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Por Ana Ozório

HISTÓRIA DA FILOSOFIA
• A filosofia nasceu fortalecida por fatos históricos que, ao
acontecerem, contribuíram para esclarecer diversas
modificações ocorridas.
• Fatos históricos que marcaram o nascimento da Filosofia:
➢ viagens marítimas;
➢ invenção do calendário;
➢invenção da moeda;
➢surgimento da vida urbana;
➢invenção da escrita alfabética;
➢invenção da política.
DO MITO À FILOSOFIA
• A curiosidade humana levou o homem a buscar
explicações para os fenômenos do cotidiano. Numa época
em que não havia nenhuma fundamentação científica
capaz de fornecer base para o conhecimento, o homem
encontrou na mitologia grega antiga (ou cosmogonia) uma
forma de entender o mundo que o cercava. Por isso
mesmo, nós podemos afirmar que o conhecimento
mitológico representou uma das primeiras tentativas de
organizar um conhecimento sobre a realidade.
• De acordo com alguns autores, na mitologia nada existe
em uma única forma. Existe sempre o antagonismo: a
comunhão dos opostos. Assim, é impossível pensar vida
sem morte, trevas sem luz, saúde sem doença, bonito sem
feio. O mito, ao considerar os opostos, é um movimento
de passagem de uma situação para outra: permanência e
mutabilidade.
• De acordo com a crença mitológica, para que algo novo
seja construído é preciso que haja uma destruição da
forma anterior. A morte, por exemplo, seria uma eterna
condição de renascimento.
• Etimologicamente, a palavra MITO vem do grego
MYTHOS e significa FÁBULA; NARRATIVA; PALAVRA. Na
crença grega, o mito era um fato narrado pelo poeta-
rapsodo, um escolhido dos deuses, para quem era
revelada a origem de todas as coisas e seres, ficando ele
incumbido de transmiti-la aos ouvintes. A narrativa,
mesmo sendo fabulosa, incompreensível ou
contraditória, tornava-se confiável e sagrada. Confiável
devido à autoridade religiosa do narrador. Sagrada
porque tinha origem divina.
• As principais referências escritas dessa fase
mitológica são as obras de:
• Homero (Ilíada e Odisséia)
• Hesíodo (Teogonia e Os trabalhos e os dias).
MITOLOGIA X FILOSOFIA

• A Filosofia, ao contrário do Mito, não aceita fabulação,


contradição ou incompreensibilidade. Ela busca
respostas lógicas, coerentes e racionais. Na Filosofia, a
confiança não está assentada na autoridade do filósofo,
mas na razão, que é a mesma em todas as pessoas. Razão,
para a Filosofia, é uma forma de organizar a realidade de
modo que esta se torne compreensível.
• O conhecimento mitológico é anterior ao conhecimento
filosófico: Uma segunda importância creditada à
Mitologia é que ela contribuiu para o surgimento da
Filosofia, uma vez que a Filosofia nasceu justamente
questionando a validade do conhecimento mitológico.

• O nascimento da Filosofia na Grécia Antiga não resultou


de um “milagre” realizado por um povo privilegiado, e
sim resultou de um processo lento e gradual, influenciado
por mudanças sociais, políticas e econômicas.
Sobre o nascimento da Filosofia, Marilena
Chauí (2003; p.182) afirma que:
“A Filosofia nasce da admiração e do
espanto, dizem Platão e Aristóteles.
Admiração: ‘Por que o mundo existe?’
Espanto: ‘Por que o mundo é tal como é?’”
O MITO E SUAS
CONTRIBUIÇÕES
• Segundo Mircea Eliade, a tentativa de definir mito é a
seguinte, “o mito é uma realidade cultural extremamente
complexa, que pode ser abordada e interpretada em
perspectivas múltiplas e complementares.(...) o mito conta
uma história sagrada, relata um acontecimento que teve lugar
no tempo primordial, o tempo fabuloso dos começos (...) o
mito conta graças ou feitos dos seres sobrenaturais, uma
realidade que passou a existir, quer seja uma realidade tetal,
o Cosmos, quer apenas um fragmento, uma ilha, um
comportamento humano, é sempre, portanto, uma narração de
uma criação, descreve-se como uma coisa que foi produzida,
como começou a existir...” ELIADE, Mircea. Aspectos do Mito, p.
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FILOSOFIA: CONCEITO

