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LITERATURA RUSSA PARA BRASILEIROS


BLOG PARA DIVULGAÇÃO DA LITERATURA RUSSA AOS FALANTES DE LÍNGUA PORTUGUESA .

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 SUMÁRIO › B i o g ra f i a

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Parte 1 › Po e m a

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Manuscritos não ardem


Por autor
1. Primeira versão
2. Segunda versão
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› A k h m a tova
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› Anna Bunina

 
› A s s a d ov

› B a r to

Parte 2 › Blok

Símbolos e significados: dimensão pessoal, dimensão social e dimensão › B u l g a kov


universal
Sutilezas linguísticas
› D o s to i év s ki

Nomes › G a m z á tov

Bônus: adaptações › G e n n a d i y Ayg i


Referências
› Gogol

› G o n tch a rov

› G o rki

› J u kov s ki

› Le rm o n tov

› M a i a kóv s ki

› N a b o kov

› N e kra s s ov

› O s te r

› Pa s te rn a k

› R u b t s ov

› S e rg u e i M i k h a l kov

› S h o l o k h ov

› S i m o n ov

› S t ro m i l ov

› Ti u tch ev

› To l s toy

› Tsve t a eva

› Tu rg u e n i ev

Traduções brasileiras e portuguesas de O mestre e Margarida. De 1969 a 2017. › Vya ze m s ki y

› Vy s o t s ky
› Ye s e n i n

› Yevg u e n i y Yev t u s h e n ko

SÍMBOLOS E SIGNIFICADOS: DIMENSÃO PESSOAL, › Z a b o l ó t s ki

DIMENSÃO SOCIAL, DIMENSÃO UNIVERSAL › Zamiátin

No que
diz respeito à grandeza de O mestre e Margarida, seu enredo divertido
e complexo, resumido na
primeira parte desta resenha, é apenas a ponta do iceberg.
Se furarmos o gelo e mergulharmos no buraco,
encontraremos um oceano de
símbolos, referências, menções, alfinetadas e pensamentos profundos que
entretecem um desabafo pessoal do autor, o retrato de uma sociedade com época e
local definidos, e uma
visão de mundo de aplicação universal.

A dimensão
pessoal do livro está muito entrelaçada com a história de sua
idealização, escrita e publicação, já
tratada anteriormente. Além de Woland e
Pilatos serem por vezes considerados retratos de Stálin, o mestre ser
o próprio
Bulgákov (há quem defenda que Yeshua Ha-Notzri também) e Margarida, sua
terceira esposa, vale
Arquivo
acrescentar que muitos dos outros personagens da história
são inspirados em pessoas com quem o escritor
Agosto 2021 (2)
convivia. Existem trabalhos
dedicados a desvendar os modelos para os personagens, e, de qualquer forma, a
maioria dessas pessoas não é conhecida do leitor brasileiro contemporâneo, por
isso esse tema não será
explorado aqui. RECENTE POPULAR

Destaca-se
somente o poeta que acompanha a internação de Ivan Sem-Teto, Riúkhin,
pretensamente baseado Resenha: O mestre
Mikhail Bulgákov (P
em Maiakóvski. Quando se lê a passagem sobre Riúkhin com
a história de Maiakóvski em mente, ela adquire
 Érika Batista  Au
uma nota muito mais sombria.
Isso porque o escritor se suicidou em em 14 de abril de 1930, entre o envio da
carta de Bulgákov ao governo soviético, de 28 de março de
1930, e a resposta de Stálin, em 18 de maio de 1930. Resenha: O mestre
Mikhail Bulgákov (P
Há quem especule que esse
incidente foi o que fez Stálin responder: queria evitar mais um escritor
 Érika Batista  Au
relativamente célebre se matando.

Carta ao governo so
Já a dimensão
social do livro é, talvez, a principal responsável por seu sucesso,
por motivos diversos. Um deles Bulgákov
 Érika Batista  Ma
é seu viés antissoviético, que sem dúvida
contribuiu para o interesse do Ocidente na sua publicação e difusão.
Doutor
Jivago, de Pasternak, O arquipélago Gulag, de Soljenítsin e
muitas outras obras tiveram o mesmo Desafio Literário 20
destino de verem a luz em texto integral
primeiro em praias estrangeiras, e só depois em casa. O bloco russos
capitalista
aceitou de braços abertos muitos refugos da censura soviética, e é ingênuo
acreditar que nada  Érika Batista  Ja

havia de político nessa receptividade em plena Guerra Fria.


Resenha: Contos Ru
Turguêniev e Lesko
Todavia,
tais conflitos e segundas intenções não diminuem em nada a qualidade da obra.
Tanto assim que,  Érika Batista  De

quando o livro enfim pôde ser lido pelos cidadãos soviéticos,


tornou-se depressa um dos favoritos do país,
Marcadores
justo por retratar em toda a sua
crueza os pontos espinhosos da existência sobre os quais não se podia falar
abertamente. Alguns dos elementos soviéticos satirizados por Bulgákov em O
mestre e Margarida são próprios
ABSURDO A FA N A S I F E T
e característicos das décadas de 1920–30;
outros, porém, são reconhecíveis até para leitores mais jovens que
ALEKSIÉVITCH AMOR A
viveram na
URSS só uns poucos anos antes da dissolução do país.
ANO NOVO ARTIGO AS

Dentre os
elementos específicos do início do período stalinista, cabe destacar a questão
do dinheiro, que se BARTO B A S H K I R T S E VA
encontra no centro ou na culminação de
diferentes linhas da trama de Moscou.
BIOGRAFIA BLOK BRÓ

B U L G A KO V B U L G Á KO V
A
economia na URSS não era regida pelo mercado, e sim planificada,
isto é, trabalhava-se com planos
quinquenais de desenvolvimento, a nível nacional, e metas de produção para
cada ramo da economia, C ATA R I N A D A S H KO VA CH

pensadas para atender as necessidades que o país tinha


de cada tipo de produto. Os economistas- CLUBE DE LEITURA CONT
planejadores eram quem elaborava esses
planos e seus detalhamentos.
CORRESPONDÊNCIA CUR

D E R J ÁV I N DESAFIO
Cumprir
os planos quinquenais significava não só suprir as necessidades da sociedade,
mas também
modernizar um país mormente agrário até as vésperas da revolução,
fazê-lo crescer e enriquecer e, assim, DESAFIO LITERÁRIO DEZ

provar a capacidade do modelo econômico


socialista de competir com o modelo capitalista de economia
de
DISTOPIA D O L G O R Ú KO VA
mercado. Com a ascensão de Stálin ao poder, marcando a vitória da ideia de construir o socialismo
em um só
DOSTOIÉVSKI D O V L AT O V
país sobre a ideia da revolução permanente de Trótski, cresceu a ênfase no
cumprimento (e superação) dos
planos quinquenais, pois era isso que provaria
que a ideia de Stálin era a melhor. E N T R E V I S TA ESCRITORAS

FRAGMENTO G A M Z ÁT O V

G E N N A D I Y AYG I GOGOL

GONTCHAROV GORENSTE

GÓRKI GROSSMAN GU
GÓRKI GROSSMAN GU

HISTÓRIA HUMOR IESS

INACABADO J U KO V S K I

K H V O S C H Í N S KA I A KO L L O

KRILOV K R U P S KÁ I A

LEONID ANDRÊIEV LERM

L E S KO V

L I T E R AT U R A C O N T E M P O R Â N

LOUCURA M A I A KÓ V S K I

MÚSICA FOLCLÓRICA NAB

N ATA L NEKRASSOV NÉ

NOITES BRANCAS NOMES

NOVELA OSTER PA S T E

PAV L O VA P E T R U C H É V S KA

POLÊMICAS LITERÁRIAS P

R A C H M A N O VA R E C E I TA

RESENHA ROMANCE R

SÃO PETERSBURGO S ÁT I R

SÉCULO XX SERGUEI MIK

SHOLOKHOV SIMONOV

STROMILOV TCHEKHOV

Cartaz soviético. "A melhor resposta aos desígnios dos imperialistas é fortalecer a industrialização".
T E AT R O TÉFFI TIUTCHE
Embaixo: "Cooperação da URSS". 
T O L S TÁ I A TOLSTÓI TOL

TRADUÇÃO TRADUTOR

TURGUENIEV TURGUÊNIE

Mas não
bastava a boa vontade dos trabalhadores para acelerar o cumprimento dos planos,
por mais que a VIÁZEMSKI VOCABULÁRIO

propaganda a enfatizasse: era preciso financiá-los. Era aí que


começavam os problemas que, por atingirem os VOINÓVITCH V YA Z E M S K I Y
indivíduos soviéticos, Bulgákov
trouxe para o livro.
YESENIN YEVGUENIY YEV

ZABOLÓTSKI Z A M I ÁT I N
A
ausência de reconhecimento da URSS como país por muitos outros Estados fazia
com que suas moedas não
fossem cambiáveis e obrigava o governo a extrair da
população toda moeda estrangeira disponível no ZETKIN

território para
pagar com ela o maquinário importado necessário para equipar suas primeiras fábricas.

O autor
criticou a inutilidade do novo dinheiro soviético, o tchervônets,
posto em circulação em notas de 1, 3, 5,
10 e 25 a partir de 1922, e de 2, em
1928, substituindo o rublo. Os tchervôntsy que a gangue de Woland faz
chover no teatro desaparecem, transformando-se em papel de bala, rótulo de água
mineral e outros lixos no
bolso de quem o aceitou. Moscou fica cheia de
fornecedores irritados por terem levado prejuízo e
desconfiados de quem paga
com dinheiro soviético.

