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217 REVISTA BRASILEIRA DE

ESTUDOS PEDAGÓGICOS RBEP

Jeron

ISSN 0034-7183
R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 281-441, set./dez. 2006.
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VOLUME 87 | set./dez. 2006

217 REVISTA BRASILEIRA DE


ESTUDOS PEDAGÓGICOS RBEP

Jeron

ISSN 0034-7183
R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 281-441, set./dez. 2006.
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mundo, acrílico sobre tela, 135 cm x 140 cm.
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Rodrigo Godinho A. da Silva | rodrigo.silva@inep.gov.br Avaliada pelo Qualis/Capes 2003 – Nacional A

A exatidão das informações e os conceitos e opiniões emitidos são de exclusiva


responsabilidade dos autores.

PUBLICADA EM DEZEMBRO DE 2006

Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos / Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira.
v. 1, n. 1, (jul. 1944 - ). – Brasília : O Instituto, 1944 -.
Quadrimestral. Mensal 1944 a 1946. Bimestral 1946 e 1947. Trimestral 1948 a 1976.
Suspensa de abr. 1980 a abr. 1983.
Publicada pelo Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, Rio de Janeiro, até o v. 61, n. 140, set. 1976.
Índices de autores e assuntos: 1944-1951, 1944-1958, 1958-1965, 1966-1973, 1944-1984.
ISSN 0034-7183
1. Educação-Brasil. I. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.
REVISTA BRASILEIRA DE
ESTUDOS PEDAGÓGICOS RBEP Sumário/Summary 217

„ APRESENTAÇÃO / PRESENTATION 287

„ ESTUDOS / STUDIES
Família e escola: uma parceria necessária para o processo de letramento 291
Family and school: a necessary partnership for the literacy process
Eulália H. Maimoni
Ormezinda Maria Ribeiro

Movimentos sociais do campo e a afirmação do direito à educação: 302


pautando o debate sobre as escolas multisseriadas na Amazônia paraense
Social movements in the countryside and the right to education:
regulating the debate on multi-grade schools in the Pará Amazon
Salomão Mufarrej Hage

Cooperativismo: alternativa viável para a gestão escolar? 313


Um estudo de caso
Co-operativism: a feasible alternative for school management?
Gerrá Leite Correia de Araújo
Candido Alberto Gomes

A metáfora guerra na comunicação das idéias de HIV/Aids em 327


livros didáticos
The war metaphor in the transmission of HIV/Aids ideas in textbooks
Marta Bellini
Priscila Caroza Frasson

Construção e reconstrução multicultural de identidades docentes: 339


pensando na formação continuada de coordenadores pedagógicos
Multicultural construction and reconstruction of teachers’ identity:
thinking on a continuing education of pedagogical coordinators
Ana Canen
Angela Rocha dos Santos

O "aluno da escola pública": o que dizem as professoras 349


The public school student: what teachers say
Alda Judith Mazzotti
A dimensão estética e democrática da experiência: uma contribuição da 360
filosofia deweyana para novas propostas educacionais
The esthetic and democratic dimension of the experience: a contribution
of Dewey’s philosophy for new educational proposals
Cecília Maria Siqueira Silva

A qualidade de vida de estudantes que ingressam 370


na universidade na meia-idade
The quality of life of students who enter the university in middle age
Denise Maria dos Santos Paulinelli Raposo

Processos de formação de professoras iniciantes 382


Profissional knowledge of peginning teachers
Maévi Anabel Nono
Maria da Graça Nicoletti Mizukami

Profissionalização dos professores universitários: raízes históricas, 401


problemas atuais
The academical teachers’ professionalization: historical roots,
current problems
Renata Aparecida Belei
Sandra Regina Gimeniz-Paschoal
Edinalva Neves Nascimento
Ana Clara Bortoleto Nery

„ CIBEC / DOCUMENTAÇÃO / DOCUMENTATION 411


Teses e Dissertações Recebidas
Theses and Dissertations Received

„ ÍNDICE DO V. 87 / INDEX 417

„ AGRADECIMENTOS / ACKNOWLEDGMENTS 437

„ INSTRUÇÕES PARA COLABORAÇÃO / 439


INSTRUCTIONS FOR COLLABORATION

286
Apresentação

A universalização do acesso e cobertura no ensino fundamental, de um lado, e os


resultados de desempenho revelados pelas avaliações periódicas – Saeb, Prova Brasil –
aliados aos altos níveis de repetência e abandono, de outro, têm colocado na agenda
dos formuladores de política, estudiosos e especialistas em educação a necessidade
imperiosa de adoção de políticas e ações que levem à permanência dos alunos na escola
e a uma educação de melhor qualidade.

A qualidade da educação é um fenômeno complexo envolvendo fatores e dimen-


sões extra-escolares e intra-escolares como têm mostrado estudos sobre a questão, es-
tando essas últimas associadas à infra-estrutura e ao processo de organização do traba-
lho escolar – condições de trabalho, gestão da escola, currículo, formação docente –,
assim como à análise de sistemas e unidades escolares a partir dos resultados obtidos
nas avaliações externas.

As dimensões extra-escolares dizem respeito às determinações e às possibilidades


de superação das condições de vida das camadas sociais menos favorecidas e assisti-
das. Estudos e pesquisas têm mostrado que elas afetam profundamente os processos
educativos e os resultados de aprendizagem, refletidos em problemas como fracasso
escolar, desvalorização social dos segmentos menos favorecidos, a auto-estima dos alu-
nos, entre outros. Isso porque é grande o peso de variáveis como capital econômico,
social e cultural das famílias e dos alunos na aprendizagem e trajetória escolar e profis-
sional dos estudantes.

O mais complicado é que tais determinantes socioeconômico-culturais tendem a


ser naturalizados, levando à crença de que os alunos menos favorecidos são fadados
inexoravelmente ao fracasso ou a uma capacidade de sucesso muito baixa, salvo pou-
cas e excepcionais exceções. Essa crença tende a ser reforçada na escola – antecipando
a exclusão dos já excluídos pela etnia, raça, classe social, capital econômico, social e
cultural e contribuindo na expectativa de aprendizagem – não só pelos profissionais da
escola, mas também pelos pais, alunos e comunidade, que aceitam como normal um
padrão de aprendizagem inferior. A escola acaba por reproduzir as condições
socioeconômico-sociais do entorno em que se localiza, que pode ser traduzido em co-
munidade em situação de desvantagem, escola com baixo padrão de qualidade.

Romper tal círculo vicioso exige o reconhecimento de que a oferta de educação por
tal tipo de escola seja aquela capaz de promover uma atualização histórico-cultural, via
uma formação sólida, crítica, ética e solidária, articulada com políticas públicas de
inclusão e de resgate social. Portanto, além de políticas públicas e projetos escolares e
extra-escolares que possibilitem enfrentar os déficits inerentes ao cotidiano das popu-
lações menos favorecidas, é urgente introjetar em toda a comunidade escolar (no senti-
do abrangente que inclua também pais e alunos) uma visão da educação como direito e
bem social, capaz de contribuir para promover a emancipação dessas populações.

Em termos da escola ela se materializa por meio de projeto pedagógico que contem-
ple a identificação de conteúdos e conceitos relevantes no processo ensino-aprendiza-
gem, a avaliação que subsidie a correção de problemas que afetam a aprendizagem
efetiva, a utilização adequada dos recursos pedagógicos e uma concepção ampliada de
educação envolvendo cultura, esporte e lazer, ciência e tecnologia. E, sobretudo, além do
financiamento adequado para a educação, na valorização da força de trabalho docente e

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 287-290, set./dez. 2006. 287
Apresentação

em sua qualificação que, além da capacitação e atualização técnica, contribua para


substituir a crença na “sina dos desfavorecidos” pela convicção de que é necessário
acolher e confiar na capacidade de aprendizagem e desenvolvimento de alunos menos
favorecidos econômica e socialmente, ajudando-os a superar os obstáculos que têm
condicionado os resultados escolares e comprometido seu futuro.

Nesse sentido, é digno de nota o fato de essa edição da RBEP trazer vários estudos
abordando diferentes aspectos relacionados com a qualidade da educação e as múlti-
plas formas de ofertá-la.

Eulália H. Maimoni e Ormezinda Maria Ribeiro abordam em “Família e escola:


uma parceria necessária para o processo de letramento” questões que envolvem as prá-
ticas de leitura e escrita na escola e a interferência da família nesse processo, conside-
rando as concepções de letramento que subjazem a essa prática e como a família tem
contribuído para a mudança ou para a cristalização das práticas escolares de leitura e
escrita que emergem dessas diferentes concepções. Com base em pesquisas realizadas
na Universidade de Uberaba, são apresentadas as implicações da participação de pais
para a proficiência em leitura e escrita de alunos de ensino fundamental.

“Movimentos sociais do campo e a afirmação do direito à educação: pautando o


debate sobre as escolas multisseriadas na Amazônia paraense” é o tema do artigo em
que Salomão Mufarrej Hage analisa a realidade das escolas multisseriadas na Amazô-
nia paraense, inserindo suas particularidades nos desafios mais abrangentes enfrenta-
dos pelos movimentos sociais populares para afirmar o direito à educação e à vida com
dignidade das populações do campo. Ele socializa os resultados de uma pesquisa que
envolveu estudo bibliográfico e documental e entrevistas com estudantes, professores,
gestores, pais e lideranças comunitárias, com o objetivo de motivar uma discussão con-
seqüente com o poder público e a sociedade civil que resulte num compromisso efetivo
por parte desses órgãos e instituições de incluir em sua agenda política o enfrentamento
do abandono e da precarização que caracteriza o processo de escolarização no ensino
fundamental ofertado nas escolas multisseriadas.

Gerrá Leite Correia de Araújo e Candido Alberto Gomes analisam, em “Cooperativismo:


alternativa viável para a gestão escolar? Um estudo de caso”, os resultados de pesquisa na
Cooperativa de Ensino da Cidade de Goiás e no Colégio Alternativo, na cidade de Goiás,
fundados como resposta à insatisfação de um grupo de pais de camadas sociais médias
tanto com a escola pública quanto com a particular. Os resultados mostram um modelo
no qual todos os atores participam da gestão. Do ponto de vista pedagógico, alcança
eficazmente a apropriação de conteúdos pelos seus alunos para concursos públicos e o
acesso à educação superior, conforme as aspirações dos pais. As despesas revelam que a
remuneração docente é a mais alta da comunidade, porém a contribuição financeira das
famílias é menor que a mensalidade da escola privada.

Em “A metáfora guerra na comunicação das idéias de HIV/Aids em livros didáti-


cos”, Marta Bellini e Priscila Caroza Frasson apresentam o exame das figuras de retórica
destacando as metáforas presentes em nove livros didáticos e uma apostila de ciências
de ensino médio. A seleção dos livros e do tema – HIV/Aids – foi feita a partir de uma
entrevista com roteiro com trinta alunos do ensino médio de uma escola pública de
Bandeirantes, Paraná. Estes alunos indicaram o tema HIV/Aids como um dos assuntos
que queriam conhecer mais. Para a análise das figuras de retórica dos textos didáticos,
as autoras fundamentaram-se nos estudos de Lakoff e Johnson (2002), Breton (2003) e
Reboul (2004). Entre as figuras examinadas destacou-se a metáfora guerra como
condutora do modelo conceitual sobre o HIV/Aids. Esta metáfora, para as autoras, é
imprópria para uma educação preventiva, pois subjuga os leitores/alunos e professores
ao medo e à coerção.

Em “Construção e reconstrução multicultural de identidades docentes: pensando


na formação continuada de coordenadores pedagógicos”, as autoras, Ana Canen e

288 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 287-290, dez. 2006.
Apresentação

Angela Rocha dos Santos, discutem uma pesquisa-ação sobre formação continuada
de coordenadores pedagógicos do Estado do Rio de Janeiro em 2005, desenvolvida
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Secretaria de Estado de Educação do
Rio de Janeiro. Ela focaliza as formas pelas quais a construção e reconstrução identitária
dos sujeitos envolvidos foi buscada na proposta e nos materiais elaborados e apresen-
ta as construções discursivas sobre temas didático-pedagógico-curriculares trabalha-
dos na perspectiva multicultural, no âmbito dos módulos produzidos para o curso,
visando contribuir para reflexões sobre possíveis traduções do multiculturalismo para
propostas didáticas e curriculares concretas em ações de formação inicial e continu-
ada de docentes.

O resultado de outra pesquisa, desta vez sobre “O aluno da escola pública: o que
dizem as professoras”, é apresentado por Alda Judith Mazzotti. A pesquisa investigou
as representações de “aluno da escola pública” construídas por professores da rede
pública de ensino fundamental do Rio de Janeiro. Utilizando a abordagem estrutural de
Abric, concluiu-se que o núcleo da representação é constituído pelos elementos pobre e
aprende a “se virar” sozinho. Cotejando-se estes resultados com os obtidos nas etapas
anteriores da pesquisa, observa-se que, para os professores, o aluno tem que aprender a
“se virar” sozinho porque é pobre e a pobreza implicaria desagregação familiar e luta
pela sobrevivência, impedindo os pais de oferecerem aos filhos a atenção de que neces-
sitam. Dadas todas estas características, esse aluno representaria um desafio para os
professores, desafio este que eles se sentem impotentes para enfrentar.

Cecília Maria Siqueira Silva, em “A dimensão estética e democrática da experiên-


cia: uma contribuição da filosofia deweyana para novas propostas educacionais”, argu-
menta que a continuidade entre experiência e conhecimento, ação e reflexão, indivíduo
e sociedade são os fundamentos da concepção de educação na filosofia deweyana, que
trazem sentido para o questionamento da prática pedagógica e suas relações com a arte.
Analisar a educação como reconstrução contínua da experiência e pensar nos pressu-
postos do hábito inteligente e cooperativo de julgamento, segundo a autora, permite
melhor compreensão da função democratizante que a perspectiva deweyana traz às
propostas educativas.

A partir da constatação de que os estudos sobre o desenvolvimento humano na


idade adulta e o envelhecimento têm instigado o interesse de teóricos do assunto, em
virtude do aumento do tempo de vida da população, Denise Maria dos Santos Paulinelli
Raposo traz o artigo “A qualidade de vida de estudantes que ingressam na universidade
na meia-idade”. Constatando que, entre os anos de 1996 e 2003, houve um crescimento
do número de pessoas que ingressaram na universidade na meia-idade, procura discu-
tir a qualidade de vida de estudantes que ingressam na universidade após os 45 anos de
idade, revisitando estudos de Baltes (1970, 1977, 1990, 1995, 1997, 1999) e Neri (1985,
1991, 1993, 1995, 2002). Os resultados revelam que os respondentes antes de ingressa-
rem no ensino superior vivenciaram um período de estabilidade e que, após seleciona-
rem suas metas e otimizarem suas capacidades de reserva, apresentaram melhorias na
qualidade de vida. Conclui-se, com base nos argumentos relatados pelos estudantes,
que o desenvolvimento deve ser visto sob vários prismas – biológicos, psicológicos,
sociais – e num processo de interação.

Maévi Anabel Nono e Maria da Graça Nicoletti Mizukami analisam os “Processos


de formação de professoras iniciantes” na educação infantil e no ensino fundamental,
mediante o estudo dos relatos dessas profissionais sobre sua trajetória, nos quais elas
descrevem os problemas enfrentados nos primeiros anos de docência e o modo como os
conteúdos foram ensinados.

Em “Profissionalização dos professores universitários: raízes históricas, problemas


atuais”, Renata Aparecida Belei, Sandra Regina Gimeniz-Paschoal, Edinalva Neves Nas-
cimento e Ana Clara Bortoleto Nery analisam os elementos do processo histórico de
profissionalização do ensino superior no Brasil, relacionando-os aos problemas atuais

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dos processos de ensino-aprendizagem. Os resultados apontaram a origem das falhas
desses processos como decorrentes da forma pela qual se estrutura o ensino superior no
Brasil, o que sugere reflexões sobre mudanças no método de seleção de professores,
equilíbrio entre formação didática e pedagógica e formação específica, formas de
ingresso e de atuação docente e incentivo à formação continuada.

Boa leitura!

Oroslinda Maria Taranto Goulart


Diretora de Tratamento e Disseminação de Informações Educacionais
e membro do Comitê Editorial da RBEP

290 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 287-290, dez. 2006.
ESTUDOS

Família e escola: uma parceria


necessária para o processo de
letramento
Eulália H. Maimoni
Ormezinda Maria Ribeiro

Resumo
Aborda questões que envolvem as práticas de leitura e escrita na escola e a interfe-
rência da família nesse processo, considerando as concepções de letramento que
subjazem a essa prática e como a família tem contribuído para a mudança ou para a
cristalização das práticas escolares de leitura e escrita que emergem dessas diferentes
concepções. Com base em pesquisas realizadas na Universidade de Uberaba, são apre-
sentadas as implicações da participação de pais para a proficiência em leitura e escrita
de alunos de ensino fundamental.

Palavras-chave: letramento; práticas de leitura e escrita; família.

Abstract Family and school: a necessary partnership for


the literacy process
This article approaches questions that involve reading and writing in the school and
the interference of the family in this process, considering the conceptions of literacy and
how the family contributes for the change or the crystallization of the schooling practices
of reading and writing that emerge from these different conceptions. According to researches
carried through in the University of Uberaba, the implications of the participation of
parents for the proficiency in reading and writing of basic education pupils are presented.

Keywords: literacy; reading and writing; family.

Compreender, na perspectiva discursiva, como a família tem contribuído para a


não é, pois, atribuir um sentido, mas co- mudança ou para a cristalização das práti-
nhecer os mecanismos pelos quais se põe cas escolares de leitura e escrita que emer-
em jogo um determinado processo de gem dessas diferentes concepções.
significação. A maneira como encaramos nosso ob-
(Orlandi, 1993, p. 117) jeto de estudo interfere no modo como li-
damos com ele; portanto, para iniciarmos
Nossa atenção, neste artigo, estará es- nossa reflexão, é fundamental que façamos
pecialmente voltada para as questões que alguns questionamentos. Assim, começa-
envolvem as práticas de leitura e escrita remos indagando: o que é ler? A família
na escola e a interferência da família nes- do educando compreende o sentido de lei-
se processo. Dois aspectos são essenciais tura tal como a escola à qual confia a edu-
a essa reflexão: as concepções de cação de seu filho? De que forma e quando
letramento que subjazem a essa prática e se pode considerar uma pessoa letrada em

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 291-301, set./dez. 2006. 291
Eulália H. Maimoni
Ormezinda Maria Ribeiro

vez de alfabetizada e, principalmente, copiar o que está escrito no livro ou no qua-


qual a diferença entre ser alfabetizado e dro-de-giz, repetem de forma mecânica a
ser letrado? combinação de sons representados pelas
Pautaremos nossas reflexões tentando letras, mas não estabelecem, em princípio,
responder a essas questões empregando um a relação simbólica que há entre essa com-
caminho oposto: partiremos da última ques- binação sons/letras e a realidade.
tão apresentada para chegarmos à primeira, Em outras palavras, a aprendizagem
de modo a suscitar a compreensão de um da língua escrita não é apenas a transcri-
ponto crucial a nossa reflexão, o que é ler. ção da oralidade, mas está associada às ati-
Uma pessoa pode ser considerada al- vidades discursivas nas quais os indiví-
fabetizada se aprendeu a ler e escrever, mas duos estão envolvidos.
não se apropriou da leitura e da escrita, Se viajarmos na História, vamos per-
incorporando as práticas sociais que as de- ceber que o grande divisor de águas para
mandam. Assim, alfabetizados são aque- a Humanidade foi exatamente a apropria-
les que decodificam o sinal gráfico, que re- ção da escrita. Caminhando no tempo
conhecem as letras, as copiam de forma constataremos que as grandes revoluções
legível, pronunciam os sons que elas re- se fizeram a partir das letras, da "luz" que
presentam, mas não saem desse nível de elas trouxeram ao mundo, em oposição às
compreensão - não são capazes de ''tradu- "trevas", representadas pela ausência de
zir'' em outras palavras aquilo que ''leram'' leitura, pela não apropriação da cultura,
ou ''escreveram''. Letrada é aquela pessoa depositada nos livros e patrimônio sólido
que se envolve nas práticas sociais de lei- e bem guardado daqueles que, coinciden-
tura e de escrita, alterando seu estado ou temente, detinham o poder. Aproximan-
condição do ponto de vista social, cultu- do-nos dos tempos atuais reconhecemos
ral, político, cognitivo, lingüístico e até que a história não mudou. Aquele que
econômico. O letrado não somente detém o poder de comunicação, aquele que
decodifica os sinais gráficos, mas é capaz de fato lê e escreve, detém também o po-
de associar a eles situações específicas de der sobre os demais. Em um mundo car-
um determinado grupo social nos momen- regado de símbolos, no qual a palavra é o
tos distintos de sua história, em dada situ- elemento de poder, não se pode fechar os
ação de interação verbal. olhos para essa questão. Quem lê se so-
Assim, o letramento pode ser enten- bressai aos demais. O grande marco
dido como resultado da participação em divisor ainda é a escrita. Quer seja sobre o
práticas sociais que usam a escrita como papel ou cristal líquido.
sistema simbólico. Ter o domínio da lin- A leitura é, mais do que antes, a cha-
guagem escrita de uma língua não é somen- ve para a ascensão social. A própria trans-
te aprender as palavras, familiarizar-se com formação da sociedade exigiu uma
seus sons e aspectos gráficos, mas apro- redefinição das práticas sociais, que hoje
priar-se de seus significados culturais e, a incluem fazer uso constante da leitura e
partir deles, entender como as pessoas de da escrita como condição para ser um ci-
seu meio social compreendem e interpre- dadão no sentido pleno da palavra. Por
tam a realidade. isso, em nossa sociedade, hoje, é comum,
Portanto, ser alfabetizado não é o mes- por exemplo, crianças ainda ágrafas já se-
mo que ser letrado. Embora se associe le- rem letradas, pois estão rodeadas de ma-
tra a alfabeto e, conseqüentemente, surja terial escrito e já percebem seu uso e sua
a idéia de que alfabetizar é conhecer as função, já adentraram, portanto, ao mun-
letras, a diferença conceitual é bastante do do letramento.
significativa. Esse fato nos leva a compreender a di-
Indivíduos há que reconhecem as le- ferença conceitual entre letramento e alfa-
tras, pronunciam suas combinações, que se betização. Nossas crianças, devido à gran-
apresentam em forma de palavras, frases e de exposição à leitura do universo no qual
até em forma de texto, assinam seus no- estão inseridas, ao contato com as múlti-
mes, copiam outros textos, mas não com- plas possibilidades de leitura, embora en-
preendem o exercício que realizaram. Isso trem na escola sem saber ler e escrever, já
é facilmente perceptível nas crianças em são crianças, de certa forma, letradas.
fase de ''alfabetização''. Elas, embora sejam Ao incorporar esse novo conceito no
falantes da língua na qual estão se alfabe- nosso vocabulário educacional, começa-
tizando, apresentam uma habilidade em mos a compreender, como educadores, que

292 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 216, p. 291-301, maio/ago. 2006.
Família e escola: uma parceria necessária para o processo de letramento

nossa questão não é apenas ensinar a ler desse suporte que sejam diferentes daque-
e escrever, mas é muito mais do que isto: las historicamente escolarizadas.
é possibilitar a plena participação social Bortone e Ribeiro (2000, p. 66) desta-
a partir das práticas sociais da leitura e cam que a prática de leitura na escola fra-
da escrita, que deverão ser desenvolvidas cassa justamente pela forma como é
cotidianamente. operacionalizada. A leitura do texto é tra-
De um modo geral, a escola trabalha balhada linearmente, com a decodificação
com diferentes práticas de leitura. Pela sua de conteúdos a serem avaliados. Soma-se
própria função e especificidade, essas prá- a esses fatores o fato de se reduzir a leitura
ticas diferem de outras práticas de leitura apenas a textos literários, tornando o pro-
no campo social, já que não se trata so- cesso irreal e particularizado. Dessa ma-
mente de uma necessidade da vida coleti- neira, as agências de letramento não con-
va, mas têm como objetivo explícito a for- tribuem no sentido de explicar os usos e
mação de leitores. Todavia, essa as funções sociais da leitura e da escrita.
especificidade da leitura escolar não a As diversidades de práticas discursivas que
desvincula do campo social mais amplo, caracterizam as várias modalidades de lei-
pois a leitura só tem sentido como uma tura são, pois, reduzidas às de prestígio na
prática social porque é parte de uma ca- tradição escolar.
deia de significação, conforme postula E quais seriam as condições para que
Bakhtin (1990, p. 58). a escola desenvolvesse essas habilidades?
Se, por um lado, a escola objetiva a Onde entra a família nesse processo? Qual
formação do sujeito, o que implica todo um é efetivamente o seu papel para a constru-
leque de intencionalidades para formar lei- ção de um processo de letramento ideal?
tores em potencial, por outro, é imprescin- Bortone e Ribeiro (2000, p. 66) afir-
dível a busca de resgatar as funções e usos mam, ainda, que a primeira condição é ga-
sociais da leitura, que vão garantir que esse rantir uma escolarização real e efetiva.
leitor alcance seus objetivos e processos no Toda a escola – direção, professores, corpo
uso da leitura. discente – e as famílias dos alunos deveri-
Contudo, no espaço de sala de aula, am engajar-se em um amplo projeto de
onde as experiências de leitura deveriam leiturização que propusesse formas alter-
se aprofundar, a ênfase recai no processo nativas e produtivas para tornar não só os
de sistematização da leitura, quase que alunos, como também os professores (in-
em detrimento das outras possibilidades, dependentemente de sua área de atuação),
e os responsáveis pelo processo de cada vez mais proficientes nos diversos ti-
letramento ou leiturização acabam em- pos de textos. Desse modo, a leitura não se
pregando como pretextos textos e frag- resumiria à decodificação de sons em le-
mentos de textos retirados quase que ex- tras, mas trabalharia as habilidades
clusivamente de livros didáticos e pro- cognitivas e metacognitivas que incluiri-
pondo uma leitura destinada unicamen- am a capacidade de interpretar idéias, de
te a desenvolver ou avaliar conhecimen- fazer analogias, de perceber o aspecto
tos lingüísticos, no sentido restrito. polissêmico da língua, seus diversos sen-
Nesse caso percebemos que a concep- tidos, entre eles a ironia, de construir
ção de linguagem que subjaz a esse traba- inferências, de combinar conhecimentos
lho é, quase sempre, a de linguagem como prévios com a informação textual, de alte-
expressão do pensamento, ou como instru- rar as previsões iniciais, de refletir sobre o
mento de comunicação, em que o sentido que foi lido, sendo capaz de tirar conclu-
está dado pelo signo lingüístico, sões e fazer julgamentos sobre as idéias
desvinculado de suas condições de produ- expostas, entre outros.
ção e de seus usos e funções reais. Não A segunda condição, para Bortone e
importam as estratégias ou os veículos Ribeiro (2000), é que haja um material de
materiais; a revista e o jornal são trabalha- leitura disponível e de qualidade. Como
dos na mesma lógica que os textos didáti- é possível tornar nossos alunos letrados
cos ou os livros de literatura. Dá-se ênfase sem uma boa biblioteca, sem a leitura de
apenas à capacidade de verbalização da revistas e jornais, ou seja, sem um ambi-
leitura. Suas possibilidades sociais não ente real de letramento? É necessário,
são trabalhadas ou discutidas, uma vez portanto, que os alunos tenham acesso
que a professora, apesar de ciente delas, constante a bons livros didáticos e
não encontrou formas de incorporação paradidáticos, obras técnicas e teóricas,

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Ormezinda Maria Ribeiro

grandes nomes da literatura nacional e Reportando-se ao exemplo que tive-


mundial, dicionários, enciclopédias, jor- ram de aprendizagem, acentuam o papel
nais e revistas, além dos diversos tipos de do ensino no modelo prescritivo e não raro
textos socialmente funcionais, como catá- cobram a aplicação de regras, o ensino da
logos, receitas, ofícios, relatórios, formu- terminologia gramatical, o ''tomar a leitu-
lários, cardápios, legislações, entre outros. ra de cor'', quando reclamam que a escola
O professor não somente ensinaria o ''não está ensinando nada'', que ''em seu
aluno a ler (decodificar) o que o autor dis- tempo não era assim''.
se, mas estaria muito mais voltado para as Esse ciclo de compreensão da leitura
estratégias que propiciassem ao aluno a como habilidade a ser treinada pelo apren-
habilidade de ler o que o autor quis dizer. diz não-leitor, que é a todo o momento ava-
Para desencadear esse processo, é mister liada, empregando-se nas atividades de lei-
que a leitura seja para o aluno um proces- tura o texto como pretexto para a própria
so coerente. A coerência resulta de uma avaliação da fluência, entonação, rapidez,
conexão conceitual cognitiva entre os ele- cujo leitor se mantém passivo diante do
mentos do texto e seu receptor, ou seja, texto, restringindo-se a habilidades que
entre a escolha lingüística e a intenção do precisam de treino e avaliações constantes,
autor, que será facilmente compreendida é completado ao ser repassado para a famí-
à medida que se compreende como se dá o lia e se constitui uma das características
processo de formatação do pensamento na marcantes da leitura no espaço escolar,
língua, e esta correlação só será possível num processo histórico de escolarização do
se o ensino de gramática também estiver letramento, e, segundo Cook-Gumperz
voltado para esse objetivo. (1991, p. 54), foi redefinido dentro do con-
Uma pedagogia da gramática conce- texto de escolarização e se transformando
bida segundo esses princípios poderá re- naquilo que agora chamamos de letramento
duzir consideravelmente a distância entre escolar, isto é, um sistema de conhecimen-
as aulas de gramática e de produção textu- to descontextualizado, validado por meio
al, fazendo com que o aluno comece a pen- de desempenhos em testes.
sar por escrito e não seja somente um mero Acostumada a esse tipo de ensino, a
preenchedor de folhas no exercício de re- família nem sempre se dá conta de que a
dação ou apenas um depositário da nomen- própria sociedade mudou e, conseqüen-
clatura gramatical, mas que no exercício temente, as demandas são outras. O que
da linguagem possa realmente saber quem muitos não percebem é que não foi só o
é o sujeito da ação, posicionando-se como perfil da sociedade que mudou; as crian-
tal (Ribeiro, 2002, p. 321). ças entregues à escola também mudaram.
A análise lógica deveria se fixar como Não são como seus pais ou avós, ou pelo
exercício de descoberta das articulações menos não vivem imersas na mesma soci-
comuns à linguagem e ao pensamento, edade que seus genitores. Já dissemos que
permitindo que se encontre na língua uni- a escola recebe em seu seio crianças que
dades e conexões que correspondam às têm contato intenso com o mundo dos si-
unidades e conexões do pensamento. As- nais, das letras, da informação. São, por-
sim, o aluno será capaz de compreender tanto, iniciadas no letramento; falta siste-
como a mente humana estabelece con- matizar esse processo, papel atribuído à
ceitos, concebe idéias, formula juízos e escola. Nas sociedades urbanas modernas
os encadeia em raciocínios através da lín- não existe grau zero de letramento, pois é
gua, que servirá, então, como roupagem impossível que seus integrantes não par-
para um pensamento que não pode se ma- ticipem de alguma forma das práticas so-
terializar a não ser enformado na língua ciais e culturais no ambiente em que es-
(Ribeiro, 2002, p. 321). tão inseridos. Essas crianças já são falan-
A família, engajada nesse processo, tes da língua na qual serão alfabetizadas;
não poderá deixar de fazer a sua parte, tão não lhes será ensinada, nesse caso, a lín-
importante quanto a da escola. Muitas ve- gua, mas uma variante dessa língua: a va-
zes, no afã de cumprir o seu papel de riante culta, dita padrão. O papel da esco-
cooperadores, pais e mães, desconhecen- la é o de propiciar à criança a aquisição
do alguns aspectos conceituais do proces- de uma nova modalidade da língua: a es-
so de letramento, atuam num sentido con- crita. A sua competência está circunscrita
trário ao da escola que pretende mais do à habilidade de apresentar de modo efici-
que alfabetizar, tornar seu aluno letrado. ente a transposição da modalidade oral

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Família e escola: uma parceria necessária para o processo de letramento

para a modalidade escrita, de forma que o eles poderão apropriar-se das leituras, com
educando perceba suas correlações e di- a possibilidade de, como leitores, produzir
ferenças, dada a natureza de cada uma, e, sentido a partir do texto, levando em consi-
assim, possa se expressar com proficiên- deração seus conhecimentos lingüísticos e
cia nas diversas situações discursivas que de mundo e contextualizando sua leitura
a sociedade lhe impõe. em função de objetivos pessoais ou de ne-
Para as crianças, por um lado, a preo- cessidades sociais?
cupação com o desempenho escolar res- Levando-se em consideração a diver-
tringe, ao invés de ampliar, suas possibili- sidade cultural, pouco se tem feito, na es-
dades de leitura. Os livros comprados pe- cola, no sentido de desvelar as práticas
los pais, em sua maioria, são livros didáti- socioculturais de relação com a escrita dos
cos, cujos textos se prestam, na maior par- diferentes grupos sociais que compõem
te das vezes, para se avaliar a capacidade essa diversidade.
de oralização da leitura feita pelas crian- Na relação família e escola, a família
ças, o que demonstra a apropriação pelos legitima o discurso escolar, buscando ade-
pais da concepção de leitura veiculada quar as práticas culturais familiares às pra-
pela escola. ticas escolares. Castanheira (1991) consta-
Fica a cargo da escola a seleção dos tou que há toda uma preparação para a al-
livros de leitura que as crianças irão ler. A fabetização escolar, antes mesmo que a cri-
ênfase, nesse caso, também recai na con- ança entre na escola.
cepção de que é preciso aprender a ler para A grande importância que essas famí-
só então fazê-lo. lias atribuem à escola é quase unânime.
Nesse processo, são geralmente as Por isso, na leitura para as crianças predo-
mães que ajudam seus filhos nas ativida- mina a concepção escolar. Os pais com-
des escolares. Algumas mães, pela curta pram livros didáticos e avaliam o desem-
trajetória escolar, mostram-se inseguras penho da criança na oralização da leitura.
nessa tarefa, sentindo-se quase incapazes Embora as crianças tenham acesso a revis-
de ajudar seus filhos. tas em quadrinhos, alguns até a fitas de
Essa posição sobre a leitura, que a es- vídeo, os livros de literatura encontrados
cola adota e a família assume, é de certa na família são aqueles emprestados pela
forma cristalizada pelo próprio fetiche do escola, por meio do Projeto Leia Brasil ou
livro de literatura, que se tornou tanto o pela iniciativa pessoal da professora.
simulacro da escola, por ensinar sempre A importância da escola como media-
uma atitude ou um saber à criança, e con- ção cultural, desse modo, apresenta-se
formou-se em atuar como um instrumento como fundamental na formação desses lei-
do ensino, ao ser introduzido na sala de tores. É preciso, no entanto, por um lado,
aula na forma simulada de livro didático. conhecer as práticas, possibilidades e
Segundo Zilberman (1990, p. 100), o potencialidades de leitura com as quais a
livro infantil, mesmo antes de entrar para criança interage em seu meio familiar e
a seleção da escola, sempre teve uma pos- social e, por outro lado, ampliar as práti-
tura pedagógica para inculcação de valo- cas de leitura da escola. Dessa forma, as
res e normas do mundo adulto e sempre crianças poderão reconhecer algumas prá-
apresentou uma forte ligação com os tex- ticas com as quais têm alguma familiari-
tos educativos. dade e conhecer aquelas que não fazem
Na sala de aula, a ação pedagógica pri- parte de seu meio, incluindo a leitura vir-
vilegia resquícios da concepção teórica da tual, que é uma prática cada vez mais coti-
deficiência cultural em que os alunos são diana nas sociedades letradas.
considerados não-leitores, alegando-se a Partindo de uma concepção de leitura
falta do hábito de leitura em suas famílias como produção de sentidos, tendo como
para justificar a ênfase na sistematização fundamento o conhecimento que o leitor
da leitura e a limitação da leitura como tem da linguagem e do mundo, a sistema-
prática social a outros momentos e espa- tização da leitura passa a ser uma parte
ços. Essa perspectiva é comum em proces- importante de um processo mais amplo, que
sos iniciais de alfabetização na escola, envolve as múltiplas possibilidades de lei-
em que, primeiro, aprende-se a ler para, tura produzidas por diferentes sujeitos, com
só então, efetivamente ler. O inusitado é diferentes objetivos e conhecimentos pré-
que os alunos não estão em um processo vios, diante de diferentes tipos de texto e
inicial de alfabetização. Quando, então, em ambientes socioculturais diversificados.

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Eulália H. Maimoni
Ormezinda Maria Ribeiro

À família, atuando de forma conjunta de seis a 16 anos. Esses pais eram estu-
com a escola, caberá o papel de co-partici- dantes de licenciatura da mesma univer-
pante do processo, mediando aprendiza- sidade, no ano de 2001. O procedimento
gens de seus filhos, de modo a garantir que de mediação de aprendizagens de leitura
as crianças possam receber um suporte pre- foi o mesmo nos dois estudos. Consistia
ventivo, em idade de aquisição da leitura em o pai, mãe ou responsável ouvir o alu-
e da escrita. no ler, por cinco minutos, um texto curto
A experiência da aprendizagem medi- escolhido pelo filho, de acordo com o in-
ada caracteriza-se por uma situação de teresse do ouvinte, sobre temas variados
interação entre um adulto, ou colega mais de jornal, revista ou livro, desde notícias
capaz, e um aprendiz. Nela, o agente me- sobre acontecimentos atuais até receita de
diador, que é o mais capaz nesse momen- bolo ou curiosidades, como a invenção da
to, seleciona e ordena as aprendizagens, escova de dente, por exemplo, ou sobre
dando-lhe significados específicos da cul- esportes. Esse procedimento foi adaptado
tura a que pertence, o que, segundo de Topping (1989), que propôs com bas-
Linhares (1995), pode ampliar o seu po- tante clareza como pais podem colaborar
tencial para a mudança ou para a aprendi- com a escola na aprendizagem dos filhos,
zagem. Os estudos de Beyer (1996), ao fazerem o que o autor chamou de "lei-
Linhares (1995) e Baquero (1998), que, tura conjunta" com seus filhos em casa,
apoiados em Vygotsky, relacionam a expe- de uma forma agradável para ambos. O
riência da aprendizagem mediada ao con- mesmo autor (1990, 1994) também elabo-
ceito de zona de desenvolvimento rou e testou um outro procedimento para
proximal, a pesquisa longitudinal de as aprendizagens de escrita, que os pais
Bradley, Caldwell e Rock (1998), que en- podem utilizar, o qual foi adaptado ape-
controu uma relação entre a estabilidade nas para o segundo estudo, com o objeti-
do envolvimento dos pais e a competência vo de proporcionar aos participantes da
escolar dos alunos, e os resultados da pes- pesquisa a oportunidade de, nesse proces-
quisa Construindo trajetórias para a so de mediação, melhorarem o seu pró-
leiturização, desenvolvida na Universida- prio desempenho em produção escrita, na
de de Uberaba por Bortone, Maimoni e Ri- qualidade de estudantes universitários,
beiro (1999-2000), apontaram para a ne- que eram mediados pelos pesquisadores
cessidade de um estudo acerca das ativi- em tarefa de produção de texto. Esse estu-
dades de leitura e escrita, pelo qual os pais do objetivou ainda contribuir em um ou-
universitários envolvidos na pesquisa se tro aspecto para a formação desse aluno
capacitassem a exercer a mediação de universitário: como futuro professor, pre-
aprendizagens para que seus filhos possam tendeu-se que, através da experiência da
ser leitores proficientes. aprendizagem mediada em leitura e escri-
A seguir, passaremos a descrever es- ta, na relação com seus filhos, ele pudes-
ses estudos sobre a mediação de ativida- se utilizar tal procedimento, depois, com
des de leitura e escrita exercida por pais seus alunos. Esperava-se que, em decor-
em casa, com o objetivo de ilustrar melhor rência da sua participação em uma pes-
essa possibilidade. Foram pesquisas reali- quisa dessa natureza, esse professor tam-
zadas na Universidade de Uberaba: a pri- bém ficasse sensibilizado para atuar com
meira1 coordenada por Márcia E. Bortone os pais dos alunos das escolas onde vies-
e a segunda, por Eulália H. Maimoni, ten- se a trabalhar, criando condições
do ambas colaborado nas duas pesquisas. facilitadoras para a colaboração família-
Do primeiro estudo participaram pais escola, evitando as resistências que
de alunos de 2ª série do ensino fundamen- comumente ocorrem nessa interação.
tal, de nível socioeconômico baixo, con- Segundo Klein (1992), uma boa me-
forme critérios de seleção da própria esco- diação deve ter as seguintes característi-
la, já que se tratava de uma instituição cas: focalização, expansão, afetividade,
mantida pela universidade particular aci- recompensa e regulação. Essa autora de- 1
Pesquisa publicada na ínte-
ma referida. Esse estudo compreendeu um senvolveu um programa para mães e gra na Revista da Abrape,
período de dois anos (1999-2000). Do se- cuidadoras de creche, com o objetivo de tendo sido realizada com a
colaboração do bolsista
gundo estudo2 participaram pais universi- promover a qualidade de sua mediação Tiago Olivieri de Paiva.
tários cujos filhos freqüentavam desde a ao lidar com crianças pequenas. No estu- 2
Colaboraram nessa pesquisa
as bolsistas de IC Mylena de
pré-escola até a oitava série do ensino fun- do em referência, pode-se verificar que Lima e Santos e Leila Ban-
damental, portanto, com idades variando esses critérios também estão presentes na deira Matos.

