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União Metropolitana de Educação e Cultura

Departamento de Psicologia

ANÁLISE DE CASO
HISTÓRIA DA DONA RAQUEL

SALVADOR
2022
Fernanda Assunção Germano
Fernanda de Sousa Carvalho

Trabalho apresentado no Curso de Bacharelado


em Psicologia na disciplina Análise Experimental do Comportamento

Orientadora: Profª Ms.Nayla Lima

SALVADOR
2022
AVALIAÇÃO PARCIAL II
ANÁLISE EXPERIMENTAL DO COMPORTAMENTO

NOMES: Fernanda Assunção Germano


Fernanda de Sousa Carvalho

ANÁLISE DE CASO: História da Dona Raquel


(Extraído de Lombard-Platet, Watanabe, O.M. e Cassetari, L. Psicologia Experimental. 3. ed.
São Paulo: Edicon)

Dona Raquel sempre foi dona de casa. Casada, um casal de filhos, só com o curso
primário e uma vida econômica bastante difícil. O marido trabalha como porteiro em um
prédio até às 14 horas e, muitas vezes, antes de ir para casa, passa no bar da esquina. Ele,
nessas ocasiões, chega bêbado em casa, para a hora do jantar.
Dona Raquel também teve uma infância complicada: um pai autoritário que achava
que “lugar de mulher era dentro de casa”. Assim, cada vez que ela ousava pedir a ele para
sair, ele a esbofeteava e a insultava. Seus irmãos, homens, podiam pedir para sair e eram logo
atendidos pelo pai.
Mesmo se ela saísse até a padaria (por ex., enquanto o pai não estivesse em casa), ao
voltar, ela logo ia se sentar no sofá, próximo da hora de sua chegada, para que ele não
brigasse com ela. Além disso, ela ficava bordando panos de pratos para serem vendidos e isso
dava grande satisfação ao pai, que a elogiava muito quando a via fazendo isso.
Abandonou os estudos na 4ª série. No início, quando ela tinha sete anos e estava na 1ª
série pedia auxílio aos irmãos para fazer as tarefas e eles ajudavam. Já na 4ª série se pedisse
colaboração deles, eles se recusavam terminantemente, ignorando-a a maior parte do tempo.
Quando seu pai a via pedir ajuda, ele ainda berrava frases do tipo: “Eu tenho razão: mulher
não é para estudar, elas são mesmo umas burras, devem ficar em casa”, etc.
Sua história não continuou muito feliz: executava sempre todos os afazes domésticos
de modo adequado durante o dia e quando seu marido chegava bêbado em casa, lhe batia.
Com o tempo, ela foi deixando de fazer seus afazeres domésticos tão caprichosamente como
antes. Ela também tentava dialogar com o marido nessas ocasiões, mas ele a surrava ainda
mais. Ela já desistiu de falar qualquer coisa nessas horas.
Um outro problema está ocorrendo com Dona Raquel: assim que o marido e/ou os
filhos chegam em casa, ela começa a se queixar de dores de cabeça, nas pernas, diz que vai
desmaiar, etc. De certo modo, todos acabam lhe dando uma certa atenção e a filha, se está
próximo da hora do jantar, pede que ela se deite no sofá e serve o jantar para a família.
Ela afirma que gostaria de se separar do marido. Não o faz e acaba cumprindo todas as
suas determinações, dispensando-lhe um tratamento até carinhoso, para evitar que ele lhe
bata. Ela não conversa com os filhos sobre a separação, só fala de assuntos banais diários. Isso
evita que a critiquem por continuar “com essa vida”.
Além disso, ela acaba fazendo coisas para o marido, que aparentemente criticaríamos:
ele chega já gritando em casa e pedindo para ela lhe servir “uma pinga”. O que ela faz? Ela
acaba servindo-lhe a pinga e deixando a garrafa (que ela havia escondido) sobre a mesa. Com
isso, ele para de gritar e de ameaçá-la de surra.
Ao mesmo tempo, nessas ocasiões, frente aos gritos e ameaças do marido bêbado,
Dona Raquel sente seu coração disparar, começa a tremer e a suar. Ela relata que tem a
sensação de que vai morrer.