Na
presença de Woland, a lixarada volta estranhamente a ser dinheiro, como se só o
demônio, criador da
ilusão, pudesse sustentá-la. (Reacende-se a questão: seria
Woland uma representação de Stálin?). Mas a crítica
permanece: o tchervônets
é dinheiro falso e ninguém o quer, nem os estrangeiros, e nem o governo
soviético.
Afinal, só tendo dinheiro estrangeiro para comprar as mercadorias
luxuosas ou importadas da rede de lojas
Torgsin (a abreviatura
de Torgóvlia s inostrântsami, i. e., comércio com
estrangeiros), foi aberta com o intuito
de arrecadar fundos para financiar a
execução dos planos quinquenais. Não é à toa que Korôviev comove os
circundantes com seu discurso sobre o pobre Beemote antropomorfizado, que
supostamente não podia
saborear as delícias da Torgsin por só ter dinheiro local.
Não é à toa, também, que esse símbolo dos desvios
antissocialistas da URSS, dos
momentos em que ela se afastou da prometida igualdade, acaba queimado na
purga
do final do livro junto com outros prédios que representam privilégios.
Loja Torgsin na Rua Petróvka em Moscou.

Outra
forma que o governo soviético arranjou de obter recursos para acelerar a
industrialização e o
desenvolvimento do país foi a expedição de títulos da
dívida pública, comprados por particulares e que
podiam ser resgatados com
lucro após algum tempo. O resgate poderia se dar em dinheiro ou em grão. Parte
dos títulos expedidos eram empréstimos com possibilidade de ganho, isto é,
incluíam um número de loteria.
Tanto as obrigações quanto as
loterias eram práticas correntes no Império Russo pelo menos desde a segunda
metade do século XIX. A loteria, proibida de início como jogo burguês, foi
restaurada na URSS em 1922 e a
participação nela passou a ser insistentemente
estimulada por todos os órgãos ligados ao Estado, inclusive
sindicatos
profissionais e órgãos internos do local de trabalho. Um bilhete desses, que o
mestre ganhou no
museu em que trabalhava, está na base de toda a história. Foi
com o prêmio da loteria que ele alugou o
apartamento no porãozinho que lhe
rendeu o livro, Margarida e todo o resto da confusão.

Um
terceiro método método de arrecadação de verba era o confisco puro
e simples do dinheiro estrangeiro.
Foi proibido aos soviéticos ter dinheiro
estrangeiro, moedas de ouro do período tsarista e outras preciosidades,
cuja
entrega voluntária foi solicitada pelo governo. Além disso, a polícia secreta
organizou algumas
campanhas entre 1928 e 1933 para prender quem era suspeito de
especular com esses bens na
clandestinidade. Os suspeitos eram mantidos na
cadeia por muitas semanas até decidirem entregar o
dinheiro estrangeiro.

Toda a
linha narrativa sobre o presidente da administração predial, Nikanor
Ivânovitch, é construída em torno
dessa prática. É interessante como o autor
mostra que o tratamento desses presos era ligeiramente diferente
do dispensado
a outras vítimas da repressão. Afinal, se eles sumissem, o dinheiro e o ouro
sonegados nunca
seriam recuperados. Buscava-se vencer sua resistência, mas,
comparando as trilhas dos personagens, vemos
que Nikanor Ivânovitch sofreu
menos do que, por exemplo, o mestre.

Tem-se
ainda o caso do consciencioso contador do Variété, que vai levar o dinheiro da
bilheteria para o órgão
competente, depara-se com várias cenas chocantes no
caminho, e acaba preso quando o pegam com
dinheiro estrangeiro que ele nem
sabia que tinha. O autor talvez tenha providenciado essa vítima inocente
para
ressaltar a injustiça de tais prisões, já que a corrupção de Nikanor Ivânovitch
pode reduzir a compaixão do
leitor por ele.

Aliás, já
que se falou na corrupção de Nikanor Ivânovitch, vale abordar em seguida a questão
habitacional
que, segundo Woland, estragou os moscovitas.

Nas
primeiras décadas da U RSS, diante da carência de apartamentos ou casas
suficientes para abrigar toda a
população que já vivia nas cidades desde os
tempos do Império e a que afluía para elas, a solução adotada foi
o
compartilhamento dos imóveis existentes de maneira mais ou menos igualitária
entre todos os habitantes.
Cada indivíduo tinha direito não a um apartamento ou
casa inteiros, mas a um número de metros quadrados
de área habitável ou de
cômodos, por vezes situados em apartamentos
comunais. A disputa pelos melhores
lugares para exercer o próprio direito à
moradia foi um dos pontos mais marcantes da vida social de Moscou
nessa época,
motivando subornos, brigas, delações e esquemas fraudulentos que permeiam toda
a narrativa
de O mestre e Margarida.

As
dificuldades da convivência em apartamentos coletivos são
abordadas de
passagem, de forma até condescendente: é uma
mulher tomando banho que dá as
boas-vindas a alguém que,
ao que parece, não é seu marido; é a fofoca que corre
solta no
prédio quando algo de ruim acontece a alguém; são vizinhas
que
Margarida vê brigando em uma cozinha junto aos
fogareiros, que aparecem por
todo o livro como símbolo
daquela vida precária, tensa e forçadamente
compartilhada… A
falta de privacidade e o aperto dessas condições de vida são,
em parte, o que estimula os moscovitas a descer a níveis
horrendos de baixeza
buscando mais espaço e moradias
melhores para si. (Embora caiba ressaltar que,
para muitas
famílias pobres, o aperto e a falta de privacidade não eram
problemas novos: antes da Revolução era até pior).

Fogareiro P`rimus n. 96, 1930.

Na
descrição da associação dos escritores, a fila mais longa
com que nos deparamos
é a que leva a uma porta com a placa
“Questão habitacional”. Korôviev conta a
Margarida, ante do baile de Satanás, a história de um homem que fez
um esquema
com sucessivas trocas de cômodos por anúncio de jornal até terminar com um
apartamento
bem maior do que teria direito — obviamente perdido quando
descobriram a tramoia. O mestre é delatado e
preso por um falso amigo que
estava de olho em seu apartamento. O cadáver de Berlioz ainda nem esfriou e
seus vizinhos já assaltam Nikanor Ivânovitch para pedir os cômodos dele para
si, inventando todas as
justificativas possíveis. É selvageria atrás de
selvageria.

Cabe
observar que, como Moscou era o coração da URSS, muita gente queria se mudar
para lá, uma cidade já
superlotada. É o caso do tio de Berlioz, morador de
Kíev, que já tentara trocar seu apartamento por um menor
em Moscou, sem
sucesso, e agarra com todas as forças a oportunidade de herdar os aposentos do
sobrinho.
Quando seus planos são frustrados, ele nem fica para o funeral.

Mudar-se
para Moscou não era uma questão de quem queria, mas de quem podia, e ter uma
moradia
espaçosa, também. Pelo livro se vê que todo mundo que morava sozinho
tinha alguma importância:
Artchibald Artchibáldovitch, respeitado nome da
comissão de diversões, mora com a esposa arrogante “e uma
parenta” no seu
apartamento; Margarida mora sozinha com o marido, pessoa de interesse do
governo, na
parte de cima de um sobrado; os literatos propagandistas têm
apartamentos de um andar no prédio dos
trabalhadores do teatro e da literatura;
o mestre, historiador que trabalhava em um museu, só consegue um
lugar mais ou
menos decente quando ganha na loteria e aluga o porão de um agente imobiliário,
excrescência
que o sistema deixou continuar existindo, segundo ele. Mesmo
figuras importantes de segunda categoria
tinham que compartilhar suas
habitações, como Berlioz e Likhodêiev depois que ficaram com o apartamento

50 do 302-b da Rua Sadováia, que era de uma viúva levada pela NKVD.

Vale
dizer que o próprio Bulgákov tinha um apartamento inteiro garantido pelo
governo, então ele não era
exatamente pouca coisa, apesar de suas dificuldades
para trabalhar.

Esses privilégios
em uma sociedade que devia ser igualitária não podiam deixar de suscitar certa
revolta. Vê-
se muito ressentimento na atitude de Rímski, diretor financeiro do
Variété, em relação a seu superior
Likhodêiev, embora essa ressentimento talvez
se devesse mais à inépcia de Likhodêiev para o cargo. O próprio
Rímski tem
acesso a certos confortos inacessíveis ao povo comum, como vemos quando ele
foge do teatro no
tem postal para Leningrado. É verdade que seus gastos
exorbitantes podem ter sido motivados pelo medo,
não exatamente por ele ter
mais recursos.

Os trens
postais eram os melhores trens existentes na Rússia e, depois, na URSS no
início do século XX.
Circulavam em pouquíssimos trajetos importantes e, devido
ao preço alto da passagem, as pessoas só
recorriam a eles em casos de extrema
urgência ou para mostrar status. Eles mesclavam alta velocidade e
conforto, dispondo de vagões de primeira classe. A terminologia de classes nos
trens foi oficialmente abolida
após a revolução de 1917. Mas se observarmos, no
capítulo respectivo, Rímski fala em 1ª categoria, 2ª categoria
(que remetem à
velha terminologia, apesar de não serem iguais) e no “vagão coletivo duro”, o
equivalente da
antiga terceira classe, que constituía a esmagadora maioria dos
vagões disponíveis nos trens e se chamava
assim por causa dos leitos feitos de
madeira. Os trens expressos só surgiram e roubaram dos postais o título de
melhores trens do país no final da década de 1930.

Poplávski,
o tio de Berlioz, descrito como “um dos homens mais inteligentes de Kíev”,
também viaja em um
vagão superior, o que mostra que devia ser uma pessoa
relevante na sua cidade, provavelmente em virtude da
profissão de
economista-planejador. Por ser de Kíev, no entanto, seu potencial não podia se
desenvolver ao
máximo, e tudo no personagem indica sua posição secundária — e
sua insatisfação com ela.

A cena
final na Torgsin, referida um pouco acima, também destaca os privilégios: o
figurão russo de roupa lilás
se fazendo de estrangeiro consegue comprar peixes
selecionados na Torgsin, enquanto um pobre coitado
velhinho sai de lá com um
docinho só.