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Família e escola: uma parceria necessária para o processo de letramento

proposta de leitura e escrita adotada. As- os pressupostos vigotskianos, no que diz


sim, quando o procedimento propicia que respeito ao conceito, já referido anterior-
o aluno preste atenção ao texto está foca- mente, de zona de desenvolvimento
lizando a sua atenção, mas para que isso proximal (Vygotski, 1988), que foram tam-
ocorra é preciso que haja reciprocidade por bém os que orientaram os procedimentos
parte desse aluno, que garanta que ele re- de leitura e escrita aqui utilizados, já que
almente esteja com a atenção focalizada, os pais deveriam possibilitar que seus fi-
compreendendo o que lê e não apenas lhos progredissem na compreensão e na
decodificando o texto. Isso fica evidente elaboração de textos, além do que já sabi-
quando é o próprio filho que busca um am fazer sem assistência. Ao ler para o me-
texto do interesse do pai ou da mãe para diador, o aluno podia se sentir avaliado,
ser lido, quebrando com a forma tradicio- mas em um clima de interação diferente
nal de leitura imposta na escola, em que, do que ocorre na escola, pois havia liber-
conforme mostraram em seu estudo dade para errar e assistência de um adulto
Bettelheim e Zelan (1992), os textos esco- mais capaz para suas dificuldades. O que
lares não são interessantes nem para o alu- se propunha era uma nova forma de
no nem para o professor. O segundo crité- interação com a língua escrita, que fosse
rio de Klein também é contemplado pelos mais motivadora e promovesse o desenvol-
procedimentos, quando informações são vimento do aluno, com a mediação de um
acrescentadas pelo mediador, tanto duran- adulto também interessado.
te a leitura como durante a produção de No primeiro estudo, foram realizados
texto, ampliando assim as possibilidades encontros semanais com os alunos, na pró-
de aprendizagem do participante menos pria escola, quando escolhiam, de uma co-
habilitado. No momento em que signifi- letânea de textos variados, aqueles que iri-
cados culturais e emoções são partilhados, am ler em casa para os pais. Nessas ocasi-
a partir da leitura ou da produção escrita, ões podiam relatar para os pesquisadores
o critério afetividade pode ser observado, como estavam acontecendo as leituras e
provocando uma interação prazerosa com para quem estavam lendo, o que se dava
o texto. Como os pais são orientados nes- em um clima de grande interesse. Partici-
se procedimento a nunca punirem os fi- param dessa pesquisa 28 alunos de 2ª sé-
lhos pelos erros, mas a mediarem senti- rie do ensino fundamental, sendo 18 do
mentos de competência, através de expres- sexo feminino e 10 do sexo masculino. Os
sões verbais que mostrem os progressos pais foram orientados a como proceder em
do aluno, promovendo a sua auto-estima reuniões convocadas pela escola.
positiva, o critério chamado por Klein de No segundo estudo, os encontros eram
recompensa está sendo atendido. Por fim, feitos com os pais universitários, quinze-
a regulação aparece quando são utilizados nalmente, na Universidade, quando eles
procedimentos corretivos, que vão dando discutiam suas dificuldades em aplicar os
pistas aos alunos que os aproximem da procedimentos com os filhos. Nesses en-
leitura ou escrita correta, quando eles po- contros, os pais também passavam pelos
dem fazer perguntas de busca a serem res- procedimentos de produção de texto que
pondidas pelo participante mais capaz. iriam aplicar em casa. Participaram desse
Quando nenhum dos dois (pai-filho ou estudo 11 pais, sendo dois pais e nove
mãe-filho) conhece a resposta, ambos pro- mães, e 18 filhos, sendo 15 do sexo mas-
curam, por exemplo, em um dicionário, culino e 3 do sexo feminino.3
para aprenderem juntos como se escreve Embora a proposta de Topping de lei-
uma palavra ou qual é o seu significado. tura e escrita conjunta (Anexos 1 e 2) te-
As perguntas de busca foram estuda- nha como um dos seus objetivos tornar
das por Linhares (1995), em um contexto mais fácil a relação família-escola, mui-
de avaliação assistida, com alunos com di- tas dificuldades se apresentaram nas duas
ficuldade de aprendizagem, em que a ex- situações de pesquisa. Isso ficou eviden-
periência da aprendizagem mediada pos- te tanto nos encontros com os pais como
sibilita que um aluno seja avaliado não em nos encontros com os filhos e, ainda, atra-
relação ao seu nível de desempenho real, vés de um questionário respondido pelos
mas potencial, pois, com a assistência de pais no primeiro estudo. Uma dessas di-
um adulto ou pessoa mais habilitada, esse ficuldades foi em relação à compreensão
3
Participou também desse es-
tudo, como lingüista, a dou-
aluno pode prosseguir além do que é ca- dos procedimentos. Quando se orientava
toranda Ormezinda Ribeiro. paz de fazer sozinho. Seus estudos seguem para que os próprios alunos buscassem

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Eulália H. Maimoni
Ormezinda Maria Ribeiro

textos que fossem do interesse dos seus entregá-los depois, adiando sempre essa
pais, verificou-se que, inicialmente, as entrega, que acontecia somente após mui-
crianças levavam para casa textos de his- ta insistência. Se, na sua relação com os
tórias infantis e, portanto, do seu próprio filhos, pais apresentam a característica já
interesse, que eram muitas vezes longos descrita de transmitir significados e afetos,
e cansavam os pais, depois de um dia e se produzir texto tornou-se uma prática
exaustivo de trabalho em casa ou no em- aversiva para eles, talvez em função de uma
prego. Assim, alguns alunos relataram que história escolar fundamentada em punição
o pai havia dormido durante a leitura. Foi constante para erros de escrita, é possível
necessária, então, a intervenção dos pes- que esses pais estejam transmitindo para
quisadores, organizando, com o auxílio da seus filhos que escrever não pode ser fácil
bibliotecária da escola, uma coletânea de nem dar prazer. Assim, observou-se que
textos curtos, que ficavam arquivados em aqueles pais que apresentavam tal dificul-
uma pasta, entre os quais os alunos esco- dade também não conseguiam trabalhar a
lhiam o que supunham que o pai gostaria escrita com o filho em casa, ficando sem
de ouvir. Esse procedimento foi depois uti- trazer os textos semanais solicitados. Mes-
lizado no segundo estudo, mas foi dada mo o procedimento de leitura, que parecia
maior liberdade para que as mães e os ter sido melhor aceito, nem sempre era apli-
pais, em casa, orientassem os filhos a bus- cado conforme a proposta, segundo seus
carem outros textos em revistas e jornais, relatos nos encontros.
já que havia maior número de contatos Por outro lado, três mães e dois pais
com esses participantes do que na pesqui- que se mostraram assíduos aos encontros
sa anterior, em que os contatos se davam aplicaram os procedimentos de acordo com
mais com os filhos. o que era discutido a partir da proposta fei-
Outra dificuldade que se apresentou ta, e seus filhos (seis alunos) obtiveram os
e que ficou mais evidente nos relatos dos melhores resultados tanto em leitura como
pais participantes da segunda pesquisa foi em escrita. O restante dos pais, embora
em relação à falta de tempo para ouvir a comparecendo aos encontros e procuran-
leitura de seus filhos, já que eram pessoas do aplicar em casa os procedimentos de
que, além de trabalhar, ainda estudavam à leitura e escrita conjunta, conforme propos-
noite, muitas vezes indo do trabalho para ta, tiveram dificuldades relacionadas à fai-
a escola. Assim, as leituras não eram diá- xa etária do filho, que eram ou muito no-
rias, conforme a proposta original de vos, entre seis e sete anos, e ainda não ti-
Topping, realizando-se em torno de duas nham adquirido as condições mínimas para
vezes na semana. Uma das mães incluídas ler e escrever, mesmo tendo transcorrido
no segundo estudo, aluna do Curso de Le- quase um ano letivo, ou eram mais velhos,
tras, desistiu de participar, ainda que con- entre 14 e 16 anos, e não atendiam às soli-
cordasse com a idéia de que aquelas ativi- citações dos pais alegando não gostar de
dades de leitura e escrita poderiam bene- escrever, embora fizessem a leitura algu-
ficiar seus filhos. mas vezes, segundo registro dos pais. Dos
Mesmo com essas dificuldades, os re- dezoito filhos que participaram do estudo,
sultados da primeira pesquisa foram ani- três meninas e três meninos tiveram me-
madores, pois houve melhora significati- lhora significativa após as dez semanas de
va dos alunos que passaram pelo procedi- uso dos procedimentos.
mento de leitura conjunta, em compreen- O mais interessante nesse segundo es-
são de texto, após seis semanas de uso do tudo foram os ganhos obtidos pelos pais,
procedimento. um dos objetivos do estudo, consideran-
No caso do segundo estudo, pode-se do o quanto o estudante universitário apre-
observar que a maioria dos pais mostrou senta de dificuldade para a redação de um
grande resistência para cumprir as tarefas texto. Verificou-se que esses pais e essas
de produção de texto, nos encontros reali- mães mais assíduos aos encontros e que
zados para isso, quando deveriam passar melhor aplicaram os procedimentos foram
pela experiência de aprendizagem em es- aqueles que apresentaram maior progres-
crita, mediada pelos pesquisadores, para so na produção de texto escrito. Eram dois
depois serem os mediadores dos filhos em alunos do Curso de Letras (um pai e uma
casa. Demonstraram desinteresse em parti- mãe), uma aluna do Curso de Pedagogia e
cipar dos encontros para esse fim, faltando um aluno de História. Uma aluna do Cur-
ou não concluindo os textos e deixando para so de Matemática teve pontuação máxima

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Família e escola: uma parceria necessária para o processo de letramento

desde o início, declarando gostar muito de que a escola também pode ser responsável
escrever, e obteve bons resultados com os por isso), no primeiro estudo, o grande in-
procedimentos em casa com seu filho. teresse despertado nos alunos pela ativida-
Assim, parece que até mesmo adultos po- de de ler para seus pais textos escolhidos
dem ser mediados em seu processo de por eles pode ter influenciado os pais a
aprendizagem, possibilidade que tem sido melhor participarem desse processo; tal fato
bastante explorada por Feuerstein e seus ficou registrado nas respostas dos pais ao
colaboradores (Beyer, 1996), em outros questionário que lhes foi solicitado que res-
países, por meio de programas especiais pondessem. Como foram poucos os conta-
para adolescentes e adultos com grande tos pessoais dos pesquisadores com os pais
defasagem de aprendizagem. em reuniões convocadas pela escola, a que
Esse tipo pesquisa, caracterizada nem todos compareciam, o maior
como um experimento formativo, em que envolvimento desses pais no estudo talvez
é feita uma proposta, uma intervenção e é seja explicado mais pela influência e moti-
avaliado o seu efeito, diferencia-se de um vação dos próprios filhos do que pela ação
estudo experimental tradicional, por uti- dos pesquisadores.
lizar o modelo de avaliação assistida, em Um outro dado que merece ser desta-
que os sujeitos que participam do estudo cado aqui se refere à participação do pai.
são avaliados durante o processo de apren- No início da pesquisa, quando os estudan-
dizagem (e não apenas ao final), e são fei- tes universitários foram convidados a par-
tas interferências pelos pesquisadores, a ticipar do segundo estudo, apenas dois pais
exemplo do que fazia Vygotski em seus se apresentaram, sendo um do Curso de
estudos, por acreditar na importância da Letras e outro do Curso de História. Embo-
intervenção de um indivíduo no desenvol- ra se tenha insistido para que os esposos
vimento de outro (Oliveira, 1993). Assim, das alunas também participassem, isso não
o pesquisador não se presta a ser apenas aconteceu como se esperava. Contudo, os
um observador passivo do sujeito, nem dois pais citados tiveram um envolvimento
este fica tão-somente submetido aos pro- muito grande, não faltando aos encontros e
cedimentos da pesquisa, sem poder ex- dando boas contribuições durante as dis-
pressar suas dúvidas e sugestões para cussões. Cada um mediou as aprendizagens
melhorar o processo. No primeiro estudo de um casal de filhos, com idades entre oito
esse papel ativo era desempenhado pelos e dez anos, e tanto a menina como o meni-
alunos e no segundo, pelos pais. no produziram textos cada vez de melhor
Comparando os resultados das duas qualidade, no decorrer do estudo. Isso vem
pesquisas, talvez se possa concluir que o confirmar a necessidade de que a escola
trabalho de intervenção realizado na es- busque mais a colaboração do pai e não
cola, tal como o fez Topping, parece ter apenas a da mãe, como comumente vem
alcançado melhores resultados não só por- ocorrendo. Isso já fora recomendado por
que um maior número de alunos melho- Topping (1990), ao propor os seus procedi-
rou o seu desempenho, como também foi mentos de leitura e escrita conjunta, visan-
possível ter a colaboração de maior quan- do facilitar a colaboração família-escola. Em
tidade de pais mediante o chamamento um estudo brasileiro (Freitas, Maimoni,
para participar da própria escola. Siqueira, 1994), foi verificado que o horá-
Além desses aspectos quantitativos, rio de trabalho do pai mostrou ter relação
deve-se ressaltar também o aspecto com o seu envolvimento na vida escolar do
motivacional relacionado ao envolvimento filho, ou seja, quanto mais tempo o pai tem
de pais na vida escolar do aluno, anterior- disponível, maior é o seu envolvimento. Os
mente estudado por Grolnick e Slowiaczeck pais do segundo estudo trabalhavam e es-
(1994). Esses autores concluíram, entre tudavam, mas encontraram tempo para as
outras coisas, que, se filhos podem ser in- atividades de leitura e escrita com os filhos,
fluenciados pelo comportamento dos pais talvez porque os procedimentos não exigi-
no que se refere à importância que dão à am muito gasto de seu pouco tempo livre.
escola, filhos que tiram boas notas podem Quanto às mães, ou porque tinham afaze-
levar mães a serem mais envolvidas com a res domésticos, além do estudo e trabalho,
escola. Assim, se no segundo estudo o ou por razões ligadas à autoridade sobre o
desprazer dos pais em relação às tarefas de filho ou às suas poucas condições de
escrita parece ter influenciado seus filhos textualidade, nem sempre conseguiam cum-
a não gostar de escrever (sem esquecer de prir as tarefas propostas.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 291-301, set./dez. 2006. 299
Eulália H. Maimoni
Ormezinda Maria Ribeiro

Cabe à escola, munida de informações representa a realização da autonomia do


como essas, proporcionar maior número de sujeito que encontra na leitura não ape-
oportunidades para a participação dos pais, nas a maneira erudita de ver ou de reali-
pois o tempo de uma pesquisa é muito cur- zar o armazenamento passivo das infor-
to, servindo apenas para indicar caminhos. mações, mas também a demonstração con-
Se com apenas poucas semanas foi possí- creta de que é possível saber pensar para
vel obter resultados positivos para os pais compreender e para melhor intervir como
e para os alunos, um tempo maior de ex- cidadão. E para que a leitura se frutifique
posição a procedimentos como esses, ou na devida competência e na devida cida-
outros que a escola possa criar, talvez ame- dania, precisa da escrita, da redação pró-
nize as dificuldades de aprendizagem mais pria, da formulação pessoal, na produção
freqüentes nos meios escolares, que são re- de um outro texto: o texto do próprio lei-
ferentes à leitura e à escrita. tor, pois, em certo sentido, como diz
A urgência de se associar a leitura à Austin, "dizer é fazer".
construção de sentido é ponto básico das É urgente superar a passividade que
diversas pesquisas que realmente domina a sala de aula e buscar na leitura
objetivam trabalhar o letramento como for- (e conseqüentemente na escrita) o seu im-
ma global de aprendizado. A mudança de pacto histórico, fazendo o aluno compre-
atitude do professor, tanto na identifica- ender o contexto socioistórico em que está
ção do processo como no desenvolvimen- inserido, para que, ao fazer parte da cons-
to de uma leitura de construção de senti- trução da leitura, faça parte da constru-
do, somada ao engajamento da família nes- ção da sua própria identidade social. Só
se processo, é, a nosso ver, o ponto de par- assim ele poderá apresentar-se com com-
tida para um trabalho eficiente e realmen- petência própria, realizando-se como su-
te significativo. jeito ativo, crítico e participativo. E nesse
Ora, sabe-se que a leitura implica, ao enfoque a família não poderá jamais estar
mesmo tempo, a competência formal e po- alijada desse processo, como elemento que
lítica e que, nesse quadro, também a escrita é de transmissão cultural.

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Eulália H. Maimoni, doutora em Psicologia da Educação pela Universidade de São


Paulo (US), é professora do mestrado em Educação da Universidade de Uberaba (Uniube).

Ormezinda Maria Ribeiro, mestre em Lingüística pela Universidade Federal de


Uberlândia (UFU) e doutoranda em Lingüística e Língua Portuguesa pela Universidade
Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (Unesp/Araraquara), é professora do Institu-
to de Formação de Educadores da Universidade de Uberaba (Uniube) e coordenadora
da pós-graduação em Lingüística dessa Universidade.
ormezinda.ribeiro@uniube.br

Recebido em 25 de novembro de 2005.


Aprovado em 10 de outubro de 2006.

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ESTUDOS

Movimentos sociais do campo e a


afirmação do direito
à educação: pautando o debate sobre
as escolas multisseriadas
na Amazônia paraense
Salomão Mufarrej Hage

Resumo
Analisa a realidade das escolas multisseriadas localizadas na Amazônia paraense,
inserindo as particularidades dessas escolas nos desafios mais abrangentes que enfren-
tam os movimentos sociais populares do campo para afirmar o direito à educação e à
vida com dignidade das populações. Socializa os resultados de uma pesquisa que en-
volveu estudo bibliográfico e documental e entrevistas com estudantes, professores,
gestores, pais e lideranças comunitárias, com o objetivo de motivar uma discussão con-
seqüente com o poder público e a sociedade civil que resulte num compromisso efeti-
vo, por parte desses órgãos e instituições, de incluir em sua agenda política o
enfrentamento do abandono e da precarização que caracteriza o processo de escolarização
no ensino fundamental ofertado nas escolas multisseriadas.

Palavras-chave: educação do campo; movimentos sociais; escolas multisseriadas;


políticas educacionais.

Abstract Social movements in the countryside and the


right to education: regulating the debate on
multi-grade schools in the Pará Amazon

This article analyzes the reality of multi-grade schools in the Pará Amazon. It inserts
the particularities of these schools within the broader challenges that popular social
movements in the countryside face in asserting the right to education and a dignified life
for rural people. It shares the results of a research project that employed secondary sources
and documents, as well as interviews with students, teachers, administrators, parents
and community leaders. The objective is to motivate an important discussion with the
State and the civil society, which results in an effective commitment on the part of these
organizations and institutions to include in their political agenda an offensive against
the abandonment and precarious conditions that characterize the educational process at
the elementary level in multi-grade schools.

Keywords: countryside education; social movements; multi-grade schools; educational


policies.

302 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 302-312, set./dez. 2006.
Movimentos sociais do campo e a afirmação do direito à educação:
pautando o debate sobre as escolas multisseriadas na Amazônia paraense

Introduzindo a problemática responsáveis pela educação em nosso País


e apresentando os horizontes se façam mais presentes, reconhecendo a
da investigação dívida social, cultural e educativa que têm
para com os diversos sujeitos que vivem
Os movimentos sociais populares do no campo e na floresta; e que seja reco-
campo, nas últimas décadas, têm parti- nhecida a especificidade desses povos e de
cipado ativamente das disputas que en- suas formas de viver e de ser, de formar-
volvem a conquista da terra, o fortaleci- se, socializar-se, aprender, de produzir e
mento da agricultura familiar e a garan- relacionar-se com o conhecimento, com as
tia do direito à vida com dignidade, cons- ciências e as tecnologias, com os valores e
tituindo-se sujeitos coletivos de direito, com a cultura. (II CNEC, 2004, p. 4).
entre os quais se encontra o direito à Uma conquista recente desse proces-
educação. so de mobilização no âmbito das políticas
Nessa caminhada de mobilização e públicas educacionais – envolvendo a par-
protagonismo, a articulação nacional Por ticipação dos Conselhos Estaduais e Muni-
uma Educação do Campo tem assumido cipais de Educação, da SEF/MEC, do
um papel destacado para que não sejam Consed, da Undime, de universidades e ins-
reeditadas as tradicionais políticas de tituições de pesquisa, do Conselho Nacio-
manutenção precária das escolas rurais nal de Desenvolvimento Rural Sustentável
de cunho assistencialista, compensató- e de ONGs – foi a aprovação das "Diretrizes
rio e compassivo, que reforçam o atraso Operacionais para a Educação Básica nas
e o abandono secular da educação dos Escolas do Campo", que se constituem um
povos que vivem da agricultura, do conjunto de princípios e procedimentos que
extrativismo e do trabalho do campo (II visam adequar o projeto institucional das es-
CNEC, 2004, p. 3). colas do campo às políticas curriculares na-
Essa articulação, considerada atual- cionais vigentes, intencionando legitimar a
mente uma das expressões de identidade própria dessas escolas, que deve
mobilização por uma educação do cam- ser definida ancorando-se na temporalidade
po no Brasil, reúne órgãos do poder pú- e saberes próprios dos povos do campo, em
blico, ONGs e movimentos sociais do sua memória coletiva, na rede de ciência e
campo, entre os quais se destacam o Mo- tecnologia disponível na sociedade e nos
vimento dos Trabalhadores Rurais Sem movimentos sociais, contemplando o cam-
Terra (MST), a Confederação Nacional po em sua diversidade social, cultural, polí-
dos Trabalhadores na Agricultura tica, econômica, de gênero, geração e etnia
(Contag), a Conferência Nacional dos Bis- (Resolução 1/2002 do CNE/ CEB).
pos do Brasil (CNBB), a Organização das Outro indicativo desse processo
Nações Unidas para a Educação, a Ciên- organizativo em curso tem sido a pressão
cia e a Cultura (Unesco), o Fundo das sobre as várias instâncias governamentais
Nações Unidas para a Infância (Unicef), para que renovem os processos de gestão
a Universidade de Brasília (UnB), o Pro- da educação, ação que tem resultado num
grama Nacional de Educação na Reforma esforço de determinadas Secretarias de
Agrária (Pronera), o Instituto Nacional de Educação para se tornarem mais sensíveis
Colonização e Reforma Agrária (Incra), o à inclusão da educação do campo em sua
Núcleo de Estudos Agrários e Desenvol- agenda política, criando espaços e situa-
vimento Rural (Nead), o Ministério do De- ções em que as especificidades do campo
senvolvimento Agrário (MDA) e a Coor- sejam reconhecidas e valorizadas. Nessa
denação Geral de Educação do Campo, perspectiva, o próprio MEC tem respon-
do Ministério da Educação. dido a essa mobilização, com a criação,
A primeira e a segunda Conferência em 2004, da Secretaria de Educação Con-
Nacional de Educação do Campo, ocorri- tinuada, Alfabetização e Diversidade
das respectivamente em 1998 e 2004, em (Secad), onde se insere a Coordenação
Luziânia, Goiás, se constituíram marcos Geral da Educação do Campo, que assu-
históricos dessa articulação nacional nes- miu como meta pôr em prática uma polí-
se processo de afirmar o direito das po- tica de educação que respeite a diversi-
pulações do campo à educação, ao reivin- dade cultural e as diferentes experiências
dicar que a educação do campo seja as- de educação em desenvolvimento, em to-
sumida como política pública de manei- das as regiões do País, como forma de
ra mais explícita; que os órgãos públicos ampliar a oferta de educação de jovens e

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Salomão Mufarrej Hage

adultos e da educação básica nas escolas dignidade aos sujeitos do campo, situações
do campo (Secad, 2005). essas que, em geral, são muito pouco
Nos documentos que expressam as investigadas (e sobretudo ocultadas) em
intencionalidades oficiais com relação à face do descumprimento da legislação atu-
definição e implementação de políticas al, que já aponta marcos operacionais da
educacionais, têm-se reconhecida a reivin- qualidade que deveriam ser alcançados na
dicação dos movimentos sociais de conce- educação básica nas escolas do campo.
ber e valorizar o campo em sua diversida- Reconhecendo essa situação
de, "que engloba os espaços da floresta, da estapafúrdia, este artigo foi elaborado com
pecuária, das minas, da agricultura, dos a perspectiva de pautar a discussão sobre
pescadores, dos caiçaras, dos ribeirinhos a problemática que envolve as escolas
e dos extrativistas como espaço de inclu- multisseriadas nesse contexto mais amplo,
são social, a partir de uma nova visão de de mobilização pela garantia do direito à
desenvolvimento" (Secad, 2005). educação que se efetiva a partir da articu-
Não obstante a identificação dos indi- lação nacional Por uma Educação do Cam-
cadores de vitalidade desencadeados atra- po. Ele busca, como intencionalidade,
vés dos processos de mobilização sinali- motivar uma discussão conseqüente com
zados, a situação de penúria vivenciada os órgãos do poder público, com as orga-
pelos sujeitos que estudam nas escolas nizações não-governamentais e, em espe-
existentes no meio rural nos remete a fo- cial, com os movimentos sociais do cam-
calizar e compreender com mais po, que resulte num compromisso mais
radicalidade as contradições que se mate- efetivo, por parte desses órgãos, institui-
rializam entre os discursos inovadores e ções e entidades, de incluir em sua agen-
entusiastas e a realidade existencial que da política o desafio de enfrentar o aban-
revela situações de abandono e dono e a precarização que caracterizam o
descompromisso para com a qualidade da processo de escolarização dos sujeitos do
educação que é ofertada aos sujeitos do campo nas séries iniciais do ensino fun-
campo em nosso país e na Amazônia. damental, ofertado, predominantemente
O descaso com que tem sido tratada a pelo poder público, nas escolas
base do processo de escolarização das po- multisseriadas.
pulações do campo por entidades gover- Para dar consistência à discussão,
namentais e não-governamentais e pelos estamos disponibilizando os resultados de
movimentos sociais do campo se constitui uma pesquisa desenvolvida no biênio 2002-
um exemplo significativo das contradições 2004, que obteve financiamento do CNPq
entre discurso e prática referidos anterior- mediante a chamada de fomento à pesquisa
mente. A pesquisa que referencia a reali- Programa Norte de Pesquisa e Pós-Gradua-
zação deste artigo revelou que, para além ção (PNOPG) (01/2001). A pesquisa envol-
dos indicadores de vitalidade menciona- veu investigação bibliográfica, documental
dos, os sujeitos do campo ainda são obri- e de campo na construção de um Banco de
gados a se submeterem a um processo de Dados que explicita com detalhamento e
escolarização nas séries iniciais do ensino sistematicidade a realidade dramática que
fundamental que se consubstancia como enfrentam educadores e educandos no coti-
uma precarização do modelo seriado ur- diano das atividades educativas vivenciadas
bano de ensino, materializado na experi- nas escolas multisseriadas, situação em que
ência das escolas multisseriadas, que, em se encontram reunidos estudantes de várias
grande medida, se constituem a única al- séries na mesma sala de aula, com apenas
ternativa para que esses sujeitos tenham uma professora.
acesso à escolarização nas comunidades No artigo que ora apresentamos, soci-
em que vivem. alizamos os aspectos mais significativos do
As implicações dessa realidade podem banco de dados mencionado, que, em sua
ser identificadas nos altos índices de anal- íntegra, disponibiliza estatísticas levanta-
fabetismo e exclusão escolar no campo, na das junto aos órgãos oficiais (MEC, Inep,
existência de prédios escolares Saeb e Seduc/PA) relativas às escolas
depauperados, na definição de currículos multisseriadas em cada um dos municípi-
deslocados da realidade, na presença de os do Estado do Pará, tomando como refe-
muitos docentes sem a qualificação neces- rência o ano de 2002, e apresenta informa-
sária e na ausência de um financiamento ções que revelam particularidades do pro-
apropriado que oportunize o estudo com cesso de ensino-aprendizagem realizado

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Movimentos sociais do campo e a afirmação do direito à educação:
pautando o debate sobre as escolas multisseriadas na Amazônia paraense

nessas escolas, identificadas durante a re- estudantes em condições precárias e com


alização de uma pesquisa qualitativa que pouco aproveitamento na aprendizagem.
envolveu estudantes, professores, pais, No Pará, Estado que constitui o locus
mães, membros das comunidades locais e específico onde o estudo se desenvolveu,
gestores das secretarias municipais de edu- os dados apresentados no relatório de pes-
cação envolvidos com as escolas quisa ao CNPq revelaram um quadro alar-
multisseriadas de seis municípios do Es- mante em que as escolas multisseriadas
tado do Pará (Breves, Santarém, Cametá, constituem a modalidade predominante
Moju, Marabá e Barcarena), selecionados de oferta do primeiro segmento do ensino
por pertencerem às diferentes fundamental no campo, atendendo
Mesorregiões do Estado e possuírem o 97,45% da matrícula nessa etapa escolar.
maior número de escolas multisseriadas Nessas escolas, a taxa de distorção idade-
em sua rede de ensino. série é de 81,2%, chegando a 90,51% das
crianças matriculadas na 4ª série, e a taxa
de reprovação equivale a 25,64%, atingin-
Retratos da realidade das do um índice de 36,27% na 1ª série
escolas multisseriadas na (Geperuaz, 2004).
Amazônia paraense Dados do Censo Escolar de 2003 indi-
cam o Estado do Pará com o segundo mai-
A realidade vivenciada pelos sujeitos or número de escolas multisseriadas do
nas escolas existentes no campo denun- País, 8.675 escolas, perdendo somente para
cia grandes desafios a serem enfrentados a Bahia, que tem 14.705 escolas; o mesmo
para que sejam cumpridos os marcos se repete em relação às turmas
operacionais anunciados nas legislações multisseriadas, que totalizam 11.231 tur-
educacionais que definem os parâmetros mas e perde para a Bahia, que tem 21.451
de qualidade do ensino público conquis- (Inep, 2003). Ante essa realidade, a única
tados com as lutas dos movimentos soci- política pública direcionada às escolas
ais populares do campo. multisseriadas é o "Projeto Escola Ativa",
Dados oficiais do Inep relativos ao que atende um percentual de 9,4% das es-
Censo Escolar de 2002 mostram que, no colas multisseriadas do Pará.
meio rural brasileiro: Para além dos indicadores quantitati-
vos apresentados, a precarização das es-
a) 28% dos jovens acima de 15 anos colas multisseriadas se faz notar por um
ainda são analfabetos; conjunto de particularidades que compro-
b) 3,4 anos é a média de anos de estu- metem o processo de ensino-aprendiza-
do nessa mesma faixa etária; gem, as quais foram identificadas durante
c) a distorção idade-série atinge 65% a realização da pesquisa e serão
dos estudantes matriculados; e explicitadas a seguir, com a utilização de
d) somente 25% das crianças de 4 a 6 depoimentos dos próprios sujeitos do cam-
anos são atendidas. po envolvidos com essa realidade.

Apesar de concentrar mais da meta-


de das escolas brasileiras, 97 mil das 169 1. Visão dos sujeitos do
mil existentes, a metade das escolas do campo sobre a existência da
campo ainda é de uma sala e 64% são escola multisseriada
multisseriadas. Em relação aos professo-
res, boa parte dos que ensinam no campo Atentar para a visão dos sujeitos do
tem formação inadequada, e apenas 9% campo sobre as escolas multisseriadas é
completaram o ensino superior. importante, para que possamos conhecer
No caso da Amazônia, locus ampli- suas expectativas e interesses com relação
ado da pesquisa realizada, a situação no à escola que lhes tem sido oferecida e in-
campo é preocupante, pois 29,9% da po- corporar os aspectos significativos dessa
pulação adulta são analfabetas; 3,3 anos representação nas políticas educacionais
é a média de anos de escolarização des- a serem direcionadas ao meio rural.
sa população; e 71,7% das escolas que A pesquisa identificou aspectos posi-
oferecem o ensino fundamental nas sé- tivos e negativos, no depoimento dos su-
ries iniciais são exclusivamente jeitos entrevistados, com relação a essa
multisseriadas, atendendo 46,6% dos questão:

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 302-312, set./dez. 2006. 305
Salomão Mufarrej Hage

– A escola multisseriada é boa por uma em seriadas, como alternativa para que o
parte e por outra não. É boa porque sucesso na aprendizagem se efetive.
pelo menos as crianças estão apren-
dendo. Todo dia a minha filha pode ir
para a escola. Mas, eu acho que essa 2. Condições existenciais
escola está precisando de ajuda, pre- das escolas multisseriadas
cisando de apoio. O fato negativo que
eu vejo é que não há cada um na sua Os sujeitos entrevistados entendem
série. Cada um na sua sala seria me- ser as condições existenciais das escolas
lhor. Eles estudam todos juntos, eu um dos fatores cruciais que compromete
acho que isso não é certo, mas a pre- a positividade do processo ensino-apren-
cisão está obrigando. (Mãe e partici- dizagem no meio rural e, em especial, nas
pante da comunidade R. F. N.) escolas multisseriadas, que têm sido
marcadas pelo abandono e precarização,
– Deveria ter uma escola onde tivesse sé- conforme podemos identificar nos seguin-
ries separadas e uma professora para tes depoimentos:
cada série. Não é muito boa uma escola
assim, com várias séries juntas, porque – A situação é muito séria. O lugar é
o aluno tem muita precisão de apren- muito pequeno, não é apropriado, ele
der e desse jeito é difícil. (Mãe O. F. A.) é da comunidade. Se chover, molha. É
arriscado para a própria criança pegar
Entre os aspectos positivos, identi- uma doença, porque ela vem direto
ficamos que as escolas multisseriadas para o chão e aqui passa bicho, rato,
oportunizam o acesso à escolarização na lagarto e cachorro. (Prof. J. M.)
própria comunidade, evitando que os es-
tudantes, em sua maioria crianças e ado- – Nós trabalhamos com até 3 ou 4 crian-
lescentes, enfrentem dificuldades de des- ças numa carteira. Isso complica o nos-
locamento envolvendo longas distânci- so trabalho, porque a gente está expli-
as, tranqüilizando os pais nesse aspecto. cando para um, o outro já está "profes-
A escola multisseriada também sora, meu colega está sacudindo a ca-
oportuniza o apoio mútuo e a aprendiza- deira e não deixa eu copiar direito".
gem compartilhada, a partir da convivên- Como é que vamos resolver isso, três
cia mais próxima estabelecida entre es- crianças sentadas numa carteira? A
tudantes de várias séries e idades na questão da lousa melhorou, porque a
mesma sala de aula, o que em determi- gente conseguiu outras. Mas, antiga-
nados aspectos é considerado salutar. mente era só uma lousa para três, qua-
Para além das questões mencionadas, a tro séries, a gente dividia um pedacinho
existência da escola no próprio lugar em para cada uma. (Profª K. A. D.)
que os sujeitos vivem (no campo) tem
sido reivindicada pelos movimentos so- – Eu venho de casco para a escola e às
ciais do campo, com a convicção de que vezes eu tenho que vir contra a maré e
o povo tem direito a uma educação pen- fico muito cansada. Às vezes tem muita
sada desde o seu lugar e com a sua parti- maresia e, quando chove muito, eu não
cipação, vinculada à sua cultura e às suas venho para a escola. (Aluna R. C. S., 13
necessidades humanas e sociais. anos, 4ª série)
(Caldart, 2000).
Por outro lado, há posicionamentos – No momento não tem merenda. Quan-
que expressam insatisfação com relação do tem, a diferença é muito grande na
à existência das escolas multisseriadas, sala de aula e não falta nenhum aluno.
considerando-as um "problema", por cau- No interior, o dia-a-dia é muito traba-
sar prejuízos ao processo de aprendiza- lhoso, há criança que sai de sua casa e
gem. Em muitos casos, os sujeitos se refe- não toma nem café e vem pensando
rem a essas escolas como "um mal neces- chegar na escola e merendar um
sário" e estabelecem muitas comparações pouquinho. (Profª K. A. D.)
entre elas e as turmas seriadas, ao abor-
darem o ensino -aprendizagem que Os depoimentos revelam que a preca-
ofertam, manifestando a expectativa de que riedade da estrutura física das escolas, as
as escolas multisseriadas se transformem dificuldades dos professores e estudantes

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Movimentos sociais do campo e a afirmação do direito à educação:
pautando o debate sobre as escolas multisseriadas na Amazônia paraense

em relação ao transporte e às longas dis- enfrenta, porque ele não fica só cui-
tâncias percorridas e a oferta irregular da dando do plano de aula. Ele pensa no
merenda são alguns dos fatores que provo- todo da escola. Ele tem que resolver
cam a infreqüência e a evasão e prejudi- todos os problemas pendentes da clas-
cam a obtenção de bons resultados no pro- se na secretaria de educação. Eu acho
cesso ensino-aprendizagem, sendo, portan- que tudo isso prejudica o ensino.
to, fatores que contribuem para o fracasso (Prof. R. V. A.)
escolar que se evidencia nas escolas do
campo e particularmente na multissérie. – As dificuldades que envolvem os pro-
De fato, estudar nessas condições des- fessores das escolas multisseriadas são
favoráveis não estimula os professores e muitas porque o quadro maior é de con-
os estudantes a permanecer na escola ou tratados e isso é muito influenciado por
sentir orgulho de estudar em sua própria questões políticas. A cada ano troca,
comunidade, fortalecendo ainda mais o aqueles que estão lecionando saem,
estigma da escolarização empobrecida que muda o quadro de professores e há uma
tem sido ofertada no meio rural e incenti- ruptura no processo. (Técnica da Semed
vando as populações do campo a buscar J. C. M.)
alternativas de estudar na cidade como
solução dos problemas enfrentados. – A presença da Secretaria em nossa co-
Buscando enfrentar essa dificuldade, munidade é ausente, pois durante eu
as Diretrizes Operacionais para a Educa- morar nesse local, há mais de 30 anos
ção Básica nas Escolas do Campo indica eu desconheço a presença da Secreta-
o cumprimento da atual LDB, que deter- ria de Educação em nossa comunida-
mina a diferenciação do custo-aluno com de. (Mãe e integrante da comunidade
vista ao financiamento das escolas do A. M. N. S.)
campo considerando o atendimento das
exigências de materiais didáticos, equi- – A Secretaria fornece o barco, óleo, ali-
pamentos, laboratórios e condições de mentação e o motorista, mas ainda as-
deslocamento dos alunos e professores sim tenho grande dificuldade para fa-
apenas quando o atendimento escolar não zer o assessoramento pedagógico por
puder ser assegurado diretamente nas co- causa da distância. A escola mais pró-
munidades rurais (Resolução 1/2002 do xima fica a oito horas de barco da cida-
CNE/CEB, art. 15, II). de, temos que sair às 5h da manhã e
passamos 3, 4 ou 5 dias para lá e nem
conseguimos visitar todas as escolas.
3. Trabalho docente e (Técnica da Semed I. C. S.)
acompanhamento das
Secretarias de Educação às – É um pouco difícil a relação com a Se-
escolas multisseriadas cretaria de Educação porque eles têm
algumas restrições. Professor do inte-
O desenvolvimento do processo ensi- rior fala com a Secretaria só tal dia, e
no-aprendizagem nas escolas multisseriadas isso fica meio difícil, para a gente ir
tem sido muito influenciado pelas parti- daqui e chegar lá, porque perdemos
cularidades que caracterizam o trabalho aula. Nos sentimos em 2º plano na hora
docente e o acompanhamento das Secre- de ser atendido; primeiro as escolas
tarias Estaduais e Municipais de Educa- seriadas da cidade, depois as escolas
ção às escolas do campo, conforme indi- do interior. Eu acho que a escola da
caram os sujeitos entrevistados durante cidade é a vitrine para a sociedade. A
a pesquisa: sociedade organizada está lá, então,
eles procuram colocar o que há de me-
– Na escola multisseriada, normalmen- lhor na vitrine, e depois vem o interi-
te é um professor só e ele tem que ser or, pois aqui não tem ninguém vendo
servente, fazer e servir a merenda, ser e não vai interessar politicamente para
tudo. Além da dificuldade de atuar eles. (Prof. R. V.)
em várias séries ao mesmo tempo,
existe a dificuldade extraclasse que é Identificamos por meio dos depoimen-
de: cuidar da escola, de tudo. Essa é tos explicitados que as condições adver-
a grande dificuldade que o professor sas presentes no cotidiano das escolas

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 302-312, set./dez. 2006.


