser o comentário redigido pelo participante
19, que demonstrou concordar com a política pelos Indicadores de Qualidade e não
concordo em relacionar o IDESP com o Bônus para os profissionais da educação, pois
a responsabilização punitiva recai para os professores e diretores.
352

Algumas considerações

Pode-se verificar que alguns participantes concordam com o IDESP e o


entendem como um instrumento pedagógico que possibilita diagnosticar o nível de
proficiência dos estudantes e, a partir disso, elaborar planos de ações instrucionais
visando melhorar a aprendizagem dos estudantes. Essas percepções podem ser
consideradas semelhantes ao pontuado em outros estudos (PARO, 2011; SOUSA e
OLIVEIRA, 2010; VIEIRA e FERNANDES, 2011). Seria interessante saber se as
opiniões que revelam concordar com o IDESP foram conscientes e se de fato os
gestores escolares que declaram acreditar que o IDESP pode ser um recurso diagnóstico
utilizam este índice para tal fim, pois, como constatado por Alves (2014) tal prática não
foi observada em algumas escolas. Outro aspecto que contribuiria para ampliar a
compreensão dessas respostas seria saber se esses gestores escolares participaram de
alguma formação específica para o tema em questão.
Já, a maioria dos participantes demonstrou não concordar com a política
contemplada pelo IDESP, porque não acreditam que seja possível diagnosticar o nível
de aprendizagem por apenas algumas provas ou porque se sentem responsabilizados
pelo insucesso, mesmo quando as causas para tal insucesso não seja oriunda de suas
ações, mas sim decorrente da desconsideração da adversidade contextual em que as
escolas estão inseridas ou da postura descomprometida dos estudantes, para os quais o
IDESP nada significa. Essas percepções podem ser comparadas às verificadas em
outros estudos sobre o tema (PARO, 2011; VIEIRA e FERNANDES, 2011), como
também podem reforçar argumentos de pesquisadores, os quais também discordam do
modo como o IDESP tem sido utilizado, responsabilizando os educadores pelo
insucesso escolar, sem considerar as especificidades de cada escola e associando o
desempenho obtido no IDESP com bônus financeiro (FREITAS, 2007; SOUSA e
OLIVEIRA, 2010).
O estabelecimento de metas parece ser outro aspecto que contribui para que os
gestores não concordem com o IDESP. Uma das respostas que revelavam concordar em
parte com o IDESP comentava que as metas estabelecidas prejudicavam a sua escola,
que tinha índices mais altos que as demais. Segundo esse gestor, sua escola estava
sendo punida, pois alcançar as metas ficava mais difícil e os profissionais não recebiam
o bônus, mesmo tendo mantido o IDESP acima de outras escolas.
353

É interessante ressaltar que alguns gestores demonstravam receio em emitir suas


opiniões, pois comentavam que não tinham autorização da Secretaria de Educação para
concede entrevistas. Isso pode ser interpretado como decorrente do cerceamento da
autonomia escolar, bem como receio do controle e monitoramento realizados pelos
órgãos oficiais. Pelo aqui exposto, acredita-se que este estudo soma-se à outros já
realizados, os quais alertam que a política meritocrática associada ao IDESP prejudica a
utilização desse índice como um instrumento diagnóstico, norteador de ações
pedagógicas. Isto posto, conclui-se este texto pontuando-se que, como comentado por
Ravitch (2011), é necessário atentar para que a educação não se resuma ao treino de
alunos e professores, tampouco que as políticas educacionais se resumam à avaliações
externas padronizadas.

Referências

ALVES, C. S. Implicação dos resultados dos sistemas de avaliação nos processos de


formação no interior da escola. Olh@res, Guarulhos, v. 2, n. 1, p. 124-142. mai. 2014.

FREITAS, L. C. Eliminação Adiada: O caso das classes populares no interior da escola


e a ocultação da qualidade do ensino. Educação e Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100 –
Especial, p. 965-987, out. 2007.

NETO, J. L. H. Como os resultados das avaliações educacionais vêm sendo utilizados


pelos programas educacionais dos estados de Minas Gerais e São Paulo. IV Congresso
Ibero-Americano de Política e Administração da Educação / VII Congresso Luso
Brasileiro de Política e Administração da Educação. 14 - 16 de abril de 2014, Porto,
Portugal.

OLIVEIRA, M. B. A estratégia dos bônus: três pressupostos e uma consequência. Trab.


Educ. Saúde, Rio de Janeiro, v. 7 n. 3, p. 419-433, fev.2010.

PARO, V. H. Crítica da estrutura da escola. São Paulo: Cortez, 2011a. 248 p.

PARO, V. H. Progressão Continuada, supervisão escolar e avaliação externa:


implicações para a qualidade do ensino. Revista Brasileira de Educação, v. 16, n. 48,
set.-dez. 2011b.

RAVITCH, D. The death and life of the great american school system: how testing
and choice are undermining education. New York: Basic Books, 2011.

SOARES, J. F. Índice de desenvolvimento da Educação de São Paulo – Idesp: bases


metodológicas. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, Fundação Seade, v. 23, n. 1, p.
29-41, jan./jun. 2009. Disponível em: <http://www.seade.gov.br>; <www.scielo.br>.
Acesso em: out. 2012.
354

SOUSA, S. Z.; OLIVEIRA, R. P. Sistemas estaduais de avaliação: uso dos resultados,


implicações e tendências. Cadernos de Pesquisa, v. 40, n. 140, p. 793-822, set.-dez.
2010.

VIEIRA, R. A.; FERNANDES, C. P. Avaliações externas em foco: percepções


e efeitos para o trabalho docente. Educação em Perspectiva, Viçosa, v. 2, n. 1, p. 119-
132, jan./jun. 2011.

ZAMBO, R.; ZAMBO, D. The Impact of Professional Development in Mathematics on


Teachers' Individual and Collective Efficacy: The Stigma of Underperforming. Teacher
Education Quarterly, v. 35, n. 1, p. 159-168, 2008.
355

Comunicação

A língua inglesa nas Escolas de Tempo Integral: diretrizes e práticas de ensino1

Daniela Morales Monteiro2


UNICID

RESUMO: O objetivo deste trabalho foi identificar como vem sendo desenvolvido o
ensino de língua estrangeira nas oficinas das Escolas de Tempo Integral, entender as
políticas públicas e diretrizes que orientam este ensino, discutir as possibilidades de
inclusão do ensino de língua estrangeira na matriz curricular dos anos iniciais do ensino
fundamental I e verificar quais são as condições necessárias para que o ensino de língua
estrangeira se torne um instrumento de promoção da equidade social. Para atingir o
objetivo, busquei apoio em dois corpos teóricos. No primeiro, busquei a partir de uma
análise documental e da leitura dos estudos de autores como Leffa (1998/ 1999), Coelho
(2005) e Oliveira (1999), entender brevemente a história do ensino de língua estrangeira
no Brasil, em seguida, realizei um estudo dos documentos, leis e resoluções que
regulamentam o ensino de língua estrangeira com foco nas diretrizes de ensino das
Escolas de Tempo Integral. No segundo, trouxe as vozes de autores como Cameron
(2002), Figueira (2002), Rocha (2006, 2010), Santos (2005, 2009), Scaffaro (2006),
Tonelli (2005), entre outros que tratam especificamente de metodologias aplicadas ao
ensino de língua estrangeira para crianças, denominada (LEC). No terceiro, discuti
como o ensino da língua inglesa tem se dado nas escolas estaduais a partir de uma
descrição pormenorizada sobre estas práticas, construído a partir das entrevistas com os
professores e da observação participante. Foi adotada a abordagem qualitativa, e como
procedimento de coleta de dados, estudo documental e revisão bibliográfica
complementado por entrevista semiestruturada com três professoras responsáveis pelas
oficinas de língua inglesa de três escolas distintas pertencentes à Diretoria de Ensino

1
Este artigo é um recorte da minha dissertação de mestrado, defendida em março de 2014, sob orientação
do Prof. Dr. Júlio Gomes Almeida. Aproveito para agradecer a SEE (Secretaria de Educação do Estado de
São Paulo) pelo apoio financeiro e a CAPES que possibilitou o aprimoramento dos meus estudos no
Insitute of Education in London.
2
Mestre em Educação pela Universidade Cidade de São Paulo. Possui aperfeiçoamento em Metodologia
para o ensino de Língua Inglesa pelo I.O.E - Institute of Education in London. Pesquisadora dos grupos
de pesquisa "Ensino de Língua Estrangeira, Formação Cidadã e Tecnologia" pela UNICAMP e "Grupos,
Práticas e Formação" pela UNICID. Professora titular de língua inglesa na rede estadual de ensino de São
Paulo. Professora de língua inglesa para fins específicos.
356

Leste 5. Os resultados indicam que muitas das práticas realizadas pelas professoras
estão presentes nos estudos dos autores abordados neste trabalho. A aprendizagem de
uma segunda língua é fator importante na construção da equidade, mas o ensino no
sistema estadual ainda precisa evoluir muito neste sentido. As diretrizes para as oficinas
de língua inglesa não estão condizentes com o que preconiza o Currículo do Estado de
São Paulo, possibilitando uma diferenciação, tanto nas orientações metodológicas,
como na oferta do ensino.
Palavras-chave: aprendizagem, ensino, escola pública, língua estrangeira, professores,
formação.

Introdução

Os objetivos deste estudo foram: entender como vem sendo desenvolvido o ensino
de língua estrangeira nas oficinas das Escolas de Tempo Integral; entender as políticas
públicas e diretrizes que orientam este ensino; discutir as possibilidades de inclusão do
ensino de língua estrangeira na matriz curricular dos anos iniciais do ensino
fundamental (ciclo I); verificar quais são as condições necessárias para que o ensino de
língua estrangeira se torne um instrumento de promoção da equidade social.
A relevância pessoal desta pesquisa foi a de que ela possibilitou um
entendimento mais específico sobre as diretrizes e metodologias para o ensino-
aprendizagem de língua inglesa nos anos iniciais, além de revelar algumas dificuldades
e desafios enfrentados pelas professoras que atuam neste segmento. Com isso, pude
refletir melhor sobre a minha prática como professora de língua inglesa do ensino
fundamental (ciclo II e médio), e também colaborar com o processo de aprendizado de
língua estrangeira dos alunos em anos posteriores.
Trata-se de um trabalho que considero haver relevância social na medida em que
disponibiliza para os professores de língua inglesa um estudo sobre as diretrizes para as
Escolas de Tempo Integral, e do Currículo do Estado de São Paulo, no que diz respeito
ao ensino de língua inglesa, bem como, apresenta estudos que tratam do ensino-
aprendizagem de língua estrangeira para crianças.
Na rede estadual de ensino de São Paulo, até o presente momento, as línguas
estrangeiras não integram oficialmente a matriz curricular dos anos iniciais. O Estado
vem possibilitando acesso dos alunos à língua estrangeira nos primeiros anos dessa
etapa da Educação Básica, apenas nas Escolas de Tempo Integral. Com essa proposta,
357

atende-se apenas a uma pequena parte dos alunos que frequentam o Ensino
Fundamental (ciclo I) na rede estadual, excluindo a maioria dos alunos do ensino
público.
Ao discutir a questão do ensino de língua estrangeira na escola pública, Rocha
(2009) salienta que o ensino da língua inglesa nos anos iniciais do ensino fundamental
das redes públicas brasileiras é socialmente relevante à luta por maior equidade, à
promoção do protagonismo social, bem como, à construção da cidadania crítica e de
bases multiculturais.
Ao considerar a importância da abordagem do ensino de língua estrangeira com
crianças que iniciam os estudos curriculares obrigatórios, agiu bem a Secretaria de
Educação do Estado de São Paulo ao observar nos princípios da Proposta Curricular do
Estado de São Paulo (2009), na qual se lê: “Na sociedade de hoje, são indesejáveis,
tanto a exclusão pela falta de acesso a bens materiais, quanto à exclusão pela falta de
acesso ao conhecimento e aos bens culturais”. Contudo, a própria secretaria não vem
garantindo a todos os alunos esse direito de inclusão, por ela própria preconizada.
Na prática, não se verifica a inclusão acima mencionada, como no caso da língua
inglesa no Ciclo I, que é restrita, apenas, aos alunos das Escolas de Tempo Integral.

1- Currículo do Estado de São Paulo


São Paulo foi pioneiro na reformulação curricular que acompanhou o processo de
redemocratização do país entre 1980 e 1990. Muito do que aqui foi produzido
influenciou as orientações curriculares de outros estados, e até mesmo, os Parâmetros
Curriculares Nacionais.
A proposta curricular veio atender a uma antiga reivindicação dos professores,
especialistas e famílias.
A elaboração da Proposta Curricular de Língua Estrangeira teve início em 1988
onde a tônica foi a ênfase comunicativa, o trabalho com as quatro habilidades – ler,
ouvir, falar e escrever –colocava a prática oral e o desenvolvimento da habilidade
comunicativa no centro das atenções deixando as demais habilidades como práticas
secundárias.
O desenvolvimento da proposta curricular estadual não objetivou ser uma
novidade pedagógica, e sim, “valorizar a continuação de diversos caminhos curriculares
358

que, mesmo na ausência de coordenação central, diversas escolas desenvolveram,


enquanto outras ainda estavam nos primeiros passos”.3
Em 2008 a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo propôs o currículo
básico para as escolas da rede estadual para os níveis de ensino fundamental (ciclo II) e
ensino médio, objetivando apoiar o trabalho realizado nas escolas estaduais e contribuir
para a melhoria da qualidade das aprendizagens dos alunos.
Segundo a SEE (2011):
Este documento apresenta os princípios orientadores do currículo para uma
escola capaz de promover as competências indispensáveis ao enfrentamento
dos desafios sociais, culturais e profissionais do mundo contemporâneo.
Contempla algumas das principais características da sociedade do
conhecimento e das pressões que a contemporaneidade exerce sobre os jovens
cidadãos, propondo princípios orientadores para a prática educativa, a fim de
que as escolas possam preparar seus alunos para esse novo tempo. SEE (2011,
p.9).

No que tange à questão da inclusão social, o documento relata a importância de


existir um currículo homogêneo que proporcione uma educação “a altura dos desafios
contemporâneos”.
Ainda segundo a SEE, para que a democratização do acesso à educação tenha
função inclusiva, não é suficiente universalizar a escola, mas, é indispensável
universalizar a relevância da aprendizagem.
A proposta ressalta também, que a base da educação das crianças, dos jovens e
dos adultos, que têm em suas mãos a continuidade da produção cultural e das práticas
sociais, está na importância de se criar uma autonomia para a aprendizagem “aprender a
aprender”, e estender esta aprendizagem em intervenções solidárias “aprender a fazer e
a conviver”.
O Currículo da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo confirma como
princípios centrais: a escola que aprende; o currículo como espaço de cultura; as
competências como eixo de aprendizagem; a prioridade da competência de leitura e de
escrita; a articulação das competências para aprender; a contextualização no mundo do
trabalho.

3
Idem.
359

2- Das Diretrizes e Normas das Escolas de Tempo Integral do Estado de São Paulo
O projeto Escola de Tempo Integral desenvolvido no Estado de São Paulo foi
instituído em dezembro de 2005, com aplicação imediata nas escolas de ensino
fundamental I que aderiram ao projeto.
Nas considerações da resolução que trata dos pormenores da aplicação do
projeto levou-se em conta a necessidade da educação, que desempenha papel relevante
na dinâmica da sociedade, em especial, no dia a dia de crianças e jovens.
A resolução ainda considera e exalta a importância em se oferecer aos estudantes
do ensino fundamental a oportunidade de se estender o tempo de exposição às
atividades que propiciem o aprendizado, o que veio atender aos anseios da sociedade e
materializar um importante instrumento de política de inclusão.
O programa previa também a organização de um currículo voltado a atender e
orientar os alunos nas matérias básicas curriculares, desenvolver atividades artísticas e
culturais no ambiente escolar, o fomento de atividades esportivas e de integração social
além de outras atividades complementares de enriquecimento curricular, dentre estas, as
oficinas curriculares de língua inglesa.

3 - Currículo do Estado de São Paulo e as Diretrizes de Ensino da Escola de Tempo


Integral (DEETI): visões metodológicas
Para que se entendam as orientações metodológicas atuais, o texto do Currículo
do Estado de São Paulo é iniciado com um breve histórico em relação às suas
características fundamentais aplicadas no ensino de língua estrangeira no Brasil.
O documento aponta as mudanças relacionadas à educação em geral, e em
particular, àquelas relacionadas às concepções de língua e de aprendizagem de línguas,
trazendo uma definição da visão metodológica utilizada ao longo dos anos em que o
ensino de língua estrangeira passou a integrar o currículo escolar brasileiro.
Conforme o texto do Currículo do Estado de São Paulo (2011), devido às
mudanças na sociedade contemporânea, os avanços tecnológicos ampliaram as
possibilidades de intercâmbios pessoais, comerciais e culturais, contribuindo para
ampliação de formas e canais de comunicação. Com isso, surgiu uma terceira ênfase,
que destaca os letramentos múltiplos e subsidiam as orientações metodológicas atuais,
hoje objeto de estudo de vários autores, Rocha (2006, 2010), Santos (2005), para citar
apenas alguns.
360

Para o Currículo do Estado de São Paulo (2011), a orientação baseada no


letramento sustenta-se nas relações existentes entre os princípios anteriormente
polarizados, propondo a articulação: entre o saber e o fazer, entre o sistema linguístico e
a língua em uso, entre a oralidade e a escrita, entre o aprender e a reflexão sobre a
própria aprendizagem.
Já as Diretrizes de Ensino da Escola Tempo Integral organizam suas temáticas
com acentuado teor conteudista, na medida em que se voltam visivelmente à cobertura
de vocabulário. O documento propõe ainda, que as unidades sejam divididas em três
partes distintas: Words to Learn, Talking Time e Storage. A primeira delas focaliza a
aquisição de vocabulário, enquanto que, as outras duas, respectivamente, voltam-se à
prática de diálogos e desenvolvimento de atividades de modo geral.
Com isso, no que tange a abordagem metodológica, observamos que as
orientações propostas pelas Diretrizes da Escola Tempo Integral (DEETI), não estão em
consonância com o que preconiza o documento do Currículo do Estado de São Paulo,
uma vez que, não apresenta uma visão de linguagem como prática social, que destaca os
letramentos múltiplos, de acordo com os gêneros tomados como objetos de ensino.
Em consequência desta orientação para o desenvolvimento das aulas de língua
inglesa, os alunos são expostos à aquisição de vocabulário e diálogos dissociados de
gêneros discursivos, restringindo sua proximidade com as orientações e práticas de
natureza sócio-interacionista.
Conforme observado na sugestão pelas diretrizes (SÃO PAULO, 2007, p. 17):
ETI KIDS 3 — UNIT 2 — FOOD AND DRINKS
Objective: Citar as comidas e bebidas favoritas; oferecer comida e bebida; descrever o que se come e bebe nas
diferentes refeições do dia (hábitos alimentares).
Topic: Comidas e bebidas.
Words to Learn Talking Time Storage
Dialogue A
A: What is your favorite food?
B: Oh, I love hamburger/ fries. And you?
A: I like beef/ spaghetti.
Different types of food: hamburger /
hot dog / sandwich / beef / rice / Dialogue B
Activities:
beans / fries / salad / spaghetti / A: What is your favorite drink?
4, 13,
fruit / ice-cream / chocolate cake / B: Oh, I love coke. And you?
17 e 28
bread / butter / cookies. A: I like juice.
Different types of drinks: water / Dialogue C
juice / soda / coke / milk / coffee A: What do you have for lunch?
Breakfast / lunch / snack / dinner B: Rice and beans and water.
Dialogue D
A: Do you want some coffee?
B: Yes, please or No, thank you.
Figura 4: quadro adaptado das (DEETI) 2007:16 diretrizes de atividades organizadas para a Oficina
Curricular de Inglês – Ciclo I, da Escola Tempo Integral.
361

Contradizendo o currículo atual do Estado de São Paulo (2011), que possui uma
orientação baseada no letramento, propondo uma articulação entre o saber e o fazer, as
Diretrizes da Escola Tempo Integral trazem orientações práticas, como sugestões para o
desenvolvimento das aulas, divididas em que confirmam o modelo Apresentação,
Prática e Produção/Consolidação, característico de abordagens funcionais e
comunicativas.
Podemos verificar as diferenças de abordagem na atividade abaixo, proposta
para alunos do 6º ano (antiga 7ª série) do ensino fundamental.

caderno do aluno 7ª. Série SEE 2009, p.30.

A atividade acima apresenta características dos multiletramentos, propõe que o


aluno leia, compreenda, analise e interprete rótulos de produtos, inferindo seus traços
característicos, bem como, as suas finalidades e usos sociais. Confirma os objetivos dos
documentos oficiais em engajar a língua inglesa com um gênero textual presente no
cotidiano dos alunos, demonstrando o papel da língua como prática social.
Observa-se ainda, um caráter interdisciplinar sobre o tema da atividade, que
propõe desenvolver a consciência crítica dos alunos sobre alimentos saudáveis e não
saudáveis.
362

4- A metodologia da pesquisa

Neste estudo foi utilizada a abordagem qualitativa, e como instrumento de coleta


de dados, a análise documental do Currículo do Estado de São Paulo e das Diretrizes de
Ensino das Escolas de Tempo Integral, além da análise bibliográfica de estudos que
tratam sobre metodologia de ensino de língua estrangeira para crianças (LEC),
complementado por entrevistas com professores que atuam com o ensino de língua
inglesa nas escolas da rede publica estadual pertencentes à Diretoria de Ensino Leste 5,
e que participam do projeto Escola de Tempo Integral.
As entrevistas com as professoras teve como propósito conhecer a formação das
docentes, seus conhecimentos metodológicos, o grau de interesse dos alunos durante as
aulas, recursos utilizados durante as aulas de LE e o papel da LE nos anos iniciais.

Considerações Finais
Nesta pesquisa foi constatado um distanciamento das orientações metodológicas
para o ensino de língua estrangeira (ciclo I) contidos nas Diretrizes de Ensino das
Escolas de Tempo Integral, e as orientações presentes no Currículo do Estado de São
Paulo – ensino fundamental (ciclo II) e ensino médio. As diferenças evidenciadas não
corroboram com a visão de linguagem apresentadas nos estudos desta pesquisa, nem
com a visão preconizada pelo Currículo do Estado de São Paulo, que destaca a ênfase
nos letramentos múltiplos.
Foi possível também apresentar nesta pesquisa alguns estudos que tratam
especificamente do ensino de língua estrangeira para crianças, e com isso, pude associar
estes estudos com os depoimentos das professoras entrevistadas sobre as práticas
vivenciadas em sala de aula.
As entrevistas com as professoras indicaram que o ensino língua inglesa desperta
grande interesse nas crianças dos anos iniciais, que em sua maioria, possuem grande
motivação para o aprendizado. Outro fator mencionado pelas docentes é o grau de
desinibição destes alunos, uma característica preponderante das crianças que colabora
no aprendizado de línguas. Também foi possível compreender que as atividades lúdicas,
que envolvam jogos e músicas, facilitam o ensino e possibilitando uma aprendizagem
significativa.
Não obstante, a pesquisa mostrou alguns fatores que não contribuem para que o
ensino de línguas seja efetivo nas Escolas de Tempo Integral da rede estadual: a falta de
363

recursos didáticos para alunos e professores, e a falta de formação específica para os


professores que atuam nos anos iniciais, uma vez que estes professores não são
pedagogos.
Ainda sobre o ensino de língua inglesa nos anos iniciais, a pesquisa mostra que
uma quantidade significativa de escolas está excluída desse projeto, e com isso, deixa de
ofertar o ensino da língua estrangeira em sua grade curricular. Com a resolução SE n.º
3, de 16 de janeiro de 2014, o sistema estadual deu um passo significativo, criou a
possibilidade de ampliação do ensino da língua inglesa na matriz curricular das escolas
de ciclo I do Estado de São Paulo, contudo o problema da garantia a todos não foi
resolvido, pois ficou a cargo do diretor das respectivas unidades escolares, incluir ou
não.
Como o Estado tem o papel de garantir o acesso ao ensino de qualidade a todos,
esta pesquisa vem sinalizar que o ensino de língua inglesa merece ampliar o seu
alcance, de modo que atinja a todos os alunos, para que não apenas alguns possam ser
preparados para enfrentar os desafios do mundo atual, e formar uma base sólida para
prosseguir nos estudos posteriores.
Pelos estudos realizados ficou evidente que o aprendizado de uma língua
estrangeira constitui um passo importante no sentido da equidade social, contudo a
garantia de aprendizagem de outra língua depende de vários fatores que a dinâmica
desenvolvida no Estado ainda não contempla.

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366

Comunicação

A educação de jovens e adultos e sua dimensão política: o caso de campinas, sp.

Debora Cristina Jeffrey


UNICAMP
Grupo de Estudos e Pesquisas de Educação de Jovens e Adultos (GEPEJA)
Observatório da Educação/CAPES

Resumo: A pesquisa documental retrata a qualidade do ensino na educação de jovens e


adultos (EJA), a partir da análise da legislação e documentos oficiais produzidos pelas
Secretarias Estadual e Municipal de ensino. A questão da qualidade do ensino na EJA é
entendida como um termo polissêmico e amplo e foi apresentada no estudo por meio de
três dimensões: normativa, política e educativa. Evidenciou-se, após o levantamento
documental, que a qualidade de ensino na EJA, em particular no município de
Campinas, na rede estadual e municipal de ensino, é entendida como um processo que
visa garantir o direito à educação, mediante as condições de acesso, permanência e
oferta de condições para o funcionamento das unidades escolares e atendimento à
população, cumprindo assim os preceitos constitucionais e da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação, n. 9.394/96.
Palavras-Chave: Qualidade de ensino; Educação de Jovens e Adultos; Sistema de
Ensino.

A qualidade da educação tem apresentado inúmeras definições e interpretações, já


que o termo pode ser entendido como polissêmico, pois se relaciona e se configura
mediante a relevância política, social, cultural ou econômica que possui em um
determinado contexto educacional. Esse processo pode ser entendido através de
Brandão (1992), ao compreender que não há um único tipo educação, mas sim várias
educações que podem atender diferentes propósitos em cada sociedade, comunidade ou
grupo.
Para Fonseca (2009), a qualidade da educação pode ser definida em diferentes
perspectivas, com destaque para:
a) A responsabilidade do Estado na garantia do direito individual, por meio da
oferta, acesso e permanência de todos no sistema de ensino;
367

b) As políticas governamentais no estabelecimento de iniciativas que visem a


regulação do sistema (avaliação externa), financiamento público, inovação
tecnológica, formação do quadro administrativo e de docentes;
c) A dinâmica das instituições educativas no estabelecimento da gestão
institucional, autoavaliação e currículo.
Esses diferentes aspectos apontados por Fonseca (2007), podem ser analisados
através do caráter conferido à qualidade da educação pelo Estado, Governos e
instituições educativas, que Demo (2002) denomina como instrumental (atividades
meio) ou político (atividades fins). O caráter instrumental, segundo o autor, se refere às
condições materiais, estruturais e de pessoal oferecidas ao sistema educacional, servindo
de base para as reformas educacionais, enquanto o político visa combater a injustiça, as
desigualdades por meio de uma perspectiva democrática, que objetiva a garantia da
qualidade de vida.
Tanto o caráter instrumental como o caráter político, conferidos à qualidade da
educação, além de co-existirem, podem nortear as ações, iniciativas e políticas
educacionais estabelecidas pelos governos, o que para Oliveira e Araújo (2005) poderá
favorecer a garantia ao direito à educação por meio do acesso, das condições de
atendimento e permanência da população escolar; para Enguita (1995), contribuir no
atendimento às demandas do mercado; e para Freire (1987) levar à conscientização e a
transformação social dos sujeitos.
Embora cada autor, acima indicado, destaque as diferentes perspectivas e
possibilidades de configuração da qualidade da educação, mediante o seu caráter,
Gadotti (2009) considera que o termo, representa um novo paradigma de educação, e
que, portanto, deverá ser reconstruído, de modo que a:
Qualidade significa melhorar a vida das pessoas, de todas as pessoas. Na
educação, a qualidade está ligada diretamente ao bem-viver de todas as
nossas comunidades, a partir da comunidade escolar. A qualidade na
educação não pode ser boa se a qualidade do professor, do aluno, da
comunidade é ruim. Não podemos separar a qualidade da educação da
qualidade como um todo, como se fosse possível ser de qualidade ao entrar
na escola e piorar a qualidade ao sair dela. Por isso, o tema qualidade é tão
complexo. Não basta melhorar um aspecto para melhorar a educação como
um todo (GADOTTI, 2009, p.7).

Gadotti (2009, p. 7), ao analisar o significado do termo, ressalta a dimensão


social, cultural e política que a envolve, entendendo a sua complexidade e polissemia.
Porém, enquanto o referido autor problematiza a qualidade da educação como um
processo complexo, o ideário internacional a compreende como algo vinculado ao
368

contexto econômico e produtivo, como bem destacou o Relatório Delors (2004, p. 72),
ao se referir ao objetivo educacional, a ser alcançado, por diversos países, incluindo o
Brasil.
Esse objetivo educacional expresso em um Relatório Internacional, que contou
com o apoio da UNESCO, foi difundido mundialmente, ao final dos anos de 1990,
tendo como base fundamental a aprendizagem ao longo da vida (lifelong learning).
Desloca-se, portanto, o centro das atenções da qualidade da educação dos processos
educativos, condições de infra-estrutura e recursos humanos, para os resultados
educacionais, com destaque para a aprendizagem que deverá, segundo Macedo (2002,
p.142), valorizar as competências pessoais e favorecer, de acordo com Delors (2004, p.
90):
[...] aprender a conhecer, isto é adquirir os instrumentos da compreensão;
aprender a fazer para poder agir sobre o meio envolvente; aprender a viver
juntos, a fim de participar e cooperar com os outros em todas as atividades
humanas; finalmente aprender a ser, via essencial que integra as três
precedentes (Delors, 2004, p. 90).

Na análise de Miranda (1997, p. 41), essa proposição leva ao estabelecimento de


um novo padrão de conhecimento, que não tem mais a escola como o principal espaço
de aprendizagem, pois os conhecimentos, saberes e informações poderão ser acessados,
buscados e adquiridos através dos novos recursos tecnológicos. Para isso, a autora (op.
cit) considera que os indivíduos deverão aprender a buscar a informação e utilizá-la, já
que o novo padrão de conhecimento será: “[...] menos discursivo, mais operativo,
menos particularizado, mais interativo, comunicativo; menos intelectivo, mais
pragmático; menos setorizado, mais global, não apenas fortemente cognitivo, mas
também valorativo” (MIRANDA, 1997, p. 41).
Diante dessa análise, entende-se que a qualidade da educação deixa de ser um
aspecto retratado como uma questão local, envolvendo a garantia de direitos e o
atendimento das demandas educacionais, e passa a ter dimensões globais. Para Dale
(2004, p. 423), esse ideário educativo se caracteriza pela configuração de uma agenda
globalmente estruturada resultante das forças econômicas que passam a operar supra e
transnacionalmente, para romper ou ultrapassar, as fronteiras nacionais, ao mesmo
tempo, que reconstroem as relações entre as nações.
Certamente, que esse processo não é linear e não decorre, de acordo com Ball
(2001, p. 112) de uma transposição da agenda educacional global, no qual os Estados-
Nação perderiam o controle total sobre suas decisões políticas, mas da convergência de
369

paradigmas que expressa a invocação de políticas com uma base de princípios e


tecnologias comuns, mecanismos operacionais idênticos e efeitos de primeira e segunda
ordens semelhantes.

1. Dimensão da política educacional da EJA: anos 2000.

A Educação de Jovens e Adultos na gestão do governo Lula foi e está sendo


retratada como uma temática no qual as ações governamentais são identificadas como
políticas de diversidade, com o intuito de promover ora a inclusão social e em outro
momento focalizar a diversidade existente na sociedade brasileira (MOEHLECKE,
2009).
Esse processo é evidente, ao se analisar a estrutura do Ministério da Educação que
a partir do ano de 2004, criou a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade (SECAD) que aglutinou os departamentos de Educação de Jovens e
Adultos e o de Educação para a Diversidade e Cidadania – responsável pela Educação
Escolar Indígena; Diversidade e Inclusão Educacional; Educação no Campo; Educação
Ambiental; e Ações Educacionais Complementares.
Moehlecke (2009, p. 468), ao analisar as políticas de diversidade na educação no
Governo Lula, evidenciou o seguinte aspecto:
A concentração de programas com questões, públicos, demandas e histórias
tão distintas é defendida com base na aposta de que seria possível, por meio
dessa nova configuração, fortalecer o trabalho desenvolvido em cada área
específica e transversalizar a perspectiva da diversidade para as demais
secretarias e ministérios (MOEHLECKE, 2009, p. 468).

Além da tentativa de fortalecer o trabalho em cada área específica e


transversalizar a perspectiva da diversidade, Moehlecke (2009) destaca que as políticas
do MEC adotadas após a criação da SECAD estiveram associadas a sua proximidade a
sociedade civil organizada, através da constituição de comissões de assessoramento ou
de parcerias na execução de programas e projetos. A autora considera que esses
mecanismos de participação da sociedade civil organizada serviram para atenuar as
tensões e pressões que eventualmente recaiam sobre o governo.
Ainda a esse respeito, Moehlecke (2009, p. 483) apontou alguns aspectos
problemáticos com relação a atuação da SECAD na tentativa de fomentar a inclusão
social e favorecer a valorização da diversidade, com destaque para:
370

a) A dificuldade do MEC para alcançar o objetivo de tranversalizar a perspectiva


da diversidade para o conjunto das secretarias do ministério e promover o
desenvolvimento de programas e projetos articulados;
b) Valorização de políticas direcionadas aos grupos sociais mais vulneráveis e
discriminados como garantia para a efetivação do direito de todos à educação;
c) A variedade de significados atribuídos ao termo diversidade, que expressou as
disputas internas e externas ao governo pela definição de projetos educacionais
de modos distintos com o intuito de responder as demandas dos movimentos
sociais no reconhecimento de suas múltiplas diversidades.
d) Dependência das pessoas que estão a frente da gestão dos programas, devido a
baixa institucionalidade destes, que não conferiu um aparato normativo de
suporte para garantir a permanência das propostas a médio e longo prazo.
A evidência de tais aspectos por Moehlecke (2009), contribui para o
entendimento das principais características da gestão educacional durante o Governo
Lula, entre os anos de 2003 e 2009, que segundo Oliveira (2009, p. 208) se pautaram na
tentativa de resgate de direitos e garantias estabelecidas na Constituição Federal de
1988; no estabelecimento de uma relação entre a elevação dos padrões de desempenho
educativo e a crescente competitividade internacional; e a naturalização de políticas que
veiculam as capacidades de escolha e ação individual à transformação institucional, por
meio do estabelecimento do compromisso de todos com a educação.
É neste contexto de resgate do direito e garantia a educação, assegurado na
Constituição Federal de 1988 e na LDB n. 9.394/96 e na relação entre os padrões de
desempenho educativo e a competitividade educacional descritos por Oliveira (2009, p.
208), é que a EJA se configurou no Brasil tendo como principal grupo a ser atendido o
jovem.
Observa-se que todos os programas do Governo Federal apresentados
caracterizam-se por iniciativas que fomentam políticas compensatórias e focalizadoras,
embora destaquem a questão da diversidade, ora em uma perspectiva de inclusão social,
ora em uma perspectiva de garantia do direito à educação.
Além disso, é importante destacar que em nenhum dos programas há uma
integração entre as ações do MEC direcionadas à educação básica e os demais
ministérios que oferecem suporte aos programas implementados destinados à população
de jovens e adultos.
371

Por sua vez, a categorização dos jovens em grupos etários específicos –


adolescentes, jovens e adultos jovens-, a fim de atender as especificações internacionais,
acaba por excluir os adultos e idosos, que não correspondem as faixa etária beneficiária
dos programas apresentados, constituindo uma problemática na oferta da garantia do
direito à educação de todos, independentemente do grupo etário, conforme prevê a
Constituição Federal de 1988 e a LDB n. 9.394/96.
No entanto, embora os programas priorizem os jovens, Di Pierro (2008, p. 370)
salienta que há uma tendência nas políticas de educação de pessoas jovens e adutas, em
âmbito latino-americano, que é a proposta de uma articulação intersetorial de dois tipos:
a) Enfatiza a promoção social, compreendendo programas destinados à populações
em situação de pobreza e risco social, no qual a adesão dos beneficiários aos
programas de alfabetização, elevação de escolaridade ou capacitação para o
trabalho são contrapartidas de transferência de renda mínima;
b) Procura satisfazer as múltiplas aprendizagens dos jovens e adultos através da
formação geral, a capacitação geral para o trabalho, valores e habilidades
relevantes, saúde, relações de gênero, interculturalidade, acesso às novas
tecnologias, entre outros.
Essa tendência intersetorial existente na América Latina, conforme apontou Di
Pierro (2008, p. 370), que enfatiza a promoção social por meio da geração de renda ou
destaca a satisfação das múltiplas aprendizagens dos jovens e adultos parece se
manifestar nos programas adotados pelo Governo Federal, especialmente após o ano de
2003, período em que, o ideário da educação e a aprendizagem ao longo da vida se
legitimam e contribuem para justificar as ações propostas.
Essa tendência predominante no atendimento de jovens e adultos, entre a faixa
etária de 15 a 29 anos, representa um processo denominado por Ball (2001, p. 112)
como de convergência de paradigmas, que resulta na invocação de políticas com base
em princípios e tecnologias comuns, mecanismos operacionais idênticos e efeitos de
primeira e segunda ordem semelhantes.
Entende-se assim, que os programas adotados pelo Governo Federal, desde o ano
de 2003, pelo MEC e demais ministérios, com relação à EJA, refletem uma tendência
latino-americana, que segundo Di Pierro (2005, p. 1119) expressa um novo paradigma
para a área ao sugerir:
[...] que a aprendizagem ao longo da vida não é só um fator de
desenvolvimento pessoal e um direito de cidadania (e, portanto, uma
responsabilidade coletiva), mas também uma condição de participação dos
372

indivíduos na construção de sociedades mais tolerantes, solidárias, justas,


democráticas, pacíficas, prósperas e sustentáveis (DI PIERRO, 2005, p.
1119).

Nota-se, que o ideário da educação e aprendizagem ao longo da vida envolve um


processo de desenvolvimento social, de direito à cidadania dos sujeitos da EJA, como
destacou a autora, porém visam a construção de uma sociedade mais justa e sustentável,
daí, a preocupação com a formação do jovens, que seria o sujeito preparado para dar
vida a esse projeto, por meio de sua empregabilidade e capacidade empreendedora.
No Brasil, os programas destinados ao jovem fundamentam-se nesse ideário, mas
vem se concretizando, por meio de parcerias com a sociedade civil organizada, e um
processo de descentralização das ações envolvendo os governos locais (estados e
municípios). Cabe a União idealizar e atribuir as ações entre os demais entes federados,
procurando incentivar a participação local e induzindo as políticas de EJA.
Apesar do crescente número de programas destinados aos jovens e vinculados à
EJA, duas problemáticas se fortalecem a cada dia, sem que sejam solucionadas: a
ausência de regulação dos programas implementados, tende em vista a verificação do
êxito ou fracasso das medidas; a garantia do direito a oferta da modalidade EJA na rede
regular de ensino, já que sem uma articulação entre as ações e os processos de
escolarização oferecidos pelo Poder Público, esse direito corre o risco de não ser
cumprido.

2.Dimensão educativa da Educação de Jovens e Adultos: o caso de Campinas, SP.

O sistema educacional de Campinas, SP é constituído por três redes de ensino:


estadual (Secretaria Estadual de Campinas), municipal (Secretaria Municipal de
Campinas) e privada (Secretaria Estadual de Educação). Referente à Educação de
Jovens e Adultos, de acordo com dados do Censo Escola (2012), o sistema educacional
do município possuía matriculados na modalidade EJA presencial, referente ao ano de
2012: 9.343 alunos na modalidade em Campinas, SP, sendo que a rede estadual possuía
3.329 matrículas, representando 35,7%, enquanto a municipal 5.916 matrículas,
dispondo de 63,3% destas (46%), a privada detinha 98 matrículas, com 1% do total e a
rede federal com nenhuma matrícula.
Nesse sentido, a compreensão e análise da qualidade da educação de jovens e
adultos, no município de Campinas, SP, resultará na delimitação das redes estadual e
373

municipal que apresentam maior representatividade. Por isso, optou-se pela análise
documental da legislação, a fim de nortear o entendimento sobre esse aspecto.
Assim, no que se refere à legislação que embasa a rede estadual de ensino e a
qualidade da educação de jovens e adultos.

Quadro 1: Legislação e indicativo de qualidade na EJA – Rede Estadual de São Paulo.

Ano Documento Dispõe Qualidade na EJA


Art. 37 - a educação de jovens e adultos será destinada
Estabelece as diretrizes para os Cursos de
àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de
Educação de Jovens e Adultos em nível do Ensino
Deliberação CEE estudos no ensino fundamental e médio na idade própria.
2009 Fundamental e Médio, instalados ou autorizados
N.º 82/2009 § 2º - O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a
pelo Poder Público no Sistema de Ensino do Estado
permanência do trabalhador na escola, mediante ações
de São Paulo
integradas e complementares entre si”.
Artigo 1º - Os Cursos de Educação de Jovens e Adultos -
EJA, de freqüência obrigatória às aulas (presenciais) ou de
presença flexível e atendimento individualizado,
implementados pelos Centros Estaduais de Educação de
Dispõe sobre alterações na organização dos cursos Jovens e Adultos – CEEJAs, passarão a adotar, em caráter
Resolução SE 3,
2010 de Educação de Jovens e Adultos, mantidos pelas obrigatório, a partir de 2010, materiais didáticos de apoio,
de 13-1-2010
escolas estaduais organizados e selecionados por esta Pasta, consolidados
como Propostas Curriculares dos cursos regulares de Ciclo
II do Ensino Fundamental e do Ensino Médio do Estado de
São Paulo, para os alunos ingressantes e em
continuidade;
Fonte: SEE-SP (WWW.educacao.sp.gov.br).

Os atos normativos destacados no quadro 2, se referem à qualidade da EJA


através da garantia do acesso, permanência e condições materiais de apoio aos alunos
matriculados. Como se vê, a questão central é garantir e proporcionar o cumprimento da
oferta e do direito à educação àqueles que não tiveram oportunidade de acesso ou de
continuidade de estudos, na idade própria, cumprindo, deste modo, os preceitos
normativos presentes na Constituição Federal de 1988 e LDB n. 9.394/96.
Com relação à rede municipal de Campinas, SP a qualidade de ensino é entendida
assim, como a rede estadual , a garantia do acesso, permanência e oferta de condições
materiais, físicas e estruturais , que deverão ser destinadas aos alunos matriculados.
Porém, desde o ano de 2007, é enfatizado, de acordo com a Secretaria Municipal de
Educação (SME-Campinas) que a qualidade de ensino deve ser:
374

[...] entendida como o melhor que uma comunidade escolar pode conseguir
frente às suas reais condições, com o objetivo de servir a população naquilo
que é específico da educação: formação e instrução. (...) A qualidade não é
optativa no serviço público. É uma obrigação. Deve incluir os processos que
conduzem à emancipação humana e ao desenvolvimento de uma sociedade
mais justa (SME, 2007, p. 76).

Em síntese, a SME-Campinas (2007; 2010) compreende que a qualidade do


ensino na rede municipal, incluindo a EJA deverá contemplar:
• O estudo, sugestão e deliberação juntamente com a Secretaria Municipal de
Educação medidas que visam a expansão qualitativa do Ensino Municipal;
• A universalização do ensino, garantia dos padrões mínimos de qualidade de
ensino, definidos como variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos
indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem,
• A viabilização de projetos e programas especiais para crianças, jovens e adultos
em situação de vulnerabilidade social. O Sistema Municipal de Ensino,
assegurada sua autonomia, organizará em regime de colaboração junto ao
Sistema Estadual de Ensino o atendimento adequado à demanda,
• A criação das bases de uma política de recursos humanos capaz de conduzir de
forma mais eficaz o desempenho, a qualidade, a produtividade e o
comprometimento do integrante do Quadro do Magistério com os resultados do
seu trabalho, estabelecimento do piso de vencimento.
É possível considerar que a rede municipal de Campinas tem uma concepção
mais abrangente sobre a qualidade de ensino, em todos os níveis de ensino atendidos,
incluindo a modalidade EJA, com ênfase na estrutura, funcionamento, organização,
oferta de condições e investimento no quadro docente, o que indica, pelo menos nos
documentos normativos, o comprometimento com a qualidade de ensino.
No entanto, embora os atos e documentos normativos indiquem o
comprometimento com a qualidade de ensino, nota-se que esse ainda é um processo
desafiador tanto para a Secretaria Estadual de Educação quanto para a Secretaria
Municipal de Campinas, pois como este é um termo polissêmico e amplo, certamente os
Governos têm optado por priorizar a educação básica regular, que contempla os níveis
obrigatórios de ensino. Desse modo, apesar dos avanços, a EJA ainda não tem tido um
indicador de qualidade que contemple as diversidades de experiências e vivências dos
alunos e profissionais envolvidos nesse processo.

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375

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377

______. Resolução SE 3, de 13-1-2010 . Dispõe sobre alterações na organização dos


cursos de Educação de Jovens e Adultos, mantidos pelas escolas estaduais. Disponível
em http://www.educacao.sp.gov.br Acesso em 02/ 2012.
378

Comunicação

A comunicação na gestão de pessoas na escola

Débora Oliveira Diogo1


UNICID
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo

Resumo: Esta pesquisa trata da discussão sobre a comunicação na gestão de


pessoas na escola, à luz de referências. Considerando a escola como uma
organização educativa, a partir das análises referentes à literatura, concluiu-se pela
importância da comunicação na gestão de pessoas na escola, servindo de
instrumento não apenas para a melhoria dos relacionamentos interpessoais que se
dão na escola, mas principalmente para, a partir da convivência baseada em uma
comunicação clara e objetiva, favorecer o diálogo, de modo que o objetivo da
escola de realizar a formação dos alunos bem como de todos os profissionais
envolvidos no processo seja potencializado.
Palavras Chaves: organização educativa, comunicação e gestão escolar de pessoas.

Introdução
Este trabalho faz parte da pesquisa que desenvolvo com vistas a obter o título de
mestre no Programa de Mestrado da Universidade da Cidade de São Paulo – UNICID,
tendo os seguintes objetivos: (1) descrever e distinguir formas de comunicação de
gestores escolares da rede pública estadual de São Paulo; (2) identificar os desafios do
gestor escolar para a Educação do Século XXI considerando as proposições da
legislação da rede estadual de educação de São Paulo no que tange ao desenvolvimento
da cultura de paz na escola (3) identificar limites e possibilidades das técnicas da
Comunicação Não Violenta (CNV) para a gestão escolar na mediação de conflitos.
Este artigo, especificamente, tem por objetivo discutir a importância da
comunicação na gestão de pessoas na escola à luz de referências. O interesse pela
temática surgiu dos questionamentos sobre o papel do diretor escolar frente aos desafios

1
Psicóloga e pedagoga, diretora de escola pública na Secretaria de Estado da Educação de São Paulo,
especialista em Psicodrama, Gestão Escolar e Cultura de Paz, mestranda em Educação pela Universidade
Cidade de São Paulo – UNICID, 2014, deboradiogo@ig.com.br
379

enfrentados no cotidiano da escola, na gestão de pessoas, por meio da comunicação com


os membros da equipe pedagógica, com os funcionários da escola, alunos, responsáveis
e a comunidade em geral, reconhecendo o diretor escolar como sendo o principal
responsável por estabelecer a dinâmica da vida escolar, coordenando os trabalhos, seja
no âmbito administrativo ou pedagógico, com o objetivo de garantir o clima escolar
favorável ao aprendizado dos alunos, ao desempenho e o desenvolvimento de toda
equipe escolar, bem como a satisfação da comunidade, além de responder as demandas
legais de órgãos administrativos, como o diretor escolar da rede pública.
As reflexões realizadas à luz das referências aqui utilizadas me levaram a
afirmar que a comunicação do diretor escolar na coordenação do trabalho das pessoas
na escola, bem como no trato com os alunos e comunidade, é relevante para o
desenvolvimento de todos os envolvidos no processo educativo, sendo necessário o
empenho do poder público no incremento das habilidades comunicacionais dos
gestores, por meio da formação.
O texto se divide na apresentação do conceito de escola como organização
educativa, seguido de discussões sobre a gestão de pessoas na escola e sobre a
comunicação na gestão escolar. Para tanto foi realizada pesquisa bibliográfica.

A escola como organização educativa


A vida social humana é pautada por organizações formais ou informais desde o
nascimento (maternidade, hospital etc), durante a vida (instituições de ensino), até a
morte (funerária, igreja etc), ou seja, as organizações são inerentes ao mundo social,
necessárias à manutenção da vida do ser humano e demandam coordenação de suas
atividades em diferentes níveis. Concebendo a escola como uma organização educativa
e, uma vez sendo impossível seu isolamento da sociedade, representando tanto um
espaço de reprodução dos valores sociais, bem como de transformação dos mesmos por
meio do processo educativo que lhe é inerente, a escola é uma organização social
significativa para o desenvolvimento humano.
Libâneo (2013) considera que, embora a sociedade moderna esteja pautada
concretamente pelos meios de comunicação tecnológicos que conectam pessoas ao
redor do mundo, ampliando as formas e locais de aprendizado e desenvolvendo novas
competências, a escola cumpre funções formativas básicas, não exercidas por outro
espaço, a de prover a capacidade de ler, escrever, a formação científica, estética e ética,
o desenvolvimento de capacidades cognitivas e operativas, além de ser uma síntese
380

entre a cultura experenciada que acontece na vida cotidiana e a cultural formal que é o
domínio dos conhecimentos e das habilidades de pensamento (LIBÂNEO, 2013, p.49).
Acrescentamos ser a escola, também, um espaço de aprendizado com normas de
convivência social, possibilitando o desenvolvimento das competências comunicativas e
relacionais entre os educandos e todos os demais envolvidos no processo educativo.
Destacando o crescente interesse sobre a revalorização da escola como
organização educativa, Lima (2003) lança novo olhar, apresentando-a como objeto de
estudo da sociologia das organizações:
Apoiado pela emergência de uma sociologia das organizações educativas e
procurando estabelecer pontes com a análise das políticas educacionais, com
modelos, imagens e metáforas para a interpretação das organizações sociais
formais, e com a crítica às ideologias organizacionais e administrativas,
tradicionalmente de extração empresarial, o estudo da escola vem ganhando
centralidade. Trata-se de um processo complexo, mas também muito
estimulante, de construção de um objeto de estudo que, no passado, foi
frequentemente apagado, ou colocado entre a ‘espada e a parede’, isto é, entre
olhares macro analíticos que desprezaram as dimensões organizacionais dos
fenômenos educativos e pedagógicos, e olhares micro analíticos,
exclusivamente centrados no estudo da sala de aula e das práticas
pedagógicos-didáticas. (LIMA, 2013, p.7)

Assim, como toda organização social, a escola, com tarefas éticas e educativas
peculiares, para atingir seus objetivos sociopolíticos, necessita de meios operacionais
para desenvolver uma estrutura e cultura organizacionais (setores, cargos, atribuições,
normas), uma tecnologia, processos de gestão e tomada de decisões, bem como a análise
dos resultados que contribuem para o processo formativo e para o aperfeiçoamento da
gestão (LIBÂNEO, 2013, p.16). Para Libâneo (2013) é necessário se instituir formas de
gestão e organização da escola que venham a atender às necessidades da instituição
escolar, uma vez que cada instituição possui uma cultura própria e meios para atingir o
fim socioeducativo que, para o autor, é formar os educandos para adquirirem uma
compreensão teórica das matérias e usar os conceitos para analisar as próprias condições
de vida e suas próprias expectativas de futuro na vida social, cultural e profissional. O
autor reconhece que há correspondência entre as ações dos envolvidos no processo
educativo (alunos, professores, funcionários etc) com o desempenho dos educandos em
sala de aula, sendo a estrutura funcional da escola e o funcionamento da mesma de
responsabilidades de todos, orquestrados pelo gestor escolar.
Bravo (2011) classificou em cinco disciplinas as condições de aprendizagem
organizacional. Destacamos duas delas, incluindo-as ao cenário da organização escolar
381

educativa em razão do tema desta pesquisa, tendo como foco a atuação do gestor
escolar:
1. Aprendizagem em grupo: começa com o ‘diálogo’, que é a
capacidade de os membros de um grupo levantarem ideias preconcebidas e
participar de um ‘raciocínio em grupo’. Torna-se vital porque a unidade
fundamental de aprendizagem nas organizações modernas é o grupo, porém,
não se deixa de privilegiar as ações individuais. O fato é que a organização só
terá capacidade de aprender, se os grupos forem capazes disso. Esse
procedimento é utilizado para que as pessoas possam enxergar o mundo além
dos limites das suas perspectivas pessoais.
2. Valores: [...] Os valores constituem uma disciplina que permite uma
visão de conjunto, da estrutura das inter-relações dos padrões de mudança em
lugar de “instantâneos” estáticos. Os valores estão sempre nos mostrando que
o todo pode ser maior que a soma das partes. (BRAVO, 2011, p. 62)

Na primeira disciplina, ”Aprendizagem em grupo”, o autor afirma ser o diálogo


um recurso importante para o desenvolvimento do trabalho em conjunto,
especificamente no que tange a abertura para a troca de experiências educativas visando
atingir um objetivo comum, sugerindo o desenvolvimento de uma habilidade do grupo,
“raciocinar em grupo”, ou seja, pensar em conjunto nas soluções para as questões da
organização e ações da escola. Enfatizamos, com isto, ser de responsabilidade do gestor
escolar promover espaços de diálogo constante com sua equipe. Na segunda disciplina
“Valores”, Bravo (2011) oferece a perspectiva de uma estrutura de valores comuns aos
membros da organização educativa que permeia os relacionamentos interpessoais no
sentido de, em detrimento das individualidades, favorecer o bem comum – enfatizamos
o significado dos valores expressos pelo gestor escolar frente aos objetivos e desafios da
sua função, inclusive como líder de uma organização educativa.
Segundo Libâneo (2013), se referindo as pesquisas sobre escolas com destaque
no desempenho de seus resultados, no que diz respeito à qualidade da educação que
oferecem, ganhando assim reputação na comunidade, são características organizacionais
destas escolas: a capacidade de liderança dos dirigentes, especialmente do diretor; as
práticas de gestão participativa; o clima de trabalho da escola; o relacionamento entre os
membros da escola. (LIBANÊO, p.22). Visando, então, o cumprimento do seu papel na
formação dos educandos, no desenvolvimento do corpo docente, de funcionários e da
comunidade, considerada como uma organização educativa, a escola pode investir na
disposição dos seus processos administrativos e pedagógicos, objetivando proporcionar
sempre o melhor desempenho do professor em sala de aula e na formação dos discentes.
Tendo a escola como uma organização educativa, ponderando sobre a influência
dos relacionamentos interpessoais que nela se dão, sendo espaço privilegiado de
382

convívio social, no desempenho dos alunos, no clima escolar e no cumprimento do


objetivo educacional e qualificando como regente principal dos processos
administrativos e pedagógicos da escola, o gestor escolar. Este deve dispor de
instrumentos que possibilitem dinamizar o potencial das relações pessoais e
profissionais, visando o trabalho colaborativo das pessoas como membros de um grupo
com objetivos educativos comuns, transformando a vida coletiva escolar.
A partir das referências, podemos considerar que a habilidade do gestor escolar
em se comunicar é de fundamental importância tanto para o papel de líder quanto para a
garantia de um clima escolar favorável ao desenvolvimento das equipes escolares,
beneficiando a partilha de conhecimentos e de valores comuns, afetando assim a
qualidade da educação. A relação entre gestão escolar e comunicação na gestão de
pessoas em uma organização será objetivo de discussão.

Gestão de pessoas na escola


Compreendendo a escola como uma organização com fim educativo onde atuam
várias pessoas envolvidas no processo de ensino e aprendizagem, realizando um
trabalho em conjunto e tendo como atores principais alunos e professores, o gestor
escolar, administra a escola para que se cumpra seu objetivo, dispondo também dos
relacionamentos interpessoais que nela se dão, mobilizando, incentivando e
participando da formação das pessoas, sendo o principal responsável pela vida escolar.
Apesar de não ser o objetivo deste estudo a discussão entre o significado estrito
dos termos “gestor” ou “diretor” escolar, entendemos ser necessário deixar claro que,
caso haja diferenças conceituais, as práticas cotidianas se aproximam e se fundem na
administração escolar. Concordamos com Libâneo (2013) que considera que a “gestão”
é o conjunto de processos intencionais e sistemáticos para se chegar a uma decisão e
para fazer a decisão funcionar, uma atividade pela qual são mobilizados meios e
procedimentos para se atingir os objetivos da organização, envolvendo, basicamente, os
aspectos gerenciais e técnico-administrativos. Neste sentido, o autor considera “gestão”,
sinônimo de administração, e a “direção” um princípio e atributo da gestão, mediante a
qual é canalizado o trabalho conjunto das pessoas, orientando-as e integrando-as no
rumo dos objetivos (LIBÂNEO, 2013, p. 88).
Além de alunos, familiares e professores a escola conta com a presença de
outros profissionais, como coordenadores pedagógicos, pessoal da equipe
administrativa, pessoal da cantina, pessoas que cuidam da limpeza e, no caso da escola
383

pública, há ainda os responsáveis pela merenda e pela manutenção do prédio escolar, há


também os membros dos colegiados, além da relação com supervisores e dirigentes de
ensino. Uma vez estando em um ambiente educativo, objetivando-se o processo de
formação educacional constante e partindo do princípio que todos os envolvidos são
educadores no trato com os educandos, além de fazer parte de uma só organização
educativa, configura-se assim um campo considerável para o desenvolvimento dos
relacionamentos interpessoais em diferentes níveis e graus.
Segundo Bravo (2011, p.61) a maneira dos indivíduos se relacionarem uns com
os outros é um componente fundamental da cultura de cada grupo social, implica no
entendimento do poder e da autoridade, da intimidade, do amor e da amizade. Para este
autor estas dimensões do relacionamento humano, nas organizações, refletem as
concepções dos fundadores, líderes e gestores principais que estimulam a cooperação ou
a disputa, que mantém a distância social em um determinado nível e as relações internas
com certo grau de informalidade e questiona até que ponto as organizações se orientam
por aspectos emocionais ou aspectos profissionais, considerando que as relações entre
os indivíduos podem ser difusas, envolver diferentes níveis de relacionamento, ou
então, alternativamente, ser particulares e exclusivas as atividades profissionais.
Portanto, a gestão das pessoas na escola requer do diretor escolar o desenvolvimento de
habilidades relacionais que possam promover o diálogo constate e a mediação dos
possíveis desencontros e conflitos entre as pessoas.
Qualificando as características do gestor escolar, Trigo e Costa (2008, p. 571)
em um ensaio sobre a liderança nas organizações educativas, com ênfase na direção por
valores, afirmam que as escolas necessitam de um comando que coloque no centro da
sua atividade a ética, a moral, os valores, as pessoas, o diálogo e a relação entre as
pessoas, a adaptabilidade à mudança, ao desenvolvimento organizacional e a qualidade.
Mais uma vez, podemos observar, uma demanda por características que possam
desenvolver as habilidades na gestão de pessoas no diretor escolar, não apenas
reacionais mas também de postura ética.
Em se tratando dos relacionamentos que se dão na escola, não podemos deixar
de mencionar a relação com a cultura e o clima escolar, pois estes são compostos,
arranjados e rearranjados pela ação humana tanto individual quanto coletivamente. Para
Libâneo (2013, p. 95), a cultura organizacional é algo complexo que envolve interesses
distintos entre pessoas e grupos e diferentes bagagens culturais, constituindo ao diretor
escolar um desafio para se chegar a definições e decisões em torno de objetivos comuns.
384

O autor considera, dentro desta complexidade, tanto a disputa de interesses, os


significados, os valores, as relações de poder quanto o contexto sociocultural e político,
cuja influência é determinante na organização escolar e completando este pensamento,
considera que este desafio, que cabe tanto para o diretor escolar quanto para os demais
membros da equipe gestora, requer ações organizadas, racionais, uma normatividade.
Em se tratando do diretor escolar púbico do estado de São Paulo, no que tange a
gestão de pessoas, destaca-se na Resolução SEE/SP nº 52/2013, que trata dos perfis dos
educadores da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEE/SP), as dimensões
da gestão escolar, exemplificando as competências e habilidades necessárias para
exercer o cargo de diretor escolar, bem como para a seleção por meio de concurso
público. Dentro as dimensões da gestão escolar explícitas nesta resolução2, destacamos
a Gestão de Pessoas:
a) Promover, aproximar e integrar, os diversos segmentos da comunidade
escolar, para a construção de unidade de propósitos e ações que consolidem a
identidade da escola no cumprimento de sua função.
b) Desenvolver processos e práticas de gestão no coletivo escolar, para o
envolvimento e o compromisso das pessoas com o trabalho educacional.
c) Promover um clima organizacional que favoreça o relacionamento
interpessoal e profissional, para uma convivência solidária e
responsável.3
d) Desenvolver ações de gestão que valorizem e apoiem iniciativas que
promovam o desenvolvimento pessoal, social e profissional.
e) Otimizar o uso do tempo e dos espaços coletivos disponíveis na escola.
(SÃO PAULO, Secretaria de Estado da Educação, Resolução SE nº 52 de
14/08/2013, Anexo A, II Diretor de escola, 2. Competências e Habilidades,
2.2.2 Gestão de Pessoas).

Uma vez cabendo ao diretor escolar a responsabilidade sobre a gestão das


pessoas na escola, como evidencia na Resolução SEE/SP nº 52/2013, no que diz
respeito às suas competências para a manutenção de um clima escolar favorável à
convivência cooperativa, esta pesquisa tem a relevância de, a partir de estudos sobre
estratégias de comunicação, discutir as possibilidades do diretor de escola atuar na
mediação de conflitos, uma das suas atribuições definidas em legislação. Além disso, há
pertinente literatura que considera que o diálogo e a comunicação são fatores que
influenciam positivamente o clima escolar, um dos elementos que a literatura considera
ser importante dimensão da qualidade da educação (SAMMONS, 2008).

2
Gestão Pedagógica, Gestão de Pessoas, Gestão de Recursos Didáticos, Materiais, Físicos e Financeiros e
Gestão dos Resultados Educacionais do Ensino e Aprendizagem.
3
Grifos das autoras.
385

A comunicação na gestão escolar de pessoas


A comunicação é fruto inerente da condição humana, encontra nas diferenças
culturais, sociais e históricas seu processo dinâmico, nas organizações é meio e veículo
no qual suas partes se organizam. Sendo a gestão de pessoas uma das atribuições do
diretor escolar na organização educativa que é a escola, nos cabe então investigar a
relevância da comunicação como instrumento de caráter educativo nos relacionamentos
que se dão no espaço escolar.
A partir da observação empírica, como gestora escolar, na convivência com os
problemas causados por dificuldades na comunicação interna na escola é frequente
perceber a desinformação constante com relação a eventos e ou atividades
desenvolvidas na escola e o quanto este fato prejudica o contato interpessoal e
consequentemente inviabiliza a construção do diálogo, o que resulta em um processo de
comunicação vulnerável e alvo de ruídos e diversas interpretações, colocando os
sujeitos envolvidos a mercê de subjetividades e tendo como consequência um com
menor aproveitamento das ações desenvolvidas.
Considerando a educação e a comunicação áreas extremamente abrangentes, que
permeiam todas as ramificações da configuração social, Goerk (2002, p. 92), se
referindo à organização educativa, afirma que a comunicação é um aspecto inerente às
atividades e ao funcionamento das organizações e determinante para a realização de
atividades e consecução dos objetivos da instituição, pois todas as questões da
sociedade são impregnadas de um caráter educativo por ser objeto de ensino e
aprendizagem, ao mesmo tempo em que a comunicação está presente em todos os
espaços de interação e aprendizagem social. Esta autora apresenta a ideia de que a
valorização das pessoas e as iniciativas voltadas para a construção do conhecimento são
evidências de que a comunicação que se dá no espaço escolar, caracteriza a organização
educativa, a diferenciando de outras organizações, pois abriga uma finalidade social e
política que determina especificidades na comunicação com os públicos, para tanto
considera a perspectiva do feedback, na qual o receptor da mensagem participa
ativamente do processo, por meio de seu envolvimento, sua manifestação e seu
conhecimento, como instrumento de participação e envolvimento no processo (GOERK,
2002, p.95/99). Podemos considerar que, para Goerk (2002), o processo de
comunicação com feedback, ou seja, com a confirmação da mensagem e do seu fluxo,
representa a condição para uma comunicação educativa que denota aprendizagem e
386

desenvolvimento tanto para o sujeito emissor quanto para o sujeito receptor da


mensagem.
A comunicação, segundo Bordenave (1991), serve para que as pessoas se
relacionem entre si, transformando-se mutuamente e a realidade que as rodeia e a
considera produto funcional da necessidade humana de expressão e relacionamento.
Sem a comunicação cada pessoa seria um mundo fechado em si mesmo. Pela
comunicação as pessoas compartilham experiências, ideias e sentimentos. Ao se
relacionarem como seres interdependentes, influenciam-se e, juntos, modificam a
realidade onde estão inseridos (BORDENAVE, 1991, p.36). Uma contribuição
significativa deste autor para este trabalho é a classificação das funções da comunicação
em cinco tipos:
1. Instrumental - satisfação das necessidades (físicas ou espirituais); 2.
Informativa; 3. Regulatória - controlar o comportamento do outro; 4.
Interacional; 5. Expressão pessoal; Heurística: explorar o mundo dentro e
fora da pessoa; 6. Imaginativa [...] e outra função, indicar a qualidade de
nossa participação no ato da comunicação, que papéis tomamos e impomos
aos outros. (BORDENAVE, 1991, p. 45)

Gadotti (1985) trata em sua obra “Comunicação Docente, ensaio de


caracterização da relação educadora” (GADOTTI, 1985), da comunicação
fundamentada sob a perspectiva da filosofia da totalidade e interdisciplinaridade de
Buber (1954). Em linhas gerais, o autor atribui à comunicação a qualidade de formadora
do ser humano como ser de relação comunicacional além de via de expressão dos seus
pensamentos ou sentimentos.
No que se refere à formação do gestor escolar no enfrentamento das questões
atuais da escola, no que tange a gestão de pessoas, citamos Klebis (2010, p.194) que
trata em sua tese de doutorado, da revisão sobre as formações continuadas para os
gestores escolares da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo. A autora aponta,
mediante o cenário da reforma educacional da década de 1990 para a descentralização
operacional e consequente responsabilização das instituições escolares pelo seu
desempenho, que a qualidade da educação passou a ser vista pelo viés da competência
administrativa e da técnica da gestão escolar, sendo os problemas deslocados dos
aspectos econômicos e sociais. Somado a este cenário a crescente globalização da
economia e a competitividade de mercado, emerge uma exigência para que os países
invistam nos recursos humanos, que implica no desenvolvimento de habilidades e
competências, citadas algumas delas pela autora, como sendo a capacidade de atenção e
responsabilidade, a capacidade de comunicação, de utilizar novas tecnologias para
387

resolução de problemas práticos, a capacidade de trabalho em equipe, de liderança e de


identificar e resolver problemas com agilidade, assumindo diferentes papéis, dentre
outras. Apesar do seu olhar crítico com relação às mudanças nos cenários da Educação
das últimas décadas a partir da concepção neoliberal, e consequentemente na formação
do gestor escolar, a autora conclui sobre a importância da gestão democrática na escola,
do compartilhamento de responsabilidades e poder, o que, para tanto, podemos
compreender a comunicação como meio de possibilitar a integração entre as pessoas nas
relações de trabalho formativo que se dão na escola.
A articulação das relações interpessoais entre a escola e a comunidade tem sido objetivo
de estudo por parte de alguns especialistas. Reconhecendo a complexidade do contexto escolar e
que a escola não dispõe de meios adequados ou respostas eficientes para desenvolver um
processo dinâmico de comunicação, o diálogo e a resolução de conflitos, Nunes (2011) afirma
que os educadores precisam desenvolver maiores estratégias que permitam trabalhar o conflito
de forma construtiva, cujos resultados produzam efeitos mais duradouros. Portanto, cabe ao
gestor escolar, considerado um educador4, desenvolver habilidades relacionais que favoreçam a
compreensão e o diálogo na escola, bem como incentivá-las em todos os membros da
comunidade escolar.
Uma das maiores expressões intelectuais brasileiras, voltada à Educação, Paulo Freire
(1921-1997) tratou do tema comunicação em sua obra Extensão e Comunicação (1983),
deixando claro que a educação é um processo de comunicação, pois sua construção se dá por
meio do outro, nos relacionamentos entre as pessoas, numa construção compartilhada do
conhecimento, especificamente a partir de uma relação dialógica.
Não há, realmente, pensamento isolado, na medida em que não há homem
isolado. Todo ato de pensar exige um sujeito que pensa, um objeto pensado,
que mediatiza o primeiro sujeito do segundo, e a comunicação entre ambos,
que se dá através de signos linguísticos. O mundo humano é, desta forma, um
mundo de comunicação. (FREIRE, 1983, p. 44)

Segundo Freire (1983, p.45) ainda, é indispensável ao ato comunicativo, para


que este seja eficiente, o acordo entre os sujeitos, a reciprocidade na comunicação – a
expressão verbal de um dos sujeitos deve ser percebida dentro de um quadro
significativo comum ao outro sujeito, sendo este um encontro comunicativo entre os
interlocutores na busca de definição dos significados entre si.

4
A Secretaria de Estadual da Educação de São Paulo considera o diretor escolar como um dos educadores
que compõem a comunidade escolar, conforme Resolução SE nº 52/2013, Artigo 2º, Inciso I, Anexo A.
388

Conclusão
Qualificando a escola como uma organização educativa, a partir das análises
referentes à literatura citada, infere-se ser importante a comunicação na gestão de
pessoas na escola, servindo de instrumento não apenas para a melhoria dos
relacionamentos interpessoais que se dão na escola, mas principalmente para, a partir da
convivência baseada em uma comunicação mais clara e objetiva, favorecer o diálogo, de
modo que o objetivo da escola em realizar a formação dos alunos bem como de todos os
profissionais envolvidos no processo, seja potencializado.

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Dispõe sobre os perfis, competências e habilidades requeridos dos Profissionais da
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fundamentam e orientam a organização de exames, concursos e processos seletivos.
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390

Comunicação

Espaço europeu de ensino superior (EEES): Instrumento de regulação na gestão


das instituições de educação superior brasileiras?

Egeslaine de Nez
Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat)
Grupo de Estudos sobre Universidade (GEU/Unemat)
Antonio Bosco de Lima
Universidade Federal de Uberlândia (UFU)

Resumo: Este artigo tem como objetivo identificar se o Espaço Europeu do Ensino
Superior (EEES), intitulado inicialmente como Processo de Bolonha, é reconhecido
como um movimento regulatório que influencia a gestão de universidades no Brasil. O
procedimento metodológico parte de um estado da arte/estado de conhecimento dos
documentos que compõem o Processo, assim como sobre o tema da regulação e
contempla a análise de conteúdo. A abordagem analítica dos dados é qualitativa. A
relevância científica desta investigação relaciona-se diretamente com o fato de apesar da
existência de vários estudos dedicados ao EEES, poucos destes são no âmbito desta
discussão que tem como um dos principais focos descritivos a regulação transnacional.
Considera-se finalmente, que se verifica uma complexa relação de entrelaçamento entre
a regulação transnacional e as políticas públicas educacionais contemporâneas que se
articulam dinamicamente e servem como aporte para algumas ações das instituições
brasileiras.
Palavras-chave: Educação Superior, Gestão, Regulação.

Introdução
As políticas sociais não estão isentas da intervenção do estado capitalista. Aliás,
essas são produtos deste Estado. Servem aos interesses do capital, ou como sugere
Vieira (1992, p. 30) “parte da estratégia da classe dominante, mais adequadamente da
burguesia”. Isto que parece ser óbvio, mas no imaginário popular não é assim tão
simples assim. Afinal, as políticas públicas são moedas de troca, que parecem
solucionar questões da miserabilidade (cultural, social, educacional, da segurança,
dentre outras), mas apenas amenizam o teor de tais problemas.
391

Assim, na análise e avaliação de políticas implementadas por um governo,


fatores de diferentes natureza e determinação são importantes. A compreensão do
conceito de políticas públicas é um fator relevante e pode ser caracterizado como o
Estado em ação, isto significa dizer que é o Estado implantando um projeto de governo,
através de programas e de ações voltadas para setores específicos da sociedade
(HÖFLING, 2001).
É nesta conjuntura que este estudo se desenvolve, destacando uma política social
da educação, com especificidade da Educação Superior, e um de seus principais marcos
internacionais regulatórios: o Tratado de Bolonha. Para entendê-lo, torna-se necessário
estabelecer algumas teses sobre a globalização, mundialização e a questão local. Neste
trabalho tais categorias estão articuladas ao mundo da produção, sob a custódia do
capitalismo, que essencialmente volta-se para o mercado e para a circulação de
mercadorias. Lógico, portanto, que a educação perde, neste contexto, seu viés social e
passa a ser tratada como uma mercadoria, que precisa, para ser viabilizada garantir
acúmulo e circular, o que significa ser comprada e vendida.

Regulação: conceitos, definições e tipos


Numa época marcada pelo impacto das tecnologias de informação e
comunicação, deter e produzir conhecimento, bem como transformá-lo em inovações
nas esferas econômica e social, é um posicionamento estratégico de cada país (LIMA e
CONTEL, 2011). Robertson (2009) destaca que é compreendida como um motor para o
desenvolvimento de uma economia baseada no conhecimento. Reconhece-se, deste
modo, a importância que a universidade tem, sobretudo na perspectiva de produção e
transferência de conhecimentos através da pesquisa produzida na Pós-graduação.
Iniciativas nesse sentido, de caráter nacional, foram relevantes para a
interiorização da Educação Superior, seja pela via do Programa de Reestruturação e
Expansão das Universidades Federais (REUNI)1 – no âmbito público, seja pela
aceleração do financiamento da educação via Fundo de Financiamento Estudantil
(FIES)2 ou de bolsas por meio do Programa Universidade para Todos (ProUni)3 – no
âmbito privado. Além disso, a criação da Universidade Aberta do Brasil entre outros

1
Decreto nº 6.096/2007 que institui o Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades
Federais (REUNI) (BRASIL, 2007).
2
Lei nº 10.260/2001 que descreve sobre o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) (BRASIL, 2009).
3
Lei nº 11.096/2005 que constitui o Programa Universidade para Todos (ProUni) (BRASIL, 2008).
392

desdobramentos que ocorreram no sentido de massificar (quantificar) o número de


egressos com formação superior atendendo a demandas exclusivas do capital.
Tais iniciativas, que ocorreram particularmente durante o governo Lula da Silva,
em seus dois mandatos (2003-2010) visavam no campo da economia sustentar a tese de
neodesenvolvimentismo econômico e social, alavancando as cidades do interior na
conquista capital, elevando-se o número de vagas na Educação Superior e formando
sujeitos com base tecnológica. Daí o foco voltado para a criação de cursos de caráter
tecnólogo.
Substancialmente, tem-se no Plano Nacional de Educação (PNE)4, recém
aprovado, um teor de incremento na graduação e na Pós-graduação. Em seu artigo
Artigo 2 que trata das diretrizes, destaca-se o inciso VII: promoção humanística,
científica, cultural e tecnológica. Duas metas são fundamentais para potencializar tal
objetivo: a Meta 12 - elevar a taxa bruta de matrícula na Educação Superior para 50% e
a taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos, assegurada a qualidade da oferta
e expansão para, pelo menos, 40% das novas matrículas (no segmento público); e, a
Meta 14 - elevar gradualmente o número de matrículas na Pós-graduação Stricto Sensu,
de modo a atingir a titulação anual de 60.000 mestres e 25.000 doutores.
Vale destacar que as Instituições de Educação Superior (IES) já vinham
caminhando em direção a estas metas. As políticas, os programas e as práticas
universitárias foram cada vez mais cooptadas e dimensionadas por interesses políticos e
econômicos geoestratégicos, que sofrem injunções e suportam pressões ao longo de sua
história. Barroso (2006) chama esse movimento de regulação e sinaliza que o conceito é
polissêmico e descreve dois tipos de fenômenos diferentes e interdependentes que são:
“os modos como são produzidas e aplicadas as regras que orientam a acção dos actores;
os modos como esses mesmos actores se apropriam delas e as transformam” (p. 12).
Cabrito (2011) a define como o “[...] modo como os portadores de autoridade
coordenam, controlam e influenciam o sistema educativo e os seus actores, através de
regras, normas, pressões e constrangimentos, condicionando a acção daqueles actores
em função dos objectivos políticos que perseguem” (p. 187). Assim, a regulação se
concretiza nas ações dos ocupantes ocasionais que detém o poder, isto significa dizer, os
indivíduos que possuem a capacidade legal para implementar regras ou normas com
êxito e que fazem valer suas decisões.

4
Lei nº 13.005/2014 que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) (BRASIL, 2014b).
393

Segundo Dale (1998) a regulação pressupõe controle. Aqui, no caso específico


da Educação Superior, as sanções legais que originam o domínio seria através da
organização das atividades que o Estado impõe por meio do Ministério da Educação
(MEC), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES) e
do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Assim,
ao longo das décadas a regulação consegue um avanço na definição de padrões e regras,
segundo os quais as IES brasileiras são forçadas a seguir e a respeitar.
Afinal, tratam-se de políticas que visam garantir o controle do Estado sobre a
sociedade. Mas além do controle social, trabalha-se com o imaginário social,
construindo-se uma ideia de acesso, de conquista e de evolução. Como referencia
Faleiros (1991, p. 18), “A forma como as políticas sociais aparecem nos discursos, nos
jornais, nas inaugurações faz parte do imaginário social da interação simbólica ou da
ideologia dominante.”
Processualmente, como esclarece Barroso (2006), acentua-se a relevância da
regulação nos processos de recomposição do papel do Estado e na alteração dos seus
modos de intervenção. Sendo resultado da busca de seu papel na “[...] definição,
pilotagem e execução das políticas e da ação públicas, mas, por outro lado, ele passa a
ser obrigado a partilhar esse papel com a intervenção crescente de outras entidades, e
atores, que se reportam a referências, lugares e processos de decisão distintos” (p. 11).
Para se compreender a natureza e a dimensão do processo regulatório na
Educação Superior e as imbricadas interlocuções que se estabelecem entre os níveis
global e local, considera-se útil recorrer às contribuições formuladas por Barroso (2006)
que divide a regulação em três instâncias: regulação transnacional; nacional e
microrregulação local. Esses três níveis de regulação se distinguem pelo lócus de sua
atuação (hierarquia) e pela extensão e capacidade que têm de se impor ao conjunto das
relações que se materializam entre os vários níveis de políticas públicas educacionais.
Por regulação transnacional, Barroso (2006) compreende um

conjunto de normas, discursos e instrumentos (procedimentos, técnicas,


materiais diversos, etc.) que são produzidos e circulam nos fóruns de decisão
e consulta internacionais, no domínio da educação, e que são tomados, pelos
políticos, funcionários ou especialistas nacionais, como “obrigação” ou
“legitimação” para adoptarem ou proporem decisões ao nível do
funcionamento do sistema educativo (p. 44-45 – grifos do autor).

Vale destacar que esse tipo de regulação tem sua origem em países centrais e faz
parte do sistema de dependência em que se encontram os países periféricos, num quadro
394

de constrangimentos estruturais de natureza política e econômica, que integram os


chamados efeitos da globalização e que resultam na geopolítica do conhecimento e na
internacionalização da Educação Superior (LIMA e CONTEL, 2011).
Barroso (2006) ressalta que esse tipo de regulação é resultado da existência de
“[...] estruturas supranacionais – que mesmo não assumindo formalmente um poder de
decisão em matéria educativa – controlam e coordenam, por meio das regras e dos
sistemas de financiamento, a execução das políticas nesse domínio” (p. 45).
Já com relação à discussão do conceito de regulação nacional, destaca-se que
pode ser entendido como o modo que as autoridades exercem a coordenação, o controle
e a influência sobre o sistema educativo, orientando através de normas, o contexto da
ação dos diferentes atores sociais e seus resultados. Barroso (2006) esclarece que

Por um lado, e numa perspectiva diacrónica, assiste-se a um processo de


sedimentação normativa que resulta da sobreposição de novas regras,
orientações e reformas (produzidas numa volúpia de transformação
permanente que raramente ultrapassa a superfície do sistema), às praticas e
estruturas antigas que, na maior parte dos casos, acabam por subsistir ainda
que “travestidas” de uma pretensa modernidade (p. 53 – grifo do autor).

Assim, se constitui nas formas institucionalizadas de intervenção do Estado e de


sua administração na coordenação do sistema educativo. Para Nez (2013) o governo
nacional ao definir marcos regulatórios para a educação se respalda nas diretrizes
internacionais, mas deveriam recontextualizá-las para atender às suas demandas
específicas e às particularidades de seu país que está numa determinada conjuntura,
considera o global, mas atenta-se para o local. O poder público acaba aperfeiçoando
suas condições para o exercício da função regulatória.
A relação global/local obedece a uma essencialidade que está presente nas forças
produtivas a serviço do capital. Então, o marco regulatório, que se segue ao marco
reivindicatório irá conduzir o Estado fundando ou refundando uma “nova ordem
burguesa, apoiado em um Estado diminuído em sua base social, mas burocraticamente
eficaz para servir ao capital” (BORON, 1991, p. 81). Nas últimas décadas tem-se visto
algo diferente disto? O Governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002)
extremamente monetário e o governo de Lula da Silva, praticando um ecletismo entre o
social e o monetarismo.
A compreensão da disposição regulatória de conselhos específicos ou de espaços
locais diversos é importante para se perceber algumas das tensões existentes na
Educação Superior. Surge, então, a terceira e última instância de regulação proposta por
395

Barroso (2006) é a microrregulação local, sendo considerada “o processo de


coordenação da acção dos actores no terreno que resulta do confronto, interacção,
negociação ou compromisso de diferentes interesses, lógicas, racionalidades e
estratégias [...]” (p. 56-57). Desta forma, está relacionada ao complexo jogo de
estratégias, negociações e ações de vários atores na qual as normas e injunções da
regulação nacional (ou internacional) são (re) ajustadas localmente.
Para Barroso (2006), os pólos de influência da microrregulação local são
diversificados e podem situar-se nos serviços da administração com intervenção direta
ao nível local, nos grupos de interesses (políticos, sociais, econômicos, profissionais
entre outros) organizados ou não, sejam no âmbito nacional ou internacional.
Enfim, pode-se enfatizar que o termo regulação está associado à intervenção do
Estado na definição dos processos e na avaliação das atividades universitárias. É, sendo
assim, uma forma de controle, organização das normas e função essencial para a
manutenção do equilíbrio ou transformação de qualquer sistema. É exatamente nesse
ínterim, que as reflexões deste artigo se fundamentam e se articulam com foco analítico
para a regulação transnacional, como é o caso do Tratado/Processo de Bolonha.
Estado, globalização, local, espaço, obedecem as leis maiores de mercado, as
quais tendem a regular e não serem reguladas no sistema capitalista. Portanto, a
regulação transnacional visa o intercâmbio, o reconhecimento, a relação sem entraves
para a circulação das várias mercadorias, dentre as quais, a que se tratou: a educação.
Novamente, recorrendo a Boron (1991), o “desenvolvimento capitalista requereu o
desmantelamento sistemático das instituições, práticas e valores tradicionalmente
associados com a democracia burguesa” (p. 87).
Visa, portanto, o desmantelamento do nacional, do local, das fronteiras, e o
primado do capital internacional, globalizado, mundializado, de valores centrais sobre
os “periféricos”, de tecnologias primeiro mundista sobre as “pseudo tecnologias”
“terceiro mundista”, sinalizando o Tratado de Bolonha para o seu incremento nas várias
nacionalidades.

O Espaço Europeu de Ensino Superior (EEES)


O Processo/Tratado de Bolonha se intitula oficialmente como EEES e ocupa um
papel de destaque na última década nas discussões da Educação Superior, não apenas na
Europa, mas no restante do mundo. Wielewicki e Oliveira (2010) enfatizam que
“Podem-se empreender distintas análises sobre ele, mas é cada vez mais difícil ignorar
396

sua força e impacto. A dimensão que ocupa hoje a Declaração de Bolonha está
visceralmente relacionada ao contexto no qual esse acordo ganha existência” (p. 222).
É, destarte, uma das transformações mais importante na história das universidades
européias desde o início do século XIX.
Para Bastos (2008) essa renovação foi relevante para inserir a Europa novamente
num contexto desenvolvimentista no que diz respeito à qualificação de seus
profissionais e à competitividade. Todavia, o EEES se reporta e se relaciona diretamente
com algumas tendências, tais como: a globalização da economia acompanhada de um
fluxo transnacional de capitais e o estabelecimento de acordos comerciais, resultando na
internacionalização do comércio, além da reestruturação do mercado de trabalho.
O EEES se constituiu inicialmente a partir da Carta Magna (1988) que
considerava que o futuro da humanidade dependia em larga medida do desenvolvimento
cultural, científico e técnico das universidades. Dez anos depois, a Declaração de
Sorbonne (1998) lançou a proposta de harmonizar a arquitetura do Sistema Europeu do
Ensino Superior e, em, 1999 foi sistematizado o documento oficial designado de
Declaração Conjunta que marcou a formalização da ideia da transformação do ensino
superior na Europa (FRANÇA, 2013).
A partir de então, foram publicados seis comunicados (Praga/2001, Berlim/2003,
Bergen/2005, Londres/2007, Leuven/Louvain-la-Neuve/2009 e Bucareste/2012) e uma
nova declaração (Budapeste-Viena/2010). Todos esses documentos desvelam os
avanços da constituição do EEES e a análise do Processo de Bolonha 2020. Além disso,
dispõem as ações a saber: os ciclos acadêmicos, a concentração e transferência de
créditos curriculares, a mobilidade dos envolvidos e a unificação e colaboração dos
países-membros na expansão do ensino superior (Disponível em:
<http://europa.eu/legislation_summaries/education_training_youth/lifelong_learning/c1
1088_pt.htm>. Acesso em: 03 jan. 2013).
Seu grande objetivo era a convergência dos sistemas baseados em três ciclos
(licenciatura, mestrado e doutorado), também buscava introduzir um sistema de graus
acadêmicos, promovendo a mobilidade dos estudantes, dos professores e dos
pesquisadores. Ao longo do processo foram acrescentados outros elementos, tais como:
aprendizagem ao longo da vida, competitividade econômica, atratividade aos
estudantes, professores e pesquisadores, acreditação, cooperação, avaliação, qualidade,
entre outros (Disponível em: <http://europa.eu/legislation_summaries/
397

education_training_youth/lifelong_learning/c11088_pt.htm>. Acesso em: 03 jan.


2013).
Trinta países europeus assinaram a carta de intenções da declaração e hoje mais
de quarenta e sete países participam do EEES, o que de alguma forma demonstra a
capacidade de articulação, e de proposição de uma política pública transnacional.
Hortale e Mora (2004) destacam que a Declaração de Bolonha não se caracteriza como
um mandato da União Europeia (UE) que obriga os países-membros ao seu
cumprimento; é, pois, um acordo que tem validade se os governos o implementarem em
seus países. Poder-se-ia dizer que é “[...] um processo de todas e de cada uma das
nações europeias em que a UE atua como dinamizadora” (p. 946). Com isso se informa
o papel decisivo que a comunidade acadêmica tem para tornar o EEES uma realidade.
Morosini (2006) enfatiza que a declaração parte do pressuposto que a “Europa
do Conhecimento” é um fator imprescindível ao crescimento social e humano, elemento
indispensável à consolidação e enriquecimento da UE, capaz de oferecer aos seus
cidadãos as aptidões necessárias para enfrentar os desafios do novo milênio.
Para Siebiger (2013) a concepção do EEES apresenta uma política que busca
conciliar cooperação, liberdade acadêmica, autonomia institucional, princípios
democráticos, aliada as ideias de igualdade de oportunidades, atratividade,
competitividade e atendimento a demandas do mercado do trabalho.
Em sendo desta forma, conclui-se que o EEES gerou um período intenso de
atividades políticas e universitárias. Porém, é notório que esse movimento não surgiu no
âmago das universidades, e sim sob o comando dos dirigentes políticos. Segundo Nez
(2011) tem-se a nítida impressão de que o sistema estava mais consciente dos problemas
da Educação Superior, do que necessariamente a comunidade acadêmica, e essa
intencionalidade deve ser considerada na análise do EEES. No entanto, não se pode
ignorar que a toda política está subjacente uma intencionalidade teórica e que o pano de
fundo em que se constitui está regado pelos interesses globais e locais.

Repercussões no plano nacional


Como apresentado inicialmente o teor ideológico do Tratado de Bolonha está na
possiblidade de, enquanto mercadoria, ter um “luxo internacionalizado”. Portanto,
sistemas de credenciamento, de transferência de créditos, reconhecimento de diplomas,
mobilidade estudantil está presente nas políticas sejam curriculares, sejam de
mobilidade, sejam de articulações acadêmicas. No Brasil tem-se o Programa Ciência
398

sem Fronteiras5 que promove expansão e internacionalização da ciência, da tecnologia,


da inovação e da competitividade brasileira, por meio do intercâmbio e da mobilidade
internacional, além da especificidade da formação do pesquisador. Essa ideia implica o
empresariamento da atividade científica. Prevê-se

[...] até 101 mil bolsas em quatro anos para promover intercâmbio, de forma
que alunos de graduação e pós-graduação façam estágio no exterior com a
finalidade de manter contato com sistemas educacionais competitivos em
relação à tecnologia e inovação. Além disso, busca atrair pesquisadores do
exterior que queiram se fixar no Brasil ou estabelecer parcerias com os
pesquisadores brasileiros nas áreas prioritárias definidas no Programa, bem
como criar oportunidade para que pesquisadores de empresas recebam
treinamento especializado no exterior (CIÊNCIA, 2013, p. 01).

Deste modo, parece inegável considerar que o Tratado/Processo de Bolonha é


uma forma de igualar a Educação Superior nos países-membros, com o foco principal
na adequação de seus sistemas curriculares, visando mobilidade que favorece o
desenvolvimento da pesquisa e seu financiamento. Essas ações pretendem manter
pesquisadores no espaço da União Europeia consolidando-a centro de excelência da
educação, fazendo com que se torne precursora de uma nova tendência em educação
mundial.
Porém, para além da mobilidade da acreditação têm-se mudanças substanciais
que ocorreram com os Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) dos cursos de graduação no
Brasil, que foram iniciados com a chamada Edital 4/19976. Este conclama as IES a
realizarem suas mudanças curriculares, focando, principalmente a formação
bacharelesca e de licenciaturas. A partir deste ato regulatório, os cursos foram se
especializando. É imprescindível comentar que o item 1 deste edital reforça que as
diretrizes objetivam:

[...] servir de referência para as IES na organização de seus programas de


formação, permitindo uma flexibilidade na construção dos currículos plenos e
privilegiando a indicação de áreas do conhecimento a serem consideradas, ao
invés de estabelecer disciplinas e cargas horárias definidas.
As Diretrizes Curriculares devem contemplar ainda a denominação de
diferentes formações e habilitações para cada área do conhecimento,
explicitando os objetivos e demandas existentes na sociedade (BRASIL,
2014a).

Mesmo que não sejam encontradas referências explícitas ao Tratado de Bolonha


nas Diretrizes e nos PPP dos cursos de graduação, identifica-se em termos conceituais e

5
Decreto n º 7.642/2011 que cria o Programa Ciência sem Fronteiras (BRASIL, 2013).
6
Edital nº 4/97 que convoca as IES a apresentar propostas para as novas diretrizes curriculares dos cursos
superiores (BRASIL, 2014a).
399

essenciais que estão sinalizados nos termos: flexibilidade, habilidades, competências,


dentre outros que demarcam e regulam os parâmetros para a constituição dos cursos.
Outro programa vinculado a tais orientação é o Projeto Tuning América Latina,
que foi articulado em várias IES brasileiras, buscando uma afinação da Educação
Superior ao modelo europeu. No Brasil, algumas universidades federais já possuem esse
mesmo formato de arquitetura acadêmica, o Estado de Minas Gerais foi um dos
precursores nesse tipo de formação, que na legislação brasileira intitulam-se
Bacharelados Interdisciplinares (BI) (NEZ, 2011). Na Universidade Federal de
Uberlândia, por exemplo, pode-se encontrar no PPP do Curso de Engenharia referência
a tal programa, principalmente no que diz respeito ao perfil do egresso e a creditação,
aproximados ao posto no EEES.

Considerações finais
O objetivo central deste trabalho foi o de realizar uma explanação sobre o
modelo europeu para a Educação Superior e a sua influência no Brasil. Foram discutidas
brevemente as concepções do mundo do capital, por meio de seus instrumentos de
internacionalização, globalização, mundialização e como repercute nas experiências
nacionais. Isso foi identificado na política educacional implementada nas últimas
décadas (final do século XX e início do século XXI), desde o Edital nº 4/97, passando
pelo PNE de 2014, pelas mudanças de diretrizes curriculares, pelas adaptações de
financiamento referenciadas, além de discussões pertinentes em vasta literatura da área
(LIMA, 2014) que tem privilegiado o primado do privado.
A partir da análise de conteúdo dos documentos que compõem o EEES, é
possível enfatizar que a cada encontro, os comunicados têm maior refinamento de idéias
e aprofundamento teórico. Ao longo do processo foi perceptível a ênfase no contexto
mundial com base da internacionalização da Educação Superior e na sociedade do
conhecimento organizada em rede, além da sistematização de um possível alinhamento
mundial.
Destaca-se, desta forma, a correlação de forças para o incremento de políticas
públicas para o EEES, bem como predomínio da referência à pesquisa, como um forte
aliado na construção de um espaço hegemônico de apropriação e socialização do
conhecimento produzido.
Isso se mostra aparente nas atividades realizadas pelo Processo que estão
articuladas e inscrevem-se nos objetivos do programa Educação e Formação 2020 e
400

Europa 2020, como uma política pública para a Educação Superior nesses países.
Assim, a adoção de um sistema de dois ciclos, em particular, já alterou a arquitetura do
sistema de ensino superior europeu de uma forma inédita e profunda e de forma
definitiva demarca ações noutros países.
É imprescindível aqui nesse momento conclusivo das reflexões sobre o EEES
compreender que pode ser aclamado como uma regulação do tipo transnacional.
Ratifica-se que é categorizado como uma regulação burocrática e administrativa, sujeita
a uma rede complexa de normativas (diretrizes e metas propostas nos comunicados e
nas declarações) que reforçam a intervenção direta do Estado (através dos Ministros
seus representantes legais), que teve como função reconfigurar a oferta da Educação
Superior europeia.
Cada contexto de ação (transnacional, nacional, local) é fonte e palco da
regulação institucional e situacional. Isto porque a ação política das sociedades ocorre
sempre condicionada por regras e recursos protagonizados e disponibilizados por atores
no quadro de relações sociais com certo grau de institucionalização.
Salienta-se, também, que coexistem algumas diferenças nas três formas
regulatórias exercidas nos diversos espaços (global, nacional e local), mas todas
igualmente servem como uma possibilidade de organização das ações, políticas e
práticas da Educação Superior brasileira.

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403

Comunicação

Formação de coordenadores pedagógicos: integração para a gestão democrática

Elenise Pinto de Arruda


HISTEDBR/PPGE/UFOPA
Maria Lília Imbiriba Sousa Colares
HISTEDBR/PPGE/UFOPA

RESUMO: Este texto integra uma pesquisa em andamento, cujo objetivo é analisar as
concepções e práticas dos coordenadores pedagógicos da rede pública de Santarém –
PA, no que se refere à atuação no processo de gestão da escola. Insere-se na abordagem
qualitativa e utiliza como metodologia a análise documental e estudo bibliográfico. Os
resultados preliminares apontam que o contexto histórico da gestão escolar apresenta
uma forte associação ao controle do processo educativo e que, o perfil de
gestor/coordenador tem sido cada vez mais exigente frente a realidade globalizada.
Compreende-se que o coordenador pedagógico exerce uma função primordial no
cotidiano da escola e que a gestão da escola não deve se centralizar na figura do diretor
Palavras – chave: Gestão escolar. Coordenação Pedagógica. Gestão democrática.

INTRODUÇÃO
O presente artigo apresenta reflexões preliminares de uma pesquisa que está
sendo desenvolvida no Mestrado em Educação do Programa de Pós-Graduação em
Educação na Universidade Federal do Oeste do Pará. A pesquisa aborda o processo de
gestão na educação, especificamente, a gestão da escola no que se refere à coordenação
pedagógica e tem como objetivo, analisar as concepções e práticas dos coordenadores
pedagógicos1 da rede pública de Santarém, egressos do curso de formação continuada
de especialização em coordenação pedagógica, no que se refere à atuação da
coordenação pedagógica no processo de gestão da escola, tendo como recortes teóricos
as abordagens sobre gestão democrática.

1
Na rede estadual de ensino do Estado do Pará, a função de coordenação pedagógica é exercida por
pedagogos, denominada Técnico em Educação. Na rede municipal de Santarém-PA, também é exercida
por pedagogos, sendo denominados coordenadores pedagógicos. Neste artigo, as nomenclaturas
supervisão pedagógica/escolar/educacional e coordenação pedagógica são equivalentes e sempre se
referirão ao trabalho exercido pelo pedagogo.
404

Conhecer as concepções e práticas dos que atuam na gestão das escolas é


relevante para se compreender como essa relação se efetiva na realidade escolar, quais
são as contradições e similaridades e como isso se materializa no cotidiano da escola.
Contudo, considera-se imprescindível apontar alguns elementos que estão inseridos no
contexto social mais amplo e que relacionam-se de forma determinante com a educação.
Portanto, tendo em vista, o andamento da pesquisa, a compreensão de que
refletir sobre gestão escolar e coordenação pedagógica, mesmo no âmbito específico da
escola, requer resgatar o contexto histórico e social que as determinam e que, as práticas
educacionais não estão descoladas e muito menos imune a estrutura econômico e social
da sociedade atual, propõe-se neste texto, abordar alguns aspectos mais específicos do
trabalho que já se apresentam como primeiros resultados do levantamento bibliográfico
referente a gestão na sociedade globalizada e trajetória histórico-conceitual da
coordenação pedagógica.

1. A GESTÃO DEMOCRÁTICA E A CULTURA GLOBALIZADA

Não há como falar em gestão democrática sem considerar que a mesma traz
determinantes históricos, políticos e econômicos. No campo das políticas em educação é
indiscutível a necessidade de se resgatar reformas educativas que iniciaram no fim da
década de 1980, fortaleceram-se na década de 1990 e perduram até os dias atuais. A
seleção deste período não se dá aleatoriamente e despropositadamente, pelo contrário,
destaca-se, por se considerar um marco histórico no desenvolvimento da sociedade, pois
mundialmente, uma revolução econômica e tecnológica sem precedentes históricos,
caracterizada como a era da informática, da internet, do capital e do conhecimento
estava se consolidando.
A década de 90 foi marcada por ações que buscavam ajustar a sociedade a
reestruturação do capitalismo e para isto o papel do Estado foi redefinido. Sobre isso
acrescenta Sousa e Faria

Nos anos 90, no contexto das relações internacionais [...] formou-se a ideia
hegemônica de que o Estado – sobretudo nos países periféricos – deveria
focar sua atuação nas relações exteriores e na regulamentação financeira, com
base em critérios negociados diretamente com os organismos internacionais.
A reforma nas suas estruturas e aparato de funcionamento consolidou-se no
anos 90, por meio de um processo de desregulamentação na economia, da
privatização das empresas produtivas estatais, da abertura de mercados, da
reforma dos sistemas de previdência social, saúde e educação,
405

descentralizando-se seus serviços, sob a justificativa de otimizar seus


recursos. (SOUSA; FARIA, 2004, p. 927)

Os autores expõem com clareza as bases das reformas que foram implantadas
pelo Estado. E assim, acresce-se que no Brasil, “[...] a Reforma educacional da década
de 1990 ocorreu concomitantemente às mudanças no âmbito [...] político que
radicalizaram a implantação de medidas neoliberais iniciada na ditadura militar dos
anos de 1970 que institucionalizaram o Estado mínimo (KRAWCZYK, 2010, p.12)
Neste cenário, com o aprofundamento das políticas neoliberais, a educação
ganhou importância estratégica para a realização das reformas educativas. Para a
implementação das mesmas e alcance dos objetivos propostos, a influência de
organismos internacionais foi decisiva, pois estes organismos emplacaram o discurso da
necessidade das reformas e impuseram diretrizes e ajustes nas políticas dos países,
defendendo a bandeira da educação como instrumento para a prosperidade e
desenvolvimento dos países periféricos. Com isso, o ideário do projeto neoliberal estava
se solidificando e as reformas educativas expressaram conteúdos e métodos que
buscavam cumprir esse objetivo.
Krawczyk (2010) informa que visando reverter o precário atendimento do ensino
fundamental e médio e as altas taxas de reprovação e evasão escolar a reforma no Brasil
iniciou-se na segunda metade da década de 1990, consolidando uma nova forma de
gestão da educação e da escola. A reestruturação da gestão da educação aparece como
estratégia de superação da crise estabelecida, pois os problemas são vistos com questões
de natureza econômica, de ordem administrativa, ou seja, as redes públicas são
ineficientes, pois não conseguem administrar suas instituições com os recursos que
possuem (OLIVEIRA, 2006).
Frente a isso, a alternativa defendida era a adaptação das teorias e práticas
administrativas dos setores empresariais ao contexto educacional e assim, a gestão das
instituições escolares, por meio de diversas medidas, passaram a viver um conjunto de
ações baseadas em estratégias e metas, na qual a melhoria da educação equivaleria a
melhoria dos índices de evasão e repetência.
Shiroma e Campos chamam a atenção para um aspecto importante no âmbito das
reformas:

Outro aspecto observad em el contexto de las reformas es ala resgnificación


de conceptos que historicamente orientaron el ideário del campo crítico em la
educación, em especial, aquellos relacionados a la gestión democrática de la
406

educación que, em el marco de las referencias liberales, son tomados como


fundamentales para as nuevas estratégias gestionarias y cuyo objetivo es la
performance de las escuelas (SHIROMA e CAMPOS, 2006, p.223).

Essa situação também é levantada por Oliveira (2006), pois segundo a autora, o
Estado brasileiro foi pressionado pelos movimentos populares a democratizar a
educação, abrangendo não só a questão do acesso ao ensino mas a qualidade do mesmo.
Contudo, o Estado atendeu de forma contraditória essa demanda, pois ao mesmo tempo
que implanta medidas, buscando dar respostas ao pleito das pressões populares,
também, implementa políticas de contenção de gastos publicados, permanecendo ainda
no controle do processo de mudanças.
Esses aspectos levantados por Shiroma e Campos e por Oliveira, faz-nos
compreender que a história da democratização da gestão da educação, arraigada de
determinantes políticos, econômicos e sociais, não se consolidou de forma indiferente.
Há de se considerar a importância das manifestações populares que lutavam não
somente pela democratização do ensino mas pela própria democratização da sociedade
brasileira. Mas também, não se pode acreditar de forma ingênua que a gestão
democrática propalada nos discursos das políticas não traz em seu bojo elementos de
uma ordem política que visa assegurar a subordinação da educação ao ideário
econômico.
Diante disso, “[...] o novo sentido da gestão democrática da educação é o de
humanizar a formação nesta cultura globalizada, dirigida virtualmente, pelo capitalismo
[...]” (FERREIRA, 2004, p. 1242) e ainda, “[...] mais do que nunca se faz necessário
ressignificar a gestão da educação a partir de outra base ética, que permita fazer frente
aos desafios constantes da cultura globalizada [...]” ( FERREIRA, 2004, p.1231).
Para que de fato a proposta da gestão democrática seja implementada na escola é
primordial a participação dos integrantes da escola no planejamento e nas decisões da
escola, pois como afirma Ferreira, “a gestão da educação acontece e se desenvolve em
todos os âmbitos da escola, inclusive e fundamentalmente na sala de aula”. (2001.
p.309)
Neste sentido, a gestão democrática

[...] implica que a comunidade, os usuários da escola, sejam os seus


dirigentes e gestores e não apenas os seus fiscalizadores, ou, menos ainda, os
meros receptores dos serviços educacionais. Na gestão democrática pais,
mães, alunos, alunas, professores e funcionários assumem sua parte de
responsabilidade pelo projeto da escola. (GADOTTI, 2002, p. 35)
407

A gestão das escolas atualmente não tem como desconsiderar as transformações


oriundas do neoliberalismo, deve tentar proporcionar uma formação voltada para a
cidadania, dando instrumentos de reflexão sobre os processos vivenciados
cotidianamente. E neste aspecto, a presença do gestor escolar – diretor e coordenador
pedagógico, na condução desse caminho é de suma importância.

2. GESTÃO DA ESCOLA: CONTEXTUALIZANDO A COORDENAÇÃO


PEDAGÓGICA

Ferreira (2012) destaca que a gestão e supervisão se faz presente desde o


momento em que se estabelecem as relações entre o homem e o trabalho. Neste
contexto esclarece que, com a efetivação do capitalismo, fez-se necessário um maior e
mais qualificado “controle” sobre o processo de trabalho, pois, segundo a autora, torna-
se fundamental para o capitalista ter o controle do processo de trabalho, a fim de
controlar a execução do planejado, minimizar os custos e maximizar a produção e ainda
corrigir os desvios que por ventura podem ter ocorrido no percurso da produção.
Destaca-se então, que o “controle” sempre esteve presente em todas as relações
de trabalho, perpassando desde a antiguidade e acentuando-se no projeto capitalista. E
esse aspecto –controle- também se fez presente na escola, tendo em vista, que o cenário
escolar é permeado por concepções e estratégias frutos de uma concepção hegemônica
do capitalismo. (FERREIRA, 2012, p.69).
Referente à atuação do coordenador pedagógico, Vasconcelos afirma que
“muitos dos problemas que se colocam atualmente no exercício da coordenação
pedagógica têm sua explicação na origem da configuração formal da função, associada
ao controle” (2007, p. 85). Compreende-se, que este aspecto advindo do necessário
controle do processo de produção vivido no sistema capitalista, foi transferido para a
escola e colocada como condição para o resultado esperado do trabalho escolar -
consolidar a hegemonia da política neoliberal.
Desta forma, é relevante resgatar brevemente como o trabalho desempenhado
pelo coordenador pedagógico surge ao longo da história, desde sua atuação controladora
até a compreensão de sua função como articuladora do trabalho pedagógico.
Pinto descreve que

A função de coordenação pedagógica nas escolas é marcada por um conjunto


de expressões para designar o mesmo trabalho desenvolvido pelo pedagogo
408

ao acompanhar as atividades do corpo docente. São elas: supervisão


pedagógica, supervisão educacional, supervisão escolar, assistência
pedagógica e orientação pedagógica (PINTO, 2011, p.80).

Portanto, a coordenação pedagógica ao longo da história recebeu várias


nomenclaturas variando de acordo com o período histórico, local e entidades.
Saviani (2000) amplia discussão sobre a temática fazendo um destaque inicial
sobre a função supervisora e destaca que nas comunidades primitivas a função
supervisora já se apresenta mesmo sem se ter uma educação em sentido estrito.
Acrescenta ainda, que essa função também se fazia presente na sociedade antiga e na
Idade Média. Porém, é na época Moderna, com a necessidade da generalização da
escola, exigida pelas transformações do capitalismo, que se evidencia um esboço de
ideia de supervisão educacional. No Brasil, no ensino ministrado pelos jesuítas é
verificado indícios do trabalho de supervisão através do “prefeito de estudos” que cabia
de maneira geral auxiliar o reitor na “boa ordenação dos estudos”, a quem todos os
professores e todos os alunos deviam obedecer. (2000, p.21)
Vasconcelos (2007) afirma que apesar da influência dos jesuítas o modelo de
supervisão que influenciou o cenário brasileiro foi o modelo dos Estados Unidos no
século XVIII, no bojo do processo de industrialização, a “Inspeção Escolar”.
Foi com o Parecer nº 252/69 do Conselho Federal de Educação, no período
militar em meio do Golpe militar de 1964, que se confirmou a formação de especialistas
para atuar na supervisão escolar, pois este documento retratou essa função como uma
habilitação do Curso de Pedagogia e segundo Saviani (2000), a introdução das
habilitações nos Cursos de Pedagogia se deu numa âmbito de uma pedagogia tecnicista,
que tinha como objetivo garantir a eficiência e a produtividade do processo educativo.
Referente a isso, Vasconcelos destaca:

Sabe-se que a Supervisão educacional foi criada num contexto de ditadura.


A Lei nº 5692/71 a instituiu como serviço específico da Escola de 1º e 2º
Graus (embora já existisse anteriormente). Sua função era, então,
predominantemente controladora e, de certa forma, correspondia a
militarização Escolar. (URBAM, 1985 apud VASCONCELOS 2007 p. 86)

A administração educacional também apareceu no Parecer 252/69 como uma das


habilitações do curso de Pedagogia, juntamente com a Orientação Educacional. Todas
as habilitações certamente vinham com o mesmo objetivo de controle, pois as figuras de
diretor e supervisor escolar foram definidas a partir do modelo empresarial e
409

consequentemente, “o trabalho do diretor como com controlador de ensino, de acordo


com os princípios da racionalidade técnica, se fez presente há tempos nos serviços de
administração educacional no país, atendendo as ideias da pedagógica tecnicista”.
(PINTO, 2011, p.87).
Com a publicação das Diretrizes Curriculares do Curso de Pedagogia em 2006,
as habilitações foram extintas e consequentemente encerrou o período de formação de
especialistas para atuar como supervisores, diretores e orientadores educacionais e o
pedagogo passou a ser formado para assumir de forma integral as funções referentes aos
serviços e apoio escolar.
Esse abreviado contexto já demonstra o quanto a ação da administração escolar e
da supervisão escolar, foram criadas com um caráter controlador, executor de tarefas
administrativas e burocráticas a fim de garantir a execução eficiente de técnicas vinda
do modelo empresarial e indicadas ao processo educativo. Sem dúvida, estes aspectos
até hoje causam desconfortos no trabalho desenvolvido, haja vista ainda ser ter
resquícios da função fiscalizadora a qual primeiramente essa função teve.
No entanto, apesar da contradições vivenciadas ao longo da história da sua
atuação, Ferreira destaca a relevância do papel do coordenador pedagógico para
educação.
A supervisão educacional tem uma importante responsabilidade no sistema
educacional brasileiro e, fundamentalmente na escola, desde que
compreendida como integrante da gestão da educação, compromissada com a
formação de qualidade, a implementação de políticas e como elemento que
necessita subsidiar novas políticas públicas a partir de sua experiência
entendida como práxis. É ela que, no cotidiano escolar, com o coletivo de
professores, toma decisões, coordena as ações e vivencia as contradições e
necessidades educacionais que necessitam ser refletidas coletivamente pelo
conjunto dos profissionais da escola. Portanto, seu trabalho não é uma
“função”, muito pelo contrário, é um trabalho de gestão da educação, de
tomada de decisões com o diretor e os demais profissionais da educação
responsáveis pela escola. (FERREIRA,2012, p.127)

A coordenação pedagógica é parte integrante da escola e deve atuar em conjunto


com a direção e demais integrantes a fim de promover uma educação com qualidade. O
diretor escolar não tem como gerir todo o processo ensino-aprendizagem sozinho,
portanto, o coordenador pedagógico vem com a perspectiva de organizar o trabalho
pedagógico da escola, pelo planejamento escolar, pela coordenação e elaboração do
Projeto político pedagógico e muitos outros (SOARES, 2012, p. 57). Desta feita, a
direção escolar e a coordenação pedagógica devem atuar em conjunto para o bom
andamento do processo educativo.
410

Ferreira ao elucidar que gestão “significa tomar decisões, organizar e dirigir as


políticas educacionais que se desenvolvem na escola comprometidas com a formação da
cidadania, no contexto da complexa cultura globalizada” (2004, p. 1241) reforça o
pressuposto que, frente a este quadro, é por meio da gestão democrática da educação
que constrói coletivamente, através da participação, a cidadania da escola e seus
integrantes da escola, possibilitando o desenvolvimento de uma consciência mais ampla
no mundo, que será possível a superação do modelo taylorista/fordista, que foi a fonte
da administração da educação por muitas décadas (Ferreira , 2001).
Entende-se, portanto, que atualmente, uma gestão baseada em princípios
meramente técnicos, instrumentais e racionais, apropriados do setor empresarial, não
atende ao complexo e importante processo educacional da escola. É necessário repensar
como a gestão pode ser o campo articulador da gestão democrática na escola.

CONCLUSÕES PRELIMINARES

Os estudos realizados demostram que o contexto histórico da gestão escolar


apresenta uma forte associação ao controle do processo educativo, sendo uma
característica que ainda faz parte da realidade de muitas escolas. Existem
administrações permeadas pelos aspectos tecnicistas e pragmáticos, aonde os resquícios
da racionalidade técnica, da divisão de tarefas, do trabalho hierarquizado não foram
superados e comprometem sobremaneira a atuação da coordenação pedagógica. E como
a gestão democrática pode vir a romper essa estrutura?

Quem ocupa cargos de liderança- como diretor e coordenador pedagógico-


precisa despir-se do posicionamento predominantemente autocrático para
possibilitar o desenvolvimento de um clima em que todos contribuam com
ideias, críticas, encaminhamentos, pois a gestão e participação pedagógica
pressupõe uma educação democrática (LIMA;SANTOS 2007, p.85)

Diante disso, compreende-se que o coordenador pedagógico deve atuar como um


gestor frente as necessidades da escola, pois exerce uma função primordial no cotidiano
escolar como vimos no decorrer do estudo. Entende-se que a gestão da escola não se
centraliza na figura do diretor, já que gerir a escola é tarefa de todos que a compõem.
Não se trata aqui de uma generalização das tarefas, na qual todos podem fazer tudo ou
podem fazer qualquer coisa, mas sim, de um trabalho coletivo em prol de objetivos
411

construídos conjuntamente e que devem estar expressos no projeto político pedagógico


da escola.
Com resquícios de uma administração tradicional, que prega o controle, a
fiscalização, a divisão de tarefas, como o coordenador pedagógico pode contribuir para
o fortalecimento de uma gestão democrática que visa o compartilhamento de
responsabilidades e a permanência de um trabalho pedagógico participativo e coletivo?
Ferreira esclarece que:
a supervisão educacional compõe a gestão democrática da educação. Ela é
responsável pelo “controle’ das políticas educacionais que necessitam ser
desenvolvidas com qualidade e construídas coletivamente no espaço escolar.
A supervisão escolar é responsável pela formação humana que se realiza na
escola. (FERREIRA, 2012, p.114)

Há que se compreender, portanto, que não há gestão democrática sem a


participação dos integrantes das escolas, e nesse contexto fundamentalmente sem a
participação da coordenação pedagógica, haja vista que a autora acima defende que a
supervisão é parte imprescindível da gestão democrática.
Apreende-se ainda que, atualmente, o perfil de gestor/coordenador para atuar nas
instituições escolares tem sido cada vez mais exigente, tendo em vista as cobranças que
essas instituições têm recebido da sociedade globalizada. A gestão, compreendendo os
dirigentes escolares e coordenadores pedagógicos, é tida como uma dos estratégias para
o alcance da aprendizagem e deve estar “atenta aos processos educacionais de maneira a
oferecer meios que viabilizem a concretização das expectativas da sociedade e,
particularmente dos sujeitos envolvidos no de ensinar e aprender” (COLARES, 2012.
p.53).
Esses complexos e determinantes fatores demonstram que a discussão sobre
gestão escolar está associada a uma reflexão mais ampla e que as rupturas e desafios são
muitos e igualmente complexos. Não há como esgotar este conteúdo, nem é esse o
espaço para essa pretensão. As ponderações aqui levantadas nos levam a perceber que
mais análises são possíveis e necessárias, haja vista as numerosas dimensões que
envolvem a temática e seus extensos e complexos fatores. Entendemos que os desafios
não são poucos e tampouco simples, pois diante de uma contraditória e desigual
sociedade globalizada não há soluções fáceis ou receitas prontas para dissipar as
mazelas que perpassam o processo educacional na atualidade. Mas resta-nos, ir para
além dos discursos, ir para o campo das lutas ideológicas e políticas e buscar a
construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
412

REFERÊNCIAS

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414

Comunicação

A formação docente a partir de políticas organizacionais do mec: uma análise


sobre o PARFOR no estado do Pará

Eliane Gracy Lemos Barreto


UFOPA1
Anselmo Alencar Colares
UFOPA2

Resumo: O objetivo deste artigo é apresentar uma análise sobre o Plano Nacional de
Formação dos Professores da Educação Básica (PARFOR) no Estado do Pará referente
ao seu modo de funcionamento, intencionalidades e à sua abrangência diante da
demanda por formação em relação aos aspectos quantitativos. Utilizou-se como
recursos metodológicos a produção bibliográfica e documental e as informações
disponíveis no site eletrônico que gerencia o processo de inscrição e seleção ao
PARFOR. Os resultados demonstram que entre os 144 municípios que compõem o
Estado do Pará, o PARFOR está presente em 71 municípios com a implantação de 571
turmas e ofertando 29 cursos em áreas diversas, capacitando, um número expressivo de
docentes que atuam na educação básica.
Palavras-Chave: Formação Docente. Políticas Organizacionais. PARFOR.

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa foi desenvolvida junto ao Programa de Pós-Graduação em


Educação (PPGED) – Mestrado, ofertado pela Universidade Federal do Oeste do Pará
(UFOPA), a qual apresenta-se primeiramente na intenção de compreender o
funcionamento do Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica –
PARFOR, como uma política organizacional do Ministério da Educação (MEC) a partir
de sua dinâmica de desenvolvimento e posteriormente através de uma análise e
apresentação dos resultados alcançados pela mesma diante da formação docente no
Estado do Pará.

1
Mestranda em Educação – PPGE/UFOPA
2
Doutor em Educação, docente do PPGE/UFOPA.
415

No entanto, importa-nos apresentar não somente a organização estrutural


desta política organizacional, mas também os objetivos propostos como contribuições
para a formação docente, entendendo-se desta forma, que tais políticas interferem na
organização da escola, assim como no campo de atuação efetiva do professor que está
sendo formado/capacitado e consequentemente para a melhoria da qualidade do ensino.
Desta forma, defende-se aqui o conceito de qualidade do ensino de acordo
com as concepções de Leite et al. (2010, p.12), que defendem que para enfrentar este
momento histórico da educação brasileira com coerência, no que diz respeito à
democratização e aperfeiçoamento da qualidade do ensino

É essencial reconhecer que não existe educação de qualidade sem docente de


qualidade. Desta forma, torna-se necessário pensar um novo paradigma na
formação dos professores que os tornem capazes de assumir o importante
papel na dinâmica das necessárias transformações educacionais.

Diante deste contexto, evidenciou-se que estudos, eventos e pesquisas3


revelam que as políticas educacionais e os seus resultados na prática cotidiana das
escolas em geral, ocuparam um lugar de destaque no debate educacional
contemporâneo, no entanto, apesar da implementação e efetivação dessas políticas
referentes à formação de professores, o que se vivencia de acordo com esses estudos,
são situações que demonstram que tais políticas não têm causado impactos
significativos ante os problemas relacionados ao desenvolvimento da Didática e da
Prática de Ensino com vistas para a valorização docente e para a qualidade do ensino.
E é justamente diante deste cenário que surge a problemática deste estudo, o
qual pretende apresentar o modo de funcionamento, intencionalidades e a abrangência
deste Plano Educacional do Ministério da Educação diante da demanda por formação
docente no Estado do Pará em relação aos aspectos quantitativos.
Como objetivo geral pretende-se: Analisar e compreender o Plano Nacional
de Formação dos Professores da Educação Básica (PARFOR) como uma política
organizacional do Ministério da Educação (MEC) e como objetivos específicos
pretende-se: 1) Caracterizar a realidade na qual se inserem as atuais políticas
educacionais para a formação de professores no Estado do Pará; 2) Apresentar os
resultados a partir dos aspectos quantitavos diante da formação docente e 3) Contribuir
para o repensar crítico e consistente de tais políticas educacionais e seu
desenvolvimento diante da necessidade de melhoria da qualidade do ensino.
3
Sobre isto verificar COLARES; COLARES, 2013; GATTI; BARRETO; ANDRÉ, 2011; DI GIORGI et
al., 2010; GATTI, 2009.
416

Di Giorgi et al. (2010, p.15), ao se referir a formação contínua de


professores defende que a mesma pode ser definida como “um processo constante do
aprender a profissão de professor, não como mero resultado de uma aquisição
cumulativa de informação, mas como um trabalho de seleção, organização e
interpretação da informação”.
Portanto, percebe-se que apesar da implementação e efetivação de algumas
políticas educacionais referentes à formação de professores, o que se vivencia no
cotidiano de nossas escolas, são situações que revelam que os problemas relacionados à
formação docente, estão além de serem resolvidos, ou ainda minimizados.
Dessa forma, essas políticas educacionais em torno da formação/capacitação
de professores da Educação Básica continuam sendo implantadas e implementadas na
intenção de melhorar a qualidade da formação dos professores e consequentemente
melhorar a qualidade do ensino ofertado pelos mesmos, como é o caso do Plano
Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica (PARFOR).
Gatti (2012, p. 19), levando em consideração as pesquisas dentro do campo
educacional sobre as políticas de ensino afirma que
no concerto das políticas de ensino especialmente das políticas de formação
de professores, a força do campo ou a sua fraqueza tem a ver com seu
impacto e relevância.

Assim, este artigo visa analisar e compreender o Plano Nacional de


Formação dos Professores da Educação Básica (PARFOR) como uma política
organizacional do Ministério da Educação (MEC) através da realização de um estudo
bibliográfico, histórico e crítico sobre este Plano, visando desta forma, contribuir para o
repensar crítico e consistente das políticas educacionais e seus desdobramentos diante
da necessidade de formação docente e consequente melhoria da qualidade da educação
básica.

O Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica no Estado do


Pará: Organização e Abrangência

A partir da promulgação da Lei 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases para


Educação Nacional (LDB) intensificaram-se as ofertas de Educação Superior no Brasil,
a qual abriu precedentes para tal intensificação após apresentar orientações e a
necessidade de que os docentes deveriam possuir no mínimo uma licenciatura para
atuarem na Educação Básica.
417

Assim, a LDB em seu título VI o qual trata dos Profissionais da Educação,


em seu artigo 62 estabelece que:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível


superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e
institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o
exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do
ensino fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade normal.

Diante da necessidade de formação dos profissionais do Magistério e ainda


de uma busca incessante pela melhoria da qualidade do ensino no contexto brasileiro, o
Ministério da Educação (MEC), propõe um conjunto de ações em parceria com as
Secretarias de Educação Municipais e Estaduais, na intenção primordial de melhorar a
qualidade da formação dos professores atuantes na Educação Básica pública do país,
estabelecendo os seguintes critérios:

Art. 3º. São objetivos da política nacional de Formação de Profissionais do


Magistério da Educação Básica:
I – Promover a melhoria da qualidade da educação básica pública;
II – Apoiar a oferta e expansão de cursos de formação inicial e continuada a
profissionais do magistério pelas instituições públicas de educação superior;
III – Promover a equalização nacional de oportunidades de formação inicial e
continuada dos profissionais do magistério em instituições públicas de
educação superior;[...]
X – Promover a integração da educação básica com a formação inicial do
docente, assim como reforçar a prática da formação continuada.
(BRASIL/MEC, 2009).

De acordo com dados divulgados pelo Ministério da Educação (MEC)


através do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(INEP) sobre o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica de 2007, a educação
básica no Pará aparece situada entre os mais baixos índices nacionais, fortalecendo a
necessidade urgente de atenção no que se refere à qualidade do ensino.
Diante desta realidade, elaborou-se em 2008 o plano estratégico
denominado Plano de Formação Docente do Estado do Pará, sendo participantes deste
processo a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação – UNDIME-PA e o
PROTOCOLO SEDUC-IES constituído por Instituições Públicas de Ensino Superior
(IPES) do Pará e pela Secretaria de Estado de Educação – SEDUC.
Entende-se, portanto, como estabelece este Plano de Formação Docente do
Pará, que os fatores que concorrem para esse cenário são inúmeros, dentre eles podemos
citar ainfraestrutura das escolas, o dimensionamento de pessoal técnico, nível salarial,
assim como o perfil profissional docente.
418

A partir destes dados, o Plano de Formação Docente do Estado do Pará,


sinaliza que
Para solucionar definitivamente esse problema e dar um salto qualitativo em
termos de educação, torna-se necessário intensificar a formação de
professores. É dessa maneira que podemos colaborar efetivamente para o
desenvolvimento de um processo ensino–aprendizagem mais identificado
com os objetivos da educação, da sociedade e da realidade regional.

Assim, para melhor gerenciamento dessas ações educativas no estado, a


SEDUC-PA estabeleceu domínios de gestão denominados Unidades Regionais de
Educação – URE. Onde de acordo como Plano de Formação Docente do Estado do Pará
cada URE congrega municípios próximos com características geográficas semelhantes.
Assim sendo, os 143 municípios4 que até então formavam o estado do Pará estavam
organizados em 20 URE. Cada URE tem como pólo um dos municípios que a compõe.
A partir dessas ações os dados do Educacenso5 2007 revelaram ainda que
apenas 10% das funções docentes exercidas na Educação Básica no Estado do Pará são
desempenhadas por professores com formação inicial adequada, a grande maioria
necessita de formação inicial por não serem graduados ou por terem sidos graduados em
área distinta de sua atuação, o que por sua vez apresenta-se como um fator que pode
comprometer o desempenho dos professores diante do fazer pedagógico em sala de
aula, e consequentemente a qualidade do ensino.
Sendo esta uma realidade vivenciada não somente pelo estado do Pará, mas
em conformidade com a situação nacional, o Ministério da Educação – MEC, em
parceria com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –
CAPES, apoiado pelo Decreto 6.755/2009 implementou o Plano Nacional de Formação
de Professores da Educação Básica – PARFOR na intenção de transformar a realidade
apresentada.
De acordo com dados disponíveis no site do Ministério da Educação
(MEC), até o ano de 2012, o PARFOR implantou 1920 turmas em todo o Brasil.
Atendendo desta forma, 54.000 professores da educação básica, os quais frequentam os
cursos em turmas especiais, localizadas em 397 municípios do País.
Algumas aproximações teóricas concernentes ao Plano Nacional de
Formação dos Professores da Educação Básica (PARFOR), foco principal desta análise
serão necessárias, para que a partir desses conceitos, ideias e dados, possa-se

4
Hoje o Estado do Pará conta com 144 municípios após a criação do Município de Mojuí dos Campos, o
qual compõe a URE do município de Santarém.
5
Levantamento de dados educacionais realizado no Brasil pelo Ministério da Educação.
419

compreender melhor sobre sua aplicação prática, seu alcance e suas possíveis
contribuições para a melhoria da qualidade da educação no estado do Pará.
Ao analisar a dinâmica do PARFOR, em sua modalidade presencial,
entendeu-se que o mesmo possui caráter emergencial, o qual foi instituído para atender
o disposto no artigo 11, do Decreto nº 6.755, de 29 de Janeiro de 2009, que em seu
inciso III, estabelece:

Oferta emergencial de cursos de licenciaturas e de cursos ou programas


especiais dirigidos aos docentes em exercício há pelo menos três anos na rede
pública de educação básica, que sejam: a) graduados não licenciados; b)
licenciados em área diversa da atuação docente; e c) de nível médio, na
modalidade Normal;

O Decreto estabelecido por este Plano, em seu artigo 2º, inciso I, institui:
“A formação docente para todas as etapas da educação básica [...], buscando assegurar
o direito das crianças, jovens e adultos à educação de qualidade”. E ainda seu artigo 3º,
inciso I, estabelece o objetivo de: “promover a melhoria da qualidade da educação
básica pública”.Cabendo à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES), através do FNDE, o financiamento deste Plano e a
operacionalização do processo através da Plataforma Freire6, na qual os professores se
inscrevem, tendo como parâmetro os dados do Educacenso e validação realizada pelas
Secretarias Estaduais e Municipais de Educação.
Entende-se, portanto, que este plano está disposto com o objetivo principal
de induzir e fomentar a oferta de educação superior, gratuita e de qualidade, para
professores em exercício na rede pública, na intenção de que estes profissionais possam
contribuir para a melhoria da qualidade da educação básica no Brasil.
No entanto, apesar dos objetivos anunciados, ao observamos tal política de
formação de professores em sua totalidade, percebe-se que a mesma está impregnada de
valores que revelam uma educação marcada pelo utilitarismo pragmático requisitado
pelo mercado capitalista na busca de uma produtividade lucrativa, uma vez que esses
profissionais encontram-se em serviço, sendo necessário estudar durante seu período de
recesso e de férias.
Levando em consideração, tal condição dos profissionais que compõem este
Programa, os quais encontram-se em pleno exercício de sua profissão sendo
formados/capacitados para atuarem em escolas diversas, Arroyo (2008, p. 12), defende

6
Sistema eletrônico criado em 2009 pelo Ministério da Educação, com a finalidade de realizar a gestão e
acompanhamento do Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica – PARFOR.
420

que “parte-se sempre da ideia de organizar um currículo que os capacite para lecionar
em qualquer escola, seja da cidade ou do campo, das periferias urbanas, seja para
indígenas ou jovens e adultos”.
Apesar dos indicativos expostos acima por Arroyo (2008), percebe-se
através da análise desta política para a formação docente que a mesma configura-se
essencialmente pela oferta de cursos emergenciais descontextualizados da realidade dos
docentes, pois apesar deste Plano contemplar professores que estão atuando em sala de
aula o Decreto que o fundamenta não apresenta objetivos que estejam vinculados com
os saberes, experiências e com o contexto de trabalho dos mesmos.
No entanto, importa-nos demonstrar aqui não somente a fragilidade deste
Plano, mas principalmente sua abrangência no que se refere à formação de professores
em caráter quantitativo. A Região Norte, onde se localiza o estado do Pará, até o ano de
2012 já apresentava o maior número de professores frequentes e atendidos pelo
PARFOR, como mostra o gráfico abaixo:

Gráfico 01: Número de professores contemplados pelo PARFOR por região até o ano de
2012.

28073

20781

3422
1847
753

Norte Nordeste Centro-Oeste Sul Sudeste


Fonte: Plataforma Freire

As instituições integrantes do PARFOR no Estado do Pará são: a


Universidade do Estado do Pará (UEPA), o Instituto Federal de Educação Ciência e
Tecnologia (IFPA), a Universidade Federal do Pará (UFPA), a Universidade Federal
Rural da Amazônia (UFRA), a Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) e a
Secretaria de Educação do Estado do Pará (SEDUC).
421

De acordo com dados disponíveis no site da SEDUC/PARFOR, dentre os


144 municípios existentes no Estado do Pará, do ano de 2009 até o ano de 2014 o
PARFOR está presente em 71 municípios, tendo organizado 571 turmas, credenciadas
por diferentes Instituições Públicas de Ensino Superior (IPES).
Percebe-se, então, que este Plano de Formação Docente está presente em
vários municípios no Estado do Pará, ofertando desta forma,uma quantidade
significativa de cursos em áreas diversificadas, credenciados por cinco Instituições de
Ensino Superior, somando um total de 29 cursos, conforme demonstra a tabela abaixo:

Tabela 04: Cursos ofertados pelo PARFOR no Estado do Pará.


Nº CURSOS OFERTADOS
01 Artes – Dança
02 Artes – Música
03 Artes – Teatro
04 Artes – Visuais
05 Biologia
06 Ciências da Religião
07 Ciências Naturais
08 Ciências Naturais – habilitação em Biologia
09 Ciências Naturais – habilitação em Física
10 Ciências Naturais – habilitação em Química
11 Computação
12 Educação do Campo
13 Educação Física
14 Filosofia
15 Física
16 Geografia
17 História
18 Integrado em Educação Ciências Matemática e Linguagem
19 Integrado em História e Geografia
20 Integrado em Letras Português e Inglês
21 Integrado em Matemática e Física
22 Integrado em Química e Biologia
23 Letras-Língua Espanhola
24 Letras-Língua Inglesa
25 Letras-Língua Portuguesa
26 Matemática
27 Pedagogia
28 Química
29 Sociologia
Fonte: Plataforma Freire.

Evidencia-se, portanto, que o número de municípios onde o PARFOR está


presente no estado do Pará é muito relevante, somando um total de 71 municípios, com
422

a organização e implantação de 571 turmas e 29 cursos em áreas distintas, o que por sua
vez, justifica também o elevado número de professores formados/capacitados por este
Plano na região Norte do país, onde está localizado o estado do Pará.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos resultados desta pesquisa é possível compreender que o


surgimento do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica
(PARFOR) se deu a partir da necessidade de formar/capacitar docentes, com objetivos
primordiais de melhorar a qualidade do ensino e valorizar esses profissionais.
Os dados revelam que este Plano de Formação de Professores tem alcançado
resultados numéricos relevantes, pois entre os 144 municípios que compõem o Estado
do Pará o PARFOR até o ano de 2014 encontra-se presente em 71 municípios com a
implantação de 571 turmas e ofertando 29 cursos em áreas diversas.
Por outro lado, o que se percebe é que desde a sua gênese até a sua
implantação e implementação são ínfimas as evidências que revelam a participação
direta e/ou indireta dos professores no que diz respeito à definição e construção desta
política de formação docente, assim como não foi possível evidenciar relações da
mesma com a prática desses profissionais diante das reais condições de trabalho no
cotidiano escolar, o que por sua vez, a fragiliza e a torna motivo de muitas dúvidas e
questionamentos quanto às expectativas relacionas às mudanças efetivas em sala de aula
para a melhoria da qualidade do ensino.
Com relação a esta limitada e às vezes ausente participação dos professores
na definição de políticas de formação docente Gatti e Barreto (2009, p. 201-202)
apontam que os professores “não se envolvem, não se apropriam dos princípios, não se
sentem estimulados a alterar sua prática, mediante a construção de alternativas de ação,
ao mesmo tempo em que se recusam a agir como meros executores de propostas
externas”.
Desta forma,entende-se que a formação desses profissionais não se
apresenta como garantia suficiente de que a educação terá qualidade em sua aplicação
prática, ou seja, no cotidiano escolar, torna-se necessário ainda um estudo para verificar
a forma como esses profissionais socializam e desenvolvem os conhecimentos
adquiridos ao longo de sua formação e quais as reais implicações efetivas no âmbito das
transformações sociais no “chão da escola”.
423

Enfim, acredita-se que o estudo sobre esta Política Educacional de formação


de professores, poderá contribuir com estudos posteriores, os quais poderão
fundamentar-se na coleta de dados a partir de uma pesquisa de campo, e assim,
possibilitar um aprofundamento teórico-metodológico sobre a aprendizagem adquirida
por esses profissionais ao longo de sua formação diante de sua ação pedagógica, e ainda
uma reflexão prática sobre a dinâmica de funcionamento da mesma como agente
impulsionador do trabalho docente e da qualidade do ensino, e assim, viabilizar uma
análise crítica atual da própria Política no contexto educacional brasileiro,
especificamente no estado do Pará. Pois, embora ainda não se possa mensurar o
potencial desta Política de Formação Docente como alternativa ou solução para
minimizar os problemas educacionais que favoreça para uma educação de qualidade no
estado do Pará, é importante destacar que o percentual elevado de professores que estão
sendo formados pela mesma apresenta-se como um avanço significativo para que esta
melhoria seja vislumbrada na prática.

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Comunicação

Formação de professores em São Paulo: entre o efetivado e o prescrito –

Elianeth Dias Kanthack Hernandes


UNESP/Marília
Ana Clara Bortoleto Nery
UNESP/Marília
CEPAE

Resumo: Esse texto é resultado de investigação que teve a finalidade de discutir a


proposta de formação de professores para exercício na educação básica, no Estado de
São Paulo, presente na Deliberação n. 111/2012 e a formação realizada nos cursos de
Pedagogia das universidades estaduais, em particular, da Unesp. A pesquisa permitiu
analisar o que está no cerne das determinações oriundas do Conselho Estadual de
Educação de São Paulo na formulação das Diretrizes Curriculares fixadas na
Deliberação n° 111/2012. Qual é a base epistemológica da Deliberação? A forma como
o currículo é ali tratado aponta para uma perspectiva de formação de professores como
intelectuais, sujeitos capazes de desenvolver um processo de ensino de qualidade? O
currículo proposto tem alguma aproximação com o que consta nos Projetos Políticos
Pedagógicos das instituições formadoras que têm sido avaliadas como de excelência nos
diferentes sistemas avaliativos aos quais se submetem atualmente os Cursos Superiores?
Para responder a essas questões realizamos uma revisão bibliográfica do conhecimento
já produzido na área e uma análise documental para referendar as respostas
encontradas. Dentre os resultados podemos afirmar que ao determinar como deve ser a
organização dos currículos dos cursos de Formação de Professores para a Educação
Básica, a citada Deliberação ignora aspectos históricos, conceituais e contextuais que
estruturam a organização atual desses cursos, bem como desconsidera muito do
conhecimento científico, já produzido, em diferentes momentos e espaços acadêmicos.
Palavras-chave: Formação docente, Diretrizes Curriculares, Reforma Educacional.
426

1. Introdução

Atualmente o ensino superior no Brasil está inserido em um quadro bastante


desafiador por receber tanto as inúmeras demandas de cunho social e de caráter
pedagógico, como as demandas oriundas dos setores econômicos e dos
direcionamentos nem sempre coerentes das políticas governamentais. Nesse contexto, a
educação superior no país está contida em um cenário que envolve diversos atores, com
diferentes propósitos e perspectivas, o que faz desse nível de ensino uma área complexa,
envolvida num jogo político nem sempre fácil de ser entendido ou analisado. Com este
texto nos propomos ao desafio de refletir sobre os direcionamentos que têm sido dados
aos cursos de licenciatura, pelos gestores da política educacional no Estado de São
Paulo.
Com a intenção de contribuir para o debate acerca da formação de professores
para a educação básica no Brasil, elegemos como objeto de estudo, neste trabalho
investigativo, as determinações legais oriundas de normatização que o Conselho
Estadual de Educação de São Paulo publicou, em 14/03/2012, sob a denominação de
Deliberação CEE n° 111/2012. O caput desse documento legal anuncia sua finalidade
como sendo a de fixar Diretrizes Curriculares Complementares para a Formação de
Docentes para a Educação Básica nos Cursos de Graduação de Pedagogia, Normal
Superior e Licenciaturas, oferecidos pelos estabelecimentos de ensino superior
vinculados ao sistema estadual.
Este artigo tem como ponto de partida a importância da formação inicial do
professor, considera avanços significativos nessa área de conhecimento, assim como
no campo do currículo e do saber docente, os quais, articulados podem oferecer maior
compreensão dos efeitos que a implementação das novas diretrizes curriculares para o
curso de Pedagogia, propostas pela Deliberação 111/2012, podem acarretar na formação
inicial dos futuros profissionais da educação.
Embora não possam ser respondidas plenamente nos limites deste trabalho, as
problematizações e questões que serviram como balizadoras para a estruturação do
estudo do tema proposto, bem como para a organização deste texto, são as seguintes:. 1)
quais são as questões estruturantes e a base epistemológica dessa Deliberação? 2) a
forma como o currículo é ali tratado aponta para uma perspectiva de formação de
professores como intelectuais, com fundamentação teórica consistente, sujeitos capazes
de desenvolver um processo de ensino que garanta uma aprendizagem de qualidade? 3)
427

o currículo proposto na nova norma tem alguma aproximação com o que consta nos
Projetos Políticos Pedagógicos das instituições formadoras que têm sido avaliadas como
de excelência nos diferentes sistemas avaliativos aos quais se submetem atualmente os
Cursos Superiores? 4) passados mais de 150 anos dos primeiros cursos de formação de
professores para a Escola Primária em São Paulo, a evolução do conhecimento da área
de Educação e as várias reformas educativas, que análise podemos fazer da atual
proposta?
Para tentar responder a essas questões, realizamos uma revisão bibliográfica do
conhecimento já produzido na área, bem como, procedemos uma análise documental na
busca de dados que referendassem as respostas encontradas. Procuramos, dessa forma,
estabelecer relação entre as demandas de professores e alunos dos cursos de Pedagogia
das universidades estaduais paulistas, as concepções de formação docente e organização
curricular explícitadas nos documentos legais que são objeto desse estudo (Deliberação
CEE nº 111/2012 e Portaria CEE/GP nº 441/2012) e as possibilidades que podem advir
desse contexto desafiador e complexo.
Para encaminhar a pesquisa, também selecionamos documentos que estruturam
o Curso de Pedagogia da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP/Marília - o
Projeto Político Pedagógico, os relatórios dos sistemas avaliativos internos e externos
(ENADE, Guia do estudante e Comissão Permanente de Avaliação – CPA) - e os
analisamos numa perspectiva problematizadora e reflexiva, a fim de compreender suas
determinações históricas e contextuais, na tentativa de desvelar as concepções e
direcionamentos para a educação e a formação de professores.
Outro levantamento feito para ampliar a consistência de nossas conclusões foi a
de buscar a relação existente entre o desempeho no IDESP – Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica - das instituições de ensino da região de Marília,
e o número de alunos egressos do Curso de pedagogia da FFC/Marília que atuam como
educadores nas escolas com alto desempenho.
Os temas de estudo que escolhemos para ampliar o nosso olhar sobre esse objeto
de conhecimento foram os seguintes: 1) Formação de professores - com destaque para
as contribuições resultantes da investigação do contexto da realidade concreta,
articulando-a com as determinações mais amplas (SAVIANI, 1996; TARDIF, 2002); 2)
Reforma Curricular – entendendo que diferentes currículos formam diferentes pessoas e
que isso implica enxergá-lo como um processo social constituído de conflitos e lutas
entre diferentes tradições e concepções sociais, como afirma Ivor F.Goodson (2012); 3)
428

Avaliação Educacional em .Larga Escala – como prática que incorpora concepções,


tensões e que é reveladora de vínculos e de posicionamentos muitas vezes antagônicos
(AFONSO, 2000); e Pedagogia - como sendo a educação que pensa a si mesma, ou seja,
que fala para si, se avalia e se imagina, ou seja, um campo que se mostra pelas
diferentes vertentes construídas ao longo da história , na busca de traduzir como o
conhecimento humano se constitui. (GATTI, 2012).

O Currículo proposto e o currículo vivenciado: contradições explícitas


Os debates sobre o currículo nos cursos de licenciatura tem assumido maior
destaque nos últimos anos no Brasil, principalmente motivados pelas variadas alterações
que as propostas curriculares oficiais buscam implementar por diferentes textos legais.
Além dos vários direcionamentos, que contemplam diferentes perspectivas, a questão
dos currículos nos cursos destinados à formação de professores sofre os efeitos dos
múltiplos enfoques teóricos que se desdobram e se reorganizam em uma variedade de
concepções e pressupostos. Concordamos com Lopes e Macedo (2010) quando
afirmam que a marca do campo do currículo no Brasil é o hibridismo.[...] um campo
mais assinalado pela diversidade orgânica do que pela uniformidade.[...] um campo
contestado em que se misturam influências, interdependências, rejeições (p.47).
O que está acima afirmado ficou evidenciado nos estudos que foram realizados
com os representantes dos Conselhos dos seis Cursos de Pedagogia dos seis campi da
UNESP1 que oferecem esse curso, com a finalidade de analisar os currículos que
estavam sendo implementado em cada um desses espaços acadêmicos, na tentativa de
/reformulá-los em um processo negociado de articulação entre eles. Esse movimento
reflexivo de olhar de forma mais detalhada e aprofundada sobre o que estava sendo
vivido por nossos alunos no percurso escolar, possibilitou concluirmos o quanto
estamos imersos em um contexto híbrido e plural, com múltiplos enfoques e
perspectivas.
A diferença se manifesta tanto na carga horária quanto nas outras categorias de
análise que os representantes dos Conselhos de Curso de Pedagogia levantaram para
proceder o estudo dos PPP com a finalidade de repensar a organização curricular dos
cursos. Alguns destaques dessas especificidades dos cursos merecem ser dados aqui,
tais como, o da diversidade de denominação dada aos componentes curriculares que

1
Localizados nas Unidades de Araraquara, Bauru, Marília, Presidente Prudente, Rio Claro e São José do
Rio Preto
429

compõem a matriz de cada curos; a ênfase em diferentes áreas do conhecimento com


destinação de carga horária diferenciadas. A diversidade identificada nas matrizes
curriculares dos seis cursos de Pedagogia da mesma universidade – UNESP – nos
remete à necessidade de explicitar que todos esses cursos foram normatizados pelos
mesmos documentos legais2. Cabe aqui uma questão: Por que respostas tão
diferenciadas para um mesmo arcabouço legal? Ivor F. Goodson (2012) nos auxilia a
pensar sobre isso quando afirma::
Uma história do currículo que se limitasse a buscar o lógico e o
coerente estaria esquecendo precisamente o caráter caótico e
fragmentário das forças que o moldam e o determinam.(p.9)
É igualmente importante que uma história do currículo não se detenha
nas deliberações conscientes e formais a respeito daquilo que deve ser
ensinado nas escolas, tais como leis e regulamentos, instruções,
normas e guias curriculares, mas que investigue também os processos
informais e interacionais pelos quais aquilo que é legislado é
interpretado de diferentes formas, sendo frequentemente subvertido e
transformado.(p.9).

Nesta direção, com os estudos realizados, de forma conjunta pelos Conselhos de


Curso, foi possível compreender que as diferenças detectadas na organização curricular
dos cursos, estava diretamente relacionada aos processos informais, interacionais,
históricos e contextuais vivenciados em cada campus. Cada uma das especificidades
identificadas era referente a uma história e a um contexto.
Quando esse processo de reflexão coletiva sobre a possível articulação entre os
currículos dos cursos de pedagogia da UNESP ganhava maior consistência e
significação, fomos surpreendidos pela aprovação da Deliberação CEE-SP 111/2012
promulgada pela Resolução SEE-SP de 14/03/2012, fixando Diretrizes Curriculares
Complementares para a Formação de Docentes para a Educação Básica nos Cursos de
Graduação de Pedagogia, Normal Superior e Licenciaturas, oferecidos pelos
estabelecimentos de ensino superior vinculados ao sistema estadual.
A reação da comunidade acadêmica das universidades públicas paulistas foi
imediata. Com relação aos cursos de Pedagogia, ficou evidenciado que existe uma
profunda irreconciliável distância entre o que determina a citada Deliberação e o que
propõem os projetos políticos pedagógicos dos cursos. Os argumentos que referendam
esta afirmação foram amplamente divulgados entre a comunidade acadêmica e,

2
LDB - nº 9394/96; Parecer nº 009/2001 do CNE; Resolução do Conselho Nacional de Educação/Câmara
de Educação Básica - CNE/CEB nº 02/2001 e a Resolução do Conselho Nacional de Educação/Conselho
Pleno - CNE/CP nº 01/2002
430

inclusive encaminhados ao Conselho Estadual de Educação na forma de vários


documentos formulados com essa intenção, tais como: a Carta Aberta da
UNESP/Marília; o Manifesto da UNICAMP, a Moção de Repúdio do Conselho de
Curso da UNESP/Presidente Prudente, a Moção de Repúdio da FEUSP, o Manifesto da
Comissão de Cursos de Licenciatura das UNESP, e a Solicitação do Fórum das
Universidades Públicas no Estado de São Paulo – Em Defesa da Educação Pública ao
Conselho Estadual de Educação. Quando esse registro de pesquisa estava sendo
concluído, tomamos conhecimento de que o Conselho de Reitores das Universidades
estaduais Paulistas – o CRUESP – encaminhou no dia 28 de junho de 2013, um ofício
ao Conselho Estadual de Educação de São Paulo, requerendo a revogação da
Deliberação 111/12 e solicitando:
Que sejam reabertos os canais de diálogo entre representantes das
universidades e o CEE, com o único e claro objetivo da construção
fundamentada de referências exequíveis e compromissadas do Estado
de São Paulo, através dos seus órgãos educacionais (Universidades) e
normativos (CEE) para com a educação pública e de qualidade para
todos (CRUESP – 28/06/2013).

Nos documentos acima mencionados fica evidenciado o descontentamento da


comunidade acadêmica com o fato de que a Deliberação nº 111/12, na direção oposta da
legislação que a antecedeu (Del. CEE nº 78/2008), deixa de explicitar que, para
atendimento ao que está previsto naquela norma legal, está ressalvada a autonomia
universitária. A Constituição Federal ao determinar, em seu artigo 207: “As
universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão
financeira e patrimonial,[...]”, garante que as normatizações complementares não
contrariem esse princípio constitucional.
Uma outra questão proposta na Deliberação CEE 111/12 que foi rejeitada por
todos representantes das universidades estaduais de São Paulo foi o fato de o texto
trazer de volta a dualidade na formação de professores das séries iniciais do Ensino
Fundamental e da Pré-Escola possibilitando que ela ocorra em dois cursos diferentes –
Normal Superior e Pedagogia. Os questionamentos que surgiram a partir dessa
proposição foram os seguintes: Que vantagem essa dualidade pode trazer? A formação
de docentes para os demais conteúdos curriculares não é feita sempre numa determinada
licenciatura? Duas licenciaturas com nomes diferentes não sugerem uma indefinição no
caráter da formação que se pretende? É preciso esclarecer que apesar dos estudos
intensivos que foram feitos em vários encontros organizados para esse fim não foi
431

possível encontrar respostas a esses questionamentos no texto da Deliberação e nem em


outros documentos oriundos do Conselho Estadual de Educação.
Nos estudos que realizamos para o desenvolvimento dessa pesquisa, entendemos
que fica explícita, no texto da Deliberação 111/12, uma tentativa de resolver problemas
oriundos da formação dos concluintes do Ensino Médio, por meio dessa proposta de
reorganização da matriz curricular das licenciaturas. Isso se evidencia no inciso I do
artigo 4º, quando a Deliberação preve a destinação de 800 horas da carga horária do
curso de Pedagogia para a formação científico-cultural dos alunos. Já o artigo 5º registra
que a formação científico-cultural tem por objetivo ampliar a formação obtida no ensino
médio [...].É importante definir se esta proposta não fica alicerçada no esvaziamento de
conteúdos de fundamento para a formação dos futuros educadores para atender o
objetivo de garantir aos alunos de Pedagogia os conhecimentos científicos-culturais que
não foram devidamente aprendidos na Educação Básica. A formação profissional desse
segmento pode ficar prejudicada, quando a ênfase da reforma curricular proposta recai
na apropriação de “competências especificamente voltadas para a prática da docência e
da gestão do ensino” (Art. 6º) – saber fazer - e não dos conhecimentos necessários e
essenciais ao trabalho docente e atuação educativa competentes e compromissadas com
a uma educação plena.
Sobre esse viés na formação profissional dos educadores, Freitas (2002, p. 148)
já denunciava que, as atuais políticas para os cursos de graduação retiraram da formação
dos professores a formação científica e acadêmica própria do campo da educação,
transferindo-a para o campo do conhecimento relacionado à epistemologia da prática.
Para Brzezinski (2008), prevalece no Brasil uma política para a educação que resulta de
um jogo de forças opostas entre os interesses do governo e os da sociedade ao formar o
professor.
Na continuidade dos embates entre as decisões do CEE/SP e as argumentações
dos representantes dos cursos de Pedagogia das universidades estaduais paulistas, em
02/10/2012, aquele órgão normativo publica a Portaria CEE/GP nº 441, designando uma
Comissão de Conselheiros com as seguintes finalidades:
I- promover uma melhor compreensão da Deliberação CEE nº
111/2012, apresentando as concepções de formação de professores
que a fundamentaram, tendo em vista acompanhar as discussões e
responder as dúvidas e questionamentos das instituições de ensino
superior”;
II- “traçar um painel das principais tendências e iniciativas sobre
formação de professores presentes no Brasil e no exterior, tendo em
432

vista identificar resultados ou conclusões que poderiam informar uma


política de formação de professores para o Estado de São Paulo.
(Portaria CEE/GP nº 441/2013).

Ao analisar a forma como esse texto legal foi redigido fica evidenciado que o
Conselho Estadual de Educação desconsiderou os exaustivos estudos feitos, em
diferentes momentos e espaços acadêmicos, para estudo e análise da referida
Deliberação. Ao admitirem pretender ‘promover uma melhor compreensão da
Deliberação CEE nº 111/2012, apresentando as concepções de formação de
professores que a fundamentaram’, os legisladores confirmaram o fato de que essas
diretrizes foram elaboradas sem nenhuma participação efetiva daqueles que realmente
deveriam fazê-lo, ou seja, a comunidade acadêmica envolvida com a pesquisa e a
prática de formação de educadores. Se tivesse ocorrido essa participação, tão oportuna
quanto necessária, não haveria a necessidade, declarada na Portaria CEE/GP nº 441, de
‘promover uma maior compreensão’ e apresentar as ‘concepções de formação [...] que
a fundamentaram’, já que os que participaram da elaboração do referido documento
devem compreendê-lo, bem como, devem conhecer as concepções de formação que o
embasam.
O inciso II da Portaria CEE/GP nº 441, ao destacar que a Comissão Especial foi
designada também com a intenção de traçar um painel das principais tendências e
iniciativas [...] tendo em vista identificar resultados ou conclusões que poderiam
informar uma política de formação de professores para o Estado de São Paulo, indica
que esses estudos não foram realizados antes da elaboração da Del. CEE 111/12. Se a
coleta desses dados é importante para informar uma política de formação de
professores, como está afirmado, entendemos que esse procedimento deveria, entre
outros, ter antecedido a formulação das novas diretrizes curriculares publicadas pelo
Conselho Estadual de Educação.
Ao destacar a importância da identificação de resultados para informar uma
política de formação de professores, o legislador nos instigou a pesquisar os resultados
alcançados pelo curso de Pedagogia da FFC/UNESP, na tentativa de tentar explicitar se,
e como, esses dados poderiam subsidiar as tomadas de decisão para uma política de
formação de professores.
433

O estudo a partir do contexto do curso de Pedagogia da FFC/ Marília


A opção por colocar foco, de forma específica, no curso ministrado na
UNESP/Marília, está embasada no fato das pesquisadoras ministrarem aulas nessa
instituição e estarem vivenciando, desde a publicação da nova legislação que determina
as diretrizes curriculares para as licenciaturas no Estado de São Paulo, o esforço de
alunos e professores,desse campus, no sentido de buscarem alternativas para uma
proposta negociada, em que fosse possível chegar a uma visão mais democrática dessa
política de reforma curricular, visando a racionalização e o embasamento, tanto das
decisões da administração central como as decisões dos contextos escolares
(MOREIRA, 2012, p. 181).
Outro fator que direcionou o nosso olhar para a especificidade do que ocorre na
FFC/UNESP/Marília foi o fato de o Curso de Pedagogia dessa instituição, ter obtido,
nos últimos anos, os melhores resultados nas avaliações externas e internas a que tem
sido submetido (ENADE, Guia do estudante e Comissão Permanente de Avaliação –
CPA) e seus alunos egressos terem uma atuação numericamente significativa e
importante na rede municipal de ensino de Marília, que tem obtido desempenho
considerado excelente no IDEB - Índice de Desenvolvimento da Educação Básica.
Ao analisarmos o que está definido no Projeto Político Pedagógico da
FFC/Marília, encontramos a proposta de: Nos quatro anos exigidos para a formação do
pedagogo será enfatizada a formação para a atuação docente na Educação Infantil e
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental e para a Gestão Educacional, conforme
definido pelas Diretrizes Curriculares para os Cursos de Pedagogia. Ao fazermos o
levantamento dos alunos egressos do curso, fica constatado que eles representam a
maioria dos profissionais que atuam na rede municipal de ensino de Marília/SP. Vale
aqui o destaque que esse município tem obtido sistematicamente excelentes médias no
Indice de Desenvolvimento da Educação Básica –IDEB – (6,4, em 2012). Por mais que
tenhamos motivos para relativizar os índices de avaliação externa em larga escala,
entendemos que a ênfase dada, no PPP do curso de Pedagogia da UNESP/Marília, tem
resultado em uma formação do profissional que tem sido condizente com demandas da
formação dos alunos das séries iniciais da Educação Básica.
Com relação a esses resultados obtidos em sistemas avaliativos, concordamos
com Afonso (2000) quando denuncia a função coercitiva e controladora do Estado ao
implementar esses sistemas de avaliações em larga escala, Sabemos ainda, que os
resultados obtidos nesses processos avaliativos, por si só, não representam mais do que
434

podem, ou seja, são indicadores, nem sempre confiáveis ou consistentes, que podem ser
utilizados em diferentes perspectivas e intenções, e não representam, quando registram
resultados positivos, a garantia de um processo educacional plural e justo.
Nessa perspectiva, apesar de conscientes do fato de o curso de Pedagogia da
FFC/UNESP-Marília ter obtido conceito 5 no ENADE, 5 estrelas no Guia do Estudante
e conceito A na avaliação institucional realizada pela Comissão Permanente de
Avaliação, não significa, por si só, a garantia da qualidade necessária e desejável para a
formação dos futuros educadores, não podemos deixar de entender que esses dados
deveriam ser considerados pela instituição responsável pela normatização das diretrizes
curriculares para essa licenciatura, quando fosse proceder a identificação de resultados
para informar uma política de formação de professores.Uma reforma curricular que
desconsidere a historicidade de currículos existentes, como é o caso da FFC/Marília, vai
na direção do que denuncia Carlos Skliar (2010) de que sujeitamo-nos a transformar a
transformação esquecendo – ou melhor, negando – todo ponto de partida (p. 196-197)
Ao fazer a denuncia da inconsistência da mudança sem origem, esse autor nos
ajuda a compreender a razão de ter havido uma rejeição explícita ao que os legisladores
propuseram no texto da Deliberação 111/12. Ao impor uma mudança profunda no
currículo dos cursos de formação de professores o texto legal desconsiderou os fatores
históricos e contextuais que têm sido construídos ao longo dos mais de 150 anos de
história dos cursos de formação de professores primários. Isso aconteceu porque não
foram ouvidos aqueles que fazem parte desse contexto e dessa história, ou seja, alunos e
professores dos cursos de licenciatura das universidades paulistas.
Ao ignorar a perspectiva histórica e contextual dos cursos de formação de
professores nas Universidades Paulistas, o Conselho Estadual de Educação elabora
diretrizes que, se implementadas, desmontariam os Projetos Políticos Pedagógicos
existentes que foram elaborados atendendo às demandas e as especificidades de cada
local de formação. Para exemplificar trazemos o que consta no PPP do curso de
Pedagogia da UNESP/Marília que organiza o seu currículo em 3360 horas (inclusive as
405 de Estágio Supervisionado), sendo, 2955 horas relativas ao ensino do núcleo de
estudos básicos, destinado aos fundamentos da educação; três núcleos de
aprofundamentos dedicados à Educação Infantil, à Educação Especial e à Gestão
Educacional; e o núcleo de estudos integradores, constituído por projetos e programas
de estudos.Já no estabelecido na Deliberação 111/12, a carga horária destinada a essa
formação seria reduzida para 2000 horas, porque determina que 800 horas sejam
435

dedicadas a formação científico-cultural que tem o objetivo de ampliar a formação


obtida no ensino médio.
Um currículo concebido sem a validação dos que constroem e possuem os
resultados que serviriam para informar uma política de formação de professores, tem
intenções alheias às necessidades daqueles que o vivenciarão. Por isso, concordamos
com Ivor F. Goodson (2012) quando afirma que o currículo escrito não passa de um
testemunho visível, público e sujeito à mudanças, uma lógica que se escolhe para,
mediante sua retórica, legitimar uma escolarização. Como tal, o currículo escrito
promulga e justifica determinadas intenções básicas de escolarização. (p.21).
Ao refletir sobre quais são as intenções básicas de escolarização que nortearam a
elaboração da Deliberação 111/12 temos como hipótese que as concepções que a
orientaram pretendem gradativamente retirar da formação de educadores a sua natureza
científica e acadêmica, inerentes ao campo da educação, focalizando-a em um novo
patamar de conhecimento que é o campo das práticas educativas. Vários estudos vêm
firmando esta perspectiva, fortalecidos pelas reformas educativas das últimas décadas.
Em documento denominado Formação inicial de professores para a educação
básica: uma (re)visão radical que foi elaborado por uma das relatoras da Deliberação
111/12, a Dra. Guiomar Namo de Mello (1999), encontramos, na nossa opinião, o que
fundamenta as propostas de formação de professores contempladas pelas diretrizes
curriculares:
Os professores não são necessários para qualquer projeto pedagógico,
mas para aqueles que vão trabalhar de acordo com as diretrizes
estabelecidas na lei, promovendo a constituição das competências
definidas nas diferentes instâncias de normatização e recomendação
legal e pedagógica, para ensinar e fazer aprender os conteúdos que
melhor podem ancorar a constituição dessas competências. Os
modelos de instituições de formação docente que interessam ao país
são, portanto, aqueles que propiciam ou facilitam a construção de um
perfil de profissional adequado para essa tarefa. (Mello, 1999, p. 10)

A forma como a relatora argumenta nesse documento indica a implementação de


uma política de formação de professores que tem na certificação de competências e na
avaliação seus fundamentos e sua centralidade. Defendemos que é preciso colocar em
foco as construções históricas dos educadores na luta por uma formação docente que
contemple uma outra concepção de educação e de formação, a formação humana e
autônoma. A discussão que foi posta com a publicação da Deliberação 111/12 coloca
em campos antagônicos projetos de educação e formação: por um lado, aqueles que
privilegiam o controle do desempenho com vistas à competência e competitividade e,
436

por outro, projetos que privilegiam os fundamentos e os fins da educação com ênfase na
pesquisa, na investigação e na formação multidisciplinar sólida.

Referências
AFONSO, Almerindo Janela. Avaliação educacional: regulação e emancipação: para
uma sociologia das políticas avaliativas contemporâneas. São Paulo: Cortez, 2000.

BRZEZINSKI, Iria (Org.). LDB dez anos depois: reinterpretação sob diversos olhares.
São Paulo: Cortez, 2008.

CEE/SP. Deliberação CEE Nº 111/12, homologada pela Resolução SE de 14/3/12, e


publicada no DOE de 15/3/2012, seção I, página 44.

FFC/MARÍLIA/UNESP – Projeto Político Pedagógico do Curso de Pedagogia –


Disponível em http://www.marilia.unesp.br/Home/Graduacao/Pedagogia/projeto.pdf. Acesso
em 10/06/2013.

FREITAS, Helena Costa Lopes. Formação de professores no Brasil: 10 anos de embate


entre projetos de formação. Educação & Sociedade, Campinas, SP, v. 23, n. 80, p. 136-
167, set. 2002.

GATTI, Bernadete A. A construção metodológica da pesquisa em educação: desafios.


Revista Brasileira de Política e Administração da Educação. V28.n1, p.13 – 34,
jan/abr 2012.
437

Comunicação

Formação continuada de gestores escolares: o diálogo e a problematização na


construção da prática escolar democrática

Elianeth Dias Kanthack Hernandes


Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (UNESP/Marília).
Centro de Estudos e Pesquisas em Administração da Educação (CEPAE)
Graziela Zambão Abdian
Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (UNESP/Marília).
Centro de Estudos e Pesquisas em Administração da Educação (CEPAE)

Resumo: O presente artigo tem como objetivo geral analisar as possibilidades de


vivência da prática escolar democrática a partir do processo de formação continuada
fundado na dialogicidade problematizadora (FREIRE, 1983), que considerou a escola
como propositora de políticas e práticas na construção de conselhos escolares.
Apresentamos os subsídios teórico-metodológicos de nossa prática, o processo de
concretização no cotidiano de um sistema municipal e os avanços conquistados.
Considerando o que foi registrado no texto, é possível afirmar que o processo
vivenciado indica as reais e talvez novas possibilidades de estabelecimento de uma
práxis educacional baseada, sobretudo, no pensar coletivo da “lógica científica” e da
“lógica da prática cotidiana”.
Palavras chave: Conselhos escolares. Formação continuada de educadores. Prática
escolar democrática.

Introdução:
O elemento propulsor da construção do texto constitui-se, por si, um duplo
desafio. Por um lado, evidencia a complexidade emanada das relações históricas entre
os avanços teóricos da área e os cotidianos das escolas públicas e, por outro, indica-nos
as reais e talvez novas possibilidades de estabelecimento de uma práxis educacional
baseada, sobretudo, no pensar coletivo da “lógica científica” e da “lógica da prática
cotidiana”.
Quando dizemos “lógica científica”, consideramos, com Canário (1996), que a
cientificidade precisa reconhecer algumas idéias para que possam se inserir em um novo
438

paradigma, baseado, sobretudo, no reconhecimento de novas relações entre o


pesquisador e o objeto pesquisado. Para este autor, a primeira é a “ruptura com a idéia
da existência de um one best way” que sinaliza para a necessidade de explicar o objeto e
não dizer o que ele deve ser ou fazer. A segunda diz respeito ao reconhecimento de que
“os saberes científicos estão condenados a ser reciclados sob a forma de senso comum”,
ou seja, o saber científico constitui-se a partir da ruptura do senso comum, mas deve
reencontrar-se com ele, sob uma nova forma. E, finalmente, que a pertinência da lógica
científica é fundada em novas relações entre a prática e a teoria ao considerar que “o
único efeito prático de um saber teórico é dar a conhecer e não a permitir fazer.”
(MAGLAIVE, 1990 I CANÁRIO, 1996, p. 146).
Por sua vez, ao falarmos na “lógica cotidiana”, estamos pensando como “o
conjunto de atividades que caracterizam a reprodução dos homens singulares”
(HELLER, 1977, p. 19) e que traz, para a educação escolar, a possibilidade de
contribuir com a emancipação dos indivíduos e da sociedade.
Considerando os pressupostos anteriores, pesquisadoras e docentes da
universidade encontram-se com gestoras de um sistema municipal de educação e fazem
dialogar essas duas lógicas, materializando-as na redação do texto.
A pesquisa apresentou-se à Secretaria Municipal de Educação de um município
no interior do estado de São Paulo no início de 2010, como um projeto de intervenção,
baseado nos pressupostos do conceito de dialogicidade problematizadora desenvolvido
por Paulo Freire (1983). Concebemos a concomitância de duas ações complementares:
o diálogo e a problematização. Na idealização do projeto e na concretização dos
encontros, vivenciamos que “educação é comunicação, é diálogo, na medida em que
não é a transferência de saber, mas um encontro de sujeitos interlocutores que buscam a
significação dos significados” (FREIRE, 1983, p.69) e se ela é
[...] esta relação entre sujeitos cognoscentes, mediatizados pelo objeto
cognoscível, na qual o educador reconstrói, permanentemente, seu ato de
conhecer, ela é necessariamente, em conseqüência, um que fazer
problematizador (FREIRE, 1983, p.81).

A busca permanente, o diálogo e a problematização são dependentes de


vivência e aprendizado, o que se torna difícil se levarmos em conta a formação baseada
em conteúdos e pouco dialógica presente dos anos iniciais de nossa formação aos
diferentes cursos superiores dos quais participamos, assim como a dificuldade de
momentos propícios à reflexão, à troca e à problematização, diante da rotina
sobrecarregada de resoluções e respostas imediatas impostas pelo contexto de trabalho.
439

Iniciaram-se, com tais subsídios teóricos, encontros quinzenais com grupo de


gestores escolares para a realização do que intitulamos, naquele momento, de projeto de
extensão, inclusive, contando com o financiamento da Pró-Reitoria de Extensão da
Universidade, com a concessão de bolsas para graduandos e verbas para a manutenção
dos gastos. Os encontros sistemáticos nos encaminharam para o trabalho com o tema
que aquele grupo considerou um dos maiores problemas da educação escolar do sistema
de ensino municipal: a escassez e, muitas vezes, ausência de participação dos pais na
escola. Neste sentido, construímos material de apoio, com textos acadêmicos, que
funcionou como temas geradores para os encontros que caminharam na direção de uma
intervenção mais prática na realidade do município, qual seja a revisão da legislação
sobre o assunto e sua posterior construção no dia-a-dia escolar.
O presente texto tem como objetivo geral analisar as possibilidades de vivência
da prática escolar democrática a partir do processo de formação continuada fundado na
dialogicidade problematizadora, que considerou a escola como propositora de políticas
e práticas na construção de conselhos escolares. Para tal, apresentamos os subsídios
teórico-metodológicos de nossa prática e o processo de concretização no cotidiano de
um sistema municipal. Em seguida, analisamos os avanços conquistados em termos
legais e conceituais e sinalizamos para os principais desafios, tanto para este projeto
específico quanto para as pesquisas em educação que pretendam fundar-se na lógica
científica explicitada inicialmente.

1. A escola: local de proposições teóricas e práticas

Em outros momentos, tivemos oportunidade de indicar e discutir o foco


atribuído à escola, nas últimas décadas, pelos pesquisadores e pelas diretrizes gerais da
política educacional brasileira embasada em direcionamentos internacionais (ABDIAN,
2010). O ponto de vista acadêmico, que particularmente nos interessa neste momento, a
partir da mudança paradigmática da gestão que passa a considerar em suas análises a
especificidade da escola em detrimento da empresa e a buscar, na práxis administrativa
escolar, os elementos necessários para percorrer novos caminhos, indica um nível meso
de abordagem para as pesquisas (a escola) e passa a analisar a complexidade das
relações em seu interior.
Lima (1998) propõe um estudo que valorize as formas como os atores se
organizam, reproduzindo e produzindo regras. Para ele, a escola é local de reprodução,
440

mas, sobretudo, de produção de políticas, orientações e regras porque os integrantes da


escola não se limitam a jogar “apenas um jogo com regras dadas a priori, jogam-no
com a capacidade estratégica de aplicarem seletivamente as regras disponíveis e mesmo
de inventarem e construírem novas regras.” (LIMA, 1998, p. 94, grifos do autor).
Inúmeros outros autores (NÓVOA, 1995; RUSSO, 2004), ao traçarem os movimentos
políticos e teóricos que desencadearam o olhar para a escola, indicam que a escola é
uma instituição com autonomia relativa, que não se limita a reproduzir as normas
maiores porque também decide, faz política, produz práticas e sujeitos.
Os autores citados anteriormente acabam por rever alguns pressupostos
defendidos pelos teóricos crítico-reprodutivistas da década de 1970 (BOURDIEU;
PASSERRON, 1975; BAUDELOT; ESTABLET, 1971) principalmente o de que as
instituições educativas são apenas lócus de reprodução da sociedade. Não
desconsideramos toda a densidade histórica da escola a qual traz, em seu bojo, as marcas
do institucional (SILVA JR.; FERRETTI, 2004), entretanto, sustentamo-nos nos
argumentos expressos de que a escola institui seu cotidiano, com suas regras, valores,
enfim, sua própria cultura.
Consideramos que, na escola, não separamos teoria e prática, pois, no limite, há a
práxis intrínseca presente em seu dia-a-dia. Mas, podemos dizer que, do ponto de vista
teórico, a escola merece ser olhada, compreendida e analisada, portanto, pode ser
considerada como local de proposições científicas. Do ponto de vista da prática,
consideramos que os problemas e as possibilidades de mudanças podem ser pensados de
“dentro da escola” porque são os integrantes das organizações escolares que detêm o
conhecimento sobre eles e podem perspectivar seus limites e possibilidades. Neste
sentido, a escola também pode ser considerada como propositora.
As ideias construídas nos levam a ponderar sobre os subsídios principais, teórica e
metodologicamente falando, que nos embasaram na construção, condução e análises do
projeto. Consideramos que os diferentes integrantes da escola pensam, agem e reagem às
determinações; a escola é o local privilegiado para a construção e realização de pesquisas
em Política e Administração da educação que pretendam atribuir significado às análises
científicas e contribuir com o avanço da educação escolar; a universidade tem um papel a
desempenhar para além das críticas, muito bem fundamentadas e necessárias, às
diretrizes da política (em todos os âmbitos) e às diferentes práticas escolares.
441

2. O projeto, o processo e as ressignificações

Tendo em vista a grande importância da implantação de uma gestão democrática


na qual todos os segmentos envolvidos no processo escolar tenham voz e realizem
ações, sentindo-se produtores e não somente reprodutores de regras, práticas e
vivências, as diretoras das escolas do município perceberam a necessidade de
reformular o estatuto relacionado à constituição, organização e funcionamento dos
conselhos escolares a partir de encontros de formação realizados no ano de 2010.
Com olhares voltados às atuações dos gestores e as suas praticas no âmbito
escolar, a formação suscitou reflexões sobre uma administração fundada no coletivo, na
qual, sobretudo, o caminho estivesse subsidiado pela tomada de decisão coletiva, com
representatividade dos diferentes segmentos que vivenciam, direta ou indiretamente, o
cotidiano escolar.
Concomitantemente ao processo de formação, a Secretaria Municipal da
Educação realizava estudos e reuniões referentes à elaboração da minuta do Plano de
Carreira do Magistério Municipal. Estes encontros tiveram como característica principal
o exercício da democracia, visto que representantes das diferentes categorias
(supervisores, diretores, coordenadores, professores, educadores, técnicos da SME,
membros do Conselho Municipal da Educação) analisaram as diferentes reivindicações
e, em conjunto, concluíram os critérios para a valorização da carreira. Este momento na
história da educação do município, tão almejado, favoreceu determinantemente a
construção de uma nova proposta para os conselhos escolares fundamentando-se na
prática participativa de políticas educacionais. Estes aspectos indicam um elemento
favorável à realização do trabalho de formação continuada na perspectiva que
explicitamos anteriormente, qual seja, o não centralismo da Secretaria Municipal de
Educação que demonstrou flexibilidade e acolhimento da proposta cuja apresentação
não estava meticulosamente desenhada como, costumeiramente, encontram-se os cursos
de formação continuada veiculados pelos diferentes governos.
As escolas municipais amparavam-se no capítulo X da Lei nº 3.478/96 –
Estatuto do Magistério Público Municipal, e na Circular SME nº 01/97 para subsidiar os
trabalhos relacionados aos seus Conselhos de Escola. Estes documentos integraram um
período da educação municipal no qual a faixa etária de crianças atendidas pertencia
somente a Educação Infantil, conforme citado no artigo 50 da referida Lei: “As Escolas
Municipais de Educação Infantil deverão constituir o Conselho de Escola, de natureza
442

consultiva, com atuação voltada para defesa dos interesses dos educandos objetivando o
fortalecimento e consolidação de políticas públicas para a área educacional”.
Atualmente, estas escolas atendem a educação básica (infantil e fundamental),
incluindo educação de jovens e adultos, educação especial e, devido a isso, foram
percebidas as dificuldades que estas vinham encontrando para continuar exercendo suas
atividades reportando-se aos documentos citados, pois os mesmos não correspondiam
mais a realidade que vivenciavam.
Conforme também citado no artigo acima descrito, a natureza do Conselho de
Escola era de ordem consultiva, característica esta que impedia decisões autônomas
deste colegiado e sua efetiva participação, visto que no processo democrático há uma
diferença primordial entre simplesmente opinar e efetivamente decidir.
No histórico de formação dos Conselhos Escolares das escolas municipais dos
anos anteriores e durante o processo de formação continuada, diagnosticamos que
algumas escolas nem mesmo reconheciam a importância e valor deste órgão para
auxiliar suas propostas pedagógicas. Muitas delas não constituíam seus Conselhos;
outras o faziam simplesmente para atender uma burocracia vigente; outras tinham
práticas que buscavam sua devida constituição e efetiva atuação, no entanto,
apresentando diversas dificuldades.
Estas dificuldades foram vivenciadas pela maioria das gestoras, sendo as mais
destacadas: o próprio processo de formação do conselho, visto que os pais
representantes, na maioria das vezes, foram convidados a participar e não eleitos; a
baixa freqüência nas reuniões previamente organizadas; medo e apatia dos pais no
envolvimento dos assuntos discutidos; a falta de tempo da escola em organizar
momentos de formação aos pais, funcionários, professores e alunos. Além destas, a
escassez de uma formação reflexiva e consciente das próprias gestoras, bem como sua
busca desorientada em realizar ações com a participação democrática de toda
comunidade escolar sem embasamento teórico-prático, marcou um período de
frustrações e, muitas vezes, descrédito neste colegiado.
O repensar a natureza do Conselho gerou discussões e reflexões valiosas entre as
gestoras municipais.
A ideia que se tinha em relação à formação dos profissionais do âmbito escolar,
de ser algo pronto, definido por outros e que posteriormente deveria ser aplicado e
cumprido, tomou novas formas. A substituição desta ideia deu-se gradualmente pela
vivência do grupo nos encontros realizados, tendo como principio ligações e relações
443

entre os envolvidos e gerando, assim, uma conquista da autonomia conjunta na


elaboração do conteúdo da formação a se construir.
É importante salientar que a abertura da Secretaria Municipal da Educação,
quanto a oferecer o espaço e momentos de estudo /reuniões para as gestoras em horário
de trabalho, demonstrou seu interesse na atuação efetiva do Conselho de Escola e, ao
mesmo tempo, valorizou a competência das mesmas ao dar-lhes liberdade para discutir
suas experiências anteriores e construir uma nova proposta de trabalho. Neste aspecto,
houve também a atribuição de novos significados à ideia de que os órgãos superiores
resistem à auto- avaliação, ao intercâmbio com pesquisadores e são centralizadores de
processos e decisões.
No decorrer deste processo de formação, um grupo de gestoras foi assíduo e
participativo nas reuniões enquanto outro grupo foi caracterizado por freqüências
instáveis e constantes trocas de representantes, que ocorreram por diferentes situações
vivenciadas nas unidades escolares. Mesmo assim, o conteúdo abordado foi criando
forma própria, através da manifestação dos presentes, troca de experiências e estudos
teórico-reflexivos. Com o passar do tempo, o grupo permanente constitui base sólida,
coletivamente, para amparar seus novos conceitos, e reafirmá-los perante aqueles que
não participaram destes momentos e, por isso, questionavam algumas propostas já
consolidadas. Nesta perspectiva, ambos os grupos demonstraram flexibilidade em suas
convicções e respeito pelo estudo anteriormente realizado.
Além disso, o conceito sobre a atuação da direção de uma escola foi amplamente
revisto. Muitas das presentes expuseram por diversas vezes seu temor em “perder” sua
autoridade neste exercício da democracia, na medida em que a própria constituição do
conselho de escola deve respeitar a elegibilidade dos diversos segmentos, garantindo a
neutralidade neste processo e não mais as escolhas e indicações realizadas até então. A
superação destas ideias arraigadas consolidou a proposta de constituir o conselho de
forma paritária, e originou a possibilidade da presidência deste conselho ser ocupada
não única e exclusivamente pelo diretor de escola, mas também por qualquer outro
membro que seja eleito pelo próprio colegiado, em sua primeira reunião anual.
Considerando a necessidade de uma qualidade na gestão que envolva a
comunidade nas transformações da sociedade, os estudos realizados lançaram os
alicerces para um projeto com diferentes concepções sobre a organização do espaço
público escolar.
444

3. A materialização das ressignificações: projetando a lei e as práticas

Pelo que já foi descrito até aqui, fica evidente que ao propormos esse processo
formativo tínhamos a intenção de caminhar em sentido contrário aos programas de
formação continuada organizados por órgãos ou instituições, ao menos aparentemente,
externos às escolas. Essa intencionalidade se justificava porque buscávamos evitar o
distanciamento do dia-a-dia das unidades escolares que, na nossa concepção, resulta
sempre em cursos ou orientações técnicas com conteúdo abstrato e desligado da
realidade.
Para indicarmos os avanços conquistados em termos do que denominamos de
ressignificações de conceitos e práticas pelos sujeitos desse processo formativo, e
também para explicitarmos como o pensar coletivo da “lógica científica” e da “lógica da
prática cotidiana” esteve presente no processo de formação por nós vivenciado,
escolhemos socializar partes do objeto que se constituiu na materialização do processo,
ou seja, a Minuta de Lei Municipal que dispõe sobre o Conselho de Escola, elaborada
de forma conjunta pelos gestores municipais de educação e docentes e alunos da
universidade. Lembramos que essa proposta de normatização do Conselho de Escola só
foi concretizada após o estudo de textos de referência na área e de ampla reflexão sobre
as experiências já vivenciadas pelos gestores e as atuais demandas das unidades
escolares
No processo de construção desse espaço de formação continuada, foram
privilegiados procedimentos que garantiram aos sujeitos envolvidos a possibilidade de
consubstanciar, em um texto normativo, os princípios e as orientações teóricas de
educadores que pesquisam sobre o papel do Conselho Escolar para a democratização, o
fortalecimento da autonomia e a consequente elevação da qualidade de ensino oferecido
à população escolar (ANTUNES, 2008; PARO, 1999; LUCE e MEDEIROS,2006).
Com a clareza que essa legislação não será um instrumento que por si só pode
mudar os rumos da ação educativa no município, mas conscientes que pelo fato de
resultar de proposições feitas pelos agentes educacionais que terão a responsabilidade
de implementá-la, ela pode ser sim um dos elementos importantes na revisão da política
educacional que define esse momento histórico das comunidades envolvidas, nós,
pesquisadores, participantes da construção desse texto normativo, estamos
ressignificando a nossa função nos espaços de formação, aprendendo que quando somos
chamados a contribuir para a construção de uma escola pública mais condizente com
445

uma sociedade que se pretende democrática, precisamos orientar a nossa prática na


contramão da maioria dos programas de formação continuada atualmente oferecidos aos
gestores escolares, que se organizam com conteúdos pré-determinados e carga horária
definida a priori e não privilegiam o diálogo com os sujeitos da ação. Nessa direção,
cada etapa de formação vivenciada por nós teve como principal orientador de
organização dos procedimentos e de seleção dos conteúdos, as demandas e expectativas
levantadas pelo próprio grupo.
Ao analisarmos o texto legal proposto pelos gestores municipais, fica
evidenciada a ressignificação dos conceitos que sustentavam a prática gestora. No início
do Projeto, ficava explícita a resistência de muitos Diretores de Escola no que diz
respeito a garantir a participação efetiva de pais, alunos e comunidade nas decisões de
natureza pedagógica, financeira e administrativa da unidade escolar. A alegação maior
era a de que “os pais são desinteressados e não comparecem à escola quando
solicitados”. No final do processo de formação, para muitos gestores participantes, a
presença desses segmentos passa a ser, não apenas desejável, mas fundamental para
qualificar a gestão escolar. Os artigos da Minuta da Lei propostos e transcritos abaixo,
registram essa nova postura:
Art. 1º - O Conselho de Escola é um colegiado, de natureza consultiva e
deliberativa, direcionado à defesa dos interesses, finalidades e objetivos da
educação pública do Município, constituído por representantes de gestores,
professores, funcionários, pais, alunos e da comunidade.
Art. 2º - O Conselho de Escola é o órgão colegiado máximo da unidade
escolar, cuja função é orientar, decidir e atuar, articuladamente com o núcleo
de direção, no processo de gestão pedagógica, administrativa e financeira da
escola.
Art. 7º -- Na composição de cada Conselho de Escola, atendendo ao princípio
da paridade, é preciso que haja a garantia de 50% de representantes da
comunidade, 40% de docentes e 10% de funcionários e respectivos suplentes.
Art. 8º- [...]
§ 1º Após a constituição do Conselho de Escola, havendo concordância entre
seus membros, o colegiado pode optar por eleger o seu presidente entre seus
membros, neste caso, seu suplente também deverá ser eleito. (Grifos nossos)

Apesar de representar a materialização do processo vivenciado, o produto final


do projeto que estamos desenvolvendo, não pode ser apenas a formulação da Minuta de
Lei, pois concordamos com Antunes (2008) quando declara que a democracia exige
debate e pesquisa e que
A escola que se quer autônoma, democrática e participativa não pode
prescindir da pesquisa, do diálogo, da organização das fontes de
conhecimento que a ajudará a superar as dificuldades encontradas em seu
cotidiano. É preciso que ela envolvendo alunos, pais, educadores e demais
funcionários vá se constituindo um centro de pesquisas e informação que
subsidie a construção do seu projeto político pedagógico. Todos os
segmentos da comunidade devem ser desafiados a pesquisar, a debater, a
446

registrar e sistematizar suas experiências, a divulgá-las para a escola como


um todo e, também para outras escolas. (ANTUNES, 2008, p. 173 grifo
nosso).

Dando continuidade ao programa tendo como foco, agora, o envolvimento dos


diferentes segmentos que constituem o universo escolar, cinco Diretoras de Escola que
participaram de forma efetiva dos momentos de estudo e elaboração da Minuta de Lei
ofereceram-se como interlocutoras para essa nova etapa de formação, em suas escolas.
Para analisarmos de forma plena as possibilidades da prática escolar democrática
a partir do processo de constituição dos Conselhos Escolares, foram propostos e
vivenciados encontros do grupo de pesquisadores com os diversos segmentos que
constituem a comunidade escolar, ou seja, foram realizadas reuniões de estudos e
reflexões sobre as demandas de dos diferentes setores que participam da vida escolar:
gestores, professores, funcionários e pais. Esses encontros, fundamentados na
dialogicidade problematizadora (FREIRE, 1983), aconteceram em espaços das próprias
escolas envolvidas, em horários que fossem convenientes para possibilitar uma maior
presença de pais e educadores, e tiveram como pauta o debate sobre as necessidades e
expectativas da comunidade escolar, com relação à constituição de conselhos escolares,
nos termos da legislação, que fora pensada e proposta pelo próprio grupo de gestores
escolares.
Ao vivenciarmos o papel de interlocutores com as equipes de escolas que
assumiram o seu papel de propositoras de políticas e práticas, fomos surpreendidos com
os diferentes posicionamentos e encaminhamentos dados em cada uma das escolas que
participam do processo. Apesar das cinco escolas fazerem parte do mesmo sistema de
ensino e as gestoras terem tomado parte efetiva nos encontros de formação continuada e
da elaboração da legislação que embasa a proposta de formação de Conselhos
Escolares, pudemos perceber, em cada um dos encontros com as comunidades locais, a
variedade de procedimentos e entendimentos sobre o papel dos educadores e da
comunidades naquele órgão colegiado.
Os encontros com as comunidades educativas têm evidenciado o fato de que a
pesquisa-ação não se sustenta apenas com a ação propriamente dita, mas tem exigido
dos envolvidos uma atitude reflexiva e analítica para que a finalidade de constituir e
formar personalidades democráticas seja de fato consolidada.

Considerações finais
447

Nesses espaços de interlocução com os sujeitos que atuam em cada uma das
cinco escolas envolvidas no projeto de extensão e a constatação das singularidades que
identificam esses sujeitos e suas escolas, aprendemos o quanto são significativas as
contribuições de Certeau, ao declarar que. [...] “O cotidiano é aquilo que nos prende
intimamente, a partir do interior”. [...] e que “o que interessa ao historiador do cotidiano
é o Invisível...” (CERTEAU, 1996, p. 31). Constituindo-se objeto de reflexão dos
educadores/pesquisadores, as ações cotidianas representam as diferentes formas da
comunidade escolar se ajustar a qualquer nova proposição de natureza política ou
técnica. Ao serem confrontadas com a proposição da constituição de um Conselho de
Escola a partir de uma perspectiva de gestão democrática, cada escola respondeu de
forma única, reorganizando o seu cotidiano de maneira particular e às vezes ‘invisível’
para um olhar menos atento, no sentido de acolher ou rejeitar essa proposta. Foi
possível, por exemplo, constatar em uma escola, sem que isso fosse explicitado de
forma integral, que alguns membros da equipe escolar colocavam sob suspeita, o fato de
que pais e alunos pudessem participar do Conselho de Escola de forma paritária. Para
dificultar que isso acontecesse, argumentaram que eles mesmos não se interessavam por
participar da constituição desse novo Conselho de Escola. Essas invenções e
articulações do/no cotidiano vão produzindo uma cultura da escola, que se constitui na
concretude do cotidiano escolar e que define, por isso, as potencialidades e limites de
cada unidade escolar em realizar o seu projeto de constituir e formar personalidades
democráticas.
Por tudo que registramos nesse texto e, principalmente pelas experiências
oportunizadas no diálogo com os educadores que fazem parte desse projeto, é possível
afirmar que esse processo indica as reais e talvez novas possibilidades de
estabelecimento de uma práxis educacional baseada, sobretudo, no pensar coletivo da
“lógica científica” e da “lógica da prática cotidiana”.

Referências
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F. O. C. Avaliação em larga escala: foco na escola. Porto Alegre: Editora Oikos, 2010.

ANTUNES, A. Aceita um Conselho? Como organizar o colegiado escolar. SP: Cortez,


2008
BAUDELOT, C; ESTABLET, R. L école capitaliste en France. Paris: Maspero, 1971.

BARROSO, J. (org.) O estudo da escola. Lisboa: Porto Editora, 1996.


448

BOURDIEU, P; PASSERON, J. La reproduction. Paris: Editora. de Minuit, 1970.

CANÁRIO, R. Os estudos sobre as escolas: problemas e perspectivas. In: BARROSO,


João (org.). O estudo da escola. Porto Editora: Portugal, 1996 (Col. Ciências da
Educação).

CERTEAU, Michel de; GIARD, Luce; MAYOL, Pierre. A invenção do cotidiano: 2


morar, cozinhar. Petrópolis: Artes de Fazer, 1996.

DEROUET, J. L. O funcionamento dos estabelecimentos de ensino em França: um


objecto de estudo em redefinição. In: BARROSO, J. (org.) O estudo da escola. Lisboa:
Porto Editora, 1996.

FREIRE, P. Extensão ou comunicação? 7.ed. RJ: Paz e Terra, 1983. (O Mundo, Hoje,
v.24).

________. . Cartas a Cristina. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994.

HELLER, A. Sociologia de la vida cotidiana. Barcelona: Península, 1977.

LIMA, L. C. A escola como organização educativa: uma abordagem sociológica. 3ª


ed. São Paulo: Cortez, 1998.

LUCE, M. B. M.; MEDEIROS, I. L. P. (orgs.). Gestão escolar democrática:


concepções e vivências. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2006.

NÓVOA, A. (coord). As organizações escolares em análise. 2. ed, Lisboa: Dom


Quixote, Instituto de Inovação Educacional, 1995.

PARO, V. H. O Conselho de escola na democratização da gestão democrática. In:


BICUDO, M. A. V.; SILVA JR, C. A. da. Formação do educador e avaliação
educacional. v. 3. SP: Editora UNESP, 1999. (Seminários e Debates)

RUSSO, M. H. Escola e paradigmas de gestão. Eccos. V. 6, n.1, p.25-42, 2004.

SILVA JR., J. dos R. e FERRETTI, C. J. O institucional, a organização e a cultura


da escola. São Paulo: Xamã, 2004.
449

Comunicação

Recuperação da Aprendizagem nas Escolas Prioritárias

Elides Assumpção
SEESP
Patricia Aparecida Bioto-Cavalcanti
UNINOVE

Resumo: O texto apresenta resultados de pesquisa que teve como objetivo investigar o
que as Escolas Prioritárias, aquelas consideradas pela Secretaria da Educação do Estado
de São Paulo (SEE-SP) como unidades de vulnerabilidade educacional, têm realizado na
tentativa de oferecer oportunidades de recuperação aos alunos com defasagem de
aprendizagem e de obter melhor desempenho no Sistema de Avaliação de Rendimento
Escolar do Estado de São Paulo (SARESP). Para atender a este propósito, optou-se pela
abordagem qualitativa e por metodologias de coleta de dados, observação e entrevistas
estruturadas. Apresenta, ainda, considerações acerca de uma ação de formação que teve
como público alvo o corpo docente e o Coordenador Pedagógico de duas Escolas
Prioritárias, uma vez que os dados obtidos na pesquisa permitiram, também, identificar
demandas de formação dos profissionais que atuam nessas escolas.
Palavras-chave: avaliação educacional; gestão escolar; formação de professores e de
gestores escolares.

Introdução
Compreender a atuação das equipes escolares (gestores e professores) frente ao
desafio de garantir a concretização das aprendizagens do corpo discente e, em
decorrência disto, obter melhora nos índices de desempenho da escola nos sistemas de
avaliação externa foi o que motivou a realização de pesquisa junto às Escolas
Prioritárias. O estudo contemplou as movimentações da equipe escolar de duas Escolas
Prioritárias da capital paulista, desde o momento em que toma conhecimento dos
resultados educacionais da Unidade Escolar (UE), por meio do Boletim da Escola1, até a
proposição e avaliação de ações para recuperação das aprendizagens.

1
O Boletim da Escola apresenta informações sobre o índice que avalia a qualidade das escolas estaduais
paulistas (IDESP). Disponível em: <idesp.edunet.sp.gov.br>. Acesso em 17/11/2012.
450

Escolas Prioritárias são unidades de ensino que apresentam significativos


percentuais de alunos no nível “abaixo do básico” da escala de proficiência2 do Sistema
de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP), em Língua
Portuguesa e em Matemática. Recebem essa denominação em razão de serem
consideradas, pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP), escolas
com vulnerabilidade educacional e, por isso, algumas políticas educacionais são
direcionadas com mais ênfase para essas escolas. O critério adotado pela SEE-SP3 para
definição das Escolas Prioritárias baseia-se na porcentagem de alunos configurados no
Nível Abaixo do Básico na escala de proficiência4 do SARESP. Essa porcentagem
varia em função da disciplina e do nível de escolarização.

Porcentagem de alunos no nível Abaixo do Básico das Escolas Prioritárias


Porcentagem de Alunos no nível Abaixo do Básico do SARESP
2011
ETAPA LÍNGUA PORTUGUESA MATEMÁTICA
Ensino Fundamental ≥ 40 ≥ 50
Anos Iniciais
Ensino Fundamental ≥ 37 ≥ 46
Anos Finais
Ensino Médio ≥ 54 ≥ 74
Fonte: Quadro 2012 de Escolas Prioritárias da Diretoria de Ensino Pesquisada. Material de
circulação interna.

Em 2011, eram 1086 Escolas Prioritárias em todo Estado de São Paulo. No ano
seguinte, esse número passou para 1208 escolas. Dessas, 667 permaneceram na mesma
situação (remanescentes) e outras 421 apareceram pela primeira vez na lista, totalizando
1088 Escolas Prioritárias em 2013.

As Escolas Prioritárias no Estado de São Paulo


A divulgação de informações sobre as Escolas Prioritárias do Estado é bastante
restrita no portal da SEE-SP e em outros meios de divulgação de dados da rede. De
modo geral, o que se disponibiliza, até com certo destaque, é o conjunto de ações

2
Escala de Proficiência do SARESP: é usada para medir resultados de forma ordenada e a escolha dos
números que definem seus pontos é arbitrária e construída com os resultados da aplicação do método
estatístico de análise denominado Teoria de Resposta ao Item (TRI). Fonte: Relatório Pedagógico – 2012
– SARESP.
3
Comunicado Conjunto CGEB/CIMA, de 22 de Junho de 2012.
4
Escala de Proficiência do SARESP: é usada para medir resultados de forma ordenada e a escolha dos
números que definem seus pontos é arbitrária e construída com os resultados da aplicação do método
estatístico de análise denominado Teoria de Resposta ao Item (TRI). Fonte: Relatório Pedagógico – 2012
– SARESP.
451

voltadas ao atendimento dessas escolas, ainda que sem detalhamentos suficientes para a
compreensão total dos princípios fundantes e dos desdobramentos dessas ações nas
Unidades Escolares.
O fato de trabalhar como Professor Coordenador do Núcleo Pedagógico
(PCNP) em uma Diretoria de Ensino (DE) possibilitou acesso a materiais de circulação
interna, disponibilizados pela Coordenadoria de Gestão da Educação Básica (CGEB).
Trata-se de planilhas, denominadas “Prioritárias – Consolidado das Diretorias”,
contendo o número de Escolas Prioritárias de todas as Diretorias de Ensino do Estado.
Em 2011 o número de Escolas Prioritárias em todo o Estado era de 1086, o
equivalente a 21,5% de um total de 5.052 Unidades Escolares. Das noventa e uma DE
do Estado, somente duas delas não tinham Escolas Prioritárias sob sua jurisdição. A
porcentagem de Escolas Prioritárias em cada DE variou bastante, chegando a 51,7% em
uma delas. Em apenas vinte e duas DE (24%) o percentual de Escolas Prioritárias foi
inferior a 10%. E desse “seleto” grupo, somente dois escolas pertencem à capital.
Fizemos um recorte das treze DE da capital paulista, região onde se localiza a
DE pesquisada (em destaque no quadro):
Porcentagem de Escolas Prioritárias nas Diretorias de Ensino da capital paulista
Diretoria de Ensino % de Escolas Prioritárias em 2011
1 42,86
2 41,11
3 36,96
4 34,29
5 32,11
6 31,17
7 30,34
8 21,84
9 20,59
10 16,13
11 12,33
12 8
13 6,58
Fonte: Planilha “Escolas Prioritárias – Consolidado das Diretorias”. Material de circulação interna.

As Escolas Prioritárias Pesquisadas


A Diretoria de Ensino selecionada para estudo tem 89 escolas sob sua jurisdição.
O quantitativo de escolas que apresentam elevados percentuais de alunos no nível
abaixo do básico da escala de proficiência do SARESP vem aumentando desde o
lançamento do Programa Qualidade da Escola, em 2008. A partir de 2010, as escolas
452

nessa condição são consideradas, pela SEE-SP, unidades com vulnerabilidade


educacional e passam a compor a lista das Escolas Prioritárias.
Escolas Prioritárias da Diretoria de Ensino pesquisada
Ano Número de Porcentagem de
Escolas Prioritárias Escolas Prioritárias na DE
2010 21 23,6
2011 27 30,3
2012 36 40,4
Fonte: Planilha “Escolas Prioritárias – Consolidado das Diretorias”. Material de circulação interna.

O critério para a escolha do universo da pesquisa foi a incidência da UE nas


listas. Optou-se, assim, por uma escola emergente, isto é, está configurada como Escola
Prioritária, mas mostrou avanços no desempenho de seus alunos, e por uma escola
remanescente, por entendermos tratar-se de uma escola que não apresenta avanços no
desempenho de seus alunos. Doravante, tais escolas serão designadas como escola A e
escola B, respectivamente.
Caracterização das Escolas Pesquisadas
Variável Escola A Escola B
Atendimento Anos Finais do EF e EM EF, EM e EJA/EM
Número de alunos 1520 952
Turnos Manhã/Tarde/Noite Manhã/Tarde/Noite
Situação Funcional do Diretor Designado Efetivo
Professores Coordenadores
Dois Três
Pedagógicos
Professores Coordenadores
Não possui Possui
de Apoio à Gestão Pedagógica
Professores 4 Efetivos 3 Efetivos
de Língua Portuguesa 3 Ocupantes de Função/Atividade 2 Ocupantes de Função/Atividade

Professores 3 Efetivos 1 Efetivo


De Matemática 4 Ocupantes de Função/Atividade 4 Ocupantes de Função/Atividade
EF = 2,53 EF = 1,81
IDESP 2012
EM = 1,70 EM = 1,35
Fontes: Documentos das Escolas A e B, Boletim da Escola A e Boletim da Escola B.

Procedemos à busca dos dados do SARESP relativos às escolas A e B,


especificamente das edições de 2010, 2011 e 2012, por meio da análise do Boletim da
453

Escola5. Para o levantamento de informações acerca da gestão dos resultados de


desempenho dos alunos, decidiu-se pela técnica da entrevista estruturada, tendo como
sujeitos pesquisados as diretoras das escolas A e B, esperando “obter material precioso
e consolidar as respostas obtidas” (BELL, 2008, p. 137).

Gestão dos Resultados Educacionais nas Escolas Pesquisadas


Consideramos que os Resultados Educacionais das escolas sofrem diversas
influências, tais como características socioeconômicas dos alunos, formação do corpo
docente, mas não tanto quanto do processo de gestão escolar e das práticas pedagógicas
que permeiam o processo de ensino-aprendizagem. Neste contexto, o processo
gestionário na escola é fator determinante dos resultados alcançados por ela. Heloísa
Lück é enfática nessa abordagem, quando define que:
[...] a qualidade do ensino se assenta, dentre um dos aspectos mais
fundamentais, sobre a competência profissional dos diretores
escolares e sua capacidade de organizar, orientar e liderar as
ações e os processos promovidos na escola voltados para a
promoção da aprendizagem e formação dos alunos. (LÜCK, 2009, p.
9, grifo nosso).

Desse modo, o diretor é o profissional responsável pela promoção do


alinhamento entre o planejamento e as práticas dos profissionais dos demais segmentos
da escola. Miguel Henrique Russo, em seus trabalhos sobre Gestão Escolar, aponta que:
Dentre os inúmeros fatores determinantes da qualidade da educação,
está a gestão do processo pedagógico-escolar. Ainda que seja uma
mediação, a administração é um fator crucial para a articulação dos
meios aos fins, para a racionalização dos recursos materiais e
conceituais e para a coordenação do esforço humano coletivo que se
desenvolve na educação escolar. Assim, a administração é fator
fundamental para a melhoria da qualidade do ensino. Há, entretanto,
que se discutir o caráter que deve assumir a administração escolar face
à especificidade do processo educativo escolar. (RUSSO, 2007, p. 88).

Quanto à atuação das diretoras, o que constatamos nas duas escolas


pesquisadas é que poucos processos de gestão dos resultados educacionais são
contemplados em suas práticas. Nenhuma delas mencionou que realiza interpretação
dos dados do SARESP ou das avaliações internas. Tampouco confirmaram que exigem
dos professores a elaboração de planos de ação para recuperação da aprendizagem.

5
O Boletim da Escola apresenta informações sobre o índice que avalia a qualidade das escolas estaduais
paulistas (IDESP). Disponível em: <idesp.edunet.sp.gov.br>. Acesso em 17/11/2012.
454

Os afazeres administrativos parecem estar no topo da lista de prioridades,


seguidos pela gestão orçamentária e prestação de contas. Não que essas tarefas sejam
irrelevantes, mas, certamente, têm menos impacto nos processos educativos, como
advogam Azzi e Russo:

A atuação dos diretores na dimensão pedagógica do processo de


trabalho/produção escolar tem sido bastante modesta tal a
predominância da dimensão administrativa nas demandas que se
oferecem na cotidianidade da escola. Além disso, esta é uma dimensão
que apresenta grandes desafios e demanda grande esforço. Exige,
além de competência técnica, um grande compromisso político com os
interesses educacionais das camadas trabalhadoras, condições que as
demandas cotidianas do trabalho dos diretores de escola parece
dificultarem. (AZZI; RUSSO, 2010, p. 5).

As diretoras das escolas pesquisadas alegaram desconhecimento de ações para


recuperação da aprendizagem que tenham sido propostas pelos coordenadores
pedagógicos e/ou pelo corpo docente.
Os coordenadores pedagógicos da rede estadual paulista, de modo geral, têm
encontrado muitas dificuldades para desempenharem suas funções a contento, segundo
conclusão de estudos realizados por Celso Carvalho e Miguel Henrique Russo, que
apontam:
No que diz respeito aos Professores Coordenadores, a atribuição da
quase exclusiva responsabilidade “por planejar como as escolas
cumprirão as metas de desempenho e como elevarão o nível de
aprendizagem dos alunos”, parece colocar muita responsabilidade no
ocupante de uma função que historicamente não teve suas atribuições
e competências determinadas com clareza e cujos ocupantes sempre
desempenharam tarefas que nada tinham com a de coordenação
pedagógica. Em face das carências das escolas públicas e das
demandas burocráticas, os professores coordenadores, ou de
denominações equivalentes, supriam as necessidades de auxiliares de
direção em tarefas que claramente caracterizavam um desvio de
função. Além disso, em decorrência do novo perfil requerido pela
função haverá a necessidade de formação específica para que os
professores se apropriem dos conhecimentos que fundamentam a
prática de coordenação do esforço humano coletivo no processo de
produção pedagógico escolar. (CARVALHO; RUSSO, 2008, p. 14).

Os dados obtidos na pesquisa sugerem que não há proposição de ações para


recuperação da aprendizagem nas escolas pesquisadas e que tal fato decorre da
necessidade de maior apropriação dos princípios e metodologias do SARESP, por todos
os envolvidos nos processos educativos que se desenvolvem na escola, e dos
mecanismos de gestão dos resultados educacionais, pelos gestores escolares. Apontam,
455

também, desalinhamento entre diretrizes das ações propostas pela SEE-SP e seus
desdobramentos nas escolas.
Em relação ao sentimento gerado na equipe escolar de uma UE configurada
como Escola Prioritária, Julio Gomes Almeida (2013), ao apresentar resultados parciais
do estudo com um grupo de Escolas Prioritárias do município de São Paulo, apontou
que o fato de uma escola obter baixo desempenho em avaliações externas gera um
sentimento negativo nos profissionais que nela atuam:
As escolas incluídas neste grupo recebiam uma formação especial,
uma espécie de recuperação paralela, que lhe permitiria ser novamente
incluída no grupo de escolas que vinham desenvolvendo um trabalho
adequado. O sentimento dos gestores participantes, no entanto, foi
bem parecido com o dos alunos que vão para as salas de recuperação:
constrangimento! Tentaram definir o grupo de outra forma: escolas
vulneráveis, a reação foi ainda pior e então passaram a chamar, ainda
que discretamente, de escolas prioritárias. Com essa situação
pretendeu-se enfatizar que o projeto surgiu da insatisfação da equipe
gestora com a classificação da escola entre as piores da rede
(ALMEIDA, 2013, p. 5).

As diretoras das escolas A e B afirmaram que o fato de atuarem em Escolas


Prioritárias não lhes causa nenhum sentimento negativo. No entanto, ao observá-las
atentamente durante as entrevistas, identificamos comportamentos controversos às
afirmativas.

A Diretoria de Ensino e a Proposição de Ações de Formação


As Diretorias de Ensino, de acordo com o Decreto nº 57.141/2011, que
reorganiza a Secretaria da Educação, têm responsabilidades no cumprimento das
políticas, diretrizes e metas da educação (artigo 70). Os Núcleos Pedagógicos, por sua
vez, segundo o artigo 73 do referido decreto, são “unidades de apoio à gestão do
currículo da rede pública estadual de ensino, que atuam preferencialmente por
intermédio de oficinas pedagógicas” e têm em seu rol de atribuições, conforme os
incisos XIII e XVI:
XIII- acompanhar o trabalho dos professores em suas disciplinas e as
metodologias de ensino utilizadas em sala de aula para avaliar e
propor ações de melhoria de desempenho em cada disciplina;
XVI- analisar os resultados de avaliações internas e externas e propor
medidas para a melhoria dos indicadores da educação básica, no
âmbito de atuação que lhes é própria.
456

Embora sejam claras as atribuições dos membros da DE, estudo realizado por
Adriana Bauer, sobre o trabalho das DE em articulação com os resultados do SARESP,
aponta que:
[…] o alcance das metas declaradas nos documentos do sistema de
avaliação no que tange às políticas de formação parece muito mais
estar relacionado às experiências dos profissionais das diretorias e ao
seu esforço pessoal em utilizar os resultados da avaliação enquanto
indicador de caminhos para seu trabalho do que conquista geral,
relacionada às diretrizes e ações propostas pela Secretaria. (BAUER,
2006, p. 159).

Diante dos resultados da pesquisa e considerando nossas atribuições como


membro da DE, decidimos pela realização de uma ação formativa, no âmbito de atuação
própria do Núcleo Pedagógico, por meio de oficinas pedagógicas.
Como os resultados aferidos pelos sistemas de avaliação referem-se a redes de
ensino e escolas e, por isso, não permitem identificar as necessidades de recuperação de
aprendizagem de cada aluno, o instrumento diagnóstico selecionado para a realização da
ação formativa foi a Avaliação da Aprendizagem em Processo (AAP).
A Avaliação da Aprendizagem em Processo (AAP) é uma ação elaborada por
coordenadorias da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP) e constitui-
se por instrumentos investigativos e padronizados da aprendizagem, a serem aplicados
aos alunos dos Anos Finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Os
instrumentos de avaliação são fundamentados pelo Currículo Oficial do Estado de São
Paulo e as provas são compostas por itens que contemplam habilidades mínimas de
Língua Portuguesa e Matemática requeridas para o ano/série em curso, em consonância
com as Matrizes de Referência do SARESP.
Como material de apoio da AAP, os documentos Comentários e
Recomendações Pedagógicas contêm informações para subsidiar o trabalho da equipe
escolar na elaboração de seu Plano de Ação. São quadros de habilidades (Língua
Portuguesa e Matemática), gabaritos, itens (questões), orientações para aplicação e
correção das provas de redação. O material também oferece interpretação pedagógica
das alternativas, sugestões de atividades voltadas ao desenvolvimento de cada
habilidade aferida e indicação de materiais impressos, vídeos disponíveis na internet e
referências bibliográficas.
A AAP é um instrumento com potencial de contribuição para o planejamento
das ações para recuperação da aprendizagem, pois, além do diagnóstico das defasagens
457

de aprendizagem de cada aluno, ainda que com alguns limites6, apresenta sugestões de
atividades e materiais para subsidiar o planejamento de aulas. Temos, assim,
contempladas as etapas de um planejamento satisfatório, como Miguel Henrique Russo
advoga:
[...] o planejamento é uma atividade de grande complexidade que
requer a realização de diagnósticos para o conhecimento das
condições concretas e dos recursos disponíveis, a escolha dos meios
mais adequados aos fins pretendidos e das estratégias possíveis para a
ação, e a definição de critérios e mecanismos para a avaliação dos
resultados, com vistas a possíveis correções de rumo. (RUSSO, 2007,
p. 92)

De acordo com o Comunicado Conjunto CIMA/CGEB, de 01 de Junho de


2013, espera-se que as unidades escolares elaborem, a partir dos resultados da1ª
aplicação, Plano de Ação com vistas à recuperação da aprendizagem.
Nas duas escolas pesquisadas, as provas da AAP são aplicadas em desacordo
com sua finalidade. Considerando ser este um instrumento diagnóstico, seria razoável
que os alunos fossem sensibilizados sobre sua importância. Ao contrário, nas duas
escolas os resultados da AAP geram notas que são usadas pelos professores de todas as
disciplinas na composição das médias bimestrais.
A ação formativa teve como público alvo os coordenadores pedagógicos e o
corpo docente de duas Escolas Prioritárias da mesma DE das escolas pesquisadas.
Contou com o desenvolvimento de duas atividades: contextualização dos Sistemas de
Avaliação Educacional e oficina pedagógica.
A oficina pedagógica tinha por objetivo promover a elaboração de Planos de
Aula com vistas ao desenvolvimento de habilidades aferidas pela AAP e foi realizada
em duas etapas:
1ª etapa: Escolha das habilidades a serem contempladas nos Planos de Aula.
Os participantes deveriam analisar as Matrizes de Referência para Avaliação
(Língua Portuguesa e Matemática do 9º ano do Ensino Fundamental ou da 3ª série do
Ensino Médio) e selecionar, pelo menos, uma habilidade para permear o planejamento
de aulas.

6
Diferentemente dos instrumentos de avaliação do SARESP, a Avaliação da Aprendizagem em Processo
não é elaborada a partir da metodologia da Teoria de Resposta ao Item (TRI). Sendo assim, não é possível
obter a medida apropriada da proficiência de cada aluno e o acerto ao acaso é uma realidade a ser
considerada.
458

Os professores de Língua Portuguesa e de Matemática deveriam escolher uma


habilidade, ou um conjunto de habilidades convergentes, que julgavam de maior
complexidade. Já o critério de escolha dos demais participantes considerou a
possibilidade de articulação entre a habilidade da AAP e conteúdos/habilidades do
currículo das disciplinas das quais ministravam aulas.
Nessa etapa, o Currículo do Estado de São Paulo de cada área do conhecimento
foi disponibilizado para consulta.
2ª etapa: Elaboração do Plano de Aula.
A partir do modelo de Plano de Aula disponibilizado pela formadora, os
participantes deveriam proceder à elaboração de um Plano de Aula, de sua disciplina de
atuação, com vistas ao desenvolvimento da habilidade selecionada.
Nessa etapa, os cadernos do professor e do aluno do Programa São Paulo faz
Escola (material de apoio ao currículo oficial do Estado) e livros didáticos passaram a
fazer parte do material para consulta.
Observação atenta dos participantes durante o desenvolvimento da oficina e os
questionamentos feitos por eles, permitem concluir que os mesmos não têm por prática
o planejamento de ações de recuperação da aprendizagem, desconhecem as
possibilidades de uso tanto dos resultados da aplicação da AAP, como do material de
apoio, e, o mais inquietante, não se apropriaram das diretrizes e dos princípios do
currículo oficial do Estado. Senão, o que justificaria a dificuldade apresentada pelos
participantes para concluir a oficina e para, até mesmo, manusear o referido material,
não encontrando, de pronto, conteúdos e habilidades da disciplina de atuação?

Referências

ALMEIDA, Julio Gomes. Autoavaliação Institucional: a construção de indicadores que


possibilitem o diálogo com as avaliações externas. Texto apresentado no Congresso
PEEME. Évora, 2013.

ASSUMPÇÃO, Elides. Proposição de Ações para Recuperação da Aprendizagem


nas Escolas Prioritárias. São Paulo: UNINOVE, 2014.

AZZI, Roberta Gurgel; RUSSO, Miguel Henrique. Gestão da escola e crenças docente
de eficácia pessoal e coletiva. Texto apresentado no Congresso Ibero Luso-
brasileiro. ANPAE, 2010.
459

BAUER, Adriana. Usos dos resultados do SARESP: o papel da avaliação no uso das
políticas de formação docente. São Paulo: USP, 2006.

BELL, Judith. Como realizar um projecto de investigação. Lisboa: Gradiva, 2008.

CARVALHO, Celso do Prado Ferraz de; RUSSO, Miguel Henrique. Política


Educacional do Governo Serra. Texto apresentado no Seminário Internacional
Estado e Políticas Educacionais. Uberlândia: UFU, 2008.

LÜCK, Heloísa. Dimensões de gestão escolar e suas competências. Curitiba: Editora


Positivo, 2009.

RUSSO, Miguel Henrique. Contribuições da Administração Escolar para a melhoria da


qualidade do ensino. In: BAUER, Carlos; CARVALHO, Celso Ferraz do Prado de;
JARDILINO, José Rubens Lima; RUSSO, Miguel Henrique. Políticas educacionais e
discursos pedagógicos. Brasília: Líber Livro Editora, 2007.

Documentos Oficiais

SÃO PAULO (Estado). Comunicado Conjunto CIMA/CGEB, de 01 de Junho de 2013.


Avaliação da Aprendizagem em Processo – Quinta Edição – Avaliação Diagnóstica
SAEB.

___________________. Decreto nº 57.141, de 18 de julho de 2011. Reorganiza a


Secretaria da Educação e dá providências correlatas.

___________________. Secretaria da Educação. Avaliação da Aprendizagem em


Processo – Comentários e Recomendações Pedagógicas. Subsídios para o Professor
de Língua Portuguesa. 9º ano do Ensino Fundamental. Prova de Língua Portuguesa. São
Paulo: SEE, 2013.

___________________. Secretaria da Educação. Avaliação da Aprendizagem em


Processo – Comentários e Recomendações Pedagógicas. Subsídios para o Professor
de Língua Portuguesa. 3º ano do Ensino Médio. Prova de Língua Portuguesa. São
Paulo: SEE, 2013.

___________________. Secretaria da Educação. Avaliação da Aprendizagem em


Processo – Comentários e Recomendações Pedagógicas. Subsídios para o Professor
de Matemática. 9º ano do Ensino Fundamental. Prova de Matemática. São Paulo: SEE,
2013.
460

___________________. Secretaria da Educação. Avaliação da Aprendizagem em


Processo – Comentários e Recomendações Pedagógicas. Subsídios para o Professor
de Matemática. 3º ano do Ensino Médio. Prova de Matemática. São Paulo: SEE, 2013.

___________________. Secretaria da Educação. Secretaria da Educação. Currículo do


Estado de São Paulo: Ciências da Natureza e Suas Tecnologias. São Paulo: SE, 2012.

___________________. Secretaria da Educação. Secretaria da Educação. Relatório


Pedagógico: 2010 – SARESP. São Paulo: SE, 2011.

___________________. Secretaria da Educação. Secretaria da Educação. Matrizes de


Referência para a Avaliação – Documento Básico – SARESP – Ensino
Fundamental e Médio. São Paulo: SE, 2009.
461

Comunicação

A atuação do coordenador pedagógico no contexto escolar: construindo saberes

Elisabete Ferreira Esteves Campos


Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Formação de Educadores da Faculdade de
Educação da Universidade de São Paulo.

Resumo: Este texto apresenta alguns aspectos da pesquisa-ação crítica desenvolvida na


Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, para investigar a construção de
saberes considerados relevantes pelos profissionais que assumiram a coordenação
pedagógica em cinco escolas públicas de Ensino Fundamental I. A teoria de Paulo
Freire, que compreende a educação e a pesquisa como formas de intervenção no mundo,
fundamentou a investigação que contou com a participação de um grupo de Professoras
Coordenadoras em encontros nos Círculos de Debates inspirados nos Círculos de
Cultura de Freire, para dialogar sobre sua prática e seu compromisso com a escola
pública, tendo em vista a melhor qualidade do ensino e da aprendizagem dos alunos. Os
diálogos com as Professoras Coordenadoras permitiram analisar os desafios e
possibilidades de atuação, identificando, construindo e reconstruindo saberes
considerados relevantes para sua atuação profissional no contexto escolar.
Palavras-Chave: coordenação pedagógica; formação de professores em serviço; círculo
de debates.

A coordenação pedagógica na liderança da equipe escolar


A compreensão da educação e da pesquisa como formas de intervenção a partir
da fundamentação teórica de Paulo Freire, embasou esta investigação tendo como
metodologia a pesquisa-ação crítica, incluindo como sujeitos-participantes um grupo de
cinco Professoras que se desligaram da sala de aula para assumir a coordenação
pedagógica em escolas do município de São Bernardo do Campo, por terem seu projeto
de trabalho aprovado pelo diretor escolar. Realizamos encontros mensais durante dois
anos, que denominamos de Círculos de Debates inspirados nos Círculos de Cultura de
Paulo Freire, para dialogar sobre o compromisso da coordenação pedagógica visando a
melhor qualidade do ensino e da aprendizagem dos alunos das escolas públicas.
462

Compreender os meandros do trabalho pedagógico significa compreender o


contexto em que a práxis pedagógica se constrói e, no caso desta pesquisa, investigar os
saberes considerados necessários pelos profissionais que assumiram a coordenação
pedagógica e sua possibilidade de contribuição com a gradual construção da práxis
coletiva dos professores e professoras no âmbito escolar.
Identificamos em estudos e pesquisas dos últimos, a valorização do coordenador
pedagógico como liderança e agente articulador da práxis pedagógica, o que pressupõe
enfrentar muitos desafios. Autores como Almeida (1998), Garrido (2000), Orsolon
(2001), Geglio (2003), Placco e Almeida (2003), Mate (2007), dentre outros, nos
oferecem dados relevantes ao analisarem a complexidade do trabalho dos coordenadores
pedagógicos no contexto escolar. Esses e outros estudos e pesquisas demonstram que
são atribuídas aos coordenadores pedagógicos grandes responsabilidades, especialmente
no que se refere à liderança da equipe escolar para a construção do Projeto Político-
Pedagógico, o que levou a essa investigação sobre os saberes considerados necessários
para efetivação desse trabalho nas escolas.
A hipótese formulada para a pesquisa foi de que a base teórico-metodológica da
coordenação pedagógica é a docência e práticas pedagógicas que a incluem, mas vão
além dela, mesmo porque as Professoras Coordenadoras convidadas para participar
desta pesquisa, se desligaram da sala de aula e passaram a fazer parte da equipe da
gestão escolar, assumindo a responsabilidade pela liderança e formação contínua dos
professores em serviço no âmbito da escolar, o que implica na construção de saberes
para além dos saberes da docência (TARDIF, 2002).
Historicamente, a formação contínua de professores tem sido concebida como
forma de suprir as deficiências da formação em nível médio ou superior, levando as
redes públicas a ofertarem cursos, oficinas e palestras, muitas vezes como forma de
complementação dos estudos. Essa tendência na formação em serviço é também
justificada pelas rápidas mudanças em termos científicos, tecnológicos, informacionais
e gerenciais que exigem melhor qualificação para o trabalho. No entanto, é preciso
considerar que tais propostas formativas permitem abordagens pontuais de conceitos e
conteúdos e, de modo geral, não estão organizadas em torno de um amplo projeto de
formação contínua que possa provocar debates coletivos intencionais acerca da relação
entre escola e sociedade, que influencia na organização e no currículo das escolas.
Nesse modelo, nem sempre há preocupação com a formação política e cultural dos
professores, mantendo-se o foco num determinado tema de forma recortada.
463

Especialmente a partir dos anos 1990, críticas ao modelo de formação definida


por órgãos superiores e à tendência transmissiva dessas formações levaram à defesa de
propostas que privilegiassem e promovessem a reflexão dos professores, especialmente
para a construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico. A formação em serviço
tendo a escola como locus privilegiado parecia mais adequada para este propósito.
Nesse sentido, o coordenador pedagógico torna-se o profissional que pode assumir a
liderança para articular e mobilizar a equipe escolar na elaboração e desenvolvimento
do Projeto Político-Pedagógico, que implica na formação contínua de professores no
âmbito da escola numa perspectiva reflexiva.
No entanto, mudar o locus da formação não significa, necessariamente, assumir
e provocar a reflexão dos docentes e, além disso, o conceito de profissional reflexivo
requer análises mais rigorosas. Pimenta (2002) tece considerações acerca do conceito de
professor reflexivo, do currículo necessário para a formação de professores reflexivos,
do local dessa formação e das condições de exercício de uma prática profissional
reflexiva nas escolas. Não se trata de um conceito simples quando se considera a
complexidade da docência que inclui a reflexão crítica ao contexto social em que se dá a
ação educativa. A reflexão, nesse sentido, considera o caráter individual e coletivo da
reflexividade, tendo em vista a dimensão político-pedagógica da educação escolar para
a emancipação social e não fica restrita somente à reflexão-investigação de práticas
particulares em aulas de forma individualizada e apartada de análises sobre os
elementos que condicionam tais práticas.
A atenção ao conceito de professor reflexivo é relevante para se identificar
políticas de formação em serviço no âmbito da escola, com o objetivo de obter maior
facilidade para implantação de programas e projetos curriculares, constituindo o
coordenador pedagógico como mero multiplicador das reformas ou diretrizes definidas
pelos sistemas de ensino, reduzindo tal profissional àquele que deve garantir que tais
diretrizes sejam implantadas e assumidas pelos docentes, o que pode levar à
compreensão do Projeto Político-Pedagógico como documento burocrático.
Num outro paradigma, a coordenação do trabalho pedagógico pode assumir um
papel bastante diferente, em favor da educação democrática articulada à educação
contínua em serviço de sujeitos-professores capazes de compreender e analisar
criticamente as questões educacionais, leis, diretrizes, reformas e suas relações com o
contexto social mais amplo que influenciam na organização da escola, no Projeto
Político-Pedagógico, ou seja, no ensino e na aprendizagem dos alunos. Nesse sentido, a
464

educação contínua em serviço pode ser entendida como processo permanente (FREIRE,
2001) no qual, educadores escolares questionam e refletem sobre o arcabouço teórico,
metodológico, sobre a Pedagogia e as Ciências da Educação, relacionando com sua
“leitura de mundo” (FREIRE, 2005) e sua prática educativa. Considera-se, assim, que o
desenvolvimento pessoal e profissional é contínuo, como também é contínuo o
aprimoramento da pessoa como ser humano e cidadão diante dos desafios colocados
pelo trabalho e pela conjuntura mundial.
Por outro lado, a educação contínua de docentes que ocorre dentro ou fora da
escola, ainda que importante, não tem o poder de superar todos os problemas da
educação escolar. As escolas estão inseridas num tempo/espaço histórico e, portanto,
sofrem influências dos aspectos políticos, econômicos, sociais, que exigem ações e
mudanças em diferentes âmbitos. Compreender essa realidade é condição para que não
se assuma a formação de professores como redentora e a falsa expectativa de que poderá
resolver os históricos problemas da educação escolar brasileira.
Mas, não podendo tudo, as equipes docentes têm espaços de ação e participação
podendo construir outras formas de ensinar e aprender, vinculando a construção de
conhecimentos à compreensão e intervenção no mundo, como propõe Freire:

[...] ensinar já não pode ser este esforço de transmissão do chamado saber
acumulado, que faz uma geração à outra, e aprender não é a pura recepção do
objeto ou do conteúdo transferido. Pelo contrário, girando em torno da
compreensão do mundo, dos objetos, da criação, da boniteza, da exatidão
científica, do senso comum, ensinar e aprender giram também em torno da
produção daquela compreensão, tão social quanto à produção da linguagem,
que é também conhecimento (FREIRE, 2007, p.6)

No âmbito da escola, o coordenador pedagógico pode assumir essa importante


liderança curricular democrática articulada com a educação contínua de professores em
serviço, debatendo sobre o papel da escola e o compromisso de todos com o Projeto
Político-Pedagógico, mas é preciso investigar as condições e os saberes necessários ao
coordenador para que esta proposta se efetive.

Fundamentação teórica para os encontros com as Professoras Coordenadoras


Estudando a obra de Paulo Freire considerei que seus fundamentos ofereciam
suporte teórico para a pesquisa com as Professoras Coordenadoras, especialmente em
relação aos princípios que embasaram os Círculos de Cultura criados pelo autor. Nessa
proposta de Freire, os programas de alfabetização eram organizados a partir da
465

interlocução com os grupos populares, propondo a análise e problematização da


realidade com a intenção de contribuir para superar a visão fatalista do mundo por meio
de um método pedagógico que procurava dar ao educando a oportunidade de dialogar,
analisar a realidade a partir dos diversos temas geradores e redescobrir-se na retomada
reflexiva do próprio processo vivido em que ele se vai descobrindo, manifestando e
configurando o método de conscientização.

A consciência é consciência do mundo: o mundo e a consciência, juntos,


como consciência do mundo, constituem-se dialeticamente num mesmo
movimento – numa mesma história. Em outros termos: objetivar o mundo é
historicizá-lo, humanizá-lo. Então, o mundo da consciência não é criação,
mas, sim, elaboração humana. Esse mundo não se constitui na contemplação,
mas no trabalho. (FREIRE, 2005, p. 17)

Essas ideias de Freire evidenciam que o conhecimento escolar, mesmo que em


cursos de alfabetização, se articula ao conhecimento de mundo, às análises e discussões
coletivas sobre a organização política, econômica, social, cultural, que podem contribuir
com a compreensão e intervenção na construção de um mundo mais humanizado e
menos desigual.
Considerando tais ideias, desenvolvi esta pesquisa organizando Círculos de
Debates com cinco Professoras Coordenadoras que foram por mim convidadas como
sujeitos-participantes, para envolvê-las no desenvolvimento da pesquisa em encontros
que ocorreram por dois anos, tendo como fundamentação os conceitos de participação e
diálogo, para a construção contínua de um posicionamento crítico e reflexivo. Freire
(1985) concebe a criticidade como capacidade gradativa de reflexões sobre a realidade,
possibilitando constatações, desvelamento de intenções, causas, consequências e
possibilidades de intervenções para a transformação. A luta pela transformação, na
expressão do autor, não é uma luta individual, mas um projeto coletivo.
Nos Círculos de Debates, enquanto releitura ou reinvenção da proposta de Freire
pudemos identificar certas contradições na organização da educação escolar e nas ações
pedagógicas que ocorrem nas escolas, construindo e sistematizando alguns saberes
considerados necessários para favorecer processos de mudança. Saber que mudar é
difícil, mas é possível, nos enche de esperança e nos mobiliza para renovar saberes cujo
campo minha curiosidade se inquieta e minha prática se baseia (FREIRE, 2007).
466

O desenvolvimento da pesquisa
No início da pesquisa, considerando os princípios dos Círculos de Cultura,
elaborei um mapeamento das cinco escolas onde as Professoras Coordenadoras
atuavam, dialogando com elas acerca de alguns desses dados. As Professoras
Coordenadoras responderam a um questionário referente à sua atuação profissional nas
unidades escolares e, em seguida, iniciamos os encontros coletivos para debater sobre os
dados iniciais, levantando novos dados, que foram sistematicamente registrados. Os
diálogos foram gravados e registrados, sendo que tais registros foram lidos por todas
para eventuais reformulações ou acréscimos. Os debates e as discussões sistematizadas
contribuíram para que o grupo pudesse destacar aspectos relevantes acerca de sua
atuação.
Outros dados emergiram na conjunção de diferentes instrumentos: registros de
observações no decorrer da pesquisa referentes às minhas idas às cinco escolas onde
atuavam as Professoras Coordenadoras, registros de relatos, depoimentos e diálogos
com as equipes escolares, dados coletados nos documentos das escolas, registros
elaborados pelas próprias Professoras Coordenadoras, além das respostas ao
questionário. Todos esses dados foram analisados e discutidos coletivamente durante as
reuniões nos Círculos de Debates, nas quais emergiram novos dados, imprimindo maior
riqueza aos debates, promovendo outras possibilidades de ação, num processo contínuo
de ir e vir.
Em se tratando de pesquisa-ação, os dados não estão restritos aos instrumentos em
si, posto que emergem nos processos dialógicos em diferentes momentos, e pressupõem
diferentes formas e possibilidades de análises por meio das vozes dos sujeitos que
compõem o grupo. É o processo crítico e reflexivo que permeia a dinâmica produtora de
dados analisados e validados no próprio grupo, que leva à construção de possíveis
mudanças. Para Franco:
A pesquisa-ação crítica considera a voz do sujeito, sua perspectiva, seu
sentido, mas não apenas para registro e posterior interpretação do
pesquisador: a voz do sujeito fará parte da tessitura da metodologia da
investigação. Nesse caso, a metodologia não se faz por meio das etapas de
um método, mas se organiza pelas situações relevantes que emergem do
processo. Daí a ênfase no caráter formativo dessa modalidade de pesquisa,
pois o sujeito deve tomar consciência das transformações que vão ocorrendo
em si próprio e no processo. É também por isso que tal metodologia assume o
caráter emancipatório, os sujeitos da pesquisa passam a ter oportunidade de
se libertar de mitos e preconceitos que organizam suas defesas à mudança e
reorganizam a sua autoconcepção de sujeitos históricos. (FRANCO, 2005, p.
486-487)
467

Dos debates coletivos nos encontros com as Professoras Coordenadoras,


emergiram propostas de ações que foram colocadas em prática por elas em sua atuação
profissional nas escolas, novamente analisadas e debatidas para que fossem
gradativamente aperfeiçoadas. Esse processo foi permeado por estudos teóricos, que
contribuíram para que as participantes avançassem em seus saberes, construindo
conhecimentos cada vez mais elaborados.
As Professoras Coordenadoras também foram provocadas a analisar certos
aspectos da realidade social e a forma como essa realidade é compreendida no Projeto
Político-Pedagógico da escola, em termos de reprodução ou transformação, tendo em
vista princípios éticos assumidos. Muitas foram as situações escolares compartilhadas e
debatidas pelo grupo, provocando outras análises e possibilidades.
Consideramos, nesta pesquisa, que a reflexão e discussão coletiva têm
implicações na forma como cada participante realiza suas reflexões e ações pessoais, ou
seja, como cada um constrói sua práxis, que não dicotomiza teoria e prática. A
articulação da dimensão individual e coletiva contribui de maneira positiva para
impulsionar o exercício da ação-reflexão-ação que ocorre no âmbito do indivíduo e do
coletivo. A dimensão epistemológica da pesquisa-ação considera as relações entre
sujeitos e conhecimento tendo em vista sua práxis. Monceau (2005) aborda a pesquisa-
ação na expectativa de que a intervenção de intenção analítica provoque uma renovação
da percepção que os indivíduos possuem da realidade social em que estão envolvidos. É
evidente que a pesquisa-ação tem efeitos de intervenção e a intervenção produz
conhecimentos [...] (MONCEAU, 2005, p. 469).
Todavia, realizar pesquisas dessa natureza é um grande desafio, uma vez que o
nível de reflexão do grupo e o tipo de relações que estabelecem entre si é variável; os
conflitos e dificuldades que emergem nas discussões e a forma como o grupo
compreende e aborda os conceitos e as relações com sua prática, são imprevisíveis. A
construção coletiva de conhecimentos a partir das análises e debates sobre determinados
aspectos da realidade, pode contribuir para ampliar a capacidade cognitiva, fortalecendo
princípios defendidos individualmente a partir da construção coletiva e potencializando
as ações que favorecem as mudanças consideradas necessárias. Mas é relevante que essa
construção coletiva seja sistematizada, registrada como documento histórico para
embasar a construção de outra história.
No caso desta pesquisa, os documentos e relatórios produzidos durante os
encontros foram organizados e voltaram ao grupo, que pôde rever conceitos ou
468

posições, retomar ideias e produzir novos conhecimentos e novos relatórios sobre o seu
saber-fazer. Não foi nossa intenção, nesta pesquisa, elaborar uma proposta para o
trabalho de coordenação pedagógica a ser recomendada. Antes, a intenção foi construir
coletivamente os conhecimentos relativos ao tema, vivenciando uma forma de trabalho
coletivo. O saber democrático, para Freire (1979), jamais se incorpora autoritariamente,
uma vez que só tem sentido como conquista comum do trabalho do educador e do
educando. Os saberes construídos e o uso que cada Professora Coordenadora fez ou fará
dos relatórios produzidos durante o processo é diferenciado, assim como o nível de
reflexão crítica e os conhecimentos construídos a partir de novas análises de tais
relatórios, que podem continuar provocando mudanças em seu saber-fazer na dimensão
profissional e pessoal.

A contínua construção e reconstrução de saberes


Discutimos nos Círculos de Debates que, para a coordenação do trabalho
político-pedagógico nos termos mencionados, é relevante que as Professoras
Coordenadoras construam e reconstruam certos saberes que foram apontados pelo grupo
como necessários para sua atuação enquanto participantes de uma equipe gestora.
Mesmo correndo o risco do reducionismo, destaco aqui alguns pontos que foram
sistematizados e registrados durante os encontros:

A) Saber fazer acontecer o trabalho coletivo.

Esse foi o desafio apontado pelas Professoras Coordenadoras como principal na


coordenação pedagógica. No âmbito escolar, a tendência ao individualismo ainda está
muito presente, influenciada pela organização social onde predomina essa lógica. É um
desafio para as Professoras Coordenadoras compreender essa realidade e problematizá-
la com o grupo, de forma a favorecer a construção gradativa de outra dinâmica de
trabalho escolar, mudando a lógica da escola na qual a participação, o diálogo e as
decisões coletivas tomem vulto. Para coordenar o trabalho coletivo, é importante
construir conhecimentos sobre os movimentos do grupo e lidar com os projetos
individuais e coletivos dos professores. A articulação do trabalho dos professores com o
trabalho de outros atores escolares e com a comunidade é um desafio ainda maior, que
implica no envolvimento de toda a equipe escolar e apoio da Secretaria de Educação. O
discurso da gestão democrática e da participação da comunidade não se concretiza
469

apenas por decreto e precisa ser construído de forma coletiva e contínua. O trabalho
coletivo é fundamental para a elaboração e implementação do Projeto Político-
Pedagógico, que implica em conhecer o local onde a escola se situa, os equipamentos
disponíveis no bairro, as possíveis parcerias no desenvolvimento do currículo,
realizando um amplo diagnóstico sobre a escola para intensificar os pontos fortes e
investir nas mudanças necessárias elaborando um planejamento coletivo.

B) Compreender a função social da escola no mundo contemporâneo.


Para a construção de outra concepção de educação, que valorize o diálogo, a
humanização e o cuidado com a vida, a formação em serviço também assume como
objeto de estudo e discussão a organização econômica, a cultura, as políticas públicas
que incidem sobre a educação. O papel da escola, dos educadores e seu compromisso
com a educação pública, que não se resume às ações escolares, também são conteúdos
na formação em serviço e implica em refletir sobre as opções políticas que os
educadores assumem no Projeto Político-Pedagógico em ação.

C) Incluir os professores como sujeitos do processo de ensinar e aprender.


Para a inclusão dos professores como corresponsáveis pelo trabalho coletivo é
importante discutir e acordar um contrato de trabalho com o grupo, os papéis e as
responsabilidades de cada um, de forma que os docentes sejam também sujeitos de seu
próprio processo formativo. É importante que o coordenador pedagógico conheça a
equipe docente, seus saberes, sua cultura, suas autoimagens, suas experiências, por meio
de conversas informais, questionários, observação de aulas, registro de episódios
relatados, manifestações durante discussões coletivas, atividades e avaliação que
propõem aos alunos, a forma como se relacionam com alunos, pais e equipe escolar.
Para a construção de outras relações, mais humanas e dialógicas a escuta é fundamental.
Não há diálogo sem escuta, não há problematização nem reflexão crítica sem escuta,
não há educação sem escuta. Saber escutar e dialogar requer também assumir uma
postura compreensiva, amorosa, humilde, acolhedora, o que pressupõe assumir tais
posturas na vida.

D) Coordenar o grupo de educadores articulando teoria e prática.


É importante que os coordenadores pedagógicos invistam em estudos teóricos e
saibam selecionar textos que possam contribuir para que os docentes estudem, discutam,
470

reflitam, relacionem teoria e prática, além de desafiá-los a também a compartilhar sua


prática com o grupo. Ao preparar uma reunião com professores, é importante retomar o
planejamento elaborado coletivamente, considerar o percurso do grupo, elaborar uma
pauta de trabalho e estudar essa pauta, antecipando possíveis questões. Além de textos
teóricos, as Professoras Coordenadoras podem também fazer uso de filmes, músicas,
imagens e outros recursos tecnológicos que possam contribuir com os debates coletivos
nas unidades escolares. O acompanhamento sistemático da prática docente, a
tematização das práticas à luz dos referenciais teóricos são aspectos fundamentais no
trabalho da coordenação pedagógica.

E) Saber pesquisar, estudar, construir bases teóricas que possam fundamentar


suas ações, discussões, reflexões.
As Professoras Coordenadoras constataram e explicitaram, no decorrer dos
trabalhos, sua necessidade de estudo, de construir fundamentação teórica. Esse estudo
não se refere apenas às teorias sobre formação de professores e sobre os problemas da
Educação em seus mais diversos aspectos. Incluem também estudos sobre currículo,
conteúdos de ensino e aprendizagem nos anos iniciais do ensino fundamental
articulando as áreas de conhecimento, conceito de ciclos de aprendizagem, estudos
sobre a perspectiva do trabalho com projetos, didática, inclusão das tecnologias no
currículo, dentre outros aspectos relativos à fundamentação teórica na educação escolar.

F) Articular formação coletiva e interações individuais.


O trabalho formativo na unidade escolar não ocorre apenas nas reuniões de
equipe, mas em todos os momentos de interação, inclusive nas interações individuais da
Professora Coordenadora com o docente. Não se trata, pois, de refutar a individualidade,
mas de articulá-la com a coletividade. A formação profissional de professores também
se articula com sua formação pessoal, sua capacidade de relacionar-se, comunicar-se, de
emocionar-se, de sensibilizar-se, que também traduz a dimensão ética e estética da
profissão docente.

Esses são apenas alguns destaques sobre a construção de saberes que emergiram
nos diálogos com o grupo de Professoras Coordenadoras que participaram da pesquisa.
Tais saberes se imbricam, se constroem e se reconstroem nas múltiplas relações que as
471

Professora Coordenadoras e Pesquisadora estabelecem com outros educadores, com o


objeto de conhecimento e no desempenho de sua atuação profissional.
Fica claro, dessa forma, que os saberes necessários à coordenação pedagógica,
que emergiram nas interações com as Professoras Coordenadoras, não estão prontos
para serem apreendidos e não foram suficientemente abordados de forma a favorecer
sua construção por todas. Tais saberes não são estáticos e se constroem e se reconstroem
continuamente, de forma peculiar para cada uma. Os registros reflexivos elaborados por
elas durante os encontros revelaram essa peculiaridade.
Por outro lado, os debates também evidenciaram os limites de ação das
Professoras Coordenadoras. Dentre os limites, destacaram que não podem assumir
sozinhas a responsabilidade pela formação contínua de professores em serviço no
âmbito escolar. As parcerias são necessárias, bem como um projeto formativo ampliado.
A formação contínua de professores também ocorre em muitos outros espaços fora da
escola, portanto, trata-se de uma ampla discussão sobre políticas públicas, que precisa
da participação de todos os envolvidos.

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mobilizar a equipe escolar para tecer o projeto pedagógico. In: GUIMARÃES, A. A. et
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Vozes.
473

Comunicação

As contribuições do PIBID na formação inicial de professores

Eveline Ignácio da Silva Marques


PUC/SP;
Grupo de Pesquisa Formação de Professores e Cotidiano Escolar
Bolsista CAPES
Marina Graziela Feldmann
PUC/SP
Grupo de Pesquisa Formação de Professores e Cotidiano Escolar

Resumo: A pesquisa analisa a formação inicial de professores, tendo como objeto o


Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) em uma IES
comunitária. A categoria da análise é a concepção de trabalho docente, que se justifica
considerando o distanciamento entre a formação inicial e a realidade da Educação
Básica. A fundamentação teórica parte da pesquisa documental do PIBID e de autores
como Feldmann (2003), Tardif e Lessard (2012), Gimeno Sacristan (2007), Burbules e
Torres (2004) e Nadal (2009). A pesquisa privilegia uma abordagem qualitativa de
caráter reflexivo, com finalidade descritiva e explicativa. Os meios de investigação
partem da pesquisa de campo, documental e bibliográfica. Como resultados parciais é
possível considerar que o PIBID enquanto política de formação inicial de professores
vem tomando espaço nas IES. A pesquisa de campo está em desenvolvimento e com os
resultados buscamos compreender os impactos na formação inicial.
Palavras-chave: Formação de professores; PIBID; trabalho docente.

INTRODUÇÃO
O presente texto apresenta os resultados parciais da pesquisa de doutorado
desenvolvida junto ao Programa de Pós-graduação em Educação: Currículo, da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) na linha de pesquisa Formação
de Educadores. A pesquisa se desenvolve partindo da análise da formação inicial de
professores da Educação Básica no Brasil, tendo como lócus as Instituições de Ensino
Superior (IES), considerando o impacto das políticas de formação de professores a
474

partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394 de 20 de dezembro de


1996 (LDB 9.394/96).
A escolha do objeto de pesquisa se situa no desenvolvimento de um programa
federal de formação inicial de professores denominado Programa Institucional de Bolsa
de Iniciação à Docência (PIBID) desenvolvido e coordenado pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). A delimitação da pesquisa
está na análise dos dados coletados em uma IES comunitária que desenvolve o projeto
do PIBID, localizada no município de Bauru, interior do estado de São Paulo e o recorte
da análise concentra-se na concepção de trabalho docente.

CONTEXTUALIZANDO O OBJETO
A CAPES, criada em 11 de julho de 1951, pelo Decreto nº 29.741, fundação do
Ministério da Educação (MEC), atua na coordenação e avaliação dos programas de pós-
graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) em todos os estados do Brasil, com
mecanismos de controle de qualidade. A partir de 2007, passou a atuar junto à formação
de professores da educação básica e dentre suas atividades desenvolve programas de
indução e fomento da formação inicial e continuada de professores para a educação
básica nos formatos presencial e a distância. Tal atribuição é consolidada no Decreto nº
6.755, de 29 de janeiro de 2009, que instituiu a Política Nacional de Formação de
Profissionais do Magistério da Educação Básica.
A partir deste decreto, cria duas diretorias, uma de Educação Básica Presencial
(DEB) e outra de Educação a Distância (DED). As ações de ambas culminaram com o
lançamento do Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica, em 28
de maio de 2009. Com este plano foram implementados programas para contribuir com
o aprimoramento da qualidade da educação básica e estimular experiências inovadoras e
o uso de recursos e tecnologias de comunicação e informação nas modalidades de
educação presencial e a distância.
Um destes programas é o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à
Docência- PIBID, institucionalizado pelo Decreto nº 7.219, de 24 de Junho de 2010. O
PIBID é um programa de formação de professores para a educação básica, que concede
bolsas a alunos de licenciatura participantes de projetos de iniciação à docência,
desenvolvidos por IES em parceria com escolas de educação básica da rede pública de
ensino. Os projetos de iniciação à docência das IES buscam inserir os estudantes no
contexto das escolas públicas desde o início da sua formação acadêmica para que
475

desenvolvam atividades didático-pedagógicas sob orientação de um docente da


licenciatura e de um professor da escola.
Os objetivos do PIBID são: incentivar a formação de docentes em nível superior
para a educação básica; contribuir para a valorização do magistério; elevar a qualidade
da formação inicial de professores nos cursos de licenciatura, promovendo a integração
entre educação superior e educação básica; inserir os licenciandos no cotidiano de
escolas da rede pública de educação, proporcionando-lhes oportunidades de criação e
participação em experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter
inovador e interdisciplinar que busquem a superação de problemas identificados no
processo de ensino-aprendizagem; incentivar escolas públicas de educação básica,
mobilizando seus professores como coformadores dos futuros docentes e tornando-as
protagonistas nos processos de formação inicial para o magistério; e contribuir para a
articulação entre teoria e prática necessárias à formação dos docentes, elevando a
qualidade das ações acadêmicas nos cursos de licenciatura.
O desenvolvimento do projeto de iniciação à docência nasce a partir do
lançamento do Edital da CAPES, em que as IES interessadas em participar apresentam
seus projetos para seleção, podendo se candidatar IES públicas e privadas com e sem
fins lucrativos que oferecem cursos de licenciatura. Se aprovadas, recebem cotas de
bolsas e recursos de custeio e capital para o desenvolvimento das atividades do projeto.
Já os bolsistas são selecionados por processos internos de cada IES.
Existem cinco modalidades de bolsas sendo elas de Iniciação à Docência
(estudantes de licenciatura); Supervisão (professores de escolas públicas de educação
básica que supervisionam, no mínimo, cinco e, no máximo, dez bolsistas da
licenciatura); Coordenação de área (professores da licenciatura que coordenam
subprojetos); Coordenação de área de gestão de processos educacionais (professor da
licenciatura que auxilia na gestão do projeto na IES) e Coordenação institucional
(professor da licenciatura que coordena o projeto PIBID na IES). As bolsas são pagas
pela CAPES diretamente aos bolsistas, por meio de crédito bancário, entretanto, as IES
públicas e privadas sem fins lucrativos podem receber recursos financeiros para custear
despesas essenciais à execução dos projetos, por exemplo, a aquisição de material de
consumo para as atividades desenvolvidas nas escolas.
476

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A temática que envolve a formação inicial de professores é sempre relevante, pois
nela se encontra a possibilidade de aperfeiçoamento do ensino brasileiro, especialmente
da rede pública de ensino. Atualmente são várias as ações e políticas no âmbito nacional
e estadual que buscam a melhoria da qualidade do ensino, pois as análises e estudos
sobre o tema demonstram a necessidade premente de se transformar tal situação.
Para Feldmann (2003) a questão nuclear em um processo de desenvolvimento de
políticas educacionais está em considerar a complexidade, ambiguidade e diversidade,
presentes na relação entre educação e contemporaneidade.
Nos estudos sobre a função social da escola, Nadal (2009) afirma que não se tem
conseguido reverter o quadro da educação, principalmente a pública, inclusive esta em
alguns sentidos se agrava com o matiz neoliberal, universalização e verticalização do
sistema capitalista de produção que intensifica a diferença entre ricos e pobres, e com
isso cria a dificuldade de se estabelecer um projeto educativo coerente e transformador
da sociedade atual.
Corrobora com isso a necessidade de ampliarmos o debate sobre a formação
inicial de professores e neste sentindo podemos considerar que tais programas de
indução e fomento da formação inicial e continuada de professores para a educação
básica, como é o caso do PIBID, são políticas em desenvolvimento que culminam com
a construção de uma concepção de trabalho docente no Brasil.
Nesta linha de compreensão, evidenciamos a relação educação e mundo do
trabalho como um recorte da contemporaneidade e considerando que a construção da
existência humana passa pelo mundo do trabalho, passamos a explicitar as concepções
de trabalho.

A concepção de trabalho
Feldmann (2003) apresenta a concepção de trabalho em diferentes momentos
históricos. Inicialmente no mundo greco-romano, o trabalho era considerado atividade
menor, própria dos escravos, sendo que a cultura grega nega a relação entre atividade
teórica e atividade prática, de forma que o homem era compreendido como um ser
teórico por excelência, e essa cultura tinha atitude depreciativa com relação à práxis
material produtiva. Já no renascimento, o homem passa a ser entendido como um ser
além de teórico, criador e criativo, capaz de interferir na natureza e no mundo,
resultando na redução da distancia entre atividade física e intelectual. Do século X ao
477

XV, Feldmann (2003) destaca a ausência da ideia de lucro, sendo a vida econômica e
social considerada a mesma coisa, e o trabalho um fim em si mesmo.
No advento da idade média o trabalho e o capital não existiam como agentes
básicos da produção, a terra não possuía o sentido moderno de propriedade vendável,
fonte de renda, compra e venda. No sistema feudal, segundo Feldmann (2003) a terra
passou a ser usada como medida das riquezas do homem e com o comércio
desenvolveu-se um novo tipo de riqueza: o dinheiro. No mundo pré-capitalista, capital e
trabalho tiveram uma concepção bastante diferente, não havia a noção de mercado de
trabalho, e o desenvolvimento do comércio foi a principal causa da desintegração da
sociedade medieval.
Feldmann (2003) destaca que, no século XVIII ocorre um processo de
valorização do trabalho como atividade humana, e no início do século XIX, o
liberalismo clássico proporcionou as bases filosóficas do sistema capitalista industrial.
Esse breve relato histórico nos leva a refletir sobre
Qual o lugar da docência entre essas transformações? Lembremo-nos que a
docência é uma das mais antigas ocupações modernas, tão antiga quanto a
medicina e o direito. Ora, quando a situamos dentro da organização
socioeconômica do trabalho, ela representa atualmente um setor nevrálgico sob
todos os pontos de vista. (TARDIF, LESSARD, 2012 p. 21)

Globalização, cultura e trabalho docente


Considerando os aspectos da concepção de trabalho, para pensarmos na
formação inicial de professores, e na ação docente como trabalho, precisamos
compreender o conceito de globalização e a função da educação na sociedade e cultura
globalizadas. Para tanto, partimos das reflexões de Gimeno Sacristán (2007).
O termo globalização para o autor é um “guarda-chuva semântico” (p.21), mas,
pressupõe “as partes do mesmo” em uma grande rede que condiciona cada peça do todo,
e superando o reducionismo economicista, quando concentrada na dimensão cultural, a
globalização traz novos desafios para a educação.
[...] é o termo da atualidade para expressar as inter-relações econômicas,
políticas, de segurança, culturais e pessoais entre os indivíduos, os países e os
povos, dos mais próximos aos mais distantes lugares do planeta. (GIMENO
SACRISTÁN, 2007, p. 17).

Para a compreensão deste movimento devemos considerar o papel da cultura e


suas determinações históricas, geopolíticas e econômicas. Para o mesmo autor acima
referenciado (2007), a cultura é uma forma de desfazer mal-estares, infligir danos, mas
pode servir para desvalorizar os demais, sentir-se superior, para justificar nossas ações.
478

Para o autor, o conflito entre culturas revela muitas vezes uma oposição entre
marginalizados e marginalizadores. “A globalização não pode ficar limitada a uma
ligação entre ‘os de cima’, deixando de fora ‘os de fora’”. (p.19)
O comércio aproximou povos e culturas, mas em uma perspectiva neoliberal, ao
não distribuir riqueza, não aproxima ou integra, mas provoca desigualdades, exclusão de
países inteiros. Independentemente de como os indivíduos participam da sociedade e da
cultura o mercado liga produtores e consumidores, ao mesmo tempo em que desfaz
laços sociais de cooperação e o sentimento de pertença.
[...] a racionalidade científico-tecnológica, a tentativa de dominar e governar o
mundo físico, a aplicação da lógica econômica não podem por si só governar o
mundo, dar sentido a nossas vidas, sustentar relações harmoniosas e preencher
nossas aspirações de conhecer e de ser. Uma simples arma branca manejada
por uma ideia e alguns valores pode derrotar toda a parafernália tecnocientífica
em que se apoia nossa forma de ser e viver ocidentais. (GIMENO
SACRISTÁN, 2007, p. 20)

Para Gimeno Sacristán (2007) o contexto da educação está repleto de


representações sobre o outro, de entendimento das situações humanas de conflito, em
que a política nos aproxima física e simbolicamente, nos une, mas também nos separa.
Desta forma, a questão que o autor nos coloca é: “podemos viver juntos em um mundo
que, ao promover a aproximação e o encontro das culturas, dá lugar às
desigualdades?” (p.20). Com isso, o autor reforça que, está na educação a possibilidade
de resolver os conflitos e consolidar a convivência.
Ainda em referência ao termo globalização, Gimeno Sacristán (2007) apresenta
que, dependendo da sua manifestação - na cultura, comunicação, economia, comércio,
relações internacionais, política, no mundo do trabalho, na vida cotidiana – adquire uma
peculiaridade, principalmente neste tempo que denomina como “segunda modernidade”
(p.21) presente nas duas últimas décadas do século XX.
[...] um termo que se entrelaça com outros conceitos e expressões profusamente
utilizados: neoliberalismo, novas tecnologias da comunicação e mundo da
informação. Todos eles tratam de explicar diferentes fenômenos, mesmo que
intimamente ligados, não se podendo referir a qualquer um deles sem
relacioná-lo aos demais, mas nenhum esgota os outros. Na medida em que cada
um apresente temas, problemas e consequências peculiares, podemos estruturar
o discurso centrando-o sobre algum deles. (GIMENO SACRISTÁN, 2007, p.
21).

Há, contudo, a valorização do conhecimento, de forma que o sistema produtivo, o


trabalho, as culturas locais, as relações sociais, mudaram consideravelmente. Tais
mudanças de ordem política, e por isso de ação transformadora, influenciam
diretamente a educação, no que se refere ao entendimento da democracia, da
479

organização do sistema educacional, da concepção de pessoa, e conforme destaca o


autor de uma nova visão de aprendizagem, sua finalidade, contexto, conteúdo e
motivações.
Vale destacar que Gimeno Sacristán (2007) atribui o entendimento que temos do
mundo globalizado como um mundo em rede, às imposições dos poderosos sobre os
que estão em condições de inferioridade, com isto apresenta algumas dificuldades para
o correto entendimento do termo.
A primeira delas é que tem consequências desiguais, pois apesar de
aparentemente interdependentes, somos também dependentes, e muitas vezes
dependemos e sofremos ou aproveitamos e nos beneficiamos.
Outra dificuldade apontada é o fato de a globalização ser algo mais complexo do
que os mercados, de um lado com a ideia de transnacionalização dos recursos
financeiros, economia desestatizada, mundialização dos mercados, de outro lado a ideia
mais global de políticas econômicas.
A última dificuldade apresentada pelo autor é de que a globalização implica uma
reconversão da linguagem, e tal critica sugere que existe certa anulação das
singularidades dos povos e que devemos refletir sobre “que fronteiras ultrapassar e
quais preservar” (GIMENO SACRISTÁN, 2007, p. 25). Com isso o autor afirma que
A educação pode ser um instrumento para dar consciência desta realidade e
ajudar a esmiuçá-la. Este seria o novo horizonte para o moderno princípio de
“educar para a vida” que requer agora uma alfabetização cultural mais exigente
com um olhar muito mais amplo. (GIMENO SACRISTÁN, 2007, p. 25)

Neste sentido, a formação dos professores se torna fundamental, tendo como foco
o “um olhar global sobre um mundo em rede” (p.26) de forma a surgir um novo
currículo. O fato é que, a educação neste contexto ainda é complexa, uma vez que é
fruto e trabalha em prol de uma ideologia e dinâmica globalizante, como também para
uma resistência a ela.
Destaca ainda que o primeiro efeito da globalização sobre os processos
educativos, se refere ao direito e dever de oferta de condições mínimas de igualdade de
educação. Entretanto, isso foi apoiado por políticas neoliberais que aumentaram as
desigualdades, e a política de Estado passou para decisões privadas, deixando de lado
políticas integradoras.
Outro aspecto fundamental se refere às relações entre condições sociais, educação
e trabalho. Inicialmente a precariedade familiar, pais que não conseguem dedicar um
tempo de qualidade aos seus filhos, assim como no que se refere ao emprego, que
480

devido a tantas mudanças rápidas, falta identidade e realização das pessoas no que
fazem. Sugere que o desafio da educação é “preparar não se sabe muito bem para que”
(p.30) e com isso a educação tem que se adequar as necessidades sociais, as exigências
da produtividade, da competitividade, do mercado, mas que não existem referências
para tal, devido a mudanças muito rápidas.
Um significativo efeito da globalização na educação incide sobre as pessoas, os
conteúdos do currículo e as formas de aprender, e isto afeta diretamente as fórmulas
básicas de transmissão dos saberes, o que pode até deslocar a função do docente, mas
não simplesmente substituí-lo por tecnologias, como parecer prever a globalização.
Considerando a cultura como um processo dinâmico, a globalização permite
acelerar os processos, principalmente de comunicação entre as culturas, mas para esta
análise se faz necessário compreender o que entendemos como cultura.
No sentido clássico, cultura é a “tradição codificada por meio da escrita”
(GIMENO SACRISTÁN, 2007, p. 32) acumulada, estruturada e ordenada em campos
de saber, de saber fazer e de formas de expressão. Denominada pelo autor como
“cultura culta” constitui um legado anônimo global, positivo e conservado, não tem a
característica de território geográfico ou social. Nesta encontramos de acordo com o
autor, o conceito de multiculturalidade, que não se refere ao conceito de cultura culta,
pois não existe uma regra, mas múltiplas, onde através do conhecimento do outro, nos
apropriamos de suas contribuições, misturamos com o outro sem perder as
singularidades locais.
Outro sentido de cultura, de origem alemã, se refere ao
[...] conjunto da experiência, tradições, modos de vida, de expressão, de saber
fazer e formas de ser de um povo ou comunidade com as quais se identifica de
fora e com as que os indivíduos se identificam como seres que lhes unam a
outros e são da mesma cultura. Esta acepção é a que levou a falar de culturas
nacionais e depois em seu significado étnico ou antropológico, por trás de
expressões como “cultura alemã”, “cultura basca”, “cultura guarani”, “cultura
rural”, “cultura cristã”, etc. (GIMENO SACRISTÁN, 2007, p. 34).

Nesta referencia o essencial é compreender a dimensão territorial de cultura,


assim como a sua demarcação social, de pertença, de vínculo, o que acentua o caráter de
subjetividade das pessoas e seus modos de vida e neste sentido de cultura, a
globalização tem efeitos contraditórios, pois por mais que se comuniquem e conheçam
diferentes culturas, os grupos precisam manter suas especificidades.
Pensar em políticas de formação inicial de professores é pensar em conceitos e
impactos da globalização nestas políticas, e por isso os educadores devem reconhecer a
481

força de concepções como trabalho, mundialização, neoliberalismo, multiculturalismo e


enxergar suas implicações para moldar e limitar as escolhas disponíveis de políticas e
práticas educacionais.
Autores como Burbules e Torres (2004) nos atentam sobre a necessidade de
ficarmos atentos ao discurso da "inevitabilidade" que motiva a prescrição de certas
políticas e assim, devemos situar o debate contemporâneo numa perspectiva histórica.
Tal perspectiva caminha no sentido de esclarecer alguns questionamentos
fundamentais na análise de políticas de formação inicial de professores. Um deles é a
necessidade de compreensão das formas como o esforço educacional pode ser afetado
pela globalização, e sua ameaça à autonomia de sistemas educacionais nacionais? Outro
questionamento é sobre de que maneira a globalização está afetando as condições
fundamentais de um sistema educacional que tem por premissa integrar-se em uma
comunidade caracterizada pela proximidade e a familiaridade?
Tais questões nos levam a refletir sobre a compreensão da versão neoliberal da
globalização e seus reflexos educacionais que privilegiam, e de certa forma impõem
políticas de avaliação, financiamento, padrões, formação de professores, currículo,
instrução e testes.
É neste contexto que precisamos estudar as concepções de trabalho docente, e
Nadal (2009) destaca que tal trabalho foi configurado semelhante ao processo de
produção fabril, pautado em manuais e métodos de ensino coletivos e não mais
individualizados, o que barateou o custo do processo de escolarização. A medida em
que a escola passou a ser fator de interesse público e submetida a intervenção estatal, a
organização do sistema foi criada, regulando marcos legais do trabalho docente
(formação, acesso, condições de trabalho), do funcionamento, da administração e do
currículo.

OBJETIVOS DA PESQUISA
O objetivo geral desta pesquisa é identificar as contribuições do PIBID na
formação inicial de professores em uma IES comunitária. Como objetivos específicos,
pretendemos explicitar conceitos, objetivos e organização do PIBID; descrever/discutir
políticas de formação inicial de professores no Brasil pós LDB 9.394/96; pesquisar as
contribuições do PIBID para os bolsistas de uma IES Comunitária; analisar/apresentar
ações realizadas por bolsistas do PIBID de uma IES Comunitária por outros envolvidos
– coordenadores de curso, equipe gestora e professores das escolas.
482

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa privilegia uma abordagem qualitativa de caráter reflexivo, com
finalidade descritiva e explicativa. Os meios de investigação serão desenvolvidos a
partir da pesquisa de campo, utilizando-se de procedimentos/instrumentos como
entrevistas e questionários semiestruturados, além da pesquisa documental e
bibliográfica.
Optou-se pelo questionário, devido às suas vantagens, dentre elas destaca-se:
[...] economia de tempo; [...] maior liberdade nas respostas em razão do
anonimato; mais segurança pelo fato de as respostas não serem identificadas;
menos risco de distorção pela não influência do pesquisador; há mais tempo
para responder e em hora mais favorável; há mais uniformidade na avaliação,
em virtude da natureza impessoal do instrumento e obtém respostas que
materialmente seriam inacessíveis. (LAKATOS; MARCONI, 1991, p.202-203)

Outro instrumento de coleta de dados será uma entrevista individual


semiestruturada. Embora conduzidas por um roteiro, haverá flexibilidade nas questões.
Estas entrevistas serão gravadas e, posteriormente transcritas.
A entrevista, como técnica de coleta de dados, também oferece várias vantagens.
[...] há maior flexibilidade, podendo o Entrevistador repetir ou esclarecer
perguntas, formular de maneira diferente, especificar algum significado, como
garantia de estar sendo compreendido; oferece maior oportunidade para avaliar
atitudes, condutas, podendo o Entrevistado ser observado naquilo que diz e
como diz: registro de reações, gestos etc; dá oportunidade para a obtenção de
dados que não se encontram em fontes documentais e que sejam relevantes e
significativos; há possibilidade de conseguir informações mais precisas,
podendo ser comprovadas, de imediato, as discordâncias. (LAKATOS,
MARCONI 1991, p. 198)

Os questionários serão realizados por alunos e supervisores bolsistas do PIBID,


assim como pela equipe gestora e professores regentes das escolas em que o Programa é
desenvolvido. Já as entrevistas serão realizadas com bolsistas coordenadores e
coordenadores de cursos de licenciatura envolvidos.
Os dados dos questionários e das entrevistas serão tabulados e analisados através
de métodos estatísticos que serão usados para facilitar a interpretação e análise,
considerando se tratar de uma pesquisa qualitativa.

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS
Como a pesquisa encontra-se em desenvolvimento, os resultados são parciais. É
possível considerar inicialmente que o PIBID enquanto política de formação inicial de
professores vem tomando espaço nas IES, especialmente nas comunitárias. Com o edital
483

2013 o número de bolsas aumentou. Nota-se também uma ampliação do investimento


ao mesmo tempo em que o interesse das IES aumentou o que pode caracterizar uma
análise de qualidade dos projetos dos editais anteriores. Na IES pesquisada, o número
de projetos triplicou, assim como o número de bolsistas. A pesquisa de campo ainda não
foi desenvolvida, por isso não existem análises qualitativas dos resultados, sendo que a
previsão da aplicação é para o segundo semestre de 2014 e com e a partir dessa etapa é
que pretendemos buscar a explicitação da concepção sobre trabalho docente na
formação inicial.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Decreto nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009. Institui a Política Nacional de


Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, disciplina a atuação da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior -CAPES no fomento a
programas de formação inicial e continuada, e dá outras providências. Diário Oficial da
União, Brasília, DF, 20 jan 2009.

BRASIL. Decreto nº 7.219, de 24 de junho de 2010. Dispõe sobre o Programa


Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID e dá outras providências. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 24 jun 2010.

BRASIL. Lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da


educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 dez 1996.

BURBULES, N. C. TORRES, C. A. Globalização e educação: uma introdução. In:


BURBULES, N. C. TORRES, C. A. Globalização e educação: perspectivas críticas.
Porto Alegre, RS: Artmed, 2004. Capítulo 1 – p.11-26.

CAPES. Portaria nº 260, de 30 de dezembro de 2010. Aprova as normas gerais do


PIBID. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 30 dez 2010.

CAPES. Portaria nº 96, de 18 de julho de 2013. Aprova o Regulamento do PIBID.


Diário Oficial da União, Brasília, DF, 18 jul 2013.

FELDMANN, M. G. Questões contemporâneas: mundo do trabalho e democratização


do conhecimento. In: SEVERINO, J. A; FAZENDA, I. C. A. (orgs.) Políticas
educacionais: o ensino nacional em questão. Campinas, SP: Papirus, 2003. (Série
Cidade Educativa). p. 127-150

GIMENO SACRISTAN, J. Educar e conviver na cultura global: as exigências da


cidadania. Porto Alegre, RS: ARTMED, 2002.

LAKATOS, E. M; MARCONI, M. Fundamentos da Metodologia Científica. São


Paulo: Atlas, 1991.
484

NADAL, B. A escola e sua função social: uma compreensão à luz do projeto de


modernidade. In: FELDMANN, M. G. Formação de professores e escola na
contemporaneidade. São Paulo: SENAC, 2009. p. 19 – 33.

TARDIF, M.; LESSARD, C. Trabalho docente: elementos para uma teoria da


docência como profissão de interações humanas. 7.ed. Petropólis, RJ: Vozes, 2012.
485

Comunicação

Educação infantil: princípios, organização e gestão

Fabiana Silva Fernandes


Fundação Carlos Chagas

Resumo: O trabalho analisa a organização da educação infantil no Brasil e discute


concepções de gestão para essa etapa da educação básica. Para a sua realização,
procedeu-se, primeiramente, pela análise de medidas legais e políticas para a Educação
Básica, fundamentalmente ações do governo federal, que afetam a organização da
educação infantil. Em segundo lugar, foram mencionados programas e ações
governamentais voltados para a gestão escolar da educação básica. Por fim, discutiu-se
a organização da gestão da unidade de educação infantil. A reflexão indica que a gestão
da educação infantil tem como parâmetro o ensino fundamental, representando um
desafio para essa etapa, em termos da consideração de suas especificidades na oferta de
um serviço caracterizado por práticas educativas e de cuidados para crianças de zero a
cinco anos.
Palavras-chave: Educação Infantil, Política Educacional, Gestão Educacional

Considerando a importância que a educação infantil vem adquirindo no Brasil, o


texto tem por objetivo discutir aspectos da organização e da gestão da educação infantil,
tendo como referência documentos normativos e políticas do governo federal para a
educação infantil e para a básica como um todo.
A educação no Brasil conta com grande número de leis e outras normatizações
provindas das esferas federal, estadual e municipal, que definem a estrutura e o
funcionamento da educação brasileira. São princípios, diretrizes e regulamentações que
orientam o arranjo institucional dos sistemas educacionais e seus mecanismos de gestão
e financiamento. Esse sistema legal configura a gestão educacional, na medida em que
abrange dispositivos que vão desde a proposição de diretrizes curriculares até o
financiamento da educação e fontes de recursos (Cury, 2001).
Desde a Constituição Federal de 1988, a educação infantil, englobando a creche e
a pré-escola, constitui a primeira etapa da educação básica. Esta definição, reforçada na
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN 9.394, de 1996, implica no
486

reconhecimento legal do direito da criança pequena à educação e na obrigação do


Estado atender à demanda. Até recentemente, essa obrigação não se estendia à família;
porém a legislação sobre a obrigatoriedade legal foi alterada em 2006, tornando
obrigatória a educação para a faixa etária dos quatro aos 17 anos, abrangendo, portanto,
a pré-escola1.
Os princípios legais relacionados à educação infantil são frutos das conquistas de
movimentos sociais organizados que, desde a década de 1970, reivindicam-na como um
direito da mulher trabalhadora que necessita de um local seguro para os filhos pequenos.
Aos poucos esse direito amplia-se, passando a ser um direito da criança e da família.
Campos (2008) discorre sobre os motivos que justificam a sua crescente importância, os
quais são caracterizados, inicialmente, por uma demanda privada, tornando-se, de forma
gradativa, uma demanda social, um dever do Estado e um direito subjetivo:

Os motivos que justificam a crescente importância que vem sendo conferida


à Educação Infantil são de diversas naturezas. Em primeiro lugar, decorrem
das profundas mudanças ocorridas no papel da mulher na sociedade moderna,
e as consequentes transformações nos arranjos familiares que envolvem a
proteção, o cuidado e a educação dos filhos. Em segundo, são reflexo das
condições de vida nas cidades, onde agora vive a maioria das populações nas
nações industrializadas que, provocaram grandes mudanças na forma como
as crianças vivem sua infância. Em terceiro, estão fundamentados na
evolução das pesquisas científicas sobre o desenvolvimento físico, cognitivo,
afetivo e social dos seres humanos, assim como nos estudos que constatam
que a frequência a boas pré-escolas melhora significativamente o
aproveitamento das crianças na escola primária, especialmente no caso de
alunos de baixa renda. Finalmente, indicam o reconhecimento, no plano
internacional, dos direitos da criança, que incluem o direito à educação de
qualidade desde os primeiros anos de vida. Direitos esses que vêm sendo
conquistados e reafirmados graças à mobilização das mulheres, dos
educadores e de todos aqueles que desejam viver em sociedades mais justas e
democráticas. (CAMPOS, 2008, p. 92)

Do ponto de vista da organização da educação infantil, sua oferta foi definida


como uma incumbência dos municípios. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN 9394/1996) promoveu a reestruturação do ensino pela distribuição
das funções administrativas entre os níveis de governo.
No que se refere ao atendimento dos diferentes níveis de ensino, coube aos
municípios atuar no ensino fundamental, prioritariamente, e na educação infantil.

1
Embora o ensino médio não seja objeto de discussão deste texto, é importante fazer uma observação: a
obrigatoriedade refere-se à faixa etária e não ao nível de escolarização. Nesse sentido, as pessoas entre
quatro e 17 anos estarão obrigadas a frequentar instituições escolares, o que não significa que, no final
dos 17 anos, o indivíduo tenha concluído o ensino médio. No entanto, o ingresso aos quatro anos de idade
deve ocorrer na pré-escola.
487

O Plano Nacional de Educação anterior, aprovado em 2001, reafirmou as


competências dos entes federados na manutenção de seus respectivos sistemas de
ensino, mas discorreu sobre a responsabilidade mútua das três esferas de governo e da
família em relação à educação infantil. Em consonância com a Constituição Federal, o
plano afirmou que a União e os estados deveriam atuar subsidiariamente, embora
necessariamente, em apoio técnico e financeiro aos municípios. E, uma vez que a ação
dos governos municipais tende a enfrentar maior fragilidade orçamentária (CARA,
2012), o apoio da União e dos estados torna-se imprescindível.
Por outro lado, a passagem das creches, anteriormente vinculadas às áreas da
assistência social, saúde e trabalho, para o setor educacional, trouxe novos desafios à
gestão municipal da educação e ampliou o mercado de trabalho dos professores para a
população de crianças menores de quatro anos.
Além desses, outros fatores contribuíram para dar um maior destaque à educação
infantil: nos grandes centros torna-se cada vez mais evidente a crescente demanda por
creches, que não consegue ser atendida pelas prefeituras, conferindo a esse tema maior
espaço nas disputas eleitorais; e a persistência do fracasso escolar no ensino
fundamental sugere que é preciso dar mais atenção à oferta e à qualidade da educação
infantil, cujos benefícios para o desempenho no ensino fundamental são reconhecidos
por muitas pesquisas.

Política, programas e ações do governo federal na educação básica: reflexos sobre


a educação infantil

Há uma série de políticas para a educação básica que afetam a educação infantil,
ainda que não se destinem a ela. De acordo com Campos (2010), é possível identificar
algumas medidas, nesse sentido, como o ensino fundamental de nove anos e a educação
obrigatória dos quatro aos dezessete anos, que não só promoveram uma reconfiguração
da organização da educação básica, mas mobilizaram questões históricas, ainda não
resolvidas na educação brasileira, como a cisão entre a creche e a pré-escola e as
dificuldades de alfabetização das crianças nos primeiros anos do ensino fundamental.
Essas questões dizem respeito ao direito à educação infantil e afetam a qualidade das
instituições de educação infantil e também dos anos iniciais do ensino fundamental.
Com a reforma administrativa do Estado, nos anos de 1990, foram alteradas as
bases de autoridade dos governos locais pela ampliação da parcela dos tributos federais,
488

transferidos automaticamente aos entes federados. Esses tributos destinaram aos


municípios uma “autoridade tributária” sobre impostos de significativa importância,
como por exemplo, o Fundef, que promoveu a indução do processo de municipalização
da educação (AZEVEDO, 2002; CASTRO, 2007) e a priorização de investimento no
ensino fundamental, o que trouxe impacto para a educação infantil.
A definição da política de financiamento do ensino fundamental, com a criação do
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (FUNDEF), parece ter gerado alguns dificuldades para os municípios
implementarem suas redes de educação infantil, na medida em que 25% do seu
orçamento em educação deveria ser destinada ao ensino fundamental.
Até a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e
de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), em substituição ao
FUNDEF, a educação infantil não contava com recursos especialmente vinculados a seu
financiamento, deixando a maioria dos municípios, que devem prioritariamente atender
a essa etapa educacional, sem muitas condições concretas para oferecer e ampliar sua
oferta de vagas. Porém, a partir de meados da última década, o novo fundo tem
contribuído para estimular o atendimento à educação infantil no país.
A Emenda Constitucional 53/2006 gerou mudança na estrutura da educação
infantil, uma vez que se determinou que as crianças de seis anos completos deveriam ser
matriculadas no ensino fundamental. No campo da educação infantil houve muitas
críticas a essa medida, mas a discussão ficou localizada mais fortemente no âmbito da
institucionalidade da educação infantil, o que gerou poucos compromissos e
preocupações com as crianças de seis anos de idade.
Em 2009, aprovou-se a Emenda Constitucional 59/2009, que estabeleceu como
princípio a obrigatoriedade do ensino para a faixa etária dos quatro aos dezessete anos.
Como resultado dessa medida, a frequência das crianças de quatro e cinco anos à pré-
escola tornou-se obrigatória.
Passados três anos, a obrigatoriedade foi regulamentada, em 4 de abril de 2013,
pela Lei 12.796, que alterou a LDBEN 9394/1996, dispondo, entre outros assuntos,
sobre a obrigatoriedade da educação básica e gratuita dos quatro aos 17 anos de idade,
organizada em pré-escola, ensino fundamental e ensino médio (Art. 4º, inciso I) e sobre
o dever dos pais ou responsáveis de efetuar a matrícula das crianças na educação básica,
a partir dos quatro anos de idade (Art. 6º).
489

Além da legislação, programas e ações federais, sob a responsabilidade do


Ministério da Educação, tem sido adotados em todas as etapas da educação básica.
Exercendo o seu papel na coordenação da política para a educação nacional, o
Ministério da Educação tem tomado uma série de iniciativas para promover algumas
mudanças na implementação das políticas municipais de educação. Nesse sentido, serão
apontadas algumas ações do governo federal, realizadas nos últimos dez anos.
Entre as iniciativas de caráter técnico, percebe-se a preocupação em colocar em
pauta a gestão da educação tanto da unidade quanto dos órgãos públicos pelo
desenvolvimento de programas específicos que visam qualificar os gestores. Destacam-
se, nesse sentido, o Programa de Apoio aos Dirigentes Municipais de Educação
(Pradime), o Programa Nacional de Capacitação de Conselheiros Municipais de
Educação (Pró-Conselho) e o Programa Nacional “Escola de Gestores da Educação
Básica Pública” (IPEA, 2011)2.
O Programa de Apoio aos Dirigentes Municipais de Educação (Pradime) é uma
iniciativa importante do Ministério da Educação, em parceria com a União dos
Dirigentes Municipais de Educação (Undime), uma vez que tem por finalidade
fortalecer a atuação dos dirigentes na gestão dos sistemas de ensino e das políticas
educacionais.
As ações do programa são feitas por meio da oferta de cursos periódicos de
formação, voltados para os dirigentes municipais de educação e abordam aspectos
teóricos e práticos da gestão educacional no âmbito municipal, organizados em torno
dos seguintes temas:
− a educação no contexto da política de desenvolvimento com igualdade
social;
− organização da educação nacional no contexto do fortalecimento da
educação básica: o papel do município;
− avaliação de políticas educacionais;
− políticas educacionais para um Brasil de todos;
− financiamento e gestão orçamentária da educação;
− gestão de recursos materiais;
− gestão democrática da educação;

2
A descrição dos programas e das ações mencionadas pode ser obtida na página do Ministério da
Educação, disponível no endereço: http://portal.mec.gov.br.
490

− gestão pedagógica da educação escolar;


− valorização dos trabalhadores da educação: docentes e não-docentes.
(PRADIME, 2006)
É um programa extenso, que busca formar os dirigentes para ter uma
compreensão ampla da educação nacional e dos mecanismos necessários para a
implementação da política municipal de educação.
Em relação à educação infantil, o programa orienta os dirigentes com relação a
sua estrutura e funcionamento, apontando as responsabilidades dos municípios para com
a oferta, no que se refere a financiamento, padrões mínimos de funcionamento, recursos
humanos, insumos materiais, previsão de vagas e fiscalização de instituições privadas.
Menciona o Plano Nacional de Educação (PNE 2001-2011), discutindo as metas
relacionadas com as condições de funcionamento das instituições de educação infantil
no Brasil.
Na educação infantil, especificamente, não se pode desconsiderar a ação do
governo federal na prestação de assistência financeira e apoio técnico-pedagógico, por
meio da implementação do Programa Nacional de Reestruturação e Aquisição de
Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação Infantil (ProInfância).
O ProInfância consumiu parcela significativa de recursos do orçamento da
educação básica, do Ministério da Educação. De acordo com dados do IPEA (2011), o
programa concentrou, em 2009, “os recursos destinados à reestruturação da rede física
pública da educação básica, cuja execução chegou a 94% da dotação inicial e
aproximou-se dos R$ 550 milhões” (p. 141). Os recursos foram utilizados para a
construção de prédios e para aquisição de equipamentos e mobiliários para a creche e
pré-escolas públicas.
Foram desenvolvidos também programas de formação inicial e continuada, de
professores de educação infantil, do ensino fundamental e médio, por meio do Sistema
Universidade Aberta do Brasil (UAB), dado o déficit de qualidade dos recursos
humanos presentes nas escolas públicas. Conforme observado pelo IPEA (2011) a taxa
de docentes com nível superior, em 2009, estava muito abaixo das metas previstas pelo
Plano Plurianual para 2011, em todas as etapas da educação básica, mas na educação
infantil, esse descompasso é mais surpreendente: 48,9% dos professores de educação
infantil, em 2009, não tinham ensino superior, sendo a meta do governo federal, para
2001, elevar essa taxa para 70%.
491

Sobre a gestão da unidade de educação infantil fundamenta-se nos princípios e


normas estabelecidas para toda a educação básica, como a autonomia, a gestão
democrática e a construção de um projeto pedagógico próprio. No entanto, não se pode
perder de vista as suas especificidades, relacionadas com o desenvolvimento de
programas voltados para as práticas educativas e de cuidados, exigindo a organização de
um ambiente pedagógico diferenciado. No próximo item serão apresentados alguns
aspectos da gestão das unidades de educação infantil.

Gestão da unidade de educação infantil: princípios e práticas

A autonomia escolar, tal como disposto na legislação, é constituída pela


capacidade organizacional da escola para elaborar seu projeto educacional e pela
capacidade de gerenciar e executar diretamente os recursos destinados ao
desenvolvimento e manutenção do ensino (PARENTE, LÜCK, 1999). Com o incentivo
à autonomia pedagógica, administrativa e financeira, tal como definido na Lei de
Diretrizes e Bases, a escola deve se comprometer com o tratamento a ser dado a
conteúdos curriculares, métodos de ensino, uso mais adequado do tempo e do espaço
físico e gerenciamento dos recursos humanos e materiais que receber para realizar seu
próprio projeto.
Dessa forma, no âmbito da gestão escolar insere-se a responsabilidade pela
administração dos recursos financeiros, humanos e pedagógicos e por responder
rapidamente às demandas, de acordo com suas peculiaridades e com o uso eficiente dos
recursos que lhe são destinados.
Na educação infantil, especialmente no caso das creches, a prática do
conveniamento traz consigo movimentos contraditórios em relação à autonomia escolar.
Na realidade, na medida em que os sistemas de educação procuram garantir condições
básicas de funcionamento nas unidades conveniadas com os municípios, chamam a si
maior poder de controle e intervenção nesses estabelecimentos. Em algumas capitais
brasileiras, como revelou pesquisa desenvolvida na Fundação Carlos Chagas (Campos
et al, 2010), observa-se até uma tendência à municipalização do atendimento privado
conveniado.
Além disso, tal como definido na legislação pertinente, a gestão deverá ser
democrática, garantindo a participação dos profissionais e comunidade, mediante a
492

elaboração do projeto pedagógico, dentro de uma perspectiva de trabalho coletivo e a


implementação de órgãos colegiados.
Note-se que as entidades privadas sem fins lucrativos não são obrigadas por lei a
adotar os princípios da gestão democrática. No entanto, as prefeituras costumam colocar
algumas exigências nos seus modelos de convênio, como contrapartida aos subsídios
públicos oferecidos, o que, em tese, poderia incluir alguma indicação nesse sentido.
Documento publicado pelo MEC, em 2009, contendo orientações para o
estabelecimento de convênios para a oferta de educação infantil, menciona a
responsabilidade da instituição conveniada de elaborar sua proposta político-pedagógica
de forma participativa, porém não inclui, no modelo de documento fornecido em anexo,
menção direta à gestão democrática (MEC, 2009, p. 68).
De forma geral, esse movimento em direção a um modelo de gestão mais
democrático e participativo adquiriu maior formalização e base legal nas outras etapas
da educação básica. Na educação infantil, as experiências de cunho comunitário que
marcaram a origem de muitos programas, na maior parte dos casos não chegaram a
formalizar essas práticas legalmente, o que comprometeu sua continuidade ao longo de
administrações municipais com diferentes posições político ideológicas. Um exemplo
encontra-se na história das primeiras creches diretas criadas no município de São Paulo,
como resposta aos movimentos populares do final da década de 1970, as quais tiveram
seus diretores indicados pelas comunidades que haviam integrado o Movimento de Luta
por Creches. Essa forma de escolha só ocorreu nas primeiras sete unidades. Mesmo
durante a gestão da prefeita Luiza Erundina, nos anos de 1989 a 1992, a Secretaria de
Bem Estar Social da prefeitura não formalizou em lei a gestão democrática na rede de
creches sob sua responsabilidade, o que favoreceu os retrocessos observados na
administração seguinte (CAMPOS et al, 2011).
Sobre o projeto pedagógico, também um elemento constitutivo de um modelo de
gestão democrática, é um instrumento técnico-político utilizado pela escola e pressupõe
certa autonomia administrativa e pedagógica da escola. Contém a definição do conteúdo
que deve ser ensinado e o que deve ser aprendido na escola. Ele caracteriza-se,
principalmente, por expressar os interesses e necessidades dos profissionais da educação
e da comunidade e por ser concebido e construído com base na realidade local e com a
participação conjunta da comunidade escolar e local.
O projeto pedagógico na educação infantil, de acordo com Kuhlmann Jr. (2005),
deve ter o coletivo como referência central e possui potencial para “propiciar uma
493

ampla variedade de experiências interativas que promovam o desenvolvimento integral


da criança” (p. 140)
Nesse sentido, o projeto, do ponto de vista pedagógico, deve considerar os grupos
de crianças, suas especificidades e relações entre elas e com os adultos e prever as
formas de organização do ambiente e das atividades desenvolvidas durante o período de
funcionamento.
Um dos grandes obstáculos à elaboração da proposta educacional da instituição
tem sido a dificuldade de articular os princípios normativos que regulam o instrumento
de planejamento e as questões teóricas que perpassam a educação infantil. Em relação a
isso, Kuhlmann Jr.(2005) discorre sobre a necessidade de momentos de formação dos
profissionais, em que a reflexão deveria ser estimulada para que os professores
pudessem criar e agir, fundamentados no arcabouço teórico disponível sobre a educação
infantil.
As técnicas e os saberes práticos também são necessários para o trabalho
educacional e precisam ter seu espaço durante a formação. Mas a oposição
entre teoria e prática é uma resposta aligeirada para o problema apontado, que
também não proporciona condições para resolvê-lo, para formular propostas,
com autonomia, em cada unidade educacional. A prática educativa não é uma
ação irrefletida, repetitiva, mecânica, pois isso gera a monotonia e a queda da
qualidade de ensino. (KUHLMANN JR., 2005, p. 141)

Além disso, o autor discorre sobre a necessidade de avaliação das condições reais
de funcionamento das instituições, de modo que os problemas sejam identificados,
assim como os acertos e avanços. Para o autor, “são esses elementos que irão compor
uma base para a proposta pedagógica, ao lado dos objetivos e das formas de
organização do trabalho com as crianças” (p. 141).
As reflexões mostram como é fecunda a discussão sobre a gestão das unidades de
educação infantil. No entanto, ainda que se compreenda que a gestão da educação
infantil inspire-se nos modelos de gestão que, inicialmente, foram pensados para os
outros níveis da educação básica, não se pode perder de vista que o trabalho nas
instituições de educação infantil envolve, necessariamente, a articulação entre o cuidado
e a creche.

Dessa forma, a educação infantil necessita de um arranjo organizacional que


garanta o atendimento em tempo integral; a organização adequada do espaço
físico, de modo que a criança se sinta acolhida e confortável; a realização de
um projeto educativo sistemático, intencional, que promova o
desenvolvimento físico, afetivo e intelectual e a socialização e o diálogo
frequente com as famílias. (KUHLMANN, FERNANDES, 2012, p. 34)
494

Algumas considerações

As reformas educacionais introduzidas em diversos países nas últimas décadas


deram prioridade à introdução de inovações na gestão das redes de ensino e das
unidades, reforçando processos como a descentralização e a garantia de maior
autonomia.
As propostas de reestruturação do sistema educacional brasileiro delinearam-se
não apenas na perspectiva de distribuir funções do órgão central para os demais órgãos
do sistema, mas também de promover a autonomia das unidades escolares, transferindo
e ampliando o espaço da gestão escolar.
Não se pode perder de vista algumas questões que são importantes para se pensar
na gestão escolar. Em primeiro lugar, as instituições escolares, e a educação infantil
também está aí incluída, apresentam diferentes padrões de gestão, na medida em que a
ampliação da autonomia escolar estimula formas de organização do trabalho distintas,
de acordo com as características, necessidades e demandas de cada instituição.
Em segundo lugar, a autonomia das escolas deriva-se da responsabilidade que os
profissionais da educação tiveram que assumir sobre os resultados das políticas
educacionais. Em contrapartida à liberdade para a organização do trabalho, as
instituições públicas de educação devem responsabilizar-se pelos resultados obtidos e
garantir um desempenho adequado, dentro de determinados critérios de qualidade.
Por fim, cabe destacar o efeito que as políticas educacionais para a educação
básica, principalmente para o ensino fundamental, tiveram sobre a educação infantil, do
ponto de vista do atendimento da demanda e da organização da educação infantil,
introduzindo mudanças na gestão das unidades, na autonomia e nos processos referentes
à elaboração e implementação da proposta pedagógica.
Da mesma forma, verifica-se a introdução de princípios e padrões de gestão
próprios do ensino fundamental nas instituições de educação infantil, exigindo um
esforço para que esse conjunto de diretrizes, normas e modelos sejam traduzidos para a
realidade das instituições de educação infantil.
495

Referências:

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municipal. Educação e Sociedade, 2002, vol.23, n.80, pp. 49-71.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 59, de 11 de novembro de 2009. Acrescenta § 3º
ao art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias para reduzir, anualmente,
a partir do exercício de 2009, o percentual da Desvinculação das Receitas da União
incidente sobre os recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino de
que trata o art. 212 da Constituição Federal, dá nova redação aos incisos I e VII do art.
208, de forma a prever a obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos e ampliar
a abrangência dos programas suplementares para todas as etapas da educação básica, e
dá nova redação ao § 4º do art. 211 e ao § 3º do art. 212 e ao caput do art. 214, com a
inserção neste dispositivo de inciso VI. Diário Oficial da União, Brasília, DF,
12/11/2009.
BRASIL. Emenda Constitucional n.º 53, de 19 de dezembro de 2006. Dá nova redação
aos arts. 7º, 23, 30, 206, 208, 211 e 212 da Constituição Federal e ao art. 60 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias. Diário Oficial da União, Brasília, DF,
09/03/2006.
BRASIL. FNDE. Programa Nacional de Reestruturação e Aquisição de
Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação Infantil (Proinfância).
Brasília, DF: FNDE, 2007.
BRASIL. Lei nº12.796, de 05 de abril de 2013. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de
dezembro de 2013, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, para
dispor sobre a formação dos profissionais da educação e dar outras providências. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 05/04/2013, p. 1.
BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica. Orientações sobre
convênios entre secretarias municipais de educação e instituições comunitárias,
confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos para a oferta de educação
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de Apoio aos Dirigentes Municipais de Educação. Brasília, DF: Ministério da
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496

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497

Comunicação

A formulação do programa nacional de inclusão de jovens (PROJOVEM): a


trajetória de uma política de juventude entre os anos 2004-2011

Fábio Pereira Nunes


UNICAMP/GEPEJA

Resumo: Este trabalho analisa a formulação do Programa Nacional de Inclusão de


Jovens (ProJovem), instituído no governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(2003-2010) como a principal política de juventude do país. O ProJovem tem por
objetivo atuar nas áreas da escolarização, da qualificação profissional e da participação
social. No campo educacional, destaca-se que o programa atende parte do público da
EJA. Com base na análise de documentos da legislação que o instituiu e que rege o
programa, considerando o período entre 2004-2011, busca-se o percurso de sua
formulação, a qual do ponto de vista político, procurou ser interministerial e
intersetorial. Evidencia-se a dificuldade de se formular uma política pública de forma
interministerial e intersetorial; a focalização etária que o programa instituiu; a
adequação da proposta pedagógica com o público-alvo e a juvenilização das políticas de
EJA.
Palavras-chave: políticas públicas; juventude; educação de jovens e adultos.

1. Introdução

Este texto se pauta em uma pesquisa que visa analisar a formulação de uma
política pública para a juventude implementada pelo governo federal. Trata-se do
ProJovem (Programa Nacional de Inclusão de Jovens), instituído com o objetivo de
atuar nas áreas de escolarização, qualificação profissional e ações de cidadania. Para
abordar o programa em questão, analisamos documentos, como algumas produções
bibliográficas, documentos governamentais descritivos do programa e principalmente a
legislação que o instituiu ano de 2005 e outras que promoveram alterações em seu
formato, recortando o período 20041-2011.

1
O recorte a partir do ano de 2004, baseia-se no fato de que neste ano se iniciou a formulação do
programa, o qual foi instituído no ano de 2005.
498

Nota-se que o ProJovem, ao menos do ponto de vista etário, foca uma parte da
população atendida pela EJA, pois o seu público-alvo era formado inicialmente por
jovens na faixa etária entre 18-24 anos e, posteriormente, 15-29 anos de idade2. De
acordo com a Resolução CNE/CEB n.º 3 de 15 de junho de 2010 que instituiu Diretrizes
Operacionais para a EJA quanto à duração dos cursos e idade mínima para ingresso nos
cursos e exames, quanto à certificação nos exames de EJA e à Educação de Jovens e
Adultos desenvolvida por meio da Educação a Distância, a idade mínima para ingresso
em cursos em nível de Ensino Fundamental na modalidade EJA e de 15 anos.
Embora os documentos do ProJovem o enfatizem como uma política de
juventude, a sua implementação suscitou debates no campo da EJA questionando a
dualidade na oferta na modalidade educacional, a qual poderia levar a perda de
educandos na EJA. O ProJovem, por sua vez, sempre se apresentou como uma política
de juventude, assim, não seria apenas uma política educacional. O programa enfatizava
o fato de possuir uma organização distinta de outros programas existentes no cenário
nacional. Além disso, considerando o público focalizado na faixa etária de 18-24 anos,
identificou-se um contingente de mais de um milhão de jovens e adultos3/ com as
características requeridas (BRASIL, 2008a).
Este programa foi lançado como experimental se propondo trazer à escola
aqueles que por motivações diversas não concluíram os seus estudos, ofertando uma
possibilidade de elevação da “escolaridade visando a conclusão do Ensino Fundamental,
qualificação profissional visando a estimular a inserção produtiva cidadã e o
desenvolvimento de ações comunitárias com práticas de solidariedade, exercício da
cidadania e intervenção na realidade local” (BRASIL, 2008a).

2. Programa Nacional de Inclusão de Jovens (ProJovem)

Para compreender esta política educacional é importante contextualizar o


momento político do país no ano de 2004, quando se iniciou a formulação e no ano de
2005, quando o programa foi instituído. O ProJovem foi formulado pelo governo do
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A eleição do Presidente Lula, suscitou uma série
de questões historicamente defendidas por movimentos sociais e por outros setores da

2
Conforme a Lei nº. 11.129/2005 o programa se destinava para o público focalizado entre 18-24 anos de
idade. A Lei n.º 11.692/2008 ampliou a faixa etária a ser atendida para jovens entre 15-29 anos de idade.
3
Com base em número do Censo Demográfico IBGE (2000).
499

sociedade, os quais, com a mudança de governo, identificavam uma possibilidade de


verem seus temas inseridos na agenda governamental. A questão envolvendo as
“políticas de juventude” podem ser inseridas neste contexto.
O processo de elaboração desta política se relaciona, entre outros fatores, com a
eleição de um novo governo nas eleições de 2002, como já assinalara Rocha (2012).
Representou, como atesta Kingdon (2006), um momento propício para a mudança na
agenda, foi um elemento base para a criação de uma “janela de oportunidades”. O autor
entende que uma agenda é constituída a partir de três fluxos de processos que
convergem num dado momento: fluxo das políticas públicas, dos problemas e da
política. Assim, pelo fluxo da política, a mudança de governo, abre possibilidade para a
inserção de novos temas, de demandas de outros grupos de interesses.
A formulação do ProJovem teve início no ano de 2004 quando o governo formou
a Comissão Interministerial de Juventude, sendo composta por 19 ministérios,
secretarias e orgãos técnicos especializados, coordenados pela Secretaria-Geral da
Presidência da República.
Quadro 1: Comissão Interministerial de Juventude
MINISTÉRIOS SECRETARIAS
Secretaria-Geral da Presidência da República Direitos Humanos
Casa Civil Promoção da Igualdade Racial
Cultura Políticas para as Mulheres
Defesa Gabinete de segurança Institucional
Desenvolvimento Agrário
Educação
Desenvolvimento Social e Combate a fome
Esporte
Fazenda
Justiça
Meio Ambiente
Planejamento
Turismo
Saúde
Trabalho e emprego
Fonte: Relatório final do Grupo Interministerial de Juventude
A comissão deveria realizar um diagnóstico de todas as ações governamentais
dirigidas aos jovens ou aos segmentos juvenis e realizar um diagnóstico da juventude
brasileira sob diversos aspectos como acesso à cultura, emprego, educação, condições
sociais dos jovens, entre outras. O grupo tinha a incumbência de elaborar uma
referência para uma Política Nacional de Juventude. A comissão utilizou dados
produzidos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), do Censo
Demográfico do IBGE (anos 2000), resultados de pesquisas e consultas realizadas pela
500

UNESCO e dos estudos e pesquisas realizados pelo Projeto Juventude do Instituto


Cidadania.
Ao finalizar os seus trabalhos, a Comissão Interministerial sugeriu a implantação
de uma Secretaria Nacional de Juventude, de um Conselho Nacional de Juventude e de
um programa educacional com abrangência nacional, sendo posteriormente denominado
ProJovem.
Após os trabalhos da Comissão, a execução e a gestão do programa ficaram sob
a responsabilidade da Secretaria-Geral da Presidência da República, com a função de
coordenação, do Ministério do Trabalho e do Emprego, do Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do Ministério da Educação.

3. A trajetória do ProJovem na legislação brasileira

Shiroma, Campos e Garcia (2005) argumentam que a análise de documentos oficiais


auxilia na compreensão de uma política, do processo de construção do seu discurso, sobre
como as instituições explicam a realidade. Daí, a relevância em tomar os documentos
oficiais para compreender a formulação de uma política, como a realidade é explicada e
como o governo age sobre a realidade que descreveu.
Na legislação referente ao ProJovem encontramos os seguintes documentos
elaborados durante o desenvolvimento desta política, os quais são listados em sequência
cronológica considerando apenas o período compreendido entre os anos de 2004-20114.
Em 2004, a Secretaria-Geral da Presidência da República enviou à Câmara de
Educação Básica do Conselho Nacional de Educação o Oficio n. 2 explicando o
ProJovem à luz do artigo n. 81 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei n.º
9.394/1996), recebendo um parecer favorável da CNE/CEB.
No ano seguinte, em 16 de março de 2005, o Conselho Nacional de Educação
emitiu o Parecer CNE/CEB nº 2/2005, que resultou na Medida Provisória 238/20055. O
programa foi apresentado como experimental em regime de colaboração e de
cooperação entre os diversos sistemas de ensino nos termos do artigo 81 da LDB e do
artigo 211 da Constituição Federal (BRASIL/CNE/CEB, 2008).

4
O período aborda o ano do início da formulação do programa até o momento em que ele foi transferido
da Secretaria-Geral da Presidência da República para o Ministério de Educação.
5
Medida Provisória n. 238 de 1º de fevereiro de 2005 - Institui, no âmbito da Secretaria-Geral da
Presidência da República, o Programa Nacional de Inclusão de Jovens - ProJovem, cria o Conselho
Nacional de Juventude - CNJ e cargos em comissão, e dá outras providências.
501

A Medida Provisória nº. 238/2005 diz que o ProJovem é:

...destinado a executar ações integradas que propiciem aos jovens brasileiros,


na forma de curso, elevação do grau de escolaridade visando à conclusão do
ensino fundamental, qualificação profissional voltada a estimular a inserção
produtiva cidadã e o desenvolvimento de ações comunitárias com práticas de
solidariedade, exercício da cidadania e intervenção na realidade local”
(BRASIL, 2005b).

O Programa define como público-alvo pessoas que se encontram na faixa etária


entre 18 e 24 anos de idade, as quais ainda deveriam atender aos seguintes requisitos: ter
concluído a quarta série e não ter concluído a oitava série do ensino fundamental e não
ter vínculo empregatício. A abrangência envolvia todas as capitais brasileiras e o
Distrito Federal (BRASIL, 2005c). Como citado anteriormente, a execução e a gestão
do ProJovem ficavam sob responsabilidade de distintas áreas: Secretaria-Geral da
Presidência da República, que o coordenará, e os Ministérios da Educação, do Trabalho
e Emprego e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (BRASIL, 2005b).
No curso do mesmo ano de 2005, a Medida Provisória nº 238 foi convertida na
Lei nº. 11.129/20056. Na condição de programa experimental, previu-se que, após dois
anos, deveria ocorrer uma avaliação procurando verificar a sua qualidade. Ademais, no
artigo 1º, inciso 2 da referida Lei, consta que o ProJovem poderia ser prorrogado por
mais dois anos de acordo com as disponibilidades orçamentárias e financeiras da União
(BRASIL, 2005a). Entre outras características do programa, observa-se: proposta de
participação de organizações juvenis no desenvolvimento de ações comunitárias; sorteio
caso tivesse um número de inscritos maior que a oferta de vagas; participação de
pessoas com necessidades especiais com o devido atendimento de sua necessidade.
Dizia também que para a execução do programa, a União pode realizar convênios,
acordos, ajustes ou outros instrumentos congêneres com instituições da administração
pública ou com entidades de direito público e privado sem fins lucrativos. Os jovens
participantes receberiam um auxílio financeiro no valor de R$ 100,00 durante os meses
de duração do curso (BRASIL, 2005a). Ainda no âmbito desta Lei, destacamos que foi
publicado o Decreto 5.557/2005 que versa sobre o regimento do Programa.
No ano seguinte, a Secretaria-Geral da Presidência da República enviou ao
CNE/CEB um documento solicitando a aprovação de novas Diretrizes e Procedimentos

6
Lei 11.129 de 30 de junho de 2005 - Institui o Programa Nacional de Inclusão de Jovens – ProJovem;
cria o Conselho Nacional da Juventude – CNJ e a Secretaria Nacional de Juventude; altera as Leis nos
10.683, de 28 de maio de 2003, e 10.429, de 24 de abril de 2002; e dá outras providências.
502

Técnico-Pedagógicos para fins de certificação do ProJovem. Segundo a Secretaria,

[…] a experiência com a implantação dos cursos do ProJovem nas capitais de


todos os estados da Federação e no Distrito Federal, evidenciou a necessidade
de uma formulação mais clara, sob forma normativa, das diretrizes e
procedimentos técnico-pedagógicos para a implementação do ProJovem,
contidos no Parecer CNE/CEB nº 2/2005, com a finalidade de garantir a
unidade e a eficácia do Programa, respeitadas as competências próprias das
escolas e dos órgãos normativos e executivos dos sistemas de ensino
envolvidos (BRASIL, 2006).

O Parecer CNE/CEB n. 37 de 07 de julho de 2006 aprovou as novas Diretrizes


Técnico-Pedagógicas, que previu a abrangência do Programa de acordo com a
existência de recursos disponíveis. Com isso, o ProJovem foi ampliado para municípios
com mais de duzentos mil habitantes. Nesta etapa, o programa recebeu a adesão de 29
municípios.
Em 2007 foi criado o “Grupo de Trabalho Juventude, que reuniu representantes
da Secretaria-Geral da Presidência da República, da Casa Civil e dos Ministérios da
Educação, do Desenvolvimento Social, do Trabalho e Emprego, da Cultura, do Esporte
e do Planejamento” (BRASIL, 2008b). Os resultados das atividades do GT Juventude
encaminharam propostas de alteração no programa que culminaram em uma nova
regulamentação. A Medida Provisória nº. 411 de 28 de dezembro de 20077 apresentou
alterações significativas para o programa, em que se destaca: alteração da faixa etária
atendida, abrangendo a idade de 15 a 29 anos de idade, aumento do período do curso de
12 meses para 18 meses, ingresso de jovens que não concluíram o Ensino Fundamental,
ampliação do programa para municípios com mais de 200 mil habitantes e a criação das
seguintes modalidades:
Quadro: ProJovem Integrado
MODALIDADE COORDENAÇÃO FAIXA ETÁRIA
I – ProJovem Adolescente – Ministério do Desenvolvimento 15-17 anos;
Serviço Socioeducativo Social e Combate à Fome
II – ProJovem Urbano Secretaria-Geral da Presidência da 18-29 anos
República.
III – ProJovem Campo – Saberes Ministério da Educação 18-29 anos
da Terra
IV – ProJovem Trabalhador Ministério do Trabalho e Emprego 18-29 anos
Fonte: Medida Provisória 411/2007 e Lei 11.692/2008.

7
MEDIDA PROVISÓRIA Nº 411, DE 28 DE DEZEMBRO DE 2007.Dispõe sobre o Programa Nacional
de Inclusão de Jovens - ProJovem, instituído pela Lei no 11.129, de 30 de junho de 2005, altera a Lei no
10.836, de 9 de janeiro de 2004, e dá outras providências.
503

Ao Programa inicial, integraram-se ações que vinham sendo desenvolvidas por


outros órgãos. O ProJovem “original”, como passou a ser chamada a primeira versão do
programa, foi reformulado e passou a ser denominado ProJovem Urbano. As alterações
trataram da ampliação da faixa etária de atendimento até 29 anos de idade; aumento do
período de doze para dezoito meses; ingresso de estudantes com carteira assinada;
inclusão de jovens que sabiam ler e escrever e que não concluíram o ensino
fundamental; e ampliação para municípios externos às regiões metropolitanas
(BRASIL, 2010).
O ProJovem Adolescente resultou da reestruturação do programa Agente Jovem8
e o seu público-alvo são jovens entre 15-17 anos integrantes de programas sociais do
governo federal (Bolsa Família) com o objetivo de complementar a proteção social da
família (ANDRADE; ESTEVES; OLIVEIRA, 2009).
O ProJovem Campo foi criado com o objetivo de fortalecer e ampliar o acesso e
a permanência de jovens da agricultura familiar ao sistema educacional, promovendo a
elevação da escolaridade, a qualificação profissional e o desenvolvimento para o
exercício da cidadania. O ProJovem Trabalhador integrou os programas Escola da
Fábrica, Consórcio Social da Juventude e Juventude Cidadã com o objetivo de
promover a preparação de jovens para o mercado de trabalho e atividades que levassem
à geração de renda (ANDRADE; ESTEVES; OLIVEIRA, 2009).
O Projeto Pedagógico Integrado do ProJovem Urbano destaca que o Programa
visa promover um programa amplo e diversificado de inclusão social dos jovens
brasileiros, pautado na concepção de produzir oportunidade para todos e garantia de
direitos. O Projeto Pedagógico Integrado busca, com isso, enfatizar que o programa
possui uma perspectiva de cidadania para o público jovem (BRASIL, 2008b).
A Medida Provisória n.º 411/2007 foi convertida na Lei n.º 11.692 de 10 de
junho de 20089. Na redação do novo texto, a União ficou autorizada a transferir recursos

8
O programa Agente Jovem de Desenvolvimento Humano e Social foi uma ação de assistência social
destinada a jovens entre 15-17 anos que tenham participado de outros programas sociais, que fossem
considerados em vulnerabilidade e risco pessoal e social, em medida socioeducativa, oriundos de
Programa de Atendimento à Exploração Sexual de menores. O programa previa atividades
socioeducativas junto à comunidade com o objetivo de promover o protagonismo juvenil, fortalecendo os
vínculos familiares e comunitários. O programa foi criado no governo do presidente Fernando Henrique
Cardoso e foi sendo modificado durante o governo do Presidente Lula. Com o ProJovem Integrado, o
Agente Jovem foi integrado pelo ProJovem Adolescente.
9
.Lei 11.692/2008 – Dispõe sobre o Programa Nacional de Inclusão de Jovens – ProJovem, instituído pela
Lei no 11.129, de 30 de junho de 2005; altera a Lei no 10.836, de 9 de janeiro de 2004; revoga dispositivos
das Leis nos 9.608, de 18 de fevereiro de 1998, 10.748, de 22 de outubro de 2003, 10.940, de 27 de agosto
de 2004, 11.129, de 30 de junho de 2005, e 11.180, de 23 de setembro de 2005; e dá outras providências.
504

sem a necessidade da realização de convênios ou outro instrumento congênere, sendo


necessário o depósito em conta-corrente com a devida prestação de contas do emprego
do recurso. A Lei nº. 11.692 descreve com maior detalhamento os objetivos de cada
modalidade do ProJovem e coloca a exigência de acompanhamento escolar relacionada
ao beneficio, sendo necessário o mínimo de 75% de frequência em conformidade com a
Lei de Diretrizes e Bases nº. 9.394/1996. Além disso, o programa ProJovem
Adolescente – Serviço Socioeducativo, antes executado no período de dois anos passa
ser desenvolvido no período de um ano. Para ter direito ao recebimento da ajuda de
R$100,00, os estudantes deveriam ter uma frequência mínima e realizar ao menos 75%
das atividades escolares previstas para cada mês. Para obter a certificação de Ensino
Fundamental os estudantes realizariam uma avaliação externa ao final do curso
(PROJOVEM, 2008d).
Em 2008, a Secretaria-Geral da Presidência da República encaminhou o Oficio
n.º 10/2008 de 31 de julho de 2008 à CEB/CNE abordando o redesenho do ProJovem
Urbano, propondo novas alterações e a sua ampliação, o qual foi aprovado pelo Parecer
CNE/CEB n.18/2008. A principal alteração se deu na ampliação da carga horária do
curso.
No ano de 2011,o Ministério da Educação publicou a Resolução CD/FNDE n.
60/201110 que removeu o ProJovem Urbano da Secretaria-Geral da Presidência da
República para o Ministério da Educação e propôs também a ampliação do programa
para municípios com mais de cem mil habitantes. Os municípios com 200 mil
habitantes ou mais deveriam realizar convênio diretamente com a Coordenação
Nacional do Programa enquanto os municípios com menos de 200 mil habitantes foram
aglutinados e representados pelas Unidades da Federação (BRASIL, 2010; BRASIL,
2011).
Esta alteração motivou reações por parte de pessoas que estiveram à frente da
Secretaria Nacional da Juventude. Carlos Odas, Secretário Nacional da Juventude no
período 1999-2001, argumenta11 que com a perda do principal programa da Política
Nacional de Juventude, aquele que possui o maior orçamento, poderia prejudicar a
institucionalidade desta política. Odas admite que o ProJovem tem como uma de suas

10
Estabelece os critérios e as normas de transferência automática de recursos financeiros ao Distrito
Federal, aos estados e a municípios com cem mil ou mais habitantes, para o desenvolvimento de ações do
Programa Nacional de Inclusão de Jovens – ProJovem Urbano, para entrada de estudantes a partir de
2012.
11
Disponível em: http://www.ptpe.org.br/artigo.php?id=9. Acesso em: 05 de novembro de 2013.
505

dimensões a educação, porém, enquanto política de juventude deveria ser considerada a


sua transversalidade, a qual perpassa temáticas que não se limitam a questão educativa.

4. Algumas considerações

O ProJovem foi instituído como um programa em caráter emergencial, com o


objetivo de romper o ciclo de desigualdades que afeta a juventude e gerar novas
oportunidades para este público apostando, com isso, na renovação da esperança da
sociedade na construção de um futuro para o país. As premissas constantes em sua
apresentação são tanto necessárias quanto ambiciosas. Sua meta inicial era atender a
200.000 jovens entre 2005-2008, atuando em todas as capitais e no Distrito Federal. Um
dos grandes desafios encontrados pelo programa foram os índices de desistência e a
evasão do programa, problema comum aos cursos de EJA (2008a).
Rocha (2012) destaca que durante o período de formulação do programa, havia
um debate no âmbito da Comissão Interministerial que criou o ProJovem acerca da
concepção de juventude a caracterizar o programa: a de jovem enquanto sujeito de
direitos e a de jovem enquanto grupo de risco. Tais compreensões não convergem e
criam espaços para incluir num mesmo programa políticas públicas divergentes. O autor
considera que prevaleceu no ProJovem a concepção de jovem enquanto sujeito de
direitos. Levando em conta as concepções observadas – jovem enquanto sujeito de
direitos e de jovem enquanto grupo de risco –, considerar o jovem como portador de
direitos, coloca, como exemplo, que ele possui direito a condições dignas de vida, como
trabalho, educação e saúde. Assim, ressalta-se o papel do Estado na garantia destes
direitos.
Retomando a descrição do ProJovem e para situar o momento da formulação
pelo governo, destacamos que ele se originou no ano de 2004 a partir dos trabalhos de
um Grupo Interministerial constituído por dezenove setores do poder público federal
(ministérios do governo federal, secretarias e órgãos técnicos especializados). Os
trabalhos deste grupo resultaram na elaboração de um conjunto de documentos que
estruturaram a “Política Nacional da Juventude que criou a Secretaria Nacional da
Juventude, o Conselho Nacional da Juventude e o Programa Nacional de Inclusão de
Jovens: Educação, Qualificação e Ação Comunitária – ProJovem”. O ProJovem foi o
principal programa da política de juventude criado no Governo Lula.
Entre alguns aspectos que o ProJovem suscita se encontram: a emergência da
506

temática juventude como problema político; a inserção da temática juventude na agenda


governamental; a dificuldade de formulação desta política com base na proposta de
diálogo interministerial e intersetorial (governo e instituições sociais); a pertinência do
Projeto Pedagógico para o público a quem o programa se destina; a adequação da
integração das distintas áreas da estrutura pedagógica do programa: a formação escolar,
qualificação profissional e participação social; a adequação proposta de escolarização,
ações comunitárias e qualificação profissional diante dos desafios sociais
contemporâneos; o diálogo entre os agentes públicos e os diversos setores sociais na
constituição de políticas públicas e a juvenilização das políticas de EJA.

5. Referências Bibliográficas

ANDRADE, Eliane Ribeiro; ESTEVES, Luiz Carlos Gil; OLIVEIRA, Edna Castro de.
Composição social e percursos dos sujeitos do PROJOVEM: novos/velhos desafios para
o campo da educação de jovens e adultos. Brasília: Em Aberto, v.22, n. 82, p. 73-89,
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_______. Lei 11.129 de 30 de junho de 2005a. Institui o Programa Nacional de Inclusão


de Jovens – ProJovem; cria o Conselho Nacional da Juventude – CNJ e a Secretaria
Nacional de Juventude; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, e 10.429, de
24 de abril de 2002; e dá outras providências. Disponível
em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11129.htm Acesso
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Secretaria-Geral da Presidência da República, o Programa Nacional de Inclusão de
Jovens - ProJovem, cria o Conselho Nacional de Juventude - CNJ e cargos em
comissão, e dá outras providências. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/legisla07.pdf. Acesso em 18 de janeiro de
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BRASIL. Portaria 2080 de 13 de junho de 2005c. Disponível em


http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12294&Item
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págs. Disponível em:
http://www.projovem.gov.br/userfiles/file/documentos/Plano_de_Implementacao_Projo
507

vem.pdf (Acesso em 19/02/2012).

BRASIL. SECRETARIA-GERAL DA PRESIDÊNCIA DA


REPÚBLICA/SECRETARIA NACIONAL DA JUVENTUDE. Projeto Pedagógico
Integrado do ProJovem Urbano. Brasília: Programa Nacional de Inclusão de Jovens -
ProJovem Urbano, 2008b, 82 págs.

______. Lei 11.692 de 10 de junho de 2008c. Dispõe sobre o Programa Nacional de


Inclusão de Jovens - Projovem, instituído pela Lei no 11.129, de 30 de junho de 2005;
altera a Lei no 10.836, de 9 de janeiro de 2004; revoga dispositivos das Leis nos 9.608,
de 18 de fevereiro de 1998, 10.748, de 22 de outubro de 2003, 10.940, de 27 de agosto
de 2004, 11.129, de 30 de junho de 2005, e 11.180, de 23 de setembro de 2005; e dá
outras providências. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
2010/2008/lei/l11692.htm. Acesso em: 11 de maio de 2011.

______. SECRETARIA-GERAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA/SECRETARIA


NACIONAL DA JUVENTUDE. Relatório Final do ProJovem Original, 2005-2008.
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______. RESOLUÇÃO Nº 3, DE 15 DE JUNHO DE 2010. Institui Diretrizes


Operacionais para a Educação de Jovens e Adultos nos aspectos relativos à duração
dos cursos e idade mínima para ingresso nos cursos de EJA; idade mínima e
certificação nos exames de EJA; e Educação de Jovens e Adultos desenvolvida por meio
da Educação a Distância. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&id=14906&Itemid=866.
Acesso em 11 de maio de 2011.

______. RESOLUÇÃO CD/FNDE Nº 60 DE 09 DE NOVEMBRO DE 2011.


Estabelece os critérios e as normas de transferência automática de recursos financeiros
ao Distrito Federal, aos estados e a municípios com cem mil ou mais habitantes, para o
desenvolvimento de ações do Programa Nacional de Inclusão de Jovens – Projovem
Urbano, para entrada de estudantes a partir de 2012. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=99
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509

Comunicação

Pesquisas relacionadas ao sinaes no banco de teses da CAPES – de 2004 a 2011 –

Fernanda de Cássia Rodrigues Pimenta


UNICID1
Celia Maria Haas
UNICID2

Resumo: Este trabalho, parte da pesquisa “Os Instrumentos de Avaliação do SINAES:


Gestão e Qualidade na Perspectiva dos Coordenadores de Curso”, tem por objetivo
apresentar o cenário das pesquisas realizadas sobre o SINAES – Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Superior disponibilizados no Banco de Teses da Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES. Foram encontrados 122
registros sobre o SINAES relativos ao período de 2004 a 2013. Em 2004, ano em que
foi instituído este sistema de avaliação, foram encontradas três pesquisas, assim como
em 2005. A partir de 2006 o número foi aumentando, triplicando o número encontrado
nos dois anos anteriores. Em 2007 foi encontrado número ainda maior: 14 pesquisas. O
número de pesquisas encontradas sobre o SINAES foi aumentando ano a ano,
observando-se que desde a implantação do SINAES o componente mais pesquisado foi
o da Avaliação Institucional, que liderou o número de pesquisas, chegando a 47 do total.
O componente da Avaliação de Desempenho dos Alunos – ENADE se mostra pouco
expressivo, com pesquisas a partir de 2008. O componente Avaliação de Curso, por sua
vez, é ainda mais inexpressivo. O levantamento sugere a necessidade de explorar o
assunto e de buscar o impacto deste componente do SINAES nas instituições de
educação superior e no âmbito dos cursos.
Palavras-chave: Educação Superior. SINAES. Avaliação. CAPES.

1
Docente e Assessora Jurídica-Educacional da Educatio – Assessoria e Consultoria Educacional. Mestre
em Educação pela UNICID. Especialista em Gestão e Direito Educacional. Graduada em Direito pela
Universidade São Francisco.
2
Docente e pesquisadora do Programa de Mestrado em Educação da UNICID. Doutora em Educação –
Currículo pela PUC-SP, Mestre em Educação – História, Política, Sociedade – pela PUC-SP e Graduada
em Pedagogia pela Fundação Faculdade Estadual de Educação Ciências e Letras de Paranavaí.
510

INTRODUÇÃO
Frente a importante processo de expansão do sistema de educação superior
privado brasileiro, saltando, em 1991, de 671 e 4.908 cursos de graduação, para 2.013
instituições de educação superior e 18.644 cursos de graduação em 2004 e após algumas
tentativas de avaliações isoladas (PARU, GERES, PAIUB, ENC, ACO, ACE),3 a
criação de um sistema nacional de avaliação presente em âmbito internacional e nas
discussões nacionais é justificado (BARREYRO; ROTHEN, 2008). Em resposta a tal
demanda foi instituída a Lei Federal nº. 10.861, de 14 de abril de 2004 que criou o
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), que tinha o objetivo
de implantar um sistema nacional e articulado de avaliação que previsse a avaliação das
instituições de educação superior, dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico
de seus estudantes.
A partir do SINAES, a avaliação passa a ser concebida como instrumento
dinâmico e processual, superando a fase estática característica do Provão. O SINAES
vem em substituição a um conjunto não articulado de instrumentos de avaliação e com a
ideia de instalação de um ciclo de avaliação que seria referencial para a regulação das
instituições (ROTHEN; BARREYRO, 2011).
O SINAES se encontra no seu terceiro ciclo avaliativo (2013-2015) e as
instituições procuram acompanhar as diversas mudanças desde a sua implantação.
Considerando que os coordenadores de curso são os profissionais que
respondem pelo curso sob sua responsabilidade, no tocante às exigências que esse
sistema de avaliação faz sobre o controle de qualidade, e, ainda, considerando que os
instrumentos de avaliação podem servir de indicadores para a gestão acadêmica, foi
desenvolvida a pesquisa “Os Instrumentos de Avaliação do SINAES: Gestão e
Qualidade na Perspectiva dos Coordenadores de Curso” com a proposta de conhecer a
opinião destes no que se refere à possibilidade de o instrumento de avaliação do
SINAES aferir o nível de qualidade de um curso de graduação e deste instrumento
servir como instrumento de gestão acadêmica do curso.
O trabalho ora apresentado é um recorte dos resultados encontrados na referida
pesquisa.

3
Programa de Avaliação da Reforma Universitária (PARU); Grupo Executivo para Reformulação da
Educação Superior (GERES); Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras
(PAIUB); Exame Nacional de Cursos (ENC); Análise de Condições de Oferta (ACO); Avaliação das
Condições de Ensino (ACE).
511

OBJETIVOS DO LEVANTAMENTO REALIZADO


O levantamento junto ao Banco de Teses da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (CAPES) foi realizado com o objetivo de compreender o
cenário das pesquisas realizadas sobre o SINAES desde a sua implantação, ou seja, no
período de 2004 a 2011. O foco foi, sobretudo sobre o componente de avaliação de
cursos, objeto principal da pesquisa geradora deste levantamento.

METODOLOGIA DE BUSCA E SELEÇÃO


No endereço eletrônico do banco de teses da CAPES:
http://bancodeteses.capes.gov.br/ foi realizada a busca pela palavra-chave “SINAES”
ano por ano, desde 2004. Foram encontradas 170 dissertações e teses. Destas 170
pesquisas, 122 tem como palavra chave “SINAES” correspondente ao Sistema Nacional
de Avaliação da Educação Superior e 48 com a palavra “SINAES” dentre as palavras
chave, cuja sigla, no entanto, se refere a tema diverso.
Das 122 pesquisas encontradas, foram selecionados para leitura todos os resumos
em que no título da pesquisa não foi possível identificar explicitamente o componente
do SINAES discutido (avaliação institucional, avaliação do desempenho dos estudantes
ou avaliação de cursos).
Após a identificação de todas as pesquisas e organização por ano, de 2004 a 2011,
foram selecionadas para leitura 2 dissertações que trataram do componente do SINAES:
avaliação de cursos, objeto da pesquisa central.
Anterior à escolha da palavra chave SINAES realizou-se quatro exercícios de
busca com as seguintes palavras chave:
• Palavra chave: Avaliação de Curso Superior – Resultado: 1.660 pesquisas;
• Palavra chave: Políticas Públicas em Educação – Resultado: 8.394 pesquisas;
• Palavra chave: Políticas Públicas de Avaliação da Educação Superior –
Resultado: 283 pesquisas;
• Palavra chave: Qualidade na Educação Superior – Resultado: 1.020 pesquisas.
Com estes exercícios de busca foi possível identificar que estas não eram as
palavras chaves mais adequadas para conhecer o cenário desejado, pois tais palavras
chaves trouxeram como resultado muitas pesquisas relacionadas à educação básica,
tantas outras não correspondentes à avaliação e, principalmente, não correspondentes ao
SINAES.
Contudo, toda pesquisa relacionada à avaliação da educação superior no âmbito
do SINAES, tem dentre o rol de palavras chave a sigla SINAES, não havendo
512

possibilidade de incorrer no risco de deixar escapar alguma pesquisa de interesse.


A pesquisa, de natureza qualitativa e exploratório apoiou-se, entre outros
autores, em Bogdan; Biklen (1991).