O
capítulo mais representativo da questão dos privilégios e do ressentimento que
causavam, porém, é o
capítulo 5, sobre a Casa de Griboiêdov. No começo dele, o
autor “perde tempo” com um diálogo
aparentemente aleatório em que um escritor
esfrega na cara de um reles mortal as vantagens de poder
almoçar no restaurante
exclusivo da associação. O cidadão comum reage com uma resposta genérica,
demonstra um tiquinho de inveja, não chega a se revoltar. Mais tarde, no mesmo
prédio, os escritores
pertencentes à direção da MASSOLIT estão reunidos
aguardando Berlioz, e, quanto mais ele se atrasa, mais
eles começam a lembrar
das desigualdades entre os membros da associação. Incitados pela escritora
Piloto
George, põem-se a trocar indiretas, alfinetadas, e murmurar contra os
ausentes e presentes que ganharam
direito a férias criativas nas casas de campo
da MASSOLIT. É interessante o contraste entre a forma resignada
como o cidadão
comum reage aos privilégios (com que talvez já estivesse acostumado desde o
antigo regime,
aristocrático) e a forma como reagem a eles pessoas que também
são privilegiadas em relação ao homem
médio.

Aliás, as
rixas e a hipocrisia são apenas um dos pontos do comportamento dos escritores
soviéticos que
Bulgákov critica no livro. O ranço que ele tinha desse
ambiente que nunca o recebeu de braços abertos
armou-o de veneno especial ao
tratar deles. Esse ranço aparece na atitude do mestre, que se recusa até a ser
chamado de escritor, preferindo o título “mestre”, e mais tarde convence Ivan
Sem-teto a deixar de ser poeta.
Ivan começa o livro como um poeta típico
daquela época: escrevendo, sob pseudônimo e sob encomenda,
textos que mais se
assemelham a propaganda que a literatura e são criticados como tal, isto é, não
por sua
qualidade artística, mas por terem expressado ou não o que o governo
queria incutir nas cabeças do povo.
Parte da “conversão” de Ivan de ignorante
em intelectual passa por abandonar a escrita nos moldes soviéticos,
deixando
para trás fama e profissão.

A
profissionalização da escrita também é muito criticada por Bulgákov. Não o fato
de um escritor viver da
escrita, até porque ele mesmo escolheu essa vida para
si, mas a forma como isso ocorria na URSS. Para ser
publicado, um escritor
precisava ser filiado a uma associação oficial e seguir suas regras. Bulgákov
claramente
achava ridícula a ideia de se definir um escritor pela posse, ou
não, de uma carteirinha de associação, o que
coloca na boca de Korôviev em um
dos capítulos finais. Quando Korôviev e o gato estão tentando entrar para
almoçar no restaurante da MASSOLIT e a atendente lhes pede suas carteirinhas,
Korôviev tenta enrolá-la
assim:

(…)
Pois bem, para certificar-se de que Dostoiévski é um escritor, acaso é preciso
pedir-lhe uma carteirinha? Pegue quaisquer cinco páginas de qualquer romance
dele e, sem carteirinha nenhuma, terá certeza de que está lidando com um
escritor.
Suponho até que ele nem tinha carteirinha alguma!

A
MASSOLIT satiriza essas associações, particularmente a RAPP (Associação Russa
de Escritores Proletários) e a
MAPP (Associação Moscovita de Escritores
Proletários).

Cabe
notar que a mesma pessoa dirige a MASSOLIT e edita uma revista literária.
Revistas literárias volumosas
eram o principal veículo literário na Rússia
desde o século XIX. Era a publicação nessas revistas que tornava um
escritor
conhecido e lhe dava validação no meio literário, de modo que ela era mais
significativa do que uma
publicação à parte no formato livro. Essas revistas
costumavam ter uma orientação política que permeava
tanto o jornalismo
opinativo, quanto a ficção publicada, e protagonizavam o debate político
intelectual. Por
isso mesmo, após a Revolução, só eram publicadas revistas com
respaldo oficial. Do Império Russo até a queda
da URSS, elas saíam em tiragens
enormes para a respectiva época, e existem até hoje na Rússia, embora não
sejam
mais tão expressivas.

Ora, se a
revista e a associação tinham o mesmo dirigente, um escritor que não cumprisse
com a etiqueta — 
especialmente a ideológica — da associação dificilmente teria
seus textos incluídos na revista por esse
dirigente. Até por uma questão de
sobrevivência, os editores efetuavam uma censura prévia do que
publicariam. Os
textos que chegavam às redações eram perscrutados em busca de passagens que
poderiam
dar problema ou até impedir a aprovação do livro pelo órgão de
censura, as quais se aconselhava ao autor
alterar. Isso quando os editores eram
bonzinhos; em outros casos, podia acontecer o que aconteceu com o
mestre na
história: seu romance começou a ser esculachado na imprensa antes mesmo que uma
página
chegasse aos olhos do público.

Esse zelo
todo não era vão: ninguém queria ser considerado o responsável por trazer um
conteúdo
possivelmente subversivo para a população. Vê-se, no livro, o nervoso
dos trabalhadores do Variété e toda a
cadeia burocrática associada ao teatro
depois que o espetáculo de Woland causa confusão e começam a
investigar quem o
teria autorizado.

Sem
querer acabar na cadeia, os próprios escritores se censuravam e,com frequência,
deslizavam suas críticas
nas entrelinhas. Isso tornou-se mais necessário após a
consolidação do poder de Stálin: o início da década de
1920 foi relativamente
mais relaxado nesse sentido, tanto que, em 1924–25, Bulgákov publicou as
novelas
Diabolíada, Coração de cachorro e Os ovos fatais,
todas sátiras azedas à realidade soviética. O mestre e
Margarida, posterior,
não viu a luz do dia por várias décadas, mesmo com o autor evitando dar nome
aos bois
em alguns pontos, para poder publicar.

A grande
presença oculta que Bulgákov evitou nomear foi a polícia secreta,
à época, a NKVD (antecessora da
KGB). Ela aparece em quase todo capítulo, sem
aparecer jamais. No fim mais óbvia, no começo mais sutil, está
sempre lá. É ela
que investiga e deslinda todo caso dos “hipnotizadores” do apartamento n. 50 e
tenta capturá-
los, sem sucesso. É ela que envia o Barão Meigel para espionar
Woland e sua súcia. É ela que visita o Variété
após o espetáculo para descobrir
o que acontecera. É para ela que Rímski e Varenúkha pretendem levar os
telegramas de Likhodêiev. É sobre ela que o mestre cochicha a Ivan no hospício.
É ela que leva Nikanor
Ivânovitch e os outros membros do comitê predial embora
após a denúncia de que ele tinha dinheiro
estrangeiro. É ela a “bruxaria” que
some com os habitantes do apartamento n. 50 do 302-b da Rua Sadováia.
Ivan
enlouquece tentando capturar o diabo para entregá-lo a ela. É para ela que
Berlioz vai ligar, a fim de
denunciar o “consultor estrangeiro”, um momento
antes de sua morte.

Aliás,
essa desconfiança de Berlioz em relação ao consultor estrangeiro
é um dos muitos detalhes
essencialmente soviéticos desse capítulo inicial do
livro, que já estabelece a atmosfera para todo o resto. Todos
os estrangeiros
eram considerados espiões e sabotadores em potencial, ainda mais falando russo
bem e
circulando sozinhos pela cidade. As visitas de estrangeiros eram
controladas e supervisionadas, e eles tinham
hotéis específicos para se
hospedar, como o Metropol (citado na história) e o Lux. A ideia era mantê-los
relativamente separados do cidadão soviético comum, para evitar que fosse dito,
por algum dos lados, algo
que o outro não devia ouvir.
Cartaz antirreligioso soviético com poema de Demián Bédny. Legenda: "Para o buraco de lixo".

A propaganda antirreligiosa é outro fenômeno essencial do período que aparece cedinho no capítulo 1. Nas
primeiras décadas da URSS, a investida antirreligiosa foi tão grande que se chegou ao ponto de proibir o
festejo de feriados religiosos. Produziam-se materiais, paradas e festividades “comunistas” de cunho
antirreligioso para os dias dessas festas (como o poema de Ivan Sem-teto, encomendado para a Páscoa).
Também se aboliu a semana de sete dias para fins de trabalho, demoliram-se várias igrejas, entre outras
medidas. A semana de sete dias acabou sendo restaurada, assim como o Natal, que continuava sendo
comemorado à revelia por parte da população ainda profundamente religiosa e mística. Esse lado místico da
população também aparece em detalhes do livro: nas velas de casamento e no santinho de papel que Ivan
encontra em uma casa e guarda para si, nas lendas em torno do apartamento “amaldiçoado”, entre outros
pontos.
"Viva a semana ininterrupta!". Anexo à revista "O ímpio junto ao prelo", M. M. Tcheremykh, 1927.

No topo: "A luta contra a religião é a luta pelo socialismo".

A burocracia
também nos espia do primeiro capítulo, quando Ivan e Berlioz, ainda que
desconfiados, se
dispõem a acreditar na identidade sustentada por Woland porque
ele conjurou alguns documentos
justificando sua presença no país. Presente nos
muitos memorandos trocados na história, nos telefonemas
pedindo autorização e
esclarecimentos, nas prestações de contas, nas filas e departamentos, a
burocracia
permeia todo o enredo, embora não constitua o seu centro, como em Diabolíada,
obra em que o autor mais a
atacou.