307
Salomão Mufarrej Hage

multisseriadas impõem aos professores 4. Planejamento do


uma sobrecarga de trabalho, forçando-os a currículo e organização do
assumir um conjunto de outras funções trabalho pedagógico nas
para além da docência na escola. Entre as escolas multisseriadas
funções diagnosticadas na investigação
encontram-se as de faxineiro, líder comu- No entendimento dos sujeitos do cam-
nitário, diretor, secretário, merendeiro, po, o sucesso na aprendizagem dos estu-
agricultor, agente de saúde, parteiro, etc. dantes nas escolas multisseriadas em mui-
Nessas escolas, o trabalho docente tem to se relaciona com a adequação do pla-
pouca autonomia em face das questões nejamento curricular e a organização do
políticas que envolvem o poder local e in- trabalho pedagógico, conforme indicam os
terferem na dinâmica das secretarias de depoimentos seguintes:
educação, submetendo os professores a
uma grande rotatividade (mudança cons- – O planejamento não está dando para
tante de escola) em função de sua instabi- fazer escrito no papel, porque é
lidade no emprego. multisseriado e eu teria que realizar
Além dessas particularidades, os pro- um para cada série, e isso leva muito
fessores, pais e integrantes das comunida- tempo, e eu não estou tendo esse tem-
des envolvidos com as escolas po. Então a gente trabalha baseado no
multisseriadas se ressentem do apoio que livro didático. (Prof. D. C.)
as Secretarias Estaduais e Municipais de
Educação deveriam dispensar às escolas do – Faço o planejamento por série. Eu pego
campo e afirmam ser estas discriminadas o livro didático e tem muita coisa nele
em relação às escolas da cidade, que têm que é baseado mais para os alunos da
prioridade em relação ao acompanhamen- cidade. A gente muda muita coisa.
to pedagógico e formação dos docentes. No (Profª E. S.)
entendimento desses sujeitos, essa situa-
ção advém do descaso dessas instâncias – Eu trabalho só num período, de 7 às
governamentais para com as escolas 11h, com seis séries. Eu organizo o tra-
multisseriadas. Por parte do pessoal que balho na sala de aula assim: todo dia,
atua nas secretarias de educação, as justi- eu levo os cadernos dos menores (jar-
ficativas em relação à falta de acompanha- dim II e III) para casa. Lá eu passo as
mento pedagógico advêm da falta de es- atividades para eles. Chegando aqui,
trutura e pessoal suficiente. eu dou o caderno para eles e depois
Essas situações, em seu conjunto, têm vou passar as atividades para a 1ª, 2ª,
motivado as entidades representativas do 3ª e 4ª série. Quando uma está termi-
movimento social do campo a reivindicar nando, eu mando aguardar um
a valorização e formação específica de pouquinho, enquanto atendo a outra
educadoras e educadores por meio de uma que já acabou. Eu procuro ao máximo
política pública permanente que priorize me esforçar para cumprir as ativida-
a formação profissional e política de edu- des, usando os três quadros, apesar de
cadores e educadoras do próprio campo, ser difícil cumprir os conteúdos, de-
gratuitamente; a formação no trabalho que vido serem muitas séries. Eu sinto di-
tenha por base a realidade do campo e o ficuldade para pôr em prática o pla-
projeto político-pedagógico da Educação nejamento. São seis turmas, o tempo
do Campo; incentivos profissionais e con- que estou explicando para uma, as ou-
curso diferenciado para educadores e edu- tras crianças já estão dizendo: "profes-
cadoras que trabalham nas escolas do sora, já acabou minha atividade; a se-
campo; garantia do piso salarial profissi- nhora ainda não vem explicar para
onal nacional e de plano de carreira; for- mim?" A gente tem que ter aquele fô-
mas de organização do trabalho que qua- lego, para reparar todas as turmas.
lifiquem a atuação dos profissionais da (Profª K. A. D.)
Educação do Campo... tendo a clareza da
necessidade de regulamentar o regime de – Uma das maiores dificuldades no
colaboração e cooperação entre as três multisseriado é a leitura. Existem cri-
esferas do Poder Público quanto à sua res- anças na 2ª, 3ª e até 4ª série que não
ponsabilidade na implementação das po- sabem ler. Isso dificulta muito o tra-
líticas de Educação (II CNEC, 2004, p. 6). balho, porque elas estão numa série,

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Movimentos sociais do campo e a afirmação do direito à educação:
pautando o debate sobre as escolas multisseriadas na Amazônia paraense

mas não acompanham aquele nível. realizar o trabalho da melhor forma pos-
(Profa. C. M. S.) sível e, ao mesmo tempo, perdidos, care-
cendo de apoio para organizar o tempo
– A gente prefere reprovar porque vemos escolar, numa situação em que atua em
a necessidade do aluno obter a apren- várias séries concomitantemente. Eles
dizagem. A Secretaria cobra da gente também se sentem pressionados pelo fato
passar o aluno, mas não podemos apro- de as secretarias de educação definirem
var se não há aprendizagem. Isso acon- encaminhamentos padronizados de horá-
tece mais na 1ª e 2ª séries. (Prof. J. M.) rio do funcionamento das turmas, de pla-
nejamento e listagem de conteúdos, rea-
– Já reprovei muitas vezes, faz tempo, eu gindo de forma a utilizar sua experiência
estudava junto com a 3ª e 4ª série e fi- docente acumulada e criatividade para or-
cava ruim, a professora passava mais ganizar o trabalho pedagógico adotando
trabalhos para eles. Ela dava uma coi- medidas diferenciadas em face das
sa para a gente e ficávamos esperando especificidades das turmas.
ela passar para os outros. Já desisti de No entanto, o acúmulo de funções e
estudar por causa do trabalho com meu tarefas que assumem nas escolas
pai, ele trabalha no mato e na serraria. multisseriadas dificulta aos professores
(Aluno A. J. F.) realizar o atendimento adequado aos estu-
dantes que não dominam a leitura e a es-
– A evasão e a repetência existem mais crita, implicando a elevação das taxas de
por causa das faltas. Tem o período de reprovação e defasagem idade-série nas
plantar na roça em que eles passam turmas. Por outro lado, essa situação se
uma semana para plantar e faltam na torna problemática, porque os professores
escola. Também, tem muitos pais que são pressionados pelas secretarias de edu-
não tem um lugar fixo, passam um mês cação a aprovar o maior número de estu-
aqui e vão para outro lugar trabalhar, dantes possível no final do ano letivo,
vão e voltam, causando a repetência e como forma de relativizar os índices ele-
a evasão. (Prof. A. L.) vados de fracasso escolar.
Além de todos esses fatores, muitos
Os depoimentos revelam que os pro- estudantes ainda são obrigados a se au-
fessores enfrentam dificuldades em reali- sentar ou abandonar a escola para reali-
zar o planejamento nas escolas zar atividades produtivas ou acompanhar
multisseriadas, porque trabalham com os pais em atividades de trabalho
muitas séries ao mesmo tempo, envolven- itinerantes, de pouca rentabilidade, pre-
do estudantes de diversas faixas etárias, judiciais à saúde e sem condições de se-
interesses e níveis de aprendizagem. A al- gurança, em face das precárias condições
ternativa mais utilizada para solucionar o de vida que enfrentam os sujeitos no cam-
problema e viabilizar o planejamento po, corroborando para dificultar ainda
numa situação dessa natureza tem sido mais a organização do trabalho pedagógi-
seguir as indicações do livro didático, sem, co nas escolas multisseriadas.
contudo, atentar com clareza para as im- Apontando indicadores para
plicações curriculares resultantes dessa referenciar políticas e práticas educacio-
atitude, uma vez que esses materiais di- nais emancipatórias para o campo na Ama-
dáticos impõem a definição de um currí- zônia e no País.
culo deslocado da realidade e da cultura Após a identificação das principais
das populações do campo da região. mazelas referentes à ação educativa que
Identificamos ainda as angústias sen- se desenvolve nas escolas multisseriadas,
tidas pelos professores ao organizar o tra- discutiremos indicadores que possam
balho pedagógico justamente porque as- referenciar práticas e políticas educacio-
sumem a visão da multissérie enquanto nais emancipatórias para o campo na
"junção de várias séries ao mesmo tempo Amazônia e no País, apresentando um
e num mesmo espaço", passando a ela- conjunto de reflexões que estimulem o de-
borar tantos planos de ensino e estratégi- bate sobre a realidade das escolas
as de avaliação da aprendizagem diferen- multisseriadas e seus desafios para garan-
ciados quantas forem as séries presentes tir às populações do campo o direito à edu-
em sua turma. Como resultado, os pro- cação de qualidade na primeira etapa do
fessores se sentem ansiosos ao pretender ensino fundamental.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 302-312, set./dez. 2006. 309
Salomão Mufarrej Hage

1) As escolas multisseriadas devem elas ofereçam um processo


sair do anonimato e ser incluídas educativo de qualidade, faz-se ne-
na agenda das Secretarias Estadu- cessária a transgressão desse padrão
ais e Municipais de Educação, do de organização do ensino, que tem
Ministério da Educação, das univer- se constituído um empecilho em
sidades e centros de pesquisa e dos face da rigidez com que trata o tem-
movimentos sociais do campo. Elas po escolar, impondo a fragmentação
não podem continuar sendo trata- em séries anuais e submetendo os
das como se não existissem, exclu- estudantes a um processo contínuo
ídas até das estatísticas do censo es- de provas e testes como requisito
colar oficial. Não há justificativa para que sejam aprovados e possam
para tamanha desconsideração do progredir no interior do sistema edu-
poder público e da sociedade civil cacional. Ao mesmo tempo, o mo-
para com os graves problemas de delo seriado se pauta por uma lógica
infra-estrutura e de condições de "transmissiva", que organiza todos os
trabalho e aprendizagem que en- tempos e espaços dos professores e
frentam os professores e estudan- dos alunos em torno dos "conteúdos"
tes das escolas multisseriadas, que, a serem transmitidos e aprendidos,
em geral, se encontram abandona- transformando os conteúdos no eixo
das às situações contingentes pró- vertebrador da organização dos
prias das comunidades em que se graus, séries, disciplinas, grades, ava-
localizam; afinal, delas depende liações, recuperações, aprovações ou
atualmente a iniciação escolar da reprovações (SEF/MEC, 1994).
maioria das crianças, adolescentes Miguel Arroyo (1999), analisando
e jovens do campo. essa problemática, afirma que os ín-
dices alarmantes de fracasso escolar
2) O enfrentamento dos graves pro- em muito se devem à escola seriada
blemas que envolvem as escolas "peneiradora", seletiva e excludente,
multisseriadas, para ser efetivo, que é a própria negação da escola
deve considerar os desafios mais como direito de todos, universal.
abrangentes que envolvem a rea-
lidade socioeconômica-política- 4) As escolas multisseriadas têm assu-
ambiental-cultural e educacional do mido um currículo deslocado da
campo na sociedade brasileira con- cultura das populações do campo,
temporânea. Entre esses desafios, situação que precisa ser superada
destacamos, por um lado, a degrada- caso se pretenda enfrentar o fracas-
ção das condições de vida dos ho- so escolar e afirmar as identidades
mens e das mulheres que vivem no culturais das populações do campo.
campo, que resulta numa expansão Reconhecemos que ainda predomi-
acelerada da migração campo-cida- nam em nossos sistemas de ensino
de, e, por outro, o fortalecimento de compreensões universalizantes de
uma concepção urbanocêntrica de currículo, orientadas por perspecti-
mundo que dissemina um entendi- vas homogeneizadoras que sobre-va-
mento generalizado de que o espaço lorizam concepções mercadológicas
urbano é superior ao campo, de que e urbanocêntricas de vida e desen-
a vida na cidade oferece o acesso a volvimento e desvalorizam as iden-
todos os bens e serviços públicos, de tidades culturais das populações que
que a cidade é o lugar do desenvolvi- são do campo e nele vivem, interfe-
mento, da tecnologia e do futuro, en- rindo em sua auto-estima. Não
quanto o campo é entendido como o obstante, o enfrentamento dessa si-
lugar do atraso, da ignorância, da po- tuação desastrosa no contexto da
breza e da falta de condições míni- educação do campo pode ser alcan-
mas de sobrevivência. çado através da construção coleti-
va de um currículo que valorize as
3) As escolas multisseriadas têm cons- diferentes experiências, saberes, va-
tituído sua identidade referenciada lores e especificidades culturais das
na "precarização do modelo urba- populações do campo da Amazônia.
no seriado de ensino", e, para que Sinalizamos, assim, a importância da

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Movimentos sociais do campo e a afirmação do direito à educação:
pautando o debate sobre as escolas multisseriadas na Amazônia paraense

concretização de um processo de edu- sexo, de idade, de interesses, de do-


cação dialógica que inter-relacione mínio de conhecimentos, de níveis
sujeitos, saberes e intencionalidades, de aproveitamento, etc. Essa
superando a predominância de uma heterogeneidade inerente ao proces-
educação bancária de forte tradição so educativo da multissérie, articu-
disciplinar, pois entendemos que os lada a particularidades identitárias
saberes da experiência cotidiana no relacionadas a fatores geográficos,
diálogo com os conhecimentos sele- ambientais, produtivos, culturais,
cionados pela escola propiciam o etc., são elementos imprescindíveis
avanço na construção e apropriação na composição das políticas e prá-
do conhecimento por parte dos ticas educativas a serem elaboradas
educandos e dos educadores. para a Região Norte e para o País.
Essa prerrogativa referencia nossa
5) As escolas multisseriadas opor- intencionali-dade de pensar a edu-
tunizam às populações do campo cação do lugar dos sujeitos do cam-
o acesso à escolarização no lugar po, o que significa que, se temos por
em que vivem, em sua própria co- pretensão elaborar políticas e práti-
munidade, fator que poderia con- cas educativas includentes para as
tribuir significativamente para a escolas do campo, é fundamental re-
permanência dos sujeitos no cam- conhecer e legitimar as diferenças
po e para a afirmação de suas existentes entre os sujeitos, entre os
identidades culturais, não fossem ecossistemas e entre os processos
todas as mazelas que envolvem a culturais, produtivos e ambientais
dinâmica educativa efetivada cultivados pelos seres humanos nos
nessas escolas, detalhadas ante- diversos espaços sociais em que se
riormente. Essa é uma questão inserem. Não obstante, não pode-
importante a ser considerada, mos desconsiderar a visão dos su-
pois entre as reivindicações dos jeitos envolvidos com a multissérie,
movimentos sociais populares do que consideram toda essa
campo encontra-se a afirmação do heterogeneidade mencionada como
direito inalienável que todos os um fator que dificulta o trabalho pe-
sujeitos têm de serem educados dagógico, fundamentalmente por-
no próprio lugar em que vivem e que se tem generalizado na socie-
convivem com seu grupo social, dade que as "classes homogêneas"
o qual constitui pré-requisito fun- são o parâmetro de melhor aprovei-
damental para o fortalecimento tamento escolar e, conseqüentemen-
dos laços de pertencimentos dos te, de educação de qualidade. Con-
sujeitos e para a afirmação das tudo, os fundamentos teóricos que
identidades culturais das popula- orientaram a realização da pesqui-
ções do campo. A escola localiza- sa apontaram justamente o contrá-
da no próprio espaço em que vi- rio, indicando ser a heterogeneidade
vem e convivem os sujeitos do um elemento potencializador da
campo pode constituir-se num cen- aprendizagem e que poderia ser
tro de desenvolvimento cultural da mais bem aproveitado na experiên-
comunidade, envolvendo a todos, cia educativa que se efetiva na
sem exceção – crianças, adolescen- multissérie, carecendo, no entanto,
tes, jovens e adultos, estudantes, de muitos estudos e investigações
pais, lideranças e membros da co- sobre a organização do trabalho pe-
munidade –, nos processos de dagógico, sobre o planejamento e a
apropriação do conhecimento e de construção do currículo e de
mobilização e participação coleti- metodologias adequadas às peculi-
va na construção de uma socieda- aridades de vida e de trabalho das
de inclusiva, democrática e plural. populações do campo, o que de for-
ma nenhuma significa a perpetua-
6) As escolas multisseriadas são espa- ção da experiência precarizada de
ços marcados predominantemente educação que se efetiva nas escolas
pela heterogeneidade, ao reunir gru- multisseriadas tal qual identifica-
pos com diferenças de série, de mos nesse estudo.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 302-312, set./dez. 2006. 311
Salomão Mufarrej Hage

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Salomão Antônio Mufarrej Hage, doutor em Educação pela Pontifícia Universida-


de Católica de São Paulo (PUC-SP), é professor adjunto do Centro de Educação da Uni-
versidade Federal do Pará (UFPA).
salomao@uol.com.br

Recebido em 2 de maio de 2006.


Aprovado em 11 de setembro de 2006.

312 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 302-312, set./dez. 2006.
ESTUDOS

Cooperativismo: alternativa viável


para a gestão escolar? Um estudo
de caso

Gerrá Leite Correia de Araújo


Candido Alberto Gomes

Resumo
Analisa a Cooperativa de Ensino da Cidade de Goiás e o Colégio Alternativo, na
cidade de Goiás, fundados em virtude da insatisfação de um grupo de pais de cama-
das sociais médias tanto com a escola pública quanto com a particular. O estudo de
caso coletou dados por meio de observação, análise documental, entrevistas e grupos
focais. Os resultados apresentam um estabelecimento em que todos os atores partici-
pam da gestão. Do ponto de vista pedagógico, alcança eficazmente a apropriação de
conteúdos pelos seus alunos para concursos públicos e o acesso à educação superior,
conforme as aspirações dos pais. As despesas revelam que a remuneração docente é a
mais alta da comunidade, porém a contribuição financeira das famílias é menor que a
mensalidade da escola privada.

Palavras-chave: ensino médio; ensino fundamental; custos educacionais; gestão


participativa; cooperativismo educacional.

Abstract Co-operativism: a feasible alternative for school


management?

This research project focuses on an educational co-operative and its junior and senior
high school in the city of Goiás, Brazil. It was founded as a result of parents’ low level of
satisfaction concerning both public and private schools. The case study analysed data
from observation, documentary analysis, interviews and focus groups. The results reveal
that all school actors participate in its management. From the educational perspective,
the school effectively teaches the contents required by college entrance exams and other
kinds of selection, according to the parents’ aspirations. The teachers’ salaries reach the
highest level in the community, however, the families’ financial contribution is lower
than the private school’s tuition and fees.

Keywords: secondary education; primary education; educational cost; participative


management; educational cooperativism.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 313-326, set./dez. 2006. 313
Gerrá Leite Correia de Araújo
Candido Alberto Gomes

Introdução pelo mercado; e o terceiro constituído de


fundações, organizações não-governamen-
tais e movimentos grupais, que geralmen-
Nas últimas décadas o Brasil tem as-
te refletem a mobilização da sociedade ci-
sistido à busca de alternativas para a ges-
vil, ocorrida precisamente a partir dos anos
tão escolar, valorizando a organização e a
80, isto é, da “década (pelo menos econo-
participação da comunidade escolar. Mo-
micamente) perdida”. Em outras palavras,
vendo-se entre os pólos das escolas públi-
o espaço entre os pólos público e particu-
cas e particulares em sentido estrito, exis-
lar se preencheu com maior número de al-
tem alternativas intermediárias que mere-
ternativas, tendendo a formar uma espé-
cem ser estudadas; uma delas é o
cie de gradiente, não isento de contradi-
cooperativismo escolar, que obedece a ori-
ções internas.
entações filosóficas originadas no século
Na verdade, o espaço intermediário
19. O presente trabalho focalizou uma das
deste gradiente não estava vazio. São mui-
diversas experiências existentes no Brasil,
tas as semelhanças entre o terceiro setor e
um estabelecimento mantido por coopera-
o cooperativismo na busca de soluções
tiva, que oferece as últimas séries do ensi-
econômicas e sociais para os problemas
no fundamental e o ensino médio. Quais
que atingem as classes e grupos menos
as características da experiência, sobretu-
favorecidos. O cooperativismo possui pre-
do no que se refere aos processos de ges-
cedentes nos “socialistas utópicos”, tendo
tão e às perspectivas dos envolvidos nessa
começado em 1844, quando foi fundada a
experiência? Como se aplicam a filosofia,
Sociedade dos Equitáveis Pioneiros de
a doutrina e os princípios cooperativistas?
Rochdale, na Inglaterra. Era uma coope-
Como são os processos da gestão? Como
rativa de consumo para melhorar as con-
se apresentam as suas estruturas de finan-
dições de vida dos trabalhadores da Revo-
ciamento e custos, quando comparadas
lução Industrial e, assim, emancipar o pro-
com outros estabelecimentos?
letariado (Carneiro, 1981). O movimento
passou da distribuição e consumo para os
Existe espaço entre os pólos? sistemas de produção, crédito, educação,
serviços e outros setores. Seus princípios
A história recente da educação brasi- básicos se tornaram a adesão livre e aber-
leira envolve, em grande parte, a ascensão ta; o controle democrático pelos membros;
da escola pública como dever constitucio- a participação destes membros no capital
nal a ser prestado diretamente pelo Esta- da cooperativa; a autonomia e indepen-
do. O programa do Manifesto dos Pionei- dência; o provimento de educação, trei-
ros da Educação Nova, de 1932, lançou as namento e informação aos seus membros,
bases da mudança da paisagem educacio- gestores e empregados; a cooperação en-
nal brasileira, que aflora em debates técni- tre as cooperativas e o trabalho pelo de-
cos e, sobretudo, ideológicos, mais ou me- senvolvimento sustentável das suas comu-
nos calorosos, até os dias de hoje, entre nidades (International Co-operative
escola pública e escola particular Alliance, 2006; cf. também Carneiro, 1981;
(Romanelli, 1978). Um dos resultados foi Pinho, 1982). Desde as origens o movimen-
a extensão crescente das redes públicas por to previa a constituição de um fundo para
todo o País, predominando em toda a edu- a educação dos cooperados e do público
cação básica, com exceção apenas da edu- em geral, o que permite verificar que a
cação superior. Nos tempos mais recentes educação estava inserida no seu cerne.
desta trajetória, particularmente a partir Anos mais tarde surgiram as cooperativas
dos anos 80, manifestou-se com maior cla- intelectuais e recreativas, as escolares, as
reza no nosso continente a crise do Estado educacionais de pais e de alunos, as de
e o rompimento de estruturas administra- trabalho cultural, as de profissionais da
tivas sobre as quais foi construída a educação (Organização das Cooperativas
modernidade dos nossos países (Kliksberg, Brasileiras, 2000) e o ensino do
2003, 2004; Xavier, Amaral Sobrinho, cooperativismo em vários níveis.
Marra, 1994; Colozzi, 2002). Além dos mo- No Brasil o cooperativismo surgiu no
delos participativos da gestão democrática início da República, com a constituição das
nas escolas públicas, se estabeleceram três primeiras cooperativas, no setor de consu-
setores: o primeiro composto pelo poder mo, ao final do século 19. Em 1902 ele che-
público ou governo; o segundo formado gou ao campo, por meio do padre jesuíta

314 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 313-326, set./dez. 2006.
Cooperativismo: alternativa viável para a gestão escolar?
Um estudo de caso

suíço Theodoro Amstadt, que organizou extrair vantagens econômicas. Elas são for-
uma caixa de crédito rural (Pinho, 1982). madas por pessoas que convencem os tra-
Por sua vez, o cooperativismo educaci- balhadores a se associarem a uma coope-
onal teve raízes na primeira metade do sé- rativa de trabalho ou serviço, colocando
culo 20 na Europa, Estados Unidos, Brasil e condições, dados e situações irreais, além
outros países, que criaram cooperativas in- de ocultar as verdadeiras intenções dessas
telectuais e recreativas (Frola, 1937) e esco- pessoas. Entre outras características, este
lares (Luz Filho, 1960). O cooperativismo tipo de cooperativa possui “donos” e se
educacional tem como objetivos oferecer organiza com o interesse de usar os servi-
uma educação de qualidade, diminuir os ços dos cooperados e, ao mesmo tempo,
seus custos, utilizar a gestão cooperativista fraudar e sonegar as obrigações legais em
e atuar de forma coletiva por meio da parti- geral, particularmente trabalhistas e
cipação da comunidade escolar, com base previdenciárias. Os “donos” tendem a se
na democracia e eqüidade. perpetuar na direção da cooperativa, para
Segundo Luz Filho (1960), a primeira que possam manipular e controlar a sua
cooperativa escolar fundada no Brasil gestão, elevando, assim, os seus interesses
data de 1933, na cidade de Cruzeiro, Es- em detrimento daqueles dos cooperados
tado de São Paulo, com berço e modelo (Camacho, 1997).
franceses. Em 1958 o ramo já possuía 883 Mais ainda, o cooperativismo apresen-
cooperativas escolares. Por meio do ta as suas contradições históricas. Respei-
autoplanejamento, da auto-organização e tadas outras posições, ele poderia ser inter-
da autogestão dos educandos se produzia, pretado como uma alternativa pragmática,
comercializava, poupava e comprava o que proposta no bojo do capitalismo, sem negá-
fosse necessário para os alunos e a escola, lo nos fundamentos, porque é inevitável
segundo um processo coletivo, educativo articular-se com o mercado. Propõe-se mo-
e prático, formando os cooperados para a dificar as relações sociais e as relações com
vida prática, como planejadores, o capital, porém não se pode ignorar a com-
organizadores, gestores, produtores, pou- petição no seu entorno, a obtenção de exce-
padores, fiscais, etc. dentes, etc., assim apresentando possibili-
O Estado, ao contrário, deve prosse- dades e limites para a mudança (cf. Ribei-
guir com o seu papel constitucional. Se- ro, 2004). Estas contradições também se
gundo Pasquini (1992), as cooperativas não verificam em escolas cooperativas focaliza-
podem ser vistas apenas como forma de das pela literatura. Duas delas, por exem-
baratear os custos educacionais, isto é, plo, nasceram basicamente da crise da es-
como meras mantenedoras de escolas, mas cola pública, do avanço da organização da
como uma alternativa pedagógica para alu- sociedade civil e da busca de menores cus-
nos, educadores e pais insatisfeitos com tos pelas camadas médias urbanas. Numa
limitações de escolas existentes. A dimi- foram detectadas as tensões entre os pio-
nuição dos custos com o ensino virá como neiros idealistas e os demais cooperados,
conseqüência do processo cooperativista cujos objetivos eram mais “práticos”, obser-
aplicado ao setor. vando-se o choque entre valores cooperati-
A sua gestão é essencialmente demo- vos e competitivos (Gabbi, 2001). Em outra
crática, graças à participação dos seus co- se evidenciou o campo contraditório entre
operados, com igualdade de direito a voz o seu projeto pedagógico e educacional e
e voto, onde a decisão da maioria é de res- o seu projeto político-econômico. Apesar
ponsabilidade. A participação dos seus desse terreno ambíguo, nela se encontra-
membros é simultaneamente um direito e ram espaços que traziam esperança de
um dever, privilegiando a participação aprimoramento de conteúdos de formação
daqueles que trabalham nessas organiza- humana (Mota, 2003).
ções. No caso do Brasil, a filosofia, doutri-
na e princípios do cooperativismo estão
consubstanciados na Lei nº 5.764, de 16 Objetivos e metodologia
de dezembro de 1971 (Brasil, 2006).
Entretanto, deve-se estar alerta a Ao se propor realizar um estudo de
distorções destes ideais e princípios his- caso, esta pesquisa adota uma posição que
tóricos, entre as quais citam-se as coo- há algum tempo seria considerada hete-
perativas organizadas com a intenção de rodoxa, especialmente em face da gene-
simular uma situação pseudolegal, para ralização dos dados. Como é amplamente

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Candido Alberto Gomes

reconhecido, cabe renunciar à repre- levados a efeito com alunos de uma tur-
sentatividade clássica e optar pela “genera- ma do ensino fundamental e outra do
lização naturalística”, isto é, em função do ensino médio, ambas sorteadas. Vários
conhecimento experiencial do sujeito lei- alunos foram também entrevistados in-
tor, este indagará o que pode (ou não) apli- dividualmente. Igualmente, foi realizado
car deste caso na sua situação (Lüdke, um grupo focal com cooperados. Ao todo
André, 1986). Nesse sentido, a pesquisa houve 28 participantes.
supera a chamada ilusão indutiva, segun-
do a qual investigadores crêem que o seu
trabalho consiste em demonstrar a genera- A cooperativa e o colégio
lidade de uma afirmação e se esgotam na
vã e incessante procura da universalidade A Coopecigo foi fundada em 1989,
nos casos concretos. Na verdade, quando o como cooperativa de pais de alunos, con-
verdadeiro trabalho científico constitui um juntamente com o referido Colégio. Pos-
sistema de interpretação pertinente para o suía 350 cooperados; Estatuto Social de
real estudado (Lerbet, 2001). acordo com a Lei anteriormente citada;
A presente pesquisa se propôs iden- Conselho Administrativo composto por
tificar as características e analisar a expe- dez cooperados, assim distribuídos: dire-
riência da Cooperativa de Ensino da Ci- tor presidente, diretor vice-presidente, di-
dade de Goiás Ltda. (Coopecigo), da retor secretário, diretor financeiro, diretor
tipologia educacional “pais de alunos”, de operações e cinco conselheiros, que se
mantenedora do Colégio Alternativo. Em reuniam uma vez por ano em assembléia
coerência com a metodologia do estudo geral ordinária e, sempre que necessário,
de caso, foi adotada a “amostragem inten- em assembléia geral extraordinária.
cional”, como um caso extremo (Quinn, Tanto a entidade mantenedora quanto
2000), rico de informações, por ser consi- a mantida surgiram como alternativa às ele-
derada bem-sucedida, inclusive pelo seu vadas mensalidades escolares cobradas
longo tempo de funcionamento, de 15 pelas escolas particulares e à deficiente
anos, e pela manifesta disposição de ofe- qualidade da escola pública, segundo as
recer os dados necessários, inclusive da expressões consensuais dos entrevistados.
área financeira, estes últimos essenci- Ainda segundo estes, a Cooperativa e o
ais para os propósitos. O trabalho visou Colégio reduziram os custos, na medida em
verificar o conhecimento e a aplicação que diminuíram a burocracia e se valeram
da fi losofia, doutrina e princípios da autonomia e da descentralização finan-
cooperativistas e as perspectivas dos ato- ceira. As decisões eram tomadas pelos co-
res envolvidos. Além disso, buscou ana- operados em assembléias, por maioria, dei-
lisar a estrutura das despesas e a despesa xando de lado os processos decisórios ver-
média por aluno/ano. A coleta de dados ticais, atados à palavra final do proprietá-
em campo levou 20 dias úteis integrais, rio, no caso de estabelecimento particular,
no período de março a abril de 2004, con- ou do diretor e da Secretaria de Educação,
vivendo com os integrantes da Cooperati- com suas intrincadas legislação e normas,
va e do Colégio. A análise documental fo- no caso da escola pública, mais uma vez
calizou a legislação e normas pertinentes, de acordo com as percepções convergentes
os estatutos, regimentos, regulamentos, li- dos entrevistados. A descentralização fi-
vros de atas das diversas assembléias e nanceira ocorria e ocorre através do rateio
conselhos, projeto político-pedagógico do das despesas com os seus cooperados, sem
Colégio, planos de curso, manuais dos es- que nessas despesas estivesse incluído
tudantes e professores e outros. Foram re- qualquer lucro. Neste sentido, o caráter não-
alizadas entrevistas semi-estruturadas, lucrativo tem o sentido da expressão cons-
com roteiros diferenciados, além de gru- titucional (art. 213, I), observando-se a exis-
pos focais.1 Os participantes foram esco- tência de excedentes financeiros, aplicados 1
As entrevistas de grupos fo-
lhidos mediante sorteio, com uso de re- no próprio Colégio. cais, como são conhecidas e
aplicadas também no Brasil,
posições, alcançando 60% do Conselho À época da coleta de dados, o Colégio têm tipicamente seis carac-
Administrativo, 65% do Conselho Co- Alternativo atendia a 130 alunos, a quem terísticas: 1) pessoas, 2) reu-
nidas numa série de grupos,
munitário, 25% dos professores, o dire- oferecia as quatro últimas séries do ensino 3) possuem determinadas
tor do Colégio, o coordenador pedagógi- fundamental e o ensino médio. O quadro características e 4) provêem
dados 5) de natureza quali-
co e o coordenador de turno, totalizando pedagógico era formado por 18 professores tativa 6) numa discussão fo-
26 participantes. Os grupos focais foram e um bibliotecário, além do diretor e dois calizada (Krueger, 1998).

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Cooperativismo: alternativa viável para a gestão escolar?
Um estudo de caso

coordenadores, todos contratados como apesar de os diretores terem conhecimen-


empregados celetistas, isto é, não eram co- tos mais pormenorizados, os diversos ato-
operados. O quadro de auxiliares era com- res convergiam nos princípios, sugerindo
posto de tesoureiro, secretário, porteiro, o conhecimento e a possível internalização
dois vigias e dois auxiliares de limpeza, da filosofia cooperativista. Ainda assim,
também empregados celetistas. O projeto notou-se nos sujeitos pesquisados a neces-
político-pedagógico, com tendências sidade de conhecimentos mais profundos
sociointeracionistas (construtivistas), in- sobre o cooperativismo, o que dificultava
cluía a filosofia, doutrina e princípios a sua aplicação em favor da gestão e da
cooperativistas. Havia um conselho comu- educação, constituindo obstáculo à parti-
nitário, composto de um pai, um aluno e cipação de todos na comunidade escolar.
dois professores representando cada turma, As assembléias e reuniões tratavam
que se reunia na última quinta-feira de cada de assuntos mais ligados à gestão geral da
mês, nos termos regimentais. Cooperativa e do Colégio, como contratação
O prédio, cedido pela Universidade de funcionários, do diretor do Colégio, apro-
Federal de Goiás, era composto por sete vação da contratação de professores, salári-
salas de aula, uma sala para professores, os, compra de materiais e equipamentos,
uma sala para coordenação, biblioteca, despesas de manutenção e conservação e
laboratório de ciências, áreas coberta e também de ações pedagógicas a serem
descoberta, campo de futebol e duas qua- efetuadas, como passeios, rádio interna, fes-
dras alugadas. tas e jogos. As reuniões do Conselho Co-
munitário do Colégio analisavam e discuti-
am as decisões das assembléias e reuniões
A organização da Cooperativa, juntamente com os demais
e o funcionamento problemas pedagógicos. Os assuntos mais
freqüentemente tratados eram o rendimen-
A Cooperativa e o Colégio, planeja- to de turmas e alunos, problemas de
dos de modo integrado, segundo se cons- indisciplina, conteúdos a serem trabalha-
tatou, obedeciam a todas as exigências da dos, interdisciplinaridade, plantão pedagó-
legislação e normas pertinentes. As deci- gico, preparação dos alunos para o ingresso
sões tomadas pelos cooperados nas as- em cursos superiores, festas, jogos, visitas
sembléias e nos Conselhos Administrati- a outras cooperativas educacionais, neces-
vo e Comunitário eram implantadas pela sidade de montar laboratório e oferecer cur-
direção do Colégio. O Estatuto, regimen- sos de informática, construção e aprimora-
tos e projetos foram elaborados de modo mento do projeto pedagógico e maior rigi-
compartilhado. dez na disciplina dos alunos, como as re-
Os conhecimentos sobre a filosofia, gras de não fumar, namorar ou trazer ami-
a doutrina e os princípios cooperativistas gos para o interior do Colégio.
apareciam em todo o Estatuto da Coope- Por sua vez, os alunos enfatizaram que
rativa, não sendo, porém, devidamente as decisões eram tomadas por meio da co-
explicitados no Regimento, nos planos locação dos problemas, do que é preciso
de curso e no Regulamento do Conselho fazer ou resolver, discussões sobre os mes-
Comunitário do Colégio. No entanto, por mos, onde se tem a participação dos alu-
meio das entrevistas com os participan- nos, coordenadores, diretora e pais. Num
tes sobre os princípios cooperativistas grupo focal uma aluna da sétima série as-
mais importantes, verificou-se que eles sim se expressou:
eram percebidos como a democracia, a
participação, a partilha, a interação, a – No nosso Colégio quem toma as deci-
atividade comunitária, a gestão democrá- sões são os pais, os professores e os alu-
tica, a união em torno de um objetivo nos. Todos os meses temos um conse-
comum e a colaboração e a construção lho comunitário que reúne representan-
coletivas. Na visão dos alunos, estes tes dos pais, dos professores e dos alu-
princípios eram a união, a ajuda mútua, nos para discutirmos como vai a edu-
a participação, a luta por um bem co- cação no Colégio. (Aluna da 7ª série)
mum e a colaboração. Já os pais integran-
tes do Conselho Comunitário deram ên- Também os professores enfatizaram o
fase aos princípios da cooperação, caráter participativo das decisões, como
integração, participação e união. Assim, um docente que declarou:

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Candido Alberto Gomes

– O diferencial desta escola em relação – Aqui os alunos estudam todos os con-


às outras está no poder de decisão. Tudo teúdos, completos, aqui os alunos es-
aqui é discutido, pesado e analisado tudam de verdade. É uma escola res-
para chegarmos a uma decisão melhor ponsável, onde eu tenho confiança pela
para todos. Aí está a diferença da admi- rigidez na disciplina e atenção com os
nistração da escola particular, onde alunos. (Cooperado, pai de aluno)
tudo é decidido pelos donos e, na esco-
la pública, o diretor é quem manda. – Eu percebo a direção, coordenadores e
(Membro do corpo docente) professores sempre buscando novida-
des e melhorias, sempre interessados
Por sua vez, em grupo focal de coope- em ensinar mais e mais para os alunos,
rados, uma manifestação típica foi que nas o que não ocorre na escola pública. (Co-
assembléias e reuniões pode-se falar à von- operado, pai de aluno)
tade, discutir os assuntos do Colégio. So-
mos livres para perguntar, ter acesso aos Percebe-se a valorização do caráter
documentos, caso precise, aqui tudo é aber- propedêutico do ensino e da apropriação
to a todos. de conteúdos como fatores de êxito na vida
Desse modo, os documentos e as en- social. Portanto, se a formação dos
trevistas com diferentes grupos convergi- educandos é importante, a informação, ou
ram para um ponto: que a gestão estava seja, o domínio daqueles conteúdos de
baseada na participação democrática da maior relevância deixa os cooperados sa-
comunidade escolar, independentemente tisfeitos. Quanto à disciplina, observou-
do seu capital social, de acordo com os se que as normas eram consistentemente
princípios cooperativistas. aplicadas, o que se verificava, inclusive,
Nas entrevistas com os cooperados pela não existência de pichação e depre-
foi transmitida a idéia de que o Colégio dação das dependências internas e exter-
não era algo dos outros, mas dos coope- nas, pela conservação dos banheiros e pelo
rados. Não se verificaram comportamen- cuidado com os equipamentos, inclusive
tos de clientes cobrando direitos em re- da rádio interna, cuja programação era fei-
lação aos serviços prestados, mas de pes- ta pelos alunos.
soas que tomavam os problemas como
coletivos, requerendo a sua participação.
As declarações revelaram significativa O colégio visto pela direção
coerência em torno de diversas caracte-
rísticas positivas do Colégio, como o in- A diretora do Colégio e a coordena-
centivo à leitura; o desenvolvimento de dora pedagógica foram escolhidas pelo
competências, a exemplo da responsabi- Conselho Administrativo da Cooperati-
lidade; o fato de ser conceituado como va. Por sua vez, a coordenadora de tur-
um dos bons colégios da cidade (o que no foi selecionada pela diretora do Co-
foi corroborado por depoimentos de di- légio. As escolhas dos profissionais eram
versas pessoas da comunidade); o qua- efetuadas coletivamente pela Cooperati-
dro de professores qualificados; o rigor va ou pelo Colégio, ou ambos, com rati-
na disciplina; o ensino participativo, mas ficação coletiva.
exigente; os altos índices de classifica- Sobre a gestão do Colégio, as entre-
ção no ingresso na educação superior e vistadas fizeram declarações que
em concursos públicos e o bom relacio- enfatizaram o seu caráter participativo,
namento social. como no exemplo abaixo:
Afirmações feitas em grupos focais de
cooperados representam bem duas aspira- – As tomadas de decisões, os problemas
ções dos pais: de um lado, a preocupação do Colégio e demais coisas em relação
com a apropriação dos conteúdos ao administrativo e ao pedagógico são
programáticos e, de outro, a ordem na esco- resolvidas coletivamente pelo Conselho
la. Apesar do projeto político-pedagógico, Administrativo da Coopecigo ou pelo
constatou-se, na prática, uma escola Conselho Comunitário do Colégio. São
disciplinadora e transmissora de informa- sempre decisões que envolvem a todos,
ções, estas ligadas à preparação para con- a menos que seja um problema corri-
cursos e processos seletivos de acesso à edu- queiro, que é da minha competência
cação superior, preferentemente pública: resolver. O Conselho Administrativo e

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Cooperativismo: alternativa viável para a gestão escolar?
Um estudo de caso

o Conselho Comunitário são suportes realidade de sala de aula estavam voltadas


para a direção e eu cumpro o que a mai- não para construir o conhecimento, mas
oria decide. (Membro do grupo diretivo) para apropriar-se dos conteúdos. O proje-
to político-pedagógico dificilmente pode-
A análise documental e a observação ria realizar-se na prática, pois não atendia
evidenciaram também que as decisões às aspirações dos pais, que valorizavam a
eram tomadas coletivamente em reuniões acumulação daqueles conteúdos, de modo
e assembléias, após questionamentos, dis- que os alunos pudessem obter o êxito em
cussões e análise de problemas. Em rela- concursos e processos seletivos.
ção ao que precisava melhorar no Colé-
gio quanto à gestão e ao ensino-aprendi-
zagem, as entrevistadas foram unânimes O colégio visto pelos
em citar a necessidade de uma sede pró- professores
pria e de um laboratório de informática
e, ainda, de maior participação dos pais Os professores destacaram que a ges-
em todas as reuniões da Cooperativa e tão envolvia a presença de todos os seg-
do Colégio. mentos do Colégio e que as decisões eram
Do ponto de vista da direção, o esta- tomadas democraticamente pela maioria e
belecimento diferia dos públicos e parti- acatadas por todos, a exemplo da declara-
culares: ção abaixo:

– A gestão da Cooperativa e do Colégio – Quanto à administração, ela não é im-


planeja e faz acontecer, isso influi di- posta e, sim, discutida e definida en-
retamente no ensino-aprendizagem tre todos. [...] Usamos muito da ajuda
(...). Justamente nas tomadas de deci- mútua entre os professores, pois todos
sões é que o Colégio é diferente dos têm o mesmo objetivo... (Membro do
outros. As decisões aqui são coletivas corpo docente)
(...). Decidimos coletivamente em fun-
ção do que é melhor para a maioria. A principal diferença apontada pelo
(Membro do grupo diretivo) corpo docente em face de outros estabe-
lecimentos era a autonomia, aliada ao
No que tange ao processo de ensi- poder de decisão, onde “tudo é discuti-
no-aprendizagem, verificaram-se diver- do, pesado e analisado...”. Em relação à
gências entre, de um lado, o que consta- educação e ao ensino-aprendizagem, per-
va do projeto político-pedagógico e as de- cebeu-se entre os professores satisfação
clarações em entrevistas do grupo quanto ao atendimento das suas solici-
diretivo e, de outro lado, a prática ob- tações e à disponibilidade de material di-
servada nas salas de aula e as entrevis- dático, bem como a valorização da sua
tas de outros atores. A abordagem formação inicial e continuada. Com efei-
sociointeracionista, segundo expressões to, esta última ocorria por meio de semi-
do projeto, preconiza uma prática nários, palestras e cursos de curta dura-
educativa para formar o educando en- ção realizados nas dependências da pró-
quanto pessoa humana dotada de auto- pria unidade educacional. Também se
nomia intelectual e capacidade crítica verificou reiteradamente, nas salas dos
para lidar com a realidade social, de professores e da coordenação, a troca de
criatividade, de capacidades múltiplas idéias, com o planejamento conjunto de
de inteligências e inspiração nos valo- conteúdos a serem trabalhados de modo
res universais do cooperativismo e da so- interdisciplinar.
lidariedade humana. Todavia, estas po- Deve ser reiterado que os professores
sições divergiam dos planos de curso, e outros funcionários não eram coopera-
que, embora baseados nos Parâmetros dos (o que evitaria os encargos trabalhis-
Curriculares Nacionais, tinham objetivos tas), mas empregados da Cooperativa. Seus
explícitos de apropriação, acumulação e salários eram mais altos que os das esco-
utilização do conhecimento na vida fu- las particular e públicas da comunidade.
tura. Tanto as observações das atividades Afirmava-se que, não havendo lucro ou
letivas quanto os depoimentos dos ato- publicidade para atrair alunos, os recur-
res indicaram que, ao contrário do pro- sos eram suficientes para melhor remune-
clamado no projeto, as expectativas e a ração do magistério.