O SINAES NO BANCO DE TESES DA CAPES


Relativo ao período de 2004 a 2011 foram encontrados 122 registros sobre o
SINAES. Os primeiros registros são de 2004, ano que em foi instituído o SINAES, com
três dissertações: Versieux (2004), que discutiu sobre a “Avaliação do Ensino Superior
Brasileiro: PAIUB, o ENC e o SINAES” e aponta que o SINAES, embora tenha um
caráter mais democrático que os demais, acaba por incorporar alguns pressupostos
reguladores; Bertelli (2004), sob o título “Avaliação Institucional: a trajetória da
Faculdade de Pato Branco”, que discutiu o grau de satisfação dos alunos de uma
determinada instituição pública, fazendo referência ao SINAES como um novo processo
de avaliação com características que demandam das Instituições de Educação Superior
novas responsabilidades, dentre elas a autoavaliação; e Renck (2004), sob o título
“Proposta de um Modelo de Sistema de Avaliação de Desempenho em Instituição de
Ensino Superior, Sem Fins Lucrativos e Comunitária - o caso da Feevale”, que discutiu
sobre a avaliação de desempenho da Instituição, levando em conta os indicadores
necessários à Filantropia, os requisitos avaliados pelo SINAES e a avaliação de
desempenho como fator de informação para tomada de decisão na instituição tal qual
uma empresa. Em 2005, ainda foram raras as pesquisas relacionadas ao tema: apenas
três dissertações: duas discutindo a autoavaliação (RODRIGUES, 2005; MOTA, 2005)
e uma (RECKTENVALD, 2005) que investigou a percepção sobre os atributos de
qualidade de uma instituição de ensino, a partir da integração dos modelos SERVQUAL
e KANO. Em 2006 este número triplicou e foram encontradas oito dissertações: cinco
delas sobre a avaliação institucional (ANTONELLO, 2006; COSTA, 2006; COPETI,
2006; LARA, 2006; SILVA, 2006); uma discutindo as práticas discursivas dos governos
FHC e Lula (TARCÍLIA FERRAZ, 2006); uma delas sobre o impacto do SINAES na
Governança Corporativa das Instituições (OLIVEIRA, 2006); (MELLO, 2006),
apresentando uma proposta de Sistema de Medição de Desempenho estudando o
SINAES com a finalidade de englobar na referida proposta as dimensões avaliadas; e a
última apresentando a discussão sobre a formação continuada e a prática docente,
traçando um paralelo entre as intenções da avaliação proposta pela Marinha e as
expressas no SINAES, procurando problematizar as duas práticas avaliativas.
513

Em 2007 foram encontradas 14 pesquisas: oito delas tratam da avaliação


institucional (PINTO, 2007; RETZ, 2007; AUGUSTO, 2007; DIAS, 2007; ARAÚJO,
2007; AMARAL, 2007; RODRIGUES, 2007; OLIVEIRA, 2007). Uma teve como
problemática central a reforma (neoliberal) da universidade brasileira, a partir da análise
dos discursos dos Ministros da Educação Cristovam Buarque, Tarso Genro e Fernando
Haddad, além das principais medidas desenvolvidas e relacionadas com o PROUNI e
SINAES (BASTOS, 2007). Felden (2007) trata de uma das dez dimensões do SINAES:
a responsabilidade social; Galleguillos (2007) tratou do impacto na Avaliação Externa
(Institucional) na prática docente e uma delas discutiu a avaliação da educação superior
na área de enfermagem. Foram encontradas, também, as pesquisas de Soares (2007),
sob o título “O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior e a Gestão
Estratégica das Instituições Particulares de Ensino Superior: um estudo de casos
múltiplos”, cujo objetivo gira em torno da discussão sobre o papel da gestão estratégica
nas Instituições de Educação Superior Privadas perante a inserção do SINAES e parte
da hipótese central de que, enquanto o Governo insere mecanismos de controle e de
avaliação em busca da qualidade, as Instituições se adaptam às regulamentações
inserindo mecanismos de gestão estratégica, tentando, ao mesmo tempo, preservar a
qualidade do ensino e a competitividade externa; Souza (2007) sob o título “Gestão
Universitária em Instituições Particulares: os documentos institucionais como
indicadores de modelo de gestão”, teve como proposta a investigação sobre o papel dos
documentos institucionais Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) e Projeto
Pedagógico Institucional (PPI) e das Dimensões e Indicadores do SINAES, como
indicadores de um modelo de Gestão Universitária nas Instituições de Educação
Superior Privadas; e, Scheffer (2007) com o título “Avaliação de Cursos na
Universidade de Santa Cruz do Sul e a Qualificação da Graduação: contribuições e
influencias do “olhar externo” da avaliação”, discute o olhar externo da avaliação
realizada pelo MEC, apresentando um aporte legal e teórico que enfatiza paradigmas e
concepções de avaliação institucional e identifica a avaliação como um agente capaz de
desencadear transformações tanto no curso avaliado como na instituição. Apresenta,
também, a conclusão de que o curso foi avaliado com base em diferentes concepções de
avaliação e que, na percepção do olhar institucional dos respectivos gestores e da
instituição, as avaliações externas de curso são positivas, pois vem contribuindo na
qualificação de ações nos cursos e influenciando nas políticas da instituição para a
graduação.
514

No ano de 2008, foram localizadas vinte pesquisas, e destas, o componente do


SINAES que lidera, mais uma vez, é a Avaliação Institucional com oito delas
(NASCIMENTO, 2008; ROCHA, 2008; JUNIOR, 2008; LEAL, 2008; CARON, 2008;
QUEIROZ, 2008; RIBEIRO, 2008; SORGATTO, 2008). Sobre o Exame Nacional de
Desempenho dos Estudantes (ENADE) foram encontradas duas pesquisas (FONSECA,
2008; RODRIGUES, 2008) e as dez pesquisas restantes distribuem-se na discussão
sobre a Responsabilidade Social da Instituição (SILVA, 2008); Plano de
Desenvolvimento Institucional (PDI), Projeto Pedagógico Institucional (PPI) e Projeto
Pedagógico de Curso (PPC) (PICAWY, 2008); o SINAES na Universidade Pública
Estadual (VIEIRA, 2008); Balanced Scorecard (CAMPOS, 2008; SANTOS, 2008);
Currículo, Pedagogia e Avaliação do Ensino-Aprendizagem nos Cursos de Enfermagem
e Direito (ESCOTT, 2008); Avaliação in loco (RODRIGUES, 2008); o impacto da
avaliação externa no corpo docente (STUDER, 2008); os sistemas de avaliação como
ferramenta de gestão e competitividade (DEL RIO, 2008); e sobre o processo de gestão
da informação e do conhecimento nas avaliações do INEP (NUNES, 2008). Não houve,
nesse ano de 2008, nenhuma pesquisa a respeito da Avaliação de Cursos.
Das 26 pesquisas encontradas de 2009, De Paula, (2009) discutiu a “A vivência
dos coordenadores de curso de enfermagem em relação ao Sistema Nacional de
Avaliação do Ensino Superior”; 13 delas trataram sobre a Avaliação Institucional
(DOTTA, 2009; SILVA, 2009; MESSINETTI, 2009; REYNAUD, 2009; SOUZA,
2009; OLIVEIRA DA SILVA, 2009; HARDER, 2009; ALVES DE SOUZA, 2009;
SCHNEIDER, 2009; TRAVASSOS, 2009; FORO DE SOUSA, 2009; FAGUNDES,
2009; MELO 2009) e o restante dividiu-se em: duas sobre o ENADE (POLIZEL, 2009;
REIS, 2009); uma sobre Biblioteca (GÓIS, 2009); uma sobre Extensão Universitária
(FEITOSA, 2009); uma sobre Papel do Estado (ARAUJO, 2009); uma sobre o caráter
público do SINAES e seu potencial de transformar o currículo das universidades
(SOUSA, 2009); uma sobre a Implementação do SINAES em uma Instituição Pública e
em uma Instituição Privada (RIBEIRO, 2009); duas sobre Planejamento Estratégico
(NOGUEIRA, 2009; FREITAS JUNIOR, 2009); uma sobre as Implicações do SINAES
no Ensino Jurídico Brasileiro (OPITZ, 2009); uma sobre as repercussões do SINAES no
Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia (CAMPOS, 2009); e uma sobre o Discurso
polêmico do ANDES – Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino
Superior sobre o SINAES (NARDELI, 2009).
Em 2010, foram encontradas 26 pesquisas, não havendo qualquer pesquisa sobre
515

o componente Avaliação de Cursos. Novamente, a Avaliação Institucional lidera o


interesse com 12 pesquisas registradas nesse ano (SOARES, 2010; CRUZ, 2010;
SILVA, 2010; LIMA, 2010; CUNHA, 2010; RIBEIRO, 2010; SOUZA, 2010;
MARTINS, 2010; ARGOLLO, 2010; TOGNARELLI, 2010; OLIVEIRA, 2010;
SANCHES, 2010). As demais dividiram-se em: Planejamento Institucional (SANTOS,
2010); Avaliação dos Egressos (STADTLOBER, 2010); Farmácia Escola (PIMENTA,
2010); Recuperação de Serviços na Instituição de Educação Superior (PEREIRA,
2010); As diferentes faces do SINAES (EUSSEN, 2010); Desempenho Docente
(WESSLING, 2010); Qualidade na Educação Tecnológica (VIEBRANTZ, 2010);
Modelos Avaliativos (BIFFI, 2010); Avaliação da Qualidade da Biblioteca (BEZERRA,
2010); Indicadores de Qualidade na Universidade Pública (FRANCO, 2010); Educação
Superior Brasileira no período de 1998-2007 (FREITAS, 2010); Estudo dos Processos
de Credenciamento de novas IES e de autorização de novos cursos (SALVADOR,
2010); e duas sobre o ENADE (RANGEL, 2010; PEREIRA, 2010).
No Ano de 2011, por fim, foram encontradas 22 pesquisas, com apenas uma
delas discutindo a avaliação de cursos de graduação: Andrade (2011), sob o título “As
contribuições da avaliação de cursos de graduação para a melhoria da qualidade da
educação superior”. Das pesquisas restantes, nove trataram da Avaliação Institucional
(LEMOS, 2011; CUNHA, 2011; LIMA, 2011; BREZINSKI, 2011; BATTINI, 2011;
CARIBÉ, 2011; BARBOSA, 2011; TAHIM, 2011; FILHO, 2011); uma sobre a
Atuação do Corpo Docente (ANDRIOLA, 2011); sobre o Egresso (BARBATO, 2011);
uma sobre Gestão e Coordenadores de Curso (ARGETA, 2011); uma sobre Biblioteca
(BRASIL, 2011); uma sobre Balanced Scorecard (FILHO, 2011); uma sobre
Responsabilidade Social (ROSETTO, 2011); uma sobre o SINAES como Instrumento
de Controle do Estado (ALBUQUERQUE, 2011); uma sobre Educação Profissional
(DORNELES, 2011); uma sobre Educação a Distância (SANTOS, 2011); uma sobre o
Ensino Universitário, Cidadania e Políticas na perspectiva do SINAES (LIMA E
SILVA, 2011); uma sobre Políticas de Avaliação: entre avaliadores e avaliados
(CONCEIÇÃO, 2011); e uma sobre o Paroxismo da qualidade (CURI, 2011).
Observa-se que desde a implantação do SINAES o componente mais pesquisado
foi o da Avaliação Institucional, que liderou o número de pesquisas, chegando a quase
50% do total. O componente da Avaliação de Desempenho dos Alunos - ENADE, ainda
está bem tímido, com 6 pesquisas, a partir de 2008. Sobre o componente do SINAES
Avaliação de Cursos observa-se apenas a pesquisa de Andrade (2011), além da pesquisa
516

da De Paula (2009) sobre a vivência dos Coordenadores de Curso em relação ao


SINAES.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observa-se que desde a implantação do SINAES o componente mais pesquisado
foi o da Avaliação Institucional, que liderou o número de pesquisas, chegando a 47% do
total. O componente da Avaliação de Desempenho dos Alunos – ENADE se mostra
pouco expressivo, com pesquisas a partir de 2008 e o componente de Avaliação de
Curso, por sua vez, é ainda mais inexpressivo, sendo encontradas apenas: a pesquisa de
Andrade (2011), sob o título “As contribuições da avaliação de cursos de graduação
para a melhoria da qualidade da educação superior” e a pesquisa da De Paula (2009)
sobre a vivência dos Coordenadores de Curso em relação ao SINAES.
Neste sentido, foi possível identificar que a pesquisa proposta pode contribuir
com mais uma investigação relacionada ao componente avaliação de cursos, além de
promover a discussão sobre a atuação e a opinião do coordenador de curso neste
processo, a possibilidade de utilização dos instrumentos de avaliação de curso como
instrumentos de gestão e a promoção da melhoria da qualidade por meio da avaliação.
O levantamento feito sugere a necessidade de explorar o assunto e de buscar o
impacto deste componente do SINAES nas instituições de educação superior e no
âmbito dos cursos.
A autora que mais contribuiu para a pesquisa foi a De Paula, (2009), pois
discutiu em seu estudo a “A vivência dos coordenadores de curso de enfermagem em
relação ao Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior”, apresentando sua
experiência como coordenadora de curso. A pesquisadora relata que ao utilizar os
instrumentos de avaliação do SINAES, percebeu que poderiam contribuir para o
processo de gerenciamento do curso, na avaliação das ações e, consequentemente, na
construção de indicadores de qualidade. De Paula (2009) constata na pesquisa que “as
vivências dos coordenadores, em relação ao SINAES, demonstraram sua participação
direta nos processos avaliativos, o que lhes permitiu analisar e identificar juntamente
com os atores envolvidos os problemas acadêmicos e administrativos do curso, para,
posteriormente, planejarem e realizarem mudanças”. Para estes coordenadores, o
SINAES foi considerado um “elemento direcionador”, que, por fornecer informações
“confiáveis e reais”, é importante na gestão do curso e amplia a visão da universidade.
517

Os resultados da pesquisa mostraram como o SINAES influenciou a prática da gestão


do curso e como os coordenadores utilizaram as informações geradas na organização
didático-pedagógica, nas ações que envolvem o corpo docente, o corpo discente e o
corpo técnico-administrativo e na organização e provisão da infraestrutura (DE
PAULA, 2009, p. 61).
A sistemática adotada pelo SINAES, desde a sua implantação, e a repercussão e
proporção que tomou, evidencia que este processo avaliativo tende a se aprimorar, não
havendo indícios de extinção. O que antes eram experiências isoladas e não articuladas,
passou, com o advento do SINAES, a ser encarado como algo sistemático e articulado.
A avaliação no SINAES teve início como subsídio da Regulação, para
autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos, bem como para
credenciamento e recredenciamento de instituições, no período de 2004 – ano de criação
e implantação do SINAES – a 2006. No período, de 2007 a 2009, quando instituído o
primeiro ciclo avaliativo do SINAES, a avaliação passou a subsidiar a Supervisão, cujos
primeiros resultados foram:
a) 862 notificações a instituições de educação superior sobre irregularidades;
b) 43 termos de saneamento de deficiências assinados;
c) 79 medidas de saneamento de deficiências determinadas pelo MEC;
d) 19 medidas cautelares de suspensão ou redução de novos ingressos; e
e) 29 penalidades de desativação de cursos ou descredenciamento de instituições
(BRASIL, 2010).
Esse período pode ser considerado um período de responsabilidade forte da
avaliação da educação superior, como classificam as pesquisadoras Bonamino e Sousa
(2012), ao abordarem a questão das avaliações em larga escala no âmbito da educação
básica.
O segundo ciclo avaliativo do SINAES (2010-2012) foi marcado como o
período que houve o maior número de instrumentos de avaliação em vigor e a
necessidade urgente de revisão. Foram 16 instrumentos em 2010 e a revisão ocorrida em
2011 resultou na padronização de 12 instrumentos de avaliação de cursos em apenas 1.
Os demais instrumentos de avaliação institucional externa e de cursos a distância
ficaram para depois.
O Sistema Nacional de Avaliação implantado adentra em seu terceiro ciclo
avaliativo (2013-2015) num processo de amadurecimento e reformulação. As
instituições procuram, a cada ciclo avaliativo, acompanhar as diversas mudanças e
518

alterações dos instrumentos de avaliação e indicadores de qualidade expressos,


concentrando esforços para atendimento aos padrões de qualidade explicitados e
aprovação com êxito nas avaliações.
Acredita-se, como indicam Dias Sobrinho (2008) e Weber (2010), a avaliação é
capaz de instituir estilos de gestão e de desencadear os processos de mudança dentro das
próprias instituições, bem como subsidiar os estabelecimentos de padrões de qualidade
a serem atingidos.
A avaliação dos cursos de graduação também utiliza procedimentos e
instrumentos diversificados, dentre os quais, obrigatoriamente, de acordo com a Lei do
SINAES, as visitas por Comissões de Especialistas das respectivas áreas do
conhecimento, resultando na atribuição de conceitos, ordenados em uma escala de cinco
níveis, a cada uma das dimensões e ao conjunto das dimensões avaliadas. Portanto, a
avaliação dos cursos de graduação subsidia os processos de autorização, de
reconhecimento e de renovação de reconhecimento de cursos de graduação.
Assim, podemos destacar, a partir do levantamento das pesquisas realizadas e
registradas no Banco de Teses da CAPES, que a ‘avaliação de curso’ precisa ainda ser
mais e melhor estudada para que sejam reconhecidos, identificados e analisados os
impactos que esse procedimento, de educação superior nacional. Estudos e pesquisas da
avaliação de curso, componente de uma política de avaliação do sistema pode contribuir
para a construção de uma educação superior visando a melhoria da qualidade do ensino
oferecido aos jovens(e não tão jovens) brasileiros.
Podemos admitir que este estudo ratificou a preocupação inicial, em considerar
fundamental compreender a visão dos coordenadores (sujeito da pesquisa proposta)
sobre a avaliação de Cursos.

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520

APÊNDICE

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interna da Universidade Federal do Ceará - UFC - acerca da autoavaliação
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escolar e empresarial e feedback em rede: um estudo de casos múltiplos. 118 f.
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graduados para a melhoria da qualidade da educação superior. 267 f. Tese
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Comunicação

O gerencialismo na atual organização de trabalho docente universitário

Fernando Henrique Protetti


Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação e Diferenciação Sociocultural
(GEPEDISC)

Resumo: O texto objetiva-se identificar a presença do gerencialismo na atual


organização de trabalho docente universitário. Inicialmente, por meio de pesquisa
bibliográfica e documental, analisam-se casos significativos no período recente de
políticas de avaliação do trabalho docente, identificando-se o contexto social de
produção da política em questão, suas principais características e consequências à
organização do trabalho dos professores universitários. Posteriormente procura-se
compreender como que alguns traços constitutivos na atual organização do trabalho
docente universitário coadunam-se as características do gerencialismo. À guisa de
conclusão, sintetizam-se questões levantadas no decorrer do texto sobre a forma atual de
organização de trabalho dos professores universitários.
Palavras-chave: Gerencialismo; Organização do trabalho docente; Professor
universitário.

1 Introdução
Nos últimos anos pesquisadores têm investigado as condições e consequências
do processo de intensificação e precarização do trabalho docente nas universidades
públicas brasileiras1. Por sua vez, movimentos associativos e sindicais de professores
universitários denunciam e lutam contra o congelamento salarial2, o produtivismo
acadêmico3 e o adoecimento, sofrimento e assédio moral no trabalho4.

1
Para uma síntese desta problemática, ver Sguissardi e Silva Júnior (2009).
2
Ver notícias e artigos da grande mídia paulista (jornais Folha de S. Paulo e Estadão) e informes e
boletins da Associação de Docentes da USP (ADUSP), Associação de Docentes da Unicamp
(ADUNICAMP) e Associação de Docentes da UNESP (ADUNESP) sobre a atual (jul. 2014) greve dos
professores universitários das universidades estaduais paulistas.
3
Ver números especiais das revistas (i) Universidade e Sociedade, Brasília, ano XIX, n. 45, jan. 2011
(Reforma da Educação e Trabalho Docente) do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de
Ensino Superior (ANDES-SN), (ii) Revista ADUSP, São Paulo, n. 48, set. 2010 (Produtivismo
535

Neste texto, instrumento de resistência “via produção de conhecimento” (LEDA;


SILVA JÚNIOR, 2013), objetiva-se identificar a presença do gerencialismo na atual
organização de trabalho docente universitário, tendo em vista o estudo de casos
significativos no Brasil recente de políticas de avaliação do trabalho de professores
universitários. Embora seja “no âmbito da pós-graduação, no caso do Brasil, que se
ditam os rumos da efetiva reforma universitária”, via modelo CAPES5 de avaliação e
financiamento e produtivismo acadêmico (SGUISSARDI, 2010, p. 308)6, talvez ainda
seja importante investigar pontos de inflexão sob a organização do trabalho dos
professores universitários, induzidos por processos ditos de “avaliação”.
No debate Produtivismo: a que veio? A quem serve? (2012) promovido pela
ADUSP, seu então presidente, professor João Zanetic, lembrava que “a expressão
‘produtivismo acadêmico’ deriva, de certo modo, de matéria publicada pelo jornal Folha
de S. Paulo em 21/2/1988, intitulada ‘Pesquisa da USP mostra que ¼ dos docentes nada
produz’, acompanhada de uma lista dos docentes ‘improdutivos’ em 1985 e 1986”
(ADUSP, 2012, p. 2). Significativo é notar também que “a avaliação da CAPES que
outrora desempenhara um papel relevante na organização do sistema de pós-graduação
brasileiro incorporou a mesma lógica produtivista, pragmática e utilitarista na GED
[Gratificação de Estímulo à Docência]” (LEHER; LOPES, 2008, p. 8). Sendo assim,
pergunta-se: quais são as características comuns destas políticas de avaliação do
trabalho de professores universitários ainda presentes na atual organização de trabalho
docente nas universidades públicas brasileiras?
Tendo por finalidade responder a pergunta acima, estruturou-se o texto, além
desta introdução, em três momentos distintos. Inicialmente analisam-se casos
significativos no período recente de políticas de avaliação do trabalho docente, a saber:
(1) a avaliação da produção científica docente na Universidade de São Paulo (USP),
política protagonizada pela gestão do reitor José Goldemberg, explicitado no episódio
da “lista dos improdutivos da USP” (1988); (2) a imposição legal da Gratificação de
Estímulo à Docência (GED) aos professores das Instituições Federais de Ensino
Superior (IFES) ao final do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC)

acadêmico, estresse laboral & distúrbios afins) da ADUSP e (iii) Movimento em Debate, Campinas, ano
2, n. 3, mai. 2009 (Produtivismo e avaliação docente) da ADUNICAMP.
4
Ver conjunto de reportagens (Assédio moral no serviço público, Condições de trabalho na universidade
e assédio moral na universidade) do II Seminário da ADUFPR-SSind sobre Assédio Moral no Trabalho
realizado em Curitiba pela Associação dos Professores da Universidade Federal do Paraná (APUFPR-
SSind) em 2014. Disponível em: <http://www.apufpr.org.br/8/19/reportagens>. Acesso em: 10 jun. 2014.
5
Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal em Nível Superior.
6
Para uma síntese sobre o assunto, de perspectiva crítica, ver Bianchetti e Sguissardi (2009).
536

(1998). Para cada um dos casos realizou-se pesquisa bibliográfica e documental, de


caráter não exaustivo, cuja finalidade foi identificar (i) o contexto social de produção da
política de avaliação do trabalho docente em questão, (ii) suas principais características
e (iii) consequências à organização do trabalho dos professores universitários. Num
segundo momento, a partir de uma apreciação inicial dos resultados obtidos pelo estudo
de ambos os casos, procura-se compreender, tendo em vista as contribuições críticas de
Gaulejac (2007), como que alguns traços constitutivos na organização do trabalho
docente universitário no período recente coadunam-se as características do
“gerencialismo”, destacadamente seu poder e sua ideologia. Por fim, à guisa de
conclusão, sintetizam-se questões levantadas no decorrer do texto sobre a forma atual de
organização de trabalho dos professores universitários, orientadas, em boa medida, pelo
modelo CAPES de avaliação e financiamento e produtivismo acadêmico.

2 As políticas recentes de avaliação do trabalho dos professores universitários

2.1 A “lista dos improdutivos da USP” (1988)


Em 21 de fevereiro de 1988, domingo, o jornal Folha de S. Paulo publicou uma
lista com 1.108 nomes de professores da USP que, segundo levantamento realizado pela
reitoria sobre a produção científica docente, não teriam publicado nos anos de 1985 e
19867. O rol desses nomes, a popularização desta notícia pelo jornal e o debate público
daí decorrente entre jornalistas e professores, que teve como cenário o próprio jornal
durante os meses de fevereiro e março de 1988, tornou-se conhecido como o episódio
da “lista dos improdutivos da USP”. Se o seu “efeito foi devastador e durante dois
meses houve intensa polêmica” (CATANI; GUTIERREZ; FERRER, 1999, p. 76),
pode-se partir do pressuposto de que
A lista dos improdutivos é significativa porque sintetiza e escancara
dispositivos que foram se tornando, talvez, mais sutis e, aparentemente, mais
sofisticados do ponto de vista da técnica de medida da produção, mas que, no
fundo, reproduzem a mesma vivão insensata do trabalho intelectual.
(SCHMIDT, 2011, p. 316)

7
Além da publicação desta lista nominal, subdivida por unidades e com uma tabela-resumo, a notícia
acompanhava quatro matérias assinadas (Ana Fromer, Pesquisa da USP mostra que ¼ dos docentes nada
produz; Rogério Cezar de Cerqueira Leite, Produção norteia avaliação do mundo desenvolvido; Paulo
Francis, Nos EUA, acadêmico que não publica está morto; Roseli Forganes, Na França, o relatório final
é divulgado), duas tabelas (uma salarial dos docentes das universidades públicas paulistas e outra
subdividida por regime de trabalho) e dois artigos de professores da própria USP (José Goldember,
Avaliação visa melhor formação de pessoal qualificado; Paul Singer, Todo funcionário público deve
estar sujeito à avaliação). Para detalhes ver Folha de S. Paulo (1988).
537

Inicialmente destaca-se que o episódio da “lista dos improdutivos da USP”


insere-se numa conjuntura singular, o das políticas de modernização das universidades
brasileiras no período pós-década 1970. Fundamentadas em processos de burocratização
nos domínios do ensino, pesquisa, extensão e administração, essas políticas
possibilitaram a criação de “mecanismos que inserem as universidades na lógica
nacionalizadora do capital” (PAULA, 2000, p. 200).
No caso da USP, [...] a gestão do professor Goldemberg na Reitoria (1985-
1989) [constitui-se] como um marco importante do processo de
recrudescimento do espírito burocrático. [...] Ou seja, houve na USP, a partir
da segunda metade da década de 80, uma hipertrofia das técnicas que
simulam uma maior eficiência e racionalidade para a instituição, mas que
concretamente têm conduzido a universidade para um processo de
burocratização anárquica que, no limite, tem entrado em conflito com os
valores propriamente acadêmicos, tais como o ensino e a pesquisa. (PAULA,
2000, p. 192)

É precisamente nesta circunstância que se tem a implementação da avaliação da


produção científica docente na USP. Para Goldemberg (1992, p. 94), por meio desta
tratava-se de criar “uma nova mentalidade que implicava valorizar a produção científica
e desenvolver um esforço coletivo, em cada departamento, para melhorar seu
desempenho”, pois tinha ele a
[...] impressão de que a universidade estava estagnada e enfrentava uma série
crise de desenvolvimento. Tinha a impressão de que havia departamentos
com muitos professores acomodados em suas posições, o que acarretava um
fraco desempenho. Além disso, estes departamentos possuíam critérios
extremamente lenientes para aprovação em concursos e ou promoção, o que
os tornava prisioneiros de um círculo vicioso difícil de quebrar, e que os
impedia de melhorar. Mesmo os departamentos mais conceituados pareciam
encontrar poucos estímulos para desenvolver seus trabalhos.
(GOLDEMBERG, 1992 , p. 92)

Considerava, ainda, que “o melhor caminho seria o de reunir informações


quantitativas confiáveis sobre a atividade dos departamentos e unidades, colhendo
dados sobre a produção [científica] dos seus docentes”8, uma vez que teria disponível
um conjunto de “informações e indicadores de desempenho institucional – tanto da
USP, como um todo, como das suas unidades e departamentos” (GOLDEMBERG,
1992, p. 92-93), possibilitando-o “administrar uma universidade do porte da USP com
um mínimo de eficiência e dirigi-la com um mínimo de justiça, alocando recursos de
forma responsável” (GOLDEMBERG, 1992, p. 102). No entanto, com a publicação da
“lista dos improdutivos da USP” o processo de avaliação da produção científica docente
8
A produção científica dos professores era classificada em artigos de periódicos, de jornais, livros e
capítulos de livros, patentes, produção artística e/ou materiais audiovisuais, relatórios técnicos, resenhas,
traduções, trabalhos apresentados em congressos e publicados em anais, e trabalhos apresentados em
congressos, divididos em trabalhos internacionais e nacionais (GOLDEMBERG, 1992, p. 93).
538

atingiu seu ápice, pois no debate público travado entre jornalistas e professores no
jornal Folha de S. Paulo o centro da questão tornou-se a avaliação do trabalho
acadêmico. Vale notar, conforme Schmidt (2011, p. 317), que a “atmosfera singular,
marcada pelo impacto da publicação da lista e pelo dinamismo comum aos jornais”,
produziu uma situação que “constrange os autores à tomada de posição imediata e, ao
mesmo tempo, dá oportunidade à aparição do vasto campo de implicações conceituais,
ideológicas, éticas e políticas que a avaliação suscita”.
Do ponto de vista do jornal “a quantidade de publicação constitui-se num
indicador confiável para a atividade intelectual e a produção científica docente”, tal
como atesta sua denominação atribuída ao episódio: “lista dos improdutivos da USP”.
Nas reportagens dos jornalistas da Folha de S. Paulo9 observa-se uma posição comum,
a da identidade entre publicação e produtividade, o que demonstra um claro “elogio ao
modelo norte-americano de avaliação” (CATINI; GUTIERREZ; FERRER, 1999, p. 78).
Por sua vez os professores em seus artigos10 manifestam-se “contra a elaboração
e divulgação da lista”, responsabilizando “a incompetência administrativa da Reitoria, a
mentalidade empresarial de setores da universidade, a mediocridade da burocracia e o
sensacionalismo da Folha pela geração do lamentável acontecimento” (SCHMIDT,
2011, p. 317). As críticas dirigiam-se ao viés quantitativo, homogêneo e classificatório
da avaliação, enfatizando sua característica burocrática, pois ao privilegiar unicamente a
produção científica desconsiderava outras dimensões do trabalho dos professores
universitários (ensino e extensão, por exemplo). Neste sentido, defendem uma avaliação
qualitativa, democrática e transparente, que seja interna a própria universidade
(CATANI; GUTIERREZ; FERRER, 1999; SCHMIDT, 2011).
Sendo assim, a avaliação da produção científica docente na USP, explicitada no
episódio da “lista dos improdutivos da USP”, caracteriza-se como “uma avaliação
produtivista e quantitativa baseada sobretudo no número de publicações dos docentes
[que] não leva necessariamente a uma maior eficiência do sistema universitário como
um todo” (PAULA, 2000, p. 195). Isto porque,
Em 1987, uma fração de até 20% do orçamento de custeio e capital das
unidades de ensino e pesquisa [da USP] foi alocada com base no número de
publicações técnico-científicas e no número de teses de mestrado e doutorado

9
Paulo Francis (Nos EUA, acadêmica que não pública está morto, 21/02/1988) e Carlos Eduardo Lins da
Silva (Publicações e desempenho didático contam pontos nos EUA, 33/02/1988).
10
Exceção é o artigo de José Goldemberg (A avaliação visa melhor formação do pessoal qualificado,
21/02/1988) que faz “um longo elogio ao processo de avaliação na USP, onde destaca os objetivos da
universidade, a sua função de transparência e prestação de contas e defende que o mesmo seja utilizado
como critério para a distribuição de verbas” (CATANI; GUTIERREZ; FERRER, 1999, p. 80-81).
539

produzidas por docentes das respectivas unidades. Deu-se grande ênfase à


avaliação da produção técnico-científica medida pelo número de trabalhos
publicados, culminando com a alocação de partes dos recursos orçamentários
em função dessa “produção”. A resposta da comunidade acadêmica foi no
sentido de aumento do número de publicação no período de 1985-1988 [...].
Entretanto, podemos verificar que justamente no ano de 1988, quando se
atingiu o maior número de trabalhos publicados, o número de formados nos
cursos de graduação foi o menor do período compreendido entre 1982 e
1988. (PAULA, 2000, p. 194-195)

Finalmente, no que se refere à organização do trabalho docente, os professores


passaram “a encarar os relatórios de atividades com mais seriedade, como um
documento que, aos poucos, vai se tornando peça relevante para decidir o profissional
de quem o apresenta” (CATANI; GUTIERREZ; FERRER, 1999, p. 86). A avaliação da
produção científica docente, por seu turno, tornou-se instrumento com presença
constante no trabalho dos professores universitários, especialmente após sua
sofisticação e complexificação e vinculação ao financiamento auferida em relação à
produtividade, feições próximas à lógica empresarial de organização do trabalho.

2.2 A Gratificação de Estímulo à Docência (GED) (1998)


O anúncio da edição da Medida Provisória n° 1.616, de 13 de março de 1998,
que criava o Programa de Bolsas de Incentivo à Docência (PID)11, sistema rotativo de
bolsas que implicava no aumento de horas/aula na graduação, no contexto de
congelamento e acúmulo de perdas salariais, produziu a deflagração de uma das mais
longas greves dos professores das IFES. A pauta de reivindicações contemplava 48% de
reajuste salarial, retirada imediata da Medida Provisória n° 1.616/1998 e a abertura de
concursos públicos de professores e técnico-administrativos para reposição de vagas
(ROSSETI, 1998). Sendo rejeitada a PID, e
Após uma greve de quase cem dias, a correlação de forças no Congresso
Nacional, majoritariamente governista, possibilitou ao governo a adoção de
uma política de não aumento salarial, mediante a adoção da velha estratégia
de conceder gratificações, neste caso denominada de estímulo à docência.
Ainda que uma parte significativa da gratificação esteja sujeita à “avaliação
qualitativa” nas atividades de “docência, pesquisa e extensão” trata-se uma
gratificação pelo conjunto das atividades realizadas. (BELLONI, 2000, p.
106, itálicos da autora)

11
O PID apresentava “a finalidade de estimular e valorizar o envolvimento de docentes com o ensino,
especialmente com a modernização e transformação do ensino de graduação” (art. 6), sendo aberta apenas
a participação de “docentes do quadro efetivo em regime de trabalho em dedicação exclusiva ou quarenta
horas semanais, [...] que não recebam proventos de aposentadoria de qualquer órgão público e não sejam
beneficiários de bolsas de formação” (§ 1°, art. 6), e permitida sua manutenção com outros tipos de bolsa
(produtividade e pesquisa) (§ 2°, art. 6°) (BRASIL, 1998a).
540

Imposta aos professores das IFES, por meio da Lei n° 9.678, de 3 de julho de
1998 (BRASIL, 1998b), a GED foi apresentada pelo governo como um “instrumento de
reposição salarial e de avaliação docente” (PINTO, 1999, p. 12), no qual condicionava-
se o valor da gratificação à avaliação de atividades docentes, privilegiando-se o ensino
em detrimento da pesquisa, extensão e administração.
A Gratificação consistia em um sistema de atribuição de pontos às atividades
realizadas pelos professores, de acordo com o regime de trabalho e a sua
titulação. Para receber a gratificação integralmente, o docente teria que
perfazer uma determinada quantidade de pontos aferidos por comissões
instituídas nas unidades acadêmicas. Cada professor deveria atingir pelo
menos 140 pontos, destes, 120 poderiam resultar de suas atividades de
ensino. A atividade de ensino recebia, portanto, maior pontuação, 10 pontos
por hora/aula. Os demais pontos seriam atribuídos às suas atividades de
pesquisa e de extensão. (SILVA, 2010, s. p.)

Ainda de acordo com Silva (2010, s. p.), “Como o nome indicava, a GED
estimularia os docentes, faria com que se voltassem às atividades de sala de aula, de
ensino, já que estas seriam mais valorizadas.” Para Catani e Oliveira (1999, p. 65) “A
GED também objetiva valorizar a titulação acadêmica e os professores da ativa, bem
como acabar com os reajustes isonômicos de salários mediante gratificação baseada no
desempenho”. Vale lembrarmos que estavam excluídos da GED os professores das
IFES sem titulação e os de 1° e 2° graus, enquanto que professores aposentados, com
licença maternidade, médica, para capacitação ou em férias prêmio e pensionistas
recebiam apenas 60% do seu valor total.
Mais do que um “sistema de avaliação do desempenho docente” (BRASIL,
1998b, art. 1°, § 6°) a GED apresenta como característica principal a associação de duas
dimensões; constitui-se num (i) “procedimento para atribuição de gratificação
pecuniária por atividade realizada”, no qual há a “associação entre resultados de
avaliação de desempenho e recursos financeiros, especificamente salários para todos os
integrantes do sistema, atribuídos de forma diferenciada” (BELLONI, p. 105-106,
itálicos da autora) e, simultaneamente, numa (ii) estratégia governamental que introduz
no interior da universidade pública os mecanismos competitivos da empresa privada
(SILVA, 2010; CATANI; OLIVEIRA, 1999).
Há convergências entre os analistas de considerar a GED responsável por
alterações significativas na organização de trabalho dos professores das IFES. Isto
porque, a GED, ao valorizar a premiação individual segundo o desempenho docente,
acabou por estimular a competição e reforçou o individualismo entre os professores.
Neste cenário explicitam-se
541

[...] duas novas realidades no processo de produção do trabalho e da vida


acadêmica. A primeira diz respeito ao fato de que a diferenciação inicial dos
vencimentos vai sendo associada, paulatinamente, ao desempenho ou mérito
individual, o que legitima naturalmente as vantagens e/ou prêmios
conquistados, fazendo com que a pontuação das atividades docentes opere
como um ranking do êxito ou do fracasso do trabalho acadêmico. A segunda
refere-se às relações de trabalho docente, antes horizontalizadas, que se
tornam mais verticalizadas e naturalizadas, uma vez que a disputa e a
rivalidade assume a forma da luta dos seres vivos pela sobrevivência,
especialmente quanto são escassos os elementos necessários à vida.
(CATANI; OLIVEIRA, 1999, p. 70, itálicos dos autores)

A GED também delineou “um novo ethos acadêmico” (SILVA, 2010, s. p.) no
trabalho dos professores das IFES ao produzir uma “mudança da mentalidade nas
relações de produção acadêmica” (CATANI; OLIVEIRA, p. 71).
Os professores universitários não desenvolvem mais atividades como
integrantes de um projeto de produção de conhecimento – com ramificações
para o ensino, a pesquisa e a extensão – gerando elaborações, como
produções escritas, debates, que reafirma a identidade do trabalho docente. O
que ocorre é que as definições das atividades passam a ser orientadas a partir
das exigências da GED, que impõem prioridades, acabando por delinear o
perfil dos cursos. Isto se agrava numa situação de crise onde o achatamento
salarial é brutal e a ameaça do desemprego um fato. O trabalho do professor
universitário alterou-se ao mesclar-se com esta dura realidade. (PINTO,
1999, p. 23).

Portanto, ao reforçar a “ideia de que o trabalho docente deva encontrar o seu


lugar no desempenho individual e no mercado acadêmico”, a GED alterou o sentido e
significado do trabalho dos professores das IFES, uma vez que a “maior subordinação
real do trabalho acadêmico aos instrumentos legais burocráticos do Estado e,
indiretamente, ao capital produtivo”, fez com que este se comportasse cada vez mais
como uma mercadoria (CATANI; OLIVEIRA, 1999, p. 71). Pinto (p. 1999, p. 23)
identifica-a com as antigas práticas de gestão do trabalho no modelo taylorista-fordista:
Estamos de volta a velhos conceitos e práticas; quais sejam, o atrelamento da
remuneração pela atividade desenvolvida ao critério de produtividade em
termos de tarefas executadas, matematicamente computadas. Atingiu-se o
patamar exigido, recebe, não atingiu...

Por fim parece claro que “o trabalho docente assalariado está se tornando mais
flexível, embora controlado em seus movimentos e finalidades”, até porque com a GED
“o aumento da produtividade e dos vencimentos passam a depender, em grande parte,
do esforço do próprio docente, sob certas condições objetivas.” (CATANI; OLIVEIRA,
1999, p. 72, itálicos dos autores).
542

3 O gerencialismo na atual organização do trabalho docente universitário


O estudo de casos significativos de políticas de avaliação do trabalho docente no
período recente revela alguns traços constitutivos na organização do trabalho docente
universitário no período recente: avaliação do trabalho como técnica de mensuração
quantitativa; financiamento/remuneração vinculada aos indicadores de eficiência,
desempenho e produtividade no trabalho; instrumentos e mecanismos de gestão que
fomentam a meritocracia, competição, diferenciação entre os trabalhadores.
Muitos desses traços coadunam-se as características do “gerencialismo”,
conceito descrito por Gaulejac (2007) no livro A gestão como doença social. Para este
autor o gerencialismo constitui-se, simultaneamente, numa “tecnologia de poder, entre
capital e trabalho, cuja finalidade é obter a adesão dos empregados às exigências da
empresa”, e numa “ideologia que legitima uma abordagem instrumental, utilitarista e
contábil das relações entre o homem e a sociedade” (GAULEJAC, 2007, p. 27).
Do ponto de vista do poder, no âmbito da relação entre capital e trabalho, a
característica do gerencialismo é a de inserir na lógica da produção a lógica financeira
do capital, situação na qual “A gestão de pessoal e das relações sociais é substituída pela
gestão dos recursos humanos” (GAULEJAC, 2007, p. 40). De tal modo que
O desempenho e a rentabilidade são medidos em curto prazo, “em tempo
real”, pondo o conjunto do sistema em uma tensão permanente: zero de
atraso, tempo exato, fluxos intensos, gerenciamento imediato etc. Trata-se de
fazer sempre mais, sempre melhor, sempre mais rapidamente, com os mesmo
meios e até como menos efetivos. (GAULEJAC, 2007, p. 41)

No que diz respeito à ideologia, o gerencialismo caracteriza-se pelo


agrupamento, em si mesmo, de diferentes princípios e paradigmas que fundamentam a
gestão do trabalho no capitalismo: “compreender é medir, calcular” (paradigma
objetivista), “a organização é um dado” (paradigma funcionalista), “a objetivação é um
dado científico” (paradigma experimental), “a reflexão está a serviço da ação”
(paradigma utilitarista) e “o humano é um recurso da empresa” (paradigma
economicista) (GAULEJAC, 2007, p. 77). Deste modo, ao ocultar os mecanismos de
poder, aplicar a dominação da racionalidade instrumental, submeter o conhecimento a
critérios de utilidade e reduzir o ser humano a um recurso da empresa, o gerencialismo
submete o trabalhador aos objetivos da gestão gerencialista, sendo que este deve
“adaptar-se ao ‘tempo do trabalho’, às necessidades produtivas e financeiras. A
adaptabilidade e a flexibilidade são exigidas em mão única: cabe ao homem adaptar-se
ao tempo da empresa e não o inverso.” (GAULEJAC, 2007, p. 78-79)
543

Parece válido notar ainda que o gerencialismo, ao apresentar conceitos-chave da


“qualidade” por meio de termos ou expressões como “excelência”, “sucesso”,
“progresso”, “desempenho”, “comprometimento”, “satisfação das necessidades”,
“reconhecimento” etc., produz um “discurso insignificante”, circular em si, pois
“encoberta a complexidade pela evidência, neutraliza as contradições pelo positivismo,
erradica os conflitos de interesse pela afirmação de valores que se pretendem
‘universais’” (GAULEJAC, 2007, p. 91). Apreende-se, então, que no gerencialismo,
“Por trás da qualidade, os objetivos perseguidos são claros: otimizar os ‘recursos
humanos’, melhorar os resultados financeiros, favorecer a flexibilidade, produzir a
adesão, desenvolver a autonomia controlada.” (GAULEJAC, 2007, p. 92) Por outro
lado, a utilização recorrente de instrumentos de medida no sentido de auferir a qualidade
do trabalho produz a “quantofrenia” ou “doença da medida”, uma “patologia que
consiste em querer traduzir sistematicamente os fenômenos sociais e humanos em
linguagem matemática” (GAULEJAC, 2007, p. 94). Por conseguinte, pode-se dizer que
A insignificância e a quantofrenia são duas figuras do poder. Uma permite
evitar a crítica e a contestação, pois ela impede de chegar ao sentido dos
mecanismos que estão em prática, e a outra permite apresentar como neutro e
objetivo um programa que leva os agentes a interiorizar a ideologia
gerencialista. (GAULEJAC, 2007, p. 97)

O poder e a ideologia gerencialista, portanto, ao “submeter os indivíduos por


injunções paradoxais” acaba por transformar a “energia psíquica em força de trabalho”
(GAULEJAC, 2007, p. 108), o que leva o trabalhador ao processo de “alienação à
segunda ordem”, isto é, “cada indivíduo é convidado a cultivar sua autonomia, sua
liberdade, sua criatividade para melhor exercer um poder que reforça sua dependência,
sua submissão, seu conformismo”; nesta circunstância é “o próprio indivíduo que se
torna seu principal motor” (GAULEJAC, 2007, p. 123).

4 À guisa de conclusão
O estudo de casos recentes de políticas de avaliação do trabalho de professores
universitários (“lista dos improdutivos da USP” e GED) permitiu identificarmos como a
avaliação tem sido utilizada como técnica de mensuração quantitativa da produtividade
no trabalho docente. Fundamentada em critérios de eficiência e desempenho, próprios
da lógica do capital (financeiro), e produzindo indicadores de produção segundo a
“qualidade” do trabalho realizado (número de publicações e pontuação das atividades
docentes), a avaliação, ao se vincular ao financiamento/remuneração, altera a
544

organização do trabalho dos professores universitários, induzindo-os a meritocracia, a


competição e diferenciação de carreiras e salários. Pragmatismo, racionalidade
instrumental, utilitarismo, flexibilidade, autonomia controlada, insignificância,
quantofrenia, injunções contraditórias etc. produzem e reproduzem o gerencialismo na
atual organização de trabalho docente universitário. Logo, “obedecer a considerações
militantes, mas que gestionárias, colocando a pesquisa a serviço do bem comum e da
demanda social, mais do que a critérios de utilidade e de lucratividade” (GAULEJAC,
2007, p. 32) constitui-se numa forma de resistência ao atual modelo CAPES de
avaliação e financiamento e produtivismo acadêmico, além de contribuir com a luta dos
movimentos associativos e sindicais de professores universitários.

Referências

ASSOCIAÇÃO DE DOCENTES DA USP. Choque de visões antagônicas marca debate


sobre produtivismo acadêmico. Informativo ADUSP, n. 302, p. 2-3, 22 mar. 2012.

BELLONI, I. A Gratificação de Estímulo à Docência: (GED) e a política de educação


superior. In: SGUISSARDI, V. (Org.). Educação superior: velhos e novos desafios.
São Paulo: Xamã, p. 103-130.

BRASIL. Medida Provisória nº 1.616-16, de 13 de março de 1998. Dispõe sobre o


número de Cargos de Direção e Funções Gratificadas das Instituições Federais de
Ensino Superior, dos Centros Federais de Educação Tecnológica e das Escolas
Agrotécnicas Federais, e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília:
Imprensa Oficial, 14 mar. 1998a.

______. Lei nº 9.678, de 3 de julho de 1998. Institui a Gratificação de Estímulo à


Docência no Magistério Superior e dá outras providências. Diário Oficial da União.
Brasília: Imprensa Oficial, 6 jul. 1998b.

BIANCHETTI, L.; SGUISSARDI, V. (Org.). Dilemas da pós-graduação: gestão e


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CATANI, A. M.; GUTIERREZ, G. L.; FERRER, W. M. H. O jornal Folha de S. Paulo


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______.; OLIVEIRA, J. F. de. A Gratificação de Estímulo à Docência (GED):


alterações no trabalho acadêmico e no padrão de gestão das Instituições Federais de
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545

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Comunicação
546

Atuação dos fóruns estaduais permanentes de apoio ao programa de formação de


professores (PARFOR) nos estados do Amazonas e do Piauí

Francinete Massulo Corrêa


Universidade Federal do Amazonas UFAM
Rosilda Maria Alves
Instituto Federal do Piauí-IFPI
Miguel H. Russo
Universidade Nove de Julho-UNINOVE

Resumo: O objetivo deste artigo é identificar as ações dos Fóruns Estaduais


Permanentes de Apoio à Formação Docente - FORPROF dos Estados do Amazonas e
do Piauí, utilizando como fonte de análise os documentos gerados pelas Secretarias de
Educação dos dois Estados e publicados no Portal da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior-CAPES. Aborda aspectos gerais da política Nacional de
Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica - PARFOR, focando sua
execução na Universidade Federal do Amazonas e no Instituto Federal do Piauí. Analisa
as atribuições e atuação dos Fóruns, criados com o objetivo de em cada Estado elaborar
seu plano estratégico de formação, seu acompanhamento e revisão periódica. As
análises preliminares indicam a necessidade de ações voltadas para a avaliação
periódica do desempenho do Programa no âmbito das atribuições do FORPROF, haja
vista o tempo decorrido desde a publicação do Decreto 6.755, de 29 de janeiro de 2009
e das diretrizes nacionais para o funcionamento dos Fóruns Estaduais.
Palavras Chave: Formação de Professor, PARFOR, FORPROF.

INTRODUÇÃO
Este artigo tem como escopo a questão da criação e atuação do Fórum Estadual
Permanente de Apoio à Formação Docente, nos termos do Decreto nº 6.755, de 29 de
janeiro de 2009 que, em seu § 1º do art. 4º e art. 5º, estabelece a necessidade de cada
Estado elaborar o seu plano estratégico de formação, assim como seu acompanhamento
e revisão periódica. Esta exigência regulatória institui a política de formação de
professores, conforme a especificidade regional demandada pela comunidade educativa
local, que deve compor os colegiados previstos na lei, bem como assegurar a formação
gratuita e de qualidade exigida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional -
547

LDB – (Lei Federal nº 9.394/96). O Decreto 6755 estabelece, também, a atuação da


Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES no fomento a
programas de formação inicial e continuada e fixa princípios e objetivos dessa política.
Já a Portaria nº 883, de 16 de setembro de 2009, estabelece as diretrizes nacionais para o
funcionamento dos Fóruns Estaduais1.
A temática abordada é a Politica Nacional do Ministério da Educação – MEC -
de Formação de Professores da Educação Básica – PARFOR (BRASIL, 2009a),
implantada em diferentes Estados do país em caráter emergencial visando estimular a
formação, em nível superior, de professores em exercício nas redes públicas de
educação básica. Foi incorporada pelo poder público, em regime de cooperação técnica,
envolveu diversas instâncias educacionais – Secretarias de Educação dos Estados,
municípios e instituições públicas e comunitárias de ensino superior. O recorte desta
investigação alcança duas instituições2 de educação superior pública dos Estados do
Amazonas e Piauí, por serem os estados e instituições de origem das duas autoras, bem
como, pelo alcance do PARFOR nos respectivos Estados. A divulgação do Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB -, em 2009, revelou que nos Estados da
Região Norte e Nordeste a educação básica aparece com os mais baixos índices
nacionais e com os mais baixos índices de professores com formação superior.
O foco do estudo é a atuação do Fórum por considerá-lo uma instância
privilegiada para ações com vistas à melhoria dos indicadores da efetividade desta
política pública, com suas implicações na formação inicial e continuada de professores.
Além disso, pesa o fato da região Norte liderar o número nacional total de matrículas de
professores nos cursos do PARFOR, efetuadas no período de 2009 e 2012, com o
percentual de 48,86% seguida da região Nordeste com 38,18%, conforme relatório de
Gestão 2009-2012 da Diretoria de Formação de Professores da Educação Básica – DEB.
(BRASIL, 2013).
Neste contexto, tem nos inquietado o fato de que, apesar da institucionalização,
em 2009, da Política Nacional de Formação dos Profissionais do Magistério da
Educação Básica, conforme espelham os resultados da oferta quantitativa do Parfor “até
2013, de 2.145 turmas ofertadas por 96 instituições de educação superior – IES - e um
efetivo de 70.220 professores da educação básica frequentando os cursos em turmas

1
Os Fóruns Estaduais são órgãos colegiados criados para dar cumprimento aos objetivos da Política
Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica.
2
Universidade Federal do Amazonas-UFAM e Instituto Federal do Piaui-IFPI
548

especiais do Parfor3, em 397 municípios do País” (BRASIL, 2013). Tais números não
foram suficientes para estimular estudos e pesquisas sobre as ações gestionarias dos
Fóruns Estaduais, criados para dar cumprimento aos objetivos daquela política.
O objetivo deste estudo é a identificação das ações em desenvolvimento nos
Fóruns Permanentes de Apoio à Formação Docente dos Estados do Amazonas e Piauí
com vistas à realização de reflexão crítica sobre o atendimento às suas funções de apoio
à formação docente.
Este estudo, com base na análise dos documentos4 gerados pelos setores
responsáveis pelo PARFOR no âmbito do MEC, da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior - CAPES e Secretarias de Educação dos Estados do
Amazonas e Piauí, contribui para a compreensão do processo gestionário de um
programa de governo implantado para melhorar a formação dos professores e,
consequentemente, melhorar a qualidade do ensino.
Em essência, o que justifica este estudo é o fato de que a implantação e a
implementação dos Fóruns Estaduais de Apoio à Formação Docente dos Estados –
FORPROF - no PARFOR, nas instituições UFAM e IFPI, podem contribuir para a
melhoria do programa e, por consequência, da qualidade do ensino, como consta do
primeiro objetivo para criação do PARFOR: “promover a melhoria da qualidade da
educação” (BRASIL, 2009a). Além disso, acredita-se que o estudo sobre a atuação do
FORPROF pode ser útil para o surgimento de outros estudos e pesquisas das ações dos
Fóruns Estaduais de outras instituições de ensino superior localizadas em outros Estados
do país.

2 POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO PARA FORMAÇÃO DE


PROFESSORES: O FORPROF NO CONTEXTO DO PARFOR

Ao tentarmos compreender a atuação dos Fóruns Estaduais buscamos,


inicialmente, o significado de Política Pública e política educacional no âmbito da
formação de professores da educação básica, como um norte para estabelecermos os
nexos de tais fóruns. Estes compõem a esfera de poder político dos órgãos envolvidos
(nível federal, estadual, municipal), conforme expresso no documento síntese do Plano
3
Fonte: http://www.capes.gov.br/educacao-basica/parfor/foruns-estaduais
4
Os Dados e informações citadas resultam da leitura dos documentos apensados nos sites da
Plataforma Freire, MEC/INEP/CAPES/UFAM /IFPI: Legislação pertinente: Portarias, Ata de reuniões
dos Fóruns Estaduais e Folders de eventos compartilhados.
549

Nacional de Formação de Professores da Educação Básica. Esse documento estabeleceu


como uma primeira tarefa dos Fóruns, a elaboração do plano estratégico de formação,
seu acompanhamento e revisão periódica, “é imprescindível destacar o
comprometimento e esforço das Instituições Públicas de Educação Superior do Brasil
com este Plano, bem como a colaboração efetiva entre as instâncias do MEC e
Secretarias de Educação dos Estados” (BRASIL, 2009b, p.4).
A função do Estado sofreu inúmeras mudanças ao longo dos anos. No Brasil, por
exemplo, a reforma empreendida na década de 1990 traz no seu bojo as ideias de
redemocratização que pressupõe a participação popular, a descentralização e a garantia
de direitos, que foram princípios dessa reforma consolidados na Constituição Federal de
1988 – a chamada “Constituição cidadã” (FRANZESE, 2006).
Com o aprofundamento e expansão da democracia as responsabilidades do
Estado se diversificaram, sendo uma das suas principais funções promover o bem-estar
da sociedade. Para tanto, ele necessita desenvolver ações, programas e planos em
diferentes campos, tais como assistência social, saúde, educação. Sobre a questão da
democratização da educação nos aponta Tedesco:
Democratizar a educação seria uma condição necessária para a
democratização social. Depois da Segunda Guerra Mundial, a expansão
educativa foi considerada como uma necessidade para o crescimento
econômico. Gastar em educação seria investir, tanto ao nível individual
quanto social. Dessa forma, a democratização e o desenvolvimento
econômico apareceram como os objetivos básicos da política educacional, e
foi a partir dessa perspectiva que o funcionamento real dos sistemas
educacionais existentes foi avaliado (1995, p. 92).

Para alcançar tais resultados nas diversas áreas e promover o bem-estar os


governos se utilizam de políticas públicas, tema frequente nas discussões sobre as
atividades da Administração Pública, afetando a vida das pessoas como profissionais e
como cidadãos. Sobre as políticas públicas, um dos desafios que se apresenta é
esclarecer o seu significado, pois “não existe uma única, nem melhor, definição sobre o
que seja política pública” (SOUZA, 2006, p. 20).
Em um dos conceitos apresentado por Rua (2009, p.19), políticas públicas
“compreendem o conjunto das decisões e ações relativas à alocação imperativa de
valores envolvendo bens públicos”. De acordo com Teixeira (2002, p.2):
Políticas públicas soa diretrizes, princípios norteadores de ação do poder
publico; regras e procedimentos para as relações entre poder publico e
sociedade, mediações entre atores da sociedade do estado. São nesse caso,
políticas explicitadas, sistematizadas ou formuladas em documentos (leis,
programas, linhas de financiamentos) que orientam ações que normalmente
envolvem aplicações de recursos públicos.
550

Neste sentido é que se destaca que política pública envolve mais do que uma
decisão e requer diversas ações realizadas de forma estratégica para implementar
decisões tomadas. Dessa forma, as políticas públicas representam os instrumentos de
ação dos governos que influenciam a vida de um conjunto de cidadãos. Sobre a análise
do papel dos governos que decidem implementar políticas públicas Souza (2006, p.14)
destaca que “implicam responder à questão sobre que espaço cabe aos governos ou
outras instituições na sua definição e implementação”
De acordo com registro na literatura do campo educacional, a partir da década de
1990, com a aprovação da LDB, Lei nº 9394/96, que estabeleceu as diretrizes e bases da
educação nacional, a formação de professores da educação básica passou a merecer
maior atenção e reflexão.
Segundo a LDB, no seu Artigo 62, “a formação de docentes para atuar na
educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação
plena, em universidades e institutos superiores de educação [...]” (BRASIL, 1996),
admite, entretanto, a formação mínima de nível médio, na modalidade Normal, para o
exercício do magistério na educação infantil e no primeiro segmento do ensino
fundamental, tendo estipulado ainda um prazo de dez anos para o alcance da meta, que
não foi cumprida, até o término daquele prazo, em 2006.
O Educacenso5 2007 trouxe, entre suas estatísticas, que quase um terço dos
professores da educação básica das redes pública e particular do Brasil não tem
formação adequada. De um total de 1.977 milhões de docentes, 636,8 mil (32,19%)
atuam em sala de aula sem a devida qualificação universitária (INEP, 2008).
O Educacenso de 2009 revela dados que mostram um quadro crítico das regiões
consideradas mais pobres do país, pois dos cerca de 600 mil professores do Nordeste,
metade não tem curso superior. Nos Estados do Norte, os docentes que tem apenas
ensino médio e fundamental atingem 76,3 mil, número que representa 45,98% do total
(INEP, 2010).
Nos documentos oficiais, a melhoria da educação está atrelada à formação de
professores, e assim foram envidados esforços para a implantação de uma Política
Nacional de Formação de Profissionais do Magistério (PARFOR). A Portaria
Normativa n°. 9 de 30 de junho de 2009, estabelece um conjunto de ações entre

5
O Educacenso é um sistema on-line que visa coletar, organizar, transmitir e disseminar os dados
censitários. Os dados coletados são fundamentais para a elaboração de diagnósticos sobre a. educação
brasileira, os quais colaboram para a implementação de políticas públicas na área da educação.
551

Ministério da Educação - MEC, secretarias de educação dos estados e municípios e as


instituições públicas de educação superior, com a finalidade de atender os professores
das redes públicas de educação básica, sem a formação exigida pela LDB, ou com
formação divergente da área de atuação.
Numa breve leitura dos documentos da política educacional, pode-se entender
que os novos dispositivos legais, pós LDB/96, incorporam a formação de professores da
educação básica como uma das prioridades. O que repercute sobremaneira no lócus de
atuação do professor – a escola -, pondo na ordem do dia a discussão sobre o
desenvolvimento de soluções para os desafios da formação dos profissionais da
educação. Nesta direção caminham as palavras de Freire e Shor “os professores, cujo
sonho é a transformação da sociedade, têm de ter em mãos um processo permanente de
formação, e não esperar do establisment a formação profissional” (2003, p.33). E para
Shiroma e outros autores
Uma política educacional de educação é mais abrangente do que a legislação
proposta para organizar a área. Realiza-se também pelo planejamento
educacional e financiamento de programas governamentais, em suas três
esferas, bem como por uma série de ações não-governamentais que se
propagam, com informalidade, pelos meios de comunicação. Realiza-se, para
além desses espaços, por meio da difusão de seu ideário pelas publicações
oficiais e oficiosas (SHIROMA et al, 2002, p. 87).

Do acima exposto conclui-se a importância de pensar na atuação do FORPROF


na consecução do seu papel fundamental que é aproximar as ações de formação docente
das necessidades da realidade de cada Estado, como forma de realização de uma política
educacional que “afirma a centralidade da formação dos profissionais da educação
como requisito fundamental para se avançar na consolidação de uma escola pública de
qualidade”. (BRASIL, 2009a).

3 Ações dos Fóruns Estaduais de Apoio à Formação Docente dos Estados –


FORPROF

O que é? E quais são as atribuições do Fórum Estadual? Fundamentalmente, no


âmbito de cada Estado, trata-se de um órgão colegiado de caráter consultivo,
deliberativo e de assessoramento, que estabelece suas normas internas a partir das
diretrizes nacionais definidas pelo MEC. O artigo 1º, § 4º da Portaria MEC nº 883, de
16 de setembro de 2009, apresenta as atribuições dos Fóruns Estaduais, dentre as quais
merecem destaque:
552

I – elaborar os planos estratégicos de que trata o § 1º do art. 4º e o art. 5º do


Decreto 6.755, de 29 de janeiro de 2009; II – articular as ações voltadas ao
desenvolvimento de programas e ações de formação inicial e continuada,
promovidas pelos membros do Fórum; [...] VI – dar amplo conhecimento aos
sistemas estadual e municipal de educação das diretrizes e prioridades da
Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação
Básica; [...] IX – acompanhar a execução do plano estratégico e promover
sua revisão periódica.

Dessa forma, é nas atribuições supracitadas, que se vão encontrar as ações a


serem implementadas no processo de atuação dos membros institucionais do Fórum
Permanente de Apoio à Formação Docente- FORPROF. Tais ações têm como objetivos:
planejar, articular, coordenar, subsidiar, propor, observar, acompanhar e avaliar os
cursos de formação inicial e continuada, ofertados pelas Instituições participantes do
Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com o MEC.
Neste contexto, a criação do PARFOR conforme registra o documento síntese
do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (BRASIL, 2009b,
p.4) se deu a partir dos Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente.
Fato que pressupõe a atuação dos fóruns, desde o primeiro momento de sua implantação
conforme o Decreto n° 6.755, de 29 de janeiro de 2009, que instituiu a Política Nacional
de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, estabelecendo os
princípios e objetivos dessa política. No entanto, constatamos que a instalação dos
Fóruns nos Estados que aderiram ao PARFOR ocorreu em datas posteriores ao início da
operacionalização da oferta dos cursos de licenciatura na modalidade presencial,
embora o diagnóstico já tivesse consolidado. No Estado do Amazonas, por exemplo, o
Fórum foi instalado em 25/02/2010, e, somente instituído em 11/09/2012 conforme
Portaria de nº1369, do gabinete do Secretário de Estado de Educação e Qualidade do
Ensino. Já no do Piauí foi instalado no ano de 2010, com início das atividades no
segundo período daquele ano.
Os Fóruns, nas suas composições, devem ter membros de diversos setores da
educação, entre esses órgãos: secretarias de educação estadual e municipal, Ministério
da Educação, União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação – UNDIME,
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação - CNTE; Conselho Estadual de
Educação, União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação – UNCME, Fórum
das Licenciaturas das Instituições de Educação Superior Públicas. Atendendo ao que
dispõe o artigo 4º, § 1º, incisos I a VIII, do Decreto nº 6.755, os fóruns estaduais dos
estados do Amazonas e Piauí estão compostos por profissionais e instituições com
diferentes responsabilidades educativas: Secretários de educação, reitores, gestores
553

escolares, associações e sindicatos de formação dos profissionais da educação, alunos,


professores, membros dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente, dentre
outros.
Para fomentar o trabalho dos fóruns, a partir de instrumentos regulatórios já
citados neste texto, consta no documento síntese do Plano Nacional de Formação de
Professores da Educação Básica (BRASIL, 2009b) uma extensa relação de atividades
que podem compor a agenda dos fóruns. Considera que ao menos duas dimensões são
fundamentais no trabalho a ser desenvolvido por esses fóruns. Além do trabalho de
planejamento da formação inicial e continuada deve “discutir, também o sentido, o
papel, a perspectiva político-pedagógica que deve orientar as ações de formação
desenvolvidas [...]” Isto posto, o Plano Estratégico elaborado pelo fórum deve englobar
a formação inicial e a formação continuada nas modalidades presencial e à distância.
Nesta direção, Nesta direção, propõe como agenda/pauta o seguinte:
[...] O Plano Estratégico e sua formulação deve envolver a formação inicial e
a formação continuada nas modalidades presencial e à distância [..] A
formação a ser desenvolvida, seja no âmbito da formação inicial seja no
âmbito da formação continuada deve se orientar na perspectiva de se
consolidar algumas características e princípios fundamentais que mostrem
seu vínculo com a escola, a partir de alguns indicadores básicos: a)Estar
organizada em conformidade com Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de
licenciatura, de graduação plena, especialmente no que tange aos
componentes curriculares e à carga horária, enfatizando o trabalho coletivo e
interdisciplinar entre os professores e os demais estudantes dos cursos de
licenciaturas em formação; b) Oferecer sólida formação teórica, ampla e
consistente, sobre o fenômeno educacional e seus fundamentos históricos,
políticos e sociais, de modo a assegurar visão contextualizada dos conteúdos
de sua área de atuação e viabilizar a construção do trabalho coletivo na escola
como condição para as ações e para a produção interdisciplinar; c)Assegurar
a interação teoria e prática, ao longo do processo formativo, tendo o trabalho
docente como elemento articulador dessa interação e de modo que a prática
não fique reduzida a um momento isolado na matriz e organização
curricular;d)Propiciar o desenvolvimento da atitude investigativa como
princípio formativo, epistemológico e eixo da organização e desenvolvimento
do currículo;e)Desenvolver no educando a capacidade para a compreensão do
professor da educação como sujeito capaz de propor e efetivar as
transformações político-pedagógicas que se impõem às instituições
educativas, com vistas à consolidação do princípio da gestão democrática da
escola e ao desenvolvimento do currículo da educação básica na perspectiva
da formação integral do educando;f) Estar organizado em consonância com o
projeto pedagógico dos cursos de formação de professores da respectiva
instituição de ensino superior; Propiciar o acesso e domínio pelos professores
em formação das tecnologias de comunicação e informação e seus códigos,
bem como a produção de novos materiais e de alternativas metodológicas no
âmbito de sua área de trabalho; [...]

No âmbito da UFAM, o PARFOR foi implantado pela Resolução nº.


076/2009 do Conselho Universitário, no segundo semestre de 2009, com o objetivo de
554

atender à demanda inicial de 1119 (um mil, cento e dezenove) vagas para professores,
no exercício da docência, das redes estadual e municipais de ensino. A UFAM, no
período de 2010 a 2014, conforme o edital publicado em seu Portal eletrônico procedeu
à oferta que abrange aproximadamente 10 mil vagas distribuídas nas diferentes áreas
nos campi da instituição. Em 2012 e 2013 mais de mil alunos das unidades acadêmicas
da capital, dos campi do interior e do PARFOR receberam o grau de licenciados.
A UFAM realizou no período de 17 a 19 de setembro de 2013, cinco anos após
seu início, o primeiro Seminário de Avaliação do Programa cujos objetivos, segundo o
folder do evento, foi “avaliar o funcionamento do PARFOR e traçar diretrizes de
trabalho para aprimoramento de ações no Estado do Amazonas”. Nessa primeira ação,
com a participação dos órgãos envolvidos no acordo, nos dois dias programados para o
evento, constaram grupos de trabalho e “Relatos de experiência”, não há indicação da
apresentação de estudos e relatórios de pesquisa de avaliação do Programa em
articulação com a Secretaria de Estado de Educação, e, das ações que foram
implementadas, decorrentes da avaliação periódica da execução dos cursos.
No âmbito do IFPI, a instituição aderiu ao PARFOR no ano de 2010, ofertando
60 vagas, em duas turmas para o curso de 2ª Licenciatura em Matemática para o campus
Teresina Central, com início das atividades no segundo período daquele ano. O
FORPROF no Piauí foi implantado no dia 22 de dezembro de 2009, na Secretaria de
Estado da Educação - SEDUC. Entre as suas primeiras ações foi solicitar a
homologação de quatorze novos pólos de funcionamento da Universidade Aberta no
Piauí, em vários municípios, tendo sido votada e aprovada, atendendo ao que consta o
inciso III, artigo 2º da Portaria Normativa n° 883, de 16 de setembro de 2009 do MEC
As informações documentais coletadas sobre os Fóruns Estaduais de Educação
no Amazonas e Piauí, considerando a periodicidade das reuniões, pautas específicas
para o PARFOR, observamos que o FORPROF/AM e FORPROF/PI publicaram no site
da CAPES – é uma exigência que consta no Manual Operativo do PARFOR- atas das
reuniões, que revelam a recorrência, como pontos de pauta, de assuntos sobre: regulação
de criação e composição dos membros do fórum; regimento; organização da agenda de
trabalho; deliberação sobre a oferta de vagas para formação de professores. Nas duas
últimas reuniões, conforme atas datadas de 05/03/12 e 26/10/12, respectivamente do
FORPROF/AM e FORPROF/PI, de modo geral, mantém o foco de pauta sobre as
demandas quantitativas dos cursos do PARFOR.
555

Em âmbito nacional, a CAPES realizou no período de 21 e 22 de setembro de


2011 o I Encontro Nacional do PARFOR, integrando o processo de avaliação do
PARFOR, tendo como finalidades: fomentar a troca e a socialização de experiências e
reflexões; identificar proposições que contribuam para o aperfeiçoamento da gestão e
execução do Programa; e, contribuir para a melhoria da qualidade da educação básica.
O público-alvo desse evento foi: representantes das Instituições de Ensino Superior
participantes do PARFOR, representantes das secretarias estaduais e municipais de
educação e professores da rede pública da educação básica, matriculados nos cursos de
licenciatura oferecidos no âmbito do PARFOR. Não há registro de outros eventos com
tal objetivo organizado pela CAPES.
Apesar da importância das atribuições e urgência de eventos voltados para
dinamizar a atuação dos Fóruns, percebe-se a ausência de publicação e divulgação dos
resultados consolidados da avaliação periódica no âmbito do Programa pelo FORPROF
haja vista, o tempo decorrido desde a publicação do Decreto 6.755, de 29 de janeiro de
2009 e das diretrizes nacionais para o funcionamento dos Fóruns Estaduais.

COMENTÁRIOS FINAIS
Compreende-se que a função social e política do Fórum Permanente de Apoio à
Formação Docente- FORPROF, se efetiva pela participação dos profissionais da
educação nos eventos que discutem e deliberam sobre a própria profissionalização. Este
entendimento redimensiona os desafios lançados aos professores que buscam na escola
um espaço de formação. Assim sendo, a atenção do Fórum como órgão deliberativo,
consultivo e de assessoramento, não pode perder de vista que “a formação e a
valorização profissional são faces indissociáveis da política de profissionalização”
(AGUIAR, 2011, p.272).
Sendo o PARFOR uma política educacional de caráter permanente, que envolve
a utilização de recursos públicos, cremos serem, ainda, insuficientes os resultados de
avaliação do Programa. É necessária a produção de análises quantitativas e qualitativas
que indiquem o atendimento das demandas identificadas em cada situação específica,
como reconhece a própria existência dos Fóruns Estaduais, para oferecer à sociedade
respostas mais concretas dos resultados do programa executado pelas instituições
envolvidas no ACT. A gestão de tal Programa necessita desenvolver ações de
acompanhamento e avaliação sistemáticos, sob pena, de não o realizando, transformar
556

sua execução em um processo burocrático e genérico, isto é, desenvolvido


independentemente e sem levar em consideração o contexto.
Em relação ao FORPROF é necessário que, para o cumprimento de suas
atribuições, faça constar da sua atuação o acompanhamento e a reflexão sobre os
indicadores de qualidade da formação que os professores estão recebendo, incluindo as
dimensões didático-pedagógicas (Projeto Político Pedagógico Institucional e de cursos);
infraestrutura; corpo social (docentes e discentes), procedendo à realização de registros
detalhados e atualizados sobre todos os cursos e atividades realizadas a cada ano e quem
deles participou.
É preciso que os Foruns estimulem que no âmbito dos cursos do PARFOR
se realizem estudos e pesquisas sobre seu desenvolvimento e de como as instituições
que assumiram o Programa estão realizando, nas diferentes licenciaturas, o ensino e a
pesquisa, em atendimento à uma formação que extrapole a dimensão instrumental da
profissão docente. Esta preocupação decorre da nossa percepção de que há uma forte
tendência à burocratização das ações de Programas dessa natureza, imposta pelas
condições de execução das políticas públicas, em geral, e pelas imposições do cotidiano
institucional. Esta parece ser, por ora, a reflexão que podemos realizar em face do
estudo, ainda em fase exploratória, que realizamos.
Finalmente, para retomar o tema do nosso objeto, vale lembrar seu objetivo:
“Induzir e fomentar a oferta de educação superior, gratuita e de qualidade [...] que estes
profissionais possam obter a formação exigida pela Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional – LDB e contribuam para a melhoria da qualidade da educação
básica no País” (BRASIL, 2009b).

REFERÊNCIAS

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Brasília/DF: MEC, 2009a.
______. Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica. Documento
Síntese. Brasília: DEB/CAPES, Brasília, DF, 2009b.
557

________.Portaria n. 883, 16 de setembro de 2009. Brasília: MEC, 2009c. Disponível


em: http://www.portal.mec.gov.br. Acesso em 02 de junho de 2014.
________. Ministério da Educação/MEC. Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional nº 9394, de 20 de dezembro de 1996. Brasília: DOU, 23/12/1996.
_________.Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior Diretoria de
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www.capes.gov.br/ /legislacao/Manual/Operativo.Acesso em 29 de junho de 2014.
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http://www.ufam.edu.br. Acesso em 29 de junho de 2014.
558

Relato de Experiência

Gestão de resultados do índice de desenvolvimento da educação do estado de São


Paulo (IDESP) na Diretoria Regional de Ensino de Itaquaquecetuba/SP.

Francisco Lindoval de Sousa


UNIFESP/SP
Marcos Pedro Rezende
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo

RESUMO: Este relato de experiência diz respeito à sistemática de acompanhamento e


pesquisa, pela Supervisão de Ensino, dos resultados do IDESP (Índice de
Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo) em escolas jurisdicionadas a
Diretoria de Ensino da Região de Itaquaquecetuba. Em 2008 a Secretaria de Estado da
Educação de São Paulo fez publicar a Resolução SE – 74, que instituiu o Plano de
Qualidade na Educação (PQE) e o IDESP, apresentando como justificativa a
necessidade de disponibilizar às Unidades Escolares diferentes indicadores de natureza
quantitativa e qualitativa que forneçam diagnósticos acerca da qualidade do ensino
oferecido. Define como critérios para aferir o IDESP: o desempenho escolar, medido
pelos resultados alcançados no SARESP (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar
do Estado de São Paulo); e o fluxo escolar, qual seja, em quanto tempo os alunos
aprenderam, medido pela taxa média de aprovação nas séries do Ensino Fundamental e
do Ensino Médio.
PALAVRAS CHAVE: Gestão de Resultados, IDESP e SARESP.

Introdução
A Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEE/SP), implementou no ano
de 2008 o Programa de Qualidade da Escola (PQE), conclamando o objetivo de
“promover a melhoria da qualidade e a equidade do sistema de ensino na rede estadual
paulista” (Nota Técnica, SÃO PAULO, 2014a).
Em 06 de novembro de 2008 a SEE/SP publicou no Diário Oficial do Estado a
Resolução SE – 74/2008 (SÃO PAULO, 2008a), que instituiu o PQE e criou o Índice de
Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo (IDESP) com a justificativa da
“necessidade de disponibilizar à unidade escolar diferentes indicadores de natureza
559

quantitativa e qualitativa que forneçam diagnósticos acerca da qualidade do ensino


oferecido e possibilitem a definição de metas exequíveis” (Res. SE 74/08).
Conforme descrito na Res. SE 74/08 o IDESP permitiria avaliar a qualidade das
escolas estaduais, fixar metas específicas para a qualidade e subsidiar ações para a
promoção da melhoria da qualidade e da equidade do sistema de ensino. Os termos da
Resolução demostram que, como afirmou Enguita (2001, p.955), “se existe hoje uma
palavra em moda no mundo da educação, essa palavra é, sem dúvida, ‘qualidade’”. Uma
análise da desta legislação nos leva a concluir que a qualidade referida no texto se
restringe ao desempenho dos alunos no Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar
do Estado de São Paulo (SARESP), uma prova anual aplicada às escolas da rede
estadual desde 1997 e ao fluxo escolar, calculado pelas médias de promoção de alunos
para o ano subsequente em cada unidade escolar.
A Diretoria de Ensino é a instância intermediária entre a SEE/SP e as escolas e
os Supervisores de Ensino os mediadores imediatos da gestão das políticas públicas nas
unidades escolares. Encontram-se desta forma no meio do embate das concepções
gerencialistas da SEE/SP e da realidade social na qual vivem as escolas.
O desafio de promover a gestão dos resultados educacionais das escolas sem
perder de vista suas características idiossincráticas, marcadas pelas relações com a
comunidade, impõe a necessidade de se enxergar além dos discursos da SEE/SP que
tentam naturalizar sua política marcada pela meritocracia e bonificação por resultados.
Este é o desfio que os Supervisores de Ensino no Estado de São Paulo enfrentam no seu
cotidiano.

1 – Divulgação de resultados do IDESP e o acompanhamento pela Supervisão de


Ensino
Em março de 2009 a Secretaria de Estado da Educação tornou público os resultados
do IDESP referentes ao ano letivo de 2008 e também promoveu simultaneamente o
pagamento do bônus mérito gestão, implementado pela Lei Complementar 1078/2008
(SÃO PAULO, 2008b). O recebimento ou não da bonificação é atrelado, entre outros
fatores, aos índices obtidos no IDESP, desta forma a reflexão crítica sobre as referências
quantitativas apresentadas não foi desenvolvida.
560

Apresentamos a seguir o exemplo do resultado IDESP referente ao ano letivo de


2008 da Escola Estadual “Filomena Henares Milano”, uma unidade localizada na
periferia do município de Itaquaquecetuba:

Fonte: Boletim IDESP (SÃO PAULO, 2014b)

O município é um dos mais pobres do Estado de São Paulo, com índice de


incidência de pobreza de 65,20 % conforme dados do IBGE (Fonte: IBGE, Censo
Demográfico 2000 e Pesquisa de Orçamentos Familiares - POF 2002/2003). Os
resultados educacionais das escolas estaduais do município, nas avaliações do
SARESP/IDESP, posicionam o município também entre os piores desempenhos do
Estado, cabendo aqui apontar que estes índices educacionais desconsideram os fatores
socioeconômicos e promovem a “...transferência dos conteúdos que caracterizam a
discussão sobre a qualidade do campo produtivo-empresarial para o campo das políticas
públicas educativas e para análise dos processos pedagógicos...” ( GENTILI, 2001,
p.116)
561

A publicação dos resultados provocou dentre os profissionais da Unidade Escolar


dois aspectos: inicialmente questionamentos pelo não recebimento do bônus e em
seguida apatia por entenderem não ser possível aumentar os índices.
A Supervisão de Ensino, de posse dos resultados, passou a visitar a Unidade
Escolar propondo um estudo envolvendo de início a Direção e a Coordenação
Pedagógica. O estudo e as orientações tinham como foco a compreensão dos dados,
sobretudo, fluxo escolar, qual seja, em quanto tempo os alunos aprenderam, medido
pela taxa média de aprovação nas séries do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. A
Unidade Escolar apresentou uma taxa de reprovação de cerca de: 10% no ciclo I do
Ensino Fundamental, 29% no ciclo II do Ensino Fundamental e de 46% no Ensino
Médio. A propositura em relação a estes dados era de orientação, formação docente e de
acompanhamento contínuo da recuperação da aprendizagem. A Supervisão de Ensino
orientou ainda a Direção e a Coordenação Pedagógica a levar o debate para as reuniões
de Trabalho Pedagógico Coletivo com a equipe docente.
A formação realizada pela Direção e pela Coordenação Pedagógica inicialmente
resultou nos seguintes dados referentes a recuperação paralela1:
70
60
50
40
30
20
10
0
Alunos Encaminhados Alunos Frequentes Alunos com
Rendimento
Satisfatório

Recuperação Paralela 1º Semestre


Recuperação Paralela 2º Semestre

Gráfico I. Alunos atendidos na recuperação paralela. Elaboração nossa com dados da unidade escolar.

Durante o ano letivo de 2009 o foco de atuação didática foi a recuperação da


aprendizagem, os alunos que não compareceram às aulas de recuperação paralela foram
submetidos à recuperação contínua2.
Em seguida a orientação teve como foco o desempenho escolar, medido pelos
resultados alcançados no SARESP pela Unidade Escolar, que no ano letivo de 2008

1
Instituída pela Resolução SEE/SP 40/2008, garantia atendimento de alunos com defasagem fora de
período regular de aulas. Esta resolução foi revogada no ano de 2012.
2
Realizada durante as aulas regulares pelos professores regentes das turmas.
562

apresentou os seguintes resultados nas disciplinas de Língua Portuguesa e em


Matemática:

Fonte: Boletim IDESP (SÃO PAULO, 2014b)

Em relação aos resultados a propositura foi uma reflexão coletiva envolvendo


toda a comunidade escolar com vistas também a recuperação da aprendizagem tornado
público os resultados no sentido de uma reflexão contínua sobre os dados.

2 - Resultados obtidos após debate sobre a Resolução SE 74/08


Ainda usando como relato de experiência a Escola Estadual Filomena Henares
Milano os resultados quantitativos obtidos no ano letivo de 2009 comparados ao ano
letivo de 2008 foram os seguintes:
Ensino Fundamental:
Fluxo 2008 Fluxo 2009 IDESP 2008 IDESP 2009
Ciclo I 10% retidos 4% retidos 1,63 3,59
Ciclo II 29% retidos 9% retidos 1,36 1,88
Ensino Médio:
Fluxo 2008 Fluxo 2009 IDESP 2008 IDESP 2009
3ª série 46% retidos 16% retidos 0,81 2,03
Tabela I. Comparativo IDESP e Fluxo Escolar do período de 2008/2009. Elaboração nossa com
dados do Boletim IDESP.

Em 2010 foram apresentados os resultados do IDESP alcançados pela Unidade


Escolar, os dados foram substancialmente superiores aos obtidos em 2008, o que
representou o cumprimento de todas as metas estabelecidas:
563

A Supervisão de Ensino desenvolveu uma ferramenta3 de análise dos resultados do


IDESP e SARESP que permitiu a comparação histórica dos resultados de cada escola.
Desde então a Unidade Escolar vem realizando estudos e ações pedagógicas
considerando os resultados do IDESP divulgados anualmente pela Secretaria de Estado
da Educação. O gráfico abaixo é um exemplo obtido na ferramenta e mostra resultados
da série histórica de 2008 à 2012 para o 5º ano do Ensino Fundamental da EE Filomena,
com dados de rendimento (ID) e fluxo (IF).

5º ANO EF
ID; 2011; 5,93
Desempenho / Fluxo ID; 2012; 4,87
ID; 2010; 4,71

ID; 2009; 3,76

IF; 2009; IF; 2010;ID IF IF; 2011; IF; 2012;


0,9556 0,9681 0,9462 0,9775
Gráfico II. Evolução dos indices de ID e IF. Autoria nossa.

3
Ferramenta de Análise: planilha eletrônica para inserção dos dados referentes aos anos subsequentes a
2008, que gera gráficos para análise da série histórica de cada escola, com o objetivo de subsidiar a gestão
de resultados pelas unidades escolares.
564

A análise crítica de tais resultados é fundamental para a escola pois há uma clara
tendência de responsabilização pelos resultados que atinge única e exclusivamente os
atores locais, de forma que a SEE/SP, ao divulgar resultados por escola, exime-se de
qualquer responsabilidade, como se as condições dadas em todas as escolas fossem as
ideais e o desempenho de cada unidade dependesse apenas das ações desenvolvidas no
interior das escolas.

3- Considerações finais
O acompanhamento e as orientações da Supervisão de Ensino realizadas no período
objetivaram promover a prática de refletir sobre os resultados da escola por parte dos
envolvidos no processo, englobando gestores (Diretores e Coordenadores Pedagógicos),
professores, pais e alunos. Mas cabe ressaltar que os resultados IDESP abrangem
apenas duas dimensões dentro da realidade das escolas: o rendimento (aferido pelo
SARESP) e o fluxo. Quais as implicações e limitações deste fato?
Em primeiro lugar os resultados do desempenho dos alunos são aferidos no 5º ano
do Ensino Fundamental, no 9º ano do Ensino Fundamental e na 3ª série do Ensino
Médio nas avalições que ocorrem uma vez a cada ano letivo. Desta forma, o resultado
obtido em um determinado ano é utilizado para definir as metas do ano seguinte, mas as
avaliações serão aplicadas à outros alunos, ou seja, não é realizado um
acompanhamento ou uma comparação das mesmas turmas o que gera uma série de
distorções. Cabe salientar também que as avaliações se restringem a um currículo
centralmente definido para todo o Estado, que desconsideram as diferentes realidades
sociais dos alunos.
Segundo, o fluxo escolar, que é calculado para compor o IDESP com base na média
sintética da razão entre o número de alunos aprovados e número de alunos matriculados
para cada série no ano da avaliação, gera distorções que penalizam mais as escolas que
atendem as comunidades mais vulneráveis. Os alunos residentes nas áreas mais
vulneráveis são os mais expostos a fatores que levam a evasão escolar e por conseguinte
as escolas são penalizadas como se fossem as responsáveis por esta evasão. Não há
mecanismo de compensação para estas escolas e a SEE/SP não admite a influência de
tais fenômenos na aprendizagem dos alunos. E não se pode dizer que esta falta de
percepção da realidade é por falta de tempo para conhecer o sistema, já que a SEE/SP
faz parte da continuidade do mesmo partido político no poder ao longo dos últimos 20
anos no Estado de São Paulo.
565

O trabalho da Supervisão de Ensino na Diretoria de Ensino de Itaquaquecetuba no


acompanhamento e na gestão dos resultados educacionais fundamenta-se tanto no
reconhecimento de que os alunos, principalmente os mais pobres, precisam desenvolver
as habilidades e competências do currículo oficial, pois estas são reconhecidas
socialmente e o não domínio das mesmas condena estes alunos a exclusão social,
quanto na visão de que a educação como fenômeno complexo não pode ser apreendida
simplesmente por um índice que, como já citado, apresentam uma série de limitações.

Referências

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Silva, T.T. (org.). Neoliberalismo, qualidade total e educação. 9ª edição, Petrópolis,
RJ, Ed. Vozes, 2001.

GENTILI, P.A.A., O discurso da ‘qualidade’ como nova retórica conservadora no


campo educacional. In Gentili, P.A.A., Silva, T.T. (org.). Neoliberalismo, qualidade
total e educação. 9ª edição, Petrópolis, RJ, Ed. Vozes, 2001.

SÃO PAULO. Secretaria de Estado da Educação. Programa de qualidade da escola.


Nota técnica. São Paulo, mar. 2014/a. Disponível em:
<http://idesp.edunet.sp.gov.br/Arquivos/NotaTecnica2013.pdf>. Acesso em 09/06/2014.

SÃO PAULO. Secretaria de Estado da Educação. Boletins IDESP/2014b. Disponível


em <http://idesp.edunet.sp.gov.br/>. Acesso em 09/06/2014.

SÃO PAULO. Secretaria de Estado da Educação. Resolução SE 74/2008/a. Disponível


em:http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/74_08.HTM?Time=18/07/2014%200
0:37:07. Acesso em 16/06/2014.

SÃO PAULO. LEI COMPLEMENTAR Nº 1.078, DE 17 DE DEZEMBRO DE


2008/b - Institui Bonificação por Resultados - BR, no âmbito da Secretaria da
Educação, e dá providências correlatas. Disponível em
http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei.complementar/2008/lei.complementar
-1078-17.12.2008.html. Acesso em 16/06/2014.
566

Comunicação

Organização e volume de trabalho de docentes dos anos finais do ensino


fundamental no Brasil: evidências a partir do Censo da Educação Básica de 2013

Gabriela Moriconi
Nelson Gimenes
Lisandra Marisa Príncepe
Fundação Carlos Chagas

Resumo: O texto investiga a organização e volume do trabalho dos docentes que


lecionam nos anos finais do ensino fundamental em todo o Brasil por meio da análise
dos microdados do Censo Escolar de 2013. Constatou-se que há uma diversificação na
organização do trabalho e diferenças significativas entre o número de turmas e de
alunos para cada docente. Professores com atuação exclusiva no EFII tendem a ter uma
situação melhor de trabalho no que diz respeito ao número de turmas e total de
matrículas quando comparada com a dos professores que também lecionam em outro
nível de ensino, sobretudo dentre aqueles que estão no EFII e EM. Identificou-se
melhores condições de trabalho entre os professores que lecionam exclusivamente em
uma rede de ensino e em uma unidade escolar. Por outro lado, as situações de trabalho
menos desejadas em termos de número de turmas e de alunos são daqueles que atuam
no EFII e EM e em mais de uma escola.
Palavras-chave: Volume de trabalho do professor; Anos finais do Ensino Fundamental;
Censo Escolar

Introdução

Na literatura sobre o trabalho docente no Brasil, a quantidade de turmas e alunos com os


quais o professor trabalha é recorrentemente apresentada como parte integrante de suas
condições de trabalho. Dado que os números levantados nas pesquisas são
consideravelmente altos, o volume de trabalho docente gerado a partir deles é
apresentado como uma evidência da precarização do trabalho, sendo comumente
estudado em termos dos seus efeitos sobre a saúde dos professores.
567

Embora os estudos encontrados sejam relevantes no sentido de levantar e explorar a


questão da organização e do volume de trabalho docente, as tendências metodológicas
das pesquisas focaram, quase que exclusivamente, em situações muito específicas, com
predomínio de pequenas amostras de sujeitos, em contextos muito particulares.
Diante disso, o presente trabalho visa apresentar a quantidade de turmas e de alunos de
docentes que lecionam nos anos finais do ensino fundamental em todo o Brasil,
analisando as diferenças entre as condições enfrentadas por professores dadas as
diferentes características da organização do seu trabalho. Trata-se de números que
impactam diretamente no volume de trabalho desses docentes, um fator relevante tanto
do ponto de vista da qualidade do trabalho que o professor poderá desenvolver, quanto
na sua satisfação profissional e qualidade de vida.
O texto baseia-se na análise dos dados do Censo da Educação Básica de 2013. A
escolha pela análise da quantidade de alunos e turmas dos professores que lecionam nos
anos finais do ensino fundamental deve-se ao fato de que é justamente nessa etapa de
ensino que os alunos passam a ter aulas com professores especialistas em disciplinas
específicas e, por consequência, os professores passam a ter maiores números de turmas
e de alunos. A análise da quantidade de alunos e turmas dos professores que lecionam
no ensino médio também segue essa lógica e faz parte de etapas posteriores a essa
pesquisa.

Revisão de literatura
A única publicação com dados em nível nacional encontrada sobre as condições de
organização do trabalho docente no Brasil foi o “Estudo Exploratório sobre o professor
brasileiro com base no Censo Escolar da educação básica, 2007”, publicado pelo INEP
em 2009. Nela são encontrados, entre outros, dados sobre a quantidade de turmas nas
quais os professores lecionavam. No entanto, o estudo trouxe apenas uma breve visão
das possibilidades de exploração do tema que a atual estrutura dos dados do Censo
Escolar da Educação Básica oferece.
Na literatura sobre as condições de organização do trabalho docente no Brasil,
predominou a discussão de um trabalho docente precarizado, especialmente, sob a ótica
da intensificação das demandas profissionais promovidas em alguns casos pelas
reformas educacionais ou transformações sociais. O volume de trabalho dos professores
não foi o centro das investigações, mas emergiu nos resultados das pesquisas sobre as
condições de trabalho.
568

No exame dos estudos realizados por pesquisadores da Rede Latinoamericana de


Estudos sobre Trabalho Docente (Rede Estrado), que são representativos de uma ou
mais redes de ensino, a precariedade das condições de trabalho, destacada pelas
jornadas de trabalho duplas ou triplas, carga horária de trabalho e elevado número de
alunos nas turmas, foi registrada em artigos da autoria de Miranda (2006), Dias-da-Silva
e Fernandes (2006), Santos (2006) e Monfredini (2006).
Uma das abordagens mais frequentes nos estudos sobre o tema se encontra na área da
saúde com investigações relacionadas à síndrome de burnout, estresse ocupacional,
ergonomia, além de análises de caráter psicológico e suas relações com as condições de
trabalho dos professores.
Lopes e Pontes (2009), trabalhando com 40 professores do ensino fundamental e médio
da rede particular e rede estadual da cidade de Maceió, Alagoas, verificaram uma
associação positiva entre número de turmas e carga horária em relação à dimensão
emocional. Quanto maior o número de turmas e, consequentemente, maior a carga
horária de trabalho do professor, haveria maior tendência da elevação do desgaste
emocional.
Neves (2008), em uma pesquisa com 601 professores de escolas públicas estaduais e
municipais de ensino fundamental e médio da cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul,
observou que quanto mais variado o trabalho docente em termos do número de turmas,
turnos e escolas, maior o volume de trabalho e mais esforço intelectual. Nesses casos, o
desgaste emocional seria muito maior, o que justificaria a sobrecarga mental e
consequentemente a exaustão e perda do sentido do trabalho.
Rodrigues (2009) analisou os fatores relacionados ao contexto pedagógico que
implicam no trabalho e na saúde de 357 professores do ensino fundamental e médio da
rede estadual de Curitibanos, Santa Catarina, que se afastaram do trabalho por
problemas de saúde. A autora concluiu que a tendência para o adoecimento poderia ser
explicada devido à carga excessiva de trabalho e diversidade de turmas, fatores que
intensificavam o trabalho do professor.
Na mesma linha de Rodrigues, Maia (2010) analisou as condições de trabalho de 29
professores do ensino fundamental I e II, da rede municipal de Sorocaba, a partir dos
motivos revelados em 62 licenças médicas referentes a transtornos mentais e de
comportamento. As conclusões do estudo apontaram para uma concentração de
afastamentos dos professores que atuavam no ensino fundamental II, pois lecionavam
569

para um número maior de turmas, tinham um número maior de alunos e,


consequentemente, possuíam uma carga de trabalho muito maior.
A organização do trabalho docente e seus efeitos sobre o volume de trabalho de
professores que lecionam nos anos finais do ensino fundamental aparecem
especialmente em alguns trabalhos que analisaram reformas educacionais no Brasil. Por
exemplo, a reforma educacional paulista, empreendida entre os anos de 1995 e 2000.
Moreira (2007) explica que, como parte da reforma paulista, uma das alterações ocorreu
na carga horária, pois a redução do número de aulas das disciplinas por série implicou
que os docentes tivessem que trabalhar com um número maior de turmas, como ilustrou
o autor: (...) “As disciplinas de Biologia e Geografia no ensino médio, por exemplo,
passaram a contar com duas aulas semanais. Por isso alguns docentes passaram a
trabalhar com 16 turmas de alunos ao invés de 8 ou 9 como ocorria antes da reforma”
(p. 95). Outra modificação que afetou o trabalho docente se refere ao número mínimo de
alunos por turma, pois houve um acréscimo de 5 alunos em média para cada nível de
ensino.
Mendes (2009) aplicou questionários a 31 professores do ensino fundamental II que
atuavam em duas escolas localizadas no interior de São Paulo e identificou que os
professores que atuavam em disciplinas com menor número de aulas semanais, para
comporem suas cargas-horárias, trabalhavam com 15 turmas ou mais, chegando a
atender um número de 600 alunos durante o ano.
Por meio do trabalho de Faria (2010), pode-se pressupor que haja uma grande
diversidade de situações a que os professores paulistas podem ser submetidos em
termos do volume de trabalho. Ao analisar a organização do trabalho de professores do
ensino médio e fundamental II da rede pública do estado de São Paulo, os resultados
apontaram que o número de turmas por professor variava de uma a quarenta. Um grupo
de 18,9% lecionava para 1 a 5 turmas; 25,3% de 6 a 10 turmas; 23,2% de 11 a 15
turmas; 14,7% de 16 a 20 turmas e 5,3% de 21 a 40 turmas. A relação de alunos por
professor, por sua vez, apresentou média de 404,7 alunos, com o mínimo de 16 e o
máximo de 1210 alunos por professor.

Metodologia de Análise dos Dados


No intuito de contribuir na discussão sobre as condições de trabalho dos professores,
sobretudo, a partir de informações censitárias, este estudo trata dos professores que
lecionam no Ensino Fundamental II nas escolas de todo o território Nacional. A partir
570

dos microdados de professores disponíveis no Censo Escolar 2013 foi construída uma
base de dados considerando os aspectos a seguir.
No que tange a função exercida na escola foram consideradas apenas o registro
denominado “docente”, excluindo os outros possíveis (“Auxiliar de educação infantil”,
“Profissional/ Monitor de atividades complementares” e “Tradutor Intérprete de
Libras”).
O conjunto de docentes da base de dados utilizada contém apenas aqueles que lecionam
em pelo menos uma turma no ensino fundamental II e que atuam exclusivamente no
ensino regular, não exercendo a docência nas modalidades “Educação Especial –
Modalidade substitutiva” e/ou “Educação de Jovens e Adultos”. Por conta desse recorte,
este estudo abrange 80,8% dos docentes do ensino fundamental II, uma vez que os
demais 19,2% atuam também em outras modalidades de ensino.
Ressalta-se também que, embora o foco seja os professores EFII, os totais de turmas e
de alunos não se referem apenas aos dados específicos do ensino fundamental II.
Considera também as informações deste conjunto de docentes relativas aos demais
níveis de ensino, caso lecione na Educação Infantil e/ou Ensino Fundamental I e/ou
ensino Médio. Esta decisão baseia-se no fato de que o estudo tem como eixo temático a
organização e volume de trabalho do professor, e por isso supõe prudente a inclusão
destas informações.
Diante do exposto, a seguir são analisados os resultados das tabulações feitas quanto aos
números médios de turmas e de matrículas por professor e alunos por turma.

Organização do trabalho do Professor do EFII segundo o Censo Escolar 2013


A partir dos dados apresentados na Tabela 1, pode-se observar para o conjunto de
docentes considerado nesta pesquisa, que há múltiplas combinações e arranjos possíveis
em relação à organização do trabalho desses profissionais. Constata-se a possibilidade
pelos docentes de exercerem a docência em mais de uma etapa de ensino, em uma ou
mais escolas, e um ou mais municípios, em escolas de diferentes categorias
administrativas (Federal, Estadual, Municipal e Privada) e até mesmo lecionar
disciplinas muito distintas.
Em relação às etapas de ensino, verifica-se que cerca de 47% do conjunto de
professores pesquisados trabalham exclusivamente nesse nível de ensino, quase 1/3
571

atuam no EFII e EM, 10,9% no EFII e EFI e 10,5% no EFII e outros1. Uma das
possíveis explicações para a existência de um percentual elevado de professores que
trabalham no EFII e EM deriva da própria organização disciplinar dos currículos destes
dois níveis de ensino, uma vez que eles contam com estruturas curriculares semelhantes.
Quanto ao número de escolas em que os docentes trabalham, verifica-se que pouco mais
de 1/3 deles lecionam em duas ou mais escolas. Já em relação ao número de municípios,
nota-se que 8,7% trabalham como docente em mais de uma cidade.
No que se refere à categoria administrativa das instituições que estes professores
exercem a docência, destaca-se que a maior parte deles atua exclusivamente em escolas
de redes estaduais de ensino, correspondendo a 37,2% do total; outros 29,8% em redes
municipais e 16,5% no setor privado. Ressalta-se ainda que 15,7% destes docentes
atuam em mais de uma rede de ensino (Estadual e Municipal ou Estadual e Privada ou
Municipal e Privada).

Tabela 1. Docentes em exercício no EFII, segundo a etapa, categoria


administrativa, números de municípios e de escolas que atuam

N %
Só EFII 275.402 46,8
EFII+EFI apenas 63.942 10,9
ETAPA
EFII+EM apenas 187.669 31,9
EFII+outros 61.627 10,5
N de Um município 537.533 91,3
Municípios Dois ou mais municípios 51.107 8,7
Uma escola 389.916 66,2
N de escolas
Duas ou mais escolas 198.724 33,8
Estadual 219.266 37,2
Municipal 175.495 29,8
Categoria
Em duas redes 92.226 15,7
Administrativa
Privada 97.288 16,5
Outros 4.365 0,7
Tal diversificação na organização do trabalho pelos professores relaciona-se também
com as condições de trabalho exposta aos docentes. A partir dos dados a serem
apresentados a seguir, verifica-se que há diferenças expressivas entre o número de
turmas e de alunos para cada docente a depender do arranjo no qual o professor está
associado.

1
A categoria “outros” refere-se ao grupo de professores que leciona em mais de dois níveis de ensino (por
exemplo: EI, EFI e EFII ou EFII e nas etapas relativas à educação profissional ou no ensino fundamental
multi etapa ou ensino fundamental de 9 anos – correção de fluxo).
572

A tabela 2 apresenta estatísticas básicas dos números médios de turmas, de matrículas e


de alunos por turma dos docentes que lecionam no EFII, segundo o agrupamento etapa
de ensino e categoria administrativa das escolas. Nela é possível observar que
professores com atuação exclusiva no EFII tendem a ter uma situação melhor de
trabalho em termos de número de turmas e número total de matrículas quando
comparada com a dos professores que também lecionam em outro nível de ensino,
sobretudo dentre aqueles que estão no EFII e EM ou EFII e “outros”. Enquanto que as
médias de turmas e de alunos dos professores que trabalham exclusivamente no EFII
são de 6,0 e 167,2, respectivamente, entre os professores com jornadas de trabalho no
EFII e EM a média de turmas é 10,4 e de alunos é 308,8, ou seja, um aumento de mais
de 73% em relação ao número de turmas e de 85% em relação ao número de alunos.
Outra constatação importante diz respeito à análise dos dados segundo os diferentes
agrupamentos de categoria administrativa das escolas as quais os docentes lecionam. A
situação em termos de número de alunos e de turmas para os docentes que trabalham
apenas em redes municipais é melhor em relação aos demais agrupamentos, uma vez
que suas médias são de 164,8 e 6,4, respectivamente.
Tabela 2. Médias de turmas, de matrículas e de alunos por turma dos docentes que lecionam
no EFII, segundo o agrupamento etapa de ensino e categoria administrativa das escolas.
EFII+ EFI EFII+EM EFII+
Só EFII Total
apenas apenas outros
Turmas 5,9 8,5 9,6 10,4 8,0
Estadual Matrículas 177,0 223,8 289,5 277,5 237,5
Alunos por turma 29,4 25,6 30,0 25,8 29,4
Turmas 5,8 8,0 8,9 7,0 6,4
Municipal Matrículas 157,6 198,3 239,7 149,6 164,8
Alunos por turma 26,1 23,9 26,1 20,3 25,1
Turmas 9,7 9,7 12,6 13,3 12,0
Em duas
Matrículas 273,6 254,6 375,3 349,2 339,5
redes
Alunos por turma 27,9 25,8 29,4 25,8 28,0
Turmas 5,2 9,6 9,7 15,2 8,6
Privada Matrículas 134,3 200,7 272,3 330,5 213,9
Alunos por turma 24,2 19,7 26,7 21,0 23,9
Turmas 5,3 14,1 13,6 17,4 12,5
Outros Matrículas 154,5 351,2 407,8 463,5 358,3
Alunos por turma 29,3 24,9 29,9 26,6 28,8
Turmas 6,0 8,7 10,4 11,5 8,3
Total Matrículas 167,2 211,2 308,8 279,0 228,8
Alunos por turma 27,1 23,4 29,3 23,2 27,0
573

Dentre os professores das redes estaduais e das escolas privadas, embora possuam
médias relativamente semelhantes de número de turmas (8,0 e 8,6, respectivamente),
destaca-se que a diferença entre eles se dá notadamente quando observados os números
médios de alunos por turma, tendo os professores das escolas privadas em média, uma
situação comparativamente melhor, já que possuem menores médias de alunos (213,9
no setor privado e 237,5 em redes estaduais) e de alunos por turma (23,9 no setor
privado e 29,4 em redes estaduais).
As maiores médias de total de alunos (alunos por turma e número de turmas por
professor) se apresentam para os docentes que atuam em mais de uma rede.
Comparativamente aos docentes que trabalham apenas em redes municipais, este grupo
tem praticamente o dobro de turmas e de alunos. Quando cruzadas as informações sobre
a categoria administrativa das escolas e a etapa de ensino, nota-se que a situação mais
preocupante é a do professor que atua, ao mesmo tempo, em mais de uma rede e no
EFII e EM. Este grupo de professores em média possui 12,6 turmas, leciona para um
total médio de 375,3 alunos e tem em cada sala de aula uma média de 29,4 alunos.
Outro aspecto relevante para a análise das condições de trabalho docente diz respeito ao
número de escolas em que atuam. A Tabela 3 apresenta estatísticas dos números médios
de turmas, de matrículas e de alunos por turma, segundo o agrupamento de categoria
administrativa das escolas e número de unidades que os docentes lecionam. A
comparação entre os grupos de professores que trabalham em apenas uma escola e dos
que lecionam em mais de uma unidade permite observar que o segundo grupo possui
médias de turmas (11,4) e de matrículas (315,5) bem superiores ao dos professores que
atuam em apenas uma escola (6,7 e 184,6, respectivamente).
Em relação ao agrupamento de categoria administrativa, verifica-se melhor situação no
grupo de professores de escolas de redes municipais e que leciona em apenas uma
escola, com médias de 5,6 turmas por professor e 147,5 matrículas. O grupo de
professores de escolas do setor privado e que leciona em apenas uma escola, embora
tenha se registrado médias de turmas por professor muito semelhantes à encontrada
dentre o grupo de docentes de redes estaduais (7,1 e 7,3, respectivamente), a média de
alunos por turma (23,3 no setor privado e 29,6 em redes estaduais) e a média de
matrículas (172,9 no setor privado e 219,7 em redes estaduais) são bem inferiores.
Dos professores que lecionam em mais de uma escola, verifica-se melhor situação
daqueles que atuam apenas em redes municipais. Por outro lado, dentre os professores
que atuam em mais de uma escola na rede privada as médias de turmas (13,4) e de
574

alunos matriculados (346,2) são mais elevadas quando comparadas às demais categorias
de análise, até mesmo, daqueles docentes que lecionam em mais de uma rede de ensino.
Nota-se que em todos os agrupamentos de categoria administrativa analisados, os
professores que lecionam em mais de uma escola tendem a ter maiores médias de
número de turmas e de matrículas, quando comparados com os que atuam em apenas
uma escola.
Tabela 3. Médias de turmas, de matrículas e de alunos por turma dos
docentes que lecionam no EFII, segundo o agrupamento decategoria
administrativa das escolas e número de unidades que leciona.
Duas ou mais
Uma escola Total
escolas
Turmas 7,3 10,6 8,0
Estadual Matrículas 219,7 306,2 237,5
Alunos por turma 29,6 28,8 29,4
Turmas 5,6 9,2 6,4
Municipal Matrículas 147,5 233,7 164,8
Alunos por turma 25,1 25,0 25,1
Turmas 12,0 12,0
Em duas
Matrículas 339,5 339,5
redes
Alunos por turma 28,0 28,0
Turmas 7,1 13,4 8,6
Privada Matrículas 172,9 346,2 213,9
Alunos por turma 23,3 25,7 23,9
Turmas 5,6 15,4 12,5
Outros Matrículas 162,5 440,7 358,3
Alunos por turma 29,2 28,7 28,8
Turmas 6,7 11,4 8,3
Total Matrículas 184,6 315,5 228,8
Alunos por turma 26,8 27,4 27,0

Sabe-se que há diferenciações importantes em relação ao número de turmas e de alunos


por professor a depender das disciplinas ministradas. Tal diferença pode ser explicada
em grande parte devido ao fato da diversidade de carga horária entre as disciplinas,
sobretudo na comparação entre Língua Portuguesa e Matemática e, por exemplo,
Geografia, História, Ciências, Artes, Língua Estrangeira. Estas duas primeiras
concentram grande parte das horas aula da grade curricular das escolas.
575

Por conta disso, a seguir apresentamos algumas estatísticas dos números médios de
turmas e de matrículas dos docentes que lecionam no EFII, segundo os agrupamentos de
disciplinas lecionadas e etapa de ensino [Tabela 4]2.
De modo geral pode-se distinguir três grandes grupos de disciplinas de acordo com as
distribuições médias de turmas e de alunos por professor. O primeiro diz respeito ao
grupo de professores que lecionam Língua Portuguesa e Matemática, o segundo aos
docentes de Ciências, Biologia, Química e Física e História e Geografia e o terceiro
grupo dos profissionais de Línguas Estrangeiras e Artes ou Educação Física.
Como já indicado anteriormente, verifica-se que os professores que lecionam Língua
Portuguesa ou Matemática tendem a ter menores números de turmas e de matrículas,
quando comparados aos professores das demais disciplinas. Enquanto que para os
professores de Português e Matemática os números médios de turmas são de 6,4 e 6,1,
respectivamente, para os que lecionam Artes, Educação Física ou Línguas Estrangeiras
tais médias são superiores ou iguais a 9,2.
Tabela 4. Números médios de turmas e de matrículas dos docentes que lecionam no EFII, segundo os
agrupamentos de disciplinas lecionadas e etapa de ensino.

Biologia, Línguas
Artes e
Língua Ciência, História e Estrangeiras
Matemática Educação
Portuguesa Química e Geografia e Língua
Física
Física Indígena
Turmas 4,9 4,7 5,6 6,3 6,7 6,6
Só EFII
Matrículas 134,5 129,2 154,1 174,0 184,6 180,9
EFII+EFI Turmas 5,8 5,3 5,4 5,6 9,2 8,2
apenas Matrículas 140,5 127,8 129,5 133,4 212,1 200,5
EFII+EM Turmas 8,8 8,5 10,2 11,3 11,7 12,0
apenas Matrículas 258,1 249,1 298,5 333,3 343,5 354,2
EFII+ Turmas 7,8 7,0 7,5 7,7 12,5 12,1
outros Matrículas 187,3 168,7 178,0 184,7 295,8 290,0
Turmas 6,4 6,1 7,2 7,8 9,6 9,2
Total
Matrículas 173,3 164,8 194,4 214,4 258,5 244,8

Em relação ao número médio de alunos por professor, verificam-se também diferenças


expressivas quando comparados os diferentes grupos de professores mencionados. Para

2
Para o processamento das estatísticas de cada um dos grupos de disciplinas, foram consideradas além
das informações dos professores que lecionam apenas a(s) disciplina(s) do agrupamento, os dados
referentes ao número de turmas e de matrículas das demais disciplinas ministradas, caso isso ocorra. Ou
seja, as informações do professor que leciona Matemática e Física, por exemplo, foi computada tanto no
grupo de professores de Matemática como no grupo que compreende as disciplinas de Biologia, Física,
Ciências e Química.
576

os professores do primeiro grupo (Língua Portuguesa ou Matemática) as médias de


alunos são de 173,3 e 164,8, respectivamente. Por outro lado nos demais conjuntos,
estas médias são superiores, sobretudo dentre aqueles professores que ministram
disciplinas de Língua Estrangeira (258,5) ou Artes e Educação Física (244,8). Os
professores de Geografia e História e os de Ciências da natureza (Ciências, Química,
Física e Biologia) podem ser considerados o grupo intermediário em relação ao número
de turmas e de matrículas já que suas médias de turmas variam de 7,2 a 7,8 e o de
alunos de 194,4 a 214,4.
Destaca-se também que em todos os agrupamentos de disciplinas analisados, os
professores que lecionam no EFII e EM tendem, em média, a ter números de alunos e de
turmas mais elevados, quando comparados aos demais agrupamentos de etapa.
Diante das informações sobre a organização e do volume do trabalho dos professores
analisadas neste estudo, pode-se considerar que a carreira docente possibilita diferentes
arranjos, vislumbrando uma diversidade na organização do trabalho em termos de carga
horária, local de trabalho, nível de ensino, disciplinas ministradas, número de
empregadores etc.
Diferentes arranjos “provocam” situações de trabalho muito diferentes em termos de
número de turmas e de alunos por professor. Identificam-se tendências de melhores
condições de trabalho entre os professores que lecionam exclusivamente em uma rede
de ensino e em uma unidade escolar. Por outro lado, é possível que as situações de
trabalho menos desejadas em termos de número de turmas e de alunos são daqueles que
atuam sobretudo no EFII e EM e em mais de uma escola.
Tais informações apontam para a necessidade de aprofundarmos nossos conhecimentos
em relação à carreira de docente. Sugere-se a análise mais detalhada dos dados
produzidos em relação à docência, especialmente dos disponibilizados anualmente pelo
INEP por meio do Censo Escolar, para a avaliação e aprimoramento das políticas
relativas às condições de trabalho docente.

Referências

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trabalho dos professores e o trabalho coletivo: mais uma armadilha das reformas
neoliberais? In: Seminário da Rede Latino-Americana de Estudos sobre o Trabalho
Docente – Rede Estrado, 6, 2006. Rio de Janeiro: UERJ, nov. 2006.
577

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contrato e conflitos trabalho-família.2010. 173 f. Tese (Doutorado em Engenharia de
Produção) - Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2010.

INEP. Estudo exploratório sobre o professor brasileiro com base nos dados do
Censo Escolar da Educação Básica 2007. Brasília: INEP, 2009.

LOPES, Andressa P.; PONTES, Élder A.S. Síndrome de Burnout: um estudo


comparativo entre professores das redes pública estadual e particular. Revista
Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional
(ABRAPEE), v. 13, n. 2, jul./dez. de 2009, p. 275-281.

MAIA, Paola A. As condições do trabalho docente e suas interferências na saúde


mental do professor: um estudo sobre as licenças médicas.2010. 160 f. Dissertação
(Mestrado em Educação) - Universidade de Sorocaba, Sorocaba, 2010

MENDES, Célia M.L. Magistério: vocação ou sofrimento? Percepções de


professores acerca do cotidiano escolar num contexto de precarização e
intensificação do trabalho docente. 2009. 76 f. Mestrado (Educação) - Centro
Universitário Moura Lacerda, Ribeirão Preto, 2009.

MONFREDINI, Ivanise. Profissão docente na instituição escolar: a historicidade


das práticas e culturas profissionais. In: Seminário da Rede Latino-Americana de
Estudos sobre o Trabalho Docente – Rede Estrado, 6, 2006. Rio de Janeiro: UERJ, nov.
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MOREIRA, Elias E. A reforma educacional Paulista entre 1995-2000 e o trabalho


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MIRANDA, Kênia. As transformações contemporâneas no trabalho docente:


repercussões em sua natureza e seu processo de trabalho. In: VI Seminário da Rede
Estrado: Regulação Educacional e Trabalho docente – Rede Estrado, 6, 2006. Rio de
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NEVES, Siduana F. Trabalho docente e qualidade de vida na rede pública de ensino


de Pelotas. 2008. 105 f. Dissertação (Mestrado em Política Social) - Universidade
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RODRIGUES, Janete A. O mal-estar docente: trabalho, saúde e educação. 2009. 153


f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Oeste de Santa Catarina,
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SANTOS, Terezinha F. A. M. A gestão do trabalho docente do ensino básico público


em Belém frente a autonomia das escolas: algumas considerações. In:Seminário da
Rede Latino-Americana de Estudos sobre o Trabalho Docente – Rede Estrado, 6, 2006.
Rio de Janeiro: UERJ, nov. 2006.
578

Comunicação

Diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em fisioterapia: uma


compreensão da estética da humanização e dignidade humana nos processos
formativos

Gilmar Talarico e Silva


Universidade Cidade de São Paulo
Margaréte May Berkenbrock Rosito
Universidade Cidade de São Paulo - Unicid

Resumo: Trata-se de uma pesquisa concluída. Apresenta como objeto de estudo a


dimensão estética das Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em
Fisioterapia. Tem como objetivo compreender e interpretar um caminho para a
humanização nos cursos de formação em Fisioterapia visando a dignidade humana. A
metodologia baseia-se na Analise documental, o objeto Parecer nº 1.210/2001 da
Resolução CNE/CES nº 4/2002, que regulamentam as Diretrizes Curriculares do curso
em questão, sob o enfoque hermenêutico na perspectiva de Gadamer (2007). O estudo
reflete a condição da prática docente, sobretudo, na contemporaneidade, quando os
sujeitos se transformam em objeto de consumo, para tratar da humanização do
fisioterapeuta, no atendimento aos clientes, vislumbrando a possibilidade de criação de
um caminho de autonomia e emancipação nos processos formativos, como caminho da
estética da dignidade humana.
Palavras-chave: Diretrizes Curriculares Nacionais; Graduação em Fisioterapia;
Humanização; Dignidade Humana.

INTRODUÇÃO

A reflexão será concretizada a partir da análise das Diretrizes Curriculares


Nacionais do Curso de Graduação em Fisioterapia, que fundamentam a estrutura e o
funcionamento dos processos formativos em suas propostas de ações e intervenções.
O estudo reflete o documento que emerge da Constituição de 1988, a nova Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), sancionada em 20 de dezembro de
579

1996, como Lei nº 9.394/96, assegurada pelo Parecer nº 776/97, do MEC/CNE,


referente à orientação para as Diretrizes Curriculares dos Cursos de Graduação, nas
diferentes áreas do conhecimento em todo o território nacional.
No período compreendido entre 1964 e 1983, o curso de Fisioterapia possuía um
Currículo Mínimo do Curso Técnico de Fisioterapia, conforme apontam Rebelatto e
Botomé (1999, p. 80). A proposta inicial foi apresentada pela Portaria Ministerial n°
511/64, sendo substituída pela Resolução n° 4, de 28 de fevereiro de 1983,
estabelecendo um novo Currículo Mínimo para os fisioterapeutas que vigorou até 2001,
quando foram criadas e aprovadas as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de
Graduação em Fisioterapia. Nestas diretrizes, propõe-se a formação de um
fisioterapeuta com formação “generalista, humanista, crítica e reflexiva, com
capacitação para atuar em todos os níveis de atenção à saúde embasada no rigor
científico e intelectual”.
Em relação à finalidade da formação do profissional consiste em lhe desenvolver
a consciência de sujeito, pressupondo saúde de forma ampliada, capaz de busca de
conhecimento relevante e desenvolvimento de habilidade na perspectiva da necessidade
do outro, que deverá o maior estímulo para conduta ética enquanto ser que serve a
alguém. (BRASIL, 2002).

REFERENCIAL TEÓRICO

Para composição do quadro teórico sobre os conceitos de Biossegurança,


Bioética, Educação Estética adotam-se, os seguintes autores: Adorno (2002) e Freire
(2009; 2010; 2011), extraindo o processo de conscientização e autonomia, em Adorno
(1985; 1995), a estética da massificação da indústria cultural e emancipação dos
sujeitos, em Adorno. Dussel (2000), Amorim Neto (2007) sobre a conceituação de ética
e moral. Em Rebelatto e Botomé (1999), a evolução da Fisioterapia no Brasil e no
Mundo. Sarlet (2002), Nunes (2002), Jonas (2006) e Nascimento (2009) sobre a
humanização e dignidade humana na área da saúde.
Para a compreensão dos processos formativos por meio das DCN’s, é necessária
a consciência de que a formação do profissional em saúde, em instituição do ensino
superior (IES), deve respostas aos problemas que a humanidade vive, hoje, no sentido
de elaboração de procedimentos adequados, aos problemas que ameaçam à sua
dignidade. Portanto, a Biossegurança diz respeito à melhoria da espécie humana, como
580

um caminho para a realização da justiça entre os homens. É precisamente na área da


Bioética, que o profissional em saúde encontra as vias da consolidação, de sua
universalidade, uma vez que é pauta em todos os países do mundo, garantir a
reprodução, manutenção e desenvolvimentos da dignidade humana, que, segundo
Dussel (2000), são princípios que fundamentam o conceito de vida, sentido da ética na
perspectiva do autor.
Estas são reflexões possíveis que podem oferecer respostas às questões
referentes à Bioéticas e à Biossegurança, no entrelaçamento entre as DCN’s do Curso de
Graduação em Fisioterapia e da Educação Estética, para a partir deste ponto refletir se a
prática docente vem sendo construída próxima ao que Freire chama de “educação
bancária”. Trata-se de um procedimento pedagógico que impede o aluno de olhar-se
como o protagonista do processo formativo de refletir sobre o sentido do conceito de
Biossegurança, se trata de uma normatização de um pacote de medidas imposto aos
alunos sem que eles tenham a oportunidade de refletir.
As contribuições de Adorno e Freire para a compreensão da Educação Estética,
na prática docente, consistem na articulação de emancipação e autonomia, para que se
atinja o objetivo de formar alunos professores autônomos, conta-se com a revisão das
práticas pedagógicas tradicionais. Tais procedimentos suscitam a formação profissional
na área da saúde contrapondo-se à desumanização ocorrida no cenário das Instituições
de Ensino Superior (IES).
Assim sendo, a Educação Estética ocorre por meio da participação em um
procedimento importante de desenvolvimento, que auxilia os alunos e alunas-sujeito a
se tornarem conscientes de sua autonomia e emancipação na conjuntura da
contemporaneidade, proporcionando um olhar reflexivo, uma possibilidade de romper
com a educação bancária.

OBJETIVOS

Estabelece-se como objetivo: analisar, compreender e interpretar a importância


da Educação Estética, na prática do docente e nos processos formativos do profissional
em saúde, visando o desenvolvimento da autonomia e da emancipação dos sujeitos no
Curso de Graduação em Fisioterapia.
581

METODOLOGIA

A análise documental é o procedimento adotado para coleta de dados, que foram


analisados, compreendidos e interpretados sob o enfoque hermenêutico, na perspectiva
de Gadamer.
De acordo com Gadamer (2007), compreender requer na hermenêutica
considerar o percurso histórico a fim de promover uma reflexão inserida na
contemporaneidade.
O enfoque hermenêutico aplica-se à compreensão de textos escritos ou de
qualquer comunicação (oral, visual, gestual) reduzida a um texto ou documento. O
objetivo é compreender criticamente o sentido de seu conteúdo dito ou não, as
significações explícitas ou ocultas.
Desta forma, pode-se contar com a hermenêutica a fim de interpretar, traduzir,
explicitar e compreender, o que demanda:
a consciência de que nossa compreensão depende da linguagem que se
realiza no diálogo que somente no encontro com outras pessoas que pensam
de outra forma podemos superar nossos próprios horizontes interpretativos.
(HERMANN, 2002, p.60).

Sendo assim, o pesquisador produz sentidos a respeito do estudo do tema, e ao


produzir e ampliar sentidos produz um conhecimento e um saber ler o dito e o não-dito,
relacionar parte e todo, a compreensão se dá na totalidade da dissertação, oferece um
saber ser pesquisador.

DESENVOLVIMENTO

Quando exposto e confrontado o currículo mínimo de 1983 com as Diretrizes


Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Fisioterapia, percebe-se uma
mudança no perfil do egresso. Antes esse profissional era um mero reprodutor e
executor de técnicas supervisionadas e desenvolvidas por médicos, com uma visão de
formação e atuação tecnicista. Isto, de acordo com Lemos (2005), faz com que a
dimensão do trabalho intelectual perca espaço, devido à ênfase em práticas aliadas à alta
carga horária semanal, privilegiando-se o automatismo e o tecnicismo do curso de
graduação. Percebe-se que, se não há tempo para o estudo, também não há para a
dúvida. Consequentemente são desvalorizadas a crítica, a reflexão e a mudança, vistas
como um caminho que levam a autonomia desses sujeitos.
582

A transição do Currículo Mínimo para as DCN’s do Curso Superior de


Graduação em Fisioterapia representa um caminho para o desenvolvimento da
autonomia e da emancipação do docente e do profissional fisioterapeuta. Desperta a
criticidade nestes sujeitos, que, com uma estética da visão holística, enxergam seu papel
na sociedade e a possibilidade de transformá-la.
De acordo com o Parecer nº 1.210/2001, em relação ao objeto das DCN’s do
Curso de Graduação em Fisioterapia, este deve:

Permitir que os currículos propostos possam construir perfil acadêmico e


profissional com competências, habilidades e conteúdos, dentro de
perspectivas e abordagens contemporâneas de formação pertinentes e
compatíveis com referências nacionais e internacionais, capazes de atuar com
qualidade, eficiência e resolutividade, no Sistema Único de Saúde (SUS),
considerando o processo da Reforma Sanitária Brasileira (BRASIL, 2001, p.
3).

Nesta perspectiva, é possível compreender que o objeto define que a formação do


egresso se faça com base em competências e habilidades em prol das demandas sociais
e que ele seja capaz de exercer sua função de forma qualitativa com eficiência. Existe
uma preocupação com a sociedade: ética, poder, ideologia, moral, metodologia,
conteúdo, da competência do profissional e docente.
Considerando a estética uma ação ética, capaz de agir com justiça e proteger o
outro das injustiças, cometidas tanto por indivíduos como por instituições, somente na
perspectiva da necessidade do outro é que o fisioterapeuta será competente para garantir
a vida com dignidade de indivíduos e coletividades.
No que se refere aos objetivos das Diretrizes Curriculares dos Cursos de
Graduação na Área da Saúde, o Parecer nº 1.210/2001, do CNE, considera:

Levar os alunos dos cursos de graduação em saúde a aprender a aprender


que engloba aprender a ser, aprender a fazer, aprender a viver juntos e
aprender a conhecer, garantindo a capacitação de profissionais com
autonomia e discernimento para assegurar a integralidade da atenção e a
qualidade e humanização do atendimento prestado aos indivíduos, famílias e
comunidade (MEC/CNE, Parecer nº 1210/2001, p. 3).

Desta forma, consideramos a dimensão estética o desenvolvimento da criticidade


que, de acordo com Freire, é um caminho para a autonomia, que por sua vez gera
qualidade, integralidade e humanização, refletida no individual e no coletivo, para que o
profissional dentro da sua área resolva os problemas da sociedade.
583

Com relação à autonomia, o Edital n° 4/97, estabelece:

As Diretrizes Curriculares devem conferir uma maior autonomia às IES na


definição dos currículos de seus cursos. Desta forma, ao invés do atual
sistema de currículos mínimos, onde são detalhadas as disciplinas que devem
compor cada curso, deve-se propor linhas gerais capazes de definir quais as
competências e habilidades que se deseja desenvolver nos mesmos. Espera-
se, assim, a organização de um modelo capaz de adaptar-se às dinâmicas
condições de perfil profissional exigido pela sociedade, onde a graduação
passa a ter um papel de formação inicial no processo contínuo de educação
permanente que é inerente ao mundo do trabalho. (BRASIL, 1997, p.1).

Sendo assim, podemos compreender a dimensão estética nas DCN’s quando


prioriza a promoção da autonomia com o aprofundamento em cada área do
conhecimento, do saber ou profissão com objetivo de formar profissionais críticos e
adaptados à realidade da sociedade brasileira. Deste modo, é possível considerar que as
Diretrizes Curriculares preocupam-se com a educação continuada, visto que consideram
a formação acadêmica como uma formação inicial num processo contínuo de formação
profissional autônoma.
Assim, a humanização envolve o desenvolvimento de competências, como a
atenção integral à saúde, tomada de decisões, comunicação, liderança, administração e
gerenciamento e educação permanente. (Brasil, 2007, p.58).
No Art. 5º da Resolução em análise, está contemplado que a formação do
fisioterapeuta tem por objetivo dotar o profissional dos conhecimentos requeridos para o
desenvolvimento das competências e habilidades específicas e, ainda, a formação
profissional deverá atender ao sistema de saúde vigente no país.
Fica claro, a partir do analisado até aqui, que o ensino superior vem sofrendo
alterações significativas, conforme considera Kuenzer (2001):

da formação especializada, passa-se à formação do generalista; dos currículos


mínimos, passa-se às diretrizes curriculares amplas – que serão adequadas a
cada curso, segundo as peculiaridades locais e dos alunos - ; de trajetórias
unificadas, passa-se à diversificação dos percursos. (KUENZER, 2001, p. 19)

A formação mais especializada, prevista no Currículo Mínimo, preparava o


profissional para ser um executor de métodos e técnicas de avaliação e tratamento
fisioterápicos em diferentes áreas de atuação; previa um profissional “preparado”.
Já o profissional generalista é aquele com capacidade crítica, reflexiva, capaz de
desempenhar suas atividades com base no rigor científico, elaborando o diagnóstico
cinético-funcional, com capacidade de adaptação às diversas alterações que podem
584

ocorrer em função do próprio cliente, da conduta realizada, do método ou técnica


escolhida ou, ainda, da evolução biotecnológica. Assim, observa-se que o profissional
generalista proposto pelas DCN’s é a de um profissional "adaptável" às demandas do
mercado de trabalho.
A compreensão do significado de estética das Diretrizes Curriculares do Curso
de Graduação em Fisioterapia propõe a formação generalista, humanista, crítica,
reflexiva, pautada em princípios éticos, com o princípio responsabilidade social e
compromisso com a cidadania, e a promoção da saúde integral do ser humano. Embora
de modo implícito, a dimensão estética é abordada nas Diretrizes Curriculares Nacionais
do Curso de Fisioterapia. Em relação à finalidade da formação do profissional consiste
em lhe desenvolver a consciência de sujeito, pressupondo saúde de forma ampliada,
capaz de busca de conhecimento relevante e desenvolvimento de habilidade na
perspectiva da necessidade do outro, que deverá o maior estímulo para conduta ética
enquanto ser que serve a alguém.
Nesta perspectiva, é interessante destacar que a humanização da saúde é um
movimento internacional que surgiu na tentativa de sensibilizar o profissional da área da
saúde em relação ao distanciamento provocado pelo advento da indústria da
massificação cultural, bem como do avanço tecnológico que faz com que a relação entre
terapeuta e cliente torne a pessoa objeto da investigação clínica, ou que acaba
coisificando as pessoas e reduzindo "de modo artificial o irreal humano, que supõe
mentes abertas às inovações, por mais ‘hetéricas’ que pareçam." (BERKENBROCK-
ROSITO; LOTERIO, 2012, p. 140).
Deve-se pensar criticamente em relação às tecnologias e conhecimentos
científicos, refletir sobre sua validade e melhor modo de aplicação à vida humana,
respeitando a vontade e atendendo a necessidade de cada indivíduo. A crítica e a
reflexão devem levar a mudanças de pensamento e comportamento para transformar a
sociedade. A formação crítica e reflexiva deve exigir uma postura ativa, portanto
política.
O processo de (des)coisificar essas relações, tornando-as mais humanizadas, é
um trabalho complexo, que necessita a compreensão de olhar a técnica como
instrumento que deve acolher o cliente, e não excluí-lo. Estas transformações despertam
inseguranças, pois, para alcançar tal objetivo, é necessário um trabalho de abertura e de
respeito ao outro como um ser singular.
585

De acordo com Leite e Strong (2006, p. 213), a humanização dos serviços de


saúde, com a ótica da visão holística,

evidencia que a noção de qualidade em saúde necessita transcender o senso


de conformidade técnica dos agentes sobre o objeto de sua prática, para
considerar que um ato técnico se realiza num campo simbólico de trocas, em
uma relação intersubjetiva que se inicia com o acolhimento ao outro, com a
construção do vinculo e repercute intensamente em todos que dela participam
pelo princípio da alteridade que ocorre em todo contato humano. [...] Os
conhecimentos advindos da visão biomédica são muito importantes para a
atuação do profissional, porém de igual importância tem-se o estudo do ser
humano com todas as suas facetas, em seu meio de relação. Assim, qualquer
inclinação, para um lado ou outro, do que se considera um todo, incorre no
risco de um tratamento fragmentado, desumanizado e, portanto, alienado e
alienante. (LEITE; STRONG, 2006, p. 213).

Estes profissionais necessitam dar mais atenção aos valores éticos, de dignidade
considerando o processo de humanização como possibilidade de desenvolver um novo
olhar, uma nova forma de atuar.
Nesta perspectiva, é essencial incorporar a ótica da dimensão da Educação
Estética na formação de futuros profissionais da área da saúde com objetivo de trilhar
novos caminhos na educação e na saúde. Estes profissionais necessitam dar mais
atenção aos valores éticos, de dignidade considerando o processo de humanização como
possibilidade de desenvolver um novo olhar, uma nova forma de atuar.
Questões como esta estão presentes, segundo Adorno, na estética da
massificação da indústria cultural, que pode levar a uma desnutrição filosófica pela
perda da criticidade, da desumanização dos sujeitos, de valores subjetivos que se
perderam com o avanço científico. Não é o caso de abandoná-las, mas de agregar
valores humanos no trato das instituições de educação e saúde ligadas a princípios
éticos, com respeito e valorização dos seres humanos.
Mas compreendemos que pelo histórico da profissão de fisioterapia, a
naturalidade deste processo, enquanto proposta da mudança do perfil do profissional e
fisioterapeuta, desenrola-se lentamente, pois as novas vivências acadêmico-profissionais
que buscam uma consciência moral mais sensível e critica ainda estão em processo de
construção.
A dignidade humana articula os valores estéticos, éticos, bioéticos e de
biossegurança e confere o sentido da formação do profissional e docente na área da
saúde. A dignidade humana nasce com o conceito de pessoa humana, sempre ligada ao
homem e sua posição no mundo — logo, é uma qualidade de ser humano. Com efeito, a
586

dignidade humana é o fundamento da própria civilização, pois estabelece uma relação


de igualdade entre os seres humanos, possibilitando a convivência em comunidade,
voltada para o respeito das diferenças.
Sarlet (2002) afirma:

a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor


do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade,
implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais
que assegurem a pessoa tanto contra tudo e qualquer ato de cunho degradante
e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas
para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa
e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão
com os demais seres humanos. (SARLET, 2002, p.62).

Sarlet (2009) lembrando que nenhum ser humano vive isoladamente e sempre
está inserido num contexto social e histórico, apresenta o conceito de dignidade no
contexto da antiguidade clássica:

No pensamento filosófico e político da antiguidade clássica, verifica-se que a


dignidade (dignitas) da pessoa humana dizia, em regra, com a posição social
ocupada pelo individuo e o seu grau de reconhecimento pelos demais
membros da comunidade, daí poder falar-se em uma quantificação e
modulação da dignidade, no sentido de se admitir a existência de pessoas
mais dignas ou menos dignas. Por outro lado, já no pensamento estóico, a
dignidade era tida como a qualidade que, por ser inerente ao ser humano, o
distinguia das demais criaturas, no sentido de que todos os seres humanos são
dotados da mesma dignidade, noção esta que se encontra, por sua vez,
intimamente ligada à noção da liberdade pessoa de cada individuo (o Homem
como ser livre e responsável por seus atos e seu destino), bem como a ideia
de que todos os seres humanos, no que diz com a natureza, são iguais em
dignidade. (SARLET, 2009, p.32).

Nunes (2002) salienta que,

E aí, nesse contexto, sua dignidade ganha – ou, como veremos, tem o direito
de ganhar – um acréscimo de dignidade. Ele nasce com integridade física e
psíquica, mas chega um momento se seu desenvolvimento que seu
pensamento tem de ser respeitado, suas ações e seu comportamento – isto é,
sua liberdade -, sua imagem, sua intimidade, sua consciência –religiosa,
cientifica, espiritual – etc., tudo compõe sua dignidade. (NUNES, 2002, p.
49).

Deste modo, a responsabilidade na perspectiva dos estudos da bioética responde


à conceituação de dignidade humana, o eixo norteador das questões éticas e da bioética,
ao propor uma reflexão sobre a vida. Remete à prática do profissional como a
responsabilidade da manutenção da dignidade humana.
587

É por meio de abertura de espaços de reflexões que se traduz a ética de


responsabilidade das ações públicas de solidariedade e respeito dentro dos espaços
públicos, espaços na saúde, espaços nos cursos de formação docente e profissional,
como condição de maior responsabilidade sobre as intervenções profissionais, a serviço
da vida, refletindo sobre as formas de aplicar a bioética.
Também é mister assinalar a ética de responsabilidade da prática docente perante
os problemas do cotidiano, no campo da saúde, para que se tenha uma compreensão das
ações bioéticas sustentadas pelos princípios de solidariedade, responsabilidade, respeito
pela dignidade da vida humana. Com isso, comprova-se que o profissional necessita da
compreensão da dimensão humana, não apenas do conhecimento técnico, do campo da
saúde, mas de um conhecimento de ética e bioética que se concretiza na boniteza da
manutenção da dignidade do ser humano.
De tal modo, é possível compreender que a maior dificuldade para a prática do
profissional da área da saúde não parece ser a competência técnica e conhecimento das
normas e leis, embora, seja essa uma séria exigência que requer estudo e preparo
consistente. Nascimento (2009) aponta que o desafio maior é aprender no cotidiano as
necessidades de dignidade humana de crianças e jovens.
A capacidade do profissional na área da saúde em desenrijecer atitudes
cristalizadas e vislumbrar a possibilidade de proporcionar a dignidade em espaços de
acolhimento, confiança, solidariedade como elementos de um espaço de relacionamento
humano entre as pessoas, cabendo também aqui uma visão das situações apresentadas.
Contudo, Nascimento (2009) alerta que a pressa, a pressão por resultados concretos e
palpáveis, põe a perder a essência da relação humana — e ainda aponta que:

a atividade de Sócrates era conversar, e conversar sobre conhecimento do


homem sobre si mesmo e sobre virtudes, tais como sabedoria e justiça.
Quando motivava uma conversa não motivava doutrinas preestabelecidas,
apenas perguntava. Era assim, que o diálogo se tornava iniciador de
progressos de descobertas. No diálogo o conhecimento não é atingido por um
único individuo, mas por diferentes consciências que, chegam a acordos entre
si, chegam a novos conhecimentos, é isso é construção. O diálogo se mostra
como princípio filosófico ajuda para compreender a filosofia não como algo
abstrato, mas como algo que faz parte da vida apontando a dimensão concreta
ao lidar com questões essenciais da existência humana. (NASCIMENTO,
2009, p.81).
588

CONCLUSÕES

Percebemos que o processo de humanização da saúde surge na tentativa de


sensibilizar o profissional da saúde em relação ao distanciamento provocado pelo
avanço tecnológico sobre a relação fisioterapeuta/cliente, em que o último acabava por
ser um objeto de investigação clínica. Esse processo de humanização é um trabalho
complexo, pois estão envolvidas transformações que geram inseguranças
principalmente num ser e fazer no trabalho e no atendimento à saúde que se inspira
numa disposição de abertura e de respeito ao outro como um ser singular.
Com vistas à possibilidade de se transformar e, consequentemente, desenvolver
em seus alunos e futuros profissionais fisioterapeutas a consciência crítica por meio da
estética e da arte, no desenvolver da experiência estética alcançar a Educação Estética,
como um caminho para o desenvolvimento da autonomia e emancipação desses
profissionais da área da saúde.
Podemos afirmar que o caminho para a autonomia e emancipação dos docentes,
alunos e profissionais do Curso de Fisioterapia passa por uma estética da dignidade
humana, trilhando pelo caminho do campo sujeito sensível e racional, no tratamento de
um cliente, na relação fisioterapeuta-cliente, como uma possibilidade de se reinventar e
de se perceber diante de sua patologia e buscar novos caminhos com fins libertadores.

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saúde: uma recusa ao esvaziamento da essência do cuidado humano. Porto Alegre:
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589

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KUENZER, A. Z. O que muda no cotidiano da sala de aula universitária com as


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590

Comunicação

Gestão educacional e formação continuada: a disciplina projeto vivencial e a


gestão democrática

Glaucilene Sebastiana Nogueira Lima


PPGE/UNIR. HISTEDBR/UFOPA
Maria Lília Imbiriba Sousa Colares
PPGE/UNIR. HISTEDBR/UFOPA. LAPPLANE/UNICAMP

Resumo: O presente artigo visa analisar a formação dos gestores e a relação do PI nesse
processo, com ênfase na disciplina PV e a gestão democrática. Para tanto foram
analisados os artigos resultados dos PI desenvolvidos pelos cursistas no curso de
Especialização em Gestão Escolar da UFOPA. Buscando preservar a identidade dos
autores dos artigos pesquisados e das escolas, utilizam-se as iniciais dos temas
recorrentes e números indicativos da sequencia de ocorrência e quando o título do artigo
engloba mais de um desses termos eles são especificados como por exemplo FE e PPP.
Nos artigos a gestão democrática é vista como fruto das lutas sociais, com
fundamentação nas leis, que exige participação e transparência, tendo o PPP como
mecanismo para execução da gestão nessa perspectiva. O curso viabilizou mudança de
concepção e engajamento para atividades de cunho democrático, tendo a ciência de que
o PPP por si só não é sinônimo de Gestão democrática, que muitos desafios perpassam
essa ação.
Palavras- chave: Formação de gestor. Projeto de Intervenção. Projeto Político
Pedagógico

Introdução

A formação continuada dos profissionais da educação é hoje compreendida


como central nas políticas educacionais que se destinam a enfrentar e ajudar a resolver
os problemas relativos à correção dos índices de desempenho escolar dos estudantes nos
sistemas educacionais públicos.
591

Colares; Ximenes-Rocha; Colares destacam que, “[...] a qualidade da educação


está relacionada à democratização do ensino público [...]. Mas este entendimento passa
pela formação dos sujeitos que atuam em diferentes espaços escolares e,
fundamentalmente, dos gestores públicos.” (2012, p. 14).

O desenvolvimento de conhecimento e formação de profissionais entendidos


em gestão educacional, capazes de implementar e operar as transformações
necessárias dos sistemas de ensino e escolas, é prioritário, por ser condição
fundamental para o imprescindível salto qualitativo da educação brasileira
(LUCK, 2011, p. 24).

No que se refere aos gestores escolares, a formação continuada vem sendo


oferecida sob a forma de cursos de especialização, dentre eles o Curso de Escola
Nacional de Gestores da Educação Básica/UFOPA, que integra as ações do Plano de
Desenvolvimento da Educação (PDE). Eles surgiram da necessidade de se construírem
processos de gestão escolar compatíveis com a proposta e a concepção da qualidade
social da educação, tendo como base os princípios da moderna administração pública e
de modelos avançados de gerenciamento de instituições públicas de ensino. Busca-se,
assim, qualificar os gestores das escolas da educação básica pública, mediante a oferta
de cursos de formação a distância (BRASIL, 2009).
O curso iniciou com o 410 cursistas, desses 61 abandonaram o curso e 12 se
evadiram. Apurou-se um percentual de aprovação e conclusão de 82%, uma média
considerável, tendo em vista as dificuldades com a internet e a questão da logística e
acessibilidade aos pólos.
O curso contemplou a elaboração e a apresentação de trabalho de conclusão de
curso iniciado na disciplina denominada Projeto Vivencial (PV) culminou com
produção de artigo e apresentação na disciplina TCC. Além dos estudos por meio das
Salas Ambientes, foram realizados encontros presenciais, cujo objetivo foi integrar
cursistas/docentes bem como orientar as atividades propostas nas várias disciplinas e no
PI (Projeto de Intervenção) que foi realizado em estreita relação com o Projeto Político-
Pedagógico das escolas onde os cursistas desenvolviam a função de diretor ou vice-
diretor. Essa intervenção envolveu a investigação de problemáticas existentes na escola,
proposição e execução de ações que pudessem respondê-las e tentassem saná-las,
visando estabelecer uma estreita relação entre a teoria e a prática cotidiana da gestão.
Para realização desta pesquisa analisaram –se a formação dos gestores e a
relação do PI nesse processo, por meio da disciplina PV e do PI como um projeto de
fortalecimento dos objetivos do curso de Gestão Escolar e da prática profissional dos
592

gestores de fortalecimento da gestão democrática. Buscando preservar a identidade dos


autores dos artigos pesquisados e das escolas, nas análises do conteúdo dos
artigos, na referência a eles utilizam-se as iniciais dos temas recorrentes e números
indicativos da sequencia de ocorrência do tema para especificar a que artigo se refere,
apresentando-se a seguinte nomenclatura: Projeto Político Pedagógico: PPP, PPP1,
PPP2, PPP3...; Família Escola: FE1, FE2, FE 3...; Gestão democrática: GD1, GD2,
GD3...; Conselho Escolar: CE1, CE2, CE3..., e quando o título do artigo engloba mais
de um desses termos eles são especificados como por exemplo FE e PPP, CE e GD.

A disciplina projeto vivencial: Projetos de Intervenção

A disciplina PV/TCC foi desenvolvida no decorrer do curso de forma que os


cursistas tiveram possibilidade de relacionar os conteúdos trabalhados nas demais
disciplinas com a proposta dela que é elaborar um Projeto de Intervenção: pressupostos
da pesquisa-ação; Aplicação do projeto na escola; Construção de um trabalho acerca dos
procedimentos adotados, ação desenvolvida e resultados em forma de artigo. Essa
proposta prevê um caminho com possibilidades de mudanças no ambiente escolar e na
relação teoria e prática que

Segundo a filosofia da práxis, só entendemos a teoria como “teoria de uma


prática” e vice-versa, a prática sempre é “prática de uma teoria”. A teoria é
entendida como compreensão da prática. È elaborada a partir da prática, e,
uma vez analisada e compreendida, deve voltar sobre esta em forma de
estratégias de ação. Desta maneira, cumpre-se um circuito em que o
conhecimento parte da prática e volta sobre ela mesma, estabelecendo, dessa
forma, um critério de verdade que exige uma tensão dialética entre esses dois
pólos contrários. Uma teoria é válida a medida que transforma a prática , e a
prática também é verdadeira à medida que transforma a teoria. Dessa relação
dialética surge o principio da validade do conhecimento como fonte de
transformação da realidade: “conhecer para transformar” (GAMBOA, 2007,
p. 119)

O Projeto de Intervenção é componente curricular do curso e se fundamenta nos


pressupostos metodológicos da pesquisa-ação sendo consenso nos estudos de Barbier
(2004), Thiolentt (2011), Toledo (2013), que ela visa promover maior articulação entre
a teoria e a prática na produção de novos saberes. Com base nos estudos dos autores
acima citados, podem se especificar os seguintes pressupostos da pesquisa-ação:
Identificação do problema dentro do contexto; Levantamento de dados; Análise de
dados; Significação dos dados levantados; Identificação de necessidade de mudança;
descoberta de possíveis soluções; Intervenção; transformação.
593

[...] a pesquisa ação, pressupõe que o conhecimento seja essencialmente um


produto social, que se expande ou muda continuamente, da mesma maneira
que se transforma a realidade concreta e como ato humano não está separado
da prática; o objetivo último da pesquisa é a transformação da realidade
social e o melhoramento da vida dos sujeitos imersos nessa realidade
(GAMBOA, 2007, p. 29).

Essa modalidade de pesquisa tem como base a ideia de uma relação dialética
entre pesquisa e ação, supondo ainda que a pesquisa deve ter como função a
transformação da realidade e como enfatiza Toledo (2013) “Na pesquisa-ação as
intervenções e a produção do conhecimento se inter-relacionam”.
A pesquisa-ação é bastante enfatizada no campo educacional, devido a
relevância de seu caráter pedagógico: os sujeitos, ao pesquisarem sua própria
prática, produzem novos conhecimentos e, ao fazê-lo, apropriam-se e
ressignificam sua prática, produzindo novos compromissos, de cunho crítico,
com a realidade em que atuam. “a pesquisa-ação exerce também uma função
política, oferecendo subsídios para [...] a transformação de representações e
mobilizar os sujeitos para ações praticas”. (TOLEDO, 2013, p. 158)

A pesquisa-ação é associada a diversas formas de ação coletiva em busca de


resolução de problemas, ou para gerar transformação. Não se trata de um simples
levantamento de dados, ela exige a participação de todos (pesquisadores e interessados),
analisa os problemas dinamicamente, toma decisões e executa ações.
Após a leitura dos temas, e com base nos pressupostos e definições dos autores
que trabalham a temática da pesquisa-ação como (Barbier 2004) e (Thiollent 2011),
trabalhou-se com os que podem ser considerados projetos de intervenção de acordo com
as discussões e bases teóricas que justificam essa modalidade e em função de ser esse o
objetivo do projeto de pesquisa proposto pelo curso de Gestão Escolar.
No que se refere às temáticas, elas surgiram de estudos realizados nos diferentes
níveis de ensino evidenciando em seus títulos a expressão gestão, acompanhada ou não
por qualitativos como: democrática, participativa e compartilhada. Isso se dá
possivelmente em virtude de todas as discussões realizadas nas salas ambientes
envolverem direta ou indiretamente, o conceito de gestão democrática.
Dos artigos produzidos ao término do curso, como resultado dos Projetos de
intervenção, 37% contêm em seus títulos a expressão PPP o que se justifica pelo foco
temático do curso e pelas orientações de valorizar a reflexão sobre esse documento da
instituição escolar, sua elaboração ou reformulação.
Dos 337 artigos apresentados no término do curso de gestão, os termos que mais
se destacam são: PPP, Gestão democrática, Família escola, conselho escolar e PPP e
594

Gestão democrática juntos em um mesmo título. Sendo que dos 337, 209 utilizam um
dos termos acima citados o soma 62% do total.
A terminologia PPP se evidencia, pois surge separada ou acompanhada do
termo gestão democrática. O termo PPP é citado nos títulos de 77 artigos o que significa
23%do total e 37% dos temas recorrentes. Já o termo gestão democrática aparece em 44
dos produzidos no término do curso, totalizando 215 dos temas recorrentes.
O termo PPP juntamente com a gestão democrática também se evidenciam em
32 trabalhos, totalizando 15% dos temas recorrentes. Nos temas recorrentes prevalecem
quatro termos: PPP, Família escola, conselho escolar e Gestão democrática.
Dos 111 artigos considerados PI, 31 trazem o termo PPP o que totaliza
46% dos PI. É um percentual considerável que pode ser justificado pelo foco dado no
curso na formulação ou reformulação desse documento na escola. Os termos que se
relacionam com o temas recorrentes são 35 que citam o termo PPP 38 termo Gestão
democrática relacionado aos termos dos temas recorrentes, sendo que o termo conselho
escolar não se apresenta nos títulos dos artigos juntamente com o termo PPP, já com
relação à categoria Gestão democrática é evidenciado em 11 artigos o que mostra que os
cursistas percebem estreita relação entre o conselho escolar e a efetivação da gestão
democrática.

Gestão democrática: Caracterização da gestão democrática descrita nos artigos


Os textos produzidos pelos alunos concluintes do curso de gestão escolar da
UFOPA abordam a gestão democrática a partir da década de 80, a fundamentação legal,
os conceitos de gestão, o papel do gestor, diferenças entre gestão e direção baseados nos
estudos de Veiga (2004), Libâneo( 2001), 2007), Hora( 2010) Paro(2002 ), Luck( 2002,
2008 e 2011 ).
A gestão democrática é fruto das lutas sociais dos profissionais da educação e tem
fundamentação nas leis. Essa questão é demonstrada nos textos produzidos pelos
concluintes do curso de gestão escolar.

No Brasil, com a lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei


n.º 9394/ 96, cujo inciso VIII do Artigo 3. º, no titulo II, trata a questão da
“gestão democrática do ensino publico“, enfatiza o principio de participação
e fortalece o espaço para gestão colegiada e avaliação do desempenho. Os
artigos 14 e 15 incentivam a descentralização administrativa, a autonomia da
escola, e a participação da equipe escolar e da comunidade na tomada de
decisões, como forma de revitalizar a eficiência das escolas públicas e torná-
las mais eficazes. (artigo PPP 6)
595

Pensando-se a escola como espaço de integração de sujeitos e construção de


sujeitos históricos, logo se depara com a necessidade de envolvê-los no processo de
gestão da própria escola. Aqui surge a priorização da gestão escolar na perspectiva de
participação e democracia: a gestão democrática. Essa forma de gestão possibilita o
exercício de procedimentos de transparência na administração escolar. A gestão
democrática traz três princípios importantes: a participação, a descentralização e a
transparência. Esses princípios, já relacionados como essenciais pela Constituição
Federal de 1988, vêm sendo incorporados na prática diária das escolas com as
deliberações da LDB nº 9.394/1996 e com o Plano Nacional de Educação. Reforçando a
importância da democracia na condução e na promoção da educação.
A gestão escolar deve pautar-se no exercício democrático. Assim,

Como um dos principais eixos das políticas públicas da década de 90, a


gestão escolar democrática tem como base a eleição direta para diretores, a
formação dos conselhos escolares e a construção do Projeto Político
Pedagógico.( artigo GD )

No trecho acima verifica-se a citação do PPP como um dos mecanismos para


execução da gestão democrática, fruto do contexto sócio-econômico-cultural
evidenciado e que vem sendo aplicado na escola com o discurso ideológico de
necessidade para atender as premissas exigidas pelos movimentos sociais, porém é
permeado dos objetivos do mercado porque, como mecanismo de controle, o Estado
estabelece normas e regulamentos para atingir os resultados, pois há situações que
geram sentimentos contraditórios na figura do diretor, o qual, ao mesmo tempo,
representa a comunidade pela qual foi eleito e tem que satisfazer ao poder central.
O Projeto Político-Pedagógico fundamentado na necessidade da comunidade
escolar é passo importante para essa gestão compartilhada, democrática e
autônoma. ( artigo GD)

Há presente uma visão critica considerando que

O que se observa frequentemente , nos espaços escolares, é que parece haver


um temor das pessoas em “dividir o poder ...( artigo GD 2)

Para a integral efetivação do Projeto Político Pedagógico, exige-se uma gestão


democrática dentro da escola, tendo esta, a capacidade de traçar a própria identidade,
com a possibilidade de resgatar a escola como espaço público, lugar de diálogos e
discussões, embasados na reflexão coletiva. O PPP deve ser construído por meio de um
processo participativo, desde o momento do diagnóstico, passando pelo estabelecimento
de diretrizes, objetivos e metas, execução e avaliação.
596

No que se refere ao conselho escolar e sua relação com gestão democrática,


trabalham o conselho escolar, PPP e gestão democrática. Tratam os mecanismos de
democratização da escola pública exercidos pelo Conselho Escolar afirmando que a
articulação das três instâncias amplia a possibilidade de avançar o processo de
democratização da escola pública, pois explicitam que “o Conselho Escolar junto à
Gestão define caminhos para a gestão democrática, autônoma e transparente”. (artigo
CE e GD)
Nesse sentido, a democratização da gestão escolar implica a superação de
processos centralizados de decisão e o aprimoramento da vivência da gestão
colegiada, de modo que as decisões nasçam das discussões coletivas,
envolvendo todos os segmentos num processo pedagógico vivo e dinâmico.
As atitudes, os conhecimentos o desenvolvimento de habilidades na formação
do gestor são elementos cruciais para o funcionamento do Conselho Escolar e
da Gestão Democrática. (artigo CE e GD)

Há a presença de visões que consideramos como concepções restritas sem ampliação


de análises dos diversos aspectos que envolvem a educação quando verificamos falas do tipo
“um dos mecanismos de maior legitimidade da gestão democrática das escolas é o
Projeto Político Pedagógico. (artigo PPP e GD )
Só o conselho escolar e/ou o PPP implementado como exigência legal não são,
entretanto, garantia de efetivação da gestão democrática no sentido pleno, pois a gestão
democrática da escola significa, portanto, a conjunção entre instrumentos formais,
eleição de direção, conselho escolar, descentralização financeira e práticas efetivas de
participação. Para a efetivação da democracia é importante a criação de mecanismos
que incentivam a participação da comunidade nos processos decisórios da instituição
que garantam a representatividade, a continuidade e a legitimidade da participação
popular, pois
a participação é condição para gestão democrática, uma não sendo possível
sem a existência da outra, e aceitando que a gestão democrática deve implicar
necessariamente a participação da família nos processos decisórios da escola(
artigo FE 5)

Lima( 2010, p. 34-35) nos alerta que


Temos, portanto duas posições distintas, uma que indica a necessidade de
participação de todos e articuladamente em torno do projeto da escola, mas
que esbarra no individualismo de cada sujeito e outra posição que aponta a
operacionalidade desta união: a manutenção da escola[...] A participação tem
esbarrado em vários entraves, dentre eles o processo centralizador das
tomadas de decisões, seja na perspectiva do diretor centralizador seja na
perspectiva do diretor condutos da participação.

Para que a participação realmente se efetive no contexto da escola e o sentimento


de autoria de contribuição ao processo realmente ocorra é necessário que a tomada de
597

decisão seja efetivamente coletiva, fazendo-se ouvir os pais presentes, fazendo que
exerçam sua influência e contribuam para a dinâmica do processo educacional como
bem descreve. Dessa forma a gestão democrática se caracteriza como ação de forma
descentralizada, participativa e transparente, visando sempre à integração de todos

A gestão democrática como princípio da educação nacional, presença


obrigatória em instituições escolares, é a forma não violenta que faz com que
a comunidade educacional se capacite para levar a termo um projeto
pedagógico de qualidade e possa também gerar “cidadãos ativos” que
participem da sociedade como profissionais compromissados e não se
ausentem de ações organizadas que questionam a invisibilidade do poder
(OLIVEIRA, 2011, 17)

Por gestão democrática entende-se o processo pelo qual se exercita a


democracia coletiva, vivenciando as atividades do que se vem praticando na escola e
interagindo com a comunidade, onde os sujeitos são peças fundamentais para
executarem as atividades e participarem das decisões de forma integrada na unidade de
ensino, para alcançar a qualidade e equidade no processo de ensino da educação
pública, com intuito de formar cidadãos críticos e atuantes para uma sociedade
igualitária. A gestão democrática visa desenvolver um trabalho integrado em que todos
os segmentos que compõem o processo educativo possam participar da definição e da
efetivação prática dos rumos da escola no contexto social. O que nos possibilita
perceber que

é importante olharmos a gestão democrática através de ações pensadas e


decididas no coletivo, dando ênfase à flexibilidade em uma ação
descentralizada, transparente e solidária, buscando a participação da
comunidade é um dos fatores determinantes neste processo de gerenciamento
educacional democrático. (artigo GD 10)

Nesse contexto, a relação entre família e escola deve ser fundamentada no


diálogo e na troca de experiências e conhecimentos, pois a participação democrática não
é fácil de ser praticada. Muitas contradições surgem nesse processo devido á grande
variedade de pensamentos e de formação, o que configura em âmbito geral, situações na
educação na presença de “escola burocratizada, hierarquizada, em que os trabalhos são
feitos isoladamente”. (artigo FE e GD 6).
Por vezes, a gestão democrática tem o seu exercício cerceado pelas práticas
centralizadas de gestão, resultantes das estruturas hierarquizadas ainda presentes na
sociedade. Dessa forma, “avançar na direção de um projeto participativo implica
considerar que esse será um processo em permanente construção, dinâmico, marcado
pela diversidade e pelos distintos modos de compreender a escola” (artigo GD 2). Não
598

é fácil, conviver com pessoas que pensam e agem de modos diferentes, respeitar suas
opiniões e crenças.
Para tanto, como o curso discute a questão da gestão escolar, o papel do gestor
ganha destaque para os aspectos discutidos no âmbito da efetivação da gestão
democrática, pois o gestor precisa saber trabalhar os conflitos e desencontros; deve ter
competência para buscar alternativas que atendam os interesses da comunidade
escolar, compreendendo que a qualidade da escola depende da participação ativa de
todos os membros, respeitando a individualidade de cada um e buscando, nos
conhecimentos individuais, fontes de enriquecer o trabalho coletivo, tendo
conhecimento de que “na perspectiva neoliberal, a autonomia da escola não contempla
uma efetiva distribuição do poder , mas implica delegação de tarefas e atribuições”
(Rosário & Araújo, 2011, p.60), pois

a prática da administração escolar dilacera-se em duas direções opostas e


contraditórias: por um lado a necessidade de mobilização da subjetividade
dos diferentes atores sociais... que traduz na proposição e na prática de
projeto político pedagógico que envolvam a comunidade escolar como um
todo... Por outro lado, tais estratégias se situam no marco da racionalidade
instrumental que permeia a sociedade capitalista... escola.. encontra-se
submetida aos critérios de eficácia e efetividade nos termos desta lógica e
não de uma lógica humanista( OLIVEIRA, 2011, p.37)

Há artigos que chegam de certa forma a colocá-lo como total responsável pela
qualidade e pela efetivação do processo quando enfatizam que
estabelecer um processo democrático dentro da escola não é só compromisso
de todos que fazem parte da comunidade escolar, mas principalmente do
diretor e especialmente se traduz em um desafio já que precisa estabelecer o
consenso entre os ordenamentos do estado e das demandas e necessidades da
escola requerida pelos seus segmentos representados.( artigo GD)

Dessa forma, fica evidente que, apesar de se considerarem os limites e os


entraves para real efetivação do processo democrático na escola e a responsabilidade do
gestor nesse contexto, apresentam visão otimista do processo. A atuação do gestor é
essencialmente contraditória e difícil.

Considerações finais
A gestão democrática exige novas formas de organização e efetivação das
ações, estabelecendo laços de comprometimento de todos os envolvidos no dia a dia
escolar, primando por uma convivência harmoniosa. A escola proporciona o bem
comum e incentiva a construção de um processo ativo, em que se respeitem normas de
condutas, limites individuais e coletivos. Nesse contexto uma gestão democrática
599

promove a cultura da liberdade, deixando prevalecer o bom senso. Estabelece normas


para a descentralização e distribuição de poder. Orienta estratégias para garantir uma
educação mais qualitativa, com ênfase na aprendizagem. Tal garantia está condicionada
a objetivos como a manutenção da escola pelo poder público, ao planejamento e à
execução plena do projeto político pedagógico, à autonomia administrativa, financeira,
jurídica e pedagógica da escola. O projeto político pedagógico, elaborado de forma
participativa, tem mais chance de ser assumido por todos, pois é resultado de debates
políticos e aglutinação de opiniões diversas.
Por mais que a mudança não tenha se efetivado como propõe o curso,
considera-se que seria certa ilusão, no entanto viabilizou a possibilidade de mudança de
concepção e até mesmo engajamento para atividades futuras de cunho democrático,
tendo a ciência de que o PPP por si só não é sinônimo de Gestão democrática, que
muitos desafios perpassam essa ação, mas é preciso visualizá-lo como uma política
pública que é implementada para atender as exigências do mercado. A partir da
realidade da implantação dessas políticas há, porém, possibilidade de tomar posse do
discurso ideológico do sistema e vislumbrar probabilidade de mudanças para atender da
maneira proposta por Dourado (2011, p. 10) “que as políticas educacionais são
expressão dos embates travados no âmbito do Estado e nos desdobramentos assumidos
por ele – no atual contexto das mudanças tecnológicas e no reordenamento das relações
sociais”
No que se refere a concepção de gestão democráticas nos artigos resultados dos
PI, é vista como fruto das lutas sociais dos profissionais da educação e tem
fundamentação nas leis, necessária ao contexto escolar que exige participação e
transparência nas ações . Sendo que um dos mecanismos para execução da gestão nessa
perspectiva é o PPP, fruto do contexto sócio-econômico-cultural evidenciado e que vem
sendo aplicado na escola com o discurso ideológico de necessidade para atender as
premissas exigidas pelos movimentos sociais.
Ressalta-se, ainda limites na implementação da gestão democrática na
realidade escolar pela dificuldade que as pessoas que exercem a função de liderança
possuem em “dividir o poder”, bem como a necessidade de criação de mecanismos que
incentivem a participação da comunidade nos processos de decisão e efetivação das
ações da instituição, que garantam a representatividade, a continuidade e a legitimidade
da participação de maneira efetiva, pois a participação é condição para gestão democrática.
600

REFERÊNCIAS

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VEIGA, I. P. A. (Org.). Projeto político-pedagógico da escola: uma construção
possível. Campinas, SP: Papirus, 2004.
602

Comunicação

Representações sociais associadas ao componente curricular educação física e ao


professor de educação física: uma proposta de intervenção

Guilherme Rocha Savarezzi 1


UNICID
Roberto Gimenez 2
UNICID

Resumo: O presente trabalho tem por objetivo discutir as representações sociais que
permeiam o componente curricular Educação Física e, em consequência, os
professores de Educação Física. Além disso, são levantadas implicações dessas
representações para o processo de aprendizagem dos alunos e apresentadas
alternativas de intervenção por parte dos professores de Educação Física no contexto
escolar. Finalmente, é apresentada e discutida uma proposta de intervenção
direcionada ao referido componente curricular.
Palavras-Chave: Educação Física, docente, representações sociais

INTRODUÇÃO
Diferente dos outros seres vivos cuja herança genética parece dar conta
daquilo que é necessário em suas vidas e que, ao nascerem, já demonstram certa
autonomia ao lidar com o ambiente em que vivem, o ser humano nasce totalmente
indefeso e totalmente dependente de seus progenitores. Neste sentido, pode-se dizer
que o homem nasce incompleto, ou seja, o aprender é uma condição fundamental
para ele, visto que vive em um ambiente cultural. É aprendendo que a espécie
humana consegue se adaptar às demandas que este mundo cultural em constante
mudança oferece. Neste caso, pode-se dizer que, diferente das outras espécies do
planeta, não é o instinto que guia o homem e sim a busca pelo conhecimento. Busca
esta que, desde cedo, provoca-lhe inquietude em explorar o ambiente que o cerca e

1
UNICID/Licenciando em Educação Física - Bolsista PIBIC CNPq /Grupo de Estudos sobre o
Comportamento Motor e Intervenção Motora (GECOM)
2
Docente do Programa de Mestrado em Educação/Coordenador do Curso de Educação Física da UNICID
e líder do Grupo de Estudos sobre o Comportamento Motor e Intervenção Motora (UNICID)
603

ânsia pelo desenvolvimento de seu ser (FREIRE & SCAGLIA, 2010). Um processo
que só termina no fim da vida.
Sobre tal processo Vygotsky explica o seguinte:
Desde os primeiros dias do desenvolvimento da criança, suas atividades
adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e,
sendo dirigidas a objetivos definidos, são refratadas através do prisma do
ambiente da criança. O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto
passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto
de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações
entre história individual e história social. (Vygotsky, 1984, p.33)

Verifica-se então, que o processo de desenvolvimento do ser humano ocorre


por meio da interação deste com o ambiente que o cerca. Nesta interação o homem
vai, aos poucos, se apropriando dos conteúdos historicamente determinados e
culturalmente organizados. Tais conceitos são reelaborados dentro de sua mente e
são internalizados, passando assim, a construí-lo enquanto sujeito (PALMIERI &
BRANCO, 2004; MARTINS, 1999).
No entanto, o meio não é o único fator a influenciar o desenvolvimento
humano. Assim como afirma Vygotsky (1984), o “outro” (ou “outra pessoa”) é parte
essencial nesse processo, uma vez que, apesar de o sujeito ser ativo na construção de
seu próprio ser, ele necessita da mediação de alguém rumo à internalização do
objeto de exploração e, desta forma, conseguir exercer o domínio como ser humano
sobre o ambiente em que vive. Neste prisma, nota-se a importância do contexto
social em que o indivíduo está inserido na composição de si mesmo. Em tal
contexto, único em seu tempo e espaço, o ser em formação, sempre nesta relação de
interdependência indivíduo-sociedade, constitui-se em sua totalidade (PALMIERI &
BRANCO, 2004).
Neste processo de construção surgem, também, as representações sociais
com as quais o indivíduo esquematiza o mundo à sua volta procurando compreendê-
lo e aproximá-lo de sua realidade (MAZZOTTI, 2008). Numa visão complexa do
assunto, tais representações, também, acabam por modificar a forma como uma
pessoa ou evento representado socialmente pelo sujeito vai interagir com este,
alterando assim, a forma como a representação vai influenciar no desenvolvimento
do próprio sujeito.
Levando em conta que o professor, diante deste contexto sociocultural, é um
dos principais mediadores na relação entre seu aluno e os conhecimentos
culturalmente organizados e construídos ao longo do tempo, parece adequado pensar
604

na forma como o docente tem sido representado socialmente pelo discente, o que
permitiria uma ação em relação à transformação destas representações, visto que
elas têm influencia no comportamento dos alunos (MAZZOTTI, 2008) e, por
consequência no processo de ensino/aprendizagem.
Considerando mais especificamente o âmbito da Educação Física, apesar de não
enfocarem propriamente a formação de representações, há alguns estudos que revelam
dados interessantes acerca delas no espaço escolar. Por exemplo, Betti (2003) por meio
de um estudo com alunos de quinta à oitava série do Ensino Fundamental constatou que
o componente curricular Educação Física era a disciplina que elas mais gostavam, uma
vez que lhes proporcionava prazer e satisfação. Entretanto, este componente não estava
entre os mais importantes para elas, lugar ocupado pelas disciplinas Língua Portuguesa
e Matemática. Corroborando estes dados, uma investigação de Darido (2004) com
alunos de diferentes séries do Ensino Fundamental e Médio, também constatou a
Educação Física como disciplina favorita, mas novamente considerada menos
importante para eles. Além disso, percebeu-se que, no decorrer dos anos de escola
formal, os alunos vão perdendo o interesse por essas aulas chegando ao Ensino Médio
com alto número de dispensa do referido componente curricular. Tal fato, também é
constatado por Chicati (2000) quando destaca que no Ensino Médio a falta de
diversificação nos conteúdos diminuiria gradualmente o interesse dos discentes pelas
aulas.
No que diz respeito ao professor, percebe-se que nos primeiros anos do Ensino
Fundamental, os alunos parecem ter uma boa visão do docente de Educação Física, algo
que, assim como na representação da disciplina vai perdendo-se com o tempo. Talvez,
seja possível inferir que devido ao conteúdo mais voltado ao esporte e sem muita
diversificação, os discentes atribuiriam ao professor de Educação Física a figura de
“técnico”. Com base nesta representação, ele corresponderia a um exímio praticante de
todos os esportes que ensina. Esta situação agrava-se no Ensino Médio, onde os
conteúdos da Educação Física acabam por repetir o que já foi visto no Ensino
Fundamental (DARIDO, 2004). Por fim, os alunos acabam por atribuir maior valor ao
que é ensinado por professores de outras áreas, acreditando que estas são mais
importantes na preparação para a vida profissional ou ao vestibular, temas de muito
interesse aos alunos nesta fase.
Diante do exposto acima, torna-se importante pensar sobre quais as mudanças na
prática docente seriam necessárias para a superação da realidade apresentada. Neste
605

caso, faz-se necessário uma revisão sobre o que são as representações sociais, como elas
se formam e como podem ser transformadas em benefício do processo
ensino/aprendizagem.

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Para intervir na prática docente usando como base o paradigma da
representação social, é primeiramente interessante conhecer algumas
particularidades deste conceito, por exemplo, como se deu o surgimento de tal
teoria, o que são as representações sociais e como se estudam estas representações.
Pode-se dizer que a teoria das representações sociais foi introduzida pelo
psicólogo social Serge Moscovici em sua obra “La psycanallise son image et son
public”, publicada no início da década de 1960, no qual ele aborda as representações
sociais que se formaram a respeito da psicanálise (VILLAS BÔAS, 2004).
Segundo Mazzotti (2008), Moscovici recusou-se a apresentar uma formatação
estrita da teoria explicando que não poderia determinar a forma como tal ideia iria
evoluir. Desta forma, coube a outros pesquisadores expandir o campo de investigação e
aprofundar o estudo. Dentre estes, destacam-se Denise Jodelet e Jean-Claude Abric, que
acabaram por sistematizar o conceito de representação social.
Para definir o conceito de representações sociais, é possível recorrer-se a
diferentes autores. Moscovici (1978, p. 51), que embora tenha se recusado a formular
uma teoria estrita, afirma em seu trabalho que estas representações não seriam “opiniões
de” ou “imagens de”, mas teorias coletivamente construídas sobre o real e que
“determinam o campo das comunicações possíveis, dos valores ou das ideias
compartilhadas pelo grupo e regem, subsequentemente as condutas desejáveis ou
admitidas”. Desta forma, é interessante destacar que, ao formar a representação, o
sujeito não aceitaria passivamente o que se mostra como real, mas, ao internalizar o
objeto representado, o reconstruiria tendo por base seus próprios conhecimentos e seu
universo social (MAZZOTTI, 2008).
Denise Jodelet (1994, p. 36), define as representações sociais como “uma forma
de conhecimento, socialmente elaborado e compartilhado, que tem um objetivo prático
e concorre para a construção de uma realidade comum a um conjunto social”. Para
Mazzotti (2008, p. 21) as representações sociais são “teorias do senso comum,
construções esquemáticas que visam dar conta da complexidade do objeto, facilitar a
comunicação e orientar condutas”. Por último, Abric (1994, p. 188) define tais
606

representações como “produto e processo de uma atividade mental pela qual um


indivíduo ou um grupo reconstitui o real ao qual ele é confrontado e lhe atribui uma
significação específica”.
Em suma, quando um sujeito é confrontado com um objeto, ele precisa criar uma
imagem ou construir um esquema para internalizá-lo, para tornar familiar a aquilo que
não é. Porém, ao fazer isso, o objeto será contraposto com o conhecimento do próprio
sujeito, com todas as outras imagens de mundo que este já tem. Neste processo, há
também, a influência das representações compartilhadas pelo grupo social com quem o
indivíduo, no exercício da representação, tem convivência. Desta forma, cria-se um
novo entendimento do objeto ou uma reconstituição do que primeiramente se
apresentou como real. Por fim, esta representação formada, vai orientar as condutas do
sujeito e a forma como vai se comunicar, tornando-se uma maneira de reconstruir a
própria realidade.
Há dois processos básicos pelo qual ocorrem as representações sociais, cujos
mecanismos persistem simultaneamente: a objetivação e a ancoragem (PAÉZ, 1989 e
VALA, 2000 apud VILLAS BÔAS, 2004). A objetivação corresponderia à
transformação de uma abstração ou de uma ideia, em imagens que materializem o
objeto para o sujeito (GRACIA, 1988). Segundo Mazzotti (2008), ela ocorre em três
fases. A primeira delas é construção seletiva - fase em que o sujeito se apropria das
informações sobre o objeto, sendo influenciado por condicionantes culturais; A segunda
fase é a esquematização estruturante – forma-se uma imagem coerente e facilmente
exprimível dos elementos que constituem o objeto, permitindo ao sujeito a apreensão
deste, surge aí o núcleo ou esquema figurativo; por último, ocorre a naturalização – o
núcleo figurativo permite concretizar e coordenar cada um dos elementos, tornando-os
objetivos e concretos. Ao mesmo tempo em que o sujeito, por meio da objetivação, vai
construindo imagens referentes aos objetos, estas também precisam ser integradas aos
sistemas de pensamento já existentes. A este processo de tornar familiar o que nos é
estranho, de categorizar, classificar e rotular novas imagens àquelas que já se tem, dá-se
o nome de ancoragem (GRACIA, 1988).
Apresentada de forma resumida a teoria em questão, mostra-se adequado pensar
em como se dá um estudo destas representações. Neste caso, Jodelet (1990) citado por
Mazzotti (2008, p. 34) explica que investigações sob este paradigma devem ter a
preocupação com a “dupla questão”, a saber: “como o social interfere na elaboração
psicológica que constitui a representação e como essa elaboração psicológica interfere
607

no social”. Ou seja, há de se pensar nas representações sociais como produto,


procurando compreender seu conteúdo e sentido pelos elementos que o constituem
através de questionários, entrevistas, observações, etc.; ou como processo, investigando,
assim, as relações entre a representação e as condições sociais onde foram produzidas,
através da análise de aspectos culturais, ideológicos e interacionais do grupo estudado.

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E O COMPONENTE CURRICULAR


EDUCAÇÃO FÍSICA: UMA PROPOSTA DE INTERVENÇÃO
Ao analisar as representações sociais, fica evidente a importância de tal
conceito para uma intervenção em nível educacional. Em especial, sobre este
aspecto, Mazzotti explica:
Por suas relações com a linguagem, a ideologia e o imaginário social e,
principalmente, por seu papel na orientação de condutas e das práticas
sociais, as representações sociais constituem elementos essenciais à análise
dos mecanismos que interferem na eficácia do processo educativo
(Mazzotti, 2008, p. 21).

Constatam-se vários aspectos pela mera observação da realidade dos alunos


em uma sala de aula, mas quando se pensa em intervir sobre ela, é importante saber
como se formam as significações destes, ou seja, como se formam e desenvolvem-se
ao longo do tempo, suas representações.
Conforme já citado, estudos demonstram que os alunos consideram o
componente curricular Educação Física “menos importante” em relação a outros
componentes curriculares como é o caso da Língua Portuguesa ou Matemática
(BETTI, 2003; DARIDO, 2004). Quanto aos professores da área, observa-se que os
alunos os relacionam mais a uma figura de “técnico” e que, assim como se dá com
os componentes curriculares, são menos importantes do que professores de outras
disciplinas.
Levando em consideração que as representações sociais orientam
comportamentos, condutas e práticas sociais (ABRIC, 1994; MAZZOTTI, 2008;
JODELET, 1994), o fato de os alunos representarem a Educação Física e seu
professor conforme expresso acima, deve estar relacionado com um comportamento
cada vez mais desinteressado apresentado em relação às aulas conforme vão
avançando nos anos de escola formal. Sendo assim, torna-se necessário que se
intervenha na maneira como o professor e o componente curricular se apresentam ao
608

aluno, fazendo com que este mude sua representação social e, em decorrência disso,
sua conduta e comportamento em relação às aulas.
Quando se fala em mudança de uma representação social, torna-se necessário
recorrer a um dos aprofundamentos desta concepção, no caso, a teoria do núcleo
central, proposta por Abric (2000). Esta teoria apresenta a hipótese de que toda
representação social possui um núcleo central e elementos periféricos. O núcleo de
uma representação surge do confronto entre a natureza do objeto representado com o
sistema de valores e normas sociais do grupo, definindo a homogeneidade deste. Ele
gera o significado básico da representação e determina sua organização. Além disso,
é bastante estável, resistente às mudanças e pouco sensível ao contexto imediato. O
núcleo reflete as condições sócio-históricas e os valores do grupo. Já o sistema
periférico é constituído pelos demais elementos da representação que giram em
torno do núcleo central, tendo a função de adaptar a realidade concreta ao núcleo,
servindo então, como defesa para este. Este sistema é mais flexível, tolerando as
contradições apresentadas entre o objeto representado e os valores nucleares, sendo
desta forma, sensível ao contexto imediato (SÁ, 1996; ABRIC, 2000; ANDRADE et
al., 2011).
Gracia (1988) explica que uma intervenção que pretenda mudar uma
representação social deve ser dirigida prioritariamente ao núcleo desta.
Corroborando isso, Villas Bôas (2004) afirma que se põe termo a uma
representação, apenas com uma ação direta em seu núcleo, e Abric (2000) explica
que é necessário um “ataque” ao núcleo central para transformar uma representação.
Visto que o núcleo central é formado pelos valores de um grupo, a ação deve
acontecer visando questionar estes valores.
Esquematizando como a mudança na representação social ocorre, Flament
(1994, p. 49) teoriza a seguinte sequência: “modificação das circunstâncias externas;
modificação das práticas sociais; modificação dos prescritores condicionais
(elementos periféricos); modificação dos prescritores absolutos (núcleo central)”.
Neste caso, mudanças ambientais e nas práticas sociais, darão boas razões para uma
mudança de comportamento do indivíduo sob novas circunstâncias. Se estas novas
condições e práticas persistirem, podem ser percebidas como irreversíveis e gerar
uma mudança no núcleo, o que levaria à mudança na representação social.
Aplicando estes conceitos às aulas de Educação Física na escola, tendo como
alvo transformar a representação atual que os alunos têm deste componente, deve-se
609

começar, segundo Flament (1994), por uma mudança no ambiente e nas práticas
sociais envolvidas nesta representação. Uma mudança nas práticas docentes, de
modo “justificar” este componente curricular aos alunos demonstrando sua
importância seria uma alternativa. Modificando-se as circunstâncias, supõe-se ser
possível uma mudança de comportamento por parte dos alunos, sendo que, a
permanência desta situação, possibilitaria a modificação do núcleo central, surgindo
uma nova representação social dos discentes em relação à disciplina. Quanto a uma
prática docente nas aulas de Educação Física que torne possível a necessária
mudança na representação social desta disciplina, pode-se dizer que ela não está
distante daquilo que Betti (1992, p. 285) destacou como função deste componente
curricular no contexto escolar, a saber:
introduzir o aluno de 1º e 2º graus no mundo a cultura física, formando o
cidadão que vai usufruir, partilhar, produzir, reproduzir e transformar as
formas culturais da atividade física (o jogo, o esporte, a dança, a
ginástica...).

Para atingir tais fins, alguns autores sugerem que os conteúdos relativos à
Educação Física escolar sejam tratados em suas dimensões procedimentais,
atitudinais e conceituais (COOL, 2000). Estas dimensões de conteúdo citadas acima
devem ser trabalhadas aproveitando o grande leque dado pela Cultura Corporal de
Movimento, que abrange formas de atividades expressivas corporais tais quais o
jogo, o esporte, a dança, a ginástica (COLETIVO DE AUTORES, 1992). Deve-se
proporcionar aos alunos uma diversificação dos conteúdos, proporcionando
vivências práticas que variem nos aspectos temporais e espaciais. Numa variação em
nível temporal, pode-se proporcionar aos alunos a riqueza cultural de jogos
praticados por povos do passado, ou ressignificar e tratar pedagogicamente
(BRACHT, 2000) práticas que a mídia traz no presente, ou ainda, pensar na criação
de jogos como forma de construir uma cultura futura. Já, em nível espacial, pode-se
pensar em práticas de outros países, de regiões diferentes ou mesmo práticas tidas
como fora da realidade social de tais alunos. Desta forma, as aulas são tiradas da
“mesmice” gerada pela prática tradicional e descontextualizada de esportes como o
futebol, o handebol, o basquete e o vôlei, relativamente comuns na realidade das
aulas de Educação Física (BETTI, 1999) e que refletem uma carência de conteúdos
que, segundo Chicati (2000), provocam o afastamento dos alunos das aulas.
Além disso, Tani et al (1988) destacam que se deve observar as
características que as crianças apresentam durante o processo de desenvolvimento e
610

aprendizagem motora e orientá-las de acordo com tais, pois, não considerar estes
fatores causaria o estabelecimento de conteúdos de ensino inapropriados
dificultando a participação dos alunos nas aulas e prejudicando a representação
social destes a respeito da Educação Física.
Em concomitâncias às vivências, a prática docente em Educação Física deve
estar voltada, também, para o desenvolvimento das ações motoras referentes a estas,
pois além de tratar de uma diversidade de práticas corporais, deve-se pensar em
instrumentalizar o aluno para elas. A mera vivência não é capaz de suprir todas as
dimensões de conteúdo (procedimental, conceitual e atitudinal) no processo de
ensino/aprendizagem.
Desse modo, é fundamental que as práticas corporais propostas sejam
acompanhadas de uma problematização. Na verdade, o aluno não aprenderia pela
repetição dos movimentos, prática relativamente comum em algumas aulas, mas
pela necessidade de ter que encontrar soluções motoras para os problemas
apresentados pelos professores de Educação Física nos diferentes contextos de
aprendizagem.
A premissa da presente proposta de intervenção é a de que exista a
necessidade de reformular concepções, espaços e práticas pedagógicas para que o
componente curricular Educação Física cumpra sua função, proporcionando o
ambiente e a prática social que vão chegar a envolver o núcleo da representação
social atual demonstrada pelos discentes, o que contribuirá para o surgimento de
uma nova representação social a médio e longo prazo.

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613

Comunicação

Gestão escolar e a emancipação do estudante.

Helena Machado de Paula Albuquerque


Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Juliana Cristina Barbosa do Amaral
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

RESUMO: Pretende-se neste trabalho apresentar os resultados de uma pesquisa


realizada em 2012 e 2013, com o objetivo de verificar características da atuação e
conduta de jovens das camadas populares no ambiente de educação formal, a escola e
dentro de uma instituição socioeducativa, sem a finalidade de compara-las.
Fundamentou-se teoricamente em Apple e Gimeno Sacristan, Pais e Dayrell. Utilizou-se
uma metodologia com abordagem qualitativa e como instrumentos, reuniões com
características de grupo focal, observação de condutas dos sujeitos envolvidos e
entrevistas. Analisaram-se os dados a partir de quatro categorias: diálogo, participação,
satisfação e autonomia. Constatou-se que no processo emancipatório do aluno, o
paradigma de gestão escolar assumido, mais do que a formalidade da instituição,
influencia a conduta do estudante.
Palavras chave: Gestão escolar, instituição socioeducativa, processo emancipatório.

Este trabalho parte de uma preocupação com as características de conduta de


doze alunos entre homens e mulheres, selecionados por frequentarem simultaneamente
duas instituições diversas – a escola pública e uma instituição socioeducativa. Sem a
pretensão de comparar estas duas instituições – que são, sabidamente, de natureza
distinta –, discutem-se questões relacionadas à juventude e ao atendimento educacional.
Para a realização da pesquisa foram investigadas quatro instituições: uma de
educação não formal, chamada neste trabalho de Instituição Socioeducativa e três
escolas da rede estadual de ensino chamadas aqui de Canhema I, Canhema II e Vila
Nogueira, ambas localizadas no mesmo bairro no município de Diadema.
A referida instituição atende a pessoas de todas as idades, desde crianças bem
pequenas até grupos de dança da terceira idade, distribuídas em grupos de dança e de
discussão e em diversas oficinas oferecidos pela instituição: relacionadas ao Movimento
614

Hip Hop – dança, grafitagem, discotecagem, poesia e literatura. É incentivada também a


realização de grupos de danças diversas e de grupos de diálogos e reflexões, geralmente,
nutridos com materiais presentes no acervo sobre a negritude no Brasil e a africanidade.
A instituição socioeducativa dispõe de coordenadores e de oficineiros, mas, em
breve visita, foi possível observar também o envolvimento juvenil na organização e na
limpeza dos espaços físicos, na manutenção de equipamentos tecnológicos e na
participação e na realização das oficinas.
A primeira escola visitada foi “Escola Canhema I” – localizada muito próximo à
instituição acima citada. De acordo com a coordenadora pedagógica, conta atualmente
com cerca de 572 alunos, distribuídos da seguinte maneira: 364 alunos matriculados no
Ensino Fundamental e 208 alunos, no Ensino Médio. A escola atende 3 salas da 8ª série,
2, do 1ª ano do Ensino Médio, uma do 2º ano e uma do 3º ano do Ensino Médio, no
período da manhã; duas salas da 5ª série, três da 6ª série e duas da 7ª série, no período
da tarde; e duas salas no período noturno – uma do 2º ano e uma do 3º ano do Ensino
Médio. Atualmente, além das salas de aula, a escola dispõe de uma sala de recursos,
uma sala destinada ao Acessa Escola, uma quadra poliesportiva descoberta, uma área de
estacionamento para funcionários, um pátio coberto e uma Sala de Leitura.
A escola possui dois andares de salas de aulas, sem nenhuma estrutura de
acessibilidade a deficientes físicos para os pavimentos superiores, como rampas de
acesso, por exemplo. Possui banheiros para uso dos alunos apenas localizado no pátio,
no piso inferior. A área administrativa é composta por uma sala de Direção, por uma
sala dos Professores e pela Secretaria, a qual atende à comunidade por uma janela, que
dá acesso à parte externa da escola, a qual fica aberta durante todo o horário de
funcionamento da instituição. A escola dispõe de equipamentos de áudio e vídeo, como
caixas de som, telões, televisores, datashow e câmeras fotográficas.
A segunda foi a “Escola Jardim Canhema II”, localizada também no Bairro
Canhema. Conforme documento que contempla a Proposta Pedagógica, possui 16 salas
de aula, sendo: uma sala do Acessa Escola, uma sala de Leitura, uma sala de multimídia
e um Laboratório, além das salas de aula convencionais. As demais dependências são
um pátio, com aproximadamente 200 m², uma cozinha e banheiros (femininos e
masculinos) para os alunos. O espaço administrativo é composto pela secretaria, pela
sala da Direção, pela sala dos professores e por banheiros (femininos e masculinos) para
professores e funcionários. A escola possui também uma quadra coberta, com
aproximadamente 600 m², uma pequena quadra de voleibol e um estacionamento com
615

14 vagas para veículos de professores e funcionários. A entrada dos alunos é feita pelo
portão principal e possui dois lances de escadas, o que aparentemente dificulta a
acessibilidade a deficientes físicos e portadores de outras necessidades especiais. A
entrada para atendimento à comunidade é feita por outro acesso.
A escola atende, hoje, cerca de 1000 alunos, distribuídos em 24 turmas sendo:
no turno da manhã, 1 turma da 7ª série, 4 turmas de 8ª série, 2 do 1º Ensino Médio e 1
do 2º ano do Ensino Médio; no turno da tarde, 2 turmas de 5ª série, 3 turmas de 6ª série
e 3 turmas de 7ª série; o período noturno atende 2 salas do 1º ano do Ensino Médio, 4
salas do 2º ano do Ensino Médio e 2 salas do 3º ano do Ensino Médio.
Por fim, foi visitada a escola localizada no bairro Vila Nogueira. Segundo relato
de um dos vice-diretores, a escola atende hoje cerca de 1520 alunos, sendo 480
matriculados na 7ª ou 8ª séries, no período da manhã; 460 nas 5ª ou 6ª séries, no período
da tarde; e, aproximadamente, 580 alunos, cursando o Ensino Médio, no período
noturno. A escola dispõe de uma ampla variedade de espaços físicos e de equipamentos.
Atualmente, conta com 15 salas de aula, pintadas e conservadas pelos alunos, e
uma sala de recursos, a qual atende alunos portadores de necessidades especiais,
particularmente cadeirantes e deficientes intelectuais, nos períodos da manhã e da tarde.
Há, na escola, uma sala disponibilizada para o Acessa Escola, a qual utiliza o
“Intragov”, um provedor do Estado para acesso à internet. Ainda possui uma sala de
vídeo, com moderno equipamento de áudio e vídeo. Possui também uma quadra
poliesportiva e um pátio, ambos cobertos, uma cantina mantida pela APM, um refeitório
com serviços de merenda (serviços terceirizados, como também o são os de limpeza),
um espaço organizado como biblioteca para pesquisas e para estudos e dois banheiros
adaptados. A escola possui agradável área de circulação, com corredores descobertos,
jardins bem cuidados e rampas de acesso a todos os pavimentos. Para atendimento da
comunidade, disponibiliza uma janela de acesso à secretaria, a qual se liga ao
estacionamento dos funcionários. Nesta pesquisa, essa escola será chamada de “Vila
Nogueira”.
Os dados foram obtidos por meio de reuniões com características de grupo focal
(GATTI,,2005) com os jovens, entrevistas com funcionários das escolas e observações
das rotinas em ambas as instituições e analisados a partir das contribuições teóricas
sobre a concepção de juventude de Dayrell (2005), Abramo (2005) e Pais (2003), ainda
com as contribuições sobre a função ideológica da escola de Apple (1982, 1997, 2002) e
de Apple & Beane (2001) e por fim, ideias de como construir uma escola com foco nas
616

necessidades dos alunos visto como sujeito social de Gimeno Sacritán (2001, 2005,
2008) e sistematicamente organizados e analisados de acordo com as seguintes
categorias:

Tabela 1 – Categorias norteadoras para observação e análise de dados

Categorias Indicadores
Diálogo Disponibilidade da escola para acolhida da
pesquisa da direção, ou dos coordenadores da escola
e/ou da instituição não escolar para ouvir as
reivindicações dos alunos; predisposição dos
professores para esclarecimentos de dúvidas e troca
de ideias. Apoio na escola para a construção de
colegiados de alunos, tais como grêmio escolar.

Participação Participação dos alunos em decisões que lhes


dizem respeito, nas duas instituições. Na escola, em
reuniões, por meio dos seus representantes (o
Conselho de Escola), nas atividades de planejamento
para a construção do Projeto Pedagógico, ou seja,
nos diferentes colegiados da escola.

Satisfação Pronto atendimento às propostas de


atividades. Existência de casos isolados de
indisciplina. Índice baixo de ausência às aulas. Bons
resultados nas avaliações. Manifestações de
entusiasmo e alegria e relações não conflituosas
durante o período em que estão presentes nas
instituições, por parte de todos: alunos, direção ou
coordenadores, professores.

Autonomia Não bloqueio de iniciativas, respeito a


limites. Abertura para emitir opiniões,
disponibilidade para ouvir o outro.

Descrição e análise dos dados obtidos

Os dados organizados e analisados considerando as categorias, tornaram


evidente que a existência de satisfação é um indício de como as outras categorias estão
sendo desenvolvidas nas instituições. Na instituição em que a satisfação permeou os
dados obtidos pelos jovens frequentadores, foi possível observar também práticas
617

participativas, abertura para diálogos e autonomia para seus frequentadores


desenvolverem iniciativas diferenciadas. Essas características puderam ser observadas
na Instituição Socioeducativa e em uma das escolas analisadas, aqui denominada
Canhema I. Nesta escola, a pesquisa foi muito bem acolhida. A gestão, coordenação
pedagógica e professor entrevistados mostraram que consideram a aproximação com os
alunos, fator importante para a aprendizagem. (...)conheço muitos pais, muitos alunos,
isto me facilita o trabalho. Conhecendo a comunidade, podemos entender o que eles
precisam, ter a sensibilidade de conhecer caso a caso (Coordenadora Pedagógica).
Nas duas outras escolas, a Jardim Canhema II e Vila Nogueira, a entrada para a
pesquisa foi muito dificultada. Nestas escolas foi observada menor incidência de
práticas participativas, menor abertura para diálogo entre os representantes das escolas e
seus alunos, além de aparente ausência de autonomia de professores e alunos para o
desenvolvimento de propostas diferenciadas, em especial aquelas ligadas à cultura. Ao
que parece, essas características das escolas levam a uma insatisfação dando origem a
um distanciamento do aluno em relação ao pouco que a escola oferece. A participação é
prejudicada e a autonomia praticamente não existe.
Foi possível constatar também que o fato de serem instituições de frequência
obrigatória não influenciou a assiduidade e participação dos jovens, já que esta parece
estar mais ligada à satisfação que sentem em relação às atividades oferecidas pelas
instituições. Ainda a motivação para participar não está estritamente ligada às atividades
que são realizadas por livre iniciativa dos jovens – em muitos momentos, puderam
demonstrar satisfação em participarem das atividades obrigatórias desenvolvidas pela
escola. Se a atividade é prazerosa, mesmo sendo obrigatória obtém a adesão espontânea
do aluno.
A partir das leituras realizadas durante todo o processo e produção deste estudo,
foi possível refletir sobre o processo hegemônico presente nas relações estabelecidas
nas escolas. Por muito tempo, a escola foi marcada por relações de poder entre os
adultos e seus menores, porém os jovens passaram a exercer outro papel social, distinto
daquele conhecido como adultos incompletos – que necessitavam de intensa supervisão
dos adultos e que estes deveriam escolher o que era melhor para seus jovens. Hoje a
juventude pode vivenciar um papel mais autônomo, sendo responsáveis pelo seu próprio
papel social. Todavia há escolas que ainda não perceberam esta mudança, ainda
permanecem orientadas por posturas conservadoras fiéis a um jovem estudante
imaginário, submisso às ordens, mesmo sem compreende-las, escolas que muitas vezes
618

tem um discurso democrático, porém uma atuação ainda autoritária, isto foi observado
nas escolas Jardim Canhema II e Vila Nogueira.. Em conformidade com as ideias de
Apple (1982), estabelecer rotinas em busca de práticas verdadeiramente democráticas,
portanto, necessita de uma mudança na concepção de educação existente, em especial
mudanças nas relações de poder exercidas dentro da escola.
Analisando as condutas jovens, nas instituições pesquisadas, outro aspecto
merece destaque: após visitas em outras escolas públicas do município, anteriores à
realização desta investigação, foi possível observar um número grande de alunos que
praticava atitudes de resistência às atividades e regulamentos escolares. A pesquisa,
então, partiu da hipótese de que, enquanto na escola, os jovens apresentavam condutas
de resistência, em ambientes mais próximos de suas origens sociais, onde suas
manifestações culturais são aceitas e, muitas vezes valorizadas, a conduta desses
mesmos jovens se apresenta de forma muito distinta.
No início das atividades de pesquisa, foi novamente percebido, nas escolas de
educação básica do município de Diadema, condutas resistentes e transgressoras,
partindo de alguns estudantes. Diante disto, foi pressuposto que alunos que frequentam
a casa do Hip Hop faziam parte deste grupo de alunos e que essas condutas eram
respostas a uma tentativa de inculcação de uma cultura que em nada se aproximava da
origem pessoal destes alunos.
Ao conhecê-los melhor, porém, com as conversas por meio dos encontros de
grupo focal, foi percebido que esses jovens não faziam parte do grupo de alunos
observados em outras ocasiões nas escolas. Ao retornar as escolas, agora com um olhar
mais seletivo, foi constatado que eles, realmente, não eram conhecidos por condutas
transgressoras. Foi percebido que, em sua maioria, eles constituíam um grupo de alunos
que, muitas vezes, passavam despercebidos aos olhares dos adultos, ou seja, não
compactuavam das atitudes de violação ao regimento e normas escolares, tampouco se
destacavam por excelência e desempenho acima da média.
Entretanto, a observação desses mesmos jovens, durante a realização das
atividades, na instituição socioeducativa, apresentou-se de forma muito diferenciada – o
que confirmou, em parte, a hipótese inicial, ou seja, neste local, participam das
atividades com empenho, colaboram como as funções organizativas e zelam pelos
equipamentos e espaços institucionais.
Qualquer um pode falar, o microfone fica aberto para todo mundo. (C –
Homem, 16 anos).
619

Somos nós que organizamos os rachas de B. Boys e MCs também. (A –


Homem, 19 anos).
Tem um menino aqui, que é legal pra caramba que é o [F – Homem 14
anos]. O interessante é que ele se preocupa com este espaço e tenta articular
algumas coisas. Ele fez 14 anos agora, ele tenta articular algumas coisas,
algumas ações. Ele é um moleque do mundo da dança, normalmente o
menino da dança, só dança, não pensa. É interessante quando um menino
destes toma uma atitude, porque aí você vê que eles pensam também, alguns
deles acabam falando que preferem dançar, mas é uma coisa deles, faz
articulação e tal. Temos também a Aline que dá oficina de quinta-feira e tem
uma “baita” articulação, cuida de vários projetos também, ela dança, é
dançarina e aí o Gabriel é um menino novo e está aí começando esta coisa e
a gente está meio que dando uma força. Ele está fazendo de uma forma
natural dele e eu acho que a gente como mais velhos, ou pelo menos mais
experiente podemos canalizar isto neles, para uma coisa positiva, para que
não seja uma frustração, por exemplo. Então sempre que tenho oportunidade
eu vou ali e troco uma ideia, falo: “- Toma cuidado com isto que pode gerar
tal coisa”.(Coordenador da Instituição)

O fator mais intrigante dessas observações diz respeito à indiferença que estes
jovens mostram em relação à escola. Não incitam a “bagunça”, não desrespeitam
professores ou outras autoridades escolares, tão pouco se esforçam para obter qualquer
destaque, como obtenção de notas altas ou participação de eventos externos. Essa
inquietude intensifica-se ao saber que, na instituição socioeducativa, são incentivados a
desenvolverem sua criticidade, através de grupos de discussões sobre questão racial,
econômica, política e social e a aparente aceitação com as normas escolares não
condiziam com as discussões estabelecidas nessas discussões.
Na instituição sócio educativa todos facilitam a aprendizagem, não apenas o
professor. Assistindo aos treinos de dança, indagando sobre como ocorriam e as
modalidades, responderam os jovens estudantes:
Existem algumas modalidades: POP, ROCK, LOCK. (C – Homem 16 anos).
Quanto tempo vocês levam para aprender a dançar?
Depende da vontade, tem gente que frequenta, mas não gosta tanto, demora
mais, mais tem gente que não sossega enquanto não consegue fazer um
movimento. Aí tem um amigo que tem mais facilidade e ele ensina. (C –
Homem 16 anos).
Mas quem ensina?
Tem os professores, mas se você chegar em alguém e pedir me ensina tal
coisa ele ensina. A informação vai sendo passada, tem a aula também, mas
eu aprendo mais é com o pessoal. (C – Homem 16 anos).
Aqui é muito legal porque ninguém nega informação, todos querem ver você
aprender, acham legal você conseguir aprender. (L – Homem 17 anos).
E aqui não tem idade nem menor, nem maior. (C – Homem 16 anos).
Não. É para todas as idades. Qualquer um que chegar tem sua vez. (C –
Homem 16 anos).
Na oficina tem criança de até seis anos. (K – Homem 16 anos).
Tem uma certa organização nas oficinas, mas quando não tem oficina,
quando o professor falta, ou é feriado, ou alguém teve de viajar, o pessoal
vem, vai treinar, fica de boa, um ajuda o outro. É bem flexível. (L – Homem
17 anos).
620

Ao retomar algumas ideias de Apple, algumas dessas desconfianças puderam ser


melhor desenvolvidas. Segundo o autor, a escola desenvolve um papel ideológico
baseado na lógica capitalista, portanto é comum observar tanto nas escolas, como
fábricas ou estabelecimentos comerciais, rotinas semelhantes, ou seja, a escola trabalha
para adaptar o indivíduo ao mundo do trabalho. Ao discorrer sobre as formas de
resistência de funcionários aos modos de gerência de seus empregadores, pude
estabelecer uma relação muito clara entre as condutas dos funcionários e dos jovens
participantes desta pesquisa.
Apple e Beane (2001) afirmam que existem formas diferenciadas de
demonstração de resistência. As mais facilmente identificadas são aquelas
caracterizadas pelas greves, motins etc. Contudo, com igual importância, ocorrem as
formas mais “mascaradas” de resistência, embora não menos impactante. Esse é o caso
das vendedoras que deixam de atender com eficiência seus clientes, após terem batido
suas metas diárias de vendas, ou funcionários industriais que diminuem a capacidade de
produção de máquinas deixadas sob sua responsabilidade, ou ainda, funcionários que
produzem além de suas cotas para poder ajudar colegas que possam ter encontrado
dificuldades, durante a produção e não conseguiram atingir suas metas.
A partir dessas reflexões, foi percebido que os alunos, ao manterem-se em seus
colégios sem muitas aventuras ou sucesso, demonstram que criaram a consciência de
que a escola já não pode cumprir as promessas que são feitas a eles, ou seja, esses
jovens sabem que a escola poderá não mais proporcionar aquela mobilidade social
prometida, conhecem também histórias que são excluídas de livros didáticos e
conhecem a verdade histórica de alguns falsos heróis celebrados nacionalmente.
Mas sabem também que a escola é indispensável para futura tentativa de
mudança em sua ordem social, portanto esforçam-se para se manterem na escola. Eles
reservam forças para se dedicarem a atividades mais emancipatórias que participam na
instituição socioeducativa.

Considerações finais.

Reiterando, este estudo não teve como objetivo analisar e comparar instituições
sabidamente de natureza distintas, o foco voltou-se ao jovem, protagonista de sua ação
e identidade social. Contudo, mesmo tão diferentes, as instituições partilham de ideais
comuns – a formação da juventude diademense, o que justifica a utilização de autores
621

que discutem conceitos sobre a escola, mas também conceituam diálogos sobre a
Educação, como um processo mais amplo da escolarização.
Sem a pretensão de responder a todos os questionamentos levantados no
decorrer da pesquisa e de apresentar soluções para problemas enfrentados pela escola,
este estudo tentou apontar que pequenas iniciativas podem melhorar o ambiente
educativo e que estes jovens não estão motivados a participarem apenas de atividades
desenvolvidas em instituições que não suas escolas. No decorrer da investigação foi se
tornando fundamentais as ideias de Gimeno Sacristán (2005)

Ensinar ou educar, e quem faz isso? Podemos optar por considerar que o
aluno deve aprender alguns conteúdos de caráter sobretudo intelectual e
adquirir as habilidades que tradicionalmente vêm sendo objeto do ensino nas
escolas. Podemos nos justificar na regra de que qualquer outro tipo de
formação (o que distinguimos por educação, como algo mais amplo que o
ensinar e aprender conteúdos: educação afetiva, social, religiosa, sexual,
artística, profissional, do cidadão, da personalidade, psicomotricidade, etc.),
sem deixar de valorizá-la, é competência de outros agentes e instituições não-
escolares – família, igreja, empresas, iniciativas privadas e instituições de
caráter público, meios de comunicação – ou, simplesmente, responsabilidade
de cada indivíduo. Entre essa opção de opção de especializar ou diferenciar
as funções dos agentes educacionais, e seu oposto –a de que todos devemos
nos dedicar a tudo - , existem muitas possibilidades e situações
intermediárias, nas quais as tarefas que diferentes agentes devem realizar se
combinam e também se cruzam, competindo, colaborando ou se enfrentando
entre si. (GIMENO SACRISTÁN, 2005, p. 199).

Esta pesquisa pôde mostrar que nas escolas, quando a gestão estimula que todos
os educadores que ali trabalham incorporem uma postura, na qual esteja presente a
disponibilidade para ouvir e tentar compreender as peculiaridades dos alunos poderão
desenvolver práticas de respeito, solidariedade mútua contribuindo para um ambiente
escolar verdadeiramente propício ao processo ensino aprendizagem e ao
desenvolvimento daquelas virtudes que devem ser trabalhadas para atrair, a atenção de
seus jovens.

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Lisboa, 2003.

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2013.

(http://culturaecurriculo.fde.sp.gov.br). Acesso em 01 de agosto de 2013.


623

Comunicação

Estágio de qualificação para adaptação acadêmica de alunos estrangeiros na escola


naval

Hercules Guimarães Honorato


Escola Naval

Resumo: Este artigo tem por objetivo estudar a imigração temporária de jovens
estrangeiros que vêm para o Brasil com a finalidade de realizar sua formação superior
na Escola Naval. Os jovens passam por um processo seletivo em seus países e, antes de
ingressarem oficialmente no ensino regular, realizam o “Estágio de Qualificação para
Adaptação Acadêmica de Alunos Estrangeiros”, que foi implementado em 2010 e
consiste no aprendizado de Língua Portuguesa e o nivelamento em Matemática e Física.
A metodologia é de cunho qualitativa, com pesquisa documental, tendo como
instrumentos de coleta: questionário aos sujeitos do estudo e entrevistas com as
professoras de Língua Portuguesa e Matemática. O escopo é traçar também o perfil dos
alunos do estágio, ressaltando suas principais características, os obstáculos encontrados
nesse primeiro momento e suas expectativas para o futuro. Por fim, são tecidas
considerações sobre a relevância desse nivelamento, bem como possíveis soluções para
sua melhoria.
Palavras-chave: Educação Superior. Estágio de Qualificação. Gestão educacional.

Introdução
Nesta relação entre mundo globalizado e juventude, deparamo-nos com o que
Gusmão (2007 apud FARIA, 2009, p.61) chama de "trajetória nômade estudantil", isto
é, um mundo de fronteiras difusas, com o rompimento das barreiras físicas, geográficas
e culturais pelos alunos, os quais procuram em universidades estrangeiras o espaço que
acreditam ser ímpar para seu futuro.
Assim, jovens brasileiros migram para universidades americanas e europeias, na
maioria das vezes. Por outro lado, nós recebemos em nossas Instituições de Ensino
Superior (IES) jovens estrangeiros que entendem que aqui encontrarão uma
possibilidade de melhoria da sua condição social e de vida familiar. Buscam também o
reconhecimento do seu país no fortalecimento das estruturas de elites existentes, tanto
624

no que tange ao aspecto intelectual como profissional, a serem construídas ou até


mesmo reconstruídas.
Em nossa pesquisa, observamos que as IES brasileiras recebem contingentes de
jovens estrangeiros, estudantes em busca de formação profissional em primeiro lugar,
mas que também anseiam pela construção de sua identidade – individual, coletiva ou
social e cultural. Porém, tem sido verificada a discrepância existentes no trato das
disciplinas básicas para o início da graduação. Assim, com o escopo de nivelamento dos
alunos estrangeiros, em especial aqueles de língua oficial que não seja o português, foi
implementado, em 2010, o “Estágio de Qualificação para Adaptação Acadêmica de
Alunos Estrangeiros”, objetivo deste artigo.
Procurou-se focar também nesta pesquisa em jovens imigrantes provisórios e
estudantes que deixaram seus países de origem e realizam sua formação superior em
uma IES militar – no nosso caso de estudo. São jovens africanos e asiáticos que,
atualmente, estudam na Escola Naval (EN). Assim, com este artigo, busca-se
compreender como eles experimentam, na (con)vivência diária, suas dificuldades de
adaptação à cultura local, à barreira linguística e à vida acadêmica e militar.
A metodologia é de cunho qualitativa, com pesquisa documental, tendo como
instrumentos de coleta questionário com perguntas abertas e fechadas direcionadas aos
sujeitos do estudo. Estes são jovens de cerca de 22 anos oriundos de Angola, Cabo
Verde, Líbano, Namíbia, Nigéria e Senegal. Também foram realizadas entrevistas com
as professoras de Língua Portuguesa e Matemática. Contou-se ainda com a leitura do
Relatório de acompanhamento elaborado por um dos docentes.
Este artigo está dividido em três seções principais, além da introdução e das
considerações finais. Na primeira seção, estabelecem-se alguns conceitos associados à
imigração estudantil, em especial, à temporária além da relação dos jovens estrangeiros
e a moldagem da sua identidade como "sujeitos presentes na terra do outro" (GUSMÃO,
2008, p.1). Em seguida é apresentado o estágio de qualificação e suas potencialidades e
limitações. Na última seção é realizada a análise dos dados coletados.

Imigração e Identidade: alguns conceitos importantes


Como exposto por Subuhana (2005, p.13), retomando Sayad (1998), a imigração
consiste no deslocamento de populações por todas as formas de espaço socialmente
constituídos e qualificados, sendo um "fato social completo". O imigrante seria, então,
de acordo com esse autor, um cidadão estrangeiro que tem residência fixa em outro país
625

que não o seu de origem.


No que tange à especificidade do caso aqui sob investigação, pode-se asseverar
que a imigração ocorre de forma provocada e temporária, envolvendo quase sempre
acordos de cooperação entre Estados soberanos de origem e de destino, ou mesmo entre
instituições de ensino superior, não podendo, portanto, ser enquadrada basicamente
como uma mera relação econômica ou política.
A noção de identidade, por sua vez, retoma como uma das principais
preocupações da psicologia social, o conflito existente entre indivíduo e grupo e
individual e social. Deschamps e Moliner (2009, p.14) definem identidade como “um
fenômeno subjetivo e dinâmico resultante de uma dupla constatação de semelhanças e
de diferenças entre si mesmo, os outros e alguns grupos”. Assim, a identidade social é
concebida como “parte do autoconceito do indivíduo que se deriva do conhecimento de
seu pertencimento a um grupo (ou grupos) social com o significado valorativo e
emocional associado a este pertencimento” (TAJFEL, 1982, p. 292).
Subuhana (2005) nos lembra que nenhuma identidade é tão rígida, sólida e
cristalizada que não possa ser questionada. A cultura do país escolhido irá causar
impactos importantes na identidade de um imigrante. Seus valores, suas características,
suas crenças (sua identidade) serão constantemente chocadas pelo capital cultural
estrangeiro. A partir desse confronto, ele poderá ‘escolher’ adotar ou repudiar um hábito
cultural ao qual foi exposto, e essa ‘escolha’ inferirá marcas em sua identidade.

O acordo bilateral de cooperação educacional e cultural


A educação tornou-se um dos temas que conseguiu diversificar as relações de
cooperação internacional nas últimas décadas. Para Lanni (1996 apud DESIDÉRIO,
2005, p.3), trata-se de um tema "inerente à (sic) mundialização da questão social". Neste
estudo não entraremos em todos os convênios no campo educacional existentes. Será
apresentado o convênio que existe entre os Ministérios da Defesa (MD) e o das
Relações Exteriores (MRE) para a graduação superior de estrangeiros em instituições
militares, no caso em estudo, o da formação como oficiais da Marinha do Brasil na
Escola Naval.

Apoio técnico no âmbito da Defesa


No âmbito do MD, mais especificamente no que diz respeito ao Comando da
Marinha, os cursos para estrangeiros, nesse primeiro momento, são ligados ao Ensino
626

Profissional Marítimo, disponíveis para consulta no sítio do MRE, e que são cursos, em
sua maioria, de curta duração e estão previstos no Programa Anual de Cursos de Curta
Duração para Aquaviários Estrangeiros e são realizados em centros de instrução no Rio
de Janeiro e em Belém. Tais cursos são destinados ao Órgão da Administração
Governamental responsável pela formação de pessoal da Marinha Mercante nos países
membros da Organização Marítima Internacional, com os quais o Brasil mantém
acordos culturais. A relação dos cursos é divulgada anualmente através de documentos
acessíveis no sítio da Marinha do Brasil na internet.
Os cursos de longa duração, incluindo-se o de formação de Oficiais na EN, foco
deste artigo, são acordados entre o governo brasileiro e os Adidos de Defesa
estrangeiros dos países que têm representações no Brasil, e com os quais nosso país
possui estreita relação de cooperação. As vagas de interesse de suas respectivas
Marinhas, cuja análise deve ser submetida à Marinha do Brasil, deverão ser solicitadas
até 15 de julho do ano que antecede ao da realização dos cursos em questão. As
solicitações dos Estados que não possuem estes representantes no Brasil são realizadas
pelos nossos Adidos brasileiros no exterior em virtude das necessidades
apresentadas pelas correspondentes Marinhas amigas.
Deve-se destacar que a seleção dos estrangeiros que virão realizar os diversos
cursos no Brasil não é de responsabilidade da Força Singular brasileira, mas dos países
de origem, o que, a nosso ver, por vezes acarreta a escolha de um aluno sem uma base
propedêutica mínima para o acompanhamento dos cursos.

Percursos e trajetórias: o olhar na formação inicial


Para fins metodológicos, consideraremos, neste estudo, os dados obtidos sobre
os alunos estrangeiros da EN que cursam ou cursaram em 2013 e 2014 o “Estágio de
Qualificação para Adaptação Acadêmica de Alunos Estrangeiros”. Será apresentada
uma breve análise dos dados coletados: entrevista com os professores e questionário
com os alunos do referido estágio.

Estágio de qualificação para adaptação acadêmica de alunos estrangeiros


O cenário da nossa pesquisa, como já informado, é a Escola Naval (EN), que
está situada na Ilha histórica de Villegagnon, na cidade do Rio de Janeiro. Esta IES tem
como missão formar os Oficiais da Marinha do Brasil para os postos iniciais da carreira,
627

nos corpos da Armada, Fuzileiros Navais e Intendentes da Marinha. Para o


cumprimento desse propósito, a EN ministra curso de graduação superior.
O curso regular é de quatro anos. Ao final, o aluno, titulado como Aspirante
durante o ciclo escolar, passa ao posto de Guarda-Marinha, continuando sua formação
no chamado ciclo pós-escolar, que culmina com uma viagem, de cerca de cinco meses,
pelo exterior, na qual é posto em prática o aprendizado obtido durante sua formação. Ao
término deste último período acadêmico, os jovens formam-se e, como segundos-
tenentes, são designados para as diversas organizações militares da Marinha em todo o
território nacional – em terra, no mar e em rios.
O "Estágio de Qualificação para Adaptação Acadêmica de Alunos Estrangeiros",
também conhecido como de "Nivelamento", foi instituído pela Portaria interna no 10, de
24 de fevereiro de 2010, em virtude das repetências constatadas e do cancelamento das
matrículas. É preciso destacar que a maior parte desses alunos não tinha domínio prévio
da língua portuguesa. Outro problema verificado, foi que os jovens, apesar de estarem
dentro da faixa etária solicitada para matrícula na instituição, cerca de 22 anos, não
vieram do seu país de origem com uma boa base escolar do ensino médio.
No decorrer da sua formação como Oficial da Marinha, pode-se verificar com
dados fornecidos pela Secretaria Escolar da EN que, dos 87 alunos estrangeiros
matriculados – de 1956, quando se deu o início do intercâmbio, até 2012 –, 26 não
alcançaram o objetivo colimado (tanto por seus países quanto por eles mesmos) de
concluírem o curso de graduação, ou seja, 30% do número total.
O estágio referido, segundo a Portaria que o implementa (BRASIL, 2010),
destina-se à capacitação de alunos estrangeiros selecionados pelas nações amigas e visa
desenvolver-lhes os conhecimentos básicos necessários para acesso ao curso de
graduação da EN. Consiste basicamente no incremento de um conjunto de aulas de
nivelamento destinadas ao trabalho de conteúdos, habilidades e competências
considerados pré-requisitos para o acompanhamento das disciplinas do currículo, de
modo que se viabilize a compreensão, a fala e a escrita da língua portuguesa, bem como
se supram possíveis lacunas de formação acadêmica desses candidatos a Aspirantes, em
matemática e física.
As atividades escolares são desenvolvidas ao longo de um ano letivo, que é
composto por trinta semanas de aulas, dividas em dois semestres letivos. Os alunos em
questão, para fins de administração acadêmica e militar, são denominados "Estagiários".
Será considerado aprovado aquele Estagiário que obtiver parecer “satisfatório” em todas
628

as disciplinas do currículo, podendo ser matriculado no ano seguinte no curso de


graduação regular, conforme previsto nas normas internas que trata dos Cursos de
Graduação da EN.
Existe um currículo pré-estabelecido a ser desenvolvido pelos professores para
cada uma das disciplinas e que tem, em sua maioria, a prova escrita como metodologia
avaliativa. Caso o Estagiário obtenha parecer "não satisfatório", será convidado, após
parecer favorável emitido pelo governo de seu país, a renovar sua matrícula no ano
posterior. Existe a possibilidade de a duração do Estágio ser abreviada quando for
identificado que o aluno apresenta o domínio dos conhecimentos necessários para o
acompanhamento do ciclo escolar.

Os sujeitos do estudo
A nossa lei maior da educação, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), no 9.394/96, apregoa, em seu art. no 83, que "O ensino militar é
regulado em lei específica, admitida a equivalência de estudos, de acordo com as
normas fixadas pelos sistemas de ensino" (BRASIL, 1996, não paginado). No caso da
Marinha, tais normas podem ser encontradas na Lei no 12.704, de 8 de agosto de 2012.
Seu sistema de ensino é separado da educação superior acadêmica, mas a titulação
conferida ao Aspirante é reconhecida pelo MEC como de "Bacharel em Ciências
Navais" (BRASIL, 2012).
Atualmente, a instituição em questão conta com um quantitativo aproximado de
850 Aspirantes. Deste total, 30 jovens são estrangeiros, com idade média de 22 anos,
naturais da Angola, Bolívia, Cabo Verde, Líbano, Moçambique, Namíbia, Nigéria,
Senegal e Venezuela.
Este trabalho está pautado a partir dos dados obtidos sobre os jovens
estrangeiros integrantes do Estágio de Nivelamento nos anos de 2013 e 2014, num total
de 18 estagiários, considerados os sujeitos da pesquisa. Esses jovens tiveram uma
imigração diferenciada, visto que estão representando, antes de mais nada, os seus
países em uma formação superior especial: a militar. Por características próprias,
inerentes à caserna, como aquartelamento ou internato, necessitam de uma atenção a
mais por parte de todos da instituição, desde os professores, do Serviço de Orientação
Educacional e Pedagógica (SOEP), até a administração de sua alimentação, pois alguns
são muçulmanos e, por exemplo, não podem fazer o consumo de carne de porco.
629

Resultados e análise dos instrumentos de coleta de dados


Foram realizadas uma entrevista informal e aberta com as professoras de
Matemática e de Língua Portuguesa, bem como a leitura do relatório de
acompanhamento de uma professora de português. A partir dos dados obtidos, tanto na
entrevista quanto no relatório, foi possível indicar algumas ações que poderão ser
desenvolvidas nos próximos estágios. Outra fonte de coleta de dados foi o questionário
de Perfil Social, Psicológico e Acadêmico, elaborado pelo SOEP da Instituição, que foi
aplicado aos sujeitos da pesquisa.

Análise dos instrumentos de coleta de dados dos Professores


Um dos docentes de português acompanha os alunos estrangeiros da Escola
Naval desde o início do estágio. Periodicamente, essa professora produz um relatório
sobre as suas atividades junto aos Aspirantes estrangeiros e tece comentários sobre o
desenvolvimento dos mesmos no que tange ao aprendizado de língua portuguesa. Em
seus relatórios, ela se refere a alguns dos métodos adotados no ensino para estrangeiros:
- Utilização de aulas dinâmicas: desde o primeiro momento de contato com os
alunos, a docente busca estimular a expressão oral. Portanto, faz uso do português para
comunicar-se com eles.
- Utilização de Material Complementar: desde a terceira semana, introduz, em
caráter incipiente, a leitura de jornais de grande circulação no país. Visa despertar o
interesse dos jovens a partir de informações veiculadas por meio de anúncios, de artigos
sobre esportes e notícias sobre acontecimentos atuais, em âmbito nacional e
internacional, e novidades no campo das ciências, etc.
- Utilização de livro didático: Foi utilizado o Livro “Bem-Vindo!” (Maria H. O.
de Ponce, et. al).
Nesses mesmos meios instrucionais, e a partir das próprias informações
solicitadas aos alunos, colhe-se material linguístico compatível com o grau de
desenvolvimento do grupo para estudo de vocabulário e de estruturas linguísticas,
conforme plano de curso previamente estipulado.
A docente foi estimulada, pela Coordenação de Português da Instituição, a tecer
uma avaliação subjetiva sobre o grupo de alunos estrangeiros recebidos em 2013. Em
seu relatório, ressalta as seguintes observações:
- características pessoais e comportamentais dos alunos: os alunos, de modo
geral, demonstram boa educação, disciplina, responsabilidade e disposição para o
630

aprendizado. Embora abertos a todos os ensinamentos, na maioria dos casos, são


pessoas reservadas e observadoras. Observaram-se faltas referentes ao comportamento
militar de alguns alunos, pois eram mais indisciplinados e, em alguns momentos,
apresentavam comportamento desrespeitoso para com os demais colegas. Essas falhas
verificadas inicialmente começaram a ser corrigidas desde as primeiras aulas, de forma
que este trabalho de orientação empreendido pelos dois professores de língua
portuguesa vem resultando em visível entrosamento entre o grupo, com a manifestação
clara de mútuo respeito e colaboração durante as aulas e até em outros espaços da
escola, onde fazem atividade física, por exemplo.
- desenvolvimento de habilidades linguísticas: a docente pôde constatar que dois
alunos apresentaram inicialmente grande dificuldade de apreensão dos mecanismos da
língua, mas destacou que o processo de superação é geralmente evidenciado no curso do
segundo para o terceiro mês, quando os alunos já entendem a maior parte do que lhes é
dito na modalidade formal do idioma e conseguem expressar-se ainda de forma
claudicante. Esta dificuldade pode ser explicada pelo fato de estes jovens terem, como
segunda língua de seu país, a língua inglesa.
A professora reitera que, em decorrência de sua avaliação diária das
competências linguísticas até agora adquiridas pelos alunos, estes ainda não podem ser
considerados aptos para uma desejável compreensão do português e uma boa expressão
oral e escrita no âmbito acadêmico. Além do reduzido vocabulário ativo, mesmo o
trivial, falta-lhes conhecimento estrutural do idioma que lhes permita galgar postos mais
avançados na aquisição desta língua.
Acrescenta-se ainda que, em decorrência da mencionada falta de conhecimento
das estruturas linguísticas por todos os oito alunos (com algumas claras e inevitáveis
diferenças individuais), bem como da cumplicidade que se está construindo entre eles,
considera-se importante que as aulas de português sejam ministradas para os oito,
conjuntamente. Em alguns momentos, dadas as referidas diferenças, as atividades
propostas poderão ser mais desenvolvidas com alguns deles, de acordo com os níveis
observados.
As dificuldades vivenciadas pela docente de matemática foram referentes ao
domínio da nossa língua e à cultura dos alunos. Em relação à língua, ela realçou que
eles não são naturais de países de língua portuguesa. Além do árabe e dos dialetos
africanos, as línguas pátrias dos alunos são o francês e o inglês, e muitos dos alunos não
possuíam nenhum domínio sobre nossa língua quando chegaram à EN. Ademais, para a
631

professora, por ser mulher, muitas vezes ela se depara com uma barreira cultural, já que,
como os alunos descrevem: "dificilmente os homens seriam ensinados por mulheres".
Quanto ao ensino de matemática, inicialmente, como explica a docente, buscou-
se obter informações sobre as diferenças entre a formação acadêmica brasileira e a dos
países de origem dos alunos estrangeiros. Em seguida, para compreender em que nível,
dentro do currículo brasileiro, poderia encaixar seus alunos estrangeiros, ela preparou
um bloco de exercícios com questões dos três anos do nosso ensino médio com vistas a
averiguar o conteúdo conhecido e, assim, poder preparar um programa para o
desenvolvimento da disciplina. Com os resultados, ela pôde verificar uma discrepância
no que tange à formação dos alunos, visto que uma parcela estava nivelada no que seria
o nosso ensino fundamental e outra já poderia acompanhar o conteúdo programático do
primeiro ano acadêmico da Escola Naval.

Análise dos questionários dos alunos estrangeiros - Estagiários


O questionário é uma elaboração do SOEP da Escola Naval. Ele é aplicado com
o intuito de traçar um breve e objetivo perfil social, psicológico e acadêmico dos alunos
estrangeiros. Tal perfil permite traçar estratégias de ação para facilitar a adaptação
destes alunos à rotina da Escola, assim como compreender melhor as diferenças
culturais dos alunos estrangeiros. O questionário foi aplicado pela primeira vez em 2009
e, desde então, vem sendo reformulado e aprimorado.
A versão de 2013, que contava com 36 perguntas objetivas, foi atualizada em
2014 para um questionário com cinco perguntas diretas. A atualização do questionário
foi necessária porque os jovens estagiários possuíam pouco domínio da língua
portuguesa, pois em sua grande maioria tinham como a língua oficial dos seus países o
inglês ou o francês. Fora os alunos lusófonos, de Angola e Cabo Verde, apenas três já
haviam tido contato com a nossa língua em seus países de origem, mas não foi
verificada a frequência de tempo nem o domínio do conteúdo.
A maioria não soube identificar, dentre as opções oferecidas, o grau de
escolaridade dos pais, nem a renda familiar. De acordo com a professora que aplicou o
questionário, essa parece ser uma característica cultural. Outra possibilidade pode ser a
dificuldade de fazer o câmbio monetário e equiparar o grau de ensino do seu país de
origem ao nosso.
632

A maioria dos estrangeiros mora em cidade de médio porte ou a capital de seu


país, em residência própria com cinco cômodos ou mais, e a família possui um
automóvel ou mais.
Todos os alunos estrangeiros estudavam antes de ingressar na EN e passaram
por algum tipo de processo seletivo em seus países. A maioria cursou o ensino
fundamental em escola particular. Já no ensino médio, em sua maioria estudou em
escola pública. De acordo com os participantes, não há histórico escolar de reprovação
ou dependência e a maioria foi alfabetizada com seis anos ou menos.
Ponto interessante foi que a maioria concluiu há dois ou três anos em seus países
o que equivaleria ao nosso ensino médio, fato que poderá acarretar uma necessidade
maior de relembrar conteúdos, em especial aqueles que estão previstos no programa do
nosso ensino médio. Tal necessidade ocorre em virtude não só do tempo de término dos
seus estudos e das diferenças de conteúdos programáticos, mas, principalmente, da
preparação para o ensino superior no Brasil, mais especificamente na EN, instituição
que tem, em seu "DNA acadêmico", um caminhar pelas ciências exatas, com forte
conteúdo das disciplinas de cálculo e física.
Uma expectativa comum para o curso na EN em relação à aprendizagem é
aprender coisas importantes para a vida militar. Os estrangeiros esperam estabelecer um
bom relacionamento com os oficiais e colegas. No que diz respeito ao relacionamento
com os demais Aspirantes, é esperado também que se criem laços de amizade e de
colaboração.
Foi perguntado aos Estagiários em quais disciplinas acadêmicas esperavam ter
maior e menor dificuldade. Para esta pergunta, não foram apresentadas opções de
resposta. Podemos verificar que a disciplina de português causa uma maior apreensão
aos alunos estrangeiros, pois todos os integrantes da turma de Nivelamento de 2013 não
têm como idioma oficial de seus países o português. Os libaneses e o senegalês falam o
francês, já os namibianos e o nigeriano têm o inglês como língua oficial. Na turma de
2014, temos quatro lusófonos, dois de Cabo Verde e outros dois de Angola.
Em relação às disciplinas que os alunos julgam que terão menos dificuldade, foi
interessante a constatação de que a Física comparece em primeiro lugar perto de
Cálculo, o que pode ser afiançado pelos libaneses, que já estavam cursando a Escola
Naval de seu país, com cerca de um ano e meio de ensino superior.
A maior preocupação sentida pelos alunos estrangeiros foi com o início do curso
e a necessidade de dominar a língua portuguesa, um pré-requisito para serem
633

matriculados na turma de 1º ano da EN. A percepção inicial dos Estagiários a respeito


dos Aspirantes: “são muito dedicados e têm muito medo de repetir”, e são respeitados, o
que, consideram ser “muito importante”. Um reflexo de suas próprias expectativas.

Considerações finais
O Estágio de Qualificação se torna importante quando os imigrantes temporários
chegam para um curso acadêmico sem a base do idioma numa qualidade desejada, o que
poderá prejudicar sobremaneira o seu desempenho como aluno, inclusive acarretando
desmotivação e até cancelamento ou trancamento dos seus estudos.
O ensino de língua portuguesa é fundamental no ano de nivelamento, em
especial quando ele é tecnicamente direcionado para facilitar a apresentação de hábitos
culturais, nos quais estes jovens ficarão inseridos por mais de cinco anos.
Fundamentamos que a capacidade de expressão e compreensão da língua portuguesa é
instrumento de integração. A matemática é, provavelmente, a linguagem comum entre
os alunos estrangeiros, que diferem quanto a etnias e a conhecimentos linguísticos. Faz-
se, porém, necessário compreender, através de nivelamento, as diferenças curriculares
entre os países de origem de nossos alunos estrangeiros e o que é exigido como pré-
requisito para cursar a Escola Naval.
Antes de 2001, não havia o Estágio de Qualificação, que foi regulado
internamente na EN em 2010. Os alunos eram indicados por seus países, por intermédio
de concurso local, e eram matriculados imediatamente no primeiro ano. Foi a partir
dessa experiência que se verificou a necessidade de se pensar em uma forma de nivelar
as diferenças curriculares existentes. Não se pode ignorar que cada país tem suas
prioridades curriculares. A partir de 2014, também os alunos lusófonos passaram a
realizar o estágio, sendo o foco principal o nivelamento básico de matemática e física ao
nosso Ensino Médio.
A partir do relato das duas docentes, pode-se avaliar que existe uma relação
inicial sendo construída entre os alunos, independentemente de origem e cultura pré-
formada. Foi verificado que eles sentem e reconhecem a dificuldade da barreira do
idioma, quando ingressam no curso de graduação superior regular da EN.
Pontua-se que a equipe pedagógica da Instituição estuda a possibilidade de fazer
uso das regras de aceite do aluno estrangeiro como previsto no Programa de Estudantes-
Convênio de Graduação (PEC-G) do MEC, como a obrigatoriedade de apresentação de
certificação de proficiência em português, o que seria atestado pela aplicação do teste
634

CELPE-Bras. Esta prática, se adotada, resultaria na diminuição do tempo de


nivelamento, fazendo com que o aluno fosse matriculado antes do prazo de um ano no
ensino regular da EN, diminuindo, assim, o seu tempo de permanência no Brasil como
imigrante temporário.
O Estágio em si é uma forma de bem receber os alunos estrangeiros, integrando-
os e os adaptando à cultura naval brasileira. É importante reconhecer e valorizar a
diversidade cultural e linguística destes alunos, respeitando a diferença, a identidade
étnica, o sistema de crenças e valores ao qual pertencem. Além de a presença do aluno
estrangeiro assegurar, no futuro, a prática de estreitamentos nas relações diplomáticas
entre os atuais Aspirantes brasileiros e estrangeiros, a riqueza da diversidade
evidenciada a partir da integração de alunos oriundos de outros países pode ser grande
oportunidade de capitalizar novas aprendizagens.

REFERÊNCIAS

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educação nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF,
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ingresso nas carreiras da Marinha. Diário Oficial [da] República Federativa do
Brasil. Brasília, DF, 9 ago. 2012. Disponível em:
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2010, que cria o Estágio de Qualificação para Adaptação Acadêmica de Alunos
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DESIDÉRIO, E. Migração e políticas de cooperação: fluxos entre Brasil e África. In: IV


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universidades portuguesas. Revista Pro-Posições, Campinas, SP, v. 20, n. 58, p. 45-63,
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2008.

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moçambicanos no Rio de Janeiro. 2005. 211f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) -
Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2005.

TAJFEL, H. Grupos humanos e categorias sociais. Lisboa: Livros Horizonte, 1982.


(v. I).
636

Relato de experiência

Teoria e Prática da Gestão Democrática na escola pública: conquistas e desafios da


EMEF Pres. Campos Salles (SP)

Isis S. Longo
EMEF Pres. Campos Salles/ USCS

Resumo: O relato sobre a EMEF Pres. Campos Salles aborda a trajetória de sua
constituição enquanto escola pública e popular, com práticas pedagógicas críticas,
mentalidade emancipadora e gestão escolar comprometida com a ação social. A
realidade da maioria das escolas públicas apresenta problemas recorrentes como:
precariedade dos prédios escolares, rotatividade de docentes e gestores, baixo IDEB,
alta taxa de evasão, falência da relação professor-aluno, etc. Neste cenário, há a
resistência de sujeitos históricos que atuam organicamente na adversidade e vivenciam
potencialidades em uma gestão democrática singular, que compartilha o exercício do
poder, no aprendizado político-pedagógico da auto-organização em espaços coletivos
(comissões mediadoras, república estudantil, conselho de escola, assembleias).
Palavras-chave: Escolas Públicas – Gestão Democrática – Intelectuais Orgânicos

O texto apresenta-se estruturado em três partes. Uma destinada à documentação


histórica da escola, da sua inauguração até o momento de “ruptura” com o modelo
tradicional, que compreende o período das décadas de 1950 a 1998. Momento centrado
no contexto da desestabilização do processo de reprodução do fracasso educacional e
empoderamento da comunidade, com a expectativa de uma nova concepção de gestão
escolar.
A segunda parte refere-se à adoção do modelo de ensino-aprendizagem
influenciado pela experiência da Escola da Ponte (Portugal), com destaque aos pilares
do Projeto Político Pedagógico: A escola como Centro de Liderança e Tudo Passa Pela
Educação; aos três princípios do projeto: Autonomia, Responsabilidade e
Solidariedade; e, especialmente aos dispositivos de aprendizagens catalisadores da
transformação das relações de poder (comissões mediadoras, assembleias dos
estudantes, República estudantil, conselho de escola). Esses dispositivos são objetos de
reflexão da terceira parte, para o entendimento de como os mesmos são vivenciados no
637

cotidiano escolar, por estudantes e profissionais da escola, especialmente quanto à


necessidade de mudança de mentalidade dos adultos para de fato promoverem espaços
para o protagonismo infanto-juvenil.
Por fim, apontamos algumas questões sobre os limites e possibilidades da
autonomia das escolas públicas no contexto atual, com destaque ao imperativo da
compreensão dos profissionais da educação pública como intelectuais orgânicos da
classe trabalhadora comprometidos com as transformações das desigualdades sociais.
Entender como a opção política de uma escola pública e popular inserida na
comunidade, passa pela desconstrução ideológica da neutralidade da escola pública, e
implica à corresponsabilidade de atores e instituições sociais no processo de uma
educação emancipadora e intergeracional.

Uma breve linha do tempo da EMEF Pres. Campos Salles


Sobre a história da EMEF Pres. Campos Salles, seu surgimento é anterior ao
início do processo de favelização de Heliópolis ocorrido nos anos de 1970. Em 1957,
ano de inauguração da escola, o atendimento estava restrito às séries iniciais do ensino
fundamental e os alunos eram moradores do Jardim Patente e de São João Clímaco.
Muitos familiares eram trabalhadores das chácaras e olarias que existiam na região
(NOGUEIRA; MAZON, 2005).
Com a crescente urbanização de São Paulo nos anos de 1970, a procura por
moradia se intensifica e a existência de grandes áreas em Heliópolis culmina na
ocupação desordenada da região:
Em 1971/72 teve início a construção de um alojamento provisório para
moradores da favela da região vizinha de Vila Prudente que haviam sido
desalojados devido ao projeto de construção de viadutos, pelo então Prefeito
Paulo Maluf. Aos poucos, outras famílias foram chegando e levantando mais
barracos ao lado do alojamento o que resultou no crescimento rápido da
favela e nos problemas advindos desse processo (Idem, p.9-10)

Com o aumento da população e a falta de escolas em Heliópolis, a EMEF


Campos Salles era a única opção para o atendimento desta demanda. Por serem
moradores da comunidade/favela, os alunos e a escola passam a ser estigmatizados, ou
seja, a escola passa a ser reconhecida socialmente como de baixa qualidade pela
demanda que atendia. Desta forma, a decadência institucional agrava-se com o passar
dos anos (1970 a 1995), com o recebimento de “alunos-problemas” de outras unidades
escolares e rodízio de funcionários, sendo uma prática recorrente das famílias a
matrícula de seus filhos na 1ª série, com a intenção do pedido de transferência, assim
638

que encontrassem vagas em outras escolas, mesmo que mais distantes. Pelos relatos de
docentes da época, evidencia-se que: “Era muito difícil formar uma 8ª série. Eles
tinham vergonha de tirar o diploma aqui” (Idem, p.13).
Com a chegada de uma nova direção, em 1995, por concurso público, a
configuração das práticas socioculturais da escola começa a ser alterada, há uma
desestabilização do processo de reprodução do fracasso educacional e o caminhar para o
empoderamento da comunidade na gestão da escola.
Foram desenvolvidas ações com o intuito de identificar e convidar lideranças,
de cada segmento, para a construção de um projeto coletivo para integrar a
escola e a comunidade. Uma ação que muito contribuiu para o avanço da
construção do projeto foi um curso para pais e lideranças comunitárias,
denominado – Educação e Cidadania – que tinha como objetivo levar os
participantes a perceberem que não se faz educação de qualidade sem a
participação da comunidade na vida da escola. Neste curso a escola era
mostrada por dentro com todas as suas contradições. Discutiam-se as
seguintes questões: participação, linhas pedagógicas, verbas, direitos dos
professores, direitos da comunidade, direitos dos alunos, etc. (Idem, p.15)

Neste novo percurso para a construção de uma escola democrática, em 1998, o


Conselho de Escola da EMEF Campos Salles atuava de forma ativa e não burocrática,
aproximando escola e comunidade, o que contribuiu para o fortalecimento da auto-
estima e desconstrução do imaginário de uma escola problema: “o estigma que pesava
sobre a escola – “escola dos favelados, marginais e baderneiros” começou a ser
substituído pela denominação de “escola da comunidade”(idem, p.15)
Esta denominação (escola da comunidade) foi confirmada de fato em 1999,
quando fora assassinada uma aluna da escola. Em três meses de trabalho a
escola mobilizou a comunidade e realizou a Primeira Caminhada pela Paz de
Heliópolis. No final de 1999, foi realizada também a Primeira Mostra
Cultural. A partir daí, estas duas ações vêm sendo realizadas anualmente
(idem, p.16)

A mudança no perfil da equipe gestora, que anteriormente reproduzia a


sistemática do centralismo das decisões, da distribuição de tarefas entre os membros do
conselho de escola, e que estigmatizava os alunos das camadas populares por seu
fracasso escolar, teve papel preponderante para a concretização de um PPP- Projeto
Político Pedagógico na Dimensão Emancipadora. Este PPP agrega como pressupostos:
unicidade da teoria e da prática; ação consciente e organizada; participação ativa da
comunidade e reflexão coletiva; articulação da escola, família e comunidade (VEIGA,
2001).
As influências da Escola da Ponte e da EMEF Amorim Lima
Segundo as análises do pesquisador David Silva (2013), a elaboração do PPP da
EMEF Campos Salles, ao contemplar as premissas: “Tudo passa pela Educação”; e “
639

A escola como o centro de liderança”, insere a escola na sociedade, e desmistifica a


pseudo-neutralidade que a escola pública aparenta ter na lógica da (re)produção
capitalista, assumindo o posicionamento ideológico de desvelar as contradições
socioeconômicas, sem dissociar assuntos educacionais da realidade social. No entanto, a
aproximação da “relação escola-comunidade, a princípio, não foi suficiente para
garantir o avanço pedagógico, e a figura do aluno construída pelo adulto, como menor
a ser escolarizado, ainda continuava presente nas práticas desenvolvidas” (SILVA:
2013, p.52)
Ao avaliarmos a mudança de práticas e mentalidade como um processo
dialético, significa compreendermos os desafios constantes para que de fato os preceitos
legais de uma escola pública, laica, democrática, de qualidade e popular sejam
concretizados. Desta forma, a experiência pedagógica e social da EMEF Campos Salles,
a sua práxis está em permanente construção, portanto, o fato de modificar as relações de
poder entre equipe gestora e comunidade permitiu a reflexão conjunta da necessidade de
novas intervenções mais direcionadas ao processo de ensino-aprendizagem.
Nesse contexto, reforça-se a concepção de práxis, de prática refletida, de
atividades teórico-práticas que têm, de um lado, a ação que subsidia o
pensamento para a construção de novas ideias e formas diferenciadas de
intervenções na realidade educacional, e, de outro, a teoria representada por
um conjunto de ideias, sistematizado a partir da prática pedagógica (VEIGA:
2011, p.57)

Ao buscar alternativas para a práxis emancipadora, a EMEF Campos Salles é


introduzida a dispositivos pedagógicos da metodologia da Escola da Ponte (Portugal),
que estabelecem a primazia do aprendizado em grupo, com tomada de decisões
coletivas e relação horizontal de poder entre alunos e professores. Por suposto, houve a
resistência e ainda há dúvidas sobre esta metodologia, no entanto, a busca intensificou a
identidade dos atores como membros atuantes de uma escola que defende o seu projeto.
O fato da experiência da Ponte ser uma referência positiva sobre a possibilidade
de mudança da metodologia tradicional de ensino, não significa a transposição e
reprodução desse modelo, pois como revela Pacheco, a Ponte é uma experiência
singular, não deve ser copiada e sim servir de inspiração para que cada escola, em sua
especificidade, realize sua auto-organização, em contraposição às práticas educativas
dominantes. Esta auto-organização, na Escola da Ponte ocorreu pela formação
continuada nos círculos de estudo: “O círculo pode traduzir-se, neste contexto, como
um tipo emergente de auto-organização na formação, pela gestão do conflito que o
preserva de consensos e sínteses redutoras” (PACHECO: 2013, p.135).
640

Para a obtenção de mais subsídios teóricos e práticos, sobre a possibilidade de


implantação da metodologia da Escola da Ponte, em 2005, houve o intercâmbio
pedagógico entre membros da comunidade e equipe gestora da EMEF Campos Salles,
com a EMEF Amorim Lima (DRE-Butantã – região Oeste/SP), escola pública que em
sua trajetória, assumiu os princípios da Ponte como forma de garantir a diversificação
das aprendizagens. Essa troca de experiências gerou várias ações de esclarecimentos e
proposituras na comunidade e na EMEF Campos Salles, e culminou na aprovação pelo
Conselho de Escola da adoção dos princípios e metodologia referenciados na Escola da
Ponte (NOGUEIRA; MAZON, 2005).
As discussões entre os professores têm como referência os princípios da
autonomia, da responsabilidade e da solidariedade, e o mesmo já começa a se
transferir para os alunos. A estrutura, os currículos, os tempos e os espaços
escolares estão sendo repensados dentro de uma nova ótica que vê o aluno
como sujeito de sua aprendizagem e não como objeto a ser formatado com
aquilo que o adulto acha que é bom para ele (Idem, p.37)

Aprendizagem emancipadora e dispositivos pedagógicos


O Conselho de Escola ao assumir o referencial educacional da Escola da Ponte
teve a “ousadia crítica” de romper paradigmas físicos e simbólicos. A quebra física das
paredes das salas de aula configurou a escola em uma nova arquitetura, com os salões
de estudo para 100 alunos e a docência compartilhada por três docentes. Quanto aos
paradigmas simbólicos, há a ruptura do modelo hegemônico do que significa ser
professor, rompe-se com a educação escolar tradicional magistocêntrica, do ensino
bancário (FREIRE, 2001), com aulas expositivas e busca-se o protagonismo no
processo da aprendizagem.
A dialética do processo da mudança coloca-nos avanços e recuos constantes
nesta trajetória. Conforme esclarece Pacheco (2013), a formação do professor tem sua
matriz tradicional, ou seja, na universidade o modelo que o aluno/professor aprende é o
modo como irá ensinar, portanto, realizar outra pedagogia significa desconstruir
certezas, desaprender o tradicional, ter iniciativa, senso-crítico, solidariedade e
autonomia. “A mudança não é um objetivo: é um estado. Possui componentes
existenciais tão dinâmicos como imprevisíveis” (p.177).
Nessa década de história de construção do novo projeto político pedagógico da
EMEF Campos Salles, algumas iniciativas pedagógicas foram bem sucedidas e outras
não. Conforme apresentamos, o modelo hegemônico das aulas expositivas permanece
no imaginário social, portanto, é fato que o trabalho pedagógico de ensino-
aprendizagem nos salões de estudo, na sua fase de implantação, manteve o equívoco da
641

necessidade de haver momentos de explicação do professor especialista sobre o roteiro


referente à sua disciplina (prática superada, pois a autonomia, a responsabilidade e a
solidariedade do trabalho em grupo são o foco da aprendizagem). Indagaria José
Pacheco: “Poder-se-á aprender a praticar a pedagogia ativa ouvindo aulas
expositivas?”(idem, p.151).
Como organizar a mudança de todos os tempos e espaços pedagógicos é uma
tarefa indissociável da responsabilidade coletiva, os sujeitos históricos não podem
prescindir “do recurso teórico que assegure a coerência necessária à evolução de uma
inovação pedagógica” (Idem, p.150). Portanto, o compromisso tácito de agir-refletir -
agir, necessita de estudo, reflexão, filiação às concepções teóricas e identidade de visão
de mundo.
No caso das escolas municipais de São Paulo há os horários de formação
coletiva para os docentes que estão em jornada de 40 h/a (JEIF), estes espaços são
propícios para as reflexões do cotidiano escolar, no entanto, estão restritos aos
professores em JEIF. Mais uma vez, nos deparamos com as especificidades das
realidades, ou seja, na Escola da Ponte, por exemplo, os docentes têm a dedicação
exclusiva.
Essa limitação da EMEF Campos Salles dificulta a vivência e troca de
experiências entre os docentes, além de criar tensões e subgrupos de profissionais, pois
estar mais tempo na escola é ter mais informação, em contrapartida, pode significar
mais demanda de atividades, em relação aos demais docentes. Mais um desafio para
autonomia escolar: fixar junto ao Conselho Municipal de Educação de São Paulo,
Portaria que reconheça a especificidade da EMEF Campos Salles e autorize a dedicação
exclusiva dos professores; movimento que exigirá a unidade dos docentes e a ação
orgânica na comunidade, para pressionar o Executivo Municipal.
Para Pacheco (2013), a fusão entre o discurso crítico e a prática política é
essencial para a ruptura entre os processos de conceitualização e de execução, portanto,
os espaços para reflexão-ação propiciam ao grupo-sujeito reelaborar valores, crenças,
opiniões, afirmando a escola como lócus da microcultura local, o que contraria a
hegemonia dominante. Nesta lógica, de fortalecimento do sujeito-grupo, os dispositivos
pedagógicos democráticos das comissões mediadoras, assembleias dos salões, república
de estudantes, conselho de escola são os propulsores da aprendizagem político-
pedagógica.
642

Estes dispositivos pedagógicos potencializam o fortalecimento do protagonismo


infanto-juvenil, à medida que geram aprendizagens sobre: o direito à participação
política, o exercício de liderança individual e coletiva, e a apropriação crítica do espaço
público; no entanto, como as práticas e mentalidades do modelo tradicional de ensino
estão arraigadas na cultura escolar, é fato que, partilhar o poder da gestão da aula, no
nosso caso, da gestão da aprendizagem em grupos nos salões, não é tarefa fácil.
Pacheco (2013), nos seus escritos sobre as vivências na escola da Ponte, informa
que o projeto pedagógico sempre se deparou com a tensão entre a adesão e o abandono
por parte dos profissionais da educação. Ele remete a participação docente à simbiose.
Ou seja, na analogia com os conceitos da biologia, o interessante da relação de simbiose
é que o estar junto em uma relação duradoura, seria benéfico para todos. Porém, ainda,
com o artifício da comparação conceitual, a formação docente em uma lógica
capitalista, imprime marcas de competição, predação e parasitismo entre as pessoas.
No caso do projeto da EMEF Campos Salles, a vivência dos dispositivos
democráticos de aprendizagem e a docência compartilhada nos salões de estudo também
enfrentam os problemas mencionados por Pacheco, em vários momentos professores
sentem-se “sozinhos em grupo”. Portanto, construir um território de partilha de poder
entre adultos, crianças e adolescentes para definição de prioridades e necessidades para
o aperfeiçoamento coletivo depende essencialmente da “disposição para examinar com
sentido crítico e sistemático a própria atividade prática” (idem., 125).
Os dispositivos pedagógicos não são por si próprios elementos que garantem a
qualidade da participação e da educação, precisam de fato dialogar com o processo de
ensino-aprendizagem, como elementos decisivos para uma escola pública, popular, com
a participação efetiva de seus sujeitos históricos (FREIRE, 2001).

Considerações Finais
A trajetória da participação ativa dos intelectuais orgânicos da classe
trabalhadora (conselheiros(as) de escola, militantes dos movimentos sociais (UNAS),
estudantes, profissionais da educação) na gestão escolar e na implantação do projeto
político pedagógico da EMEF Campos Salles implica-nos à reflexão sobre elementos
significativos quanto às diferentes formas de atuação dos segmentos sociais organizados
na defesa da educação pública de qualidade, que imprimem maior ou menor grau de
fortalecimento ao protagonistmo infanto-juvenil.
643

Ao investigarmos as possibilidades e os limites dos dispositivos pedagógicos da


EMEF Campos Salles, mediante o conhecimento in loco de sua dinâmica interna,
estratégias, desafios e realizações, sinalizamos questões que poderiam melhor contribuir
para o fortalecimento institucional de uma nova cultura de participação e gestão
democrática das escolas públicas.
Para nós, os dispositivos pedagógicos democráticos das comissões mediadoras,
república estudantil, assembleias, conselho de escola, representam potencial inovação
para a aprendizagem emancipadora, centrada na apropriação de conhecimento teórico-
prático, mediante o trabalho colaborativo, senso-crítico e ação política.
No entanto, na atual conjuntura da EMEF Campos Salles, mesmo havendo
conquistas significativas como: melhoria da organização dos salões de estudo,
assembleias periódicas, docência compartilhada, roteiros de estudo com disciplinas
integradas, empoderamento e reconhecimento social da atuação das comissões
mediadoras; os desafios também são significativos. Principalmente quanto ao impacto
negativo da chegada de novos docentes alheios ao projeto da escola, que optam pela
escola pela localização e não por sua proposta pedagógica, que desconsideram a
caminhada coletiva, dando destaque somente aos problemas inerentes a todas as
escolas, como a indisciplina e baixo interesse de alguns estudantes para a realização de
seus estudos, desqualificando iniciativas de protagonismo infanto-juvenil, apostando na
impossibilidade da mudança.
É importante reafirmar que o exercício da democracia é algo recente na
sociedade brasileira, portanto, o aprendizado popular da democracia participativa no
interior de instituições com práticas autoritárias seculares, como as escolas, é um
processo histórico que implica mudanças de hábitos, usos e costumes das pessoas. Desta
forma, a simples existência do marco legal que garante a gestão democrática não é
suficiente para romper com a lógica conservadora do adultocentrismo e estabelecer
novas ações, promotoras da participação ativa do protagonismo infanto-juvenil no
cotidiano escolar.
Finalizo minhas reflexões com um subtítulo autobiográfico: “Por que escolhi a
EMEF Campos Salles”, para relembrar o quanto ansiava por vivenciar a experiência em
uma escola pública não tradicional.
Militante dos direitos humanos, há décadas, sonhando e lutando pela
universalização das políticas públicas, mesmo sabedora das limitações da fruição dos
direitos em instituições disciplinares com as escolas, a ideia de estar junto, fazer junto,
644

pensar junto, propostas curriculares e metodológicas ainda corresponde ao meu


compromisso com a educação libertadora.
Ao conhecer e vivenciar in loco a experiência educativa da EMEF Campos
Salles, em permanente construção, percebo que muitas dúvidas ainda me acompanham
nesse caminhar de realização do projeto da escola. Compartilho inquietações:
– Por que nossa escola, mesmo com seus dispositivos pedagógicos democráticos, não
tem uma república estudantil atuante? Por que nossa escola não realiza com seus
estudantes atividades para além dos muros da escola? Por que nossa escola que elabora
seu próprio material didático (roteiros de estudo) ainda não superou a fragmentação do
conhecimento pelas disciplinas escolares? Por que nossa escola insiste em ser
reprodutora do adultocentrismo com a centralização da definição dos conteúdos e da
avaliação?
Vejo como “inconsistências pedagógicas”: o fato de termos superado a separação
das classes individuais e mantermos a seriação; adotarmos a docência compartilhada,
porém termos professores atuando de maneira isolada; ainda discursamos sobre os
princípios da autonomia, responsabilidade e solidariedade, mas, pouco praticarmos!
Outras possibilidades de ações educativas, não escolarizantes, não
estigmatizadoras, não classificatórias, acontecerão mediante a compatibilização entre
discursos e práticas, nossa práxis implica coerência. “Faltará o elo entre informação
teórica e criação de novas práticas em função do que se sabe” (idem., 115). Portanto,
as questões seculares sobre: Qual o nosso papel social como de educadores(as)? Que
seres humanos estamos formando? Para qual sociedade? Podem indicar possíveis
respostas para as nossas contradições pedagógicas, pois posições ideológicas libertárias
e conservadoras marcam nossa práxis.
Pensar a construção de uma sociedade mais justa e igualitária com crianças,
adolescentes, jovens, adultos e idosos, dentro de um Estado Classista é perceber as
‘brechas’ da máquina estatal e demarcar posicionamentos contra-hegemônicos. Ser
educador social, conselheiro tutelar, conselheiro de direitos, professor(a) da rede
pública, militante de direitos humanos, é exercer a função de intelectual orgânico da
classe trabalhadora, é estar comprometido com a mudança social no sentido da
superação das desigualdades de classe, étnica, de gênero, de origem, etária.
Ser um agente da transformação faz-se necessário numa sociedade de classes, e
conforme esclarece Paulo Freire (2001), se educar é um ato político, portanto, em todos
os espaços coletivos a educação política faz-se presente e imprescindível, o que sem
645

dúvida é um dos nossos desafios na EMEF Campos Salles, para a realização de uma
educação de fato emancipadora.

Referências

BEISIEGEL, C.R. A qualidade do ensino na escola pública. Brasília: Liber, 2005.

BENEVIDES, M.V. Cidadania Ativa. São Paulo: Ática, 1991.

COUTINHO, C.N. Gramsci – Um estudo de seu pensamento político. Rio de Janeiro:


Civilização Brasileira, 1999.

DALLARI, D.A. O que é participação política? São Paulo: Brasiliense,1984.

FREIRE, P. Política e Educação. 6ª ed. – São Paulo: Cortez, 2001.

GRAMSCI, A. Cadernos do Cárcere – Os intelectuais, O Princípio Educativo.


Volume 2. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.

LIBÂNEO, J.C. Pedagogia e Pedagogos, Para quê? São Paulo: Cortez, 2002.

LONGO, I.S. Conselhos Tutelares e Escolas Públicas de São Paulo: o diálogo


preciso. FEUSP: Doutorado, 2008.

NOGUEIRA, B.R.; MAZON, R.U. Implementação de uma metodologia de ensino


com base nos princípios da Escola da Ponte. SP: Anhembi-Morumbi, TCC, 2005.

PACHECO, J. Escola da Ponte – Formação e Transformação da Educação. 5ªed.


Rio de Janeiro: Vozes, 2013.

PARO, V. Por dentro da Escola Pública. São Paulo: Xamã, 2000.

SILVA, D.C.F. A República de Alunos: Projeto Pedagógico em busca de uma


escola democrática. São Paulo: PUC/SP, Mestrado, 2013.

VEIGA, I.P.A.; FONSECA, M. (Orgs). As dimensões do Projeto Político-Pedagógico.


9ªed. Campinas, SP: Papirus, 2011.
646

Comunicação

O uso do blog como ferramenta de ensino e aprendizagem por professores


participantes do Programa Melhor Gestão, Melhor Ensino.

Jeanny Silva1
EFAP
Silene Kuin2
EFAP

Resumo: Este estudo tem como objetivo investigar como professores de Língua
Portuguesa, participantes de um curso do Programa Melhor Gestão, Melhor Ensino
(MGME) promovido pela Escola de Formação e Aperfeiçoamento de Professores –
EFAP da Secretária de Educação do Estado de São Paulo fizeram uso do blog com
auxílio do curso, bem como investigar o uso pedagógico do blog em sala de aula. A
metodologia adotada é de natureza quantitativa e qualitativa e os dados foram coletados
por meio de questionário estruturado disponível no ambiente virtual do curso. Após a
análise das respostas de 7.832 professores cursistas, constatamos que esses obtiveram
avanços no uso instrumental e pedagógico do blog, no entanto, há necessidade de mais
formação para que os professores possam se apropriar tanto tecnologicamente desta
ferramenta quanto do seu potencial pedagógico.
Palavras chave: blog, AVA, formação de professores.

Introdução
Estudos (GUTIERRES, 2005; VALENTE, 2003) sobre o uso de blogs na
educação revelam que essa ferramenta está se consolidando como ambiente de
construção colaborativa de conhecimentos e que suas potencialidades podem ampliar os
espaços e tempos de aprendizagem. Os blogs estão sendo explorados por alunos e
professores e a cada dia surgem formas diferentes de utilizá-lo. Segundo Gomes e Lopes

1
Mestre em Letras – Mackenzie –SP, gestora de projetos CEFOP (Centro de Formação Professores) da
Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores do Estado de São Paulo Paulo Renato Costa
Souza - EFAP.
2
Doutora em Currículo - PUC-SP, diretora do DETED (Departamento Educação e Tecnologia) da Escola
de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores do Estado de São Paulo Paulo Renato Costa Souza-
EFAP.
647

(2007, p. 121) podem ser utilizados como um recurso pedagógico ou como uma
estratégia pedagógica.
Para atender essas novas possibilidades, no entanto, o professor precisa possuir
domínio instrumental e pedagógico no uso das tecnologias digitais. Nos últimos tempos,
esforços vêm sendo realizados para atender essa necessidade por meio de várias
iniciativas de formação dos professores.
Neste estudo veremos como professores dos anos finais do Ensino Fundamental
se apropriaram e utilizaram o blog como ferramenta de ensino-aprendizagem com
auxílio do curso “Formação de Professores de Língua Portuguesa” da ação formativa
“Melhor Gestão, Melhor Ensino” promovido pela Escola de Formação de Professores –
EFAP da Secretária de Educação do Estado de São Paulo. O estudo está estruturado da
seguinte forma: primeiramente, apresentamos um panorama geral sobre a ação “Melhor
Gestão Melhor Ensino”, seguido de uma discussão sobre o uso de blogs na educação;
apresentação da metodologia adotada para coleta e geração de dados, os resultados
provindos da análise de dados e, por último, as considerações finais.

O Programa Melhor Gestão Melhor Ensino


A ação formativa “Melhor Gestão, Melhor Ensino - MGME3”, teve origem após
análise dos indicadores apresentados no Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar
do Estado de São Paulo – SARESP4 e do Índice de Desenvolvimento da Educação do
Estado de São Paulo – IDESP da disciplina de Língua Portuguesa. Os resultados desses
índices evidenciaram fragilidades, principalmente no que se refere ao distanciamento
entre as médias aferidas e a expectativa da proficiência de nível adequado. Por essa
razão, fez-se necessária a promoção de ações de intervenção nos processos de ensino e
aprendizagem, objetivando fortalecer a ação docente, articulando os conteúdos das
diferentes áreas, visando ao aprimoramento das competências leitora e escritora dos
alunos dos anos finais do Ensino Fundamental.
Dentre as ações oferecidas em 2013, destacamos nesta pesquisa o Curso 2
“Formação de Professores de Língua Portuguesa”, destinado aos professores dos anos
3
A concepção do MGME contou com o trabalho articulado e colaborativo das equipes gestoras de duas
coordenadorias da Secretaria Estadual de Educação de São Paulo a Escola de Formação de Professores do
Estado -EFAP e a Coordenadoria de Gestão da Educação Básica - CGEB em conjunto com a Fundação
Padre Anchieta e outros parceiros.
4
Fonte: SARESP 2012. Resultados gerais da Rede Estadual. Disponível em:
<http://saresp.fde.sp.gov.br/2012/Pdf/Resultados/
2%20-%20Saresp2012_Resultados%20Gerais%20da%20Rede%20Estadual.pdf>. Acesso em: 20 mar.
2014.
648

finais do Ensino Fundamental. Matricularam-se nesse curso 18.516 professores da Rede


Pública do Estado de São Paulo.
O formato educacional do curso apresentou uma dinâmica que associava
formação presencial e a distância. A concepção de um curso semipresencial levou em
consideração a ideia de manter um formato que mobilizasse e envolvesse o corpo
docente em ações imersivas com momentos de interação e troca entre os pares.
O formato do curso na modalidade semipresencial decorreu, também, da
demanda da rede por cursos de formação continuada – com momentos
presenciais e a distância – em prosseguimento aos processos de formação que
já eram oferecidos nos últimos anos, sem perder de vista a construção
coletiva de uma proposta da escola para o interior da escola, articulando e
aproximando as ações dos gestores escolares (diretor, vice-diretor e professor
coordenador) e os professores. (KUIN, et al. (orgs.), 2014, p.66)

Assim, o curso 2 teve em sua estrutura 32 horas de encontros presenciais e 28


horas de formação a distância no ambiente virtual de aprendizagem (AVA) da Escola de
Formação de Professores (EFAP), perfazendo uma carga horária total de 60 horas. Os
conteúdos do curso no AVA (parte a distância) foram divididos em três módulos e
abrangeram os seguintes aspectos: abordagem de práticas de leitura e escrita comuns na
internet; leitura e escrita em blogs; construção de uma situação de aprendizagem
fazendo uso de recursos digitais etc.
O curso Língua Portuguesa debateu e colocou em prática a construção
colaborativa em situações de leitura e produção de textos, e, o principal foco de
discussão na etapa on-line foi: “Como trabalhar com os gêneros que circulam na
internet?”. Para essa questão, optou-se por trabalhar ao longo do curso o gênero blog.
Assim, os cursistas foram orientados para a construção de um blog coletivo. A atividade
teve a seguinte dinâmica: os cursistas estavam agrupados no AVA em grupos de até 40
participantes, para realização do blog os cursistas foram reagrupados em grupos
menores de até 6 participantes.
649

Figura 1 - tela do curso e divisão dos grupos no AVA.


Toda a discussão e interação entre os cursistas ocorreram nos fóruns de grupo
dentro do AVA e contou com a orientação e mediação dos tutores. Essa atividade de
construção de blog coletivo aliou tanto aspectos teóricos como: a apresentação de
características do blog, interação entre os participantes no fórum dos grupos, produção,
colaboração e autoria, bem como possibilidades para o uso pedagógico do blog, quanto
aspectos práticos como o acesso ao site Blogger e a criação de um blog pedagógico
pelos professores participantes do curso. Assim, a problematização da criação de um
blog percorreu toda essa trajetória. O foco foi o processo, e não o produto final.
A proposta de elaboração do blog também teve por objetivo incentivar os
professores a perceberem o potencial de uso do blog em sala de aula. O curso, portanto,
priorizou a reflexão da prática, e essa guinada de expectativas revelou-se acertada. O
blog, de construção relativamente simples, gerou uma série de discussões sobre como
trabalhar a reinserção de ferramentas tecnológicas na prática pedagógica.

O Blog e suas potencialidades na formação de professores.


Weblog5 ou, simplesmente, blog, como é popularmente conhecido, é um tipo de
publicação on-line relativamente recente. Surgidos no final dos anos 90, como um
diário virtual que permitia um compartilhamento de pensamentos, relatos e reflexões
pessoais. O blog se popularizou quando foram criados, em 1999, os primeiros
aplicativos e serviços de weblog, como o Blogger, do Google, por exemplo. Foram estes
sistemas gratuitos e de baixo custo que facilitaram a disseminação da prática do weblog,

5
Palavra composta por web, que significa página na internet, e log, que significa diário de bordo.
650

e permitiram que qualquer pessoa pudesse ser um blogueiro, como é conhecido o autor
de um blog (GUTIERREZ, 2005).
Nos últimos anos o blog tem ocupado um lugar de destaque no contexto
educacional, esse fato pode ser comprovado pelos diversos tipos de blogs com fins
pedagógicos. Barbosa e Granado (2004, p.69) afirmam que no campo educacional o
blog é “utilizado como ferramenta de comunicação e de troca de experiências com
excelentes resultados”. Silva e Albuquerque (2009) realizaram uma pesquisa sobre os
tipos de blogs educacionais e concluíram que é possível agrupá-los em cinco categorias:
blog de professores, blogs de alunos, blogs de instituições educativas, blogs de projetos
educativos e blogs de grupos de pesquisa.
Há inúmeras possibilidades de utilização do blog em contexto educacional,
dentre elas Silva e Albuquerque (2009, p. 97) consideram as possibilidades de interação
por meio da escrita coletiva e mencionam: “[...] com o blog estaríamos diante da
possibilidade de escrita de um hipertexto cooperativo, da construção de uma mensagem
não-linear e hipermídia, composta por símbolos gráficos diversos.” A utilização desta
ferramenta em sala de aula também possibilita ao professor inserir-se de forma ativa na
Web, implementando ou iniciando sua cultura de uso de recursos disponíveis da Rede.
Contudo, apesar de todas essas potencialidades, ainda há poucos estudos sobre o
uso do blog na sala de aula, sobretudo no que se refere à utilização que os professores
fazem desta ferramenta para fins pedagógicos. O presente estudo investigou de que
forma os professores participantes do Curso Melhor Gestão Melhor Ensino se
apropriaram do blog, como recurso e estratégia pedagógica. No próximo tópico
detalhamos a metodologia utilizada no estudo.

COLETA DOS DADOS


O Monitoramento e a Avaliação do Programa MGME ocorreu em conjunto com
a execução de todas as etapas dos cursos e suas informações serviram para tomadas de
decisões ao longo do processo. Os gestores do Programa (EFAP e CGEB) participaram
desde o início da avaliação na formulação e validação da matriz avaliativa e na
definição de seus indicadores. As questões elaboradas na matriz de avaliação foram
concebidas para atender às funções gerencial e formativa do curso. A proposta era
compreender o perfil dos participantes, analisar a satisfação dos cursistas, sua adesão e
engajamento, e as possibilidades de mudanças de práticas e de concepções.
651

Assim, os professores cursistas puderam, durante o período de realização do


curso, 20 de maio a 17 de junho de 2013, participar da pesquisa respondendo a um
questionário estruturado que estava disponível no próprio ambiente virtual do curso –
no AVA da EFAP. Ao final, 7.832 professores de língua portuguesa responderam a esse
questionário.
Para nossa pesquisa escolhemos delimitar os dados gerais coletados da ação.
Analisamos apenas os resultados obtidos no Curso 2 de Língua Portuguesa do Programa
MGME. Nosso foco foi investigar os avanços e dificuldades dos professores na
apropriação e uso pedagógico do blog em suas práticas pedagógicas. Com essa
perspectiva em mente, escolhemos três questões que nos permitiria uma melhor análise
da compreensão que os professores têm do uso pedagógico do blog. São elas: 1. Entre
as atividades propostas no curso, qual você considerou mais relevante para seu processo
de aprendizagem? 2. Para você, qual das atividades do curso apresentou maior
dificuldade de realização? E 3. Que medidas você tomou para superar essa dificuldade?
As duas primeiras questões solicitavam ao cursista que escolhesse apenas uma
alternativa em cada questão. Assim, para análise das respostas utilizamos a metodologia
de pesquisa quantitativa que permite a quantificação do objeto de estudo. Conforme
Richardson (1989), este método caracteriza-se pelo emprego da quantificação, tanto nas
modalidades de coleta de informações, quanto no tratamento dessas, por meio de
técnicas estatísticas, desde as mais simples até as mais complexas.
A terceira questão permitia ao cursista expressar livremente seu ponto de vista
sobre a temática levantada. Assim, com base nas afirmações presentes nos
questionários, analisamos suas colocações tentando depreender dessa observação as
reflexões realizadas pelos professores ao longo do curso, e de que maneira essa
formação impactou em sua prática. Dessa forma, optamos por utilizar na análise da
questão 3 o método qualitativo, pois, conforme consideram Ludke e André (1986), a
pesquisa qualitativa tem um caráter exploratório, uma vez que estimula o entrevistado a
pensar e a se expressar livremente sobre o assunto em questão. Na pesquisa qualitativa,
os dados são retratados por meio de relatórios, levando-se em conta aspectos tidos como
relevantes, como as opiniões e comentários do público entrevistado. No próximo item
detalhamos os resultados que emergiram da análise.
652

Detalhamento dos resultados da pesquisa.


• Análise quantitativa
Para questão “Entre as atividades propostas no curso, qual você considerou mais
relevante para seu processo de aprendizagem?” Os 7.832 cursistas que responderam ao
questionário no AVA deveriam escolher uma das seguintes alternativas: fórum, blog,
questão dissertativa, questão objetiva. Essas alternativas estavam relacionadas às
atividades avaliativas realizadas durante o curso. Assim, quantitativamente tivemos o
resultado demonstrado no gráfico 1:

Blog Fórum Questão Discursisva Questão Objetiva


8%(1.431)
32%(2.500)

18%(620)

42%(3.281)

Gráfico 1 – Análise da Questão: Entre as atividades propostas no curso, qual você considerou mais relevante
para seu processo de aprendizagem?

Observamos no gráfico que a maioria dos participantes encontraram no fórum e


no blog, atividades de relevância significativa que contribuiu para sua aprendizagem.
Nos três fóruns do curso os tutores procuraram acompanhar, progressivamente, a
trajetória de aprendizado comum da comunidade constituída pelos professores
participantes.
Na interação promovida no fórum deste curso, cada participante submetia suas
colaborações à crítica coletiva, podendo, a partir da intervenção comunitária, agregar
novos aspectos ao seu conhecimento sobre o assunto em questão. Acreditamos que essa
perspectiva interativa do fórum tenha contribuído para escolha dos cursistas. Essa
interação auxilia na valorização do entendimento dos significados, em benefício do
aprofundamento crítico e em detrimento da superficialidade. À intervenção individual,
quando da postagem de um texto para discussão, soma-se uma aprendizagem
socializada, proporcionada por respostas de outros participantes e por consequentes
discussões. Okada;Santos (2004, p. 10) consideram que no fórum “a inteligência
coletiva é alimentada pela conexão da própria comunidade na colaboração todos-todos
653

[...] cada sujeito na sua diferença pode expressar e produzir saberes, contribuindo e
construindo a comunicação e o conhecimento coletivamente”.
A segunda questão analisada “Para você, qual das atividades do curso
apresentou maior dificuldade de realização?” Da mesma forma, os mesmos cursistas
deveriam escolher uma das seguintes alternativas: fórum, blog, questão dissertativa,
questão objetiva.

Blog Fórum Questão Discursisva Questão Objetiva

3%(221) 8%(596)
7%(570)

82%(6.445)

Gráfico 2 – Análise da Questão: Para você, qual das atividades do curso apresentou maior dificuldade de
realização?

Para compreender porque houve um percentual tão grande de cursistas que


consideraram a atividade blog como sendo a mais complexa do curso é necessário
cruzar esses dados com as justificativas fornecidas pelos mesmos cursistas à questão
“Que medidas você tomou para superar essa dificuldade?” Que será analisada a seguir.

Análise Qualitativa
O cruzamento dos dados coletados quantitativa e qualitativamente não são
divergentes, pois, conforme considera Santos (2001) os métodos quantitativos e
qualitativos, na verdade, se complementam, e a escolha de uma ou outra abordagem está
associada diretamente aos objetivos e finalidades de cada pesquisa. Fazendo uso do
caráter exploratório da pesquisa qualitativa, nossa análise buscou investigar e tentar
compreender o porquê tantos professores (82%) manifestaram ter dificuldades na
realização da atividade blog dentro do curso.
As respostas dos cursitas à questão “Que medidas você tomou para superar essa
dificuldade?” evidenciaram certo padrão e foram agrupadas em categorias. Sobretudo, é
interessante observar que um ponto em comum em todas as respostas é que, apesar das
654

dificuldades com a utilização das tecnologias, dificuldades em navegar na internet e


principalmente elaborar e alimentar um blog, quase todos reconhecem a importância e a
necessidade de suplantar os obstáculos que se apresentavam no curso e se apropriaram e
utilizaram o blog como ferramenta de ensino-aprendizagem.
Assim, para pergunta “Que medidas você tomou para superar essa dificuldade?”
percebemos que uma quantidade muito grande de professores cursistas respondeu que
para conseguirem realizar a atividade de elaboração do blog coletivo buscaram ajuda
dos demais colegas dentro do fórum de grupo no AVA. Evidenciando um padrão de
respostas “Interação com os demais participantes do curso no fórum”. A seguir algumas
dessas respostas:
“Felizmente era uma atividade em grupo e o que ajudou bastante foi a interação dos outros
participantes, meu representante de grupo tinha facilidade para tal tarefa”.
“Tentei várias vezes criar o blog, segui as instruções, porém tive dificuldade com as
ferramentas e, finalmente pedi auxílio para minhas companheiras de grupo que foram muito
solícitas”.
“Conversei com os demais cursistas, li bastante e pedi ajuda para o meu tutor. Primeiramente,
estive aberta a mudanças em prática pedagógica. Depois iniciei o processo de aprendizagem
com a ajuda da tutora, comentários dos fóruns e leitura de textos disponíveis na Internet para
construção do blog”.
“Pedi através do fórum que algum integrante do grupo me ajudasse a criar o blog e teve um
anjo que fez isso”.

Por meio desses comentários percebemos que um fator decisivo para que os
professores cusistas pudessem construir o blog coletivo foi a interação com os demais
colegas no AVA. De fato, os ambientes virtuais de aprendizagem priorizam a interação
social, a aprendizagem colaborativa e o trabalho cooperativo. Conforme Lévy (1996, p.
96) “por intermédio de ambientes virtuais, podemos não só trocar informações, mas
verdadeiramente pensar juntos, pôr em comum nossas memórias e projetos para
produzir um cérebro cooperativo”. O autor também considera que, nesta perspectiva, a
própria comunidade se legitima, por constituir-se a partir de afinidades de interesses, de
conhecimentos, de projetos mútuos e valores de troca, estabelecida no processo de
cooperação.
A interação ocorreu também fora do ambiente virtual. Percebemos nos
depoimentos coletados que muitos buscaram ajuda de alunos, parentes, etc. Conforme
os depoimentos abaixo:
655

“Procurei pessoas que também participam do curso e pedi ajuda. Mas confesso que ainda
tenho dificuldades a superar”.
“Para superar essa dificuldade tive buscar orientações com colegas que conheciam a respeito
do assunto. Tive, também, que pesquisar, junto ao google, e nas tentativas de erros e acertos
consegui postar minha situação de aprendizagem e foto”.
“Procurei ajuda aos mais jovens, pois, quando se trata de tecnologia, eles são bem mais
alfabetizados que nós”.
“Fiz algumas pesquisas, conversei com vários alunos que possuem blog e obtive algumas dicas,
porém minha dificuldade foi muito grande”.
“Fui solicitando ajuda de várias pessoas, até meu filho de 9 anos me ajudou”.

Podemos inferir dados interessantes desses depoimentos. O fato de muitos


professores cursistas buscarem ajuda fora do AVA pode demonstrar que para esses as
dificuldades de utilização das ferramentas tecnológicas é ainda maior, pois,
provavelmente precisaram contar com a ajuda presencial para acessar o site de criação
do blog. É o caso desse depoimento da cursista: “Pedi ajuda aos colegas cursistas, fui à
DE da minha cidade pedir ajuda. O Blog é uma ferramenta nova para mim. Com
certeza, preciso me aprimorar mais ainda sobre o assunto para poder construir
atividades com meus alunos”.
Outro dado interessante nas colocações dos professores é que muitos
reconhecem que os alunos dominam mais as tecnologias digitais que eles próprios.
Além disso, compreendem a importância de buscar maneiras de conhecer essas
tecnologias digitais e de como elas podem auxiliar no processo de aprendizagem dos
alunos e também em sua própria capacitação para a vida social. Xavier (s/a p. 8)
considera que “[...] hoje em dia a aquisição do letramento digital se apresenta como
uma necessidade educacional e de sobrevivência”.
Também é interessante observar a opinião geral dos cursitas em relação à
realização do Blog:
“Apesar de encontrar maior dificuldade em relação à construção do blog, foi essa atividade
que me fez desafiar minhas limitações, pois a coloquei em prática com meus alunos através da
criação de um blog literário”.
“Pesquisei bastante e segui as orientações da tutora. Gostei muito de criar um blog, afinal eu
nunca tinha feito isso e deu certo. Quero fazer um com meus alunos”.
656

“Para mim, por ser uma atividade nova, diferente, não sabia como proceder, mas fui procurar
orientação e estudar, consegui montar o blog, adorei a experiência e montei um blog particular
para compartilhar atividades com meus alunos e amigos”.

Essas declarações dos professores cursistas atestam que a atividade de


construção de um blog colaborativo favoreceu a aprendizagem, enriqueceu as
discussões no grupo, e do ponto de vista da colaboração, o ambiente virtual permitiu
que a aprendizagem ocorresse a partir do momento que os professores participaram
ativamente do processo, como parceiros entre si. Além disso, aliado a estes fatores,
percebemos que a receptividade dos professores em querer realizar essa atividade e em
buscar medidas para superarem suas dificuldades evidencia que reconhecem o potencial
pedagógico do blog.

Considerações Finais
O efetivo emprego do blog como recurso de ensino e aprendizagem no âmbito
escolar depende de alguns fatores que foram identificados durante esta investigação.
Primeiramente, constatamos que, no universo pesquisado, 7.832 professores de língua
portuguesa, 82% declararam ter dificuldades na realização da atividade de construção de
um blog coletivo. É possível inferir que para o blog ser utilizado adequadamente pelos
professores é necessário que conheçam suas potencialidades educativas e vivenciem
momentos de apropriação tecnológica.
Em relação ao trabalho coletivo, ainda foi possível observar que, ao mesmo
tempo em que exige um empenho grande no ambiente virtual, talvez mais que no
presencial, também representa a alternativa para resolver questões conflituosas em
relação à tecnologia. Negociar os encaminhamentos para o desenvolvimento do trabalho
coletivo ainda é um desafio, ao mesmo tempo em que representa um avanço na
superação da falta de familiaridade dos cursistas em relação à tecnologia digital de
informação e comunicação.
Por meio dos relatos ficou claro que para muitos professores faltam habilidades
e conhecimento no manuseio do computador, o que acaba se tornando um dos
obstáculos para utilização do blog e outras ferramentas tecnológicas. Percebemos
também, que vários professores conhecem o que é um blog, mas que muitos ainda
desconhecem as possibilidades de seu uso como estratégia pedagógica. Além da falta de
657

conhecimento acerca das potencialidades pedagógicas, percebemos a ausência de


conhecimentos técnicos para utilizar a ferramenta.
É fato, que as demandas da sociedade atual exigem que os docentes possuam
habilidades tecnológicas, no entanto, para que eles possam se apropriar e se habituar a
essas tecnologias no cotidiano escolar, os mesmos precisam de formação. Valente
(2003) ressalta que a formação de professores para o uso da informática não deve ser
apenas pontual, como um treinamento básico para aquisição de conhecimentos técnicos,
mas sim formação continuada para que se alcance seu verdadeiro potencial pedagógico.
Daí, constatamos a importância de projetos como o MGME, pois, após a análise dos
dados coletados nesta pesquisa observamos que muitos professores participantes do
curso obtiveram avanços no uso instrumental e pedagógico do blog. Esses avanços estão
relacionados à formação dos professores, interação e troca de experiências entre os
participantes no ambiente virtual de aprendizagem (AVA) e no apoio pedagógico
especializado no curso.
Estudos futuros devem verificar se os professores continuam a utilizar essa
tecnologia e de que maneira. Verificar também, se novos avanços foram obtidos com a
continuidade da formação.

Referências

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GOMES, M. J.; LOPES, A. M. Blogues escolares: quando, como e porquê? Setúbal:


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https://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/6487/1/gomes2007.pdf Acesso em:
16 de julho de 2014.

GUTIERREZ, S. Weblogs e educação: contribuição para a construção de uma


teoria. Revista Novas Tecnologias na Educação - Renote Porto Alegre: CINTED-
UFRGS, v. 3 nº 1, Maio, 2005. Disponível em
http://www.virtual.ufc.br/cursouca/modulo_web2/parada01_cid2/para_saber_mais/gutie
rrezteoriaweblogs.pdf Acesso em 16/07/2014.

KUIN, S. et al. (orgs.). Seminário Centralizado Melhor Gestão, Melhor Ensino. São
Paulo: Fundação Padre Anchieta, 2014.

LEVY, P. O que é o virtual. São Paulo, SP: Editora 34, 1996.


658

LUDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas.


São Paulo: EPU, 1986.

Okada, A. L. P.; Santos, E. O. Comunicação Educativa no Ciberespaço: utilizando


interfaces gratuitas. Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v. 4, n.13, p. 161-174,
set./dez. 2004. Disponível em
http://people.kmi.open.ac.uk/ale/journals/r02dialogo2004.pdf
Acesso em 20/07/2014

RICHARDSON, R. J. Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1989.

SILVA, L.T.;ALBUQUERQUE, M. Blogs pedagógicos: possibilidades de interação p


or meio da escrita coletiva de hipertextos cooperativos. Revista Latinoamericana de
Tecnologia Educativa – RELATEC, n. 8, 2009. Disponível
em http://campusvirtual.unex.es/revistas/index.php/relatec/article/view/493/429 Acesso
em 16/07/2014.

VALENTE, J. A. Formação de educadores para o uso da informática na escola


(Org.) Jose Armando Valente. Campinas, SP: UNICAMP/NIED, 2003.

XAVIER, A. C. S. Letramento digital e ensino. Disponível em


http://www.ufpe.br/nehte/artigos/Letramento%20digital%20e%20ensino.pdf
Acesso em 18 de julho de 2014.
659

Comunicação

Efetividade da escola e condicionantes do desempenho escolar de alunos: a teoria e


a pesquisa

José Camilo dos Santos Filho


Prof. titular da UNICAMP e da UNOESTE
Pesquisa financiada pela CAPES

Resumo: O objetivo deste estudo foi apresentar breve revisão de pesquisas sobre
efetividade escolar e condicionantes do desempenho de alunos na escola. Até os anos
setenta, foram realizadas pesquisas macrossociais fundamentadas em abordagem
positivista ou marxista para oferecer explicações sobre o desempenho escolar dos
alunos e as injustiças do sistema educacional do país reproduzidas na escola. A partir
dos anos setenta, a introdução da pesquisa qualitativa no estudo dos problemas
concretos da escola levou ao progressivo entendimento e explanação dos fatores
internos relacionados ao desempenho escolar dos alunos. A partir dos anos oitenta, nova
confiança no poder da educação e renovado reconhecimento da importância das
pesquisas quantitativas no contexto meso da escola, a fim de determinar seu efeito,
readquiriram novo vigor. Desde os anos noventa aumentou o interesse pelo estudo da
escola que, com relativa autonomia, exerce influência na sociedade e na vida e no
desempenho de seus alunos.
Palavras-chave: Desempenho escolar; desempenho do aluno; condicionantes do
desempenho escolar; escola eficaz; efetividade escolar.

As pesquisas sobre efetividade escolar e desempenho dos alunos na escola já


têm uma história de mais de 50 anos e têm encontrado importantes evidências que
podem contribuir para a melhoria da qualidade do ensino e o aprimoramento do
desempenho dos alunos nas avaliações de sua aprendizagem. Segundo Reynolds et al.
(2000), as pesquisas sobre efetividade escolar, até o presente, tiveram quatro estágios
ou etapas de desenvolvimento. Essas etapas podem ser sintetizadas e visualizadas na
Figura 1. Uma análise das contribuições mais relevantes dessas pesquisas é apresentada
nesta breve revisão da literatura sobre o tema.
660

Estágio 1: Paradigma do input-output

O primeiro estágio se caracterizou como paradigma do input-output e as


pesquisas se centraram em estudos sobre a influência do status socioeconômico dos
alunos e de variáveis de recursos da escola (gasto por aluno) sobre o desempenho dos
alunos. Nesse período foram dominantes os estudos sobre a influência do fator
socioeconômico no resultado da aprendizagem dos alunos. Dois estudos clássicos deste
período merecem ser citados: o de Coleman et al. (1966) e o de Jencks (1972). Os
resultados desses estudos nos Estados Unidos indicaram que o desempenho dos alunos
estava mais associado ao nível socioeconômico de suas famílias do que aos recursos
disponibilizados para as escolas.

Figura 1: Estágios na evolução da pesquisa sobre efetividade escolar nos Estados Unidos
Baseado em Reynolds et al. (2000).
661

Até os anos 70, a tendência era valorizar as pesquisas macrossociais


fundamentadas em abordagens teóricas positivistas e/ou de inspiração crítica para
oferecer explicações sistêmicas e abrangentes sobre o precário desempenho escolar dos
alunos e as mazelas e injustiças do sistema educacional do país, reproduzidas na
instância da escola. A onda de pessimismo sobre a eficácia social da escola resultante da
influência dos estudos sociológicos, econômicos e culturais dos anos 60 e 70 do século
passado sobre os fatores externos do desempenho escolar dos alunos e sobre o papel de
reprodução social e cultural da escola gerou forte descrédito na política de valorização
da escola como instrumento de inclusão e ascensão social (COLEMAN et al., 1966;
JENCKS, 1972; BOURDIEU; PASSERON, 1975). Até o final dos anos setenta, por
influência de estudos sociológicos sobre fatores externos à escola e da abordagem
marxista da educação, era hegemônico atribuir o desempenho acadêmico dos
alunos e o males da educação do país a determinantes socioeconômicos, culturais e
familiares externos à escola.

Estágio 2: Introdução de variáveis do


processo e de novas variáveis de produto

No segundo período, além das variáveis de entrada, foram introduzidas variáveis


do processo e variáveis adicionais do produto nas pesquisas sobre efetividade escolar.
Estudos pioneiros deste período foram os de Weber (1971), Murnane (1975) e Summers
e Wolfe (1977). Estudos mais recentes de Murnane (1981, p. 31) o levaram a concluir
que “os principais recursos que estão consistentemente relacionados ao desempenho dos
alunos são os professores e outros alunos”. Outros recursos afetam o desempenho dos
alunos de modo indireto mediante seu impacto nas atitudes e comportamentos dos
professores e dos alunos. No estudo dos processos escolares, as pesquisas deste período
evoluíram para o estudo do clima psicossocial da escola e da sala de aula (Brookover et
al., 1978; 1979). No estudo do desempenho dos alunos, passou-se a pesquisar a
influência de testes não padronizados no desempenho dos alunos (Madaus et al., 1979).
Por volta das décadas de 70 e 80, as pesquisas educacionais já revelavam
que os problemas da qualidade do ensino e da aprendizagem relacionam-se às
dimensões externas e internas à escola (BAUDELOT; ESTABLET, 1971;
JENCKS, 1972; BOWLES; GINTIS, 1976; BROOKOVER et al., 1978). A
descoberta da abordagem qualitativa de pesquisa e sua introdução no estudo dos
662

problemas concretos da escola, bem como as novas pesquisas sociológicas sobre


o processo escolar interno à própria escola, a partir dos anos setenta e firmando-
se nos anos oitenta, levaram ao progressivo entendimento da dimensão interna
dos problemas da escola e à explanação dos fatores intrínsecos relacionados ao
desempenho escolar dos alunos. Explicações e entendimentos complementares e
não excludentes, as abordagens quantitativa e qualitativa de pesquisa estão
delineando um perfil mais completo e significativo dos problemas e da
contribuição específica das escolas ao desempenho dos alunos.
Cabe reconhecer que os problemas didático-metodológicos e do desempenho
escolar dos alunos não se restringem ao âmbito da escola, mas têm imbricações com o
contexto socioeconômico externo à escola e com a cultura e nível educacional das
famílias dos alunos (ALVES, 2006). O projeto pedagógico da escola, sua proposta
curricular, sua liderança administrativa, seu clima interno e a formação e atuação de
seus professores expressam a influência direta ou indireta das políticas educacionais
dos governantes e da própria escola no desempenho dos alunos, mas representam
apenas a face interna dessa influência (SOARES et al. 2002; RESENDE, 2005;
BRESSOUX, 1994; MESQUITA. 2009).
A partir dos anos 80, nova confiança no poder da educação e renovado
reconhecimento da importância das pesquisas focadas no contexto meso da instituição
escolar, a fim de determinar seu efeito, readquiriram novo vigor (NÓVOA, 1992;
LIMA, 2001). Desde os anos 90 veio aumentando o interesse pelo estudo da escola
como instituição e organização que atua na sociedade com autonomia relativa e exerce
influência relevante na vida e no desempenho de seus alunos, e por consequência, na
transformação da sociedade onde está inserida.
Atualmente, são reconhecidas a complementariedade, as influências recíprocas e a
relativa autonomia das dimensões macro, meso e micro das instituições sociais (LIMA,
2001). Por isso, merecem ser pesquisadas nas suas relações de influência e de mútua
causalidade em suas atuações sobre os alunos. Em função deste novo olhar sobre a
importância da pesquisa nos contextos extraescolar e escolar, é que os pesquisadores
começaram a abrir a “caixa preta” das escolas para observar o que acontece dentro
delas, mediante a realização de pesquisas quantitativas e qualitativas. Neste novo
momento histórico, já parece superada a controvérsia paralisante sobre o benefício
mútuo do diálogo entre as abordagens quantitativas, qualitativas e críticas. Marx
analisou inúmeros dados quantitativos sobre a economia inglesa para reforçar os
663

argumentos de suas teses socialistas. A pesquisa quantitativa tem sua fase necessária de
análise qualitativa e interpretativa, sem a qual seus dados são irrelevantes e sem
significado.
Certamente, entre os fatores concorrentes para a manutenção do continuo
insucesso das escolas do país estão o despreparo do professor, a não adequação do
projeto pedagógico da escola às reais necessidades de seus alunos, a distância entre a
escola, a sociedade e a cultura, condicionantes decisivos da ineficácia escolar
(BROOKE; SOARES, 2008). Como revela a literatura especializada, não aprendemos
apenas pelo repertório de habilidades, pelo potencial intelectual ou pela
disponibilidade das estruturas cognitivas, mas também pela influência de nossas
concepções, desejos, valores e ações. Em função disso, torna-se relevante pesquisar
como a escola tem lidado com tais questões que se tornam cada vez mais cruciais para
o bom desempenho escolar dos alunos.
A abordagem da problemática do desempenho escolar dos alunos é tarefa
complexa que implica o conhecimento do funcionamento real da escola, do sistema
educativo, dos fatores intervenientes no processo escolar. No contexto interno à
escola, os professores atuam como agentes de mudança tendo em conta sua formação,
comprometimento, percepção e atuação na escola (SAMMONS, 2008;
TORRECILLA, 2008; ALVES; FRANCO, 2008).
Weiner (1985) reconhece a possibilidade de uma lista infinita de causas
concebíveis para as experiências de sucesso e de insucesso escolar além das geralmente
atribuídas a fatores como inteligência, esforço, sorte, nível econômico da família do
aluno, influência do professor, influência dos alunos e de outras pessoas, temperamento,
cansaço, humor, saúde. O autor classifica esses fatores como causas internas ou externas
(denominando-as de internalidade), como causas estáveis ou instáveis (estabilidade) e
causas controláveis ou incontroláveis (controlabilidade).
Como exemplo dessas causas, podemos dizer com Weiner (1985), que a
capacidade, o esforço, o humor e a saúde, são considerados como causas internas ao
sujeito, ao passo que a influência do professor e da família são causas externas. No
entanto, a influência da família pode ser tida como estável ou instável, dependendo de
esta ser contínua ou descontínua, enquanto o esforço e a atenção seriam causas instáveis
do próprio sujeito. Quanto à controlabilidade, a influência do professor é por ele
considerada uma causa incontrolável quando vista da perspectiva do aluno, mas seu
esforço e humor são considerados causas controláveis pelo sujeito. Assim o modo
664

como os indivíduos (professor e aluno) interpretam uma determinada situação


educacional tem grande influência na determinação de seu comportamento.
Reynolds e Teddlie (2008) escrevem que “altas expectativas em relação aos
alunos têm sido uma das descobertas mais consistentes na literatura, juntamente com a
comunicação de tais expectativas de modo que os alunos tomem conhecimento dela” (p.
320). Estudos clássicos sobre escolas eficazes, pesquisas americanas mais recentes,
estudos empíricos britânicos, bem como um grande número de revisões da literatura
sobre esse tema mostram uma forte relação entre altas expectativas e aprendizagem
eficaz (REYNOLDS; TEDDLIE, 2008; SAMMONS, 2008). Por isso, o trabalho
docente exige do professor não apenas conhecimento acadêmico e habilidades didático-
pedagógicas, mas também o conhecimento sobre a influencia das suas crenças e
expectativas sobre o rendimento do aluno e de como estas influenciam as expectativas
de sucesso e insucesso dos próprios alunos, bem como suas emoções e motivação.
Gama e Jesus (1994) encontraram relação significativa entre o insucesso dos alunos e os
considerados pelo professor como menos inteligentes, com dificuldades de aprendizado,
ou mesmo com mau comportamento. Juvonen (1988) verificou que os professores veem
as causas do fracasso dos alunos como estáveis, reduzindo as expectativas de sucesso do
aluno e elevando as de insucesso. Parece que os professores julgam essa situação como
algo estável e incontrolável, o que os impede de buscar estratégias de intervenção. São
essas teorias tácitas que se transformam em “profecias autorrealizadoras”
(ROSENTHAL; JACOBSEN, 1968).
São notórios e conhecidos os problemas e precariedades das escolas públicas do
Brasil que conseguiu democratizar o acesso à escola fundamental até o final do século
XX já com um atraso de quase um século em relação aos países desenvolvidos. No
entanto, continua na entrada da segunda década do século XXI com os problemas não
resolvidos da evasão, retenção e baixa qualidade do ensino, como mostram as
avaliações nacionais e o vexaminoso desempenho de alunos brasileiros nas avaliações
internacionais comparativas.
Diante de tal quadro sem retoque, torna-se necessário pesquisar as condições de
organização e funcionamento de escolas públicas e a figura de seus professores,
especialmente em relação à sua formação inicial e continuada e à sua atuação
profissional, a fim de se aquilatar o impacto dessas dimensões no desempenho escolar
dos alunos e no desempenho da própria escola como instituição educadora. Além disso,
cabe lembrar que a Educação Básica é condicionada pelo contexto histórico, político,
665

econômico e social no qual está inserida e sofre influência direta das políticas
educacionais e m s u a s práticas e d u c a t i v a s e d e formação de professores. Cabe
destacar aqui a influência determinante do background socioeconômico, educacional e
cultural dos pais dos alunos, como Björklund e Salvanes (2011) enfatizam em seus
estudos recentes sobre o tema.

Estágio 3: Ênfase na equidade e em estudos


sobre o aprimoramento escolar

No terceiro estágio, a partir do final dos anos 70 até meados dos anos 80, às
variáveis anteriores acrescentaram-se a ênfase na equidade e estudos sobre o
aprimoramento das escolas. Estudos pioneiros deste período foram os de Edmonds
(1978; 1979a; 1979b), Lezotte and Bancroft (1985) e Weber (1971). Para Edmonds e
seus colegas não era suficiente apenas descrever as escolas efetivas. Era necessário criar
escolas efetivas especialmente nas áreas pobres da cidade. Essa orientação para a
equidade levou à emergência dos estudos para o aprimoramento das escolas. As
pesquisas sobre escolas efetivas geraram um modelo de cinco fatores do desempenho
dos alunos: forte liderança instrucional do diretor, foco instrucional amplamente
compreendido, ambiente ou “clima” de aprendizagem escolar seguro e ordenado, alta
expectativa quanto ao desempenho de todos os alunos, e uso dos dados dos testes de
desempenho dos alunos para avaliar o sucesso do programa e da escola.
A avaliação de escolas, mediante exames nacionais, tem provocado discussões
acaloradas e diversificadas no ambiente acadêmico, havendo posicionamentos tanto
favoráveis como desfavoráveis a essa prática. Reconhecendo que avaliações
externas e internas às escolas são fundamentais para o estímulo e a melhoria dos
padrões de rendimento dos alunos e do desempenho das escolas e p ara a
i mp l an t ação d e ações para o alcance destes propósitos, entendemos que a
política de avaliação externa é um dos elementos mais significativos para o diagnóstico
e planejamento que garantam a melhoria da qualidade escolar. Podemos dizer, com
base na literatura que analisa os dados do PISA, que nenhuma outra medida tem tido
eficácia tão positiva para estimular a excelência do ensino.
Entendemos que o suposto básico dos processos avaliativos é o de que só
pode haver verdadeiro sucesso escolar se os al u n o s terminarem cada ano letivo
com um razoável g a n h o c o g n i t i v o em todas as áreas curriculares. Por outro
lado, entendemos que o insucesso escolar tem, entre outras razões causais, a
666

eliminação ou o mau entendimento das novas proposições sobre os processos


avaliativos que devem ser desenvolvidos em sala de aula, durante o ano letivo.
Assim, podemos afirmar que há uma relação direta entre a formação do professor
em nível superior e os processos pedagógicos que este desenvolve na sua ação
docente. Um entendimento mais aprofundado dos diferentes aspectos da
aprendizagem é uma variável de teor implicativo profundo nas práticas educacionais
dos professores, conjuntamente com uma melhor formação e uma atuação docente
mais eficiente.
A avaliação da Educação Básica, realizada pelos órgãos federais e estaduais,
além de ser um instrumento imprescindível na avaliação do próprio sistema
educacional, proporciona informações relevantes para aferir a adequação dos
programas de formação dos professores e a eficácia de medidas de política educativa.
Ela é também um estímulo às escolas para reorganizarem seus currí culos e ao
profissionalismo dos professores para atuarem com relativa autonomia de ação.
A literatura na área da educação tem apontado que é ilusório pensar que
a melhoria dos resultados escolares possa depender automaticamente de ações
centralizadas do governo, mas que esta s e d ev e em grande parte à ação
embasada, teoricamente fundamentada e instrumentada, dos professores. São os
professores, mediante melhor formação e desempenho superior, os agentes que,
no cotidiano da ação pedagógica, podem efetivamente ser o fator crucial e diferencial
da melhoria do ensino. Sob a ótica dos princípios educacionais nacionalmente
assumidos, o projeto educacional e a concretização da reforma curricular pressupõem
uma política de capacitação docente diferenciada, uma verdadeira mudança de
mentalidade para que os argumentos pedagógicos não permaneçam na esfera do
discurso.

Estágio 4: Introdução de fatores de contexto


e avanços metodológicos

Finalmente, no quarto estágio, introduziram-se estudos sobre fatores de contexto


e outros avanços metodológicos. Pesquisas relevantes deste período foram as de
Hallinger e Murphy (1986) e as de Teddlie et al. (1985;1990 ). Por terem sido relegados
os fatores relacionados ao contexto das escolas pelas pesquisas sobre efetividade escolar
nas etapas anteriores, as pesquisas deste período vêm mostrar a relevância desses fatores
para a compreensão da efetividade escolar e dos determinantes do desempenho dos
667

alunos. Houve uma mudança de valores do ideal de equidade para o ideal de eficiência
que acompanhou esses novos estudos do contexto. Avanços metodológicos ocorreram
nessa etapa com o acréscimo de variáveis nos modelos de input-produto, input-
processo-produto e aprimoramento das escolas. No entanto, o avanço metodológico
mais importante nas pesquisas sobre efetividade escolar neste período, tanto nos
Estados Unidos como em outros países, foi o desenvolvimento de modelos matemáticos
multi-níveis para avaliar de modo mais acurado os efeitos de todas as unidades de
análise associadas à escola.
Tanto as teorias e pesquisas clássicas sobre a influência de fatores externos sobre
a qualidade da escola e o desempenho dos alunos como as pesquisas mais recentes
sobre a influência de fatores internos sobre a atuação da escola e o desempenho dos
alunos e sobre o contexto onde está situada a escola merecem ser levadas em conta na
definição de uma política de melhoria da qualidade da escola e elevação do desempenho
dos alunos. A complexidade do problema requer que sejam tomadas medidas em várias
frentes para que tenham maior eficácia. A competência e o comprometimento do
professor são essenciais, mas também é imprescindível a colaboração da escola, dos
pais dos alunos e dos próprios alunos. Nessa tarefa também é insubstituível a liderança
indutora do Estado e o suporte comprometido da sociedade civil.

À guisa de conclusão

A melhoria da qualidade da educação básica para todas as crianças e


adolescentes do país é a agenda inadiável para as próximas décadas. Não sem razão, a
educação tem sido apontada por diferentes organismos internacionais, como a
UNESCO e a OCDE, como o instrumento fundamental para o
desenvolvimento eco n ô m i co e cu lt u ral de um país, a superação da desigualdade
social, a preparação de técnicos e profissionais de alto nível e a formação dos cidadãos
da sociedade nacional, regional e planetária do século XXI, caracterizada como
sociedade da informação e do conhecimento. Para tanto, o Estado, a sociedade, a
escola, os professores e as famílias dos alunos precisam agir em sinergia para
transformar a escola brasileira em escola de excelência para todos.
Tanto os fatores externos e internos à escola como o contexto onde está situada
têm considerável influência na qualidade do ensino e da aprendizagem dos alunos. A
valorização da educação pelo Estado, pela sociedade e pela família dos alunos contribui
668

de modo decisivo e relevante para a melhoria da qualidade da educação do país. Por


outro lado, a escola, especialmente pelo seu ambiente ou clima de trabalho e de
aprendizagem e pela atuação competente de seus professores, exerce influência
significativa na educação dos alunos. Finalmente, o reconhecimento do valor da
educação pelos próprios alunos e seu empenho em se educar fazem a diferença na
qualidade da educação que vivenciam na escola básica do país.
Esta breve revisão da literatura sobre o tema dos condicionantes da efetividade
escolar e do desempenho de alunos na escola mostra a consolidação de alguns achados
relevantes sobre a influência do papel da escola e do seu contexto no rendimento escolar
dos alunos. Essa análise se concentrou mais nas pesquisas americanas em função de seu
pioneirismo nessa linha de pesquisa. Isso, porém, não significa que pesquisas realizadas
na Europa, no Canadá, na Austrália e na América Latina sobre esse tema não sejam
relevantes. Estudo dessa contribuição merece ser pesquisado em trabalho específico.

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672

Comunicação

PCNEM-ENEM: a área de história nas políticas públicas de educação no


Brasil - 2009 a 2012

José Gilberto de Andrade Silva


PUC/SP
Yone de Carvalho
PUC/SP
Agência financiadora: CEPE

Resumo: Este trabalho teve o objetivo de verificar a relação existente entre o Exame
Nacional do Ensino Médio – ENEM e os Parâmetros Curriculares Nacionais para o
Ensino Médio – PCNEM, para o ensino de História. Para a coleta de informações
utilizou-se dois procedimentos: análise documental, utilizando textos políticos
relacionados tanto com currículo como com avaliação; e questões do ENEM no período
de 2009 a 2012, em que o conhecimento histórico era indispensável para a resolução do
item. A análise dos dados foi organizada pela distribuição das questões em
competências/habilidades e em conteúdos clássicos e a comparação com as orientações
curriculares para o ensino de História no ensino médio. Os resultados indicaram que
houve a priorização de algumas competências/habilidades e de alguns temas. Com isto,
o ENEM tem sido direcionador do currículo escolar, ou seja, ele é que tem orientado o
currículo das escolas de ensino médio, e não os PCNEM.
Palavras-chave: Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Exame
Nacional do Ensino Médio. História.

APRESENTAÇÃO

Por muito tempo, o ensino médio foi caracterizado como um nível de educação
propedêutico ou como treinamento prático-profissional. A nova Lei de Diretrizes e
Bases da Educação – LDB 9394/1996 trouxe ao ensino médio o caráter de formação
geral e complementação do ensino, ao ser considerado como a última etapa da educação
básica (BRASIL, 1996, art. 35), tirando seu estigma de preparação para o trabalho ou de
pré-vestibular.
673

Com as exigências do mercado de trabalho de um profissional menos técnico e


com mais habilidades cognitivas para lidar com as novas tecnologias e com a
velocidade da informação e, ainda, características comportamentais para saber trabalhar
em equipe, tem-se dado atenção especial a esta etapa de ensino. Embora, as discussões
políticas direcionadas para o ensino médio só tenham se intensificado às vésperas do
novo milênio, final do século XX (NEUBAUER et al, 2011).
Com a participação desta etapa da educação básica nas discussões políticas
educacionais, surgiu interesse na reformulação de seu currículo e avaliação. Já no final
dos anos 1990, políticas forma implantadas para modificar tanto a estrutura quanto a
maneira de se ensinar no Brasil. Nesta mesma época, foi criado os Parâmetros
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – PCNEM (BRASIL, 1999) e o Exame
Nacional do Ensino Médio – ENEM (BRASIL, 2005), o primeiro como orientador
curricular e o segundo como processo de avaliação dos alunos.
Este estudo buscou compreender este percurso histórico de criação dos PCN e
do ENEM e, a partir da leitura dos exames elaborados, identificar a relação entre ambos
para o cumprimento de um programa educacional que objetivasse uma continuidade da
política educacional. A intenção foi identificar que tipo de relação existe entre as
políticas curriculares para o ensino médio, na disciplina de História e os conteúdos,
habilidades e competências presentes nas avaliações em larga escala. Essa abordagem
possibilitou uma análise das políticas de currículo e de avaliação propostas pelo
Governo Federal e a verificação da coerência entre proposta educacional e avaliação.

MÉTODO

O caminho metodológico que foi percorrido para este estudo implicou: pesquisa
documental, num primeiro momento, das políticas públicas educacionais brasileiras,
principalmente no período que vai do final dos anos 1980 e anos iniciais de 2000. E,
num segundo momento, a pesquisa foi direcionada para os cadernos do ENEM
(BRASIL, 2013), através da leitura e quantificação das questões da área de Ciências
Humanas e suas Tecnologias, “[...] nas quais o conhecimento histórico — informações
ou conceitos — é requerido indispensável ou acessoriamente para a resolução do
enunciado” (CERRI, 2004, 222). A seleção do período foi de 2009 a 2012. Isto porque
as provas foram estruturadas por área de conhecimento somente a partir de 2009. Os
cadernos utilizados foram: 2009 – azul; 2010 – azul; 2011 – azul; 2012 – branco.
674

Na organização dos dados, optou-se pela construção de tabelas e gráficos para


sua apresentação, de forma a contribuir com uma melhor visualização dos dados
encontrados, levando-se em conta duas grandes categorias, sendo:
• Competências e habilidades: utilizando-se a Matriz de Referência do Enem
(BRASIL, 2009) da área de conhecimento Ciências Humanas e suas Tecnologias;
• Tema: divididos por conteúdo clássico, sendo:
• História do Brasil: Pré-Colonial; Colonial; Império; República;
• História Geral: Pré-História; Idade Antiga; Idade Média; Idade Moderna;
Idade Contemporânea.

ANÁLISE DOS DADOS

Na análise documental, o primeiro ponto a salientar, quando se analisam as duas


políticas educacionais para o ensino médio – uma de organização curricular e outra de
avaliação, é que a primeira deveria subsidiar a segunda, ou seja, os PCNEM deveriam
garantir ao aluno um bom desempenho no ENEM, mas o que se observa é o oposto,
Tendo em vista que a publicação e distribuição dos Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM) [...] só ocorreram em 1999 e que a
primeira edição do exame foi realizada em 1998, percebe-se certo
“descompasso”, ou, dito de outra maneira, ausência de “lógica pedagógica”
entre a instituição da Reforma e a realização do ENEM (MINHOTO, 2009, p.
34).

Por isso, não é de se admirar que o ENEM seja, muitas vezes, utilizado como
organizador curricular do ensino médio e, como afirma Cerri (2004), é o exame que
elenca os conteúdos que devem ser ensinados. Isto porque, como relata Zanchet (2007),
a preocupação da escola e do professor é com os resultados, ou seja, ensinar para
preparar o aluno para o exame. Isto não chega a ser uma novidade na educação
brasileira, pois antes do ENEM, o organizador do currículo do ensino médio eram os
exames vestibulares. E, ainda, é “[...] preciso considerar que o fato de o ENEM
participar, parcial ou integralmente, dos processos seletivos para o ensino superior deve
repercutir significativamente nas atividades cotidianas do ensino médio” (MINHOTO,
2009, p.35).
Como principal aproximação, pode-se citar o ensino baseado no
desenvolvimento de competências e habilidades, a preocupação com a
contextualização do ensino e com a interdisciplinaridade, que possibilitam um ensino
não limitado à memorização de conteúdos, mas voltado à capacitar o aluno na
675

compreensão de si mesmo e do seu tempo, além de utilizar-se dos conhecimentos


adquiridos para solução de situações-problema presentes no cotidiano.
Analisando os distanciamentos, embora pautados sobre a mesma base
epistemológica, ou seja, o ensino através do desenvolvimento de competências e
habilidades, o fato de não haver uma definição unívoca, como afirmam Garcia (2005) e
Silva e Galvão (2011) para estes conceitos e, ainda, de os autores destas políticas não
terem se interessado em caminhar na direção de uma mesma definição, causou confusão
nos os professores e nas escolas, pois tiveram que trabalhar com estes documentos sem
estarem certos de como organizar o ensino. Como afirmam Ricardo e Zylbersztajn
(2008), não houve mudanças substanciais na escola com a implantação destas políticas,
pela pouca compreensão dos professores.
Ao oferecer ao professor a liberdade de escolha dos conteúdos a serem
selecionado em seu plano de ensino, mas impondo-lhe um exame que já traz em sua
matriz o conteúdo e as competências que serão cobradas, o Governo lhe tolhe o direito
de escolha (CERRI, 2004).
Ao analisar as questões foram distribuídas pela sua pertença a um conteúdo
clássico e de acordo com as competências e as habilidades principais exigidas para a
execução da questão; não ignorando o fato de que mais de uma habilidade poderia estar
presente nela, portanto, o critério de seleção foi por conveniência (tempo disponível
para a análise e preparo acadêmico do pesquisador).
Na tabela 1 estão apresentadas as Competências e Habilidades encontradas em
cada questão, no período estudado. Nela, pode-se identificar a distribuição das questões
para a disciplina de História em cada ano, bem como a sua frequência.
676

Tab. 1 – Distribuição das questões de História por competências/habilidades, por ano:


QUESTÕES / ANO FREQUÊNCIA POR
COMPETÊNCIA HABILIDADE
2009 2010 2011 2012 HABILIDADE/COMPETÊNCIA
1 4 2 3 3 12
2 1 5 1 1 8
1 3 2 2
4 2 2
5 0
6 1 1
7 4 3 2 4 13
2 8 0
9 2 2 6 3 13
10 1 1
11 2 1 1 5 9
12 2 2 4
3 13 1 4 1 2 8
14 0
15 0
16 2 1 3
17 1 1
4 18 1 2 3
19 1 1
20 0
21 0
22 0
5 23 0
24 0
25 0
26 0
27 0
6 28 0
29 1 1
30 0
TOTAL DE QUESTÕES/ANO 22 22 18 20

Como se pode observar, a quantidade de questões de História se manteve


relativamente constante no período abordado. Igualmente, a escolha das competências e
habilidades que seriam avaliadas no aluno não apresentou grande variação.
Foi possível observar que algumas competências/habilidades foram recorrentes,
como, por exemplo, as competências: 1, 2 e 3; e as habilidades 1, 2, 7, 9, 11 e 13,
incluídas nestas competências. Estas competências enfatizam a construção cultural das
identidades; as transformações geográficas resultantes das relações socioeconômicas e
culturais de poder; e a compreensão dos processos históricos das instituições e
movimentos sociais na disputa do poder.
Embora tão alardeada pelos PCNEM, a competência 4, que trata das técnicas e
tecnologias são pouco recorrentes. Curiosamente, num momento em que se valorizam
questões de sustentabilidade e de preservação da natureza, a tabela 1 demonstra que a
Competência 6, que tem como foco a compreensão da relação do homem com a
677

natureza em diferentes contextos históricos e geográficos, praticamente não apareceu


nestas questões. Nesta mesma direção, observou-se a Competência 5, relacionada à
compreensão de valores fundamentais de cidadania e democracia, foi pouca explorada
nas questões, apesar de os PCNEM valorizarem o exercício da cidadania como tema
central a ser trabalhado com os alunos do ensino médio.
Após análise dos dados que descrevem as competências/habilidades presentes
nas questões do ENEM, nos exames relacionados ao período recortado, passou-se à
observação da recorrência dos temas nestas questões. A tabela 2 apresenta a distribuição
dos temas encontrados e destaca a ausência de alguns e, ao mesmo tempo, a recorrência
de outros.
Tab. 2 – Distribuição das questões de História por tema, por ano:
QUESTÕES / ANO TOTAL
TEMA
2009 2010 2011 2012 POR TEMA
Pré-Colonial 0
Colonial 4 4 5 4 17
História do Brasil
Império 2 2 2 1 7
República 4 8 7 4 23
Total Parcial 10 14 14 9 47
Pré-História 0
Idade Antiga 1 1 2
História Geral Idade Média 1 2 1 4
Idade Moderna 4 1 2 3 10
Idade Contemporânea 6 5 1 7 19
Total Parcial 12 8 4 11 35
TOTAL POR ANO E GERAL 22 22 18 20 82
Já o gráfico 1, destaca esta recorrência ao longo de todo o período observado.

História do Brasil Pré-Colonial


FREQUÊNCIA GERAL POR TEMA
História do Brasil Colonial

História do Brasil Império


19 17 História do Brasil República

História Geral Pré-História


7
História Geral Idade Antiga
10
História Geral Idade Média
4
2 23 História Geral Idade Moderna

História Geral Idade


Contemporânea

Graf. 1 – Frequência geral das questões de História por tema, de 2009 a 2012:
678

Como se pode notar, com relação à História Geral, apenas duas questões de
Idade Antiga foram exigidas, contra dezenove da Idade Contemporânea. E, com relação
à História do Brasil, o período do Império é três vezes menos exigido em comparação
ao período República. E, ainda, não parece haver prevalência dos conteúdos de História
do Brasil (57%) com relação aos de História Geral (43%), como é preconizado nos
PCNEM.
De acordo com as informações coletadas, os temas relacionados à História do
Brasil – República e História Geral – Idade Contemporânea são os mais utilizados na
elaboração dos itens, ao passo que História do Brasil – Império e História Geral –
Idades Antiga e Média, pouco aparecem, além disso, História do Brasil – Pré-Colonial
e História Geral – Pré-História não apareceram em nenhuma das avaliações analisadas.
Isto configurou a utilização da disciplina História como instrumento de compreensão do
presente, ignorando temas relacionados com a evolução e as transformações da
sociedade ao longo de toda a história das ações humanas. De acordo com Cerri (2004, p.
224),
[...] coloca em xeque a própria motivação de trabalhar com a História e fazer
referência ao passado da experiência humana, uma vez que, quanto mais
distante no tempo, menos o período é considerado significativo para a
compreensão da contemporaneidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com relação à construção das duas políticas (PCNEM e ENEM), foi possível
notar um descompasso em sua criação, visto que a primeira deveria subsidiar a segunda,
mas, o que ocorreu foi o contrário, pois a primeira avaliação do ENEM ocorreu em
1998, antes mesmo da criação dos PCNEM (que foi em 1999) e sem tempo hábil para
sua divulgação e utilização da organização curricular da escola, para que os alunos
fossem, posteriormente, avaliados pelo exame. Isto ocorreu novamente quando da
estruturação do Novo ENEM, em 2009, que destacou entre seus objetivos a
reorganização curricular do ensino médio.
Somado a isto, a falta de compreensão dos conceitos presentes neste modelo de
ensino, baseado no desenvolvimento de competências/habilidades, da
interdisciplinaridade e da contextualização, tanto por parte da escola como dos
professores e a falta de clareza na apresentação desta proposta, além da não
679

homogeneidade na utilização desses conceitos nos diversos documentos oficiais, fez


com que a proposta fosse difícil de ser implantada nos meios escolares.
Com relação aos resultados da análise dos exames do período de 2009 a 2012,
observou-se uma presença constantemente similar no número de questões que tinham
como requisito para sua solução o conhecimento histórico.
Além disso, foi possível verificar que o ENEM tem destacado a disciplina
História como um instrumento de compreensão do presente. Isto pode ser verificado ao
identificar um grande número de questões dentro dos grandes recortes clássicos: Idade
Contemporânea e Brasil Império, priorizando o estudo do passado recente e
negligenciando o estudo de fatos históricos de tempos mais distantes, o que, segundo
Cerri (2004)
[...] é um erro, uma vez que a “concretude” de um saber não passa
necessariamente pela sua proximidade espacial ou temporal, sobretudo num
mundo ocupado pela comunicação de massa. Pelo contrário, a “concretude”
ou a “utilidade” de um conhecimento histórico estão muito mais dadas pela
sua possibilidade de dialogar com o presente e escavar seus significados,
compondo um conjunto significativo (CERRI, 2004, 225).

Isto não condiz com os pressupostos da orientação curricular, que enfatiza a


importância de se conhecer o passado para compreender o presente, não um passado
próximo, mas o passado que descreve o desenvolvimento do homem, todas as suas
ações, para compreensão das permanências e transformações ocorridas ao longo do
tempo.
O que pode significar a insidência de temas no ENEM para a organização do
currículo do ensino médio? Com certeza, resulta numa predominância no currículo de
conteúdos ligados aos temas mais recorrentes nos exames e a diminuição de temas
pouco utilizados neles.
E, ainda, os dados encontrados nos exames no período estudado, com relação à
frequência observada, indicaram que o ENEM exigiu recorrentemente certas
competências/habilidades a despeito de outras pouco utilizadas, sendo que algumas não
foram, sequer, utilizadas em nenhum dos anos analisados.
Quando se pensa em políticas avaliativas, logo vem à mente as políticas de
currículo, partindo-se para a observação, cada vez mais presente nos meios escolares, de
que a relação entre elas deveria ser vertical, pois um “[...] dos fatores que condiciona a
efetivação do currículo é a avaliação externa à escola” (CERRI, 2004, p. 214). No
entanto, a valorização dos resultados vem fazendo com que esta relação seja invertida,
ou seja, que as avaliações externas sejam as direcionadoras do currículo da escola, com
680

poder de instrumento de seleção para as universidades (SOUSA et al, 2012) e de


ranking das escolas (NEUBAUER et al, 2011).
É necessário que o interesse no aprendizado do aluno não esteja voltado somente
às questões de mercado e de valoração de seu desempenho, mas que possam, realmente,
ajuda-lo na construção de seu futuro, ser senhor de suas decisões, livres da imposição
do mundo do trabalho ou da necessidade exclusiva de sobrevivência; capacitá-lo não só
no sentido de “Adaptar-se para sobreviver, em vez de compreender para transformar”
(CERRI, 2004, p. 221).

REFERÊNCIAS

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682

Comunicação

Das necessidades formativas às possibilidades de formação: um estudo com


professores do Ensino Fundamental

Josefina Valentini de Santi


Universidade da Cidade de São Paulo – UNICID.
Secretaria de Estado da Educação – SEESP.

Resumo: Esta pesquisa buscou identificar como professores de Língua Portuguesa do


6º ano do Ensino Fundamental da rede pública estadual paulista dão continuidade ao
processo de alfabetização, em função do declínio da competência leitora dos alunos nos
Anos Finais. Considerando as disputas sobre métodos de alfabetização e o descompasso
entre currículos oficiais e ação docente, buscou-se refletir sobre: o que significa estar
alfabetizado, o processo de alfabetização/letramento e como tais questões se refletem na
prática docente. Constatou-se que os currículos dos dois segmentos concordam quanto à
concepção de alfabetização/letramento de Emília Ferreiro e Magda Soares como
processo que se estende por toda a Educação Básica. Os resultados indicaram o
desconhecimento dos docentes sobre os fundamentos desses currículos, cujas práticas
não correspondem à metodologia neles recomendada. As ações de formação continuada
devem discutir tais concepções e metodologia para respaldar a autonomia docente.
Palavras-chave: Alfabetização. Formação Continuada. Língua Portuguesa.

É comum os professores do início do segundo ciclo do Ensino Fundamental


reportarem-se aos alunos recém-saídos dos anos iniciais como não alfabetizados. Qual é
o entendimento destes professores acerca do desenvolvimento cognitivo destas
crianças? O que pensam estes professores sobre o processo de alfabetização?
Por meio de minha experiência profissional, entre o ir e vir de meus
questionamentos, nas leituras e releituras de diversas pesquisas na área da alfabetização,
encaminhei minha pesquisa buscando compreender o que pensam os professores de 6º
ano do Ensino Fundamental sobre a alfabetização dos alunos.
A partir das várias concepções sobre alfabetização, a prática educativa vem se
estabelecendo com uma pluralidade de métodos e conceitos paradigmáticos que, quando
debatidos no espaço escolar, acabam gerando conflitos. As concepções divergentes
683

assumidas pelos docentes nem sempre são acompanhadas por uma clareza por parte
desses sujeitos quanto ao seu real significado, gerando inúmeras controvérsias, que
podem ter seus efeitos na aprendizagem dos alunos no Ensino Fundamental.
Podemos depreender que o processo educativo deve ser sustentado por ações
políticas pedagógicas que confiram ao educando, criança ou jovem, o direito de se
apropriarem do conhecimento acumulado historicamente. Os responsáveis pelo bom
encaminhamento destas ações, educadores de todas as esferas, devem apropriar-se do
modo de pensar, de proceder, descritos pelos filósofos, psicólogos, biólogos, linguistas,
sociólogos que estudam e disponibilizam suas descobertas para melhorar a ciência
pedagógica para, consequentemente, cumprirem sua função de favorecer a todos uma
educação de qualidade.
A Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEESP) desde 1983 vem
implementando várias ações com vistas à melhoria na qualidade do ensino: reorganizou
a estrutura curricular em um ciclo de alfabetização; a incorporação da teoria
construtivista como base para as opções didático-pedagógicas; o regime da progressão
continuada, que prevê o respeito pelo ritmo de aprendizagem de cada aluno ao longo de
um ciclo plurianual escolar eliminando, deste modo, a retenção e a provável evasão
escolar; implementação do Programa Ler e Escrever enquanto orientador do currículo
dos anos iniciais do Ensino Fundamental e um novo currículo para todas as séries e
disciplinas dos anos finais do Ensino Fundamental e Médio.
O currículo oficial de Língua Portuguesa – Ensino Fundamental e Médio prevê a
classificação em gêneros do discurso, literários e não literários. Ressaltamos que esta
proposta de gêneros do discurso faz parte do Currículo dos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental, e que sem esta acepção, a progressão do desenvolvimento das habilidades
requeridas para o encaminhamento da proficiência leitora e escritora seria improvável.
Aliada à compreensão da progressão do desenvolvimento das competências que
permitam os alunos encaminharem-se para a proficiência leitora e escritora, entender a
transição de um segmento a outro é ponto facilitador para que a aprendizagem dos
alunos. Estudos apontam para que

A passagem da primeira para a segunda etapa marca o início da convivência


do aluno com uma organização institucional desconhecida: horário
compartilhado por diversas matérias e professores, outros níveis de
exigência, diferentes expectativas quanto à conduta em sala de aula e à
organização do trabalho escolar, novas relações professor-aluno e diferentes
abordagens de ensino e aprendizagem. (MANSUTTI et al., 2007, p.11)
684

As pesquisadoras argumentam que as disciplinas, na segunda metade do Ensino


Fundamental, passam a ser apresentadas isoladamente, por diferentes professores, e com
abordagens diferentes, rompendo a totalidade que até então os alunos conviviam,
dificultando a percepção de objetivos comuns tanto por parte de quem ensina quanto de
quem aprende, posto que, para as autoras, é importante “o diálogo e os pactos
consensuais, que os sujeitos se reconheçam como potenciais aliados em torno de uma
causa.” (MANSUTTI et al., 2007, p.11). Em relação ao ensino da leitura e da escrita, tal
transição se apresenta de forma igualmente problemática, e reflete, de alguma forma,
equívocos e incompreensões quanto à continuidade do processo de alfabetização.
Na busca da compreensão de como é desenvolvido o processo de alfabetização
na segunda metade do Ensino Fundamental, essa pesquisa foi desenvolvida com
professores que atuam na 5ª série/6º ano do Ensino Fundamental nas escolas públicas
paulistas circunscritas à Diretoria de Ensino Leste 4 que está localizada no Bairro da
Vila Matilde e atende à demanda de alunos do Ensino Fundamental e Ensino Médio, nas
modalidades regular e educação de jovens e adultos (EJA). Para isso, coordena o
trabalho de 77 escolas, localizadas nos bairros de: Vila Matilde, Cidade Líder, Parque
do Carmo, São Mateus e Sapopemba.
Os resultados da pesquisa foi obtido por meio de amostragem probabilística, por
conveniência, com 15 (quinze) professores que atuam na área de Linguagens e Códigos
ministrando aulas na disciplina de Língua Portuguesa, com aulas atribuídas no ano de
2013 nas turmas de 5ª série/ 6º ano, com cargos Efetivos ou Ocupantes de Função
Atividade (OFA).
Inicialmente foi enviado um questionário contendo perguntas não estruturadas e
abertas, via internet para, aproximadamente, duzentos e dois professores da disciplina
de Língua Portuguesa por meio da ferramenta online Google Docs. Ao final de certo
prazo, foram obtidas cinquenta respostas. Foram desprezados quarenta e quatro
questionários de professores que desenvolviam suas atividades docentes em outras
séries/anos do Ensino Fundamental/Anos Finais e Ensino Médio, pois não trabalhavam
com o 6º ano, restando seis questionários referentes àqueles professores que
ministravam aulas na disciplina de Língua Portuguesa nas turmas de 5ª série/ 6º ano.
Para atingir um número maior de docentes e, portanto, conferir maior
representatividade ao universo pesquisado, foram impressos e enviados mais trinta
questionários às escolas, em envelopes lacrados e sem solicitação de identificação da
escola e do respondente. Foi solicitado a quarenta e cinco Professores Coordenadores
685

e/ou Diretores de algumas escolas que participavam de ações no Núcleo Pedagógico


desta Diretoria de Ensino que os entregassem em mãos aos professores que ministravam
aulas na 5ª série/6º ano.
No envelope, além do questionário, foi incluído um pequeno texto explicativo
que abordava: o motivo e o tema da pesquisa, o sigilo e a não identificação da escola e
do professor, a explicação de que o professor não deveria responder àquele questionário
se já o havia feito no documento via internet, e outro envelope em branco caso o de
origem tivesse sido danificado, impedindo sua lacração e devolução, além do
agradecimento pela participação.
Após duas semanas, em novo encontro de Professores Coordenadores e/ou
Diretores, foram devolvidos quinze envelopes, dos quais foram desprezados seis
questionários que: ou continham respostas monossilábicas – sim/não – ou afirmações
como “não sei responder”, “não tenho opinião acerca disso”, impossibilitando uma
análise mais apurada, muito embora tais respostas possam já ser tomadas como indícios
de certa dificuldade dos professores para discorrerem sobre o tema. Assim, apesar de
terem suscitado algumas hipóteses sobre o que levou esses professores a tal
procedimento – não envolvimento com a pesquisa, receio de “responder errado”, ter sua
identidade revelada, dentre outras possibilidades –, decidiu-se descartar tais respostas.
Após esse processo, os quinze questionários selecionados foram lidos, analisados, e
então foi elaborado um protocolo que permitiu a observação para a apreciação de todas
as respostas dos professores.
A análise das respostas dos professores favoreceu a elaboração dos seguintes
núcleos temáticos: tempo de docência; critérios para assumir aulas na 5ª série/6º ano;
motivo para ministrar aulas na série/ano; conhecimento dos professores do Currículo
oficial prescrito para os Anos Iniciais; conhecimentos dos professores sobre o processo
de alfabetização; percepção dos professores sobre a articulação entre os Currículos
prescritos: Anos Iniciais e Anos Finais do Ensino Fundamental; percepção dos
professores sobre os conhecimentos prévios necessários para cursar a 5ª série/6ºano;
percepção dos professores sobre as dificuldades encontradas nos alunos da 5ª
série/6ºano; percepção dos professores sobre as causas das dificuldades dos alunos;
como os professores articulam as dificuldades apontadas no cotidiano da sala de aula;
estratégias desenvolvidas em sala de aula para lidar com as dificuldades de
alfabetização dos alunos.
686

A pesquisa apontou que doze dos professores ministraram aulas para a referida
série/ano por escolha própria. Saliente-se que a atribuição de aulas ocorre de forma
descentralizada (na própria escola) ou centralizada (na Diretoria de ensino), dependendo
da situação funcional do professor, de sua posição em listas de classificação e da
disponibilidade de aulas por ano/série.
A respeito do que motivou suas escolhas, destacaram três aspectos principais: a)
conteúdo ministrado no ano/série; b) a idade dos alunos e c) a junção dos dois fatores,
conteúdo e idade.
Nenhum dos sujeitos demonstrou ter escolhido esse ano para lecionar levando
em conta sua formação e os saberes necessários para lecionar nessa etapa, os quais
implicam, além do conhecimento das exigências expressas no Currículo oficial quanto
ao ensino da Língua Portuguesa para o segmento, também a continuidade do processo
de alfabetização e letramento, como se lê na apresentação do referido Currículo, que,
em linhas gerais, define a formação dos alunos na língua materna apontando para a
superação de atividades voltadas apenas para informação, posto que devemos formar
sujeitos para o mundo do conhecimento por meio da linguagem. (SÃO PAULO, 2012)
No que tange ao conhecimento do Currículo dos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental, desenvolvido por meio do Programa Ler e Escrever, as respostas indicam
que os docentes consultados: conhecem, conhecem pouco ou não conhecem.
Tanto os que afirmam conhecer o Currículo oficial dos Anos Iniciais quanto os
que responderam que o conhecem pouco, mostram desconhecer a teoria construtivista
desenvolvida por Piaget e adaptada para a alfabetização pelas pesquisadoras Emília
Ferreiro e Ana Teberosky: concepção que embasa o ensino dos alunos deste segmento
nas escolas da rede pública do estado de São Paulo.
Conhecer o Currículo oficial desenvolvido nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental, bem como a proposta metodológica para esta etapa do ensino, a qual
enfatiza a dimensão didática (escolha dos melhores recursos + boas
instruções/orientações) que favorece a construção do conhecimento por parte dos
alunos, parece ser uma condição necessária para que o processo de alfabetização se
desenvolva com sucesso e sem solução de continuidade no 6º ano.
As respostas evidenciaram, também, o desconhecimento e a incompreensão, não
somente do Currículo oficial do Estado de São Paulo, como também do documento que
embasa sua elaboração: os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL - PCNs, 1997),
que descrevem os objetivos gerais do ensino da Língua Portuguesa para o Ensino
687

Fundamental nos dois segmentos, quanto ao ensino e aprendizagem da proficiência


leitora e escritora.