Mesmo
assim, sua falta de lógica não deixa de ser ridicularizada, sobretudo em três
pontos: (1) quando é o gato
quem examina o documento do tio de Berlioz, para
ver se o autoriza a participar do funeral do sobrinho; (2)
quando o mesmo gato
fornece um atestado ridículo ao vizinho de Margarida, como prova de que ele
passou a
noite no baile de Satanás, transformado em um porco; e (3) quando o
terno vazio de Prókhor Petróvitch,
presidente da comissão de espetáculos,
continua trabalhando como se fosse seu dono, que mais tarde aprova
todas as
resoluções adotadas pelo terno. O episódio é considerado por alguns uma
referência ao livro Istória
odnogô góroda (História de uma cidade), de Mikhail Saltykov-Schedrin, em
que a cidade em questão é
governada por alguns personagens com coisas estranhas
no lugar do cérebro.

Outro
ponto presente nas primeiras linhas do livro é a falta de
itens de diversos tipos na URSS. Ela aparece
quando Ivan e Berlioz se aproximam
de uma banquinha que vende cerveja e água e que, no entanto, não tem
uma coisa
nem outra. A falta, como parte da ideia maior de ausência ou negação, aparece
no texto de muitas
formas, inclusive linguísticas, sobre as quais se falará
mais adiante.

Os
críticos do comunismo gostam de enfatizar uma suposta carência alimentar na
URSS, que de fato ocorreu
em alguns períodos de crise intensa, como na Guerra
Civil ou durante os cercos da Segunda Guerra Mundial,
mas que não era uma
realidade absoluta no país, e isso também pode ser visto do livro. O já
mencionado
restaurante da Griboiêdov e a também mencionada Torgsin eram
exemplos de lugares que serviam comida
de qualidade. Nem todos
os lugares eram assim, claro, vide os alimentos “de frescor secundário” do buffet
do
Variété, que Woland esculacha.
Mas o
livro também cita outros tipos de estabelecimento alimentar
que existiam na URSS e ajudavam a
garantir alimentação saudável para gente que
até antes da revolução nem sonhava com isso. Durante o
período da Nova Política Econômica, permitiu-se a abertura de pequenos
restaurantes por particulares. A
iniciativa foi até estimulada, visto que
dispensava as mulheres de cozinhar em casa. Dentre esses
estabelecimentos,
abriram-se inclusive cantinas dietéticas, estabelecimentos voltados para o
oferecimento de
alimentação saudável, isto é, recomendada para tratamentos de
saúde. Verdade que eram famosos pela
comida desinteressante, devido aos menus
elaborados por médicos para atender as necessidades calóricas da
população e
tratar doenças, sem muita atenção ao sabor. Após o encerramento da NEP, os
funcionários dessas
cantinas migraram para as cantinas dietéticas estatais. O
presidente do conselho de administração predial,
Nikanor Ivânovitch, é
funcionário de uma delas, e esse detalhe é parte importante na formação do
personagem.

Fábrica-cozinha MOSPO n. 1, Av. Leningradski 7, Moscou.2 de janeiro de 1931.

Outro tipo de estabelecimento soviético de alimentação coletiva típico das décadas de 1920–30 é a  fábrica-
cozinha, com as quais Ivan compara ironicamente as instalações avançadas do hospital psiquiátrico. Misto de
cozinhas industriais, bufês e salões de festa, as fábricas-cozinhas distinguiam-se por suas sedes enormes com
andares de destinação específica e equipamento de ponta onde trabalhavam, por vezes, centenas de
empregados. Ofereciam pratos de menus preparados por nutricionistas para comer no local ou refeições pré-
prontas para casa e também supriam os refeitórios de escolas, indústrias, hospitais, etc. Sua estruturação
tecnológica se devia a seu papel ideológico como parte do programa de coletivização de todas as esferas da
vida  e do esforço de libertação das mulheres das amarras do serviço doméstico, e a intenção era que
substituíssem os restaurantes privados e a preparação de alimentos em fogareiros nas cozinhas dos
apartamentos comunais, objetivo nunca alcançado na prática.
"Operárias e camponesas, todas para as eleições! Sob a bandeira vermelha, junto com o homem nas fileiras!

Poremos medo na burguesia!" A. N. Valerianov, 1925.

Havia,
ainda, os refeitórios simples das fábricas e demais locais de trabalho, como o
dos trabalhadores da
comissão de espetáculos no capítulo 17. Isso fazia parte
do estímulo à coletivização de todos os aspectos da
vida. Esse objetivo era
levado a sério na referida comissão, em grande parte graças ao diretor, que
ficava
inventando clubes e círculos para os empregados confraternizarem, em vez
de trabalharem. Korôviev lhes
lança uma praga bem adequada a essa vivência
coletiva forçada: os coitados acabam amaldiçoados a cantar
sem parar em
uníssono, quer queiram, quer não, e vão para o hospício abraçados.

Enfim,
são inúmeras as alusões a fenômenos soviéticos que figuram em O mestre e
Margarida, fazendo-o ser
considerado por muitos um retrato da época
soviética. Mas a obra não para por aí, e tem uma dimensão
universal
que lhe confere ainda mais profundidade e abrangência.

Há três
eixos em que a obra toca questões fundamentais da humanidade: a batalha (ou
antes, da convivência)
entre luz e sombras e seus respectivos
atores e espaços; a disputa do eterno com o temporário; e o processo
de queda
(pecado), castigo e arrependimento. Esses temas se espalham por todas as tramas
da obra, e
convergem no ponto que as une: Woland.

Bulgákov
tinha uma relação complexa com a religião. Seu avô materno era um pope
ortodoxo, sua mãe era
religiosa e ele foi criado conhecendo bem a bíblia e a
religião cristã ortodoxa. Ao cursar Medicina, afastou-se da
religião e se
aproximou do ateísmo; as raízes religiosas permaneceram nele pelo resto da
vida, porém,
transparecendo lá e cá em sua obra. A propaganda antirreligiosa
soviética o irritava, e esse foi um dos motivos
para ele desejar escrever um
romance sobre o diabo, ou sobre Deus e o diabo, como consta de algumas
anotações.

Esse
prelúdio serve para dizer que lhe eram familiares a tradição cristã, tanto a
oficial, quanto a apócrifa, e as
doutrinas básicas da religião. Em vez de focar
na ação do diabo enquanto tentador, porém, a epígrafe do livro
mostra que o
autor preferiu retratar um outro papel de Satanás: mostrá-lo como instrumento
do castigo que
leva ao arrependimento — para quem ainda tem tempo de se
arrepender, o que não é o caso de todos os
personagens. Os castigos que os
personagens recebem nem sempre estão relacionados diretamente com
seus
malfeitos, mas, como vimos na epígrafe, com frequência servem para que eles
aprendam a lição e
mudem de trajetória. Com frequência, após um encontro com
Woland ou um dos seus, os personagens
perdem a cabeça, literalmente, como no
caso dos ateus proselitistas Berlioz e Jorj Bengálski, ou
figurativamente, como
os muitos personagens que foram parar no hospício. A perda da cabeça pode
simbolizar a perda da orientação: eles saem dos eixos em que vinham andando e,
para recuperar um sentido
na vida, precisam recalcular suas rotas.

É em
torno disso que gira a principal tese do livro: de como o mal é necessário
para coibir o avanço do
próprio mal sem que a luz precise deixar de
ser luz, sem que precise sujar as mãos.

O espaço
das trevas, governado por seu príncipe, Satanás, serve ao espaço da luz,
governado por Jesus (ou
Yeshua Ha-Notzri), como se vê em um dos diálogos finais
do livro, quando Levi Mateus vem até Woland para
mandar que ele leve o mestre
consigo e pedir que também leve Margarida. É interessante que um dos casos
tenha sido um pedido, e não uma ordem, apesar de ser um pedido irrecusável.
Ainda assim, não se sente,
nesse diálogo, amizade ou coisa parecida entre os
dois mundos. Woland mal suporta Levi, despreza-o, e o
sentimento é mútuo.

A
ascendência que o reino da luz tem sobre o reino das sombras provém de algo que
não é acessível a esse
último, que só pode servir à justiça pelo castigo: a
misericórdia. Woland não a compreende e mostra pouca
surpresa, mas
certo desprezo sempre que se depara com uma manifestação dessa virtude. Além de
aparecer
em todos os atos de Yeshua Ha-Notzri, essa característica desponta:
quando Levi Mateus se detém um
instante para desprender os outros crucificados
dos postes antes de levar embora o corpo de seu mestre;
quando Pilatos decide
dar um enterro digno aos crucificados e um emprego a Levi; quando as pessoas da
plateia começam a pedir que a cabeça de Jorj Bengálski seja colada de volta; ou
quando Margarida se comove
com a história de Frida e tenta conceder-lhe
perdão — o que Woland, exasperado, não garante que ela
conseguirá conceder
pois, como diz, “Cada departamento deve se ocupar dos seus assuntos”.

Os
espaços de luz e sombras estão bem delimitados no livro, e uma simbologia
paralela os conecta como um
quadro. Por exemplo, a descrição da investigação
conduzida pela polícia contra Woland e que acaba por
espantar seu grupo da
cidade enfatiza que o prédio da polícia estava “iluminado a noite inteira”.
Também não
é coincidência que a equipe de investigação seja formada por doze
pessoas. Andorinhas aparecem em
momentos cruciais da história, tanto no núcleo
de Moscou, quanto no de Pilatos, replicando o a descida do
Espírito Santo em
forma de pomba sobre Jesus no dia do seu batismo, nos evangelhos.

Já quanto
aos símbolos das sombras, pode-se falar dos espelhos. Presentes em várias
cenas, sendo espelhos
genuínos ou semelhanças de espelho (vidraças, água,
etc.), eles servem de portais para os demônios servos de
Woland, reforçando uma
tradição de encarar o espelho como espaço de entrada das forças impuras que
pode
ser conectada ao Inspetor geral de Gógol. Analisar essa
coincidência junto com a famosa citação daquela obra 
— “Não é culpa do espelho
se a cara é torta” — faz ponderar sobre o que os autores tinham em mente quando
apontaram esse utensílio como portal para demônios.