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Candido Alberto Gomes

O colégio visto pelos alunos Por sua vez, esta qualidade, repetindo as
aspirações dos pais, foi vista como a cha-
As declarações dos alunos valoriza- ve para o sucesso na vida futura, marcada
ram a qualidade do processo de ensino- por concursos, processos seletivos de in-
aprendizagem e o rigor da avaliação. Tais gresso na educação superior e transferên-
exigências, porém, davam lugar a per- cia para outras unidades educacionais, na
cepções variadas, como a de uma aluna capital do Estado.
da sétima série, que concordava com a
qualidade do Colégio, mas considerava
as tarefas excessivas: As despesas educacionais
do colégio
– Eu e meus pais achamos que este Co-
légio é o melhor. O que eu não gosto As questões dos custos e da não-
muito daqui é porque passam muitas lucratividade são tratadas desde o
tarefas para casa. [...]. Outra coisa que surgimento do cooperativismo e consti-
eu não gosto é porque nossos pais e tuem parte integrante da sua filosofia,
professores querem que a gente apren- doutrina e princípios. Um estabeleci-
da muito sobre tudo e estejamos sem- mento educacional que não visa ao lu-
pre lendo um livro. (Aluno do ensino cro deve ter custos mais baixos para as
fundamental). famílias dos alunos, um dos objetivos dos
cooperados, que, no caso pesquisado,
Os discentes externaram o consenso eram profissionais liberais, fazendeiros
de que se tratava de um estabelecimento e funcionários públicos, entre outros, e
exigente, atencioso e cuidadoso com os alu- que buscavam diferenças de qualidade
nos, a começar pelos cooperados, seus pais, e de custos em relação às redes escola-
apesar de às vezes se perceberem falhas res do município.
no campo motivacional. A disciplina não Os pesquisados concordaram, em
raro era criticada (“a direção vigia a gente suas declarações, quanto à estimativa da
como crianças, todo mundo aqui manda composição dos cooperados e dos alunos
na gente, pega no pé e qualquer coisa ligam com relação ao nível socioeconômico. Se-
para os nossos pais”), mas também era va- gundo eles, não havia cooperados e alu-
lorizada, considerando-se o Colégio como nos de níveis “alto” e “baixo”. Cerca de
“o mais disciplinado da cidade”. A partici- 30% eram de nível “médio alto”; 50%, de
pação discente, por meio das reuniões do nível “médio médio” e 20%, de nível “mé-
Conselho de Classe e do Conselho Comu- dio baixo”. Portanto, a seleção social eli-
nitário, foi outro aspecto considerado fa- minava da Cooperativa e do Colégio as
vorável e diferenciador de outras escolas, camadas populares, que não podiam pa-
com impacto sobre o interesse nos traba- gar as despesas, mesmo mais baixas que
lhos, que muitas vezes eram organizados as de uma escola particular usual. Situa-
em conjunto. Alguns entrevistados salien- ção semelhante tinham outras escolas co-
taram que em outros colégios nunca havi- operativas focalizadas pela literatura
am participado de reuniões, nem tomado (Gabbi, 2001; Mota, 2003). Desse modo,
decisões coletivamente. Conforme um alu- a escola não precisava fazer face a obstá-
no, “aqui não tem uma só pessoa que re- culos mais significativos quanto ao capi-
solve tudo”. E uma representante de tur- tal cultural e à integração à cultura esco-
ma, sentindo-se protagonista do processo, lar, o que não ocorre na rede pública. Tam-
disse: “eu reúno os elogios, as reclamações, bém havia relativa homogeneidade de as-
os pedidos e levo para o Conselho”. pirações socioeducacionais elevadas, que
Os professores eram considerados as- se expressavam repetidamente e influí-
síduos e capacitados, o que muitas vezes am no processo de ensino-aprendizagem,
não ocorreria na rede pública, segundo al- considerando a escolarização um canal
guns entrevistados. No entanto, refletindo de mobilidade social ascendente.
as contradições já mencionadas entre o De que maneira este grupo, que pas-
projeto político-pedagógico, os planos de sou por certo filtro social, conseguia re-
curso e as práticas de sala de aula, os alu- duzir os custos educacionais? Como os co-
nos destacaram a qualidade do ensino, mas operados têm como objetivo o suprimen-
esta foi definida como a apropriação e o to da necessidade de bens ou serviços, a
acúmulo de conhecimento sistematizado. educação tende a se fazer por custos mais

320 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 313-326, set./dez. 2006.
Cooperativismo: alternativa viável para a gestão escolar?
Um estudo de caso

baixos. A legislação isenta as cooperati- sob a forma de rodízio. Os estabelecimen-


vas de certos impostos, abrangendo os re- tos particulares, como foi declarado por co-
sultados dos atos cooperativos, ou seja, os operados, geralmente “têm menos foco nos
atos ocorridos entre a cooperativa e os seus pais e buscam atender, antes de tudo, pro-
cooperados. Dependendo do tipo de coo- fessores, livreiros e editores” (Cooperados
perativa, podem deixar de ser pagos os em grupo focal).
impostos de Renda, sobre serviços, sobre Não havendo condições de calcular os
a circulação de mercadorias e serviços de custos, foram obtidos os dados das planilhas
transporte e comunicação e outros. Haven- do Colégio, que compreendem as suas des-
do caráter não-lucrativo, no sentido antes pesas, do ponto de vista contábil (Tabela 1).
indicado, e isenções fiscais, era feito o ra- Os dados, tais quais constam dos documen-
teio das despesas entre os cooperados. tos fornecidos, incluem muitos números
Estas eram controladas pelo Conselho redondos, sugerindo que são estimativas ou
Administrativo da Cooperativa, que toma- um orçamento preliminar. Cabe esclarecer
va providências relativamente simples de que se consideraram os salários brutos men-
economia, como, por exemplo, a circula- sais e anuais, incluindo todos os encargos
ção dos livros adquiridos entre os alunos trabalhistas correspondentes e eventuais

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Gerrá Leite Correia de Araújo
Candido Alberto Gomes

gratificações. Isso, aliás, caracteriza a ver- em geral apontando-se desvantagens para


dadeira cooperativa, em vez de entidades turmas muito grandes e muito pequenas
artificiosas que obrigam os trabalhadores a (Gomes, 2005). Segundo cálculos com da-
ser “cooperados” e a fazer descontos da sua dos originais do Censo Escolar de 2003
remuneração para fugir às obrigações tra- (Inep/MEC), na rede estadual de Goiás a
balhistas e previdenciárias. Foram também média de alunos por turma era de 59,5 e,
incluídos os honorários da diretoria da Co- na rede particular, era de 38,4. Já as médi-
operativa, pagos sob a forma de pró-labore, as de alunos por função docente eram, de
por se tratar de sociedade cooperativista, de 21,6 e 13,6 nas redes pública e privada, res-
acordo com a citada Lei nº 5.764, de 16 de pectivamente. O Colégio enfocado pela pre-
dezembro de 1971 (Brasil, 2006). Sendo es- sente pesquisa se situava muito abaixo des-
tes os únicos dados disponíveis, deve-se sas médias, porém, na percepção dos in-
considerá-los como uma aproximação razo- formantes, não indicava capacidade ocio-
ável da realidade. sa, pois a sua função era atender satisfato-
A Tabela 1 deixa claro que a maior par- riamente aos filhos dos cooperados. De
te das despesas se refere ao corpo docente. qualquer forma, deve-se reconhecer que um
Com efeito, o mínimo salário por hora-aula número maior de alunos permitiria um ra-
de uma cooperativa educacional é estabe- teio das despesas a menor para os coopera-
lecido pela Organização das Cooperativas dos. Permitiria também arrecadar mais re-
Brasileiras e, no exercício de 2003, foi de cursos para investimento, de modo a resol-
R$ 8,00. Na Cooperativa em foco, o valor ver a questão de o estabelecimento funcio-
da hora-aula era de R$ 8,70 e o salário mé- nar em prédio cedido.
dio mensal bruto por professor, de R$ 495 Quanto ao material de consumo e às
por uma média de dez horas-aula semanais. outras despesas, eram muito menores que
Este vinha a ser o maior valor pago na cida- as do pessoal, com destaque para material
de, uma vez que a rede estadual remunera- didático, encargos e taxas e água, energia
va a hora-aula por R$ 4,00 e o outro estabe- elétrica e telefone. A Tabela 2 indica que a
lecimento particular (que só oferecia o en- despesa com o pessoal docente
sino fundamental), por R$ 7,00. Neste últi- correspondia a quase a metade e com o
mo a média salarial era maior, isto é, de R$ pessoal não-docente a quase um terço do
600,00 para 20 horas semanais. total. O pessoal era responsável, ao todo,
O Colégio Alternativo tinha em média por 84,32% das despesas estimadas. Numa
19 alunos por turma e oito alunos por pro- pesquisa sobre o ensino médio público, os
fessor. Estas médias foram consideradas salários totais variaram de 85,11% a
pelos entrevistados como positivas para o 90,21% do custo/aluno (Brasil, 2002).
sucesso do ensino-aprendizagem, permitin- Note-se, porém, que despesas não são cus-
do que os professores dispensassem mais tos e que, mesmo em se tratando destes
tempo para cada aluno (o que foi corrobo- últimos, há diversas metodologias de apu-
rado pelas observações). Deve-se consignar ração, sem unanimidade de resultados.
que, para a literatura internacional, é con- Dividindo-se a despesa total estima-
trovertida a associação entre o número de da pela matrícula, chega-se à despesa por
alunos por turma e o rendimento escolar, aluno/mês de R$ 131,35. Levando em

322 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 313-326, set./dez. 2006.
Cooperativismo: alternativa viável para a gestão escolar?
Um estudo de caso

consideração as estimativas anuais das Acrescentando-se o aluguel suposto, che-


planilhas, que parecem mais aproximadas ga-se a R$ 137,51. À época da coleta de
da realidade, o valor seria de R$ 1.721,38 dados, foi informado que os pais pagavam
por aluno/ano. Como, porém, considerar o dez parcelas mensais de R$ 175,00 tanto
valor da cessão do prédio? Conforme ava- para o ensino fundamental quanto para o
liação obtida na comunidade, o aluguel médio. Multiplicando-se pela matrícula,
suposto a ser pago, a preço de mercado, por teríamos R$ 227.500,00, o que superaria
uma edificação semelhante à cedida seria a despesa total de 2003 em 1,66%. Pela
de R$ 800,00 mensais. Acrescentando-se legislação, as despesas são rateadas entre
este montante, a despesa média aluno/ano os cooperados.
passaria a ser de R$ 1.795,23, sem incluir o O único estabelecimento particular da
valor dos móveis e equipamentos. cidade, de natureza confessional, cobrava
A título de comparação simplesmen- a mensalidade de R$ 195,00 pelas quatro
te ilustrativa, convém citar que o custo/ últimas séries do ensino fundamental. Se
aluno no ensino médio público, apurado fosse oferecido o ensino médio, tal mensa-
por pesquisa de campo realizada em 2001 lidade seria maior. Embora não tivessem
(Brasil, 2002), segundo outra metodologia, sido apurados os números exatos, as mé-
variou de R$ 301,44 a R$ 592,86 (ou, res- dias de alunos por turma e alunos por pro-
pectivamente, a R$ 375,02 e R$ 737,58 a fessor eram bem mais altas. Apenas a títu-
preços de 2003, com a correção pelo IPCA- lo ilustrativo, a mensalidade do Colégio
IBGE). Os custos muito mais baixos que Alternativo era 10,26% mais baixa que a
as despesas do Colégio Alternativo pare- daquele estabelecimento, e a despesa mé-
cem se dever em grande parte às vanta- dia estimada por aluno/mês do primeiro
gens da economia de escala. A menor ma- (R$ 137,51) ficava 29,48% abaixo da men-
trícula dos estabelecimentos incluídos salidade do segundo.
naquele relatório foi de 1.604 alunos. A
média de alunos por turma foi de 37 a 48,
enquanto a média de alunos por professor Conclusões
ficou entre 24 e 36. Por outro lado, a mé-
dia de funcionários não-docentes por alu- A Cooperativa, pelas evidências, orga-
no teve a variação de 59 a 115, ao passo niza-se em bases participativas, objeti-
que no Colégio Alternativo esta proporção vando não só suprir seus cooperados de
era de 10. Além disso, o custo salarial bens e serviços educacionais, como tam-
médio docente por hora, na citada pesqui- bém realizar determinados programas
sa sobre o ensino médio, situava-se entre educativos e sociais. Sua organização e fun-
R$ 2,95 e R$ 8,13 (R$ 3,67 e R$ 10,11, res- cionamento, apesar de indicações de que
pectivamente, segundo a correção para a participação nas reuniões deveria ser
2003 pelo IPCA-IBGE). maior, eram coerentes com os princípios
Como o Colégio Alternativo, numa cooperativistas. Havia, porém, indícios de
cidade de porte médio, pagava R$ 8,70 por que os cooperados tinham certas restrições
hora-aula, os seus professores eram rela- em relação a efetuar maiores investimen-
tivamente muito bem remunerados, ape- tos, como, por exemplo, a construção de
sar da pequena matrícula e das reduzidas nova sede e a constituição do laboratório
médias de alunos por professor e por fun- de informática.
cionário. Apesar de todas as diferenças, é Quanto à estimativa da despesa mé-
provável que a gestão da Cooperativa, o dia aluno/ano, é aparentemente muito mais
seu caráter não lucrativo e as isenções fis- elevada que o custo dos estabelecimentos
cais (que, entretanto, não cobriam os en- públicos pesquisados em 2001 (Brasil,
cargos trabalhistas) contribuíssem para 2002), por ser um estabelecimento relati-
que, apesar da despesa média elevada, os vamente pequeno, que não se valia de
professores alcançassem tal nível salari- modo amplo das vantagens da economia
al, sendo correspondentemente exigidos de escala. Entretanto, os cooperados paga-
no seu trabalho pelas direções do Colégio vam menos do que se tivessem os filhos
e da Cooperativa. numa unidade escolar privada stricto
Outra questão se refere aos preços pa- sensu. As turmas eram menores e os pro-
gos no mercado local pelos pais e a despesa fessores não só percebiam o maior salário
média aluno/mês do Colégio Alternativo. por hora-aula do município como só em
Esta despesa já foi estimada em R$ 131,35. dois casos eram menos remunerados que

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Gerrá Leite Correia de Araújo
Candido Alberto Gomes

os seus colegas das escolas públicas Estes, de modo geral, consideraram que
investigadas em todo o País (Brasil, 2002). a participação na Cooperativa e no Co-
Os processos de participação eram légio era muito maior que nos setores
ativos para os diferentes atores integran- público e particular e que os professo-
tes da comunidade escolar. A reputação res podiam ser cuidadosamente
do Colégio na comunidade era elevada, monitorados. Se os mesmos recursos
tanto pelo aproveitamento dos alunos e financeiros fossem entregues à escola
a sua aprovação em processos seletivos pública, seriam obtidos idênticos re-
em geral como pelo rigor da disciplina. sultados? Certamente não. Mesmo que
Os cooperados se revelavam satisfeitos a gestão fosse revolucionada, as barrei-
porque o objetivo de preparar os alunos ras burocráticas vencidas e o porte da
para a vida, tal como a concebiam, era escola pública alterado, seria ingênuo
atingido, apesar da proclamação de um supor que o modelo pudesse ser tão am-
ideário pedagógico diferente. A prática pliado. Como se frisou, o Colégio em
pedagógica acabava sendo modelada pe- tela não conta com as camadas popula-
las expectativas dos cooperados, tornan- res e os problemas de capital cultural
do as teorias esposadas apenas valores e adequação da escola, de maneira in-
proclamados. Sendo à época o único es- clusiva, a um alunado heterogêneo. A
tabelecimento particular a oferecer o en- Cooperativa é um projeto de camadas
sino médio na cidade, o fato de não es- sociais médias, ao passo que a escola
colher a escola pública levaria parte sig- pública deve ser universal e lidar com
nificativa do seu alunado a estudar em diversidades muito mais amplas, inclu-
Goiânia. Esta mudança significaria ele- sive de aspirações educacionais e
var as despesas indiretas com a educa- ocupacionais. De qualquer forma, pode
ção, com aluguel de habitação, transpor- ser registrado um paradoxo: a Coope-
te, alimentação e outras. Portanto, pelas rativa e o Colégio foram criados como
indicações verificadas, os objetivos eram alternativa às escolas públicas e parti-
alcançados. culares. No Colégio a gestão era mais
A Cooperativa e o Colégio podem ser democrática e o protagonismo de pais e
vistos como meios de maximizar a rela- alunos, maior que na escola pública,
ção custos-benefícios em favor de um pro- que, constitucional e legalmente, deve-
jeto de ascensão social de grupos perten- ria ser gerida assim.
centes às camadas médias da população. Entretanto, o fato de o projeto ser
Os cooperados conseguiam pagar menos de camadas médias e apresentar nível
por uma educação por eles acompanhada relativamente elevado de participação
e, de certo modo, dirigida e supervisiona- (pelo menos mais alto que na escola
da. Esta educação tinha como alvos a con- pública) não deve conduzir a subesti-
servação ou a elevação do status das fa- mar as comunidades de baixa renda. A
mílias na geração seguinte por meio do literatura apresenta evidências de pro-
acesso a cargos públicos por concurso e jetos sociais bem-sucedidos, inclusive
por meio da continuidade dos estudos em ao criar raízes e continuidade, em gran-
nível superior. Neste sentido, a discipli- de parte porque são participativos. O
na era uma das suas tônicas. As contradi- capital social das populações pobres
ções entre ideário pedagógico escrito e a com freqüência é rico e pode contribuir
sua prática, entre os princípios do para este sucesso, ainda que se reconhe-
cooperativismo e a ampla participação dos çam os riscos de cooptação destas po-
cooperados, entre a oferta de educação a pulações, como o clientelismo. As or-
custos mais baixos e a protelação de in- ganizações empresariais – e não só os
vestimentos importantes se apresentam de projetos sociais – também se tornam
modo semelhante às ambigüidades de mais abertas e participativas, com o
outras escolas cooperativas e do próprio compartilhamento do poder organi-
cooperativismo. zacional (Kliksberg, 2003). Será então
Entre as questões que se pode pro- o cooperativismo, nascido no século 19,
por à reflexão está a de que a escola pú- apesar de todas as suas contradições (ou
blica, apesar da determinação constitu- exatamente por elas, caso se considere
cional da gestão democrática, na percep- que a história brota das contradições),
ção de entrevistados, parecia centrada um caminho significativo e promissor
no diretor e na Secretaria de Educação. para o século 21?

324 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 313-326, set./dez. 2006.
Cooperativismo: alternativa viável para a gestão escolar?
Um estudo de caso

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Gerrá Leite Correia de Araújo, mestre em Educação pela Universidade Católica


de Brasília (UCB), é professor e ex-gestor escolar da rede pública do Distrito Federal.

Candido Alberto Gomes é professor titular fundador da Universidade Católica de


Brasília (UCB).
cgomes@pos.ucb.br

Recebido em 5 de maio de 2006.


Aprovado em 6 de outubro de 2006.

326 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 313-326, set./dez. 2006.
ESTUDOS

A metáfora guerra na comunicação


das idéias de HIV/Aids em livros
didáticos

Marta Bellini
Priscila Caroza Frasson

Resumo
Apresenta o exame das figuras de retórica, destacando as metáforas presentes em
nove livros didáticos e numa apostila de ciências de ensino médio. A seleção dos livros e
do tema – HIV/Aids – foi feita a partir de uma entrevista com roteiro com trinta alunos do
ensino médio de uma escola pública de Bandeirantes, Paraná. Esses alunos indicaram o
tema HIV/Aids como um dos assuntos que queriam conhecer mais. Para a análise das
figuras de retórica dos textos didáticos, a pesquisa fundamentou-se nos estudos de Lakoff
e Johnson (2002), Breton (2003) e Reboul (2004). Entre as figuras examinadas destacou-se
a metáfora guerra como condutora do modelo conceitual sobre o HIV/Aids. Esta metáfora,
segundo as autoras, é imprópria para uma educação preventiva, pois subjuga os leitores/
alunos e professores ao medo e à coerção.

Palavras-chave: figuras de retórica; metáforas; HIV/Aids; livros didáticos.

Abstract The war metaphor in the transmission of HIV/


Aids ideas in textbooks

The work presents an analysis of rhetorical figures of speech, with special reference
to metaphor, in nine textbooks and a science handout for secondary schools. Choice of
books and the HIV/Aids theme were made from a structured interview with thirty secondary
school students of a government school in Bandeirantes, State of Paraná, Brazil. Students
chose the HIV/Aids theme as a subject matter, ,which they desired to know more about.
Studies by Lakoff and Johnson (2002), Breton (2003) and Reboul (2004) underpinned the
analysis of figures of speech in school textbooks. The war metaphor representing the
conceptual model on HIV/Aids has been conspicuous among the figures of speech analyzed.
From the point of view of the authors of the current research, the above metaphor is
inadequate for preventive education since it subjects readers/students and teachers to
fear and coercion.

Keywords: figures of speech; metaphors; HIV/Aids; textbooks.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez. 2006. 327
Marta Bellini
Priscila Caroza Frasson

Introdução de estilo ou um meio retórico funcional


para “exprimir-se de um modo marcante,
com encanto e emoção” (Reboul, 2004, p.
O objetivo deste artigo é mostrar que as
113). Quando recorremos às essas figuras
idéias de HIV/Aids, nos livros didáticos, se
impomos “sentidos” à fala ou escrita, ou
constituem argumentos fundamentados na
seja, impomos nossas idéias, concepções de
metáfora guerra e que esta noção não é inte-
ressante para estruturar a conduta e a ação vida e de mundo àquele que nos lê ou nos
de jovens estudantes diante da epidemia. ouve. Entre as figuras de retórica, a metá-
Apesar de a metáfora guerra ser um concei- fora apresenta um papel fundamental.
to presente no cotidiano de nossa cultura “A essência da metáfora é compreen-
(sempre falamos em debate, defender nossa der e experienciar uma coisa em termos
idéia, ataque-defesa, batalha verbal), a idéia de outra” (Lakoff, Johnson, 2002, p. 48-49).
guerra para apresentar nos livros didáticos o Na vida cotidiana as metáforas não são
modo de infecção por HIV/Aids gera uma meras palavras ou questões da linguagem.
estratégia de comunicação limitada, pois, As metáforas são, também, partes dos pro-
nestes livros, trata-se de uma luta em que o cessos de pensamento. Metáfora significa
vírus quase sempre é o vencedor. conceito metafórico.
De acordo com Ayres (2002, p.15-16),
as estratégias de educação que optam pelo Os conceitos que governam nosso pen-
terror não são eficazes à prevenção da Aids. samento não são meras questões do inte-
Para ele, “A primeira lição aprendida, logo lecto. Eles governam também a nossa ati-
nos primeiros anos da epidemia, é que o vidade cotidiana até nos detalhes mais
caminho do terror, do susto, de que quan- triviais. Eles estruturam o que percebe-
to mais assustadora a propaganda melhor mos, a maneira como nos comportamos
seu efeito preventivo, é extremamente li- e o modo como nos relacionamos com
mitado”. Longe de conseguir adesão para outras pessoas. Tal sistema conceitual
a prevenção e/ou tratamento, essa forma desempenha, portanto, um papel central
de educação afastou os jovens, pois “aju- de nossa realidade cotidiana. [...] Mas
dou a gerar e aumentar a discriminação e nosso sistema conceitual não é algo do
o preconceito”, “desmobilizando os jovens qual normalmente temos consciência.
ao associar a infecção do HIV ao sofrimen- Na maioria dos pequenos atos da nossa
to”. “Repita-se aqui Betinho”, diz Ayres. “É a vida cotidiana, pensamos e agimos auto-
possibilidade da vida que nos leva a interagir, maticamente, seguindo certas linhas de
construir, planejar, não a certeza da morte.” conduta, que não se deixam aprender fa-
Como os livros didáticos destinam-se cilmente. Um dos meios de descobri-las
à educação científica dos jovens, podería- é considerar a linguagem. Já que a comu-
mos esperar que, pelo menos, no plano da nicação é baseada no mesmo sistema
reconstrução conceitual em sala de aula, conceitual que usamos para pensar e agir,
estes livros estabelecessem o ensino das a linguagem é uma fonte de evidência
noções básicas sobre o funcionamento do importante de como é esse sistema
HIV/Aids segundo os conhecimentos/mo- (Lakoff, Johnson, 2002, p. 45-46).
delos científicos dos últimos anos, pois
estes modelos são elaborados segundo a Lakoff e Johnson (2002) classificam as
metáfora interação. No entanto, os livros metáforas em estruturais, quando um con-
didáticos por nós examinados, ao apresen- ceito é estruturado metaforicamente em
tar o vírus HIV e os aspectos da síndrome termos do outro (“debater é combater”),
Aids, optam pelas dimensões bélicas para orientacionais (“estou me sentindo para
estruturar o modelo e o funcionamento do cima hoje”, ou “estou down”, “ele caiu
HIV/Aids, deixando de lado a idéia de doente”) e ontológicas (metáforas de enti-
interação dos textos científicos. dade e de substância, como “A inflação está
nos colocando em um beco sem saída”, “Há
tanto ódio nesse mundo”, “aquela foi uma
A metáfora guerra na boa pegada”, “ele explodiu”). As metáforas
situação de ensino: nos permitem atribuir sentido às nossas
considerações teóricas experiências; desse modo, falamos “amor
é loucura”, “amor é guerra”, “amor é uma
As figuras de retórica ou de linguagem, viagem”, “tempo é dinheiro”, “estou para
como chamam os gramáticos, são recursos cima”, “debater é guerrear”, “administrar

328 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez. 2006.
A metáfora guerra na comunicação das idéias de HIV/Aids em livros didáticos

o tempo” e “pegar uma idéia”, para esta- não substitui o repórter somente, mas
belecer nossas ações cotidianas e para ex- enfatiza a instituição.
pressar o que estamos pensando. Outro estudo da metáfora e de outras
Um dos conceitos metafóricos presen- figuras de retórica é o de Olivier Reboul
tes no dia-a-dia de nossa vida é o conceito (2004). Este autor apresenta-nos um inte-
discussão, e, pela metáfora, discussão é ressante estudo de argumentação e nos con-
guerra. Esta metáfora é presente em nosso duz a uma compreensão bem rigorosa das
cotidiano com uma variedade de expres- figuras que compõem o sistema retórico.
sões, dizem Lakoff e Johnson (2002). Em Destacamos de Reboul (2004), para efeito
uma discussão falamos em “ganhar ou de nosso artigo, a sinédoque e a hipérbole,
perder terreno”, “ele atacou todos os pon- que são figuras correntes nos livros didáti-
tos fracos de minha argumentação”, “suas cos que analisamos. A sinédoque cumpre
críticas foram direto ao alvo”, “destruí sua uma função de proposição universal; desig-
argumentação”, “ele derrubou os argumen- na uma coisa por meio da outra que tem
tos”. Não é possível, para os autores, com ela uma relação de necessidade, como
a parte pelo todo, a matéria pelo objeto,
[...] imaginar uma cultura em que as dis- como o exemplo “cem cabeças por cem pes-
cussões não sejam vistas em termos de soas”, sinédoque da parte, ou “cem mortais”,
guerra, em que não haja ganhadores nem sinédoque da espécie (Reboul, 2004, p. 121).
perdedores [...]. Imagine uma cultura em A hipérbole é a figura que denota exagero,
que uma discussão seja vista como uma amplifica ou condensa um argumento
dança, em que os participantes sejam vis- (Reboul, 2004, p. 120).
tos como dançarinos e em que o objetivo Como destacamos as figuras de retóri-
seja realizar uma dança de um modo equi- ca nos livros didáticos, para avaliá-los, re-
librado e esteticamente agradável. Nessa corremos ao estudo de Paula Contenças
cultura, as pessoas perceberiam as discus- (1999) que trata das funções da metáfora
sões de outra maneira, experienciariam as no processo de elaboração de modelos
discussões diferentemente. Mas nós, pro- conceituais científicos. Contenças (1999)
vavelmente, não consideraríamos essa ati- examinou, nas produções escritas na área
vidade uma discussão: as pessoas estari- de genética de 1953 a 1966, suas constru-
am fazendo algo diferente (Lakoff, ções metafóricas. A autora distinguiu em
Johnson, 2002, p. 47). seu estudo dois tipos de metáforas: as subs-
tantivas ou constitutivas e as exegéticas ou
Em suma, para Lakoff e Johnson pedagógicas. As primeiras aparecem na
(2002), as discussões normalmente se- ciência; são utilizadas pelos cientistas para
guem padrões; a linguagem traduz concei- expressar suas teses teóricas. Estas expres-
tos e o modo como estruturamos os aspec- sões metafóricas permitem aos cientistas
tos do mundo em que vivemos. “realizar a tarefa de acomodação da lingua-
Os conceitos são estruturados pelas gem à estrutura causal do mundo”
metáforas e também por outras figuras (Contenças, 1999, p. 73). As segundas de-
de retórica (ou linguagem) que dão su- sempenham um papel importante na co-
porte às metáforas. Lakoff e Johnson municação e explicação das teorias e es-
(2002, p. 92-93), nesse sentido, descre- tão presentes nos livros didáticos
vem a função referencial da metonímia. (Contenças, 1999, p. 72).
Demonstram que esta figura está presen- Os conceitos metafóricos nas produ-
te quando atribuímos qualidades huma- ções escritas na área da genética são as que
nas a entidades não humanas, como “A conhecemos até hoje: “dupla hélice”, “ca-
inflação roubou minhas economias”, deias polinucleotídicas”, “mapa genético”,
“Ele está na dança” (na profissão dan- molécula “esqueleto” de açúcar, RNA “men-
ça). Está presente, ainda, quando descre- sageiro”, “código”, “cópia” como traslado de
vemos a parte pelo todo, como “O auto- caracteres “escritos”, “informação” genéti-
móvel está entupindo nossas estradas” ca, genes estruturais, genes transcritos, le-
(o conjunto de automóveis). Mas, dizem tras do código genético, mecanismo de lei-
os autores, “metonímia não é meramente tura dos genes, dicionário de código de
referencial”, pois ela tem “pelo menos em palavras (genéticas). Todas são expressões
parte o mesmo uso que a metáfora”, como metafóricas que constituíram as teorias
quando falamos “O Times ainda não che- e os modelos conceituais da área. Essas
gou para a coletiva”. Nesse caso, o Times metáforas proporcionaram uma estrutura

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez. 2006. 329
Marta Bellini
Priscila Caroza Frasson

coerente na comunicação, conceitualização de educação, adesão e vulnerabilidade.


e categorização da genética. Ou como disse Sanches (1999), a
A transposição dessas expressões ou “Síndrome de Imunodeficiência Adqui-
conceitos metafóricos para o livro didáti- rida (Aids) é um problema de Saúde
co significa que as metáforas serão, nova- Pública que alcançou proporções
mente, acomodadas a um novo universo pandêmicas” e está intimamente ligada
– o do ensino. As teorias científicas pas- à vida sexual de todos nós. Sabemos que
sam, então, por uma reconstrução de sen- a sexualidade é central na nossa vida, e
tido; ou seja, um novo discurso é produ- também reconhecemos que, por isso
zido, agora pelo autor do livro didático, o mesmo, é particularmente difícil con-
novo criador de metáforas. Desse modo, seguir adesão para a prevenção da
para Contenças (1999), se nas ciências as síndrome. Deste modo, quando se fala
metáforas permitem a elaboração das te- em HIV/Aids fala-se em enfrentar vári-
orias articulando-se a lógica da descober- as situações cotidianas: entre os profis-
ta com a lógica da justificação/comunica- sionais da saúde, cientistas, educado-
ção, nos livros didáticos, devido à exigên- res e todas as comunidades que se pre-
cia da aprendizagem dos alunos, os auto- ocupam em trabalhar com a adesão e
res lançam mão das metáforas vulnerabilidade diante da Aids, uma
constitutivas ou das exegéticas (pedagó- vez que o número de pessoas infectadas
gicas). Nesta tarefa os livros didáticos re- pelo vírus da imunodeficiência huma-
criam seu próprio discurso e, se o tema na (HIV), seu modo de transmissão e seu
for complexo, estes se afastam dos con- impacto na sociedade levou a Aids a
ceitos metafóricos originais como estra- tomar uma grande dimensão social
tégia pedagógica para conseguir a adesão (Sanches, 1999).
dos alunos aos temas apresentados. Historicamente, a Aids se constituiu
como “doença” estigmatizante de ho-
mens homossexuais. A partir de 1986, a
Por que HIV/Aids em livros proporção de homens homo e bissexuais
didáticos? decresceu de 71,3% para 24,6% em 1998
(Sanches, 1999). Hoje sabemos que, no
Nos livros didáticos, como vimos com Brasil, ocorreu o que se chama de
Contenças (1999), as expressões metafóri- feminização da Aids; a síndrome cres-
cas são mudadas para adequar o modelo ceu entre mulheres e, também, entre os
elaborado pelos cientistas ao modelo peda- jovens. Ocorreu expressiva elevação de
gógico e dele obter adesão dos alunos e do casos de mulheres infectadas: em 1985
professor na situação de ensino. O tema tínhamos 24 homens para uma mulher
HIV/Aids nos livros didáticos foi por nós infectada e em 1999 tivemos dois homens
escolhido para o exame das figuras de retó- para uma mulher, segundo o Boletim
rica após uma sondagem com 30 alunos do Epidemiológico de Aids de junho de 2004.
ensino médio entre 15 a 19 anos de idade, A Aids não ocorre mais somente no
na cidade de Bandeirantes, Paraná, em 2005. eixo Rio–São Paulo; aumentou em todos
O objetivo era conhecer, entre os temas de os centros urbanos, inclusive nos cen-
seus livros didáticos de ciências e de biolo- tros bem menores e em locais rurais em
gia, os que mais geravam dúvidas e/ou cu- extratos mais pobres (Sanches, 1999). Se-
riosidade entre os alunos de ensino médio. gundo Sanches (1999), os dados da Co-
De acordo com as respostas obtidas com a ordenação de DST/Aids-MS até novem-
aplicação de um questionário com seis per- bro de 1998 indicavam “mais de 95% dos
guntas, os 30 alunos apontaram a sexuali- casos com idade superior a 12 anos”;
dade/corpo humano como temas que que- “aproximadamente 70% estavam na fai-
riam conhecer melhor, e, entre estes, 20 xa etária entre 20 e 39 anos”. Indicavam
apontaram a Aids como tema que gostari- que 77,3% são homens e 22,7%, mulhe-
am de compreender mais. res; “a idade entre homens é de 30-34
Optamos, então, por analisar o que anos e entre mulheres de 25-29 anos, su-
os livros didáticos diziam sobre HIV/ gerindo que as mulheres se infectam em
Aids, primeiro porque estes livros são idades mais jovens”. Em pessoas maio-
os utilizados pelos 30 alunos e, em se- res que 12 anos, a transmissão de HIV
gundo lugar, porque o tema ganhou, ocorreu pela relação sexual em 54,3%
hoje, uma importância vital em termos dos casos (Sanches, 1999).