ETMOLOGIA DA PALAVRA

PHILO : SOPHIA:

• PHILIA SABEDORIA

• AMIZADE CONHECIMENTO

FRATERNA VERDADEIRO

• AMOR
CONHECIMENTO FILOSOFICO
Conhecimento:

• Analítico: Capacidade ilimitada do ser humano de interrogar a


realidade em sua volta;

• Reflexivo: capacidade do ser humano apreender a realidade em


sua volta;

• Crítico: nada é óbvio e evidente;

• Racional: buscar apreender a totalidade do universo a partir do


raciocínio bem formulado;

• Argumentativo

• Interpretativo: não existe somente uma única verdade sobre os


seres, o mundo, o universo, etc;
QUESTÕES BÁSICAS

O que é conhecimento?

O que é verdade?

O que é crítica?

O que é consciência?

Quando um argumento, um conhecimento é


válido?

O que é moral, ética?


• Se uma pessoa fosse substituindo sucessivamente
suas perguntas cotidianas, suas afirmações como:
“onde há fumaça, há fogo”, ou “não saia na chuva para
não ficar resfriado”, por: O que é causa? O que é
efeito?; “Seja Objetivo”, ou “Eles são muito
subjetivos”, por: o que é a objetividade? O que é a
subjetividade?
• Se, em vez de falar na subjetividade dos namorados e
maridos, inquirisse: o que é amor? O que é o desejo?
O que são os sentimentos?
ATITUDE FILOSOFICA
• Alguém que tomasse essa decisão estaria tomando
distância da vida cotidiana e de si mesmo, teria passado
a indagar o que são as crenças e os sentimentos que
alimentam, silenciosamente, nossa existência. Estaria
interrogando a si mesmo, desejando conhecer por que
cremos no que cremos, por que sentimos o que sentimos
e o que são nossas crenças e nossos sentimentos. Esse
alguém estaria começando a adotar o que chamamos de
ATITUDE FILOSÓFICA.
• Uma primeira resposta à pergunta “o que é filosofia?”
poderia ser:
A DECISÃO DE NÃO ACEITAR COMO ÓBVIAS E
EVIDENTES AS COISAS, AS IDÉIAS, OS FATOS, AS
SITUAÇÕES, OS VALORES, OS COMPORTAMENTOS DE
NOSSA EXISTÊNCIA COTIDIANA; JAMAIS ACEITÁ-LOS
SEM ANTES HAVÊ-LOS INVESTIGADO E
COMPREENDIDO.
Isto implica:
* Perguntar O QUE a coisa, o valor, a ideia, é. A filosofia
pergunta qual é a realidade ou natureza e qual é a
significação de alguma coisa.
* Perguntar COMO a coisa, a ideia ou o valor, é. A
filosofia indaga qual é a estrutura e quais são as
relações que constituem uma coisa, uma ideia ou um
valor.
* Perguntar POR QUE a coisa, a ideia ou o valor existe e
é como é. A filosofia pergunta pela origem ou pela
causa de uma coisa, de uma ideia, de um valor.
O QUE ESTUDA A FILOSOFIA?

1. As condições e os princípios do conhecimento que


pretenda ser racional e verdadeiro;

2. Com a origem, a forma e o conteúdo dos valores


éticos, políticos, artísticos e culturais;

3. Compreender as causas e as formas da ilusão e do


pré-conceito no plano individual e coletivo;

4. Com as transformações históricas dos conceitos


(palavras, termos), das ideias e dos valores que
constituem as relações humanas;
5. A consciência em suas várias modalidades: percepção,
imaginação, memória, linguagem, inteligência,
experiência, reflexão, comportamento, vontade, desejo e
paixões.