Ao longo dos oito anos do ensino fundamental, espera-se que os alunos


adquiram progressivamente uma competência em relação à linguagem que
lhes possibilite resolver problemas da vida cotidiana, ter acesso aos bens
culturais e alcançar a participação plena no mundo letrado. (BRASIL - PCNs,
1997, p.33)

Aliada à compreensão da progressão do desenvolvimento das competências que


permitem os alunos encaminharem-se para a proficiência leitora e escritora, entender a
transição de um segmento a outro é ponto facilitador para que a aprendizagem dos
alunos. Estudos apontam para que

A passagem da primeira para a segunda etapa marca o início da convivência


do aluno com uma organização institucional desconhecida: horário
compartilhado por diversas matérias e professores, outros níveis de
exigência, diferentes expectativas quanto à conduta em sala de aula e à
organização do trabalho escolar, novas relações professor-aluno e diferentes
abordagens de ensino e aprendizagem. (MANSUTTI et al., 2007, p.11)

As pesquisadoras, acima citadas, argumentam que as disciplinas, na segunda


metade do Ensino Fundamental, passam a ser apresentadas isoladamente, por diferentes
professores, e com abordagens diferentes, rompendo a totalidade que até então os alunos
conviviam, dificultando a percepção de objetivos comuns tanto por parte de quem
ensina quanto de quem aprende, posto que, para as autoras, é importante “o diálogo e os
pactos consensuais, que os sujeitos se reconheçam como potenciais aliados em torno de
uma causa.” (MANSUTTI et al., 2007, p.11). Em relação ao ensino da leitura e da
escrita, tal transição se apresenta, no estudo do CENPEC, de forma igualmente
problemática, e reflete, de alguma forma, equívocos e incompreensões quanto à
continuidade do processo de alfabetização.
Após análise do protocolo elaborado pelas respostas dos entrevistados,
percebemos algumas contradições apontadas nos quadros abaixo.
A primeira ambiguidade observada foi sobre a preferência manifestada pelos
professores pela faixa etária e os conteúdos curriculares que os alunos devem ter
desenvolvido para progredirem em sua aprendizagem.
688

Conteúdos para prosseguirem na


Idade
aprendizagem
“Conhecimento de leitura e escrita. O aluno
sabendo ler e escrever adequadamente,
consegue progredir em suas aprendizagens
nos anos finais. Saber ler e interpretar o
texto, compreender sua mensagem e
Sujeito 1
“Gosto de trabalhar com esta dominar basicamente o sistema de escrita,
idade” pelo menos, o suficiente para expressar-se
por meio dela, ou seja, ler, escrever,
conseguir ler o que escreveu e conseguir
que outros leiam o que ele escreveu.”
“Gosto, principalmente porque “O mínimo necessário é ser alfabetizado,
os alunos são mais carinhosos, ter domínio da leitura e da escrita nos
Sujeito 4
necessitam de apoio maior do diversos gêneros e para uso social
professor.” adequado.”
“Gosto porque os alunos são “Está totalmente alfabetizado, ter noção de
mais abertos, receptivos ao que organização, ter desejo de aprender, ter
Sujeito 5
o professor propõe em sala de letra compreensível, ter noções básicas de
aula.” escrita e leitura, de parágrafos, de
pontuação, etc.”
“Sim, porque é uma idade em “Os alunos deveriam ter domínio da leitura
que os alunos ainda são bastante e da escrita, ou seja, estarem alfabetizados e
Sujeito 6
infantis e carinhosos e porque letrados”
gosto muito do conteúdo.”

Os professores parecem apreciar essa suposta condição infantil que se por um


lado tornam os alunos mais disponíveis e carinhosos com os professores, por outro, os
colocam em uma situação de pouco saber. No entanto, esses professores revelam em
seguida, altas expectativas em relação a esses alunos, como sugere o uso recorrente da
expressão “domínio” da leitura e da escrita, levando-se em consideração que este
domínio resulta de um processo que pode levar toda uma vida. De acordo com a
pesquisadora Telma Weisz (2010), tal percepção dos professores é uma visão
adultocêntrica, posto que eles percebam o conhecimento dos alunos sob sua perspectiva,
de adulto, que domina o conteúdo ensinado, não podendo enxergar o objeto do
conhecimento com os olhos de quem ainda não sabe.
Quanto ao conhecimento sobre o processo de alfabetização e a dificuldade dos
alunos da 5ª série/6º ano, revelam-se equívocos conceituais sobre o processo de
alfabetização.
689

Conhecimento sobre o processo


Dificuldade dos alunos
de alfabetização
“Devido eu ser professora de EFI “Alguns alunos alfabéticos não lê, nem
também e alfabetizar à 20 anos, interpreta, nem produz textos. Os
conheço os processos de alfabéticos tiveram dificuldades em
Sujeito 2 aprendizagem e às causas e produzir textos com coesão, coerência
consequências de alunos não textual, estruturação e paragrafação.”
alfabetizados ainda no ciclo II,
embora não possa solucionar
todos os problemas.”
“Estou conhecendo atualmente no “Ler/escrever (alfabetização),
curso de Pedagogia.” ortografia, regras gramaticais,
objetividade, organização do caderno,
Sujeito 3 transposição de linguagens (ex: poética
para narrativa).”
“O processo de Alfabetização é “Eles tem muitas dificuldades de leitura
contínuo e quando o aluno chega e escrita, de compreensão dos objetivos
no sexto ano para uma grande e conteúdos trabalhados, não conhecem
Sujeito 5 parte dos alunos está completo, as regras básicas de escrita e
mas para outra parte ainda está em gramática.”
andamento, pois muito alunos
necessitam de apoio, reforço para
avançarem.”
“Sei que atualmente, nas escolas “Para os alunos alfabetizados e letrados
estaduais, ocorre por meio de as dificuldades são absolutamente
Sujeito 6
hipóteses e não mais como era normais, dúvidas. Mas os alunos não
antigamente, pelo método alfabetizados ou letrados não realizam
tradicional.” as atividades, não acompanham os
textos, as leituras e nem mesmo
conteúdos.”
“Leitura e escrita. E “Alguns alunos, tem defasagem das
conhecimento prévio do meu séries anteriores tanto na parte escrita,
Sujeito 8
aluno.” como a da leitura.”
“Fiz Pedagogia e cursos de “Ler, compreender, interpretar e
especialização, porém não me escrever com propriedade e
Sujeito 14
sinto preparada, ainda, para proficiência.”
alfabetizar.”

Além das já constatadas altas expectativas em torno das capacidades dos alunos
que iniciam a segunda etapa do Ensino Fundamental (ex.: exigências de coesão e
coerência textual, transposição de linguagens, regras gramaticais, ler, compreender,
interpretar e escrever com propriedade etc.), as respostas dos professores que dizem
conhecer o processo de alfabetização, quando questionados sobre as dificuldades dos
alunos, apontam o desejo de que o conhecimento sobre as práticas de leitura e escrita
esteja totalmente desenvolvido ao final do 5º ano, como se a aprendizagem da língua
escrita ocorresse “(...) termo a termo entre parcelas de saber e parcela de tempo”
(LERNER, 2002, p. 20).
690

De acordo com Lerner (2008) esta concepção de linearidade temporal no ensino


da língua escrita, sugerida pelos professores em suas respostas, dificulta a aprendizagem
da leitura e escrita.
Ao cruzarmos o conhecimento que os professores têm sobre o Currículo oficial
dos Anos Iniciais, ou seja, como esses alunos se aproximam do objeto de ensino – a
língua – e quais conhecimentos precisam ter para continuarem sua aprendizagem, o
equívoco fica ainda mais evidenciado, como demonstra o quadro abaixo.
Percepção dos professores sobre os
Conhecimento do currículo
conhecimentos prévios dos alunos
oficial dos Anos Iniciais
para cursar a 5ª série/ 6º ano
“Pouco. Sei que ele prioriza a “Conhecimento de leitura e escrita. O
alfabetização e que aceita as aluno sabendo ler e escrever
hipóteses, trabalhando na adequadamente, conseguem progredir
evolução gradativa do aluno.” em suas aprendizagens nos anos finais.
Saber ler e interpretar o texto,
compreender sua mensagem e dominar
Sujeito 1 basicamente o sistema de escrita, pelo
menos, o suficiente para expressar-se
por meio dela, ou seja, ler, escrever,
conseguir ler o que escreveu e conseguir
que outros leiam o que ele escreveu.”
“Sim, pois sou PEB I também “Seria muito bom se todos estivessem
(Professor de Educação Básica I)” alfabetizados no 6º ano, pois os
Sujeito 2
conteúdos baseados no currículo, que
procura abranger à todos com
igualdade, às vezes, não há progressão
com bom desempenho por estes alunos
terem dificuldades.”
“Não conheço.” “O mínimo necessário é ser
alfabetizado, ter domínio da leitura e da
Sujeito 4
escrita nos diversos gêneros e para uso
social adequado.”
“Pouco conhecemos nos anos “Os alunos deveriam ter domínio da
finais sobre o currículo dos anos leitura e da escrita, ou seja, estarem
Sujeito 6
iniciais. Sabemos apenas que os alfabetizados e letrados.”
alunos passam por sondagens e
são classificados por hipóteses
para que hajam intervenções.”
Sujeito 9 “Alguma coisa.” “Ao menos saber ler e escrever.”
Sujeito 10 “Não.” “Acho que no mínimo serem bem
alfabetizados.”
Sujeito 14 “Sim.” “Ler, compreender e interpretar e
escrever com propriedade e
proficiência.”
Sujeito 15 “Ainda não.” “Principalmente as competências leitora
e escritora.”
691

As respostas acima reforçam a necessidade de o professor conhecer os conteúdos


e as condições didáticas presentes no currículo dos Anos Iniciais a continuidade do
processo de alfabetização que estão presentes no currículo dos Anos Finais do Ensino
Fundamental.
Quando questionados a respeito dos conhecimentos dos alunos para
prosseguirem em sua aprendizagem na etapa final do Ensino Fundamental, salientam
algumas competências e conteúdos tais como: leitura e escrita; ler, interpretar e produzir
textos; conteúdos gramaticais e compreensão de diversos gêneros textuais; ou seja,
aqueles que normalmente são destacados nos livros didáticos da série em que lecionam.
Mais uma vez se evidencia a falta de conhecimento do Currículo e dos Parâmetros
Curriculares. Tais respostas sugerem, também, que os saberes dos alunos que chegam
no 6º ano do Ensino Fundamental não são considerados ao propor a continuidade do
trabalho com Língua Portuguesa na segunda etapa do Ensino.
As considerações dos professores a respeito das causas das dificuldades dos
alunos localizam-nas no sistema de ensino, alfabetização dos anos iniciais, falta de
apoio familiar, mesmo daqueles que dizem compreender o processo de alfabetização e
não no trabalho desenvolvido no 6º ano do Ensino Fundamental.
Os dados apontam para a necessidade de uma formação que considere os
conhecimentos prévios dos professores que recebem os alunos no 6º ano do Ensino
Fundamental e que, com base em suas trajetórias formativas, sugira projetos de
formação continuada que ponham em diálogo os saberes dos professores e as teorias e
metodologias que orientam o processo de alfabetização, propostas pelos currículos
oficiais da Rede Estadual.

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693

Comunicação

A ineficiência do IDESP como indicador de qualidade diante dos efeitos do


território.

Juarez Bernardino de Oliveira


PUC/SP
Francisco Lindoval de Sousa
UNIFESP/SP
Alessandra Simão da Costa
UNINOVE/SP

Resumo: Neste trabalho discutimos como as políticas públicas de educação no Estado


de São Paulo impõe um sistema de gerencialismo, baseadas em mecanismos de
produtividade e meritocracia. Neste contexto a discussão da qualidade do ensino passa
do campo da política social para o da gestão de resultados, imprimindo a
responsabilização dos indivíduos mais penalizados ao ignorar a heterogeneidade dos
lugares onde estão as escolas. Avaliamos o uso do IDESP como ferramenta única de
aferição de qualidade da educação nas escolas paulistas, apontando suas fragilidades
diante da realidade social dos municípios da Região Metropolitana de São Paulo, nosso
objeto de estudo. Demonstramos a relação simétrica entre os baixos resultados no
IDESP e os baixos níveis socioeconômicos de forma a desconstruir o discurso
apresentado pela Secretaria de Estado da Educação em relação à qualidade do Ensino.
Palavras-chave: Avaliação de Sistema, Efeitos de lugar, Vulnerabilidade Social.

Introdução
A Secretaria de Estado da Educação de São Paulo - SEE/SP, ao implantar o
Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo (IDESP)1, acentuou
em sua política a lógica da eficiência padronizada, caracterizada pela criação de
mecanismo de aferição de desempenho individual motivado, guiado e medido por

1
Índice calculado com base no Indicador de Desempenho (ID) e Indicador de Fluxo (IF). O primeiro é
uma média dos resultados dos alunos no Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São
Paulo (SARESP). O segundo considera os índices de aprovação nas diferentes séries de cada segmento
(Ensino Fundamental I, Ensino Fundamental II e Ensino Médio) para compor uma média percentual
(SÃO PAULO/SEE, 2014a).
694

padrões externos que dizem respeito a tarefas e funções predeterminadas para atender
demandas objetivas do aparato e metas centralmente estabelecidas2. (MARCUSE, 1999,
p.78)
Com esta lógica, a SEE/SP deslocou o centro do debate educacional fazendo-o
migrar do campo da política para o da técnica ou tecnologia de gestão (MARCUSE,
1999). Esta operação, fundamental para a sustentação da atual política educacional,
colocou o IDESP e suas variáveis na condição de ferramenta exclusiva de aferição de
qualidade da educação e permitiu o silenciamento de outros fatores e processos que
incidem diretamente no processo de construção e apropriação do conhecimento escolar,
dentre eles os efeitos de lugar (BOURDIEU, 2011).
Neste trabalho, propomos um olhar reflexivo sobre os mecanismos de
mensuração da qualidade utilizados pela SEE/SP de modo a demonstrar como estas
ferramentas, ao desconsiderar os efeitos de lugar nas relações de poder, fornecem leitura
enviesada e reducionista dos processos de distribuição e aquisição de capital escolar
socialmente valorizado.
Com base em dados retirados dos Boletins IDESP e da Fundação SEADE e
utilizando como variáveis o nível socioeconômico, território e desempenho,
comparamos os resultados do IDESP em diferentes regiões, diretorias de ensino,
municípios e escolas, para demonstrar que este instrumento pode ser uma ferramenta
importante para revelar exatamente o que pretende omitir: os efeitos de lugar, as
limitações as quais os indivíduos estão sujeitos diante do território que ocupam e das
relações de poder neles constituídos que impactam nos índices de desempenho escolar3.
Nossa hipótese é que as discrepâncias e construções veladas que o instrumento
(IDESP) carrega tem como função social central, ao transpor para o campo da
tecnologia de gestão questões do campo da política, responsabilizar os moradores das
periferias, sejam professores, diretores, pais ou alunos, pelos péssimos resultados da
escola pública paulista e, o que é mais grave, silenciar e naturalizar o estado de barbárie,
socialmente construído, a qual estão submetidos os moradores das regiões periféricas da
Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) que, além da precariedade de serviços de
saúde, transporte público e segurança, estão agora obrigados a frequentar escolas

2
Para uma discussão aprofundada do IDESP a serviço da materialização da racionalidade tecnológica ver
Gesqui (2012).
3
Para um mapeamento das discussões sobre território-desempenho escolar ver Ernica (2012) e Padilha
(2013).
695

dominadas, ou sob forte ameaça, pela violência endêmica. Este é o legado não declarado
da atual política em São Paulo.

1 – Os usos sociais do IDESP: de indicador de qualidade para dispositivo de


classificação social
O IDESP, parte do Programa Qualidade na Escola (PQE), foi lançado pela
SEE/SP em maio de 2008 com “... objetivo de promover a melhoria da qualidade e a
equidade do sistema de ensino na rede estadual paulista, com ênfase no direito que
todos os alunos da rede pública possuem: o direito de aprender com qualidade...” (SÃO
PAULO/SEE, 2014a, p.1, grifos nossos).
A “grande inovação” do PQE foi o estabelecimento de metas de longo prazo, por
unidade escolar, que permitiriam, segundo a Secretaria, a “melhoria de toda a rede”.
Assim, o PQE,
[...] cumpre o papel de apoiar o trabalho das equipes escolares no esforço da
melhoria da educação e de permitir que os pais de alunos e a comunidade
possam acompanhar a evolução da escola pública paulista. (SÃO
PAULO/SEE, 2014a, p.1).

A função de “apoiar o trabalho das equipes escolares no esforço da melhoria da


educação”, resumiu-se à implantação de mecanismo de aferição de desempenho,
reduzindo a ação do Estado à aplicação de escala métrica com finalidade de classificar
escolas, atribuindo notas de 0 a 10, como se estas medidas, por si só, fossem suficientes
para superar os desafios da escola pública paulista.
Com o IDESP, portanto, criou-se na rede a ideia de qualidade única, padronizada.
Cada escola recebeu uma nota que passou a representar o seu valor no mercado de bens
culturais e, o mais importante, considerando que cada instituição recebia do poder
público os mesmos recursos financeiros, realizava as mesmas provas e apresentava
resultados diferentes, a nota transformou-se, progressivamente, em sinônimo de
capacidade, ou incapacidade (em muitos casos), da equipe escolar de atuar de modo a
obter a melhoria de desempenho esperada.
De avaliação de sistema o índice foi transformado em instrumento de aferição e
classificação do trabalho das equipes, ignorando vasta produção acadêmica que alerta
que estas medidas,
[...] além de confundir e reduzir esta questão a técnicas de mensuração vai
revelar o óbvio [...] uma brutal desigualdade que as pesquisas vêm apontando
há décadas, no desempenho de acordo com a materialidade de condições
sociais (extraescolares) e das condições institucionais (intraescolares) [...]
(FRIGOTTO, 2013, p.81).
696

A avaliação, utilizada como técnica impessoal de aferição de desempenho serviu


ainda para naturalizar a distribuição desigual do capital cultural, transferindo para a
instituição e seus frequentadores a responsabilidade exclusiva por seus resultados.
Para além do contido na Nota Técnica 2014 e nas declarações da Secretaria é
preciso enfrentar o desafio analítico de desconstrução do monumento (LE GOFF, 1990)
que a SEE/SP, com base nos dados do IDESP e sua ideia de qualidade, tem sustentado.
É preciso ir aos números oficiais para demonstrar, em seu campo de combate, o que
estes podem confessar e demonstrar quando interrogados por aqueles que não se
contentam em alimentar o que o discurso oficial insiste em silenciar.
1.2. A construção do objeto de análise
A Região Metropolitana de São Paulo, formada por 39 municípios, possui,
atualmente, 14 Diretorias Regionais de Ensino4 (excluídas as da Capital).
Para a análise foram selecionadas três Diretorias de Ensino da Região
Metropolitana de São Paulo que, na série histórica, apresentaram baixo desempenho no
IDESP: as Diretorias de Ensino da Região de Caieiras, Suzano e Itaquaquecetuba. Cada
uma é responsável por mais de um município com realidades demográficas,
socioeconômicas e culturais diversas. Outra característica importante destas regiões é
que, conforme pode ser verificado no mapa, formam uma extensão da periferia do
município de São Paulo.
Mapa da Região Metropolitana de São Paulo

Após a definição das regiões, foi realizado levantamento do desempenho no


IDESP das três Diretorias. As informações selecionadas foram separadas por município,

4
As Diretorias Regionais de Ensino são órgãos intermediários entre a SEE/SP e as mais de cinco mil
escolas estaduais, com atribuições definidas pelo Decreto nº 57.141, de 18 de julho de 2011.
697

segmento de ensino e região, e dispostas no quadro abaixo de modo a facilitar a


comparação dos resultados.
Municípios que jurisdicionado à Diretoria IDESP Média IDESP
Diretoria de Ensino Município - 2013 Diretoria 2013
de Ensino
EF EM EF EM
Caieiras 2,71 1,67
Cajamar 2,34 1,72
Região de Caieiras Francisco Morato 2,27 1,57 2,31 1,57
Franco da Rocha 2 1,26
Mairiporã 2,54 1,92
Ferraz de Vasconcelos 2,02 1,28
Região de Suzano Suzano 2,33 1,65
2,22 1,52
Itaquaquecetuba 2,07 1,38
Região de Itaquaquecetuba Poá 2,31 1,7
2,14 1,47
Fonte: Boletim IDESP/2013 (SÃO PAULO/SEE, 2014b). Quadro elaborado pelos autores.

Ao comparar o índice por município/segmento, Franco da Rocha apresenta os


piores indicadores (média 2 no Ensino Fundamental e 1,26 no Ensino Médio), seguida
por Ferraz de Vasconcelos e Itaquaquecetuba. Já com melhor desempenho aparecem os
municípios de Caieiras, Mairiporã e Cajamar.
Ao considerar o desempenho médio das Diretorias de Ensino, por ordem
decrescente, temos Caieiras, Suzano e Itaquaquecetuba.
Para além desta comparação classificatória é preciso questionar o que explica a
diferença de desempenho escolar entre as regiões.
Segundo a SEE/SP, a diferença de resultados decorre, fundamentalmente, da
atuação/ação das equipes gestoras em cada órgão regional, portanto, seria possível, por
esta lógica, afirmar que o trabalho desenvolvido por algumas equipes é de baixa
qualidade, ocasionando desempenho educacional abaixo das metas estabelecidas.
Contudo, a explicação da SEE/SP de que o desempenho das regiões seria a
expressão (resultado) da eficiência gerencialista das respectivas equipes pode ser
sustentada quando comparamos índices entre as diferentes Diretorias. Entretanto, o
argumento não encontra lastro quando questionado o desigual desempenho de
municípios dentro de uma mesma Diretoria, pois, neste caso, o trabalho é realizado
pelas mesmas equipes. Assim, como explicar que o trabalho que garantiu o índice 2,71
no Ensino Fundamental no Município de Caieiras obteve 2 em Francisco Morato?
Como justificar a grande proximidade do IDESP entre os municípios de Franco da
Rocha, Ferraz de Vasconcelos e Itaquaquecetuba que, mesmo estando em áreas
distantes, em especial, Franco da Rocha em relação aos outros dois Municípios,
apresentam índices semelhantes? Responder a estas questões ajudará na compreensão
698

sobre os limites do IDESP e da forma como o lugar influencia e estigmatiza as


comunidades que nele vivem.

1.3. O que o IDESP não revela


A compreensão do desigual desempenho dos municípios de uma mesma região e
mesmo a proximidade do IDESP de municípios de regiões diversas pode começar a
emergir ao analisar a distribuição da população destes locais por grupos do Índice
Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS5), eufemismo criado para classificar, por nível
de renda, o processo de produção da desigualdade social em São Paulo.
Ao analisar o IPVS dos municípios com o melhor e o pior IDESP no Ensino
Fundamental, da Diretoria de Ensino da Região de Caieiras, respectivamente, Caieiras,
com índice de 2,71 e Franco da Rocha com 2 de IDESP, encontramos os seguintes
dados:
IPVS – Município de Caieiras IPVS – Município de Franco da Rocha

A visualização dos gráficos deixa em evidência que o percentual de pessoas com


baixíssima ou muito baixa vulnerabilidade social no Município de Caieiras é de 40,2%
da população, enquanto que em Franco da Rocha há pouco mais de 16,6% da população
na mesma condição.
Considerando que os dois Municípios são acompanhados pela mesma equipe,
com ações educacionais articuladas, a diferença de desempenho no IDESP,
coincidentemente, neste caso, pendeu de modo desfavorável ao Município com maior
percentual de pessoas com média, alta e muito alta vulnerabilidade que representa
quase 60% da população.

5
Entre os 66.096 setores censitários do Censo Demográfico 2010, o IPVS classifica 59.773 em um dos
sete grupos de vulnerabilidade social: Grupo 1: Baixíssima vulnerabilidade; Grupo 2: Vulnerabilidade
muito baixa; Grupo 3: Vulnerabilidade baixa; Grupo 4: Vulnerabilidade média; Grupo 5: Vulnerabilidade
alta (urbanos); Grupo 6: Vulnerabilidade muito alta (aglomerados subnormais) e Grupo 7:
Vulnerabilidade alta (rurais). Entre esses setores, 56.773 estão localizados em áreas urbanas e 3.224 em
áreas rurais e, segundo o Censo Demográfico 2010, abrangem população de 40.545.968 habitantes. Todos
os 59.773 setores possuem pelo menos 50 domicílios particulares permanentes. (SÃO PAULO/SPDR,
2010).
699

Na Diretoria de Ensino da Região de Itaquaquecetuba a distribuição da


população por grupos do IPVS forneceu os seguintes percentuais:

IPVS – Município de Poá IPVS – Município de Itaquaquecetuba

Sem considerar a violência que caracteriza esta Região, é possível observar o


verdadeiro abismo que marca estes dois municípios. Enquanto em Poá o percentual da
população com baixa ou muito baixa vulnerabilidade corresponde a, aproximadamente,
50%, em Itaquaquecetuba este índice não chega a 17%. Se considerarmos apenas a
população no nível de muito baixa vulnerabilidade teremos em Poá aproximadamente
30% e em Itaquaquecetuba 7%. A soma do percentual de pessoas com média, alta e
muito alta vulnerabilidade, neste Município, representa mais de 80% da população.
Na comparação Poá X Itaquaquecetuba o IDESP pendeu negativamente para o
município com os piores indicadores sociais.
Na terceira região, os índices encontrados foram os seguintes:
IPVS – Município de Suzano IPVS – Município de Ferraz de Vasconcelos

Na Região de Suzano o abismo social, quando comparamos os dois Municípios,


não é tão marcante, exceto no percentual de população na condição de muito baixa e
baixíssima vulnerabilidade que em Suzano representa 25% da população e em Ferraz
corresponde a 11%. Nas demais faixas há grande proximidade nos percentuais.
Contudo, o Município em condição de menor vulnerabilidade obteve, mais uma vez,
melhor desempenho no IDESP.
Diferente do que apregoa a SEE/SP, de que as diferenças de desempenho
indicariam, preponderantemente, o domínio das técnicas gerencialistas das equipes
700

locais, os dados apontam clara correlação entre desenvolvimento socioeconômico e


IDESP.
Portanto, nada mais longe da verdade que a afirmação de que o PQE/IDESP
seria um instrumento capaz de “... promover a melhoria da qualidade e a equidade do
sistema de ensino (...) com ênfase no direito de todos os alunos (...) de aprender com
qualidade...” (SÃO PAULO/SEE, 2014a, p.1).
O IDESP transpôs para o campo escolar, a desigual distribuição de capital
econômico e cultural socialmente valorizado, porém, com uma grande virtude: como
algumas regiões e instituições conseguiram bons resultados, o problema deixou de ser
da rede de ensino e passou a ser exclusivo daqueles que não conseguiram alcançar as
metas, o problema foi individualizado.
Os novos culpados (os profissionais que atuam nas regiões periféricas), por sua
vez, reclamam das condições adversas para educar as crianças e jovens destas regiões de
fracasso programado e a SEE/SP, em um exercício de cinismo e dissimulação, limita-se
a dizer que há regiões nas quais, apesar da pobreza, as crianças apresentam melhores
resultados.
Afirmar que crianças aprendem em condições e espaços físicos e sociais
diversos significa, neste caso, omitir os efeitos de lugar sobre a produção e reprodução
social. Qual seriam, afinal, os efeitos do lugar sobre os processos de apropriação de
conhecimento escolar? Seria o lugar capaz de marcar de forma indelével os sujeitos?
Contra-argumentos mistificados e apresentados com o objetivo de desviar a atenção do
problema real.

2. Os efeitos de lugar: o território e o espaço social da escola


O argumento de que crianças aprendem em condições adversas minimiza e, por
vezes, naturaliza a condição de miséria, violência física e simbólica na qual as famílias
são obrigadas a viver e criar seus filhos. Falam da miséria como se estivessem se
referindo a uma doença incurável ou uma catástrofe natural. Como se a pobreza,
socialmente construída, não possuísse construtores.
Os Municípios aqui estudados estão na periferia da RMSP e sofrem os efeitos
deste lugar no espaço social, contudo, é preciso lembrar que estes municípios periféricos
também possuem a sua própria periferia, onde está situada grande parte de suas escolas.
A periferia da periferia é um lugar que pode ser definido, fundamentalmente, pela
precariedade dos serviços de saúde, segurança pública, rede de esgoto, asfalto e
701

transporte público que configuram um isolamento espacial ao limitar as possibilidades


de deslocamento físico e/ou simbólico no plano da metrópole.
Ao desterritorializar as instituições de ensino a SEE/SP omite a informação
fundamental de que
[...] Não há espaço, em uma sociedade hierarquizada, que não seja
hierarquizado e que não exprima as hierarquias e as distâncias sociais, sob
uma forma (mais ou menos) deformada e, sobretudo, dissimulada pelo efeito
de naturalização que a inscrição durável das realidades sociais no mundo
natural acarreta: diferenças produzidas pela lógica histórica podem, assim,
parecer surgidas da natureza das coisas [...] (BOURDIEU, 2011, p.160).

A afirmação perversa de que o lugar ocupado não tem grande importância omite
que os sujeitos “... são constituídos como tais em e pela relação com um espaço
social...” (BOURDIEU, 2011, p.160) e que
[...] os que não possuem capital são mantidos à distância, seja física, seja
simbolicamente, dos bens socialmente mais raros e condenados a estar ao
lado das pessoas ou dos bens mais indesejáveis e menos raros. A falta de
capital intensifica a experiência da finitude: ela prende a um lugar
(BOURDIEU, 2011, p.164).

Desta forma os indivíduos são literalmente cerceados ao lugar de baixo valor no


mercado de bens simbólicos, capaz de conformar sujeitos adequados para sua ocupação.
Assim “... o habitat contribui para fazer o hábito, [e] o hábito contribui também para
fazer o habitat através dos costumes sociais mais ou menos adequados que ele
estimula...” (BOURDIEU, 2011, p.165).
É este o universo de relações duráveis que os jovens são submetidos, desde sua
primeira infância até a entrada no mercado de trabalho. Muitos não conhecem nada
além de seu bairro, exceto pelos programas televisivos.
Será com esta herança de capital social, cultural e linguístico, seus modos
corporais e de pronúncia, com estes efeitos de lugar, que estes jovens ingressarão na
disputa por outra inserção social e enfrentarão os exames padronizados da SEE/SP que,
como destacou Frigotto (2013), “revelam o óbvio”.
O que a tecnologia de gestão a serviço das classificações se recusa a admitir é a
clara evidência de que
[...] o bairro estigmatizado degrada simbolicamente os que o habitam, e que,
em troca, o degradam simbolicamente, porquanto, estando privados de todos
os trunfos necessários para participar dos diferentes jogos sociais, eles não
têm em comum senão sua comum excomunhão. A reunião num mesmo lugar
de uma população homogênea na despossessão, principalmente em matéria
de cultura e de prática cultural: as pressões exercidas, em escala da classe ou
do estabelecimento escolar ou em escala do conjunto habitacional pelos mais
carentes ou mais afastados das exigências constitutivas da existência
‘normal’ produzem um efeito de atração, para baixo, portanto de
nivelamento [...] (BOURDIEU, 2011, p.166).
702

Há, portanto, um mecanismo naturalizado, logo invisível, de reprodução do


fracasso, é o “efeito de atração para baixo” que a SEE/SP não admite, sob pena de ter
que denunciar seus construtores.
Contudo, em 2013 a SEE/SP cedendo às pressões dos profissionais da rede,
criou, para fins de bonificação, o Índice de Nível Socioeconômico (INSE), associado ao
IDESP. Vejamos o que o INSE trouxe de informação sobre as instituições escolares e
seu desempenho.

3. O Índice de Nível Socioeconômico – INSE e o desempenho escolar


O INSE foi criado, segundo a SEE/SP, com o objetivo de “aprimoramento do
modelo de Bonificação por Resultados” e foi incluído no cômputo dos resultados do
IDESP 2013.
Construído com as informações dos questionários contextuais respondidos pelos
pais dos alunos, à época da aplicação dos testes do SARESP 2008, 2009 e 2010, o INSE
agregou indicadores de renda, ocupação e escolaridade. Classificou os alunos de cada
escola, conforme a média do seu nível socioeconômico, numa escala com variação entre
0 e 10, sendo 10 (dez) a escola com o nível socioeconômico mais baixo e 0 (zero) a
escola com nível socioeconômico mais alto.
A divulgação do INSE nos boletins do IDESP permitiu comparar nível
socioeconômico e rendimento escolar de cada escola para verificar se a correlação
verificada entre IPVS e IDESP já constatada permaneceria quando da análise de cada
escola. A Diretoria de Ensino da Região de Itaquaquecetuba, a de pior desempenho
dentre as analisadas neste trabalho, foi a selecionada para esta análise.
Esta Diretoria é responsável pelo acompanhamento de cinquenta e oito escolas
públicas. Consultando os boletins do IDESP de cada unidade escolar obtivemos os
dados de IDESP relativos ao Ensino Médio (EM) e INSE. Classificamos as unidades
conforme seu INSE e agrupamos por quintis, calculando as médias das duas variáveis
(IDESP e INSE) para cada um dos grupos e plotamos os dados no gráfico que segue.
703

6 6,48
5,57
5,02
4,11

1,75 1,63 1,57 1,25 1,24

GRUPO 1 GRUPO 2 GRUPO 3 GRUPO 4 GRUPO 5

MÉDIA INSE MÉDIA IDESP

Gráfico: Comparativo do Índice de Nível Socioeconômico (INSE) e IDESP/EM, escolas da


Diretoria Regional de Ensino de Itaquaquecetuba. Construção dos autores com dados dos
Boletins IDESP 2013 (São Paulo/SEE, 2014b).

O gráfico demonstra que conforme pioram as condições de nível socioeconômico


das famílias as médias de desempenho das unidades escolares no IDESP do EM
também pioram.
Assim, o desempenho superior das escolas no grupo de melhor INSE é dado, no
discurso da SEE/SP, como produto do melhor gerenciamento e eficácia das equipes
escolares. Pode-se então concluir que, segundo a mesma visão, o fracasso é devido ao
“problema nas cabeças dos indivíduos mais pobres e nos erros das escolas que os
servem” (CONNEL, 2013, p.19), bem como à desqualificação dos profissionais que
nelas atuam.

Considerações finais
O uso de um indicador numérico como indicador de qualidade permitiu
dissimular as diferenças sociais no arcabouço das médias. Um olhar mais aproximado
das realidades dos territórios nos quais as escolas estão inseridas fornece elementos para
desmitificar o uso deste indicador único para referenciar a qualidade da educação.
A simetria entre os baixos resultados no IDESP e os baixos níveis
socioeconômicos reforça a ideia de que o IDESP:
a) Reduz a ação educativa das escolas à inculcação de um currículo que
desconsidera os efeitos de lugar sobre relações de ensino-aprendizagem;
b) Dissimula os mecanismos de distribuição e apropriação de um capital
cultural específico ao exigir uma herança cultural a não herdeiros;
c) Desterritorializa as instituições escolares com o intuito de responsabilizar os
alunos mais pobres e os profissionais que ali trabalham pelos baixos
desempenhos.
Estes são alguns dos efeitos do IDESP cotidianamente sonegados aos pais,
alunos e profissionais da rede paulista de ensino.
704

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705

Comunicação

Sobre políticas públicas e gestão voltadas à educação profissional no Brasil

Júlio Penna Fedre


Mestrando em Educação PucCamp

Resumo: Esta comunicação tem como objetivo expor e comentar, ainda que de forma
breve, a atual política pública para a educação profissional e tecnológica em vigor no
Brasil. Parte-se da hipótese de que o atual governo federal busca responder à questão
que relaciona o mundo do trabalho à educação, especialmente partindo-se do
pressuposto de que essa modalidade de ensino tem a incumbência de vislumbrar tanto à
formação intelectual do educando quanto à sua formação para o exercício pleno de uma
profissão, respondendo às demandas socioeconômicas atuais e, também, aquelas ligadas
à cidadania e ao bem-estar dos indivíduos. É a partir deste panorama que são tecidos os
comentários aqui expostos, realizados após a leitura de documentos oficiais
disponibilizados pelo governo federal.
Palavras-chave: Educação; políticas públicas; educação profissional; gestão da
educação profissional.

Introdução

Para Bash (2012, p. 659), citando Tessarin e Wannan (2004, p. 13), o ensino
profissionalizante pode ser definido como “[...] todas as atividades mais ou menos
organizadas ou estruturadas que visam proporcionar às pessoas as habilidades, as
competências e os conhecimentos necessários para a execução de uma tarefa ou um
conjunto de tarefas, que conduzam ou não a uma qualificação formal”.
O Brasil tem a necessidade premente de mão de obra qualificada para atender às
mais diversas áreas da economia (LUCHESI, 2013). Tal qualificação necessita estar
sintonizada com a complexidade tecnológica e superespecializada da economia global,
pois os setores produtivos nacionais possivelmente conseguirão crescer, caso consigam
elevar seus ganhos de escala e produtividade e, assim, se tornarem competitivos como
as economias maduras da Europa, Estados Unidos, países industrializados da Ásia e
706

membros do BRICS1 mais bem sucedidos – Índia e China –, que vêm conseguindo
avanços não apenas no âmbito econômico, mas também no educacional e em outras
áreas centrais para o desenvolvimento socioeconômico e sociocultural das nações,
partindo-se do paradigma desenvolvimentista das sociedades atuais. Caso contrário, a
indústria nacional será, como já vem sendo, engolida pela competição em nível global
com esses países (KUNTZ, 2014). Destaca-se que algumas áreas, ou nichos
tecnológicos, já foram ocupados pela produção de outros países (novamente Índia e
China), que saíram e continuam à frente. Desta forma, o Brasil

[...] assume, cada vez mais claramente, o papel de fornecedor de matérias-


primas, principalmente no comércio com a China e outros países da Ásia. Em
contrapartida, a China exporta principalmente manufaturados para o mercado
brasileiro e, de quebra, toma do Brasil fatias crescentes do comércio com os
latino-americanos” (KUNTZ, 2014).

Somando-se a esses fatores, o Brasil possui grande número de pessoas


desempregadas e uma grande quantidade delas fora do mercado de trabalho formal. Para
os pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) (2013), essas
vagas permanecem ociosas porque o mercado de trabalho passa por uma escassez de
trabalhadores com credenciais suficientes para ocupá-las.
Sob essa perspectiva, esta comunicação tem como objetivo sublinhar as políticas
públicas que, segundo Giovanni e Nogueira (2013), “começaram nas três últimas
décadas a fazer parte da linguagem dos governos (municipais, estaduais e federal), dos
movimentos sociais, das organizações não governamentais, dos sindicatos, dos partidos
políticos e, particularmente, da mídia”, vigentes no Brasil para a educação profissional,
e verificar de forma breve se estas, de alguma forma, pelo menos no discurso oficial
governamental, buscam alterar a imagem dessa modalidade de ensino, aquela voltada
apenas a atender aos nichos mais vulneráveis da população, tendo em vista o panorama
político educacional voltado para essa modalidade de ensino, que nos últimos anos, vem
ganhando grande investimento e esforço em ampliar os indivíduos beneficiados e
atender às demandas por profissionais.
Partindo do pressuposto de que as políticas públicas educacionais vigentes para a
educação profissional passam por quatro fases – agenda, formulação, implementação e
avaliação (Perez, 2010) –, no caso específico deste manuscrito, observar-se-á que as
políticas públicas para a educação profissional vigentes no Brasil encontram-se nas mais

1
Grupo formado pelos cinco maiores países em desenvolvimento no mundo – Brasil, Rússia, China, Índia
e África do Sul.
707

diversas fases, algumas delas ainda na agenda, principalmente, aquelas instauradas após
o projeto de lei do Plano Nacional de Educação (PNE) para o decênio 2011-2020 e
outras já avaliadas pelo governo, pelo menos em dados quantitativos. Portanto, este
estudo visa contribuir para o pensamento e conhecimento dessas políticas públicas.
Como metodologia para a constatação das preposições supracitadas, foram
analisados alguns documentos do Governo Federal, especialmente aqueles publicados
após a divulgação das propostas em discussão para políticas públicas para a educação
profissional tecnológica, no ano de 2004.

Políticas públicas para a educação profissional e tecnológica em vigor

No Brasil, os diversos tipos de educação profissional e tecnológica possuem as


seguintes nomenclaturas: Ensino médio e técnico – aquele que inclui a rede federal,
estadual, municipal e privada e é praticado de forma concomitante ou não; o Sistema S,
ao qual correspondem os Serviços Nacionais de Aprendizagem e de Serviço; as
universidades públicas e privadas; as escolas e centros mantidos por sindicatos de
trabalhadores; as escolas ou fundações mantidas por grupos empresariais; organizações
não governamentais de cunho religioso, comunitário e educacional e ensino profissional
regular ou livre a distância (MANFREDI, 2002).
Segundo o Censo da Educação Básica de 2012, o país possuía 1.063.655 alunos
matriculados na educação profissional, divididos em instituições municipais, estaduais,
federais e particulares. Quando somados aos alunos matriculados de forma integrada ao
ensino médio, o número de alunos cursando a educação profissionalizante sobe de
1.063.655 para 1.362.200, num crescente ano a ano. Entretanto, a maioria desses alunos
está matriculada em cursos independentes do ensino médio, tanto os denominados
iniciais quanto os de continuidade ou requalificação.
Outro dado relevante é o grande número de instituições privadas, sublinhando a
característica dos poderes públicos no Brasil, ao adotarem a escola como “a única
instância capaz de promover a instrução e a educação para todos” (LOPES et al, 2003,
s/p.). Assim, soluções oferecidas por organizações não governamentais, empresas,
associações de bairro, instituições de ensino privadas, igrejas, associações de moradores
etc. foram sempre incentivadas pelo governo, e a elas coube ocupar o papel, também, de
espaços educacionais, dando conta daquilo que o governo não conseguia suprir, como
destaca um dos documentos aqui analisados – Proposta em Discussão para Políticas
708

Públicas para a Educação Profissional e Tecnologia (2004) –, quando refere-se ao


predomínio de instituições privadas nessa modalidade de ensino: “[...] a predominância
das instituições privadas [...] confirmam um movimento de desresponsabilização das
instâncias governamentais federal e estaduais no tocante à educação profissional e
tecnológica de nível básico tecnológico”.
Contudo, é notório que o governo parece estar tentando mudar esse cenário, ao
criar políticas e ações voltadas para essa modalidade de ensino, atuando desde a
infraestrutura para organização das escolas até o reconhecimento de saberes dos
trabalhadores, ficando clara tal perspectiva, ao analisarmos a Proposta em Discussão
para Políticas Públicas para a Educação Profissional e Tecnologia, publicada pelo
Ministério da Educação em 2004, como um primeiro esforço para retificar a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996 –,
reformada pelo Decreto 5.154, de 23 de julho de 20042, reforma esta, que visou
primeiramente à integração da educação profissional:

[...] às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia,


conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva. O
aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental, médio e superior, bem
como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará com a possibilidade
de acesso à educação profissional. (MEC, 2004).

Adiante, o decreto nivela e classifica o ensino profissionalizante e sua área de


atuação, de modo que os cursos e programas ficam divididos em: 1 – aqueles de
formação inicial e continuada de trabalhadores; 2 – educação profissional técnica de
nível médio e 3 – educação profissional e tecnológica de graduação e pós-graduação.
O Plano Nacional de Educação para o decênio 2011-2020 (PNE – 2011/2020)
destaca, em seu Artigo 2º, a formação para o trabalho e a promoção humanística,
científica e tecnológica do país. A seguir, o documento apresenta metas e estratégias
que devem ser tomadas pelos governos nos três níveis (federal, estadual e municipal),
dentre as quais destaca-se a meta número 10: “Oferecer, no mínimo, 25% das matrículas
de educação de jovens e adultos na forma integrada à educação profissional nos anos
finais do ensino fundamental e no ensino médio” (PNE 2011/2020) e a Meta 11:
“Duplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio, assegurando a
qualidade da oferta” (PNE 2011/2020). Tais características, preocupadas com a
formação humanística concatenada com a formação profissional, expostas neste

2
Esta Lei já havia sido amplificada anteriormente pelo Decreto 2208, de 17 de abril de 1997.
709

documento, já estavam sendo discutidas na década de 2000, não que tal preocupação
tivesse surgido nessa década, pois já podia ser observada desde a publicação do
Manifesto dos Pioneiros da Educação em 19323.
Voltando-se à Proposta em Discussão para Políticas Públicas para a Educação
Profissional e Tecnologia, publicada pelo Ministério da Educação, essa apresenta as
metas e ações a serem traçadas visando ao fortalecimento dessa modalidade de ensino e
expõe um discurso mais atual e preocupado com a cidadania e o bem-estar do
trabalhador, em equilíbrio com as mudanças tecnológicas e necessidades do país. De
modo que o “técnico não é simplesmente um fazedor de ações, cumpridor de ordens que
acaba não raciocinando. Ele exerce a função tomando decisões, relacionando-se com
seu superior, com seu colega e com seu subordinado, na execução de suas tarefas”
(MEC, 2004, p.8). Adiante, o documento explicita: “trata-se de um ser reflexivo e
crítico que possui funções instrumentais e intelectuais, dependendo da ação a ser
tomada” (MEC, 2004, p.8), pactuando tais proposições com o atual momento, pois “os
valores humanos, hoje mais do que nunca, estão sendo proclamados, necessários e
desdobrados num sentido ético, de modo a levar este homem, que vivencia e processa a
tecnologia de seu tempo, a ter uma visão maior desse contexto” (GRINSPUN, 2001,
p.28).
Considerando tal posicionamento do governo, alguns princípios foram
enunciados pelo mencionado documento, de forma que a educação profissional deve:
comprometer-se com a redução das desigualdades sociais, assumir que o
desenvolvimento econômico é fundamental, incorporar a educação básica (fundamental
e média) como um direito garantido e empenhar-se para uma escola pública de
qualidade (MEC, 2004). Doravante, o documento enumera os pressupostos específicos
que deverão fundamentar os programas e ações da educação profissional: articular a
educação profissional e tecnológica com a educação básica; integrar a educação
profissional e tecnológica ao mundo do trabalho, requerer a interação da educação
profissional e tecnológica com outras políticas públicas (educacionais ou não),
recuperar o poder normativo da LDB (art. 22, 35, 36 e 39 a 42), proceder à
reestruturação do sistema público de ensino médio e técnico e da educação profissional

3
Cf. AZEVEDO, Fernando de et al. Manifesto dos pioneiros da educação nova (1932) e dos educadores
(1959). Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, 2010.
710

e tecnológica e, finalmente, comprometer-se com a formação e valorização dos


profissionais de educação profissional e tecnológica (MEC, 2004).
Portanto, é importante a interlocução entre as formas de tecnologia, o
conhecimento e a sociedade que afetam abertamente o trabalhador e a comunidade
como um todo. Logo: “Impõe-se um novo princípio educativo que busque
progressivamente afastar-se da separação entre as funções intelectuais e as técnicas com
vistas a estruturar uma formação que contemple ciência, tecnologia e trabalho, bem
como atividades intelectuais e instrumentais” (MEC, 2004, p. 8). Finalmente, o governo
afirma que “a educação profissional e tecnológica não é suficiente, levantando a
hipótese de que o próprio capital moderno reconhece a necessidade dos trabalhadores
terem acesso à cultura de todas as formas e esta estaria na educação básica” (MEC,
2004, p.8).
Assim, esse documento do ano de 2004 visa traçar as novas metas e parâmetros
para essa modalidade de ensino, que é calcada no paradigma dualístico entre intelectual
x instrumental. Para poder somar os dois, a escola tem de somar os conhecimentos
técnico-científicos àqueles sócio-históricos, por meio da articulação entre os sistemas de
ensino e, também, com outros órgãos do Estado, como o Ministério do Trabalho ou o
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
À luz de tais afirmativas, o documento estabelece como ação, a organização da
educação profissional e tecnológica, o que consistiria em um subsistema balizado pelos
princípios da LDB, com flexibilidade e autonomia para as instituições, e as
dependências administrativas buscando valorizar os saberes dos trabalhadores. Contudo,
não deixa clara a forma como essa complexa articulação, especialmente no que diz
respeito à gestão dessas instituições, será feita. Ele apenas sinaliza a possibilidade da
gestão democrática, a qual também foi apontada nesse documento como um ponto para
a organização desse sistema de ensino, bem como para a inclusão, no atendimento, de
pessoas dos mais diversos segmentos da sociedade. A avaliação4 e a divulgação de
informações foram igualmente mencionadas nessa proposta em discussão, bem como
ações voltadas para a educação de jovens e adultos e a continuidade dos estudos dessa
população. Uma dessas ações seria a matrícula conjunta nas duas modalidades de
ensino.

4
Para Perez (2010, p. 1183), “a avaliação de políticas, programas e projetos sociais educacionais foi
incorporada de fato a agenda governamental brasileira no início dos anos de 1990”.
711

Diante de tais apontamentos, ao ler esse documento, deparou-se com uma forma
de pensar a educação profissional atenta às mudanças sociais e também aos novos
parâmetros de comportamento tanto empresarial quanto da sociedade, um pensamento
mais voltado ao bem-estar das pessoas e à prática da cidadania, tendo como pano de
fundo a questão da inclusão social e o respeito à diversidade.
Feitas essas considerações, atualmente, observa-se, de acordo com sítio do
MEC5, que a educação profissional (básica, média e superior) é dividida, no Brasil, em
eixos tecnológicos que organizam e sistematizam os cursos profissionalizantes,
alocados dentro de suas respectivas áreas do conhecimento e natureza das profissões.
Sob esse panorama, atualmente, no Brasil, a educação profissional e tecnológica
deve estar travestida de elemento estratégico para a construção da cidadania e para uma
melhor inserção de jovens e trabalhadores na sociedade atual, marcada por avanços
tecnológicos muitas vezes determinantes para as nações, sem descartar a sua
contribuição às estratégias desenvolvimentistas do país.
A mudança do ângulo de visão para essa modalidade de ensino pode ser
compreendida, também, a partir do momento em que o discurso ganha novas formas.
Essa modalidade não deve mais ser vista apenas como um meio de treinar as pessoas
para ocupar postos de trabalho instrumentais; ela ganha mais amplitude quando deixa de
ser vista de modo reducionista e passa a ser compreendida como um processo de
construção social do trabalhador, qualificando-o e educando-o em “bases científicas,
bem como ético-políticas, para compreender a tecnologia como produção do ser social,
que estabelece relações sócio-históricas e culturais de poder” (MEC, 2004, p. 7).
Portanto, ao todo, são oito programas e ações em funcionamento, mantidos pela
Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação
(SETEC), que visam promover as mudanças com as quais o governo se comprometeu
em relação a essa modalidade de ensino. Conforme o sítio do MEC (2013), são elas:
Programa Mulheres Mil; Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego
(Pronatec); a Rede Certific, que se trata de um programa de certificação de saberes
adquiridos ao longo da vida durante o exercício profissional; Programa de Expansão da
Rede Federal; Programa Brasil Profissionalizado Rede e-Tec Brasil; Programa Nacional
de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica de Jovens e Adultos

5
www.mec.gov.br
712

(Proeja); Curso Técnico de Formação para os Funcionários da Educação


(Profuncionário).
Concomitantemente aos programas mencionados, o governo promove premiações e
outras iniciativas, além de elaborar diretrizes para a educação profissionalizante,
visando fortalecer essa modalidade e balizar questões como desemprego e
empregabilidade, formação do trabalhador e domínio de novas tecnologias,
contemplando não apenas as disciplinas instrumentais, mas também aquelas matérias
próprias do ensino propedêutico, a qualificação para o mercado de trabalho, e
qualificando as exigências e complexidades pertinentes ao desenvolvimento do país
(GRINSPUN, 2001). Como salienta o Documento Base do Proeja:

O que se aspira é uma formação que permita mudança de vida por parte do
aluno; a compreensão das relações que se estabelecem no mundo do qual ele
faz parte; a ampliação de sua leitura de mundo e a participação efetiva nos
processos sociais. Enfim, uma formação plena. Para tanto, o caminho
escolhido é o da formação profissional aliada à escolarização, tendo como
princípio norteador a formação integral (MEC, 2007).

Porquanto, observa-se um esforço em unir o aprendizado das funções manuais às


intelectuais por meio da formação inicial ou continuada, integrada e subsequente com o
ensino fundamental ou médio, como no caso do Proeja e Pronatec. No caso daqueles
que não têm estudo algum ou apenas o ensino fundamental, seja ele parcial ou
completo, a possibilidade de ingressar na escola e dar continuidade aos seus estudos,
destaca-se com a Rede Certific. Finalmente, em outros casos, como o do Programa
Mulheres Mil, a educação tem caráter paliativo, visando retirar o público atendido da
linha de pobreza extrema, miséria e situação de vulnerabilidade, por meio de
qualificação profissional imediata.

Conclusão
Desconsiderando-se o caráter fortemente propagandista do atual governo,
contido nos documentos analisados, todos os programas expostos têm como pilar
central o discurso que: alia cidadania, direitos sociais e educação à consequente inserção
do aluno trabalhador no mercado de trabalho, visando melhorar a renda dos cidadãos
gerando recursos e desvinculando-os de programas de transferência de renda, assim
como atender às exigências capitais atuais, ou seja, às demandas por profissionais em
diversas áreas, no sentido de incrementar o desenvolvimento social e econômico do
país. Portanto, o Governo Federal preparou-se para encarar e ao mesmo tempo que
713

equaliza (pelo menos no que diz respeito a educação profissionalizante) o que


Almerindo Janela Afonso coloca como os dilemas pelos quais a educação passa
atualmente:
[...] atender de forma instrumental as necessidades do capitalismo e dos
interesses econômicos, culturais e sociais hegemônicos, ou, ao contrário,
atender prioritariamente aos indivíduos, em função das necessidades ditadas
pelo seu desenvolvimento cognitivo, afectivo, moral e social, ainda que sem
deixar de referenciar as dimensões colectivas mais amplas. (AFONSO, 2001,
p. 30)

Como apresentado nesta comunicação entende-se que as políticas públicas e a


gestão para a educação profissional atual, buscam o equilíbrio entre os dois objetivos
citados no excerto acima. No que se refere ao estigma dos cursos profissionalizantes,
em muitos dos textos de apresentação dos programas que podem ser apreciados no sítio
do MEC fica clara outra preocupação: aquela que diz respeito ao tipo de formação que
se quer do trabalhador ou estudante, conforme excerto a seguir, extraído da página do
Proeja no sítio do MEC:
[...] o PROEJA tem como perspectiva a proposta de integração da educação
profissional à educação básica buscando a superação da dualidade trabalho
manual e intelectual, assumindo o trabalho na sua perspectiva criadora e não
alienante. Isto impõe a construção de respostas para diversos desafios, tais
como, o da formação do profissional, da organização curricular integrada, da
utilização de metodologias e mecanismos de assistência que favoreçam a
permanência e a aprendizagem do estudante, da falta de infraestrutura para
oferta dos cursos dentre outros (MEC, 2013).

Muitas vezes, as profissões já são classificadas como mecânicas e indutivas sem


que tenham sido avaliadas ou pesquisadas, porém, a nós não cabe verificar se tal
informação procede, pois são inúmeras as profissões, e cada indivíduo tem um jeito
diferente de realizá-la, tendo em vista que alguns podem agir apenas de forma mecânica
e indutiva e outros, utilizando-se do intelecto na mesma atividade. Em vista disso, as
novas políticas para a educação profissional aqui relatadas de forma sucinta, visam não
apenas apagar o estigma dos ofícios manuais tidos como atividades e saberes inferiores
àquelas atividades e conhecimentos apresentados como intelectuais, como pode-se
observar com a Rede Certific, que visa valorar os saberes dos trabalhadores adquiridos
durante o exercício de sua profissão, seja como pescador ou eletricista, profissões, estas,
muitas vezes consideradas inferiores intelectualmente, mas também, mudar a concepção
que o ensino técnico tem no país de ser uma instituição apenas preocupada com a
ocupação das vagas na indústria, sem pensar no bem-estar social do trabalhador.
Agora, a intenção do governo federal está voltada para a completa formação do
educando, visando ora integrar o ensino médio ao profissionalizante, ora, por meio do
714

profissionalizante, levar o educando a prosseguir seus estudos e, ainda, levando aqueles


que não têm estudo algum ou são semianalfabetos, a voltarem para a escola. Ao
trabalhador, cabe o conhecimento instrumental e técnico da profissão e ramo em que
atua e, também, o conhecimento cultural geral, no sentido de que sua atuação no
mercado de trabalho seja consciente e pontual, suscitando uma preocupação com o
estado de bem-estar social, a partir do momento em que algumas das políticas públicas
para a educação profissionalizante estão concatenadas com políticas de inclusão social e
políticas de transmissão de renda. Encerra-se esta comunicação com uma questão
intrigante: será que essas medidas e metas que foram traçadas e tão bem escritas nos
documentos do governo federal e nos sítios oficiais do MEC surtirão efeito em todos os
âmbitos aos quais elas se propõem, a gestão da educação profissional será capaz de tirar
do papel as proposições e aplica-las no âmbito prático?

Referências

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715

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PEREZ, José Roberto Ruz. Por que pesquisar implementação de políticas educacionais
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Disponível em: <www.cedes.unicamp.com.br>. Acesso em: 25 de fev. de 1014.
716

Comunicação

O Processo Avaliativo na Formação de Professores

Karla Eleutéria Cavalcanti Silva de Lima


Mestranda do PPGE / Uninove
Grupo de Pesquisa Educação, História e Instituições Escolares – Bolsista da CAPES
Yonara de Albuquerque Camurça
Mestranda do PPGE / Uninove
Grupo de Pesquisa Educação, Conhecimento e Formação

Resumo: Este trabalho tem como objetivo discorrer sobre o processo de avaliação no
contexto atual que garante a formação de profissionais qualificados para o desempenho
da docência. Para tanto, o referencial teórico baseia-se em bibliografias que apontam a
importância da avaliação na prática pedagógica, buscando analisar criticamente as
questões que permeiam esta prática dentro da instituição de Ensino Superior. Na
maioria das instituições ainda prevalece a avaliação classificatória, seletiva, excludente
e autoritária, que dificulta o processo de aprendizagem e, consequentemente, forma
profissionais desqualificados. A partir do presente estudo, aponta-se a avaliação
formativa como prática avaliativa que é compreendida como reguladora da
aprendizagem tanto por professores, como por alunos em formação, levando em
consideração os propósitos estabelecidos e propondo novos desafios para aquisição dos
conhecimentos. Com isso, entende-se que o processo avaliativo desenvolvido de forma
responsável, coerente, dinâmico, participativo e reflexivo, gera a produção de
conhecimentos significativos que serão essenciais na formação de professores e na
produção de profissionais capacitados para atuar no âmbito educacional.
Palavras-chave: avaliação, formação, aprendizagem, prática pedagógica.

O Processo Avaliativo na Formação de Professores

Independente das discussões, questionamentos e reflexões que transitam pelo


processo de formação de professores, um aspecto que considero crucial para obtermos
profissionais competentes no mercado de trabalho é o processo avaliativo nos cursos de
Pedagogia, que é o que forma professores.
717

A avaliação do processo de aprendizagem é muitas vezes, distorcida por muitos


docentes que avaliam, aprovam e reprovam os alunos na formação de professores, pois,
não utilizam a avaliação com o seu real objetivo. Então, como tornar o professor do
ensino superior consciente do real papel da avaliação?
O educador deve construir o contexto avaliativo, juntamente com os
educandos, pois, estes fazem parte do processo de ensino-aprendizagem. A tomada de
consciência desse educador se faz necessária diante do caráter subjetivo que a avaliação
tem. Pois, a partir do momento em que se estabelece o significado do processo
avaliativo para os alunos, as decisões serão encaradas de maneira real, justa e
significativa.
De acordo com o pensamento de Hoffman (1998, p.17):

Os professores não são “culpados” pelos resultados obtidos pelos alunos, mas
são, sim, responsáveis. Serão, entretanto, culpados se não forem
comprometidos no sentido de buscarem o seu aperfeiçoamento e se não
preservarem a sensibilidade ao lidar com a complexidade do processo.

Vários aspectos devem ser levados em consideração no processo avaliativo.


Um deles são os objetivos determinados no planejamento, que nortearão todo o fazer
pedagógico no processo de aprendizagem. Os objetivos vão definir aonde se quer
chegar. A avaliação vai analisar se tais objetivos foram alcançados e se os conteúdos
trabalhados tiveram significado para os educandos. A partir daí cabe um olhar analítico
sobre o alcance dos objetivos ou não, tendo consciência de que o processo avaliativo
pode interferir positiva ou negativamente no processo de aprendizagem. Para tanto, é
fundamental que o professor formador tenha total conhecimento teórico do que quer que
seja aprendido e avaliado em sua área de ensino.

“Se é importante aprender aquilo que se ensina na escola, a função da


avaliação será possibilitar ao educador condições de compreensão do estágio
em que o aluno se encontra, tendo em vista poder trabalhar com ele para que
ele saia do defasado em que se encontra e possa avançar em termos de
conhecimentos necessários. Desse modo, a avaliação não seria tão somente
um instrumento para aprovação ou reprovação dos alunos, mas sim um
instrumento de diagnóstico de sua situação, tendo em vista a definição de
encaminhamentos adequados para a sua aprendizagem.” (LUCKESI, 1999,
p.81)

A avaliação coerente e significativa exige do educador uma constante reflexão


sobre as concepções que norteiam seus julgamentos. A permanente busca pelo
aprimoramento de seus critérios avaliativos e sua tomada de consciência de que a
necessidade de transformá-la e atualizá-la para que realmente sejam alcançados os
718

objetivos que a avaliação tem, são aspectos que devem ser reconhecidos como parte
deste processo. A avaliação deve ser encarada sempre como um processo e nunca como
um fim. Desta forma, o professor é capaz de analisar ao longo do processo de ensino-
aprendizagem e construir valores subjetivos de acordo com os critérios escolhidos.
É necessário que o professor trace critérios para a forma de avaliar com um
olhar crítico, rígido, absoluto e justo, estando em consonância e coerente com a
metodologia utilizada e com os objetivos propostos. No processo de construção do
conhecimento pelo aluno, deve levar-se em consideração as condições do meio em que
está inserido, o momento sócio-político-econômico, a bagagem cultural já adquirida
pelo aluno e o próprio desempenho do professor, que ao mesmo tempo foi o mediador
desses conhecimentos, é o avaliador de todo o processo de construção.
Para Hoffman (1998, p.37):

Daí porque o processo não pode se dar por etapas, mas


continuamente...Muitos professores concordam com essas afirmações, senão
a maioria. Mas, o que se percebe é que embora enunciem essa concepção,
não chegam a desenvolver um processo avaliativo que respeite tal
dinamicidade do processo de conhecimento. Permanece muito forte, nos
meios educacionais, a busca de “novas tecnologias” em avaliação, a
expectativa por fórmulas, normas e critérios que, magicamente, contribuam
para uma ação diferenciada dos professores. A distância entre o discurso e a
prática é muito forte em avaliação. Professores criticam, por vezes, os
mesmos procedimentos que desenvolvem em sala de aula com seus alunos.

O olhar atento e individual para o estudante também é um aspecto relevante no


processo avaliativo, pois o indivíduo inserido neste processo complexo, o acúmulo de
conhecimentos já adquiridos ao longo do percurso, o seu contexto social, histórico e
cultural, e todo o conhecimento mediado no momento da graduação, irão construir o
profissional que atuará nas salas de aula e que educará outros indivíduos. Portanto, estar
atento, sem classificar os alunos pelas relações interpessoais, ou excluí-los pelas
limitações ou dificuldades encontradas, ou construir um conceito antecipado em relação
ao desempenho dos alunos, ou mesmo utilizar a avaliação como forma de autoridade do
professor podem ocasionar no fracasso de todo o processo avaliativo. Segundo Hoffman
(1998), “Um sem-número de educadores concordam que a construção do conhecimento
pelo educando se dá de forma dinâmica e progressiva, não havendo início, meio ou fim
nesse processo”. Encontrar meios e critérios que busquem o alcance dos objetivos na
avaliação, farão com que o educador chegue mais perto do real e justo resultado do
desempenho de seus alunos, colocando-os cada vez mais próximo de uma formação que
719

lhe oportunize a constante busca de conhecimentos, que o torne um educador


competente, seguro e habilidoso.

“O processo avaliativo não deve estar centrado no entendimento imediato


pelo aluno das noções em estudo, ou no entendimento de todos em tempos
equivalentes. Essencialmente, porque não há paradas ou retrocessos nos
caminhos da aprendizagem. Todos os aprendizes estarão sempre evoluindo,
mas em diferentes ritmos e por caminhos singulares e únicos. O olhar do
professor precisará abranger a diversidade de traçados, provocando-os a
prosseguir sempre”. (HOFFMAN, 2005, p. 47)

O resultado do trabalho desenvolvido em sala se reflete não só na avaliação


para que os alunos alcancem uma média, mas também na avaliação do trabalho do
professor, que deve ter um pensamento reflexivo diante deste resultado e ir em busca da
constante capacitação para o seu aprimoramento profissional. Quando ocorre um
fracasso no processo de aprendizagem, sendo comprovado por meio das notas dos
alunos, cabe ao próprio professor uma autoanálise das metodologias utilizadas, da
revisão e ajuste do planejamento e da adequação dos métodos avaliativos aplicados.
Todo e qualquer procedimento utilizado no processo de avaliação deve estar de acordo
com que será desenvolvido em sala e discutido entre os educandos para que fique
esclarecido o que e como serão avaliados, podendo opinar quando os critérios pré-
estabelecidos forem explicados permitindo assim, um processo avaliativo transparente e
democrático.
Segundo Hoffman (2005, p.20):

Baseia-se, para tal, no confronto entre objetivos pretendidos e alcançados,


entre pontos de partida do estudante e pontos de chegada, mudanças
percebidas de comportamento, comparação com padrões alcançados pelo
grupo. Uma vez comprovada e explicada essa etapa de aprendizagem
transcorrida, dá-se por concluída a avaliação. Seja ao final ao final de
períodos ou ao final de um ano, a preocupação do avaliador é de apontar e
tentar explicar resultados obtidos pelo aluno, para iniciar um novo período
avaliativo.

Diante da clareza do processo avaliativo, dos critérios definidos e até mesmo


das penalidades sofridas quanto ao que não for comprido, o aluno terá uma visão ampla
de como será analisado pelo professor, pois houve sua participação ativa na construção
deste processo. Quando o aluno se sente parte do processo, ele valoriza e acata da
melhor maneira o resultado obtido.
Com a preocupação da qualidade dos professores em formação no curso de
pedagogia, penso que o processo avaliativo é um grande aliado na busca pela
competência desses profissionais. O rigor, a criatividade e a democracia na construção
720

do processo avaliativo traz à própria formação dos professores um ganho significativo


no que diz respeito à construção de conhecimentos que tornarão o professor em
formação um profissional cada vez mais competente.
Quando o professor do ensino superior traça em seu plano como objetivo
desenvolver em seus alunos capacidades para torná-los profissionais competentes
capazes de promover a aprendizagem significativa em seus futuros alunos, é comum
que este professor formador reflita sobre o seu fazer pedagógico, sua prática educativa,
orientando de acordo com suas experiências e organizando seu processo educativo.
A partir das reflexões feitas do processo de aprendizagem, do levantamento do
resultado das práticas educativas aplicadas e do efeito do processo avaliativo, o docente
é capaz de direcionar novas ações pedagógicas que levem os alunos a alcançarem a
aprendizagem de maneira cada vez mais eficaz e significativa. Essas práticas reflexivas
vão muito além da dimensão da sala de aula. As reflexões devem atingir uma dimensão
ampla, que sejam capazes de transformar o pensamento acomodado e repetitivo dos
docentes em possibilidades constantes de aprendizagem e de avaliação.
Quando os objetivos estabelecidos, não somente do plano de ensino, mas
também os objetivos da própria avaliação, ficam claros tanto para os docentes como
para os futuros docentes o que se esperar da avaliação e aonde se quer chegar com este
processo, sendo esclarecidos de que forma serão analisados seu desempenho e atitudes.
Avalia-se a aprendizagem para muitas finalidades. A busca pelo sentido de
avaliar é a etapa fundamental para que pessoas e organizações façam escolhas coerentes
e conscientes em relação aos esforços e investimentos que desejam embutir no processo
avaliativo. O sentido encontra-se em fazer com que cada envolvido na avaliação procure
reconhecer e expor o contexto em que está inserido, procurando destacar o real papel
tem no processo de ensino-aprendizagem do professor em formação.
A avaliação é uma ferramenta importante, pois irá definir a aprovação,
reprovação, recuperação e certificação do aluno. Portanto, deve ser uma prática que
contribua de forma significativa no processo educacional, que possa permitir o
aprimoramento da prática docente, atuando como instrumento orientador e construtivo
do processo. Enfim, a avaliação é extremamente necessária para que as exigências
administrativas educacionais sejam cumpridas. De acordo com (Hoffman, 2005, p. 18),
“avaliar para promover significa, assim, compreender a finalidade dessa prática a
serviço da aprendizagem, da melhoria da ação pedagógica, visando à promoção moral e
intelectual dos alunos”.
721

Se um professor planeja de forma coerente e transparente sua avaliação e tem


seus objetivos traçados de acordo com os conteúdos e metodologias aplicadas, esta pode
tornar-se um objeto provocativo e estimulador para os educandos, enriquecendo a
prática educativa e construindo mentes capazes de formular hipóteses, resolver
problemas e adquirir conhecimentos que serão úteis em sua vida profissional como
docente.
No contexto, em que a escola assume a qualidade de uma instituição que forma
o indivíduo em sua totalidade, é fundamental a capacitação permanente dos
profissionais da educação, cujo papel será muito mais árduo do que se pode imaginar,
pois, devem estar comprometidos com a educação dos indivíduos, mostrando-lhes
perspectivas de vida e proporcionando-lhes o desenvolvimento de suas potencialidades.
Neste sentido, a concepção de avaliação que apresenta responder as reais
necessidades do contexto atual e que visa a construção da cidadania, unida à formação
do indivíduo enquanto ser pensante e transformador e a formação profissional é a
avaliação formativa. Essa concepção avaliativa é a forma de regular a ação pedagógica
contra o fracasso e as desigualdades, deixando de lado o perfil celetista, comparativa e
classificatória e desempenhando um papel de formação contínua e global do
aprendizado para os alunos universitários.
De acordo com Perrenoud (1999, p. 89):

A ideia de avaliação formativa sistematiza esse funcionamento, levando o


professor mais metodicamente os alunos, a compreender melhor seus
funcionamentos, de modo a ajustar de maneira mais sistemática e
individualizada suas intervenções pedagógicas e as situações didáticas que
propõe, tudo isso na expectativa de otimizar as aprendizagens. (...) Essa
concepção se situa abertamente na perspectiva de uma regulação intencional,
cuja intenção seria determinar ao mesmo tempo o caminho já percorrido por
cada um e aquele que resta a percorrer com vistas a intervir para otimizar os
processos de aprendizagem em curso.

A avaliação formativa é uma concepção que busca focar em um diagnóstico


preciso das dificuldades que o aluno apresenta, com o objetivo de permitir a
compreensão dessas dificuldades e com o intuito de superá-las. Busca também permitir
o ajuste entre a prática educativa e a realidade dos progressos dos alunos. É a partir daí
que o professor é capaz de estabelecer uma relação entre o desempenho e a competência
que se quer alcançar, que são fundamentais no aprendiz para que sejam alcançados os
objetivos propostos, havendo a aprendizagem de fato.
Para Perrenoud (1999), é considerada avaliação formativa toda avaliação que
ajuda o aluno a aprender a se desenvolver, participando da regulação das aprendizagens.
722

“Importa, claro, saber como a avaliação formativa ajuda o aluno aprender,


por que mediações ela retroage sobre os processos de aprendizagem.
Todavia, no estágio da definição, pouco importam as modalidades: a
avaliação formativa define-se por seus efeitos de regulação dos processos de
aprendizagem. Dos efeitos, buscar-se-á a intervenção que produz e, antes
ainda, as observações e as representações que orientam esta intervenção”.
(PERRENOUD, 1999, p.103-104)

Para o autor, os professores que acompanham diariamente seus alunos, com a


tarefa desafiadora de avaliar, pois não basta simplesmente acreditar nesta concepção,
mas conhecer o real papel da avaliação formativa para colocá-la em prática e possa ter a
capacidade de observar, analisar e interferir no processo de aprendizagem, de acordo
com suas concepções de educação.
A avaliação formativa está focada na gestão da aprendizagem, como prática
formadora pedagógica, privilegiando a autorregulação. De fato é reguladora, pois o seu
objetivo é de interagir a prática educativa, as necessidades e dificuldades dos educandos
e a realidade dos progressos obtidos. Regula a relação entre a competência e o
desempenho do aluno que são necessários para a aquisição da aprendizagem e alcance
dos objetivos estabelecidos.
Esta modalidade de avaliação ocorre durante o processo de ensino-aprendizagem,
possibilitando a regulação progressiva do nível de aprendizagem alcançado pelo aluno.
Desta forma, as necessidades e as dificuldades apresentadas pelos alunos podem ser
identificadas antes do resultado final, dando a oportunidade aos professores e alunos de
reconstruírem as estratégias de maneira reflexiva, assim como, possibilitando uma
autoavaliação, tanto do aluno em relação ao seu desempenho, mas também do professor
enquanto mediador do processo.
Perrenoud ressalta ainda que não há necessidade do domínio dos conhecimentos e
das habilidades. A instituição escolar continua sendo o ‘campo de batalha’, onde
prevalece o melhor e o pior, a classificação, muito mais do que o próprio conhecimento.

“Na competição escolar, responder constantemente a mais exigente das


normas não é a melhor maneira de sobreviver, mais vale saber dosar o
esforço, manter a distância. A avaliação formativa e as pedagogias de
domínio voltam as costas a essas estratégias utilitaristas, até mesmo cínicas.
Postulam que o aluno não deveria parar de trabalhar antes de dominar sólida
e duradouramente o essencial dos saberes e habilidades ensinadas, o famoso
80% de Bloom (1972, 1979, 1988). Aqueles que conhecem, por experiência,
o bom uso da instituição escolar compreenderam que, nesse jogo, às vezes
mais se perde do que se ganha. Isso não quer dizer que a avaliação formativa
será constantemente combatida. Ela será utilizada quando servir ao interesse
723

das famílias e dos alunos melhor colocados, isto é, quando o investimento no


saber parecer uma boa solução. (PERRENOUD, 1999, p. 120)

A avaliação formativa é entendida como prática avaliativa enquanto processo


contínuo que pretende melhorar as aprendizagens dos alunos durante o processo de
formação. “É formativa toda avaliação que ajuda o aluno a aprender e a se desenvolver,
que participa da regulação das aprendizagens e do desenvolvimento no sentido de um
projeto educativo”. (Perrenoud, 1999,78)
O autor Perrenoud defende que a proposta essencial na avaliação formativa é o
investimento na identidade e formação dos professores. Neste caso, se os professores
buscassem serem mais justos e conscientes na ação avaliativa, teríamos profissionais
bem mais competentes atuando no âmbito educacional e formando de fato, indivíduos
que possam ser transformadores e que exerçam a cidadania de maneira responsável e
autônoma.
A intenção dessa avaliação formativa é de que o aluno possa se apropriar dos
critérios avaliativos passando a regular o próprio processo de aprendizagem. É
imprescindível que o aluno saiba exatamente o que se espera de seu desempenho, em
conformidade com seu nível de ensino. Isso significa que o aluno terá clareza dos
critérios estabelecidos a serem avaliados e que não precise agir em uma lógica de
acertos e erros. Portanto, o professor do Ensino Superior deve possibilitar seus alunos a
participarem da construção dos critérios avaliativos, inclusive a realizarem uma
autoavaliação, como parte desse processo. A autoavaliação passa a fazer parte da ação
avaliativa e do processo de ensino-aprendizagem. Com isso, espera-se que o aluno se
constitua como avaliador autônomo e parte integrante de todo o processo educativo.
Pensar em avaliação como um processo contínuo que possa contribuir na
aprendizagem dos alunos, ainda não é uma prática desenvolvida nas instituições de
Ensino Superior. Gradativamente, observa-se uma organização que busque trajetórias
mais eficazes no ato de avaliar, porém, ainda muito atrelada ao conceito tradicional com
provas, trabalhos frequências nas aulas, entre outros, somando a um valor numérico que
permite a progressão, permanência, sucesso ou fracasso.
É necessário construir uma prática no ato de avaliar que esteja voltada para a
qualidade do que o aluno adquiriu enquanto aprendizagem, mesmo que o valor
quantitativo seja necessário, mas que seja voltada para a avaliação do desenvolvimento
harmonioso e da aprendizagem integral do professor em formação, pois ele deve ser
visto como agente transformador da sociedade.
724

Avaliar envolve valores morais, ética e, consequentemente, pessoas. Portanto,


entendemos a ação avaliativa como um procedimento natural da vida, na qual suas
finalidades são inesgotáveis e as transformações de avaliar alcançam diversas e amplas
dimensões, cujos envolvidos são parte integrante de todo o processo.
Não basta ter concluído o curso de formação de professores com o objetivo
apenas de adquirir a certificação. É essencial considerar que a sólida formação do
educador irá consequentemente refletir nas ações e práticas no âmbito escolar e a
avaliação enquanto ato pedagógico, deve se apoiar em valores e princípios que estejam
comprometidos na transformação social e na construção dos saberes fundamentais na
formação humana.
É importante que a organização do currículo do Ensino Superior destaque o
processo avaliativo como ferramenta que possibilite a decifração cada vez mais crítica e
reflexiva, para que se alcance a profunda significação dos conhecimentos e que estes
possam ser reconstruídos e aplicados no exercício da prática educativa.
A construção e o fortalecimento da ação avaliativa que vise a análise da
qualidade da aprendizagem tanto teórica, quanto prática só será possível se tivermos
uma olhar focado no desejo de construir uma sociedade transformadora por meio da
ação educativa significativa no âmbito educacional. A aprendizagem é um processo e
não deve ser vista como um produto.
No atual cenário educativo em que vivemos, pode estar ao alcance das
instituições, de professores e alunos, um processo avaliativo que priorize o fazer, o
refazer, o autoconhecimento, o construir, o reconstruir e o aprender, com o intuito de
aprimorar cada vez mais o processo educacional. É por isso, que o ato de avaliar deve
ser coerente, desafiador, consciente e transformador, na constante busca do aprendizado
da educação contemporânea.

Referências Bibliográficas:

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, n. 9.394, de 20 de


dezembro de 1996.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa.


1ª ed. Coleção Leitura. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

HOFFMANN, Jussara Maria Lerch. Avaliação Mediadora. Uma Prática em


construção da Pré-escola à Universidade. Porto Alegre: Educação e Realidade, 1993.
725

___. Avaliar para promover – As setas do caminho. 7ª ed. Porto Alegre: Editora
Mediação, 2005.

___. Pontos e Contrapontos – Do pensar ao agir em avaliação. 10ª ed. Porto Alegre:
Editora Mediação, 1998.

LUCKESI, Cipriano C. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições.


9ª ed. São Paulo: Cortez, 1999.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Os Parâmetros Curriculares Nacionais: Dos


Professores que Temos aos que Queremos? In: BICUDO, Maria Aparecida Viggiani
e SILVA JR, Celestino Alves. (Org.) Formação do Educador e Avaliação
Educacional – São Paulo: Editora UNESP, 1999.

PERRENOUD, Philippe. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens –


entre duas lógicas; trad. Patrícia Chittoni Ramos. Porto Alegre: Artes Médicas Sul,
1999.

PIMENTA, Selma Garrido (org.). Saberes Pedagógicos e Atividade Docente. 3 Ed.


São Paulo: Editora Cortez, 2002.
726

Comunicação

Processos formativos: professores e gestores

Katsue Hamada e Zenun


NAP Escola do Futuro/USP
Secretaria Municipal de Educaçao de Carapicuiba/SP – Grupos de Estudos Curriculares
Adriana Mendes dos Santos Silva
L. Portuguesa
Clarissa Kato de Oliveira Ramalho
Ed. Física/Movimentos
Paloma Adriana Nunes
História
Rafael Santos Campelo
Geografia
Silvio Pereira Andrade
Matemática
Suzana Cardoso dos Santos Siqueira
Arte

Resumo: Desde 2009, a Secretaria Municipal de Educação de Carapicuíba, na região


metropolitana de São Paulo, iniciou o programa de formação continuada para os
gestores e professores a partir da elaboração de seu Plano Curricular, fundamentado em
teorias interacionistas de Currículo, buscando a identidade de sua Rede de Ensino, e
valorizando a realidade e a cultura local. Em 2013, o projeto ampliou a reflexão sobre as
estruturas do sistema; retomou conceitos norteadores como conhecimento, abordagem
metodológica e avaliação; bem como trouxe a discussão sobre reorganização das
disciplinas em áreas do conhecimento, determinando a seleção e distribuição dos
conteúdos o que demanda também a reorganização dos tempos e espaços escolares.
Constitui-se então, o Grupo de Estudo Curricular (GEC), formado especialistas das
diversas áreas do conhecimento, gestores e professores da Rede de Ensino de
Carapicuíba, se reuniu mensalmente, por áreas do conhecimento/disciplinas para
aprofundar os estudos. Em cada componente curricular foi indicado um professor ou
gestor participante para acompanhar as práticas pedagógicas e reflexão nas escolas,
727

colhendo material para a análise e elaboração do documento curricular. Em janeiro de


2014 foi apresentado à Rede o Documento Curricular Preliminar, publicado o no Portal
“Olhar Educador” e discutido nas escolas na semana do planejamento. Durante todo o
primeiro semestre, os coordenadores dos GEC visitaram escolas, observaram as práticas
pedagógicas, elaboraram relatórios, culminando com a realização do 6º EnFoCo
(Encontro de Formação Continuada) para compartilhar as práticas pedagógicas e as
reflexões realizadas nas escolas da Rede Municipal.
As reflexões ora apresentadas são fruto do trabalho desses grupos e da equipe
pedagógica que assessora o projeto de construção do Currículo do município e nesse
processo, a formação continuada dos sujeitos que dele participam.
Palavras-chave: políticas públicas – formação continuada – currículo

Histórico
Carapicuíba é um município da Região Metropolitana de São Paulo, um dos doze
povoados fundado pelo Pe. José de Anchieta por volta de 1580, no início do processo da
colonização portuguesa na América. Até meados da década de 1950, manteve-se como
pequeno núcleo urbano até 1965, com a expansão de um modelo de desenvolvimento
econômico pautado na indústria e no transporte rodoviário, o território foi
desmembrado, passando por um rápido processo de ocupação. Na década de 1970
paralelamente ao período de expansão econômica, recebeu um grande número de
migrantes, atraídos principalmente pela oferta de empregos nas indústrias da capital
paulista.
No início de séc. XXI, face à universalização do acesso à educação e à grande
diversidade populacional do município, surgiram outros desafios, como a expansão do
ensino de qualidade para todas as faixas etárias. Conforme o censo populacional de
2010, o município contava com 377.622 habitantes, dos quais 88.625 matriculados em
todos os níveis de ensino: 13.743 na Educação Infantil (creche e pré-escola), 52.350 no
Ensino Fundamental (anos iniciais e anos finais) e 3.446 na Educação de Jovens e
Adultos.
Assim, o município tem investido na ampliação e reforma de sua rede física de escolas,
garantindo o direito de acesso e permanência, valorização dos profissionais de educação
(Plano de Carreira, piso salarial nacional e jornada de trabalho, Currículo e formação
continuada de professores). É deste último tópico que trataremos no presente.
728

Formação de professores e Currículo


Para elaboração do currículo e formação continuada, buscaram-se subsídios que as
pesquisas recentes sobre a importância na educação, da responsabilidade nas diferentes
esferas da sociedade, atribuem às escolas o papel fundamental na construção do
conhecimento, pois são nestes espaços que se viabilizam as especificidades da educação
escolar, possibilitando aos alunos acesso e apropriação dos conhecimentos acumulados
pela humanidade. Estão envolvidos tanto os alunos e professores quanto a equipe
escolar e os pais, além da comunidade local, por meio do esforço conjunto para tornar
possível a apreensão da realidade, sua leitura e releitura, para, enfim, a produção de
novos conhecimentos.
A produção desses novos conhecimentos está fundada principalmente nos processos de
investigação que promovem a superação do senso comum e a apropriação dos
procedimentos de pesquisa, cuja sistematização contribui para a elaboração de novos
estudos. Dessa forma, ganham relevância os processos formativos porque requerem da
escola e de seus profissionais clareza quanto aos fins da educação, os pressupostos
teóricos e os conteúdos específicos para sua viabilização. Nesse contexto, a formação
continuada deve proporcionar aos professores a reflexão da, na e sobre a ação para
repensar sua prática pedagógica. Quando nos defrontamos com tarefas complexas é
preciso avaliar a pertinência de tal ou qual método, combinar vários, e até mesmo
inventá-los para fazer frente à singularidade da situação. O profissional competente
buscará além da ciência aplicada, a prática reflexiva, porque não se trata de
conhecermos primeiro a teoria para posteriormente aplicá-la aos problemas da prática,
mas sim, com o auxílio da teoria, dos conhecimentos científicos, problematizarmos as
experiências para compreender os problemas de uma nova forma. Busca-se criar não
apenas formas de resolver os problemas da prática, mas de apreendê-los para mudar a
prática.
Para o GEC, os saberes da prática aguçados pelo olhar investigativo e vinculados a
outros saberes - “teorizar a experiência” – ampliam a sua formação, além de com
partilhar esses saberes com os demais professores - a importância da pesquisa na
formação, revelando o pesquisador, aquele que não se conforma com o aluno que está
em dificuldades, não se conforma que o trabalho de um ano inteiro resulte em avanços
mínimos e, pelo seu inconformismo vai batalhar, tentar outras maneiras de fazer, buscar
alternativas. Esse professor, que não está registrando mudanças, enfim, de pesquisa é
quem, de fato, está produzindo novos conhecimentos, vozes ausentes na literatura
729

científica sobre o ensino (ZEICHNER, 1993). É nesse espaço que o GEC atuará: visitas
às escolas para observação e registro das práticas subsidiam a análise e reflexão sobre as
práticas comuns nas escolas e que se tornem processos investigativos efetivos.
Para tanto, é preciso garantir certas condições no ambiente de trabalho escolar e nas
relações entre o grupo de formadores de educadores e de professores, além de
contemplar perspectivas que envolvam: a pesquisa na formação de professores; a
formação continuada baseada em princípios e diretrizes norteadores de um Currículo
que contribua para a superação das desigualdades, do fracasso escolar e possibilite
educação de qualidade para todos; valorização de grupos de estudos (mediação,
acompanhamento e reflexão das práticas pedagógica); fortalecimento das ações
conjuntas, projetos coletivos) capazes de modificar os contextos escolares, criando uma
“comunidade crítica de professores”, alimentados por saberes acadêmicos ou
profissionais compartilhados.
Pesquisas recentes situadas no final do século XX situam os estudos sobre currículo na
perspectiva cultural e resgatam a importância das investigações inerentes às práticas
pedagógicas, isto é, o educador age e busca respostas, ao mesmo tempo em que
investiga as razões da boa aula ou do fracasso, experimenta as hipóteses que levanta
entre uma aula e outra. Na necessidade de dar respostas imediatas aos problemas e
velocidade e sobrecarga cotidiana do seu trabalho, mal consegue repensar suas ações,
registrar e sistematizá-las para refletir sobre as hipóteses e as mudanças que introduziu
no seu plano de aula.
São aspectos importantes, pois constituem saberes singulares que nascem de
experiências semelhantes e resultam em experiências plurais. Compreendê-los significa
avançar no processo das investigações didáticas e contribuir para melhorar as práticas
pedagógicas fundadas em teorias respondam aos desafios colocados para o 3º milênio à
sobrevivência e desenvolvimento da condição humana.
O conhecimento da forma tradicional passou a ser questionado e o seu lugar repensado
a partir das novas pesquisas – quais são os saberes que a criança já traz? Quais são os
saberes necessários e ou importantes para serem ensinados na escola? Quais são os
referenciais e os critérios que definirão o que é importante?
Assim, como já colocado, para a discussão e elaboração do documento Curricular
preliminar retomaremos as ações desenvolvidas no Programa de Formação Continuada
de Professores da Rede Municipal de Ensino de Carapicuiba/SP no decorrer de 2009 a
2014. As experiências decorrentes das discussões, estudos e pesquisas desenvolvidos
730

pelos professores integrantes do Grupo de Estudos Curriculares (GEC) no processo de


elaboração do Plano Curricular e os encontros de Formação Continuada com foco e
Currículo (2012 e 2013) subsidiarão as práticas pedagógicas inovadoras, possibilitando
compreender melhor as concepções que permeiam o Projeto Político Pedagógico. Além
disso, propiciará uma experiência singular de reflexão dessas práticas e o seu processo
de apropriação, isto é, reflexão sobre a prática e a implantação do um Projeto de
Educação da Cidade de Carapicuíba/SP, em busca de sua própria identidade.
Essas questões foram colocadas aos professores da Rede, desde 2009, nos Encontros de
Formação Continuada de Professores (EnFoCo), realizados pela Secretaria Municipal de
Educação, sempre no mês de julho. Desde sua primeira edição, a reflexão sobre os
saberes escolares e a práxis cotidiana do professor pautaram os trabalhos e aliados às
mais recentes pesquisas subsidiaram a gradativa construção das bases para a elaboração
de um currículo próprio, pensado pelos professores que dia a dia trabalham diretamente
com a população e conhecem a história e as particularidades do município.
Portanto, um currículo democrático que visa a humanização de todos deve ser
desenhado por todos, principalmente com a participação da população que,
frequentemente, é excluída dessas discussões
“A humanização se refere, assim, ao desenvolvimento da cultural pelo qual,
passa a espécie. [...] é função do momento histórico pelo qual passa a
humanidade e do quanto cada País participa do acervo da cultura, tecnologia,
ciências e bens disponíveis a um momento dado. Dentro de um mesmo país,
a participação é definida também em termos de classes sociais, etnias, gênero
e diversidade biologia. (LIMA, 2008, p. 18).

Nessa perspectiva é que a Secretaria Municipal de Educação de Carapicuíba ousou


desenvolver em suas escolas um projeto curricular fundamentado em teorias
interacionistas de Currículo, buscando reinventar a identidade de Rede Municipal de
Ensino, com um Projeto Político Pedagógico que valoriza a realidade e a cultura local,
além de estimular o prazer de aprender. Assim, o Plano Curricular foi organizado em
consonância com os princípios norteadores do Projeto de Educação do Município,
compreendendo os espaços educativos como formadores da identidade ativa e solidária
por meio da convivência, fundada em valores essenciais à coexistência enquanto seres
humanos ao mesmo tempo em que busca, no espaço escolar, o desenvolvimento das
potencialidades, da reflexão, enfim, aprendizagens necessárias para atuar em uma
sociedade em constante transformação.
731

A construção de um Projeto desse porte envolveu a seleção de conhecimentos e valores


que fundamentam a formação de crianças e jovens no momento histórico da escolha de
que humanidade se quer ao mesmo tempo em que se mantém as características que
identificam o perfil do sistema de ensino e que lhe possibilite ressignificar e recriar a
identidade das escolas públicas na cidade de Carapicuíba. Buscou-se, portanto, construir
um currículo que pudesse dialogar com as experiências anteriores ao mesmo tempo em
que estimulasse a interação para possibilitar a emergência do novo.
Baseado na concepção de que se aprende para ensinar e ao ensinar, se apropria do
conhecimento, o currículo propõem-se trabalhar em todas as áreas do conhecimento,
habilidades comuns no projeto. Para tanto, as áreas de conhecimento foram organizadas
a partir dos objetivos comuns para a formação do aluno, os conhecimentos que
compartilham os mesmos objetos de estudos, propiciando o diálogo necessário para o
desenvolvimento de uma prática escolar em uma perspectiva integradora e crítica.
A proposta metodológica interdisciplinar e a indicação de eixos comuns para o
desenvolvimento de competências e habilidades buscam a superação do ensino
compartimentalizado e a fragmentação do conhecimento, na convergência de ações de
todas as áreas. Citamos, por exemplo: saber problematizar a realidade como abordagem
metodológica comum; pesquisar/investigar; trabalhar coletivamente, compartilhando
descobertas, investigações, dúvidas, conhecimento, bibliografia, etc.; desenvolver
valores (ética e moral)/espiritualidade (transcendência); ler, escrever e produzir
diferentes textos como responsabilidades de todos na escola; mobilizar informações,
conceitos e procedimentos em situações diversas; valorizar a cultura local e do aluno;
quebrar/superar preconceitos; utilizar relatos de prática mediando a compreensão do que
pensam e fazem os professores para aproximar do Currículo que se propõe.
A distribuição de conteúdos, respeitando-se as necessidades de aprendizagem,
desenvolvimento dos alunos e as especificidades locais (escola e realidade local), segue
os Referenciais e Parâmetros e Diretrizes Curriculares Nacionais, no que diz respeito
aos conteúdos mínimos, pois nele se funda a formação integral e a construção conjunta
do conhecimento, possibilitando compartilhar saberes e experiências, ao mesmo tempo
em que se estimula a elaboração de projetos de trabalho e se corresponsabiliza as
equipes escolares na construção dos novos saberes. Constituem também, conteúdos de
ensino, as aprendizagens de valores e atitudes na formação de posturas como aluno,
cidadão e ser humano.
732

Essas novas formas de organização suscitaram novas demandas, como repensar as


condições propiciadoras das aprendizagens, o que requereu metodologias distintas,
novas formas de ocupação e distribuição dos espaços e dos tempos, diferentes
agrupamentos, priorizando-se o pedagógico, por exemplo, na distribuição das
disciplinas na grade horária, respeitando-se as necessidades de tempo/aula para projetos
ou trabalho coletivo.
Na atualidade muito se tem discutido sobre a interdisciplinaridade como a fórmula
mágica para superar a fragmentação do conhecimento. Como a interdisciplinaridade é
um processo - uma abordagem metodológica - existem várias linhas de ações de acordo
com os desafios a serem superados e os encaminhamentos adotados pela equipe escolar,
de preferência uma decisão tomada coletivamente respeitando-se a “pluralidade dos
espaços e das épocas e a multiplicidade das formas do humano [...]” (GUNSDORFF,
apud SANTOMÉ, 2002, p. 66). Esse é o caminho em construção em Carapicuíba.

A avaliação realimenta o processo de formação


A avaliação é reconhecida como um dos pontos privilegiados para estudar o processo de
ensino e aprendizagem. Abordar o problema da avaliação supõe necessariamente
questionar os problemas fundamentais da pedagogia. Quanto mais se penetra no
domínio da avaliação, mais consciência se adquire do caráter enciclopédico de nossa
ignorância e mais se põe em questão nossas certezas, ou seja, cada interrogação
colocada leva a outras. Cada árvore enlaça com outra e a floresta aparece como imensa
(CARDINET, 1986, Apud SACRISTÁN e GÓMEZ, 2007, p. 295).
Para HOFFMANN é possível uma escola desenvolver uma cultura avaliativa mediadora
contrapondo à avaliação classificatória e excludente, partir de três princípios: (1)
Avaliação a serviço da ação: toda a investigação sobre aprendizagem busca superar as
dificuldades e melhorar a aprendizagem; (2) Avaliação como projeto de futuro, que
reflete sobre os resultados da avaliação para transformá-los em propostas pedagógicas
que atendam as necessidades dos alunos; (3) Avaliação baseada no princípio ético claro,
com parâmetros de qualidade estabelecidos pelo coletivo da escola norteada por uma
proposta político-pedagógico definida com clareza para que a prática avaliativa seja
coerente e, efetivamente promova o atendimento aos alunos com maiores dificuldades.
Nesse sentido, a avaliação deve se voltar para as múltiplas perspectivas tanto da
organização social, quanto das diferentes dimensões em que ação social resulta em
mudanças. Mais especificamente, a educação escolar.
733

No processo de construção do conhecimento o conflito que se estabelece desvela as


múltiplas perspectivas do olhar e dos interesses pela hegemonia na escolha do currículo.
Porém, é possível avaliar com pressupostos que levem em conta esse processo de
construção do conhecimento, isto é, uma concepção de currículo que busca
aprimoramento no processo de humanização.
A avaliação formativa, proposta no Projeto de Carapicuíba, busca, em última instância,
“a tomada de consciência que ajuda a refletir sobre um processo, insere-se no ciclo
reflexivo de investigação na ação: planejamento de uma atividade ou plano, realização,
conscientização do ocorrido, intervenção posterior.” (SACRISTÁN e GÓMEZ, 2007, p.
328). É nesse contexto que se deve inserir a avaliação dos conteúdos escolares mais
específicos (matéria, disciplina, conteúdos programáticos), atendendo ao mesmo tempo,
o desenvolvimento e valorização da autonomia e da capacidade de criar e, apropriar-se
do conhecimento sistematizado.

Considerações
Em 2013, o Grupo de Estudo Curricular (GEC), formado especialistas das diversas
áreas do conhecimento, gestores e professores da Rede de Ensino de Carapicuíba, se
reuniu mensalmente, por áreas do conhecimento/disciplinas para aprofundar os estudos
sobre os fundamentos do Currículo e das disciplinas escolares, metodologias e formas
de avaliação.
Em janeiro de 2014 o Documento Curricular Preliminar foi apresentado à Rede,
publicado o no Portal “Olhar Educador” e discutido nas escolas na semana do
planejamento. Prosseguindo, durante todo o primeiro semestre, os coordenadores do
GEC visitaram escolas, observaram as práticas pedagógicas, elaboraram relatórios com
acompanhamento dos Assessores, culminando com a realização do 6º EnFoCo
(Encontro de Formação Continuada). Realizada entre 14 a 17 de julho as oficinas e
relatos de experiências foram todas protagonizadas pelos professores da Rede
Municipal, compartilhando as práticas pedagógicas e as reflexões realizadas nas escolas
da Rede Municipal, revelando que é possível viabilizar as propostas contidas no
Documento Curricular.
As reflexões ora apresentadas são fruto do trabalho desses grupos e da equipe
pedagógica que assessora o projeto de construção do Currículo do município e nesse e
processo, a formação continuada dos sujeitos que dele participam.
734

Notas:
1
Dados de 2013 - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (Inep), disponível em http://portal.inep.gov.br/basica-censo-escolar-matricula,
acesso em 25.11.2013.
2
O Ensino Médio e Profissionalizante não são de responsabilidade do Município, sendo
atendidos por outras redes de ensino.
3
Entrevista disponível em <
http://www.dn.senai.br/competencia/src/contextualizacao/celia%20-
%20avaliacao%20Jussara%20Hoffmam.pdf>, acesso em 02.11.2013.

REFERÊNCIAS

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Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997.

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curriculares nacionais para a educação infantil. Secretaria de Educação Básica. –
Brasília: MEC, SEB, 2010.

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http://www.carapicuiba.sp.gov.br/index.php/carapicuiba/historico, acesso em
27.11.2013.

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SACRISTÁN, J.G.; GÓMEZ, A.I.P. Compreender e transformar o ensino. Porto


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ZEICHNER, K.M. A formação reflexiva de professores: ideias e práticas. Lisboa:


Educa, 1993.
736

Comunicação

O Sistema Mineiro de Avaliação e suas repercussões na organização do trabalho


da escola e da sala de aula

Keila Fernanda Silva1


Maria Simone Ferraz Pereira Moreira Costa2
Financiamento: CNPq

Resumo: A presente pesquisa desenvolvida no Programa Institucional de Bolsas de


Iniciação Científica- PIBIC/CNPq/UFU (Edital Nº 02/2013), objetivou identificar quais
melhorias/transformações a política de avaliação mineira tem provocado na escola e se
essas transformações têm produzido qualidade educacional. Assim, por meio de
pesquisa documental e observações desenvolvemos um estudo sobre a influência do
Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública - SIMAVE, na organização do
trabalho pedagógico de uma escola pública municipal. Para a reflexão realizada nesse
trabalho fizemos um recorte e trouxemos para o debate as mudanças que acontecem na
escola nos dias que as provas do SIMAVE acontecem. Constatamos que o dia das
avaliações externas é um momento de muita tensão entre os profissionais da escola, pois
além de mudar a rotina da escola a expectativa é o alcance de uma média prevista pelo
governo.
Palavras-chave: Avaliação Externa; SIMAVE; Qualidade Educacional, Escola.

O SISTEMA MINEIRO DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA: razões e


princípios

O SIMAVE foi criado pela resolução nº14 de 03/02/2000 da Secretaria de


Estado da Educação de Minas Gerais. O principal objetivo para a criação do SIMAVE
foi a implementação do Programa de Avaliação da Rede Pública de Educação Básica –
PROEB.

1
Graduanda do Curso de Pedagogia da Faculdade de Ciências Integradas do Pontal-UFU, membro do
Grupo de Estudos e Pesquisa em Avaliação Educacional (GEPAE) e bolsista no PIBIC. Endereço
eletrônico: keila_fernanda2010@hotmail.com
2
Professora do Curso de Pedagogia da FACIP/UFU, doutora em educação pelo LOED-Unicamp,
especificidade avaliação, membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Avaliação Educacional (GEPAE).
Endereço eletrônico: msimonefp@pontal.ufu.br
737

O SIMAVE objetiva desenvolver programas de avaliação cujos resultados


forneçam informações importantes para o planejamento de ações em todos os
níveis do sistema de ensino. O SIMAVE aponta as prioridades educacionais
tanto para professores, especialistas e diretores quanto para os gestores do
sistema, sendo fundamental na definição de ações e para subsidiar políticas
públicas para uma educação eficaz. (SIMAVE, 2013, p.1).

Tendo como responsabilidade a promoção da avaliação na educação, o SIMAVE


se baseia nos seguintes princípios: equidade, descentralização, participação, gestão
consorciada e publicidade dos resultados.
Nesse sentido, são objetivos do SIMAVE:
a) Promover a avaliação sistemática da rede pública de educação básica.
b) Criar instrumentos de participação da sociedade e dos profissionais da
educação na gestão da escola pública.
c) Democratizar o acesso à informação sobre a Educação Pública.
d) Desenvolver procedimentos de gestão de avaliação das políticas públicas
educacionais com base em princípios de equidade.
e) Fortalecer a escola como instituição de promoção de igualdade de
oportunidade para todos os mineiros. (SILVA, 2001, p.139),

De acordo com Falci (2005), os resultados do SIMAVE contribuem para a


formulação de propostas pedagógicas dentro da escola sendo que as avaliações desse
sistema não priorizam avaliar individualmente o aluno, mas obter resultados coletivos e
não tem intenção de classificação.
As avaliações externas no Brasil são influenciadas por instituições internacionais
como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional. Segundo Araujo e Silva
(2001, p.213) “os sistemas de avaliação de Minas Gerais e São Paulo, são para o Banco
Mundial, exemplos para o resto do pais”.
Para melhor compreendermos o SIMAVE, faremos uma breve reflexão sobre os
programas que o compõem. Esse sistema de avaliação é composto por três programas:
O Programa de Avaliação da Rede Publica de Educação Básica - PROEB, para
alunos de 5º ano e 9º ano
O PROEB é uma avaliação censitária que avalia a Educação pública do
Estado de Minas, o programa avalia anualmente os alunos de 5º e 9º ano do
ensino fundamental e do 3º ano do ensino médio as competências de
Matemática e Língua Portuguesa. (SIMAVE, 2013, s/).

O Programa de Avaliação da Alfabetização - PROALFA, destinado a alunos do


3º e 4º ano do Ensino Fundamental avalia os níveis de alfabetização alcançados pelos
alunos.
O PROALFA é destinado a alunos da rede pública de ensino, para alunos do
3º ano do ensino fundamental e para os alunos de 2º e 4º ano de forma
amostral. As provas são aplicas na rede estadual e também municipal de
ensino a qual tem o objetivo de avaliar a capacidade de escrita, leitura,
síntese e interpretação dos alunos. (SIMAVE, 2013, s/).
738

O Programa de Avaliação da Aprendizagem Escolar - PAAE, por sua vez, é


composto por provas internas e distintas e, os resultados das mesmas orientam os
professores e gestores para o desenvolvimento de cada turma. Essas avaliações são
realizadas anualmente. Vale destacar que o PAAE passa por quatro etapas, sendo elas:
cadastro; provas; relatórios e gráficos; e o uso dos resultados, que são apresentados em
relatórios estatísticos. Este programa é considerado:
[...] um suporte didático para os professores e gestores. O programa conta
com um sistema “online” de avaliações, o que possibilita uma intervenção
imediata, a avaliação é interna e de responsabilidade do diretor. (MINAS
GERAIS, 2013, p.1).

Segundo Araújo e Silva (2011), os documentos do SIMAVE relatam o quanto as


avaliações em larga escala são importantes para a educação no estado.
O SIMAVE é um Sistema, que visa a diagnosticar o desempenho dos alunos
em diferentes áreas do conhecimento e níveis de escolaridade, bem como a
subsidiar a implementação, a (re)formulação e o monitoramento de políticas
educacionais, contribuindo efetivamente para a melhoria da qualidade da
educação no estado. O objetivo é utilizar os resultados das avaliações como
base para intervenções destinadas a garantir o direito do aluno a uma
educação de qualidade. (MINAS GERAIS, 2010b, p.13, apud ARAÚJO;
SILVA, 2011, p. 216, grifo dos autores).

Como vimos, existe uma preocupação com a questão da qualidade educacional e


o elemento central para aquisição dessa qualidade tem sido a avaliação externa e os
resultados obtidos pelas instituições por meio dos rendimentos dos alunos. Buscamos
nessa reflexão compreender em que consiste essa avaliação, as razões e princípios
defendidos pelo governo como justificativa para sua aplicação nas diferentes escolas.
Entretanto, vale ressaltar, que para além das questões visíveis, precisamos
compreender o que essas avaliações, no nosso caso as que estão diretamente ligadas do
SIMAVE - objeto de nossa análise, têm provocado no interior das escolas e na formação
dos estudantes. Aspecto que evidenciaremos na próxima etapa do trabalho.

PROEB e PROALFA: a realização das provas na escola Constelação3

No decorrer das observações acompanhamos ações e falas relacionadas tanto às


avaliações externas do governo federal (Prova Brasil, Provinha Brasil, ANA, Ideb)
como do governo estadual (SIMAVE). Apontaremos agora como aconteceu a aplicação
do PROALFA e do PROEB na escola Constelação.

3
Os nomes da escola e das pessoas utilizados nesse trabalho são fictícios para preservar a identidade da
instituição e das profissionais
739

A nossa pesquisa nos levou a perceber que essa política de avaliação tem papel
central dentro da escola, e que a qualidade tem girado em torno das proficiências
obtidas em Língua Portuguesa e Matemática. Para saber a proficiência das escolas os
resultados são apresentados como recomendável, intermediário e baixo desempenho.
Para as provas do PROEB as médias para cada proficiência são: acima de 225 é
considerado recomendável, até 225 é intermediário e até 175 é considerado baixo
desempenho. Já para o PROALFA as notas devem ser: acima de 500 é recomendável,
até 500 é considerado intermediário e até 450 é baixo desempenho. A escola para ser
considerada com boa qualidade tem que atingir o recomendável nas duas áreas do
conhecimento. A escola pesquisada até ano de 2013 atingiu os seguintes resultados:
Quadro VI - Resultados do PROEB da escola Constelação.
PORTUGUÊS MATEMÁTICA
2013->178,3 (Intermediário) 2013->198,0 (Intermediário)
2012-> 184,0 (Intermediário) 2012-> 206,8 (Intermediário)
2011-> 193,7 (Intermediário) 2011-> 206,6 (Intermediário)
2010-> 190,7 (Intermediário) 2010-> 205,4 (Intermediário)
2009-> 199,6 (Intermediário) 2009-> 212,6 (Intermediário)
2008-> 181,8 (Intermediário) 2008-> 192,2 (Intermediário)
2007-> 182,2 (Intermediário) 2007-> 175,4 (Intermediário)
Fonte: Tabela organizada pela equipe de Ituiutaba-MG como parte da pesquisa "A PRODUÇÃO DA
QUALIDADE A PARTIR DA POLÍTICA DE AVALIAÇÃO SISTÊMICA MINEIRA NAS REDES MUNICIPAIS
DE UBERLÂNDIA E ITUIUTABA", com base nos resultados retirados do site http://www.simave.caedufjf.net/ em
2014.

Quadro VII - Resultados do PROALFA da escola Constelação.


PORTUGUÊS
2013->563,7 (Recomendável)
2012->558,2 (Recomendável)
2011->520,7( Recomendável)
2010->508,1 (Recomendável )
2009->487,6 (Intermediário)
Fonte: Tabela organizada pela equipe de Ituiutaba-MG como parte da pesquisa "A PRODUÇÃO DA
QUALIDADE A PARTIR DA POLÍTICA DE AVALIAÇÃO SISTÊMICA MINEIRA NAS REDES
MUNICIPAIS DE UBERLÂNDIA E ITUIUTABA", com base nos resultados retirados do site
http://www.simave.caedufjf.net/ em 2014.

Dentro da lógica de resultados, na perspectiva do Estado, a escola pesquisada


apresentou um ensino de qualidade nos 3º anos do Ensino Fundamental, no entanto, de
acordo com os resultados do PROEB, os 5º anos não tem apresentado o mesmo ensino
de qualidade, pois ainda não atingiram o recomendável. Será que realmente podemos
considerar isso? Qualidade tem realmente que ser baseada em números?
740

No primeiro dia da aplicação das provas do PROALFA os profissionais da


escola estavam bastante tensos, a rotina da escola mudou completamente. Não havia
sinal para a entrada, nem na troca de horários. Os alunos que realizaram as provas
precisaram mudar de salas e o recreio não aconteceu no horário de costume. Nos dias
das provas a escola recebeu um analista de sistema para acompanhar todo o processo.
O analista de sistema é um profissional da Superintendência Regional de Ensino
- SRE, o qual tem como papel observar e vigiar a escola nos dias das avaliações
externas, se for necessário chamar a atenção da equipe gestora e professores caso a
aplicação da prova não aconteça como orientado e, informar todo o processo para a
coordenação da SRE. Isso evidencia o controle, por parte do governo, que é preciso ter
nesses dias, por isso a necessidade de um funcionário direto da SRE. Assim como
orientado nas capacitações dos diretores e professores, os professores regentes das
turmas avaliadas não aplicaram as provas, mas eles permaneceram na escola o tempo
todo na sala dos professores.
Assim que os alunos entraram para as salas de aula para realizarem as
avaliações, no corredor das salas ficaram o analista de sistema, a comissão de
acompanhamento, a diretora da escola e a pesquisadora que teve autorização para
acompanhar a aplicação. A comissão acompanhou todo o processo, desde o local que
estava guardado os envelopes até o fim das avaliações.
Já o analista observou cada movimento da escola fazendo o controle de tudo,
inclusive do barulho. No corredor haviam cartazes sobre o PROALFA e o PROEB e no
quadro da sala dos professores informações sobre data e horário das avaliações e sobre a
necessidade, neste dia, de não ter nenhuma atividade que causasse barulho.
Em relação ao barulho a diretora estava bem preocupada e pediu a todo o
momento que os professores controlassem seus alunos. Foi distribuído aos alunos lápis
e borracha para eles fazerem as provas, os alunos estavam bem calmos, quase nem
conversaram, mesmo assim os aplicadores pediam silêncio a todo momento.
Dentro da sala de aula a professora aplicadora, antes dos alunos iniciar as
provas, perguntou,
Vocês lembram como que marca o gabarito né?
(Violeta, professora aplicadora Registro, diário de bordo, 29de outubro de
2013).

Nesse momento em uma conversa com o analista de sistema, ele disse,


741

Você acha que isso faz uma educação de qualidade? Não, não faz. Pra ter
uma educação de qualidade deveria repensar a escola, jogar tudo fora e fazer
tudo de novo.
(Jacinto, analista de sistema da SRE. Registro em diário de bordo, 29 de
outubro de 2013)

Constatamos que esse tipo de avaliação têm gerado opiniões divergentes na


escola Constelação, há aqueles que consideram fundamental esse processo e outros
consideram não tão importante, no entanto, a escola e seus profissionais não possuem
autonomia para decidirem se querem ou não fazer parte deste sistema de avalições, são
impostas normas que precisam ser seguidas.
Frente a essa realidade, no segundo dia das provas uma professora desabafou
com o analista de sistema,
Coitado dos alunos, pra que isso, só pra deixar eles estressados, essa prova é
muito grande, é fora da realidade.
(Dália, professora do 5º ano. Registro em diário de bordo, 30 de outubro de
2013).

Ela é muito cansativa, também não concordo, mas nem posso falar nada, meu
trabalho é ligada a elas.
(Jacinto, analista de sistema da SRE, Registro no diário de bordo, 30 de
outubro de 2013).

Neste dia, a dinâmica da escola foi a mesma do primeiro dia, no entanto, os


alunos de baixo desempenho-BD também estavam realizando as provas do 3º ano.
Nessa sala, antes de iniciarem as provas, a supervisora disse aos alunos:

Vocês foram escolhidos, pois melhoraram este ano, por isso vão fazer a
prova.
Quem quer ganhar surpresa? Mas pra ganhar surpresa tem que fazer tudo
direitinho.
(Camélia - supervisora da escola Constelação, Registro, diário de bordo, 30
de outubro de 2014)

Percebemos que para alcançar bons resultados, a escola adota na realização das
avaliações externas a metodologia da troca, se o aluno fizer uma boa avaliação ele terá
uma recompensa. Isso, em nossa opinião evidencia o que Costa (2012) sinaliza como o
distanciamento da avaliação como um momento de aprendizagem e, o reforço da
mesma como momento de recompensa entre as partes, pois a escola precisa obter um
bom resultado e para isso, usa de todos os artifícios para que os alunos possam
consegui-lo, já que depende do desempenho deles.
No fim das avaliações, os professores apresentaram estar aliviados. A profª.
Dália desabafou com a seguinte fala "Mais uma etapa vencida" (Registro, diário de
bordo, 30 de outubro de 2013).
742

Frente à observação da maneira como a escola organiza seu trabalho nos dias
das provas do SIMAVE, constatamos que a escola cada vez mais tem conduzido o
ensino como algo mecânico, o professor dá o comando e os alunos executam, e nas
avaliações externas o que ganha centralidade antes da aplicação da mesma é o
treinamento.
As professoras do 3º( Dália) 5º ( Amarílis) afirmaram isso com as seguintes
falas,
É um treinamento mesmo, para que eles consigam realizar as provas
( Registro no Diário de bordo, Amarílis, 19 de setembro2013).

Os simulados são um treinamento mesmo (...) na verdade é um adestramento.


(Registro no diário de bordo, Dália,07 de outubro/2013)

Ao relatarem que os simulados aplicados antes das avaliações externas são um


treinamento/adestramento elas também relatam que não consideram relevante esse
movimento, pois os alunos aprendem apenas a decorar o que é passado e não há
nenhum significado positivo nisto.
É um ritual que tem que ser cumprido, é uma coisa boba, não deveria ser
como é, pois cada escola tem uma realidade diferente, e isto deveria ser
considerado nas avaliações externas.
(Dália, Registro no diário de bordo, 07 de outubro de 2013).

Fica explicito nas falas das professoras que a escola treina os alunos para que os
mesmos consigam realizar as avaliações. Diante disso, podemos considerar que o
espaço e o cotidiano da escola tem sido como ressalta Muniz (2006) um espaço
fragmentado, hierarquizado e homogeneizado. Frente a concepção que os resultados das
avalições têm servido apenas para expor os “fracassos” ou “sucessos” da escola,
Hoffmann (2004, apud MUNIZ, 2006, p.68) afirma que,
As notas e as provas funcionam como redes de segurança em termos do
controle exercido pelos professores sobre seus alunos, das escolas e dos pais
sobre os professores, do sistema sobre suas escolas. Controle esse que parece
não garantir o ensino de qualidade que pretendemos, pois as estatísticas são
cruéis em relação à realidade das nossas escolas.

Segundo a autora, as avaliações têm funcionado como controle entre os sujeitos,


e esse controle não tem garantido a qualidade da educação, pelo contrário, tem deixado
de lado a realidade das escolas, e se preocupado em garantir boas notas (resultados
quantitativos).
Essa concepção está presente também nos profissionais da educação que não
trabalham diretamente na escola. Ao conversar com o analista de sistema nos dias das
avaliações ele afirmou,
743

Se você me perguntar para que serve essas avaliações vou te dizer que apenas
para obter resultado, é quantidade, número que o governo deseja.
Essas avaliações são fora da realidade dos alunos.
(Jacinto, analista de sistema da SER. Registro em diário de bordo, 29 de
outubro de 2013).

Assim, como Paulo Freire, acreditamos que é preciso conhecer a real


necessidade e realidade do sujeito para que seja possível fazer um bom trabalho e para
promover a construção de saberes e conhecimentos. Não é viável pré julgar um ensino
se não sabemos as condições de determinada escola, devemos sim, compreender o
contexto em que ela se encontra e quais as possibilidades que ela oferece no seu âmbito
escolar.
Viviane Mosé nos afirma que os problemas da escola não são só da escola, mas
da sociedade em geral, assim, inclui-se professores, alunos, pais, comunidade escolar,
gestores e sem dúvida o Estado também. Frente a essa constatação, o que estamos
fazendo para que haja uma educação de qualidade? Quais as condições que o Estado
tem oferecido para que cada escola, de acordo com sua realidade, possa ter um ensino
significativo para os alunos? Eis alguns dos questionamentos que me acompanharam no
período de observação da aplicação das provas.
No dia 22 de novembro aconteceu na escola pesquisada a aplicação da Prova
Brasil que é destinada para os alunos do 5º ano e a ANA destinada para os alunos do 3º
ano. Essas avaliações não são o foco central do nosso estudo, mas consideramos
relevante acompanhar o movimento da escola durante a aplicação das mesmas, pois
segundo as próprias coordenadoras da SRE, o PROEB e o PROALFA acabam sendo
um treinamento para essas que servem para medir o Ideb da escola.
Não são os professores que aplicam essas provas, há uma equipe da
Superintendência de Girassol que vai até a escola para aplicar as avaliações, mas o
professor regente tem que ficar na sala de aula para conter a indisciplina dos alunos.
A supervisora estava bastante tensa neste dia, pois alguns alunos faltaram, então
foi preciso ligar para que eles pudessem vir. Mesmo com a ligação um aluno não
compareceu e por isso foi preciso ir até a casa desse aluno para buscá-lo. Ao voltar para
a escola a supervisora comentou que foi preciso esperar ele tomar banho, pois estava
brincando e estava muito sujo.
Assim que subimos as escadas encontramos com a diretora da escola e ela logo
nos disse:
744

Você veio acompanhar as avaliações? Vem aqui para gente fofocar.


Colocaram pessoas idosas para aplicar as provas e o professor regente tem
que ficar na sala e, os alunos estão inquietos com a presença das aplicadoras.
(Azaleia, diretora da escola. Registro em diário de bordo, 22 de novembro de
2013)

Foi possível constatar que as aplicadoras andavam pela sala o tempo todo
pedindo silêncio e observando os alunos e quando um aluno queria ir ao banheiro só
pode ir com a professora ou inspetora da escola, frente a isso a supervisora afirmou:
Essas avaliações são mais tranquilas, as outras são mais cobradas, mas
mesmo assim elas ficam na sala monitorando para não haver cola.
(Camélia, supervisora da escola. Registro em diário de bordo, 22 de
novembro de 2013).
No entanto, nesta avaliação a diretora da escola precisou preencher um relatório,
após o término das mesmas, que foi junto com as provas. Antes mesmo de terminar as
provas a diretora disse "no relatório coloco tudo bom, que deu tudo certo, até já fiz, não
gosto de prejudicar ninguém".
Essas provas têm duração de 2hs e 30 min, porém a sala que terminava antes
podia sai e ir para o recreio. Percebemos que mesmo a ênfase no treinamento na SRE
sendo dada no Ideb a aplicação da Prova Brasil, que contribui para o cálculo do Ideb,
não foi tão tensa como no dia do PROALFA e do PROEB. Aparentemente o SIMAVE,
altera mais a organização de trabalho pedagógico da escola.
A tensão é maior nas avaliações do SIMAVE, no entanto, toda a escola também
se prepara a realização das outras avaliações, com isso, a rotina também é mudada assim
como nas avaliações do SIMAVE, e os professores também tem que continuar treinando
os alunos para a realização das mesmas.
De acordo com o Boletim pedagógico (2009, p.9) o PROALFA tem caráter
investigador dos “níveis de alfabetização alcançados pelos alunos da rede pública” para
então indicar as intervenções necessárias para trabalhar as dificuldades encontradas.
Essas intervenções, de acordo com o período que permanecemos na escola, não
tem tido caráter tão qualitativo, mas tem se voltado para o aspecto quantitativo pois, por
meio do treinamento e da presença no dia das provas, espera-se que o maior número de
alunos consiga ter bons resultados. Constamos que a preocupação muitas vezes não é se
o ensino tem tido significado para a realidade destes alunos, mas se eles estão bem
treinados para responder o que será medido pelo governo.
A partir disso, podemos considerar que o SIMAVE, por meio do PROEB e do
PROALFA se preocupa em verificar se as intervenções têm sido realizadas e se tem
sido quantitativamente positivas, pois, as provas deste sistema têm intuito de “verificar
745

a eficiência e a qualidade do ensino” (BOLETIM PEDAGÓGICO, 2009, p.09),


considerando que qualidade para o sistema de avaliação externa tem se pautado em
resultados.
Com isso, tanto o PROALFA quanto o PROEB tem interferido na rotina da
escola, bem como no trabalho pedagógico dos professores, pois, os seus resultados têm
servido para identificar qual escola tem sido considerada boa ou ruim, e dentro das
observações foi possível identificar nas falas dos profissionais da educação que todos
temem por resultados que não são considerados recomendáveis, e com isso, fazem do
ensino uma educação bancária e mercadológica, pois por meio de treinamentos e
premiações aos alunos a escola tem tentado alcançar as metas estabelecidas.
Já as avaliações Prova Brasil e ANA, não tem gerado tantas aflições por parte
dos profissionais da educação da escola pesquisada, pois os mesmos consideram que
elas são mais tranquilas, mesmo tendo o monitoramento eles afirmam que as avaliações
do SIMAVE têm sido mais cobrada e mais fiscalizada dentro da escola.
No final de todas as avaliações a escola deu aos alunos uma pequena premiação
por terem comparecido na escola e realizado as avaliações externas, a premiação foi
uma laranjinha para cada aluno. Como a diretora da escola já havia comentado na
capacitação da equipe gestora, a escola não tem verba para oferecer os itens sugeridos
pela SRE, com isso, a supervisora Camélia comprou com o seu próprio dinheiro as
laranjinhas para dar aos alunos como forma de premiação pelo bom comportamento e
conduta nos dias das avaliações externas.
Compreendemos que os mecanismos usados pela escola são adotados com o
intuito de garantir resultados recomendáveis nas avaliações externas para que ela não
seja vista como uma escola de má qualidade, pois a qualidade, na concepção do
governo, tem se restringido ao alcance de bons resultados/notas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As avaliações externas têm tido papel central dentro da escola e tem sido fator
primeiro para a organização do trabalho pedagógico dos professores. Dentro desta
perspectiva, a avaliação externa, no discurso oficial, tem o objetivo de melhorar o
sistema educacional a partir dos seus resultados, no entanto, foi possível perceber que
há uma fragilidade muito grande dentro da escola quando nos referimos a melhoria por
meio da avaliação externa.
746

Os sistemas de avaliação têm provocado na escola não melhoria do ensino, mas


reforçado a educação tradicional e bancária, pois, o fator primordial é a nota/resultado, e
cada escola e os demais segmentos que a compõe são culpabilizados pelo
fracasso/sucesso obtidos nesses resultados.
Com isso, foi possível perceber dentro da escola pesquisada que as avaliações
externas têm sido trabalhadas como um instrumento controlador da qualidade
educacional, e que para conseguir essa qualidade é imposto pelo sistema um
treinamento com a equipe gestora e professores para que eles também façam um
treinamento contínuo com os alunos afim de atingir notas altas. Diante disso, o
ensino/aprendizagem tem se limitado a uma prática mecanizada e controladora,
favorecendo cada vez mais o treinamento, a artificialização do processo educacional, a
competição e a desigualdade dentro e entre escolas.
Frente às exigências do governo, federal e estadual, a escola passa a reproduzir o
que é imposto pelo sistema e a qualidade das escolas tem se pautado no alcance de bons
resultados, sem oferecer, muitas vezes, um ensino que supre as necessidades
educacionais de cada escola e, principalmente de cada estudante. Não podemos negar
que o acesso à escola é oferecido a todos, mas nem todos tem tido o direito a uma
educação de qualidade, essa qualidade tem sido sonegada nas escolas, principalmente
nas de classe baixa, com o intuito de que a ordem vigente não seja desestruturada, mas
apenas prevalecida.
Uma educação de qualidade e emancipadora só será possível quando não mais
houver divisão de classes sociais, e todos compreenderem que independente da sua
condição social e econômica é um direito de todos e dever do poder público oferecer um
ensino de qualidade que promova a autonomia, a emancipação e a libertação dos
oprimidos dentro do nosso sistema capitalista, mesmo que esse não seja o desejo de
quem está no poder.

Referências

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Avaliação da Educação Pública (SIMAVE) na busca pela qualidade da educação
no Brasil. Roteiro, Joaçaba, v.36, n.2, p. 205-224, jul./dez . 2011.

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(Mestrado). UFJF. Juiz de Fora – MG. 2005.
747

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MUNIZ, Luciana Soares. O Fórum da Classe na Escola Pública: Significados e


Práticas Direcionadas à Construção de uma Coletividade. 2006.250f. Dissertação
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SILVA, Maria Juliana Almeida e. REGULAÇÃO EDUCATIVA: o uso dos resultados


de proficiência das avaliações do PROEB por diretores escolares em Minas Gerais. Tese
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Disponível em < http://www.simave.caedufjf.net/proeb/o-que-e-proeb/> Acesso em 05
dez 2013.

______. Programa de Avaliação da Alfabetização – PROALFA. Disponível em


http://www.simave.caedufjf.net/proalfa/ Acesso em 05 dez 2013.
748

Comunicação

Criação e desenvolvimento de softwares institucionais na Universidade do Estado


da Bahia: o caso do Sistema Integrado de Planejamento (SIP)

Kellen Lima Gomes


UNEB
Membro do Grupo de Pesquisa EduReg
Pedro Alejandro Herrera Ramirez
UNEB
Membro do Grupo de Pesquisa GEOTEC
Tânia Maria Hetkowski
Membro do Grupo de Pesquisa GEOTEC

Resumo: Este artigo tem como objetivo discutir a utilização de sistemas informatizados
como ferramenta de trabalho pelas organizações e instituições, as quais tornam-se
imprescindível nas dinâmicas atuais, neste caso na Universidade do Estado da Bahia
(UNEB). Assim, faz-se premente demonstrar os desafios e as principais etapas no
desenvolvimento e implantação do Sistema Integrado de Planejamento (SIP) e, os
resultados obtidos nos últimos anos, provocando reflexões e ações que despertem para a
importância do desenvolvimento de sistemas tecnológicos de suporte à gestão
institucional. O SIP foi concebido a partir das demandas da UNEB, integrando
importantes plataformas e bases de dados, respeitando as especificidades e
singularidades dessa Instituição Multicampi.
Palavras chave: Universidade, Gestão, Sistemas.

Uma nova universidade – um novo discurso


A Universidade do Estado da Bahia (UNEB), segunda maior instituição pública de
ensino superior do Estado, foi criada pela Lei Delegada 66, de 01 de junho de 1983,
como autarquia em regime especial, vinculada à Secretaria da Educação e Cultura
(SEC), com sede na cidade de Salvador e jurisdição em todo território do Estado da
Bahia (BAHIA, 1983). Sua estrutura inicial era composta por:
749

Art. 3º - A Universidade do Estado da Bahia - UNEB, estruturada sob a


forma de um Sistema Multicampi de Educação Superior, fica constituída
pelas seguintes unidades:
I - Faculdade de Agronomia do Médio São Francisco;
II - Faculdade de Formação de Professores de Alagoinhas;
III - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Juazeiro;
IV - Faculdade de Formação de Professores de Jacobina;
V - Faculdade de Formação de Professores de Santo Antônio de Jesus;
VI - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caetité;
VII - Centro de Ensino Técnico da Bahia - CETEBA;
VIII - Faculdade de Educação da UNEB. (BAHIA, 1983)

Hoje, trinta anos após a sua criação, em face da multicampia1, “a Universidade, com
seus 29 (vinte e nove) Departamentos, está presente geograficamente em 24 (vinte e
quatro) municípios do estado da Bahia, atingindo 14 (quatorze) regiões econômicas e 18
(dezoito) dos 26 (vinte e seis) Territórios de Identidade do estado, o que a coloca como
instituição de destaque e referência no modelo de gestão multicampi brasileiro” (UNEB,
PE, 2007, p. 27).
A UNEB oferta, atualmente, à comunidade baiana, “mais de 150 (cento e cinquenta)
opções de cursos e habilitações nas modalidades presencial e à distância (EaD), nos
níveis de graduação e pós-graduação (lato e stricto sensu) e está presente, mesmo que
virtualmente, na quase totalidade dos 417 (quatrocentos e dezessete) municípios do
Estado2, por intermédio de programas e ações extensionistas em convênio com
organizações públicas ou privadas, que beneficiam milhões de cidadãos baianos”
(UNEB, 2014).
Seu quadro funcional possui cerca de 4.000 (quatro mil) servidores efetivos entre
docentes, técnicos e estagiários3, alocados nos 29 (vinte e nove) Departamentos e na
Administração Central da Universidade, localizada em Salvador. Uma Instituição de tal
porte, com especificidades e regionalidades, cujo desafio é aproximar sua estrutura
acadêmica e administrativa, independentemente da posição geográfica, busca o
fortalecimento da sua natureza multicampi, a qual é potencializada pelos benefícios
trazidos pelas redes digitais, inaugurando e estabelecendo processos de
desenvolvimento e inovação tecnológica. Assim, se faz urgente a necessidade de
atualização e informatização dos seus processos, apoiados em políticas institucionais

1
Multicampia: Uma instituição multicampi está estruturada em vários espaços, usualmente, na capital e
no interior do estado. As políticas para o ensino, para a pesquisa e para a extensão adotadas não podem
ser dissociadas e devem ser respeitadas e reconhecidas as singularidades de cada espaço, oportunizando
se pensar a instituição como um todo, considerando as potencialidades e as vocações locais.
2
Dados do IBGE consultados em 18.07.2014;
3
Informações obtidas através de relatório gerado no Sistema Integrado de Gestão Pessoas (SIGP) em
julho de 2014.
750

que valorizem os avanços da ciência e da tecnologia, cooperando para o sucesso do seu


plano gestor e no atendimento das demandas regionais.
Com a evolução e digitalização das Tecnologias da Informação e Comunicação -
TIC, constantemente nos deparamos com novos propósitos, aplicações e usos. É nessa
vertente que surge a incessante busca pela garantia de um nível elevado de transmissão
e sinais de dados, voz e vídeo, característica da sociedade contemporânea, com seus
ideais inovadores e globalizantes. Para o pesquisador Piscitelli ( apud Pretto, 2010, p.
65) essas mudanças provocaram um profundo deslocamento existencial do ser humano,
com consequências diretas na relação sujeito/objeto, uma vez que componentes
tecnológicos passam a ser elementos fundantes de uma nova estruturação cultural,
transformando a relação homem-máquina, sobretudo em função do desenvolvimento da
nanotecnologia4.
Contemporânea, embora vanguardista em muitos momentos, a Universidade do
Estado da Bahia passou a adotar em seu discurso o sentido de uma nova forma de
geração de conhecimento e, muitas razões podem ser relacionadas a esse novo caminho:
a aceleração tecnológica vivenciada pelas instituições; a inserção de alunos, técnicos e
docentes na era digital; novas possibilidades para a democratização e inovação dos
processos da Universidade; o potencial de interação entre a UNEB e outras
organizações educacionais e empresariais, favorecendo experiências tácitas com novos
atores e espaços e o redimensionamento dos processos de gestão de informações e
dados, como elemento imprescindível ao modelo de transparência da instituição.
Simantob (2008), professor e presidente do Fórum de Inovação da Fundação Getúlio
Vargas (FGV), em entrevista à Fundação Nacional da Qualidade (FNQ), descreve a
dinâmica da inovação como um processo que demanda disciplina, normalmente segue
um processo formal, mas também pode ocorrer informalmente, criando sistematizações
de práticas, procedimentos e pressupostos que orientam o fluxo criativo, demandas de
clientes e insigths por uma espécie de sistema de filtros, de tal forma que estes insights,
frutos de pesquisas, análises e tendências que agreguem condições para transformar
ideias em experimentos. Experimentos que geram oportunidades e estas em iniciativas-
piloto, lançadas em todas as áreas do conhecimento. Se o resultado desse movimento

4
A nanotecnologia estuda a modificação da matéria para a construção de novas estruturas e materiais a
partir dos átomos. Integra diversos campos do conhecimento como a medicina, a ciência da computação,
física etc. É uma tecnologia recém criada no Japão e que busca resultados inovadores para melhoria da
qualidade de vida do ser humano.
751

gerar valor para a organização podemos dizer que se trata de uma dinâmica de inovação,
caso contrário, será uma dinâmica meramente inventiva.
Há uma relação entre universidade (unidade gestora) e seus servidores (capital
intelectual), agentes mobilizadores da Missão de Instituição de Ensino Superior, elos
entre sociedade e suas atividades fins, que desempenham papeis fundamentais nas
estratégias de gestão e na geração de iniciativas inovadoras, não meramente inventivas,
virtuais, mas concretas, aplicáveis e necessárias. A UNEB é o grande laboratório, com
recursos humanos e tecnológicos especializados, ávidos por respostas para os grandes
insights desta caminhada, se considerarmos seu dever social e educacional quanto sua
busca pela autonomia tecnológica e de gestão.
O potencial criativo da instituição vem sendo explorado, atualmente, na busca desta
autonomia e da automatização dos seus processos, como filamentos de uma política
institucional que investe, no desenvolvimento tecnológico, como um catalisador
estratégico para decisões de qualidade e excelência na gestão universitária. O grande
exemplo é o Programa 128, Desenvolvimento da Ciência, Tecnologia e Inovação5, cujo
objetivo é incentivar e difundir ações científicas, tecnológicas e de inovação, divulgar os
experimentos educacionais, inclusive com a implantação de projetos em comunidades,
grupos sociais e empresas, visando à geração e difusão de novas tecnologias
desenvolvidas no âmbito da UNEB (UNEB, RA, 2012, p. 73).
O grande desafio para a UNEB no século XXI está explícito na relação entre
Tecnologia e Gestão, na qual há uma dicotomia fraterna, mas dependente e
indissociável quando se trata de grandes espaços institucionais e de geração,
sistematização, armazenamento, consolidação e registro de dados e informações sobre
sujeitos e processos nela desencadeados.

Experiências da relação Gestão e Tecnologia – O Sistema Integrado de


Planejamento (SIP)6
A utilização e constante atualização dos sistemas informatizados pelas organizações
tornam-se cada vez mais imprescindíveis. Hoje, as possibilidades para a aquisição de
recursos tecnológicos computacionais (desktops, notebooks, tablets, etc.) estão mais
acessíveis às organizações e ao público de forma geral. O advento da internet vem

5
Programa previsto no Relatório de atividades da Universidade do Estado da Bahia, Ação 1805, sob a
responsabilidade da Pró-Reitoria de Pesquisa e Ensino de Pós-Graduação – PPG.
6
Software com patente registrada pelo pesquisador no INPI sob o nº 14162-3;Sexto colocado no prêmio
Boas Práticas de Trabalho no Serviço Público (SAEB) em 2011.
752

ampliando a comunicação, a pesquisa e transpondo barreiras geográficas que, em


muitos aspectos, vêm repercutindo na interação homem-máquina.
Segundo mencionam Laudon e Laudon (1999, p.16), “alguns teorizam que o
sistema de informação mais sofisticado é aquele que mal podemos notar”, assim, a
utilização das TIC, independentemente da plataforma, está cada vez mais próxima do
cotidiano das pessoas, muitas vezes, de forma imperceptível. A gestão de grandes
instituições não pode desconsiderar tais avanços, onde se fazem urgentes as demandas
internas por processos informatizados e ferramentas que fechem as lacunas que se
abrem em suas rotinas administrativas e que possam, de forma simples e ágil, se
aproximar dos seus sujeitos e do dia a dia dessas organizações, conduzindo à gestão
eficaz.
A UNEB está alargando os seus horizontes tecnológicos e, atualmente, conta
com uma Gerência de Informática (GERINF), setor ligado à Unidade de
Desenvolvimento Organizacional (UDO), composta por desenvolvedores, analistas de
sistemas, analistas de banco de dados e web designer, responsáveis por atender às
demandas institucionais na composição da informatização dos seus processos
administrativos. Faz-se necessário mencionar o retrocesso mantido na universidade no
decorrer de sua história, considerando que o quadro de analistas e desenvolvedores é
terceirizado, com contratos firmados a partir de processos licitatórios renovados
periodicamente, gerando rotatividade de recursos humanos e diminuindo as
possibilidades de formação de um núcleo de desenvolvimento tecnológico
especializado, próprio e permanente.
Mesmo diante desta inconstância do grupo, surgem inúmeras propostas
implantadas e de destaque, que atualmente atendem às demandas de desenvolvimento
de softwares institucionais mais importantes levantadas nos últimos anos. O grande
exemplo do trabalho que vem sendo desenvolvido é o Sistema Integrado de
Planejamento (SIP) idealizado, inicialmente, para atender às demandas apresentadas
pela Pró-Reitoria de Planejamento – PROPLAN/UNEB, com o objetivo de substituir o
antigo sistema utilizado pela Universidade, o POA-WEB (Plano Operativo Anual), o
qual apresentava uma série de entraves e limitações.
Dentre os problemas identificados no antigo sistema POA-WEB, podemos
considerar como principais, sua interface e seu projeto de concepção, a exemplo:
• Somente permitia a utilização do browser IE (Internet Explorer) versão 6;
753

• Na interface (telas), a cor predominante (marrom), gerava cansaço visual


para um software de utilização diária;
• As telas não eram ‘amistosas’, ou seja, as informações não eram claras
provocando confusão ao usuário;
• Ausência de uma identidade visual;
• O tamanho da tela com padrão de 800x600 px;
• Ausência de telas ou mecanismos de ajuda para o usuário;
• Falta de interface/integração com outros sistemas ou banco de dados;
• Digitação redundante de informações, ou seja, dados repetidos e não
amigáveis;
• Processamento lento de relatórios importantes;

Figura 1:tela inicial do POA-WEB

Fonte: manual do POA-WEB

O SIP centraliza as informações do planejamento de atividades e dos projetos de


docentes (administração, pesquisa, extensão, etc.), como do acompanhamento físico e
financeiro dos mesmos e, através de uma interface intuitiva, os usuários informam os
dados do(s) projeto(s) e a previsão de desembolso financeiro (se for o caso), para que, à
754

medida que ocorre o desenvolvimento das ações, a integração com o FIPLAN7 possa
associar os empenhos e as portarias de descentralização de recursos financeiros para as
respectivas unidades gestoras, conduzindo a um controle do gasto planejado versus
gasto real, metas previstas versus metas alcançadas.
A partir das constatações dos usuários e dos gestores envolvidos, o primeiro passo
foi encaminhar à GERINF a demanda da criação de um software institucional, cuja
proposta era substituir o software em uso, a fim de superar as dificuldades do POA-
WEB e fomentar maior potencial de eficiência em um novo modelo, além do desafio de
torná-lo funcional e atraente aos seus usuários.
Para a construção do novo sistema, desconsiderando a análise dos requisitos
funcionais (funcionalidades propriamente ditas), um passo de extrema relevância na
concepção foi o levantamento dos requisitos não funcionais (tempo de resposta,
acessibilidade, usabilidade, plataforma de desenvolvimento, etc.) pelos seguintes fatores
inerentes à instituição:
a) Distancia física: grande parte dos usuários se encontra localizada,
fisicamente, distante da região metropolitana de Salvador, dificultando o
treinamento e o acompanhamento no uso dos sistemas;
b) Público alvo: mais de 58% dos funcionários da Universidade tem mais de
40 anos de idade e constituem uma parcela significativa dos denominados
“não nativos digitais”;
c) Recursos Tecnológicos: em vários departamentos, a qualidade da internet e
a velocidade da internet comprometem as atividades, a qual quando
compartilhada não alcança 1(um) Mbps;
d) Recursos Humanos: falta de formação adequada para uma parcela
significativa dos funcionários à realização das rotinas de trabalho, utilizando a
internet e softwares não institucionais como simples ferramenta.

Com o intuito de responder positivamente à preocupação dos gestores, quanto aos


impactos dos sistemas novos juntos aos usuários e as resistências possíveis, a equipe
responsável teve grande preocupação com o design e o tempo concedido ao desenho da
interface do novo software, resultando em uma interface amigável e simplificada.
Segundo Krug (2006, p. 35), os usuários, comumente, fazem um ‘scan’ das páginas de

7
Sistema Integrado de Planejamento, Contabilidade e Finanças do Estado da Bahia (FIPLAN), banco de
dados contendo todas as informações orçamentárias e financeiras de todas as secretarias e órgãos do
Estado da Bahia.
755

um software a procura do que precisam ou de uma indicação rápida do que fazer, assim
como fazemos ao andarmos por uma rua, pois observamos coisas e ações que nos
atraem, ignorando grande parte de outros elementos.
Assim, como terceiro passo, foi elaborado o projeto de design da interface do SIP,
no qual foram considerados alguns aspectos limitadores da instituição:
• Estações de trabalho antigas, baixa memória e baixa resolução gráfica;
• A grande maioria dos departamentos não possui uma banda larga para uso
da internet, compatível com as demandas dos usuários;
• Os sujeitos usuários possuem conhecimento básicos no uso da internet
como ferramenta de trabalho.

A avaliação feita pelos usuários, durante a fase de testes, apontou grandes


resultados como telas mais ‘simples’ e intuitivas, facilitando as rotinas diárias de
trabalho. A tela de contato, por exemplo, foi um grande avanço no quesito
interatividade, pois facilitou a comunicação entre os usuários e os gestores do sistema,
otimizando a abertura de chamadas de ordem técnica ou operacional, possibilitando
maior efetividade e rapidez na resolução de dúvidas e entraves. Mas, apesar dos avanços
e da coerência entre os atuais padrões de acessibilidade e navegabilidade nas práticas
correntes, urge ações importantes: o desenvolvimento e implantação de interfaces que
eliminem (ou diminuam) os problemas de acessibilidade ainda existentes.
A partir da experiência com o SIP, a UNEB, integrando suas áreas de
desenvolvimento e design, projetou e institucionalizou um novo padrão de interface
para ser utilizado não somente para o projeto SIP, mas em todos os novos projetos,
destacando os seguintes pontos norteadores:
• Leveza no design das telas;
• Redução do uso de recursos ‘pesados’, ou seja, imagens grandes;
• Os recursos gráficos (botões, imagens, etc.) devem ser intuitivos para o
usuário;
• Desenvolvimento de uma identidade visual própria;
• Utilização de padrões de usabilidade e navegabilidade;
• Criação de um canal de comunicação entre o usuário e o gestor do sistema.
756

Figura 2: tela inicial do SIP

Fonte:www.sip.uneb.br

É importante esclarecer, através do pensamento de pesquisadores o sentido da


usabilidade para os processos. Para Winckler et al (2010, p. 48) usabilidade é o termo
que descreve a qualidade de uso de uma interface, onde vários problemas podem ser
eliminados. Partindo desse pressuposto, reduzir o tempo de acesso a determinadas
informações e torná-las mais fáceis e disponíveis aos seus usuários, podem ser um bom
exemplo para acabar com os vários entraves, evitando a frustração de não encontrar as
informações no website, e assim, ajudar na qualidade da interface e da navegação.
Há de se considerar, entre outros fatores, os padrões de usabilidade, assim o passo
seguinte foi a definição do padrão do template (modelo) das telas web a ser seguido e
utilizado no projeto do SIP, como modelo institucional a ser considerado em novos
projetos, com padrões de ícones, fontes de letras, layout, etc.
Através do SIP, foi aberto um canal de comunicação direto entre o usuário e o
gestor do sistema, na interface do próprio software, que dispara e-mails automáticos à
equipe responsável pelo suporte que permite ao usuário realizar contatos diretos através
de solicitações, sugestões e/ou reclamações. O sistema foi programado para interagir
757

com outros sistemas e base de dados, fornecendo e obtendo informações, a exemplo de


informações funcionais relativas aos docentes ou técnicos, alimentadas/adquiridas
diretamente da base de dados do Sistema utilizado pela Secretaria de Administração do
Estado da Bahia (SAEB), bem como a captação de dados de sistemas institucionais em
operação, a saber:
• SIGP – Sistema de Gestão de Pessoas
• SPO – Sistema de Portarias Oficiais
• PIT – Plano Individual de Trabalho Docente

Figura 3: integração do SIP

Fonte: autoria de Pedro Alejandro H. Ramirez

A adoção de práticas adequadas e as atualizações do design dos Sistemas


Institucionais representam grandes avanços e diminuição de riscos. A utilização do
POA-WEB nos dias atuais poderia estar causando problemas de compatibilidade, visto
que, atualmente, cerca de 46 % (quarenta e seis) dos acessos no SIP, durante o ano de
2013, foram realizadas através do browser Mozilla Firefox. Analisando o gráfico 1, é
possível verificar que ocorre uma diminuição na utilização do Internet Explorer e que o
uso dos browsers Firefox e Chrome estão, gradativamente, sendo mais adotados pelos
usuários.
758

Gráfico 1 – Comparativo de utilização de browsers no SIP

Fonte: Google Analytics– SIP


O próximo passo (ou evolução) na construção do template e do design será
atender ao público com algum tipo de deficiência auditiva e visual, buscando a
adequação do software às demandas de acessibilidade da universidade. Atualmente a
UNEB não possui dados quantitativos sistematizados sobre esse público,
impossibilitando uma análise aprofundada da relevância do investimento e da sua
funcionalidade, no entanto, a lacuna existe principalmente se considerarmos que uma
parcela significativa de técnicos-administrativos, ainda não têm acesso aos sistemas
informatizados da Instituição.
O sucesso na utilização do SIP pode ser expresso em números. Em 2013 foram
contabilizados cerca de 10.900 acessos, 860 usuários distintos acessaram o sistema e
mais de 1.161 projetos foram criados e cadastrados. A PROPLAN em conjunto com os
gestores da instituição podem agora tomar decisões de forma dinâmica e com maior
confiabilidade.
Além do SIP, outros projetos de desenvolvimento de software ganharam
destaque institucional, entre eles:
• SIGP – Sistema Integrado de Gestão de Pessoas: software que captura
informações dos Recursos Humanos da UNEB diretamente da base de
dados da Secretaria de Administração do Estado (SAEB) e permite
alimentar outros sistemas da instituição com informações de RH, bem
como a geração de relatórios e gráficos gerenciais;
• SIV – Sistema Integrado de Vestibular: software gerenciador do processo
de seleção do vestibular da UNEB; gerencia e possibilita o
acompanhamento em tempo real das inscrições.
759

Conclusão
Assim, entendemos que o desenvolvimento de softwares institucionais concretiza os
objetivos previstos no Plano Estratégico da UNEB, no contexto do novo modelo de
gestão eficiente assumido pela instituição, se tornando um dos grandes desafios para a
modernização dos seus processos e da sua insfraestrutura física e lógica. Tais iniciativas
auxiliarão no alcance das metas desejadas, respondendo às demandas da rotina setorial
interna, no controle sobre a execução e otimização das atividades, além do
aperfeiçoamento do quadro funcional na operacionalização de ferramentas tecnológicas
facilitadoras da sua atuação na instituição.

Referências Bibliográficas

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Fatores Humanos em Sistemas Computacionais (IHC2001), 2001, Florianópolis. Anais
do IV Workshop sobre Fatores Humanos em Sistemas Computacionais (IHC2001).
Porto Alegre : SBC, 2001.
760

Comunicação

Formação continuada de professores no contexto de trabalho: do prescrito ao


executado

Laurinda Ramalho de Almeida


PUC-SP
Vera Maria Nigro de Souza Placco
PUC-SP
Agência Financiadora: Fundação Victor Civita
Grupo de pesquisa: Processos psicossociais de formação de educadores

Resumo: Esta comunicação refere-se a um recorte de pesquisa realizada em 2010-2011


sobre o papel do coordenador pedagógico na formação continuada de professores.
Objetiva analisar a formação de professores em contextos de trabalho, confrontando o
que é prescrito na legislação e na literatura pedagógica sobre o coordenador com o que é
efetivamente executado nas escolas, conforme depoimento de coordenadores, diretores
e professores de escolas estaduais e municipais das cinco regiões brasileiras.
Questionários, entrevistas e análise documental foram as técnicas empregadas. Os
resultados indicam que, embora a legislação e a literatura defendam que a formação
continuada dos professores no contexto de trabalho é atribuição dos coordenadores
pedagógicos – atribuição prescrita, esta não é considerada prioritária na maioria das
escolas, não sendo concretizada em decorrência de inúmeras interferências.
Palavras-chave: coordenador pedagógico, formação continuada, formação em
contextos de trabalho

INTRODUÇÃO
Há um consenso, não só na literatura brasileira, como também na internacional,
sobre a importância da formação de qualidade para o professor, tanto inicial como
continuada. Igual importância é dada à coordenação pedagógica para a formação de
professores, mesmo quando não é desenvolvida por um profissional em cada escola.
Exemplificando, os sistemas educacionais da França, Canadá, Moçambique e Chile
(Placco, Almeida, Souza, 2011) registram, em seu quadro de pessoal, um profissional
para articular a formação na escola e, em alguns casos, responsabilizar-se por ela. Da
761

conferência realizada em 2007, em Lisboa, proposta pelo Conselho da União Europeia,


decorre uma recomendação explícita para a formação de professores: “manter e
melhorar a qualidade da formação de professores ao longo de toda a sua carreira”
(Canário, 2008), o que pressupõe um profissional para planejar e/ou articular essa
formação.
No Brasil, a literatura pedagógica (que será focalizada em tópico posterior),
aponta o coordenador pedagógico, ator que atua na escola, como responsável pela
formação continuada de professores.
A maioria dos estados brasileiros, a partir da lei 5692/1971, que instituiu a
Reforma de Ensino de 1° e 2° Graus, passou a definir funções relacionadas com a
função supervisora, tanto em nível de sistema, como de unidade escolar. Na última
década, a coordenação pedagógica está presente na maioria das escolas brasileiras,
oficiais e particulares, com diferentes atribuições para o ator que a desempenha, porém
sobressaindo a de formação de professores no contexto de trabalho. No entanto, em que
pese o fato de a literatura brasileira defender a coordenação pedagógica nas escolas
como lócus privilegiado para formação continuada de professores, e a prescrição dessa
atribuição para o coordenador pedagógico constar na legislação da maioria dos estados,
uma questão se coloca: o prescrito é executado nas escolas?
É o que nos propomos a discutir nessa comunicação, fundamentados em dados
da pesquisa realizada em 2010-2011, encomendada pela Fundação Victor Civita1 à
Fundação Carlos Chagas.

ALGUMAS INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA


A pesquisa investigou a coordenação pedagógica nas cinco regiões do país, nos
seguintes estados e cidades: São Paulo, São Paulo; Paraná, Curitiba; Acre, Rio Branco;
Goiás, Goiânia; Rio Grande do Norte, Natal. Em cada uma das cidades, foram
selecionadas duas escolas estaduais e duas escolas municipais, e um coordenador, um
diretor e dois professores de cada escola, perfazendo um total de dezesseis informantes
por região e oitenta informantes, abrangendo as cinco regiões. Como instrumentos para
produção das informações, optou-se por questionários e entrevistas. Paralelamente ao
trabalho de aplicação desses instrumentos, foi feito um levantamento da legislação
presente nas cidades pesquisadas.

1
http://www.fvc.org.br/estudos-e-pesquisas/livro-2-2011.shtml
762

Questionários e entrevistas possibilitaram a caracterização dos coordenadores


pedagógicos quanto a alguns aspectos do seu perfil:
• mulheres: 85%
• idade média: 42 anos
• formação: 60% em Pedagogia (como primeira formação)
• tempo na função: 6,2 anos
• um ano na função na escola atual: 50%
As entrevistas e questionários possibilitaram outras informações. Segundo os
coordenadores, para o desenvolvimento de suas atividades, a idade é irrelevante; já a
experiência é considerada muito importante, desde que haja reflexão sobre ela; a
experiência na docência é importante, entretanto não suficiente; a formação continuada
é necessária, porém com determinadas características.
Quanto ao modo de ingresso na função:
• por concurso: 40% (oito citações)
• a convite do diretor: 30% (seis citações)
• por transferência de outra escola: 10% (duas citações)
• pela via da eleição pelos pares: 10% (duas citações)
• escolhido pelo Conselho de Escola: 5% (uma citação)
• escolhido pela Diretoria de Ensino: 5% (uma citação)

1 – O PRESCRITO
a) Nas teses e dissertações
A consulta à Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações do Ministério
da Ciência e Tecnologia e ao Banco de Teses e Dissertações CAPES-MEC revelou que
teses e dissertações sobre coordenação pedagógica, no período de 1981 a 2010, foram
defendidas em 35 universidades, e que o maior crescimento se deu a partir de 2003.
Esse incremento significativo nos anos recentes revela certo consenso sobre a
importância desse profissional nas escolas e, em consequência, a necessidade de adensar
o conhecimento sobre suas atribuições e práticas.

b) Na literatura pedagógica
Uma coletânea especialmente dedicada ao coordenador pedagógico apresenta
seu 1° volume em 1998 (Edições Loyola), e hoje está com seu 10° volume no prelo.
Nos textos nela apresentados são discutidas inúmeras questões referentes ao
coordenador pedagógico, quanto ao papel, à identidade, aos saberes, às habilidades de
relacionamento interpessoal, às relações de poder dentro da escola, às dificuldades de
763

construir um trabalho coletivo que seja refletido no projeto da escola, à formação


centrada na escola, entre outros.
Procuramos sintetizar os fundamentos que estão subjacentes em tais discussões,
pelas falas de alguns autores da coletânea.
Almeida (2000) registra experiências bem sucedidas assumidas por
coordenadores pedagógicos para elaborar projetos para a melhoria do ensino noturno
em escolas estaduais paulistas, tendo alavancado seu trabalho nas especificidades de
cada escola e afirma:
a formação continuada deve estar centrada na escola [...]. É o lugar onde os
saberes e as experiências são trocadas, validadas, apropriadas e rejeitadas
[...]. É no cruzamento dos projetos individuais com o coletivo, nas
negociações ali implicadas que a vida na escola se faz e que, quanto mais os
projetos individuais estejam contemplados no coletivo, maior a possibilidade
de sucesso destes.” (Almeida, 2000, p. 86)

Nesta mesma linha, Placco e Souza (2008, p.28) afirmam:

...é preciso que o projeto da escola seja um espelho que reflita cada um de
seus participantes, com suas marcas e características específicas, que
contribuem, a seu modo, para o trabalho da escola. Mas esse espelho, a um só
tempo, reflete também a escola, como coletivo, com objetivos e finalidades
que visem à formação do aluno e dos professores.

Bruno (1998), ao tratar dos desencontros de expectativas dos diferentes


envolvidos na construção do trabalho coletivo das escolas, ao questionar qual seria o
papel do coordenador, afirma:
Podemos pensar em três visões possíveis para o papel do coordenador: uma
como representante dos objetivos e princípios da rede escolar a que pertence
[...], outra, como educador que tem a obrigação de favorecer a formação dos
professores, colocando-os em contato com diversos autores e experiências
para que elaborem suas próprias críticas e visões de escola (ainda que sob as
diretrizes da rede em que atuam) e, finalmente, como alguém que tenta fazer
valer suas convicções, impondo seu modelo para o projeto pedagógico.
(BRUNO, 1998, P.15)

O que é recorrente nos textos da coletânea (que tem apresentado sucessivas


reedições) é a defesa de que a função principal do CP é a formação continuada dos
professores, seja na própria escola, em horários de trabalho pedagógico coletivo ou
atendimento individual, seja estimulando a participação em cursos, congressos,
seminários, orientações técnicas.
Os textos sugerem que as atribuições do coordenador, no que se refere à
dimensão formativa, se fundamentam em: promover a articulação da equipe escolar para
elaborar o projeto político-pedagógico da escola; mediar as relações interpessoais;
764

planejar, organizar e conduzir as reuniões pedagógicas; enfrentar as relações de poder


desencadeadas na escola; desempenhar sua prática atendendo à diversidade dos
professores e das escolas; efetivar o registro escrito como forma de sustentar a autoria
de seu papel na escola. Para tanto, saberes específicos são requeridos, além dos saberes
da docência, embora ancorados neles, o que reporta à necessidade de novas
aprendizagens.

c) Na legislação
A consulta aos documentos legais, parte integrante da pesquisa já referida,
evidencia que todas as regiões do Brasil instituem a figura do coordenador pedagógico,
em se tratando das redes municipal e estadual, embora com denominações diversas:
pedagogo, supervisor, professor coordenador, coordenador pedagógico, em algumas
redes como cargo, em outras como função.
Porque a opção por focalizar a legislação: porque entendemos (na pesquisa e
nesta comunicação) que o coordenador pedagógico, como sujeito histórico, é
determinado por diferentes configurações da função que exerce, e estas decorrem:
• da estrutura oficial: do que chega ao coordenador, do instituído legal, e como
isso é absorvido por ele;
• da estrutura da escola: como a organização da escola interfere no trabalho da
coordenação;
• do sentido que o coordenador confere, tanto ao instituído legal, como à
organização da escola; entra aí sua subjetividade.
Na última década, em todos os estados pesquisados, a coordenação pedagógica
foi instituída para a escola como um todo, e não para projetos especiais, como se fazia
anteriormente em algumas redes. O que significa que é possível ter um coordenador
para uma escola pequena, ou para uma de grande porte, o que, neste caso, o
sobrecarrega. Com poucas exceções, é isto que revela a pesquisa. Mesmo porque, como
profissional da escola, no âmbito da rede estadual e municipal, as atribuições dadas a
esses profissionais são muitas, envolvendo desde a liderança do PPP (projeto político
pedagógico), a funções administrativas de assessoramento da direção, mas, sobretudo,
atividades relativas ao funcionamento pedagógico da escola e de apoio aos professores.
Assim, uma análise da legislação das cinco regiões do país revela que estão previstas,
como função do coordenador, atividades como avaliação dos resultados dos alunos da
escola, diagnóstico da situação de ensino e aprendizagem, supervisão e organização das
ações pedagógicas cotidianas (frequência de alunos e professores, andamento do
planejamento de aulas (conteúdos ensinados), planejamento das avaliações, organização
765

de conselhos de classe, organização do material necessário para as aulas e reuniões


pedagógicas, organização das avaliações feitas pelos sistemas de ensino – municipal,
estadual ou nacional, atendimento a pais etc.), além da formação continuada dos
professores.
A análise das atribuições do CP pela legislação leva a concluir que há
atribuições explicitamente formativas (que se referem ao papel do CP como formador
de professores) e outras potencialmente formativas (referem-se a atribuições que
tangenciam o papel formativo do CP, pois dependem do significado que o CP dê a elas),
que são a maioria e, finalmente, atribuições que não se referem ao papel formativo do
CP. No entanto, mesmo essas últimas, dependendo do sentido que se lhes atribua,
apresentar-se-ão como formativas.
Exemplificando, a partir de atribuições prescritas na legislação sobre o
coordenador pedagógico nas redes estadual e municipal de São Paulo: - “assumir o
trabalho de formação continuada, a partir do diagnóstico dos saberes dos professores
para garantir situações de estudo e de reflexão sobre a prática pedagógica, estimulando
os professores a investirem em seu desenvolvimento profissional”; e “conhecer os
recentes referenciais teóricos relativos aos processos de ensino e aprendizagem, para
orientar os professores” - são atribuições nas quais a ação formativa está em evidência.
As atribuições: – “assegurar a participação ativa de todos os professores do
segmento/nível objeto da coordenação, garantindo a realização de um trabalho
produtivo e integrador” e – “organizar e selecionar materiais adequados às diferentes
situações de ensino e de aprendizagem” - são atribuições potencialmente formativas,
pois: 1) a ideia de um trabalho produtivo e integrador sugere uma ação formativa por
parte do CP; 2) para que se proceda à organização e seleção de materiais adequados,
faz-se necessária a utilização de critérios que se estabeleçam no processo de formação.
As atribuições: – “participar das diferentes instâncias de tomada de decisão
quanto à destinação de recursos financeiros, materiais e humanos da unidade escolar” e
“organizar e sistematizar a comunicação de informações sobre o trabalho pedagógico
junto aos responsáveis dos alunos2” - são atribuições que não evidenciam o papel
formativo do CP.

2
As quatro primeiras atribuições foram retiradas da resolução SEE nº. 88/2007 e as duas últimas, do
edital de concurso realizado na Rede Municipal, publicado no Diário Oficial em julho de 2009.
766

2 – O EXECUTADO NAS ESCOLAS


• Na visão dos coordenadores pedagógicos
Um ponto que é recorrente na fala dos CP refere-se à multiplicidade de
atribuições que lhes são imputadas – atribuições que, na maioria das vezes, são
assumidas por eles. Assim é que os CPs de todas as regiões identificam como
atribuições suas na escola (mudando apenas de ordem de priorização nas regiões e redes
de ensino): atendimento a professores, alunos e pais; atendimento a demandas do diretor
e de técnicos das secretarias estaduais ou municipais de educação; atividades
administrativas; organização de eventos; atendimento às ocorrências que envolvem os
alunos. Em algumas regiões, ainda, aparecem: organização da entrada de alunos,
acompanhamento dos alunos nos horários de intervalos, gerenciamento de conflitos na
escola, organização de horários de provas com destaque para o atendimento às questões
disciplinares, que são trazidas pelos professores.
Apenas na região Sudeste aparece explicitamente, na fala dos coordenadores, a
atribuição de formação de professores como sua responsabilidade (e também a
realização de visitas às salas de aula). Ainda assim, essa formação é percebida apenas
ocorrendo nos horários de trabalho coletivo. Esses coordenadores são os únicos que
colocam a função formativa como prioridade.
Embora todos afirmem que sua função é acompanhar o trabalho dos professores
e o desempenho dos alunos, ao listarem as atividades administrativas, as intervenções
disciplinares, o acompanhamento dos projetos elaborados por órgãos centrais para
serem executados nas escolas e até o encaminhamento de alunos para setores de
atendimento específico, parece-nos que sobra pouco tempo para fazer o
acompanhamento aos professores. Essa atribuição, que é potencialmente formativa, fica
esmaecida diante de outras atribuições.
Em síntese, a multiplicidade de fazeres é o eixo condutor da fala dos CPs.
A fala de uma CP retrata bem a multiplicidade de tarefas do seu dia-a-dia, e a
justificativa para fazê-las:
Quando você cai na escola – e você cai em um setor pedagógico de uma
escola grande como essa – você vê uma realidade muito difícil com uma
comunidade muito difícil, com muita violência e essas crianças fazem parte
dessa sociedade e dessa comunidade tão violenta. Quando isso acontece, você
já começa a se deparar com outras coisas para resolver [...]. (CP da cidade de
Curitiba, PR)

Concretamente, “outras coisas” se referem ao atendimento às ocorrências que


acontecem na escola, na tentativa de proteger alunos e professores, organização de
767

eventos para angariar fundos para suprir necessidades de recursos, atendimentos às


demandas do diretor, deixando de lado as atividades formativas, a articulação do
trabalho pedagógico dos professores em torno do projeto político-pedagógico da escola
e atividades transformadoras e inovadoras, que provoquem a ampliação da
aprendizagem dos alunos.

• Na visão de diretores e professores


Os diretores entendem que os coordenadores pedagógicos devem participar de
tudo o que acontece na escola, pois consideram sua função como de gestão. Esperam
que os coordenadores assumam, como responsabilidades, atribuições ligadas ao aluno,
ao professor e à comunidade escolar. Em síntese, ratificam as atribuições declaradas
pelos coordenadores, mencionando, com destaque, as atribuições que dão suporte a eles,
diretores.
Com exceção da Região Sudeste, os diretores não se referem explicitamente à
função formativa dos CPs e reconhecem o volume de atividades que fica sob a
responsabilidade do CP para justificar a inviabilização do processo formativo na escola.
...o coordenador tem que fazer N atividades. Como é que ele faz uma
formação, se ele tem que sentar com o professor e, ao mesmo tempo, tem que
estar atendendo o aluno, o professor, ao chamado de um pai que vem aqui, e
assim vai...? Então, fica difícil estar fazendo esse trabalho. (Diretor da cidade
de Natal, RN)

Analisando considerações como essa, percebe-se que os diretores aceitam que as


atividades exercidas pelo CP devem atender às necessidades diversas que surgem na
escola e que são priorizadas pela equipe escolar, em detrimento das atribuições que, de
fato, são de sua responsabilidade, como é o caso da atuação formativa. Fica a impressão
de que há uma inversão de prioridades nas funções exercidas por este profissional, pois
seria mais adequado lamentar que não seja possível atender a tantas outras demandas
existentes na escola, quando o CP precisa cuidar da formação dos professores.
Os professores, em sua maioria, nas diferentes regiões, compactuam com os
diretores, considerando que os coordenadores exercem função de direção, porque suas
atividades têm afinidades com as da direção. Enumeram, também, como principais
atividades do CP, atendimento aos pais, aos alunos, orientação a alunos com
dificuldades de aprendizagem, encaminhamento a médicos. Alguns se referem a
atividades ligadas às questões pedagógicas e de planejamento; outros, identificam o
trabalho de CP como fiscalização, pois é ele quem verifica se o professor está
768

cumprindo o planejamento e as rotinas da escola. Outros, ainda, identificam o trabalho


como de ordem burocrática.

3 – A TENSÃO ENTRE O PRESCRITO E O EXECUTADO


Os dados coletados nas cinco regiões brasileiras sobre o trabalho dos
coordenadores pedagógicos permitem considerar que a maioria deles não tem como
prioridade a formação de seus professores. Mas afirmam que esta é uma de suas
atribuições, e que deveriam dar conta dela. Eis o primeiro ponto de tensão. Gostariam
de dar conta das atribuições prescritas na legislação e discutidas na literatura
pedagógica, mas a rotina eletrizante da escola não lhes permite.
Acresce ainda que, se a legislação os favorece por dar-lhes um status
profissional, estabelece, no entanto, um rol de atribuições difícil de ser cumprido. O CP
tenta atendê-las, mas fica com o peso de não dar conta de suas responsabilidades. É
impossível atender às demandas do sistema, do diretor, das famílias, dos alunos, da
escola como um todo. As questões formativas aparecem na lista de prioridades, mas
acabam sendo sugadas por outras emergentes.
O segundo ponto de tensão refere-se ao formato das formações. Informam os
coordenadores que, na maioria das regiões do Brasil, quem planeja e organiza a
formação de professores são as Secretarias de Educação (do Estado e do Município),
isto é, as propostas de formação (muitas vezes com objetivos a atingir, conteúdos e
modalidades de avaliação dos resultados) vêm dos órgãos centrais, sem a participação
dos coordenadores. Eles passam a ser meramente executores das propostas do Sistema.
Em poucos casos, há participação das escolas, no sentido de fazerem levantamento das
necessidades de seus professores quanto à formação, e levarem-nos como sugestão para
elaboração das propostas.
Como, na maioria dos estados, a formação é planejada pelas instâncias
superiores, via de regra, as formações se realizam nos momentos de reuniões ou
permanências dos professores, ou nos momentos estipulados como horário de
permanência coletiva, horário nem sempre condizente com as possibilidades dos
professores.
O terceiro ponto de tensão, decorrente dos dois primeiros, refere-se à dificuldade
da resolução da equação desejado versus executado.
Retomamos a colocação de Bruno (1998), que apareceu no tópico anterior,
porque nos parece apropriada para os três pontos que optamos por discutir aqui:
769

Podemos pensar em três visões possíveis para o papel do coordenador:


uma como representante dos objetivos e princípios da rede escolar a que
pertence (...), outra, como educador que tem a obrigação de favorecer a
formação dos professores, colocando-os em contato com diversos autores e
experiências para que elaborem suas próprias críticas e visões de escola
(ainda que sob as diretrizes da rede em que atuam) e, finalmente, como
alguém que tenta fazer valer suas convicções, impondo seu modelo para o
projeto pedagógico.” (BRUNO, 1998 p. 15)

A dificuldade quanto à primeira visão: “CP como representante de objetivos e


princípios da rede escolar” já foi esclarecida, quando se mostrou a multiplicidade de
objetivos e princípios – muitas vezes contraditórios – presentes nas propostas legais. A
proposição de “Formação de Professores” fica prejudicada pelas demandas também
contraditórias dos participantes da própria escola. Como poderia o CP pensar “Tentar
fazer valer suas convicções, “impondo seu modelo”? Além de ser esta uma tarefa
impossível, no quadro que os coordenadores apresentaram, sua validade é questionável.
Na realidade, estas convicções e modelos precisam ser discutidos coletivamente, pois
representam ideias e valores pessoais e sociais necessários à consecução de uma
educação de qualidade. Não é fácil operacionalizar as ideias de Almeida (2000), de que
“a formação deve estar centrada na escola” e de que “é no cruzamento dos projetos
individuais com o coletivo, nas negociações ali implicadas que a vida na escola se faz”,
que coadunam com as de Placco e Souza (2008): “é preciso que o projeto de cada escola
seja um espelho que reflita cada um de seus participantes, com suas marcas e
características específicas”. Aceitá-las no discurso é bonito, mas executá-las na escola é
tarefa complexa, dadas as determinações do sistema, das demandas que vêm de todos os
lados e que interferem nos objetivos propostos. Acresce a isso a constatação que os
dados evidenciam: a precária formação que é oferecida para os coordenadores
exercerem suas funções.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, L.R. A dimensão relacional no processo de formação docente: uma


abordagem possível In BRUNO, E.G; ALMEIDA, L.R. e CHRISTOV, L.H.S (org). O
coordenador pedagógico e a formação docente São Paulo: Loyola, 2000.

BRUNO, E.G. O trabalho coletivo no espaço de formação. In autores coletivos. O


coordenador pedagógico e a educação continuada. São Paulo: Loyola, 1998.

CANÁRIO, Rui. Formação e Desenvolvimento Profissional dos Professores.


Conferência Desenvolvimento Profissional dos Professores. Para a Qualidade e para a
Equidade da Aprendizagem ao Longo da Vida. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2008.
770

PLACCO, V.M.N.S.; ALMEIDA, L.R. e SOUZA, V.L.T. O coordenador pedagógico e


a formação de professores: Intenções, tensões e contradições. Estudos e pesquisas
educacionais, n°2, nov/2011 São Paulo: FVC.

PLACCO, V.M.N.S. e SOUZA, V.L.T. Desafios ao coordenador pedagógico no


trabalho coletivo da escola: intervenção ou prevenção? In: PLACCO, V. M. N. S. e
ALMEIDA, L.R. (org). O coordenador pedagógico e os desafios da educação São
Paulo: Loyola, 2008.
771

Relato de Experiência

O olhar estético como desafio ao aprendizado: a leitura do espaço como


experiência no Centro Velho do Município de Santos/SP

Leide Patricio Monteiro


Universidade Católica de Santos - UNISANTOS

Resumo: A leitura de imagens é uma das práticas fundamentais no ensino das Artes
Visuais, pois prepara o aluno para uma leitura mais compreensiva do seu entorno.
Assim, a vivência estética de alunos do Ensino Fundamental II no conhecimento do
patrimônio artístico/histórico da cidade de Santos é o tema deste trabalho, que buscou
investigar a percepção dos estudantes em relação à observação do espaço. O estudo, de
natureza qualitativa, além dos elementos observados, propiciou aos estudantes a
elaboração de desenhos, de depoimentos escritos e da construção de uma caixa de
madeira utilizando a técnica barroca de folheação a ouro. A análise dos resultados finais
apresentados demonstra aspectos positivos em relação ao desenvolvimento da leitura
visual dos alunos, assim como a sua percepção estética e em seu envolvimento com a
escrita e a produção de objetos artísticos.
Palavras-chave: arte, educação estética, leitura do espaço.

Introdução
Compreender melhor as consequências das mudanças educacionais e a
contribuição da arte na formação humana coloca-se como um desafio ao professor, que
deve acompanhar o quadro de mudanças e as normativas propostas nos documentos
governamentais.
No caso da Arte, qual a finalidade a que se propõe? Colli (1993) traz a questão
do reconhecimento do valor estético das obras de arte como um pressuposto da
educação artística para que o indivíduo desenvolva, em sua personalidade, uma visão
mais sensível, ampla e comprometida do seu papel como agente de mudanças na
sociedade.
772

A apreciação das obras de Arte desempenha um papel fundamental no processo de


construção do olhar favorecendo assim:

[...] o ensino trazido pela arte se faz por ascese, por


iniciação, pelo olhar demorado, pela escuta atenta. Isso acarreta uma séria
moralização à soberba dos conceitos e da teoria. Pois as obras gostam da
nossa atenção. Mais e mais a elas nos consagramos, mais e mais elas nos
devolvem sentidos ocultos, inimaginados. E com isso fogem constantemente
ao rigor classificatório, escapam das camisas-de-força que lhe são impostas.
Denunciam assim a estreiteza e a tirania dos sistemas. Indicam-lhe os limites
(COLLI, 1993, p. 58).

É uma característica da Arte a capacidade de mobilizar todos os sentidos do


homem, isto é, o sensível e o inteligível do ser humano, posto que “através da Arte, é
possível desenvolver a percepção e a imaginação para aprender a realidade do meio
ambiente, desenvolver a capacidade crítica, permitindo analisar a realidade e
desenvolver a capacidade criadora de maneira a mudar a realidade que foi analisada”
(BARBOSA, 2005, p.100). Sem sombra de dúvida, que a experiência estética do
estudante da educação básica, pressupõe um trabalho que integra os conteúdos dos
componentes curriculares com a educação artística, favorecendo assim a alfabetização
visual numa aprendizagem significativa.
A aprendizagem significativa, por sua vez, pari-passo com uma prática
pedagógica, não evoluiu somente na direção estética, mas também como instrumento
de humanização e comprensão da arte. Para tanto, a leitura da imagem não poderá ser
feita de forma esclusivamente descritiva, pois a alfabetização visual tem como objetivo
desenvolver diferentes leituras dos objetos e dos espaços nos quais estão inseridos os
aluno, e, portanto, é importante que eles saibam o real valor do ato de ler, uma vez que,
no ponto de vista de Freire (1989, p. 9) “a leitura do mundo precede a leitura da palavra,
daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura
daquela”. Esse mesmo autor salienta que a compreensão do texto a ser alcançada por
sua leitura crítica, que compreende a percepção das relações entre o texto e o contexto,
contribui para o exercício da criticidade e da autonomia, posto que é por meio da
expressão escrita e oral que o sujeito se manifesta.
A educação patrimonial e o respeito em relação ao meio ambiente é outro
aprendizado que se faz presente neste trabalho. O sistema bio-ecológico não foi o único
espaço a sofrer erosão e depredações; os patrimônios histórico-artísticos e naturais
também sofreram dasagregação de valores, embricados à falta de políticas educacionais
e de interesses político-econõmico que se omitiram diante desse processo destrutivo.
773

A cultura local é a principal referência nesse processo educacional, reconhecê-la


e valorizá-la foi o ponto de partida deste trabalho. Sob esse aspecto, o desafio de ensinar
o olhar estético implicou em alguns procedimentos relevantes como: foi desenvolvido
junto à Unidade Municipal de Ensino Pedro II, em parceria com a Fundação Arquivo e
Memória de Santos; teve como foco o resgate e a manutenção da memória da cidade,
com objetivo de conscientizar os alunos do curso fundamental II, nono ano sobre o
valor do patrimônio histórico e artístico do período Barroco, considerando que Santos
possui inúmeros monumentos e obras artísticas que retratam esse período da arte. Ao
iniciar o estudante no conhecimento e na cultura de preservação do patrimônio artístico
e histórico de Santos, buscou-se ampliar a sua capacidade de olhar as obras artísticas,
compreendendo-as dentro de um contexto espacial, histórico e político, de modo a
desenvolver habilidades para a interpretação das imagens a partir da expressão artística
e textual.
Em termos gerais, os estudantes do ensino fundamental II não têm noção do
valor artístico e histórico de obras de arte, bem do valor dessas obras como documento
de registro da época, no qual estão grafados os momentos econômicos, políticos e
culturais do período. Por outro lado, quando preparado com fundamentação teórica, e
tendo a oportunidade de estar em contato direto com essas produções, o estudante pode
diminuir as dificuldades de entendimento em relação às obras artísticas. Além disso, ao
realizar uma atividade vinculada ao conhecimento artístico de modo que possibilite
compreender as produções culturais em seu contexto, há múltiplos ganhos em relação
ao desenvolvimento estético. Hernández (2000) ao estudar essas questões afirma que:

[...] algo que, por óbvio, muitos esquecem: que não só potencia uma
habilidade manual, desenvolve um dos sentidos (a audição, a visão, o tato) ou
expande sua mente, mas, também, e, sobretudo, delineia e fortalece sua
identidade em relação às capacidades de discernir, valorizar, interpretar,
comprender, imaginar, etc., o que lhe cerca e também a si mesmo
(HERNÁNDEZ, 2000, p. 42).

Sendo assim, o ensino/aprendizagem flui, acontece de forma espontânea e


lúdica, transformando a experiência estética em conhecimento enriquecedor, o que dá
ao estudante condições de ser mais crítico, questionador e apreciador do belo.

Fundamentação teórica
A arte, assim como a leitura, está presente em toda trajetória das atividades
humanas e sua influência na Educação se dá ao longo de toda vida. Partindo desse
774

pressuposto, as práticas do professor de Arte, ao focar a alfabetização visual, podem


transformar a realidade do ensino/aprendizagem dos professores em formação, a fim de
que possam oferecer melhor qualidade de ensino aos seus estudantes. Parte-se do
princípio que a reflexão é um dos conceitos mais utilizados para pensarmos nas nossas
ações realizadas. Dentro dessa linha, considera-se importante que o exercício do pensar
naquilo que se faz se transforme em reflexão metódica, a fim de que se possa aprender
com as experiências e mudar as práticas. O estudo das práticas pedagógicas decorre da
necessidade de rever novos referenciais, pois,

o saber dos professores não é um conjunto de conteúdos cognitivos definidos


de uma vez por todas, mas um processo em construção ao longo de uma
carreira profissional na qual o professor aprende progressivamente a dominar
seu ambiente de trabalho. Ao mesmo tempo em que se insere e o interioriza
por meio de ação que se torna parte de sua consciência prática (TARDIF,
2005, p.15).

O componente curricular Arte, que consta do currículo escolar do ensino


fundamental II, historicamente é colocado em uma posição secundária. Barbosa (1995,
p. 38), aponta que “a Arte-Educação não é usável em si mesma e seu lugar é
considerado periférico no currículo”. Diferentemente da Arte, os demais componentes
curriculares, por seu turno, têm valor reconhecido no currículo porque atendem aos
interesses da escola e da sociedade. Já aquelas voltadas à educação artística precisam
justificar e convencer o por quê de sua inclusão no currículo escolar. Hernández (2000,
p. 43) em estudo sobre a importância da arte na formação, mostra que, “junto com a
história, são as experiências e conhecimentos afins ao campo das artes os que mais
contribuem para configurar as representações simbólicas portadoras dos valores que os
detentores do poder utilizam para fixar sua visão de realidade”.
Dessa forma, verifica-se que a Arte ainda é um campo de conhecimento pouco
valorizado no conjunto do currículo enquanto os outros componentes curriculares
respondem com mais compreensão às expectativas colocadas pelas políticas
educacionais e pelas escolas.

Métodologia de pesquisa utilizada


Abordagem qualitativa buscou investigar a percepção visual dos participantes
do nono ano do Ensino Fundamenta II, dividindo-a em etapas:
Primeira etapa
775

- para despertar a apreciação estética, foi apresentado um objeto folheiado a


ouro povocando a problematização de quem fez a obra;
- pesquisas e leituras sobre o estilo Barroco forão feitas nos livros, pois a
grande maioria dos alunos das escolas públicas tem acesso a esses recursos, dessa
forma esse material serviu de orientação para entenderem melhor essa técnica;
- exercitar a observação desenhando, cujo modelo, ora era o aluno, ora a
professora, e assim estimular o olhar, a partir de um tempo determinado no relógio;
- pesquisas em livros sobre os espaços educativos, o Centro Velho do
Município de Santos, pois esses espaços apresentam patrimônios históricos e artísticos;
- visita ao Centro Velho do Município de Santos, conhecendo vários objetos e
espaços, e após observá-los, desenhar o que o olhar captou, durante um tempo
determinado;
- a produção artísticas dos alunos se manifestou na criação de caixas com
foliação a ouro, portanto transformando assim as informaçoes adquiridas em
conhecimentos, levando, no final, as caixas como recordação de conclusão do Ensino
Fundamenta II.
Segunda etapa
As produções textuais dos alunos relataram suas experiências estéticas, e
sobre isso, Duarte Júnior (2008, p. 237) afirma que “por certo a reflexão encontra-se
sempre presente na vida daqueles que se entregam as experiências frente à arte.
Inevitavelmente, em especial quando são mais intensas, as vivências estéticas levam o
espectador não só a imaginar como também a refletir, a pensar sobre os sentidos e
sentimentos experimentados durante a experiência com obras”.

A visão dos estudantes


A visita, como prática pedagógica, ao centro histórico-artístico da cidade,
propiciou aos alunos uma leitura dos espaços e dos objetos, a qual resultou em
produções textuais, conforme ressalta Freire (2004, p. 97), quando argumenta que:

Afinal, o espaço pedagógico é um texto para ser constantemente “lido”,


interpretado, “escrito e reescrito”. Nesse sentido, quanto mais solidariedade
exista entre educador e educandos no “trato” deste espaço, tanto mais
possibilidades de aprendizagem democráticas se abrem na escola.

Dos sujeitos envolvidos (trinta e três, no total), analisou-se a produção textual


que possibilitou a caracterização dos principais referenciais a, saber apreciar, apreender
e conhecer ações relatadas nos textos produzidos e que constituíram valores
776

epistemológicos na formação educacional do estudante. Dessa análise resultaram


categorias que possibilitou visualizar um universo estético que se amplia por meio do
desenvolvimento da percepção e da sensibilidade, que, por sua vez, são fundamentais
para que haja o aprendizado e o conhecimento.
Sentimentos de alegria, emoção, tristeza, felicidade, autoestima, foram
manifestados pelos alunos, quando aproximados da cultura visual. Essa emoção
expressou-se na imagem do escuro e do chão duro e frio, do local histórico visitado,
onde permaneciam os escravos. Rompeu-se a passividade do pensamento, e, através da
dialética entre o mundo interno e externo, a emoção aflorou no registro da expressão
escrita. Dessa forma, compreende-se melhor esse processo da comunicação, porque “o
pensamento tem que passar primeiro pelos significados e depois pelas palavras”
(VIGOTSKI, 1999, p. 186).
O reconhecimento de valor do espaço-histórico e dos objetos artísticos, assim
como a reconstrução do conceito de tempo, na construção da cultura do cotidiano dos
estudantes, além do sentimento de pertença do patrimônio histórico e artístico da cidade
em que vivem, reforça o conceito de que a aprendizagem deve ser concebida como uma
produção ativa (HERNÁNDEZ, 2000).
Com a intenção de avaliar o ensino/aprendizagem, na segunda etapa do trabalho,
propôs-se a questão aos alunos: qual o sentimento que você experimentou ao vivenciar
este trabalho? Ao que foi respondido:
“Com a construção da caixinha, percebi que quando os escravos faziam esse trabalho
era muito trabalhoso. Mas vale a pena, pois essa caixinha é superinteressante, a arte
barroca é interessante e legal de fazer. No passeio do centro histórico de Santos,
conhecemos lugares que eu ainda não tinha ido, mas tinha vontade de ir, pois sempre
ouço falar. As igrejas eu adorei, a arquitetura delas, a história de cada pontinho de cada
azulejo, são tantos os detalhes que não consegui passar para o desenho. ”( Aluna “A”).

“Eu me senti muito bem. Foi como se eu tivesse naquele tempo antigo imaginando
como seria tudo aquilo. Eu achei uma maravilha por que fiquei sabendo de coisas que
nem imaginava que aconteceram” (Aluno “B”).

“Senti tristeza quando conheci o Pantheon dos Andradas, e quando vi o lugar onde os
escravos dormiam, no chão duro, frio e no escuro” (Aluno “C”).
777

As mininarrativas dos alunos expressam o desejo de conhecer o passado, mas


também denotam percepções relacionadas à opressão do poder econômico-político do
colonizador branco sobre os negros, e deixam fluir o sentimento de compaixão pelos
escravos. A relação da percepção com o espaço, o sentimento de satisfação por adquirir
um novo saber e a importância de estar num local histórico-artístico de sua cidade foram
relatados pelos alunos que, no momento da produção artística e textual, demonstraram
interesse, imaginação e criatividade.
Os comentários dos alunos também demonstram, mesmo que de forma não
intecional, uma leitura afetiva do espaço:

“Eu me senti surpreso, não sabia que esses lugares eram tão importantes. Confesso que
pensei que fosse chato, mas fui descobrindo como apreciar aquilo, que faz parte da
nossa cidade. O que era para ser um passeio a fim de descobrir a arte que habita a nossa
cidade, virou um passeio histórico e divertido, e o que posso dizer é que faria esse
passeio outra vez” (Aluno “F”).

“Eu senti que estava adquirindo mais conhecimento, não tinha noção que todas aquelas
casas, monumentos, igrejas antigas, tinham tanta cultura para nos oferecer. Mas depois
do passeio adquiri mais conhecimento do que aqueles patrimônios históricos, não são
apenas coisas antigas, sem importância, mas, sim, aprendemos mais sobre o nosso
passado, a importância daqueles patrimônios, e que para vivermos o nosso presente e
futuro com mais cultura, precisamos estudar o passado para vivermos o agora. Gostei
muito de ter feito o passeio, pois enriqueceu mais meu conhecimento” (Aluna “G”).

A aluna G mostra em seu relato que, durante o passeio, os conhecimentos


apresentados foram se incorporando aos seus interesses culturais, e que despertados pela
curiosidade, constituíam-se novos conhecimentos. Pode-se constatar através dos
registros das expressões escritas dos estudantes, que, num passeio sócio-cultural aliado
a prática pedagógica, criou-se a posssibilidade de ensino-aprendizagem por um caminho
que beneficia, também a reflexão do professor quanto às suas práticas, porque o
professor
não trabalha apenas um objeto, ele trabalha com sujeitos e em função de um
projeto: transformar os alunos, educá-los e instruí-los. Ensinar é agir com
outros seres humanos; é saber agir com seres humanos que sabem que lhes
ensino; é saber que ensino a outros seres humanos que sabem que sou um
professor, etc. Daí decorre um jogo sutil de conhecimentos, de
reconhecimentos e de papéis recíprocos, modificados por expectativas e
778

perspectivas negociadas. Portanto o saber não é uma substância ou um


conteúdo fechado em si mesmo; ele se manifesta através de relações
complexas entre o professor e seus alunos. Por conseguinte, é preciso
inscrever no próprio cerne do saber dos professores a relação com o outro, e,
principalmente, com esse outro coletivo representado por uma turma de
alunos (TARDIF, 2005, p.13).

Considerações finais
O que mata um jardim,
não é
Abandono...
O que mata um jardim é esse olhar
Vazio,
De quem por ele passa indiferente
Mário Quintana

O Centro Velho da cidade de Santos, em loco, foi o espaço Educacional, tido


como cenário para que a experiência estética dos estudantes do ensino do fundamental
II se realizasse. Buscou-se caracterizar a importância da observação dos espaços
através de desenhos, produções artísticas e produções textuais com gêneros literários
como: mini-narrativas, poemas e relatos, consolidando essas produções em
conhecimentos.
Pôde-se constatar que o aprendizado não foi mecanizado, simplesmente
memorizado, houve muitos questionamentos sobre os locais visitados, sobre a época,
sobre a arte Barroca e, principalmente, sobre a importância daquele universo novo que,
não com um olhar vazio e sim com o olhar estético apreendido de cconhecimentos,
estavam desvelando e incorporando como transformação na sua formação como ser
humano.
Por isso, como desafio para ensinar o olhar estético, a alfabetização visual fez
parte da prática pedagógica, e, para tanto saber ler o mundo das imagens, captadas pelo
olhar, isto é, o espaço em que vivem, com sensibilidade estética e ética é aprender a
pensar com Arte, é ter a possibilidade de transformar o mundo de acordo com sua
vontade, tendo a liberdade de escolhas, tanto na visão do professor ou como na do
aluno.
Está, portanto, na formação do professor-crítico-reflexivo, a importância da
subjetividade ao fazer reflexões que norteiem suas práticas. O pensar-agir com ética não
aceita a postura do professor que não tenha respeito, comprometimento e coerência com
sua profissão, e também com o aluno, o qual deve ser tratado com respeito e afeto.
779

A curiosidade que move e estimula o interesse em busca do conhecimento


também o coloca em confronto com as diversas formas de experiências. Diante de
situações como essas, o professor reflexivo e crítico necessita estar atento às mudanças
que sua prática exige, porém, considerar o rigor metodológico e científico da ciência,
pode ajudá-lo a criar e fundamentar teoria e prática no saber-fazer docente, a partir do
contexto sócio-cultural do aluno e do professor.

Referências Bibliográficas

BARBOSA, A.M. Dilemas da Arte/Educação como mediação culural em namoro com


as tecnologias contemporâneas. In: BARBOSA, A. M. (Org.). Arte/educação
contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.

BARBOSA, A. M. T. B. Teoria e Prática da Educação Artística. 14. ed. SP:


Cultrix, 1995.

COLLI, Jorge. A Arte e a Contribuição da Pesquisa Histórica. In: BARBOSA, Ana


Mae Tavares Bastos et al. (Orgs). O Ensino das Artes nas Universidades. SP: USP,
1993.

DUARTE JR, J.F. A Arte na Educação: cinco temas para reflexão. In: BONIN, I.;
TRAVERSINI, C.; EGGERT, E.; PERES, E. (Orgs.). Trajetórias e processos de
ensinar e aprender: políticas e tecnologias. RS: EdiPUC, 2008.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 29.


ed. SP: Paz e Terra, 2004.

HERNÁNDEZ, F. Cultura Visual, Mudança Educativa e Projeto de Trabalho.


Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. 5. ed. RJ: Vozes,


2005.

VIGOTSKI, L. S. Pensamento e Linguagem. SP: Martins Fontes, 1998.


780

Comunicação

Formação continuada de coordenadores pedagógicos: avaliação de expectativas e


novas propostas

Ligia Elliot
Fundação Cesgranrio
Patricia Regina Santos
SME-RJ

RESUMO: O presente estudo avalia a Formação Continuada de Coordenadores


Pedagógicos, de escolas municipais do Rio de Janeiro, realizada Gerência de Educação
da 2ª Coordenadoria Regional de Educação do Rio de Janeiro. A metodologia utilizada
analisa as expectativas apontadas pelos coordenadores para a formação nas respostas
aos instrumentos aplicados durante o curso, dispostas em um quadro de evidências para
mapeamento qualitativo, elencando as principais categorias e indicadores e o
atendimento das mesmas. A elaboração de lista de verificação dos aspectos dos
indicadores e respectivas categorias da formação possibilitou identificar o nível de
atendimento às expectativas dos participantes. As recomendações foram dispostas em
uma matriz que se divide em pontos fortes, fragilidades, oportunidades e ameaças, a
partir das percepções dos participantes, compondo o cenário avaliativo com sugestões
de modificações e melhoria para futura proposta de formação continuada do
Coordenador Pedagógico.
Palavras-chave: Formação Continuada. Coordenadores Pedagógicos. Avaliação.

COORDENADOR PEDAGÓGICO: função e perfil


A função de coordenador pedagógico, devido à necessidade de organização
pedagógica das unidades escolares, foi instituída na Rede Pública Municipal de Ensino
da cidade do Rio de Janeiro, em 1998. A Lei nº 26191 define como atribuição específica

Assessorar o diretor na coordenação e planejamento, execução e avaliação


curricular e o desenvolvimento do trabalho pedagógico, em consonância com

1 Lei Municipal 2619, de 6 de janeiro de 1998 dispõe sobre a estrutura organizacional, pedagógica e
administrativa da rede pública municipal de educação.
781

as diretrizes emanadas da Secretaria Municipal de Educação do Rio de


Janeiro, de forma a atender a diversidade da escola.

As funções específicas foram discriminadas na Circular do Departamento Geral


de Educação- E/DGED Nº 37 de julho de 1998, determinando aspectos específicos
referentes às atribuições, à capacitação e à avaliação. Dentre tantas ações pedagógicas,
sob responsabilidade do coordenador, destaca-se a formação continuada do corpo
docente de sua unidade escolar, fazendo a articulação entre a teoria educacional e a
prática pedagógica escolar. Pode-se identificar a figura do coordenador como elemento
responsável pela gestão pedagógica junto à direção escolar. Apresentam-se desta
maneira como responsáveis pela unidade escolar pertencente, respondendo
institucionalmente sobre o desempenho da mesma junto à Secretaria Municipal de
Educação do Rio de Janeiro (SME-RJ).
Para exercer a função de coordenador pedagógico foram estabelecidos alguns
critérios, que vigoram até a presente data, dentre eles estão ser professor da Rede e ter
mais de cinco anos de regência. A escolha e a indicação do profissional são feitas pela
direção da escola. A avaliação e a aprovação desta escolha são realizadas pela divisão
responsável da área pedagógica nas escolas, Gerência de Educação (GED) dentro das
respectivas Coordenadorias Regionais de Educação (CRE).
A GED é responsável pelo suporte pedagógico junto às escolas, com ações de
acompanhamento do desenvolvimento pedagógico escolar, passando pela formação do
corpo docente das unidades escolares.
Ações formativas para capacitação do corpo docente são promovidas como
cursos, seminários, palestras, troca de experiências, e muitas outras, de forma
generalizada, no âmbito da Secretaria de Educação, bem como as específicas, pelas
coordenadorias regionais responsáveis. A formação continuada oferecida para os
Coordenadores Pedagógicos também corresponde aos dois tipos, assim como a utilizada
para esta avaliação.
No ano de 2011, por entender a necessidade de intensificar o suporte pedagógico
junto às suas unidades escolares, devido ao desempenho apresentado pelas mesmas,
tanto acima, quanto abaixo da meta 5, no IDEB para o Município do Rio de Janeiro, a
GED/2ª CRE propôs um curso de formação continuada para Coordenadores
Pedagógicos. Esta ação também foi motivada por sugestão dada pelos Coordenadores
Pedagógicos, participantes do Curso em 2010, promovido pela SME-RJ para escolas
com turmas de 1º ano do EF que apresentaram um baixo desempenho na avaliação
782

diagnóstica da alfabetização e obtiveram resultado abaixo do nível desejável para o


período.
Com o intuito de aprofundar o conhecimento sobre o reflexo da formação
continuada para o Coordenador Pedagógico, fornecendo-lhe subsídios para o trabalho
realizado, e o quanto este fator pode ser identificado de forma positiva no desempenho
da escola, é que surgiu a proposta da avaliação realizada por este estudo.

A FORMAÇÃO CONTINUADA DO COORDENADOR PEDAGÓGICO


A formação continuada compõe o cenário da Rede Municipal de Educação do
Rio de Janeiro há mais de uma década. Desde a implantação do cargo de Coordenador
Pedagógico na SME-RJ, em 1998, foram realizadas várias propostas de formação para
que ele atue como agente multiplicador junto a sua escola, promovendo a formação
continuada do corpo docente.
A proposta da formação dos Coordenadores Pedagógicos surge como uma das
ações da Gerência de Educação (GED), visando ao pleno desenvolvimento do trabalho
pedagógico nas escolas. O Coordenador Pedagógico passou a ser o foco em virtude do
seu papel formador, com a finalidade de transformar a escola em um espaço permanente
de educação/formação continuada. Segundo Demo (2004, p.11), “O conhecimento é a
energia fundamental da construção histórica e evolucionária da autonomia, uma
autonomia que nunca é plena (somos sempre seres dependentes), mas pode alargar-se, à
medida que soubermos aprender e conhecer”.
A formação continuada do Coordenador Pedagógico 2011 apresenta como
objetivos possibilitar a reflexão sobre teorias da educação, articulando-as com questões
do cotidiano escolar, bem como viabilizar espaços de discussão sobre as questões e
tensões as quais permeiam o espaço escolar.
O curso foi elaborado com eixos temáticos norteadores, desde diferentes teorias
e concepções educacionais até as áreas específicas de cada disciplina e segmento,
conforme o Quadro 1. Para aprofundamento de alguns temas e exercício da prática de
alguns eixos foram organizados Grupos de Estudos (GE). A criação deste espaço
pedagógico visava à efetiva troca de experiências de situações cotidianas pertinentes ao
tema em questão.
783

Quadro 1 - Formatação do Curso para Coordenadores Pedagógicos.


Eixo Data Tema
17/5 1.O papel do coordenador pedagógico: suas atribuições e possibilidades.

1º 24/5 2.Inclusão: O que é isso?


31/5 3.GE - Trabalho do CP/função da supervisão escolar e do
acompanhamento pedagógico.
7/6 4.O pensamento de Piaget, Vygotsky e Wallon: contribuições para a
2º aprendizagem.
21/6 5.O pensamento de Paulo Freire e sua contribuição para a educação.
5/7 6.Letramento e leituras: do quadro à tela.

16/8 7.GE - Letramentos e prática pedagógica.
4º 23/8 8.As linguagens das artes.
13/9 9.Ciência, relações socioambientais e patrimônio.

20/9 10. GE - Ciência e patrimônio – 2ª etapa.
6/10 11. Alfabetização cartográfica.

18/10 12. GE - Dinamização de acervo, mapas e patrimônio.
8/11 13. Desmistificando a matemática.

22/11 14. Uma pausa...
Fonte: GED/2ª CRE (2012).
No último encontro do curso foi realizada uma avaliação de todos os temas,
englobando apontamentos feitos pelos Coordenadores sobre cada uma das etapas,
pedidos e sugestões para uma nova versão do curso. Este material foi disponibilizado
para este estudo, contribuindo para que a análise das respostas pudesse ser aprofundada.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: abordagem, instrumentos e análise de


dados

Este estudo buscou compreender a relevância da formação pedagógica segundo


a percepção dos coordenadores por meio dos cursos realizados pela GED/2ªCRE. Tem
natureza somativa por tratar de resultados referentes ao final de cursos já realizados, nos
anos de 2010 e 2011. Worthen, Sanders e Fitzpatrick (2004, p.166) explicam que

Scriven (1967) fez uma grande contribuição a essa abordagem com a


distinção entre somativa e formativa. O papel somativo da avaliação, dizia
ele, “[possibilita] que os administradores concluam se todo o currículo já
pronto, refinado pelo uso do processo de avaliação em seu(...) papel
784

[formativo] representa ou não uma avanço suficientemente significativo em


relação às alternativas existentes para justificar as despesas de sua adoção no
sistema escolar”.

A avaliação realizada para este estudo fez parte de um processo que pode refletir
na forma e na continuidade do próprio curso. Realizada ao final de dois cursos para os
Coordenadores Pedagógicos, consecutivamente em 2010 e 2011, foi classificada como
somativa a posteriori.
A seguinte questão avaliativa norteou o desenvolvimento do estudo. Até que
ponto o curso de Coordenadores Pedagógicos 2011 da 2ª CRE atendeu às expectativas
da formação continuada, explicitadas pelos participantes por ocasião da capacitação
realizada em 2010?
Os instrumentos de coleta de dados utilizados inicialmente foram elaborados
pela SME-RJ e 2ª CRE e aplicados durante e ao final da realização dos cursos. Foram
utilizadas informações coletadas nos seguintes instrumentos: a entrevista, realizada com
os Coordenadores Pedagógicos no Curso de 2010, os instrumentos avaliativos de cada
encontro do curso de 2010 sendo este um instrumento padrão da SME-RJ para todas as
suas ações formativas e o instrumento de avaliação final do Curso de Coordenadores
Pedagógicos 2011, elaborado pela equipe da GED/2ª CRE.
A entrevista utilizada aconteceu no primeiro encontro de 2010 como parte de
uma dinâmica de apresentação e entrosamento entre os pares. Esta era composta das
questões sobre a identificação do coordenador, da escola pertencente e perfil de
atendimento da mesma, formação acadêmica do coordenador, tempo de função,
experiência em turma de alfabetização e expectativa para esta capacitação.
A análise dos dados coletados pelos instrumentos que foram aplicados aos
Coordenadores Pedagógicos, participantes da formação continuada, cursos 2010 e 2011,
foi então realizada pela autora do estudo.
Os dados relativos à expectativa da formação do Coordenador Pedagógico
passaram por uma análise de conteúdo, observando-se as falas dos próprios
Coordenadores que serviram para a construção do Quadro para Coleta de Evidências.
785

Quadro 2 – Quadro para Coleta de Evidências dos Cursos de Coordenadores


Pedagógicos
Evidências (Falas dos
Categoria Subcategorias Indicadores Coordenadores
Pedagógicos)
Novos conhecimentos
Formação do Coordenador Prática Pedagógica
Pedagógico Troca de experiências
Atendimento do Motivação funcional
curso às Auxílio Pedagógico
expectativas na Suporte do Professor Intervenção na prática
percepção dos Incentivo profissional
Coordenadores Apoio ao ensino
Pedagógicos Novas práticas
Aplicabilidade na Escola Sucesso do trabalho
Transformação da escola
Melhoria de desempenho

Fonte: SANTOS (2012).

Este quadro foi inserido como metodologia de análise de conteúdo de forma


qualitativa, utilizando as respostas das entrevistas, para compor o cenário de
representatividade da expectativa do Coordenador Pedagógico para o curso.
O instrumento avaliativo utilizado de 2011 foi elaborado pela equipe da
GED/2ª CRE. Foi aplicado no último encontro, a um total de 61 respondentes. A
Avaliação foi diagramada com os eixos, data, palestrante para ser conceituada e espaço
para preenchimento opcional de destaque ou observação de cada encontro.
Os 14 encontros realizados de abril a novembro de 2011, conforme disposto no
Quadro 1, foram avaliados com os conceitos. Para finalizar, o instrumento apresentava
duas questões abertas, sobre sugestões para a Formação Continuada de 2012 e críticas
em relação à caminhada de 2011, referente ao Curso CP 2011. Estas questões foram
analisadas no quadro de atendimento à expectativa dos participantes no Quadro de
Evidências (Quadro 2).
Com o propósito de analisar as respostas quanto ao atendimento das expectativas
a partir das respostas das questões abertas do instrumento avaliativo do Curso de 2011,
foi elaborado um instrumento específico para análise de dados coletados neste estudo, a
lista de verificação (Quadro 3). Este instrumento estabelece uma avaliação simultânea e
786

paralela dos dois cursos analisados para melhor identificar os critérios avaliativos
atendidos.
Conforme explica Elliot (2012, p.17), a lista de verificação consiste em

(...) um instrumento bastante utilizado em avaliações, sozinho ou como


instrumento coadjuvante de um estudo. Privilegia, assim, a verificação de
atividades correntes ou já concluídas, com a finalidade de estabelecer se um
determinado atributo é encontrado ou inexistente...

A avaliação dos dados coletados sobre o curso de Coordenadores Pedagógicos


de 2011 foi disposta na Matriz SWOT. Esta matriz divide-se em força e fragilidades em
relação ao ambiente interno, oportunidades e ameaças, com referência ao ambiente
externo (WORTHEN; SANDERS; FITZPATRICK, 2004).
Para este estudo avaliativo, a matriz SWOT foi utilizada para apresentar os
dados coletados de forma conclusiva, composta a partir das percepções dos
Coordenadores Pedagógicos, sendo apresentada na seção de conclusões e
recomendações do estudo.

RESULTADOS
Foram analisadas as respostas dos instrumentos com enfoque qualitativo,
considerando o teor das mesmas para compor as evidências relacionadas aos
indicadores do Quadro 2. O objetivo da análise foi mapear as percepções dos
Coordenadores Pedagógicos envolvidos sobre as ações de formação continuada
desenvolvida pela 2ª CRE, com ênfase no Curso de Coordenadores Pedagógicos 2011 e
em sua aplicabilidade nas abordagens pedagógicas na escola.
A Expectativa do Coordenador Pedagógico para o Curso
A disposição da análise dos dados da entrevista na questão aberta referente à
ação formativa foi representada no esquema (Figura 2) que contém as três categorias
identificadas para a variável expectativa do Coordenador Pedagógico: formação de
Coordenador Pedagógico, suporte ao professor e aplicabilidade na escola.
As categorias e indicadores surgiram mediante a análise do conteúdo das
respostas dos coordenadores participantes.
787

Figura 1- Expectativa do Coordenador Pedagógico para formação continuada.

Fonte: SANTOS (2013).

Na análise de dados de 2010, a partir da declaração dos Coordenadores, foram


identificadas as evidências que apontaram categorias e indicadores.
Para a categoria Formação do Coordenador Pedagógico foram apontados quatro
indicadores, a saber: novos conhecimentos, prática pedagógica, troca de experiências e
motivação funcional. Na categoria Suporte do Professor foram apontados os
indicadores auxílio pedagógico, intervenção na prática e incentivo profissional. E para
categoria Aplicabilidade na Escola foram indicados: apoio ao ensino, novas práticas,
sucesso do trabalho, transformação da escola e melhoria de desempenho.
Todas as evidências apresentadas nos seus respectivos indicadores justificam a
existência dos mesmos. Os indicadores representam a composição das categorias que
foram apontadas nas falas dos coordenadores. Algumas categorias são recorrentes na
fala dos profissionais que compõem o universo escolar, como por exemplo, suporte ao
professor. Esta categoria apareceu no material utilizado no estudo metodológico que
originou o Quadro para Coleta de Evidências (Quadro 2).
As categorias e indicadores apresentados nas expectativas dos Coordenadores
Pedagógicos para o curso de 2010 serviram de referência para verificação do
atendimento às expectativas no Curso CP 2011- Gerência de Educação da 2ª CRE,
através de construção do Quadro para Coleta de Evidências.
788

Percepção dos Coordenadores Pedagógicos sobre o Curso 2011: atendimento as


expectativas
A análise das respostas às perguntas abertas, contendo sobre sugestões para o
Curso CP 2012 e críticas do Curso de 2011, proporcionou a avaliação do atendimento
das expectativas da formação continuada do Curso, que motivou a continuidade da
formação na 2ª CRE. O conteúdo das falas dos Coordenadores Pedagógicos foi
analisado qualitativamente, compondo as evidências apresentadas. Vale destacar que as
evidências apresentadas correspondem às categorias e indicadores representados na
Figura 3. Este procedimento foi utilizado para identificar o atendimento através das
categorias e indicadores de expectativas. A mesma metodologia de análise qualitativa de
conteúdo por meio do Quadro para Coleta de Evidências foi utilizada para a verificação.
As respostas dos Coordenadores na avaliação do Curso 2011 possibilitou análise
das categorias de formação do Coordenador Pedagógico, suporte ao professor e
aplicabilidade na escola e seus respectivos indicadores.
Na análise das evidências apresentadas pode-se perceber que todos os
indicadores da categoria Formação do Coordenador Pedagógico, apontados na
expectativa do curso de 2010, foram atendidos segundo a percepção dos Coordenadores
participantes do Curso de 2011.
Os indicadores da categoria suporte ao professor foram atendidos, com destaque
para o indicador auxílio pedagógico, pois apresentou maior número de evidências nesta
categoria.
E na categoria aplicabilidade na escola foi observado o atendimento aos
indicadores, sendo apoio ao ensino o que apresentou maior ocorrência de evidências.
Desta forma, identifica-se como interesse recorrente do Coordenador Pedagógico a
aplicabilidade do curso para apoiar o ensino da escola.

Comparação do atendimento às expectativas dos Coordenadores Pedagógicos

Para uma melhor análise dos resultados quanto ao atendimento das expectativas
dos Coordenadores Pedagógicos, foi utilizada uma Lista de Verificação (Quadro 3)
como instrumento avaliativo.
Este instrumento foi construído a partir da coleta de evidências, compondo um
quadro que foi organizado com as mesmas categorias e indicadores, identificados por
meio das falas representativas dos Coordenadores Pedagógicos. A partir dos dois
789

conjuntos de evidências construídos no estudo, o das expectativas do Coordenador


Pedagógico do curso 2010 e o de atendimento as expectativas no curso 2011, foi
avaliado o atendimento às expectativas dos Coordenadores Pedagógicos pela formação
continuada.
O Quadro 3 apresenta o resultado da avaliação do atendimento, ou não, às
expectativas dos Coordenadores Pedagógicos em relação aos cursos de 2010 e 2011.
Observa-se que a expectativa da categoria formação do Coordenador Pedagógico foi
atendida, bem como seus indicadores novos conhecimentos, prática pedagógica e troca
de experiência.
Quadro 3- Avaliação da Formação Continuada do Coordenador Pedagógico
Aspectos Curso 2010 Curso 2011
Requer Requer
Formação do Coordenador Pedagógico Atendeu aprimora- Atendeu aprimora-
mento mento
Forneceu Novos Conhecimentos
Proporcionou a Troca de Experiências
Facilitou a Prática Pedagógica
Motivou para exercício da função
Incentivou a Permanência na Função
Indicou ou disponibilizou materiais para o suporte
pedagógico
Suporte ao professor
Contribuiu com ideias para o trabalho junto aos
professores
Apresentou temas que foram trabalhados em Centros
de Estudos
Motivou o trabalho dos professores
Associou a aplicabilidade com materiais pedagógicos
da rede.
Auxiliou a intervenção do trabalho pedagógico
Aplicabilidade na escola
Agregou valor ao projeto da escola com informações
Intensificou o processo de ensino aprendizagem
Contribuiu com sugestão de materiais pedagógicos e
pesquisas
Incentivou o desenvolvimento pedagógico escolar
Colaborou para a transformação do espaço escolar
790

Incentivou a busca pelo sucesso escolar


Promoveu a melhoria de desempenho

Fonte: SANTOS (2013).


Após a análise do Quadro 3, foi constatado que os cursos atenderam às
expectativas dos Coordenadores Pedagógicos em quase todos os aspectos apontados.

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
A questão avaliativa tinha a intenção de identificar o atendimento das
expectativas do Coordenador Pedagógico sobre a formação continuada oferecida no
curso de 2011.
Na opinião dos participantes, o atendimento aos aspectos da formação
continuada do Coordenador Pedagógico obteve maior incidência de respostas positivas
com relação aos aspectos contemplados nesta categoria. O aspecto incentivo à
permanência na função foi o aspecto que recebeu menor número de respostas positivas
nesta categoria. Desta forma, entende-se que as expectativas da categoria formação do
Coordenador Pedagógico foram atendidas. A categoria suporte ao professor apresentou
o atendimento pleno, sendo contemplados todos os aspectos. Já na categoria
aplicabilidade dos conhecimentos adquiridos na escola durante o curso, não foi
constatado seu atendimento pleno. Nesse sentido, apenas os aspectos incentivo ao
sucesso escolar e melhoria de desempenho não alcançaram o atendimento pleno pelo
curso de 2011, requerendo aprimorá-los.
Com o propósito de compor o cenário conclusivo deste estudo, foi elaborada a
matriz do Curso de Coordenador Pedagógico 2011 da 2ª CRE, a partir das percepções
dos participantes, utilizando o modelo da matriz SWOT2.

2
WORTHEN, SANDERS, FITZPATRICK (2004).
791

Quadro 4- Matriz avaliativa do curso de Coordenador Pedagógico 2011 - 2ª CRE


Pontos fortes Fragilidades
Importância da formação continuada para os Locais de difícil acesso e distantes das escolas
coordenadores; de atuação do Coordenador;
Divisão dos temas por áreas do conhecimento; Coincidência de calendário com outros
Temas interessantes e variados; encontros da CRE/SME-RJ;
Calendário bem organizado, com poucas Proximidade com datas de avaliação escolar,
Ambiente Interno

alterações; Conselhos de Classe e Centro de Estudos;


Formação continuada durante todo ano letivo; Encontro somente em um horário;
Troca de experiências entre os participantes; Alguns encontros muito teóricos sem
Bons dinamizadores e palestrantes associação com a prática;
Apreciação pelos dinamizadores internos; Não conhecer previamente o material dos
Contribuição dos temas para projetos encontros;
pedagógicos de algumas escolas; Poucos encontros ou pouco tempo para temas
Encontros em espaços culturais (MAM); que merecem maior aprofundamento como
Material dos encontros disponibilizado para os Alfabetização e Letramento, Inclusão, Função
participantes; do CP;
Aplicabilidade nos Centros de Estudo e no Espaços pouco adequados ao tema do
cotidiano escola. encontro.
Oportunidades Ameaças
Opção de locais mais centrais e de fácil acesso, Dificuldade de participação do CP por:
Substituição do Professor;
através de parcerias;
Demandas da rotina escolar-administrativa e
Disponibilizar alguns encontros em diferentes pedagógica impossibilitando a saída;
espaços culturais como museus, centros culturais, Necessidade de motivação;
Ambiente Externo

Rotatividade da função;
entre outros; Falta de Coordenadores em algumas unidades;
Conscientização dos diretores para importância
da participação do Coordenador Pedagógico;
Destacar a relevância da Função do Coordenador
Pedagógico no desenvolvimento escolar;
Seleção de Coordenadores que atendam a mais
critérios para função;

Fonte: SANTOS (2013).


Observa-se na Matriz avaliativa do Curso 2011 mais fatores positivos do que
fragilidades. Estas últimas assumem o papel de recomendações específicas dos
participantes para os organizadores do Curso na 2ª CRE (Quadro 4).
Conclui-se que, na percepção dos Coordenadores Pedagógicos, o Curso de 2011
atingiu as expectativas apontadas pelos participantes, uma vez que alcançou
satisfatoriamente o objetivo proposto de fornecer subsídios pedagógicos por meio da
formação continuada para exercício da função. Em relação ao ambiente externo, que diz
respeito à estrutura externa do curso, as oportunidades referidas na fala dos
792

Coordenadores Pedagógicos servem para apontar as possibilidades existentes para


auxiliar a melhor formatação do curso.
Quanto às ameaças, entende-se que é necessário utilizar as possíveis estratégias
para superá-las. As principais ameaças estão nos fatores que impedem a participação do
Coordenador Pedagógico no curso.
Considerando os resultados e as conclusões do estudo, recomenda-se que a
formação continuada do Coordenador Pedagógico seja promovida segundo os
apontamentos dos participantes e atenda aos seguintes aspectos:
- que os Temas sejam variados e divididos por áreas do conhecimento, sirvam para
suporte à formação do professor incluindo com ênfase para educação inclusiva,
Matemática para prática na sala de aula, utilizando jogos e material concreto;
- que haja maior aprofundamento dos temas, sugere-se que sejam utilizados por mais de
um encontro;
- que a Estrutura possibilite que o local do curso seja mais próximo ao centro, sem
muitas variações e de fácil acesso; que o horário seja disponibilizado nos dois turnos e
que o calendário seja diferenciado das demais ações formativas e do período de
avaliação escolar;
- que a Metodologia privilegie a associação de teoria e prática em cada tema, utilize
grupos de estudos para prática do tema e troca de experiência, com apresentação das
bem sucedidas ao final e trabalhe o registro dos temas individualmente (Diário de
bordo) e coletivamente (Portfólio), para que ao final da formação possam ser utilizados
para avaliação da formação pelo Coordenador. Que tenha oficinas, dinâmicas de grupo,
vídeos e músicas para utilização em centro de estudos.
Na Inovação, que a formação continuada seja transformada em espaço virtual de
comunicação e de troca de informações permanente entre os participantes.
A partir das recomendações feitas, entende-se que o atendimento das mesmas
favorecerá a continuidade da formação dos Coordenadores Pedagógicos e em
consonância com as suas expectativas. Conforme afirma Sánchez (2012, p.162): “A
aprendizagem implica na participação ativa daquele que aprende e a aquisição de
competências para autonomia, a construção e a gestão do conhecimento de maneira
individual, ou seja, para se “aprender a aprender”.
Entende-se ainda que o ajuste dos aspectos apontados por este estudo poderá
tornar a formação continuada dos Coordenadores Pedagógicos mais adequada na
793

consolidação da aprendizagem, fornecendo subsídios para sua atuação no atendimento


às demandas pedagógicas das unidades escolares de docentes e discentes.

REFERÊNCIAS

DEMO, Pedro. Professor do futuro e reconstrução do conhecimento. Petrópolis:


Vozes, 2004.

ELLIOT, Ligia Gomes (Org.). Instrumentos de avaliação e pesquisa: caminhos para


construção e validação. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012.

RIO DE JANEIRO. (Estado). Lei nº 2.619 de 16 de janeiro de 1998. Dispõe sobre a


estrutura organizacional, pedagógica e administrativa da rede pública municipal de
educação. [Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro]. Rio de Janeiro, RJ, 16 jan.
2008.

______. (Município). Departamento Geral de Educação da Secretaria Municipal de


Educação. Circular nº 37, 13 de julho de 1998. Define as atribuições do Coordenador
Pedagógico. Rio de Janeiro: Secretária Municipal de Educação. 1998.

Santos, Patricia Regina M.R Avaliação de Curso de Formação Continuada da 2ª


Coordenadoria Regional de Educação: atendimento às expectativas do Coordenador
Pedagógico. 64f .2013. Dissertação (Mestrado Profissional em Avaliação)–Fundação
Cesgranrio, Rio de Janeiro, 2013.

WORTHEN, Blaine R.; SANDERS, James R.; FITZPATRICK, Jody L. Avaliação de


programas: concepções e práticas. Tradução Dinah de Abreu Azevedo. São Paulo:
Gente, 2004.

ZAYAS, Emílio López-Barajas et al. (Org.). O paradigma da educação continuada.


Tradução Alexandre Salvaterra. Porto Alegre: Ed. Penso, 2012.
794

Comunicação

Gestão de práticas pedagógicas em um centro de estudos supletivos: a visão da


equipe gestora

Luciana Bandeira Barcelos


ProPed/UERJ
Grupo de Pesquisa Aprendizados ao longo da vida: sujeitos, políticas e processos
educativos
Agência: CAPES/INEP

Resumo: O trabalho em referência é um recorte de minha dissertação de Mestrado, que


objetivou — refletindo sobre concepções de educação de jovens e adultos vigentes e
analisando práticas diversificadas de atendimento a esse público, desenvolvidas em um
Centro de Estudos Supletivos — avaliar qualidade de ensino nessa modalidade, em
instituição escolar na cidade do Rio de Janeiro, tomada como estudo de caso. Nesse
recorte, discuto a gestão de práticas pedagógicas em um CES, considerando-a uma
dimensão cujos indicadores podem demonstrar qualidade no que se faz, no espaço
escolar. Por meio dela, operacionalizam-se políticas que trabalham para a
universalização e democratização do ensino qualitativo. Colabora, portanto,
decisivamente, para a inserção dos estudantes no mundo da cultura escrita, promovendo
acesso a bens materiais e imateriais: de consumo, tecnológicos e culturais.
Palavras chave: Centro de Estudos Supletivos, gestão, qualidade na EJA.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho, é um recorte de minha dissertação de Mestrado, que


objetivou — refletindo sobre concepções de educação de jovens e adultos (EJA)
vigentes e analisando práticas diversificadas de atendimento a esse público,
desenvolvidas em um Centro de Estudos Supletivos (CES), expressão de política
pública estadual existente há quase 40 anos — avaliar qualidade de ensino nessa
modalidade, em instituição escolar na cidade do Rio de Janeiro, tomada como estudo de
caso.
795

A pesquisa, de caráter quantiqualitativo, ao buscar compreender qualidade de


ensino em um CES, tomou como fonte de dados, as dimensões processos e resultados,
fluxo escolar e gestão escolar. Nesse recorte, discuto a gestão de práticas pedagógicas
no CES Bairro B1, lócus da pesquisa, a partir do que denomino relativa autonomia de
gestão, considerando-a uma dimensão cujos indicadores podem demonstrar qualidade
no que se faz, no espaço escolar. Por meio dela, operacionalizam-se políticas que
trabalham para a universalização e democratização do ensino qualitativo. Colabora,
portanto, decisivamente, para a inserção dos estudantes no mundo da cultura escrita,
promovendo acesso a bens materiais e imateriais: de consumo, tecnológicos e culturais.
No bojo das determinações da LDBEN, Lei 9394/96, visando à desejada
democratização do ensino no país e considerando a diversidade da população
demandante de EJA, a oferta da modalidade deve incorporar flexibilidade no currículo,
nos espaços e nos tempos escolares, permitindo percursos variados, adequados às
realidades dos participantes, que se caracterizam, sobretudo, pela condição de sujeitos
com diversas trajetórias de vida, que comportam pluralidade de objetivos, saberes,
experiências e responsabilidades.
Nesse contexto, o CES trava embates em seu cotidiano escolar, pela
permanência de movimentos de superação, de reinvenção da escola e de busca de
identidade, reconhecida e valorizada como política pública adequada a necessidades
presentes de jovens e adultos, sujeitos de direito à educação. Embates que
proporcionaram flexibilidade às ações estabelecidas em seu interior, com a
diversificação de seus modos de atendimento, garantindo assim movimentos de
autonomia frente aos interesses e necessidades advindas do cotidiano escolar, buscando
melhor responder as necessidades de jovens e adultos.

2. CES: SITUANDO A OFERTA NO CENÁRIO EDUCACIONAL


Os CES são unidades escolares que atendem a modalidade EJA nos níveis
fundamental e médio, por meio de ensino semipresencial, e preveem avanços
sequenciados de módulos, sem caráter de seriação.
Criados no início dos anos 1970, durante a ditadura militar, quando princípios
como “conscientização e participação” (SOARES, 1996) deixavam de fazer parte do
ideário da EJA, então impregnado pelo tecnicismo educacional, pela excessiva

1
Nome fictício para resguardar o anonimato da instituição.
796

centralização na metodologia, e na finalidade última da educação: servir ao mercado de


trabalho.
A orientação metodológica do CES, segundo Santos; Oliveira (2004, p. 9)
baseou-se em módulos instrucionais e no estudo dirigido, visando ao atendimento
individualizado por meio da autoinstrução, com o auxílio do que ficou conhecido como
orientador de aprendizagem, que atendia estudantes em horários predeterminados.
O atendimento individual, por módulos, não tinha obrigatoriedade de frequência
diária, podendo-se supor que visava ao atendimento à diversidade de horários dos
estudantes, favorecendo o retorno à escola, e encobrindo o objetivo do modelo
predeterminado de inserção do sujeito em processo de escolarização, sem abertura para
questionamentos.
Os CES foram considerados a solução mais viável para sujeitos jovens e adultos,
de modo a atender, ao mesmo tempo, “ao trinômio: tempo (rapidez de instalação), custo
(aproveitamento de espaços ociosos) e efetividade (emprego de metodologias
adequadas)” (Santos; Oliveira, 2004, p.7).
Criava-se um modelo contraditório ao oportunizar um espaço de atendimento
individual que permitia ao professor olhar particularmente o aluno, observando
deficiências e necessidades, ao mesmo tempo, em que se exigia que esse mesmo
professor o inserisse em um padrão previamente determinado, nem sempre adequado,
que desconsiderava trajetórias anteriores de cada sujeito, em maioria oriundos de
formação escolar “marcada por problemas de seletividade, descontinuidade e fraturas”
(SOUZA, 2000, p. 3), o que gerou uma série de inquietações, entre professores e alunos.
Com o decorrer do tempo, o modelo mostrou-se insuficiente, emergindo
contradições dos contatos estabelecidos entre professores e alunos e entre alunos e
materiais de ensino, facilmente obsolescentes; questionamentos comuns acerca de
práticas legalmente instituídas; proposição de novas práticas de atendimento, que a
priori considerei instituintes (SOUZA, 2005), definindo alternativas ao modelo
tradicional, que aliadas a modificações legais, levaram a tentativas de superação do
modelo tradicional do CES, o clássico mecanismo “leva o módulo, estuda, tira dúvidas
e faz prova”, instituindo-se práticas diversificadas de atendimento, na busca pela
melhoria da qualidade de ensino ofertado nesse espaço.

2.1. CES Bairro B – lócus da pesquisa


797

O CES Bairro B2 é uma unidade escolar da Secretaria de Estado de Educação do


Rio de Janeiro (SEEDUC/RJ), criado em 1991, funcionando nas dependências de um
CIEP3, ocupando quatro salas de aula, cujo espaço foi dividido e adaptado às
necessidades de um CES. Da sua criação até 2002, manteve objetivos e modos de
funcionamento originalmente estabelecidos, oferecendo atendimento segundo o modelo
de implantação. A partir daí, com o incentivo da Coordenação de Ensino de Jovens e
Adultos (CDJA) e diante dos embates que tomavam corpo no espaço escolar, em
relação a modos de atendimento e sua insuficiência diante da realidade enfrentada,
surgiram tentativas de diversificação desses atendimentos.

Esse movimento teve seu marco inicial na proposição da CDJA de estender aos
CES a realização da Semana EJA, evento corrente nas demais escolas de EJA,
recomendando a realização de atividades diversificadas e coletivas, oficinas, palestras
etc. A determinação provocou intensos debates, havendo poucos com consciência de ser
este um movimento que expressava outras convicções que possibilitariam, ao longo do
tempo, mudanças mais profundas de concepções e não apenas de oferta de atividades
diversificadas.
A 1ª Semana EJA no CES Bairro B foi realizada no segundo semestre de 2002.
Organizada precariamente, devido à falta de espaço e material, aconteceu com oferta de
oficinas de artes, exibição de filmes, palestras, aulas práticas, seminários, apresentação
de grupo de teatro formado por alunos do CES.
Era a primeira vez, em 11 anos, que se via um movimento como este na escola.
Marcava o início da oferta de outras atividades, para além do empréstimo de módulos e
da realização de avaliações. O primeiro desafio vencido, que levou a meditar sobre as
contribuições de tais atividades no cotidiano, fazendo germinar a ideia de se
incorporarem atividades da Semana EJA de forma permanente aos modos de
atendimento do CES. Para alguns, constituíam apenas meio de auxiliar e otimizar a
conclusão do curso; para outros, o reconhecimento da existência de diversos saberes
válidos e de diferenciadas formas de aprender.
Ao mesmo tempo, foram criados pelo CES, programas de aceleração de estudos,
que buscavam atender alunos com urgência de conclusão, reconhecendo os muitos
sujeitos privados da escolarização formal que desenvolveram potencialidades e

2
Nome fictício, guardando o anonimato da instituição.
3
Centro Integrado de Educação Pública, “famosos” Brizolões, implantados no Governo de Leonel
Brizola.
798

encontraram formas de sobreviver na sociedade grafocêntrica necessitando, por vezes,


apenas o reconhecimento formal de seus saberes.
O CES abria, assim, ainda mais seu modelo não seriado, permitindo a oferta de
EJA com diferentes proposições, possibilitando à diversidade de sujeitos e interesses
um atendimento também diversificado, provocando, ao mesmo tempo, uma série de
questionamentos entre os que o frequentavam.

3. INDICADORES DE QUALIDADE DA PESQUISA

Minha pesquisa, ao buscar compreender qualidade de ensino em um CES, tomou


como fonte de dados as dimensões processos e resultados, fluxo escolar e gestão
escolar. Como dito anteriormente, tratarei nesse trabalho apenas da dimensão gestão
escolar.
O indicador gestão buscou compreender a faceta autonomia de gestão, e que
impulsionou, de certa maneira, o movimento de instituição e ressignificação dos modos
de atendimento deste CES. De que maneira as ações da equipe gestora impactam o
cotidiano de um CES, tanto em relação a aspectos pedagógicos quanto a aspectos
organizacionais, tendo em vista que, devido a sua organização espacial singular, até
mesmo para se iniciar um atendimento diversificado é preciso reorganizar o espaço
interno dessa escola? Há relação possível entre ações da equipe gestora e melhoria da
qualidade? Como os sujeitos envolvidos percebem e avaliam tais ações?
Quando discutimos qualidade em uma escola para todos — o que implica
respeitar diferenças —, há que se pensar o paradoxo instituído quando se declara a
necessidade de propiciar a todos os diferentes o direito à educação e, ao mesmo tempo,
aceitar que se avalie de maneira uniforme as escolas, tal como vem sendo realizado. Nas
palavras de Freire (apud GADOTTI, 2010, p. 7), “precisamos construir uma nova
qualidade”, que consiga acolher a todos e a todas .
Essa nova qualidade implica ir além da avaliação de resultados, para considerar
condições iniciais de cada sujeito, insumos recebidos e processos que a escola
desenvolve na tentativa de atender a cada um conforme sua necessidade, o que por si só
representa imenso desafio.
O direito de cada um à educação é, assim, entendido como mais uma
possibilidade de aprendizado no mundo. Portanto, processos que valorizem o sujeito no
exercício de sua ação, mesmo que influenciados por condições infraestruturais e de
799

insumos recebidos, imbricam-se com a qualidade dos profissionais da escola que, por
sua vez, integram processos mais complexos que definem qualidade da educação.
Qualidade da educação está, assim, intrinsecamente ligada à práxis humana, à condição
de “sujeitos criativos, imaginativos, produtores de sentidos, significados e símbolos,
capazes de fazer perguntas que vão além do estritamente físico, racional ou sentimental”
(MORAES, NAVAS, 2009, p. 14-15), seres em permanente construção, o que coincide
com o pensamento freireano.
Em se tratando do CES, pensar qualidade de ensino implica considerá-la
processo de muitas dimensões, na acepção polissêmica do termo, cuja busca pressupõe
permanente adaptação de seus modos de atendimento, alterando práticas cotidianas, de
forma a melhor responder a especificidades de seu público. Este, o desafio que
impulsionou esta pesquisa.

4. GESTÃO DE UM PROJETO PEDAGÓGICO: PRÁTICAS INSTITUINTES


NA VISÃO DA EQUIPE GESTORA

Neste item tratarei de compreender, com base em diferentes fontes, a dimensão


gestão escolar, por mim proposta como uma das ideias-força que tomei como eixo da
pesquisa, considerando-a uma dimensão cujos indicadores são capazes de demonstrar
qualidade no que se faz, no espaço escolar. Por meio dela, operacionalizam-se políticas
que trabalham para a universalização e democratização do ensino qualitativo. Colabora,
portanto, decisivamente, para a inserção dos alunos no mundo da cultura escrita,
promovendo acesso a bens materiais e imateriais: de consumo, tecnológicos e culturais.
Parto da concepção original do CES, um modelo aberto, não seriado, cuja
possibilidade de atendimento à diversidade de sujeitos que caracteriza a EJA, em meu
entendimento, é maior do que nas escolas de oferta presencial, em maioria, muitas ainda
organizadas conforme escolas “regulares”. O “ser diferente” do CES representaria uma
vantagem e pode fazer diferença no processo pedagógico oferecido aos alunos? Que
relação essa diferença estabelece com qualidade de ensino?
Ao mesmo tempo, essa escola aberta nascia com um modelo fechado, definido
por concepções epistemológicas de educação a distância do mundo em que foi gerada,
assim como com concepções de formação pautadas nos meios, e não no sujeito
educável. Esse modelo, portanto, acabava por restringir a tal escola aberta, cheia de
possibilidades, hipoteticamente falando. As práticas instituídas pelo modelo ligavam-se,
800

prioritariamente, ao estudo de módulos instrucionais e à realização de avaliações, que


passavam ao largo da diversidade de saberes de jovens e adultos, e apostavam no
controle dos meios para o sucesso do produto do sistema: o aluno certificado.
Entretanto, o paradoxo da escola aberta com um modelo fechado de ensino, sob
rígido controle de normas e procedimentos que “garantem” a certificação e preparação
de mão de obra, não parece ter sido, para o sistema, ao longo de todos esses anos, um
“calcanhar de Aquiles”. Ou mantida à míngua, com poucos recursos materiais e
humanos, ou privada de políticas e atenção do sistema, equilibrou-se, como pode, no
tênue fio que a mantinha existindo, mas sempre sob o risco de extinguir-se. Sua
permanência não ameaçava o sistema, por isso estava lá, por isso mantinha-se existindo.
A permanência do modelo de oferta CES, no sistema a que pertence, entre outros
fatores, parece atender uma necessidade do próprio sistema. Este sistema, considerando
o expresso na formulação original — atendimento e conclusão em qualquer época;
atendimento por meio de convênios diversos; atuação em parceria com escolas
“regulares” que o integram — mantém o modelo como um meio de responder à
sociedade, dada a quase ausência de políticas públicas comprometidas com a educação
para todos.
A quase estagnação que por longos anos acompanha a educação de jovens e
adultos no âmbito do estado do Rio de Janeiro, cuja proposta educacional para a área
fere o pensamento acadêmico vigente no estado da federação que oferece 11 cursos de
pós-graduação stricto sensu e tem corpo docente na rede pública extremamente
qualificado merece reflexão profunda. Do mesmo modo, merece reflexão o fato de o
CES, cotidianamente, resistir, contornando o burocrático sistema e criando
possibilidades e soluções locais para seus problemas.
Assumir esse paradoxo implica visibilizar a luta permanente que o CES trava
junto ao sistema, pelo reconhecimento e respeito a suas peculiaridades, que,
paradoxalmente, são utilizadas como dispositivos para o enfrentamento de tentativas de
controle do sistema a que pertence.
Certeau (1990, p. 40-41) contribui para compreender o acionamento desses
dispositivos cotidianos:

Se, é verdade que por toda parte se estende e se precisa a rede da


“vigilância”, mais urgente ainda é descobrir como é que uma sociedade
inteira não se reduz a ela: que procedimentos populares (também minúsculos
e cotidianos) jogam com os mecanismos da disciplina e não se conformam
com ela a não ser para alterá-los, enfim, que “maneiras de fazer” formam a
801

contrapartida, do lado dos consumidores (ou “dominados”), dos processos


que organizam a ordenação sociopolítica.

Ou seja, como o CES Bairro B absorve e reinventa políticas públicas, em


práticas pedagógicas cotidianas? De que “maneiras de fazer” se utiliza para contornar as
determinações do sistema e colocar em curso propostas educacionais que tentam a todo
custo superar o modelo oficialmente instituído? Como sobrevive diante de constantes
reorientações e reformulações impostas pelo sistema?
Pode-se, com Certeau (2011 p. 41), iniciar a resposta às questões, admitindo que
“essas maneiras de fazer constituem as mil práticas, pelas quais usuários se apropriam
do espaço organizado pelas técnicas da produção sociocultural”. Mas também se deve,
com o mesmo autor (p.43-44), entender que “dispositivos semelhantes, jogando com
relações de forças desiguais, não geram efeitos idênticos”, o que parece ser verdade
considerando as lutas existentes no interior do próprio CES, entre professores que se
inquietam com a estagnação e desgaste da escola e tentam meios de superá-la, e outros
que consideram esse fato normal, devendo os alunos que não se adaptem ao modelo
buscar outros caminhos.
No cotidiano do CES Bairro B surgem diariamente tensões entre práticas
instituídas e novas práticas, a que nomeio como instituintes, que se originam de relações
humanas conflituosas e divergentes, em um espaço de convivência de pessoas únicas,
com concepções diversas sobre a ação educativa.
A condição de quase “invisibilidade” da escola parece ter favorecido a busca de
soluções locais para questões da prática pedagógica. Assim, o CES Bairro B ao
aproveitar sua condição de “invisibilidade” na rede, a potencializa, utilizando-a como
dispositivo de fortalecimento de soluções para problemas singulares, que mitigam a
qualidade no ensino.
Cabe, por fim, indagar se as práticas que se instituem no CES, e as dinâmicas de
gestão que delas decorrem possibilitam a efetivação de processos de mudança na
concepção circulante de EJA vigente no espaço escolar, embora superada legal e
epistemologicamente.
A linha que separa o instituinte do instituído é muito tênue. Linhares (2007, p.
149; 157), discorrendo sobre práticas instituintes, afirma que elas “não são puras, não se
protegem em redomas e, por isso mesmo, se misturam sem parar com as dimensões já
instituídas”, ao mesmo tempo em que o instituído “também procura apropriar-se delas e,
assim garantir alguma dose de vitalidade”.
802

Nesse sentido, práticas instituintes podem representar a diferença em uma escola


por si só diferente, possibilitando permanentes construções e reconstruções de suas
práticas, pois a exemplo da afirmação de Linhares (2007, p. 149):

É possível demarcar teorizações potentes, abrindo outras perspectivas de


participação vital e de aprendizagem política que representam fagulhas de
esperança para pensarmos o futuro, como um empenho de nele atuarmos, em
que memórias e sonhos éticos estejam articulados nessa realidade sempre em
crescimento, mas contraditoriamente, sempre em ruínas.

Nesse cenário, a ação da equipe gestora do CES Bairro B tem somado à de


professores e alunos, como instância imediata no processo de enfrentamento a diretrizes
do órgão central, como fomentadora de discussões que acompanham os embates que
ocorrem no interior da escola, seja na preparação do espaço para a oferta dessas
atividades, seja na aquisição de materiais necessários ou no incentivo a diversificação
das práticas.
Linhares (2010, p. 23) refere-se aos movimentos instituintes em educação como
“insurgências que sem cessar (re)criam a vida, a história, a educação e os processos de
institucionalização social”, e que representam:

Centelhas que nada têm de espontâneas, porque estão carregadas de


pensamentos, de forças que vão se acumulando e se potencializando com
memórias a fecundar projetos e vice-versa; com necessidades e opressões a
provocar e alimentar desejos ou rebeldias ou, antagonicamente, inércias,
indiferenças.

As experiências instituintes estão “Sempre em confronto com o já instituído, do


qual não pode ser separado. Pelo contrário. Umas e outras estão sempre em litígios, em
afirmações que não são praticadas no vazio, mas que buscam expandir-se, ou seja,
penetrar nos espaços e nos tempos que lhe são antagônicos”. (LINHARES, 2007, p.
157).
Práticas instituintes constituem, assim, ato político, que reafirma os diferentes
sentidos e significados atribuídos à educação. Nas palavras de Freire (1992, p. 119-
120), “Não há educação sem objetivos, sem finalidades. É isto que a fazendo diretiva,
não permite sua neutralidade ou a neutralidade do educador”.
No contexto em que se inserem, de uma escola altamente padronizada como o
CES, essas práticas adquirem força e valor inestimáveis. Mesmo quando não
representam rompimento total e mudança de concepção, ainda assim constituem brechas
por meio das quais busca-se instituir um novo modo de pensar a educação de jovens e
adultos, nesse espaço.
803

Experiências instituintes, “estão sempre num devir, pisando em um terreno


movediço, sem certezas e comprovações da história, mas enfrentando e infiltrando-se
nas tramas instituídas, aproveitando frestas e contradições”. (LINHARES, 2007, p.
157). Essas práticas ainda desconstroem certezas, reafirmam possibilidades e a
existência de outros caminhos válidos.
A maneira como a equipe gestora vem lidando com constantes alterações
políticas promovidas pela SEEDUC/RJ que reorienta(ra)m a ação dos CES; com os
resultados delas advindos; e com os impactos no cotidiano, influencia o modo como os
demais membros da comunidade escolar do CES Bairro B se posicionam diante de
situações tensionantes, pois conforme destaca Kemmis (apud GARCIA, 1992, p. 56):

[...] as escolas não podem mudar sem o compromisso dos professores, os


professores não podem mudar sem o compromisso das instituições em que
trabalham. As escolas e os sistemas são interdependentes e interativos no
processo de reforma e a educação só pode reformar-se transformando as
práticas que a constituem.

Reformar a escola por meio da transformação de suas práticas, não vem sendo
tarefa fácil, nem de curto prazo. Práticas mudam a partir do diálogo, utilizado como
mediador de processos de reflexão e de desenvolvimento.

6. Concluindo...
Considerando o embate entre práticas instituídas e instituintes no CES e sua
relação com o conceito de qualidade de ensino por mim definido — ligado à ação
humana, a capacidade humana de intervir e transformar — é possível concluir que tais
práticas evidenciam tentativas de melhoria da qualidade de ensino e que a ação da
equipe gestora ao lidar com essas tensões tem contribuído para a melhoria do ensino
ofertado nesse espaço.
A diversificação de modos de atendimento parece revelar-se um caminho para a
melhoria da qualidade de ensino nesse espaço, qualidade entendida como fruto da ação
humana, que respeita a diversidade dos sujeitos e seus percursos de formação,
possibilitando o aproveitamento de estudos realizados, assim como o reconhecimento de
saberes válidos, constituindo-se um indicativo de que o CES pode, também, ser um
espaço pleno de possibilidades ainda não desenvolvidas ou subutilizadas, à medida que
atende necessidades, interesses e expectativas dos sujeitos.
É possível afirmar que tais processos têm contribuído para a melhoria da
qualidade de ensino, ao legitimar práticas humanas, fugindo à padronização. Para
804

Varela (apud ASSMANN, 2007, p. 43), “o conhecimento emerge da história da ação


humana, das práticas humanas recorrentes. É a história das práticas humanas que dá um
sentido ao mundo”.
O movimento empreendido no CES Bairro B ao longo dos últimos anos
representa um esforço consciente de gestores e docentes para se modificarem práticas
institucionalizadas, implicando visibilizar a luta permanente que vem travando junto ao
sistema, pelo reconhecimento e respeito à suas peculiaridades.
Pensar qualidade de ensino em um CES, implica considerá-la processo de
muitas dimensões, na acepção polissêmica do termo, cuja busca pressupõe permanente
adaptação de seus modos de atendimento, alterando práticas cotidianas, de forma a
melhor responder a especificidades de seu público.

REFERÊNCIAS

ASSMANN, Hugo. Reencantar a educação. Rio de Janeiro: Vozes, 2007.


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Graduação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: ProPed/UERJ.
806

Comunicação

Experiência na escola: programa educação em valores humanos / Projeto Escola


Sustentável

Luciana Pimentel Rhodes Gonçalves Soares


Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
Fundo de Amparo à Pesquisa do Espírito Santo (FAPES)

RESUMO: Este trabalho apresenta uma pesquisa realizada em uma escola municipal de
Serra-ES, tendo como foco o Programa Educação em Valores Humanos,
posteriormente denominado Projeto Escola Sustentável. Experiência que revela os
limites e as potencialidades do trabalho desenvolvido nos espaços escolares e, ainda, a
urgência de superar propostas educacionais distantes de um posicionamento crítico, ao
se colocarem como estratégicas no enfrentamento dos dilemas sociais. A metodologia
considerada foi o estudo de caso. Análise documental, observação participante e
entrevistas semi-estruturadas foram as técnicas utilizadas para a coleta dos dados.
Palavras-chave: Programa Educação em Valores Humanos. Projeto Escola
Sustentável. Sentidos da Escola.

APRESENTAÇÃO
Apresento reflexões da pesquisa realizada por ocasião do Mestrado em Educação, na
qual busquei, dentre outros objetivos, compreender o significado do desenvolvimento
do Programa Educação em Valores Humanos (PEVH), posteriormente denominado
Projeto Escola Sustentável (PES), em uma escola da rede municipal de Serra-ES. Nesse
sentido, evidenciar a relação dessa experiência às questões e desafios atuais do
desenvolvimento do trabalho educativo nas escolas. A metodologia considerada para
realização da pesquisa privilegiou o estudo de caso, e as técnicas utilizadas para a coleta
de dados foram análise documental de fontes relacionadas ao programa e ao projeto
destacados, observação participante e entrevistas semi-estruturadas aos profissionais da
instituição educativa selecionada para sediar a pesquisa. Portanto, o objetivo deste
trabalho é perquirir a argumentação de que o desenvolvimento do PEVH e do PES nas
escolas, embora tenha despertado atenção a questões atuais relevantes, negaram um
debate mais amplo e profundo acerca dos sentidos da escola na atualidade. Distanciam-
807

se de uma perspectiva crítica ao serem promovidos alheios à análises substantivas a


respeito - dentre outros aspectos - do trabalho docente na atual conjuntura. Logo, pela
via da responsabilização individual, desconsideraram as contradições históricas.

Sendo assim, em primeiro lugar apresento brevemente essa experiência, o PEVH,


posteriormente PES, suas propostas e desenvolvimento, tendo como referência o
contexto da escola que sediou a pesquisa. Em seguida, à luz das discussões atuais acerca
das políticas educativas (FANFANI, 2007; OLIVEIRA D., 2009a, 2009b; OLIVEIRA
2009; GENTILI, 2002) proponho reflexões acerca dos limites e das potencialidades
dessa experiência desenvolvida nos espaços escolares e, ainda, a urgência de superar
propostas educacionais distantes de um posicionamento crítico, ao se colocarem como
estratégicas no enfrentamento dos dilemas sociais. Para finalizar, algumas
considerações que asseveram a importância de se pensar a respeito dos sentidos da
escola na atualidade à luz da afirmação de políticas educacionais, de fato, públicas.

DO PROGRAMA EDUCAÇÃO EM VALORES HUMANOS (PEVH) AO PROJETO


ESCOLA SUSTENTÁVEL (PES): DESENVOLVIMENTO NA ESCOLA

O Programa Educação em Valores Humanos (PEVH) foi implantado de maneira


gradativa em algumas unidades de ensino do município de Serra-ES, em agosto de
2009, em parceria com a iniciativa privada, tendo como meta “[...] a formação do ser
humano de maneira integral: Primeiro a criança aprende a se amar para depois amar o
mundo; primeiro ela é ensinada a lidar com as suas emoções para depois fazer sucesso
na vida” (JORNAL..., 2012, p. 3).

Tal iniciativa foi amplamente divulgada junto à sociedade (folder’s, jornal institucional
da empresa que apoiou e patrocinou a proposta, materiais disponibilizados às escolas
pela prefeitura de Serra-ES, sites, outdoor’s, propagandas televisivas) sendo aclamada
como novidade no âmbito da educação e, portanto, perspectiva inovadora e eficaz frente
aos problemas sociais desdobrados no contexto escolar.

Inicialmente o PEVH foi implantado como projeto piloto em 3 escolas, se expandiu e,


até o final de 2012 foi desenvolvido em 35 unidades de ensino do município, sendo na
ocasião constantemente relacionado à diminuição dos índices de evasão, repetência e
808

violência nas unidades de ensino municipais. Tal programa chegou ao município por
intermédio do Instituto Educação em Valores Humanos (IEVH), uma organização não-
governamental (ONG), cuja “missão” se volta à regeneração espiritual da humanidade
por meio dos princípios da verdade, retidão, paz e amor. No que tange à educação, a
centralidade de sua implementação voltou-se ao desenvolvimento de “valores
humanos”. Portanto, na escola, o objetivo do PEVH era desenvolver não só os aspectos
cognitivos, mas também, de acordo com o material orientador da proposta, “[...] os
conceitos da inteligência emocional e espiritual” (EDUCAÇÃO, 2011, p. 10),
sinalizando preocupação em promover um novo sentido à escola, dada a atual
configuração da sociedade.

A proposta voltou-se, destarte, a formar cidadãos não apenas por meio do ensino de
conhecimentos científicos, mas potencializar os valores “inerentes à alma humana”
(EDUCAÇÃO, 2011, p. 13). O PEVH favoreceria, então, a mudança do sistema de
ensino atual rumo a uma educação voltada para a vida, para o ser integral.
Para despertar os verdadeiros valores é necessário mudar o sistema de ensino
com a adoção do Programa. [...] um trabalho que requer experiência e
envolvimento, pois não é uma mera transmissão intelectual de conhecimento.
É vivência transformadora (EDUCAÇÃO, 2011, p. 13).

Diante disso, a proposta asseverava ser preciso, além da intelectualidade, desenvolver a


inteligência pautada na ética e no amor, pois apenas o ensino de conhecimentos
científicos sob o lema da eficiência não tem sido suficiente para promover mudanças na
vida das pessoas rumo à felicidade. Nesse entendimento, afirmou que o fato de a
educação tal qual tem se constituído, não considerar a “natureza da criança” - entendida
como um ser sagrado, de infinitas possibilidades, como puro amor - propicia a formação
do mau caráter e da fraca personalidade, o que favorece o surgimento da violência em
suas mais variadas formas.

Como então mudar esse contexto? Basta, segundo a proposta em análise, romper com as
formas destrutivas de pensamento e fazer com que os valores essenciais e inerentes à
alma humana irradiem. Para tanto, o autoconhecimento é fundamental, pois estar de
bem consigo mesmo favorece a convivência harmoniosa, afinal, “É geralmente uma
pessoa agressiva que enxerga o mundo sempre cinzento e perigoso” (EDUCAÇÃO,
2011, p. 14). Portanto, a aplicabilidade do PEVH nas escolas foi proposta em torno da
prática de “valores humanos”. Nessa direção, a metodologia apresentada propôs aulas
809

(sobre amor, esperança, solidariedade, responsabilidade, paz, etc.) a partir do


direcionamento dos professores. E, nesse sentido, foi apresentada como uma cartilha a
ser seguida pelos docentes; uma iniciativa que ainda não se tem notícias de pesquisas
que se propuseram a avaliá-la, mas que foi promovida como algo que deu certo e que,
portanto, deveria ser estendida a outras unidades de ensino. Apenas algumas escolas da
rede municipal participaram do PEVH, mas pelo destaque que vinha ganhando
possivelmente seria implantado nas demais instituições educativas, não fosse a eleição
de outra administração municipal por ocasião do fim daquele mandato. Por ter se tratado
de uma proposta de governo e não uma política educacional municipal, naquele
momento não teve continuidade. Todavia, a não continuidade dessa experiência não
deslegitima a sua análise, haja vista sua materialidade posterior em Lei Municipal (Lei
nº 4.108 de 16 de outubro de 2013)1.

Por ter se aclamado como maneira de solucionar muitos dos problemas vivenciados
pelas escolas na atualidade, desconsiderando as condições de constituição de nossa
sociedade e os debates em pauta a respeito dos desafios e conquistas educacionais,
veiculou-se a ideia de que mudanças substantivas são possíveis e acontecem desde que
o sujeito (no caso, os alunos, os professores, as famílias) sejam motivados
primeiramente a amar a si mesmos para, posteriormente amar o mundo e, portanto,
alcançar a felicidade.

Assim, ao propor a institucionalização de uma ética como “novidade”, como uma


“solução” aos problemas desdobrados na escola, tendo “[...] custo praticamente zero”
(EDUCAÇÃO, 2011, p. 51) o PEVH corroborou ações superficiais que só confirmam a
lógica apontada pelas políticas educacionais: a lógica da responsabilização individual,
que no caso do PEVH se concretiza, além dos pressupostos teóricos acríticos, também
na maneira como é instituído: parceria público/privado.

1
Lei que estabelece a criação do Programa Educação em Valores Humanos no âmbito da Secretaria de
Educação do município de Serra-ES, tendo como objetivos a redução da evasão escolar; a melhoria da
disciplina; a permanência e o sucesso dos alunos na escola; a consideração no currículo escolar dos
temas: amor, verdade, paz, não violência e boa conduta, além da importância da conservação do
patrimônio público e do fortalecimento das relações interpessoais. Reitera a ideia de uma educação
voltada ao ser humano integral e para a vida, sem, no entanto, tender a qualquer religião. A lei garante
ainda que o PEVH deve ser implementado nas escolas por adesão, após apresentação pela Secretaria de
Educação e discussão ampla com a comunidade. Considera também que, para seu desenvolvimento
poderão ser estabelecidas parcerias (com empresas, entidades e outros órgãos).
810

Em virtude da mudança da gestão municipal, haja vista eleição da nova administração


no ano de 2012 para exercício 2013-2016, o PEVH ganhou novo contorno, assumindo-
se no início do ano de 2013 como Projeto Escola Sustentável (PES). Na verdade, não há
neste Projeto referência explícita ao PEVH, mas essa referência é percebida
principalmente por dois aspectos: a) pela concepção teórica orientadora do PES, em
grande medida assente nos princípios do PEVH, visível não só no documento do Projeto
como também na formação de professores proposta pela Secretaria de Educação de
Serra, ainda que alguns aspectos se diferenciem; b) pela continuidade da parceria entre
poder público municipal e empresa privada, mesmo que não mais faça parte dessa
parceria o IEVH.

A nova perspectiva, PES, previu a incorporação e continuidade de ações já


desenvolvidas quando do PEVH, mas voltou-se à ideia de sustentabilidade e organizou-
se de maneira distinta. Sob a gestão municipal 2013-2016, a Secretaria de Educação
divulgou junto às unidades de ensino essa proposta de trabalho, configurando um
projeto institucional. De caráter inter e transdisciplinar, esse projeto foi formalizado
junto às escolas municipais em março de 2013.

O PES seria, portanto,uma proposta em parceria com uma empresa privada (a mesma à
época do PEVH) a ser desenvolvida nas escolas, tendo como abordagem conceitual e
metodológica a sustentabilidade e os valores humanos. Esclareceu que a maneira de
desenvolvimento do Projeto seria por meio de vários outros projetos mais específicos,
estes formulados pelas escolas, tendo como parâmetro as orientações do documento
divulgado a todas as unidades de ensino. Este documento previa o tema geral Escola
Sustentável e os subtemas Sustentabilidade e Relações Humanas; Sustentabilidade e
Relações com o Meio; Cidadania, Sustentabilidade e Valores Humanos; Consumo
sustentável.

Percebe-se, portanto, uma continuidade em favor dos valores humanos, mas expande
essas considerações teoricamente, pois considera o conceito sustentabilidade de forma
ampla, destacando relações entre as dimensões social, ambiental e econômica, referidas
superficialmente no PEVH.
811

Foi possível perceber que tais experiências adentram as escolas de modo natural, sendo
vistas muitas vezes como algo positivo:

Chegou pra escola a necessidade, porque, assim, o tema meio que entrou em
pauta agora... realmente se fala da questão da sustentabilidade (DIRETORA
- informação verbal)

Assim, a escola se organizou em torno do desenvolvimento do PES do mesmo modo


que os sujeitos entrevistados disseram ter se organizado em torno do PEVH: de maneira
indireta, sempre adaptando os conteúdos e aproveitando as oportunidades. Os
professores, ao responderem o questionamento de como desenvolveram o PES nas
aulas, reafirmaram as considerações da diretora. Deste modo, embora a escola dê
importância e espaço aos temas que as propostas em análise favoreceram, articulou suas
práticas e mediações muito mais voltadas àquilo que considerava pertinente do que ao
próprio formato proposto pelo PEVH e pelo PES. O desenvolvimento de atividades em
torno dos valores humanos e a respeito da sustentabilidade fazem parte da escola, quer
sejam tratados diretamente, quer sejam, indiretamente. Assim, pode-se afirmar que a
escola, por ser lugar de socialização do conhecimento - conhecimento esse traçado
segundo a configuração social (PETITAT, 1994) - vê-se como propositora desses temas
por se tratar de algo inerente à educação. Por que, então, deu lugar ao PEVH, ao PES,
exaltando-os sobremaneira? Porque representaram, para a escola, maneiras de
sistematizar e viabilizar a abordagem do assunto na prática cotidiana, embora a escola,
independentemente dessas propostas, já evidenciava os temas em destaque, por vezes
mais diretamente, por vezes menos.

De modo algum desconsidero a importância de dar relevo em certos momentos a algum


tema específico e, nesse sentido, é comum que as escolas sistematizem suas ideias em
projetos. O que reitero é o fato de ser próprio da instituição escolar colocar em pauta os
valores humanos, não sendo, portanto, a presença de um programa ou projeto
responsável por colocar essas questões em pauta. Pelo contrário, muitas vezes ações
dessa natureza só fazem intensificar os desafios, impondo aos docentes maiores
responsabilidades, conforme constatações dessa pesquisa que apresento. A consideração
de uma das professoras entrevistadas chama a atenção, pois deixa claro que a presença
de distintas atividades no contexto escolar não promovem uma relação vis a vis com o
812

conhecimento. Há questões mais amplas que, no caso do programa e do projeto


apresentados, não foram consideradas:

Em função das condições atuais dos alunos, a escola tem sido sufocada por
outras coisas e o ensino dos conteúdos fica prejudicado. Igual... houve
mudança no comportamento dos meus alunos do começo do ano pra cá, mas
o problema é a aprendizagem (PROFESSORA P - informação verbal)

Aprendizagem dos “conteúdos” por si só, no sentido técnico, no sentido utilitário, não é
o sentido que se defende aqui; mas também não é possível afirmar que apenas a
consideração harmoniosa das relações humanas a partir da verdade, da ação correta, da
paz, do amor e da não violência será capaz de modificar o sentido da escola atual. O
acesso aos conhecimentos históricos é condição para o desenvolvimento de relações
humanas distintas da que hoje colocamos em evidência, na medida em que favorece um
olhar àquilo que o homem foi e é capaz de construir. Ao mesmo tempo em que o
contexto atual coloca em evidência o conhecimento superficial, destaca a autonomia das
pessoas frente à vida. Seria esse o contraponto. Ir à contramão disso é afirmar políticas
públicas, portanto, políticas que reconheçam os dilemas enfrentados cotidianamente
pelos professores no ato de ensinar e fazer aprender, e também pelos alunos no acesso
aos conhecimentos e a outros bens. Políticas que de fato se assentem junto a
perspectivas em torno do bem comum. A consideração da justiça social seria um
começo.

OS SENTIDOS DA ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

No cenário de mundialização da economia o conhecimento assume papel de destaque, o


que tem demandado ainda mais a afirmação da escolarização. Ainda que a escola
pública tenha sua qualidade questionada dado os desafios concretos que enfrenta, é
lugar legítimo de desenvolvimento desse conhecimento. Podemos dizer que se trata do
paradoxo indicado por Gentili (2002): “Dela não se espera nada, e dela se espera tudo”
(p. 25). Ou seja, ao mesmo tempo em que é anunciada a falta de qualidade, a falta de
preparo da escola frente à “sociedade do conhecimento”, a escola é também afirmada
como instituição que terá condições de superar os males sociais. Deste modo, ao exigir
que a escola faça o que não pode fazer, é confirmado o seu fracasso; mas, ao mesmo
tempo há a exaltação de sua potência.
813

Nesse sentido, o argumento que sustenta a explicação da crise social na crise


da escola, longe de atribuir um poder magnânimo às instituições
educacionais, acaba desvalorizando (pela sobrevalorização) e des-
hierarquizando (pela sobre-hierarquização) as possibilidades e
potencialidades efetivas da prática pedagógica (p. 27-28).

São, pois, argumentos que desconsideram as tensões históricas em torno das quais
vislumbramos a ampliação da garantia do acesso à educação, atendendo exigências
legítimas da sociedade pelo acesso ao conhecimento e, também, a demanda do mundo
do trabalho, voltando-se ao aprender a fazer em detrimento de sua consubstancial
dimensão política. Argumentos que desconsideram a função de assistência social que a
escola também tem assumido, dada às tensões desiguais, fruto da lógica produtivista,
configurando um terreno de disputas entre as demandas da sociedade civil por uma
educação como bem público e as premissas hegemônicas.

Deste modo, a escola tem sido desafiada a propor a formação integral do homem, ou
seja, conforme João Oliveira (2009), uma formação que potencialize o desenvolvimento
físico, político, social, cultural, filosófico, profissional, afetivo; que conceba o homem
em sua totalidade. Portanto, a função legítima da escola de transmitir o conhecimento
científico, artístico, filosófico, tecnológico e uma consciência crítica a seu respeito pode
ser questionada. E, para compreender melhor os sentidos assumidos pela escola
contemporânea é preciso pensar a respeito da natureza do Estado dentro da lógica
capitalista revelada pelas políticas educacionais.

Nessa direção, a nova configuração das políticas educacionais prevê a formulação no


nível central e a descentralização na execução local. Portanto, as concepções que têm
orientado as políticas educativas se pautam no caráter assistencial, descentralizador e
focalizado (OLIVEIRA, D., 2009a). É importante dizer que ao lado dessa nova
característica assumida pelas políticas está sempre presente a ideia de democracia
participativa no intuito de se fazer acreditar que se trata de uma construção coletiva
eficaz da realidade.
Trata-se de uma reconstrução do Estado em relação à sociedade civil,
nomeada de parceria, em que o envolvimento e o engajamento dos atores
sociais, no nível individual e coletivo, são constantemente buscados, tendo
por objetivo encontrar soluções locais para problemas que são muitas vezes
de ordem geral (OLIVEIRA D., 2009b, p. 21).
814

As concepções orientadoras da gestão têm defendido uma perspectiva de educação


como direito inalienável, consoante às lutas dos movimentos sociais pela garantia do
acesso ao acervo cultural. Entretanto, de acordo com Dalila Oliveira (2009b) é possível
dizer que as políticas educativas têm sutilmente voltado às costas à igualdade de acesso
de condições objetivas e subjetivas. À medida que a sociedade passa a ter outra
configuração em função das novas formas de reprodução da estrutura social, também a
escola se vê diante de outra realidade e para ser capaz de lidar com essa nova lógica
instaurada precisa reconhecer os limites de sua forma tradicional.

Valendo-se dessa necessidade, as premissas hegemônicas propõem adotar posturas mais


flexíveis que valorizem o “reconhecimento” do diverso em detrimento de um plano
comum. Sendo assim, o sujeito aprendente deve ser o responsável por suas ações e a
responsabilidade de educar é ampliada, passando a ser também da sociedade sob o lema
“sociedade educadora”. Na esteira dessas ideias, programas e projetos “inovadores”,
que representam uma “novidade”, adentram a escola impondo-lhe responsabilidades
mais amplas; responsabilidades alheias à sua função. Mas, não seria essa uma maneira
de diluir as responsabilidades e, portanto, também embaçar as desigualdades? Nesse
intento, experiências como o PEVH e o PES representam “boas práticas” que devem ser
valorizadas e estendidas aos espaços educativos.

Fanfani (2007, tradução nossa), afirma que a escola parece ter perdido o rumo; vive uma
crise de sentido. Pois, apesar de se passar anos na escola sendo certificado por isso, este
espaço não tem necessariamente ensinado coisas importantes para a vida, como
conhecimentos básicos de matemática e de línguas e nem critérios éticos e estéticos. No
que pese as inúmeras conquistas já registradas em torno do direito à educação, o que se
tem mostrado é o esvaziamento da escola de formas de pensar novos modos de
existência, haja vista a crise social que a atravessa. Entretanto, mesmo submetida a
circunstâncias que dificultam uma educação em seu sentido pleno, não se pode deixar
de reconhecer sua potência positiva. É nesse sentido que se torna urgente afirmar a
função da escola como espaço de formação humana. Espaço que conceba os
conhecimentos como produtos humanos e que possibilite novas formas de instituir um
mundo comum. Um sistema educativo verdadeiramente democrático deve ser capaz de
propiciar o acesso ao conhecimento conquistado historicamente e de desenvolver novas
formas de se pensar a sociedade a partir de um posicionamento crítico e responsável,
815

tendo a existência humana como centro. Contudo, programas e projetos pontuais;


alternativas superficiais e acríticas distantes da materialidade pública, representada por
políticas educacionais de fato comprometidas com esses ideais precisam ser
questionadas, haja vista o propício espaço que tem se estabelecido para sua expansão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Colocar em pauta a maneira como temos produzido a existência é incontestável. Nesse


sentido, não há como negar as justificativas que balizam o PEVH e o PES, pois é uma
preocupação importante que sinaliza a possibilidade de criação de novos modos de
existir. Todavia, situar a escola nesse contexto não significa dar-lhe poder magnânimo,
como bem já nos advertiu Gentili (2002); significa preocupar-se com uma entre outras
estratégias, e não a consideração da educação como prática isolada ou determinante no
processo das transformações, tão necessárias no contexto atual.

A mera apresentação dessa realidade não é suficiente para balizar um caminho


emancipatório. É preciso mais. É preciso considerar as contradições históricas; não
perder de vista os embates e a direção que os subjaz. E, por negar essa premissa o
PEVH e o PES podem ser considerados propostas acríticas, uma vez que colocam sobre
os sujeitos a responsabilidade de transformação da ordem social negando-lhe a história
de constituição desse cenário.

Apesar de considerar a importância de se fazer frente às condições de existência atuais,


não favorece uma perspectiva transformadora, pelo contrário, contribui para a
responsabilização individual ao não considerar a maneira pela qual a produção da vida
tem se constituído. Para se justificar considera questões atuais relevantes contra as quais
é preciso pensar estratégias de enfrentamento, contudo o caminho que aponta é muito
mais despotencializador de uma perspectiva política do que uma alternativa que se
possa dizer de enfrentamento. Ao não considerar os debates em torno das políticas
educativas acaba por se constituir uma discussão muito mais para a passividade que
para a emancipação.

Ainda que essas propostas tenham também considerado o atual contexto que nos
impõem uma lógica competitiva e individualista ao afirmar que a orientação dada aos
816

alunos é na direção de uma profissionalização entendida pelo mercado como rentável,


como aquela a ser seguida, em que o dinheiro figura como se fosse o objetivo único da
existência, deixa de considerar que sequer a maioria das crianças que frequentam a
escola pública tem a chance de ocupar os bancos dos cursos de profissionalização
sugeridos pelo mercado como mais rentáveis. O que se tem visto é uma perversa divisão
do trabalho em que a maioria cabe lugares menos privilegiados na estrutura social e a
outros, a uma minoria, cabe funções privilegiadas, funções de mando e de poder. Nesse
sentido, sugerem muito mais servir amorosamente ao capital do que propõem uma nova
racionalidade, uma vez que em momento algum trata de problematizar os aspectos
macrossociais historicamente construídos. Parte do real dado e fica nele, na aparência;
não se preocupa em fazer referências históricas com vistas a compreender as condições
atuais de existência. Salienta que é possível uma nova realidade a partir de uma simples
mudança na postura de cada um centrada na prática do amor universal, e assim acredita
que será possível alcançar a profundidade das coisas verdadeiras. Mas, à maneira do
PEVH e do PES o que será possível alcançar é a profundidade das coisas
verdadeiramente legitimadas por uma ordem social injusta e desigual, ainda que o
discurso se faça em torno de palavras legítimas como amor, paz, solidariedade, respeito,
etc.

Essa configuração permite perceber o caminho porque passa a constituição das políticas
educacionais. Não um caminho linear, mas um caminho de idas, vindas e distinções; um
processo de muitos movimentos que revelam a correlação de forças e interesses
distintos subjacentes a esse processo, não só no âmbito da formulação, mas também no
âmbito da implementação dessas políticas, sejam elas municipais, estaduais ou federais.
Movimento esse contraditório que, ao mesmo tempo em que estabelece limites, aponta
algumas possibilidades. Trata-se, como propõe Telles (1999), da possibilidade de
formular perguntas às urgências que se colocam; é a problematização dos dramas da
existência na exigência de equidade e justiça.

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em Valores Humanos: Isso é educação em valores humanos. Serra, [2011?]. 1 folder.
818

Comunicação

Formação do professor: perfil desejado, desafios necessários

Luís Alípio Gomes


UFOPA/PPGE1
Elenise Pinto de Arruda
UFOPA/PPGE2

Resumo:Este presente artigo tem como objetivo analisar os desafios sobre a formação
do professor, a partir dos desdobramentos da sociedade contemporânea e das políticas
educacionais. Tomou-se como base o pensamento de vários autores (FREITAS, 2002,
2007; HÖFLING, 2001; MIZUKAMI, 2002; OLIVEIRA, 2012; SAVIANI, 2009) que
discutem a respeito do tema e oferecem importantes contribuições ao debate. O advento
do século XXI e os avanços vivenciados no campo tecnológico, na comunicação e na
informação, por meio do processo de restruturação do capitalismo, trouxe repercussões
para a educação, influenciando diretamente, as políticas educacionais em vários
aspectos. Analisou-se que a promoção de uma formação de professores mais consistente
deve considerar a participação dos professores e/ou suas entidades representativas na
elaboração de políticas educacionais de formação, repensar as atuais políticas
educacionais e apropriar-se dos conhecimentos produzidos pelas universidades para
fazer o enfrentamento dos problemas educacionais.
Palavras-chave: Formação do professor, Concepções, Perfil docente.

INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como tema a formação do professor e visa discutir a
formação do professor na sociedade contemporânea, destacando o cenário atual, o perfil
exigido e as políticas desenvolvidas para este fim.
A temática formação de professores possui um extenso número de estudos e
pesquisas e com o intuito de contribuir para o debate, o artigo apresenta no primeiro
momento o cenário atual da formação do professor, destacando as concepções e

1
Mestrando em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do
Oeste do Pará- UFOPA
2
Mestranda em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do
Oeste do Pará- UFOPA
819

características exigidas para o novo perfil deste profissional. Em seguida, reflete sobre
formação do professor no âmbito das políticas públicas, abordando o panorama político
neoliberal e os desafios necessários para a instituição de uma política global de
formação docente.

1. FORMAÇÃO DO PROFESSOR: CONCEPÇÕES E PERFIL NA


ATUALIDADE
Um debate que tem sido bastante instigante nos tempos atuais no campo da
educação, diz respeito à formação de professores. Não que este tema seja recente. Não
é. Na verdade, a temática da formação de professores tem suscitado importantes
reflexões e debates, principalmente, no contexto da academia, em função das várias
concepções teóricas que se apresentam com relação a esse tema. Assim, sem a pretensão
de fazer um esgotamento das concepções sobre formação de professores, de modo linear
e exaustivo, faremos uma abordagem sobre esse tema a partir da conjuntura atual do
Século XXI, que é um período bastante significativo e que inspira várias reflexões.
Para estabelecer o diálogo sobre a conjuntura atual, como recorte temporal de
nossas reflexões, tomaremos inicialmente como base o livro Escola e aprendizagem da
docência: processos de investigação e formação, de Maria das Graças Nicoletti
Mizukami (2002). Neste livro, a autora reserva um capítulo para discutir a formação de
professores, com o tema: Formação de Professores: concepção e problemática atual, c as
teorias que considerando o embasamento à formação de professores, bem como as
problemáticas atuais enfrentadas.
O advento do século XXI culminou com uma nova forma de pensar a
sociedade, a educação, a natureza, a vida, o homem em seus aspectos bio-psico-social,
em suma, uma nova forma de pensar a ciência. Nos tempos hodiernos, abriu-se a
possibilidade de se fazer uma redefinição de alguns aspectos do conhecimento, até então
inquestionáveis e imutáveis da chamada ciência moderna. Essa redefinição também
exige das diferentes profissões, em especial dos professores, que sejam capazes de
conviver com a mudança e com a incerteza (MIZUKAMI, 2002, p. 13).
O avanço da tecnologia, da informação e comunicação são exemplos de outros
aspectos marcantes desse século, e que estão presentes hoje, impregnados nos diferentes
ambientes de convivência do ser humano. Brasileiro(2000), contextualizando esse novo
tempo, destaca:
820

Este nuevo tiempo despunta con raíces que se originan básicamente a partir
de tres procesos históricos: la revolución tecnológica de la informática, la
crisis y reestructuración del capitalismo y del estatismo y el florecimiento de
movimentos culturales transnacionales como el ambientalismo, el feminismo
y los derechos humanos. La interacción de estos procesos generó una nueva
sociedad estructurada en redes - network society - una economía global
informatizada y una cultura de la realidad virtual en un mundo cada vez más
interdependiente. (BRASILEIRO, 2000, p. 2-3)

Além disso, surgem outras demandas no campo econômico quanto ao perfil do


trabalhador, que deve ser muito mais versátil e amplo, como condição sine qua non de
sobrevivência do mercado de trabalho, do modo de produção capitalista.
Todas essas características do século atual atingiram não apenas a ciência, mas,
sobretudo, a educação e de forma particular, a ação daqueles profissionais que lidam
diretamente, com o processo de ensino e aprendizagem: os professores. Para os
professores, elaborou-se um perfil de profissional que é considerado eficaz e, portanto,
desejado nas instituições de ensino. Torres (apud MIZUKAMI, 2002), elenca os traços
ou características do ‘docente eficaz’ ou ‘docente desejado’, que é um profissional
competente, um agente de mudanças, prático, reflexivo, investigador, intelectual crítico
ou transformador que domina os saberes, inclusive os pedagógicos, no sentido de fazer
com que os alunos aprendam.
Soma-se a essas características uma longa lista de conhecimentos e habilidades
que o professor deve ter e que foi elaborado por Torres (1999 apud MIZUKAMI, 2002),
a partir da consulta a várias obras e autores. A autora faz uma análise que

Essas competências [...] são elaboradas sem a crítica necessária sobre o que
está por trás delas e de seu pretendido reconhecimento universal, uma vez
que se limitam a descrever as características desejadas, sem promover
elementos que ajudem a definir como se constroem essas características em
situações concretas. (TORRES apud MIZUKAMI, 2002, p. 30).

Esta observação é importante, pois, se poderia imaginar que a culpa por não
desenvolver esta ou aquela característica recai única e, exclusivamente, sobre a pessoa
do professor. Aqui reside um perigo, pois, o foco volta-se para a pessoa do profissional
da educação, e não se leva em consideração as condições sociais. Zeichner (2008)
chama isso de “viés individualista” onde os professores deixam de questionar,
confrontar e transformar os aspectos estruturais de seu trabalho, e acabam introjetando
uma culpa, resultando inclusive no ‘esgotamento docente’.
A partir desses esclarecimentos, questiona-se se existiria ou não a necessidade
de se estabelecer um perfil para o professor. A resposta é sim. Cada escola, cada
821

instituição de ensino deve forjar esse perfil do professor desejado. E aqui surge um
desafio: ao instigar cada instituição de ensino, quer seja ela uma escola ou universidade,
sobre o perfil do professor desejado, os sujeitos que participam desse processo devem se
sentir provocados a definir e se envolver na construção desse perfil do professor ou da
escola desejada. Implica em dizer que quem vai orientar os traços desse perfil, não é
mais alguém ou alguma entidade de fora, mas os próprios sujeitos das instituições de
ensino que assumem essa responsabilidade.
Não podemos dissociar essa discussão do perfil do professor dos tempos atuais,
sem fazer referência a sua formação. De fato, este tema apresenta alguns pontos
nevrálgicos que precisam ser analisados. Mizukami (2002) destaca dois modelos da
formação do professor, sendo um baseado na racionalidade técnica e outro na
racionalidade prática.
No modelo da racionalidade técnica da formação do professor, existe uma
espécie de hierarquia de saberes, onde se colocam em primeiro lugar os conhecimentos
teóricos, o domínio dos conteúdos das disciplinas e as técnicas para transmissão dos
saberes em detrimento dos conhecimentos de natureza pedagógica. A racionalidade
técnica concebe o professor como um técnico especialista, um detentor das regras do
conhecimento e um conhecedor das estratégias de ensino voltadas para proporcionar a
transmissão do saber.
Porém, essa concepção deixa de considerar a realidade que se apresenta nas
escolas ou nas salas de aula. A formação do professor, neste modelo, deixar de ver a
realidade em suas múltiplas situações divergentes que vai além dos referenciais teóricos
e técnicos. A racionalidade técnica por não considerar esta realidade, não apresenta
solução para os problemas educativos.
A formação inicial e a formação continuada na perspectiva da racionalidade
técnica têm papéis distintos na formação de professores. Na formação inicial, por
exemplo, há uma maior ênfase no conhecimento advindo das teorias e das técnicas da
ciência básica e aplicada. As habilidades para o manuseio das teorias e das técnicas
deverão vir posteriormente, quando o estudante de licenciatura tiver aprendido a ciência
relevante (MIZUKAMI, 2002, p.19). Por sua vez, a formação continuada tem como
característica a oferta de cursos de rápida duração para os professores, com o objetivo
de instrumentalizá-los, uma vez que já estão no exercício da profissão, para aplicação de
técnicas e métodos de ensino. A formação continuada, quando analisada no contexto da
822

educação brasileira, enfatiza a reciclagem dos professores, e é vista como atualização


sendo realizada de forma aligeirada.
Diante desse quadro, qual a alternativa proposta para romper com a formação
de professores compreendida dentro de um modelo da racionalidade técnica?
Muzukami (2002) discute a necessidade de superação da racionalidade técnica,
por outro tipo de racionalidade. Trata-se da racionalidade prática, que se apresenta na
formação de professores de forma bastante significativa, pois,

É uma aprendizagem que deve se dar por meio de situações práticas que
sejam efetivamente problemáticas, o que exige o desenvolvimento de uma
prática reflexiva competente. Exige ainda que, além de conhecimentos, sejam
trabalhadas atitudes, as quais são consideradas tão importantes quantos os
conhecimentos. (MIZUKAMI, 2002, p. 12).

Na racionalidade prática, a concepção da formação de professores é vista como


um continuum, ao longo de toda a vida do professor. Ela supera a visão limitada e
fragmentada da formação do professor que tem um começo, meio e fim. Para Pérez
Gómez (apud MIZUKAMI, 2002) essa concepção permite compreender o
funcionamento das regras e das técnicas da realidade da sala de aula, ao mesmo tempo,
que permite desenvolver as competências profissionais necessárias. A formação dos
professores passa a ser encarada,

[...] segundo o modelo reflexivo [...] tendo por base a concepção


construtivista da realidade com a qual o professor se defronta, entendendo
que ele constrói seu conhecimento profissional de forma idiossincrática e
processual, incorporando e transcendendo o conhecimento advindo da
racionalidade técnica (MIZUKAMI, 2002, p. 15).

A racionalidade prática, segundo o modelo reflexivo na formação de


professores, deve ser encarada e exercitada com o cuidado para não cair naquilo que
Zeichner (2008) chama de slogan. Segundo o autor, a reflexão é um conceito
estruturante na formação de professores, porém, chegou-se a um ponto que todos,
independente de seus compromissos ideológicos, foram levados como numa onda, a se
comprometer com o ensino reflexivo. Havia uma preocupação ao não usar o termo
reflexivo, pois corria-se o risco de ficar fora da nova tendência em educação. Ao lado
dessa preocupação, pouca ou nenhuma importância se dava, a bagagem teórica, política
e epistemológica que as pessoas traziam consigo (SMYTH apud ZEICHNER, 2008, p.
538).
Considerando a racionalidade prática, então, quais são os espaços reservadas
para a formação dos professores, quer seja ela, inicial ou continuada? Mizukami (2002)
823

deixa claro que o lócus privilegiado e irrenunciável da ocorrência dessa formação é a


universidade, onde, “[...] por excelência, se dá a relação entre o ensino, a pesquisa e a
extensão” (MIZUKAMI, 2002, p. 25). Porém, chama a atenção, para se construir uma
nova concepção de formação, principalmente, a continuada.
Nessa nova concepção, é a própria escola o lugar privilegiado da formação
continuada, evitando-se deslocar essa formação para outras instituições. Em seguida,
deve-se levar em consideração como referencial fundamental na formação, o saber que
o docente acumulou ao longo da carreira e que precisa ser respeitado e valorizado.
Finalmente, enfatiza que é necessário ter presente os diferentes momentos ou etapas do
profissional do magistério, uma vez que se promove uma formação continuada de forma
padronizada e homogênea, sem levar em conta a realidade pedagógica, profissional e de
carreira dos professores.
É importante enfatizar que embora se reconheça a necessidade de mais
pesquisas e investigações sobre a formação de professores, não podemos esquecer que
uma das questões que se apresenta como basilar, reside no questionamento se é possível
aprender a ensinar. Sabemos que a resposta a essa questão não é simples, e por mais que
se chegue a algumas conclusões, é necessário potencializá-las na formação dos
professores.
Neste sentido, ao considerar esse questionamento, utilizamos as palavras de
Zeichner ao afirmar que “aprender a ensinar é um processo que continua ao longo da
carreira docente e que, não obstante a qualidade do que fizermos nos nossos programas
de formação de professores, na melhor das hipóteses só poderemos preparar os
professores para começar a ensinar” (ZEICHNER apud MIZUKAMI, 2002, p.22).

2. FORMAÇÃO DO PROFESSOR: O OLHAR DAS POLÍTICAS


EDUCACIONAIS
Na seção anterior, estabeleceu-se um diálogo com Mizukami (2002) e outros
autores para apresentar o cenário atual da formação do professor, considerando o recorte
temporal do Séc. XXI. No entanto, cabe neste momento, resgatar a formação docente
sob o olhar das políticas públicas, compreendendo neste contexto, a educação como
uma política pública de corte social que, de acordo com Hofling significa “ações que
determinam o padrão de proteção social implementado pelo Estado [...] visando a
diminuição das desigualdades estruturais produzidas pelo desenvolvimento
socioeconômico” (HOFLING,2001, p.31).
824

Este aspecto é resgatado tendo em vista que a discussão sobre a formação do


professor está agregada a uma reflexão mais ampla, que supera a questão sobre forma e
conteúdo (SAVIANI, 2009). O dilema sobre o quê e como ensinar se faz sempre
presente nos debates sobre formação docente. No entanto, é tendo como contexto, uma
sociedade que defende o fortalecimento do projeto capitalista e em consequência, a
manutenção das desigualdades sociais, que está inserida a problemática da formação do
professor.
Problematizar esta formação diante deste quadro se faz necessário, por se
compreender que esta discussão não está descolada e muito menos imune ao contexto
histórico, político e social que a determina. Neste sentido, alavancar a reflexão sobre a
formação docente nesta conjuntura é condição imprescindível para se perceber que
circunstâncias estão implicando na realidade escolar.
Freitas (2007) enfatiza que o cenário atual da formação de professor é uma
prioridade postergada, que a luta por uma política global de formação e valorização dos
profissionais da educação, que articule a formação inicial, formação continuada e
condições de trabalho, salários e carreira faz parte do ideário de todos os educadores nos
últimos trinta anos e que não se materializa por se viver uma sociedade marcada pelo
capitalismo.
Contextualizando, historicamente, o debate sobre formação de professor no
Brasil, Saviani (2009) faz uma retrospectiva sobre a questão do preparo dos professores.
Evidencia que esse preparo emerge explicitamente após a independência do país,
quando é cogitada uma organização da instrução popular.
Em sua análise, Saviani conclui que o que se percebe na retrospectiva é a
“precariedade das políticas formativas”, ou seja, não houve uma continuidade em
termos de política educacional voltada para a formação de professores, agravada pelo
não estabelecimento de um “padrão minimamente consistente de preparação docente
para fazer face aos problemas enfrentados pela educação escolar em nosso
país”(SAVIANI, 2009, p. 148).
Como destacamos no início, nosso foco de reflexão é o século atual, contudo,
não podemos deixar de considerar que o mesmo traz determinantes históricos do Século
XX, e que no campo das políticas em educação destacou-se as reformas educativas e de
Estado no fim da década de 1980 e durante a de 1990. A análise deste período não se dá
aleatoriamente e despropositadamente, pelo contrário, destaca-se, por se considerar um
marco histórico no desenvolvimento da sociedade, pois mundialmente, uma revolução
825

econômica e tecnológica sem precedentes históricos, caracterizada como a era da


informática, da internet, do capital e do conhecimento estava se consolidando. No
campo da educação, as políticas educacionais sofre influência desse contexto até os dias
atuais.
Saviani (2009) relata que a partir da década de 1980, difundiu-se um amplo
movimento pela reformulação dos cursos de Pedagogia e licenciatura. Reiterando,
Freitas (2002) fala que os anos 1980 marcaram a ruptura com o pensamento tecnicista
que predominava na educação até então.

No âmbito do movimento da formação, os educadores produziram e


evidenciaram concepções avançadas sobre formação do educador, destacando
o caráter sócio histórico dessa formação, a necessidade de um profissional de
caráter amplo, com pleno domínio e compreensão da realidade do seu tempo,
com desenvolvimento da consciência crítica que lhe permita interferir e
transformar as condições da escola, da educação e da sociedade. (FREITAS,
2002, p. 140)

No período seguinte, nos anos 1990, com o aprofundamento das políticas


neoliberais, a educação e a formação de professores, ganharam importância estratégica
para a realização das reformas educativas. Tendo a avaliação como chave-mestra para
todas as políticas, diversas medidas foram implementadas a fim de adequar o Brasil a
nova ordem: Parâmetros Curriculares Nacionais; Diretrizes Curriculares Nacionais para
a educação básica, para a educação superior, para a educação infantil; Sistema Nacional
de Avaliação da Educação Básica – SAEB; Exame Nacional do Ensino Médio –ENEM;
descentralização, FUNDEF- Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério e outros. (FREITAS, 2002, p.143)
No âmbito da formação docente, Freitas (2007) diz que esta década foi
marcada pela criação dos Institutos Superiores de Educação e pela diversificação e
flexibilização da oferta dos cursos de formação, causando uma expansão desordenada,
que visou atender a demanda urgente por formação superior e que, apesar dos esforços
das comissões que os autorizavam, sem dúvida comprometeu a qualidade dos cursos de
formação de professores (FREITAS, 2002, p. 145).
Torres (1999 apud Mizukami, 2002), destaca alguns aspectos sobre as reformas
dos anos 90 e faz algumas críticas nas ações implementadas. Segundo a autora,
destaques importantes devem ser feitos:
a) O discurso sobre o papel docente parece estar desconectado da necessidade
de um novo modelo de formação;
826

b) A ênfase das políticas sobre formação de professor recai sobre a aprendizagem e


o rendimento escolar dos alunos, desconsiderando a questão da aprendizagem;

c) Os professores são vistos como obstáculos e como insumo caros, depositando


grandes esperanças no livro didático. Existe portanto, uma primazia dos livros
didáticos e uma tentativa de exclusão dos docentes;

d) A educação à distância e as proposta de auto-aprendizagem são vistas como


respostas mais efetivas e rápidas do que investimento em formação docente e
representam maior economia para os governos, sendo considerada melhor e mais
efetiva que as modalidades presenciais;

e) Nos projetos de melhoria da qualidade de ensino, financiado pelo Banco


Mundial, a formação docente continua ocupando espaços e financiamentos cada
vez menores;

f) A formação continuada tem sido realizada por meio de cursos de curta duração,
meramente instrumentais e em serviço e desconectada da formação inicial.
(TORRES 1999 apud MIZUKAMI, 2002, p. 36)

Todos esses aspectos nos mostram que resolver a situação da formação do


professor não é uma tarefa simples. Envolve um contexto marcado por determinações
externas e pela consolidação de um modelo de sociedade que vislumbra uma educação
voltada para atender as exigências do mercado atual. Exige-se que “[...] a Educação
deve mudar seu eixo: de uma Educação baseada em um ensino que privilegia
conhecimentos e saberes teóricos para uma abordagem que dê ênfase ao saber fazer
utilitário e pragmático que é requerido pelo mercado” (NORONHA, 2008, p. 29).
Portanto, o professor atua em uma escola específica, contudo, seu cotidiano é
influenciado e determinado por políticas educacionais vinculadas a lógica do
neoliberalismo e frente à isso não há como pensar em educação sem pensar na
sociedade como um todo, permeada por desigualdades, conflitos e contradições
Imbernón (apud Brasileiro, 2000) revela uma preocupação diante desta mudança
de eixo da educação e aponta
“[...] La educación, viene, entonces, considerada un sector “estratégico“ para
el desarrollo económico de las distintas regiones y, para la preparación de
una “mano de obra“ que pueda adaptarse a los vaivenes de la oferta y la
demanda del mercado, en el marco de la Europa del Acta Única. Ello
comporta el peligro de instalar a los gobiernos a decantarse por los
indicadores de rendimiento y olvidar los indicadores de calidad de los
sistemas educativos.” (IMBERNÓN, 1998 apud BRASILEIRO, 2000, p.3)

Esses complexos e determinantes fatores demonstram que a discussão de


formação de professores está associada a uma reflexão mais ampla e que as rupturas e
827

desafios são muitos e igualmente complexos. No entanto, vem sido demonstrado


constantemente por pesquisadores da área, ideias e ações que devem ser priorizadas
para uma mudança na conjuntura atual.
A construção coletiva é uma característica presente nessa perspectiva, na qual o
processo de pensar considera as vivências locais e regionais, partilhadas e
compartilhadas por meio das experiências coletivas. Resgatamos neste ponto, a
importância da coletividade, da participação dos professores e/ou suas entidades
representativas na elaboração das políticas públicas educacionais, tendo em vista, que
desta maneira os professores deixam de ser objetos das políticas e transformam-se em
sujeitos da sua própria formação e atuação.
Freitas reflete que

As soluções dos problemas relativos à formação dos professores não estão


vinculadas a questões técnicas, nem sequer a grandes proposições teóricas.
Elas se articulam com a possível e devida apropriação, pelo Estado, dos
resultados dos estudos dos pesquisadores que têm orientado os educadores,
seus movimentos e entidades no debate sobre os princípios e os fundamentos
da formação. (FREITAS, 2007, p. 1207)

O Estado, entendido aqui como o “[...]conjunto de instituições permanentes que


possibilitam a ação do governo [...]” (HOFLING, 2001, p.2), não vem se apropriando
dos resultados que as pesquisas tem produzido sobre os problemas relativos à formação
de professores. E essa apropriação, é um ponto crucial para contribuir para a superação
dos problemas referentes a educação e consequentemente, a formação do educador, haja
vista, que as universidades, um dos lócus dessa formação, vem produzindo consistentes
estudos sobre a temática, buscando cada vez mais apresentar dados, pressupostos
teóricos e metodológicos a fim de colaborar para melhoria da educação, cooperando
assim, para o avanço da qualidade de vida em sociedade.

3. À GUISA DE CONCLUSÃO
Ao final deste trabalho, não podemos, contudo, deixar de fazer referência ao
pensamento de Saviani (2009), onde coloca que o cerne de todo o cenário que perpassa
a formação o professor é a questão das condições de trabalho do docente e, nos faz
compreender que qualquer política instituída que não contemple essa questão, será uma
política inócua, cujas consequências interferirá em todas as outras dimensões
associadas.
828

Este artigo buscou destacar alguns apontamentos no que se refere às políticas de


formação de professor. No entanto, não há como esgotar este conteúdo, nem é nossa
pretensão. Há muitas dimensões que envolvem a temática formação de professores com
extensos e complexos fatores. Percebemos que os desafios não são poucos e tampouco
simples. Diante de uma contraditória e desigual sociedade não há soluções fáceis ou
receitas prontas para dissipar as mazelas que perpassam o processo educacional na
atualidade. Resta-nos, ir para além dos discursos, ir para o campo das lutas ideológicas e
políticas e buscar a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

REFERÊNCIAS

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Aprendizaje Activo en la Universidad. ¿Una Propuesta Pedagógica Utópica? Articulo
electrónico publicado en el Primer Congreso Internacional: "Docencia Universitaria e
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FREITAS, H.C.L. A (nova) política de formação de professores: A prioridade


postergada. Educação & Sociedade, Campinas, v.28, n. 100, p. 1203-1230, out. 2007.

FREITAS, H.C.L. Formação de professores no Brasil: 10 anos de embate entre projetos


de formação. Educação & Sociedade, Campinas, v.23, n. 80, p. 137-168, set. 2002.

FRIGOTTO, G. Fundamentos científicos e técnicos da Relação trabalho e educação no


Brasil de hoje. (p. 241-288) IN:LIMA, J. F.; NEVES, Lúcia W. (Orgs.). Fundamentos
da educação escolar do Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2006. (2ª.
reimpressão, 2008)

HÖFLING, E. M. Estado e políticas (públicas) sociais. Cadernos Cedes, ano XXI, nº


55, novembro/2001 [p. 30-41].

MIZUKAMI, Maria das Graças Nicoletti et all. Escola e aprendizagem da docência:


processos de investigação e formação. São Paulo: EDUFSCAR, 2002.

NORONHA, Olinda Maria. Globalização, Mundialização e Educação. IN: LUCENA,


Carlos (org). Capitalismo, Estado e Educação. Campinas, SP: Editora Alínea, 2008.

OLIVEIRA, Dalila Andrade. Políticas de formação e desenvolvimento profissional


docente: da intenção às práticas. Livro 2 - p.000033 XVI ENDIPE - Encontro Nacional
de Didática e Práticas de Ensino .UNICAMP/Campinas : Junqueira&Marin Editores,
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SAVIANI, Demerval. Formação de professores: aspectos históricos e teóricos do


problema no contexto brasileiro. Revista Brasileira de Educação, v. 14, n. 40, jan./abr.
2009.
829

ZEICHNER, Kenneth M. Uma análise crítica sobre a “reflexão” como conceito


estruturante na formação docente. Educação & Sociedade, Campinas, vol. 29, n. 103,
p. 535-554, maio/ago. 2008
830

Comunicação

Organização do trabalho na escola pública paulista em função do absenteísmo


docente

Luiz Carlos Gesqui


Centro Universitário de Araraquara – UNIARA
Grupo de Pesquisa: Organização e gestão das instituições educativas
Financiamento: FUNADESP

Resumo: Gestores escolares e especialistas da rede pública paulista de ensino regular


referem-se ao alto índice de absenteísmo docente como um dos principais problemas da
referida rede. Nesse sentido, esta comunicação utiliza dados de recente pesquisa que
mensurou o absenteísmo docente em uma dessas escolas e que registrou as práticas
institucionais utilizadas pela escola para solucionar tal problema. O registro diário e
sistemático das ausências dos docentes de toda e qualquer aula do dia e das diferentes
formas institucionais para supri-las (professor eventual, aulas vagas e situações
diversas) apontam para a confirmação de que o absenteísmo docente é um problema
para a organização do trabalho no ambiente escolar; que toda a equipe escolar é
conivente com práticas escolares que, em sua maioria, depõem contra o processo de
ensino e aprendizagem e que tais situações não são oficialmente registradas e, portanto,
não chegam às instâncias administrativas superiores.
Palavras-chave: organização escolar; absenteísmo de professores; gestão escolar.

Introdução
A incursão no tema organização do trabalho nos espaços educacionais remete, de
imediato, a algumas delimitações para melhor compreensão do texto a seguir. Entende-
se, nesta comunicação, por espaço educacional o cotidiano da escola pública paulista de
ensino regular e por organização do trabalho o conjunto de ações desenvolvidas pelos
gestores escolares para que se realizem as aulas previstas legalmente, uma vez que, o
elevado índice de absenteísmo docente tem sido relatado por muitos profissionais e
especialistas da educação como problema reincidente.
Isto posto, o texto está organizado de modo a situar o problema do absenteísmo
docente na organização do trabalho educacional em uma escola pública paulista de
831

ensino regular; a apresentar um balizamento teórico referente à importância da escola


para a sociedade moderna, a frequente responsabilização do aluno por seu suposto
fracasso escolar e a apresentação de uma hipótese que relaciona este suposto fracasso ao
elevado absenteísmo docente; as questões metodológicas; alguns resultados de pesquisa
e algumas considerações.

O problema do absenteísmo docente na rede pública paulista de ensino regular

O trabalho docente em uma escola pública paulista de ensino regular é


amparado, como todas as profissões legalmente conhecidas, por leis e seus
desdobramentos que buscam garantir deveres e direitos adquiridos ao longo da história,
além de oferecer alternativas para solucionar, muitas vezes momentaneamente,
situações previstas ou não, que desestruturam, parcial ou totalmente, a vida interna de
uma escola. Uma situação prevista é a possibilidade da ausência do professor titular1 de
um componente curricular no encontro com seus alunos, quer numa aula, quer num dia
ou numa sequência de dias.
Analisando de forma isolada, essa ausência pode ser facilmente solucionada,
utilizando-se de um recurso legal previsto: a atuação de um professor eventual2.
Contudo, quando essa situação ao invés de esporádica, torna-se rotineira, envolvendo
até um número maior de profissionais, acaba por desorganizar toda a vida interna da
escola, obrigando-a a buscar procedimentos que a reorganizem.
Atuando como professor coordenador de uma escola pública paulista de ensino
regular observei diariamente, durante quarenta (40) meses, bem como em seguidas
reuniões com outros professores coordenadores da mesma Diretoria de Ensino – os
quais relatavam a existência de situação idêntica nas escolas onde atuavam – que a
ausência de apenas um professor titular já implica atividades extras de vários
profissionais que deveriam estar envolvidos em situações de modo a facilitar os
processos de ensino e de aprendizagem e não apenas evitando ou administrando
conflitos resultantes da ausência do professor titular da disciplina. Este constitui um dos
argumentos que buscam sustentar esta comunicação.
Menos visíveis, embora não menos importantes do que as preocupações
administrativas e organizacionais geradas em função dessa ausência são as

1
O especialista no componente curricular e cujas aulas foram atribuídas antes do início do ano letivo.
2
Professor substituto que, em muitas oportunidades, ainda é estudante na graduação.
832

consequências para o alunado em função de ter reduzidos consideravelmente seus


encontros com o professor titular da disciplina. Entre elas, figura a descrença desse
alunado assim como de seus familiares na possibilidade da existência de uma escola de
qualidade e preocupada com ele, assim como a certeza de que, mesmo nessas condições
– poucas frequências – será promovido para a série seguinte. Esta consideração parece
constituir um segundo pilar de argumentação na compreensão da realidade escolar nesta
comunicação.
Este texto, portanto, tem por intuito problematizar essa situação, buscando
informações que permitam ampliar a compreensão dos modos como a escola pública
paulista de ensino regular se organiza frente ao absenteísmo docente. As análises
privilegiam os estudos sobre a escola e questões relativas ao tempo dedicado ao
processo pedagógico. Procuro enfatizar que quanto mais nos aproximamos dos dias
atuais, mais se evidencia o tempo como unidade determinante não só das práticas e
saberes específicos como dos objetivos buscados por esse histórico equipamento social
denominado escola.

Balizamento teórico

Vincent, Lahire e Thin (2001) afirmam ser um erro acreditarmos que a escola e
sua forma, como hoje a conhecemos, são o resultado de uma sequência lógica de
eventos imunes a conflitos políticos, econômicos e de interesses. Porém, poderíamos
partir de um período anterior ao século XVII, em que, exceto aos filhos dos nobres, a
transmissão de saberes condicionava-se ao ver e fazer no âmbito familiar, baseada na
cultura oral, que demandava uma grande quantidade de tempo, mas um processo pouco
sistematizado ou padronizado.
A evolução e consequente divulgação da escrita no ocidente determinaram novos
rumos para a humanidade, sobretudo nas relações de manufatura, convivência social e
aquisição de saberes, instalando definitivamente a cultura da escrita. Com o advento do
processo de urbanização da Europa, a partir da revolução industrial, as situações de
ociosidade de um grande número de crianças pobres chamam a atenção de J. B. de La
Salle que, ao agrupá-las para, ao menos, ensiná-las a ler, escrever e contar percebe a
necessidade de sistematizar as atividades a elas oferecidas, adequando-as também ao
tempo disponível, visto que sua relação com as crianças não tinha vínculos familiares
nem profissionais. Começa, assim, a caracterização dos atuais moldes de forma escolar,
833

tornando-se impossível, a partir daí, falarmos de escola ou forma escolar sem a presença
de um espaço físico, saberes, práticas e tempo específico. O uso e o controle do tempo
na escola estão definitivamente instituídos.
Ao descrever a situação da cidade de Manchester quando de sua industrialização,
Engels (1989) também relata uma situação de ociosidade acentuada por um grande
número de crianças, aproximando-as da marginalidade, do alcoolismo e de outras
situações de degradação humana. Um equipamento social eficaz foi necessário para
transformar esse quadro, pelo menos até as crianças alcançarem idade ou
comportamentos aceitáveis e serem absorvidas pela industrialização. Caso este
equipamento social eficaz seguisse o modelo industrial vigente, tanto melhor seria.
O equipamento social existe: é a escola reorganizada por Lancaster e Bell no
século XIX o qual, atendendo também o modelo industrial vigente, oferecia o ensino
mútuo. Com baixos investimentos e utilizando um professor por turma, era possível
educar elevado número de crianças ao mesmo tempo valendo-se, para tanto, da
consagração dos elementos presentes na forma escolar. Isto é, em um espaço específico
eram oferecidos os saberes necessários para que crianças alcançassem, no mínimo, o ler,
o escrever e o contar. Contudo, eram indiretamente moldadas a atender as exigências da
indústria como o cumprimento de regras e comportamentos. O controle do tempo por
meio do relógio, do sinal ou do apito tornou-se fundamental nessa etapa de
escolarização das crianças, tanto que Narodowski (1999) cita a escola, nesses moldes,
como instituição de sequestro da infância.
O século XX depara-se com dois grandes questionamentos no campo educacional.
Primeiro que já não existem mais dúvidas quanto à necessidade de democratização da
educação, visto que a cultura escrita atingiu seu status de imprescindível ao mundo
moderno, e a indústria, em franca ascensão, requer mão-de-obra cada vez mais
qualificada. A princípio, oferecer esta qualificação compete à escola; porém, sua
organização e seu currículo não atendem a essas necessidades.
Nesse contexto, o século XX finda com o tema educação entregue à competência
de organizações mundiais, haja vista a mesma assumir proporções, valores e custos
financeiros impensáveis há cem (100) anos. Encerrada a segunda grande guerra
mundial, países que se firmaram econômica e politicamente criaram instituições como o
Banco Mundial que, entre suas funções, determina o que e como ensinar, a quem e por
quanto tempo ensinar, quem e com qual formação ensinar e, o principal, com que custo
financeiro.
834

Tomasi (1996) afirma que a preocupação pedagógica, social e cultural da


educação sucumbiu frente ao valor econômico da mesma. Temos hoje ampliado o
acesso à educação, o que pode ser positivo; temos a ampliação do número de horas que
o aluno permanece diariamente na escola, embora não se tenha comprovado ainda se
isso por si só é, de fato, positivo. Canário (1996), afirma que, em sua trajetória, a escola
conquistou uma importância social, transformando-a em objeto social de estudo. Só
que, em concordância com o pensamento de Hutmacher (1995), ela carece de pesquisas
no âmbito do estabelecimento escolar. Ambos enfatizam a necessidade de estudos que
abordem a escola buscando visões mais compreensivas no seu todo.
Neste quadro sintético é comum associarmos o fracasso escolar do aluno à sua
não apropriação de conhecimentos, à sua falta de pré-requisitos, mesmo contando com
estudos como o de Sampaio (1998), que demonstram que os mesmos ainda, na maioria
das vezes, são utilizados apenas para justificar encaminhamentos como promoção e
retenção. O fracasso escolar do aluno e sua não apropriação de conhecimentos são
relacionados sempre à sua dificuldade de aprendizagem, apesar dos estudos de Charlot
(2000) apontarem para a necessidade dos conhecimentos oferecidos, também pela
escola, apresentarem algum significado para o aluno.
Há comum associação do fracasso escolar do aluno e sua não apropriação de
conhecimentos à sua baixa freqüência escolar, à superlotação das salas de aula, à má
formação dos professores, à indisciplina. Entretanto, pesquisas como a de Marin (1998)
apontam que problemas similares são enfrentados pelos professores desde a década de
1940 e permanecem em evidência na manifestação dos professores até a década de
1990.
Quanto à organização do tempo escolar, vale lembrar que já tivemos, por
exemplo, 180 dias letivos com 720 horas anuais para o antigo 1° grau (CHAGAS,
1984), e hoje temos uma legislação que determina o cumprimento de, ao menos, 200
dias letivos durante o ano (BRASIL, 1996), e ela é oficialmente respeitada. Temos uma
legislação que permite ao professor valer-se por várias vezes da falta/aula, permite faltar
várias vezes seguidas ou alternadamente até que o mesmo torne-se passível de sanções,
permite faltas injustificadas, permite o afastamento no início do ano letivo, pelo artigo
22, atendendo a interesses próprios, inclusive, em alguns casos, prejudicando os alunos.
Além destas possibilidades, apenas para nos determos em algumas, temos
constantes convocações para orientações técnicas que geralmente ocorrem em horário
de serviço, acrescentando, ainda, as possibilidades legais de ausência ao aluno em até
835

25% das atividades desenvolvidas por sua turma. Poderemos chegar a uma situação
hipotética em que professor e aluno fazem uso da maioria dos recursos legais que
justificam seu afastamento da sala de aula e as datas dos mesmos não coincidam,
resultando na questão: a quanto tempo estará reduzida a possibilidade de uma situação
de ensino e aprendizagem favorável para ambos dentro do ambiente escolar?

Questões Metodológicas

Com o objetivo de auxiliar na compreensão da realidade escolar em seu dia-a-


dia a pesquisa referência desta comunicação (GESQUI, 2008) se desdobrou na busca de
constatar a quanto tempo está reduzido o encontro entre profissional titular da disciplina
e aluno dentro do ambiente escolar, tendo em vista todas as ausências de professores e
alunos durante o ano letivo.
Registrou-se, diariamente, toda e qualquer ausência dos professores titulares nas
aulas previstas e os mecanismos utilizados pela escola para reorganizar-se;
quantificando essas ausências e os motivos das mesmas, além de registrar
bimestralmente o número de ausências de cada aluno.
O intuito da pesquisa não foi o de questionar a permanência, inclusão ou retirada
de alguma conquista nas condições de trabalho do professor, nem ao menos questionar a
quantidade de dias letivos durante o ano, ou o número de horas/aula por disciplina, ou
ainda o número de ausências legais permitido ao professor, mas, sim, verificar o quanto
e de que forma essas situações – que retiram legalmente o professor e o aluno da sala de
aula – foram encaminhadas.
A pesquisa foi realizada no turno da manhã de uma escola de ensino
fundamental no âmbito do Ciclo II da rede pública paulista de ensino regular situada da
grande São Paulo, no período de 13/02/06 a 22/12/06 (100% do ano letivo) com registro
diário de toda e qualquer ausência dos professores às aulas previstas, bem como do
registro bimestral da frequência dos alunos. Todos os registros foram realizados por
meio de instrumentos específicos testados anteriormente.
Os dados coletados foram analisados e organizados em tabelas e quadros. Além
disso, as observações permitiram acréscimos para análise do dia-a-dia da escola. Da
mesma forma foram estabelecidas análises de relações com referenciais das ciências
sociais tais como Canário (2005), Weber (1976), Vincent, Lahire e Thin (2001) entre
outros.
836

Inicialmente foram analisados os indicadores referentes ao destino dado as 13.448


aulas previstas para as doze turmas, presentes na pesquisa, durante o ano todo
concluindo que as mesmas podem ser distribuídas em quatro grandes grupos, ou seja:
aulas ministradas por professores titulares das disciplinas, aulas ministradas por
professores eventuais, aulas vagas e aulas em que mesmo com a presença do professor o
aluno foi convidado a não frequentar a escola ou foi dispensado mais cedo as quais
foram denominadas de situações diversas. Posteriormente estes indicadores foram
cotejados com informações3 referentes à formação inicial e o tempo de atuação docente
dos professores eventuais.

Alguns resultados

A tabela 1 tem o objetivo de auxiliar na exposição do destino dado as aulas


legalmente previstas para todo o ano letivo da escola pesquisada e, em seguida são
apresentadas algumas, das muitas possibilidades de análise destes indicadores, todavia
torna-se central destacar que todas as aulas previstas foram oficialmente registradas pela
escola como aulas dadas e a utilização da expressão “destino dado para as aulas
previstas” tem a finalidade de enfatizar que a definição de cada destino corresponde a
uma decisão tomada por profissionais da educação sediados na escola e, ao menos em
tese, cientes dos possíveis impactos e desdobramentos das mesmas.

Tabela 1: Previsão e distribuição das aulas durante todo o ano letivo.

Aulas Destino dado para as aulas previstas


Bimestre Previstas Prof. Titular Prof. Eventual Aulas Vagas Situações Diversas
1 3.356 2.353 592 83 328
2 3.228 2.389 478 111 250
3 3.228 2.036 634 256 302
4 3.836 1.886 363 351 1.036
Total 13.448 8.664 (64,42%) 2.067 (15,37%) 801 (5,96%) 1.916 (14,25%)
Fonte: Elaborado pelo autor a partir de Gesqui, 2008.

Os dados apresentados na linha “Total” permitem afirmar que foi elevado o


absenteísmo docente na escola pesquisada o que se configura numa situação
determinante na organização do trabalho da escola, contudo, ao observarmos as linhas

3
Obtidas também na pesquisa referência desta comunicação.
837

que descrevem bimestralmente esta situação torna possível inferir que a mesma não foi
solucionada em nenhum dos bimestres, ao contrário, se agravou, haja vista a redução na
participação do professor titular, ampliação da participação do professor eventual, das
aulas vagas e das situações diversas. Vejamos alguns números e informações adicionais
obtidas também na pesquisa referência desta comunicação.
• apenas 64,42% ou 8.664 das 13.448 aulas previstas para as doze turmas foram
ministradas pelo professor titular da disciplina (o especialista). Os professores
titulares valeram-se de dezoito (18) diferentes tipos de afastamento sendo a
maioria sem perda ou redução de vencimentos;
• 15,37% ou 2.067 das 13.448 aulas previstas para as doze turmas foram
ministradas por quinze (15) diferentes professores eventuais, alguns ainda
estudantes e a grande maioria sem nenhuma experiência no Magistério;
• 5,96% ou 801 das 13.448 aulas previstas para as doze (12) turmas ficaram
vagas, isto é, os alunos não tiveram contato com o professor titular da disciplina
nem com o professor eventual e por não serem dispensados permaneceram em
situação de ociosidade, uma vez que não se registrou (e nem foi observada) a
realização de nenhuma atividade pedagógica com estes alunos;
• 14,25% ou 1.916 das 13.448 aulas previstas para as doze turmas foram utilizadas
em situações diversas como entrega de kit escolar ou utilizar quatro (04) dias
letivos para realização de Conselhos de Classe e Série quando oficialmente está
previsto apenas um (01) dia letivo, dispensar o aluno para limpeza da escola ou
os famosos pré-conselhos. O professor estava presente, mas o aluno foi
convidado a permanecer em casa ou foi dispensado mais cedo. Ocorreram
dezessete (17) diferentes situações ao longo do ano;
• O número de aulas vagas e situações diversas aumentaram a cada bimestre;
• O professor eventual é o único recurso utilizado pela escola para suprir a falta do
professor titular da disciplina;
• Os indicadores de frequência dos alunos, face às várias ocorrências observadas
ao longo do ano, não são confiáveis;
• Pouco tempo é destinado ao processo de ensino e aprendizagem, muito tempo é
destinado a produção de relatórios.
838

Feitas apenas algumas das muitas possibilidades de análise dos indicadores de


presença do professor titular da disciplina, bem como dos modos como a escola se
reorganizou diariamente em função do elevado absenteísmo docente é possível observar
que:
• os indicadores de presença dos professores titulares das disciplinas poderiam ser
bem mais elevados com a simples eliminação das situações diversas, ou seja,
depende de uma tomada de decisão no âmbito da escola;
• a atuação dos professores eventuais, mesmo sendo em grande quantidade, não
sugere qualidade, considerando, principalmente, a formação acadêmica e tempo
de experiência no Magistério de cada um. Considerando ainda que, na maioria
das vezes, foi o inspetor de alunos quem definiu qual eventual atuaria em qual
turma, fica clara a falta de critérios pedagógicos para tais encaminhamentos. A
ampliação de possibilidades legais para solucionar a questão do absenteísmo
docente ocorre no âmbito dos órgãos centrais, porém, a definição de qual
professor eventual atuará em qual turma é pedagógica e da escola;
• a ocorrência de aulas vagas implica legalmente na reposição destas aulas, do que
não foi encontrado registro algum nem se deu observação de tal fato, o que
sugere a necessidade de outros mecanismos legais para suprir a ausência do
professor titular da disciplina. O fato de não se encontrar nenhum registro oficial
da ocorrência de aulas vagas aponta, novamente, para uma decisão no âmbito da
escola;
• as situações diversas, ou seja, as situações criadas pela escola que não
permitiram a realização de aulas e que foram registradas oficialmente como
aulas dadas, surgem como recurso utilizado pela escola para produzir
documentos, no caso outra prática definida a partir de uma decisão tomada no
âmbito da escola.
• a frequência dos alunos levanta questões pois os números oficiais apontam para
o uma frequência4 satisfatória. Pautado nas mais variadas ocorrências e nos
mecanismos de controle de frequência utilizados, é possível questionar sobre
como foram realizados estes registros, ou seja, uma prática realizada a partir de
uma decisão tomada no âmbito da escola.

4
De um total de 424 alunos 93,87% (398 alunos) apresentou frequência igual ou superior a 75% do total
de aulas dadas.
839

Considerações finais

O quadro que se apresenta das condições em que foi desenvolvido este ano letivo,
permite inferir que foi muito difícil, para qualquer um dos professores que atuou nesta
escola, desenvolver um trabalho com um mínimo de continuidade, considerando que,
quando a interrupção não era fruto de sua ausência, a escola encarregava-se desta
interrupção. Esse contexto permite, da mesma forma, inferir que, mesmo com a entrada
de um professor eventual, a continuidade não se deu por motivos já citados
anteriormente, e penso que este mínimo de continuidade seja um item indispensável na
busca de um trabalho de qualidade, o que, decerto, permitirá registros mais confiáveis e
avaliações mais eficientes.
A maneira como a escola foi priorizando a construção de relatórios e documentos
expressos principalmente na ocorrência das situações diversas, em detrimento do ensino
e aprendizagem, sugerem outro questionamento: não seriam os registros de frequência
dos alunos somente mais um destes documentos?
Esses dados, aqui reunidos, permitem identificar que a escola usa os mecanismos
disponíveis e oficiais para enfrentar as questões de falta dos professores. Porém cria
outras situações que interferem no fluxo do processo educativo. As faltas, de
professores, mudam de caráter, pois de um direito passam quase a ser um dever de uso e
as redes de ensino precisam atentar para soluções de outra natureza diante dessa
realidade.
Faz-se necessário destacar também que muitas das decisões tomadas no âmbito da
escola solucionam uma situação pontual, momentânea, todavia produzem
desdobramentos negativos no que se refere ao processo de ensino e aprendizagem, à
formação da sociedade e à prática docente, entre outras, contudo, transfere para a equipe
gestora da escola e para os profissionais da educação que ali atuam a responsabilidade
direta por estes desdobramentos, visto que os registros oficiais enviados aos órgãos
centrais – por esta mesma equipe gestora - dão conta de que a questão do absenteísmo
docente não precisa ser revista, pois os professores eventuais são suficientes em
quantidade e qualidade; não ocorrem aulas vagas nem situações diversas e a frequência
dos alunos não está prejudicada.
Tão importante quanto garantir que as aulas legalmente previstas ocorram é o fato
de garantir que todas as informações referentes a este esforço cheguem de modo
840

fidedigno, aos órgãos centrais. Ocultá-las depõem contra uma escola pública de
qualidade.

Referências Bibliográficas

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da


educação nacional. Diário Oficial da União. Brasília, DF. 1996.

CANÁRIO, Rui. Os Estudos sobre a escola: problemas e perspectivas. In: BARROSO,


João (org). O estudo da escola. Porto: Porto Editora, 1996. pp. 123 -149.

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Saraiva. 1984.

CHARLOT, Bernard. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Porto
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FERNANDES. Florestan (Org.) K. Marx, F. Engels – história. São Paulo: Ática, 3ª
edição. 1989. pp. 308-318.

GESQUI, Luiz Carlos. Organização da escola, absenteísmo docente, discente e


rendimento escolar. Dissertação de Mestrado, Programa de Estudos Pós-Graduados em
Educação: História, Política, Sociedade, da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo. 2008.

HUTMACHER, Walo. A escola em todos os seus estados: das políticas de sistemas as


estratégias de estabelecimento. In: NÓVOA, A. As organizações escolares em análise.
Lisboa: Dom Quixote, 1995, pp. 43-76.

MARIN, Alda Junqueira. Com o olhar nos professores: desafios para o enfrentamento
das realidades escolares. Cadernos Cedes. Campinas, nº 44, 1998. pp. 8-18.

NARODOWSKI, Mariano. Infância e Poder: conformação da pedagogia moderna.


Bragança Paulista: Editora da Universidade São Francisco. 2001.

SAMPAIO, Maria das Mercês Ferreira. Um gosto amargo de escola: Relações entre
currículo, ensino e fracasso escolar. São Paulo, Educ. 1998.

TOMMASI, Lívia de, WARDE, Miriam, HADDAD, Sérgio (orgs.). O Banco Mundial
e as políticas educacionais. São Paulo: Corte/PUC-SP/Ação Educativa. 1996.

VINCENT, Guy, LAHIRE, Bernard, THIN, Daniel. Sobre a história e a teoria da forma
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WEBER, Max. Os fundamentos da organização burocrática: uma construção do tipo


ideal. In: CAMPOS, Edmundo (Org.). Sociologia da burocracia. Rio de Janeiro:
Zahar. 1976, pp. 15-28.
841

Comunicação

Adolescentes em liberdade assistida e escola: um encontro possível?

Luziane de Assis Ruela Siqueira


PPGE/UFES
Vania Carvalho de Araújo
PPGE/UFES
Grupo IESC
Apoio/Financiamento: Fapes

Resumo: As normativas legais focadas na infância e na adolescência configuram


diversos direitos destas categorias geracionais. Vistos na contemporaneidade como
sujeitos de direitos e em desenvolvimento, tornam-se o foco de políticas públicas. Esta
pesquisa de doutorado tem como foco a inserção compulsória dos adolescentes em
liberdade assistida na escola pública, no que concerne às práticas engendradas a partir
da inserção destes sujeitos, colocando em análise se esta inserção pode se constituir
numa inclusão efetiva e na garantia do direito à educação.
Palavras-chave: Liberdade assistida, direito, educação.

O Brasil tem sofrido mudanças paradigmáticas em relação à busca pelos direitos da


juventude. Em relação aos adolescentes que cometem atos infracionais estas mudanças
foram notáveis, ao menos na configuração das leis. Da reclusão em espaços comuns,
independentemente da idade e do crime cometido, que configurava um direito punitivo
e repressivo, passamos a conviver com ideais de proteção, educação e moralidade do
sujeito jovem (MORAES, 1916). A partir das lutas democráticas pelo reconhecimento
das necessidades específicas do adolescente como sujeito em desenvolvimento,
configurou-se a legislação que legitima este sujeito como sujeito de direitos e alvo de
proteção integral. Paradoxalmente, convivemos com a não-efetivação destes direitos,
quando as leis não garantem a efetiva proteção e inclusão dos adolescentes.
Destacamos neste artigo o direito à educação, garantido pela Constituição Federal de
1988 e pela Lei nº 8.069 de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), como
um direito que garante a inserção e matrícula do adolescente em liberdade assistida, mas
que não garante a inclusão efetiva destes sujeitos na instituição de ensino.
842

Pretendemos colocar em análise que a inserção do adolescente que cumpre medida


socioeducativa em liberdade assistida pode provocar a necessidade de novas práticas a
serem desempenhadas pelo professor e pelo gestor no âmbito escolar, na medida em que
muitas vezes este adolescente se encontrava evadido da escola ou afastado para
cumprimento de medida socioeducativa de internação.
Assim, configura-se um retorno à instituição, acrescido do fato de muitas vezes este
adolescente ser associado à violência, pois autor de ato infracional, no recorrente
discurso deste sujeito como “metáfora da violência” contemporânea (SALES, 2007).
Observamos que a escola se reconhece como direito dos adolescentes em conflito com a
lei, mas seus profissionais podem demonstrar medo, insegurança e desconhecimento das
realidades destes adolescentes e assim, torna-se um desafio saber como lidar com eles
no cotidiano. Entendemos que é fundamental ir além das discursividades construídas
sobre os adolescentes e construir, a partir de suas narrativas, no encontro com estes
sujeitos, os sentidos que a escola pode assumir.

Adolescentes em liberdade assistida


Os adolescentes em liberdade assistida, de acordo com o ECA, são os sujeitos dos 12
aos 18 anos de idade, autores de atos infracionais (atos correlatos ao crime previsto para
o adultos), que passam a ser denominados em conflito com a lei e que cumprem medida
socioeducativa de liberdade assistida, que compreende, entre outras questões, a inserção
compulsória do adolescente em instituição de ensino.
Esses adolescentes tensionam o direito pois a medida socioeducativa estabelece a
educação como um direito que pode ser visto como um dever. Destacamos que a
inserção em instituição de ensino é vista como um direito, porque previsto/garantido
pela lei, e dever, porque se não estiver matriculado na escola, tal situação é vista como
“quebra” de medida, o que pode ocasionar nova medida socioeducativa para o
adolescente. A educação assume assim, importante papel na reinserção, reeducação e
ressocialização destes adolescentes.
O prefixo “re” pode configurar a reintrodução do que está fora, portanto excluído da
sociedade. Torna-se importante questionar se este é o papel da escola: reinserir,
reintegrar, que pode engendrar práticas de conformação, formatação e normatização
destes sujeitos de acordo como modelos de adolescência e de aluno tidos como padrões
normais. Novamente devemos tensionar: existe um único modo de ser adolescente e de
ser aluno?
843

A Psicologia do Desenvolvimento contribuiu notadamente na construção de padrões


normativos de criança e adolescente. Vistos como indivíduos em desenvolvimento, em
formação, estes sujeitos seguiriam padrões universais, produzindo uma infância e uma
adolescência normais e os que não seguissem estes padrões seriam anormais.
Distanciamo-nos desta concepção naturalizada e universalizante de adolescência,
baseada na ideia de uma essência adolescente, traduzida em “rebeldia, desinteresse,
crise, instabilidade afetiva, descontentamento, melancolia, agressividade, impulsividade,
entusiasmo, timidez e introspecção” (COIMBRA, BOCCO e NASCIMENTO, 2005, p.
4).
Questionamos a concepção de uma identidade adolescente, que produz sujeitos
homogêneos, ignorando a capacidade do sujeito adolescente de se reinventar, de escapar
de normatizações. Em contraponto ao conceito de adolescente e adolescência,
adotamos, conforme Coimbra, Bocco e Nascimento (2005), os termos jovem e
juventude, denotando uma intensidade juvenil em detrimento da ideia de identidade
adolescente.
Assim como questionamos uma adolescência única e universal, entendemos os
adolescentes em liberdade assistida como diversos, com histórias de vida imersas em
diferentes contextos. Instaura-se um desafio: vê-los em suas subjetividades e
intensidades, assumindo o lugar de adolescentes, o que implica em resistir à visão
desses sujeitos somente como “em liberdade assistida”, “em conflito com a lei”, na
personificação do conflito, como se isto resumisse sua condição enquanto adolescente.
Implica também em vê-los como alunos. Novo desafio se apresenta: é possível ver
como aluno um adolescente que muitas vezes resiste às regras da instituição, que
representa a violência, personificando o risco?
Tratam-se de alunos que desafiam o ofício de aluno que lhes é apresentado como fator
de reinserção à sociedade, numa visão da educação como salvação, historicamente
construída a partir da modernidade e reatualizada nas práticas educativas
contemporâneas. Para Patto (2007), diante da criminalidade juvenil, a escola como
instituição salvadora é conclamada pela sociedade, ideal preconizado desde o Segundo
Império do Brasil e atualizado na concepção atual da educação como essencial à
conservação da ordem social e na prevenção da criminalidade juvenil.
844

Ofício de aluno
Utilizamos o termo “ofício de aluno” conforme descreve Perrenoud (1995), como o
ofício desempenhado pela criança e pelo adolescente, em muitos anos de suas vidas, não
remunerado e obrigatório. Destacamos a naturalização deste ofício, na medida em que
não se concebe a ideia de uma criança ou adolescente fora da escola. O autor destaca
que nesse ofício, o aluno não tem liberdade de escolha, depende do adulto, é controlado
quanto ao tempo, modalidade e exercício, sendo constantemente avaliado. Controle que
pode ser burlado quando o aluno resiste ao ofício, traçando estratégias de sobrevivência,
ainda que estas estratégias transformem as relações educacionais em relações
meramente utilitaristas.
Para o autor, a escola, vista como preparação para a vida e para o futuro, justifica
currículos e pedagogias focados na função de preparar sujeitos produtivos e aptos ao
mercado de trabalho. Porém alerta que centrar a escola somente em currículos,
aprendizagem de conteúdos, avaliação e métodos, pode ofuscar o cotidiano da escola
em suas microrealidades: os sentimentos dos alunos, as relações traçadas em torno de
liderança e popularidade, a necessidade de ser amado, de falar de si. Se o ofício de
aluno formata o adolescente ao cobrar seu desempenho de ofício de aluno, provoca
também escapes, fugas deste ofício imposto. O autor aponta que na escola há vida e que
não devemos reduzir as crianças e adolescentes ao papel de alunos.
Para Sarmento (2011), o ofício de aluno se relaciona ao ofício de criança, configurando
comportamentos esperados das crianças de acordo com o seu papel social na escola
pública. O autor fala de uma normatividade que se constitui a partir de uma ideia do que
é “ser criança”, produção de uma normatividade que exclui qualquer diferença que
escape ao padrão.
Segundo o autor, o padrão de normatividade, constituído a partir dos saberes
institucionalizados sobre a criança, notadamente a Psicologia do Desenvolvimento,
produz a “não-criança”, aquela que não se enquadra aos padrões. Entendemos que os
saberes sobre a adolescência e as práticas sociais podem produzir os “não-
adolescentes”, que seriam os que não se encaixam nos padrões de normatividade
prescrita a estes sujeitos.
O adolescente em liberdade assistida nem sempre é visto como apto ao ofício de aluno,
pois às vezes assume-se sua incapacidade de desempenhar tal ofício. Muitas vezes ele
não aceita este ofício, resiste ao que pode não mais fazer sentido ao seu cotidiano.
Inserido em atos infracionais, comumente encontra-se evadido da escola.
845

O desafio de pensar a escola para este adolescente emerge em toda sua intensidade:
como pensar em práticas institucionais e educativas que façam sentido para este sujeito?
Entendemos, a partir de Perrenoud (1995), que se há um ofício de aluno,
necessariamente, há um ofício de professor. Sentido dado na relação entre ambos,
relação intrínseca entre sujeitos que ocupam lugares diferenciados, mas que atuam
concomitantemente no mesmo espaço – a escola. Pensar num aluno que recusa “seu”
ofício implica em pensar novas formas de lidar com este sujeito, novas práticas de
ensino, fundação de novas práticas de trabalho.

Pensando o ofício de professor


Ressaltamos que não pretendemos prescrever normas, ideias para um manual de
condutas do professor em relação ao aluno/adolescente em liberdade assistida. Não se
trata de obter respostas aos desafios, porque estas deverão ser construídas na relação
entre os sujeitos, não existindo a priori uma forma padrão, uma regra normalizadora.
Buscamos pensar nas tensões, nos conflitos, nas crises configuradas a partir dos novos
atores/alunos, entendendo a crise como produtora de novas configurações das relações
traçadas na escola, movimento instituinte de processos de formação, tanto de alunos,
quanto de professores e gestores, que precisam se adequar às novas formatações que se
dão no espaço educacional.
A demanda de práticas adequadas à inclusão do aluno/adolescente em liberdade
assistida pode gerar desconforto e resistência, na medida em que pode ser vista como
mais uma demanda de trabalho para o docente, diante de tantas atualizadas na
contemporaneidade: diversidade, inclusão, cidadania, sentidos atribuídos à instituição
de ensino, vista como formadora por excelência dos “cidadãos do futuro” (as crianças e
os adolescentes).
Sinalizamos para a visão deste adolescente como a personificação do risco, trazendo
para o âmbito escolar a discussão da violência contemporânea. Vários autores e
pesquisas atualizam os discursos sobre a violência escolar, com ênfase no docente,
como Silva e Scarlatto (2009), que relatam que do final dos anos 90 a 2000, o foco das
pesquisas tem sido sobre as relações interpessoais agressivas entre os alunos e os
agentes da instituição escolar. As autoras ressaltam que os professores têm de lidar
cotidianamente com o desafio da violência e têm sua saúde e sua vida em risco.
Assunção e Oliveira (2009) atribuem o processo de intensificação do trabalho nas
escolas a questões de saúde/adoecimento dos professores, apontando que a
846

democratização do ensino provocou mudanças e adaptações dos docentes, assim como


efeitos sobre suas condições de trabalho, o que resulta em intensificação do trabalho,
afetando a saúde e podendo provocar adoecimento. Para os autores, a prática docente
não se restringe à sala de aula, pois inclui relações com a família e com a comunidade,
formando, uma rede de atuação que tem como centro o professor.
Pensar a família como parte do campo de atuação do docente, implica em considerar a
imagem historicamente construída da família, cuja desorganização e má influência eram
apontadas como fatores causadores da criminalidade infanto-juvenil. Configurava-se a
noção de fraqueza moral da família (MORAES, 1916), que ainda persiste e é
continuamente atualizada nas práticas contemporâneas. Incluir a família na escola,
implica portanto, em rever e analisar tal noção e as práticas que a atualizam,
questionando o papel da família no cotidiano da instituição e da vida do adolescente.
Destacamos ainda que a violência presente nas vidas dos alunos, que se atualiza com a
presença dos autores de ato infracional, passa a fazer parte da atuação do professor, e
portanto deve ser colocada em análise.
Para Pais (2008), “as malhas com que se tece a ‘violência escolar’ são de textura
heterogênea e de urdiduras bem mais complexas do que se possa supor a uma primeira
aproximação” (p. 15). E nos questiona quanto ao papel da escola frente a essa trama
complexa – a violência. O autor pesquisou escolas em Portugal tidas como “escolas do
diabo”, que são as “escolas de risco”, cuja população de alunos é de bairros degradados.
Pais aponta a vinculação da violência aos jovens desses bairros, a maioria de origem
africana e cigana e professores que “fogem dessas escolas como o diabo da cruz” (p.
13), daí a expressão “escolas do diabo”.
Segundo o autor, os jovens têm origens, memórias culturais e histórias diferentes, mas a
escola intenta torna-los iguais. Pais aponta um movimento paradoxo que trata os jovens
de maneira igual, quando gostariam de ser compreendidos em suas diferenças, e os trata
como diferentes, quando deveriam ser tratados como iguais, “se é tido como igual mas
olhado como diferente” (PAIS, 2008, p. 16), o que pode provocar sentimentos de
revolta entre alunos que não reconhecem a escola como sua, e o sentimento de não-
pertencimento à escola pode conduzir a condutas violentas como forma de reagir a uma
escola que não os acolhe.
Araújo (2005) tensiona a educação inclusiva para as crianças:
847

Construir uma educação a partir da infância, a partir da criança e com a


criança muda o foco de análise para uma educação que se deseja inclusiva.
Além de pensarmos que esta criança deva ser incluída fisicamente na escola
no sentido de seu acesso e permanência, a legitimidade desta inclusão se dá,
sobretudo, no reconhecimento da criança como sujeito de direitos e não a
partir dos estigmas de suas carências, falta ou incompletude (ARAÚJO,
2005, p. 73).