De acordo com o relato do caso, responda as questões:


a) Identifique no relato, os dados que fazem parte da história de vida (ontogênese)
de Dona Raquel.

Dona Raquel, segundo compreendemos, através do texto acima, era a única


filha, mulher, em uma residência cheia de homens e ainda por cima extremamente
machistas (pai- violento / Irmãos -- que a ignoravam). Sua infância foi bastante
conturbada sendo constantemente ameaçada pelo seu pai e irmãos homens (no texto
não aborda a presença de uma figura feminina na vida de Raquel – mãe).
Pouco Raquel saía de casa por medo do seu genitor que, quando a escuta pedir
para sair, imediatamente, depositava, em Raquel, sua ira, esbofeteando-a e insultando-
a, diferente de seus irmãos homens que eram, imediatamente, atendidos em seus
pedidos. Quando saía, rapidamente, para ir à padaria, por exemplo, Raquel, ao retornar
ao lar, sentava-se no sofá, próximo à hora da chegada de seu genitor, para que o
mesmo não se desequilibrasse emocionalmente e, mais uma vez, descarregasse suas
frustrações na pequena Raquel. Enquanto ela vivia uma vida de semi-cárcere, bordava.
O bordado para Raquel era uma fuga da realidade, talvez para dar conta do seu infinito
particular e das metáforas da alma, ou seja, para preencher um vazio de sentimentos e
amor familiar que nunca viveu.
A situação só piorou e quando a pequena Raquel completou os seus 10 anos de
idade, na 4ª série, resolveu abandonar os estudos por falta de apoio familiar. Seus
irmãos a ajudava, mas, ao passo que Raquel ia crescendo eles se afastaram e a
ignorava quando eram solicitados. Raquel sempre ouvia frases do tipo: “Lugar de
mulher é dentro de casa!” ou “Eu tenho razão: mulher não é para estudar, elas são
mesmo umas burras, devem ficar em casa!”.
Com o exposto acima, percebemos uma vida pautada na violência física,
emocional, psicológica, no abandono total por parte de seus familiares, o que fez com
que Raquel internalizasse tudo o que foi ouvido e vivenciado, achando-se, realmente,
incapaz de ser feliz de ser merecedora de ter oportunidades na vida e, talvez o pior de
toda uma situação: reproduzindo sua infância em um casamento infeliz e opressor.
Com tudo isso, Raquel se torna uma figura heterônoma, dependente,
traumatizada e escolhe como parceiro uma figura muito parecida com seu pai (marido
bêbado, agressivo e sem nenhum respeito pela figura feminina), reproduzindo, assim,
uma vida de sofrimento e amarguras.

b) Qual o procedimento envolvido quando Dona Raquel, na infância, pedia a seu pai
para sair? Construa o paradigma completo desse procedimento e coloque os
dados do caso.

O procedimento que mantinha esse comportamento era a Punição Positiva, ou


também conhecida como Punição por Estimulação Contingente que ocorre quando um
comportamento (resposta) é seguido por um estímulo aversivo, ou seja, trata-se de
apresentar um resultado desfavorável ou evento seguinte a um comportamento
indesejável. O estímulo (S) era a terrível presença de seu pai, enquanto que a resposta
(R) seria pedir ao pai para sair tendo como consequência (C) um estímulo aversivo
positivo: uma bofetada e muitos insultos da parte do seu genitor.

SRC
S:o próprio pai
R: o pedido da saída de casa
C: insultos e bofetadas na pequena Raquel

c) Quanto ao comportamento de “bordar panos de pratos para serem vendidos”,


qual o procedimento que mantinha esse comportamento? Por quê?