Procurando descrever as formas e os conteúdos dessas


modalidades de relação entre o ser humano e o mundo,
do ser humano consigo mesmo e com os outros.
A filosofia visa ao estudo e à
INTERPRETAÇÃO de ideias ou
significações gerais como: realidade,
mundo, natureza, cultura, história,
subjetividade, objetividade, diferença,
repetição, semelhança, conflito, contradição,
mudança, etc.
Sem abandonar as questões sobre a essência da realidade, a
filosofia procura diferenciar-se das ciências e das artes, dirigindo a
investigação sobre o mundo natural e o mundo histórico (ou
humano) num momento muito preciso: quando perdemos nossas
certezas cotidianas e quando as ciências e as artes ainda não
ofereceram outras certezas para substituir as que perdemos.

A filosofia se interessa por aquele instante em que a realidade


natural (o mundo das coisas) e a histórica (o mundo dos homens)
tornam-se estranhas, espantosas, incompreensíveis e enigmáticas,
quando o senso comum já não sabe o que pensar e dizer e as
ciências e as artes ainda não sabem o que pensar e dizer.
O MÉTODO DE
QUESTIONAMENTO FILOSÓFICO
Análise (das condições da ciência, da religião, da arte, da moral) como
reflexão (isto é, volta da consciência para si mesma para conhecer-se
enquanto capacidade para o conhecimento, o sentimento e a ação) e
como crítica (das ilusões e dos preconceitos individuais e coletivos,
das teorias e práticas científicas, políticas e artísticas), essas três
atividades (análise, reflexão e crítica) estando orientadas pela
elaboração filosófica de significações gerais sobre a realidade e os
seres humanos.
Além de análise, reflexão e crítica, a filosofia é a busca do fundamento
e do sentido da realidade em suas múltiplas formas, indagando o que
são, qual sua permanência e qual a necessidade interna que as
transforma em outras.
FILOSOFAR É:

Análise Reflexão Crítica

Racional

Pensamento

Mundo Natural História


Totalidade do mundo real Explicação do ser humano

CONHECIMENTO UNIVERSAL
AS CONCEPÇÕES CIENTÍFICAS
CONHECIMENTO CIENTÍFICO

• Todo e qualquer campo de conhecimento científico está


organizado em concepções teóricas e metodológicas específicas e
características. Estas, por sua vez, se apoiam em pressupostos
epistemológicos.
• As questões sobre os fundamentos da verdade constituem a teoria
do conhecimento ou epistemologia, uma parte da filosofia clássica.
A filosofia da ciência é a reflexão filosófica sobre os fundamentos
epistemológicos e éticos do conhecimento e da prática científica.
• A reflexão sobre a natureza dos objetos dos diversos campos de
conhecimento e, portanto, sobre as concepções de verdade que
lhe são intrínsecas é uma tarefa fundamental na formação
profissional do cientista.
OS TIPOS DE CONHECIMENTO

• Classicamente, se distinguem os seguintes


tipos ou modalidades de conhecimento:
• Senso Comum: assistemático, concreto e prático
• Filosófico: sistemático, abstrato, especulativo e
racional
• Teológico ou Religioso: sistemático, abstrato e
dogmático
• Científico: sistemático, abstrato, racional e empírico
TEORIA CIENTÍFICA

• É um sistema ordenado e coerente de proposições ou enunciados


baseados em um pequeno número de princípios, cuja finalidade é
descrever, explicar e prever do modo mais completo possível um
conjunto de fenômenos, oferecendo suas leis necessárias.
• A teoria científica permite que uma multiplicidade empírica de
fatos aparentemente muito diferentes sejam compreendidos como
semelhantes e submetidos às mesmas leis; e, vice-versa, permite
compreender por que fatos aparentemente semelhantes são
diferentes e submetidos a leis diferentes.
CONCEPÇÕES DE CIÊNCIA