De acordo com a autora, se a criança não for considerada como sujeito, respeitada em
suas culturas, em sua forma de ser e agir no mundo, diferenciada do adulto, não há
educação inclusiva, de fato. De forma paralela, a mera inserção compulsória não garante
a inclusão do adolescente em liberdade assistida se ele não for aceito em suas diferenças
e singularidades, reconhecido em sua condição de ser adolescente e sujeito de direito, se
não gerar o sentimento de pertencimento a esta escola, provocando linhas de fuga às
condutas violentas como forma de resistir ao não-pertencimento.

Adolescentes em liberdade assistida e escola: um encontro possível?


Se não pretendemos dar respostas, lançamos como proposta ética a aposta no
reconhecimento do adolescente em liberdade assistida como adolescente e aluno e no
pertencimento deste sujeito à escola.
Como último desafio a ser lançado nesta pesquisa em andamento, propomos pensar a
educação a partir de Arendt (1997), que concebe como papel da educação e do
educador, apresentar o mundo aos novos que se inserem nele. Assim, pensar no
adolescente em liberdade assistida e a escola, implica pensar no papel/responsabilidade
do educador frente a este aluno.
O desafio se apresenta tanto na concepção da educação contemporânea, com a escola
centrada na formação de competências para o mercado (em concordância com os apelos
capitalistas de formação de mão-de-obra e sujeitos ativos/produtivos); no ensino da
cidadania, numa visão da escola cuja função seria formar os “cidadãos do futuro”;
quanto nos processos contemporâneos de individuação, que cada vez mais conduzem ao
sentimento de solidão, em detrimento da busca de novas formas de relacionalidades.
Em um mundo apontado como em crescente níveis de criminalidade, com sujeitos em
constante risco, como nos responsabilizar por um mundo que não desejamos assumir?
Como inserir as crianças e os adolescentes na escola e no mundo que não queremos
compactuar?
848

O desafio deve aqui se converter em esperança, não uma espera em algo utópico, mas
em algo absolutamente concreto: se a criança e o jovem configuram o milagre, que é a
capacidade de refundar e recriar o mundo - gerar pertencimento e potencializar estes
sujeitos talvez seja um caminho possível para um mundo no qual possamos nos sentir
partícipes/ativos em sua criação. Falamos de milagre conforme Arendt (2007), para
quem o que pode salvar o mundo de sua ruína é o fato do nascimento, “em outras
palavras, é o nascimento de novos seres humanos e o novo começo, a ação de que são
capazes em virtude de terem nascido” (p. 259).

Considerações finais
À indagação do título Adolescentes em liberdade assistida e escola: um encontro
possível?, produzimos mais indagações que respostas, cientes que o encontro, a relação
entre docentes, gestores e adolescentes podem gerar novos processos de trabalho, novas
formas de pensar a instituição de ensino, suas práticas e seus cotidianos. Desnudamos
uma educação pautada em desafios, apostando numa ética que potencialize direitos, na
busca da efetividade dos direitos da juventude, na constituição de sujeitos de direitos.
A continuidade da pesquisa se ancora na aposta de que as mudanças históricas acerca do
direito da juventude não se percam diante de práticas naturalizadas e
despotencializadoras, atualizadas na contemporaneidade. Propomos pensar em práticas
que apostem na vida e nos encontros, em caminhos abertos para a construção de uma
escola como espaço de criação e invenção, conforme Scheinvar (2009), num espaço
possível, tecido na relação entre a escola e os alunos que cumprem liberdade assistida.

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850

Comunicação

As movimentações inerentes ao processo de implantação do programa de avaliação


de desempenho individual produzidas na escola

Márcia Aparecida Rodrigues Silva1


UFV
Natália Rigueira Fernandes2
UFV
Heloisa Raimunda Herneck3
UFV

Resumo: O presente artigo objetiva identificar os saberes e fazeres produzidos no


cotidiano escolar de uma escola, tendo em vista as movimentações produzidas pela
Avaliação de Desempenho Individual (ADI), implantada no Estado de Minas Gerais a
partir do ano de 2003 e aplicada aos profissionais da educação. Para tanto realizamos
leitura de documentos oficiais sobre a Avaliação de Desempenho Individual, e
realizamos observações em uma escola pública estadual da cidade de Viçosa/MG, além
de realizar entrevistas semiestruturadas ao gestor escolar e duas professores. Os
resultados apontam certo incômodo provocado pela forma como a avaliação é aplicada.
Há depoimentos que dizem a respeito do desconforto causado, uma vez que o uso que
se ode fazer da mesma é incerto, podendo até mesmo ser usada como punição.
Concluímos que a ADI divide opiniões no cotidiano escolar, interfere nas relações dos
sujeitos. Isso porque muitas vezes os resultados das avaliações externas são usados para
dizer quem é ou não apto, capaz, autônomo o suficiente para exercer determinada
função na sociedade.
Palavras-chave: Avaliação de Desempenho Individual; Cotidiano Escolar; Relação de
poder.

O poder produz saber; poder e saber estão diretamente implicados; não há


relação de poder sem constituição correlata de um campo de saber; também

1
Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal de Viçosa
2
Professora Assistente na Universidade Federal de Viçosa
3
Professora Adjunta na Universidade Federal de Viçosa
851

não há saber sem que haja ou se constituam, ao mesmo tempo, relações de


poder.

(FOUCAULT, 20089, p.33)

1. Introdução

O presente artigo tem como objetivo identificar os saberes e fazeres produzidos


no cotidiano de uma escola a partir das movimentações causadas pela Avaliação de
Desempenho Individual (ADI) bem como sua influência nas relações de poder
produzidas no interior do espaço escolar. Da mesma forma, objetiva verificar
possibilidades e limites enfrentados pelo gestor e professores ao realizar a ADI e dar
visibilidade ás movimentações inerentes ao processo de implantação do programa de
Avaliação de Desempenho Individual produzidas na escola.
Toda a história que permeia a criação desse projeto teve inicio durante a gestão
do então governador do Estado de Minas Gerais, Aécio Neves, que propôs um programa
de governo denominado Choque de Gestão, que segundo ele era necessário, pois a
gestão anterior (Itamar Franco de 1998 a 2002) tinha deixado uma grave crise fiscal e
também administrativa. Esse programa era constituído por ações de racionalização de
processos, modernização de sistemas, reestruturação do aparelho do Estado e Avaliação
de Desempenho Institucional e Individual, com o objetivo de melhorar a qualidade e
reduzir os custos dos serviços públicos. Trata-se de uma reforma do Estado realizada,
segundo os documentos que a descrevem, para sanear as finanças e promover a
melhoria dos serviços públicos (MINAS GERAIS, 2004).
Essa avaliação foi implantada no Estado de MG pela Lei complementar nº 71 de
30 de julho de 2003, que estabelece a avaliação periódica de desempenho individual,
institui a perda de cargo público e de função pública para o servidor público estável e
detentor de função pública na Administração Pública direta, autárquica e fundacional do
Poder Executivo e dá outras providências.
A Avaliação de Desempenho consiste no processo de acompanhamento do
trabalho realizado pelo servidor no exercício do cargo que ocupa, com intuito de
possibilitar o encadeamento de ações corretivas que permitam o desenvolvimento das
habilidades necessárias a um desempenho desejado no trabalho, visando à melhoria dos
serviços prestados.
Conforme a Secretaria do Estado da Fazenda (SEF) de MG o projeto tem por
objetivos: aprimorar o desempenho dos servidores; valorizar e reconhecer o
852

desempenho eficiente do servidor; aferir o desempenho do servidor no exercício de


cargo ocupado ou função exercida; identificar as necessidades de capacitação do
servidor; fornecer subsídios à gestão da política de recursos humanos; contribuir para o
crescimento profissional e para o desenvolvimento de novas habilidades do servidor;
possibilitar o estreitamento das relações interpessoais e a cooperação dos servidores
entre si e suas chefias; contribuir para a implementação do princípio da eficiência na
SEF (MINAS GERAIS, 2004, p.6).
Para a SEF/MG o projeto de Avaliação de Desempenho Individual é
importante, pois oportuniza ao servidor receber um retorno formal sobre o trabalho
realizado por ele. Além disso, vários aspectos de sua vida funcional passarão a depender
da Avaliação de Desempenho, tais como: “progressão na carreira; manutenção de cargo
comissionado ou função gratificada; percepção de remuneração adicional; aprovação
em estágio probatório e dispensa do serviço público” (MINAS GERAIS, 2004, p. 8).
A Resolução nº 23, de 22 de abril de 2004 dispõe sobre o servidor ocupante de
cargo efetivo ou detentor de função pública em exercício de cargo em comissão ou
função gratificada. Também o servidor de cargo efetivo em cumprimento de estágio
probatório será submetido á Avaliação Especial de Desempenho nos termos de Decreto
43.764 de 16 de março de 2004 e Resolução SEPLAG nº 16 de 22 de março de 2004
que define a metodologia e os procedimentos da Avaliação Especial de Desempenho do
servidor público civil em estágio probatório dos Órgãos e Entidades da Administração
Pública Direta, Autárquica e Fundacional do Poder Executivo Estadual.
O programa de Avaliação de Desempenho Individual é algo complexo, que pode
ocasionar mudanças nas relações entre os sujeitos que atuam nas escolas. E os
profissionais docentes como estão lidando com esse programa? Será que ele interfere na
atuação do profissional? São muitos os questionamentos que esse programa suscita por
sua atualidade e importância. Esta pesquisa objetiva investigar a sua implantação em
uma Escola Estadual da cidade de Viçosa-MG a fim de, no cotidiano desta, ter a
oportunidade de buscar respostas a tais inquietações.
Acreditamos na hipótese de que a ADI afeta a subjetividade do professor efetivo
em escolas públicas na rede estadual de Minas Gerais, na medida em que impõe a estes
novas exigências no âmbito de sua atuação. É um processo de avaliação que possui
mecanismos de premiação e punição, instituindo dessa forma modelos de gestão de
recursos humanos baseado no sistema meritocrático.
853

Dessa forma, buscou-se nessa pesquisa analisar os saberes e fazeres produzidos


na escola, enquanto a Avaliação de Desempenho Individual e sua influência nas
relações de poder produzidas no interior desse espaço escolar.
Para tanto, a presente pesquisa se propôs, inicialmente, a fazer uma leitura dos
documentos disponíveis na escola, referentes ao programa de Avaliação de
Desempenho Individual, como manuais da ADI e pasta/arquivo de avaliações
anteriores.
Essa pesquisa se configura como qualitativa, por realizar entrevistas
semiestruturadas4 realizada com o gestor e professores da escola. Foram convidados dez
professores para participarem da entrevista, porém, somente duas professoras
colaboraram com a mesma.
Para aprofundamento da discussão foi realizada uma consulta à bibliografia
específica produzida a respeito do programa de ADI, que buscam compreender os
(des)caminhos desse programa no Estado de Minas Gerais.
Outro instrumento que contribuiu muito na investigação do cotidiano da Escola
foi a observação, que para Lüdke e André (1986) ocupa um lugar privilegiado nas novas
abordagens de pesquisa educacional, seja como principal método de investigação ou
associado a outras técnicas de coleta de dados, pois ela possibilita um contato pessoal e
estreito do pesquisador com o fenômeno pesquisado, apresentando uma série de
vantagens. A observação para essa pesquisa foi realizada durante três semanas no turno
da manhã.
Após cumprimento das etapas supracitadas foi realizada descrição qualitativa
dos dados levantados, buscando não nos restringir ao que está explícito no material, mas
procurando desvelar as mensagens implícitas, as dimensões contraditórias e os temas
sistematicamente silenciados.

2. Impactos da ADI aos profissionais do Estado


As avaliações, sejam elas quais forem, normalmente, como o próprio nome já
diz, são utilizadas para julgar ou estimular o valor. No caso da ADI determina a
excelência e a qualidade do trabalho realizado por um empregado. Muitas vezes a
aversão a uma avaliação se encontra no fato de que esta coloca em evidência as

4
Triviños (1992) conceitua entrevistas semi-estruturadas como aquela que parte de certos
questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida,
oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se
recebem as respostas do informante.
854

carências do trabalhador e interfere diretamente nas decisões de órgãos superiores ao


que diz respeito a sua remuneração, colocação, desenvolvimento.
Conforme Santos et al (2012), a avaliação do desempenho docente é algo que
sempre esteve presente no cotidiano desse profissional, todavia de maneira informal,
sendo realizada pelo próprio docente, pelo comentário dos alunos ou até mesmo de
outros profissionais da educação.
Entretanto, o docente que faz uso também da avaliação na prática de seu
trabalho se mostra resistente quando submetido a uma avaliação, isso ocorre por dois
motivos, primeiro os docentes entendem a sua avaliação como um instrumento de
controle ou punição, em oposição à ideia de crescimento profissional. O segundo está
relacionado a não compreensão do processo avaliativo tanto pelos avaliadores como
pelos avaliados (SAUL, 2007 apud SANTOS et al, 2012,p.5).
Conforme Santos et al (2012) há argumentos contrários a concepção de
responsabilização das escolas e dos docentes por seus resultados, pois para que haja
qualidade do ensino ofertado em uma instituição escolar é preciso que o Estado, através
de seus ministérios e secretarias de educação também garantam as condições básicas e
indispensáveis para um trabalho de qualidade.
As avaliações externas voltadas à educação implementadas no Brasil nos
últimos anos, como a Prova Brasil5, por exemplo, que avalia o aluno, surge com a
expectativa de que as escolas utilizem seus resultados para aperfeiçoar sua ação, de
modo a melhorar a qualidade da educação ofertada. Os professores são avaliados
indiretamente por meio dessas avaliações realizadas junto aos alunos e com a ADI são
avaliados mais diretamente, com o discurso de que isso venha a favorecer seu
crescimento e desenvolvimento no trabalho e, consequentemente, a melhoria da
qualidade do serviço prestado.
Segundo Barbosa (2013) a descentralização das responsabilidades e das
atividades relativas à escola culminou no aprimoramento da avaliação e da maior
responsabilização da instituição escolar, pois a ideia de que atividades que
anteriormente eram conduzidas de forma centralizada agora precisam ser monitoradas,
para que a eficácia das operações seja assegurada. Todavia esse monitoramento no que

5
Mais informações em
<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=210&Itemid=324>.Acesso
em: 17. Jul. 2014.
855

diz respeito mais especificamente aos professores se traduz em formas de regulação e


controle, muitas vezes acompanhadas por premiação ou punição.
Na educação, as estruturas de incentivos e de divulgação atreladas a resultados
de alunos em avaliações externas6, consideradas como programas de responsabilização
dos profissionais da educação, são justificadas pelo discurso de incentivos financeiros.
Assim sendo, Alves (2006) argumenta que a Avaliação de Desempenho
Individual se traduz em um fator relevante dentro da proposta de dotar o Estado de
organização racional centrada nos resultados.
Desse modo, cumpre perguntar como e em que medida tal avaliação de
desempenho afeta a subjetividade docente, tendo em vista que sinaliza para novas
exigências na prática cotidiana, alterações nas relações no interior da instituição escolar
e no julgamento profissional com base em resultados. Esses são utilizados como
requisitos para o cálculo do Adicional de Desempenho – ADE7, o pagamento de prêmio
por produtividade8, demissão do servidor público estável e para fins de dispensa do
detentor de função pública9. De forma geral, percebemos que a introdução da ADI pode
sinalizar para o fim de vários direitos adquiridos pelos servidores públicos estaduais,
onde o tempo de serviço é substituído pelo desempenho no cálculo dos adicionais.
Para Augusto (2012) todos os profissionais que ingressaram no serviço público
estadual de Minas Gerais a partir do ano de 2003, possuem suas carreiras conduzidas
apenas pelo desempenho e perdem “prerrogativas como a concessão de alguns
benefícios decorrentes do tempo de trabalho, estando sujeitos às situações de mais
precariedade e flexibilidade no trabalho” (AUGUSTO et al,2012,p.8).
A Avaliação de Desempenho Individual considera, entre outros, a
produtividade no trabalho, iniciativa, aproveitamento em programas de capacitação,
6
Mais informações em <http://www.portalavaliacao.caedufjf.net/pagina-exemplo/tipos-de-
avaliacao/avaliacao-externa/>. Acesso em 17. Jul. 2014.
7
Substitui-se assim o critério de tempo de serviço no direito aos benefícios (biênios, qüinqüênios, férias-
prêmio) pelo critério de desempenho profissional.
8
O pagamento de prêmio por produtividade, segundo o “Acordo de Resultados” firmado entre o governo
do Estado e algumas secretarias e órgãos públicos (entre os quais a Secretaria de Estado da Educação-
SEE/MG) destina-se somente aqueles servidores que obtiverem nível de desempenho maior ou igual a
70% da pontuação máxima na avaliação de desempenho. Tal acordo tem a vigência prevista entre junho
de 2006 e dezembro de2008. Os incentivos serão concedidos aos servidores e órgãos que firmaram o
“Acordo de Resultados” somente em caso de redução das despesas correntes de suas atividades. Cfr.
Acordo de Resultados-Versão completa. Disponível no endereço: www.planejamento.mg.gov.br.
9
Aqui, altera-se a estabilidade do servidor público efetivo, uma vez que coloca a possibilidade de
demissão por insuficiência de desempenho, alterando o art. 249º da Lei 869/52, que trata da estabilidade
funcional dos servidores efetivos do estado. Assim, além das formas previstas na lei, a pena de demissão
pode ser aplicada ao servidor que receber nas ADI’s dois conceitos sucessivos de desempenho
insatisfatório, três conceitos insatisfatórios em cinco ADI’s ou quatro conceitos insatisfatórios em dez
ADI’s.
856

pontualidade e assiduidade. Ao avaliar essa política, pode-se destacar como ponto


positivo o fato de não ser apenas um sistema de bonificação, mas de progressão
funcional, e o uso de critérios não atrelados ao cumprimento de metas de desempenho
dos alunos (SANTOS et al, 2012).

3. Os saberes e fazeres produzidos na escola


O período de observação oportunizou vivenciar diferentes tarefas: atuação na
secretaria da escola, papel da supervisora acompanhando três alunas que foram expulsas
da sala de aula pelo professor por “mau comportamento”, o trabalho desenvolvido pela
coordenadora em reuniões e planejamentos com os professores, momentos estes ricos
para observação da relação existente entre os profissionais da escola.
Percebemos durante a observação o quanto se faz árduo o trabalho de uma
gestora escolar de escola pública, seja ela diretora e/ou supervisora, pois estas, mesmo
se esforçando, não conseguem suprir as demandas da escola como um todo que envolve
o atendimento aos professores, alunos e pais, e a busca por soluções das “emergências”
que surgem no dia-a-dia escolar.
Entendemos como competência do diretor estudar e analisar as propostas
levantadas nas reuniões pela coordenadora e pelos professores e verificar se estas são
plausíveis ou não, bem como contribuir para o desenvolvimento profissional de todos.
Infelizmente, não é em toda reunião que o diretor pode participar, pois sua presença é
solicitada a todo o momento pelas secretarias e por outros. Desta forma, os encargos
burocráticos e financeiros acabam consumindo muito a atenção do gestor e outros
serviços tão ou mais importantes para o desenvolvimento da escola ficam em segundo
pano.
O processo de Avaliação de Desempenho é realizado por uma Comissão de
Avaliação formada pelos profissionais de cada segmento da escola: serviços gerais,
secretaria e professores. Os representantes são escolhidos em assembleia, com mandato
de dois anos, onde o presidente sempre é o diretor/gestor da instituição escolar. A ADI
acontece em dois momentos: no primeiro, cada professor preenche o seu Plano de
Gestão de Desempenho Individual (PGDI), onde coloca todas as ações e metas que
pretende alcançar durante o ano; no segundo momento o professor recebe o Termo de
Avaliação, um documento que não é obrigatório ser entregue antes da avaliação, mas
virou uma prática nesta escola por se considerar uma ação necessária em uma escola
democrática. Nesse Termo o docente tem que se dar uma nota pra cada item elencado,
857

preenchendo-o á lápis porque na notificação dos resultados feita pela comissão essa nota
é revista.
Sem dúvida, a Notificação dos Resultados é o momento mais importante da
ADI, pois é onde o professor é chamado para a entrevista e auto avaliação. A Comissão,
depois de analisar o PGDI do professor e também seu Termo de Avaliação vai
questionar com o docente se ele merece a nota que se deu. Este é considerado um
momento muito rico pra ambas as partes. Para o professor por ter a oportunidade, entre
outras coisas, de rever a sua prática e também de expor angústias e necessidades quanto
á sua condição de trabalho; para o gestor e a comissão por poder ajudar esse professor a
se encontrar na sua prática ou até mesmo encaminhá-lo para um curso de capacitação,
entre outras providências.
Ao observar o cotidiano da escola, percebemos que há um mal estar muito
grande em relação á ADI na escola. Muitos professores, conversando entre si nos
intervalos das aulas, questionavam e criticavam essa avaliação. Em um trecho da
entrevista com um professor ele diz: “a ADI pra mim sempre foi um processo tranquilo
dentro do cotidiano escolar. Mais uma exigência do estado que devemos cumprir.
Quanto à relação entre avaliador e avaliado, no geral, na escola, percebo que é tensa,
para mim normal” (professora A). O mesmo professor comentou que apesar de todos os
docentes saberem que essa é uma exigência do Estado, ainda assim ela interfere no
relacionamento entre os colegas de trabalho deixando o clima tenso.
Neste sentido Foucault (1984) apud Bertoldo (2012) diz que as formas de
poder exercidas sobre a vida cotidiana imediata, classificam os indivíduos em
categorias, os designa pela sua individualidade própria, liga-os a sua identidade, impõe-
lhes uma lei de verdade que é necessário reconhecer e que os outros devem reconhecer
neles. É uma forma de poder que transforma os indivíduos em sujeitos.
É interessante perceber como também os próprios professores acabam se
contradizendo, é como se não tivessem uma opinião sólida formada a respeito da ADI,
pois, a mesma professora que a principio diz não se importar com a avaliação,
posteriormente comentou: “Sobre essa relação de poder, percebo uma vontade de
aparecer (no caso dos membros da comissão da ADI) acho que o objetivo é mostrar
que tem a vida profissional dos colegas nas mãos...bobagem..., mas esta é a minha
visão... porém nunca me preocupei com notas e tal, levo numa boa”(professora A).
Há professores que consideram a ADI como um ponto positivo no ambiente
escolar e acreditam que com ela a escola só tem a ganhar. Em relação à Avaliação de
858

Desempenho Individual no cotidiano escolar uma professora comentou: “A avaliação


de desempenho é muito importante[...]Por meio dessa avaliação a escola verifica quais
são as necessidades de capacitação do professor[...]Além disso, possibilita à escola
verificar quais recursos estão sendo utilizados, bem como quais equipamentos estão em
falta”(professora B).
As opiniões diferentes no que diz respeito a ADI já é uma clara evidencia de
que a mesma interfere na relação dos sujeitos no ambiente escolar. Para Castro (2009)
apud Bertoldo (2012) se pensarmos essa questão a partir de uma “história do sujeito”,
algo muito defendido por Foucault, os sujeitos, em meio a tantas imposições não
aparecem mais “como instâncias de fundação, mas como efeitos de uma constituição”.
Para Foucault (2009) apud Carminatti e Borges (2012) medir
quantitativamente e hierarquizar capacidades de forma a dar valor, utilizando o exame
como fundamento de uma educação, cujo poder exacerbado estabiliza os sujeitos em
“corpos dóceis”, por muito tempo sustentou a educação moderna (FOUCAULT, 2009)
apud CARMINATTI e BORGES, 2012 P.13).

4. Possibilidades e Limites Enfrentados pelo Gestor e Professores diante da


Avaliação de Desempenho Individual

A aplicação da ADI engendra diferentes posturas a respeito da mesma no


cotidiano escolar e coloca o gestor que é o responsável por realizar a avaliação na escola
em situações, algumas vezes, constrangedoras. Há professores que ficam revoltados
com a ADI, por considerarem que ela foi implantada somente para vigia-los e puni-los.
E cabe ao gestor realizar a avaliação de modo a equilibrar essas opiniões sem
desrespeitar a nenhum docente. Para tanto, a gestora acredita que é preciso fazer a
avaliação buscando ser o mais justo e imparcial possível, escutar o ponto de vista dos
diferentes membros da Comissão e ainda levar em consideração as subjetividades e
necessidades pessoais e profissionais do profissional que esta sendo avaliado.
A afirmação da gestora vai ao encontro ao que afirma Alves (2006), sobre a
Avaliação de Desempenho Individual (ADI), que é composta por critérios de
julgamento, com caráter avaliativo e punitivo. Esta avaliação considera, entre outros, a
produtividade no trabalho, iniciativa, aproveitamento em programas de capacitação,
pontualidade e assiduidade.
859

Ainda segundo Alves (2006) ao avaliar essa política, pode-se destacar como
ponto positivo o fato de não ser apenas um sistema de bonificação, mas de progressão
funcional. Todavia, como indica a mesma autora, esse sistema pode prejudicar direitos
adquiridos pelos servidores, ao ser substituído o tempo de serviço pelo desempenho
individual para o cálculo dos adicionais. A autora ressalta ainda que a avaliação por
pares tem fragilidades, tais como: interferências pessoais e de amizade.
E ainda, segundo a gestora, o processo de avaliação de desempenho se bem
conduzido se torna um motivador. “Penso que deveríamos ter maior tempo para sentar
com o avaliado, conversar com ele sobre suas ações, expor as ideias da Comissão e
associar seu trabalho aos resultados das avaliações internas e externas dos alunos”.
Assim, a gestora e a comissão teriam melhores resultados com relação à avaliação. Mas,
como os prazos são curtos e o trabalho de avaliar, preencher os formulários, reunir
comissão, transcrever para o computador, gerar os dados, enfim, como os prazos de
tanta ação (muitas vezes burocráticas) são bastante curtos e se acumulam ao trabalho já
realizado, não conseguem cumprir com o verdadeiro papel de avaliar para melhorar.
Isso porque não há nenhum bônus salarial à comissão de avaliação, para que ela realize
esse trabalho, mas sim, ela se torna mais um serviço realizado gratuitamente ao Estado,
e que se acumula a tudo o mais que cada um dos profissionais envolvidos já faz em seu
dia a dia.
A gestora, ao ser questionada sobre sua percepção ou crença na influência da
ADI no cotidiano escolar afirmou que, devido ao zelo que grande parte dos colegas de
trabalho tem com suas carreiras, não querem ter uma nota ruim nem ser oscilante no
desenvolvimento dos trabalhos. Para ela, se bem direcionada, a avaliação mesmo que
polêmica algumas vezes, pode gerar bons frutos para a comunidade escolar e vir a se
tornar um instrumento motivador, pois os profissionais da educação já enfrentam
problemas demais no seu dia a dia e não precisam que esse meio que o Estado cria para
vigiar os trabalhadores, se concretize como mais um monstro “Temos é que nos
informarmos e não nos deixarmos abater, nem nos desunirmos”(gestora).
860

5. Considerações Finais

As avaliações externas direcionadas aos alunos ou docentes, são


fundamentadas, a serviço de um sistema de classificação, que com o discurso de
melhorar a qualidade da educação, muitas vezes as usa para aplicar sanções e dar
gratificações, dizer quem é ou não apto, capaz, autônomo o suficiente para exercer
determinada função na sociedade.
A pesquisa mostrou que o cotidiano dos sujeitos da escola é caracterizado pela
necessidade dos resultados de avaliações e suas metas e isso tem provocado mudanças
tanto na convivência quanto nas condições de trabalho desses sujeitos. A ADI tem
agradado e desagradado a muitos.
Por meio da observação realizada no cotidiano da escola pesquisada e das
entrevistas realizadas junto à gestora e as duas professoras, afirmamos que mesmo
sendo difícil para alguns assumirem, a ADI interfere nas relações dos profissionais que
se sentem vigiados a todo o momento e propensos a sofrer sanções, caso seu
desempenho não agrade ao avaliador, que ninguém mais é do que a gestora da escola e
seus pares.
Percebemos que o fato de a gestora da escola ser a avaliadora, engendra uma
postura de mudança por parte dos professores em relação a ela, isso porque uma
profissional que deveria ser vista como uma colaboradora no desenvolvimento do
trabalho docente passa a ser vista como um vigia, uma autoridade a serviço do Estado.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, Ana Carolina Timo. As reformas em Minas Gerais: choque de gestão,


avaliação de desempenho e alterações no trabalho docente. In: VI Seminário da Rede
latino americana sobre trabalho docente, 2006, Rio de Janeiro. Anais VI Seminário da
Redestrado, 2006.

AUGUSTO, Maria Helena. Regulação educativa e trabalho docente em Minas Gerais: a


obrigação de resultados. Educação e Pesquisa (USP. Impresso), v. 38, p. 695-709,
2012.

BARBOSA, Liliane C. de M. Barbosa; Fraga VIEIRA, Lívia. Avaliações Externas


Estaduais: Possíveis implicações para o trabalho docente. Revista e-curriculum,
vol.11, nº2, agosto,2013, pp.409-433. Pontifica Universidade Católica de São Paulo.
São Paulo, Brasil.
861

BERTOLDO, Fernanda. A avaliação como dispositivo de subjetivação. In: IX


Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul - IX ANPED SUL, 2012, Caxias
do Sul. A Pós-graduação e suas interlocuções com a Educação Básica. Caxias do Sul:
Upplay, 2012.

CARMINATTI, Soares Simone Haas.; BORGES, Martha Kaschny. Perspectivas da


avaliação da aprendizagem na contemporaneidade. Estudos em Avaliação
Educacional (Impresso), 2012.

CASTRO, Edgardo. Vocabulário de Foucault: Um percurso pelos seus temas,


conceitos e autores. Traduzido Ingrid Müller Xavier. Belo Horizonte: Autêntica
Editora,2009.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução Raquel


Ramalhete. 36. ed. Petrópolis: Vozes, 2009.

LUDKE, Menga; ANDRÉ, Marli. E. D. A Pesquisa em educação: abordagens


qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

MINAS GERAIS. Manual da Avaliação de Desempenho Individual – ADI dos


servidores da secretaria de Estado de Educação. DDGA/SRH/SEEMG. 2004.

MINAS GERAIS. Lei Complementar nº 71, de 30 de julho de 2003. Institui a


avaliação periódica de desempenho individual, disciplina a perda de cargo público por
insuficiência de desempenho e dá outras providências. Belo Horizonte, 2003.
862

Comunicação

Gestão de cursos à distância

Margarete Bertolo Boccia


PPGE- UNINOVE

Resumo: O texto apresenta os resultados de uma pesquisa realizada com professores de


um curso de Pedagogia oferecido na modalidade à distância e apresenta de modo focado
o papel da gestão de cursos nessa modalidade. A pesquisa bibliográfica sobre gestão em
EAD demonstrou que as referências ainda são muito pautadas pela perspectiva
empresarial e nosso olhar será mais pedagógico, visando demonstrar a importância de
um gestor conhecer além da estrutura do curso, os seus alunos, as necessidades dos
professores de modo a construir um plano de gestão e atuação que possibilite a
transposição de barreiras. O instrumento utilizado foi um questionário com três
perguntas, respondido por trinta e sete professores e analisado a partir de cinco
categorias/ campos: conceitual, pedagógico, comunicação e linguagem, metodológico e
técnico.
Palavras-chave: Gestão, Desafios, EAD.

INTRODUÇÃO

Os cursos superiores de graduação oferecidos na modalidade EAD, tem


apresentado significativo aumento do número de matriculas de alunos a cada ano,
segundo dados do Censo EAD BR: Relatório analítico da aprendizagem a Distância no
Brasil 2012, as matrículas em disciplinas de EAD no ano de 2012 (ano do levantamento
de dados do censo), aumentaram 52,5% em relação a 2011. Sendo que, a maior
concentração de cursos “é no nível superior de pós-graduação (53%), em especial no
latu sensu de especialização (44%), e de graduação (26% do total), sendo a maioria dos
cursos concentrada em licenciatura (50%) (ABED, 2013, p. 20)”. Já as conclusões dos
cursos estão concentradas nos cursos de graduação, com 62% de alunos concluintes do
total, divididos entre os cursos tecnológicos – 42,3% e licenciaturas – 42,1% das
conclusões. Esses dados nos indicam a necessidade de um olhar mais atento sobre esses
cursos, principalmente, cursos de licenciatura e sua gestão.
863

Ainda já em dados anteriores, segundo Gatti (2009) no estudo sobre os


professores do Brasil seus impasses e desafios, as licenciaturas ganharam fôlego e um
aumento do número de alunos matriculados,

De acordo com o Censo da Educação Superior de 2006, quando se


examinam os cursos de licenciatura a distância oferecidos nas
diferentes áreas, constata-se que metade deles era de Licenciatura I,
abrangendo os cursos de Pedagogia, normal superior e outros
(GATTI, 2009, p.108).

O texto foi estruturado e organizado para atender a dois grandes objetivos: o


primeiro apresentar os resultados da pesquisa de opinião realizada com trinta e seis
professores de um curso de Pedagogia oferecido na modalidade à distância, por meio de
um questionário que pediu que os professores indicassem quais foram os seus desafios
ao assumirem turmas na modalidade EAD. A segunda pergunta indicava que passado o
tempo, quais desses desafios já tinham sido superados? E, como ocorreu a superação. E,
ainda quais novos desafios surgiram e que ainda precisavam ser superados?
A análise dos dados nos possibilitou a categorização das respostas em cinco
campos: campo conceitual, campo pedagógico, campo da comunicação e linguagem,
campo metodológico e campo técnico.
E, o segundo objetivo de discutir o papel da gestão de cursos nessa modalidade,
pois a pesquisa bibliográfica realizada sobre gestão de cursos em EAD demonstrou que
as referências sobre o tema e as discussões, ainda são muito pautadas pela perspectiva
empresarial, distanciando-se do nosso olhar que é mais pedagógico, visando demonstrar
a importância de um gestor conhecer além da estrutura do curso e de seus alunos; as
necessidades dos professores atuantes no curso de modo a construir um plano de gestão
e atuação que possibilite a transposição de barreiras.
A gestão de cursos oferecidos na modalidade EAD apresenta novos e
importantes elementos a serem considerados no desempenho gestionário e no papel a
ser assumido por esse gestor.
Em texto anteriormente publicado1sobre os desafios da gestão de um curso em
EAD duas frentes desafiadoras da gestão do curso foram destacadas: a primeira sob a
perspectiva da estruturação prévia do curso, produção de material, sua importância, os

1
Os desafios da gestão de um curso de Pedagogia na modalidade à distância, no I Seminário nacional de
Política e gestão da Educação do Grupo de Pesquisa em Avaliação, Política, gestão e Organização da
Educação (APOGEU), da Universidade federal de Itabaiana – Sergipe, 2011. Publicado com a professora
Elaine de Oliveira Carvalho Moral Queiroz.
864

caminhos necessários, para a realização dos comitês de educação a distância,


estruturação do ambiente virtual de aprendizagem, escolha de objetos virtuais, os
prazos, a antecipação, ou seja, a gestão de tempos e espaços a partir de cronogramas,
calendários, entre outros, como fatores preponderantes para o sucesso, ou melhor
colocado, as possibilidades de bom desenvolvimento do curso.
E, a outra sob a perspectiva de acompanhamento e desenvolvimento do curso,
com a atribuição de aulas, considerado a aderência (formação e experiência) e, interesse
dos professores pela modalidade em questão. Gerenciamento das dificuldades dos
alunos no uso da ferramenta – plataforma de estudos e o acompanhamento dos
professores. E, é exatamente nessa perspectiva que se enquadra a pesquisa sobre os
desafios da atuação docente. Visando identificar quais seriam os desafios vivenciados
por eles de modo a possibilitar a intervenção do gestor e assim tentar resolver os
problemas indicados ou dar os encaminhamentos necessários.

GESTÃO DE CURSOS EM EAD

A pesquisa bibliográfica2 sobre o tema seja em livros, mas principalmente em


publicações de artigos em seminários, congressos, encontros e simpósios sobre o tema
indicam que são poucos os estudos sobre a gestão de cursos à distância e quando esses
são encontrados estão pautados em pressupostos empresariais.
Segundo Tavares e Gonçalves (2012), além a constatação da vinculação com a
perspectiva empresarial, os demais trabalhos restantes, poucos por sinal, versam sobre
os cursos oferecidos pela Universidade aberta do Brasil (UAB).

No Brasil há um reduzido número de estudos sobre a gestão da EAD.


Este número se restringe a trabalhos sobre a gestão em EAD na UAB,
cabe ressaltar que de acordo com o MEC, o número de matrículas é
maior nas instituições privadas (2012, p.06).

Indicando assim, um novo complicador e a ampliação da necessidade de se


refletir sobre os cursos ofertados em instituições privadas. Reforçando assim a
relevância da temática abordada.

2
Site da ABED (associação Brasileira de Educação à Distância), Congressos da ABED, Simpósio
Internacional de Educação a Distância. ENPED – Encontro de pesquisadores em Educação à distância.
Universidade Federal de São Carlos UFSCar (2012). Repositório da UFSJ. Colóquio Internacional sobre
Gestón Universitaria em América del Sur. Mar del Plata (2010). Entre outros.
865

Dos elementos gestionários identificados, a gestão de pessoas é a que mais se


aproxima do viés pedagógico que nos direciona, segundo Garbin e Dainese (2010)

Na modalidade de educação à distância os processos de gestão devem


oferecer a possibilidade da relação entre os recursos tecnológicos e os
recursos humanos para que o processo de aprendizagem possa ocorrer
de forma facilitada (p.1).

E, ainda complementando Tavares e Gonçalves (2012), “uma das características


primordiais ao gestor em EAD é a gestão de pessoas (p.7)”, compreendida como a
possibilidade de facilitar e orientar os processos desencadeados pelas relações na EAD,
pois por “trabalhar com o capital intelectual”, ganha destaque as ações de planejamento
integrado, colaborativo, compartilhado e democrático.
Demarcando assim, a necessidade do acompanhamento da atuação docente,
visando identificar quais são as necessidades reais deles de modo a propor um plano de
gestão e ação gestora que possibilite a transposição de barreiras, tal como a própria
modalidade se propõe (transpor as barreiras de distância, acesso, tempo, locomoção em
grandes cidades), de modo a valorizar os recursos humanos, ou seja, os professores e
suas intervenções pedagógicas.

APRESENTANDO O CURSO E OS PROFESSORES

O curso de Pedagogia na modalidade EAD no qual foi realizada a pesquisa com


os professores foi implantado no ano de 2011, no início do 2º semestre letivo, com três
turmas (duas turmas de agosto e uma turma de outubro), 146 alunos.
Ao longo dos seis semestres de duração do curso foi possível constatar um
acentuado aumento do número de alunos matriculados, correspondendo a 1.003,42%,
conforme o gráfico abaixo demonstra:
866

Pedagogia 100% EAD


1800
1611
1600
1387
1400 1299
1200
1000
800 726
Pedagogia 100% EAD
600 484
400
200 146

0
2º Sem 1º Sem 2º Sem 1º Sem 2º Sem 1º Sem
2011/3 2012/8 2012/15 2013/30 2013/45 2014/54
turmas turmas turmas turmas turmas turmas

(gráfico 1)

Para que pudéssemos conhecer nossos alunos, suas expectativas e possíveis


perspectivas, produzimos uma pesquisa sobre os motivos de escolha do curso, se
identificou que os alunos em sua maioria escolheram o curso por representar uma
possibilidade de continuidade de seus estudos, alguns ingressantes já eram professores
formados em outras licenciaturas, outros egressos do curso magistério secundário com
interesse na complementação de sua formação. Muitos alunos indicaram serem donas de
casa e que deixaram os estudos devido aos filhos, outros indicaram a ausência de tempo
para cursarem os cursos presenciais regulares e ainda, poucos indicaram o interesse em
promoções, ascensão na carreira e financeira. O valor das mensalidades (menores que o
curso presencial), também representou motivo pela escolha.
Pelas respostas apresentadas pelos alunos foi possível identificar que os alunos
em sua maioria não conheciam as vantagens ou desvantagens relacionadas à modalidade
escolhida, não valorizando o uso da tecnologia como mediadora do ensino e das
relações.
Já na perspectiva dos professores, o curso iniciou com a atuação de nove
professores e com o acréscimo das turmas esse número também aumentou, chegando a
quase totalidade do número de professores que atuam na modalidade presencial
também, e ainda com cinco professores do departamento, mas exatamente do curso que
trabalham permanentemente no curso.
867

100

90

80

70
2º Sem 2011/professores
60 1º Sem 2012/professores

50 2º Sem 2012/professores
87 1º Sem 2013/professores
40
71 2º Sem 2013/proessores
30
1º Sem 2014/professores
20 43
34
10 20
9
0
Pedagogia 100% EAD

(gráfico 2)
A PESQUISA

Temos a compreensão que buscarmos a aproximação dos professores e assim,


conhece-los de modo mais apurado/ melhor facilita a ação gestora. Pautados nessa
concepção foi que propusemos a pesquisa que ora será apresentada, composta de três
perguntas tal como segue:
1- Indique quais foram os seus desafios ao assumir sua (s) turma(s) em EAD.
2- Passado o tempo, quais desses desafios já foram superados? Como?
3- Quais novos desafios surgiram e que ainda precisam ser superados?
Com o objetivo de identificar quais os desafios que ainda persistiam na atuação
dos professores que precisavam de um olhar atento e propostas de intervenção.
Tivemos quarenta professores respondentes, mas três foram descartados, pois
não traziam respostas significativas apenas sim ou não, restando trinta e sete
respondentes da pesquisa para análise. Destaca-se que essa pesquisa foi realizada no
primeiro semestre de 2013, época em que o curso contava com quarenta e três
professores alocados.
Os dados brutos obtidos a partir das respostas dos professores foram divididos
em cinco grupos: campo conceitual, campo pedagógico, campo da
linguagem/comunicação, campo técnico e metodológico.
868

No quadro abaixo podemos identificar quais foram os desafios indicados pelos


professores:

Campo Descrição Quant. de


respostas
Campo conceitual Novo paradigma 02
Campo pedagógico Possibilidades de interação/mediação 05
Promover fóruns de debate que estimulassem o grupo 04
a participar e opinar
Estimular/ motivar o aluno 04
Mediação 05
Pensar metodologicamente 03
Auxiliar o aluno “via” contato virtual 03
Campo da comunicação/ Comunicação e linguagem 06
linguagem Diálogo com o aluno 04
Clareza e objetividade nas propostas 04
Campo metodológico Pensar metodologicamente como propor discussões 03
Encontro virtual 05
Quantidade dos fóruns 04
Maior exigência na elaboração das atividades 01
Frequência e acompanhamento das atividades 01
Autodisciplina 02
Campo técnico Uso da ferramenta 08
Organização do tempo 09
Planejamento/ cronograma 08
(tabela 01)

Analisando a tabela, o que consideramos como campo conceitual – a necessidade


de compreensão de um novo paradigma, apesar de serem apenas dois professores,
demonstra ainda a necessidade de discussões e reflexões sobre a temática de modo a
chegarmos à sua superação, pois quando da pergunta sobre os desafios superados,
apenas um desses professores indicou a temática em sua resposta, e ainda como o inicio
do processo, a partir da busca e matrícula em um curso de pós exatamente com esse
foco.
Os gráficos abaixo demonstram os desafios conforme os campos delimitados:
869

auxiliar o aluno campo pedagógico


"via" contato
possibilidades de
virtual
interação/mediaçã
12%
o
21%
pensar
metodogicamente
12%

promover
fóruns de
mediação debate
21% 17%
estimular/
motivar o
aluno
17%

(gráfico 3)
A análise do campo pedagógico nos permite afirmar que os desafios estão bem
distribuídos entre as possibilidades de intervenção mediação, preocupação com a
motivação do aluno para a participação em fóruns e o pensar metodológico do
professor.
Já no campo da comunicação e da linguagem além de identificarmos que existe
uma concentração no desafio do diálogo com o aluno, podemos indicar que as duas
outras respostas indicadas clareza e a linguagem quando superadas também auxiliarão
na superação do desafio do diálogo. A partir dessa constatação.
A ação gestora foi da proposição de um curso sobre aprendizagem colaborativa
que visou a realização da construção de trabalhos coletivos que visavam a afinação da
fala, da escuta e da interação. Em nova pesquisa certamente esses dados estarão
alterados.
870

campo da comunicação e da linguagem


comunicação/lingu
agem
28%
clareza e
objetividade nas
propostas
22%

diálogo com o
aluno
50%

(gráfico 4)
Assim, como no campo da comunicação e da linguagem, o campo metodológico
apresenta forte destaque para o desafio da organização do tempo com 41% das
respostas. Podemos afirmar que esse também foi um desafio bastante citado pelos
alunos, cujos dados foram apresentados em outro estudo3.
O oferecimento de um novo cronograma, como sugestão de organização das
atividades e ações poderá facilitar e amenizar esse índice.
Quanto aos demais desafios indicados podemos inferir que o item maior
exigência na elaboração das atividades, demonstra um processo de reflexão dos
professores sobre suas ações e práticas, possibilitando o despertar de mudanças
significativas em vista da melhoria da qualidade do curso nas questões metodológicas.

3
Estudo Individual – um desafio aos alunos do curso de Pedagogia na modalidade EaD, apresentando no
IX Colóquio de Pesquisa Sobre Instituições Escolares, 2013. Publicado em Anais com as professoras
Andreza Gessi Trova, Andreia Cristina Leite e Elaine de Oliveira Carvalho Moral Queiroz.
871

campo metodológico
autodisciplina
frequencia/ 13%
acompanhamento
das atividades
6%
maior exigência na
elaboração de encontro virtual
atividades 31%
6%

quantidade de
fóruns propor discussões
25% 19%

(gráfico 5)

No campo técnico o uso da ferramenta compreende 32% dos desafios indicados


demonstrando a necessidade de investimento em novas formações com característica
prática de utilização do ambiente virtual de aprendizagem com que trabalham, mas
atuando na perspectiva de alunos.
Já a organização do tempo é o maior desafio indicado pelos professores com
36% das respostas. Podemos ainda indicar que o item cronograma, apesar de ser
apresentado em separado, poderia ainda ser agrupado com o item organização do tempo
e assim compreenderia um total 68 % das respostas indicando que no curso na
modalidade EAD, aquilo que é marcadamente considerado um fator de vantagem aos
seus alunos e professores, que seria a flexibilização do tempo, também caracteriza-se
em um dos maiores desafios a serem suplantados.
872

campo técnico

uso da
cronograma ferramenta
32% 32%

organização do
tempo
36%

(gráfico 6)
No quadro abaixo identificamos as respostas dadas pelos professores, no tocante
à superação de alguns desses desafios indicados nas respostas à segunda pergunta:

Campo Desafio superado Quant. De


respostas
Campo conceitual Novo paradigma 01
Campo pedagógico Possibilidades de interação/mediação 02
Promover fóruns de debate que estimulassem o grupo 02
a participar e opinar
Estimular/ motivar o aluno 02
Mediação 05
Auxiliar o aluno “via” contato virtual 02
Campo da comunicação/ Comunicação e linguagem 03
linguagem Diálogo com o aluno 03
Clareza e objetividade nas propostas 02
Campo metodológico Pensar metodologicamente como propor discussões 03
Encontro virtual 02
Quantidade dos fóruns 02
Maior exigência na elaboração das atividades 01
Frequência e acompanhamento das atividades 01
Autodisciplina 01
Campo técnico Uso da ferramenta 04
Organização do tempo 04
Planejamento/ cronograma 04
(tabela 02)

Quanto à terceira pergunta, ressaltamos que não foram todos os professores que
responderam à pergunta, os que o fizeram apresentam respostas bem variadas e que
caracterizam uma preocupação relacionada à metodologia e desenvolvimento das aulas,
tais como: plágios nas produções dos alunos; falta de etiqueta no EAD – NETIQUETA
873

- um conceito novo relacionado à ferramenta e à modalidade de ensino, forma de


avaliação, aumento da exigência nos fóruns, entre outros.

FINALIZANDO.....

Mais do finalizar, nos propomos a apresentar os pontos que ainda merecem a


ampliação de nossas reflexões.
Atualmente vivemos e convivemos com a era da globalização, a educação a
distância vem ganhando cada vez mais espaço em cursos de formação superior.
Esse tipo de ensino tem ganhado a preferência dos alunos, por conta de vários
fatores, como por exemplo, vida profissional, administração de tempo, distâncias,
deslocamentos, dentre outros; tem como característica primeira o contato virtual com
seu professor/tutor, sendo raras as oportunidades de um contato real; por conseguinte,
apontamos a importância de haver, tanto por parte do professor, quanto por parte da
instituição, uma boa organização e para isso, o gestor torna-se uma figura importante
nesta relação.
Os dados da pesquisa demonstraram que são muitos os desafios ainda enfrentados
pelos professores, desde a apropriação da nova concepção de ensino em que estão
inseridos até questões de ordem prática e técnica de utilização das ferramentas – estas
de modo polarizado e com uma centralidade expressiva às questões de ordem
metodológica e pedagógica, considerados por nós satisfatório da perspectiva da
qualidade (boa qualidade do curso).
Demonstra também, a importância do papel do gestor diante das possibilidades
de superação desses desafios elencados, pois com um plano de ação estruturado com
cursos, reuniões, discussões (virtuais e presenciais), com possibilidade de socialização
das formas de realização dessas ações. Momentos de reflexão e articulação teoria e
prática, não só auxiliará aos professores como facilitará o trabalho de todos.

REFERÊNCIAS:
ABED, Censo EAD Brasil: Relatório da Aprendizagem a Distância no Brasil, 2012.
ABED – Associação Brasileia de Educação a Distância, Curitiba: Ibpex, 2013.

GARBIN, Tania R., DAINESE, Carlos, A. Complexidade da gestão em EAD.


Congresso ABED, 2010.
874

GATTI, Bernardete A. (coord). Professores do Brasil: impasses e desafios. Organização


das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura. UNESCO, Brasília, 2009.

MILL, BRITO, SILVA & ALMEIDA. Gestão da educação a distância (EaD): Noções
sobre planejamento, organização, direção e controle da EaD. Em
htt//www.ufsj.edu.br/portale-repositório.

MOREIRA, SAFANELLI, CARDOSO & BATTISTI. Gestão Acadêmica na Educação


a distância: Desafios e Práticas. X Colóquio Internacional sobre Gestón Universitaria
em América del Sur. Mar del Plata, 2010.

TAVARES, Valquiria de L. , GONÇALVES, André L. Gestão da EAD no Brasil:


Desafio ou oportunidade? SIED – simpósio internacional de educação a distância.
EnPED – encontro de pesquisadores em educação a distância. Universidade Federal de
São Carlos – UFSCar, 2012.
875

Comunicação

A democratização da gestão nas instituições de educação infantil: a participação


das famílias no conselho de escola

Maria Aparecida Guedes Monção


FEUSP

Resumo: O objetivo deste artigo é apresentar a análise da participação das famílias no


conselho de um Centro de educação infantil (CEI) da rede Municipal de São Paulo, que
atende crianças de 0 a 4 anos. Os dados apresentados fazem parte de uma pesquisa de
doutorado cujo o objetivo geral é analisar a interação entre família e educadores em um
CEI, com vistas a identificar a especificidade da administração educacional nesse
segmento. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, realizada por meio de um estudo de
caso de cunho etnográfico. Os procedimentos conjugaram a observação participante, a
entrevista semiestruturada e a análise documental. Os resultados desta pesquisa,
evidenciam que a participação das famílias no conselho é pequena, resultando
especialmente das dificuldades de comunicação entre educadores e famílias e pela
ausência de uma política pública de âmbito municipal para potencializar os conselhos,
bem como promover a formação dos conselheiros.
Palavras-chaves: Gestão democrática - Conselho de escola - Educação infantil

Introdução
A gestão democrática figura desde 1988 como um princípio de nossa educação
nacional, expresso na Constituição Brasileira. Alicerçada pelos princípios da
descentralização, autonomia e participação, a gestão democrática possibilita aos sujeitos
envolvidos diretamente na educação definir os rumos do projeto político pedagógico e
das políticas públicas educacionais, de modo a garantir transparência e exercer o
controle social sobre o Estado. Nesse sentido, os conselhos de escola surgem e
legitimam-se legalmente como um instrumento potencial para esse processo de
democratização.
Sobre os conselhos de escola, Cileda Perrella (2012, p. 103) considera:

Distante de ser a panaceia para resolver os problemas de gestão da escola,


uma vez que essa possui imbricações com condicionantes externos a ela,
876

pautados pela organização de um sistema de ensino verticalizado e


autoritário, construído à sombra do sistema capitalista de produção, o
conselho de escola, embora não seja o único instrumento para a
democratização da gestão escolar, também se firmou como um importante
espaço de tomada de decisão, de informação e também de explicitação de
conflitos, num processo que promove o exercício da democracia e revela
diferentes incoerências e contradições, também presentes nos demais espaços
escolares em que o caráter público da escola parece perder sua relevância e
especificidade.

A participação das famílias, nesse colegiado é um elemento importante para


viabilizar debates, encaminhamentos e decisões sobre questões relacionadas a
organização da escola e a política pública educacional. Entretanto, apesar de seu
potencial para fortalecer a gestão democrática, os conselhos de escola não têm
conseguido atuar nessa direção, constituindo-se, muitas vezes, como mais um órgão
burocrático. (PARO, 1995; CAMARGO, 1997; ADRIÃO; PERONI, 2007; MARTINS;
SILVA, 2010; PERRELLA, 2012)
A constituição da gestão democrática nas instituições de educação infantil deve
ter como finalidade a promoção da integração entre cuidado e educação e o seu
compartilhamento entre educadores e famílias. O debate e encaminhamento de questões
relacionadas ao desenvolvimento do trabalho com a participação das famílias, fortalece
a dimensão coletiva do compartilhamento da educação das crianças e o reconhecimento
da especificidade da educação infantil.
Com o intuito de contribuir com os debates a respeito da gestão democrática na
educação infantil, esse texto versará sobre a participação das famílias no conselho a
partir dos dados de uma pesquisa de doutorado realizado no CEI Anália Franco1
buscando evidenciar dois aspectos: 1) a organizado do conselho e a visão das famílias e
professoras sobre sua função e 2) A participação das famílias nas reuniões de conselho.

O Conselho de Escola no CEI Anália Franco


No caso do CEI Anália Franco, é possível a partir da pesquisa realizada, afirmar
que o conselho tem uma configuração burocrática. As dificuldades de comunicação

1
Como já assinalamos no resumo esse texto trata de um excerto da pesquisa de doutorado “Gestão
Democrática na Educação infantil: o compartilhamento da educação da criança pequena” realizado no
CEI Anália Franco no município de São Paulo. Para a realização da pesquisa foram entrevistados 11
professoras, um professor, três coordenadoras pedagógicas, uma diretora, dois auxiliares técnicos de
Educação, um agente escolar, uma auxiliar de limpeza, uma auxiliar de cozinha, uma supervisora de
ensino e 18 famílias – sendo 17 mães e um pai, num total de 40 sujeitos. Os nomes do CEI e dos sujeitos
entrevistados são fictícios.
877

cotidiana e a visão negativa dos profissionais a respeito das famílias são elementos que
refletem na constituição dos conselhos e reforçam uma perspectiva pouco democrática.
Apesar da boa vontade da diretora Maria Vitória em não concentrar a
coordenação do conselho sob sua responsabilidade, contribuindo para que a presidência
fosse ocupada por outros membros, na prática o conselho ainda é espaço cujo
funcionamento e organização são conduzidos e determinados pelos profissionais do
CEI.
O caráter burocrático dos conselhos já é visualizado desde sua formação, na
eleição de seus representantes no início do ano letivo. Em 2010, a diretora promoveu
uma reunião geral no auditório do CEU e informou aos pais a necessidade da
colaboração das famílias para a composição do conselho de CEI e da APM2. Ao término
de sua fala, pediu que os pais que desejassem participar desses órgãos se manifestassem.
Os pais interessados inscreveram-se e, como o número de voluntários não excedeu ao
número de vagas desse segmento, os pais foram eleitos naquele momento.
No ano de 2011 mudou-se a estratégia, mas permaneceu o caráter normativo. Ao
realizar as primeiras reuniões de pais, as professoras recolheram os nomes dos pais que
desejavam participar desses órgãos e depois realizaram a primeira reunião do conselho
com os pais que se ofereceram a participar.
A eleição do segmento dos professores e da secretaria é interna, também sem a
realização de assembleias ou debates.
Muitas mães dizem não conhecer o conselho e lembram apenas quando tiveram
de participar do processo de referendo da diretora substituta, ou quando foram
informadas sobre a prestação de contas das festas. Ao se referirem ao papel do conselho,
atrelam-no à importância de realizar melhorias no CEI.
Pode-se inferir que tal visão é fruto das intervenções da diretora e das
professoras, que explicitam com muita ênfase a dimensão “instrumental” da
participação das famílias, ou seja, sua importância para resolver os problemas
estruturais e materiais do CEI, tais como: comprar ventilador para as salas, fazer
reparos, decidir sobre a proposta de compra de objetos necessários para a unidade.
O caráter instrumental e sua dissociação do trabalho com as crianças e seu papel
político também é perceptível no depoimento de Rosenilda, mãe de Otto e Enrico. Ela e

2
No CEI Anália Franco existe a Associação de Pais e Mestres (APM), mas, em função de seu caráter
meramente burocrático, só consegui observar uma reunião que foi dedicada a prestação de contas e
assinatura de documentos. Por esse motivo, muitas vezes as reuniões da APM nem ocorriam, as
assinaturas eram colhidas nos momentos de entrada ou saída das crianças.
878

o marido, José, são muito atuantes no CEI, participam das reuniões, comunicam-se
constantemente com as professoras e acompanham cotidianamente o desenvolvimento
dos filhos. Contudo, na entrevista, Rosenilda afirmou que é importante a participação
dos pais no CEI, mas, ao falar do conselho, informa que não participa nem conhece.
Reconhece que não se interessa por esse tema e, apesar de considerá-lo importante,
acaba por participar apenas das questões que se relacionam diretamente aos seus filhos:
“Tenho interesse pelo meu filho, não pelo conselho.”
O desconhecimento das famílias sobre o papel do conselho enfraquece seu
potencial de contribuir para a garantia do compartilhamento da educação da criança
pequena no âmbito coletivo, delineando novas formas de conceber a infância.
Enfraquece também o caráter de instrumento de pressão para o Estado assumir e
efetivar um atendimento de qualidade.
Outro dado importante é que, das 18 famílias entrevistadas, 6 eram ou já foram
membros do conselho. Cassiana, mãe de Ramon, relata que entrou no conselho em 2010
e participou de algumas reuniões, mas afirma que não sabe nada sobre ele, e diz: “Fico
de olho fechado com a direção da Maria Vitória, confio.” Ela acha que o conselho é
importante para a melhoria do CEI e para participar só é válido se o pai “tiver a mesma
mente que a Maria Vitória”. Denise, mãe de Gabriele, informa que é do conselho, mas
nunca participou das reuniões.
O depoimento dessas duas mães evidencia uma percepção de que o conselho é
da diretora e as famílias entram para colaborar, mesmo que seja apenas com o nome,
como no caso de Denise. Isso pode ser reflexo da forma como é encaminhada a eleição,
que, desprovida de reflexão, não possibilita visualizar o significado do conselho e sua
importância para a educação das crianças. Tanto as professoras quanto a equipe de
gestão abordam a temática da participação das famílias no conselho como algo
necessário, uma obrigação das famílias, e não atentam para o caráter processual da
participação, que requer tempo e aprendizagens, onde se aprende a participar,
participando.
Rosail, Gilberto, Nilva e Verena são familiares que participam ativamente das
reuniões do conselho e, ao serem indagados sobre as aprendizagens dessa participação,
Verena diz que aprendeu que os pais também podem decidir sobre questões do CEI, não
apenas a diretora, relatando que sua visão sobre esse espaço de participação foi sendo
construída ao longo de sua vivência nas reuniões; Gilberto, presidente do conselho,
entende que a participação nesse órgão deliberativo é importante, pois possibilita saber
879

o que está acontecendo no CEI. Sua experiência ao longo de 2011 permitiu constatar a
ocorrência de vários problemas internos, entre professoras e equipe de gestão, que não
imaginava existirem. Segundo sua visão, é fundamental que haja um trabalho coletivo
para garantir a qualidade do atendimento. Acrescenta que sua participação trouxe-lhe
também aprendizagens que repercutiram em sua família, pois “você acaba aprendendo
com o que as professoras falam, o que falam da gestão, de valores, do cronograma
deles, então às vezes você tenta levar pra casa.”
Gilberto relatou que ele e Rosail, sua esposa – que participou do conselho e
atualmente é da APM −, tinham dificuldades para organizar e controlar o orçamento
doméstico, não sabiam quais contas já haviam sido pagas ou não durante o mês e, por
isso, na maioria das vezes gastavam mais do que ganhavam. Ver as planilhas de gasto
apresentadas pela diretora Maria Vitória nas reuniões despertou-lhes o interesse e sua
esposa fez um curso sobre finanças online, oferecido pela Fundação Bradesco. Isso
contribuiu para que fizessem o orçamento familiar e, nos dois últimos meses do ano, já
conseguissem organizar as finanças da família.
Esse depoimento comprova o caráter formativo da participação, ainda que
restrito a experiências individuais: mesmo com a intenção de apenas prestar contas dos
gastos da unidade, na interação, a experiência de analisar as planilhas propiciou a
Gilberto e Rosail estabelecer relação com a realidade familiar e modificá-la.
Rosail diz que aprendeu muito quando participou do conselho e destaca que o
grande diferencial de participar é poder tirar as dúvidas e conhecer mais os
profissionais. Mas alerta que também é difícil, pois, ao participar da eleição da
coordenadora pedagógica como representante do segmento de pais, envolveu-se demais
com a situação e “sofria muito”, pois “foi difícil essa parte de votar, de ter a
responsabilidade [...] todo mundo tem direito de votar, mas assim, seu voto tem um
peso, ainda mais como pai.”
Diante do desconhecimento das famílias com relação ao papel político do
conselho e de dificuldades próprias do processo democrático ao ter de escolher,
posicionar-se diante de situações conflituosas, faz-se necessária a promoção de fóruns
que fortaleçam as possibilidades das famílias de constituírem uma visão mais ampla
sobre o caráter do conselho, a fim de qualificar suas aprendizagens individuais e
coletivas.
Entretanto, não foi possível constatar ações para a potencialização da
participação das famílias, apesar de as professoras entrevistadas destacarem a
880

importância de sua ampliação.


O professor Jovino, que atuou como presidente do conselho em 2010, diz ter
ficado desapontado com a baixa participação das famílias:

Acho que me esforcei, eu falhei nesse sentido de não conseguir um


mecanismo para que os pais estivessem aqui, então me frustrei nesses pontos,
mas eu acho que, quando houveram as reuniões e alguns dos pais estavam
presentes, acho que foi produtivo, valeu a pena, acho que eles se
expressaram, [mas] poderia ser melhor.
Realmente, nas reuniões coordenadas por esse professor foi visível sua
preocupação em garantir a voz de todos os participantes, apesar de reforçar apenas o
caráter instrumental da participação das famílias.
Nas reuniões de conselho realizadas ao longo de 2010 e 2011, foi possível
observar que a participação dos pais é bem pequena, seja pelo número de pais presentes,
seja pelas suas manifestações durante as reuniões.
Os conflitos internos entre professoras e equipe de gestão, se intensificaram ao
longo de 2011 e repercutiram nas reuniões do conselho que foram realizadas em menor
escala do que em 2010. No mês de agosto de 2011, a professora Mirtes, presidente do
conselho, pediu exoneração e seu cargo foi assumido por Gilberto, pai de Jaime e Guto.
Ao entrevistar Mirtes – que também foi coordenadora do CEI por um período – e
perguntar o motivo da exoneração do cargo de presidente, ela informa que não aceitou a
pressão de uma parcela do grupo de professoras com relação a votar contra o referendo
de Maria Vitória para permanecer na direção da unidade. O depoimento de Mirtes
evidencia a intensidade dos conflitos entre a equipe de gestão e professoras3 e a
repercussão no funcionamento do conselho.
O depoimento da professora Doralice pode auxiliar na identificação de um dos
fatores que favorecem a baixa participação das famílias. Trata-se da visão de que as
famílias incomodam as professoras, especialmente no conselho:

Talvez a família seja perigosa para a comunidade escolar porque podem ser
tomadas decisões que os professores não concordam [...] não só aqui como
em diversos lugares que eu passei, como a escola particular [...] Por que às
vezes nós pensamos que algumas coisas são boas para a escola ou para...
mim... individualmente como pessoa ou como professora... E talvez os pais
não entendam dessa forma, talvez nem é tão bom pra criança, e o pai corre o
risco de votar numa outra questão, sei lá, decidir uma outra questão e o que é
interessante para o professor, pra mim individualmente como professor, ou

3
Para maiores detalhes a respeito dos conflitos internos no CEI consultar a tese: Gestão Democrática na
educação infantil: o compartilhamento da educação da criança pequena - capítulo 5 “Relações entre os
adultos no Cei Anália franco: tensões e contradições”.
881

coletivamente como professor [...] são interesses diferentes. Então eu vejo


que nós temos medo.

A professora Doralice exemplifica dizendo que todo ano as famílias são


consultadas a respeito do melhor horário de funcionamento da unidade, e que o
conselho decide sobre isso. A decisão sobre esse assunto relaciona-se diretamente com a
vida do professor, pois, caso haja alteração de horário por ser mais conveniente para a
população, isso pode afetar negativamente o professor que trabalha em outra escola.

Novamente, a lógica de garantir as necessidades de apenas um segmento é


apontada. Não há debate a respeito dos objetivos do CEI, do papel da instituição pública
e da necessidade de atentar para a necessidade das crianças, famílias e profissionais. A
precariedade dos investimentos no segmento da educação infantil, associada à cultura
autoritária com que a política de educação infantil é administrada, propiciam a criação
de uma ilusão segundo a qual é preciso escolher de “qual lado ficar”. Vence o segmento
mais forte, em uma batalha que nem sempre todos os que participam sabem que existe.

É interessante notar que o professor Jovino foi o único a expressar a


preocupação em representar as propostas do segmento dos professores no conselho; por
diversas vezes, observei situações em que a posição dele divergia da do grupo de
docentes, mas, ao votar como conselheiro, mantinha a posição do segmento que
representava.

Porém, tais questões não são responsabilidade apenas dos profissionais das
unidades, mas devem ser parte da política pública de Educação. De acordo com a
supervisora Melânia, o conselho de escola não tem sido uma questão priorizada pela
administração municipal, diferentemente de outros períodos em que os representantes
da administração, alinhados ao campo democrático e aos interesses da população,
investiram no fortalecimento desses órgãos. Em sua análise, há atualmente um
esvaziamento desta instância de participação e os professores participam devido à
pontuação para a evolução funcional, mas para as famílias não há vantagem nessa
participação.

A participação das famílias nas reuniões de conselho

A definição da pauta das reuniões do conselho do CEI Anália Franco é


centralizada no corpo docente e gestão, tendo pouca ou quase nenhuma interferência das
882

famílias. Tampouco há a cultura de discussão entre os diferentes segmentos antes das


reuniões de conselho, especialmente no segmento das famílias, o que poderia estimular
o pai ou mãe que participa do conselho a decidir e discutir as temáticas da pauta a partir
do ponto de vista do coletivo das famílias e não do ponto de vista individual do
conselheiro. O caráter normativo das reuniões revelava as dificuldades do
compartilhamento da educação da criança pequena nos embates entre as diferentes
formas de cuidar e educar a criança.

Nos trechos das reuniões que apresentarei a seguir, busco mostrar como a
relação de dominação das professoras para com as famílias se expressa no cotidiano do
conselho.

Um dos únicos momentos em que presenciei a intervenção dos pais no conselho


foi na reunião realizada no dia 27 de outubro de 2011, quando Gilberto, presidente do
conselho, relatou que foi procurado por outras famílias que desejavam saber o motivo
do alto índice de faltas de professores. Vejamos um excerto dessa reunião:

Gilberto diz: “Me perguntaram, questionaram sobre a questão dos


professores... Eles perguntaram o que está acontecendo que em toda sala teve
um [professor] que não estava... Queriam perguntar, o que aconteceu?”
A professora Alcione imediatamente responde ao pai, afirmando que “os
professores, como todas as outras pessoas, têm problemas também. E às
vezes calha que tudo acontece em um dia só, temos filhos”. E afirma que, por
uma questão de postura ética, do mesmo modo que cobram das famílias o
cuidado com a saúde dos filhos, também devem tê-lo quando seus próprios
filhos adoecem.
Gilberto é solidário à proposição de Alcione, mas afirma que, apesar de
reconhecer a veracidade do que ela fala, o assunto tem causado inquietação
nas famílias, por se tratar de uma situação que tem ocorrido com frequência e
não apenas em uma sala, produzindo a necessidade de muitas famílias
retornarem com seus filhos para casa.
A professora Alcione continua a argumentar a favor dos professores,
relatando que é difícil a situação e, apesar de serem comprometidos com o
trabalho e terem como direito dez dias de folga ao longo do ano, ocorrem
problemas sem que elas possam prever. A professora Sidineia complementa a
fala de Alcione e diz que, diante dos imprevistos, às vezes não é possível nem
utilizar as faltas abonadas.
Gilberto entende as ponderações das professoras, mas pergunta se não há
uma maneira de avisar as famílias antes de chegarem ao CEI.
A professora Alcione explica que as professoras avisam quando vão faltar e
há um controle disso.
Mas Gilberto não compreende a argumentação da professora e pergunta
novamente sobre como são agendadas as faltas.
A professora Alcione tenta novamente afirmar as questões que permeiam a
vida dos professores, que, tal como todo mundo, lidam com problemas de
saúde de familiares – pai, mãe, filhos – e que, no caso dela, quando chega o
final do ano, até ela fica doente. E que, por esses motivos, as professoras
pedem a colaboração para a mãe que pode ficar com a criança em casa.
A professora Karin complementa e destaca que o objetivo dessa solicitação
“é para a criança não sofrer”.
883

Gilberto demonstra compreensão e diz que entende a questão se o filho ficar


doente... Mas é interrompido pela professora Alcione, que compara
novamente a situação dos pais quando têm filhos doentes e elas solicitam
para cuidar.
Gilberto, já um pouco constrangido, explica que apenas perguntou o que
estava acontecendo e não estava falando mal dos professores.
A professora Sidineia intervém e enfaticamente diz: “Falta de professor tem
em todo lugar”.
Maria Vitória, que até esse momento não havia se manifestado, retruca a
argumentação da professora Sidineia e afirma: “Mas aqui saiu fora de
controle”.

Esse fragmento da reunião demonstra que a maneira como as professoras reagem


ao questionamento de Gilberto reforça a perspectiva assistencialista – tão questionada
por elas −, como se o atendimento à criança fosse um “favor” à população, que deve
entender as questões de ordem pessoal de cada professora, e apoiá-las – por gratidão.
Apesar de terem ciência de que o alto índice de faltas realmente prejudica o
atendimento, as professoras tratam isso como se fosse natural e tentam convencer
Gilberto de que, por serem comprometidas, não poderiam deixar de cuidar de seus
filhos. Essa argumentação revela total falta de reconhecimento do caráter do
atendimento público e ausência de clareza do papel profissional.
Outro momento que revela a falta de cuidado e a relação de dominação
estabelecida entre professoras e famílias foi observado em reunião extraordinária
realizada num sábado, no mês de novembro de 2010. Diferentemente das reuniões
mensais do conselho, nesse dia a reunião foi realizada no auditório e com a presença de
todos, familiares e professoras, tal como ocorre nas reuniões de início do ano. A reunião
teve início com a apresentação de slides com fotos das crianças no CEI. Após isso, a
diretora Maria Vitória agradece a presença dos familiares e em seguida, passa a
coordenação para o professor Jovino – presidente do conselho-, que explica que se
tratava da última reunião de conselho de 2010, e resolveram fazer naquele dia com
todos os familiares, para não precisar voltar em uma nova data e para todos terem a
oportunidade de votar.
Os trechos relatados a seguir sobre a reunião evidenciam a maneira como foi
encaminhada:

O primeiro assunto da pauta referia-se à avaliação do PEA. O professor


explica o que é o PEA e informa que todos os dias é destinada uma hora para
a formação dos professores, momento em que “discutem e planejam como
fazer o melhor para nossas crianças.” Informa que no início do ano foi
aprovado o projeto “Múltiplas linguagens”, e foram cumpridas 112 horas
para sua realização. Sem maiores informações ou qualquer debate, todos
aprovam o PEA.
884

O segundo item da pauta tratava da aprovação do regimento interno da


unidade. O professor Jovino informa que o regimento contempla as regras
que os pais precisam cumprir na unidade, envolvendo desde as questões
básicas, como horário, até coisas mais complexas. E diz: “O regimento já está
consolidado e ficará disponível na secretaria a partir da semana que vem.
Geralmente, fazemos um resumo para os pais e encaminhamos”. Informa que
naquele dia era necessário “votar o regimento” e, ao perguntar “quem é
contra e quem é a favor” da aprovação, diz que “reconhece que é difícil votar
sem saber, mas é por causa do tempo. A gente aprova e, caso queiram fazer
alteração, podemos fazer no início de janeiro e ratificar em reunião de
conselho”, e pergunta: “a favor?” Todos levantam as mãos. Ele continua:
“contra?” E repete novamente: “Quem é a favor do regimento consolidado?
Alguém é contra e quer propor uma nova forma?” Ninguém se manifesta.
Jovino exclama: “Então o regimento foi aprovado!!!” E informa que enviará
um resumo na agenda no próximo ano.
É uma situação embaraçosa. A impressão que tenho é que as famílias nem
imaginam o significado daquele documento, mas, como o professor explicou
e pediu para votar, todos fazem isso.
Mas a reunião continua e o próximo ponto de pauta refere-se a reposição de
aula. Outro assunto que os pais desconhecem. Jovino explica que no início do
ano ocorreram duas paralisações de professores para requerer coisas
necessárias para a melhoria da escola; conta que vários CEIs pararam e por
isso conseguiram várias coisas, e outras, ainda não. Informa que a reunião
daquele dia era uma reposição referente à emenda de um feriado, mas que
ainda havia dias para repor – relativos à paralisação – e a proposta é a
realização de duas atividades, uma no sábado e uma no dia de semana, com
horário dobrado em atividade cultural. E conclui: “Eu acho que é justo a
aprovação, porque nós fomos lá e conseguimos”, e indaga: “Quem é a
favor?” Observei que uma mãe se colocou contra, mas isto não foi observado
ou considerado, aliás, o professor nem a viu erguer a mão.

O fato é que tanto o professor Jovino quanto Maria Vitória, que sempre foram
muito cuidadosos com relação ao respeito à participação das famílias, naquele momento
atuaram de forma muito coercitiva. Na entrevista, questionei o professor a respeito
desse fato e ele reconheceu que foi uma alternativa que desconsiderou as famílias, pois
o regimento foi discutido internamente desde o mês de julho e, por falta de
planejamento e organização, teve de ser encaminhado às pressas junto àquele segmento.
A diretora Maria Vitória diz que as famílias foram chamadas para discutir o regimento,
mas que houve pouca participação.
De qualquer modo, essa situação demonstra como o conselho serve para o
cumprimento de ações burocráticas, pois, devido às exigências da SME, os assuntos
debatidos na reunião devem ser deliberados pelo conselho; entretanto, a participação é
pró-forma, na medida em que as famílias pouco ou nada sabem sobre os assuntos
deliberados.
A aceitação do caráter burocrático do conselho pode chancelar o que já foi
assinalado por Paulo Freire quanto à nossa “inexperiência democrática”, e à falta de
885

vontade política dos representantes da administração municipal e dos profissionais que


atuam no CEI, para constituir experiências democráticas na unidade.
Outro exemplo importante para observar como os profissionais compreendem o
papel do conselho como espaço para legitimar suas divergências com as famílias
relaciona-se a um dos pontos de pauta da reunião do conselho de julho de 2011. As
professoras propuseram encaminhar para o conselho tutelar as crianças com piolho e
aquelas cujos pais não cuidavam.
Participei da reunião e a atuação da presidente do conselho na época, professora
Mirtes, e da diretora Maria Vitória foi determinante para a não aprovação dessa medida,
apesar de contar com muitas defesas das professoras presentes na reunião.
Entretanto, ao realizar as entrevistas com as professoras, perguntei sobre essa
temática e pude constatar que tal proposta não havia sido fruto de uma discussão do
grupo: ao contrário, a maioria nem sabia que esse tema tinha sido pauta do conselho,
mas concordaram com a proposta.
Apenas as professoras Valentina e Suzana sabiam desse debate. A professora
Valentina disse que esse assunto foi para o conselho porque estava se tornando uma
epidemia, saiu da normalidade e “todo mundo estava pegando piolho”. Valentina
afirma, tal como a professora Suzana, que há uma pressão das famílias cujos filhos não
têm piolho para que o problema seja resolvido, e diz:

Ficou na questão social, naquilo que a gente tava conversando, a criança com
piolho, ela vem, continua frequentando, é justo que venha, eu não acho certo
afastar uma criança por piolho, mas também não acho justo que o pai veja lá
e não limpe a cabeça da criança. Também não acho justo que outra criança
que a mãe limpe, pegue piolho, então eu acho que essa questão devia ser
tratada no conselho, o que vai fazer numa hora dessa? Você sabe que você
tem ali pai, você tem ali professores, você tem ali a gestão, então a decisão
dos três tem que ser tomada [...] a criança continua vindo, continua
incomodando o pai que limpa, continua incomodando, a cabeça da criança
está suja, o pai que não toma nenhuma providência, continua do mesmo jeito
[...].

Perguntei à professora Valentina se ela sabia qual o motivo pelo qual uma
família não se dispunha a tirar os piolhos das crianças e ela disse acreditar ser
“desleixo” e até “caso de maus tratos”, e defendeu a ideia de que é preciso chamar o pai
e falar:

[...] ou você trata o seu filho ou a gente encaminha ele para o conselho
tutelar, porque se está assim a cabeça, como será que está a casa? Se o
conselho delibera esse assunto e decide que vai acionar o conselho tutelar,
acionando o conselho tutelar dá um susto. [...] Eu tenho [a mãe] que dar pelo
menos um banho no meu filho, tenho que pelo menos passar um pente fino
886

na cabeça dele. De repente o conselho tutelar acha até outras coisas, que a
gente [professoras] às vezes não está indo atrás, a gente está sendo negligente
(Valentina, professora).

Esse depoimento, apesar de revelar a preocupação da professora com a criança,


demonstra mais uma vez o caráter autoritário da relação com as famílias: percebe-se
uma intolerância que impossibilita enxergar que a questão precisa ser abordada de
forma mais cautelosa e por um ângulo multidisciplinar.
Romper com as relações de discriminação e intolerância com relação as famílias
é fundamental para a constituição da gestão democrática e para a qualificação da
participação das famílias e comunidade. Atuar contra a “invisibilidade” das famílias,
nas instâncias coletivas e no cotidiano da escola, é uma tarefa necessária para
transformar a visão negativa da maioria das professoras sobre os familiares das crianças
e promover a efetivação do compartilhamento da educação das crianças.
Considerações Finais
É preciso reafirmar o sentido da educação pública e o direito dos cidadãos de
participar das instituições educacionais, tanto nas instâncias participativas de
representação coletiva, como os conselhos, quanto na participação cotidiana direta sobre
a educação das crianças.
Os conselhos de CEI podem – como já assinalei − ser instrumentos potentes para
a democratização das relações internas com as famílias e o estabelecimento de relações
horizontais entre poder público e população. Entretanto, a forma como vêm sendo
administrados pelos representantes do governo municipal e nas unidades de educação
infantil pouco favorece qualquer processo de democratização, servindo apenas para o
cumprimento de normas estabelecidas pela legalização desses órgãos.
A formação política dos conselheiros por meio de uma política de governo
(PERRELLA, 2012) é fundamental para auxiliar na recuperação da força que os
conselhos podem ter junto à comunidade. Assim também, a retomada das diferentes
experiências desenvolvidas com as famílias durante a permanência dos CEIs na
Secretaria de Assistência Social pode, além de fortalecer seu papel, esclarecer sua
especificidade nas instituições de educação infantil (MONÇÃO, 2013).
Faz-se urgente também reconhecer as experiências democráticas que existem na
rede atualmente e são pouco divulgadas, pois estes são elementos valiosos para a
revitalização dos conselhos, a fim de que realmente promovam a democratização da
unidade educacional. No entanto, é preciso atentar para a importância das demandas do
887

conselho serem ampliadas para instâncias em nível regional e municipal, para garantir a
interlocução entre as políticas públicas e as práticas cotidianas.

Referências
ADRIÃO, T. e PERONI, V. Implicações do Programa Dinheiro Direto na Escola,
Campinas, Educação & Sociedade, vol. 28, n. 98, p. 253-267, jan./abr. 2007.
CAMARGO, Rubens Barbosa de. Gestão democrática e nova qualidade do ensino: o
Conselho de Escola e o projeto da interdisciplinaridade nas escolas municipais da
cidade de São Paulo (1989-1992). 1997. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de
Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997.

MARTINS, Ângela Maria; SILVA, Vandré Gomes da. Gestão escolar, autonomia
escolar e órgãos colegiados: a produção de teses e dissertações (2000 – 2008). Revista
Brasileira de Política e Administração da Educação, Brasília, DF, v. 26, n. 3, p. 421-
440, set./dez. 2010.

MONÇÃO, Maria Aparecida Guedes. Conselho Gestor de CEI: relato de um percurso


em busca da construção de gestão democrática nas instituições públicas de educação
infantil. In: IX Congresso Paulista de educação infantil: Tempos de infância na
contemporaneidade: contrastes em políticas públicas e ações educativas, 2006, v.1,
p. 92.

MONÇÃO, Maria A. Guedes. A gestão democrática nas instituições públicas de


educação infantil: um projeto em construção. Revista do Sinpeem, São Paulo, p. 70-72,
2008.

MONÇÃO, Maria Aparecida Guedes. Gestão democrática na educação infantil: o


compartilhamento da educação da criança pequena. 2013. Tese (Doutorado em
Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013.

PARO, Vitor Henrique. Por dentro da escola pública. 3. ed. São Paulo: Xamã, 1995.

PERRELLA, Cileda dos Santos Santana. Formação e participação política de


conselheiros na escola: o caso do município de Suzano-SP (2005-2009). 2012. Tese
(Doutorado em Educação) − Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São
Paulo, 2012.
888

Comunicação

Indicadores de desempenho dos sistemas de ensino e determinantes da qualidade


de ensino: análise da gestão educacional de municípios no interior paulista

Maria Eliza Nogueira Oliveira


Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília. Centro de Estudos e Pesquisas em
Administração da Educação (CEPAE) – CAPES.

Resumo : O objetivo geral desta pesquisa é analisar a relação entre os indicadores de


desempenho e a construção e materialização das diretrizes das políticas educacionais
locais em instituições escolares do interior paulista que se destacam nos dados
estatísticos disponibilizados pelo INEP. A este objetivo maior, somam-se alguns
objetivos específicos. São eles: analisar as concepções de educação, gestão escolar e
qualidade de ensino veiculadas nos âmbitos dos governos, da mídia, dos periódicos
qualificados e das concepções vivenciadas pelos integrantes das escolas públicas do
ensino fundamental. Metodologicamente, baseamo-nos nos estudos das representações
sociais (JODELET, 2001), considerando dois âmbitos principais de análise: o da
circulação e produção de informações do ponto de vista organizacional (o da cultura da
escola); da comunicação midiática (revista Nova Escola e propagandas televisivas sobre
o IDEB); da comunicação institucional (governos federal, estadual de São Paulo e
municipais) e acadêmica (periódicos qualificados) e os estados e processos das
representações sociais a partir do que pensam e concebem os diferentes integrantes das
escolas em análise. Neste texto, apresentamos os dados circunscritos à produção
midiática (Revista Nova Escola), documentos legais dos diferentes âmbitos
governamentais e, por fim, as representações sociais de gestores escolares, todos
referentes às categorias em destaque: gestão, qualidade de ensino e avaliação.
Palavras-chave: Gestão escolar. Avaliação em larga escala. Qualidade de ensino.

Introdução
O presente trabalho integra-se ao projeto de pesquisa em rede, financiado pela
CAPES/INEP (Edital n. 38/2010), intitulado “Indicadores de qualidade e gestão
democrática” cuja problemática é discutir a qualidade da escola básica referente aos
indicadores de desempenho, gestão democrática e avaliação em larga escala. O
889

desenvolvimento do trabalho conta com a participação da Universidade Vale do Rio dos


Sinos (UNISINOS), Universidade de Passo Fundo (UPF), Universidade do Oeste do
Paraná (UNIOESTE) e Universidade Estadual Paulista (UNESP).
A pesquisa norteia-se, especificamente, pela análise do complexo processo de
materialização das políticas públicas educacionais em escolas da rede pública de ensino
a partir do contato com seus diferentes modos de coordenação das ações que recaem na
construção de identidades próprias.
Na perspectiva de estudar as escolas, encontramos respaldo teórico para análise
em diversos autores, entre eles, vale indicar Silva Jr e Ferretti (2004); Lima (1998);
Derouet (1996).
O que os autores indicam é que a escola apresenta uma face institucional que
prioriza o cumprimento de uma determinada função social, legitimada historicamente.
Entretanto, a escola, constituída por seres humanos políticos, apresenta a potencialidade
de transformação, de construção de identidade e modos próprios de funcionamento.
Pensar a avaliação (da aprendizagem, em larga escola e institucional) nesta perspectiva
ganha um tom diferente. Considerando o referencial traçado anteriormente,
potencializamos as ações da escola (das escolas enquanto identidades próprias)
enquanto “cidades a construir” e não apenas o modelo dos estudos que valorizam os
“efeitos de escola” (DEROUET, 1996), neste sentido, é fundamental conhecermos e
analisarmos como as organizações escolares se constroem e interagem com as políticas
governamentais nos diferentes âmbitos.
Neste trabalho especificamente, percorremos o objetivo de identificar, em
municípios do interior paulista, instituições escolares que se destacaram nos dados
estatísticos disponibilizados pelo INEP e analisar a relação entre os indicadores de
desempenho e a construção e materialização das diretrizes das políticas educacionais
locais. Diante deste propósito, elencamos alguns objetivos específicos que nos serviram
de apoio na compreensão do espaço escolar e da complexa relação que se estabelece em
seu interior a partir da ação dos sujeitos escolares influenciada por suas representações a
respeito do que entendem ser uma educação de qualidade. São eles: analisar as
concepções de educação, gestão escolar e qualidade de ensino veiculadas nos âmbitos
dos governos, da mídia, dos periódicos qualificados e das concepções vivenciadas pelos
integrantes das escolas públicas do ensino fundamental.
Metodologicamente, baseamo-nos nos estudos das representações sociais
(JODELET, 2001), considerando dois âmbitos principais de análise: o da circulação e
890

produção de informações do ponto de vista organizacional (o da cultura da escola); da


comunicação midiática (revista Nova Escola e propagandas televisivas sobre o IDEB);
da comunicação institucional (governos federal, estadual – São Paulo – e municipais) e
acadêmica (periódicos qualificados) e os estados e processos das representações sociais
a partir do que pensam e concebem os diferentes integrantes das escolas em análise.
Para análise do primeiro âmbito, utilizamos como procedimentos metodológicos análise
de conteúdo e análise documental (BARDIN, 1977; FRANCO, 2004) e, para o segundo,
procedemos à observação sistemática e entrevistas semiestruturadas com os diferentes
integrantes das escolas pesquisadas. Neste texto, apresentamos os dados circunscritos à
produção midiática (Revista Nova Escola), documentos legais dos diferentes âmbitos
governamentais e, por fim, as representações sociais de gestores escolares, todos
referentes às categorias em destaque: gestão, qualidade de ensino e avaliação.
- Partimos do pressuposto que essas três temáticas estão fortemente
interligadas, uma vez que as representações sociais acerca da educação escolar e sua
qualidade incidem diretamente no modo de organização do processo pedagógico,
portanto da gestão escolar. Daí a importância de analisá-las e compreendê-las, buscando
responder às seguintes questões: que concepções de educação, de qualidade e de gestão
escolares estão sendo propagadas pela mídia? Em que medida essas concepções se
distanciam ou se assemelham daquelas propagadas pelas diretrizes políticas e pelos
próprios gestores escolares em seus discursos?
- Conquanto essas concepções estejam articuladas, para tornar mais didática a
exposição de nossa breve análise e apresentação de seus resultados, procederemos à
divisão das temáticas na seguinte ordem: Educação, Qualidade e Gestão Escolares:
conceitos e concepções da comunicação midiática; Educação, Qualidade e Gestão
Escolares: o que dizem os documentos oficiais; e Educação, Qualidade e Gestão
Escolares nas representações sociais dos gestores escolares.
- Educação, Qualidade e Gestão Escolares: Conceitos e concepções da
comunicação midiática
A fim de atingir o objetivo da pesquisa, foram escolhidos dois diferentes
veículos de comunicação midiática: a mídia informativa, com a análise da Revista Nova
Escola do período de 2006-2010; e a mídia televisiva, com a análise das propagandas do
IDEB veiculadas em canais abertos desde o ano de 2007.
891

Nesse contexto, foram levantados em um primeiro momento, 61 números da


revista “Nova Escola”, publicados no período de 2006-2010, sendo 11 números das
revistas “Nova Escola Gestão Escolar”. Nos anos de 2006 e 2007, os temas mais
recorrentes nas capas das edições se referem a assuntos pouco relacionados à prática
escolar. Referente a essa pesquisa, os temas sobre avaliação, qualidade de ensino e
gestão escolar aparecem com pouca frequência, uma vez em 2006 e outra em 2007.
Nos anos de 2008 e 2009 as temáticas mais recorrentes são referentes ao
currículo e às metodologias, seguidas de temas referentes à educação infantil e ensino
fundamental. Por fim, no ano de 2010 a temática mais recorrente recai sobre a
aprendizagem no âmbito escolar e a profissão-professor.
Com o início da publicação da revista “Nova Escola Gestão Escolar”,
desenvolvida pela Fundação Vitor Civita, em 2009, é estabelecido o objetivo de
contribuir com o trabalho de diretores, vice-diretores, coordenadores pedagógicos,
orientadores educacionais, visando à promoção do avanço da qualidade de ensino no
país. Nas edições listadas, a temática mais recorrente é sobre o trabalho coletivo.
Após este levantamento prévio, foram definidas as unidades de análises
(FRANCO, 2008), com sete revistas escolhidas como unidades de registros com o
critério de escolha da presença dos temas: qualidade de ensino, avaliação e gestão
democrática nas capas das revistas, além das propagandas do IDEB veiculadas nos anos
de 2007, 2009 e 2011.
- A temática da educação na esfera midiática aparece vinculada à temática da
avaliação da qualidade de ensino. Desse modo, a discussão do tema inicia-se,
frequentemente, com a exposição dos dados estatísticos atuais acerca do desempenho
dos alunos nas avaliações externas que apontam para uma realidade considerada crítica.
(BENCINE e MINAMI, 2006).
- Como meio de mudar esta realidade, a mídia apoia o envolvimento de vários
segmentos da sociedade como empresários e líderes políticos, como demonstra o
Projeto “Todos pela Educação”. Para os autores, a importância dessa proposta justifica-
se pela urgente necessidade de garantir aos alunos o domínio das competências básicas
para a inserção no mundo do trabalho em um mundo marcado pelo contexto da
globalização econômica.
Esta relação entre educação e produtividade recai sobre a necessidade de
professores, diretores e dirigentes municipais e estaduais prestarem contas à
892

“sociedade” sobre o aprendizado dos alunos por meio das chamadas avaliações
externas.
Outra solução apresentada é o sucessivo aumento de recursos para a educação
escolar. Apesar de ser possível identificar algumas conquistas com relação a esta
solução, como a aprovação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) seguida da aprovação do
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Escola Básica (FUNDEB), Bencini e
Minami (2006) consideram que ainda há muito a ser feito neste campo.
A valorização dos profissionais da educação, por meio da qualificação
profissional e do aumento de salários, é outro ponto que aparece com certa frequência
como quesito necessário ao alcance de uma educação escolar de qualidade. No que se
refere à atuação dos diretores de escola, aponta-se a necessidade de uma formação de
caráter gerencial-empresarial, em que se desenvolva a capacidade de mediação dos
interesses advindos de todas as partes.
Diante do que foi exposto até o momento, observamos uma forte contradição,
uma vez que consideramos difícil, se não impossível, estabelecer objetivos educacionais
coletivos em uma escola cuja gestão é impulsionada pelas avaliações externas e, a partir
delas, tenta estabelecer ações pontuais nos moldes da gestão empresarial, em que
prevalecem as relações verticais e o diretor é considerado o maior responsável pela
posição que a escola ocupa no ranking nacional.
Na mesma perspectiva são realizadas as propagandas televisivas do IDEB (2007,
2009), em que uma delas é encerrada com um recado para os diretores dizendo que a
recuperação de um aluno com dificuldades de aprendizagem é um direito e está previsto
na lei, para isso, todas as escolas públicas receberiam um material para orientar sobre a
Prova Brasil. Novamente, a propaganda é encerrada afirmando que, “buscar mais
qualidade na educação é compromisso de todos”.
Já a propaganda de 2011 começa dizendo que nos últimos dez anos as avaliações
internacionais colocaram o Brasil entre os três países que mais evoluíram na educação e
afirma que a qualidade melhorou em todos os níveis. Depois, apresenta a evolução do
IDEB brasileiro desde 2003 e acrescenta que a meta é chegar em 2022 com a nota 6,0
dos países desenvolvidos. Encerra apresentando o material que será distribuído nas
escolas e alerta os professores para se mobilizarem e mobilizarem suas escolas, pois, “a
educação brasileira está no caminho certo”. Resta-nos saber aonde este caminho irá nos
levar!
893

Educação, Qualidade e Gestão Escolares: o que dizem os textos legais delineados em


âmbito nacional
Com o objetivo de analisar as legislações produzidas em âmbito federal acerca
da temática da avaliação em larga escala fizemos levantamento junto aos portais do
Ministério da Educação (MEC) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais (INEP)1.
A primeira legislação selecionada para o estudo foi a Lei nº 9.394/1996 que
estabelece as diretrizes e bases da educação nacional (LDBEN)2. Em seu artigo 9º
(inciso VI), a LDBEN estabelece como uma das incumbências da União “assegurar
processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e
superior, em colaboração com os sistemas de ensino”, destacando que os processos
avaliativos desenvolvidos nos diferentes níveis de ensino têm como objetivo “a
definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino”. Mais adiante, no artigo
87 (§ 3º, inciso IV), dispõe que o Distrito Federal, os Estados e Municípios e,
supletivamente, a União devem “integrar todos os estabelecimentos de ensino
fundamental do seu território ao sistema nacional de avaliação do rendimento escolar”.
A definição do que seria um ensino de qualidade, no entanto, não aparece de
forma clara na LDBEN e apenas no artigo 4º é feita uma menção acerca do tema.
Conforme o artigo, um dos deveres do Estado com a educação pública é garantir
“padrões mínimos de qualidade”. Tais padrões, por sua vez, são definidos como “a
variedade e a quantidade mínimas por aluno, de insumos indispensáveis ao
desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem”.
O segundo documento legal analisado foi a Lei nº 10.172/2001 que aprova o
Plano Nacional de Educação (PNE). A referida legislação apresenta as metas para
educação brasileira no decênio subsequente à sua publicação e dispõe em seu artigo 4º
que a União instituirá o Sistema Nacional de Avaliação e estabelecerá os mecanismos
necessários ao acompanhamento dessas metas.

1
O endereço do portal do MEC é http://portal.mec.gov.br e o do INEP é http://portal.inep.gov.br
2
Antes disso, porém, a avaliação nacional da educação básica já vinha se configurando na prática com
uma institucionalização incipiente e um fundamento legal provisório. De acordo com Freitas (2004), entre
1987 e 1990, os processos avaliativos eram realizados na forma de programa do Ministério da Educação
(MEC) denominado Sistema de Avaliação do Ensino Público de 1º Grau (SAEP) e, a partir de 1992, com
algumas alterações, o referido programa deu origem ao Sistema de Avaliação da Educação Básica
(SAEB), cuja primeira regulamentação legal ocorreu com a edição da Medida Provisória nº 661/1994.
894

Na sequência, o PNE elenca como objetivos centrais para os dez anos seguintes
à sua publicação3: elevar o nível de escolaridade da população, melhorar a qualidade do
ensino em todos os níveis, reduzir as desigualdades sociais e regionais de acesso e
permanência na escola pública; e democratizar a gestão do ensino público. Para tanto,
estabelece algumas prioridades dentre as quais está a de “desenvolvimento de sistemas
de informação e de avaliação em todos os níveis e modalidades de ensino”. Os dados
coletados por meio desses sistemas, segundo o documento, constituem “instrumentos
indispensáveis para a gestão do sistema educacional e melhoria do ensino.” Observa-se,
assim, a tentativa de intensificar a regulação central pela via da avaliação e dos sistemas
de informação.
Com relação à qualidade do ensino, é importante registrar que ela é definida
tendo como referência as experiências internacionais de modo que o desafio expresso no
PNE é “oferecer uma educação compatível na extensão e na qualidade à dos países
desenvolvidos”.
No que se refere à educação básica, foco deste estudo, o documento apresenta o
diagnóstico, as diretrizes e os objetivos e metas para cada nível de ensino. No tópico
que trata dos objetivos e metas, a avaliação em larga escala aparece sempre como
ferramenta para operar o monitoramento do trabalho desenvolvido pelas escolas e
sistemas de ensino.
Outro aspecto que chama a atenção é a associação da ideia de qualidade de
ensino à melhoria do desempenho dos alunos nos processos avaliativos realizados pelas
diferentes instâncias de governo.
O último instrumento normativo analisado foi o Decreto nº 6.094/2007 que
dispõe sobre a implantação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação. Tal
Plano, conforme o artigo 1º, corresponde a “conjugação dos esforços da União, Estados,
Distrito Federal e Municípios, atuando em regime de colaboração, das famílias e da
comunidade, em proveito da melhoria da qualidade da educação básica” (BRASIL,
2007).
No artigo seguinte do referido documento é estabelecida uma série de diretrizes
a ser implementada pelos Municípios, Distrito Federal, Estados e respectivos sistemas
de ensino. Dentre elas, destacam-se a de “estabelecer como foco a aprendizagem,

3
A proposta de um novo Plano Nacional da Educação (PNE) que deveria vigorar de 2011 a 2020 foi
aprovada pela Câmara dos Deputados e pela Comissão da Constituição de Justiça somente em outubro de
2012 e está sendo analisada pelo Senado para, em seguida, ser encaminhada para a sanção presidencial.
895

apontando resultados concretos a atingir” e a de “divulgar na escola e na comunidade os


dados relativos á área da educação, com ênfase no Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica – IDEB”.
O artigo 3º marca a institucionalização do IDEB e associa qualidade do ensino a
esse índice, ao dispor que “a qualidade da educação básica será aferida, objetivamente,
com base no IDEB”. Nessa perspectiva, o conceito de qualidade da educação parece ser
reduzido ao rendimento escolar, desconsiderando o conjunto de fatores intra e
extraescolares (condições de vida dos alunos e de suas famílias; seu contexto social,
cultural e econômico; recursos, instalações, estrutura organizacional e relações
intersubjetivas do cotidiano escolar, entre outros) que interfere nos resultados
educativos de cada escola.
Em linhas gerais, a análise descritiva das legislações apresentadas aponta para a
ausência de uma discussão clara dos fundamentos dos processos avaliativos voltados
para a educação básica brasileira. A maior parte das diretrizes legais que tratam do tema
está orientada para a consolidação e/ou legitimação dessas avaliações, sob a justificativa
de que elas constituem elemento estratégico para a melhoria da qualidade do ensino.
Educação, Qualidade e Gestão Escolares nas representações sociais dos gestores
escolares
Nesta etapa da pesquisa, foram entrevistados quatro supervisores (as) de ensino
da/na Diretoria Regional de Ensino e quatro diretores (as) de escolas às quais são
coordenadas por aqueles profissionais, que passarão a serem designados, respectivamente
por S1, S2, S3 e S4 e D1, D2, D3 e D44. Com relação às escolas, designaremos por E1,
E2, E3 e E4 nas quais trabalham, respectivamente, os D1, D2, D3 e D4.
As escolas são de bairros que apresentam estruturas bastante diferenciadas. A E1
tem 250 alunos de Ciclo I do ensino fundamental, há 24 professores atuando, sendo a
maioria efetiva e com ensino superior completo. A E2 tem 400 alunos matriculados,
atende crianças de bairros próximos e também de outros do Ciclo I do ensino
fundamental, em tempo integral. A E3 tem 548 alunos e atende várias regiões do
município, sendo apenas 35% das crianças pertencentes ao bairro, provavelmente, isto
se deve, segundo o D3, à sua localização na cidade, pois “tem uma posição geográfica
privilegiada, além de ser bonita”. A E4 não está localizada em bairro periférico do
município, atende 476 alunos do Ciclo I do ensino fundamental e, segundo a D4, é uma

4As escolas 1 e 2 apresentaram notas altas no SARESP e as escolas 3 e 4 apresentaram notas baixas no
SARESP.
896

escola privilegiada em termos de participação dos pais e também de ausência de


problemas relacionados à falta, indisciplina e evasão que, segundo ela, são praticamente
inexistentes.
As concepções e vivências dos profissionais das quatro escolas são complexas,
diferenciadas e, muitas vezes, contraditórias. As escolas 1 e 2, que apresentam baixo
desempenho, considerando a média da Diretoria à qual pertencem, apresentam um
ponto comum representado pela instabilidade de permanência da equipe de gestão na
escola. Tal constatação ganha sentido se considerarmos as entrevistas com os
respectivos supervisores entrevistados que, ao serem questionados a respeito de quais
elementos estão presentes para que a escola ganhe em termos de qualidade, respondem,
respectivamente:

É uma pergunta complexa, mas... são vários aspectos. As questões estruturais


pegam bastante. E não só de equipamento escolar, porque elas têm condições
assemelhadas, quadra coberta, biblioteca. Tem escola que tem tudo para ser
boa escola. Mas eu não sei o que acontece. A gestão faz muita diferença, a
gestão... nessa escola que eu estou falando, a gestão não é presente na
discussão pedagógica, ela era meio centralizadora, embora tenha um discurso
meio democrático, era uma diretora com um perfil mais técnico. (S1, 2011).
A gente percebe que a questão do clima, da cultura da escola, é determinante.
Nós temos diretores que fazem realmente a diferença da escola. O trabalho
colaborativo, a gestão participativa também. Eu tenho trabalho intensamente
para que os diretores de duas escolas se aposentassem porque era um
impeditivo, neste momento. A escola G, por exemplo, [...] agora mudou a
diretora e, nossa, mudou tudo. A escola merecia uma diretora presente, que
articulasse para que a equipe compreenda quem são as crianças e jovens.
Antes, era totalmente descoordenado (S2, 2011).

Com relação à gestão educacional e escolar e também aos aspectos diretamente


articulados com a qualidade de ensino e metas/objetivos estabelecidos pelas instituições,
ao contrário do ponto anterior, há inúmeras diferenças entre os posicionamentos das
duas profissionais da escola e entre elas e os supervisores. As diferentes compreensões
acabam por se articular, também, às vivências relacionadas à avaliação em larga escala.
A D1 apresenta uma postura crítica ao indicar a subordinação da escola às
diretrizes da política educacional e da gestão do sistema. Suas críticas relacionam-se às
vivências da política de avaliação em larga escala ao denunciar a semelhança entre as
provas e o vestibular, cujo processo de preparação dos alunos resulta na retirada dos
aspectos afetivos presentes na relação diária professor-aluno, tão caros e importantes
para o processo de ensino e de aprendizagem. Segundo ela, os alunos

são muito apegados ao professor, temos alunos que quando sabem que a
professora vai faltar, nem vem na escola. É um trabalho muito intenso muito
897

duro para os alunos virem no SARESP. A prova é aquela coisa, não pode
falar, não pode ir ao banheiro quando quer, não tem liberdade. É muito
diferente do dia a dia (D1, 2011).

Para esta diretora, as punições às escolas que não alcançam as metas culminam
com os cortes de verba porque o fato de não receberem bônus é uma das formas de
punição. Além disso, o SARESP gera conflitos, competição, favoritismo.
A D2 não apresenta tantos pontos críticos à avaliação externa em larga escala e
diz que em sua escola há o preparo do aluno o ano todo, “o ano todo trabalhando em
cima dos conteúdos, dos professores, das crianças, colocando as questões da prova.”
Com relação às punições, esta diretora, ao ser questionada a respeito dos resultados (se
eles refletem a escola com qualidade), diz que, quando atinge altos índices, a escola é
boa, mas entra em contradição com a D2 ao afirmar que governo investe nas escolas que
não atingem as metas.
Apesar das diferenças indicadas, quando questionadas a respeito dos objetivos
da escola e da função da gestão, as profissionais são claras e suas respostas
complementares: “a meta do governo é aumentar o índice, a nossa também é” (D1,
2011) e a função da gestão é “construir espaços para atender às orientações do
governo.” (D2, 2011).
As entrevistas com os D3 e D4 seguiram outros caminhos a partir de um mesmo
roteiro prévio.
Nas duas escolas, segundo os entrevistados, há trabalho bastante rigoroso,
disciplinado e disciplinar com a família e com os professores da escola, principalmente
na E3. Para o diretor desta escola, faz-se necessário que os alunos com dificuldade de
aprendizagem participem de

Recuperação continuada e recuperação paralela, de intervenções, mas não são


intervenções para a massificação das atividades, mas diversificar maneiras do
aluno entender o conteúdo escolar, então, a gente sugere mais leituras para
eles, diferenciada. Tem até alguns alunos da universidade que vêm trabalhar
com estes alunos com dificuldades, os graduandos vêm acompanhar a leitura
e sistematizar essa leitura com os alunos (D3, 2011).

Quando questionados a respeito da função da gestão escolar e da escola, os dois


profissionais discriminam, separadamente, as tarefas da equipe – diretor, vice diretor e
5
coordenador –, mas, sobre sua função, indicam: “os problemas de aprendizagem são

5
Inclusive, o D3 diz que quando chegou à escola, havia uma confusão de tarefas e, para solucionar o
problema, disse à coordenadora: “você vai controlar os projetos pedagógicos da escola, aqueles projetos
898

mais com a coordenadora, agora, falar com os pais, problema de compromisso, de


disciplina, de cuidado de atenção com as crianças aí isso é mais comigo, então, a gente
tem um modelinho de convocação e dá para a criança”, além disso, para ele, seu
trabalho está em “propor inovações, em propor novas perspectivas para trabalho e
produção dentro da escola e controle dessa produção” (D3, 2011). Para a D4:
Assim como os outros supervisores, os S3 e S4 indicam vários problemas a
respeito da política de avaliação em larga escala no que tange, especificamente, aos
aspectos estruturais: aplicação das provas; não consideração das diferentes realidades
escolares que são bastante específicas; o tamanho do investimento feito na avaliação em
larga escala para pouco retorno no sentido de melhoria da aprendizagem.
Mesmo tendo encontrado elementos comuns entre as escolas com baixo e as
com alto desempenho e também tendo identificado elementos específicos em cada uma
delas, merece nosso destaque a ênfase dada aos resultados nas avaliações externas em
larga escala e à gestão da escola como responsável por incentivar o alcance de tais
resultados. Fato este que, diretamente, encontra coerência e convergência com as
constatações realizadas no início deste texto a respeito das diretrizes da política
educacional nacional e local.
Para concluir, além das indicações já apresentadas, nossas análises permitem
afirmar que, conquanto as escolas tenham uma margem de autonomia significativa para
formular propostas pedagógicas divergentes daquelas delineadas no âmbito dos
governos, as representações acerca dos objetivos da educação escolar e,
consequentemente, da função da gestão escolar, assemelham-se daquelas propagadas
nos documentos oficiais e na mídia.
Percebemos que os gestores das escolas com menor índice no IDEB realizam
fortes críticas com relação à política de avaliação externa que visa medir o nível de
qualidade de ensino das escolas, contrariando os gestores das escolas com maior índice,
cujas falas demonstram apoio a esta política e total adesão aos critérios de avaliação,
uma vez que realizam com os alunos treinamentos intensivos para o alcance das metas
pré-estabelecidas.
Conquanto observemos este contraponto, podemos afirmar que os diferentes
modos de compreender esta política, em que se enfatizam ora suas contribuições ora
seus percalços, não incidem no modo como ela vem sendo vivenciada pelos sujeitos

que estão declarados no começo do ano quando a gente faz um planejamento você tem que garantir a
eficácia e a eficiência deles.”.
899

escolares. De modo geral, as escolas têm buscado direcionar suas ações no sentido da
busca por alcance de resultados externos, o que contradiz fortemente os estudos que há
anos vêm sendo desenvolvidos no âmbito acadêmico, cujos resultados nos levam a
defender uma gestão mais democrática em que os objetivos educacionais sejam
delineados coletivamente de acordo com as necessidades e os anseios da comunidade
escolar.

REFERÊNCIAS

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n.196, p.40-45,out. 2006.

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educação nacional. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 12 de novembro
de 2011.

BRASIL. Lei n.10.172/2001. Estabelece o Plano Nacional de Educação. Disponível em:


<http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/pne.pdf > Acesso em: 01 de Nov. de 2009.

BRASIL. Decreto nº 6094/2007. Dispõe sobre a implementação do Plano de Metas


Compromisso Todos pela Educação. Brasília, 2007. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6094.htm>.
Acesso em: 01 de Nov. de 2009.

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objecto de estudo em redefinição. In: BARROSO, J. (org.) O estudo da escola. Lisboa:
Porto Editora, 1996.

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FREITAS, D. N. T. de. Avaliação da Educação Básica e ação normativa federal.


Cadernos de Pesquisa. São Paulo, Fundação Carlos Chagas, n.123, p.663-689, set./dez.
2004.

LIMA, L. C. A escola como organização educativa: uma abordagem sociológica. 3ª


ed. São Paulo: Cortez, 1998.

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(Org.) As representações sociais. Rio de Janeiro: UERJ, 2001. p. 17-44.
900

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políticas educacionais. Educação & Sociedade. Campinas, v.27, n.94, p.47-69,
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SILVA JR., J. dos R.; FERRETI, C. J. O institucional, a organização e a cultura da


escola. São Paulo: Xamã, 2004.
901

Comunicação

Violência e indisciplina em uma escola de território vulnerável: análise


exploratória de relatos de livros de ocorrências1

Maria Helena Bravo


USP
Claudia Lemos Vóvio
Unifesp
Vanda Mendes Ribeiro
Cenpec/Unicid

Resumo: Há um conjunto significativo de problemáticas socioeducacionais que afeta


escolas situadas em territórios de alta vulnerabilidade social. Esta comunicação
apresenta uma análise exploratória de livros de ocorrências de uma escola pública
situada em um território vulnerável do município de São Paulo, com base nas
contribuições e proposições de pesquisas sobre violência escolar e indisciplina. Estes
documentos são tomados como um dos meios para se apreender as características da
gestão e do ambiente escolar. Os resultados da análise de 2550 ocorrências apontam a
diversidade de situações para que quebram com expectativas em relação à introjeção de
regras e aos comportamentos de alunos, familiares e, em menor número, de
profissionais, e conturbam o ambiente escolar. Notou-se ainda que, a maioria dos
registros, refere-se a episódios de violência na escola, de ordem física e moral, e de
indisciplina. Em parte significativa dos casos, busca-se envolver os familiares na
solução de conflitos.
Palavras-chave: Violência escolar; Indisciplina; Ambiente escolar.

Introdução
Esta comunicação visa analisar, de modo exploratório, relatos de livros de ocorrências
de uma escola pública situada em um território vulnerável2 da periferia do município de

1
Este estudo integra a pesquisa, Relações de Interdependência Competitiva entre Escolas e Qualidade
das Oportunidades Educacionais, em andamento, sob a coordenação do Centro de Estudos e Pesquisas
em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
2
Território é definido, como proposto por Santos (1999), como espaço humano e habitado, que não
abrange simplesmente um conjunto de formas naturais, mas sistemas naturais e artificiais, socialmente
902

São Paulo, com base nas contribuições e proposições de pesquisas sobre violência
escolar e indisciplina. Há um conjunto significativo de problemáticas socioeducacionais
que afeta escolas situadas em territórios de alta vulnerabilidade social. A violência, a
indisciplina e situações que conturbam o ambiente escolar representam uma parcela
desse conjunto e são temáticas relevantes para compreender o que se passa nessas
instituições em relação às matrículas, ao acolhimento e às transferências de certos
alunos. Alguns estudos sobre seleção e evitamento de alunos e processos de remoção de
profissionais da educação3 mostram que as representações desses profissionais sobre o
comportamento desses alunos interferem na possibilidade de acessarem certas escolas,
de permanecerem ou serem transferidos, e, também, nas suas decisões sobre remoção.
Relacionados a essas dinâmicas, há, ainda, estudos que afirmam que escolas de
territórios vulneráveis encontram dificuldade para desenvolver estratégias capazes de
lhes inserir de forma mais favorável no mercado de escolhas de profissionais e de
famílias preocupadas com a escolarização de seus filhos, o que termina por reforçar seus
problemas. De acordo com tal perspectiva, isso ocorre porque essas escolas vivenciam
ambientes muito conturbados (VAN ZANTEN, 2005).
Para este estudo, coletou-se uma série histórica de livros de ocorrência, de 2007 a 2013.
Trata-se de um documento escolar que faz parte do conjunto de livros oficiais das
escolas municipais de São Paulo, instituído pela Portaria SME 1358/2007, que dispõe
sobre esses documentos no âmbito das unidades educacionais desta rede de ensino.
Pressupomos que, por se tratar de um instrumento da gestão escolar, permite apreender
o que, na visão das equipes e profissionais da escola, conturba o ambiente, bem como
identificar os demais atores envolvidos nessas situações.
A análise compreende as ocorrências registradas de 2007 a 2011 e 2013 e, de modo
parcial, as de 20124. Embora, em sua finalidade, os relatos possam abarcar uma gama
variada de fatos do cotidiano escolar, focalizamos aqueles que dizem respeito à
disciplina e à violência escolar. Os estudos sobre esses temas asseveram sobre a

originados, junto com pessoas, instituições sociais e empresas, agindo em fluxo permanente e em relação
de interdependência. Desse modo, territórios vulneráveis seriam aqueles nos quais agentes e instituições
encontram-se sujeitos a riscos de diversas naturezas e que "não dominam um conjunto amplo de recursos
socialmente produzidos que lhes permitam fazer frente às forças e circunstâncias da sociedade que
determinam suas vidas; aproveitar as estruturas de oportunidade criadas pelo mercado, Estado e pela
sociedade; tomar decisões voluntárias para satisfazer suas necessidades, desenvolver suas potencialidades
e realizar seus projetos." (ÉRNICA; BATISTA, 2011, p. 26)
3
Cf. Alves e Batista (2012); Alves et. al (2103), Torres et. al. (2008).
4
Neste estudo, não tivemos acesso a totalidade das ocorrências do ano de 2012, posteriormente, a unidade
escolar cedeu-nos o livro.
903

necessidade de distingui-los como dois fenômenos, o que orientou a seleção e


classificação dos registros a partir das definições e categorizações apresentadas por
Sposito (1998, 2001), Charlot (2002), Silva Neto (2001) e Debarbieux (2001, 2002).
Violência e disciplina na escola: uma breve abordagem
Para Abramovay (2006), o conceito de violência é variável e relativo, por se configurar
como uma construção histórica e cultural sujeito, portanto, a deslocamentos de sentido
no tempo e espaço social. Data do início do século passado, as premissas de uma
reflexão sistemática sobre a sociologia da violência e da disciplina na escola, propostas
por Émile Durkheim (1902). Para o autor, "a educação consiste numa socialização
metódica das novas gerações" (DURKHEIM, 1953, p. 32), na qual a introjeção da regra
é uma das funções da escola, evidenciando a necessidade de uma disciplina escolar, de
acordo com as condutas recomendadas para a convivência social submetida às regras da
moral. Para Durkheim, como destaca Sposito (2003), a moral era essencialmente
racional e de fundamento social, sendo, portanto, passível de ser ensinada. Debarbieux
(2001, p. 165) afirma que tais ideias forneceriam o referencial analítico através do qual
os primeiros trabalhos sobre violência seriam conduzidos.

[A] violência dos alunos, num primeiro momento, poderia ser considerada ou
como uma resistência à opressão sofrida – legítima (na perspectiva
“civilizadora” durkheimiana) ou não –, ou, ao contrário, como uma violência
integrante, papel deixado ao irracional num sistema que toma a desordem
para fazer a ordem.

Nesses termos, autores puderam afirmar que a universalização do acesso à escola não
necessariamente resultou em sua democratização, uma vez que as condutas de
convivência social próprias de uma determinada moral, tornariam mais difícil a
integração de novos públicos. Em decorrência, o desrespeito à norma se tornaria
progressivamente menos tolerado e mais suscetível a punições. Tal fenômeno, se
compreendido em conjunto, seria nomeado então, através dos escritos de Bourdieu e
Passeron (1975, p. 19), como violência simbólica, pois, ao impor ao conjunto de alunos
"significações consideradas legítimas por determinados grupos sociais, dominantes,
dissimulando as relações de força que estão na base de sua força, acrescenta sua própria
força, isto é, propriamente simbólica, a essas relações de força".
Ao mostrar a complexidade da violência simbólica no processo de reprodução das
desigualdades sociais na qual a escola teria papel importante, Bourdieu e Passeron
(1975) propiciaram novas formas de compreensão do fenômeno da violência e também
da disciplina na escola. Observe-se que o fenômeno refere-se ao tratamento de relações
904

entre indivíduos que não se dão no vácuo, mas no âmbito de relações sociais anteriores
aos próprios indivíduos, com as quais eles se deparam ao viver em sociedades nas quais
o conflito e a desigualdade social lhes são constituintes.
À luz dos estudos sobre a violência simbólica, Crubellier (1979) considerou que a
violência dos alunos seria uma resistência às normas dominantes. As reações de
afrontamento e oposição teriam a intenção de “frear” a ação da escola em relação à
cultural juvenil. Dessa maneira, a violência escolar estaria compreendida como uma
violência da escola, na qual a instituição seria uma mera reprodutora das normas e
regras sociais propícias aos grupos dominantes, e a violência dos alunos compreendida
como uma reação legítima a essa violência institucional.
A mudança de paradigma frente à legitimação da violência juvenil transformando-a em
delinquência juvenil passível de prevenção estaria, para Debarbieux (2002),vinculada à
opinião pública, quando esta, manipulada pela mídia e pelos poderes políticos, projeta
um “olhar reparador”, a partir do qual a escola teria um papel a desempenhar. Nesse
contexto de inquietude social e política da década de 1980, são produzidos os primeiros
relatórios sobre a crescente violência na escola tanto nos países europeus, quanto no
Brasil, fixando-se compreensões sobre suas repercussões tanto para a instituição escolar
como para a sociedade.
Especificamente, relacionado ao contexto brasileiro, Sposito (2001, p.90), em balanço
da produção sobre violência escolar no Brasil, argumenta ter sido após o início da
implementação de políticas educacionais voltadas à universalização da educação escolar
que eclodiram no país, por parte das escolas públicas, demandas no sentido de serem
"protegidas, no seu cotidiano, de elementos estranhos, os moradores dos bairros
periféricos, atribuindo a eles a condição de marginais ou delinquentes." Estudos
posteriores indicaram que, para além dessa violência externa aos muros das escolas,
produzia-se no país, a violência própria da instituição5.

5
Guimarães (1984; 1990) utilizou-se de aproximações qualitativas, enfocando a violência dentro de
unidades escolares. Costa (1993), Rodrigues (1994), Paim (1997) e Guimarães (1995) apresentam
pesquisas relacionadas à influência do tráfico de drogas e da disputa pelos territórios nos morros na
violência escolar do Rio de Janeiro. Cardia (1997) apresenta investigações sobre os efeitos da percepção
da violência nos bairros e seus possíveis efeitos sobre a vida escolar. Castro (1998) discute, em seu
mestrado, as representações de crianças e adolescentes a respeito da violência. Candau (1999) estudou o
tema da violência escolar no universo dos professores da rede pública. Laterman (2000) foi responsável
por uma investigação em duas escolas marcadas pela sensação de caos e de deterioração do clima diário
das interações. Camacho (2000) examina o tema da violência escolar na cidade de Vitória, capital do
Espírito Santo.
905

Apesar de um termo polissêmico, Sposito (1998, p.61) define violência como “todo ato
que implica ruptura de um nexo social pelo uso da força” e, nesse sentido, completa que

Nega-se, assim, a possibilidade da relação social que se instala pela


comunicação, pelo uso da palavra, pelo diálogo e pelo conflito. Mas a própria
noção encerra níveis diversos de significação, pois os limites entre o
reconhecimento ou não do ato como violento são definidos pelos atores em
condições históricas e culturais diversas.

A autora (1998) aponta como passível de investigação “o modo como, no âmbito da


instituição escolar, são construídas as definições que designam e normalizam condutas -
violentas ou indisciplinadas - por parte dos atores envolvidos", o que está em
consonância com os escritos de Charlot (2006, p. 20) quando considera que a violência
escolar é aquela que “remete a fenômenos ligados à especificidade da escola”. O autor
pondera que é necessário compreender as escolas para, então, descortinar o fenômeno
da violência que ali se produz. As pesquisas de Camacho (2001) e Corti (2002)
convergem, ainda, nesse mesmo sentido, ao considerarem que o conceito de violência
na escola também comporta diferentes situações e intensidades.
Embora esses autores apregoem a necessidade de compreender os contextos para
atribuir sentido à violência na escola, é preciso reconhecer que essa discussão também
se coloca, desde Bourdieu, no centro das tensões relativas à produção da desigualdade
escolar e da relação dessa com a desigualdade social. Dubet (2001) afirma que a
violência escolar e a indisciplina podem ser compreendidas como algumas das reações
possíveis usadas por alunos que não conseguem bons resultados na escola, como formas
de afirmar sua existência num sistema que faz uso da justiça meritocrática, que os
classifica entre ganhadores e perdedores. Considerando, portanto, a correlação entre
desempenho escolar e nível socioeconômico, pode-se intuir de antemão que ao fazer uso
da justiça meritocrática, a escola individualiza um fracasso que, na verdade, está
relacionado a uma situação de origem sobre a qual as crianças, adolescentes e jovens
não têm governabilidade (a vulnerabilidade social, por exemplo).
Ainda do ponto de vista das definições, Charlot (2002) ilumina o debate ao diferenciar
distintos tipos de violência escolar. Em suas palavras,

Violência na escola é aquela que se produz dentro do espaço escolar, sem


estar ligada à natureza e as atividades da instituição escolar: quando um
bando entra na escola para acertar contas das disputas que são as do bairro, a
escola é apenas o lugar de uma violência que teria podido acontecer em
qualquer outro local. Violência à escola esta ligada à natureza e às atividades
da instituição escolar: quando os alunos provocam incêndios, batem nos
professores ou os insultam, eles se entregam a violência que visam
906

diretamente à instituição e aqueles que a representam. Essa violência contra a


escola deve ser analisada com a violência da escola: uma violência
institucional, simbólica, que os próprios jovens suportam através da maneira
como a instituição e seus agentes os tratam (modos de composição das
classes, de atribuição de notas, de orientação, palavras desdenhosas dos
adultos, atos considerados pelos alunos como injustos ou racistas)
(CHARLOT, 2002, p. 434, grifos nosso).

Cabe destacar que as reações dos alunos à produção da desigualdade escolar, discutidas
por Dubet (2001), poderiam ser incluídas na categoria violência à escola. Já a ação da
escola nessa produção da desigualdade poderia ser incluída na categoria violência da
escola. Sposito (1998) e, posteriormente, Camacho (2001) ponderam que os diversos
usos e significados da palavra violência, principalmente, quando utilizados ao lado de
termos correlatos como indisciplina, permitem alterações nos significados correntes
sobre as ações escolares, tornando aquelas, antes aceitas e corriqueiras, como violentas
ou vice-versa. Atos de violência se confundem, se interpenetram e se inter-relacionam
com a agressão de modo geral e com a indisciplina, trazendo, assim, a necessidade de
diferenciá-los Para fins deste artigo, será utilizado o conceito de indisciplina proposto
por Silva Neto (2011), que a define como desrespeito às regras, incivilidades, rebeldia,
insurreição, entre outros, mas que não envolve situações de agressão física e moral e
depredação do patrimônio.
Indisciplina e violência na escola encontram-se associadas nos estudos aqui
mencionados porque ambas tratam das relações de indivíduos no espaço de uma
instituição social constituída por representações e relações sociais mais amplas. Frente
às situações, normas ou regras sociais os indivíduos se comportam, muitas vezes,
assimilando-as, quebrando-as ou mesmo efetivando bruscas rupturas que podem
inclusive ensejar impossibilidade do diálogo e da convivência, casos em que se chega a
situações de agressão. Esses fenômenos, na literatura, podem ser compreendidos de
diversos modos: como reação à tentativa legítima, por parte da instituição, de introjetar
valores e regras voltadas à convivência social; como reação legítima de grupos sociais
dominados à tentativa de imposição de regras que favorecem grupos dominantes; como
reação à conversão das desigualdades sociais em desigualdades escolares, dinâmica
sobre a qual os alunos não têm governabilidade. Pode-se dizer ainda que para os estudos
mencionados é relevante diferenciar violência escolar e indisciplina para que se possa
melhor compreender o que se passa nessa instituição em relação às normas e regras.
907

Análise e resultados
A complexidade das situações cotidianas de violência e indisciplina enfrentadas nesta
escola evidencia-se por meio dos registros contidos nesses livros, abrindo um leque
infindável de leituras, problematizações e compreensões. Foram inventariadas 2550
ocorrências, transcritas de modo sumarizado para fins de análise. Nesta etapa, nos
propusemos a classificá-las e analisá-las à luz do quadro teórico ao qual nos filiamos,
criando um modelo (quadro 01) e observando variações e permanências sobre o que
conturba o ambiente escolar, na visão daqueles que produzem esses registros. Tal
modelo conta com cinco grandes categorias (de nível 1) e três subcategorias a elas
relacionadas (de nível 2).
Quadro 01: Categorias de análise
Categoria de nível 1 Subcategorias de nível 2
1. Violência na escola: quando uma ocorrência se deu dentro da Patrimonial
instituição, mas poderia, por sua característica, ter ocorrido em qualquer Física
outro espaço. Moral ou simbólica
Patrimonial
2. Violência à escola: quando uma ocorrência diz respeito a reações ao
Física
que representa a instituição escolar.
Moral ou simbólica
3. Violência da escola: quando uma ocorrência expressa uma violência Física
institucional e simbólica daqueles que representam a instituição. Moral ou simbólica
4. Indisciplina: ocorrências causadas por comportamentos que se insurgem contra regras, mas que não
implicam em agressão física, ao patrimônio ou agressão moral. Não contém categorias de nível 2.
5. Outros: situações que não puderam ser abarcadas pelas anteriores e cujo conteúdo foge ao objeto de
estudo. Não contém categorias de nível 2.
Todas as ocorrências foram classificadas de acordo com as categorias estabelecidas e
quantificadas. À medida que nos apropriávamos de seus conteúdos, observarmos
detidamente suas características e as comparamos. Cabe observar que situações de
quebra de rotina escolar foram classificadas na categoria Outros porque abarcam relatos
de atrasos, dispensas de alunos, problemas no cumprimento de projetos ou programas
sociais (por exemplo, a entrega do leite), dentre outras semelhantes. Durante a análise,
subcategorias de nível 3 foram criadas de modo a contemplar a diversidade de
ocorrências registradas nesses livros, totalizando 46 formas de classificação. Além
disso, a partir de certos indícios, inventaríamos questões que merecem ser pesquisadas a
partir de um maior conhecimento do contexto da escola e da escuta de atores
envolvidos.
Inicialmente, apresentamos a quantificação e categorização dos eventos, na tabela 2.
Posteriormente, discutimos conteúdos e vislumbramos questões que nos orientarão na
908

geração de novos dados para compreender as dinâmicas desta escola e suas relações
com o território no qual se encontra.
Tabela 01: Ocorrências classificadas segundo as categorias (em n.)

Violência NA escola Violência À escola Violência DA escola Indisciplina Outros


Anos Total
Patrimonial Física Moral Patrimonial Física Moral Física Moral Indisciplina Outros
2007 6 25 15 6 1 3 2 11 15 47 131
2008 7 42 5 6 0 5 1 15 40 202 323
2009 4 125 67 27 3 7 4 7 135 248 627
2010 9 204 120 16 1 16 2 14 106 246 734
2011 4 22 3 1 1 2 0 0 80 21 134
2012 0 6 1 0 1 1 0 0 1 8 18
2013 12 145 118 18 1 16 2 4 100 252 668
42 569 329 74 8 50 11 51 477 1024
Total 2635*
940 132 62 477 1024

* É importante assinalar que a categoria de nível 3, ameaças seguidas de agressão física, pertence tanto à categoria
de nível 2, violência física, quanto à categoria de nível 2, violência moral ou simbólica, sendo portanto computada
nos dois campos.

Como se pode observar, depois da categoria Outros6, há um maior número de


ocorrências relacionadas violência na escola, abarcando 35,67% dos casos. Trata-se de
um tipo de violência que poderia se efetivar em qualquer espaço de convivência e na
qual não estão envolvidos diretamente os profissionais da educação e demais
funcionários da escola. São ocorrências que dizem respeito à agressão física e verbal
entre alunos: colegas que se batem, xingamentos e ameaças entre crianças, adolescentes,
jovens e adultos7. Quando comparados, o número de agressão física suplanta a verbal,
em 25 pontos percentuais e, a maior parte desses episódios, se dá em momentos e
espaços “menos controlados” pela instituição escolar (durante o recreio, no pátio, por
exemplo). Estas constatações geram várias questões sobre a escola e seus atores. Como
os representantes da escola agem diante desses conflitos? Estariam, nos dizeres de
Sposito (1998), superestimando o que se passa entre os alunos e suas capacidades de
negociação e reparação de conflitos?
A categoria indisciplina é a terceira em número de ocorrências, abarcando 18,10% dos
casos. Conforme a definição adotada, são relatos nos quais os alunos se insurgem em
relações às regras ou normas, sem recorrerem a agressões verbais ou físicas. Análise
desses relatos mostram que a quase totalidade deles é registrada a partir da perspectiva
de professores, funcionários e equipe de gestão, o que faz com que, apesar de
claramente disciplinares, ganhem contornos de violências sofridas pelos relatores ou
outros atores. Esta constatação corrobora os escritos de Camacho (2001), anteriormente,

6
Embora a maior parte das ocorrências esteja classificada na categoria outros, a análise estará focada nas
demais, tendo em vista os objetivos desse artigo.
7
A escola de ensino fundamental abarca também a modalidade Educação de Jovens e Adultos, portanto é
esperado que alunos adultos também estejam citados nas ocorrências.
909

apresentados, que apontam para as flutuações nos significados atribuídos à violência e


indisciplina. Quando observadas no conjunto,essas ocorrências parece-nos relacionadas,
de um lado, às representações que se constroem sobre os envolvidos e, de outro, aos
significados atribuídos a elas, que podem variar muito. Embora os episódios de
indisciplina não impliquem o rompimento com a possibilidade de diálogo, podem
indicar uma reação dos alunos à violência simbólica da escola.
A maior parte da violência à escola está registrada nos livros como sendo expressa por
meio da depredação do patrimônio. O número de agressões físicas, nesse caso, é
também menor em relação ao número de agressões morais. Chama atenção a
similaridade entre o número de ocorrências de ordem moral e física neste tipo em
relação à violência da escola (8 e 50 e 11 e 51 respectivamente). O que nos leva a
perguntar se esta constatação indicaria uma possível dinâmica de ação-reação. Esse
dado talvez seja uma evidência de que, na escola, a agressão verbal seja de fato mais
utilizada do que a agressão física, seja por alunos, familiares, seja por professores e
outros representantes da instituição escolar.
Entre todas as categorias a violência da escola é a que apresenta o menor número de
ocorrências. No entanto, relaciona-se à produção de violência simbólica. Nos casos
analisados, a violência moral por parte da escola predomina em relação à física, o que
indica que é mais frequente a ruptura do diálogo por meio da violência verbal. Cabe
considerar que o fato de este tipo de violência aparecer em menor quantidade pode ser
resultado da própria dinâmica de registro desses fatos, uma vez que a decisão sobre
conteúdo presente nos livros é de responsabilidade da gestão e demais profissionais,
estando imbricadas nessas escolhas e modos de registro tanto relações de poder como
significações atribuídas por esses atores aos fatos do cotidiano. Considerando que tais
fatores intervêm no conteúdo dos livros, pode-se dizer que a escola estudada parece
mais propensa a registrar ocorrências de violência moral seja porque a realiza mais
frequentemente, seja porque há menos filtros para que esse tipo de notação ocorra.
A grande maioria das ocorrências que envolve alunos apresenta como consequência a
convocação dos familiares à escola, o que pode ser compreendido como uma estratégia
de envolvimento das famílias na busca de soluções para essas situações. No entanto,
observamos uma variação nos critérios para essa convocação, ora se justifica pelo fato
de mesmos alunos estarem envolvidos em brigas e desentendimentos, de modo
recorrente, ora se justifica por ser a primeira vez que esses atores se envolveram em
conflitos. Quando os pais comparecem à escola por convocação, as medidas giram em
910

torno de “tomar ciência das ocorrências de seu filho”, “conversas conscientizadoras”,


aconselhamentos e reforço dos deveres legais para com a criança, encaminhamentos
para especialistas ou órgãos responsáveis (com destaque para psicólogos e Conselho
Tutelar) ou registro de comprometimento dos pais em “acompanhar de perto seu filho”.
Os resultados desta análise apontam para a diversidade de situações que quebram com
expectativas em relação à introjeção de regras e aos comportamentos esperados de
alunos, familiares e, em menor número, de profissionais, e que conturbam o ambiente
escolar.

Considerações finais
Dentre os tipos de ocorrências são os casos de violência na escola e de indisciplina
aqueles que, quantitativamente, mais conturbam o ambiente da escola-participante
segundo a análise. Os casos que envolvem agressão física ou moral aparecem em
número bem menor tanto quando implica em violência à escola por parte de alunos ou
familiares, como quando expressa a violência da escola em direção àqueles para os
quais o seu serviço público é direcionado. Como próximo passo da pesquisa, será
interessante verificar se esse dado coincide com a visão de gestores, professores e
alunos.
Considerando que a violência na escola, a maior parte das ocorrências, se dá em
espaços menos controlados e, ainda, conta-se com a forte presença dos familiares como
estratégia para resolução dessas situações, algumas questões se abrem para a
continuidade dessa pesquisa. Dentre elas, destacam-se: Qual o papel do livro e de seus
registros na tomada de decisão pela equipe de gestão sobre estratégias necessárias para
criar um ambiente escolar favorável? Como os representantes da escola lidam com seu
papel de mediadores de conflitos, de co-produtores de regras e de introjeção de valores
necessários à convivência social?
A análise de dados nos leva ainda a novas perguntas. Estaria a representação social dos
representantes da escola e dos relatores dos livros sobre alunos e suas famílias
interferindo na seleção do que é registrado e no modo como se registra as ocorrências?
Os casos de violência e indisciplina desta escola têm relação com a produção da
desigualdade escolar? Decorrentes destas questões, outra demanda se coloca para novas
explorações dos dados: a compreensão da relação entre a violência da escola, a
indisciplina e a produção da desigualdade escolar, à luz do que já foi objeto de estudo
de Bourdieu e Passeron (1975) e Dubet (2001). Para tanto, seria importante verificar o
911

perfil socioeconômico dos alunos sobre os quais recaem ações de violência moral e
daqueles que tomam parte de situações de indisciplina, bem como analisar, de forma
qualitativa, cada uma das situações classificadas nessas categorias, buscando identificar
similaridades e distinções.
A partir dos dados de pesquisas que tratam da relação entre vulnerabilidade social e a
dificuldade da escola em reter profissionais para uma boa qualidade do ensino
(TORRES et., 2008) ou em adotar estratégias que tornariam tais escolas mais atrativas
(VAN ZANTEN, 2005) e seguras (BATISTA; CARVALHO-SILVA, 2013), caberia
ainda uma observação. Reitera-se a importância do apoio de órgãos administrativos da
Secretaria Municipal de Educação no sentido de oferecer condições para que escolas
localizadas nesses territórios consigam fazer face àquilo que considera ser objeto de
conturbação de seu ambiente, seja para solucionar problemas, seja para mudar suas
representações sobre violência escolar ou indisciplina, seja para favorecer a constituição
de ambientes voltados para o processo de ensino e aprendizagem.

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escolares. Cad. Pesqui., v. 35, n. 126, p. 565-593, set./dez. 2005.
914

Comunicação

A avaliação de desempenho em minas gerais: uma análise de seus efeitos no


trabalho docente

Mariane Gomes Pereira


FACIP/UFU
Lucia de Fatima Valente
FACIP/UFU
Fonte de Financiamento: CNPQ

RESUMO: O presente artigo apresenta resultados de uma pesquisa que teve como
objetivo analisar e compreender as ações e os efeitos da Avaliação de Desempenho
Individual – ADI no trabalho docente. Deste modo, visou-se compreender as
concepções de avaliação de desempenho docente na atualidade; analisar as diretrizes
para a avaliação de desempenho docente no Estado de MG; apreender como se efetiva a
organização do processo de avaliação do desempenho docente e identificar os efeitos da
avaliação de desempenho no trabalho docente. Trata-se de uma pesquisa qualitativa,
com a realização da revisão bibliográfica, análise documental e aplicação de
questionários para os professores por meio da ferramenta formulário do Google drive.
Nessa perspectiva, o texto discute inicialmente a Avaliação de Desempenho:
concepções e práticas; na sequência princípios e aplicabilidade e por fim materialização
e efeitos no trabalho docente.
Palavras-chave: Avaliação de Desempenho Docente; Trabalho Docente; Política
Mineira.

INTRODUÇÃO
O presente texto objetiva analisar e compreender as ações e os efeitos da
Avaliação de Desempenho Individual – ADI no trabalho docente. Para tal buscou-se
compreender as concepções de avaliação de desempenho docente na atualidade; analisar
as diretrizes para a avaliação de desempenho docente no Estado de MG; apreender
como se efetiva a organização do processo de avaliação do desempenho docente e
identificar os efeitos da avaliação de desempenho no trabalho docente.
915

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, a partir de uma revisão bibliográfica,


análise documental e questionários aplicados para os professores por meio da
ferramenta formulário do Google drive. Nessa perspectiva, na organização do texto
discute-se inicialmente a Avaliação de Desempenho: concepções e práticas; na
sequência a Avaliação de Desempenho Docente em Minas Gerais: princípios e
aplicabilidade. Posteriormente, apresenta a Avaliação de Desempenho em escolas:
materialização e efeitos no trabalho docente e para finalizar, as considerações finais.
1. Avaliação de Desempenho: concepções e práticas

Esta seção tem como objetivo apresentar as concepções de avaliação de


desempenho a partir de autores que discutem a temática em âmbito nacional e
internacional.
Atualmente vários são os debates e estudos relacionados à avaliação de
desempenho. É um tema polêmico, pois os professores utilizam a avaliação em sala de
aula e avaliam os estudantes, mas resistem à avaliação de seu trabalho. (Santos et. al.,
2014).
Estudos demonstram que o conceito de avaliação é polissêmico, uma vez que de
acordo com a política de cada estado poderá se configurar de uma forma, e, também, de
acordo com alguns teóricos, pode ser conceituada de diferentes perspectivas.
Caetano (2008), na perspectiva da administração pondera que a avaliação de
desempenho está ligada a apreciação formal e sistemática relativa a um determinado
período do desempenho das pessoas nas funções e atividades que são responsáveis, no
qual há o objetivo de verificar o desempenho profissional dos diferentes agentes na
execução das tarefas.
Afonso (2009) define a avaliação como um processo dinâmico de avaliação
profissional em que ocorre uma observação e análise do desempenho dos colaboradores
em suas funções, relacionamento, atitudes, comportamentos, conhecimentos e
responsabilidades em um determinado contexto e tempo.
Diante destes dois conceitos, nota-se que há uma análise do comportamento e
um desempenho esperado. Ainda apresentam determinadas cobranças para o
profissional que precisam ser respondidas, em um determinado período.
De acordo com Souza (2010), avaliar refere-se a um processo de julgamento e
isso implica em uma atribuição de valor e, ainda, em uma coleta e análise de
916

informações que subsidiam decisões e ações. E o desempenho é a atuação do professor


no exercício profissional, para essa autora,
Avaliar a atuação docente, com vistas a subsidiar e contribuir para o
desenvolvimento profissional, extrapola a apreciação de seu desempenho na
esfera da sala de aula. Supõe, além, disso, analisar suas ações e interações no
âmbito da escola, podendo ainda abranger ações em espaços técnicos e
políticos mais amplos. Entretanto, varia o que se considera bom desempenho
e visão de desenvolvimento profissional que se assume em um processo
avaliativo. (s/p, 2010)

A partir do conceito apresentado por Souza (2010), observa-se que a avaliação


de desempenho poderá fornecer mecanismos para desenvolvimento do professor, mas
possui valores subjetivos que variam de acordo com o avaliador.
Nessa lógica, avaliação de desempenho ainda poderá ter vários modelos e,
Fernandes (2008) apresenta três categorias para a avaliação de desempenho, podendo
até pertencer a um ou mais destes modelos:
Repare-se que um dado modelo de avaliação pode estar mais focado em
avaliar a qualidade dos professores, isto é, na análise da competência dos
professores, outro pode estar mais interessado em avaliar a qualidade do
ensino, analisando o desempenho dos professores, enquanto outro pode estar
mais orientado para avaliar eficácia dos professores através da apreciação
dos resultados dos alunos. (obviamente que poderemos ter modelos que
estejam focados em duas ou três das características enunciadas)”. (p. 15)

Observa-se que um dos instrumentos que permite ter o controle e centralizar as


decisões no próprio governo é a avaliação, e, de acordo com o que apontou Fernandes
(2008), em relação aos modelos de avaliação de desempenho, um está ligada à
competência do professor e outro à analise de sua função na relação com ensino e outro
em relação os resultados dos alunos.
Neste sentido, o controle e regulação por parte do Estado e a lógica
mercadológica tem se efetivado por meio da avaliação educacional. Maroy (2010)
conceitua a regulação no campo educacional e aponta suas várias formas, sendo elas:
A regulação é, primeiramente, institucional e política. Diversos arranjos
institucionais promovidos pelo Estado (as regras e as leis editadas pelas
autoridades públicas, o poder discricionário atribuído a autoridades escolares
locais ou às direções dos estabelecimentos escolares, dispositivos de
consenso, de avaliação ou de financiamento, exercendo funções de incitação
ou de coordenação) contribuem para coordenar e orientar a ação dos
estabelecimentos, dos profissionais e das famílias no sistema educativo, pela
distribuição dos recursos e limitações (dinheiro, conhecimentos e
principalmente regras). (MAROY, 2010, p. 1)

Deste modo há vários impactos na educação principalmente no que se refere à


condução de políticas e programas regulatórios com o objetivo de obter mais eficácia e,
917

“a obrigação de resultados repousa sobre sistemas de avaliação e indicadores


estabelecidos para medir desempenhos, bem como em classificação de escolas.”
(AUGUSTO, 2013, s./p.). Contudo, há autores que destacam que a responsabilidade de
resultados tem recaído sobre o professor e, segundo Bauer (2013), no Brasil têm
ocorrido reflexos do que já foi vivenciado no cenário internacional.
Torna-se importante saber como tem sido esta política de avaliação de
desempenho no Brasil. Uma pesquisa realizada por Santos et al. (2014) investigou 27
secretarias estaduais, no Brasil, sobre a avaliação docente e constataram que as
avaliações centram-se em uma lógica de responsabilização e poucas preocupam se com
a valorização docente.
Nestas condições, conforme Augusto e Melo (2004) políticas tais como a da
Avaliação de Desempenho e mais precisamente se referindo a de Minas Gerais, tem
gerado várias consequências para os profissionais da educação, sendo elas: a
intensificação do trabalho docente, a desvalorização, o individualismo, além de
dificultar a capacidade de organização e criação de resistências ativas, tem gerado
também o adoecimento.
Ao contrário da responsabilização, Souza (2010) assevera que avaliação precisa
ser assumida como uma prática dinâmica de investigação que deve articulada ao projeto
e contexto do trabalho escolar, ou seja, é necessário que a escola pense na avaliação
institucional de forma que integre a avaliação de desempenho com caráter de repensar a
postura e a atuação docente.
Em suma, os estudos demonstram que o professor tem sido um profissional que
sofre as conseqüências dessas políticas e por vezes não é valorizado. Assim, é
necessário que a avaliação de desempenho se volte para a valorização do profissional,
como aponta Souza (2010):
Avaliar a atuação docente, com vistas a subsidiar e contribuir para o
desenvolvimento profissional extrapola a apreciação de seu desempenho na
esfera da sala de aula. Supõe, além, disso, analisar suas ações e interações no
âmbito da escola, podendo ainda abranger ações em espaços técnicos e
políticos mais amplos. Entretanto, varia o que se considera bom desempenho
e visão de desenvolvimento profissional que se assume em um processo
avaliativo. (s/p, 2010)

Para melhor compreensão, na próxima seção será realizada uma breve


abordagem histórica do surgimento da política de avaliação de desempenho em Minas
Gerais, seus princípios legais e sua aplicabilidade a partir dos documentos
regulamentadores dessa política.
918

2. Avaliação de Desempenho Docente em Minas Gerais: princípios e aplicabilidade


Analisar e compreender os princípios e aplicabilidades de políticas educacionais
e públicas se faz necessário, uma vez que, na sociedade brasileira muitos campos são
regidos pela doutrina neoliberal. De acordo com Libâneo, Oliveira e Toschi (2012,
p.108) “a reorganização do capitalismo mundial para a globalização da economia, assim
como o discurso do neoliberalismo de mercado e das mudanças técnicas-científicas
trouxeram novas exigências, agendas, ações e discurso ao setor educacional, sobretudo a
partir da década de 1980.”.
Nesse contexto, se consolida o neoliberalismo que tem como princípio o
paradigma da liberdade, da eficiência e da qualidade, com o objetivo de modernizar os
espaços e instituições. O papel do Estado é mínimo para financiar, mas é máximo para
controlar e regular. E no que se refere à educação, esta doutrina espera que os
indivíduos sejam formados apenas para atender às exigências do mercado, e isto
também se dá pela globalização que promove intensas mudanças no campo econômico,
político e cultural.
De acordo com Kellner (2004, p.199) “é impossível resistir ou ignorar a
globalização, a qual tem influenciado todos os aspectos da vida”. Para tanto, este
processo de globalização e o neoliberalismo no sistema educacional e no campo das
políticas têm tornado a avaliação um mecanismo de gerenciamento deste sistema, a fim
de controlar e verificar se esta tem cumprido sua função, e, a partir deste cenário, há a
constituição do Estado Avaliador.1
Em Minas Gerais, a partir de 2003, foi implantado um novo modelo de gestão e
administração intitulado de Choque de Gestão, justificada por Aécio Neves da Cunha –
(2003 – 2010), ter encontrado o Estado em uma crise fiscal, devido a administração
anterior de Itamar Franco (1998 – 2002).
Na visão governamental, as ações do Choque de Gestão referem-se “à
racionalização de processos, modernização de sistemas, reestruturação do aparelho do
Estado e avaliação institucional e individual, com o objetivo de melhorar a qualidade e
reduzir os custos e serviços públicos” (AUGUSTO, 2012, p. 700)

1
O Estado Avaliador consiste em realizar o controle e a regulação por meio da aplicação de avaliação, e
utiliza os resultados para distribuir financiamento e responsabilidades aos diversos campos da sociedade e
principalmente na educação. A finalidade disto é obter eficiência e eficácia na administração dos
recursos.
919

Dentre os vários programas implementados, também é possível apontar o


Acordo de Resultados, no qual é um acordo que integra as Superintendências Regionais
de Ensino – SREs e as escolas a fim de estabelecer metas para aumento dos índices nas
avaliações do Sistema de Avaliação Mineiro de Avaliação da rede pública
SIMAVE/PROEB. Para tanto, o governo mineiro ainda organizou o prêmio
produtividade que, através deste Acordo de Resultados, concede bônus e condiciona a
Avaliação de Desempenho Individual dos professores.
Na perspectiva da legislação, a Avaliação de Desempenho Individual de Minas
Gerais – ADI é regulamentada pelo Artigo nº 41 da Constituição Federal, Artigo nº 35
da Constituição Estadual, Lei complementar nº 71/2003, Decreto nº 43.764 de 2004,
Decreto nº 44.559 de 2007, Resolução SEPLAG/SEE nº 7110 de 2009 e Manual da
Avaliação de Desempenho Individual – ADI dos Servidores da Secretaria de Estado de
Educação.
A Lei complementar nº 71, de 30/07/2003, institui a avaliação de desempenho
individual e aponta que tal política ocasiona a perda do cargo público e de função
pública por insuficiência de desempenho do servidor público estável. Nessa mesma lei,
ainda é apontado que esta avaliação de desempenho individual acontecerá anualmente,
sendo realizada por uma comissão de avaliação composta por, no mínimo, três e no
máximo cinco servidores de nível hierárquico não inferior ao do avaliado.
Perante tal contexto, há dois grupos de servidores: um é aquele servidor público
civil em período de estágio probatório (três primeiros anos de serviço) e, o outro, o
servidor estável ocupante do cargo efetivo. O primeiro passa pelo processo da
Avaliação Especial de Desempenho – AED regulamentada pelo Decreto 43764 de 2004
e Resolução SEPLAG nº 16 de 2004 e, o segundo, pela Avaliação de Desempenho
Individual – ADI, instituída por documentos legais já citados acima.
Um documento importante referente à Avaliação de Desempenho Individual,
com o foco nos servidores da Secretaria de Estado de Educação efetivos é o Manual da
Avaliação de Desempenho Individual – ADI dos Servidores da Secretaria de Estado de
Educação do ano de 2004. Este documento apresenta a avaliação de desempenho com o
objetivo de “atuar como um radar que indica direções na busca da melhoria da
qualidade dos serviços, no aumento da competência e na recuperação da imagem, não
somente do próprio servidor, como, também, da instituição da qual faz parte”
(MANUAL, 2004, s./p.).
920

Para que a ADI e AED se efetivem, há um processo que, a partir da resolução nº


7.110 de 2009, define que o primeiro momento consiste em um Plano de Gestão de
Desempenho Individual – PGDI, que é elaborado pelo servidor e pela chefia imediata,
no qual este deverá conter as metas e ações planejadas para o período de avaliação.
Posteriormente é apresentado o termo de avaliação que se constitui em duas
partes, sendo a primeira um registro da identificação do servidor, da comissão,
notificação do resultado e também síntese da entrevista, proposta de desenvolvimento
do servidor e manifestação do representante. Já a segunda parte é o instrumento de
avaliação com os critérios que deverão ser preenchidos de acordo com desempenho do
servidor.
Assim, os resultados da ADI e AED estão vinculados a duas bonificações, sendo
uma delas o Adicional de Desempenho – ADE que, de acordo com Manual (2004, s./p.),
“é a vantagem pecuniária a ser concedida ao servidor ocupante de cargo de provimento
efetivo e ao detentor de função pública” e outra bonificação é o prêmio por
produtividade, que é pago ao servidor que tem desempenho satisfatório, e este só é pago
no caso de celebração pela SEE do Acordo de Resultados.
É importante compreender os documentos legais e a política de avaliação de
desempenho para perceber seus princípios. Dois princípios que a embasam são o
individualismo e a competição. Vários programas geram esses comportamentos e
atitudes na escola. De acordo com Freitas (2012), o individualismo e a competição entre
os profissionais levam à impossibilidade de uma colaboração entre eles, e para que a
escola seja diferente e cumpra sua função de transformação social, ela precisa contar
com trabalho coletivo dos professores e não com a busca por resultados de desempenho
individuais.
Observa-se nessa política uma intensa cobrança por resultados e “quase sempre de
modo imperativo, sem a participação dos professores, e sem levar em conta as
especificidades do trabalho docente; e ainda, os resultados quantitativos aferidos nem
sempre representam de fato a qualidade social que se almeja para a educação pública.”
(AUGUSTO, 2013, p. 2)
Portanto, esta seção centrou-se em detalhar o processo da Avaliação de
Desempenho Individual – ADI e Avaliação Especial de Desempenho – AED, e, ainda,
como surgiu tal política em Minas Gerais. É notório que tal política tem centrado em
critérios meritocráticos e desejo pelo alinhamento dos servidores, em busca da
qualidade dos serviços prestados.
921

A próxima seção apresenta a análise e reflexões a partir dos dados coletados por
meio dos questionários aplicados, com a utilização da ferramenta formulário do Google
Drive.

3. Avaliação de Desempenho na visão dos professores: materialização e efeitos


no trabalho docente na visão dos professores

Os dados coletados revelam que há pouco conhecimento dos profissionais em


relação aos documentos legais que regulamentam e normatizam a ADI. Ao serem
indagados sobre a legislação que regulamenta a avaliação, percebeu-se que há um
equívoco por parte de alguns que responderam tal pergunta, já que a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação – LDB, Plano Nacional de Educação – PNE, Plano de
Desenvolvimento da Educação – PDE não normatizam e nem regulam a ADI. Também
a Constituição Federal e a Estadual de Minas Gerais apenas apontam que é permitido
que a avaliação de desempenho ocorra, mas que também não regulamentam. Deste
modo, apenas 18% dos professores apontaram os decretos estaduais que regulamentam
e normatizam a ADI.
No que se refere às mudanças implementadas na escola a partir da avaliação, 33%
dos professores declararam que nada mudou, ou seja, foi possível constatar dentre os
fatores colocados nesta afirmativa não houve grandes mudanças no compromisso dos
professores, na melhoria da qualidade do ensino, na atuação dos coordenadores, na
aplicação dos conteúdos e nem na clareza da função dos professores em sala de aula.
Entretanto outra questão que apresentou uma contradição. Ao questionar os
professores sobre os pontos positivos na ADI, 33% afirmam que é o feedback dado ao
professor. 33% acreditam que possibilita a progressão na carreira, mas também 21%
mostram a melhoria na qualidade do ensino. Porém, como foi demonstrado na pergunta
anterior eles apontam que não houve mudança. Nesse sentido, questiona-se: como pode
ser um ponto positivo?
No que tange aos aspectos negativos, os dados revelam que a ADI gera a
responsabilização e a cobrança por resultados, fato que Santos et. al. (2014) apontaram
na pesquisa realizada nos estados brasileiros. Constataram que a política de avaliação
docente é pensada e implementada na perspectiva de responsabilização. E também 20%
relatam que a ADI não demostra a capacidade real do professor.
Entretanto, por mais que esses professores percebam que a ADI gera a
responsabilização e cobrança por resultados, por outro lado, acreditam que é necessária
922

a avaliação docente (76%). Talvez seja porque acreditam em uma possível mudança na
perspectiva e lógica com que esta política vem sendo utilizada.
No tocante aos fatores preponderantes para um trabalho docente de qualidade, a
grande maioria, ou seja, 35% enfatizam que é preciso o domínio do conteúdo e das
metodologias de ensino. 29% acreditam que é a valorização profissional - plano de
carreira. Observa-se que os professores enfatizam mais o domínio do conteúdo (35%)
do que a própria valorização profissional, um plano de carreira que poderia garantir
melhores condições salariais e de trabalho.
Ao questionar se a ADI deveria estar atrelada a fatores inerentes à escola, 88%
disseram que sim e ainda 29% desses consideram que devem ser as condições de
trabalho, porém fatores como a avaliação institucional que se faz importante para
repensar as políticas demandadas para escola e a própria política de avaliação de
desempenho não foi considerada como necessária.
Freitas (2013) aponta que a avaliação institucional precisa ser um ponto de
mediação entre o poder público e a escola e seus profissionais por meio de um processo
de negociação em que as responsabilidades de um e de outro sejam devidamente
especificadas. E, foi possível observar que os professores não consideraram importante
tal fator.
Ao indagar os docentes sobre que elementos que acreditam que devem ser
levados em consideração para uma avaliação do desempenho docente, os três fatores
apontados pela grande maioria foi a qualidade na execução do trabalho (14%),
capacidade de trabalho em equipe (11%) e administração do tempo, com relação ao
cumprimento de trabalhos dentro dos prazos (10%). Outro ponto é que fatores como
tempo de atuação do professor não foram considerados como necessários. Essa visão
representou apenas 5% das respostas.
No que se refere aos efeitos no trabalho docente, foi feita esta pergunta para os
professores e foi possível destacar quatro categorias de análises, sendo elas: condições
de trabalho, mecanismos de controle, efeitos negativos ou nulos da avaliação de
desempenho e efeitos positivos da avaliação de desempenho.
No que se refere às condições de trabalho os autores estudados apontam para a
necessidade que estas estejam adequadas e contribuam para bom desempenho da sua
função; sobre os mecanismos de controle, avaliam que atualmente há vários
mecanismos para assegurar o controle e a regulação e a avaliação é um desses
mecanismos.
923

E as outras duas categorias efeitos negativos ou nulos da avaliação de


desempenho e efeitos positivos da avaliação de desempenho possibilitam
compreender que uma política como essa tem pontos que colaboram para o desempenho
docente, mas, também, pontos que regulam e controlam e trazem alguns efeitos ao
trabalho docente.
No tocante às condições de trabalho docente, de acordo com P12, não há
condições de trabalho adequadas e as políticas cobram resultados incoerentes. É
possível apreender neste trecho “Percebo que avaliar o professor sem dar condições de
trabalho dignas e sem organização da casa é incoerente” (P1, questionário respondido
dia 19/06/2014).
A outra categoria de análise são os mecanismos de controle que geram
consequências no trabalho docente e, também, a maneira como a ADI tem sido
implementada nas escolas estaduais, na qual o P6 destaca que “na verdade a ADI está
sendo utilizada de forma enganosa, a equipe responsável juntamente com a direção faz
o que quer notas de acordo com seus interesses e ninguém segue nada. Mais um
mecanismo para pressionar o docente.”. Desse modo, evidencia-se nessa resposta, que
tal política surge para pressionar o docente.
A partir desta pergunta, também aparecem os efeitos negativos ou nulos e foi
possível ver que não há efeito, já que o trabalho continuou sendo executado igual a
quando não tinha ADI. Quantos aos efeitos positivos houve respostas que indicavam o
reconhecimento e valorização do trabalho realizado, melhoria de pontos negativos e
fortalecimento de pontos positivos, mudança no comprometimento e práticas
diferenciadas.
Portanto, como o principal objetivo do trabalho era verificar e compreender
quais os efeitos da Avaliação de Desempenho Individual - ADI no trabalho docente,
considera-se que foi possível perceber essa dimensão e também outros aspectos
relacionados ao trabalho docente e, mesmo, à avaliação de desempenho. A partir dos
questionários, foi possível constatar que nessa política de avaliação é necessário
mudanças.
Diante do exposto, é preciso que a ADI funcione não como um mecanismo de
controle, mas, sim, como um meio que promova a valorização, a qualidade da escola
pública e dê melhores condições de trabalho aos professores.

2
Sujeito participante da pesquisa e para resguardar a identidade será utilizado tal letras e número.
924

Considerações finais

Esse trabalho permitiu compreender, conhecer e analisar um pouco da política


mineira de avaliação docente e ainda despertou um anseio por continuar e aprofundar
ainda mais as pesquisas neste campo que se mostrou tão complexo devido às várias
relações existentes.
A primeira seção Avaliação de Desempenho: concepções e práticas, apresentou
alguns autores que discutem a avaliação de desempenho, conceitos, pesquisas realizadas
no âmbito nacional e internacional e reflexões a cerca desta política de avaliação de
desempenho. Quanto à segunda seção, nomeada de Avaliação de Desempenho Docente
em Minas Gerais: princípios e aplicabilidade centrou-se em apresentar um breve
contexto histórico e viabilizou o surgimento da Avaliação de Desempenho em Minas
Gerais, os princípios desta e suas aplicabilidades.
E na última seção deste trabalho, Avaliação de Desempenho na visão dos
professores: materialização e efeitos no trabalho docente foi possível perceber a
materialização das teorias e também das leis que normatizam a ADI. O objetivo foi
apresentar a análise a partir dos dados presentes nos questionários aplicados
Portanto, pesquisar sobre avaliação de desempenho docente permitiu
compreender conceitos como regulação, controle, avaliação de desempenho docente,
trabalho docente, valorização e outros e, ainda, compreender que uma política possui
lógicas e objetivos definidos, de acordo com ideais governamentais e/ou partidários.

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precisam de saber. Lisboa: Livros Horizonte.2008

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5ed. Petropólis, RJ: Vozes 2013.

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Horizonte: UFMG/Faculdade de Educação, 2010. CDROM
927

Comunicação

Implantação das diretrizes nacionais para educação nas prisões no estado de São
Paulo

Marieta Gouvêa de Oliveira Penna


UNIFESP
Andressa Baldini da Silva
UNIFESP
Grupo de pesquisa: Avaliação de Políticas Educacionais
Financiamento UNIFESP

Resumo: Apresenta-se nesta comunicação resultado de pesquisa sobre o tema das


políticas públicas educacionais para a oferta de educação escolar nas prisões, com foco
no estado de São Paulo. O objetivo é mapear as ações de implantação das Diretrizes
para a educação prisional neste estado, a fim de verificar as estratégias adotadas pelo
poder público para atingir os objetivos nela propostos. Trata-se de pesquisa documental,
realizada por meio do levantamento e análise de documentos como pareceres, decretos,
resoluções, produzidos pelos órgãos oficiais do estado após a publicação das Diretrizes
em 2010. Como referência teórica, parte-se de discussões formuladas por Viñao-Frago.
No total, foram analisados 17 documentos relativos ao estado de São Paulo. Os
resultados permitem evidenciar a distância existente entre os legisladores e os
responsáveis pela implantação das ações. Também, o afastamento em relação às
especificidades do contexto prisional.
Palavras-chave: políticas públicas; educação nas prisões; escola na prisão.

Introdução
Nesta comunicação, apresenta-se resultado de pesquisa1 sobre o tema das
políticas públicas educacionais para a oferta de educação escolar para jovens e adultos
em situação de privação de liberdade, com foco específico no estado de São Paulo. O
objetivo é mapear as ações de implantação das Diretrizes para a educação prisional

1
Trata-se de pesquisa de Iniciação Científica que contou com financiamento da instituição das
pesquisadoras.
928

neste estado, a fim de verificar as estratégias adotadas pelo poder público para atingir os
objetivos nela propostos.
Com relação a esse tema, inicialmente, é necessário que a educação escolar para
sujeitos em situação de privação de liberdade seja compreendida como direito, previsto
pela Lei de Execução Penal Brasileira - Lei n. 7210, de 11/7/84 (BRASIL, 1984), e
sintetizado na Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988). A publicação das
Diretrizes Nacionais para a oferta de Educação para Jovens e Adultos em situação de
privação de liberdade nos estabelecimentos penais evidencia necessidade de se
estimular e aperfeiçoar as oportunidades de educação àqueles que se encontram nessa
condição.
Um dos aspectos normatizados nas Diretrizes refere-se ao fato de as Secretarias
de Estado da Educação passarem a ter a responsabilidade pela educação escolar nas
prisões, em parceria com os órgãos que até então possuíam tal responsabilidade
(BRASIL, 2010). Em São Paulo, até o começo dos anos de 1980, a educação nas prisões
era realizada por meio de um comissionamento de professores da rede pública estadual,
no qual “cada presídio era vinculado a uma escola pública estadual, constituindo-se a
educação de presos em uma extensão das atividades educacionais do estabelecimento
escolar” (MOREIRA, 2008, p. 39). No final dos anos de 1970, a Secretaria Estadual da
Educação (SEE) ausenta-se de atuar na educação dentro das prisões. Neste contexto,
cria-se a Fundação Professor Manoel Pedro Pimentel (FUNAP), atualmente vinculada à
Secretaria de Administração Penitenciária (SAP). A fundação foi criada em 1976, tendo
por objetivo promover a recuperação social de homens e mulheres presos e a melhoria
de suas condições de vida por meio do trabalho e da educação, além da promoção de
projetos que visem à reinserção social do egresso (PENNA, 2003).
Até 2010 a FUNAP coordenava um programa de educação que era responsável
pelas atividades escolares desenvolvidas nos estabelecimentos penais do estado de São
Paulo. Segundo dados fornecidos por pesquisa realizada pela instituição (SÃO PAULO,
s/ data), 68% da população carcerária paulista possuía menos de oito anos de estudo, ou
seja, não possui o Ensino Fundamental completo. O quadro de educadores da FUNAP
era composto por monitores orientadores, que tinham por função orientar e acompanhar
o trabalho pedagógico nas escolas situadas nos estabelecimentos prisionais, bem como
por educadores presos, contratados para ministrar aulas nas escolas.
Dessa forma, por mais de vinte anos tal instituição foi responsável pela educação
escolar nos estabelecimentos penais em São Paulo, realizada por meio de acordos e
929

parcerias com outras instituições. Agora, a partir de 2010, a SEE, de acordo com o
disposto nas Diretrizes, deve novamente assumir a responsabilidade pela educação nas
prisões em São Paulo, e é justamente essa passagem da responsabilidade de uma
secretaria para outra que temos por finalidade discutir nessa comunicação.
O método utilizado para desenvolver esta pesquisa envolveu a análise de
documentos referentes às ações efetivadas no estado de São Paulo e dispostas nos
seguintes documentos: pareceres, decretos e resoluções produzidos pelos órgãos
oficiais; e documentos de circulação interna, tais como: comunicados internos,
relatórios, informativos e termos de cooperação. No total, foram analisados 17
documentos relativos ao estado de São Paulo.
Para auxiliar na compreensão da relação existente entre as reformas educacionais
e o que ocorre nas escolas foram utilizadas discussões formulados por Vinão-Frago
(2000), que contribuiu para tal discussão e forneceram bases teóricas ao longo da
pesquisa. Ao analisar os processos de implantação de reformas na atualidade, o autor
apontou para o afastamento entre os reformadores e os atores envolvidos nas ações
cotidianas, destacando que as práticas e tradições muitas vezes são ignoradas,
conferindo caráter a-histórico a tais reformas. Para o autor, as mudanças são processos
lentos e, quando ocorrem de forma rápida, estabelecem vínculos com interesses
corporativos, mais que com necessidades advindas da realidade cotidiana (VINÃO-
FRAGO, 2000).
Na primeira parte do trabalho faremos breve discussão sobre as políticas públicas
educativas na atualidade a fim de se compreendê-las no contexto das políticas
econômicas neoliberais. Em seguida, será discutida a educação escolar na prisão, seus
valores e significados. Para finalizar, serão apresentadas as análises feitas sobre os
documentos.

1. Políticas públicas educativas


Ao se considerar as proposições de políticas públicas para a educação na
atualidade, tais ações de governo necessitam ser analisadas no contexto das políticas
econômicas neoliberais, ou seja, inseridas numa situação mais ampla e que se relaciona
aos rumos econômicos da atualidade. As autoras Sampaio e Marin (2004, p. 1203)
apontam que nas décadas de 1980 e 1990 as alterações nas políticas educacionais e a
interferência dos organismos internacionais de financiamento se tornaram ainda mais
expressivas no campo educacional. Tais políticas, ao serem pautadas por princípios
930

neoliberais, relacionam-se a um conjunto de proposições práticas e a uma cultura de


solução de problemas, permeadas pela ideia de eficiência e de modernidade na busca de
mecanismos mais ágeis para atender às demandas da população, e que promovam cortes
públicos e redução das verbas de atuação em alguns setores sociais, como em educação
(DRAIBE, 1993). Na educação, Gentili (1999) aponta o progressivo processo de
privatização do ensino público, aliado à diminuição do investimento público no campo
educacional. De acordo com o autor: “o neoliberalismo privatiza a escola pública,
negando desta forma o direito à educação das maiorias e aprofundando os mecanismos
históricos de exclusão social aos quais estão submetidos os setores populares”
(GENTILI, 1999, p. 105). A falta de investimento púbico em educação acentua ainda
mais as dificuldades de atendimento às demandas por educação nas prisões.
No que diz respeito à organização do ensino no Brasil, na Constituição Federal
de 1988 consta o direito universal ao ensino fundamental público e gratuito,
independentemente da idade (BRASIL, 1988). No que diz respeito ao direito à educação
escolar nas prisões, Graciano (2005, p. 10) faz a seguinte observação:

[...] no caso da educação, as leis brasileiras garantem universalidade a este


direito, mas as ações do Estado são insuficientes para possibilitar que toda a
população possa exercê-lo, excluindo dele os grupos empobrecidos, como as
pessoas encarceradas.

A educação escolar é uma dimensão essencial da cidadania, sendo princípio


básico a orientar políticas que visam à participação de todos nos espaços sociais e
políticos, e principalmente no que se refere à reinserção no mundo profissional (CURY,
2002). A lei é o primeiro passo para que não ocorra a violação dos direitos que, segundo
Julião (2012), não têm sido efetivados, quando se trata da educação nas prisões.
Ao que parece, a educação escolar nas prisões não tem sido prioridade em São
Paulo, pois,
[...] segundo dados da FUNAP, o estado de São Paulo conta com 147
unidades prisionais [...] A grande maioria dos encarcerados/as possui ensino
fundamental incompleto. A média de reincidência de presos em São Paulo é
de 58%. O atendimento educacional no estado atinge cerca de 8,29% da
população encarcerada (CARREIRA, 2009, p. 51).

O interesse nesta pesquisa é saber quais os esforços traçados no estado de São


Paulo a fim de se promover a integração entre a SAP e a SEE na oferta da educação nas
prisões, cumprindo o disposto no texto das Diretrizes.
931

2. A educação nas prisões


Para se refletir sobre as políticas públicas sobre a educação prisional importa
levantar questionamentos sobre o significado atribuído à ação educativa escolar nas
prisões, levando-se em consideração as especificidades desse ambiente. As leituras que
dizem respeito ao sistema prisional e à escola na prisão permitem refletir sobre a
especificidade desse contexto, que necessita ser considerada quando da formulação de
políticas públicas a ele destinadas.
Num primeiro momento, é importante considerar que ao se trabalhar com a
educação escolar nas prisões estamos diante de duas lógicas antagônicas, uma vez que a
prisão que tem como sentido a atuação para disciplina, controle, punição, vigilância; e a
educação que deveria ter por suposto a autorreflexão crítica2.
Estudos (PENNA, 2003; ONOFRE e LOURENÇO, 2011) indicam que a escola
dentro desse ambiente hostil configura-se de forma semelhante ao que encontramos fora
dele, assumindo característica da educação escolar. No entanto, possui peculiares,
sempre marcadas pelo ambiente prisional (LOURENÇO; ONOFRE, 2011). Tais marcas
dizem respeito ao fato de ser um ambiente no qual a segurança vem sempre em primeiro
lugar. Leme (2007, p. 113) destaca que “a prisão é um lugar de obediência, de
domesticação do corpo, por excelência”. Além disso, são tempos e espaços distintos aos
da escola na rua. Questões específicas a esse contexto como, por exemplo, a alta
rotatividade dos alunos – constantemente transferidos para outras unidades prisionais –
necessitam ser consideradas ao se estabelecer o projeto pedagógico (PAIVA, 2007).
As atividades educativas escolares são marcadas pela tensão existente na prisão.
Sobre isso, Leme (2007, p. 116) esclarece que toda a cultura coercitiva da prisão
prevalece nas ações cotidianas, “influenciando a maneira de ser e agir de cada um”.
Com isso, é possível perceber certa resistência inicial dos sujeitos privados de liberdade
ao se realizar certas atividades em grupos na escola, com medo da exposição e da
vigilância, e apenas, com o decorrer do tempo e confiança, que estes conseguem realizar
atividades que dizem respeito à dinâmica escolar. Além disso, os recursos utilizados
pelo professor são limitados, tendo em vista, que não pode interferir nas questões de
segurança.

2
O conceito autorreflexão crítica foi retirado das formulações de Theodor Adorno (2011) em “Educação
após Auschwitz”, no qual, o autor defende que a “a educação tem sentido unicamente como educação
dirigida a uma autorreflexão crítica” (p. 121).
932

Ainda segundo Leme (2007, p. 147) “a cela de aula não esconde seu lado
grotesco, disciplinador; ela não disfarça suas grades [...] Sendo a cela de aula um lugar
de aprendizagem para alguns, para outros não passará de um refúgio”.
A escola é marcada pela tensão existente no ambiente prisional, mas, apesar
disso, é valorizada pelos detentos como um local diferenciado, onde coisas boas
acontecem, separado do restante da cadeia, onde é possível “ser melhor” (PENNA,
2003, p.49). Assim, apesar do ambiente de opressão que caracteriza a instituição penal,
a escola na prisão se apresenta como uma possibilidade, obviamente que carregando as
marcas dessa instituição.
Ou seja, além de ser um direito dos sujeitos privados de liberdade o acesso aos
estudos, pesquisas indicam o valor que a escola assume neste ambiente de opressão,
destacando a relevância de se investir na educação escolar nas prisões.
É nesse ambiente marcado por contradições que a escola necessita ser garantida a
todos, posto ser direito assegurado constitucionalmente. Refletir sobre a contribuição
que a educação escolar pode ter na vida de um preso é fundamental para a construção de
uma sociedade mais justa e democrática.
No entanto, o fato de a escola ser marcada pelo ambiente prisional necessita ser
considerado quando da elaboração de políticas de formação de professores para atuarem
nesse contexto, a fim de melhor prepará-los para enfrentar tal situação.

1.3. A implantação das Diretrizes no estado de São Paulo


Em São Paulo, conforme já apresentado, a educação nas prisões até 2010 estava
a cargo da SAP, devendo, de acordo com o disposto no texto das Diretrizes, ser
assumida pela SEE. A fim de se investigar como tal processo ocorreu, fizemos um
levantamento acerca dos documentos oficiais publicados após essa data, como
pareceres, decretos, resoluções, produzidos pelos órgãos oficiais, aos quais tivemos
acesso por meio de Publicações no Diário Oficial da União e/ou do estado de São Paulo.
Após, entramos em contato com a equipe técnica da FUNAP, que forneceu alguns
documentos de circulação interna, tais como: comunicados internos, relatórios,
informativos e termos de cooperação. O primeiro documento analisado foi o próprio
texto das Diretrizes para a oferta de Educação de Jovens e Adultos em situação de
privação de liberdade nos estabelecimentos penais.
Todos os documentos, num total de 17, foram impressos e arquivados por ordem
cronológica. Após essa etapa, elaboramos um protocolo para análise de cada
933

documento, contendo tópicos previamente estabelecidos e que orientaram a leitura,


como: órgão emissor, tipo de documento (resolução, decreto, etc.), local da publicação,
interessado, data, assinatura, número de páginas, assunto/título, decisões/deliberações
sobre educação nas prisões em São Paulo, referências bibliográficas e comentários das
pesquisadoras. Apresentamos a seguir uma síntese dos principais aspectos destacados
com a leitura dos documentos pesquisados.
Foi possível evidenciar que o texto das Diretrizes (BRASIL, 2010) é um marco
normativo importante, ocasionando diversas mudanças após a sua promulgação,
expressando a necessidade de uma orientação nacional para a garantia do direito à
educação nos estabelecimentos penais. Até 2010, não havia uma diretriz politico-
pedagógica nacional para os sujeitos privados de liberdade. Nele, define-se a
necessidade de uma proposta pedagógica para a educação nas prisões, que deve ser
distinta para cada ente federado. É dada ênfase ao respeito às peculiaridades locais,
tendo em vista que a realidade penitenciária brasileira é heterogênea. Seu objetivo é
apresentar elementos para a definição de uma política macro e não para singularidades
locais.
Um aspecto importante refere-se à ênfase dada à necessidade de programas de
formação para educadores, agentes penitenciários e todos os profissionais que trabalham
no ambiente prisional, para que assim se efetive uma mudança de cultura e práticas, e
dessa forma, a população carcerária tenha acesso e oportunidade de educação e não seja
o mais violento produto da exclusão social.
Para esta pesquisa, importa destacar o fato de o documento explicitar
necessidade de as Secretarias de Educação nos diferentes estados da União assumirem a
educação nas prisões, em parceria com órgãos que até então eram responsáveis por tal
atividade.
No caso específico de São Paulo, de acordo com a documentação consultada,
para atender a essa solicitação foi criado, por meio de um decreto, um Grupo de
Trabalho composto por representantes da Casa Civil, da Secretaria da Administração
Penitenciária (SAP); da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e
Tecnologia (SDECT) e da Secretaria de Estado da Educação (SE) (SÃO PAULO,
2011).
Um destaque a ser feito sobre esse decreto refere-se ao fato de não ter nenhum
membro de universidades ou sociedade civil para a realização dos estudos e ações.
Nesse sentido, cabe sinalizar a manifestação pública divulgada por diversas entidades
934

signatárias3 em 21 de setembro de 2011, com o objetivo se posicionar acerca do


relatório final do Grupo de Trabalho Educação no Sistema Prisional do Estado de São
Paulo, momento em que apresentam uma forte crítica à forma restrita às esferas de
governo na implantação das Diretrizes Nacionais em São Paulo, ou seja, sem a
participação da sociedade civil e dos movimentos sociais (AÇÃO EDUCATIVA et. al.,
2011).
Tal Grupo de Trabalho propôs o desenvolvimento e a implantação do Programa
Estadual de Educação nas Prisões (PEP), vinculado à Universidade Virtual do Estado de
São Paulo (UNIVESP), por meio de trabalho cooperativo entre as secretarias
envolvidas, objetivando “a oferta de Ensino Básico integrado em todas as unidades
prisionais do estado por meio de ensino presencial distribuído e intensamente suportado
por tecnologia” (SÃO PAULO, 2011, p. 2). No que se refere ao currículo, afirma-se que
terá uma base nacional comum e uma parte complementar voltada ao desenvolvimento
da pessoa, considerando seus antecedentes de ordem social, econômica e cultural, bem
como as peculiaridades do local, tal como previsto na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional n. 9294/96. Não foi possível verificar destaques às peculiaridades da
Educação de Jovens e Adultos no contexto prisional, que necessitam ser atendidas,
conforme apontado por diferentes pesquisadores (HORA e GOMES, 2007; PAIVA,
2007). Ainda, o documento dispõe que a UNIVESP prestará orientação acadêmica e
metodológica, em seu campo de atuação, para a execução do PEP (SÃO PAULO,
2011).
De acordo com a regulamentação estabelecida para a implantação do PEP nas
Unidades Prisionais (SÃO PAULO, 2012a), fica fixada que a carga horária das aulas
será de quatro horas diárias, em turmas multiseriadas, e os alunos deverão ser
cadastrados no sistema oficial da SEE.
Foi aberto concurso para professores para atuar nos estabelecimentos penais do
Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2012b). As inscrições ocorreram nas Diretorias de
Ensino4 que possuíam escolas vinculadoras de classes das unidades prisionais. No que
se refere à atribuição de aulas, de acordo com o informativo estas “serão realizadas por
áreas de conhecimento” (SÃO PAULO, 2012b, p. 2). O docente que vai atuar nas

3
Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Informação; Conectas Direitos Humanos; Instituto de Defesa do
Direito de Defesa; Instituto Praxis de Direitos Humanos; Instituto Pro Bono; Instituto Terra, Trabalho e
Cidadania; Pastoral Carcerária; Relatoria Nacional para o Direito Humano à Educação (Plataforma
DHESCA Brasil); PET – Educação Popular da UNIFESP/BS
4
Órgão administrativo da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, que organiza as escolas por
regiões.
935

unidades prisionais será contratado para esse projeto específico. Nada foram
encontradas informações que se referissem à necessidade de formação específica para
esses profissionais.

Para finalizar
A análise dos documentos referentes à implantação das Diretrizes para a
educação nas prisões no estado de São Paulo evidenciou distância existente entre o
Grupo de Trabalho e os educadores que estavam atuando nas escolas (coordenadores e
educadores presos), bem como em relação à sociedade civil que vinha debatendo tais
questões, explicitando distância entre o universo dos reformadores e daqueles
envolvidos com as ações práticas (VINÃO-FRAGO, 2000).
O fato de o Grupo de Trabalho não ter se reunido com os educadores presos, até
então responsáveis pela educação escolar nas prisões paulistas, evidencia a imposição
de novas regras e maneiras de atuação, desconsiderando-se todo um saber acumulado
por anos de experiência.
Ademais, foi possível evidenciar processo truncado, com idas e vindas, no que
diz respeito às proposições feitas e, nos documentos finais, ficou evidente a dificuldade
de diálogo entre a SEE e a SAP, ou seja, a SEE não está considerando a experiência
acumulada da FUNAP, instituição que possui mais de duas décadas de experiência com
a educação nas prisões em São Paulo. Disso resulta a imposição de modelo escolar
estabelecido para contextos diversos daqueles da instituição prisional.
Ao analisarem a escola na prisão, Hora e Gomes (2007) atentam para o fato
dessa instituição se ver condicionada a dispositivos disciplinares específicos, que dizem
respeito à manutenção da ordem na instituição penitenciária. Por isso, entendem que as
práticas pedagógicas desenvolvidas necessitam se amparar em procedimentos
diferenciados, que levem em conta os tempos e espaços prisionais. Nesse sentido Paiva
(2007) ressalta questões relacionadas à duração das aulas, à negociação dos horários, e
especialmente a necessidade de se atentar às características dos alunos, quais sejam,
jovens e adultos presos, duplamente discriminados, por não terem concluído a
escolarização no tempo adequado, e por sua condição de privação de liberdade. Um
aspecto que se destaca, como já afirmado, é a alta rotatividade dos alunos, do que
decorre a necessidade de se pensar o currículo em blocos. Também, a necessidade de se
levar em consideração algumas facetas, como: facilitar acesso dos detentos à escola;
garantir a participação dos detentos na elaboração dos programas educativos para que
936

respondam aos seus anseios e necessidades; facilitar a ação dos professores e dos outros
agentes educativos que atuam nas prisões (TEIXEIRA, 2007).
Evidenciou-se que em São Paulo a Secretaria Estadual de Educação é a atual
responsável pela educação prisional, vinculada à modalidade da Educação de Jovens a
Adultos, tal como previsto nas Diretrizes. Resta saber como será enfrentada a
especificidade do contexto prisional. Ainda, se o direito à educação será assegurado a
todos os que se encontram na situação de detentos.

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Grupo de Trabalho Educação no Sistema Prisional do Estado de São Paulo, do Governo
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939

Comunicação

Desafios oferta pública e obrigatoriedade do ensino médio no estado do Espírito


Santo em 2016

Michele Pazolini
UFES
Eduardo Augusto Moscon Oliveira
UFES

Resumo: Trabalho que propõe a discutir os desafios a oferta do Ensino Médio no


estado do Espírito Santo. No Brasil, o Direito à Educação pública no contexto pós-
constituição federal de 1988 tem se ampliando quantitativamente e qualitativamente.
Mas ainda é um processo em curso não consolidado, em especial no acesso ao Ensino
Médio. Essa etapa da educação básica tem sua expansão ligada ao desenvolvimento da
sociedade brasileira marcada pela seletividade e exclusão. Na reforma educacional dos
anos 1990, tanto a educação infantil como o ensino médio não foram priorizados. Com a
Emenda Constitucional nº 59/2009 a Educação Básica passa a ser obrigatória para
todos aqueles que tenham entre 04 e 17 anos, sendo cobrada a obrigatoriedade somente
a partir de 2016.Contudo, apesar de se constituir como um avanço, a obrigatoriedade
deixa de existir para os cidadãos acima dos 17 anos, afetando aqueles que apresentam
defasagem escolar. Apesar da expansão e democratização do acesso a educação básica,
a adequação idade/série educacional ainda é um desafio imenso no Brasil. Neste
trabalho verifica-se que apesar das regulamentações legais acerca da obrigatoriedade
escolar que dá institucionalidade ao direito à conclusão da educação básica, a sua
garantia e efetivação tem sido marcada por problemas, contradições e desafios. O
Espírito Santo, no contexto brasileiro, não foge à regra, uma vez que a realidade
observada é preocupante. Com uma oferta que pouco se amplia por parte da governo
estadual, números elevados de evasão, repetência e distorção idade série, evidenciam
que o planejamento para incluir os jovens de 15 a 17 anos no ensino médio em escola
públicas estaduais em 2016 tem sido é insuficiente. É necessário uma maior
mobilização da sociedade civil para que o direito á educação se efetive ‘de fato’ com
uma oferta de qualidade para esta etapa da educação básica.
Palavras-chave: Ensino médio. Obrigatoriedade. Emenda constitucional 59/2009.
940

INTRODUÇÃO

No Brasil, o direito à educação pública no contexto pós-constituição federal de 1988


tem se ampliando quantitativamente e qualitativamente, mas ainda é um processo em
curso não consolidado. Na educação básica pública, a oferta tem se consolidado no
ensino fundamental. Com a emenda 59/2009 a educação básica torna-se obrigatória a
todos com idade entre 15 a 17 anos. Conforme Horta (1998) se a educação é Direito
subjetivo, com a obrigatoriedade o Estado é incentivado a oferta-la. Ocorre que o
Ensino Médio tem sido historicamente negado a parcela significativa dos jovens
brasileiros. Os desafios a universalização dessa etapa da educação básica no Brasil são
imensos. No estado do Espírito Santo não são menores e necessitam ser enfrentados
pelo poder público com a participação da sociedade civil.

ENSINO MÉDIO NO BRASIL: SELETIVIDADE, DUALIDADE E


DESIGUALDADE

Historicamente, o ensino médio no Brasil sempre foi marcado pela seletividade de


acesso e desigualdade social. Antes denominado ensino secundário, essa modalidade de
ensino era basicamente destinada às elites, afastando a oportunidade de aproximação da
classe popular, impossibilitando a chance de acesso ao ensino superior.

Souza (2008) destaca que era destinada ao grupo social abastado, apresentando seus
estudos desinteressados, expressando a distinção cultural de uma elite, bem como
preparar estes jovens para o ingresso nos cursos superiores.

No Brasil império (1822-1889), o ensino secundário foi marcado de uma “situação de


extrema precariedade e desorganização” (SOUZA, 2008, p.90). Apesar da função
propedêutica do secundário, não existia um currículo próprio. Apresentava-se de
maneira aleatória as matérias que seriam ministradas em cada estabelecimento de
ensino. O aluno tinha liberdade de começar um novo curso sem ter, necessariamente,
concluído o curso anterior. De estrutura precária, com pequeno numero de
estabelecimentos de ensino, oferecia baixa remuneração ao docente.
941

O início do século XX é marcado por políticas que levaram a mudanças significativas


ao ensino secundário. A Reforma de 1925, a Reforma Francisco Campos (1931), o
Manifesto dos Pioneiros (1932) e a Reforma Capanema são momentos importantes de
debates e decisões acerca da educação em geral e do ensino secundário.

Dentre essas reformas, merece destaque a Reforma Francisco Campos pois foi a partir
deste momento que o ensino secundário adquiriu organicidade. O currículo tornou-se
seriado e a frequência obrigatória: “[...]com dois ciclos, um fundamental e outro
complementar. A habilitação no ensino secundário tornou-se exigência para o ingresso
no ensino superior”, destaca Ramos ( 2011, p.230).

Neste contexto não apenas a seletividade foi alvo de discussões, mas a dualidade entre
ensino propedêutico e ensino profissional. Somente na década de 1930 esta disputa se
consolidou pois o processo de industrialização do Brasil, passou a demandar por mão
de obra qualificada. Assim, a educação propedêutica, que já era insuficiente tornou-se
ainda mais escassa e inacessível para as classes socialmente desfavorecidas.

A Reforma Capanema em 1942, com as leis orgânicas, iniciou uma nova configuração
do ensino secundário. O ensino profissional, passou a ser ofertado voltado para a área
industrial, do comércio, agrícola e normal. O Normal, embora profissionalizante, era
considerado como ensino secundário, voltado para o prosseguimento de estudos em
nível superior.

Somente o curso secundário proporcionava acesso ao ensino superior. O ensino


profissional não tinha essa prerrogativa, o que confirma a seletividade em favor de um
grupo social restrito. De acordo com Nascimento (2007), havia o estabelecimento de
“[...] duas organizações paralelas; o ensino secundário destinado a preparar as
individualidades condutoras, e o profissional, destinado a formar mão-de-obra
qualificada para atender ao setor produtivo “(p. 82).

O Decreto-Lei nº 4.048/1942 instituiu o SENAI com a finalidade de qualificar mão de


obra para atuar principalmente nas indústrias, onde eram oferecidos cursos como:
padeiro, costureiro(a), carpinteiro, marmorista, gravador têxtil, tecelão de tecidos,
joalheiro, impressor, vidreiro e etc ( ROMANELLI, 1993).
942

A estrutura da educação básica no Brasil teve sua alteração anunciada na LDB 4024/61
e modificada com a lei nº 5.692/71 que fundiu o primário ao ginásio, constituindo o
1º grau (hoje ensino fundamental) com duração de 08 anos de duração e transformando
o secundário em 2º grau, hoje ensino médio, com três anos de extensão. Com a lei
5692/71, houve a implantação do ensino médio integrado (integração forçada/tecnicista)
que teve consequências significativas no conjunto da educação básica brasileira. Neste
período histórico, houve a criação do ensino de 2º grau, que, foi orientado a ser
implantado com profissionalizante, com vistas a contribuir, por um lado, para o
desenvolvimento econômico e por outro para garantir a ordem pública.

A Reforma do ensino de 1º e 2º graus (Lei nº 5692/71) direcionou suas determinações a


contenção do movimento operário e a institucionalização da formação profissionalizante
necessária ao incremento da produção ambicionada pela burguesia industrial e ancorada
na qualificação mínima dos trabalhadores industriais (ROMANELLI, 1993)

A Lei definia os currículos como constituídos por disciplinas de obrigatoriedade


nacional, escolhidas pelo Conselho Federal de Educação (atual núcleo comum). Além
disso, os Estados podiam indicar disciplinas obrigatórias em suas jurisdições (atual
parte diversificada do currículo). Também na década de 1970, surgiu uma política de
valorização do ensino técnico profissionalizante (SAVIANI, 2007).

Em relação à educação Profissional, ao tornar compulsória a profissionalização ao nível


do 2º grau, a reforma elimina (do ponto de vista legal) a dualidade entre educação geral
e formação profissional. Com esse modelo, o regime militar - marcado nos anos 1970
por forte crescimento econômico – se propunha a dar uma resposta à ausência de
recursos humanos qualificados, fundamentado na teoria do capital humano.

Salm (1980) destaca que as empresas, no curto prazo, não precisam das escolas: elas
mesmas podem treinar o seu pessoal e com isso aumentar sua produtividade. Porém,
Frigotto (1984), afirma que a escola é uma mediação que interfere de modo não direto
na relação entre investimento e desenvolvimento. A mediação (em questão) dá-se pelo
fornecimento de um saber geral que se articula com o específico e o prático, um saber
que se desenvolve no interior do processo produtivo.
943

Além disso, mediante a dotação de traços de comportamentos dominantes e


convergentes com a lógica aquisitiva, acumulativa, dócil e individualista, necessária ao
capital, restabelece-se um vínculo não imediato, mas mediato, com a produção material.
Kuenzer (1995) constatou que os saberes tácitos eram de importância relevante para a
produção, e que a escola desempenhava inúmeros papéis dentro do sistema produtivo,
dentre os quais a função de legitimadora das posições na divisão interna do trabalho.
Porém, tal tentativa de profissionalização em massa, não foi suficiente nem para
resolver os problemas educacionais e tampouco profissionais, demandados a época.

Para tentar reparar os efeitos da Lei 5.692/71, foi publicado a Lei Federal nº 7.044/82,
tornou facultativa a profissionalização no ensino de “segundo grau”. Se por um lado o
ensino médio ficou livre das “amarras” da profissionalização, por outro ela restringiu o
ensino profissional às instituições especializadas nessa modalidade de ensino. Dessa
forma as mudanças ocorridas contribuíram para a falta de identidade do ensino médio
no Brasil e levando também a falsas expectativas quanto à educação profissional.

O ENSINO MÉDIO NO BRASIL A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE


1988

A Constituição Federal de 1988 (CF/88), no art. 205 garante o direito à educação, como
direito de todos. No art. 208 o ensino fundamental obrigatório era de oito anos, somente
para crianças de 06 e 14 anos. A educação básica apesar de Direito, o fato de ter a
obrigatoriedade vinculada a somente uma etapa da educação básica acabou por
restringir a prioridade a efetivação apenas para o ensino fundamental (HORTA,
1998).

A partir da década de 1990, começam a surgir políticas visando assegurar o direito à


educação. Em 1990 é criado o Estatuto da criança e do adolescente para assegurar a
proteção da criança e do adolescente, e reafirmar o seu direito à educação. Soma-se a
isso, em 1996, a Lei das Diretrizes e Bases (LDB), lei nº 9.394 (BRASIL, 2008).

Na reforma educacional dos anos 1990, tanto a educação infantil como o ensino médio e
educação infantil não eram prioridades, pouco se fez pela sua efetivação. O Fundo de
944

Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do


Magistério (FUNDEF- Emenda Constitucional nº14/1996), o qual era responsável por
fazer a redistribuição dos recursos provenientes de impostos aplicados pelos municípios
e Estados, estabelece o Ensino Fundamental como prioridade, empenhando 15% dos
25% do mínimo constitucional, para a manutenção e desenvolvimento do ensino. Tal
situação somente deverá será alterada a partir de 2007, com Fundo de Manutenção e
desenvolvimento da Educação Básica – FUNDEB (Lei nº 11.494/07) que passa abarcar
toda a educação básica

Em 2009, com a Emenda Constitucional nº 59/2009 a Educação Básica passa a ser


obrigatória para todos aqueles que tenham entre 04 e 17 anos, tendo até o ano de 2016
para sua efetivação plena. Contudo, apesar de se constituir como um progresso, a
obrigatoriedade deixa de existir para os cidadãos acima dos 17 anos, afetando aqueles
alunos que apresentam defasagem escolar. Apesar da expansão e democratização do
acesso a educação básica, a adequação idade/série educacional ainda é um desafio
imenso no Brasil.

Dados do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio


Teixeira) revelam as taxas de distorção idade-série dos alunos em período para a
freqüência no ensino médio. No Brasil, no ano de 2010, foram constatados que 41,5%
dos jovens que freqüentavam a 1ª série, 36,2% na segunda série e 35,3% na terceira
série do ensino médio estavam defasados quanto sua idade-série. Por isso, o Ensino
Médio,
Pode ou não ser obrigatório, pois vai depender do desenvolvimento do aluno
nas séries do Ensino Fundamental. Vencendo-as nas etapas adequadas,
completará o ensino médio aos 17 anos e assim o mesmo se torna obrigatório.
Contudo, se não conseguir ultrapassar as séries do Ensino Fundamental, antes
de completar 17 anos, não existirá a obrigatoriedade para o Ensino Médio
(CURY; FERREIRA, 2010, p. 135).

Sendo assim, a obrigatoriedade da educação básica não abrange de fato o ensino médio
em sua plenitude. Além disso, a sua implementação progressiva, com a obrigatoriedade
somente a partir de 2016, mostra a ausência, por parte do Estado, de estrutura para
implementação constitucional imediata do direito anunciado pela emenda
constitucional 59/2009.
945

ENSINO MÉDIO NO ESPÍRITO SANTO: PROBLEMAS E DESAFIOS

A situação do estado do Espírito Santo não é muito diferente do que e ocorre no Brasil.
As poucas ações realizadas por parte da esfera Estadual desde o ano de 2010, com o
proposito do atendimento a última etapa da educação básica, não foram satisfatórias.

De acordo com os dados do IBGE do ano de 2010, o estado do Espírito Santo possuía
uma população estimada em 3.514.952 habitantes, destes 800.318 eram crianças,
adolescentes e jovens que estavam em idade escolar, de 04 a 17 anos. Do total das
crianças e jovens, 181.921 corresponde a população residente de jovens entre 15 e 17
anos. Dados levantados pela Secretaria de Educação do Espírito Santo (SEDU), de
2010, 12.893 não frequentaram à escola (LIMA; SILVA, 2013).

Entre os anos de 2010 a 2012, levando em conta as matrículas efetuadas e os egressos


do ensino médio, os dados são preocupantes: em 2010, dos 169.028 matriculados nas
redes de ensino, apenas 31.292 concluíram o ensino médio no ano de 2012, ou seja,
apenas 18,5 % dos matriculados concluíram esta etapa de ensino no estado do Espírito
Santo (ESÍRIT0 SANTO, 2011).

Outro dado que merece destaque, se refere à distorção idade-série de alunos que
freqüentaram o ensino médio no estado do Espírito Santo. No ano de 2010, dados do
INEP assinalam que 25,1% dos alunos apresentaram defasagem quanto à sua idade e a
idade recomendada para a série que o mesmo deveria cursar. Observa-se, ainda, que o
pico da distorção idade-série no ensino médio, acontece, principalmente, na 1ª série,
chegando esse índice a 29,1% no ano em questão. No contexto do estado do Espírito
Santo, diferentes situações, concorrem para excluir de forma maciça os jovens da escola
( BRASIL, 2012).

Outro ponto a ser considerado acerca da situação do Ensino Médio no Brasil, e em


especial no estado do Espírito Santo, refere-se aos docentes desta etapa de ensino. O
Relatório de Auditoria (Fiscalização nº 177/2013) realizado pelo Tribunal de Contas da
União, concluiu que, de maneira geral, “[...] não há professores com formação
específica em quantidade suficiente para ofertar as disciplinas obrigatórias especificadas
para o currículo do ensino médio”. A estimativa, segundo o Relatório, é de que
946

existiam, no ano de 2012, mais de 46 mil professores em sala de aula, sem apresentar
uma formação específica. Soma-se a essa situação, que 69% dos professores do Espírito
Santo estão contratados em designação temporária.

Tendo em vista diferentes fatores, como as elevadas taxas de abandono, o déficit de


profissionais habilitados para exercem a docência em disciplinas específicas, a pequena
expansão da rede física estadual pública nos últimos 12 anos, sinaliza o enorme desafio
da oferta do ensino médio, mesmo para a população com idade entre 15 e 17 anos.

CONCLUSÃO

O Ensino médio no Brasil sempre se constituiu enquanto etapa de maiores desafios


frente à sua funcionalidade, efetividade e obrigatoriedade. As políticas públicas ao
longo da história do Brasil não ofereceram mecanismos que assegurassem o acesso
desta etapa de ensino como Direito.

Superados estes percalços em torno das prescrições legais, especificamente a partir da


Emenda Constitucional 59/2009, que torna a educação básica no Brasil obrigatória e
gratuita para todos em idade de 04 a 17 anos, devendo ser implementada
progressivamente até o ano 2016, outros problemas se apresentam enquanto
desafiadores no que diz respeito ao ensino médio no Brasil e no estado do Espírito
Santo.

Destaca-se ainda a importância ampliar os espaços públicos de formação de professores


habilitados, bem como a valorização da categoria, reconhecendo-a como imprescindível
no processo de investimento na qualidade da educação. Também, tornar a profissão
docente atrativa, expandindo o horizonte de possibilidades deste profissional. Soma-se
a isso, a necessidade e urgência de ampliar os investimentos públicos em infraestrutura.

O Espírito Santo, no contexto brasileiro, não foge à regra, uma vez que a realidade
observada é preocupante. Com uma oferta que pouco se amplia por parte da governo
estadual, números elevados de evasão e distorção idade série, evidenciam que o
planejamento para incluir os jovens de 15 a 17 anos no ensino médio em escola
947

públicas estaduais em 2016 é insuficiente. Da forma como está, acaba por reforçar
o mecanismo perverso de exclusão do jovem.

Espera-se que a elaboração do plano estadual de educação com a participação da


sociedade, o ensino médio possa ser incluído como pauta prioritária na esfera estadual
para que centenas de jovens possam ser incluídos e tenham educação de qualidade.

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948

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949

Comunicação

Os anos finais da Educação Básica em busca de uma identidade histórica:


Reinventando o Ensino Médio?

Mislene de Fátima Sebastião


UFV- CNPq
Cristiane Aparecida Baquim
UFV- CNPq

Resumo: O presente trabalho apresenta resultados de uma pesquisa de iniciação


cientifica, e tem por finalidade analisar o processo de implantação do projeto
Reinventando o Ensino Médio, criado pela Secretaria de Estado da Educação de Minas
Gerais (SEE/MG), em duas escolas estaduais, uma localizada na cidade de Ponte Nova
e a outra na cidade de Viçosa. Para tal, realizamos análise da legislação referente ao
Projeto, consulta à bibliografia específica sobre o tema e entrevistas com as
coordenadoras responsáveis pelo projeto nas escolas pesquisadas. Concluímos que, ao
longo de sua história, o Ensino Médio passou por diversas transformações, mas que
nenhuma delas foi capaz de definir, para este nível de ensino, uma finalidade intrínseca.
Em busca dessa definição, a implantação do Projeto Reinventando, no cotidiano das
escolas pesquisadas, tem engendrado alguns desafios a serem enfrentados pelos alunos e
professores, pois o projeto se constitui em algo novo para toda a comunidade escolar.
Palavras-chave: Reinventando o Ensino Médio; Política educacional mineira; História
do Ensino Médio no Brasil.

1 INTRODUÇÃO
Quando se pensa no sistema educacional brasileiro é consensual a ideia de que
o Ensino Médio, nível de ensino que por décadas não foi prioridade das políticas
públicas educacionais brasileiras, pois as atenções estavam voltadas para o Ensino
Fundamental e Superior, gera os mais variados e controversos debates, seja quando se
trata dos problemas do acesso e da permanência, seja pela qualidade da educação
oferecida, ou ainda, pela discussão sobre sua finalidade.
950

Para Kuenzer (1997), a história do Ensino Médio, por seu caráter


intermediário, onde se propõe o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no
Ensino Fundamental e preparação básica para o trabalho e para a cidadania, é a
história do enfrentamento da tensão entre educação geral e educação específica. O
Ensino Médio assume função de, simultaneamente, preparar para continuidade dos
estudos e para o mundo do trabalho.
A origem da chamada Escola Média, no mundo ocidental, reservada à faixa
etária da adolescência, remonta ao período medieval. No Brasil, a Escola Média foi
dividida em duas partes, uma permanecendo ligada à Escola Elementar, formando o
Ensino de 1º grau, e a outra passou a constituir o Ensino de 2º grau.
Neste sentido, o trabalho que desenvolvi enfocando duas escolas estaduais (A e
B) enquanto estudante do curso de Pedagogia e bolsista de iniciação científica
patrocinado pelo PIBIC (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica)
permitiu-me identificar que os debates existentes em torno da última etapa da Educação
Básica são muitos, e que a ideia de buscar encontrar sua identidade por meio da criação
de programas voltados para este nível de ensino vem ocorrendo ao longo de toda a
história da educação no Brasil.
O projeto de iniciação científica teve como título “A implantação do projeto
Reinventando o Ensino Médio em Viçosa e Ponte Nova: análises e perspectivas” e
como objetivo estudar essa política educacional mineira criada no ano de 2011, a fim de
atender às atuais demandas socioeconômicas que, emanadas da sociedade, ressoam no
ambiente escolar.
O Projeto da Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais (SEE/MG)
propõe reformular o Ensino Médio, propiciando a reconstrução de sua identidade como
última etapa da Educação Básica, por meio de uma ordenação curricular e estratégias
didático-pedagógicas inovadoras que estabeleçam uma adequada articulação entre
educação, empregabilidade e cidadania. Objetiva ainda estabelecer uma efetiva relação
do conhecimento com a realidade que possibilite a construção da autonomia e da
emancipação dos jovens, seja para a conclusão ou continuidade dos estudos ou para a
preparação à inserção no mundo do trabalho.
O projeto Reinventando o Ensino Médio se constitui em uma política pública
complexa e atual, que assim como proposto pela SEE/MG, engendrará mudanças na
forma de organização do Ensino Médio em todo o Estado. A fim de melhor
compreender a implantação do projeto nas escolas supracitadas realizamos entrevistas
951

com as coordenadoras do Reinventando de ambas as escolas, análise da legislação


referente ao Projeto e consulta à bibliografia específica produzida a respeito das
políticas públicas que buscam compreender os (des)caminhos do Ensino Médio,
principalmente no Estado de Minas Gerais.
A própria nomenclatura utilizada para nomear esta etapa do processo de
escolarização já sinaliza para essa falta de autonomia conceitual, pois em alguns
momentos ela aparece como uma fase escolar que se encontra “espremida” entre o
Ensino Fundamental e o Superior, em outras ocasiões se apresenta como um ensino
marginalizado e até dispensado ou dispensável pelos cursinhos pré-vestibulares
essencialmente voltados à preparação para o acesso ao Ensino Superior ou, no caso do
ensino profissionalizante, pela prática direta na produção. Isso é o que nos conta a
história.

2 ENSINO MÉDIO NO BRASIL

A história do Ensino Médio brasileiro é marcada pela busca de uma identidade,


pela superação da dualidade que marca esse nível de ensino que tem a função de ofertar
uma educação que, ao mesmo tempo, prepare o sujeito para o mundo do trabalho e para
dar continuidade aos estudos.
Segundo Kuenzer (2009) a formação profissional no Brasil como
responsabilidade do Estado teve início em 1909, a partir da criação de 19 escolas de
artes e ofícios em diferentes unidades da federação, mas a autora chama nossa atenção
para o fato de que essas escolas não tinham por objetivo preparar mão de obra, tendo em
vista que o desenvolvimento industrial era praticamente inexistente na época. O que
buscavam era educar pelo trabalho os órfãos, os pobres e os desvalidos, e retirá-los das
ruas. Nos anos 40 com o desenvolvimento dos diversos ramos profissionais, começaram
a aumentar o número de escolas para atender aos diferentes ramos ocupacionais.
Durante o Estado Novo (1937-1945), na ditadura Vargas, foram empreendidas
algumas mudanças no ensino que ficaram conhecidas como Reformas Capanema,
regulamentadas por decretos-leis que ordenaram o Ensino Primário, Secundário,
Industrial, Comercial, Normal e Agrícola, assinados entre os anos de 1942 a 1946. Esses
decretos, denominados de Leis Orgânicas do Ensino, ajustaram as propostas
pedagógicas existentes na época voltadas à formação de intelectuais e trabalhadores e as
952

transformações que estavam ocorrendo no mundo do trabalho (ARANHA, 1996, p.


202).
Em 1942 é criado o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e
em 1946 o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), ambos mantidos
pela iniciativa privada, complementando a formação da força de trabalho. Neste mesmo
ano o Decreto Lei nº 4244/42 estabeleceu que o primeiro ciclo do ensino secundário
passasse a ser chamado de Ginasial e o segundo ciclo de Colegial, sendo reestruturados
como Clássico e Científico, ambos preparatórios para a universidade.
Ghiraldelli Junior (2006) acredita que as Leis Orgânicas do Ensino
oficializaram o dualismo educacional, tendo em vista que esta lei tratava de organizar
um sistema de ensino dividido, tendo de um lado o Ensino Secundário público
destinado, conforme texto da lei, às chamadas “elites condutoras”, e de outro o Ensino
Profissionalizante para os outros setores da população.
Para Oliveira (2000), no auge do ideário nacional-desenvolvimentista
brasileiro, durante as décadas de 1950, 1960 e até mesmo 1970, foi bastante forte no
país a preocupação com a educação como impulsionadora do processo técnico, por meio
da formação de trabalhadores dentro dos padrões exigidos pelo modelo de
industrialização adotado. Segundo a autora, os esforços para qualificar os recursos
humanos, de modo a atender as demandas da economia, contribuindo para a criação de
condições gerais de produção, marcaram este período.
Neste sentido, num período onde as ideias tecnicistas dominavam, foi criada a
Lei n. 5692, de 11 de agosto de 1971, que reestruturou o ensino de 1º e 2º graus, e
impôs ao último a profissionalização obrigatória, impondo a todos a mesma trajetória
escolar. Entretanto, o intuito de promover mudanças nesse nível de ensino por meio de
textos oficiais não termina aqui.
Em 5 de outubro de 1988 é promulgada a Constituição brasileira atual que
determina como dever do Estado a “progressiva universalização do Ensino Médio
gratuito”. Para Krawczyk (2003), como instrumento regulatório em 20 de dezembro de
1996 é promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDBEN) situando o
Ensino Médio como etapa integrante da Educação Básica, juntamente com a Educação
Infantil e o Ensino Fundamental.
Na LDB de 1996 foi reservada ao Ensino Médio a seção IV, onde o artigo 35
especifica que esse nível tem por finalidades: consolidar e aprofundar os conhecimentos
adquiridos no Ensino Fundamental, possibilitando a continuidade dos estudos; a
953

preparação básica para o trabalho e a cidadania do jovem; aprimoramento do educando


como pessoa humana, o que inclui formação ética, desenvolvimento da autonomia
intelectual e do pensamento crítico e a compreensão de fundamentos científico-
tecnológicos dos processos de produção, relacionando a teoria com a prática, isto no
ensino de cada disciplina. E o artigo 36 traz diretrizes sobre o currículo a ser adotado
nesse nível de ensino.
Em 1998 foram instituídas as primeiras Diretrizes Curriculares Nacionais para
o Ensino Médio (DCNEM) que traziam definições sobre princípios, fundamentos e
procedimentos a serem levados em consideração pelas unidades escolares que
ofertavam este nível de ensino durante a organização pedagógica e curricular. As
diretrizes apresentavam um discurso até muito coerente sobre a valorização da educação
para a vida e não mais somente para o trabalho; defendia um Ensino Médio unificado,
onde a formação técnica e a científica fossem integradas.
Entretanto, segundo Kuenzer (1997), ao analisarmos mais a fundo as DCNEM
de 1998 percebemos que elas estavam marcadas pelo ideário neoliberal, pois seguiam os
mesmos pressupostos da reforma efetivada na educação e no Estado na década de 1990.
E, ainda, nas diretrizes permaneceu a separação entre formação geral e formação para o
trabalho e a subordinação da educação às demandas do mercado de trabalho, dando
outros significados a conceitos como autonomia, flexibilização e descentralização.
Em 2008, por meio da Lei 11.741 é incluída na LDBEN a Seção IV-A,
permitindo a integração do Ensino Médio à Educação Profissional. Com isso, além dos
objetivos supracitados esse nível de ensino assume ainda, facultativamente, a
responsabilidade da oferta da habilitação profissional, preparando os cidadãos “para o
exercício de profissões técnicas”, sendo que os programas que atendam a essa formação
técnica em nível médio podem ser desenvolvidos “nos próprios estabelecimentos de
Ensino Médio ou em cooperação com instituições especializadas em educação
profissional”, atendida a formação geral do aluno.
Em conformidade com esse contexto, no ano de 1999, de acordo com Oliveira
(2002), as diretrizes político-educacionais delineadas para o Estado de Minas Gerais
articularam uma nova política para o Ensino Médio, concretizada nas diretrizes da
Escola Sagarana, que “define-se por um conjunto de planos e atitudes baseadas no
compromisso social com as futuras gerações, pela composição integral da política
educacional de Minas Gerais e sua identidade com o povo”.
954

Recentemente a Emenda Constitucional n. 59, de 11/11/2009, foi aprovada em


âmbito nacional, ampliando o ensino obrigatório para crianças e adolescentes dos 4 aos
17 anos de idade, devendo ser implementada progressivamente até 2016. Desse modo,
busca-se fortalecer a ideia de universalizar o acesso e a permanência ao Ensino Médio à
população brasileira e colaborar para com a sua especificidade enquanto última etapa da
educação básica.
Em 2011, a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais, buscando
responder ao desafio de dar outro significado à escola pública estadual, de modo
especial ao Ensino Médio como lugar que disponibiliza aos jovens uma formação
qualificada, cria o Projeto Reinventando o Ensino Médio.
O projeto Reinventando o Ensino Médio busca reformular esse nível de ensino,
de modo a reconstruir sua identidade como última etapa da Educação Básica, por meio
de uma ordenação curricular e estratégias didático-pedagógicas inovadoras que
estabeleçam uma articulação apropriada entre educação, empregabilidade e cidadania,
uma efetiva relação do conhecimento com a realidade que possibilite a construção da
autonomia e da emancipação dos jovens, seja para a conclusão ou continuidade dos
estudos ou para a preparação à inserção no mundo do trabalho.

3 REINVENTANDO O ENSINO MÉDIO

O Reinventando o Ensino Médio se constitui em uma política pública recém-


lançada pela Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais, com a finalidade de
reformular o Ensino Médio, conforme visto anteriormente. Objetiva ainda:
- buscar a excelência no ensino e na aprendizagem;
- garantir a especificidade da formação do Ensino Médio da rede pública
estadual de educação de Minas Gerais;
- gerar competências e habilidades para empregabilidade;
- preparar para o prosseguimento dos estudos. (MINAS GERAIS, 2013a, p.
1).

O projeto vem sendo implantado no Estado desde 2012, inicialmente como


projeto-piloto em 11 escolas estaduais de Ensino Médio localizadas na Regional Norte
de Belo Horizonte, que apresentavam características que as potencializavam enquanto
laboratório do Reinventando como: relevância pública, viabilidade de funcionamento e
oportunidade de replicabilidade.
Em 2013 o Reinventando foi estendido a mais 122 escolas, dentre estas se
encontram as escolas A, localizada no município de Ponte Nova e B, localizada no
955

município de Viçosa; ambas pertencentes à Superintendência Regional de Ensino de


Ponte Nova e foco desta pesquisa. Em 2014 está sendo universalizado às demais 2164
escolas públicas estaduais que ofertam o Ensino Médio.
A Secretaria de Estado de Educação propôs o projeto apresentado por dois
motivos. De um lado, trata-se de um exercício de proatividade que sugere a
preocupação em desenvolver um Ensino Médio adequado com o nosso tempo, onde o
conhecimento se constitui em um recurso cada dia mais determinante para enfrentar os
problemas gerados pela exploração acelerada dos recursos naturais, seja como instância
de qualificação profissional, como requisito para a vida em comunidade, como condição
para acesso à grande parte dos instrumentos e objetos que caracterizam a atualidade
(MINAS GERAIS, 2012a, p.6).
E de outro, trata-se de procurar meios de enfrentar problemas que, apesar de
virem de longa data, permanecem cruciais, pois o Estado de Minas Gerais continua com
patamares de desempenho insuficientes, com números relativos ao abandono/evasão
preocupantes e com dados inaceitáveis relativamente à distorção idade/ série.
A SEE/MG pretende também com este projeto, tornar este nível de ensino mais
atrativo, proporcionando aos estudantes o acesso a temáticas e abordagens que
despertem o interesse dos alunos a partir da consideração do Ensino Médio como uma
etapa que propicia o desenvolvimento de habilidades que permitem continuação dos
estudos e ingresso melhor preparado, qualificado, no mundo do trabalho.
Consta na proposta da Secretaria de Educação, que em virtude da necessidade
de instalação curricular das áreas de empregabilidade, seriam criados, com apoio em
legislação específica, os cargos de coordenação (ocupado pelo vice-diretor) e orientação
de cada área (ocupado por docentes), isto conforme Resolução nº 2.252 de janeiro de
2013. Dessa forma cada escola passaria a contar com um coordenador geral do
Reinventando e três orientadores, um por área, com carga horária, requisitos e funções
explicitadas em legislação própria.
Entretanto segundo informações adquiridas junto aos coordenadores gerais do
projeto nas escolas estaduais A e B, logo na primeira reunião em que participaram para
obter maiores informações sobre o projeto, foram informados de que os cargos de
coordenadores de área haviam sido extintos, restando apenas o de coordenador geral,
que tem a função de: participar do planejamento e execução do projeto na escola onde
atua; coordenar a articulação entre os conteúdos voltados às áreas de empregabilidade
com as disciplinas do Currículo Básico Comum (CBC); atuar como agente mediador e
956

dinamizador do projeto, reconhecendo oportunidades de interação com a comunidade, e


prestar informações dentro do prazo estipulado à direção da escola, Superintendência
Regional de Ensino e SEE.
O projeto Reinventando amplia a carga horária da formação, seja a diurna ou a
noturna, de acordo com o disposto, também, na Resolução SEE Nº 2251 de 2 de janeiro
de 2013. No turno diurno foi acrescentado o 6º horário para o cumprimento do total de
horas nos 200 dias letivos. No turno noturno, o cumprimento da carga horária se dá por
meio de atividades extraclasse, em parte decorrentes da área de empregabilidade e em
parte decorrentes dos Conteúdos Interdisciplinares Aplicados.
No ano de 2013 na etapa de expansão do projeto foram oferecidas pela SEE as
seguintes áreas de empregabilidade: Comunicação Aplicada, Empreendedorismo e
Gestão, Meio Ambiente e Recursos Naturais, Tecnologia da Informação e Turismo.
Dentre essas, as escolas poderiam optar por três e o aluno por uma com a qual deve
permanecer até a conclusão da última etapa da Educação Básica.
De acordo com a SEE/MG, o que denominam por empregabilidade neste
projeto, não significa Ensino Médio profissionalizante, mas sim a oferta de uma
formação que permita ao estudante dispor de maiores condições de inserção múltipla no
mercado de trabalho. É oferecer ao aluno a oportunidade de ter o conhecimento na
prática.
Márcia de Paula Leite (1997) em artigo publicado na Fundação SEAD com o
titulo de “Qualificação, desemprego e empregabilidade” considera que o conceito de
empregabilidade foi criado mais para esconder do que para explicar o fato de que, com
o modelo produtivo vigente, houve um aumento significativo nas exigências de
qualificação para o trabalho, do desemprego e da precarização.
Num primeiro momento a escola estadual localizada em Viçosa optou pelas
áreas de: Turismo, Comunicação Aplicada e Estudos Avançados em Ciência, mas a
última área escolhida pela escola não se encontra entre as disponibilizadas pela
SEE/MG. Isto porque, quando a escola fez a opção pelas áreas de empregabilidade no
início do ano de 2013, havia dez opções disponíveis e a instituição escolheu Estudos
Avançados em Ciências.
Mas, no mês de maio do mesmo ano foi encaminhada uma nova circular
contendo as áreas de empregabilidade disponíveis e nesta não estava incluída a área
escolhida pela escola, pois segundo a SEE/MG, não conseguiram capacitar pessoal para
desenvolvê-la, e logo em seguida a escola recebeu a informação de que, aquelas
957

instituições que tivessem optado por áreas não contempladas nas cinco opções
oferecidas teriam que escolher outra área de empregabilidade dentre as da lista.
Sendo assim, por meio de uma reunião realizada junto a pais, professores e
alunos, optou-se por substituir os Estudos Avançados de Ciência por Meio Ambiente e
Recursos Naturais, isto por terem chegado à conclusão de que estas áreas eram bem
similares e o que havia sido trabalhado até o momento pelos professores podia ser
reaproveitado.
Dessa forma, a escola optou pelas áreas de Turismo, Comunicação Aplicada e
Meio Ambiente e Recursos Naturais. Do total de alunos matriculados no Ensino Médio,
300 por estarem no primeiro ano deste nível de ensino fizeram parte do Projeto
Reinventando em 2013, distribuídos em 8 turmas, todas no período diurno. A escola
contava ainda com 11 docentes trabalhando no projeto.
A escola localizada em Ponte Nova optou pelas áreas de empregabilidade de
Comunicação Aplicada, Meio ambiente e Recursos Naturais e Tecnologia da
Informação. Em 2013 a escola possuía 9 docentes e 320 alunos participando do projeto,
distribuídos em 8 turmas, destas seis funcionavam no período diurno e duas no noturno.
Segundo informações da coordenadora do projeto na escola de Ponte Nova,
para que pudessem começar as aulas referentes às áreas de empregabilidade, ela
juntamente com os professores desenvolveu a ementa de cada área adequando ao nível
acadêmico de seus alunos e à realidade da escola.
Para ela, uma dificuldade encontrada foi convencer professores a trabalharem
no projeto, pois o valor pago por hora/aula é baixo e acaba desestimulando-os. Além do
mais, para a coordenadora, para atuar neste projeto é preciso ser professor pesquisador,
pois ele terá de estar sempre buscando conteúdos para trabalhar com os alunos. Outro
desafio tem sido lidar com os alunos do período noturno, onde as atividades referentes à
empregabilidade são realizadas sob a forma de projetos e como a essas atividades não
são dadas notas e sim conceitos, que não levam a nenhum tipo de reprovação, o aluno as
desenvolverá se for do seu interesse e o docente não tem como controlar isso.
Quando a coordenadora fala da questão do professor pesquisador, é porque no
início a SEE/MG planejou capacitar os professores interessados em trabalhar no projeto,
por meio do Magistra, Escola de Formação e Desenvolvimento Profissional de
Educadores de Minas Gerais, criada no ano de 2011 para desenvolver cursos a distância,
ou enquanto escuta das demandas de formação provenientes das escolas. Porém,
segundo as coordenadoras, o esquema montado não funcionou por isso a formação ficou
958

a cargo dos próprios professores que pesquisam individualmente e trocam experiências


com outros docentes.
Outro desafio que se apresentou para a coordenadora da escola da cidade de
Viçosa é a questão do horário do transporte escolar destinado aos alunos da instituição,
pois muitos dos alunos residem em zona rural e não há muitos horários de ônibus para
que estes voltem para casa, o que fez com que alguns alunos dispensassem o sexto
horário, e já os que ficavam para as aulas, permanecessem até mais tarde na escola à
espera de transporte para retornar às suas residências.
Segundo a coordenadora, devido ao sexto horário, a Prefeitura Municipal de
Viçosa, criou carteirinhas de passe livre para os alunos do Ensino Médio, mas isto
também tem causado problemas, pois há muitas perdas das carteirinhas por parte dos
alunos e estes ainda as trocam com outros alunos não pertencentes ao projeto. Para ela,
este irá se constituir em um desafio para a prefeitura, tendo em vista a universalização
do Reinventando o Ensino Médio em 2014.
Importante ressaltar que, tanto no projeto piloto de 2012, no processo de
expansão em 2013 e na universalização em 2014, a estrutura curricular do Reinventando
foi implantada gradativamente iniciando no10 ano do Ensino Médio.
Para a SEE/MG (2012) a busca por um novo Ensino Médio se justifica, pois o
seu formato anterior já não respondia às expectativas e às ansiedades dos jovens, e que
ao se informar disso a Secretaria, a partir de estudos e pesquisas feitas com grupos
focais de professores e alunos e tendo como base as ações que o Governo já
desenvolvia, percebeu a necessidade de uma transformação imediata e ofereceu para a
rede estadual o Reinventando o Ensino Médio.
Como podemos perceber, mais uma vez a busca pela definição da identidade
do Ensino Médio se dá pela articulação do currículo e dos conteúdos desenvolvidos aos
ditames do mercado de trabalho. Será esse o caminho?

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebemos, por meio dessa pesquisa, que mesmo tendo passado por
transformações ao longo de sua história, nenhuma delas foi capaz de definir para o
Ensino Médio uma finalidade intrínseca e que no cotidiano das escolas pesquisadas a
implantação do Reinventando tem engendrado alguns desafios a serem enfrentados pela
959

comunidade escolar como o sexto horário no turno diurno e as dificuldades dos


professores para trabalhar com as áreas de empregabilidade.
O Reinventando o Ensino Médio, projeto restrito ao Estado de Minas Gerais,
surge também propondo modificações na forma de organização curricular da última
etapa da Educação Básica, com o intuito de dar a ela outro significado, diminuir a
evasão e oferecer à sociedade mineira um Ensino Médio de qualidade.
Agora, se o Reinventando conseguirá ou não alcançar seus objetivos, só o
tempo, a maturidade do projeto e as opções políticas por acertar o passo à medida da
caminhada, poderão apontar. Confrontando a história do Ensino Médio, vemos que
iniciativas como a criação da DCNEM, a inclusão de uma seção na LDB para esse nível
de ensino com o acréscimo a posteriori de outra seção que o vincula diretamente à
formação técnica, e outras formuladas por órgãos estaduais, denotam que algo precisa
ser feito em prol da qualidade e universalização da Educação Básica - e isso é fato. Mas
se as ações que contribuirão para que isso ocorra emergirão do Estado ou das escolas,
ou ainda dos próprios docentes imersos nas diferentes realidades em que se encontram
no Ensino Médio brasileiro, com ou sem o apoio governamental, ainda é um capítulo
dessa história a ser escrito.
Na esperança de que as ações políticas futuras revertam-se em prol de uma
qualidade socialmente referenciada, continuamos investigando e enfrentando os
desafios de compreender os meandros das políticas voltadas para o Ensino Médio
mineiro.

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Paulo: Moderna, 1996.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n0 9.394/96, de 20 de


dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 12 ago. 2013.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 5 de outubro de


1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/
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BRASIL. Conselho Nacional de Educação (CNE). Resolução n. 3, de 26 de junho de


1998. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/res0398.pdf>. Acesso em: 5 nov. 2013.
960

GHIRALDELLI JUNIOR, Paulo. História da educação brasileira. 2 ed. São Paulo:


Cortez, 2006.

KRAWCZYK, Nora. A Escola Média: um espaço sem consenso. In: Cadernos de


Pesquisa (Fundação Carlos Chagas. Impresso), Campinas, v. 120, p. 169-202, 2003.

KUENZER, Acácia Zeneida. Ensino médio e profissional: as políticas do estado


neoliberal. São Paulo: Cortez, 1997. (Questões da nossa época; v. 63).

_____ (Org.). Ensino Médio: construindo uma proposta para os que vivem do trabalho.
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Perspectiva, São Paulo, v. 11, n.1, p. 64-69, 1997.

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_____. Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais. Resolução SEE/ nº 2251 de


2 de janeiro de 2013. Dispõe sobre a implementação do projeto Reinventando o Ensino
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_____. Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais. Resolução SEE/ nº 2252 de


3 de janeiro de 2013. Dispõe sobre a função de coordenador do projeto Reinventando o
Ensino Médio. Belo horizonte: SEE/MG, 2013b.

OLIVEIRA, Dalila Andrade. Educação básica: gestão do trabalho e da pobreza.


Petrópolis: Vozes, 2000.

OLIVEIRA, Maria Aparecida Carvalhais de. Atendimento do ensino médio no Estado


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Ensino médio: os desafios da reforma. Belo Horizonte: SEE/MG, 2002, p.15-28.
961

Comunicação

Os conselhos escolares e a gestão das escolas públicas entre os anos de 1997 e 2007

Nadia Pedrotti Drabach


UNICAMP

Resumo:Este trabalho tem por objetivo apresentar e analisar os dados referentes a


presença, atuação e composição dos conselhos escolares nas escolas públicas brasileiras
de Ensino Fundamental entre os anos de 1997 e 2007. Este recorte faz parte de um
estudo mais amplo desenvolvido ao longo do mestrado sobre o perfil dos gestores e da
gestão escolar a partir da Reforma do Estado de 1995. O estudo utilizou como fonte
empírica os bancos de dados referentes aos questionários aplicados aos dirigentes
escolares através SAEB nos anos de 1997 e 2003 e da Prova Brasil no ano de 2007. O
texto procura apontar as mudanças e permanências no perfil dos conselhos escolares e
as possíveis relações com a política educacional mais ampla.
Palavras-chave: conselho escolar, política educacional, gestão escolar

INTRODUÇÃO

Neste trabalho faz-se uma análise dos dados referentes a presença, atuação e
composição dos conselhos escolares nas escolas públicas brasileiras de ensino
fundamental entre os anos de 1997 e 2007 a luz das políticas de reestruturação da gestão
educacional que tiveram início na década de 1990. Este recorte faz parte de um estudo
mais amplo desenvolvido ao longo do mestrado1 sobre o perfil dos gestores e da gestão
escolar à luz da Reforma do Estado de 1995. O estudo utilizou os bancos de dados
referentes aos questionários aplicados aos dirigentes escolares através SAEB nos anos
de 1997 e 2003 e da Prova Brasil no ano de 20072.

1
Realizado no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná, sob
orientação do prof. Dr. Ângelo Ricardo de Souza, que resultou na dissertação que tem como título: “As
mudanças na concepção da gestão pública e sua influência no perfil do gestor e da gestão escolar no
Brasil”.
2
Os microdados do Saeb e Prova Brasil utilizados no trabalho estão disponíveis no sitio do Inep na
internet http://portal.inep.gov.br/basica-levantamentos-acessar. A leitura dos dados foi realizada através
do software estatístico SPSS
962

Os conselhos escolares (CEs) são órgãos colegiados que oferecem um potencial


significativo de ampliação da democracia, porque possibilitam a inclusão dos diferentes
sujeitos que atuam na escola: pais, alunos, funcionários e professores, como
participantes ativos na gestão escolar conforme assegura a LDB 9394/96 no artigo 14,
inciso II como um dos mecanismos da gestão democrática: “participação das
comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes” (BRASIL, 1996).
A presença dessa exigência na Lei possui fundamental importância “uma vez que uma
das formas de se procurar garantir mecanismos e instâncias com conteúdos
democráticos é consolidá-los legalmente” (ADRIÃO e CAMARGO, 2003, p 29)
Além disso, um dos argumentos que sustentam a constituição de conselhos
escolares segundo Souza (2007) é “a necessidade da presença de outros sujeitos com
vistas a se compor um quadro multirreferenciado, necessário ao enfrentamento da
crescente complexidade dos problemas escolares” (p. 226). Eles têm como principal
função possibilitar a participação da comunidade na gestão da escola. É o espaço no
qual os pais podem ser ouvidos e podem participar das decisões que são tomadas. Os
CEs são instrumentos de ampliação da capacidade decisória da população e de formação
política, podendo ser entendidos como “espaço privilegiado para a construção da
cidadania através de uma prática de conscientização” (CAMARGO, 1997, p. 291).
Na prática, conforme ampla e detalhada análise sobre os conselhos escolares
realizada por Camargo (1997), há diversos condicionantes que acabam limitando o
papel democratizante dos conselhos escolares e que esbarram na cultura da pouca
participação. Estes entraves estão relacionados aos aspectos materiais, ideológicos,
institucionais e político-sociais, dos quais destacaremos alguns. Em relação aos aspectos
materiais destacam-se, por exemplo, a disponibilidade de horários comuns dos
componentes do conselho e falta de espaço para as reuniões; a falta de espaço para
divulgações das decisões e de recursos para multiplicação de materiais, entre outros. Em
relação aos aspectos ideológicos estão: o medo do conflito, a compreensão de participar
como sinônimo de ouvir e consentir, a representatividade, as decisões são tomadas por
quem sabe, medo da participação dos pais por não entenderem os assuntos da escola,
entre outros. Dentre os aspectos institucionais que condicionam a atuação do conselho
estão: problema de frequências às reuniões, necessidade de conhecer a legislação,
decorrências da institucionalização dos conselhos. Dentre os aspectos político-sociais
estão: dificuldade de encontrar pessoas que queiram fazer parte do conselho; o medo
963

dos pais de interferir na escola e os filhos sofrerem represálias dos professores e diretor,
percepção do papel do diretor (CAMARGO, 1997, p. 303).

Além destes condicionantes, Souza (2007) aponta ainda outras barreiras


encontradas pelos conselhos escolares que estão principalmente na “compreensão que
os diferentes sujeitos têm em relação aos princípios e capacidades do Conselho Escolar
(CE) e na qual há uma identificação do CE como um organismo auxiliar da direção e/ou
da gestão escolar” (p. 226). Além disso, “classicamente, a comunidade escolar
reconhece na diretora da escola a sua principal autoridade e a possibilidade de modificar
esta ideia, plantando elementos de uma cultura mais democrática, na qual o sujeito
coletivo representado pelo CE seria, este sim, a grande autoridade política, não encontra
simpatia em parte dos dirigentes escolares” (SOUZA, 2007, p. 227). E ainda, parte das
resistências à atuação dos conselhos escolares vem dos professores “historicamente
aculturados na condição de grupo dominante na escola” (SOUZA, 2007, p. 227) que
resistem à possibilidade de inserção de diferentes opiniões e da socialização do poder
com outros segmentos da escola.
A base empírica utilizada nesta pesquisa, entretanto, não nos permite avaliar em
que condições funcionam os conselhos escolares, quem são os seus líderes, os assuntos
que são tratados nas reuniões e se há ou não resistência, por exemplo. Porém, nos
permite averiguar à existência de conselhos nas escolas, o número de vezes que se
reuniram e os segmentos escolares que estão representados nele, que são informações
relevantes sobre a presença e importância desses colegiados nas escolas.

A presença dos conselhos escolares

Quando analisamos a presença dos conselhos escolares nas escolas públicas


brasileiras de Ensino Fundamental no período de 1997 a 2007 observamos que houve
um aumento crescente no percentual de escolas que passaram a ter esse órgão colegiado.
Em 1997 esse percentual era de 76%, em 2003 passou para 86,4% e em 2007 cresceu
para 88,3%. O maior crescimento se situa entre 1997 e 2003, conforme é possível
observar nas tabelas 01, 02 e 03. Entretanto, em 2007 ainda era alto o percentual de
escolas brasileiras nas quais não existia conselho escolar, chegava a 11,6%. Na região
Norte este percentual em 1997 era de 28,9%, em 2003 diminuiu para 21,8% e em 2007
aumentou para 25,5%. Em 1997 a região Sul apresentava o maior percentual de escolas
que não tinham conselho escolar no total 31,9%, em 2003 diminuiu para 17,6% e em
964

2007 esse percentual era de 16,7%. As regiões Norte e Sul em 1997 apresentavam os
maiores percentuais de escolas sem conselho escolar. Em 2007, embora o percentual
tenha diminuído, as duas regiões continuaram apresentando os maiores percentuais de
escolas sem conselho escolar no Brasil.
Além da exigência presente na legislação, o aumento de escolas que possuem
conselhos escolares pode ser uma consequência do processo de descentralização
especialmente em relação aos recursos destinados às escolas que, para a sua
viabilização, de acordo com o PNE “foi induzida a formação de Associações de Pais e
Mestres ou de Conselhos escolares” (BRASIL, 2001, p. 168). Contudo, o aumento no
percentual de escolas que passaram a ter conselho escolar nestes dez anos pode indicar a
expansão, mesmo que parcial da gestão democrática.

TABELA 01: SAEB 1997 – EXISTÊNCIA DO CONSELHO ESCOLAR POR REGIÃO

Região
N NE SE S CO Total
A escola contou Sim N 278 343 182 79 150 1032
com a colaboração % Região 71,1% 78,7% 81,6% 68,1% 78,1% 76,0%
do conselho de Não N 113 93 41 37 42 326
escola neste ano?
% Região 28,9% 21,3% 18,4% 31,9% 21,9% 24,0%
Total N 391 436 223 116 192 1358
% Região 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Fonte: Microdados SAEB 1997, MEC/INEP, 1997.

TABELA 02: SAEB 2003 - EXISTÊNCIA DO CONSELHO ESCOLAR POR REGIÃO3

Região
N NE SE S CO Total
Sim, existe conselho N 409 1008 526 488 413 2844
na escola % 78,2% 88,8% 90,2%
82,4% 90,0% 86,4%
Região
Não existe Conselho N 114 127 57 104 46 448
Escolar % 21,8% 11,2% 9,8% 17,6% 10,0% 13,6%
Região
Total N 523 1135 583 592 459 3292
% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Região
Fonte: Microdados SAEB 2003, MEC/INEP, 2003.

3
O dado referente à existência de conselhos escolares nos questionários de 2003 e 2007 foi obtido através
da recodificação da variável “Quantas vezes o conselho da escola se reuniu?” Uma vez que uma das
alternativas de resposta era “Não existe Conselho de Escola” e as demais alternativas supunham a
existência de um conselho escolar.
965

TABELA 03: PROVA BRASIL 2007 - EXISTÊNCIA DO CONSELHO ESCOLAR POR REGIÃO

Região
Centro-
Norte Nordeste Sudeste Sul oeste Total
Sim, existe Conselho N 3703 14385 20939 9391 4308 52726
de Escola % Região 74,5% 88,1% 93,1% 83,3% 92,2% 88,3%
Não existe Conselho N 1265 1944 1553 1887 366 7015
de Escola % Região 25,5% 11,9% 6,9% 16,7% 7,8% 11,7%
Total N 4968 16329 22492 11278 4674 59741
% Região 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Fonte: Microdados PROVA BRASIL 2007, MEC/INEP, 2007.

Juntamente com o aumento no percentual de escolas que contam com conselhos


escolares que aparece em 2007 é preciso verificar se estes conselhos estão ativos na
escola. Uma forma de identificar isso e que a base empírica possibilita é saber quantas
vezes ao ano os conselhos se reuniram.

Atuação dos conselhos escolares

De acordo com os dados do SAEB observa-se que em 1997 os conselhos que se


reuniam três vezes ou mais somavam um percentual de 82,2%. Esse percentual, nos
demais anos 2003 e 2007 era um pouco menor. Em 2003 o percentual de conselhos que
se reuniu três vezes ou mais era de 76,5%. Em 2007 aumentou, chegando a 78,2%.
Observa-se, diante destes dados, que nestes dez anos diminuiu o número de conselhos
ativos nas escolas públicas.
Na análise por região, a presença de conselhos que se reuniam três vezes ou mais
ao ano diminuiu em todas as regiões, de 1997 até 2003. Em 2007 houve um pequeno
aumento, a região Sudeste neste ano apresentava o maior percentual de escolas nas
quais os conselhos se reuniram três vezes ou mais ao ano, 84,5%. Na região Centro-
Oeste este percentual era de 83,5%, na região Sul 83,2%, na região Norte 71,9% e na
região Nordeste era de 65,8%, conforme podemos observar nas tabelas abaixo:
966

TABELA 04: SAEB 1997 - NÚMERO DE VEZES QUE O CONSELHO DA ESCOLA SE REUNIU
POR REGIÃO

Região
Centro-
Norte Nordeste Sudeste Sul Oeste Total
Quantas Uma vez por N 84 142 66 39 58 389
vezes o mês % Região 29,1% 38,9% 35,3% 47,0% 38,9% 36,3%
Conselho Uma vez por N 140 143 98 38 73 492
de Escola bimestre % Região 48,4% 39,2% 52,4% 45,8% 49,0% 45,9%
se reuniu
este ano? Uma vez por N 49 47 16 1 15 128
semestre % Região 17,0% 12,9% 8,6% 1,2% 10,1% 11,9%
Apenas uma vez N 14 24 6 3 2 49
% Região 4,8% 6,6% 3,2% 3,6% 1,3% 4,6%
Nenhuma vez N 2 9 1 2 1 15
% Região ,7% 2,5% ,5% 2,4% ,7% 1,4%
Total N 289 365 187 83 149 1073
% Região 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Fonte: Microdados SAEB 1997, MEC/INEP, 1997.

TABELA 05: SAEB 2003 – NÚMERO DE VEZES QUE O CONSELHO DA ESCOLA SE REUNIU
POR REGIÃO 4

Região
Centro-
Norte Nordeste Sudeste Sul Oeste Total
Neste ano, Nenhuma vez N 21 36 12 18 7 94
quantas % Região 4,2% 3,5% 2,2% 3,6% 1,6% 3,3%
vezes o Uma vez N 36 78 19 15 13 161
Conselho
% Região 7,3% 7,7% 3,6% 3,0% 3,1% 5,6%
de escola se
reuniu? Duas vezes N 89 163 66 53 41 412
% Região 18,1% 16,1% 12,5% 10,8% 9,9% 14,4%
Três vezes ou N 263 731 429 402 352 2177
mais % Região 53,6% 72,5% 81,5% 82,3% 85,2% 76,5%
Total N 490 1008 526 488 413 2844
% Região 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Fonte: Microdados SAEB 2003, MEC/INEP, 2003.

4
Foi retirado desta questão em 2003 e 2007 a alternativa “Não existe conselho de escola” e o percentual
de respostas nas demais alternativas foi recalculado. Dessa forma foi possível alcançar um maior grau de
comparabilidade com os dados de 1997.
967

TABELA 06: PROVA BRASIL 2007 - NÚMERO DE VEZES QUE O CONSELHO DA ESCOLA SE
REUNIU POR REGIÃO

Região
Centro-
Norte Nordeste Sudeste Sul oeste Total
Neste ano, Nenhuma vez N 118 403 244 209 59 1033
quantas % Região 3,1% 2,8% 1,1% 2,2% 1,3% 1,9%
vezes o Uma vez N 219 1179 615 382 139 2534
conselho
% Região 5,9% 8,1% 2,9% 4,0% 3,2% 4,8%
desta escola
se reuniu? Duas vezes N 701 3328 2374 986 511 7900
% Região 18,9% 23,1% 11,3% 10,4% 11,8% 14,9%
Três ou mais N 2665 9475 17706 7814 3599 41259
vezes % Região 71,9% 65,8% 84,5% 83,2% 83,5% 78,2%
Total N 3703 14385 20939 9391 4308 52726
% Região 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Fonte: Microdados PROVA BRASIL 2007, MEC/INEP, 2007.

Entretanto, se formos ver do ponto de vista dos conselhos menos atuantes, ou


seja, aqueles que se reuniram até duas vezes observamos que este número aumentou
nestes dez anos. Vejamos no quadro abaixo:

QUADRO 01: NÚMERO DE VEZES QUE O CONSELHO DE ESCOLA SE REUNIU EM 1997, 2003
E 2007.

Reunião do conselho/Ano 1997 2003 2007


Nenhuma vez 1,4% 3,3% 1,9%
Uma vez 4,6% 5,6% 4,8%
Duas vezes 11,9% 14,4% 14,9%
Três vezes ou mais 82,2% 76,5% 78,2%
Fonte: Elaborado pela autora.
A diminuição do percentual de conselhos mais atuantes e o aumento dos
conselhos menos atuantes (que se reuniram até duas vezes por ano) podem ser
observados de forma mais marcante de 1997 para 2003. Isso ocorreu em todas as
regiões. Na região Norte, foi onde houve a maior redução no número de conselhos que
se reuniram três vezes ou mais, em 1997 o percentual era de 77,5% e em 2003 passou
para 53,6%. Esta região, entretanto, foi a que registrou o menor aumentou no número de
escolas que passaram a ter conselho escolar de 1997 a 2003. Então, possivelmente
diminuíram a sua atuação em 2003, conselhos que eram ativos em 1997. Contudo, os
questionários não nos permitem identificar se estas escolas, cujos conselhos são pouco
968

ativos possuem outras formas de organização coletivas como Associações de Pais ou


Unidades Executoras, por exemplo, pois isso poderia ser indício de influências da
reforma gerencial na educação.
De 1997 até 2003 o que se observou foi um aumento acentuado no número de
escolas que passaram a ter um conselho escolar, mas foi também o período em que mais
aumentou o número de conselhos inativos. Isso parece indicar que a exigência legal de
constituição dos conselhos escolares ou do próprio PNE, resultou na maior presença dos
conselhos escolares nas escolas. Entretanto, em vários casos estes conselhos passaram a
existir apenas no papel. De 2003 a 2007 observa-se um movimento contrário do que se
tinha no período anterior. Diminuiu em todas as regiões o percentual de conselhos que,
embora existissem não se reuniram nenhuma vez e aumentou o número de conselhos
que passaram a se reunir pelo menos duas vezes ao ano. Continua sendo uma atuação
pequena, contudo já indica um avanço. Aumentou também em 2007 embora levemente
(1,7%) o percentual de conselhos que se reuniram três vezes ou mais.
Analisando esse período de dez anos, observa-se que em 1997 embora o número
de escolas que possuíam conselho escolar fosse menor, os conselhos que existiam eram
mais atuantes (no sentido de que se reuniam mais) do que em 2007. De modo geral,
nesse período, aumentou o número de escolas que possuem conselhos escolares, mas
aumentou também o número de conselhos pouco ativos.
Esse fato corrobora com o que afirma Paro (2001) sobre os conselhos escolares.
Para o autor, desde o surgimento dos conselhos escolares na década de 1980 até hoje, a
dificuldade em constituir um conselho escolar e fazer com que de fato funcione está
relacionado com a organização do poder na escola, que se concentra ainda na figura do
diretor. Um dos problemas que envolve a constituição dos conselhos escolares é que
tem sido tomado como uma medida isolada, desligado de uma política mais ampla de
democratização da escola o que acaba evidenciando muito mais a sua face burocrática
do que a sua inspiração democrática. “O conselho escolar que deveria existir para dar
apoio e auxiliar o diretor na sua tarefa de administrar a escola acaba sendo mais um
encargo do qual ele precisa prestar contas” (PARO, 2001, p.83). Nesse caso, torna-se
muito complicada a execução das atribuições do conselho escolar porque este acaba
sendo subordinado à vontade do diretor. Para mudar esta realidade faz-se necessário
“uma nova ética que desautorize a atual configuração autoritária de escola” (PARO,
2001, p.80), favorecendo a construção de uma cultura democrática.
969

Composição dos conselhos escolares

Quanto à composição dos conselhos escolares, em 1997 as questões possuem um


formato diferente dos demais anos. Em 1997, as alternativas não consideram a presença
de funcionários no conselho escolar. Contudo, a presença do diretor aparece em todas as
alternativas, o que parece indicar que o dirigente da escola era uma figura importante
nos conselhos escolares em 1997. Em 2003 e 2007 não é perguntado sobre a presença
do diretor e passa a ser considerada a presença de funcionários no conselho da escola.

TABELA 1: SAEB 1997 - COMPOSIÇÃO DO CONSELHO ESCOLAR POR REGIÃO

Região
N NE SE S CO Total
Qual é a Direção e represent. N 20 9 7 4 4 44
composição dos professores % Região 7,0% 2,5% 3,7% 4,7% 2,7% 4,1%
do Direção, professores N 46 42 27 14 22 151
Conselho e pais. % Região 16,0% 11,5% 14,4% 16,5% 14,8% 14,1%
Escolar?
Direção, professores, N 208 310 150 62 121 851
pais e alunos. % Região 72,5% 84,7% 80,2% 72,9% 81,2% 79,2%
Direção, professores N 13 5 3 5 2 28
e alunos. % Região 4,5% 1,4% 1,6% 5,9% 1,3% 2,6%
Total N 287 366 187 85 149 1074
% Região 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Fonte: Microdados SAEB 1997, MEC/INEP, 1997.

De acordo com o SAEB de 1997, em todas as regiões destaca-se o percentual de


diretores que afirmaram que em suas escolas o conselho é composto pela direção, por
pais, alunos e professores. O percentual de escolas brasileiras, cujo conselho
apresentava esta composição em 1997 era de 79,2%. Com destaque para a região
Nordeste cujo percentual chegava a 84,7%, centro oeste 81,2%, Sudeste 80,2%, Sul
72,9% e Norte 72,5%.
Conforme os dados apresentados no quadro 02 em relação à presença de
professores no conselho escolar, o percentual aumentou de 2003 até 2007, mas esse
aumento não chegou a 1%. Quanto à presença de funcionários no conselho escolar
observa-se que aumentou o percentual de escolas que incluíram este segmento em seu
conselho em 2003 o percentual era de 95,2% e em 2007 passou para 96,2%,
970

QUADRO 02: PRESENÇA DOS DIFERENTES SEGMENTOS NO CONSELHO ESCOLAR EM 2003


E 2007

SEGMENTOS SAEB 2003 PROVA BRASIL 2007


Professores 97,8% 98,3%

Pais 96,0% 96,9%

Funcionários 95,2% 96,2%

Alunos 81,4% 81,1%

Fonte: Elaborado pela autora

Quanto à presença de pais no Conselho Escolar também é possível observar um


aumento de 2003 para 2007 no percentual de escolas que incluem pais no conselho.
Esse aumento é de 0,9%.
Em relação à presença de alunos, o percentual é menor do que dos demais
segmentos da escola. O percentual de escolas que incluem alunos no conselho escolar
teve uma leve diminuição de 2003 até 2007, passou de 81,4% para 81,1%.
Em 2007 em relação a 2003 houve um pequeno aumento no percentual de
escolas que envolvem professores, pais e funcionários no Conselho de Escola. Diminuiu
apenas o percentual de alunos em 0,3%. Mais de 95% dos conselhos escolares são
compostos por professores, funcionários e pais, nesta ordem: professores, 97,8%, pais,
96% e funcionários 95,2%. Em relação a presença de alunos o percentual é um pouco
menor, no total chega a 81,4%. A Região Norte é a que menos inclui alunos no conselho
escolar em 2007 o percentual era de 74,2%, nas demais regiões esse percentual era um
pouco maior.
Observa-se que é alto o percentual de escolas que incluem estes segmentos no
conselho o que pode indicar que está havendo maior participação nas decisões e maior
controle da comunidade sobre a escola (SOUZA, 2007). Porém, a simples presença dos
sujeitos representantes dos diversos segmentos não é garantia de que a atuação do
conselho seja democrática. Na prática, a exigência legal destas representações no
conselho pode levar a compreensão de que a simples presença pode ser entendida como
participação (CAMARGO, 1997). De qualquer forma, mesmo que parcialmente,
avaliamos que o aumento no número de escolas que possuem um conselho escolar e o
alto percentual de representação dos diferentes segmentos, significou a ampliação da
democracia na escola nestes dez anos em estudo.
971

Contudo é importante salientar que esta expansão também pode significar um


interesse técnico, mais do que democrático, uma vez que houve um incentivo da
reforma na educação dos anos 1990 para a criação de órgão coletivos nas escolas como
forma de controle que, de acordo com Souza (2009): “É uma percepção de que os
conselhos de escola poderiam significar uma diminuição do poder da corporação
docente no controle do poder escolar, pois a presença dos pais e familiares dos alunos
nesses conselhos representaria a figura do cliente ou usuário ou cidadão que tem a tarefa
de cobrar resultados da escola” (p. 279). A verificação desse dado poderia nos dar a
dimensão do grau de democracia ou de gerencialismo presente nas mudanças ocorridas
no perfil dos conselhos escolares nestes dez anos. Entretanto, isso exigiria um estudo
que considere a imersão na prática dos conselhos escolares.

CONCLUSÃO

No período estudado verificou-se um aumento no número de escolas que


passaram a contar com o conselho escolar. O crescimento maior se deu especialmente
entre 1997 e 2003, porém foi também o período em que mais cresceu o percentual de
conselhos pouco ativos nas escolas. Em 2007 houve um movimento inverso, os
conselhos passaram a ser mais atuantes e em sua maioria contam com representantes de
todos os segmentos. Por esses dados, pode-se aferir que aumentou o número de escolas
que contam com conselhos e a grande representatividade de todos os segmentos
escolares, pode indicar uma abertura maior para o diálogo, a construção de processos de
gestão mais democráticos e, conforme aponta Souza (2007), a existência de conselhos
escolares significa um avanço importante na construção da autonomia da escola.
Contudo, de acordo com o mesmo autor, as potencialidades de democratização da
gestão escolar presente nos conselhos, só são possíveis de serem verificadas ou não no
decorrer de práticas concretas.
Pois isso, torna-se importante a realização de estudos que busque analisar a
atuação dos conselhos e o papel que desempenham na escola, contribuindo para uma
melhor percepção do potencial democrático destes colegiados.
972

REFERÊNCIAS
ADRIÃO, T; CAMARGO, R. B. Princípios e processos da gestão democrática do
ensino: implicações para os Conselhos Escolares. Chão de Escola, Curitiba:
SISMMAC, v. 2, p. 28-33, outubro de 2003.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da


Educação Nacional.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Plano Nacional de Educação.


Brasília: MEC/Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, 2001.

CAMARGO, R. B. Gestão democrática e nova qualidade do ensino: o conselho de


escola e o projeto da interdisciplinaridade nas escolas municipais da cidade de São
Paulo (1989 – 1992). 1997, 370 p. Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-
Graduação da Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo.1997.

PARO, V. H. Escritos sobre educação. São Paulo: Xamã, 2001.

SOUZA, A. R. De. Perfil da Gestão Escolar no Brasil. 2007. 302 p. Tese (Doutorado
em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. São Paulo. 2007.
973

Comunicação
Livro digital acessível

Nancy Rigatto Mello


Mestranda em Educação
Orientadora – Profª Ângela Maria Martins
Universidade Cidade de São Paulo
São Paulo / SP
nrigatto@ig.com.br

Resumo: Na atualidade as políticas de educação do país vêm reafirmando o princípio


da inclusão inerente à concretização do direito as pessoas com necessidades
educacionais especiais. O objetivo dessa pesquisa é avaliar a implantação e
funcionamento do programa Mecdaisy (livro digital acessível) nas salas de recursos
multifuncionais tipo II na cidade de São Paulo.
Palavras-chave: Inclusão; Sala de recurso multifuncional; Livro digital acessível.

INTRODUÇÃO
Este trabalho tem sua justificativa nos pressupostos da Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988, que em seus Art. 205, 206 e 208 descreve o
direito do pleno acesso ao livro às pessoas com deficiência visual, assegurando o direito
de todos a educação, a igualdade de condições de acesso, permanência na escola e a
continuidade nos níveis mais elevados de ensino.
Sendo assim, o principal norte do referido estudo é oferecer às pessoas com
deficiência visual condições de convivência com pessoas de diferentes perfis no
ambiente escolar e, consequentemente, em sua vida cotidiana e acessibilidade nos
Programas do Livro, o objetivo dos programas do livro é prover as escolas das redes
federal, estadual e municipal e as entidades parceiras do programa Brasil Alfabetizado
com obras didáticas e paradidáticas de qualidade e por meio do programa do livro
didático em Braille, os estudantes cegos ou com deficiência visual, os alunos das
escolas de educação especial públicas e das instituições privadas definidas pelo censo
escolar como comunitárias e filantrópicas. O Programa Nacional do Livro Didático em
Braille atende alunos cegos que cursam o ensino fundamental em escolas publicas de
ensino regular e escolas especializadas sem fins lucrativos. Garantindo ainda o direito a
974

acessibilidade o Ministério da Educação lança o Programa Livro Digital Acessível –


Mecdaisy; uma solução tecnológica que permite a produção de livros em formato digital
acessível, no padrão Daisy.
Nesta perspectiva da educação inclusiva, a educação especial deve atuar de
maneira articulada com a educação comum, passando a constituir a proposta pedagógica
da escola. Nesse sentido, a educação especial é uma modalidade de ensino que perpassa
todos os níveis, etapas e modalidades, realiza o atendimento educacional especializado,
disponibiliza os serviços e recursos próprios desse atendimento e orienta os alunos e
seus professores quanto a sua utilização nas turmas comuns do ensino regular. Esta ação
está em consonância com o Decreto Nº 6.571, de 17 de setembro de 2008, que dispõe
sobre o atendimento educacional especializado, quando em seu Art. 3º, informa que o
Ministério da Educação prestará apoio técnico e financeiro às ações voltadas à oferta do
atendimento educacional especializado, dentre estas, a elaboração, produção e
distribuição de recursos educacionais para a acessibilidade.
O interesse em pesquisar as políticas públicas de acessibilidade e inclusão
referente ao livro digital acessível adveio da autonomia que o programa proporciona aos
estudantes com deficiência visual. Muitos questionamentos surgem: Como essa política
contempla os estudantes com deficiência visual?Qual a eficiência do programa?
Esses questionamentos me levam a definir o objeto de estudo e a delinear os
objetivos da pesquisa que são: 1) Avaliar a implantação e funcionamento do programa
Mecdaisy (livro digital acessível) nas salas de recursos multifuncionais tipo II na cidade
de São Paulo; 2) Analisar se o programa no âmbito do uso do livro digital acessível vem
cumprindo seu propósito.

DESENVOLVIMENTO

LIVRO DIGITAL ACESSÍVEL - MECDAISY

A Inclusão é uma proposta de acolhimento social participado, onde pessoas com


deficiência e a sociedade como um todo buscam a eliminação das barreiras da exclusão
que mantinham indivíduos que possuem algum comprometimento sensorial ou motor
separados dos que se enquadravam no modelo utópico de perfeição. O ato de incluir
requer uma postura revolucionária de uma sociedade que se identifica pela marca da
heterogeneidade e se permite enriquecer com a diversidade. Muito se tem ouvido falar
975

em inclusão social [Nações Unidas, 1994], processo bilateral, no qual a sociedade e a


pessoa com necessidades especiais agem conjuntamente, buscando “equacionar
problemas, decidir soluções e efetuar equiparação de oportunidades para todos”
(Sassaki, 1997 p.41). A inclusão social pretende inserir indivíduos nos diversos
segmentos da vida coletiva, proporcionando a sua interação em atividades desde as mais
corriqueiras, como domésticas e da vida diária, bem como no mercado de trabalho,
sendo assunto constante em debates, seminários e manifestações, sobretudo por parte de
pessoas marginalizadas por possuírem algum tipo de comprometimento sensorial ou
motor. Como meio de acesso à informação, a escrita se tornou imprescindível no mundo
contemporâneo e o indivíduo que não se apodera desse bem fatalmente estará à margem
dessa sociedade letrada. As pessoas cegas ficaram em desvantagem em relação à
leitura/escrita durante muito tempo, pela inexistência de um meio eficaz de registro de
mensagens que permitisse um contato direto entre leitor e o texto, sem interferência de
um ledor. O Sistema Braille, que traz o nome de seu inventor, foi criado em 1824 na
França e se constitui em uma ferramenta essencial na formação de indivíduos cegos e
pode ser considerado o primeiro formato acessível de texto e importante tecnologia
assistiva no letramento dos que possuem limitação visual.
Atualmente, outros recursos tecnológicos e digitais estão sendo desenvolvidos,
oferecendo às pessoas com deficiência visual a oportunidade de escolher o formato que
melhor responde às suas necessidades como indivíduo e até mesmo a possibilidade de
associar essas várias mídias e formatos como lhe aprouver. Trata-se de programas
específicos para leitura de tela de computador, através dos quais se torna possível à
navegação na internet, à produção textos para serem lidos no próprio PC ou até mesmo
a impressão em tinta, caracteres simples ou ampliados ou Braille. O mais importante é
que todos esses procedimentos podem ser executados por indivíduos com ou sem
deficiência visual, o que se constitui em um ganho na autonomia do primeiro grupo, que
outrora se valia exclusivamente da mão de obra alheia para poder manter-se informado.
O grande entrave no acesso a esse aparato tecnológico da era digital costuma ser o alto
custo para sua aquisição. No Brasil, o primeiro produto gratuito apresentado foi o
Dosvox, criado na Universidade Federal do Rio de Janeiro. “O Dosvox é um conjunto
de programas que permite a acessibilidade digital através de um sintetizador de voz em
português, mas ele opera somente sobre os sistemas operacionais proprietários”
(Borges, 2008).
Desenvolvido por meio de parceria com o Núcleo de Computação Eletrônica da
976

Universidade Federal do Rio de Janeiro - NCE/UFRJ - o Mecdaisy possibilita a geração


de livros digitais falados e sua reprodução em áudio, gravado ou sintetizado. Este
padrão apresenta facilidade de navegação pelo texto, permitindo a reprodução
sincronizada de trechos selecionados, o recuo e o avanço de parágrafos e a busca de
seções ou capítulos. Possibilita também, anexar anotações aos arquivos do livro,
exportar o texto para impressão em Braille, bem como a leitura em caractere ampliado.
Todo texto é indexado, facilitando, assim, a manipulação através de índices ou buscas
rápidas. Além dos benefícios do Mecdaisy às pessoas com deficiência visual ou física
que podem ter acesso à leitura sob a forma de áudio e texto digital, destaca-se que está
disponível a metodologia para geração de livros neste padrão, que poderá ser utilizada
gratuitamente nas escolas e instituições de educação superior, para garantia da
acessibilidade, além de fornecer recursos de tecnologia assistiva capazes de oferecer
autonomia aos que necessitam de linguagens e códigos específicos para sua
comunicação.
Nesta perspectiva da educação inclusiva, a educação especial deve atuar de
maneira articulada com a educação comum, passando a constituir a proposta pedagógica
da escola. Nesse sentido, a educação especial é uma modalidade de ensino que perpassa
todos os níveis, etapas e modalidades, realiza o atendimento educacional especializado,
disponibiliza os serviços e recursos próprios desse atendimento e orienta os alunos e
seus professores quanto a sua utilização nas turmas comuns do ensino regular. Esta ação
está em consonância com o Decreto Nº 6.571, de 17 de setembro de 2008, que dispõe
sobre o atendimento educacional especializado, quando em seu Art. 3º, informa que o
Ministério da Educação prestará apoio técnico e financeiro às ações voltadas à oferta do
atendimento educacional especializado, dentre estas, a elaboração, produção e
distribuição de recursos educacionais para a acessibilidade.
O acesso à educação inclusiva é um direito irrevogável de pessoas com ou sem
deficiência. A escola, como reprodutora de um sistema social maior, historicamente se
orientou por uma “lógica paradoxal”, que ao arriscar incluir um indivíduo, acabava por
excluí-lo, pois tentava padronizar, homogeneizar as pessoas, negando-lhes o direito vital
de serem únicas. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva apresenta propostas de uma educação escolar que traz em sua essência a idéia
da valorização da diferença e conjuga igualdade e diferença em um só conceito. Para
Martins (2010,p.382.): "A noção de política é vista por alguns teóricos como as ações de
um governo com vistas à consecução de objetivos definidos e, por outros, como um
977

processo de negociações e confrontos entre grupos de interesses, nem sempre


diretamente envolvidos na formulação do conjunto legal e normativo dos programas
governamentais".No entanto, cabem algumas considerações a esse respeito. Uma delas
refere-se à questão, de ordem prática, das ofertas de que já dispomos, e que
representam, historicamente, toda uma reorganização de sistemas a favor de uma
educação cada vez mais democrática, com preocupações referentes ao acesso e
permanência de todos os alunos.
Não esqueçamos que nesta luta sempre esteve presente à preocupação com todos
os grupos excluídos, e não apenas com portadores de deficiências. Isto significa que os
sistemas que tem tentado se organizar para atender essas premissas, o fazem das mais
variadas formas em todo o mundo. E que, acima de tudo, e exatamente em função dessa
variedade, o conceito de inserção (seja pela inclusão, seja pela integração), é sempre
relativo: aos olhos de quem é inserido, aos olhos de quem insere, aos olhos de quem
planeja as possibilidades de inserção e ao contexto em que a mesma acontece, segundo
Martins (2010, p.387) romper com o modelo top-down de estudos em políticas
educacionais – colocando como foco a opinião/visão/percepção e/ou significados
atribuídos por atores alocados em espaços educacionais e responsáveis pela
operacionalização de diretrizes legais e programas oficias –, não é tarefa simples, ao
contrário. Em outros termos, é preciso, ainda, considerar que o contexto adverso atual
não permite a construção de perspectivas de longo prazo, cumulativas e previsíveis, e
isso inclui a política e o conhecimento que se constrói nela e sobre ela então podemos
dizer que a inclusão se origina da mesma fonte que a integração: a luta pela, e a
preocupação com, a democratização e humanização da vida social. E que, além disso,
ela ‘rompe’ com o movimento que lhe antecede no curso histórico porque abrange
aspectos antes intocados, como a reformulação do sistema e a questão da reciprocidade,
Carvalho (2000, p.111): não se trata mais de simplesmente tolerar o diferente, mas de
entrar numa relação de verdadeira troca em que se reconheça que ambas as partes têm a
ganhar com os frutos dessa relação. Mas ainda continua igualmente cabendo aos
excluídos empreenderem esforços no sentido da inclusão. Esforços esses que se dão nos
planos físicos, mental, político, individual, social, organizacional, multidimensional.
Essa nova postura diante da heterogeneidade põe em confronto as atitudes
discriminatórias e os meios de superação dessas atitudes, e a inclusão assume o centro
do debate, conforme diz a Nova Política de Educação Especial. O objetivo da inclusão
escolar, dentro da nova política, é a transformação das ambiências de ensino, de maneira
978

que se tornem lugares de formação e informação de qualidade para todos,


irrestritamente. Sua proposta parte do indivíduo e suas peculiaridades, suas diferenças,
sem perder de vista a possibilidade de serem iguais. A inclusão implica em mudança de
práticas e conceitos; sob sua égide, igualdade quer dizer “equivalência” e não “padrão
de normalidade”, este último responsável pela exclusão cruel que, infelizmente, ainda
atinge pessoas que não se adéquam às regras. Entende-se por acessibilidade
“a condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida,
dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos
serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e
informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida
[Decreto 5.296/2004]”

O direito ao acesso irrestrito à Educação, previsto no artigo 206 da Constituição da


República Federativa do Brasil [1988], quando diz que “O ensino será ministrado com
base nos [...] princípios de igualdade de condições para o acesso e permanência na
escola”, implicitamente pressupõe acesso às produções textuais por parte de pessoas
com ou sem deficiência visual e oferece um amparo legal no qual podem-se criar os
princípios basilares que nortearão e justificarão as ações relativas a este projeto, cuja
essência é a inclusão plena de cidadãos com limitação visual no universo dos livros.
Além da Constituição da República Federativa do Brasil, outros decretos,
portarias e leis preveem o direito ao acesso aos livros a pessoas com deficiência visual,
como é o caso da Lei 9.610/98 que asseguram a reprodução de obras literárias e
científicas, sem agravo a direitos autorais, para fins de Educação dos que possuem
limitação visual
“Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais: [...] I - a reprodução:
[(...] d) de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de
deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita
mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para
esses destinatários [BRASIL, 1998]”

O acesso à educação, independente de nível, é um direito de todas as pessoas,


irrestritamente. Logo, qualquer cidadão, com ou sem deficiência, tem o direito de
usufruir de um sistema de Educação que respeite suas diferenças individuais. As
diferenciações de atendimento ou estabelecimento de prioridades, visando equiparação
de oportunidades, são admitidas em casos e circunstâncias específicas, mas a exclusão
de pessoas por motivo da deficiência que esta possui jamais será admitida
“A Constituição Federal de 1988 traz como um dos seus objetivos
fundamentais “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” [art.3º, inciso
IV]. Define, no artigo 205, a educação como um direito de todos, garantindo
979

o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação


para o trabalho. No seu artigo 206, inciso I, estabelece a “igualdade de
condições de acesso e permanência na escola” como um dos princípios para o
ensino e garante como dever do Estado, a oferta do atendimento educacional
especializado, preferencialmente na rede regular de ensino [art. 208].
[Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva, 2008]”

A indução e financiamento de Salas de Recursos Multifuncionais tem sido um dos


programas mais importantes da política de Educação Especial. Definido como
Atendimento Educacional Especializado e passou a ser implementada nas redes
municipais e estaduais de educação mediante editais e financiamento público
federal.Em 23 de setembro de 2009, foi homologado o parecer nº 13/2009 do Conselho
Nacional de Educação [CNE], que aborda as diretrizes operacionais para o atendimento
educacional especializado para alunos que estejam matriculados em classes regulares e
que tenham deficiência ou outras condições que exigem atenção especial como a
superdotação, os transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades. O parecer
vem regulamentar o decreto nº 6.571/08, que discorre sobre o apoio técnico e financeiro
da União aos sistemas públicos de ensino nos estados, Distrito Federal e municípios,
ampliando assim a oferta do atendimento educacional especializado. Esse atendimento
refere-se às atividades que complementam a escolarização do público-alvo da Educação
Especial nas classes regulares.
Ainda sobre a garantia que as pessoas com deficiência possuem quanto ao acesso
à educação e vida em sociedade, dispõe a Resolução CEB/CNE Nº 4/2009 em seu artigo
2º que “o AEE tem como função complementar ou suplementar a formação do aluno
por meio da disponibilização de serviços, recursos de acessibilidade e estratégias que
eliminem as barreiras para sua plena participação na sociedade e desenvolvimento de
sua aprendizagem”.
A comunicação é fator primordial para a convivência em sociedade e garante a
expressão de idéias, sentimentos, reivindicações, elementos fundamentais para a
garantia da dignidade tão almejada. Em respeito aos princípios que declaram ser a
dignidade um direito inalienável de todo ser humano e condição primaz para o
estabelecimento da liberdade, da justiça e da paz no mundo [conteúdo já explicitado na
Carta das Nações Unidas] o Decreto 6.949/2009 em seu artigo define que a
comunicação
“abrange as línguas, a visualização de textos, o Braille, a comunicação tátil,
os caracteres ampliados, os dispositivos de multimídia acessível, assim como
a linguagem simples, escrita e oral, os sistemas auditivos e os meios de voz
digitalizada e os modos, meios e formatos aumentativos e alternativos de
980

comunicação, inclusive a tecnologia da informação e comunicação


acessíveis”
Uma escola de fato inclusiva e aberta à diversidade é aquela que faz revisão
constante de seu modo de pensar e de fazer educação. Dar sentido ao conhecimento,
fazer um planejamento e avaliação do ensino, oportunizar o aperfeiçoamento e a
formação continuada de professores, são atitudes que se tornam imperativas na
construção de um espaço inclusivo de educação. Além disso, reconhecer a diferença
como uma oportunidade de crescimento para pessoas com ou sem deficiência, é uma
estrada a ser construída passo a passo, oferecendo voz para todas as pessoas se
manifestarem, abrindo caminhos para as idéias transitarem com liberdade de expressão
e abrindo os olhos do entendimento para perceber que a nós resta aprender a belíssima
arte de conviver.

METODOLOGIA

Este trabalho tem por foco a avaliação da implementação de uma política de


Educação Especial e será possível utilizar grupo focal, entrevista como instrumento de
coleta de dados,análise de conteúdo , seja como estratégia principal ou complementar.

CONCLUSÃO
Pretendo concluir que há um movimento claro de intervenção estatal na
política educacional no que se refere à educação especial. Registra-se que a implantação
de Salas de Recursos Multifuncionais representa a criação de novos espaços públicos
que se associam à estrutura existente na rede estaduaL. Apresento resultados parciais de
pesquisa que tem por objetivo avaliar a implantação e funcionamento do programa
Mecdaisy nas salas de recursos multifuncionais tipo II na cidade de São Paulo;as salas
de recursos existem para apoiar a organização e a oferta do Atendimento Educacional
Especializado – AEE, prestado de forma complementar ou suplementar aos estudantes
com deficiência. Em todo território nacional há 1.416 salas de recursos multifuncionais
tipo II - com recursos adicionais para alunos cegos, 169 estaduais e na cidade de São
Paulo são 4 salas.
Para tanto, é necessário ainda pesquisar a formulação de políticas públicas de
orientação, popularização do uso e das ferramentas de socialização que podem ser
frentes de ações: a proficiência tecnológica, uso das tecnologias da informação e
comunicação,da tecnologia assistiva e o programa Mecdaisy, pois esses recursos podem
981

servir de suporte a inúmeras atividades para as pessoas adentrarem ao mundo letrado.

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983

Comunicação

A gestão na formação do pedagogo após a instituição das diretrizes curriculares


nacionais

Nathália Delgado Bueno da Silva


UNESP/Marília. Centro de Estudos e Pesquisas em Administração da Educação/ Capes
Graziela Zambão Abdian
UNESP/Marília. Centro de Estudos e Pesquisas em Administração da Educação/ Capes

Resumo: O trabalho analisa a concepção e o espaço da gestão escolar na formação do


Pedagogo após a institucionalização das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso
de Pedagogia (2006), tendo como foco duas universidades estaduais (Paraná e São
Paulo). Justifica-se a escolha das universidades porque os dois estados possuem
políticas distintas para a forma de provimento do cargo do gestor e seu ingresso no
cargo e para sua função. A importância da pesquisa está na escassez de estudos que
contemplam as relações entre gestão escolar e formação inicial do pedagogo. Nesta
comunicação, apresentamos resultados no que diz respeito ao percurso teórico da
Administração escolar e suas relações com a formação do Pedagogo. Os elementos
trazidos explicitam preocupações, por um lado, que dizem respeito à construção teórica
da área no sentido de se ter um conteúdo para formar os futuros diretores de escola e,
por outro lado e de forma coincidente, à formação do especialista em administração
escolar.
Palavras-chave: Formação do pedagogo; Gestão Escolar; Políticas Públicas
educacionais.

1. Introdução
O presente artigo é decorrente de desenvolvimento de pesquisa realizada na
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho-UNESP (FFC, Marília) e faz
parte de um projeto integrado desenvolvido junto ao Centro de Estudos e Pesquisas em
Administração da Educação (CEPAE), cujo objetivo geral é analisar os aspectos
históricos e atuais relativos à formação, à função e ao provimento do cargo de
administrador escolar, problematizando e estabelecendo relações com a qualidade do
ensino e com a produção do conhecimento na área.
984

O foco da pesquisa ao qual esta comunicação se vincula é analisar o espaço que


a gestão escolar assumiu na formação inicial do pedagogo, após a publicação das
Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia. Em 2006, após ampla
discussão entre a comunidade acadêmica e sociedade em geral, foi promulgada a
referida Diretriz, que possibilitou a reformulação desse curso em âmbito nacional. Esse
documento retira as habilitações e propõe uma formação ampla para o exercício no
magistério na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental, nos cursos de
ensino médio na modalidade normal, educação profissional na área de serviços e apoio
escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.
No que diz respeito à gestão escolar, as Diretrizes recomendam que o pedagogo
deverá compreender a escola como organização que promove a educação para cidadania
do aluno e a articulação entre a pesquisa, análise e a aplicação dos resultados de
investigações de interesse da área educacional, bem como “[...] a participação na gestão
de processos educativos e na organização e funcionamento de sistemas e instituições de
ensino e:

Art. 4- Parágrafo único: I-planejamento, execução, coordenação,


acompanhamento e avaliação de tarefas próprias do setor da Educação; II-
planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de
projetos e experiências educativas não-escolares; III- produção e difusão do
conhecimento científico-tecnológico do campo educacional, em contextos
escolares e não-escolares (BRASIL, 2006, p. 2).

Após a instituição das Diretrizes, houve fortes críticas à formação comum para o
desempenho de diversos cargos e, se tratando da gestão, autores apontam para uma
formação simplificada e não consistente, questionando o seu espaço. Para alguns deles
(LIBÂNEO, 2006; SAVIAINI, 2007), a gestão foi posta em segundo plano. A partir
destas premissas, questiona-se: qual é a concepção e o espaço da gestão escolar
presentes no curso de formação inicial em Pedagogia? Ou seja, considerando a extinção
das habilitações que formavam o especialista, como a universidade pública concebeu a
gestão na formação do Pedagogo? Se ela não forma mais o gestor (ou diretor de escola
na habilitação em administração escolar), qual é o espaço e a formação em gestão
destinados ao pedagogo?
Para responder às questões norteadoras da pesquisa, estão sendo analisadas as
matrizes curriculares de dois cursos de Pedagogia de universidades públicas estaduais,
sendo uma de São Paulo e outra do Paraná, e estão sendo feitas entrevistas com
professores que ministram disciplinas relacionadas à gestão, bem como, com alunos dos
985

últimos anos dos cursos. A escolha por estes estados se justifica por serem pertencentes
a contextos que indicam diretrizes políticas educacionais diferentes para a forma de
provimento do cargo do gestor e a sua função. Ou seja, pretende-se relacionar as
questões da formação inicial, função e forma de provimento do cargo, tensionando as
diretrizes da política educacional e o desenvolvimento teórico da área.
Nesta comunicação, especificamente, temos como objetivo apresentar resultados
da pesquisa no que diz respeito ao percurso teórico da Administração escolar e suas
relações com a formação do Pedagogo. Trabalhamos esse objetivo em duas partes,
seguidas de algumas considerações: apresentamos análise da construção teórica da
Administração escolar, em seguida, alguns aspectos da constituição histórica do curso
de Pedagogia e suas relações com a gestão escolar.

2 A construção teórica em administração escolar

Desde que se iniciaram os estudos acerca da administração escolar, uma série de


teorias foram debatidas e confrontadas, no entanto, ainda que estes estudos tenham sido
norteados por diferentes embates e influenciados por seu contexto histórico e político, o
questionamento que perpassa durante anos diz respeito à articulação entre as influências
da administração empresarial no ambiente escolar, em que alguns estudiosos defendem
que há relações diretas entre estes sistemas no que diz respeito à gestão, e outros
apontam para a escola como uma instituição de peculiaridades próprias e que deve
buscar elementos que estejam de acordo com o seu próprio contexto enquanto
instituição escolar.
As discussões iniciais, trazidas por Ribeiro (1968), Lourenço Filho (2007) e
Alonso (1976), defendem, ainda que de modo distinto pelos autores, que a
Administração escolar seja pautada nos princípios estabelecidos nas empresas. Oliveira
(2011), buscando traçar a trajetória deste campo de estudo, aponta as especificidades
que nortearam os autores supracitados em sua teoria acerca da Administração escolar.
Destaca que Ribeiro (1907-1990) apoia-se fortemente na perspectiva empresarial,
colocando esta como norteadora dos indivíduos em suas práticas, dentro de suas
especificidades e funções, porém, buscando os objetivos comuns da instituição em
questão. Na mesma década, apresenta o posicionamento de Teixeira (1900-1971) e o
caracteriza como distinto, logo que este diz que a administração tem um caráter de
mediadora, buscando auxiliar os componentes da escola na organização de seu trabalho
986

pedagógico e extinguindo o posicionamento de figura autoritária ao


diretor/administrador.
Lourenço Filho (2007) também se pauta em conceitos da administração
empresarial e pontua como função do diretor escolar a busca de informações e
problemas acerca de seu ambiente para em seguida acontecer a tomada de decisões que
visem soluções. Indo ao encontro do que ele propõe, Alonso (1976) entende a
administração escolar como práticas que irão acatar tanto elementos externos à
instituição de ensino, trazendo informações dos níveis superiores e as adequando ao seu
contexto, quanto internos, averiguando os problemas e buscando a solução dos mesmos.
Nota-se que quando os autores atribuem funções a apenas um membro da
instituição sobre os demais, esta passa a ter um caráter centralizador, um dos pontos que
será questionado por autores progressistas que defendem a gestão democrática nas
escolas e a participação coletiva na tomada de decisões, dentre outros aspectos frente à
especificidade da escola. Estas críticas começam a vir à tona a partir da década de 1980,
juntamente com o fato de a Constituição Federal de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LEI nº 9394/1996) terem consolidado a gestão democrática
como princípio da educação escolar pública. Vale considerar, segundo Oliveira (2011),
que do âmbito teórico para o político, esta consolidação também fez com que vários
estados brasileiros adotassem a eleição como forma de provimento do cargo de diretor
de escola.
A construção teórica em administração escolar vai tomando um novo rumo a
partir de então, não desconsiderando a construção já estabelecida, mas incorporando
elementos mais amplos no que diz respeito às peculiaridades das instituições de ensino.
A este respeito, Paro (1986) aponta que há uma natureza específica no processo
pedagógico o que faz com que ele apresente elementos que o diferem dos encontrados
no âmbito empresarial, sendo assim, que irão influenciar e também deverão nortear a
gestão que será estabelecida.

Pensar sobre a gestão escolar é pensar sobre as condições materiais a partir


das quais se desenvolve a ação educativa, e, nesse sentido, a gestão escolar,
em seu sentido clássico, apresenta-se como a mediação necessária. Por essa
razão, só faz sentido contemplar a atividade administrativa se os fins a que
ela servir forem conhecidos e apropriados pela comunidade educativa,
porque, se, no sentido geral, a administração é a utilização racional de
recursos para a realização de fins determinados (PARO, 1986, p. 18).

No que tange ao contexto política e social dos anos 1980, é preciso destacar o
movimento de democratização da sociedade e da educação e a publicação da
987

Constituição Federal de 1988 que, pela primeira vez na história do país, traz a gestão
democrática como princípio educacional.
Nos anos 1990, presenciamos, no âmbito dos estudos acadêmicos, a
construção da escola como objeto de estudo, marcada pela forte influência da produção
portuguesa (NÓVOA, 1995; LIMA, 1998). Estes estudos privilegiam um nível meso de
abordagem e identificam que “[...] apesar de conterem visões parcelares da realidade, é
evidente que tanto as teorias macroscópicas como os estudos microscópicos produziram
um conhecimento útil e pertinente do ponto de vista do pensamento e da acção
pedagógica” (NÓVOA, 1995, p.20).
Os pesquisadores adotam uma perspectiva centrada na organização escolar,
preocupam-se em olhar para as organizações escolares, analisar, explicar, compreender
o que elas fazem em seu cotidiano, como constroem o processo educacional. Maia
(2004), em pesquisa realizada sobre as publicações da ANPAE, identificou o percurso
semelhante que culminou com a mudança de abordagem em Administração escolar na
Revista Brasileira de Política e Administração da Educação (RBPAE).
Os autores citados anteriormente acabam por rever alguns pressupostos
defendidos pelos teóricos crítico-reprodutivistas da década de 1970 (BOURDIEU;
PASSERRON, 1975; BAUDELOT; ESTABLET, 1971) principalmente o de que as
instituições educativas são lócus de reprodução da sociedade. Para eles, as instituições
executam as normas estabelecidas em âmbito central e se constituem como aparelho do
Estado. Portanto, juntamente com a mudança teórica dos anos 1980, há uma mudança
metodológica, as pesquisas passam a construir seus apontamentos a partir da realidade
das escolas, com a realização de estudos de caso, pesquisas participantes e pesquisas-
ação. Na literatura da área, praticamente desaparecem os livros de autores únicos e
crescem, significativamente, as coletâneas com relatos de pesquisa realizadas a partir
das diferentes realidades escolares brasileiras (LUCE; MEDEIROS, 2006).
A construção teórica em administração escolar vem sendo consolidada
juntamente com fatores políticos que norteiam esta prática nas instituições de ensino,
principalmente as diretrizes da política educacional que, assim como o desenvolvimento
teórico da área, vem focalizando a escola. No entanto, as diretrizes da política,
diferentemente da área, colocam a gestão como sendo um dos fatores mais importantes
para a melhoria da qualidade de ensino, esta entendida como a garantia dos índices
colocados externamente pelo governo federal. Os aspectos teóricos e sociais destacados
construíram novo pensamento na administração escolar, trazendo, sobretudo, aspectos
988

políticos em detrimento de aspectos técnicos a serem discutidos em relação à função do


diretor de escola.
O cenário atual de hegemonia capitalista dos anos 1990, respaldado na
doutrina neoliberal e na globalização dos mercados, determinou em nosso país uma
ampla reforma do Estado concretizada via reformas setoriais, dentre elas, a da educação.
Identifica-se, mediante abordagem realizada por diversos autores
nacionais/internacionais (BARROSO, 2005; OLIVEIRA, 2005), que a reforma
educacional brasileira da década de 1990 privilegiou (talvez ainda venha privilegiando)
questões relacionadas aos aspectos financeiros e à adequação do sistema educacional à
lógica do capitalismo, mediante, entre outros aspectos, redefinição do sistema de
financiamento e regulação da política com a concretização de rígido e centralizado
sistema de avaliação nacional. No contexto das reformas, a gestão da educação ganhou
atenção maior na medida em que se tornou uma das responsáveis direta pela melhoria
da produtividade do setor educacional público diante das novas demandas dos setores
produtivos e das orientações das agências internacionais de financiamento (RUSSO,
2004).
Em relação às alterações na organização da escola, é preciso destacar que os
diretores passam a ser considerados “[...] a principal carreira em que se dá a
incorporação do novo gerencialismo, sendo crucial para a transformação dos regimes
organizacionais das escolas” (BALL, 2006, p.13). Emergem também alguns programas
que se remetem diretamente às escolas, como por exemplo, o Programa Dinheiro Direto
na Escola que estimula a administração por objetivos, a pedagogia de projetos, a cultura
da eficiência e demonstração dos resultados. Neste contexto, são incentivados cursos de
formação continuada de diretores de escola (“Circuito Gestão; ProGestão”) com o
principal objetivo de formar lideranças que conduzam, de forma eficiente e eficaz, as
metas traçadas pela política educacional. Neste sentido, o Estado se torna mais flexível
na definição dos processos e rígido na avaliação da eficiência e eficácia dos resultados,
principalmente mediante a realização das avaliações nacionais do ensino, em todos os
níveis e modalidades.
Da análise exposta, podemos dizer que as primeiras discussões sobre
administração escolar no Brasil foram baseadas na administração de empresas, o que
permaneceu até meados dos anos 1980, momento em que a teoria marxista influencia
sobremaneira as pesquisas educacionais e, sem dúvida, a área da administração escolar.
Nesse momento, há uma mudança de paradigma e a maioria das produções teóricas da
989

área realiza um diagnóstico negativo do que havia sido produzido até o momento e
indicam a possibilidade de a administração escolar contribuir com a transformação da
sociedade. No bojo de um contexto marcadamente neoliberal dos anos 1990, as
pesquisas, na contramão das diretrizes políticas, passam a estudar a escola, seus limites
e possibilidades de contribuição para a emancipação social a partir da vivência da
gestão democrática. No entanto, a área não apresenta mais a consistência teórica
anterior, em que estavam presentes autores únicos de livros considerados clássicos, uma
vez que estão presentes, basicamente, coletâneas com predominância de relatos de
experiências e estudos de caso. Portanto, podemos dizer que há um arrefecimento da
área da administração escolar no que diz respeito à construção de um corpo teórico
próprio (SILVA JR, 2002).

3 A formação do pedagogo e o espaço da gestão escolar

No âmbito das políticas de formação de educadores, incluindo o diretor de


escola, com a Lei nº 4.024/1961 (BRASIL, 1961), a formação dos professores para o
magistério foi atribuída ao Curso Normal de nível médio, não havendo referência ao
curso de Pedagogia. Já em 1962, foi elaborado o Parecer CFE nº 251/1962 (BRASIL,
1962), que estabeleceu a primeira regulamentação para o curso de Pedagogia, fixando
currículo e duração mínima, com formação do pedagogo generalista, sem a separação
entre bacharelado e licenciatura.
No período da ditadura militar, logo após a Lei Federal nº 5.540/1968, o
Conselho Federal de Educação deliberou mudanças para o curso de Pedagogia por meio
do Parecer CFE nº 252/1969 (BRASIL, 1969a) e da Resolução CFE nº 02/1969
(BRASIL, 1969b), que introduziram habilitações a serem cursadas após as disciplinas
pedagógicas específicas do magistério.
O pedagogo encontrou-se dividido entre a identidade de professor e de
especialista, sendo que “[...] a maioria dos planos de carreira do magistério alcançou o
‘especialista’ a um plano mais elevado como profissional da educação.” (BRZEZINSKI,
2007, p. 238, grifo da autora). Os cursos de Pedagogia no Brasil passam a assumir, a
partir de então, diversas identidades, alguns com inúmeras habilitações (como é o caso
da Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília que apresentou até o ano de 2007 nove
habilitações) e outros com uma habilitação dentre aquelas possíveis. O curso de
licenciatura em Pedagogia foi concebido como aquele que forma o professor para atuar
990

nas séries iniciais do ensino fundamental e no nível médio, modalidade normal e, em


cada proposta pedagógica, aquele profissional habilitado (especialista) para atuar em
uma área específica (diretor, supervisor, professor de educação infantil, professor para
atuar com diferentes deficiências, entre elas: física, visual, auditiva, intelectual).
Apesar de existirem diversas práticas em estados e municípios brasileiros de
eleição de diretores que não exigiam a habilitação em administração escolar para
assumir o cargo, o curso de Pedagogia fica constituído dessa forma até os anos 2006.
Vale ressaltar que tais práticas foram possíveis após a publicação da LDBEN que, entre
suas diretrizes, permitiu que os sistemas (estaduais e municipais) definissem o que e
como compreendem a gestão democrática. Muitos deles passaram a incluir a
participação da comunidade desde a forma de provimento do cargo do diretor da escola
e, nesse sentido, entre os elegíveis poderiam (e podem) ser, normalmente, um professor
da escola a qual pretende administrar, mas que, não necessariamente, apresenta
formação em Pedagogia ou especialização em administração escolar. Essas vivências
são coerentes com as conquistas da área, traçadas anteriormente, no que tange aos
aspectos políticos que caracterizam a função do diretor de escola.
O curso permaneceu com as habilitações por todo esse período (anos 1970 até
2006), mas, especificamente os anos 1980 foram marcados por fortes discussões,
principalmente dos movimentos dos educadores, com a realização da Primeira
Conferência Brasileira de Educação, na qual foi criado o Comitê Pró-Participação na
Reformulação dos Cursos de Pedagogia e Licenciatura, transformado em Comissão
Nacional pela Reformulação dos Cursos de Formação de Educadores (CONARCFE); e,
posteriormente, em Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação
(ANFOPE). As principais defesas foram: a docência como eixo sobre o qual se apoiam
a formação do educador e a base comum nacional (SAVIANI, 2007).
Em 2007, a ANPAE publicou um número temático sobre formação de
professores e o curso de Pedagogia (REVISTA..., 2007), com a intenção de registrar a
longa e debatida tramitação da Resolução CNE/CP nº 1/2006, que instituiu as Diretrizes
Curriculares Nacionais para o curso de Graduação em Pedagogia. O registro desse
movimento, que deu origem às DCN vigentes, procura destacar o processo de
elaboração de uma série de documentos, publicados a partir de 1970, que apresentaram
desde a possibilidade de extinção do Curso de Pedagogia, até seu fortalecimento
enquanto responsável pela formação de profissionais da educação aptos para atuarem na
docência e nas diversas áreas que envolvem assuntos educacionais.
991

Ao descrever a trajetória da luta pelas Diretrizes Curriculares, Castro (2007) cita


os vários documentos elaborados pelo conjunto de entidades (entre elas a Associação
Nacional de Política e Administração da Educação, a Associação Nacional de Pesquisa
e Pós-Graduação em Educação e o Fórum Nacional em Defesa da Formação de
Professores) e afirma que, depois de uma série de negociações com o Conselho
Nacional de Educação, aprovou-se a Resolução CNP/CP n. 1, que instituiu as DCN para
o Curso de Graduação em Pedagogia.
As conquistas parecem articular-se diretamente com o movimento da área da
administração escolar que, mesmo não tendo a preocupação explícita de discutir a
formação do diretor/gestor de escola, aponta para a necessidade de qualquer professor
poder vir a ser um diretor, desde que eleito por sua comunidade. Ou seja, as conquistas
na formação do pedagogo parecem ir ao encontro das conquistas teóricas da
administração escolar que enfatizam, sobretudo, o caráter eminentemente político do
diretor de escolar em detrimento do caráter técnico, sendo este enfatizado entre os anos
1960 e 1970.

4 Considerações finais

A pesquisa que originou esse trabalho tem como objetivo analisar o espaço da
gestão na formação do pedagogo em duas universidades públicas estaduais, sendo uma
paulista e outra paranaense. Integrando tal objetivo, apresentamos resultados da
pesquisa no que tange à construção teórica da área e à constituição histórica do curso de
Pedagogia, com foco na formação do gestor.
Cotejando as duas partes do texto, podemos fazer uma análise que nos permite
indicar questionamentos que podem se constituir como objeto de estudo de pesquisas
posteriores. Inicialmente, os elementos trazidos explicitam preocupações, por um lado,
que dizem respeito à construção teórica da área da administração escolar no sentido de
se ter um conteúdo para formar os futuros diretores de escola e, por outro lado e de
forma coincidente, à formação do especialista em administração escolar (habilitado para
ocupar o cargo de diretor de escola). Nesse sentido, por um longo período (entre os anos
1960 e final dos anos 1980), parece coincidir a construção teórica da área com as
diretrizes para a formação do diretor de escola: este profissional é um especialista
formado no curso de Pedagogia com conhecimentos específicos da administração
escolar (baseados na administração empresarial) para dirigir a escola.
992

Nos anos 1980, no bojo do processo de democratização da sociedade e da


educação, a área da administração escolar apresenta um rompimento com o referencial
da administração empresarial e incorpora o referencial marxista em seus estudos,
privilegiando os aspectos políticos nas questões relacionadas à função do diretor de
escola. Neste período, apesar de os cursos manterem as habilitações, vários sistemas
(estaduais e municipais) vivenciam o processo de eleição de diretores, eliminando a
necessidade de o diretor ter cursado a Pedagogia e a habilitação em administração
escolar para administrar a escola. Há, portanto, o distanciamento entre a construção
teórica da área (com as conquistas da gestão democrática) e a formação do diretor que
ainda se manteve em habilitações (formação do especialista). Entretanto, nesses anos,
houve forte participação do movimento dos educadores pela alteração da formação do
pedagogo e, entre os elementos, esteve presente a defesa da extinção das habilitações.
Dos anos 1990 aos dias atuais, do ponto de vista teórico da área, há um
arrefecimento dos estudos que privilegiam a construção da teoria da administração
escolar, crescendo a produção sobre realidades específicas, com predominância de
coletâneas que trazes estudos de caso. Em relação à formação, os anos 2000 marcam a
extinção das habilitações e a formação do pedagogo generalista, fazendo coincidir,
novamente, as conquistas da área com a perspectiva de formação do diretor.
Atualmente, nos diferentes estados e municípios, há diversas práticas de provimento do
cargo do diretor de escola. Quando eleito e/ou indicado, o profissional não
necessariamente precisa ter formação específica em Pedagogia ou especialização em
administração escolar. Quando concursado, o diretor precisa ser diplomado em
licenciatura em Pedagogia que não necessariamente apresenta conteúdos referentes à
administração escolar, dada a autonomia das diferentes universidades no sentido de
construírem suas propostas pedagógicas.
Das considerações finais traçadas, indicamos uma preocupação: qual é o espaço
da gestão na formação do pedagogo? Especificamente, se o pedagogo formado ocupar a
função de diretor quais conhecimentos iniciais ele possui para interagir com a
complexidade em que a escola pública hoje está inserida, considerando, sobretudo, as
diretrizes da política educacional com seu viés economicista? Essas questões precisam
ser investigadas e debatidas em novas pesquisas e foram possíveis de serem realizadas a
partir de toda a análise empreendida nesse texto.
993

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995

Comunicação

A semana de atividades científicas – SEAC - como espaço educacional e trabalho


meritório.

Nilza M. Macario
Associação Educacional Dom Bosco (AEDB)
Luci Hildenbrand
Fundação Cesgranrio
Angela M. da S. Campos
Associação Educacional Dom Bosco (AEDB)

Resumo: O presente estudo descreve a Semana de Atividades Científicas – SEAC, da


Associação Educacional Dom Bosco, Município de Resende, tendo como foco sua
evolução em doze anos de organização e trabalho. Tem como objetivo mostrar a
construção gradativa deste espaço educacional que tem se mostrado capaz de incentivar
a produção científica de alunos e professores, além de converter-se em caminho
essencial à consolidação de linhas de pesquisa e meio para a melhoria da qualidade e
para a integração de ensino, pesquisa e extensão. Apoia-se nos aportes metodológicos
da pesquisa qualitativa e na utilização de métodos mistos no que se refere a
procedimentos de estratégia exploratória sequencial. Nas considerações finais, ressalta-
se a importância da continuidade do empreendimento pedagógico, sustentado na
participação coletiva comprometida com o desenvolvimento de um espaço educacional
que congregue valores, pessoas e Instituição.
PALAVRAS CHAVES: Semana de Atividades Científicas. Integração Ensino,
Pesquisa, e Extensão. Espaço Educacional.

1 INTRODUÇÃO
1.1 Associação Educacional Dom Bosco
Fundada em 21 de dezembro de 1964, como instituição privada, de natureza
filantrópica, a Associação Educacional Dom Bosco, ao comemorar seu cinquentenário,
apresenta-se como mantenedora da Faculdade de Engenharia de Resende, das
Faculdades de Ciências Econômicas e Administrativas e da Computação, e da
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Dom Bosco, perfazendo áreas de Educação,
996

Engenharia, Negócios e Tecnólogos, somando dezoito cursos de graduação, um Curso


de Pós-Graduação stricto sensu, cursos lato sensu em áreas correlatas à graduação e ao
Colégio de Aplicação de Resende (CAR).
Situada geograficamente na região do Médio Paraíba, no sul fluminense, em
Resende, município do Estado do Rio de Janeiro, tem investido na expansão de suas
atividades, entendendo que convênios e parcerias com diferentes segmentos de sua
região, órgãos e instituições públicas ou privadas, possam favorecer melhores condições
para a consolidação de seus objetivos. Esta preocupação espelha-se na filosofia
institucional declarada em sua Missão, que é “Formar o homem com elevado grau de
consciência crítica, que lhe permita conhecer a realidade e agir sobre ela, com vistas a
mudanças nas relações sociais” (AEDB, PDI, 2009, p. 12). No desenvolver de suas
ações, acredita e propõe tornar realidade a premissa legal que marca a indissociabilidade
ensino – pesquisa – extensão, enquanto procura alinhar-se às necessidades de seu
entorno e responder às expectativas de sua clientela, por meio do Centro de Pesquisa,
Pós-Graduação e Extensão (CPGE), criado em 1998.

1.2 Centro de Pesquisa, Pós-Graduação e Extensão


O Centro de Pesquisa, Pós-Graduação e Extensão (CPGE) tem como atribuição
maior o estabelecimento de princípios, normas e processos para o desenvolvimento da
pesquisa, da pós-graduação e da extensão. Para consolidação de suas atribuições,
organiza-se em coordenações setoriais, conforme mostra a Figura 1.

Figura 1. Estrutura Organizacional do CPGE

Fonte: Regimento do CPGE (2006).

O CPGE defende a formação de uma mentalidade investigativa na comunidade


acadêmica, construída a partir de programas de iniciação à pesquisa, do
desenvolvimento de projetos de pesquisa, do fomento a ações diversas no âmbito dos
997

cursos e ações em nível de pós-graduação e de extensão, a medida que assume que todas
concorra para a formação do elo integrador entre os ensinos fundamental, médio e
superior, mantidos pela Associação Educacional Dom Bosco.
Ao longo dos anos, o CPGE vem aprimorando suas estratégias de atuação tendo
em vista contribuir para que a Associação Educacional Dom Bosco firme a sua
determinação em garantir a produção do conhecimento, a partir da mobilização e do
incentivo aos esforços empreendidos por toda a sua comunidade acadêmica. Neste
intento, criou, em 2003, a primeira Semana de Atividades Científicas - SEAC, evento
que passou a acontecer anualmente.
A expectativa em fazer circular a informação científica, produzida pela
comunidade, no seu próprio espaço institucional, foi proposta considerando três
modalidades de comunicação recorrentes em eventos de pequeno, médio ou grande
porte, a saber: comunicação científica, comunicação de trabalhos de conclusão de
cursos de graduação e apresentação de pôster.
Com isto, além de promover a divulgação do conhecimento produzido
internamente junto às nove graduações, a SEAC, ainda, abriu espaço para que a
comunidade, como um todo, começasse a perceber-se produtora de conhecimento. O
Quadro 1, apresentado na sequência, mostra a participação da comunidade acadêmica
nos eventos SEAC, realizados no interstício dos anos 2005 a 2010.
Quadro 1. Inventário dos Trabalhos apresentados por Cursos e Modalidades, na SEAC 2005
a 2010.

CURSO COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA COMUNICAÇÃO TCC PÔSTER

05 06 07 08 09 10 05 06 07 08 09 10 05 06 07 08 09 10
MODALIDADE

LETRAS 04 02 05 08 04 02 02 - 04 03 10 08 01 - - - - 02

PEDAGOGIA 05 - 01 05 - 19 - - 01 03 05 - 06 14 27 06 05 05

ENGENHARIA
ELÉTRICA/ - 01 01 03 04 04 - 02 - - - 02 05 01 - 04 05 05
ELETRÔNICA
ENGENHARIA DE
PRODUÇÃO - 02 03 - 02 - - - - 08 04 04 - - 01 01 05
AUTOMOTIVA

ADMINISTRAÇÃO 01 - 07 10 07 08 08 - 12 06 11 21 - - 02 - 08 -

ECONOMIA - 01 04 07 01 05 - 09 10 02 - 05 02 01 01 02 05 02

SISTEMA DE
- 08 13 05 05 11 - 05 - - 06 02 10 - 17 07 - 01
INFORMAÇÃO

Legenda: 05= 2005 06= 2006 07=2007 08=2008 09=2009 10= 2010
Fonte: ANAIS da SEAC (2005 a 2009).
998

No intervalo de tempo compreendido entre 2005 e 2010, a SEAC passou por


várias mudanças estruturais, que decorreram de decisões acadêmico-administrativas.
São exemplos neste sentido, a elaboração de regulamento próprio, em 2009, a criação de
grupos de professores avaliadores dos trabalhos a serem apresentados e outras incursões
que favoreceram a consolidação do caráter interdisciplinar da Semana. Nos anos
seguintes (2011- 2014), a expansão da SEAC no seio da comunidade evidencia o
reconhecimento e a consagração do espaço pedagógico (QUADRO 2).
Quadro 2. Inventário de trabalhos apresentados por Cursos e Modalidades, na SEAC - 2010 a
2014.
COMUNICAÇÃO
COMUNICAÇÃO TCC POSTER
CURSO CIENTÍFICA

11 12 13 14 11 12 13 14 11 12 13 14
MODALIDADE
LETRAS 02 01 02 03 16 11 11 09 01 - - 02
PEDAGOGIA 04 02 03 01 01 01 01 02 08 - - -
BIOLOGIA - 01 02 01 - 01 11 01 10 10 10 18
ENGENHARIA ELÉTRICA/
02 05 05 09 01 - 01 02 04 13 13 09
ELETRÔNICA
ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
09 22 22 23 04 10 10 06 01 10 10 02
AUTOMOTIVA
ENGENHARIA CIVIL - 11 11 07 - - - - - 03 03
ENGENHARIA DE PRODUÇÃO - - - - - - - -
- 06 06 03
METALÚRGICA
ENGENHARIA MECÂNICA - - - - - - - - - - - -
ADMINISTRAÇÃO 03 23 23 18 08 14 14 19 01 01 01 -
ECONOMIA 02 13 13 11 - - - 01 01 05 05 -
CIÊNCIAS CONTÁBEIS - - - - - - - - - - - -
COMUNICAÇÃO SOCIAL - 09 03 08 - - 01 01 - 12 12 16
SISTEMA DE INFORMAÇÃO 02 04 04 01 06 01 01 01 - - - 06
TECNOLOGIA EM LOGÍSTICA 06 - - - - - - - - - - -
TECNOLOGIA EM - - - - - - -
- 12 01 01 05
AUTOMAÇÃO INDUSTRIAL
TECNOLOGIA EM GESTÃO DE
04 13 13 10 - - - 02 - - - 02
RH
TECNOLOGIA EM GESTÃO - - - - - - -
01 - 03 03 -
PÚBLICA
TECNOLOGIA EM GESTÃO - - - - - - - - - - - -
INDUSTRIAL

Legenda: 11= 2011 12= 2012 13=2013 148=2014


Fonte: ANAIS da SEAC (2005 a 2009).

A partir de 2011, sexto ano de realização da SEAC, observa-se expressivo


crescimento na participação de discentes e docentes e a SEAC, cada vez mais, converte-
999

se em espaço incentivador da iniciação à pesquisa e de suas manifestações na


comunidade.

2 METODOLOGIA DO ESTUDO
O aporte metodológico deste estudo fundamenta-se na pesquisa qualitativa
quando procura a relevância do funcionamento organizacional de um trabalho meritório
que congrega valores na busca da consolidação de linhas de pesquisa.
Seguindo as proposições da pesquisa qualitativa (STRAUSS; CORBIN, 2008),
dos procedimentos de métodos mistos e da estratégia sequencial exploratória
(CRESWELL, 2007), mas ainda os grupos de conceitos delineados por conjuntos de
produções acadêmicas, o estudo empenhou-se em estabelecer categorias (áreas de
concentração) e subcategorias (áreas temáticas) geradoras de possíveis linhas de
pesquisa institucional, que tenham nascido no decorrer dos 10 anos de SEAC,
Quanto a seus fins, o estudo classifica-se como pesquisa descritiva (GIL, 1994),
preocupando-se claramente com uma atuação prática, ou seja, com a organização,
funcionalidade e relevância da Semana de Atividades Científicas da AEDB.
A pesquisa fez uso de instrumentos para levantamento longitudinal de dados (10 anos) e
também incorporou consultoria externa de especialista para ratificar a distribuição dos
trabalhos acadêmicos nas subcategorias, ou seja, nas áreas temáticas.
Como meio, procedeu a análise do conteúdo dos Anais da SEAC, ao longo do
intervalo de tempo 2003 – 2014, e ainda considerou os registros de avaliação do evento
dos últimos cinco anos (2010 e 2014) e o levantamento bibliográfico necessário a
referendar os tipos de pesquisa que marcaram o estudo.

3 A SEAC COMO ESPAÇO EDUCACIONAL MERITÓRIO


NA AEDB, A SEAC constitui-se em espaço educacional: valoriza a produção
discente e docente, fortalece a integração ensino, pesquisa e extensão, incentiva a
dinamização de trabalhos conjuntos, prima pela consolidação das oportunidades
favoráveis à troca de experiências e à formação de parcerias, enquanto garante a
construção, a divulgação e o confronto de ideias, a interdisciplinaridade e o crescimento
da relação professor – aluno – cursos - IES.
Tal espaço resultou da determinação, focalização e participação de todos os
envolvidos no processo. Movida por objetivos comuns e identificada com os valores
que norteiam ações, hoje, a SEAC conta com atores fidelizados que, impregnados por
1000

modos particulares de ver e de sentir a realidade, se alternam nos papéis de sujeito e de


coadjuvante. O valor pedagógico da Semana sobressai quando da reflexão do
empreendimento, que se consolida ao longo de seus 10 anos. A cada nova edição, a
experiência acumulada da SEAC tem mostrado a necessidade de se adotar
procedimentos que concorram para a maior qualidade do processo e para a maior
consistência dos resultados.
Ao longo dos anos, elaboraram-se diretrizes e normas para dar fundamento ao
regulamento da SEAC, inicialmente concebido em 2009 e atualizado em 2012. Dele
constam a definição do evento, as suas finalidades e objetivos, as orientações gerais
atinentes à organização e controle da SEAC, bem como os tipos de trabalhos e
modalidades, as formas de inscrição e de apresentação, os procedimentos recomendados
para a avaliação do evento e a certificação aos participantes.
A avaliação dos trabalhos submetidos para apresentação teve início com a livre
participação de um grupo de professores colaboradores, o que, em 2010, evoluiu para a
formação de uma comissão científica de avaliação, indicada pelos coordenadores de
cursos. Também decidiu-se pela criação de um manual de submissão de trabalhos,
objetivando a próxima criação e instalação de um sistema informatizado para
administração do evento.
Publicados em mídia impressa e eletrônica, os Anais da VIII SEAC, realizada
em 2010, em sua apresentação, dão ênfase às mudanças que caracterizam o status
acadêmico da Semana,
A VIII Semana de Atividades Científicas da Associação Educacional
Dom Bosco representa mais um marco na caminhada rumo ao
aprimoramento e consolidação da pesquisa que busca envolver professor e
aluno em seu fazer indissociável de ensino, pesquisa e extensão. A inscrição
dos trabalhos por áreas temáticas privilegiou as linhas de pesquisa e permitiu
a aproximação com os outros eventos institucionais em nível nacional,
SIMPED e SEGET.
Pela primeira vez os trabalhos foram avaliados por uma Comissão Científica
constituída por Doutores, Mestres e especialistas nas áreas temáticas,
indicados pelas Coordenações de Curso. Também pela primeira vez contou-
se com um sistema de informatização próprio para a SEAC o que facilitou e
otimizou todo o processo, garantindo resultados mais efetivos e de melhor
qualidade .O interesse de professores e alunos em apresentar trabalhos tornou
possível uma culminância de 117 trabalhos aprovados para apresentação
dentre as modalidades Comunicação Científica, Comunicação de TCC
(trabalhos Finais), Pôsteres, Oficinas, Relato de Experiências e Atividades
Culturais. Diretores, Coordenadores, Professores, alunos, funcionários, todos
estão de Parabéns! A cada um de vocês cabe uma parcela significativa do
sucesso da VIII SEAC (ANAIS da SEAC, 2010 p, 5).
1001

A organização estrutural do evento também foi, ao longo do tempo, sofrendo


modificações. A princípio, fazia-se a distribuição dos trabalhos segundo as formações
envolvidas; em seguida, adotaram-se novos critérios como interdisciplinaridade e
afinidade temática. Ao lado das mudanças citadas e do aperfeiçoamento logístico,
evidências qualitativas da melhoria da produção discente e docente reforçaram o status
do evento que passou a figurar no calendário oficial da AEDB.
A assinatura dos trabalhos inscritos passou a requerer não apenas o(s) nome(s)
do(s) graduando(s), mas ainda o do professor orientador que deveria assumir
corresponsabilidade e coautoria pela produção acadêmica. Por ocasião da apresentação
das produções, a mesa diretora, responsável pela apreciação da qualidade das
apresentações, passou a ser formada por professores previamente designados, auxiliados
por alunos colaborados voluntários, prestigiando os autores com comentários e
sugestões de melhoria, aprofundamento e continuidade.
Do mesmo modo que as disciplinas integram-se horizontal e verticalmente
dando vez à estrutura curricular dos cursos, a análise das produções da SEAC, no correr
do período, tem sinalizado as tendências das produções de discentes e docentes,
deixando ver as linhas de pesquisa que se agrupam em áreas de concentração e que
direcionam os esforços de integração entre cursos e atividades (FIGURA 2).

Figura 2. Inte-relação, Área de Concentração e Linhas de Pesquisa

Fonte: BORGES ANDRADE, J.S. (2003) adaptado por MACARIO, N. M. (2014).

Neste contexto surgem, pouco a pouco, projetos que se revertem em linhas de


pesquisa, consolidadas pela continuidade e consistência das áreas temáticas, a exemplo
do que se mostra por meio do Quadro 3. Nele, consideraram-se as áreas de concentração
editadas pelos próprios cursos – Engenharia Elétrica/Eletrônica e Engenharia de
1002

Produção Automotiva – e o aporte teórico sobre categorização de Strauss e Corbin


(2008).
adro 3. Inventário de trabalhos publicados na SEAC por Áreas de Concentração e Áreas
Temáticas
da Faculdade de Engenharia de Resende, no período 2005 a 2014.
ÁREAS DE CONCENTRAÇÃO TRABALHOS
ÁREAS TEMÁTICAS
PUBLICADOS

CONTROLE AMBIENTAL 21

EFICIÊNCIA ENERGÉTICA 34

TECNOLOGIA DA ENGENHARIA AUTOMAÇÃO INDUSTRIAL 14


ELÉTRICA/ELETRÔNICA,
AUTOMAÇÃO E CONTROLE. CONTROLE INDUSTRIAL 66

ROBÓTICA 26

FORMAÇÃO TECNOLÓGICA 21

INCLUSÃO SOCIAL 1

GESTÃO DA PRODUÇÃO E OPERAÇÕES 3

GESTÃO PELA QUALIDADE 16


GESTÃO DA PRODUÇÃO E
OPERAÇÕES
DESENVOLVIMENTO DE PRODUTOS E PROCESSOS 22

TECNOLOGIA DA PRODUÇÃO AUTOMOTIVA 22

Fonte: ANAIS DA SEAC (2005 – 2014).

Por meio do Quadro 3, ainda, pode-se observar que áreas temáticas, a exemplo
de Controle Industrial, despontam, no intervalo de 10 anos, com uma média anual
bastante elevada de trabalhos publicados/ano, consubstanciando uma linha de pesquisa
em consolidação, o que reforça as áreas de concentração.
No estudo, a distribuição dos trabalhos computados por áreas temáticas
(subcategorias) foi ratificada por consultor externo1, denotando a importância e o mérito
da SEAC como incentivadora da produção científica e como espaço educacional
relevante da AEDB.

1
Tadeu Luiz Pacheco da Silva. Engenheiro de Produção, Especialidade Mecânica, com experiência em
produção industrial e manutenção preventiva e corretiva em empresas de médio e grande porte.
(CREA/RJ).
1003

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho aqui elaborado confirma a importância da relação estrutura e
processo, principalmente quando se trata de uma construção educativa como a Semana
de Atividades Científicas - SEAC da AEDB.
A utilização do método misto, possibilitando o estudo longitudinal do desenvolvimento
dos trabalhos, apresentados ao longo dos últimos dez anos de funcionamento da SEAC
(2005-2014), corroborou para o melhor entendimento do processo de criação de linhas
de pesquisa em uma instituição de Ensino Superior, como prerrogativa de, ao mesmo
tempo, estar construindo um espaço educacional que congregue valores, pessoas e
Instituição.
O mérito e a organização do espaço educacional constroem-se no tempo,
gradativamente, passo a passo, envolvendo o individual e o coletivo, onde todos os
interessados estejam irmanados pelo mesmo espírito investigativo que busca a
consolidação de novos conhecimentos e novas atitudes frente ao ensino, à pesquisa e à
extensão.
Este é o legado deixado pelo estudo apresentado por este trabalho, desenvolvido
com base no percurso e evolução da Semana de Atividades Científicas da AEDB –
SEAC.

REFERÊNCIA

Anais da Semana de Atividades Científicas - AEDB. Resende: AEDB/CPGE. 2003-


2014.

Associação Educacional Dom Bosco. Regulamento da Semana de Atividades


Cientificas-SEAC. 2009. Mimeo

_____. MANUAL DE SUBMISSÃO DE TRABALHOS NO SISTEMA SEAC.


2010. Mimeo.

BORGES-ANDRADE, J.E. Em busca do conceito de linha de pesquisa. Revista de


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CRESWELL, John W. Projeto de Pesquisa. 2ed.Porto Alegre: Artmed; Bookman, 2007.

GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1994.
1004

STRAUSS, Anselm ; CORBIN, Juliet . Pesquisa Qualitativa. Técnicas e


Procedimentos para o Desenvolvimento de Teoria Fundamentada . 2 ed. Porto
Alegre: Artmed; Bookman, 2008.
1005

Comunicação

Movimentos identitários de alunas do curso de letras de uma instituição privada de


São Paulo
Rafael Conde Barbosa
Selma O. Alfonsi
Vera M. N. S. Placco
Helena M.M. Lima
PUC-SP

Resumo: Este trabalho apresenta uma pesquisa que investigou os processos de


constituição identitária profissional de sete alunas do curso de letras. O instrumento
utilizado para coleta de dados foi entrevista e o referencial teórico, os estudos sobre
identidade profissional de Claude Dubar e os trabalhos sobre formação docente de
Placco, Placco e Souza, Marcelo e Tardif. Os resultados indicam que, mesmo
reconhecendo a fragilidade da formação recebida, o vínculo estabelecido com alguns
docentes foi determinante para a conclusão do curso e influenciou o ingresso na
docência, reforçando o que afirma Placco (2008) sobre a importância de se atentar para
a dimensão humano-interacional no fazer docente.
Palavras-chave: Movimentos Identitários; Formação Inicial; Inserção na docência

INTRODUÇÃO
A pesquisa que se apresenta é o recorte de um estudo desenvolvido com
discentes do curso de Letras, na último ano da sua formação inicial. Esta produção foi
elaborada pelo Grupo de Pesquisa Movimentos Identitários do Adulto Professor,
coordenado pela professora Dra. Vera Placco PUC-SP. Este grupo está ligado ao Centro
Internacional de Estudos em Representações Sociais e Subjetividade – Educação
(CIERS-Ed), criado na Fundação Carlos Chagas (FCC), no Brasil, em parceria com a
Fondation Maison des Sciences de l'Homme, em 2006, e é formado por vários grupos de
diferentes países (França, Portugal, Argentina e Brasil).
O grupo coordenador pela profa. Vera iniciou essa pesquisa no ano de 2009,
buscando elementos do processo de constituição identitária na formação inicial da
carreira docente. Como forma de criar espaços de aprendizagem e possibilitar o diálogo
entre pessoas participantes do grupo, e que falam de diferentes lugares (alunos de
1006

mestrado, doutorado e pós-doutorado), os dados das entrevistas foram analisados


durante a disciplina Movimentos Identitários de Professores II1, oferecida no ano de
2011.
Esses dados foram analisados sob a perspectiva teórica dos movimentos de
constituição identitária, a partir da abordagem sociológica de Claude Dubar (2005); dos
estudos realizados por Maurice Tardif (2009, 2010), que discute a articulação entre o
tempo e aprendizagem do trabalho docente na sedimentação dos saberes relacionados à
atividade do professor; e autores como Placco (2008) e Marcelo (2010), que estudam o
desenvolvimento profissional docente e como os futuros professores vão constituindo a
sua identidade profissional.
Nessa pesquisa, o nosso material de análise foram entrevistas realizadas com
sete estudantes do oitavo semestre do curso de Letras. Buscou-se identificar quais os
elementos constitutivos da identidade profissional se apresentam já no momento da
formação inicial.
Para tanto, as questões que nortearam este estudo foram:
• Como as discentes, futuras docentes, negociam a imagem que possuem
sobre a docência confrontada com aquela mostrada ao longo do curso?
• De que modo elas aderem à profissão e quais expectativas possuem sobre a
docência e o seu agir em sala de aula?
Em um primeiro momento, com o intuito de identificar os dados que
respondessem aos objetivos da pesquisa, foram realizadas leituras minuciosas das
entrevistas, organizando os trechos que revelassem movimentos de atribuição e
pertença, conforme propõe Dubar (2005).
Essa organização e análise das falas deu origem a quatro categorias: Escolha
profissional e expectativas sobre o curso; Saberes docentes; Trajetória; e, Identidade,
alteridade e subjetividade.
Com o objetivo de compreender as narrativas das entrevistadas e analisar as
construções elaboradas, sob as influências dos determinantes: história de vida, formação
inicial, expectativas sobre a profissão, aspectos esses presentes nas categorias Escolha
Profissional, e Expectativas Sobre o Curso e Saberes Docentes, optamos por construir
uma breve abordagem sobre o processo de constituição identitária, apresentada por
Dubar (2005), seguida das contribuições de Tardif (2008), no que concerne aos saberes

1
Este trabalho foi desenvolvido na Disciplina Projeto: Movimentos Identitários de Professores II,
ministrada pela Profa. Dra. Vera Maria Nigro de Souza Placco, no Programa de Estudos Pós-Graduados
em Educação: Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, durante o
primeiro semestre de 2011
1007

docentes, tentando estabelecer um diálogo entre as falas dos sujeitos pesquisados e os


autores estudados.

REFERENCIAL TEÓRICO
A profissão docente, assim como qualquer outra, tem especificidades e
características próprias e faz-se necessário definir a quais aspectos dar relevo, quando se
procura compreender como professoras em formação se constituem docentes, como elas
percebem suas condições de trabalho, caso já estejam atuando, e quais concepções e
intenções revelam em relação à docência. Visando aprofundar essas questões, que
envolvem o aluno em formação na Licenciatura, buscamos, nos estudos de Marcelo
(2010) e Placco (2008), subsídios para analisar as entrevistas dessas alunas que estavam
nesse período de transição, universidade - escola.
Como o foco desta pesquisa centrou-se na questão dos movimentos identitários
do futuro professor, recorremos aos estudos de Dubar (2005, 2009), para compreender
como o sujeito negocia suas expectativas, necessidades e desejos com aquilo que lhe é
atribuído e/ou imposto pelo contexto de formação.
O professor em formação traz consigo uma experiência da época em que era
aluno na educação básica, sobre o que é a docência, experiência essa à qual muitas
vezes ele atribui pouca importância. No entanto, como afirma Marcelo (2010), o
professor aprende sua profissão mesmo antes de estar atuando, pois passa pela
experiência da observação do que é ser professor ainda enquanto aluno, desde a
educação básica.
A identidade docente vai, assim, se configurando de forma paulatina e pouco
reflexiva, por meio do que poderíamos denominar aprendizagem informal, mediante a
qual os futuros docentes vão recebendo modelos com os quais vão se identificando
pouco a pouco, e em cuja construção influem mais os aspectos emocionais do que os
racionais. (MARCELO, 2010)
Fora o fato de que o docente é o profissional que possui mais tempo imerso na
profissão e de que os cursos de formação inicial nem sempre possuem clareza no que
diz respeito à formação na e para a prática, faz-se necessário identificar quais são os
aspectos que influenciam a constituição identitária do professor, antes dele se graduar,
ao sair de uma licenciatura e ao iniciar sua atuação numa instituição escolar.
Considerando que os estudos teóricos possibilitam orientar a prática,
encontramos em Tardif (2005, 2009, 2010, 2013) elementos sobre a relação entre os
1008

saberes profissionais e a constituição da identidade docente. Este autor possui uma


posição semelhante à de Marcelo (2009, 2010), ao relatar que os alunos de Pedagogia
ou Licenciatura, ao adentrarem a docência, não modificam suas crenças sobre o ensino
durante o curso universitário e esses alunos apresentam dificuldades em relacionar o
conhecimento acadêmico com o conhecimento profissional.
Constituir-se docente é um processo mais complexo do que simplesmente obter
um título de curso superior. Os saberes da prática precisam ser reinterpretados à luz de
uma teoria e é no processo de leitura, releitura e reflexão que o sujeito negociará com
suas crenças, seus valores, e aspectos subjetivos, formados por meio de várias
experiências e na interação com as crenças, valores e aspectos da instituição em que está
inserido. A este processo, Dubar (2005) nomeia transação subjetiva (indivíduo) e
transação objetiva (outros)2.
Mesmo reconhecendo que Dubar (2005) não estuda a inserção profissional
docente, alguns pontos de sua teoria foram transpostos para o ofício do professor.
Entendemos que é no exercício da atividade profissional, na interação com seus pares,
que o professor se identifica3 ou não com os diversos papéis que vivencia. Estas
diferentes situações permitem que ele aceite ou não a imagem, as funções, as intenções
sobre o que é ser professor, existentes no ambiente ao qual pertence e no qual está
integrado.
Negociar interna e externamente essas crenças, concepções, valores, imagens e
desejos do “ser professor” implicam num movimento que sofre influências não só da
instituição à qual o sujeito pertence, mas também de toda sociedade que, por vezes, não
contribui para que o professor legitime sua profissionalidade.
Para as autoras Placco e Souza (2006, p. 19), a deliberação envolvida no
processo de constituição docente envolve a consciência, “no sentido de estar consciente

2
Para Dubar, estas transações “podem assumir duas formas: ou de transações “externas” entre o
indivíduo e os outros significativos, visando a tentar acomodar a identidade para si à identidade para o
outro (transação denominada objetiva), ou a de transações “internas” ao indivíduo entre a necessidade de
salvaguardar uma parte de suas identificações anteriores (identidades herdadas) e o desejo de construir
para si novas identidades no futuro (identidades visadas), com vistas a tentar assimilar a identidade-para-
o-outro à identidade-para-si. Essa transação, denominada subjetiva, constitui um processo de socialização
concebido como produtor de identidades sociais.” (2005, p.140)
3
No que se refere a identificação Dubar (2005, p. 137) afirma que “cada um é identificado por outrem,
mas pode recusar essa identificação e se definir de outra forma. […] Ele denomina “atos de atribuição os
que visam a definir ‘que tipo de homem (ou de mulher) você é’, […] identidade para o outro; atos de
pertencimento os que exprimem ‘que tipo de homem (ou de mulher) você quer ser, […] para o si.”
(Grifos do autor)
1009

do que se busca e dos movimentos que se está empreendendo na direção desses


objetivos”.
Ter consciência dos movimentos ocorridos em seu processo de constituição
identitária auxiliará o professor na legitimação de sua profissão e de sua valorização
profissional. Para atingir essa consciência, o professor necessita mobilizar recursos
internos (subjetivos) e externos (objetivos), que se desenvolvem continuamente ao
longo de sua trajetória profissional e pessoal. Nesta pesquisa, partimos, assim, da
valorização do princípio de dar voz ao futuro professor, para que ele ressignifique suas
experiências no momento em que se narra, se ouve e promove a articulação entre
transação objetiva e subjetiva, representando “a projeção do espaço-tempo identitário de
uma geração confrontada com as outras” (Dubar, 2005, p.156).