Entendemos que o comportamento operante de bordar seja de Reforçamento


Positivo que geralmente é definido como o fortalecimento de uma resposta devido à
apresentação de determinado estímulo a ela contingente, ou seja, é o aumento da
frequência de um comportamento pelo acréscimo de alguma coisa como consequência
deste comportamento. O ambiente é modificado e produz consequências que agem de
novo sobre ele, alterando a probabilidade de ocorrência futura semelhante. É um tipo
de aprendizagem em que o comportamento é controlado por consequências.
Se Raquel compreende que bordando ela agrada ao pai e se o pai ao vê-la
bordando não a esbofeteará nem a insultará, com toda a certeza, Raquel permanecerá
com esta “estratégia”. O elogio, acaba sendo um reforçador para Raquel, que acaba
bordando para fortalecer esta resposta. Quanto mais Raquel borda e seu pai visualiza
esta ação, mais Raquel compreende que agrada ao seu pai. E Raquel só faz isso perto
da hora de seu pai chegar em casa.

ESTÍMULO (S) – “próximo da hora de sua chegada” – presença da chegada


do pai em casa
RESPOSTA (R) – Estar bordando e vendendo os panos de prato
CONSEQUÊNCIA (C) – Pai fica feliz, elogia e não maltrata a pequena
Raquel – Reforçamento Positivo
d) Quais as contingências que acabaram diminuindo a frequência do
comportamento de “pedir ajuda aos irmãos nos deveres de casa?”. Qual o
procedimento usado pelos irmãos?

A contingência é a reação dos irmãos em não ajudá-la, ou seja, não existe


nenhuma forma de ajuda, de empatia, de colaboração por parte dos irmãos para com
Raquel. Vimos, no texto, que até a 4ª série, eles estavam presentes e depois,
simplesmente, deixaram de acompanhá-la nos afazeres escolares. Esta reação, dos
irmãos, está pautada na Extinção, pois ocorreu quando uma resposta não é mais
reforçada (a resposta seria pedir ajuda aos irmãos) na sequência de um estímulo
discriminativo (a presença dos mesmos na ajuda). A ajuda não foi mais
disponibilizada e Raquel deixou de estudar.

ESTÍMULO (S) – Raquel estava na escola, cursando e se saindo bem.


Realizando as atividades com a ajuda de seus irmãos mais velhos
RESPOSTA (R) – Raquel pedia ajuda aos seus irmãos
CONSEQUÊNCIA (C) – Como não houve ajuda (ajuda foi suspensa/extinta)
Raquel não deu conta sozinha e ficou sem estudar

e) Além disso, para esse mesmo comportamento (pedir ajuda para os deveres de
casa), quais as consequências oferecidas pelo pai? Qual o efeito delas sobre a
frequência dessa resposta? Qual o procedimento que controlava essa resposta?

Quais as consequências oferecidas pelo pai? Observamos que as


consequências oferecidas pelo pai foram as mais adversas possíveis para uma
criança: gritos e ameaças. Ele sempre reforçava na cabeça de Raquel sua
condição de mulher na sociedade. ““Lugar de mulher é dentro de casa!” ou
“Eu tenho razão: mulher não é para estudar, elas são mesmo umas burras,
devem ficar em casa!”:  ESTÍMULO (S)

Qual o efeito delas sobre a frequência dessa resposta? Logo, com tantas
adversidades, a pequena Raquel começou a se fechar e se recolher diminuindo
consideravelmente seus pedidos de ajuda a seus irmãos: --- RESPOSTA (R)

Qual o procedimento que controlava essa resposta? O procedimento


observado foi uma Punição Positiva – ele acrescenta condições para a
internalização, por parte de Raquel, de que a mesma, realmente, é uma inútil e
não tem capacidade por ser mulher. O pai sempre acrescentando algo aversivo
(seja berros, surras ou palavras desestimulantes) -- CONSEQUÊNCIA (C)

f) Em relação aos comportamentos de “executar os afazeres domésticos


adequadamente” e “conversar com o marido, quando chegava bêbado”, qual o
estímulo consequente para esses comportamentos? Qual o nome técnico desse
estímulo consequente? Qual o efeito obtido? E qual o nome técnico do
procedimento envolvido?
Qual o estímulo consequente para esses comportamentos? O estímulo
consequente (chamado de aversivo - quando diminui a probabilidade de
emissão futura da resposta que o produziu, o que gera variabilidade
comportamental) era quando o marido batia nela. Estímulo é o bater do
marido. E a surra (surrar, pelo marido) é o estímulo consequente para que ela
pudesse conversar com o esposo quando ele chegava bêbado do trabalho.