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A metáfora guerra na comunicação das idéias de HIV/Aids em livros didáticos

Como enfatiza Sanches (1999), a Livro 3: Biologia. José Luiz Soares. São
prevenção é, ainda, a melhor opção para Paulo: Scipione, 1999. Volume único.
o controle da epidemia da Aids, e é es- Livro 4: Biologia. Albino Fonseca. São
sencial o entendimento de como a do- Paulo: Cia. Editora Nacional, 1999.
ença é percebida em um contexto cultu-
ral para que se possa definir e desenvol- Livro 5: Biologia. Wilson Roberto Paulino.
ver estratégias preventivas. Para nós, em São Paulo: Ática, 2003.
termos educacionais, os livros didáticos Livro 6: Biologia – De olho no mundo do
podem contribuir para a compreensão da trabalho. Sídio Machado. São Paulo:
epidemia, todavia, pelo que analisamos, Scipione, 2003.
é necessário mudar o contexto de comu-
Livro 7: Fundamentos da Biologia Moder-
nicação destes livros. Estes livros, nove
na. José Mariano Amabis e Gilberto
ao todo e uma apostila do Curso Positi-
Rodrigues Martho. São Paulo: Moderna,
vo, são materiais didáticos usados nas 1998.
escolas da rede pública e da rede priva-
da da cidade de Bandeirantes, PR, por- Livro 8: Biologia integrada. Luiz Eduardo
tanto, são aprovados e indicados pelo Cheida. São Paulo: FTD, 2003.
Ministério da Educação. Estabelecemos Livro 9: Biologia. Sérgio Linhares e
como categoria livro mais usado na es- Fernando Gewandsznajder. São Paulo:
cola sua disponibilidade nas bibliotecas Ática, 1993.
das escolas, na biblioteca pública muni-
Livro 10: Apostila Positivo. Desafios do
cipal, para a consulta e estudo dos pro-
Conhecimento 1. Curitiba: Posigraf, 2004.
fessores e alunos, e livros indicados pe-
los professores, provenientes de suas
coleções particulares. No livro 1, Biologia Essencial de Sônia
Lopes, a Aids é caracterizada como doen-
No caso dos livros didáticos utiliza-
ça e não como síndrome (síndrome, um
dos no ensino dos jovens nas escolas de
conjunto de sintomas). Os vírus são
Bandeirantes, embora não sejam livros
“encapsulados ou envelopados” e “parasi-
para educação preventiva, o tema HIV/
tas intracelulares obrigatórios”. A autora
Aids exige um especial tipo de comuni-
descreve os vírus qualificando-os como
cação, que, para nós, são: a) uma apro-
“envelopes” (metáfora) e “parasitas”
ximação aos conceitos mais recentes da
(metonímia, espécie pela qualidade), “ex-
teoria sobre a interação HIV/Aids elabo-
tremamente simples” (hipérboles). Estes
rada pelos cientistas; b) uma apresenta-
seres extremamente simples injetam seu
ção dos modos de prevenção em uma lin-
material genético na célula hospedeira
guagem que não utilize expressões me-
(metáfora), o RNA do vírus comanda a sín-
tafóricas da guerra, porque elas podem
tese protéica na célula hospedeira e o DNA
provocar a fuga dos leitores e porque
é transcrito em várias moléculas de RNA.
estão distantes dos argumentos dos ci-
A autora não apresenta uma imagem do
entistas, como veremos mais adiante vírus HIV, mas somente do bacteriófago.
neste artigo. Em suma, para a autora, os vírus são seres
extremamente simples que atacam a célu-
la hospedeira, injetam seu material gené-
Procedimentos tico e comandam a síntese de seu RNA por
metodológicos: meio do DNA da célula hospedeira. A me-
o que dizem os livros sobre táfora guerra estrutura o modelo de funci-
HIV/Aids? onamento do HIV.
No livro 2, Biologia de José Arnaldo
Os livros analisados sob o enfoque das Favaretto e Clarinda Mercadante, os vírus
expressões metafóricas e outras figuras de são definidos como os únicos seres vivos
retórica foram: que não apresentam organização celular e
têm apenas RNA e DNA. Estes são descri-
Livro 1: Biologia Essencial. Sonia Lopes.
tos como parasitas intracelulares obrigató-
São Paulo: Saraiva, 2003.
rios (metonímia, espécie pela qualidade).
Livro 2: Biologia. José Arnaldo Favaretto Também são chamados de parasitas (metá-
e Clarinda Mercadante. São Paulo: Moder- fora) em “estado temporário de aparente ina-
na, 2003. Volume único. tividade no interior da célula hospedeira

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez. 2006. 331
Marta Bellini
Priscila Caroza Frasson

como o herpes” (metáfora). Apresentam o um corpo humano quando surge o sarcoma


HIV, como o vírus que invade os linfócitos de Kaposi, que é um tumor canceroso, o
humanos e, por meio de seu RNA, pela ação que, sabemos, não é correto. No texto do
da enzima transcriptase reversa, assume o livro, a metáfora guerra é, assim, também
comando de sua reprodução. Os autores es- presente: “O HIV invade e destrói os
tabelecem para a ação do HIV no corpo hu- linfócitos T”; “Assim, a destruição dos
mano a mesma metáfora guerra do livro 1. linfócitos T provoca a [...]”; “Nesta situa-
No livro 3, Biologia, de José Luiz Soa- ção, o organismo fica exposto ao desenvol-
res, o vírus HIV é definido como agente vimento de inúmeras doenças considera-
infectante de células vivas. Os vírus apre- das ‘oportunistas’”. O autor recorre à
sentam estrutura simplíssima (hipérbole). hipérbole para designar o tamanho dos ví-
Suas dimensões variam entre 17 nm (nm é rus: “Os vírus são extremamente pequenos”.
a milionésima parte de um milímetro) e 300 As metonímias são: “Os vírus são conheci-
nm (uma molécula de hemoglobina mede dos como parasitas intracelulares obriga-
6,4 nm de diâmetro). Define a membrana tórios” (figura de espécie pela qualidade);
externa dos vírus como cápsula protéica e “[...] há a representação dos bacteriófagos
o RNA como o miolo de ácido nucléico ou fagos, parasitas de certas bactérias” (fi-
(metonímia), que pode ser de DNA (vírus gura o ser pela espécie); “Os vírus são pa-
do herpes, adenovírus, bacteriófago) ou de rasitas de microrganismos [...]” (figura o ser
RNA (vírus da gripe, poliomielite, Aids e pela espécie). Quanto à prevenção, indica
mosaico do tabaco). Os vírus “[...] atacam o uso do preservativo e a esterilização de
as células injetando-lhes o seu ácido materiais cirúrgicos e odontológicos.
nucléico” (metáfora guerra). O livro 6, Biologia – de olho no mun-
No livro 4, Biologia, de Albino Fonse- do do trabalho, de Sídio Machado, descre-
ca, temos as mesmas definições de vírus ve o HIV/Aids como vírus com RNA, que,
dos livros 1, 2 e 3. O autor trata a Aids como pela ação da enzima transcriptase reversa,
uma síndrome, mas a define como mal re- sintetiza DNA. Indica os dois tipos de ví-
cente entre nós. Descreve os linfócitos T4 rus da Aids, o HIV-1 e o HIV-2. Ambos des-
e como estes atacam os “micróbios inva- troem o linfócito T auxiliar, a principal
sores”, enquanto que os linfócitos B pas- célula do sistema imunológico humano.
sam a produzir substâncias denominadas O HIV liga-se ao receptor CD4 na superfí-
anticorpos. O autor descreve como o vírus cie do linfócito T auxiliar e libera o
HIV ataca preferencialmente os linfócitos nucleocapsídeo para o interior da célula,
T4, inserindo seu código genético composto e o nucleocapsídeo se desfaz, liberando as
de RNA. Após o ataque, o HIV implanta duas fitas de RNA e as enzimas do HIV.
seu código genético no interior dos Descreve a evolução da Aids e as doenças
linfócitos T4, se duplica à custa deles e, provocadas por microrganismos oportu-
finalmente, os destrói, ameaçando, então, nistas: pneumonias, candidíase oral,
o sistema imunológico. As expressões ata- toxoplasmose, herpes e tuberculose, além
ca, implanta, destrói são expressões meta- dos tumores malignos. Machado também
fóricas da guerra. Quanto à prevenção da utiliza a metáfora estrutural guerra: “[...]
Aids, o autor utiliza-se de hipérboles como que era capaz de infectar bactérias e, por
é importantíssimo medidas de prevenção isso, ficou conhecido como vírus
da contaminação pelo HIV. Ou diz: Com bacteriófago, que significa “vírus comedor
certeza não transmitem o vírus da Aids o de bactérias”; “Os vírus são entidades in-
ar, as banheiras e privadas, a água das pis- fecciosas que não possuem [...]”; “O DNA
cinas, os abraços, os beijos sociais na face, do vírus assume o comando do citoplasma
na testa e doações de sangue com instru- da bactéria”; “Na última fase, a enzima
mentos descartáveis. Descreve, assim, uma endolisina produzida pelo vírus provoca a
concepção de prevenção ambígua. destruição ou lise da bactéria”. “Transcor-
No livro 5, Biologia, de Wilson Roberto ridos 30 minutos, há liberação de 100 no-
Paulino, o HIV é descrito como aquele ví- vos vírus que irão parasitar outras bactéri-
rus que invade e destrói os linfócitos T, as”; “o HIV-1 e o HIV-2, e ambos destroem
glóbulos brancos do sangue, essenciais para o linfócito T auxiliar”; “A enzima integrase
o funcionamento dos linfócitos B, produto- insere o DNA viral”; “[...] pode ficar dor-
res de anticorpos, e para a atividade mente (lisogenia) ou pode fazer o ciclo
fagocitária de outros glóbulos brancos. Para lítico, reproduzir-se rapidamente e destruir
o autor, a Aids torna-se mais evidente em o linfócito T auxiliar”; “Transcorridos 30

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A metáfora guerra na comunicação das idéias de HIV/Aids em livros didáticos

minutos, há liberação de 100 novos vírus os lugares onde possam parasitar quaisquer
que irão parasitar outras bactérias”; “O células e causar doenças virais ou viroses”;
DNA do vírus incorpora-se ao DNA “[...] não surjam doenças que se aprovei-
bacteriano e permanece dormente sob a tem do corpo já debilitado”. A hipérbole
forma de provírus”. assegura a noção de estrutura simples para
O livro 7, Fundamentos da Biologia o vírus: “[...] sua estrutura é a mais sim-
Moderna, de Amabis e Martho, expõe o ples que se conhece”.
HIV/Aids como retrovírus que se reprodu- O livro 9, Biologia – Programa Comple-
zem na célula. O livro descreve a ação da to, de Sérgio Linhares e Fernando
transcriptase reversa; a mensagem genéti- Gewandsznajder, destaca os dois tipos de
ca do RNA viral é transcrita para uma HIV: o HIV-1 e o HIV-2. De acordo com os
molécula de DNA. O HIV ataca os autores, os dois tipos de vírus atacam as
linfócitos T, causando a síndrome da células T4. Por isso, os doentes de Aids apre-
imunodeficiência adquirida. Para os auto- sentam uma grande vulnerabilidade a in-
res, a Aids é uma doença letal, ainda sem fecções por germes chamados oportunistas,
cura, que se disseminou rapidamente pelo que não causam problemas a pessoas com
mundo a partir de 1981. Dizem os auto- saúde normal. A metáfora guerra conduz os
res: “Um único vírus, ao invadir uma cé- argumentos utilizados pelos autores: “É cau-
lula, pode assumir o comando das ativi- sada por um vírus que ataca o linfócito T4”;
dades celulares”; “Como [os vírus] não “O sarcoma de Kaposi, que ataca os tecidos
possuem a maquinaria necessária para dos vasos sangüíneos [...]”; “Finalmente, por
realizar nenhum desses processos, desen- atacar também células do sistema nervoso,
volveram, [...] mecanismos para subverter ele pode causar distúrbios neurológicos –
o funcionamento da célula hospedeira e inclusive demência”; “Após penetrar na cé-
se reproduzir à custa do metabolismo ce- lula, o RNA do vírus”; “podendo atacar e
lular”; “[...] eles inibem o funcionamento destruir outras células”; “[...] a partir de ou-
do material genético da célula infectada e tro vírus que parasita os macacos verdes”;
passam a comandar a síntese de proteí- “O principal modo de transmissão se dá pelo
nas”; “A transcriptase penetra no núcleo ato sexual. O vírus pode penetrar através
da célula infectada e incorpora-se a um de lesões, cai na circulação e ataca os
de seus cromossomos”; “O HIV ataca os linfócitos do sangue”; “[...] a mulher conta-
linfócitos T”. Utilizam a hipérbole para minada pode passar o vírus para o bebê”;
designar a velocidade da interação dos “Suspeita-se que o contágio possa se dar
vírus com as células: “No entanto, sua também através da amamentação”.
capacidade reprodutiva é assombrosa [...]”; No livro 10, a Apostila Positivo – Desa-
“[...] capaz de produzir, em poucas horas, fios do Conhecimento 1, da Editora Posigraf/
milhões de novos indivíduos”. Predomi- AS, há a descrição do vírus HIV; apresenta
na no texto a metáfora guerra. as formas de contágio, sintomas, compli-
No livro 8, Biologia Integrada, de Luiz cações, tratamento e profilaxia. A Aids é
Eduardo Cheida, a Aids é apresentada em tratada como doença que destrói parte do
sua composição, estrutura, funções e re- sistema imunológico do corpo. Quando o
produção. O autor faz a descrição da for- vírus HIV é transmitido, ataca principal-
ma de transmissão, causas e sintomas da mente as células chamadas linfócitos T e
Aids. Para o autor, o vírus pode ficar no os macrófagos. As metáforas mais utiliza-
fluido vaginal e no sêmen quando é trans- das são as estruturais; indicando idéia de
mitido pela relação sexual. O vírus HIV guerra: “Atacam todos os seres vivos, es-
pode ser transmitido diretamente para o pecificamente, plantas ou animais e [...]”;
sangue de uma pessoa sadia por transfu- “Quando estão fora das células atacadas e,
sões ou por agulhas e seringas partilha- portanto, não estão se reproduzindo, não
das. O HIV ataca as células de defesa do manifestam nenhuma atividade vital”;
corpo e deixa a pessoa vulnerável a qual- “Esta doença destrói parte do sistema”; “[...]
quer doença. O autor utiliza a metáfora suas vítimas se tornam incapazes de se de-
guerra: “o vírus [...] adere a uma célula, fenderem (sic) de outros agentes etiológicos
parasita-a e se reproduz”; “Na maturação, oportunistas, como certos tipos de [...]”;
os capsídeos formados acoplam-se às no- “[...] o portador do HIV é um transmissor que
vas moléculas de DNA, produzindo novos deve ser orientado para precaver-se e não
vírus. Ocorre, posteriormente, a liberação contaminar ninguém”; “Quando o vírus HIV
dos vírus da célula infectada”; “[...] todos é transmitido, ataca principalmente”; “[...]

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Marta Bellini
Priscila Caroza Frasson

e ao se produzirem anticorpos para dar- Evolutivamente, o HIV é capaz de interagir


lhe combate, ficam sem ação diante das com células do sistema imunológico por
transformações que o vírus sofre [...]”; meio de estratégias de replicação bastante
“[...] ao amadurecimento do HIV, fase fi- elaboradas. As estratégias de replicação e
nal do ciclo”. evolução do HIV são tão organizadas que
Os dez textos analisados tratam o HIV os cientistas já conhecem, atualmente, nove
como estrutura “extremamente” simples; subtipos de vírus HIV, identificados como
vírus são seres de RNA que são capazes A, B, C, E, F, G, H, J e K – todos são produ-
de, por sua evolução, transformar RNA em tos de variações genéticas. São vírus pare-
DNA e realizar sua reprodução. Desse cidos que se diferenciam pela seqüência
modo, estes seres tão “simples” vencem a maior ou menor de genes (Bicudo, 2005).
guerra contra as células nas quais se hos- Não se trata, portanto, de um vírus
pedam. O esquema conceitual dos 10 li- extremamente simples. Delicato (2005)
vros – há livros com mais informações, indica a complexidade da membrana do
outros menos – é o mesmo em termos das HIV, em termos de estrutura e funciona-
expressões que levam à metáfora guerra. mento bioquímico, quando mostra que
Este esquema traduz-se em: “seres simples ele apresenta duas membranas: a externa
ou extremamente simples (hipérbole) ata- e a interna membrana. A primeira mem-
cam uma célula (a hospedeira), lançam (ou brana é lipoprotéica, formada por 72 com-
implantam ou inserem) seu material gené- plexos de glicopreteina ligada aos lipídeos
tico nesta célula e reproduzem”. O vírus do chamado envelope. Cada complexo
aparece descrito como onipotente. Se ele apresenta uma glicoproteína, a gpl120, e
(o vírus) pode tudo – o vírus vence a guer- uma proteína transmembranar, a gpl41,
ra contra o organismo –, se ele sempre ven- que mudam sua estrutura de acordo com
ce, ou fugimos desta lição, para que ela não o ambiente. Internamente à membrana do
nos atormente, ou deixamos a sexualida- HIV há um envoltório de proteína deno-
de de lado. Sabemos que não é correta esta minada p17, que delimita o espaço da
afirmação, pelo menos para os cientistas. cápsula protéica formada pelo antígeno
Na secção seguinte vamos indicar, então, denominado p24. No interior dessa cáp-
como os cientistas comunicam-nos as des- sula há outro complexo proteína-ácido,
cobertas sobre o HIV/Aids. formado por duas moléculas de RNA as-
sociadas à nucleoproteína denominada
p7 e à enzima transcriptase reversa. A
O que dizem os textos partícula viral tem enzimas que proces-
científicos: a metáfora sam a replicação do HIV: são a
interação transcriptase reversa, a integrase p12 e a
protease p11 (Delicato, 2005).
Se não é a metáfora guerra a forma de De acordo com Roitt, Brostoff e Male
comunicar a idéia de HIV/Aids nos livros (2003), o HIV interage com as células T ou
didáticos, qual seria um outro tipo de co- linfócitos T auxiliares (Helper), células que
municação do tema? Como dissemos, a têm a função de controlar a resposta do or-
idéia de combate entre o organismo huma- ganismo às infecções. As células T apresen-
no e um ser “muito simples” traduz-se em tam em sua superfície uma molécula, a CD4
um jogo de guerra em que, segundo os li- ou receptor CD4, uma glicoproteína
vros didáticos, vence o vírus. Para investi- monomérica de 58 kDa (quilodáltons), e o
gar um outro modo de expressão metafóri- HIV interage exatamente com este receptor
ca do tema HIV/Aids, oito textos científi- CD4, tirando das células T sua capacidade
cos, descritos nesta seção, acerca da estru- de controlar a entrada e reprodução do HIV.
tura e funcionamento do HIV, foram exa- O mecanismo pelo qual o HIV atinge e
minados. Afinal, destes textos são destrói os linfócitos ainda não está claramen-
estruturados outros que servem à finalida- te compreendido. Há vários modelos para
de de divulgação científica. Vamos descre- explicitar este mecanismo. O modelo mais
ver como o tema HIV/Aids é neles tratado aceito é o da ligação intracelular entre o re-
e estabelecer qual metáfora estrutura a ceptor CD4 da célula T e a proteína gp120
noção de HIV/Aids. do HIV (Roitt, Brostoff; Male, 2003). Este
Em Bicudo (2005) o HIV é descrito modelo é o que apresenta o HIV-1 realizan-
como um vírus complexo tanto do ponto do o processo de adsorção e fusão de sua
de vista bioquímico como evolutivo. estrutura com a membrana citoplasmática

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A metáfora guerra na comunicação das idéias de HIV/Aids em livros didáticos

do linfócito. Esta fusão é, na verdade, a monócitos próximos ao local da infecção


interação das proteínas do envelope viral e, em seguida, nos tecidos linfóides regio-
gp120 (glicoproteína) com os receptores da nais (Delicato, 2005).
superfície da célula CD4 (receptor), CCR5 Janeway, Travers, Walport e
ou CXCR4 (co-receptores) dos linfócitos T Shlomchik (2002) descrevem que, a par-
Helper e das células da linhagem dos tir do momento em que há redução no
macrófagos (Delicato, 2005). A fusão entre número de células T CD4 no organismo
HIV e o linfócito provoca a transformação pela entrada do HIV, pode-se falar em três
na forma e função das células T. Há, então, mecanismos: no primeiro, há a morte di-
mudança nos receptores das membranas do reta das células infectadas pelo vírus; no
linfócito, ocorrendo, então, a chamada in- segundo, aumenta a suscetibilidade do
fecção por HIV (Janeway et al., 2002). organismo; no terceiro, a morte das célu-
Quanto à replicação HIV, este apresen- las T CD4. Quando o número de células
ta um genoma com nove genes com lon- T CD4 fica abaixo de um nível crítico, o
gas seqüências terminais repetitivas corpo humano perde a imunidade celu-
(LTRs), que se integram ao DNA do lar e surgem os sintomas como a febre,
linfócito (Janeway et al., 2002). Todavia, a sudorese noturna, diarréia e perda de
interação entre o RNA do vírus e o DNA peso. Em seguida, surgem as infecções
do linfócito não é tão fácil de ser realiza- por uma variedade de agentes oportunis-
da. Os linfócitos criam mecanismos para tas. Em geral, a resistência do organismo
evitar a exportação de transcritos de sucumbe à candida oral ou candida
mRNA processados em seu núcleo. Isso albicans e ao mycobacterium tuberculosis.
pode ser um problema para o HIV, pois ele Neste estágio, a contagem de células T
depende da exportação de espécies de CD4 encontra-se normalmente abaixo de
mRNA não processados para traduzir to- 200/Ìl. Mais tarde, os pacientes podem ter
das as proteínas virais. o Herpes zoster, os linfomas e sarcoma de
De acordo com Delicato (2005) os es- Kaposi ou outras doenças.
tudos sobre o HIV indicam que a Os anticorpos contra o HIV aparecem,
replicação viral é dinâmica, e os linfócitos no sangue de indivíduos infectados, de 3 a
e os vírus interagem em um processo de 12 semanas. Este período é denominado
auto-regulação. Por um lado, os linfócitos de “anela imunológica”; é o período com-
reagem ao HIV; por outro, o próprio preendido entre o momento da infecção e
genoma do HIV “erra” em sua replicação. o aparecimento de anticorpos anti-HIV em
Ocorre uma pressão seletiva sobre o HIV concentração suficiente para permitir a sua
por mutações pré-existentes exercida por detecção pelas técnicas laboratoriais cor-
certas drogas ou pelo próprio sistema rentes (Manual de condutas, 2000). Os tes-
imunológico que produz anticorpos tes utilizados com maior freqüência para a
neutralizantes ou células T citotóxicas. detecção de anticorpos anti-HIV são os
A capacidade de infecção de um or- ensaios imunoenzimáticos (ELISA =
ganismo pelo HIV depende dos fatores de Enzyme-Linked Immunosorbent Assay), por
risco biológicos e comportamentais; bio- sua facilidade de automação e custo rela-
lógicos são aqueles que dizem respeito à tivamente baixo. Há, segundo o Ministé-
concentração do HIV no fluido biológico, rio da Saúde (Manual de condutas, 2000),
integridade e vulnerabilidade da mucosa outras técnicas que detectam diretamente
(anal, oral e vaginal), duração da exposi- o vírus ou suas partículas e são utilizadas
ção e amostra viral não transmitida. A em situações específicas.
transmissão do vírus HIV pode ocorrer Com relação ao tratamento da Aids,
pelo ato sexual, sangue e vertical, ou seja, desde 1987, usa-se a zidovudina (AZT); é
de mãe para filho, por meio de uma infec- como análogo ao nucleosídeo inibidor da
ção durante a gestação, perinatal, pós-na- transcriptase reversa, a enzima utilizada
tal ou durante o aleitamento. O HIV tem pelo HIV. O período ideal para o início da
acesso ao organismo pelas mucosas que terapia ainda é controverso, mas, geralmen-
são ricas em células de Langerhans (célu- te, ocorre quando há uma contagem repeti-
las que capturam antígenos e partículas da de células CD4 em torno de 200-400 cé-
virais). Após 18 horas de infecção, os ví- lulas/ìL-1 e em todos os pacientes sintomá-
rus se encontram em células dendríticas e ticos (Roitt, Brostoff, Male, 2003). Segundo
células T da mucosa genital e, em poucos Janeway, Travers, Walport e Shlomchik
dias, detecta-se vírus em linfócitos e (2002), já nas duas primeiras semanas após

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Marta Bellini
Priscila Caroza Frasson

o início do tratamento há queda na produ- causam uma doença mortal é substituída


ção do vírus. Após esse período, a taxa de por interação bioquímica entre um vírus
declínio do vírus é mais lenta. complexo e células, os linfócitos, que são
Atualmente, uma nova classe de me- provocadas para reagir.
dicamentos está sendo utilizada em pes-
soas com HIV. Souza (2006), no texto
“Fuzeon, o primeiro medicamento de uma Conclusão
nova classe anti-HIV denominada
inibidores de fusão”, descreve como o Ayres (2002), referindo-se aos mode-
fuzeon pode inibir o processo de interação los educacionais, diz que o Brasil demo-
da proteína gp 20 do HIV com o receptor rou a buscar modelos emancipatórios de
CD4 e com os co-receptores CXCR4 ou educação como o de Paulo Freire. No ge-
CCR5 do linfócito. ral, os modelos de educação preventiva
Para Janeway, Travers, Walport e são, diz Ayres (2002, p. 17), “bastante li-
Shlomchik (2002), o desenvolvimento de mitados e limitantes”. “São modelos, diz
vacinas para a prevenção da infecção pelo Ayres citando Paiva, orientados por uma
HIV é um objetivo das pesquisas atuais. Mas idéia de comunicação unidirecional,
este empreendimento encontra obstáculos dogmática e autoritária; modelos baseados
pela própria natureza da infecção por HIV, na idéia de aprendizado como simples
pois ele replica e se recombina rapidamen- aquisição de informação; modelos
te. Outro problema é a capacidade de o HIV centrados na modelagem do outro à pró-
persistir em forma latente no organismo. pria imagem como objetivo da educação
Mas, além disso, há os aspectos éticos: é preventiva.”
difícil ou quase impossível conduzir um Os exemplos de comunicação dos li-
teste de vacinas sem expor aos riscos do HIV vros didáticos aqui apontados podem ser
a população vacinada. entendidos como formas de pensar e de
Capria (2003) e Lanzarini (2005) ques- falar um tema – o HIV/Aids – de modo
tionam a precisão dos “testes da Aids” limitante à compreensão científica do que
(Elisa e Western Blot). Dizem que, em pes- são o vírus e a síndrome até o momento.
quisas controladas, há uma percentagem Apesar do esforço dos autores em tratar
muito elevada de reações cruzadas falso- do tema Aids em uma linguagem palatável
positivas devido a diferentes fatores do aos estudantes de ensino médio, esta re-
HIV, pois podemos ter pessoas que foram tórica – a da guerra – impõe uma via de
expostas anteriormente à tuberculose, à mão única à compreensão do HIV.
clamídia sp, à pneumonia, malária e ou- Para os autores dos livros didáticos, o
tras 50 doenças que podem dar um resul- HIV, este “ser extremamente simples”, ata-
tado “soropositivo”. Capria (2003) também ca, comanda, prolifera e mata. Para os ci-
afirma que a situação da África é diferente entistas a interação entre o RNA do vírus
das demais regiões do globo terrestre, so- e o DNA do linfócito não ocorre de modo
bretudo dos Estados Unidos e da Europa. tão brando assim. Os linfócitos criam me-
Para Capria (2003), antes de 1980 o HIV canismos para evitar que o RNA do HIV
não era incluído como vírus da Aids na processe sua replicação (ver Janeway;
África. Somente após 1985 todas as mo- Travers; Walport; Shlomchik, 2002). A
léstias como febre, diarréia, tosse persis- idéia de que esse “ser extremamente sim-
tente e perda de peso foram caracterizadas ples” traduz-se em uma “doença mortal”
como Aids, distorcendo as estatísticas (hipérbole, figura do exagero que cria uma
mundiais de casos de Aids. antítese) é o raciocínio base dos textos. Não
Como vemos, a explicação científica do é fácil partilhar desse argumento (seres
HIV e de aspectos da infecção da Aids não simples e mortais que entram em guerra
são fáceis de serem apreendidos pela com- com os homens). Então, como fica a ade-
plexidade terminológica, porém os textos são aos argumentos ditos científicos dos
que apresentamos nos dão pistas de que a livros didáticos?
metáfora utilizada pelos cientistas é a da Como estamos falando/argumentan-
interação. O HIV interage bioquimicamente do com um auditório de adolescentes,
com os linfócitos e estes, por sua vez (já pois os livros didáticos são para alunos
que não são objetos-recipientes de vírus, de ensino médio, é importante destacar a
como dizem os livros didáticos), reagem eficácia da metáfora guerra; esta metáfo-
ao HIV. A idéia, então, de seres simples que ra pode não resultar em negociação de

336 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez. 2006.
A metáfora guerra na comunicação das idéias de HIV/Aids em livros didáticos

sentido com os jovens. Para nós, a metá- situação de distanciamento, no máximo


fora guerra utilizada nos livros didáticos os alunos aprendem uma fórmula que não
analisados não permite abertura para a tem qualquer significado em suas vidas:
circulação de informações científicas so- vírus simples que provocam uma doença
bre uma epidemia que, cada vez mais, mortal. O discurso sobre HIV/Aids veicu-
alcança jovens, mulheres, crianças e ho- lado, nas escolas, pelos livros didáticos
mens. Como a Aids quase sempre é vin- de modo reducionista e não explícito não
culada aos aspectos mais conservadores garante uma adesão racional e, de fato,
da educação, a metáfora guerra não esta- preventiva entre os jovens. Ou, como diz
ria colaborando para afastar os jovens do Ayres (2002), “quem pensa a prevenção
universo conceitual e afetivo dos alunos? pensa a subjetividade, a significação, a
Se esta idéia ficar distante destes uni- interação, a dinamicidade”. Para isso, te-
versos, o espaço para a negociação de sig- mos que caminhar para além da guerra
nificados também ficará restrito. Nessa entre os vírus e os humanos.

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Marta Bellini, professora doutora do Departamento de Fundamentos da Educa-


ção e Mestrado em Educação para a Ciência e Ensino de Matemática da Universidade
Estadual de Maringá (UEM).
martabellini@uol.com.br

Priscila Caroza Frasson, professora mestre do Departamento de Saúde e Educação


da Fundação Faculdades Luiz Meneguel, Bandeirantes, Paraná.

Recebido em 19 de junho de 2006.


Aprovado em 6 de outubro de 2006.

338 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez. 2006.
ESTUDOS

Construção e reconstrução
multicultural de identidades docentes:
pensando na formação continuada de
coordenadores pedagógicos*
Ana Canen
Angela Rocha dos Santos

Resumo
Trata de uma pesquisa-ação que envolveu a formação continuada de coordenadores
pedagógicos do Estado do Rio de Janeiro em 2005, desenvolvida pela Universidade Fede-
ral do Rio de Janeiro e a Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro. Focaliza, a
partir de uma perspectiva multicultural, as formas pelas quais a construção e reconstru-
ção identitária dos sujeitos envolvidos na referida ação foi buscada na proposta e nos
materiais elaborados. Apresenta as construções discursivas sobre temas didático-pedagó-
gico-curriculares, trabalhados na perspectiva multicultural, no âmbito dos módulos pro-
duzidos para o curso, visando contribuir para reflexões sobre possíveis traduções do
multiculturalismo para propostas didáticas e curriculares concretas em ações de forma-
ção inicial e continuada de docentes.

Palavras-chave: formação continuada; identidade docente; multiculturalismo;


pesquisa-ação.

Abstract Multicultural construction and reconstruction


of teachers’ identity: thinking on a continuing
education of pedagogical coordinators

The present article is an action research that involved continuing education of


pedagogical coordinators of the state of Rio de Janeiro, developed by the Federal University
of Rio de Janeiro and the Rio de Janeiro Secretariat of Education. It focuses the ways by
which construction and reconstruction of pedagogical coordinators’ permeated the
discourses within the referred program and its related materials, based on a multicultural
perspective. It presents the discursive constructions on curricular, pedagogical and didactic
themes of the program within the modules produced for the course, aiming at contributing
for reflections about possible translations of multiculturalism in concrete didactic and
curricular proposals within both initial and continuing teacher education.

Keywords: continuing education; teacher identities; multiculturalism action research.

*
Uma versão preliminar des-
te artigo foi apresentada no
XIII Endipe, maio de 2006,
realizado na Universidade
Federal de Pernambuco
(UFPE), Recife, PE.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 339-348, set./dez. 2006. 339
Ana Canen
Angela Rocha dos Santos

Introdução b) emprega categorias interpretativas


dos docentes e demais participan-
tes do processo educativo;
Pensar em sinergias entre institui-
c) promove o questionamento crítico
ções de formação de professores e a esco-
sobre idéias e interpretações, bus-
la constitui-se um dos meios mais promis-
cando seus vieses ideológicos;
sores para promover o fortalecimento da
educação básica e, conseqüentemente, d) empenha-se em verificar o que blo-
contribuir para a solução dos grandes queia a mudança racional e propõe
problemas sociais existentes no nosso interpretações teóricas que ajudem
país. Particularmente, esse efeito trans- a superar tais bloqueios;
formador pode se concretizar e se multi- e) funda-se na premissa de que se tra-
plicar por intermédio de ações desenvol- ta de um conhecimento prático, uma
vidas mediante parcerias de universida- “ciência da práxis exercida pelos
des públicas com secretarias de Estado técnicos no âmago de seu local de
de educação para a formação continua- investimento” (Barbier, 2002, p. 59).
da de professores e gestores da rede. Em
um contexto de discursos políticos que Assim, o objeto da pesquisa é “a ela-
urgem a universidade a desenvolver pro- boração da dialética da ação, num proces-
jetos extensionistas de impacto, ações na so pessoal e único de reconstrução racio-
formação de professores podem redun- nal pelo ator social”.
dar na melhoria do ensino, bem como na A partir de tais reflexões, a ação em
reflexão sobre formas de promoção do foco constituiu-se uma pesquisa-ação
sucesso escolar e sobre meios de cuja pertinência e justificativa deu-se
minimizar a exclusão e a marginalização em uma dupla perspectiva: de um lado,
que atingem camadas sociais e econômi- permitiu que docentes da Universida-
cas desfavorecidas de nossa população. de pudessem articular a perspectiva
Assim, tais ações revestem-se de papel multicultural à prática da elaboração do
político e social estratégico. material didático e à reflexão crítica so-
Em uma perspectiva multicultural bre ele, relacionando teoria e prática e
pós-colonial (Assis, Canen, 2004; Hall, produzindo conhecimento na dialética
2003) valorizadora da diversidade cultu- entre ambas, na formação continuada de
ral e voltada aos processos discursivos de coordenadores pedagógicos; por outro
formação das identidades plurais docen- lado, a pesquisa-ação foi o motor que
tes e discentes no contexto educacional, engendrou a construção discursiva do
argumentamos, no presente artigo, que tais material mencionado (como será visto a
espaços de parceria no contexto da forma- seguir), isto porque essa construção visa-
ção continuada podem, em uma dimensão va tornar os próprios coordenadores pe-
adicional à perspectiva extensionista, re- dagógicos pesquisadores em ação, isto é,
presentar um campo fértil de pesquisa, nos atores sociais que não fossem limitados a
moldes da pesquisa-ação (André, 1995; meros receptores de informações, mas
Barbier, 2002). que, ao contrário, as problematizassem,
De fato, conforme Barbier (2002), a dialogando com o material e interagindo
metodologia da pesquisa-ação obriga o pes- por meio do relato de suas próprias ações
quisador a agir e, assim, a perceber-se como e práticas.
implicado pela estrutura social na qual está Dessa forma, como comentado an-
inserido, como, também, a compreender as teriormente, a pesquisa-ação represen-
implicações dos outros sujeitos por meio tou o caminho trilhado na realização da
de seu olhar e de sua ação singular no formação continuada em foco, refletin-
mundo. A partir de Carr e Kemmis, Barbier do -se nos discursos contidos nos
(2002) aponta que a pesquisa-ação permi- módulos produzidos. Tal perspectiva
te aos docentes participarem diretamente possibilitou reflexões sobre a tradução
da produção do conhecimento sobre as do multiculturalismo para o currículo
questões e os problemas que lhes em ação e para práticas didáticas e pe-
concernem, sendo que tal metodologia dagógico-curriculares na escola, questi-
atende a cinco exigências: onando seus sentidos, pensando em suas
traduções no contexto concreto das es-
a) rejeita noções positivistas de racio- colas do sistema público de ensino, bem
nalidade, objetividade e verdade; como articulando as reflexões teóricas

340 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 339-348, set./dez. 2006.
Construção e reconstrução multicultural de identidades docentes:
pensando na formação continuada de coordenadores pedagógicos

multiculturais com a análise de seus li- Multiculturalismo,


mites, possibilidades e tensões no espa- identidades e propostas
ço de ensino público. Nessa perspecti- didático-curriculares:
va, ações de formação continuada são articulações na formação
vistas como espaços de construção e re- continuada de professores
construção identitária dos atores envol- e gestores educacionais
vidos, tanto os da escola como os da
universidade e da secretaria de educa- Refletir sobre a formação de professo-
ção, na parceria em questão. res e gestores escolares em meio a um
O argumento que desenvolvemos é o mundo globalizado, tecnologizado, mas ao
de que o multiculturalismo, no âmbito de mesmo tempo plural, constituído na diver-
ações de formação continuada, pode abar- sidade de raças, etnias, gêneros, opções
car não apenas formas de trabalhar a di- sexuais, religiões, linguagens e outros
versidade cultural e perspectivas anti-ra- marcadores identitários, é o grande desa-
cistas e antidiscriminatórias nos conteú- fio da educação nesse novo milênio.
dos ministrados, como também pode im- Como vertente dos estudos culturais,
pregnar discursos sobre temas mais con- o multiculturalismo, no campo da educa-
vencionais da didática e do campo ção, apropria-se da centralidade da cul-
curricular. Na perspectiva da pesquisa- tura e da desconstrução dos discursos
ação desenvolvida, isso significou irmos educacionais de modo a produzir, de for-
além das teorizações que normalmente ma pró-ativa, respostas concretas à diver-
dominam as discussões multiculturais, sidade cultural. Assim, o multicultu-
contribuindo para a construção e recons- ralismo, segundo Kincheloe e Steinberg
trução das identidades envolvidas, no (1997), pode ser definido como um con-
âmbito da formação continuada de docen- junto de respostas à diversidade cultural.
tes e gestores. Tais respostas visam ao trabalho com as
É nessa perspectiva que se colocou o identidades dos sujeitos – sejam docen-
presente estudo, que, como discutimos tes, discentes ou outras –, percebidas
anteriormente, trata de uma pesquisa- como necessariamente plurais, formadas
ação que envolveu a formação continua- de marcadores como raça, etnia, gênero,
da de coordenadores pedagógicos do Es- classe social, religião, opção sexual e ou-
tado do Rio de Janeiro. Essa ação, deno- tros. É importante notar que as identida-
minada de Formação Continuada de Co- des, no multiculturalismo, são sempre
ordenadores Pedagógicos, foi coordenada percebidas como provisórias, em proces-
pelas autoras do presente artigo, em 2005, so de construção e reconstrução constan-
no âmbito do Programa Sucesso Escolar, tes. Nesses processos, a educação
desenvolvido mediante parceria da Uni- multicultural ocupa papel central, fomen-
versidade Federal do Rio de Janeiro com a tando a apreciação da diversidade e o de-
Secretaria de Estado de Educação do Rio safio a preconceitos. Além dos autores
de Janeiro (SEE-RJ). Nos limites do artigo, citados anteriormente, outros, como Go-
não serão analisados os discursos orais em mes e Silva (2002) e Candau et al. (1995),
sala ou as atividades desenvolvidas pelos por exemplo, têm discutido conceitos e
cursistas, mas tão-somente as construções experiências de valorização da diversida-
discursivas sobre temas didático-pedagó- de cultural no cotidiano educacional.
gico-curriculares trabalhados na perspec- Em outras palavras, além das análises
tiva multicultural abraçada, nos módulos discursivas e dos descentramentos defen-
produzidos para o curso. Estruturamos o didos pelos estudos culturais, o
artigo de forma que, primeiramente, dis- multiculturalismo possui, em seu horizon-
cutamos concepções alargadas do te, a premissa básica de que outros discur-
multiculturalismo, para, em seguida, nos sos alternativos devem ser construídos,
debruçarmos sobre os discursos didáti- voltados à valorização da diversidade cul-
co-pedagógico-curriculares construídos tural e ao desafio a preconceitos. E é justa-
na pesquisa-ação, de modo a contribuir mente sobre esses discursos alternativos,
para reflexões sobre possíveis traduções sobre essas possibilidades de respostas ati-
do multiculturalismo para propostas di- vas à pluralidade cultural, que se voltam
dáticas e curriculares concretas, no âm- suas atenções.
bito de ações de formação inicial e conti- Mas que tipos de respostas seriam
nuada de docentes. estas? Como ir além das identidades