METODOLOGIA
Para coletar os dados que viessem responder como essas discentes estão fazendo
a transição para a docência e como negociam suas expectativas com aquelas que
percebem serem atribuídas à profissão, foi elaborado um questionário dividido em duas
partes: a primeira, com questões objetivas tais como: faixa etária; se era a primeira
graduação; se a aluna tinha cursado o magistério; se já trabalhavam como docente, se
sim, há quanto tempo e, se não, qual era a ocupação naquele momento; e com o que
pretendiam trabalhar depois de formadas.
A outra parte do instrumento era um roteiro para a entrevista. Ali as questões
abordavam os seguintes temas: Escolha profissional e expectativas sobre o curso;
Saberes docentes; Trajetória de formação; e Identidade/Alteridade/ Subjetividade.
As questões objetivas foram transcritas em uma tabela e nos permitiram
conhecer o perfil das alunas participantes da pesquisa que concluíam o curso de letras
naquela instituição. As entrevistas foram transcritas e analisadas, e as categorias
utilizadas para análise dos dados seguiram os temas propostos no roteiro da entrevista.
Para este texto, procuraremos indicar os pontos mais relevantes que perpassam
as categorias Escolha profissional e Expectativas sobre o curso e Saberes docentes.
1010

ANÁLISE DOS DADOS


Analisar o conteúdo trazido nas falas das alunas entrevistadas requereu
considerar o momento em que cada uma se encontrava e de onde cada uma falava. As
entrevistas foram realizadas no último dia de aula do curso de Graduação, o que foi
considerado relevante para a análise dos conteúdos apresentados.
Iniciamos a análise das falas, levando em consideração as relações das alunas
com os professores, suas vivências com o conteúdo aprendido e como essa relação
sustenta a constituição de uma identidade docente.
Um fato que chama atenção nas falas é a dificuldade enfrentada pelas alunas em
superar, durante o curso, as defasagens oriundas de uma educação pública precária. Elas
relatam também como a dificuldade financeira interfere e influencia na aquisição de
uma maior bagagem cultural e indicam a precariedade do ensino recebido na escola
pública.
[...] toda a minha trajetória (foi) em escola pública. Então você sabe, a escola
pública tem um pouco de defasagem na questão do ensino. Eu sei que assim,
a disciplina que eu mais pude aprender foi a língua portuguesa, gramática,
essas coisas. E até mesmo, por conta de uma professora muito boa que eu
tinha. (Linda)

Tardif (2009) indica que o futuro professor traz para a sua formação inicial e
para a profissão marcas de sua própria cultura, história pessoal e de uma educação
fragilizada. Esse problema apresentado pela aluna Linda nos mostra que os cursos de
formação de professores devem prezar pela qualidade dos conteúdos que são oferecidos
e que os docentes, fora o domínio do conteúdo da disciplina ministrada, devem atentar
para as dificuldades que os alunos apresentam e que podem ser frutos de uma má
formação escolar.
Todas as alunas participantes desta pesquisa cursavam Letras, e elas apontaram
que a escolha por este curso está ligada à sua história de vida. A motivação por esta
licenciatura, entre outros fatores, se deu pela lembrança de uma boa professora, a quem
creditam a responsabilidade pela sua escolha.
Ainda para Tardif (2010), o ensino apresenta uma evolução de forma desigual e
muito diferenciada, tendo-se em conta que a docência e o fazer docente não evoluem no
mesmo ritmo por toda parte e formas antigas convivem com formas contemporâneas.
Percebemos refletido nas falas das alunas, quando retratam seus professores no curso de
1011

licenciatura, que o ensino continua a ser conteudista e o que faz diferença para cada
aluno é a maneira como seus professores lidam com o fator humano-interacional:
existem pessoas que sabem, de repente, te puxar e falar: “-Não, vem que você
pode continuar, que você pode ir além. Você tem capacidade.” Mas existem
professores que não, que te derrubam e você acaba até sendo desmotivada.
(Heloisa)

[...] ela tem um jeito de ensinar que faz você querer ensinar também! Faz
você querer aprender com ela e querer ensinar... e isso é muito gostoso!
(Carolina)

Segundo Placco (2008), a constituição do profissional docente ocorre em


múltiplas dimensões. Estas estão entrelaçadas no próprio indivíduo, de modo “não-
fragmentado, não compartimentado, não isolado, nem meramente complementar”
(p.185), dado que exprimem a direção e a intenção desse processo formativo. Desta
forma, destacamos a importância da dimensão humano-interacional, descrita pela
autora, que enfatiza o aspecto afetivo, cognitivo e comunicacional no processo de
constituição identitária docente. Ela afirma ainda que:
[...] sem a intermediação do afetivo em relação ao cognitivo, ancorado no
ético-político, esse desenvolvimento será fragmentado e não satisfatório. Só
quando há uma real comunicação e integração entre os atores do processo
educativo na escola pode haver a possibilidade de emergência de uma nova
prática docente, em que movimentos de consciência e de compromisso se
instalam e se ampliam, e uma nova forma de gestão e uma nova prática
docente podem ser implementadas. (PLACCO, 2003, p.190)

A influência do papel dos professores na vida de seus alunos interfere não


apenas na aprendizagem, mas principalmente no fator propulsor dela, a motivação para
aprender. Tardif (2009) corrobora a fala de Placco (2008), ao relatar que as diferentes
vivências escolares contribuem determinantemente no modo como os professores
modelam a sua identidade profissional, ancorando-as nas boas relações que tiveram e
que identificam como fundamentais para o seu fazer prático na sala de aula.
As alunas revelam ainda a importância da dimensão humano-interacional, em
relação ao seu desenvolvimento como docentes, ao indicarem quais os elementos que
valorizam como necessários para o exercício da profissão:
Eu acredito que um professor que é preocupado com a ética,
responsabilidade, preocupado com a verdade, [...] também tem a competência
de poder expor os seus conteúdos de forma inteligível, [...] Essa junção causa
um efeito assim, que dá uma relação completa. Esse professor sabe ser um
humano e sabe ser o professor, sem misturar as coisas na hora de conversar.
Como amigo, ele é amigo, na hora de ser professor, ele é professor, é
responsável, ele não faz distinção de pessoas, de classe social, de idade, de
cor, de nada. (Linda)
1012

Partindo da atribuição positiva conferida às relações, as alunas relatam três


pontos interessantes de estudo: novamente o relacionamento com alguns professores; a
relação teoria/prática e os sentimentos frente ao ser docente. Fica evidente, nas falas, a
influência dos professores que mantiveram uma relação de interesse e preocupação com
o aprendizado na formação de futuros docentes.
Tive excelentes professores […] (que) me ensinaram os conteúdos das suas
matérias porque revelaram muito domínio e conhecimento, porque souberam
me ajudar a construir novos saberes e porque me ensinaram uma postura
docente, ética. [...] conhecer e compreender a sua metodologia, a sua postura,
adquirir confiança, trocar, ter a possibilidade e a liberdade de dialogar.[...]
acho que a experiência foi boa porque o professor era bom. Porque sempre
soube associar o seu papel docente, a diretividade que ele exige, com a
liberdade e a autonomia que eu, como aluna do ensino superior, precisava ter.
A relação entre professor e aluno, nesse caso, foi como uma dança, uma
parceria harmoniosa, ritmada, construída. (Simone)

Para essas alunas, aprender a docência centra-se na congruência das boas


relações com os professores e a capacidade destes de despertar a construção do
conhecimento. Tardif e Lessard (2005) explicitam essa premissa ao relatar que a
docência é um trabalho ancorado em relações humanas, em que os sujeitos não são
estáticos e estão continuamente ressignificando suas experiências.
Esses futuros professores são, então, convidados a perceber que ser professor é
possuir o domínio de um conteúdo, mas que faz-se necessário olhar para os outros como
sujeitos que possuem necessidades que extrapolam os conteúdos curriculares; porém
esses docentes não podem perder de vista que a sua principal função é ensinar.
O curso de licenciatura foi avaliado positivamente pelas alunas, porém com
algumas ressalvas, pois as mesmas relataram que o curso foi muito teórico com
reduzidos espaços para atividades práticas. Ao falarem sobre a prática, esta fica restrita
às horas de estágio obrigatório para o curso.
A proposta de estágio precisa ser analisada, as experiências [...] precisam ser
mais socializadas e discutidas, precisa haver um espaço assegurado para isso.
Muitas vezes, um semestre não é suficiente para o professor das disciplinas
que têm estágio introduzir e discutir os conteúdos necessários. A experiência
dos estágios fica reduzida a conversas particulares entre aluno e professor e
escritas nos relatórios que só os professores leem. Se fossem
sistematicamente socializadas seria mais proveitoso para todos. (Simone)

No que diz respeito ao estágio e à prática docente, nos reportamos a Marcelo


(2009), que identificou catorze desafios/constantes que participam do processo de
profissionalizar o docente e, dentre essas constantes, destacamos aqui o: aprende-se a
ensinar ensinando: o valor do conhecimento prático.
1013

Este autor diferencia entre o Conhecimento para a prática (conhecimento que


objetiva organizar a prática; quanto mais se conhece mais se orienta para uma prática
eficaz); o Conhecimento na prática (o que os “professores conhecem está implícito na
prática, na reflexão sobre a prática, na pesquisa prática e na narrativa dessa prática; o
conhecimento está situado na ação, nas decisões e julgamentos dos professores. Esse
conhecimento é adquirido nas diferentes experiências vividas e os professores aprendem
quando têm oportunidade de refletir sobre o que fazem”); e o Conhecimento da prática
(conhecimento do professor como pesquisador, conhecimento formal e conhecimento
prático é uno e é construído coletivamente) (MARCELO, 2009, p 121-122).
Ele conclui que o que melhor identifica a profissão docente é o Conhecimento na
prática, na ação, revelado nas falas das alunas no que diz respeito aos estágios que
realizaram.
[...] nós fazemos o estágio, mas o estágio, muitas vezes, de observação, ele
precisa também da regência. [...] Se tivesse uma disciplina focada para um
professor acompanhar... Eu sei que isso acontece, eu acho que é na pós ou no
mestrado, que tem um profissional que acompanha [...] eu sentia necessidade,
por exemplo: “-Ah, vamos fazer estágio.” Poderia ser aqui mesmo, na
faculdade, mas com uma supervisão, para poder orientar erros ou acertos. Eu
acho que seria ideal. A gente teve a supervisão, mas uma supervisão afastada
disso, da regência. Porque eu ainda tenho facilidade, porque eu fiz
magistério. E magistério, a minha coordenadora, a minha orientadora, ela
sentava lá no fundo da sala e enfim: “-Vai se virar lá na frente.” E depois era:
“-Olha, você fez isso, estava errado. Você fez isso, acertou aqui, mas precisa
adaptar assim.” (Vera)

Essas alunas, por mais que tenham tido pouco tempo para refletir sobre a sua
graduação, indicam um problema que precisa ser melhor estudado, que é a questão do
estágio. Elas reconhecem a necessidade de um bom relacionamento com os professores
e com os seus futuros alunos, valorizam o conhecimento adquirido na universidade e
indicam que apenas o conteúdo não garante a aprendizagem dos alunos. Como forma de
complementar a formação inicial, elas apontam a necessidade, senão urgência, da
articulação da universidade com a escola, tendo como foco principal a aprendizagem na
prática, mesmo que seja uma prática simulada.
Quando elas indicam que o estágio poderia ser feito na própria universidade, elas
evocam aquilo que o pesquisador norte-americano Zeichner (2010) denomina de
terceiro espaço. Este espaço serviria para promover a interação entre professores da
Educação Básica e do Ensino Superior, buscando a troca de conhecimentos que cada um
destes indivíduos possui. Ao avaliarem o curso, elas afirmam que:
[...] nenhum curso de Pedagogia ou Licenciatura pode ‘dar conta’ de preparar
completamente para o trabalho docente, mas ficou a consciência da
1014

necessidade de estudar mais, de aprender mais, de continuar o processo de


formação em outros níveis e cursos. (Simone)

O que se percebe é que a experiência dos estágios, aliada a algumas disciplinas,


proporcionou uma visão e reflexão da realidade da escola atual, da prática dos
professores e da dinâmica com os alunos que, devido a ausência de um direcionamento
e de uma formação mais sistemática e intencional, no sentido de refletir o papel docente,
deixou sentimentos confusos nas alunas que terminam a formação em licenciatura, e
sinalizam o desejo de buscar outros espaços de formação como, por exemplo, a pós-
graduação.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Embora outros dados da pesquisa pudessem ser aqui acrescentados e analisados,
consideramos estes breves exemplos significativos para compreendermos os
movimentos identitários gerados nas relações estabelecidas entre professores e alunos,
nos cursos de licenciatura. Pudemos verificar quão significativas foram suas relações
com os professores de graduação, e a importância desse professor na continuidade dos
estudos das discentes.
Outro ponto que merece atenção é o formato curricular dos cursos de
licenciatura que carecem de melhores espaços os quais possibilitem que seus alunos
vivenciem e discutam o cotidiano de uma sala de aula. O momento em que podem ter
um pouco dessa experiência é no estágio e mesmo assim, elas indicam a necessidade de
que hajam professores no ensino superior que orientem a vivência nesses espaços.
Percebemos no discurso das alunas a pouca articulação entre a universidade e a
escola visando a formação dos novos professores. No entanto, verificamos a
importância do olhar do outro, os seus professores formadores, na valorização e
reconhecimento das potencialidades dos sujeitos em formação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1015

MARCELO, Carlos. O professor iniciante, a prática pedagógica e o sentido da


experiência. Revista Formação Docente, Belo Horizonte, v. 03, n. 03, p. 11-49,
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PLACCO, Vera M. N. S e TREVISAN-DE-SOUZA, Vera L. (orgs) Aprendizagem do


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TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. Petrópolis, RJ: Vozes,


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docência como profissão de interações humanas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005

ZEICHNER, Ken. Repensando as Conexões entre a Formação na universidade e as


experiências de Campo na Formação de Professores em Faculdade e Universidade.
Revista Educação, Santa Maria, v. 35, n.3, p.479-504, set./dez. 2010
1016

Comunicação

Avaliação educacional no Brasil: a construção de conhecimento a partir de textos


paradigmáticos

Regilson Maciel Borges


José Carlos Rothen
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)
Grupo de Pesquisa: Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas, História e Avaliação da
Educação Superior (GEPPHAES)
Financiamento: CNPq

Resumo: O texto resulta de pesquisa que procurou identificar os modelos e regras


adotados para a construção do conhecimento, os problemas considerados legítimos, e os
princípios básicos não problematizados e aqueles sobre os quais se busca consenso, em
textos considerados paradigmáticos para o campo da avaliação educacional no Brasil,
que se encontram publicados em coletânea publicada em 1982. Utilizou-se enquanto
estratégias metodológicas a Epistemologia Política formulada por Rothen (2004). Da
análise realizada é possível constatar que a definição do que seja avaliação é o ponto
primordial para a compreensão de questões relacionadas ao seu alcance, aos seus
métodos e mesmo suas limitações. Os principais problemas apontados pelos autores
enfocam necessariamente a questões de cunho metodológico, que acabam por incidir
sobre os momentos nos quais se busca obter consenso.
Palavras-chave: Avaliação educacional. Produção de conhecimento. Epistemologia
política. Textos paradigmáticos.

Introdução
O presente estudo apresenta resultado parcial de pesquisa em andamento que se
propõe analisar a construção do campo científico brasileiro da avaliação durante os anos
1980. Neste trabalho, particularmente, sistematizamos as contribuições de textos que
compõem coletânea publicada no mesmo período.
A década de 1980 é simbólica para diversos setores da sociedade brasileira, e
isso se deve em grande parte pelo contexto pelo qual passava o país, evidenciado nas
lutas pela redemocratização, momento em que se discutia, inclusive, uma nova
1017

Constituição para a nação, que veio a ser promulgada em 5 de outubro de 1988. É um


período em que as políticas, programas, e projetos para as diferentes áreas sociais, se
encontravam em processo de formulação.
No contexto educacional não é diferente, as influências de autores europeus
como Bourdieu, Passeron, Althusser, Baudelot, Establet, assim como a apropriação de
Marx, Gramsci e Snyders para pensar o papel da escola na sociedade capitalista,
somados aos estudos de autores brasileiros como Saviani e Paulo Freire, apontavam
para uma perspectiva progressista de educação (SOUSA, 1998).
O conhecimento construído neste período na área de Educação,
fundamentado pela sociologia e pela filosofia, veio opor-se a uma teoria
educacional marcada principalmente por uma base psicologizante, que
reduzia a compreensão do social às influências de contexto e de relações
intergrupais (SOUSA, 1998, p.165).

Essa vertente psicológica também marcava a avaliação educacional,


principalmente no que se refere à concepção de que testes bem construídos permitiriam
medir com rigor as aprendizagens dos alunos. Essa concepção que associava avaliação a
medida, passou a ser rejeitado por setores da comunidade científica brasileira, que
passou a buscar outros referenciais para pensar a teoria e a prática da avaliação
(SOUSA, 1998).
Neste período é traduzido para o português, em 1982, um conjunto de textos
organizados por Maria Amélia Azevêdo Goldberg e Clarilza Prado Sousa, no livro
intitulado “Avaliação de Programas: vicissitudes, controvérsias e desafios”. Trata-se
de uma obra constantemente referenciada em estudos que têm se voltado para uma
retrospectiva histórica da avaliação educacional no Brasil (SOUSA, 2005; SAUL, 2010;
CALDERÓN; BORGES, 2013), e cujas abordagens avaliativas dos autores trazidas na
obra, “constituem, até hoje, referências para o desenvolvimento de projetos avaliativos”
(SOUSA, 2005, p.15).
Nos textos integrantes da coletânea, a avaliação é colocada como dimensão
específica dentro da complexidade que apresenta o campo da avaliação, ultrapassando
os domínios das aprendizagens, as discussões se dirigem para a área de avaliação de
currículo e programas educacionais.
O entendimento acerca do que são obras paradigmáticas nos é dado por Rothen
(2004), que ao analisar o papel paradigmático das revistas oficiais do Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (INEP) na formulação de políticas públicas,
identifica na obra de Thomas Kuhn, “A Estrutura das Revoluções Científicas”, três
1018

tipos de obras científicas, as “instauradoras”, as de “divulgação” e as de “aplicação do


paradigma”.
Entende-se por obra paradigmática aquela que altera o padrão de
desenvolvimento da ciência, e que acaba servindo de modelo de ciência adotado por um
paradigma. As obras de divulgação, constituídas em grande parte pelos manuais, são
aquelas que apresentam os princípios básicos e principais resultados obtidos por uma
ciência. Por sua vez, as obras de aplicação discutem os princípios básicos e apresentam
soluções técnicas aos problemas derivados de um paradigma (ROTHEN, 2004).
[...]. Pode-se ressaltar que na visão de Kuhn o mais importante não são as
regras estabelecidas em um paradigma, mas sim o modelo de ciência
adotado, os compromissos metodológicos assumidos por uma comunidade
científica. A ênfase nos modelos, em vez de nas regras, permite que se afaste
de uma visão jurídica da ciência, isto é, que se afaste da visão de que toda
prática científica é avaliada a partir da sua adequação às regras. [...]
(ROTHEN, 2004, p.96, grifos nossos).

Nota-se que na acepção de Kuhn o termo paradigma adquire o significado de


“visão de mundo, filosofia ou mesmo ortodoxia intelectual”, nesse sentido “um
paradigma prescreve áreas de problemas, métodos de pesquisa e padrões de solução e
explicação aceitáveis pela comunidade acadêmica que o adota” (SAUL, 2010, p.55,
grifos nossos). Do exposto entendemos que a obra em questão, “Avaliação de
Programas: vicissitudes, controvérsias e desafios”, exerce função análoga àquelas que
apresentam uma nova definição do campo de estudos, e que acabou sendo
compartilhada pelos membros da comunidade científica brasileira interessada nas
discussões em torno de uma visão mais qualitativa para a avaliação.
A fim de analisarmos os textos que compõem a referida obra, utilizaremos
alguns dos procedimentos metodológicos propostos por Rothen (2004, p.110) em sua
Epistemologia Política1, a saber:
• Identificação dos modelos e regras adotados para a construção do conhecimento;
• Identificação dos problemas considerados legítimos pelos autores dos textos;
• Identificação dos princípios básicos não problematizados e aqueles em relação
aos quais se busca obter-se consenso.

1
Rothen (2004, p.109) nomeia de Epistemologia Política, os procedimentos metodológicos que elabora
para estudar o exercício do poder do Conselho Federal de Educação, no período de 1962 a 1968. Este
conceito é baseado na proposta metodológica de Thomas Popkewitz para a pesquisa da influência do
currículo escolar na elaboração da maneira de ver e de formar o mundo. A Epistemologia Política,
“proporciona o contexto dentro do qual devem ser considerados as regras, os modelos” e as concepções
de Estado – “através dos quais o mundo é formado”, isto é, através dos quais são construídas “as
distinções e categorizações que organizam as percepções...”, as propostas de políticas públicas e “as
formas de responder ao mundo” –, além de direcionarem a formulação de políticas públicas.
1019

O olhar retrospectivo da construção do campo da avaliação educacional no


Brasil nos possibilita reconhecer que as abordagens avaliativas presentes na obra
analisada vieram a se tornar referência para o desenvolvimento de diversos projetos
avaliativos em nosso cenário educacional (BARRETO; PINTO, 2001; SOUSA, 2005),
sendo ainda adotada por autores que têm sido frequentemente utilizados como
referências para as pesquisas na área da avaliação educacional (VIANNA, 1989; 1997;
ABRAMOWICZ, 1994; 1995ab; DEPRESBITERIS, 1998; SOUSA, 2000;
DEPRESBITERIS; TAVARES, 2009; SAUL, 2010).

Modelos e regras adotados para a construção do conhecimento sobre avaliação


Nos textos analisados identificamos alguns modelos utilizados para a construção
do conhecimento sobre avaliação educacional a partir do entendimento conceitual do
que seja avaliação.
Worthen (1982) prevê a necessidade de dissociar o entendimento do termo
avaliação de outros com os quais é confundida frequentemente, tais como verificação,
medida, pesquisa, e controle. Para o autor “a avaliação inclui (1) determinar que
medidas e critérios deveriam ser usados para julgar o desempenho [...]; (2) decidir se o
critério deveria ser relativo [...] ou absoluto [...]; (3) coletar a informação relevante
através de medição ou outros meios e (4) aplicar o critério para determinar o mérito ou
efetividade” (WORTHEN, 1982, p.5).
Para Tyler (1982, p.35) o processo avaliativo consiste “na determinação de
quanto os objetivos educacionais estão sendo atingidos por programas curriculares e
instrucionais”. Aparentemente o autor apresenta uma mudança de foco do objeto a ser
avaliado, ao privilegiar currículo e programas, parece distanciar-se da avaliação
centrada na aprendizagem dos alunos. Contudo, ao relacionar objetivos educacionais ao
comportamento dos alunos, acaba por entender que “[...] a avaliação é o processo
destinado a verificar o grau em que essas mudanças comportamentais estão ocorrendo”.
Stake (1982, p.46), entende que “a essência da avaliação consiste em determinar
o valor de algo, talvez reconhecendo suas múltiplas dimensões axiológicas e as
diferentes percepções de seu valor”. Para o autor, “não é possível realizar estudos
avaliativos sem considerar – implícita ou explicitamente (de preferência) – como as
pessoas valorizam, em termos subjetivos, os vários planos e produtos educacionais”.
Também para Nilo (1982, p.52) a avaliação implica num juízo valorativo, assim
entende, que “a avaliação, a ação avaliativa, mais do que a educação, é de um
1020

significado cultural profundo: é o elo entre a educação e a cultura, já que se refere –


necessariamente – aos valores (axiologia) de uma cultura e à maneira como esses
valores são aceitos”.
Para Guttentag (1982, p.21) “avaliação é um aspecto do processo de tomada de
decisão”. A tomada de decisão aparece ainda na definição de Weiss (1982, p.23), que
entende que “a avaliação é realizada com a finalidade de alimentar a tomada de
decisões”, e na definição de Parlett e Hamilton (1982, p.45), para quem “o escopo
principal dos estudos avaliativos é o de contribuir para a tomada de decisões”.
A avaliação nas definições apresentadas de MacDonald (1982, p.16) e Weiss
(1982, p.23) é situada numa dimensão política. Para o primeiro autor, “a instância
política do avaliador tem consequências na sua escolha de técnicas para coletar e
analisar informações”. Para o segundo, “a avaliação é uma atividade racional que se
situa num contexto político”, e por isso “a avaliação tem um posicionamento político”.
Caro (1982, p.10) entende que a avaliação de programas possui duas dimensões,
uma preocupada com o julgamento, e a outra com a informação. Assim “a avaliação de
um programa fornece julgamentos acerca do grau em que os resultados desejados foram
ou podem ser alcançados”, onde “a informação é de crucial importância no processo
avaliativo”.
As abordagens mencionadas pelos autores estudados permitem constatar que o
termo avaliação sofreu profundas transformações conceituais, de onde emergiram
abordagens que a relacionam a consecução de objetivos (TYLER, 1982), a juízo de
valor (STAKE, 1982; NILO, 1982), a tomada de decisão (GUTTENTAG, 1982;
WEISS, 1982; PARLETT; HAMILTON, 1982), a afirmações políticas
(MACDONALD, 1982; WEISS, 1982), e a julgamento (CARO, 1982).

Os problemas considerados legítimos


Os principais problemas apontados pelos autores dos textos estão diretamente
relacionados a questões de cunho metodológico, para os quais apresentam
possibilidades a serem consideradas nos processos avaliativos.
Worthen (1982, p.7-9) apresenta uma listagem de dez características que
deveriam ser incluídas em qualquer boa avaliação. Os componentes são: clareza
conceitual; caracterização do objeto da avaliação; reconhecimento e representação das
audiências legítimas; sensibilidade aos problemas políticos da avaliação; especificidades
das necessidades e fontes de informação; abrangência; adequação técnica; consideração
1021

dos custos; padrões/critérios explícitos; julgamentos e/ou recomendações; e relatórios


adaptados às audiências.
Caro (1982, p.11) prevê que a avaliação acompanhe a implementação do
programa e forneça uma base para seu posterior replanejamento e aperfeiçoamento.
Deste modo, o ciclo de planejamento-ação-avaliação pode vir a ser repetido diversas
vezes, até que se atinjam os objetivos ou até que os problemas e objetivos sejam
definidos novamente.
Guttentag (1982, p.22) discute a aplicação da teoria de decisão ao campo da
avaliação. Inicialmente, “cada grupo define e hierarquiza seus próprios objetivos para
qualquer programa”. Em seguida, “para relacionar os objetivos hierarquizados às
inferências, emprega-se a estatística bayesiana em vez da clássica [...]”. Isso permite
que, a qualquer momento do processo, probabilidades anteriores possam “ser revistas
desde que existam dados suficientes”.
Stake (1982a, p.31-34) apresenta nove métodos que podem ser utilizados para a
avaliação de programas educacionais, são eles: medida de rendimento escola;
autocrítica da instituição; grupo de “prestígio”; interação-observação; pesquisa
educacional; análise de gestão; análise de política social; avaliação sem objetivo
predeterminado; e avaliação contraditória.
Em outro texto, Stake (1982b, p.46) reforça a necessidade de que a pesquisa
repousasse “mais em experiência e significados pessoais enquanto dados e na
observação participante e introspecção, enquanto procedimentos metodológicos”. Esses
procedimentos implicam em interpretações sistemáticas, “resultantes de bons métodos
de observação e interpretação subjetivas”.
Nos demais textos Stake (1982cd) esclarece as possibilidades de estudos
avaliativos a partir da contratação de um avaliador partidário de três abordagens, uma
centrada nos resultados, a que procura responder às preocupações dos interessados, e as
sem objetivos preestabelecidos (STAKE, 1982c, p.57-62). No outro texto, o autor
descreve as opiniões de avaliadores a respeito da “escolha dos métodos de
investigação”, da “quantidade de pesquisa básica a ser introduzida na avaliação”, da
“publicação na imprensa especializada”, da “divulgação de procedimentos
condenáveis”, da “atenção concedida às conclusões da avaliação”, da “utilização
abusiva das conclusões”, e de “conselhos finais aos avaliadores” (STAKE, 1982d, p.63-
68).
1022

Tyler (1982, p.36) aponta alguns passos para a construção de um instrumento


avaliativo. O primeiro passo trata da definição de objetivos. O seguinte é a identificação
de situações que deem ao aluno a oportunidade de demonstrar o comportamento
implícito nos objetivos educacionais. Segue-se com o planejamento de um meio para
registrar o comportamento do aluno. Em seguida deve-se decidir que unidades serão
usadas para sintetizar ou julgar os registros de comportamento apresentados. E, por fim,
determinar o grau de objetividade dos métodos de medida e síntese utilizados.
Parlett e Hamilton (1982, p.41-43) apresentam a organização e os métodos do
que denominarão de “avaliação iluminativa”. Entendem que, inicialmente, o
pesquisador deve familiarizar-se bem com a realidade cotidiana da situação a ser
estudada, para então proceder com três etapas que se superpõem e estão inter-
relacionadas, etapas em que “os pesquisadores observam, questionam depois e,
finalmente, procuram explicar”. Neste processo é traçado um perfil de informações que
foram coletadas a partir de observação, entrevistas, questionários e testes, e documentos
em geral.
Enquanto um campo novo, a avaliação de programas acaba se defrontando com
diversas contribuições de metodológicas qualitativas. São propostas, modelos, métodos,
e procedimentos que buscam responder a preocupações que vão desde o papel a ser
desempenhado pelo avaliador a quais os melhores instrumentos e estratégias a serem
empregados no processo avaliativo.

Os princípios básicos não problematizados


É possível encontrar nos textos alguns princípios básicos que são anunciados,
mas não são problematizados.
A questão da avaliação formativa e somativa aparecem apenas em curtas
menções. Quando Parllet e Hamilton (1982, p.38) reconhecem que uma das
preocupações do período estava na função da avaliação formativa, e quando Caro (1982,
p.11) e Stake (1982, p.30) apresentam breve conceituação e exemplificação de ambas as
funções:
A avaliação formativa é planejada com a finalidade de aperfeiçoar um
programa ainda em desenvolvimento; a avaliação somativa é planejada para
apreciar um produto depois que ele estiver concluído (CARO, 1982, p.11).
Já tive ocasião de afirmar que a cozinheira que experimenta a comida faz
uma avaliação formativa, enquanto o convidado que a experimenta faz uma
avaliação somativa (STAKE, 1982, p.30).
1023

O estudo de caso aparece em Stake (1982, p.31) como um dos aspectos


principais de seu método “interação-observação”, mas não há maiores esclarecimento
de seu emprego em estudos avaliativos, e isso se revelava necessário naquele momento
principalmente para os pesquisadores brasileiros, tal como reconhece Vianna (1992,
p.102).
Apenas Caro (1982, p.13) questiona a carga de informalidade que muitas vezes
se baseiam planejadores e administradores para tomar decisões. Sabe-se que essas
abordagens de avaliações assistemáticas e impressionistas, quando emitidas por um
especialista, acabam por designar o investimento que será feito neste ou naquele
programa.
Weiss (1982, p.27) alerta para a necessidade de se aprimorar as práticas
avaliativas para que se tenha maior confiança em seus resultados. Também Caro (1982,
p.13) entende que a avaliação poderá ser aperfeiçoada se os avaliadores conscientizarem
administradores, técnicos e representantes da clientela, do papel da avaliação no
desenvolvimento de programas.
A questão da avaliação interna é ressalta nos textos de Weiss (1982, p.27),
quando menciona a necessidade de fortalecer ela para uma influência mais direta e
imediata nas decisões, e de Stake (1982, p.31), ao considerar que uma avaliacao interna
será mais formativa do que somativa, assim como fornecerá mais descrições que
julgamentos.
O problema do qualitativo e do quantitativo em avaliação é apontado por Stake
(1982, p.46), que considera ambas necessárias no processo, havendo apenas a
necessidade de se encontrar um melhor equilíbrio entre elas.
Outro princípio não problematizado é a questão da divulgação e utilização dos
resultados das avaliações realizadas. Para Caro (1982, p.13), isso se deve a restrição da
pesquisa avaliativa “a uma gama bastante limitada de questões, cujos resultados não são
plena ou amplamente divulgados”, já para Worthen (1982, p.9), os escritos costumam
destinar-se mais a especialistas em avaliação do que a professores e técnicos atuantes na
escola. O problema para Guttentag (1982, p.21) está em “como fornecer informações
relevantes para as contínuas decisões que devem ser tomada [...]”.
Outra questão levantada é como adaptar a teoria e prática norte-americana de
avaliação a realidade latino-americana. Nilo (1982, p.54) apresenta alguns elementos
que para pensar essa questão, sem necessariamente demonstrar como efetivamente isso
poderia ocorrer.
1024

Os princípios básicos em relação aos quais se busca o consenso


São três os princípios sob os quais se busca consenso, o primeiro diz respeito à
posição subjetiva e política do avaliador, o outro que relaciona a avaliação e a pesquisa,
e o que focaliza aspectos da profissionalização do campo da avaliação educacional.
A visão política da avaliação é defendida por Stake (1982, p.46-47), para quem a
pesquisa em avaliação educacional deve ser mais subjetiva do que objetiva, associando
“as experiências e significados pessoais enquanto dados e na observação participante e
introspecção enquanto procedimentos metodológicos”. Para ele “o julgamento subjetivo
constitui parte central e essencial do ato avaliativo”.
Parllet e Hamilton (1982, p.43) apontam como primeira preocupação da
avaliação iluminativa a questão da natureza “subjetiva” do método, uma vez que se se
questiona até que ponto as interpretações pessoais podem ser científicas. Contudo, para
os autores “qualquer pesquisa requer julgamentos humanos especializados e,
consequentemente, será sempre vulnerável”.
MacDonald (1982, p.16) irá enfatizar a posição política da avaliação, que se
ocorre a partir do momento em que o avaliador descobre que as questões relativas à
ação educativa estão imbricadas no cenário sociopolítico, e isto coloca o avaliador numa
instância política, capaz inclusive de influenciar relações de poder. Por outro lado,
Weiss (1982, p.23) observa que algumas influências políticas chegam a moldar a
própria concepção do estudo-avaliativo, isso porque durante o estudo que está se
processando, as pressões políticas podem alterá-lo ou mesmo prejudicá-lo.
O segundo princípio trata das relações entre avaliação e pesquisa, e procura
mostrar seus pontos de confluência na pesquisa avaliativa. Para Caro (1982, p.11) o
objeto da pesquisa avaliativa podem ser “programas estáveis e bem definidos ou
programas novos”, e os pesquisadores avaliativos “podem tomar várias providências no
sentido de melhorar sua contribuição ao desenvolvimento de programas” (p.13).
Guttentag (1982, p.18) posiciona a pesquisa avaliativa na grande mudança de
paradigma, para ele “a pesquisa avaliativa é a ciência social que está em posição de
vanguarda nestas mudanças sociais, por estar intimamente ligada ao desafio de uma
sociedade, tal como ele se traduz em seus serviços humanos e sociais”.
Weiss (1982, p.23) entende a pesquisa avaliativa como uma atividade racional
que examina os efeitos de políticas e programas sobre sua clientela, em vista de
objetivos previstos, por meio “de métodos objetivos e sistemáticos, a pesquisa avaliativa
1025

analisa em que medida as metas são atingidas e examina os fatores associados e


resultados satisfatórios ou não”.
O terceiro princípio busca consenso na ideia de profissionalização do campo da
avaliação, presente na exigência de especialização aprofundada. Worthen (1982, p.8)
indica que “bons avaliadores costumam elaborar e seguir um plano que lhes indique
com precisão as informações que precisam obter e as fontes respectivas”. Mas a
responsabilidade do avaliador não se encerra com a coleta, análise e relato dos dados,
pois os dados não falam por si mesmos, por isso é o avaliador, conhecedor dos dados,
que conseguirá julgar se o programa é eficiente ou ineficiente, válido ou não.
Para Caro (1982, p.13) os avaliadores podem desenvolver também formas mais
eficientes de comunicar implicações para ação, provenientes de suas próprias
descobertas. Isso significa o que Stake (1982, p.30) denomina como adoção de estilos
diferentes que possam ser acolhidos “pelos diversos públicos e mais ou menos úteis aos
diferentes clientes”.
A fim de propor respostas a essa questão da comunicação dos resultados, pelo
avaliador, Parllet e Hamilton (1982, p.44) consideram que o “avaliador iluminativo”
pode dirigir seu relatório a pelo menos três grupos de administradores, os que
participam do programa, os que financiam ou supervisionam o programa, e o pessoal
externo interessado no processo.
MacDonald (1982, p.16) ao propor três tipos distintos de estudo avaliativos
(burocrático, autocrático e democrático), fala do papel do avaliador dentro de cada um
destes. O avaliador burocrático age como um consultor administrativo e seu critério de
sucesso é a satisfação do cliente. O avaliador autocrático enfoca problemas ligados à
meritocracia educacional e age como um assessor especializado. O avaliador
democrático age como um intermediário nas trocas de informação entre diferentes
grupos.
A dinâmica das relações entre avaliador e o administrador é ressaltada por Lewy
(1982, p.69), para quem esta relação não deve obscurecer “a importância de se garantir
validade aos resultados obtidos”. O autor alerta para o fato de que o avaliador, por mais
que esteja interessado em ver suas orientações e sugestões acatadas pelos
administradores, não desvie do foco de seu trabalho.
1026

Considerações finais
A construção do conhecimento sobre avaliação educacional no Brasil foi
analisada neste trabalho a partir de textos que compõem a obra “Avaliação de
Programas: vicissitudes, controvérsias e desafios”.
Nos textos os autores discutem quatro grandes questões. A primeira diz respeito
à definição conceitual da avaliação. A segunda trata da incorporação das dimensões
subjetiva e política no processo avaliativo. A terceira procura apontar métodos para a
avaliação. A quarta enfoca aspectos da prática profissional da avaliação educacional.
Para cada questão os autores propõem os seguintes princípios: 1º) Avaliação
consiste em determinar o valor de algo para fins de tomada de decisão, ela possibilita
julgar se os resultados desejados foram ou podem ser alcançados; 2º) A avaliação situa-
se num contexto político, e como tal revela o posicionamento político do avaliador. Os
avaliadores, por sua vez, influenciam relações de poder, pois produzem informações que
funcionam para satisfazer determinados interesses. As influências políticas do avaliador
moldam a própria concepção do estudo-avaliativo, assim como influenciam nas
escolhas das técnicas utilizadas para a coleta e análise das informações. Ressalta-se que
as pressões políticas pela qual passa o avaliador podem alterar e prejudicar o estudo
avaliativo, mas nem por isso ele deve obscurecer a validade dos resultados obtidos; 3º)
O método através do qual se obtém informação é ponto central na avaliação, mas não
existe um método único para a avaliação que convenha a todas as situações, pois o ato
avaliativo é essencialmente subjetivo; 4º) O avaliador deve, no processo avaliativo, ter
um plano que indique o que pretende avaliar; deve julgar se o programa é eficiente ou
ineficiente, válido ou não, mas não impor seus resultados ao administrador; e deve
adotar estilos diferentes para comunicar os resultados obtidos, para que atinja diferentes
grupos.
É possível encontrar nos textos outros princípios que são anunciados, mas não
são problematizados, é o caso da discussão em torno de questões relacionadas às
funções “formativa e somativa” da avaliação, ao “estudo de caso” como forma de
avaliação qualitativa, do papel da “informalidade” no processo avaliativo, do
“aprimoramento” de práticas avaliativas, do fortalecimento da “avaliação interna”, do
problema do “qualitativo e quantitativo” em avaliação, da “divulgação e utilização” dos
resultados da avaliação, e de como “adaptar a teoria e a prática” avaliativa norte-
americana a outras realidades.
1027

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1030

Comunicação

Grupo de referência: articulações entre formação e práticas gestoras

Renata Maria Moschen Nascente


DEd/UFSCar
Marcia Cristina Castellen Vella
Bolsista de IC – PIBIC/ UFSCar/ CNPq

Resumo: O objetivo é apresentar e discutir alguns resultados de uma pesquisa de


Iniciação Científica sobre as possíveis articulações entre uma formação oferecida pela
SEE/SP por meio dos Grupos de Referência - GR a equipes gestoras e as práticas de
uma diretora de escola participante dessa formação. A metodologia utilizada foi
qualitativa e exploratória. Primeiramente, explicitam-se as bases teóricas da
investigação no que se refere aos processos formativos envolvendo gestores escolares.
Em seguida, são explicados os procedimentos metodológicos. Finalmente, são
analisados e discutidos alguns dos resultados alcançados, levantados por meio de
entrevistas com a diretora e com alguns dos membros de sua comunidade escolar. Esses
resultados indicam a existência de algumas articulações entre a formação no GR e as
práticas gestoras da diretora, principalmente no que se refere à gestão democrática
baseada na autonomia e na participação.
Palavras-chave: Formação; Grupo de Referência; Práticas Gestoras.

Introdução

O objetivo da comunicação é apresentar e discutir alguns resultados de uma


pesquisa de Iniciação Científica sobre as possíveis articulações entre uma formação
oferecida pela Secretaria Estadual da Educação de São Paulo - SEE/SP por meio dos
Grupos de Referência - GR a equipes gestoras e as práticas de uma diretora de escola
participante dessa formação.

A análise do documento que estabeleceu como deveria ser a formação das


equipes gestoras nos GR, o Plano de Formação Continuada de Professores e Gestores
(SÃO PAULO, 2011), despertou nosso interesse na medida em que nele se apresentava
um processo formativo que deveria ser construído pelos seus participantes, tratando-se
então, supostamente, de uma formação potencialmente autônoma e participativa, na
1031

qual os próprios educadores envolvidos estabeleceriam os temas a serem desenvolvidos


e os encaminhamentos dos trabalhos.

Diante de uma proposta aparentemente inovadora, tentou-se compreender


como se desenvolveu a formação de uma gestora em um dos GR e se essa formação
poderia de alguma maneira influenciar suas práticas, principalmente no que diz respeito
ao fomento da autonomia e da participação em sua comunidade escolar.

A comunicação foi organizada em cinco seções. Na primeira delas, são


explicitadas nossas concepções de autonomia, participação e gestão democrática. Em
seguida, na segunda seção, são apresentadas as bases teóricas da investigação no que se
diz respeito aos processos formativos envolvendo gestores escolares. Na terceira seção
os GR são caracterizados. A abordagem metodológica e os instrumentos/ procedimentos
de pesquisa são expostos na quarta seção. Finalmente, na quinta seção, são tematizados
alguns resultados alcançados por meio das entrevistas semiestruturadas realizadas com a
diretora e com alguns membros de sua comunidade escolar.

1. Autonomia, participação e gestão democrática

A análise da formação de gestores desenvolvida nos GR teve como um dos seus


objetivos compreender essa formação no que diz respeito à autonomia e à participação,
bases da gestão democrática da escola pública. Para isso, é essencial que se explicitem
como são entendidos esses conceitos neste trabalho.
Um princípio básico da gestão democrática da escola pública é o de autonomia,
que para Riscal (2009, p.52): “(...) tem origem nas palavras gregas autós, que significa
eu mesmo ou si mesmo, e nomos, que significa lei. Logo, autonomia significa dar a lei a
si mesmo, ou seja, seguir sua própria lei, o resultado de sua reflexão ou consciência”.
Portanto, ser autônomo, significa governar-se de acordo com o que se acredita. Em
seguida, Riscal (2009) opõe esse conceito de autonomia ao de heteronomia, que
basicamente está ligado à ideia de dependência e de subserviência. A autora esclarece
ainda que o conceito de autonomia é relacional e processual. Relacional porque a
autonomia de cada um refere-se ao seu relacionamento com os outros no convívio
social; e processual porque ela é gradativamente conquistada. Nesse sentido, a
autonomia da escola também é relativa, tratando-se de um ideal a ser perseguido. Dessa
forma, as escolas se equilibram entre as demandas dos sistemas educacionais e a busca
pela autonomia.
1032

Além da autonomia, outro princípio fundamental da gestão democrática é a


participação. Para Nascente (2013) a participação na escola é composta de duas
dimensões: a dialógica e de ação cooperativa. Por meio da dimensão dialógica, isto é,
pelo diálogo amplo e irrestrito, os problemas devem ser discutidos, estudados, tendo
suas soluções acordadas. Também pelo do diálogo, as decisões devem ser tomadas e os
projetos elaborados, desenvolvidos e avaliados. A dimensão dialógica deve ser
componente de todos os tempos e espaços escolares, nas salas de aula, nos colegiados e
nas reuniões de pais.
A outra dimensão da participação é a de ação cooperativa (NASCENTE, 2013),
na qual todos os acordos e encaminhamentos resultantes da dimensão dialógica são
colocados em prática em ações concretas desenvolvidas coletivamente. A participação é
o resultado da união das duas dimensões: dialógica e de ação cooperativa.
Segundo Libâneo, Oliveira e Toschi (2009), a direção escolar tem um papel
essencial a ser assumido na construção da gestão democrática baseada na participação,
na qual decisões e responsabilidades devem ser compartilhadas, estando constantemente
sujeitas a avaliações e reordenamentos. Por isso é tão importante compreender a
formação de gestores escolares, que será discutida na próxima seção deste trabalho.

2. Formação continuada e permanente de gestores escolares

Cursos e programas de formação continuada destinados a professores e gestores


escolares têm sido justificados em função das lacunas na formação inicial de docentes,
das dificuldades na inserção e permanência desses profissionais nas escolas e da
complexidade e dinâmica da educação escolar na atualidade. Nessas formações os
profissionais da educação podem dar prosseguimento aos seus estudos, com base nas
realidades das escolas e sistemas educacionais nos quais atuam. Esses cursos/programas
vêm se estabelecendo em diversas modalidades: presencial, semipresencial e a distância,
podendo ser ofertados de forma centralizada e/ou descentralizada.
Estamos nos referindo neste trabalho aos programas de formação continuada
propostos pelas secretarias municipais e estaduais de educação. Há que se levar em
conta que muitos educadores dessas redes têm, por conta própria, buscado dar
continuidade aos seus estudos por meio de uma segunda graduação, frequentemente em
pedagogia para os licenciados em outras áreas. Outro caminho encontrado pelos
1033

profissionais das escolas de educação básica para aprimorarem seus conhecimentos e


práticas pedagógicas têm sido os cursos de especialização e de pós-graduação.
O que pode ser constatado nas escolas, portanto, é que a chamada formação
continuada vem se constituindo tanto por meio de iniciativas individuais de cada
docente, como na forma de cursos e outras atividades formativas estabelecidas nas
escolas e nos sistemas de ensino. É importante que se explique que frequentemente
licenciados em diversas áreas procuram como segunda graduação os cursos de
licenciatura em pedagogia, ou de pós-graduação na área de educação, pois isso
possibilita a esses professores encaminharem suas carreiras para área de gestão
educacional, tais como coordenação pedagógica, direção, vice-direção e supervisão.
Devemos esclarecer ainda que a concepção de formação que permeia este
trabalho é a de formação permanente (IMBERNÓN, 2005; 2009), isto é, a formação
docente não é segmentada entre inicial e continuada, mas construída continuamente ao
longo da vida dos educadores, desde a escolarização básica, passando pelo ensino
superior, pelos estágios, pela docência, pela coordenação pedagógica, pela direção e,
eventualmente, pela supervisão.
Essa concepção de formação permanente das equipes gestoras que abraçamos
deve ter com um dos seus objetivos a gestão participativa, cuja construção depende da
compreensão da situação econômica, social e política das comunidades escolares nas
quais essas equipes atuam. Trata-se de um levantamento ao mesmo tempo muito
moroso e delicado a ser realizado, mas necessário, pois a integração das comunidades às
escolas exige esse conhecimento.
Para Lück (2000), infelizmente os cursos/programas de formação oferecidos a
gestores escolares não têm contemplado as realidades de seus participantes:

(...) esses programas muitas vezes são realizados teoricamente sem a


considerar a realidade da escola e comunidade, que fazem parte dessa gestão.
Os cursos de capacitação de gestores tendem a apresentar formação de caráter
normativo, partindo do pressuposto de que as pessoas são individualistas,
mas para se ter uma gestão participativa é preciso englobar a realidade da
comunidade em torno da escola. (LÜCK, 2000, p.28-29)

Portanto, diante do exposto, pensamos que processos de formação continuada


que garantam a formação permanente de gestores escolares baseados nos princípios da
participação, da autonomia e da democracia são essenciais para que se aprimorem os
processos educacionais com o objetivo da oferta de uma educação de qualidade social.
1034

3. Grupos de Referência: formação em serviço

Os Grupos de Referência – GR foram montados pela SEE/SP nas 91 Diretorias


de Ensino do Estado tendo como objetivo anunciado no Plano de Formação Continuada
de Professores e Gestores (SÃO PAULO, 2011) implantar uma política de formação
permanente de professores e gestores que atuavam nas escolas, nas diretorias de ensino
e nos órgãos centrais em parceria com universidades, institutos e organizações da
sociedade civil para ampliação das formações centradas na gestão escolar, no currículo
e nas práticas docentes.

O Plano (SÃO PAULO, 2011) dividia essas formações em duas modalidades


de GR: os destinados à formação de docentes e os destinados à formação das equipes
gestoras. Os encontros dos GR voltados à formação de gestores desdobrava-se em dois
núcleos. No primeiro núcleo, o regional, cerca de 30 membros de equipes gestoras de
escolas abrangidas por algumas diretorias de ensino, agrupadas por proximidade
geográfica, realizavam encontros periódicos, em uma delas, contando ainda com a
participação de representantes da CENP – Coordenadoria de Estudos e Normas
Pedagógicas e um consultor, preferencialmente professor de uma universidade pública.
No segundo núcleo, o local, os participantes do GR regional, promoviam encontros
formativos em cada uma de suas respectivas diretorias de ensino. De acordo com essa
proposição, os participantes dos GR regionais construíam suas próprias formações e
organizavam os processos formativos das equipes gestoras em cada uma de suas
diretorias de ensino. O GR foco deste estudo agrupava quatro diretorias de ensino do
interior do Estado de São Paulo.
Assim, percebeu-se pela leitura do Plano (SÃO PAULO, 2011) a presença dos
princípios da autonomia e da participação na formação proposta. Eles se expressaram
pela liberdade dada aos GR regionais de elaborarem suas próprias pautas formativas a
partir das demandas dos GR locais. Colabora para essa perspectiva a reafirmação no
documento de que a formação de docentes e de gestores deveria ser permanente e
centrada nas problemáticas vivenciadas nas escolas de acordo com suas respectivas
culturas organizacionais.
Consideramos, assim, que a formação de gestores escolares nos GR teria
potencial para desenvolver a autonomia e a participação no espírito da gestão
democrática, pois promoveria tanto uma como a outra por meio da autogestão dos
grupos de estudo no que se refere aos conteúdos a serem trabalhados, as formas pelas
1035

quais isso seria feito, assim como pelas ações possivelmente desencadeadas pelos
participantes em suas escolas.

4. Metodologia de pesquisa

Esta investigação teve como ponto de partida a leitura do Plano (SÃO PAULO,
2011) que resultou na elaboração da seguinte questão de pesquisa: Como uma formação
destinada a equipes gestoras de escolas da rede estadual paulista se reflete nas práticas
gestoras de uma de suas participantes, diretora de uma unidade escolar?
Ao decidirmos realizar esta pesquisa não tínhamos uma hipótese elaborada em
relação a essa questão. A premissa que orientou seu início era a de que, possivelmente,
as articulações entre a formação da qual os gestores estavam participando e suas
práticas de gestão em suas escolas eram bastante tênues, o que é comum a muitos de
processos de formação de educadores. Entretanto, acreditávamos que os efeitos da
formação vivenciada por eles, ainda que tímidos, poderiam ser verificados. Também
suspeitávamos, no sentido inverso, que as práticas gestoras desses sujeitos, poderiam
estar, de alguma forma, influenciando o próprio processo formativo pelo qual estavam
passando.
Assim consideramos que seria apropriado que esta pesquisa fosse desenvolvida
de acordo com os princípios metodológicos da pesquisa qualitativa e exploratória em
educação (LÜDKE; ANDRÉ, 1986; BODGAN; BIKLEN, 1994), tendo como
instrumentos/procedimentos: análise documental dos documentos oficiais sobre o GR e
dos relatos dos encontros formativos; um questionário aberto, respondido por oito
diretores participantes do GR foco da investigação; observações de reuniões
pedagógicas e de colegiados na escola dirigida pela gestora sujeito principal da pesquisa
e entrevistas semiestruturadas realizadas com os seguintes membros da comunidade
escolar: a diretora; um aluno do ensino médio; uma mãe de aluno/a; uma funcionária;
uma professora; um coordenador pedagógico e a professora mediadora comunitária
escolar.

5. Resultados: possíveis articulações entre formação e práticas gestoras

Devido à necessidade de selecionar uma parte dos resultados desta pesquisa para
esta comunicação, nos basearemos nas entrevistas semiestruturadas para caracterizar a
1036

formação da diretora sujeito principal da investigação, para em seguida tentar levantar e


compreender algumas possíveis articulações entre a formação pelo GR e suas práticas
gestoras, refletindo sobre essas práticas sob a ótica dos conceitos de autonomia,
participação e gestão democrática.
A gestora é licenciada em Física com Mestrado em Educação na área de
Metodologia de Ensino. Atuou na rede estadual como professora por doze anos e é
diretora efetiva da mesma escola há onze anos. Após trabalhar na secretaria de uma
escola no início de sua carreira e cursar a universidade no período noturno, tentou
alguns concursos para ingresso como efetiva no quadro do magistério do estado de São
Paulo, mas, por diversas circunstancias, inclusive por ter se casado e tido filhos muito
cedo, não conseguiu efetivar-se como professora, só conseguindo ser titular de cargo
como diretora. Desde então tem tentado participar das formações oferecidas pela
SEE/SP e de outras tanto quanto possível.
Ao referir-se ao seu percurso profissional, ela explicou que no início de sua
carreira na gestão ela foi observando o trabalho da vice-diretora então em exercício, que
era também muito experiente como professora e coordenadora: “(...) então no início da
minha carreira eu era muito dependente de uma vice-diretora que tinha muito tempo de
serviço porque eu nunca tinha participado da parte de direção, assim eu dependia
muito do que ela achava e pensava... A gente vai aprendendo com os erros, com os
acertos e vai construindo essa forma de gerir”. Essa fala demonstra como a diretora,
desde o início de sua gestão esteve disposta a aprender com outros, não importando a
posição deles na hierarquia escolar, e também uma capacidade reflexiva de
aprendizagem profissional por meio de experiências cotidianas. Levando em
consideração que a diretora já tinha um mestrado em educação ao ingressar nessa
carreira, a chance de que ela tivesse condições de gradativamente construir-se
profissionalmente com base em interlocuções entre teoria e prática é bastante razoável.
Acreditamos que disposição que a diretora mostrou em aprender com os outros na
sua trajetória profissional tem sido importante também no desenvolvimento de sua
própria autonomia, na busca de caminhos para a resolução dos problemas por ela
vivenciados na gestão da escola. Como ela mesma disse, aprendeu e aprende com seus
erros e acertos, construindo assim sua forma de gerir.
Uma das preocupações com a gestão por ela explicitada é a tomada de decisões
precipitadas que podem acarretar algum desconforto para os envolvidos, seja estudante,
docente, funcionário ou membro da equipe gestora. Apesar de ter certo receio em tomar
1037

decisões no calor dos acontecimentos, às vezes é instada a agir dessa forma por pressão
dos próprios membros da equipe e comunidade escolar: “(...) eu acabei tomando uma
decisão precipitada, um pouco pressionada pelo grupo... Eu estou me sentindo muito
mal porque eu estou muito dividida com o que está acontecendo, eu estou enxergando
um lado e o outro lado. Então o que eu faço, eu tento consultar o máximo possível as
pessoas...”.
Percebemos nessa fala a tendência da diretora de rejeitar tomadas de decisões
solitárias e irrefletidas, ao contrário, considera fundamental consultar os envolvidos e
ter clareza das possíveis consequências. Em outro ponto de sua entrevista explicou que
uma gestão democrática deve ter como princípio ouvir o outro, saber de suas
necessidades e suas perspectivas em relação ao ensino e aprendizagem. Já a autonomia
para ela não é plena, pois sempre há a necessidade de seguir algumas regras, da escola,
do sistema, da sociedade. Portanto, não há liberdade plena para fazer ou opinar de
acordo apenas com as próprias convicções. Ela explicou também que é preciso ter ética
profissional e pensar nos interesses de todos que participam da comunidade escolar,
tanto quanto possível. Para ela, ser autônomo não é ser autossuficiente, pois sempre se
depende do outro para tomar decisões.
Essa caraterística de ouvir o outro, de incentivar a participação faz com que a
diretora tenha bastante dificuldade em exercer o papel que o sistema educacional e até a
própria comunidade exigem, isto é, de constituir-se como autoridade escolar, o que é
demonstrado pela sua fala: “(...) tenho muita dificuldade em dar ordens. Para
conversar com um funcionário e corrigir algo errado, fico uma semana sem dormir,
pensando as melhores falas, o melhor caminho para conduzir o problema. Sofro muito
com isso”. Notamos que sua preocupação com o outro, com suas reações, com as
consequências de suas decisões a fazem refletir muito, ficando dividida entre o que se
espera dela formalmente e suas concepções de gestão, predominantemente
democráticas.
As falas de uma funcionária e da professora mediadora parecem refletir que essa
abordagem democrática de gestão prevalece nas práticas da diretora. A funcionária,
que trabalha há alguns anos na secretaria da escola explica: “(...) ela divide o nosso
trabalho e essa divisão é uma sugestão nossa, (...) a diretora sempre falou que a
prioridade é o aluno, é o atendimento, e o resto é consequência, a gente está ali pra
trabalhar mesmo, para servir mesmo e qualquer problema relacionado ao aluno tem
que ser atendido antes de qualquer papel, antes de qualquer relatório que você tenha
1038

que se apresentar, antes de qualquer coisa que você tenha prazo para fazer para o
sistema. (...) um trabalho dividido onde todo mundo aprende, onde todo mundo sabe
fazer um pouco de cada coisa. A gente só procura passar para ela o que a gente sabe
fazer melhor, e ela mesma já identifica isso, ela tem um conhecimento assim da pessoa,
às vezes ela não sabe seu nome, mas ela sabe do que cada um é capaz”. Além de
perceber o outro, a diretora (re) constrói suas práticas gestoras juntamente com sua
equipe. Surge também na fala da funcionária outro pressuposto fundamental da gestão
democrática da escola que é o foco nos estudantes e nas suas famílias. O sistema até
pode ser atendido em suas demandas, mas os alunos são sua prioridade. Ela consegue
ainda enxergar as subjetividades, isto é, a escola não é apenas um coletivo, mas
composta de indivíduos socialmente constituídos. Percebe-se ainda na fala da
funcionária uma admiração pelo trabalho da gestora, uma variável afetiva que deve
contribuir para um clima organizacional produtivo na escola.
Também observamos alguns desses aspectos na fala da professora mediadora, que
tem como responsabilidade auxiliar na resolução de problemas, principalmente
interpessoais e de disciplina, de quase setecentos e cinquenta alunos. “Ela é ótima, ela é
a verdadeira líder. Ela sabe muito bem a diferença entre autoritarismo e liderança. Ela
é a liderança pura, assim eu acredito que ela consegue trazer os funcionários para ela
por meio do diálogo, por isso eles são muito envolvidos, empenhados no trabalho por
meio dela. Ela tem essa liderança, ela tem um jeito de articular, de falar com os
funcionários, fazer com que eles façam do jeito dela, mas sem impor isso”. Parece claro
que nessa fala a professora mediadora explica seu conceito de liderança no contexto da
gestão democrática escolar, que ela considera uma das marcas das práticas gestoras da
diretora.
No que se refere à gestão democrática, a professora mediadora enfatiza que a
diretora é: “(...) envolvida com todos, busca a participação de todos, todos têm
abertura não só para opinar, como para dar sugestões, principalmente do conselho, um
caminho da gestão democrática, não é mesmo? O conselho de escola tem que funcionar
de fato, com pais, professores participando realmente, e também alunos, é por meio
dele que nós conseguimos traçar os demais objetivos da escola”.
Portanto, para ambas as entrevistadas, a diretora pratica alguns princípios básicos
da gestão democrática, exercendo sua autonomia e promovendo a participação,
organizando a escola e dando a todos oportunidades de conciliar horários e funções,
priorizando estudantes e suas famílias, procurando envolver a equipe e a comunidade
1039

nas decisões a serem tomadas. Isso tem resultado em uma relação de estima e respeito
muito positiva entre a diretora, a escola e a comunidade.
No que se refere especificamente às articulações entre formação e práticas
gestoras, a diretora afirmou que a formação pelo GR a ajudou a mudar sua visão em
relação ao ensino e aprendizagem, além de valorizar ainda mais o trabalho de uma
gestão participativa, construída coletivamente. O GR teve ainda, segundo ela, um papel
importante na organização das reuniões pedagógicas, dos colegiados e do próprio
cotidiano da escola, sempre com foco no desenvolvimento de relações horizontais entre
os membros da equipe e comunidade escolar: “(...) também passei por um processo de
amadurecimento em relação à importância de buscar a teoria para compreender o dia-
a-dia da escola e trabalhar com a reflexão da própria comunidade escolar na busca de
soluções para os problemas que encontramos em nossa atuação”.

Considerações finais

Como suspeitávamos no início desta investigação, parece não haver uma relação
unívoca entre programas de formação em serviço, como o GR, e práticas gestoras. O
que é perceptível é que processos formativos com foco na gestão democrática e que
fomentem a autonomia e a participação são promissores no desenvolvimento de práticas
gestoras baseadas nesses princípios. Como teoria e prática andam juntas, cremos ser
importante continuar investindo nesse tipo de formação, tendo clareza que cada
participante vai aprender e eventualmente, ter suas práticas subsidiadas pelos estudos
realizados, de acordo com sua trajetória de vida e de constituição de sua
profissionalidade.

Intuímos assim que possa ter havido algumas possíveis articulações entre a
formação pelo GR e as práticas gestoras da diretora foco do nosso estudo.
Consideramos, finalmente, que essas articulações devem ter sido moderadas pelos
limites estabelecidos pelo próprio sistema ensino, ofertante da formação, e também
pelas próprias culturas organizacionais de cada escola.
1040

Referências

BOGDAN, R. C., BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em Educação: uma


introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 2010.
IMBERNÓN, F. Formação docente e profissional. São Paulo: Cortez, 2005.
______. Formação permanente do professorado. São Paulo: Cortez, 2009.
LIBÂNEO, J.C; OLIVEIRA, J. F.; TORCHI, M. S. Educação Escolar: políticas,
estrutura e organização. 7ª ed. Cortez: São Paulo, 2009.
LÜCK, H. Perspectivas da Gestão Escolar e implicações quanto à formação de seus
gestores. Em Aberto, Brasília, v.17, n. 72, p.11-33, fev./jun., 2000.
LÜDKE, M; ANDRÉ, M. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo:
EPU, 1986.
NASCENTE, R. M. M. A construção da participação na gestão escolar: uma proposta
de formação. In: XXVI Simpósio Brasileiro de Política e Administração da Educação,
2013, Recife. Anais... Recife: ANPAE, 2013. v. 17, p.01-16.
RISCAL, S. A. Gestão Democrática no cotidiano escolar. São Carlos: EDUFSCar,
2009.

SÃO PAULO (Estado). Secretaria da Educação. Coordenadoria de Estudos e Normas


Técnicas. Plano de formação continuada de professores e gestores: 2º semestre de
2011. São Paulo: Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas - CENP, 2011.

Agradecimentos: ao CNPq /PIBIC pelo financiamento desta pesquisa.


1041

Relato de experiência

A formação de professores no contexto escolar

Ricardo Alexandre Marangoni


UMESP/SEE-SP

Resumo: Este relato tem como objetivo discutir o papel do professor coordenador
pedagógico (PCP) na formação de professores em contextos escolares. Ele é resultado
de ações desenvolvidas em uma escola pública estadual do município de Osasco-SP, na
qual o autor exerce o cargo de diretor de escola. A revisão de literatura apontou-nos
várias temáticas relacionadas ao trabalho do PCP, das quais nos interessou a formação
de professores em contextos escolares por ele mediadas. O estudo fundamenta-se na
pesquisa qualitativa e apóia-se principalmente nas contribuições bakhtinianas. A análise
dos resultados está pautada em categorias sobre a percepção de seu papel e sua atuação
profissional. Acessados por meio das discursividades, os resultados revelam entraves a
serem por eles e por nós superados.
Palavras-chave: formação de professores, professor coordenador pedagógico, contexto
escolar.

1. Introdução

Na revisão de literatura sobre o PCP1 encontramos vários estudos que abordam


diferentes temáticas e enfoques, dos quais destacaremos três de grande impacto. O
estudo de Fernandes (2004), de natureza bibliográfica, nos apontou a trajetória histórica
do PCP e suas atribuições na Rede Pública do Estado de São Paulo, bem como suas
limitações e possibilidades. Afirma que eles convivem com problemas relacionados às
condições de trabalho, e exemplifica os obstáculos enfrentados:

(...) o desvio de função, a ausência de identidade, a falta de um território


próprio de atuação no ambiente escolar, o isolamento do trabalho cotidiano, a
deficiência na formação pedagógica, a convivência com uma rotina de
trabalho burocratizada, a utilização da função na veiculação, imposição e

1
O sujeito desta pesquisa designado por professor coordenador pedagógico (PCP) aparece em outros
estudos com o mesmo nome ou outros, tais como: professor coordenador, coordenador pedagógico ou
simplesmente coordenador.
1042

defesa de projetos da Secretaria de Educação, a presença de traços


autoritários e julgadores e a fragilidade de procedimentos para a realização de
trabalhos coletivos (FERNANDES, 2004, p. 104).

A nossa observação, enquanto membro do trio gestor (diretor de escola2) ratifica


os entraves apontados pela autora (2004), salientando para a necessidade de superação.
Para ela, os PCP inserem-se num contexto de contradições marcado pelas reformas
educacionais dos anos 90 e a visão progressista de educação dos anos 80.
Ao refletir sobre os saberes e fazeres dos PCP, temos como meta de trabalho
buscar referenciais a fim de ampliar nossa compreensão sobre a constituição desse
profissional e ajudá-los na reflexão de suas práticas.
Organizada por Bruno, Almeida e Christov (2009), o livro “O coordenador
pedagógico e a formação docente” insere-se numa coletânea3 sobre o PCP que abrange
a discussão de vários temas: formação continuada do PCP; lócus de sua formação
continuada; reformas educacionais; os saberes e os fazeres do PCP na relação com
professores iniciantes; a liderança do PCP e o uso das tecnologias no contexto escolar.
Em especial, os livros “O coordenador pedagógico e a educação continuada” e
“O coordenador pedagógico e a formação centrada na escola” trazem vários artigos que
enfocam diferentes aspectos do PCP que ajudou-nos na reflexão de nosso objeto de
estudo.
Uma das temáticas por nós salientada é a formação do PCP. Sobre esta questão,
destacamos a pesquisa da Fundação Victor Civita, em parceria com a Fundação Carlos
Chagas (PLACCO, ALMEIDA e SOUZA, 2010/20114). Os dados que tratam da
formação continuada dos PCP revelam que 70% dos entrevistados buscaram a pós-
graduação, sendo que, desse total, 99% na modalidade lato sensu. No entanto, apesar do
investimento deles, 64% defendem que as Secretarias de Educação deveriam
responsabilizar-se pela oferta relacionada à formação continuada. Porém, essas são
esporádicas e os PCP são vistos como meros multiplicadores de informações nas
escolas.

2
Ricardo Alexandre Marangoni é diretor de escola da SEE-SP. Doutorando em Educação pela UMESP.
Bolsista da SEE-SP. Contato: ramarangoni@hotmail.com
3
A coletânea intitulada “O Coordenador Pedagógico” reúne nove livros com pesquisas sobre várias
temáticas relacionadas ao PCP.
4
Na primeira fase da pesquisa (2010) realizou-se um levantamento quantitativo, envolvendo 400 PCP de
13 estados brasileiros. O relatório completo pode ser acessado em http://www.fvc.org.br/estudos-e-
pesquisas/2010/perfil-coordenadores-pedagogicos-605038.shtml. Na segunda fase (2011) ocorreu um
aprofundamento desse estudo.
1043

Dessa forma, os cursos de pós-graduação deveriam privilegiar a reflexão dos


PCP, instrumentalizando-os para a mediação da formação de professores em contextos
escolares, uma vez que os órgãos superiores pouco corroboram com a formação deles e,
por conseguinte, dos docentes.
Esse levantamento inicial trouxe vários referenciais que nos motivaram, ainda
mais, a investigar alguns aspectos da prática dos PCP.

2. Objetivo

Este relato tem como objetivo discutir o papel do PCP na formação de


professores em contextos escolares, por meio de uma pesquisa5 e das observações por
nós realizadas.

3. Metodologia

O relato aqui exposto expressa as observações, ações e os resultados da pesquisa


realizada pelo diretor, junto à sua escola sobre a atuação do PCP. Na realização da
pesquisa distinguimos duas fases: na primeira formulamos o corpus teórico, cujas
abordagens estão relacionadas aos estudos de Bakhtin (1999), Nóvoa (1992; 1995),
Nunes (2001) entre outros. Na segunda fase, realizamos a coleta dos dados em uma
escola pública estadual localizada no município de Osasco-SP, na tentativa de responder
a quatro questões norteadoras:
1. O que os PCP entendem por coordenação pedagógica?
2. Como desenvolvem seu trabalho nas escolas pesquisadas?
3. Quais são as ações propostas para formação de professores, em que momento
e como elas ocorrem?
4. Que mudanças é preciso introduzir na escola para que ela se assuma como
lócus de formação continuada de professores?

5
Relato de experiência elaborado a partir do Trabalho de Conclusão de Curso intitulado “O professor
coordenador pedagógico e a formação de professores na escola pública”, realizado em 2012, no Curso de
Especialização em Gestão da Escola para Diretores pela USP, em parceria com o Programa REDEFOR
da SEE-SP.
1044

4. Marco Teórico

O estudo das práticas escolares cotidianas revela as formas particulares com que
cada sujeito interpreta a realidade e atribuem significados. Uma das maneiras de
apreender o cotidiano escolar é por meio da linguagem, levando-se em conta o contexto
em que são produzidas. Conhecer e interpretar a escola, através das interações verbais,
significa colocar uma lente de aumento na dinâmica das relações e interações,
compreendendo o papel e a atuação de cada sujeito nos modos de organização do
trabalho pedagógico.
Ao longo da história, a formação dos professores foi marcada por diferentes
abordagens. Nóvoa (1995), Tardif (2002) e outros destacam que as pesquisas recentes
enfatizam a necessidade de dar voz ao professor e reconhecer os saberes por eles
desenvolvidos. Daí a necessidade de se investigar a formação docente nos contextos
escolares, mediada pelos PCP. Para isso, definimos uma perspectiva teórica que nos
ajudasse a capturar esse dinamismo e que orientasse nossa análise e interpretação.
Utilizamos o discurso dos PCP para o entendimento da formação docente, numa
perspectiva bakhtiniana. Portanto, a discursividade é compreendida por nós como um
processo que explicita, em seu caráter sócio-histórico-cultural e ideológico, a dinâmica
de produção de sentidos para contemplar as práticas enunciativas.
Para Brait (apud CASTRO, 2009, p. 26), o conjunto das obras do Círculo de
Bakhtin motivou o aparecimento de uma análise dialógica do discurso que “contribui
para o reconhecimento do constitutivo papel da linguagem nas atividades humanas e,
portanto, nas diferentes ciências que têm o sujeito e sua alteridade como objeto de
estudos”.
Cabe destacar que há outras vozes do discurso, mas neste momento interessa-nos
investigar o problema a partir desses sujeitos (PCP). Também acrescentamos que o
discurso é aqui entendido, não sob o aspecto da fala individual, mas do entrelaçamento
de discursos que, veiculados socialmente, realizam-se nas e pelas interações dos
indivíduos.
Os PCP, ao enunciarem, inscrevem-se em uma posição enunciativa. Os discursos
nos quais inscrevem seus dizeres coexistem com outros discursos que provêm de outras
posições-sujeito, de outros lugares discursivos, de outras formações discursivas. Nessa
perspectiva, nos vemos atrelados e entrelaçados a discursos, nos quais ocorrem as
1045

contradições, os conflitos entre os dizeres dos enunciadores, pois estes se constituem de


outros dizeres povoados por outros discursos.
De todo modo, a perspectiva bakhtiniana ajuda-nos a entender que diálogo não
se resume a uma relação face a face, mas é algo mais amplo, trata-se de diálogo entre
pessoas, textos, discursos, autores, culturas e épocas. Faraco (apud CASTRO, 2009, p.
29) resume essa ideia como o encontro, em todas as instâncias da linguagem, inclusive
na bivocalidade do enunciado individual ou na dinâmica do discurso interior, de “vozes
que se entrecruzam, se complementam, discordam umas das outras, se questionam,
duelam entre si”. O trecho ilustra a complexidade do entendimento do discurso, aqui
concebido em suas dimensões ideológica, sócio-histórica e polifônica.
Assim como Warchauer (2001, p.187), concordamos que “escrever é imprimir o
próprio pensamento” expressando-se, de acordo com Bakhtin (1999) no terreno do
social. O grupo social interlocutor e o contexto são determinantes para a compreensão
da palavra como signo. No que se refere a palavra, salientamos que é um signo neutro e
pode preencher qualquer tipo de função ideológica sendo a expressão de um em relação
ao outro, uma espécie de ponte lançada entre nós e os outros. Ela é o território comum
do locutor e do interlocutor (BAKHTIN, 1999, p. 131-132) e, à medida que o locutor
expõe suas ideias, ele entra em contato com seus questionamentos internos, sob
influência do contexto social que o envolve.
O entendimento sobre as vozes do discurso na perspectiva apontada orientou as
análises da pesquisa relatada (MARANGONI, 2012) e nossas observações e ações,
ampliando nossa compreensão da prática do PCP no contexto social que o envolve e
pela mediação da qual é responsável.

5. Análise dos Resultados

5.1. As percepções do diretor de escola

A coleta dos dados teve como eixo norteador investigar os sentidos explicitados
pelos dois PCP quanto às questões mencionadas no subitem três. Uma vez eleitas as três
categorias passou-se a transcrição das entrevistas e análise dos resultados. As categorias
analisadas foram: (1) percepção sobre o papel da coordenação pedagógica; (2)
percepção sobre sua atuação profissional; (3) percepção sobre mudanças necessárias.
1046

Categoria 1: Percepção sobre o papel do PCP

Os PCP revelaram ser importante: (a) a mediação no exercício profissional; (b)


auxiliar, acompanhar, socializar e refletir sobre a prática pedagógica; (c) o preparo das
ATPC6 e das reuniões; (d) orientar alunos e pais; (e) participar das orientações técnicas
fornecidas pelos órgãos superiores; (f) investir na socialização das experiências
pedagógicas entre os pares; (g) acompanhar o desenvolvimento do currículo e coordenar
os processos de ensino-aprendizagem.
Apesar de não mencionarem a questão da formação de professores, no discurso
deles subentende-se essa preocupação. O que temos observado é que a prática se
encontra atrelada a tarefas não pertencentes a sua função, restando pouco tempo para
investir em suas atribuições. Isso ocorre porque as exigências burocráticas e as
demandas de natureza diversas prejudicam seu trabalho.
Salientamos que a legislação pertinente ao PCP prevê mais atribuições, das quais
não foram destacadas pelos PCP entrevistados, mas as demandas e os entraves são
inúmeros, muitas vezes não permitindo o exercício profissional com eficiência.

Categoria 2: Percepção sobre a atuação profissional

As narrativas dos PCP expressaram: (a) o trabalho abrange os itens destacados


na questão um; (b) o estudo de textos pedagógicos entre os pares; (c) a troca de
experiências; (d) o desenvolvimento da formação de professores nas ATPC; (e) as
orientações técnicas fornecidas pela Diretoria de Ensino são repassadas aos professores;
(f) a formação externa é incentivada; (g) o auxílio individual e o cuidado com o
relacionamento interpessoal.
A PCP do ensino fundamental destacou as parcerias e as orientações técnicas da
Diretoria de Ensino. No nosso entendimento essas ações pouco ajudam na formação dos
professores, já que ocorrem de forma esporádica e essencialmente expositiva, não
apresentando e criando efetivamente a troca de experiências relacionadas e
fundamentadas em teorias e concepções pedagógicas muitas vezes por nós defendidas.
Há uma crítica dos professores e dos PCP, e particularmente do autor (diretor), quanto
às formações realizadas, porque elas normalmente priorizam Língua Portuguesa e

6
ATPC significa Atividade de Trabalho Pedagógica Coletiva e, substitui a nomenclatura HTPC (Horas de
Trabalho Pedagógica Coletiva).
1047

Matemática e não permitem o exercício do diálogo entre os pares, ficando muitas vezes
subentendido a relação daqueles que sabem sobre aqueles que precisam incorporar os
conhecimentos e simplesmente exercitá-los.
Também salientamos que a PCP do ensino fundamental incentiva os professores
a buscar uma formação além do ambiente escolar. Acreditamos ser importante essa
ação, porém, o discurso por ela proferido preocupa-nos, porque também devemos
reforçar a ideia de que a escola apresenta-se como lócus de formação permanente do
professor e, o PCP tem como atribuição a mediação desses processos. Aqui, observamos
um entrave – os professores, muitas vezes não valorizam as ATPC como espaço de
formação e também não reconhecem o PCP como mediador desses processos.
O PCP do ensino médio destaca as ações de orientação individual e coletiva. Ele
demonstra uma preocupação com a reflexão sobre a prática pedagógica e o
relacionamento interpessoal. Ele deseja “cutucar” (expressão utilizada pelo pesquisado)
os professores para que os últimos reflitam sobre suas práticas.

Categoria 3: Percepção sobre Mudanças

Sobre as mudanças na escola, os PCP apontaram: (a) a falta de incentivo aos


professores; (b) os professores encontram-se desmotivados e acomodados; (c) o
professor continua a pensar e agir sem a dinâmica que o momento exige; (d) trazer em
algumas ATPC pessoas indicadas pela Diretoria de Ensino para ministrar a formação de
professores.
Os dados revelam a necessidade de formação do PCP no sentido de
instrumentalizá-los para enfrentar os desafios de mediar a formação dos docentes, que
muitas vezes, encontram-se desmotivados. A PCP do ensino fundamental novamente
reforça a ideia da formação vinda de fora, enquanto, defendemos a proposta de
formação do PCP para que ele desenvolva práticas em que o professor reflita sobre seu
trabalho. A mudança por eles defendida passa pela mudança dos outros, enquanto,
observamos que nós devemos mudar para que isso ocorra.
O PCP do ensino médio ratifica o discurso da outra PCP, quanto à falta de
interesse do professor em continuar o seu processo de formação. Afirma estarem
acomodados com a situação vigente e, aponta a necessidade de revermos nossas
posturas diante do novo contexto que se apresenta.
1048

Desencadear um trabalho de acompanhamento e intervenção da ação docente,


que privilegie a reflexão da prática pedagógica, movimenta-o para a mudança, enquanto
pesquisador de sua própria prática, a partir dos interesses e interrogações por ela
suscitados. O PCP será um agente transformador na medida em que transformar a si
mesmo e, por consequência, à realidade.

6. Considerações Finais

Diante dos resultados do presente estudo, podemos perceber a complexidade do


papel do PCP e a importância de se investigar a formação de professores na escola
pública, tendo os PCP como mediadores. Como explicitamos anteriormente, o estudo
foi realizado no local de trabalho do autor, com vistas a desencadear mudanças quanto à
percepção dos envolvidos.
As análises evidenciaram que a SEE-SP, através da legislação tem expectativas
de que esse profissional, juntamente com os demais gestores, contribua para a
construção de uma gestão democrática e participativa, porém, pouco corrobora e cria
condições de trabalho para que isso ocorra.
Cabe notar que, no discurso do PCP sua identidade profissional é “projetada” e
muitas vezes “assumida” na ambiguidade de papéis. Nossas observações confirmam que
ele acaba assumindo “tarefas”, das quais não fazem parte de suas atribuições,
dificultando assim a sua prática profissional e, em especial, a gestão da formação de
professores.
Entretanto, consideramos o PCP como um agente mediador e a escola como um
espaço de transformação da realidade. Para tanto, é essencial que sejam criadas as
condições para a qualificação do professor que assume a função de PCP, bem como a
melhoria das condições de trabalho. Coloca-se, portanto, o desafio de inserir a
coordenação pedagógica desenvolvendo seu papel de articuladora e mediadora do
projeto educativo.
Assim, acreditamos que este estudo trouxe contribuições aos envolvidos e
proporcionou a oportunidade de reflexão sobre a nossa prática com vistas a intervir
sobre ela. A organização linguística favoreceu a reflexão dos sujeitos da pesquisa e
ajudou-nos a abandonar um discurso cristalizado em que responsabiliza o outro. Todos
são corresponsáveis no processo educativo e, o PCP responsável pela mediação da
1049

formação dos professores na escola pública. Enfim, essa experiência expressa apenas
um começo para que, efetivamente, essas transformações ocorram no contexto escolar.

7. Referências Bibliográficas

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professores na escola pública. Trabalho de Conclusão de Curso, USP, São Paulo,
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professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.

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(CP) e a formação de professores: intenções, tensões e contradições. São Paulo, Revista
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WARSCHAUER, C. Rodas em rede: Oportunidades formativas na escola e fora dela.


Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.
1050

Comunicação

Os Conselhos Municipais de Educação da Região Metropolitana de Campinas e o


Regime de Colaboração

Roque Lucio
Faculdade Euclides da Cunha
São José do Rio Pardo
Antônio Carlos Will Ludwig
Faculdade de Administração Pública da Academia da Força Aérea
Pirassununga
Agência financiadora: FAPESP

Resumo: Este texto procurou estabelecer as relações existentes entre os Conselhos


Municipais de Educação como instrumento de materialização do Regime de
Colaboração na Região Metropolitana de Campinas (RMC). Iniciamos, apresentando o
significado da palavra conselho; em seguida, buscamos verificar como as nossas
Constituições Federais, Leis de Diretrizes e Bases da Educação e outras leis ordinárias
trataram do assunto Conselho de Educação, no âmbito federal, estadual e municipal.
Tratamos também de apresentar o artigo da Constituição Federal de 1988 que tratou do
Regime de Colaboração no âmbito da Educação. Trouxemos ainda no corpo do artigo,
informações básicas sobre Região Metropolitana e a Região Metropolitana de
Campinas. Feita esta introdução apresentamos os achados preliminares da pesquisa
empreendida pelo Laboratório de Gestão Educacional – LAGE, da Faculdade de
Educação da Universidade de Campinas, iniciada em 2012,quando a RMC era composta
por 19 municípios, a saber: Americana, Artur Nogueira, Campinas, Cosmópolis,
Engenheiro Coelho, Holambra, Hortolândia, Indaiatuba, Itatiba, Jaguariúna, Monte
Mor, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa Bárbara D’Oeste, Santo Antônio de Posse,
Sumaré, Valinhos e Vinhedo. A Pesquisa LAGE/FAPESP em andamento cujo titulo é:
Políticas Educacionais na Região Metropolitana de Campinas: regime de colaboração,
teve como objetivo analisar as políticas educacionais presentes na RMC que favorecem
ou dificultam a construção do regime de colaboração, considerando a legislação e
programas implementados na área da educação. Em relação aos Conselhos Municipais
de Educação os resultados preliminares foram que não foi encontrada nenhuma relação
1051

entre as Leis de Criação dos Conselhos Municipais de Educação e a materialização do


Regime de Colaboração em 6 municípios e que em 13 municípios considerou-se que, o
conteúdo das leis de Criação dos Conselhos Municipais de Educação facilitavam a
materialização do Regime de Colaboração.
Palavras-chave : Regime de Colaboração - Conselho Municipal de Educação - Região
Metropolitana de Campinas

Conselhos Municipais de Educação

Conselho na etimologia latina (consilium) significa assembleia deliberativa,


lugar onde se delibera, trazendo a ideia de “ajuntamento de convocados”, o que supõe
participação em decisões precedidas de debate e análise, sendo percebido como a
abertura de espaços públicos, de participação da sociedade civil, ampliando o processo
de democratização da sociedade.
Conforme Gohn (2001, p.7) “os conselhos constituem no inicio deste milénio
(2000) a principal novidade em termos de políticas públicas. Após análises, conclui-se
que eles são agentes de inovação e espaço de negociação de conflitos”.
Estes conselhos apresentam-se organizados em três modalidades, ou seja, os
criados pelo Poder Executivo com a função de estabelecer relações junto aos
movimentos e organizações da sociedade civil; os populares, organizados pelos setores
sociais majoritários com o objetivo de estabelecer negociações com o poder público e os
institucionalizados, originados de leis específicas elaboradas pelo Poder legislativo, os
quais podem participar da gestão dos negócios públicos.
Do ponto de vista político, tais conselhos podem ser vistos como uma forma de
democracia direta, isto é, um tipo de exercício do poder onde as pessoas concretizam
atividades de gestão, controle, orientação e deliberação de maneira autônoma e livre da
ação dos governantes escolhidos pelo voto.
Podemos olhar para eles, portanto, como uma significativa inovação na área da
democracia participativa surgida logo após ter acontecido em nosso país o retorno ao
regime democrático representativo. Destaque-se que neste momento da história
brasileira emergiram diversos movimentos sociais que pugnaram pela volta à
democracia e pelo estabelecimento de procedimentos de gestão baseados na
participação. As políticas públicas foram baste influenciadas pela ação desses
movimentos.
1052

O Conselho de Educação é tema Constitucional desde a Constituição de 1934,


de 16 de julho de 1934, tratando do assunto no Artigo 152, parágrafo único. As
Constituições de 1937, de 10 de novembro de 1937 e a Constituição de 1946, de 18 de
setembro de 1946, não abordaram o tema. A primeira Lei de Diretrizes de Bases da
Educação Nacional, Lei 4.024, de 20 de dezembro de 1961, instituiu o Conselho Federal
de Educação como órgão normativo do Ministério da Educação e Cultura. Esta Lei
previu também os Conselhos Estaduais de Educação no artigo 10. A Lei 5.692, de 11 de
agosto de 1971 acompanhou a Lei n.º 4.024/1961 acrescentando a possibilidade da
existência destes colegiados nos municípios, inserindo no artigo 71 do Ato das
Disposições Transitórias que “ Os Conselhos Estaduais de Educação poderão delegar
parte de suas atribuições a Conselhos de Educação que se organizem em seus
Municípios em que haja condições para tanto”. O artigo 71 não foi implementado pelo
Conselho Estadual de Educação do Estado de São Paulo, provavelmente, por esta razão,
no final da década de 1980, criaram-se Comissões Municipais de Educação e não
Conselhos Municipais de Educação no Estado de São Paulo.
A Lei 9.131, de 24 de novembro de 1995, que modificou a Lei n.º 4.024/1961
alterando artigos, criou o Conselho Nacional de Educação. A Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996 confirma a existência do
Conselho Nacional de Educação no artigo 9.º, com a seguinte orientação no seu § 1º :
“Na estrutura educacional, haverá um Conselho Nacional de Educação, com funções
normativas e de supervisão de atividade permanente, criado por lei”. Em relação aos
estados, Distrito Federal e municípios a LDB estabeleceu como incumbências destes
três entes federativos no inciso I do Artigo 10 (no caso dos Estados e Distrito Federal) e
mesmo inciso do Artigo 11 (no caso dos Municípios): “organizar, manter e desenvolver
os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino”, deduzindo-se que; no caso
do município os órgãos que compõem seu sistema seriam: as Secretarias Municipais de
Educação ou setores equivalentes como órgão executivo e o Conselho Municipal de
Educação como órgão normativo.
Além deste arcabouço legal acima citado temos ainda outras leis que fizeram
referencias aos Conselhos Municipais de Educação, a saber: Lei n.º 9.424, de 24 de
dezembro de 1996, que regulamentou o FUNDEF; a Lei que estabeleceu o Plano
Nacional de Educação para do período de 2001 a 2010, Lei n.º 10.172, de 09 de janeiro
de 2001; a Lei que regulamentou o FUNDEB, Lei n.º 11.274, de 20 de junho de 2007,
refere-se às obrigações e competências do colegiado nas três esferas do governo; o
1053

Decreto n.º 6.094, de 24 de abril de 2007, quando tratou do Plano de Metas


Compromisso de Todos pela Educação, também referiu-se à obrigações do colegiado
da educação nas três esferas de governo.
No Estado de São Paulo, a partir de 1996, a existência dos Conselhos Municipais
de Educação era exigência para se estabelecer convênios de municipalização do ensino.
No Brasil, no final da década de 1990, os Conselhos Municipais de Educação ganharam
crescente importância porque a transferência e o recebimento dos recursos financeiros
pelos municípios estavam vinculados, por lei federal, à existência desses colegiados.
O Laboratório de Gestão Educacional (LAGE) da Faculdade de Educação da
Unicamp desenvolveu, no período de 2002 a 2004, uma pesquisa sobre os conselhos
municipais da Região Metropolitana de Campinas (RMC), analisando a situação destes
colegiados nos 19 municípios que compunha a RMC. A pesquisa foi financiada pela
FAPESP e publicada sob título “Conselhos Municipais de Educação: um estudo da
Região Metropolitana de Campinas”. Tal pesquisa analisou o funcionamento dos CMEs
abordando os seguintes aspectos: processo decisório, elaboração de pareceres,
levantamento dos temas mais discutidos, abrangência das ações dos CMEs, formas de
divulgação dos trabalhos, interferências externas, relacionamento com outros órgãos,
interação com a Região Metropolitana de Campinas, como os conselheiros
conceituavam Sistema Municipal de Ensino, a relação dos Conselhos Municipais de
Educação e a municipalização do ensino e as dificuldades na pesquisa, entre outros
(OLIVEIRA, et. al, 2006).
A equipe de pesquisadores do LAGE, após análise das temáticas enfocadas e de
acordo com os objetivos propostos concluiu:
1 – A criação, organização e funcionamento dos CMEs estão diretamente
ligados à discussão sobre sistemas de ensino. Nos termos da legislação, a
constituição de um sistema pressupõe a criação do CME e um dispositivo
legal que normatize a matéria. Observando, entretanto, a realidade efetuada
nos municípios, constatamos que isso não acontece. Verificamos que não há
consenso entre os agentes educacionais sobre o seu significado. Falta clareza
entre os membros sobre a constituição do sistema municipal de ensino, bem
como a relação entre este e o sistema estadual de ensino.
[...]
2 - O Dirigente Municipal de Educação figura como destaque na dinâmica
de funcionamento dos CMEs. Sua participação exerce grande influência na
condução dos encaminhamentos.
[...]
3 – Foi possível apontar convergências entre os CMEs e as discussões
ocorridas na Câmara Temática de Educação da RMC, estas relacionadas à
melhoria da qualidade do ensino nos municípios da região, Assim, dentre
outros, foram discutidos os seguintes temas: atendimento à demanda escolar,
transporte, merenda, o levantamento do gasto “per capita” com alunos de
creche na educação infantil, do ensino fundamental e médio, estudos sobre
1054

educação inclusiva e análise da possível implementação do Fundo de


Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (FUNDEB), programa de formação continuada
dos professores, criação dos núcleos de formação continuada nos municípios,
presentes naquele órgão colegiado, também estivem presentes, de forma
diversa, nas reuniões dos CMEs. (OLIVEIRA, et.al.,pp. 271-273, 2006).

Os pesquisadores apontaram algumas conclusões que, ao nosso ver, são cruciais


para a concretização do regime de colaboração, como por exemplo, a importância de se
constituir os sistemas de ensino e, as relações de colaboração que os CMEs precisam ter
com o Conselho Estadual de Educação, “que é fundamental para a elaboração de uma
política educacional regional, bem como de colaboração das esferas municipais com a
estadual” (OLIVEIRA, et. al., p. 273, 2006) e, também, da esfera estadual com as
esferas municipais.

Região Metropolitana de Campinas

As primeiras Regiões Metropolitanas do Brasil foram criadas com base no § 10


do Artigo 157 da Constituição Federal do Brasil, de 1967, modificada pela Emenda de
1969. Este parágrafo estabelecia que:
a União, mediante lei complementar, poderá estabelecer regiões
metropolitanas, constituídas por Municípios que, independentemente de sua
vinculação administrativa, integram a mesma comunidade socioeconômica,
visando à realização de serviços de interesse comum.

Era, portanto, da competência da União a criação das Regiões Metropolitanas.


A Lei Complementar 14, de 08 de junho de 1973, criou as Regiões
Metropolitanas de São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, Curitiba,
Belém e Fortaleza e a Lei Complementar 27, de 03 de novembro de 1975, regulamentou
as Regiões Metropolitanas das Capitais. A Constituição Federal de 1988 transferiu a
competência de instituir Regiões Metropolitanas aos Estados (§ 3.º, Artigo 25,
CF/1988).
No Estado de São Paulo, a Lei Complementar 760, de 1995, estabeleceu
diretrizes gerais para a criação de Regiões Metropolitanas. A Lei Complementar 815, de
30 de julho de 1996, criou a Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS) e a Lei
Complementar 870, de 19 de julho de 2000, criou a Região Metropolitana de Campinas
(RMC).
1055

Conforme dados do IBGE do ano de 2010, a população residente na RMC


correspondia a 6,3 % (seis inteiros e três décimos por cento) da população do Estado, ou
seja, cerca de 2,6 milhões de pessoas.
A maioria da população da RMC concentrava-se no meio urbano. Apenas três
municípios tinham a população rural considerável: Engenheiro Coelho com 70%
(setenta por cento) da população no meio urbano e 30% (trinta por cento) no meio rural;
Nova Odessa com 65% (sessenta e cinco por cento) da população no meio urbano e
35% (trinta e cinco por cento) no meio rural e Holambra com 52% (cinquenta e dois por
cento) da população no meio urbano e 48 % (quarenta e oito por cento) no meio rural.
Nos outros 16 (dezesseis) municípios, a população rural oscilava entre 1% (um por
cento) (Paulínia); 1,3 % (um inteiro e três décimos por cento) (Santa Bárbara D’Oeste);
2 % (dois por cento) (Campinas, Sumaré e Indaiatuba) e 19% (dezenove por cento)
(Itatiba).
A RMC caracterizava-se pela intensa articulação econômica, social e cultural e a
interdependência que existia entre seus 19 municípios. A interdependência estava
associada a uma economia que se destacava pelas atividades tecnologicamente
avançadas na área industrial e de serviços. Conforme Semeghini (2006) “embora a
RMC tivesse classificação de metrópole regional, apresentava dinamismo maior que a
maioria das metrópoles nacionais”.

Regime de Colaboração

O Brasil é uma República Federativa em que as quatro esferas do poder político:


União, Estados, Distrito Federal e Municípios têm a mesma dignidade e suas relações
devem estar alicerçadas na ideia da relação entre iguais, não havendo relação de
subordinação, mas a relação desejável e esperada deve ser a de colaboração, posto que
subordinação é característica entre desiguais, enquanto colaboração é feita entre iguais.
O Regime de Colaboração é um conceito ligado ao principio federativo.
Em relação ao Regime de Colaboração a Constituição Federal no caput do
artigo 211 diz: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão
em regime de colaboração seus sistemas de ensino” e no parágrafo 4.º do mesmo artigo
faz menção a colaboração, assim: “Na organização de seus sistemas de ensino, os
Estados e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a
1056

universalização do ensino obrigatório”. O Regime de Colaboração, embora previsto no


artigo 23 da Constituição Federal, ainda não foi regulamentado.
A Lei Federal n.º 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprovou o Plano
Nacional de Educação – PNE e deu outras providências, não fez alusão explicita aos
Conselhos de Educação nas diferentes esferas do governo, mas referiu-se ao regime de
colaboração entre os entes federativos nos artigos 7.º ( incisos 4.º,6º e 7º) e Artigo 13.
O PNE também explicita o regime de colaboração nas seguintes Metas e Estratégias:
Meta 1 – Estratégias 1.1,1.3,1.5; Meta 6 – Estratégias 6.2 e 6.3; Meta 7 – Estratégias
7.19 e 7.21; Meta 9 – Estratégias 9.5 e 9.8; Meta 10 – Estratégias 10.8 e 10.10; Meta 15
– Caput e Estratégia 15.11; Meta 16 – Estratégia 16.1; Meta 18 – Estratégia 18.5 e
Meta 20 – Estratégia 20.9.
A Lei n.º 13.005, de 25 de junho de 2014(PNE), em seu artigo 13, define que
“contados 2 (dois) anos da publicação desta lei”, portanto, até 26 de junho de 2016, o
poder público deverá instituir , em lei específica , o Sistema Nacional de Educação que
será fundamental para se regulamentar o Regime de Colaboração.

Alguns achados da pesquisa

A primeira análise da pesquisa sobre Regime de Colaboração em que o foco foi os


Conselhos Municipais de Educação na Região Metropolitana de Campinas nos revelou
que todos os municípios possuem o órgão colegiado.
A distribuição dos municípios pela data de criação dos Conselhos Municipais de
Educação é a seguinte:
• Ano de 1990 – Vinhedo;
• Ano de 1991 - Sumaré;
• Ano de 1995 - Holambra e Santo Antônio de Posse;
• Ano de 1996 - Campinas, Indaiatuba, Itatiba, Nova Odessa e Paulínia;
• Ano de 1997 - Americana, Artur Nogueira, Cosmópolis, Engenheiro Coelho,
Hortolândia, Jaguariúna, Pedreira, Santa Bárbara d’Oeste e Valinhos;
• Ano de 2001 - Monte Mor.
Por este levantamento percebe-se claramente que os Conselhos Municipais de
Educação da RMC tiveram suas criações concentradas nos anos de 1996, com 05 leis de
criação e 1997, com 09 leis criação, perfazendo um total de 14 leis criadas nos dois anos
considerados, o que corresponde a 73,68% (setenta e três inteiros e sessenta e oito
centésimos por cento) do total. Estes dados podem estar diretamente relacionados com o
1057

Programa de Ação de Parceria Educacional Estado-Município, Decreto n.º40.673, de 16


de fevereiro de 1996 do Governo do Estado de São Paulo, e pela regulamentação da
Emenda Constitucional n.º 14 pela Lei federal n.º 9.424, de 24 de dezembro de 1996,
que induziram à municipalização do ensino fundamental, no Estado de São Paulo e no
Brasil, respectivamente.
Vale destacar que os Municípios com maior número de conselheiros eram: o de
Paulínia com 22, o de Americana, com 18, o de Campinas com 16 e os de Artur
Nogueira, Holambra e Hortolândia com 15 conselheiros. Destacamos ainda que o
Regimento Interno do Conselho Municipal de Santo Antônio de Posse foi instituído
pela Lei n.º 1.762, de 23 de dezembro de 1999 e que o Conselho Municipal de
Educação de Paulínia tinha 22 conselheiros, sendo 12 membros de Câmara de Educação
Básica e 10 membros da Câmara do FUNDEB. Os Conselhos com menor número de
conselheiros foram os de Cosmópolis e Engenheiro Coelho com 9, e, Vinhedo com 10
conselheiros.
Em relação à forma de eleição do Presidente do Conselho tivemos: 10 Conselhos
Municipais de Educação em que o Presidente é eleito entre os pares ( 52,63 %), em 4
Conselhos Municipais de Educação o Presidente é o Secretário Municipal de Educação
- 21,05 % (vinte e um inteiros e cinco centésimos por cento), 2 Presidentes são
escolhidos pelo Prefeito entre os integrantes de lista tríplice o que significa 10,52 %
(dez inteiros e cinquenta e dois centésimos por cento), e 3 Presidentes são escolhidos
pelo Prefeito entre membros titulares do CME, o que representa 15,8% ( quinze inteiros
e oito décimos por cento). Das 19 leis que criaram os CMEs, 10 sofreram alterações até
junho de 2014, o que representa 52,63% (cinquenta e dois inteiros e sessenta e três
centésimos por cento) do total. Apenas 2 Conselhos Municipais de Educação tem o
Secretário da Educação como membro nato (Americana e Jaguariúna).
É importante deixar registrado ainda, que a Lei n.º13.446, de 23 de outubro de
2008, da Prefeitura Municipal de Campinas, em seu artigo 1.º, inciso XX, exclui
representante da Câmara Municipal, integrante do Conselho Municipal de Educação
do referido Município.

Considerações Finais
A análise das leis que criaram os Conselhos Municipais de Educação dos 19
municípios da RMC em relação à contribuição para a materialização do Regime de
Colaboração nos revelaram o seguinte:
1058

1- Não foi encontrada nenhuma relação entre as Leis de Criação dos Conselhos
Municipais de Educação e a materialização do Regime de Colaboração em 6 (seis)
municípios: ( Campinas, Engenheiro Coelho, Itatiba, Paulínia, Sumaré e Valinhos), o
que representa 31,57% ( trinta e um inteiros e cinquenta e sete centésimos por cento) do
total de municípios pesquisados.
2 – Pudemos inferir da análise das leis dos 13 municípios restantes, que o
conteúdo destas leis de Criação dos Conselhos Municipais de Educação facilitavam a
materialização do Regime de Colaboração, o que representa 68,43% ( sessenta e oito
inteiros e quarenta e três centésimos por cento) do total de municípios pesquisados.
Ficou bem caracterizado na pesquisa, que o Conselho Municipal de Educação
pode ser um importante instrumento para a materialização do Regime de Colaboração.
Em relação ao Regime de Colaboração, o alento é que o PNE/2014 ( Lei 13.005,
de 25 de junho de 2014) estabeleceu em sua Meta 20 a Estratégia 20.9 que afirma:
Regulamentar o parágrafo único do art. 23 e o art. 211 da Constituição
Federal, no prazo de 2 (dois) anos, por lei complementar, de forma a
estabelecer as normas de cooperação entre a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios, em matéria educacional, e a articulação do sistema
nacional de educação em regime de colaboração, com equilíbrio na repartição
das responsabilidades e dos recursos e efetivo cumprimento das funções
redistributiva e supletiva da União no combate às desigualdades educacionais
regionais, com especial atenção às regiões Norte e Nordeste (BRASIL, 2014)

O que esperamos é que está estratégia não se configure como apenas uma carta
de intenção. Ainda sobre o PNE/2014 estranhamos a inserção do §7º do artigo 7.º que
afirma: “O fortalecimento do regime de colaboração entre os Municípios dar-se-á ,
inclusive, mediante a adoção de arranjos de desenvolvimento da educação”, instrumento
que pode possibilitar as assessorias privadas nos sistemas municipais, em larga escala,
desvirtuando o lema “recursos públicos para escola pública”.
O fato de que na maioria dos municípios estudados os conselhos de educação
apresentam-se como órgãos importantes para a concretização do regime de colaboração
apoia a tese do afloramento desse regime mesmo inexistindo um entendimento
consensual entre educadores a seu respeito e uma legislação específica que o
regulamente.

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de 20 de dezembro de 1961, e dá outras providências. Disponível em
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BRASIL. Lei 10.172, de 9 de janeiro de 2001. Aprova Plano Nacional de Educação e


dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 10 jan. 2001.
1060

BRASIL. Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007. Regulamenta o Fundo de Manutenção e


Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação -
FUNDEB, de que trata o art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
altera a Lei no 10.195, de 14 de fevereiro de 2001; revoga dispositivos das Leis
nos 9.424, de 24 de dezembro de 1996, 10.880, de 9 de junho de 2004, e 10.845, de 5 de
março de 2004; e dá outras providências.
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colaboração com Municípios, Distrito Federal e Estados, e a participação das famílias e
da comunidade, mediante programas e ações de assistência técnica e financeira, visando
a mobilização social pela melhoria da qualidade da educação básica. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6094.htm

BRASIL. Decreto nº 6.253, de 13 de novembro de 2007. Dispõe sobre o Fundo de


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1061

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Região Metropolitana de Campinas, o Conselho de Desenvolvimento da Região
Metropolitana de Campinas e autoriza o Poder Executivo a instituir entidade autárquica,
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1062

Comunicação

Formação Continuada de Professores: um estudo dos Programas para


Alfabetização e Letramento.

Rosana Ramos de Souza


UFOPA- HISTEDBR/FAPEAM
Anselmo Alencar Colares
UFOPA – HISTEDBR

Resumo: O Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa/PNAIC, lançado pelo


Governo Federal, destina-se à formação de professores alfabetizadores nas áreas de
Letramento e Matemática que atuam nos anos/séries iniciais do Ensino Fundamental.
Este trabalho visa identificar as contribuições teórico-metodológicas do PNAIC para a
prática educativa dos professores. Para atingir o objetivo proposto, fez-se necessário o
levantamento sobre a formação contínua de professores no Brasil, as exigências das
políticas de formação. Quanto à coleta de dados utilizou-se da observação direta e
acompanhamento de cinco (5) professoras alfabetizadoras; e entrevista semiestruturada
com duas docentes. O estudo sinaliza ampla contribuição teórico-metodológica do
PNAIC para a prática pedagógica, mas ressalta os desafios na prática educativa, pois os
professores encontram barreiras na escola ao tentarem materializar os conhecimentos
obtidos durante o curso de formação.
Palavras Chave: Formação. Programas. Continuada. PNAIC. Parintins.

INTRODUÇÃO
O Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa começou a ser idealizada em
2012 e posto em prática em 2013 nos municípios, o mesmo é um acordo firmado pelo
Governo Federal, com Estados e Municípios, visando formar professores dos
anos/séries iniciais do I Ciclo de Alfabetização para que os alunos quando estiverem no
final do I ciclo estejam alfabetizados.
Tem-se como objetivo geral compreender como ocorre o processo de formação
continuada de professores que participam do Pacto Nacional de Alfabetização na Idade
Certa (PNAIC) e as contribuições destes estudos para a prática pedagógica. O olhar para
1063

o contexto pesquisado desenvolve-se dentro de uma abordagem qualitativa, onde na


primeira etapa obteve-se o levantamento da literatura, nesta etapa tiveram como
materiais estudados livros, textos e artigos acadêmicos que possibilitaram melhor
compreensão do assunto. A segunda etapa consistiu de observação e entrevistas na
escola onde as professoras alfabetizadoras lecionavam. Por último, procedeu-se a
análise e discussão dos resultados a partir do referencial teórico adotado.

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES: CONTEXTOS


HISTÓRICOS

As ações de formação continuada no Brasil têm seu início em meados dos anos
60 e início da década de 70, onde houve a primeira sistematização dos órgãos públicos
voltados para o aperfeiçoamento dos docentes. Segundo Alferes (apud et all ANDALÓ
1995) “as experiências mais antigas de que se tem notícias datam do início dos anos
60”. Foi nessa época que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (INEP) promoveu um estudo em colaboração com os Cursos de
Aperfeiçoamento do Instituto do Rio de Janeiro.
Nesse estudo, constatou-se que os professores estavam pouco satisfeito com os
cursos de aperfeiçoamento, pois estes não atendiam as necessidades da escola. Do
resultado da pesquisa realizada, verificou-se que 80% dos docentes queriam uma
reforma na forma dos assuntos práticos do professor primário; 69% sugeriram que as
aulas fossem a partir das necessidades da escola; 42% opinaram que o aperfeiçoamento
deveria ser planejado levando em conta a opinião dos docentes; 43% sugeriram mais
ênfase nas questões práticas.
Em relação às três últimas décadas, podemos elucidar três fatos importantes no
cenário político do país, a ditatura militar, o movimento pela democratização do Brasil e
a globalização da economia e da cultura. A partir da década de 70, o modelo de
educação era a educação tecnicista. Segundo Aranha (2006), “a educação tecnicista
encontrava-se imbuída dos ideais de racionalidade, organização, objetividade, eficiência
e produtividade”. E de acordo com a autora, o professor é um técnico que, assessorados
por outros técnicos, transmitiam conhecimentos técnicos e objetivos. E nesse contexto,
na década de 70, Pedroso (1998) evidencia que a formação continuada ganha uma
significativa expansão devido ao advento da modernização social, o que exigiu recursos
1064

humanos mais qualificados para atender às demandas do governo militar e os objetivos


da educação.
Já na década de 80, com os avanços da ciência e da tecnologia, inicia-se uma
etapa importante na formação dos professores, os docentes passaram a se mobilizar, a
lutar pelos seus direitos e a participar sobre a questão da educação no país. A partir
dessa época, se intensifica a criação de programas de formação continuada exigindo do
contexto “formar indivíduos capazes de pensar e de aprender permanentemente
(capacitação permanente) em um contexto de avanço das tecnologias e de
desenvolvimento de atitudes e disposições para a vida numa sociedade técnico-
informacional” (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2003). Diante disso, a formação
continuada de professores estava voltada para as demandas específicas dos
professorados, pois as exigências pedia o aprendizado permanente dos docentes, como
forma de sempre estarem buscando o conhecimento.
Apesar dos avanços e do reconhecimento da formação contínua para o
aperfeiçoamento dos docentes, nessa década pesquisas demonstraram a insuficiência
dos cursos de formação continuada, pois as queixas constantes dos docentes foram à
ausência de uma política séria de capacitação nos cursos. De acordo com Gatti e Barreto
(2009, p.201):

[...] os processos de formação continuada desenvolvidos desde os anos de


1980, quer para atualização ou complementação de conhecimento, quer para
preparar a implementação de reformas educativas, não produziram efeitos
esperados. Entre as razões invocadas estão à dificuldade da formação em
massa, a brevidade dos cursos, realizados nos limites dos recursos
financeiros, e a dificuldade de fornecer, pelos motivos citados, ou ainda pelo
nível de preparação das instituições formadoras, os instrumentos e o apoio
necessário para realização das mudanças esperadas.

Nesse sentido, podemos analisar como acontecia o processo de formação


contínua pelos cursos de capacitação oferecidos pelos docentes nos anos 80. Dentre as
dificuldades citadas pelas autoras, há ainda a pouca participação dos profissionais da na
formulação e definições políticas públicas educacionais, relacionando a elaboração de
projetos pedagógicos da escola e o fazer pedagógico como elementos centrais na
formação. E a partir disso, concluímos que as propostas implementadas pelo governo
para a capacitação dos educadores não surtiram efeitos, devido o pouco investimento na
educação no país.
Na década de 90, deparamos com as questões da globalização da economia e da
cultura, e com o desenvolvimento da tecnologia, nesse novo contexto exigiu-se dos
1065

professores novos procedimentos nos estudos e no trabalho. A partir de então, as


universidades brasileiras passaram a reivindicar que nesse local de ensino, passassem a
realizar a formação inicial e continuada dos docentes. Apesar da importância das
universidades na formação dos professores, os cursos ofertados para os educadores não
condiziam com a realidade da escola e com a prática pedagógica. As instituições de
ensino superior ofereciam conhecimentos científicos válidos, mas desvinculados de uma
reflexão continuada sobre a escola e os problemas nela enfrentados.
Outro acontecimento significativo na formação dos professores nos anos 90 foi
às políticas educacionais que abriram as discussões a respeito à formação dos docentes,
seja ela, inicial ou continuada. Segundo Macêdo (2006) os anos 90, também assistiram
ao processo de debate sobre uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
a qual atuou como um dos principais mecanismos para nortear a organização do novo
modelo de educação no nosso país.
Além da LDB, Lei nº 9.394/96 outro documento oficial que traz a ideia de
formação dos professores são os Referenciais para Formação dos Professores, o
documento enfatiza como deve ser organizada a formação dos docentes adequando as
transformações decorrentes na sociedade atual. Em relação à formação continuada os
Referencias para Formação de Professores de (1999, p.131) destaca o seguinte “a
atualização, o aprofundamento dos conhecimentos profissionais e o desenvolvimento da
capacidade de reflexão deverão ser promovido a partir de processos de formação
continuada que se realizarão na escola onde cada professor trabalha [...]”.
Portanto, o processo histórico apresentado mostra que a preocupação pela
formação continuada dos professores durante ao longo dos tempos foi bastante discutido
e está ligado ao contexto econômico, político e social do país em cada época. Na
contemporaneidade onde a busca pela qualidade da educação é exigida continuamente
pelas famílias, empresas e órgãos internacionais, o foco na formação docente tornou-se
algo prioritário para obter êxito no processo de ensino-aprendizagem dentro da escola e
alcançar a média educacional proposta por países mais desenvolvidos com realidade
distinta do contexto brasileiro.
De início a formação profissional em serviço, caracterizava-se por ser um curso
de “reciclagem” e “treinamento” este tinham a característica de serem cursos para
adquirir habilidades e conhecimentos, no curto período de tempo. Nessa perspectiva, os
professores, uma vez na atividade profissional, em determinado momento realizavam
atividades específicas, retornavam à universidade para participarem de cursos em
1066

diferentes níveis, ou frequentavam cursos promovidos pela Secretaria de Educação e/ou


participavam de encontros e congressos que contribuíam para o aperfeiçoamento
profissional.
Em relação, aos programas de formação continuada, o Governo Federal
implantou em 2001 o Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (PROFA),
visando à melhoria e qualidade da formação docente e o aprofundamento teórico-
metodológico para professores e formadores que trabalham com a alfabetização.
As questões sobre a profissionalização e as competências profissionais foram
base para a construção da criação deste programa, a criação do PROFA visava superar a
inadequação da formação inicial do professor alfabetizador.

O programa de formação de professores alfabetizadores é um curso de


aprofundamento, destinado a professores e formadores, que se orienta pelo
objetivo de desenvolver as competências profissionais a todo professor que
ensina a ler e escrever. Por intermédio deste projeto serão oferecidos meios
para criar um contexto favorável para construção de competências
profissionais e conhecimentos necessários a todo professor que alfabetiza
(BRASIL, 2001).

Como visto, o PROFA é uma proposta de formação em serviço, idealizada pela


Secretaria de Ensino Fundamental (SEF) do Ministério da Educação, durante os anos de
1999 e 2001. As contribuições desse programa estão voltadas para o aprofundamento
teórico metodológico dos professores e formadores que trabalham com alfabetização
nas ações Educativa de Alfabetização, Ensino Fundamental e Educação de Jovens e
Adultos (EJA).
Além do PROFA, o Governo Federal lançou recentemente outros programas para
formação de professores alfabetizadores entre eles o Pró-Letramento, Plano Nacional de
Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR) e o PNAIC.
O Pacto Nacional da Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) idealizado em 2010
e posto em execução no ano de 2013 e prossegue funcionando em 2014, é um curso
presencial que atende professores alfabetizadores do I ciclo de alfabetização dos anos
iniciais do Ensino Fundamental. O programa tem duração de dois anos, com carga
horária de 120 horas por ano, as metodologias propõem estudos e atividades práticas.
Os estudos são orientados pelos coordenadores/tutores do respectivo curso, estes
primeiro passam por formação de 200 horas em universidades parceiras do programa
PNAIC, para posteriormente conduzir os trabalhos em conjunto com os professores
alfabetizadores.
1067

O PNAIC visa à melhoria significativa da alfabetização no país, para


concretização desta meta são desenvolvidas diversas ações que possam contribuir neste
processo dentre eles: os direitos de aprendizagem das crianças no I Ciclo de
Alfabetização; os processos de avaliação e acompanhamento da aprendizagem das
crianças; planejamento e avaliação das situações didáticas; o bom uso dos materiais
distribuído pelo MEC (BRASIL, 2010).

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente estudo foi realizado em uma Escola Municipal de Parintins com o


objetivo de compreender como ocorre o processo de formação continuada de
professores que participam do Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC)
e as contribuições desta formação para a prática educativa dos professores.
Para atingir os objetivos propostos neste projeto foi realizada uma pesquisa com
abordagem qualitativa, por ser um método social tem grande destaque nas realizações
de pesquisas que tratam da educação, pois vários estudos nesta área têm apontado as
raízes profundas dos problemas educacionais devido ao pesquisador usarem desta
abordagem para compreender os fatos à sua volta.
Após levantamento teórico sobre o histórico da formação de professores no
Brasil, as políticas e programas vigentes para a formação docente na Educação Básica, o
passo seguinte foi realizar a observação, entrevistas e questionário com cinco (5)
professoras alfabetizadoras selecionadas porque participam do PNAIC e lecionam na
mesma escola.
A observação realizada em sala de aula das professoras alfabetizadoras permitiu
verificar como as educadoras articulavam os conhecimentos teóricos e práticos
adquiridos no curso de formação continuada do PNAIC.

RESULTADO E DISCUSSÕES
.
A primeira questão levantada às professoras foi referente ao curso de formação
inicial e obtenção do título. As respostas foram sintetizadas na seguinte tabela.
1068

TABELA 1- Formação/Graduação.
GRADUAÇÃO ANO
PA-Licenciatura em Artes Visuais 2006
PB-Licenciatura em Geografia 2010
PC-Licenciatura em Geografia 2010
PD-Cursando Licenciatura em Pedagogia 2014
PE-Cursando Licenciatura em Pedagogia 2014
Fonte: Questionário

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para atuar na


educação infantil e nos anos iniciais é necessário ter graduação no magistério em
Normal Superior ou Licenciatura em Pedagogia. Mas a realidade com que deparamos na
escola de Educação Básica é avessa a Legislação Educacional, professores formados em
outras áreas específicas, como no caso das professoras PA, PB e PC, lecionando em
uma área totalmente diferente no qual se formou na universidade.
Esta realidade nos permite questionar quais os critérios são utilizados para
selecionar os professores de diferentes áreas para atuar nos Anos Iniciais. Neste caso na
Alfabetização, na qual requer do docentes conhecimentos e métodos específicos para
orientar o aluno no processo de Ensino Aprendizagem e mais instigante ainda é
propiciar uma formação continuada para estes professores que não obtiveram uma base
sobre alfabetização na formação inicial.
Nas observações realizadas durante o período da coleta de dados na sala de aula
podemos observar a preocupação das educadoras com a alfabetização dos educandos,
das cinco docentes, apenas duas estão cursando a graduação em Pedagogia, as demais
formadas em outras áreas estão se especializando na área de alfabetização e letramento
como mostra o quadro nº2 correspondente as seguintes perguntas: Quais cursos de
aperfeiçoamento você participou? Destas quais contribuíram para prática educativa?
1069

TABELA 2- Formação Continuada


PA PB PC PD PE
Pró-Letramento. Não Não Educação Pró-letramento
Foi o que mais respondeu. respondeu inclusiva e o e o PNAIC.
tempo durou e as PNAIC.
oficinas tinha como
proposito alfabetizar
as crianças do
Ensino
Fundamental.
Fonte: Questionário
Como observado no quadro acima, as três professoras PA, PD e PE, ao longo de
sua carreira como docente já participaram de outros cursos de formação continuada.
Segundo a docente PA, dentre os curso de formação continuada o que mais se destacou
foi o Pró-Letramento.
O Programa Pró-Letramento foi criado na gestão do Presidente Luiz Inácio Lula
da Silva em 2005, o mesmo funcionava como modalidade semipresencial, os materiais
utilizados na formação consistia em materiais impressos, vídeos e atividades presenciais
conduzidas pelos orientadores de estudo dos municípios que integravam as
universidades das redes nacionais. O público alvo desse programa eram os professores
dos anos inicias que atuavam na rede pública, os encontros realizados eram para
orientações de estudo, debates e planejamento de futuras ações.
Já as professoras PD e PE, relataram no questionário que o curso de formação
continuada que está contribuindo na prática pedagógica é o PNAIC, este programa de
formação continuada foi lançado em 2012 pelo governo federal, e posto em prática no
ano de 2013 e segue funcionamento em 2014, este visa formar os educadores dos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental nas áreas de Língua Portuguesa e Matemática, com o
objetivo de alfabetizar e letrar crianças até 08 anos de idade no final do I Ciclo de
Alfabetização do Ensino Fundamental. O PNAIC apresenta como meta:

Reduzir a distorção idade-série da educação básica; melhorar o IDEB;


contribuir para o aperfeiçoamento da formação dos professores
alfabetizadores; e construir propostas para definição dos direitos de
aprendizagem e do desenvolvimento das crianças nos três primeiros anos do
ensino fundamental (BRASIL, 2008).
1070

Na cidade de Parintins onde se realizou a pesquisa com as professoras


alfabetizadoras, o PNAIC iniciou em Agosto de 2013, os encontros consistiam de aulas
teóricas e oficinas pedagógicas de como confeccionar materiais e trabalhar os conteúdos
de português direcionado a alfabetizar e letrar alunos do 1º ciclo de alfabetização.
Sobre as contribuições do PNAIC para a prática pedagógica das professoras
obtivemos as seguintes respostas.
TABELA N°3- Contribuições PNAIC.
PA PB PC PD PE
Está Posso dizer que Nos ajuda a Trazendo uma Esta
oferecendo esse programa montar nova visão de contribuindo
muito está estratégias de como com novos
conhecimento e contribuindo aprendizado, alfabetizar e conhecimentos e
as oficinas para minha em cada aula letrar os práticas que
proposta ajuda prática em sala um educandos. darão novos
na prática de aula me aprendizado direcionamentos
pedagógica. As dando suporte diferente. no processo de
oficinas têm teóricos e aprendizagem.
como tema metodológicos
brincando e muito rico de
aprendendo. conhecimento.
Fonte: Questionário
Na fala das professoras o pacto auxilia a prática pedagógica, orientando
estratégias e novos aprendizados como alfabetizar e letrar os alunos. “É com intenção de
assegurar uma reflexão mais minuciosa sobre o processo de alfabetização e sobre a
prática docente, garantindo que todas as crianças estejam alfabetizadas até oito anos de
idade, no final do 3°ano do ensino fundamental, se criou o Pacto Nacional Pela
Alfabetização na Idade Certa” (BRASIL,2012) .
Como visto, os objetivos principais do PNAIC é capacitar os docentes para
alfabetizar e letrar crianças de 6 a 8 anos de idade, independente de sua classe social,
raça e condição socioeconômica. Além, da formação continuada oferecida aos
professores dos anos iniciais, os mesmos recebem auxílio financeiro de R$ 200,00 reais
mensais, como incentivo para evitar a desistência do programa de formação, e contribuir
na compra de materiais pedagógicos quando houver necessidade.
1071

Uma questão relevante foi apontada pelos professores durante o


acompanhamento dos encontros mensais de formação, a desistência de professores
associada à rotatividade na rede municipal. Com a mudança da gestão municipal até
metade de 2013 alguns professores haviam desistido do curso devido as transferências
para os anos finais do Ensino Fundamental, Educação Infantil, Educação de Jovens e
Adultos sendo que o critério para permanecer no PNAIC é lecionar para o I Ciclo de
Alfabetização.
A organização do PNAIC fica sob responsabilidade da Secretaria Municipal de
Educação de Parintins (SEMED/PIN), encarregada de escolher os tutores para
direcionarem os estudos dos professores alfabetizadores e providenciar o local para
estudos.
Os tutores ou coordenadores do PNAIC/Parintins receberam primeiramente uma
formação inicial em Manaus, capital do Amazonas, o foco principal da formação é
refletir sobre o papel do orientador de estudo no acompanhamento e auxílio ao professor
na sua prática pedagógica diária. A carga horária total do curso dos orientadores de
estudo são de 200 horas, sendo o curso inicial de 40 horas; 04 encontros de 24 horas;
seminário final do município de 08 horas; seminário final do Estado 16 horas; 40 horas
de estudo, planejamento, realização das atividades propostas. O objetivo principal dos
coordenadores é orientar os professores do PNAIC, na realização das atividades e
estudos no curso totalizando 240 horas distribuídas em encontros presenciais, totalizado
168 horas distribuídas em 16 unidades; 56 horas de estudo e atividades extra sala e
seminários finais de 16 horas.
A professora PC, quando questionada sobre as contribuições do conhecimento
teórico respondeu: “nem tanto, pois os autores estudados são poucos usados e a
realidade na sala de aula é bem diferente”, na conversa com a mesma acrescentou
também que os teóricos estudados não são novidades, pois já conhecia de estudos
realizados em formação anteriores e está apenas relembrando os conteúdos a partir de
outra perspectiva.
Em relação, as dificuldades em associar teoria & prática pedagógica, as
professoras relataram o seguinte:
1072

TABELA Nº 5- Teoria & Prática Pedagógica.


PA PB PC PD PE
Não. Porque já Às vezes, o Sim. Como foi Em parte. Em parte. Pois
conhecemos os espaço e a falado, a teoria Porque às nem sempre o
conhecimentos escassez de é bem vezes a escola educador é
teóricos recursos diferente da não dispõe de compreendido
estudados, só didáticos prática. materiais no desenrolar
estamos agora dificultam em Geralmente os necessários de sua prática
aprimorando na associar resultados não para um no âmbito
prática conhecimentos são tão ensino de escolar.
pedagógica. teóricos e satisfatórios qualidade aos
práticos obtidos como se alunos.
no processo de espera.
formação
continuada ao
trazê-lo a
prática
educativa.
Fonte: Questionário
Como exposto, no quadro de nº5 a maioria das professoras são unânimes em
relatar que sentem dificuldades em associar teoria à prática pedagógica. O fator
principal no qual as professoras esbarram quando sentem dificuldades em trabalhar os
conhecimentos teóricos adquiridos no curso de formação na prática educativa, é a
própria escola, a docente PB ressalta o seguinte o espaço e a falta de recursos didáticos
dificulta quando se quer trabalhar melhor na instituição com os alunos. De acordo com
Thuller (2002, p.89).
As reformas atuais confrontam os professores com dois desafios de
envergadura: reinventar sua escola enquanto local de trabalho e reinventar a
si próprios enquanto pessoas e membros de uma profissão. A maioria deles
será obrigada a viver em condições de trabalho e em contextos profissionais
totalmente novos, bem como a assumir desafios intelectuais e emocionais
muito diversos daqueles que caracterizavam o contexto escolar no qual
aprenderam seu oficio.

Conforme afirma a autora, estamos diante de novas reformas, de um novo


paradigma os professores, a partir de agora, devem reinventar a escola como local de
trabalho e a si próprios como profissionais isso permite direcionar novos objetivos de
1073

aprendizagem e novas metodologias de trabalho na organização da instituição. Desse


modo, a questão é mudar sua prática anteriormente direcionada a um trabalho rígido
onde não tinham possibilidades de crescimento e não atendiam as necessidades dos
alunos, para uma prática pedagógica capaz de melhorar o seu ambiente de trabalho para
crescer como profissional transformador de sua prática pedagógica.
Um dos principais objetivos da criação de cursos de formação continuada para
professores alfabetizadores no Brasil, além de sanar os problemas de analfabetismo é
preparar os educandos para os indicadores como: Provinha Brasil, Prova Brasil que
compõe o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), a Provinha Brasil é
realizada para os anos iniciais no 2º ano do I ciclo, o Governo Federal implantou essa
avaliação como instrumento para verificar o processo de alfabetização das crianças,
após um ano de escolarização.
Assim, as professoras participantes desta pesquisa se posicionaram favoráveis
em relação à criação e execução do Pacto, pois reconhecem a necessidade de programas
como este para possibilitar aos professores a elaboração de estratégias que colaborem no
processo de alfabetização e letramento dos alunos. As críticas referentes a esse
programa na visão das docentes se referem à elaboração e planejamento que ocorrem
em nível nacional desconsiderando as especificidades regionais e locais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Pacto Nacional para a Alfabetização na Idade Certa é uma intervenção


necessária para possibilitar ao professor subsídios teóricos metodológicos que auxiliem
no processo de alfabetização e letramento dos alunos no I Ciclo de Alfabetização.
É possível inferir o Pacto como uma iniciativa positiva, mas o mesmo ainda se
apresenta no formato de curso pontual e específico, pois privilegia a individualidade, e
responsabiliza o docente pelo fracasso e sucesso do aluno, omitindo também como
fatores necessários para a melhoria da educação, as transformações na infraestrutura das
escolas públicas, a qualidade nos materiais didáticos, concretização da gestão
democrática e valorização dos professores.
1074

REFERÊNCIAS

ALFERES, Marcia Aparecida. Formação Continuada de Professores


Alfabetizadores: Uma Análise Crítica do Programa Pró-Letramento. Dissertação de
Mestrado (Mestrado em Educação). Universidade Estadual de Ponta Grossa, 2009.

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Brasil.3.ed-ver e ampl. São Paulo: moderna, 2006.

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LDB 9.394/ 96. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília,
1996.

BRASIL, Presidência da República. Ministério da Educação. Referenciais para a


Formação de Professores. Brasília, 2001.

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Series Iniciais do Ensino Fundamental: Guia Geral: MEC/SEB/SEED, 2007.

______ Pró Letramento: Programa de Formação Continuada de Professores dos


Anos/Séries Iniciais do Ensino Fundamental: Alfabetização e Linguagem. Brasília.
MEC/SEB, 2007.

BRASIL, Secretaria de Educação Básica. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade


Certa: Formação do Professor Alfabetizador: Caderno do Professor Alfabetizador/
Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, Diretoria de Apoio à Gestão
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GATTI, Bernadete Angelina; BARRETO, Elba Siqueira de. Professores do Brasil:


impasses e desafios. Brasília: Unesco, 2009.

LIBÂNEO, José Carlos; OLIVEIRA, João Ferreira de [et all]. Educação Escolar:
políticas, estrutura e organização. 6. São Paulo: Cortez, 2008.

PEDROSO, R. de J. Perspectiva Crítico-Reflexiva na Formação Continuada de


Professores da Educação Básica: Trabalho de Formação Continuada realizado no
Município de Telemâco-Borba-PR. Dissertação. (mestrado em educação). Universidade
de Ponta Grossa, 1998.

THURLER, Mônica Gather, PERRENOUD, Philippe. As competências para ensinar


no século XXI: a formação dos professores e o desafio da avaliação. Porto Alegre:
Artmed, 2002.
1075

Relato de experiência

Gestão Escolar: a formação continuada tecendo a gestão educacional coletiva.

Roseli Trevisan Marques de Souza


Mestranda UNINOVE
Orientação Prof. Dr. Antonio
Joaquim Severino
Grupo de pesquisa em Filosofia da
Educação (Grupefe) na
Universidade Nove de Julho.

RESUMO: O presente resumo visa à submissão de uma experiência de formação


continuada que contemplava a melhoria dos processos de gestão escolar pela formação
em serviço de gestores e professores, com vistas no preparo para o exercício da
cidadania preconizado na LDB 9394/96. Entendemos que essa proposta de formação
continuada torna-se relevante frente ao cenário político social que vivenciamos, pois a
educação pública nos moldes que se apresenta acaba tendo por resultado a reprodução
do status quo capitalista, excluindo qualquer perspectiva de superação das tendências
unidimensionais predominantes no mundo atual. A formação foi iniciava com a reflexão
do cotidiano escolar e dessa reflexão participaram outros sujeitos da realidade territorial.
São eles: alunos, funcionários, pais ou responsáveis e a comunidade local. A ação
formativa foi proposta pela SEE/SP em parceria com o Instituto Crescer e British
Council e denominava-se “Liderança de Gestores da Escola Pública”. Apesar de, a
princípio, tal demanda sofrer rejeição do grupo de professores, no decorrer das reuniões
formativas a rejeição foi superada. O diálogo entre os sujeitos e a elaboração conjunta
do plano de ação possibilitou a mudança da postura defensiva. Ou seja, numa
perspectiva contra-hegemônica os sujeitos envolvidos vivenciaram a construção da
cultura cidadã quando refletiram a realidade, elaboraram e executaram um plano de
ação interventor e significativo ao contexto. Houve destaque à mediação gestora e ao
protagonismo juvenil durante o processo formativo, fatos representativos à construção
da cidadania.
1076

I- Introdução

Segundo a Constituição Brasileira de 1988 art. 205, reiterado no art. 2º da


L.D.B. 9394/96, a educação escolar tem como uma das finalidades fundamentais a
preparação do jovem para o exercício da cidadania. Quando se observa, no entanto, a
prática cidadã em parte significativa das escolas, identifica-se a distância entre o
descrito e o efetivado. Diante da constatação a pergunta inevitável ocorre: Por que
existe esse distanciamento entre o descrito na legislação e o efetivado no interior das
escolas quanto ao exercício da cidadania?
Para responder tal questão podemos considerar dois aspectos: O primeiro
aspecto, talvez, esteja no sentido atribuído ao verbo “preparar” para a cidadania. O
verbo na origem latina tem como definição aprontar, arranjar, planejar1 . Esse sentido
no texto legal remete ao conflito entre o proposto e o realizado, pois a preparação nos
traz à idéia de formação para realização futura e não à construção presente da ação
cidadã. Desta forma, não se pode futuramente exercer algo que não se construiu
efetivamente no presente. O segundo aspecto a ser considerado nessa reflexão vem da
história brasileira não ter como cultura marcante uma população que pratica a cidadania
como exercício social, e com base nesse segundo aspecto pauta-se a explanação a
seguir.
A ineficiência participativa na educação escolar e na sociedade brasileira como
um todo decorre de processos históricos estagnadores, como foi dito, desta forma, uma
educação cidadã dependerá do atendimento de três exigências: A primeira seria romper
com o passado estagnador. Esse rompimento dependerá de processos reflexivos entre os
membros de uma coletividade, inseridos num dado contexto escolar, sobre o passado, o
presente e finalmente sobre o que se quer construir; a segunda seria a formação dos
professores e dos gestores mais conscientizados das finalidades da educação em
contextos sociais excludentes e a terceira, que é a prática cotidiana da escola conduzida
mediante diálogos intensos e sistematizados com a comunidade envolvida para a
construção da cidadania.

1
CUNHA, Antonio Geraldo Cunha. Definição encontrada no Dicionário Etimológico Nova Fronteira da
Língua Portuguesa 2ª Edição, 1986.
1077

II- A educação pública no cenário histórico brasileiro

A deficiência participativa instaurou-se no Brasil após a trajetória histórica de


repressão política e crescente domínio capitalista; um período longo de ditadura militar,
seguido de abertura política sem eleições diretas, num primeiro momento, culminando
no advento neoliberal. A sociedade brasileira foi desconstruída a ponto de não haver
entendimento do que significa uma realidade verdadeiramente democrática.
A educação pública, nesse cenário, ficou comprometida em vários aspectos,
porém a mais discutida é a baixa qualidade regulada pelo baixo desempenho dos alunos
em avaliações externas. Segue um breve relato do cenário histórico educacional. O
ensino formal em nosso país surgiu para atender prioritariamente à elite visando à
manutenção do status quo das classes privilegiadas. A educação popular foi relegada
pela minoria dominante e um cenário social de discriminação e segregação foi montado,
promovendo exclusão da grande massa da população do Brasil que não tinha acesso à
educação. O acesso à educação foi ampliado a partir de 1970, porém a qualidade não foi
privilegiada e hoje é uma das maiores preocupações postas nos discursos
governamentais. A população esteve passiva diante do exposto e, atualmente, há
necessidade do resgate da qualidade educacional.
Nosso assunto, no entanto, foca em especial na questão da cidadania,
entendendo que esta questão reflete significativamente na qualidade, à medida que
promove reflexões e ações produtivas que favorecem o contexto escolar e local
tornando-os significativos à promoção de aprendizagem.
A legislação supracitada, bem como de discursos pedagógicos e literatura
variada a respeito de cidadania, confirma o entendimento que a escola é vista como o
principal veículo de resgate ao exercício da cidadania. Esse exercício democrático
depende, no entanto, de aprendizagem cidadã. Depende de vivência cidadã.
A escola está sendo convidada ou, talvez, impelida a promover a educação para
a democracia. Temos, porém, as seguintes questões: É possível uma escola democrática
dentro de uma sociedade autoritária e excludente? É possível o educador ensinar sobre
cidadania, se este mesmo professor/educador foi formado sob a égide do autoritarismo e
atualmente sob a égide neoliberal? Temos diante da escola pública um grande desafio
colocado sobre os ombros de profissionais da educação a serem estruturados para
enfrentá-lo.
1078

A formação continuada no contexto escolar se torna, na experiência que será


descrita, uma das formas de enfrentamento ao desafio posto.

III- A educação para a cidadania e para a democracia

Severino nos diz que há íntima relação entre educação e sociedade. Para o autor
a ciência humana ao longo da história promoveu práticas informais de educação para
atender às demandas sociais. Com o advento da formalização da educação esta continua
mantendo a idéia de vínculo estabelecido com à humanidade para o fortalecimento da
sociedade. (SEVERINO, 2012, p.71).
Nesta perspectiva de pensamento é demonstrada a importância do processo
educacional, mas pautado no ideário da pedagogia histórico-crítica. Esta pedagogia
pressupõe estimulo à participação e ao compartilhamento de responsabilidades;
coexistindo os sujeitos do território escolar de forma interativa buscando significado à
vida humana. Saviani, no que se refere à pedagogia histórico-crítica nos diz:
A educação é entendida como um ato de produzir, direta e intencionalmente,
em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida e coletivamente
pelo conjunto de homens. Em outros termos isso significa que a educação é
entendida como mediação no seio da prática social global. A prática social
põe-se, portanto, como o ponto de partida e o ponto de chegada da prática
educativa. Daí decorre um método pedagógico que parte da prática social em
que o professor e o aluno se encontram igualmente inseridos, ocupando,
porém, posições distintas, condição para que travem uma relação fecunda na
compreensão e no encaminhamento da solução de problemas postos pela
prática social. (SAVIANI. 2011, p. 421 e 422)

Há nesse processo educacional uma construção de significados e nessa


construção não cabe uma relação estanque entre o professor, o aluno e o espaço (sala de
aula). Este espaço composto somente por estes sujeitos é limitador de criatividade e da
construção histórica
O processo educacional, com vistas no social, pressupõe novos espaços e novos
sujeitos envolvidos numa aprendizagem cidadã para o exercício da democracia. Espaços
de aprender vinculados à escola com parceiros reflexivos e atuantes, que estão nas
igrejas; organizações não governamentais; cooperativas de reciclagem; sociedades de
amigos de bairro; nos pais ou responsáveis, ou até mesmo nos times que se unem para
praticar esporte na quadra da escola. Grupo que, unido, propiciará a tecitura coesa do
contexto, um dos requisitos importantes na construção da educação significativa para a
construção social inclusiva em prol da maioria.
1079

O encontro entre os sujeitos citados é primordial à transformação da localidade e


da globalidade. Lembrando que a transformação ocorre pela reflexão sobre o espaço
territorial, sobre a realidade desse espaço e sobre a ativa participação nesse espaço.
Uma relação nesse patamar promove criatividade e exige uma programação específica
ao grupo, bem como um currículo pensado coletivamente. (SACRISTÁN, 1991, p. 91).
Esta postura educacional ressignifica a localidade e proporciona aos seus participantes a
possibilidade de trânsito na realidade global. Alunos, professores e comunidade tendo
em mente que a educação de qualidade se faz pelo trabalho pedagógico reflexivo e
atuante, que se concretiza em produções de bens diversos ao grupo, sejam de cunho
epistemológicos, axiológicos ou simbólicos, configurando a práxis. (SEVERINO,
2012, p. 69).
Esse movimento social se efetiva no exercício da dimensão política da educação.
A dimensão política da educação propicia a formação para o entendimento das relações
de poder existentes na sociedade e a necessidade de superação destas relações de poder
pela consciência da realidade e sobre a possibilidade de intervenções na realidade.
Fazer-se ouvir; ter voz; cumprir os deveres; fazer valer os seus direitos; conquistar seu
espaço social; participar efetivamente nele; construir a história como sujeito
emancipado e feliz. Ou seja, extrapolar os muros escolares por meio de encontros
formativos entre escola e comunidade com pautas e planejamentos elaborados
conjuntamente, conforme diagnóstico da realidade posta. Nessa perspectiva uma
trajetória foi traçada.

IV- Formação coletiva no contexto escolar

O presente relato tem por finalidade apresentar a trajetória traçada. Houve a


observação de duas escolas por sete meses para cumprir a proposta do curso “Liderança
de Gestores da Escola Pública” da SEE/SP. As duas unidades escolares com alunado
em situação socioeconômica similar, devido à proximidade dos estabelecimentos de
ensino que apresentavam, no entanto, segundo Idesp de 2010 e 2011, desempenho
acadêmico diferenciado.
A interação com o grupo escola e comunidade, por meio do material proposto ao
longo do programa possibilitou a visualização da realidade na qual estávamos inseridos
e a encontrarmos meios, com apoio de todos, para intervenção na realidade posta;
elaboramos um plano de ação.
1080

O material de formação era composto de questionários voltados ao entendimento


da realidade local e nos reunimos com os vários segmentos escolares e locais, para
diálogo a respeito da escola, e da qualidade de ensino que era oferecida.
Esse caminho que trilhamos propiciou uma formação coletiva, entendemos que o
modelo de gestão interferiu significativamente nos resultados finais e no envolvimento
do grupo de professores; um modelo que privilegiou a interação por meio do diálogo e
debates em plenárias, mediando constantemente o processo interativo.

V- Passos e procedimentos

Os passos iniciaram com reunião entre supervisora e gestora da unidade escolar.


Nós, supervisora e gestora, conversamos sobre a proposta de um trabalho voltado para a
ação coletiva, tendo por base em nossa discussão alguns questionamentos paraque fosse
identificada sob qual perspectiva a diretora visualizava a escola e sobre qual perspectiva
ela gostaria de visualizá-la. Ela enfatizava na reunião que o alvo dela era uma escola
com um clima organizacional propicio à aprendizagem construída coletivamente.
Depois, de nosso diálogo, agendamos reuniões com o grupo gestor: nas quais
passamos o que havíamos discutido para os outros colegas e os mesmos argumentavam
a respeito proposta inicial. Argumentavam sobre a visão e as expectativas de cada um
sobre a escola e sobre a atuação particular. Esse segundo grupo de discussões e
reflexões era composto por supervisor, diretor, coordenadores, vice-diretores e professor
mediador comunitário.
Diretrizes elaboradas, nós agendamos uma nova reunião em ATPC, com os
professores da unidade escolar. O grupo de professores apresentava as várias sugestões,
e tudo o que os incomodava dentro da unidade escolar. Um diálogo aberto, esclarecedor
e com propostas de mudanças. Os professores manifestaram desejo de refletir
coletivamente o caminho para que a aprendizagem do aluno ocorresse e fosse
mobilizadora da transformação do indivíduo em sujeito e da sociedade excludente em
inclusiva.
Agendamos uma nova ATPC, conforme acordado com a presença da
comunidade escolar e local. Participaram da reunião: agentes de organização escolar,
alunos, pais e agentes da comunidade, além de gestores, professores e supervisor de
ensino. O mesmo processo anterior ocorreu, porém nesse momento trazíamos uma pauta
que ordenava com cada etapa da ação reflexiva junto ao grupo envolvido. Na pauta
1081

constava um momento para a sensibilização do grupo para a realidade escolar. Num


segundo momento houve questionários sobre as dimensões didáticas e comunicacional.
Questionários, cujas respostas eram motivo de debates numa plenária. Os debates
visavam encontrar o foco, ou focos mais frágeis do contexto escolar que mereceriam
ser parte de um plano de ação para superação das fragilidades. Esse processo dialógico
trouxe, finalmente, à luz o que se propunha era precário no cenário escolar e propiciou
várias ações que determinaram o fazer pedagógico da U.E. focafo na superação dessa
precariedade.
Dentre as ações postas estava a observação da sala de aula como suporte da
equipe gestora ao professor no processo pedagógico. O processo de observação contava
com planejamento prévio de uma aula; planejamento realizado pelo professor e
submetido à apreciação do coordenador que fazia suas considerações em diálogo com o
diretor e supervisor de ensino; produzindo novas considerações. Após considerações
finais do grupo, o mesmo se reunia com o professor para que ele mesmo explanasse o
objetivo de sua prática e como viabilizaria seu planejamento. Nesse momento, havia
interferência do grupo gestor para alguns pontos de reflexão, no que se refere à
organização dessa aula que foi gravada, visando à tematização da prática2. A sala de
aula foi observada e o professor teve o suporte da equipe gestora em sala de aula. Todos
assistiram a aula gravada e participaram do momento de feedback do processo para
redirecionamento de ações e customização do processo à realidade.

VI- O Foco da Análise

Meu foco, porém, nessa explanação, não está nas ações de observação de sala de
aula, que são importantes ações realizadas no contexto escolar e, certamente, ao
processo ensino-aprendizagem, mote maior de cada escola. O foco aqui está no que
mobilizou a ação pedagógica significativa; diante do descrito entendemos que a prática
educativa foi tecida no exercício de sociabilidade. Como disse Severino: “(...) a atuação

2
Tematizar a prática é um dos jargões mais comuns nas atividades de formação continuada. Segundo
Telma Weisz, doutora em Psicologia da Aprendizagem e do Desenvolvimento e formadora de
professores, isso nada mais é do que a "análise que parte da prática documentada para explicitar as
hipóteses didáticas subjacentes ao trabalho do professor". Ou seja, refletir sobre o dia-a-dia dentro da sala
de aula. Trecho do artigo de Gustavo Heidrich, publicado em Setembro de 2008 na revista Nova Escola
no endereço http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/tematizacao-pratica-
428225.shtml
1082

educacional pode ter efeitos desestruturadores, tornando-se fatos de mudança social.”


(SEVERINO, 2012, p.72). O papel dos educadores foi de manter o diálogo vivo entre
os diferentes intra e extramuros na busca da construção de um espaço político de
aprendizagem. Construir uma formação consubstanciada por valores éticos, políticos e
socais importantes aos membros escolares e locais; um fazer político.
Para Hannah Arendt, há relação entre a polis e o cidadão e a partir desta relação
a polis representa o espaço para o exercício da política; da cidadania que acontece pelo
princípio de isonomia. A isonomia garante a igualdade entre entes desiguais, por isso a
polis representa um espaço de liberdade, no qual todos apesar das diferenças dialogam
para um bem comum. Desta forma, entende-se que a cientista política, como gosta de
ser chamada Hannah Arendt, vê a liberdade e a política como dois conceitos integrados
que propiciam a ação humana em favor da coletividade.
Como Paulo Freire enfatizou em sua obra, Pedagogia do Oprimido (1983), uma
educação popular com vistas no exercício da cidadania pauta-se em levantamento
coletivo das necessidades e nas expectativas de seus sujeitos durante as constantes
trocas de informações, experiências e conhecimentos. Temos, na ideia acima, e, no que
descrevemos abaixo, a retomada do conceito e da prática política evidenciada na
“polis” grega; a relação comunidade/escola para a formação cidadã.
Esse modo de conceber e praticar a política tem em seu centro a educação
dos cidadãos: um esforço permanente para fazer com que todos aprendam a
valorizar o diálogo e o alcance de consensos como meio de resolver conflitos,
organizar e viver a vida. É uma retomada da idéia grega de política, que,
como escreveu a filósofa Hannah Arendt na Condição Humana, explora ao
máximo a natureza eminentemente política, comunitária, dialógica,
comunicativa do homem: zoon politikon. Uma idéia que não tem como se
afirmar sem se unir à perspectiva da Paidéia, ou seja, daquele processo
continuo dedicado à formação integral do homem. Educação para
cidadania(...). (NOGUEIRA, 2001, p. 61,).

A participação e a possibilidade de intervenção de todos no processo dialógico


trouxe ao grupo a conscientização da realidade e sentimento de pertença, aspectos
importantes para o comprometimento efetivo dos atores. A execução do plano foi
acompanhada e avaliada em cada etapa, por reuniões constantes promovidas e mediadas
pela gestão escolar. Foram instalados painéis, nos quais afixaram registros de acesso
irrestrito do que havia sido feito e o que deveria ainda ser concluído. Um processo de
reflexão-ação da coletividade para a formação cidadã, que priorizou em sua execução o
que o aluno trazia de conhecimento. Ou seja, o protagonismo juvenil.
1083

VII- Conclusão

Nas escolas que acompanhei, os diretores são iniciantes e com personalidades e


perfis diferenciados, porém atuantes e dispostos a mudar a realidade com trabalho
comprometido. Um deles, no entanto, estava sempre receptivo ao diálogo com o grupo
escola e comunidade nos processos formativos e fora deles, independente das críticas ao
seu trabalho que surgiram nessa construção educacional; o outro diretor não tinha tempo
para as reuniões formativas com os atores do cenário escolar e local, outros gestores
assumiram esse papel e os resultados finais foram aquém do esperado, apesar dos
esforços desses membros. O plano de ação não vingou. Não houve acompanhamento
das ações postas. O trabalho individualizado prevaleceu na sala de aula e a dinâmica
estagnadora de reflexão e aprendizagem não foi alterada no contexto escolar e esse
relato completo seria assunto de uma outra experiência.
Nesse relato consideramos o fazer pedagógico que obteve êxito, pois foi parte
de uma formação conjunta, uma formação que partiu da reflexão e que gerou ações
significativas para o grupo escola e comunidade com foco na interação do grupo e
finalmente na promoção de aprendizagem. O êxito adveio de dois fatores. Primeiro a
visão holística e sistêmica da educação conquistada nas formações. O segundo a
execução de ações metódicas e sistemáticas. Ambos fatores visarvam ao aprimoramento
da ciência e da arte de educar. O desenvolvimento de cada etapa trazia ao grupo o
entendimento de que realmente a educação não se efetiva sem a ação conjunta humana.
A ação conjunta propicia a transformação do homem e do mundo como disse Paulo
Freire.
Apesar da vertente inicial da formação pautar-se num ideário de gestão
empresarial, identificados pelos exemplos que seguem. São eles: o formato de “Análise
SWOT”3, e o termo “liderança” , e ainda representar ao grupo de professores uma
ação impositiva, essa formação, no entanto, em seu desenvolvimento assumiu, na escola
exitosa, um caráter dialógico, nos moldes de Paulo Freire e um caráter da filosofia da
práxis posta por Gramsci, devido ao referencial teórico que pautou-se o grupo gestor na
construção da ação formativa.

3
Idealizada por Albert Humphrey . Em Administração de Empresas, a Análise SWOT é um importante
instrumento utilizado para planejamento estratégico que consiste em recolher dados importantes que
caracterizam o ambiente interno (forças e fraquezas) e externo (oportunidades e ameaças) da empresa.
A Análise SWOT é uma ferramenta utilizada para fazer análise ambiental, sendo a base da gestão e do
planejamento estratégico numa empresa ou instituição. http://www.significados.com.br/swot/
1084

A figura do intelectual orgânico também foi identificada na ação do diretor de


escola e dos gestores que o assessoravam. Foram atores sociais responsáveis pela
construção reflexão política. Os gestores dessa unidade escolar foram mediadores e não
líderes de uma ação político-pedagógica e o êxito foi coroado pelas metas do Idesp
atingidas nos anos de 2012 e 2013. O índice do Idesp é um fator muito questionado no
contexto da escola pública e também por uma parcela de professores da comunidade
acadêmica, porém nesse relato o índice se constitui como uma evidência do sucesso na
aprendizagem dos alunos após a experiência vivenciada.
Houve modificação da cultura escolar e da localidade no que se refere à
participação. O trabalho coletivo foi realizado sob o enfoque da filosofia da práxis de
Gramsci que propiciou a humanização, a autonomia e a realização, independente das
diferenças e particularidades, pois para Gramsci nenhuma diferença pode justificar
qualquer tipo de desigualdade ou impedir a participação de todos na construção da
história.
A realidade local foi conhecida e refletida. O trânsito nessa realidade para
conhecimento da mesma foi possível pelo estabelecimento do diálogo constante entre
seus atores; discutir sobre a realidade foi a melhor forma de refleti-la para, então,propor
um plano de ação que norteou a prática interventora e emancipadora de seus integrantes;
foram sujeitos construtores da nova realidade. Foram esses passos que trilhados para
efetivação da experiência formativa descrita. Passos que levaram ao exercício efetivo da
cidadania, pois foi construída pelos envolvidos e não somente preparada como
preconiza a LDB e a Constituição Federal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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FREIRE Paulo. Pedagogia do oprimido. Paz e Terra, Rio de Janeiro. 1983.

__________ Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução ao


pensamento de Paulo Freire - São Paulo. Cortez & Moraes, 1979.

___________ Pedagogia da Esperança. Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1997.

GRAMSCI Antonio, Cadernos do cárcere. Rio de Janeiro. Editora Civilização


Brasileira, vol. 1, 1999.
1085

NOGUEIRA Marco Aurélio, Em Defesa da Política. São Paulo. Editora SENAC,


2001.

TORRES, Rosa Maria (org.). Educação popular: um encontro com Paulo Freire. São
Paulo. Edições Loyola, 1987.

SEVERINO, Antônio J. Educação, sujeito e história. São Paulo. Olho d’Água, 2011.

WEISZ, Telma. Diálogo entre ensino e aprendizagem. São Paulo. Ática, 2000.
1086

Comunicação

O sistema nacional de educação em Anísio Teixeira e a organização da educação


nacional: o que fizemos nós?

Rosenery Pimentel do Nascimento


Universidade Federal do Espírito Santo - UFES
rosenerypimentel@yahoo.com.br

Resumo: Este trabalho pretende problematizar e analisar a concepção e influência de


Anísio Teixeira na organização da educação nacional e no debate para a constituição de
um Sistema Nacional de Educação no Brasil. O recorte escolhido visa compreender os
argumentos defendidos por Anísio Teixeira, colocando em evidência as contribuições do
educador no campo das políticas educacionais. Para tanto, utilizamos a análise
documental e bibliográfica de 12 obras de Anísio Teixeira como fonte para as reflexões
abordadas. As ideias defendidas por Anísio Teixeira refletem um campo permanente de
ação, afirmando a contemporaneidade de suas obras no campo da educação brasileira, a
luta para a consolidação de um projeto nacional de educação que se move ainda hoje em
um terreno de impasses e disputas, criando um movimento histórico e político de
rupturas e permanências. Contudo os desafios indicados por Anísio Teixeira em suas
obras, quanto a democratização da educação brasileira e a defesa pelo direito à educação
pública de qualidade, revelam necessidades presentes em nosso tempo. Nesse sentido,
suas proposições podem criar em nossa atualidade uma lente de aumento para que os
dilemas educacionais não sejam banalizados situando a relevância de tomar a educação
como foco e instrumento de luta cotidiana, indicando a necessidade de aprimoramento
do modelo federativo brasileiro.
Palavras-chave: Anísio Teixeira. Sistema Nacional de Educação. Políticas
Educacionais.

1 APRESENTAÇÃO

A experiência histórica e política que retrata a trajetória de Anísio Teixeira o inseriu


ativamente no debate sobre a organização da educação nacional. A persistência pela
constituição de um Sistema de Educação democrático foi central em suas posições e
1087

ações dentro do cenário educacional.


Conforme analisou Darcy Ribeiro (1960, p. 234):
A obra de Anísio Teixeira constitui o mais profundo esforço de compreensão
das condições em que atuam as nossas instituições educacionais e das
perspectivas de desenvolvimento cultural que se abrem ao País. É feita,
porém, quase exclusivamente, de estudos circunstanciais, escritos ao calor
das inúmeras campanhas em que se empenhou como peça de combate e
tomadas de posição diante dos mais diversos problemas educacionais.

Nessa perspectiva, Anísio Teixeira discutiu as questões do campo educacional


conectando passado e presente. Tomou em suas análises a constituição do processo
educacional no Brasil como um tempo em constante movimento. A participação de
Anísio Teixeira no debate de formulação e instituição da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação de 1961, que percorreu um longo processo até a sua promulgação, vem
elucidar a influência de suas posições neste processo, traremos como foco duas obras do
educador: A educação e a crise brasileira, de 1956, e a Educação no Brasil, de 1969.
Essas obras enfatizaram, em seus artigos, as expectativas, repercussões nos debates que
antecederam a promulgação da Lei e as análise da situação educacional do País pós-
LDB.

2 CONTEXTO POLÍTICO: IMPASSES HISTÓRICOS

Nesse contexto, é interessante destacar o clima de expectativas que foi anunciado na


promulgação da Constituinte de 1946, com a afirmação do dispositivo Constitucional
para fixar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que originou uma
comissão para discussão do projeto da LDB, instalada em abril de 1947, sob a
coordenação do ministro da Educação Clemente Mariani e representações de várias
correntes do pensamento educacional brasileiro (SAVIANI, 1999).

Para Anísio Teixeira, a organização da LDB criava a expectativa de traçar as bases para
a educação nacional e a possibilidade de colocar em prática a descentralização,
assegurando a autonomia num processo de coesão ou integração nacional.
Assim, os argumentos de Anísio Teixeira pela defesa da LDB se constituem a partir do
olhar com que analisou a realidade educacional do País, afirmando:
Fomos, até ontem, algo de inautêntico, de fictício, confundindo a nação com
sua burocracia e as suas leis exequíveis, algumas, e impeditivas do progresso,
outras. A tradição colonial do Estado fiscal e do Estado Cartório continuou
pela Monarquia a dentro e pela República, dividindo em duas a nação real e a
nação legal ou oficial […]. Tenhamos, agora, a coragem de lançar as bases de
1088

uma verdadeira readaptação institucional para o País. Criemos as condições


necessárias a uma ampla experimentação social […]. Com isso, teremos
cumprido o disposto na Constituição que declara livre a educação, dentro das
Diretrizes e Bases que cumpre ao governo federal fixar, com a plasticidade e
flexibilidade indispensáveis a que a escola brasileira, como uma planta viva e
forte, brote cresça da terra, das condições e da experiência brasileira
(TEIXEIRA, 2005, p.111-112).

Desse modo, a LDB assumiu um significado político importante. Seria a tentativa de


superar a transplantação de modelos educacionais e a ambiguidade legislativa definida
entre o plano real e o oficial. Em suas análises, Anísio Teixeira reconhece a função da
lei como instrumento de orientação jurídica, mas que, por si só, não pode ser efetivada,
pelo formalismo e pela rigidez de suas normas. Assim, esse “[...] é um processo a ser
regulado pela consciência profissional e técnica dos que o orientem” (TEIXEIRA,
2005e, p.186).

De acordo com a visão de Anísio Teixeira, entre os começos e recomeços do debate de


formulação da Lei, ofuscou-se uma análise mais profunda do problema da educação
brasileira, o que evidenciou um sentimento de indignação por parte do educador,
registrado em um dos seus muitos diálogos realizados por meio das cartas de Anísio
Teixeira a Fernando Azevedo:
Bahia, 31 de Março de 1951.
Meu caro Fernando:
Recebi um telegrama da União Paulista de Educação, assinado por Solon
Borges dos Reis, comunicando-me o desejo de celebrar o vigésimo
aniversário do seu Manifesto dos Pioneiros da Reconstrução Educacional,
com a presença dos signatários desse documento.
Não tenho o manifesto em mãos, mas julgava que o vigésimo aniversário
seria em 1952 ou, quando muito, em fins de 1951. Que sabe você do assunto?
Antes de qualquer decisão quero ouvi-lo. Não sei se essa comemoração tem
oportunidade. Aí está o projeto de Bases e Diretrizes empacado desde...
quando? O País é aquele mesmo de que dizia Nabuco faltar solidez para
medrarem raízes. Tudo nasce mas não pega. O conselho seria continuar a
plantar. O manifesto é, porém, semente velha, a despeito de tudo nele ser
ainda bom e são. Os pioneiros são hoje veteranos frustrados em seus
sonhos de pioneiros. Escreva-me.
Com um grande e saudoso abraço do muito seu Anísio. CP.-Cx.32,44
(VIDAL, 2000, p.67, grifo nosso).

Esse relato evidencia a insatisfação de Anísio Teixeira quanto ao projeto da LDB e à


falta de prioridade com os assuntos educacionais. Nesse sentido, o debate sobre a LDB
precisava ser mantido para que essa perspectiva não fosse mais uma peça fora do jogo a
ser lembrada pelo que poderia ter sido, se concretizada, e não pelo o que, de fato, tivesse
representado.
1089

Cabe ressaltar que esse percurso foi mais longo do que talvez tenha imaginado o próprio
Anísio Teixeira, pois essa carta foi escrita em 1951, dez anos antes da promulgação do
texto final da sonhada LDB. Em sete de julho de 1952, Anísio Teixeira participou da
sessão da Comissão de Educação e Cultura da Câmara que debatia o projeto da LDB,
Essa era mais uma oportunidade para demarcar suas posições e colocar em pauta a
defesa da educação pública.

Esse debate foi publicado nas obras: A educação e a crise brasileira, de 1956, e em
Educação no Brasil, de 1969, indicando a relevância da discussão, reafirmando o
espaço de luta pelo qual Anísio Teixeira manteve total empenho e envolvimento. Em
suas análises, buscou pontuar as lacunas do nosso processo educacional, criticou o
formalismo burocrático, a uniformidade do ensino que apresentou como consequência
uma educação limitada e de qualidade comprometida.

Nessa perspectiva, Anísio Teixeira reconhecia a importância e os limites do projeto para


a organização da educação nacional e afirmava que a lei:
[…] É uma aplicação moderadíssima da solução que propugnamos.
Representa uma média entre os que desejariam um experiência mais radical e
corajosa e os super-prudentes, temerosos de liberdade. Aplaudo-a com muitas
restrições, mas reconheço que melhorará a situação (TEIXEIRA, 2005, p.
264).

Um ponto marcante desse debate foi o posicionamento de Anísio Teixeira contra os


processos de centralização no campo educacional, que se tornou uma barreira para o
regime federativo no País. Assim, essa perspectiva seria um caminho para assegurar a
autonomia e o fortalecimento do Sistema de Ensino.

Em depoimento na sessão de 7 de julho de 1952, da Comissão de Educação e Cultura da


Câmara dos Deputados, quando se debatia o projeto da Lei de Diretrizes e Bases,
registrado na integra em seu livro A educação e a crise brasileira, de 1956, Anísio
Teixeira foi questionado a pontuar sua posição sobre várias perspectivas que
compunham o debate da lei.

Dentre as questões levantadas, destacamos a pergunta do deputado Rui Santos com


relação à definição do que seria, na opinião de Anísio Teixeira, um Sistema de
Educação. Ele diz: “[...] considero a palavra 'sistema', sem dúvida alguma, equivoca,
1090

pois tanto pode significar sistema de ideias, quanto conjunto de escolas ou instituições
educativas” (TEIXEIRA, 2005, p. 270).

De acordo com Saviani (2008), entre os argumentos produzidos por Anísio Teixeira, é
interessante ressaltar as considerações apresentadas. Quando questionado sobre a
definição de sistema de educação, identificou o sentindo da palavra como “equívoco”,
deixando a questão em aberto.

Teria sido essa uma estratégia de Anísio Teixeira em frente ao conjunto de interesses e
em meio às questões que se colocavam em disputa entre o público e o privado, uma vez
que, estando numa arena política e com uma variedade de posições, era necessário criar
um espaço de escuta para suas análises sobre as contradições identificadas no projeto?

Desse modo, não caberia, naquela sessão, aprofundar a questão do Sistema. Questão que
foi por ele elucidada anos mais tarde, em entrevista concedida ao jornal A Última Hora,
em março de 1959, publicada em seu livro Educação no Brasil, quando abordou o
conceito da LDB, afirmando a intervenção do Estado na educação e a LDB como base
do sistema de educação que se constituiria na busca de uma unidade na diversidade.

Vale destacar que a defesa da escola pública por Anísio Teixeira provocou reações
desencadeadas pela polêmica conferência realizada em Ribeirão Preto, em 1956,
incitando posições conservadoras que buscaram a retirada de Anísio Teixeira da
atividade pública.
De acordo com Hemes Lima (1977, p. 178):
Em 1957, o clamor pela Lei de Diretrizes e Bases repercutiu e o projeto
andou mais depressa. Em 1958, o Deputado Carlos Lacerda encaminhou o
substitutivo provocador nos meios educacionais de intensa discussão […].
Respirava-se no substitutivo contundente vocação privatista e confessional.

Esse contexto revelou a complexidade do campo educacional no cenário que compunha


o debate da LDB, uma vez que esse cenário integrava um ambiente de disputas que se
estabeleceu na organização de uma educação nacional, mobilizações foram feitas. Um
exemplo foi o Manifesto de 1959 “Mais uma Vez Convocados”, que criticava a situação
do ensino no País e defendia a fixação de diretrizes e bases e a obrigação do Estado
com a educação. Numa outra direção, acenavam os interesses das escolas particulares e
católicas, que criticavam a ação do Estado para com a educação e buscavam a
1091

subvenção para as instituições de ensino privado.

Nesse bojo, Anísio Teixeira (2011, p. 249-250) expressou sua crítica ao substitutivo
Lacerda que pretendia o fortalecimento da iniciativa privada, coibindo a ação do
Estado, criando o fantasma do monopólio estatal, deixando a cargo das instituições
particulares a tarefa de instalar as escolas, com a subvenção do Estado e sem
fiscalização por parte dele. Para Anísio Teixeira, “[...] nunca o laissez-faire educacional
foi tão completo”.

Diante da conjuntura apresentada, Anísio Teixeira demonstra a sua insatisfação com as


indefinições e o desgaste com que travavam o debate do projeto. Na carta endereçada à
Fernando Azevedo, desabafa:
Rio, 7 de maio, 59
[…] Ah!, meu caro Fernando, cada vez me parece mais inútil todo esse nosso
comum esforço de cooperação, com o Governo. Todos os dias penso em
renunciar. Retém-me, talvez, apenas um senso estúpido de pisar nos espinhos,
já que alguém terá que neles pisar. Mas estou ficando cansado. Reli ontem,
por acaso, à noite, um pouco de Jefferson, em sua correspondência, nos
começos do século XIX. Que fôlego, que visada no futuro, que confiança! E
aqui estamos hoje rodeados de muito do que sonhou o grande democrata e
atolados! Em ideiazinhas, interessezinhos e politiquinhas de padres e
soldados! […] Cp.-Cx. 32, 9 (VIDAL, 2000, p. 126).

Cumpre observar que o contexto que abrigou as formulações da LDB foi construído por
um longo caminho de esperas e disputas de interesses políticos, recebendo várias
emendas e substitutivos. Assim, a correlação de forças entre as diferentes frentes
partidárias criou vários impasses até sua aprovação final, em que, segundo Saviani
(1999, p. 45), “[...] o texto convertido em Lei representou uma 'solução de
compromissos' entre as principais correntes em disputas. Prevaleceu portanto, a
estratégia de conciliação”.
Cabe considerar que a “estratégia de conciliação” em destaque por Saviani (1999) não
se reduz a uma mera convenção de acordos, mas representa a correlação de forças do
jogo político, uma disputa na defesa de um projeto de educação com perspectivas e
interesses distintos. Podemos dizer que, nas análises de Anísio Teixeira, essa visão se
colocava com total clareza.
Em suas análises, Anísio Teixeira identificava a importância da lei, mas ressaltava as
lacunas deixadas nesse processo, quando afirmava que:
O debate, que levou afinal a uma nova Lei de educação- a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação – constitui um singular esforço da sociedade brasileira de
introspecção e de busca da própria identidade. Não se pode dizer que o
1092

esforço tenha sido coroado com êxito. Projeta-se na Lei o estado de divisão
da sociedade. Deixa-se aberta a porta da expansão anárquica de escolas por
iniciativa particular e fazem-se modestas reformas de organização e conteúdo
(TEIXEIRA, 2011, p. 345).

Com a aprovação, Anísio Teixeira (2011, p. 256-257) considerou a LDB uma “[...] meia
vitória mas uma vitória”, embora não tenha conseguido acompanhar a evolução do País
haja vista o tempo que durou a sua tramitação. Constituiu um marco importante na
legislação educacional brasileira, como uma lei de abrangência nacional.

Segundo Saviani (2008, p. 24-25), o Projeto das Diretrizes e Bases apresentou várias
indefinições provocadas pela superposição de concepções políticas, interesses da Igreja
durante o processo, com destaque para discussão sobre a liberdade de ensino, acordos
alinhados aos interesses econômicos e uma variedade de interpretações do termo
Sistema.

Com relação aos aspectos definidos na lei e que poderiam identificar o Sistema,
observamos que não houve uma clareza quanto à sua definição. No Título V que trata
“Dos Sistemas de Ensino”, disposto principalmente nos artigos 11,12,13,14,15 e 16,
predominou a orientação de aspectos administrativos, voltados para a organização dos
sistemas de ensino. Não houve elementos de articulação para a sistematização da
educação na sua totalidade.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse percurso, após a promulgação da LDB, a obra do educador manteve-se firme


em seus propósitos educativos. Embora tenha sido novamente interrompido pelo
autoritarismo imposto pós-golpe militar de 1964, demonstrou grande capacidade de
refazer os passos em novas iniciativas. Clarice Nunes (2000, p. 162) reafirma a
persistência de Anísio Teixeira: “[...] a violência barrou suas iniciativas, mas não
venceu a sua implacável denúncia de que a privação da educação torna impossível até a
simples sobrevivência”.

Desse modo, sobre as tendências e perspectivas identificadas por Anísio Teixeira em


1966, seis anos após a LDB, são definidas por ele como um período propício para
reestruturação do sistema educacional brasileiro, situando o Conselho Federal de
1093

Educação como elemento-chave na articulação da política educacional. Tínhamos o


PNE e a LDB já estruturados. Essa era a possibilidade de se organizar a educação
Nacional e instituir um SNE. Sistema este que continua em nossas expectativas e
perspectivas o que inclui, para nossa época, a lição deixada por Anísio Teixeira (2011, p.
410) em compreender que: “[...] o que chamamos de educação é o esforço para
compreender esse insistente presente”.

Contudo, já vivemos um pouco mais de meio século da aprovação da primeira LDB e


hoje já estamos há 16 anos da atual e ainda vivemos a permanência das grandes tensões
que regularam as politicas educacionais debatidas por Anísio Teixeira. Estaríamos
novamente em frente a uma “meia vitória”. Assim, de acordo com Cury (2010, p. 94),
ao analisar a Lei nº 9.394/96 (LDB).
[...] A lei aprovada acabou por conjugar diferentes vozes com distintas
potências. As vozes dominantes, as recessivas, as abafadas e as ausentes que
a constituem continuam sendo uma 'rede intertextual' […]. O texto aprovado,
cumpre vê-lo como um intertexto cujo jogo de vozes não chega a compor
uma melodia harmônica. Nele há como que uma contenda que se expressa
nas vozes circulantes e contraditórias do intertexto. Afinal, essas vozes
cantam valores diferentes e os sons por elas emitidos não são uníssonos.

Em meio a essa “rede intertextual”, antigos dilemas reaparecem na cena representados


por algumas indefinições no texto que integra a Lei. Como exemplo, podemos citar a
relação entre o público e o privado. Essa questão não fica totalmente definida na Lei nº
9.394/96 (art. 69, art. 70, III), pois ora se afirma que as verbas públicas são destinadas
ao ensino público e ora se abre essa possibilidade para as instituições privadas (art. 70,
VI; art. 77).

No que tange aos aspectos relativos à organização do ensino, foram distribuídas


funções, atribuições e responsabilidades que integram, no conjunto dessas ações, o
termo Sistema, mas não articula esses elementos dentro de uma unidade. Observamos
muito mais explícito um papel de divisão do que de colaboração, pois destaca, em sua
estrutura, uma organização do ensino distribuída em níveis, etapas, modalidades e por
entes federados de forma descentralizada, que não define um SNE.

Assim, podemos dizer que “[...] o Sistema Nacional de Educação integra e articula
todos os níveis e modalidades de educação com todos os recursos e serviços que lhes
correspondem, organizados e geridos, em regime de colaboração, por todos os entes
1094

federativos” (SAVIANI, 2010, p. 780).

Dessa maneira, é importante perceber que a LDB visa à constituição de um Sistema de


Educação e deve buscar as condições para sua construção, mas que, ainda hoje, não
representa tal construção. Segundo Saviani (2008, p. 112), “[…] embora se denomine a
organização educacional brasileira de 'sistema', a verdade é que não existe sistema
educacional no Brasil. O que existe é uma estrutura”.

Com isso, podemos destacar que os diálogos e interlocuções de Anísio Teixeira com
relação à organização nacional da educação marcaram uma posição de análise da
realidade educacional. Em um trecho do seu discurso Autonomia para a Educação,
publicado no livro Educação é um direito, de 1968, Anísio Teixeira faz uma abordagem
sobre a situação da educação no País, tomando-a como base para a fundamentação do
Capítulo de Educação e Cultura da Constituição baiana de 1947. Em suas
considerações, enfatizou a fragilidade democrática do Brasil e a dificuldade em tomar a
educação como função suprema do Estado. Assim, questionou: “[...] que fizemos nós no
Brasil, até hoje, para que essa suprema função do Estado a educação se exercesse?”
(TEIXEIRA, 2009, p. 108).
Desse modo, cabe, então, a indagação: o que fizemos nós diante da tradição educacional
brasileira de tantos recomeços em meio aos impasses de uma história da educação que
foi constituída a partir de diferentes conjunturas políticas e transformações na
configuração do Estado brasileiro? Dessa maneira, em que medida é possível afirmar:
Anísio voltava-se para o futuro em busca de uma democracia até então
inexistente na sociedade brasileira. Esse movimento que se projeta em
sentidos contrários tem seu ponto de intersecção na conciliação entre o antigo
e o novo, representada pela categoria de reconstrução, entendida justamente
como revisão da experiência anterior em qualquer campo (seja ele filosófico,
religioso, político, pedagógico), colocada a serviço de novos ideais. Esse foco
cognoscitivo é também afetivo. Seu grau de abrangência permite não só uma
reordenação da biografia, mas também a redefinição da história das
instituições de que o sujeito participa projetando, nelas, outros significados
(NUNES, 2010, p. 45-46).

Esse exercício constitui nosso maior desafio de tomar a educação brasileira como causa
pública para que possa consolidar um Sistema de Educação democrático e de qualidade,
reconhecendo a dinâmica e as especificidades federativas, num processo articulado de
mediação entre as esferas governamentais, que possam vincular responsabilidades
integradas a uma colaboração efetiva, reduzindo as desigualdades sociais e políticas de
nossa organização educacional.
1095

Sendo assim, pensar em um sistema educacional evoca um caráter próprio do fenômeno


educativo, afirmando-se de modo integrado, constituindo a Educação como direito
social numa perspectiva pautada nos direitos humanos e na cidadania, o que evidencia
uma crescente necessidade de um federalismo cooperativo.

De acordo com Telles (1999), é na articulação entre movimentos sociais e práticas


associativas, direitos e espaços públicos democráticos, que identificamos registros de
uma sociedade em formação, viabilizando alargar a ideia de sistema para além de uma
organização reducionista que anuncia uma cadeia de sistemas desiguais, competitivos e
desarticulados, com ações paliativas, num jogo em que as cartas já nos são velhas
conhecidas, fixando nosso desafio em ampliar os processos de mediação entre Estado e
sociedade, não tomando como natural os interesses privados.

4 REFERÊNCIAS

LIMA, Hermes. Anísio Teixeira estadista da educação. Rio de Janeiro: Editora


Civilização Brasileira, 1978.

NUNES, Zilda Clarice Rosa. Anísio Teixeira: a poesia da ação. São Paulo: Edusf,
2000.

_____. Trajetória intelectual e identidade do educador: Anísio Teixeira (1900-1971).


Revista Brasileira Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 81, n. 197, p. 154-166, jan./abr.
2000.

RIBEIRO, Darcy. Anísio Teixeira, pensador e homem da ação. Rio de Janeiro, 1960.

SAVIANI, Dermeval. A nova Lei da educação LDB: trajetória, limites e perspectivas.


11. ed. Campinas, São Paulo: Autores Associados, 2008.

______. Documento Sistema Nacional de Educação articulado ao Plano Nacional de


Educação. Revista Brasileira de Educação, v. 15, n. 44, maio/ago. 2010. Disponível
em:<www. Scielo.org>. Acesso em: 26 dez. 2010.

______. Política e educação no Brasil. 4. ed. Campinas. São Paulo: Autores


Associados, 1999.

TEIXEIRA, Anísio Spinola. Educação e a crise brasileira. NUNES, Clarice (Org.).


Rio de Janeiro: UFRJ, 2005.

______. Educação é um direito. NUNES, Clarice (Org.). Rio de Janeiro: UFRJ, 2009.
1096

______. Educação no Brasil. 4. ed. NUNES, Clarice (Org.). Rio de Janeiro: UFRJ,
2011.

TELLES, Vera da Silva. Direitos sociais afinal do que se trata? Belo Horizonte: Ed.
UFMG,1999.

VIDAL, Diana Gonçalves. Na batalha da educação: correspondência entre Anísio


Teixeira e Fernando de Azevedo (1929-1971). Bragança Paulista, Edusf, 2000.
1097

Comunicação

A contribuição do IDEB para o estudo do papel da democratização da escola


pública na melhoria da qualidade do ensino.
Sandra A.Riscal
UFSCar
José R. Riscal
UFSCar

Resumo: O objetivo deste trabalho é apresentar um estudo dos resultados obtidos a


partir da análise dos questionários que acompanham as avaliações do IDEB, em
particular no aspecto relacionado à gestão escolar. Pretende-se identificar, por meio da
análise quantitativa dos dados, quais características, dentre aquelas consultadas, que
determinaram a elevação, queda ou estagnação dos índices das escolas. Tomou-se como
base para o estudo, os dados da base do INEP relativos ao ano de 2011. A análise
efetuou-se por meio de comparação do índice em todo o território nacional, destacando
as características regionais e locais. Para a estruturação desse estudo apresentamos um
breve histórico da implantação das avaliações de larga escala na recente política
educacional e finalmente apresentamos os resultados quantitativos obtidos na análise.
Palavras-chave: IDEB, gestão democrática, qualidade do ensino

A contribuição do IDEB para o estudo do papel da democratização da escola


pública na melhoria da qualidade do ensino.
O uso da estatística na educação não é recente. Nas duas últimas décadas,
entretanto, pode-se observar o crescimento do uso de técnicas estatísticas na
determinação de ações na esfera político-educacional. A abordagem estatística tem o
intuito de auxiliar à visualização e compreensão dos diferentes aspectos das políticas
educacionais para o planejamento e projeção de novas estratégias a partir dos resultados
obtidos. A partir desta perspectiva, vem sendo elaborados diferentes tipos de pesquisas
com vistas à produção de indicadores de qualidade educacional, com diferentes
abrangências e metas. Essas medidas advêm de uma concepção de gerencial adotada
pelos Estados com a perspectiva de otimização dos sistemas educacionais e elevação da
eficiência na gestão dos recursos financeiros
1098

Política Educacional e indicadores estatísticos

A estatística passou a ser constituir um dos principais fatores de determinação de


estratégias políticas educacionais a partir da Conferência Mundial sobre Educação
para Todos, realizada em Jomtien, em março de 1990. Nesta conferência, os países
signatários, entre eles o Brasil, assumiram o compromisso de desenvolver projetos
voltados para a equidade e maximização dos recursos financeiros, orientados pela
perspectiva dos quatro pilares da educação apresentados no Relatório Delors (1996).
Isso exigia, entretanto, a produção de um indicador que permitisse visualizar os
aspectos prioritários a serem enfrentados. Quatro anos depois, o Fórum Mundial de
Educação de Dakar em 2000 teve como principal objetivo avaliar os resultados do
processo iniciado em Jontiem . Verificou-se, nesta oportunidade, a dificuldade que a
maioria dos países apresentava para atingir as metas propostas. Novos compromissos
foram firmados para o ano de 2015 a partir da implementação de avaliação por meio de
indicadores dos processos encaminhados por meio dos compromissos pelos países
signatários.
Um dos aspectos mais importantes destes compromissos refere-se ao fato de
tratarem prioritariamente de políticas de gestão pública, que deveriam ser estabelecidas
a partir do conhecimento proporcionado pela analise de dados quantitativos que
permitiriam estabelecer quais pontos que deveriam ser privilegiados pela ação estatal.
No Brasil, a produção de indicadores gerenciais teve início no período entre 1995 e
2001, quando era ministro da educação o economista Paulo Renato Costa Souza,
durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Souza deu início a
mudanças estruturais que empregavam técnicas de gerenciamento baseadas em
diagnósticos, indicadores, metas e projeções e cujo ápice foi a implantação de um
sistema nacional de avaliação. As medidas tiveram como base a LDB, que em seu artigo
9º, inciso VI, determina a necessidade de:
VI - assegurar processo nacional de avaliação do rendimento escolar no
ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de
ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do
ensino (BRASIL, 1996).

Dentro dessa concepção foi criado, em 1990 o SAEB (Sistema de Avaliação da


Educação Básica) realizado por amostragem bienalmente. Em 1998 foi criado o ENEM
(Exame Nacional do Ensino Médio). Durante o período da presidência de Luiz Inácio
1099

Lula da Silva, foram criadas duas novas avaliações, baseadas nas experiências
anteriores. O INEP, Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
órgão do Ministério da Educação que desde o período de Souza vinha elaborando as
propostas de avaliação, implantou em 2005 a Prova Brasil, que mantinha a avaliação
amostral do Saeb, e que passou a ser denominada de Avaliação Nacional da Educação
Básica (ANEB) e posteriormente Avaliação Nacional do Rendimento Escolar
(ANRESC). As novas avaliações, mais detalhadas que as anteriores, udaram o foco para
a unidade escolar. Atingindo todas as escolas, as avaliações apresentam informações
cada vez mais precisas sobre a educação escolar brasileira. Foi incorporado ao sistema
um questionário socioeconômico, onde os estudantes fornecem informações sobre
fatores que influenciam o seu desempenho.
Em 2007 é criado o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), lançado
concomitantemente ao Decreto nº 6.094/2007, que instituiu o "Plano de Metas
Compromisso Todos pela Educação". O “Plano de Metas” estabelece 28 ações que
abrangem todos os níveis e modalidades de ensino. A partir de 2011 é implantada a
“Provinha Brasil”, destinada a avaliar o desempenho em leitura e escrita das crianças de
6 a 8 anos de idade da rede pública e voltada para a alfabetização e letramento. Dentro
do espirito do PDE é criado do IDEB,
O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) foi criado pelo Inep
em 2007 e representa a iniciativa pioneira de reunir num só indicador dois
conceitos igualmente importantes para a qualidade da educação: fluxo escolar
e médias de desempenho nas avaliações. Ele agrega ao enfoque pedagógico
dos resultados das avaliações em larga escala do Inep a possibilidade de
resultados sintéticos, facilmente assimiláveis, e que permitem traçar metas de
qualidade educacional para os sistemas. O indicador é calculado a partir dos
dados sobre aprovação escolar, obtidos no Censo Escolar, e médias de
desempenho nas avaliações do Inep, o Saeb – para as unidades da federação e
para o país, e a Prova Brasil – para os municípios.(BRASIL, MEC, 2007)

O Ideb permite ao INEP identificar quais as escolas públicas mais vulneráveis e


que podem ser consideradas de atendimento prioritário. Estas escolas, mediante um
plano de adesão, podem receber recursos e apoio técnico e pedagógico. O Ideb é um
indicador que representa o índice da qualidade da educação a partir da observação de
dois aspectos: o fluxo (progressão ao longo dos anos) e o desenvolvimento dos alunos
(aprendizado). Cada escola tem metas definidas individualmente pelo INEP que levam
em conta o valor do seu Ideb inicial. Um importante instrumento aliado ao Ideb é o
Censo Escolar , um levantamento de dados estatístico-educacionais de âmbito nacional
realizado todos os anos.
1100

Trata-se do principal instrumento de coleta de informações da educação


básica, que abrange as suas diferentes etapas e modalidades: ensino regular
(educação Infantil e ensinos fundamental e médio), educação especial e
educação de jovens e adultos (EJA). O Censo Escolar coleta dados sobre
estabelecimentos, matrículas, funções docentes, movimento e rendimento
escolar. Essas informações são utilizadas para traçar um panorama nacional
da educação básica e servem de referência para a formulação de políticas
públicas e execução de programas na área da educação, incluindo os de
transferência de recursos públicos como merenda e transporte escolar,
distribuição de livros e uniformes, implantação de bibliotecas, instalação de
energia elétrica, Dinheiro Direto na Escola e Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
Educação (Fundeb). (BRASIL, MEC, 2007)

Os dados obtidos no Censo Escolar sobre o rendimento (aprovação e reprovação)


e movimento (abandono) escolar dos alunos do ensino Fundamental e Médio são,
juntamente com Saeb e Prova Brasil, utilizados para o cálculo do Ideb. Um dos
aspectos importantes das avaliações de larga escala é o fato delas não apenas regularem
a ação das escolas, mas também de todo o sistema de ensino e os sistemas de
administração pública, guiando e direcionando novas políticas educacionais.

Avaliação da gestão democrática a partir dos dados do IDEB

O intuito deste estudo é apresentar algumas conclusões obtidas a partir das


respostas dos gestores escolares aos questionários encaminhados pelo INEP. Foram
selecionadas apenas as questões relativas à gestão da escola, em particular aquelas que
dizem respeito à gestão democrática da escola. Procurou-se estabelecer a correlação
entre as questões que foram apresentadas no questionário e o Ideb final da escola.
Dessa forma é possível verificar, dentro dos parâmetros estabelecidos pelo INEP, a
importância de cada questão e a intensidade de sua influência na determinação do Ideb.
A intensão é verificar em que medida os indicadores apontados podem oferecer alguma
contribuição para a tomada de decisão dos setores governamentais e apontar saídas e
perspectivas a partir dos casos exitosos.

Metodologia de análise quantitativa:

De acordo com o Censo de 2011, existiam no Brasil 194.932 estabelecimentos de


ensino de educação básica, dos quais 157.381 pertenciam à rede pública e 37.551 à rede
privada. Os docentes da educação básica eram 2.039.261. Na educação Básica existem
1101

50.972.619 alunos matriculados dos quais 43.053.942 estão na rede pública e 7.918.677
na rede privada.
Os dados utilizados foram obtidos na base do INEP de questionários dos diretores
- TS_QUEST_DIRETOR.csv; Os dados de divulgação do Ideb foram obtidos na base
de dados do IDEB 2011 - divulgacao-anos-finais-escolas-2011.xls e divulgacao-anos-
iniciais-escolas-2011.xls. A partir destes arquivos foi gerada uma base de dados única,
incluindo o IDEB 2011 para as séries iniciais e finais e variáveis relacionadas ao perfil
do diretor e à gestão escolar de todas as escolas das redes estadual e municipal que
responderam integralmente a Prova Brasil 2011.
O número de escolas avaliadas neste trabalho se encontra na Tabela 1:
TABELA 1
Depêndenci Séries Séries
a Iniciais Finais
Estadual 10.020 16.943
Municipal 30.343 13.867
Total 40.363 30.810

Para determinar se e quais variáveis apresentam diferenças significativas em


relação ao IDEB 2011, foi ajustado um Modelo Linear Generalizado (MCCULAGH e
NELDER, 1989), que consegue explicar 55,1% da variabilidade do Ideb das séries
iniciais, e 43% da variabilidade do Ideb das séries finais. Além das variáveis de
interesse para este artigo, referentes ao processo de gestão escolar e a experiência do
diretor, as demais variáveis foram incluídas no modelo para efeitos de controle. O
gráfico 1 indica a importância relativa das variáveis analisadas nas séries iniciais e
finais. É facilmente verificável que o papel da localização (40% da importância
relativa), que fica mais claramente estabelecida no Gráfico 2. A unidade da federação
onde se localiza a escola é fundamental para a determinação do Ideb. No gráfico 3 pode-
se observar que na região sudeste prevalece a nota superior a 5,0 paras as series iniciais.
Nas series finais acima da nota 4,0 estão os estados do sudeste, exceto o Rio Grande do
Sul, e acrescido do estado de Mato Grosso. Tantos nos casos de series iniciais como
finais, os piores resultados são obtidos nas regiões norte, nos estados do Pará e
Maranhão e Amapá e nordeste, excetuando-se os estados de Piauí e Pará. Também a
localização urbana possibilita uma ascensão no Ideb em relação às escolas rurais, como
se pode observar no gráfico 4. No gráfico 5 é possível constatar-se que as redes
1102

estaduais ainda mantém um padrão de qualidade maior do que as redes municipais,


tanto nas séries iniciais como finais, segundo o padrão do IDEB.
GRÁFICO 1 – IMPORTÂNCIA RELATIVA DOS GRUPOS DE VARIÁVEIS
Séries iniciais Séries finais
Outros Outros
fatores fatores
15% 13%

Formação
Formação 6%
6% Localização Localização
40% Processo de 40%
Processo de gestão
gestão 8%
7%

Experiência Experiência
do diretor do diretor
14% 16%

Ocorrência Ocorrência
de problemas de problemas
18% 17%

GRÁFICO 2 – IMPORTÂNCIA DAS VARIÁVEIS DE LOCALIZAÇÃO (40% de


importância relativa)
Séries Iniciais Séries Finais

Dependência Dependência
Administrativa Administrativa
Localização 2% 6%
Localização
11%
5%

UF
87% UF
89%

GRÁFICO 3
1103

GRÁFICO 4 – LOCALIZAÇÃO DA ESCOLA


IDEB 2011

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0


Séries iniciais
Urbana
Séries finais

Rural

GRÁFICO 5 – DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA


IDEB 2011

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0

Séries iniciais
Estadual
Séries finais

Municipal

Os gráficos a seguir tratam de questões relativas à gestão escolar. No gráfico 6


pode-se constatar o papel relativo de cada uma das categorias, números de reuniões do
conselho, apoio da comunidade à gestão e forma de elaboração do PPP – Projeto
Político Pedagógico da Escola. É importante que se observe que são três dimensões que
se referem à participação da comunidade na escola e salta aos olhos a importância da
forma como é elaborado o Projeto Político Pedagógico da escola. Estas questões serão
retomadas a seguir.
GRÁFICO 6 – IMPORTÂNCIA DAS VARIÁVEIS DO PROCESSO DE
GESTÃO ESCOLAR (aprox. 8% de importância relativa)
1104

Quantidade de
vezes que o Séries iniciais Séries finais
Quantidade de
conselho vezes que o
escolar se conselho
reuniu no ano escolar se
do reuniu no ano
levantamento do
15% levantamento
24%

Forma de
elaboração do
Apoio da projeto
comunidade à pedagógico da
gestão escola
22% Forma de 48%
elaboração do
projeto
pedagógico da
escola Apoio da
63% comunidade à
gestão
28%

O gráfico 7 permite se verificar que a elaboração coletiva, realizada com a


colaboração de professores, funcionários e alunos contribui significativamente para a
elevação do Ideb. Um aspecto interessante a se observar é que a alternativa de elaborar
sozinho ou reproduzir o modelo da secretaria de educação produzem o mesmo
resultado.
GRÁFICO 7 – FORMA DE ELABORAÇÃO DO PROJETO PEDAGÓGICO
IDEB 2011
0,0 2,0 4,0 6,0

Não existe Projeto Pedagógico.

Não sabe como foi desenvolvido.


Séries iniciais
Elaborado somente pelo diretor.
Séries finais
Utilizou o modelo encaminhado pela secretaria da
educação
Elaborado em conjunto pelo diretor e professores,
funcionários e alunos

Elaborado de outra maneira.


1105

GRÁFICO 8 – REUNIÕES DO CONSELHO ESCOLAR NO ANO DO


LEVANTAMENTO
IDEB 2011

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0

Não existe Conselho de Escola.

Séries iniciais
Nenhuma vez.
Séries finais

Até duas vezes por ano

Três vezes ou mais.

Os gráficos 8 e 9 referem-se ao papel da comunidade na gestão da escola. No


gráfico 8 pode ser observado que o papel do Conselho só se torna significativo a partir
de três reuniões ao ano (ou mais), o que significa que um Conselho realmente presente
na gestão da escola e atuante é importante fator para elevação do IDEB. No gráfico 9
pode-se observar o fundamental papel do apoio da comunidade ao diretor na elevação
do IDEB.
GRÁFICO 9 –APOIO DA COMUNIDADE À GESTÃO DO DIRETOR
IDEB 2011
0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0

Sim Séries iniciais


Séries finais

Não

Os gráficos seguintes referem-se às variáveis relativas às características do diretor.


Relativamente, pode-se constatar que a forma como foi conduzido ao cargo, a
experiência como diretor de escola e a experiência na escola atual são fatores
determinantes da elevação do IDEB.
GRÁFICO 10 – IMPORTÂNCIA DAS VARIÁVEIS DE EXPERIÊNCIA DO
DIRETOR (aprox. 15% de importância relativa)
1106

Séries iniciais Séries finais

Possui outra
Carga horária atividade fonte
de trabalho Forma como de renda
6% assumiu a 5%
Idade
direção da Idade
8% Forma como 7%
escola Tempo de
21% assumiu a
experiência na
direção da
Possui outra área de
escola
atividade fonte educação
9%
de renda 41%
10%
Tempo de
Tempo de experiência
Salário bruto experiência na como diretor da
mensal como área de escola atual
diretor educação 15%
16% 20%
Tempo de
experiência Salário bruto
como diretor da mensal como
escola atual diretor
19% 23%

No gráfico 11 podemos observar que nas redes estaduais os processo de seleção


(por concurso) conjugados com eleição lideram, de forma absoluta, e estão relacionadas
aos mais elevados IDEBs. O fato da maioria das redes estaduais possuírem processos de
seleção baseados em concursos públicos parece ser fundamental para que se determine a
importância deste aspecto no IDEB.
GRÁFICO 11 – FORMA COMO ASSUMIU A DIREÇÃO DA ESCOLA (Rede
Estadual)
IDEB 2011

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0

Eleição apenas.

Indicação Séries iniciais


Séries finais
Outra forma.

Seleção.

Seleção e eleição.

O Gráfico 12 refere-se à forma de condução ao cargo nas redes municipais. Neste


caso a existência de um processo de seleção para a ocupação do cargo de diretor
determina os melhores IDEB. É importante que se tenha em mente que nesses casos a
maioria dos municípios, que passaram por processo de municipalização, adotaram a
indicação como forma prioritária de condução de diretores. A distância em termos de
IDEB do processo de indicação em relação ao de seleção pode denotar a indicação de
indivíduos que não são profissionais da educação ou que não tem formação especifica
nesta área
1107

GRÁFICO 12 – FORMA COMO ASSUMIU A DIREÇÃO DA ESCOLA (Rede


IDEB 2011

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0

Indicação
Séries iniciais
Seleção e eleição.
Séries finais
Eleição apenas.

Outra forma.

Seleção.

Municipal)
Um dos aspectos que chama a atenção em termos de importância na determinação
do IDEB é o tempo de experiência do diretor na área de educação. Os dados indicam
que é altamente significativa a diferença entre um profissional no início de carreira e
aquele com mais de 20 anos de magistério. Além disso, parece ser diretamente
proporcional a quantidade de anos de experiência do diretor em relação ao IDEB
alcançado pela escola.
GRÁFICO 13 – TEMPO DE EXPERIÊNCIA NA ÁREA DE EDUCAÇÃO
IDEB 2011

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0

Há menos de um ano.
De 1 a 2 anos.
De 2 a 5 anos. Séries iniciais
De 5 a 7 anos. Séries finais
De 7 a 10 anos
De 10 a 15 anos.
De 15 a 20 anos.
Há mais de 20 anos

Outro aspecto importante é apontado pelo Gráfico 14, que representa o papel do
tempo de experiência do diretor na sua escola atual. As faixas de 10 a 15 e com mais de
20 anos na direção da escola atual aparecem como determinantes na elevação do IDEB
da escola.
1108

GRÁFICO 14 – TEMPO DE EXPERIÊNCIA COMO DIRETOR DA ESCOLA


ATUAL

IDEB 2011

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0

Há menos de um ano.

De 1 a 2 anos.

De 2 a 5 anos.
Séries iniciais
De 5 a 7 anos. Séries finais

De 7 a 10 anos

De 10 a 15 anos.

De 15 a 20 anos.

Há mais de 20 anos

A carga horária do diretor é outro fator que pesa significativamente na


determinação do IDEB. Jornadas de 40 horas ou mais são importantes para a elevação
do IDEB, significando que uma presença maior do diretor na unidade escolar e uma
maior interação com os problemas da escola propiciam melhores resultados.
GRÁFICO 15 – CARGA HORÁRIA SEMANAL COMO DIRETOR DA ESCOLA
IDEB 2011

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0

Até 20 horas semanais.

Séries iniciais
Até 30 horas semanais.
Séries finais

Até 40 horas semanais.

Mais de 40 horas semanais.

ATUAL

Considerações finais

O estudo aqui proposto permite que se compreenda a importância de alguns


fatores ligados à gestão democrática da escola na determinação de uma melhoria da
qualidade de ensino. Em determinados casos pode-se constatar aquilo que já vinha
sendo anunciados pela maior parte dos estudiosos da área educacional: a gestão
democrática, com a participação da comunidade é fator crucial no desempenho da
1109

escola o que pode ser demonstrado pelos resultados do Ideb. Juntamente com a
elaboração coletiva do Projeto Político Pedagógico da escola, a participação da
comunidade e o apoio desta comunidade ao diretor constituem os aspectos mais
importantes, relativamente, para a elevação do IDEB. Além destas, questões como o
tempo de experiência do diretor e sua fixação na unidade escolar permitem que se
compreenda que uma maior relação com comunidade escolar conjugada com um
diretor ativo e que se dedique apenas a uma escola, propiciam uma melhoria na
qualidade do ensino, segundo os critérios do IDEB.
Nenhuma dessas questões é nova. O importante aqui é que estes dados podem ser
utilizados como fundamento para a tomada de decisões na área de política educacional.
Questões como as relações políticas de natureza patrimonialista, que ainda persistem na
esfera escolar, podem ser agora consideradas a partir dos resultados negativos que
apresentam para as escolas cujos diretores são escolhidos por indicação ou por sistemas
que não fixam os diretores nas escolas, mudando-os ao sabor da política eleitoral.

REFERÊNCIAS

BRASIL, MEC, INEP, Microdados Prova Brasil – 2001 disponível em


ftp://ftp.inep.gov.br/microdados/microdados_prova_brasil_2011.zip
http://portalideb.inep.gov.br/planilhas-para-download: acesso em 15 de junho de 2014

BRASIL, MEC, INEP. O Índice de desenvolvimento da Educação Básica - IDEB


disponível em http://ideb.inep.gov.br/ , 2007. Acesso em 15 de junho de 2014

BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei número 9394, 20 de


dezembro de 1996. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf, acesso
em acesso em 15 de junho de 2014.
1110

Comunicação

O Novo Plano Nacional de Educação: ganhos e perdas para a educação de jovens e


adultos

Sandra Fernandes Leite


UNICAMP/Faculdade de Educação/GEPEJA

Resumo: Esse texto busca compreender o novo Plano Nacional de Educação (PNE) no
tocante às metas que estão diretamente relacionadas ao público que atualmente se
encontra na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Este estudo
configurou-se através de uma pesquisa qualitativa, utilizando fontes documentais tais
como: documentos nacionais, legislações e informativos referentes à modalidade
Educação de Jovens e Adultos (EJA) e os debates delineados na elaboração do novo
Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024). O estudo não tem a pretensão de
esgotar o assunto, mas pretende ensejar a discussão sobre o que se esperar para a
modalidade EJA no novo PNE.
Palavras-chave: Plano Nacional de Educação, Educação de Jovens e Adultos.

Introdução
O Novo Plano Nacional de Educação – PNE – Lei n.º 13.005/2014 (BRASIL,
2014b), recentemente aprovado e esperado desde 2011, tem sua origem quando o
Projeto de Lei do Plano Nacional de Educação foi encaminhado pelo Governo Federal
ao Congresso Nacional em 15 de dezembro de 2010 (BRASIL, 2014d). Este novo PNE
apresenta dez diretrizes e vinte metas, seguidas das estratégias específicas para sua
concretização. Há estratégias específicas para a inclusão de minorias, como alunos com
deficiências, indígenas, quilombolas, estudantes do campo e alunos em regime de
liberdade assistida. Estabelece ainda estratégias para alcançar a universalização do
ensino de quatro a dezessete anos, prevista na Emenda Constitucional n.º 59, de 2009
(BRASIL, 2014b). Prevê a correção de fluxo e o combate à defasagem idade-série.
Estabelece metas para o aumento da taxa de alfabetização e da escolaridade média da
população. A nova lei obriga o Governo a investir 10% do Produto Interno Bruto (PIB)
em um prazo de dez anos.
1111

O objetivo deste texto é analisar o que este novo PNE propõe para a modalidade
EJA e o que se pode esperar para seu período de vigência (2014 a 2024).
O novo Plano Nacional de Educação foi sancionado pela Presidenta Dilma
Rousseff em junho de 2014, em meio ao clima de Copa do Mundo e às vésperas do
início da corrida eleitoral. Pode-se considerar uma vitória a sanção do PNE, visto que se
temia a sua votação não entrar na agenda legislativa em um ano eleitoral. Neste sentido,
destaca-se o papel desempenhado pelas mídias sociais ao disseminar, alertar e cobrar a
aprovação do PNE que já tramitava por quatro anos. Ainda, a discussão do novo PNE
ganhou espaço nas manifestações que brotaram pelo país nos meses anteriores a sua
aprovação1. Cartazes expondo os problemas da educação estavam presentes nos
protestos. Destacava-se a questão do aumento do investimento para a educação.
Em Mensagem postada no Blog do Planalto em 26 de junho de 2014, sob o
título: Presidenta Dilma sanciona sem vetos novo Plano Nacional de Educação,
encontramos o seguinte relato da mesma,

“‘Ontem sancionei, sem vetos, o novo Plano Nacional de Educação – PNE,


que terá vigência nos próximos dez anos, orientando a atuação e o papel da
União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios, de instituições de
ensino, professores, famílias e estudantes, na busca por uma educação de
qualidade acessível a todos.
(...)
O PNE nos desafia a ampliar, ainda mais, essas oportunidades, em busca da
melhoria da qualidade em todos os níveis, etapas e modalidades da educação,
partindo da educação infantil, passando pela educação em tempo integral, o
crescimento das matriculas da educação profissional e tecnológica, a
ampliação do acesso à educação superior e a expansão da pós-graduação.
Para isso serão muito importantes a valorização dos professores, o aumento
dos investimentos em educação e o fortalecimento da articulação da União
com os estados, o Distrito Federal e os municípios.
A destinação dos recursos dos royalties do petróleo e do Fundo Social do pré-
sal para a educação abrem a perspectiva de tornar realidade as metas do PNE.
O país tem hoje um Plano Nacional de Educação à altura dos desafios
educacionais do Brasil.’
Dilma Rousseff – Presidenta da República.” (BRASIL, 2014c).

A Presidenta destaca a abrangência do plano da creche à pós-graduação, o ENEM


como sendo o melhor caminho de oportunidades na área educacional, a busca pela
melhoria da qualidade em todos os níveis, etapas e modalidades da educação. Ela
conclui a sua mensagem enfatizando a destinação dos recursos dos royalties do petróleo
e do Fundo Social do Pré-sal para a Educação como a base de sustentação para tornar

1
Uma retrospectiva daquele momento pode ser consultada em < http://www.jb.com.br/retrospectiva-
2013/noticias/2013/12/17/retrospectiva-manifestacoes-de-junho-agitaram-todo-o-pais/>. Acesso em
30/06/2014.
1112

realidade às metas do PNE. A Lei n.º 13.005/2014 obriga o governo a investir em


educação dez por cento do PIB em um prazo de dez anos (BRASIL, 2014b). Prevê o
alcance da meta de investimento dividida em duas etapas: um mínimo de sete por cento
do PIB no quinto ano de vigência da Lei e dez por cento do PIB ao fim do período de
dez anos. Sobre o PIB e a Educação, Pita (2011) comenta,

Um modo interessante de quantificar de forma relativa o investimento em


educação se dá pela comparação com o PIB, basicamente a riqueza produzida
por um país. (...) ‘As pessoas adoram falar de percentual do PIB e se
esquecem que há uma outra variável: o número de pessoas para quem o
recurso será distribuído’, diz o especialista em financiamento de educação,
professor associado II, aposentado, da Universidade Federal de Goiás,
Nelson Cardoso Amaral.
(...)
Segundo Amaral, o valor de 10% do PIB seria adequado, porque a fatia da
população brasileira em idade educacional é muito grande (...). ‘Os desafios
para o Brasil são enormes, considerando-se o tamanho de seu PIB e a
quantidade elevada de pessoas em idade educacional’, diz ele. A partir de
2030, no entanto, o Brasil entrará na faixa dos países que possuem menos de
30% de sua população em idade educacional (PITA, 2011, p.09).

O novo PNE tem as condições para alterar o quadro de desigualdade da educação


pública brasileira? Existem metas, diretrizes e estratégias que contemplem os problemas
recorrentes da EJA? Para refletir sobre estas perguntas é necessário buscar uma
compreensão sobre o significado de um Plano Nacional de Educação dentro da agenda
educacional brasileira.

Histórico dos Planos Nacionais de Educação


A primeira intenção de elaboração de um plano de educação para o Brasil surgiu
nos idos de 1932 com o Manifesto dos Pioneiros da Educação, sendo uma das primeiras
tentativas de se construir um plano de reconstrução educacional para o país. A partir daí,
todas as Constituições Brasileiras, excetuando a de 1937, incorporaram, seja de forma
implícita ou explícita, a ideia de um Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2009, p.
97).
O primeiro Plano Nacional de Educação surgiu em 1962, elaborado na vigência
da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n.º 4.024, de 1961.
Não foi proposto como lei, mas era uma iniciativa do Ministério da Educação e Cultura,
onde um conjunto de metas quantitativas e qualitativas deveria ser alcançado em oito
anos. Em 1965 este plano sofreu uma revisão, sendo introduzidas normas
descentralizadoras e estimuladoras da elaboração de planos estaduais. Em 1966 passou a
1113

se chamar Plano Complementar de Educação. Este plano fez alterações na distribuição


dos recursos federais que beneficiaram a implantação de ginásios orientados para o
trabalho e o atendimento de analfabetos com idade superior a dez anos (BRASIL, 2009,
p. 97).
Somente com a promulgação da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2014a)
foi recuperada a ideia de Plano Nacional de Educação como uma lei. Posteriormente em
1996 foi criada a Lei n.º 9.934, que estabeleceu as Diretrizes e Bases da Educação
Nacional. Esta lei determinou a elaboração do Plano em colaboração com os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios e a institui a Década da Educação. Estabeleceu que a
União encaminhasse o plano ao Congresso Nacional contemplando diretrizes e metas
para os dez anos posteriores e em sintonia com a Declaração Mundial sobre Educação
para Todos (BRASIL, 2009, p. 98).
Em 2001 foi aprovado, depois de idas e vindas e fruto de intensas disputas no
Congresso Nacional, o Plano Nacional de Educação Lei nº. 10.172/2001, com duração
prevista para dez anos (2001-2011). Esta lei considerou as transformações mundiais, os
avanços tecnológicos, a influência do fenômeno da globalização e propôs desenvolver o
conceito de Educação ao Longo da Vida, partindo da alfabetização, mas não se
restringindo a ela (BRASIL, 2014e).
Este Plano Nacional de Educação de 2001 estabeleceu metas para a Educação de
Jovens e Adultos (EJA), vinculando ações que previam o fim do analfabetismo, a
ampliação da oferta, a produção de dados estatísticos de modo a subsidiar o
planejamento de políticas e programas na área, bem como à busca pela melhoria da
qualidade, no sentido de alterar o perfil da educação de jovens e adultos. (MEC, 2011).

O Novo Plano Nacional de Educação (Lei n.º 13.005, de 25 de junho de 2014)


Em abril de 2010 foi realizada a Conferência Nacional de Educação – CONAE.
Dela resultou a elaboração do documento: Construindo o Sistema Nacional Articulado
de Educação: O Plano Nacional de Educação, Diretrizes e Estratégias de Ação, que
contou com a participação de representantes de Governo e da Sociedade Civil nos
debates das questões sobre a educação brasileira. Entre as reivindicações feitas pela
CONAE estava a importância da consolidação da política de educação de jovens e
adultos no país pelo o comprometimento dos diferentes entes federativos no combate ao
analfabetismo, para evitar “postergar para a próxima década metas de ‘erradicação’ do
analfabetismo” (DI PIERRO, 2010, p.953).
1114

O projeto de lei do novo Plano Nacional de Educação (PNE) foi enviado ao


Congresso Nacional em 15 de dezembro de 2010 e a votação foi concluída pela Câmara
no início de junho de 2010.
Ao longo do processo, o PNE sofreu ganhos e perdas. O texto original aprovado
pela Câmara previa que a parcela do PIB estipulada fosse destinada apenas para a
educação pública. No entanto, mudanças garatiram que os recursos também passassem a
atender programas como o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) e o Programa
Universidade para Todos (ProUni).
O novo Plano Nacional de Educação (Lei n.º 13.005, de 25 de junho de 2014)
tem vigência de 10 (dez) anos e trata das diretrizes, das metas, da execução, da
avaliação, financiamento e dos pápeis a serem desenvolvidos por diferentes orgãos na
implementação do mesmo (BRASIL, 2014c). Em seu Art. 2º estabelece as suas
diretrizes:

Art.2º São diretrizes do PNE:


I – Erradicação do analfabetismo;
II – Universalização do atendimento escolar;
III – Superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da
cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação;
IV – Melhoria da qualidade da educação;
V – Formação para o trabalho e para a cidadania, com ênfase nos valores
morais e éticos em que se fundamenta a sociedade;
VI – Promoção do princípio da gestão democrática da educação pública;
VII – Promoção humanística, científica, cultural e tecnológica do País;
VIII – Estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em
educação como proporção do Produto Interno Bruto – PIB, que assegure
atendimento às necessidades de expansão, com padrão de qualidade e
equidade;
IX – Valorização dos (as) profissionais da educação;
X – Promoção dos princípios do respeito aos direitos humanos, à diversidade
e à sustentabilidade socioambiental. (BRASIL, 2014c).

Destaca-se o Art. 2º, Inciso I – Erradiação do analfabetismo. A partir da Lei n.º


9394/1996 foram implementadas políticas voltadas para a universalização do ensino
fundamental para todos, incluíndo a modalidade EJA. Porém, estas ações não foram
acompanhadas de propostas que garantissem a permanência e a continuidade dos
estudos de jovens e adultos. A alfabetização, na maioria dos casos, é ofertada de forma
separada do restante da educação básica como se fosse um braço para o acesso à
educação básica e não a base desta (LEITE, 2013, p. 328). Persiste ainda a adoção de
campanhas para extinguir o analfabetismo, como se a alfabetização fosse um processo
mecânico e que de maneira simples se alfabetiza. Em verdade, a alfabetização é um
1115

processo que acompanha todo o aprendizado do aluno e que depende de inúmeros


fatores para atingir o aprendizado satisfatório.
Observa-se no decorrer das últimas décadas uma queda nos números de
analfabetos e analfabetos funcionais. Porém, também se constata o surgimento de um
novo perfil do analfabetismo: os que passaram pela alfabetização ou pela escola regular
e que ainda não estão plenamente alfabetizados, não dominando a leitura e a escrita.
Estes não conseguem dar continuidade aos estudos e, ao tentar prosseguir, esbarram nas
inúmeras dificuldades de aprendizagem (LEITE, 2013, p. 329).
As metas da Lei serão cumpridas no prazo de vigência do mesmo. O Art. 5º que
trata da execução do PNE e revela o cumprimento e o monitoramento contínuo das
avaliações do mesmo. Segundo o Art. 5º da Lei 13.005/2014,

Art.5º a execução do PNE e o cumprimento de suas metas serão objetos de


monitoramento contínuo e de avaliações periódicas, realizados pelas
seguintes instâncias:
I – Ministério da Educação – MEC;
II – Comissão de Educação da Câmara dos Deputados e Comissão de
Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal;
III – Conselho Nacional de Educação.
(...) (BRASIL, 2014c).

E acrescenta no § 2º do Art.5º da Lei 13.005/2014,


§ 2º A cada 2 (dois) anos, ao longo do período de vigência deste PNE, o
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira –
INEP publicará estudos para aferir a evolução no cumprimento das metas
estabelecidas (...) com informações organizadas por ente federado e
consolidadas em âmbito nacional, tendo como referência os estudos e as
pesquisas e que trata o art. 4º (...) (BRASIL, 2014c).

Pode-se observar o papel fundamental do INEP (INEP, 2014). Espera-se que a


modalidade EJA seja contemplada detalhadamente em tais estudos, dando subsídios
para a garantia de um processo de implementação para o PNE.
Um dos grandes desafios do novo PNE é a questão do investimento público em
educação. Conforme o Art. 5º,

§ 4º O investimento público em educação (...) engloba os recursos aplicados


(...) nos programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive
na forma de incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos concedidas no
Brasil e no exterior, os subsídios concedidos em programas de financiamento
estudantil e o financiamento de creches, pré-escolas e de educação especial
(...).
§ 5º Será destinada à manutenção e ao desenvolvimento do ensino, em
acréscimo aos recursos vinculados nos termos do Art. 212 da Constituição
Federal, além de outros recursos previstos em lei, a parcela da participação
1116

no resultado ou da compensação financeira pela exploração de petróleo e de


gás natural, na forma de lei específica, com a finalidade de assegurar o
cumprimento da meta prevista no inciso VI do Art. 214 da Constituição
Federal (BRASIL, 2014c).

Verifica-se no texto da lei uma ênfase na proposta de expansão da educação


profissional e superior. Fica em sintonia com as ações já implementadas ao longo do
Governo Lula (LEITE, 2013) e do governo Dilma com a implementação do
PRONATEC, um programa similar ao ProUni, mas voltado para a educação
profissional (MEC, 2014b).
Para a avaliação do PNE, a União promoverá a realização de pelo menos duas
conferências nacionais até o final da década. Estas conferências nacionais serão também
replicadas em conferências distrital, municipais e estaduais, articuladas e coordenadas
pelo Fórum Nacional de Educação. O Fórum Nacional de Educação é:
(...) um espaço inédito de interlocução entre a sociedade civil e o Estado
brasileiro, reivindicação histórica da comunidade educacional e fruto de
deliberação da Conferência Nacional de Educação (...).
(...) Ele tem as seguintes atribuições: I – Participar do processo de concepção,
implementação e avaliação da política nacional de educação; II -
Acompanhar, junto ao Congresso Nacional, a tramitação de projetos
legislativos referentes à política nacional de educação, em especial a de
projetos de leis dos planos decenais de educação definidos na Emenda à
Constituição 59/2009; III - Acompanhar e avaliar os impactos da
implementação do Plano Nacional de Educação; IV - Acompanhar e avaliar o
processo de implementação das deliberações das conferências nacionais de
educação; V - Elaborar seu Regimento Interno e aprovar “ad referendum” o
Regimento Interno das conferências nacionais de educação; VI - Oferecer
suporte técnico aos Estados, Municípios e Distrito Federal para a organização
de seus fóruns e de suas conferências de educação; VII - Zelar para que os
fóruns e as conferências de educação dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios estejam articuladas à Conferência Nacional de Educação; VIII -
Planejar e coordenar a realização de conferências nacionais de educação, bem
como divulgar as suas deliberações (MEC, 2014a).

Como o PNE estabelece metas, o acompanhamento e a avaliação constantes são


fundamentais para o cumprimento das mesmas dentro dos prazos estabelecidos,
ressaltando a importância do Fórum Nacional de Educação.
O PNE também reforça o fortalecimento do regime de colaboração e lembra, em
seu Art.8º, que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão elaborar seus
correspondentes planos de educação, ou adequar os planos que já existam, considerando
as diretrizes, metas e estratégias previstas no PNE. O prazo para que os mesmos façam
suas adequações é de um ano, a contar da publicação do PNE.
1117

A Educação de Jovens e Adultos no Novo Plano Nacional de Educação


O novo PNE propõe ações para a Educação de Jovens e Adultos na próxima
década em suas metas. A meta 3:
Meta 3: universalizar, até 2016, o atendimento escolar para toda a população
de 15 (quinze) a 17 (dezessete) anos e elevar, até o final do período de
vigência deste PNE, a taxa líquida de matrículas no ensino médio para 85%
(oitenta e cinco por cento) (BRASIL, 2014c).

Apesar da meta 3 não estar diretamente voltada para a modalidade EJA, ela pode
impactar de forma extremamente positiva se conseguir garantir para o jovem de quinze
a dezessete anos a continuidade dos estudos e o seu acesso ao ensino médio, como é seu
direito. Atualmente, a modalidade EJA recebe inúmeros jovens que acabam buscando
na EJA a possibilidade de continuidade dos seus estudos. Neste sentido, dentro das
estratégias da meta 3 estão ações que podem sanar a evasão dos jovens de quinze a
dezessete anos, buscar os que estão fora da escola e atender aos que estão encontrando
dificuldades em sua trajetória escolar. Estas ações podem garantir uma qualidade no
processo de escolarização, embora exijam da escola pública uma infraestrutura mais
adequada e condições de trabalho e de formação para os profissionais da educação em
especial para os professores. O grande desafio será ver tais ações realmente
implementadas.
A meta 7, “fomentar a qualidade da educação básica em todas as etapas e
modalidades, com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem...” (BRASIL, 2014c),
tem potencial de um impacto significativo para a modalidade EJA.
Ainda que a meta 7 não possua estratégias voltadas diretamente para a
modalidade EJA, pode-se inferir que a as estratégias de correção de fluxo, respeito aos
diferentes ritmos de aprendizagem, respeito ao perfil do aluno e a realidade da escola
sejam muito adequadas para o perfil dos alunos que atualmente estão na EJA, onde
grande parte deles são frutos do fracasso escolar e que evadiram.
Como um potencial risco, esta meta tem como objetivo seguir as médias
nacionais como o IDEB. Se não for analisado criteriosamente, pode-se transformar o
processo de aprendizagem das escolas em um único objetivo de fazer provas e
conseguir médias altas em determinadas disciplinas, em detrimento do aprendizado. O
conteúdo da sala de aula é a próxima avaliação e segue para a próxima avaliação,
1118

repetem-se questões, moldam-se aos mais diversos padrões de avaliações e no fim a


educação se transforma em garantir aos alunos a expertise de fazer prova.
A meta 8 propõe,
Meta 8: elevar a escolaridade média da população de 18 (dezoito) a 29 (vinte
e nove) anos, de modo a alcançar, no mínimo, 12 (doze) anos de estudo no
último ano de vigência deste Plano, para as populações do campo, da região
de menor escolaridade no País e dos 25% (vinte e cinco por cento) mais
pobres, e igualar a escolaridade média entre negros e não negros declarados à
Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (BRASIL,
2014c).

Tem como foco o perfil do jovem trabalhador e suas estratégias são voltadas para
resgatar um grupo significativo da força de trabalho que poderia ser mais bem
qualificado se tivesse garantido o seu direito a educação. Para tanto propõe a correção
de fluxo, o acompanhamento pedagógico individualizado, a prioridade aos estudantes
com rendimento escolar defasado, a continuidade dos estudos após a alfabetização e a
oferta gratuita de educação profissional e técnica. É totalmente voltada para o
atendimento à força ativa de trabalho do país.
Uma critica para essa meta é o corte etário dos dezoito aos vinte e nove anos,
pois a qualidade da educação, o acompanhamento satisfatório e o desenvolvimento do
aluno é prioridade em todas as faixas etárias. Mas observa-se o foco no aluno
trabalhador e na formação para o trabalho.
A meta 9 propõe,
Meta 9: elevar a taxa de alfabetização da população com 15 (quinze) anos ou
mais para 93,5% (noventa e três inteiros e cinco décimos por cento) até 2015
e, até o final da vigência deste PNE, erradicar o analfabetismo absoluto e
reduzir em 50% (cinqüenta por cento) a taxa de analfabetismo funcional
(BRASIL, 2014c).

Esta meta é voltada exclusivamente para o público da EJA. Ela ainda propõe a
oferta gratuita da EJA, a realização de diagnóstico dos jovens e adultos com ensino
fundamental e médio incompletos, para através desse diagnóstico identificar a demanda
ativa por vagas na EJA, a oferta de alfabetização com garantia de continuidade dos
estudos, a garantia de escolarização básica, a realização de chamadas públicas para o
levantamento da demanda da modalidade. Propõe também realizar a avaliação, através
de exames específicos, visando aferir o grau de alfabetização de jovens e adultos com
mais de quinze anos, estabelecer mecanismos e incentivos que integrem os segmentos.
Não se percebe nas metas um destaque nas ações voltadas para os idosos. A
modalidade EJA tem em seu público uma parcela de idosos que não vem encontrando
1119

espaço e muito menos condições para retornar a escola e não recebem uma proposta
educacional voltada para as suas características e necessidades.
Olhando para as políticas públicas implementadas para a modalidade EJA,
percebe-se a prioridade para o jovem e para o adulto trabalhador. Mesmo assim, tais
ações voltadas para a oferta da educação profissional, visando a formação para o
trabalho, a prestação de exames ou obtenção de certificados. A EJA necessita de uma
política pública diferenciada para o atendimento ao idoso e essa política precisa pensar
uma proposta de escolarização diferenciada, que respeite ritmos, estratégias e objetivos
que são diferentes e próprios de quem sobreviveu a inúmeras dificuldades na vida, mas
ainda sim mantém o desejo de aprender. Para esse público, a educação em si tem outro
significado. Representa um resgate de vida, de algo que não foi possível na época
adequada.
O aumento da expectativa de vida do brasileiro e o envelhecimento da população
(IBGE, 2014) anunciam que a educação não pode ficar fora desse debate e precisa
pensar uma proposta educacional diferenciada para o público idoso, não se limitando
apenas na oferta de alfabetização. Nessa linha, a estratégia 9.12 da meta número 9
aponta,
9.12) considerar, nas políticas públicas de jovens e adultos, as necessidades
dos idosos, com vistas à promoção de políticas de erradicação do
analfabetismo, ao acesso a tecnologias educacionais e atividades recreativas,
culturais e esportivas, à implementação de programas de valorização e
compartilhamento dos conhecimentos e experiência dos idosos e à inclusão
dos temas do envelhecimento e da velhice nas escolas (BRASIL, 2014c).

A meta 10 mantém a ênfase na oferta da EJA na forma integrada com a educação


profissional,
Meta 10: oferecer, no mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) das matrículas
de educação de jovens e adultos, nos ensinos fundamental e médio, na forma
integrada à educação profissional (BRASIL, 2014c).

As estratégias para essa meta não são novidades. Elas vislumbram o que já vem
sendo implementado: a manutenção de oferta de programas de EJA voltados para a
conclusão do ensino fundamental aliado a formação profissional inicial e a conclusão do
ensino médio aliado a formação técnica. Embora venha sendo uma prática já
implementada, essa articulação acaba não acontecendo plenamente, sendo ainda uma
questão que merece atenção.
1120

Considerações Finais
O Novo Plano Nacional de Educação se propõe a garantir a universalização com
qualidade da Educação Básica, através de ações que vão da inclusão de todos no
processo educativo, a garantia de acesso, a permanência na escola com conclusão de
estudos e com bom desempenho, promovendo a igualdade de direitos.
O novo PNE tem condições de alterar o quadro de desigualdades da educação
brasileira, pois consegue tocar nos pontos frágeis da educação brasileira, mas será
necessário muito trabalho conjunto e de diálogo, principalmente entre União, o Distrito
Federal, os Estados e os Municípios, sincronizando prazos de implementação e
estimulando sinergias entre os seus respectivos planos.
Constata-se a importância de se manter atento à implementação do novo PNE
para a educação brasileira. Assegurar ações concretas que visem garantir ao Novo Plano
Nacional de Educação instrumentos de acompanhamento e avaliação. Além disso,
divulgar o conhecimento do mesmo para a sociedade, a compreensão de sua
importância e as ações educacionais concretas que serão implementadas.
Para a modalidade EJA, o plano é bastante tímido e mantém, na maior parte dos
casos, o que já vem sendo feito. As estratégias são vagas e a ênfase é no atendimento ao
jovem e ao adulto e com vistas ao mercado de trabalho. O PNE traz algumas estratégias
com potencial de auxiliar a EJA, de forma direta e indireta, prevendo ações importantes
para a modalidade.
A EJA precisa de políticas públicas que compreendam a sua importância, que
garantam uma oferta plena, satisfatória que considere todas as especificidades da
modalidade. Nela estão diversos públicos e cada um deles precisa ser atendido e não
deveria acontecer a priorização de demanda para um público específico. Tem o mérito
de estimular a formação profissional, mas deveria reconhecer igualmente os que já
doaram sua força de trabalho ao país, mesmo tendo sido a eles negado o direito a
educação no tempo adequado.

Bibliografia
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outubro de 1988. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/legislacao/ const/
con1988/CON1988_13.07.2010/art_214_.shtm >. Acesso em: 29/06/2014a.
1121

_______. Emenda Constitucional n.º59, de 11 de novembro de 2009. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc59.htm>.
Acesso em: 29/06/2014b.

_______. Lei n.º 13.005/2014, de 25 de junho de 2014 – Aprova o Plano Nacional de


Educação e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm>. Acesso em: 29/06/2014c.

_______. Presidenta Dilma sanciona sem vetos novo Plano Nacional de Educação.
Disponível em: <http://blog.planalto.gov.br/index.php?s=Presidenta+Dilma+sanciona
+sem+vetos+novo+Plano+nacional+de+Educa%C3%A7%C3%A3o+>. Acesso em:
29/06/2014d.

_______. Projeto de Lei 08035/2010 – Aprova o Plano Nacional de Educação para


o decênio 2011 – 2020 e dá outras providências. Disponível em: <http://www.camara.
gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp? id=490116>. Acesso em: 29/06/2014e.

BRASIL. Legislação Brasileira Sobre Educação. – Brasília: Câmara dos Deputados,


Edições Câmara, 2009. (Série legislação; n.12).

DI PIERRO, Maria Clara. A Educação de Jovens e Adultos no Plano Nacional de


Educação: Avaliação, Desafios e Perspectivas. In: Educação & Sociedade: Revista de
Ciência da Educação / Centro de Estudos Educação e Sociedade – V.31, n. 112. São
Paulo: Cortez, Campinas, CEDES, 2010.

IBGE. Em 2012, esperança de vida ao nascer era de 74,6 anos. Disponível em:
<http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias?view=noticia&id=1&busca=1&idnoticia=2
528>. Acesso em: 29/04/2014.

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< http://pronatec.mec.gov.br/institucional-90037/o-que-e-o-pronatec > Acesso em:
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MEC. Plano Nacional de Educação (PNE). Disponível em: <https://www.planalto.


gov.br /ccivil_03/leis/leis_2001/l10172.htm.> Acesso: 17/01/2011.

LEITE, Sandra Fernandes. O Direito à Educação Básica para Jovens e Adultos da


Modalidade EJA no Brasil: Um resgate histórico e legal. Tese de Doutorado –
Universidade Estadual de Campinas, SP, 2013. Disponível em: < http://www.
bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000910013 >. Acesso em: 30/06/2014.

PITA, Marina. O Setor exige investimento mínimo de 10% do PIB. In.: Caros Amigos
Especial, ano XV, n.º53, Casa Amarela Ltda. São Paulo (SP), junho de 2011.
1122

Comunicação

A contribuição da formação continuada para a atuação dos coordenadores


pedagógicos da Educação Infantil

Sandra Regina B. de Macedo


FEUSP

Resumo: Tem-se discutido amplamente a importância da formação continuada de


professores para o seu aprimoramento e para a compreensão dos diferentes aspectos que
compõe a profissão docente. Em menor medida, discute-se a formação continuada dos
formadores de professores. O interesse da pesquisa realizada que aqui apresento, voltou-
se para a formação continuada dos coordenadores pedagógicos por entender que ela é
momento necessário e privilegiado para que esses profissionais discutam as questões
inerentes à sua profissionalização e a sua atuação junto ao grupo de professores, para a
execução de suas atribuições. Estabeleci como objeto da pesquisa a formação
continuada dos coordenadores pedagógicos da educação infantil de um município da
Região do Grande ABC, realizada por profissionais da Secretaria de Educação. O
objetivo foi investigar se e em que medida a formação continuada contribui para a
atuação desses profissionais.
Palavras-chave: coordenação pedagógica, formação continuada.

Uma síntese da pesquisa


Aqui, represamos um rio, para fora,
sempre fica um oceano.
Há muito ainda o que se publicar.
Marcos Cezar de Freitas
Moyses Kuhlmann Jr.

A pesquisa intitulada A contribuição da formação continuada para a atuação


dos coordenadores pedagógicos da Educação Infantil de São Bernardo do Campo foi
desenvolvida como requisito do curso de Mestrado da Faculdade de educação da
Universidade de São Paulo e teve por objetivo analisar se e em que medida a formação
continuada dos coordenadores pedagógicos da educação infantil do município de São
1123

Bernardo do Campo contribuiu para a atuação desse profissional. Essa investigação teve
como período temporal os anos de 2011 e 2012.
Para sua realização três temáticas foram abordadas por se entrecruzarem: a
formação continuada, por ser o âmbito de atuação dos coordenadores; a educação
infantil, por se constituir na área de atuação dos coordenadores; e a coordenação
pedagógica, que por ser função que está se constituindo, possui especificidades
necessárias de discussão.
Para escrever o texto optou-se por dividi-lo em quatro capítulos. No primeiro
foram apresentados os aspectos físicos e estruturais do Município e uma síntese de
como se deu a constituição da rede de ensino e os diferentes atendimentos que ela
proporcionou ao longo dos anos.
No capítulo II, abordou-se o entrelaçamento dos focos de pesquisa citados
acima, trazendo alguns aspectos referentes ao histórico da forma como a educação
infantil, a formação continuada e a coordenação pedagógica se constituíram, e como
estão delineadas na atualidade no cenário da educação. Esses aspectos foram
subdivididos em partes: num primeiro momento explicitando algumas concepções e
históricos sobre cada um deles apoiando-nos na literatura concernente à temática; na
sequência situando as bases em que essas temáticas se constituíram historicamente
também no município de São Bernardo do Campo, uma vez que era este o local de
atuação dos sujeitos da pesquisa. Assim, o texto foi composto intercalando os históricos
e concepções de cada uma das temáticas com o que apuramos no histórico da educação
do município de São Bernardo do Campo.
Para a composição do referencial teórico que pautou cada uma das temáticas
fizemos algumas escolhas. Barbosa (2000), Oliveira (2002), Carvalho (2002), Pinazza
(2007), Elias e Sanches (2007) e Postman (2011), foram alguns dos autores convocados
para compor o cenário da educação infantil no âmbito brasileiro.
A temática da formação continuada foi abordada considerando as discussões
propostas por autores como Nóvoa (1992), Day (2001), Oliveira-Formosinho (2002),
Thurler (2002), Arroyo (2003), Brzezinsky (2006) e Gadotti (2008) e, nos textos
produzidos pelo Ministério da Educação que diziam respeito à importância dessa
modalidade de formação para o aprimoramento do profissional da educação.
Para a abordagem do histórico da composição da coordenação pedagógica e seus
aspectos referentes à profissionalidade dos coordenadores, o texto foi referenciado em
1124

Garcia (2002), Horta (2007), Vasconcellos (2008) e Placco (2010), dentre outros, e,
ainda na legislação brasileira.
No capítulo III procurou-se esclarecer a metodologia utilizada e apresentar os
instrumentos de coleta de dados bem como as expectativas formuladas pelos
coordenadores que foram expressas nesses instrumentos. Nesse capítulo, encontram-se
presentes uma breve interpretação dos dados agrupados em categorias; foi realizada a
apresentação de cada um dos coordenadores pedagógicos entrevistados e, também, um
quadro destacando, dos planos de ação dos orientadores pedagógicos da Secretaria de
Educação, os objetivos, conteúdos e estratégias que eles elaboraram para a formação
continuada que realizaram com os coordenadores nos anos de 2011 e 2012.
O capítulo IV apresenta a análise desses dados coletados em todos os
instrumentos utilizados resgatando as categorias elaboradas a partir das expectativas, e
trazendo, para compor o cenário de análise, as falas dos coordenadores e, ainda, os
dados presentes nos planos de ação dos CP. A literatura produzida em torno das
temáticas da pesquisa foi chamada para compor o texto.
Apresenta-se por fim, o entendimento da pesquisadora sobre o que foi estudado
ao longo do trabalho. As considerações finais da pesquisa estarão presentes neste texto
posto que explicitam as análises e apresentam algumas questões que abrem
possibilidades a novas discussões sobre temas que tangenciaram o estudo.
Assim, entende-se que a pesquisa apresentou, conforme citado em Freitas e
Kuhlmann Jr. (2002), apenas uma possibilidade de trabalho diante de tantas outras que
seriam igualmente possíveis.
Para compor o texto deste trabalho, apresento a síntese da metodologia, a
primeira etapa do levantamento de dados e as considerações finais da pesquisa.
A metodologia
A pesquisa realizada se caracteriza como um estudo empírico de cunho
qualitativo que parte de questões elaboradas em instrumentos escritos aplicados aos
coordenadores pedagógicos (CP) em dois momentos distintos e por meio de entrevistas,
que permitiram a investigação sobre o objetivo posto.
Para fundamentar tal análise foi realizada a revisão bibliográfica sobre os focos
de trabalho, bem como o cotejamento entre as expectativas levantadas pelos CP para a
formação – por meio dos instrumentos de coleta de dados – e o que estava descrito nos
1125

planos de ação dos orientadores pedagógicos1– que são documentos que norteiam as
ações formativas.
Entendeu-se por bem, questionar os orientadores pedagógicos sobre o que eles
compreendem ser a coordenação pedagógica, acreditando que a sua compreensão pode
ser determinante para as ações que eles implementam com seu grupo.
O levantamento de dados
Do universo de aproximadamente 65 escolas da educação infantil que atendem a
faixa etária de 3 a 5 anos, foram distribuídos na primeira fase 37 questionários. O
primeiro contato com os coordenadores foi realizado no ano de 2011 – um ano após eles
terem assumido seus cargos no município que, no final do ano de 2009 realizou o
primeiro concurso público para esse cargo.
O primeiro instrumento elaborado para o levantamento das expectativas dos
coordenadores, além de dados gerais como nome, escola de atuação, tempo de
experiência, data do concurso, continha uma única questão direta: quais são as suas
expectativas em relação à formação que está se iniciando?
As respostas obtidas a partir dessa questão foram organizadas em três categorias
nas quais foram citadas e quantificadas as expectativas descritas pelos coordenadores.
As expectativas propriamente ditas, tal e qual aparecem escritas nos instrumentos
preenchidos pelos CP, foram nomeadas de sub-categorias.
Ainda que a ideia inicial não fosse a de trabalhar apenas com dados
quantitativos, optou-se por relacioná-los para talvez identificar alguma correspondência
entre a quantidade de CP com experiência anterior ao concurso e alguma expectativa
específica relativa ao fazer do coordenador pedagógico. Esse poderia assim ser o início
de uma análise.
Ocorre que as correspondências foram evidenciadas em outros níveis. Não foi
possível afirmar que a qualidade das expectativas dos coordenadores tivesse qualquer
relação com o tempo de experiência na coordenação pedagógica. Os CP com mais de 08
anos de atuação, da mesma forma que os CP com 05 anos de atuação como professores
no município e aqueles recém chegados na coordenação pedagógica e na SE,
relacionaram expectativas semelhantes. Assim, sem desprezar o aspecto quantitativo,

1
O orientador pedagógico é o profissional que atua na Secretaria de Educação com funções semelhantes
ao que é denominado como supervisor de ensino em outras redes de ensino. Ele é pedagogo, concursado e
tem habilitação específica em supervisão escolar, além de ter período comprovado em docência na
educação básica.
1126

posto que ele revelasse a intensidade dos interesses, a atenção se voltou às outras
correspondências possíveis.
O quadro abaixo além de listar as categorias, apresenta os quantitativos
referentes às indicações de determinada expectativa.

Quantidade de
Categorias Sub-categorias indicações

Aspectos teóricos/práticos referentes a função de


coordenador 10
Fortalecimento do grupo de CP 08
Reflexão sobre as próprias ações 07
Atuação do CP Papel de formador 06
Organização da rotina do CP 05
Contribuições à prática 05
Trabalho na gestão/colaboração efetiva 01
(42)
Intervenções nos instrumentos dos
professores/trabalho pedagógico 13
Conflitos/diversidade de concepções 05
Formação Problematização/ construção de soluções para
e PPP cotidiano escolar 04
Elaboração de plano de ação/formação 02
Construção do PPP/fazer da escola 02
Atendimento às demandas da escola 02
Formação de grupo 01
(29)
Concepções relativas à Educação/infância 07
Educação Infantil Trabalho com famílias/comunidade 01
Currículo da Educação Infantil e Avaliação 01
(09)
Estudo para aprimoramento/ampliar
conhecimento/subsídios teóricos 34
Socialização de práticas/trocas de experiências
18

Expectativas da formação – abril 2011.


Considerando a análise inicial realizada pela equipe da Secretaria de Educação e
seus diferentes profissionais que apontavam a necessidade de elaborar uma formação
para os CP que abordasse conteúdos específicos da coordenação pedagógica - discutir
características concernentes à configuração da atuação do CP – foi possível, fazendo
1127

uma breve leitura das expectativas citadas na categoria denominada acima de atuação
do CP, identificar correspondência entre o que ensejava a SE e o que esperavam os
coordenadores.
Outra correspondência possível se situou na categoria denominada formação2e
PPP. Novamente a avaliação realizada pela SE indicava a necessidade de que a
configuração da atuação do coordenador pedagógico do município se pautasse na ideia
de coordenador como formador de professores, ou seja, aquele que realiza intervenções
ao mesmo tempo em que provoca reflexões e estabelece parcerias de trabalho.
A terceira categoria que se formou a partir das expectativas foi denominada
Educação Infantil. Ainda que tenham sido poucos os CP que indicaram temáticas
referentes a ela, em virtude de esta ser a modalidade de atuação dos coordenadores
pedagógicos, num primeiro momento, e em virtude disso mesmo surgiu uma
preocupação: sendo essa a área de atuação dos CP – alguns deles sem experiência- não
seria importante que os conteúdos referentes à infância figurassem de forma expressiva
nas suas expectativas?
No entanto, no contexto em que se deu a formulação das expectativas para a
formação ocorria no município uma assessoria específica para as equipes gestoras e
orientadores pedagógicos da educação infantil que discutia, sob a ótica da teoria
histórico-cultural, os aspectos relativos ao desenvolvimento infantil, perpassando
também temas relativos ao desenvolvimento profissional de professores. Assim,
podemos inferir que as temáticas da infância não figuraram as expectativas visto que os
conteúdos de interesse dos CP já estavam sendo tratados pela assessoria.
As expectativas elaboradas pelos coordenadores apresentadas no quadro acima,
forneceram alguns elementos passíveis de uma análise que será, conforme se explicitou
acima, trazida conforme descrito na dissertação elaborada.
As concepções delineadas e os pontos de contato entre o histórico geral e o local
A pesquisa desenvolvida tomou como base algumas concepções:
a escola de Educação Infantil é local privilegiado para o desenvolvimento e
aquisição de aprendizagens pela criança, assim como se constitui em espaço de
interações. Compactuando com Nunes, Corsino e Didonet (2011), a criança que

2
O termo formação faz referência aqui à formação de professores, mais especificamente ao que habilita,
capacita ou confere ao CP condições de realizar intervenções no trabalho dos professores, seja por via
direta – nos planejamentos, planos de aulas, propostas de projetos didáticos e atividades – seja de forma
mais indireta – por meio do Projeto Político Pedagógico da unidade escolar. Convém reafirmar o nosso
entendimento de que toda ação formativa traçada pelo CP compõe o PPP.
1128

atualmente frequenta as escolas de educação infantil são sujeitos de direitos e por isso
mesmo, o espaço escolar deve primar por uma atuação que coloque a criança como
centro do processo educativo. A escola de educação infantil deve assim, estar
estruturada de forma tal que à criança seja possibilitada a interação com objetos e com
outros sujeitos e vivencie ali, diferentes experiências que lhe coloque em contato com a
cultura;
a formação continuada é um campo necessário para que os profissionais entrem em
contato com a reflexão sobre o seu fazer e, assim, possam aprimorar a sua atuação. Ela
pode ser concebida, conforme nos remete Gadotti (2008), como espaço de trocas,
reflexão, experimentação, de forma que nela, o profissional da educação encontre
terreno propício para o debate da sua constituição profissional e sobre o que é específico
da sua área de atuação.
o coordenador pedagógico é o profissional que atua no contexto escolar e tem como
seu foco de intervenção a formação continuada de professores e a elaboração do Projeto
Político-Pedagógico. Assim, adotou-se o entendimento de Almeida, Placco e Souza
(2011) segundo as quais ao coordenador pedagógico cabe articular, formar e
transformar o contexto escolar, por meio da atuação desenvolvida no coletivo escolar, e,
na mesma medida, na especificidade e individualidade da atuação docente. A adoção
dessa concepção implica a coordenação pedagógica numa prática que abarca a
complexidade.
Procurou-se também tecer um panorama da constituição desses três focos do
trabalho no município destacado, para que se pudesse identificar pontos de contato entre
a concepção geral, as discussões, debates e estudos no âmbito brasileiro e a forma de
interpretação local, em um determinado período histórico.
Desde os anos de 1960 quando a Educação Infantil começa a ser oficialmente
organizada em São Bernardo do Campo, a administração pública reúne esforços no
sentido de direcionar a prática dos professores, intentando alinhá-la inclusive às
legislações, conforme observou-se na Proposta Curricular do município mais recente
datada de 2004, que retrata os marcos legais aos quais o município se encontra
submetido.
Ao delinear uma síntese das concepções que permearam o entendimento sobre
criança, infância e educação infantil no âmbito geral e local, pode-se verificar os
seguintes pontos de contato:
1129

a visão assistencialista, a institucionalização da criança pobre pautada no cuidado e


supressão de fragilidades, mas também a forma de superação da marginalização de
crianças esteve presente na implantação das escolas do município;
a visão de escola como preparação e pré-escola como requisito para uma fase
posterior de ensino (primário), norteou muitas das ações implantadas no município que
derivaram de políticas públicas para superação do fracasso escolar;
atividades de seriação, classificação foram a tônica do trabalho que tinha como
pressuposto a ideia da necessidade de maturação para o desenvolvimento, assim como
estiveram também demarcadas as práticas que identificavam a criança como uma
semente a ser regada. Os jardins da infância, os profissionais denominados
recreacionistas figuraram na história da educação do município;
as atividades de exploração, as aulas-passeio (ainda que com outra nomenclatura), as
rodas de conversa, bem como a necessidade da compreensão do processo de apreensão
do conhecimento pela criança são elementos identificados no percurso da pré-escola/
educação infantil de São Bernardo do Campo.
Quanto à formação continuada, delineado o percurso histórico do município,
pode-se identificar:
ao longo dos anos, a formação esteve voltada para o aprimoramento profissional
colocando em foco as ações desenvolvidas pelos profissionais ajustando-as às
determinações e orientações do município, ou melhor, da administração que estava em
vigência.
a forma de conceber a formação continuada imprimiu aos próprios educadores uma
concepção de formação voltada para a discussão da prática de forma a adequá-la às
teorias vigentes, o que se aplicou também à forma como os coordenadores pedagógicos
direcionam as suas ações formativas junto ao coletivo escolar em que se encontram
inseridos.
ocorreu a criação de uma equipe interna concursada para garantir o processo de
formação, ainda que representando a administração vigente.
cursos, palestras, seminários, encontros entre professores, congressos de educação,
assessorias externas à SE, estudos de textos, elaboração de subsídios teóricos, foram
algumas estratégias formativas organizadas para colocar os educadores da rede de
ensino em contato com as experiências desenvolvidas, bem como com as teorias de
cada momento histórico.
1130

as diferentes teorias e concepções estudadas no município por meio da formação


continuada imprimiram diferentes modelos de estrutura e prática na educação infantil de
São Bernardo do Campo.
A coordenação pedagógica, por sua vez, vem se configurando ao longo dos anos
como sendo responsável pela formação continuada dos professores e pela elaboração e
implementação do PPP como observou-se na literatura consultada e, no município local
desta pesquisa. Identificou-se assim, que a complexidade é a característica da
coordenação pedagógica no que se averiguou no âmbito geral, e também no município
de São Bernardo do Campo, em virtude de diversos fatores:
a recente instituição desse cargo que, ainda que não trouxesse fortemente o ranço da
antiga supervisão ou da inspeção, é encarada com tal, em alguns contextos escolares,
uma vez que a atuação dos coordenadores pedagógicos provoca resistências aos
professores;
o amplo espectro da atuação dos coordenadores pedagógicos que incide desde a
consciência do professor sobre quais as características da sua profissão, até intervenções
com crianças e famílias e a articulação da equipe gestora;
as relações de poder que se instalam no contexto escolar na contrapartida da
necessidade de construção coletiva;
a corresponsabilidade pelo sucesso das aprendizagens das crianças e a constituição
de parcerias com os professores;
a necessidade de compreensão de seu papel e a construção de uma prática que
fortaleça as relações de grupo, tanto no que diz respeito a seus pares coordenadores,
tanto no que diz respeito a equipe que coordena.
Esses pontos de contato ou de identificação explicitados acima, serviram de
referência para localizar o panorama de atuação dos coordenadores pedagógicos.
Após identificadas convergências entre as concepções, as expectativas escritas e
as falas dos CP, os documentos e legislações que consultados, entende-se que a
formação continuada dos coordenadores pedagógicos da Educação Infantil de 3 a 5 anos
realizada pela Secretaria de Educação nos anos de 2011 e 2012 ofereceu contribuições
para a atuação profissional na medida em que:
propiciou discussões acerca da profissionalidade dos coordenadores pedagógicos que
abarcaram não apenas o aspecto relativo a compreensão do seu papel como formador de
professores, como aspectos relacionados ao seu cotidiano e importância de estruturar a
sua rotina diária; necessidade de identificar demandas que realmente fazem parte da
1131

natureza do seu trabalho; necessidade de articulação com a equipe gestora da qual faz
parte; acompanhamento individual e específico ao grupo de educadores (intervenções
nos registros, planejamentos e relatórios elaborados pelos professores); elaboração e
implementação dos projetos político-pedagógicos;
se constituiu como momento de reconhecimento da complexidade da sua atuação e
ainda, do coordenador pedagógico como pertencente a um grupo – extra-escolar – cujos
integrantes possuem as mesmas dúvidas, angústias, questionamentos. Dessa forma, o
sentimento de pertença necessário para imprimir maior segurança ao seu fazer
pedagógico, foi vivenciado. Em alguns grupos foi também um momento de expressar as
dificuldades do cotidiano escolar em relação aos mandos da direção e a falta de
aceitação às contribuições, aos novos olhares que os CP trouxeram para as antigas
práticas, o que provocou a discussão cotidiana de possibilidades de utilização de
estratégias para evidenciar essas contribuições;
possibilitou a troca de experiências entre os pares no que se referia à: atuação no
acompanhamento à prática pedagógica dos professores; estratégias de condução do
trabalho coletivo; compreensão de seu papel como formador de professores; ampliação
do referencial teórico acerca da educação infantil, formação de professores e
profissionalidade do formador; complexidade e especificidade do trabalho com a
infância;
evidenciou a necessidade da construção coletiva considerando as contribuições,
necessidades e dificuldades individuais no que diz respeito à construção e
implementação de um projeto político-pedagógico que prime pela participação ativa de
todos os atores (profissionais, famílias, comunidade).
No entanto, é sabido que a transformação dessas reflexões ocorridas, das
discussões, dos confrontos entre teoria e prática em uma prática consciente e renovada
pode levar algum tempo, visto que os encontros formativos são recentes e que
demandam algumas outras ações, inclusive na estruturação da política pública do
município.
Assim, identificou-se também alguns problemas na formação oferecida, ainda
que reconhecendo que ela ocorreu em forma de encontros pontuais e espaçados no
tempo cronológico, sendo essa questão inclusive apontada pelos coordenadores
pedagógicos que, mesmo avaliando bem a formação indicaram que a quantidade de
encontros foi insuficiente para a necessidade que se colocava.
Dessa forma, destacaram-se como problemáticas a serem enfrentadas/superadas:
1132

as orientações conforme a vigência da administração – muda a administração,


mudam as diretrizes o que causa, por vezes rupturas na forma de conceber a formação
dos profissionais da educação;
a dicotomia teoria x prática esteve presente quando observamos movimento ora
voltados para a socialização de práticas, ora para o estudo e aprofundamento teórico,
com a contratação inclusive de assessorias externas, atualmente, sem a participação da
equipe de orientadores pedagógicos, colocando-os à margem das discussões sobre as
diretrizes da política pública da educação;
a dualidade característica da atuação dos orientadores pedagógicos que coloca os
profissionais em contato com teorias, organiza encontros formativos e subsídios que
viabilizem trocas entre os profissionais visando o seu aprimoramento, ao mesmo tempo
em que representa a SE e, dessa forma a administração vigente;
o movimento dinâmico de estudo das diferentes concepções imprimiu práticas aos
educadores, algumas obsoletas, mas que ainda são observadas em consonância com as
diferentes tendências;
a pouca indicação sobre os estudos referentes à educação infantil. A implantação do
ensino fundamental de 9 anos provocou mudanças importantes no contexto educacional.
Os abismos conceituais entre educação infantil e ensino fundamental se tornam assim
mais evidentes. A concepção de 0 a 10 anos é anunciada nos documentos do município,
mas até o ano de 2013 pouco se fez em relação à isso;
a discussão sobre a coordenação pedagógica é realizada de foram restrita - a
discussão da ação coordenadora junto aos professores poderia ser importante para a
construção de uma atuação mais democrática e compreendida;
a hierarquização, relações de poder são citadas com a tendência de evitar conflitos,
quando eles, ao inverso, são necessários para a revisão de concepções e práticas;
as intervenções nos planejamentos dos professores realizadas pelos coordenadores
pedagógicos são realizadas, por vezes, muito mais na perspectiva de questionar ou
apontar possibilidades de atividades junto as crianças, deixando em segundo plano os
objetivos, as finalidades das atividades. Assim, a discussão sobre a prática dos
coordenadores pode também acompanhar essa tendência.
Os aspectos apontados acima devem ser colocados em discussão de forma mais
abrangente. Assim, essas problemáticas remeteram a algumas questões:
• A quase ausência de discussões sobre os aspectos históricos referentes à infância, à
coordenação pedagógica e à formação, não estaria imprimindo à formação continuada
1133

dos coordenadores um caráter estritamente prático, sem a compreensão dos


determinantes históricos que originam inclusive algumas concepções e resistências,
ainda que apoiadas na literatura educacional? A pouca discussão sobre as dimensões da
profissão docente não estaria, conforme aponta Vasconcellos (2007), contribuindo para
alienação do educador?
• Por que as ações formativas do município são descontinuadas uma vez que todos os
envolvidos reconhecem a necessidade a formação continuada devido à complexidade do
trabalho e da especificidade das faixas etárias atendidas? O “eterno recomeçar” citado
por um CP na entrevista também não estaria caracterizando as ações da SE?
• Em que medida as relações de poder manifestas explicitamente pela hierarquização
institucional permitem, de fato, a exposição das críticas e mazelas do sistema público
educacional? Os profissionais se envolvem no fazer à mesma medida que questionam a
sua condição de educadores e o contexto da sua atuação?
Essas questões abrem possibilidades para outras tantas investigações. Naquilo que
foi proposto como objetivo de pesquisa pode-se concluir que a formação continuada
apresentou contribuições à atuação dos CP.

Referências

ALMEIDA, Laurinda Ramalho. PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza. SOUZA, Vera
Lucia Trevisan. O coordenador pedagógico e a formação de professores: intenções,
tensões e contradições. Fundação Vitor Civita, 2011. Disponível em
http://www.fvc.org.br/estudos-e-pesquisas/2010/perfil-coordenadores-pedagogicos-
605038.shtml. Acesso: Jan. 2012.

FREITAS, Marcos Cezar de; KUHLMANN Jr, Moyses. Os Intelectuais na História


da Infância. São Paulo: Cortez Editora, 2002.

GADOTTI, Moacir. Boniteza de um sonho: ensinar-e-aprender com sentido. São


Paulo: Editora e Livraria Instituto Paulo freire, 2008. Escola Cidadã: 2.

NUNES, Maria Fernanda Rezende; CORSINO, Patrícia e DIDONET, Vital. Educação


infantil no Brasil: primeira etapa da educação básica. Brasília : UNESCO, Ministério
da Educação/Secretaria de Educação Básica, Fundação Orsa, 2011.

VASCONCELLOS. Celso dos S. Planejamento: projeto de ensino-aprendizagem e


projeto político-pedagógico. 17ª. ed. São Paulo: Libertad, 2007.
1134

Comunicação

A desvalorização da carreira do magistério : um contexto de uma categoria no


Brasil atual

Sebastião Monteiro Oliveira


PPGE/UNINOVE

A discussão sobre a carreira do magistério e sua desvalorização nas últimas


décadas tem aumentado, hoje é uma carreira que tende a desaparecer como única renda
de quem a exerce, as condições de trabalho, o salário e a falta de prestígio são apenas
alguns dos aspectos que não tornam uma profissão atraente. Existem hoje no país
muitas atividades profissionais que atraem mais em início de carreira. Isso é reflexo de
uma política de desvalorização desse profissional que nos últimos anos tem se
intensificado bastante, essa rápida reflexão faz uma análise sobre o tema que é muito
complexo e merece ser mais debatido.
Fazendo um paralelo com o político brasileiro por exemplo, um deputado
federal, que nem precisa ter formação acadêmica, receber um salário de R$ 26,7 mil é
um luxo para poucos no país.
Fazendo um paralelo de salários e vantagens é vergonhoso o descaso com a
profissão docente. Os deputados federais que ganham essa bolada todos os meses, os
rendimentos privilegiados não são o único atrativo do cargo. Existem tantos benefícios
que um deputado ou mesmo senador ode viver sem sequer colocar a mão no próprio
bolso.
Além do salário com suas vantagens, eles têm direito a atendimento médico
ilimitado, passagens aéreas, carro alugado, combustível, conta de telefone paga pelo
estado e auxílio-moradia. Numa comparação dos benefícios garantidos aos deputados
com os direitos assegurados aos cidadãos comuns é fácil constatar que a situação de
quem tem mandato no Congresso destoa muito da realidade dos trabalhadores
brasileiros e do povo em geral que eles representam.
É constrangedor uma análise dessa atividade com o valor profissional a nível
salarial em qualquer Estado do país. Em relação aos vencimentos salariais, nem mesmo
1135

na capital federal, onde a renda já é bastante alta em comparação com o resto do país,
existem tantas famílias que chegam ao nível de remuneração dos parlamentares.
São 7.783 famílias vivendo com renda domiciliar entre 40 e 50 salários
mínimos, o que corresponde a 1% dos lares brasilienses. Na Região Metropolitana de
Belo Horizonte, 90% dos trabalhadores ganham menos de R$ 2,5 mil, ou seja, recebem
menos de um décimo do que ganham os parlamentares, se formos para a chamada
periferia do Brasil, vamos observar que essa disparidade cresce assustadoramente,
considerando, por exemplo cidades do interior nordestino ou mesmo do norte do Brasil
(ONG Brasil, 2014).
O professor da rede pública de qualquer Estado da Federação tem
dificuldade de assistência médica, no entanto, um deputado federal tem assistência
médica ilimitada, sem considerar a maioria dos cidadãos que morrem a mingua na porta
dos hospitais. Outro aspecto a ser considerado é que deputados podem pedir reembolso
de despesas médicas e hospitalares realizadas em qualquer local do país.
É muito comum a Câmara pagar cirurgias, exames e tratamentos
realizados na clínica ou hospital de preferência do parlamentar. Segundo a Câmara, esse
serviço de reembolso é mais vantajoso para os cofres públicos. Isso porque o custo de
pagar um plano de saúde para deputados seria alto, já que a maioria tem mais de 50
anos, recentemente o Presidente do Senador escandalizou a sociedade brasileira ao
utilizar avião pago pelo senado para implante de cabelos, mas isso é apenas um gasto,
considerado irrisório se realmente for divulgado os gastos dos políticos de Brasília.
Outras vantagens absurdas dos parlamentares vão desde tanque cheio em carros de
luxo até direito a reembolso dos recursos gastos com uma série de produtos ou serviços
e o limite mensal varia de R$ 23 mil a R$ 34,2 mil, dependendo do estado do
parlamentar. Com esse dinheiro, é possível comprar passagens aéreas; pagar telefone e
serviços postais; manter escritório de apoio à atividade parlamentar; acertar conta de
restaurantes e de hotéis; alugar ou fretar aeronaves, embarcações ou carros; encher o
tanque de combustível; contratar segurança particular ou serviços de consultoria (ONG
Brasil 2014).
Em contrapartida, estoura movimentos de greve dos professores, na Bahia, São
Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e por aí vai, e não tem dinheiro para
melhorar o salário minguado de quem faz educação nesse país, surgem os comentários e
1136

argumentações sobre os professores que fazem greve, é interessante porque o professor


é considerado o responsável pelo futuro do país quando suporta calado e passivamente a
relação de exploração por parte do Poder Público, mas quando se mobiliza passa a ser
baderneiro, irresponsável, que deixa as crianças sem aula e começa a relação de
adjetivos que desqualificam esse sofrido profissionais
Os políticos, apesar de todas as regalias e de terem aprovado a rotina de três dias
de expediente, os parlamentares até hoje adiam uma decisão a respeito do fim do 14° e
15° salários. Eles recebem em fevereiro e em dezembro de todos os anos uma "ajuda de
custo" equivalente à remuneração de R$ 26,7 mil. Em um ano, esses salários extras
representam um incremento médio de R$ 4,4 mil no rendimento mensal. È assim que é.

Deputado X Professor: quanto custa

Vejamos os altos salários dos 513 deputados federais, segundo dados da ONG
Transparência Brasil:

Fonte: Transparência Brasil


1137

Cada um dos 513 deputados federais possui a chamada verba de gabinete, esta
verba mensal é para gastar com material de escritório e pagar até 25 assessores
parlamentares. Os deputados federais brasileiros estão entre os que podem contratar
mais gente.

Fonte: transparência Brasil

A verba indenizatória , outro absurdo pago aos deputados, essa verba é utilizada
para gastos com gasolina, comida, hospedagem, aluguel de escritório, além dos auxílio
que eles já recebem no Congresso, e consultorias, essas consultorias podem ser
qualquer coisa que os deputados decidirem chamar de consultoria.
1138

Fonte: Transparência Brasil 2014


Além do 13º, há mais dois salários extras no início e no fim do ano legislativo,
para dar uma força. Recebem inclusive mais que o Presidente da República
(Transparência Brasil)
1139

Fonte: Transparência Brasil 2014

Outras vantagens:

Auxílio moradia
A ajuda no aluguel vale até para deputados do Distrito Federal. A alternativa
seriam apartamentos funcionais, que acabam repassados a assessores e parentes.

Cota Postal e telefônica


É preciso muito correio e DDD para contatar as bases. A cota também pode
incluir a conta da banda larga.

Impressões e assinaturas: R$ 1 000


Além de imprimir o que acharem necessário, nossos representantes têm uma
grana para assinar jornais e revistas (Transparência Brasil).
1140

Fonte: Transparência Brasil 2014

Passagens
Deputados ganham viagem ida e volta de Brasília para o estado que
representam. São R$ 9 mil por mês que não precisam de justificativa - pode ser
convenção partidária ou festa junina.

Assistência Médica
Cada deputado e sua família podem pedir reembolso ilimitado de gastos com
saúde. Em 2009, a Câmara gastou R$ 50 milhões com médicos e dentistas: deu R$ 8 mil
para cada (transparência Brasil).
1141

Fontes: ONG Transparência Brasil e Câmara dos Deputados

Câmara dos Deputados


Comparação do custo de um deputado federal com a riqueza média gerada por
um cidadão em alguns países.

Fonte; Transparência Brasil e Câmara dos Deputados


1142

Agora vamos comparar com um professor de uma IFES .Um professor com
mestrado na rede federal de ensino: acompanhando os itens dos proventos do deputado
federal:

Vencimento básico: 4.484,99


Anuênio art. Lei 8112/90: 134,54
Auxílio alimentação: 373,00
RT – Retribuição por titulação AT: 2.261,88
Contribuição/INSS: 756,95 (desconto)
Imposto de Renda retido na fonte: 801,73 (desconto)
Total líquido: 5.695,73
Fonte: Siapenet

Fazendo uma rápida comparação pode-se perceber que um professor com


mestrado com mais de 15 anos de trabalho ganha pouco mais de cinco mil reais por
mês, as férias são de 45 dias, se tiver alguma viagem para apresentar trabalho e o
departamento ao qual pertence tiver recurso, recebe passagem e minguadas diárias com
um valor que não permite se hospedar num hotel com diária de duzentos e cinquenta
reais por exemplo, dependendo do lugar esse valor não chega a um valor de uma diária.
É importante destacar aqui que nestes dados não entram as barganhas políticas e
as “tramoias” que os políticos fazem em Brasília para se beneficiar mais ainda, portanto,
os benefícios e as vantagens são bem maiores ainda.
Se o departamento não dispor mais de recursos, o professor não vai para o
evento, isso é muito frequente, outro valor que chama atenção é o vale alimentação, no
governo FHC op valor era de oitenta reais, e o governo Tucano colocou no
contracheque, embutido nas gratificações, e hoje está em 373,00 (trezentos e setenta e
três reais), se o professor viajar para algum evento e receber diária esse valor cai.
Essa amostra não coloca outros valores que o professor possa ter, por exemplo,
se ele tiver um plano de saúde, esse valor reduz mais ainda, se tiver algum empréstimo
consignado, cai mais ainda e é muito comum um servidor ter empréstimo em folha.
Quanto ao salário de deputados, os valores falam por si só, é tanto auxílio e
vantagens, a ponto de recebem décimo quarto e décimo quinto como forma de ajuda
para seus gastos, essa analogia é apenas para uma reflexão, mas a situação é mais grave
1143

ainda porque no caso dos políticos, é muito comum nos noticiários da mídia em geral,
sempre conseguem uma maneira de aumentar mais ainda os seus salários e vantagens.
Essa é a realidade do professor, mas se comparar com os professores de
municípios do norte e nordeste, a situação é bem pior, professores que ganham salários
minguados em condições de trabalho precárias, em cidades como São Paulo, que tem os
melhores centro de excelência do país, é o caso por exemplo, da USP e da UNICAMP, e
em contrapartida, os professores que atuam na Educação Básica são completamente
abandonados, um Estado rico que poderia fazer mais, no entanto a insatisfação é geral.
Os professores que atual em Instituições de ensino superior públicas,
conseguem, não como regra geral, a liberação para cursar mestrado e doutorado, e
poucas bolsas são disponibilizadas para estes profissionais, e no caso dos professores
que atuam na Educação Básica, esses nem sequer conseguem liberação, com raras
exceções.
Quando se trata do financiamento e a destinação de mais recursos para o setor
educacional, tal qual a prática administrativa implementada pelo Estado Português em
sua medida de “desresponsabilização” pela educação pública da colônia”
(MONLEVADE, 2001, p.67). A Educação a Distância, de certa forma, é resultado dessa
preocupação, é uma política de formação mais barata e massificada, é uma herança
histórica o descaso com a educação, por outro lado, ouvimos falar constantemente de
livro didático que não chega, de uniforme que não é entregue para os alunos já no meio
do ano letivo (muito comum no caso de São Paulo), greves por todo Brasil por
melhorias de salário e melhores condições de trabalho.
Isso tudo, por assim dizer, reflete a lógica da “racionalidade financeira”,
recomendada por organismos internacionais de financiamento (Banco Mundial),
totalmente acatada e implementada, principalmente pelo governo Fernando Henrique
Cardoso, conforme evidenciado pela política educacional e de financiamento executadas
durante sua gestão nos anos 90 e início dos anos 2000, seguida a risca pelo governo que
o sucedeu, como bem podemos observar depois de mais de uma década do início dessas
políticas.
Esse é o contexto do professor no Brasil inteiro e essa pálida comparação
demonstra o cuidado que se tem com um grupo de pessoas que pouco ou nada se
importam com os problemas da maioria da população brasileira, propiciando tantas
1144

vantagens quantas eles poderem criar para seus confortos e comodidade, e os


professores como categoria profissional, perdem totalmente o estímulo pela profissão, o
que justifica o déficit de professores que existe no Brasil.

Considerações Finais

É perfeitamente compreensível esse quadro da atual desvalorização dos


professores no Brasil, quando se faz uma análise das políticas de formação de
professores na década de 90, que se preocupou em criar cursos mais curtos, a chamada
formação em serviço e os c ursos a distância, reduzindo os gastos do governo mas sem
se preocupar como uma formação de qualidade, nem com um ensino de qualidade.
Além disso, quase conseguiram acabar com as universidades públicas no Brasil,
um golpe quase fatal do governo Tucano contra o ensino superior público, que ainda
hoje sofremos as consequências, universidades tradicionais como a UFRJ, uma das
primeiras do áis, quando visitamos vemos o estado de sucateamento dessa instituição,
que não é uma exceção, as universidades públicas em todo Brasil sofrem do mesmo
mal, a falta de recurso, falta de professores, falta de técnicos administrativos e por aí
vai.
A educação Básica por sua vez, de qualidade duvidosa para não usar outros
adjetivos, professores com salários aviltantes, condições de trabalho péssimas,
professores se afastando de trabalho por depressão e outras doenças num ambiente que
hoje é insalubre para eles, a escola, sem falar na falta de segurança, hoje ser professor é
uma profissão de risco.
Portanto, essa é atual situação dos professores em nosso país, sem muitas
perspectivas de melhoria, mas a luta continua, muitos professores estão indo para as
ruas para reivindicar, mesmo com o silêncio da imprensa, buscando dias melhores, para
o ensino público brasileiro.
1145

REFERÊNCIAS

GATTI, B. A; BARRETTO, E. S. de S. Professores do Brasil: impasses e desafios.


Brasília: UNESCO, 2009

MONLEVADE, J. e FERREIRA, E. O FUNDEF e seus Pecados Capitais. 2ª


ediçãoCeilândiaDF: Idea Editora, 1998.

_______________. Educação pública no Brasil: contos e descontos.2ª edição.


Ceilândia DF: Idea Editora, 2001

ONG Transparência Brasil. 2014.

Portal da Câmara dos Deputados. 2014

PRETI, Oreste. Educação a distância: construindo significados. 2. ed. Brasília:


Plano, 2000.

SAVIANI, D. Da Nova LDB ao novo Plano Nacional de Educação: Por uma outra
Política Educacional . 3ª edição rev. Campinas, SP: Autores Associados, 2000 (Coleção
educação contemporânea).

Siapenet.org.br. 2014

Transparência Brasil Câmara dos Deputados. 2014.


1146

Comunicação

Políticas da educação infantil e a prática docente

Simone de Oliveira Andrade Silva


PUC/SP
Clarilza Prado de Sousa
PUC/SP; FCC
Agência financiadora: CNPq

Resumo: Este trabalho teve o objetivo de identificar diretrizes presentes no Referencial


Curricular Nacional para a Educação Infantil – RCNEI, eixo de trabalho: matemática,
que persistiram como orientações na prática docente. Para coleta de informações,
utilizou-se: análise documental e entrevistas a professores e coordenadores pedagógicos
de Escolas Municipais de Educação Infantil do município de São Paulo. Para a análise
dos documentos, tomou-se como referência a teoria-metodológica do Ciclo de Políticas,
de Stephen J. Ball e Richard Bowe. Esta análise contou com o apoio do software
ALCESTE. Os resultados revelaram que os profissionais mantiveram sua forma
tradicional de ensino, embora tenham citado o documento como um modelo unificador
nacional das diretrizes para a Educação Infantil. Além disso, foi possível identificar um
documento que sofreu influências nacionais e internacionais, o que contribuiu para um
texto confuso, de difícil interpretação e com muitas contradições.
Palavras-chave: Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Abordagem
do Ciclo de Políticas. Ensino e aprendizagem.

APRESENTAÇÃO

Este trabalho buscou analisar o alcance de um documento que foi elaborado pelo
Ministério da Educação e Cultura – MEC para orientar a escola e o professor na busca
da qualidade na educação infantil. A intenção foi analisar o Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil – RCNEI (BRASIL, 1998), um documento não
mandatório, que, de acordo com as pesquisas de Cerisara (2002) e Wiggers (2009) está
presente em grande parte das escolas brasileira. Para Wiggers (2009), o RCNEI é
conhecido e supostamente o mais utilizado no embasamento dos projetos pedagógicos,
por causa das estratégias de divulgação e implementação utilizadas pelo MEC.
1147

Com relação a isto, pesquisa realizada pelo próprio MEC com a colaboração da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, em 2009, concluiu que 52,08%
das instituições de ensino de todo o Brasil utilizavam o RCNEI na elaboração de suas
propostas pedagógicas.
Partindo destas considerações, o interesse inicial deste estudo surgiu do
questionamento de quais as diretrizes presentes no RCNEI persistiram como orientações
para a prática docente do professor de educação infantil – EI. Para isto, analisou-se o
documento e, ao mesmo tempo, a compreensão de como e quais as orientações estavam
sendo vivenciadas na prática desses profissionais, atuando com crianças na faixa etária
de quatro a seis anos1.
No entanto, para melhor compreensão desta dinâmica e na intenção de delimitar
o trabalho, focou-se em uma área de conhecimento específica: a matemática. A escolha
desta área de conhecimento se justifica pela crescente preocupação do Brasil com seu
ensino nas escolas, devido aos resultados apontados pelas avaliações nacionais (SAEB e
Prova Brasil), em que foi demonstrado baixo desempenho dos alunos.
Diante disso, o problema desta pesquisa ficou assim delineado: quais as
diretrizes presentes no RCNEI referente ao ensino de matemática persistiram
como orientações da prática docente do professor de EI?
Considerando que as diretrizes apresentadas no RCNEI resumem políticas
educacionais em relação à EI, procurou-se o apoio de autores que desenvolveram
instrumental teórico-metodológico que permite uma análise mais ampla, articulada dos
processos, documentos e práticas políticas. Neste sentido, os estudos de Stephen Ball e
Richard Bowe formulados em 1992, contribuíram efetivamente para organização das
análises do presente estudo. Para os autores, a análise dos documentos que definem uma
política, se constitui em um momento importante para compreender os conflitos e
transformações que operam na prática. Para isso, o estudo das orientações curriculares
pode ser observado em cinco contextos: o contexto de influências, o contexto da
produção de texto, o contexto da prática, o contexto dos resultados/efeitos e o contexto
da estratégia política. No entanto, Ball (1994) e, também, Mainardes (2006),
descreveram mais profundamente os três primeiros contextos citados.

1
Embora a pesquisa tenha utilizado somente a faixa etária de quatro a cinco anos, pois as crianças de seis
anos não pertencem mais à EI e, sim, ao Ensino Fundamental, como estabelecido a partir da Lei
11.274/2006, onde se lê, no art. 32, que “O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove)
anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade [...]” (BRASIL, 2006).
1148

Para estes autores, os contextos devem ser compreendidos como processos que
se articulam, identificados como Ciclo de Políticas. Sua teoria-metodológica foi
denominada Abordagem do Ciclo de Políticas – ACP, que parte da concepção de
política como um processo em movimento, não linear, onde os contextos, mesmo tendo
sua abrangência e características próprias, se influenciam mutuamente, significa dizer
que cada ciclo não pode ser analisado isoladamente.
Este alerta foi considerado no presente estudo que, mesmo tendo analisado
apenas dois ciclos (contextos de produção de texto e da prática), teve o cuidado de
compreendê-los no contexto de uma política mais ampla, que envolveria todos os ciclos.
Neste sentido, ao analisar o espaço político em que o documento foi gestado, no
contexto de produção de texto, buscou-se rastros dos grupos que influenciaram a
construção do documento, sem se deter nas características destes, por não ser objetivo
desta pesquisa. Para a compreensão do contexto da prática, foram ouvidos os
professores e coordenadores pedagógicos, para identificar como estes descrevem a
prática e as orientações políticas no trabalho junto à criança pequena.

MÉTODO

Neste trabalho, optou-se por duas formas de coleta de informações: a análise


documental e a entrevista. Para a primeira coleta, buscaram-se dados para a análise do
contexto de produção de texto através análise documental do RCNEI, a fim de
compreender a organização do documento em termos de revelar os tópicos considerados
mais relevantes, as prioridades, as ênfases e as políticas presentes nas orientações
curriculares.
Na segunda etapa, para a compreensão do contexto da prática, o estudo voltou-
se para o discurso dos atores educacionais (coordenadores pedagógicos e professores de
EI, das Escolas Municipais de Educação Infantil – EMEI da cidade de São Paulo) sobre
o RCNEI e o ensino da matemática, para a compreensão de como este documento vem
sendo interpretado e utilizado, longe daqueles que formularam a sua redação. Nessas
escolas, foram entrevistados três coordenadores pedagógicos e nove professores,
totalizando doze entrevistas. O critério utilizado para a escolha desses profissionais foi
amostragem não probabilística, por conveniência (acessibilidade da pesquisadora e
disponibilidade da escola em participar da pesquisa). O ambiente da própria escola foi
utilizado como local para a realização das entrevistas.
1149

Nesta etapa, o que importava era descobrir como o documento foi recebido e
utilizado, quais as resistências foram criadas, quais as concessões foram permitidas e
quais as transformações foram praticadas. Esta decisão se deve ao fato de que, segundo
Ball,
[...] a pessoa que põe em prática as políticas tem que converter/transformar
essas duas modalidades, entre a modalidade da palavra escrita e a da ação, e
isto é algo difícil e desafiador de se fazer (MAINARDES; MARCONDES,
2009, p.305).

Para que fosse possível analisar a importância do RCNEI na prática do


professor, utilizou-se a técnica de entrevista semi-diretiva, que, para Hoffmann e
Oliveira (2009)
[...] pressupõe que o informante é competente para exprimir com clareza sua
experiência, é uma maneira de receber informações do entrevistado da
maneira que ele desejar manifestar em seus atos o significado que têm no
contexto em que eles se realizam [...] (HOFFMANN; OLIVEIRA, 2009, p.
924).

Esta técnica possibilita que o entrevistado possa se expressar, sem que tenha que
ser dirigido, o que pode ajudar o pesquisador a observar o grau de frequência com que o
assunto-alvo aparece livremente no discurso do participante. Além disso, por trazer
mais naturalidade, possibilita, também, o aparecimento de contradições em sua fala.
Para organização dos dados, foi utilizado o software francês ALCESTE. No
entanto, a análise da primeira etapa – análise do contexto da produção de texto –
envolveu, ainda, uma análise documental descritiva.

ANÁLISE DOS DADOS

As análises possibilitaram a compreensão do contexto de produção de texto do


RCNEI e dos grupos que o influenciaram. O documento não apresentou o que se vinha
conduzindo através dos estudos, pesquisas e discussões realizadas entre o MEC, os
pesquisadores acadêmicos, as escolas e os profissionais que atuam na EI, ao utilizar os
modelos internacionais de currículo, ele se “esqueceu” de apontar a realidade brasileira,
na concepção de uma criança universal, contradizendo sua concepção de uma criança
contextualizada e histórica. Como afirma Haddad (1998), o currículo espanhol, mais
utilizado como modelo na elaboração do RCNEI, foi um documento elaborado com
toda a sociedade espanhola e pensado durante dois anos para a sua elaboração. O
RCNEI, ao contrário, entre o tempo de elaboração, de consulta (restrita a alguns
1150

estudiosos e com tempo escasso) e de envio para as escolas, levou menos de um ano.
Percebeu-se um documento cheio de remendos e de contribuições variadas, que o
tornou confuso e, por vezes, contraditório.
Quando se analisou o resultado do processamento do trecho referente ao eixo de
trabalho de matemática no software ALCESTE, embora a separação dos três
componentes curriculares tenha sido encontrada nas classes que dividiram o material
textual, conforme demonstra a figura 1, não foi encontrada integração entre elas, como o
documento propõe. Os objetivos, que abarcaram a maior parte dos discursos, indicaram
uma forma de ensino menos sistemática, voltada para vivência de experiências e
aproximações com noções matemática, através da utilização de situações-problema. A
extensa lista de conteúdos apresentados na classe: conteúdo indicou a sistematização do
ensino, com planejamento centrado no currículo. As orientações didáticas descritas na
classe com menor porcentagem, com função de orientar o professor na avaliação do
desenvolvimento da criança, citaram quase que exclusivamente o bloco de conteúdos:
números e sistema de numeração, conduzindo o professor a identificar este bloco como
o mais importante a ser trabalhado.

Fig. 1 – Distribuição do corpus e seus significados do RCNEI,


eixo de trabalho – matemática:
Apesar de se apresentar como um documento que visa ir além de uma concepção
de EI como pré-alfabetizadora, quando se comparou o RCNEI com os outros
documentos produzidos por São Paulo, não se observou muitas inovações quanto ao
ensino da matemática (SIQUEIRA, 2007).
Ao se observar o contexto da prática, os dados indicaram a utilização do
documento mais como um modelo de currículo do que como orientador do trabalho.
O professor identifica o documento como obrigatório e não o percebe como
orientador. Sua força como um texto prescritivo surgiu na compreensão dos significados
e na identificação de categorias de sentido através da análise das classes resultantes do
processamento do ALCESTE, como demonstra a figura 2, as ideias de currículo comum
1151

e de bíblia apontaram para diretrizes de conduta que deveriam ser seguidas. No entanto,
a dificuldade de interpretação e a resistência ao novo modelo de EI, faz com que ele não
modifique sua forma anterior de ensinar e conceber este nível de educação.

Fig. 2 – Distribuição do corpus e seus significados


no discurso dos profissionais sobre o RCNEI:
Quando se abordou, especificamente, o ensino da matemática, no resultado da
distribuição do corpus, como indica a figura 3, o programa fragmentou o material em
seis classes que foram agrupadas, de acordo com a integração entre si, em duas
categorias de sentido: prática (na integração das classes 1, 5 e 6) e planejamento
(representada pelas classes 2, 3 e 4).
O baixo aproveitamento do material (somente 63%, sendo eliminados 37%),
resultou em um discurso divergente. Com isso, foi possível identificar, pela primeira
vez, uma separação entre os discursos dos dois grupos de profissionais.
A categoria prática representa 32% do discurso aproveitado pelo programa e está
relacionada ao discurso dos professores, enquanto que a categoria planejamento
representa 68% e está relacionada ao discurso dos coordenadores pedagógicos.

Fig. 3 – Distribuição do corpus a partir do discurso dos profissionais sobre matemática:


As respostas dos professores indicaram que o documento não trouxe orientações
que possibilitassem a melhora da prática docente, pois ele continuou apontando para
direções que não conduziam a um ensino diferente, além de não ser um suporte para a
1152

reflexão do professor sobre a área. O que se observou no discurso dos profissionais foi
que mantiveram suas práticas anteriores e que os componentes curriculares tão
trabalhados no RCNEI (objetivo, conteúdo e orientações didáticas) apareceram de
forma imprecisa em seus discursos, sendo relatadas somente as estratégias utilizadas
para o ensino da matemática.
No discurso dos coordenadores pedagógicos, pareceu haver uma tentativa de
minimizar esses conflitos buscando cursos de formação que possibilitem novas
estratégias, mas parecem também focados no trabalho prático e não no domínio e
compreensão dos conteúdos que devem ser ensinados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo deste trabalho, procurou-se analisar a construção da política


educacional descrita no documento e sua implantação, a fim de compreender seu
alcance, tomando como ponto de observação o eixo de trabalho: matemática, presente
no documento e na prática do professor.
No contexto de produção de texto foi possível observar um processo de
“bricolagem” (BALL, 2001), termo cunhado por este autor para explicar o intenso
processo de empréstimo e da junção de fragmentos de políticas globais e locais, na
intenção de fazer uma política que possa funcionar a partir de resultados anteriores
alcançados. E mais, o modelo brasileiro indica um texto prescritivo e com uma extensa
lista de conteúdos a serem trabalhados.
Essa colcha de retalhos de vários documentos produziu um texto de difícil
interpretação. Neste sentido, a análise aponta para um texto confuso, com referências
teóricas imprecisas, que não são exploradas e nem justificada, deixando o leitor sem
entender qual foi o caminho teórico percorrido.
Além disso, com a necessidade de cumprir uma agenda política, o MEC ignorou
o processo de discussão que vinha ocorrendo no Brasil sobre este nível de educação,
tendo como resultado um aglomerado de propostas, teorias e de modelos curriculares
que não refletem a realidade da EI brasileira (PALHARES; MARTINEZ, 1999 apud
CAMPOS, R., 2002).
Apesar de se apresentar como um documento inovador, por trazer a ideia de uma
educação integral e rica em experiências para a criança, sua estrutura continuou
mantendo um padrão curricular sistemático, voltado para a listagem de conteúdos. Além
1153

disso, por apresentar um texto prescritivo, não conduz o professor para uma prática
reflexiva e não o orienta para a elaboração de seu próprio planejamento.
Quanto à matemática presente no documento, pode-se observar uma
incongruência entre o que se quer alcançar, como fazer e como avaliar os resultados, ele
não orienta o trabalho do professor. Embora os objetivos apontem para uma educação
menos sistemática e mais voltada para oportunizar experiências e vivências para a
criança pequena, esta ideia se confunde com uma listagem complexa e extensa de
conteúdos que devem ser trabalhados, com ênfase na pré-escolarização, cujo interesse
parece se direcionar para o desempenho da criança, como nos outros níveis de educação
(KUHLMANN JR, 2005; CERISARA, 2002).
Outra questão que deve ser observada é que o documento, embora se afirme
orientador e não obrigatório, apresenta um discurso normativo, com orientações num
tom prescritivo, direcionando o trabalho do professor e desconsiderando as
especificidades da criança e do contexto local da escola.
No contexto da prática, a caracterização do RCNEI como documento orientador
político surgiu na análise do discurso dos profissionais. Para eles, este documento foi
considerado importante, pois criou parâmetros que deveriam ser observados pelas
escolas a fim de proporcionar uma educação de qualidade.
Quando se dirigiu para o trabalho específico da matemática, a unanimidade do
discurso dos profissionais deixou de existir. O que se percebeu foi uma separação dos
participantes em dois grupos, de acordo com sua função: de um lado os professores que
se limitaram a relatar suas estratégias de ensino, que remetiam aos modelos tradicionais
de ensino, com foco no professor e em atividades repetitivas, de memorização do
número e da noção de quantidade, deixando pouco espaço para os outros conteúdos
listados no RCNEI, além de apresentar uma preocupação com a escrita e compreensão
do número pela criança. De outro lado, o grupo dos coordenadores pedagógicos,
preocupado em alterar esta concepção de educação preparatória incutida no professor,
na intenção de fazê-lo assimilar uma nova concepção de educação integral, mas, ao
mesmo tempo, encontrando dificuldade em trabalhar com áreas como a matemática,
que, também, era um problema para eles.
Em relação à divulgação do RCNEI, é interessante notar que, embora as
pesquisas realizadas pelo MEC e UFRGS (2009), por Wiggers (2009) e por Francisco
(2010) indiquem que o documento é o mais utilizado nas escolas de EI de todo o país,
foi possível constatar, no contexto da prática, que o documento é apontado somente
1154

como orientador da organização do texto do projeto pedagógico, ou seja, ele está


presente no documento escrito da escola, por exigência legal, mas não é utilizado na
orientação do trabalho docente.
Neste sentido, concluiu-se que, embora a terminologia usada no discurso dos
profissionais da EI e na organização dos projetos pedagógicos das escolas de EI seja a
mesma apresentada pelo documento, este não pareceu orientar as práticas docentes e,
ainda, não apontou uma renovação para o ensino da matemática.
Ao analisar o processo político através da Abordagem do Ciclo de Políticas foi
possível um estudo mais indutivo, a partir dos dados retirados do seu texto, das vozes
presentes nos documentos e dos discursos dos profissionais sobre sua prática, diferente
de análises dedutivas que partem de um referencial teórico fechado, que condiciona a
leitura de dados de forma a privilegiar somente um dos espaços de circulação dessa
política.

REFERÊNCIAS

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2009. Disponível em: <http://www.ustream.tv/recorded/2522493>. Acesso em: 14 dez.
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<http://www.curriculosem fronteiras.org/vol1iss2articles/ball.pdf>. Acesso em: 14 dez.
2012.

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Open University Press, 1994.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica; Universidade Federal


do Rio Grande do Sul. Práticas cotidianas na Educação Infantil – bases para a
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UFRGS para construção de orientações curriculares para a Educação Infantil.
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BRASIL. Lei n. 11.274, de 6 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29, 30, 32
e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o Ensino
Fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Brasília,
2006.

BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial


Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SE, v. 1, 2 e 3, 1998.
1155

CAMPOS, R. Políticas governamentais e Educação Infantil: histórias ou estórias? Zero-


a-Seis, Revista eletrônica, UFSC, n.5, p. 21-31, jan./jul. 2002.

CERISARA, A. B. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil no


Contexto das Reformas. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 80, set. 2002, p. 326-345.

FRANCISCO, S. dos S. A. Análise de Planos de Ensino de Educação Infantil, à luz


de uma literatura analítico-comportamental. 2010. 85f. Dissertação (Mestrado em
Educação: Psicologia da Educação) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
São Paulo, 2010.

HADDAD, L. O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil no contexto das


políticas para a infância: uma apreciação crítica. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED,
XXII, 1998, Caxambu. Anais da 22ª Reunião Anual da ANPEd. Caxambu: Universidade
Federal de Santa Catarina, 1998. Disponível em: <http://www.ced.ufsc.br/
~nee0a6/anped.html>. Acesso em: 14/06/2012.

HOFFMANN, M. V.; OLIVEIRA, I. C. S. Entrevista não-diretiva: uma possibilidade de


abordagem em grupo. Ver. Bras. Enferm., Brasília, v. 62, n. 6, nov./dez. 2009.

KUHLMANN JR., M. Educação Infantil e Currículo. In: FARIA, A. L. G.;


PALHARES, M. S. (Orgs.). Educação Infantil pós-LDB: rumos e desafios. 5. ed.
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MAINARDES, J.; MARCONDES, M. I. Entrevista com Stephen J. Ball: um diálogo


sobre justiça social, pesquisa e política educacional. Educ. Soc. Campinas: Unicamp,
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MAINARDES, J. Abordagem do Ciclo de Políticas: uma contribuição para a análise de


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SIQUEIRA, R. G. Educação Matemática na Educação Infantil: um levantamento de


propostas. 2007. 142f. Dissertação (Mestrado Profissional em Educação Matemática) –
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007.

WIGGERS, V. Aportes teóricos e metodológicos que subsidiam as orientações


curriculares na Educação Infantil. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, XXXII, 2009,
Caxambu. Anais da 32ª Reunião da ANPEd. Caxambu: Hotel Glória, 2009.
Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/32ra/arquivos/trabalhos/GT07-
5406--Int.pdf>. Acesso em: 25 out. 2012.
1156

Comunicação

A crise nos cursos de formação de professores: dos vestibulandos aos concluintes

Simone Santos Pereira


Universidade de São Paulo – CAPES

Resumo: Por conceber a importância da formação docente, analisamos


quantitativamente o número de inscritos no processo de seleção dos cursos de
Licenciatura e Pedagogia da Universidade de São Paulo de 2000 a 2013 e comparamos
o número de vagas e de concluintes no mesmo período. Consideramos ainda, explorar
nessa comunicação, algumas reflexões acerca da baixa atratividade da carreira docente e
diminuição da procura por estes cursos. Os resultados mostram que tanto o número de
vestibulandos quanto o número de concluintes caíram no período estudado, embora
tenha ocorrido um pequeno aumento no número de vagas nos cursos de Geografia,
Educação Física, Pedagogia e Química. Acreditamos que são inúmeros os fatores que
levam à falta de interesse no ingresso e na conclusão dos cursos, incluindo desprestígio
social e financeiro que cercam a profissão. Políticas públicas de ingresso e permanência,
por parte da universidade, também são preponderantes para o sucesso acadêmico dos
estudantes.
Palavras-chave: Formação de professores, cursos de Licenciatura, atratividade na
docência

1. Introdução

Muitos estudiosos afirmam que a Educação Brasileira está em crise. É


importante, contudo, especificar a que tipo de crise se referem. Consideramos analisar
nessa pesquisa a crise nos cursos de formação de professores, em que estudos apontam
que a diminuição de professores se formando pode gerar uma escassez na profissão num
futuro próximo. Ristoff (2008) apontou uma demanda de mais de 350 mil professores
com formação específica para atender todo o território nacional. Essa pesquisa se refere
aos cursos de formação docente da Universidade de São Paulo (USP) de 2000 a 2013.
As Licenciaturas, selecionadas aqui, são aquelas que estão diretamente relacionadas às
disciplinas do Ensino Fundamental II (EFII), sendo elas: Língua Portuguesa, História,
1157

Geografia, Matemática, Física, Química, Biologia e Educação Física, além da


graduação em Pedagogia, requisito básico para a profissão no Ensino Fundamental I
(EFI). Nossos objetivos são comparar o número de vestibulandos, vagas e de
concluintes nesse período e verificar quais alterações se fizeram presente em relação ao
ingresso, oferta e conclusão. Visamos ainda, explorar algumas possibilidades que
justifiquem o resultado obtido a partir de artigos publicados no mesmo período.

2. Resultados

Analisamos de maneira quantitativa, comparando o número de vagas ofertadas,


o número de vestibulandos e o número de concluintes. Em relação à oferta, em alguns
cursos se aumentaram o número de vagas nesse período, o aumento ocorreu nas
Licenciaturas de Geografia, Educação Física, Química e Pedagogia, sendo que em
Química e Pedagogia o aumento foi de 50% e em Educação Física de 100%. O número
de vagas iniciais era de 1.889 e até 2013 cento e cinquenta novas vagas foram criadas,
totalizando a oferta de 2.039. A figura 1 mostra o número de vagas de cada curso, com
dois referencias: o ano inicial (2000) e o ano final (2013).

Figura 1 – Evolução do número de vagas nos cursos


de formação de professores em 2000 e 2013

1000
800
600
400
200 2000
0
2013

Fonte: Distribuição de inscritos por curso, FUVEST

Nesse sentido houve, por parte da universidade, uma expansão na oferta dos
cursos de formação de professores, ainda que essa expansão seja inferior à 10% das
vagas no período inicial, durante um período de 14 anos.
Em seguida, coletamos dados relacionados aos vestibulandos. Confirmamos
que o número de candidatos, em sua totalidade, nesses cursos vem diminuindo
1158

progressivamente desde 2006, como apontado na figura 2. Entre 2000 e 2006 o número
de pleiteantes se alternou entre 19 mil e 24 mil, contudo, desde 2006 os números de
estudantes vêm caindo progressivamente chegando a 10.332 candidatos em 2012, o
mais baixo nos treze anos analisados e menos da metade do número de vestibulandos, se
comparado ao período de 2004 a 2006. Desde 2010 o número médio gira em torno de
dez mil candidatos.

Figura 2 – Número de vestibulandos nos cursos de formação


30000
25000
20000
15000
10000
5000
0

Fonte: Distribuição de inscritos por curso, FUVEST


A figura 3 mostra o número de concluintes, em sua totalidade, no período
pesquisado. O ano com mais formandos foi em 2010 com 552 licenciados, dentro as
2039 vagas dispostas, representa 27% dos estudantes. Houve um declínio a partir de
2011 resultando no pior índice do período em 2013, com apenas 10% de concluintes, ou
seja, 217 formados, ressaltando o pouco interesse, por parte dos estudantes, de um modo
geral, em se tornarem professores.
1159

Figura 3 – Concluintes nos cursos de Formação de Professores


600
500
400
300
200
100
0

Fonte: Anuário Estatístico, USP

Considerando o período todo, e comparando o número de vagas com o de


concluintes observamos que os cursos com mais concluintes foram o de Física com 61%
e Pedagogia, com 54%. Todas as demais Licenciaturas tiveram menos de 50% de
formandos. Os índices mais baixos foram Geografia, Letras, História e Química,
alternando entre 9% e 13%.
Figura 4 – Vagas e concluintes entre 2000 e 2013
14000
12000 1133
10000
8000
6000 11037
4000 444
2000 964 225 1272
1950 689 875 157 206 3510 2350 2340
0 1560 1430 1170 850

vagas concluintes

Fonte: Anuário Estatístico, USP


Analisando as especificidades de cada curso, concluímos que as Licenciaturas
de Língua Portuguesa, que oferta anualmente 849 vagas, Geografia, 170, História, 270 e
Química, 90 vagas foram as que apresentaram um menor índice de concluintes, menos
de 13% dos estudantes concluíram a Licenciatura nos 14 anos pesquisados. No curso de
Geografia, em alguns anos (2003, 2008 e 2009) menos de 10 estudantes se graduaram,
conforme a tabela 1. Números esses baixíssimos, como no curso de Letras, em que
apenas 51 estudantes se formaram em 2012 e 2 em 2013. Os cursos de Exatas e
Biológicas resultaram em números mais elevados. Matemática, Física e Biologia têm
1160

como um número médio de concluintes entre 40 e 60%. Matemática, no entanto, nos


últimos seis anos teve menos de 50% dos estudantes concluindo a Licenciatura. O curso
de Educação Física também possui um baixo número de aprovação, das 50 vagas
ofertadas, menos de 50% obtiveram o diploma e nos últimos dois anos apenas 26% dos
estudantes terminaram seus estudos. Em Pedagogia pode-se observar que os anos de
2012 e 2013 foram os piores anos da história, com um pouco mais de 23% e 8% de
concluintes respectivamente, embora o curso tenha formado mais de 50% de seus
estudantes entre 2000 e 2011. Todos os cursos tiveram menos licenciados em 2013.

Tabela 1 – Evolução do número de concluintes nos cursos de Licenciatura


Vagas 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Letras 849 81 65 72 83 99 99 135 95 65 50 109 127 51 2
Matemática 150 71 68 56 60 91 95 75 79 61 54 61 69 70 54
Biologia 120 46 43 59 63 66 47 51 51 39 27 63 39 64 31
Física 110 50 48 53 58 55 80 62 66 79 59 74 76 65 50
Química 90 10 10 12 16 13 11 7 7 8 14 12 17 11 9
Ed. Física 100 10 6 13 15 15 10 12 17 15 23 21 23 13 13
História 270 52 22 30 38 36 22 34 22 16 15 58 33 34 32
Geografia 170 19 19 21 8 16 16 26 21 7 7 18 17 19 11
Pedagogia 180 93 77 84 106 91 109 110 103 105 86 136 114 43 15
Fonte: Anuário Estatístico, USP

3. Análises

Alguns estudos recentes têm se preocupado em analisar a crise em torno dos


cursos de formação de professores, versando sobre a falta de interesse, por parte dos
jovens, na procura pela profissão e a diminuição de professores formados. Esses fatores
podem gerar, num futuro próximo, uma escassez na profissão. Nossa pesquisa corrobora
com os dados uma vez que aponta no micro espaço da USP a diminuição da procura nos
cursos de formação docente pelos vestibulandos tanto quanto o interesse em se licenciar.
Gatti (2009) ressalta a pouca valorização do magistério nos dias atuais,
colocando-o como opção para estudantes oriundos de famílias de classe C e D. Ela
pondera ainda que a Educação Básica está intrinsecamente relacionada com o
desenvolvimento social e econômico do país, que necessita emergir enquanto sociedade
do conhecimento. É importante, nesse momento, considerar o perfil do ingressante dos
cursos de formação de professores. Nesse sentido, Louzano (2010) aponta que no ano
1161

de 2005, por exemplo, apenas 5% dos interessados no magistério estavam entre os 20%
que obtiveram melhor desempenho no Enem, e 16% dos candidatos se encontravam
entre os 20% com pior desempenho. Em relação aos perfis socioeconômicos, os
estudantes de Licenciatura, em sua grande maioria, são oriundos de escolas públicas,
com renda familiar inferior a três salários mínimos, além de trabalharem ao mesmo
tempo em que estudam. Podemos discorrer que, em sua maioria, são os estudantes com
baixo rendimento acadêmico e, nesse sentido, questionamo-nos em relação ao domínio
dos conteúdos escolares básicos. No que se refere ao domínio da escrita e da leitura,
Marin e Giovanni (2007) ressaltam o despreparo dos estudantes em relação a esses
conteúdos, pois em sua pesquisa muitos problemas estruturais na expressão escrita e na
interpretação de textos são evidenciados. Há, portanto, uma preocupação em relação ao
profissional formado e ao processo ensino aprendizagem, uma vez que parte dos
problemas detectados são conteúdos que devem ser transmitidos aos futuros estudantes.
Por conseguinte, se menos estudantes buscam o magistério, há a possibilidade de
escassez de profissionais. E, se os que buscam possuem rendimentos acadêmicos
inferiores, os cursos de formação superior talvez não estejam preparados para sanar
essas dificuldades. Portanto serão profissionais menos capacitados que lecionarão os
conteúdos precariamente, impedindo que se desenvolva uma sociedade do
conhecimento, que resultaria numa emergência adequada para o país.
Nossa pesquisa confirma que o magistério tem deixado, ao longo dos anos, de
ser uma opção profissional recorrente entre os estudantes de Ensino Médio. Entre os
fatores que incidem sobre a escolha profissional estão o renda, plano de carreira,
empregabilidade, status, vocação entre outros. De acordo com Gatti (2009), estudantes
de Ensino Médio, de todas as regiões do Brasil, apontam que a docência é uma
profissão complexa que envolve tanto aspectos negativos quanto positivos, por um lado
há pouco reconhecimento social, além dos baixos salários, e por outro é um trabalho
bonito e nobre.
Percebemos que o discurso dos estudantes são respostas individuais a partir de
suas interações sociais, em que o individual e o coletivo estão intrinsecamente
relacionados, pois são socialmente construídos. Observamos os mesmos argumentos em
pesquisas com profissionais já estabelecidos e estabilizados na profissão. Vianna (1998)
conclui, em sua pesquisa com professores da Educação Básica nos anos 90, que dois
aspectos se destacaram acerca do magistério, por um lado o desencanto e por outro, a
paixão. Essas características antagônicas entre si permeiam, na maioria das vezes, a
1162

realidade dos docentes, alternando-se em maior ou menor grau para os dois lados da
balança. Essa interpretação subjetiva da profissão é, ao mesmo tempo, social e coletiva,
construindo historicamente uma representação socialmente negativa que incide sobre o
status da profissão. O aspecto mais recorrente na pesquisa foram as condições de
trabalho, que se resultam precárias, alterando as relações no interior e no exterior da
escola e com todos os atores da comunidade escolar. Vianna também aponta o contínuo
processo de arrocho salarial, que pode resultar significativamente no desprestigio
financeiro da profissão na atualidade. Nesse sentido, diante de um imaginário social de
desvalorização, cada vez menos os jovens se interessam pela docência, tendendo a
seguirem em outras profissões socialmente mais respeitadas.
Todos os artigos pesquisados em algum momento evidenciam a questão salarial,
como um ponto importante a ser discutido. Alves e Pinto (2011) comparam o salário
médio de profissionais que possuem o mesmo número de anos em sua formação
acadêmica para o exercício de sua profissão. Enquanto 82,8% dos médicos ganham
mais de 5 salários mínimos, 89,3% dos professores da Educação Básica ganham até 5
salários mínimos. Segundo os autores, o salário do docente da escola pública é
normalmente 36% mais baixo se comparado ao de outras profissões que exigem a
mesma qualificação no Ensino Superior. Nesse sentido, o desencanto com a profissão e
o desprestígio social e financeiro está enraizado no imaginário coletivo da sociedade
brasileira, e resulta na pouca atratividade do magistério para a geração atual.

4. Conclusões

Devido à universalização do acesso ao Ensino Fundamental, o número de


professores especialistas aumentou nos últimos anos. Entretanto, a procura pelos cursos
de Licenciatura na maior universidade do país tem o número de vestibulandos
diminuindo a cada ano, ao mesmo tempo em que o número de concluintes também
decresce.
Os cursos em que o estudante opta pela Licenciatura no ingresso do vestibular
há um maior número de concluintes, sendo eles os das Ciências Exatas e Biológicas. O
mesmo não ocorre com os cursos de humanidades. Nesses cursos os estudantes entram
no bacharelado e podem cursar a Licenciatura se assim desejarem, contudo ocorre deles
não optarem por este curso, concluindo seus estudos no bacharelado e decidindo pela
não docência. A configuração dos cursos exclusivos de Licenciatura faz com que os
1163

vestibulandos tenham desde o início da trajetória acadêmica o interesse pelo magistério,


inferindo, consequentemente, no número de formando, que se torna mais elevado do
que os demais cursos.
Em relação à oferta, concluímos que em alguns cursos se aumentaram o
número de vagas nesse período. O aumento ocorreu nas Licenciaturas de Geografia,
Educação Física, Química e Pedagogia. Acreditamos que políticas públicas em relação
ao ingresso e a permanência são imprescindíveis, para que se atraiam os melhores
estudantes do Ensino Médio e se favoreça sua permanência até a conclusão da
graduação.
Louzano (2010) aponta que a atratividade para a docência e a oferta de bons
cursos de formação são duas das três principais características dos países com melhores
desempenhos em educação no mundo. A autora reflete sobre como a atratividade para o
magistério no Brasil se consolida de maneira ineficiente, pois apesar dos aspectos
positivos da profissão como flexibilidade, férias, baixas taxas de desemprego e o
sentido altruísta da profissão, o pouco prestigio social e financeiro, além de restrição de
influência nas políticas públicas e imobilidade no plano de carreira diminuem o
interesse pela profissão aos melhores estudantes do Ensino Médio.
É notório que, para reverter este quadro de desinteresse pela docência, seja
imprescindível reverter o desprestígio social acerca da profissão. Logo, é importante
valorizar os profissionais, incentivar financeiramente, melhorar as condições dos cursos
de formação, entre outros fatores. Melhorar as condições para os docentes reflete em
atrair mais e melhores profissionais.
Concluímos por afirmar que as políticas educacionais brasileiras divergem dos
pressupostos da OECD que asseguram que o professor é o fator mais importante no
processo de escolarização. Como resultado, os países com mais sucesso educacional
possuem uma política efetiva para atrair e manter os professores, além de propiciar bons
cursos de formação. Na maioria dos países, especialmente naqueles com as melhores
notas nos exames internacionais, está tendo nesta década mais professores iniciando a
carreira que em qualquer outro momento desde 1970. Esse crescimento é decorrente do
processo de valorização do profissional que estes países desenvolveram. O Brasil,
devido aos inúmeros fatores já citados, segue na contramão em relação aos estudantes
que desconsideram a profissão no momento da escolha no fim do Ensino Médio ou ao
longo da graduação.
Diante dos resultados alarmantes em que o número de vestibulandos e
1164

concluintes tem diminuído em todos os cursos de Licenciatura no micro espaço


analisado, ponderamos acerca da necessidade de mais pesquisas sobre o assunto.
Justifica-se, portanto, que nesse momento histórico sejam importantes pesquisas, como
esta, que inferem diretamente sobre o problema, pesquisas que envolvam outras
universidades, tanto no estado de São Paulo quanto no país inteiro. Visando assim,
diagnosticar os problemas e apontar soluções, uma vez que a diminuição de
profissionais formados possa gerar, num futuro próximo, uma escassez no cenário
educacional brasileiro.

REFERÊNCIAS

ALVES, Thiago e PINTO, José. Remuneração e características do trabalho docente no


Brasil: um aporte. Cadernos de Pesquisa, v. 41, n. 143, p. 606-639, maio/ ago, 2011.

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LOUZANO, Paula. Quem quer ser professor? Atratividade, seleção e formação docente
no Brasil. Estudos em Avaliação Educacional v. 21, n. 47, p. 543-568, set/ dez 2010.

MARIN, Alda e GIOVANNI, Luciana. Expressão escrita de concluintes de curso


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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, Anuário estatístico. 2001-2014. Disponível em:


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VIANNA, Cláudia. Entre o desencanto e a paixão: Desafio para o Magistério. In:


BRUSCHINI, Cristina e HOLLANDA, Heloísa Buarque de. Horizontes Plurais:
Novos Estudos de Gênero no Brasil. 1.ed. São Paulo: Fundação Carlos Chagas/ Editora
34,1998.
1165

Comunicação

Transdisciplinaridade e Currículo Integrado: uma proposta para EJA

Steve Ramos
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Mestrando em Ciências Sociais pela PUC-SP,
membro do núcleo de estudos da complexidade –
Complexus , Bolsista do CNPq e Professor de
sociologia da rede pública estadual de São Paulo.

Resumo: Este estudo de caso, realizado com 50 pessoas, matriculadas no curso noturno
da EJA da rede pública do Estado de São Paulo, tem como objetivo relatar a aplicação
de uma prática de ensino e aprendizagem sob a perspectiva transdisciplinar. Para tanto,
parte-se da análise bibliográfica sobre os temas Paradigma, Avaliação e Exame,
Transdisciplinaridade e Currículo Integrado. Como método de análise, optou-se pelo
pensamento complexo segundo Edgar Morin. Os dados levantados nos questionários
durante as intervenções pedagógicas apontaram para uma mudança de percepção do
alunado diante das situações-problemas constituídas de questões e temas transversais
propostos, apresentados nos projetos e nas atividades solicitadas em sala de aula,
recorrendo para a busca da resolução a articulação e a interação dos saberes oficiais da
escola e os próprios saberes informais do alunado. Após o período das intervenções
pedagógicas, percebeu-se que o senso crítico, a disciplina, autoestima, a interação, o
hábito da pesquisa, a expressividade, o respeito e a tolerância melhoraram
consideravelmente. Além disso, os dados revelaram uma melhora significativa na
aprendizagem construída durante a trajetória da realização das intervenções
pedagógicas.
Palavras-chave: Pensamento complexo; Transdisciplinaridade; Currículo Integrado e
Exame.

HÁ INADEQUAÇÃO cada vez mais ampla, profunda e grave entre os


saberes separados, fragmentados, compartimentados entre as disciplinas e,
por outro lado, realidades ou problemas cada vez mais polidisciplinares,
transversais, multidimensionais, transnacionais, globais, planetários.
Edgar Morin
1166

INTRODUÇÃO
No decorrer do tempo, ocorreu uma mudança de perfil do público referente à
procura de oferta de vagas na modalidade de EJA. Outrora a procura por vagas nesse
curso era constituída na sua maioria por adultos e idosos e poucos jovens entre 15 e 17
anos. Entre as principais razões apontadas pelos especialistas a despeito da dimensão do
tamanho do problema destaca-se que seis a cada dez estudantes de 16 anos concluíram o
9º ano ou a 8ª série em 2009; segundo o movimento todos pela educação, os jovens
ingressados na EJA estavam matriculados na escola regular e ela por sua vez não
conseguiu assegurar a permanência deles na escola e, mais do que isso, não garantiu a
eles o direito ao ensino público.
Por outro lado, houve uma queda na demanda principalmente nas etapas finais
do ensino fundamental e médio da EJA por conta dos adultos. Um dos motivos seria
que alguns setores de serviços não exigem para candidatura à vaga do posto de trabalho
o certificado de conclusão do curso. Os mais jovens consideram quesitos como
praticidade, facilidade e rapidez oferecidos pela EJA para obter a certificação de
conclusão de curso.
Em 2007, o Conselho Nacional de Educação (CNE) discutiu a possibilidade de
elevar para 18 anos a idade mínima para o ingresso no Ensino Fundamental da EJA, que
atualmente exige mínima de 15 anos. A medida tinha como propósito conter o ingresso
desmedido de adolescente na EJA. Apesar de todos os esforços, a medida não foi
aprovada pelo MEC.
Apesar das turmas de EJA serem constituídas de jovens, adultos e idosos, a
convivência torna-se possível, mesmo levando em consideração essa diversidade em
idade, além das origens sociais tão dispares. Desde que a gestão funcione, os
professores sejam bem formados e o currículo venha de encontro à pluralidade de
idades. A dificuldade de convivência surge por conta de problemas de adaptação dos
mais jovens, pois estes quando se sentem mais sozinhos procuram se relacionar com
pessoas de mesma idade. Geralmente, os problemas decorrem na sua maioria da falta de
diálogo nos conflitos de opinião quando se trata de gerações diferentes.
No tocante à gestão do sistema, os governos das esferas municipal, estadual e
federal necessitam atuar em conjunto com as Secretarias de Educação para conter os
problemas relacionados à vulnerabilidade, à gravidez precoce na adolescência e ao
ingresso antecipado no mercado de trabalho. Cabe às secretarias junto às escolas atuar
em conjunto para reduzir o tamanho das turmas com vistas a atender de modo
1167

adequado, assegurando o transporte escolar, selecionando material didático específico e


garantindo a formação de professores.
Apesar de este ano abrirem-se 18 mil vagas em cursos da EJA, deve-se atentar
para não ignorar este fato e não deixar que piore este quadro e mantenha a tímida taxa
de analfabetismo entre 15 e 18 anos no patamar de cerca de 15%.
Além disso, é importante destacar a estrutura precária da EJA, referente ao seu
currículo de ensino fundamental inadequado para o público, e professores voluntários
sem qualificação, que são alguns dos maiores problemas da EJA.
Ao pensar num modelo de escola para a EJA torna-se imprescindível pensar em
estratégias pedagógicas contextualizadas com a experiência de vida do alunado e mais,
conscientizar os professores para deixarem de lado a preparação para o futuro tal como
ocorre com as crianças, mas ficarem atentos em conciliar o conteúdo pedagógico com o
projeto de vida deste público.
Vale ressaltar a migração de adolescentes do ensino básico para a EJA entre 15 a
17 anos. Sem contar a queda no total de matrículas no ensino fundamental que chega a
28,6%, pressionado por este segmento de alunado. Esse quadro vem chamando a
atenção de especialistas na área. Quais seriam os motivos de adolescentes recorrerem à
educação da EJA em vez de estar na educação básica?
Alguns dos motivos apontados seriam a reprovação e evasão na educação básica;
a distância da escola no campo; desmotivação pelo que é ensinado na escola; e a decisão
do gestor de considerar as EJAS como algo de menor importância. Além disso, esses
fatores são acompanhados todos os anos por três grandes questões sociais que
aumentam ainda mais os índices de reprovação e evasão escolar: a vulnerabilidade
acompanhada pela pobreza extrema, o uso de drogas e a exploração juvenil e a
violência; o trabalho com a necessidade de compor a renda familiar levando a
dificuldade de muitos estudantes de conciliar estudo com trabalho, fazendo com que
optem pelos cursos da EJA, sobretudo no período noturno, como última opção.
A gravidez precoce, a chegada do primeiro filho durante a adolescência tanto de
meninos como meninas tem levado ao afastamento de muito deles da sala de aula. As
meninas principalmente, pois adiam a vida escolar para se dedicarem aos cuidados dos
bebês e assim que conseguem retornam à escola por meio da EJA.
A partir do estudo de caso surgiu a necessidade de investigar alguns temas
dentre outros que julgo relevantes e que levam à desmotivação e à falta de interesse ao
1168

conteúdo escolar, à reprovação, à evasão escolar e à procura por parte do alunado pela
EJA.
A amostra neste estudo constitui-se de um grupo de 50 alunos oriundos da
periferia do sul de São Paulo, matriculados no curso da EJA em uma escola estadual da
rede pública de ensino do estado de São Paulo.
A finalidade do estudo foi investigar as repercussões da aplicação de uma prática
de ensino e aprendizagem transdisciplinar junto a uma classe de EJA com vistas a
estimular no alunado da EJA a criatividade científica, o hábito da pesquisa, o exercício
da cidadania, e a contextualização e interação entre os saberes formais e informais.
Partindo das análises das bibliografias sobre os temas como reducionismo,
globalidade, interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e currículo integrado foram
elaboradas situações-problemas com ênfase na proposta do projeto visando estimular
nos alunos o raciocínio e a prática transdisciplinar.
Os tópicos a seguir apontaram aspectos relevantes dos temas referentes ao
reducionismo, globalidade, interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e currículo
integrado com os quais serviram de referência para as intervenções pedagógicas. A
seguir, apresenta-se o percurso metodológico dessa investigação, o método baseado no
pensamento complexo segundo Edgar Morin.

PARADIGMA DA MODERNIDADE

Paradigma é um termo de origem grega (paradeigma) que significa modelo,


padrão, e corresponde a um modelo a ser seguido. Daí por constituir de normas
orientadoras de um grupo que ao estabelecerem limites determinam como os indivíduos
devem atuar dentro dessas delimitações.
Thomas Samuel Kuhn (1992) designou como paradigma realizações científicas
que geram modelos ao longo do tempo, fundamentais por orientar o desenvolvimento
posterior das pesquisas, tendo em vista a busca de solução para os problemas por ela
suscitados.
Segundo Edgar Morin (2000), o pensamento, paradigma consiste em efetuar a
seleção dos conceitos-mestres da inteligibilidade e a determinação das operações
lógicas-mestras. Em suma, o paradigma estabelece relações fundamentais para
constituir axiomas (valores), determina conceitos, comanda discursos, teorias, organiza
a organização com vistas para a geração e regeneração.
1169

O paradigma da racionalidade da ciência moderna foi formulado por Decartes e


é responsável pelo desdobramento da história européia a partir do século XVII. O
paradigma cartesiano tal como passou a ser conhecido separou o sujeito do objeto cada
qual em seu domínio. Repercutindo na divisão e na organização do conhecimento e do
cosmo, a filosofia e a pesquisa reflexiva de um lado e a ciência e a pesquisa objetiva do
outro, inclusive entre homem e natureza, sujeito e objeto, sentimento e razão, qualidade
e quantidade.
Para Boaventura de Sousa Santos (2001), o modelo de paradigma da
racionalidade da ciência moderna surge a partir do contexto da revolução científica do
século XVI e se desenvolve posteriormente nos séculos seguintes no domínio das
ciências naturais. Mas é no século XIX que o modelo de racionalidade se estende às
ciências sociais.
A racionalidade científica predominante, além de admitir variedade interna,
comporta duas formas de conhecimentos não científicos: o senso comum e as
humanidades ou estudos humanísticos (incluindo os estudos históricos, filológicos,
jurídicos, literários, filosóficos e teológicos).
Por ser um modelo global, a racionalidade científica é também um modelo
totalitário, uma vez que nega as outras formas de conhecimento que não partem dos
mesmos princípios epistemológicos e pelas suas regras metodológicas.
Esse paradigma científico parte do pressuposto de que conhecer significa
quantificar. O rigor científico decorre do rigor das medições. As qualidades intrínsecas
do objeto são desconsideradas e em seu lugar passam a impera as quantidades as quais
podem ser traduzidas em objetividade numérica.
Dessa forma, o que não é quantificável é cientificamente irrelevante. Por outro
lado, o método científico baseia-se na redução da complexidade, visto que o mundo é
complexo e a mente humana é incapaz de desvelar totalmente a complexidade do
mundo. Vale lembrar da máxima que conhecer pressupõe dividir e classificar para mais
adiante estabelecer as relações sistemáticas entre o que se separou.
Também é importante mencionar a divisão primordial do paradigma científico
entre condições iniciais e leis da natureza. No primeiro opera o reino da complexidade,
do acidente, em que é necessário destacar os fatos relevantes a observar; enquanto as
leis da natureza são o lugar do reino da singularidade e da regularidade, lugar possível
da observação e da medição com rigor científico que, segundo Eugene Wigner
(SANTOS, 2001), ao mesmo tempo arbitrária e alicerce da ciência moderna.
1170

As repercussões do paradigma da racionalidade da ciência moderna repercutiram


valores e práticas sociais e pedagógicas envoltas no ato de generalizar, fragmentar e
homogeneizar os seres sociais, propiciando a exclusão de valores e a privação de
aprendizagem e desenvolvimento e até muitas vezes a anulação das capacidades e
habilidades do alunado das quais não atendem o perfil da escola da modernidade
industrial.
Esse tipo de escola reproduz de forma acrítica e autoritária o paradigma
moderno da pedagogia do exame de seleção, que fracassa diante da possibilidade de
oferecer uma preparação com vistas ao desenvolvimento dos potenciais do alunado,
privando-o de permitir e favorecer quaisquer situações de aprendizagem conforme o
contexto da vida sociocultural e cognitiva do alunado da EJA.
Já o paradigma da teoria das inteligências múltiplas de Howard Gardner (1995)
baseia-se no pressuposto de que todos os indivíduos são inteligentes, embora as
inteligências se manifestem de formas diferentes. Uma vez que as inteligências são
aperfeiçoadas segundo os estímulos recebidos durante a vida, o ambiente cultural que
cercam o indivíduo, os seus valores e crenças individuais e os propósitos culturais.
A argumentação de Gardner amplia a compreensão de inteligência como um
processo individual e contínuo na história humana. A partir desta constatação do autor,
identificaram-se oito inteligências: Linguística, Lógico-Matemática, Espacial, Musical,
Corporal Cinestésica, Interpessoal e Intrapessoal e a Naturalista. A saber que cada
inteligência possui sua característica própria.
Vale observar que ao situar os desdobramentos das implicações do paradigma da
modernidade no tipo de escola e na falsa medida universal do homem moderno (QI) nos
conduziram à encruzilhada da crise de civilização, da cultura, da sociedade, da escola e
da espécie humana.
Para Edgar Morin (2000), a aposta de educação do futuro tem em vista superar
essa crise, o que consiste em estabelecer o paradigma complexo de implicação,
distinção e conjunção, que permite estabelecer a relação indivíduo-sociedade-espécie e
a partir disso elaborar uma concepção de educação e práticas pedagógicas voltada para
o exercício de valores éticos contextualizados com a vida na sua complexidade.
1171

AVALIAÇÃO E EXAME

Segundo Luckesi (2011), a prática educativa da escola brasileira fundamenta-se


numa pedagogia do exame em detrimento de uma pedagogia condizente da avaliação da
aprendizagem. A primeira, por concentrar-se no sistema de exames, implica em notas e
suas manipulações. Centrada nas provas, exames e notas com as quais denotam e
apresentam os desdobramentos na relação professor e aluno.
Com isso, a pedagogia do exame (LUCKESI, 2011) atua por meio dos
mecanismos do medo e do fetiche. Uma vez que não atende à sua necessidade e vem a
tornar-se uma espécie de entidade universal. De certa forma, provas e exames muitas
vezes são descontextualizados do processo de ensino e aprendizagem, indiferentes à
relação professor e aluno, ou seja, pouco pontuam a respeito do que foi ensinado. As
notas e as médias decorrentes são expressões de média entre números e sequer
sinalizam se a aprendizagem foi bem ou mal sucedida. O caráter fetichista expressa-se
não numa relação entre professor e aluno em direção a uma relação instrumental entre
coisas: a supremacia da nota.
A nota se revela a um só tempo na prática escolar objeto de adoração por alunos
e professores. Para o primeiro passa a significar promoção ou retenção escolar.
Enquanto para os professores revela lisura e poder do docente.
O medo se torna um fator gerador de personalidades submissas no alunado por
meio da ameaça do castigo psicológico decorrente do medo da ameaça permanente da
supremacia da égide da regra da escola ou do docente com vistas ao disciplinamento
social dos educandos.
Para Luckesi (2011), a avaliação da aprendizagem utilizada de forma fetichizada
tem em vista fortalecer o comportamento de autocensura e autocontrole psicológico.
Sendo este último por meio da assimilação de padrões externos que cerceiam os sujeitos
em função dos processos de avaliação escolar.
Sem contar que a avaliação de aprendizagem está para a sociedade estamental e
vice-versa. Uma vez que ambas compactuam a favor do processo de seletividade. A
primeira ritualiza a crença meritocrática do mérito, embora isso suceda em
desigualdades de oportunidades, contribuindo por outro lado com a seletividade social e
a legitimidade da desigualdade social.
Em contramão a isso a avaliação de aprendizagem visa auxiliar a construção de
uma aprendizagem contextualizada com a vida social e existencial do educando por não
1172

estar centralizada em provas e exames, atribui significado ao ensino e à aprendizagem


daquilo que é ensinado, em suma, compactua com a máxima ‘conhecimento é vida’.

CURRÍCULO INTEGRADO

Esse tema foi reservado para debate sobre os marcos e limites a despeito da
transdisciplinaridade como referência para a organização de um currículo integrado. De
forma breve discutirá sobre a educação escolar bem como seus conhecimentos
vinculados às disciplinas acadêmicas em seus campos fechados, dentro da organização
do currículo acadêmico fragmentado, descontextualizado da dinâmica da vida social,
das mudanças nos saberes disciplinares e nas vidas dos alunos, sobretudo dos
adolescentes.
Um aspecto apontado por Edgar Morin (2012) quando diz que a
hiperespecialização do ensino impossibilita de ver o global, bem como o essencial. Uma
vez que os problemas essenciais são passíveis de ser parceláveis e os problemas globais
tornam-se cada vez mais essenciais. Além do mais, os problemas locais só fazem
sentido se situados em seus contextos e os problemas desses contextos situados nas
dimensões planetárias.
Alguns dos problemas apontados com os quais se encontra a educação decorrem
da persistência de uma minoria em defesa da manutenção da organização do currículo
por disciplinas como resposta diante dos problemas e necessidades educativas.
Diante desse cenário, surgem duas correntes contrapostas. Por um lado, os
partidários em manter o currículo por matérias disciplinares, baseados em conteúdos
conceituais disciplinares e procedimentais, como única via legítima ao acesso do
conhecimento socialmente aceito como basilares da cultura científica abordada nas
disciplinas. A outra tendência decorre da formação da subjetividade dos estudantes, na
mobilização de estratégias para dialogar e interpretar informações que possibilitem
construir elos entre diversos problemas e fenômenos, visando o estímulo ao hábito da
pesquisa, levando a uma atitude de aprendizagem aberta e inconclusa ao longo da vida.
Para isso, faz-se necessário nesse sentido repensar a educação referente à sua
forma de pensar o presente, na organização dos saberes e na função da escola. Frente à
proposta educativa capaz de dialogar e dar respostas adequadas às situações de mudança
na sociedade, no conhecimento e nas disciplinas no sentido de seleção e
estabelecimento de critérios de avaliação, decidir o que, o como e para que aprender.
1173

Desenvolver capacidades cognitivas de ordem superior: pessoais e sociais, atentar para


o internacionalismo, bem como seus valores de respeito, solidariedade e tolerância.
Vale ressaltar de forma breve que uma abordagem transdisciplinar decorre da
formulação de uma terminologia compartilhada por várias disciplinas e aplicação de
uma metodologia que transcende os campos de estudos disciplinares fragmentados. A
avaliação consiste na habilidade dos indivíduos em uma contribuição relevante a um
campo de estudos a partir de organizações abertas e flexíveis.
Essa concepção de abordagem transdisciplinar seria para Edgar Morin a
verdadeira racionalidade por deter o caráter aberto e dialógico.
Opera o ir e vir incessante entre a instância lógica e a instância empírica; é o
fruto do debate argumentado das idéias, e não a propriedade de um sistema
de idéias. O racionalismo que ignora os seres, a subjetividade, a afetividade e
a vida é irracional (MORIN, 2000, p.23).

De forma sucinta, transdisciplinaridade representa uma concepção de pesquisa


baseada numa referencia nova e compartilhada entre várias disciplinas, acompanhada
por uma interpretação recíproca das epistemologias disciplinares. A busca de resolução
de problema parte da colaboração, daí a transdisciplinaridade, baseada no ensino de
interpretação, surge por meio do diálogo entre conhecimento e vida não dissociado no
estudo do objeto de estudo.
Emergem alguns dos argumentos a favor de um currículo integrado de caráter
transdisciplinar: favorecer a interação e o intercâmbio entre os docentes, visando o
acompanhamento personalizado da aprendizagem dos alunos; evitar a repetição de
temas e conceitos durante a escolaridade, devido à falta de coordenação entre os
professores; favorecer uma maior eficácia do tempo escolar.
Por outro lado, há críticas decorrentes a essa forma de currículo por parte dos
partidários do currículo acadêmico, que seriam: a integração de várias disciplinas numa
só avaliação levaria à redução dos conteúdos do currículo das áreas originais abordadas
no programa do curso; tempo insuficiente do que quando situado em relação à
aprendizagem de procedimentos baseados no currículo acadêmico; baixam-se as
exigências; destrói-se o rigor exigido pelas matérias; impedem os alunos de vincularem
as demandas que propõem a formação especializada.
Por fim, a abordagem transdisciplinar vinculada ao currículo integrado é vista
por Fernando Hernández (1998), como uma possibilidade de situar diante de cenários de
incerteza e imprevisibidade na escola com vistas a responder às mudanças referentes à
sociedade, aos saberes, aos alunos e à própria educação escolar.
1174

Que tudo continue como está, com o que se continuaria favorecendo a


exclusão de muitas crianças e adolescentes que não se adaptam à atual
concepção da Escola. Ou, como já se ouve em algumas vozes, que se volte ao
ensino tradicional, centrado nas formas reprodutoras, baseadas na informação
estável e de caráter universal que o professorado transmite aos alunos
(HERNÁNDEZ, 1998. p. 59).

Com isso, a transdiciplinaridade vinculada ao currículo integrado, implicaria


dentre outras coisas criar novos objetos de conhecimento de modo a fazer do
conhecimento algo concreto, estimulando o aprender e reaprender, convertendo numa
espiral a atividade de ensino numa descoberta inacabada social e intelectual.

O PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA

Esse trabalho foi desenvolvido em uma escola pública situada na periferia de


São Paulo. A escolha dessa unidade como estudo de caso foi devido ao pesquisador
atuar como docente de sociologia nessa escola, facilitando assim a observação e as
intervenções pedagógicas.
As inquietações direcionaram a uma pesquisa de estudo de caso a despeito do
relato de uma experiência decorrente da aplicação de uma prática de ensino e
aprendizagem transdisciplinar. A classe escolhida era de EJA do período noturno
composta por 50 alunos do 2º grau.
Para tanto, era necessário levantar algumas questões: Qual o perfil do público da
EJA?; O que motiva a busca por esse segmento de educação?; Quais os motivos
associados à evasão escolar?; A aplicação de uma abordagem transdisciplinar de ensino
e a busca de currículo integrado ajudariam na melhoria do ensino e aprendizado e
culminaria para uma melhoria da escolaridade?; Por que e como por meio da adoção
dessa metodologia culminaria para o estímulo ao hábito da pesquisa, ao exercício da
cidadania, o senso crítico, a abertura da criatividade e a convivência com a diferença?
As atividades de avaliação foram desenvolvidas pelo professor e pesquisador de
sociologia durante os anos de 2012 e 2103. Os materiais pedagógicos utilizados foram
os elaborados pelo professor. As atividades foram realizadas durante o módulo com
aulas duplas de 50min, totalizando 20 aulas.
Os dados coletados em questionários abertos ajudaram a analisar os efeitos de
uma prática de ensino transdisciplinar e ao mesmo tempo ajudaram em como proceder
para alcançar os objetivos traçados na pesquisa. O passo seguinte consistiu na
elaboração e aplicação das intervenções pedagógicas.
1175

Considerando que a base teórica da metodologia parte dos pressupostos da


abordagem do pensamento complexo segundo Edgar Morin, os dados suscitados por
meio da aplicação do questionário da pesquisa servirão para avaliar os efeitos da
aplicação dessa metodologia, bem como ajudarão durante a fase da aplicação das
intervenções pedagógicas para o público da EJA.

BIBLIOGRAFIA

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Adriana Veríssimo Veronese. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

HERNÁNDEZ, Fernando. A transdisciplinaridade como marco para a organização


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1176

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(Portugal), v. 23, n. 2, 2010, pp. 191-211.
1177

Comunicação

Sistemas Municipais de Educação e os desafios na oferta da educação pública,


gratuita e de qualidade

Suely Ferreira
UFG
Luís Gustavo Alexandre da Silva
UFG
Agência financiadora: CNPq1

Resumo: O trabalho tem como objetivo discutir quais são os impactos do processo de
institucionalização dos Sistemas Municipais de Educação (SME), selecionados no
estado de Goiás, no contexto das políticas educacionais induzidas pela União, a partir da
década de 1980 que vem pressionando os municípios a assumirem maiores
responsabilidades no campo da organização e da gestão da educação. O contexto atual
demonstra que a não efetivação do regime de colaboração entre os entes federados e a
sobrecarga de atribuições sob responsabilidade municipal vem permitindo a manutenção
das significativas desigualdades na oferta da educação.
Palavras-chave: Sistemas Municipais de Educação, regime de colaboração, qualidade.

O Estado de Goiás possui 246 municípios de acordo com o IBGE (2013)2 e,


destes 63% tem uma população abaixo de 10.000. Essa quantidade relevante de
municípios pequenos levanta desafios significativos para a organização e a gestão dos
Sistemas Municipais de Educação (SMEs), bem como a discussão sobre a importância
do efetivo regime de colaboração entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios na
oferta da educação básica pública, gratuita e de qualidade.

1
Este trabalho integra a pesquisa “Organização e gestão dos sistemas municipais de educação em Goiás”,
coordenado pelos autores da comunicação.
2
IBGE. (2013). Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/estimativa2013
Acesso em: 20 abr. 2014
1178

Heterogeneidade dos municípios e os desafios da institucionalização do SME

O critério para a escolha dos municípios selecionados para a análise buscou


priorizar duas variáveis: a) população abaixo de 20.000 habitantes; b) existência de
documentos oficiais que indicam o processo de institucionalização dos SMEs, a saber,
Lei de criação do SME, Lei de criação do Conselho Municipal de Educação (CME), Lei
de criação do Plano Municipal de Educação (PME), Lei de criação do Conselho do
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (Fundeb), Lei de normatização do Conselho Escolar (CE),
Lei de criação do Plano de Carreira3. Os municípios selecionados para pesquisa foram:
Aparecida do Rio Doce, Flores de Goiás, Goianápolis, Itaguari, Israelândia, Ouro
Verde, Morro Agudo, Palmelo, Rubiataba, Turvelândia, Vicentinópolis, Panamá.
Ressalta-se que apesar dos municípios informarem ao MEC existência dos
documentos, ao serem solicitados a enviarem uma cópia dos mesmos para a pesquisa,
somente um município disponibilizou todos os documentos. Os demais deixaram de
encaminhar de um a três documentos alegando dificuldade de encontrá-los, falta de
tempo para o envio e desconhecimento dos documentos. Dentre os documentos que não
foram cedidos para a pesquisa, destaca-se o Plano Municipal de Educação, não enviado
pelos municípios de Aparecida do Rio Doce, Ouro Verde de Goiás, Palmelo, Rubiataba,
Morro Agudo de Goiás e Panamá. A ausência ou a falta de reconhecimento do Plano
como uma política de estado no âmbito municipal levanta um sério obstáculo para a
institucionalização dos SMEs, pois o Plano Municipal de Educação constitui-se como
um instrumento norteador das políticas públicas e definidor de objetivos, de diretrizes e
dos rumos da educação municipal. A recente publicação da Lei nº 13.005 de 25 de
junho de 2014, correspondente ao Plano Nacional de Educação (PNE), transfere para os
municípios a responsabilidade de elaborar seus PMEs em consonância com as
diretrizes, metas e estratégias do PNE, no prazo de um ano após sua publicação.
Em relação a existência de Conselhos Escolares (CE), os municípios de
Aparecida do Rio Doce, Goianápolis, Itaguari, Israelândia, Ouro Verde de Goiás,
Palmelo, Rubiataba não souberam informar por meio de seus documentos oficiais a
existência desses orgãos colegiados na escola. Partindo da compreensão que o CE é uma

3
Os municípios informam ao Ministério da Educação (MEC), via Plano de Ações Articuladas (PAR), a
existência dos documentos legais existentes. As informações coletadas são relativas ao ano de 2013. A
informação dos documentos foi considerada fundamental na pesquisa para considerar o processo de
institucionalização do SME.
1179

instância deliberativa importante na unidade escolar as possíveis fragilidades em sua


implementação poderá indicar a centralização, a verticalização e a ausência da
participação da comunidade escolar na gestão das escolas municipais. De acordo com a
meta 19, estratégia 19-5, do PNE (2014-2024) que se refere à gestão democrática está
previsto
o fortalecimento de conselhos escolares e conselhos municipais de educação,
como instrumentos de participação e fiscalização na gestão escolar e
educacional, inclusive por meio de programas de formação de conselheiros,
assegurando-se condições de funcionamento autônomo (BRASIL, 2014).