• Historicamente, três têm sido as principais


concepções de ciência ou de ideais de
cientificidade: o racionalista, cujo modelo de
objetividade é a matemática; o empirista, que
toma o modelo de objetividade da medicina grega
e da história natural do século XVII; e o
construtivista, cujo modelo de objetividade
advém da idéia de razão como conhecimento
aproximativo.
O PROGRESSO CIENTÍFICO
• A perspectiva empírica e moderna de ciência, cujo auge se deu no
positivismo de Auguste Comte no início do séc. XIX, via o
conhecimento científico como superior a outros modos de
conhecimento e também como suscetível a uma evolução progressiva e
contínua rumo à totalidade da compreensão da natureza e do homem.
• O modelo positivista de ciência está baseado no método empírico e
procedimentos indutivos para a construção de conhecimento a partir de
dados observáveis e quantificáveis por meio de medições de
fenômenos controlados. Daí a ênfase nos modelos experimentais e no
controle de variáveis como forma de inferência de relações causais.
• A aplicação do método científico aos diversos campos de fenômenos
naturais e humana deveria progredir continuamente, integrando cada
vez mais objetos e fenômenos, de forma que ao final teríamos uma
unidade homogênea e universal de conhecimento
AS MUDANÇAS CIENTÍFICAS
• A Filosofia das Ciências, estudando as mudanças científicas, impôs
um desmentido às idéias de evolução e progresso.
• O que a Filosofia das Ciências compreendeu foi que as
elaborações científicas e os ideais de cientificidade são
diferentes e descontínuos.
• Verificou-se, portanto, uma descontinuidade e uma diferença
temporal entre as teorias científicas como conseqüência não de
uma forma mais evoluída, mais progressiva ou melhor de fazer
ciência, e sim como resultado de diferentes maneiras de conhecer
e construir os objetos científicos, de elaborar os métodos e
inventar tecnologias.
A PSICANÁLISE: UM EXEMPLO
PARADIGMÁTICO

• Figueiredo (1996) defende então uma posição ética sobre os novos


modos de subjetivação em que as psicologias assumam o
compromisso de desiludir a ilusão da unidade do sujeito e da
soberania e transparência da consciência, por meio das tarefas de
teorizar a cisão e propiciar o trânsito no âmbito das subjetividades.
• Entende-se assim que a concepção freudiana de um inconsciente, ao
afirmar uma heterogeneidade irredutível entre forças e sentidos (ou
seja, entre o campo das representações e daquilo que as escapa), faz
uma ruptura epistemológica com toda a tradição da subjetividade
moderna (isto é, a filosofia do sujeito, da consciência e da
representação).
CONCLUSÃO
• Uma abordagem puramente epistemológica é insuficiente
para compreender as posições e implicações das diferentes
teorias e sistemas psicológicos. É preciso avançar em
direção à dimensão ética dos discursos e práticas que as
reflexões filosóficas contemporâneas revelam.
• As Psicanálises ocupam um lugar privilegiado na expressão
das contradições próprias ao espaço psicológico e, portanto,
são interlocutoras importantes no fomento de uma ética da
desilusão das identidades e no respeito à diferença no
cuidado das questões psicológicas.
A CIENTIFICIDADE DA PSICANÁLISE
ELA É UMA CIÊNCIA???
A CONSTITUIÇÃO HISTÓRICA DA
PSICANÁLISE