Qual o nome técnico desse estímulo consequente? O nome técnico deste


estímulo consequente é Aversivo Positivo - aqueles que reduzem a frequência
do comportamento que os produzem (estímulos reforçadores negativos).
Um estímulo só pode ser classificado como aversivo se a sua apresentação for
seguida por uma resposta de evitação, esquiva ou fuga. Vimos que a fuga de
Raquel seria “Ela já desistiu de falar qualquer coisa nessas horas”.

Qual o efeito obtido? O efeito é cada vez mais aumentar a probabilidade da


diminuição da frequência da resposta.

E qual o nome técnico do procedimento envolvido? O nome técnico do


procedimento envolvido é Punição Positiva, ou seja, ocorre quando um
comportamento (resposta) é seguido por um estímulo aversivo. Raquel vai
paulatinamente desistindo.

g) Identifique qual o procedimento envolvido no comportamento de “queixar-se de


dores”.
Esta frase do texto é emblemática “De certo modo, todos acabam lhe dando
uma certa atenção.” Conseguimos perceber, claramente, um Reforço Positivo nesta
ação - como o fortalecimento de uma resposta devido à apresentação de determinado
estímulo a ela contingente.  Vimos que o aumento da frequência de um
comportamento pelo acréscimo de alguma coisa como consequência desse
comportamento — antes do comportamento essa coisa não está presente, mas depois
da ocorrência do comportamento, essa coisa é apresentada ou adicionada à situação.
Em relação à situação de Raquel, a mesma começa a perceber que pode ser
mais “mimada” quando acrescenta as inúmeras dores a seu repertório.

ESTÍMULO (S) – quando os familiares chegam em casa/presença dos


familiares
RESPOSTA (R) – Raquel se queixa de muitas dores
CONSEQUÊNCIA (C) – Raquel tem a atenção de todos e ela é “mimada”
pela filha que vai para cozinha colocar a janta.

h) “Ter taquicardia, tremer e suar” são que tipos de comportamentos? Você deve
ser capaz de construir o paradigma completo referente a esses comportamentos,
tentando mostrar uma possível associação que tenha havido com os estímulos
eliciadores do mesmo.
“Ter taquicardia, tremer e suar” são comportamentos involuntário, que acontece mediante as
contingências, ou seja, produzidos pelo organismo sem controle do indivíduo. Esse tipo de
comportamento é denominado Comportamento Respondente.
Dividiremos, aqui, o paradigma em dois momentos:
Momento 1.
ESTÍMULO INCONDICIONADO (Si): marido de Raquel bate e surra sua esposa

RESPOSTA INCONDICIONADA (Ri): Raquel treme e transpira bastante

ESTÍMULO NEUTRO (Sn): gritos e ameaças – faz Raquel tremes e transpirar bastante

ESTÍMULO INCONDICIONADO (Si): provoca uma resposta natural e automática


RESPOSTA INCONDICIONADA (Ri): é a resposta que ocorre naturalmente em reação ao
estímulo incondicionado.
ESTÍMULO NEUTRO (Sn) : não fornece a resposta desejada em um sujeito.

Momento 2.

ESTÍMULO CONDICIONADO (Sc): os gritos e ameaças do marido

RESPOSTA CONDICIONADA (Rc): Raquel treme e transpira

ESTÍMULO CONDICIONADO (Sc): um estímulo previamente neutro que, após tornar-se


associado com o estímulo incondicionado, eventualmente, desencadeia uma resposta condicionada.

RESPOSTA CONDICIONADA (Rc): é a resposta aprendida ao estímulo anteriormente neutro.


O que você fez em relação ao caso acima foi uma ANÁLISE FUNCIONAL, ou seja, você
identificou as variáveis das quais os comportamentos são função. Ao fazer assim, identifica-se
a contingência de três termos (a Tríplice Contingência = S antecedente, a Resposta e o S
consequente) e torna-se mais viável uma intervenção a fim de se produzir mudanças
necessárias nesses comportamentos.

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