A mera presença dos documentos legais não traduz a institucionalização efetiva


do SME, bem como não é garantia do seu funcionamento, apesar de se constituírem
como elementos fundamentais nesse processo. A opção pela institucionalização do SME
não é uma decisão isolada e descolada da realidade local, pelo contrário, é perpassada
pelas condições econômicas, culturais, políticas, ideológicas, históricas e sociais dos
municípios, além de materializarem as contraditórias disputas entre os diversos
interesses dos grupos políticos locais capazes de induzir novas possibilidades de
remanejamento e organização do poder. Portanto, não é um processo livre e voluntário
destituído de efetivas contradições. Salienta-se que as reais condições dos municípios
são muitas vezes mais determinantes nos resultados das políticas educacionais do que as
propostas contidas nas leis, nos planos e nos programas elaborados no âmbito da União.
A institucionalização do SME é uma questão que necessita ser amplamente debatida em
conjunto com o Sistema Nacional de Educação (SNE).
O quadro I mostra a significativa heterogeneidade dos municípios pesquisados.
1180

Quadro I
Caracterização dos municípios estudados
Municípios Data de criação do município IDHM4 2010 Área da unidade População estimada 2013
territorial
km²
Aparecida do Rio Lei Estadual nº 11.402, de 16 0,693 602,133 2.501
Doce de janeiro de 1991, Médio

Flores de Goiás Lei estadual nº 4926, de 14 0,597 3.709, 427 13.596


de novembro de 1963 Baixo

Goianápolis Lei Estadual nº 2.142 de 14 0,703 162,436 11.001


de novembro de 1958 Alto

Itaguari Lei n° 10400 de 27de janeiro 0,693 564,687 4.673


de 1988 Médio

Israelândia Lei estadual nº 2.114, de 14 0,711 577,482 2.938


de novembro de 1958 Alto

Ouro Verde Lei Estadual nº 4.595 de 1 0,719 208,769 4.062


de outubro de 1963 Alto

Morro Agudo Lei estadual nº 10.425 de 05 0,695 282,616 2.387


de janeiro de 1988. Médio
Palmelo Lei estadual nº 908, de 13 de 0,730 58,959 2.407
novembro de 1953 Alto

Rubiataba Lei Estadual nº 807 de 12 de 0,719 748,264 19.661


outubro de 1953. Alto
Turvelândia Lei Estadual nº 10.429, de 08 0,691 933,957 4.751
de janeiro de 1988 Médio
Vicentinópolis Lei estadual nº 8846 de 10 de 0,684 737,256 7.933
junho de 1980 Médio
Panamá Lei estadual nº 709, de 14 de 0,686 433,761 2.733
novembro de 1952 Médio

Fonte: IBGE - http://www.cidades.ibge.gov.br/2013

Os municípios investigados foram criados ou emancipados recentemente, sendo


cinco na década de 1950, dois na década de 1960, quatro na década de 1980 e um na
4
O índice de Desenvolvimento Humanos dos municípios (IDHM) mede três dimensões para avaliar o
desenvolvimento dos municípios. São eles: longevidade (vida longa e saudável), educação (acesso ao
conhecimento) e renda (padrão de vida). As escalas são: 0 a 0,499 (muito baixa); 0,500 a 0,599 (baixo);
0,600 a 0,699 (médio); 0,700 a 0,799 (alto) e 0,800 a 1,00 (muito alto). O IDHM geral do Brasil é de
0,727, enquanto que nas dimensões são: longevidade (0,816), renda (0,739), educação (0,637). Conferir
em: IDH municipal do Brasil cresce 47,5% em 20 anos, aponta PNUD. Disponível em:
http://g1.globo.com/brasil/noticia/2013/07/idh-municipal-do-brasil-cresce-475-em-20-anos-aponta-
pnud.html. Acesso em: 01 jun. 2014.
1181

década de 1990. Em relação ao IDHM somente um município encontra-se na escala


“baixo”, sendo seis com índice “médio” e cinco como “alto”. Em relação à unidade
territorial são bastante heterogêneos, como Palmelo que possui a unidade de 58,959 km²
e Flores de Goiás com 3.709,427 km². Em relação ao quantitativo populacional temos
cinco municípios abaixo de 3 mil habitantes, três municípios com população inferior a 5
mil e quatro municípios com população acima de 7 mil. O maior município possui
19.661 habitantes e o menor 2.387.
A data de criação dos SME informados pelos municípios também é recente, a
grande maioria dos sistemas foram criados na década de 2000, com exceção dos
municípios de Ouro verde em 1993 e Palmelo em 1998. Todas essas características
demonstram uma expressiva heterogeneidade entre os municípios acarretando
consequentemente impactos relevantes no processo de institucionalização dos SMEs. O
fato de muitos municípios ampliarem suas responsabilidades educacionais apesar da
significativa heterogeneidade levanta reflexões a respeito da oferta e da qualidade da
educação no âmbito municipal. Assim, para diminuir a desigualdade da oferta e
qualidade educacional no Brasil não bastam somente políticas educacionais de
focalização nos municípios, mas deve-se rever o papel a ser assumido em todos os
níveis educacionais pelos demais entes federados.
A Constituição Federal, no Artigo 211, afirma que a União, os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios organizarão em “regime de colaboração” seus sistemas
de ensino. Em 2006, a Emenda Constitucional n. 53, alterou a CF/1988, acrescentando o
Parágrafo Único no Art. 23, em que adicionou “leis complementares fixarão normas
para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo
em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem estar em âmbito nacional”
(BRASIL, 2006). Já a LDB, no Artigo 8, afirma que caberá à União, Estados, Distrito
Federal e Municípios, em regime de colaboração, a organização dos sistemas de ensino.
No artigo 11, da mesma Lei, designa a incumbência ao município dos deveres de
I- organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus
sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União
e dos estados […]; III - baixar normas complementares para o seu sistema de
ensino;[…] V - oferecer a educação infantil em creches, pré-escolas, e, com
prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de
ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de
sua área de competência e com recursos mínimos vinculados pela
Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino (BRASIL,
LDB, 2010).

A Resolução n. 4 de 13 de julho de 2010 avança no entendimento do SNE:


1182

Art. 7º A concepção de educação deve orientar a institucionalização do


regime de colaboração entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios,
no contexto da estrutura federativa brasileira, em que convivem sistemas
educacionais autônomos, para assegurar efetividade ao projeto da educação
nacional, vencer a fragmentação das políticas públicas esuperar a
desarticulação institucional.
§ 1º Essa institucionalização é possibilitada por um Sistema Nacional de
Educação, no qual cada ente federativo, com suas peculiares competências, é
chamado a colaborar para transformar a Educação Básica em um sistema
orgânico, sequencial e articulado.
§ 2º O que caracteriza um sistema é a atividade intencional e organicamente
concebida, que se justifica pela realização de atividades voltadas para as
mesmas finalidades ou para a concretização dos mesmos objetivos.
§ 3º O regime de colaboração entre os entes federados pressupõe o
estabelecimento deregras de equivalência entre as funções distributiva,
supletiva, normativa, de supervisão e avaliação da educação nacional,
respeitada a autonomia dos sistemas e valorizadas as diferenças regionais
(MEC, 2010).

Apesar desse esforço, cabe ressaltar que a efetivação do SNE5 passa pela
discussão da articulação entre autonomia, direito e responsabilidade entre os entes
federados, bem como pela relação entre autonomia e diversidade, uma vez que
se inscreve a liberdade de agir dos entes federativos, garantindo, de um lado,
os direitos da diversidade e, de outro, os direitos da unidade. Faz-se
necessário, para tanto, esforço integrado e colaborativo, a fim de consolidar
novas bases na relação entre todos os entes, visando a garantir o direito à
escola pública unitária para todos (GRACINDO, 2010, p. 59).

Portanto, a competência para a oferta da educação básica com padrões de


qualidade cabe a União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Porém,
as normas de relacionamento e as condições para o cumprimento das
responsabilidades não estão bem definidas e refletem-se na ausência de um
sistema nacional. Não há acordo federativo claro sobre a repartição e o
compartilhamento das responsabilidades para o exercício da competência –
que é comum (ALMEIDA JÚNIOR, 2012, p. 11).

Para a Saviani, sistema é a


é a unidade de vários elementos intencionalmente reunidos de modo a formar
um conjunto coerente e operante. [...] Na verdade, um sistema se insere
sempre num conjunto mais amplo do que ele próprio; e a sua coerência em
relação à situação de que faz parte (coerência externa) se exprime
precisamente pelo fato de operar intencionalmente transformações sobre ela.
Com efeito, se o sistema nasce da tomada de consciência da problematicidade
de uma situação dada, ele surge como forma de superação dos problemas que
o engendraram. E se ele não contribuir para essa superação ele terá sido
ineficaz, inoperante, ou seja, incoerente do ponto de vista externo. E tendo

5
Conforme o Documento Final da CONAE (2010) “O SNE é entendido como mecanismo articulador do
regime de colaboração no pacto federativo, que preconiza a unidade nacional, respeitando a autonomia
dos entes federados” (BRASIL. MEC. CONAE, 2010, p. 15). A CONAE recomenda ainda que esse
sistema deva prever a participação de movimentos sociais e demais segmentos da sociedade civil e da
sociedade política por meio de instâncias colegiadas. Acessar os documentos da CONAE em:
http://fne.mec.gov.br/index.php. Acesso em: 15/08/2013.
1183

faltado um dos requisitos necessários (a coerência externa) isso significa que,


rigorosamente falando, ele não terá sido um sistema (2009, p. 3).

De acordo com Savian (2009), o “sistema educacional” deve ser o resultado de


uma atividade intencional coletiva. Portanto, para a construção de um “sistema
educacional” são necessários a consciência dos problemas da situação, o conhecimento
da realidade e a formulação de uma pedagogia (teorial educacional). Nesse sentido, o
termo “sistema” indica um conjunto de atividades que visam alcançar uma finalidade e,
para tal, fazem-se necessárias atividades organizadas de acordo com as normas que
embasam os valores que fundamentam as finalidades propostas. Assim, “sistema
implica organização sob normas próprias (o que lhe confere um elevado grau de
autonomia) e comuns (isto é, que obrigam a todos os seus integrantes)” (SAVIANI,
2009, p. 10-11).
O Sistema Nacional de Educação implica necessariamente a articulação e a
efetiva colaboração na oferta da educação pública, gratuita e de qualidade entre os entes
federados e não a transferência de responsabilidades. A publicação do atual PNE
estabelece no Art. 7º que “a União, os Estados e o Distrito Federal e os Municípios
atuarão em regime de colaboração, visando ao alcance das metas e à implantação das
estratégias objeto do Plano” (BRASIL, 2014) e no 5º§ afirma que será criada uma
instância permanente de negociação e cooperação entre os entes federados. Porém, na
Lei não é explicitada o prazo para criação dessa instância, bem como a descrição do seu
funcionamento e das suas atribuições.
O Brasil possui um quantitativo expressivo de municípios de pequeno porte com
inúmeras dificuldades para assumir isoladamente a educação infantil e o ensino
fundamental, além das expressivas desigualdades inter e intra-regionais. Tais desafios
tendem a ser ampliados na medida em que o novo PNE estabelece a responsabilidade de
universalizar, como definido na meta 1, a educação infantil na pré-escola para as
crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade e ampliar a oferta de educação infantil
em creches de forma a atender, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das crianças de
até 3 (três) anos até o final da vigência do PNE, na meta 2, universalizar o ensino
fundamental de 9 (nove) anos para toda a população de 6 (seis) a 14 (quatorze) anos e
garantir que pelo menos 95% (noventa e cinco por cento) dos alunos concluam essa
etapa na idade recomendada, até o último ano de vigência do PNE, na meta 4,
universalizar, para a população de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso à
1184

educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede


regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos
multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados,
na meta 5, alfabetizar todas as crianças, no máximo, até o final do 3o (terceiro) ano do
ensino fundamental, na meta 6, oferecer educação em tempo integral em, no mínimo,
50% (cinquenta por cento) das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25%
(vinte e cinco por cento) dos (as) alunos (as) da educação básica e na meta 10, oferecer
no mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) das matrículas de educação de jovens e
adultos, nos ensinos fundamental e médio, na forma integrada à educação profissional
(BRASIL, 2014). Ressalta-se que apesar de existir responsabilidades comuns, há outras
que são definidas como prioritárias para um ou demais entes (União, Estados, Distrito
Federal e Municípios) e a execução das metas depende da efetiva colaboração de todos
os entes mediante a consolidação de um Sistema Nacional de Educação.

Cenário educacional dos municípios pesquisados e o IDEB

O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) aprovado em 2007, bem como


a aprovação do Decreto N. 6.094/2007 que introduziu o Plano de Metas Compromisso
Todos pela Educação e criou também um novo indicador de avaliação da qualidade da
educação, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica-IDEB que pretende na
ótica governamental ser o indutor da melhoria da educação em todo o país. De acordo
com o MEC, o regime de colaboração proposto entre os entes federados por meio do
PDE permitirá
prever o aumento das transferências automáticas de recursos às escolas e às
redes educacionais que demonstrem capacidade de avançar com suas próprias
forças e o aumento das transferências de recursos condicionado à elaboração
e ao cumprimento de um plano de trabalho para as escolas e as redes
educacionais que necessitem de apoio técnico e financeiro. Em outras
palavras, deve-se equalizar as oportunidades educacionais pelo aumento do
financiamento, diferenciando-se apenas o caráter do apoio, de modo a
garantir a ampliação da esfera de autonomia das escolas e das redes
educacionais (BRASIL, 2007, p. 40).

O Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação inaugurou nesse


referencial, um novo regime
de colaboração, que busca concertar a atuação dos entes federados sem lhes
ferir a autonomia, envolvendo primordialmente a decisão política, a ação
técnica e atendimento da demanda educacional, visando à melhoria dos
indicadores educacionais (BRASIL, MEC, 2011, p. 2).
1185

O IDEB é calculado a partir de dois fatores que são as taxas de rendimento


escolar (aprovação, reprovação e evasão) e as médias de desempenho nos exames
aplicados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) mediante
a Prova Brasil para escolas e municípios. O desempenho dos estudantes é avaliado por
meio dos conteúdos em língua portuguesa e matemática. Os índices de rendimento são
obtidos a partir do Censo Escolar, realizado anualmente. As medições envolvem os anos
iniciais (5º ano) e anos finais (9º ano) do ensino fundamental e ensino médio (3º ano) a
cada dois anos. As metas estabelecidas pelo IDEB são diferenciadas para cada escola e
rede de ensino. O objetivo é alcançar seis pontos até 2022, média do sistema
educacional dos países considerados desenvolvidos.
A pesquisa focalizou-se nas médias obtidas em relação ao 5º ano da rede
municipal urbana, por considerar que a oferta dessa etapa do ensino é prioritariamente
realizada pelas redes municipais no Brasil que concentram 11,13 milhões de matrículas,
ou seja, quase 80% do total (MEC/INEP, 2011). Em relação aos municípios
pesquisados, somente quatro municípios encontram-se abaixo da meta estipulada pelo
MEC em 2011 (Ouro Verde, Panamá, Israelândia e Morro Agudo de Goiás). O IDEB
nacional alcançou média 5,0, para o quinto ano em 2011(MEC/INEP, 2011).

Quadro II
IDEB observado e IDEB projetado
Município IDEB Meta Meta Meta Desempenho
5º ano projetada projetada projetada
2011 pelo INEP pelo INEP pelo INEP
alcançado 2011 2013 2021
Rubiataba 6,6 5,6 5,8 6,8 Próximo de atingir a meta de 2021
Itaguari 6,2 4,8 5,1 6,1 Atingiu de 2021
Palmelo 5,6 xxx 5,8 6,7 Próximo de meta de 2013
Ouro Verde 5,3 5,4 5,7 6,7 Abaixo da meta
Vicentinópolis 5,2 4,2 4,4 5,6 Próximo de atingir a meta de 2021
Aparecida do Rio 5,1 3,6 3,9 5,1 Atingiu de 2021
Doce
Panamá 5,1 5,4 5,6 6,6 Abaixo da meta
Goianápolis 5,0 4,5 4,8 5,9 Acima da meta de 2013
Israelândia 4,6 4,8 5,1 6,2 Abaixo da meta
Morro Agudo de 4,4 5,0 5,3 6,3 Abaixo da meta
Goiás
Turvelândia 4,2 3,9 4,2 5,4 Atingiu a meta de 2013
Flores de Goiás 4,2 3,9 4,1 5,0 Acima da meta de 2013
Fonte: INEP - http://portal.inep.gov.br/web/portal-ideb(2012)
Dois municípios da amostra já atingiram a meta projetada para 2021, são eles:
Itaguari e Aparecida do Rio Doce. Outros dois municípios estão próximos de atingir a
meta de 2021, Rubiataba e Vicentinópolis. Os municípios de Goianápolis, Turvelândia e
1186

Flores de Goiás já conseguiram atingir ou ultrapassar a meta de 2013. De acordo com o


MEC/INEP (2011) dos 5.222 municípios no Brasil, 4.060 conseguiram alcançar a meta
projetada do ano de 2011 para os anos iniciais do ensino fundamental, perfazendo um
total de 77,5% dos municípios. O percentual dos municípios goianos pesquisados que
ultrapassaram a meta de 2011 foi de 66,6%, abaixo do quantitativo nacional.
Quadro III
Dados educacionais da rede urbana municipal relativo ao 5º ano e IDEB
Município IDEB 5º IDEB 5º Taxa Distor. Média Média % docente curso
ano ano Aprov. idade/ alunos hora/aula superior
2011 2011 urbano6 série /turma diária EFAI
Proj. Alcan. EFAI EFAI EFAI
INEP urbano urbano Urbano
7
2012 2012 2012
Rubiataba 5,6 6,6 99,1% 2,9% 26 4,2 100
Itaguari 4,8 6,2 97,9% 6,1% 21,1 4 90,5
Palmelo xx 5,6 100% 2,8 14,2 4,3 100
Ouro Verde 5,4 5,3 99,7% 4,4 21,4 4,3 88,9
Vicentinópolis 4,2 5,2 88,3% 21,7 22 4,3 100
Aparecida do Rio 3,6 5,1 95,6% 15,4 24,5 4,4 100
Doce
Panamá 5,4 5,1 98,5% 8,5 17,8 4,4 100
Goianápolis 4,5 5,0 97,% 15 26,1 4,3 76,7
Israelândia 4,8 4,6 98,3% 7,8 18,6 4,4 100
Morro Agudo de 5,0 4,4 100% 4,5 18,5 4,2 71,4
Goiás
Turvelândia 3,9 4,2 91,5% 17,2 27,4 4,3 100
Flores de Goiás 3,9 4,2 96,4% 27,7 22,6 4 90,9

Fonte: INEP - http://portal.inep.gov.br/indicadores-educacionais (2012)

Os dados indicam que a análise das diversas variáveis isoladas e o IDEB


parecem não ter correlação direta. Nesse sentido, Morro Agudo apesar de possuir 100%
de aprovação discente está abaixo da meta projetada para o IDEB em 2011 (5,0), além
de possuir um quantitativo inferior aos demais municípios quanto à formação dos
professores com curso superior (71,4%). Em relação aos municípios de Rubiataba,
Palmelo, Vicentinópolis, Aparecida do Rio Doce, Panamá, Israelândia, Turvelândia,
todos possuem 100% de docentes com curso superior no ensino fundamental. Porém,
existem diferenças expressivas entre eles. Panamá, Israelândia e Aparecida do Rio Doce
possuem maior média hora/aula (4,4) e estão abaixo da média projetada do IDEB.

6
Taxa de rendimento 2011 atualizado em 25/07/2012.
7
EFAI – Ensino Fundamental Anos Iniciais
1187

Enquanto que Turvelândia que está acima da média projetada possui o menor índice de
aprovação (91,5%) e a maior média de alunos/turma 27,4. Chama a atenção o elevado
índice de distorção idade/série dos municípios de Flores de Goiás (27,7%) e
Vicentinópolis (21,7%) e ambos estão acima da meta projetadado IDEB. Israelândia,
Ouro Verde e Goianápolis possuem IDHM considerado alto, porém Israelândia está
abaixo da média do IDEB e com um considerável patamar de distorção idade/série
7,8%. Ouro Verde também está abaixo do IDEB com a aprovação de quase 100% e com
um percentual de professores com formação superior em 88,9%. Já Goianápolis atingiu
a meta projetada, porém segue com problemas em relação à distorção idade/série (15%),
possui somente 76,7% de professores com formação superior e média considerável de
alunos/turma em 26,1%.
Os dois municípios de Itaguari e Aparecida do Rio Doce já atingiram a meta do
IDEB para 2021. Porém, apresentam desafios a serem superados, em Itaguari somente
90,5% dos professores tem formação superior e uma distorção idade/série de 6,1%.
Aparecida do Rio Doce tem um elevado número de alunos com distorção idade/série em
15,4%. Esses dois municípios também não souberam informar sobre a existência do
Plano Municipal de Educação. Já Vicentinópolis que está próximo de atingir a média de
2021 possui a expressiva distorção idade/série em 21,7% e taxa de aprovação no
patamar de 88,3%. Portanto, reduzir a compreensão da elevação da qualidade da
educação somente ao cumprimento do IDEB e com a ênfase nos resultados das
avaliações não permite compreender a realidade e os desafios da oferta da educação
pública e gratuita pelos municípios.

Para concluir ....

A constituição de um Sistema Municipal de Educação não ocorre somente pela


somatória de um conjunto de instituições e órgãos oficiais que realizam atividades
relacionadas à educação sob a coordenação da Secretaria Municipal de Educação. O
aspecto determinante capaz de garantir a institucionalização de um SME é o grau de
intencionalidade do conjunto dos agentes sociais concernente aos efeitos políticos das
práticas educativas. Assim, os agentes sociais que se preocupam em constituir seus
SME precisam discutir e assumir a intencionalidade de suas atividades de forma
participativa e democrática mediante a defesa de um projeto educacional que contemple
as especificidades do município e, ao mesmo tempo, integrada aos planos, ações e
1188

programas elaborados e realizados no âmbito federal e estadual. A definição do Sistema


Nacional de Educação associado a delimitação do regime de colaboração permitirá ao
município desenvolver suas atribuições de forma autonoma e responsável garantindo
que se aperfeiçoe práticas democráticas e participativas em âmbito local.

Referências

ALMEIDA JÚNIOR, Arnóbio Marques de. Federalismo e educação: novos marcos e


perspectivas. Entrevista. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 6, n. 10, p. 5-6,
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maio 2014.
1189

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qualidade para todos. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 4 n. 6, p. 53-64, jan./jun.
2010.
1190

Comunicação

Normatização das funções dos Coordenadores Pedagógicos da rede estadual de


ensino do Estado de São Paulo

Valéria Flores de Souza


Coordenadora Pedagógica
Mestranda em Educação (UNICID).

Resumo: O presente trabalho trata sobre das atribuições e funções do Professor


Coordenador Pedagógico da rede estadual de ensino de São Paulo, que abordam
aspectos relativos à legislação a exemplo do conteúdo da Resolução SE nº 68 de
19/06/2012, que dispõe sobre as ações de acompanhamento realizadas pelos
Coordenadores Pedagógicos nos Núcleos Pedagógicos (PCNPs) nas unidades escolares.
Também trata da Resolução SE nº 88/2007 que traz orientações sobre a função
gratificada do Professor Coordenador, bem como da Resolução SE nº 89 de 19/12/2007,
que regra a função gratificada do Professor Coordenador das quatro séries iniciais do
ensino fundamental I. A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, por meio das
Resoluções, determina funções aos Coordenadores Pedagógicos que nem sempre
condizem com a realidade do cotidiano do profissional no âmbito escolar. Desta forma,
o Professor Coordenador Pedagógico tem função de extrema importância no espaço
escolar, pois estruturam as políticas educacionais no âmbito das unidades escolares, em
prol da qualidade de ensino. Sendo assim, esta pesquisa tem como objetivo analisar as
Resoluções que atribuem funções aos Coordenadores Pedagógicos da rede estadual de
ensino à luz da literatura, com base em Celso dos Santos Vasconcellos, Izaneide
Domingues, Laurinda Ramalho de Almeida, Maria José da Silva Fernandes, Vera Lucia
Trevisan Souza, Vera Maria Nigro de Souza Placco.
Palavras-chave: Coordenador pedagógico; atribuições e funções do coordenador
pedagógico; resoluções legais das escolas públicas.
1191

Introdução
Em l980, prestei vestibular para o curso de Pedagogia na Universidade de Mogi
das Cruzes, concluindo-o com especialização em Administração Escolar. Em 1981,
iniciei meu trabalho como professora eventual em uma escola estadual, lecionando
matérias específicas para o extinto Magistério, aproveitando o pouco tempo livre para
frequentar diversos cursos extensivos. Um pouco mais experiente, assumi a direção de
uma escola de educação infantil, onde trabalhei por doze anos, abandonando essa
função após a perda de um irmão mais novo, em um acidente trágico, período difícil que
me levou a abandonar o magistério. Trabalhei em diversas áreas, mas o coração
remetia-me à sala de aula e, assim, o fiz.
Voltei a lecionar, agora, para alunos do Ensino Fundamental I. Anos passaram-
se e fui convidada a trabalhar como Coordenadora Pedagógica em uma escola de
educação infantil, onde permaneci por seis anos. Mais experiente, profissionalmente,
comecei a interessar-me e passei a observar o processo de desenvolvimento da criança,
do picar papel com as mãos aos primeiros rabiscos, consequentemente, encantei-me
com a alfabetização, por acreditar que partindo da educação infantil e, posteriormente,
educação básica, os seres humanos teriam possibilidades de uma formação intelectual
mais adequada.
Em minha concepção, os educadores não podem perder de vista a
responsabilidade que lhes cabe de formar cidadãos conscientes e responsáveis, que
pensam, analisam e discutem questões sociais com a possibilidade de gerar um desejo
para se construir um mundo melhor.
Em 2007, ingressei no curso de Especialização em Administração Escolar e
Coordenação Pedagógica. Os debates trazidos para a sala de aula pelos colegas
enriqueciam os temas discutidos, considerando a visão de importância do contexto
social em que a criança está inserida. Ao concluir o curso de pós-graduação, passei a
atuar em uma escola particular na zona Sul do município de São Paulo, onde o poder
aquisitivo e cultural de alunos e professores era de alto nível. Organizavam-se palestras,
reuniões e mesas redondas com autores de livros didáticos e os docentes tinham
consciência dos objetivos a serem atingidos em relação à proposta de alfabetização aos
alunos do 1º. ao 5º. ano do Ensino Fundamental I. Os livros didáticos eram manuseados
de acordo com debates e discussões pedagógicas, sequencialmente, série por série, ou
seja, havia uma continuidade de conteúdos necessários ao desenvolvimento cognitivo
1192

dos alunos do Ensino Fundamental I.


A Coordenadora Pedagógica acompanhava, passo a passo, todas as reuniões e o
desenvolvimento decorrente das propostas discutidas. As reuniões ocorriam
semanalmente, sendo que as Professoras Alfabetizadoras estavam incumbidas de
encaminhar um relatório explanando as dificuldades e sucessos que obtiveram durante a
semana em relação às ações pedagógicas trabalhadas. Os relatórios de cada turma eram
debatidos entre todas as Professoras Alfabetizadoras de outras séries, pois os mesmos
deveriam ser encaminhados à Coordenadora Pedagógica.
Quando eram apresentados quadros de defasagens ou dificuldades de algum
aluno, tanto de ordem disciplinar, como de ensino e de aprendizagem, a situação era
analisada em equipe. Cada docente, com sua experiência profissional e conhecimentos
adquiridos nas rotinas pedagógicas, colaboravam da melhor maneira possível para sanar
dúvidas e ajudar aquele indivíduo em formação. Um trabalho enriquecedor, pois, muitas
vezes alguns alunos já eram conhecidos das professoras pelo contato em anos letivos
anteriores, e o auxílio que prestavam com sugestões e atitudes preveniam ou mesmo
subsidiavam orientações aos pais ou responsáveis na busca de ajuda de profissionais
especializados, como psicólogas, psicopedagogas, neurologistas entre outros.
A troca de experiência trazia segurança e o processo articulador entre os
integrantes da equipe propiciava o crescimento e o desenvolvimento do alunado. Das
muitas escolas nas quais trabalhei, em especial esta sobre a qual ora se comenta, foi
onde me senti mais integrada, segura e acabei por aprender como atuar em grupo,
visando os mesmo objetivos. Além de todas as atividades a que era submetida,
obrigatoriamente, frequentava um curso de capacitação a cada dois meses, lia um livro,
semestralmente, com título livre, porém, ao final do semestre apresentava um relatório
sobre a obra escolhida, com as considerações interessantes.
Ante a experiência como professora alfabetizadora e Coordenadora Pedagógica,
decidi analisar as Resoluções da Secretaria Estadual da Educação (Seesp) que atribuem
funções aos Coordenadores Pedagógicas da rede estadual de ensino, com base nos
seguintes teóricos: Celso dos Santos Vasconcellos, Izaneide Domingues, Laurinda
Ramalho de Almeida, Maria José da Silva Fernandes, Vera Lucia Trevisan Souza, Vera
Maria Nigro de Souza Placco.
Em outros termos, busco analisar de que forma o Coordenador Pedagógico
alfabetizador no espaço escolar, assume a sua função mediante os conteúdos das
1193

Resoluções (SE) a seguir: Resolução SE nº. 68, de 19 de junho de 2012, que dispõe
sobre as ações de acompanhamento realizadas pelos Professores Coordenadores nos
Núcleos Pedagógicos (CNPq) em unidades escolares; Resolução SE nº. 88, de 19 de
dezembro de 2007, que traz orientações sobre a função gratificada do Professor
Coordenador; e a Resolução SE nº. 89, de 19 de dezembro de 2007, que regra a função
gratificada do Professor Coordenador das quatro séries iniciais do ensino fundamental I,
em escolas da rede estadual de ensino. Vale ressaltar que os documentos estão à
disposição da população, em outros termos os documentos são de domínio público.

As Resoluções das funções do Coordenador Pedagógico do Estado de São Paulo:


regulamentação e campo teórico

A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seesp) é um órgão público


administrativo responsável pelo atendimento do ensino estadual. Segundo a Seesp, a
estrutura organizacional atual, apresenta os seguintes dados: 5,3 mil escolas, 230 mil
professores, 59 mil servidores e mais de quatro milhões de alunos, organizadas em sete
órgãos centrais e dois vinculados (SÃO PAULO, 2013 a). Cabe, ainda, destacar que
segundo afiança a Coordenadoria de Gestão de Recursos Humanos, o número de
Professores Coordenadores Pedagógicos na Capital do estado de São Paulo é de 5 056,
totalizando no estado 11 781 profissionais, com dados atualizados em agosto de 2013
(SÃO PAULO, 2013 b).
Este artigo trata da Resolução SE nº. 88, de 19 de dezembro de 2007, que
prescreve acerca da função gratificada do Professor Coordenador; também analisa a
Resolução SE nº. 89, de 19 de dezembro de 2007, que aborda a função gratificada do
Professor Coordenador das quatro séries iniciais do ensino fundamental, em escolas da
rede estadual; e da Resolução SE nº. 68, de 19 de junho de 2012, que dispõe sobre as
ações de acompanhamento realizadas pelos Professores Coordenadores dos Núcleos
Pedagógicos (PCNPs) nas unidades escolares.
Na última década, as atribuições definidas aos Coordenadores Pedagógicos pela
legislação estadual, levam aos profissionais responsabilidades como o assessoramento
da direção através de funções administrativas, liderança de projetos político-
pedagógicos, apoio ao professor e atividades relativas ao funcionamento da escola, tais
como:
1194

Avaliação dos resultados dos alunos, diagnóstico da situação de ensino e


aprendizagem, supervisão e organização pedagógicas cotidianas (frequência
de alunos e professores), andamento de planejamento de aulas (conteúdos
ensinados), planejamento das avaliações, organização de conselhos de classe,
organização das avaliações externas, material necessário para as aulas e
reuniões pedagógicas, atendimento de pais etc., além da formação continuada
dos professores (PLACCO; SOUZA; ALMEIDA, 2012).

Segundo Placco, Souza e Almeida (2012), o Coordenador Pedagógico tem a


percepção de que a experiência e o tempo atuante como professor em sala de aula, ou
mesmo na área educacional são fatores importantes para um bom trabalho pedagógico,
porém não determina um bom desempenho como Coordenador Pedagógico quando
executam o seu trabalho no âmbito escolar. Portanto, de acordo com a Resolução SE nº.
88/2007, está determinado que o Professor Coordenador ocupe o cargo comprovando:
experiência de três anos, no mínimo, como docente na rede estadual de ensino;
atribuição de, no mínimo, dez aulas na própria unidade escolar na qual o profissional
pretende atuar na função de Professor Coordenador; e ter sido atuante, principalmente,
nas séries iniciais do ensino da Educação Básica:

Art. 1º - A coordenação pedagógica, nas unidades escolares e oficinas


pedagógicas, a partir de 2008, serão exercidas por Professores
Coordenadores, na seguinte conformidade:
[...]
II – contar, no mínimo, com três anos de experiência docente na rede pública
de ensino do Estado de São Paulo;
III – ser efetivo ou ocupante de função-atividade abrangido pelo § 2º, do
artigo 2º, da Lei Complementar 1.010, de 1.6.2007, na unidade escolar
em que pretende ser Professor Coordenador;
§ 1º - A experiência docente, de que trata o inciso II deste artigo, deverá
incluir preferencialmente, docência nas séries/anos do segmento/nível
de ensino da Educação Básica referente ao posto de trabalho pretendido.

Atualmente, de acordo com a Resolução SE nº 68/2012, em seu artigo 1º, as


responsabilidades do Professor Coordenador vão muito além, cabendo a esse
profissional propiciar orientações técnicas dos Núcleos Pedagógicos aos docentes, para
que as propostas e ações pedagógicas sejam cumpridas pela unidade escolar, assim
como as atividades desenvolvidas pelos docentes e por ele acompanhadas,
implementando o currículo, avaliando e encaminhando as práticas pedagógicas dentro
da escola.

Art. 1º - As Orientações Técnicas realizadas pelos Professores


1195

Coordenadores do Núcleo Pedagógico – PCNPs, visam, precipuamente,


a acompanhar as unidades escolares no desenvolvimento das
atividades implementadoras do currículo, avaliando seu andamento e
orientando os docentes de modo a assegurar o cumprimento das metas
estabelecidas pela unidade escolar em sua proposta pedagógica (SÃO
PAULO, 2012).

De acordo com Domingues (2009), o Estatuto do Magistério Público do Estado


de São Paulo, aprovado pela Lei Complementar nº. 201/78, define, dentre outros
aspectos, a função do Coordenador Pedagógico nas escolas públicas estaduais,
estabelecendo que o acesso à função deve ser por meio de concurso público, além das
seguintes exigências: cinco anos de experiência no magistério como docente,
licenciatura plena em Pedagogia e especialização em supervisão escolar. Mesmo com o
estatuto, a função de Coordenador Pedagógico não se propagou como deveria na rede
estadual de ensino, sendo que a partir de 1988, após movimentos para reformas
educativas, o Coordenador Pedagógico passou a denominar-se Professor Coordenador
(PC).
A partir da edição da Resolução SE nº 89/2007, artigo 4º inciso I, II, III, o
Professor Coordenador, para que assuma a função em unidades escolares, deverá ser
graduado em licenciatura plena, ser profissional atuante na rede estadual de ensino por
no mínimo três anos, ser efetivo ou ocupante de função-atividade, conforme abrangido
no § 2º, do artigo 2º da Lei Complementar SE nº 1.010/2007.

Artigo 2º- São segurados do RPPS e do RPPM do Estado de São Paulo,


administrados pela SPPREV:
I - os titulares de cargos efetivos, assim considerados os servidores cujas
atribuições, deveres e responsabilidades específicas estejam definidas
em estatutos ou normas estatutárias e que tenham sido aprovados por
meio de concurso público de provas ou de provas e títulos ou de provas
de seleção equivalentes;
[...]
§2º - Por terem sido admitidos para o exercício de função permanente,
inclusive de natureza técnica, e nos termos do disposto no inciso I deste
artigo, são titulares de cargos efetivos os servidores ativos e inativos
que, até a data da publicação desta lei, tenham sido admitidos com
fundamento nos incisos I e II do artigo 1º da Lei nº 500, de 13 de
novembro de 1974. (SÃO PAULO, 2007c).

Para Fernandes (2012), no âmbito escolar a função do Coordenador Pedagógico


não se limitou à importância das ações e práticas pedagógicas, mas o profissional
intensificou sua função com a visão distorcida de que poderia e deveria associar seu
cargo às divergências das rotinas escolares, ou seja, estava à disposição para resolver
1196

qualquer que fosse o problema, assim como assumir as emergências e urgências que
aconteciam no cotidiano escolar.
De acordo com a Resolução SE nº 88/2007, artigo 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI
e VII, os Professores Coordenadores Pedagógicos dentro da escola têm suas funções e
atribuições determinadas pela legislação que estabelece regras para os órgãos públicos
da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Cabe ao Professor Coordenador
avaliar o desempenho dos alunos por meio da verificação do processo do ensino e da
aprendizagem, acompanhando e avaliando resultados e tendo como objetivo principal, o
desempenho no ensino e na aprendizagem dos alunos. Os resultados podem ser
avaliados por meio do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São
Paulo (SARESP), que avalia em especial o rendimento no ensino e na aprendizagem do
alunado, conforme a Resolução SE nº 68/2012, Artigo 5º, inciso I e II. O instrumento de
avaliação, a partir da análise de resultados, tem como objetivo desenvolver novos
currículos, buscando orientar os docentes e acompanhar os resultados, caso o
desempenho dos alunos tenha sido satisfatório ou não, de acordo com a proposta
pedagógica de cada unidade escolar.
Ao Professor Coordenador, cabe, também, acompanhar as práticas e ações dos
docentes com o objetivo de tornar os espaços coletivos em oportunidades de reflexão
sobre as práticas e ações pedagógicas dentro da sala de aula, para que possa se
desenvolver uma construção contínua de conhecimentos.
Segundo Domingues (2009, p. 65) “como fruto de um processo reflexivo dos
próprios educadores que, por conhecerem as demandas escolares, tornam-se capazes de
propor e organizar sua própria formação”. Isto posto, o Coordenador Pedagógico passa
a ser responsável pela identidade de formação do processo de reflexão pedagógico da
escola na qual é o mediador. É fundamental que o Coordenador Pedagógico desenvolva
ações e práticas com os demais profissionais, pensando nos desafios atuais que serão
enfrentados em um novo modelo de escola. Há necessidade de uma reflexão sobre a
formação do profissional que trabalhará como mediador das práticas e do processo do
ensino e da aprendizagem, ou seja, o Coordenador Pedagógico.
Conforme a Resolução SE nº 68/2012, em seu artigo 1º, os Professores
Coordenadores dos Núcleos Pedagógicos têm como objetivo principal oferecer
orientações técnicas quanto às propostas pedagógicas das unidades escolares, visando
reconduzir o desenvolvimento das atividades que se fazem indispensáveis para a
1197

elaboração e reelaboração do currículo, acompanhando e avaliando o progresso das


ações praticadas no âmbito escolar, assim como guiar os professores alfabetizadores de
sua equipe ao cumprimento das propostas pedagógicas e metas fixadas pelas unidades
escolares.
Para Placco, Souza e Almeida (2012), os Coordenadores Pedagógicos do estado
de São Paulo, mesmo com as atribuições definidas pela legislação, apontam no sentido
de que a experiência na área educacional é essencial para o desenvolvimento de um bom
trabalho na escola, sendo que a remuneração é sempre inadequada à função exercida, se
comparada aos salários do município e de outros estados, lembrando que a função exige
a execução de atividades fora do ambiente de trabalho, e em horários, muitas vezes,
indisponíveis.
De acordo com a Resolução SE nº 88/2007, Artigo 3º, o exercício funcional do
Professor Coordenador semanalmente, corresponde a quarenta horas, tempo insuficiente
diante do quadro de decisões e resoluções que este profissional deve cumprir dentro da
rede estadual de ensino e fora dela.
As funções do Coordenador Pedagógico estão relacionadas às práticas
educativas baseadas nas Diretrizes que norteiam o Projeto Político-pedagógico (PPP) e
nas normativas oficiais. A realidade da rotina dentro da escola vai muito além das
resoluções e normas estipuladas pelos órgãos governamentais, pois os alunos, os
professores alfabetizadores, os colaboradores administrativos e a sociedade de um modo
geral, necessitam de acompanhamento e atenção que só cabem ao Professor
Coordenador. Sendo assim, para Placco, Souza, Almeida (2012) “a falta de
compreensão sobre limites de sua atuação, considerando-se os eixos articulação,
formação e transformação, pode gerar equívoca e desvios no exercício da função
coordenadora”.
A Coordenação, em sua função, sofre com a falta de reconhecimento de suas
atribuições legais, especialmente nas questões pedagógicas, normalmente envolvidos
com tarefas administrativas e demais conflitos que ocorrem dentro da escola. O desvio
de conduta que este profissional da área educacional tem que enfrentar no seu dia a dia
levou a que parte da literatura da área o caracterize como “apagador de incêndios”
(VASCONCELLOS, 2006; FERNANDES, 2012).
De acordo com a Resolução SE nº 89/2007, Artigo 3º, o Professor Coordenador
Pedagógico articula as ações, tendo um papel fundamental no processo do ensino e da
1198

aprendizagem nas unidades escolares, visando os objetivos das práticas pedagógicas;


entretanto, os Professores Coordenadores que exercem suas funções nas unidades
escolares e que atendam as séries iniciais do Ensino Fundamental I, cumprirão 40 horas
semanais nas Diretorias de Ensino, participando das reuniões, dos grupos que estudam
novas teorias, recebendo e transmitindo as orientações técnicas, e, com a participação
destes profissionais nos programas, haverá possibilidades apropriadas para criar
condições favoráveis aos recursos de parcerias entre a escola e a sociedade.
A Resolução SE nº 88/2007 direcionada à função do Coordenador Pedagógico,
passa a considera-lo um dos pilares para a articulação e melhoria na qualidade do ensino
e da aprendizagem dos alunos da rede estadual. Assumindo a responsabilidade em
administrar e executar as políticas educacionais, terão como objetivo os seguintes
princípios: edificar o grau de desempenho escolar e desenvolver os conhecimentos e
saberes dos alunos, atento aos resultados das avaliações internas e externas; auxiliar os
docentes, tornando-se mediador em suas práticas e dificuldades junto ao alunado e
procurar impulsionar o desempenho dos professores visando à melhoria em seu
trabalho.

Considerações
Este artigo buscou apresentar as possibilidades e limites enfrentados pelos
Coordenadores Pedagógicos na rede estadual de ensino do estado de São Paulo,
mediante funções estabelecidas nas Resoluções da Secretaria Estadual da Educação do
Estado de São Paulo (Seesp).
As Resoluções foram confrontadas com estudos literários dos seguintes teóricos:
Celso dos Santos Vasconcellos, Izaneide Domingues, Laurinda Ramalho de Almeida,
Maria José da Silva Fernandes, Vera Lucia Trevisan Souza, Vera Maria Nigro de Souza
Placco. Registram-se as dificuldades, os erros e acertos que este profissional enfrenta
nas rotinas e atividades pedagógicas no âmbito escolar.
Ao levar em consideração os estudos expostos, os Coordenadores Pedagógicos
da rede estadual de ensino assumem uma sobrecarga nas funções exercidas, colocando
em risco a própria estrutura física e emocional, em consequência do excesso de
trabalho, prejudicando a qualidade de ensino e a organização na escola.
É importante salientar a importância deste profissional como mediador e
articulador das práticas e ações pedagógicas, porém a excessiva jornada e as funções
1199

que não lhe cabem assumir, desorganizam atividades pedagógicas, tiram o foco da
qualidade do ensino e da aprendizagem na rede estadual, e principalmente, às vezes,
aumentam a distância entre os docentes e o Coordenador Pedagógico, sendo ele
responsável pela formação dos professores na unidade escolar.
Neste contexto, o Coordenador Pedagógico ao assumir o papel no espaço
escolar, deve refletir e organizar suas atividades pedagógicas, assim como priorizar
práticas e ações pedagógicas, junto à equipe de docentes, para efetivamente desenvolver
o ensino e aprendizagem eficiente ao alunado.

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político pedagógico ao cotidiano da sala de aula. 7. ed. São Paulo: Libertad, 2006.
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Comunicação

O “tempo integral” na educação infantil: uma análise de suas práticas no estado do


Espírito Santo

Vania Carvalho de Aráujo


(Programa de Pós Graduação em Educação/UFES)
Grupo de Pesquisa “Infância, Sociedade e Cultura” – IESC
Financiamento: FNDE/MEC

Edson Maciel Peixoto


(Programa de Pós Graduação em Educação/UFES)

Luziane de Assis Ruela Siqueira


(Programa de Pós Graduação em Educação/UFES)

Marcela Gama da Silva Gomide


(Secretaria Municipal de Educação de Serra -ES)

Resumo: Esta pesquisa tem como objetivo identificar e analisar, por meio de um estudo
exploratório qualitativo, as experiências realizadas em diferentes cidades do Estado do
Espírito Santo e as múltiplas justificativas de ampliação do tempo de permanência das
crianças em creches e/ou pré-escolas localizadas na área rural e urbana, visando
compreender as concepções e motivações em torno do atendimento da educação infantil
em tempo integral. Os resultados da primeira fase da pesquisa apontam que a oferta da
educação infantil em tempo integral já é uma realidade nos diferentes municípios
capixabas, contudo essa experiência tem apresentado cenários ora contrastantes ora
complementares ao reconhecimento da educação infantil como primeira etapa da
educação básica.
Palavras-chave: Educação infantil em tempo integral. Educação integral. Políticas de
educação infantil.
1202

INTRODUÇÃO

Um grande desafio vem sendo colocado à nossa histórica tradição escolar brasileira de
turnos parciais e períodos de quatro horas letiva. Trata-se da ampliação da jornada
escolar que vem se constituindo como uma política educativa nos diferentes níveis de
ensino em estados e municípios brasileiros. Na história da educação brasileira,
diferentes manifestações ideológicas e políticas surgiram em torno da “educação
integral” ou da “escola integral”, sem que isso implicasse, necessariamente, na
reconfiguração do tempo de permanência dos alunos na escola.
Quando os debates se presentificam em torno da idéia da “educação em tempo integral”
ou “escola em tempo integral” temos aí uma dupla provocação ao fenômeno
educacional: uma pela via da redefinição dos conteúdos e atividades escolares no turno
e contraturno e da reconfiguração da estrutura administrativa escolar (universalização x
critérios de matrículas, organização do tempo, financiamento, carga horária de trabalho,
contratação de profissionais e seleção de alunos) e outra, tão desafiadora quanto a
primeira, pelo critério motivador que justifica a necessidade de ampliação da jornada
escolar nas unidades de ensino.
Ainda que muitas dessas experiências não tenham conseguido sobreviver com o tempo
em função de vários fatores, o que vem ocorrendo no Brasil é um crescimento
vertiginoso da ampliação do tempo escolar e de iniciativas voltadas à educação em
tempo integral, nas escolas de educação básica (CAVALIERE, 2002), sobretudo no
ensino fundamental. Como forma de incentivar a ampliação da educação integral, o
governo federal criou, em 2008, o Programa Mais Educação destinado às escolas que
atendessem a maioria de alunos cadastrados no Programa Bolsa Família e com menos
de 3.5 pontos no Ideb – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica1.
Instituído pela Portaria Normativa Interministerial nº. 17/2007, que tem por objetivo
fomentar a educação integral de crianças, adolescentes e jovens, por meio de atividades
sócio-educativas no contraturno escolar, articuladas ao projeto de ensino desenvolvido
pela escola e dos processos escolares com outras políticas sócio-culturais, o Programa
Mais Educação é uma das metas do Plano de Desenvolvimento da Educação.
Atualmente 32 mil unidades de ensino fazem parte do Programa (MEC, 2012).

1
Índice de qualidade da educação básica instituído pelo Ministério da Educação no ano de 2007. Esse
índice é obtido a partir do cruzamento de duas variáveis: taxa de aprovação dos alunos e desempenho na
Prova Brasil, e seus resultados são apresentados numa escala de zero a dez.
1203

Ainda que sejam princípios orientadores do Programa Mais Educação a qualidade da


educação, a articulação da educação com outras políticas públicas, prevenção a
situações de violação dos direitos da criança e do adolescente, o que observamos é um
empenho significativo do Programa melhorar o desempenho escolar e ampliar a
permanência dos alunos na escola, sobretudo em territórios mais vulneráveis, com o
objetivo de reduzir os índices de evasão e reprovação escolar e de distorção idade/série.
Essa perspectiva, sem dúvida, desafia a concepção sistêmica de educação, uma vez que
o Programa está voltado exclusivamente para o ensino fundamental, sobretudo às
escolas com baixo Ideb e que atendem em sua maioria alunos cadastrados no Programa
Bolsa Família.
Quando esta questão é deslocada ao campo da educação infantil não há um programa
consolidado de âmbito federal. O que temos são iniciativas isoladas, motivadas,
sobretudo, pela reivindicação da família em colocar os filhos em unidades de tempo
integral ou por iniciativa próprias de governos. Ainda que alguns aspectos da matriz
discursiva do Programa Mais Educação parece inspirar a implementação do tempo
integral no âmbito da educação infantil, o que observamos é uma ênfase na ampliação
do tempo de permanência das crianças, sobretudo naquelas instituições cujos territórios
se encontram em áreas mais vulneráveis decorrentes da pobreza e em função dos
chamados “riscos sociais” que ameaçam os direitos das crianças pequenas.
Embora grande parte dos efeitos da tradição da “educação assistencialista”
(KUHLMANN JR, 1998) na educação infantil continua a se perpetuar como um
elemento forte de promoção de ampliação do tempo de permanência das crianças nas
instituições educativas, principalmente nas creches, a extensão desses efeitos tem
ameaçado a tênue experiência da educação infantil como primeira etapa da educação
básica, ora porque a ampliação do tempo das crianças em creches e pré-escolas tem se
constituído unicamente pelo viés da reivindicação familiar ou do apelo das promessas
políticas; ora pelo viés da reprodução do modelo do ensino fundamental comumente
adotado.
Por diferentes motivações, tais experiências, se apresentam pouco consistentes sob o
ponto de vista teórico e metodológico (SANTOS, 2010; MARCHIORI, 2011), realidade
esta que tem influenciado significativamente as relações estabelecidas dos adultos com
as crianças, a forma como a educação infantil tem se constituído como uma política
pública e como primeira etapa da educação básica, o modo como o currículo tem
1204

orientado as práticas pedagógicas destinadas às crianças pequenas das creches e das pré-
escolas, só para citar algumas dessas constatações.
A hipótese de que a experiência da educação integral na educação infantil se mantém
principalmente sob a égide da ampliação do tempo de permanência da criança na
instituição é um anúncio do quão se fazem necessários estudos e pesquisas que nos
permitam compreender os diferentes desafios e motivações que têm se constituído em
torno da demanda de ampliação do tempo integral ou da educação em tempo integral na
educação infantil. Portanto, uma análise mais apurada dos diferentes processos que vem
ocorrendo em torno da organização e implementação dessas propostas é um caminho
importante para subsidiar as políticas de educação infantil.
Com o intuito de compreender as concepções, motivações e estratégias que se
configuram em torno do atendimento da educação infantil em tempo integral, esta
pesquisa teve como objetivo identificar e analisar, por meio de um estudo exploratório,
as experiências existentes em diferentes cidades do Estado do Espírito Santo, cujos
contextos diversos (creches e pré-escolas públicas localizadas no campo e nos centros
urbanos), tem feito emergir formas institucionalizadas e justificações múltiplas de
ampliação do tempo de permanência das crianças em creches e/ou pré-escolas.
A expansão das creches e pré-escolas continua a ser um tema inquietante, sobretudo se
considerarmos os efeitos da afirmação de direitos consagrados pela Constituição de
1988, as mobilizações sociais em torno dos direitos da criança pequena, as
reivindicações do movimento de mulheres, as novas responsabilidades públicas e
obrigações dos municípios com a educação infantil (CAMPOS, ROSEMBERG,
FERREIRA, 1995). Contudo, num contexto onde as lutas pela universalização da
educação infantil reatualizam debates e colocam em xeque a capacidade do Estado de
promover novas interlocuções públicas em torno da educação infantil como primeira
etapa da educação básica, o que percebemos é um quadro eivado de disparidades onde a
negação de direitos expõe as evidências de uma cidadania inconclusa e demiurga.
Se a universalização da educação infantil ainda constitui-se uma luta inacabada,
sobretudo se considerarmos a histórica invisibilização das crianças de zero a três anos
de idade na sociedade brasileira, quando os olhares se voltam para a expansão da
educação em tempo integral em creches e pré-escolas, novas interpelações por políticas
públicas surgem no horizonte da reivindicação e da ampliação de direitos. É justamente
a possibilidade problematizadora dessas questões que nos permitiu adentrar com maior
profundidade no terreno conflituoso que cerca a demanda por ampliação do tempo de
1205

permanência das crianças nas unidades de educação infantil, traduzida como política
pública.

DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA
Com o objetivo de analisar as concepções, motivações e estratégias que se configuram
em torno dos processos de organização e implementação do atendimento do tempo
integral nas creches e nas pré-escolas como subsídios às políticas de educação infantil,
esta pesquisa2 teve como objetivos principais: a) identificar os fatores de natureza
econômica, administrativa, educacional, social e política que motivam a organização e
implementação da educação infantil em tempo integral nas creches e pré-escolas; b)
investigar os efeitos/consequências da educação infantil em tempo integral na vida das
crianças e de suas famílias, na organização e administração escolar e nas práticas
pedagógicas; c) compreender os significados atribuídos pelas crianças, famílias,
professores, gestores escolares e secretarias de educação à experiência da creche e pré-
escola em tempo integral.
Considerando a diversidade dos contextos investigados, foram consideradas duas etapas
para a recolha dos dados. A primeira etapa do estudo exploratório constituiu-se da
aplicação de um questionário a todos os municípios capixabas, numa tentativa de extrair
alguns elementos que subsidiariam as etapas seguintes da pesquisa. A sistematização
das questões encaminhadas por 94% dos municípios respondentes contribuiu para
caracterizar melhor os contextos e identificar o quantitativo de atendimento da educação
infantil em termos de matrícula inicial e número de instituições (campo e centro urbano,
tempo parcial e integral, creche e pré-escola). A partir destes dados, foram estabelecidos
critérios mais rigorosos para a escolha dos municípios a serem investigados in loco, de
acordo com os objetivos propostos.
Para a seleção dos municípios considerados na segunda fase da pesquisa, foram
utilizadas as referências aplicadas pelo Governo do Estado do Espírito Santo na
definição das Microrregiões e Macrorregiões do Estado.3 Na tentativa de contemplar um
município em cada microrregião, os critérios para a escolha dos dez municípios
selecionados foram adotados de acordo com os quesitos previstos em uma escala de

2
“Educação em Tempo Integral na Educação Infantil: um estudo das concepções e práticas no Estado do
Espírito Santo”. Pesquisa em andamento por meio de um Termo de Cooperação Técnica entre o
MEC/COEDI e a UFES (2013/2014).
3
A divisão dos municípios capixabas em Microrregiões e Macrorregiões está prevista na Lei Estadual nº
9.768/11.
1206

prioridade: 1) Oferta de Educação Infantil em Tempo Integral na área urbana e rural; 2)


Municípios que possuem instituições que ofertam Educação Infantil (0 a 6 anos)
exclusivamente em Tempo Integral; 2.1. Municípios que possuem instituições que
ofertam Educação Infantil (0 a 6 anos) exclusivamente em Tempo Integral levando em
consideração maior número de instituições do município; 3) Municípios que possuem
instituições que ofertam pelo menos uma das etapas da Educação Infantil (creche ou
pré-escola) em Tempo Integral. Os municípios selecionados representam as seguintes
Microrregiões: Metropolitana (Vitória), Rio Doce (Linhares); Central Serrana (Santa
Leopoldina), Litoral Sul (Anchieta); Sudoeste Serrana (Domingos Martins), Nordeste
(Pinheiros), Centro Oeste (Vila Valério), Noroeste (Barra de São Francisco), Centro Sul
(Castelo), Caparaó (Ibatiba).

RESULTADOS PRELIMINARES – PRIMEIRA FASE


Os dados obtidos na primeira fase da pesquisa apontaram que a oferta da educação
infantil em tempo integral era uma realidade nos diferentes municípios capixabas. A
matrícula inicial das crianças nas creches em tempo parcial é de 67,6%, em tempo
integral é de 32,4%. Na pré-escola, o atendimento às crianças no tempo parcial em
relação ao tempo integral era ainda maior, pois apenas 7,5% dessas crianças possuíam a
matricula inicial no tempo integral, o que demonstra uma focalização de atendimento
em tempo parcial na pré-escola. Comparando a matrícula inicial em tempo integral nas
creches e nas pré-escolas obtivemos os seguintes dados: matrículas na creche tempo
integral (32,4% das crianças) e matrículas na pré-escola tempo integral (7,5% das
crianças). Quanto ao quantitativo de instituições que atendiam exclusivamente o tempo
integral, identificamos 23,5% de atendimento nas creches e 7,4%, nas pré-escolas.
Por meio da análise de variância - ANOVA (estatística paramétrica que permite a
análise de equivalência das médias alcançadas pelos diferentes grupos em relação ao
construto investigado) foi possível identificar as diferenças em relação às matrículas
iniciais das crianças nas creches em tempo integral nas diferentes microrregiões do
estado. O resultado do procedimento ANOVA sugere que existe diferença, de pelo
menos uma das microrregiões, em relação ao percentual médio de estudantes
matriculados nas creches em tempo integral (F(9,59)=3,793; p=0,001). Quando
estabelecemos uma análise complementar, percebemos que a região metropolitana
apresenta o menor percentual médio de estudantes matriculados em tempo integral nas
creches.
1207

Se na primeira fase do estudo exploratório pudemos identificar, ao menos em seus


aspectos mais gerais, a configuração do atendimento da educação infantil, seja em
tempo parcial, seja em tempo integral, para a segunda fase foram indicadas duas
instituições de educação infantil em cada um dos dez municípios selecionados,
obedecendo, assim, os seguintes critérios de escolha: 1) Possuir instituição em área
urbana e na área rural; 2) Contar com atendimento em creche e em pré-escola
exclusivamente em tempo integral; 3) Contar com atendimento em creche e pré-escola
simultaneamente em tempo integral e parcial. Caso, tais municípios selecionados não
contemplassem o atendimento simultaneamente em creche ou pré-escola, seria realizado
um sorteio para se definir a instituição em que se realizaria a pesquisa.
Como sujeitos da pesquisa, privilegiamos as crianças e seus respectivos pais e/ou
responsáveis, professores, gestores das unidades de educação infantil e secretários de
educação. Para a recolha das vozes das crianças foi adotada uma estratégia diferenciada
junto a seis crianças com idades de três e cinco anos de idade vinculadas às famílias
selecionadas.

RESULTADOS PRELIMINARES – SEGUNDA FASE


Levando-se em consideração as variáveis previamente estabelecidas e as questões
elaboradas em questionários com questões semi-estruturadas, alguns resultados
preliminares da segunda etapa da pesquisa foram sistematizados de acordo com sua
perspectiva administrativa, pedagógica e orçamentário-financeira.
Quanto aos desafios administrativos encontrados na consolidação do tempo integral na
educação infantil, os gestores apontaram algumas disparidades entre o “tempo parcial” e
o “tempo integral”, o que tem implicado modos distintos e, às vezes, contraditórios, de
atuação e visibilização da experiência da educação infantil. A fragmentação dos tempos
de permanência das crianças tem ocasionado, além de outras questões, uma fragilidade
da educação infantil enquanto primeira etapa da educação básica, já que ao tempo
denominado de “regular” ou “parcial” é instituída uma visibilidade pedagógica e ao
“tempo integral” uma visibilidade mais assistencial.
Quanto aos aspectos pedagógicos, de acordo com os professores entrevistados, a
ausência de um projeto político-pedagógico articulado às Diretrizes Curriculares
Nacionais de Educação Infantil que contemple a especificidade do trabalho do tempo
integral tem sido causa de muitas distorções quanto aos objetivos da permanência das
crianças pequenas em jornada ampliada na educação infantil, uma vez que a ausência de
1208

um debate pedagógico acerca dessa experiência tem produzido novas cisões entre o
cuidar e o educar, despotencializado o sentido da avaliação e do planejamento, além de
secundarizar as questões que dizem respeito às condições de trabalho com qualidade e à
formação dos profissionais para atuarem no tempo integral. Outra questão levantada foi
a necessidade de considerar as realidades distintas de atendimento, já que o tempo
integral é uma experiência presente em contextos rurais e urbanos.
Quanto ao aspecto orçamentário-financeiro, os sujeitos entrevistados (gestores, família e
professores) destacam a necessidade de maior autonomia financeira da instituição para
atender a especificidade do tempo integral, bem como, a garantia de repasse de recursos
diferenciados para atender as demandas do “tempo parcial” e “tempo integral” e das
instituições localizadas em contextos urbanos e rurais. Além disso, apontam a
necessidade de contratação de profissionais para atuarem no tempo integral da educação
infantil em articulação com o professor.
Do que pudemos apreender a partir de alguns dados preliminares, a experiência do
tempo integral na educação infantil, na maioria dos municípios investigados, ainda
constitui-se como reflexo de uma matriz cultural assistencialista, reforçando assim, a
ausência de redes de proteção e políticas públicas articuladas em torno da infância, já
que há uma predominância no critério de matrícula crianças em situação de
“vulnerabilidade e risco social”. Um outro fator está na constatação de que a maioria
das atividades com as crianças ocorrem em salas de aula, apontando, assim, uma
precariedade de alternativas de trabalho além do espaço escolar. Esta situação é
ressaltada, sobretudo, pelas crianças quando afirmam que se pudessem escolher
estariam em casa brincando e não no tempo integral.
Apesar da configuração de “política pública”, a maioria das propostas do tempo integral
na educação infantil não tem nenhum tipo de sistematização, ficando fragilizada a
eventuais mudanças na administração municipal. Na maioria das vezes, ela não nasce de
uma demanda pedagógica e sim de um apelo “popular” e/ou “judicial”. Tudo isso nos
desafia a pensar em que medida a oferta do tempo integral tem se constituído como uma
política da educação infantil e como um reconhecimento da criança como sujeito de
direitos.
São algumas dessas evidências que nos desafiam a questionar a complexidade da
educação infantil em tempo integral na contemporaneidade e como esta experiência tem
se colocado no interior mesmo da educação infantil como um direito sobretudo da
criança.
1209

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As diferentes experiências que se configuram em torno da ampliação do “tempo
integral” ou da “educação em tempo integral na educação infantil”, as polarizações em
torno das finalidades expressas da educação infantil e do ensino fundamental, as
disparidades de investimento público na educação infantil, os desafios em torno da
universalização da educação infantil, a obrigatoriedade da matrícula na pré-escola, as
exigências da vida contemporânea culminando com a inserção crescente da mulher no
mercado de trabalho, as responsabilidades públicas em torno do combate à pobreza, a
ampliação e reconhecimento das crianças como sujeitos de direitos, são algumas das
evidências do quanto a educação infantil em tempo integral precisa ser analisada com o
objetivo de aprimorar as políticas públicas destinadas às crianças pequenas. Ainda que a
ampliação do tempo de permanência das crianças na educação infantil não seja um tema
atual, os desdobramentos de natureza política, pedagógica, econômica e social que
emergem dessa experiência nos provocam a compreender melhor os nexos de uma
realidade que continua a alojar os paradoxos e os desafios de nossa educação e de nossa
sociedade.
Assim, de um lado, temos algumas contradições que precisam ser superadas na
afirmação do tempo integral como uma experiência “da educação infantil”, e de um
outro lado, a possibilidade de aprender com o tempo integral e o que ele nos desafia a
pensar a própria educação infantil.
Não podemos deixar de considerar que a implementação do tempo integral na educação
infantil tem “provocado” outras lógicas discursivas e práticas nas instituições de
educação infantil, sobretudo, quando seu trabalho tem apontado para uma configuração
pedagógica diferenciada e demandado a participação das crianças em outros espaços
sócio-culturais da cidade. Se tudo isso tem produzido novas tensões em torno da
afirmação da educação infantil como primeira etapa da educação básica, tem também
demandado novas responsabilidades públicas e obrigações com a educação infantil.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Portaria Normativa Interministerial nº17, de 24 de abril de 2007. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 26 de abr. 2007.
1210

CAMPOS, Maria Malta; ROSEMBERG, Fúlvia; FERREIRA, Isabel M. Creches e pré-


escolas no Brasil. 2.ed. São Paulo: Cortez, 1995.

CAVALIERE, Ana Maria Villela. Educação integral: uma nova identidade para a escola
brasileira? In: Educação e Sociedade, Campinas, vol.23, n.81, p.247-270, dez.2002.

KUHLMANN JR., Moysés. Infância e educação infantil: uma abordagem histórica.


Porto Alegre: Mediação, 1998.

MARCHIORI, Alexandre Freitas. A criança como sujeito de direitos no cotidiano da


educação infantil. 2012. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal
do Espírito Santo, 2012.

SANTOS, Maria Aparecida Rodrigues da Costa. Educação em tempo integral no


município de Vitória: a experiência do Brincarte. 2012. Dissertação (Mestrado em
Educação) – Universidade Federal do Espírito Santo, 2012.
1211

Comunicação

Relações entre o público e o privado na educação: o projeto jovem de futuro do


instituto Unibanco

Vera Maria Vidal Peroni


UFRGS-CNPQ
Maria Raquel Caetano
FACCAT-IFESUL

RESUMO: Este trabalho faz parte da pesquisa “Parcerias entre sistemas públicos e
instituições do terceiro setor: Brasil, Argentina, Portugal e Inglaterra implicações para a
democratização da educação” realizada pelo Grupo de Pesquisa “Relações entre o
Público e o Privado na Educação” do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Nesta etapa da pesquisa, o grupo enfoca o
conteúdo da proposta, isto é, como a lógica privada mercantil está sendo inserida no
sistema público e também como se dá a influência das redes nacionais e globais na
política educacional brasileira de educação básica, sob a perspectiva de Thompson
(1981) de que são sujeitos e relações com objetivos de classe. Assim, neste texto,
daremos prioridade para estes dois aspectos - sujeitos e conteúdo da proposta - na
análise do Projeto Jovem de Futuro do Instituto Unibanco.
Palavras -chave: Público - privado; parcerias;educação;Unibanco.

Introdução
Este texto é parte de uma pesquisa que analisa a materialização das relações
entre o público e o privado nas etapas e modalidades da educação básica no Brasil,
realizada por um grupo de pesquisa da UFRGS que investiga o tema há uma década. O
enfoque teórico-metodológico do grupo é que o Estado, assim como o capital, deve ser
visto como relação ou processo1. Entendemos que ele é parte importante do movimento
de correlação de forças de sujeitos2 situados em um contexto histórico e geográfico3.
Portanto, Estado e sociedade civil são perpassados por correlações de forças de classes

1
Relação ou processo na concepção de Thompson (1981)
2 Sujeitos na concepção de Thompson (1981)
3 Contexto histórico e geográfico na concepção de Harvey (2005)
1212

sociais e projetos societários distintos. Destacamos que estamos tratando em nossas


pesquisas da sociedade civil mercantil, em que o privado está vinculado ao mercado.
O foco da análise é a privatização do público, na lógica mercantil, com
implicações para a democratização da educação. Compreendemos que as mudanças nas
fronteiras entre o público e o privado são partes de redefinições no papel do Estado que
ocorrem como consequências da profunda crise atual. Nos últimos anos, constatamos
várias formas de privatização do público que vêm se concretizando através da alteração
da propriedade, ocorrendo a passagem do estatal para o público não-estatal ou privado;
ou através de parcerias entre instituições públicas e privadas com ou sem fins lucrativos,
quando o que é privado define o público. Ainda nesse mesmo pensamento, o que
permanece com a propriedade estatal passa a ter a lógica de mercado, reorganizando,
principalmente, os processos de gestão e redefinindo o conteúdo da política
educacional.
Nesta etapa da pesquisa, o grupo enfoca o conteúdo da proposta, isto é, como a
lógica privada mercantil está sendo inserida no sistema público e também como se dá a
influência das redes nacionais e globais na política educacional brasileira de educação
básica, sob a perspectiva de Thompson (1981) de que são sujeitos e relações com
objetivos de classe. Assim, neste texto, daremos prioridade para estes dois aspectos -
sujeitos e conteúdo da proposta - na análise do Projeto Jovem de Futuro do Instituto
Unibanco.

O Instituto Unibanco
O Instituto Unibanco4 foi criado em 1982, inicialmente para promover as ações e
os investimentos sociais do Unibanco – que em 2008 formou o conglomerado Itaú
Unibanco. Segundo o próprio Instituto Unibanco, a instituição se dedicou durante anos
ao apoio a projetos de terceiros, de diferentes áreas. Buscando obter maior impacto
social, em 2002, redirecionou sua atuação para a educação, desenvolvendo projetos
próprios.
Em 2007, o Instituto concebeu e implantou o Projeto Jovem de Futuro, de forma
experimental, em três escolas paulistanas. No ano seguinte, aplicou o projeto piloto em
20 instituições de ensino de Minas Gerais e 25 do Rio Grande do Sul. Já em 2009, o
projeto se expandiu para mais 41 escolas do estado de São Paulo. Em 2011, as unidades

4
Sobre este assunto ver Monteiro (2013)
1213

participantes da fase experimental tornaram-se as primeiras a cumprir todo o ciclo do


Ensino Médio sob a ação do Jovem de Futuro e deram subsídio para a validação do
projeto e para sua aplicação em larga escala, em parceria com o Programa Ensino
Médio Inovador, do Ministério da Educação, Secretaria de Assuntos Estratégicos da
Presidência (SAE) e cinco Secretarias Estaduais de Educação, como política pública
estadual de ensino no Ceará, em Goiás, no Mato Grosso do Sul, no Pará e no Piauí, cujo
objetivo, segundo o instituto, é a melhoria do Ensino Médio público.
A missão do Instituto Unibanco é contribuir para o desenvolvimento dos alunos
do Ensino Médio em escolas públicas, concebendo, validando e disseminando novas
tecnologias ou metodologias que melhorem a qualidade e a efetividade das políticas
públicas. O Instituto conta com um Conselho de Administração ativo, formado por
especialistas, e uma diretoria, conforme dados do site, comprometida com a
interlocução e com o Conglomerado Itaú Unibanco. O Instituto optou por desenvolver
suas ações no Ensino Médio por ser o passaporte mínimo tanto para a inserção no
mercado de trabalho quanto para a continuidade dos estudos.
(www.institutounibanco.org).

Os sujeitos
O Conselho de governança do IU – Instituto Unibanco - é composto pelo
presidente Pedro Moreira Salles, vice-presidente Pedro Sampaio Malan,
superintendência executiva Ricardo Henriques. Além disso, é formado pelos
conselheiros Antonio Matias, Cláudio de Moura Castro, Cláudio Luiz da Silva Haddad,
Marcos de Barros Lisboa, Ricardo Paes de Barros, Tomas Tomislav Antonin Zinner,
Thomaz Souto Corrêa Netto e Wanda Engel.
A figura que segue visualiza quem são os sujeitos que participam do Conselho
de Governança, bem como onde atuam ou atuaram. Destacamos com cores distintas a
própria instituição financeira Itaú/Unibanco, governo, instituições privadas
educacionais, do terceiro setor, organizações internacionais e outras instituições
financeiras para analisarmos as suas experiências, no sentido dado por Thompson, isto
é, de onde falam e como se relacionam ou não com a educação. Os sujeitos que
participam do Conselho de Governança são sujeitos históricos em relação a outros
sujeitos, que defendem interesses individuais ou coletivos, por isso é necessário estudá-
los nas relações que estabelecem com indivíduos ou grupos.
1214

Elaborado por Greice Hochmuller, Raquel Caetano e Vera Peroni.

É possível verificarmos na figura anterior que os membros do Conselho de


Governança (CG) também ocupam cargos importantes na Instituição Financeira
Itaú/Unibanco, sendo pessoas que têm princípios e práticas empresariais e não têm
expertise na área educacional. No entanto, influenciam na política educacional
brasileira. Outro fator importante que observamos foi a relação entre o governo federal e
o Instituto, como Ricardo Henriques, que foi secretário da SECAD/MEC (2004-2007) e
é, atualmente, o superintendente do Conselho de Governança, e Ricardo Paes de
Barros, que é o atual subsecretário de assuntos estratégicos da Presidência da República
e ocupa cargo de conselheiro no conselho de Governança do Instituto.
Notamos, também, a presença de sujeitos atuantes em outras instituições
privadas de educação. Entre esses se destacam o conselheiro Claudio de Moura Castro,
presidente do conselho consultivo da faculdade Pitágoras e assessor especial da
presidência do grupo Positivo, bem como Claudio Luiz da Silva Haddad, presidente do
Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa) e presidente do Conselho do Grupo Ibmec S.A.,
entidade mantenedora das Faculdades Ibmec Rio de Janeiro, Minas Gerais, Brasília e
das Faculdades Veris (http://www.institutounibanco.org.br/o-instituto/governanca).
1215

Ricardo Henriques, superintendente do IU, (2012) diz que assumiu a


responsabilidade de conduzir os trabalhos do Instituto e a oportunidade de disseminar o
Projeto Jovem de Futuro. Para ele é uma iniciativa com resultados testados e efetivos,
construídos em sólida base técnica e forte articulação institucional, ainda na gestão
anterior. Após a fase piloto e um extraordinário impacto na aprendizagem dos alunos
confirmado pela avaliação externa conduzida pelo pesquisador Ricardo Paes de Barros
– o Jovem de Futuro passou a integrar uma agenda que irá contemplar até 2016, em
torno de 2,5 mil escolas e mais de 2 milhões de alunos com a parceria estruturada do
Ministério da Educação. (UNIBANCO,2012)
Ricardo Henriques, nas suas colocações sobre os novos desafios do Instituto e
do Projeto Jovem de Futuro, diz que, em 2012, foi iniciada uma redefinição do modo de
atuar do IU, mudando estruturas internas, redesenhando atribuições e governanças e
criando condições operacionais de implantação. Assim, constituiu-se um escritório de
projetos, definindo procedimentos de acompanhamento, análise e avaliação que criaram
condições de funcionalidade, eficácia e eficiência para oferecer às redes de ensino uma
parceria profissional, qualificada e robusta. (UNIBANCO, 2012).
Sobre a relação do Instituto com o governo, destacamos entre outras formas a
atuação dos sujeitos que atuam no conselho de governança, que são ou foram cargos
estratégicos no atual governo, conforme já mencionamos. Para Henriques, a iniciativa
do ProEMI/JF se configura em um exemplo de que é possível instituir um arranjo
institucional virtuoso de cooperação entre o setor público-responsável pela política
educacional e o investimento social privado para a construção de um espaço público,
não estritamente governamental.

Trata-se de uma experiência concreta, que revela a possibilidade de geração


de bens públicos a partir de esforços de complementaridade referentes às
responsabilidades compartilhadas entre governos, sociedade civil e setor
privado. (UNIBANCO, 2012, p.7).

Ricardo Paes de Barros, membro do Conselho do IU e secretário de Ações


Estratégicas da SAE, diz que a parceria do IU com o MEC é de extrema importância
tanto do ponto de vista simbólico como prático. O Jovem de Futuro é uma tecnologia
social de interesse público desenvolvido pelo setor privado com vistas a aprimorar o
funcionamento de qualquer escola pública que contemple o Ensino Médio. Para ele, a
1216

“parceria com o MEC representa o reconhecimento federal da efetividade da estratégia


JFe, daí, vem a relevância do setor privado para a melhoria da qualidade da educação
pública no país.” (UNIBANCO, 2012, p.22). Ricardo Paes de Barros é também
responsável pela avaliação dos resultados obtidos pelo Projeto através da avaliação de
impacto nas escolas participantes.

O Projeto Jovem de Futuro


Atualmente, a principal tecnologia do Instituto Unibanco é o Jovem de Futuro.
Trata-se de um projeto de Gestão Escolar para Resultados que oferece às escolas
participantes apoio técnico e financeiro para, em um período de três anos (duração do
Ensino Médio), melhorar substancialmente seu desempenho. As escolas recebem
capacitação e assessoria técnica para planejar, executar, acompanhar e avaliar uma
proposta de melhoria de seus resultados e R$ 100/aluno/ano para financiar as ações
estratégicas previstas neste plano.
O Jovem de Futuro, conforme o Instituto Unibanco (2012), é uma proposta que
visa mobilizar alunos, professores e famílias em torno de metas pactuadas para um
mesmo objetivo: garantir que os jovens entrem, permaneçam, tenham um bom
desempenho e terminem o Ensino Médio. A fase piloto representou um período de
testagem da tecnologia social no modelo concebido pelo Instituto Unibanco, com apoios
técnico (supervisão direta) e financeiro (aporte de recursos) proporcionados pelo
Instituto, em ambiente real – escolas públicas, com baixos índices educacionais e alta
heterogeneidade. O Instituto Unibanco afirma que essa fase foi de extrema relevância,
pois foi a partir de suas experiências e do impacto positivo no aprendizado dos
estudantes que o projeto pôde ser disseminado em larga escala e receber os ajustes
necessários.
Participaram da fase piloto escolas de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande
do Sul e São Paulo (Grande São Paulo e Vale do Paraíba). O compromisso firmado
entre o Instituto Unibanco e as quatro Secretarias de Educação contemplou dois grupos
de escolas, sendo que, inicialmente, um recebeu o Projeto e o outro realizou avaliações
para comparar o desempenho dos alunos dos dois grupos. Finalizado o primeiro ciclo de
escolas, um novo grupo de instituições de ensino recebeu o projeto.
A parceria com o Ministério da Educação (MEC), gerando a integração do
Programa Ensino Médio Inovador (ProEMI) e do Jovem de Futuro, ocorreu após a fase
de avaliação do projeto piloto, criando o ProEMI/JF que possibilitou a expansão em
1217

larga escala com a adesão voluntária das Secretarias de Educação do Ceará, Goiás,
Mato Grosso do Sul, Pará e Piauí, integrando suas respectivas políticas públicas
educacionais. A parceria foi assinada pelo ministro Aloisio Mercadante em 14 de
fevereiro de 2012 através de um termo de cooperação técnica entre o MEC e o IU.
(UNIBANCO, 2012, p.21).
O Projeto Jovem de Futuro (ProEMI) incentiva o redesenho curricular das
escolas, com orientação da política educacional e aporte financeiro direcionados pelo
MEC, através do Guia de Tecnologias Educacionais (que habilita o PJF enquanto
tecnologia educacional na categoria gestão). O arcabouço legal da destinação dos
recursos ao PJF se encontra nos convênios firmados entre Secretarias Estaduais de
Educação e o MEC para implantação do Programa Ensino Médio Inovador e convênio
firmado entre Secretaria do Estado da Educação e o Instituto Unibanco para a
implantação do PJF. Ainda o convênio entre o Instituto Unibanco e o MEC garante
financiamento do ciclo do PJF que é de três anos5.
O Projeto busca fortalecer a gestão escolar, com foco na melhoria da aprendizagem
dos estudantes. Nesse contexto, o Instituto Unibanco oferece formação para gestores e
supervisores, apoio técnico, acompanhando e monitorando os resultados por meio de
instrumentos pedagógicos e gerenciais. Os Estados são os responsáveis por toda
implementação do ProEMI/JF em suas respectivas redes, com infraestrutura e equipe
necessárias, inclusive disponibilizando equipes de técnicos para a supervisão e o
monitoramento das escolas. A Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência (SAE)
realiza as avaliações de impacto do ProEMI/JF.
Atualmente, o Programa Ensino Médio Inovador/Jovem de Futuro (ProEMI/JF)
reflete uma parceria público privada entre o Ministério da Educação (MEC), cinco
Secretarias Estaduais de Educação e o Instituto Unibanco. O Instituto permitirá, até
2016, universalizar o programa nas escolas públicas de Ensino Médio do Ceará, Goiás,
Mato Grosso do Sul, Pará e Piauí, atendendo cerca de 2.500 unidades de ensino e mais
de dois milhões de alunos. (UNIBANCO, 2012, p. 21).
Destacamos que o ProEMI/JF se apresenta como política pública nacional que
propõe o redesenho curricular do Ensino Médio, focado em um currículo dinâmico,
flexível e compatível com as exigências da sociedade contemporânea. A ação

5
Informações retiradas do site www.dejau.com.br/admin/.../040420121PPT_vc_PROEMI_PJF.ppt que
traz informações sobre financiamento para execução do Projeto Jovem de Futuro. Acesso em: 4 de abril
de 2014.
1218

contemplará uma ampliação do tempo dos estudantes na escola e uma diversidade de


práticas pedagógicas que atendam às expectativas e às necessidades dos jovens.
Percebemos que, assim como os demais programas de larga escala, o Jovem de
Futuro, atua especialmente na gestão escolar das escolas públicas, considerada
ineficiente e ineficaz. Parte da idéia de que modificando a gestão da escola de ensino
médio, os problemas de evasão, reprovação, o chamado fracasso escolar, seja resolvido.
Para isso se utiliza de programas padronizados para os diferentes estados do país e um
forte controle e monitoramento dos resultados, como já vem sendo pesquisado em
outros programas, como o caso do Instituto Ayrton Senna6.

Conteúdo da Proposta - Pressupostos da gestão do Jovem de Futuro

Para o Jovem de Futuro, uma gestão eficiente, participativa e com foco nos
resultados positivos de aprendizagem pode influenciar de maneira decisiva a qualidade
da educação oferecida pela escola. O projeto Jovem de Futuro utiliza o conceito de
Gestão Escolar para Resultados (GEpR), e a ideia básica parte do pressuposto de que
não existe organização, sobretudo uma instituição, voltada para o interesse público, sem
uma qualificação técnica e social da gestão. Nesse sentido, busca apresentar para os
gestores escolares estratégias e instrumentos que tornam seu trabalho mais eficiente,
criativo e produtivo, sendo que seus princípios orientam para um trabalho com foco nos
resultados positivos de ensino e de aprendizagem.
Tal proposta sugere a integração de diferentes processos e ferramentas de gestão
escolar, bem como a mobilização de recursos humanos, a articulação de recursos
técnicos, materiais e financeiros, a divisão de responsabilidades, a adoção de sistemas
de informação voltados para o monitoramento, controle e avaliação e a utilização de
programas de comunicação para garantir ampla adesão da comunidade às ações da
escola, sempre tendo em vista a conquista de melhores resultados na aprendizagem dos
alunos(http://www.portalinstitutounibanco.org.br/index.php?option=com_content&view
=article&id=10&Itemid=8.Acesso em 21 de maio de 2014.). Esse processo inicia-se na
Formação em Gestão Escolar para Resultados. É nesse momento que os profissionais
que integram o projeto têm o primeiro contato com o conceito, com os objetivos do
projeto e com os instrumentos que orientam as ações do Jovem de Futuro.

6
Ver relatório da pesquisa nacional. Peroni e Adrião(2012).
1219

O curso de formação tem aproximadamente 120 horas e é oferecido durante os


três anos do projeto. É importante destacar que o curso pretende atingir os profissionais
da escola e secretaria de educação que são o centro das decisões na definição e na
elaboração das políticas. Na escola, participam o diretor, o coordenador pedagógico e
um professor, e na secretaria de educação participam supervisores e técnicos
responsáveis por acompanhar as escolas.
A principal maneira que o Jovem de Futuro propõe para efetivar a gestão focada
em resultados na escola é a construção de um Plano de Ação. É por meio dele que a
comunidade escolar deve fazer o diagnóstico, para alcançar os resultados esperados. Na
figura a seguir, apresentamos o ciclo de gestão do Projeto.

Fonte:Formação de gestores, Ceará 2013.


Para desenvolver o conceito de Gestão Escolar por Resultado (GEpR) nos
módulos Planejamento e Execução, o gestor escolar faz o curso de formação. O
conceito, segundo informações do IU, se concretiza no desenvolvimento do Plano de
Ação por escola que é validado e acompanhado pela equipe de supervisores. O próprio
Projeto oferece apoio técnico para que as escolas públicas desenvolvam Planos de
Ações eficientes no uso dos recursos recebidos e impactem na qualidade do ensino e na
aprendizagem dos alunos (Fonte: Relatório Anual 2012. Instituto Unibanco).
Se pensarmos no “pressuposto da neutralidade científica e inspirada nos princípios
da racionalidade, eficiência e produtividade” (SAVIANI, 2010, p.381), a aproximação
do planejamento do Projeto JF tem como proposta torná-lo objetivo e operacional. A
1220

operacionalização dos objetivos e a mecanização do processo de planejamento estão


contempladas na proposta através da padronização de esquemas de planejamento
previamente formulados aos quais se devem ajustar as disciplinas e as práticas
pedagógicas do Ensino Médio.
Para suportar as ações do projeto Jovem de Futuro, o Instituto Unibanco
desenvolveu uma Plataforma online de gestão de projetos das escolas e formação a
distância. Atualmente, é composta pelo Sistema de Gestão de Projetos (SGP) e pelo
Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) que, conforme o Instituto Unibanco (2012),
serão em breve integrados. A plataforma permite às escolas construir os seus Planos de
Ação, de forma alinhada às diretrizes do MEC (PDE Interativo, outros programas do
ministério ou mesmo outras fontes de financiamento). Após a aprovação do plano,
elaborado de acordo com as necessidades identificadas pelo diagnóstico da escola, é
possível realizar o acompanhamento da execução das ações e identificar desvios em
relação ao que foi planejado, seja em relação ao tempo ou ao orçamento. Para colaborar
com o alcance dos resultados propostos no Plano de Ação pelas escolas participantes do
projeto, o Jovem de Futuro disponibiliza Metodologias, que são estratégias educacionais
elaboradas a partir de necessidades detectadas no cotidiano escolar. Elas buscam
fomentar ações, projetos e trabalhos de forma interdisciplinar; corrigir dificuldades e
fragilidades específicas encontradas nas escolas; articular a comunidade escolar,
visando à sustentabilidade e à obtenção de resultados; e potencializar ações já existentes
na escola. Nesse caso, o elemento principal passa a ser a organização racional dos
meios, apresentando o professor e o aluno posição secundária, relegados à condição de
meros executores do processo de planejamento.

Considerações Finais
Em nossas pesquisas, analisamos as várias formas de relação entre o público e o
privado na educação básica. Neste artigo, buscamos analisar mais especificamente como
o privado interfere no público através de uma parceria, em que a propriedade permanece
pública, mas a instituição privada interfere no conteúdo da educação, através da gestão
por resultados, trazendo uma lógica individualista e competitiva empresarial, com foco
nos resultados em detrimento da construção de uma proposta garantida como princípio
constitucional de gestão democrática que tem princípios coletivistas e focados no
processo de construção de valores democráticos. Para que a proposta se efetive, a
1221

parceria prevê a formação de gestores da escola e secretaria e professores dentro dos


princípios da gestão para resultados.
Outra questão importante é que o conselho escolar, um dos importantes pilares
da gestão democrática, fica subsumido, já que é formado outro conselho na escola
vinculado ao projeto. Questionamos, dessa forma, os princípios constitucionais de
gestão democrática e de liberdade de ensino dentro dessa proposta de parceria,
principalmente em um país que não tem um histórico de cultura democrática e deu
passos importantes no período recente pós-ditadura. Ao dar os primeiros passos nesse
sentido, os sujeitos, individuais e coletivos, vinculados ao mercado, se articularam para
uma grande ofensiva para barrar este projeto e imprimir novamente a lógica de mercado
na educação, como historicamente ocorreu neste país.
Assim, outra questão importante são os sujeitos que participam do Instituto e de
onde falam para propor as mudanças na educação. Verificamos que a maioria dos
membros está vinculada à Instituição Financeira Itaú/Unibanco e não tem nenhum
vínculo com a educação. Já aqueles que têm, pertencem a Instituições privadas com fins
lucrativos e uma lógica de mercado bem definida. Observamos também uma relação
muito estreita entre governo e Instituto, com membros do governo participando do
Instituto. E, através destes sujeitos, o Instituto passa a influenciar na política de Ensino
Médio nacionalmente e não apenas nas parcerias pontuais.

Referências
HARVEY, David. O neoliberalismo história e implicações. São Paulo: Loyola, 2005.

MONTEIRO, Marcelisa. Relação Público-privada na educação básica no Brasil:


uma análise da proposta do Instituto Unibanco para o Ensino Médio público. In:
PERONI, Vera Maria Vidal (org) Redefinições das fronteiras entre o público e o
privado: implicações para a democratização da educação. Brasília, Liber Livro, 2013.

THOMPSON, Edward Palmer. A miséria da teoria ou um planetário de erros: uma


crítica ao pensamento de Althusser. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.

TODOS PELA EDUCAÇÃO. Quem está conosco. Disponível em:


<http://www.todospelaeducacao.org.br/institucional/quem-esta-conosco/>. Acesso em:
21 mar. 2014.

INSTITUTO UNIBANCO. Relatório de Atividades, 2012. Disponível em


http://www.institutounibanco.org.br/relatorio. Acesso em 3.4.2014.

SAVIANI, D. História das idéias pedagógicas no Brasil. Campinas: Autores


Associados, 2010.
1222

Comunicação

Aprendizagem de habilidades gráficas em crianças da educação infantil: as


possíveis influências do mobiliário escolar

Victor Vedovelli Ojeda 1


Rafael do Nascimento Soares 2
Evandro Felício de Carvalho 3
Roberto Gimenez 4

Resumo: O presente estudo teve por objetivo investigar as influências do mobiliário


escolar no processo de aquisição de habilidades motoras gráficas de crianças do Ensino
Fundamental. Para tanto, 30 crianças da primeira série, divididas em dois grupos (G1 =
Mobiliário Escolar fixo; G2 = Mobiliário Escolar regulável), foram comparadas durante
o processo de aprendizagem de um padrão gráfico que correspondeu a uma figura
similar a uma “Coroa de Rei”. As variáveis analisadas corresponderam a: Legibilidade
do padrão gráfico, erro espacial linear e a velocidade de execução. Não foram
encontradas diferenças entre os grupos em relação ao tipo de mobiliário no que diz
respeito à legibilidade e velocidade de execução, mas foram identificadas diferenças em
relação às dimensões espaciais da tarefa motora. Os resultados encontrados possibilitam
inferências acerca do papel do espaço físico na aprendizagem na educação infantil.
Palavras-chave: escrita, aprendizagem motora, criança.

Introdução
Entende-se que o conhecimento da escrita compreende desde a habilidade de
simplesmente transcrever sons até a capacidade de comunicar-se adequadamente com
um leitor potencial. Desse modo, a capacidade para comunicar-se por meio de um
desenho pode ser entendida como a capacidade para escrever (MARR, WINDSOR &
CERMAK, 2001).
1
UNICID/Bolsistas PIBIC CNPq /Grupo de Estudos sobre o Comportamento Motor e Intervenção
Motora (GECOM)
2
Bacharel em Educação Física/Grupo de Estudos sobre o Comportamento Motor e Intervenção Motora
(GECOM)
3
UNICID/Bolsistas PIBIC CNPq /Grupo de Estudos sobre o Comportamento Motor e Intervenção
Motora (GECOM
4
Docente do Programa de Mestrado em Educação/Coordenador do Curso de Educação Física da UNICID
e líder do Grupo de Estudos sobre o Comportamento Motor e Intervenção Motora (UNICID)
1223

Para GNERRE (1985) a compreensão da escrita acontece por meio da interação


das principais áreas de categorização das atividades intelectuais tradicionais no
pensamento ocidental, tais como a história, a linguística, a sociologia, a educação, a
antropologia e a psicologia. Indiscutivelmente, os registros de padrões gráficos
historicamente contribuíram para a transmissão de valores culturais entre povos, e, por
este motivo, indivíduos que não são capazes de apresentar o padrão de excelência
estabelecido numa condição de grupo no que tange à aquisição e o desempenho em
habilidades gráficas, podem ser considerados socialmente excluídos.
Reconhecidamente, habilidades motoras gráficas representam um grande
impacto social para as crianças com problemas de coordenação. De acordo com a
literatura, a competência para escrever é fundamental durante o período escolar e está
associada a uma série de aquisições por parte da criança, tais como, o registro de
informações durante uma situação de aula e, até mesmo, a construção de textos
criativos. CHRISTENSEN (2004), por exemplo, aponta a existência de uma correlação
entre a capacidade de construir padrões gráficos e a produção de textos de qualidade
criativa. Isto aconteceria, uma vez que a sobrecarga para o processamento de
informação associada às dificuldades para a produção de habilidades gráficas
minimizaria as condições de imaginar, projetar e construir mapas conceituais. Além
disso, as dificuldades para a construção de padrões gráficos também estariam associadas
a problemas de aprendizagem em geral, pois a apreensão de informações concorreria
com a demanda informacional envolvida no desempenho das habilidades gráficas. Esses
achados também são encontrados em outros trabalhos (p.e. BERNINGER,
VAUGCHAN, ABBOTT, ABBOTT, BROOKS, ROGAN, 1997; JONES,
CRISTENSEN, 1999).
Assim, a compreensão do processo de aquisição de habilidades motoras gráficas
pode contribuir significativamente para a atuação dos profissionais da educação em
geral.
Além disso, o estudo sobre habilidades motoras gráficas representa um meio
importante para a investigação dos processos de formação de representações na
memória. Em especial, esse tipo de tarefa motora tem sido utilizado em diferentes
estudos sobre o comportamento motor (p.e.TANI, 1998; MANOEL, 1998; GIMENEZ,
MANOEL e BASSO, 2006), pois, em geral, as tarefas utilizadas possibilitam a
identificação clara dos componentes do programa de ação, sua ordem, bem como, em
muitos casos, registros de pressão e picos de velocidade (MANOEL, 1998).
1224

Uma das dúvidas consiste em identificar quais são as possíveis influências do


contexto e da tarefa na aquisição dessas habilidades. É vasta a literatura que tem
discutido o papel da ergonomia no controle postural e no desempenho motor na escrita
(p.e. BRACCIALLI, OLIVEIRA, BRACCIALLI & SANKAKO, 2008; BRACCIALLI
& VILLARTA, 2000).
Em linhas gerais, defende-se que o mecanismo de controle motor é
suficientemente dinâmico e é resultado de uma interação dinâmica que se estabelece
entre o indivíduo, o ambiente e a tarefa (p.e. NEWELL, 1986). Assim, diante de
alterações na configuração de aspectos do ambiente ou da tarefa o controle motor dos
indivíduos sofreria adaptações tendo em vista assegurar o sucesso, a segurança a
economia de energia (GIMENEZ & MANOEL, 2005). As constatações das influências
das condições ambientais e da tarefa no controle motor incitam dúvidas acerca das
possíveis interferências dessas variáveis na aquisição de habilidades motoras gráficas
por parte de crianças. Um dos pressupostos é o de que a configuração e o layout dos
espaços educativos possam influenciar consideravelmente a aquisição dessas
habilidades.
A organização e estrutura do mobiliário escolar deveriam receber mais atenção
por parte de professores e dirigentes de escola (BRACCIALLI, OLIVEIRA,
BRACCIALLI & SANKAKO, 2008; BRACCIALLI & VILLARTA, 2000). Embora se
assuma que os processos de controle motor sofram influências de restrições ambientais,
da tarefa e do próprio indivíduo, em se tratando do processo de aquisição de habilidades
motoras gráficas em crianças, essas variáveis são relativamente pouco consideradas e
investigadas.
Vale ressaltar que num levantamento realizado pelo Grupo de Estudos sobre o
Comportamento Motor e Intervenção Motora (GECOM) junto a quinze
estabelecimentos de ensino da rede pública localizados na Zona Leste de São Paulo,
identificou-se que o mobiliário escolar utilizado nas primeiras séries do Ensino
Fundamental não leva em consideração as dimensões antropométricas das crianças, uma
vez que não se tratam de carteiras escolares reguláveis. Este mesmo grupo verificou que
este percentual é menor em escolas da rede privada, em apenas 20%. Esta constatação
aponta para uma relativa negligencia por parte do poder público em relação aos espaços
e equipamentos destinados à prática pedagógica.
Em especial, um período que requer uma discussão mais aprofundada refere-se
justamente ao da Educação Infantil, momento caracterizado pela aquisição da escrita.
1225

Neste ciclo da escolarização a criança se familiariza com o processo de formação de


padrões gráficos cursivos. Este processo acontece em diferentes tipos de mobiliário e
não são suficientemente claras as efetivas influências destes mobiliários no processo de
aquisição de habilidades motoras gráficas. Assim, o objetivo desta pesquisa foi
investigar as possíveis influências das condições ambientais (mobiliário escolar) no
processo de aquisição de habilidades gráficas de crianças da educação infantil. O
presente estudo teve ainda por objetivo identificar se existiriam diferenças durante o
processo de aquisição em aspectos espaciais e temporais dos padrões gráficos.

Material e Método
Tomaram parte do estudo dois grupos de crianças: GC1 – Grupo de crianças
com mobiliário escolar fixo; GC2 – Grupo de crianças com mobiliário escolar
regulável. Ambos os grupos apresentavam média de idade de 6 anos e desvio padrão de
0.7 anos. A escolha pela faixa etária se deve ao fato de representar o período de
aquisição da escrita na escola. No GC2 o mobiliário escolar foi adaptado às dimensões
corporais das crianças, conforme as recomendações para o processo de execução de
padrões gráficos previstos em SHIMELL, CANDLER & NEVILLE-SMITH (2009).
Essas adaptações levam em consideração o apoio dos pés, costas e cotovelo.
Os parâmetros utilizados para a categorização do mobiliário escolar foram
definidos com base nos protocolos utilizados por CASSAROTO (1993) e confrontados
com o mobiliário mais prevalente em Colégios da Rede Pública e Privada, conforme
consulta dos pesquisadores.
As crianças reproduziram um desenho de uma coroa (Figura 1) por vinte e cinco
tentativas, utilizando-se de uma caneta sem fio sensitiva a pressão. Esta figura foi
definida a partir de um estudo piloto desenvolvido pelo grupo e teve como base a
escolha de um padrão gráfico com registros identificáveis e com significado para a
criança em situação de aprendizagem. Ela foi apresentada aos sujeitos por meio de uma
folha de papel com dimensões de 10 cm X 10 cm.
Durante as orientações, ao apresentar a figura às crianças, o experimentador
indagava se ela já conhecia a mesma, e o que ela lembrava. Noventa por cento das
crianças participantes afirmavam se tratar de uma coroa. Em seguida, o experimentador
contava às crianças que o rei havia perdido a coroa e que havia a necessidade de fazer
outras para ele. Segundo o experimentador, os desenhos das coroas deveriam ser feitos
1226

sobre a mesa. Após esta fase de contato inicial, as crianças tinham a oportunidade de
deslocar a caneta sensitiva sobre a mesa digitalizadora como forma de ambientação.
As orientações proporcionadas às crianças participantes foram: “Faça nesta mesa
um desenho o mais parecido possível com esta coroa”. Antes da execução da tarefa, o
experimentador alertava à criança para o fato de que a figura apresentava três pontas e
base arredondada e fechada. Nesta ocasião, o experimentador também chamava a
atenção para a possibilidade da criança observar o seu registro gráfico na tela do
computador.
Todas as crianças executaram a tarefa com a mão de preferência após a
aplicação do inventário de Edimburgo para a dominância lateral e dispuseram de
feedback visual online somente durante as tentativas.
A reprodução do padrão gráfico foi realizada sobre uma mesa digitalizadora,
marca Aiptec 8000 U. Os dados coletados foram armazenados na memória de um
notebook marca HP modelo Pavilion e receberam tratamento por meio do programa
MovAlyzer versão 6.1. Esse programa foi desenvolvido pelo Grupo Neuroscript e já foi
utilizado em trabalhos, em várias partes do mundo, para análise de registros gráficos.
As variáveis analisadas no estudo foram: Legibilidade do padrão gráfico; tempo
de execução e erro espacial linear.
O presente estudo leva em consideração que uma das características principais
da escrita habilidosa é a legibilidade e que uma figura só pode ser considerada legível a
partir da possibilidade de identificação de todos os componentes da ação. Assim, no
caso da figura da coroa, elegeu-se que esses componentes seriam (as três pontas e a base
arredondada e fechada). Desse modo, o padrão gráfico registrado foi avaliado por dois
avaliadores que, tomando como base a figura critério (coroa), apontado se em cada
tentativa executada foi, ou não, apresentado o padrão proposto. O reconhecimento de
cada componente isoladamente e a forma pela qual esses componentes se ordenam é
que assegura o reconhecimento da escrita. Nesse sentido, é possível considerar que a
escrita é legível quando ela permite esse reconhecimento (MARR, WINDSOR &
CERMAK, 2001). Para minimizar o grau de subjetividade dos avaliadores foi
calculado um índice de concordância inter-avaliadores proposto por THOMAS,
NELSON & SILVERMAN (2011) para o qual foi encontrado um valor de 0.77.
1227

Figura 1 – Padrão gráfico a ser reproduzido pelos sujeitos participantes


Assim, a medida indicadora da legibilidade correspondeu ao número de
execuções apresentadas pelo indivíduo nas quais o registro gráfico foi considerado
legível por apresentar as três pontas da “coroa”, bem como, a base arredondada e
fechada.
A medida indicadora da velocidade de execução correspondeu à média do
tempo para a realização do padrão gráfico por parte do aprendiz. Por outro lado, a
medida do erro espacial linear correspondeu à diferença espacial (cm) da figura
apresentada pelo executante e o padrão apresentado a ele como referência por parte do
experimentador.
As vinte e cinco tentativas foram agrupadas de blocos de cinco. Para a
identificação de possíveis diferenças entre os grupos e blocos foi aplicada uma ANOVA
Two Way conforme pacote estatístico SPSS versão 13. O teste de Post-hoc de Tukey foi
aplicado para a localização das diferenças. Para assegurar a confiabilidade dos
resultados adotou-se como referência um intervalo de confiança com o valor de
p<0,005.

Resultados e Discussão
A análise dos dados da legibilidade não identificou diferenças estatisticamente
significativas entre os grupos em relação ao tipo de mobiliário. Também não foram
identificadas diferenças intra-grupo ao longo dos blocos de tentativas, ou seja, os grupos
não demonstraram apresentar desempenho melhor com a prática na legibilidade.
Conforme pode ser percebido por meio da análise da Figura 2, o número de
acertos foi consideravelmente baixo ao longo de todos os blocos de tentativas. Esse
comportamento foi identificado de forma similar nos dois grupos avaliados. É possível
inferir que se o número de tentativas fosse maior, ambos os grupos poderiam apresentar
1228

melhora mais significativa na legibilidade, pois o grau de dificuldade da tarefa, aliado à


quantidade de prática teriam contribuído para um efeito piso para ambos os grupos.

FIGURA 2 – Média do Número de Acertos de Legibilidade por blocos de


tentativa

3,5

2,5
Média (acertos)

2 Gc 1
1,5 Gc 2

0,5

0
1 2 3 4 5
Blocos

Além disso, uma quantidade de prática maior talvez pudesse contribuir para a
identificação de diferenças entre os grupos em decorrência do mobiliário escolar. Esta
constatação corrobora os resultados de estudos desenvolvidos por
HAMMERSCHMIDT, & SUDSAWAD (2004) que sugerem a necessidade de grande
quantidade de prática associada a padrões gráficos para crianças em fase inicial de
aprendizagem da escrita.
Convém destacar que é possível que a ausência de feedback visual após cada
tentativa tenha contribuído para aumentar o tempo para a estabilização do padrão
gráfico, uma vez que a informação visual corresponde a uma variável notadamente
importante durante a fase inicial de aprendizagem de padrões gráficos (VAN GALEN,
SMYTH, MUELENBROEK, HYLKEMA, 1989; VAN GALEN; MUELENBROEK,
1990).
Também não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre
os grupos em relação ao tipo de mobiliário no que diz respeito à velocidade de execução
como mostra a Figura 3.
1229

FIGURA 3– Média do Tempo Total de Execução

8
7
6
5
Média (s)

Gc 1
4
Gc 2
3
2
1
0
1 2 3 4 5
Blocos

Além disso, também não foram encontradas diferenças intra-grupo ao longo dos
blocos de tentativas. De forma similar, ao que aconteceu com a variável legibilidade, é
possível que o período de prática não tenha sido suficiente para a identificação de
diferenças entre os grupos. Vale ressaltar que o ganho de velocidade de execução
dependeria fundamentalmente da estabilidade do padrão gráfico (CLOUGH, 1999;
GRAHAM, STRUCK, SANTORO, BERNINGER, 2006).
Finalmente, foram identificadas diferenças na variável erro espacial linear em
todos os blocos de tentativas [Anova 2, 27) = 8.74, p=0,001]. Essas diferenças não
aconteceram intra-grupo ao longo dos blocos de tentativas.

12,0

10,0

8,0
Erro (cm)

Gc 1
6,0
Gc 2
4,0

2,0

0,0
1 2 3 4 5
Blocos

FIGURA 4 – Média do Erro Espacial Linear (p<0,001) N=27 r=8,744


1230

Esta constatação chama a atenção para dois aspectos do estudo. Em primeiro


lugar para a premissa de controle motor e aprendizagem motora que aponta para uma
dissociação entre aspectos espaciais e temporais das tarefas motoras no programa motor
(REQUIN, 1992). Tal fato possibilita inferir a necessidade de se estudar de forma mais
aprofundada os processos de formação de programas de ação em habilidades gráficas,
como, por exemplo, os desenvolvidos em outros trabalhos (MANOEL 1998;
GIMENEZ, MANOEL e BASSO; 2006; MANOEL, DANTAS, GIMENEZ &
OLIVEIRA, 2011).
A supremacia exercida pelo grupo com cadeiras reguláveis nos aspectos
espaciais da tarefa motora também reforça o pressuposto da existência de uma
predominância de aspectos espaciais sobre os temporais no início da execução
(GRAHAM, STRUCK, SANTORO e BERNINGER, 2006). Em outras palavras, os
indivíduos tenderiam a priorizar aspectos associados à precisão e acurácia em
detrimento de realizar em menor tempo.
Outro aspecto crucial corresponde aos efetivos impactos exercidos pelo
mobiliário no desempenho de aspectos espaciais do padrão gráfico. Este tipo de
influência já havia sido destacado em estudos anteriores (GRAHAM, BERNINGER,
ABBOTT, ABBOTT & WHITAKER, 1997).
Esses achados nos remetem a uma discussão acerca do papel exercido pelo
mobiliário escolar no processo de aprendizagem das crianças. Tomando como base a
tríade de controle motor proposta por NEWELL (1986), variáveis do indivíduo como as
dimensões antropométricas, suas capacidades motoras e físicas; da tarefa,
principalmente associadas às instruções e feedback por parte do professor e do
ambiente, como o tipo de mobiliário, caneta e papel exerceriam influência neste
processo de aquisição. Vale ressaltar ainda que, essas variáveis não poderiam ser
estudadas de forma isolada, mas em interação, tendo em vista que, diante de restrições
ambientais e da tarefa motora os indivíduos buscam estratégias alternativas de controle
e aprendizagem motora.
Considerando que os estabelecimentos têm por premissa maximizar as
possibilidades de aprendizagem de seus alunos, as variáveis físicas como o layout e a
estrutura dos equipamentos não podem ser negligenciadas por docentes e gestores de
escolas das redes públicas e privadas de ensino.
1231

Conclusão
Os dados encontrados no presente estudo permitem inferências quanto à
interação que se estabelece entre o indivíduo, a tarefa e o ambiente durante o processo
de aquisição de um padrão gráfico, configurando um sistema de ação para a realização
de tarefas motoras.
O mobiliário não impactou de forma estatisticamente significativa na
legibilidade do padrão gráfico, bem como, também não impactou de forma
estatisticamente significativa em parâmetros temporais da execução do padrão gráfico.
O mobiliário influenciou de forma estatisticamente significativa nos parâmetros
espaciais do padrão gráfico.
Futuros estudos devem investigar o problema a partir da testagem da
estabilidade do padrão adquirido, caracterizar parâmetros qualitativos da execução, bem
como, controlar parâmetros do sujeito e da tarefa.
Os estabelecimentos escolares devem atentar de forma mais rigorosa para os
mobiliários e layouts dos espaços, uma vez que eles podem minimizar ou maximizar o
processo de aprendizagem dos alunos. Além disso, políticas públicas associadas aos
projetos pedagógicos das escolas devem levar em consideração também as variáveis
físicas que compõem os estabelecimentos escolares.

Referências
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1234

Comunicação

Educação Financeira: visão de alunos do Ensino Técnico sobre a sociedade


consumo.

Wagner Pagliato1

Resumo: Esta pesquisa tem como objetivo investigar qual a visão de alunos de Ensino
Técnico sobre a gestão de finanças na sociedade de consumo. Para desenvolvimento da
pesquisa será adotada abordagem quanti-qualitativa e como procedimento de coleta de
dados será adotada análise documental completada por questionário proposto aos alunos
de uma escola técnica pertencente à rede publica estadual paulista. Espera-se com a
pesquisa encontrar elementos que permitam analisar de que forma os alunos vêem no
cenário contemporâneo, os valores sociais baseados no consumo de bens e produtos.
Palavras chave: Educação, finanças pessoais, consumo, consumismo

JUSTIFICATIVA
A escola é um local privilegiado para se descobrir, conhecer, criticar e
transformar a sociedade de consumo.
Assim, a educação do consumidor se baseia na relação entre consumo e
qualidade de vida, entendendo-se esta última como o desenvolvimento pleno, criativo,
solidário e livre do ser humano. O presente estudo pretende investigar como os alunos
de uma escola de ensino médio percebem a relação entre consumo e realização pessoal.
De acordo com SILVA (2004), no Brasil as pessoas não foram educadas para
administrar suas finanças , dessa forma, a maior parte da população gasta aleatoriamente
sem refletir sobre seu contexto financeiro e os impactos futuros.
A pesquisa surge da necessidade de se compreender a importância da administração das
finanças pessoais, assim como os valores que embasam o comportamento do
consumidor e de sua realização pessoal. Desta forma pretende-se estimular práticas
educativas que motivem o foco na racionalidade do uso do dinheiro.
Desta forma, trata-se de um tema que tem relevância social, tendo em vista que
a população brasileira, em sua grande maioria, conforme relata MACEDO JR. (2007),

1
Aluno do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São Paulo
1235

têm dificuldades para administrar suas dívidas, dificuldades para adquirir bens e
despreparo para enfrentar momentos de desemprego.
A abundância dos bens de consumo, continuamente produzidos pelo sistema
industrial, é considerada, frequentemente, um símbolo do sucesso pessoal nas
sociedades capitalistas modernas, levando muitas pessoas a se endividarem para
adquirirem coisas das quais não precisam. No entanto, esse tipo de comportamento,
passou a ser objeto de críticas que consideram o consumismo um dos principais
problemas das sociedades industriais modernas.
Os bens, em todas as culturas, funcionam como manifestação concreta dos
valores e da posição social de seus usuários. Na atividade de consumo se desenvolvem
as identidades sociais e sentimos que pertencemos a um grupo e que fazemos parte de
redes sociais. O consumo envolve também coesão social, produção e reprodução de
valores. Desta forma, não é uma atividade neutra, individual e despolitizada.
Ao contrário, trata-se de uma atividade que envolve a tomada de decisões
políticas e morais praticamente todos os dias. Quando consumimos, de certa forma
manifestamos a forma como vemos o mundo. Há, portanto, uma conexão entre valores
éticos, escolhas políticas, visões sobre a natureza e comportamentos relacionados às
atividades de consumo.
Com a expansão da sociedade de consumo no Brasil, amplamente influenciada
pelo estilo de vida norte-americano, o consumo se transformou em uma compulsão e
um vício, estimulados pelas forças do mercado, da moda e da propaganda. Conforme o
Manual de Educação para o Consumo Sustentável “A sociedade de consumo produz
carências e desejos (materiais e simbólicos) incessantemente”. Os indivíduos passam a
ser reconhecidos, avaliados e julgados por aquilo que consomem aquilo que vestem ou
calçam, pelo carro e pelo telefone celular que exibem em público.
O próprio indivíduo passa a se auto avaliar pelo que tem e pelo que consome.
Assim é muito difícil estabelecer o limite entre consumo e consumismo, pois a
definição de necessidades básicas e supérfluas está intimamente ligada às características
culturais da sociedade e do grupo a que pertencemos. O que é básico para uns, pode ser
supérfluo para outros e vice-versa.
Para entender o comportamento do consumidor é preciso compreender alguns
conceitos básicos sobre o consumo. Limeira (2008) define o conceito de necessidade,
como um estado de carência, privação ou sensação de falta de algo essencial para a
pessoa. As necessidades são de dois tipos: inata ou adquiridas. Para esse autor as
1236

necessidades inatas são entendidas como aquelas ligadas à vida humana, como as
necessidades fisiológicas e de sobrevivência, e as necessidades adquiridas são aquelas
originadas pelo contexto cultural e convívio social.
Ainda segundo Limeira (2008; p.5) existem outras maneiras de classificar as
necessidades: “biogênicas [decorrentes de fatores fisiológicos], psicogênicas [de origem
psicológica, como poder, status, reconhecimento, auto realização] e hedônicas
[necessidade de prazer, emoção e fantasia]”.
O autor conclui que o consumo é definido como ato ou efeito de consumir, ou
seja, o comportamento de escolha compra uso e descarte de produtos e serviços para a
satisfação de necessidades e desejos humanos.
Campbel (2001) aponta que o nascimento do consumismo começou desde o
século XVIII, pois podia-se identificar a produção e o consumo de produtos que
poderiam ser considerados supérfluos. O autor afirma, que a ética romântica e a
sensibilidade auxiliavam os gastos, fazendo o capitalismo girar e funcionar,
proporcionando a dinâmica necessária ao consumismo moderno. Esse homem sensível e
romântico tinha como característica a busca pelo prazer e a felicidade na aquisição de
bens.

A felicidade e a qualidade de vida têm sido cada vez mais associadas e reduzidas
às conquistas materiais. Isto acaba levando a um ciclo vicioso, em que o indivíduo
trabalha para manter e ostentar um nível de consumo, reduzindo o tempo dedicado ao
lazer e a outras atividades e relações sociais.
Até mesmo o tempo livre e a felicidade se tornam mercadorias que alimentam
este ciclo. Vale refletir sobre as palavras de Bauman (2002. P183):
As necessidades individuais de autonomia pessoal, auto definição, vida
autêntica ou perfeição pessoal são todas traduzidas na necessidade de possuir
e consumir bens oferecidos no mercado. Essa tradução, no entanto, faz parte
da aparência de valor de uso de tais bens, e não do próprio valor de uso;
como tal, é intrinsecamente inadequada e em última análise conduz à
autoderrota, levando ao alívio momentâneo dos desejos e à frustração
duradoura das necessidades… O abismo entre as necessidades humanas e os
desejos individuais é produzido pela dominação do mercado, o abismo é, ao
mesmo tempo, uma condição de sua reprodução. O mercado se nutre da
infelicidade que gera – os medos, ansiedades e sofrimentos da inadequação
pessoal que induz liberam o comportamento consumidor indispensável à sua
continuidade.

Em suas atividades de consumo, os indivíduos acabam agindo centrados em si


mesmos, sem se preocupar com as consequências de suas escolhas. O cidadão é
1237

reduzido ao papel de consumidor, sendo cobrado por uma espécie de “obrigação moral e
cívica de consumir”.
As nossas identidades se definem também pelo consumo. Poderíamos vincular o
exercício da cidadania e a participação política às atividades de consumo, já que é
nestas atividades que sentimos que pertencemos e fazemos parte de redes sociais.
O consumo é o lugar onde desigualdade entre as classes, originados pela falta de
equidade na estrutura produtiva, ganham continuidade, através da distribuição injusta da
produção social, cultural e econômica e apropriação dos bens. Assim, consumir é
participar de um cenário de disputas pelo que a sociedade produz e pelos modos de usá-
lo. Sob certas condições, a busca pela possibilidade de consumir pode se tornar motivo
de conflitos que se traduzem em situação de violência, assumindo um caráter político.
A maneira como vemos as relações de consumo presentes em nosso cotidiano
determinam e refletem em grande parte os nossos valores, as nossas preocupações com
a sociedade em que vivemos e com o meio ambiente, embora nem sempre nos
apercebamos disso.
O desenvolvimento do mercado de consumo, a necessidade crescente de ampliar
as ofertas de produtos e serviços, alimentando assim o sistema, levou o mercado a
organizar seu funcionamento com base na oferta constante e crescente de novas
necessidades, interferindo direta ou indiretamente nos hábitos e nas decisões do
consumidor e criando, assim, novos valores e necessidades através de campanhas
publicitárias entre outros.
O consumidor, inconscientemente, passou a definir seus valores e necessidades
pelo que lhe é "oferecido", e não pelas suas reais aspirações e necessidades. Isso se dá
não só em termos de produtos, mas também como referência de modo de vida, de
sucesso, de felicidade, de qualidade de vida.
A educação para o consumo se propõe a trabalhar com estes elementos. O seu objetivo é
capacitar os alunos/consumidores para que saibam discernir, escolher com fundamento
e propriedade os bens e serviços que vão utilizar e que tenham consciência de seus
direitos e responsabilidades.
Neste contexto parece importante investigar como os alunos do ensino técnico
percebem a relação entre consumo e valores sociais.
1238

PROBLEMA DE PESQUISA

Compreender visão de alunos da Etec de Vila Formosa (em diversos cursos


técnicos), sobre os valores sociais que sustentam a sociedade de consumo e de que
forma conseguem administrar suas finanças pessoais.

OBJETIVOS GERAIS

- Identificar o grau de conhecimento e familiaridade dos alunos sobre finanças


pessoais, economia e consumismo;

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

- Pontuar os fatos históricos marcantes envolvendo o valor e a origem do


dinheiro e das trocas monetárias;
- Identificar os elementos básicos das finanças, como por exemplo: juros,
inflação e previdência;

METODOLOGIA
Para desenvolvimento da pesquisa será adotada abordagem quanti-qualitativa e
como procedimento de coleta de dados será adotada análise documental completada por
questionário proposto aos alunos de uma escola técnica pertencente à rede publica
estadual paulista. Serão propostos questionários aos alunos matriculados nos diferentes
cursos e realização de entrevistas semiestruturadas com alunos selecionados entre os
que responderem o questionário. Será proposto o mesmo questionário para todos os
alunos, mas para a análise dos dados serão agrupados por curso. Com isso, pretende-se
verificar a influencia da formação na visão dos alunos sobre a relação ente consumo e
realização pessoal. O critério de inclusão dos alunos na pesquisa é estar matriculado na
escola pesquisada e manifestar concordância em participar mediante assinatura do
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. No caso dos alunos menores, a sua
inclusão na pesquisa se dará mediante anuência dos responsáveis manifesta pela
assinatura do mesmo documento.
O questionário será aplicada da seguinte forma: Curso Técnico em Contabilidade - 3
turmas com 40 alunos, a 5 alunos de cada turma, total 15, curso Técnico Comunicação
1239

Visual - 2 turmas com 40 alunos a 5 alunos de cada turma, em total 10, ao curso
Integrado - 3 turmas com 40 alunos a 5 alunos de cada turma, em total 15. Desta forma,
aplicaremos o questionário a um total de 40 alunos dos diversos cursos.
A entrevista semiestruturada será aplicada a 10% dos alunos que responderam ao
questionário e aceitarem participar. Caso a quantidade de alunos que manifestarem
interesse optando pelo sim, ultrapasse os 10%, utilizaremos como critério sorteio dos
nomes incluindo somente os que aceitaram participar da mesma.

REFERÊNCIAS
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BAUDRILLARD, Jean. A Sociedade de Consumo. 1. ed. Lisboa: Edições 70, 2007.

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SOUZA, A. F.; TORRALVO, C. F. A Gestão dos próprios Recursos e a Importância


do Planejamento Financeiro Pessoal. In: VII Semead, São Paulo, 2004.
1241

ANEXO
Pesquisa sobre Educação Financeira: a percepção dos alunos do Ensino
Médio sobre a relação entre gestão das finanças pessoais e vida financeira
saudável.
Obrigado pela sua participação nesta pesquisa que objetiva descobrir a
percepção dos alunos do Ensino Médio sobre a relação entre gestão das finanças
pessoais e vida financeira saudável. Trata-se de uma dissertação do Programa de
Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São Paulo. O preenchimento das
informações é opcional, mas gostaria de sua colaboração para a pesquisa. Todos os
dados coletados serão utilizados única e exclusivamente para a pesquisa em questão.
1) Sexo ( ) Masculino ( ) Feminino
2) Idade ________ anos
3) Qual melhor alternativa descreve a renda mensal de sua família:
( ) R$ 465,00 ou menos ( ) R$ 465,00 a R$ 1.395,00 ( ) R$ 1.395,00 a R$ 2.325,00
( ) R$ 2.325,00 a R$ 4.650,00 ( ) R$ 4.650,00 a R$ 9.300,00 ( ) mais que R$ 9.300,00
4) Você recebe mesada?
( ) Sim. Valor: R$ ____________ ( ) Não
5) Possui alguma fonte de renda independente da de seus responsáveis? (Ex. Trabalho,
estágio)
( ) Sim. Valor: R$ ____________ ( ) Não
Entende-se Educação Financeira Pessoal como o conjunto de conhecimentos que auxilia
a pessoa a gerenciar melhor sua disponibilidade financeira. São informações que
educam você a administrar corretamente o seu dinheiro, a gastar e utilizar créditos
disponíveis, poupar e investir, de modo que você tenha uma vida financeiramente
saudável.
6) Em sua opinião, obter informações voltadas à educação financeira pessoal é:
( ) muito importante ( ) importante ( ) pouco importante ( ) sem importância
7) Dos itens abaixo, escolha 5 que você tem interesse em obter mais informações e
enumere-os de 1 a 5, sendo 1 o item que você tem mais interesse e 5 o item que você
tem menos interesse:
( ) Uso do cartão de crédito ( ) Empréstimos pessoais ( ) Poupança
( ) Financiamentos ( ) Consumo planejado ( ) Bolsa de Valores
( ) Juros ( ) Gerenciamento de gastos ( ) Aposentadoria
1242

( ) Outros assuntos. Qual (is)? _______________________ ( ) Não tenho nenhum


interesse
8) Dos itens abaixo, marque com um “x” o(s) que voce considera já possuir informações
suficientes para tomar decisões a respeito do assunto:
( ) Uso do cartão de crédito ( ) Empréstimos pessoais ( ) Poupança
( ) Financiamentos ( ) Consumo planejado ( ) Bolsa de Valores
( ) Juros ( ) Gerenciamento de gastos ( ) Aposentadoria
( ) Outros assuntos. Qual (is)? _______________________ ( ) Não possuo nenhuma
informação.
9) Você já teve alguma aula cujo conteúdo ministrado estava relacionado à educação
financeira pessoal?
( ) Sim ( ) Não
10) Em sua opinião, a educação financeira pessoal deveria ser ensinada na escola?
( ) Sim ( ) Não.
11) Voce aceita participar de uma entrevista sobre o tema ?
( ) Sim ( ) Não.
12 ) Conforme o seu comportamento e seu modo de pensar. VOCÊ:
Quase Quase
Nunca Sempre
nunca sempre
a) Preocupa-se em gerenciar melhor o seu dinheiro
b) Identifica a existência de juros ao comprar um produto à crédito (ex.: juros
embutidos)
c) Anota e controla os seus gastos pessoais mensais (ex.: planilha de receitas
e despesas, caderno de anotações, etc.)

d) Está satisfeito com o sistema de controle de suas finanças

e) Estabelece metas financeiras que influenciam na administração do seu


dinheiro (ex.: Poupar uma quantia no ano)
f) Poupa visando a compra de um produto mais caro
g) Poupa mensalmente sem ter necessariamente a intenção de consumir algo
com o dinheiro poupado
h) Pensa em investir o seu dinheiro
i) Compara preços ao fazer compras
j) Compra por impulso
k) Paga suas contas em atraso

l) Seus gastos mensais ultrapassam o valor recebido mensalmente


1243

m) Não tem limite de gastos mensais, compra tudo o que quer e quando quer

n) Prefere comprar um produto financiado a juntar dinheiro para comprá-lo a


vista
o) Pensa em ser independente financeiramente dos seus responsáveis o mais
rápido possível
p) Considera importante ter uma vida financeira saudável

ROTEIRO DE ENTREVISTA
Nome da Escola: ____________________________________________
Entende-se Educação Financeira Pessoal como o conjunto de conhecimentos que auxilia
a pessoa a gerenciar melhor sua disponibilidade financeira. São informações que
educam você a administrar corretamente o seu dinheiro, a gastar e utilizar créditos
disponíveis, poupar e investir, de modo que você tenha uma vida financeiramente
saudável.
1. Você considera relevante o ensino da educação financeira pessoal para a formação do
cidadão brasileiro? Comente.
2. Em sua opinião, quem deveria ser o responsável por promover e atuar diretamente na
educação financeira da população?
3. Você percebe alguma ação de educação financeira hoje na sociedade?
4. Você acha que a escola poderia fomentar a difusão de informações de educação
financeira pessoal para a formação de adultos mais preparados para tomar decisões
financeiras?
5. O Ensino Médio seria o momento adequado para o ensino de educação financeira
pessoal?
6. Dos assuntos abaixo, quais você considera mais relevantes para a formação de um
adulto capaz de administrar sua vida financeira de forma saudável? Enumere em ordem
de importância de 1 a 5, sendo 1 o mais relevante e 5 o menos relevante.
( ) Uso do cartão de crédito ( ) Empréstimos pessoais ( ) Poupança
( ) Financiamentos ( ) Consumo planejado ( ) Bolsa de Valores
( ) Juros ( ) Gerenciamento de gastos ( ) Aposentadoria
( ) Outros assuntos. Qual (is)? __________________ ( ) Não tenho nenhum interesse
1244

Pôsteres

Representações sociais de professores sobre o ensino médio integrado: a


ressignificação da prática docente dos níveis secundários de ensino

Adriana Cristina Ruescas Santana


UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO

Resumo: Esta pesquisa busca identificar e analisar as Representações Sociais de


professores do ensino médio e do ensino profissionalizante de uma Escola Técnica
Estadual, da Região Leste da Cidade de São Paulo, sobre o Ensino Médio Integrado.

Objetivo Geral

Contribuir para a compreensão das Representações Sociais dos professores de


modo a favorecer a concretização da proposta integradora, conforme Decreto n°
5154/04, assim como oferecer subsídios para a formação dos docentes de ensino médio
e ensino médio profissionalizante que atuam no Ensino Médio Integrado.

Justificativa

Por meio da abordagem psicossocial da Teoria das Representações Sociais este


trabalho busca entender quais as representações sociais que possuem professores do
ensino médio e profissionalizante, sobre o ensino médio integrado. A Lei de Diretrizes e
Bases brasileira (LDB n. 9.394/96) define como uma das finalidades do ensino médio a
preparação para o mundo do trabalho e para a cidadania. No entanto, a falta de
especificidade da LDB levou à necessidade de elaboração do Decreto n° 2.208/97 que
instaurou de forma desarticulada as seguintes modalidades de ensino médio: cursos da
base nacional comum (caracterizados pelo ensino propedêutico), os cursos
profissionalizantes modulares e os cursos livres.
As mudanças no cenário político brasileiro em 2003, a partir do início do
governo Lula, foi marcada por grandes expectativas de mudanças sociais , e tentando
responder a estas expectativas ,conforme Frigotto e Ciavata (2012) o Ministro da
Educação na época Cristovão Buarque, em sua posse realizou um discurso onde dizia
1245

que a reforma desintegradora não poderia continuar, referindo-se ao Decreto n°


2.208/97. Regulamentava, assim, uma proposta de educação integral,objeto de muitas
discussões no meio acadêmico e político. Um indicador decisivo para elaboração do
novo Decreto foi dado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência
e a Cultura (UNESCO), que em 2004 realizou na cidade de Bonn – Alemanha uma
reunião internacional como o tema “ Aprender para o Trabalho, a Cidadania e a
Sustentabilidade, que originou um documento denominado “A Declaração de Bonn” ,
propondo que a educação, em todos os níveis deverá proporcionar o desenvolvimento
de habilidades e competências capazes de propiciar uma educação técnica e vocacional.
Assim, no dia 23 de julho de 2004, surge o Decreto n° 5.154 que revogava o Decreto
n° 2.208 / 97.
A elaboração de nova normativa (Decreto n. 5154/04) teve o intuito de
enfocar o trabalho como principio educativo , orientado a formação integral do sujeito :

“ O que é integrar? É tornar íntegro, tornar inteiro, o quê ? No


caso da formação integrada ou do ensino médio integrado ao ensino técnico,
queremos que a educação geral se torne parte inseparável da educação
profissional em todos os campos onde se dá a preparação para o trabalho :
Significa que buscamos enfocar o trabalho como principio educativo, no
sentido de superar a dicotomia trabalho manual/ trabalho intelectual, de
incorporar a dimensão intelectual ao trabalho produtivo, de formar
trabalhadores capazes de atuar como dirigentes e cidadãos”. (Frigotto
,Ciavatta,coords.,2012,p.84 )

Educação Profissional de Nível Médio

A educação profissional no Brasil desperta pouco interesse em estudiosos da


área da educação:
De acordo com CUNHA ( 2000, p. 89)
“Esse “espaço vazio” se explica , pelo menos em parte, pelo fato de que os
historiadores da educação brasileira se preocupam, principalmente, com o
ensino que se destina às elites políticas e ao trabalho intelectual, deixando
o trabalho manual em segundo plano-atitude consistente, aliás com sua
própria formação “.

A história da educação profissional inicia-se pelo ofícios desempenhados pelos


escravos, no Brasil Colônia, as relações escravistas de produção afastaram o
desenvolvimento das forças produtivas do trabalho que envolviam a manufatura e o
artesanato, pois homens livres associavam este trabalho com a condição dos escravos,
este foi um dos motivos que não houve desenvolvimento das corporações de ofício
(irmandades) que eram destinadas a ensinar ofícios manufatureiros, esta representação
1246

socialmente construída em relação ao trabalho manual da a origem ao preconceito com


trabalhos manuais, assim sendo os ditos “homens livres” não aceitavam executar tais
atividades, por sua vez quando o Estado precisava de mão de obra, para execução de
seus projetos , conforme (Cunha, 2000 p.101) para atender esta demanda eram
“convocados” homens livres que viviam em condições menos favorecidas como (órfãos,
abandonados,os desvalidos) eram encaminhados para aprender ofícios aos arsenais
militares e da marinha . A partir de 1809 foi criado na cidade do Rio de Janeiro, pelo
Príncipe Regente D.João, destinado a atender os órfãos da Casa de Pia de Lisboa,
trazidos na frota que transportou a família real e sua comitiva pra o Brasil. Eles
aprendiam vários ofícios com os artífices que vieram na mesma frota, portanto com
caráter assistencialista. Em 1858, com a mesma finalidade de amparar crianças órfãs e
abandonadas, foi criado também no Rio de Janeio o Liceu de Artes e Ofício,
oferecendo-lhes instruções e iniciando –as em ocupações industriais. Em 1906 as
empresas ferroviárias mantinham escolas para formar operários para trabalhar na
manutenção das ferrovias
No início do período republicano, o ensino profissional manteve a mesma
característica assistencial, atendendo aos menos favorecidos, mas com objetivo de
preparar operários, para atender ainda timidamente a produção industrial. A partir de
1909, a formação profissional como política pública começa a tomar corpo, com a
criação de 19 escolas uma em cada Estado, estas escolas tinham prédios próprios,
currículos e metodologias definidas, condição de ingresso e destinação esperada dos
egressos, as escolas de aprendizes artífices funcionaram até 1942, e passaram por ela
141 mil alunos, como sua característica era formação de cunho artesanal, e o mercado
demandava profissionais qualificados para a indústria , nasce então o Decreto – Lei n°
(4.073/1942) Lei Orgânica do Ensino Industrial, que trouxe como principal inovação o
deslocamento do ensino profissional para o ensino médio, a Lei também propiciou a
criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), em 1946 o Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), e no mesmo período as antigas
escolas de aprendizes artífices foram transformadas em Escolas Técnicas Federais,
assim sendo o ensino profissional é consolidado a partir das necessidades da economia
industrial e da sociedade urbana.
A equiparação do ensino profissional ao acadêmico ocorreu através da Lei n°
4.024/1961, primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. A evolução do
ensino profissional se deu através da Lei 5692/1971, que fixou as bases para o ensino de
1247

primeiro e segundo grau, e tornou obrigatória a profissionalização para o segundo grau.


A partir desta Lei o Conselho Federal de Educação, pelo Parecer CFE n° 45/1972,
regulamentou a profissionalização no nível técnico, este decreto possibilitou as
instituições de ensino tanto pública como particulares oferecerem currículos mistos,
com disciplinas de formação geral e disciplina de formação profissional, o que expandiu
de forma indiscriminada o ensino profissionalizante, devido a falta de planejamento, e
de professores qualificados este crescimento trouxe efeitos considerados danosos, e que
até na atualidade percebemos seus efeitos danosos. Nesse processo o ensino de segundo
grau perdeu sua identidade, não se preparava para o ensino propedêutico para acesso ao
nível superior, seja a de preparação para o mundo do trabalho, na tentativa de corrigir
esta situação, foi promulgada a Lei n° 7.044/1982, que tornou facultativa a oferta do
ensino profissional. Em 20 de dezembro de 1996 , a Lei 9394 o texto do projeto da
nova LDB que por quase 10 anos vinha sendo discutida foi aprovada, e com ela o
Decreto n° 2208/97 regulamentou a educação profissional e sua relação com o ensino
médio, não se constitua mais como parte diversificada do currículo do ensino médio, era
concomitante ou posterior ao ensino médio, dividiu em três níveis ; básico(não formal e
livre), técnico (cursos modulares com habilitação de nível médio) e tecnológico
(graduação de nível superior), houve então uma mudança radical na educação
profissional de nível médio, pois entende-se que o ensino técnico poderia ser
desenvolvido subsequente ao ensino médio, ou de forma concomitante, mas não
integrado em um único curso. O referido Decreto trouxe algumas consequências
positivas para o ensino profissionalizante, com a modalidade “modular” do ensino como
dar a possibilidade de alunos voltarem a escola, e fazerem mais de um curso
profissional, e também referente ao perfil dos alunos que passaram a ser mais
vocacionado uma vez que estava desvinculado a conclusão do ensino médio, embora
houvesse exigência de estar cursando o 2° ano do ensino médio, ou ter concluído. Em
23 de julho de 2004 surge o Decreto n° 5.154 que revogava o Decreto n° 2.208/97, o
referido Decreto manteve as modalidades de ensino do Decreto antigo e incorporou
novas modalidades de ensino, com o ensino técnico integrado ao ensino médio,
conforme segue:
“Art. 4o A educação profissional técnica de nível médio, nos termos
dispostos no § 2o do art. 36, art. 40 e parágrafo único do art. 41 da Lei n°
9.394, de 1996, será desenvolvida de forma articulada com o ensino médio,
observados:
§ 1o A articulação entre a educação profissional técnica de nível médio e o
ensino médio dar-se-á de forma:
1248

I - integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino


fundamental, sendo o curso planejado de modo a conduzir o aluno à
habilitação profissional técnica de nível médio, na mesma instituição de
ensino, contando com matrícula única para cada aluno;
II - concomitante, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino
fundamental ou esteja cursando o ensino médio, na qual a
complementaridade entre a educação profissional técnica de nível médio e o
ensino médio pressupõe a existência de matrículas distintas para cada curso,
podendo ocorrer:
a) na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as oportunidades
educacionais disponíveis;
b) em instituições de ensino distintas, aproveitando-se as oportunidades
educacionais disponíveis; ou
c) em instituições de ensino distintas, mediante convênios de
intercomplementaridade, os;
III - subseqüente, visando o planejamento e o desenvolvimento de projetos
pedagógicos unificada oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino
médio

Processo de Implantação do Ensino Médio Integrado em uma Escola Técnica


Estadual na Zona Leste de São Paulo

O Ensino Técnico Integrado ao Ensino Médio (ETIM), foi implantado na no ano


de 2012 na Escola Técnica onde será realizada esta pesquisa, de acordo com o Decreto
n° 5154/2004 e do Parecer CNE/CEB n° 39/2004, com uma proposta de um currículo
integrado entre a formação geral (propedêutica), correspondente ao Ensino Médio, com
a parte de formação profissional, articulados e orientados para o mesmo foco. Foram
implantados dois cursos integrados ao ensino médio – Técnico de Nível Médio
Integrado ao Ensino Médio (ETIM) – Eletrônica e Técnico de Nível Médio Integrado ao
Ensino Médio (ETIM) – Edificações, cada turma com quarenta alunos, em período
integral.
Os alunos são selecionados a partir de uma processo seletivo público, e houve
uma procura (média ) entre os dois cursos de seis (06) , candidato vaga, após esta etapa
os alunos foram matriculados, e em fevereiro de 2012 iniciaram as aulas em período
integral, a escola não fornecia alimentação , e também não havia uma infra estrutura que
favorecesse o lazer, o horário de aula foi desenvolvido de acordo com a disponibilidade
de cada professor, que na instituição são remunerados por hora / aula, não há carga
horário integral, existiam coordenadores da área do ensino médio e ensino
profissionalizante,os professores foram orientados a desenvolver o plano de trabalho
docente coletivamente, mas devido ao formato de trabalho da instituição não foi
possível realizar, iniciaram as aulas,e os professores e a comunidade escolar com este
novo desafio a ser superado.
1249

A Teoria das Representações Sociais como forma de acesso às simbolizações dos


professores

Pesquisar as representações sociais dos professores envolvidos no ensino médio


integrado, nos possibilitará compreender suas identidades sociais,e sua posição frente a
implantação de uma nova modalidade de ensino médio.
As representações são construídas em grupos sociais e definem, para seus
integrantes, os objetivos e os procedimentos específicos que devem cumprir em sua vida
diária. Elas formam as referências que permitem aos sujeitos interpretarem seu meio,
classificar, dar sentido a realidade cotidiana tendo, essencialmente, uma função prática
(Moscovici, 2003 apud, Novaes ,2006)
A Teoria das Representações Sociais, inaugurada por Serge Moscovici, em 1961
através de sua obra A Psicanálise, sua Imagem e seu Público , buscou compreender
como os fenômenos da Psicanálise incorporaram no pensamento popular dos franceses.
A Teoria das Representações Sociais, estuda os fenômenos das representações sociais,
isto é busca conhecer como o conhecimento é produzido, e o impacto nas práticas
sociais, e o porquê as pessoas partilham o conhecimento e desse modo constituem sua
realidade comum, transformando ideias em práticas.

Trajetória Metodológica

Este estudo recorrerá à técnica dos grupos focais para compreender quais as
representações sociais dos sujeitos afetados pela proposta do ensino médio integrado,
conforme Decreto nº 5.154/04. Pretende-se realizar dois grupos focais em uma Escola
Técnica Estadual localizada na Zona Leste da Cidade de São Paulo.
Ao se reportar ao Grupo Focal como técnica para coleta de dados, faz-se menção
de que ele é utilizado quando se querem compreender diferenças e divergências,
contraposições e contradições (GATTI, 2005) , considera-se tal metodologia uma
estratégia de coleta privilegiada no estudo das representações sociais uma vez que
permite ao pesquisador a observação e o registro da comunicação entre os componentes
de um grupo social. Após transcrição do registro sonoro, o estudo procederá à análise
por meio da elaboração de categorias temáticas que, combinadas aos registros nos
diários de campo, poderão contribuir para a compreensão das representações dos
1250

professores de modo a favorecer a concretização da proposta integradora e a oferecer


subsídios para a formação dos professores.

Referências Bibliográficas

Cunha, Luiz Antônio. O ensino industrial-manufatureiro no Brasil. Revista Brasileira


de Educação [ On-line ] 2000, (mai-ago) : [ Data de consulta: 24 / junho / 2014]
Disponível em: <http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=27501406> ISSN 1413-2478

GATTI, Bernadete Angelina. Grupo focal na pesquisa em ciências sociais e


humanas. Brasília: Líber Livro, 2005.

REGATTIERI, Marilza; CASTRO, Jane Margareth (orgs). Ensino médio e educação


profissional:desafios da integração. -2.ed-Brasília: UNESCO,2010.270 p.

FRIGOTTO, Maria Gaudêncio; CIAVATTA, Marise Ramos (orgs.).-Ensino médio


integrado:concepções e contradições. 3.ed.-São Paulo: Cortez,2012

NOVAES,A. Brasil: representações sociais de estudantes de pedagogia. Ano de


Obtenção: 2006, Dissertação de Mestrado – Programa de Mestrado em Educação –
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, Brasil.

MOSCOVICI, Serge. A Psicanálise,sua imagem e seu público. Tradução de Sonia


Fuhrmann.-Petrópolis: Vozes,2012 – (Coleção Psicologia Social)

BRASIL. Resolução CNE/CEB n° 04/2005 de 27/10/2005. Inclui novo dispositivo à


Resolução CNE / CEB 1 /2005 , que atualiza as Diretrizes Curriculares Nacionais
definidas pelo Conselho Nacional de Educação para o ensino Médio e para a Educação
Profissional Técnica de Nível Médio às disposições do decreto n° 5.154/2004.

__________ Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira – n. 9394/96.

__________Decreto Federal n° 2.208/97 – regulamenta o parágrafo 2° do artigo 36 e


os artigos 39 a 42 , da Lei n° 9394/96 que estabelece as Diretrizes e Bases da Ed.
Nacional.
1251

Pôster

Entre a responsabilização e a responsabilidade: possibilidades de uma experiência


compartilhada entre adultos e jovens em uma instituição de ensino médio

Adriana Gomes Silveira


PPGE/UFES/IFES
adrianagomes@ifes.edu.br

Resumo: A pesquisa em andamento faz parte do meu doutorado em Educação na


Universidade Federal do Espírito Santo e diz respeito à parte da revisão bibliográfica e
do arcabouço teórico da investigação. Enfoco a tensão entre a responsabilidade e a
responsabilização no campo escolar, em especial na relação intergeracional: adultos
(docentes) e jovens (alunos). Em um momento de mutações profundas que vem
ocorrendo na sociedade ocidental e seus rebatimentos que afetam as instituições e o
processo de socialização das novas gerações, nos instiga questionar se é possível em
uma atualidade educacional direcionada por políticas quantificadoras que contribuem
para a culpabilização e individualização do agir, pensar a responsabilidade como uma
experiência que pode ser compartilhada entre adultos e jovens.
Palavras-chave: Responsabilidade. Responsabilização. Relações intergeracionais.

INTRODUÇÃO

A pesquisa em andamento faz parte do meu doutorado em Educação na Universidade


Federal do Espírito Santo e diz respeito à parte da revisão bibliográfica e do arcabouço
teórico da investigação. Enfoco a tensão entre a responsabilidade e a responsabilização
no campo escolar, em especial na relação geracional: adultos (docentes) e jovens
(alunos). Em um momento de mutações profundas que vem ocorrendo na sociedade
ocidental e seus rebatimentos que afetam as instituições e o processo de socialização das
novas gerações, nos instiga questionar se é possível em uma atualidade educacional
direcionada por políticas quantificadoras que contribuem para a culpabilização e
individualização do agir, pensar a responsabilidade como uma experiência que pode ser
compartilhada entre adultos e jovens. Seria utopia pensar em responsabilidade em um
momento de crise? Ou o momento de crise também é o momento de se pensar o novo, a
1252

ruptura com o senso comum é um momento para a transformação de decisões e ao


questionamento. Talvez por isso em um momento liberal (em crise) aonde o público
vem pensado apenas como a serviço dos interesses privados (AGUIAR, 2009) com um
crescente e contínuo esmorecimento das fronteiras entre as esferas pública e privada na
vida contemporânea (CARVALHO, 2013), pensar sobre a responsabilidade (JONAS,
2006, ARENDT, 2007) seja fundamental para pensarmos a vida em comum. Por outro
lado, a ideia que perpassa o princípio da responsabilidade não desconsidera as
condições e características de uma sociedade capitalista e de uma escola inseria nesta
sociedade.
Diante do resumidamente exposto, o objetivo geral de nossa investigação é buscar
compreender a tensão entre a responsabilidade e a responsabilização no campo escolar,
em especial na relação geracional: adultos (docentes) e jovens (alunos) como uma
possibilidade de uma experiência compartilhada.

ENTRE A RESPONSABILIZAÇÃO E A RESPONSABILIDADE: TENSÕES E


DESAFIOS

O deslocamento do conceito tradicional de responsabilidade “ referido ao presente, foi


enriquecido com uma dimensão retrospectiva e prospectiva em virtude da qual é preciso
incluir de alguma maneira no actual espaço de responsabilidade de o passado e o futuro,
a memória e a possibilidade (INNERARITY, 2006, p. 223). Neste sentido é preciso
responder pelo o que já aconteceu no passado e principalmente pelo que poderá
acontecer no futuro (JONAS, 2006).
Em se tratando da educação da juventude e sua relação com a escola, o fracasso da
instituição escolar com altos índices de evasão e reprovação (PATTO, 1999) é muitas
vezes reduzido a culpas mútuas. De um lado, para a escola e seus profissionais, o
problema situa-se na juventude, em seu individualismo e irresponsabilidade; de outro,
para os jovens, a escola se torna distante e enfadonha, não existe para a maioria o
sentimento de pertencimento (DAYRELL, 2007; SPOSITO, 2005). Os desafios e
tensões existentes entre adultos que explicam o comportamento dos jovens e vive-versa
são muitos, acreditamos que a compreensão das práticas e dos símbolos do novo modo
de ser jovem, consequência das mutações ocorridas nos processos de socialização “que
coloca em questão o sistema educativo, suas ofertas e as posturas pedagógicas”
1253

(DAYRELL, 2007, p. 1107) seja uma possibilidade para um compartilhamento de


experiências geracionais.
Para Arendt (2007) a crise da educação é o reflexo de uma crise conjuntural muito mais
ampla. Uma crise que remete à relação dos homens com o mundo, à responsabilidade
que assumem em relação a eles e aos recém-chegados ao mundo. Diz respeito à ruptura
do fio da tradição, a dificuldade de o passado iluminar o presente, de as gerações
passadas apresentarem o mundo como um legado aos novos. E ainda dos novos,
sentirem-se pertencentes ao mundo. Neste sentido, não é possível pensarmos a vida em
comum sem pensarmos sobre a ideia da responsabilidade. A exata medida de pensá-la é
tarefa que requer grande cuidado, dado que os discursos sobre a questão movem-se em
dois extremos. De um extremo, a impossibilidade de se conceber a ideia da
responsabilidade no mundo contemporâneo; de outro a dramatização dos riscos globais
e as consequências de nossas ações, o que nos torna verdadeiros delinquentes, como
apontado por Innerarity (2006, p. 214).
A responsabilidade diz respeito ao outro, ao futuro para que continue existindo
indefinidamente a possibilidade de vida. É importante considerar que em nossa vida a
educação nos abre a possibilidade de superarmos a condição de objetos de
responsabilidade para sujeitos dela. Por isso a ética de responsabilidade tem uma
dimensão pedagógica que se desloca em todas as direções do nosso agir.
(ZANCANARO, 1998). Trata-se da ideia arendtiana de “endireitar o tempo” e “renovar
o mundo“ já que “podemos fazer porque todos entramos num ou noutro tempo como
recém-vindos a um mundo que existia antes de nós e ainda vai existir depois que
partirmos, quando teremos deixado a sua carga para os nossos sucessores. (ARENDT,
2007, p.90).
O princípio responsabilidade muitas vezes é utilizado como sinônimo de
responsabilização, termo – dentre outros - inicialmente utilizado na gestão de negócios e
que a partir dos anos 90 invade as políticas educacionais brasileiras. Responsabilização
(ou accountability)1 remete à obrigação de membros de um órgão administrativo ou
representativo de prestar contas a instâncias controladoras ou a seus representados. Diz
respeito a obrigações e, em consequência, a punições.

1
Accountability é um termo da língua inglesa, sem tradução exata para o português, Outro termo usado
numa possível versão portuguesa é responsabilização.
1254

Os rebatimentos das políticas atuais do Governo Federal destinadas às avaliações


externas da Educação Básica, em nosso caso às relativas ao Ensino Médio - o Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM); reforçam muitas vezes a ideia de culpabilização,
isolamento e sofrimentos de jovens e adultos que de alguma forma se
“desresponsabilizaram” frente ao futuro. Por um lado o aluno
deve responsabilizar-se pela sua aprendizagem. Caso não o faça, será
reprovado pela vida e a culpa será apenas dele. A desresponsabilização do
professor faz parte de uma redefinição de seu papel no processo de
aprendizagem, com base em um modelo individualista de desenvolvimento
pessoal: a cada um segundo o seu esforço. Deve-se “aprender a aprender”
(FREITAS, 2012, p. 318).

Por outro lado, o docente é extremamente demandado em seu trabalho, oscilando entre a
responsabilização em relação aos resultados de seus alunos (OLIVEIRA, 2006) e o
desconhecimento de uma cultura juvenil que lhe parece tão diferente daquela em que
viveu (DAYRELL, 2007).

ADULTOS E JOVENS: TENSÕES, CRISES E POSSIBILIDADES.

Para Foracchi (1965), influenciada pela perspectiva mannheimiana sobre gerações


(1952, 1983), o conceito adulto e jovem surgem como categorias socialmente distintas,
mas vinculada por um elo de continuidade e interesses comuns. De maneira geral, a
passagem de uma condição social à outra é realizada com tensões. É comum no discurso
dos adultos, desconsiderar as especificidades da geração dos jovens e as diversidades de
suas experiências, e de outro lado; no discurso dos jovens, a pretensa desvinculação do
presente e do futuro em relação às experiências do “passado” dos adultos.
Em nosso trabalho além da categoria jovem, abarcaremos a categoria aluno e não é
possível desvinculá-la das mudanças ocorridas na sociedade. Dentre elas, a expansão
ocorrida a partir dos anos 90 e a ampliação da obrigatoriedade e gratuidade desse nível
de ensino no Brasil que tem gerado uma mudança significativa do perfil dos jovens
alunos que chegam a ele, pois até então os jovens que adentravam este nível de ensino
pertenciam de maneira geral às camadas altas e médias da sociedade, os “herdeiros”,
segundo Bourdieu (2013). Em decorrência desta ampliação houve significativa alteração
do perfil do alunado, de um perfil mais homogêneo a um bastante heterogêneo, por
exemplo, em relação à etnia e classe social.
1255

Acrescidos à mudança do perfil do alunado é importante ressaltar as mutações


profundas que vêm ocorrendo na sociedade e em consequência nas formas de
socialização das novas gerações, em nosso caso específico, nos jovens. Isto quer dizer
que existe uma nova condição juvenil em nossa sociedade, em nossa escola e em nossa
sala de aula, ou seja, um novo
modo como uma sociedade constitui e atribui significado a esse momento do
ciclo da vida, no contexto de uma dimensão histórico-geracional, mas
também à sua situação, ou seja o modo como tal condição é vivida a partir
dos diversos recortes referidos às diferenças sociais – classe, gênero, etnia etc
(DAYRELL, 2007, 1108.).

O convívio dos adultos com a nova condição juvenil se caracteriza por um antagonismo
constante árduo, contudo, sendo difícil, não é impossível que possa ser estabelecido
(FORACCHI, 1965). A possibilidade de uma experiência compartilhada precisa
subverter a ideia de que o adulto pode impor e ao jovem cabe, somente, obedecer.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa em andamento encontra-se em fase de revisão bibliográfica e definição das


categorias de que serão discutidas no arcabouço teórico. Acreditamos que a temática
proposta contribua para as discussões acerca da tensão entre responsabilização e
responsabilidade, tomando como foco o convívio geracional entre adultos e jovens
como uma possibilidade de compartilhamento.
Em um momento em que a busca exclusiva do homem para sanar suas necessidades,
tem implica no aumento da solidão e da alienação de indivíduos considerados cada vez
mais supérfluos e descartáveis – homo sacer. (AGAMBEM, 2004; AGUIAR, 2009), o
que em consequência inviabiliza o mundo comum, acredito a temática proposta
contribua com uma ínfima parte desta construção.
1256

REFERÊNCIAS

AGAMBEM, Giorgio. Estado de exceção. Tradução de Iraci D. Poleti. 2. Ed. São


Paulo: Boitempo, 2004 (Estado de sítio).

AGUIAR, Odílio Alves. Filosofia, Política e Ética em Hannah Arendt. Porto Alegre:
Editora UNIJUÍ, 2009.

ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. 7. ed. Tradução Mauro W. Barbosa.


São Paulo: Perspectiva, 2007.

BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. Os herdeiros: os estudantes e a


cultura. Santa Catarina: EDUFSC, 2013.

CARVALHO, José Sérgio. Reflexões sobre educação, formação e esfera pública.


Porto Alegre: Penso, 2013.

DAYRELL, 2007. A escola “faz” as juventudes?Reflexões em torno da socialização


juvenil. Educ. Soc., Campinas, v.28, n100 – Especial, p. 1105-1128, out. 2007.
Disponível em: <http://www. www.scielo.br. >. Acesso em: 5 julho. 2014.

JONAS, Hans. O princípio da responsabilidade: ensaio de uma ética para a


civilização tecnológica. Tradução Marijane Lisboa e Luiz Barros Montez. Rio de
Janeiro: Contraponto, 2006.

FORACCHI, Maria M. O estudante e a transformação da sociedade brasileira. São


Paulo: Companhia Editora Nacional, 1965.

FREITAS, Luís. Carlos de. A Internalização da Exclusão. Educação & Sociedade,


Campinas, v. 23, n. 80, setembro/2002, p. 299-325. Disponível em:
<http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: 20 julho. 2014.

INNERARITY, Daniel. O novo espaço público. Tradução Manuel Ruas. Lisboa:


Teorema, 2006.

MANNHEIM, Karl. "El problema de las generaciones", Revista Española de


Investigaciones Sociológicas (REIS), n. 62, p. 145-168, 1993.

OLIVEIRA, Dalila Andrade. Regulação educativa na América Latina: repercussões


sobre a identidade dos trabalhadores docentes. Educação em Revista, Belo Horizonte,
v44, p. 209-227, 2006.

PATTO, Maria Helena Souza. A Produção do fracasso escolar: histórias de submissão


e rebeldia. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999.

SPOSITO, Marília Pontes. Algumas reflexões e muitas indagações sobre as relações


entre juventude e escola no Brasil. In.: ABRAMO, H.; BRANCO, P.P.M. (Org,).
Retratos da juventude brasileira: análises de uma pesquisa nacional. São Paulo:
Instituto Cidadania; Fundação Perseu Abramo, p. 87-128. 2005.
1257

Pôster

Narrativas de crianças de seis anos que estão entrando no primeiro ano do ensino
fundamental

1
Aline de Souza Medeiros
UNICID

Resumo: Este estudo tem como tema as narrativas das crianças de seis anos que estão
entrando no primeiro ano do ensino fundamental. Levaremos em consideração as vozes
das crianças enquanto sujeitos ativos e capazes de narrar suas próprias experiências. A
partir do olhar das crianças buscaremos conhecer o que pensam e sentem saindo da
educação infantil e entrando no ensino fundamental aos seis anos, e não aos sete, como
ocorria anteriormente. Baseado em estudo exploratório, estamos realizando uma revisão
de literatura com dezenove trabalhos publicados que abordam a obrigatoriedade do
ensino fundamental de nove anos com a perspectiva de professores, gestores, poder
público, mas nenhum destes visando a expectativa da criança em torno desta nova
proposta. São pressupostos para este estudo os documentos oficiais que norteiam e
fundamenta a proposta de ensino de nove anos, referencial histórico-cultural do
desenvolvimento humano elaborado a partir dos autores Bakhtin e Vygotsky para uma
possível análise das narrativas das crianças participantes.
Palavras-Chave: Ensino Fundamental de Nove Anos. Narrativas de Crianças. Crianças
de Seis Anos.

INTRODUÇÃO

Em 2008 tive trabalhei como Auxiliar Técnica de Educação na EMEI Miroel


Silveira, a qual atendia crianças entre três e seis anos de idade. Minha atribuição era
cuidar e educar colaborando para elas pudessem desenvolver autonomia em relação às
tarefas simples do cotidiano como higiene, alimentação e respeito ao próximo, numa
tentativa de torná-los independentes e capazes de contribuir para um mundo melhor. A
EMEI é um espaço lúdico e cheio de alegria, onde as crianças brincam, criam e se

1
Mestranda do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São Paulo. Orientadora:
Professora Dra. Ecleide Cunico Furlanetto
1258

desenvolvem na medida em que cuidar, educar e brincar se articulam. No final do ano


de 2009, com a implantação do ensino fundamental de nove anos obrigatório para o ano
letivo seguinte, as crianças que estavam terminando o segundo e o terceiro estágio
foram matriculadas no primeiro ano do ensino fundamental, ou seja, crianças com cinco
e seis anos ingressavam no 1º. Muitas indagações foram feitas por parte de pais,
professores e funcionários em relação à idade das crianças, questionavam se estariam
preparadas, como seriam acolhidas, como seria a proposta pedagógica, se existia
condições e equipamentos adequados para crianças tão pequenas nas Escolas de Ensino
Fundamental, uma vez que na EMEI as mesmas eram cuidadas e educadas de acordo
com suas necessidades e faixa etária.
A partir desta minha experiência tão significativa surgiu uma inquietação que
ocupou meus pensamentos de educadora, e nesta perspectiva procurei dar uma atenção
especial às narrativas dessas crianças de seis anos que estariam entrando no primeiro
ano do Ensino Fundamental, saber o que elas “sentem”, o que “pensam”, o que
“esperam” desta nova fase escolar a qual serão submetidas.
Ao ingressar no Mestrado deparei-me com a necessidade de definir um problema
de pesquisa. Refletindo sobre a temática a ser abordada, retornei a essa experiência e
senti-me instigada a investigar o processo de implantação do ensino de nove anos.
Cumpre destacar que no Mestrado passei a integrar o grupo de Pesquisa coordenado
pela Prof.ª Dra. Ecleide Cunico Furlanetto que na ocasião participava de uma Rede de
Pesquisa que integrava pesquisadores de diferentes regiões e universidades do Brasil
(UFRN, UNICID, UNIFESP, UFF, UFRS) que tem como objetivo: colocar em
narrativa, significações construídas por crianças de diferentes regiões brasileiras a
respeito das escolas da infância. Essa pesquisa estava em fase de finalização e outra
estava sendo delineada, buscando, com base nos achados anteriores, realizar alguns
desdobramentos. Entre eles, estava previsto ouvir, além de alunos de Escolas
ligados às universidades que compunham o projeto, crianças que cursavam as
escolas das redes públicas das diferentes regiões. Optei por integrar esse projeto
propondo para isso, dar voz ás crianças que estão vivendo essa experiência ao invés
de ouvir profissionais da Educação envolvidos nesses projetos.
Para alcançar os objetivos propostos, a revisão da literatura está sendo realizada
por meio de trabalhos publicados que abordam a temática do ensino de nove anos e, as
perspectivas de professores, gestores e do poder público a respeito da proposta, mas no
que diz respeito às crianças, ainda não foi possível encontrar textos que tratem das
1259

expectativas destas para o ensino fundamental de nove anos.


Bakhtin (1997) considera a linguagem como interlocução histórica, social e
ideológica. Tal concepção aponta para a importância da qualidade das interações verbais
vividas pelas crianças principalmente em instituições educativas, quando se deseja a
crescente ampliação de suas possibilidades discursivas. As narrativas de crianças podem
esboçar um mundo de possiblidades peculiares à linguagem infantil e por meio das
rodas de conversa2, que aparentemente parece um momento simples e informal
poderemos estabelecer quais representações sociais as crianças constroem a cerca de
suas experiências cotidianas.
Autores como Vygotsky (2007), Bakhtin (1997) e Kramer (1995, 2006) com suas
produções, contribuirão para a fundamentação teórica necessária para um maior
entendimento a respeito da abordagem histórico-cultural do desenvolvimento infantil,
sua relação com as políticas educacionais, como também os documentos oficiais que
norteiam a proposta de ensino de nove anos. Bauer
(2002) e Rabelo (2008) darão subsídios para discussão sobre as narrativas. Segundo
Rabelo (2011), a narrativa admite que se compreenda a complexidade das estórias
contadas pelos indivíduos sobre seus conflitos e dilemas vividos, reconstruindo a
experiência vivenciada e dando significação ao sucedido. Contar uma estória é assumir
uma posição moral, pois nossa propensão para organizar a experiência em forma de
narrativa não serve somente para conservar e elaborar uma tradição, mas para
interpretar e “melhorar” o que se passou, promovendo uma nova forma de contar.

Traçado metodológico

Por meio de uma abordagem qualitativa, o lócus da pesquisa se dará em uma


instituição escolar de ensino da rede estadual de São Paulo, em uma sala do primeiro
ano do ensino fundamental, com crianças de seis anos que saíram da educação infantil.
Na tentativa de encontrar respostas para tais inquietações que apareceram no decorrer da
minha prática profissional, formulei a seguinte problemática: O que “pensam” as
crianças que estão entrando no primeiro ano do ensino fundamental com apenas seis
anos de idade?

2
As rodas de conversa serão utilizadas enquanto dispositivos de mediação para a produção de dados, em
que as crianças poderão ficar sentadas no chão em círculo e com a mediação do professor, o diálogo irá se
efetivando de maneira intencional ou não.
1260

Uma vez que anteriormente elas entravam aos sete anos e tendo em vista que
antes da Lei nº 11274/20063, tais crianças estariam matriculadas na educação infantil.
Kramer (2006, p.20) afirma que a “educação infantil e ensino fundamental são
indissociáveis: ambos envolvem conhecimentos e afetos; saberes e valores; cuidados e
atenção; seriedade e riso”. Neste contexto, é de grande relevância que as crianças de
seis anos que estão passando por esta transição entre a educação infantil e o ensino
fundamental, possam ser vistas como sujeitos assistidos como atores sociais, pois estão
implicados e sofrendo o impacto de tais mudanças que ocorrem na atual estrutura
educacional brasileira. Sendo assim, a escolha do tema desta pesquisa, que tem como
objeto, as narrativas de crianças, surgiu durante minha trajetória pessoal e profissional e
pela necessidade de aprofundar estudos e pesquisas, que busco desde a formação na
Pedagogia.
A “roda de conversa” será utilizada enquanto dispositivo de mediação para a
produção dos dados, visto como uma prática educativa essencial no desenvolvimento
das crianças , tem sua importância como um momento privilegiado para a promoção da
socialização, do desenvolvimento de afetividades, de construção de vínculos e de
constituição de sujeitos críticos (autonomia e pensamento divergente) e criativos
(ressignificações). De acordo com Freinet (1991), a livre expressão traz como
fundamento o respeito e a valorização da maneira como cada criança pronuncia o
mundo, seja por meio da fala ou de outras linguagens que compõem suas relações
sociais e culturais (desenho, pintura, escrita, música). Enfatiza o diálogo, considerando a
voz dos alunos e suas necessidades para as ações educativas. Dos princípios de Freinet
(1991, 1998), é interessante mencionar o conceito de livre expressão, pois orienta as
práticas da “roda de conversa”. Minha intenção não é discutir a proposta frenetiana em
sua totalidade, pretende-se a partir de suas ideias, apresentar somente as bases que
compõem a conversação, ou seja, a “roda de conversa” no contexto educativo.

Considerações em aberto

Trata-se de uma pesquisa qualitativa em que os dados serão coletados por meio
de narrativas quando serão utilizadas “rodas de conversa” como dispositivo de
mediação para a produção dos dados. A pesquisa encontra-se em andamento,

3
Lei nº 11274/2006 – Institui o ensino fundamental de nove anos de duração e a inclusão das crianças de
seis anos de idade.
1261

precisamente na revisão de literatura em que cerca de vinte trabalhos publicados


abordam a temática da pesquisa, ou seja, versando a obrigatoriedade do ensino de nove
anos e as perspectivas dos atores em questão. Acredita-se que, por meio das
significações construídas narrativamente pelas crianças participantes, será possível
contribuir com elementos para ampliar a reflexão sobre suas narrativas, possibilitando
que organizem suas experiências e se apropriem de acontecimentos que compõem suas
vivências podendo assim se posicionarem enquanto autores de sua própria história.

Referências

BAUER, Martin W. GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e


som: um manual prático. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. Tradução de Maria Ermantina Galvão


G. Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

BRASIL. Lei n. 11274, de 6 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29, 30, 32
e 87 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino
fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Diário
Oficial [da] União, Brasília, DF, 7 fev. 2006.

Educ. Soc., Campinas, v. 32, n. 114, p. 171-188, jan.- mar. 2011


Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: 17 jun. 2014.

FREINET, C. A Educação do Trabalho. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

________. Pedagogia do Bom Senso. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

FURLANETTO, Ecleide Cunico. Como nasce um professor? : uma reflexão sobre o


processo de individualização e formação. São Paulo: Paulus, 2003.

KRAMER, Sônia. A infância e a sua singularidade. In: Brasil. Ministério da


Educação. Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de
seis anos de idade. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Brasília:
Ministério da educação, 2006.

________. A política do pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce. 5 ed. São Paulo:


Cortez, 1995.

VYGOTSKI, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos


psicológicos superiores. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
1262

Pôster

Edgar Morin na formação do professor de geografia: romper com o pensamento


fragmentado utilizando a literatura como ferramenta para o ensino do espaço
geográfico.

Ana Carolina Robles de Cara Ramos


UNINOVE-SP

Resumo: Este pôster apresenta pesquisa em andamento sobre como o professor de


Geografia pode utilizar a literatura para possibilitar uma aprendizagem do espaço
geográfico. O objetivo é evidenciar a construção do entendimento do espaço geográfico
por meio da relação entre o discurso literário e o geográfico. Propor um estudo
abordando aspectos relevantes à Geografia Cultural e o espaço escrito por João Cabral
de Melo Neto em Morte e Vida Severina. Analisar as categorias geográficas à luz da
poética do escritor João Cabral de Melo Neto, no caso o espaço geográfico delimitado:
o Sertão Nordestino. Buscar um diálogo entre o pensamento complexo e a Geografia
além de evidenciar em que medida Morte e Vida Severina permite um intercâmbio entre
Geografia e Literatura rompendo com o pensamento fragmentado.
Palavras-chave: geografia; literatura; complexidade

1- INTRODUÇÃO

O desejo de realizar esta pesquisa é resultado das minhas andanças, e nisto inclui as
vivências fora e dentro da academia. No meu tempo de criança a literatura era parte do
meu cotidiano. Nessas minhas vivências, a apreciação pelas obras se tornou cada vez
mais intenso e ao entrar na graduação pude perceber que a Geografia se fazia presente
nas histórias e que seria uma possibilidade para ensinar questões que envolviam o
espaço geográfico.
A Geografia, graças ao interesse crescente pela dimensão cultural do espaço
desenvolvido e sistematizado pela Geografia Cultural, repensou vários de seus conceitos
redefinindo o espaço geográfico. A literatura não ficou indiferente às novas perguntas e
respostas formuladas pela Geografia Cultural e se abriu à revisão do espaço literário.
1263

Pretende-se a partir da revisão literária como o conceito de espaço geográfico


mobilizado pela Geografia Cultural pode instrumentalizar a abordagem dos espaços
construídos na obra Morte e Vida Severina a luz do pensamento complexo. A partir das
categorias constitutivas do pensamento de Edgar Morin, a relação Literatura e Geografia
busca romper com o conhecimento fragmentado e reducionista propondo uma
integração e articulação para construção de um saber uno, pautado numa perspectiva de
conjunto.

2-BASE TEÓRICA PARA FORMAÇÃO DO PROFESSOR

Serão apresentadas as obras que servirão de base para formação do professor de


Geografia que irá utilizar a literatura como ferramenta para o ensino do espaço
geográfico. A Geografia brasileira nasceu, ou seja, adquiriu o “status” de ciência na
Universidade de São Paulo em 1934. Mas deve-se a Universidade do Rio de Janeiro os
esforços mais decisivos para integrar esta área do conhecimento às mais modernas
tendências mundiais de abordagem do espaço e da cultura.
Os caminhos seguidos pela Geografia Cultural, iniciada e praticada na Europa há mais
de um século. Na década de 1980, aspectos da cultura eram tratados nos estudos
regionais, mas não como tema central das pesquisas.
Em 1993, na Universidade Estadual do Rio de Janeiro foi criado o Núcleo de Estudos e
Pesquisas sobre Espaço e Cultura, direcionando suas pesquisas para três dimensões:
relações entre espaço e religião, espaço e cultura popular e, espaço e literatura sendo
uma base sólida para os estudos da Geografia Cultural Brasileira.
Parte desta estratégia é realizada pela tradução de textos que fez aumentar a produção de
textos nacionais que tratam da paisagem cultural, espaço geográfico e literatura, que
será objeto desta pesquisa alicerçada nos princípios do pensamento complexo de Edgar
Morin.
O diálogo da geografia com a Literatura tem um dos seus marcos iniciais no livro
Topofilia de Yi-Fu Tuan, publicado em 1974. Ao trabalhar o conceito de topofilia como
a relação amorosa com a terra, Tuan realça a necessidade e a possibilidade de se usar a
literatura nos estudos geográficos, porque ela fornece informações detalhadas sobre
como as pessoas percebem seus mundos.
A relação entre Geografia e Literatura seguem três caminhos: os escritos geográficos
podem ter maior qualidade literária; a literatura pode ser fonte de material para
1264

geógrafos e a literatura pode fornecer uma perspectiva de como as pessoas


experimentam seu mundo.
Quando a literatura trata de temas como espaço, lugar, natureza e ambiente ela pode ser
geográfica, e quando ela apresenta o mundo como ele é percebido pelo homem, ela
amplia a visão científica do geógrafo preocupado com a clareza e a especificidade.
Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro em seu livro O mapa e a trama, publicado em
2002, amplia o estudo do espaço, nos ensaios sobre o conteúdo geográfico de criações
romanescas. Ele entende que a trama, no seu dinamismo, representa a condição humana.
Para que esta condição seja comunicada, a trama, envolvida no espaço, isto é, onde se
desenvolve a ação.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística também lançou, no final de 2006, o
Atlas das Representações Literárias das Regiões Brasileiras, confirmando o empenho,
no Brasil, em aproximar Geografia da literatura.
Há também, esforços de estudiosos da Literatura em dialogar com a Geografia. Entre
eles “O espaço geográfico no romance brasileiro” (1993), composto por cinco
conferências proferidas em evento promovido pela Fundação Casa de Jorge Amado.
Antônio Dimas, em seu livro “Espaço e Romance” (1987), considera o espaço como
integrante de qualquer romance.
Predomina no Brasil abordagem geográfica em romances regionalistas, localizando a
realidade rural. Mas há estudos que ampliam esta abordagem para a poesia e para
realidade urbana.
A Geografia tem se apoderado da arte para explicar o espaço. É plausível que
aprendamos Geografia por intermédio da literatura, um exemplo deste é Morte e Vida
Severina, de João Cabral de Melo Neto, o protagonista percebe o espaço rico
pernambucano, o caminho de Severino é do interior para o litoral.
O leitor encontra esse Severino saindo do sertão, iniciando seu caminho em direção ao
Recife, tentando por cada lugar que passa ficar, trabalhar e viver. É revelado, a fuga da
morte com a busca pela vida porque em todos os lugares por onde Severino passa, tenta
trabalhar prolongando o seu deslocamento e sua travessia existencial.
Dentro do dualismo descrito sobre o rio e a seca, que “neste caminho, até os rios são
severinos. A água é, sem dúvida, elemento central que permeia” Morte e Vida
Severina”, não apenas na sua existência, mas principalmente em sua ausência.
Nesses aspectos, Severino percebe as paisagens por onde passa: vida/morte; seca/água;
cana/cacau; pobreza/riqueza.
1265

Morte e Vida Severina tem como subtítulo “ Auto de Natal pernambucano” e remonta à
transposição do nascimento de Cristo para os manguezais do Recife, atualizado o
gênero e dando ao auto uma nova dimensão estética que se prende ao social e ao
político, denunciando as mazelas do povo.
João Cabral de Melo Neto nasceu na cidade do Recife, estado do Pernambuco, no dia 9
de Janeiro de 1920, ele publica em 1956, dentro de seus textos, um dos poemas mais
geográficos da literatura brasileira, intitulado Morte e Vida Severina.
Nessa obra, o autor descreve a jornada de Severino, que sai do interior do Sertão
brasileiro, passando pelo Agreste, até chegar á zona da Mata. Depara-se com as mais
variadas paisagens e as demonstra pelo caminho, na fala dos personagens. O autor
denuncia a grilagem e o abuso dos grandes nas tomadas das terras.
O poema Morte e Vida Severina, o autor descreve, uma geografia literária, retrata a
vegetação, a hidrografia e o solo do espaço geográfico nordestino.
Para a Geografia, o sertão no Brasil corresponde à vastíssima zona interiorana, podemos
especificar qual o sertão a que se refere, como o sertão nordestino que compõe uma das
grandes áreas de semiaridez da América do Sul.
Muitas perspectivas de análise têm sido propostas para compreender as intensas
transformações do espaço geográfico, entre elas, uma perspectiva baseada na Geografia
Cultural. Destaca-se, nessa abordagem o interesse pela investigação de uma pluralidade
de temas relacionados à literatura e poesia. A geografia Cultural definiu como espaço
geográfico resultante da ação da cultura, ao longo do tempo, sobre a paisagem natural.
O espaço geográfico passou a ser visto como resultado das formas como os homens
organizam sua vida e suas formas de produção. A Geografia concebe a relação entre
natureza e sociedade sob o ponto de vista da apropriação, ou seja, a natureza como
recurso.
O espaço é a categoria central para a Geografia que será desvendado na trama Morte e
Vida Severina, quando este se transforma em espaço literário, ou seja, pano de fundo da
trama.

3-EDGAR MORIN NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE GEOGRAFIA

O Ensino de Geografia tem por objetivo principal levar o educando a compreender a


organização do espaço, ao utilizar da memorização mecânica, a Geografia parece não
fazer sentido para a vida dos alunos. Nessa perspectiva de analise o paradigma da
1266

complexidade busca romper com esse saber compartimentado e busca a construção do


conhecimento a partir de uma abordagem transdisciplinar , ou seja, uma integração dos
saberes proposto pelo uso da literatura como ferramenta para aprender Geografia.
Edgar Morin em seu livro Meus Demônios(2002) afirma que a literatura é a vida
transformada em linguagem. A literatura instaura uma vida paralela. Morin tem total
consciência de que a literatura não é vida, mas é como se fosse. A literatura está entre,
através e além da Geografia.
Edgar Morin eleva a geografia ao status de ciência eminentemente complexa. Em A
Cabeça Bem-Feita (2003), onde propõe uma reformulação dos paradigmas
educacionais, pela complexidade, Morin coloca a geografia como uma daquelas ciências
que já nascem dentro se sistemas complexos de investigação. Ele reconhece que, ao ir
da natureza à cultura, ao transpassar o econômico e o social, “as explicações geográficas
seguem vias que encontram, conectam e interpenetram caminhos e direções múltiplas”
(DANTAS, apud SILVA & GALENO, 2004, p. 237).
A fragmentação é caracterizada pelo ensino compartimentado dos saberes, compondo as
estruturas disciplinares nas quais há uma distinção não só na divisão rígida entre as
disciplinas, como também na hierarquia entre elas.
Dessa forma, o debate sobre inter ou transdisciplinaridade tem sido feito sob o domínio
da disciplina, considerada neste trabalho tanto como estrutura de produção e
transmissão do conhecimento, quanto como estrutura de percepção da realidade.
Há uma inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre os saberes separados,
fragmentados, compartimentados entre disciplinas e, por outro lado, realidades e
problemas cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais,
transnacionais, globais, planetários.
O excesso de especialização levou à necessidade de sua superação e o próprio avanço
do conhecimento gerou novas formas de estruturação que, sem eliminar a disciplina,
buscam superar as fronteiras dos campos de saber. Estruturas, como por exemplo, a
transdisciplinar foi concebida como alternativa à especialização excessiva e
consequente fragmentação do conhecimento científico e do ensino.
As disciplinas têm tendência de estabelecer fronteiras, em função de sua própria
organização, porém a atitude contextualizadora e de ligação dos saberes, não. Seu
objetivo é promover o diálogo entre as disciplinas, para que as mesmas sejam solidárias
entre si. Ao promover esse diálogo gera-se a desorganização da organização disciplinar
e uma nova organização de um todo do conhecimento.
1267

Nesse sentido, a proposta de transdisciplinaridade pode ser um bom caminho para a


ligação dos saberes, pois não visa apenas relacionar saberes separados por conta da
divisão disciplinar, nem é um novo modo de organizá-los uns ao lado dos outros. A
transdisciplinaridade nos remete ao que está entre, através e além das disciplinas
ultrapassando “as fronteiras do isolamento e do reducionismo do saber, que o fragmenta
e o inibe” (PETRAGLIA, 1995, p.16), evitando assim que a aprendizagem se torne
fragmentada, dispersa, sem sentido e, portanto, desinteressante.
Trata-se de pensar globalmente vendo as relações que estão nas coisas, na realidade, nos
acontecimentos e vendo, ao mesmo tempo, nos vários saberes, os pontos de intersecção
que nos ajudam na compreensão mais alargada da
complexidade do real, nos termos em que Morin entende complexidade: aquilo que é
construído junto nos seus laços, nas suas ligações, na sua tessitura. Morin diz que
complexo quer dizer aquilo que é “tecido junto”. Ele diz sobre o pensamento complexo:
“É o pensamento capaz de reunir (complexus: aquilo que é tecido conjuntamente), de
contextualizar, de globalizar, mas ao mesmo tempo, capaz de reconhecer o singular, o
individual, o concreto.” (MORIN; MOIGNE, 2000, p.207).
Pensar o complexo significa ser capaz de unir conceitos divergentes, de pensar o
contraditório, de construir, desconstruir e depois reconstruir algo novo.
O pensamento complexo reconhece que nem todas as coisas são antagônicas, mas, sim,
complementares. É por isso que Morin procura restituir um "conhecimento que se
encontra adormecido", reagrupando unidade e diversidade, diferentemente da
mentalidade clássica que quando surgia uma contradição no interior de uma
argumentação, esta era considerada como indicativa de erro. Isso significava retornar e
construir uma nova argumentação. “Como modo de pensar, o pensamento complexo se
cria e se recria no próprio caminhar”. (MORIN, CIURANA e MOTTA, 2003, p. 52).
O pensamento complexo tenta promover a religação dos saberes reconhecendo
criticamente aquilo que se perde em função da fragmentação, simplificação e redução
do saber. Um modelo de educação que tiver por objetivo compreender a realidade
através de uma concepção que procure ver o todo e as relações das partes nesse todo,
como a concepção complexa, estará colaborando para construção de sujeitos mais
críticos e dispostos a intervir em sua realidade.
Como diz Edgar Morin, serão conhecimentos “abraçados juntos”, entrelaçados,
complexos, pois é este o sentido desta palavra que indica uma nova forma de pensar
que, por sua vez, indica o caminho da transdisciplinaridade. Nesse sentido, o ensino
1268

transdisciplinar não se restringe à simples reunião das disciplinas ou à possibilidade de


haver diálogo entre duas ou mais, proposto neste trabalho pelo uso da literatura para
aprender Geografia.

4-REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKHTIN, Mikhail. Questões de Literatura e Estética. São Paulo: Hucitec, Ed.


UNESP, 1988.

CORREA, Roberto, L & ROSENDAHL, Z. (Org) Introdução à Geografia Cultural.


Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.

________________. “Geografia cultural: passado e Futuro: uma introdução”. In:


CORRÊA, R.L. et al . Manifestações da Cultura no Espaço. Rio de Janeiro: EdUERJ,
1999.

CLAVAL, P. A geografia cultural: o estado da arte. In: CORRÊA, R.L. et al. (org.).
Manifestações da Cultura no Espaço. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1999

__________. As abordagens da Geografia Cultural. In: INÁ Elias de Castro et al


(Org). Explorações Geográficas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997.

__________. A Geografia Cultural. Florianópolis: EdUFSC, 1995.

DANTAS, Eugênia Maria. Caminhos de uma Geografia Complexa. In. SILVA, Aldo
A. Dantas da; GALENO, Alex (Org.). Geografia: ciência do complexus: ensaios
interdisciplinares. Porto Alegre: Sulina, 2004.

MARANDOLA, Janaina de Alencar e Silva. Caminhos de morte e de vida: o rio


Severino de João Cabral de Melo Neto. 2007. 133 f. Dissertação (Mestrado em
Geografia) – Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual
Paulista, Rio Claro, 2007.

MARANDOLA JR., E.; GRATÃO, L. H. B. Geografia, poética e imaginação. In:


MARANDOLA JR., E.; GRATÃO, L. H. B. Geografia & Literatura: Ensaios sobre
geograficidade, poética e imaginação. Londrina: EDUEL, 2010.

MORIN, E.; LE MOIGNE, J.L., A inteligência da complexidade. São Paulo.


Peirópolis, 2000.

______; CIURANA, E. R.; MOTTA, R. D. Educar na era planetária: o pensamento


complexo como método de aprendizagem no erro e na incerteza humana. São
Paulo: Cortez Editora, 2003.

______; Educação e complexidade: sete saberes e outros ensaios. ALMEIDA, M. da


C.; CARVALHO, E. de A. (Orgs.). 3 ed. São Paulo: Cortez, 2005.
1269

PETRAGLIA, I. Edgar Morin: a educação e a complexidade do ser e do saber.


Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

MORIN, Edgar. A cabeça bem feita. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.

__________.Meus demônios. São Paulo: Bertrand Brasil; 2000.

__________.Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Sulina; 2006

SAUER. C. Geografia Cultural. In: CORRÊA, R.L. et al. (Org.) Introdução a


Geografia cultural. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.
1270

Pôster

Formação inicial de professores e práticas gestoras de formação docente em


serviço

Ana Maria Falsarella


Centro Universitário de Araraquara/Uniara
Mestrado Profissional em Processos de Ensino, Gestão e Inovação
Grupo de Pesquisa “Organização e Gestão de Instituições Educacionais”

Resumo: A pesquisa aqui apresentada, ainda em andamento, tem como justificativa a


importância de aprofundar estudos sobre o impacto da formação inicial dos professores
no trabalho das equipes gestoras das escolas, visando o melhor desempenho dos alunos.
Isso porque uma das críticas à baixa efetividade da educação brasileira se refere à
precária formação docente. De um lado, a formação inicial seria aligeirada e superficial.
De outro, haveria pouco empenho das equipes gestoras das escolas na formação
continuada em serviço. Dessa crítica surgiu nossa indagação: A formação docente
inicial tem repercussões na prática gestora de formação continuada em serviço? E essa
indagação levou-nos à formulação das seguintes hipóteses: 1ª. Pressões dos sistemas
sobre a escola levam a equipe gestora a investir na formação docente em serviço, o que
é insuficiente para chegar aos resultados esperados pelo sistema; 2ª. A ocorrência de
mudanças nas práticas docentes responde mais à cultura da escola do que às propostas
das políticas educacionais. Nosso objetivo é estudar as relações entre a formação inicial
docente e práticas gestoras de formação em serviço. Para responder à indagação, testar
as hipóteses aventadas e atender ao objetivo proposto, estamos desenvolvendo pesquisa
de cunho quali-quantitativo, com trabalho de campo em cinco escolas públicas que
trabalham com Ensino Fundamental I, tendo por instrumentos entrevistas com equipes
docentes e questionários para professores. A pesquisa de campo é acompanhada de
estudos bibliográficos sobre o tema e da coleta, em ambiente digital, de dados
quantitativos sobre indicadores educacionais das escolas. Das etapas previstas para a
pesquisa, estamos (maio/2014) na de coleta de dados de campo. Para análise dos
resultados, nosso principal referencial teórico advirá dos seguintes autores: Ball (2004,
2005), Elias (1999), Certeau (2001), Fullan e Hargreaves (2000) e Nóvoa (1992, 1999).
1271

A pesquisa é financiada pela Fundação Nacional de Desenvolvimento do Ensino


Superior Particular (FUNADESP).
Palavras-chaves: política pública de formação docente; práticas gestoras de formação
continuada; cultura escolar.

Apresentação

O que motivou esta pesquisa, ainda em andamento, foi a constatação de que uma
das críticas ao mau desempenho escolar dos alunos brasileiros se relaciona à precária
formação docente, tanto a inicial quanto a continuada. De um lado, os cursos de
pedagogia ofereceriam uma formação aligeirada e pouco profunda. De outro, as equipes
gestoras das escolas não se empenhariam o suficiente na formação dos professores em
seu lócus de trabalho. Dessa crítica surgiu nossa indagação: A formação docente inicial
tem repercussões na prática gestora de formação continuada em serviço dos
professores? Essa indagação levou-nos à formulação das seguintes hipóteses:
1ª. Em função de pressões dos sistemas, as equipes gestoras das escolas buscam
investir na formação docente em serviço, mas isso é insuficiente alcançar os resultados
ditados pelos sistemas;
2ª. Mudanças nas práticas docentes ocorrem, mas elas respondem mais à cultura
da escola do que a propostas das políticas educacionais.

Objetivos

O objetivo geral é estudar as relações entre a formação inicial docente e as


práticas gestoras de formação em serviço.
São objetivos específicos:
a) Levantar informações sobre a formação inicial docente e apreciações sobre
qualidade e adequação dos cursos;
b) Identificar a percepção dos docentes sobre a relação entre os estudos
desenvolvidos na formação inicial, o exercício concreto da docência e a formação
continuada na escola;
c) Identificar a percepção da equipe gestora sobre a formação inicial dos
professores e as repercussões dessa formação em seu trabalho.
1272

Roteiro de organização

Para organizar a pesquisa, elaboramos o roteiro (Quadro I, Roteiro de


Organização da Pesquisa). Estamos cientes de que, em sua concretização, ele está
sujeito a mudanças. É um rumo, não uma limitação ao movimento da pesquisa, em que
as etapas se entrelaçam, não são lineares.

Quadro I – Roteiro de Organização da Pesquisa


Resumo. Sumário.
Introdução:
a) Escolha do tema;
b) Delimitação do problema;
c) Justificação da relevância;
d) Objetivos geral e específicos;
e) Apresentação das hipóteses;
f) Apresentação de cada parte componente do texto.
A. Percurso metodológico:
a) Indicação dos procedimentos metodológicos;
b) Delimitação do universo de pesquisa e seleção da amostra;
c) Descrição dos instrumentos de pesquisa e de avaliação dos instrumentos;
d) Validação dos instrumentos: estudo preliminar.
B. Revisão da literatura:
a) pesquisas afins;
b) quadro teórico referencial.
C. Coleta dos dados: desenvolvimento da pesquisa de campo.
D. Resultados:
a) Elaboração de instrumentos de organização dos dados;
b) Inserção dos dados.
E. Discussão: análise dos dados à luz do quadro teórico.
Considerações finais. Referências. Anexos.

Percurso metodológico

Trata-se de pesquisa quali-quantitativa, com foco na perspectiva dos atores


internos à instituição. A amostra é composta por 05 escolas públicas urbanas do estado
de São Paulo, selecionadas por diversidade de localização e de rede de pertencimento.
1273

Os procedimentos envolvem pesquisa de campo, bibliográfica e em meio digital. São


instrumentos da pesquisa de campo:
a) roteiros para entrevistas semiestruturadas com equipes gestoras;
b) questionários estruturados para 10 professores de cada escola.
Está prevista, ainda, a elaboração do perfil das escolas, considerando contexto
externo, indicadores educacionais, condições sistêmicas, organização interna e quadro
de pessoal. Para a organização, categorização e inserção dos dados coletados será
organizado instrumento específico. A pesquisa bibliográfica para apoiar a análise dos
resultados envolve exploração de trabalhos científicos existentes (teses, dissertações,
comunicações, artigos) e de referencial teórico pertinente. A pesquisa digital se volta ao
apoio na seleção da amostra e à coleta dos indicadores educacionais externos.
O percurso de investigação foi organizado tendo por fundamento o livro
“Investigação por questionário” (Hill e Hill, 2012). Para os autores, todas as ciências
naturais e sociais têm por base a empiria porque a observação empírica é a base para a
construção de explicações adequadas para os problemas em estudo. A natureza da
investigação empírica pode ser comparada a uma viagem de ida e volta que começa no
“País Teórico, chega ao País Prático e termina mais uma vez no País Teórico” (HILL e
HILL, 2012, p. 21). Tal como uma viagem, uma investigação empírica requer
planejamento, a começar pelos objetivos, demanda opções (do tema, das hipóteses, dos
métodos) e que o pesquisador pense adiante, ou seja, pense como fará a análise dos dados
antes mesmo de coletá-los.

Referencial teórico

A seleção do referencial teórico incide sobre autores que exploram conceitos


inter-relacionados – conforme as palavras-chaves propostas (política pública de
formação docente; práticas gestoras de formação continuada; cultura escolar) – os quais
expomos brevemente.
Ao fazer a inversão de perspectiva na reflexão sobre o que constitui a cultura
numa sociedade, deslocando a atenção do consumo supostamente passivo de produtos
para a criatividade dos consumidores no uso desses produtos, Certeau (2001) tece uma
teoria das práticas cotidianas. No presente estudo, consideramos que as equipes
escolares seriam “consumidoras não passivas” das políticas educacionais propostas
pelos sistemas.
1274

Elias (1994) assinala os padrões mutáveis de interdependência entre indivíduos


e sociedade e a repercussão desses padrões dentro dos grupos sociais, a partir dos
conceitos de configuração, interdependência, jogo, poder e movimento. Entendemos
que tais elementos, aplicados às questões educacionais, possibilitam ampliar o
entendimento sobre as relações sociais que acontecem na escola.
Fullan e Hargreaves (2000) destacam a importância de as equipes escolares
pensarem a escola em profundidade, de modo a levar à formação de uma cultura
cooperativa e à construção de um ambiente de aprendizagem rico e desafiador a alunos
e educadores.
Nóvoa (1992, 1999) destaca o caráter positivo da resistência à importação de
categorias de análise do mundo econômico, bem como ao esvaziamento das dimensões
pessoais, simbólicas e políticas do campo educativo, na medida em que impede “uma
transferência acrítica e redutora das perspectivas organizacionais para o espaço escolar”
(NÓVOA, 1999, p.16), frente à especificidade própria da ação educativa.
Ball (2004, 2005) apresenta dois conceitos – performatividade e gerencialismo –
que representam tecnologias das políticas de reforma do setor público. No setor
educacional tais tecnologias são voltadas a introduzir novas formas de regulação no
trabalho das escolas, levando ao surgimento de novos modelos identitários de professor
e de gestor. Na “cultura performativa ou do desempenho”, cuja força motriz é a busca
permanente pela excelência, as pessoas são valorizadas por sua produtividade, inibindo-
se outros valores, como, justiça social, equidade, tolerância, cooperação. Cabe ao
“gerente” (diretor, coordenador pedagógico) incutir tal cultura na subjetividade dos
“trabalhadores” (os professores).

Resultados esperados

a) Obter retorno de 80% dos questionários para professores e realizar entrevistas


com as cinco equipes gestoras;
b) Organizar e categorizar os dados e levantar indicadores que possibilitem
estabelecer (ou não) a correlação entre a formação inicial de professores de Ensino
Fundamental I e a organização da formação continuada na escola.
1275

Ações já desenvolvidas

Em direção ao atingimento dos objetivos propostos, no momento atual


(julho/2014) já foram desenvolvidas as seguintes ações: detalhamento do plano inicial;
estudos teóricos relativos às referências bibliográficas; revisão da literatura (teses,
dissertações, comunicações); elaboração de resumos/resenhas da revisão bibliográfica;
início da redação do corpus da pesquisa; contato com três escolas e diretorias de ensino
do município de São Paulo; mapeamento de escolas da região de Araraquara;
elaboração de instrumentos de pesquisa (Ficha de Caracterização da Escola,
Questionário para Professores, Roteiro para Entrevista com Equipe Gestora, Quadro de
Avaliação do Instrumento pelos Participantes) e de outros aportes necessários
(Apresentação do Estudo às Escolas, Requerimentos de Solicitação de Autorização aos
diretores das escolas e aos dirigentes das diretorias de ensino); pré-testagem dos
instrumentos; pesquisa de campo nas três escolas da cidade de São Paulo.

Produção científica decorrente dos estudos realizados

A partir do início dos estudos para a realização da presente pesquisa,


decorreram, de nossa parte, publicações e participações em eventos científicos.
a) Publicações: foram encaminhados, aceitos e publicados em revistas especializadas
três artigos de nossa autoria:
1o. “Formação continuada de professores e elaboração do Projeto Pedagógico da
escola”. (Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, v.8, n.1, 2013);
2o. “O gestor em meio a discursos contraditórios: formação docente e desempenho dos
alunos” (Colabor@ Revista Digital, vol.8, n.30, 2013);
3o. “A organização e a gestão da escola: um olhar a partir dos estudos de Norbert Elias”
(Revista Uniara, v.16, n.2, dez.2013, p.111-117).
Também foram aceitos, mas ainda não publicados:
1o. “O lugar da pesquisa qualitativa na avaliação de políticas e programas sociais”
(Revista da Avaliação da Educação Superior).
2o . “Repercussões das políticas educacionais no âmbito escolar” (Revista
Meta:Avaliação).
b) Participação em eventos com apresentação de trabalho: relacionada a essa
pesquisa, nossa participação se deu nos seguintes eventos:
1276

1º. II Workshop dos Grupos de Pesquisa da Área de Educação da UNIARA, com a


apresentação deste Projeto. (Araraquara, Uniara, 17/05/2013);
2º. VIII EIDE (Encuentro Iberoamericano de Educación), com a comunicação
“Processos de mudança, prática gestora e formação docente”. (Araraquara, Unesp, 13-
16/11/2013).

Resultados preliminares

Já desenvolvemos o trabalho de campo em três das cinco escolas previstas.


Obtivemos a participação de todos os professores presentes (em horário de trabalho
coletivo previamente agendado), totalizando 29 questionários respondidos. Os dados
que coletamos ainda não permitem conclusões finais. Dessa forma, para tecer algumas
considerações preliminares, tomaremos apenas dois aspectos observados até agora. O
primeiro se refere aos professores. Ante à questão “As reuniões pedagógicas e de
trabalho coletivo têm repercussões no trabalho que você desenvolve em sala de aula?
Justifique sua resposta”, as respostas, ao contrário do que imaginamos, foram positivas
para 25 deles (86%), que consideram produtivos esses encontros principalmente porque
possibilitam a troca de experiências e o esclarecimento de dúvidas.
O segundo se refere às equipes gestoras das escolas. Embora não tenhamos
observado discordâncias explícitas, também não notamos, a princípio, uma efetiva
integração entre os membros das equipes. Um indicador disto é que não conseguimos
entrevistar, em nenhuma das escolas, todos os componentes reunidos. Na primeira
escola, a diretora nos atendeu antes. Em separado, o coordenador pedagógico, depois de
muita insistência de nossa parte, concordou em responder às questões. Na segunda
escola, apenas a coordenadora pedagógica foi entrevistada, pois a diretora, embora
presente, não quis participar porque “a formação de professores é com o coordenador”.
Por fim, na terceira escola, a diretora, embora tenha participado do pré-teste do
instrumento, na ocasião de nossa visita de campo encontrava-se em licença médica,
sendo que apenas uma coordenadora foi a entrevistada. Ora, não querendo tirar
nenhuma conclusão precipitada, pois conclusões só serão possíveis ao término da
investigação, podemos ponderar que, se entendemos que a formação em serviço visa
exatamente a coesão do grupo-escola em torno de objetivos comuns, é de esperar que
essa coesão comece a se formar com a integração dos membros da equipe gestora.
1277

Considerações finais

O presente estudo se dá em continuidade a outros estudos por nós desenvolvidos


em função de nossa experiência como profissional de carreira no ensino público
municipal de São Paulo, como docente universitária e como formadora em cursos de
formação continuada para professores e gestores de escolas e de sistemas, inclusive na
elaboração de publicações a respeito. Conta-se também nossa participação em
pesquisas coletivas e o desenvolvimento de pesquisas individuais, incluindo-se a
elaboração de monografia em curso de especialização em psicopedagogia, de
dissertação de mestrado e tese de doutorado e a apresentação de trabalhos em
congressos, simpósios e eventos congêneres.
Nosso interesse maior de investigação tem sido a escola analisada da perspectiva
de seus atores internos. Assim, a maior parte de nosso trabalho envolve pesquisa de
campo e volta-se à confluência de áreas estreitamente interligadas: política educacional,
formação docente, gestão educacional e avaliação escolar.
Este projeto de pesquisa foi aprovado pelo Centro Universitário de Araraquara
(Uniara). Faz parte dos estudos desenvolvidos pelos docentes do Mestrado Profissional
em Processos de Ensino, Gestão e Inovação, dessa instituição. É financiado pela
Fundação Nacional de Desenvolvimento do Ensino Superior Particular (Funadesp).
Atualmente, encontra-se em fase de inserção na Plataforma Brasil, sistema eletrônico
criado pelo Governo Federal para sistematizar o recebimento de projetos de pesquisa
que envolvem serem humanos nos Comitês de Ética em todo o país.

Referências

BALL, Stephen J. Performatividade, privatização e pós-estado do bem-estar. Educação


e Sociedade, Campinas-SP, vol. 25, n. 89, p. 1105-1126, Set./Dez. 2004.

_________. Profissionalismo, gerencialismo e performatividade. Cadernos de


Pesquisa, São Paulo, v. 35, n.126, p. 539-564, set./dez. 2005.

CERTEAU, M. A invenção do cotidiano, v.1-Artes de Fazer. Apresentação GIARD,


L. Petrópolis-RJ: Vozes, 2001.

ELIAS, Norbert. O conceito de configuração. In: Introdução à Sociologia. Lisboa:


Edições 70, 1999, p. 140-145.
1278

FULLAN, M.; HARGREAVES, A. A escola como organização aprendente –


buscando uma educação de qualidade. Porto Alegre: Artmed, 2000.
HILL, Manuela M. e HILL, Andrew. Investigação por questionário. Lisboa: Sílabo,
2012.

NÓVOA, A. (coord.). Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.


1279

Pôster

Inclusão escolar: o que pensam os professores? Uma análise do município de Rio


Claro - SP

Ana Paula Abdalla


Mestrado em Educação,
UNESP– Campus Rio Claro

Resumo: A educação inclusiva assume espaço central no debate acerca da sociedade


contemporânea e do papel da escola na superação da lógica da exclusão. O professor do
ensino regular, que trabalha com o ensino fundamental, recebe em sua sala, crianças
com necessidades educacionais especiais. Muitas vezes, o educador não sabe como lidar
com este aluno. Diante disso, os professores estão submetidos a um crescente discurso
acerca da inclusão educacional e que, por isso, produzem e incorporam coletivamente
pensamentos e representações sobre essas questões que acabam por orientar seus
comportamentos no cotidiano escolar. Conhecer como os professores da educação
básica estão produzindo representações acerca da inclusão reforça a necessidade de
aprender com esses discursos os possíveis entraves e também os caminhos propostos em
prol de uma proposta verdadeiramente inclusiva.
Palavras-chave: Representações, Educação Inclusiva, Educação Básica.

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho1 tem por objetivo geral conhecer e analisar as representações de


um grupo de cinco professores do ensino fundamental - etapa I -, acerca da inclusão de
alunos com necessidades educacionais especiais nas classes comuns de ensino regular.
Os objetivos específicos da pesquisa são: a) levantar dados relativos à inclusão no
município de Rio Claro. b) analisar quais são as representações de um grupo de
professores do município, a fim de compreender como está acontecendo à inclusão
destes alunos nas classes comuns de ensino regular. c) discutir a questão da inclusão na
Educação Básica.

1
Este trabalho faz parte da pesquisa da dissertação de mestrado em andamento.
1280

O movimento mundial pela inclusão é uma ação política, cultural, social e


pedagógica, desencadeada em defesa do direito de todos os alunos de estarem juntos,
aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação. A educação inclusiva
constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos,
que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação
à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da
exclusão dentro e fora da escola (BRASIL, 2008). Ao reconhecer que as dificuldades
enfrentadas nos sistemas de ensino evidenciam a necessidade de confrontar as práticas
discriminatórias e criar alternativas para superá-las, a educação inclusiva assume espaço
central no debate acerca da sociedade contemporânea e do papel da escola na superação
da lógica da exclusão.
Somente no ano de 1961, o atendimento educacional às pessoas com deficiência
passa ser fundamentado pelas disposições da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, que aponta o direito dos “excepcionais” à educação, preferencialmente dentro
do sistema geral de ensino (BRASIL, 2008). Começa-se então a pensar na educação
inclusiva dentro do sistema regular de ensino.
Em 1973, o Ministério da Educação e Cultura cria o Centro Nacional de
Educação Especial – CENESP, responsável pela gerência da educação especial no
Brasil, que, sob a égide integracionista, impulsionou ações educacionais voltadas às
pessoas com deficiência e às pessoas com superdotação, mas ainda configuradas por
campanhas assistenciais e iniciativas isoladas do Estado (BRASIL, 2008).
Dos documentos importantes no cenário nacional que legislam sobre a inclusão
podemos citar a Constituição Federal de 1988, nos artigos 206 e 208; o Estatuto da
Criança e do Adolescente – Lei n. 8.069 de 13/07/1990; a Política Nacional de
Educação Especial (MEC/SEESP, 1994); as Diretrizes Nacionais para a Educação
Especial na Educação Básica (Resolução CNE/CEB n. 2, de 11 de setembro de 2001)
(BRASIL, 2001), a Lei n. 10.436, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais –
Libras (24 de abril de 2002); o Plano Nacional de Educação – Educação Especial
MEC/SEESP 2000 (BRASIL, 2000); a nova Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2007); e o Decreto 6.571, de 17 de
setembro de 2008 (BRASIL, 2008), que regulamenta o atendimento educacional
especializado (ALMEIDA, NAIFF, 2011).
Em 1994, surge em âmbito internacional, um importante marco para a
implantação da inclusão educacional, a Declaração de Salamanca. A Declaração traz
1281

princípios, políticas e práticas na área das necessidades educativas especiais e o


documento assegura que a educação de pessoas com deficiências seja parte integrante
do sistema educacional (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994).
Nesses documentos, é possível observar algumas orientações gerais para as
escolas e para a formação de professores, tais como:
- O atendimento educacional especializado aos alunos com necessidades
educacionais especiais deve ser preferencialmente oferecido na rede regular de
educação básica e o acesso ao ensino obrigatório é gratuito, direito público e subjetivo.
- Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular,
para atender às peculiaridades da clientela de educação especial.
- O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços
especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for
possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular.
- Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais:
currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específica, para atender
às suas necessidades; terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o
nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências,
e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;
professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento
especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração
desses educandos nas classes comuns.
- Deverão ser tomadas as medidas necessárias para conseguir a mesma política
integradora de jovens e adultos com necessidades especiais, no ensino secundário e
superior, assim como nos programas de formação profissional.
- Os administradores locais e os diretores de estabelecimentos escolares devem
ser convidados a criar procedimentos mais flexíveis de gestão, a remanejar os recursos
pedagógicos, diversificar as opções educativas, estabelecer relações com pais e a
comunidade.
- O corpo docente, e não cada professor deverá partilhar a responsabilidade do
ensino ministrado a crianças com necessidades especiais.
- Aos professores que já estão exercendo o magistério devem ser oferecidas
oportunidades de formação continuada, inclusive em nível de especialização, pelas
instâncias educacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
1282

Complementando as leis e decretos em defesa da Educação Inclusiva, muito


importantes para o início do “se pensar” a inclusão e começarmos a trilhar o caminho
para sua tão esperada efetivação, Almeida e Naiff (2011), afirmam que outra grande
marca do processo de inclusão é o crescente processo de “extinção” das escolas
especiais, salas de aceleração e, afinal, de todos os serviços segregados oferecidos à
pessoa diferente. A partir daí, começou-se a desenhar um modelo de escola para todos
que respeite o ser humano com sua diversidade. Mas, há muitos desafios a serem
enfrentados, pois, o sistema educacional brasileiro necessita passar por reformas para
atender aos princípios deste novo paradigma educacional.

2. A INCLUSÃO E AS REPRESENTAÇÕES DOS PROFESSORES

Mantoan (2001) observa que a inclusão, como consequência de um ensino de


qualidade para todos os alunos provoca e exige da escola brasileira novos
posicionamentos e é um motivo a mais para que o ensino se modernize e para que os
professores aperfeiçoem as suas práticas. É uma inovação que implica num esforço de
atualização e reestruturação das condições atuais da maioria de nossas escolas de nível
básico, pois o professor do ensino regular, que trabalha com o ensino fundamental,
recebe em sua sala, crianças com necessidades educacionais especiais e muitas vezes, o
educador não sabe como lidar com este aluno.
Para Almeida e Naiff (2011), os educadores têm sentimentos de despreparo para
trabalharem junto às crianças com necessidades especiais, pois, eles foram preparados
para trabalharem com as crianças que “aprendem”; assim, quando se deparam com as
limitações na aprendizagem, sentem frustração, angústia, impotência e medo. Tudo isso
resulta em dificuldade no trabalho inclusivo.
As escolas que não estão atendendo alunos com deficiência em suas turmas
regulares se justificam, na maioria das vezes pelo despreparo dos seus
professores para esse fim. Existem também as que não acreditam nos
benefícios que esses alunos poderão tirar da nova situação, especialmente os
casos mais graves, pois não teriam condições de acompanhar os avanços dos
demais colegas e seriam ainda mais marginalizados e discriminados do que
nas classes e escolas especiais (MANTOAN, 2001, pág. 4).

Essa nova perspectiva de educação, a inclusiva, que trabalha a incorporação das


crianças no ensino regular, reconhecendo a existência de múltiplas diferenças, provoca
questionamentos sobre o papel do professor na construção de uma nova abordagem
1283

pedagógica, que direcione o ensino à necessidade dos alunos (SMEHA, FERREIRA,


2008).
Diante de novos desafios e novas exigências, Almeida e Naiff (2011) afirmam
que os professores estão submetidos a um crescente discurso acerca da inclusão
educacional e que, por isso, produzem coletivamente pensamentos e representações
sobre essas questões que acabam por orientar seus comportamentos no cotidiano
escolar.
O uso da Teoria das Representações se faz oportuna, pois, ela designa o
conhecimento produzido pelo senso comum marcado por processos generativos e
funcionais sociais e culturalmente. Portanto, não podemos falar em representações sem
considerá-las como emergentes na dimensão simbólica da sociedade, tendo como
objetivo final a apropriação cognitiva dos conteúdos sociais desconhecidos ou pouco
acessíveis (MOSCOVICI, 2005).
Cada um de nós está obviamente cercado, tanto individualmente como
coletivamente, por palavras, ideias e imagens que penetram nossos olhos,
nossos ouvidos e nossa mente, quer queiramos quer não e que nos atingem,
sem que o saibamos, do mesmo modo que milhares de mensagens enviadas
por ondas eletromagnéticas circulam no ar sem que as vejamos e se tornam
palavras em um receptor de telefone, ou se tornam imagens na tela da
televisão (MOSCOVICI, 2005, pág. 33).

Todas as interações humanas, sejam elas entre duas pessoas ou entre dois
grupos, pressupõem representações (MOSCOVICI, 2005) e conhecer como os
professores da educação básica estão produzindo representações sociais (ALMEIDA E
NAIFF, 2011) acerca da inclusão reforça a necessidade de aprender com esses discursos
os possíveis entraves e também os caminhos propostos em prol de uma proposta
verdadeiramente inclusiva.

3. CONSIDERAÇÕES INICIAIS...

A Convenção da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre os Direitos das


Pessoas com Deficiência foi incorporada à legislação brasileira em 2008. O Brasil
decidiu ratificá-la com equivalência de emenda constitucional, e quando o fez,
reconheceu um instrumento que gera maior respeito aos Direitos Humanos. A
Convenção e seu Protocolo Facultativo são uma referência essencial para o País:
construir um Brasil com acessibilidade, no sentido mais amplo desse conceito;
conscientes de que hoje não é o limite individual que determina a deficiência, mas sim
as barreiras existentes nos espaços, no meio físico, no transporte, na informação, na
1284

comunicação e nos serviços educacionais (BRASIL, 2011).


Com relação à questão primordial da Inclusão, que é o direito de todos á
Educação e a participação social, a Convenção traz os seguintes tratados:

Relembrando os princípios consagrados na Carta das Nações Unidas, que


reconhecem a dignidade e o valor inerentes e os direitos iguais e inalienáveis
de todos os membros da família humana como o fundamento da liberdade, da
justiça e da paz no mundo.
Reafirmando a universalidade, a indivisibilidade, a interdependência e a
inter-relação de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, bem
como a necessidade de garantir que todas as pessoas com deficiência os
exerçam plenamente, sem discriminação..
Preocupados com o fato de que, não obstante esses diversos instrumentos e
compromissos, as pessoas com deficiência continuam a enfrentar barreiras
contra sua participação como membros iguais da sociedade e violações de
seus direitos humanos em todas as partes do mundo.
Reconhecendo que as crianças com deficiência devem gozar plenamente de
todos os direitos humanos e liberdades fundamentais em igualdade de
oportunidades com as outras crianças e relembrando as obrigações assumidas
com esse fim pelos Estados Partes na Convenção sobre os Direitos da
Criança.
Reconhecendo a importância da acessibilidade aos meios físico, social,
econômico e cultural, à saúde, à educação e à informação e comunicação,
para possibilitar às pessoas com deficiência o pleno gozo de todos os direitos
humanos e liberdades fundamentais (BRASIL, 2001, pág. 21 – 25, grifo
nosso).

Para assegurar estes direitos fundamentais e entender o sistema educacional


inclusivo, principalmente o ensino fundamental, nível de escolaridade obrigatório para
todos, que é o que mais parece ter sido atingido pela inclusão escolar (MANTOAN,
2004), uma análise dessa etapa da educação básica é importante, para entendermos a
razão de tanta dificuldade e perplexidade diante da inclusão, especialmente quando o
inserido é um aluno com deficiência.
Segundo dados do MEC/SEESP (2008), o número de matrículas do Censo
Escolar/2006, na educação especial, registram a evolução de 337.326 matrículas em
1998 para 700.624 em 2006, expressando um crescimento de 107%. No que se refere à
inclusão em classes comuns do ensino regular, o crescimento é de 640%, passando de
43.923 alunos incluídos em 1998, para 325.316 alunos incluídos em 2006.
Com o desenvolvimento de políticas de educação inclusiva, evidencia-se um
crescimento de 146% das matrículas nas escolas públicas, que passaram de 179.364
(53,2%) em 1998, para 441.155 (63%) em 2006.
Com relação à distribuição das matrículas por etapa e nível de ensino, em 2006:
112.988 (16%) são na educação infantil, 466.155 (66,5%) no ensino fundamental,
1285

14.150 (2%) no ensino médio, 58.420 (8,3%) na educação de jovens e adultos, 46.949
(6,7%) na educação profissional (básico) e 1.962 (0,28%) na educação profissional
(técnico).
Foi realizado o contato com a Secretaria Municipal de Educação de Rio Claro -
SP, onde disponibilizou - se para a pesquisadora a lista de escolas do Ensino
Fundamental - Etapa I da rede, com a quantidade de alunos sem NEE e a quantidade dos
alunos com NEE. De acordo com o censo escolar de 2014, há 10.103 alunos
matriculados do 1° ao 5° ano. Destes, 308 alunos possuem uma necessidade educacional
especial.
Diante disso, consideramos de extrema importância sabermos quais são as
concepções e representações dos professores da rede municipal de Rio Claro - SP que
vivenciam o cotidiano da escola acerca da inclusão escolar e se essas orientam sua
prática docente, visto que o número de matrículas de alunos com NEE (necessidades
educacionais especiais) é cada vez maior nas Instituições públicas de ensino e no ensino
fundamental.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, S. A. de & NAIFF, L. A. M. Inclusão Educacional nas Representações


Sociais de Professores e Estudantes de Magistério. Pesquisas e Práticas Psicossociais
6(1), São João Del-Rei, janeiro/julho 2011.

BRASIL. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: Protocolo


Facultativo à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: decreto
legislativo nº 186, de 09 de julho de 2008: decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. 4.
ed., rev. e atual. – Brasília: Secretaria de Direitos Humanos, Secretaria Nacional de
Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, 2011.

BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na


Educação Básica. Secretaria de Educação Especial – MEC; SEESP, 2001.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política nacional


de educação especial na perspectiva da educação inclusiva. Brasília. 2008.
Disponível em <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf>. Acesso
em 18 set 2013.

UNESCO. Declaração de Salamanca: Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área


das Necessidades Educativas Especiais, 1994. Disponível em
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf>. Acesso em 18 set 2013.

MOSCOVICI, Serge. Representações sociais: investigações em psicologia social. Ed


Petrópolis, RJ: Vozes, 2005.
1286

MANTOAN. Maria Teresa Eglér. O direito de ser, sendo diferente, na escola.


R. CEJ, Brasília, n. 26, p. 36-44, jul./set. 2005.

MANTOAN. Maria Teresa Eglér. Todas as crianças são bem-vindas à escola. Revista
Profissão Docente, Uberaba, v.1, n.2, p. 1 -19, mai/ago. 2001.

SMEHA, L. N. FERREIRA, I. V. Prazer e sofrimento docente nos processos de


inclusão escolar. Revista “Educação Especial” n. 31, p. 37-48, 2008.
1287

Pôster

LDB: foco na gestão democrática.

Anderson Dias Batista


Mestrando UNICID
Sandra Lúcia Ferreira
UNICID

Resumo: Esta pesquisa em desenvolvimento no Programa de Mestrado em Educação da


Universidade Cidade de São Paulo (UNICID) inserida na linha de Pesquisa Políticas
Públicas da Educação tem como objetivo identificar quais princípios e concepções de
Gestão Escolar Democrática estão contidos na LDB e de que forma esses aparecem no
processo de elaboração e na escrita da lei.
Palavras-chave: Gestão Escolar, Gestão Escolar Democrática, LDB.

INTRODUÇÃO:

No ano de 2010 iniciei na Universidade Cidade de São Paulo (UNICID) o curso


de pós-graduação Lato Sensu em Gestão Escolar naquele momento estudar essa
temática era uma maneira de tentar sanar uma série de dúvidas e também de tentar
entender um pouco mais do universo escolar no qual atuava desde o ano 2000. Enfim
era preciso pensar a escola além da sala de aula, espaço que ocupava diariamente.
Durante o curso pude estudar e discutir algumas concepções de Gestão
Escolar Democrática, esses estudos me levaram a uma série de dúvidas, pois o que lia
nos textos estava muito distante da realidade que eu particularmente vivia e tinha vivido
no meu trabalho como professor.
Por ter atuado como professor apenas na rede privada de ensino questionava se a
democratização da gestão escolar não era incompatível com uma educação voltada,
sobretudo ao mercado e se a escola particular enquanto empresa não estava, mas
habituada ou alicerçada em formatos administrativos hierárquicos voltados ao
centralismo do poder.
Aprofundando os estudos e conversando com professores da rede pública de
ensino pude perceber que a disparidade entre a teoria da Gestão Democrática e a prática
1288

não acontecia apenas nas escolas particulares e que ao pensar a escola democrática não
fazia sentido polarizar o estudo entre rede pública e rede privada de ensino, afinal de
contas estávamos falando da escola e da Gestão Escolar em um sentido mais amplo,
pensávamos a Gestão Escolar Democrática a partir da sua normatização iniciada na
Constituição de 1988 e reafirmada na LDB de 1996.
A partir dessas duas balizas normativas achei que seria possível estudar a
construção da ideia de Gestão Escolar Democrática tendo como base: o final do Regime
Militar (1964/1985), o processo de Abertura Política iniciado no governo do Geisel
(1974/1979) e continuado no governo Figueiredo (1979/1985), os debates da Comissão
de Educação na Assembleia Constitucional (1987/1988) e as discussões sobre o tema
realizado para a composição da LDB 1996.
Com o aprofundamento dos estudos percebi a complexidade do tema e também a
impossibilidade de realizar um estudo a partir de um recorte temporal tão extenso. Era
preciso “ajustar o foco” e foi nesse pensar e repensar que percebi que a Constituição no
que tange a educação norteou os princípios legais posteriormente estabelecidos pela
LDB de 1996.
O objetivo dessa pesquisa é identificar quais princípios e concepções de Gestão Escolar
Democrática estão contidos na LDB e de que forma esses aparecem no processo de
elaboração e na escrita da lei.

JUSTIFICATIVA:

A Constituição Brasileira de 1988 no artigo 206 parágrafo VI diz que o ensino


será ministrado com base nos princípios da gestão democrática do ensino público
Seguindo os dizeres da constituinte a LDB de 1996 em seu artigo 3º inciso VIII
anuncia que o ensino será ministrado com base no princípio da gestão democrática do
ensino público. O artigo 14 da mesma lei declara que os sistemas de ensino definirão as
normas da gestão democrática de ensino público na educação básica.
Percebemos que o termo gestão democrática aparece em nossa Carta Magna, a
Constituinte, e na lei maior da educação nacional, a LDB, porém nenhum dos dois
documentos nos apresenta definições do que seja de fato a gestão democrática.
Muitos autores versaram sobre o tema: Lück (2000) afirma que vivemos uma
mudança de paradigma de administração para gestão no contexto das organizações de
1289

ensino, ainda segundo ela essas mudanças tem como objetivo a promoção da melhoria
do ensino brasileiro já com relação ao termo gestão a autora diz:

“Gestão é uma expressão que ganhou corpo no contexto educacional acompanhando


uma mudança de paradigma no encaminhamento das questões desta área. Em linhas
gerais, é caracterizada pelo reconhecimento da importância da participação
consciente e esclarecida das pessoas nas decisões sobre a orientação e planejamento
de seu trabalho. O conceito de gestão está associado ao fortalecimento da
democratização do processo pedagógico, à participação responsável de todos nas
decisões necessárias e na sua efetivação mediante um compromisso coletivo com
resultados educacionais cada vez mais efetivos e significativos.”

No Dicionário Interativo da Educação Brasileira (2004) aparece a seguinte


definição para Gestão Escolar:

“Expressão relacionada à atuação que objetiva promover a organização, a


mobilização e a articulação de todas as condições materiais e humanas necessárias
para garantir o avanço dos processos socioeducacionais dos estabelecimentos de
ensino, orientados para a promoção efetiva da aprendizagem pelos alunos”.

Ainda no mesmo verbete temos:

“O conceito de gestão escolar foi criado para superar um possível enfoque


limitado do termo administração escolar. Foi constituído a partir dos movimentos de
abertura política do país, que começaram a promover novos conceitos e valores,
associados, sobretudo à ideia de autonomia escolar, à participação da sociedade e da
comunidade, à criação de escolas comunitárias, cooperativas e associativas e ao
fomento às associações de pais. Assim, no âmbito da gestão escolar, o
estabelecimento de ensino passou a ser entendido como um sistema aberto, com uma
cultura e identidade próprias, capaz de reagir com eficácia às solicitações dos
contextos locais em que se inserem.”

Prado (2012), diz que no Brasil é durante o governo do presidente Fernando


Henrique Cardoso que essa nova forma de gestão passa a ser predominante e que
devemos, no entanto observar que a predominância teórica não significou
necessariamente uma predominância nas práticas de gestão:

“Sistemas, redes e escolas foram fortemente influenciados pelas novas


determinações. Vocábulos e expressões como descentralização da administração ou
da gestão, gestão democrática, gestor, entre outros começaram a ganhar evidência no
cenário brasileiro, em especial a partir dos textos legais que retomavam o já previsto
no art. 206 da Constituição federal de 1988(...)”.
1290

Determinações legais em um Estado democrático surgem ou devem surgir a partir


de um processo de discussão/debate o que no caso da LDB não foi diferente, a
tramitação dessa lei iniciada em 1988 e promulgada em 1996 foi perpassada por debates
envolvendo grupos que apresentavam os mais diferentes interesses.
Pino, (1992) diz que a trajetória democrática da tramitação do projeto,
caracterizada na primeira fase, foi substituída por um círculo de tensões entre
manobras/resistências/vitórias//impasses.
Estudar esse espaço de debate e de tensões e saber quais atores sociais estiveram
nele envolvidos é importante para buscarmos compreender de que forma os autores
dessa legislação( LDB) conceberam o que na normativa foi chamado de gestão escolar
democrática.
Buscar essa compreensão é relevante para que possamos ampliar a discussão em
torno do conceito de gestão escolar democrática, para divulgarmos a necessidade que
todo o profissional da educação tem de conhecer a legislação que o ampara e
principalmente compreendermos que o documento legal é concebido a partir de
influências e interesses que não são explicitados na escrita e na leitura da Lei.

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS:

Em reportagem da Revista Educação (ano 18 – nº 206) o pesquisador Álvaro


Chrispino declara:
(....) “os professores precisam deixar os preconceitos e conhecer as bases legais da
sociedade onde atuam” (pp 48)
O conhecimento dessa base legal passa sem dúvida pelo conhecimento da LDB
que é o nosso objeto de estudo, passa também pelo entendimento de qual modelo de
Gestão Escolar Democrática fala a legislação, caso essa seja embasada em um ou mais
modelos.

REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA:

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 18ª ed.,atualizada e


ampliada. São Paulo: Saraiva, 1988
1291

____. Lei de Diretrizes e Bases as Educação Nacional. Lei nº 9394, de 20.12.1996


CURY, R. J.O Conselho Nacional de educação e a gestão democrática. In: ADRIÃO, T
(orgs) Gestão, financiamento e direito a educação: análise da LDB e da Constituição
Federal. São Paulo: Xamã, 2001.

LUCK, Heloísa. Perspectivas da Gestão Escolar e Implicações quanto à Formação


de seus Gestores. Em Aberto, Brasília, v. 17, n. 72, p. 11-33, fev./jun. 2000.

_______. Liderança em gestão escolar. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

______.Gestão educacional: uma questão paradigmática. Petrópolis, RJ: Vozes,


2011.

______.Gestão da cultura e do clima organizacional da escola. Petrópolis, RJ:


Vozes, 2010.

______.A gestão participativa na escola. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.

OLIVEIRA, Maria Auxiliadora Monteiro. et al. Gestão educacional: novos olhares,


novas abordagens. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

PRADO, Edna. Estágio na licenciatura em Pedagogia: gestão educacional.


Petrópolis, RJ: Vozes; Maceió, AL: Edufal, 2012.

PARO, Vitor Henrique. O princípio da gestão escolar democrática no contexto da


LDB. In: Oliveira, R.P.,ADRIÃO, T (orgs) Gestão, financiamento e direito a educação:
análise da LDB e da Constituição Federal. São Paulo: Xamã, 2001.

PINO, Ivany Rodrigues. A trama da LDB na realidade política nacional. Educação &
Sociedade,ano XIII,nº 41. Campinas: Papirus,1992

Periódicos:

Revista Nova Escola Gestão Escolar n.1 a n. 6. Fundação Victor Civita. Editora Abril.
2009.

Sites:

(http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2012/03/13/cresce-n-de-
alunos-em-escola-particular-em-sp.htm - acesso ás 9h43min do dia 15/11/2013 )

(http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br/AnonimoSistema/BannerTexto.aspx?MenuBanner
ID=22 – acesso às 10h23min do dia 15/11/2013)
1292

Pôster

Gestão escolar: políticas e práticas profissionais

Andréia Nunes Militão


PPGE/FCT/UNESP
Agência de Fomento: FAPESP

Resumo: Intenciona-se analisar as políticas públicas educacionais formuladas pelo


governo paulista detendo-se sobre aspectos político-partidários na definição de uma
política educacional voltada para o trabalho dos gestores escolares do Estado de São
Paulo durante o período de 2004 a 2013. A abordagem metodológica, de natureza
qualitativa, recorre à literatura produzida na área e à pesquisa documental. Para tanto,
analisa-se mais detidamente os programas e projetos destinados à gestão escolar e seus
rebatimentos no contexto escolar. Depreende-se, que existe um grande volume de
normatizações editadas pela SEE-SP, o que nos leva a concluir que a gestão escolar vem
sendo realizada de maneira atópica, desconsiderando a dinâmica própria de cada escola
e, sobretudo, a ação dos seus atores, indicando que as decisões ocorrem de forma
externa ao âmbito escolar.
Palavras-chave: Políticas Educacionais; Gestão Escolar; Partidos Políticos.

I. Introdução
O trabalho em tela debruça-se sobre os normativos legais produzidos pelo
governo estadual durante a última década (2004-2013), objetivando apreender e
compreender qual o viés da política educacional gestada nesse período. Argumenta-se
que os sucessivos governos, pertencentes a um mesmo partido político, veem colocando
em ação, de forma concomitante, um excessivo número de programas e projetos, sem
que estes resultem numa efetiva melhoria da educação; ao contrário, comportam um
caráter de responsabilização.
Ao recorrermos à pesquisa documental não podemos deixar de considerar o
cenário de produção dos mesmos, ou seja, entendemos que estes “não são apenas uma
fonte de informação contextualizada, mas surgem num determinado contexto e
fornecem informações sobre esse mesmo contexto” (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p.39).
1293

Na perspectiva adotada nessa investigação, considera-se que os documentos


representam uma visão sobre os fatos/acontecimentos e que não podem prescindir da
análise de outras visões e de outros tipos de fontes. Conforme Lima (2011):
O estudo da legislação escolar e da restante produção normativa e
regulamentadora, sobretudo sinalizado a partir das grandes reformas, dos
momentos de ruptura ou de inovação, quase sempre acompanhando de perto
a cronologia de factos políticos e sociais relevantes, parece indispensável não
apenas à compreensão histórica, política e sociológica, do processo de
construção das instituições e das mudanças socioeducativas, mas também à
contextualização e à elucidação de muitas questões do tempo presente
(LIMA, 2011, p. 168-169).

Embora predomine uma concepção/percepção em torno de que na produção de


documentos oficiais o Estado haja como agente imparcial, responsável por promover o
bem comum, entendemos que “as ações empreendidas pelo Estado não se implementam
automaticamente, têm movimento, têm contradições e podem gerar resultados diferentes
dos esperados” (HOFLING, 2001, p. 35). Deste modo,
As políticas públicas são aqui compreendidas como as de responsabilidade do
Estado – quanto à implementação e manutenção a partir de um processo de
tomada de decisões que envolve órgãos públicos e diferentes organismos e
agentes da sociedade relacionados à política implementada. Neste sentido,
políticas públicas não podem ser reduzidas a políticas estatais (HOFLING,
2001, p. 31).

A essa complexidade, adiciona-se a presença dos partidos políticos, com


concepções e projetos distintos para a sociedade como um todo e para a educação em
particular.
Torna-se necessário não esquecer que a disputa pelos rumos da educação no
Brasil se dá nos marcos institucionais da economia capitalista e da luta de classes
marcados por interesses antagônicos dos mais variados segmentos. Dessa forma, leis,
decretos, resoluções nunca são neutros, são resultados desses antagonismos. As decisões
dos governos implicam muitas vezes no atendimento ao interesse de uns e o abandono
de outros. Com o uso de “critérios técnicos” ocultam-se opções políticas sobre a
condução das políticas públicas sociais e da educação, em especial.
Com relação ao contexto político e aos partidos políticos, mais especificamente,
o cenário contemporâneo revela-se conturbado. Em que pese serem necessários para o
processo eleitoral, dissemina-se a descrença com relação aos mesmos, sobretudo,
discute-se se têm diferenças substanciais entre si.
Borges recorre a Seiler (2000, p. 6) para destacar que “apesar da existência do
descrédito lançado sobre os partidos políticos desde seu surgimento na cena política
1294

nenhuma democracia no mundo funciona sem partidos políticos, sendo eles o


fundamento da competição representativa” (BORGES, 2002, p. 12).
Ao elencar as diversas funções dos partidos políticos, Seiler (2000, p. 30-36),
destaca a formulação de programas e de políticas para o governo. Estas, geralmente,
são registradas em cartório, publicizadas em atos políticos, pois são um dos elementos
que garantem ou não a adesão de outros partidos e de apoiadores durante a campanha.
Na perspectiva de Gracindo (1994, p. 85), para o estudo e categorização dos
partidos políticos em relação à política educacional deve-se considerar “o modelo de
estado e de sociedade que cada um preconiza, o regime político que cada um deseja, a
forma de governo pelo qual cada um opta e a doutrina que cada um abraça”. Esses
elementos permitem indiciar a natureza das políticas públicas educacionais defendidas
por cada partido.
Gracindo (1994, p. 86-91) propõe como tipologia de análise dos partidos
brasileiros uma tendência conservadora, uma que defende mudanças e, por fim, outra
corrente que propõe a transformação da realidade. De acordo com a autora, no primeiro
grupo situam-se os partidos “que parecem estar vinculados à manutenção do capitalismo
e da democracia vigentes”. Integrariam esta categoria os partidos: Partido Democrata
Cristão (PDC), Partido Democrata Social (PDS), Partido da Frente Liberal (PFL),
Partido da Reconstrução Nacional (PRN), Partido Social Cristão (PSC), Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB) e Partido Trabalhista Renovador (PTR). A segunda
categoria agrega partidos como o Partido Democrático Trabalhista (PDT), Partido
Liberal (PL), Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), Partido das
Reformas Sociais (PRS), Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e Partido
Social Trabalhista (PST). Aspecto que uniria estas agremiações políticas, caracterizadas
pela autora como de viés mudancista seria o fato de defenderem “um capitalismo mais
civilizado, acenando para um modelo de Estado e de sociedade que se aproxima do
Welfare State”.
No tempo presente é questionável incluir o PSDB no grupo de partidos que
defendem mudanças, conforme a perspectiva construída por Gracindo (1994), uma vez
que os governos desse partido adotam discursos e práticas de teor neoliberal.
Defendendo a transformação da realidade, a terceira categoria reuniria partidos
como Partido Comunista do Brasil, (PCdoB), o Partido Popular Socialista (PPS), o
Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Verde (PV).
1295

No cenário político é possível ainda encontrarmos outras classificações para


diferenciar os partidos, tais como direita e esquerda ou conservadores e progressistas.
No entanto, cabe ressaltar que algumas propostas identificadas como do campo
conservador, têm sido adotadas no plano concreto por partidos considerados como
progressistas. O que leva setores da sociedade a considerar que não há mais fronteiras
entre os mesmos. Outro aspecto que corrobora esse posicionamento são as chamadas
alianças eleitorais, onde tanto nacionalmente como localmente busca-se a adesão dos
mais diversos partidos em prol da candidatura de prefeitos e governadores.
Diante dessa problemática, intenciona-se analisar as políticas públicas
educacionais implementadas pelo governo paulista, no caso, do PSDB na definição de
uma política educacional voltada para o trabalho e formação dos gestores escolares.

II. A política educacional paulista (2004-2013)


A política educacional desenvolvida pela Secretaria de Educação do Estado de
São Paulo (SEE-SP) no período de 2004 a 2013, período em que o cargo de governador
foi exercido por políticos provenientes de um mesmo partido político pode ser
identificada como de caráter neoliberal. O cargo de governador do Estado de São Paulo
vem sendo ocupado por um mesmo partido político há cerca de duas décadas, no caso
pelo Partido Social Democrata Brasileiro (PSDB). Entretanto, considerando as
diferenças internas dentro desse grupo político, interessa-nos saber se durante a última
década a política educacional teve continuidades ou rupturas e qual o teor da mesma.
Ao priorizarmos, nessa seção, a análise da atuação política dos governos do
PSDB durante o exercício de cinco mandatos no governo estadual paulista, assumimos
que “são os partidos políticos os grandes definidores das políticas sociais, nas quais a
educação está inserida” (BORGES, 2002, p. 01). Nessa mesma perspectiva de análise,
Gracindo (1994, p. 20) ressalta que os partidos políticos “traçam a política educacional
brasileira, ao elaborarem as leis de ensino, nos diversos níveis de poder legislativo”.
A partir da premissa que a direção da escola realiza-se de maneira atópica
(LIMA, 2011), portanto, fora da escola, entende-se que a política educacional é traçada
fora da organização escolar. Destaca o autor supracitado:
Como a direcção de cada escola portuguesa revela uma condição atópica, isto
é, foi deslocada do seu interior para o seu exterior, recusando qualquer
solução de compromisso e, por essa via, situando-se nos órgãos centrais
concentrados e desconcentrados do Ministério da Educação, compreende-se
que, em tais circunstâncias, o recurso à assessoria não se adéque; pelo menos
em termos minimamente expressivos de prestação de apoio especializado à
1296

direcção própria de cada escola ou estabelecimento educativo público.


(LIMA, 2011, p. 133).

Cabe questionar até que ponto os pressupostos partidários estiveram embutidos


nas realizações produzidas durante o período estudado (2004-2013). Corroborando com
esse posicionamento, Borges (2002) ressalta que existe influência da orientação
governamental sobre toda estrutura da SEE/SP:
[...] a ação política dos especialistas e intelectuais (no caso: professores,
administradores escolares, supervisores, enfim os educadores) fica sob a
determinação, então, dos programas partidários e dos governantes, sob a
forma de ocupação de cargos nos diversos escalões de comando (secretaria,
coordenadorias e departamentos), ou de participação nos órgãos colegiados
(Conselho Estadual de Educação, Conselho de Planejamento Educacional),
ou ainda, como administradores regionais, sub-regionais e locais
(BORGES, 2002, p.6-7).

Consideramos que a quantidade de normativos emitidos para a educação paulista


mais do que assinalar um elemento burocrático, caracteriza uma decisão política,
revelando mais descontinuidades e desarticulação em torno das decisões sobre as
políticas educacionais. Conforme Sanfelice (2010, p. 147):
Embora se convencione dizer que a vida partidária dos políticos brasileiros
não se define exatamente por uma forte identidade ideológica deles com os
respectivos programas dos partidos aos quais pertencem, no presente caso a
afirmação não se aplica vigorosamente. Os últimos governantes do executivo
paulista tiveram e, na medida do possível, continuam tendo uma inspiração
ideológica razoavelmente comum. Respeitadas as diferenças dos estilos
individuais de governo e as ambições pessoais geradoras de atritos, todos eles
perseguiram, e José Serra também persegue, políticas públicas alimentadas
pela visão neoliberal.

Intencionando captar a política estadual durante a última década, realizamos um


levantamento documental de todas as normativas emanadas pela SEE-SP e seus órgãos
auxiliares, abrangendo leis complementares, leis ordinárias, portarias, resoluções,
decretos, instruções e comunicados, entre os anos de 2004 e 2013.
Para a análise da documentação, assumiremos o conceito de plano das
orientações para a ação organizacional proposto por Lima (1998). Na perspectiva do
autor, esta dimensão analítica confere destaque às estruturas formais e informais. Assim,
“As estruturas formais são simultaneamente veiculadas por, e veiculadoras de, as
orientações normativas produzidas pela administração central. De um ponto de vista
oficial só elas existem, e de igual modo em todas as escolas” (LIMA, 1998, p. 164).
Isso não significa que a dimensão das orientações para a ação tem menor
importância, uma vez que ela representa a face oficial da organização, portanto, deve ser
conhecida e estudada, porém não pode ser tomada como a única face.
1297

A partir da análise da legislação produzida na última década foi possível


visualizarmos a ocorrência de modificações do tipo jurídico-normativo, produzidas por
decisores políticos que estão fora do ambiente escolar. Tais mudanças têm sempre como
característica a tentativa de uniformização das organizações escolares. Portanto, trata-se
de “[...] textos que comportam orientações para a acção, regras formais-legais que
projectam e antecipam, no plano discursivo, certos cursos de acção, soluções estruturais
e morfológicas, de alcance universal, servidas pela força da imposição normativa [...]”
(LIMA, 2011, p. 166).
Não se constitui em característica da educação pública paulista a normatização
por meio de grandes textos, ao contrário, tem sido marcada por um conjunto volumoso
e fragmentado de normativos legais. Portanto, por “[...] pequenos textos e ofícios que
redizem e desdizem, que ora alcançam visibilidade semelhante ou superior face às suas
matrizes, ora são remetidos para a penumbra [...]” (LIMA, 2011, p. 169). A
interferência de outras secretarias estaduais na produção legislativa é outro elemento
que a caracteriza, sobretudo, da Secretaria de Administração Pública e de Saúde.
A excessiva produção normativa-legal indicia a predominância por parte
daqueles que a formulam de se considerar a escola mais como espaço de reprodução das
decisões políticas do que espaço de produção e reconstrução desses normativos, dessa
maneira, entende os atores como seres passivos.
No nosso entendimento, o quantitativo de textos regulamentadores e o seu teor
revelam mais do que uma possível fragilidade educacional, mas uma opção política que
confere maior importância a decisões periféricas a decisões políticas de grande impacto.
Devido ao aumento da centralização em torno das decisões e ao crescente
controle exercido sobre o trabalho dos diretores, esses ficam assim privados de exercer
uma função de “formulação”, para se concentrarem em ações de “execução”.
O Quadro 01 permite-nos visualizar a quantidade de normativos relacionados à
educação paulista produzidos na última década:
1298

Quadro 01 – Normatizações Educacionais (Estado de São Paulo, 2004-2013)


Tipo de legislação 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Resoluções da SE 27 27 35 40 70 76 70 83 64 51
(Secretaria de
Educação)
Resoluções - - - - - - - - 05 01
Conjuntas (com
outras secretarias
estaduais)
Resoluções Diversas 14 17 43 31 36 36 14 30 16 09
Projeto de Lei 10 18 15 16 16 15 12 08 07 06
Complementar
Projeto de Lei 80 57 42 47 27 09 01 05 31 04
Portarias DRHU 04 06 06 05 05 06 13 07 02 03
Portarias Diversas 19 17 16 10 10 19 09 16 41 13
Parecer 05 05 01 06 01 04 03 03 - 01
Lei Complementar 08 04 07 13 12 06 05 04 05 02
Lei 07 21 21 15 17 08 03 09 08 03
Instrução Diversa 08 02 06 09 25 18 10 17 02 04
Instrução Conjunta - - - - - - - - - 01
CGRH-CGEB
Instrução CGRH - - - - - - - - - 01
Concursos 30 27 28 26 31 21 57 27 29 03
Comunicados 12 08 - 03 08 04 - 01 02 04
Comunicados do - - - - - - - 04 04 08
DPME
Comunicados 13 22 57 78 149 92 65 47 94 23
Diversos
Decretos 48 27 29 51 43 44 40 26 32 14
Comunicado DRHU 14 12 20 18 25 21 17 12 04 -
Total 299 270 326 368 475 379 319 299 346 151
Fonte: elaborado pela autora, 2014.

Numa primeira análise, que não se atém ao conteúdo das normativas, temos uma
quantidade, de certa forma, surpreendente. Dessa forma, podemos inferir a dificuldade
dos diretores escolares e demais dirigentes dos níveis intermediários da hierarquia
educacional em acompanhar tamanha profusão de documentos que, em princípio,
organizam e determinam a forma de funcionamento das escolas e do sistema de ensino.
A partir da totalidade dos documentos temos uma média de quase um por dia
durante os dez anos analisados. Considerando que temos 200 dias letivos ou cerca de
250 dias úteis durante no ano, chegamos a uma marca mais impressionante, em 2008
com 475 novas determinações, perfazendo praticamente duas a cada dia de trabalho das
escolas. Levando em consideração que resoluções, decretos e pareceres são de menor
importância no ordenamento jurídico e que as leis são mais estruturantes, temos ainda
um número significativo. Enquanto no ano de 2010 teve-se um número menor de
aprovação de novas leis, representando 15 novas leis ao ano sendo 08 leis
1299

complementares e 07 leis ordinárias no total; durante os anos de 2006, 2007 e 2008,


observamos 85 novas leis, ou seja, uma média de mais de duas novas leis a cada mês.
Numa análise inicial verificamos que, a escola não possui estrutura
administrativa suficiente para acompanhar a profusão de novas regulamentações. A
partir da análise dos documentos depreende-se que embora esteja em curso um processo
de desmaterialização da documentação educacional, esta tem se avolumado, o que tem
provocado um mal estar, pois a sensação é a de que não se consegue realizar tudo o que
vem sendo emanado.
A excessiva normatização retira a responsabilidade dos governantes,
proponentes das mesmas, pois coloca para a sociedade que estão pensando a educação e
que estão tomando medidas para a sua melhoria. Na maior parte das vezes
responsabilizando os gestores escolares e professores pelas mazelas da educação.

Referências
BORGES, Z. P. Política e Educação: análise de uma perspectiva partidária. Campinas,
SP: Graf. FE, 2002.

GARCIA, W. Tecnocratas, educadores e os dilemas da gestão. In: FERREIRA, N. S.


C.; AGUIAR, M. A. da S.(org.). Gestão da educação: impasses, perspectivas e
compromissos. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2009.

GRACINDO, R. V. O escrito, o dito e o feito: educação e partidos políticos.


Campinas, SP: Papirus, 1994.

HOFLING, ELOISA DE MATTOS. Estado e políticas (públicas) sociais. Cad.


CEDES, Campinas, v. 21, n. 55, Nov. 2001. Available from
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32622001000300003&lng=en&nrm=iso>. access
on 05 May 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-32622001000300003.

LIMA, L. C. A escola como organização e a participação na organização escolar:


um estudo da escola secundária em Portugal. (1974-1988). 2ª. Ed. Braga: Instituto de
Educação e Psicologia – Centro de Estudos em Educação e Psicologia. Universidade do
Minho, 1998.

LIMA, L. C. Administração Escolar: estudos. Porto, Portugal: Porto Editora, 2011.

LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. A Pesquisa em educação: abordagens qualitativas.


São Paulo: EPU, 1986.

SANFELICE, J. L. A política educacional do Estado de São Paulo: apontamentos.


Nuances: estudos sobre Educação. Ano XVII, v. 17, n. 18, p. 146-159, jan./dez. 2010
1300

Pôster

Tensão entre a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva e a


Inclusão implementada nas escolas

Ayéres Brandão

Resumo: Os processos de implantação e consolidação da Política de Educação Especial


na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008)´, é o testemunho dos avanços
brasileiros, em direção à Inclusão Escolar, que está sendo realizada pelos sistemas
estaduais e municipais de ensino. Esse texto é um convite para pensar como as
condições institucionais, humanas, pedagógicas e operacionais, têm provocado tensões
entre essa legislação e sua implementação nas escolas.
Palavras-chave: Inclusão, deficiência, Política Nacional, tensão.

INTRODUÇÃO

A conscientização de que a sociedade e a educação


excluem, como excluem, por que excluem e a quem excluem pressupõe o
“anuncio” de um projeto de transformação da sociedade, de cujo processo a
educação faz parte, e de um processo de luta ético-política [ ... ] A
conscientização da exclusão aponta a necessidade de a sociedade e a escola
serem transformadas (Oliveira, 2003)

Esta é uma anotação provisória de como venho pensando a Inclusão Escolar e em


decorrência disso a tensão entre a Política da Educação Especial na Perspectiva da
Inclusão e a sua implementação nas escolas. Isso se deve ao fato de estar voltada para a
Inclusão, desde o ano de 2005, assessorando redes de ensino na questão inclusão: em
formações de professores, gestores e famílias e no encaminhamento de alunos com
deficiência para salas regulares e Atendimento Educacional Especializado (AEE).
Gostaria de convidar os presentes a pensar comigo estas tensões.
As minhas primeiras experiências com deficiência foram de acompanhar alunos com
deficiência visual na Fundação Dorina Nowill. Assessorava, nesta época, uma rede de
ensino da grande São Paulo e uma das minhas funções era estabelecer um elo entre as
famílias e a referida instituição. Como as crianças passavam por vários exames e os
especialistas faziam um rodízio de horários, as famílias aguardavam quase o dia todo no
local e acabavam almoçando no refeitório da Fundação.
1301

Pude vivenciar experiências significativas com essas famílias e seus filhos. Convivi ali
com dois tipos de mãe: aquela que punha os alimentos no prato do filho e o induzia a
comer e aquela que levava a criança frente aos alimentos e ia dizendo qual era ele. Só
depois é que perguntava o que o filho queria comer. Essa autonomia proporcionada pela
mãe (que presumo se estendia para outras dimensões) fazia diferenças significativas na
vida daquelas crianças. Isso me mostrou que a deficiência existe, as dificuldades
relacionadas às deficiências são reais, mas poderão deixar de ser interpretadas como
impeditivas do desenvolvimento e da participação dos alunos nas práticas escolares, os
alunos poderão ultrapassar limites, surpreender-nos, enunciar novos mistérios, apontar
novas opções.

A DIFERENÇA E A INCLUSÃO

A diferença sempre esteve entre nós, mas ganhou o mundo, no final do século XX.
Nos dias de hoje, esse realce se daria para ser reconhecida, respeitada ou para ser
apagada e contida?
Pensamos a diferença em relação a algo, nunca a diferença pela diferença, ou a
diferença por si mesma e nesta perspectiva a diferença não é de fato diferença, mas
simples variação que confirma a norma. A sociedade tende a defender-se das diferenças,
controlá-as em um padrão de normalidade para que possam ser administradas,
governadas e que não fujam ao controle. Vamos encontrar então as tentativas de
normalização dessas diferenças e a Inclusão Escolar é uma dessas formas.
A Educação Inclusiva, embora parta de uma construção teórica, não pode sustentar-se
absolutamente como ideia. Formatos, práticas e condutas têm de sustentá-la. Ela não é
uma ideia, tem de ser uma prática. Como prática é um avanço para que a sociedade
possa ser mais justa.
Atribuindo à educação o caráter corretivo às diferenças, ela reforça o processo de
normalização que a escola moderna se propõe. Aparece como o grande foco da escola,
uma vez que as Políticas Educativas, presente neste espaço abordam a questão do
diferente sob o olhar da normalidade, reduzindo a diferença à diversidade ou à
deficiência.
Tem sido extremamente positiva a discussão sobre si mesma que a política de inclusão
vem suscitando dentro das escolas, sobretudo, públicas. Tenho sido testemunha desse
processo. A presença das pessoas com deficiência na escola questiona-a profundamente,
1302

e traz à baila questões fundamentais, até mesmo, sobre o sentido e a função social que
lhe é atribuída.
Embora, ainda, de maneira muito conflituosa e centrada na inclusão de pessoas com
deficiência, a Inclusão nas escolas brasileiras é um fato e vai ganhando legitimidade. O
número de matrículas de alunos com deficiência em salas de aula regulares vem
aumentando, da mesma forma que cai significativamente nas classes e escolas especiais.
(censo escolar da Educação Básica de 2012)
No momento, na prática, vivemos as imensas dificuldades inerentes à transição da
mudança de paradigma educacional de um modelo autoritário de ensino centrado no
professor para outro, mais democrático, centrado na aprendizagem dos alunos. Neste
contexto, muitas vezes, ainda não ocorrem diálogos, mas contendas. Todavia,
juntamente com os outros, os alunos com deficiência estão lá e todos precisam e têm
direito ao acesso à construção do conhecimento em boas condições. Isso é um fato
irreversível! E a escola, apesar dela mesma e da cultura, majoritariamente
discriminatória na qual está incluída, é obrigada a fazer frente aos novos desafios e a
brigar dialogando. E, pelo menos, algo está abalando e desconstruindo suas velhas e
arcaicas estruturas.
A exclusão escolar no Brasil foi sendo gestada, nutrida e naturalizada em um cotidiano
perverso, sendo legitimada no interior do sistema de ensino. O modelo médico-
psicológico contribuiu para que a tarefa da educação dessas crianças estivesse a serviço
de um sistema educacional de organização seriada, elitista e classificatória, produtos de
exclusão da escola por meio de um trabalho pedagógico com base na homogeneidade
criando estruturas responsáveis pelo diagnóstico de deficiência, dificuldades de
aprendizagem e fracasso escolar (Patto, 1993).
Para estudiosos atuais que se debruçam sobre a inclusão (Baum, 2012; Mantoan, 2010;
Boaventura, 2008; Beyer, 2003; Baptista, 2004 etc.) ela vai se definindo como um
movimento mais amplo que a inclusão das pessoas com deficiência; arrebanha todas as
minorias que habitam nosso planeta. A política inclusiva faz referência a todos os
excluídos por diferenças individuais, de classe, etnia, gênero, idade, entre outras.

O autor inglês, Roger Slee (2006) considera que a apropriação e popularização da


educação inclusiva pela educação especial tradicional e o gerenciamento educativo
resultaram em níveis crescentes de exclusão e em maior vulnerabilidade educativa. A
inclusão passa a ser vista por uma interrogação mais ampla da economia política da
1303

educação escolar como uma plataforma para reconstrução congruente com os desafios
de novos tempos de educação.
No Brasil, a associação entre pobreza e fracasso, afastamento e exclusão escolar foi
documentada por Patto em 1993. Sua pesquisa mostrou que não há acaso no fracasso de
alunos pobres, assim como há relatos de racialização da educação especial. A
cumplicidade das escolas na produção da desigualdade e exclusão é de longa data, como
afirma a pesquisadora:
“A educação não é [ ... ] um reflexo de desigualdades sociais
ou culturais. Esta é uma imagem demasiadamente sem movimento. Os
sistemas de ensino são instituições ativas. Eles estão vibrantemente
envolvidos na produção de hierarquias sociais. Eles selecionam e excluem
seus próprios clientes; eles expandem mercados de trabalho credenciados;
eles produzem e disseminam tipos particulares de conhecimento a usuários
específicos” (Patto, 1993)

Como citado acima, as escolas não são agentes passivos no mercado educacional:
existe uma reciprocidade perversa, um malabarismo de desvantagem e vantagem
posicional. Eles refletem e refratam desigualdades sociais. Os movimentos de avaliação,
classificação, interagem com a intervenção de interesses empresariais e as divisões de
escola, para formar uma hierarquia de escolas.
A Educação Especial na perspectiva da Inclusão conquistou posições importantes do
ponto de vista legal e educacional na educação brasileira e esses marcos estão
fundamentados na Constituição de 1988 e na Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência/ONU, 2006, ratificada e assimilada ao texto constitucional pelo
Decreto no. 6.949/2009. A prática da inclusão nas escolas é, no entanto, ainda tímida,
salas especiais segregadas continuam convivendo à parte nas escolas regulares. O
discurso, porém se mostra avançado. Acredita-se no discurso inclusivo, mas
desconfiança em sua prática.
Há uma tensão entre e dentro da Educação Inclusiva, mas a maior tensão se dá mesmo
entre a legislação sobre a Inclusão e a sua prática nas nossas escolas, nos investimentos
públicos e privados.
Essa tensão citada se fundamenta em justificativas contrárias à Inclusão, há
argumentos de caráter político: “a inclusão é um artifício pseudo-humanístico
promovido pelo Estado neoliberal com o intuito de retirar verbas da educação especial”,
mas há também o de caráter técnico-clínico que ressalta que alguns tipos de deficiências
precisam de atendimento multidisciplinar especializado e que as crianças, ao serem
deslocadas para o ensino comum regular nas escolas, correm o risco de não terem
1304

atendimento especializado. Sem dúvida a falta de articulação entre a área de saúde e da


educação, não conseguem efetivar nos municípios, ações complexas.
Talvez o de mais grave que se encontra nessa tensão seja a viabilização do
Atendimento Educacional Especializado. O AEE é um dispositivo, um serviço criado
pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Inclusão, destinado a
alunos com deficiências, transtornos globais de desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação, o qual deve ser realizado na sala de recursos multifuncionais.
O que temos observado em algumas escolas consideradas inclusivas, é que nessas salas
dão continuidade ao que a professora de sala regular planeja aos alunos. A
concretização dessa proposta no que ela tem de essencial do trabalho com as
dificuldades específicas dos alunos (que talvez seja o “pulo do gato” dessa Política), na
prática não tenha sido “entendido”, pela escola, e os alunos com deficiência, acabam
ficando em um canto da sala, na melhor das hipóteses, fazendo um caderno à parte. Se
há um professor auxiliar, este se torna responsável por estes alunos e poucas vezes
promovem interação com os demais. Passam a ser de fato, alunos dos professores
auxiliares Isso vem sendo chamado pelos críticos da Inclusão de “exclusão dentro da
inclusão”
Essas salas de AEE constituem desafios e podem por decorrência de pesquisas,
estimular experiências, relatos e estudos de caso, resultando na disponibilidade de novas
práticas pedagógicas. Um professor que tece condições para desenvolver essas crianças
conseguirá, por certo, relatar, denunciar e reconhecer o que se passa com essa população
nos contextos educativos, e estar consciente das imbricações da tarefa dos educadores,
no tecido social das comunidades. É estar consciente de que a sociedade e a escola,
precisam se transformar. Como combinar “sociedade que exclui e educação Inclusiva?
professores exclusivos e educação inclusiva?”
Atualmente promovida pelo OEI/ MEC/ UNICAMP e o Instituto de Pesquisa do
Discurso do Sujeito Coletivo (IPDSC), realiza-se a pesquisa “A Escola e suas
Transformações, a partir da Educação Especial, na Perspectiva Inclusiva” (publicação
em dezembro de 2014). Considerou-se que já era tempo de conhecer como o AEE está
se concretizando, avançando e quais seriam as medidas a serem adotadas para que
elimine a plena participação dos alunos, considerando suas necessidades específicas.
As entrevistas realizadas em 24 municípios das cinco regiões brasileiras consideraram o
AEE de muita valia para as transformações da escola para todos os seus protagonistas e
principalmente relacionadas à mudança de vida dos professores e ao comprometimento
1305

com os alunos com deficiência. Fica claro que o grande entrave entre a lei e a sua
implementação nas escolas é que há ainda discriminações, preconceitos; o acolhimento
não é de todos os educadores; nem todas as escolas contam com acessibilidade e
formação para os profissionais em todas as deficiências.
Há uma concordância geral de que as crianças com deficiência se desenvolvem melhor
em escola comum do que em unidades especiais, ganham quando convivem com as
crianças sem deficiência e vice-versa. Quanto à questão aprendizagem escola, ainda é
difícil investigar o que cada criança concreta, com deficiência, ali observada, teria de
melhor preservado, entre as suas facilidades e dificuldades. O que a padroniza e o que é
possível de encontrar nela de particular? Uma professora de AEE conta a história de
Josefa, sua aluna, que como tinha a mão direita paralisada não conseguia escrever,
entretanto já lia e ela, a professora, nem tinha se dado conta de perceber isso, tão presa
à padrões e estereótipos (Brandão, 2013) .
Diante da questão o que seria uma escola inclusiva ideal, alguns professores não tiveram
dúvida de colocar que seria esta escola onde todos estariam em sala de aula e o
professor regente trabalharia com todos naturalmente, respeitando suas necessidades
específicas. Os recursos, apoios, professor auxiliar seria provisórios para situação que
seria natural. A inclusão já estaria internalizada, fazendo parte do seu ser. A escola não
mais seria adjetivada de “inclusiva”, uma vez que sem inclusão não seria escola.
No conto ”O livro de Areia” (1999), Borges fala de um livro que comprou de um
desconhecido que lhe bate à porta. Ao abri-lo surpreende-se: é um livro misterioso, sem
início, sem final, sem sequência, sem mensagens, mas a cada olhar, abre um belíssimo
texto. Talvez a transformação da escola de que fala Oliveira (2003), seja o
desenvolvimento desse olhar que não está pronto, que provoca o novo, naquilo que já se
viu mais de uma vez. Que uma sociedade e uma escola em transformação observem as
diferenças em seus alunos e ofereçam educação para todos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

BORGES, J. L. O conto da Areia. In: Obras completas de Jorge Luis Borges. São
Paulo: Globo, 1999. V. 3

BRANDÃO, A. Pensando em uma escola de qualidade para o século XXI. E-book-


LEPED/UNICAMP, 2013.
1306

FIGUEIREDO, R. V.; POULIN, J. R. Atendimento Educacional Especializado.


Editora Moderna, 2011.

GALLO, S. Uma apresentação: diferenças e educação; governamento e resistência. In


LOPES,C.Maura; HATTGE, D. Morgana (orgs.) Inclusão Escolar: conjunto de
práticas que governam - Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009.

MANTOAN, M. T. E. Escolas dos diferentes ou escola das diferenças. 2012

PATTO, M. M. S. A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia.


Editora São Paulo T. A. Queiroz, 1993.

OLIVEIRA, I. A. A Política de Educação Inclusiva nas escolas: trajetória de conflitos.


In Inclusão Práticas Pedagógicas e Trajetórias de Pesquisa. Porto Alegre: Editora
Mediação, 2007.

SLEE Roger. Um cortador de queijo com outro nome? Reduzindo a sociologia da


inclusão a pedaços. In: A Sociologia da Educação: uma análise internacional.
1307

Pôster

Educação a distância e formação docente: estudos preliminares dos processos


pedagógicos e do gerenciamento de uma AVA no curso de pedagogia

Carlos Adriano Martins


Universidade Cruzeiro do Sul
Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
Carlos Fernando de Araújo Jr
Universidade Cruzeiro do Sul
Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática
Pró-reitoria de Educação a Distância

Resumo: A educação a distância é entendida como uma modalidade de ensino pautada


nos processos pedagógicos síncronos e assíncronos e tem crescido significativamente o
oferecimento de cursos por todo o país, notadamente na área de formação docente. Por
sua especificidade, a EaD pressupõe uma ação sistemática e conjunta de diversos
agentes envolvidos no processo educativo, por meio de equipes multidisciplinares
(técnico-administrativa e pedagógica). Políticas públicas de atendimento,
governamentais e institucionais, ajudam na disseminação e na popularidade desta
modalidade, no entanto, é necessário que tais políticas sejam caracterizadas como
instrumento de amplo atendimento e da promoção de uma inclusão digital por todo o
país. A pesquisa, que se encontra em andamento, procura delimitar o espaço entre o
gerenciamento de um ambiente virtual de aprendizagem e o desenvolvimento do
processo formativo no curso de Pedagogia e na formação continuada de professores da
educação básica.
Palavras-chave: Educação a distância, Ambiente virtual de aprendizagem, Políticas
públicas em educação.

Introdução

Os primeiros contatos com EaD (educação a distância) nem sempre são


confortáveis, pois podem apresentar um modelo com certas “facilidades“ e vender um
1308

produto pronto e acabado. Existe uma tendência de melhoria na aceitação de cursos


online, por meio de políticas públicas governamentais e institucionais, nos cursos de
extensão universitária, graduação e especialização, pois estes crescem
significativamente em todo o país. (INEP, 2011).
Temos, também, que considerar os cursos híbridos, os B-learning, conhecidos
como blended learning, oferecidos na modalidade a distância, em sua maior parte, mas
possuindo momentos presenciais de atividades. Esta mescla de situações caracterizam
uma necessidade de formadores e estudantes, diversificar seus métodos de trabalho, seja
em cursos presenciais, a distância ou semi presenciais, carecendo de fomento de
agências de financiamento e do estabelecimento de intrumentos de políticas
educacionais eficazes e focadas neste segmento.
De acordo com o Censo da Educação Superior (INEP, 2011), estatísticas básicas
de graduação (presencial e EaD) em 2010 foram apuradas 2.099 instituições de ensino
superior privadas, perfazendo um total de 20.262 cursos dos quais 4.736.001 de
matrículas na graduação, somente.
Como observa-se na Figura 1, as matrículas na graduação aumentaram 110,1%
de 2001 a 2010. Isso aconteceu pelo crescimento econômico, pela busca de mão de obra
especializada, e pelo aumento do número de financiamento dos estudos com programas
e administração de bolsas do governo federal, sobretudo.
Segundo o Censo, com a expansão das novas tecnologias da informação e
comunicação temos novos modelos de cursos de formação dos profissionais de diversas
áreas, por meio de estudos a distância e, também, por cursos de menor duração, como os
de formação continuada, o que tem acelerado o processo de abertura e funcionamento
desses cursos.
Figura 1. Evolução do número de matrículas em cursos de graduação (presencial e a
distância) Brasil 2001-2010.

Fonte: INEP, 2011.


1309

Analisando os cursos na modadlidade presencial, os mesmos atingem os totais


de 3.958.544 matrículas em cursos de bacharelado, 928.748 matrículas nos cursos de
formação de professores (licenciatura) e 545.844 matrículas em cursos de formação
tecnológica, como observa-se ver na Figura 2.
Com foco nos estudos na modalidade que subsidiará esta pesquisa, ou seja, em
cursos de formação continuada a distância, há, segundo dados de INEP (2011), 268.173
matrículas em cursos de bacharelado, 426.241 matrículas nas licenciaturas e 235.765
matrículas nos cursos de tecnólogos.
É significativa a porcentagem de matrículas em cursos de formação de
professores na modalidade de EaD, perfazendo um total de 45,8% de matrículas, daí
surge uma necessidade de pequisar esses dados e avaliar como estes cursos são
oferecidos, do ponto de vista pedagógico, administrativo e dos instrumentos de políticas
públicas praticados em EaD.

Figura 2. Número de matrículas por modalidade de ensino e grau acadêmico - Brasil 2010.
Fonte: INEP, 2011.
Por sua especificidade, a EaD pressupõe uma ação sistemática e conjunta dos
diversos agentes envolvidos no processo educativo (equipes multidisciplinares e
multifuncionais, tutores, professores, coordenadores e alunos), todos articulados por
recursos midiáticos e pedagógicos que possibilitem a aprendizagem eficiente e efetiva,
marcada pela autonomia e pela responsabilidade.
Como conceito inicial e introdutório, defini-se EaD, segundo as Competências
para educação a distância da ABED, assim:

A educação distância (EAD) permite a possibilidade de transformação, de


romper o paradigma da educação presencial, pois educador e educando
deixam de ocupar o mesmo espaço físico e nem sempre estão envolvidos, ao
mesmo tempo, no processo ensino-aprendizagem. O novo paradigma altera o
espaço e o tempo da comunicação e isso não pode nem deve ser ignorado.
Trata-se de uma significativa oportunidade de procurar superar os erros do
1310

passado e abrir espaço para novas conquistas, o que só será possível dentro
de um novo paradigma educacional. (ABED, 2012, p. 63)

Assim sendo, a pesquisa será composta de análises dos referenciais teóricos


voltados à formação docente, obras que contemplam os instrumentos legais e de
políticas públicas educacionais e algumas propostas curriculares, contando, também
com autores que pesquisam a EaD.

Justificativas

Como objeto evidencia-se a necessidade de pesquisa na área de educação que


enfoque os métodos e alternativas não presenciais de ensino, destacando aqueles que
formam os docentes da educação básica. Já para delimitar a pesquisa, é necessário
adentrar ao universo de um AVA (ambiente virtual de aprendizagem) do curso de
Licenciatura em Pedagogia, do Campus Virtual de uma IES da região da Grande São
Paulo, a qual será preservada sua identidade.
A justificativa da escolha do curso de formação em Pedagogia enquanto campo
de análise, dá-se pois “o objetivo da Pedagogia como ciência da educação será o
esclarecimento reflexivo e transformador da práxis“ (FRANCO, 2003, p. 83). Ainda
podemos destacar “os saberes interrogantes das práticas, os saberes dialogantes das
intencionalidades da práxis e os saberes que respondem às indagações reflexivas
formuladas por essas práxis“ (FRANCO, 2003, p. 85).
Este trabalho será direcionado para o curso de formação de professores oferecido
na modalidade a distância pois, dentre as propostas de cursos oferecidos no Brasil,
verifica-se um aumento significativo no número de cursos de graduação na modalidade
a distância (INEP 2011; ABED, 2013). A EaD, no contexto nacional, representa uma
parcela significativa do número de estudantes matriculados em universidades que
oferecem seus cursos nesta modalidade.
A educação a distância pode ser entendida como uma forma de ensino que
possibilita a auto-aprendizagem, com a mediação de recursos didáticos e tecnológicos
organizados. Mas esses novos métodos fazem parte do cotidiano contemporâneo há
pouco tempo. A internet foi popularizada há pouco mais de 15 anos e o aproveitamento
de instrumentos online para o ensino tem sido utilizado a partir da primeira década dos
anos 2000, com mais força e amplitude (ABED, 2013).
1311

É notório o crescimento do número de matrículas em cursos na modalidade a


distância, especialmente em instituições de ensino particulares. Também é interessante
apontar a abertura de acesso que um curso a distância possui, atendendo, de uma
maneira mais democrática, pessoas em regiões distantes e/ou isoladas, outras com
dificuldades de locomoção etc. Daí a importância de se conhecer e praticar os
instrumentos de políticas públicas referentes à formação de professores em contexto
nacional.

Procedimentos metodológicos

A pesquisa em andamento se caracteriza, em sua modalidade, pela análise


qualitativa de seus dados e um estudo de caso envolvendo um ambiente virtual de
aprendizagem no curso de Pedagogia, oferecido na modalidade a distância.

Seu campo de observação abrange um levantamento bibliográfico inicial, por


meio de livros, artigos acadêmico-científicos, dissertações de mestrado e teses de
doutorado sobre as aplicações da EaD e de seus AVA´s na formação de professores,
bem como outras obras/documentos que enfatizem, exclusivamente, temas relacionados
à formação docente. Também serão analisados documentos oficiais/governamentais e
institucionais (referenciais de qualidade, instrumentos de políticas públicas em
educação, diretrizes curriculares, pareceres, decretos etc.) que se referem aos métodos e
padrões de qualidade aplicados no ensino a distância, pelas universidades brasileiras, e
se estas estão em consonância com as diretrizes e referenciais de qualidade para a EaD.

Para o trabalho de fundamentação teórica haverá o uso do estado da arte que,


segundo Sales (2011), significa uma contribuição importante na constituição do campo
teórico de uma área de conhecimento, pois buscam identificar os aportes significativos
da construção da teoria e prática pedagógica, apontar as restrições sobre o campo em
que se move a pesquisa, as suas lacunas de disseminação, identificar experiências
inovadoras que apontem alternativas de solução para os problemas da prática e
reconhecer as contribuições da pesquisa na constituição de propostas na área focalizada.

Para a coleta de dados no AVA, são elencados os seguintes métodos de trabalho:


pesquisa bibliográfica, documental, exploratória e explicativa, seguido de um estudo de
1312

caso que, sobre a sua caracterização conceitual, Stake (1995, p. 236) enfatiza que este
não é um método específico, mas um tipo de conhecimento: estudo de caso não é apenas
uma escolha metodológica, mas uma escolha do objeto a ser estudado. Uma questão
fundamental, segundo ele é o conhecimento derivado do caso, ou melhor, o que se
aprende ao estudar o caso.
O estudo de caso em educação e ensino acontece quando os pesquisadores se
preocupam não com a teoria social ou com julgamento de avaliação, mas sim com o
entendimento da ação educativa, enriquecendo o pensamento e discurso dos educadores
seja pelo desenvolvimento de alguma teoria da educação, seja pela análise sistematizada
de documentos e reflexão de suas evidências (ANDRÉ, 2008, p. 21-22).
O trabalho de análise dos dados coletados no AVA seguirá por duas linhas. Uma
de descrição e avaliação de recursos educacionais e objetos de aprendizagem (OA´s) e
outra de análise discursiva, por meio das produções dos alunos do curso e do processo
de dialogismo e interatividade. Posteriormente à coleta e análise, os dados obtidos serão
comparados e observados se cumprem os referenciais de qualidade e se respeitam os
instrumentos de políticas educacionais, instituídos pelo Ministério da Educação.
Na sequência, haverá análise de conteúdos elaborados pelos alunos participantes
do curso de formação continuada, por meio da ferramenta interativa Fórum de
Discussões e das produções acadêmicas, ou seja, atividades e textos elaborados pelos
alunos.
Esta pesquisa adota os estudos propostos por Bardin (1977), sobre Análise de
Conteúdo, que seguirá as três etapas sugeridas pela autora: pré-análise, exploração do
material e análise dos dados, por meio do estudo dos gêneros discursivos (BAKHTIN,
2006; FIORIN, 2008; MACHADO, 2008).
Este processo teórico-metodológico dos estudos em análise de conteúdo,
proposto por Bardin (1977), mais detidamente em processos de categorização,
caracterizam-se na pré-análise e na análise flutuante e serão aplicados às análises dos
textos que serão selecionados pelo pesquisador. Após essa etapa a pesquisa adentra na
análise discursiva/dialógica propriamente dita, ou seja, na organização, no mapeamento
e no tratamento dos resultados obtidos, chegando à interpretação do que foi pesquisado
e suas devidas aplicações. Neste caso, ocorrerá um estudo de análise de conteúdos,
observando a interatividade, de atividades, apontamentos, discussões do fórum,
enquanto ferramenta assíncrona do AVA.
1313

Considerações finais

A EaD, no Brasil, tem crescido exponencialmente, com métodos renovados do


processo ensino-aprendizagem e configurando-se como instrumento de política pública
e de atendimento expansivo à todas as regiões do país, por meio das diretrizes
curriculares dos cursos de graduação, dos referenciais de qualidade para educação
superior a distância e dos referenciais para formação de professores, sob a supervisão do
Ministério da Educação.
Esta modalidade carece, ainda, de pesquisas mais consistentes e de investimento
por parte da esfera governamental no sentido de ampliação de acesso e inclusão digital
dos usuários/alunos, para que a EaD possa se consolidar nacionalmente como parte do
processo educacional e de atendimento a todos os segmentos da sociedade.

Referências
ABED. Associação Brasileira de Educação a Distância. Disponível em:
<http://www.abed.org.br> Acesso em: 06 out. 2013.

ABED. Competências para educação a distância: referenciais teóricos e instrumentos


para validação. São Paulo: ABED, 2012.

ANDRÉ, M. E. D. A. Estudo de caso em pesquisa e avaliação educacional. 3. ed.


Brasília: Liber Livro, 2008.

BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. Trad. Michel Lahud e Yara F.


Vieira. 12 ed. São Paulo: Hucitec, 2006.

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.

FIORIN, J. L. Os gêneros do discurso. In: FIORIN, J. L. Introdução ao pensamento


de Bakhtin. São Paulo: Ática, 2008.

FRANCO, M. A. S. Pedagogia como ciência da educação. Campinas-SP: Papirus,


2003.

INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo


da Educação Superior 2010. Brasília: MEC/Inep, 2011.

MACHADO, I. Gêneros discursivos. In: BRAIT, B. (Org.) Bakhtin: conceitos-chave.


4. ed. São Paulo: Contexto, 2008.

SALES, A. B.; OLIVEIRA, M. R.; LANDIM, M. F. Tendências atuais da pesquisa em


ensino de biologia: uma análise preliminar de periódicos nacionais. V Colóquio
Internacional: Educação e Contemporaneidade. Sergipe, Brasil. 2011.
1314

STAKE, R. E. The art of case study research. Thousand Oaks-CA: SAGE


Publications, 1995.
1315

Pôster

Avaliação e trabalho pedagógico: tendências e concepções em escolas da rede


municipal

Carolina do Nascimento Gremelmaier Moreira


Julio Gomes de Almeida
UNICID

Este trabalho apresenta os resultados iniciais de um projeto de pesquisa que


assume como objeto de estudo as tendências e concepções de avaliação presentes na
organização e desenvolvimento do trabalho pedagógico em escolas da rede pública
municipal e tem entre seus objetivos identificar algumas desses tendências e verificar
como essas tendências se manifestam nos discursos dos professores sobre a relação
entre avaliação e trabalho escolar. Neste sentido parte-se da apresentação de um breve
panorama das discussões sobre avaliação no Brasil a partir da Instituição do Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Básica e também as repercussões das avaliações
externas na organização do trabalho pedagógico a partir dos discursos dos professores.
Trata-se de um desdobramento de uma pesquisa desenvolvida no período de
2012 a 2013 em uma escola da Rede Pública Municipal de São Paulo, intitulada “Auto
avaliação Institucional: a construção de indicadores que dialoguem com as avaliações
externas”, cujo objetivo foi verificar a possibilidade de uma escola pública construir
indicadores de qualidade que dialogassem com as avaliações externas. Tal pesquisa foi
realizada por meio de parceria interinstitucional envolvendo a escola e a Universidade
Cidade de São Paulo - UNICID, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo – FAPESP.
O foco de minha participação naquela pesquisa foi entender a percepção dos
alunos sobre o que seria uma escola de qualidade. Minha participação foi de grande
relevância pessoal, pois além de permitir a discussão de questões que há muito me
inquietavam como professora que atua na educação básica, foi fundamental para a
minha inserção no mundo acadêmico pois foi a partir dela que fui sensibilizada para o
ingresso no Programa de Mestrado, onde posso aprofundar aspectos que emergiram
1316

naquele momento e dar continuidade ao meu processo de formação enquanto professora


e pesquisadora.
Para o seu desenvolvimento adotei a abordagem qualitativa e os dados serão
coletados por meio de revisão de literatura sobre o assunto feita por meio de artigos,
teses e dissertações sobre o tema, da análise de documentos oficiais, completados pela
proposição de questionários aos professores de português e matemática das escolas
pesquisadas e realização de entrevista semiestrutura da com um professor de cada
escola. Neste trabalho apresento algumas reflexões sobre os dados produzidos a partir
da revisão de literatura que é a etapa da pesquisa sobre a qual me detive até o momento.
No seu desenvolvimento assumi como referência os trabalhos desenvolvidos por
Afonso (2009), Freitas (2012), Alavarse (2013), Souza (2012), Bonamino
(1999),Bauer(2012), entre outros.
Os dados iniciais mostram que há hoje no Brasil grande preocupação com a
qualidade da educação oferecida aos nossos jovens. Parece haver um consenso no
sentido de que a qualidade da educação oferecida não é adequada e, ao mesmo tempo,
grandes divergências sobre o que seria educação de qualidade e, sobretudo, com relação
à definição de instrumentos eficazes na medida dessa qualidade. Neste contexto tem
grande repercussão as discussões sobre as avaliações externas como instrumentos
capazes de medir essa qualidade. Assim destacam-se alguns conceitos que emergiram
nesta fase da pesquisa e que merecem ser compreendidos. Entre eles destaco: avaliações
externas e internas, regulação e contra regulação: progressão continuada, bonificação
por resultados, autonomia da escola entre outros.
A avaliação interna é feita dentro da escola, pelos próprios professores, afim de,
autoavaliar seu trabalho e mapear o conhecimento dos alunos, sobre externa, é feita de
fora da escola, com uma das finalidades de, medir a qualidade da educação, visando à
utilização de um conjunto de informações para melhor direcionamento nas ações da
escola.
“A avaliação é, então, um processo e uma condição necessários para que se
possam estabelecer e acompanhar metas quantitativas e qualitativas e
verificar se estas últimas são atingidas. Com esse olhar, a avaliação é capaz
de fomentar nas escolas e nas redes uma interpelação sistemática sobre a
qualidade de suas práticas e dos seus resultados, articular os contributos da
avaliação externa com a cultura e dispositivos de autoavaliação das escolas e
reforçar a capacidade das escolas de desenvolver sua autonomia, regulando o
funcionamento do sistema educativo.” (Alavarse, 2013,p. 25)

Com relação aos conceitos de regulação e contra regulação Freitas assim se


manifesta:
1317

É importante notar que o termo “regulação” está relacionado à ação de privatização do


Estado no âmbito das políticas neoliberais. Ao privatizar o estado desresponsabiliza-se
por uma gama de serviços e transfere o controle para mecanismos de “regulação do
mercado”. Porém, transfere o controle para mecanismos de “regulação do Mercado”.
Porém, esse controle visa a retirar do Estado uma eventual capacidade de intervenção
sobre tais serviços, deixando que sejam afetados apenas pelas leis de mercado. A
batalha entre o governo e as operadoras de serviços de telefonia com relação ao reajuste
de tarifas, por exemplo, evidencia esta estratégia. É neste sentido que reafirmamos que o
conceito de regulação não pode ser discutido em abstrato, ser levar em conta a natureza
da política pública que o abria, sob pena de analisarmos a forma e não o conteúdo.
(Freitas,2005 p. 913)
Entender esses conceitos é importante para a compreensão e a relação entre as
políticas de educação e a autonomia da escola. A autonomia da escola segundo Barroso
(1996) pode ser entendida como, um modelo de autogoverno, a escola é capaz de gerir-
se, de tomar atitudes próprias, porém, sem a relação de independência dos órgãos
regulamentadores.
A autonomia é um conceito relacional (somos sempre autónomos de alguém
ou de alguma coisa) pelo que a sua ação se exerce sempre num contexto de
interdependência e num sistema de relações. A autonomia é também um
conceito que exprime um certo grau de relatividade: somos mais, ou menos,
autónomos; podemos ser autónomos em relação a umas coisas e não o ser em
relação a outras. A autonomia é, por isso, uma maneira de gerir, orientar, as
diversas dependências em que os indivíduos e os grupos se encontram no seu
meio biológico ou social, de acordo com as suas próprias leis.” (Barroso,
2006,p. 17)

Refletindo sobre estes conceitos é possível concluir que as políticas de avaliação


de perspectiva neoliberais tendem a não considerar a autonomia da escola uma vez que
estão centradas no controle centralizado do processo avaliativos
Outro conceito importante para se entender a questão da avaliação é a
bonificação por resultados que segundo Alavarse (2012) consiste em recompensar
profissionais que atinjam as metas pré estabelecidas pela administração governamental.

...muitas polítcas de bonificação avaliam o conjunto dos professores e isso


não é justo, porque existem diferenças entre os professores, que não seriam
contempladas, configurando uma contradição nos objetivos dos que
defendem tal bonificação, pois haveria um indicador que é geral, e para
captar cada um dos indivíduos .....ao fazer o uso das avaliações externas para
bonificação você pode anular ou limitar todo o potencial que essas avaliações
1318

teriam em fornecer indicadores para que a escola os incorporasse numa


avaliação institucional.(Alavarse, 2012, p. 127)

A progressão continuada, têm o propósito de garantir a viabilização do fluxo de


alunos e tende a melhorar sua aprendizagem com medidas de apoio como reforço,
recuperação ,etc (Freitas 2005), a bonificação por resultados, como uma progressão
funcional baseada na titulação ou habilitação e na avaliação do desempenho” (Souza
2012) entre outros.
A pesquisa mostra que, embora muito se venha discutindo sobre esses conceitos
ainda há muito que se caminhar para que eles sejam efetivamente compreendidos pelos
professores. A problematização destes conceitos junto aos professores de modo que eles
possam explicitar sua intenção nas situações reais do seu trabalho vem emergindo na
pesquisa como fundamental. As discussões sobre a construção de instrumentos eficazes
como medida da eficácia do trabalho que se desenvolve na escola vem repercutindo
muito nas escolas e nos sistemas de ensino e reclamando a inclusão no espaço
institucional de formação continuada um projetos de estudos sobre avaliação e seus
desdobramentos.
Vale ainda destacar como dado importante desta fase da pesquisa a percepção
pessoal, vinda da observação enquanto profissional que atua na escola, de que as
avaliações externas, assumidas como medida de qualidade,repercutem de forma
diferenciada entre os professores, o que reforça necessidade de entender como essa
repercussão se materializa em diferentes escolas, tomando como fonte de informação as
falas dos professores. Entender a tendências e concepções sobre avaliação presentes nas
escolas a partir dos discursos dos professores pode ser uma contribuição importante
para as discussões que hoje se verifica no campo educacional, particularmente no
sistema municipal de educação de São Paulo.

Referencias

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Cortez, 2009.

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1319

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____________________ Qualidade negociada: avaliação e contra-regulação na


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Alavarse.Revista@ambienteeducacao, jan/jun 2012

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er1998.pdf Acessado em: 20/02/14.
1320

Pôster

O Proeja e o Plano de Desenvolvimento da Educação – desafios da implementação


no processo de expansão do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de
São Paulo

Carolina Machado d´Avila


IFSP / Unicamp – Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos

Resumo: O trabalho destaca concepção de Educação de Jovens e Adultos presente no


Plano de Desenvolvimento da Educação, e de que forma ela se materializa nas
Instituições Federais de Educação Tecnológica. Considerando que o PDE entende a
educação como a principal forma de superar desigualdades sociais, sua aproximação
com a formação para o trabalho é essencial para atender aos objetivos propostos pelo
documento. O objetivo da pesquisa é entender como se deu o processo de expansão da
rede federal e qual o lugar destinado à EJA nessas instituições, destacando as
dificuldades da implementação através da apresentação da quantidade de matrículas no
ano de 2012.
Palavras-chave: PROEJA. Educação de Jovens e Adultos. Plano de Desenvolvimento
da Educação.

Este trabalho pretende analisar as ações propostas pelo Plano Nacional de


Educação – PDE em relação à Educação de Jovens e Adultos – EJA e sua integração
com a Educação Profissional, através do Programa Nacional de Integração da Educação
Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos –
o Proeja; especificamente no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de
São Paulo – IFSP.
Em 2007, logo após o lançamento do PAC – Programa de Aceleração do
Crescimento, o governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva lança o PDE, com o
objetivo de “convidar todos os educadores, das mais variadas visões, os professores, os
alunos, a sociedade brasileira, em suma, para conhecer mais de perto os fundamentos do
trabalho que vem sendo desenvolvido, visando ao seu aprimoramento cada vez maior.”
(BRASIL, 2007, p. 3).
1321

A concepção de educação presente no PDE tem como objetivo formar


indivíduos criativos, críticos, com autonomia para desenvolver-se pessoal e
profissionalmente. O texto propõe uma ligação estreita entre educação e trabalho,
acreditando que o cidadão só poderá ser plenamente formado quando conciliar estas
duas dimensões, capazes de diminuir as diferenças sociais e regionais.
O PDE é um plano executivo, que compreende mais de 40 programas, dentre
eles, o Proeja. “Talvez seja na educação profissional e tecnológica que os vínculos entre
educação, território e desenvolvimento se tornem mais evidentes e os efeitos de sua
articulação, mais notáveis.” (BRASIL, 2007, p. 31).
Nesse caminho, o documento trata os Institutos Federais de Educação, Ciência
e Tecnologia (IFET) como uma experiência inovadora, a qual articula todos os
princípios que influíram em sua formulação. A valorização do ensino médio, através da
integração de conteúdos propedêuticos com conteúdos profissionalizantes contempla a
politecnia, superando a diferenciação entre ensino regular e profissionalização. A
expansão do ensino técnico, ocorrida a partir de 2004, de acordo PDE, seria uma forma
de auxiliar na superação de paradigmas existentes no ensino médio: a “decoreba” de
conteúdos e o currículo vazio no núcleo comum e a mecanização do ensino técnico, que
não auxilia o aluno a inserir-se no mercado de trabalho em profundas mudanças.
A rede federal foi amplamente expandida, instalando-se tanto nos municípios
dos grandes centros e capitais como no interior, desde que fossem, de acordo com
avaliação do Ministério da Educação – MEC, polo de desenvolvimento regional. Entre
2003 a 2006, foram contratados mais de três mil docentes e técnicos administrativos, o
que, de acordo com o PDE é o maior processo de expansão da rede desde sua criação,
em 19091.
A previsão era que, até 2010, a rede federal de educação profissional e
tecnológica fosse ampliada em 150%, com a autorização de funcionamento de mais 214
escolas. Dessa forma, a rede atenderia à demanda de formação local, considerando as
especificidades culturais regionais. Atualmente, de acordo com informações obtidas no
portal do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira -
INEP, a rede federal de ensino é composta por 4032 unidades, com previsão 5623
escolas em funcionamento até o final de 2014.

1
O Decreto n.º 7.566, de 1909 cria as Escolas de Aprendizes Artífices nas capitais dos Estados, voltadas
ao ensino profissional gratuito, formando, assim, a rede federal de ensino profissional.
2
Dados do Censo da Educação Básica de 2013, disponível em http://portal.inep.gov.br/basica-censo-
1322

Para Azevedo (2004, p. XI), essa nova reorganização do sistema educacional é


uma tentativa de desenvolver a economia do País através da aproximação entre
“escolarização, trabalho, produtividade, serviços e mercado”.
Porém, para alcançar esses objetivos há um maior controle sobre o desempenho
escolar dos estudantes, bem como sobre as habilidades que estão sendo adquiridas
durante o curso, muitas vezes com a “importação” de técnicas de gestão das empresas,
tornando os professores e os gestores escolares os representantes principais do novo
gerencialismo. “Tudo isso vem sendo feito em nome da redução dos gastos
governamentais e da busca de um envolvimento direto da comunidade nos processos de
decisões escolares e nas pressões por escolhas, conforme os critérios de mercado.”
(AZEVEDO, 2004, p. XI).
Em 2008, a Lei n.º 11.892 cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e
Tecnologia, a partir da “transformação” dos CEFETs. No entanto, os estudos para a
expansão da rede federal, no Estado de São Paulo, são superficiais (quando acontecem),
o que significa abertura de câmpus do IFSP com cursos “padrão” na área de
informática, em municípios com características das mais diversas, que nem sempre têm
mercado para esses profissionais. Os gestores desses câmpus têm que conseguir fazer
com que esses cursos “deem certo”, com muitos alunos matriculados e baixa taxa de
evasão, na maioria das vezes sem estrutura de equipe e até mesmo sem professores.
Sobre a educação profissional e a educação de jovens e adultos, o PDE se
propõe a superar a visão fragmentada destas modalidades de ensino – educação
profissional desvinculada do ensino médio e alfabetização sem relação com a educação
de jovens e adultos – EJA. A criação do Proeja e do Projovem e a orientação para que se
alterasse a LDB com a inclusão do texto “A educação de jovens e adultos deverá
articular-se, preferencialmente, com a educação profissional”, o que de fato ocorreu
com a Lei 11.741, de 2008, são exemplos da preocupação do governo com esta
população excluída do sistema.
O Proeja é criado pelo Decreto n.º 5.478 e seria ofertado pelas instituições
federais de ensino. Em 2006, é publicado o Decreto n.º 5.840, que revoga o anterior e
estende a possibilidade de oferta do Proeja aos governos municipais, estaduais e
entidades privadas vinculadas ao sistema “S”.

escolar-sinopse-sinopse. Acesso em 20 jul. 2014.


3
Dados do portal da expansão da Rede Federal, disponível em http://redefederal.mec.gov.br/expansao-da-
rede-federal. Acesso em 20 jul. 2014.
1323

O art. 1º do Decreto nº 5.840 estabelece os cursos a serem oferecidos, quais


sejam: formação inicial e continuada de trabalhadores (Proeja-Fic) e educação
profissional e técnica de nível médio (Proeja), indicando que devem ser adequados às
características dos jovens e adultos atendidos na instituição, e o art. 2º dispõe que as
instituições federais deverão implementar o Proeja até 2007, destinando, no mínimo,
10% das vagas para essa modalidade de ensino.
À época da criação do Proeja, a rede federal compreendia a Universidade
Federal Tecnológica do Paraná, os Centros Federais de Educação Tecnológica, as
Escolas Técnicas Federais, as Escolas Agrotécnicas Federais, as Escolas Técnicas
Vinculadas às Universidades Federais e o Colégio Pedro II, conforme o art. 1º, § 5º do
Decreto n.º 5.840.
No Estado de São Paulo, em 2006, o então Centro Federal de Educação
Tecnológica – CEFET, sediado na capital, inicia o curso de Qualificação Profissional de
Operador de Máquinas Operatrizes, na modalidade Proeja, de nível técnico e com a
duração de dois anos. Ao final de 2007, dos 40 alunos matriculados, apenas 8
concluíram, por causa da alta taxa de evasão, somada ao grande número de repetentes.
Além disso, o curso ainda sofreu pressão por parte de professores e alunos do nível
médio integrado, que reivindicavam as vagas para cursos superiores. (ROSTA FILHO,
2010).
Por lei, os IFETs devem destinar o mínimo de 50% das vagas para o ensino
técnico, prioritariamente integrado, para concluintes do ensino fundamental e para o
público da EJA, e 20% para cursos superiores de licenciatura. Em relação ao Proeja, não
há clareza se os 10% previstos para o programa, pelo Decreto 5.840 estão ou não
incluídos nessa nova divisão de vagas.
Para Paiva (2013) o programa nasceu com uma expectativa muito grande de
valorização da educação do trabalhador, com ofertas desde cursos de formação
continuada a ações que incentivassem a pesquisa e a formação de pesquisadores, além
de cursos de formação com currículos de conteúdo propedêutico e técnico efetivamente
integrados. No entanto, a autora, mesmo considerando que é uma política bem
elaborada, pondera que existem dificuldades em sua implementação, uma vez que o
público alvo é completamente diferente do que vinha sendo atendido pela instituição,
até então, demandado novas formas de trabalho aos envolvidos.
Este fato é comprovado pela fala da Diretora de Ensino do Cefet, em 2006,
responsável pelo acompanhamento da implementação do Proeja no Cefet (atual IFSP):
1324

[...] os Cefets não atuavam com EJA, nunca atuaram. [...] O mais parecido
que tinha, era lá em tempos passados, o antigo complementar, [...] para
pessoas que já [...] tinham feito o EJA antigo e depois queriam o diploma de
técnico. Então vinham para cá [IFSP] fazer só o complementar. Ou pessoas
que tinham feito o supletivo. Veio muita gente do supletivo. [...]. Isso acabou,
a partir de 98 [...] porque aí veio o modelo novo, o modelo Cefet e nesse
novo modelo a gente não estava oferecendo nada parecido.

E quando questionada por quê a expansão do Proeja não acompanhou a


expansão dos câmpus,
Não expandiu por […] falta de pessoal preparado, tanto os professores, como
falta de pedagogo, porque esse público precisa de um suporte, […] esse
público precisa de aulas extas, precisa ter um currículo um pouco
diferenciado, coisa que aqui [no IFSP] nunca se fez.

O fato é que em 2013, o IFSP tinha 30 câmpus, dos quais apenas três ofereciam
cursos de Proeja - Sertãozinho, 2 cursos; São Paulo e Cubatão, 1 curso cada, câmpus
esses que já funcionavam à época da criação do programa. E três ou quatro oferecem
cursos de Proeja-Fic, em parceria com prefeituras.
Total
Campus Prefeitura Modalidade Curso
alunos
Cubatão Proeja Informática básica 42

São Paulo Proeja Gestão da qualidade 86

Sertãozinho Proeja Mecânica 104

Sertãozinho Proeja Administração (em extinção) 13


Auxiliar de processos
Guarulhos Guarulhos Proeja-Fic 211
industriais
Operador de máquina de solda
Sertãozinho Sertãozinho Proeja FIC 21
elétrica
Birigui Penápolis Proeja-Fic Auxiliar de torneiro mecânico 156*

Salto Varzea Paulista Proeja-Fic Informática Básica 18

Salto Varzea Paulista Proeja-Fic Gestão Básica de Negócios 17

Total de alunos de Proeja / Proeja-Fic (aproximadamente) 668


Dados retirados do Relatório de Gestão IFSP 2012 e também por informações obtidas na Pró-Reitoria
de Ensino. *As informações sobre o Campus Birigui foram retiradas exclusivamente do relatório de
gestão 2012, não há dados sobre a continuidade dos cursos em 2013.

Informações obtidas no site oficial do IFSP mostram que, em 2013, a


instituição tinha aproximadamente 22 mil alunos matriculados em cursos presenciais e
mais quatro mil em cursos à distância. Em outras palavras, a expansão ocorrida entre
1325

2007 e os dias de hoje, não contemplou a oferta de 10% das vagas para cursos Proeja,
previstas no Decreto n.º 5.840, apesar do programa estar previsto no Plano de
Desenvolvimento Institucional 2009-2013.

Considerações finais

Este trabalho procurou demonstrar os desafios de se implementar a educação


profissional integrada à educação regular, no Brasil, especificamente no IFSP. Um
deles, o mais evidente pelas falas da ex-Diretora de Ensino é a falta de estrutura do IFSP
para adequar suas metodologias e ensino a esse público. Por esse motivo, aas propostas
de valorização desta modalidade de ensino, previstas no PDE não acompanharam,
ainda, a expansão do IFSP.
A educação deve promover a autonomia e o PDE destaca que há uma
concepção dialética entre individuação e socialização. Garantir a formação autônoma é
garantir uma formação que desenvolva competências de apropriação de conteúdos e
capacidade de realizar leituras críticas sobre eles. A criticidade seria desenvolvida mais
pela maneira que se ensina do que propriamente pelo conteúdo que se ensina.
Mas, para que isso aconteça, é necessário que a sociedade tenha acesso à essa
modalidade de ensino, garantindo o direito constitucional à educação. Sendo assim, há
que se buscar os reais motivos da falta de oferta de vagas para cursos Proeja nos novos
câmpus do IFSP, a fim de identificar possíveis entraves e buscar soluções que
viabilizem a oferta desses cursos, destinados à população mais carente e excluída do
sistema, os quais esperam, através da qualificação e formação profissional, o tão
esperado "lugar ao sol".

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Autores Associados, 2004.

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______. Lei nº 11.892, de 29 de janeiro de 2008. Institui a rede federal de educação


profissional, científica e tecnológica, cria os institutos federais de educação, ciência
e tecnologia, e dá outras providências. Disponível em: <http://www. planalto.
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PAIVA, Jane. Sonata para a educação de jovens e adultos: harmonias e dissonâncias na


geopolítica de movimentos de uma década. In: JEFFREY, Debora Cristina;
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SAVIANI, Dermeval. A nova lei da educação: LDB trajetória, limites e perspectivas.


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1327

Pôster

Representações sociais de professores universitários sobre a popularização do


ensino superior

Cláudia Terra
Mestranda UNICID
Adelina de Oliveira Novaes
FCC/ UNICID

Resumo: A perspectiva psicossocial da Teoria das Representações Sociais (TRS)


oferece valioso instrumental para a compreensão das simbolizações construídas no
contexto educativo, por dedicar-se ao estudo dos processos comunicacionais
estabelecidos nas práticas cotidianas. Ao considerar as dimensões figurativa,
informacional e atitudinal das representações dos objetos, a TRS contribui ainda para o
planejamento de intervenções que considerem, além dos elementos cognitivos, os
elementos de ordem emocional. O presente trabalho busca compreender as
representações sociais que professores universitários constroem sobre a “popularização”
do alunado de nível superior, fenômeno caracterizado pela crescente presença de
estudantes pertencentes aos grupos considerados de baixa renda, camada da população
que historicamente esteve distante dos bancos universitários. A proposta investigativa
inclui coleta de informações junto ao corpo docente dos cursos de Direito (15
professores) e de Serviço Social (15 professores) dos períodos matutino e noturno de
uma faculdade privada localizada no centro da cidade de São Paulo.
Palavras-chave: representações sociais, formação docente, popularização do alunado.

O interesse em entender a influência da “popularização” do alunado no ensino


superior sobre o trabalho do professor iniciou em 2012 quando, após seis anos atuando
no treinamento de gerentes comerciais em uma empresa do segmento bancário, retornei
para a educação e me deparei com um público diversificado e salas de aula com grande
número de alunos, além do desafio de colaborar com a formação acadêmica de pessoas,
na grande maioria, distantes da educação há mais de dez anos e, por outro lado buscar a
parceria de colegas docentes para a realização da tarefa de capacitação profissional do
alunado e para os exames oficiais (ENADE), além da iniciação da produção científica.
1328

A atuação diária em sala de aula impulsionou a busca de conhecimento e


pesquisa para tal realidade. Ao ingressar no Programa de Mestrado em Educação entrei
em contato com a Teoria das Representações Sociais de Serge Moscovici e o valioso
instrumental para a compreensão das simbolizações dos professores construídas na
comunicação e na prática cotidiana.
Dessa forma, esta pesquisa busca identificar e analisar as Representações
Sociais dos professores dos cursos de Direito e Serviço Social de uma faculdade privada
localizada no centro de São Paulo sobre a “popularização” do alunado no ensino
superior.
Tem como objetivo geral compreender as representações sociais que os
professores universitários constroem sobre a “popularização” do alunado de nível
superior.
Apresenta os seguintes objetivos específicos: ter elementos para a reflexão das
práticas educativas no contexto dos cursos de Direito e Serviço Social, obter
informações que contribuam para a proposição de estratégias de formação docente para
o ensino superior e contextualizar a Instituição de Ensino Superior (IES) no escopo das
políticas educacionais para o ensino superior.
Dessa forma, o presente trabalho busca compreender as representações sociais
que professores universitários constroem sobre a “popularização” do alunado de nível
superior, fenômeno caracterizado pela crescente presença de estudantes pertencentes aos
grupos considerados de baixa renda, camada da população que historicamente esteve
distante dos bancos universitários.
Os programas sociais oferecidos pelo Governo Federal, sobretudo nas duas
últimas décadas contribuíram para a alteração do perfil do alunado universitário
brasileiro. Esses programas abriram as portas do ensino superior para um público de
baixa renda que muitas vezes não tem na família um histórico de educação formal que
vá além do Ensino Médio (muitas vezes nem sequer completando o Ensino
Fundamental).
Com vistas à captação dessa verba pública ampla e segura, a maioria das
faculdades particulares ampliaram as vagas em seus cursos e facilitaram o ingresso dos
candidatos, eliminando os vestibulares, substituídos pelo processo seletivo exigido pelo
Ministério da Educação (MEC), limitado a uma redação que comprove a alfabetização
mínima desse aluno.
1329

Diante dessa nova condição, as salas de aula passaram a ser compostas por uma
grande diversidade de perfis: na mesma turma é possível encontrar alunos já titulados
em outros cursos e com bom nível de formação acadêmica e outros mal alfabetizados.
Tal diversidade passou a ser o grande desafio dos professores que atuam nessas
instituições de ensino. Por um lado, as direções e coordenações, buscando atender as
exigências do MEC, cobram que seus professores escrevam artigos científicos,
desenvolvam projetos de iniciação científica com os alunos, organizem provas
semelhantes ao modelo proposto no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes
(ENADE).
Por outro lado, as carências básicas de instrução, às vezes de nível
fundamental, fazem com que os docentes tenham que planejar aulas que abordem
conhecimentos e façam uso de recursos metodológicos cada vez mais básicos.
Qual é a prioridade? Atender às exigências de produção docente do MEC, a
excelência na docência, haja vista os referenciais teóricos e metodológicos que devem
ser apresentados ao discente, o desenvolvimento de atividades de ensino, pesquisa e
extensão ou adequar à aula o repertório escolar do alunado, cliente essencial ao
funcionamento da instituição?
Esse novo aluno provavelmente terá dificuldades também com as leituras
teóricas e o espaço da sala de aula será essencial para suprir as lacunas deixadas pelos
textos lidos.
Esse conflito tem gerado desestímulo em muitos professores, que não sabem
como agir entre as expectativas do MEC e as demandas e repertório do alunado.
Acredita-se, portanto, que o conceito da profecia auto-realizadora de Rosenthal (1981)
possa auxiliar a avaliação da dinâmica da relação do professor em relação à
“popularização” do ensino superior.
Assim, esta pesquisa buscará entender a representação social que os
professores universitários constroem sobre a “popularização” do alunado de nível
superior, com vistas a obter elementos para a reflexão das práticas educativas no
contexto dos cursos superiores, bem como obter informações que contribuam para a
proposição de estratégias de formação docente.

A proposta investigativa inclui coleta de informações junto ao corpo docente


dos cursos de Direito (15 professores) e de Serviço Social (15 professores) dos períodos
matutino e noturno de uma faculdade privada localizada no centro da cidade de São
1330

Paulo por meio de questionário que inclui, além das questões de perfil socioeconômico,
questões projetivas elaboradas de modo a apresentar situações comuns ao cotidiano da
relação professor-aluno em sala de aula. As técnicas projetivas de coleta contribuem
para a obtenção de informações que possam escapar ao discurso “socialmente-
aceitável”, por favorecerem a expressão de elementos das representações pela reação a
estímulos não convencionais. Nesse sentido, para a elaboração do questionário,
pretende-se recorrer a imagens e narrativas de dilemas que abordem o fenômeno da
popularização do ensino superior.
A escolha da faculdade deu-se devido a uma particularidade: mais da metade
do alunado da instituição é beneficiada por programas sociais que contribuem para seu
ingresso e permanência no ensino superior.
Após a coleta e sistematização dos dados, procederá a análise de conteúdo dos
discursos dos professores. Pretende-se ter indícios de suas representações sociais, de
modo a ter elementos para a reflexão das práticas educativas no contexto dos referidos
cursos bem como obter informações que contribuam para a proposição de estratégias de
formação docente.

Referências citadas:

ROSENTHAL, Robert e JACOBSON, Lenore. Profecias auto-realizadoras na sala de


aula: as expectativas dos professores como determinantes não intencionais das
capacidade intelectual dos alunos. In: PATTO, Maria Helena Souza (Org). Introdução
à psicologia escolar. São Paulo : T.A. Queiroz, 1981.

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2012.

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Livro : 2012.

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Denise (Org). Tradução de Lilian Ulup. As Representações Sociais. Rio de Janeiro:
EdUERJ, 2001.

JODELET, Denise (Org). Representações sociais: um domínio em expansão. In: As


Representações Sociais. Tradução de Lilian Ulup. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001.

JOVCHELOVITCH, Sandra. Os contextos do saber: representações, comunidade e


cultura. 2. ed. - Petrópolis, RJ : Vozes, 2011.

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reimpr. - São Paulo: EDUC, 2013.

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2012.

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elementos para uma história. In: JODELET, Denise (Org). Tradução de Lilian Ulup. As
Representações Sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001.

SÁ, Celso Pereira de. A construção do objeto de pesquisa em representações sociais.


Rio de Janeiro : EdUERJ, 1998.

SAWAIA, Bader (Org.). As artimanhas da exclusão: análise psicossocial e ética da


desigualdade social. 11. ed. – Petrópolis, RJ : Vozes, 2011.
1332

Pôster

Avaliação Institucional: a participação dos funcionários nos processos avaliativos


da escola

Cristiane Aparecida Ferreira Passos Bueno

Resumo: A pesquisa tem como objeto de estudo a avaliação institucional em escolas da


Rede Pública Municipal de São Paulo, e tem como objetivo compreender como se dá a
participação dos funcionários nos processos avaliativos que se desenvolvem na escola.
A sua realização decorre de minhas inquietações enquanto profissional nesta rede, uma
vez que tenho percebido certa dificuldade para os funcionários participarem dos espaços
formais que lhe são oferecidos. Essas inquietações surgiram a parir da minha
participação em um Grupo de Pesquisa que se formou na escola onde eu atuava
tomando como objeto de estudo a avaliação institucional ali desenvolvida. Por iniciativa
desse grupo foi realizada uma pesquisa por meio de parceria entre a unidade
educacional e a Universidade Cidade de São Paulo, com apoio da FAPESP1. Posso
afirmar que a participação neste grupo foi muito significativa para mim, pois me
colocou em contato com o universo da pesquisa e incentivou a dar continuidade à
investigação sobre a participação dos funcionários iniciada durante a realização daquele
projeto.
Palavras chave: Avaliação Institucional; Espaços formais; FAPESP.

Introdução
A Avaliação Institucional é entendida como um processo, inserido nas escolas públicas
ou privadas, com a finalidade de avaliar as instituições, visando uma reflexão coletiva
que possibilite uma gestão democrática e comprometida com a transformação social, e
leve os educadores a unir esforços no sentido da efetivação da melhoria da qualidade do
ensino.

1
No período de 2012 a 2013 foi desenvolvido na EMEF Coelho Neto o projeto “Auto avaliação
Institucional: a construção de indicadores que dialoguem com as avaliações externas” por meio de
parceria interinstitucional envolvendo essa escola e a Universidade Cidade de São Paulo - UNICID, com
apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP. Nesta pesquisa fui uma das
responsáveis pela coleta e análise dos dados junto aos funcionários da escola.
1333

Entendendo a escola pública como espaço de aprendizagem e convivência num


momento em que tanto se discute sobre a qualidade da educação e que muito se fala na
participação dos diversos atores que atuam no cenário escolar, na definição não apenas
desse padrão de qualidade, mas também dos instrumentos que possam aferi-la, assim
como na participação ativa nos espaços formais que lhe são oferecidos, parece
fundamental incluir os funcionários neste processo. A pesquisa acima referida revelou
que os funcionários parecem excluídos dos processos formais de avaliação que se
desenvolvem na escola e que, mesmo quando chamados a interferir não se sentem à
vontade. E como já foi dito, no momento em que foi desenvolvida a pesquisa citada, e
nela participei mais diretamente da coleta e análise dos dados colhidos junto aos
funcionários, no qual chamou bastante atenção a resistência deste segmento em aceitar a
participar da pesquisa. Ao abordá-los percebi que alguns manifestavam certa
desconfiança ou mesmo constrangimento diante das solicitações. A situação pareceu-me
estranha porque há anos que as leis e normas que organizam o sistema falam de gestão
democrática e participativa e os funcionários integram os colegiados da escola, no
entanto, a sua participação parece resumir-se ao preenchimento formal de vagas no
Conselho de escola e Associação de Pais e Mestres. Dizer apenas que se trata de um
grupo que é resistente certamente não dava conta das expressões por mim
testemunhadas no momento da abordagem. Desta forma, pareceu-me importante
entender os motivos dessa dificuldade de manifestar a própria opinião sobre as questões
relevantes da escola. Assim, essa pesquisa nasce do desejo de entender o porquê dessa
dificuldade. Acredito que por versar sobre uma situação de pesquisa que retrata o real,
este artigo busca fundamentalmente uma boa descrição da realidade estudada e extrair
dela as lições conceituais e instrumentais necessários.

Justificativa
Entender as formas de participação dos funcionários nos processos
avaliativos da escola tem para mim grande importância, uma vez que grande parte do
meu percurso profissional tem sido trabalhando diretamente com esse segmento. Por
outro lado a pesquisa tem também relevância em termos sociais porque será uma
oportunidade de sistematizar conhecimento sobre a participação a partir da voz de um
segmento que é pouco valorizado na dinâmica escolar embora, pelo que observo, exerça
papel importante na formação global dos alunos, pois geralmente fazem de modo
1334

informal, a mediação entre estes e os professores e bem como na gestão escolar, que
frequentemente fazem a mediação entre a escola e as famílias.
Nesse sentido o envolvimento dos funcionários nos processos avaliativos que se
desenvolvem na escola não pode constituir-se em cumprimento formal das exigências
legais quando consideramos um processo de avaliação institucional entendido nos
termos seguintes:
A avaliação institucional é um processo de apropriação da escola pelos seus
atores, não na visão liberal da “responsabilização” pelos resultados da escola
como contraponto da desresponsabilização do estado pela escola, mas no
sentido de que seus atores têm um projeto e um compromisso social junto às
classes populares e, portanto, necessitam além de seu compromisso do estado
em relação à educação.(FREITAS e outros,2012,p.36).

Na perspectiva desse autor a avaliação institucional pode ser um instrumento que


aponta as necessidades da comunidade e também os mecanismos compatíveis com a
construção de soluções, considerando o compromisso dos que atuam na escola com um
projeto social e um compromisso do estado com relação à garantia de condições para o
desenvolvimento deste projeto. Assim torna-se também um mecanismo importante nos
processos formativos que se desenvolvem nos tempos e espaços da escola. A avaliação
institucional como meio de identificação, no trabalho escolar, daquilo que é considerado
adequado e daquilo que pode ser melhorado a partir da consideração dos resultados, das
condições de trabalho e do contexto no qual o trabalho acontece.
A avaliação institucional constitui-se em um processo que muito contribui para a
mudança no olhar das pessoas na medida em que exige que todos se manifestem por
meio de canais que, além de viabilizarem a expressão também proporcionem meios para
problematização dos ruídos. Assim, não basta instituir por decreto que se uma
determinada quantidade de funcionários fizer parte do conselho este segmento está
representado. Aquela pesquisa revela que, embora a proporção numérica seja
importante, pode significar pouco em termos de interferência nas decisões, pois na
cultura escolar há o poder simbólico que em grande medida se impõe. Assim, além da
garantia de proporcionalidade e paridade numéricas parece necessário um
acompanhamento que problematize os ruídos.
Neste sentido precisa ser cuidadosamente planejada, envolvendo todos os
segmentos da instituição, como um processo bem elaborado, que sensibilize e envolva
toda a comunidade escolar, com vistas à garantia de continuidade, e que os resultados
sejam amplamente divulgados a todos os envolvidos no processo e aos poucos se
estabeleça uma cultura avaliativa.
1335

Para cumprir o seu papel social, a instituição escolar necessita organizar um


processo de planejamento que inclui os diversos instrumentos avaliativos. Afinal, qual
é o lugar da avaliação? Se a concepção de qualidade deve ser medida pela avaliação, até
onde as políticas de avaliação avaliam a qualidade? Tais questionamentos surgem na
medida em que vemos a necessidade de sensibilizar a comunidade escolar para a
importância da construção de indicadores que irão apontar as reais necessidades da
escola.
AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL: Processo que busca avaliar a instituição
de forma global, ou seja, contemplando os vários elementos que a
constituem em função de sua finalidade. Através de instrumentos que
permitam a manifestação de suas características próprias (identidade, e que
também a localizem dentro da globalidade do sistema, sem deixar de articular
identidade e globalidade com o contexto social (...). A avaliação expressa
nesse instrumento pretende ser formativa e emancipadora, descarta
assimtodas as formas de classificação e estabelecimento de rankings ou
premiação. Busca-se conhecer a realidade e os seus resultados devem se
constituir em subsídios para a tomada de decisões no sentido de avançar na
melhoria da educação escolar pública do nosso Estado. (...) tem o propósito
de mobilizar as escolas através da reflexão e discussão coletivas,
a fim de criar uma cultura de avaliação institucional como forma de
autoconhecimento e de comprometimento em torno da principal função da
escola, que é a efetivação do processo ensino-aprendizagem. (SEED, 2003-
2006 p. 2 – 3

A partir dessa situação surge a necessidade de compreender porque os


funcionários têm dificuldades de se envolver com as questões relacionadas ao trabalho
escolar. Para compreender essa resistência pareceu-me fundamental investigar mais a
fundo a questão da participação dos funcionários nas decisões sobre a organização do
trabalho escolar.
Desta forma pretendo encontrar elementos que contribuam com a
ampliação da participação dos funcionários nas decisões da escola, pois a partir do
entendimento dos motivos que dificultam a sua participação será possível pensar
formas de intervenção com vistas a inclui-los nas decisões da escola, sobretudo aquelas
relacionadas aos aspectos pedagógicos.

Objetivo Geral
Identificar as formas de participação dos funcionários nos processos de avaliação da
instituição escolar
Objetivos Específicos
1 – Compreender quais são os elementos que dificultam a participação dos funcionários
nas decisões da escola.
1336

2 – Verificar o que diz as normas de funcionamento da escola no que concerne à


participação dos funcionários e comparar com o que eles dizem sobre a própria
participação
Metodologia
Para desenvolvimento da pesquisa será adotada abordagem qualitativa de cunho m
fenomenológico e como instrumento de coleta de dados a análise bibliográfica e
documental completada por trabalho de campo efetivado por meio de observação
participante, questionário e entrevista semiestruturada com realizada em três escolas da
rede municipal, sendo cinco funcionários de cada escola. Serão sorteados, entre os
funcionários que devolverem os questionários respondidos, um funcionário de cada
escola para participar da entrevista. O questionário será proposto somente aos
funcionários públicos, que atuam nas funções de apoio, alimentação e limpeza, sendo
excluídos da pesquisa os funcionários das empresas que assumem os serviços
terceirizados das unidades. O critério de inclusão do funcionário na pesquisa, além de
ser servidor municipal e atuar na escola pesquisada, é aceitar participar da mesma por
meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. As escolas
pesquisadas são localizadas na Região de São Mateus, e pertencem a DRE São Mateus.

Referências
FREITAS, Luis Carlos de, e outros. Avaliação Educacional: caminhando pela
contramão: 4ª edição. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.
SOUSA, S. Z. Avaliação escolar e democratização: o direito de errar. In: Aquino, J. G.
O. Erro e fracasso na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summuns,
1997. p.125-137.

SEED, SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO. Avaliação Institucional da


Educação Básica no Paraná: Processo de Auto Avaliação - Escola. SEED, 2003
1337

Pôster

Indisciplina Escolar e os profissionais da educação

Cristina Munhaes
Adelina de Oliveira Novaes

Universidade Cidade de São Paulo/SP


Programa de Mestrado em Educação
Fonte de Financiamento: Secretaria Estadual de Educação – SP

Resumo: A indisciplina é um dos fatores que podem provocar a exclusão no interior


das escolas e diante dessa problemática, percebe-se a necessidade de repensar a
formação dos profissionais da educação, proporcionando subsídios para a solução do
dilema. Numa perspectiva psicossocial, além da revisão literária, de produções
acadêmicas, análise de documentos como Projeto Político Pedagógico e Regimento
Escolar de uma escola pública estadual, da Região Leste de São Paulo, Capital. O
trabalho se desenvolverá considerando as representações construídas pelos atores
escolares acerca da indisciplina. Para tal, será realizada coleta de informações junto a
alunos do 2º e 3º ano do Ensino Médio, incluindo docentes e inspetores de alunos. Os
questionários serão aplicados por meio eletrônico utilizando-se a técnica de associação
livre combinados à da análise dos discursos obtidos por questões dissertativas.
Palavras-chave: Indisciplina escolar, exclusão, formação de profissionais de educação.

Introdução

O objetivo deste trabalho visa proporcionar subsídios para a reflexão sobre as


competências necessárias aos profissionais da educação frente à problemática da
indisciplina no âmbito escolar. Essa preocupação se faz presente porque a indisciplina
escolar é um dos aspectos que causam exclusão e como instituição envolvida com a
educação, que é exigida como direito de todo cidadão, deve manter-se atenta às novas
exigências dos alunos que freqüentam nossas escolas, proporcionando sua integração de
forma participativa, reflexiva, crítica e consciente.
1338

E se a escola precisa estar apta para receber a nova clientela, é preciso que os
profissionais estejam preparados, o que sugere a revisão de sua prática e um olhar
criterioso para esse atendimento.

Profissionais da educação e suas competências para enfrentar a indisciplina


escolar

Tendo como premissa que a educação é direito de todos, proclamado no


contexto atual brasileiro, pela Constituição Federal de 1988, em seu Art. 205 em que
declara a "educação como direito de todos (...) visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa" (BRASIL, 1988), quanto na Lei de Diretrizes e Bases de 1996, em seu Art. 5º,
que determina que “o acesso à educação básica obrigatória é direito público subjetivo”,
documentos que asseguram o direito ao acesso, obrigatório e gratuito, a escola deve
buscar o firme propósito de formar integralmente os sujeitos que estão em seu interior,
demonstrando seu comprometimento com o ensino, embora existam aspectos que
interferem negativamente, como aponta Araújo quando menciona entraves como “[...]
interesses de grupos privados em detrimento do grupo beneficiário [...] uso político e/ou
clientelístico” (2012, p.93), o que demonstra uma oposição frente ao papel da escola
descrita nos documentos.
É preciso que a escola esteja atenta, portanto para não reforçar as
desigualdades e discriminações produzidas e que acentuando a exclusão dos jovens,
principalmente se observarmos que a própria instituição cria artimanhas, ou perpetua
métodos e instrumentos de controle (FOUCAULT, 2013) que, sob o pretexto de educar,
acaba por impor regras, na tentativa de domesticar os jovens, facilitando o exercício do
poder sobre os corpos (FOUCAULT, 2013) ou sobre o comportamento considerado
adequado ou por meio do poder intelectual (Apple, 2006), exercido pela imposição de
saberes e conhecimentos que ocorre de forma unilateral.
Diante de mecanismos internos engendrados pela instituição escolar,
observa-se, gradativamente, o surgimento de conflitos que resultam na problemática da
indisciplina escolar e na conseqüente exclusão. Para Vianna (1996) a indisciplina é
conseqüência dessa disciplina submissa, suportada pelo medo, que exige obediência
cega, com vistas a manutenção da ordem. Sendo assim, a escola que, frente aos
desafios, se limita a aplicar sanções punitivas para os atos de indisciplina, estará
1339

mantendo “[...] a marca histórica da exclusão, consubstanciada pela enorme


desigualdade social [...]” (DIAS, 2007, p. 443).
Mas o que significa disciplina? Segundo Borba (2011, p. 443), o verbete
disciplina significa “comportamento metódico segundo os princípios de ordem e de
obediência” ou “observância estrita das regras de uma organização”. Logo, se o aluno
não observar ou não cumprir as regras que a escola lhe impõe, o mesmo será
considerado como indisciplinado. Destaca-se que o termo indisciplinado nem sempre
aparece, à luz da literatura ou produções acadêmicas, como um aspecto negativo, se
analisado sob a perspectiva do aluno, quando este percebe ser vítima de injustiça e
tratamento desigual por parte dos educadores.
Nas produções existentes há uma polissemia no que tange ao conceito sobre
disciplina e indisciplina. Para alguns autores, a indisciplina é resultado de um “[...]
enfraquecimento do vínculo entre moralidade e sentimento de vergonha” (LA TAILLE,
1996, p. 11), associado ao constrangimento perante os outros, ou seja, para o autor, a
indisciplina seria o resultado de um total descaso do aluno pelos professores, porque
não consideram erradas condutas assumidas contrárias à moral. Na verdade, esse
enfraquecimento moral estaria intimamente ligado aos novos valores agregados aos
valores pessoais.
Outros autores abordam a questão da moralidade à indisciplina, como
Durkheim (1974), Piaget (1994) que consideram fundamental a necessidade de regras,
alguns mantendo conexão com as fases de maturidade de cada sujeito, apontando para a
necessidade de um controle externo, visando o crescimento humano, até que por si
próprio, o sujeito perceba a necessidade de disciplinar-se.
Contudo, destacam que as regras não podem ser simplesmente impostas,
mas precisam ser compreendidas de maneira que faça sentido assim incorporadas pelo
sujeito que as cumprirá porque faz parte dos seus próprios valores, como coloca Piaget,
ao mencionar que “toda moral consiste num sistema de regras, e a essência de toda
moralidade deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por essas regras”
(1994, p.23).
Entretanto, Passos (1996), por exemplo, aponta para outra perspectiva sobre
a abordagem da indisciplina escolar. Sustenta que a indisciplina, quando colocada em
segundo plano, deixando de ser o foco da atenção dos agentes escolares, permite o
fortalecimento da “[...] aprendizagem e a relação que ela pode gerar com o saber”
(PASSOS, 1996, p. 118) e isto se deve ao fato de que a disciplina deixa de ser o
1340

objetivo a ser alcançado para ser o “[...] caminho para a aprendizagem” (CARVALHO,
1996, p.132).
Para Passos (1996) indisciplina não é indicação de privação de disciplina,
mas a considera “[...] como um fogo que atravessa a calmaria e faz novos movimentos,
diversas invertidas” (PASSOS, 1996, p.118). Nesta perspectiva, “[...] o problema da
disciplina escolar desloca-se do âmbito e da perspectiva moral e comportamental para
situar-se no âmbito da apropriação de práticas e linguagens [...]” (CARVALHO, 1996,
p. 133).
Neste caso, Passos (1996) e Carvalho (1996) defendem que se adotem
práticas educativas que valorizem o universo cultural dos alunos, sem desconsiderar os
conhecimentos e saberes necessários ao processo ensino-aprendizagem.
O que se coloca diante dos profissionais da educação é a necessidade de
buscar um olhar diferenciado sobre a representação que possuem sobre a indisciplina
em sala de aula, visto que muitos ainda buscam

[...] obter tranquilidade, o silêncio, a docilidade, a passividade das crianças de


tal forma que não haja nelas nem fora delas que as possa distrair dos
exercícios passados pelo professor, nem fazer sombra à sua palavra
(WALLON, 1975, p.379).

Não se trata de apontar culpados para a problemática da indisciplina, mas na


dificuldade da escola em “[...] administrar as novas formas de existência social concreta,
personificadas nas transformações do perfil de sua clientela” (AQUINO, 1996, p. 45), o
que exige dos profissionais da educação que adquiram e ampliem “[...] seus
conhecimentos para além da sua própria disciplina [...] [conhecendo] o campo
educacional de modo a permitir maior mobilidade do educador nas várias situações que
lhe coloca o trabalho educativo” (SILVA, 1999, p. 69).
O trabalho educativo, segundo Silva (2003), envolve que os profissionais da
educação tenham como foco que, para percorrer um caminho é preciso considerar “[...]
um ponto de partida, um de chegada [...]” (SILVA, 2003, p.66) e que, diferente do
quese busca numa sociedade predominantemente individualista, de um sistema
globalizado, buscar desenvolver uma prática educativa quer priorize o trabalho coletivo,
buscando soluções aos desafios que se apresentam no cotidiano escolar, como a
indisciplina, considerando-se necessário um olhar mais humanizado (SILVA, 2003),
que privilegie o diálogo, a tolerância, o respeito frente às diversidades, contrária a uma
1341

prática autoritária que visa domesticar, adestrar (FOUCAULT, 2013) ou submeter os


alunos às regras de obediência.

Trajetória metodológica

O estudo recorrerá à revisão da literatura, produções acadêmicas, análise


documental, como o Projeto Político Pedagógico e Regimento Escolar, e por adotar
uma perspectiva psicossocial, será realizada uma coleta de informações junto a 500
estudantes do 2º e 3º ano do Ensino Médio, 50 professores e 05 inspetores de alunos de
uma escola pública, estadual, localizada na Região Leste de São Paulo, Capital. Para a
coleta, serão utilizados questionários eletrônicos que combinam a técnica de associação
livre (ABRIC, 2000) à da análise dos discursos obtidos por questões dissertativas.
As informações obtidas por meio eletrônico, utilizarão o software EVOC
(Conjunto de Programas para Análise de Evocações) para processamento das questões
de associação livre e as obtidas por meio das questões dissertativas receberão o
processamento computacional pelo Programa Alceste (Analyse Lexicale par Contexte
d'un Ensemble de Segment de Texte). Os relatórios dos programas poderão oferecer
elementos para a identificação de categorias temáticas e para a compreensão das
simbolizações construídas pelos sujeitos investigados.
As informações de perfil obtidas também por meio dos questionários
eletrônicos passarão por um tratamento estatístico e serão apresentadas por grupos, de
modo a garantir o anonimato dos respondentes.

Algumas considerações

A mobilização da população ao exigir uma educação para todos, fez com


que o Brasil se preocupasse com ações que garantissem esse direito social. Promulgou
documentos que garantissem os direitos de acesso, permanência, com ensino de
qualidade.
No entanto, a escola deve se “[...] comprometer e lutar pelo direitos de
todos” (FERREIRA, 2005, p. 43) e para tanto, é preciso, ao se deparar com situações
desafiadoras, como a indisciplina escolar, buscar caminhos que vão muito além de
sanções punitivas aos atos considerados de indisciplina, porque estas perpetuam a
exclusão e a desigualdade. Deve almejar caminhos alternativos capazes de solucionar
1342

tais desafios, por meio do diálogo e respeito, possibilitando uma constante reflexão-
ação-reflexão sobre a sua própria prática educativa, na busca por estratégias e
metodologias que contribuam para a inclusão dos alunos no processo educativo,
considerando os conhecimentos prévios que os alunos possuem, e ambicionar uma
relação de interação entre educadores e alunos, por meio de um olhar mais humanizado.

Referências

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MOREIRA, A. S. P.; OLIVEIRA, D. C. (Org.). Estudos interdisciplinares de
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WALLON, H. Psicologia e educação na infância. Lisboa: Editorial Estampa, 1975.


1344

Pôster

Plano de desenvolvimento da escola: limites e perspectivas para a gestão da escola


pública no município da Serra/ES

Cybele Barbosa Brahim


Andreza Alves Ferreira
Universidade Federal do Espírito Santo- UFES

Resumo: Este trabalho analisa em que medida a implantação do Plano de


Desenvolvimento da Escola (PDE Escola) impactou a gestão da escola pública no
município da Serra (ES) procurando evidenciar perspectivas e limites desse programa
nos anos de 2008 a 2013.O trabalho foi desenvolvido a partir da revisão da literatura
sobre a temática e entrevistas com os técnicos da Secretaria Municipal de Educação
(SME), responsáveis pela coordenação dos programas federais destinados aos
municípios. Realizamos ainda, pesquisa nos sites do MEC, Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE) e Sistema de Monitoramento e Ações Integradas do
MEC (SIMEC). Os resultados da pesquisa apontam que a implementação desse
programa denota a fragilidade institucional dos municípios concernente as suas
capacidades/autonomia para conduzirem a política educacional bem como das escolas.
Explicita a atuação do governo federal que, na nossa avaliação não vem desempenhando
o seu papel de coordenador das políticas educacionais, e sim de indutor por meio de
programas vinculados a repasses de recursos, evidenciando a insuficiência de recursos
necessários à manutenção da educação ofertada pelos municípios, bem como a tímida
participação da União no repasse de recursos por meio desses programas. Por fim,
destacamos que os limites para o alcance dos objetivos propostos no PDE Escola
perpassaram pela sua apropriação no órgão central a partir da comunicabilidade
estabelecida entre o modelo de política adotado e a cultura escolar na qual foi inserido.
Palavras-chave: PDE escola, Gestão escolar, Qualidade da educação.

Introdução
Este trabalho analisa em que medida a implantação do Plano de Desenvolvimento da
Escola (PDE Escola) impactou a gestão da escola pública no município da Serra (ES)
procurando evidenciar perspectivas e limites desse programa nos anos de 2008 a 2013.
1345

Foram realizadas entrevistas com os técnicos da Secretaria Municipal de Educação


(SME), responsáveis pela coordenação dos programas federais destinados aos
municípios. Realizamos ainda, pesquisa nos sites do MEC, Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE) e Sistema de Monitoramente e Ações Integradas do
MEC (SIMEC), além de pesquisas bibliográficas sobre o tema.
O PDE Escola1 foi instituído como ferramenta de gestão baseada na metodologia do
planejamento estratégico com o objetivo de melhorar o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (IDEB)2 das escolas que não atingiam as metas estabelecidas para aquele
ano. Se analisado do ponto de vista ideal, pode ser comparado ao Plano de
Desenvolvimento da Educação (PDE)3, porque foi pensado no nível da gestão escolar, para
ser um plano capaz de possibilitar a articulação dos demais programas e ações
desenvolvidas pela escola, abrangendo todas as suas dimensões: financeira, administrativa e
pedagógica.
Desde a sua criação, o PDE Escola vem sendo utilizado como uma ferramenta de gestão dos
recursos repassados via FNDE às Unidades de Ensino (UEs). Foi introduzido nas escolas
consideradas prioritárias4 no ano de 2008, acompanhado de um forte movimento de
formação na metodologia em vários estados brasileiros. Em 2009, o MEC deu início ao
processo de informatização da gestão deste programa por meio da disponibilização de uma
ferramenta na plataforma do SIMEC, de modo que estados, municípios e escolas pudessem
acessá-lo. Assim, as escolas vêm realizando neste sistema, a elaboração de seus PDEs.
Em 2010 o SIMEC passou por algumas alterações, apontando para um formato mais
diretivo no que diz respeito à elaboração do Plano de Ação da escola, com um forte

1
O PDE escola é concebido como um processo de planejamento estratégico desenvolvido pela escola para
a melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem. Advoga que a escola deve, de maneira
disciplinada, conjugar esforços para produzir decisões e ações fundamentais que moldam e guiam o que
ela é, o que faz e por que assim o faz, co
m um foco no futuro. Dentro deste modelo, a escola deve preparar um Plano de Ação apontando os
objetivos e metas a serem alcançadas. Trata-se de um projeto importado no final dos anos de 1990,
pautado em orientações do Banco Mundial (BM) quando do estabelecimento de parcerias com
organismos internacionais para, dentre outros objetivos, realizar empréstimos e, como contrapartida, fazer
concessões político ideológicas, além das econômicas (OLIVEIRA, FONSECA e TOSCHI, 2005).
2
O IDEB foi criado em 2007 para medir a qualidade de cada escola e de cada rede de ensino. O indicador
é calculado com base no desempenho do estudante em avaliações do INEP e em taxas de aprovação.
Assim, para que o IDEB de uma escola ou rede cresça é preciso que o aluno aprenda, não repita o ano e
frequente a sala de aula. O índice é medido a cada dois anos e o objetivo é que o país, a partir do alcance
das metas municipais e estaduais, tenha nota 6 em 2022 – correspondente à qualidade do ensino em países
desenvolvidos.
3
O PDE foi lançado em 2007, por meio do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, instituído
pelo Decreto 6.094 de 24 de abril de 2007. Trata-se, segundo consta neste documento, de um
compromisso fundado em 28 diretrizes e consubstanciado em um plano de metas concretas, efetivas, que
compartilha competências políticas, técnicas e financeiras para a execução de programas de manutenção e
desenvolvimento da educação básica (BRASIL, MEC, 2014).
4
Escolas cujo IDEB, estava abaixo da média nacional estabelecida para aquele ano.
1346

direcionamento à priorização das ações financeiras. Já em 2011 é instituído o PDE Escola


Interativo, cuja característica principal foi tornar a ferramenta autoexplicativa de modo a
facilitar a utilização da mesma. Esta mudança explicitou a intencionalidade do MEC no
sentido de ampliar sua utilização por todas as UEs, não se limitando apenas às escolas
prioritárias, o que ocorreu no ano seguinte - 2012.
Considerando que o principal incentivo das escolas à adesão ao programa era o recurso que
elas recebiam e que as UEs não prioritárias agora também poderiam acessar esta
ferramenta, sem que para isto recebessem recursos, o que garantiria a sua adesão? Que
estratégias foram utilizadas pelo MEC neste sentido? O MEC condicionou o repasse de
recursos referentes a outros programas, à elaboração/atualização do PDE Escola no SIMEC.
Além disso, em 2014, o link de acesso à plataforma do SIMEC recebeu uma nova
nomenclatura: “PDDE Interativo”, sendo apresentado com o objetivo de “melhorar a
identificação com os programas que transferem recursos”. Ou seja, as abas de acesso aos
demais programas foram disponibilizadas dentro do PDE Escola de modo que a escola
somente terá acesso a elas, caso preencha as abas anteriores, como num “game” onde só se
alcança algumas “fases”, depois da ultrapassagem das anteriores.
Constam atualmente nesta plataforma, seis programas endereçados às redes municipais de
ensino: Mais Educação, Água na Escola e Esgotamento Sanitário, Escolas Sustentáveis,
Atleta na escola, Escolas do Campo e PDE Escola. Além de receberem o recurso
diretamente em suas contas, as UE's tornam-se responsáveis pela elaboração e execução
desses programas que, segundo o MEC, é um mecanismo importante para garantir a
autonomia da escola e fortalecer a gestão democrática. Contudo, sua materialização vem se
dando de maneira muito controversa, já que a constatação feita caminha na contramão desta
ideia.