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 339-348, set./dez. 2006. 341
Ana Canen
Angela Rocha dos Santos

individuais e incorporar a identidade da 2005), formadas na confluência de identi-


escola como componente no pensamen- dades individuais plurais e na construção
to multicultural? Como traduzir as ten- de identidades institucionais singulares.
sões entre identidades individuais, iden- Nesse sentido, trata-se de pensar em formas
tidades coletivas e a identidade da esco- pelas quais a articulação entre a diversida-
la? Como compreender a escola como de cultural de identidades individuais, co-
organização multicultural (Canen, letivas e institucionais pode ser buscada,
Canen, 2005), marcada por relações in- sem que se caia em um relativismo total em
ternas plurais e, ao mesmo tempo, termos de formação continuada e, ao mes-
inserida no bojo de projetos de educação, mo tempo, sem que se busquem formula-
no caso, de caráter estadual? Essas ques- ções centralizadoras que abafem a
tões são centrais ao se pensar em ações pluralidade dessas identidades.
de formação continuada de professores A terceira perspectiva é a de se levar
e gestores educacionais, no âmbito de em conta a pluralidade dos sujeitos envol-
parcerias de universidades públicas com vidos na formação continuada propria-
Secretarias de Estado de Educação. mente dita, com suas singularidades e suas
Nesse sentido, argumentamos que uma especificidades. Assim, busca-se romper
visão alargada do multiculturalismo impli- com paradigmas de formação continuada
ca que a relevância multicultural de tais que homogeneízam suas identidades, re-
ações se dá em uma tripla perspectiva. A duzindo-as à passividade, à condição de
primeira delas é a de que essas represen- objetos das ações em vez de ativos sujei-
tam espaços possíveis de discussão de te- tos que delas participam e que atuam como
mas educacionais à luz do olhar peças centrais em processos de constru-
multicultural. Isso significa articular tais ção e reconstrução de identidades docen-
temas à pluralidade cultural, a perspecti- tes, discentes e institucionais.
vas de valorização do diverso e de Essa tripla perspectiva amplia o olhar
questionamento das construções das dife- multicultural sobre a construção e recons-
renças e dos preconceitos. Buscam-se, as- trução das identidades docentes, discen-
sim, formas pelas quais tais questões po- tes e de gestores envolvidos na formação
dem ser trabalhadas no currículo, nas prá- continuada, bem como sobre a construção
ticas pedagógico-avaliativas e nas e reconstrução da identidade da escola
metodologias didáticas. Nesse nível de dis- como organização multicultural inserida
cussão, pensar sobre os diferentes sentidos em sistemas públicos de ensino. Tal olhar
do multiculturalismo e suas implicações em traz novo fôlego às discussões sobre didá-
conteúdos e atividades desenvolvidas na tica, práticas pedagógicas e outros temas
escola é relevante, isso porque docentes e centrais à formação inicial e continuada
formadores de docentes devem refletir em de professores e gestores educacionais.
que medida se deseja permanecer no nível Discutiremos as formas pelas quais tal
do multiculturalismo liberal, folclórico, de perspectiva multicultural impregnou nos-
valorização da diversidade cultural em ter- sa ação de formação continuada de coor-
mos de ritos, costumes, festas e outros denadores pedagógicos, conforme
marcadores das identidades, ou se deseja ir explicitada acima, focalizando, nos limi-
além e trabalhar com a origem histórica e tes do presente artigo, as opções de tradu-
com as manifestações de preconceitos e ção do multiculturalismo na construção
desigualdades, em perspectivas mais críti- dos discursos contidos nos módulos pro-
cas e pós-coloniais do multiculturalismo, duzidos para o referido curso.
de modo a desafiá-los (Assis, Canen, 2004;
Canen, Oliveira, 2002; Hall, 2003).
A segunda vertente é a de que o olhar Traduzindo o
multicultural sobre a formação continuada, multiculturalismo nos
fruto de parceria de universidade e governo, discursos didáticos
trabalha possíveis tensões entre projetos po- e curriculares: articulações
líticos que propõem diretrizes curriculares e na formação continuada
avaliativas centrais e a diversidade cultural de coordenadores
das escolas, identidades institucionais por pedagógicos
excelência. Isso significa perceber que as
próprias escolas podem ser consideradas Como trabalhar a tripla perspectiva
organizações multiculturais (Canen, Canen, do multiculturalismo, nos módulos sobre

342 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 339-348, set./dez. 2006.
Construção e reconstrução multicultural de identidades docentes:
pensando na formação continuada de coordenadores pedagógicos

temas didático-curriculares e pedagógicos indivíduos apenas por serem diferentes


selecionados para a formação continuada daquilo que prejulgamos ser o “ideal”, o
de coordenadores pedagógicos? Conforme “correto”, o “perfeito”, o “adequado”, o
sugerimos nas seções anteriores, uma pri- “normal”. [...] As noções de “normalidade”
meira e mais conhecida faceta do e de “diferença” são o resultado de rela-
multiculturalismo é o trabalho para a va- ções sociais e de produções discursivas.
lorização da diversidade cultural, para o Elas configuram-se como criações que en-
desafio a preconceitos e, na perpectiva volvem relações de poder que buscam clas-
pós-colonial, para a superação de sificar, assegurar e marcar posições de su-
binarismos e congelamentos identitários jeito na sociedade, dividindo o mundo en-
(Assis, Canen, 2004; Canen, Oliveira, tre “nós” e “eles”, entre o “normal” e o
2002; Hall, 2003). Parte-se da idéia de que “anormal” [...] (Xavier, 2005, p. 18).
tal perspectiva promove a construção e
reconstrução das identidades docentes e Em uma segunda perspectiva, as ten-
discentes em uma perspectiva desafiado- sões entre universalismo e particularismo,
ra de pretensas idéias de universalismo e entre a existência de critérios ditos “univer-
de homogeneização curricular. Nesse sen- sais”, mas que eram por nós encarados como
tido, a pesquisa-ação buscou interferir historicamente construídos, e aqueles lo-
multiculturalmente, nessa primeira abor- cais, focalizados, ressignificados pelos gru-
dagem, na construção discursiva dos te- pos, foram evidenciadas nos materiais. Por
mas propostos para a formação continua- exemplo, ao falarmos sobre avaliação da
da em questão, de modo a desafiar discur- aprendizagem, em uma perspectiva histó-
sos congeladores de identidades e supe- rica, algumas sentenças demonstram a pre-
rar noções meramente técnicas de currí- ocupação multicultural em termos do tra-
culo, avaliação e projeto político-pedagó- balho com as tensões entre a valorização
gico – temas centrais, entre outros, traba- da diversidade cultural dos sujeitos e a ne-
lhados no referido curso. cessidade de trabalho com critérios que, ain-
Alguns exemplos ilustram a forma da que construídos, possam balizar o julga-
pela qual essa perspectiva foi construída mento de valor implícito em qualquer pro-
em nossos discursos: cesso de avaliação (Canen, 2004; Canen,
Oliveira, 2000). Também, em uma perspec-
Conforme discutimos no módulo 8, a tiva multicultural, desconfiamos de discur-
perspectiva multicultural preocupa-se em sos preconceituosos contra determinados
indagar em que medida os currículos es- tipos de avaliação, defendendo uma arti-
tão trabalhando a favor da valorização da culação entre as diversas modalidades, a
pluralidade cultural e desafio a precon- favor do sucesso escolar, da valorização da
ceitos, em suas formulações. O currícu- diversidade cultural e da inclusão. Essas
lo, segundo esta visão, deveria trabalhar idéias aparecem, por exemplo, nos extra-
em prol da formação das identidades tos abaixo:
abertas à pluralidade cultural, desafiado-
ras de preconceitos, em uma perspectiva [...] o conceito de avaliação não pode ser
de educação para a cidadania, para a paz, pensado de forma separada de uma visão
para a ética nas relações interpessoais, de educação. No caso de uma perspecti-
para a crítica às desigualdades sociais e va que valoriza a diversidade cultural dos
culturais. Neste tópico, buscaremos iden- alunos e das instituições de ensino, tor-
tificar, em cada área do conhecimento, na-se urgente um repensar sobre critéri-
elementos que se configurem como des- os de avaliação, sobre a necessidade de
dobramentos da perspectiva anterior- construir políticas e práticas que levem
mente mencionada, no que diz respeito em conta essa diversidade e que estejam
ao desenvolvimento curricular [...]. Você comprometidas com o sucesso, e não com
pôde verificar intenções multiculturais e o fracasso escolar (Canen, 2005, p. 18).
interdisciplinares no documento [de
Reorientação Curricular] (Lavinas Pereira, [...] Existem preconceitos contra ambos os
2005, p.18 e 24). tipos de avaliação – somativa e diagnóstica
– por parte de muitos educadores. No caso
Excluir significa afastar, abandonar, des- da avaliação somativa, muitos a acusam de
pojar, discriminar, negar direitos, silenci- classificatória e excludente, já que estaria
ar vozes, condenar ao insucesso alguns fornecendo um “juízo final” a respeito de

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Ana Canen
Angela Rocha dos Santos

alunos, atribuindo-lhes o estigma de “in- entre a pluralidade e as políticas educa-


competentes”. No que diz respeito à ava- cionais públicas, fertilizando-se e alteran-
liação diagnóstica ou formativa, muitos te- do-se mutuamente, da mesma forma
mem que leve a uma pouca clareza sobre que falamos sobre propostas curriculares
a qualidade da aprendizagem, pois não e avaliativas, em módulos anteriores
forneceria um “conceito”, “nota” ou uma (Souza, Bezerra, 2005, p. 17).
apreciação final. Defendemos que ambos
os tipos de avaliação são relevantes. Na me- Em uma terceira perspectiva, confor-
dida em que a avaliação somativa é feita me salientado anteriormente, pensar
no contexto de um processo de avaliação multiculturalmente sobre a formação con-
contínua, diagnóstica, formativa, que le- tinuada também significava levar em conta
vou em conta momentos e instrumentos as identidades plurais dos atores envolvi-
plurais de avaliação, ela pode fornecer um dos (no caso, os coordenadores pedagógi-
grau, conceito, nota ou qualquer outro cos), em termos de seus marcadores
símbolo, com fundamentação no proces- identitários singulares de raça, etnia, cul-
so realizado no decorrer do período, dife- tura, visões de mundo e outros. Isso signi-
rentemente de uma avaliação somativa ficava, também, visualizar a identidade
que se limite a apenas um instrumento dos coordenadores pedagógicos como
único (Canen, 2005, p. 18-19). mediadores da construção e reconstrução
identitária de docentes, discentes e da pró-
Nessa perspectiva, o trabalho também pria identidade escolar em que atuam. Tal
voltava-se para as tensões entre projetos visão implicava construções discursivas
mais amplos, de caráter nacional e estadu- que mobilizassem essas identidades no
al, defendidos no âmbito das políticas pú- sentido de trabalhar com a construção e
blicas em que as escolas estaduais estão reconstrução identitária de docentes, dis-
imersas e sua ressignificação, no contexto centes e da própria instituição escolar.
da pluralidade das identidades escolares e Para tal, além das tensões multicultu-
de seus atores. Conforme argumentado, tra- rais que impregnavam os conteúdos e te-
tava-se, nesta abordagem multicultural, de mas trabalhados nos módulos, tratava-se
buscar o trabalho com as tensões propria- de proceder a discursos que interpelassem
mente ditas, encaradas como possibilida- os coordenadores pedagógicos, que os tra-
des concretas de se trabalhar o multi- tassem não como objeto da formação con-
culturalismo sem recair em perspectivas tinuada, mas como sujeitos ativos, parti-
centralizadoras, pretensamente universais. cipantes, parceiros dessa formação, que
Por outro lado, não desejávamos resvalar constroem e reconstroem suas identidades
para uma visão relativista multicultural por no processo.
nós rejeitada. Algumas ilustrações são Tais discursos, também, deveriam tra-
fornecidas a seguir, da forma como tais ten- zer em seu bojo a mobilização para a ação
sões formaram parte da construção e não para o consumo do discurso “da aca-
discursiva multicultural que buscamos nos demia”, em relação de poder desigual no
temas didáticos, curriculares e pedagógicos âmbito da formação continuada. Somente
com que trabalhamos: assim poderíamos estar seguros de desen-
volver uma ação multiculturalmente ori-
A partir de nossa perspectiva multicultural entada, formando coordenadores que fos-
de compreensão do projeto político-peda- sem pesquisadores em ação, sujeitos au-
gógico, não estamos privilegiando nem tores de seus discursos, como comentamos
uma visão centralizadora, homogeneizadora anteriormente.
do processo, nem estamos advogando um A construção discursiva mobilizadora
relativismo total, defendido por alguns do pensamento e da ação dos coordenado-
multiculturalistas (que seriam a favor da res pedagógicos não foi neutra, como não é
construção de projetos político-pedagógi- neutro nenhum discurso. Ao contrário, foi
cos totalmente plurais, sem qualquer es- impregnada de uma intencionalidade
forço de diálogo com um projeto político transformadora, em termos de trabalho de
mais amplo, de caráter nacional, estadu- construção e reconstrução de suas identi-
al, municipal ou local). Ao contrário, a dades plurais, enquanto mediadores de
visão do projeto como uma construção a ações e de construções e reconstruções
ser trabalhada nas tensões entre essas es- identitárias na escola. Essa perspectiva foi
feras pressupõe um diálogo constante buscada em um duplo movimento: em

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Construção e reconstrução multicultural de identidades docentes:
pensando na formação continuada de coordenadores pedagógicos

primeiro lugar, por intermédio da cons- uma reflexão mobilizadora de ações


trução dos discursos que a eles se dirigi- transformadoras nas escolas em que atua-
am. Nesses, interrompíamos a narrativa vam, replicando o nosso próprio papel,
dos módulos que versava sobre os temas como professores formadores que estavam
em questão por meio de “choques”, obti- atuando como pesquisadores em ação, no
dos por sentenças que a eles se dirigiam, âmbito da construção e reconstrução
em uma perspectiva dialógica no texto. identitária dos coordenadores pedagógicos.
Essa técnica já havia sido sugerida por Em outras palavras, buscou-se romper com
Canen e Oliveira (2002) em práticas di- os dualismos eu-outro, sujeito-objeto de
dático-pedagógicas multiculturalmente ação de formação continuada, e trazer a
comprometidas, na sala de aula. Esse pon- perspectiva da pesquisa-ação para o espa-
to pode ser melhor compreendido nos ço das identidades e subjetividades não só
exemplos a seguir: de nós, professores formadores tutores,
mas para aquele dos próprios coordenado-
Caro coordenador, este é o momento de res pedagógicos, em seus contatos, choques
traduzir, em uma prática, o que vimos e entrechoques culturais com as identida-
discutindo [...]. Nesta seção, você vai pla- des docentes e discentes nas escolas.
nejar, apresentar e avaliar, em grupo, uma Alguns exemplos contidos nos
atividade com recursos da Informática. módulos ilustram essa perspectiva:
Inicialmente, forme um grupo para ela-
borar uma atividade que envolva a A partir das idéias discutidas neste
informática na educação (curso de módulo sobre avaliação da aprendizagem,
capacitação de professores, pesquisa, apresentamos o roteiro, a seguir, com
aula, projeto, grupo de discussões, etc.), questões para serem respondidas por
exponha o que tem em mente e vá ano- você, a partir de uma análise da realidade
tando em tópicos, juntamente com o que de sua escola. Este roteiro servirá como
dizem seus parceiros de trabalho [...]. Em orientador para uma ação, que deve ser
seguida a esta atividade, forneceremos realizada nos moldes de uma pesquisa-
um roteiro para que o grupo desenhe, com ação, buscando promover, transformar ou
mais clareza, o que pretende fazer dinamizar uma avaliação da aprendiza-
(Repsold, Marinho, 2005, p. 39). gem em uma perspectiva diagnóstica,
multicultural e formativa... Os resultados
Prezado coordenador: como caracterizaria desta intervenção deverão ser trazidos no
o seu “olhar” na sua prática cotidiana? próximo encontro (Canen, 2005, p. 30).
Encontra-se próximo ou distante daquele
idealizado nesses depoimentos? Lembre- Agora, vamos trabalhar com uma propos-
se que há um olhar imediato de curto al- ta de ação, na escola. Releia o texto deste
cance, um olhar que nos faz chegar às pes- módulo e faça o que se pede. Você deverá
soas e aos problemas do cotidiano. Mas apresentar, pelo menos, uma das ações a
há outro olhar, mais amplo, que nos faz seguir, como trabalho de casa, para efeti-
projetar o futuro, o que desejamos cons- var a perspectiva de ação que esperamos
truir a médio e longo prazos. É também desenvolver no curso, como você tem per-
um olhar necessário na coordenação pe- cebido no decorrer dos módulos (Canen
dagógica (Stuhler, Assis, 2005, p. 26). et al., 2005, p. 32)

Em uma segunda perspectiva, a cons- Assim, longe de limitarmos a pesqui-


trução discursiva, além do multicultura- sa-ação à nossa ação e reflexão, como pes-
lismo impregnado nos conteúdos dos quisadores e professores universitários,
módulos, como exemplificado mais acima, ressignificamos esse olhar na formação
buscava também ressignificar suas iden- continuada desenvolvida. A tripla perspec-
tidades para além de sujeitos que “sofri- tiva pela qual a pesquisa-ação buscou tra-
am” uma formação continuada, para ca- duzir o multiculturalismo para o âmbito
minhar no sentido de vê-los igualmente dos discursos construídos sobre temas di-
como pesquisadores-em-ação. dático-pedagógico-curriculares buscou
Essa estratégia discursiva permitiu contribuir para uma formação multicultural
que, além das discussões sobre os temas, continuada tanto dos atores escolares como
em uma visão multicultural, fosse requi- universitários envolvidos. Entendemos,
sitada dos coordenadores pedagógicos como argumentado anteriormente, que o

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Ana Canen
Angela Rocha dos Santos

multiculturalismo não pode ser defendido permitiu levar em conta a especificidade


como uma narrativa mestra, mas como pers- identitária dos atores escolares com que li-
pectiva que mobilize as identidades plurais dávamos e impregnou os discursos que
na construção de discursos inovadores, construímos a respeito dos temas didáti-
transgressores, transformadores, em prol da cos, pedagógicos e curriculares para a for-
construção e reconstrução das identidades mação continuada em tela. Buscamos, con-
abertas à pluralidade e desafiadoras de con- forme discutimos no presente artigo, pen-
gelamentos e discriminações. sar multiculturalmente sobre a formação
continuada em termos de temas que eram
tensionados a partir dos próprios desafios
Conclusões entre o universalismo e o particularismo
presentes no pensamento multicultural. Ao
O presente artigo partiu da necessi- mesmo tempo, articulávamos essa tensão
dade de se pensar sobre a formação con- aos temas específicos, tais como currículo,
tinuada de professores e gestores educa- avaliação, projeto político-pedagógico e ou-
cionais, bem como dos pesquisadores- tros desenvolvidos. Da mesma forma, tra-
formadores envolvidos nesse tipo de távamos as identidades plurais dos coor-
ação, a partir da categoria identidade, denadores pedagógicos de forma dialógica,
central no multiculturalismo. Tal catego- encarando-os como interlocutores e atores
ria foi entendida de forma mais alargada, ativos e culturalmente situados no decor-
de modo a avançarmos em pesquisas no rer de toda a ação.
campo do multiculturalismo que não se Conforme temos argumentado, os
limitem à categoria identidade em uma sentidos do multiculturalismo acima ex-
visão individualizada ou mesmo coleti- postos e a visão da escola como organiza-
va, desprezando a construção identitária ção multicultural podem abrir caminhos
da escola, de seus atores e daqueles que para se pensar em respostas que
participam de processos de formação ressignifiquem os discursos que circulam
continuada. A partir dessa perspectiva, na escola e na universidade. Tal perspec-
analisamos os discursos produzidos nos tiva pode resultar em encontros e parce-
módulos didático-pedagógico-curriculares rias que produzam práticas de ensino
construídos para o curso de formação con- multiculturalmente comprometidas.
tinuada de coordenadores pedagógicos do Futuros trabalhos podem buscar, a partir
Rio de Janeiro, desenvolvido em parce- do exposto, as hibridizações e ressignifi-
ria da UFRJ com a SEE-RJ em 2005. Dis- cações discursivas desenvolvidas pelos
cutimos as formas pelas quais concebe- sujeitos no âmbito de cursos dessa natu-
mos a construção e reconstrução reza, de modo a ampliar as discussões
identitária de coordenadores pedagógicos sobre a construção e reconstrução das
envolvidos nessa ação política e social, identidades dos atores envolvidos e das
em uma perspectiva multicultural. Nos instituições nas quais atuam. Dessa for-
limites do artigo, focalizamos especifica- ma, tais pesquisas podem continuar con-
mente as opções de tradução do tribuindo para trazer as reflexões
multiculturalismo na construção dos dis- multiculturais para os espaços do cotidi-
cursos contidos nos módulos produzidos ano escolar e da formação de professores
para o referido curso, deixando para fu- e gestores, reflexões essas cada vez mais
turos trabalhos a análise dos desdobra- necessárias para a formação educacional
mentos a partir dessa proposta. em um mundo marcado por conflitos cul-
Trabalhar com a pesquisa-ação como turais e barreiras contra aqueles percebi-
caminho multiculturalmente comprometido dos como “os outros”.

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Construção e reconstrução multicultural de identidades docentes:
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Ana Canen, Ph.D em Educação pela University of Glasgow, Escócia, é professora


adjunta do Departamento de Fundamentos da Educação da Faculdade de Educação da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisadora do CNPq.
acanen@globo.com

Angela Rocha dos Santos, doutora em Matemática pelo Instituto de Matemática da


Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é professora adjunta desse Instituto e
decana do Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza (CCMN/UFRJ).
angela@im.ufrj.br

Recebido em 19 de maio de 2006.


Aprovado em 11 de setembro de 2006.

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ESTUDOS

O “aluno da escola pública”: o que


dizem as professoras*

Alda Judith Mazzotti

Resumo
Apresenta resultados de uma pesquisa que investigou as representações de “aluno
da escola pública” construídas por professores da rede pública de ensino fundamental do
Rio de Janeiro. Utilizando a abordagem estrutural de Abric, concluiu-se que o núcleo da
representação é constituído pelos elementos pobre e aprende a “se virar” sozinho. Cote-
jando-se estes resultados com os obtidos nas etapas anteriores da pesquisa, observa-se
que, para os professores, o aluno tem que aprender a “se virar” sozinho porque é pobre e
a pobreza implicaria desagregação familiar e luta pela sobrevivência, impedindo os pais
de oferecerem aos filhos a atenção de que necessitam. Dadas todas estas características,
esse aluno representaria um desafio para os professores, desafio este que eles se sentem
impotentes para enfrentar.

Palavras-chave: representações sociais; aluno da escola pública; família e escola;


fracasso escolar.

Abstract The public school student: what teachers say

The article presents a research that investigated the representations of the “public
school student” constructed by public elementary school teachers of Rio de Janeiro. Using
the structural approach proposed by Abric, one concluded that the nucleus of the
representation is constituted by the elements poor and learns to make it on his own.
Comparing these results with those obtained in the previous steps of the research, it can
be observed that, to the teachers, the student has to learn to make it on his own because
he is poor and poverty would imply family desegregation and struggle for survival,
preventing the parents from providing their children with the attention they need. Given
all those characteristics, this student would represent a challenge to the teachers, but this
is a challenge they feel they are impotent to cope with.

Keywords: social representations; public school student; family and school; school failure.

*
Pesquisa apoiada pelo Con-
selho Nacional de Desenvol-
vimento Científico e Tecno-
lógico (CNPq).

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Alda Judith Mazzotti

Introdução Penin (1992) assinala a origem histó-


rica dessas representações, construídas
quando a clientela da escola pública era
A discussão sobre o fracasso escolar
constituída basicamente por alunos de
das crianças oriundas das camadas mais
classe média e os pais assessoravam os fi-
pobres da população já tem uma longa his-
lhos em suas tarefas escolares. A autora
tória. Estudos sobre esse “fracasso” se su-
cederam, responsabilizando-se ora a “na- conclui pela necessidade de levar os pro-
tureza” da própria criança, que não teria fessores a refletirem sobre as contradições
as aptidões exigidas pela aprendizagem entre suas representações e a realidade de
escolar, ora seu meio cultural, que não ofe- seus alunos e suas famílias. De fato, al-
receria estímulos e recursos necessários ao guns estudos sugerem que grande parte
seu desenvolvimento, ora o sistema esco- dos professores desconhece ou
lar, que zelaria pela reprodução do siste- desconsidera as condições materiais de
ma social vigente. Tais explicações, porém, existência do aluno pobre e de suas famí-
levavam a um certo imobilismo, pouco ten- lias, bem como os valores e interesses da
do contribuído para uma mudança efetiva classe trabalhadora, o que os leva a preen-
das práticas escolares e dos mecanismos cher esse vazio de informações com con-
de exclusão nelas embutidos. teúdos ideológicos que circulam nas clas-
Mais recentemente, as pesquisas vêm ses médias, construindo imagens
buscando caminhos mais promissores, vol- preconceituosas a respeito desses alunos
tando o foco das atenções para o estudo das e de suas famílias.3
práticas docentes e, em particular, das Considerando que atualmente a imen-
interações professor/aluno. Tais estudos in- sa maioria dos alunos que freqüentam a
dicam consistentemente que: a) o baixo ní- escola pública provém de famílias pobres,
vel socioeconômico do aluno tende a fazer procuramos investigar como professoras
com que o professor desenvolva baixas ex- de escolas públicas de ensino fundamen-
pectativas sobre ele; b) os professores ten- tal representam esse aluno, bem como suas
dem a interagir diferentemente com alunos expectativas com relação a essa clientela.
sobre os quais formaram altas e baixas ex-
pectativas; c) esse comportamento diferen-
ciado freqüentemente resulta em menos Abordagem teórico-
oportunidade para aprender e diminuição metodológica
da auto-estima dos alunos sobre os quais se
formaram baixas expectativas; e d) os pro- Adotamos neste estudo a abordagem
fessores tendem a atribuir o fracasso esco- estrutural da representação social, propos-
lar a traços sociais e psicológicos do aluno ta por Jean Claude Abric e consolidada em
e a condições econômicas de sua família, inúmeras pesquisas ao longo dos últimos
eximindo-se de responsabilidade sobre esse anos. Abric (1996) define a representação
fracasso.1 Tomados em seu conjunto, esses social como um conjunto organizado e
resultados explicam um dos mecanismos hierarquizado de julgamentos, atitudes e
básicos pelos quais se produz o “fracasso informações que um dado grupo social
escolar” das crianças pobres, configurando elabora sobre um objeto, como resultado
a chamada “profecia autoconfirmada”.2 de um processo de apropriação e recons-
Complementando esse quadro, outras trução da realidade em um sistema sim-
pesquisas indicam que os professores ten- bólico. Nesta perspectiva, a representação
dem a ser pouco críticos com relação ao que é vista como um sistema sociocognitivo
esperam de seus alunos pobres e de suas fa- particular composto de dois subsistemas: 1
Ver, por exemplo, Alves, 1983;
mílias, baseando-se numa visão de mundo o núcleo central e o sistema periférico. O Aronson, 2002; Brophy, 1979;
característica da classe média, visão esta con- primeiro, constituído por um número bas- Gama et al., 1991; Weber,
1996; Patto, 2000.
siderada como a única legítima (Dauster, tante reduzido de elementos, é responsá- 2
Grande parte desses estudos
1991; Gama et al., 1991; Mello, 1992; Penin, vel pelo significado e pela organização teve como inspiração o estu-
1992). Em outras palavras, os professores interna da representação e, também, por do seminal sobre expectativas
dos professoras (Rosenthal;
adotam um modelo ideal de aluno que não sua estabilidade, resistindo às mudanças Jacobson, 1968), que demons-
corresponde ao aluno concreto que hoje e assegurando, assim, a permanência da re- trou a importância das expec-
tativas do professor no desem-
constitui a maior parte da clientela da esco- presentação. Constitui a base comum e penho escolar do aluno, fenô-
la pública do ensino fundamental: a criança consensual da representação aquela que re- meno que ficou conhecido
como "efeito de Pigmalião".
pobre, cujos pais têm baixa ou nenhuma es- sulta da memória coletiva e do sistema de 3
Ver, por exemplo, Alves-
colaridade e lutam pela sobrevivência. normas do grupo. Já o sistema periférico, Mazzotti, 2004; Mello, 1992.

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O “aluno da escola pública”: o que dizem as professoras

constituído pelos demais elementos da como regente de turma, 53,85% tinham


representação, é dotado de grande flexibi- entre 8 e 15 anos e 23,08% tinham acima
lidade e preenche as seguintes funções: a) de 15 anos. Quanto à formação profissio-
permite que a representação seja formula- nal, 56,67% completaram o curso superi-
da em termos concretos e compreensíveis, or, 26,67% ainda estavam cursando e uma
ancorados na realidade imediata; b) per- completou a pós-graduação. Apenas três
mite a adaptação da representação às mu- professoras (10%) tinham somente o 2º
danças no contexto, integrando elementos grau. Cabe assinalar que a maioria das pro-
novos; c) permite modulações individuais fessoras provém da classe média baixa.
relacionadas à história de vida de cada um;
d) sendo um esquema, permite o funcio-
namento da representação como guia ins- Associação livre
tantâneo de leitura de uma dada situação;
e e) protege o núcleo central, absorvendo A utilização desta técnica teve o obje-
e reinterpretando as mudanças nas situa- tivo não apenas de complementar a inves-
ções concretas (Abric, 1998, 2003). tigação do conteúdo, mas, também, de for-
A análise de uma representação soci- necer o material que serviria de base para a
al tal como definida por Abric exige que pesquisa da estrutura da representação. Essa
sejam conhecidos seus três componentes técnica consiste em, a partir de uma ou mais
essenciais: seu conteúdo, sua estrutura palavras indutoras, pedir ao sujeito que as
interna e seu núcleo central. associe às primeiras palavras ou expressões
que lhe venham à cabeça. A característica
de espontaneidade e a dimensão projetiva
Investigação do conteúdo desse tipo de produção permitem chegar
mais facilmente que na entrevista aos ele-
O levantamento do conteúdo foi feito mentos que constituem o universo semân-
por meio de um teste de associação livre e tico do termo ou do objeto estudado, favo-
de entrevistas individuais. Em se tratan- recendo a emergência de elementos laten-
do de um estudo de natureza essencial- tes que seriam ocultados ou mascarados nas
mente compreensiva, não trabalhamos produções discursivas (Abric, 1994).
com amostras nem pretendemos fazer ge- Duas expressões indutoras foram uti-
neralizações de tipo estatístico; as esco- lizadas: “aluno ideal” e “aluno da escola
las, assim como as professoras, foram pública”. Isto foi feito com o objetivo de
selecionadas de maneira acidental, entre verificar em que medida a representação
aquelas que aceitaram participar. Assim, do aluno “real” se distancia do “ideal”. Para
foram incluídos no estudo 30 professoras evitar possíveis contaminações entre as
regentes de turmas de 1ª a 4ª série do en- diferentes fases da coleta de dados, o teste
sino fundamental, atuando em escolas pú- de associação livre foi feito antes das en-
blicas municipais e estaduais do Estado trevistas, e o estímulo “aluno ideal” foi
do Rio de Janeiro (3 na zona sul, 3 na zona apresentado em primeiro lugar. A compa-
norte, 5 em Niterói e 9 na Baixada ração entre as respostas mais freqüentes
Fluminense). Nenhuma das professoras relacionadas aos estímulos apresentados é
tinha menos de quatro anos de experiência mostrada na Tabela 1.

Tabela 1 – Associação livre com as expressões


“aluno ideal” e “aluno da escola pública”

Ordem Aluno ideal Aluno da escola pública

1º interessado sem apoio da família


2º participativo apoiado pela família pobre carente de afeto
3º assíduo desinteressado
4º tem um objetivo enfrenta muitas dificuldades
5º com base de conhecimentos sem base de conhecimentos

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Alda Judith Mazzotti

Os resultados da Tabela 1 deixam cla- típico” da escola pública. A seguir, dife-


ro que, para a grande maioria das profes- rentes aspectos desse “perfil” – interesses,
soras, o aluno da escola pública está mui- necessidades, aspirações, conhecimentos
to distante da imagem que elas têm de um e hábitos – foram explorados em detalhe.
aluno ideal, uma vez que as qualidades No perfil traçado livremente, os aspec-
mais freqüentemente atribuídas a este se tos que mais se destacam são a pobreza e
encontram praticamente ausentes na des- a situação de abandono em que se encon-
crição do “aluno real”. As maiores discre- tram os alunos, as quais, por sua vez, re-
pâncias se referem ao interesse do aluno, sultam em inúmeras carências, assim re-
ao apoio da família e à base de conheci- sumidas por uma professora:
mentos com que o aluno ingressa na esco-
la, elementos destacados no aluno ideal e – É desamparado... Não tem o apoio da
explicitamente apontados como ausentes família. A família joga na escola e dele-
no aluno da escola pública. ga tudo para a escola. Você vai alimen-
Outras qualidades do “aluno ideal” tar, educar, orientar. Eu acho que tam-
não citadas com relação ao “aluno da es- bém faz parte do nosso papel, mas em
cola pública” foram: estudioso, discipli- conjunto [com a família]. Eu não acho
nado, crítico, responsável, inteligente, que é minha função…
pontual. As palavras e expressões
evocadas pelas professoras ante o estí- A visão das professoras sobre a famí-
mulo “aluno ideal” parecem, em parte, lia dos alunos é coerente com esse perfil:
confirmar o que diz Penin (1992) quanto uma família pobre e desestruturada, ocu-
à valorização das qualidades encontra- pada demais na luta pela sobrevivência,
das nos alunos da antiga escola pública, que não dá assistência aos filhos e é au-
cuja clientela era constituída basicamen- sente da escola. Os pais são também vis-
te por crianças de classe média. Cabe, en- tos como tendo, eles próprios, muitas ca-
tretanto, assinalar que a falta de apoio rências – analfabetos, ignorantes, violen-
da família parece estar mais relacionada tos – , as quais, ao lado da pouca disponi-
a mudanças sociais e culturais mais am- bilidade de tempo, os impedem de dar aos
plas, como a maior participação da mu- filhos uma formação adequada e os levam
lher no mercado de trabalho, do que sim- a delegar à escola esse papel. A fala que se
plesmente a uma questão de classe soci- segue ilustra essa visão:
al. Mas se vários elementos enfatizados
na representação de “aluno ideal” estão – [Famílias] desestruturadas, muito
ancorados na memória de épocas passa- desestruturadas, muito. É a mãe que sai
das, outros – como participativo, crítico, pra trabalhar, entendeu? É o pai que
consciente – parecem estar ancorados aos tem que sair pra batalhar também, ou
conteúdos veiculados nos cursos de for- é uma mãe solteira ou então é uma cri-
mação e aperfeiçoamento freqüentados ança, um adolescente que vive com a
pelos professores. avó [...] com uma outra família e que a
mãe não tá nem aí, entendeu?

Entrevistas Indagadas sobre como é o cotidiano


desses alunos fora da escola, as profes-
As entrevistas foram de tipo não- soras retratam uma vida com poucos
estruturado, deixando que as professoras se atrativos. Além de eventuais brincadei-
expressassem livremente sobre os temas ras e diversões próprias da idade – jogar
propostos. As opiniões, crenças, informa- futebol, bola de gude, baile funk, pago-
ções, imagens e atitudes contidas nas falas de –, destacam a televisão como a prin-
foram submetidos à análise de conteúdo cipal ou a única fonte de lazer, o que
(Bardin, 1977), procurando-se descrever o freqüentemente ocorre, principalmente
conteúdo das representações de “aluno da com as meninas, em face do meio vio-
escola pública” através da freqüência dos lento em que vivem:
temas e da importância e sentido a eles atri-
buídos pelos respondentes. – Eles passam o dia vendo televisão; na
A entrevista foi iniciada solicitando- maioria dos casos, vendo televisão o
se, de maneira bastante livre, que as pro- dia inteiro, ou então eles vão para a
fessoras nos dessem um perfil do “aluno rua, pra laje soltar pipa. Muitos ficam

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O “aluno da escola pública”: o que dizem as professoras

olhando os irmãos menores. Alguns Quanto às necessidades percebidas


ficam trancados dentro de casa, por- nesses alunos, as professoras destacam a
que não podem sair por causa do mor- necessidade de atenção, de apoio e afeto
ro. O que eles vêem do mundo é o que da família e, também, de alimentação:
a televisão passa. Eles não têm muita
vivência... – A necessidade principal é a alimenta-
ção, entendeu? Eu posso até florear, fa-
A presença da violência no cotidia- lando de outras coisas, mas a grande
no dos alunos, bem como seus efeitos verdade é essa. Depois da carência ali-
sobre suas vidas, é destacada pelas pro- mentar, vem a carência afetiva.
fessoras de várias outras maneiras. A
maioria faz referência à violência com que Outras apontam necessidades mais
é obrigada a conviver em seus locais de relacionadas à falência dos serviços de saú-
moradia, incluindo tiroteios e assassina- de pública:
tos de parentes e amigos. Algumas pro-
fessoras mencionam também a violência – Essas crianças têm muitos problemas
doméstica, afirmando que a relação dos de fala, muitos problemas neurológi-
pais com os filhos é muito violenta, “só cos, e têm dificuldade de tratar isso
no tapa”. Em decorrência do contato co- porque vão no Posto, não tem
tidiano com essa violência, os alunos se fonoaudióloga, não tem neurologista,
tornariam agressivos, uma agressividade não tem médico, não tem dentista...
que as professoras identificam na fala, nos Quer dizer, não tem nada!
gestos e nas atitudes com os colegas, e
que parece ser parte de um esquema de Indagadas sobre os interesses dos
sobrevivência: alunos e o que mais eles valorizam na
escola, a quase totalidade das professo-
– Eles vivem numa comunidade vio- ras deixa claro que os conteúdos acadê-
lenta. Então, quando a gente ensina micos são o que menos interessa às cri-
que não se trata [o outro] com vio- anças. De fato, os aspectos priorizados
lência, que tem outras formas de vi- são novamente a alimentação, as ativi-
ver, às vezes a gente se sente como dades extraclasse, a atenção e o cari-
se tivesse tirado as armas de sobre- nho das professoras e o convívio com
vivência dele, fazendo com que ele os colegas. Entre as atividades
fique tão manso que não saiba se de- extraclasse destacam recreação, espor-
fender no seu meio. tes, educação física, canto, dança, in-
terpretação, artes, visitas a museus e à
Ao falarem sobre os hábitos que os biblioteca. As afirmações que se se-
alunos trazem para a escola, as professo- guem são ilustrativas:
ras apontam apenas aspectos negativos: a
maioria dos alunos não apresenta os re- – [O que eles mais valorizam] é o conví-
quisitos mínimos de socialização básica, vio e a merenda [...] de estudar eles não
necessários não apenas à aprendizagem gostam muito não...
escolar, mas ao convívio social civilizado.
Não têm hábitos de higiene e limpeza (es- – [Os alunos] não sabem exatamente o
covar os dentes, pentear o cabelo, andar que estão fazendo ali. Parece que vão
com roupas limpas, conservar limpo o para a escola para dizer que vão. [...]
ambiente em que vivem) e desconhecem Aquelas crianças não têm interesse
as regras de polidez (não sabem se sentar, nenhum.
falam gritando, não sabem pedir um favor
nem agradecer): Algumas professoras admitem que
esse desinteresse se deve, pelo menos em
– São uns bichinhos, a gente aqui tem parte, aos conteúdos e métodos tradicio-
que ensinar tudo. [...] Eles sujam os ba- nais utilizados nas escolas, afirmando
nheiros, fazem xixi fora do vaso, mo- que eles não se enquadram naquela
lham tudo [...] estão habituados a fazer aprendizagem tradicional, “de sala de
xixi na rua, normalmente. Eles trazem aula, caderno”.
maus hábitos pra cá e a professora so- Duas professoras associam a questão
zinha não dá conta de tudo... do desinteresse pela escola à violência

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 349-359, set./dez. 2006. 353
Alda Judith Mazzotti

do meio em que vivem. A primeira atri- – Eles dizem: ah, eu quero ser fazer me-
bui a esta o desinteresse dos alunos pelo dicina, ser médico. Eu fico com von-
estudo; a segunda a relaciona ao valor tade assim de rir e de chorar ao mes-
que as crianças atribuem ao espaço da mo tempo quando eu escuto um ne-
escola: gócio desses... [...] Eu me sinto meio
num filme de Fellini quando eu escu-
– Se ele vai morrer daqui a pouco com to um negócio desses na periferia...
um tiro, vai ser um empacotador de co- Juro por Deus!
caína.… então não vale a pena estudar...
– O horizonte deles é bem pequeno; tipo
– Eu acho que [o que eles valorizam] é o assim, se o pai é mecânico, eles acham
espaço e a tranqüilidade da escola. Eles que o máximo que eles podem ser é
buscam na escola uma tranqüilidade mecânico. O horizonte deles é bem
que eles não têm nos lugares onde eles restrito.
moram, por causa da violência. [...] Eu
acho que, na cabecinha deles passa que Quanto às expectativas das própri-
aqui a bala não vem, aqui o assaltante as professoras com relação aos seus alu-
não entra, a polícia não entra [...] é o nos, elas são, em sua maioria, extrema-
espaço que eles precisam pra correr, mente pessimistas, indicando que a
pra brincar, é o espaço dele, que ele lá perpetuação da situação de pobreza lhes
fora não está tendo. parece um destino inexorável. A frustra-
ção e a impotência das professoras di-
Quanto aos conhecimentos que os ante das dificuldades da tarefa que lhes
alunos trazem para a escola, as profes- cabe estão expressas nas falas que se
soras se referem de maneira vaga a “co- seguem: 4
nhecimentos da própria comunidade” –
que geralmente se resumem a música, – Olha, eu não vejo um horizonte [...].
dança (samba, capoeira), religião e, no O número de alunos que passaram
caso das escolas rurais, conhecimentos pelas minhas mãos, o futuro de mui-
relativos a plantas e animais – e, tam- tos que eu vi, [...] ao abrir o jornal e
bém, a experiências adquiridas no tra- ver lá [como vítima ou agente da vio-
balho e na vida cotidiana (fazer troco) e lência]. Eu falo que eles têm capaci-
a informações veiculadas pela televisão. dade, conto casos de pessoas pobres
Estas últimas, porém, são bastante que venceram na vida, que a gente tem
criticadas: que ter determinação, garra! [...] Todo
dia eu falo a mesma coisa pra ver se,
– A escrita é péssima, mesmo porque o de repente, eu consigo lançar alguma
vocabulário não é bom. Eles vêem tele- coisa pra ficar…
visão, todos têm televisão, mas vêem é
Ratinho Livre, Gugu, Faustão. [...] Então – Sou até muito nova no magistério pra
isso é a bagagem deles. estar assim tão desanimada, né? Mas
eu vejo muito pouco, muito pouco, a
Indagados sobre as aspirações dos perspectiva é mínima. Porque eu vejo
alunos, as professoras indicam priorita- que, a cada ano, o número de repeten-
riamente questões ligadas a uma futura tes aumenta, o número de alunos den-
profissão e a continuidade dos estudos. tro da sala aumenta... Eu estou muito
Entre as profissões destacam as opções desgastada [...] Não é nem o esgotamen- 4
As descrições feitas pelos
professoras sobre como se
por profissões liberais (médico, profes- to físico, nem o esgotamento mental, sentem atualmente em seu
sor, veterinário) e glamurosas (atriz, can- mas o esgotamento emocional, a carga trabalho são muito seme-
lhantes aos sintomas do "de-
tora, jogador de futebol, piloto de Fór- emocional... samparo adquirido" (learned
mula 1), ou então dizem que eles falam helplessness) descritos por
em seguir a profissão dos pais (pedrei- As falas que procuram ser otimistas Seligman (1977). Segundo
esse autor, o desamparo é um
ro, carpinteiro, etc.). As professoras pa- parecem revelar mais um desejo do que estado psicológico que se ca-
recem confusas com relação a essas as- propriamente uma expectativa: racteriza por depressão, an-
siedade, sentimento de im-
pirações, uma vez que as primeiras são potência e passividade e que
consideradas pouco realistas e as últi- – Eu gostaria de poder oferecer a essas se manifesta em decorrência
de situações problemáticas
mas, falta de ambição, como indicam as crianças o melhor, eu gostaria que eles que afetam o sujeito mas es-
falas que se seguem: aprendessem assim... a se virar no tão fora do seu controle.