Além dos
castigos propriamente ditos, outra parte do trabalho de Woland e de seus servos
é expor mentiras,
falsidades e hipocrisias, tirar máscaras e revelar a
verdade, sem a qual o arrependimento é impossível. Parece
até
contraditório que eles estejam encarregados de fazer isso, pois mentem sem
parar em quase tudo o que
falam e Woland até exige implicitamente, na atitude
para consigo, certa falsidade (é algo a se observar nos
diálogos dele com
Margarida, por exemplo, que tem que responder como Korôviev ou Azazello
ensinam). No
entanto, essa falsidade intrínseca do grupo — até suas aparências
são disfarces — não os impede de expor, às
vezes pelo prazer da malandragem ou
do escândalo, os disfarces e pecados dos outros.

O ápice
dessa função reveladora se manifesta no capítulo 12, “Magia negra e sua
revelação”, que narra o
espetáculo de mesmo nome montado pela gangue de Woland.
O título promete duas coisas: deslumbrar com
a superstição, coisa antiquíssima,
e destrinchar sua técnica, desmistificando-a em um processo de princípio
ateu
cheirando a novidade, à forma nova como se concebia o funcionamento das coisas.
Afinal, o espetáculo
jamais seria aprovado para exibição para o público
soviético sem a parte da revelação, como alguns
personagens fazem questão de
lembrar. O capítulo é composto a partir de um princípio carnavalesco, com
hierarquias invertidas e
acontecimentos grotescos que abrem espaço para a profanação de tudo e para que
se
arranquem as máscaras da decência.

A magia
negra que o capítulo revela, como se vê pelas últimas cenas, não é a de Woland,
mas sim a do
governo soviético. Mostra-se que, a despeito de todo o progresso
tecnológico, de todo o “aparato” que reveste
a cidade, o novo
homem soviético é uma farsa. Não existe progresso interno. Os moscovitas
soviéticos são tão
dinheiristas quanto os do antigo regime e suas mulheres,
igualmente vaidosas. Revela-se que eles podem ser
cruéis, como quando gritam
para que se arranque a cabeça do apresentador, só porque ele está dizendo
coisas que não querem ouvir (isto é, que o dinheiro que receberam é falso, o
que mais tarde se prova
verdadeiro). Revela-se que suas autoridades com
jeitinho de cidadão de bem vivem vida duplas. Não é à toa
que, no fim do episódio,
quem trocou suas roupas velhas pelas novas bonitonas acaba nu.

Além dos
desmascaramentos individuais, ocorre o desmascaramento da sociedade. O social,
conjuntural e
temporário mostra-se impotente para domar o eterno: a natureza
humana, o Bem (luz), o Mal (sombras).
Nesse sentido, Woland está ali como
representante do eterno, como pedra contra a qual o temporário se
choca… e se
esfacela.

SUTILEZAS
LINGUÍSTICAS

Quando um
autor passa doze anos trabalhando um texto, analisá-lo detidamente é no mínimo uma
questão
de respeito. Só assim podemos encontrar as “coincidências” que o
escritor espalhou por meio de uma
cuidadosa escolha de palavras, reforçando ou
expandindo os sentidos da obra. É ao ver a intencionalidade por
trás de
pinceladas aparentemente casuais que reconhecemos a habilidade do artista.

Em O
mestre e Margarida não é diferente. Passando ao largo da genialidade
cômica de alguns diálogos,
selecionamos aqui quatro sutilezas específicas do
vocabulário usado por Bulgákov no livro que são
particularmente difíceis de
reproduzir em uma tradução. Elas servirão de exemplo de como tudo está
encadeado neste romance.

Este
verbo, sidet’, aparece em momentos cruciais de O mestre e
Margarida, como na cena da primeira
conversa entre o poeta Ivan e o mestre
(capítulo 13), ou no sonho de Nikanor Ivânovitch (capítulo 15).

Acontece
que, em russo, a palavra tem um uso um pouco diferente do que estamos
acostumados: também
significa permanecer ou passar um tempo (sentado ou não) em
algum lugar, em alguma condição. Com esse
sentido, o verbo integra algumas
expressões, como «сидеть в тьюрме» (sidet’ v tiúrme, estar na
cadeia). Às
vezes, na conversa coloquial, nem é preciso usar a expressão
completa: o verbo сидеть, combinado com o
contexto, já sugere a
prisão.

Aí está o
pulo do gato de Bulgákov: ele usa esse verbo para dar um duplo sentido às cenas
supracitadas.

Quando o
mestre pergunta a Ivan «Итак, сидим?» (Itak, sidím?, ou seja:
Então, vamos passar um tempo
conversando?) e Ivan responde «Сидим»
(Vamos), o diálogo também poderia ser compreendido como “Então,
estamos
presos?” e “Estamos”.

Da mesma
forma, na cena de Nikanor Ivânovitch, os espectadores estão sentados no chão.
Quando o
apresentador lhes pergunta «Сидите?» (Sidite?, ou
seja: “Estão sentados?” ou “Estão aqui há algum tempo?”), a
pergunta também
pode ser entendida como “Estão presos?”. Não há dúvidas de que esse
sonho alude à
prisão, e no contexto bem específico das operações de confisco de
dinheiro estrangeiro, sobre as quais já se
falou nesta resenha.

Outra
ideia que permeia O mestre e Margarida é o princípio da negação,
materializada inclusive no Diabo
como um dos principais personagens. Além
disso, a ideia de ausência é, paradoxalmente, muito presente no
livro. Ela se
expressa pela palavra «нет» (niét), que significa “não”, como
até quem não fala russo sabe.

Acontece
que «нет» nem sempre é “não”. Às vezes é a contração de не + есть
(niê + est’), isto é, “não” e o verbo
ser/estar, que também é
usado no sentido de haver.

Considerando
que a ideia de posse, em russo, também é expressada usando esse verbo, com a
construção «у …
есть» (u … est’), o «у …
нет» (u… niét), a expressão também pode significar “…não tem”.
A única coisa que varia
nessa construção é o sujeito que vai ali no lugar das
reticências (eu, você, Maria, as nações, etc.). Então o «у …
нет»
é usado para todas as pessoas da conjugação: eu não tenho, tu não tens, ele não
tem…

Em uma
conversa coloquial, muitas vezes a frase não precisa ser usada inteira, e o «нет»
sozinho faz o trabalho.
E a forma «нету» (niétu) — incorreta segundo a
norma culta, mas muito usada — dá um tom ainda mais
coloquial.

Pois bem.

Bulgákov
faz uso pleno da incrível flexibilidade dessa palavrinha e a utiliza para
conferir unidade aos vários
segmentos do seu livro. O tempo todo alguém não
está (нет) ou não existe (нет) ou não tem (нет)
algo, ou esse
algo não está disponível, isto é, não há (нет). Começa
logo no primeiro diálogo do livro, aparentemente
inocente, mas que alude à
escassez nos primeiros momentos da história soviética:


Dê-me água mineral com gás  —  pediu Berlioz.

Não tem água com gás  —  respondeu a mulher no quiosque, e, por algum
motivo, se
ofendeu. (…)

O «нет»
reaparece com insistência, no mesmo capítulo, quando Berlioz, Ivan e o diabo
debatem a existência de
Deus, de Jesus e do diabo.

Mais
tarde, com os sumidos do apartamento n. 50 e do teatro (Likhodêiev, Varenúkha e
Rímski), o «нет» se
repete para cá e para lá, causando confusão. A
mesma coisa pode ser dita dos documentos ou brindes que o
diabo fornece: quando
alguém vai checá-los novamente — «нет».

O «нет»
dá as caras de novo no sonho de Nikanor Ivânovitch, repetido insistentemente no
fim do capítulo e
dessa vez já significando “não tem” e “não tenho”.
E o vemos pelo menos mais uma vez para indicar a ausência
de Prókhor Petróvitch
do próprio terno, que escrevia sozinho.
Assim
como a ideia de falta ou ausência, a ideia de falsidade também é sugerida pelo
léxico de O mestre e
Margarida, em um jogo de palavras de tradução
quase impossível. E ela começa a se insinuar pelo cenário do
primeiro capítulo,
a saber, a alameda ladeada por tílias do Parque do Patriarca, onde ocorre o
encontro de
Berlioz e do poeta Ivan com Woland. As tílias são citadas
repetidamente nos capítulos que se passam nesse
cenário: “ninguém vinha
para o abrigo das tílias”, “um silêncio se instalou sob as tílias”,
Woland as menciona
especificamente ao dizer que se sente bem no local, a
gargalhada dele espanta os pardais pousados nas tílias…

Acontece
que tília, em russo, é «липа» (lipa), e deriva dela o adjetivo «липовый»
(lípovyi, de tília). Tanto o
substantivo quanto o adjetivo têm
outro significado: falsificado, falso. Não é coincidência: a madeira da tília
era
usada pelos falsificadores para reproduzir os selos oficiais de metal do
Império Russo, por ser maleável e
flexível. As falsificações feitas com essa
madeira ficavam críveis e, quando o método dos falsários se tornou
conhecido na
sociedade por meio das investigações, as próprias falsificações começaram a ser
denominadas
de «липа», tília, por um processo metonímico.

Ora, na
mesma alameda de tílias, no capítulo 3, Berlioz reflete se os documentos
apresentados por Woland
seriam falsos, e emprega exatamente «липовые»
(lípovye, falsificados), em detrimento de sinônimos como
«поддельный»
(poddêlnyi) ou «фальшивый» (falchívyi).