O PDE Escola no contexto da educação municipal da Serra/ES

O município da Serra aderiu ao PDE Escola a partir do ano de 2008, sendo


implementado em seis Escolas de Ensino Fundamental (EMEFs), consideradas
prioritárias. Como a prova Brasil é realizada a cada dois anos, a inclusão de escolas
ocorre neste período. Assim, em 2010 foram incluídas mais vinte e seis, em 2012, mais
seis e em 2014, também mais seis. De modo que hoje do total de sessenta e cinco
EMEFs, quarenta e quatro recebem recursos via PDE Escola.
Conforme já explicitado neste texto, o caso da Serra evidencia os impactos do atual
modelo de gestão das políticas educacionais pelo governo federal aos municípios e,
1347

consequentemente, na gestão escolar. Corroborando a ideia propugnada pela maioria


dos estudiosos do tema, trata-se de um plano onde se privilegia o planejamento com os
gastos em detrimento do planejamento de ações pedagógicas (OLIVEIRA, FONSECA e
TOSCHI, 2005), ao contrário do que se advoga em sua concepção. O que já de início
compromete seu objetivo principal que seria elevar a qualidade da educação.
Todavia, trata-se de um processo permeado por contradições e tensões. Assim, a
implementação desse programa, revela a fragilidade institucional dos municípios
concernente as suas capacidades/autonomia para conduzirem a política educacional
(VIEIRA, 2011). O que aumenta a probabilidade da influência desses programas em
suas práticas. Além disso, explicita a atuação do governo federal que, na nossa
avaliação não vem desempenhando o seu papel de coordenador das políticas
educacionais, e sim de indutor por meio de programas vinculados a repasses de recursos
(ABICALIL, 2013; ARAÚJO, 2013; DOURADO, 2013). Tampouco vem contribuindo
com a necessária instituição de mecanismos de colaboração na implementação das
políticas, já que sua estratégia tem sido a de se relacionar verticalmente com os
municípios, descentralizando programas e ações para os seus órgãos gestores (Secretaria
e UEs).
Esse processo, contudo, mediante as responsabilidades dos municípios em relação à
oferta educacional, evidencia a insuficiência de recursos necessários a sua manutenção
bem como a tímida participação da União no repasse de recursos por meio desses
programas. Assim, os municípios não têm motivação para aderirem a tais programas já
que seus maiores encargos ficam na conta dos cofres municipais.
Um caso que denotou a posição do município neste sentido, diz respeito ao programa
“Escolas Sustentáveis”, lançado no ano de 2013. O principal fator explicativo para sua
adesão consistiu na confluência entre a proposta do programa e o tema escolhido para o
projeto de maior visibilidade da educação no município, encabeçada pelo grupo político
que assumiu a Secretaria naquele período: “Sustentabilidade”. Dessa forma, percebemos
também além da fragilidade do órgão central, a fragilidade das escolas na condução de
seus processos pedagógicos. E isto ocorre por vários fatores: a) ausência de articulação
das ações ao Projeto Político Pedagógico (PPP), que ainda não se constitui em um
instrumento de busca da identidade e fortalecimento da autonomia da escola; b) o
contexto tende a produzir resistência, principalmente em relação ao método proposto e
às exigências técnicas e burocráticas dos programas, complexificando e intensificando
as atividades dos profissionais da educação; c) destinação de recursos à aquisição de
1348

materiais pedagógicos e equipamentos incompatíveis com a provisão de espaços físicos


adequados e profissionais para atuarem com essas ações pedagógicas; d) estruturação e
proposta no Programa não condizente com a realidade e organização dos
tempos/espaços da escola e; d) alta concentração nas mãos do diretor e baixa
participação e pouco envolvimento de professores e/ou demais servidores.

Conclusão

Apesar de reconhecermos os méritos técnicos do PDE Escola e de suas possibilidades


de fortalecer o processo de descentralização de recursos e de inovação das práticas
pedagógicas no interior das escolas, consideramos que este não se constitui numa real
possibilidade de elevar a qualidade da educação por todos os motivos aqui expostos.
Além de seguir com os traços da história da educação brasileira com avanços e
percalços, mas que não deu o passo essencial para a sua transformação. Pela mesma
história também foi possível identificar os elementos para sua efetiva transformação:
financiamento, com maiores recursos; autonomia da escola, com democratização das
relações; reconhecimento, por parte da sociedade de sua importância para a elevação
não só do nível intelectual de seu povo, mas na formação de cidadãos críticos e ativos,
de sujeitos que compreendem o mundo em que vivem e tenham autonomia para atuar
nele. Seria relevante a realização de estudos que avaliem os gastos da União com estes
programas e seu impacto no orçamento público municipal.

REFERÊNCIAS

ABICALIL, Carlos Augusto. Sistema Nacional de Educação: os arranjos na


cooperação, parceria e cobiça sobre o fundo público na educação básica. Educação
& Sociedade. Revista de Ciências da Educação/Centro de Estudos Educação e
Sociedade. Vol. 34. jul-set. 2013. São Paulo: Cortez; Campinas, CEDES, 2013, p. 803-
828.

ARAÚJO, Gilda Cardoso de. Federalismo e políticas educacionais no Brasil:


equalização e atuação do empresariado como projetos em disputa para a regulamentação
do regime de colaboração. Educação & Sociedade. Revista de Ciências da
Educação/Centro de Estudos Educação e Sociedade. Vol. 34. jul-set. 2013. São Paulo:
Cortez; Campinas, CEDES, 2013, p. 787-802.
1349

BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO.


http://simec.mec.gov.br/cte/relatoriopublico/principal.php?system=apresentacao&est=E
S&mun=Serra&municod=3205002&estuf=ES&muncod=32050

DOURADO, Luiz Fernandes. Sistema Nacional de Educação, federalismo e os


obstáculos ao direito à educação básica. Educação & Sociedade. Revista de Ciências
da Educação/Centro de Estudos Educação e Sociedade. Vol. 34. jul-set. 2013. São
Paulo: Cortez; Campinas, CEDES, 2013, p. 761-786.

OLIVEIRA, João Ferreira; FONSECA, Marília; TOSCHI, Maria Seabra. O programa


FUNDESCOLA: concepções, objetivos, componentes e abrangência - a perspectiva de
melhoria da gestão do sistema e das escolas públicas. Educação e Sociedade, Campinas-
SP, v. 26, n. 90, p. 127-147, 2005.

VIEIRA, Sofia Lerche. Poder local e educação no Brasil: dimensões e tensões. Revista
Brasileira de Política e Administração da Educação (RBPAE), v. 27, p. 123-133, 2011.
1350

Pôster

Mestrado em educação sociocomunitária: a formação do professor pesquisador

Deise Becker Kirsch


Programa de Pós-Graduação em Educação/UNISAL
Bolsista PNPD/CAPES

Resumo: Esta investigação analisa os enfoques teórico-metodológicos das dissertações


do Curso de Mestrado, área de Educação Sociocomunitária, do Centro Universitário
Salesiano de São Paulo-UNISAL. O objetivo do estudo é verificar os paradigmas das
pesquisas produzidas por professores da Educação Básica inseridos no Mestrado, no
período de 2005 a 2012, bem como a formação desse docente pesquisador. A
metodologia baseia-se nos estudos de Gamboa (1996; 2000) com o Esquema
Paradigmático para analisar as dissertações. O aporte teórico discute as concepções
filosóficas Positivismo, Fenomenologia, Marxismo e Teoria da Complexidade, além do
referencial que contempla a formação do professor como pesquisador a partir do
Programa Stricto Sensu. Essa pesquisa tem papel significativo, pois, além de contribuir
para a delimitação dos fundamentos epistemológicos nas pesquisas em Educação
Sociocomunitária, identifica elementos centrais para a formação do professor da
Educação Básica na investigação científica.
Palavras-chave: Educação Sociocomunitária. Enfoques teórico-metodológicos.
Professor Pesquisador.

Considerações iniciais

A educação no Brasil, a cada ano que passa, tem ganhado com a formação
continuada dos profissionais do ensino através da pós-graduação, em especial stricto-
sensu. Os cursos de Mestrado em Educação, especificamente, são exemplos disso,
inserindo os sujeitos na produção científica que, além de construírem conhecimentos
específicos em sua área de atuação, contribuem com os processos educativos, sejam
formais, informais e não formais de crianças, adolescentes e adultos.
1351

Sendo assim, a ideia desse estudo nasce de uma inquietação que envolve três
elementos centrais: a fundamentação epistemológica das pesquisas em Educação
Sociocomunitária, do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE), do Centro
Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL); a consolidação da formação do
professor pesquisador a partir do ingresso na Pós-Graduação Stricto-Sensu; e o docente
da Educação Básica que se submete a essa formação e produz cientificamente.
Dessa maneira, temos o problema de pesquisa: quais são os enfoques teórico-
metodológicos das dissertações de Mestrado em Educação do UNISAL no período de
2005 a 2012 e qual a relação com a formação do professor pesquisador que produziu
cientificamente?
Esse estudo se justifica pelo fato de verificar em que medida a inserção no
PPGE/UNISAL está fazendo a diferença na formação e desenvolvimento docente dos
sujeitos sob dois aspectos: na concepção da Educação Sociocomunitária, considerando a
filosofia Institucional: educar para a autonomia, para a emancipação e para a
transformação social; e, no segundo aspecto, no que se refere à produção científica do
professor pesquisador no que concerne à fundamentação epistemológica das suas
dissertações.
Esse segundo aspecto, ao analisar os enfoques teórico-metodológicos que há nas
dissertações do UNISAL, é uma forma de organizar, sistematicamente, o conjunto de
dados das pesquisas e sedimentar os estudos no campo da Educação Sociocomunitária e
da capacitação de professores pesquisadores da Educação Básica, como também
estabelecer paradigmas de pesquisa dentro desse contexto de investigação.
Para tanto, os objetivos da investigação são: proceder à análise dos enfoques
teórico-metodológicos das dissertações dos professores pesquisadores da Educação
Básica que foram alunos do PPGE/UNISAL no período de 2005 a 2012, com base nos
estudos de Gamboa (1996; 2009); e, verificar a relação dessa produção científica para a
formação de professores pesquisadores.

Desenho da investigação

Diante do problema de pesquisa, utilizamos como referencial metodológico,


num primeiro momento, o levantamento exploratório da literatura sobre os enfoques
filosóficos contemporâneos (TRIVIÑOS, 2013) que dão suporte às pesquisas em
1352

educação, especialmente a identificação e discussão em torno dos paradigmas utilizados


no PPGE/UNISAL ao longo de sua existência.
A partir desse levantamento foi possível nomear e discutir acerca do
Positivismo, da Fenomenologia, do Marxismo e da Teoria da Complexidade como
fundamentos epistemológicos e filosóficos de pesquisas em Educação. Além disso, está
sendo realizado o estudo bibliográfico sobre a formação do professor como pesquisador
a partir da inserção em Programa Stricto Sensu.
Num segundo momento do trabalho, a pesquisa bibliográfica ocorre a partir da
coleta de dados das dissertações de Mestrado produzidas no PPGE/UNISAL, no período
de 2005 a 2012.
Ainda nesse segundo momento, baseado no Esquema Paradigmático proposto
por Gamboa (1996; 2009), há a construção de um instrumento, a fim de identificar
dados essenciais das dissertações, tais como: enfoque teórico-metodológico; técnicas e
instrumentos de coleta de dados; maneira de analisar, abstrair, generalizar e classificar o
objeto científico; e, ainda, concepções de homem e educação.
De acordo com Gamboa (1996), a construção do Esquema Paradigmático pode
ser organizada a partir de níveis e/ou pressupostos, o que “subentende uma prévia
tipificação das abordagens metodológicas, assim como de outras categorias relativas às
diversas técnicas de pesquisa [...]” (GAMBOA, 1996, p.56).
A partir do Esquema Paradigmático e, considerando os níveis e/ou pressupostos
acerca de cada dissertação, é possível verificar os enfoques teórico-metodológicos bem
como os pensamentos que existem em torno da produção de conhecimentos
(GAMBOA, 1996; 2009) e, assim, estruturar o todo em relação à produção científica
em questão.
No terceiro e último momento, ocorre à análise paradigmática das dissertações e
o estabelecimento das relações entre essa produção científica e a formação dos
professores pesquisadores no Programa Stricto Sensu.

Elementos teóricos do estudo

Pensar no Programa de Pós-Graduação Stricto-Sensu, nível Mestrado, é se


referir à formação do sujeito pesquisador, além de, consequentemente, esse sujeito estar
ampliando e aprofundando seus conhecimentos profissionais.
1353

No Curso de Mestrado em Educação do UNISAL, no período de 2005 a 2012,


temos o dado de que mais de 70% dos seus alunos são professores da Educação Básica,
o que significa que o Programa está participando da constituição de docentes
pesquisadores. Considerando o histórico de formação de professores, essa estatística é
relevante, isso porque, conforme aponta Fazenda (1999, p.80)

o educador, na maioria dos casos, era apenas objeto das pesquisas. A falta de
formação em pesquisa e a ausência de uma linguagem pedagógica própria
conduziram-no ao isolamento da sala de aula, isolamento esse agravado pelo
desprestígio da carreira e falta de tempo para reflexão e estudo.

Além de esse dado ser essencial para o campo da formação de educadores, esse
estudo tem importância também pela nossa preocupação em torno da qualidade dessa
constituição do professor como pesquisador durante a realização do Curso de Mestrado.
Partimos do pressuposto que é necessário que todo profissional em educação tenha o
mínimo de clareza em relação à base teórica e metodológica de seu trabalho científico.
Nesse sentido, fazer pesquisa requer trabalho mental árduo, discussão teórica e
epistemológica, e é isso que diferencia e identifica o pesquisador dos demais sujeitos.
Para Japiassú (1995, p.86) “O intelectual define-se e afirma-se pelo caráter diferenciado
do seu trabalho. Enfim, ele afirma-se como alguém que tem direito ao pensamento e à
paixão por esse pensamento (esta paixão se denomina “filosofia”).”
Sendo assim, nossa construção da pesquisa perpassa também pela discussão
acerca das tendências filosóficas mais estudadas e citadas na literatura científica,
considerando que estas contemplem os diferentes olhares que envolvem as produções
em pesquisa educacional.
Dentre as correntes de pensamento contemporâneo, na nossa perspectiva,
elencamos: o Positivismo, a Fenomenologia, o Marxismo, e a Teoria da Complexidade.
Torna-se relevante, de maneira breve, destacar algumas características dessas tendências
filosóficas.
O Positivismo é uma das concepções filosóficas e predominou no século XIX,
tendo como fundador Augusto Comte. De acordo com os paradigmas de pesquisa
(CHIZZOTTI, 1998) de estudo dos fatos sociais, o positivismo foi o primeiro a surgir.
Nesse paradigma, tem importância a observação fiel dos fatos (externos ao
sujeito) e que, a partir desses dados particulares, é possível conceder significado geral e
universal. Comte (1876) em seu trabalho revela essa concepção quando expõe que todos
os fenômenos estão sujeitos a leis naturais invariáveis.
1354

A palavra positivo, desse modo, está diretamente relacionada ao sentido do real,


do útil, da certeza, do preciso e do organizar (RIBEIRO JUNIOR, 1991; TRIVIÑOS,
2013). Isso se refere à necessidade de estudo e de conclusões concretas, palpáveis, para
não dizer apenas mensuráveis, do conhecimento sistematizado de modo a não deixar
dúvidas nem espaço para ociosidades.
A Fenomenologia nasce no final do século XIX e início do século XX com
Husserl, embora outros autores tenham usado essa palavra antes de Husserl
(MOREIRA, 2004). Como estudo das essências (TRIVIÑOS, 2013; MOREIRA, 2004;
DARTIGUES, 2002), a Fenomenologia considera que o mundo está posto e, a partir
disso, é possível descrever e esclarecer as experiências vivenciadas (TRIVIÑOS, 2013).
Esse paradigma de pesquisa busca entender a realidade em todos os aspectos da
vivência humana.
Para Bueno (2003, p.19), na Fenomenologia
o seu papel é o de distinguir e revelar o que há de essencial na percepção do
fenômeno, o que requer a suspensão dos juízos sobre a realidade que nos
cerca. É como se o indivíduo adotasse uma espécie de abandono provisório
do mundo para melhor captá-lo. Husserl denominou esse processo de redução
fenomenológica ou epoché..

Essa suspensão de juízo é marcante na obra de Merleau-Ponty (1994) que,


seguidor da Fenomenologia de Husserl, coloca como fundamental esse abandonar-se,
provisoriamente, de certos valores, de preconceitos, para que se compreenda o objeto
em investigação.
Outro ponto relevante da Fenomenologia, conforme Triviños (2013), é a
intencionalidade da consciência humana ao olhar para o objeto. Essa intenção está
relacionada ao sujeito buscar o entendimento acerca de um fenômeno, ou seja, é o dado
que apreendo em minha consciência.
O Marxismo, advém dos estudos de Marx que é caracterizado como “um
pensador jovem-hegeliano diretamente influenciado por Feuerbach” (FREDERICO,
1995, p. 11). A ideologia e a ciência do marxismo denominam-se Materialismo e é o
oposto do Positivismo.
Diversos autores escrevem e aprofundam essa abordagem Marxista, mas para
Minayo (2012, p.24) o marxismo “[...] considera a historicidade dos processos sociais e
dos conceitos, as condições socioeconômicas de produção dos fenômenos e as
contradições sociais [...].”
1355

O Materialismo Dialético, fundamento do Marxismo “[...] tem como base seus


princípios a matéria, a dialética e a prática social, mas também aspira ser a teoria
orientadora da revolução do proletariado” (TRIVIÑOS, 2013, p.51)
A dialética, por sua vez, preocupa-se na investigação das contradições existentes
na realidade, “[...] está vinculada ao processo dialógico de debate entre posições
contrárias [...]”, conforme aponta Richardson (1999, p.45). Nesse conflito de ideias que
geram verdades para um determinado tempo, evidenciamos a concepção da
transitoriedade dos fenômenos, visto que esse processo, em espiral, envolve sempre
uma tese, antítese, síntese, e assim sucessivamente.
Sem dúvida, o Marxismo merece destaque como um dos enfoques teóricos nas
práticas de pesquisas educacionais, pois considera o contexto sociocultural e o processo
contraditório existente nos fenômenos analisados.
A Teoria da Complexidade deixa de lado os princípios que norteiam o
paradigma clássico, ou a chamada teoria cartesiana, para olhar o mundo, os fenômenos e
o fazer ciência considerando todos os fatores que estejam interligados aos
acontecimentos bem como àqueles que parecem, num primeiro momento, não estar
diretamente relacionados aos fatos.
Para entendermos essas concepções, podemos partir da definição de
complexidade posta por Morin (1990, p. 17):

[...] é um tecido (complexus: o que é tecido em conjunto) de constituintes


heterogéneos inseparavelmente associados: coloca o paradoxo do uno e do
múltiplo [...] é efectivamente o tecido de acontecimentos, acções, interacções,
retroacções, determinações, acasos, que constituem o nosso mundo
fenomenal.

Tal citação demonstra que a complexidade é o oposto a qualquer pensamento ou


paradigma de simplificação, de pormenorizar fatos para entendê-los.
O conhecimento, desse modo, é inacabado, incerto, e as explicações sobre os
fenômenos precisam ocorrer dialeticamente. Ciência, assim entende-se, não pode ser
delimitada ou limitar-se, e sim estar constantemente aberta para a imprevisibilidade.
A partir dessas breves ideias acerca dos fundamentos filosóficos que podem
embasar a pesquisa científica, é importante sinalizar que, independentemente de qual
abordagem seja utilizada, investigar significa ter clareza da seriedade e do
comprometimento que envolve esse trabalho. Pesquisar não é assistir aula nem decorar
1356

conteúdos para serem reproduzidos na avaliação. Pesquisar possibilita sujeito ativo e


interativo com os colegas e com o próprio conhecimento.
Conforme escreve Demo (2010, p.16):

Pesquisa é princípio científico, mas igualmente princípio educativo. Autoria


não é marca apenas do pesquisador supremo, mas de todos os docentes que
produzem textos próprios, reconstroem conhecimentos com alguma
originalidade, aprendem a escudar-se na autoridade do argumento, não no
argumento da autoridade.

Desenvolver pesquisa, portanto, é aprender uma atividade em que o


investigador mergulha no mundo da incerteza, do problema a ser pesquisado, do estudo
aprofundado, da construção de fundamentação teórica e metodológica e da arte de
escrever, de questionar e de discutir no campo da educação.

Alguns apontamentos

Quando olhamos para o PPGE/UNISAL, observamos o quantitativo


significativo de professores da Educação Básica em busca da capacitação para a
pesquisa científica através do curso de Mestrado. Eles são profissionais inseridos no
mercado de trabalho e que buscam novos horizontes para sua formação e
desenvolvimento docente.
Nosso estudo, ao buscar mapear os paradigmas das pesquisas em Educação
Sociocomunitária bem como verificar a formação do professor pesquisador, está
preocupado com a qualidade e consistência da fundamentação epistemológica da
investigação científica além da repercussão disso na prática docente.
Isso porque, o professor pesquisador, se ainda não observa sua realidade
escolar com inquietação e olhar apurado, vai fazê-lo assim que ingressar no campo da
pesquisa científica e, mais que isso:

Quando o aluno aprende a lidar com método, a planejar e a executar


pesquisa, a argumentar e a contra-argumentar, a fundamentar com autoridade
do argumento, não está só “fazendo ciência”, está igualmente construindo a
cidadania que sabe pensar (DEMO, 2010, p.20).

O autor apresenta a ideia da educação cidadã através da pesquisa, desse saber


pensar e que, segundo o próprio Demo (2010, p.21), significa “saber construir e usar
ciência e tecnologia para fins sociais éticos e cidadãos.” Ou seja, quem ainda pensa que
pesquisar é ato para superdotados, que são cientistas de branco isolados em seus
1357

laboratórios, está um tanto enganado. Muitos profissionais estão envolvidos no campo


da investigação científica e esse número tende a crescer, contribuindo, assim, para a
formação de sujeitos e de uma sociedade melhor.

Referências

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PEIXOTO, Adão José (org.). Interações entre Fenomenologia & Educação. Campinas:
Alínea, 2003.

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DEMO, Pedro. Educação Científica. Boletim Técnico do Senac: Revista de Educação


Profissional, Rio de Janeiro, v. 36, n.1, p. 15-25, jan./abr. 2010.

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FAZENDA, Ivani (org.). Novos enfoques da pesquisa educacional. São Paulo: Cortez,
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RIBEIRO JUNIOR, João. O que é positivismo. São Paulo: Brasiliense, 1991. 10 ed.
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RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas,
1999.

TRIVIÑOS, Augusto N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa


qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 2013.
1359

Pôster

Estudantes do parfor, gestores das escolas em que atuam e qualidade da educação


infantil: possíveis convergências e fortalecimento da identidade profissional

Domeiver Elias Santiago Verni


Maria Angélica Rodrigues Martins
Universidade Católica de Santos (UNISANTOS)
Agência financiadora: Capes

Resumo: Trata-se de pesquisa em fase inicial inserida em projeto Obeduc/Capes


centrado na implantação do Parfor. Focaliza professores-estudantes de um curso de
Pedagogia subsidiado pelo Programa nas escolas em que atuam, relacionando-os com
seus gestores em termos de concepções e ações acerca do tema qualidade na educação
infantil, dado que a maioria absoluta atua em creches. A pesquisa integra a terceira fase
do projeto Obeduc/Capes e orienta-se pela questão: a identidade profissional que está
sendo forjada no curso de Pedagogia subsidiado pelo Parfor, apontada nas pesquisas
anteriores com o grupo de professores-estudantes, tem condição de manter-se e reforçar-
se nas práticas cotidianas das escolas em que esses professores atuam? O estudo prevê
observação e caracterização de duas escolas de um mesmo município que contam com
mais de dez estudantes Parfor. Prevê aplicação de questionário e entrevistas com os
professores-estudantes e respectivos gestores escolares.
Palavras-chave: Políticas de Formação de Professores. Qualidade da Educação.
Educação Infantil.

Uma proposta
Trata-se de pesquisa em fase inicial inserida em projeto Obeduc/Capes intitulado
Políticas de Formação de Professores: implicações, desafios e perspectivas para a
constituição da identidade profissional e para as práticas pedagógicas, centrado na
implantação do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica –
Parfor. O projeto é desenvolvido em uma universidade confessional que oferece curso
de Pedagogia presencial subsidiado pelo Parfor, iniciado no segundo semestre de 2010.
O Parfor é um plano emergencial, gerenciado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (Capes) que visa a assegurar a formação exigida na Lei de
1360

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) para todos os professores que atuam
na rede pública de educação básica, oferecendo, gratuitamente, cursos superiores de
qualidade (BRASIL, 2009).
A pesquisa objetiva compreender a constituição das identidades profissionais em
formação a partir de um programa emergencial de formação como o Parfor, analisando
as implicações, os desafios e as perspectivas para as IES, para as escolas e seus
professores.
Esta investigação situa-se na terceira fase do projeto maior, momento que focaliza os
estudantes que cursam ou concluíram o curso de Pedagogia patrocinado pelo Parfor e as
escolas em que atuam. Resultados de estudos realizados nas fases anteriores com
professores-estudantes do Parfor em uma universidade confessional mostraram que
mais de 70% desses estudantes atuam em escolas de educação infantil públicas, com
crianças de zero a três anos, como funcionários não incluídos no quadro do magistério
que lutam por essa inclusão.
Desempenham funções similares (monitores, atendentes de educação, auxiliares de
classe, de creche, de desenvolvimento infantil), são mulheres com 31 anos ou mais ,
casadas e que declaram ter podido cursar a licenciatura dada a oportunidade oferecida
pela Capes, uma vez que a região geográfica em que vivem e trabalham não dispõe de
universidade pública, apesar de contar com cursos isolados oferecidos por elas.
As pesquisas anteriores realizadas no âmbito do curso apontam a gratidão dessas
professoras-estudantes ao programa e à instituição de educação superior que as acolheu,
especialmente ao curso de Pedagogia e seus professores e seu ganho em autoestima,
autoconfiança pessoal e profissional e conhecimento.
A primeira fase da pesquisa cuidou da identificação e da inserção sócio-profissional do
grupo, a segunda das relações com o curso e com a profissão de professor. A terceira
prevê observação nas escolas em que atuam e a análise das relações com os gestores e
demais professores.
As pesquisas que integrarão esta terceira fase do projeto Obeduc/Capes orientam-se por
uma questão de fundo: a identidade profissional que está sendo forjada no curso de
Pedagogia subsidiado pelo Parfor, apontada nas pesquisas anteriores com o grupo de
professores-estudantes, tem condição de manter-se e reforçar-se nas práticas cotidianas
das escolas em que esses professores atuam?
Este estudo, iniciado no corrente ano, pode ser considerado como voltado aos contextos
da prática e dos efeitos de uma política tal como propostos por Ball (1994), citado por
1361

Mainardes (2006). Situa-se em nível micro, focado em práticas cotidianas, assume


caráter exploratório, sendo considerado como um ponto de partida para análise da
recepção ou repercussão de uma política de formação de professores em duas escolas de
educação infantil de um município que concentra todo o atendimento de crianças de
zero a seis anos em escolas de educação infantil por ele mantidas, isto é, escolas
públicas. Não mantém convênios com entidades particulares.
A investigação estrutura-se em torno de questões como: qual a recepção/repercussão do
Parfor em escolas que têm professores nesse programa? Há evidência de resistência a
eles por integrarem o Parfor? Os profissionais envolvidos, professores-estudantes e
gestores, podem expressar-se livremente, discutir dificuldades, concepções, dúvidas? Há
conflito, contradições e tensões entre eles que possam ser atribuídas à formação
recebida no curso de Pedagogia subsidiado pelo Parfor? Quais as principais dificuldades
encontradas no contexto da prática?
O tema escolhido para permear essas questões é o da qualidade do atendimento na
educação infantil, comparando as práticas e visões (informações, crenças, atitudes) dos
professores-estudantes Parfor e as dos gestores das escolas.
O foco nos estudantes Parfor e nos gestores mediado por questões de qualidade deve-se
aos seguintes fatores. Primeiro: os professores-estudantes têm como campo de trabalho
escolas de educação infantil, com crianças de zero a três anos. O atendimento a crianças
dessa faixa etária esteve, até o advento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (BRASIL, 1996), sob a responsabilidade da assistência social e ainda guarda
resquícios de assistencialismo (CAMPOS et al., 2011).
Segundo: as pesquisas levadas a cabo por Campos e outros (2006, 2011) relatam a baixa
qualidade ou a fragilidade do atendimento a essa faixa etária. Terceiro: ao mesmo
tempo, a legislação, recomendações oficiais como os Indicadores de Qualidade da
Educação Infantil oferecem critérios para analisar a qualidade nesse nível da educação
escolar. Quarto: o Plano Nacional de Educação - PNE 2014 (BRASIL, 2014) prevê em
sua meta 1, que trata da universalização do atendimento de crianças em idade pré-
escolar e da ampliação da oferta de creches para crianças de zero a três anos, a
estratégia 1.6 que consiste em realizar, até o segundo ano de vigência do Plano,
avaliação da educação infantil, a cada dois anos.
Desse cenário derivam questões relacionadas aos contextos da prática e dos efeitos do
Parfor quando se trata da qualidade da educação infantil. Dentre elas, a investigação
busca privilegiar o entendimento de professores -estudantes Parfor e gestores a respeito
1362

da qualidade nesse nível da educação escolar. Há convergências? Divergências? Como


são expressas? Há oportunidade de diálogo, de discussão? Há conflito? Quais itens de
qualidade são enfatizados? Por quê? Há percepção do espaço de ação dos profissionais
atuantes na escola, no caso, gestores e professores para incrementar a qualidade da
educação oferecida? Há cooperação? Há espaço para o exercício de alguma autonomia,
aqui considerada como relativa às finalidades da educação escolar?
O objetivo mais geral da pesquisa consiste em buscar convergências e divergências no
entendimento e nas ações ligadas à qualidade da educação infantil por professores-
estudantes Parfor e gestores das escolas em que atuam. Deriva de um dos objetivos do
Parfor melhorar a qualidade da educação básica pública (BRASIL, 2009), aqui
representada pela educação infantil. Mais especificamente, a pesquisa tem por objetivo
caracterizar o ambiente de atuação dos professores-estudantes Parfor, mapeando suas
oportunidades de ação profissional tal qual por eles intencionadas e anunciadas em
estudos anteriores com esse grupo. Tem como objetivo conhecer seu entendimento a
respeito de qualidade da educação escolar, com detalhamento para as especificidades da
educação infantil, assim como dos gestores das escolas em que atuam. Identificar se as
concepções de qualidade dos professores-estudantes e dos gestores convergem para as
propugnadas pelo MEC. Identificar convergências e divergências entre os grupos -
professores-estudantes e gestores. Conhecer se o trazido pela formação recebida no
Parfor é aceito, reconhecido e valorizado pelos gestores. Em resumo, a pesquisa busca,
a partir do posicionamento sobre qualidade na educação infantil, analisar implicações,
desafios e perspectivas geradas pelo Parfor para as escolas e seus professores.

As primeiras referências
No Dicionário de Língua Portuguesa Houaiss (2009), qualidade é substantivo feminino,
e, dentre outras, trata-se da propriedade que determina a essência ou natureza de um ser
ou coisa; e conjunto de traços psicológicos e/ou morais de um indivíduo e característica
comum que serve para agrupar (seres ou objetos).Verifica-se que qualidade não é
unidimensional. Quer dizer, as pessoas não avaliam um produto ou serviço tendo em
conta apenas uma das suas características, mas várias, daí talvez a necessidade de
considerar a qualidade como sendo um conjunto de requisitos para qualificar um objeto.
Quando se trata de qualidade na educação escolar, a LDBEN 9.394/1996 dispõe, no
artigo 4° - item 9, que é dever do Estado garantir os padrões mínimos de qualidade de
ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos
1363

indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem. (BRASIL,


1996)
Segundo Dourado e Oliveira (2009) a análise da qualidade da educação deve dar-se em
uma perspectiva polissêmica, uma vez que esta categoria traz implícita múltiplas
características. Os autores desenvolvem a perspectiva de que uma escola de qualidade
socialmente referenciada e apresenta dimensões intra e extraescolares fundamentais
para a construção de uma educação de qualidade para todos, no contexto histórico,
político, econômico e cultural da educação brasileira.
O Ministério da Educação (MEC) publicou os principais fundamentos para o
acompanhar e analisar a qualidade da educação infantil no documento Parâmetros
Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil (2006). Em 2009, fundado nos
princípios de atendimento aos direitos fundamentais da criança, na legislação existente e
em resultados de pesquisa sobre educação infantil, o Ministério, por meio de sua
Secretaria de Educação Básica, publicou Indicadores da Qualidade na Educação
Infantil, que objetivam traduzir e detalhar aqueles parâmetros em indicadores
operacionais, no sentido de oferecer aos profissionais das redes e sediados nas escolas,
assim como às comunidades atendidas pelas instituições de educação infantil um
instrumento adicional de apoio (BRASIL, 2009), de uso simples e flexível, que
propicia uma autoavaliação da escola de educação infantil que requer adesão voluntária
e realização em perspectiva democrática e participativa.
O instrumento foi elaborado com base em aspectos considerados fundamentais para a
qualidade da instituição de educação infantil, expressos em sete dimensões: 1 –
planejamento institucional; 2 –multiplicidade de experiências e linguagens; 3 –
interações; 4 – promoção da saúde; 5 – espaços, materiais e mobiliários; 6 – formação e
condições de trabalho das professoras e demais profissionais; 7 – cooperação e troca
com as famílias e participação na rede de proteção social. Cada dimensão é detalhada
em uma série de indicadores, com eles é possível identificar o que vai bem e o que vai
mal na instituição de educação infantil, de forma que todos tomem conhecimento e
possam discutir e decidir as prioridades de ação para sua melhoria.
Estudo de Campos, Fülgraff e Wiggers (2006) a respeito da pesquisa sobre qualidade da
educação infantil no Brasil aponta para uma situação dinâmica mas ainda contraditória
nas redes e escolas, revelando que a distância é grande entre as metas legais e a situação
vivida pela maioria de crianças e adultos que convivem no cotidiano das instituições de
educação infantil.
1364

Campos e outros (2011) em pesquisa ampla sobre qualidade da educação infantil que
envolveu seis capitais brasileiras ratificam resultados de outras pesquisas sobre esse
nível da educação básica e, apesar das desigualdades regionais e locais das escolas
estudadas, revelam que os resultados da pesquisa reforçam a urgência de políticas
educacionais que possibilitem avanços tanto nas creches como nas pré-escolas, isto é, na
educação infantil como um todo: infraestrutura adequada, melhor orientação, formação
continuada de pessoal tanto em nível das escolas como das redes (equipes técnicas das
secretarias). Trata-se enfim de saber se as condições oferecidas nas escolas permitem às
crianças exercer seu direito à educação de qualidade. Recomendam que as pesquisas
aprofundem o conhecimento a respeito das condições de funcionamento das escolas e
redes e que avancem no sentido apontar caminhos para alterar tais condições.

Os caminhos a percorrer
Neste primeiro momento, a pesquisa em andamento está sendo pautada por referências
de qualidade que incluem os documentos legais e oficiais citados. O trabalho de campo
de natureza qualitativa, enfatizará os sujeitos, suas posturas e ações, em seus locais de
trabalho, em seu ambiente natural.
No desenvolvimento da pesquisa estão previstos os seguintes momentos que poderão
ocorrer de forma interdependente: 1) elaboração do referencial teórico precedido e
acompanhado por levantamento bibliográfico sobre o tema-problema; 2) análise e
consideração dos requisitos de qualidade na educação escolar e da educação infantil
infantil 3) análise dos dados colhidos nas fases anteriores da pesquisa em busca de
dados de qualidade; 4) elaboração de roteiro de observação na escola, complementação
de questionário de caracterização das escolas nos moldes do adotado pela pesquisa
maior; estudo de projeto pedagógico, regimento e outros documentos ligados à atuação
dos gestores e professores das unidades escolares estudadas; aplicação de questionário e
realização de entrevistas com gestores e professores-estudantes Parfor nas escolas; 5)
análise dos dados à vista dos objetivos da pesquisa maior e desta pesquisa, assim como
de seu referencial; 6) indicação de ganhos e de possíveis aprofundamentos necessários à
pesquisa a respeito da repercussão de uma política de formações de professores no que
respeita à qualidade da educação infantil.
1365

A exposição dos resultados


Prevê-se que o relatório da pesquisa estará estruturado em quatro partes. A primeira
composta por um capítulo dedicado a políticas de formaçào de professores, com
destaque para o Parfor e suas características tanto em âmbito nacional como local. A
segunda sobre educação escolar e qualidade, com foco na qualidade da educação
infantil. A terceira dedicada aos caminhos da pesquisa com explicitação dos
procedimentos metodológicos e técnicos da pesquisa. A quarta dedicada à análise dos
dados, seguida pelas reflexões resultantes da investigação realizada.

Considerações iniciais
Numa volta ao objetivo geral do projeto Obeduc/Capes que consiste em "compreender a
constituição das identidades profissionais em formação a partir de um programa
emergencial de formação como o Parfor, analisando as implicações, os desafios e as
perspectivas para as IES, para as escolas e seus professores" e ao objetivo geral desta
pesquisa " buscar convergências e divergências no entendimento e nas ações ligadas à
qualidade da educação infantil por professores-estudantes Parfor e gestores das escolas
em que atuam" coloca-se a questão de fundo orientadora da terceira fase do projeto: a
identidade profissional que está sendo forjada no curso de Pedagogia subsidiado pelo
Parfor apontada nas pesquisas anteriores com o grupo de professores-estudantes tem
condição de manter-se e reforçar-se nas práticas cotidianas das escolas em que esses
professores atuam?
Em outros termos: os contextos da prática e dos efeitos do Parfor nas escolas ou sua
repercussão no cotidiano escolar sinalizam para a possibilidade de fortalecimento da
identidade profissional dos professores-estudantes participantes desta pesquisa?
O caminho que está sendo proposto neste estudo para procurar pistas para respondê-la
consiste em introduzir um tema de interesse comum - qualidade na educação infantil- e
buscar convergências de divergências em torno dele nas práticas escolares, no cotidiano
das escolas, onde se inclui o posicionamento dos sujeitos sobre o tema, de modo a
reunir informações, registrar e analisar a inserção, as possibilidades de ação e de
desenvolvimento profissional de professores-estudantes Parfor nas escolas.
1366

REFERÊNCIAS

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Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, disciplina a atuação da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior -CAPES no fomento a
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1367

Pôster

Formação continuada de professores do ensino técnico no estado de São Paulo –


Centro Paula Souza

Elaine Cristine de Sousa Luiz


Programa de Mestrado em Educação
Professora do Centro Paula Souza
Mestranda da Universidade Cidade de São Paulo

Resumo: O trabalho do professor na área de educação profissional é desafiador e lida


com muitas dificuldades como questões vinculadas a desigualdades sociais e exigências
do mundo do trabalho. Esse tipo de ensino é entretanto relevante para o
desenvolvimento profissional do professor e não deve ficar à mercê de sua ação
individual. Deve, ao contrário, ser objeto de políticas públicas implementadas pelos
órgãos educacionais dirigentes de modo a se mostrar significativa, garantindo ao
professor momentos reflexivos que lhe permita relacionar a teoria à sua prática. O
objetivo geral deste trabalho é identificar a visão dos professores sobre a formação
continuada concedida por uma instituição de ensino técnico e como pode ser percebida
a relação dos conteúdos dos cursos com seus desenvolvimentos profissionais. Para sua
consecução
serão realizadas entrevistas com base em roteiro pré-estruturado junto a 15 docentes –
localizadas no município de São Paulo que tenham realizado cursos oferecidos pela
instituição nos últimos três anos.
Palavras chaves: Ensino técnico, Formação continuada, Centro tecnológico Paula
Souza.

Introdução

Formada em Administração de empresas, iniciei minha carreira em uma escola


técnica de Ensino Médio. Nessa instituição, pude realizar vários cursos de formação
continuada do eixo com embasamento em gestão e negócio. Percebi, então, que há,
nessa área, uma grande demanda por cursos e que a maioria dos docentes que os
realizam são do interior de São Paulo. Presenciei várias conversas informais, nas quais
1368

os docentes relatam dificuldades encontradas para a realização dos cursos sendo as mais
frequentes relacionadas à falta de tempo, ao fato de que os cursos não respondem suas
expectativas iniciais e que, muitas vezes, não se referem à temática apresentada nos
instrumentos de divulgação.
Desse modo, percebi a necessidade de estudar, a visão dos professores sobre as
capacitações realizadas por uma instituição de Ensino Técnico, buscando identificar
como esses docentes relacionam os conteúdos dos cursos com seu desenvolvimento
profissional.
A discussão presente nesta comunicação é parte importante da dissertação de
mestrado que se encontra em andamento no programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Cidade de São Paulo.

Justificativa

Embora tenha havido nos últimos anos várias iniciativas no país voltadas para o
fortalecimento da formação continuada, a literatura indica que ainda são muitos os
desafios para que se chegue a uma aformação de tipo significativa, que garanta ao
professor momentos reflexivos que lhe permita relacionar a teoria à sua prática. Na área
de ensino técnico, especialistas avaliam que aa formação continuada deve considerar as
exigências do mercado de trabalho e focalizar os conteúdos pelos quais são
responsáveis. E que precisa ainda a fazer parte de um conjunto de ações sistemáticas
voltadas para o desenvolvimento profissional dos professores, e não estar baseada em
ações pontuais e aleatórias. Minha experiência com professora de um centro de ensino
profissionalizante mostra que várias das iniciativas dessa instituição não são acessadas
pelos professores e que muitos criticam o conteúdo. Desse modo, cabe se perguntar
sobre abrangência dessas opiniões, observando de forma sistemática a visão desses
profissionais sobre a formação continuada oferecida.

O problema da pesquisa

O que pensam os docentes do Centro Tecnológico Paula Souza e sua


participação nos processos formativos oferecidos pela instituição por meio do programa
CETEC/CAP (Centro Paula Souza Capacitação).
1369

Objetivo geral

Identificar a visão dos professores sobre a formação continuada oferecida por


uma Instituição de Ensino Técnico e perceber a relação dos conteúdos dos cursos com
seus desenvolvimentos profissionais.

Objetivos específicos:

• Verificar o que pensam docentes de uma Instituição de Ensino Técnico


sobre os cursos oferecidos por ela;
• Verificar-se, na opinião dos docentes dessa instituição, a formação
continuada ali oferecida fornece subsídios que permitem aprimorar sua prática e
desenvolver sua capacidade profissional;
• Levantar junto aos docentes sugestões que possam contribuir com a
formação do docente de Ensino Técnico.

Discussão de Literatura

Vários autores , como Luckesei (1992), Ramos (2007), Imbernõn (2000),


Aranha (2006), Andre (2012) têm se preocupado com a relação entre a formação
continuada e a qualidade do processo de trabalho nas escolas.
A revalorização da profissão docente deve começar pelos cuidados com a
formação do professor. E ainda é preciso fazer com que o professor supere a percepção
de que exerce atividades meramente burocráticas. Desse modo, os cursos de formação
devem ser momentos efetivos de reflexão sobre a educação.
Além disso, o professor precisa adquirir os conhecimentos científicos
imprescindíveis para o ensino do conteúdo pelo qual é responsável. Para Aranha (2006),
“A formação ética e política do professor permitiria a melhor compreensão a respeito do
que é relevante na aprendizagem, a fim de evitar o enciclopedismo, o academicismo, o
tecnicismo ou a manipulação do educando”. De acordo com Aranha (2006, p.43).
A formação do professor deve gerar ruptura de tradições, inércias e ideologias
impostas, formando o professor na mudança e para a mudança por meio do
desenvolvimento de capacidades reflexivas em grupo. Desse modo, os caminhos seriam
1370

abertos para a verdadeira autonomia profissional compartilhada, já que a profissão


docente inclui a difusão do conhecimento no contexto social.
Portanto, o desenvolvimento profissional do professor é decorrente de sua prática
pedagógica e do conhecimento da interação consigo mesmo. O docente é, para ele, um
agente social que precisa apresentar capacidade e autonomia no exercício de suas
funções. Assim, precisa sempre se atualizar para se formar e sempre aprendendo e
reapredendo para ensinar.
A prática educativa, a troca de experiências, a realização de projetos, as práticas
sociais e coletivas e os trabalhos em conjunto possibilitam sua formação que nunca se
esgota. Portanto, de acordo com Imbernõn (2000) a formação continuada do professor,
nessa perspectiva, deveria permitir a relação entre a teoria para e a prática.
A educação profissional traz desafios devido à sua dinâmica agressiva do
mercado. Ela captaria as tendências do mundo global e do trabalho. O contexto
socioeconômico atual e futuro, bem como as tendências do mercado estimula a
aprendizagem de forma constante sobre o domínio das tecnologias e atualização da área
de atuação. Assim, avalia que a escola está isolada dos setores produtivos e sociais e
entender as necessidades do mercado exige a formação de um profissional que seja
capaz de lidar com o fator de produtividade e melhorias de competitividade.
Além disso, a formação no campo profissional lida com a vulnerabilidade de
jovens desempregados e, muitas vezes, de baixa renda. São trabalhadores em processo
de conversão para a inserção no exigente mundo do trabalho, o que traz tensão para os
professores, pois é importante enfatizar a questão da prática solicitada pelo mundo
globalizado e relacionar com as aprendizagens ensinadas nas escolas, segundo, Ramos
(2007).
Adotando por base as características básicas do educador e do educando, como
seres humanos e como sujeitos da práxis pedagógica, afirma-se que o papel do educador
inclui, dentre outros elementos, condições para que o educando aprenda, e se
desenvolva, de forma ativa, a criar uma sistemática, acrescenta .Luckesi (1992, p. 119).
Já André (2012) ao analisar políticas voltadas à formação continuada, afirma que
estas precisam assegurar que os docentes trabalhem em um ambiente que favoreça seu
bom desempenho profissional. Para ela, estratégias de apoio, acompanhamento e
capacitação podem ajudar a reduzir o peso do trabalho desse profissional que precisa
lidar com muitos desafios. E afirma ainda que a formação para a docência não se
encerra na conclusão dos cursos de licenciatura, mas deve prosseguir ao longo da car-
1371

reira. Essa oferta de formação continuada seria, para ela, um passo importante para que
o iniciante não desanime diante das dificuldades e possa buscar os instrumentos e
apoios necessários, sejam eles colegas mais experientes, ex-professores da universidade,
ações ofere¬cidas na escola ou em outros espaços formativos.
Mas essas iniciativas não podem depender da vontade pessoal nem se limitar ao
âmbito individual. Caberia, nessa perspectiva, aos órgãos gestores da educação inserir
alguns programas de apoio à docência num plano mais amplo de desenvolvimento
profissional para que as ações formativas tenham continuidade após o período
probatório.

Essa literatura sobre os desafios do desenvolvimento profissional do professor e


sobre a formação continuada nos leva a fazer algumas afirmações:

1 – O trabalho do professor na área de educação profissional é desafiador e lida com


muitas dificuldades como questões vinculadas a desigualdades sociais e exigências do
mundo do trabalho;
2 – A formação continuada é muito relevante para o desenvolvimento profissional do
professor e não deve ficar à mercê sua ação individual. Deve, ao contrário, ser objeto de
políticas públicas implementadas pelos órgãos educacionais dirigentes;;
3 – A formação continuada deve ser significativa, garantindo ao professor momentos
reflexivos que lhe permita relacionar a teoria à sua prática;
4 – A formação continuada para professores da educação profissional deve considerar as
exigências do mercado de trabalho e focalizar os conteúdos pelos quais são
responsáveis;
5 – A formação continuada deve fazer parte de um conjunto de ações sistemáticas
voltadas para o desenvolvimento profissional dos professores, e não estar baseada em
ações pontuais e aleatórias.
É, portanto, oportuno e necessário aprofundar a discussão sobre a visão dos
professores sobre a formação continuada concedida por uma instituição de ensino
técnico e como pode ser a relação dos conteúdos dos cursos com seus desenvolvimentos
profissionais.
1372

Metodologia

Segundo André (2005) estudos de caso podem ser utilizar em pesquisa


educacional quando se deseja estudar uma unidade social, no caso em questão, a opinião
de docentes do CEETPS sobre sua formação continuada. A autora afirma que esse
expediente metodológico pode apoiar a descrição de: “ações e comportamentos, captar
significados, analisar interações, compreender e interpretar linguagens, estudar
representações, sem desvinculá-los do contexto, e das circunstâncias especiais em que
se manifestam.” (p. 93). Na pesquisa, será feito essas atividades baseando-se nas ideias
dessa autora.
Serão realizadas entrevistas com base em roteiro pré-estruturado junto a 15
(quinze) docentes de três ETECs – localizadas no município de São Paulo que tenham
realizado cursos oferecidos pela instituição nos últimos três anos, e:
Entrevistas com tutores e professores que foram responsáveis pela oferta dos
cursos: serão onde quatro desses mostrará por meio de informações o envolvimento dos
docentes com os cursos oferecidos.
E, por fim, será realizada a análise de registros sobre o fenômeno e: serão
avaliações feitas pelos docentes ao final do curso realizado.

Referências

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1374

Pôster

A formação de educadores ambientais em um curso de pedagogia: primeiras


análises

Eliane Aparecida Toledo Pinto1


Jandira Liria Biscalquini Talamoni2

Resumo: A ideia de desenvolver essa pesquisa surgiu da minha atuação como docente,
há onze anos, no curso de Pedagogia, e da minha trajetória acadêmica nos cursos de
licenciatura em Ciências Biológicas e Pedagogia. Pude perceber na formação de
professores uma carência em relação à formação em ciências e, em particular, a
educação ambiental (EA). Os conhecimentos em EA são tratados geralmente de forma
superficial; há carências por parte dos graduandos em relação a vários conteúdos,
dificultando o processo de ensino-aprendizagem e, consequentemente, a formação e
atuação desses estudantes. Partindo dos argumentos referentes à desejada formação de
professores para que possam atuar efetivamente em EA e, também, considerando o
papel do professor e a influência que este exerce nos processos de ensino-aprendizagem,
é que surge a necessidade de contribuir adequadamente para a formação de futuros
professores de um curso de pedagogia e para que os mesmos venham atuar como
educadores ambientais.
Palavras-chave: Educação; Educação Ambiental; Formação de Professores.

INTRODUÇÃO/JUSTIFICATIVA
Uma das principais preocupações da sociedade moderna é com a questão
ambiental, desencadeando assim uma série de iniciativas tanto no âmbito de políticas
públicas quanto no contexto educacional (CASTRO et al, 2000). Essas iniciativas
surgem com o propósito de reverter a situação atual, de consequências decorrentes da
degradação ambiental, face ao desenvolvimento e à produção intrinsecamente ligados
ao sistema capitalista vigente (MORGADO, 2006).
De acordo com Leff (2003, p.15-16):

1
Doutoranda em Educação para a Ciência, UNESP-Bauru.
2
Docente do Depto. de Biologia e no Programa de Pós Graduação em Educação para a Ciência,
Faculdade de Ciências, UNESP, Bauru/SP.
1375

A crise ecológica é a crise do nosso tempo. O risco ecológico questiona o


conhecimento do mundo. Esta crise se apresenta a nós como um limite no
real que re-significa e re-orienta o curso da história: limite do crescimento
econômico e populacional; limite dos desequilíbrios ecológicos e das
capacidades de sustentação da vida; limite da pobreza e da desigualdade
social.

Neste contexto, uma das iniciativas propostas é a EA, que as instituições de


educação básica estão procurando desenvolver, na busca da formação de cidadãos
críticos, conscientes, participativos e comprometidos com as principais preocupações da
sociedade (SERRANO, 2003 apud MORGADO 2006, p. 5).
De acordo com Jacob (apud TRISTÃO, 2004), a dimensão ambiental se
configura crescentemente como uma questão que envolve um conjunto de atores do
universo educativo e, assim, potencializa o engajamento dos diversos sistemas de
conhecimento, a capacitação de profissionais, a formação inicial e continuada de
professores e a comunidade universitária em uma perspectiva interdisciplinar.
Embora Costa Lima (1999 apud SOUZA 2010, p. 77) afirme não entender “a
educação como uma panacéia capaz de solucionar todos os problemas sociais, mas,
também, consideramos não ser possível pensar e exercitar a mudança social sem
integrar a dimensão educacional”, percebe-se a temática ambiental como uma
possibilidade fecunda de união de professores e alunos em situações de ensino-
aprendizagem, nas quais a problematização tem sido facilmente atingida, por envolver
direta ou indiretamente, questões vitais. Para tanto, há necessidade de formarmos
professores que possam desenvolver a EA de forma contextualizada, crítica e
transformadora e, neste sentido, Loureiro afirma:

temos também que buscar a superação do caráter moralista e moralizante que


temos observado em algumas ações educativas ambientais para a construção
da educação ambiental crítica e emancipatória (2004).

Sabe-se que a EA é também educação em suas várias dimensões, estando


intrinsecamente relacionada a formação humana, portanto, um processo de apropriação,
pelos sujeitos construída histórica e coletivamente pela própria humanidade. Desta
forma, o processo educativo ambiental diz respeito à relação entre cidadania, ambiente e
aspectos históricos construídos pela humanidade e, neste sentido, é imprescindível, no
contexto educacional, a preparação de professores com competência para atuar como
agentes transformadores.
1376

Partindo dos argumentos referentes à desejada formação de professores para


que possam atuar efetivamente em EA e, também, considerando o papel do professor e a
influência que este exerce nos processos de ensino e aprendizagem, é que surge a
necessidade de analisar e identificar em que medida o processo de formação de futuros
professores de um curso de pedagogia pode contribuir para que venham atuar como
educadores ambientais.

METODOLOGIA
A pesquisa em educação, especificamente em EA, tem se pautado na metodologia
da pesquisa qualitativa. Os métodos qualitativos são apropriados quando o fenômeno
em estudo é complexo, de natureza social e não tende à quantificação. Normalmente,
são usados quando o entendimento do contexto social e cultural é um elemento
importante para a pesquisa. Para aprender métodos qualitativos é preciso aprender a
observar, registrar e analisar interações reais entre pessoas, e entre pessoas e sistemas
(LIEBSCHER, 1998). Para Kaplan e Duchon (1988), as principais características dos
métodos qualitativos são: a imersão do pesquisador no contexto e a perspectiva
interpretativa de condução da pesquisa.
Sob a ótica teórico-metodológica, Tozoni-Reis (2007) aponta que a pesquisa
qualitativa é uma referência para a EA vista como estratégia de intervenção social,
levando em conta, a necessidade de organizar-se de acordo com as exigências da
sustentabilidade, da participação, da interdisciplinaridade, da conscientização, da
continuidade, da autonomia, da transformação e da coletividade.
Baseando-se nessas considerações, esta pesquisa se caracteriza qualitativa com
análise documental.

RESULTADOS E DISCUSSÃO INICIAIS


A pesquisa está sendo desenvolvida no curso de Pedagogia da Faculdade
Municipal de Filosofia, Ciências e Letras de Ibitinga/SP e inicialmente realizou-se a
análise do Projeto Político Pedagógico (PPP) do curso de Pedagogia, juntamente com o
ementário e dos planos de curso das disciplinas, buscando refletir criticamente sobre a
dimensão das questões ambientais inseridas nos mesmos. Cabe salientar que
descreveremos apenas esta primeira etapa da pesquisa neste momento.
O PPP tem sido o foco de estudo para professores, pesquisadores e instituições
educacionais, seja na instância nacional, estadual e/ou municipal, com o intuito de uma
1377

melhoria da qualidade do ensino (VEIGA, 1998). Assim, o PPP deve ser percebido
como um instrumento que norteia as ações presentes e futuras no âmbito educacional,
ou seja, ele deve orientar e direcionar as ideias dos processos pedagógicos com base nas
reflexões dos gestores, do corpo docente e dos recursos humanos que compõem o
ambiente escolar.
O curso de Pedagogia tem como modalidade descrita em seu PPP a seguinte
descrição para a formação do pedagogo: o licenciado em Pedagogia, formado pela
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ibitinga (FAIBI), tem como campos de
atuação profissional: as funções de docente na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do
Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio (na modalidade Normal), na
Educação de Jovens e Adultos e na Educação Profissional (na área de serviços e apoio
escolar); gestão educacional (Direção de Escola, Vice-Direção e Coordenação
Pedagógica); e em outros campos de atuação profissional não escolares em que a
pluralidade dos conhecimentos pedagógicos seja relevante.
A estrutura curricular do curso de Pedagogia foi elaborada conforme os Pareceres
CNE/CP 5/2005 e 3/2006, a Resolução CNE/CP 01/2006 e a Deliberação CEE nº
78/2008. O currículo do curso de Pedagogia está organizado por Núcleos de
Conhecimento, em consonância com a Resolução CNE/CP nº 01, de 15/05/2006.

I- Núcleos de Conhecimento
1- Núcleo de Estudos Básicos (por meio do estudo de literatura específica, da
reflexão e de ações críticas sobre realidades educacionais).
2- Núcleo de Aprofundamento e Diversificação de Estudos (este núcleo
volta-se para áreas de atuação profissional priorizadas pelo projeto
pedagógico).
3- Núcleo de Estudos Integradores (este núcleo, por meio de atividades
complementares, proporcionará o enriquecimento curricular e compreende a
participação dos discentes).
II- Estágio Supervisionado.
III- Residência Escolar (objetivo principal fazer com que o graduando em
Pedagogia possa conhecer, na prática, o cotidiano de sua futura profissão) .
IV- Disciplinas Eletivas.
V- O Núcleo de Estudos Integradores.

O PPP analisado traz em seu cerne a história da Instituição, do curso, concepção


do curso, sua missão, seus objetivos, perfil profissional, campo de atuação, corpo
docente, papel dos coordenadores e dirigentes, infraestrutura física e tecnológica,
sistema de avaliação e ainda ementas e bases curriculares.
A carga horária total do curso de Pedagogia é de 3.640 horas, com aulas teórico-
práticas composta por disciplinas curricular; eletiva e monografia de conclusão de curso
1378

com 2.820 horas, estágio supervisionado com 400 horas, atividades complementares
com 100 horas e a residência escolar com 320 horas.
O futuro pedagogo deverá atuar sob os princípios de caráter transversal para
atender a uma abordagem pluralista da educação, e ainda parte da interdisciplinaridade
para se alcançar esses princípios no processo educativo. Entre estes princípios tem-se:

- Atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade


justa, equânime, igualitária;
- Promover e facilitar relações de cooperação entre a instituição educativa, a
família e a comunidade.
- Identificar problemas socioculturais e educacionais com postura
investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com
vistas a contribuir para superação de exclusões sociais, étnico-raciais,
econômicas, culturais, religiosas, políticas e outras.

A presença de características como sociedade justa, equânime, igualitária,


diferentes formas de pensar e atuar sobre a realidade e a complexidade, nos remete a
suscitar que o ser humano esteja em harmonia com o meio onde vive. Assim, esse
princípio para o processo educativo, nos deixa aberto a possibilidade/necessidade da
inserção da EA, para que se chegue ao fim desejado.
Podemos ainda também recorrer à EA inserida nesse contexto das características
de princípios da educação, pelo fato de a mesma, antes de tudo, ser Educação
(LAYRARGUES, 2006).
Outro ponto encontrado no PPP do curso acerca da dimensão ambiental diz
respeito às competências e habilidades que o profissional deve possuir, destacando:

O conjunto de conhecimentos e saberes transmitidos aos graduandos deve


fornecer-lhes o número mais satisfatório possível de competências e
habilidades que lhes permitam transitar por uma educação que solicita, cada
vez mais, uma formação plural, inter e multidisciplinar, tornando o
profissional capaz de oferecer aos seus alunos uma visão ética do mundo e
um conjunto de valores que possam norteá-los não só em sua formação
educacional, mas, inclusive, em suas próprias vidas.

Especificamente nesse ponto, o PPP do curso de Pedagogia da FAIBI, reflete a


importância do profissional em educação, na obtenção dos conhecimentos e na
transmissão para seus alunos, além da formação ética do mundo e o conjunto de valores
que possam orientá-los para a vida levando em consideração a formação plural, inter e
transdisciplinar.
Como mais uma ferramenta para poder identificar e responder algumas
inquietações relacionadas à dimensão ambiental presente do Curso de Pedagogia, foi de
1379

extrema necessidade analisar o currículo do presente curso, como também conhecer o


que as ementas trazem em suas essências para se obter uma formação pedagógica
coerente com as necessidades atuais da sociedade. Nesta análise pode-se observar que
durante o Curso de Pedagogia, há quatro disciplinas que abordam a dimensão
ambiental: Biologia Educacional, Natureza e Sociedade, Tópicos Contemporâneos,
Conteúdos e Metodologia de Ciências.
Especificamente na disciplina Natureza e Sociedade encontramos em sua ementa
a importância e a relação existente entre o homem e a natureza através do tempo, ou
seja, as heranças deixadas pela humanidade, com suas concepções de mundo, natureza,
ser humano e sociedade, além da preocupação quanto aos problemas ambientais.

As relações do Homem com a natureza ao longo do tempo, desde a


antiguidade (desenvolvimento da agricultura na beira dos grandes rios) até os
dias atuais. A importância do conhecimento científico para o
desenvolvimento sustentável da humanidade. Os grandes cientistas: Galileu,
Copérnico, Newton, Einstein e outros. Efeito direto do homem sobre a
natureza: Destruição da Camada de Ozônio e Efeito Estufa. Energia e formas
de gerar energia elétrica. ECO 92, Protocolo de Kyoto, Copenhaguen
Conference 2009 e as Conferências mais recentes. As relações entre o
homem e a natureza do ponto de vista legal.

Na disciplina Tópicos Contemporâneos também são abordados temas


específicos sobre educação ambiental, meio ambiente, atitudes, terra e universo, vida e
ambiente, ser humano e saúde, tecnologia e sociedade, conforme ementa abaixo:

Conceitos teóricos: Moral e Ética. Objetivos e valor da ética na educação.


Responsabilidade social. Ações educativas com foco no meio ambiente.
Articulação da teoria e da prática da educação ambiental. Conceitos,
procedimentos e atitudes sobre: Terra e Universo; Vida e Ambiente; Ser
Humano e Saúde; Tecnologia e Sociedade.

Para Guimarães (1995) é um importante enfoque a ser perseguido pelos


educadores ambientais, já que permite, pela compreensão mais globalizada do ambiente,
trabalhar a interação em equilíbrio dos seres humanos com a natureza. Assim, o
educador precisa trabalhar intensamente a integração entre ser humano e ambiente,
conscientizando que o ser humano é natureza e não apenas parte dela.
Nos programas e ementas das disciplinas, assim como no PPP do curso de
Pedagogia, a EA se apresenta de forma clara em alguns momentos, porém ainda de
forma sutil, no que diz respeito a atender ao caráter interdisciplinar e transversal
proposto pelos PCNs.
1380

Evidenciamos também nas duas disciplinas supracitadas a inserção de caráter


político nas tomadas de decisão que reorienta o modo de vida dos indivíduos e suas
influências e consequências. Segundo Loureiro:

Nesse sentido, é preciso que fique claro para o conjunto dos educadores
ambientais que nos compomos não somente em sujeitos pedagógicos (no
sentido estrito da palavra) ecológicos, mas igual mente em sujeitos políticos,
e de modo unitário nessas três dimensões (LOUREIRO, 2006, p. 106).

Podemos observar ainda outras disciplinas que podem vir a tratar de EA, como é
o caso das disciplinas Filosofia da Educação I e II, Sociologia da Educação,
Fundamentos da Ação Educativa em Espaços Não Escolares e Conteúdos e
Metodologia de Geografia, que apresentaram em seu plano de ementas características
que remetessem ao estudo das questões ambientais. Essa prática interdisciplinar e
transversal objetiva superar a fragmentação do conhecimento.
Observamos que apesar de tantas disciplinas oferecidas no curso de Pedagogia,
apenas algumas trazem em seu planejamento a discussão acerca dos aspectos
ambientais, bem como a transversalidade proposta pelos PCNs, incluindo assim, os
temas transversais em seus programas.
A ausência da EA nas demais ementas das disciplinas dispostas no PPP, de
forma transversal e contextualizada com quaisquer que seja a área de conhecimento,
denuncia o que Guimarães (1995) denomina de falta de integração entre diferentes
saberes científicos, dificultando a melhor compreensão da realidade, que é integrada,
formando uma totalidade.
Ao analisar o PPP do curso de Pedagogia, pode-se observar de forma sutil a
inserção da temática ambiental em suas ideologias.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O curso de Pedagogia deve preparar o professor para a formação de um sujeito
que compreenda a relação existente entre homem, natureza e sociedade, bem como a
sua influência no planeta e como pode agir politicamente, cientificamente,
cotidianamente, para preservar o meio ambiente.
A formação de educadores ambientais para a Educação Básica deve ser garantida
durante a formação superior, constituindo nos futuros professores uma consciência
ambiental crítica, que os capacite a compreender que os problemas ambientais que
enfrentamos atualmente estão relacionados ao crescimento tecnológico e populacional,
1381

advindo do domínio do homem sobre os recursos naturais. Assim, é imprescindível que


a formação do professor contemple o que é necessário para que esse se torne, também,
educador ambiental. Nesse sentido, a formação do educador ambiental no curso de
Pedagogia também passa pela questão da organização curricular dessa formação ao
longo do curso, que independente de se dar em uma disciplina específica, deverá
contemplar conteúdos que permitam a construção de uma compreensão sólida dos
conceitos fundamentais, a relação entre teoria e prática e a formação didático-
pedagógica necessária para que os futuros professores realizem uma EA de qualidade
nas escolas.

REFERÊNCIAS
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parâmetros curriculares nacionais. In: LOUREIRO, C.F.B. et al. (Orgs.). Sociedade e
meio ambiente: a educação ambiente em debate. São Paulo: Cortez, 2000. p.157-179.

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(Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico)

KAPLAN, B.; DUCHON, D. Combining qualitative and quantitative methods in


information systems research: a case study. MIS Quarterly, v. 12, n. 4, p. 571-586,
Dec. 1988.

LAYRARGUES, P. P. Muito além da natureza: educação ambiental e reprodução


social. In_ CASTRO, R. S; LAYRARGUES, P. P; LOUREIRO, C. F. B. (orgs.).
Pensamento complexo, dialética e educação ambiental. São Paulo: Cortez, 2006.

LEFF, E. (Coord.). A complexidade ambiental. São Paulo: Cortez, 2003.

LIEBSCHER, P. Quantity with quality? Teaching quantitative and qualitative


methods in a LIS Master’s program. Library Trends, v. 46, n. 4, p. 668-680, 1998.

LOUREIRO, C. F. B. Trajetória e Fundamentos da Educação Ambiental. São


Paulo: Cortez, 2004.

MORGADO, F. da S. A horta escolar na educação ambiental e alimentar:


experiência do Projeto Horta Viva nas escolas municipais de Florianópolis. 2006. TCC.
50. f. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, SC. 2006.

SOUZA, A. X.; ALONSO, A. M.; SILVA, A. S. A Pesquisa Ação Participante (PAP)


na construção da Rede Social de Coleta de óleo de fritura para a produção de biodiesel
num processo de Gestão Ambiental em Jaboticabal/SP. Revista Iluminart, n. 5, ago.
2010, Campus Sertãozinho. P.74-87.

TOZONI-REIS, M. F. C. A pesquisa-ação-participativa e a educação ambiental: uma


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1382

de C. (Org.). A pesquisa-ação-participativa em educação ambiental: reflexões


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TRISTÃO, M. A educação ambiental na formação de professores: rede de saberes.


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VEIGA, I. P.; RESENDE, L. M. G. de (orgs.). Escola: espaço do projeto político-


pedagógico. Campinas: Papirus, 1998.
1383

Pôster

Estratégias de formação de professores no contexto de trabalho: o papel do


Coordenador Pedagógico como formador.

Elisa Moreira Bonafé


Laurinda Ramalho de Almeida
PUC-SP
Grupo de pesquisa: Desenvolvimento profissional do formador e práticas educativas

Resumo: O presente estudo objetiva identificar as estratégias utilizadas na formação de


professores em contexto escolar, que mobilizam os docentes a melhorarem suas práticas
pedagógicas com os alunos. A partir de entrevista com coordenador de uma escola
pública, é possível observar a diversidade de desafios que se refletem no planejamento
da formação. Um dos desafios do Coordenador Pedagógico é atender às angústias dos
professores e discutir o processo de ensino e aprendizagem de modo a favorecer a
mudança do olhar para as situações-problema, encontrando novos caminhos. Utilizando
como base os escritos de Canário e Imbernón, produzimos algumas reflexões na defesa
da formação em contexto de trabalho, por considerar as situações reais que se colocam
na rotina escolar. Lerner colabora indicando caminhos para a formação por meio de
estudos que ampliam o conhecimento sobre o objeto de ensino ao mesmo tempo que
identificam as melhores condições didáticas para desenvolvê-lo com os alunos.
Palavras-chave: estratégia formativa, formação na escola; coordenador pedagógico
como formador.

Introdução
É cena comum, a quem trabalha com educação, ouvir Coordenadores
Pedagógicos (neste texto tratados como CP ou CPs) comentando em tom de desabafo
que, ao iniciar na nova função, se percebem tendo dormido professores e acordado
coordenadores. Essa fala retrata o sentimento de despreparo para a nova função,
envolvendo a construção da nova identidade profissional e o desenvolvimento de
estratégias de trabalho no enfrentamento dos desafios cotidianos que a escola impõe.
A formação mínima exigida para exercer a coordenação pedagógica no
município de São Paulo é o curso de Pedagogia e, no mínimo três anos de experiência
1384

no magistério. Após ingressar no novo cargo, o coordenador participa de encontros


organizados por formadores que o repertoriam nos temas prioritários definidos pela
gestão política em vigência. Em alguns casos são organizados cursos que tratam da
função do coordenador pedagógico, destacando a importância do papel do CP como
formador de professores.
A tarefa de formação continuada de professores na escola se coloca como um
grande desafio ao coordenador pedagógico por diversos fatores relacionados ao
cotidiano escolar. A partir da pesquisa realizada no ano de 2010/2011 pela Fundação
Carlos Chagas, por encomenda da Fundação Victor Civita (Placco, Almeida e Souza),
contata-se que, além da formação de professores, os CPs realizam atividades que, por
sua urgência ou grau de importância, se sobrepõem ao acompanhamento dos
professores, planejamento e execução da formação continuada. Entre essas atividades
destacam-se: atendimento aos pais, ocorrências com alunos, demandas do diretor ou dos
órgãos centrais do município, atividades administrativas e organização de eventos.
Desconsiderando todas as variáveis que se sobrepõem à organização do tempo
dedicado a formação continuada no contexto escolar, há ainda desafios próprios da
formação em serviço que dificultam, em alguns casos, seu sucesso no desenvolvimento
profissional do professor e, consequentemente, na melhoria da aprendizagem dos
alunos.
Após vivenciadas diversas situações formativas (como formanda ou formadora)
e observar que não são raros os casos em que os temas e desenvolvimento da ação são
interessantes e promovem discussões e reflexões acerca da prática profissional porém
não se refletem em mudanças reais na prática, ou seja, mesmo diante de
questionamentos e argumentos, parte dos professores não se utilizam do que foi
discutido para repensar e replanejar sua atuação com os alunos, surgiu um
questionamento: quais estratégias formativas, utilizadas pelo coordenador pedagógico,
se refletem com melhores resultados nas aulas dos professores e nas aprendizagens dos
alunos?
Partindo do pressuposto de que o objetivo principal do investimento financeiro e
de tempo na formação continuada dos docentes é a melhoria nas práticas pedagógicas
dos docentes e, consequentemente da aprendizagem dos alunos, este texto traz o estudo
sobre as estratégias de formação continuada que favorecem a mudança na prática
profissional dos professores. Para tanto será considerada a realidade da formação em
contexto escolar com turmas heterogêneas de docentes, o que se configura em mais um
1385

desafio ao CP, pela necessidade em adequar o conteúdo da formação com as diferentes


demandas trazidas pelas especificidades ao longo das etapas do Ensino Fundamental.

Referencial Teórico
A formação profissional do professor em contexto escolar é claramente
defendida por Canário (1998), que considera a necessidade em valorizar a experiência e
o contexto de trabalho dos docentes. O autor destaca que, valorizando a experiência
profissional, atribui-se o papel central ao professor, não ao formador, por considerar a
aprendizagem como um processo interno do sujeito, a partir da reflexão crítica
simultaneamente à reflexão.
Canário (1998) e Imbernón (2010) concordam que é o momento de abandonar a
“capacitação” individual para dar lugar ao trabalho colaborativo, pois consideram que as
situações profissionais são complexas e exigem romper com o isolamento e a autonomia
exagerada, partindo do respeito e do reconhecimento dos saberes dos professores,
adquiridos pela experiência profissional e que podem auxiliar na reflexão e resolução de
problemas concretos de um contexto conhecido por todos.
A diversidade de professores, no que diz respeito às práticas educativas e as
características específicas das turmas e faixas etárias dos alunos com que atuam, se
configuram em elementos que podem ser facilitadores na formação ou em obstáculos
para ela. Imbernón (2010) sugere uma substituição progressiva da “formação
padronizadora e solucionadora de problemas genéricos, (...) dirigidas por especialistas
acadêmicos que dão soluções a tudo, por uma formação que se aproxime das situações
problemáticas em seu próprio contexto, isto é, da prática das instituições educacionais.
Uma formação que, partindo das complexas situações problemáticas educacionais,
ajude a criar alternativas de mudanças no contexto em que se produz a educação” (2010,
p. 55).
Os autores citados consideram o professor com um profissional capaz de
solucionar problemas além das respostas comuns a situações previsíveis, inclusive
questionando criticamente processos de formação baseados nesta concepção de ensino,
que consideram apenas situações específicas que se supõem comuns aos professores.
Sendo assim, a formação baseada em situações problemáticas na própria escola parte do
pressuposto de que a escola é o sujeito e objeto da mudança através do processo ação-
reflexão-ação. Partindo das necessidades reais, a formação passa a proporcionar a
participação ativa dos docentes, implicando em questões éticas, de valores, ideologias e
1386

concepções que permitirá compreender os outros, analisar suas posições e suas visões
de mundo.
Ao coordenador pedagógico cabe enfrentar o desafio de conhecer as melhores
estratégias que favoreçam a participação e comprometimento dos professores em seu
processo formativo.
Ao participar de um processo de formação o docente, geralmente, está em busca
de respostas a angustias, dúvidas ou do desejo em ampliar seu conhecimento um
determinado assunto. E durante o processo, ao estabelecer relações entre o tema
abordado e sua prática pedagógica, surgem dúvidas e questionamentos insistentes sobre
como relacionar o estudo teórico com a prática e, inclusive, pedidos de “modelos” para
colocar em prática o que está sendo discutido. São comuns frases como: “O que eu faço
se o aluno...”, “qual é a intervenção mais adequada diante de determinado erro?”,
“Como faço para que se interessem por...”. Parafraseando Brousseau (1994), Delia
Lerner insiste que “quando muitos professores apresentam os mesmos problemas, o
mínimo que tem que fazer o capacitador é se perguntar por que os apresentam e tentar
entender quais são e em que consistem os problemas que estão enfrentando” (LERNER,
2002 p. 104). Isto não significa oferecer receitas de ações didáticas ou desconsiderar os
saberes dos docentes, mas compreender que alguns saberes didáticos possuem
conceitualização específica.
Lerner (2002) propõe, nas formações, o estudo sobre o saber didático. O que, a
princípio, parece se distanciar da concepção defendida por Canário e Imbernón (de uma
formação contextualizada para uma formação prática), na verdade se revela como uma
alternativa concreta em atender às demandas dos professores sobre algumas dificuldades
de aprendizagem ou baixo rendimento dos alunos. Da mesma forma que os dois autores
acima citados, Lerner acredita que os problemas que os professores enfrentam estão
vinculados ao ensino ou à aprendizagem, portanto, este tema se coloca como prioridade
e deve ser foco de discussão, reflexão e enfrentamento nos horários coletivos de
formação. A contribuição da autora pode nos mostrar um novo caminho a fim de ocupar
as lacunas existentes em algumas propostas formativas dos coordenadores pedagógicos.
A formação de professores em contexto escolar como proposta por Canário e
Imbernón considera os problemas reais vivenciados na escola, porém na pesquisa
realizada pela Fundação Carlos Chagas, já referida, os CPs responderam que o foco da
formação de professores é 71% sobre problemas de aprendizagem e desempenho dos
alunos e 63% conhecimentos didáticos, enquanto que 58% do foco das formações é
1387

destinado para teorias e fundamentos e 43% para problemas de disciplina. Temas


motivacionais ocupam 34% do foco das formações e 6% para outros temas.
Considerando que a maior demanda é sobre problemas de aprendizagem e
conhecimentos didáticos, é possível concluir que tais assuntos possam estar
interligados, exigindo portanto a reflexão do grupo de professores na busca de
alternativas válidas para a realidade da escola e da comunidade na qual está inserida,
mas também de discutir e aprofundar os conhecimentos didáticos dos professores sobre
as disciplinas ou sobre as concepções de ensino e aprendizagem.
A proposta de Lerner é trabalhar com situações que ela denomina como “dupla
conceitualização”. Isto significa criar situações formativas que favoreçam a construção
do conhecimento pelo professor sobre um objeto de ensino ao mesmo tempo que
permite ao docente elaborar conhecimentos sobre as condições didáticas necessárias
para favorecer a aprendizagem dos alunos.
O papel do coordenador-formador é de promover a reflexão sobre os
encaminhamentos da situação de aprendizagem vivenciada, direcionar a
conceitualização de questões didáticas fundamentais e confrontar os docentes de modo a
permitir que, ao refletirem e se questionarem, estabeleçam relações entre diferentes
situações vividas e compreendam as intervenções realizadas, aprofundando desta forma
o conhecimento em parceria com seus colegas.

Procedimentos Metodológicos
A técnica utilizada para esta pesquisa é a entrevista. Foi entrevistada uma
coordenadora pedagógica de escola pública e, posteriormente, serão realizadas
entrevistas com três a cinco professores que participam do horário coletivo de formação
desta mesma escola.
A fim de atingir o objetivo de pesquisar situações de formação de professores em
contexto escolar que demonstrem-se efetivas sob o aspecto de refletir nas práticas
pedagógicas dos professores e, consequentemente, promover a melhoria da
aprendizagem dos alunos, utilizamos alguns critérios para escolha da escola, sendo o
primeiro deles que o grupo de formação fosse composto por professores de diferentes
níveis e áreas do conhecimento, apresentando um desafio desde o planejamento da
pauta até os encaminhamentos durante a formação. O Coordenador Pedagógico (neste
caso, coordenadora pedagógica) deveria ter, no mínimo quatro anos de experiência no
1388

cargo e também tenha um histórico profissional na escola de mais de 2 anos, a fim de


garantir uma experiência profissional construída ao longo dos anos.
Com a coordenadora pedagógica foi investigado, utilizando um roteiro: a
caracterização do grupo de formação, o planejamento e as prioridades de formação
identificadas na escola pelo CP, os critérios para a escolha dos temas, como são
encaminhados os encontros de formação, a participação dos docentes no processo
formativo e as estratégias utilizadas ao atuar com grupo heterogêneo de docentes a fim
de atender aos diferentes desafios por eles demandados.
Aos professores será questionado: os desafios que se apresentam em sua prática
pedagógica, os temas ou conteúdos de formação que se tornaram significativos, as
mudanças percebidas em sua atuação a partir de situações de formação, a relação entre
os processos de formação vividos e a melhoria da aprendizagem dos alunos.

Primeiros resultados
A entrevista já realizada com a coordenadora pedagógica permitiu observar
alguns pontos:
• Da mesma forma como defende Imbernón, ao afirmar que a formação de professores
deve partir dos problemas reais da escola, a CP relata que planeja sua pauta de formação
conforme as demandas observadas e relatadas pelos docentes no dia-a-dia da escola.
• Sobre as demandas diárias dos professores e suas angústias, estão questões relacionadas
à avaliação, a baixa frequência de alguns alunos, ao baixo rendimento e aproveitamento
das aulas e, no Ensino Fundamental II, a indisciplina também incomoda e é um tema
recorrente.
• Uma situação formativa marcante para esta CP ocorreu no ano de 2013, quando
realizou um trabalho amplo sobre avaliação. Após aplicar as avaliações aos alunos e
realizar a correção, sob orientação da CP, os professores analisaram as habilidades que
os alunos demonstravam maior dificuldade. A partir dos resultados, os docentes das
diferentes áreas do conhecimento, planejavam atividades a fim de desenvolver tais
habilidades nos alunos em suas aulas. Para atingir seu objetivo, a CP trabalhava com o
grupo o significado de cada habilidade, mostrava exemplos concretos, retirados de
outras avaliações, e propunha repensar coletivamente como cada área poderia trabalhá-
las em suas aulas. Na próxima avaliação era verificado por todo o grupo a melhoria do
aprendizado nos alunos nas habilidades trabalhadas. A entrevistada conta que os
resultados eram satisfatórios, animando a todos os docentes. Ela também relata que
1389

percebia envolvimento do grupo todo nesta proposta, pois os professores gostavam


deste trabalho. Ao final, o grupo também aprendeu a elaborar questões de provas de
modo a avaliar as habilidades que se deseja.
• Em áreas que não tem domínio, a CP convida um professor da área específica e pede
sua participação no planejamento e realização da formação. É uma estratégia utilizada
com certa frequência e que também aponta para a compreensão do professor como autor
do conhecimento.
• Outra estratégia que a coordenadora entrevistada utiliza é oferecer “todos os modelos
prontos” (SIC). Ela explica que é um material que o professor pode utilizar depois como
apoio. A CP faz uso de texto teórico, porém não se foca nesta estratégia, ela prefere
demandar coisas que os professores possam aplicar nas aulas e argumenta que os
docentes gostam e se atraem mais por formações com esta dinâmica. Aqui observamos,
em seu relato, situações de dupla conceitualização (assim como no relato das formações
sobre avaliação), ou seja, a coordenadora opta por, como cita Lerner, “conseguir , por
um lado, que os professores construam conhecimentos sobre um objeto de ensino e, por
outro lado, que elaborem conhecimentos referentes às condições didáticas necessárias
para que seus alunos possam apropriar-se desse objeto” (2002, p. 107)
• Por ser um grupo heterogêneo, nem tudo o que se trabalha na formação será utilizado
por todos no mesmo momento, porém a CP observa que, como estão sempre discutindo
sobre escola e sobre educação, em algum momento, mesmo que posteriormente, os
estudos e reflexões serão úteis.
• Para esta coordenadora, formação é o que provoca mudança no olhar do profissional
sobre sua prática. Porém, muitas vezes, formações pontuais externas, mesmo sendo
interessantes, não provocam esse movimento, e, portanto, não atingem o objetivo. O
mesmo ela percebe que ocorre na formação na escola. Em alguns momentos, o CP não
consegue sensibilizar o professor para a mudança de olhar sobre seu aluno. Apesar de se
angustiar quando isto ocorre, a CP relata que ainda não consegue saber os motivos.
1390

Referências:
CANARIO, Rui. A escola: o lugar onde os professores aprendem. Psicologia da
educação, São Paulo, 6, 1º sem. 1998, p. 9-27.

IMBERNÓN, Francisco. Formação continuada de professores. Porto Alegre: Artmed,


2010.

LERNER, Delia. Ler e escrever na escola: o real, o possível e o necessário. Porto


Alegre: Artmed, 2002.

PLACCO, V. M. S., ALMEIDA, L. R., SOUZA, V. L. T. O coordenador pedagógico


(CP) e a formação continuada: intenções, tensões e contradições. Estudos & Pesquisas
Educacionais, no 02. Novembro, 2011. São Paulo: FVC.
1391

Pôster

Impactos nos currículos e na identidade dos pedagogos após as diretrizes


curriculares nacionais para o curso de Pedagogia (2006)

Elisângela Lisboa Micheletti


Universidade de São Paulo

Resumo: Esta pesquisa em andamento tem como tema a formação de professores no


curso de Pedagogia. O objetivo é contribuir com a discussão sobre o que representaram
as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia para a formação inicial
de professores, tendo por base o Parecer CNE/CP nº. 3/2006 e a Resolução CNE/CP
nº1/2006. A metodologia de pesquisa, de natureza qualitativa, envolverá os
procedimentos: análise bibliográfica, pesquisa documental e realização de grupos focais
com egressos do curso de Pedagogia formados antes e depois da promulgação das
Diretrizes. Buscar-se-á identificar possíveis mudanças na percepção da identidade e na
inserção profissional do pedagogo. Neste pôster apresenta-se a produção bibliográfica
desenvolvida no período de 2006 a 2013 sobre a temática focalizada, ressaltando-se a
lacuna sobre a qual a pesquisa incidirá.
Palavras-Chave: Currículo; Formação de Professores; Identidade do Pedagogo.

Introdução
O objetivo da pesquisa em andamento é identificar e discutir os impactos
causados na formação e atuação dos Pedagogos após a reestruturação do curso de
Pedagogia decorrente da promulgação das DCNP (2006). Assim, o que se pretende é
empreender uma reflexão acerca dos reflexos dessa alteração legal no currículo dos
cursos de Pedagogia e das possíveis mudanças na identidade dos pedagogos decorrentes
dessas alterações.
Quando se busca a produção sobre as mudanças decorrentes das DCNP,
encontram-se críticas à reestruturação dos cursos, com destaque para os seguintes
aspectos: imprecisão do lugar da produção do conhecimento, que quando mencionada
aparece subordinada à prática, traduzindo uma abordagem instrumentalista do
conhecimento (EVANGELISTA, 2008), a limitação à base docente em detrimento do
1392

estudo do fenômeno educativo (PIMENTA, 2011), a expansão de novas instâncias de


formação em detrimento da expansão das universidades (SHEIBE, 2008), dentre outras
questões que buscaremos analisar na pesquisa que ora se inicia.
A origem das divergências relativas às DCNP se encontra na ênfase a ser dada
nos currículos, com duas posições ganhando destaque, uma que defende a ênfase na
base docente e a outra, no estudo do fenômeno educativo. Para os que defendem que a
base seja a docência, isto representa um avanço histórico na luta dos educadores. Por
outro lado, temos os que defendem que o curso tenha um caráter de formação mais
amplo, que tenha como base o estudo do fenômeno educativo, sendo o curso
considerado uma ciência da Educação.
Este pôster apresenta um levantamento da produção bibliográfica que versa
sobre as alterações no curso de Pedagogia decorrentes da implementação das DCNP. A
ideia é que, a partir desse panorama da produção, se encaminhe na sequência uma
análise geral das intenções expressas no documento legal em questão e das mudanças
dele decorrentes sobre os currículos e sobre as práticas e discursos daqueles que
passaram pela formação. Espera-se na continuidade da investigação, trazer alguns
elementos que fomentem a compreensão dos impactos de todo esse processo sobre a
identidade desses profissionais.

Levantamento bibliográfico
Com base no levantamento bibliográfico realizado (Tabela 1), é possível
perceber que no período de busca por estratégias para a adequação dos cursos em
função das DCNP, houve uma preocupação maior em analisar a formação docente,
principalmente no que diz respeito à forma pela qual as reformulações curriculares
interfeririam na formação do professor: a maioria dos trabalhos estão relacionados à
formação docente e à configuração do currículo para dar conta da formação do
pedagogo para atuar dentro e fora da escola.
Começamos a apresentar essa produção destacando os trabalhos voltados para a
questão da formação no curso de Pedagogia e das suas implicações curriculares. Várias
dissertações e algumas teses analisaram especificamente como tem se caracterizado a
formação do Pedagogo em determinadas Instituições de Ensino Superior (IES) após as
DCNP. Ao todo foram encontradas 34 dissertações, seis teses, sete artigos em
1393

periódicos e 11 livros e/ou capítulos de livro que focalizam estes dois temas, totalizando
58 trabalhos. Embora cada pesquisa tenha voltado o olhar para uma particularidade da
formação do Pedagogo, no geral, observa-se a preocupação maior com as implicações
para a formação oriundas de uma nova configuração do curso, que passa a abranger uma
série de conhecimentos específicos para atuação em campos diversos.
Almeida (2008), por exemplo, faz uma análise da origem e extinção da função
de pedagogo especialista, verificando como as DCNP contribuíram para o processo de
formação do pedagogo conforme os ditames governamentais de construção de um
profissional com habilidades e competências para uma função polivalente. Conclui que
as orientações advindas das DCNP não contemplam os futuros pedagogos com uma
proposta de formação omnilateral, posto que retomaram os princípios tecnicistas,
atendendo as atuais exigências postas pelo mercado de trabalho.
Ainda sobre essas mesmas temáticas, da formação no curso de Pedagogia e do
currículo dos cursos, encontramos sete artigos em periódicos e 11 livros e/ou capítulos
de livro, neste mesmo período. A preocupação central nessas produções é semelhante às
encontradas em teses e dissertações: verificar como as mudanças curriculares a partir
das DCNP têm contemplado a formação do pedagogo diante de uma diversidade de
campos de atuação. Por exemplo, Cruz (2012) discute a complexa relação entre teoria e
prática no curso de pedagogia a partir da visão de “pedagogos primordiais”. O trabalho
apresenta uma análise parcial desses dados, abordando especificamente o histórico
embate entre a teoria e a prática no curso em seus tempos iniciais e na atualidade,
mediante as diretrizes curriculares de 2006. As análises apresentadas evidenciam que os
fundamentos teóricos, em comparação com a experiência prática, obtiveram maior peso
na estrutura e na prática curricular do curso. E a partir das DCNP, permitiu ver que o
problema entre a teoria e a prática permanece em pauta, ainda que com outras nuances.
E conclui que a multiplicidade de saberes que constituem a pedagogia correrá o risco de
dispersar-se ainda mais, enfraquecendo a formação teórico-prática em face da
diversidade de enfoques formativos que passou a vigorar no curso.
Por conta do período focalizado (2006-2013), foi pequeno o número de
produções que tinham como foco a discussão central desenvolvida na elaboração das
DCNP, mais abordada em período anterior. Já a questão da identidade do pedagogo,
quando é discutida aparece em segundo plano na maioria das pesquisas, sem maiores
1394

aprofundamentos. Apenas nove trabalhos vão tratar especificamente da questão, sendo


sete dissertações e duas teses. Não foram encontrados neste período artigos, livros e/ou
capítulos de livro que tratem especificamente da questão da identidade do pedagogo
frente às DCNP.
Dentre eles, temos Oliveira (2011) que, na sua dissertação “O processo de
reestruturação curricular do curso de Pedagogia da UNESP/Marília: desafios e
possibilidades” analisa como se constituiu a identidade do pedagogo no novo curso,
alterado por meio das DCNP. Verificou-se que, com a publicação das DCNP, selou-se a
extinção definitiva das habilitações e o curso de Pedagogia deu início ao processo de
reestruturação curricular; porém, enquanto o projeto político pedagógico pretendeu
atender aos preceitos das DCNP, a matriz curricular empenhou-se para manter
praticamente intacta a estrutura anterior. Também Gimenes (2011), na tese “Graduação
em Pedagogia: identidades em conflito” propôs-se a identificar e analisar os processos
de constituição das identidades sociais dos cursos de Pedagogia e de seus alunos,
sobretudo após o estabelecimento das novas DCNP. Identificou que os cursos cada vez
mais se voltam para a formação do professor e menos do educador, este último
entendido para além das atividades escolares em sala de aula, mas para as demais
atividades do pedagogo previstas nas DCNP. Neste sentido, espera-se que as
especializações Lato sensu deem conta da incompletude da preparação do pedagogo
para atuar nos diversos campos de possibilidades abertas pelas DCNP, o que
supostamente teria atribuído ao curso de graduação em Pedagogia a função de formação
do pedagogo professor.

Algumas considerações
Após analisar a produção acadêmica sobre as DCNP e suas implicações para a
formação do Pedagogo, na reconfiguração dos currículos do curso de Pedagogia e
consequentemente na identidade profissional do pedagogo, é possível verificar uma
considerável lacuna nas pesquisas acerca da identidade desse profissional. O que
justifica a necessidade e a relevância de maior aprofundamento dos aspectos da
formação e atuação do pedagogo para identificar que identidades estão sendo
fomentadas pelos currículos dos cursos de Pedagogia alguns anos depois da
implementação das DCNP.
1395

Referências Bibliográficas
ALMEIDA, Ana Luiza Melo de. Pedagogo Especialista em Educação - Origem e
Extinção na Política Educacional Brasileira. Dissertação de Mestrado em Educação da
Universidade Federal de Sergipe. Disponível em:
http://bdtd.ufs.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=141. Acesso em 2/5/2014

BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Resolução nº 1, de 15 de maio


de 2006. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em
Pedagogia, licenciatura, 2006.

CRUZ, Giseli Barreto da. Teoria e Prática no curso de Pedagogia. Educação e


Pesquisa, São Paulo, v. 38, n. 1, p.149-164, 2012. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/ep/v38n1/aop230.pdf Acesso em: 19/05/2014.

EVANGELISTA, Olinda. Conhecimento e Diretrizes curriculares para o curso de


Pedagogia no Brasil. Revista Perspectiva, vol.26, nº. 02, p. 551-
570, Florianópolis jul./dez. 2008. Disponível em:
http://www.perspectiva.ufsc.br/perspectiva_2008_02/Olinda.pdf Acesso: 19/5/2014 .

GIMENES, Nelson Antonio Simão. Graduação em Pedagogia: Identidades em


conflito. Tese de Doutorado em Educação (Psicologia da Educação) da Pontífica
Universidade Católica de Monte Alegre. Disponível em:
http://busca.ibict.br/SearchBDTD/search.do?command=search&q=+assunto:%22Curso
%20de%20gradua%C3%A7%C3%A3o%20em%20pedagogia%22 Acesso em 3/5/2014

OLIVEIRA, Maria Eliza Nogueira. O processo de reestruturação curricular do


curso de Pedagogia da UNESP/Marília: Dissertação de Mestrado em Educação da
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho/Marília. Desafios e
Possibilidades. Disponível em: http://www.bv.fapesp.br/pt/dissertacoes-teses/85193/o-
processo-de-reestruturacao-curricular-do-curso-de-pedagogi/ Acesso em: 16/05/2014

PIMENTA, Selma Garrido. Pedagogia e pedagogos: caminhos e perspectivas. São


Paulo: Cortez, 2011.

SHEIBE, Leda. Formação de Professores no Brasil – A herança histórica. Revista


Retratos da Escola, Brasília, v. 2, n. 2-3, p. 41-53, jan./dez. 2008. Disponível em
www.esforce.org.br Acesso em: 23/03/2013

Tabelas
Tabela 1. Levantamento bibliográfico*
Descritor Dissertações Teses Artigos de Capítulo de Total
periódico livro /Livro
Formação Docente no curso de Pedagogia 20 5 3 9 37
DCN para o curso de Pedagogia 2 0 5 0 7
Currículo do curso de Pedagogia 14 1 4 2 21
Identidade do Pedagogo 7 2 0 0 9
Total 43 8 12 11 74
* Levantamento do período de 2006 a 2013
1396

Pôster

Centros de ciências: desafios e possibilidades no atendimento ao público infantil

Erika Milena de Souza


PPGE//UFES
Grupo IESC

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo compreender os espaços tempos


oportunizados pelos centros e museus de ciências, que estabelecem diálogo com as
culturas da infância. São abordadas as interrelações entre conhecimento científico e
modernidade, bem como destacados determinados pressupostos que permeiam a
construção do espaço de dialogicidade entre as culturas da infância e os centros e
museus de ciências. Para tanto será realizada um estudo de caso etnográfico, uma vez
que este tipo de pesquisa tem como proposta ouvir os significados que os atores sociais
atribuem às ações desenvolvidas nestes espaços educativos. Com esta pesquisa,
pretende-se tornar visível as estratégias utilizadas pelos centros de ciências, educação e
cultura, localizados no município de Vitória, que tornam audível e visível a participação
das crianças em suas estratégias pedagógicas.
Palavras-chave: Centros e museus de ciências, crianças, culturas da infância.

INTRODUÇÃO

Neste trabalho, temos como proposta refletir, ainda que brevemente, sobre a
importância de estratégias pedagógicas nos centros e museus de ciências que
oportunizem um diálogo com as culturas da infância.
Segundo reflexões de SANTOS (2013), na atualidade, a ciência foi utilizada pelo
mercado como um dos vetores fundamentais da globalização, uma vez que seu ideário,
indispensável para a produção capitalista, apresentou-se como uma única solução. Para
este autor, a ciência santificou ideologias e legitimou ações, que promoveram a exclusão
de grupos sociais o que implicou em dificuldades no convívio social e no exercício da
democracia.
Conforme TOURAINE (1992), na sociedade moderna houve a difusão dos produtos da
1397

atividade racional-científica-tecnológica, que influenciou diversos setores da vida


social: política, econômica, educacional, dentre outras.
Podemos inferir, então que, a racionalidade científica influenciou a distribuição
assimétrica de renda, poder e dos benefícios provenientes de suas novas descobertas.
Deste modo, ela tornou-se um fator para distinguir dominantes e dominados entre os
países, classes sociais, grupos étnicos e etários.
Neste contexto, é relevante a elaboração de políticas públicas que ampliem o debate
sobre a influência da ciência e da tecnologia no contexto social. Segundo o Ministério
da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), promover ações que difundam o
conhecimento científico na sociedade tem como objetivo a formação permanente para a
cidadania e no aumento da qualificação científico-tecnológico da sociedade.
Assim, uma formação científica que articule a aprendizagem dos conteúdos básicos das
ciências, a compreensão do papel da ciência e tecnologia na construção social e a uma
participação qualificada no planejamento e implementação das políticas públicas neste
campo torna-se necessária.
Uma das estratégias que pode possibilitar um maior debate sobre a ciência-tecnologia na
sociedade é aumento do quantitativo de espaços de educação não formal (museus,
centros de ciência e tecnologia, planetários, observatórios astronômicos, jardins
botânicos, zoológicos, dentre outros), promoção de ações que aumentem o atendimento
ao publico visitante e a realização de uma distribuição mais equânime destas instituições
no território nacional.
Todavia, um dos desafios para implementar essa política é oportunizar um adequado
atendimento a um público que possui múltiplos interesses e perfis, desta forma é
necessário problematizar as práticas educacionais e comunicacionais desenvolvidas
nesses espaços, bem como os meios, as metodologias e as linguagens utilizadas no
desenvolvimento dos processos educativos.
Segundo reflexões de GOHN (2011), a educação não formal se apresenta como uma
possibilidade de produção de conhecimento em territórios externos às estruturas
curriculares da ação formal de ensino, por meio de suas práticas ela pode proporcionar
novas aprendizagens, desocultar saberes subalternizados e incentivar a busca e a
produção de conhecimentos relevantes para os indivíduos realizarem leituras própria do
mundo em que vivem, dos fatos sociais que os circundam.
Nesse sentido, centros e museus de ciências podem oportunizar uma educação científica
que fomente a participação ativa de todos nos processos de tomada de decisões sobre o
1398

desenvolvimento científico e tecnológico, contrapondo um ideário dominante de


sermos, apenas, consumidores passivos da tecnologia.
Cabe ressaltar que, para possibilitar o acesso desse conhecimento ao público infantil
crianças é relevante que estes espaços estimulem a conversação, a reflexão, a
observação, a experimentação, enfim, o atendimento a este público deve proporcionar
estímulos diversos e utilizar estéticas diversas as utilizadas para os adultos.
De acordo com KRAMER (1998), os museus podem proporcionam às crianças os
processos de socialização e de construção do saber, pois é através da sua dimensão
pedagógica que elas tem a oportunidade de uma experiência cultural significativa.
Conforme reflexões de ARENDT (1988), a educação tem como proposta introduzir os
jovens no mundo comum, possibilitar a sua participação e contribuir para a conservação
e renovação deste mundo já constituído. Assim, é tarefa da educação contribuir para que
os novos encontrem seu lugar nele, de maneira a estabelecer uma relação próxima com
este lugar e sua memória.
Nesse sentido, cabe as instituições educacionais a tarefa de apresentar às crianças as
experiências humanas incorporadas no patrimônio artístico, cultural, científico e
tecnológico que compartilhamos com os outros, de maneira que elas possuam a
oportunidade de dar continuidade ou ressignificá-lo
No entanto, para apresentar o mundo às crianças as propostas pedagógicas devem
articular seus saberes com os saberes já presentes no patrimônio da humanidade, além
do mais é necessário construir novas formas de sociabilidade e de subjetividade, que
sejam comprometidas com a ludicidade, a democracia, a sustentabilidade. Contudo,
estas propostas não podem se configurar na transmissão e aceitação do conhecimento
como produto pronto e acabado, mas na compreensão que no processo de produção do
conhecimento, é importante buscar diferentes possibilidades para iniciar os estudantes
no universo do conhecimento científico-tecnológico.
Segundo reflexões de Castelfranchi et al. (2008), centros e museus de ciências devem
estar atentos as demandas produzidas pelas crianças, deste maneira é necessário escutá-
las, entender o que elas sabem sobre a ciência para, a partir daí, construir um diálogo.
Para o pesquisador, “a percepção que as crianças têm da ciência e da tecnologia, seu
imaginário sobre [...] o seu papel na sociedade, pode representar uma janela de
observação surpreendente das relações entre ciência, tecnologia e sociedade (pág14).”
Entretanto, garantir a participação das crianças na elaboração das ações pedagógicas
desenvolvidas nos centros e museus de ciências tem como desafio a construção de um
1399

espaço de diálogo com as culturas infantis. Segundo SARMENTO (2005, p. 21), “as
crianças não recebem, apenas, uma cultura constituída que lhes atribui um lugar e
papéis sociais, mas operam transformações nessa cultura, seja sob a forma como a
interpretam e integram, seja nos efeitos que nela produzem, a partir das suas próprias
práticas.”
No que se refere aos centros e museus de ciências, acreditamos que os canais de diálogo
podem se constituir por meio da inserção de elementos estéticos que oportunizem a
sensibilidade, criatividade, ludicidade e a liberdade de expressão nas diferentes
manifestações artísticas e culturais. Assim, é necessário a ampliar e diversificar os
modos e estilos de racionalidades utilizadas nas ações pedagógicas desenvolvidas no
atendimento destas instituições, como estratégia de recolha de opiniões das crianças.
Para SARMENTO (2007, 2008), ouvir a voz das crianças no interior das instituições
não constitui apenas um princípio metodológico da ação adulta, mas uma condição
política, por meio do qual se estabelece um diálogo intergeracional de partilha de
poderes.
Nesse sentido, compreender como os centros e museus de ciências se constituem como
espaços de diálogo com as culturas infantis, de maneira a permitir a participação das
crianças nas (re)configurações das ações desenvolvidas destas instituições, além do
mais identificar os significados que os estagiários, coordenadores pedagógicos e
gestores dos centros de ciências atribuem à participação das crianças e analisar, a partir
dos processos pedagógicos desenvolvidos nos centros de ciências, em que medida à
participação da criança interfere nas propostas de atendimento ao público apresenta-se
como possibilidade para tornar audível a voz destes sujeitos na constituição das
instituições públicas educacionais.

METODOLOGIA

A presente pesquisa será um estudo de caso do tipo etnográfico no centro de ciência,


educação e cultura Escola da Ciência, Biologia e História, localizada no município de
Vitória, terá como público-alvo alunos e alunas do 1º ao 3º anos do ensino fundamental.
Segundo MOREIRA e CALEFFE (2006), o propósito da pesquisa etnográfica nos
contextos educacionais é descrever, analisar e interpretar um recorte da vida social de
um grupo cultural e sua relação com a educação. Assim, esta perspectiva metodológica
no auxiliará a analisar as relações estabelecidas entre as crianças e as pessoas que
1400

realizam o atendimento pedagógico nestes espaços.


Segundo CAMPOS (2008), focalizar as crianças como atores sociais exige do
pesquisador orientações metodológicas, que implica captar a perspectiva da criança, a
partir de suas vozes, assim eles assumem que elas possuem percepções e opiniões que
devem ser levadas em conta como ponto de partida para o desenvolvimento da pesquisa.
Como instrumento de coleta de dados será utilizado: observação participante, diário de
campo, entrevista semi estruturada, fotografia e a análise do projeto político pedagógico
e do plano de ação da instituição.

CONCLUSÃO

A modernidade imprimiu no campo da educação científica uma nova reconfiguração.


Neste sentido, é necessário romper com uma visão tradicional da transmissão do
conhecimento científico e oportunizar que outras racionalidades possam ser utilizadas
para a discussão da ciência e tecnologia na atualidade. Desta maneira, pesquisar as
interações realizadas entre os centros e museus de ciências e as culturas da infância
apresenta-se como uma estratégia para compreender estes espaços como ambientes
onde a ação e o discurso de cada um podem ganhar efetividade na construção do mundo
comum.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro.São Paulo:Perspectiva. 1988.

CASTELFRANCHI, Yurji; MANZOLI, Frederica; GOUTHIER, Daniele, CANNATA,


Irene. O cientista é um bruxo? Talvez não: ciência e cientistas no olhar das
crianças. In: MASSARANI, Luisa (Organizadora). Ciência e criança: a divulgação
científica para o público infanto-juvenil. Rio de Janeiro:Fiocruz, 2008. Pág 13-18.

CAMPOS, Maria Malta. Por que é importante ouvir a criança? A participação das
crianças pequenas na pesquisa científica. In: CRUZ, Sílvia Helena Vieia. A criança fala:
a escuta de crianças em pesquisas. São Paulo:: Cortez, 2008. Pág. 35-42.

FERREIRA, Manuela; SARMENTO, Manuel Jacinto. Subjetividade e bem estar das


crianças (in)visibilidade e voz. Revista Eletrônica de Educação, v.2, nº 2, nov. 2008.

GOHN, Maria da Glória. Educação não formal e cultura política: impactos sobre o
associativismo do terceiro setor. 5ª edição. São Paulo: Cortez, 2011.
1401

MOREIRA, Herivelto; CALEFFE, Luiz Gonzaga. Metodologia da pesquisa para o


professor pesquisador. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

SARMENTO, Manuel Jacinto. Crianças: educação, culturas e cidadania ativa.


Refletindo em torno de uma proposta de trabalho. Perspectiva. V. 23, nº 01, jan/jul,
2005. Pág 17-40.

________; FERNANDES, Natália; TOMÁS, Catarina. Políticas públicas e


participação infantil. Educação, Sociedade e Cultura, nº 25, 2007. Pág 183-06.

________. Sociologia da Infância: correntes e confluências. In: SARMENTO,


Manuel Jacinto; GOUVEA, Maria Cristina Soares de. (organizadores). Estudos da
Infância: Educação e Práticas Sociais. Rio de Janeiro:Vozes, 2008.

SANTOS, Milton. Por uma outra globalização do pensamento único à consciência


universal. 23ª Edição. Rio de Janeiro:Record, 2013.

TOURAINE, Alain. Crítica da Modernidade. Lisboa:Instituto Piaget. 1992.


1402

Pôster

Definições das Políticas Públicas de Avaliação da Educação Básica: relações entre


o global e o local
Fabio Perboni
PPGE/FCT/UNESP

Resumo: Argumenta-se, neste trabalho, que a centralidade conferida à avaliação em


larga escala nas últimas décadas constitui um indicador dos princípios neoliberais que
orientam as reformas no campo educacional. O trabalho em tela discute inicialmente as
orientações do Banco Mundial, para, em seguida, relacionar a existência de sistemas de
avaliação externa nos estados com a filiação partidária dos governadores eleitos nas
últimas três eleições (2002-2006-2010). Para tanto, recorre à pesquisa bibliográfica e
documental a partir da normatização legal e dados disponibilizados pelas secretarias
estaduais de educação, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e pelos partidos políticos.
Conclui que não é possível estabelecer uma relação simples e direta entre as orientações
das instituições multilaterais, partidos que ocupam o poder e a existência ou não de
sistemas de avaliação em larga escala.
Palavras-chave: Sistemas Estaduais de Avaliação. Neoliberalismo. Partidos Políticos.

I. Introdução
O cenário atual é palco de um debate público marcado por forte carga ideológica
“[...] que coloca em lós mercados toda la pureza, toda la bondad, toda la eficiência, toda
la creatividad de la vida econômica, y que coloca em lós Estado todos lós elementos
irracionales, ineficentes incompetentes y corruptos” (BORON, 2003, p. 40).
Boron (2003) identifica um período de reformas que se centram em torno de três
eixos: o desmantelamento do setor público; um segundo, marcado pelo crescente grau
de “debilidade estatal”, definido pela dificuldade cada vez maior das instituições
disciplinarem empresas e mercados e, por último, a deterioração da noção de
“responsabilidade estatal” em áreas ligadas ao bem estar geral, ao desenvolvimento
econômico, a seguridade e a busca por justiça.
Se há concordância em torno da ideia de que as reformas ocorreram sob
inspiração neoliberal, não há consenso sobre em que medida um poder monolítico tem a
responsabilidade exclusiva pelas políticas nacionais de educação. Nesse sentido, torna-
1403

se necessário compreender melhor como se dão as relações entre os organismos


internacionais e os poderes das diferentes localidades que concretizam as políticas
educacionais.
Ao tratar do Banco Mundial, Coraggio (2007, p.77) afirma que “é urgente saber
quais os limites e as possibilidades ainda inexploradas dessa relação, entre o Banco
Mundial, os governos e as sociedades da America Latina”. Concordando com esse
posicionamento diversos autores (Afonso, 2009; Peroni e Adrião, 2005; Souza e
Oliveira, 2003) apontam para os limites da oposição esquemática entre neoliberais e
defensores do Welfare State como também para os limites das teorias marxistas e
neomarxistas para explicar o papel do Estado.
Nessa perspectiva, Afonso (2001) ressalta que existem novas configurações e
novos atores políticos nacionais e internacionais, bem como novos movimentos sociais
que interpenetram as ações e definições antes exclusivas do Estado Nação. Assim,
“Dois exemplos paradigmáticos podem ser referenciados a este propósito: a promoção
de quase-mercado e as relações com o terceiro sector” (AFONSO, 2001, p. 37).
Dessa forma, questionamos em que medida a oposição entre medidas de
esquerda e de direita ajudam a compreender esses novos processos. Desde a queda da
URSS e do Muro de Berlim estabeleceu-se um intenso debate sobre a validade dessa
oposição. Essas contestações se colocam em diferentes níveis. Uma primeira posição
aponta para o término da guerra fria e para a vitória do capitalismo que expressa o único
modelo possível, cabendo, portanto, se adaptar, não existindo possibilidade de ruptura.
Assim, a capacidade explicativa dos termos estaria esgotada na realidade da prática
política. Outra posição destaca que apesar da persistência no mundo político da sua
capacidade como categoria explicativa estaria esgotada devido aos novos arranjos na
organização do Estado e das políticas públicas.
Na perspectiva de Guiddens (1996), após a década de 1990 com o fim da URSS,
as antigas formas de luta política estariam em vias de ser superada e com elas também a
distinção entre políticas de esquerda e políticas de direita teriam se tornado anacrônico
no contexto do século XXI. Porém, destaca o autor, o resultado da luta política não seria
uma vitória da direita sobre a esquerda como se poderia supor pelo contexto da guerra
fria e a desintegração de um dos polos da disputa. Estaríamos vivenciando novas formas
de organização social e política com grupos emergentes ocupando os espaços do cenário
político.
1404

Portanto, estamos num momento em que o neoliberalismo pode ser considerado


revolucionário e transformador da realidade, enquanto antigos grupos de esquerda
defendem a manutenção de benefícios sociais do Welfare State. Conforme Guiddens
(1996, p.17):
De outro modo, o neoliberalismo torna-se internamente contraditório, e essa
contradição é cada vez mais evidente. Por um lado, o neoliberalismo é hostil
à tradição – e, de fato, é uma das principais formas que estão eliminando a
tradição em toda parte, como resultado da promoção das forças de mercado e
de um individualismo agressivo. Por outro, ele depende da persistência da
tradição para sua legitimidade e sua ligação como o conservadorismo – nas
áreas da nação, da religião, do gênero e da família. Sem possuir um
fundamento lógico teórico que seja adequado, sua defesa da tradição nessas
áreas geralmente assume a forma de fundamentalismo.

Por outro lado, Bobbio (2011) contesta esses posicionamentos, defendendo que a
díade direita/esquerda continua válida porque a distinção entre os termos continua a ser
utilizada na prática cotidiana da política e também serve ao estudo da ciência política.
Contesta as posições de vários autores tais como de Fukuyama (1992) que defendeu o
“fim da história” e de Giddens que propôs a superação dessa dicotomia.
Bobbio (2011) destaca, ainda, que uma vez considerada a distinção válida é
importante definir o que diferencia a esquerda da direita, pois dependendo do ponto de
referencia utilizado a mesma realmente perde o sentido. Argumenta o autor, que se para
Giddens a direita defendia a tradição e a esquerda a mudança, no final do século XX e
início do século XXI esses papéis se inverteram com a esquerda defendendo a
manutenção (do welfare state, por exemplo) e a direita a mudança com as reformas
neoliberais. Entretanto, para Bobbio (2011) não são essas as características que marcam
a atuação desses grupos políticos. Está claro, para o autor, que as pessoas que
participam da política não têm dificuldades em utilizar esses termos, mesmo quando
dizemos que um partido dito de esquerda está fazendo uma política de direita ou vice
versa, estamos validando esses conceitos. O autor chama a atenção para outro aspecto,
quer seja, os conceitos de direita e de esquerda são imbuídos de certo significado
emotivo onde “a esquerda é boa e a direita é má, ou vice-versa” (BOBBIO, 2011, p. 15).
Além das objeções sobre a essência da distinção existem outras que a
consideram válida, porém não mais aplicável à realidade. Ao mapearmos a presença dos
sistemas de avaliação nos diversos estados e DF, localizamos políticas e práticas
semelhantes, embora propostas por partidos de concepções políticas assumidas como
díspares. Conforme Bobbio:
[...] ainda que a distinção seja sempre análise em abstrato, constata-se que a
ação política daquela que há um tempo era a esquerda já não é mais muito
1405

diferente daquela que costumava ser atribuída à direita. Do mesmo modo


que, no passado recente, a esquerda invadira pouco a pouco o espaço da
direita, a ponto de torná-la politicamente irrelevante, agora é a derrota da
hegemonia da esquerda que teria deixado espaço somente para a direita. Não
seria verdade, portanto, que a esquerda como tal perdeu sua razão de ser. O
que está acontecendo é que a esquerda não consegue mais fazer valer suas
próprias razões numa situação em que a tradicional política de esquerda está
destinada a perder consensos e apoios (BOBBIO, 2011, p. 19).

Na próxima seção, buscamos nos dados empíricos indícios que apontem para a
relação entre o partido no poder e a adoção de medidas identificadas como práticas
neoliberais de partidos de direita, como as avaliações externas em larga escala.

II. Sistemas de avaliação em larga escala nos estados brasileiros


Objetivando captar a relação entre os partidos no governo e a existência de
sistemas próprios de avaliação, elaboramos quadros por região da federação procurando
demonstrar que existe um movimento generalizado de ampliação dos sistemas estaduais
de avaliação da educação básica que, em algumas regiões, complementa o sistema
nacional de avaliação, em outras, se sobrepõe a ele, criando inclusive índices próprios
de rendimento escolar.
Cabe destacar que, estamos considerando nessa análise a existência de sistema
próprio de avaliação apenas nos Estados que tiveram aplicação de provas pelo período
de três anos de um mesmo mandato. Dessa forma, estados com avaliações externas da
educação básica aparecem como não tendo sistema de avaliação por terem iniciativas
pontuais, provas bianuais ou descontinuadas. Os quadros sintetizam os resultados
respectivamente das regiões Norte, Sul, Centro-Oeste, Sudeste e Nordeste.

QUADRO 01 – REGIÃO NORTE


Período Estados com Sistemas de Partidos no Governo
avaliação
SIM NÃO SIM NÃO
2003-2006 - AC-AM-RO-PA-RR- - PT (2) / PPS / PSL /
AP-TO PSDB / PDT / PFL
2007-2010 AC-AM RO-PA-RR-AP-TO PT PSDB (2) / PPS / PDT
PMDB PMDB
2011-2014 AC-AM- PA-RR-AP PT / PMN/ PT / PSDB / PSB
RO-TO PMDB / PSDB
Fonte: pesquisa realizada, 2014.
Com relação à Região Norte, constata-se que existe um crescente movimento de
ampliação da avaliação por sistemas próprios dos estados. Verifica-se ainda que no
período de 2003 a 2006 não existiam experiências consolidadas nesta região. Por outro
lado, na atualidade a maioria dos estados já possuem experiências de avaliação externa
1406

da educação básica por meio de sistema próprio. Em relação aos partidos que ocupam o
poder, denota-se que não existe indicação clara de posicionamento partidário, havendo
um estado sem sistema próprio governado pelo PT e outro pelo PSDB, sendo que os
mesmos partidos governam estados com sistema próprio de avaliação da educação
básica.

QUADRO 02 – REGIÃO SUL


Período Estados com Sistemas de avaliação Partidos no Governo
SIM NÃO SIM NÃO
2003-2006 - PR-RS-SC - PMDB (3)
2007-2010 RS PR-SC PSDB PMDB (2)
2011- 2014 RS PR-SC PT PSDB / DEM
Fonte: pesquisa realizada, 2014.
Da mesma forma, o Quadro 02 demonstra que a experiência de avaliação própria
por sistema estadual só existe no Rio Grande do Sul e que a mesma se iniciou no
governo do PSDB e foi mantida pelo atual governo do PT. Ao passo que o governo do
PSDB no Paraná não desenvolveu sistema próprio.

QUADRO 03 – REGIÃO CENTRO-OESTE


Período Estados com Sistemas de avaliação Partidos no Governo
SIM NÃO SIM NÃO
2003-2006 DF-MS-GO-MT PMDB / PT /
PSDB / PPS
2007-2010 DF-MS GO-MT PFL / PMDB PP / PPS
2011-2014 MS-GO DF-MT PMDB / PSDB PT / PMDB
Fonte: pesquisa realizada, 2014.
Em relação ao Centro-Oeste, percebe-se, da mesma forma, que o período de
2007 a 2014 teve nítida ampliação do número de estados que criaram sistemas de
avaliação da educação básica, com dois estados em cada período. Porém, denota-se que
o DF criou seu sistema em 2007 e descontinuou a ampliação da avaliação no período do
atual governo do PT. Esse fato é pouco comum, uma vez que no contexto internacional
e nacional temos o avanço dessas práticas. Dessa forma, constata-se a expansão dos
sistemas de avaliação pelos estados e por diferentes partidos, mas são poucos os que
encerram os sistemas existentes, mesmo com mudanças no governo/partido.
QUADRO 04 – REGIÃO SUDESTE
Período Estados com Sistemas de Partidos no Governo
avaliação
SIM NÃO SIM NÃO
2003-2006 MG-RJ-SP ES PSDB (2) / PSB PSB
2007-2010 ES-MG-RJ-SP PMDB (2) / PSDB(2)
2011- 2014 ES-MG-RJ-SP PSB / PSDB(2) /
PMDB
Fonte: pesquisa realizada, 2014.
1407

Na Região Sudeste, temos um quadro que compreende 100% dos estados que
aplicam as provas para avaliar a educação básica, sendo que dois estados são
governados pelo PSDB e dois pelo PMDB e PSB.
QUADRO 05 – REGIÃO NORDESTE
Período Estados com Sistemas de Partidos no Governo
avaliação
SIM NÃO SIM NÃO
2003-2006 AL-CE-SE BA-MA-PE-PB- PFL(3) / PSDB PFL / PMDB / PSDB
PI-RN / PT / PSB
2007-2010 CE-PE AL-BA-MA-PB- PSB(2) / PDT PSDB (2) / PT(3) /
PI-SE-RN PSB
2011- 2014 AL-CE-PE BA-MA-PB-PI- PSDB / PSB(2) PT(2) / PMDB /
SE-RN PSB(2) / DEM
Fonte: pesquisa realizada, 2014.
A Região Nordeste expressa uma maioria de estados que não possuem sistema
próprio de avaliação. Outro aspecto relevante está na tendência a descontinuidades na
aplicação das provas. Podemos considerar que apenas CE e PE mantiveram um sistema
com avaliações anuais por dois mandatos consecutivos, com governos do PSB no
período de 2007 a 2014. Enquanto que Alagoas possuía um sistema próprio em 2003
sob governo do PSB e o mesmo foi descontinuado em 2007 pelo PSDB e retomado em
2011 pelo mesmo partido, o PSDB.
Sintetizando as informações por partido político e período de governo,
elaboramos o Quadro 06, que indica a baixa relação entre a orientação política do
partido que ocupa o governo e a existência ou não de sistemas próprios de avaliação da
educação básica. Uma hipótese para explicar esse fato é que não existe uma clara
orientação partidária sobre a temática, abordada como um mecanismo “técnico” voltado
para a melhoria da educação e despido, portanto, de fundamentação política por parte
dos governantes.
QUADRO 06 – Síntese - Partido político do governador e a existência de sistemas
de avaliação externa
PARTIDOS SIM % NÃO %
PSDB 11 55 09 45
PMDB 07 41 10 59
PT 03 21 11 79
PSB 07 54 06 46
PFL/DEM 02 29 05 71
PPS - -- 04 100
PDT - -- 03 100
PP - -- 01 100
PSL - -- 01 100
PMN 01 100 - --
Fonte: pesquisa realizada, 2014.
1408

Verifica-se que entre os cinco maiores partidos no período analisado, o PT é a


agremiação que mais teve governos sem sistemas próprios de avaliação (79% dos
governadores), seguido pelo PFL/DEM, com 71% dos governadores sem sistemas
próprios de avaliação. No campo oposto, segue-se o PSDB (com 55%) e PSB (com
54%), representando os partidos que tiveram mais governadores com sistemas próprios
de avaliação em seus mandatos. Mesmo sem aprofundarmos o debate sobre as
perspectivas de atuação dos partidos indicados, uma análise rápida da realidade política
nacional mostra que PT e PFL/DEM assumem no espectro político, posicionamentos
díspares, sendo designados pelo senso comum como partido de esquerda e de direita,
respectivamente.

III. Apontamentos finais


A expansão da avaliação externa no Brasil amplia-se sob a inspiração de outros
países que implantaram esse modelo de gestão da educação ainda na década de 1980.
Encontramos certa diversidade nos modelos implantados tanto no Brasil como em
outras localidades do mundo. Conforme Maroy e Voisin:
[...] alguns estados norte americanos e a Inglaterra implantaram sistemas de
accountability duro com punições para aqueles locais mal avaliados de
acordo com os padrões estabelecidos na Europa continental foi mais comum
o accountability suave, “ou ‘reflexiva” baseiam-se na suposição de
engajamento e de reflexividade dos atores e num modelo de obrigação de
resultados que façam preferencialmente apelo à autoavaliação e não à sanção
externa (MAROY; VOISIN, 2013, p.886).

Sob essa perspectiva de análise, rompem-se ideias maniqueístas que opõem de


forma simplista a existência ou não de sistemas de avaliação externa como elemento
definidor da política educacional. Quando tratamos do accountability e da política de
regulação da educação “[...] as ferramentas utilizadas e os mecanismos que as unem
umas às outras constituem elementos de análise chave para compreender os significados
e as orientações sociopolíticas diversas [...]” (MAROY; VOISIN, 2013, p.886).
Os diferentes tipos de avaliação (de alunos, de professores), os mecanismos de
prestação de contas e as consequências para os atores são fatores que não podem ser
desprezados numa apreciação crítica. Como exemplo, citamos o caso do Rio Grande do
Sul, que teve o sistema de avaliação implantado no período de 2007-2010 pelo governo
do PSDB, e no período de 2011-2014, já no governo do PT manteve seu sistema de
avaliação da educação básica, porém com profundas transformações, que não permitem
1409

classificá-lo como uma continuidade do modelo anterior, mas uma ruptura com o
mesmo.
Concluímos que os sistemas de avaliação da educação se tornaram, no tempo
presente, um fenômeno comum em diferentes países e também nas diferentes regiões
brasileiras que, de certa forma, reproduzem diretrizes gerais do BM para o setor
educacional, porém, diante da diversidade de possibilidades de avaliação, com
diferentes ferramentas utilizadas e variados mecanismos de responsabilização e/ou
envolvimentos dos atores no processo a simples existência desses sistemas não permite
rotular uma política educacional e compreender seu significado.
Podemos, portanto, afirmar que não existe relação direta entre o partido político
no poder e a existência ou não de um sistema próprio de avaliação externa. Entretanto,
antes de aprofundarmos as consequências teóricas dessa constatação empírica cabe
perguntarmos se a existência de um sistema próprio de avaliação da educação básica
constitui um elemento suficiente para apontarmos uma política educacional como
claramente inclinada aos princípios da direita neoliberal.

REFERÊNCIAS
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Cortez, 2009.

BOBBIO, N. Direita e Esquerda: razões e significados de uma distinção política. 3ªed.


São Paulo: Editora UNESP, 2011.

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“desempeños” de La democracia em América Latina. In: Krawczyk, N. R.;
WANDERLEY, L. E. América Latina: Estado e reforma numa perspectiva comparada.
São Paulo: Cortez, 2003.

CORAGGIO, J. L. Propostas do Banco Mundial para a educação: sentido oculto ou


problemas de concepção? In: In: TOMMASI, Livia de; WARDE, Miriam Jorge;
HADDAD, Sérgio. (orgs) 5ª ed. O Banco Mundial e as Políticas Educacionais. São
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FUKUYAMA, F. O fim da História e o último homem. Rio de Janeiro: Rocco, 1992.

GIDDENS, A. Para Além da Esquerda e da Direita. São Paulo: Editora UNESP,


1996.

MAROY, C.; VOISIN, A. As Transformações Recentes das Políticas de Accountability


na Educação: desafios e incidências das ferramentas de ação pública. Educação e
Sociedade, Campinas, v. 34, n. 124, p. 881-901, jul.-set. 2013.
1410

PERONI, V.; ADRIÃO, T. (orgs.). O público e o privado na educação: interfaces


entre Estado e Sociedade. São Paulo, Xamã, 2005.

SOARES, M. C. C. Banco Mundial: políticas e reformas. In: TOMMASI, Livia de;


WARDE, Miriam Jorge; HADDAD, Sérgio. (orgs) 5ª ed. O Banco Mundial e as
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SOUZA, S. Z. L. de; OLIVEIRA, R. P. de. Políticas de avaliação da educação e quase


mercado no Brasil. Educação e Sociedade, 2003, vol.24, nº. 84.
1411

Pôster

Gestão pública escolar de qualidade: ações que desencadeiam a melhoria do Ideb


no Estado do Maranhão

Felix Barbosa Carreiro

1.0 INTRODUÇÃO

Os índices de rendimento escolar dos alunos da educação básica brasileira,


matriculados nas escolas públicas, indicam em quais contextos as Políticas Públicas
Educacionais têm alcançado o cotidiano da sala de aula.
Nesse contexto, segundo Oliveira (2010, p. 254) é necessário que os
investimentos na Educação Básica sejam direcionados para a construção de uma
educação pública de qualidade sociocultural.

Entre esses investimentos destacamos os destinados às avaliações em larga


escala, como a Prova Brasil, que em meio a outras avaliações tem tido grande destaque
por integrar o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – Ideb.
Em acordo com Castro (2009, p.3) a institucionalização de avaliações em
larga escala no Brasil,

[...] pode prover informações estratégicas para aprofundar o debate sobre a


situação educacional de um país e mostrar o que os alunos estão aprendendo,
ou o que deveriam ter aprendido, em relação aos conteúdos e habilidades
básicas estabelecidos no currículo.

No entanto, é necessário que se avance no debate, em prol da melhoria de


qualidade da Educação, tendo em vista que há condicionamentos intra e extraescolares
que precisam ser conhecidos. Nesse sentido, Dourado, Oliveira e Santos (2007, p.7)
“traçam um importante cenário para a análise das dimensões intra e extraescolares.
Inicialmente, definem o horizonte das dimensões extraescolares envolvendo dois níveis:
o espaço social e as obrigações do Estado”.
Sobre o Ideb e a aplicação da Prova Brasil, destacamos o compromisso da
gestão escolar no desenvolvimento de ações que impliquem a melhoria do processo
educativo e por consequência refletem nos resultados dos processos avaliativos, seja da
1412

avaliação de aprendizagem, seja das avaliações em larga escala. Isto porque


compreendemos que está entre as funções dos gestores, organizar estratégias que gerem
participação coletiva em prol de uma escola de qualidade sociocultural. Quanto à
repercussão dos indicadores do Ideb no cotidiano escolar, assim se expressam Nardi;
Schneider; Rios (2014, p. 386),

[...] É possível referir que esses indicativos constituem mostra de uma tensão
entre meios (e quiçá opções) internos às escolas e expectativas externas a elas
no tocante à produção de um ensino de qualidade, mesmo com certa
permeabilidade das políticas recentes à abordagem da qualidade social da
educação.

Nesse contexto de avaliações em larga escala aplicadas nas escolas


brasileiras é que definimos como problema de pesquisa: Quais são as ações e estratégias
desencadeadas pelos gestores escolares das escolas públicas do Estado do Maranhão
que apresentam o Ideb crescente entre os anos de 2007 a 2011?
Pelo exposto, cabem na pesquisa, elementos críticos em relação à melhoria
do Ideb como o que sugere Campbell (1976, p. 49): “um indicador quantitativo, ao ser
usado para tomada de decisões, fica mais sujeito a manipulações”.

2. PROBLEMÁTICA DA PESQUISA

Os resultados do Ideb referentes ao Estado do Maranhão, ainda continuam


longe do ideal, mesmo considerando o crescimento dos resultados da Prova Brasil nos
últimos anos de sua aplicação. Sabe-se que estes resultados necessitam urgentemente de
políticas públicas que visem uma educação de qualidade sociocultural. No chão da
escola, o trabalho dos gestores escolares torna-se fundamental para a qualidade da
Educação. É necessário então que se conheça o que vem sendo desenvolvido para que
se busquem referências de um trabalho de gestão de qualidade em prol da melhoria do
Ideb, no Estado.
Nesse sentido, considerando que a qualidade da educação vem sendo
expressa por meio de indicador de qualidade, no caso o Ideb, centrou-se o problema da
pesquisa nas ações e estratégias desencadeadas pelos gestores escolares das escolas
públicas estaduais do Estado do Maranhão que apresentam Ideb crescente entre os anos
de 2007 a 2011.
1413

Para responder a esse questionamento outras perguntas ainda nortearão a


presente pesquisa: 1) Quais são as políticas educacionais que prevalecem no Estado do
Maranhão? 2) Quais são os pressupostos e os desafios para a construção de uma
educação de qualidade sociocultural no Brasil? 3) Em que medida os resultados do Ideb
foram valorizadas como indutoras de ações pedagógicas direcionadas para o
aprendizado? 4) Quais são os condicionantes que implicam índices de rendimento
escolar elevado?

3.0 JUSTIFICATIVA

O professor e pesquisador Miguel Arroyo(2009) reconhece indicadores de


qualidade na educação pública brasileira, mas é preciso clareza quanto ao uso do termo
qualidade,

[...] a palavra “qualidade” vem muito da área da produção de matérias e nós


estamos trabalhando com seres humanos. E como medir a qualidade da
formação de uma criança, de um jovem adolescente, simplesmente pela nota
que tirou? Ou seja, a qualidade da educação básica tem sido expressa por
meio de indicador quantitativo (ARROYO, 2009, p. 150).

O índice de desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) é constituído do


resultado da Prova Brasil e do fluxo escolar. Referindo-se a esse procedimento, vale
lembrar a crítica formulada por Vieira (2010, p. 3) considerando que “a Prova Brasil
como um dispositivo de controle que atua nos poros das práticas curriculares cotidianas
dos/as docentes, agindo de forma a limitar cada vez mais as suas alternativas em relação
à sua autonomia”
O ensino de qualidade no Brasil, abrangendo a dimensão educacional
técnica, democrática e pedagógica, será uma realidade à medida que as Políticas
Públicas Educacionais garantirem o direito social “ao acesso, a permanência, a
aprendizagem e a conclusão da Educação Básica na idade certa de todas as crianças e
adolescentes” (UNICEF, 2012, p.46). Contudo, o ingresso e a permanência do aluno no
espaço escolar só efetivarão se houver participação da sociedade organizada, não apenas
como parceiros, mas como atores de um processo que se constrói cotidianamente
(Vieira; Freitas, 2003).
A sala de aula é um espaço pedagógico onde acontecem as interações
sociais favoráveis à construção do conhecimento e à troca de experiências, informações,
1414

ideias e opiniões que contribuem para o crescimento educacional do indivíduo.


Assim, é necessário considerar os fatores extraescolares no desempenho dos
alunos, conforme Dourado, Oliveira e Santos (2009)

[...] a qualidade da educação envolve dimensões extra e intraescolares e, nessa


ótica, devem se considerar os diferentes atores, a dinâmica pedagógica, ou seja,
os processos de ensino-aprendizagem, os currículos, as expectativas de
aprendizagem, bem como os diferentes fatores extraescolares que interferem
direta ou indiretamente nos resultados educativos (DOURADO, OLIVEIRA,
SANTOS, 2009, p. 105)

4.0 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Cumpre lembrar que uma educação pública com qualidade e inclusão social
exige políticas públicas que contemplem em suas ações dimensões como: infraestrutura
e recursos pedagógicos, planejamento e financiamento da educação, gestão
participativa, formação inicial e continuada de professores e práticas pedagógicas nos
processos de ensino e aprendizagem. Estes elementos induzem políticas públicas que
consolidam a qualidade da educação pública da educação básica, como se expressa
Dourado, Oliveira, Santos, 2009:

[...] qualidade da educação é definida envolvendo a relação entre os recursos


materiais e humanos, bem como, a partir da relação que ocorre na escola e na
sala de aula, ou seja, os processos ensino aprendizagem, os currículos, as
expectativas de aprendizagem com relação à aprendizagem das crianças etc.
(DOURADO, OLIVEIRA, SANTOS, 2009, p. 19).

Dourado, Oliveira, Santos (2009, p. 9) destacam ainda que, “a qualidade


pode ser definida a partir dos resultados educativos, representados pelo desempenho do
aluno”. O pensamento educacional do pesquisador será referência na investigação

Embora sendo relevantes as contribuições de Lukesi (2001) e Vasconcelos


(1995) para a pesquisa sobre a avaliação da aprendizagem escolar, cito Melanda (2014,
p. 10) por apresentar as implicações das avaliações em larga escala para a qualidade da
educação e para a gestão escolar. Assim se expressa a referida doutoranda,

[...] o grande entrave da questão avaliação externa e qualidade de ensino está


no uso social que se faz dos resultados, isso porque mais do que demonstrar
resultados, os instrumentos de avaliação externa estão se constituindo cada
vez mais no Brasil, em ferramentas da gestão da educação, mobilizando
ações concretas para buscar efetivamente qualidade nos processos educativos
(MELANDA, 2014, p. 10).
1415

O gestor educacional busca comandar as discussões pedagógicas que


permeiam a prática educacional com foco na aprendizagem dos alunos, ao mesmo
tempo em que administra o espaço escolar, sem esquecer que a autonomia deve gerar as
decisões. Portanto, a gestão participativa, caracteriza-se por uma força de atuação
consciente pela qual os membros da escola reconhecem e assumem seu poder de
influenciar na determinação dessa unidade escolar, de sua cultura e de seus resultados.

5.0 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

De acordo com os objetivos, a pesquisa se caracteriza como qualitativa,


pois, concordando com André (2005, p. 47), “esse tipo de abordagem valoriza o papel
do sujeito na produção do conhecimento, os significados que ele atribui à realidade, às
suas experiências, às formas de interações sociais”.

Essa pesquisa terá abordagem de cunho qualitativo, pois se pretende


investigar as causas possíveis do elevado rendimento do Ideb, entre 2007 a 2011, de
duas escolas públicas do Estado do Maranhão.
O critério de seleção das escolas considerou o Índice de Desenvolvimento
da Educação Básica(Ideb), entre os anos de 2007 e 2011, levando-se conta: as escolas
com ideb igual ou superior à meta estabelecida e, as escolas que, cumprindo o critério
acima, não apresentaram decréscimo no período investigado.
Em consulta ao site do INEP, relativo ao Ideb dos anos iniciais do ensino
fundamental, observou-se que apenas três escolas apresentam Ideb igual ou superior à
meta estabelecida, sem haver decréscimo. Tais escolas localizam-se nos municípios de
Santa Inês, Viana e Caxias. Em função da escola localizada no município de Santa Inês
ter sido municipalizada, integrarão a pesquisa somente as escolas dos municípios de
Cajari e Caxias.
Após a seleção dessas escolas dos seus respectivos municípios, procedemos
com o encaminhamento do “documento de consentimento” aos gestores das escolas
para obter a devida autorização para a realização da pesquisa de campo.
Os instrumentos e técnicas de coleta de dados são a análise documental dos
PPP (Projetos Políticos Pedagógicos) das escolas pesquisadas, o questionário misto a
ser aplicado aos gestores escolares e a entrevista semiestrutural a ser realizada com os
1416

gestores escolares e os professores de português e matemática dos 5°s anos da educação


básica.
O questionário será formulado considerando as seguintes dimensões:
infraestrutura física e recursos pedagógicos, planejamento e gestão, formação de
professores, práticas pedagógicas para o ensino de português e matemática.
O questionário, segundo Gil (1999, p.128) pode ser definido “como a
técnica de investigação composta por um número mais ou menos elevado de questões
apresentadas por escrito às pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opiniões,
crenças, sentimentos, interesses, expectativas, situações vivenciadas etc.”.

6.0 LÓCUS DA PESQUISA

O campo de investigação dessa pesquisa são as escolas das cidades dos


Municípios de Caxias e Cajari, que pertencem respectivamente à Unidade Regional de
Educação (URE) de Caxias e a URE de Viana, da Secretaria Estadual de Educação do
Maranhão.
As UREs fazem parte da organização da Secretaria de Estado da Educação
do Maranhão (SEDUC/MA). Segundo informações do site da SEDUC/MA (2014),
“foram criadas com o objetivo de promover a reestruturação administrativa, a
descentralização e a gestão participativa no governo do Estado do Maranhão, resultando
no aumento do controle social das ações governamentais.”. Estão divididas em
dezenove para gerenciar e articular eficazmente as escolas do Estado.
A URE Caxias está localizada na região Leste Maranhense e compõe os
seguintes municípios: Caxias, Aldeias Altas, Duque Bacelar, Coelho Neto, Afonso
Cunha e São João do Sóter. A escola “A” (Ideb obervado 2007: 4.1/2009: 4.1/2011:
4.3), que está entre as doze escolas estaduais do município de Caxias, fará parte dessa
pesquisa por ter apresentado o Ideb igual e crescente entre os anos de 2007 a 2011. A
outra escola “B” (Ideb obervado 2007: 3.6/2009: 3.9/2011: 4.3), é a única escola
estadual do município de Cajari e que também obteve o Ideb crescente nesse período.
Ela pertence à URE Viana e está localizada na região dos Lagos Maranhenses, sendo
composta pelos seguintes municípios: Arari, Bacurituba, Cajapió, Cajari, Matinha,
Olinda Nova do Maranhão, Palmeirândia, Penalva, São Bento, São João Batista, São
Vicente de Ferrer e Viana.
1417

7.0 INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS

A produção do material empírico será realizada através dos seguintes


instrumentos: entrevista semiestruturada com as professores, conforme roteiro em
anexo; entrevista semiestruturada com os gestores escolares, também em anexo, das
escolas “A” e “B” conforme especificadas anteriormente.

Assumimos as entrevistas em uma perspectiva sociocultural, na qual estes


procedimentos não se resumem a uma troca de perguntas e respostas previamente
preparadas, mas como uma dimensão da linguagem e, portanto, dialógica.

Também utilizaremos como instrumentos de coleta de dados ao longo da


pesquisa, encontros com professores e gestores, os seguintes recursos: diário de campo
do pesquisador, relatórios dos participantes; análise dos Projetos Políticos Pedagógicos,
os estatutos dos conselhos escolares, regimentos internos das escolas e a existência dos
grêmios estudantis.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei nº 9394, 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da


educação nacional. Disponível em: <http//www.mec.gov.Br/legis/defalt.shtm>. Acesso
em: 12 de outubro de 2013.

CASTRO, M. H. G. Sistemas de avaliação da educação no Brasil: avanços e novos


desafios. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, Fundação Seade, v. 23, n. 1, p. 5-18,
jan./jun. 2009. Disponível em: <http://www.seade.gov.br>; <www.scielo.br>. Acesso
em: 9 de novembro de 2013.

LUCKESI, C. C. Avaliação da Aprendizagem Escolar: estudos e posições. 11. ed.


São Paulo: Cortez, 2001.

LUCK, H. A escola participativa: o trabalho do gestor escolar. 2. ed. Rio de Janeiro:


DP&A , 1998.

__________. Gestão educacional: estratégia, ação global e coletiva no ensino. In:


FINGER, A. et al. Educação: caminhos e perspectivas. Curitiba: Champagnat,1996.

SANT’ANNA, Ilza Martins. Por que Avaliar? Como Avaliar? 8. ed. Petrópolis:
Editora Vozes, 2002.
1418

VALERIEN, J. Gestão da escola fundamental: subsídios para análise e sugestão de


aperfeiçoamento. São Paulo: Cortez; [Paris]: UNESCO; [Brasília]: Ministério da
Educação e Cultura, 2002.

VASCONCELOS, C. S. Avaliação: concepção dialética libertadora do processo


avaliação escolar. São Paulo, Libertad, 1995.

Chizzotti, Antonio. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 8. ed. São Paulo : Cortez,
2006.

FLICK, Uwe. Uma introdução à pesquisa qualitativa. 2ª edição. Porto Alegre:


Bookman. 2004.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4.ed .São Paulo:
Atlas,2002

OLIVEIRA, Maria Marly de. Como fazer pesquisa qualitativa. Recife: Bagaço, 2005.
1419

Pôster

Avaliação da qualidade na educação e federalismo brasileiro: uma análise das


políticas públicas no estado do Espírito Santo

Flávia Costa Lima Dubberstein


PPGE/UFES
flaviaclima22@yahoo.com.br

Resumo: A pesquisa pretende uma análise para o contexto educacional, das políticas
públicas de acesso a educação de qualidade e as ações do Governo balizadas em um
sistema avaliativo, com intuito de contribuir para melhoria na oferta do ensino.
Centralizaremos nosso debate no Estado do Espírito Santo, marcado por desigualdades
advindas do modelo federalista brasileiro, e o que isso implicaria na oferta educacional
dos municípios capixabas. Pretendemos, por meio de análise bibliográfica, resgatar o
processo histórico na perspectiva de provocar mais reflexões em torno da temática, com
objetivo de aprimorar os conhecimentos teóricos em políticas públicas educacionais.
Consideramos o debate oportuno, tendo em vista o panorama recente de aprovação do
Plano Nacional de Educação e as implicações para o planejamento educacional da
próxima década.
Palavras chave: Políticas educacionais, Avaliação, Qualidade.

INTRODUÇÃO

De que maneira podemos mensurar a qualidade na oferta educacional, considerando as


leis que regem o nosso país? No artigo 206 inciso VII da Constituição de 1988,
encontramos em um dos princípios em que o ensino seria ministrado, a garantia da
oferta de qualidade. Para tanto, o Artigo 211 da Carta estabelece, que esta seria de
responsabilidade da União. Contudo, o Governo Federal por meio do Ministério da
Educação (MEC), tem balizado a política educacional brasileira para aferição da
1420

qualidade desde a década de 19901, por meio de avaliação por desempenho definidas a
partir de metas que deveriam ser alcançadas.

Desde o ano de 2007, com a criação do IDEB, o governo estabeleceu metas bienais de
qualidade educacional a serem atingidas pelas escolas existentes em todas as Unidades
da Federação (estados e municípios). Esse índice é calculado com base nos dados sobre
a aprovação dos alunos, obtidos no Censo Escolar e nas médias de desempenho após
aplicação dos testes que compõem Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
(SAEB)2. A meta a ser alcançada pelo governo visa contribuição para melhora na oferta
da educação brasileira com fins de atingir o patamar educacional da média dos países da
OCDE3.
Para atenuar a complexidade do debate proposto em nossa pesquisa, no caso da
República Federativa Brasileira, ainda temos a pontuar questões tais como a não
descentralização conforme proposto em Carta Política de 1988. Estando assim
organizados os estados e municípios, limitadamente autônomos e devendo submeter-se
a Constituição Federal, diferentes em seus contextos regionais e avaliados em alguns
momentos como iguais. Dessa forma, em consonância com Araújo (2005), nosso
trabalho também tencionará a urgência na formulação de políticas educacionais
pensando em um sistema articulado considerando os aspectos que o federalismo
acarretou para o Brasil.

Após a promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88) e, em especial, das


emendas constitucionais 14/96 e 53/06, que criaram, respectivamente, o Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (FUNDEF) e o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), observa-se que a

1
Na referida década o Estado Brasileiro sofreu reforma administrativa, e as atenções do país estavam
totalmente voltadas para o mercado. De acordo com Pereira (2005), após essa reconstrução/reforma o
Brasil assume uma perspectiva de administração de governo de modo gerencial.
2
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), realizado pelo Ministério da Educação
(MEC) por meio do Instituto Nacional Anísio Teixeira (INEP), tem como principal objetivo avaliar a
Educação Básica brasileira e contribuir para a melhoria de sua qualidade e para a universalização do
acesso à escola.
3
Organização para o Comércio e Desenvolvimento Econômico.Organização internacional composta por
34 países membros que aceitam democracia representativa e da economia de livre mercado2 , que procura
fornecer uma plataforma para comparar políticas econômicas, solucionar problemas comuns e coordenar
políticas domésticas e internacionais. A maioria dos membros da OCDE são economias com um
elevado PIB per capita e Índice de Desenvolvimento Humano e são considerados países desenvolvidos.
1421

questão do federalismo brasileiro e a educação têm ocupado cada vez mais espaço nas
discussões e que o nosso debate perpassará necessariamente pela distribuição de
recursos para o financiamento da educação em uma federação recortada e marcada por
desigualdades.

Encontramos em nosso estado brasileiro uma federação organizada em três níveis de


governo: União, Estados/Distrito Federal e Municípios, na qual as atribuições e
responsabilidades quanto à manutenção e o desenvolvimento do ensino deveria ocorrer
em um regime de colaboração previsto na CF/88, que, ressalte-se, ainda carece de
regulamentação.

Concernente a Lei 9394/96, particularmente ao capítulo de financiamento, tendo em


vista que o mesmo se refere ao “padrão de qualidade” do ensino, encontramos o Artigo
74. O mesmo prescreve o regime de colaboração entre a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios por meio do estabelecimento do padrão mínimo de
oportunidades educacionais para o ensino fundamental, baseado no cálculo do custo
mínimo por aluno, o que seria capaz de assegurar um ensino de qualidade. O parágrafo
único do artigo da LDB mencionado aponta ainda que o custo mínimo levaria em conta
as variações regionais. Sendo assim, essa contribuição dialogaria com o panorama de
lacunas quanto às garantias de acesso à educação de qualidade que atenda às demandas
e expectativas não somente no estado do Espírito Santo mas também nas diferentes
regiões, estados e municípios brasileiros.

Muitos são os avanços alcançados na educação brasileira, principalmente na última


década, como por exemplo: a ampliação do Ensino Fundamental de 8 para 9 anos; a já
citada criação do FUNDEB; a ampliação da obrigatoriedade da educação escolar na
faixa etária de 4 a 17 anos, garantida até o ano de 2016 de acordo com a Emenda
Constitucional (EC) 59/09 e em conformidade com a Meta 3 do PL nº 8530/10 referente
ao novo Plano Nacional da Educação (PNE). Todos estes fatores representam
significativos avanços e, também, grandes desafios para a política educacional do País.

Para o nosso debate em torno da oferta do ensino de qualidade e as políticas avaliativas


aplicadas pelo governo brasileiro a fim de mensurar a educação, compartilho dos
apontamentos de Oliveira e Araujo (2005), tendo em vista que definir estabelecer
1422

indicadores para medição da qualidade exige para além de técnica, que no caso seria a
aplicação das avaliações em larga escala, mas ações políticas a fim de definir insumos e
parâmetros para um ensino de qualidade que requer uma análise de custos, uma análise
para o contexto local e as expectativas.

FALANDO UM POUCO SOBRE AS POLÍTICAS PÚBLICAS E O CONTEXTO


EDUCACIONAL NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO.

Em 2012, os municípios capixabas receberam R$ 1,38 bilhão do FUNDEB e


repassaram R$ 750,5 milhões para a sua formação. A diferença entre os valores
recebidos e enviados, ou seja, o saldo FUNDEB foi de R$ 627,4 milhões, 7,1% a mais
do que no ano anterior. Os valores repassados por meio do Fundo repercutiram nos
gastos com educação neste mesmo período, implicando numa elevação de 11,4%, sendo
que a capital Vitória foi responsável pelo aumento com 22,4% de todo o conjunto dos
municípios do Estado.

Neste ano, o gasto médio com educação por aluno apresentou um crescimento
acentuado em relação a 2011, de 11,4%, passando de R$ 4.514,24 para R$ 5.029,28.
Dentre os municípios com os maiores gastos com educação por aluno, destacam-se:
Anchieta (R$ 12.569,52), Presidente Kennedy (R$ 10.321,51), Governador Lindemberg
(R$ 8.108,45), Brejetuba (R$ 7.568,72) e São Domingos do Norte (R$ 7.549,62). Em
contrapartida, Pedro Canário (R$ 4.071,56), Sooretama (R$ 3.996,92), Cariacica (R$
3.928,01), Viana (R$ 3.744,89) e Guarapari (R$ 3.696,87), ocuparam os últimos lugares
no ranking (FINANÇAS DOS MUNICÍPIOS CAPIXABAS, 2013).

De acordo com o site do INEP e os resultados divulgados para o IDEB 2011, nenhum
dos municípios acima citados entre os que tiveram maiores gastos com educação por
aluno, estão entre aqueles que obtiveram as maiores notas considerando os alunos
matriculados nas redes municipais e estadual de 1º ao 5º ano conforme consta na tabela
1, tampouco entre os alunos matriculados nas redes municipais e estadual do 6º ao 9º
ano, conforme tabela 2.
1423

TABELA 1: LOCALIZAÇÃO DAS MELHORES ESCOLAS PÚBLICAS DE 1º


AO 5º ANO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
Município Rede Ideb 2011
SAO MATEUS Estadual 7,3
NOVA VENECIA Municipal 7,2
ALFREDO CHAVES Municipal 7,1
VILA VELHA Municipal 7,0
VITORIA Municipal 7,0
COLATINA Municipal 6,9
ARACRUZ Municipal 6,8
DOMINGOS MARTINS Municipal 6,8
LINHARES Municipal 6,8
PANCAS Estadual 6,8
Fonte: Elaboração da autora a partir dos dados do MEC/INEP (2012).

TABELA 2: LOCALIZAÇÃO DAS MELHORES ESCOLAS PÚBLICAS DE 6º


AO 9º ANO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
Município Rede Ideb 2011
VITÓRIA Municipal 6,4
DOMINGOS MARTINS Municipal 6,1
DOMINGOS MARTINS Municipal 6,0
CASTELO Municipal 5,8
MARECHAL FLORIANO Estadual 5,8
MARILÂNDIA Municipal 5,8
MUNIZ FREIRE Estadual 5,7
BREJETUBA Estadual 5,6
CASTELO Municipal 5,5
MUNIZ FREIRE Municipal 5,4
VENDA NOVA DO IMIGRANTE Municipal 5,4
VITÓRIA Municipal 5,4
VITÓRIA Municipal 5,4
VITÓRIA Municipal 5,4
Fonte: Elaboração da autora a partir dos dados do MEC/INEP (2012).

Destaca-se ainda, após a análise das tabelas 1 e 2, que a maioria dos municípios que
obtiveram as melhores notas melhores notas desse Índice, não fazem parte da Região
Metropolitana da Grande Vitória (RMGV)4, contrariando uma expectativa natural tendo
em vista que a região é responsável por 63% do PIB total estadual, considerando-se os
valores de 2005, e responde por 65% de arrecadação de ICMS (imposto sobre operações

4
A Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV) ocupa apenas 5% do território capixaba e é
composta pelos municípios de Cariacica, Fundão, Guarapari, Serra, Vitória e Vila Velha.
1424

relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte


interestadual, intermunicipal e de comunicação) do estado.

A RMGV divide com a região Litorânea Sul e a região Pólo Cachoeiro a condição de
maior atratividade para investimentos no Estado. Contudo e apesar dessa vantagem
econômica, a região apresenta acentuado quadro de desigualdades sociais, que se
manifestam a partir de sua estrutura territorial, com áreas de alto nível de renda e
desenvolvimento humano e outras com condições urbanas ainda precárias. Esse cenário
de contradições parece uma marca do desenvolvimento brasileiro, com industrialização
tardia e concentrada (INSTITUTO JONES DOS SANTOS NEVES, 2008).

O IDEB foi criado em 2007 pelo INEP e possui uma escala de zero a dez. Esse índice
sintetiza dois conceitos considerados importantes, de acordo com a análise feita pelo
governo, a fim de mensurar a qualidade na educação. Um deles é a aprovação e média
de desempenho dos estudantes em língua portuguesa e o outro nos conhecimentos em
matemática. O indicador é calculado a partir dos dados sobre aprovação escolar, obtidos
no Censo Escolar, e médias de desempenho nas avaliações do Inep, o Saeb e a Prova
Brasil.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O DEBATE PROPOSTO

O nosso esforço com fins de análise para o contexto educacional, das políticas públicas
de acesso à educação de qualidade e as ações do Governo balizadas em um sistema
avaliativo visando contribuir para melhoria na oferta do ensino e o recorte para o Estado
do Espírito Santo propõe uma reflexão imediata. A aplicação de testes em larga escala,
com intuito de aferir as competências e habilidades para a oferta de um ensino de
qualidade, apresenta-se até o presente momento apenas como mais uma política de
avaliação de educação por parte do governo, de acordo com Oliveira e Araújo (2005,
p.18) “pouca ou nenhuma medida política administrativa é tomada a partir de seus
resultados”.

Na dimensão da oferta qualitativa, há que se atentar para a diversidade de demandas e


expectativas sobre o que seria uma oferta de qualidade e as relações que possam surgir
ao associá-la a quantidade de dinheiro gasta em educação. A fim de alcançar o objetivo
1425

proposto e ampliar o debate iniciado está em andamento uma pesquisa bibliográfica e


documental com enfoque quanti-qualitativo. Na pesquisa em andamento pretendemos
dialogar com o panorama de lacunas quanto às garantias de acesso à educação de
qualidade que atenda às demandas e expectativas não somente no estado do Espírito
Santo, mas também nas diferentes regiões, estados e municípios brasileiros.

REFERÊNCIAS

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das ideias políticas no Brasil. 2005. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade de
São Paulo

BRASIL. Constituição (1988).Constituição da República Federativa do Brasil.


Brasília, DF: Senado Federal, 1988.

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setembro de 1996. Brasília, DF: Senado Federal, 1996.

_______. Emenda Constitucional (1996). Emenda Constitucional no 53 de 19 de


dezembro de 2006. Brasília, DF: Senado Federal, 2006.

_______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB n.º 9.394, de 20 de


dezembro de 1996. Diário Oficial da União, Brasília, 23 dez. 1996.

BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. Gestão do setor público: estratégia e estrutura


para um novo Estado. IN: BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos; SPINK, Peter. (Orgs.).
Reforma do estado e administração pública gerencial. 7. ed. Rio de Janeiro: Editora
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FERNANDES, Reynaldo. Índice de desenvolvimento da educação básica. – Série


Documental. Brasília: INEP, 2007.

FERNANDES, Reynaldo. IDEB: monitoramento objetivo da qualidade dos sistemas


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INEP – Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, (2010). Censo


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INSTITUTO JONES DOS SANTOS NEVES. Perfil Regional: Região Metropolitana


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de 2014.

OLIVEIRA, Romualdo Portela de, ARAUJO, Gilda Cardoso de. Qualidade do ensino:
uma nova dimensão da luta pelo direito à educação. Revista Brasileira de
1426

Educação. Rio de Janeiro, núm.28, pp.5-23, abr. 2005. Disponível em: <
http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n28/a02n28.pdf>. Acesso em 02 de julho de 2014.

VILLELA, Tania Mara Cursino (org.). Finanças dos Municípios Capixabas. Vitória,
v.19, jul. 2013. Disponível em: <http//www.financasdosmunicipios.com.br>. Acesso em
19 de abril de 2013.
1427

Pôster

O atual currículo oficial do estado de São Paulo: pressupostos políticos e


pedagógicos

Flordenice Tavares de Longui Silva


Supervisora de Ensino na SEE-SP
Mestranda em Políticas Públicas de Educação na UNICID

Resumo: Este texto integra pesquisa maior intitulada “USOS DOS CADERNOS
CURRICULARES E REPERCUSSÕES NA ORGANIZAÇÃO PEDAGÓGICA DAS
ESCOLAS DE ENSINO MÉDIO: O QUE DIZEM DIRETORES DE ESCOLAS
PÚBLICAS ESTADUAIS PAULISTA”. No estudo original buscou-se apresentar uma
discussão a respeito do Currículo Oficial das escolas estaduais paulista proporcionando
uma visão de conjunto, tanto da teorização relativa ao currículo escolar, quanto de
aspectos da organização pedagógica das escolas. Neste texto discuto os pressupostos
políticos e pedagógicos que orientam o Currículo Oficial. Para isso apresento elementos
teóricos e práticos do processo de implementação curricular. Debater o currículo oficial
paulista significa, também, apontar aspectos importantes do processo de disseminação
do conhecimento no interior da escola. Esta é uma discussão constantemente pautada no
campo educacional, em particular no campo do currículo, que, nos dias atuais, tem se
tornando objeto de inúmeras tensões no ambiente da escola.
Palavras-chave: Proposta Curricular - Currículo Oficial – Organização Pedagógica das
escolas.

Introdução
A partir dos resultados do SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica
(Prova Brasil), do ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio – e de outras avaliações
realizadas em 2007, o Governo do Estado de São Paulo elaborou 10 metas para a
educação paulista, a serem conquistadas até 2010. Para isso, a SEE-SP propôs uma ação
integrada e articulada, cujo objetivo era organizar melhor o sistema educacional de São
Paulo. Neste cenário, com alegações de querer melhorar o quadro de desempenho dos
alunos da Educação Básica do estado de São Paulo, a SEE-SP envolveu-se em tarefas,
1428

ações e projetos estruturais, e apresentou uma nova Proposta Curricular. (SEE-SP,


2008).
A Proposta Curricular do Estado de São Paulo para o Ensino Fundamental e
Médio, implantada desde 2008 na rede pública de ensino criou uma base curricular
comum para toda a rede estadual de ensino. A SEE-SP assegura que a iniciativa da
Proposta Curricular procura “[...] garantir a todos uma base comum de conhecimentos e
competências, para que nossas escolas funcionem de fato como uma rede [...]”. Assim,
em janeiro/2008, no início do programa, foram enviados materiais a todas as escolas da
rede pública estadual - revista, jornal e DVD’s – com orientações específicas sobre sua
utilização na unidade escolar. (SEE-SP, 2008)
Depois de enviar o Jornal do Aluno, a Revista do Professor e os Vídeos Tutoriais
(material do período de recuperação intensiva - entre os dias 18 de fevereiro a 30 de
março de 2008), a SEE-SP enviou um novo material (Cadernos Curriculares) indicando
os conteúdos a serem trabalhados pelo professor. O material que apresenta o Caderno do
Professor é uma espécie de apostila denominada “Proposta Curricular do Estado de São
Paulo – disciplina especificada – Ensino Fundamental Ciclo II e Ensino Médio”. O
Caderno do aluno é semelhante ao do professor. Possui a mesma disposição de textos,
figuras e gráficos, porém, com espaços para respostas, dicas de pesquisas, filmes, livros
e sites. Além disso, com a intenção de complementar o trabalho na sala de aula e
contribuir para a formação do aluno, o caderno oferece as “Lições de casa”. De acordo
com a introdução dada no Caderno do aluno “é por meio de estudos e da realização das
tarefas que você poderá conquistar a autonomia para aprender sempre” (SEE-SP, 2009).
Em continuidade à política educacional delineada no ano de 2008 por meio de
um novo modelo de proposta curricular – a partir de 08/11/2008 a proposta adquire
“status” e passa a ser tratada como Currículo Oficial (Resolução SE nº 76/2008). A
SEE-SP enviou, ainda, às escolas o Caderno do Aluno, que paralelo ao Caderno do
Professor, também é dividido por disciplina/série/bimestre.
Tomando esse cenário como ponto de partida, considera-se que tratar do
Currículo Oficial da SEE-SP nas dimensões da escolha dos conteúdos, da veiculação
das informações, do acesso e da utilização dos Cadernos Curriculares - relacionando tais
dimensões à gestão pedagógica das escolas - é relevante para a análise e entendimento
dos fenômenos que podem (ou não) contribuir para a melhoria da qualidade da
educação ofertada pelo Sistema de Ensino Estadual Paulista. Assim, este trabalho
propõe analisar e debater a implementação da política curricular no estado de São Paulo
1429

e seu imbricamento na organização pedagógica das escolas. Esta é uma discussão


constantemente pautada no campo educacional, em particular no campo do currículo,
que, nos dias atuais, tem se tornando objeto de inúmeras tensões no ambiente da escola.
Nessa perspectiva, o trabalho tem como objetivo central analisar a
implementação do atual Currículo Oficial da SEE-SP em escolas públicas estaduais da
cidade de Guarulhos, com foco na organização pedagógica dessas escolas. Apresenta
como objetivos específicos analisar e investigar: os processos de escolha dos conteúdos
e distribuição dos materiais gráficos pedagógicos (Cadernos do Gestor, Cadernos do
Professor e Cadernos do Aluno); o processo de veiculação das informações sobre o
Currículo Oficial da SEE-SP; o processo de aplicação, nas unidades escolares, dos
materiais gráficos pedagógicos.

Discussão metodológica
O presente estudo emprega metodologia qualitativa para examinar o campo do
currículo relacionado à organização pedagógica das escolas públicas paulistas, com
vistas à análise da aplicação dos Cadernos Curriculares. Os dados foram obtidos
mediante contato direto com diretores de escolas públicas estaduais e gestores da SEE-
SP, o que possibilita entender os problemas que envolvem a implementação, segundo a
perspectiva dos entrevistados. Assim, na tentativa de responder ao problema de pesquisa
proposto, as informações foram coletadas por meio de entrevistas pessoais, com
aplicação de questionário contendo questões abertas e fechadas. Foram entrevistados 30
gestores escolares (diretores de escolas públicas estaduais paulistas da cidade de
Guarulhos-SP). Além disso, foram examinados os seguintes documentos oficiais:
Proposta Curricular do Estado de São Paulo; Caderno do gestor 2009: gestão do
currículo na escola; Cadernos do Professor: gestão do currículo na escola; Edição
Especial da Proposta Curricular. Jornal do Aluno; Resolução SE nº 76/2008.

A discussão do problema à luz da literatura


A implementação da Proposta Curricular da SEE-SP, atualmente configurada
como Currículo Oficial das escolas públicas estaduais, é recente – 2008. E esta ação já
provocou, no campo educacional e acadêmico, diversas matérias e publicações que
estão analisadas em artigos, resumos, etc.
Para iniciar o debate faz-se necessário definir currículo, pois na atualidade, são
inúmeras suas definições. O termo currículo vem substituir o termo programa, mais
1430

usado entre educadores e ainda vigente. Com relação à concepção de currículo,


SAVIANI, N. (2009, p. 31) ressalta que
“[...] no exame das políticas curriculares é necessário entender o
currículo como processo, que envolve uma multiplicidade de relações,
abertas ou tácitas, em diversos âmbitos, da prescrição à ação, das
decisões administrativas às práticas pedagógicas, na escola como
instituição e nas unidades escolares especificamente. [...]”

Ao apresentar um panorama das teorias do currículo, Silva (2007) relata que os


estudos sobre currículo nascem nos Estados Unidos, onde se desenvolveram duas
tendências iniciais. Uma mais conservadora, com John Franklin Bobbitt, buscava
igualar o sistema educacional ao sistema industrial, utilizando o modelo organizacional
e administrativo de Frederick Taylor. De acordo com Silva (2007) Bobbitt (2004 apud
Silva, 2007) encontrou ainda suporte na teoria de Ralph Tyler e na de John Dewey. O
primeiro defendia a ideia de organização e desenvolvimento curricular essencialmente
técnica. Por sua vez, conforme Silva (2007) John Dewey se preocupava com a
construção da democracia liberal e considerava relevante a experiência das crianças e
jovens, revelando uma postura mais progressivista.
De maneira geral, encontramos disseminada na literatura específica, que a teoria
tradicional de currículo defende a ideia de currículo ”neutro”, científico, que desenvolve
um saber desvinculado das relações de poder e, que é admitido como o saber legítimo,
universal, do interesse da humanidade como um todo indistinto. Desse ponto de vista, o
currículo não se preocupa em questionar os arranjos sociais vinculados à estrutura
social, fomentando a aceitação e a adaptação (Silva, 2007).
Silva (2007, p. 148) define currículo como “uma questão de saber, poder e
identidade”, fazendo ainda uma relação entre as teorias críticas e pós-críticas do
currículo:
[...] as teorias pós-críticas podem nos ter ensinado que o poder está em
toda parte e que é multiforme. As teorias críticas não nos deixam
esquecer, entretanto, que algumas formas de poder são visivelmente
mais perigosas e ameaçadoras do que outras (SILVA, 2007, p. 147).

Na visão do autor, depois de conhecer as teorias críticas e pós-críticas, torna-se


impossível conceber o currículo de forma ingênua e desvinculado de relações sociais de
poder. Nas teorias críticas isso significa nunca esquecer, por exemplo, a determinação
econômica e a busca de liberdade e emancipação; e para as pós-críticas significa
questionar e/ou ampliar muito daquilo que a modernidade nos legou. Importante dizer
que na apresentação das teorias tradicionais, críticas e pós-críticas não houve pretensão
1431

de afirmar que uma única teoria ou tendência pode sozinha, esgotar toda compreensão
sobre este artefato cultural complexo que é o currículo.
Diante do exposto, conforme parte da literatura, é possível observar que com
relação à concepção de Currículo, o vocabulário pedagógico é: extenso, multivariado,
multifacetado, dinâmico, sucessivo e simultâneo, desde um ponto de vista histórico,
inclusive contraditório em si mesmo e, determinado por um contexto político, científico,
filosófico e cultural. Currículo modifica-se historicamente atendendo a realidades
sociais distintas, tempos e espaços específicos e, em consequência disso, precisa ser
compreendido no contexto social em que está inserido.
O campo do currículo, em particular, no Brasil, vem adquirindo cada vez mais
consistência e visibilidade, constituindo-se como eixo das políticas públicas de
educação do MEC – Ministério da Educação – e, também das Secretarias Estaduais e
Municipais de Educação, tornando-se alvo privilegiado da atenção de autoridades,
políticos, pesquisadores, professores e especialistas. Sua centralidade no panorama
educacional nacional pode ser atestada pelas constantes reformulações dos currículos
dos diversos níveis de ensino, bem como pelo incremento da produção teórica na área.
É neste cenário de valorização do campo curricular que esta investigação se
insere buscando, sobretudo, fortalecer as práticas educativas democráticas tanto nos
Sistemas de Ensino como nas escolas públicas estaduais paulistas de Educação Básica.

A proposta curricular do estado de São Paulo - 2008


A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo introduziu em 2007, e,
implementou no ano de 2008, uma Proposta Curricular para todas as escolas da rede
pública estadual. Esta proposta, amparada na distribuição de materiais gráficos, indicou
os conteúdos a trabalhar, a atuação dos professores, os objetivos a alcançar e a forma de
avaliar a aprendizagem dos alunos. O projeto nasceu sob a nomenclatura de Proposta e a
partir da publicação da Resolução SE nº 76 de 07/11/2008, consolidou-se como o
Currículo Oficial da Rede Pública Estadual Paulista.
Na Educação Básica, assim como no ensino superior, as questões curriculares
estão diretamente ligadas às questões da qualidade de ensino, que por sua vez estão
ligadas às de organização pedagógica das escolas. Nesse sentido, os problemas de
gestão relacionados à logística, distribuição e aplicação dos cadernos curriculares estão
imbricados, por sua natureza, à implementação do Currículo Oficial do Estado de São
Paulo e, refletem, direta ou indiretamente, nos processos de ensino e aprendizagem que
1432

ocorrem, necessariamente, no interior das escolas. Estes materiais são enviados


bimestralmente às escolas da rede pública estadual com orientações específicas sobre
sua utilização na unidade escolar.
A organização curricular unificada da SEE-SP está referenciada nas Diretrizes
Curriculares Nacionais e, portanto, configurada com ênfase na cultura e em
competências e habilidades – com prioridade à competência leitora e escritora,
articulada às competências para aprender e contextualizada no mundo do trabalho.
(SEE-SP, 2008, p. 03)
A maioria das críticas à Proposta Curricular da SEE-SP/2008 não se refere,
fundamentalmente, às suas diretrizes, mas está pautada na concepção e definição de
currículo e seus desdobramentos, principalmente, na falta de diálogo com a “Rede” e no
papel atribuído ao professor. É consenso entre os críticos da Proposta Curricular que o
professor não pode ter seu papel singularizado e reduzido ao de simples executor de
currículo, ele deve fazer parte de todo o processo desde sua concepção.
De maneira geral, os críticos afirmam que não são contra a existência de um
currículo que sirva de parâmetro para atuação pedagógica das escolas. Discordam da
maneira de se fazer isso e dos princípios que a orientam, bem como a ênfase na sua
operacionalização pelo controle do professor – via cadernos/apostilas e contratação de
mais especialistas com esta finalidade. (SARNO, 2009, p. 10)
Afirmam, como pré-condição, a necessidade de melhorar as condições gerais de
operação das escolas, em especial pela construção de mais escolas, redução do número
de alunos em sala, contratação de professores por concurso público e melhorar a
infraestrutura das escolas – nesta ordem ou de preferência, simultaneamente.
(FREITAS, 2009, p. 54)
Penin (2010, p. 04), afirma que compreender e analisar uma proposta curricular,
e melhor contribuir com a sua construção e mudanças de percurso, demandam organizar
um quadro de referências a partir do qual sejam ancoradas as necessárias interlocuções
entre os diferentes protagonistas do cenário cultural e educacional (PENIN, 2010, p. 4).
No universo da discussão a respeito do currículo observa-se uma busca de
sentido das coisas e de compreender os fenômenos curriculares, ou seja, da necessidade
de percorrer um caminho em busca dessa compreensão.
No entanto, não se pode percorrer tal caminho sem observar e considerar a visão
de diretores de escolas para assim evitar-se uma compreensão unilateral dos fenômenos.
Talvez, por esse motivo é que, conforme Sarno e Cancelliero (2009, p. 76), “a Proposta
1433

Curricular da SEE-SP ao ser implementada sem as condições adequadas, acabou por


cair no descrédito, dificultando a mudança esperada”.

Algumas considerações
Este texto – parte de investigação em andamento - apresentou uma breve
discussão acerca de concepções de currículo e uma apresentação do atual Currículo
Oficial implantado no estado de São Paulo.
Em termos de políticas públicas educacionais, a Proposta Curricular da SEE-
SP/2008, apresenta-se como elemento fundamental, porém, apesar dessa iniciativa,
muito ainda deve ser feito do ponto de vista de adequação da proposta de modo a
envolver a comunidade escolar, principalmente os profissionais das escolas. Existem
muitas questões a serem examinadas quanto à aplicação dos cadernos curriculares que
compõem o Currículo Oficial do Estado de São Paulo.
Nesse contexto, considera-se que dizer aos profissionais o que eles deveriam
pensar ou fazer, sem envolvê-los anteriormente em discussões e atividades motivadoras,
parece algo sem sentido.
Este estudo buscou discutir criticamente conceitos, ideias e abordagens sobre o
currículo oficial paulista. Esses elementos podem possibilitar a geração de novas ideias
e proposições sobre possibilidades e limites de participação dos profissionais da
educação – neste caso, diretores de escolas – na renovação de práticas pedagógicas no
interior de escolas públicas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
PENIN, Sônia Teresinha de Sousa. Políticas para a melhoria na Qualidade de Ensino
e Proposta Curricular da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo –
SEESP. Apostila REDEFOR/USP do Curso de Gestão da Rede Pública para
Supervisores – Disciplina 1 / Módulo 1. São Paulo, 2010.

SÃO PAULO (Estado). Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Proposta


Curricular do Estado de São Paulo. Coordenação, Maria Inês Fini. São Paulo: SEE,
2008.

SARNO, Maria Cecília Mello. Proposta Curricular do Estado de São Paulo: uma
análise Crítica. Documento da APASE - Sindicato dos Supervisores do Magistério no
Estado de São Paulo; da APEOESP – Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do
Estado de São Paulo; do CPP – Centro do Professorado Paulista. São Paulo, 2009.
1434

SARNO, Maria Cecília Mello e CANCELLIERO, José Maria. As políticas para a


Educação Pública no Estado de São Paulo. In: Revista Educação & Cidadania.
Volume 8, número 1, pp. 11-17. Editora Átomo. Campinas, São Paulo. Jan/Jun 2009.

SAVIANI, Nereide. Políticas Curriculares: Elementos para a discussão da


estrutura e organização do currículo para a rede estadual de educação de São
Paulo. In: Revista Educação & Cidadania. Volume 8, número 1, p. 29-36. Editora
Átomo. Campinas, São Paulo. Jan/Jun 2009.

SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do


currículo, 2ª edição. 11 imp. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. [1999]
1435

Pôster

A carreira docente no estado de São Paulo à luz da literatura e das fontes legais:
um breve panorama

Gabriela Rodrigues Nery


Mestranda Unicid
Professora da E.E. Oswaldo Catalano

Resumo: Este trabalho integra investigação maior intitulada “Motivações e expectativas


de professores de ensino médio sobre a docência: uma análise de trajetórias
profissionais”. O estudo original tem como propósito identificar e analisar motivações e
expectativas de professores do ensino médio no que se refere à opção pela carreira
docente, por meio da análise de fontes oficiais e da visão de professores da rede pública
estadual paulista. Busca apontar os elementos que permeiam o exercício do magistério,
a partir das trajetórias de formação, além de levantar dificuldades e possibilidades de
permanência na profissão, considerando-se que há um contexto de desvalorização da
docência na sociedade moderna.
Palavras-chaves: políticas de formação; exercício da docência; expectativas de
professores

Introdução:

O fracasso escolar tem sido tema de grande importância para a sociedade


brasileira e, a partir da década de 1990, a discussão sobre a educação pública recebeu
destaque devido à mundialização da economia. Parte desse debate vem apontando a
necessidade de atender as recomendações internacionais para que a escola forme
sujeitos capacitados para a inserção no mercado de trabalho, recaindo sobre os docentes
essa responsabilidade.
Porém, um dos pontos de maior relevância para a melhoria da qualidade da
educação é a valorização da carreira docente, pois estes atuam diariamente em
condições distantes das ideais e lidam com dificuldades para as quais não foram
adequadamente preparados para enfrentar.
1436

Assim, uma das ações de destaque do governo brasileiro quanto à valorização do


profissional de educação foi a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
(LDB) nº 9.394 de 1996, que estabelece diretrizes com a finalidade de valorização do
docente, a serem implantadas pelos sistemas de ensino, mediante Estatutos e Planos de
Carreira para o magistério público, assegurando os direitos, de ingresso na carreira por
concurso público de provas e títulos; de formação continuada; de implantação do piso
salarial para a profissão docente; da progressão profissional; do período reservado aos
estudos; do planejamento e da avaliação incluídos na carga horária de trabalho e das
condições adequadas de trabalho.
A urgência na valorização da carreira docente fica evidente em Gatti, Barreto e
André (2011) que afirmam ser necessário criar condições para que esse profissional se
sinta suficientemente reconhecido socialmente, no esforço de formação das novas
gerações na perspectiva democrática sinalizada pela Constituição Federal e na direção
da ampliação cultural da população brasileira, atual e futura.
É inegável que nos anos mais recentes o tema da educação foi sendo
definitivamente alçado à prioridade na agenda nacional, mobilizando Governos e os
mais diversos segmentos da sociedade em torno de um objetivo comum: a ampliação do
acesso à educação de qualidade para todos os brasileiros.
É neste mesmo espírito do escopo da lei acima citada que surge a urgência do
reconhecimento, pela sociedade, dos docentes, conforme Gatti, Barreto e André (2011,
p. 139) enfatizam:

O reconhecimento dos docentes da educação básica como


profissionais essenciais ao país passa pela oferta de carreira digna e
remuneração condizente com a formação deles exigida e ao trabalho deles
esperado. Não se pode camuflar isso com sofismas que não contribuem com
a profissionalização dos professores e a construção de sua identidade
profissional com características comuns valorizadas.

No entanto, mesmo reconhecidas por lei e por pesquisas de grande relevância, as


propostas nacionais de valorização da carreira docente não são seguidas e cumpridas no
âmbito estadual e municipal. Blindados pela Lei de Responsabilidade Fiscal -
promulgada em 2000 pelo então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso,
que condiciona os gastos de estados e municípios à capacidade de arrecadação de
tributos dos mesmos - os governantes não cumprem a Lei do Piso Nacional e/ou um
terço da jornada para as atividades docentes. Desta forma muitos órgãos de classe têm
se mobilizado para assegurar que se cumpram as leis de valorização do magistério,
1437

conforme discute Souza, (2012). Tais mobilizações denunciam a situação precária no


desenvolvimento do trabalho docente, representada pelos baixos salários e pelas
condições do trabalho; pelo desrespeito aos direitos trabalhistas, o aumento de horas de
trabalho e o descumprimento da legislação sobre a valorização da carreira; da política
de aumento salarial via gratificação de desempenho; e das múltiplas e flexibilizadas
funções – quando da divisão por especialidades, enfraquecendo o trabalho como
atividade totalizante.
Entre os governos estaduais que moldaram o plano de carreira docente,
destaque-se o Estado de São Paulo que promulgou o Estatuto do Magistério Paulista
(LC 444/1.985), que, embora não sendo totalmente satisfatório, foi democraticamente
discutido com os órgãos de representação do professorado e valorizava, em certa
medida, a experiência do docente bem como a sua formação complementar com as
evoluções previstas na lei.
Este por sua vez foi substituído pela LC 836/97, sem diálogo algum com as
entidades representativas, reduzindo o Plano de Carreira em cinco faixas, não
possibilitando mais a evolução por tempo de docência e não prevendo mecanismos que
permitissem a formação do professor em seu local de trabalho (APEOESP, 2012).
A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo atende em parcialidade as leis
nacionais, pois como afirma Meguerditchian (2O12, p. 64):

Apesar de apresentar os planos de carreira, nos prazos determinados,


pagar um valor acima do estipulado pelo piso nacional do magistério, de
possibilitar a evolução pelas vias acadêmica e não acadêmicas, de realizar
concursos públicos para o ingresso de novos docentes, o Estado de São Paulo
ainda não cumpre plenamente a determinação da lei do piso que estabelece
um terço da carga horária dos professores deve ser exercida fora da sala de
aula; não promovem ações que indiquem a equiparação salarial do professor
com outras profissões; não incentiva a dedicação exclusiva em uma unidade
escolar; mantém em seu quadro um elevado nível de professores não
concursados, não garantindo a esses professores o devido respaldo
profissional.

Todos estes fatores não têm atraído novos professores e não têm mantido os
jovens professores recém-formados, de acordo com dados demonstrados na pesquisa
realizada por Souto e Paiva (2013) com alunos de Licenciatura em Matemática da
UFSJ. O estudo constatou que um número expressivo de alunos manifestou desejo de
não exercer a docência, bem como os egressos que já exerciam a docência buscavam
meios de atuar profissionalmente em outras áreas ou estavam investindo em formação
complementar para que a docência fosse uma segunda ocupação.
1438

Distante de uma generalização, mas verificando que estes dados representam um


forte indício de ocorrência das mesmas características em outras regiões do país, nos
possibilita afirmar que a imagem da docência como profissão valorizada pela sociedade
não existe mais e para muitos estudantes esta não é a primeira opção, sendo cogitada
somente como uma possibilidade secundária.
No dia 25 de junho de 2014, a presidente Dilma Roussef sancionou (sem vetos)
o Plano Nacional de Educação, por meio da Lei n. 13.005, publicado no dia 26 de
junho, no Diário Oficial da União, após quase quatro anos de tramitação durante os
quais negociações foram encetadas entre legisladores, representantes do governo,
entidades do magistério e da sociedade civil organizada. Nesse processo, o Projeto de
Lei 8035/ 2010 (PNE), encaminhado pelo executivo federal, recebeu milhares de
propostas de emendas, tendo sido a maior parte delas discutida e deliberada na
Conferência Nacional de Educação (Conae) em 2010, durante a qual participaram quase
dois mil municípios e três mil delegados. A partir da sanção, estados e municípios têm
um ano para elaborar ou reelaborar seus planos decenais de educação.
O atual Plano – que havia sido aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 03
de junho de 2014 - foi proposto pelo Executivo ao Congresso em 2010, estabelecendo
vinte metas e estratégias para a educação nos próximos dez anos, dentre as quais, destaquem-
se: investimento de 10% do PIB; erradicação do analfabetismo; ampliação da oferta de
educação infantil em creches, que deverá atender um mínimo de 50% das crianças de até três
anos; ao final de dez anos de vigência, as crianças deverão estar alfabetizadas, no máximo,
até os seis anos; a escolaridade média da população de 18 a 29 anos deverá ser elevada e
alcançar o mínimo de 12 anos de estudo; 50% das escolas públicas deverão oferecer
educação em tempo integral, a fim de atender pelo menos 25% de todos os alunos da
educação básica; formação de 60 mil mestres e 25 mil doutores por ano ao final de sua
vigência. Registre-se que os royalties do petróleo do pré-sal deverão garantir a execução do
Plano Nacional de Educação, pois a Lei prevê a destinação de 75% dos recursos obtidos
por meio da extração do petróleo e 50% do excedente em óleo para a educação (sendo
25%, para a saúde).
Acrescente-se que no atual PNE, o texto afirma que a união repasse para estados
e municípios o necessário para que estes consigam implantar as mudanças
integralmente, diferentemente da proposta do PNE 2001/2011 em que as secretarias
deveriam cumprir seus compromissos com recursos próprios e, desta forma muitas ou
não cumpriam o piso salarial da lei ou não cumpriam a jornada de 1/3 para atividades
1439

tais como: o período reservado aos estudos, o planejamento e a avaliação incluídos na


carga horária de trabalho.
Este é provavelmente o maior avanço da legislação brasileira em termos de
valorização da profissão docente, entretanto uma lacuna se estabelece quando a
legislação não cria um Sistema Nacional de Educação pois como cada ente da federação
possui autonomia para criar legislação própria para atender ao PNE e a Lei decorrente
deste plano, a fragmentação da educação brasileira poderá continuar, como enfatiza
Oliveira (2010) citado por Scheibe (201, p.984), pois há professores federais, estaduais
e municipais; professores concursados e não concursados; professores urbanos e rurais;
professores das redes pública e particular e das redes patronais profissionais (Sistema
S); e professores titulados e sem titulação. Essa situação origina planos de carreira
distintos (ou ausência de planos), salários diferenciados e duplicação de jornada em
carreiras diferentes: estadual/municipal; pública/privada; educação básica/educação
superior.
Talvez seja esta fragmentação que enfraquece a luta dos trabalhadores da
educação por melhores condições de trabalho, por melhores salários, por um plano de
carreira atraente e, sobretudo pela valorização da profissão pela sociedade.
Divididos, cada um destes grupos busca seus direitos de maneira individualizada
além de obterem pequenas conquistas, e se sujeitando muitas vezes a um desgaste da
imagem perante a sociedade, por se tratar de uma categoria de trabalhadores que
frequentemente se mobiliza em greve para ter suas reivindicações históricas discutidas
por seus empregadores, sejam eles governantes ou empresários.
Especificamente no estado de São Paulo, desde a promulgação da LC
1097/2009, a progressão na carreira é conseguida por meio de uma prova e se o
professor estiver classificado entre os 20% mais bem colocados. Entretanto, pode-se
afirmar que a ascensão na carreira ocorre de acordo com interstícios e a faixa de
remuneração. Dessa forma, o ganho salarial não se converte em valorização, além de
excluir os professores que se encontram em vias de aposentadoria, ou seja, um plano
incoerente e excludente.
Além disso, a Lei prevê condições para que o professor tenha direito a participar
tais como:
a) esteja em efetivo exercício na data base da lei;
b) tenha cumprido o interstício de 4 (para a primeira promoção) ou 3
anos (para as demais);
1440

c) tenha permanecido 80 % do interstício em uma mesma escola;


d) tenha sido assíduo.
Tornar-se incoerente permitir que docentes trabalhando na mesma unidade
escolar, com os mesmos alunos, tenham tratamento diferente, pois de acordo com a
referida Lei apenas os docentes efetivos e que reúnam os quesitos exigidos podem
realizar a prova, lembrando ainda que apenas 20% destes receberiam o reajuste salarial.
Uma Lei equivocada que apenas serve para desmotivar os professores, mesmo que esta
prova não seja o único mecanismo de progressão na carreira. Para melhor exemplificar
o exposto acima segue a tabela que apresenta a diferença salarial de uma faixa para a
outra na evolução profissional por meio da prova:

Da faixa 1 para a faixa 2 25%. Da faixa 1 para a faixa 2 25%.


Da faixa 2 para a faixa 3 20%. Da faixa 2 para a faixa 3 20%.
Da faixa 3 para a faixa 4 16,67% Da faixa 3 para a faixa 4 16,67%
Da faixa 4 para a faixa 5 14,28% Da faixa 4 para a faixa 5 14,28%
FONTE: APEOESP (2012)
Em seguida, a LC 1143/2011 aumenta em mais três níveis evolutivos a carreira
docente no Estado de São Paulo, agora ampliando ainda mais a dificuldade de um
professor que não está em início de carreira alcançar o último nível de evolução antes de
sua aposentadoria.
Este debate merece ser ampliado e divulgado no Estado de São Paulo, pois o
momento político e social é favorável para que professores se mobilizem rumo a
mudanças significativas, colocando a carreira docente como uma possibilidade a ser
considerada pelos jovens em fase de escolha da profissão, assim como possibilitar que
professores que já exercem a docência tenham motivação para permanecerem na
profissão.

Referências:

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BRASIL. (Constituição de 1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 15
jul. 2014.
1441

________. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da


educação nacional. Diário Oficial da União. Brasília: Casa Civil da Presidência da
República, 1996b. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm
>. Acesso em: 15 jul. 2014.

_________. Projeto de Lei do Plano Nacional de Educação (PNE – 2011/2020).


Projeto em tramitação no Congresso Nacional – PL nº 8.035/2010. Brasília: Edições
Câmara, 2.011. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/831421.pdf>.
Acesso em: 15 jul. 2014.

GATTI, Bernadete Angelina; BARRETO, Elba Siqueira de Sá; ANDRÉ, Marli Eliza
Dalmazo de Afonso. Políticas docentes no Brasil: um estado da arte. Brasília:
UNESCO, 2011.

MEGUERDITCHIAN, Alan Ary. Plano de carreira do professor da rede de


educação básica do estado de São Paulo: Expectativas e Atendimentos. Dissertação
de Mestrado. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2012.

SÃO PAULO. LEI COMPLEMENTAR Nº 444, DE 27 DE DEZEMBRO DE 1985.


Dispõe sobre o Estatuto do Magistério Paulista e dá providências correlatas. Disponível
em:<http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei.complementar/1985/lei.complem
entar-444-27.12.1985.html>. Acesso em: 17jun 2014.

___________. LEI COMPLEMENTAR Nº 836, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1997.


Institui Plano de Carreira, Vencimentos e Salários para os integrantes do Quadro do
Magistério da Secretaria da Educação e dá outras providências correlatas. Disponível
em:<http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei.complementar/1997/lei.complem
entar-836-30.12.1997.html>. Acesso em: 17 jun 2014.

___________. LEI COMPLEMENTAR Nº 1097, DE 27 DE OUTUBRO DE 2009.


Institui o sistema de promoção para os integrantes do Quadro do Magistério da
Secretaria da Educação e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei.complementar/2009/lei.complementa
r-1097-27.10.2009.html>. Acesso em: 24 jun 2014

___________.LEI COMPLEMENTAR Nº 1143, DE 11 DE JULHO DE 2011. Dispõe


sobre a reclassificação de vencimentos e salários dos integrantes do Quadro do
Magistério da Secretaria da Educação, e dá providências correlatas. Disponível em:
<http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei.complementar/2011/lei.complementa
r-1143-11.07.2011.html>. Acesso em: 24 jun 2014.

OLIVEIRA, J. F> A articulação entre universidade e educação básica na formação


inicial e continuada de professores: demandas contemporâneas, situação-problema
e desafios atuais. 2010, 17p. (mimeo.) apud SCHEIBE, Leda. Valorização e formação
dos professores para a educação básica: Questões desafiadoras para um novo plano
nacional de educação. Educ. Soc., Campinas, v. 31, n. 112, p. 981-1000, jul.-set. 2010
Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>

SOUTO, Romélia Mara Alves; PAIVA, Paulo Henrique A.A. de. A pouca atratividade
da carreira docente: um estudo sobre o exercício da profissão entre egressos de uma
1442

Licenciatura em Matemática. Pro-Posições, São João Del Rei, v. 24, n. 1, p. 201-224,


jan./abr. 2013.

SOUZA, Michele Borges. Política de Valorização dos profissionais da educação


básica estadual de ensino do Pará. Dissertação de Mestrado. Belém: Universidade
Federal do Pará, 2.012.
1443

Pôster

O professor como intelectual: limites e possibilidades


Os Seminários de Boas Práticas da rede Estadual de SP como lócus privilegiado de
Formação Contínua

Gilvonete Schimitz do Prado Rodrigues


Universidade Nove de Julho - UNINOVE

Resumo: Frente à crescente desvalorização social e política do professor acrescida à


forte tendência de percebê-lo como um executor de programas o tema desta pesquisa
será o professor intelectual. Terá por objetivo compreender como os Seminários de
Boas Práticas contribuem para a constituição da intelectualidade docente e discutir a
formação docente como alternativa ao paradigma dominante da racionalidade técnica.
Os sujeitos da pesquisa serão cinco professores da DER Leste 1 que apresentaram
trabalhos em Seminários de Boas Práticas. Utilizar-se-á metodologia de cunho
qualitativo cujo instrumento de coleta de dados serão entrevista semi-estruturadas. A
pesquisa será fundamentará nos seguintes autores: Gramsci (1982) e Giroux (1998) no
que diz respeito ao Professor Intelectual, Nóvoa (1992, 1995, 2007) que discute a
formação de professores e Contreras (2002) que traz contribuições acerca da autonomia
docente.
Palavras - Chave: Autonomia Docente, Formação de Professor, Professor intelectual.

INTRODUÇÃO

Professores intelectuais

O professor é compreendido como o profissional que se educa e forma-se no


decorrer de sua existência, num processo de construção de si próprio como
pessoa e na relação com os outros. Como sujeito histórico o professor tem a
possibilidade de intervir, mediante seu trabalho, na transformação social,
visto que sua profissão tem como objetivo a formação de outros seres
humanos, uma atividade complexa para a qual se exige uma formação sólida
e qualificada, não apenas inicial, mas contínua, que lhe dê condições de
enfrentar os inúmeros desafios que o contexto educacional apresenta
diariamente nas escolas. (Lima, 2012, p 99)

Perceber e assumir o professor enquanto um intelectual transformador é abandonar a


concepção do professor em termos puramente instrumentais e técnicos. É entender a
1444

função docente como um trabalho intelectual, além do seu papel como legitimador de
interesses políticos, econômicos e sociais que variam de acordo com as pedagogias por
eles endossadas e utilizadas. Essa é uma percepção que os próprios professores
precisam reconhecer e assumir. Muitos ainda não se reconhecem enquanto intelectuais
muito menos legitimadores e multiplicadores da hegemonia dominante, alienando-os do
seu papel político enquanto agente transformador.
É importante entender que nenhuma atividade por mais mecânica e rotinizada que seja,
pode ser abstraída do funcionamento da mente em algum nível. Nessa perspectiva,
Paulo Freire contribui em nossa reflexão ao passo que, assim como Gramsci argumenta
que todos os homens e mulheres são intelectuais uma vez que “independente de sua
função social e econômica, todos os seres humanos atuam como intelectuais ao
constantemente interpretar e dar significado a seu mundo e ao participar de uma
concepção de mundo particular” (Giroux, 1997 p. 154). Ao passo que consideramos o
uso da mente como uma parte essencial da atividade humana referenda-se a capacidade
humana de integrar o pensamento e a prática, e assim destacamos a essência do que
significa encarar os professores como profissionais reflexivos. Desse modo, os
professores não podem ser vistos como meros executores de programas, mas sim
percebidos e aceitos como homens e mulheres livres, com uma dedicação especial aos
valores do intelecto e ao fomento da capacidade crítica dos jovens.
John Dewey argumenta que os cursos de formação docente que enfatizam somente o
professor enquanto executores de programa, que prioriza o conhecimento técnico em
detrimento da reflexão prestam “um desserviço tanto à natureza do ensino quanto a seus
estudantes” (Giroux, 1997, pág. 159). Segundo o autor “em vez de aprenderem a refletir
sobre os princípios que estruturam a vida e a prática de sala de aula, os futuros
professores aprendem metodologias que parecem negar a própria necessidade do
pensamento crítico”. O que condiciona os futuros docentes a manterem uma prática
pedagógica tecnicista, baseada na transmissão do conhecimento assim como se
apresenta nos programas oficiais ou livros didáticos. Os professores não são
estimulados a refletirem sobre questões acerca dos princípios que subjazem os
diferentes métodos didáticos, técnicas de pesquisa e teorias da educação. Os alunos não
são preparados para analisarem a natureza subjacente por trás dos problemas escolares,
em contra partida, aprendem o “como fazer”, “o que funciona” ou o domínio da melhor
técnica para ensinar um dado conhecimento.
1445

A partir desta perspectiva o professor é reduzido político e socialmente ao status de


técnicos especializados dentro da instituição escolar, cuja função resume-se em executar
e implementar o currículo, em detrimento de desenvolver ou apropriar-se criticamente
dos programas estabelecidos pela Secretaria de Educação.
Para Giroux ao se pensar na racionalidade tecnocrática e instrumental que também
opera dentro do campo de ensino, este desempenha um papel cada vez maior na redução
da autonomia do professor, uma vez que se torna bastante evidente na proliferação do
que se tem chamado “pacotes curriculares” onde reservam aos professores a única
função de executar procedimentos preestabelecidos de instrução e conteúdos
predeterminados. Segundo o autor, tais pacotes legitimam o que ele chama de pedagogia
de gerenciamento, ou seja, “a subdivisão do conhecimento em partes diferentes, a
padronização para serem mais facilmente gerenciados e consumidos, e medidos através
de formas de avaliação predeterminada” (Giroux, 1997, p. 160)
Tais características se enquadram na lógica e contabilidade da teoria pedagógica
administrativa que compreende todos os estudantes tendo as mesmas necessidades de
materiais, metodologias bem como modos de avaliação. O fato de que os estudantes
trazem histórias e experiências diversas para dentro da sala de aula, e que também
possuem saberes prévios acerca dos diversos conteúdos incluindo as diversas
linguagens e a matemática, tudo isso é renegado dentro dessa lógica de pedagogia
administrativa.
A profissão docente segundo Libâneo, Oliveira e Toshi (2003) e Tardif e Lessard (2005)
envolve uma variedade de funções as quais podemos destacar a relação com o ensinar, a
gestão educacional e por fim o desenvolvimento pessoal e profissional. Para os autores
o desenvolver pessoal e profissional consiste em reflexões, questionamentos, discussões
sobre o seu próprio desenvolvimento e ações educativas conscientes. Tais ações
embasadas a partir de leituras, participação em cursos, congressos, dentre outros
espaços que contribuam qualitativamente para sua formação contínua, proporcionando
ao professor o exercício da investigação crítica reflexiva sobre sua própria prática e seu
trabalho, possibilitando uma ação docente transformadora em suma, um professor
intelectual.
Lecionar nos anos iniciais é uma tarefa complexa e desafiante que requer um contínuo
processo de reflexão sobre a prática. Mas muitas vezes, o que encontramos são
professores desmotivados, cansados, que encaram a sua tarefa de ensinar como uma
atividade apolítica, como mais uma rotina do seu dia. Professores que adentram suas
1446

salas de aula sem ter a menor ideia do que será trabalhado aquele dia, sem objetivos
didáticos claros, que se apoiam em livros didáticos e simplesmente transmitem o
conhecimento sem estabelecer uma relação com o aluno, com suas vivências e
experiências. Ainda encontramos docentes que reproduz em sala de aula a mesma
didática com a qual foram ensinados como se nada houvesse mudado. Como se as
nossas crianças fossem as mesmas de um passado um tanto quanto distante. Como se as
novas tecnologias, a globalização fosse um fato qualquer que não trouxesse nenhuma
interferência para o ato de ensinar. Professores que simplesmente passa a matéria.
Avalia. Atribui nota. E ainda acreditam que estão formando cidadãos críticos e atuantes.
Grande parte dos professores desconhece as palavras básicas do repertório educacional,
não se considera um intelectual, desconsidera as características de classe social, ou
melhor, as condições econômicas, sociais e culturais de seus alunos no momento de
selecionar, aplicar e avaliar conteúdos de ensino. Assume uma didática de reprodução
de conteúdos baseado no reflexo do seu próprio ensino que recebeu enquanto aluno de
educação básica bem como em suas próprias concepções que, conscientemente ou não,
determinam o seu trabalho.
O conhecimento profissional ou o conhecimento sobre a prática docente tem sido cada
vez mais deixado de lado talvez pela distância que existe entre teoria e prática,
universidade e escola, pensamento e ação. A influência da concepção de que “na prática
é uma coisa e na teoria é outra” tem alargado a lacuna entre conhecimento teórico e
conhecimento prático que encontra raízes e gera conflitos a partir das visões da ciência e
de profissão presentes na “racionalidade técnica derivada do positivismo, com base na
qual o conhecimento prático passa a profissional quando se fundamenta em resultados
de pesquisa científica”(Moreira, 1995, p, 16). Nesta perspectiva, o professor longe de
ser um intelectual autônomo, é considerado um técnico especialista que aplica com rigor
as regras que derivam do conhecimento científico.
A partir do questionamento a esta perspectiva tecnicista, este trabalho tem como
objetivo pensar como os Seminários de Boas Práticas Pedagógicas dos Anos Iniciais da
Rede Estadual de São Paulo, que constitui em encontros que possibilitam a troca de
experiências com o trabalho em leitura e escrita bem como alfabetização matemática,
constitui-se em um espaço de formação e integração entre as 91 Diretorias de Ensino no
estado de São Paulo otimizando um espaço de formação potencializador da
intelectualidade docente.
1447

Meu desejo é que meu trabalho contribua para a reflexão do professor acerca da sua
própria prática bem como a certeza de suas possibilidades de se constituir, sim, um
professor intelectual, reflexivo e autônomo na arte do ensinar.

Objeto da pesquisa
Os Seminários de Boas Práticas da Rede estadual de SP como lócus privilegiado de
formação, espaço de reflexão e contribuição para a constituição do professor enquanto
intelectual.

Universo e sujeitos da pesquisa


O universo de pesquisa se dará na Diretoria de Ensino – Leste 1. Os sujeitos serão cinco
professores e um PCNP de Anos Iniciais que participaram e apresentaram trabalhos nos
Seminários de Boas Práticas da rede Estadual de São Paulo, ocorridos em Águas de
Lindóia (2012) e Serra Negra (2013).

Problematização
• Como os Seminários de Boas Práticas da Rede Estadual de São Paulo, enquanto
espaço de formação, contribui para a constituição do professor enquanto
intelectual?
• Quais os limites e possibilidade da intelectualidade docente tendo em vista as
influências de políticas educacionais?

Hipótese
Os Seminários de Boas Práticas, pensados pela SEE, enquanto um espaço de formação
não só com trocas de experiências a partir do trabalho em leitura e escrita entre
educadores dos Anos Inicias, mas também durante todo o processo de planejamento e
desenvolvimento das boas práticas na unidade escolar, possibilita aos professores a
apropriação de autonomia intelectual o que permite ao docente uma atuação reflexiva e
fundamentada bem como a negação à concepção da função docente como puramente
instrumental e técnica.
1448

Objetivos:

Geral
Compreender como os Seminários de Boas Práticas da Rede Estadual de São Paulo,
como lócus de formação contínua, contribui para a constituição do professor enquanto
intelectual.

Específicos
• Discutir a concepção de professores como intelectuais;
• Discutir a formação do professor como alternativa ao paradigma dominante da
racionalidade técnica – Proletarização docente;
• Identificar os limites e possibilidade da intelectualidade docente tendo em vista
influências de políticas educacionais.

Referencial Teórico
O atual apelo por mudança educacional apresenta aos professores tanto uma ameaça
quanto um desafio que parecem sem precedentes na história da nossa nação (Giroux,
1997). Para o autor a ameaça se dá através de uma série de mudanças que demonstram
pouca confiança na capacidade dos professores de escola pública de oferecerem uma
liderança intelectual sólida aos jovens do nosso país. Tal fato pode ser percebido na
“sugestão de reformas que ignoram a inteligência, julgamento e experiência que os
professores poderiam oferecer em tal debate”. Por outro lado, quando os professores
entram no debate é para serem objetos de reformas educacionais que os reduzem ao
status de técnicos de alto nível cumprindo ditames e programas pensados por
especialistas distantes da realidade escolar concreta.
Nesse sentido a pesquisa será referenciada e iluminada a partir dos estudos de Gramsci
(1987) e Giroux (1997) partindo do pressuposto do entendimento do professor enquanto
intelectual; o tema Formação de Professores será traTado à luz das contribuições de
Nóvoa (1995) e a questão da autonomia dos professores abordada por Contreras (2002).
Tais autores serão o aporte teórico a partir do qual nos ajudará a pensar questões de
intelectualidade docente, formação contínua bem como a autonomia docente enquanto
ser pessoal e político que é o professor.
Tentarei discorrer sobre os impactos nas políticas educacionais durante o trabalho
trazendo as influências do Banco Mundial e OMC tratados por Sérigio Haddad (2008).
1449

Procedimentos metodológicos
Propor-se-á na investigação uma abordagem qualitativa que, de acordo com André
(1995, p.17), baseia-se em princípios como a valorização da “maneira própria de
entendimento da realidade pelo indivíduo”, não aceitando que a realidade seja algo
externo ao sujeito.
Minayo (2001) esclarece que na pesquisa qualitativa a definição de amostragem de
sujeito baseia-se numa preocupação menor com a generalização, ou melhor, o mais
importante é a compreensão do fenômeno. O critério quantitativo não é o mais
significativo, mas a incursão social, ou ainda a capacidade do pesquisador de identificar
e analisar dados não mensuráveis, como percepções, pensamento, opiniões, significados
etc. de determinados sujeitos em relação a um determinado problema. Os sujeitos da
pesquisa serão cinco professores e um PCNP dos Anos Iniciais da DER Leste I que
apresentaram trabalhos no Seminário de Boas Práticas Pedagógicas da rede Estadual de
São Paulo em 2013. Serão empregadas fontes orais e a técnica de pesquisa de dados se
dará através de entrevistas semi-estruturadas, considerada por Tourtier-Bonazzi (1996)
uma técnica intermediária entre um monólogo de uma testemunha e um interrogatório
direto, permitindo ao entrevistador abordar assuntos diferentes ou complementares às
temáticas enfocadas.
Uma vez que “os fatos, os dados não se revelam por gratuita e diretamente aos olhos do
pesquisador” (Ludke; Andrè, 1986, p.4), a análise consistir-se-á num processo contínuo
durante a investigação, procurando identificar as relações e os significados, sendo que a
interpretação e o foco da análise serão ajustados mutuamente no decorrer do estudo
(Alves, 1991). Atentando-se para explicações de Santos (2005, p. 6,)
A leitura de uma entrevista, de uma história de vida, ou de um conjunto de
depoimentos não é tarefa simples. O ponto de partida é, necessariamente, a
precisa delimitação de um problema de pesquisa. No caso de trabalharmos
com um conjunto de depoimentos, é interessante perceber que cada um
contribui com a pesquisa, isolando acontecimentos ou indivíduos,
complementando informações e, mais importante, oferecendo os elementos
necessários para a construção do contexto social ao qual a pesquisa se refere.

Procurar-se-á não perder de vista as orientações acima, valorizando os entrevistados e


suas manifestações, destacando o que cada um poderá trazer de contribuição para o
objeto de estudo, buscando apreender os significados emitidos nos depoimentos.
1450

Referências
ANDRÉ, Marli Eliza D. A. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus,
2003.

BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação – uma


introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1997.

CONTRERAS, José Domingo. A autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2012.


GIROUX, Henry. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia
crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. Tradução Carlos


Nelson Coutinho. 4ºed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982.

HADDAD, Sérgio; WARDE, Mirian Jorge; Tommazi, Lívia. O Banco Mundial e as


políticas educacionais. São Paulo: Cortez, 1996.

HADDAD Sérgio (org). Banco Mundial, OMC e FMI: Impacto nas políticas
educacionais. Cortez, 2008.

NÓVOA, Antonio. Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.

______, (org) Vida de professores. 2 ed. Porto: Porto Editora, 1995*

______, Profissão Professor. 2. ed. Porto: Porto Editora, 1995 b.


1451

Pôster

Como circulam as políticas de formação na visão de diretores escolares: caso PARFOR


(Baixada Santista/SP).

Gisele Santos Fernandez


UNISANTOS
Bolsista CAPES

Resumo: Este trabalho põe em foco o PARFOR/baixada santista/SP, tendo como objetivo
desvelar as representações sociais dos diretores escolares sobre o programa. Pergunta-se qual
o lugar das professoras nas escolas? Como os diretores podem contribuir para os objetivos do
programa? Pretende-se fazer uma aproximação com a teoria das representações sociais de
Moscovici, com autores que escrevem sobre a profissionalidade docente e sobre a escola
enquanto lugar de formação. Utiliza-se análise documental, abordagem qualitativa e técnica
de análise de conteúdo. Esta pesquisa está em fase inicial e encontra-se inserida em projeto
maior financiado pela Capes. As pesquisas anteriores focalizaram as representações das
professoras no que tange à formação no curso e sua caracterização (inserção social e
profissional). Tais estudos indicam, entre outros que a identidade profissional docente resulta,
sobretudo, da socialização profissional, consideradas as condições de exercício da prática
profissional.
Palavras-chaves: Políticas Públicas Educacionais, Gestão Escolar, Formação de Professores.

I – Introdução
O tema dessa pesquisa refere-se à gestão escolar pública na educação infantil, tendo
como sujeitos, diretores/gestores escolares e como objeto, Políticas Públicas e Gestão das
escolas do Programa PARFOR (Baixada Santista/SP). Busca-se a compreensão dos gestores
sobre políticas de formação do Parfor e sua contribuição na atuação docente e no cotidiano da
organização.
A escolha deste tema de pesquisa ocorreu pela minha trajetória profissional e
acadêmica, desde a faculdade de Letras na Universidade de São Paulo (USP) até os cargos de
1452

gestão na área escolar e devido, principalmente, às minhas transformações pessoais e


profissionais, às inquietações e às necessidades formativas que tive ao longo da carreira que
aumentaram meu interesse em torno de formação e da atuação de diretores, dada a
peculiaridade da gestão escolar, em comparação a outras organizações empresariais. A
evolução em lecionar, coordenar, supervisionar, gerenciar e dirigir foi um aprendizado
crescente e cheio de desafios. Percebi que a direção formativa e integradora contribuía para
um ambiente profícuo, para um solo fértil, enfim, um lugar de formação, liberdade,
criatividade e resultados positivos. Isso me levou a buscar uma especialização em Direção de
Centros Educativos, na Espanha, pela Fundación Carolina, quando encontrei caminhos para
uma gestão educativa e depois, ao mestrado, com o intuito da pesquisa em educação,
especialmente, em políticas e gestão escolar. As empresas medem seu desempenho pelos
resultados, mas para mim, apenas isso não era o suficiente. Era preciso ter qualidade e
satisfação de todos. Acreditar nessa possibilidade era correr riscos e ter um desafio imenso.
Encontrar um meio de conseguir resultados com crescimento individual e coletivo foi
amadurecendo a ideia de que, antes dos colaboradores, o próprio diretor deve ter sua
formação continuada e sua transformação pessoal para atingir esta dimensão de seu trabalho.
Por tanto, a trajetória é um caminho de mãos dadas com as dimensões da formação
acadêmica, da atuação profissional e da transcendência pessoal.
No Brasil, na ultima década, temos assistido aos esforços do governo em criar
programas de formação e de incentivos para profissionais da rede pública de educação. Um
desses programas, o PARFOR (Plano Nacional de Formação de Professores da Educação
Básica), instituído pelo Decreto 6755/2009 (BRASIL, 2009), é uma iniciativa emergencial
para professores da educação básica da rede pública que foi criado para oferecer cursos
gratuitos de graduação presencial aos professores que trabalham na educação básica, mas que
não têm uma formação na educação superior (licenciatura). Neste cenário, as professoras-
estudantes da Pedagogia/PARFOR ao apreender os conhecimentos e saberes da profissão,
espera-se que levem para as suas práticas novos olhares e intervenções, modificando e
transformando suas ações na escola, bem como consolidando a construção de sua identidade
profissional. É neste sentido que se justifica o estudo da percepção do gestor e como ele se
apropria dos programas de formação em sua escola e quais os efeitos de sua ação na
organização e na prática docente. Parte-se do pressuposto de que as políticas atravessam
níveis ou camadas pelas quais elas se transformam, desde a sua concepção teórica, em nível
1453

macro, passando pelo nível meso ou institucional, em que sofrem mudanças e concretizam-se
na escola, em nível micro, por meio de seus agentes, entre os quais, gestores e professores.
Este ciclo das políticas (MAINARDES, 2006), desde o contexto de produção normativo até o
contexto das práticas, sofre influências que podem indicar tensões e rupturas no processo de
gestão e que podem ser pistas para um estudo mais aprofundado.
O objeto deste projeto de pesquisa é o estudo das Políticas Públicas e da Gestão das
escolas do Programa/Parfor na Baixada Santista, em São Paulo, tendo como problema central
a compreensão dos gestores sobre tais políticas de formação de professores e a contribuição
deste programa na formação docente e na atuação gestora no cotidiano da organização.
O objetivo geral da pesquisa busca compreender as implicações entre políticas
educacionais de governo e gestão escolar e seus efeitos na organização e na atuação docente.
Especificamente, questiona-se como a gestão apropria-se das políticas e qual o seu papel e sua
contribuição no sucesso desses programas para atingir a finalidade a que este programa se
propõe. Objetiva-se investigar os efeitos do programa de governo como o Parfor na gestão
escolar e qual a visão dos gestores sobre o lugar das professoras-estudantes na escola.
Trata-se de estudo em fase inicial que recorre à teoria das representações sociais
(Moscovici, 2013; Jodelet, 2001) como referência para uma aproximação às informações,
atitudes e o campo de representação dos gestores quanto ao Parfor. Quanto à identidade
profissional e desenvolvimento profissional, até o momento, foi consultado Gimeno Sacristán
(1995) Para esta investigação, utiliza-se análise documental (legislação, diretrizes,
depoimentos) e abordagem qualitativa Bogdan & Biklen (1994). O estudo prevê observação
em escolas com estudantes PARFOR na Baixada Santista, um questionário de caracterização
das escolas e entrevistas com seus diretores. A análise de dados será feita com utilização da
técnica de análise de conteúdo (Bardin, 2011; Franco 2007.
Esta pesquisa encontra-se inserida em projeto maior (Obeduc) desta mesma instituição
financiado pela Capes. Focaliza as escolas em que os estudantes Parfor atuam e por encontrar-
se em fase inicial não traz resultados próprios. As fases anteriores da pesquisa maior
focalizaram as representações do estudantes Parfor no que tange à formação no curso e sua
caracterização (inserção social e profissional). Tais estudos indicam, entre outros, os
elementos constituintes das representações sociais dos estudantes sobre sua práticas .
Ratificam que a identidade profissional docente resulta sobretudo da socialização profissional
consideradas as condições de exercício da prática profissional.
1454

O PARFOR, assim como outros programas e ações em políticas docentes, busca o


esforço da articulação entre instituições de ensino superior (públicas e privadas), instâncias do
ensino (Federal , Estadual e Municipal) e órgãos do governo. Antes do PARFOR, algumas
medidas já vinham sendo tomadas para melhorar a qualidade da educação brasileira, em
especial, a formação docente inicial e continuada, para atender às orientações da LDBEN
9495/96 (BRASIL), de que todos os professores devem ser ensino superior.

REDE NACIONAL DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

MEC
(SEC Ead/ PLANO DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO - PDE
SECADI/ SEB)
CAPES
desde 2007 e PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO 2010
(DEaD/DEB)
CTC/EB
Gestar II
2004 Política Nac de Form.de Profissionais
UAB
do Magistérfio de Educ. Básica (2009)
Pró-Letramento
IPES/ IES 2005
Secretarias
(Fed/Est/Mun) PAR (2008) PARFOR (2009) PBID (2010)
Especialização
PLAT. FREIRE Infantil 2010
FÓRUNS Estaduais

Bibliografia
BARDIN, L... Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.

BOGDAN, R. & BIKLEN, S. Investigação Qualitativa em Educação: uma introdução à


teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994.

BOBBIO, Norberto. Dicionário de Política/Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco


Pasquino; trad. Carmen C, Varriale ET ai.; coord. Trad. João Ferreira; rev. Geral João Ferreira
e Luis Guerreiro Pinto Cacais. – Brasília: Editora Universidade de Brasília, 13ª. Ed., 5ª.
Reimpressão, 2010. Vol. 2: 656 p. (total 1.330 p.)

BRASIL. Decreto D nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009. Institui a Política Nacional de


Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica. Brasília/DF: MEC, 29 de
janeiro de 2009.
1455

DOURADO, Luis Fernades. Políticas E Gestão Da Educação Básica No Brasil: Limites e


Perspectivas. Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial, p. 921-946, out. 2007 921
Disponível em http://www.cedes.unicamp.br

FRANCO, M. L. P. B. Análise do conteúdo. 2. ed. Brasília: Liber Livro, 2007.


GATTI, Bernadete A. Políticas docentes no Brasil: um estado da arte / Bernardete
Angelina Gatti, Elba Siqueira de Sá e Marli Eliza Dalmazo deAfonso André. – Brasília:
UNESCO, 2011, 300p.

JODELET, D. Representações sociais: Um domínio em expansão. In: JODELET, D.


(Org.). As representações sociais . Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001

LIMA, Licínio C. A escola como organização educativa: Uma abordagem sociológica. 4ª.
Ed. – São Paulo: Cortez, 2011.

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Jan./abr. 2006 Disponível: HTTP://www.scielo.br/pdf/es/v27n94/a03v27n94.pdf

MARTINS, Ângela Martins. Instituições Educacionais: Políticas, Gestão e Práticas


Profissionais / Angela Maria Martins (organizadora).—Santos: Editora Universitária
Leopoldianum, 2009

MOSCOVICI, Serge. Representações Sociais: Investigações em psicologia social/ Serge


Moscovici; editado em inglês por Gerard Duveen; traduzido do inglês por Pedrinho A.
Guareschi. 10ª. Ed. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.

SACRISTÁN, J. G. Consciência e Acção sobre a prática como libertação profissional dos


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Brasil. RBPAE – v.22, n.1, p. 13-39, jan./jun. 2006

VIEIRA, Silva Lerche. Educação Básica: política e gestão da escola. Brasília : Líber Livro,
2009.
1456

Pôster

Formação de EDUCADOR musical infantil: em busca da compreensão da estética


na perspectiva de Paulo Freire

Isabela Ventreschi
Graduação em Pedagogia/Universidade Cidade de São Paulo

Resumo: Apresenta-se um recorte de um estudo concluído de Iniciação Científica


PIBIC-Cnpq, intitulado: “A estética na perspectiva de Paulo Freire e suas implicações
na compreensão do Ensino Musical Infantil: Contribuições aos estudos sobre formação
de professores”, vinculado ao projeto maior “O regime de esteticidade em Paulo Freire
como teoria e prática da formação de professores: uma contribuição para a História da
Educação”, do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São
Paulo. A metodologia baseou-se no mapeamento de quatro obras de Paulo Freire,
extraindo a conceituação de estética na perspectiva do autor relacionando com a
literatura sobre o Ensino Musical Infantil. Discute-se a partir da perspectiva estética em
Freire a formação do Educador Musical. O estudo mostra a necessidade de mudança de
compreensão acerca de paradigmas envolvidos na área musical, assim como aspectos
estéticos e éticos norteadores da prática docente do Ensino Musical Infantil.
Palavras-chave: Educação Estética; Ensino Musical Infantil; Paulo Freire.

Introdução

A música é arte, logo está relacionada ao belo, pois a arte sempre está associada
a beleza. A música é um universo imensurável, ainda mais quando relacionado ao
âmbito infantil, é parte indissociável na vida de todos e está sempre presente em nosso
cotidiano, seja nas cantigas de ninar (ao nascer), nas brincadeiras vivenciadas com
outras crianças, nas ruas, ou até mesmo nos meios de comunicação.
A Educação Estética, efetivada através da música, proporciona uma educação
profunda e total da formação humana, uma vez que a musicalização promove o
desenvolvimento infantil, visando a sua autonomia.
Neste estudo, focalizamos a reflexão sobre a formação do educador de Ensino
Musical Infantil, na perspectiva da Estética Freiriana, o autor preocupa-se com a
1457

“boniteza” do processo de aprendizagem, manifestada nos sentimentos de esperança,


solidariedade e ética. A preocupação com a boniteza do processo de aprendizagem, em
Freire, adquire o caráter do que é caro em sua Pedagogia: o processo de
conscientização, o conceito de sujeito histórico como criador de cultura (FREIRE,
2002a), que ocorre por via da curiosidade estética e epistemológica. Esse processo
consiste na percepção de relações entre experiências existenciais e culturais como
processo de criar conhecimento. Desta forma, compreender a formação do professor de
Ensino Musical Infantil, na perspectiva da estética em Freire, tem como horizonte a
valorização da expressão, comunicação, cultura e conhecimento, visando à sensibilidade
para o exercício da cidadania e boa convivência. Portanto, a relevância da estética nos
processos formativos diz respeito ao desenvolvimento da autonomia dos sujeitos, que
aprimora a intervenção na sociedade.

Objetivo

Compreender a importância da dimensão estética na formação do educador do


Ensino Musical Infantil a partir do referencial estético em Paulo Freire, visando à
formação humana.

Metodologia

A proposta metodológica teve abordagem qualitativa, para tanto se utilizou a


análise documental para coleta e organização de dados extraídos das seguintes obras
freirianas: Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, Ética,
utopia e educação, Pedagogia da esperança e À sombra desta mangueira.
A análise foi realizada em dois momentos, o primeiro o mapeamento de trechos
relativos ao conceito de estética em Freire, o segundo momento a compreensão da
dimensão estética do Ensino Musical Infantil a partir da perspectiva de Paulo Freire.
São três as categorias: feiura na formação do Educador Musical; busca da Estética na
formação musicopedagógica; decência e boniteza no Ensino Musical Infantil.
1458

Desenvolvimento

No eixo feiura na formação do Educador Musical, destacam-se lacunas


encontradas no Ensino Musical Infantil, principalmente através dos programas de
treinamento que enfatizam somente o conhecimento técnico, como aponta Giroux
(1997), sem a compreensão de como a sociedade funciona (FREIRE, 1997, p. 69).
Nesse quesito, salienta-se que os princípios socioeconômicos e políticos de
nossa sociedade colaboraram para este fim, culminando na alteração da natureza do
ensino propriamente dita, bem como na mudança do perfil dos estudantes, sendo esta
alteração classificada por Giroux (1997) como “prestação de um desserviço”.
Freire (2000), por sua vez, adiciona mais uma variável a esta questão: falta de
esperança. Assim, ele discorre que, em qualquer dimensão envolvida à prática
educativa, há o envolvimento de esperança, subtendendo-se que, em determinado
momento da História da Educação, alguns educadores afastaram-se deste sentimento
necessário para lecionar, culminando em contradições de suas práticas. Além disso, este
contexto contribuiu para torná-los autoritários, característica imposta visando
recuperação do respeito perdido, e “homens e mulheres sem endereço e sem rumo”.
De forma mais específica, contradições advindas do docente induzem à
autoridade por parte do mesmo (FREIRE, 2000, p. 73), já que a falta de coerência leva à
irresponsabilidade ética, culminando no ensino ineficaz, o que alimenta características
indesejadas do docente, como o autoritarismo e a impaciência, pois um ensino ineficaz
gera dúvidas e estas não são respondidas devido à imposição de respeito por parte do
mesmo.
Por conseguinte, esta desesperança e autoritarismo refletiram na negação do
pensamento crítico quanto ao ensino metodológico, conforme salienta Madureira
(2012), induzindo os futuros educadores musicais, enquanto educandos, à memorização
mecânica dos conteúdos. Este aspecto também é abordado por Freire (2000) quando ele
se refere à educação da resposta, à assimilação e permanência do autoritarismo. Além
disso, este contexto converge para a redução da tomada de consciência acerca do valor
da profissão, de acordo com Mendonça (2009), e à passagem dos atributos citados
anteriormente para os futuros educandos destes, reiniciando este ciclo (RODRIGUES,
2009), notando-se claramente a perda de curiosidade acerca da essência do Ensino
Musical.
1459

No eixo em busca da estética na formação musicopedagógica, considerando os


argumentos expostos acima, torna-se essencial a mudança de compreensão, segundo
Freire (1997), acerca do assunto para a compreensão da Educação Musical Infantil.
Todavia, ainda conforme Freire (1997, p. 14), “a mudança de compreensão [...] não
significa, porém ainda, a mudança do concreto”, denotando que o ato de mudar a
compreensão, propriamente dito, já induz ao entendimento equivocado por parte dos
educandos e educadores, possivelmente transmitindo a informação de que, mudando a
compreensão acerca de um determinado tema, estaríamos modificando o concreto - o
previamente definido / o que não deveria ser modificado - quando, na realidade, nada
seria modificado, apenas abordado diferentemente através de análises críticas
fundamentadas.
Ademais, partindo-se de outro princípio freiriano de que “somos seres da
transformação e não da adaptação” (FREIRE, 2000, p. 23), o autor ressalta que “no
domínio das estruturas sócio-econômicas, o conhecimento mais crítico da realidade [...]
não opera, por si só, a mudança da realidade”. Complementando o discutido com a
visão de que somente possuir um conhecimento crítico acerca da realidade não é o
suficiente para que haja a mudança desejada da realidade, vale destacar que é essencial
a mudança de compreensão acerca desta realidade em questão (FREIRE, 1997, p. 16).
Neste contexto, Freire (2000) utiliza o termo “releitura” para indicar
analogamente que, após inúmeras releituras acerca de algum tema, aprende-se uma nova
linguagem, ou seja, passa-se a compreender o mesmo tema de outras formas. Logo, há
uma mudança de compreensão baseada em uma nova “leitura de mundo”, já que nunca
algo “tem por trás uma única razão” (FREIRE, 1997, p. 9).
Ainda segundo ele, consequentemente ao aprendizado de novas linguagens,
destacam-se “novas possibilidades” (FREIRE, 2002a), permitidas a partir da estética na
inserção de emoções que “dão sentido e significado à existência” alegria, esperança,
paixão ternura e encantamento. (FREIRE, 1997, p. 18). Assim, a estética se manifesta
no respeito às diferenças, valorização do saber popular, solidariedade, autonomia,
coletivismo, diálogo, democracia, encantamento e ética, durante a construção destas
novas linguagens, culminando na idéia de que precisa haver o entendimento individual
de que o ser humano é o ser da “ruptura” (FREIRE, 2000, p. 23) principalmente acerca
de paradigmas.
Desta maneira, torna-se possível uma sociedade livre, ética, de opção e de
decisão, como ressaltado por Freire (2000), e posteriormente “menos desigual, menos
1460

injusta, essencialmente, mais humana” (FREIRE, 2002a, p. 50). Assim, na perspectiva


freiriana é mister buscar novas bases teóricas para transformar, somente é possível a
partir do “entrecruzamento entre linguagem, cultura e poderes” (FREIRE, 2002a, p. 59),
o qual norteia o diálogo permanente como alimento para análise e reconstrução da
realidade, visando num futuro próximo a emancipação social e, portanto, a auto-
emancipação.
Em consonância, insere-se a concepção de que “educar é sempre um ato ético”
(FREIRE, 2002a, p. 10) e sempre se encontra envolvida com: o diálogo, seja com
relação à escolha de conteúdos ou com a forma de relacionamento com os alunos; e com
a estética, por isso não se deve confundir ética com moralismo.
Para compreender a prática docente, em Freire, destaca-se que o ato estético de
ensinar/aprender relaciona-se com “o esforço melodicamente crítico do professor de
desvelar a compreensão de algo e com o empenho igualmente crítico do aluno de ir
entrando como sujeito em aprendizagem” (FREIRE, 2002a, p. 45). Desta forma, nota-se
a necessidade de certa sintonia entre o educando e o educador para que esta finalidade
seja atingida, sendo mediada principalmente através do respeito não imposto, como
defende Freire (1997, p.41), pois “respeitá-los significa, de um lado, testemunhar a eles
a minha escolha, defendendo-a; de outro, mostrando-lhe outras possibilidades de opção
enquanto ensino”.
Entretanto, salienta-se que apenas condições estéticas não propiciam um ensino
musical eficaz, já que o educador somente concretiza sua tarefa docente caso usufrua de
certas condições básicas e favoráveis, já que a estética encontra-se nas condições
concretas: higiênicas, espaciais, estéticas, como defende Freire (2002a). Deste modo,
caso a prática docente ocorra em condições de precariedade, há uma estética da feiura,
que gera “uma ofensa aos educandos, aos educadores e à prática pedagógica” (FREIRE,
2002a, p. 28).
Ademais, baseando-se nos trechos Freirianos “a rigorosidade do método científico
provoca uma maior exatidão das descobertas” (FREIRE, 2000, p. 21) e “toda docência
implica pesquisa e toda pesquisa implica docência” (FREIRE, 1997, p. 99), nota-se que
o autor demonstra certa preocupação com relação aos educadores. Isto é demonstrado
pela discussão da importância de assumir a indagação, a curiosidade e a criatividade
como princípios norteadores docentes, visando principalmente o aprendizado contínuo,
conhecimento de novas linguagens obtido tanto a partir de cursos de atualização quanto
de Congressos e Oficinas.
1461

Freire (2000) também endossa a idéia de que, compreendendo-se todos os


quesitos discorridos neste subtópico, o processo progressista de ensinar passa a
transcorrer naturalmente, possibilitando-se ao educando o exercício da percepção crítica
sem medo de errar, percepção crítica tanto das palavras quanto do mundo, bem como o
aguçamento da curiosidade epistemológica, a qual não pode satisfazer-se com “a mera
descrição do conceito do objeto” (FREIRE, 2000, p. 58). Assim, analogamente ao
conceito da “educação bancária” de Freire (2002), o educador assume a tarefa de
“digestão prévia de imagens ou de objetos”.
Carvalho (2005) também endossa esta prática e acrescenta que, desta forma,
permite-se o envolvimento fundamentado dos educandos no conhecimento, culminando
em aulas criativas, dinâmicas, com temas da atualidade e bastante abrangentes,
buscando educá-los realmente para a vida. Além disso, ele afirma que o conhecimento
aumenta à medida que se cria novas formas rítmicas, melódicas, da vida em que se vive
e se experiência, explicitando também a importância de “releituras” (já explicadas
acima) para a formação de novas linguagens e, portanto, de conhecimentos.
Nesta perspectiva, propiciar-se-á, conforme Madureira (2012) que o educando e
antes dele o educador, saia da rotina e catalize toda sua energia criativa a serviço da arte
musical, pois deste modo a criança poderá assimilar ativamente, brincando, utilizando
todos os elementos construtivos da linguagem musical, independente dos valores
rítmicos, os desenhos melódicos e as arquiteturas de harmonia.
Com relação ao eixo da decência e boniteza no Ensino Musical Infantil,
iniciaremos sua abordagem com o auxílio de Ongaro (2006)

a expressão musical desempenha importante papel na vida recreativa de toda


criança, ao mesmo tempo em que desenvolve sua criatividade, promove a
autodisciplina e desperta a consciência rítmica e estética, [...], cria um terreno
favorável para a imaginação quando desperta as faculdades criadoras de cada
um (ONGARO, 2006, p. 15).

Percebe-se uma relação com a preocupação freiriana, a entrega do educador e do


educando no processo de ensino e aprendizagem. É possível ressaltar que a entrega do
público infantil, apresenta-se de forma exacerbada e é caracterizada pela curiosidade,
imaginação e espontaneidade. A boniteza da música proporciona, nas palavras de
Rodrigues (2009)

por meio do contato com a música a criança aprende a conviver melhor com
outras crianças, estabelecendo um diálogo mais harmonioso, o que contribui
1462

para relação interpessoal e o convívio em sociedade, promovendo ainda o


desenvolvimento do senso de colaboração e respeito mútuo, já que ela
proporciona mais segurança emocional e confiança porque, ao praticá-la, as
crianças conseguem liberar suas angústias. (RODRIGUES, 2009, p. 2)

Neste viés, é preciso considerar o diálogo como peça fundamental para um


convívio mais harmonioso com outras crianças, visando futuramente uma contribuição
para o convívio destas em sociedade, o desenvolvimento do senso de colaboração e o
respeito mútuo, de suma importância para que haja aumento de confiança por parte dos
discentes. Somente assim, perseguindo-se constantemente o momento estético da
linguagem, defendido por Freire (1997), haverá uma constante busca na compreensão e
no conhecimento de mundo, que é totalmente compatível com a beleza na forma de
expressão dos achados, culminando no aspecto fundamental de sempre manter a
“decência e boniteza de mãos dadas” (FREIRE, 2002a, p. 16).
Por fim, e não menos importante, Ongaro (2006) incrementa ainda mais este
raciocínio com o argumento de que, também no quesito científico, a música propicia
inúmeros benefícios biológicos através de determinados mecanismos de ação, sendo
estes classificados por ele como diretos (efeito sonoro direto sobre as células e órgãos) e
indiretos (agindo sobre as emoções e influenciando diversos processos corpóreos de
tensão e relaxamento).
Portanto, a intervenção do educador é de suma importância para, não só
compreender as experiências que as crianças apresentam, mas também para transformá-
las e levá-las à expansão de conhecimentos e vivências musicais, bem como à
apreciação de novos gêneros musicais, jogos, brincadeiras cantadas, cantigas de roda,
desenvolvimento da percepção rítmica e melódica através de instrumentos musicais e do
próprio corpo, culminando no incremento acerca da formação cultural, cognitiva,
afetiva e emocional de cada indivíduo.
Igualmente, a música serve como recurso para a transformação do pensamento e
da compreensão da sociedade. É um elemento auxiliar na ação pedagógica e estimula a
capacidade de criação e recriação, distanciando-se do ensino puramente mecânico.
Além disso, enriquece o conhecimento e desperta a sensibilidade discente e docente. Na
prática musical, seja esta instrumental ou vocal (pessoal ou em grupo), é proporcionado
às crianças a interação e a socialização com outras crianças e adultos, para que ela
compreenda a si mesma e o ambiente no qual está inserida.
1463

O incentivo docente para o conhecimento da música em todas as suas


performances (leitura de partituras, apreciação de canções populares, eruditas ou
folclóricas, história da música e de compositores, e até mesmo na escolha de um
instrumento para estudo) é de extrema importância no processo de aprendizagem
musical. Contudo, o que muitas vezes ocorre é que o conteúdo sem dinâmica torna-se
tedioso, principalmente quando o educando é uma criança.
Neste quesito, um musicopedagogo que contribuiu amplamente para um Ensino
Musical genteificado, conceito desenvolvido por Freire (2000), visando desenvolver a
capacidade crítica e tornar a prática musical dinâmica e prazerosa, foi Jaques-Dalcroze.
Para tal, ele originou a Rítmica, sendo esta uma forma de vivenciar experiências
musicais através do corpo, criando assim uma relação íntima com a música e integrando
diversos saberes dos elementos musicais, caminhando para uma experiência estética,
sensível e alegre.
Jaques-Dalcroze (1917) salienta que sua finalidade era permitir que os
educandos, ao término de seus estudos, dissessem não apenas eu sei, mas eu sinto,
mostrando que sua prática, além de tornar o conhecimento musical internalizado e
vivenciado, leva à uma experiência prazerosa e alegre para a criança, despertando o
ritmo em sincronia com seu movimento.

Considerações Finais

Através deste estudo percebeu-se a emergência social envolvida no tema, já que


é extremamente necessário o incremento na qualidade do Ensino Musical Infantil no
país, tanto para a formação estruturada dos educandos, quanto para os futuros
educadores.
Além disso, destaca-se a necessidade de promoção das áreas artísticas em geral,
de forma que, principalmente na infância, estas se tornem alicerces da educação,
juntamente às unidades curriculares básicas, culminando na formação íntegra do ser
quanto à imaginação, sensibilidade, manipulação crítica e criativa de linguagem, além
de possibilitar a expressão de experiências humanas a fim de ampliar o desenvolvimento
cognitivo.
1464

REFERÊNCIAS

ADORNO, T. W. Teoria estética. Lisboa: Edições 70, 1970.

CARVALHO, P. A. Re-tocando a aprendizagem na educação de infância: A música


como linguagem. Campo Grande: UFMS, 2005.

FREIRE, P. Pedagogia da esperança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.

______. À sombra desta mangueira. 3. ed. São Paulo: Olho d’água, 2000.

______. Ética, utopia e educação. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.

______. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. 25. ed.


Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002a.

GIROUX, H. A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da


aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

JAQUES-DALCROZE, É. La Rythmique II. Lausanne: Jobin & Cie, 1917.

MADUREIRA, R. J. Rítmica Dalcroze e a formação de crianças musicistas: uma


experiência no Conservatório Lobo de Mesquita. Vozes dos Vales da UFVJM:
Publicações Acadêmicas, ano I, 2012.

MENDONÇA, J. S. Educação musical como educação estética: diálogos e confrontos.


Revista eletrônica de musicologia. v. XII, mar./ 2009;

ONGARO, C. F. A importância da música na aprendizagem, 2006. Disponível em:


<http://www.meloteca.com/musicoterapia2014/a-importancia-da-musica-na-
aprendizagem.pdf> Acesso em: jun. 2014.

RODRIGUES, C. A. A importância do ensino de música para desenvolvimento infantil.


Revista eletrônica de musicologia, v. XII; 2009.

SCHILLER, F. Cartas sobre a educação estética da humanidade. São Paulo: EPU,


1991.
1465

Pôster

As apropriações dos professores perante o programa ler e escrever

Ivana Santiago Bueno


Universidade Nove de Julho - UNINOVE

Resumo: O professor face às mudanças na Educação necessita estar e ter uma formação
permanente que possibilite a apropriação de conhecimentos para se tornar um
profissional intelectual à frente desta cultura docente. Diante desta perspectiva esta
pesquisa tem por objetivo estudar o papel do professor, suas aflições, mediações,
possível mudança e as apropriações dos conteúdos pelos professores perante o
PROGRAMA LER E ESCREVER. A metodologia de pesquisa de cunho qualitativo
será produzida com as obras dos autores: Assmann (2007), Bourdieu (1999), Esteve
(1999) e Giroux (1997) que norteiam as concepções do perfil professoral em seu amplo
aspecto.
Palavras-chave: Apropriações, Programa Ler e Escrever, Professor.

INTRODUÇÃO
Neste trabalho de pesquisa que estuda o papel do professor, suas aflições, mediações,
possível mudança e as apropriações dos conteúdos pelos professores perante o
PROGRAMA LER E ESCREVER.
O PROGRAMA LER E ESCREVER como parte integrante do currículo das escolas do
Estado se destaca diante da perspectiva do ensino na educação do ciclo I.
Segundo o FDE – FUNDAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO–
Mais do que um programa de formação, o PROGRAMA LER E ESCREVER é um
conjunto de linhas de ação articuladas que inclui formação, acompanhamento,
elaboração e distribuição de materiais pedagógicos e outros subsídios, constituindo-se
dessa forma como uma política pública para o Ciclo I, que busca promover a melhoria
do ensino em toda a rede estadual. Sua meta é ver plenamente alfabetizadas, até 2010,
todas as crianças com até oito anos de idade (2ª série/3º ano) matriculadas na rede
estadual de ensino, bem como garantir recuperação da aprendizagem de leitura e escrita
aos alunos das demais séries/anos do Ciclo I do Ensino Fundamental.
1466

Os principais objetivos do PROGRAMA LER E ESCREVER são:


• apoiar o Professor Coordenador em seu papel de formador de
professores dentro da escola;
• apoiar os professores regentes na complexa ação pedagógica de
garantir aprendizagem de leitura e escrita a todos os alunos, até o final
da 2ª série do Ciclo I / EF;
• criar condições institucionais adequadas para mudanças em sala
de aula, recuperando a dimensão pedagógica da gestão;
• comprometer as Universidades com o ensino público;
• possibilitar a futuros profissionais da Educação (estudantes de
cursos de Pedagogia e Letras), experiências e conhecimentos
necessários sobre a natureza da função docente, no processo de
alfabetização de alunos do Ciclo I / EF. (São Paulo, 2013).

O PROGRAMA LER E ESCREVER envolve a estrutura da SEE - Secretaria Estadual


da Educação - (CENP- Coordenadora de Estudos e Normas Pedagógicas; COGSP-
Coordenadores de Ensino da Região Metropolitana da Grande São Paulo; CEI-
Coordenadoria de Ensino do Interior e as D.E- Diretorias de Ensino-) e promove tanto a
participação dos gestores (Supervisores, Professores Coordenadores das Oficinas
Pedagógicas - PCOPs e Diretores de escolas), promovendo discussão de conteúdos que
ampliem as possibilidades de compreensão, apoio, acompanhamento e avaliação para a
tomada de decisões voltadas à aprendizagem dos alunos; quanto à formação pedagógica
(para PCOPs e Professores Coordenadores - PCs), visando aperfeiçoar a didática de
alfabetização e a formação de professores nas escolas.
A primeira fase do PROGRAMA LER E ESCREVER teve início em 2007, com
iniciativas nas escolas da Capital paulista, com destaque para a adoção do Bolsa
Alfabetização (no segundo semestre do ano) e a formação de professores para implantar
o programa em todas as salas de aula em 2008. Nesse ano, por iniciativa do governo
estadual, o Programa foi ampliado para a Região Metropolitana de São Paulo- RMSP e,
em 2009, para Interior e Litoral.
Atualmente o PROGRAMA LER E ESCREVER já chega completo a todas as salas de
aula do estado, incluindo os diversos materiais especialmente preparados para sua
utilização na escola.

Objeto de pesquisa
Estudar o papel do professor, suas aflições e mediações, possíveis mudanças e como os
docentes estão sendo instruídos na formação continuada no PROGRAMA LER E
ESCREVER.
1467

Universo da pesquisa
O universo de pesquisa será realizado no horário de formação continuada em serviço
(Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo - ATPC) com 1 hora de duração em duas
escolas da Diretoria de ensino- NORTE 1. Os sujeitos de pesquisa: duas professoras de
cada escola.
Assim sendo, a formação que o professor recebe facilita o trabalho dele em sala de aula
ou não? Como o professor se apropria da formação do PROGRAMA LER E
ESCREVER?
Por meio de cursos direcionados ao público docente busca-se a emancipação de
informações que possam servir de caminho para que o professor se habitue a decodificar
e aplicar o conteúdo do PROGRAMA LER E ESCREVER na sala de aula.
Os cursos de formação continuada direcionados aos docentes visam à melhoria da
aplicação do PROGRAMA LER E ESCREVER e para que eles saibam diagnosticar
onde permanecem as dúvidas ou a falta de estruturação em geral. Visto que o baixo
índice de aprendizado acarretará futuramente nas notas dos alunos em tempo de provas
do SARESP- Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo.
É fato que enquanto o professor bem informado que busca aprender e reaprender se
sobressai melhor na atuação com o PROGRAMA LER E ESCREVER, ao contrário, se
lamenta o tempo todo achando “perca de tempo” ter que seguir as orientações tanto
contidas no livro do professor quanto as norteadas no curso de formação continuada
oferecida pela SEE (Secretaria Estadual de Educação).
Os professores diante das reformas na educação passam por fases distintas de aceitação
e ameaça, ou seja, partem para um novo desafio em sua carreira docente. Para os que
veem a situação por fora, o professore é visto como incompetente e ignorado em seu
papel principal, como líder intelectual experiente.
Nesta parte que fala sobre a postura do professor, cita-se Henry Giroux em Professores
como intelectuais transformadores (1997, p.157).

Quando os professores de fato entram no debate é para serem objeto de


reformas educacionais que reduzem ao status técnicos de alto nível
cumprindo ditames e objetivos decididos por especialistas um tanto afastados
da realidade cotidiana da vida em sala de aula. A mensagem parece ser que
os professores não contam quando trata de examinar criticamente a natureza
e o processo de reforme educacional.
1468

Na atualidade, professor está sendo avaliado em sua postura dentro da sala de aula e não
mais em seu valor crítico profissional e político, pois os cursos e metodologias se
preocupam em passar qual postura este docente necessita ter e como fazer, e não mais o
quanto se faz importante o próprio ponto de vista e autocrítica.
Em sua trajetória jamais esquecer que deve e pode assumir o papel de intelectual
transformador.
Um aspecto imprescindível ao professor durante sua vida acadêmica, bem como a de
todo profissional, é que tenha a consciência de que vivemos em um período de
aceleradas mudanças que o atropelam e o empurram na busca do conhecimento visando
o seu aperfeiçoamento tanto no profissional como no pessoal.
Parte-se daqui para as motivações, apropriações e inquietudes dentro da proposta deste
trabalho de pesquisa que pretende estudar a ação do professor em seu campo
gravitacional, a escola, que ao mesmo tempo lhe fixa ao chão também transforma a sua
vida num turbilhão de emoções, reações, conhecimentos e atritos em sua trajetória
acadêmica.
Embora não exista uma fórmula fechada e imbatível para solucionar os problemas
herdados e criados nos ambientes escolares. O que se pretende com esta pesquisa é a
possível busca sob uma forma de se repensar os métodos de ensinamentos em um local
determinado ao aprendizado do aluno, visto que, o docente pode ser este eterno aluno do
aprender, o professor intelectual.
O interesse deste repasse de informações aqui citados nesta pesquisa o não é diminuir
ou julgar professores e a gestão escolar de cada escola, e sim o que pode ser modificado
ou repensado na estrutura de formação continuada para que os professores se sintam
profissionais importantes e muito além de serem somente integrantes do sistema
educacional.
Estes fatos contribuem para que se analise a necessidade de formação contínua entre as
partes, gestão e professores nas escolas, e, além disto, as melhorias oferecidas na rede
na busca em avanços para a classe docente.

JUSTIFICATIVA
O texto oferecido neste projeto tem por finalidade estudar o papel do professor, suas
aflições e mediações, possíveis mudanças e como os docentes estão sendo instruídos na
formação continuada no PROGRAMA LER E ESCREVER.
1469

Assim destacar a importância do bom desempenho do docente por meio da formação


continuada escolar em razão e propósito de serem mediadores do PROGRAMA LER E
ESCREVER.
Mediados por fatos e pesquisas já existentes se faz notar o quanto o professor está em
pleno desafio com as notórias mudanças na educação, a sua postura e quanto o
profissional e educador necessita “renovação” moral e intelectual.
Neste ponto destaca-se de contra partida os profissionais que resistem a essas tais
mudanças por falta de repasse das informações, métodos e incentivos, o docente estar
desmotivado ou se passa por algum tipo distúrbio psicológico resultante da profissão.
Seguindo nesta linha de argumentos justifica-se o tema desta pesquisa que visa tratar
deste assunto destacando a grande oportunidade do professor reformular a sua trajetória
profissional, apropriar-se do PROGRAMA LER E ESCREVER e em sua defesa
elucidar os problemas e distúrbios surgidos na atuação do docente. Sendo e tendo como
foco principal de pesquisa em prol do PROGRAMA LER E ESCREVER.

REFERENCIAL TEÓRICO
O campo de pesquisa envolve de forma qualitativa enriquecer a pesquisa de por meio de
relatos, situações do cotidiano, sala dos professores e ATPC (Atividades de Trabalho
Pedagógico Coletivo) na escola A e B na periferia do estado de São Paulo.
No referencial teórico serão utilizados os textos de autores que tanto contribuem, como:
Pierre Bourdieu e Maria de Sá entre outros citados ao decorrer da pesquisa neste
trabalho no qual se pretende analisar os fundamentos da pesquisa.
Na concepção de Pierre Bourdieu, em juízo professoral, o autor retrata a questão que se
refere diretamente à dinâmica de funcionamento da estrutura escolar, especialmente às
relações professor-aluno e às relações entre os próprios professores. Norteia os
mecanismos sociais de construção das categorias de juízo dos professores a respeito de
si mesmo e de seus alunos. Nesta concepção, Bourdieu (1999) constata que:

(...) o conhecimento prático é uma operação prática de construção que aciona,


por referencia a funções práticas, sistemas de classificação (taxinomias) que
organizam a percepção e a apreciação, e estrutura prática.
(...) Para acreditar nisso basta submeter à análise não mais essa ou aquela
dessas curiosa exóticas que a distância neutraliza, terminologias de
comportamento de parentesco, classificações que o professores produzem
cotidianamente, tanto em seus julgamentos sobre os seus alunos, ou seus
colegas atuais ou potenciais como em sua produção específicas (manuais,
teses, obras eruditas) e em toda a sua prática. (p.187 -188).
1470

Assmann (2007,) retrata a importância do renovar do saber docente em sua árdua prática
diária sem o conformismo da profissão ou sem a flexibilidade adaptativa das mudanças.

Sabemos que muitas vezes não o é. O panorama educacional brasileiro é


desolador, especialmente na escola pública de primeiro e segundo graus.
É tal o vilipêndio da profissão de educador neste país que, para muitos, soa
bastante ingênuo e idílico passar diretamente à proposta de somarmos
esforços para que, em nossas escolas, o gozo das experiências de
aprendizagem seja erigido em sistema. A luta pela revalorização e
redignificação salarial e profissional dos docentes, adquiriu tal prioridade que
muitos já nem se lembram de ancorá-la também no reencantamento do cerne
pedagógico da experiência educacional. (p.23).
.
Se o ponto a discutir na educação é de ordem das políticas educacionais e curriculares.
O emudecer do professor frente à realidade posta na escola o leva à clausura dos
problemas, transformando o docente no único responsável pelo desempenho ou não de
seus atributos, sem uma análise do contexto psicológico e profissional como um todo.
O silêncio dos professores acobertou sentimentos ao não receber “aplausos” por estar
em cena e sentir que ao seu redor não existe expectador, somente criticas que o
desprezam. Por meio da perspectiva de Henry Giroux (1997) que ressalta a importância
do professor como intelectual nos diz:

Eu argumentei que, encarando os professores como intelectuais, nós podemos


começar a repensar e reformar as tradições e condições que têm impedido
que os professores assumam todo o seu potencial como estudiosos e
profissionais ativos e reflexivos.Acredito que é importante não apenas
encarar os professores como intelectuais, mas também contextualizar em
termos políticos e normativos as funções sociais concretas desempenhadas
pelos mesmos.Desta forma, podemos ser mais específicos acerca das
diferentes relações que os professores têm tanto com seu trabalho como com
a sociedade dominante.(p.162)

O docente não se forma um profissional inseguro, pois não se ensina ou se adquire este
conceito em sua formação acadêmica enquanto aluno na universidade. O professor se
torna inseguro ao logo do tempo na sua jornada na qual prefere lamentar-se, sentir-se
culpado o tempo todo ao invés de se doutrinar em prol de si mesmo, ao saber relacionar
os desafios e barreiras, transformando os fracassos em fronteiras a serem exploradas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASSMANN, Hugo. Reencantar a educação: rumo à sociedade pendente. Petrópolis/
RJ: ed. Vozes, 2007.

BOURDIEU, P. As categorias do juízo professoral. In: NOGUEIRA, M. A.; CATANI,


A.(Orgs.). Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, pp.185-216, 1999.
1471

EARP, Maria de Lourdes Sá. O juízo professoral: um estudo em uma escola pública da
cidade do rio de janeiro. Fundação Cesgranrio. XVI ENDIPE - Encontro Nacional de
Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas – 2012.

ESTEVE, José Manuel. O mal- estar docente: a sala de aula e a saúde dos professores.
Trad: Durley de Carvalho Cavicchia. Bauru, SP: EDUSC, 1999.

GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica


da aprendizagem. Trad. Daniel Bueno. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

MAINARDES, Jefferson. A teoria de Basil Bernstein e algumas das contribuições para


as pesquisas sobre políticas educacionais e curriculares. Revista Teias, vol.11nº22,
pp.31-54, maio/agosto 2010.

SÃO PAULO. Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Fundação para o


Desenvolvimento da Educação. O Programa Ler e Escrever. Disponível em:
http://lereescrever.fde.sp.gov.br/SysPublic/InternaPrograma.aspx?alkfjlklkjaslkA=260&
manudjsns=0&tpMat=0&FiltroDeNoticias=3. Acesso em 30 de outubro de 2013.
1472

Pôster

Trajetórias de formação docente

Jefferson Riule
UNICID

Resumo:O objetivo desta pesquisa é investigar a trajetória da formação de docentes que


atuam no Programa “Aprendizagem” do Senac SP, identificando e compreendendo a
visão desses profissionais sobre o que pensam a respeito das relações entre escola e
mercado de trabalho. A abordagem será qualitativa, o procedimento de entrevista
narrativa, a proposta é dar voz a docentes do referido programa, a fim de entender como
se constituiu seu processo de formação e em que medida, os estímulos adquiridos ao
longo desse percurso, proporcionaram visões sobre o modelo “ideal de escola” e do
“mercado de trabalho”. O estudo se pautará no diálogo com autores como Dubar (2006),
Furlanetto (2003), Nóvoa (1988), com vistas a desvendar os processos de construção de
identidade do sujeito, bem como os processos de formação de professores. Essa
literatura comporá o campo teórico em conjunto com autores como Pineau (1996),
Bauer (2002), Josso (2008), entre outras, no que tange as discussões sobre narrativas de
vida.
Palavras-chave: Narrativas de docentes. Formação de professores. Cursos
profissionalizantes

INTRODUÇÃO

Sou Técnico de Desenvolvimento Profissional do Senac São Paulo, uma


instituição de ensino que atua e contribui há 67 anos, para a formação profissional
oferecendo cursos livres, técnicos e de ensino superior (graduação, extensão
universitária e pós-graduação), presenciais ou a distância, em diferentes áreas do
conhecimento.
Tenho uma trajetória de 20 anos nesta instituição, dos quais os últimos 10 anos
na equipe da Gerência de Operações 2 (GOs), que tem a função de promover a
articulação, o monitoramento e a distribuição de produtos e serviços educacionais do
1473

Senac São Paulo para 19 unidades em até 250km de distância da capital. O papel das
GOs está diretamente relacionado ao processo de planejamento estratégico da oferta e
ao seu acompanhamento na rede sendo um suporte direto para as unidades alinharem
suas ações cotidianas com as macroestratégias e diretrizes definidas pela organização.
Há 3 anos componho uma frente de trabalho chamada “Frente Oferta”, em que
seu trabalho consiste no acompanhamento das metas corporativas, orientações sobre a
operação do Programa Aprendizagem, composição dos percentuais de alunos do
Programa Senac de Gratuidade (PSG) em sala de aula e apoio às atividades das equipes
de Assistentes Sociais. Um dos principais objetivos desta Frente é a gestão do Programa
Senac de Gratuidade (PSG), que promove o acesso à educação profissional de qualidade
por meio da Política Senac de Concessão de Bolsas de Estudo, ação que foi ampliada
em 2009 e que proporciona bolsas parciais ou integrais em cursos livres de curta
duração, com mais de 160 horas como capacitações e técnicos, as bolsas são integrais,
(exceto ensino superior).
O Programa Aprendizagem, hoje é o carro chefe e prioridade na composição da
oferta de todas as unidades educacionais, totalizando 45.062 mil vagas em 2014 e
representando 24% da meta total PSG. É regulamentado pelo Decreto nº 5.598, de 1º de
dezembro de 2005, e com as diretrizes curriculares estabelecidas na Portaria MTE nº
615, de 13 de dezembro de 2007.
O Programa proporciona a qualificação social e profissional às demandas
considerando a diversidade dos adolescentes, em sua condição peculiar, de jovens, em
período de inserção no mundo do trabalho considerando às dimensões ética, cognitiva,
social e cultural do aprendiz.
Permite a formação técnico-profissional de adolescentes e jovens, amplia as
possibilidades de inserção no mercado de trabalho e torna mais promissor o futuro da
nova geração. O empresário, por sua vez, além de cumprir sua função social, contribui
para a formação de um profissional mais capacitado para as atuais exigências do
mercado de trabalho e com autonomia, senso crítico, empreendedor e com visão mais
ampla da própria sociedade.
Trabalhar em uma gerência corporativa e sobretudo na coordenação operacional
do Programa Aprendizagem me possibilita vivenciar a gestão de outras Unidades do
Senac, ter contato direto com alunos e com professores e a construir um conceito do que
é uma comunidade escolar e entender como se dá o processo educacional na ponta. No
entanto, apesar da proposta procurar garantir condições de ensino e aprendizagem
1474

adequadas para professores e alunos, observo que existem docentes e alunos


insatisfeitos e infelizes.
Várias ações são realizadas com as unidades a fim de entendermos as principais
dificuldades operacionais. Além da avaliação institucional, instrumento que compila a
opinião dos alunos e professores, em 2014 foram realizados 8 encontros presenciais
com técnicos, docentes coordenadores e docentes do Programa Aprendizagem.
Com base nessas avaliações e acompanhamento continuo do programa pude
perceber que algumas questões emergem com muita força:
o Preconceito, por parte da maioria dos docentes em relação ao perfil dos
alunos do Programa;

o Falta de habilidade dos docentes em lidar com adolescentes;

o Postura rígida dos docentes e adoção de regras inflexíveis quanto a


vestimentas e identificação apenas para os alunos do Programa;

o Falta de entendimento dos tutores das empresas sobre o “significado” do


Programa;

o Ausência de parceria e acompanhamento dos pais.

Essas questões e dificuldades me conduziram a desenhar um projeto de pesquisa


em que o sujeito será o docente do Programa Aprendizagem e que por meio da
abordagem qualitativa, tendo como procedimento de coleta de dados a entrevista
narrativa.
Dar voz a esse grupo permitirá criar um espaço de reflexão no qual as
concepções de escola e de formação para o trabalho que dão sustentação às suas ações
poderão emergir, Josso (2008, p.17) salienta que “Trabalhar as questões de identidade,
expressões de nossa existencialidade, através da análise e da interpretação de narrativas
de vidas escritas, permite-nos evidenciar a pluralidade, a fragilidade e a mobilidade de
nossas identidades ao longo da vida [...]”.
Logo, analisar as narrativas dos docentes, nos fará compreender como se dá o
processo de formação desse grupo, sobretudo entender como eles constroem sua
identidade docente e concepções de formação.
Nesse sentido, também Rabelo, assim se refere:

“Os estudos de vida e as narrativas dos professores possibilitam aceder a uma


informação de primeira ordem para conhecer de modo mais profundo o
processo educativo, um meio para que os professores reflitam sobre sua vida
profissional e compreendam, em seus próprios termos ou vozes, como eles
1475

mesmos vivem seu trabalho e tomam esta compreensão para mudar o que não
gostam no seu trabalho e na sua atuação profissional. ” (RABELO, 2011, p.
185).

Utilizar a investigação narrativa no processo educacional nos permitirá percorrer


pelas trajetórias de formação do grupo de professores, propor uma reflexão sobre seu
trabalho e sua atuação no Programa, potencializando o processo de formação atual.
Portanto, este estudo nasce do interesse em investigar o processo de formação
docente, considerando a formação como projeto, produção de vida e construção de
sentido (JOSSO, 2010) a qual ocorre por meio de experiências que marcam as
trajetórias dos sujeitos deslocando e criando bifurcações e dessa forma participam da
construção de subjetividades influenciando suas maneiras de ser, de aprender e de
ensinar.
Nessa direção, a pesquisa assume como objetivo principal: investigar as
narrativas da formação de docentes que atuam no Programa Aprendizagem do Senac SP
no sentido de apreender como os professores oriundos de diferentes áreas do
conhecimento, se apropriam de suas referências formativa, o modelo de escola e do
mundo do trabalho que se cruzam com seu contexto profissional.
Como objetivos específicos esperamos:
o Contextualizar o panorama institucional sobre a educação profissional e o
Programa Aprendizagem;

o Colocar em diálogo autores que investigam narrativas e formação docente;

o Realizar entrevistas narrativas com os docentes do Programa Aprendizagem;

o Analisar as narrativas buscando identificar os principais estímulos ou elementos


que impactaram no seu percurso de formação.

Traçado metodológico
A pesquisa se apoiará na abordagem qualitativa, tendo como procedimento de
coleta de dados a entrevista narrativa. Triangulando com análise documental e
observação, possibilitando inferências, interpretações e analises.
Bauer (2002) nos apresenta que o estudo de narrativas conquistou uma nova
importância nos últimos anos, atrelado com a crescente consciência do papel que o
contar histórias desempenha na conformação de fenômenos sociais, se tornando um
método de pesquisa muito difundido nas ciências sociais.
1476

Afirma que contar histórias é uma forma elementar de comunicação humana e


que independe do tipo de linguagem, sendo uma capacidade universal e que por meio
delas as pessoas recordam acontecimentos, exibem a sua experiência em uma sequência,
encontram possíveis explicações, e jogam com a cadeia de acontecimentos que
constroem a vida individual e social.
Percebe-se que, as narrativas ganham uma amplitude, pois compreender a
história contatada, não significa entender o seu enredo início, meio e fim, mas sim
reconhecer sua dimensão expressa dentro de um contexto e de uma linha do tempo.
Nesta direção Stake (2011), diz que parte desta metodologia é capturar uma
história. Que poderá ser de uma pessoa, grupo ou instituição e o trabalho do pesquisador
é investigar, interpretar e disponibilizar essa história a outras pessoas.
Logo, organizar o pensamento, ideias e compartilha-las é uma necessidade
apenas humana, valorizar esta ação, possibilita transformar algo, dar significado e
sentindo ao que foi vivenciado. Estudar e analisar o que foi vivenciado pode nos trazer
caminhos importantes dentro de um processo de formação.

Considerações em aberto
A investigação narrativa no Brasil vem se destacando no meio cientifico e
acadêmico principalmente nas áreas educacionais, isso fica evidente na pesquisa de
revisão de literatura quando encontramos Maria da Conceição Passeggi (2008), Ecleide
Furlanetto (2008), Elizeu Clementino de Souza (2008), Maria-Christine Josso (2008),
Amanda Oliveira Rabelo (2011), entre outros pesquisadores nacionais com suas
trajetórias e contribuições neste tema.
Portanto, dar continuidade a investigação narrativa no processo educacional
possivelmente nos fará compreender as práticas, motivações e escolhas amplamente
calcadas na experiência humana, logo, ouvir as experiências de docentes que atuam na
formação inicial técnica profissionalizante nos trará os caminhos percorridos,
experiências formativas e especialmente, entender as escolhas pessoais de cada um para
poder compreender mais acerca da escola e da atividade educacional, Rabelo 2011.

“Os estudos de vida e as narrativas dos professores possibilitam aceder a uma


informação de primeira ordem para conhecer de modo mais profundo o
processo educativo, um meio para que os professores reflitam sobre sua vida
profissional e compreendam, em seus próprios termos ou vozes, como eles
mesmos vivem seu trabalho e tomam esta compreensão para mudar o que não
1477

gostam no seu trabalho e na sua atuação profissional. ” (RABELO, 2011, p.


185).

Em consonância ao que afirma Rabelo, este projeto de pesquisa procurará


encontrar um espaço de diálogo, de reflexão sobre a práxis e um aprofundamento sobre
o processo educativo dos alunos de aprendizagem do Senac São Paulo.
A análise dos dados e problematizações se pautará no diálogo com autores como
Dubar (2006), Furlanetto (2003), Nóvoa (1988), quando estivermos discorrendo sobre a
construção de identidade do sujeito, bem como o processo de formação de professores.
Em Narrativas de vida além dos já citados o Pineau (1996) traz grande contribuição,
entre outros.

Referências Bibliográficas
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som : uma manual prático. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

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1478

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STAKE, Robert. Pesquisa qualitativa : estudando como as coisas funcionam. Porto
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1479

Pôster

O tempo e a formação integral nas reformas curriculares: a literatura produzida


nos últimos anos.

Jocinete Figueiredo
PUC/SP
CAPES/CNPQ
GP- PEC/Políticas de Educação e Currículo

Resumo: Este texto trata-se da revisão da literatura da pesquisa de doutorado em


andamento Formação humana e tempos educativos nas inovações curriculares: teorias,
práticas e perspectivas que investiga as inovações curriculares e suas novas maneiras de
operar na escola, tendo como foco as lacunas nas políticas educacionais relacionadas a
questão do tempo e ritmo escolar e a qualidade desse tempo em sua efetivação prática.
Faz-se uma incursão acerca do contexto nacional e local da organização curricular
(2000-2011) – semelhante a do Estado de Mato Grosso - lócus da pesquisa. Utiliza-se
de estudos, pesquisas e reflexões já realizadas, descrevendo a questão das reformas
educacionais enquanto práticas de poder, além de discutir as teorias e conceitos das
diretrizes curriculares instituídas, enfocando a relação entre o ritmo e tempo escolar
enquanto variáveis centrais que fundamentam as reformas curriculares como a
organização por ciclos e a escola de tempo integral.
Palavras chave: Tempo escolar. Organização do tempo. Formação Humana.

No Brasil, houve um aumento considerável de investigações das políticas

educacionais e sua relação com as reestrurações curriculares. Este vem se configurando


como um campo promissor e profícuo em busca de consolidação. Ball e Mainardes
(2011) discutem os dilemas nas reestruturações curriculares e alertam que diversos
pesquisadores desta área destacam a necessidade de empregar referenciais analíticos
mais consistentes, e ampliar a interlocução com a literatura internacional, bastante
vasta e com uma variedade de perspectivas teórico-metodológicas (p 11).
No caso desta pesquisa, há a pretensão e o esforço em realizar o que os autores
sugerem, uma análise crítica de políticas especificas. Nesse sentido, as políticas
1480

envolvem confusão, necessidades (legais e institucionais), crenças e valores


discordantes, incoerentes e contraditórios, pragmatismo, empréstimos, criatividade e
experimentações, relações de poder assimétricas (de vários tipos), sedimentação,
lacunas, espaços, dissenso e constrangimentos materiais e contextuais (p. 13).

Na prática, as políticas são freqüentemente obscuras, algumas vezes


inexeqüíveis, mas podem ser, mesmo assim, poderosos instrumentos de
retórica, ou sejam, formas de falar sobre o mundo, caminhos de mudança do
que pensamos sobre o que fazemos (BALL E MAINARDES, 2011:13).

Embora não seja foco a discussão sobre a escola de tempo integral, escola de
ciclos, ou o programa Mais educação as duas primeiras serão mencionadas com um
olhar especial, pois são as políticas mais impactantes que resultam em alterações de
tempos e espaços escolares de modo geral. Como a presente tese trata-se dos tempos
escolares, considerou-se pertinente abordar as implicações que tais projetos vêm
provocando enquanto alterações curriculares na escola básica. Tais propostas de
políticas públicas também vêm perseguindo as questões da formação integral
relacionada com o tempo escolar. Além disso, escolheu-se deter nas propostas que tem
repercutido com mais ênfase nos últimos anos, e ao menos no estado de MT, lócus da
pesquisa tem causado mais polemica em sua implementação nas escolas.
Muitas investigações são pontuais, dentro das possibilidades de trabalhos
acadêmicos, e a maioria é concentrada nas regiões mais desenvolvidas, que tomaram a
dianteira das inovações referidas e são também as mais bem documentadas em nosso
país.
De forma crescente, inúmeras políticas publicas e projetos educacionais
apresentam fortes características relacionadas à jornada e ampliação dos tempos
escolares. A experiência de maior repercussão ocorreu na década de 1980, que foram
os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), no Rio de Janeiro. Com a
promulgação da LDB/96, em seu artigo 341, intensifica-se o surgimento, nos sistemas
públicos estaduais e municipais, de projetos que envolvem o aumento do tempo diário
de permanência das crianças e adolescentes nas escolas desse estado.

1
Artigo 34. A jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho
efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola. [...]
§ 2º. O ensino fundamental será ministrado progressivamente em tempo integral, a critério dos sistemas
de ensino.
1481

A proposta de escolas de tempo integral gerou, nas duas últimas décadas, intensos
debates, posicionando diversos educadores e pesquisadores que ora questionavam o
caráter populista nas propostas políticas de apresentação (PAIVA, 1985) e a
inviabilidade de sua universalização (PARO, 1988), ora, sua consistência como projeto
pedagógico, apontando uma intenção de confinamento, constituindo-se numa instituição
total (Arroyo, 1988).
Ferreira, V. M. R.; Arco-verde, Y. F. S.(2001), Parente (2006), Barbosa (2000),
Santos (2009, 2010) abordam questão dos tempos escolares, enfocando a noção de
tempo e do modo como esta é construída histórica e culturalmente. Em termos gerais,
discutem as diferentes formas pelas quais passou e tem passado o tempo escolar, suas
diferentes configurações e significados, assim como exploram as rotinas pedagógicas
enquanto instrumento de controle e regulação dos comportamentos dos estudantes.
Parente (2010) apresenta algumas heranças dos tempos escolares, mostrando que
estes são construções humanas e, por isso, passíveis de transformações. Faz referência
ao início e à duração da escolarização (tempos de escola); à organização da
escolarização (tempos de escolarização); às construções consolidadas no interior das
instituições escolares (tempos na escola).
Existem muitos estudos sobre a organização por ciclos desde sua implantação,
entre estes se destaca o texto produzido por Gomes (2004), Mainardes(2006), Fernandes
(2003); Barreto et al (1999) e trazem um balanço dos ciclos no ensino fundamental, e
destacam as perspectivas para a pesquisa nos últimos 15 anos em nosso país. Gomes
(2004), Mainardes (2006), se constituem referencias em termos de revisão de
bibliografia sobre o tema, além de apresentarem experiências de modo geral e suas
repercussões no contexto educacional brasileiro.
Miranda (2005) analisa os ciclos enfocando os pressupostos subjacentes à
racionalidade dessa política enquanto reforma educacional em curso no Brasil.
Segundo revisão bibliográfica realizada por Mainardes (2006), de 1987 a 2004,
foram produzidos 147 textos sobre a organização de ciclos de formação no Brasil, sendo
37 teses e dissertações, 10 livros, 38 capítulos de livros e 62 artigos. A maioria desses
textos foi escrito em Língua Portuguesa (143) e apenas quatro em Língua Inglesa
(Gandin, 2002; Gandin; Apple, 2002a; 2002b; Mainardes, 2004). Os programas mais
abordados foram o Ciclo Básico de Alfabetização no Estado de São Paulo (24 textos) e
em Minas Gerais (13 textos), o Projeto Escola Cidadã (24 textos) e o Projeto Escola
Plural (21 textos).
1482

Segundo Cavalieri (2007) a ampliação do tempo escolar tem o sentido do tempo


diário de permanência dos alunos na escola, entretanto, outra vertente igualmente
importante, é a que envolve a reorganização do tempo de escola em sua lógica
pedagógica, seqüencial e simbólica – mais especificamente a criação dos ciclos de
formação.

A ampliação do tempo diário de escola pode ser entendida e justificada de


diferentes formas: (a) ampliação do tempo como forma de se alcançar
melhores resultados da ação escolar sobre os indivíduos, devido à maior
exposição desses às práticas e rotinas escolares; (b) ampliação do tempo
como adequação da escola às novas condições da vida urbana, das famílias e
particularmente da mulher; (c) ampliação do tempo como parte integrante da
mudança na própria concepção de educação escolar, isto é, no papel da escola
na vida e na formação dos indivíduos (CAVALIERI, 2007:1016).

Moreira (2000) faz uma análise das propostas curriculares desenvolvidas, nas
décadas de 1980 e 1990 em alguns estados e municípios brasileiros, que segundo ele,
buscaram caminhar na contramão do discurso oficial hegemônico, destacando as
conquistas, limitações e os desafios de tais propostas. Entre estas, destaca a preocupação
constante com a formação integral, justificando as organizações por ciclo e a escola de
tempo integral implementadas no país no período analisado.
Como em Mato Grosso, as reorganizações curriculares se baseiam nas principais
legislações de nosso país, quanto a garantir: "a igualdade de condições para o acesso e
permanência na escola" (art. 206 da Constituição), e ter como objetivo, "assegurar-lhe a
formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer- lhe meios para
progredir no trabalho e em estudos posteriores" (art. 22 da LDB)?
Fernandes (2003) faz uma abordagem exaustiva, no bom sentido, sobre a
questão dos tempos educativos e nos comprova através de analises de artigos e
documentos das décadas de 60, 70 e 80 que as alterações dos tempos escolares têm
intima relação com a avaliação escolar. A partir daí, os termos promoção automática ou
correção de fluxo passaram a dominar os discursos educacionais, na tentativa de
combater os altos índices de evasão e repetência.
Ferreira, V. M. R.; Arco-Verde, Y. F. S.(2001) e a pesquisa que resultou a tese
de doutorado A construção dos tempos escolares: possibilidades e alternativas plurais,
de Parente (2006) constituem importantes contribuições sobre a temática no país. É
sabido que as pesquisas acadêmicas devem supor estudos posteriores, já que cada uma
em particular é continuidade, ou uma peça no quebra cabeça, no nosso caso, o complexo
campo educacional. A partir das sugestões ao final destes estudos em particular, e o de
1483

Agnes Cavet, importante pesquisadora francesa serviram-me como um gancho para


encaminhar minhas discussões.
Araújo (2008) discute a escassez do tempo de trabalho docente, e os arranjos
realizados em prol de mais tempo, nas escolas, enquanto decorrente de mobilizações dos
professores, assumindo um caráter conquistado e não decretado. Barbosa (2000)
abordou a questão do uso das rotinas como objeto de investigação e constatou que as
rotinas realizadas nas escolas de educação infantil estão em profunda relação com a
construção da modernidade e que somente a partir de uma reflexão contextualizada é
que se poderão re-ssignificar o seu uso.
Uma das reformas curriculares mais importantes no que se refere à
ampliação da jornada escolar tem inteira relação com a concepção de educação integral
cuja perspectiva é de que “o horário expandido represente uma ampliação de
oportunidades e situações que promovam aprendizagens significativas e emancipadoras
(Gonçalves, p 4)”. A educação integral se encontra no cerne das várias concepções e
práticas e as tendências tem se caracterizado com alguns binômios: educação/proteção,
educação integral/currículo integrado ou educação integral/tempo escolar. Nas
publicações locais, alguns estudos chamam a atenção para a possibilidade da
reorganização do tempo/espaços não garantirem uma alteração efetiva na aprendizagem
dos alunos. Isso remete a questão norteadora desta pesquisa de que a cultura escolar
herdada de modelos convencionais é mais forte na praticas escolares, e dessa forma está
arraigado nos valores e cotidiano de professores e alunos, talvez aí se encontre a
resposta para a resistência de muitos professores as reformas curriculares, o medo do
novo. Arruda (2011), Gomes (2012), Almeida (2011), Pereira (2011), Resende (2010),
Jacomini (2010), são alguns autores que discutiram temas relacionados com a
implantação e perspectivas da reorganização por ciclos de formação em MT enquanto
inovação curricular. O foco na reorganização do tempo é o aluno, visando a
aprendizagem humana, e assim, a concepção de tempo é a que acompanhe os processos
de aprendizagem e de ensino tal como estes ocorrem na espécie humana, “evitando as
rupturas criadas sempre que interrompemos uma explicação, uma atividade, um
processo de reflexão por causa da forma rígida como o tempo é distribuído no dia-a-
dia da escola” (LIMA, 1998).
1484

Conclusão
No panorama geral nas discussões sobre os tempos educativos, seja com relação
aos ciclos, ou escola de tempo integral, percebe-se que estes ainda não podem ser
considerados consolidados como estruturas e praticas inovadora. Alguns pesquisadores
afirmam que em relação aos ciclos de alfabetização parece haver um relativo consenso
de que eles são irreversíveis nas redes em que estão instalados há mais tempo, embora
estejam ainda longe de ter concretizado um modelo verdadeiramente novo de operar
da escola (BARRETO E MITTRULIS, 1999).

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1487

Pôster

O direito à educação no município da Serra do estado do Espírito Santo: análise do


processo de judicialização do programa “PRÓ-ESCOLA”.

Jucilene Batista da Rocha


jucilenebatista5@yahoo.com
Mestranda do Programa de Ensino na Educação Básica (PPGEB), Centro Universitário
Norte do Espírito Santo (CEUNES), Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

Márcia Helena Siervi Manso


marcia.manso@ufes.br
Doutora em Educação
Professora do Programa de Ensino na Educação Básica (PPGEB), Centro Universitário
Norte do Espírito Santo (CEUNES), Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

Resumo: Este trabalho é parte de uma pesquisa em desenvolvimento que tem como
objetivo analisar o direito à educação no Município da Serra/ES do Estado do Espírito
Santo no período de 1997 até 2013, em relação à oferta, a reprovação e evasão escolar.
A metodologia utilizada é a pesquisa de abordagem qualitativa tendo como parâmetro à
aferição dos dados apresentados de forma crítica com um referencial bibliográfico e
documentos legais enfocando o direito à educação, materializado no programa “Pró-
Escola” na perspectiva de um projeto de Educação Comum. Nos achados da
investigação estão sendo considerados a questão do planejamento que é necessário
envolver toda a sociedade civil, em consonância com a judicialização da educação que
representa a busca de mais e melhor instrumento de defesa de direitos juridicamente
protegidos, partindo do pressuposto que a educação deve ser considerada prioridade
social e política fundamental para a construção de uma sociedade democrática.
Palavras-chave: Direito à Educação - Evasão Escolar - Judicialização da Educação

A evasão e reprovação escolar constitui um dos temas historicamente presentes nos


debates e reflexões acerca da educação brasileira, pois são problemas que afetam
1488

estudantes em todo país, que preocupa os educadores, a sociedade civil e o poder


público que colocando em foco a qualidade do ensino ofertado.
Para compreender essa questão optou-se pelo desenvolvimento de uma pesquisa com o
objetivo analisar o direito à educação no período compreendido entre 1997 a 2013,
considerando as mudanças advindas da aprovação da Lei e Diretrizes e Bases da
Educação Nacional – LDB, no Município da Serra/ES em relação à oferta, a reprovação
e a evasão escolar. Para desenvolver este estudo vem utilizando-se a pesquisa de
abordagem qualitativa, tendo como parâmetro dados documentais e legais, enfocando o
direito à educação, materializado no programa “Pró-escola”.
A escolha do Município da Serra/ES para a investigação desse estudo foi em
decorrência da atuação profissional da pesquisadora, fazer parte do cotidiano escolar,
como forma de contribuir para reflexões acerca da realidade educacional desse
Município.
De acordo com (SANT´ANNA, 2014) o Município da Serra/ES possui uma localização
estratégica, ficando apenas mil quilômetros dos principais centros comerciais e
industriais do Brasil, além de ficar no centro econômico e administrativo do Espírito
Santo. O Município que é cortado de Norte a Sul pela Rodovia Federal BR-101 Norte,
que liga o Sul ao Nordeste Brasileiro. Nos últimos quarenta anos, deixou de ser
tipicamente rural, passando a ser o principal Pólo Industrial e a segunda economia do
Estado. O município da Serra abriga, segundo o CENSO de 2010, o percentual de 11%
da população do Espírito Santo e 23% da população da Região Metropolitana da Grande
Vitória.
A educação passa ser um princípio fundamental da cidadania com a questão da
universalização do ensino fundamental descrita nos documentos oficiais. Segundo Cury
(2002) hoje, praticamente, não há país no mundo que não garanta, em seus textos legais,
o acesso de seus cidadãos à educação básica. Afinal, a educação escolar é uma
dimensão fundamental da cidadania, tal princípio sendo indispensável para políticas que
visam à participação de todos nos espaços sociais e políticos e, mesmo, para reinserção
no mundo profissional.
A Educação do Município da Serra em 2013 contava com aproximadamente 62.000
estudantes nas áreas de Educação Infantil, Ensino Fundamental Regular e Educação de
Jovens e Adultos (EJA), distribuídos em 120 Unidades de Ensino.
Conforme tabela abaixo, o Município da Serra/ES, os índices de evasão escolar no
ensino fundamental regular têm diminuído nos últimos anos. No ano de 2008 as taxas
1489

de evasão escolar tiveram um índice de 2,0%. Em 2011, o índice de evasão na rede


municipal de ensino foi de 0,7%. Já em 2012, observa-se um decréscimo ficando a taxa
de evasão escolar em 0,5%.
Tabela 1 – Índices de evasão escolar no Município da Serra/ES no Ensino Fundamental Regular

Ano Índice
2008 2,0%
2009 0,9%
2010 0,6%
2011 0,7%
2012 0,5%
Fonte: Secretaria de Comunicação da Prefeitura Municipal da Serra/ES 2013
A redução da evasão escolar deve-se, principalmente, ao projeto “Pró-Escola”. Este
programa visa o Combate à evasão e reprovação escolar das escolas municipais,
definido por meio do convênio assinado entre o tribunal de justiça do Estado do Espírito
Santo, o Ministério Público Estadual e o Município da Serra. A materialização desse
Projeto está na publicação da Portaria nº 0002/2010, da Prefeitura Municipal da Serra /
Secretaria da Educação, que fixa normas, para ações previstas no Programa de Combate
à Evasão e Reprovação Escolar.
Do levantamento preliminar feito até agora sobre os índices de evasão escolar do
Município da Serra, os índices chegaram a 0,6% em 2013, conforme a Secretaria de
Educação. Fica então, a questão sobre a efetividade do processo de cooperação entre
Munícipio e a justiça estadual.
Outro dado a considerar que interfere diretamente nos índices de evasão e reprovação
escolar foi a aprovação da LDB, em que as esferas da União, Estados, Distrito Federal e
os Municípios iniciaram um processo de reorganização do ensino, dando
responsabilidades em relação à oferta do ensino infantil, fundamental e médio. Assim na
organização da educação nacional, a LDB estabelece:
(...)
Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão,
em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.
(...)
Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade,
o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino
somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área
de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados
1490

pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino


(BRASIL, 1996).

Matrículas da Rede Estadual e Municipal da Serra/ES

50000
45000
40000
35000
30000
25000
20000
15000
10000
5000
0
1997 2000 2004 2008 2012
Rede Estadual
Rede Municipal

Gráfico 1 – Matrículas do Ensino Fundamental da Rede Estadual e Municipal da Serra/ES


(1997-2012)
Fonte: Dados fornecidos pela Secretaria Estadual (SEDU) e Municipal de Educação (SEDU)
2014
No Município da Serra/ES, essa distribuição de competências ampliou
consideravelmente o número de escolas e estudantes no ensino fundamental a partir do
ano 1997, com o recebimento das matrículas dos alunos do ensino fundamental da Rede
Estadual para a Rede Municipal da Serra/ES. Conforme podemos perceber no gráfico
acima.
Os dados apresentados no Gráfico 2 sobre o abandono escolar foram elevados devido o
processo de adequação da LDB em relação às responsabilidades de oferta do ensino
fundamental, que estavam concentradas na esfera Estadual em 1997.
No ano de 1999, houve uma queda considerável desses índices de abandono escolar, em
relação aos anos anteriores em torno de 1,2%. Conforme podemos observar no gráfico
2.
Observamos, porém, nos anos subsequentes (2000 a 2004) os índices de abandono
escolar aumentaram em 2000 com 3,5%, 2001 com 2,3%, e 2002 com 2,0%, alcançando
por fim 0,4% em 2004, chegando aos índices de 2,0% em 2008 (Gráfico 2).
Analisando o período de 1997 a 2006 (Gráfico nº 2), período da vigência do Fundo de
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef),
1491

percebemos uma diminuição das taxas de abandono escolar que foram se ampliando no
final da vigência do Fundef. No período de 2009 a 2013, o período foi marcado por uma
certa estabilidade ente 0,9% a 0,5%.

Taxas de Abandono Escolar no Ensino Fundamental Regular

12,00%
10,00%
8,00%
6,00%
4,00%
2,00%
0,00%

Taxas de Abandono
Escolar

Gráfico 2 – Taxas de Abandono Escolar da Rede de Ensino Fundamental da Serra/ES (Período de 1997 a
2013)
Fonte: Dados fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação (SEDU) 2014

Com a vigência do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização do


Magistério (Fundeb) e do Plano Nacional de Educação (PNE), apesar de dotar o sistema
educacional brasileiro de um conjunto de diretrizes e metas com o objetivo de balizar a
política educacional do País, com vista ao resgate de uma dívida historicamente
acumulada, não alcançou ainda os resultados esperados de universalização do
atendimento.
De acordo com Fraga (2010, p.89) o programa “Pro-Escola” desempenha a função de
diminuir os índices de evasão, pois o programa é considerado como uma ação positiva
já que a escola faz os encaminhamentos dos alunos faltosos sem justificativa para a
Vara da Infância e da Juventude. Uma vez encaminhados para essa instituição, a família
dos alunos faltosos são intimados a comparecer perante o juiz e explicar os motivos das
faltas, além disso, o juiz encaminha as devidas informações sobre as responsabilidades
da família em relação ao cuidado com a vida escolar dos filhos com idade inferior a 18
anos e as sanções que podem sofrer, caso não atendam a todas essas exigências legais.
1492

No Município da Serra/ES, a Judicialização na educação, abrange o Juizado da Infância


e Juventude, Ministério Público Estadual e Conselhos Tutelares, envolvidos nas
questões educacionais de forma a contribuir para a universalização do ensino bem como
nas ações do combate à evasão e reprovação escolar em parceria com Secretaria de
Educação Municipal e Estadual, representantes de escolas e de organizações da
sociedade civil.
Essas Instituições reúnem-se mensalmente na chamada Rede de Atenção à Criança e
Adolescente, que iniciou suas atividades em 2008, em função dos adolescentes em
conflito com a lei e/ou usuários de drogas.
De acordo com Freire (2013) ao longo da existência da Rede de Atenção à criança e
adolescente no Município da Serra/ES, e vinculados ao público criança e adolescente,
sua política levam os atores a pensarem e repensarem suas práticas e até reformularem
ações e conceitos em que as reuniões são espaços de diálogo, troca, busca de
alternativas face a limitação de cada serviço e construção do saber com o intuito de
fortalecer a educação no Município da Serra. Sendo assim, intensificando as ações e
prevenção em relação à evasão e reprovação escolar.
A pesquisa sobre o “Direito à educação” no Município da Serra desenvolvida até o
momento faz compreender que é necessário haver um amplo diagnóstico das
disparidades de maior incidência da evasão escolar, com intuito de planejar políticas
públicas e garantir “de fato” a permanência de todos os alunos matriculados.

Referências
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei número 9394, 20 de
dezembro de 1996.

SANT´ANNA, Clério José Borges de. Origem histórica da cidade da Serra –


Espírito Santo – Brasil. Disponível em: http://www.clerioborges.com.br/serra.html.
Acesso em: 22 de jun. de 2014.

PREFEITURA MUNICIPAL DA SERRA. Portaria nº 0002/2010. Espírito Santo, 2010.


CURY. Carlos Roberto Jamil. Direito à educação: direito à igualdade, direito à
diferença. Scielo. Caderno Pesquisa. n. 116 São Paulo. Julho 2002.

FREIRE, Marcela Ferrat. INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA: Em cena a Rede de


Atenção do Município de Serra/ ES. 2013. 114 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia
Institucional) - Programa de Pós-Graduação em Psicologia Institucional do Centro de
Ciências Humanas e Naturais da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, 2013.
1493

FRAGA, Elisangela Ribeiro. O PROGRAMA DE CRÉDITO ESTUDANTIL “BOM


NA ESCOLA”: estudo sobre uma política social de geração de renda e redução dos
índices de reprovação e evasão. 2010. 133f. Dissertação (Mestrado em Educação) -
Programa de Pós- Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade
Federal do Espírito Santo, ES, 2010.
1494

Pôster

Sobre a formação de professores e saberes docentes para educação de jovens e


adultos em tempos de modernidade líquida

Juliana Bárbara Camargo


Mestranda no Programa de Educação UNICID
Júlio Gomes Almeida
Professor do Programa de Mestrado em Educação da UNICID

RESUMO: O presente trabalho teve por objetivo refletir sobre a formação de


professores para a Educação de Jovens e Adultos buscando compreender como ela pode
acontecer em um contexto hoje definido como Modernidade Líquida. A pesquisa é parte
do projeto de Mestrado que venho desenvolvendo vinculado à linha Sujeitos Formação
e Aprendizagem do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Cidade de
São Paulo.A discussão recaiu sobre os saberes docentes e a prática pedagógica
problematizada como elemento para autoformação docente. Num tempo em que se
abandona a modernidade sólida e com ela a certeza das coisas para um tempo de
modernidade líquida onde a única certeza são as incertezas, a formação propedêutica é
questionada e a autoformação parece ser o caminho mais acertado para se pensar a
formação de professores. Espera-se com a pesquisa compreender qual o perfil de
professor adequado para atuar nesta modalidade e como ele vem sendo formado.

Palavras-chave: Formação; autoformação; professores; modernidade líquida

Introdução
. Este artigo apresenta dados iniciais de uma pesquisa que busca compreender a
formação de professores que atuam na educação de Jovens e Adultos em uma
sociedade marcada por intensa crise de valores e pela velocidade. Embora muito se fale
da formação de professores, muitas vezes relacionando a formação precária com a baixa
qualidade da educação, pouco tem se falado especificamente da formação daqueles que
atuam junto aos jovens e adultos que não tiveram acesso a escola na idade certa. Assim,
o estudo deste tema me parece bastante relevante.
1495

No seu desenvolvimento adotou-se a abordagem qualitativa de cunho


fenomenológico e como técnica de coleta de dados optou-se pela análise bibliográfica e
documental que será completada por trabalho de campo efetivado pela observação
participante e entrevista semiestruturada com professores que atuam na modalidade de
ensino estudada. Neste artigo reflito sobre dados produzidos por meio da análise
bobliográfica e documental.
A questão da formação de professores não é nova, tema de inúmeros trabalhos,
seminários, congressos, palestras, palco de discussões acaloradas e de diferentes
posturas e olhares. Na medida em que a sociedade se transforma, novos olhares surgem
e então reacendem estes debates. Mas o que dizer de uma sociedade com mudanças tão
rápidas?
Em tempos de Modernidade Líquida, Bauman (2009) nos fala do que é liberdade,
do que se desfaz, do transitório.
Uma inédita fluidez, fragilidade e transitoriedade em construção (a famosa
“flexibilidade”) marcam todas as espécies de vínculos sociais que, uma
década atrás, combinaram-se para constituir um arcabouço duradouro e
fidedigno dentro do qual se pôde tecer com segurança uma rede de interações
humanas. Elas afetam particularmente, e talvez de modo mais seminal, o
emprego e as relações profissionais (BAUMAN, 2003, p. 112).

Sobre essa fluidez o autor coloca


O aspecto definidor de ‘liquidez’, a incapacidade de reter sua forma por
muito tempo e sua propensão a mudar de forma sob a influência de mínimas,
fracas e ligeiras pressões é apenas o traço mais óbvio e, em minha opinião,
também a característica mais consequente de nossa atual condição
sociocultural. (BAUMAN, 2010).

É nessa sociedade moderna líquida que temos que pensar esta formação, a partir
desse lugar é que vamos falar sobre a formação de professores.
Pensar na modernidade líquida é perceber que os sujeitos não possuem mais
padrões de referência, nem códigos sociais e culturais que lhes possibilitassem, ao
mesmo tempo, construir sua vida e se inserir dentro das condições de classe e cidadão
(FRAGOSO, 2011). Para Bauman (2001) estamos vivendo um momento, onde os
indivíduos não possuem mais lugares preestabelecidos, estes indivíduos devem lutar
livremente por sua própria conta e risco para se inserir numa sociedade.
Fragoso (FRAGOSO, 2011; 110 ) explica que :

Na modernidade sólida, as identidades eram sim autoconstruídas, no entanto,


eram também feitas para durar. No caso da experiência dos indivíduos na
versão líquida da modernidade, a identidade é continuamente montada e
desmontada. E tem de ser assim, visto que a busca fugaz da felicidade exige
1496

adaptabilidade e mudança constante, portanto prender-se a uma “identidade”


pode ser o desfecho final de um destino infeliz.

Pensando na questão da identidade e mais especificamente da identidade do


professor, poderíamos pensar então que havia uma identidade que ele julgava ser aquela
que o caracterizava, agora neste momento uma nova identidade será construída mas
poderá sofrer adaptações ou ajustes o que nos remete a pensar também na crise das
identidades que Dubar (2006) explica ser decorrência da crise da modernidade. Dubar
(2006) não fala de identidade mas identidades no plural pois explica que são várias as
identidades e que os indivíduos escolhem suas pertenças a partir de suas necessidades as
quais as de hoje podem não ser as mesmas amanha. O autor fala é que a crise das
identidades é conseqüência de mutações em três esferas centrais da vida social: a
transformação nas relações de gênero e da instituição familiar; a esfera do trabalho,
emprego, formação e escolarização e a esfera do Estado-nação, contribuindo com a
fragmentação das identidades.
Assim, pensar em formação de professores numa crise de identidades tendo como
pano de fundo a modernidade líquida, não é tarefa fácil, mas arriscamos algumas
colocações.

Referencial Teórico

As leituras iniciais revelam que EJA é o resultado de um ensino que


historicamente foi tratado de forma compensatória nas políticas educacionais, o que
resultou em um problema ainda não resolvido em pleno século XXI evidente nos altos
índices de analfabetismo que ainda hoje fazem parte da realidade educacional do país.
Segundo Tardiff (2000) Os alunos passam pelos cursos de formação de
professores sem modificar suas crenças anteriores sobre o ensino. E, quando começam a
trabalhar como professores, são principalmente essas crenças que eles reativam para
solucionar seus problemas profissionais.
Muitas vezes os alunos vão se valer se suas experiências como aluno para
atuarem como professores, e nos remetendo especificamente a EJA o caso ainda é pior,
pois tal público prescinde de uma particularidade, competências e habilidades próprias
apara atuarem nessa modalidade. Vemos que muitos professores vão para EJA sem o
menor preparo muitas vezes escolhem para “acomodarem” seus horários, ou por
acreditarem ser um público sem maiores problemas.
1497

Também Torres (1990) comenta nesse sentido:

Na verdade continua arraigada a idéia de que qualquer pessoa que saiba ler e
escrever pode se converter em alfabetizador, assim como a idéia de que
qualquer educador o é automaticamente – pelo fato de sê-lo um educador de
adultos. É típico que se passe a ver o professor da escola como depositário
natural da tarefa de alfabetizar adultos (TORRES,1990, p. 05)

A formação de professores então para jovens e adultos precisa de um olhar


cuidadoso que leve em consideração os indivíduos envolvidos neste processo, que são
sujeitos de uma história e possuem saberes muito particulares e que devem ser levados
em consideração no contexto escolar.
Bernardino (2008) fala da formação do professor de Educação de Jovens e
Adultos e diz que esta é desatualizada, pois na sua prática reproduz os mesmos métodos
da educação regular, além disso diz que são poucas as pesquisas, discussões e produção
de conhecimento para esta modalidade de ensino.
Arroyo (2006) também comenta sobre a formação de professores para EJA e
explica que tal formação é precária e que estamos construindo este perfil talvez por
conta do descrédito da EJA que por anos não obteve o olhar das políticas públicas
educacionais.
Esse caráter universalista, generalista dos modelos de formação de
educadores e esse caráter histórico desfigurado dessa EJA explica por que
não temos uma tradição de um perfil de educador de jovens e adultos e de
sua formação. Isso implica sérias consequências. O perfil do educador de
jovens e adultos e sua formação encontra-se ainda em construção. Temos
assim um desafio, vamos ter que inventar esse perfil e construir sua
formação. Caso contrário, teremos que ir recolhendo pedras que já existem
ao longo de anos de EJA e irmos construindo esse perfil da EJA e,
consequentemente, teremos que construir o perfil dos educadores de jovens e
adultos e de sua formação (ARROYO, 2006, p. 18).

A EJA, como modalidade diferenciada em relação à educação de crianças,


necessita de elementos apropriados para atender às peculiaridades típicas do processo
esses elementos podem ser especificados nas seguintes categorias, a saber: professores,
ambiente físico, programas (conteúdos), metodologia própria, e neste caso práticas
pedagógicas diferenciadas. Dessa forma, os jovens e adultos na EJA, exigem do
professor, além dos saberes disciplinares, práticas educativas que aproveitem a sua
bagagem cultural e a experiência acumulada.
Esse problema nos leva a questionar os saberes dos professores. Nesse sentido
Tardiff (2000) comenta:
1498

O que a pesquisa sobre os saberes profissionais mostra é que eles são


fortemente personalizados, ou seja, que se trata raramente de saberes
formalizados, de saberes objetivados, mas sim de saberes apropriados,
incorporados, subjetivados, saberes que é difícil dissociar das pessoas, de sua
experiência e situação de trabalho (p.15)

Tardiff nos fala dos diferentes saberes que contemplam a formação de professor,
para este autor não se trata de um saber e sim vários saberes, destacando quatro tipos
diferentes de saberes relacionados a atividade docente: os saberes da formação
profissional (das ciências da educação e da ideologia pedagógica); os saberes
disciplinares; os saberes curriculares e, finalmente, os saberes experienciais. Para o
autor o que forma um professor são conhecimentos de ordem diversa, é esse conjunto
de conhecimentos/saberes que vai formar um professor, na realidade são os
conhecimentos oriundos da universidade aliados as saberes da prática docente.
Para Tardiff o saber dos professores é o saber deles e está relacionado com a
pessoa e a identidade deles, com a sua experiência de vida e com a sua história
profissional, com as suas relações com os alunos em sala de aula e, com os outros atores
escolares na escola.
Pensar que existem vários e diferentes saberes e mais, que o saber da prática
docente é um saber importante foi de muita contribuição pois agora tem-se o saber do
professor como objeto de estudo
Assim um professor aprende a trabalhar trabalhando, e quanto mais experiência
possuir, mais saberes ele possuirá, pois sua prática anterior, reavaliada e retomada,
configura-se em nova prática dessa vez ponderada a partir dos erros e acertos de
vivências outrora realizada.
Nunes (2001) afirma que as pesquisas sobre formação e profissão docentes
apontam para uma revisão da compreensão da prática pedagógica do professor, que é
tomado como mobilizador de saberes profissionais. Considera-se assim que este, em sua
trajetória, constrói e reconstrói seus conhecimentos conforme a necessidade de sua
utilização, suas experiências, seus percursos formativos e profissionais etc.
O autor nos chama a atenção para:

as pesquisas sobre a formação de professores e os saberes docentes surgem


com marca da produção intelectual internacional, com o desenvolvimento de
estudos que utilizam uma abordagem téorico-metodológica que dá a voz ao
professor, a partir da análise de trajetórias, histórias de vida etc.
1499

Segundo Nóvoa (1995) também direciona o olhar para o professor e aponta:

Essa nova abordagem veio em oposição aos estudos anteriores que acabavam
por reduzir a profissão docente a um conjunto de competências e técnicas,
gerando uma crise de identidade dos professores em decorrência de uma
separação entre o eu profissional e o eu pessoal. Essa virada nas
investigações passou a ter o professor como foco central em estudos e
debates, considerando o quanto o “modo de vida” pessoal acaba por interferir
no profissional. Acrescenta ainda o autor que esse movimento surgiu “num
universo pedagógico, num amálgama de vontades de produzir um outro tipo
de conhecimento, mais próximo das realidades educativas e do quotidiano
dos professores” (p. 19).

Gonçalves Pinto (2010) em seu estudo reflete acerca da formação de


professores, tendo como foco de análise os saberes docentes construídos ao longo da
prática pedagógica. Para este autor, valorizar a prática pedagógica como elemento de
partida para as reflexões acerca da formação de professor pode nos parecer um
desprestígio ao processo de teorização, o que não é o caso. A questão central que se
coloca é pensarmos alternativas para as análises tradicionalmente construídas sobre o
tema.
Também buscando algo mais próximo das realidades educativas Nunes
(2001:38) afirma:
De certa forma, o repensar a concepção da formação dos professores, que até
a pouco tempo objetivava a capacitação destes, através da transmissão do
conhecimento, a fim de que “aprendessem” a atuar eficazmente na sala de
aula, vem sendo substituído pela abordagem de analisar a prática que este
professor vem desenvolvendo, enfatizando a temática do saber docente e a
busca de uma base de conhecimento para os professores, considerando os
saberes da experiência.

Comungamos das mesmas proposições de Nóvoa, Tardiff, Nunes, Vagula


quando falam da necessidade de se ter o professor ou melhor os saberes dos professores
como objeto de estudo, é hora de ouvi-los de dar voz e vez aos professores para que
possamos conhecer suas percepções, angústias, necessidades, desafios enfim as
representações sociais que fazem do ser-docente em sua prática pedagógica.
Baumann (2009) fala deste momento como um momento de angústia mas
também de esperança. Pensar em formação de professores num tempo em que 2 horas é
tempo demais o que dirá de uma formação inicial de 3 ou 4 anos se é a velocidade e não
a duração o que importa, será que os conteúdos adquiridos neste tempo servirão para o
momento futuro, uma vez que dentro da ótica de baumann os longos discursos as teorias
complexas não teriam mais lugar? Neste espaço só interessa aquilo que for flexível e
passível de mudança e adequação o duradouro acabou deu lugar ao passageiro. A
1500

velocidade das coisas é o que interessa é o que é necessário. O indivíduo é aquilo que
ele veste o que come, o restaurante que freqüenta as etiquetas e marcas que carregam,
são esses os valores que irão definir a identidade dos indivíduos, mas e enquanto aos
professores? Serão eles também os pensadores que defendem, as concepções
pedagógicas que os norteiam?

Considerações Finais

O artigo teve por intenção apresentar dados parciais de uma pesquisa que busca
refletir sobre a formação de professores na modernidade líquida. Se pensássemos
somente na formação de professores a tarefa já seria difícil, mas falar de uma nova
perspectiva onde o antigo ordenamento já não existe e onde o indivíduo encontra-se
sozinho, ele mesmo em busca de seu eu, então só podemos fazer algumas colocações.
A formação inicial tão importante para os docentes agora é questionada, pois
os conteúdos hoje apresentados serão utilizados quando o educador for para a sua sala
de aula? Se tudo é transitório e passageiro também o conhecimento deveria adequar-se
a este novo ordenamento.
A Educação de Jovens e adultos requer um olhar cuidadoso pois trata-se de
uma modalidade onde os indivíduos foram excluídos em algum momento, e agora
necessitam não só de uma chance mais de um estímulo que os levem a construção e
aplicação de novos conhecimento, para isso a necessidade da formação do professor ser
específica para o atendimento de jovens e adultos
Os saberes docentes advindos da prática pedagógica parecem ser um elemento
de autoformação adequado e pertinente no sentido de que mudarão de acordo com as
necessidades do momento bem ao ritmo e de acordo com a vida líquido moderna.

Referências

ALMEIDA, Julio Gomes. Práticas institucionais e formação de educadores.


Notandum, São Paulo, CEMO FEUSP Universidade do Porto. Ano XI, n. 17, p. 69-78.
jul/dez 2008.

ALMEIDA, Julio Gomes. Ensino fundamental de nove anos ampliação da permanência


e qualidade de ensino. EccoS, São Paulo, n. 25, p. 159-179, jan./jun. 2011.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009.
1501

BERNARDINO, A.J. Exigências na formação dos professores de EJA. VIII Seminário


de pesquisa em educação da região sul. Univale. Itajaí. Junho/2008

FRAGOSO, Tiago de Oliveira. Modernidade líquida e liberdade consumidora: o


pensamento crítico de Zygmunt Bauman Revista Perspectivas Sociais Pelotas, Ano 1,
N. 1, p. 109-124, março/2011

GONÇALVES PINTO, O lugar da prática pedagógica e dos saberes docentes na


formação de professores. Acta Scientiarum. Education Maringá, v. 32, n. 1, p. 111-
117, 2010

NÓVOA, Antonio. Os professores e as histórias da sua vida. In: Vidas de professores.


Porto: Porto Editora, 1995.

TARDIFF, Maurice; LESSARD, Claude; LAHAYE, Louise. Os professores face ao


saber – esboço de uma problemática do saber docente. Teoria & Educação. Porto
Alegre, n.4, 1991

TARDIFF, Maurice. Saberes profissionais dos professores e conhecimentos


universitários – elementos para uma epistemologia da prática profissional dos
professores e suas consequências em relação a formação para o magistério. Revista
Brasileira de Educação, ANPED, São Paulo, n.13, jan/abr. 2000

VAGULA, Edilaine. O professor seus saberes e sua identidade. Rev. Cient. Fac. Lour.
Filho - v.4, n.1, 2005
1502

Pôster

A dimensão estética na educação física: narrativas docentes

Jusselma Ferreira Maia


Universidade Cidade de São Paulo - UNICID.

Resumo: Trata-se de uma pesquisa em andamento tendo como objeto de estudo o


sentido da dimensão estética na docência na visão dos professores de Educação Física,
que atuam no Ensino Fundamental I, de uma escola privada, localizada na zona Norte
da cidade de São Paulo. O objetivo consiste em compreender o sentido da dimensão
estética da Educação Física Escolar presente nas narrativas docentes. Adota-se, como
referencial teórico, a obra de Adorno, voltada para a compreensão dos parâmetros da
estética da indústria cultural e da massificação da cultura, visando a emancipação dos
sujeitos. Em Freire, no que se refere ao desenvolvimento da autonomia como caminho
de conscientização e de Schiller, no que concerne à dimensão do sensível e da razão nos
processos formativos. A metodologia utilizada é a Entrevista Narrativa, na perspectiva
de Jovchelovitch & Bauer (2002). Para a compreensão dos dados adota-se o enfoque
hermenêutico, na perspectiva de Gadamer (1997). Pretende-se com o estudo contribuir
para uma melhor compreensão dos processos formativos como possibilidade de
desenvolvimento da autonomia e emancipação dos sujeitos que ocorre na dimensão
estética na docência de Educação Física Escolar.
Palavras - Chaves: Educação Estética. Ética. Educação Física Escolar.

INTRODUÇÃO

O estudo nasce da experiência da pesquisadora como docente na disciplina de


Educação Física, na Educação Básica e Ensino Superior, sobretudo, quando da leitura
dos valores estéticos e éticos, nos espaços escolares como, entre outros, um objetivo dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s), destaca a reflexão acerca do componente
estético na compreensão do sentido de ser professor.
Convém ressaltar que, na visão de Freire (2003), na jornada educativa e
formativa de ser professor, é fundamental na construção de valores estéticos e éticos
1503

pelos alunos, nos espaços escolares, visando à consciência crítica de sua atuação como
cidadão.
Percebe-se que nos espaços escolares a preocupação do professor de Educação
Física permanece focada na transmissão do conteúdo, no cronograma e no resultado da
prática a busca da excelente habilidade motora. Entretanto, o desenvolvimento de
atitudes éticas no aprender a conviver em grupo, em sociedade, passa pelos
componentes da educação estética.
Diante do exposto emergem algumas questões: Qual a visão de educação estética
na concepção dos professores de Educação Física? Qual a percepção dos professores
sobre a importância da dimensão estética no desenvolvimento de autonomia e
emancipação dos alunos? Qual a compreensão dos professores a respeito dos objetivos
dos PCN’s, no que concerne aos valores estéticos na Educação Física no espaço
escolar?

PROBLEMA

O sentido da dimensão estética na Educação Física na visão dos professores de


uma escola privada do Estado de São Paulo, localizada na zona Norte da cidade de São
Paulo.

OBJETIVO

Compreender a atribuição de sentido da educação estética a partir das narrativas


docentes da disciplina Educação Física no espaço escolar.

JUSTIFICATIVA

Justifica-se o estudo na possibilidade de compreender que o desenvolvimento da


autonomia e emancipação dos sujeitos ocorre na dimensão estética nas aulas de
Educação Física. De acordo com Palma (2001); Daolio (1998); Gallardo (1998); Soares
(2001); Darido (2003); Bracht (1999); Medina (1992), no processo de construção da
Educação brasileira, a Educação Física cumpriu diferentes papéis que eram pertinentes à
determinada época.
1504

Nas quatro primeiras décadas do século XX, foi marcante a influência dos
Métodos Ginásticos e da Instituição Militar. Como destaca Bracht (et al, 1992), outra
função foi estabelecida pelo surgimento da educação higienista, que determinava que a
Educação Física prestava-se como meio de construção do homem saudável.
A partir da década de 1970, iniciaram-se vários movimentos críticos na busca de
reavaliar a especificidade da Educação Física no contexto escolar. Nesse sentido, muitos
autores construíram novas abordagens e metodologias de ensino a serem trabalhadas,
especificamente na Educação Física.
Diferentes significados e sentidos atribuídos historicamente à Educação Física,
mostram o processo no qual a disciplina caracteriza-se dentro dos parâmetros da
Educação Bancária. Freire (2003) refere-se a uma concepção bancária de educação, na
qual os alunos são meros receptores de informação, sem qualquer incentivo a
consciência crítica e a autonomia, foram, e ainda são muito importantes que envolvem a
Educação Física no espaço escolar.
A formação de pessoas no espaço escolar envolve respeito às diferentes opiniões
e às regras, negação a qualquer tipo de violência, buscando solucionar problemas,
trabalhar em grupo, discussões, construir a criticidade. Neste contexto, são atribuições
da função do professor de Educação Física, o compromisso ético e estético com o
aprimoramento não apenas de habilidades motoras, mas o desenvolvimento da
autonomia e responsabilidade no aprender a ser sujeito no próprio aprendizado do saber
conviver.

METODOLOGIA

A abordagem da pesquisa será qualitativa e o procedimento de coleta de dados


será a Entrevista Narrativa, na perspectiva de Jovchelovitch & Bauer (2002). A
Entrevista Narrativa visa captar as experiências subjetivas do entrevistado, sem a
limitação dos questionários fechados ou semiestruturados. Vale destacar que a
Entrevista Narrativa tem como objetivo evitar o discurso na terceira pessoa, já que
quando a pessoa fala de si própria como se fosse outra pessoa, não se sente tocada pela
sua própria história, expressando-se de maneira mecânica. Neste viés, afirmam os
autores:
1505

O estudo da narrativa conquista uma nova importância nos últimos anos. Este
renovado interesse tem um tópico antigo: narrativas e narratividade tem suas
origens na Poética de Aristóteles e está relacionada com a consciência do
papel que contar histórias desempenha na conformação de fenômenos sociais.
(JOVCHELOVITCH & BAUER, 2002, p. 90)

Os referidos autores esclarecem que a Entrevista Narrativa, compreende as fases


de:
I. Preparação, com a exploração do campo e identificação dos sujeitos envolvidos; II.
Iniciação, através da formulação do tópico inicial para narração; III. Narração central,
partindo da narração livre por parte dos sujeitos; IV. Fase de perguntas: constituída das
questões desencadeadoras formuladas pelo entrevistador.
O questionário narrativo, elaborado pela orientadora desta pesquisa, consiste na
preparação dos entrevistados para a entrevista narrativa. Já que a fase I “Preparação”
compreende a identificação dos sujeitos da pesquisa e sua formação acadêmica,
buscamos este objetivo através de questões como: Quando iniciou o seu trabalho como
professora/professor de Educação Física?
É essencial ressaltar que os critérios para a seleção dos professores são: interesse
em participar da pesquisa; lecionar para o Ensino Fundamental I e concordar com os
termos de consentimento e participação na pesquisa.
Na fase II, a Iniciação, o questionário narrativo consiste na realização de duas
estratégias, sendo que a primeira, compreende uma Narrativa Biográfica, na qual os
entrevistados falam sobre sua vivência no Ensino Superior, focalizando três cenas
marcantes. O indivíduo será exposto aos seguintes questionamentos: Minha formação
foi de autoria ou não? Como foi a minha relação com as disciplinas no Ensino Superior?
Foi de autoria ou submissão? Como foi a minha relação com o professor? Foi de autoria
ou submissão? Que aluno (a) fui?
A segunda estratégia, a elaboração do Quadro da Vida, busca “os momentos
divisores de água”, inspirados nos “momentos charneiras”, conceito desenvolvido por
Josso (2002), nas categorias de espaço e tempo: vida familiar, escolar, acadêmica,
profissional. O indivíduo recorda-se das preferências de leituras, cinema, pessoas,
relacionamentos amorosos, episódios marcantes e mudanças em seus referenciais. Nesse
processo, ele reconhece as pessoas, professores e livros que influenciaram na sua
escolha profissional, questionando sua relação com a maneira de ser pessoa e professor.
Josso (2004) ainda esclarece que através do Quadro da Vida é possível
compreender que toda experiência é vivência, mas nem toda vivência torna-se
1506

experiência. A autora define experiência formadora como a compreensão dos momentos


charneiras, situações e acontecimentos que modificaram os referenciais de vida do
indivíduo. A reflexão sobre o que se aprendeu com essa vivência permite entender
melhor o próprio processo de formação e os componentes estéticos constituintes da
identidade pessoal e profissional.
Na fase III, a Narração Central, é Entrevista Narrativa, propriamente dita,
apresenta-se a pergunta que deflagra a narrativa: O que significa para vocês a dimensão
estética na docência da Educação Física no espaço escolar? Quais as dificuldades
encontradas e as sugestões para melhoria da docência da Educação Física no espaço
escolar?
Na fase IV, durante a entrevista, a partir da narrativa dos participantes da
pesquisa, algumas perguntas poderão emergir, tais como: Por quê? Para quê?. Já na fase
V, que traz a Fala Conclusiva, o entrevistador propõe as questões: O que significou para
você o resgate do processo formativo no Ensino Superior? O que significou reconhecer
as pessoas, professores, livros que influenciaram a sua escolha profissional? Refletir
sobre a sua relação com o conhecimento, professor e consigo mesmo, se de autoria ou
não, permitiu perceber que a trajetória pessoal e profissional não são distantes e que
influenciam os modelos de práticas e a decisão profissional?
Vale destacar que, durante todo o processo, as respostas serão gravadas para,
posteriormente, serem transcritas e analisadas, garantindo assim a fidelidade ao que foi
relatado pelo entrevistado.
Para compreensão dos dados coletados na Entrevista Narrativa e no questionário
narrativo, será adotado o enfoque hermenêutico, na perspectiva de Gadamer. Tal
processo envolve a subjetividade do pesquisador e faz com que haja a superação dos
pré-conceitos, conduzindo-o à compreensão da dimensão estética da docência dos
professores de Educação Física, seguindo as pistas do sentido da dimensão estética
presente nas narrativas docentes.
A compreensão filosófica Hermenêutica, em Gadamer (1997), segue o círculo de
compreensão, da teoria para prática e para a teoria como um processo infinito de
abertura de horizontes, para encontrar no texto o sentido de algo que diz por si mesmo e
que necessita ser descoberto.
Nesta perspectiva, a compreensão e interpretação dos sentidos das narrativas
docentes, desdobram-se em explicitações de conceitos, interpretações e apreensões de
sentidos, que serão fundamentos em Adorno, a compreensão dos parâmetros da estética
1507

da indústria cultural e da massificação da cultura, educação e emancipação, analisando


os padrões de beleza e estética estipulados pela mídia, evitando assim o preconceito.
Ainda neste viés, utilizamos a obra de Freire, no que se refere à crítica à Educação
Bancária e a busca de superação, por meio da curiosidade estética e epistemológica,
como caminho de conscientização e da autonomia. Aproximando-se de Schiller, no que
concerne à dimensão do sensível e da razão nos processos formativos.

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SCHILLER, F. A Educação Estética do homem numa série de cartas. 4 ed. São


Paulo: Iluminuras, 2002.
1509

Pôster

Formação de professores para educação de jovens e adultos: em busca de uma


melhoria significativa

Kátia Maria Silva Gonçalves1


Ângela Maria Martins2

Resumo: Este trabalho é parte de investigação maior que está sendo desenvolvido
no Programa de Mestrado de Educação da Universidade Cidade de São Paulo, sob o
titulo “Formação de Professores para a Educação de Jovens e Adultos (EJA)”. Guia-
se pelo pressuposto de que a EJA, em função da especificidade e complexidade de
seu alunado, requer uma formação docente que diferencie o profissional para
enfrentar os problemas nessa modalidade de ensino. A presente pesquisa apoia-se em
referencial teórico oferecido por autores como: HADDAD (2002), ARROYO
(2006), SOARES (2006), TARDIF (2010), FREIRE (2002), PAIVA (2006) e
emprega uma metodologia de caráter bibliográfico denominado “Estado da Arte” ou
“Estado do Conhecimento”. Resultados de estudos acadêmicos vêm denunciando
práticas na EJA que não correspondem às suas particularidades, e à necessidade de
condições de formação docente correspondentes às exigências dessa modalidade de
ensino. Também revelam a importância do aprofundamento de pesquisas sobre a
constituição de estudos da EJA em cursos de formação de professores em
Pedagogia.
Palavras Chaves: Formação de Professores para EJA, Políticas Públicas, Estado do
Conhecimento.

INTRODUÇÃO

Um dos pontos principais das reflexões sobre a qualidade de ensino, evasão,


reprovação, ampliação do universo cultural e científico de todos os atores da educação é

1
Mestrando do PPGE da Unicid k.m.sg@hotmail.com
2
Professora do PPGE da Unicid ange.martins@uol.com
1510

a formação de professores na escola – espaço público e central da educação. Tal ótica


requer uma análise do ato de formar, de comunicar e de saber, nas ações da dimensão
relacional do ensino-aprendizagem. O repensar dos altos e baixos da docência, suas
dificuldades e necessidades, seus alvos e descasos, seus quereres e sonhos é norte para
um planejamento que firme a concepção da palavra, absorva as incertezas e aumente o
desempenho dos envolvidos – educadores e educandos – além de uma tomada correta
de decisões no cotidiano.
Desde Comenius os educadores se tornaram a figura central do sucesso do
processo educativo. Vemos com clareza isto em Maués (2003, apud BELLO, 2008, p.
41-42) ao definir os eixos fundamentais da “arquitetura da formação de professores” nos
campos da: universalização/profissionalização, na ênfase da formação prática/validação
das experiências, da pedagogia das competências, da educação à distância e na
formação continuada. Não obstante esta declaração, nas escolas brasileiras, sentimos as
dificuldades da profissionalização rápida ou curta, sem a devida atenção e firmeza com
os princípios do cotidiano escolar – com a sala de aula. O educador não entra em
contato real com a condição ideológica da reta e sábia educação. Sua formação é
teórica. Não que a teoria deva ser desvalorizada, mas deve ser entrosada com a prática;
e vice-versa.
As escolas brasileiras têm acelerada e estruturalmente perdido a condução da
relação meio e fins, formas e intencionalidades da educação e, em consequência, tem
condicionado o elitismo com visão taylorista – a educação bancária de Paulo Freire –
em todos os seus parâmetros.
Neste sentido, podemos compreender que a formação de professores requer
participação direta dos educadores para que, deste modo, haja interiorização da
sensibilização coletiva, alargamento da ação reflexiva intencional e transformadora,
despertamento da confiança, coerência, combate firme a mesmice, a condicionalidade e
ao engessamento do potencial de mudanças.
Nos Referenciais para Formação de Professores (BRASIL, 1999) se fixa à
valorização do magistério, ao dizer que há “a necessidade de medidas em relação à
formação continuada, profissão, carreira e salário, ética profissional, direitos e
obrigações, seguridade social condições mínimas para um exercício docente eficaz”.
Como se percebe formar educadores não é apenas lhe fornecer técnicas ou
metodologias de correção ou capacitação e atualização magisterial devido às lacunas
deixadas pela formação inicial e pela obsolescência do conhecimento. Schön (apud
1511

LENCIONI, 2012, p. 41) argumenta que o que faz o “profissional reflexivo” é:


a) conhecer-na-ação: a prática profissional exige saberes para a ação; a formação
neste sentido é uma mediação que orienta a prática;
b) reflexão-na-ação: é o refletir sobre a própria prática profissional na condução
de todo o ato de ensino e também nas mudanças propostas;
c) reflexão sobre a reflexão-na-ação: é a reflexão sobre a experiência anterior,
baseada numa problematização, mas em busca de soluções; é o conceber e modificar a
prática.
É dos atores reflexivos que carecemos atualmente. Será por meio destes que
conquistaremos as finalidades e formularemos corretamente os propósitos da educação.
Será sob esta formação que os educadores darão significado ao saber, ao saber-fazer e
ao saber-ser. Nóvoa (1992) corrobora esta ideia argumentando que:

É preciso investir positivamente os saberes de que o professor é portador,


trabalhando-os de um ponto de vista teórico e conceptual. Os problemas da
prática profissional docente não são meramente instrumentais; todos eles
comportam situações problemáticas que obrigam as decisões num terreno de
grande complexidade, incerteza, singularidade e de conflito de valores. As
situações que os professores são obrigados a enfrentar (e a resolver)
apresentam características únicas, exigindo, portanto respostas únicas: o
profissional competente possui capacidade de autodesenvolvimento reflexivo
(NÓVOA, 1992 apud LENCIONI, 2012, p. 43).

A reflexão une o conhecimento e a prática. O entendimento de Madalena Freire


(2008, p. 43) nos ajuda a compreender a diferença entre construir conhecimento e
reproduzir conhecimento, repetir história e construir história. Isto porque o processo de
aprendizagem dos educandos eleva (ou ao menos deve elevar) o aspecto cognitivo, bem
como a “inteligência afetiva”. Em outras palavras, o processo educativo deve conduzir a
uma aprendizagem significativa.
Deste modo, devem ser destacados três aspectos importantes na formação do
professor. O primeiro é a já mencionada qualificação enquanto a oferta na aquisição dos
conhecimentos científicos indispensáveis aos conteúdos específicos de cada área –
alfabetização, história, geografia, matemática, línguas, etc. Segundo, a formação
pedagógica, a qual fornece e desenvolve raciocínios e atividades sistematizadas para a
transformação da realidade do educando – domínio técnico e dos recursos que
viabilizem a atividade docente na ação educativa. Por fim, a formação ética e política. A
fundamentação dos valores para elaboração da vida moral, afetiva e crítica-solidária dos
educandos a fim de desenvolver autonomia – é a construção de um mundo melhor, quer
1512

seja social, econômico e político, evitando assim o enciclopedismo, o academicismo, o


tecnicismo e a manipulação do educando.
A ideia-mor é mediar nos educadores, independente do tempo de magistério,
uma compreensão do contexto social-econômico-político-científico. O que não quer
dizer formar especialistas, mas “intelectuais transformadores” (GIROUX apud
ARANHA, 2006, p. 47). Em outras palavras, sujeitos críticos, reflexivos, que tem uma
visão do todo e um compromisso ético.
A escola tem por responsabilidade formar educadores libertários e educandos
autônomos. Deste modo, é preciso inovar na pluralidade dos olhares e opiniões do
sistema educativo. Ora, inovar é mudar intencional e deliberadamente os objetivos.
Inovar exige um processo aberto e multidimensional. Sabendo ainda que inovar não é o
mesmo que modernizar. Pois modernizar é tornar moderno, o que, por si só, não traz
inovação educativa. Afinal, inovar possibilita as mudanças nas estratégias de ensino-
aprendizagem, bem como intervir no sistema para transformar atitudes, ideias, culturas,
conteúdos, modelos e práticas pedagógicas.
Assim formação deve ir além das participações em capacitações setoriais,
reuniões pedagógicas, conselhos de classe, auditoria de registros e controles, etc., deve
também suplantar os fatores impeditivos e obstacularizadores do processo de melhoria
da formação dos educadores.
Segundo Fullan (2001) há três possibilidades de inovação no campo
educacional. A primeira firma-se na utilização de novos materiais, currículos e
tecnologias. A segunda apoia-se nas novas abordagens de ensino, estratégias e
atividades. E a última, baseia-se nas possibilidades de mudança das crenças e
pressupostos subjacentes às práticas pedagógicas.
Nestas três visões de inovação educacional pode-se notar que não há desconexão
do contexto escolar nem superficialidade ou fragmentação da prática. A visão é engajar
os educadores como responsáveis no processo de formação profissional permanente.
Porquanto, cabe a unidades escolares proverem o desenvolvimento profissional na
própria escola, sem aumentar a carga de trabalho ou descontinuar a capacitação docente;
além de firmar um compromisso coletivo nas ações de formação.
O objetivo final é superar a crise de identidade da educação, a fim de esperançar
melhores resultados na transformação de cada um e do mundo. Nas palavras de Freire
(apud ALMEIDA; BRUNO; CHRISTOV, 2006, p. 81): “A alegria não chega apenas no
encontro do achado, mas faz parte do processo de busca. E ensinar e aprender não
1513

podem dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria”.


A formação precisa ser parte de uma relação de sentido. Assim, urgir o
alinhamento das competências e o repúdio e afastamento das soluções simplistas e
paliativas ao se confrontar com a realidade vivida pela escola. Neste sentido se faz
obrigatório responder as perguntas críticas da cultura escolar e determinar as mudanças
organizacionais e humanas dentro da organização escolar.

CONCLUSÃO

As transformações buscadas pela educação vêm de muito tempo. Diz-nos Fullan


(apud BELLO, 2008, p. 46) que “a formação docente tem a honra de ser,
simultaneamente, o pior problema e a melhor solução em educação”.
Portanto, a formação de professores no cotidiano deve permear os diálogos
sociais das instituições escolares, fazendo com que as ações e os comprometimentos de
todos em relação aos resultados sejam alcançados. Assim sendo, o ponto de equilíbrio
da real formação profissional dos educadores se faz no esforço de uma análise da crítica
profissional do trabalho diário do educador. Neste caminho, formaremos profissionais
reflexivos e “intelectuais transformadores”. Em suma, a formação deve fazer a escola
funcionar num grande projeto coletivo.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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Acesso em 21 de dezembro de 2013.
1516

Pôster

A emenda constitucional nº. 59 de 2009 e a educação infantil: os dilemas entre


qualidade e quantidade

Kelly Lucas Silva


PPGE/UFES
Grupo de Pesquisa “Infância, educação, sociedade e cultura”.

Resumo: Este texto busca analisar os processos de implementação da Emenda


Constitucional nº 59 de 2009 nas políticas de educação infantil e seus desdobramentos e
articulação com a qualidade socialmente referenciada. Ao longo das últimas décadas foi
observado um conjunto de políticas que sinalizam respostas ás demandas do campo da
educação infantil, tais como, a sua afirmação como primeira etapa da educação básica, a
inclusão de creches no FUNDEB, e recentemente a aprovação do PNE, Lei Nº. 13.005
de 2014. Pretende-se entrar na interioridade dessas questões a partir da pesquisa
qualitativa, com estudo exploratório e estudo de caso de um município da Grande
Vitória, ES.
Palavras-chave: Obrigatoriedade. Educação Infantil. Qualidade socialmente
referenciada.

INTRODUÇÃO
A Emenda Constitucional nº59 de 20091 trouxe uma nova configuração em torno da
obrigatoriedade da educação, sendo definida pelo critério de recorte etário, de quatro a
dezessete anos, a ser implementado até 2016. Uma das justificativas para a
universalização dessa faixa etária é de que a obrigatoriedade da pré-escola pode
impactar positivamente no ensino fundamental e ensino médio (BRASIL, 2009). O
Plano Nacional de Educação, recentemente sancionado, Lei Nº. 13.005, de 25 junho de
2014, na meta 01, prevê "universalizar, até 2016, a educação infantil na pré-escola para

1
A EC Nº. 59/2009 além de definir a obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos, também prevê
a ampliação dos programas suplementares para todas as etapas da educação básica, a definição da duração
decenal do Plano Nacional de Educação, a definição de que os entes federados estabeleçam formas de
colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório, o fim da Desvinculação dos
Recursos da União (DRU) e a meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do
Produto Interno Bruto (PIB).
1517

as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade e ampliar a oferta de educação


infantil em creches de forma a atender, no mínimo, 50% (cinquenta por cento)
das crianças de até 3 (três) anos até o final da vigência deste PNE" (BRASIL, 2014). Os
debates e dispositivos em torno da obrigatoriedade na Emenda Constitucional nº59 de
2009 e nas metas estabelecidas pelo novo PNE remetem a um conjunto de concepções
acerca de qual educação infantil e quais fatores que demandam sua expansão. Diante
dos desafios em relação à implementação da Emenda, pesquisadores do campo
problematizam sobre a suposta incapacidade dos municípios de atender esse preceito
com qualidade social, os artíficios que cercam a função de justiça social da Emenda
(CAMPOS, 2010), a desconfiança de uma cisão na política de atendimento na educação
infantil, com ênfase na pré-escola em detrimento das creches (ROSEMBERG, 2009) e
ainda perpassa pelo debate sobre qualidade e quantidade como pressuposto na
consecução de uma política de atendimento à infância. Campos (2010) destaca que:

Não obstante a pertinência do debate sobre a obrigatoriedade ou não da pré-


escola, o fato é que a aprovação da Emenda Constitucional nº59, de 2009,
coloca-nos diante de vários desafios, que podem ser resumidos numa
questão: como promover a universalização da educação infantil, e não apenas
da pré-escola, tomando quantidade e qualidade como dimensões
indissociáveis e orientadoras de uma política nacional que respeite os direitos
das crianças? Isto é fundamental, posto sabermos que a expansão do acesso
por si só não expressa o quão justo é um sistema educacional. (CAMPOS,
2010, p.300)

Tais questões, sem dúvida, desafiam reflexões sobre as tensões e como se passam as
políticas processadas nas redes municipais de ensino. Nesse sentido, propomos analisar
a implementação da EC nº59/2009 nas políticas de educação infantil e seus
desdobramentos na articulação com a afirmação da qualidade socialmente referenciada,
bem como refletir os impactos da Emenda no planejamento municipal da educação
infantil e os dilemas entre qualidade e quantidade.