Na história de constituição da psicanálise se


configura, por meio de uma série de rupturas
epistemológicas com os saberes psicológicos e
médicos da época, um novo campo de teoria e
prática que é marcado por um objeto e um método,
próprios: o inconsciente e a associação livre,
respectivamente.
A CIENTIFICIDADE DA
PSICANÁLISE
• Esse método e esse objeto é que definem a especificidade da
psicanálise em relação a outros saberes do espaço psicológico.
• Trata-se, sobretudo, de uma especificidade epistemológica, ou seja,
da definição de uma nova região de saber assentada em parâmetros
de verdade, em uma concepção de racionalidade e em uma
metodologia.
• Essa discussão remete diretamente ao estatuto da psicanálise
enquanto uma forma de saber e, dentro de um contexto moderno, a
sua condição de cientificidade.
• A compreensão desse posicionamento variou desde Freud até a
atualidade.
TODA CIÊNCIA É NATURAL
• Embora tenha tido uma educação clássica e interesse pela filosofia e
história das civilizações, Freud teve uma formação acadêmica
amplamente marcada pelos referenciais epistemológicos e científicos
da medicina alemã da segunda metade do século XIX, que era
caracterizada pelo rigor naturalista e empiricista, com ênfase na
pesquisa experimental em áreas básicas.
• Mesmo que a discussão sobre a especificidade da epistemologia das
ciências humanas tenha se desenvolvido também no solo acadêmico
germânico, ela era pouco relevante e presente no campo da medicina,
onde imperava, na época de Freud, o paradigma da chamada Escola
de Medicina de Helmholtz
• Assim, para Freud, toda ciência seria, necessariamente, ciência
natural. Desse modo, a cientificidade da psicanálise deveria passar
por esses parâmetros.
HERANÇAS FILOSÓFICAS
• Além da escola de Helmoholtz, Freud também foi marcado pela
onipresença da tradição kantiana no meio acadêmico germânico.
• Kant é a referência filosófica mais explícita no pensamento
freudiano, pois o autor muitas vezes se reporta o criticismo
freudiano.
• A herança kantiana na epistemologia freudiana é bem apresentada
no texto de Loparic (1991), que tem como tese principal mostrar
que o inconsciente é um fenômeno fundamentalmente afetivo que
transcende o âmbito do sujeito do conhecimento e da razão pura,
caindo no âmbito da razão prática e, portanto, indicando uma
tradição de crítica da epistemologia da representação que marca a
metafísica moderna.
HERANÇAS FILOSÓFICAS
• Portanto, Freud, por meio de sua hipótese do inconsciente, teria
utilizado Kant para apontar um além do próprio kantismo e, nesse
sentido, ser um precursor de epistemologias onde a volição e a
afetividade teriam um papel fundamental, como Schopenhauer e
Nietzsche, que são autores a que Freud também se refere.
• Mas, além desses autores, Loparic (1991) também aponta a
proximidade com outro filósofo mais contemporâneo a Freud, mas
que este não conhecia: Martin Heidegger.
• Desse modo, pode-se afirmar que Freud indica um quadro
epistemológico que transcende a herança de uma metafísica
moderna clássica, embora não tenha sido suficientemente radical
em sua ruptura com ela.
OS FUNDAMENTOS EPISTEMOLÓGICOS
DO FREUDISMO
• Quer seja na vertente científica, quer seja na vertente filosófica,
podemos afirmar que a concepção freudiana é marcada por um
conservadorismo epistemológico.

• Sua “teoria do conhecimento” tem, contudo, a marca de uma


heterogeneidade de referenciais do período, cujos principais
fundamentos são, segundo Assoun (1983):
• Monismo e Reducionismo