A escolha
não parece randômica, já que esse é o único uso do adjetivo no livro todo.
Parece ter sido intenção
do autor destacar o sentido de falsificação e
atrelá-lo às tílias, que voltarão a aparecer muitas vezes no livro: no
jardim
do restaurante da associação dos escritores; no pátio junto ao porão do mestre;
no quintal da casa de
Margarida; no pátio do Teatro Variété. Há outras árvores
junto — aqui um bordo, lá um salgueiro, acolá uma
bétula — mas as tílias são as
mais insistentes. Aparecem nos principais cenários do livro, e com frequência
precedem a aparição do diabo e seus asseclas. É como se esse elemento do
cenário assinalasse a presença de
algo falso naquilo que se narra, nos eventos
que vão suceder ali, ou, quem sabe, a presença do Pai da Mentira.

A
inexistência do duplo sentido na palavra “tília” em português é o que
inviabiliza a tradução do jogo de
palavras e a percepção dessa leitura
possível — não canônica, porém — desse elemento cenográfico insistente.
Em todo
caso, fica aí a curiosidade, e o convite para os mais aficionados caçarem as
tílias no livro todo e verem
se concordam com essa interpretação.
 

“O diabo
em Moscou” é quase um subtítulo extraoficial de O mestre e Margarida.
Das muitas formas em que o
capeta aparece no livro, a linguística não é a menor
delas. Bulgákov não poupou expressões que empregam o
termo «чёрт» (tchiórt,
demônio), que, dado o contexto, adquirem uma dimensão literal, além da
idiomática.
Com uma piscadela malandra, ele oferece essa ambiguidade ao leitor,
que pode captar o duplo sentido que
escapa aos personagens, e assim enriquece a
veia cômica da obra.

Logo nos
primeiros momentos do livro, após ter o que acredita ser uma alucinação,
Berlioz pensa em “mandar
tudo para os diabos e ir para Kislovódsk”.
Ora, tudo o que ele tem irá, mesmo, “para os diabos”  . Quanto a
Kislovódsk…

E essas
alusões seguem. “Com os diabos”, “Para que diabos”, “Como
diabos” tal e tal, “Vão para o diabo”, “Que o
diabo os leve”…
Esse praguejar corriqueiro pode ser vertido naturalmente ao português e é
encaixado no texto
em pontos cruciais. Ao lado dele, há referências mais
pontuais, como quando o mestre diz que “possui uma
esquisitice diabólica”
(ou demoníaca), ao narrar para Ivan sua tendência de se apegar a pessoas, na
linguagem
de hoje, tóxicas. Em seguida vêm as expressões que não têm
correspondente em português: «к чертовой
матери» (k tchiórtovoi
máteri), para a (casa da) mãe do diabo — que poderia virar “para a…
que o pariu”, mas,
nesse caso, perde-se a referência ao cramunhão — e «к
чертовой бабушки» (k tchiórtovoi bábuchki), para a
(casa da) vó
do diabo. Bulgákov chega a literalizar essa avó da expressão: em um diálogo com
Margarida, que
está esfregando unguento na perna dele, Woland se refere à sua
avó, uma “velhinha pagã” que lhe deixara
como herança ervas medicinais
admiráveis.

De todas
essas expressões, porém, a que apresenta o maior desafio ao tradutor
provavelmente é «чёрт знает»
(tchiórt znáet), (só) o diabo
sabe.

A questão
é que a expressão mais usada em português nas mesmas situações é quase oposta:
“só Deus sabe”.
Vale dizer que o “só Deus sabe” («Бог знает», Bog
znáet) existe em russo, mas a versão com o diabo parece ser
muito mais
prevalente, ao menos nos clássicos (com exceção, talvez, de Gógol). Se a troca
do “só o diabo sabe”
pelo “só Deus sabe” operaria, em
qualquer obra, um indesejável deslocamento de sentido, uma troca de sinais
do
ponto de vista religioso, em O mestre e Margarida, essa operação teria
seus efeitos deletérios multiplicados.

Isso
porque as coisas a que os personagens reagem dizendo que “só o diabo sabe”,
o diabo realmente sabe, no
livro. A quase onisciência de Woland e seus asseclas
é um ponto vital para a construção de seus personagens,
sua função na história
e para o próprio desenrolar dos eventos da trama de Moscou. Ele entra na
história
praticamente dizendo que nasceu há dez mil anos atrás e não há nada
nesse mundo que ele não saiba
demais. Ele sabe como Berlioz morrerá e o que
acontecerá depois, e sua predição é o que faz Ivan crer na sua
identidade
satânica. O grupo sabe tudo que Likhodêiev andava fazendo de errado, sabe que
Rímski e
Varenúkha planejavam entrega-lo à polícia secreta, sabe do adultério
do figurão Archibald Artchibáldovitch, do
dinheiro que o gerente do bufê do
teatro tem escondido, dos pensamentos de Margarida... Como
príncipe das
sombras e força “que sempre faz o bem, embora querendo o mal”, é
sua tarefa saber ao menos os pecados,
maldades e más intenções dos personagens
e as desgraças que lhe acontecerão. Se há uma expressão que
poderia definir o
livro, ela é, justamente, tchiórt znáet.

OS NOMES

E as
pérolas lexicais do livro não se esgotam nos jogos de palavras.

Quem
conhece um pouco da obra de Bulgákov sabe que, na esteira de Gógol e outros
satiristas, ele dá uma
atenção especial à escolha dos nomes de seus
personagens, que com frequência integram o sentido da
história e também
apresentam um desafio à tradução. Em Os ovos fatais, por exemplo, o
sobrenome do
principal causador das desgraças no livro é Rokk, trocadilho com рок
(rok, fatalidade, fado, destino). Por isso, o
título original do
livro, Роковые яйца (Rokovye iaitsá), pode ser entendido
tanto como “Os ovos fatais” quanto
como “Os ovos de Rokk”.
É claro
que essa característica da obra dele não deixaria de aparecer em O mestre e
Margarida. A riqueza de
sentido que os nomes dos personagens acrescentam à
história vale dedicar uma seção desta resenha
somente a eles.

Comecemos
por quem não tem nome: o mestre. As razões para o nome dele
ser omitido são, em parte, dadas
pelo próprio personagem no livro. Ora diz que
perdeu o nome, ora que renunciou a ele. Mesmo no hospital, o
mestre se internou
sem declinar seu nome verdadeiro, pois na investigação relatada no epílogo,
referem-se a
ele apenas como “quarto 18”.

Essa
ausência de nome pode se explicar por diversos motivos. Pode ser uma alusão ao
completo
desaparecimento das pessoas que sofriam com a repressão na época, ou à
completa aniquilação de sua
identidade. Ela também deixa o personagem do mestre
aberto para encaixar nele outros “mestres” em
condições semelhantes, outras
pessoas que se identificassem com seus infortúnios. Essa interpretação é
reforçada pelo fato de o termo “mestre” aparecer em letra minúscula no livro
inteiro, isto é, como substantivo
comum, não como substantivo próprio. A
rejeição da capitalização o nivela também com outros mestres que
aparecem no
livro, como Berlioz, Woland e Ha-Notzri. Mas a principal função que a ausência
de nome cumpre
é colocar sua condição de mestre em primeiro plano, como fator
que domina sobre todas as outras facetas do
personagem.

Quanto ao
termo mestre em si, ele também parece ter uma tríplice acepção. Intérpretes
sugerem uma
conexão com a maçonaria, cujos símbolos também aparecem em vários outros
pontos do livro. Por falta de
familiaridade com a maçonaria e por haver tanto
mais a explorar na história, limito-me a essa menção e
convido o leitor a
procurar trabalhos que analisem a história sobre esse prisma, caso se interesse
pelo tema.
Independente da maçonaria, porém, o termo evoca a relação de mestre
e discípulo, central para o livro — e
para a religião, a filosofia, as
ciências.

Por fim,
mas não menos importante, há a questão da maestria no ofício da escrita. A
vida, a morte e o além-
morte do mestre estão conectados a seu ofício, à sua
obra literária. Isso é algo que o escritor sentia em relação
a si, como se
evidencia de sua biografia, e projetou-o no personagem. Aliás, a seção desta
resenha sobre a
história por trás da obra traz dados biográficos extras sobre a
escolha do “nome” mestre para o protagonista.

Ao seu
lado no título está Margarida (Margarita no
original), cujo nome também está entrançado em muitas
referências. Seu nome vem
do latim margarita e significa “pérola”, além de possibilitar as
referências históricas
explícitas a Margarida
de Valois (1553–1615), última rainha francesa da dinastia Valois e primeira
da casa de
Bourbon, em que ingressou por casamento. Essa suposta ascendente de
Margarida foi uma mulher
interessante e polêmica, uma das primeiras mulheres a
escrever suas memórias, culta e inteligente e com
uma suposta vida sexual
escandalosa sacramentada em torno de sua figura pelo romance de Alexandre
Dumas, A Rainha Margot.
Essas lendas em torno da rainha devem ter motivado sua escolha como primeira
anfitriã do baile anual de Satanás. Para o governo soviético, porém, sua maior
falta parece ter sido o sangue
azul, que transformava a heroína ficcional em
aristocrata por tabela: o parentesco entre Margarida de Valois e
Margarida
Nikolaevna foi suprimido na primeira versão do livro publicado na URSS (1966).

Mas o
nome da personagem não veio da rainha Margot, e sim de Fausto, obra
que Bulgákov adorava,
especialmente na versão
para ópera, que citou no epílogo e que serviu de inspiração para a linha narrativa
dos
dois amantes: a primeira vez que eles aparecem nos rascunhos do autor, são
designados como “Fausto e
Margarida”.

Margarida
é a peça central do pacto fáustico[1] presente no livro.
Ao fazer esse paralelo, no entanto, o autor
subverte a história de Fausto,
pois aqui quem faz negócios com Satanás para conseguir seu amante é
Margarida,
enquanto no poema de Goethe, Margarida era parte passiva, vítima
inocente do pacto feito por
outro. Seu nome é o que mais vezes aparece em O
mestre e Margarida e quase toda a segunda parte do livro é
impulsionada e
protagonizada por ela. Há quem considere que Margarida representa o ser humano
no livro,
enquanto o mestre representaria o conhecimento, e Woland e Ha-Notsri,
o Mal e o Bem, respectivamente.
Assim, o protagonismo de Margarida equivaleria
a um protagonismo do ser humano, a ter o ser humano no
centro dessa história.