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O “aluno da escola pública”: o que dizem as professoras

mundo, entendeu? Sozinhos, já que reformular continuamente métodos e con-


eles têm pouca assistência de pai, de teúdos, adaptar livros e outros materiais
família, [...] se defender sozinhos, pro- didáticos, usar recursos auxiliares atraen-
curar trabalhar sozinhos, conseguir tes (música, histórias), mas o que se ob-
seu sustento sozinhos. serva é que a maioria delas parece sentir
que esse esforço solitário é estressante e
– Eu queria tudo de bom, eu queria que insuficiente. As falas que se seguem ex-
eles saíssem dessa, que tivessem uma pressam esses sentimentos:
visão melhor do futuro... É horrível fi-
car sem visão, né? – É uma angústia muito grande porque,
as soluções, nós não podemos arcar com
Quanto à escola, as professoras são elas porque estão numa esfera muito
unânimes em afirmar que ela precisa mu- maior. A gente já se desdobra em sala
dar para se adaptar aos novos tempos. de aula para tentar fazer o máximo, mas
Entre as medidas mais necessárias e ur- muita coisa… a gente esbarra, vê que
gentes citam a capacitação e reciclagem não depende mais de nós.
dos professores, a contratação de profes-
sores para atividades extraclasse e para – A gente não pára um minuto, então é
outras atividades que exigem formação um stress muito grande. Muitas profes-
específica (como educação física, recrea- soras pedem licença, ficam doentes.
ção, música, teatro, artes plásticas, Não é decorrência de doenças do orga-
informática) e o oferecimento de tempo e nismo, são doenças psicossomáticas [...]
espaço no horário escolar para atualiza- Eu agora estou perdendo a voz...
ção e discussão de problemas. Outras me-
didas citadas foram apoio psicopedagógico – Eu vim com uma série de idéias de pes-
(orientadores, supervisores), recursos soas críticas... Paulo Freire… pessoas
materiais suficientes e atualizados, turmas que estão avançadas na visão crítica da
menores e maior segurança nas escolas. sociedade. Mas pra gente colocar na prá-
As falas que se seguem ilustram as princi- tica, muita coisa não funciona, você tem
pais reivindicações: que estar toda hora reavaliando, toda
hora tentando se reformular [...] Eu não
– A gente antigamente tinha tempo para posso desanimar ...
se reciclar, a gente tinha por direito.
Agora para a gente se encontrar para
fazer alguma coisa ou tem que ser meio Investigação da estrutura
que nos corredores, ou meio que extra-
oficial. É um espaço que a gente tinha Segundo Moliner (1994), as cognições
antigamente que o Governo de certa centrais de uma representação apresen-
forma está tirando... tam quatro características básicas: valor
simbólico, poder associativo, saliência e
– Olha, o que nós temos aqui de mate- conexidade. A primeira se refere ao fato
rial é nada. É o que você está vendo de que as cognições centrais mantêm
aqui, é giz, quadro e um mimeógrafo com o objeto uma relação necessária,
a álcool. E você não pode pedir mate- “não negociável”. Isto quer dizer que, na
rial para o aluno. [...]. Estamos na era visão do grupo considerado, elas não
do computador e nós trabalhando podem ser dissociadas do objeto da re-
com mimeógrafo a álcool. [...]. Nós presentação, sob pena de este perder
precisaríamos de professoras toda a significação. Poder associativo diz
extraclasse para trabalhar esse outro respeito à polissemia das noções cen-
lado do aluno. Só eu dentro de sala. trais e à sua capacidade de se associar
Eu dou a recreação, eu dou música, aos outros elementos da representação,
eu dou artes, eu dou tudo... E tomo uma vez que elas condensam o conjun-
conta da merenda, do recreio... to de significações. A saliência está di-
retamente relacionada às duas caracte-
Quanto às mudanças que procuram rísticas anteriores: graças ao seu valor
imprimir em sua própria prática para simbólico e à sua polissemia, as
adequá-la às características dos alunos, cognições centrais ocupam um lugar pri-
as professoras dizem que tentam vilegiado no discurso, sendo evocadas

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Alda Judith Mazzotti

mais freqüentemente que as demais. Fi- evocadas na associação livre – , pedimos


nalmente, a conexidade é decorrente do aos sujeitos que formassem duplas com
poder associativo: em função dessa ca- aquelas que lhes parecessem “andar jun-
pacidade, as cognições centrais são tas”. Para isso, foram preparadas 16 fi-
aquelas que apresentam maior número chas de cartolina, cada uma correspon-
de relações com os demais elementos da dendo a um elemento daquele conjunto.
representação. Depois de realizados os pareamentos,
A saliência foi verificada através da perguntava-se ao sujeito porque ele ha-
freqüência de ocorrência do elemento nas via associado os elementos de cada par,
falas e associações livres feitas pelos su- para identificar o tipo de relação feita
jeitos. Entretanto, para completar a identi- (semelhança de sentidos, implicação,
ficação dos possíveis elementos do núcleo contraste, etc.). Participaram desta fase
central, foram investigadas as relações 15 professoras.5
estabelecidas entre eles (poder associativo A apuração dos resultados foi reali-
e conexidade), bem como a hierarquia en- zada estabelecendo-se a freqüência de
tre esses elementos (valor simbólico e tam- cada elemento. A análise desses
bém saliência). Para isto, duas técnicas pareamentos, uma vez que um mesmo
propostas por Abric (1994) foram utiliza- elemento pode ser escolhido várias ve-
das: constituição de duplas de palavras e zes, permitiu conhecer os termos
escolhas hierarquizadas sucessivas. polarizadores, isto é, aqueles que são
mais freqüentemente associados a outros
elementos da representação e que, por-
Constituição de duplas tanto, têm maior poder associativo e
de palavras maior conexidade, o que lhes confere
alta probabilidade de constituir o núcleo
Esta técnica teve por objetivo inves- central. Além disso, a análise permitiu
tigar as relações entre os elementos da conhecer o sentido dos termos utiliza-
representação. A partir de um conjunto dos pelos sujeitos, reduzindo a
de 16 palavras ou expressões – as 16 que polissemia. A Tabela 2 apresenta os ter-
alcançaram maior freqüência entre as mos polarizadores identificados.

Tabela 2 – Expressões escolhidas com maior freqüência nos pareamentos

Ordem Elementos

1º sem apoio da família


2º um desafio para o professor
3º enfrenta muitas dificuldades sem apoio
da escola aprende a se virar sozinho

Uma outra possibilidade de analisar que eles atribuem as dificuldades enfren-


os dados provenientes da constituição de tadas pelas crianças à pobreza, e a carên-
duplas é verificar a quantos elementos di- cia afetiva à falta de amparo de família.
ferentes os termos polarizadores foram as-
sociados. Assim, os termos um desafio
para o professor e aprende a se virar sozi- Escolhas hierarquizadas
nho foram associados, respectivamente, a sucessivas
10 e 9 elementos diferentes. As duplas
mais freqüentes foram pobre e enfrenta Esta técnica foi utilizada com o obje-
muitas dificuldades e sem amparo da fa- tivo de identificar a hierarquia entre os ele-
mília e carente de afeto. Essas duplas aju- mentos da representação. Com os mesmos 5
Na análise da estrutura não
dam a esclarecer o sentido atribuído pe- sujeitos que participaram da etapa anteri- houve necessidade de in-
los professores às expressões por eles or e tomando por base o mesmo conjunto cluir mais de 15 professoras,
graças ao alto grau de redun-
evocadas nas etapas anteriores, sugerindo de 16 elementos usado nos pareamentos, dância obtido nas respostas.

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O “aluno da escola pública”: o que dizem as professoras

solicitou-se a cada professor que separas- pesos crescentes aos itens em cada uma
se os 8 que considerava mais caracterís- das quatro etapas de escolhas, de modo
ticos do objeto. Tomando-se apenas os 8 que estes correspondessem à importância
elementos selecionados, recomeçou-se a atribuída ao item pelo sujeito. Assim, se
operação, pedindo-lhe que escolhesse os o item que figurava entre os 8 elementos
4 mais representativos, e assim sucessi- selecionados como os mais significativos
vamente, até se chegar àquele considera- entre os 16 apresentados recebia peso 1;
do o mais representativo do objeto. Obte- se permanecia entre os 4 últimos, recebia
ve-se, então, uma classificação, por ordem peso 2; e assim por diante. A partir do
de importância, do conjunto de elemen- cálculo da freqüência ponderada, foi pos-
tos apresentado. sível estabelecer a classificação dos itens
Para analisar esses resultados, apurou- segundo a importância atribuída pelos
se, primeiramente, a freqüência de cada grupos. Os elementos que obtiveram va-
elemento nas quatro escolhas sucessivas, lores mais altos na hierarquia são aque-
isto é: os 8 elementos mais significativos; les que têm maiores probabilidades de
destes, os 4 mais significativos; destes, constituir o núcleo central da representa-
os 2; até se chegar ao mais significativo ção. Os elementos mais destacados são
dos elementos apresentados. Atribuiu-se apresentados na Tabela 3.

Tabela 3 – Escolhas hierarquizadas

Ordem Elementos

1º enfrenta muitas dificuldades


2º um desafio para o professor
3º precisa de afeto
4º aprende a se virar sozinho
5º sem apoio da família

Conforme indicam os dados da Tabe- dizer se ele: a) provavelmente é um alu-


la 3, os elementos que ocupam as posições no da escola pública; b) provavelmente
mais altas na hierarquização feita pelos não é um aluno da escola pública; ou se
professores são praticamente os mesmos c) não sabe responder. Colocando-se em
que foram destacados nos pareamentos. questão, sucessivamente, todos os ele-
mentos destacados, é possível identificar
aqueles cuja ausência implica em não re-
Teste do núcleo central conhecimento da representação. Estes
são os elementos do núcleo central; os
A última etapa da pesquisa demais são periféricos.
correspondeu ao teste da centralidade Os resultados deste teste evidencia-
dos elementos postos em evidência pe- ram que os elementos que constituem o
las análises anteriores, recorrendo-se, núcleo central da representação de “alu-
para isto, a uma adaptação da técnica no da escola pública” são pobre e apren-
de questionamento ou mise en cause de a se virar sozinho. Relacionando estes
(Campos, 1998). A técnica utilizada resultados aos obtidos nas etapas anteri-
consistiu em apresentar aos sujeitos um ores, parece válido afirmar que, para os
conjunto de frases com os elementos professores, os alunos enfrentam muitas
mais destacados nas etapas anteriores, dificuldades porque são pobres (dupla
solicitando-lhes que respondessem se a mais freqüente). Além disso, a pobreza
afirmação contida em cada uma das fra- está relacionada à desagregação familiar
ses é ou não pertinente ao objeto focali- e à luta pela sobrevivência, impedindo
zado. Em nosso caso, elas descreviam um os pais de oferecerem aos filhos o apoio
personagem, e os professores deveriam e a atenção de que necessitam, o que faz

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 349-359, set./dez. 2006. 357
Alda Judith Mazzotti

com que eles sejam carentes de afeto e suprir as carências e despertar o inte-
que tenham que aprender a “se virar” resse dos alunos pelos conteúdos que
sozinhos (conforme indicado nas entre- julgam essenciais à superação de sua
vistas e nos pareamentos). Dadas todas situação atual, esse esforço nunca é su-
estas características, esse aluno repre- ficiente, porque grande parte do pro-
senta um desafio para o professor (ele- blema está em outras esferas que fogem
mento destacado na hierarquização). En- ao seu controle. Como disse uma pro-
tretanto, segundo o que foi evidenciado fessora, “o mundo aí fora é muito mais
nas entrevistas, este é um desafio que forte”. Tais resultados confirmam a
os professores se sentem impotentes conclusão de estudo realizado por Melo
para enfrentar. (1998), segundo a qual o aluno pobre é
percebido como não tendo condições
de competir com alunos de origem so-
Conclusões cial superior.
O quadro aqui descrito parece expli-
Considerando os resultados obtidos car por que os professores se mostraram
nas diferentes etapas deste estudo, somos tão ambíguos quanto às aspirações dos
levados a concluir que, para os professo- alunos, tão pessimistas quanto ao futuro
res que participaram do nosso estudo, o deles e tão evasivos quanto às suas pró-
aluno típico da escola pública é hoje a cri- prias expectativas com relação a esses
ança de família pobre que luta pela so- alunos. Como vimos, as falas oscilam
brevivência e dá pouca ou nenhuma as- entre expectativas extremamente pessi-
sistência aos filhos, delegando à escola mistas e vagos desejos, “sonhos”, sem
funções que tradicionalmente cabem à muita esperança de concretização, o que
família. Esta imagem, como vimos, está é denunciado pelo uso do imperfeito (“eu
muito distante daquelas que os professo- queria”, “eu gostaria”).
res concebem como ideal. As baixíssimas expectativas das pro-
Tal situação, aliada à crescente ca- fessoras sobre o “aluno da escola públi-
rência de recursos materiais e humanos ca” constituem um dado preocupante.
existente nas escolas, faz com que esses Como foi anteriormente mencionado, a
profissionais vivenciem uma situação de vasta literatura de pesquisa sobre
desamparo, por ter que assumir respon- interações em sala de aula indica, de
sabilidades cada vez maiores, contando modo consistente, que as baixas expec-
com apoio cada vez menor. Além das fun- tativas dos professores freqüentemente
ções que cabiam à família, tarefas que resultam em menores oportunidades
eram desempenhadas por inspetores, para aprender e diminuição da auto-es-
pessoal de secretaria e mesmo por ser- tima dos alunos sobre os quais se for-
ventes foram sendo transferidas aos pro- maram essas expectativas, depreciando
fessores, à medida que aqueles profissi- ainda mais o desempenho desses alu-
onais foram escasseando nas escolas. nos, configurando uma “profecia
Também os especialistas, que ofereciam autoconfirmada”. Considerando-se que
apoio psicopedagógico, e os professores o conteúdo da representação de “aluno
de música, artes e educação física, que da escola pública” indica uma forte as-
enriqueciam e amenizavam seu trabalho, sociação com pobreza familiar, tais ex-
desapareceram das escolas. Os espaços pectativas passam a constituir um obs-
de discussão, que permitiriam a reflexão táculo adicional ao sucesso escolar das
conjunta e a troca de experiências, tam- crianças pobres.
bém lhes foram tomados. Este é um dado que não pode dei-
A sensação de desamparo tem, por- xar de ser considerado nos cursos de for-
tanto, bases muito concretas. E a angús- mação de professores, principalmente
tia, o estresse, a frustração, o esgotamen- pelo fato de que o comportamento dife-
to emocional, o cansaço e o desânimo – renciado do professor nas interações
termos que perpassam o discurso de com os alunos sobre os quais mantém
grande parte dos professores – são indi- baixas expectativas tende a ser incons-
cadores eloqüentes desse desamparo. ciente,6 podendo ser revertido por meio
Outro importante indicador é o sentimen- da reflexão sobre esse comportamento
to, expresso pelos professores, de que por e suas conseqüências sobre o desempe- 6
Ver, por exemplo, Brophy,
mais que façam, que se desdobrem para nho daqueles alunos. 1979; Aronson, 2002.

358 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 349-359, set./dez. 2006.
O “aluno da escola pública”: o que dizem as professoras

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Alda Judith Mazzotti, Ph.D em Psicologia da Educação pela New York University, é
Coodenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estácio de
Sá (Unesa).
aldamazzotti@estacio.br

Recebido em 18 de julho de 2006.


Aprovado em 22 de setembro de 2005.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 349-359, set./dez. 2006. 359
ESTUDOS

A dimensão estética e democrática da


experiência: uma contribuição
da filosofia deweyana para novas
propostas educacionais
Cecília Maria Siqueira Silva

Resumo
A continuidade entre experiência e conhecimento, ação e reflexão, indivíduo e
sociedade são os fundamentos da concepção de educação na filosofia deweyana
que trazem sentido para este nosso questionamento da prática pedagógica e suas
relações com a arte. Analisar a educação como reconstrução contínua da experiên-
cia e pensar nos pressupostos do hábito inteligente e cooperativo de julgamento nos
faz compreender melhor a função democratizante que a perspectiva deweyana traz
às propostas educativas. A reflexão sobre as qualidades educativas da experiência
estética nos possibilita ainda, no viés desta filosofia, compreender as necessidades
e condições essenciais sobre as quais devem ser desenvolvidas essas propostas.

Palavras-chave: experiência estética; educação democrática; reconstrução da


experiência; participação social.

Abstract The esthetic and democratic dimension of the


experience: a contribution of Dewey’s
philosophy for new educational proposals

Continuity between experience and knowledge, action and reflection, individu-


al and society are the key elements of the education conception according to Dewey’s
philosophy, which brings meaning to our questioning on pedagogical practices and
their relationships with art. Analyzing education as the continuous reconstruction
of experience and thinking on the premises of intelligent and cooperative habit for
judging lead to a better understanding of the democratizing role, which are brought
to educational proposals by Dewey’s perspective. Reflection on the educational
qualities of esthetic experience allows, as an additional consequence of this
philosophy, the understanding of the needs and essential conditions for the proper
development of such proposals.

Keywords: esthetic experience; democratic education; experience reconstruction;


social participation.

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A dimensão estética e democrática da experiência: uma contribuição
da filosofia deweyana para novas propostas educacionais

Introdução Nesta análise, o conceito de inteligên-


cia é compreendido como o instrumento
da participação social, em outras palavras,
Que a arte ocupa lugar de destaque
como a própria qualidade da ação quando
nas atuais propostas curriculares – por sua
permeada pela reflexão e capacidade de
reconhecida função social e qualidade
interpretação de uma circunstância vivi-
educativa – é fato que não mais se questi-
da. Nesta perspectiva, a experiência desti-
ona. No entanto, o êxito destas propostas
mostra-se ainda ameaçado quando o pro- tuída de pensamento reflexivo afasta-se da
fessor lida com a arte, na escola, como algo condição inteligente, para se constituir
que pode ser simplesmente agregado às uma prática mecânica, esvaziada do cará-
demais disciplinas, um meio simplesmen- ter e intenção social. É, pois, objeto desta
te facilitador da aprendizagem, ou ainda análise a contribuição deweyana para focar
um mero atrativo para o currículo. A au- as condições, na educação, favoráveis ao
sência de uma fundamentação que possa desenvolvimento do hábito inteligente e
realmente explicitar as íntimas relações cooperativo, assim como as implicações da
entre a arte e a educação talvez seja o pro- arte neste processo.
blema que, atualmente, mais sobrecarre-
ga esta prática educativa de incertezas e
incoerências. 1. As qualidades educativas
O desenvolvimento de uma prática da arte: repensando a
educativa que tenha coerência e compro- prática pedagógica
misso com estas propostas – uma prática
realmente enriquecida com as possibili- Ao definir a educação como contínua
dades da arte – requer uma atividade per- reconstrução da experiência social, Dewey
manente de investigação sobre os princí- põe em relevo a atividade de pensamento
pios e fundamentos que as constituem, o como mecanismo fundamental deste pro-
que vai possibilitar ao educador ajustar e cesso, evidenciando o eixo principal de
reelaborar, com autonomia, procedimen- uma pesquisa e proposta educacional pro-
tos e métodos, para as circunstâncias re- vidas de qualidade social. Considerar as
ais em que se encontra, com as suas con- expressões deweyanas como “aprender a
dições próprias e específicas. A pesquisa pensar” ou “aprender a aprender” signifi-
e o aprofundamento teórico em educação, ca reconhecer o princípio de reelaboração
acompanhando o desenvolvimento das da experiência como base da prática
práticas pedagógicas, favorecem esta au- educativa e, desta forma, compreender o
tonomia do educador, mantendo sempre conhecimento como sua manifestação, per-
vivos alguns questionamentos: de que for- manentemente reconstituído e reavaliado.
ma a arte, na educação, pode favorecer a O mecanismo de revisão e reelaboração
integração das áreas de conhecimento? Por da própria prática educativa, em situa-
que está o fazer artístico implicado com o ções de cooperação e compartilhamento
desenvolvimento da capacidade de inter- de diferentes interesses e opiniões, con-
pretação da realidade? De que forma a fere ao ambiente escolar o caráter pró-
educação estética está comprometida com prio da vida social, favorável ao desen-
a moralidade? volvimento da capacidade de resolver
No sentido de aprofundar estes problemas, verificar, na prática, hipóte-
questionamentos, podemos encontrar na ses, julgar e discernir idéias e valores –
filosofia de John Dewey uma importante um convívio participativo baseado no
contribuição que, certamente, nos apon- método da inteligência cooperativa, para
tará caminhos para um melhor aproveita- Dewey o pressuposto da contínua re-
mento das qualidades educativas da arte. construção da experiência social. É com
Assim, a análise das relações entre a arte, base nestes fundamentos deweyanos
a educação e a experiência democrática, que propomos questionar as condições
na filosofia deweyana, consiste em uma para o desenvolvimento deste hábito in-
tentativa de fortalecer esta fundamentação, teligente e cooperativo na escola e, tam-
oferecendo possibilidades de uma prática bém, as possibilidades da arte como ex-
educativa realmente imbuída dos princí- periência educativa.
pios estéticos e comprometida com um A arte, na filosofia deweyana,
modo de vida social cooperativo e corresponde a uma experiência intensa e
participativo. inteligente que compreende a atividade do

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pensamento na reelaboração de conceitos, de conflito que reproduzem a vida soci-


valores ou hábitos; uma experiência de al; o mecanismo de ação e percepção re-
grande valor educativo pelo uso da inteli- ceptiva no desenvolvimento da experiên-
gência que implica e pela possibilidade que cia e a continuidade entre meios e fins
oferece de compartilhamento de idéias e na atividade – estas seriam, para Dewey,
sentimentos. O nosso propósito consiste, algumas qualidades educativas da arte,
assim, em analisar as relações entre a arte já que estão comprometidas com o desen-
e a educação, já que, para Dewey, este pro- volvimento da capacidade de pensar, so-
cesso de reelaboração da experiência cons- cializar a experiência e utilizar significa-
titui a base do conhecimento, e a coopera- tivamente os conhecimentos.
ção, a base da moralidade: a aprendizagem É comum verificarmos, em muitas
compreendida como reconstrução da ex- práticas educativas, uma extrema valori-
periência e a moralidade como crescimen- zação da capacidade intelectiva e
to pressupõem uma concepção de educa- memorização em detrimento da capacida-
ção baseada no valor da participação. É por de de percepção, interpretação, habilida-
isto que a dimensão estética da experiên- des manuais ou associações analógicas –
cia está estreitamente relacionada com a a marca, ainda profunda, da educação tra-
dimensão democrática: as qualidades es- dicional persiste nessas práticas no senti-
téticas são responsáveis pela contínua do de separar as atividades perceptivas das
reelaboração da experiência, sendo que intelectuais, as atividades do corpo e da
somente nesta condição criativa e mente, as atividades racionais e aquelas
participativa em que as atividades sociais que envolvem a emoção e a imaginação.
são permanentemente avaliadas e Estaria a arte envolvida neste compromis-
reelaboradas é que se faz possível, para so de amenizar estas rupturas? As ativi-
Dewey, o ideal democrático. dades expressivas, ou seja, aquelas que
Encontrar um eixo que norteie um pro- compreendem qualidades estéticas, são,
jeto educativo de caráter estético e demo- para Dewey, essencialmente educativas,
crático é tarefa básica nas propostas justamente por considerar a unidade en-
educativas que defendem a cooperação e tre estas atividades e, dessa forma, promo-
participação efetivas nas atividades esco- ver não o desenvolvimento de habilida-
lares. Neste sentido, as atividades expres- des isoladas e desarticuladas da própria
sivas – aquelas sustentadas pelas lingua- experiência, mas sim o desenvolvimento
gens artísticas – oferecem um campo rico da criança de acordo com as possibilida-
de possibilidades nas quais a realidade des sociais, segundo Dewey (1944, p. 15),
social pode ser manipulada, ou melhor, “traduzindo seus instintos e tendências em
aproximada do trabalho educativo e equivalentes sociais”. Neste sentido, a arte
vivenciada pelas crianças. Um jogo, brin- corresponde a uma experiência real e ver-
cadeira, atividades plásticas ou musicais dadeira, pois pode articular as diferentes
são exemplos de atividades que podem potencialidades da criança em uma mes-
aproximar a criança de um objeto de estu- ma atividade, e é também considerada
do e criar condições para uma aprendiza- uma experiência educativa, por promover
gem significativa. Quais seriam, então, as o desenvolvimento de capacidades em ati-
qualidades educativas compreendidas nes- vidades providas de qualidade social.
te tipo de atividade?
Os pressupostos deweyanos de conti-
nuidade entre vida e educação, experiência 2. Educação como
e conhecimento, escola e sociedade revelam reconstrução da experiência
a sua crença na utilidade prática do conhe- social: a contribuição
cimento e na função social da educação. A deweyana
arte, como experiência, mostra-se compro-
metida com estes pressupostos pelas quali- A concepção deweyana de educação
dades que apresenta: o envolvimento com- como reconstrução da experiência social
pleto da criança nas atividades estéticas nos faz pensar a prática pedagógica em
com suas potencialidades intelectuais, sua dinâmica própria de elaboração pes-
imaginativas e emotivas; a possibilidade soal e coletiva. O que nos propomos nes-
de seleção e ordenação de significados so- te artigo é investigar as formas e os fun-
ciais de acordo com as experiências vivi- damentos desta dinâmica, ou seja, as for-
das; a presença de obstáculos e situações mas mais adequadas para que o processo

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do conhecimento alcance um caráter cri- educativo e a instituição escolar consiste,


ativo e cooperativo. Neste sentido, é im- muitas vezes, na ausência de um objetivo
portante destacar que a possibilidade de comum que possa dar um sentido e uma
seleção e ordenação de significados con- orientação às várias atividades escolares.
siste em outra importante qualidade Esta ruptura entre as ações e os próprios
educativa da experiência estética: trata-se objetivos destas ações revela-se, muitas
de um processo no qual os significados são vezes, pela falta de um eixo orientador que
determinados pelas relações que eles man- ofereça um caráter cooperativo e um sen-
têm entre si e para com as emoções e con- tido comum às várias etapas de uma ativi-
ceitos já incorporados. Compreender este dade ou mesmo às diversas matérias de
processo de seleção e ordenação de signi- estudo. É comum verificarmos um grande
ficados na experiência estética é importan- isolamento, um distanciamento entre as
te no sentido em que evidencia certas con- matérias como a matemática, a história e a
dições básicas e essenciais para o proces- literatura, por exemplo, sendo que isto
so de conhecimento: a aquisição de conhe- pode acontecer mesmo no interior de cada
cimentos pode ser entendida como um matéria, quando os assuntos não são rela-
processo no qual um novo significado é cionados uns com os outros e, também, não
conectado a um conjunto de idéias já cons- são contextualizados histórica e socialmen-
tituídas e inter-relacionadas. Perceber as te. Desta forma, a criança tem a impressão
relações entre uma idéia nova para com de estar na frente de um amontoado de
os outros significados já incorporados pelo informações, sem conexões entre si e sem
indivíduo consiste num dos aspectos bá- uma ordem que faça sentido para ela, por-
sicos da aprendizagem, e a emoção tem que não teve a oportunidade de participar
um importante papel neste processo, por- na elaboração de hipóteses explicativas
que cobre de sentido a atividade, além de para fenômenos observados e não foi in-
oferecer uma orientação às ações, de acor- centivada a elaborar os critérios segundo
do com as preferências e os interesses da os quais o conhecimento poderia estar or-
criança. Para Dewey (1959, p. 215), não ganizado. Estas condições de ensino não
adianta uma atividade querer despertar o correspondem àquelas situações que ins-
interesse da criança apenas por meio de tigam o uso da inteligência para a resolu-
distrações e divertimentos: ção de problemas; pelo contrário, mostram-
se inacessíveis e desestimulantes, justa-
Já se sabe que, se a atividade não fizer mente porque não convidam a criança a
uso das emoções e dos desejos, se não participar do processo educativo com a sua
oferecer uma válvula para a energia que curiosidade e questionamento pessoal.
tenha algum significado para o próprio A descontinuidade entre meios e fins
indivíduo, seu espírito dela se afastará nas atividades educativas pode torná-las
com aversão, embora externamente nela enfadonhas e desinteressantes (Dewey,
se conserve. 1949) para a criança, principalmente quan-
do é marcada pela ausência de um objeti-
Com essa afirmação, Dewey lembra da vo que perpassa todos os processos da ati-
importância de se considerar as habilida- vidade ou ausência de um tema central que
des pessoais da criança como as bases do compreenda as diferentes áreas do conhe-
conhecimento, compreendendo as emo- cimento. Nestas condições, estes proces-
ções e as potencialidades imaginativas, ao sos tornam-se mecânicos, desvinculados
lado das faculdades intelectuais em todo uns dos outros e do objetivo principal da
processo educativo. Uma vez que as qua- atividade, o que nos faz questionar toda
lidades estéticas em educação possibilitam proposta educativa que não compreende o
a integração das diferentes habilidades e diálogo e planejamento cooperativo das
diversas potencialidades da criança e, tam- diferentes áreas do conhecimento.
bém, o desenvolvimento da sensibilidade A desarticulação entre as atividades e
para uma efetiva reflexão sobre os proble- entre estas e os seus objetivos acontece ain-
mas e conceitos abordados, podemos con- da em propostas educativas de caráter tra-
siderar a arte um importante instrumento dicionalista. Para compreendermos a im-
pedagógico e um meio adequado para os portância da continuidade entre meios e
fins de formação pessoal e social. fins de uma atividade, apontamos como
Outro fator para o crescente desinte- modelo a experiência estética, que na filo-
resse da criança para com o processo sofia deweyana é caracterizada por uma

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íntima conexão entre suas partes. Quando como é compreendida e percebida uma
os vários momentos de uma obra de arte experiência: nas relações entre as suas par-
revelam esta conexão, então é possível per- tes. Fazendo um paralelo com a atividade
ceber um jogo de correlações entre dife- educativa, podemos comparar esta capaci-
rentes qualidades intrínsecas à experiên- dade de percepção em uma experiência
cia como um todo. Dewey (1949, p. 158) estética à capacidade de correlação de sig-
observa que é esta continuidade que con- nificados entre as diferentes áreas de co-
fere à obra de arte uma essência de vida: nhecimento. A presença de um tema cen-
tral ou de um objetivo é, neste aspecto, es-
[...] quando obtemos de um produto ar- sencial para a compreensão das várias par-
tístico o sentimento de estarmos envolvi- tes como um todo. Este tema central ou
dos com um processo, com uma história, objetivo que pode correlacionar as diferen-
percebida em um ponto particular de seu tes áreas de conhecimento tem, na perspec-
desenvolvimento, é quando temos a im- tiva deweyana, um sentido pragmático, res-
pressão de vida. O que está morto não se tabelecendo a continuidade entre a ativi-
estende ao passado nem desperta nenhum dade educativa e a vida social.
interesse no porvir. É importante salientar que uma maté-
ria de estudo deve ser compreendida em
As diferentes partes no desenvolvi- seu contexto de relações com as outras áre-
mento de uma experiência estética têm as do conhecimento. Este contexto de rela-
como base comum um tema ou objetivo ções é definido, por sua vez, pelo objetivo
que as conecta e orienta – estão, na verda- ou tema central que é utilizado para o de-
de, conectadas umas às outras, de forma a senvolvimento da atividade educativa, isto
se completarem de sentido. Podemos ana- é, dependendo do tema escolhido para ori-
lisar a importância da conexão entre as entar a atividade, as matérias de estudo
várias partes ou componentes de uma ex- podem ser relacionadas de diferentes for-
periência em dois aspectos diferentes: no mas. O que importa é que haja, sempre, este
que se refere ao desenvolvimento ativo da inter-relacionamento entre as diferentes
experiência e, também, no que se refere à áreas do conhecimento e que isto seja re-
compreensão ou percepção do jogo de sultado da presença de temas ou objetivos
interações entre as suas partes. Em outras de ordem social. Não existe sentido na se-
palavras, estes aspectos correspondem ao paração absoluta entre as várias matérias
processo ativo de construção da obra, e o de ensino, porque os conhecimentos, apar-
outro, ao processo de percepção receptiva. tados de um tema significativo e social, não
Podemos ter como base para essa aná- passam de uma simples informação, sem
lise a experiência reflexiva, ou seja, quan- interesse para a criança e sem a possibili-
to ao primeiro aspecto, sobre o desenvol- dade de contribuição moral. É neste senti-
vimento ativo da experiência, podemos do que a idéia de interdisciplinaridade,
pensar que uma idéia sempre tem como como o encontro e diálogo entre as matéri-
apoio uma outra idéia já formada, isto por- as de estudo, constitui um fator de conti-
que, no pensamento deweyano, as partes nuidade entre a vida e a educação.
de um pensamento vão se encadeando Nesta perspectiva, as atividades esco-
umas às outras, de forma que uma dá sus- lares deveriam compreender situações e
tentação à outra na construção de um novo problemas vividos socialmente, de modo
conceito. O que nos importa verificar com que a transferência destes problemas para
este pressuposto é que as experiências pre- o âmbito escolar possibilitasse sua com-
sentes se apóiam nas antecessoras, apro- preensão e análise em seus vários aspec-
veitando significados, valores e ideais em tos que, na verdade, interagem entre si fa-
novas situações. zendo parte de um mesmo fenômeno. A
A continuidade entre meios e fins na separação destes aspectos é, de fato, arti-
experiência, que defendemos como fator de ficial e prejudica a compreensão de qual-
conexão entre suas várias fases, é impor- quer situação pela criança, já que as infor-
tante na experiência educativa, também no mações transmitidas deixam muitas vezes
sentido de considerar os saberes da criança de lado o seu caráter moral, ou seja, o
e o modo como ela vai elaborar suas rela- modo pelo qual podemos transformar as
ções de sentido para um planejamento mais ações com a análise de uma circunstância
adequado das atividades escolares. O outro social. A continuidade entre as atividades
aspecto a ser analisado refere-se à maneira escolares e a vida social é um dos pontos

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da filosofia deweyana para novas propostas educacionais

essenciais da filosofia deweyana, o que que compõem um mesmo dado da reali-


podemos entender como sugestão a idéia dade e, dessa forma, a possibilidade de
de que as matérias de ensino devem ter compreensão de sua totalidade na relação
relação com a vida social e, ainda, obser- com a vida social e cotidiana.
var que é justamente esta finalidade soci- Vimos que a continuidade entre meios
al que proporciona uma verdadeira uni- e fins, em uma experiência, constitui uma
dade para processo do conhecimento. importante qualidade educativa que não
corresponde a uma ligação rígida entre os
meios e os fins da experiência, mas sim a
3. A continuidade da uma relação flexível por meio da qual pode-
experiência como se verificar uma contínua mudança nos
interdisciplinaridade na objetivos e procedimentos. Em uma ativi-
dade educativa, a flexibilidade em seus pro-
escola cessos e as mudanças dos objetivos a serem
Verificamos que a idéia de alcançados constituem aspectos positivos
interdisciplinaridade, na filosofia para a aprendizagem. Estas mudanças re-
deweyana, corresponde à idéia de que a fletem a atitude reflexiva da criança na ati-
conexão entre as matérias de ensino se dá vidade, porque, quando existe pensamen-
nas próprias atividades da criança quan- to, interesses e capacidades em ação, é na-
do são providas de caráter social. Nesta tural que novos objetivos sejam construídos.
perspectiva, as atividades escolares deve- Do contrário, quando não existe esta flexi-
riam refletir a vida social, justamente por- bilidade e possibilidade de mudança nos
que esta revela os fatos e situações em sua processos e objetivos de uma atividade, fi-
totalidade de aspectos, contínuos entre si camos com uma experiência controlada,
– moral, afetivo, intelectivo, imaginativo imposta, sem a participação real – e inteli-
–, dimensões de um todo, de uma deter- gente – da criança. Isso é comum acontecer
minada realidade vivida. Como aponta nas atividades educativas que separam a
Dewey, um dos grandes erros da ativida- prática da teoria, a ação da reflexão.
de escolar consiste no trabalho com uma A experiência verdadeiramente
grande quantidade de estudos especiais, educativa compreende a participação ati-
sem uma relação direta e significativa com va da criança, com sua ação e reflexão;
a vida social. Como forma de vencer estas portanto, o planejamento das atividades
dificuldades, jogos, brincadeiras e outras educativas deve ser construído de forma a
atividades de caráter lúdico são mencio- considerar essa participação ativa da cri-
nados por Dewey como atividades que ança e suas capacidades de construção e
preparam a criança para o contato com as pensamento. As mudanças nos processos
matérias formais. e objetivos de uma experiência são produ-
Podemos relacionar este preparo com tos de sua ação inteligente, e para compre-
o desenvolvimento das capacidades e in- endermos os fatores envolvidos nessas
teresses da criança em situações constru- mudanças adotaremos novamente a expe-
tivas, nas quais os desafios permitem a re- riência estética como modelo de análise.
flexão sobre os problemas propostos. A A experiência estética compreende uma
percepção das relações entre as diferentes atividade inteligente intensa e, por isso, é
áreas de conhecimento de sua atividade é considerada por Dewey uma experiência
uma qualidade própria das experiências verdadeira que possibilita sua permanen-
que recorrem ao cotidiano da criança e te reelaboração. Justamente por compreen-
às situações revestidas de caráter social der esta possibilidade de permanente
e lúdico. Dewey salienta que esta conti- reelaboração, em outras palavras, por ser
nuidade constitui uma importante quali- flexível e aberta a uma permanente avalia-
dade educativa devido à sua função ção, é que a experiência estética é consi-
“catalisadora” da experiência, ou seja, à derada essencialmente democrática.
sua propriedade de revelar as íntimas re- Em uma experiência, a multiplicidade
lações entre as suas partes, o que a torna e variedade de elementos – significados e
um todo de realidade, permeado de senti- qualidades – é condição básica para que
do. Na experiência educativa, essa quali- se propague o movimento de interação:
dade torna-se especialmente importante, oposição, acúmulo, conservação e coope-
porque proporciona à criança o exercício ração. Dewey qualifica esta interação como
de correlação entre os aspectos diferentes uma atividade cooperativa de significados,

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responsável pela unidade da experiência experimentação em situações de caráter


no processo de percepção. Neste sentido, social, ou seja, contextos verdadeiramen-
quando ocorre o movimento de repulsa e te significativos para a criança.
divergência entre alguns elementos da ex-
periência, é necessário que haja um mo-
mento de análise e conciliação no qual es- 4. A unidade da experiência
ses elementos encontram uma forma educativa e a utilidade do
compensadora de interação. Na experiên- conhecimento: quando a
cia estética, a percepção unificada de uma ação encontra as
obra de arte deve compreender todo este possibilidades da reflexão
trabalho de interação entre os seus signifi-
cados e qualidades, não esquecendo que Em teoria estética, dizer que a unida-
esta interação também compreende os sig- de na experiência é dinâmica, ou seja, que
nificados e as sensações próprias do indi- a obra de arte é produto da interação entre
víduo de experiências anteriores. uma multiplicidade de elementos simbóli-
A experiência estética compreende cos, corresponde, no que se refere à educa-
uma atividade humana intensa – ativida- ção, a dizer que o conhecimento é produto
de inteligente, denominada por Dewey da atividade inteligente do indivíduo, que
(1949, p.85) de processo de percepção re- se desenvolve por meio deste exercício de
ceptiva –, em que a emoção “evoca, reúne, correlação entre significados e qualidades
aceita e afasta recordações, imagens, ob- sensíveis – o que é intrínseco à experiência
servações e as elabora em uma totalidade estética. Este trabalho de correlação entre
entonada por todas as partes com o mes- os significados, no pensamento reflexivo,
mo sentimento emocional imediato”. Esta pressupõe a continuidade do indivíduo em
capacidade de criar uma interação entre seu meio social, ou seja, uma interação por
significados diversos de uma experiência meio da qual os conhecimentos possam ser
ou de constituir a unidade ante a verificados na experiência. Esta interação
multiplicidade por meio desta interação é compreende a ação do indivíduo, de forma
o que estabelece a continuidade entre ex- inteligente e planejada.
periência estética e educativa. A experiên- Contudo, o que vemos na maioria das
cia educativa deve ter como base o exercí- escolas, atualmente, é a execução de tare-
cio de correlação entre uma multiplicidade fas mecânicas, sem qualquer vínculo com
de significados – por meio da ação e per- a vida prática e social. A descontinuidade
cepção receptiva –, o que corresponde a entre as atividades práticas e o pensamen-
uma análise comparativa entre esses dife- to reflexivo é uma característica marcante
rentes significados. Analisar comparativa- de nossa experiência social cotidiana e,
mente compreende, no entanto, a relação especialmente, da experiência educativa.
entre significados intelectuais assim como Considerar o pensamento humano como
entre qualidades sensíveis inerentes a um um estoque de informações, com a função
determinado objeto de conhecimento e ao reduzida à assimilação passiva do que lhe
sistema global de objetos conectados1 do é imposto, ignorando as interações com o
indivíduo que vive a experiência. meio social, constitui, para Dewey, o erro
A partir destes fundamentos, pode- que sustenta todo o fracasso da escola
mos, então, nos questionar sobre os mo- como instituição social. Técnica e super-
dos mais adequados da prática educativa ficial torna-se a relação com o conheci-
para que seja alcançada esta correlação mento o que, para Dewey, não compreen-
entre as várias partes de uma experiên- de o verdadeiro crescimento.
cia, em outras palavras, para que tenha Uma vez que a interação ao meio so-
êxito o que denominamos, hoje, de cial compreende a ação inteligente, pode-
interdisciplinaridade. O trabalho com as mos considerar que a condição básica para
informações abordadas na escola pode ter a atividade e formação do pensamento são
qualidade verdadeiramente educativa as próprias respostas decorrentes das ações
quando promove a reflexão e, por meio do indivíduo em seu meio como elemen-
desta, a compreensão de seu sentido tos orientadores de seu pensamento e, as- 1
Dewey (1949) denomina de
sistema global de objetos
dentro de temas sociais. As atividades sim, do curso de sua experiência. Na filo- conectados o conjunto de
expressivas ou construtivas, para sofia deweyana, a percepção da realidade significados armazenados
pelo indivíduo, decorrentes
Dewey, cumprem este papel ao propici- não corresponde a um processo passivo, de suas diversas experiênci-
ar o questionamento, a investigação e a de assimilação de fatos e idéias, mas sim as de vida.