• Fisicalismo e Materialismo

• Funcionalismo e Neo-Darwinismo

• Agnosticismo e Ceticismo

• Além disso, haveria elementos pioneiros e originais que apontam


para referências epistemológicas posteriores.
A ESPECULAÇÃO COMO
RECURSO

• A posição metodológica e epistemológica geral que Freud constitui


para a psicanálise envolve a utilização de hipóteses abstratas e
provisórias como modelos para interpretação e descrição dos
fenômenos da clínica.
• Esse é o sentido específico que “especulação” teórica tem na obra
freudiana: uma ficção teórico-conceitual de caráter heurístico que
provisoriamente descreve o fenômeno mas que não decorre da
indução da observação empírica.
• A especulação é um exemplo da influência do ceticismo kantiano na
teoria do conhecimento em Freud.
• Nesse sentido, a psicanálise se distancia de um materialismo ingênuo
que acredita que a coisa-em-si pode ser conhecida e aponta para um
modelo hipotético-dedutivo mais próximo de uma concepção
construtivista e contemporânea de ciência.
O CRITÉRIO METODOLÓGICO
• Diferentemente da orientação tradicional das ciências da Natureza,
contudo, Freud não considerava a psicanálise passível de uma
comprovação experimental ou mesmo de ter o método experimental
como ideal regulador.
• Considerava que o método psicanalítico era um método
fundamentalmente clínico e interpretativo e que ele era o parâmetro
fundamental para o campo psicanalítico.
• Embora não fosse de caráter experimental, tratava-se ainda de um
método empírico e era nesse tipo de constatação empírica que a
cientificidade da psicanálise deveria estar embasada.
• Assim, como afirma Grunbaum (2000), o critério de cientificidade de
Freud sempre foi metodológico, isto é, baseado na clínica e na
etiologia dos sintomas, e não propriamente guiado por questões
ontológicas ou epistemológicas.
A PERSPECTIVA ANALÍTICA E HISTÓRICA
• Uma outra característica fundamental para compreender a posição
freudiana acerca da questão da cientificidade da psicanálise é o
reconhecimento da historicidade dos fenômenos psíquicos e a
impossibilidade de afirmação de um determinismo causal simples
como forma de explicação dos fatos da clínica.
• Isso se dá pela natureza retrospectiva do método analítico e pela
pluraridade de sentidos possíveis nos encadeamentos da história
de vida das pessoas.
• É nesse sentido que a concepção de verdade em psicanálise se
alinha a uma perspectiva histórico-compreensiva.
• É isso também que faz com que Freud insista que a natureza do
saber psicanalítico é fundamentalmente analítico (crítico-
desconstrutivo) do que sintético (explicativo-propositivo).
A QUESTÃO DA ‘VISÃO DE
MUNDO’
• Weltanschauung é um conceito especificamente alemão, cuja tradução
para línguas estrangeiras apresenta dificuldades, mas pode ser
entendido como ‘visão de mundo’.
• Freud a define como uma construção intelectual que soluciona todos
os problemas de nossa existência, uniformemente, com base em uma
hipótese superior dominante, a qual, por conseguinte, não deixa
nenhuma pergunta sem resposta e na qual tudo o que nos interessa
encontra seu lugar fixo.
• Por conta disso, entende que a posse de uma noção desse tipo situa-se
entre os desejos ideais dos seres humanos, pois acreditando-se nela,
pode-se sentir segurança na vida, pode-se saber o que se procura
alcançar e como se pode lidar com as emoções e interesses próprios
da maneira mais apropriada.
• Portanto, pode-se entender que as visões de mundo podem se
assentar em concepções mítico-religiosas, filosóficas, científicas,
estéticas, etc.
UMA COSMOVISÃO
CIENTIFICISTA
Freud toma o “Sendo esta a natureza da
partido de uma Weltanschauung, torna-se fácil a resposta,
‘visão de mundo’ de no que respeita à psicanálise. Na
fundamento qualidade de ciência especializada, ramo
científico- da psicologia — psicologia profunda, ou
psicologia do inconsciente —, ela é
naturalista, em praticamente incapaz de construir por si
conformidade com mesma uma Weltanschauung: tem de
sua posição quanto aceitar uma Weltanschauung científica”
à epistemologia da (FREUD, 1933)
psicanálise:
CARACTERÍSTICAS DA VISÃO CIENTÍFICA

• A Weltanschauung da ciência supõe a uniformidade da explicação


do universo; mas, o faz apenas na qualidade de projeto, cuja
realização é relegada ao futuro.
• Afirma que não há outras fontes de conhecimento do universo
além da elaboração intelectual de observações cuidadosamente
escolhidas — em outras palavras, o que podemos chamar de
pesquisa — e, a par disso, que não existe nenhuma forma de
conhecimento derivada da revelação, da intuição ou da
adivinhação.
COMPARAÇÃO COM OUTRAS VISÕES DE
MUNDO
• Freud encerra seu artigo de 1933, tecendo alguns comentários
sobre o que considera cosmovisões presentes em sua época, que
implicam principalmente em posições políticas.
• Fazendo todas as ressalvas de quem aborda um assunto fora de
sua área de conhecimento e indicando principalmente as
consequências sociais de certas posições políticas, Freud então
analisa:
• Os dogmatismos religiosos
• O Anarquismo e toda forma de niilismo político.
• A implantação de um socialismo real na União Soviética.
UMA MATRIZ EPISTEMOLÓGICA
HETEROGÊNEA
• A Psicanálise tem uma fundamentação epistemológica
heterogênea e híbrida, sendo marcada pela mesma contradição
de seu objeto: a subjetividade humana.
• Ela tem uma dimensão de sentido, que é propriamente
hermenêutica, mas também uma dimensão de força, que a
transcende e remete ao ímpeto das pulsões.
• Essa dualidade é constitutiva do próprio campo psicanalítico e
qualquer tentativa de redução a uma dessas polaridades minimiza
a originalidade do seu objeto.
TRÊS POSIÇÕES CONTEMPORÂNEAS