Outra
referência a Fausto é o próprio nome Woland. Bulgákov o
emprestou de uma fala de Mefistófeles que,
ao pedir que as forças das trevas
abrissem caminho para ele, refere-se a si mesmo como “Voland”, dizendo:
Junker
Voland kommt! (o nobre Voland está passando). Em uma das primeiras
redações do romance, o nome
no cartão do personagem é Dr. Theodor Voland,
assim, com V. Mais tarde Bulgákov mudou a inicial para W,
conforme se vê da
cena em que Ivan Bezdômni tenta recordar como se chama o consultor que
perseguia.
Esse Voland de Goethe, aliás, viria de “Faland”, um dos nomes
medievais do diabo na língua alemã, que
significa “o maligno”. Em outro momento
do romance em que estão tentando lembrar o nome do “artista
estrangeiro” que
barbarizou no Variété, “Faland” é uma das alternativas apresentadas.

Com esse
artifício de escolher um nome que aparece só uma vez no original do poema e
zero vezes em
muitas das suas traduções, Bulgákov incorporou Mefistófeles no
romance, escondendo-o de todos bem à
vista. Ou de quase todos: o mestre
reconhece-o pela descrição de Ivan e se refere a ele por Voland sem nunca
o ter
encontrado. Vale dizer que Mefistófeles significa “inimigo da luz”, que é
exatamente o papel que Woland
desempenha em O mestre e Margarida, como
se vê do importante diálogo entre ele e Levi Mateus no final do
livro.

Aliás, a
pluralidade de nomes e facetas de Satanás na tradição religiosa e cultural
fornece material para o
escritor nomear e caracterizar praticamente todo o
séquito de Woland. Korôviev, particularmente, apresenta-
se
pela primeira vez no livro pedindo uma esmolinha para “um ex-regente”. Mais
tarde ele se apresenta assim
de novo e efetivamente atua como regente de coro,
enfeitiçando os trabalhadores da comissão de espetáculos
para cantar uma música
tradicional sem parar. Ora, é bem conhecida a versão de que Lúcifer era regente
dos
coros celestiais antes de ser expulso do céu. O nome pelo qual esse
personagem era conhecido no seio do
séquito, Fagote, também aponta sua ligação
com a música.

Seu outro
nome, Korôviev, parece ter sido criado de improviso por ele na hora de se
apresentar para Nikanor
Ivânovitch. Pelo jeito do nome e do personagem, seu
linguajar e comportamento, vê-se que ele estava
querendo representar um russo
(a terminação em -ev o denuncia), talvez para dar segurança a quem
dialogava com o séquito e, como Nikanor, tinha certa prevenção contra
estrangeiros. Woland, Azazello e os
demais têm nomes e aspectos que jamais
poderiam passar por produto local. Korôviev, por sua vez, copia os
maneirismos
de um russo de classe baixa, fala com coloquialismos como ихний (íkhnii,
uma versão do
pronome “dele” que seria equivalente a falar “pobrema” em
português), pede dinheiro para vodca, etc.

Há outra
referência plena de significado escondida pelo nome Korôviev: Teliáev, o
conselheiro de Estado herói
do romance Упыр (Upyr), de
Aleksêi Tolstói, escritor que Bulgákov admirava. Теля (teliá)
é um diminutivo de
teliónok, que significa “bezerro” ou
“novilho”. Korôviev remete a корова (korôva, vaca). O
paralelo entre eles é
reforçado pelo fato de Teliáev se revelar um cavaleiro
vampiro ao fim do livro, algo semelhante ao que
descobrimos sobre Korôviev.
Essa revelação da verdadeira natureza do personagem é curiosa e até
enigmática,
pois o “Fagote” e a regência nos orientam a identificá-lo com um anjo caído, e
então descobrimos
que ele era um cavaleiro condenado a servir de bobo da corte
a Satanás durante alguns séculos por conta de
uma piada blasfema. Como a
revelação acontece no fim do livro, é de se questionar se Bulgákov
simplesmente
não morreu antes de corrigir esse detalhe. Mas ele é chamado de “cavaleiro” por
Hella e outros
personagens em outros pontos do livro, o que enfraquece a
hipótese de se tratar de uma metamorfose
inacabada do personagem.

O gato Beemote
(ou Behemot, Begemot, Beguemot, dependendo da tradução), mascote do grupo,
também
tem nome de origens bíblicas. Trata-se de um monstro citado no livro de
Jó e descrito como muito grande e
forte, invencível:

Contemplas
agora o beemote, que eu fiz contigo, que come a erva como o boi. Eis
que a sua
força está nos seus lombos, e o seu poder nos músculos do seu ventre.
Quando
quer, move a sua cauda como cedro; os nervos das suas coxas estão
entretecidos.
Os seus ossos são como tubos de bronze; a sua ossada é como barras
de ferro.
Ele é obra-prima dos caminhos de Deus; o que o fez o proveu da sua
espada. (…)
Podê-lo-iam porventura caçar à vista de seus olhos, ou com laços lhe
furar o
nariz?
(Jó
40:15–24, Almeida Corrigida Fiel).

Vale
dizer que a mesma passagem, na tradução Almeida Revisada e Atualizada, começa
com “Contempla
agora o hipopótamo (…)”. A identificação do beemote do
livro de Jó com nosso simples hipopótamo é antiga
na exegese bíblica, tanto que
hipopótamo, em russo, é begemot. O autor não deixaria passar a
oportunidade
de usar essa ambiguidade para efeito cômico e, na cena em que Anna
Rítchardovna descreve como seu chefe
sumiu do terno, ela menciona a entrada de
um gato preto, robusto как бегемот (kak begemot), isto é, “como
um hipopótamo”, criando um dos trocadilhos mais difíceis de traduzir do
livro.

Outra
figura com raiz na tradição bíblica é Abadom, que não é
exatamente um membro do séquito de
Woland, mas faz uma ponta ali em momentos
cruciais, isto é, nos que envolvem morte. Ele aparece quando
Woland está
monitorando a guerra no seu globo terrestre mágico, está presente no baile dos
mortos e é
olhando nos olhos dele que o barão Meigel encontra seu fim. Na
bíblia, ele é citado em Apocalipse 9:11 como “o
anjo do abismo”, rei de um
sinistro exército de gafanhotos com características equinas, leoninas e humanas
que vem para causar dano aos homens por um período determinado. “Abadom” vem do
hebraico e significa
“Destruidor”. Ao contrário da maioria dos outros membros
do séquito, que se tornam um pouco mais leves
pela veia cômica, Abadom é inteiramente
sinistro e assusta até Margarida.

Azazello,
por sua vez, tem suas raízes nos livros apócrifos. Há controvérsia sobre o
significado da única
aparição desse nome nas Bíblia (Levítico, capítulo 16).
Mas no apócrifo Livro de Enoque, que trata bastante de
demonologia, Azazel é
apresentado como chefe de um grupo de anjos caídos que se casou com mulheres
humanas e deu origem a gigantes. Ele também é o responsável por ter corrompido
os seres humanos (Livro
de Enoque, 10:8), ensinando-os a fazer armas, joias e cosméticos.
Não é à toa que esse personagem é o
capanga mais violento de Woland, muito
habilidoso com as armas, e é simbólico que seja ele a entregar o
creme mágico a
Margarida. O nome do personagem, porém, tem esse pequeno final que lhe dá uma
cara
italiana. Não se sabe por que Bulgákov quis dar essa ligação com a Itália
ao seu Azazello, mas ela é reforçada
por um diálogo no final do livro em que
Woland elogia Moscou e Azazello retruca que prefere Roma. Talvez
seja porque
Azazel é “o demônio que corrompeu toda a terra”, nos termos do livro apócrifo,
e Roma, “a grande
babilônia, a mãe das prostituições e abominações da terra”
(Apocalipse 17:5, 18).

Hella,
por sua vez, sai da mitologia nórdica. Também chamada de Hel, Hela ou Hell, ela
é a deusa do mundo
dos mortos, descrita como misto de bela mulher e corpo em
decomposição, o que bate com a aparência dessa
membra do séquito de Woland.
Será que foi por se originar em outra mitologia que ela desapareceu nos
últimos
capítulos do livro e não voltou para o reino das sombras junto com Woland e os
outros?

Resta
dizer duas palavrinhas sobre os nomes dos primeiros personagens a aparecerem no
livro, em torno dos
quais gira o núcleo moscovita da história.

Fausto
dá as caras mais uma vez na escolha do sobrenome de Berlioz.
 

O
personagem divide o sobrenome com o compositor romântico francês Hector
Berlioz (1803–1869), que
compôs a ópera “A danação de Fausto”, com base no poema de
Goethe. Sua Sinfonia Fantástica n. 5, “Songe
d’une nuit de sabbat”,
inclui cenas que compartilham motivos com o romance de Bulgákov, como o herói
sonhando com a própria decapitação e o encontro dele com bruxas. A referência
está sacramentada por uma
menção dentro da história, quando Ivan cita o seu
amigo decapitado, no hospício, e os funcionários pensam
que ele se refere a
Hector Berlioz.

O próprio
Ivan Nikoláevitch Ponyrióv, por fim, também tem um nome com significado. Seu
pseudônimo,
Bezdômni, significa “Sem-Teto”. Em uma das primeiras versões do
livro, Bezdômni se chamava Bezródni, que
significa “sem família”, “apátrida” ou
“sem linhagem”, i.e., indicando alguém de origem humilde. Pseudônimos
como o
dele eram comuns entre os intelectuais, políticos e escritores russos da época.
Lenin e Stálin eram
pseudônimos, assim como Górki (“amargo”), cujo nome
verdadeiro era Aleksandr Maksímovitch Pechkov
(1868–1936).