JUSTIFICATIVA
O debate sobre a expansão da obrigatoriedade tem como pano de fundo o projeto de
educação democrática e de massas calcada pelo republicanismo (DUBET, 2008). A
racionalidade antropocêntrica em oposição ao Estado absoluto e às explicações dos
direitos de nascença impôs e desembocou nos séculos XVIII e XIX mais do que a
concepção de educação como um direito e sim como dever do Estado e da família. A
República inaugura a concepção da educação como espaço formador de cidadãos para o
1518

cultivo dos valores das Luzes, da liberdade, igualdade de oportunidades e da


fraternidade como pertencimento a uma unidade nacional (SACRISTÁN, 2001).
No Brasil, o impacto da instauração da República não veio conjugado com os valores da
construção da cidadania moderna ou de um projeto de nação e de povo. A constituição
do Estado republicano brasileiro não teve como alicerce o confronto de segmentos
sociais dominantes e ou uma participação ativa do povo. Teve, pois, mais uma relação
de ajuste a tendências mundiais do desenvolvimento capitalista conjugada com a
formação coronelista de suas oligarquias (BRAYNER, 2008). Temos assim, a
constituição de um Estado patrimonialista com dificuldades de promoção do público e
acentuada apropriação privada (FERNANDES, 1966). Trata-se, a princípio, da
possibilidade de uma dificuldade na consolidação dos espaços públicos e privados nos
moldes preconizados pela modernidade.
Mesmo compreendendo que Dubet (2008) analisa que em 1960 o sistema de ensino
francês ainda apresentava um elitismo republicano remanescente e Florestan Fernandes
(1966) demonstra que no Brasil as relações patrimonialistas do Estado perpassam para
além da segunda metade do século XX, e talvez perdurem até hoje, é necessário refletir
que os princípios do iluminismo influenciaram o arcabouço teórico da República no
Brasil nas políticas educacionais, nos objetivos de uma educação de massas, na
necessidade de determinar a obrigatoriedade de algumas etapas, ou faixas etárias de
ensino, dentre outras medidas.
Porém, mesmo se não questionarmos os termos do projeto republicano de educação no
que concerne a obrigatoriedade, universalidade e gratuidade o que se vê é a distância
entre os direitos descritos nas constituições e a realidade de direitos ainda não
consolidados na sociedade moderna contemporânea, principalmente em países de
capitalismo dependente como o Brasil.
Ao longo do tempo a educação infantil foi se estabelecendo nesse contexto. Nas últimas
décadas teve conquistas a partir dos marcos legais, como a Constituição Federal de
1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
9394/96, dentre outras, que tratam a educação infantil como primeira etapa da educação
básica.
As vitórias legais vieram no mesmo processo que os avanços da institucionalização da
educação infantil. Esse esforço, não linear e nem simultâneo, diz mais sobre como as
políticas foram e estão sendo interpretadas e apropriadas nas esferas públicas,
municipais, estaduais e no âmbito federal. Houve uma progressiva preocupação do
1519

poder público com as formulações do campo da educação infantil, apesar de ainda ser
considerável as políticas implementadas ao largo das formulações sobre a infância.
A década de 90 foi um marco importante para a educação infantil, pois passa a ser
incorporado no campo da educação. Contudo, precisamos considerar a diversidade dos
municípios brasileiros e a falta de um Sistema Nacional de Educação consolidado, e que
ainda existem diversos desafios em torno da implementação dessas políticas (SAVIANI,
2013; CURY, 2013), como a democratização e universalização que considere a
concepção das crianças como sujeitos de direitos e produtoras de cultura
(BAZILIO;KRAMER; 2006). Rosemberg (2003) evidencia que o acesso à educação
infantil não está dissociado de uma oferta de qualidade, com infraestrutura adequada,
em espaços institucionais não domésticos, com profissionais qualificados, mas é
importante afirmar que os problemas pautados nas políticas educacionais não são
apenas de ordem técnica. De que o suposto problema da qualidade da educação não é
uma questão de problemáticas gerencialistas, mas, sobretudo, de como as demandas são
referenciadas socialmente. A qualidade da educação não existe de forma
descontextualizada, sem considerar todas as dimensões do espaço educativo. Como
evidencia Araújo e Spinassé (2012):

(...), a complexidade da educação pressupõe uma análise que não se


fixa em suas características isoladas. Enfatiza-se muito o efeito do
papel do diretor na escola, a formação de professores, o financiamento
da educação, o número de alunos em sala de aula, a questão do salário.
No entanto, a escola, como instituição social, é um organismo
complexo e nenhum desses fatores atua isoladamente. Assim, a
experiência da escola resulta de uma série de elementos
intrinsecamente articulados, associados à gestão compartilhada e às
condições concretas de seu funcionamento.
A defesa de uma educação socialmente referenciada, além de criar
uma nova forma de sociabilidade política, possibilita a configuração
de uma existência cidadã que, não obstante a pluralidade de ideias e o
jogo de interesses dos diferentes sujeitos, circunscreve-se no modo
como as questões são julgadas e problematizadas. (ARAÚJO;
SPINASSÉ, 2012).

Assim as crianças estão inseridas em um contexto social, em um espaço na sociedade de


classes, são, em determinadas situações privadas do acesso aos bens culturais e
materiais. Estão referenciadas em um lócus, uma cidade, uma localidade, participam de
uma gama de relações sociais, políticas, históricas e de poder. A educação infantil é
percebida dentro desses espaços e conjunto de sujeitos. Não está deslocada da história,
1520

da luta social, da política. Pelo contrário, marca e é marcada por essas esferas das
relações humanas.
A Emenda Constitucional nº. 59 de 2009 evidencia as tensões, desafios e demandas já
existentes no campo da educação infantil. Cabe problematizar os impactos, as práticas,
os planejamentos e concepções em torno da educação infantil a partir da implementação
da Emenda. Para isso, propomos como opção metodológica a pesquisa qualitativa, no
primeiro momento de tipo exploratória e depois a análise a partir de estudo de caso de
um município da Grande Vitória a ser selecionado pelo número de matrículas ofertadas
na educação infantil.

A GUISA DE CONCLUSÕES
Esta pesquisa tem como pressuposto que a implementação das legislações referentes à
obrigatoriedade da educação infantil são apropriadas de diversas formas pelas redes
municipais de educação e podem provocar diferentes tensionamentos sobre o sentido da
educação infantil e da infância na contemporaneidade. Com a aprovação da Emenda
Constitucional nº. 59 de 2009 e o Plano Nacional de Educação, Lei nº. 13.005, de 25 de
junho de 2014, pretende-se entrar na interioridade das questões que tratam da expansão
da educação infantil e relacioná-las com a qualidade socialmente referenciada.

REFERÊNCIAS
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socialmente referenciada. Revista Vitória: Prefeitura Municipal de Vitória. n. 2, p. 44-
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1521

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Livro, 2013. p.7-11.
1522

Pôster

Educação e pobreza: uma análise sobre o conteúdo educativo das Cartilhas do


Programa Bolsa Família (2006 - 2013)

Marcela Alvares
PUC-Campinas - CAPES
Grupo de Pesquisa: Gestão e Políticas em Educação

Resumo: Este trabalho propõe uma análise sobre o conteúdo das Cartilhas do Programa
Bolsa Família (PBF) que são voltadas aos beneficiários do mesmo no sentido de
observar quais as concepções de educação e pobreza presentes nestes materiais; se há
intenção de formar diretrizes sobre como as famílias devem educar crianças e
adolescentes para que estes superem condições de vulnerabilidade sociais e econômicas
e de que forma as Cartilhas competem para a realização dos objetivos do Programa.
Dessa forma, buscarei analisar os discursos presentes nos materiais pesquisados em
vista de gerar informações relevantes ao estudo das políticas públicas em educação, bem
como do papel destes conteúdos para a formação dos beneficiários como gestores do
bem estar de suas famílias.
Palavras-chave: Educação, pobreza e Programa Bolsa Família

Introdução e Justificativa
O Programa Bolsa Família (PBF) é uma Política de Transferência de Renda
(PTR) atrelada ao sistema de proteção social brasileiro que visa conceder um benefício
condicionado às famílias consideradas pobres ou extremamente pobres. Como toda
política pública compensatória1 o Programa tem a função de minimizar as desigualdades
socioeconômicas geradas pelas transformações socioeconômicas ocorridas nos últimos
trinta anos. (Cohn, 1995)
A transferência de renda do Bolsa Família está vinculada ao cumprimento de
condicionalidades, em que, de acordo com os formuladores do Programa, os
compromissos se justificam por promoverem o acesso a serviços básicos aos

1
Segundo Cohn (1995), as políticas públicas compensatórias visam minimizar as desigualdades oriundas
no mercado. Para a autora esse tipo de política representa o rompimento da lógica de que
desenvolvimento econômico é sinônimo de desenvolvimento social e permite, por parte das parcelas mais
pobres da população, o acesso a benefícios e serviços sociais básicos.
1523

beneficiários, tais como saúde, educação e assistência social e responsabilizar o poder


público pela oferta dos mesmos. Entre as obrigatoriedades estão: o acompanhamento do
cartão de vacinação, do crescimento e desenvolvimento de crianças menores de sete
anos de idade; acompanhamento de mulheres entre quatorze e quarenta e quatro anos,
assim como o de gestantes e nutrizes através do pré-natal; crianças e adolescentes entre
seis e quinze anos devem estar matriculadas e com frequência escolar mínima de 85%
da carga horária; adolecentes entre dezesseis e dezessete anos necessitam ter frequência
escolar mínima de 75% e crianças com até quinze anos em situação de risco ou retiradas
de trabalho infantil através do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI)
devem participar dos Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV),
com freqüência mínima de 85% da carga horária mensal. (Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Disponível em:
http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/condicionalidades. Acessado em: 21 março 2013).
Os formuladores do PBF desenvolveram, entre os anos de 2006 e 2012,
Cartilhas que visam, em primeira análise, instruir os beneficiários sobre como lidar com
esta PTR. O caráter pedagógico desses materiais revela ainda um discurso voltado a
ensinar os recebedores da renda acerca dos caminhos mais adequados para sair da
pobreza. Dessa forma, os objetos de análise dessa pesquisa serão as Cartilhas do PBF
destinadas aos beneficiários com intuito de compreender quais as concepções de
educação e pobreza presentes nesta política de transferência de renda; se há intenção de
formar diretrizes sobre como as famílias devem educar crianças e adolescentes para o
enfrentamento das situações de vulnerabilidades, tais como educação financeira e
nutricional e de que maneira os materiais voltados aos beneficiários se configuram
como instrumentos para que os objetivos do Programa sejam alcançados.
Para compreender melhor o formato de política ao qual o Bolsa Família está
inserido faz-se relevante observar o processo histórico de políticas públicas que
antecederam o Programa, bem como um aspecto debatido por Rocha (2013), ou seja, da
existência de duas experiências paralelas de transferência direta de renda: as
constitucionais, representadas pela Renda Mensal Vitalícia (RMV), que mais tarde foi
substituída pelo Benefício de Prestação Continuada (BPR), entre outras e a “nova
geração de políticas sociais”, que são condicionadas e focalizadas nos pobres, como
aquelas que culminaram com a criação do Bolsa Família. Nesse sentido Rocha (2013)
trata das dicotomias relacionadas aos dois tipos de políticas, tais como o valor do
1524

benefício concedido e público atendido e as exigências atreladas ao recebimento de cada


renda.
Desde a década de 1930 há uma busca por atender às demandas vindas da
sociedade para a criação de um sistema de proteção social e direitos sociais dos
cidadãos brasileiros, um exemplo das ações nesse sentido estavam presentes na
Constituição de 1934. RIZOTTI (2013).
Durante o Estado Novo (1937/1945), os direitos sociais sofreram algumas
limitações importantes, tal qual aquelas ligadas à educação como direito universal.
Apenas na década de 1960, com a criação do Fundo de Assistência e Previdência do
Trabalhador Rural (FUNRURAL) (1963), surge a primeira experiência desvinculada de
contribuição à Previdência Social, portanto, menos excludente.
Mesmo com os avanços concebidos a partir do FUNRURAL foi somente com a
Constituição Federal/88 que se consolidaram alguns aspectos importantes para a
construção de um novo sistema brasileiro de proteção social, como o fato de se
equiparar “(...) o status da assistência social ao das demais políticas sociais que formam
a espinha dorsal das políticas sociais: educação, saúde e previdência”. (SÁTYRO,
SOARES, 2009, p. 28).
No que tange às PTR no Brasil, as primeiras experiências estiveram ligadas à
Previdência Social, tais como o Salário Família e a Renda Mensal Vitalícia (RMV)
(1974), além destes, o governo federal concedia alguns auxílios e oferecia cestas básicas
para famílias vítimas de catástrofes (SPOSATI, 2010).
A relação de não obrigatoriedade de trabalho e contribuição para recebimento de
benefício fez parte, pela primeira vez, do desenho institucional do Benefício de
Prestação Continuada (BPC), que foi criado no âmbito da Constituição de 1988 e posto
em prática em 1996; atualmente o BPC garante, como direito, um salário mínimo
mensal – valor que é piso de todos os benefícios constitucionais - às pessoas com algum
tipo de deficiência ou com mais de sessenta e cinco anos de idade e que possuam renda
per capita inferior a um quarto de salário mínimo. O grande avanço que essa política
proporcionou, de acordo com Sátyro e Soares (2009), foi o reconhecimento da pobreza
como um risco social, pelo menos quando aliada a outros fatores, como os que tornam o
indivíduo inapto ao trabalho.
Na década de 1990 surgiram experiências de programas de transferência de
renda em nível municipal que influenciaram o desenho do atual PBF; os exemplos mais
citados em trabalhos acadêmicos, por terem sido as pioneiras no país, são as de
1525

Campinas/SP, com o Programa Garantia de Renda Mínima Familiar (1995), do Distrito


Federal/SP, denominado Programa Bolsa Educação (1996) e a experiência de Ribeirão
Preto com o Programa de Garantia de Renda Mínima Familiar (1996). (DI GIOVANI;
YASBEK; 2007)
Além das experiências em nível municipal foram criados, no âmbito federal,
durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1995 – 1998 e 1999 – 2002),
benefícios de combate à pobreza, tais como a Bolsa Escola (1997), que significou a
federalização da política criada no DF; Bolsa Alimentação (2001) e Auxílio – Gás
(2002).
Cada um dos programas mencionados dispunha de sistema cadastral
particulares, critérios de seleção e objetivos específicos, assim como eram executados
por órgãos ministeriais diferentes e tinham sua própria racionalidade. Segundo a
socióloga Amélia Cohn (2010), que compôs a primeira equipe responsável por finalizar
e implantar o PBF, foi diretora de Programas Especiais do Ministério de
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e diretora de Avaliação e
Monitoramento da Secretaria Executiva do PBF no ano de 2004, as PTR condicionadas
se encontravam, em 2003, numa situação caótica, pois, eram geridas por Ministérios
diversos e não se comunicavam; tais aspectos, além de dificultar o acesso das famílias
em situação de pobreza aos benefícios, geravam uma desigualdade em relação aos
valores de renda pagos.
A noção de que a diversidade das PTR, descritas por Cohn (2010), acarretava
problemas relevantes para o enfrentamento da pobreza era opinião predominante entre
os integrantes da gestão Lula (2003 – 2006 e 2007 - 2010). Em vista disso foi instalada,
em 2003, na Presidência da República, uma secretaria executiva a fim de unificar e
potencializar as PTR em nível federal. A partir de então foi criado, sobre o selo maior
da estratégia Fome Zero (FZ)2, o Programa Bolsa Família (PBF) cujo órgão responsável
é a Secretaria Nacional de Renda e Cidadania (SENARC), ligada ao MDS.
O período entre a implantção do FZ e a unificação de suas ações no Bolsa
Família ocorreu de janeiro de 2003 a outubro do mesmo ano; o primeiro enfrentou
diversas críticas, principalmente na área social. Um exemplo do debate que se
estabeleceu acerca das iniciativas do FZ estava atrelado ao Cartão Alimentação que, por

2O Programa Fome Zero criou uma estratégia nacional para implementar e investir recursos financeiros e
humanos em diversos programas e ações que se complementavam no sentido de acabar com a fome e a
extrema pobreza. (Aranha, 2010)
1526

ter sua renda vinculada à comprovação de gastos com alimentos, ficou fragilizado
politicamente. (Soares, 2010 apud Cotta, 2009)
Os objetivos iniciais do PBF eram: unificar o Bolsa Escola, Bolsa Alimentação,
Auxílio Gás, criados na gestão anterior ao Governo Lula, e o Cartão Alimentação,
criado no princípio de sua gestão (COHN, 2010); transferir renda diretamente às
famílias que vivem em situação de pobreza ou de extrema pobreza3; combater a situação
de vulnerabilidade econômica e a desigualdade das famílias beneficiadas através da
inserção das mesmas em outras políticas sociais voltadas principalmente à educação,
saúde e assistência social com a finalidade de quebrar o ciclo intergeracional da
pobreza.
A busca pela interrupção desse ciclo, entre gerações, está presente nas
orientações de organismos internacionais para o combate da situação de vulnerabilidade
das crianças. Em trabalho de Campos e Campos (2008), as autoras apontam que a
educação de crianças e de suas famílias é vista como elemento principal na luta contra a
pobreza. Neste sentido, a família precisa ser educada para ensinar seus filhos e auxiliá-
los a não passar pelas mesmas situações de vulnerabilidade enfrentadas por gerações
anteriores.
No sentido de compreender como o Programa visa atingir suas finalidades,
principalmente aquelas ligadas à educação, torna-se candente uma análise dos materiais
desenvolvidos para os beneficiários desta PTR, pois as Cartilhas se configuram como
um contato direto entre os gestores do Programa e os beneficiários, mostrando a estes o
que é o Bolsa Família, o quanto o mesmo é relevante na luta pelo fim da pobreza, suas
metas e condicionalidades.
Ao afirma elencar as Cartilhas como algo próximo a materiais didáticos
pretendemos apontar que a função das publicações voltadas aos beneficiários está
atrelada a pelo menos três aspectos destacados por Choppin (2004), em que são uma
referência, no sentido de ter seu conteúdo plenamente alinhado às proposições do Bolsa
Família; ser um instrumento se ensinamento das maneiras de como lidar com as
condicionalidades do mesmo e se configurar como documento relevante para a melhor
compreensão do que é o Programa.

3
A definição destes termos foi estipulada a partir das chamadas “linhas de corte” para o ingresso ao
Programa, ou seja, para ser considerado extremamente pobre ou pobre e então receber o benefício era
preciso, no ano de 2004, que a renda per capita familiar fosse de R$ 50,00 e R$ 100, 00 respectivamente.
(Sátyro; Soares, 2009)
1527

Acreditamos que esta pesquisa será relevante para auxiliar a avaliação das
políticas públicas atuais no que tange à educação não apenas de indivíduos em idade
escolar, mas também quanto à formação das famílias como instrumentos no processo de
superação da pobreza.

Objetivos
O objetivo deste trabalho é analisar os conteúdos de seis Cartilhas desenvolvidas
nos anos de 2006 e 2013, para beneficiários do Programa Bolsa Família (PBF), a fim de
identificar quais as concepções de educação e pobreza presentes nessas publicações. A
razão de utilizar tais materiais como objeto de pesquisa é que as mesmas refletem um
discurso no sentido de orientar a conduta dos beneficiários em relação à educação e
saúde de crianças e adolescentes. Dessa forma, as Cartilhas se mostram um importante
instrumento de compreensão sobre a forma como o Programa enfrenta a questão da
pobreza.
Em pesquisas bibliográficas realizadas para a construção deste Projeto foi possível
elucidar que o PBF está em consonância com algumas orientações que veem na família
o elemento principal de garantia das crianças e adolescentes à escolaridade e saída da
pobreza, em que a responsabilização dispensada a essa instituição é representada e
explicitada pelas condicionalidades e discursos presentes nos materiais desenvolvidos
para os beneficiários. Dessa forma, os objetivos específicos são:
a) Analisar qual o papel da família nos processos de enfrentamento da pobreza;

b) Qual o papel conferido à educação na busca pelo fim do ciclo intergeracional da


pobreza;

c) Compreender em que sentido as Cartilhas se configuram como um instrumento


de orientação para o bom desempenho do Programa.

Material e método
As publicações a serem analisadas neste trabalho são de domínio público e estão
disponíveis no sítio virtual do MDS ou através de solicitação, justificada, à Secretaria
Nacional de Renda e Cidadania (SENARC).
A partir da coleta de materiais desenvolvidos pelo Ministério e Secretaria
responsáveis pelo PBF, durante os meses de março e abril de dois mil e treze, foram
1528

encontrados o total de seis Cartilhas. Destes exemplares, todos são direcionados aos
beneficiários e datam do período de 2006 a 2013.
O trabalho terá caráter qualitativo, na qual será empenhada a análise de discurso
de inspiração da linha francesa, que atrela o aspecto linguístico e de teoria social que
compõe este método. Segundo Fairclough (2001), existe uma dimensão linguística e
outra social da análise de discurso. Dessa forma, o autor destaca que a abordagem
linguística mais comumente utilizada enfatiza a interação entre o falante e o receptor da
mensagem ou entre o escritor e o leitor, ou seja, destaca os processos de produção e
interpretação da fala e da escrita.
Os materiais educativos são objetos culturais com múltiplas funções e informam
valores compartilhados em uma determinada época. Considerando que as Cartilhas são
constituídas por conteúdos educativos esta pesquisa não buscará a mera descrição destes
textos como produtos acabados, mas, sim, observar-se-á o processo de produção e a
interpretação textual, analisando o período em que cada material foi publicado e o
contexto social e político de cada momento, aspectos que são caros à análise de
discurso.

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1530

Pôster

Contratados e efetivos: uma análise das práticas de acolhimento do professor no


cotidiano escolar

Margaret Jann
PPGE/UFES
Grupo de Pesquisa Infância, Educação, Sociedade e Cultura-IESC

Resumo: Este trabalho tem como objetivo investigar uma realidade pouca discutida no
contexto educacional: os processos de acolhimento dos professores e sua entrada na
Instituição de Ensino tendo como inspiração o conceito de Amor Mundi em Hannah
Arendt (2007). O foco central é analisar os sentidos e significados atribuídos aos
processos de acolhimento e compreender as relações e experiências entre professores
contratados e professores efetivos que se configuram numa escola pública de educação.
Assim, essa pesquisa estrutura-se em torno da tensão das relações que têm sido
constituídas no espaço escolar buscando desenvolver uma análise a respeito do acesso e
permanência dos professores na instituição. Para tanto pretende-se realizar um estudo
qualitativo a partir de pesquisa etnográfica.
Palavras-chave: Experiência. Trabalho docente. Modernidade.

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo investigar uma realidade pouca discutida no contexto
educacional: os processos de acolhimento dos professores e sua entrada na Instituição
de Ensino, tendo como inspiração o conceito de Amor Mundi em Hannah Arendt
(2007). O foco central é analisar os sentidos e significados atribuídos aos processos de
acolhimento e compreender as relações e experiências entre professores contratados e
professores efetivos que se configuram numa escola pública de educação. Assim essa
pesquisa estrutura-se em torno da tensão das relações que têm sido constituídas no
espaço escolar buscando desenvolver uma análise a respeito do acesso e permanência
dos professores na instituição.

Diante das tensões que se configuram na entrada do professor no campo profissional;


das expectativas em relação ao desenvolvimento do seu trabalho com uma comunidade
1531

escolar; diante de uma realidade que se mostra em geral com a presença de práticas de
acolhimento aos professores, meramente, burocráticas; diante da constituição da
racionalização na modernidade que provoca novas lógicas organizacionais e relacionais;
diante dos encontros intergeracionais entre os profissionais, observa-se a relevância da
pesquisa em investigar o acesso e a permanência dos professores nas instituições de
educação pública.

A análise que se procura desenvolver nesta pesquisa é inspirada em estudos sobre o


Amor Mundi baseado em Hannah Arendt (2007). Para a pensadora, a educação é o ato
de acolher e iniciar os jovens ao mundo, tornando-os aptos a dominar, apreciar e
transformar as tradições públicas. É neste princípio do acolhimento e da
responsabilidade introduzido pelo pensamento de Arendt, que se busca investigar a
respeito da inserção dos docentes na escola. A inquietação que surge é, se de um ponto
de vista a responsabilidade de inserir a criança/jovem ao mundo compete ao educador e
à escola, como então, se dão os processos introdutórios do professor/a na escola?

A inserção no trabalho docente em escolas públicas se dá pela via de concurso público


ou processo seletivo, processo burocrático que demanda do profissional o conhecimento
de sua área específica, da legislação da educação, da regulamentação do magistério, das
políticas educacionais ou provas de títulos, no caso dos contratados. Observa-se uma
individualização nos processos de seleção; no caso dos contratados, a demonstração de
um trabalho temporário, com vínculos em curto prazo, evidenciando um pertencimento
fragmentado com a unidade escolar. Aos efetivos cabe a apresentação da comunidade
escolar aos novos. O que é oferecido a este profissional? Quais trocas são
possibilitadas? Quais demandas são colocadas naquele contexto? Quais as primeiras
impressões destes profissionais no campo de atuação? Quais responsabilizações e qual o
nível de pertencimento com a comunidade escolar são estabelecidas?

Diante das indagações, a pesquisa vem se estruturando em torno de algumas categorias.


Uma delas é a experiência, Bondía (2002) ressalta que o sujeito moderno é portador de
uma experiência desgastada e rara devido à falta de tempo; os acontecimentos nos são
dados em forma de choque e em forma de vivência instantânea, pontual e fragmentada,
o que caracteriza o mundo moderno, impedindo, assim, as conexões significativas entre
os acontecimentos. Esta lógica na modernidade interfere, significativamente, no
1532

funcionamento e na organização da escola que vão se constituindo em seus aspectos


relacionais, em seus aspectos de temporalidade e em seus aspectos de experiências
numa realidade pouco desvelada implicada na racionalização da modernidade.

As sociedades modernas encontram-se num momento em que são obrigadas a refletir


sobre si mesmas. De acordo com Weber (2009), a modernidade é concebida como um
processo crescente de racionalização, ligado ao desenvolvimento científico, ao Estado
Burocrático; uma racionalidade que, já no início do século XX, foi observada como o
modo de agir dos indivíduos. Daí surge a necessidade de compreender como a
modernidade com seus aspectos de racionalização do tempo e das relações, e da
burocracia tem provocado outras lógicas organizacionais e relacionais nas instituições
educacionais.

Oliveira (2011) ressalta a discussão do trabalho docente se configurando com uma nova
regulação de forças no interior da escola estabelecido pelas atuais políticas educacionais
que têm atribuído a preocupação com a eficiência dos sistemas medida por meio de
resultados escolares, definindo formas de inserção, permanência e progressão na vida
profissional. A autora apresenta, também, o desenvolvimento dos sistemas escolares,
nos dois últimos séculos, a partir do paradigma do ideal de igualdade e oportunidades,
centrando-se no princípio republicano de garantir acesso a todos os cidadãos. Observa-
se a partir daí uma tensão entre os objetivos da educação formal e as demandas de novos
sujeitos sociais que adentram a escola. A tensão se estabelece quando há a perda do
modelo fundador dos sistemas escolares onde havia um saber que se impunha aos
demais. Esse saber foi sendo criticado ao longo das últimas décadas e essas críticas
contribuíram para a crise de legitimidade dos sistemas escolares e da função social da
escola, bem como, para a identidade profissional dos docentes.

METODOLOGIA

Considerando os polos de investigação para a compreensão dos processos de


acolhimento dos professores contratados e efetivos nas instituições de educação pública,
a pesquisa será constituída de um estudo etnográfico em uma escola pública municipal
no município de Cariacica/ES. Pretende-se iniciar a observação a partir do processo
seletivo divulgado pelo município no final do ano 2014, e a partir da observação iniciar
1533

aproximação e acompanhamento dos sujeitos e sua inserção na escola. A pesquisa


etnográfica é um tipo de pesquisa que permite entrar na interioridade das relações que se
estabelecem na escola para tentar entender como operam o seu dia-a-dia os mecanismos
de dominação e de resistência, de opressão e de contestação ao mesmo tempo em que
são veiculados e reelaborados conhecimentos, atitudes, valores, crenças, modos de ver e
de sentir a realidade e o mundo. (ANDRÉ. 2008, p.41).
A etnografia visa apreender a vida, tal qual ela é cotidianamente conduzida,
simbolizada e interpretada pelos atores sociais nos seus contextos de ação.
Ora, a vida é, por definição, plural nas suas manifestações, imprevisível no
seu desenvolvimento, expressa não apenas nas palavras, mas também nas
linguagens dos gestos e das formas, ambígua nos seus significados e múltipla
nas direções e sentidos porque se desdobra e percorre. (SARMENTO. 2003,
p.153).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A singularidade se revela na convivência em relação aos outros. As relações que


estabelecemos no presente, também, estão entrelaçadas com o nosso passado e dizem
respeito à nossa inserção no mundo. Pensar as relações estabelecidas na escola e refletir
os processos que vão se desencadeando devido às atuais ações políticas e devido à
racionalização na modernidade, é o que se pretende com a pesquisa. Trata-se da
necessidade de interrogar os sujeitos a respeito da produção de sentidos e significados
estabelecidos no ambiente escolar: a escola apresenta-se como um ambiente que
estabelece relações de construção de histórias ou apenas constitui-se em um espaço de
treinamento profissional? Essas realidades deverão ser investigadas no sentido de
explorar as compreensões e as relações estabelecidas entre os profissionais.

Nesse sentido, buscaremos explorar as categorias experiência, Amor Mundi, Trabalho


Docente e Racionalização na Modernidade no intuito de tensionar os sentidos e
significados atribuídos aos mecanismos relacionais entre o sistema educacional, as
instituições e os professores no processo de acesso e permanência dos professores na
escola, considerando as diferentes lógicas organizacionais e relacionais, sobretudo com
a racionalização na modernidade.
1534

REFERÊNCIAS

ANDRE, Marli E. D. A. Etnografia da prática escolar. Campinas, SP. Papiros. 14ª


Ed. 2008.

ARENDT, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro. Editora Forense


Universitária. 10ª Ed. 2007.

BONDÍA, Jorge L. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. 2002.


Disponível em:< http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n19/n19a02.pdf> Acesso em: 11 jul.
2014.

OLIVEIRA, Dalila A. A nova regulação de forças no interior da escola: carreira,


formação e avaliação docente. 2011. Disponível
em<http://seer.ufrgs.br/rbpae/article/view/19917> Acesso em: 30 jul.2014.

SARMENTO, Manuel J. O estudo de caso etnográfico na educação. In ZAGO, N. et


al (Orgs). Itinerários de pesquisa: perspectivas qualitativas em sociologia da educação.
Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

WEBER, Max. Economia e sociedade: Fundamentos da sociologia compreensiva. 4ª


Edição. Brasília: Editoria Universidade de Brasília. 2009.

.
1535

Pôster

O professor de geografia e sua formação

Maria Angélica Nastri de Carvalho


Universidade Católica de Santos - UNISANTOS
Grupo de Pesquisa: Instituições de ensino: políticas e práticas pedagógicas
Fonte de Financiamento: SEE/SP

Resumo: Esse trabalho apresenta os resultados preliminares de três entrevistas feitas


com professores de Geografia, que através de suas memórias relembram sua formação
acadêmica e, principalmente, sua preparação para a docência Tem como objetivo
compreender aspectos fundamentais como o da escolha profissional, sua formação
inicial e continuada. Fundamentando-se na Teoria das Representações Sociais/TRS
(MOSCOVICI, 2012) e na técnica da análise de conteúdo (BARDIN, 2007),
destacaram-se quatro categorias de análise: 1ª escolha profissional; 2ª formação de
professor; 3ª aulas de Prática de Ensino em Geografia; e 4ª formação continuada. Os
resultados preliminares apontam para questões importantes sobre a formação desses
professores, tais como: a disciplina de Prática de Ensino pouco contribui para a
formação profissional; a formação se desenvolve dentro das salas de aula; acontece em
paralelo às necessidades do campo profissional; e continua ocorrendo sem a
interferência do poder público.
Palavras-chave: Geografia; Formação de Professores de Geografia; Formação
Continuada.

Introdução
Antes de lermos a palavra temos que ler o mundo. (FREIRE,
ano, p. )

Este texto tem por objetivo entender a importância da disciplina Geografia e da


formação do professor nesta área. Para tanto aborda os resultados preliminares de dados
coletados junto a três professores dessa disciplina.
A presente produção é parte de uma pesquisa que intenciona discutir quais são as
percepções do professor de Geografia sobre sua formação acadêmica e como formulam
1536

suas noções a respeito das representações de sua realidade profissional. Nessa etapa
foram feitas entrevistas, com professores que se encontram próximos da aposentadoria,
buscando entender como o cotidiano escolar interfere na sua formação e como esses
professores, descrevem suas experiências.
O estudo em questão, portanto, faz parte de um trabalho maior, de abordagem
qualitativa, conforme anunciam Lüdke e André (1986) e Bogdan e Biklen (1994), e se
utiliza, também, da análise de conteúdo (BARDIN, 2007; FRANCO, 2012). Este estudo
se fundamenta teórico-metodologicamente, ainda, na Teoria das Representações
Sociais/TRS (MOSCOVICI, 2012).
O texto está dividido em quatro partes. Inicia-se com a discussão a respeito da
importância da disciplina de Geografia e da formação de professores de Geografia
atualmente. Na segunda parte, são abordados os referenciais teóricos e os
procedimentos metodológicos da pesquisa, mostrando a importância da análise de
conteúdo (BARDIN, 2007; FRANCO, 2012) e das representações sociais
(MOSCOVICI, 2012). Na terceira parte será feita a análise dos dados e esclarecidos
alguns dos resultados da pesquisa e, por fim, as considerações finais.

A geografia como disciplina e os professores de Geografia


A Geografia é uma disciplina muito importante para a formação do aluno, pois
desenvolve no aluno o senso de espacialidade e permite que este compreenda e se
posicione a respeito do mundo em que vivemos. Só com o conhecimento do mundo o
aluno pode tornar-se um agente de mudanças. A importância da disciplina é destacada,
por exemplo, por Pontuscha (2009, p. 38):
A geografia como disciplina escolar oferece sua contribuição para que alunos
e professores enriqueçam suas representações sociais e seu conhecimento
sobre as múltiplas dimensões da realidade social, natural e histórica,
entendendo melhor o mundo em seu processo ininterrupto de transformação,
o momento atual da chamada mundialização da economia.

Callai (2012) também ressalta a importância de se desenvolver um pensamento


espacial nos alunos para que estes possam compreender o mundo, revelando o que
segue: “Entendo que a Geografia escolar deve desenvolver um pensamento espacial que
se traduz em: olhar para compreender a nossa história e a nossa vida. Este olhar o
mundo diz da especificidade de nossa disciplina.” (p.17).
Porém, a disciplina Geografia tem sido negligenciada nas escolas e, ao invés de
contribuir para a formação do aluno e para a compreensão de mundo, o que se vê é uma
1537

disciplina repetitiva, pouco atrativa, que tem reproduzido o pensamento de uma classe
dominante e que usa como instrumento de ensino basicamente os livros didáticos.
A desvalorização da disciplina está relacionada à desvalorização do magistério, e
este, por sua vez, a dois fatores, como revelam autor Antes de lermos a palavra temos
que ler o mundo. Pontuschka, 2009 e Callai, 2013.
I) A questão da centralização e da descentralização das diretrizes
curriculares do Brasil; a decisão do que ensinar e como ensinar não
cabe mais às escolas e aos professores. Essa decisão foi, aos poucos,
distanciando-se das escolas de e das próprias universidades,
II) O segundo fator está ligado à questão da formação do professor a qual
é ainda mais grave e, por esse motivo, objeto deste artigo, que busca
por denunciar a existência uma política fraca de formação do professor,
inferior à formação de um pesquisador de Geografia.
Os professores foram paulatinamente perdendo a capacidade de interferir na sua
formação inicial e continuada, conforme indica Pontuschka (2009,p.89): “Os
professores, via de regra, são vistos como profissionais despreparados, sem capacidade
de gerir autonomamente os próprios saberes”.
A formação dos docentes não é prioridade nas políticas educacionais do Brasil,
de certa forma, o Estado assume a incapacidade do professor de se formar e de
regulamentar sua profissão. As faculdades de Geografia estão baseadas na organização
curricular, que prevê três anos de bacharelado, em que são contempladas disciplinas
técnico-científicas e um ano de disciplinas da licenciatura, didático-pedagógicas,
conhecido como o modelo 3+1. Os cursos de Geografia das universidades públicas dão
ênfase à formação de pesquisadores, enquanto a formação dos professores é feita
essencialmente em universidades e faculdades particulares. Instituições estas que tinham
a formação inicial em licenciatura curta e foram se adaptando à licenciatura plena, como
anuncia Callai (2013, p. 116):
Em geral, esses cursos passaram por um processo inverso ao daqueles cursos,
caracterizados anteriormente, tendo sua base nas Licenciaturas curtas, para a
formação do professor de Estudos Sociais, em que o professor saía habilitado
em História, Geografia, isto é, em Estudos Sociais, para Primeiro Grau. Da
Licenciatura curta passaram à plena e, em alguns casos, criou-se também o
Bacharelado, mas a ênfase é dada à formação de um professor para professor
de Primeiro e Segundo Graus (atualmente ensino fundamental e médio).

Do referencial teórico aos procedimentos metodológicos


1538

A teoria das Representações Sociais, do escritor romeno/francês Serge


Moscovici (2012), é muito importante na compreensão dos mais variados objetos e na
produção do conhecimento, especialmente nas ciências sociais, pois ela tenta entender
os sujeitos dentro de seu contexto social. E, neste sentido, é preciso entender o conceito
de representação social, que, segundo o autor, “é uma modalidade de conhecimento
particular, tendo a função de elaboração dos comportamentos e da comunicação entre os
indivíduos” (p.27).
A análise de conteúdo (BARDIN, 2007; FRANCO, 2012) é uma técnica que se
preocupa com as mensagens, e que está articulada às condições contextuais de seus
produtores. Segundo Franco (2012, p. 13):
(...) a análise de conteúdo assenta-se nos pressupostos de uma concepção
crítica e dinâmica da linguagem. “A linguagem aqui entendida como uma
construção real de toda sociedade e como expressão da existência humana
que, em diferentes momentos históricos, elabora e desenvolve representações
sociais na sua forma de falar”. Essas representações são dinâmicas e
interacionais, conforme anuncia.

Usando como referencial teórico-metodológico a teoria das representações


sociais/TRS (MOSCOVICI, 2012) e a análise de conteúdo (BARDIN, 2007; FRANCO,
2012), foram realizadas três entrevistas com professores de Geografia, com enfoque na
sua formação inicial. Os professores escolhidos para entrevista têm grande experiência
profissional e estão próximos à aposentadoria, buscando, nos relatos, as memórias da
formação e dos primeiros anos de profissão.
A entrevista tinha uma primeira parte com questões fechadas, com destaque para
o perfil do entrevistado: idade, formação, experiências profissionais. A segunda parte,
composta por questões abertas, tais como: por que decidiu ensinar Geografia? Quais
pontos positivos e negativos levantaria em seu curso de formação? Quando terminou o
curso, sentia-se preparado para entrar numa sala de aula? E como continuou a sua
formação?
Para a terceira parte, introduzida para melhorar o nível da informação, optou-se
por questões mais diretas, tais como: como era sua aula de prática de ensino? Como
aprendeu a dar aulas? Conte uma boa e uma má experiência do início da carreira.
Como se trata de uma etapa inicial de uma pesquisa mais ampla, feitas as
entrevistas, passamos para as análises preliminares dos resultados, focando, nessa etapa,
a classificação das categorias de análise, separamos quatro: a escolha da profissão de
professor; pontos positivos e negativos da formação acadêmica; a disciplina de Prática
de Ensino de Geografia; e, finalmente, a formação continuada.
1539

Da análise aos resultados

Os primeiros resultados da pesquisa nos possibilitaram categorizar os seguintes


pontos:

1- A escolha da profissão e da disciplina:


A escolha pela profissão de professor é bastante difícil e hoje é um dos problemas
fundamentais da educação compreender como atrair os jovens para uma profissão tão
desprestigiada. Para Saviani (2011, p. 8), essa é uma questão controvertida, pois:
(...) o problema da qualidade do ensino, a formação de professores se
converteu, atualmente, numa das questões mais controvertidas e de maior
visibilidade, uma vez que os professores e as instituições formadoras tendem
a ser apontados como vilões pelas autoridades educacionais assim como por
diversas modalidades de intelectuais influentes na mídia.

Sobre a questão da escolha profissional, dois entrevistados afirmaram que


escolheram Geografia como primeira opção: um, porque queria conhecer o mundo; e
outro por influência externa. A terceira entrevistada tinha Geografia como segunda
opção, mas acabou se “encontrando na disciplina”.

2- Pontos positivos e negativos da formação:


Os entrevistados levantaram pontos diferentes. Uma delas destacou a qualidade
da faculdade, com boas aulas, outro destacou a vontade que ele tinha de estudar, e outra
que se trata de uma disciplina dinâmica que trabalha com o dia-a-dia. O ponto que se
repete nos três entrevistados como positivo é o trabalho de campo e estudos do meio,
como uma ferramenta muito importante da geografia.
O estudo de geografia pressupõe trabalhos de campo, como revelam Rodrigues e
Octaviano (2001, p. 35): “compreender e analisar o espaço geográfico e a dinâmica de
sua organização por meio do trabalho de campo”.
Os pontos negativos que se destacaram foram: a densidade de curso era fraca;
nas aulas só se trabalhavam com texto; havia professores desinteressados; o curso não
tinha estrutura boa, por haver restrição de tempo; e faltou estudar geografia física.
Muitas faculdades pensam que o professor de Geografia não precisa dominar
todo o conteúdo da matéria. Precisa, sim, saber dar aulas. Mas, para Callai (2013), essa
é uma visão antiga que precisa ser combatida:
É muito claro, entretanto, que no caso do professor está superada aquela
proposição de que este não precisava dominar o conhecimento próprio da
Geografia, na suposição equivocada de que o mais importante era a forma de
1540

ensinar. Hoje a ideia é de aquele que vai ser professor precisa saber de
Geografia tanto quanto aquele que será técnico ou bacharel, e mais, que afora
saber da Geografia precisa saber do ensinar Geografia. (CALLAI, 2013,
p.16)

3-Prática de Ensino em Geografia:


Em relação à disciplina de Prática de Ensino em Geografia, obrigatória para
todas as licenciaturas e que deveria fornecer subsídios para que o professor enfrentasse
a sala de aula, os entrevistados relatam as seguintes memórias: “As aulas de prática
eram muito teóricas e só usavam textos”; “aulas muito boas"; "a professora ensinava
postura e como se vestir, mas não ensinou a usar a lousa ou outros métodos didáticos”.
Dois professores relatam que não fizeram o estágio obrigatório da disciplina, pois
acabaram sendo contratados na escola para dar aulas e um professor “assinou” o estágio.
A terceira entrevistada fez estágio, mas dava aulas ao mesmo tempo. Um ponto em
comum das três entrevistas é que os professores começaram a vida profissional, dando
aulas e não cumpriram a etapa de estágio supervisionado completo.
Abdalla (2006) se refere à escola como espaço de formação do professor,
quando afirma que: “à escola como espaço de ser e estar do professor. É o locus da ação
e da formação do professor, em que os professores constroem o sentido de sua
profissão” (p.67).

4- A formação continuada:
Outro ponto levantado nas entrevistas refere-se à questão da formação
continuada, que ocorreu conforme as oportunidades apareciam, não havendo uma
política oficial de capacitação e de formação continuada.
Os entrevistados foram fazendo “todos os cursos que apareciam”, na Diretoria
de Ensino, pela prefeitura e promovidos pelas escolas particulares, entre outros. Só um
dos entrevistados fez curso de especialização.
É fato que a formação de professores não é suficiente e também não recebe a
devida atenção por parte dos governantes. Como nos diz Saviani (2011, p. 10):
Ao fim e ao cabo, o que se revela permanente é a precariedade das políticas
formativas, cujas sucessivas mudanças não lograram estabelecer um padrão
minimamente consistente de preparação docente para fazer face aos
problemas enfrentados pela educação escolar em nosso país.
1541

Considerações Finais
O ponto em comum das três entrevistas é que os professores percebem que a
formação acadêmica é insuficiente e que na realidade a preparação para dar aulas
acontece na prática. Os professores entrevistados reconhecem, portanto, que a formação
principal aconteceu no ambiente escolar, conforme afirma Abdalla (2006), quando
destaca que a escola é o lugar onde os professores aprendem a dar aulas.
A escola, nesse contexto, adquire um papel fundamental na formação dos
docentes enquanto campo de saber científico, pedagógico, cultural e político-social
(ABDALLA, 2006).
Percebemos, ainda, que todos os professores entrevistados também reconhecem
que a profissão docente envolve muitos desafios, principalmente no início da carreira,
quando eles se sentem menos preparados e mais desafiados. Os docentes entrevistados
relatam essas dificuldades e desafios do início da carreira e do momento atual que
vivem. O primeiro entrevistado, por exemplo, afirma que não faria a carreira docente
novamente. Os outros afirmam que fariam, mas ressaltam que não é uma carreira fácil.
A busca pela formação contínua, por meio de cursos, de trabalhos e de
especialização também é muito importante para todos os entrevistados. Cada um seguiu
um caminho próprio para sua formação, buscando em cursos ou na prática a melhora e
sua atualização.
Apesar da reconhecida importância do professor de Geografia, a formação
inicial e contínua não tem sido realizada de forma efetiva pelas instituições. Por outro
lado, os baixos salários não permitem, também, que os professores busquem se atualizar
e melhorar sua prática.

Referências

ABDALLA, M. F. B. O Senso Prático de Ser e Estar na Profissão. São Paulo: Cortez,


2006.

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2007.

BOGDAN, R. BIKLEN, S. K. Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto


Editora, 1994.

CALLAI, H. C. A Formação do profissional da geografia: o professor. Ijuí: Ed.


Unijuí, 2013.

FRANCO, M. L. P. B. Análise de conteúdo. 4ª ed. Brasília: Líber Livro, 2012.


1542

LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas.


São Paulo: EPU, 1986.

MENDONÇA, S.; MENDONÇA, M. A formação do professor de geografia: uma tarefa


para pedagogos? Geografia: Ensino & Pesquisa, Santa Maria, v13, n.2 p.416-422,
2009.

MOSCOVICI, S. A Psicanálise, sua imagem e seu público. Trad. Sonia Fuhrmann.


Petrópolis: Editora Vozes, 2012.

NÓVOA, A. (Coord.). Os professores e sua formação. Porto: Porto Editora, 1995.

PONTUSCHKA, N. N., PAGANELLI, T. I.; CACETE, N.H.. Para ensinar e


aprender Geografia. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 2009.

RODRIGUES, A.B; OTAVIANO, C. A. Guia Metodológico do Trabalho de Campo de


Geografia. Geografia, Santa Catarina, v.10, v.1 p.35-43, jan/jun,2001. Nome da cidade

SAVIANI, D. Formação de professores no Brasil: dilemas e perspectivas. Poiesis


Pedagógica, UFG, Catalão, v 9, n.1, p. 07-19, jan/jun 2011.
1543

Pôster

Narrativas Infantis: Algumas Reflexões Das Crianças Sobre A Escola Na


Contemporaneidade

1
Maria de Belém Brandão Andrade Ferreira
UNICID

Resumo: Esta pesquisa tem como objetivo investigar os sentidos construídos por
crianças do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental de uma Escola da Rede Municipal de
Ensino de Laranjal do Jarí/AP para as experiências vividas na Escola. A pesquisa é de
cunho qualitativo e aborda a narrativa de criança. Para recolha das narrativas serão
utilizadas rodas de conversa com no máximo 05 crianças e no mínimo 03, distribuídas
por faixa etária: Grupo – 1: crianças de seis anos e a sete anos; Grupos – 2: crianças oito
a dez anos.Quanto à forma de desencadear a conversa, serão utilizados
mediadores:bonecos,desenhos,fotografias,historias que estimule as crianças a narrar
suas experiências.As narrativas infantis serão gravadas em áudio e vídeo e
posteriormente transcritas. Para análise dos dados serão mapeados os temas
identificados por meio da leitura das transcrições procurando compreender como eles
evoluem nos dois grupos, levando em consideração questões relativos às narrativas
infantis, o que as crianças pensam sobre a escola.
Palavra Chave: Criança, experiência, narração, investigar, construir, interação.

INTRODUÇÃO
Os interesses que fizeram nascer essa pesquisa e, naturalmente, o tema a ser
estudado enraízam-se em minha trajetória de vida pessoal, profissional e acadêmica.
Segundo (Josso, 2004, p. 24).

Ao resgatar a minha história de vida, tenho a expectativa de que essa


trajetória possa fundamentar coerentemente meu pensar como educadora e
minha prática como gestora. Entendo que esse caminho implica buscar,
recordar momentos positivos e negativos, alegres e tristes, em um processo

1
Aluna bolsista pela CAPES – PROSUP Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de
Ensino Particulares.
1544

árduo de ir ao passado com o pensar e o olhar de hoje, em um exercício


constante de reflexão, que visa a formação do sujeito aprendente.

Para Dubar (2005) “Somos a história que contamos a nosso respeito” e contar a
minha história se faz necessário nesse momento em que inicio minha dissertação de
mestrado.
Quando penso em minha vida, volto à infância e resgato a escola, sensações de
alegria vêm à tona. Felicidade, alegria invadem minha mente e provocam emoções.
Lembranças de fatos marcantes surgem como flashes a cada segundo. A sensação de ter
vivido sonhos, conhecido pessoas que dirigiram meus passos, apresentaram-me um
novo caminho e fizeram-me acreditar num futuro possível. Constato que a
oportunidade de ter frequentado a escola é um privilégio e uma conquista.
Tive momentos marcantes em minha infância, entre eles a saída da cidade onde
nasci Belém do Pará e a ida para um pequeno lugarejo chamado “Laranjal do Jarí”
localizado ao sul do Estado do Amapá. Essa experiência me remete aos primeiros anos
de ensino, lutava para chegar à escola que simbolizava uma esperança de sobrevivência
para uma pequena criança vinda de uma família de pais semianalfabetos. Atravessava o
rio Jarí de canoa, subia morros, mas, ao final, sabia que encontraria professores
divertidos, livros, histórias contadas pela tia Lú, recreio, merenda, corredores largos
onde corria à solta. Passei minha infância e adolescência nessa escola e quando tive que
optar por uma profissão, influenciada por uma colega, escolhi o Magistério e penso que
essa foi uma das melhores escolhas que fiz na minha vida, até hoje colho os frutos dessa
opção. No antigo ensino regido pela Lei 5.692/71 iniciei o Magistério, destinado à
formação de professores para atuar na antiga 1ª à 4ª série e na pré-escola, assim que
concluir, passei em um concurso Público da Rede Estadual de Educação.
A primeira escola que atuei foi a Escola Estadual Emílio Médici em um bairro
Periférico que atendia uma clientela bem diversificada de crianças, filhos de lavadeiras,
meretrizes, cafetões, donas de casa, comerciantes, barqueiros e filhos dos funcionários
que trabalhavam no Projeto Jarí. A diversidade era uma das marcas da escola, também
influenciada pelas idas e vindas de alunos, quando os operários eram desligados do
Projeto Jari, ficavam por algum tempo na cidade e logo partiam de volta para suas
cidades de origem, levando consigo as crianças, restando apenas a saudade. Até hoje, a
cidade é influenciada por esse transito de pessoas, quando se pensa que as crianças estão
ambientadas na escola, seus pais já estão partindo novamente.
1545

Sentia necessidade de continuar meus estudos, mas sempre deixava para mais
tarde, no entanto quando chegou uma Proposta da Secretaria de Educação do Estado do
Amapá dizendo que todos os professores do quadro efetivo que tivessem apenas o
Magistério teriam que cursar Pedagogia e para isso deveriam prestar vestibular pela
Universidade Federal do Amapá, percebi que não dava mais para esperar.
O curso foi muito interessante, professores, autores, as disciplinas que
compunham o curso, o ambiente favorecia a aprendizagem e mais uma vez acreditei ter
feito a opção certa quando decidi ser professora. Algum tempo depois cursei a pós-
graduação em Gestão Escolar e Coordenação Pedagógica. Fui convidada a assumir um
Cargo Comissionado de Gestora em uma Escola de periferia. Ao assumir, muito me
entristeci ao ver o estado daquela Escola esquecida sem vida, onde as alunos pareciam
não ter sonhos e nem esperanças. Coloquei a mão na massa e meu objetivo passou a se
aproximar essa escola da que tive na infância, queria que a escola que estava dirigindo
abrisse janelas para o futuro dessas crianças, como a minha tinha aberto, por meio de
um trabalho digno por parte de alunos e professores.
O começo não foi nada tranquilo. Os alunos e professores resistiam a um
trabalho fora dos padrões aos quais estava acostumado. Busquei novas parcerias que
incluíssem as famílias, a sociedade local, o Governo do Estado, envolvendo para isso
todos os setores da Escola. Após a realização dessas parcerias, passei há conhecer um
pouco mais as histórias dos membros da escola e teve início uma nova fase: estratégias
pedagógicas foram sendo elaboradas e propostas ao grupo, sem perder de vista aspectos
importantes decorrentes dos relatos de vida aos quais tive acesso.
Ao ingressar no Mestrado fui estimulada a narrar minhas lembranças da escola e
de vida e percebi que, ao fazer isso, fui me apropriando de minhas experiências
articulando-as e construindo sentidos para elas. Lembrei que na ocasião que dirigia a
escola havia solicitado aos alunos que desenhassem e escrevessem cartinhas para a nova
escola e muito me surpreenderam os desenhos e narrativas feitas por eles e percebi que
eles puderam falar das experiências vividas no processo de reconstrução da escola.
Dessa forma, me aproximei de um projeto de pesquisa que integra diversos
projetos: “Narrativas infantis: o que contam as crianças sobre as escola da infância?”
(MCTI/CNPq/MEC/CAPES 07/2011 – coordenado por Maria da Conceição Passeggi,
que articula pesquisadores de diversas regiões e universidades do pais (UFRN,
UNICID, UNIFESP, UFF, UFRS, UFRR). Esse projeto, por sua vez, integra um projeto
internacional, coordenado por Martine Lani-Bayle, na França, cujo objetivo é colocar
1546

em diálogo as representações construídas, narrativamente, por crianças de 04 a 10 anos


de idade acerca das escolas da infância, em diferentes culturas. Parte-se do pressuposto
que as crianças são capazes de refletir sobre suas experienciais e dessa forma contribuir
para a pesquisa educacional. Ao narrar, elas significam e resinificam as escolas de
infância, mostrando novas possibilidades de ver e compreender as mesmas.
Sarmento (2005) tem se dedicado à investigação das culturas infantis e
considera que as crianças são capazes de construir cultura o que implica não se
apropriar passivamente da cultura dos adultos, mas em construir sentidos próprios para
as experiências vividas. Bauer e Gaskell (2013) salientam que as crianças por meio ao
narrar são capazes de expressar as experiências vividas e os sentidos dados a elas
Dessa forma, optei por participar desse projeto propondo uma pesquisa cujo
objetivo é investigar os sentidos construídos por crianças do 1ª ao 5ª ano do Ensino
Fundamental de uma escola da Rede Municipal de Ensino de Laranjal do Jarí para as
experiências vividas na escola

Traçado Metodológico

A pesquisa é de cunho qualitativo e tem como procedimento de recolha de


dados: a análise de documentos, a observação e a recolha de narrativas infantis. O
cenário O cenário da pesquisa é uma escola da Rede Pública Municipal de Laranjal do
Jarí/Amapá.É importante salientar que para pesquisar crianças é de suma importância
estar atento para a sua diversidade sociocultural. (SARMENTO, 2005) Quem são essas
crianças que estamos pesquisando? Quais as condições sociais em que vivem? Qual a
classe social, etnia, raça a que pertencem, o gênero, a região onde vivem? Para
Sarmento (2005, p. 369) “os diferentes espaços estruturais diferenciam profundamente
as crianças”. Nessa perspectiva inicialmente será investigado o contexto no qual será
realizada a pesquisa com base a observação e na análise de documentos.
No que se refere à narrativa cabe destacar que segundo Passeggi et al (2014, p
88)
Do ponto de vista textual, a narrativa é concebida como uma sequência
singular de eventos, estados mentais, ocorrências, envolvendo seres humanos
como personagens da ação. Cada elemento constitutivo da narrativa adquire
sentido a partir do lugar que os personagens ocupam em suas relações com
quem o escuta ou lê.
1547

Nessa perspectiva, as narrativas são formas discursivas que possibilitam


estruturar as experienciais do mundo e de si mesmo por meio das quais se organiza o se
significa as referências experienciais.Bauer (2013, p.91), por sua vez referem-se à
importância das narrativas salientando que:
Através das narrativas, as pessoas lembram o que aconteceu, colocando a
experiência em uma sequência, encontram possíveis explicações para isso, e
jogam com a cadeia de acontecimentos que constroem a vida individual e
social. Contar história implica estados intencionais que aliviam, ou ao menos
tornam familiares, acontecimentos e sentimentos que confrontam a vida
cotidiana normal.

Os sujeitos de pesquisa são crianças de 6 a 10 anos que frequentam os anos


iniciais do Ensino Fundamental (1ª ao 5ª Ano). Para a recolha das narrativas serão
realizadas rodas de conversas com no máximo 05 crianças e no mínimo 03, distribuídas
por faixa etária: Grupo – 1: crianças de seis e sete anos; Grupo- 2 crianças oito a dez
anos. Quanto à forma de desencadear a conversar, serão utilizados mediadores para a
construção narrativa: bonecos, desenhos, fotografias, histórias que estimulem as
crianças a narrar suas experiências. As narrativas serão gravadas em áudio e vídeo e
posteriormente transcritas para análise dos dados. Para análise dos dados pretendemos
no apoiar nos autores de referência que nos alertam para a importância do pesquisador
ser um mediador entre o sujeito de pesquisa e o leitor da pesquisa no sentido de permitir
a visão de mundo de quem se expressa. Para isso serão mapeados os temas identificados
por meio da leitura das transcrições procurando compreender como eles evolem nos
dois grupos pesquisados.

Considerações Finais

Para a fundamentação desse trabalho considerei importante dialogar com autores


que pesquisam questões relativas às narrativas infantis, o que as crianças pensam sobre
a escola. Partindo da afirmação de que a narrativa de criança pode abrir possibilidade
de olhar para olhar a escola de outro lugar.
No que concerne às narrativas infantis alguns autores argumentam, quando a
criança constrói suas narrativas dentro do seu contexto social, elas expressão suas
atitudes individuais, organizando suas experienciais e relembram histórias que fazem
sentido para elas.
O que aqui se visibiliza neste processo é que as crianças são competentes e tem
capacidade de formularem interpretações da sociedade, dos outros e de si próprio, da
1548

natureza, dos pensamentos e dos sentimentos e ao fazerem isso podemos contribuir para
ampliação da compreensão dos processos educativos de o fazerem de modo distinto e de
o usarem para lidarem com tudo o que as rodeia.

Referências

BAUER, M.W. GASKELL, G. (orgs) Pesquisa Qualitativa com texto, imagem e som;
Um manual prático. 11 ed.Petropolis, RJ: Vozes, 2013.

DUBAR, Claude. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais.


São Paulo: Martins Fontes, 2005.

JOSSO, M.C. Experienciais de vida e formação. São Paulo. Cortez, 2004.


PASSEGGI, M. C. F. B. S., FURLANETTO, E. C., DE CONTI, L., CHAVES, I. M.,
GOMES, M. O., GABRIEL. G. L., ROCHA, S. M. Narrativas de crianças sobre as
escolas da infâncias: cenários e desafios da pesquisa (auto) biográfico. Educação
(Santa Maria. Online), v.39, p. 85 – 104, 2014.

SARMENTO, Manuel Jacinto. Gerações e Alteridade: Interrogações a partir da


Sociologia da Infância. Educação & Sociedade. (Dossiê Temático Sociologia da
Infância: Pesquisa com Crianças). CEDES-Brasil, Vol.26, nº91: 361- 362
Maio/Ago.2005. Disponível em:< http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: jun
2014.
1549

Pôster

A dimensão da educação estética nos processos (auto) formativos no curso de


pedagogia: um estudo sobre o lugar das narrativas discentes.

Maria Lucinalva da Silva


Programa de Mestrado em Educação,
Universidade Cidade de São Paulo - Unicid
Linha de Pesquisa– Sujeitos, Formação e Aprendizagem.

Resumo: O presente estudo ainda em processo de andamento, busca compreender


através dos conceitos da Educação Estética e da Psicanálise, a complexidade do(s)
fenômeno(s) que ocorrem nos processos formativos de alunos da graduação do primeiro
semestre do curso de Pedagogia de uma Universidade em São Paulo. Fazer um recorte a
partir de observações e leituras de narrativas, de vida pessoal (auto) biografia e
formativa dentro e fora da escola, utilizando o dispositivo “Colcha de retalhos”,
desenvolvido por Berkenbrock-Rosito (2010). Nesta perspectiva, o objetivo deste
estudo é analisar e compreender as narrativas para identificar o lugar de onde fala este
sujeito discente no processo de construção de sua história, se de autoria ou de submissão
em seu percurso formativo dentro e fora da escola. Justifica-se o estudo pela
necessidade de revelar o lugar da dimensão estética presente nos processos formativos
de alunos do curso de Pedagogia. Para realização dessa pesquisa, assumiu-se como
metodologia uma abordagem qualitativa e como procedimento de coleta de dados a
análise documental das narrativas escritas e observação do processo de construção a
partir do já citado dispositivo. Neste trabalho, recorre-se aos conceitos de autonomia e
de emancipação, respectivamente, em Freire (2011) e em Adorno (1986). Igualmente
relevante é a questão voltada à compreensão do processo formativo na perspectiva de
Schiller (2013), com o entendimento a respeito do lugar da Educação Estética,
envolvida entre o racional e o sensível, como um jogo lúdico, que abarca a arte como
dimensão da estética nos processos formativos. A dimensão do inconsciente também
carece ser abordada para melhor entendimento global do processo, considerando aqui os
conceitos de inconsciente e discurso, desenvolvidos por Freud e Lacan (1986).
Palavras-chave: Educação Estética; Colcha de retalhos; Processo Formativo Discente.
1550

INTRODUÇÃO

Este estudo propõe caminhar entre os campos da Educação Estética e da


Psicanálise como possibilidade para compreender a complexidade do(s) fenômeno(s)
que ocorrem nos processos formativos de alunos do primeiro semestre do curso de
Pedagogia em uma Universidade em São Paulo, fazendo um recorte a partir de
observação e leitura de narrativas de vida pessoal (auto) biografia e formativa, dentro e
fora da escola.
O interesse pelo estudo emergiu a partir de minha experiência na Colcha de
Retalhos como aluna ouvinte no Programa de Mestrado em Educação, na Universidade
Cidade de São Paulo, diante do exposto, deflagrou o interesse por compreender este
processo de pesquisa e formação, realizado também na graduação, no curso de
Pedagogia.
Há uma inquietação a respeito da possível compreensão sobre a complexidade
do fenômeno educativo e dos processos formativos. Uma pergunta persegue a todo
tempo e faz eco no outro, a respeito de qual lugar ocupa um profissional que sempre
atuou na saúde buscar novos conhecimentos na educação: para quem fala este
profissional e o que busca enquanto discente em um Programa de Mestrado em
Educação?
Diante da inquietação encontra resposta quando este sujeito busca um sentido
que o remete ao seu desejo, e na compreensão da estética diante deste novo lugar frente
a uma escolha, que se dá por via da escuta do discurso, encontrado em narrativas (auto)
biográficas e em sua prática profissional. É revelado então, um desejo em contribuir
através da experiência e dos saberes da psicanálise para a educação no sentido de
procurar identificar no outro, (alunos) do curso de Pedagogia, a relação das narrativas
com o processo formativo, como ou em que via estética se dá este processo também
particular e singular.
A fim de responder a estas questões remetemo-nos à dimensão estética nos
processos formativos pelas narrativas discentes partir dos referenciais teóricos de Paulo
Freire, com o conceito de educação libertadora que se opõe ao conceito de educação
bancária. Contamos também com o conhecimento a respeito de produção e reprodução
da cultura educacional, como condições do sujeito responder de forma passiva e ativa a
um modelo cultural pré-estabelecido, tão desenvolvido por Adorno. Além disso,
1551

encontra-se em Schiller com o conceito de Educação Estética, a contribuição para a


compreensão deste processo que se constitui nas relações humanas, ou seja, na maneira
como cada sujeito interage com as pessoas e com o ambiente em que se encontram. A
psicanálise também trará, a partir de Lacan e Freud, o aporte necessário para os
conceitos de consciente, inconsciente, imaginário, desejo e análise de discurso, na
perspectiva de identificar o lugar que as narrativas ocupam na dimensão estética diante
dos processos formativos e pontuar uma possível compreensão a respeito de para quem
fala(m) estes sujeitos discentes frente a um discurso que remete a uma escolha
profissional.
Neste sentido, é igualmente necessário conhecer e circular pelos espaços
estéticos estruturados nos processos formativos e educativos, pois esta ação possibilita a
compreensão de que a estética não aparece como algo concreto, mas que se faz presente
através das relações humanas e nos ambientes escolares. Sua presença é revelada
através da “beleza” marcada pelo gosto ou pelo desgosto, na manifestação da alegria e
da tristeza, do belo e do feio, num jogo lúdico marcado pelo sensível e o racional, que
surge através da linguagem em forma de discurso, deflagrando um posicionamento do
sujeito.
Para a análise das narrativas este estudo conta com o dispositivo “Colcha de
Retalhos”. Um estudo documental (auto) biográfico desenvolvido desde 2002 por
Berkenbrock-Rosito (2010), cujo propósito é compreender a dimensão do processo
formativo, através de narrativas contadas pelos discentes, composto de sete momentos.
O primeiro momento é a narrativa escrita, esta narrativa é composta de duas fases,
Histórias de vida Pessoal (auto) biografia e História de vida Formativa, processo de
desenvolvimento e construção do saber, alinhado à trajetória de vida. O segundo
momento compõe-se em uma narrativa fílmica a partir do filme “Colcha de Retalhos”,
escritos e relatos sobre cena(s) que afetaram e a maneira como afetaram. O terceiro
momento é feito através da narrativa imagética ou pictórica, apresentadas por imagens
representadas em retalhos. O quarto momento é composto por narrativas orais, contada
pelos autores e representadas nos retalhos. O quinto momento é feito a costura da
colcha, juntam-se todos os retalhos e constrói-se a colcha. O sexto momento é a
narrativa do silêncio, uma reflexão a respeito do singular e do plural em um só objeto e
por fim, o sétimo momento que é a narrativa fotográfica, onde todo o processo é
registrado por meio da fotografia que em seguida é exposto a Colcha de Retalhos.
1552

DELIMITAÇÃO DO TEMA-PROBLEMA

Diante do exposto elege-se como problema: o sentido estético do processo (auto)


biográfico e formativo por meio das narrativas discentes.
A pergunta norteadora é: Como são construídos os discursos discentes no
processo formativo dentro e fora da escola? De onde e para quem fala este sujeito e
quais as representações estéticas que emergem nestes discursos?

HIPÓTESE

O desenvolvimento da autonomia e emancipação dos sujeitos ocorre pela


dimensão das representações estéticas.

OBJETIVOS

O objetivo deste estudo é analisar, compreender e interpretar as narrativas


discentes; identificar o lugar de onde fala o sujeito na construção de um lugar de autoria
ou de submissão do seu percurso formativo dentro e fora da escola.

JUSTIFICATIVA

Justifica-se o estudo pela necessidade e revelar o lugar da dimensão estética


presente nos processos formativos de alunos do curso de Pedagogia. Olhar por entre as
belezas e as feiúras configuradas no desenvolvimento deste processo e no ambiente
escolar auxiliará para identificar o sentido e o significado dado.
A relevância social e acadêmica deste estudo diz respeito à compreensão da
dimensão estética e da Educação Estética como necessidades e possibilidades de
entender em que via se dá o processo de autonomia do sujeito frente ao seu processo de
formação, o que em Freire aponta para uma educação libertadora, à medida em que
existe uma posição crítica discente diante de seu processo educativo e de sua identidade
profissional, fazendo oposição à educação bancária que remete este sujeito a um lugar
de objeto frente a seus saberes prévios e suas experiências de vida pessoal, como
defende Freire (2011).
1553

Além disso, é preciso considerar o contexto da contemporaneidade, que pela


compreensão da estética da massificação da indústria cultural, que torna os sujeitos
apenas consumidores de produtos e idéias, um fenômeno considerado por Adorno
(1986) como processo de semi-formação.
Igualmente relevante é a questão voltada à compreensão do processo formativo
na perspectiva de Schiller (2013), com o entendimento a respeito do lugar da Educação
Estética, envolvida entre o racional e o sensível, como um jogo lúdico, que abarca a arte
como dimensão da estética nos processos formativos. A arte, neste caso, encontra-se
marcada na arte de narrar e propor a escuta da própria narrativa (auto) formativa em três
dimensões: narrativa escrita, oral e pictográfica, estruturadas pelo dispositivo “Colcha
de Retalhos”.
A dimensão do inconsciente também carece ser abordada para melhor
entendimento global do processo. Para Freud, inconsciente, é o que escapa a razão, a
consciência, isto é, lugar onde o “eu” encontra-se dividido entre uma consciência
perceptiva e o inconsciente, lugar cheio de conteúdos recalcados. Lacan nomeará este
inconsciente ou isso que escapa, como algo que aparece na forma de linguagem, através
do discurso, uma estrutura de linguagem mediada pela palavra de onde provem a ordem
simbólica.
A escuta do discurso em Lacan possibilita um encontro do sujeito com seu
desejo, o que, em Schiller, será representado pela maneira como ocorre via estética o
posicionamento do sujeito, diante do jogo lúdico do sensível e do racional encontrado
na relação que este faz através das relações humanas presentes na ética e na moral.

METODOLOGIA

Esta pesquisa adota a abordagem qualitativa. O procedimento adotado para


coleta de dados corresponde à análise documental das narrativas escritas e observação
do processo de construção do contar histórias a partir dos retalhos apresentados pelos
discentes, analisando e interpretando o modo como cada um constrói e costura seus
retalhos, formando assim sua identidade diante do dispositivo “Colcha de retalhos”,
atividade desenvolvida pela Profa. Dra. Margaréte May B. Rosito, em uma universidade
em São Paulo no curso de graduação do primeiro semestre de Pedagogia.
A escolha dos sujeitos seguirá um critério de livre escolha, para aqueles que
desejarem participar da pesquisa.
1554

Para análise dos dados adota-se a abordagem (auto) biográfica na perspectiva de


Dominicé (2006), Pineau (2006), Josso (2002), Lacan (1986), com análise do discurso e
a hermenêutica de Gadamer (2000), para a compreensão e escuta do discurso a partir
nas narrativas dos processos formativos discentes, cujo resultado é conhecer e
aprofundar o lugar de onde fala o sujeito discente diante de seu processo de formação e
contribuir para a compreensão do lugar da Educação Estética na construção de um lugar
de autoria ou de submissão do percurso formativo dentro e fora da escola.

REFERÊNCIAS

ADORNO, Theodor W. Sociologia. São Paulo: Ática, 1986.

______. Textos Escolhidos. São Paulo: Nova Cultural, 1986a. (Coleção Os


Pensadores).

AMORIM NETO, Roque do Carmo; BERKENBROCK-ROSITO, Margaréte May.


Ética e Moral na Educação. Rio de Janeiro: WAK, 2007.

BERKENBROCK-ROSITO, Margaréte May. Educação Estética: Histórias e


Vivências da Docência – Universidade Cidade de São Paulo UNICID Eixo 5 –
Formação, identidade e profissão docente – Cultura Escolar Migrações e Cidadania
Actas do VII Congresso LUSO BRASILEIRO de História da Educação 20 – 23 de
junho 2008, Porto: Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação (Universidade do
Porto).

BERKENBROCK-ROSITO, M. Colchas de Retalhos e a beleza da narrativa de si. In:


PERES, Lúcia Maria Vaz; BERKENBROCK-ROSITO, Margaréte May; JABLONSKI,
Annanda Diléia. (Org.). Costurando nossas histórias. Pelotas/RS: Editora
Universitária/UFPel, 2010, v. 1, p. 34-53.

DOMINICÉ, Pierre. A formação de adultos confrontada pelo imperativo autobiográfico.


Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.2, maio/ago, 2006, p. 345-358

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 2011.

GADAMER, H.G. Verdade e método. Tradução: Flávio Paulo Meurer. Petrópolis:


Vozes, 2000.

JOSSO, M. C. Experiências de Vida e formação. São Paulo: Cortez, 2002.

LACAN, Jacques. Análise do discurso e Análise do eu (O Seminário, Livro 1 - Os


escritos técnicos de Freud). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1986.

PINEAU, G. A autoformação no decurso da vida: entre a hetero e ecoformação. In:


NÓVOA, A.; FINGER, M. (orgs.). O método (auto)biográfico e a formação. Lisboa:
1555

Ministério da Saúde. Departamento de Recursos Humanos da Saúde/ Centro de


Formação e Aperfeiçoamento Profissional, 2006, p. 62-77.

SCHILLER, F. A Educação Estética do homem: numa série de cartas. 7 ed. Trad.


Roberto Schwarz e Márcio Suzuki. São Paulo: Iluminuras, 2013.
1556

Pôster

Narrativas infantis: experiências de crianças que frequentam a sala de


atendimento educacional especializado (AEE), em uma escola da rede pública
estadual de São Paulo

1
Marli Aparecida Herrera

Resumo: O programa de Mestrado em Educação da UNICID – Universidade do Estado


de São Paulo sob a orientação da Profa. Dra. Ecleide Cunico Furlanetto ofereceu
oportunidade para o desenvolvimento da pesquisa em andamento “Narrativas Infantis:
experiências de crianças que frequentam a Sala de Atendimento Educacional
Especializado (AEE)”, partindo do pressuposto de que, para se pensar a melhoria da
educação básica no Brasil seria necessário dar visibilidade às vozes das novas gerações
dos atores sociais por meio de seus relatos de experiências em instituições educacionais
reais. Caminhando nessa direção pensou-se em diversificar os protagonistas dessas
histórias, considerando-se importante escutar essas crianças, que estão participando de
projetos de inclusão em uma escola da rede Pública Estadual, localizada na Zona leste
de São Paulo, com o intuito de saber o que elas pensam, sentem e esperam do ambiente
escolar em que foram inseridas.
Palavras-chave: Narrativas infantis, Educação básica; Inclusão;

INTRODUÇÃO

Cursei o Ensino Fundamental na “Escola Estadual Augusto D’avila” em Arthur


Alvim localizada na zona leste da cidade de São Paulo; bairro que morava desde
criança. Justamente no ano da formatura de minha turma, foi extinto o ensino médio
regular o que ocasionou a transferência dos alunos para outras escolas dos bairros
vizinhos. Por conta dessa mudança, matriculei-me em um Colégio Comercial optando
pelo ensino médio técnico profissionalizante. Cursar “Habilitação Profissional de
Técnico em Contabilidade” oferecia, na ocasião, maiores oportunidades de emprego.

1
Aluna bolsista pela CAPES – PROSUP Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de
Ensino Particulares
1557

Mais rápido do que eu esperava, comecei a trabalhar na função de datilógrafa no Banco


Sudameris Brasil, logo depois veio à promoção para a área de Análise de Balanços e
motivada pelo novo cargo que ocupava, fiz o curso de bacharelado em Ciências
Contábeis.
Com a chegada dos filhos, optei por parar de trabalhar, essa decisão foi um
divisor de águas em minha trajetória profissional que acreditei estar encerrada. No
entanto, aos poucos fui vislumbrando novas possibilidades. Sempre tive interesse por
aprender línguas estrangeiras e, mesmo trabalhando investia parte de meu tempo e de
meus recursos financeiros em cursos de inglês. Essa opção me possibilitou um novo
recomeço, passei a atuar como professora particular de Língua Inglesa. Inserida nesse
novo contexto de trabalho e com uma agenda mais flexível, consegui conciliar o
trabalho com o tempo dedicado aos filhos e à casa e também abriram-se oportunidades
para continuar me aperfeiçoando por meio de cursos e palestras. Tive, também, chances
de fazer pós-graduação em linguística e viajar para o exterior, experiências que vieram
acrescentar maior qualidade às minhas aulas particulares.
Com o decorrer do tempo, senti necessidade de voltar a estudar e optei pelo
curso de Licenciatura em Pedagogia. Considerava ser importante buscar novos
conhecimentos para aperfeiçoar minha prática profissional e para abrir novas frentes de
trabalho. Durante o curso de Pedagogia na UNICID – Universidade Cidade de São
Paulo, ao entrar em contato com os conteúdos das disciplinas e com os professores,
passei a valorizar ainda mais a profissão docente.
Durante o curso, tive oportunidade de participar do PIBIC – Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação Científica e, dessa forma, passei a integrar o Projeto
de Pesquisa: “Narrativas Infantis: o que contam as crianças sobre as escolas da
infância? (CNPq|CAPES no 07/2011): Projeto desenvolvido em rede que integra
pesquisadores de diferentes regiões e universidades do país (UFRN, UNICID,
UNIFESP, UFF, UFRS,) que tem como objetivo: colocar em diálogo significações
construídas por crianças de diferentes regiões brasileiras a respeito das escolas da
infância.
A proposta partiu do pressuposto de que, para se pensar a melhoria da educação
básica no Brasil seria necessário dar visibilidade às vozes das novas gerações dos atores
sociais possibilitando que relatassem suas experiências em instituições educacionais
reais. Os pesquisadores que integravam a proposta tinham vínculos de pesquisa tecidos
em torno das narrativas, como método de pesquisa e prática de formação e olhavam
1558

para a infância levando em conta a alteridade da criança, legitimando-a como ser capaz
de refletir sobre suas experiências ao narrar suas vivências.
A reflexividade na infância, sobre a qual se baseia a proposta, permeia as
diferentes abordagens realizadas nos últimos anos por pesquisadores preocupados em
conferir à criança o estatuto de sujeito de direito, conforme atestam as publicações mais
recentes nessa área. Alguns trabalhos apontam nessa direção tais como: Chaves (2012);
Oliveira (2011); Serra (2006), além do texto do autor Pereira (2006) entre outros. Esses
autores mostram as mudanças que estão ocorrendo, ou seja, a criança está deixando de
ser considerada um ser incompleto e imperfeito, o que a tornava « invisível », para ser
vista como um sujeito capaz de inserir suas palavras no discurso social. Ao entrar na
escola, a criança é introduzida em um contexto social mais amplo, no qual é
chamada a desempenhar novos papéis. Por meio das narrativas ela conta o que está
vivendo e os sentidos que está construindo para suas novas experiências
Integrar essa pesquisa, além de me aproximar do referencial teórico assumido
pelo projeto e da visão das crianças a respeito das escolas, despertou em mim o
interesse pela pesquisa. Ao terminar a graduação, percebi que seria importante continuar
a trajetória que tinha iniciado como pesquisadora, o que me levou a buscar o mestrado
em Educação da UNICID. Ao entrar no mestrado, continuei frequentando o Grupo de
Pesquisa liderado pela Profa. Dra. Ecleide Cunico Furlanetto que já tinha me orientado
na pesquisa de iniciação científica e nesse espaço pude constatar que a pesquisa da qual
tinha participado, anteriormente, teria desdobramentos.
Os resultados permitiram problematizar a entrada e permanência da criança na
escola que ao ser introduzida na cultura escolar passa a ser, além de criança, aluno,
papel que vai se impondo à medida que ela avança na escolaridade. Cumpre, no
entanto, indagar o quanto essa apropriação da imagem de si como « aluno », contribui,
ou não, para a construção de processos e subjetivação e socialização da criança como
sujeito de direito, e de valores referentes à cidadania e aos processos de construção em
uma sociedade justa frente à diversidade. Caminhando nessa direção pensou-se em
diversificar os protagonistas dessas histórias, para isso considerou-se importante incluir
crianças de diferentes etnias ; com deficiências ; crianças e crianças que frequentam
classes hospitalares para aprofundar as indagações iniciais. Dessa forma a pesquisa que
pretendo desenvolver no mestrado delineou-se nesse contexto.
Observando a rotina diária da escola, no estágio que fiz no Curso de Pedagogia,
deparei-me com crianças consideradas incluídas, frequentando a sala de aula e também
1559

a salas de recursos AEE - Atendimento Educacional Especializado e pude constatar o


desafio diário dos professores para realmente incluir essas crianças bem como a
responsabilidade que todos os profissionais envolvidos com esses projetos assumem.
Sabemos que projetos que objetivam incluir crianças com algum déficit em escolas
regulares, procuram legitimar o direito de todas as pessoas de receber educação. Serra
(2006) salienta ser necessário refletir sobre o que se deseja oferecer aos alunos, quando
se pensa em educação inclusiva. O grande desafio das instituições educacionais que
assumem a inclusão é disponibilizar um ambiente de aprendizagem que possibilite a
todos o direito à educação e formação, por meio de um convívio social digno dentro e
fora da escola. Pires (2006, p.85) diz que:

No desenvolvimento de um projeto educativo que traduza as intenções, as


necessidades de todos e os valores, a escola se firma como uma comunidade
inclusiva, no verdadeiro sentido do termo: uma comunidade que fundamenta
e orienta sua ação no reconhecimento do valor da pessoa rumo a uma escola
de todos e para todos, num autêntico processo inclusivo da diversidade e das
diferenças, apoiando a aprendizagem, propiciando as interações suscetíveis
de encorajar os menos habilitados, promovendo a reflexão, discussão e
questionamento de suas práticas de ensino e utilizando práticas pedagógicas
que satisfaçam as necessidades educativas de todos os alunos e que, acima de
tudo, estes se sintam aceitos, compreendidos e respeitados em seus diferentes
estilos de aprender, conviver e ser.

No entanto, cumpre destacar que as Políticas Públicas para a Inclusão, via de


regra, têm como interlocutores os adultos, têm sido eles com base em sua maneira de
ver o mundo que têm delineado os projetos de inclusão, muitas vezes delegando às
crianças a difícil tarefa de estar na linha de frente desses projetos, melhor dizendo, são
elas que entram nas escolas regulares, em muitos casos, sem o devido apoio e enfrentam
no dia a dia, entre outros desafios, a falta de recursos das instituições, o despreparo dos
professores, a rejeição dos colegas e de suas famílias. São muito recentes pesquisas que
reconheçam as maneiras próprias de ver e representar o mundo das crianças e no que se
refere à pesquisa cujos interlocutores se tratem de crianças com deficiência, essas são
ainda mais raras.
Acredito que vivemos um momento propício para escutar as crianças que estão
participando de projetos de inclusão com o intuito de saber o que elas pensam, sentem, e
esperam do ambiente escolar em que foram inseridas. Para que isso seja possível é
necessário não só falar por eles, mas dar voz a todos aqueles que de uma forma ou outra
se encontram excluídos. Caminhando nessa direção, a pesquisa assume como objetivo
principal: compreender os significados construídos narrativamente por crianças de uma
1560

escola de Ensino Fundamental da Rede Estadual de São Paulo, incluídas nas salas de
aulas regulares e que também frequentam a salas de recursos AEE - Atendimento
Educacional Especializado, mediante suas experiências na escola.

TRAÇADO METODOLÓGICO

A pesquisa apoia-se na abordagem qualitativa e utiliza o recurso das narrativas


por considerar que as crianças ao narrar explicitam como significam suas experiências.
A pesquisa será realizada em escola da rede Pública Estadual, localizada na Zona leste
de São Paulo. Participarão da pesquisa crianças que frequentam essa escola e são
consideradas com deficiência, em função disso além de participarem de atividades
desenvolvidas nas salas de aulas regulares, participam também de atividades nas salas
de atendimento especializado.
Cumpre explicitar aqui que essas salas foram constituídas devido ao movimento
mundial pela Educação Inclusiva, em defesa do direito de todos os alunos aprenderem e
participarem juntos, sem nenhum tipo de discriminação, o que desencadeou no Brasil
inúmeras leis, decretos e publicações que vêm legitimando o movimento para a inclusão
dos alunos com deficiência, na escola regular. A Convenção da ONU sobre os direitos
das Pessoas com Deficiência (2007) ratificada em julho de 2008, com status de
constituição em solo brasileiro; a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva
da Educação Inclusiva e o decreto nº 6.571, de 17 de setembro, que dispõe sobre o AEE
- Atendimento Educacional Especializado e somam esforços para que sejam tomadas
medidas que garantam a igualdade de acesso à educação das pessoas com deficiência,
como parte integrante do sistema educativo. Além disso, é reafirmado o compromisso
que as crianças com deficiência tenham acesso à escola regular, e caso necessitarem, o
AEE - Atendimento Educacional Especializado, no contra turno, atendendo suas
necessidades específicas.
As entrevistas produzirão narrativas individuais, quando necessárias. Ambos os
procedimentos buscam favorecer a espontaneidade da criança com o intuito de estimular
a narração das experiências vividas na escola. As conversas e entrevistas serão gravadas
em áudio e vídeo e transcritas para análise e sistematização dos dados. As rodas de
conversa, serão realizadas com 03 (três) crianças, segundo a faixa etária. As crianças
serão escolhidas mediante sorteio, com o auxílio das professoras das diferentes turmas.
O tempo destinado ao encontro não deve ultrapassar 01 (uma) hora.
1561

A roda de conversa se organizará em função de uma conversa inicial a respeito


de um pedido feito por um jornalista que quer fazer uma reportagem sobre a escola e
precisa da ajuda das crianças, para isso vai emprestar uma máquina para que elas tirem
fotografias da escola e contem o que sabem sobre ela. As fotos tiradas pelas crianças
retornarão ao grupo para que cada criança possa, estimulada por elas, falar sobre a
escola. As entrevistas narrativas serão realizadas quando houver necessidade de
aprofundar alguma questão e também serão transcritas e gravadas em vídeo.
As transcrições serão analisadas tendo como foco: o que podem nos ensinar as
crianças sobre elas e sobre a escola. Serão identificados os núcleos temáticos e
categorias, com base nos referenciais teóricos assumidos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa encontra-se em andamento, mas se acredita que, por meio das


significações construídas narrativamente pelos participantes da pesquisa, será possível
contribuir com elementos para ampliar a reflexão sobre as Políticas Públicas de Inclusão
de forma a assegurar o lugar das crianças na definição dessas políticas.
Além disso ao narrar as crianças podem organizar suas experiências e se
apropriar de acontecimentos que compõem as suas histórias e dessa forma podem
descobrir novas formas e posicionar-se frente a eles, como autores e não como sujeitos
que estão à margem dos processos.

REFERÊNCIAS

CHAVES, Iduina Mont´Alverne Braun. Texto 3 -O que contam as crianças sobre as


escolas da infância - imagens e simbolismos. XVI ENDIPE - Encontro Nacional de
Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas – 2012. p. 26

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Decreto nº 6.571, de 17 de setembro de 2008.


OLIVEIRA, Maria Terezinha Espinosa de. Crianças Narradoras e suas vidas
cotidianas. 1ª ed. Rio de Janeiro: Rovelle, 2011.

ONU. Declaração de Salamanca - MEC, 1994. Disponível em:


http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/publicacoes/convencao-sobre-os-direitos-
das-pessoas-com-deficiencia#conteudo.Acesso em: 27 Junho 2014.

PEREIRA, Manuel José Jacinto Sarmento. Texto: Infância Diversidade e Expressão.


Projeto: “As Marcas dos Tempos: a Interculturalidade nas Culturas da Infância”
1562

Projecto POCTI/CED/49186/2002 In: Seminário Internacional Educação Intercultural,


Movimentos Sociais E Sustentabilidade, 3. E Colóquio Da Association Pour La
Recherche Interculturelle (Aric) Na América Latina, 1, 2006, Florianópolis. Anais ...
Florianópolis: CED/UFSC, 2006. p. 01 – 18. ISBN: 85-87103-32-6. Disponível em:
<http://www.rizoma3.ufsc.br/> Acesso em: 10 out. 2007

PIRES, José. A Questão Ética Frente as Diferenças: Uma Perspectiva da Pessoa como
Valor. Inclusão: Compartilhando Saberes. Lúcia de Araújo Ramos Martins; José Pires;
Gláucia Nascimento da Luz Pires; Francisco Ricardo Lins Vieira de Melo
(organizadores). Ed. Vozes. 2ª edição. 2006.

SERRA, Dayse. Inclusão e Ambiente Escolar. Inclusão em Educação. Mônica Pereira


dos Santos e Marcos Moreira Paulino (organizadores) Ed. Cortez. 2006.

UNESCO. Declaração de Salamanca. Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das


Necessidades Educativas Especiais. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf> Acesso em: 23 dez. 2009.
1563

Pôster

Qualidade na educação básica: um estudo sobre o desempenho dos alunos egressos


da educação básica.
Miguel Angelo Schincariol –
UNICID
Orientador: Prof. Dr. Júlio Gomes de Almeida –
UNICID

Resumo: Este trabalho apresenta os resultados iniciais de uma pesquisa que busca
discutir o desempenho apresentado pelos egressos do Ensino Médio quando ingressam
no Ensino Superior, buscando situar esse desempenho no contexto da Educação Básica
que a eles é oferecida. Nesta fase da pesquisa foi realizada uma revisão bibliográfica e
documental por meio do exame da literatura referente à educação básica, sobretudo no
que diz respeito ao currículo, a avaliação e aos documentos oficiais e artigos veiculados
por meio da imprensa, também foi iniciada a análise das entrevistas realizadas com
professores que atuam no Ensino Superior. Esta análise inicial permite inferir algumas
percepções destes professores sobre as deficiências apresentadas por esses alunos. Os
dados coletados por meio das entrevistas estão em fase inicial de análise, mas a partir
deles já é possível realizar algumas inferências sobre a percepção dos docentes que
atuam no ensino superior com relação à questão da qualidade da educação oferecida aos
jovens na educação básica.
Palavras Chaves: Políticas públicas, Educação Básica, Avaliação e Desempenho dos
Alunos.

Justificativa

Este trabalho apresenta os resultados iniciais de uma pesquisa que busca discutir
o desempenho apresentado pelos egressos do Ensino Médio no Ensino Superior,
buscando situar esse desempenho no contexto da Educação Básica que a eles é
oferecida. Nesta fase da pesquisa foi realizada uma revisão bibliográfica e documental
por meio do exame da literatura referente à educação básica, sobretudo no que diz
respeito ao currículo, a avaliação e aos documentos oficiais e artigos veiculados por
1564

meio da imprensa, foi também iniciada a análise das entrevistas realizadas. Com isso
pretendo discutir esse desempenho para então estudar encaminhamentos possíveis.
Para realização da pesquisa adotei uma abordagem qualitativa e como
procedimento de coleta de dados a análise bibliográfica, documental e entrevistas
semiestruturadas. Os dados coletados por meio do estudo bibliográfico são
completados por outros produzidos a partir de entrevistas semiestruturadas com dez
professores escolhidos aleatoriamente que atuam no Ensino Superior, neste trabalho
para manter o anonimato, o nome dos professores foram trocados por nomes fictícios.
Com isso busco identificar as percepções destes professores sobre as origens das
deficiências e os possíveis encaminhamentos.
No desenvolvimento do trabalho assumi como referencial teórico os trabalhos de
Sousa (2009) que estuda a avaliação e gestão na educação básica, Dowbor (2008) que
discute a relação entre educação e desenvolvimento local, Sordi (2010) que nos mostra
que há uma relação pragmática com a avaliação muito mais centrada na nota do que no
quanto esta possa ser expressão da apropriação do conhecimento, Freitas (2003) que nos
coloca também como uma instituição social que opera em uma sociedade hierarquizada
economicamente e que pede à escola que distribua seletivamente o conhecimento. Isso
implica criar na escola não apenas trilhas diferenciadas de progressão, mas também
alunos diferenciados que possam ocupar posições diferenciadas na estrutura
socioeconômica.
A pesquisa se relaciona com inquietações que emergiram da minha experiência
docente. Quando do meu ingresso na área da educação em 2009, primeiramente como
docente no ensino técnico e posteriormente no ensino superior, minha experiência
profissional resumia-se no trabalho dentro da área industrial de manufatura mecânica,
na qual atuei durante vinte e sete anos. A princípio a ideia de contribuir com a formação
de novos profissionais me motivou muito. Pesquisei sobre o universo do ensino, neste
momento percebi que precisava me preparar melhor, o que me fez procurar uma pós-
graduação voltada a docência no ensino superior. No curso de pós ficou evidente que
muitas das respostas que procurava, não encontraria tão facilmente.
Após muitas situações vivenciadas dentro do ambiente escolar, ficou evidente o
antagonismo entre o desejo de se ter uma educação de excelência no ensino tecnológico
e a realidade da educação básica. Esse antagonismo estava presente nos primeiros
discursos que ouvi assim que ingressei no campo da educação.
1565

A pesquisa parece ter grande relevância pessoal e social. Pessoal à medida que
tento responder a questões de como melhorar a minha prática no ensino superior, e
social porque com este trabalho pretendo sistematizar e disponibilizar conhecimento
sobre o objeto estudado, podendo contribuir também com outros educadores,
pesquisadores ou gestores de unidades e sistemas de ensino. Trata-se de uma questão de
suma importância e de grande complexidade, por isso este trabalho é um pequeno
recorte focado no desempenho dos alunos em matemática e física.
Muito se diz sobre a falta de qualidade da educação básica, os discursos
políticos, pedagógicos e científicos parecem revelar a existência de um consenso no que
diz respeito à necessidade de melhorar a qualidade da educação básica no Brasil. A falta
de qualidade denunciada nos discursos vem sendo confirmada pelos resultados obtidos
pelos egressos da educação básica nas avaliações externas, na utilização social em
habilidades e competências básicas e mesmo nas dificuldades encontradas com relação
à ocupação de vagas no mercado de trabalho e no prosseguimento de estudos.
As justificativas apresentadas para esta falta de qualidade são inúmeras, entre
elas destacam-se a falta de interesse dos alunos, a facilitação do percurso ao longo da
educação básica, jornada de trabalho excessiva dos professores, formação deficiente dos
professores, baixa escolaridade dos pais, gestão inadequada dos tempos e espaços da
escola, etc. Assim são frequentes, nos espaços onde se discute educação, afirmações
como “alunos terminam o ensino médio sem aprender nada”, “não existem pessoas
capacitadas para ocupar vagas no mercado de trabalho”, “a educação piorou depois da
progressão continuada”, entre outras.
No ensino universitário muitos docentes reclamam do baixo nível dos alunos que
atualmente estão ingressando no curso superior, no que diz respeito às habilidades e
competências que se espera dos egressos do ensino médio. A principal reclamação é que
a educação básica não está preparando para a continuidade de estudos, como mostram
os trechos seguintes:

É eles... eles tem o diálogo deles ainda é muito fraco... as.. as formas de
apresentar conclusões de um determinado assunto ainda eles não conseguem
concluir as expressões, a escrita deles é fraca a metodologia de cálculo desde
de resolução também não conseguem... cálculos simples eles se atrapalham, é
a base né, matemática e português ainda fica muito deficiente que atrapalha
na disciplina, são os dois pontos aí que eu chamo de calcanhares. (João,
professor de administração industrial e gestão da produção)

Então, dificuldade básica na matemática, no cálculo éhhh... básico de


equações, solução de sistemas, até frações. (Reinaldo, professor de técnicas
digitais e micros controladores)
1566

Eles são muito ruins de raciocínio lógico, não tem raciocínio lógico éhhh...
falta de interesse né, não dá pra ensinar isso mas é o que eles trazem, não tem
muito interesse, eu acho o que mais pesa é a falta de raciocínio lógica, eu não
diria nem que na minha matéria é mais raciocínio lógico do que a matemática
em si, então acho é a falta de raciocínio lógico. (Edgar, professor de
hidráulica e pneumática)

Bom éhhh... problema de... falta de conhecimento do ensino básico, do


ensino fundamental, consequentemente do ensino médio, isso na parte de
matemática e uma coisa que tenho observado também é problema de
interpretação de texto, então eu acho que tem alguns alunos, acho não, eu já
verifiquei alguns alunos com analfabetismo funcional. (Henrique, professor
de cálculo)

O desempenho dos alunos que concluem a educação básica é uma questão que
tem me acompanhado enquanto pai que se preocupa com o futuro dos filhos, como
educador que tem a responsabilidade de formar profissionais capazes de atuar com
competência no mercado de trabalho e agora também como pesquisador.
Uma afirmação recorrente entre os docentes quando iniciei a carreira docente e
que infelizmente ainda não mudou, era a de que “as novas gerações de alunos estão
sempre aquém da anterior”. Mas realmente isto é verdade ou é uma retórica já
incorporada entre os docentes e que agora também encontra aliados na mídia?
Grande parte das estatísticas apontam um aumento na escolarização e uma piora
no desempenho dos alunos quando se analisa a relação entre o que sabem e o que
deveriam saber quando concluem a educação básica. Então o que significa dizer que as
gerações de alunos estão sempre aquém da geração anterior? Emerge então outra
questão importante: quais são os indicadores utilizados para esta comparação. É justo
comparar a defasagem de gerações com relação ao conhecimento disponível, quando a
possibilidade das informações e acesso é infinitamente maior?
Embora os alunos frequentem as aulas e muitos manifestem grande interesse
para com os estudos, ainda ouvimos muitos discursos relacionando a falta de interesse
com o desempenho escolar insatisfatório. Nas entrevistas até aqui analisadas não
aparece referência à falta de significado ou mesmo de clareza sobre o que é ensinado
como justificativa para o baixo rendimento dos alunos. Contudo essa relação não pode
ser desconsiderada sob pena de perdermos a possibilidade de entender o problema em
sua complexidade.
Avaliações como a Prova Brasil/SAEB, o Exame Nacional de Ensino Médio
(ENEM) e o Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo
1567

(SARESP) indicam que ao final do ensino médio, esses alunos não apresentam um
desempenho adequado ao que se espera ao final desta etapa.
Os dados iniciais da pesquisa revelam que isto acontece não por problemas de
incapacidade intelectual, mas, entre outros fatores, pelas condições de ensino a que são
submetidos os alunos ao longo da educação básica e pelas condições de trabalho a que
são submetidos os professores que atuam neste nível de ensino. O resultado ao final
dessa equação é um egresso que não apresenta domínio dos conceitos necessários para
ter um desempenho adequado para ocupar uma vaga no mercado de trabalho cada vez
mais competitivo e também para o prosseguimento de seus estudos.
Na atuação como docente no ensino superior, tenho observado que os
professores se deparam com situações adversas, uma situação frequente é que após a
explicação de um conceito novo aos alunos, necessário para realização de uma dada
tarefa, aparentemente os alunos compreendem, porém, na próxima aula eles voltam com
dúvidas, não sobre o conceito novo dado na aula anterior, mas sim sobre um conceito
que supostamente aprenderam em etapas anteriores da escolarização.
A pesquisa revela que por um lado os professores percebem os alunos egressos
da educação básica como despreparados e por outro que eles não parecem preparados
para lidar com os alunos que recebem. Assim, é possível também perguntar se as
instituições de ensino superior estão preparadas para receber os alunos que batem a sua
porta.
A discussão sobre a qualidade do ensino não é recente, porém, após a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9.394/96, tem-se a impressão que o
ensino de maneira geral tem apresentado maiores deficiências. Os dados da pesquisa
revelam que antes da política de progressão continuada, consolidada na LDB, uma
quantidade muito grande de alunos desistiam no percurso escolar o que pode distorcer a
nossa visão, pois no passado estes desistentes não ingressavam no ensino superior,
assim as dificuldades que temos hoje não podem ser comparadas com as de outros
momentos.
Uma questão apontada na literatura consultada como relevante e que emerge
como causa da baixa qualidade é o sucateamento da escola pública. Com a ampliação
do acesso, sendo a escola pública destinada a todos, a elite passou a valorizar um
modelo de escola que atenda seus interesses e o poder público passou a tratar a escola
pública como meio de assistência e ou contenção social.
1568

A escola precisa que todos possam participar. Como preconiza a legislação,


tornar-se um ambiente inclusivo, no qual todos possam participar. Houve avanços
significativos sem dúvida, no passado era comum que apenas alguns frequentassem o
ensino básico, pois além de ser difícil o acesso a permanência também se constituía em
obstáculo que muitos não conseguiam ultrapassar. Há a necessidade de melhorar as
estratégias para atender este desafio e garantir o direito que os alunos tem de
permanecer na escola e aprender. Para isso o ensino precisa ter boa qualidade, isto é, ser
significativo e proporcionar as habilidades e competências necessárias para que os
alunos possam continuar os estudos, ocupar espaço no mercado de trabalho e sobretudo
capacidade de iniciativa.
Estas são questões que emergiram no meu cotidiano enquanto profissional
preocupado em proporcionar um ensino de boa qualidade aos meus alunos e foi
pensando em ampliar minha compreensão sobre elas e melhorar a minha prática
enquanto educador que decidi desenvolver esta pesquisa.
Os dados coletados por meio das entrevistas estão em fase inicial de análise, mas
a partir deles foi possível realizar algumas inferências sobre a percepção dos docentes
que atuam no ensino superior com relação à questão da qualidade da educação oferecida
aos jovens na educação básica.

Referências

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da


Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 dez. 1996. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em 30 out. 2013.

DOWBOR, Ladislau; POCHMANN, Marcio. Políticas para o desenvolvimento local.


São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2008.

FREITAS, L.C. Ciclos, seriação e avaliação: confronto entre duas lógicas. São Paulo:
Moderna, 2003. (Coleção cotidiano escolar).

SÃO PAULO(SP). Conselho Estadual de Educação. Deliberação CEE nº 09/97. Institui


no sistema de ensino do estado de São Paulo, em 1997, o regime de progressão
continuada no ensino fundamental. Diário Oficial do Estado, São Paulo, SP, 05
ago.1997. Disponivel em: <http://www.imprensaoficial.com.br/PortalIO/ DO/ BuscaDO
2001Documento_11_4.aspx?link=/1997/executivo%2520secao%2520i/agosto/05/pag_0
012_ARG1NORDN9TRe2HL6DA93FUIBJ.pdf&pagina=12&data=05/08/1997&cadern
o=Executivo%20I&paginaordenacao=10012> Acesso em 24 jul. 2014.
1569

SORDI, Mara Regina Lemes de; LUDKE, Menga. Da avaliação da aprendizagem à


avaliação institucional: aprendizagens necessárias.Avaliação: Revista da Avaliação da
Educação Superior, v. 14, n. 2, 2010.

SOUSA, Sandra Zákia L. Avaliação e gestão da educação básica. In. DOURADO,


Luiz. Políticas e gestão da educação no Brasil: novos marcos regulatórios?. São
Paulo: Editora Xamã, 2009.
1570

Pôster

A relação dos gestores escolares com a interdependência competitiva entre escolas

Natália Tripoloni Tangerino Silva


Mestranda em Educação
Universidade Cidade de São Paulo(Unicid)
Bolsista CAPES-Prosup

Vanda Mendes Ribeiro


Professora do Programa de Pós-graduação em Educação da Unicid
Doutora em Educação
Faculdade de Educação da USP
Coordenadora Adjunta de Pesquisa no Cenpec

Resumo: O presente trabalho busca analisar a relação dos gestores escolares com a
interpendência competitiva entre escolas públicas de uma região com altos índices de
vulnerabilidade. A literatura da área aponta que as escolas não agem sozinhas no
território, elas consideram o que fazem e como trabalham as demais escolas que se
encontram na sua vizinhança para tomar decisões. Assim sendo, essas relações podem
influenciar na qualidade das instituições. A literatura sobre gestão escolar afirma ser o
modo como o gestor da escola realiza seu trabalho um fator relevante para que as
escolas ampliem sua qualidade, alcançando maior eficácia. Nosso problema de pesquisa
se reporta a procurar compreender se e como os gestores escolares de uma região
vulnerável influenciam as relações de interdependência competitiva. Para a consecução
dos objetivos de pesquisa serão utilizadas entrevistas, observações e análise de
referências pertinentes.
Palavras-chaves: interdependência, gestores, escolas

Introdução

Inicialmente gostaria de descrever brevemente minha trajetória acadêmica e


profissional, afim de elucidar como cheguei ao tema do presente projeto. Inicialmente
1571

realizei a graduação no curso de Pedagogia (2009), oferecido pela Universidade Norte


do Paraná e pós-graduação Lato Sensu em Psicopedagogia (2013) pela mesma
instituição. Em 2011, tive a oportunidade de ingressar na carreira docente na Escola
Estadual Maria Auxiliadora no município de Alto Araguaia - MT, atuando no 4º ano do
Ensino Fundamental. No ano de 2012, ingressei no projeto de iniciação à docência –
PIBID/CAPES, no subprojeto de Computação/ UNEMAT, atuando como supervisora,
auxiliando os bolsistas na execução do projeto. Buscando o aperfeiçoamento
profissional entrei no Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São Paulo. Ao
entrar no mestrado, consegui afastamento de forma integral do governo de Mato
Grosso. Através da universidade conquistei a bolsa CAPES – Prosup.
O interesse por esse tema surgiu através da aproximação com a Coordenadora Adjunta
do Cenpec, Professora Doutora Vanda Mendes Ribeiro, docente no programa de
mestrado em Educação na Universidade Cidade de São Paulo. Por meio da orientação
surgiu o convite para participar da pesquisa de campo realizada pelo CENPEC1 em uma
escola daquela região. Assim, brotou os primeiros questionamentos para elaborar um
projeto sobre as relações dos gestores escolares com a interdependência competitiva.
Lendo sobre o assunto, percebi que fazia sentido a ideia de que as escolas não agem
sozinhas no território. Por ser professora de uma escola da rede pública de Mato Grosso,
foi possível notar que as escolas consideram o que fazem e como trabalham as demais
escolas que se encontram na sua vizinhança para tomar decisões.

O Campo Teórico: breve discussão

Estudos sobre relações de interdependência competitiva entre escolas


(EUROPEAN COMISSION, 2004; VAN ZANTEN, 2005) asseveram que as escolas
localizadas numa mesma zona ou vinculadas a um mesmo sistema competem entre si
por recursos que lhes permitem se desenvolver ou continuar funcionando. Tais recursos
podem ser estudantes, professores, reputação ou recursos financeiros. Os contextos e
também as regras estabelecidas pelos governos, segundo esses estudos, interferem nas
formas pelas quais as escolas competem entre si. Para esses estudos, as escolas afetam e

1
Pesquisa realizada pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária
(CENPEC) intitulada: “Interdependência competitiva entre escolas em territórios vulneráveis,
desigualdades socioespaciais e qualidade das oportunidades educacionais”.
(http://ftp.cenpec.org.br/com/portalcenpec/imagens/Planejamento_2014_projeto_Interdepend%C3%AAn
cia_28-02-14-editado.pdf)
1572

são afetadas pelas ações de outras escolas de uma mesma zona ou bairro, razão pela
qual há necessariamente relações de interdependência entre elas, ainda que seus atores
não interajam diretamente. De acordo com a European Comission (2004)

Thus the notion of competitive interdependencies signifies that school X is


(directly or indirectly) affected by the logics of action of other schools (the
“offerers”) in the same (or neighbouring) space, by the behaviours of certain
parents (the “consumers”), and this in relation to resources coveted by them
(particularly students, teachers and reputation), and in relationship to which
they are objectively and/or subjectively in competition. (p. 116)

Van Zanten (2005) busca identificar os efeitos da interpendência entre escolas.


A interdependência gera relações diretas ou indiretas entre escolas localizadas em uma
mesma região. A interdependência entre as escolas, para a autora, pode ser de pelo
menos três tipos (colaborativa, burocráticas e a competitiva). O enfoque da autora sobre
a interdependência competitiva se dá devido a resultados de pesquisas que mostraram
que as recentes políticas que visam reforçar a autonomia das escolas impulsionam a
interdependência competitiva (por meio da escolha da escola pelos pais, da seleção de
alunos e da concorrência de professores por escolas).
Embora Van Zanten(2005) em suas pesquisas tenha afirmado esse vínculo entre
políticas de quase-mercado e interdependência competitiva entre escolas, pesquisas
realizadas em São Paulo pelo Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação,
Cultura e Ação Comunitária) desde 2011 sobre as redes de interdependência em uma
zona de alta vulnerabilidade vêm mostrando a presença desse fenômeno na rede pública
do município de São Paulo. Apesar de uma legislação de matrícula que impõe aos pais e
escolas a setorização, diminuindo o grau de autonomia em relação a esse quesito.
(ALVES, ÉRNICA E BATISTA, 2014)
Para Érnica e Batista(2011) as escolas que se situam em territórios menos
vulneráveis levam vantagem em relação às escolas localizadas nas áreas de maior
vulnerabilidade social. Essa vantagem ocorre, segundo as pesquisas, em função da
qualificação e experiências dos professores e dos alunos. Os pesquisadores admitiram a
hipótese de que as escolas ao procurarem evitar alunos considerados “problema”,
podem fortalecer a vantagem de uma escola sobre outra.

É preciso salientar, porém, que mesmo não tendo explicitamente a função de


escolher alunos de melhor desempenho, a seleção baseada no comportamento
pode, com um alto custo social, resultar na construção de um ambiente
escolar mais propício – porque mais disciplinado – ao desenvolvimento do
trabalho pedagógico, e assim, impactar indiretamente a melhoria do
1573

aprendizado daqueles que da escola não são excluídos. (ALVES; ÉRNICA;


BATISTA, 2012. p. ).
Pesquisas indicam também competição para ocuparem escolas de locais menos
vulneráveis. As escolas “se valem das disputas entre os educadores por melhores postos
para conseguir equipes mais estáveis, melhor capacitadas e, desse modo, melhores
resultados” (ÉRNICA E BATISTA, 2011). No caso dos professores, verifica-se que
tendem a usar como critério em concursos de remoção, o nível de vulnerabilidade do
território, fazendo com que aquelas que estão em regiões mais vulneráveis sejam
penalizadas. Segundo Érnica e Batista (2012) as escolas mais vulneráveis tendem
também a não preencher todos os seus postos de trabalho e nelas os professores faltam
mais: “os postos de trabalho não preenchidos e as faltas numerosas de professores
acabam por fragilizar as condições institucionais necessárias para a escola funcionar”
(ÉRNICA E BATISTA, 2012, p. 657).
A direção escolar tem papel fundamental para a melhoria da instituição, segundo
a literatura do campo da eficácia escolar. Estes estudos apontam a gestão escolar como
primordial para a melhoria da aprendizagem. (BROOKE; SOARES, 2008).
Sammons (2008) afirma que a força que os diretores têm no desempenho e
avanço de seus alunos possivelmente age indiretamente por meio da influência que ele
desempenha na cultura da escola e dos professores, nas atitudes e procedimentos, os
quais por sua vez, afetam as práticas de sala de aula e a qualidade do ensino e
aprendizagem.
Se há interdependência competitiva entre as escolas e se o gestor é considerado
elemento fundamental para a eficácia escolar, nosso problema de pesquisa se reporta a
procurar compreender se e como os gestores escolares de uma região vulnerável
influenciam as relações de interdependência competitiva.
Frente à literatura analisada surgem as seguintes questões: Os gestores percebem
o escopo das relações de interdependência competitiva? Na visão dos gestores, quais os
desafios a serem enfrentados frente a essas relações? As relações de interdependência
competitiva afetam o dia-a-dia da gestão escolar? Como?
A hipótese inicial é de que os gestores de escolas localizadas em territórios
vulneráveis visualizam relações de interdependência competitiva entre sua escola e
escolas vizinhas e tomam decisões à luz do que percebem no território, o que interfere
nas configurações dessas relações e no cotidiano escolar.
1574

Diante do problema apresentado o presente projeto se justifica, pois a


interpendência competitiva tende a acirrar as desigualdades escolares. As escolas
localizadas em territórios de alta vulnerabilidade acabam tornando-se locais de
“decantação” de múltiplos problemas. (CENPEC, 2011).
As escolas em áreas de alta vulnerabilidade têm dificuldades de manter e atrair
profissionais qualificados, gerando rotatividade e criando um número maior de
contratações temporárias e falta de professores, fragilizando as instituições. (CENPEC,
2011)
As instituições escolares situadas em locais de menor vulnerabilidade consegue
atrair melhores alunos e profissionais mais qualificados, proporcionando um melhor
funcionamento. Já as escolas que recebem os problemas da rede são levadas ao “limite
da inviabilidade”. (CENPEC, 2011, p. 11)
A concorrência aumenta a diferenças no desempenho escolar

Efetivamente, os alunos com baixos recursos culturais que estudam em


escolas situadas em territórios menos vulneráveis têm desempenho superior
ao de seus pares que estudam nas escolas dos territórios onde os problemas se
concentram e decantam. Esse é o efeito de território atuando sobre a escola,
não somente porque a vulnerabilidade de sua vizinhança a torna também
vulnerável, mas também porque o modelo institucional que a sustenta e as
relações de concorrência entre escolas contribuem para o próprio efeito do
território, gerando uma redução da qualidade das oportunidades educacionais
para a população residente em áreas de alta vulnerabilidade social.
(CENPEC, 2011, p. 13).

Verificar como a gestão escolar atua diante de tais mecanismos é de suma


importância, uma vez que tal pesquisa pode contribuir com outras pesquisas brasileiras
que têm tentado compreender se e como as relações de interdependência influenciam o
dia-a-dia da equipe gestora, engendrando mecanismos que levam à segregação de
alunos com menor capital cultural. Ademais, esta pesquisa poderá ainda oferecer
subsídios para as políticas educacionais que objetivam incidir positivamente sobre os
níveis de desigualdade escolar e da qualidade da educação.

Objetivo Geral

O objetivo geral desta pesquisa é analisar a relação dos gestores escolares com a
interpendência competitiva entre escolas públicas de uma região com altos índices de
vulnerabilidade.
1575

Objetivos Específicos

• Conceituar interdependência competitiva entre escolas;


• Analisar a legislação que regula a matrícula, a remoção e alocação de
professores e gestores escolares e também a distribuição de recursos entre as
escolas do município de São Paulo.
• Identificar se os gestores de escolas vizinhas localizadas em regiões de alta
vulnerabilidade social percebem relações de interdependência competitiva e
contribuem na sua configuração.
• Verificar se e como ações de gestores escolas em torno de relações de
interdependência competitiva existentes entre escolas vizinhas de um território
vulnerável afetam o cotidiano escolar, na visão dos gestores participantes do
estudo.

Metodologia

Para a consecução dos objetivos de pesquisa será utilizada a metodologia de


estudo de caso. Segundo Martins (2006, p. 70) essa metodologia permite compreender o
que é “singular”, específico do fenômeno em questão. Esse autor faz referência a três
tipos de procedimentos que podem subsidiar o estudo de caso: entrevistas, documentos
e observação (p. 75). Nesta pesquisa, esses três procedimentos serão utilizados.
Serão entrevistados o diretor escolar, assistente de direção, coordenador
pedagógico e professores de suas escolas vizinhas localizadas em uma região de alta
vulnerabilidade social do município de São Paulo. As entrevistas visam apreender se os
gestores percebem as relações de interdependência entre escolas; se tomam decisões em
função de tais relações; como vêem os desafios da gestão frente a esse fenômeno.
Pretende ainda obter informações sobre a visão que esses gestores têm sobre o impacto
dessas relações sobre o cotidiano escolar.
No que tange ao estudo de documentos, a literatura afirma que as relações de
interdependência competitiva se configuram, muitas vezes, sob incentivo ou lacunas das
legislações que distribuem os recursos necessários ao funcionamento das instituições
escolares tais como alunos, professores e recursos financeiros. Desse modo, será
1576

necessário conhecer a legislação de modo a facilitar a compreensão da ação e percepção


dos gestores a respeito das relações de interdependência competitiva.
A ação dos gestores escolares no dia-a-dia da escola será também observada o
que permitirá i) verificar situações nas quais tais gestores fazem uso de mecanismos que
configuram relações de interdependência competitiva; ii) estabelecer diálogos com esses
gestores com vistas a identificar suas percepções sobre o fenômeno da interdependência
competitiva entre escolas; iii) observar se ações dos gestores que configuram
mecanismos de interdependência competitiva entre escolas interferem de algum modo
no cotidiano escolar, na visão dos gestores. A observação qualitativa possibilitará
imergir nas ocorrências sociais, conservando a função ativa do pesquisador e
fornecendo análises conexas, evidenciando detalhes e interações. (SAMPIERI et al,
2013).

Etapas:
1 - Análise bibliográfica sobre interdependência competitiva e gestão escolar.
Para o levantamento de referências serão pesquisadas bases como Scielo, Portal Capes,
dentre outras, fazendo uso de palavras-chave como: interdependência competitiva and
escola; concorrência and escola; concorrência entre escolas and segregação, dentre
outras que se verificarem adequadas. Em seguida, as referências centrais serão fichadas,
segundo modelo previamente elaborado, para facilitar a análise dos dados.
2 – Levantamento e análise da legislação que regula matrícula e remoção de
professores
Serão levantadas e estudadas as legislações referentes à matrícula, remoção e alocação
de professores e gestores escolares, bem como sobre distribuição de recursos
financeiros na rede municipal de ensino público de São Paulo.
3 – Observação da ação cotidiana de gestores escolares de suas escolas localizadas
em território de mais alta vulnerabilidade social.
A observação permitirá acompanhar a ação de gestores escolas das duas escolas
pesquisadas durante cinco dias consecutivos.
4 – Entrevistas com gestores escolares.
Serão entrevistados os diretores, assistentes de direção e coordenadores pedagógicos
com base em roteiro pré-estruturado, com questões abertas e fechadas. Lembrando que
as questões não deveram induzir ou confundir os entrevistados, porém é necessário ter
claro o objetivo do estudo (GOLDENBERG, 2004).
1577

5 - Análise das observações realizadas, dos documentos e das entrevistas.


Será realizada análise para evidenciar a inter-relação entre todos os dados coletados.

Referências

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pesquisa-n-3-educacao-territorios-alta-vulnerabilidade-social-metropole-um-caso-na-
periferia-sao-Paulo> Acesso em: 28 abr. 2014.

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Pilar Baptista. Metodologia de pesquisa. 5ª ed., Porto Alegre. Editora Penso, 2013.

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estabelecimentos escolares. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 35, n. 126, set./dez.,
p. 565-593, 2005.
1578

Pôster

O oferecimento de matrículas no pós Fundeb para a educação infantil no estado de


São Paulo

Patrícia Adriana Abdalla


Mestrado em Educação, UNESP– Campus Rio Claro
GREPPE- Grupo de Estudos e Pesquisas em Política Educacional

Resumo: Este trabalho, parte da pesquisa de mestrado em andamento, objetiva


identificar e analisar o crescimento de matrículas na educação infantil pública e
conveniada nos municipios paulistas no periodo 2008 e 2013, para contribuir com as
discussões acerca do processo de privatização do atendimento desta etapa de
escolaridade. Em 2007, com a criação do FUNDEB em substituição do FUNDEF, o
financiamento para a educação infantil tem maior ênfase, inclusive a creches e pré-
escolas privadas sem fins lucrativos, considerando-se então, que se pode haver a
ampliação do atendimento realizado via convênio, e que as matrículas privadas podem
estar sendo contabilizadas como públicas não mostrando a real necessidade dos
municípios.
Palavras-chave: Política educacional, parceria público-privada, FUNDEB.

1 Introdução
Este trabalho1 tem como objetivo identificar e analisar o crescimento de
matrículas na educação infantil pública e conveniada nos municípios paulistas, no
período de 2008 e 2013, que são anos de vigência do FUNDEB. Para tanto, será feita
uma breve explicação sobre temas que envolvem esse assunto e que levam para ele,
como a legislação da educação infantil e os convênios.
A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88), a educação
infantil é tida como um dever do Estado e direito de todas as crianças entre 0 e 6 anos.
Ainda na CF/88, no artigo 12, o financiamento do ensino público é assegurado, já que a

1
Este trabalho faz parte da pesquisa da dissertação de mestrado em andamento.
1579

União deverá aplicar pelo menos 18%, e os Estados, Distrito Federal e Municípios 25%
da receita proveniente dos impostos para a educação.
Com a obrigatoriedade do oferecimento de vagas, são feitos documentos legais,
para a garantia de que esse oferecimento de fato aconteça, dentre eles, a LDB2, que em
seu Art. 2º, trata que a educação é “dever da família e do Estado”. Para tanto, o
oferecimento da educação infantil e do ensino fundamental se dará através dos
municípios, como destacado no artigo V.
A Emenda Constitucional n.º 14/96, aprovou a criação do Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF),
que priorizou o financiamento do ensino fundamental, com os recursos subvinculados
para a educação e regulamentado pela LDB. O FUNDEF consiste ainda, na mudança de
financiamento do Ensino Fundamental no País (1ª a 8ª séries), a Constituição de 1988
vincula 25% das receitas dos Estados e Municípios à Educação. Com a Emenda
Constitucional nº 14/96, 60% desses recursos (o que representa 15% da arrecadação
global de Estados e Municípios) ficam reservados ao Ensino Fundamental
(MINISTÉRIO PÚBLICO, s/a).
Como evidencia Romualdo Oliveira (2007), o FUNDEF sendo um fundo de
natureza contábil e com os recursos focados no ensino fundamental, outras etapas da
educação básica sofreram impactos negativos significativos, e com a educação infantil
historicamente reprimida, fez com que se reduzissem os investimentos para esta etapa.
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) – que substitui o FUNDEF -
atende toda a educação básica, da creche ao ensino médio, está em vigor desde janeiro
de 2007 e se estenderá até 2020 (MEC, 2012). O fundo tem o intuito de distribuir verbas
para a educação básica no país.
Diferente do FUNDEF, o novo Fundo inclui toda a educação básica, e possibilita
repasse de verbas para instituições conveniadas - creches e pré-escolas privadas - sem
fins lucrativos. Oliveira e Borghi (2013) trazem que assim como o FUNDEF, o Fundeb
também é um fundo de natureza contábil, e com este novo fundo alcançando toda a
educação básica, novos impostos foram incorporados para sua composição, mas que
novamente não apresenta nenhuma fonte de recursos novos.

2
Lei n.º 9394, de 1996 – Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação
1580

Ainda na LDB, é apresentada uma seção, mesmo que pequena dedicada à


educação infantil, da qual destaca-se o Art. 30, que a educação infantil será oferecida
em creches e pré-escolas, sendo no texto original da LDB, a educação infantil oferecida
para crianças entre 0 a 3 anos na creche e de 4 a 6 anos na pré-escola com a
promulgação da lei n.º 11.114, de 16 de maio de 2005, a educação infantil passou a
compreender a creche para crianças entre 0 a 3 anos e pré-escolas para crianças de 4 a 5
anos. Essa diferença de idade se deu por conta da implantação do ensino fundamental de
9 anos.3
No Art. 77 da LDB/96, trata que o seu financiamento será destinado a escola
públicas, podendo ser destinados a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas
que comprovem seu fim não lucrativo, dentre outros fatores.

2 Os convênios
Após a implantação da LDB, os municípios tiveram um prazo de 3 anos para se
adaptarem e oferecerem as vagas necessárias para a educação infantil.
O atendimento em creches tem o seu inicio a partir não só de iniciativas do
poder público, mas também das próprias comunidades, principalmente em instituições
comunitárias, filantrópicas e assistenciais. Essas instituições privadas receberam
subsídios públicos, razão pela qual o Estado, ou a ausência deste na oferta dessa
política, aparece, desde sempre, como indutor da proliferação de convênios entre a
esfera pública e a privada. Esse formato de oferta implicava ou na total ausência de
atendimento público à faixa etária ou na coexistência de instituição públicas e privadas
sem fins lucrativos subsidiadas por recursos públicos. Destaca-se ainda a vigência de
creches privadas particulares as quais são financiadas exclusivamente pelas famílias
(ADRIÃO, ARELARO, BORGHI, 2009).
Outra alternativa utilizada desde a década de 1970, é o estabelecimento de
convênios do governo municipal com instituições privadas sem fins lucrativos, que teve
como objetivo oferecer educação infantil gratuita em espaços privados (BORGHI,
ADRIÃO, ARELARO, 2009).Pode-se observar que o repasse de verbas públicas para
instituições privadas é facultativo e de escolha política (OLIVEIRA, 2013).
Como aponta Pinto (2007, p.881):

3
A partir da implantação da Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, que altera a redação dos arts. 29,
30, 32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
1581

O sistema de financiamento só não entrou em colapso porque o FUNDEF, e


agora o FUNDEB, transferem recursos de uma esfera de governo para a
outra, mas considerando que os fundos são transitórios, montou-se uma
bomba de efeito retardado com data certa para explodir: 31 de dezembro de
2020, quando finda o FUNDEB. Se nenhuma medida de caráter permanente
for tomada neste ínterim, o país viverá naquela data uma grave crise no pacto
federativo, pois os municípios ficarão com um número de alunos muito
superior à sua capacidade de financiamento.

Assim, os convênios, como apontam Correa e Adrião (2010), são alternativas de


baixo custo que tem expandido, mas ressaltam que o recurso público se dirige para
entidades privadas, e o poder público se distancia do investimento e ampliação da
própria rede.
Mais adiante, em 2009, a partir da consolidação dos convênios, o MEC lançou
um documento intitulado “Orientações sobre convênios entre secretarias municipais de
educação e instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos
para a oferta de educação infantil”, onde estabelece as orientações sobre os
conveniamentos, o que possivelmente vai ser mais um indutor para a ampliação de
parcerias/convênios.

3 As matrículas
Os anos considerados para a pesquisa foram os anos de 2008 e 2013, anos de
início efetivo do FUNDEB e ano que constam os últimos dados a respeito da matrícula.
Os dados foram colhidos do site do FNDE, que contém o número de matrículas,
separadas por creches públicas e conveniadas, e pré escolas públicas e conveniadas,
sendo possível fazer um comparativo.
Dos 645 municípios do estado de São Paulo, em 2008, 225 municípios
ofereciam creche ou pré-escola conveniada. Como exemplo, foram pegos 12 municípios
para discussão, sendo 2 para tamanhos4 de municípios designado em muitos pequenos –
Águas da Prata e Américo Brasiliense (até 10 mil habitantes) -, pequenos – Adamantina
e Bastos (de 10 a 50 mil habitantes) -, médios – Andradina e Bebebouro (de 50 mil a
100 mil habitantes) -, grandes – Americana e Botucatu (de 100 mil a 500 mil habitantes)

4
Esta divisão por habitantes foi feita a partir da divisão original do Banco de Dados de Parcerias Públicas
e Privadas, disponível em http://www.fae.unicamp.br/greppe/bd/pesquisas/pesqdados.php. , a partir dos
dados do Censo Demográfico do IBGE de 2010. Os números de matrículas divididos entre público e
conveniado estão disponíveis no site do FNDE <http://www.fnde.gov.br/financiamento/fundeb/fundeb-
consultas/matr%C3%ADculas-da-educa%C3%A7%C3%A3o-b%C3%A1sica,-estimativa-da-receita-
anual-e-coeficientes-de-distribui%C3%A7%C3%A3o-dos-recursos>
1582

-, muito grandes – Osasco e Sorocaba (de 500 mil a 1 milhão de habitantes) -, e


metropolitanos – Campinas e São Paulo (com mais de 1 milhão de habitantes).

Tabela 1: Exemplos de matrículas do ano de 2008.


MUNICÍPIO CRECHE CRECHE PRÉ ESCOLA PRÉ ESCOLA
PÚBLICA CONVENIADA PUBLICA CONVENIADA
Águas da Prata 13,3 19,3 156 -
Américo de - 27,3 123,3 37,3
Campos
Adamantina 208,7 20 543,4 -
Bastos 93,3 48 340,7 -
Andradina 145,3 38 1010,7 18
Bebedouro 500 44,7 947,3 -
Americana 1022,7 78 3262,7 111,3
Botucatu 587,3 147,4 1706 249,3
Osasco 2771,3 31,3 11817,3 -
Sorocaba 2478,7 130 9963,3 144
Campinas 4756,7 692,6 12428,6 893,4
São Paulo 22253,3 16366,6 178792,7 21438
Autor: ABDALLA, P. A. 2014.

Como é possível observar na tabela, nos municípios muito pequenos, as


matrículas da creche conveniada são maiores que as vagas da creche pública, como no
caso de Américo de Campos em que não existem matrículas públicas, enquanto a pré-
escola pública fica com todas ou a maioria das vagas. Nos municípios pequenos as
vagas públicas são a maioria, sendo que as vagas conveniadas representam uma
pequena parcela das matrículas ou não são oferecidas através dos convênios e o mesmo
acontece com os municípios médios. Já nos municípios grandes, se vê que o número de
matrículas conveniadas é menor que as matrículas públicas, mas disparam em relação
aos municípios citados até agora, sendo possível ver essa relação também com os
municípios muito grandes e metropolitanos, onde o número das matrículas conveniadas
representa um número significativo quanto ao total de matrículas do município.
1583

No ano de 2013, 207 municípios do estado ofereceram creche ou pré-escola


conveniada. Como exemplo, foram pegos 12 municípios que foram para discussão,
sendo 2 para tamanhos de municípios designado em muitos pequenos – Adolfo e
Cristais Paulista, pequenos – Adamantina e Barra Bonita, médios – Jaboticabal e
Mirassol, grandes – Jaú e Jundiaí, muito grandes – Ribeirão Preto e Santo André, e
metropolitanos – Campinas e São Paulo, não sendo necessariamente os mesmos de
2008, pois alguns não mantiveram creches ou pré-escolas conveniadas.

Tabela 2: Exemplos de matrículas do ano de 2013.


MUNICÍPIO CRECHE CRECHE PRÉ ESCOLA PRÉ ESCOLA
PÚBLICA CONVENIADA PUBLICA CONVENIADA
Adolfo - 53 37 46
Cristais 50 71 2219 -
Paulista
Adamantina 438 88 588 -
Barra Bonita 172 362 629 -
Jaboticabal 888 76 1209 44
Mirassol 649 231 1009 28
Jaú 1265 554 2639 48
Jundiaí 4096 202 6830 -
Ribeirão Preto 8325 1164 7983 1175
Santo André 4422 1329 8669 1320
Campinas 14858 2281 15676 3878
São Paulo 60574 144778 180536 2612
Autor: ABDALLA, P. A. 2014.

Nesta tabela é possível observar que nos municípios muito pequenos, as


matrículas da creche conveniada são maiores que as vagas da creche pública, como no
caso de Adolfo em que não existem matrículas públicas, enquanto a pré-escola pública
fica com todas ou a maioria das vagas. Nos municípios pequenos as matrículas públicas
são a maioria, sendo que as vagas conveniadas representam uma pequena parcela das
matrículas ou não são oferecidas através dos convênios e o mesmo acontece com os
municípios médios. Já nos municípios grandes, se vê que o número de matrículas
1584

conveniadas é menor que as matrículas públicas, mas disparam em relação aos


municípios citados até agora, sendo possível ver essa relação também com os
municípios muito grandes e metropolitanos, onde o número das matrículas conveniadas
representa um número significativo quanto ao total de matrículas do município, se
assemelhando bastante ao ano de 2008 e mostrando que o convênio é uma alternativa
bastante praticada.

4 Considerações finais
As organizações da sociedade mudaram o conceito e o sentimento da infância
determinado historicamente. No Brasil, a formação das creches também seguiu o forte
caráter assistencialista.
Nos anos 90, deu-se maior ênfase na educação das crianças pequenas. Com o
estabelecimento da LDB, com a obrigatoriedade da educação infantil, é passada a ser
oferecida em creches e pré-escolas. No que se refere ao seu financiamento, o mesmo
documento destina os recursos públicos para atender as escolas públicas, podendo
também ser destinados a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas que
declarem não ter fins lucrativos. Dessa forma, começam a ser possibilitados os
convênios.
Ainda em 1996, é aprovada a criação do FUNDEF, que com a priorização do
ensino fundamental quanto ao seu financiamento, deixa a educação infantil em segundo
plano. Porém em 2007, este Fundo é substituído pelo FUNDEB, que vem com o intuito
da valorização também do ensino infantil, garantindo assim o seu financiamento. No
entanto, esse financiamento também é permitido a creches e pré-escolas privadas sem
fins lucrativos, considerando-se então, que se pode haver a ampliação do atendimento
realizado via convênio.
Assim, experiências de parcerias público-privado se ampliam, subsidiadas pelo
poder público, ficando este responsável por financiar parte ou total deste atendimento,
naturalizando o repasse de recursos públicos as instituições privadas.
Assim, observamos que os convênios, legitimados pela atual legislação e
impulsionados tanto pela esfera pública e/ou privada, estão em expansão, e em alguns
municípios representam a única forma de atender a essa faixa etária, mostrando o
equívoco de muitos municípios de aderir a esse tipo de atendimento municipal, e
repassar as verbas municipais para esses fins, ao invés de investir para a construção e
manutenção de instituições públicas.
1585

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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oferta da educação infantil: continuidades e rupturas. In: XXIV Simpósio Brasileiro
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democrática da educação, 2009. p. 1-19.

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educação e instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins
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Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais
da Educação - FUNDEB, de que trata o art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias; altera a Lei no 10.195, de 14 de fevereiro de 2001; revoga dispositivos das
Leis nos 9.424, de 24 de dezembro de 1996, 10.880, de 9 de junho de 2004, e 10.845, de
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ensino fundamental aos seis anos de idade.. Disponivel em: <
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32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases
da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino
fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade.. Disponivel
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11274.htm>
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1587

Pôster

Ensino Médio Integrado: Um campo de tensão no exercício da docência

Priscila Martins Diniz


Universidade Cidade de São Paulo - UNICID

Resumo: A presente pesquisa tange a integração do Ensino Médio com a educação


profissional. Este processo foi estabelecido por meio do Decreto n° 5.154/2004, e fez
emergir problemas relativos à integração dos componentes da base comum do Ensino
Médio com os componentes curriculares do Ensino Técnico. Ao integrar essas duas
modalidades de ensino, ambas com formações curriculares próprias, percebe-se que a
sua aplicação torna-se complexa, especialmente na articulação para promover uma
verdadeira integração, por meio da qual a educação profissional e ensino regular se
complementam, formando uma totalidade.
Os educadores se encontram nesse campo de tensão, buscando construir um novo papel
do professor, sendo assim, esta pesquisa objetiva compreender a perspectiva do
educador no processo de ensino e aprendizagem na modalidade de Ensino Médio
Integrado.
Palavras Chave: Ensino Médio Integrado, Educação Profissional, Educação Técnica.

1. INTRODUÇÃO
Os desafios referentes ao Ensino Médio estão presentes na pauta de discussões
dos órgãos governamentais e de instituições públicas e privadas, principalmente após a
década de 80, mas é somente em 1996, com a Lei Federal n° 9.394 (LDB) que o Ensino
Médio é integrado à Educação Básica. Essa Lei vem recebendo sucessivas alterações
sendo que em 2004, a ela foi incorporado o Decreto n° 5.154, que dentre outras
medidas, resgata o Ensino Médio integrado com a educação profissional técnica.
A partir desse Decreto, o Ministério da Educação (MEC) adota uma estratégia para a
ampliação e melhoria do Ensino Médio apoiada em vários eixos, sendo que no início de
2011, com o objetivo de ampliar o acesso à educação profissional dos jovens do Ensino
Médio e dos trabalhadores sem formação, a presidência da República anunciou o
Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), instituído pela
Lei n° 12.513/2011.
1588

Nesse cenário, o Centro de Educação Tecnológica Paula Souza (CPS) - autarquia do


Governo do Estado de São Paulo vinculada à Secretaria de Desenvolvimento
Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação, que administra Faculdades de Tecnologia
(Fatecs) e Escolas Técnicas Estaduais (Etecs) - já oferecia em suas unidades o Ensino
Médio, e acaba por implantar o ETIM, (Ensino Técnico Integrado ao Médio).
Sob esse foco, todas as Etecs no estado de São Paulo estão em processo de implantação
gradual dessa modalidade de ensino, com planos de curso que foram elaborados pelo
setor responsável pelos currículos no Centro Paula Souza. Assim, cada Etec escolhe o
curso que irá implantar de acordo com a demanda das empresas locais e também de
acordo com a infraestrutura que já possui para os cursos técnicos.
A formação profissional por competências é uma das metas político-pedagógicas da
Unidade de Ensino Médio Técnico – CETEC do Centro Paula Souza, que se associa ao
objetivo de atender e antecipar-se às demandas sociais e do mercado de trabalho.1
O processo de implantação dos cursos integrados fez emergir alguns problemas
relativos ao ensino por competências, assim como no que se refere à integração dos
componentes da base comum do Ensino Médio, com os componentes curriculares do
ensino técnico. Os educadores se encontram em momento de construção do novo papel
do professor, sendo assim, este projeto de pesquisa busca contextualizar o Ensino
Médio integrado ao Ensino Técnico, trazendo questões ligadas ao processo
interdisciplinar2, no que se refere à integração dos componentes curriculares no curso
técnico em administração.
O horizonte dessa modalidade de ensino é a inserção do aluno no mundo do trabalho,
assegurando que ele receba uma educação de qualidade, que garanta a esse jovem a
aquisição de competências essenciais para o desenvolvimento da cidadania.
Partindo da estruturação da Taxonomia de Bloom3 no domínio cognitivo, a pesquisa
tem como objetivo geral:
Compreender a perspectiva do professor no processo de ensino e aprendizagem, no
curso do ensino médio integrado ao técnico em administração.

1
Fonte: Centro Paula Souza, Unidade de Ensino Médio e Técnico – Cetec.
2
Na obra, Inter ou Transdisciplinaridade, Américo Sommerman apresenta a hierarquização nos níveis de
colaboração e integração entre as disciplinas proposta por Piaget, sendo a interdisciplinaridade o segundo
nível de associação entre as disciplinas, em que a cooperação entre as mesmas provoca intercâmbios
reais; isto é, existe verdadeira reciprocidade nos intercâmbios e, consequentemente, enriquecimentos
mútuos. (2006, p. 33).
3
Taxonomia de Bloom é uma estrutura de organização hierárquica de objetivos educacionais. Foi
resultado do trabalho de uma comissão multidisplinar de especialistas de várias universidades dos Estados
Unidos, liderada por Benjamin S. Bloom, na década de 1950.
1589

E como objetivo específico, contextualizar o cenário do ensino médio integrado com a


educação profissional técnica, mediante o Decreto 5.154/2004.
Verificar de que forma os professores tratam questões técnicas e profissionais no que
tange ao processo interdisciplinar no ensino integrado.
Analisar como os educadores da base comum do ensino médio elaboram o seu plano de
aula focando no desenvolvimento dos componentes curriculares da base profissional.
Identificar diferentes metodologias utilizadas pelos professores no ensino por
competências.
Com esta questão pretende-se demonstrar como proporcionar a integração dos diversos
componentes curriculares do ensino médio integrado ao técnico, partindo da visão do
educador no contexto interdisciplinar, assim contribuindo para a formação dos
educandos, e para o desenvolvimento de seres humanos que integrarão o setor produtivo
da sociedade em que vivem, proporcionando situações de construção de competências
sociais e emocionais para lidar com as diversas situações do cotidiano.

Justificativa e Relevância do tema

Mais de 344 mil candidatos se inscreveram no processo seletivo das escolas técnicas
estaduais (Etecs) no final de 2013 para ingresso no primeiro semestre de 2014. Em
relação às dez maiores demandas do estado nos cursos técnicos integrado ao ensino
médio, a modalidade técnico em administração aparece 5 vezes na lista, ou seja o curso
está entre as opções de escolha da maioria dos candidatos que optam pelo ensino técnico
integrado ao ensino médio.4
Ao integrar essas duas modalidades de ensino, ambas com formação curriculares
próprias, percebe-se que a sua aplicação torna-se mais complexa, especialmente na
articulação para promover uma verdadeira integração, por meio da qual a educação
profissional e o ensino regular se complementam, formando uma totalidade.
Para tanto, o decreto n° 5.154/04, na sua exposição de motivos, argumenta que a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) em seu artigo 39 apregoa que “a
educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência
e à tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida
produtiva”. Desse modo, conclui-se que a integração da educação profissional com o

4
Fonte: Centro Paula Souza, relatório de demandas de cursos do Centro Paula Souza 1° semestre de
2014.
1590

processo produtivo e com o desenvolvimento científico-tecnológico, é antes de tudo um


princípio a ser seguido.

Percebe-se que a concepção dessa modalidade de ensino é clara, nos textos oficiais,
porém na prática pedagógica, nota-se a grande dificuldade de trabalho em conjunto das
duas vertentes, ensino propedêutico e ensino profissional. Há muitos reflexos do
processo geral de especialização na sociedade, que gerou um número crescente de
disciplinas e profissões distintas.

Para superar essas dificuldades, se faz imprescindível o preparo do educador para atuar
cultivando habilidades integradoras, tornando-se mediador nesse processo, conduzindo
o educando na construção do conhecimento e na educação profissional, atrelando ao
conhecimento, o mundo real e social do educando. Nesse panorama, Vygotsky (1984)
identifica dois níveis de desenvolvimento, o real e o potencial, sendo que o real se refere
às conquistas já efetivadas pelo educando e partindo da ideia de que cada indivíduo é
uma síntese individualizada e ativa de uma sociedade, uma reapropriação singular do
universo social e histórico que o envolve, o educador deve apropriar-se do repertório
que o aluno traz na bagagem, e assim conduzi-lo no processo de ensino e aprendizagem
efetivando as competências que estão no seu nível de desenvolvimento potencial que,
segundo Vygotsky (1984) se relaciona com as capacidades em vias de serem
construídas. Assim ele afirma que “aquilo que é zona de desenvolvimento proximal hoje
será o nível de desenvolvimento real amanhã- ou seja, aquilo que o educando pode fazer
com assistência hoje, ele será capaz de fazer sozinho amanhã.” (VYGOTSKY, 1984,
p.98).

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Com o propósito de atingir os objetivos da pesquisa, a proposta é desenvolvê-la sob a
perspectiva da pesquisa exploratória. Sendo assim, os procedimentos metodológicos
utilizados para efetivação da pesquisa serão: levantamento bibliográfico, documental e
grupo focal.
É possível que a Aprendizagem Baseada em Projetos - ABP seja um caminho a ser
traçado como parte do processo de integração nos cursos de ensino médio integrado ao
técnico, pois oferece aos educandos a oportunidade de aprender a trabalhar em grupo e
1591

realizar tarefas comuns, exigindo que os educandos monitorem o seu próprio


desempenho e suas contribuições ao grupo.
Na pedagogia de projetos, pode-se citar vários estudos relacionados à aprendizagem
baseada em problemas que também pode se revelar como ferramenta a ser utilizada nas
inter relações para o ensino integrado.
Outras ferramentas como o modelo BIE5 de projetos, que tem por objetivo estabelecer
uma ABP focada em que as metas e padrões curriculares específicos possam ser
alcançados apresenta um panorama atraente para essa modalidade de ensino.

5. REFERÊNCIAS

ALARCÃO, I. (org). Formação Reflexiva de Professores: Estratégias de supervisão.


Porto, PT. Porto Editora, 2005.

ARAÚJO, U.F. – SASTRE, G. (orgs). Aprendizagem baseada em problemas no ensino


superior. São Paulo: Summus, 2009.

BERKENBROCK-ROSITO, Margaréte – HAAS, Celia Maria (orgs.).


Interdisciplinaridade e transdisciplinaridade: políticas e práticas de formação de
professores. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2014.

BRASIL. Lei n° 9.394, de 20/12/1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação


nacional. Coletânea de Leis da Casa Civil da Presidência da República Federativa do
Brasil, Brasília, DF, 1996.

BRASIL. Decreto n° 5.154, de 23/07/2004. Regulamenta o § 2° do art. 36 e os arts. 39


a 41 da Lei n° 9.394, de 20/12/1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional, e dá outras providências. Coletânea de Leis da Casa Civil da Presidência da
República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 2004.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de


educação Básica. Proposta de experiência curricular inovadora no ensino médio.
Brasília.: MEC/CNE, 2009.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CEB


n° 5/2011, aprovado em 5 de maio de 2011. Diretrizes Curriculares Nacionais para o
Ensino Médio. Brasília: MEC/CNE, 2011.

BRASIL. Lei n° 12.513, de 26/10/2011. Institui o Programa Nacional de Acesso ao


Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). Coletânea de Leis da Casa Civil da Presidência
da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 2011.

5
BIE – Buk Institute for Education: trata-se de uma organização de pesquisa norte americana, que
trabalha com educadores em vários países para tornar escolas e salas de aula mais eficazes por meio do
uso de ABP
1592

AUR, B. A. Integração entre o ensino médio e a educação profissional. In:


REGATTIERI, M. e CASTRO J.M. (Orgs.). Ensino Médio e Educação Profissional:
desafios da integração. 2. Ed. Ver. Brasília: UNESCO, 2010.

AUR, B. A. e CASTRO J.M. Proposições para a diversidade. 2. Ed. Brasília:


UNESCO, 2012.

BRASIL. Ministério da Educação. Educação profissional técnica de nível médio


integrada ao ensino médio. Documento base. Brasília: MEC, 2007.

D’AMBRÓSIO, U. Transdisciplinaridade. São Paulo: Palas Athena, 1997.

FAZENDA, I. (org). Didática e Interdisciplinaridade. Campinas, SP: Papirus, 1998.

FURLANETTO, E.C. A prática interdisciplinar: Educação e formação. Revista do


Congresso de Educação Continuada – Polo: 7 PEC-UNITAU. Taubaté: 1998.

NOGUEIRA, R. N. Pedagogia dos Projetos. São Paulo, SP: Érica, 2010.

REGO, Tereza Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico cultural da educação.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

SOMMERMAN, A. Inter ou Transdisciplinaridade?: da fragmentação disciplinar ao


novo diálogo entre os saberes. São Paulo: Paulus, 2006.

VYGOTSKI, L.S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos


psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
1593

Pôster

Reorganização dos ciclos no município de São Paulo no ano de 2014 e a prática


pedagógica: algumas considerações

Rafaela de Barros Souza


UNIFESP
Marieta Gouvêa de Oliveira Penna
UNIFESP

Resumo: Esta pesquisa, ainda em andamento, busca compreender os possíveis efeitos


na prática docente das reformas curriculares de reorganização do ensino realizadas pela
SME de São Paulo no ano de 2014. Pretende-se identificar como tal reforma é absorvida
pela escola, sob a perspectiva dos docentes que atuam no Ciclo Interdisciplinar,
considerando a organização dos tempos, espaços e condições de trabalho no cotidiano
escolar. Trata-se de pesquisa qualitativa, que implica um aprofundamento no contexto
em que o fenômeno é observado. Para a coleta dos dados, será utilizada fonte
documental e entrevistas com professores. Os conceitos de cultura escolar de Juliá e
currículo em ação de Sacristán são as principais referencias teóricas para análise dos
dados. Neste recorte, apresentamos análise preliminar realizada nos documentos que
orientam as ações de implantação da reforma em São Paulo, evidenciando novas formas
de organização dos tempos e espaços escolares.
Palavra-chave: reforma curricular; currículo; prática pedagógica.

Introdução
A busca pela qualidade tem se apresentado como um novo paradigma para a
educação brasileira nos últimos anos. Em meio a essa busca, os sistemas de ensino têm
lançado constantemente programas e projetos cujos focos principais quase sempre
permeiam o currículo e a prática pedagógica. Parte-se do suposto que tais propostas
chegam ao cotidiano escolar e encontram uma grande diversidade de contextos, sujeitos
e circunstâncias (SACRISTÁN, 2011).
O interesse desta pesquisa centra-se no atual o programa de reorganização
curricular estabelecido no município de São Paulo, lançado por meio de uma portaria de
reestruturação dos ciclos (SÃO PAULO, 2013b). Apesar da implantação dessa política
1594

ser incipiente, debruçar-se sobre ela pode trazer valiosas reflexões no que diz respeito às
relações entre práticas cotidianas e reformas educacionais. Toda proposta de mudança
ao chegar à escola implica um momento de compreensão, de difusão por parte da
secretaria municipal de educação e, sobretudo, de adaptação dos professores. Ao
realizarem os planejamentos neste ano de 2014 os professores da rede municipal de São
Paulo tiveram que remodelar suas práticas considerando as novas proposições. Num
espaço curto de tempo, vemos no sistema de ensino municipal propostas que – embora
vinculadas a gestões diferentes – se aproximam, ao evidenciaram preocupação por
remodelar o currículo e oferecer orientações didáticas aos professores, nas quais suas
origens e implicações são de ordem micro e macro sociológicas.
Nesta pesquisa, ainda em andamento, pretende-se identificar como tal reforma é
absorvida pela escola, sob a perspectiva dos docentes que atuam no Ciclo
Interdisciplinar, considerando a organização dos tempos, espaços e condições de
trabalho no cotidiano escolar. Para tanto, foi realizada uma primeira análise dos
documentos que orientam as ações de implantação da nova proposta da Secretaria
Municipal de Educação de São Paulo (SME), que apresentamos neste pôster.

Políticas educacionais, contexto neoliberal e a qualidade como um novo paradigma


A implantação de reformas educacionais desenvolvidas em vários países da
América Latina nos anos 1990 foi baseada nas recomendações dos organismos
internacionais e tive como principais eixos as premissas da nova ordem neoliberal
(TORRES, 1996). Aspectos como o desenvolvimento produtivo; profissionalização da
gestão, sua descentralização e responsabilização acerca dos resultados; desenvolvimento
da qualidade com equidade; flexibilização do currículo, caracterizaram as estratégia
centradas na gestão educacional a fim de melhorar a eficácia dos sistemas educativos1
(UNESCO, 1987). Isso porque os sistemas públicos de ensino latino-americanos foram
considerados ineficazes, improdutivos, com práticas pedagógicas desatualizadas e
desvinculadas das novas exigências postas pela transformação produtiva (CANDAU,
2001; GENTILLI, 1996). Como consequência, identifica-se certa homogeneidade no
discurso sobre a atual crise da educação e a inevitabilidade das mudanças. As palavras
de ordem são: descentralização, qualidade, competitividade, equidade, reforma
curricular, transversalidade, novas tecnologias, dentre outras de caráter mais

1
Projeto Principal de Educação, texto oriundo do encontro realizado em Bogotá no ano de 1987.
1595

secundários (CANDAU, 2001). É nesse contexto que as reformas educacionais


necessitam ser compreendidas, ou seja, permeadas pela lógica econômica, para além de
supostos pedagógicos.

Reformas do currículo e prática docente


Sacristán (1998) entende que uma reforma abarca desde uma simples ação sobre
um aspecto parcial do sistema educativo, ou mesmo mudanças que envolvem outros
aspectos do conjunto. Ao estudar mudanças curriculares ocorridas na Espanha,
identifica que os programas empreendidos por parte dos governos compõem ações
delimitas no tempo, expressando que são medidas de política educativa, com anúncio de
melhorias. Pensando assim, associa o ato de fazer reformas ao ato de fazer política.
No contexto municipal aqui analisado assistimos ao surgimento de programas
que estiveram vinculados às mudanças de administração. De um modo ou de outro,
anunciam-se como propostas que fornecerão modificações e atenderão às necessidades
do presente. Destacam-se também por proporem interferências no currículo e ações que
incidem sobre a prática docente, tais como programas de reorganização curricular,
publicação de material voltado aos professores, distribuição de livros didáticos, cursos
de formação para explicar as novas propostas pedagógicas.
A fim de se compreender tais reformas, Sacristán (1998) aponta que algumas
ações políticas sobre o currículo se equivocam ao vincularem a ideia da reforma como
equivalente ao progresso, ou colocarem em condições de desigualdade os reformadores
e os receptores das reformas. Na tentativa estabelecer formas técnicas e novos
procedimentos para o desenvolvimento do currículo, acabam por deslegitimar os
saberes teóricos e práticos dos professores, muitas vezes desmobilizando e gerando
descrenças entre os docentes.
A escola é o espaço social em que tais políticas educativas se efetivam e
enquanto tal são passíveis de recriações. Assim, se por um lado é importante
compreender as reformas dentro de um contexto globalizado, também é relevante
atentar para o fato de que as apropriações, em suas formas locais, são permeadas por
forças internas intrínsecas às instituições em sua forma escolar. As prescrições de
reorganização do ensino e as práticas possuem uma relação de interdependência, que
necessitam ser compreendidas (SACRISTÁN, 2011).
1596

Reformas do ensino, programas curriculares e prática docente no município de


São Paulo
O sistema de ensino municipal em São Paulo viveu nos últimos oito anos
algumas mudanças importantes no que diz respeito aos programas curriculares. No ano
de 2005 foi criado o programa “Ler e Escrever: prioridade na escola municipal” cujo
principal objetivo era reverter o quadro de fracasso escolar ocasionado pelo
analfabetismo e pela alfabetização precária dos alunos do Ensino Fundamental e Médio
da rede (SÃO PAULO, 2005).
Com uma expressiva ênfase no trabalho com diversos gêneros textuais, e a
priorização das disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática, materiais voltados para
o aluno e para o professor chegaram às escolas entre os anos de 2006 e 2007. Eram
compostos por três projetos: “Toda força ao primeiro ano”, que intensifica a ênfase da
alfabetização no primeiro ano do ensino fundamental I (TOF); “Projeto Intensivo no
ciclo I”, que reúne alunos retidos nos anos finais do Ensino Fundamental I e reforça a
alfabetização (PIC) e “Ler e Escrever em todas as áreas do conhecimento no ciclo II”,
no qual delega a todos os componentes curriculares a responsabilidade sobre o trabalho
de leitura e escrita (SÃO PAULO, 2005).
No ano de 2008, atrelado às propostas da gestão Gilberto Kassab, com
Alexandre Schneider no comando da SME, foi proposto o “Programa de Orientação
Curricular do Ensino Fundamental” (SÃO PAULO, 2008), instituindo conteúdos,
objetivos e expectativas de aprendizagem para cada ano e área do conhecimento, com o
objetivo de subsidiar as escolas no processo de seleção e organização dos conteúdos
escolares. Foram entregues às escolas documentação estabelecendo expectativas de
aprendizagem para cada área do conhecimento, nos níveis I e II do Ensino Fundamental
e da Educação Infantil. Até então a proposta curricular oficial eram os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN) publicados em 1996.
Em 2013 assume uma nova administração com Fernando Haddad como prefeito
e César Calegari como secretário de educação. A preocupação com as questões
curriculares e com a prática continua se fazendo presente nos programas de governo. Já
nesse mesmo ano foram publicados documentos com orientações técnicas. A SME
lançou no mês de setembro as “Interfaces Curriculares” (SÃO PAULO, 2013a), que
evidencia preocupação com o currículo, com a prática docente e com o espaço da sala
de aula. A administração, a fim de melhorar a aprendizagem dos alunos, propôs uma
1597

nova organização do ensino por ciclos. Ainda, aderiu ao “Programa Mais Educação” 2,
que prevê ampliação da carga horária de Português e Matemática. Com relação aos
ciclos, fica estabelecido que:

O Ensino Fundamental será dividido, a partir de 2014, em três ciclos com três
anos de duração. O primeiro deles será o Ciclo de Alfabetização, seguido do
Ciclo Interdisciplinar e, por fim, do Ciclo Autoral. Já no Ciclo de
Alfabetização haverá acréscimo de uma hora-aula por semana nos
componentes curriculares de língua portuguesa e matemática [...] (SÃO
PAULO, 2013b).

A reorganização dos ciclos está sendo uma das marcas dessa administração,
medida que interfere diretamente na prática pedagógica e na organização curricular.
Além de mudanças na sua estrutura e denominação, a portaria 5930/13, de outubro de
2013 (SÃO PAULO, 2013b), prescreve alterações nas formas de atuar em cada uma
destas etapas de ensino. Neste estudo, importa especificamente compreender as formas
como o Ciclo Interdisciplinar está se organizando nas escolas, uma vez que é inovador,
ao propor trabalho conjunto entre os professores do Ensino Fundamental I e o Ensino
Fundamental II.

O Ciclo Interdisciplinar
De acordo com os materiais consultados, fica estabelecido:

[...] Ciclo Interdisciplinar: compreendendo do 4º ao 6º anos do Ensino


Fundamental, com a finalidade de aproximar os diferentes ciclos por meio da
interdisciplinaridade e permitir uma passagem gradativa de uma para outra
fase de desenvolvimento, bem como, consolidar o processo de
alfabetização/letramento e de resolução de problemas matemáticos com
autonomia para a leitura e a escrita, gêneros textuais e literários e
comunicando-se com fluência e com raciocínio lógico (SÃO PAULO,
2013c).

Sobre os professores que atuarão nesta etapa de ensino, a reorganização dos


tempos e das áreas de conhecimentos institui que:

Art. 7º - No Ciclo Interdisciplinar, os 4ºs e 5ºs anos do Ensino Fundamental


serão ministrados pelo o Professor de Educação Infantil e Ensino
Fundamental I, respeitada a sua jornada de trabalho, acrescido de aulas de
Arte, Educação Física e Língua Inglesa que serão ministradas pelo Professor
especialista de cada área, bem como, aulas de Enriquecimento Curricular de
Laboratório Informática Educativa e de Sala de Leitura, ministradas pelo
Professor designado para cada função. [...]

2
Programa implantado pelo MEC pela Portaria Interministerial nº 17/2007 e regulamentado pelo Decreto
7.083/10, constitui-se como estratégia do Ministério da Educação para induzir a ampliação da jornada
escolar e a organização curricular na perspectiva da Educação em tempo Integral.
1598

§ 2º: As aulas de Língua Inglesa, Educação Física, Arte, de Laboratório de


Informática Educativa e de Sala de Leitura assumirão caráter integrador das
diferentes áreas de conhecimento.
§ 3º: Nos 4ºs e 5ºs anos do Ensino Fundamental, deverão ser programadas,
respectivamente, um e dois tempos equivalentes aos de horas-aula destinados
a orientação de “Projetos”, ministradas dentro da carga horária regular dos
educandos e em docência compartilhada com o Professor de Educação
Infantil e Ensino Fundamental I.

As referências aos “anos” aparecem no documento, pois as turmas se


encontram organizadas dessa maneira, no que diz respeito à distribuição das aulas e aos
agrupamentos de alunos nas escolas e nas listagens oferecidas, que estão seriadas. A
referência a cada componente curricular também aparece aqui, pois a atribuição e
distribuição das aulas estão assim organizadas. Segundo o documento, nessa etapa as
aulas serão realizadas por meio de uma dupla regência integrando-se professores do
Ensino Fundamental I e II, e regulamenta que deverão ser criadas aulas para o trabalho
com projetos. O documento ainda aponta as regras que deverão ser consideradas na
excussão da docência compartilhada, e estabelece que as áreas priorizadas serão
Português e Matemática (SÃO PAULO, 2013c).
Tais regulamentações explicitam reorganização dos tempos escolares,
incidindo sobre a prática docente. Resta saber como os professores absorvem tais
modificações em sua prática cotidiana, e que será objeto de nossa pesquisa de campo.
Outro documento importante, no qual se encontram as orientações para o trabalho
com esta nova reorganização são as “Notas Técnicas sobre o Documento de Referência
do Programa de Reorganização Curricular e Administrativa” (SÃO PAULO, 2013c),
que trazem minuciosas recomendações aos gestores, educadores, definição de conceitos
e instrumentalização para aplicação do decreto, assim como da expectativa depositada
na prática docente. Pelo disposto no documento, o trabalho no ciclo interdisciplinar
proposto pela SME tem como características principais: a possibilidade da docência
compartilhada, a articulação entre os componentes curriculares (disciplinas) por meio de
elaboração de projetos, flexibilização do currículo, de modo que haja modificações na
dinâmica das aulas e na organização do trabalho. As orientações estabelecidas nos
documentos preveem uma mudança de atitude por parte dos professores, que deverão
ressignificar suas formas de atuação.
De fato, de acordo com Jupiassu (1976), a interdisciplinaridade exige uma
reflexão profunda e inovadora sobre o conhecimento, com base na reflexão crítica sobre
a própria estrutura do conhecimento, com o intuito de superar o isolamento entre as
1599

disciplinas e repensar o próprio papel dos professores. No decorrer da pesquisa serão


aprofundadas as concepções acadêmicas sobre o tema interdisciplinaridade e as que
aparecem na proposta municipal analisada, no entanto este não é o foco deste trabalho.
O objetivo aqui é compreender como as propostas chegam às escolas e como são
recebidas pelos professores no que diz respeito ao seu trabalho e ao currículo que se
objetiva dentro da escola.

Para finalizar
O Ciclo Interdisciplinar é, de fato, uma novidade se considerarmos as
experiências anteriores verificadas nas escolas paulistanas sobre a organização por
ciclos. Trata-se de um ciclo qual devem atuar professores habilitados para o trabalho
com o Ensino Fundamental I (professores polivalentes) e professores habilitados para o
trabalho com o Ensino Fundamental II (professores especialistas de disciplinas
variadas). Nesse sentido, supõe-se que os efeitos nas práticas e nos momentos de
planejamento são mais impactantes, uma vez que demandam formas próprias de
socialização entre os docentes. Isso é o que queremos investigar.
No Ciclo Interdisciplinar está prevista uma maior integração entre as áreas do
conhecimento e, portanto, uma maior flexibilização do currículo. Nesse ano de 2014 os
professores tiveram que planejar suas práticas sob as novas orientações vindas da SME,
independente das condições reais que viabilizam ou não tal trabalho. A
interdisciplinaridade, ao buscar transcendência entre as especialidades, pressupõe novas
formas de interação. As escolas possuem uma cultura própria, sedimentada pelo
acúmulo de práticas e interações consolidadas ao longo do tempo. Nesse sentido,
mostra-se relevante investigar como uma recomendação que incide fortemente sobre
formas consolidadas são incorporadas pelos docentes no cotidiano escolar.

Referências Bibliográficas

CANDAU, Vera Maria. Reformas educacionais hoje na América Latina, In


MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa (org.). Currículo: políticas e práticas.
Campinas/SP: Papirus. 2001, p.29-42.

JULIA, Dominique. A Cultura Escolar como Objeto Histórico. Revista Brasileira de


História da Educação, nº 1, p.9 – 43, jan/ jun 2001.

JUPIASSU, Hilton. Interdisciplinaridade e patologia do saber. RJ: Imago, 1976.


1600

SACRISTÁN, José Gimeno. Reformas Educativas y Reformas Ddel Currículo:


anotaciones a partir de a experiência espanola. In: WARDE, Mirian Jorge (org.) Novas
políticas educacionais: críticas e perspectivas. SP: EHPS/PUC, 1998, p.85-108.

______. Currículo: uma reflexão sobre a prática. Porto Alegre/RS, Artmed; 2001.

SÃO PAULO. Secretaria Municipal de Educação. Orientações Curriculares:


Proposição de expectativas de aprendizagem, ensino fundamental I. SME/DOT: 2008.

______. Portaria 6328/05. Institui para o ano de 2006 o programa Ler e Escrever:
Prioridade na escola Municipal, mas escolas Municipais de Ensino Fundamental
(EMEF) e nas escolas Municipais de Ensino Médio. (EMEFM). São Paulo: SME/DOT,
2005. Disponível em <
http://www3.prefeitura.sp.gov.br/cadlem/secretarias/negocios_juridicos/cadlem/integra.
asp?alt=15102013P%20059302013SME>. Acesso em 12/06/2013.

______. Interfaces Curriculares. SME/DOT 2013a.

______Portaria 5930/13. Regulamenta o Decreto nº 54.452, de 10/10/13, que institui,


na Secretaria Municipal de Educação, o Programa de Reorganização Curricular e
Administrativa, Ampliação e Fortalecimento da Rede Municipal de Ensino de São
Paulo- “Mais Educação São Paulo”. São Paulo: SME/DOT, 2013b. Disponível em:
<http://www3.prefeitura.sp.gov.br/cadlem/secretarias/negocios_juridicos/cadlem/integr
a.asp?alt=15102013P%20059302013SME>. Acesso em 10/06/2014.

______. Notas Técnicas sobre o Documento de Referência do Programa de


Reorganização Curricular e Administrativa. São Paulo: SME/DOT, 2013c.
<Disponível em:
http://maiseducacaosaopaulo.prefeitura.sp.gov.br/download/docs/notas_tecnicas_mais_
educacao_sao_paulo.pdf> Acesso em 03/06/2014.

UNESCO, Projeto Principal de Educação para América Latina e Caribe. Bogotá,


1987.
Pôster

Breves considerações sobre o programa institucional de bolsa de iniciação à


docência na formação do docente em geografia - Parintins-AM

Reginaldo Luiz Fernandes de Souza 1


UEA
Ana Paula Moraes2
UEA
Resumo : Este trabalho visa relatar as ações e experiências vividas enquanto
coordenador do subprojeto de Geografia, no Programa Institucional de Bolsa de
Iniciação à Docência (PIBID) da Universidade do Estado do Amazonas (UEA). A
formação docente divide-se em inicial e continuada, assim o PIBID por intermédio da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) vem propiciar
ao acadêmico de geografia contato direto com a sala de aula e vivenciar a realidade do
ensino aprendizagem dessa ciência no Centro Educacional de Tempo Integral Deputado
Gláucio Gonçalves na cidade de Parintins-AM. A metodologia baseou-se em
levantamento bibliográfico e observações. Como resultado, foi possível notar que o
programa está contribuindo para a formação inicial do Docente de Geografia, pois a
realidade vivenciada no ambiente escolar com seus desafios diários colabora para uma
formação mais adequada desses futuros profissionais.
Palavras-chave: Formação Docente. PIBID. Geografia.

INTRODUÇÃO
Em 2007, o Ministério da Educação (MEC), em parceria com a Secretaria de
Educação Superior (SESU) e por meio da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE) tornou público através de Edital à convocação das Instituições de
Ensino Superior Federal para apresentar propostas de projetos institucionais de
iniciação à docência no âmbito do Programa de Bolsa Institucional de Iniciação à

1
Professor do Curso de Geografia da Universidade do Estado do Amazonas – UEA/CES-Parintins e
Coordenador de área do subprojeto PIBIB/CAPES.
2
Acadêmica do 6º período do Curso de Geografia Universidade do Estado do Amazonas – UEA/CES-
Parintins e bolsista do PIBID/CAPES.
1602

Docência (PIBID). A partir de 2009 também foram contempladas Instituições de


Ensino Superior Estadual no Edital.
O primeiro objetivo proposto no documento é incentivar a formação de
professores para a Educação Básica, ou seja, contribuir para a formação inicial do
docente enquanto ainda estão na Universidade. O projeto visa promover a formação dos
acadêmicos privilegiando a vivência na escola e a experiência com propostas de ensino
inovadoras e, ao mesmo tempo, imprimir melhorias na Educação Básica, ampliando a
parceria universidade-escola, que antes do Programa era praticamente restrita às
disciplinas de Práticas de Ensino.
As ações propostas, em Geografia, visam, acima de tudo, que sejam pensadas
alternativas para o ensino dessa ciência nas escolas de Educação Básica, sem romper
com a autonomia do professor que nelas atuam, nem tampouco com esses recursos ditos
tradicionais, mas que desempenham a função de mediar o aprendizado. Conforme
Tardif (2002) faz-se necessário investir na formação e desenvolvimento profissional
docente, bem como legitimar os saberes construídos pelos professores ao longo de sua
experiência no exercício da profissão.
Objetivo desse trabalho é relatar como está se desenvolvendo o PIBID no Centro
Educacional de Tempo Integral (CETI) Deputado Gláucio Gonçalves na cidade de
Parintins-AM, com intuito de demonstrar as práticas que estão sendo empregadas na
formação inicial dos professores de Geografia.

2 - CENTRO EDUCACIONAL DE TEMPO INTEGRAL - CETI DEP. GLÁUCIO


GONÇALVES
O Centro Educacional de Tempo Integral (CETI) Deputado Gláucio Gonçalves
foi inaugurado na cidade de Parintins dia 04 de julho de 2011. É o primeiro do interior
do Amazonas e o nono do Estado. Atende aproximadamente 1000 alunos com as
modalidades de Ensino Fundamental (6° ao 9° ano) e Ensino Médio. Os alunos
ingressam às 07h, com cinco tempos de aula de 50 minutos pela manhã e quatro de 40
minutos à tarde, com atividades desenvolvidas até às 16h. No atendimento diário, os
mesmos tomam café, almoçam e lancham.
O CETI Parintins está construído em uma área de 10.000m2. O espaço físico
comporta o complexo de um projeto arquitetônico, que envolve três pavimentos com 96
dependências, com acessibilidade para portadores de necessidades especiais com
1603

rampas e adaptadores nos banheiros, além de sistema de monitoramento com 32


câmeras e sonorização na parte interna do prédio.
Apesar de já possuir 03 anos, o CETI apresenta dificuldades devido à falta de
manutenção adequada, a ausência de profissionais que estão previstos no projeto
pedagógico ainda em construção, como por exemplos psicólogos e assistentes sociais,
além que no decorrer do ano letivo, algumas vezes os alunos são liberados 12h que
devido à falta de suprimentos.

3. METODOLOGIA
O presente trabalho apresenta uma perspectiva qualitativa, a qual tem como
característica dominante o ambiente natural como fonte de coleta de dados, e o contato
direto com os sujeitos participantes. As informações, os dados coletados são
predominantes descritivos, seja de pessoas, situações e acontecimentos.
A ênfase encontra-se no processo e não no produto, para compreensão dos fatos
educativos é imprescindível considerar o caráter contextual que envolve os sujeitos. A
pesquisa qualitativa, “é uma atividade sistemática orientada à compreensão em
profundidade dos fenômenos educativos sociais, à transformação de práticas e cenários
socioeducativos, a tomada de decisões” (ESTEBAN, 2010).
Para compreensão dos fatos foi necessário à utilização de análise do conteúdo e
observação. Sendo a análise do conteúdo “um conjunto de técnicas destinadas a analisar
a comunicação - oral, visual ou textual” (BARDIN, 1977). Assim foram analisadas as
ações inseridas no subprojeto de Geografia/PIBID.
As observações foram realizadas durante a execução das ações do subprojeto do
PIBID de geografia que foram organizadas e executadas pelos acadêmicos de Geografia
sob a supervisão dos Docentes do CETI.

4 - AÇÕES PROPOSTAS PARA O SUBPROJETO DO PIBID GEOGRAFIA


O programa proposto pelo PIBID de Geografia, além de facilitar o diálogo entre
Universidade e escola, permite que o estudante, antes mesmo de efetivar sua formação,
possa intervir no sentido de melhorar as condições de trabalho na escola pública e, nesse
caso, melhorar as condições de ensino da Geografia Escolar, e as condições de sua
própria formação. Dessa forma, vamos listar as ações propostas, comentando as que já
estão efetivamente em execução no CETI e as dificuldades encontradas para completar
e desenvolver as mesmas.
1604

4.1 - AÇÃO 01: CONSTRUINDO BASES PARA AS AÇÕES DO PIBID DE


GEOGRAFIA
Para contribuir com a formação dos acadêmicos e com o ensino de geografia, foi
apresentado o projeto no Centro Educacional de Tempo Integral Deputado Gláucio
Gonçalves e depois feito um diagnóstico de suas necessidades.
São realizados encontros periódicos na busca de embasamento teórico,
planejamento das oficinas e confecção dos recursos necessários para o desenvolvimento
das mesmas. As reuniões semanais, conforme indicado no projeto, além de manterem
todos atentos e atualizados com os acontecimentos na escola, facilitaram o trabalho
coletivo e, portanto, a interdisciplinaridade na escola.

4.2 - AÇÃO 02: OS JOGOS INTERATIVOS COMO FERRAMENTA NO


ENSINO DE GEOGRAFIA
Propomos trabalhar jogos interativos com elementos geográficos, oportunizando
os estudantes a identificar as semelhanças e diferenças entre o espaço representado nos
jogos com o espaço de vivência; maior possibilidade de assimilação de ideias,
interpretação de imagens, mapas e fotografias, rapidez na construção de textos e
análises comparativas; acesso a diferentes locais em tempo real, interlocução entre
diferentes culturas, localização espacial de objetos, localidades e pessoas (figura 01).

Figura 01: Jogos interativos com os alunos do CETI


Fonte: Moraes, 2014.
4.3 - AÇÃO 03: MULTIMÍDIA NA ESCOLA
A oficina priorizará a utilização de recursos multimídias como: Câmeras,
filmadoras, TV, CD, DVD, na produção de documentários. Para tanto, será necessário
programas de informática para copilar textos, sons, imagens e animações, permitindo a
1605

percepção de uma nova dimensão entre espaço e tempo. Será imperativa a elaboração de
um roteiro onde será definido o tempo de duração, o tema abordado, os locais e hora de
filmagens, os participantes, entre outras questões.

4.4 - AÇÃO 04: AS TOADAS DE BOI COMO INSTRUMENTO


INCENTIVADOR NO ENSINO DE GEOGRAFIA
Utilizaremos as toadas de boi-bumbá como elemento facilitador no ensino de
geografia. Far-se-á uma seleção das toadas classificando-as de acordo com o que se
pretende estudar como: os processos de sazonalidade do ecossistema amazônico, a
dinâmica dos rios, a diversidade biológica associada a período da enchente e vazante, a
relação dos povos amazônicos com a natureza.
O trabalho seja realizado em diálogo com leitura de imagens retratando os
espaços amazônicos e ilustrações com desenhos (figura 02).

Figura 02: Visita ao Museu do Bumbódromo - Parintins-AM

Fonte: Moraes, 2014

4.5 - AÇÃO 5: A UTILIZAÇÃO DA LITERATURA INFANTIL E O TEATRO


COMO PROMOTORA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A oficina tem o objetivo de possibilitar a introspecção de atitudes que propicie
uma visão consciente diante dos problemas socioambientais vividos pela comunidade.
Utilizaremos obras da literatura infantil como “Formosa à sementinha voadora” da qual
será feita uma apresentação teatral. Aos acadêmicos caberá à preparação da turma para
esse trabalho, desde a seleção dos personagens como estudar o texto com os alunos,
confeccionar as indumentárias, até a montagem do cenário.
1606

CONSIDERAÇÕES

O PIBID representa uma forma inovadora de inserção dos alunos graduandos no


espaço da escola pública. Por meio dessa experiência, esses alunos tomam consciência
de sua realidade e, consequentemente, da realidade do seu campo de atuação após a
conclusão do curso superior, o que possibilita, ainda, que eles passem a conhecer esse
espaço, propor medidas de intervenção e, acima de tudo, transformar para melhor essa
realidade.
Pode-se notar que com o início das atividades entre os docentes do curso de
licenciatura e os docentes da educação básica, ocorreram trocas mais significativas para
o desenvolvimento de atividades integradas de ensino, pesquisa e extensão,
contribuindo, nesse sentido, para a busca compartilhada de alternativas didáticas
orientadas para práticas educativas.
Com a continuação do PIBID e execução das ações propostas busca-se
proporcionar aos sujeitos envolvidos com a licenciatura em Geografia e com o exercício
da docência na educação básica, um conhecimento maior sobre a área, o curso, os
métodos de abordagem, as novas tecnologias e a produção acadêmica na área da ciência
geográfica.

REFERÊNCIAS

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: edições 70. S.d. p.208.

ESTEBAN, Maria Paz Sandín. Pesquisa qualitativa em educação: fundações e


tradições, Miguel Cabrera (Trad.). Porto Alegre: AMGH, 2010

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.


1607

Pôster

Novo Plano Nacional de Educação, antigos desafios

Roseli Maritan de Aboim Costa


Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da UNESA/SME-RJ
Alzira Batalha Alcântara
Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação da UNESA/ UERJ

Resumo: O artigo é um recorte de um trabalho de dissertação em curso que analisa a


importância do planejamento na política educacional. Embora a construção de um plano
educacional seja uma demanda antiga, ainda é um desafio. Parte-se da premissa de que
um plano nacional é um mecanismo essencial para se efetivar uma política de Estado.
Esta, todavia, requer uma nova relação entre os entes da federação, que vem sendo
dificultada pela ausência de regulamentação do regime de colaboração prevista na
Constituição/1988. Para análise desta questão, estudamos o arcabouço jurídico e a
literatura acadêmica sobre o tema. Os resultados, ainda que parciais, indicam que,
embora o novo Plano Nacional de Educação tenha sido recentemente aprovado pela lei
13.005/14, a consecução desse plano de longa duração depende de regulamentação de
normas que não são autoaplicáveis, o que sugere que antigos empecilhos permanecem
atuais.

Introdução
A discussão sobre a necessidade de um plano em âmbito nacional remonta aos
anos de 1930, com os educadores conhecidos como Pioneiros da Educação. Em 1932,
foi publicado o “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, redigido por Fernando de
Azevedo, tendo como signatários Anísio Teixeira e Cecília Meirelles, dentre outros.
Conforme os renovadores, um plano nacional contribuiria para superar a histórica
fragmentação que reinava na educação no Brasil (AZEVEDO, 2006).
Apesar de completar mais de 80 anos, o Manifesto de 1932 permanece atual,
porquanto continuamos com a percepção de construções isoladas, desarticuladas, ou
sobrepostas, requerendo novas posturas dos entes da federação. As ideias do Manifesto
tiveram reflexo na Constituição de 1934, visto que esta estabelece, em seu artigo 150,
como competência da União “fixar o Plano Nacional de Educação, compreensivo do
1608

ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e fiscalizar sua


execução em todo território do país” (BRASIL, 1934).
O Plano Nacional de Educação (PNE), previsto na Constituição Federal (CF) de
1934, foi elaborado pelo Conselho Nacional de Educação e encaminhado ao Congresso
Nacional em 1937. No entanto, o Golpe de Estado de 1937 não permitiu sua discussão.
No seu lugar, surgiu o ato adicional que extinguiu qualquer vestígio do PNE.
A ideia de um PNE só foi retomada com a primeira Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (Ldben), Lei nº. 4.024⁄61 (BRASIL, 1961), sob influência do
nacional desenvolvimentismo. Essa lacuna histórica gerou um sistema educacional com
ações fragmentadas e desarticuladas. Triani, Ferreira e Bastos (2011) consideram que
ocorreram, desde a década de 1940, várias tentativas de coordenar, planejar e controlar a
educação brasileira, com o fito de adequá-la às necessidades da economia nacional. Esta
busca de vincular a educação à economia relacionava-se, por sua vez, às orientações
expressas em fóruns organizados por organismos internacionais que congregavam
gestores educacionais de vários países.
Na ditadura militar (1964 ⁄ 1985), o Ministério da Educação passou a responder ao
Ministério do Planejamento, ou seja, as decisões foram transferidas aos tecnocratas, cuja
formação, na maioria, era do campo das Ciências Econômicas. O planejamento da
educação passou a fazer parte dos planos econômicos com o objetivo de preparar mão-
de-obra (capital humano) para o crescimento do país.
O início da década de 1980 foi marcado por uma forte crise econômica
decorrente do aumento da inflação e da dívida externa brasileira. Nesse contexto,
ocorreu a transição democrática negociada. Os setores empresariais e políticos que se
beneficiaram do estado desenvolvimentista passaram a atacá-lo. Assim, a política de
crescimento econômico, por meio de “planos de desenvolvimento”, foi substituída por
uma política centrada no combate à inflação. Em meados da década, os planos, em
geral, concentravam-se na estabilização econômica financeira, sob monitoramento do
Fundo Monetário Internacional.

Planejamento educacional: antigos empecilhos que rasgam o tempo


A CF de 1988 (BRASIL, 1988), cognominada Constituição Cidadã, teve uma
ampla participação de diversos setores da sociedade em seu processo de elaboração. A
nova CF proporcionou grandes avanços, em especial no campo educacional, pois
expressou uma concepção de educação enquanto direito social (“direito público
1609

subjetivo”) e retomou a vinculação financeira constitucional de um percentual de


impostos dos distintos entes federativos para a manutenção e desenvolvimento do
ensino. Ademais, importa destacar que, em seu artigo 214, resgatou a ideia de um plano
nacional de educação visando articular e desenvolver o ensino em seus diversos níveis.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Ldben) nº 9394/96
(BRASIL, 1996), no título que trata da organização da educação nacional, definiu que
cabe à União elaborar o PNE em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios (art. 9º, I).
O PNE (BRASIL, 2001) representou uma experiência importante de
planejamento da educação brasileira. Pretendia-se empreender uma política de Estado,
na medida em que o PNE possuía uma duração decenal e abarcava todos os níveis,
etapas e modalidades da educação. Foi aprovado no âmbito do legislativo, instituído
pela Lei 10.172/01, e sancionado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. Sua
construção perpassou extensas discussões ocorridas entre dois projetos distintos: um
proveniente do Poder Executivo e o outro apresentado pelo Legislativo, que ficou
conhecido como projeto da Sociedade Civil. Afinal, este foi elaborado com ampla
participação da sociedade brasileira, por meio de fóruns nacionais, e incorporou as
propostas oriundas dos Congressos Nacionais de Educação (CONEDs). Ao longo da
tramitação, diferentes estratégias reduziram a participação social nos debates travados
no Congresso Nacional. Na avaliação de Valente, a lei 10.172/01, naquilo que é
fundamental, expressou a política educacional do MEC. Assim, nos itens que expressam
os interesses do governo, a lei apresenta “comandos precisos, (...) detalhista e, regra
geral autoaplicável. No que interessa aos "de baixo" e que eventualmente não tenha sido
possível e/ou conveniente suprimir, recorre-se à redação "genérica", (...) sujeita a uma
regulamentação sempre postergada" (VALENTE, 2001, p. 14).
O PNE deveria ser concretizado por meio de distintas ações. Entretanto, os vetos
apostos pelo presidente Fernando Cardoso (1994 ⁄ 2002) tornaram o plano um
documento repleto de boas intenções, mas sem condições de ser efetivado. Apesar de
apresentar um conjunto de metas de amplo alcance, mostrando os desafios das políticas
pela melhoria da educação nacional, o PNE não apresentou esteio financeiro para sua
viabilização. Segundo Saviani (2009), com o novo governo a partir de 2003, esperava-
se a retirada dos vetos, mas isso não ocorreu. Ademais, a lei que aprovou o PNE
(BRASIL, 2001) estabeleceu, em seu art. 3º; § 2º, que a União e a sociedade e civil
deveriam realizar avaliações periódicas da execução do plano, sendo que a primeira
1610

deveria ocorrer no quarto ano após sua aprovação, porém, essa avaliação, com amplo
debate nacional, não ocorreu.
Se cabia à União a função de elaborar o PNE, os estados, municípios e o Distrito
Federal deveriam construir seu próprio plano em harmonia com os objetivos e metas do
PNE, porém considerando o contexto local e as peculiaridades de cada região. No
entanto, a “pouca tradição no Brasil de um planejamento integrado e coerente com as
necessidades das diferentes realidades que compõem o país, capaz de envolver as
diferentes instâncias de governo, deu margem a equívocos” (COSTA; CUNHA;
ARAÚJO, 2010, p. 98). Os entes subnacionais não se percebem com autonomia para
tanto e, muitas vezes, acabam repetindo o que está no plano da União ou do estado ou
contratando consultoria privada para auxiliar ou elaborar o plano.
Embora o PNE (BRASIL, 2001) ainda estivesse vigente, foi lançado pelo MEC,
em 2007, o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) (BRASIL, 2007). Este foi
organizado a partir de quatro eixos norteadores: educação básica, educação superior,
educação profissional e alfabetização. Segundo o MEC, o PDE iria além do PNE, pois
este “em certa medida, apresenta um bom diagnóstico dos problemas educacionais, mas
deixa em aberto a questão das ações a serem tomadas para a melhoria da qualidade da
educação” (HADDAD, 2008, p.6). Para Saviani (2009), entretanto, o PDE não pode ser
considerado um plano, mas um “guarda-chuva” que contempla ações e programas muito
diversificados, sem definição de prazos. Alguns já existiam antes mesmo do lançamento
do PDE, como o Programa “Merenda Escolar”, outros surgiram com a criação do Plano
em 2007 ou ainda em data mais recente. Na análise de Saviani (2009), o PDE foi
estruturado sob a lógica de resultados, alicerçando-se nas avaliações de larga escala, o
que evidencia, portanto, uma política educacional calcada em valores meritocráticos.
No contexto do PDE, o Decreto 6.094, de abril de 2007, instituiu o Plano de
Ações Articuladas (PAR) com o objetivo de melhorar a qualidade da educação. O PAR é
uma das principais ações que compõem o PDE. Segundo Fonseca (2009), o PDE visa
dar organicidade à política de descentralização, possibilitando uma articulação entre os
entes federativos por meio do PAR. No PDE, também, encontramos o embrião dos
Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs). Conforme o MEC, o “PDE
pretende responder a esse desafio através de um acoplamento entre as dimensões
educacional e territorial operado pelo conceito de arranjo educativo” (HADDAD, 2008,
p. 6). Segundo Abrucio e Ramos (2012), o PDE nasceu com a percepção de os
municípios trabalharem em rede, de forma articulada com os estados e a União, e, por
1611

isso, enfatizou o enlace entre território, educação e desenvolvimento. Assim, a


construção de um Sistema Nacional Educação (SNE), mediante o fortalecimento do
Regime de Colaboração e dos ADEs, é fundamental para que a política educacional seja
um instrumento para o desenvolvimento do país.
O ADE tem como base as pontuações1 que cada município atribuiu aos 52
indicadores do PAR no quadriênio 2007/2010. O MEC, por meio das Secretarias de
Articulação dos Sistemas de Ensino (Sase) e das Secretarias de Educação Básica (SEB),
está estruturando mecanismos internos para apoiar os ADEs. Lima (2012, p.8) ressalta
que “na versão 2.0 do Plano de Ações Articuladas (PAR), o MEC já prevê o
financiamento dos municípios trabalhando no formato de arranjos”.
Em 2009, a Emenda Constitucional nº 59 alterou a redação do artigo 214 da
Constituição Federal. À luz do novo ordenamento constitucional, o PNE é responsável
pela articulação do Sistema Nacional de Educação (SNE) em regime de colaboração,
além de definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para
assegurar a manutenção e o desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas
e modalidades, por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas
federativas (BRASIL, 2009b).
Vale lembrar que o documento final da Conferência Nacional de Educação
(CONAE ⁄ 2010) indicara a urgência de se construir um sistema nacional de educação
que orientasse a ação dos entes federados a partir de diretrizes comuns, que apontassem
para a superação das desigualdades regionais, com o desenvolvimento de políticas
educacionais universais, apoiadas em um regime de colaboração que definisse as
atribuições de cada ente federado. A necessidade de coordenação indica a percepção de
que a política nacional deve ser uma totalidade ordenada, cujos níveis e sistemas
(federal, estadual e municipal) devem atuar de forma articulada (FREITAS, 2012).
Espera-se que o novo PNE (BRASIL, 2014), aprovado em junho de 2014,
adquira status de política de Estado e supere o signo de “carta de intenções”. O cenário
de tramitação da Lei nº 13.005/14 foi contraditório e lento. As justificativas que
acompanharam o Projeto de Lei em 2010 consideraram o PNE anterior extenso e com

1
O município atribui uma pontuação, a partir de critérios dados pelo MEC, a cada um dos cinquenta e
dois indicadores que compõem o Plano de Ações Articuladas (PAR) no quadriênio 2007/2010. A
pontuação 1 indica uma situação crítica, 2 é insuficiente, 3 é tido como situação satisfatória, isto é, com
mais aspectos positivos do que negativos, e 4 indica uma situação positiva. Vale ressaltar que o município
deve, necessariamente, propor ações aos indicadores que obtiverem pontuação 1 ou 2 a fim de reverter o
aspecto que se encontra frágil. O município poderá obter assistência técnica e/ou financeira da União por
conta dos indicadores que foram pontuados negativamente (1 ou 2).
1612

pouca instrumentalização. Em quatro anos (2010 ⁄ 2014), o governo patrocinou três mil
assembleias, com quase 1milhão de pessoas e extraiu um acervo de 14 mil sugestões
sobre como resolver a crise da educação. Entretanto, apesar desta mobilização, como
sinalizou Araújo (2010), a “metodologia pulverizada das conferências preparatórias e a
falta de acúmulo teórico e histórico sobre o instituto jurídico do regime de colaboração
na área de educação podem contribuir para tornar a dinâmica federativa ainda mais
complexa do que se configura na atualidade” (ARAÚJO, 2010, p.751).
Cabe ressaltar que a portaria CNE/CP nº 10, de 06 de agosto de 2009, (BRASIL,
2009a) sinalizara que um dos principais problemas externos à consecução das metas
presentes no PNE (BRASIL, 2001) foi a ausência de normatização do SNE e do regime
de colaboração. A análise de Araújo (2010) reitera a avaliação expressa na portaria
supracitada, ao afirmar que a “ausência de regulamentação é exatamente o “nó górdio”
da Federação brasileira e, talvez o maior empecilho para a consolidação das políticas
educacionais” (ARAÚJO, 2010, p.761).
Nessa perspectiva, o artigo 13 da Lei 13.005/14 (BRASIL, 2014), que determina
que o poder público deverá instituir, em lei específica, o SNE a fim de articular os
sistemas de ensino, apresenta uma deficiência estrutural: a ausência de regulamentação
do regime de colaboração. Ao que tudo indica, a observação feita por Valente (2001) em
relação ao antigo PNE também é pertinente ao novo, já que naquilo que é fundamental à
política educacional do MEC, o PNE apresentou normas autorreguláveis, isto é, de
aplicação imediata, porém em outras questões relevantes, tidas como não prioritárias
para a atual política governamental, recorre-se à redação "genérica", sujeita a uma
regulamentação sempre postergada" (VALENTE, 2001, p. 14).

Considerações finais
Qualquer plano educacional traduz uma dada concepção política e filosófica,
ainda que possa não estar explicitada. Ou seja, elaborar um plano não é uma ação de
cunho meramente técnico. Um plano possui objetivos e metas e este conjunto, por sua
vez, expressa um dado projeto de sociedade. A implantação de um plano requer a
participação dos diferentes entes da federação, o que envolve questões de ordens
distintas, tais como: jurídica, econômica, política, cultural, dentre outras.
A aprovação do novo PNE traz esperança de que o Estado cumpra com a oferta
de uma educação de qualidade, um direito constitucional. As metas apontam a
superação de problemas que deveriam ter sido sanados no século passado. O PNE
1613

(BRASIL, 2014) tem metas importantes, pois prevê um orçamento progressivo. No


entanto, a falta de regulamentação do regime de colaboração e a ausência de
normatização do SNE são entraves para a efetivação das políticas educacionais.
Urge que sejam definidas as responsabilidades da União e demais entes da
federação por meio da regulamentação do regime de colaboração, objeto de lei
complementar, como também, que seja institucionalizado o SNE, mediante lei
específica. A ausência desta regulamentação tem promovido uma lógica organizativa
fragmentada e desarticulada do projeto educacional brasileiro. Superar este quadro é um
desafio de longa data.

Referências
ABRUCIO, F. L.; RAMOS, M.N. Apresentação. In: ABRUCIO, F.L.; RAMOS, M.
N. Regime de colaboração e associativismo territorial: arranjos de desenvolvimento
da educação. São Paulo: Fundação Santillana, 2012.

ARAUJO, G.C. Constituição, federação e propostas para o novo Plano Nacional de


Educação: análise das propostas de organização nacional da educação brasileira a partir
do regime de colaboração. Educ. Soc. [online]. 2010, vol.31, n.112, pp. 749-768. ISSN
0101-7330. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302010000300006.

AZEVEDO, F. Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova – 1932. Revista HISTEDBR.


Campinas, n˚ especial, p. 188-204, ago., 2006.

BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro,


1934. Diário Oficial da União, DF, 16 de julho de 1934.

______. Constituição da República Federativa do Brasil, 18 edª, de 05 de outubro de


1988, São Paulo: Saraiva, 1988.

______. Emenda Constitucional nº 59. Diário Oficial da União, DF, 12 de novembro


de 2009.

______. Lei 4024/1961. Fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário


Oficial da União, Brasília, DF, 14 de dezembro 1962.

______. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da


Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 dez. 1996.

______. Documento Referência da CONAE, MEC, 2010.

______. Portaria CNE/CP nº 10, MEC, de 6 de agosto de 2009.

_______. Lei 13.005/14. Aprova o Plano Nacional de Educação- PNE e dá outras


providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 25 de junho de 2014.
1614

_______. Decreto nº 6.094 de 24 de abril de 2007. Dispõe sobre a implementação do


Plano de Metas Compromisso Todos Pela Educação. Brasília, DF, Presidência da
República. . Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 de abril de 2007.

_______. O Plano de Desenvolvimento da Educação: razões, princípios e programas.


Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2007.

_______. Lei nº 10.172, de 9 janeiro de 2001. Aprova o Plano Nacional de Educação


e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 jan. 2001.

COSTA, J.M. A.; CUNHA, M. C.; ARAUJO, R. B.. Federalismo cooperativo


brasileiro: implicações na gestão da educação municipal. Jornal de Políticas
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FONSECA, M. Políticas Públicas para a qualidade da educação brasileira: entre o


utilitarismo econômico e a responsabilidade social. CADE. CEDES, Campinas vol. 29,
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FREITAS, D.N.T. A colaboração federativa e a avaliação da educação


básica. Retratos da Escola, v. 6, n. 10, 2012.

HADDAD, F. Plano de Desenvolvimento da Educação/ PDE: razões, princípios e


programas. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira, 2008.
___________. Razões que justificam o Projeto de Lei 8.035/10. EM nº 033. Brasília,
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LIMA, N. Prefácio. In: ABRUCIO, F.L.; RAMOS, M. N. Regime de colaboração e
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Fundação Santillana, 2012.

SAVIANI, D. Plano de Desenvolvimento da Educação: análise crítica da política do


MEC. Campinas, São Paulo: Autores, Associados: 2009.

TRIANI, M.S.L.S.; FERREIRA, D. H.; BASTOS, R. F. Planejamento Educacional no


Contexto da Federação Brasileira: o desafio do PAR. Anais do I Circuito de Debates
Econômicos. IPEA. Code 2011. Disponível em < http://www.ipea. gov.br/ agencia
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VALENTE, I. Apresentação. In.: BRASIL. Plano Nacional de Educação. Rio de


Janeiro: DP&A, 2001.
1615

Pôster

O impacto das questões sociais no contexto escolar: a formação do professor na


educação do adolescente em conflito com a lei

Rosimeire Souza de Oliveira1


Universidade Anhanguera de São Paulo (UNIAN)

Resumo: Este texto é resultado da conclusão da disciplina “A Questão Social e os


Problemas Epistemológicos das Áreas Sociais Críticas” do curso Mestrado Adolescente
em Conflito com a Lei da UNIAN, Unidade Maria Cândida. Enfatiza o impacto que a
desigualdade, a violência, a marginalidade e a pobreza têm na relação do professor com
o aluno adolescente em conflito com a lei. Nesse sentido, a formação docente vem à
tona, pois nem sempre esse profissional sabe lidar com o adolescente que violou a lei,
gerando uma série de conflitos entre esses dois sujeitos, o que vai exigir desse
profissional conhecimento sobre dispositivos legais (ECA) e (SINASE). Apresenta
algumas propostas de como a escola pode acolher os alunos marcados pela precariedade
da vida.
Palavras-chave: Formação, Professor, Adolescente.

INTRODUÇÃO

O foco principal deste trabalho aborda o impacto das questões sociais vividas
pelo adolescente em conflito com a lei no contexto escolar, que suscita relação tensa
entre professor e aluno; apresenta também a dificuldade de se definir o que é ser
professor e a falta de clareza quanto aos novos papéis que o docente deverá exercer. Um
desses novos papéis diz respeito aos alunos “excluídos”: os pobres, os marginalizados,
os adolescentes que violaram a lei, aqueles que vivem com frequência situações de
desigualdade. O professor nem sempre sabe lidar com estas questões, às vezes até tem
boa vontade, mas desconhece as leis que protegem as crianças e os adolescentes e em
outras situações, a escola reforça comportamento preconceituoso, reproduzindo o que

1
Pedagoga pela UNICSUL, Pós-graduada em Avaliação pela Universidade de Brasília e Mestranda em
Adolescente em Conflito com a Lei pela UNIAN, rosi.msol@gmail.com.
1616

esses meninos já vivem na sociedade. Emerge assim a questão de uma formação


docente deficiente.
Octavio Ianni (1991) indica o modo como percebe a questão social, Claude Dubar
(2007) acredita numa educação preventiva e Michel Foucault (1981) estuda os
problemas da educação na sociedade disciplinar. O conhecimento desses autores
fundamenta a construção desse trabalho, que pretende desafiar a escola: abandonar
velhos modelos, acolher os já excluídos pela sociedade, propor modos diferentes de
ensinar e aprender, abrir espaço no ambiente escolar para a discussão das questões
sociais, dentre outras.
Nos três últimos parágrafos serão lembrados os motivos que colaboram com os
conflitos entre professores e alunos marcados pela precariedade da vida, pois
professores desconhecem como lidar com alunos “diferentes” e também, que a escola
dentre tantos papéis, exerça papel social.

DESENVOLVIMENTO
O que é ser professor? Alguns o definem como mestre, outros, como docente,
também como educador, instrutor, mentor, preceptor, tutor, explicador, orientador. Para
uma leitura senso comum ser professor é aquele que ensina algo; para uma leitura
reflexiva, ser professor é caracterizado pela possibilidade de transformar. As
transformações podem ocorrer, desde que as relações efetuadas entre os diversos atores
que atuam no ambiente escolar possibilitem o exercício da profissão. Por meio dessas
afirmativas percebe-se que não há uma definição clara do que seja ser professor. Para
que não haja confusão sobre o verdadeiro ofício de ser mestre elenca-se algumas
práticas próprias da profissão
Para a prática docente se fazer concreta, o aluno, parceiro do professor, deverá
entrar no palco e também atuar. A relação entre professor e aluno, permeada pelo
diálogo, possibilita a aprendizagem. A necessidade de compreender a essência do
cotidiano escolar, que ora gira em torno do conteúdo, ora em torno do aluno e outras,
em torno do professor, faz compreender as ações do docente. A aproximação entre esse
profissional e o aluno é o que interessa, pois é um dos objetos desse estudo,
especialmente quando o aluno é um adolescente em conflito com a lei.
Percebe-se que, ser professor é algo construído historicamente. Não se sabe com
exatidão porque alguém se torna professor, pode-se supor que inicialmente nasce a
partir do desejo de ser docente e em seguida com a formação acadêmica, a profissão
1617

passa a ter consistência e legitimidade. É importante lembrar-se do desenvolvimento


profissional do professor que ocorre ou pelo menos deveria ocorrer em toda a sua
trajetória. Em se tratando de formação profissional docente obrigatória, é comum a
ênfase ser dada aos conteúdos que se vai ensinar e/ou em teorias pedagógicas.
No entanto, surgem novos papéis protagonizados pelo professor, que determinam
que tenha uma nova e melhor formação. O papel interpretado pelo professor quando tem
de lecionar para um adolescente em conflito com a lei vai exigir desse profissional uma
formação mais específica, preferencialmente ligada às áreas das Ciências Sociais e
Humanidades. O cenário descrito a seguir leva a alguns problemas que carecem de
reflexões: a questão da formação docente, as tensões entre professor e aluno e as
questões sociais.
Octavio Ianni (1991, p. 4) indica o modo como percebe a questão social em sua
diversidade de aspectos: “Conforme a época e o lugar a questão social mescla aspectos
raciais, regionais e culturais, juntamente com os econômicos e políticos. Isto é, o tecido
da questão social mescla desigualdades e antagonismos de significação estrutural”.
Na escola, as tensões entre o professor e o adolescente em conflito com a lei
surgem principalmente em decorrência de problemas sociais: violência, marginalidade
urbana e pobreza, vividos pelo adolescente. Esses problemas quando inseridos no
contexto econômico, político e escolar potencializam as desigualdades sociais: a falta de
moradia, de emprego, acesso à saúde e à cultura – aspecto urgente da questão social,
cujas perspectivas sociais não acompanham as econômicas.
São questões altamente impactantes no exercício da profissão docente e que
provocam a necessidade de desconstrução de ideias já arraigadas: como a de que todo
jovem que é pobre e mora na periferia, provavelmente, no futuro, terá problemas com a
lei, assim como a de que todo adolescente que cometeu uma infração é um aluno
violento. Entretanto, não se pode desconsiderar que um ambiente violento, muito pobre
e que tem a marginalidade urbana como pano de fundo tem impacto significativo no
desenvolvimento do adolescente, não no sentido de transformá-lo num infrator, mas no
sentido de corroborar situações de exclusão, como na escola em o jovem é tratado de
modo diferente porque vive em condições sociais adversas, e se for adolescente em
conflito com a lei, a “avaliação” tem peso maior, além da dificuldade de acesso às
políticas sociais.
Com relação à formação docente brasileira, sabe-se o quanto é deficiente
quando a proposta é atender a uma diversidade de questões, que vão desde as questões
1618

pedagógicas às administrativas, além da questão da educação de adolescentes em


conflito com a lei e que vai exigir desse profissional conhecimento sobre dispositivos
legais. Cabe ao professor se apropriar da Lei Nº 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA) e da Lei Nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012 -
Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE); saber aplicar essas leis e
garantir os direitos fundamentais do adolescente na comunidade escolar.
A pergunta que se faz é: Como a escola pode acolher os alunos marcados pela
precariedade da vida?
Apresentar ao adolescente que já vive numa situação de conflito um mundo que
ele ainda não conhece. O professor, por meio do ensino das ciências, da literatura, da
história, das artes, da computação, deve apresentar ao aluno uma nova forma de
construir o saber. Em outras palavras, alunos que vivem em situação de exclusão
demandam novas estratégias para a aquisição de conhecimento.
Os atores que atuam no palco escolar: alunos, professores, coordenadores,
diretores, funcionários, comunidade; devem abandonar velhos preconceitos, exercício
nada fácil, mas possível. Nem todo adolescente que cometeu um ato infracional, irá
infracionar sempre. Em situações em que o preconceito vem à tona, a exigência de
novos olhares é fundamental.
Neste aspecto cabe a proposta tão bem articulada de Dubar (2007), que
consiste em agir sobre as populações em risco de comportamentos delinquentes e não
sobre as vítimas:
Trata-se de ensinar às mulheres grávidas o que é preciso fazer para “educar”
seus filhos, desenvolver os Centros de Proteção Materna e Infantil, creches
ou jardins de infância grátis e com pessoal competente, generalizar os
subsídios às famílias, multiplicar os procedimentos e os atores que possam
sinalizar o absenteísmo escolar, as incividades repetidas, os pequenos furtos
nas lojas, os comportamentos agressivos, de maneira a apoiar, o mais cedo
possível, as crianças em risco [...] (DUBAR, 2007, p. 177)

Dubar assinala assim a necessidade de apoiar as crianças em risco tanto através de


programas sociais de apoio às famílias como no âmbito escolar, desde a oferta de
educação infantil até a preocupação em evitar o absenteísmo, a evasão, e o cuidado no
trato com os comportamentos agressivos e delituosos.
De maneira concreta, cabe à escola exercer papel social quando objetiva a
prevenção de atos delinquentes. Atividades com mães de crianças que frequentam a
Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental têm caráter de orientá-las a
1619

educar seus filhos. Para os alunos marcados pela precariedade da vida, a proposta é de
uma escola inclusiva.
Abandonar velhos modelos utilizados no espaço escolar propicia uma nova forma
de ver as coisas. O professor sempre será professor, não perde sua autoridade mesmo
quando propõe uma nova maneira de ensinar ou aprender, quando se aproxima mais do
seu aluno ou quando para sua aula e ouve seus aprendizes.
Foucault (1981) estuda os problemas da educação na sociedade disciplinar,
sociedade esta que constitui corpos dóceis e disciplinados. O autor denuncia
[...] instrumentos reais de formação e de acumulação do saber: métodos de
observação, técnicas de registro, procedimentos de inquérito e de pesquisa,
aparelhos de verificação. Tudo isto significa que o poder, para exercer-se
nestes mecanismos sutis, é obrigado a formar, organizar e por em circulação
um saber, ou melhor, aparelhos de saber [...] (FOUCAULT, 1981, p. 186).

O conhecimento torna-se objeto de controle e a escola, o aparelho de saber. As


avaliações, os questionamentos, as observações e os registros feitos pelo professor,
assim como a realização de tarefas, a frequência e o comportamento do aluno são
traduzidos como “suaves” instrumentos de verificação, “mecanismos sutis” de exercício
do poder. Foucault aponta uma realidade ainda presente: uma escola ainda marcada pelo
controle, pela pouca flexibilidade nas relações. Os conflitos entre o adolescente em
conflito com a lei e o professor tornam-se ainda mais tensos quando não há flexibilidade
por parte do professor e demais funcionários da escola, em lidar com adolescentes que
não se enquadram no modelo “aluno normal”.

CONCLUSÕES
A relação entre o professor e o adolescente em conflito com a lei geralmente é
permeada por tensões: o professor desconhece os direitos e deveres de adolescentes que
cumprem medidas socioeducativas e o adolescente vive o conflito de não pertencer a
nenhum grupo (falta de pertencimento).
É fato que as desigualdades, a violência, a marginalidade e a pobreza têm
impacto significativo na ação docente; ora é carregada de preconceitos, ora é carregada
de incertezas. Uma escola que objetiva controlar utilizando-se de aparelhos de
verificação e mecanismos sutis, gerando ainda mais tensões entre o adolescente e o
professor, pois falta flexibilidade por parte do professor em lidar com os alunos
“diferentes”.
1620

Cabe a esta mesma escola desconstruir velhos paradigmas, abrindo espaço


para que professores possam refletir sobre esta problemática, ocupando-se com a
prevenção de atos delinquentes e a busca por soluções.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DUBAR, Claude. Os “ensinamentos” dos enfoques sociológicos da delinquência
juvenil. In: SENTO-SÉ, J. T. e PAIVA, V. Juventude em conflito com a lei. RJ:
Garamond, 2007. p. 157-180.

FOUCAULT, Michel. Soberania e Disciplina. In: _______. Microfísica do poder. Rio


de Janeiro: Graal, 11ª edição, 1981. p. 179-191.

IANNI, Octavio. A questão social. São Paulo em Perspectiva, 5 (1). Jan./mar., 1991.
1621

Pôster

Subprojeto Pibid: Aprendendo e Ensinando com o Linux educacional

Sérgio Santos Silva Filho


UNEMAT/FACCAMP
Natália Tripoloni Tangerino Silva
SEDUC-MT/ UNICID

Resumo: O projeto possibilita auxiliar profissionais da educação básica a utilizar o


sistema operacional Linux Educacional (LE), considerando que o governo federal,
através do Ministério da Educação (MEC), desde o ano de 2006 encaminhou para as
escolas públicas de todo o país, milhares de computadores com o LE instalado, no
entanto, apesar de o governo já ter oferecido cursos de capacitação, verificamos que
muitos profissionais da educação e alunos têm demonstrado dificuldades em utilizar
este sistema e em alguns casos existe até certa rejeição em manuseá-lo. Com isso, está
possibilitando estabelecer uma nova realidade para os profissionais destas unidades
escolares e para seus alunos, mostrando a importância da utilização de um sistema
operacional, reconhecendo os diversos mecanismos existentes no sistema LE para a
utilização de alunos e professores. Ao incentivar o uso do computador como ferramenta
pedagógica, auxiliando professores e alunos no processo ensino-aprendizagem de
conteúdos curriculares, contribui para a aproximação da universidade com as escolas da
rede pública.
Palavras-chave: Estudando, Aprendendo, Linux Educacional

Introdução

O presente trabalho visa descrever sucintamente o andamento do subprojeto


Pibid do curso de Licenciatura em Computação da Unemat, campus de Alto Araguaia.
Considerando que na atualidade os computadores estão em toda parte, nas empresas,
nos bancos, nos hospitais, nos supermercados, nas ruas, nas casas, nos celulares, e
como não poderia ser diferente, também nas escolas. Diante disso Weiss e Cruz (2001)
afirmam que:
1622

Os computadores estão chegando a nossas escolas. Diante deles, encontram-


se professores com sentimentos diversos: a satisfação de estar participando
de uma realidade tecnológica, até pouco futurística, a ansiedade por
descobrir “tudo o que esta máquina pode fazer”, a sensação de não “levar
jeito” com essas coisas ou, ainda, o medo de enfrentar as mudanças que
chegam com a Informática Educativa. (WEISS; CRUZ, 2001, p. 13).

De fato, os computadores já estão presentes nas escolas e, a maioria dos alunos


e professores ainda tem dificuldades em manuseá-los, pelo fato de que tudo que é novo
causa estranheza e repulsa, de certa forma não é fácil abandonar o método tradicional
de ensino. Não que o método tradicional seja incorreto, pelo contrário é ainda um
método que funciona. Mas, diante da presença da tecnologia, cada vez mais
massificada e acessível a todos, precisamos inovar as metodologias de ensino.
De acordo com Tajra (2004) o uso de novas tecnologias como recurso didático
pedagógico tem sido incentivado e apoiado pelo governo brasileiro com a implantação
de diversos projetos e propostas na área de informática educativa. Como no caso do
Projeto PROINFO é uma iniciativa do governo que está sendo desenvolvida pela
Secretaria de Educação a Distância (SEED) e pelo MEC, para implantar a tecnologia
de informática nas escolas públicas de ensino. Essa proposta tem como base implantar
a informática educativa nas escolas, é uma maneira de aproximar a cultura escolar dos
avanços que a sociedade já vem observando e desfrutando com a sua utilização nas
redes de ensino, possibilitando maior transformação, produção e na transmissão de
informações.
A partir do projeto PROINFO as escolas começaram a adquirir Laboratórios de
Informática Educativa (LIED’s) tendo como objetivo o uso e disseminação de
softwares livres na educação. Os computadores dos LIED’s possuem o sistema
operacional Linux Educacional (LE). Em sua versão 3.0 traz como interface gráfica o
KDE, além de softwares educacionais vem também com aplicativos de uso geral como
a suíte de escritório BrOffice.org 2.4; software para gravação de CD/DVD K3b; o
browser Mozilla Firefox, entre outros. Em sua versão atual 4.0 o ambiente oferece uma
série de recursos de interface e aplicativos novos como Edubar, contendo portais
educacionais; programas educacionais contendo conteúdo das disciplinas escolares
baseados em softwares educacionais e outros programas escolares, além de jogos,
multimídias e outros recursos para séries iniciais.
Portanto, o presente trabalho possibilita capacitar alunos de escolas públicas do
município de Alto Araguaia-MT para uso do Linux Educacional (LE) e seus principais
1623

recursos, tendo como objetivo estimulá-los a aplicar os conteúdos vistos em sala de


aula no Laboratório de Informática Educativa de forma diferente, atrativa e dinâmica.
Ainda assim, é importante destacar que o presente trabalho torna-se relevante
sob três aspectos:
i) Colaborar para o incentivo de softwares livres na educação, o
que é uma política nacional implantada pelo governo federal;
ii) Contribuir para o uso do computador como uma ferramenta
pedagógica que pode auxiliar tanto o professor quanto o aluno no que diz
respeito ao ensino-aprendizagem de conteúdos curriculares; e
iii) Cooperar para a aproximação da universidade com as escolas
da rede pública de ensino do município, visto que será firmada uma parceria
entre as partes envolvidas.

2. Ações Previstas

No presente projeto, estão previstas as seguintes ações:


• Realizar encontros preparatórios visando orientar na atuação dos bolsistas e
professores supervisores, além de reuniões eventuais e mensais para expor a todas as
pessoas envolvidas, as discussões coletivas do subprojeto e coleta de sugestões para
adaptações das ações previstas;
• Caracterizar as condições de aprendizagem nos ambientes escolares
envolvidos;
• Realizar planejamentos e avaliações das atividades desenvolvidas, além de
elaborar experimentos didáticos com materiais do cotidiano e realizá-los em sala de
aula;
• Promover visitas dos professores e estudantes aos laboratórios de
informática da UNEMAT, campus universitário de Alto Araguaia.

3. Resultados Pretendidos

Espera-se após a aplicação deste projeto, seja possível constatar:


1. Que a interação entre a Universidade e as escolas possa aumentar e
proporcionar mais uma vivência prática do ensino de informática, levando a fazer com
que os bolsistas e professores supervisores envolvidos, elaborem e apliquem uma
1624

metodologia que alcance as necessidades das escolas no que diz respeito ao uso de
tecnologias voltadas para o ensino;
2. Que o trabalho voltado à capacitação e utilização do Linux Educacional
possa promover o aprendizado desejado a alunos e professores envolvidos,
conscientizando-os acerca da importância de explorar ainda mais os mais variados
recursos disponíveis neste sistema operacional;
3. Um aumento considerável, no número de alunos interessados em cursar os
cursos da UNEMAT, mais em específico, os cursos de Licenciatura em Computação,
além da diminuição da evasão de alunos matriculados neste curso;
4. Além de uma possível melhora na qualidade da formação dos licenciados
em computação da UNEMAT, principalmente quanto à articulação entre teoria e
prática, além de um possível aumento na procura de licenciados nos cursos de pós-
graduação em computação;
5. A vivência na elaboração de materiais didáticos, relatórios contendo as
experiências metodológicas desenvolvidas com a aplicação dos bolsistas neste projeto
PIBID, possam constatar que com esta vivencia, foram permanentemente incentivados a
permanecer na carreira docente, mesmo após a conclusão do curso de graduação;
Sobretudo, almeja-se ao final da aplicação deste projeto, em conjunto com as
experiências vivenciadas, que possam contribuir e incentivar ainda mais na formação de
um futuro profissional pesquisador, e não simplesmente apenas um professor
“transferidor” de conceitos e ideias já pré-concebidas, mas que possa de fato, tornar-se
um profissional docente capaz de incentivar-estimular-facilitar o aprendizado de seus
educandos promovendo cada vez mais uma formação de qualidade.

4. Descrição de impactos das atividades do projeto na formação de


professores

Durante a aplicação deste subprojeto, foi possível constatar o crescimento


exponencial de todos os envolvidos. Desde o coordenador de área, responsável por
conduzir as atividades para um efeito que conduza o aprendizado de forma que todos
aprendam. Os professores supervisores que relataram um grande satisfação em colaborar
com este subprojeto, tendo em vista a experiência em pesquisa adquirida,
complementando a experiência docente em sala de aula. E assim como também para os
acadêmicos bolsistas que aprenderam a ter uma visão mais macro e individual do real
1625

significado do “SER PROFESSOR”, que começa com os estudos em sala de aula,


conhecendo conceitos e representações formais, que antes eram rotuladas como “chatas”
e “cansativas”. Agora começa a fazer um melhor e maior sentido, pois ajuda a entender e
a se fazer entender. A valorização, tanto da docência, quanto do ensino também foi
muito discutida durante a execução deste subprojeto.
Todos foram bem recebidos pela universidade, assim como também, pelas
escolas parceiras. E esta troca fortalece em muito a confiança em ambas as instituições,
pois os acadêmicos bolsistas foram colocados em um ambiente que ainda é muito
carente de conhecimentos tecnológicos, especialmente quando o assunto é Linux
Educacional. Contudo, foi possível constatar que as ações, mesmo sendo individuais,
foram discutidas, bem exemplificadas e construídas de forma bem planejada e sempre
supervisionada pelos professores supervisores, garantindo uma maior confiança aos
acadêmicos bolsistas e alunos das salas de aulas.

5. Contribuições para os acadêmicos

Todos os acadêmicos bolsistas, mesmo aqueles que tiveram muitas dificuldades


iniciais, foram enfáticos em afirmar que estão bem mais seguros e interessados em
continuar a lecionar na área tecnológica educacional, pois eles conseguiram enxergar
que os conhecimentos adquiridos durante o curso (graduação) estão sendo bem
pregados, quando eles vão a campo, e precisam aplica-los. Isto demonstra que o
programa PIBID, está sendo de grande importância para o incentivo, tanto da docência,
quanto na permanência destes, em breve, Licenciados em Computação na docência.

6. Considerações finais e perspectivas

Ao final, podemos concluir que todas as atividades e objetivos foram alcançados


e conseguimos ir além do que tínhamos como ideia inicial, pois este além de conseguiu
aplicar todas as atividades previstas e também, participar de eventos (locais e regionais),
além de poder estar atuando diretamente em sala de aula. Percebemos um grande
crescimento acadêmico por parte dos bolsistas que atuarem neste subprojeto, pois ouve
muita troca de conhecimentos entre os grupos e professores supervisores, conseguindo
desenvolver até publicações acadêmicas em eventos, pela primeira vez. Além de
participar de organizações de eventos, contribuindo para o desenvolvimento da
1626

universidade. Sendo assim, fica compreensível a certeza de estar no caminho certo,


através do subprojeto do PIBID, pois trouxe um maior conhecimento, tanto para a vida
pessoal, quanto para vida profissional de licenciados que queiram atuar na carreira
docente. Assim como os conhecimentos em aprender a trabalhar com o sistema
operacional Linux Educacional, foi “transmitido” com certa facilidade, pois ouve tempo
para estudo e aplicação em sala de aula. Também foi possível trabalhar com alunos de
diversas idades, onde conseguimos analisar o comportamento desses alunos em várias
idades, proporcionando momentos inesquecíveis para todos os envolvidos. Além disso,
cabe reforçar que a manutenção ou continuidade deste subprojeto é de fundamental
importância para alavancar o aprendizado desses acadêmicos interessados em se graduar
no curso de Licenciatura em Computação da Unemat, campus de Alto Araguaia.

REFERÊNCIAS:

WEISS, A. M. L; CRUZ, M. L. R. A informática e os problemas escolares de


aprendizagem. 3. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2001;

CHASTINET, C. A.; MOREIRA, A. M. Linux: histórico e visão geral de um sistema


emergente. Disponível em:
<http://albertmoreira.com.br/wpcontent/conteudo/academico/BSI.CHASTINET.etal.F1
%20_Rev.%20%2023.11.06_.pdf>. Acesso em: 14/02/12.

Linux Educacional - O pinguim vai à escola. Disponível em:


<http://linuxeducacional.com/>. Acesso em: 14 fev. 2012.

LINUX EDUCACIONAL: desafio para o professor | Lemos | Revista de


Tecnologias e Mídias na Educação. Disponível em:
<http://www.reteme.org.br/index.php/reteme/article/view/16>. Acesso em: 14 fev.
2012.
1627

Pôster

A Formação Continuada e o impacto na prática dos professores que realizaram o


Curso: Melhor Gestão, Melhor Ensino – Professores de Ciências.

Sidney Cabral Lourenço


UNINOVE
Orientadora: Profa. Dra. Patricia Aparecida Bioto-Cavalcanti

Resumo: O objeto da presente pesquisa é investigar o impacto na prática docente dos


concluintes do curso Melhor Gestão – Melhor Ensino – Formação de Professores de
Ciências. Terá por objetivo geral analisar como os professores estão fazendo uso das
metodologias estudadas no curso MGME – Formação de Professores de Ciências. O
objetivo específico será acompanhar e diagnosticar as possíveis elaborações que os
professores cursistas executaram em suas práticas pós MGME. O universo da pesquisa é
constituído de três escolas publicas localizada na cidade de São Paulo, cujos sujeitos
serão três professores que atuam no ensino fundamental anos finais, especificamente 7º,
8º e 9º anos. Utilizar-se-á metodologia de cunho qualitativo cujo instrumento de coleta
de dados será entrevista semiestruturada, questionário com questões abertas e fechadas,
além de uma análise dos documentos oficiais que regem o referido Programa. Neste
sentido, a pesquisa é fundamentada em Nóvoa (1992,1995), Carvalho (1993), Alarcão
(1996), Bell (2008), e legislação vigente.
Palavras-chave: Formação continuada de professores, MGME, Formação em serviço.

Introdução

Em 2008 fui convidado para integrar a equipe da Oficina Pedagógica da


Diretoria de Ensino Região Leste 1 (hoje denominado Núcleo Pedagógico – NPE) como
Assistente Técnico Pedagógico (ATP). Parte das prerrogativas da função envolve a
formação continuada dos professores da rede estadual de ensino do Estado de São
Paulo, mais especificamente os professores de Ciências, Biologia e Química de 89
escolas desta Diretoria de Ensino.
No exercício da função pude conhecer melhor a realidade das diversas escolas
que compõem a Leste 1. Desde então realizei vários cursos de atualização e
1628

aperfeiçoamento para garantir a formação continuada dos professores da área de


Ciências da Natureza e para os Professores Coordenadores, sempre atuando com
orientações técnicas no NPE e in loco nas unidades escolares.
Neste período é sabido que a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo
estava em processo de implementação da Proposta Curricular do Estado para todas as
escolas pertencentes à rede pública de ensino. Como ATP fui capacitado em encontros
de formação, juntos com os especialistas que elaboraram a proposta de cada disciplina.
Através desses encontros de formação, tivemos a oportunidade de conhecer, refletir,
estudar as concepções que a proposta trazia sobre o currículo e a estruturação dos
conteúdos na distribuição por bimestre.
Realizamos estudos das Situações de Aprendizagem que constam nos cadernos
dos alunos, nos cadernos dos professores, a dinâmica de trabalho ali presente e como
elas foram elaboradas. Após as formações, realizei vários Cursos e Orientações
Técnicas (OTs) ministradas para os professores de Biologia e Ciências na Diretoria de
Ensino Região Leste 1, com objetivo de aperfeiçoar as metodologias e práticas
educacionais em relação à proposta curricular para a sua efetivação.
Infelizmente a adesão aos cursos não foi satisfatórias, pois os professores não
acreditavam na eficácia da Proposta e não eram incentivados pelos gestores. Alguns em
relatos alegavam que os cursos, por serem fora do horário de trabalho não eram viáveis,
pois devido ao acumulo de cargo não tinham tempo para o descolamento e a
permanência no curso. Observo que alguns professores (as) possuem uma resistência
muito grande em cursos de formação continuada, principalmente aqueles oferecidos
pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP). Nas orientações técnicas
ao contrário, por ser convocação no horário de trabalho, temos um grande número de
professores presentes, mas ainda muito resistentes à Proposta Curricular do Estado de
São Paulo, hoje Currículo do Estado de São Paulo.
Dando continuidade ás ações de formação de seu corpo docente como parte do
processo de implementação do Currículo, a Secretaria Estadual da Educação de São
Paulo (SEE-SP), promove para todos os professores da rede um curso de capacitação
em modalidade presencial e a distancia, denominado Programa “Melhor Gestão, Melhor
Ensino”. O curso ocorreu em horário de trabalho, de modo a sanar alguns problemas
apontados pelos professores em cursos anteriores. A Resolução SE 22, de 18 de abril de
2013 que instituiu o Programa Melhor Gestão, Melhor Ensino (MGME), afirma que sua
origem deve ser considerada a partir de alguns parâmetros, a saber:
1629

- O Programa Educação - Compromisso de São Paulo, instituído pelo Decreto


nº 57.571, de 2 de dezembro de 2011, cuja implementação prevê o
desenvolvimento de ações que visam à melhoria da educação básica paulista;
- O incentivo à formação continuada de educadores da rede estadual de
ensino, assegurando-lhes atualização e aperfeiçoamento e,
consequentemente, melhor desempenho profissional;
- A importância e a necessidade de se intensificarem ações de formação
continuada em prol da melhoria das práticas de gestão administrativa e
pedagógica, das classes de gestores de educação e de docentes no sistema
estadual de ensino;
- Que os avanços significativos na aprendizagem dos alunos, decorrentes de
ações de formação continuada, propiciam maior grau de proficiência nas
disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática e demais disciplina do Ensino
Fundamental Anos Finais (SÃO PAULO, 2013).

A Resolução SEº 22/2013 vem validar o Decreto nº 57.571/2011, que tem como
um dos pontos relevantes à melhoria da educação básica, contribuindo para o
aperfeiçoamento do Plano de Formação Continuada de gestores e professores das
diretorias de ensino e escolas, fornecendo subsídios na construção do processo de
fortalecimento do domínio das competências leitora e escritora aos alunos.

O programa referido é um curso, para professores que atuam do ensino


fundamental anos finais. Com uma carga horária 60 (sessenta) horas, das quais 32
(trinta e duas) com atividades presenciais, incluindo a realização de Seminário
centralizado em nível de diretoria de Ensino de 8 (oito) horas, e 28 (vinte e oito) com
atividades a distância, os materiais utilizados são autoinstrucionais com o apoio de
textos e vídeos. Há também um sistema de tutoria que provê o acompanhamento
pedagógico sistemático e direto das atividades dos professores cursistas.

Justificativa

Trabalhos sobre formação continuada em serviço para professores da rede pública


têm diagnosticado as dificuldades de mudanças nas concepções e práticas educacionais
na rotina escolar do professor. Neste sentido, esta pesquisa busca acompanhar,
diagnosticar as possíveis elaborações que os professores cursistas executam em suas
práticas pós-curso MGME.

Com esta perspectiva, pretende-se analisar em que condições podem ocorrer


mudanças nos professores de ciências como resultado de um programa de atualização.
Tomaremos como referencia o programa desenvolvido pela Secretaria da Educação do
1630

Estado de São Paulo (SEE – SP) e a EFAP que visa prover aos professores formação
continuada em serviço no formato EAD com encontros presenciais e um Seminário
Descentralizado.

Problematização

• Como os professores veem seu processo de formação continuada?

• De que maneira os professores estão fazendo uso do conhecimento adquirido no


Curso – MGME de Ciências?

Universo e sujeitos da pesquisa

O universo da pesquisa serão três escolas publicas, localizada na cidade de São


Paulo. Os sujeitos serão três professores que realizaram o curso MGME – Ciências 1ª
edição 2013.

Metodologia

A metodologia de pesquisa adotará abordagem qualitativa, utilizando como


referência o trabalho de n Judith Bell (2008), no que diz respeito às orientações teóricas
quanto aos procedimentos da pesquisa, que são:

• Levantamento bibliográfico e documental;


• Questionários e entrevistas semiestruturadas;
• Observação de sala de aula.

Aportes Teóricos

As temáticas a serem estudadas serão formação de professores em serviço, e


formação continuada.

A ação de formação continuada “Melhor Gestão, Melhor Ensino”, faz parte do


Programa Educação – Compromisso de São Paulo, como uma das vertentes voltadas à
melhoria da educação do Estado de São Paulo.

A década de 90 foi marcada pelo signo da formação continuada de


professores. Uma vez que os problemas estruturais da formação inicial e da
profissionalização em serviço estão em vias de resolução, é normal que as
atenções se virem para a formação continuada. A formação continuada tende
a articular-se em primeira linha com os objetivos do sistema, nomeadamente
com o desenvolvimento da reforma. A formação deve estimular uma
perspectiva crítico-reflexivo, que forneça aos professores os meios de um
1631

pensamento autônomo e que facilite as dinâmicas de autoformação


participada. Estar em formação implica um investimento pessoal, um
trabalho livre e criativo sobre os percursos e os projetos próprios, com vista à
construção de uma identidade, que é também uma identidade profissional. (
Nóvoa, 1995, p.25)

A formação continuada tem uma forte ligação com a compreensão e


conscientização da importância do contexto histórico, cultural e político da profissão e
como esse reflete no contexto do ato de ensinar. Outro ponto relevante, na formação, é a
necessidade de maior proximidade do docente à pesquisa e as outras ciências que
possam auxiliá-lo e subsidiar ações mais profissionais, críticas e reflexivas, cuja
aproximação o auxiliará a compreender melhor as relações entre formação pedagógica,
profissional e científica.

A literatura sobre a formação continuada de professores tem destacado a presença


de resistências a esses processos de mudanças. Como afirma Nóvoa (1995, p 16), “há
um efeito rigidez que, num certo sentido, torna os professores indisponíveis para a
mudança” e acrescenta que, os profissionais do ensino são por vezes muito rígidos,
manifestando grande dificuldade em abandonar certas práticas, nomeadamente as que
foram empregadas com sucesso em momentos difíceis da sua vida profissional.

A formação é frequentemente concretizada por meio de cursos, conferências,


seminários e outras situações pontuais em que os docentes desempenham o papel de
ouvintes nos quais se desconhece que eles têm muito a contribuir e não só a aprender.

A Formação continuada possui vários objetivos, dentre eles, proporcionar aos


profissionais da educação, discussões teóricas atuais, propondo novas metodologias e,
com a intenção de fornecer subsídios para as mudanças que se fazem necessárias para a
melhoria do trabalho do professor e consequentemente do conhecimento adquirido
pelos alunos. Para tanto não basta o profissional se nutrir de novas teorias, e não
conseguir relacioná-las com sua mediação em sala de aula, na construção diária com
seus alunos. (cf. NÓVOA, 1995, p.15-34; PERRENOUD, 2000).

Um passo importante na formação do professor é o estímulo à renovação e


adaptação das atividades experimentais às quais foi exposto. O professor deve “pensar”
1632

em como utilizar, no âmbito da escola em que atua o que “aprendeu” nos cursos de
formação.

É fundamental que o professor análise de modo crítico como empregar,


aprimorar e/ou desenvolver materiais didáticos adaptados á sua própria realidade, para
que as novidades possam ser incorporadas de forma efetiva á rotina de ensino.

Por isso se faz necessário uma formação continuada dos temas atuais e
metodologias que não foram abordados na época de sua formação inicial, ou até mesmo
em temas que o professor não se sinta bem preparado para trabalhar em sala de aula,
pois nunca saberemos qual vai ser a dúvida que nosso aluno vai possuir.

Percebe-se em cursos de formação continuada a inquietude de uma quantidade


significativa de professores, que não conseguem estabelecer relação entre o que estão
estudando com o seu trabalho cotidiano. (teoria e prática). Por este motivo os
professores que sentem dificuldades em fazer esta relação, acabam achando estes cursos
cansativos, repetitivos e não se dedicam intensamente ao estudo.

Há necessidade assim de uma mudança didática, onde as intervenções das áreas de


conhecimento pedagógico e do conteúdo a ser ensinado, no caso ciências, precisam mudar. É
preciso que o docente, numa atividade de atualização, possa refletir sobre a sua prática, os
conteúdos que ensina, aprendendo o que acaba de ser produzido, colocando-o em xeque de
como introduzir os novos conhecimentos em sala de aula.

Esta mudança na postura pedagógica se dará na medida em que o diálogo com


pesquisadores, com colegas, principalmente na formação continuada, refletindo sobre a
sua visão de como a ciência é construída, poderá levá-los a transformações mais
eficazes. Ao longo da carreira docente, os trabalhos práticos propostos apresentam uma
visão deformada da ciência e do trabalho científico (cf. GIL-PEREZ e CARVALHO,
1993, p. 39).

Entender a resistência dos professores em relação ao que se estuda nos cursos de


formação continuada requer muito mais que acabar com ‘ensino tradicional’ de
ciências, onde a aula é transcrita no quadro-negro; seguindo uma proposta curricular
tradicional elaborada coerentemente, comum em nossas escolas, com o conhecimento
centrado no professor, livresco, baseada na memorização, com uma visão de ensino-
1633

aprendizagem sem levar em conta os aspectos de conhecimentos dos alunos, o da


sociedade e seu cotidiano. Educação esta que é relevante para qualquer país e cidadão.

Deste modo, destacar a possibilidade da “compreensão profunda da matéria a ser


ensinada e da própria natureza da ciência” (GIL-PEREZ e CARVALHO, 1993, p. 47),
contextualizando os conhecimentos abordados, olhando para sua evolução histórica, nos
parece uma preocupação que, em muito, poderá orientar propostas de melhoria da
formação docente.

Objetivos:

Geral

Analisar como os professores estão fazendo uso das metodologias estudadas no


curso MGME – Formação de Professores de Ciências.

Específicos

Analisar as aulas e as metodologias que estão sendo utilizadas pelos


professores, visando identificar a contribuição dos conteúdos e metodologias
estudadas no Curso.

Acompanhar, diagnosticar as possíveis elaborações que os professores


cursistas executaram em suas práticas pós MGME- Ciências.

Compreender como as políticas educacionais, através de cursos de


aperfeiçoamento (formação continuada) pela Secretaria da Educação do Estado
de São Paulo, têm influenciado na prática dos professores.

REFERÊNCIAS

ALARCÃO, Isabel (Org.). Formação reflexiva de professores: estratégias de


supervisão. Porto: Porto Editora, 1996.

BELL, Judith. Como realizar um projecto de investigação. Lisboa: Gradiva, 2008.

CARVALHO, Anna Maria Pessoa de; GIL-PÉREZ, Daniel. Formação de professores


de ciências: tendências e inovações. São Paulo: Cortez, 1993.

____________. Formação de professores de ciências. 2. Ed. São Paulo: Cortez, 1995.


1634

NÓVOA, Antonio. (Org.) Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote,


1992.

________. Formação de professores e profissão docente. Lisboa: Dom Quixote, 1995


p. 15-34.

PERRENOUD, Philippe. Práticas pedagógicas, profissão docente e formação:


perspectivas sociológicas. Lisboa, Dom Quixote, 1993.

SÃO PAULO (Estado). Resolução SE nº 22, de 18-4-2013 Institui o Programa “Melhor


Gestão, Melhor Ensino”, no âmbito da Secretaria da Educação. Disponível em:
<http://www.rededosaber.sp.gov.br/portais/Portals/131/Resolu%C3%A7%C3%A3o%2
0SE-22%20de%2018-4-2013%20Programa%20Melhor%20Gest%C3%A3o.pdf>.
Acesso em: 28/05/2014.
1635

Pôster

Formação inicial de pedagogas (os) para a concepção e gestão do currículo

Silvana Alves Freitas


Doutoranda do PPG Educação: Currículo da PUC/SP
Membro do Grupo de Pesquisa Formação de Professores
e Paradigmas Curriculares
Bolsista CNPq

Marcos Tarciso Masetto


Professor do PPG Educação: Currículo da PUC/SP
Líder do Grupo de Pesquisa Formação de Professores
e Paradigmas Curriculares
Orientador da Pesquisa

Resumo: A pesquisa em desenvolvimento junto ao Programa de Pós-Graduação em


Educação: Currículo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, vinculada à
linha de pesquisa Formação de Educadores, analisa o currículo do curso de Pedagogia,
por meio da abordagem qualitativa com finalidade descritiva e explicativa. Faz-se uso
do método de estudo de caso coletivo para investigar os currículos de três
universidades, sendo uma pública federal, uma pública estadual e uma privada, com
vistas a encontrar alternativas curriculares para a formação das(os) pedagogas(os) como
conceptoras e gestoras do currículo.
Palavras-chave: Pedagogia. Formação. Gestão do Currículo.

INTRODUÇÃO
Este trabalho apresenta a pesquisa de doutorado em andamento, desenvolvida
junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, vinculada à linha de pesquisa Formação de
Educadores, e apresenta como foco a formação inicial das(os) pedagogas(os) no que se
refere aos conhecimentos sobre currículo, sua concepção e gestão como aspectos
centrais da formação dessas(es) profissionais.
1636

A indicação da centralidade justifica-se por acreditar que o currículo, seu


conteúdo (conhecimentos e saberes) e sua forma (maneira como viabiliza e articula as
relações interpessoais) constituem-se como desencadeadores, organizadores e
viabilizadores do trabalho pedagógico para a concretização do processo educativo
expresso no projeto pedagógico, quer seja no espaço escolar, que seja em espaços não
escolares, visto que toda educação institucionalizada pressupõe planejamento, mediação
entre pessoas e conhecimento para que se efetive, ou seja, pressupõe currículo e gestão.
A crença no caráter fulcral que o currículo, sua concepção e gestão devem ter na
formação das pedagogas tornou-se foco de minha atenção desde o início de minha
profissionalização como pedagoga e professora do Ensino Fundamental. Quando fui
docente de um curso de Pedagogia em uma universidade privada localizada no
município de São Paulo (entre 2009 e 2012), pude reafirmar minhas preocupações
anteriores relacionadas, por um lado, à tendência à naturalização dos conteúdos como
algo dado, não passíveis de mudanças, com base, sobretudo, nos relatos de estágio de
minhas alunas sobre a ausência de discussão nas escolas a respeito dos conteúdos a
serem ensinados; por outro lado, a dificuldade que senti em encontrar uma bibliografia
específica sobre gestão do currículo.
Esta preocupação tornou-se objeto da pesquisa que realizei no mesmo período,
entre 2009 e 2011, para obtenção da titulação de Mestrado pelo Programa Educação:
Currículo, na qual analisei o papel do professor coordenador como gestor do currículo
da Proposta Curricular do Estado de São Paulo promovida pela Secretaria da Educação
do Estado de São Paulo em 2007.
Os resultados obtidos mostraram a instituição de um tipo de gestão em que
subjaz a ideia de um modelo gerencialista e tecnocrático, baseado na concepção de
organização burocrática de trabalho taylorista, a qual desloca os conhecimentos prévios
dos sujeitos do processo educativo e a sua participação de forma autoritária e
incongruente com a gestão democrático-participativa fixada pela Constituição Federal
de 1988 e reiterada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) no
9.394/96.
Também desvelaram uma deficiência na formação do professor coordenador
para exercer as funções de gestor do currículo, uma vez que para tal não haja a
obrigatoriedade da formação inicial em Pedagogia, curso de graduação que
historicamente tem sido o responsável por oferecer, por meio das habilitações (hoje
extintas), a formação para a coordenação pedagógica.
1637

Estes cursos têm sido ao longo de sua história objeto de acirrados debates quanto
a sua constituição e ainda hoje permanecem no cenário das discussões sobre formação,
com um elemento trazido a mais com a instituição, em 2006, das Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura (DCNs).
Os anseios expostos quanto à formação das(os) pedagogas(os) como
conceptoras(es) e gestoras(es) do currículo mostram-se estar em consonância com as
DCNs da Pedagogia quando estas salientam, como no item III do parágrafo único, que
para a formação do licenciado em Pedagogia é central “a participação na gestão dos
processos educativos e na organização e funcionamento de sistemas e instituições de
ensino” (BRASIL, 2006, p. 2); no Art. 5º (BRASIL, 2006), que trata dos egressos,
declara-se, entre outros aspectos, que estes deverão estar aptos a participar de estudos
curriculares, realizar pesquisas que proporcionem conhecimento sobre propostas
curriculares e sobre organização do trabalho educativo e práticas pedagógicas, além de
aplicar criticamente as diretrizes curriculares e participar da gestão das instituições
contribuindo para a elaboração, implementação, coordenação, acompanhamento e
avaliação do projeto pedagógico.
Diante do exposto, a formação oferecida pelo curso de Pedagogia deve ser
problematizada, como, de maneira sintética, explicita a seguinte questão norteadora da
presente pesquisa: como deve estar organizado o currículo do curso de Pedagogia para
ser capaz de formar pedagogas(os) como conceptoras(es) e gestoras(es) competentes do
currículo?
O objetivo fulcral aqui estabelecido é a promoção da integração entre os
conhecimentos sobre currículo (sua concepção) e sobre gestão, trazendo-os para o
centro do currículo do curso de Pedagogia e, assim, oferecer alternativas à organização
curricular com vistas à formação do conceptor e gestor do currículo.
Dentre todas as instituições de ensino superior (IES) do País que oferecem o
curso de Pedagogia, foram selecionadas três universidades, sendo duas públicas e uma
privada. Entre as públicas escolhidas, uma é federal a outra é estadual. O primeiro
critério de seleção foi o de constar em suas matrizes curriculares a existência de
disciplinas ou unidades temáticas que abordem as temáticas do currículo e da gestão. Os
outros critérios se estabeleceram dadas as particularidades de cada curso que se
mostram relevantes para os objetivos da pesquisa, como se expõe na sequência.
A universidade federal foi selecionada por sua projeção na produção de
pesquisas oferecendo referencial significativo e de relevância reconhecida quanto à
1638

formação de educadores. A universidade estadual destaca-se por sua importância


histórica para a institucionalização do curso de Pedagogia e sua constituição por meio
da produção intensiva de conhecimentos sobre as temáticas da educação, da formação
de pedagogas(os) e da gestão. Já a universidade privada foi selecionada pelo diferencial
relativo à organização curricular inovadora no que tange aos aspectos de integração e de
interdisciplinaridade.
Busca-se, pela análise dos currículos de cursos selecionados, encontrar
elementos que apresentem a viabilização da integração entre os estudos referentes ao
currículo e à gestão, possibilitando uma formação competente àquelas(es) que serão
as(os) conceptoras(es) e gestoras(es) do currículo.

REFERENCIAL TEÓRICO
Os aspectos expostos apresentam um conjunto de desafios e demandas para a
formação de educadores a ser oferecida principalmente pelo curso de Pedagogia, cuja
história, como expõem Brzezinski (2012) e Silva (2006), mostra incongruências e
conflitos desde sua gênese. A existência e significação da Pedagogia são motivo de
debates até hoje. Surgem questões como, por exemplo, esta ser ou não ciência, o tipo de
formação que deve oferecer, quais profissionais devem ser por ela formados (se
somente os docentes, ou se os gestores, supervisores, orientadores educacionais,
coordenadores pedagógicos também devem ser incluídos). Essas reflexões devem ser
abordadas como o fazem Franco (2008), Pimenta (2011) e Libâneo (2011).
Em meio a essas reflexões, destaca-se a de Ferreira (2006, p. 1345), que, ao
analisar as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia,
percebe nelas contidas “a ampla possibilidade de formação e atuação do profissional da
educação, assim como a necessidade de uma sólida formação em gestão da educação”.
A autora continua a expor uma concepção ampla também de gestão que acaba por
englobar o currículo ao explicitar que:
Refere-se à necessária direção do processo educativo que se faz, um só, com
os mesmos princípios, valores, conteúdos humanos e ‘sabedoria’ desde a
construção coletiva inicial do projeto político-pedagógico, que continua
sendo reconstruído a cada momento em que se faz prática, em que a ‘ideia’ se
transforma em ‘ato’ e possibilita um novo ‘pensar’ sobre todo este processo
de formação humana [...](FERREIRA, 2006, p.1348).

Isto mostra que a gestão e a própria concepção do currículo compõem um


trabalho complexo de atuação em um “território contestado” que oferece tensões e
1639

conflitos para selecionar o conjunto de conhecimentos, saberes, competências,


habilidades, experiências, e valores que visam à educação dos alunos nas escolas, ou
seja, a escolha de uma trajetória possível, necessário para formar o ser humano que se
deseja para viver em uma sociedade que se deseja. O currículo, como explicitado na
definição de Apple (2001, p. 210),
não é pensado como uma coisa, como um programa, ou curso de estudos. Ele
é considerado como um ambiente simbólico, material e humano que é
constantemente reconstruído. Este processo de planejamento envolve, não
apenas o técnico, mas o estético, o ético e o político se quisermos que ele
corresponda plenamente tanto ao nível pessoal quanto social.

Essa concepção amplia as dimensões e implicações do currículo na formação das pessoas que
o vivenciam, bem como a concepção de Masetto (2011, p. 4) referente ao currículo do
ensino superior:
Partimos de uma concepção de currículo no ensino superior como um
conjunto de conhecimentos, saberes, competências, habilidades, experiências,
vivências e valores organizados de forma integrada visando a formação de
profissionais competentes e cidadãos, para uma sociedade contextualizada
num determinado tempo e espaço histórico, político, econômico e social.

A compreensão do currículo num sistema educativo requer que se preste atenção


“às práticas políticas e administrativas que se expressam em seu desenvolvimento, às
condições estruturais, organizativas, materiais, dotação de professorado, à bagagem de
ideias e significação que lhe dão forma e que o modelam [...]” (SACRISTÁN, 2000, p.
21).
Toda essa complexidade curricular, por um lado, não pode reduzir-se à prática
pedagógica restrita à sala de aula, ao contrário deve incluí-la, bem como “às ações de
ordem política, administrativa, de supervisão, de produção de meios, de criação
intelectual, de avaliação, etc.” (GIMENO SACRISTÁN, 2000, p. 21).
Por outro lado, essa complexidade envolve o coletivo de sujeitos no processo
educacional e, para que se realize, exige uma gestão concebida como uma conquista
ligada aos processos de democratização da sociedade e da educação ocorridos,
especialmente, na década de 1980 no Brasil (DRABACH; MOUSQUER, 2009), com o
intuito de se contrapor ao termo administração – no seu modelo tecnocrático –,
possibilitando maior participação dos sujeitos escolares, com direito a voz e vez e, nesse
exercício, ir desenvolvendo ao longo da profissão maior autonomia para pensar e tomar
decisões sempre integradas ao pedagógico, pois, como afirma Silva (2000, p. 100), a
gestão deve ser compreendida “no sentido da organização do trabalho, de coordenação
1640

da ação coletiva, da busca de diálogo [...] [para] criar condições para que o projeto
[educacional] se concretize” deixando claro que “em se tratando de gestão de
instituições de ensino, não há como separar o pedagógico do administrativo ou o
acadêmico do administrativo” (SILVA, 2000, p.73).
Estas questões podem encontrar acolhida e possibilidade de superação por meio
de elementos curriculares que tragam inovações para os cursos de Pedagogia, o que
implica estabelecer os pressupostos do que seja inovação como os apresentados por
Masetto (2012, p. 16) ao explicar que:
[...] as inovações educacionais nunca se apresentam com a característica da
neutralidade, pelo contrário, sempre surgem como resultado de um contexto
social, de determinada concepção de educação e como resposta a
necessidades emergentes para as quais os paradigmas atuais já não oferecem
encaminhamentos aceitáveis.

Carbonell (2002) oferece importantes contribuições ao discutir sobre as


inovações educacionais, mostrando que são cruciais para promover a aprendizagem
sólida dos alunos, que devem enfrentar criticamente as mudanças aceleradas da atual
sociedade do conhecimento, na qual a nova cidadania que é preciso formar exige outro
tipo de conhecimento e participação mais ativa dos alunos no processo de
aprendizagem. A inovação, para o autor, se dá mediante conflitos, em um
processo complexo e contraditório, marcado historicamente dentro da escola por
dilemas e paradoxos.
Hernandes (2000) estabelece o vínculo importante entre a inovação, o currículo
e a importância desse último no processo ao explicitar que a inovação modifica
concepções e organizações curriculares, uma vez que o currículo para o autor é a forma
organizacional de materialização de uma inovação educacional.

METODOLOGIA DA PESQUISA
A pesquisa se realiza por meio da abordagem qualitativa com finalidade
descritiva e explicativa. Faz-se uso da abordagem qualitativa por compreender, como o
faz Chizzotti (2008, p. 28), que essa abordagem “implica uma partilha densa com
pessoas, fatos e locais que constituem objetos de pesquisa, para extrair desse convívio
os significados visíveis e latentes que somente são perceptíveis a uma atenção sensível”.
A opção pelo método de estudo de caso coletivo deve-se ao fato de que são
objeto da pesquisa três cursos de Pedagogia, como já dito, oferecidos por três
1641

universidades, uma federal, uma estadual e uma privada localizadas no Estado de São
Paulo.
O método de estudo de caso, conforme explicita Chizzotti (2008, p. 135),
“objetiva reunir os dados relevantes sobre o objeto de estudo e, desse modo, alcançar o
conhecimento mais amplo sobre esse objeto, dissipando dúvidas, esclarecendo questões
pertinentes, e, sobretudo instruindo ações posteriores”, o que oferece a possibilidade de
construir uma pesquisa propositiva como a que se propõem como esse estudo.
Ainda segundo Chizzotti (2008, p. 137), o estudo de caso coletivo “significa
estender o estudo a diversos casos instrumentais para ampliar a compreensão ou
teorização a partir de uma coleção mais ampla de casos conexos”.
Utiliza-se a pesquisa documental, cujas fontes são a legislação em vigor
pertinente ao curso de Pedagogia e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Pedagogia, bem como os Projetos Pedagógicos dos cursos de Pedagogia, suas matrizes
curriculares, as ementas das disciplinas, além da pesquisa bibliográfica.
A coleta de dados da pesquisa de campo se fará por meio de entrevistas
semiestruturadas realizadas com docentes do curso de Pedagogia, principalmente
aqueles cujas áreas de domínio sejam currículo e gestão, gestores dos cursos e alunos.

CONSIDERAÇÕES PARCIAS
A pesquisa em andamento encontra-se em seu início e, portanto, trabalha com
duas perspectivas diferentes de resultados. A primeira refere-se ao cumprimento dos
objetivos propiciado pelos resultados obtidos por meio do estudo de caso coletivo, pelo
qual seriam encontrados os elementos que contemplem a integração entre currículo e
gestão para a formação desejada das(os) pedagogas(os) como conceptoras(es) e
gestoras(es) do currículo. Considerando o fato de que os casos podem não oferecer os
resultados esperados, a segunda perspectiva oferece a possibilidade de alcançar os
objetivos mediante os estudos existentes sobre inovação no ensino superior que podem
oferecer os elementos necessários ao currículo para a formação de conceptoras(es) e
gestoras(es) do currículo.

REFERÊNCIAS
APPLE, M. W. Política cultural e educação. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2001
_______. Educação e Poder. 2 reimp. Porto Alegre: Artemed, 2002.
1642

BRASIL/CNE. Resolução CNE/CP n. 1, de 15 de maio de 2006. Institui as Diretrizes


Curriculares para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. Diário Oficial da
União, Seção 1, p. 11, Brasília, 2006.

BRZEZINSKI, I. Pedagogia, pedagogos e formação de professores. 9 ed. Campinas:


Papirus, 2012.

CARBONELL, J. A aventura de inovar: a mudança na escola. Porto Alegre: Artmed,


2002.

CHIZZOTTI, A. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais. 2 ed.


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DRABACH, N. P.; MOUSQUER, M. E. L. Dos primeiros escritos sobre administração


escolar no Brasil aos escritos sobre gestão escolar: mudanças e continuidades.
Currículo sem Fronteiras, v.9, n.2, pp.258-285, Jul/Dez 2009. Disponível em:
http://www.curriculosemfronteiras.org/vol9iss2articles/drabach-mousquer.pdf Acesso
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FRANCO, M. A. S. Pedagogia como ciência da educação. 2 ed. rev. ampl. São Paulo:
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FERREIRA, N. S. C. Diretrizes Curriculares para o Curso de Pedagogia no Brasil: a


gestão da educação como gérmen da formação. Educação e Sociedade, Campinas, vol.
27, n. 97, p. 1341-1358, set./dez. 2006. Disponível em: http://www.cedes.unicamp.br.
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GIMENO SACRISTÁN, J. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3 ed. reimp.


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MASETTO, M T. Inovação Curricular no Ensino Superior. Revista e-Curriculum, vol.


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SILVA, C. S. B da. Curso de Pedagogia no Brasil: história e identidade. 3 ed.


Campinas: Autores Associados, 2006.
1643

Pôster

Trajetórias Escolares de Filhos de Funcionários da Universidade Federal de


Viçosa, Cotista, Ingressos no Ensino Superior.

Simone Glycério Carmo


UFV
Wania Maria Guimarães Lacerda
UFV

Resumo: Este trabalho constitui-se em uma investigação realizada sobre as trajetórias e


estratégias escolares de estudantes filhos de funcionários da Universidade Federal de
Viçosa (UFV), oriundos da periferia de Viçosa e ingressos no Ensino Superior no ano
de 2014, por meio da lei de Cotas, visando verificar se o fato de seus pais trabalharem
na UFV influenciou na vida escolar dos sujeitos pesquisados. Sendo esta uma pesquisa
qualitativa, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas que estão sendo analisadas.
Até o presente momento percebe-se, por meio dos dados que mesmo diante de situações
que representassem percalços a trajetória destes estudantes foi marcada por um enorme
esforço, cansaço e dificuldades financeiras, o apoio do pai se apresentou como um fator
indispensável para o ingresso dos estudantes no ensino superior e conforme os
depoimentos dos entrevistados, com a lei de Cotas aumentaram-se as chances do negro
conquistar um diploma universitário.
Palavra chave: Trajetória e estratégia escolar, Lei de Cotas, ensino superior.

1 INTRODUÇÃO
Antigamente quando estava em jogo a educação dos filhos, a figura materna era
colocada em evidência e à figura do pai ficava em segundo plano e acreditava-se que
este se limitava a impor ordem, sustento e disciplina da prole.
Hoje apesar de pequena, a participação do pai na educação de seus filhos torna-
se fundamental na construção de uma trajetória escolar de sucesso. É preciso lembrar
que o papel do pai não se resume somente a exercer autoridade e garantir a segurança
financeira familiar. Já se foi o tempo em que a mãe cuidava dos filhos enquanto o pai se
encarregava das questões financeiras e disciplinares, agora a educação dos filhos é
responsabilidade de ambos.
1644

Propus problematizar e investigar a participação paterna na trajetória escolar dos


filhos, muito se tem discutido a importância da participação paterna junto à
escolarização dos estudantes, desde Ensino Fundamental até o Ensino Superior.
Nesta perspectiva o presente trabalho visa analisar a influência dos pais na
trajetória escolar de três estudantes negros, uma mulher que cursa Gestão Ambiental no
Campus Florestal (UFV) e dois homens que cursam Física na Universidade Federal de
Viçosa. Sendo os entrevistados filhos de funcionários da Universidade Federal de
Viçosa (UFV) que ingressaram no Ensino Superior pela política de Cotas. Estes foram
selecionados por meio do Sistema de Seleção Unificada (SISU), e por informações
adquiridas junto de pessoas que moram no bairro de São Jose do Triunfo que foi o lócus
desta pesquisa. Sendo esta uma pesquisa qualitativa, foi utilizada entrevista semi-
estruturadas, para obter os dados sobre as estratégias escolares desses estudantes, para à
conclusão deste trabalho.

2 O ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO E A POLÍTICA DE COTAS

De acordo com Candau (2004) apud Bonilha (2011), o ingresso de alunos negros
no Ensino Superior, não ultrapassa os 0,10% do total de vagas oferecidas pelas
universidades públicas brasileiras, o que pode ser um bom argumento para a discussão
de implementação da Política de Ações Afirmativas de acesso dos negros no ensino
superior.
Conforme Santos (2012), embora a luta pelas políticas de ações afirmativas
seja antiga e os movimentos sociais negro desde longa data defendam sua implantação
nas universidades públicas, foi a partir da III Conferência Mundial de Combate ao
Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlatas em Durban na
África do Sul no ano de 2001, que o Brasil passou a adotar esta política de forma mais
sistêmica.
A Lei de Cotas ou Lei nº 12.711, foi sancionada pela presidenta Dilma Rosseff,
em 29 de agosto de 2012. A Lei reserva 50% das vagas de curso e turno nas 59
universidades federais e 38 institutos federais de educação, ciência e tecnologia a
estudantes oriundos de camada popular que cursaram todo o ensino médio em escola
pública, em cursos regulares ou modalidade educação de jovens e adultos.
A distribuição das vagas é feita entre negros, pardos ou indígenas, segundo o
último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estas vagas
1645

deverão ser subdivididas, sendo metade para estudantes de escolas públicas com renda
familiar bruta igual ou inferior a um salário mínimo e meio per capita e metade para
estudantes de escolas públicas com renda familiar superior a um salário mínimo e meio,
Os outros 50% das vagas permanecem para ampla concorrência.
Segundo Guimarães (2009), as cotas são apenas parte dos denominados
Programas de Ação Afirmativa, que são um conjunto de estratégias, iniciativas ou
políticas que visam favorecer grupos ou segmentos sociais que se encontram em piores
condições de competição na sociedade, em razão, muito das vezes, de práticas negativas
de discriminação, sejam elas atuais ou antigas.
Na concepção de Irineu (2005), a cota é um dos instrumentos das ações
afirmativas que é utilizado para reduzir ou eliminar completamente, na medida do
possível, as diferenças sociais brasileiras tais como: as econômicas, as culturais, as
políticas e as educacionais.

3 OS PERFIS FAMILIARES E O SIGNIFICADO ATRIBUÍDO À ESCOLA E À


UNIVERSIDADE
Os perfis familiares dos entrevistados são bastante similares: Apesar dos pais
serem funcionários públicos, de acordo com os depoimentos dos entrevistados, eles se
sentem pertencentes a classe popular, já a respeito aos níveis de escolarização há uma
oscilação, um dos pais cursa o Ensino Superior, um possui o Ensino Médio e o outro o
Ensino Fundamental (5° ano). Já as mães, uma possui o ensino fundamental, duas o
Ensino Médio completo.
Dos três sujeitos que participaram da pesquisa, um reside na casa dos pais e é
casado, funcionário da Prefeitura Municipal de Viçosa e tem um filho, um vive na casa
da avó materna, pois, os pais foram transferidos por causa do trabalho para o Campus da
UFV em Florestal, e a mulher reside em Florestal.
Em relação à ocupação no mercado de trabalho os pais dos entrevistados,
ocupam os cargos de auxiliar de bombeiro hidráulico, auxiliar administrativo e
motorista tendo cada um, média salarial de até um e meio a dois salários mínimos. No
caso das mães, uma é domestica, uma é Pedagoga e a outra trabalha como auxiliar de
serviços gerais.
Considerando que qualquer capital possibilita a criação de certos bens, que sem
a sua presença não seria possível serem alcançados, cabe avaliar qual seria o capital
cultural que as famílias populares teriam para disponibilizar para as crianças. O capital
1646

cultural não se configura apenas como uma herança familiar, porém compõe-se de um
sistema de predisposições para a ação, formada pela posição que a família ocupa na
sociedade (SILVA, 2007 apud D’ARAUJO, 2003).
As disposições são incorporadas pela criança na forma de habitus, realizado com
a convivência familiar. O habitus pode ser compreendido como um sistema de
disposições duráveis, estruturadas a partir do meio social no qual o sujeito esta inserido.
Tais disposições estariam “predispostas a funcionar como estruturas estruturantes, isto
é, como princípio gerador e estruturador das práticas e das representações”
(BOURDIEU, 1983, p.61).
Esse capital que é fundamental para o sucesso na vida, especialmente o
profissional, quando os indivíduos o têm em sua forma no estado institucionalizado, isto
é, operacionalizado e/ou comprovado por meio do diploma escolar/universitário.
Isso está perceptível quando um dos sujeitos pesquisados, estudante de Física
disse que seu ingresso no Ensino Superior trouxe muitas mudanças em sua vida pelo
fato de agora ele conseguir enxergar a possibilidade de ser um profissional diplomado
em uma instituição pública mais próxima, algo bastante valorizado no mercado de
trabalho.
Em relação ao trabalho durante os estudos, no meio popular Zago (2010),
ressalta que a participação dos filhos na renda familiar é fundamental, visto que, a
mobilização familiar fica em primeiro lugar, está voltada para a sobrevivência, é o
rendimento coletivo do grupo, decorrente do trabalho dos seus membros, que tenta
assegurar as necessidades básicas da família.
Todos os três estudantes, sujeitos dessa pesquisa conciliaram, o trabalho com
estudos durante o Ensino Médio, e disseram que isso em alguns momentos os fez pensar
em desistir de estudar, devido ao cansaço advindo do trabalho. A mulher trabalhou
como babá e os homens trabalhavam no comércio.
Dados da Síntese de Índices Sociais (SIS) 2013 revelam que as desigualdades
existentes no rendimento mensal familiar per capita também ficaram mais evidente
quando se considerou as categorias de cor ou raça da população brasileira. Essa
informação chama nossa atenção para o fato de que esse não foi um fato isolado, tendo
em vista que historicamente, as populações de pretos e pardos apresentam indicadores
sociais desfavoráveis quando comparados à população de cor branca.
Para Domingues (2005) o Brasil é o país da segregação racial não declarada e,
todos os indicadores sociais ilustram números carregados com a cor do racismo, mas na
1647

maioria das vezes não são levados em consideração pelo poder publico. Por exemplo, a
(SIS) 2013 do IBGE, mostraram que as desigualdades no mercado de trabalho se
manifestam de diversas formas e que quando ela se refere à questão de cor ou raça a
diferença se acentua e a maior proporção de pretos ou pardos se encontrava no momento
da pesquisa em trabalhos informais (49,6%) comparativamente à população de cor
branca (36%).
Henrique (2002) em seus estudos sobre as desigualdades sociais no Brasil,
mostra a diferença existência entre brancos e negros na questão educacional. Com base
nos dados da pesquisa de padrões de vida do IBGE, estima-se que cerca de 5% do
diferencial salarial entre brancos e negros está associado à desigualdade educacional,
sendo uma parte derivada da discriminação gerada no interior do sistema educacional.
Percebe-se por meio dos indicadores que há mecanismos intraescolares que
contribuem para a discriminação que pode excluir ou dificultar o sucesso escolar da
população negra.
A estudante pesquisada, disse ter sofrido preconceito na escola e ainda relatou
uma situação constrangedora que passou durante uma festa que aconteceu na escola,
poucos têm a coragem de revelar e denunciar tais discriminações e conseguir sobreviver
a esta e outras discriminações raciais no ambiente escolar e prosseguir nos estudos.
Percebe-se que este preconceito sofrido na escola deixou cicatrizes profundas.
Muitos não têm essa força demonstrada por ela, alguns preferem silenciar esse
preconceito seja por vergonha ou por não acreditarem que essa realidade um dia possa
ser diferente, desistindo assim dos estudos. Porém, mesmo aqueles que conseguem
superar tal crime, como relembrou a estudante, jamais esquece a humilhação sofrida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Lei de Cotas tem sido uma política muito importante, para o ingresso e a
presença do corpo negro nas universidades públicas, a mesma pode ser uma ferramenta
para a redução do fosso histórico que reafirma a diferença socioeconômica entre negro e
branco na sociedade.
Para os sujeitos pesquisados a lei de Cotas aumentou as chances de o negro
conquistar um diploma universitário. A Lei nº 12.711, apesar de polêmica possibilitou
ainda que pequena, uma maior inserção das minorias na universidade pública, mas
também reconhece que a mesma ainda é um espaço elitizado. É preciso mudar o jeito
1648

de ver essa política, isto é, devemos reformular o nosso olhar sobre a mesma, e vê-la
como uma ação afirmativa positiva, que pode diminuir as desigualdades sociais
existentes entre os ricos e pobres.
Com esse trabalho pude perceber que mesmo diante de situações que
representassem percalços a trajetória destes estudantes que foi marcada por um enorme
esforço, cansaço e dificuldades financeiras, o apoio do pai se apresentou como um fator
indispensável para o ingresso dos estudantes no ensino superior. Enfatizo ainda que não
se trata de colocar a universidade como a “salvadora da humanidade”, mas como um
campo de possibilidades para as minorias de ter um futuro promissor.

REFERÊNCIAS:
BOURDIEU, P. A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à
Cultura. In: NOGUEIRA, M. A.; CATANI, A. Escritos de educação. Petrópolis:
Vozes, 2010.

BONILHA, Tamyris Proença. Ações afirmativas e integração do negro no ensino


superior: uma relação possível? ETD – Educação Temática Digital, Campinas, v. 13,
n. 1, p. 152-167, jul/dez. 2011.

----------------------BRASIL. Lei Nº 12.711, de 29 de agosto de 2012. Disponível em:


<http://portal.mec.gov.br/cotas/docs/lei_12711_2012.pdf >. Acesso em: 23 mai. 2013.

DOMINGUES, Petrônio. Ações afirmativas para negros no Brasil: o início de uma


reparação histórica. Rev. Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n.29, p.164-176,
maio/ ago. 2005. Disponível em: < http://www.scielo.br/ pdf/ rbedu/ n.29/ n.29 a 13.pdf
>. Acesso em: 10 jul. 2014.

GUIMARAES, Érica. Cotas: discussão constante e necessária. Com Ciência [online].


2009, n.111, pp. 0-0. ISSN 1519-7654. Disponível em: <
http://comciencia.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-
76542009000700006&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 31 mai. 2013.
HENRIQUES, Ricardo. Raça e gênero no sistema de ensino: os limites das políticas
universalistas em educação. Brasília: UNESCO, 2002.
IBGE. Síntese de indicadores sociais: uma analise das condições de vida da população
brasileira. Rio de janeiro: 2013.

IRINEU, Gilson. Igualdade ou desigualdade de oportunidades?Uma análise das leis


de cotas e de suas implicações sociais. Rio de Janeiro: UFRJ/PPGSA – IFCS, 2005.

SANTOS, A. P. Itinerário das ações afirmativas no ensino superior público brasileiro:


dos ecos de Durban à Lei das Cotas. Revista de C. Humanas, Viçosa, v. 12, n. 2,
p. 289-317, jul./dez.2012.
1649

SILVA, Maria Luiza Canedo Queiroz da. Percepção de famílias populares sobre
educação e cultura: uma exploração qualitativa. Dissertações, Mestrado Profissional
em Bens Culturais e Projetos Sociais FGV . Rio de Janeiro, 2007.
Disponível em: <
http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/1758/browse?value=Silva%2C+Mar
ia+Luiza+Canedo+Queiroz+da&type=author >. Acesso em 10 Jun.2014.

ZAGO, Nadir. Processos de escolarização nos meios populares: as contradições da


obrigatoriedade escolar. In: Família e Escola: trajetórias de escolarização em
camadas médias e populares. Maria Alice Nogueira, Geraldo Romanelli, Nadir Zago
(orgs.). 5 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.
1650

Pôster

A crise nos cursos de formação de professores: dos vestibulandos aos concluintes

Simone Santos Pereira


Universidade de São Paulo – CAPES

Resumo: Por conceber a importância da formação docente, analisamos


quantitativamente o número de inscritos no processo de seleção dos cursos de
Licenciatura e Pedagogia da Universidade de São Paulo de 2000 a 2013 e comparamos
o número de vagas e de concluintes no mesmo período. Consideramos ainda, explorar
nesse pôster, algumas reflexões acerca da baixa atratividade da carreira docente e
diminuição da procura por estes cursos. Os resultados mostram que tanto o número de
vestibulandos quanto o número de concluintes caíram no período estudado, embora
tenha ocorrido um pequeno aumento no número de vagas nos cursos de Geografia,
Educação Física, Pedagogia e Química. Acreditamos que são inúmeros os fatores que
levam à falta de interesse no ingresso e na conclusão dos cursos, incluindo desprestígio
social e financeiro que cercam a profissão. Políticas públicas de ingresso e permanência,
por parte da universidade, também são preponderantes para o sucesso acadêmico dos
estudantes.
Palavras-chave: Formação de professores, cursos de Licenciatura, atratividade na
docência

1. Introdução e Metodologia

Nossos objetivos são comparar o número de vestibulandos, vagas e de


concluintes entre 2000 e 2003 e verificar quais alterações se fizeram presente em
relação ao ingresso, oferta e conclusão. Visamos ainda, explorar algumas possibilidades
que justifiquem o resultado obtido a partir de artigos publicados no mesmo período.
Analisamos de maneira quantitativa, comparando o número de vagas ofertadas,
o número de vestibulandos e o número de concluintes.
1651

2. Resultados

A figura 1 mostra o número de vagas de cada curso, com dois referencias: o ano
inicial (2000) e o ano final (2013).

Figura 1 – Evolução do número de vagas nos cursos


de formação de professores em 2000 e 2013

900
800
700
600
500
400
300 2000
200 2013
100
0

Fonte: Distribuição de inscritos por curso, FUVEST

Em relação à oferta, em alguns cursos se aumentaram o número de vagas nesse


período, o aumento ocorreu nas Licenciaturas de Geografia, Educação Física e Química,
sendo que em Química e Pedagogia o aumento foi de 50% e em Educação Física de
100%. O número de vagas iniciais era de 1.889 e até 2013 cento e cinquenta novas
vagas foram criadas, totalizando a oferta de 2.039.
Nesse sentido houve, por parte da universidade, uma expansão na oferta dos
cursos de formação de professores, ainda que essa expansão seja inferior à 10% das
vagas no período inicial, durante um período de 14 anos.
Em seguida, coletamos dados relacionados aos vestibulandos. Confirmamos
que o número de candidatos, em sua totalidade, nesses cursos vem diminuindo
progressivamente desde 2006, como apontado na figura 2. Entre 2000 e 2006 o número
1652

de pleiteantes se alternou entre 19 mil e 24 mil, contudo, desde 2006 os números de


estudantes vêm caindo progressivamente chegando a 10.332 candidatos em 2012, o
mais baixo nos treze anos analisados e menos da metade do número de vestibulandos, se
comparado ao período de 2004 a 2006. Desde 2010 o número médio gira em torno de
dez mil candidatos.

Figura 2 – Número de vestibulandos nos cursos de formação


30000
25000
20000
15000
10000
5000
0

Fonte: Distribuição de inscritos por curso, FUVEST

A figura 3 mostra o número de concluintes, em sua totalidade, no período


pesquisado. O ano com mais formandos foi em 2010 com 552 licenciados, dentro as
2039 vagas dispostas, representa 27% dos estudantes. Houve um declínio a partir de
2011 resultando no pior índice do período em 2013, com apenas 10% de concluintes, ou
seja, 217 formados, ressaltando o pouco interesse, por parte dos estudantes, de um modo
geral, em se tornarem professores.

Figura 3 – Concluintes dos cursos de Formação de Professores


600
500
400
300
200
100
0

Fonte: Anuário Estatístico, USP


1653

Analisando as especificidades de cada curso, concluímos que as Licenciaturas


de Língua Portuguesa, que oferta anualmente 849 vagas, Geografia, 170, História, 270 e
Química, 90 vagas foram as que apresentaram um menor índice de concluintes, menos
de 13% dos estudantes concluíram a Licenciatura nos 14 anos pesquisados. No curso de
Geografia, em alguns anos (2003, 2008 e 2009) menos de 10 estudantes se graduaram,
conforme a tabela 1. Números esses baixíssimos, como no curso de Letras, em que
apenas 51 estudantes se formaram em 2012 e 2 em 2013. Os cursos de Exatas e
Biológicas resultaram em números mais elevados. Matemática, Física e Biologia têm
como um número médio de concluintes entre 40 e 60%. Matemática, no entanto, nos
últimos seis anos teve menos de 50% dos estudantes concluindo a Licenciatura. O curso
de Educação Física também possui um baixo número de aprovação, das 50 vagas
ofertadas, menos de 50% obtiveram o diploma e nos últimos dois anos apenas 26% dos
estudantes terminaram seus estudos. Em Pedagogia pode-se observar que os anos de
2012 e 2013 foram os piores anos da história, com um pouco mais de 23% e 8% de
concluintes respectivamente, embora o curso tenha formado mais de 50% de seus
estudantes entre 2000 e 2011. Todos os cursos tiveram menos licenciados em 2013.

Tabela 1 – Evolução do número de concluintes nos cursos de Licenciatura


Vagas 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Letras 849 81 65 72 83 99 99 135 95 65 50 109 127 51 2
Matemática 150 71 68 56 60 91 95 75 79 61 54 61 69 70 54
Biologia 120 46 43 59 63 66 47 51 51 39 27 63 39 64 31
Física 110 50 48 53 58 55 80 62 66 79 59 74 76 65 50
Química 90 10 10 12 16 13 11 7 7 8 14 12 17 11 9
Ed. Física 100 10 6 13 15 15 10 12 17 15 23 21 23 13 13
História 270 52 22 30 38 36 22 34 22 16 15 58 33 34 32
Geografia 170 19 19 21 8 16 16 26 21 7 7 18 17 19 11
Pedagogia 180 93 77 84 106 91 109 110 103 105 86 136 114 43 15

Fonte: Anuário Estatístico, USP


1654

3. Análises

Alguns estudos recentes têm se preocupado em analisar a crise em torno dos


cursos de formação de professores, versando sobre a falta de interesse, por parte dos
jovens, na procura pela profissão e a diminuição de professores formados. Esses fatores
podem gerar, num futuro próximo, uma escassez na profissão. Ristoff (2008) apontou
uma demanda de mais de 350 mil professores com formação específica para atender
todo o território nacional. Nossa pesquisa corrobora com os dados uma vez que aponta
no micro espaço da USP a diminuição da procura pelos vestibulandos tanto quanto o
interesse em se licenciar.
Gatti (2009) ressalta a pouca valorização do magistério nos dias atuais,
colocando-o como opção para estudantes oriundos de famílias de classe C e D. Ela
pondera ainda que a Educação Básica está intrinsecamente relacionada com o
desenvolvimento social e econômico do país, que necessita emergir enquanto sociedade
do conhecimento. É importante, nesse momento, considerar o perfil do ingressante dos
cursos de formação de professores. Nesse sentido, Louzano (2010) aponta que no ano
de 2005, por exemplo, apenas 5% dos interessados no magistério estavam entre os 20%
que obtiveram melhor desempenho no Enem, e 16% dos candidatos se encontravam
entre os 20% com pior desempenho. Em relação aos perfis socioeconômicos, os
estudantes de Licenciatura, em sua grande maioria, são oriundos de escolas públicas,
com renda familiar inferior a três salários mínimos, além de trabalharem ao mesmo
tempo em que estudam. Podemos discorrer que, em sua maioria, são os estudantes com
baixo rendimento acadêmico e, nesse sentido, questionamo-nos em relação ao domínio
dos conteúdos escolares básicos. No que se refere ao domínio da escrita e da leitura,
Marin e Giovanni (2007) ressaltam o despreparo dos estudantes em relação a esses
conteúdos, pois em sua pesquisa muitos problemas estruturais na expressão escrita e na
interpretação de textos são evidenciados. Há, portanto, uma preocupação em relação ao
profissional formado e ao processo ensino aprendizagem, uma vez que parte dos
problemas detectados são conteúdos que devem ser transmitidos aos futuros estudantes.
Por conseguinte, se menos estudantes buscam o magistério, há a possibilidade de
escassez de profissionais. E, se os que buscam possuem rendimentos acadêmicos
1655

inferiores, os cursos de formação superior talvez não estejam preparados para sanar
essas dificuldades. Portanto serão profissionais menos capacitados que lecionarão os
conteúdos precariamente, impedindo que se desenvolva uma sociedade do
conhecimento, que resultaria numa emergência adequada para o país.
Nossa pesquisa confirma que o magistério tem deixado, ao longo dos anos, de
ser uma opção profissional recorrente entre os estudantes de Ensino Médio. Entre os
fatores que incidem sobre a escolha profissional estão o renda, plano de carreira,
empregabilidade, status, vocação entre outros. De acordo com Gatti (2009), estudantes
de Ensino Médio, de todas as regiões do Brasil, apontam que a docência é uma
profissão complexa que envolve tanto aspectos negativos quanto positivos, por um lado
há pouco reconhecimento social, além dos baixos salários, e por outro é um trabalho
bonito e nobre.
Todos os artigos pesquisados em algum momento evidenciam a questão salarial,
como um ponto importante a ser discutido. Alves e Pinto (2011) comparam o salário
médio de profissionais que possuem o mesmo número de anos em sua formação
acadêmica para o exercício de sua profissão. Enquanto 82,8% dos médicos ganham
mais de 5 salários mínimos, 89,3% dos professores da Educação Básica ganham até 5
salários mínimos. Segundo os autores, o salário do docente da escola pública é
normalmente 36% mais baixo se comparado ao de outras profissões que exigem a
mesma qualificação no Ensino Superior. Nesse sentido, o desencanto com a profissão e
o desprestígio social e financeiro está enraizado no imaginário coletivo da sociedade
brasileira, e resulta na pouca atratividade do magistério para a geração atual.

4. Conclusões

Devido à universalização do acesso ao Ensino Fundamental, o número de


professores especialistas aumentou nos últimos anos. Entretanto, a procura pelos cursos
de Licenciatura na maior universidade do país tem o número de vestibulandos
diminuindo a cada ano, ao mesmo tempo em que o número de concluintes também
decresce.
1656

Os cursos em que o estudante opta pela Licenciatura no ingresso do vestibular


há um maior número de concluintes, sendo eles os das ciências exatas e biológicas. O
mesmo não ocorre com os cursos de humanidades. Nesses cursos os estudantes entram
no bacharelado e podem cursar a licenciatura se assim desejarem, contudo ocorre deles
não optarem por este curso, concluindo seus estudos no bacharelado e decidindo pela
não docência. A configuração dos cursos exclusivos de Licenciatura faz com que os
vestibulandos tenham desde o início da trajetória acadêmica o interesse pelo magistério.
Em relação à oferta, concluímos que em alguns cursos se aumentaram o
número de vagas nesse período. O aumento ocorreu nas Licenciaturas de Geografia,
Educação Física, Química e Pedagogia. Acreditamos que políticas públicas em relação
ao ingresso e a permanência são imprescindíveis, para que se atraia os melhores
estudantes do Ensino Médio e se favoreça sua permanência até a conclusão da
graduação.
Louzano (2010) aponta que a atratividade para a docência e a oferta de bons
cursos de formação são duas das três principais características dos países com melhores
desempenhos em educação no mundo. A autora reflete sobre como a atratividade para o
magistério no Brasil se consolida de maneira ineficiente, pois apesar dos aspectos
positivos da profissão como flexibilidade, férias, baixas taxas de desemprego e o
sentido altruísta da profissão, o pouco prestigio social e financeiro, além de restrição de
influência nas políticas públicas, diminuem o interesse pela profissão aos melhores
estudantes do Ensino Médio.
É notório que, para reverter este quadro de desinteresse pela docência, seja
imprescindível reverter o desprestígio social acerca da profissão. É importante, portanto,
valorizar os profissionais, incentivar financeiramente, melhorar as condições dos cursos
de formação, entre outros fatores. Melhorar as condições para os docentes reflete em
atrair mais e melhores profissionais.
Concluímos por afirmar que as políticas educacionais brasileiras divergem dos
pressupostos da OECD que afirmam que o professor é o fator mais importante no
processo de escolarização. Nesse sentido os países com mais sucesso educacional
possuem uma política efetiva para atrair e manter os professores, além de propiciar bons
cursos de formação. Na maioria dos países, especialmente aqueles com as melhores
1657

notas nos exames internacionais, está tendo nesta década mais professores iniciando a
carreira que em qualquer outro momento desde 1970. Esse crescimento é decorrente do
processo de valorização do profissional que estes países desenvolveram. O Brasil,
devido aos inúmeros fatores já citados, segue na contramão em relação aos estudantes
que desconsideram a profissão no momento da escolha no fim do Ensino Médio ou ao
longo da graduação.
Diante dos resultados alarmantes em que o número de vestibulandos e
concluintes tem diminuído em todos os cursos de Licenciatura no micro espaço
analisado, ponderamos acerca da necessidade de mais pesquisas sobre o assunto.
Justifica-se, portanto, que nesse momento histórico seja importante pesquisas, como
esta, que inferem diretamente sobre o problema, pesquisas que envolvam outras
universidades, tanto no estado de São Paulo quanto no país inteiro. Visando assim,
diagnosticar os problemas e apontar soluções, uma vez que a diminuição de
profissionais formados possa gerar, num futuro próximo, uma escassez no cenário
educacional brasileiro.

REFERÊNCIAS

ALVES, Thiago e PINTO, José. Remuneração e características do trabalho docente no


Brasil: um aporte. Cadernos de Pesquisa, v. 41, n. 143, p. 606-639, maio/ ago, 2011.

FUNDAÇÃO UNIVERISTÁRIA PARA O VESTIBULAR. Distribuição dos Inscritos


por Opção de Curso. 2000-2013. Disponível em:
<http://www.fuvest.br/vest2000/estat/estat.stm>. Acesso em: 10.04.2014.

LOUZANO, Paula. Quem quer ser professor? Atratividade, seleção e formação docente
no Brasil. Estudos em Avaliação Educacional v. 21, n. 47, p. 543-568, set/ dez 2010.

MARIN, Alda e GIOVANNI, Luciana. Expressão escrita de concluintes de curso


universitário para formar professores. Caderno de Pesquisa v. 37, n. 130, p. 15-41, jan/
abr 2007.

ORGANIZATION FOR ECONOMIC COOPERATION AND DEVELOPMENT.


Teachers matter: attracting, developing and retaining effective teachers. 2005
Disponível em: http://www.oecd.org/edu/school/48627229.pdf. Acesso em: 12.05.2014

RISTOFF, Dilvo. Mapa da Demanda Docente na Educação Básica. 2008. Disponível


1658

em: http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/palestras/palestra_ifets_mapa_04m.pdf.
Acesso em: 10.05.2014

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, Anuário estatístico. 2001-2014. Disponível em:


<https://uspdigital.usp.br/anuario/AnuarioControle> Acesso em: 30.04.2014.

VIANNA, Cláudia. Entre o desencanto e a paixão: Desafio para o Magistério. In:


BRUSCHINI, Cristina e HOLLANDA, Heloísa Buarque de. Horizontes Plurais:
Novos Estudos de Gênero no Brasil. 1.ed. São Paulo: Fundação Carlos Chagas/ Editora
34,1998.
1659

Pôster

Critérios de seleção das crianças do tempo integral na educação infantil:


universalidade x vulnerabilidade

Telmy Lopes de Oliveira


PPGE - UFES - IESC - CAPES

Resumo: Este trabalho faz parte da pesquisa em andamento intitulada: Educação em


Tempo Integral na Educação Infantil: um estudo das concepções e práticas no Estado do
Espírito Santo, e tem como foco central investigar os critérios de matrícula do tempo
integral na educação infantil e compreender como tais critérios têm se colocado em
relação ao direito à educação da criança. A experiência da educação em tempo integral
no Brasil tem se efetivado de diferentes formas, a ampliação da jornada escolar está
prevista no Plano Nacional de Educação (PNE), na Meta 6 a partir da oferta de
educação em tempo integral em 50% das escolas de educação básica. Contudo, a
condição de vulnerabilidade das crianças tem sido determinante nos critérios de
matrícula, sobretudo em contextos socialmente desprivilegiados, assim pretende-se com
tal pesquisa entender os processos que atravessam o tempo integral na educação infantil
e seus desdobramentos nas práticas educativas das crianças.
Palavras-chave: Tempo integral. Educação Infantil. Vulnerabilidade.

INTRODUÇÃO

Este trabalho faz parte da pesquisa em andamento intitulada: Educação em Tempo


Integral na Educação Infantil: um estudo das concepções e práticas no Estado do
Espírito Santo, que tem como objetivo maior compreender as concepções, motivações e
estratégias que se configuram em torno do atendimento da educação infantil em tempo
integral.
A experiência da educação em tempo integral no Brasil tem se efetivado de diferentes
formas. No ensino fundamental tal proposição está mais consolidada em âmbito
nacional, no entanto, na educação infantil (BRASIL, 2010) não há uma problematização
específica acerca desta temática. A ampliação da jornada escolar está prevista no Plano
1660

Nacional de Educação (PNE), na Meta 6 a partir da oferta de educação em tempo


integral em 50% das escolas de educação básica (BRASIL, 2014).
Refletir sobre os critérios de matrícula adotados na educação infantil em tempo integral
é um grande desafio, pois a condição de vulnerabilidade e de risco social (TAVARES;
GUIDONI; CAPELINI, 2013) das crianças tem sido determinante, sobretudo em
contextos socialmente desprivilegiados. Tais questões têm colocado em xeque, de um
lado, a legitimação da educação infantil como um direito tendo como pressuposto a
universalidade anunciada pela lei, e de um outro lado, como uma suposta prerrogativa
de direito que vai se constituindo pela via da destituição e da negação de direitos às
crianças e às suas famílias.
Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil a jornada integral tem
duração igual ou superior a sete horas diárias. A educação infantil considerada a
primeira etapa da educação básica, também compreende a jornada integral, sendo deste
modo, dever do Estado garantir a oferta de Educação Infantil pública, gratuita e de
qualidade, sem requisito de seleção (BRASIL, 2010).
Considerando tais polarizações que têm ocorrido no campo da educação infantil, a
primeira fase da pesquisa se constituirá em um estudo exploratório, seguido de um
estudo etnográfico. Teremos como foco central de análise os critérios de matrícula
utilizados nas creches e pré-escolas do estado do Espírito Santo, no sentido de
compreender como tais preposições têm se colocado em relação ao direito à educação
da criança, e discutir também a ampliação da jornada escolar que está prevista no Plano
Nacional de Educação (PNE), na Meta 6, deste modo, procuraremos analisar os
processos e desdobramentos decorrentes desses critérios nas práticas educativas das
crianças.
Nesse sentido, entende-se que por meio do conhecimento e compreensão das políticas
educacionais em determinado contexto histórico-social, deve-se considerar a realidade
concreta do fenômeno a ser analisado. Portanto, utilizando de tal perspectiva considera-
se que a pesquisa qualitativa poderá ser uma forma adequada para entender determinado
fenômeno social. (RICHARDSON, 2007).
Vale ressaltar que é necessário ter clareza de que os critérios de matrícula do tempo
integral é uma forma de inclusão das crianças em condição de vulnerabilidade e risco
social, sendo também uma possibilidade das mães desses sujeitos entrarem e se
manterem no mercado de trabalho. No contexto atual, o tema de conciliação entre
1661

trabalho e família se faz presente nas agendas de discussões em vários países, porém no
Brasil tal temática historicamente tem fraca legitimidade (CORDEIRO, 2008).

Ainda que seja possível afirmar que as relações de gênero na família


brasileira mudaram se comparada com algumas décadas atrás, o padrão de
domesticidade, que conferem desvantagens às mulheres na vida social em
geral, ainda é predominante. Ressaltamos que, no Brasil, tais observações
precisam ser consideradas com mais rigor na formulação de políticas públicas
destinados aos cuidados, especialmente no que se refere aos serviços
destinados aos cuidados de crianças de primeira e segunda infância
(CORDEIRO, 2008, p. 83).

Segundo Cavaliere (2007), nos últimos anos os estudos identificaram quatro concepções
de escola de tempo integral: A visão predominante é de cunho assistencialista, no qual
entende a escola em tempo integral como lugar dos desprivilegiados, devendo suprir
deficiências gerais dos alunos sendo uma escola que substitui a família, o mais relevante
e a ocupação do tempo e a socialização primária; Outra visão é a autoritária, a escola de
tempo integral é tida como uma instituição de prevenção ao crime, ou seja, estar na
escola é melhor do que ficar na rua; Também existe a visão democrática, que acredita
no papel emancipatório do tempo integral, pois proporciona um aprofundamento dos
conhecimentos do ponto de vista cultural; A última concepção é a multissetorial de
educação integral, sendo que o tempo integral não precisa ser centralizado em uma
instituição, assim a educação pode se efetivar fora da escola em diferentes espaços.
Sendo assim, destaca-se a visão predominante assistencialista, por isso é necessário
refletir sobre tais critérios de matrícula e entender de fato como está se dando o tempo
integral na educação infantil. (SANTOS, 2012, p. 12)

No viés das discussões para a oferta da Educação em Tempo Integral, a


justificativa mais em evidência é a de proteção social, ou seja, a situação de
pobreza e exclusão que desencadeava situações de risco social e pessoal a um
determinado grupo de crianças.

Nesse sentido, como se constitui o tempo integral para essas crianças em situação de
vulnerabilidade e risco social? E como possibilitar novas práticas e sentidos no tempo
integral? Os critérios de matrícula devem ser tensionados nos contextos das instituições,
não basta criar determinantes socioeconômicos e deixar o discurso assistencialista
predominar no cotidiano escolar.
A vulnerabilidade social, a desigualdade socioeconômica e a destituição dos direitos
desses sujeitos dificultam os vínculos e provoca muitas vezes a desestruturação familiar.
1662

Deste modo, de acordo com Brayner (2008), quando a família (socialização primária)
não pode cumprir a primeira fase de construção de si, intersubjetiva, tornará cada vez
mais difícil que a escola (socialização secundária) cumpra esse papel, tomando para si
toda a responsabilidade dos processos de socialização.
Essas duas instâncias representam a entrada na esfera pública e a introdução em uma
comunidade de sentido mais ampla, mais aberta, mas complexa, mais concorrencial,
necessitando de cada sujeito, um nível de responsabilidade mais exigente e rigoroso, e
quando tais instâncias começam a não oferecer mais condições para responder e de
também oferecer suas bases, a crise de sentido surge e prejudica, dessa maneira, o nosso
“viver juntos” (BRAYNER, 2008).
Daí a importância do papel da educação, no qual segundo Arendt (1997), é de iniciar
um novo mundo com aqueles que são novos, seja por natureza ou nascimento, a criança
objeto da educação, possui um duplo aspecto, é nova em um mundo estranho e se
encontra em um processo de formação.
Torna-se alguém no mundo é um “vir-a-ser” visível para o outro, contudo a exclusão
elimina tal possibilidade, nesse caso a exclusão segundo Brayner (2008), não é a
econômica e social e sim a exclusão das identidades e com ela intrínseca a nossa
capacidade de enxergar o outro como igual a nós.
Será que as crianças em situação de vulnerabilidade e risco social têm suas identidades
excluídas, expulsas da “comunidade de sentido” e são invisíveis? Ou nós os adultos
também somos excluídos e também não somos visíveis nessa comunidade, pois ainda
almejamos um “novo espaço público” onde possamos nos constituirmos como
homens/mulheres compartilhando um mundo comum e plural, assim, “(...) a ideia de
espaço público reúne a totalidade dos processos de configuração da opinião e da
vontade colectivas” (INNERARITY, 2006, p. 10).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pretende-se com tal pesquisa entender os processos que atravessam o tempo integral na
educação infantil e seus desdobramentos nas práticas educativas das crianças de creche
e pré-escola, a partir dos critérios de matrícula que tem como determinante a
vulnerabilidade e o risco social.
Nesse sentido, buscaremos considerar os modos de subjetivação das crianças no intuito
de dar visibilidade a esses atores sociais que pela condição de vulnerabilidade e risco
1663

social, muitas vezes, são tidos como não sujeitos, sendo assim, segundo Sarmento
(2007), é de suma importância a ciência estar atenta à complexidade das condições de
existência das crianças capaz de combinar os vetores de socialização com os da
subjetivação, o grupo geracional em sua existência histórica concreta, considerando a
criança como autor e ator de sua história particular de vida.

REFERÊNCIAS

ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1997.

BRASIL. Ministério da Educação. Plano Nacional da Educação – PNE. Disponível


em:<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&id=16478&Itemid=1107
>. Acesso em: 10 jun. 2014.

______. Ministério da Educação. Conselho Nacional da Educação. Diretrizes


Curriculares Nacionais para a Educação infantil. Brasília, DF, 2010. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&id=12579%3Aeducacao-
infantil&Itemid=859 >. Acesso em: 10 jun. 2014.

BRAYNER, Flávio Henrique Albert. Educação e Republicanismo: experimentos


arendtianos para uma educação melhor. Brasília: Liber Livro, 2008.

CAVALIERE, Ana Maria. Tempo na escola e qualidade na educação pública. In:


Educação e Sociedade, Campinas, vol.28, n.100, p.1015-1035, out.2007.

CORDEIRO, Mariana de Carvalho. Mulher, mãe e trabalhadora: breve balanço de


recentes políticas de conciliação entre trabalho e vida familiar no Brasil. Ser Social,
Brasília, v, 10, n. 23, p. 71-79, jul./dez. 2008.

INNERARITY, Daniel. O novo espaço público. Lisboa: Teorema, 2010.

TAVARES, G. M; GUIDONI, J. P; CAPELINI, T. C. As práticas que compõem a


educação integral em Vitória (ES): uma análise da relação infância/pobreza/risco. In:
CRUZ, L. R. D. ; RODRIGUES, L. ; GUARESCHI, N. M. F. (Org.). Interlocuções
entre a psicologia e a política nacional de assistência social. Santa Cruz do Sul: UNISC,
2013.

RICHARDSON, Roberto Jarry e colaboradores. Pesquisa Social Métodos e Técnicas.


São Paulo: Atlas, 2007.

SANTOS, Maria Aparecida Rodrigues da Costa. Educação em tempo integral no


município de Vitória: a experiência do Brincarte. 2012. Dissertação (Mestrado em
Educação) – Universidade Federal do Espírito Santo, 2012.
1664

SARMENTO, Manuel Jacinto. Visibilidade social e estudo da infância. In:


VASCONCELLOS, V. M. Ramos de; SARMENTO, Manuel Jacinto (Org.). Infância
(In)vísivel. São Paulo: Junqueira & Marin, 2007.
1665

Pôster

A dimensão da educação estética nas narrativas discentes: uma compreensão do


desenvolvimento da autonomia e emancipação dos sujeitos no curso de pedagogia

Thailla Fabiane Kataoka Lopes


Mestranda em Educação/ Universidade Cidade de São Paulo

Resumo: O presente trabalho tem como foco a dimensão estética das narrativas
discentes. Apresenta como objetivos analisar, compreender e interpretar as
possibilidades e limites de desenvolvimento da autonomia e emancipação dos sujeitos
no curso de Pedagogia. Trata-se de uma pesquisa na abordagem qualitativa. Os dados
serão analisados e compreendidos a partir do documento que são as narrativas discentes
produzidas no 5º. e 6º. Semestre do Curso de Pedagogia, em 2013, e os registros diários,
do primeiro semestre de 2014, que relatam a perspectiva dos participantes na Colcha de
Retalhos, um dispositivo formativo desenvolvido por Berkenbrock-Rosito, (2008)
concretizada dentro da abordagem da pesquisa (Auto) Biográfica. Espera-se contribuir
às reflexões sobre os processos formativos do docente.
Palavras-chave: educação estética, pedagogia, processo formativo, autonomia e
emancipação e narrativas.

Introdução

Este estudo apresenta uma reflexão sobre o fenômeno educativo e o processo


formativo na perspectiva de uma aprendizagem estética e uma experiência estética no
espaço de formação de docentes. Sob essa perspectiva, a aprendizagem está
fundamentada na estética, na ética, na política, na ideologia, na moral e no poder que, na
visão de Freire (1996), são linhas invisíveis que sustentam uma pedagogia da autonomia
dos sujeitos.
Elege-se neste estudo a dimensão estética para a compreensão do
desenvolvimento da autonomia e emancipação dos sujeitos na proposta de formação de
professores, no curso de Pedagogia, desenvolvida por Berkenbrock-Rosito (2008), que
implica a produção da narrativa escrita, oral e pictórica, que diz respeito ao percurso
1666

formativo de cada participante, transformado em escrita é transformada em uma


imagem pictórica e contada oralmente para cada participante da sala de aula.

Problema de pesquisa:

Apresenta-se o problema: O Sentido da dimensão estética nos processos


formativos presente nas narrativas discentes no Curso de Pedagogia.
Pergunta-norteadora: Quais são as possibilidades e limites do desenvolvimento
da autonomia e emancipação dos sujeitos nos processos formativos no Curso de
Pedagogia?

Objetivos:
Compreender a dimensão estética no processo formativo no Curso de Pedagogia
a partir das narrativas discentes do 5º semestre e 6º. Semestre, que participaram da
disciplina História da Educação e da Pedagogia, no Curso de Pedagogia da
Universidade Cidade de São Paulo, em 2013, como possibilidade de desenvolvimento
da autonomia e emancipação.

Justificativa:

Justifica-se este estudo pelo fato de que a compreensão dos processos formativos
implica dimensão estética que tem sido pouco estudada no Curso de Pedagogia.
Pretende-se compreender como ocorre a aprendizagem estética e a importância da
Educação Estética nos processos formativos.
Estética é um fenômeno que não se deixa ver, porém, está presente na relação
com o ambiente físico e com as pessoas que convivemos. Emerge de sensações de gosto
e desgosto, prazer e desprazer, que arrebata e tem impacto diretamente nos sujeitos.
Podemos definir como uma experiência estética, uma aprendizagem estética do espaço
educativo que não ocorre via o conteúdo oficial de uma disciplina, mas sim sentido
pelos sujeitos.
Educação Estética consiste, na visão de Schiller, refletir sobre o significado
daquilo que nos afeta causando prazer ou desprazer, gosto ou desgosto. Nesse sentido, a
aprendizagem não é só consequência da transmissão de conhecimentos explícitos no
1667

currículo oficial, mas se dá, principalmente, pelas interações sociais que ocorrem nos
espaços educativos e formativos.
Esse processo de conscientização compreende o desenvolvimento da autonomia
e da emancipação que ocorre através da estética.
Pensar a dimensão estética nos processos formativos significa priorizar a
humanização do indivíduo, que em Freire, contempla a Pedagogia Libertadora uma
oposição à Educação Bancária e visaria ao desenvolvimento de autonomia dos
sujeitos, em Adorno, a emancipação em relação à manipulação estética da indústria
cultural.
Sendo assim, o papel da universidade e do professor com base na intervenção e
na produção de conhecimento com os alunos, visa – não apenas – a reprodução do
conhecimento e a transmissão de informações, uma vez que este tipo de transferência de
saberes pode ocorrer ao serem utilizados livros, enciclopédias e/ou recursos como a
Internet.
A respeito das práticas educativas, Freire diz que:

Se, na verdade, não estou no mundo para simplesmente a ele me adaptar, mas
para transformá-lo; se não é possível mudá-lo sem um certo sonho ou projeto
de mundo, devo usar toda possibilidade que tenha para não apenas falar de
minha utopia, mas participar de práticas com ela coerentes. (FREIRE, 1997,
p.54 )

De acordo com a crítica de Freire sobre a “Educação Bancária”, refere-se ao fato


que o indivíduo se torna passivo quando é apenas receptor de informações, não sendo
levado a pensar, criticar e analisar quaisquer situações e informações apresentadas, tanto
no sentido do conhecimento teórico (científico), como também, no próprio
conhecimento da vida e como sujeito que está inserido em um determinado contexto
social.
A importância da dimensão Educação Estética nos processos formativos
como destaca Banzato: “Trata-se da arte de ensinar, aprender e formar, consubstanciada
nos sentidos, sensível e sensibilidade que configuram o desenvolvimento de autonomia
e emancipação, como possibilidade de intervenção dos sujeitos por via da
Estética”. (BANZATO, 2012, p.104).
Contudo, os processos formativos visando a educação do cidadão democrático,
reflexivo, analítico, com consciência crítica, ou seja, a relação do indivíduo e mundo
pode ocorrer por meio da Educação Estética.
1668

Metodologia

Para a investigação será utilizada uma abordagem qualitativa e o procedimento


de coleta de dados são as narrativas discentes produzidas pelas alunas do 5º. e 6º.
Semestre do Curso de Pedagogia Licenciatura Plena do ano de 2013, do período
matutino e os registros diários elaborados no primeiro semestre de 2014, sobre a
metodologia da Colcha de Retalhos, desenvolvida por Berkenbrock-Rosito, (2008), um
fato que suscitou um importante momento de reflexão sobre as lembranças/recordações
de situações vividas.
As narrativas discentes e os registros diários serão analisadas tendo como
referencial teórico: Josso (2004), (2007) e (2012), Dominicé (2008), Pineau (2003) e
Nóvoa (1992) sobre a importância da História de Vida e as narrativas nos processos
formativos. Como aportes teóricos para fundamentação da educação estética, será
Schiller (2002), Adorno (2004) e Freire (1996; 2000) para a compreensão da
importância da Estética e Educação Estética nos processos formativos.
Adota-se o enfoque hermenêutico na perspectiva de Gadamer (2000), para a
compreensão desvelamos sentidos e construímos significados, desta forma, mostrar que
é possível ao ser humano encontrar na própria história os elementos necessários para
assumir a sua identidade, com todas as suas experiências vividas.

Referências:

ADORNO, T. A atualidade da Filosofia. Disponível em <


http://adorno.planetaclix.pt/tadorno3.htm> Acesso em 18 ago. 2013
BANZATO, A.C.A.S. Educação Estética e Formação Inicial de Professores da
Educação Básica: Um estudo hermenêutico do projeto político-pedagógico do Curso de
Pedagogia, na modalidade de Educação a Distância. DISSERTAÇÃO DE
MESTRADO. Universidade Cidade de São Paulo. Disponível em:
ttp://www.unicid.edu.br/pos_graduacao/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=4427 Acessado
em: 05/11/2013

BERKENBROCK-ROSITO, Margaréte May. Educação Estética: Histórias e Vivências


da Docência –Eixo 5 – Formação, identidade e profissão docente – Cultura Escolar
Migrações e Cidadania Actas do VII Congresso LUSO BRASILEIRO de História da
Educação 20 – 23 de junho 2008, Porto: Faculdade de Psicologia e Ciências da
Educação (Universidade do Porto).

GADAMER, Hans-Georg. Da Palavra ao Conceito. In: ALMEIDA CUSTÓDIO, Luís


1669

Silva de; FLICKINGER, Hans-Georg; ROHDEN, Luiz. Hermenêutica Filosófica: nas


trilhas de Hans Georg Gadamer. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000, p. 13-26

JOSSO, Marie-Christine. A transformação de si a partir da narração de histórias de


vida. Educação, Porto Alegre/RS, ano XXX, n. 3, v. 63, p. 413-438, set. / dez. 2007.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São


Paulo, Editora Paz e Terra, 1997

______. À sombra desta mangueira. 9.ed. São Paulo: Editora Olho D´Água, 2010.

______. Pedagogia do Oprimido. 43.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

______. Educação como prática da liberdade. 5.ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1975.

SCHILLER, Friedrich. A educação estética do homem numa série de cartas. 4 ed.


São Paulo: Iluminuras, 2002.

SEVERINO, A.J. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2007


1670

Pôster

O acompanhamento de egressos como indicador de qualidade na avaliação


institucional do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES

Viviane Lorena Buttros


UNICID1
vlorenab@gmail.com
Celia Maria Haas
UNICID2
celiamhaas@uol.com.br

Resumo: Este texto, parte da investigação intitulada “O acompanhamento de egressos


como indicador de qualidade na avaliação institucional: a visão de dirigentes de
instituições de ensino superior”, apresenta os aspectos centrais do SINAES no que se
refere à sua regulamentação em âmbito federal e mais especificamente à temática
acompanhamento de egressos. O estudo original se propõe a investigar como os
dirigentes de instituições de ensino superior se posicionam em relação ao indicador
presente no instrumento de avaliação institucional do SINAES como indutor de
qualidade e pertencente ao eixo de maior peso no processo avaliativo. A pesquisa se
caracteriza como qualitativa de caráter descritivo-exploratório e, após a pesquisa
documental, se utilizará de entrevistas como instrumento de coleta de dados. A amostra
se constituirá de dirigentes de instituições de educação superior particulares da cidade
de São Paulo. Serão analisadas as práticas vigentes, as possibilidades e limites
encontrados no atendimento ao indicador e se discutirá a temática como critério de
avaliação.
Palavras-chave: egressos; avaliação institucional; SINAES

1 Aluna do Programa de Mestrado em Educação da UNICID. Bolsista CAPES. Graduada em Pedagogia


pela UNICID.
2 Docente e pesquisadora do Programa de Mestrado em Educação da UNICID. Doutora em Educação –
Currículo pela PUC-SP, Mestre em Educação – História, Política, Sociedade – pela PUC-SP e Graduada
em Pedagogia pela Fundação Faculdade Estadual de Educação Ciências e Letras de Paranavaí.
1671

Introdução

Durante minha atuação profissional por 17 anos na Educação Superior,


desenvolvi e acompanhei vários projetos acadêmico-administrativos e puramente
acadêmicos. Nos últimos anos, como membro do grupo de gestão e responsável pela
área Educação Continuada de uma universidade particular de São Paulo, acompanhei os
processos de avaliação interna e externa de reconhecimento de cursos e
recredenciamento institucional. Tive a oportunidade de vivenciar a implantação do
SINAES e suas modificações, sendo então uma das partes avaliada pela Comissão
Própria de Avaliação e pela Comissão Externa enviada pelo Ministério da Educação,
como prevê o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES.
Dentre os vários itens da avaliação que eram de minha competência como
responsável pela Extensão Universitária daquela universidade, um deles se apresentava
como um grande desafio: o acompanhamento dos egressos. Os vários projetos que
participei e/ou desenvolvi consideravam a participação do egresso, produziam dados
mas estavam longe daquilo que poderia ser considerado um projeto institucional ou uma
política de acompanhamento dos egressos.
Participando de eventos e buscando compreender melhor as exigências impostas
pelo SINAES, percebi que a problemática se repetia em várias Instituições de Educação
Superior (IES). Desta forma, o que era uma atividade profissional passou a ser um
desafio para ampliar o conhecimento sobre a temática.
Em 2012, no II Encontro Nacional do Censo da Educação Superior, a Diretoria
de Avaliação da Educação Superior do INEP/MEC apresentou um estudo que analisou a
“política institucional de acompanhamento dos egressos contidas nos relatórios das
Comissões Próprias de Avaliação (CPA) dos cursos que compõem o 2º ciclo avaliativo
do SINAES, nas cinco regiões do país”. Este estudo identificou que existem poucas IES
com política institucional de acompanhamento dos egressos definidas e explicitadas em
seus relatórios de auto avaliação produzidos por suas Comissões Próprias de Avaliação
(CPA). Sendo assim, conclui que há “necessidade de consolidação do uso do
acompanhamento do egresso na busca de uma avaliação sobre a IES na qual se
formou”. Também indica que é necessário que as instituições definam uma política
institucional clara para traçar planos e ações bem como suas respectivas avaliações, ou
seja, ainda existem muitos desafios para as instituições chegarem ao que os documentos
do SINAES definem como “excelente”.
1672

A nota técnica n 8 CGACGIES/DAES/INEP de 25 de fevereiro de 2013, que


propôs a reformulação dos instrumentos de avaliação institucional externa do SINAES,
ressaltou que entre as modificações propostas, as políticas acadêmicas abordariam
novos temas indutores de qualidade, mais especificamente quatro, e um deles é a
“atuação do egresso”.
Com esta reformulação, a temática em questão passou a compor o item
“Políticas Acadêmicas” que respondem por 30% da nota da avaliação institucional em
caso de Recredenciamento da IES e por isto começou a gerar discussões no âmbito da
gestão acadêmica destas instituições e do setor da educação superior como um todo.

Justificativa

A Educação Superior no Brasil passou por transformações significativas durante


os últimos quatro governos federais. As modificações foram desde a estrutura até as
tentativas de democratização do acesso e permanência. Todo este processo de reforma,
gerou preocupações em torno da expansão desta modalidade de educação mas também
da qualidade oferecida.
O grande crescimento da Educação Superior se deu durante o governo Fernando
Henrique, a partir de 1996, que centraliza a expansão principalmente pelo setor privado.
No período de 1996 a 2002 foi registrada a duplicação do número de IES, que passou de
922 para 1637, sendo que destas 1442 eram instituições particulares (GOMES,
OLIVEIRA E DOURADO, 2011). A diversificação e a flexibilização foram as palavras
de ordem neste período de crescimento.
Toda esta expansão, com esta característica fortemente privatista, colocou a
educação superior em uma lógica de mercado considerando-a um serviço à disposição
dos clientes/consumidores. E diante desta política surgem mecanismos de avaliação
com rankeamento das instituições para que a competitividade assumisse o papel de
controle deste mercado.
Ainda neste contexto, em 2001 foi aprovado o Plano Nacional de Educação
(PNE) considerando como diretriz central resumida por Ristoff (2011): “assegurar a
expansão com qualidade”, e que fornece a base para a definição das três metas para a
educação superior, a saber:
1- Elevar a taxa de escolarização para 30% até 2011, considerando os
jovens de 18 a 24 anos;
2- Elevar a taxa de matrícula nas IES públicas para 40% do total dos
matriculados, e
1673

3- Desenvolver um sistema nacional de avaliação para monitorar o plano


de expansão e assegurar a sua qualidade.

Estas metas influenciaram diretamente o plano de governo do presidente Lula


que definiu como princípios fundamentais a qualidade, a quantidade e a equidade e que
posteriormente se transformaria em política de governo (RISTOFF, 2011).
Desta maneira, a partir de 2003, os rumos da educação superior vão se dirigindo
a partir de novos valores, porém sem desconsiderar a expansão ocorrida até então e que
mantinha sua curva ascendente. Entretanto, a concepção de educação superior voltada
para o desenvolvimento da nação, muda substancialmente as ações a serem propostas
durante o primeiro governo do presidente Lula.
Segundo o Ministro da Educação à época, Tarso Genro, “a educação superior
tem a missão estratégica e única voltada à consolidação de uma nação soberana,
democrática, inclusiva e capaz de promover a emancipação social”. (RISTOFF, 2011).
De acordo com Sobrinho (2011) “o direito social à educação de qualidade é um
aspecto essencial e prioritário na construção da sociedade, de consolidação da
identidade nacional, e um instrumento de inclusão socioeconômica”. Este entendimento
trata a educação como bem público e voltada ao bem comum e não a interesses
individuais. Esta concepção traz consigo os valores de democratização e universalização
da educação com qualidade afinal, sem a universalização não seria democrático e sem a
qualidade apenas se manteria o “sistema elitista e excludente”, conforme aponta Ristoff
(2011):
O papel do Ministro Tarso Genro foi também fundamental na
materialização da proposta 12 para a educação superior – a proposta que
instituiu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). O
Sinaes expressa a grande preocupação nacional com a questão da qualidade
da educação superior ao mesmo tempo em que as preocupações com a
necessidade de expansão quantitativa associada à ruptura com o sistema
elitista de acesso ganham força sem precedentes no país.

Desenhava-se um novo cenário para a educação superior. O Sinaes surge de uma


Comissão de intelectuais envolvidos com a temática avaliação que após seus estudos e
audiências públicas propõe
uma base para uma nova proposta de avaliação da educação superior
brasileira, orientada pelos seguintes princípios e critérios: educação como
direito social e dever do Estado; definição de valores sociais historicamente
determinados; rediscussão dos atuais marcos de regulação e controle
ampliando o seu escopo para o Estado e a comunidade educativa; resgate
histórico e político do caráter educativo e, portanto, formativo da avaliação;
respeito à identidade e à diversidade institucionais, em um sistema
diversificado e globalidade; legitimidade e continuidade das ações de
1674

avaliação, no sentido de garantir eficácia formativa e efetividade social por


meio da regulação com a emancipação institucional (BRASIL. MEC, 2003,
p.63-68).

Entretanto, o projeto de avaliação da educação superior do governo Lula foi


sofrendo várias modificações do primeiro para o segundo mandato o que alterou
algumas das concepções originais.

O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior em foco

A proposta de se avaliar a educação já era prevista na Constituição de 1988.


Entretanto, de fato ela só foi implantada de forma sistêmica a partir da década de 1980
(Barreyro, Rothen, 2011).
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES foi instituído
pela Lei n° 10.861, em de 14 de abril de 2004, ou seja, completou recentemente 10
anos. O SINAES tem como objetivo “assegurar o processo nacional de avaliação das
instituições de educação superior, dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico
de seus estudantes”, conforme art. 9º, VI, VIII e IX da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, Lei 9394/96. A partir disto, as finalidades do SINAES foram
definidas no texto da Lei como
a melhoria da qualidade da educação superior, a orientação da
expansão da sua oferta, o aumento permanente da sua eficácia institucional e
efetividade acadêmica e social e, especialmente, a promoção do
aprofundamento dos compromissos e responsabilidades sociais das
instituições de educação superior, por meio da valorização de sua missão
pública, da promoção dos valores democráticos, do respeito à diferença e à
diversidade, da afirmação da autonomia e da identidade institucional

Com o conceito de avaliação formativa, o SINAES subsidia a regulação e


supervisão da Educação Superior Brasileira baseado no tripé instituição, curso e
estudante. Desta forma, este processo avaliativo, com seu caráter público garantido no
texto da Lei, faz com que o que está definido como critério de qualidade no seu corpo e
em seus instrumentos, regulamente e modifique as práticas das IES.
A partir da Lei, foram desenvolvidos instrumentos de avaliação para cada um
dos objetos de avaliação. No instrumento de avaliação institucional são organizados os
itens descritos na lei, contendo ainda o critério de excelência a ser observado pela
comissão de avaliação externa.
1675

Este estudo trata da avaliação das instituições de ensino e aborda uma das
dimensões contidas no Instrumento de Avaliação Institucional que se refere ao
acompanhamento dos egressos. Desta necessidade de implantação de uma política de
acompanhamento do egresso apontada nos documentos oficiais, é possível identificar
alguns valores presentes nos textos, como “responsabilidade social”, “compromisso
social”, “eficácia institucional e efetividade acadêmica e social” e “construção da
identidade institucional”.
Para a construção da pesquisa foi realizado um levantamento preliminar do
referencial teórico considerando como base a legislação, dissertações e teses presentes
no banco de teses da CAPES, assim como artigos do sistema SCIELO tendo sido feitas
buscas com os descritores: egressos, SINAES, ex-aluno e avaliação institucional, de
forma direta e cruzada.
No que se refere à legislação, foram consultados os textos de Lei, Decretos,
Portarias e demais documentos oficiais, assim como documentos eletrônicos gerados
pelo INEP, disponíveis no próprio site e também divulgados em eventos sobre
Avaliação Institucional e que tem orientado as IES no estabelecimento de suas políticas
e estratégias.
Com base neste estudo preliminar, a reflexão que circunda o tema é que mesmo
após 10 anos da implantação do SINAES, instituído pela Lei n° 10.861, de 14 de abril
de 2004, o cenário apresentado ao INEP por meio dos relatórios das CPAs, conforme
dados apresentados no II Encontro Nacional do Censo da Educação Superior e já citado
acima, aponta que a grande maioria das IES brasileiras não possui ainda uma política de
acompanhamento de egressos definida e implantada.
A partir deste contexto, esta pesquisa, em desenvolvimento, investiga de que
forma os dirigentes de IES se posicionam em relação aos dois indicadores relativos ao
acompanhamento de egressos, presentes no atual instrumento de avaliação institucional.
E como eixos de dimensão de análise aponta-se:
• Práticas vigentes nas IES no que se refere ao indicador “acompanhamento de
egressos” presente no instrumento de avaliação institucional do SINAES.
• Possibilidades e limites encontrados pelas IES no atendimento ao indicador.
Desta forma, este trabalho tem como objetivo geral analisar a opinião dos
dirigentes das IES acerca dos dois indicadores relativos ao acompanhamento de
egressos no processo de avaliação institucional. E como objetivos específicos são
propostos:
1676

• Examinar conceitos, critérios e valores relacionados a egressos, contidos na Lei


e instrumentos de avaliação institucional externa do SINAES;
• Mapear as práticas existentes na IES relativas ao acompanhamento de egressos;
• Identificar as principais oportunidades e os principais desafios apontados pelos
dirigentes das IES no acompanhamento dos egressos.
• Discutir o critério acompanhamento de egressos como indutor de qualidade
proposto no SINAES.

Procedimentos metodológicos

Para o desenvolvimento deste estudo, que se caracteriza como uma pesquisa


qualitativa, está sendo implementada pesquisa documental, tomando como fontes a
legislação vigente que rege a avaliação institucional, banco de teses da CAPES e artigos
publicados no SCIELO. Após este exame inicial, passar-se-á para um estudo descritivo-
exploratório, utilizando-se para a coleta de dados entrevistas com dirigentes de
instituições de educação superior particulares da cidade de São Paulo.

Considerações finais

Este trabalho espera trazer contribuições acerca da avaliação institucional


instituída pelo SINAES fazendo uma reflexão sobre um dos indicadores de qualidade
exigidos por ele pela visão do avaliado, neste caso pelos representantes das instituições
de ensino superior, Espera-se não só fazer um levantamento das práticas vigentes mas
também, e principalmente, uma discussão sobre o critério de qualidade denominado
“acompanhamento de egressos”, sua aplicabilidade, sua viabilidade e a interpretação
dada ao tema na vida cotidiana das instituições. Desta forma, poderemos oferecer
subsídios para outros trabalhos, outras reflexões, novas práticas e outras possíveis
revisões no sistema de avaliação da educação superior brasileira.
1677

REFERÊNCIAS

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educação superior no Brasil e na América Latina. Aparecida, SP: Ideias & Letras,
2011.
Pôster

O Sistema de avaliação em larga escala brasileiro e a sua relação com o


gerencialismo e a responsabilização

Wilmara Alves Thomaz


GEPEJA/DEPASE/FE-UNICAMP

Resumo: A reforma administrativa do Estado, iniciada na década de 1990, teve como


uma de suas consequências o fortalecimento do aparelho avaliativo nacional com a
implantação de um sistema de avaliação em larga escala que pretende analisar a
qualidade da educação básica e superior existente no país. Por meio das avaliações de
larga escala o Estado brasileiro tem efetuado a padronização do currículo escolar,
supervisionado o trabalho docente e a gestão das escolas, controlado a qualidade do
ensino e proporcionado o oferecimento de uma educação voltada aos interesses de
economia de mercado. Este contexto deriva da adoção do modelo gerencialista de
Estado com forte regulação aplicada à gestão educacional de modo a torná-la ajustada
aos interesses do mercado, dando ênfase à performatividade e a responsabilização dos
sujeitos.

Palavras-chave: Avaliação; gerencialista; Reforma do Estado

Introdução:

A reforma administrativa do Estado, iniciada na década de 1990, trouxe


inúmeras consequências para a estrutura educacional brasileira e o fortalecimento do
aparelho avaliativo nacional com a implantação de um sistema de avaliação em larga
escala que pretende analisar a qualidade da educação básica e superior existente no país.
Por meio das avaliações de larga escala o Estado brasileiro tem efetuado a padronização
do currículo escolar, supervisionado o trabalho docente e a gestão das escolas,
controlado a qualidade do ensino e proporcionado o oferecimento de uma educação
voltada aos interesses de economia de mercado.
1680

Este texto tem o objetivo de compreender o contexto histórico em que estas


mudanças foram implementadas e a capacidade real do sistema de avaliação em larga
escala de medir a qualidade da educação básica e superior oferecida no Brasil.

A implementação do sistema de avaliação externa em larga escala, deriva da


adoção do modelo gerencialista de Estado com forte regulação aplicada à gestão
educacional de modo a torná-la ajustada aos interesses do mercado, dando ênfase à
performatividade e a responsabilização dos sujeitos. A reforma do sistema educacional
brasileiro teve início nos anos de 1990, durante o governo do presidente Fernando
Henrique Cardoso (FHC) e sofreu influência das Conferências Mundiais de Educação
de Jomtien (1990) e Dakar (2000) e pressão exercida por organismos internacionais
como o Banco Mundial e a CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o
Caribe) (JEFFREY, 2012).

A partir dos anos de 1990 houve uma transposição das técnicas empresarias para
o interior das escolas, por isso os conceitos de “produtividade, eficácia, excelência e
eficiência foram importados das teorias administrativas para as teorias pedagógicas”.
Esta busca pela eficiência teve sua origem na crise de legitimidade do Estado iniciada
na década de 1980 e “detectada inicialmente por um descompasso existente entre o
número de vagas nos estabelecimentos públicos de ensino e a população que demandava
escola” (CUNHA, 1999 apud OLIVEIRA, 2006, p.93).

Esta discrepância no número de vagas resultava do alto índice de evasão e


repetência que dificultava o ingresso de novos alunos, por isso começou-se a por em
cheque a validade das formas de avaliação que estavam sendo empregadas, já que o
número de repetentes era alto levando também ao desestímulo em relação aos estudos e
consequentemente à evasão escolar (OLIVEIRA, 2006).

Este desiquilíbrio no fluxo escolar elevava os níveis de defasagem idade/série, e,


somado a isto, a repetência também impedia que os alunos concluíssem o ensino
fundamental, então denominado 1º grau, até os 14 anos, ou seja, a idade prevista em lei
para a conclusão do ensino que o Estado era obrigado a oferecer (Lei 5692/71). Esta
crise educacional entra para a agenda da reforma governamental, como uma
necessidade, a partir da década de 1990 no contexto da reforma do Estado que pretendia
tornar a administração pública brasileira gerencial. Devido a estes fatores todas as
alterações operadas no período de 1990 a 2000 ocorreram em decorrência da reforma do
1681

Estado; da promulgação da Constituição Federal de 1988 e da LDB n. 9.394/96; da


exigência feita por organismos internacionais para o cumprimento de metas
educacionais e da necessidade de atendimento das demandas sociais por matrículas e
ampliação da rede de ensino público (JEFFREY, 2011).

O argumento basilar para a implementação destas mudanças era a


democratização do ensino e a expansão do acesso ao ensino básico, por isso para
monitorar a qualidade do ensino oferecido foi criado e implementado um Sistema
Nacional de Avaliação monitorado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP).

Sistema Nacional de Avaliação – principais avaliações em larga escala executadas


no Brasil:

O Sistema Nacional de Avaliação em larga escala tem o objetivo de avaliar o


desempenho dos alunos e monitorar o alcance das metas que são projetadas. Este
monitoramento é feito através de “provas, exames, relatórios, auditorias, indicadores
estatísticos entre outros” (FREITAS, D N, 2013a).

A avaliação pioneira deste sistema foi o “Sistema Nacional de Avaliação do


Ensino Público de 1º Grau (SAEP) base para a criação da política de avaliação federal
que abrange da educação básica à pós-graduação. A partir dele foi criado em 1994, o
Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) através do qual o governo federal
avalia os sistemas educacionais de educação básica no Brasil (FREITAS, D N, 2013b;
BAUER e TAVARES, 2013).

Desde a sua implementação o SAEB tem sido revisto e ampliado e atualmente é


composto por:

1º. Avaliação Nacional da Educação Básica (ANEB- devido à tradição


conquistada o nome SAEB foi mantido) cuja função é coletar dados através da
aplicação de uma prova escrita com o objetivo de verificar o desempenho dos
estudantes em língua portuguesa (leitura) e matemática (calculo e resolução de
problemas) e dados sobre as características dos estudantes, das escolas e do contexto
social em que estão localizados (JEFFREY, 2013; FREITAS, D N, 2013b).

2º. Avaliação Nacional do Rendimento Escolar - ANRESC (também


denominada "Prova Brasil"): Criada em 2005 é uma avaliação censitária aplicada aos 5º
e 9ºano do Ensino Fundamental das escolas públicas urbanas e tem a finalidade de
1682

informar dados por “turmas, escolas, redes escolares, municípios, estados e país”
(JEFFREY, 2013; FREITAS, D N, 2013b).

3º. A Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA): avaliação censitária


envolvendo os alunos do 3º ano do Ensino Fundamental das escolas públicas tem o
objetivo principal de avaliar os níveis de alfabetização e letramento em Língua
Portuguesa e a resolução de problemas em Matemática e condições de oferta do Ciclo
de Alfabetização das redes públicas.

Completando este sistema existe ainda a “Provinha Brasil” que foi


implementada por meio da Portaria MEC n. 10/2007, em virtude do Decreto n.
6064/2007, que determina que, toda criança deve estar alfabetizada até os oito anos de
idade (FREITAS, D N, 2013b).

O Sistema nacional de avaliação básica, descrito anteriormente, foi ampliado


pelo Ministério da Educação em 2007 com a criação do Índice de Desenvolvimento da
Educação (IDEB) que é a união do fluxo escolar e as médias obtidas pelos
estabelecimentos de ensino de nível fundamental e médio nas provas do SAEB e Prova
Brasil. O fluxo escolar é obtido através do resultado de censo escolar um levantamento
de dados estatístico-educacionais de âmbito nacional realizado todos os anos e
coordenado pelo INEP. O fluxo escolar consiste nos dados do Censo Escolar sobre
rendimento (aprovação e reprovação) e movimento (abandono escolar) dos alunos de
ensino fundamental e médio.

O IDEB foi instituído pelo plano de metas “Compromisso Todos Pela


Educação” (Decreto n. 6094/2007) e estipulou que a melhoria da educação deveria ser
medida através do alcance da meta bianual no valor máximo de 6,0 a ser atingido até
2021 e que corresponde à média alcançada por países avançados (FREITAS, D N, 2013
b).

Ainda com a intenção e monitorar a qualidade da educação básica foi instituído


pelo MEC por meio da Portaria Normativa n. 3 de 02/03/2011 a “Prova Nacional de
Concurso para o Ingresso na Carreira Docente” que tem os objetivos de: subsidiar
concursos públicos para a contratação de docentes para atuarem no território nacional,
estipular parâmetros de autoavaliação do candidato e subsidiar políticas de formação de
professores (FREITAS, D N, 2013b).
1683

Deve ser citado também a autoavaliação escolar introduzida pelo Plano de


Desenvolvimento da Escola (DPE- Escola) instituído pela Portaria Normativa n. 27 de
21/06/2007 que tem por objetivo de ser um plano de gestão da escola visando melhorar
a aprendizagem dos alunos (FREITAS, D N, 2013b).

Também fazem parte das avaliações em larga escala existentes no Brasil o


Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e o Exame Nacional de Certificação de
Competências de Jovens e a Adultos (ENCCEJA).

O ENEM foi instituído pela Portaria MEC nº 438, de 28 de maio de 1998 e


pode-se observar no documento inicial que o foco do ENEM estava no aluno, pois o
exame foi criado para avaliar no final da educação básica as competências necessárias
para o exercício da cidadania, já que servia para o egresso planejar sua carreira
profissional e ou escolar. Mas ao longo dos anos, novos objetivos foram sendo
agregados ao ENEM e hoje ele se caracteriza como o maior processo seletivo
universitário do país (TRAVIZTKI, 2013)

Em 2000 algumas universidades começaram a usar o exame como parte do


processo de seleção e em 2004 o Governo Federal institui o Programa Universidade
para Todos (PROUNI) para ampliar o acesso às universidades particulares e em 2005 o
vincula aos resultados e dados socioeconômicos do ENEM. Em 2006 o INEP começa a
publicar o ranking do ENEM por escola. E em 2009 é criado o Sistema de Seleção
Unificada (SISU) para articular os pontos obtidos no exame ao ingresso nas
universidades federais; acontecem mudanças estruturais na forma e conteúdo do exame
e ele passa a servir como certificador do ensino médio. Em 2011 o exame passa a ser
obrigatório para quem pretende conseguir financiamento através do Fundo de
Financiamento Estudantil (FIES) (TRAVIZTKI, 2013).

O ENCCEJA foi implantado pelo Governo Federal em 2002 para medir as


habilidades e competências dos jovens e adultos que não concluíram a educação básica
em idade escolar. Inicialmente este exame era utilizado para certificar os níveis de
ensino fundamental e médio, porém a partir de 2010 passou a certificar apenas o nível
de ensino fundamental em virtude da atribuição de certificação do ensino médio ter sido
transferida para o ENEM. O exame é voluntário e pode a ele recorrer jovens e adultos a
partir de 15 anos completos (FREITAS, D N 2013b).
1684

As avaliações em larga escala aplicadas pelo Governo Federal em âmbito


nacional serviram de modelo para que alguns estados da federação instituíssem
avaliações externas estaduais visando à verificação da qualidade de seus sistemas de
ensino como é o caso de São Paulo que instituiu o Sistema de Avaliação de Rendimento
Escolar do Estado de São Paulo (SARESP) e o Índice de Desenvolvimento da Educação
do Estado de São Paulo (IDESP).

Todas estas avaliações e exames fazem parte da política de responsabilização


articulada desde os anos de 1990 e atrelada aos interesses do Estado gerencialiasta e
regulador. Cada uma destas provas exerce influência no cotidiano e no planejamento
escolar de diversas redes de ensino no Brasil. Por isso é relevante compreender seus
pressupostos, objetivos norteadores e contextualizar suas inferências no sistema
educacional brasileiro e na aplicação das políticas educativas (BAUER, 2013).

Estado gerencialista, avaliações em larga escala e responsabilização.

A aplicação das avaliações em larga escala têm resultado em mudanças no


currículo, nas práticas pedagógicas e na avaliação na educação básica em virtude da
definição de metas e índices, do ranking dos resultados e de políticas de
responsabilização fundamentadas em uma perspectiva gerencialista que enfatiza a
“política de resultados” e as políticas de responsabilização (MAINARDES, 2013).

Por meio de estratégias de avaliação, tipicamente gerencialistas, o Estado tem


obtido êxito na padronização curricular, na implantação de políticas de
formação docente e na submissão da escola e da educação aos interesses de
mercado. Os modos de gestão, insistentemente mostrados como a solução
para a educação, chegam às escolas como formas estranhas de administração
e cada dia mais se mostram ineficientes para enfrentar os problemas
escolares. Contudo estas políticas de regulação continuam sendo a tônica das
políticas de Estado para a educação (HYPOLITO, 2010, p. 1337)

As mudanças produzidas pelo gerencialismo nas redes de ensino não alteram os


processos de desigualdade e exclusão presentes na escola pública brasileira, pelo
contrário reforçam estes processos à medida que classificam os alunos e escolas entre
fortes e fracas e responsabilizam alunos e professores pelo seu sucesso ou fracasso nas
avaliações externas. Outro ponto importante a ser ressaltado é que escolas com alto
índice de IDEB não são necessariamente escolas inclusivas e democráticas, ou seja, não
se preocupam em valorizar as diferenças e em dar estudos diferenciados e
acompanhamento individualizado aos alunos com necessidades especiais realizando
uma inclusão “marginal”(MARTINS, 1997 apud MAINARDES, 2013).
1685

Segundo Mainardes, as avaliações de sistemas educacionais são importantes,


mas ao serem usadas apenas como ranqueadoras têm fortalecido o modelo pedagógico
de desempenho e forçado os gestores escolares a adaptarem seus currículos às
exigências das avaliações externas na busca de metas e índices reduzindo a autonomia
docente e adotando matrizes de avaliações externas. Mas se fossem realizadas de
maneira diagnóstica poderiam servir de balizadoras para mudanças nos projetos
pedagógicos trazendo informações importantes no momento do planejamento escolar
(2013).

De acordo com Luiz Carlos de Freitas no início da implementação o sistema de


avaliação básica brasileiro utilizava os resultados internamente para a “elaboração de
políticas públicas e para a criação de um sistema de informações sobre a evolução da
educação” tendo o mérito de “introduzir uma cultura de avaliação no Brasil” focada na
promoção da melhoria da qualidade do ensino. Mas a partir das mudanças econômicas
desenvolvidas pela reforma do Estado estes objetivos iniciais foram sendo modificados
e na década atual as avaliações tem um caráter de auditoria (accountaility). Por isso o
uso das avaliações na atualidade se volta “preferencialmente para a responsabilização
dos autores do processo educacional”, ou seja, responsabilizam o professor pelo sucesso
ou pelo fracasso do estabelecimento de ensino. A cultura da auditoria utiliza as
avaliações para responsabilizar os professores pelos resultados obtidos oferecendo a eles
bônus salarial quando os alunos atingem as metas preestabelecidas, através da
instituição da política da meritocracia (FREITAS, L C, 2013, p. 147).

Neste processo os alunos e as escolas são avaliados de maneira individual e a


avaliação deixa ter a função principal de ser um apoio à política pública passando a ser
uma forma de controle dos sistemas educacionais reforçando a responsabilização e a
meritocracia. Assim a comunidade que se utiliza da escola é levada a crer que apenas os
bons professores são dignos de bônus e aumento salarial. Desta esta forma a lógica da
iniciativa privada passa a ser utilizada na educação pública (FREITAS, L C, 2013).

Considerações Finais

O sistema de avaliação em larga escala implementado no Brasil a partir da


década de 1990, não está mais focado em seu objetivo inicial que era o de promover a
qualidade de ensino a partir do fornecimento de dados que iriam subsidiar os
elaboradores de políticas públicas possibilitando a adequação dessas às necessidades
1686

educacionais. Atualmente estas avaliações têm sido empregadas para a montagem de


índices de qualidade de ensino que servem à lógica do ranqueamento, ou seja, as
escolas, os alunos e os profissionais de educação são classificados de acordo com as
médias obtidas no exame.

É importante frisar que se os resultados destas avaliações deixassem de serem


empregados no sentido ranqueador e passassem as serem utilizados no sentido
diagnóstico, ou seja, para verificar onde estão as falhas dos sistemas educacionais e o
que precisa ser modificado para melhorar a qualidade do ensino, poderia ser dado um
salto positivo na implementação das políticas educativas calcadas na melhoria real da
qualidade do ensino.

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