1. A psicanálise é uma ciência objetiva e natural que versa sobre


uma dimensão das condutas humanas e pode ser integrada a
uma concepção biopsicossocial do ser humano.
2. A psicanálise é uma forma de prática artístico-literária e retórica
que prescinde do rótulo de ciência.
3. A psicanálise é uma prática e teoria fundamentada na
hermenêutica e na concepção do homem como um ser histórico
e simbólico própria das ciências humanas e da linguagem.
QUESTÕES EM CONFLITO

1. Concepção da mente humana: Consciência (controle


total) X Inconsciência (desconhecido que domina e
que se opõe ao “consciente”.
- O funcionamento do Inconsciente como funcionamento
mental.
- A razão como eixo central da existência se desloca para
aquilo que seria “irracional” na concepção científica da
época do advento da psicanálise.
- O Cartesianismo é colocado em questão.
2. O questionamento sobre a verdade: determinismo psíquico
- O que determina a verdade? Seria somente a experiência
concreta? Seria o fato ocorrido? Ou a verdade pode ser
determinada pela forma singular de observação e
interpretação subjetiva?
- Conceito de Realidade Psíquica – Fantasia X Teoria do trauma

3. Diferentes formas de conceituação do sujeito:


- Sujeito do pensamento: existência/ser inteiro
- Sujeito dividido: Conflito psíquico, onde a constituição do
sujeito se dá a partir de uma divisão, provocada pela
castração e não representa uma unidade do ser.
4. Diferentes discursos com sentidos opostos:
- O discurso científico visa a determinação da verdade de
forma a preencher totalmente, obtendo-se um saber total e
final sobre o objeto observado. Busca-se certezas sobre o
que se observa, gerando um paradigma.
- O discurso psicanalítico busca suscitar a dúvida, o
questionamento para se chegar a algo que é da ordem do
provisório, do faltoso. O desejo é faltoso em sua origem.
- “O saber é não todo” J. Lacan. Nesta concepção o discurso
religiosos e científico buscam o sentido das coisas. A
Psicanálise busca fazer “furo” neste preenchimento fálico,
pois é a falta que dá movimento à vida.
5. Novo modelo teórico do psiquismo
- Tópicas do Aparelho psíquico, o Inconsciente, Complexo de
Édipo, ID, Ego e Superego, Além do princípio do prazer, etc. O
modelo de psiquismo freudiano exposto através dos textos
citados, se difere daquele cunhado pela Psicologia Clássica e
também da Neuroanatomia do cérebro, bem como das
neurociências.
- O psiquismo é tomado como “aparelho de linguagem” e por
isso o tratamento psíquico seria centrado na palavra, o que
difere diretamente da medicina positivista que não dava
importância à fala/história de vida do paciente, este é tomado
como um corpo a ser examinado, classificado os sintomas,
descritos e categorizados segundo um protocolo de
tratamento pré-existente. A lógica médica X a lógica do
inconsciente.
6. A Psicanálise não é uma Psicologia, mas uma “metapsicologia”
- Saber fundado na interpretação ( sentido e significação partem
de quem fala, não são pré-existentes)
- Os Sonhos apontam um sentido. As formações do inconsciente
dizem algo a respeito da verdade do desejo do sujeito. Não são
aleatórias.
- O EU, no registro cognitivo, falha, então emerge o Inconsciente.
- Freud comparou o discurso filosófico à paranoia e à
esquizofrenia.
- Freud distanciou a Psicanálise da Filosofia para aproximá-la da
cientificidade.
- “A experiência psicanalítica foi transformada no laboratório de
verificação científica dos enunciados Metapsicológicos da
psicanálise.” Joel Birman
“ A existência do sujeito e a produção da verdade se
realizariam para a psicanálise fora do registro do
pensamento, inscrevendo-se no registro do desejo e do
inconsciente.”

Ciência Clássica (sec. XIX): Semiologia e representação


Ciência Moderna (sec. XX): Campo da Linguagem e o
advento das ciências humanas/cultura.
7. Psicanálise: 3ª “ferida narcísica” para a humanidade
- Provocou o descentramento do Eu e da consciência.
- Tirou o homem consciente do centro do cosmos e da
vida.

3 descentramentos em Freud:
1. Da consciência para o inconsciente
2. Do ‘eu’ para o ‘outro’ – o eu se constitui a partir do
Outro.
3. Da consciência, do eu e do inconsciente para as
pulsões.

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