O
personagem de Bezdômni remete principalmente a Aleksandr Ílitch Bezymênski
(1898–1973), poeta
proletário cujo sobrenome verdadeiro soa parecido com
“Bezymiânny”, ou seja, “Anônimo”, e autor de uma
peça que parodiava Os dias dos Turbin,
de Bulgákov. Porém, também pode ser uma referência ao escritor Efim
Aleksêievitch Pridvórov (1883–1925), de pseudônimo “Demian Bédny” (Demian
Pobre), que escrevia folhetos
antirreligiosos, atacando inclusive a pessoa de
Jesus. Comentários indignados sobre a obra dele foram
encontrados no diário de
Bulgákov, confiscado pela polícia secreta.

Se nos
detivermos em cada nome do livro, encontraremos mil curiosidades, como o fato
de que Rímski
significa “romano”, Varenúkha é o nome de uma bebida a base de
vodca e mel, etc., etc. Mas a resenha está
extensa, então é melhor embrulhar
esta seção só com o nome dos protagonistas e outros personagens de
destaque, e
deixar que o leitor tenha o gosto de explorar os outros nomes sozinho, pois
ainda temos mais uma
coisinha pequena para tratar.
BÔNUS: ADAPTAÇÕES

Woland (Oleg Valerianovich Basilashvili) com Berlioz (Aleksandr Artyomovich Adabashyan) e Ivan (Vladislav Galkin)
no Parque do Patriarca. Série “O mestre e Margarida”, 2005.

Volta e
meia assisto às adaptações dos livros que leio e resenho aqui para o site, para
poder visualizar a obra
em outra linguagem e opinar sobre a respectiva versão
para as telas.

O
mestre e Margarida conta com cinco adaptações, e mais uma está sendo
filmada na Rússia, um filme de
nome Woland que deve sair em 2022. Eu,
porém, assisti apenas duas: o filme ítalo-iugoslavo de 1972, dirigido
por Aleksandr Petróvitch,
e a série russa de 2005, com dez episódios, dirigida por Vladimir Bortko, ambas
homônimas do livro.

A
abordagem das duas obras é bem diferente.

A série
repete o livro com uma fidelidade pouco usual, tanto que a maioria dos diálogos
é reproduzida fala por
fala. Por outro lado, pontos meramente insinuados pelo
autor, em uma espécie de autocensura preventiva,
foram expandidos e tratados
abertamente na série, com destaque para a presença e a ação da NKVD.

Margarida (Anna Kovaltchúk) e Korôviev (Aleksandr Gavrilovich Abdúlov) no baile de Satanás.

As
decisões quanto ao elenco parecem ter sido acertadas, de modo geral. Mesmo os
atores que não se
pareciam tanto com as descrições de seus personagens no
livro, como Ivan Sem-teto ou Woland, conseguiram
passar a essência deles.
A trilha
sonora é marcante e casa bem com as cenas.

Agora, em
termos de efeitos especiais, a série fica devendo: o gato Beemote é um boneco
esquisito e pouco
crível e alguns dos trechos do voo de Margarida parecem
efeitos especiais do Chaves. Também não gostei
muito do efeito sépia
aplicado às cenas em Moscou, pois nos rouba do colorido que o livro tem nessa
trama.
Mas entendo a necessidade do diretor de marcar de alguma forma a
transição entre os núcleos, além de usar
a cor para destacar elementos que
gostaria de trazer para o primeiro plano. Esse objetivo foi alcançado.

Ugo Tognazzi (o mestre) e Mimsy Farmer (Margarida) com Korôviev (Bata Živojinović) ao fundo. Montagem do filme
“O mestre e Margarida”, 1972.

Se da
série eu gostei bastante, o filme, por seu turno, não me
agradou. É claro que ele não poderia seguir o
livro à risca por falta de
espaço, mas a estratégia escolhida de misturar a obra com os fatos da biografia
do
escritor que a baseiam não foi bem executada. A cronologia do filme é
confusa, não há atuações marcantes,
mal dá para guardar na mente quem é quem,
os diálogos são desconexos, Azazello e Korôviev, totalmente
diferentes do
livro, e Beemote é só um gato comum. Margarida está a anos-luz de distância
tanto da
personagem quanto de sua modelo e de outras intérpretes, fisicamente e
em personalidade.

Posso
estar deixando passar alguma nuance cult que meu intelecto e meu
escasso background em cinefilia
não conseguiram alcançar. De todo
modo, na minha opinião, mais vale investir nove-dez horas de vida na série
do
que duas nesse filme.

REFERÊNCIAS

ARZAMAS.
Curso Mir Bulgákova (O mundo de Bulgákov). Lido por: Marietta
Tchudakova. Rússia: 2018.
Disponível em: https://arzamas.academy/courses/39.
Acesso em: 3 ago. 2021. Em russo.

BULGÁKOV,
Mikhail. Master i Margarita (O mestre e Margarida). Frankfurt am Main:
Possev, 1969.

IL
Maestro e Margherita. Direção: Aleksandar Petrovic. Produção: Arrigo Colombo.
Intérprete: Ugo Tognazzi,
Mimsy Farmer, Alain Cuny, Bata Živojinović. Roteiro:
Barbara Alberti, Amedeo Pagani, Aleksandar Petrović,
Roman Wingarten. [S. l.:
s. n.], 1972. Disponível em: https://youtu.be/YwA-Yi6rlsM. Acesso em: 3 ago. 2021.

JARINOV,
Nikolai. Bulgákov. Master i Margarita [Íspoved literaturoveda](Bulgákov.
O mestre e Margarida
[Confissões de um crítico literário) [S. l.: s. n.], 2020.
1 vídeo (12 min 54 s). Publicado pelo canal Artifex Ru.
Disponível em: https://youtu.be/Ib2J1Hz0cWQ.
Acesso em: 3 ago. 2021.
KOLYSHEVA, Elena. The Space of Light
and Darkness in the Context of the Creative History of M. A. Bulgakov’s
Novel
The Master and Margarita. In: Current issues of the Russian language
teaching XIV. Mazaryk University.
Brno, 2020. p. 163–173.
Disponível em: https://munispace.muni.cz/library/catalog/chapter/1934/298.
Acesso em 3
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MASTER i
Margarita (minissérie). Direção: Vladimir Bortko. Produção: Anton Zlatopolsky,
Valery Todorovsky.
Intérprete: Anna Kovaltchuk, Aleksandr Gabilin, Oleg
Bassilachvili, Aleksandr Abdulov, Valentin Gaft, Serguei
Bezrukov, Vladislav
Galkin, Aleksandr Filippenko. Rússia: Telekanal Rossiya, 2005.

MIKHAIL
Bulgákov. Jizn i tvortchestvo (Mikhail Bulgákov. Vida e Obra). Istóriia
publikátsii romana “Master i
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“O mestre e Margarida”). Disponível em: http://m-
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Acesso em 3 ago. 2021.

MOREV,
Gleb. Eschió raz o Stáline i Mandelchstame (Mais uma vez sobre Stálin
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NEVES,
Nicolas. O diabo estrangeiro: paródia
e metaficção em O Mestre e Margarida, de Mikhail Bulgákov. [S. l.:
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PARS,
Polina. Master i Margarita: smysly i místika (O mestre e Margarida:
sentidos e misticismo) [S. l.: s. n.], 2020.
1 vídeo (18 min 8 s). Publicado
pelo canal Polina Pars. Disponível em: https://youtu.be/MwITNqEH73Q. Acesso
em: 3 ago. 2021.

RIA
Novosti. Istóriia romana Mikhaila Bulgákova “Master i Margarita”
(História do romance de Mikhail Bulgákov
“O mestre e Margarida”). In
RIA Novosti, 13 fev. 2010. Disponível em: https://ria.ru/20100213/207517719.html.
Acesso em 3. ago. 2021.

SPUTNIK
FM. Potchemú poddêlku nazyváiut “lípoi”, a ne “kliónom”? (Por que
chamam a falsificação de “tília”, e
não de “bordo”?). In: Uróki russkogo (Aulas
de russo). Transcrição de programa de rádio. 30 ago. 2017.
Disponível em: https://bash.news/sputnik/uroki-russkogo/63428-pochemu-poddelku-nazyvajut-lipoj-a-ne-
klenom-7790.
Acesso em 3 ago. 2021.

STÁLIN,
I. V. Telefonnyi razgovor s M. A. Bulgákov 18 aprêlia 1930 goda (Conversa
telefônica com M. A. Bulgákov
de 18 de abril de 1930). Extraído de: STÁLIN,
I. V. Sotchinêniia (Obras). T. 17. Tver: Nautchno-izdátelskaia
kompania
“Severnaia korona”, 2004. S. 612–614 (anexo). Disponível em:
http://grachev62.narod.ru/stalin/t17/t17_400.htm.
Acesso em 3 ago. 2021.

UNIVERSIDADE
Estatal de Tomsk. Curso Tchitáem rússkuiu klássiku vmeste: M. Bulgákov
“Master i Margarita”
(Vamos ler os clássicos russos juntos: M. Bulgákov,
“O mestre e Margarida”). Instrutoras: Tatiana Boríssovna
Bankova e Elena
Andrêievna Iúrina. Rússia: Tomsk, 2016. Disponível em:
https://www.coursera.org/learn/bulgakov-master-i-margarita.
Acesso em: 3 ago. 2021. Em russo.
 
***
[1] Pacto fáustico é um motivo cultural que aparece na
lenda de Fausto e Mefistófeles, que inspirou o livro de
Goethe, e em vários
outros contos folclóricos e obras literárias, como O retrato de Dorian Gray,
de Oscar Wilde,
Dr. Faustus, de Thomas Mann, e Grande Sertão:
Veredas, de Guimarães Rosa.
 

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