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a um processo ativo, no qual as reações – é estimulada pelas dificuldades encontra-


como resultados das interferências do in- das no curso de uma atividade. A ação prá-
divíduo em seu meio – são os elementos tica da criança em uma atividade provê as
constitutivos do pensamento. reações necessárias para que haja uma
O conhecimento só é verdadeiro e sig- adaptação dos atos aos novos objetivos. Na
nificativo, para Dewey, quando formulado arte, esta adaptação entre os atos e o pen-
pela “adaptação do estímulo sensorial e da samento ou, então, entre a ação e a per-
reação motriz” (Dewey, 1954, p. 143). É a cepção receptiva é um processo permanen-
utilidade do conhecimento, no curso de te e intenso. A percepção receptiva
uma ação, que constitui a sua veracidade e corresponde a esta atividade do pensamen-
o seu valor significativo – daí a importân- to, por meio da qual o indivíduo organiza
cia de sua correspondência à vida social. A suas idéias, desejos e propósitos, na
utilização do conhecimento nas atividades interação com algum aspecto da realidade
práticas possibilita a sua verificação, ou vivida. É nessa interação com o meio que
seja, possibilita compreender se ele é coe- são produzidas as reações com as quais
rente com os resultados obtidos em deter- será realizada esta organização – que é a
minada experiência. Esta verificação é de percepção receptiva. A continuidade en-
grande valia para a continuidade da expe- tre a ação e a percepção está presente tan-
riência, porque faz que o indivíduo avalie to no fazer artístico como na apreciação
a utilidade e veracidade deste conhecimen- estética, daí que as atividades construti-
to e, com base neste julgamento, possa vas desenvolvidas com a criança não de-
reelaborar conceitos, valores e procedimen- vem se limitar às práticas, mas devem tam-
tos práticos. Para que a atividade seja con- bém contemplar toda forma de percepção
tínua, isto é, compreenda esta reelaboração sensível na relação com as diferentes lin-
de idéias, é preciso que exista um motivo guagens artísticas.
que anime o processo no desenvolvimento O prazer no desenvolvimento de uma
da atividade. Este motivo, ou propósito, atividade e a satisfação objetiva na conclu-
nasce de uma identificação do indivíduo são de um trabalho correspondem à reali-
com algum aspecto desta atividade – o sen- zação dos propósitos compreendidos em
tido social – e é o que impulsiona o indiví- uma experiência, mas em situações nas
duo para a ação. quais as ações das crianças se perdem e
Além do motivo social que impulsio- não encontram respostas, situações nas
na a ação, Dewey aponta a necessidade de quais não se pode avaliar e apreciar o que
um esforço para esta reelaboração de idéi- foi feito, esta possibilidade de realização é
as – a criação de novos meios e objetivos, perdida. A ação e a percepção receptiva,
no planejamento da atividade. A atividade como processos contínuos, que constitu-
do pensamento para esta criação de novos em toda experiência estética, são fontes de
planos de ação exige concentração, perse- satisfação que recobrem a prática educativa
verança, retitude e sinceridade2 – é um tra- de sentido, dinamismo e criação.
balho que exige esforço. Dewey (1954, p. A continuidade entre a ação e a per-
128) observa sobre a importância do esfor- cepção receptiva é uma qualidade estética
ço – na atividade do pensamento –, no cur- da experiência que corresponde a um
so de uma ação, utilizando o exemplo de envolvimento integral do indivíduo na ex-
um menino que deseja fazer um papagaio: periência – intelectual, imaginativo e
emotivo –, o que vai possibilitar à criança
No curso das operações, dificuldades ines- reelaborar os seus atos de forma criativa,
peradas o assaltam [...] examina as razões dando continuidade à experiência.
porque o seu trabalho não está certo, e Estamos falando de uma postura avaliativa
estuda, e compara, e procura novos meios que tanto a criança como o professor de-
e novos remédios. À medida que assim vem adotar para o desenvolvimento criati-
procede, o seu pensamento a respeito do vo de uma atividade.
papagaio como um todo se torna mais ní- Esta continuidade entre a ação e a per-
2
Retitude e sinceridade são
termos usados por Dewey tido, o seu projeto se torna mais claro e os cepção receptiva na arte deve estar presen-
(1936) para designar atitudes meios de realizá-lo mais adequados. te nas atividades educativas, como conti-
que expressam envolvimento
e responsabilidade para com nuidade entre ação e reflexão ou entre a
a atividade que está sendo de- Nas atividades educativas, a teoria não experiência prática e pensamento imagi-
senvolvida. Seriam, assim,
virtudes morais – porque im-
pode estar desvinculada da prática justa- nativo, justamente por ser uma condição
plicam crescimento. mente porque a atividade do pensamento básica da continuidade da experiência, ou

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 360-369, set./dez. 2006. 367
Cecília Maria Siqueira Silva

seja, de sua permanente avaliação e inteligência que implica e pela comunica-


reelaboração. Para que a criança possa ava- ção de significados sociais, como força
liar e planejar de forma inteligente sua ex- unificadora.
periência, é preciso que haja atividade do A educação, na filosofia deweyana,
pensamento na verificação da utilidade de como a contínua reconstrução da experi-
certas idéias na prática, para que sejam ência, encontra os seus meios e fins na
reelaboradas e, assim, adaptadas a novos própria vida social, o que lhe confere o
objetivos. As qualidades estéticas até aqui sentido de pragmática. Promovendo a con-
analisadas são as condições básicas para tinuidade entre o indivíduo e o meio soci-
esta atividade inteligente: a continuidade al, ação e reflexão, teoria e prática, a edu-
entre as faculdades intelectuais, emotivas cação deweyana objetiva o desenvolvi-
e imaginativas, a continuidade entre mei- mento do hábito inteligente – o hábito de
os e fins, a interação entre os elementos pensar, aprender a pensar ou aprender a
significativos na experiência e a continui- aprender (Dewey, 1959). Dessa forma, as
dade entre ação e percepção receptiva. Po- atividades construtivas de caráter lúdico
demos dizer que, para Dewey, as ativida- e estético são apresentadas neste artigo
des estéticas são essencialmente educativas, como a possibilidade de desenvolvimen-
justamente porque compreendem essas to de propostas educacionais comprome-
continuidades e oferecem à escola a possi- tidas com a participação criativa da crian-
bilidade de uma vivência real das circuns- ça em sua avaliação e planejamento.
tâncias sociais, e uma vivência democráti- Concluímos, também, pela necessida-
ca, porque compreendem a participação de de que os interesses e habilidades da
inteligente e são carregadas de sentido e criança possam ser reconhecidos como
caráter moral. capacidades para alguma forma de contri-
buição em atividades sociais. Se acredita-
mos que a educação é o meio pelo qual se
Conclusão constitui esta continuidade entre o indi-
víduo e seu meio social, é preciso inves-
A arte, na filosofia deweyana, tirmos nesta idéia de comunicação entre
corresponde a uma experiência intensa e a escola e a comunidade, entre o conheci-
inteligente, compreendendo a atividade do mento e a experiência social. Esta conti-
pensamento imaginativo na recriação e nuidade fundamenta o pragmatismo
reordenação de significados vivenciados, deweyano e reveste a educação com uma
na qual os significados são socializados, função democratizante, o que evidencia
apresentando-se de uma forma unificada. mais uma vez a necessidade de uma orga-
Concluímos que a experiência estética tem nização escolar pautada nos valores da
um grande valor educativo, pelo uso da participação, tolerância e cooperação.

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A dimensão estética e democrática da experiência: uma contribuição
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Cecília Maria Siqueira Silva, mestre e doutora em Filosofia da Educação pela Fa-
culdade de Educação da Universidade de São Paulo (Feusp), é professora do curso de
Pedagogia da Faculdade Taboão da Serra (FTS).
cecisiqueira@zipmail.com.br

Recebido em 30 de março de 2006.


Aprovado em 11 de setembro de 2006.

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ESTUDOS

A qualidade de vida de estudantes que


ingressam na universidade
na meia-idade
Denise Maria dos Santos Paulinelli Raposo

Resumo
Os estudos acerca do desenvolvimento humano na idade adulta e no envelhecimen-
to têm instigado o interesse de teóricos do assunto, em virtude do aumento do tempo de
vida da população. Constata-se, no campo educacional, entre os anos de 1996 e 2003, um
crescimento do número de pessoas que ingressaram na universidade na meia-idade. Com
base no interesse em dar continuidade ao estudo sobre a entrada na universidade, o
presente artigo tem como objetivo discutir a qualidade de vida de estudantes que ingres-
sam na universidade após os 45 anos de idade; para tanto, foram revisados os estudos de
Baltes (1970, 1977, 1990, 1995, 1997, 1999) e Neri (1985, 1991, 1993, 1995, 2002). A
metodologia utilizada foi ancorada na abordagem qualitativa. Os resultados revelam que
os respondentes antes de ingressarem no ensino superior vivenciaram um período de
estabilidade e que, após selecionarem suas metas e otimizarem suas capacidades de re-
serva, apresentaram melhorias na qualidade de vida. Conclui-se, com base nos argumen-
tos relatados pelos estudantes, que o desenvolvimento deve ser visto sob vários prismas –
biológicos, psicológicos, sociais – e num processo de interação.

Palavras-chave: idade adulta; desenvolvimento humano; qualidade de vida.

Abstract The quality of life of students who enter the


university in middle age
The studies concerning human development in the adult age and aging have instigated
the interest of theoreticians, in virtue of the increase of life expectancy of the population.
It is evidenced, in the educational field, between 1996 and 2003, a growth of the number
of people who had entered the university in middle age. On the basis of the interest in
continuing the study on university entrance, the present article aims at arguing the quality
of life of students who entered the university after the age of 45; therefore, the studies of
Baltes (1970, 1977, 1990, 1995, 1997, 1999) and Neri (1985, 1991, 1993, 1995, 2002)
were revised. The used methodology was anchored in the qualitative approach. The results
reveal that, before entering superior education, the respondents had deeply lived a period
of stability and that, after selecting their goals and optimizing their capacities of reserve,
had presented improvements in their life quality. One concluded, on the basis of the
students’ arguments, that the development must be seen under some conditions biological,
psychological, social and in a process of interaction.

Keywords: adult age; human development; quality of life.

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A qualidade de vida de estudantes que ingressam
na universidade na meia-idade

Introdução populacional e à longevidade, como o cui-


dado com os idosos, as despesas dos sis-
temas de saúde, a formação de recursos
O presente artigo aborda questões re-
humanos especializados, atividades
lativas ao estudo do desenvolvimento hu-
ocupacionais e oportunidades educacio-
mano na idade adulta, especialmente a par-
nais para idosos e pessoas da meia-idade,
tir dos 45 anos. O interesse por esse tema
originou-se da convivência diária da auto- tornaram-se fundamentais (Neri, 1995).
ra com estudantes que freqüentam cursos Com relação à educação, os dados apresen-
de graduação e que relatam fatos relativos tados pelo Inep (2005) indicam que as ma-
às mudanças que ocorreram em suas vidas trículas no ensino de graduação aumenta-
após o ingresso no ensino superior. ram de 8,7% em 1996 para 12,8% em 2003,
Nas últimas décadas, as pesquisas so- acentuadas nas faixas etárias mais elevadas.
bre o desenvolvimento humano na idade Os dados apresentados em estudos realiza-
adulta e no envelhecimento tornaram-se dos sobre o número médio de anos da po-
cada vez mais relevantes, com o aumen- pulação de 15 anos ou mais de idade nas
to da longevidade da população. O inte- grandes regiões, segundo o sexo e grupos
resse por essa fase do ciclo de vida ocor- de idade, cresceram de 5,6 para 6,8 anos de
reu como conseqüência tanto de aspectos estudos entre 1996 e 2003, na faixa etária
demográficos quanto dos avanços do co- de 40 a 49 anos. Por outro lado, acima de 50
nhecimento científico que resultaram na anos, os homens apresentam um aumento
possibilidade de oferecer à população uma de 3,4 para 4,6 anos de estudo. Esses índi-
melhoria na qualidade de vida (Neri, 1995). ces indicam que ocorreu um aumento sig-
As informações demográficas origi- nificativo nos anos de estudos de pessoas
nárias do IBGE (Censo, 2003) justificam dessa faixa-etária (Tatau et al., 2005).
uma maior razão para o rápido crescimen- Para fundamentar os estudos relativos
to no interesse pelo desenvolvimento ao interesse em pessoas que ingressam na
adulto. Essas informações indicam um universidade na meia-idade, recorreu-se à
estreitamento da base da estrutura etária, teoria denominada de perspectiva de cur-
que pode ser compreendido pelo acom- so de vida pela Sociologia e de perspectiva
panhamento da participação dos grupos do ciclo de vida pela Psicologia, expressões
qüinqüenais mais jovens. correspondentes à designação referida nos
Em meados da década de 80, os gru- estudos brasileiros e utilizadas internaci-
pos de 0 a 4 e de 5 a 9 anos de idade deixa- onalmente. Esta abordagem teórica com-
ram de ser os mais numerosos. Em 1995, preende o estudo do desenvolvimento hu-
o grupo de 10 a 14 anos de idade já supe- mano enfatizando o biológico e o cultural
rava os dois anteriores. Com a continua- e abrangendo os aspectos evolucionários e
ção desse processo, o grupo de 15 a 19 anos ontogenéticos (Neri, 1995).
de idade, em 1998 e 1999, já estava no Diante de tais evidências, o presente
mesmo patamar do anterior e superava os artigo trata, mais especificamente, de um
dois primeiros. estudo sobre a qualidade de vida de quem
O outro extremo da estrutura etária se ingressa na universidade após 45 anos de
reflete no lento mas contínuo aumento do idade, enfocando se há mudanças na vida
número de habitantes na meia-idade e ido- desses estudantes após a freqüência à uni-
sos, que cresceu bem acima da média do versidade, como se manifestam e se são
País, entre 27,9%, para grupos de 40 a 59 configuradas ou não como evento que pro-
anos, e 26,12%, para aqueles com mais de porcionou melhoria na qualidade de vida.
60 anos. A proporção numérica feminina
apresentou uma acentuada superioridade
no grupo de 40 a 59 anos, de 29,5%, e a dos O desenvolvimento humano
homens de 26%. O grupo de pessoas com na idade adulta
mais de 60 anos indicou um crescimento
de 27,3% entre as mulheres e de 24,5% Na trajetória das ciências sociais, há
entre os homens (Censo, 2003), ou seja, se um ponto de vista convergente no que se
nascem menos pessoas e estas vivem mais, refere às mudanças evolutivas – a teoria
vai aumentando o contingente de idosos. evolucionista de Charles Darwin (1872),
Com o aumento nos anos de vida, os “cujos princípios de continuidade da mu-
estudos acerca das necessidades sociais que dança histórica, multidirecionalidade,
estão relacionadas ao envelhecimento seletividade, criatividade e progressividade

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Denise Maria dos Santos Paulinelli Raposo

da evolução das espécies tiveram uma in- No Brasil, os trabalhos de Neri (1991,
fluência primordial sobre as teorias do de- 1993, 1995) e de Neri e Wagner (1985) são
senvolvimento psicológico” (Neri, 1995, dedicados ao estudo psicológico do desen-
p. 17). Por outro lado, a teoria de curso de volvimento humano na idade adulta e na
vida (Baltes, Staudinger, Lindenberger, velhice com base na perspectiva de curso
1999) considera que o desenvolvimento de vida, iniciado na Europa entre as déca-
não se completa em uma determinada das de 60 e 70 por Baltes e Goulet. Neri
fase, mas se estende ao longo da vida. (1995, p. 25) entende que “as teorias do
Segundo Honzik (1984), a maior questão desenvolvimento têm uma base comum,
levantada sobre o curso de vida se refere e tentar, a partir disso, caracterizá-las
à natureza das mudanças que ocupam quanto à origem é, porém, apenas uma das
lugar durante o desenvolvimento e o que maneiras de conceituá-las. Elas podem ser
determina essas mudanças. analisadas ainda quanto à maneira como
Os estudos sobre o desenvolvimen- consideram a natureza da progressão das
to humano na idade adulta avançaram mudanças evolutivas”.
no século 20, segundo Salthouse (1989), Segundo Baltes (1995), os estudos
especialmente durante a Primeira Guer- demonstram que durante a vida adulta os
ra Mundial, quando estudiosos da vida indivíduos “continuam a ser desafiados
adulta começaram suas investigações pelas suas próprias expectativas quanto ao
com a aplicação de testes de inteligên- futuro, por novas exigências ambientais,
cia em um número expressivo de solda- pelo desejo de progresso e pela contínua
dos do exército americano. Tais testes preocupação com o senso de controle, a
causaram enormes controvérsias, uma integração e a produtividade social” (Neri,
vez que buscaram classificar o nível de 1995, p. 12). Contudo, para que o indiví-
inteligência dos adultos. Os resultados duo mantenha seu bem-estar físico e soci-
possibilitaram ao exército realizar uma al e acompanhe as mudanças e exigências
hierarquização entre seus componentes, da sociedade, faz-se necessário levar em
muitos dos quais foram dispensados por consideração o ambiente em que vive, os
serem considerados com pouca aptidão, valores sociais e individuais, bem como
outros foram encaminhados a batalhões as circunstâncias de sua história de vida.
que exigiam um baixo nível de inteligên- Desse modo, o potencial individual para
cia e o restante foi enviado para batalhões o desenvolvimento favorecerá uma velhi-
especiais, onde se submeteriam a treino ce bem-sucedida, observados os limites da
mais desenvolvido. plasticidade de cada um.
Segundo Stevens-Long (1979), a Com base nas proposições acima des-
partir da aplicação desses instrumentos critas, foi elaborado o modelo de envelhe-
de pesquisa em adultos, cresceram ra- cimento bem-sucedido que enfoca o ma-
pidamente os estudos de pessoas com nejo dinâmico entre ganhos e perdas por
50, 60 e 65 anos. A divulgação desses meio da interação entre “Seleção,
estudos culminou com o primeiro ma- Otimização e Compensação” (Baltes, 1997).
nual sobre psicologia do envelhecimen-
to, contendo tópicos clássicos sobre a
percepção, a aprendizagem, a inteligên- SOC: a teoria da Seleção,
cia e a personalidade (Neri, 1995). As Otimização e Compensação
publicações de pesquisas longitudinais
e experimentais avançaram, bem como As mudanças no desenvolvimento
a divulgação de estudos sobre a humano são concebidas por Baltes (1997)
periodização da vida adulta, por meio de maneira positiva (aperfeiçoamento/
de estágios e crises normativas, dividi- otimização) quando o indivíduo tem a ca-
dos em ciclos de vida com diferentes pacidade de adaptação na direção de re-
blocos de tempo para o estudo de fenô- sultados desejáveis (metas), que depen-
menos diferenciados (Stevens-Long, dem da aplicação de um conjunto de com-
1979), identificados nas teorias de portamentos, de realização de metas, de
Bromley (1974), Levinson (1974), Gould conhecimento cultural, status físico, com-
(1972), Neugarten (1974), Erikson prometimento com as metas desejadas,
(1963), Lowenthal e Chiriboga (1975), práticas e esforço.
Schlossberg (1981), entre outros, descri- Esse modelo de envelhecimento bem-
tos por Günther e Günther (1986). sucedido enfoca o manejo dinâmico entre

372 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 370-381, set./dez. 2006.
A qualidade de vida de estudantes que ingressam
na universidade na meia-idade

ganhos e perdas por meio da interação através do curso de vida (Baltes, 1997), os
entre Seleção, Otimização e Compensação processos de Seleção, Otimização e Com-
(SOC). A SOC consiste numa estrutura pensação (SOC) estão embasados em:
biológica e cultural que pode ser aplicada
a qualquer teoria do desenvolvimento, por a) Benefícios de seleção evolutiva –
se tratar de um conjunto de concepções pressupõe que a idade e a
que supõem uma interação desses proces- plasticidade estão correlacionadas
sos em diferenciadas etapas da vida. Essa com a diminuição do potencial bi-
aplicação, segundo Baltes (1997), está re- ológico;
lacionada com os movimentos que b) Necessidade de cultura – prediz que
direcionam o indivíduo a atingir níveis são requeridos recursos crescentes,
mais altos de funcionamento (crescimen- baseados na cultura com o aumen-
to) e a possibilidade de impedir resulta- to da idade (recursos psicológicos,
dos negativos (manutenção). sociais, materiais, econômicos e
A seleção está relacionada com o de- simbólicos – conhecimento);
senvolvimento, que tem um universo es- c) Eficiência da cultura – sugere que
pecífico de metas de desempenho e ocor- não obstante o aumento da neces-
re dentro de determinadas condições ou sidade de cultura, a sua eficiência
limitações, inclusive limites de tempo e se torna reduzida devido à perda de
recursos. Baltes (1997) acrescenta que a plasticidade que ocorre com o au-
seleção é condicionada às disposições mento da idade.
comportamentais que durante a evolução
foram selecionadas a partir de um con- A Seleção, Otimização e Compensa-
junto de potencialidades, como a ção, fundamentadas nos três princípios
plasticidade associada à idade e às per- básicos citados, exploram os estados in-
das em potencial. Os elementos referen- completos do desenvolvimento humano e
tes ao potencial biológico ou plasticidade suas implicações, entendendo que a
associados à idade aumentam a pressão maximização de ganhos e a minimização
para seleção. de perdas permitem uma possível
A otimização, entendida como um equilibração do indivíduo, dependendo da
movimento direcionado para o aumento natureza do que significa ganho e perda.
da eficácia e para a busca de níveis mais A teoria SOC considera que este estado
altos de desempenho, está relacionada pode mudar se levarmos em conta a idade,
com uma concepção tradicional de de- padrões de comportamento, contextos cul-
senvolvimento. Os elementos relevantes turais e históricos, bem-estar funcional e
para a tarefa de otimização variam de adaptabilidade.
acordo com as condições de domínio e Assim, para Baltes (1997), a SOC tem
de desenvolvimento. um caráter de multicausalidade,
A compensação, operacionalizada multidimensionalidade, multidireciona-
quando um conjunto de recursos não está lidade e multifuncionalidade, que ocorrem
disponível, ou quando há uma perda di- durante todas as etapas do curso de vida.
reta desses meios, de restrições de tempo Partindo do princípio de que, com o au-
ou de energia, tem origens múltiplas e mento da idade, as mudanças no indiví-
possui formas variadas. duo envolvem mais perdas do que ganhos,
A teoria SOC é sistêmica e essas experiências desencadeiam uma per-
funcionalista, não designa conteúdo espe- da generalizada na capacidade de reserva.
cífico, mecanismos do processo e dos re- Desse modo, a manutenção de níveis ele-
sultados do desenvolvimento, aplicando- vados de funcionamento em todos os do-
se a uma variedade de metas e recursos. mínios torna-se pouco provável.
Dentro dessa composição, Baltes (1997) Ocorre, entretanto, uma seleção de
resume a SOC caracterizando seus três domínios que favorece o indivíduo na pre-
componentes: a seleção envolve direção, servação de altos níveis de funcionamen-
metas ou resultados; a otimização envol- to. A partir dessa seleção, procura-se a ade-
ve meios para obter sucessos (resultados quação para que esses níveis alcancem
desejados); e a compensação denota recur- bom desempenho. Durante esse processo
sos para combater as perdas/declínios. ocorrem eventos, tornando necessário que
Com relação aos princípios que gover- o indivíduo utilize novas estratégias e que
nam a dinâmica entre a biologia e a cultura potencialize as suas reservas.

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Denise Maria dos Santos Paulinelli Raposo

A influência de eventos na Ressalta, ainda, que as variações fí-


idade adulta sicas, motivacionais de recursos sociais
e intelectuais, assim como os indicado-
Baltes (1997) menciona que os res utilizados para definir desenvolvi-
limitadores propiciam perdas e os mento bem- sucedido, podem interferir
facilitadores propiciam ganhos no desen- na SOC. Costa (1998) assinala dois fato-
volvimento. Dentro da teoria de curso de res que contribuem para o bem-estar psi-
vida, eles são evidenciados por influênci- cológico do indivíduo: o primeiro se re-
as graduadas por idade, graduadas por his- fere ao valor que o indivíduo encontra
tória e de caráter não-normativo. em desempenhar uma função produtiva;
Para Staudinger, Marsiske e Baltes e o segundo trata do valor do trabalho
(1995), as influências graduadas por idade para a sobrevivência do indivíduo, seu
são normativas por estarem intimamente papel de dar significado e estrutura à
ligadas à idade cronológica e se apresenta- vida adulta e o local para fluir o talento,
rem por meio de determinantes biológicos as habilidades individuais e o conheci-
e ambientais. Por outro lado, as influênci- mento. Os processos da teoria SOC de-
as ligadas à graduação pela história estão pendem do contexto sociocultural, recur-
relacionadas com o tempo histórico, além sos individuais, preferências pessoais e
de abranger os determinantes biológicos e podem ser operacionalizados de modos
ambientais. As influências não-normativas, e meios diferenciados.
associadas aos determinantes biológicos e Com base nos estudos de Baltes
ambientais, favorecem a diferenciação de (1970, 1977, 1990, 1995, 1997, 1999) e de
um indivíduo do outro, visto que a ocor- Neri (1985, 1991, 1993, 1995, 2002), en-
rência de eventos desvincula-se das influ- tre outros, serão discutidos os resultados
ências normativas. de uma investigação sobre a qualidade de
Neri (1995, p. 31) considera que “essas vida de quem ingressa na universidade
três classes de influências (...) interagem, após 45 anos de idade, enfocando se há
mudam ao longo do tempo e têm efeitos mudanças na vida desses estudantes após
cumulativos que podem ser muito diferen- a freqüência à universidade, como se
tes de pessoa para pessoa”. Carstensen manifestam e se são configuradas ou não
(1995) ressalta que, ao longo do tempo, a como evento que proporcionou melhoria
aquisição de informação motiva cada vez na qualidade de vida.
mais o indivíduo. Embora o autor não no-
meie, afirma que existem condições sob as
quais a busca de informações aparece em Método
qualquer idade. Assim podemos entender
que tanto as influências normativas como Nesta seção abordaremos o processo
as não-normativas são fundamentadas em de investigação acerca da qualidade de
efeitos independentes e que podem ser, ao vida após os 45 anos de idade em uma ins-
mesmo tempo, interativos. tituição de ensino superior de Brasília, DF,
Baltes (1997) menciona que na infân- que oferece cursos de graduação em Ad-
cia o foco primário é direcionado ao cres- ministração, Arquitetura e Urbanismo,
cimento. Na fase adulta, esse foco é Ciência da Computação, Direito, Educa-
direcionado no sentido da manutenção ção Física, Enfermagem, Engenharias Ci-
dos ganhos e da recuperação das perdas vil, da Computação, Elétrica e
(resiliência). Segundo Carter e Mecatrônica, Farmácia, Letras, Matemáti-
McGoldrick (1995), a partir do momento ca, Nutrição, Odontologia, Pedagogia, Pro-
que os filhos se tornam independentes, o paganda e Marketing, Psicologia, Secreta-
casal sente-se liberado e começa a busca riado Executivo Bilíngüe, Sistemas de In-
no sentido de atingir antigos objetivos e/ formações, Ciências Biológicas, Relações
ou a oportunidade de consolidar, expan- Internacionais e Turismo.
dir e explorar novas possibilidades e pa- Dentro desse contexto, foram identi-
péis. Na velhice, os recursos são ficados, por meio da indicação dos coor-
despendidos com o intuito de regular e denadores dos cursos referidos anterior-
gerenciar as perdas. Contudo, para que a mente, estudantes com 45 anos ou mais
análise seja completa, faz-se necessário de idade, graduandos matriculados em
considerar as diferenças individuais, fun- turmas regulares. Após a elaboração da
cionais, contextuais e históricas. lista dos participantes que atendiam aos

374 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 370-381, set./dez. 2006.
A qualidade de vida de estudantes que ingressam
na universidade na meia-idade

critérios da investigação, a autora de análise das comunicações, visando, por


contatou pessoalmente cada um dos 42 procedimentos sistemáticos e objetivos de
(quarenta e dois) selecionados. Destes, 6 descrição do conteúdo das mensagens, ob-
(seis) não aceitaram participar do proces- ter indicadores quantitativos ou não, que
so de investigação. permitam a inferência de conhecimentos
Para o processo de coleta de dados relativos às condições de produção/recep-
elaborou-se um questionário contendo 8 ção (variáveis inferidas) das mensagens”.
(oito) perguntas relacionadas com os da- Para tanto, empregou-se a análise de
dos demográficos, 4 (quatro) perguntas conteúdo partindo da pré-análise do ma-
fechadas e 8 (oito) perguntas abertas rela- terial, por meio da leitura geral de todas as
cionadas com o tema estudado. Essas ques- respostas oriundas dos sujeitos ao questi-
tões foram elaboradas com base nos argu- onário, composto de perguntas fechadas e
mentos de Günther (1996, p. 391), o qual abertas. Em seguida iniciou-se a segunda
considera que “a estrutura do instrumen- fase do método de análise de conteúdo, a
to assegura que todos os temas de interes- descrição analítica, com a codificação, a
se do pesquisador sejam tratados e que se classificação e a categorização dos dados
mantenha o interesse do respondente em da pesquisa.
continuar”. Todavia, entende-se que a re-
alidade em que o fenômeno está inserido
é infinitamente mais complexa que o re- Resultados e discussão
curso que se tem para abranger todo o pro-
cesso de levantamento de dados. A discussão dos resultados contidos
Para testar as questões do instru- nesta seção estão fundamentadas no inte-
mento foram realizadas 3 (três) entrevis- resse pelo estudo sobre a qualidade de vida
tas com participantes com idade inferi- de alunos que ingressam na universidade
or a 45 anos, que freqüentam cursos de após os 45 anos de idade. Os dados dos
graduação na Instituição. Foi delimita- participantes, apresentados inicialmente,
do anteriormente pela entrevistadora um precedem as discussões que indicam se há
tempo de 20 minutos para cada entre- mudanças na vida desses estudantes após
vista, mantido como média. O limite de a freqüência à universidade, como se ma-
tempo foi ultrapassado quando os nifestam e se são configuradas ou não como
respondentes optaram por detalhes de evento que proporcionou melhoria na qua-
cada etapa de suas vidas. lidade de vida.
Com base nos resultados da aplicação Os resultados da caracterização dos
do instrumento em grupo focal, o instru- respondentes indicam que a população-alvo
mento foi adequado e aplicado como ques- – 36 (trinta e seis) sujeitos – que participou
tionário para o processo de coleta de da- da pesquisa tem, em média, 50 anos de ida-
dos com os estudantes com idade igual ou de, sendo 27 (vinte e sete) do gênero mas-
superior a 45 anos. Gil (1999, p. 128) defi- culino. Atuam no mercado de trabalho de
ne questionário como “a técnica de inves- 20 a 39 anos 29 participantes; como funci-
tigação composta por um número mais ou onário público, 15; como profissional libe-
menos elevado de questões apresentadas ral, 10; em educação, 3; como comerciário,
por escrito às pessoas, tendo por objetivo 3; como técnico de saúde, 3; já aposenta-
o conhecimento de opiniões, crenças, sen- dos, 3. O valor que o indivíduo encontra
timentos, interesses, expectativas, situa- em desempenhar uma função produtiva e a
ções vivenciadas, etc.”. importância do trabalho para a sua sobre-
O instrumento de pesquisa foi apli- vivência estão relacionados aos fatores que
cado aos respondentes pela pesquisadora contribuem para o seu bem-estar psicológi-
e por colaboradores (professores) no am- co (Costa, 1988). Entre os respondentes, 27
biente universitário nos intervalos de aula, (vinte e sete) são casados, e o número de
tendo a pesquisadora procurado estabele- filhos por casal é de 1 a 4. Constata-se, por
cer uma relação de confiança com o/a meio dos dados, que 15 (quinze) universi-
respondente, no intuito de obter informa- tários são procedentes da Região Nordeste,
ções satisfatórias e de qualidade. 9 (nove) da Centro-Oeste, 8 (oito) da Su-
Com base nos resultados dos questio- deste, 2 (dois) da Norte e 2 (dois) da Sul. Os
nários, iniciou-se o processo de análise de dados diferenciam os estudantes que resi-
conteúdo, que, segundo Bardin (1977, p. dem no Plano Piloto (12) daqueles oriun-
21), consiste em “um conjunto de técnicas dos das cidades-satélites (20) e das cidades

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Denise Maria dos Santos Paulinelli Raposo

situadas no Estado de Goiás (4), próximas (Baltes, 1997), e ingressaram na universi-


ao Distrito Federal. dade. As razões do retorno aos estudos fo-
Esses dados indicam que mais de 50% ram as mais variadas. A realização pesso-
dos estudantes residem em cidades- saté- al foi um aspecto identificado nos relatos
lites de Brasília. No caso desses estudan- de 34 estudantes, acompanhado de adqui-
tes, a distância entre a residência e o tra- rir conhecimento (32), objetivo de vida (31),
balho não os impediu de freqüentar a uni- atualização (28), permanência no merca-
versidade e concluir um curso superior. do de trabalho (27), oportunidade de vida
Carstensen (1995) afirma que, ao longo do (26), disponibilidade de tempo (12), entre
tempo, a aquisição de informação motiva outros. Esses resultados indicam que em
cada vez mais o indivíduo, especialmente adultos mais velhos as referências do pas-
em torno de 50 anos, média de idade dos sado influenciaram suas decisões futuras
estudantes investigados. Tal fato é relevan- (Staudinger, Marsiske, Baltes, 1995).
te, considerando que os eventos não- No que tange aos motivos que os im-
normativos “não têm caráter universal, pediam de retornar aos estudos, os resul-
nem sua ocorrência é previsível em maté- tados apontam os aspectos financeiros (33)
ria de época ou seqüência, para indivídu- como um dos obstáculos mais destacados
os ou para grupos” (Neri, 1995, p. 30). En- pelos respondentes. A escassa condição
tre os estudantes, a maioria (27) é compos- econômica é uma das causas da falta de
ta por pessoas casadas. Para Carter e autonomia em pessoas adultas. A autono-
McGoldrick (1995), um dos fatores que mia possibilita a uma pessoa ser indepen-
contribuem para que pessoas retornem aos dente e autodeterminada, capaz de resis-
estudos com 45 anos ou mais de idade está tir a pressões sociais para pensar e agir de
relacionado com a independência dos fi- determinada maneira (Baltes, Silverberg,
lhos, e, com isso, surge a busca no sentido 1995). Além da falta de recursos financei-
de atingir antigos objetivos e/ou a oportu- ros, foram informados obstáculos pesso-
nidade de consolidar, expandir e explorar ais (28), familiares (27), profissionais (18),
novas possibilidades e papéis. sociais (8) e físicos (1). Constata-se que as
variações físicas, motivacionais de recur-
sos sociais e intelectuais, assim como dos
A universidade: um espaço indicadores utilizados para definir desen-
de mudanças? volvimento bem-sucedido, podem interfe-
rir na SOC (Baltes, Baltes, 1990).
O tempo que os estudantes ficaram Com a superação dos obstáculos, os
sem estudar, a motivação e os obstáculos respondentes ingressaram na universida-
que os impediam de retornar aos estudos de; relataram como a principal expectati-
e as expectativas que tinham ao ingressar va a realização de objetivo de vida (28),
na universidade também foram identifica- seguida de adquirir conhecimento (22) e
dos na investigação. Cada resultado relati- melhorar na profissão (18), entre outras.
vo a essas questões nos permite perceber Constata-se que houve um compromisso
se há mudanças na vida dos estudantes para com as metas de vida entre os
com 45 anos ou mais de idade após a fre- respondentes. Esses resultados confirmam
qüência à universidade. Considerando os as três funções gerais ou resultados de
estudos sobre o desenvolvimento humano desenvolvimento que sugerem uma mu-
na idade adulta, especialmente aqueles dança sistemática no curso de vida: a) a
embasados na perspectiva do ciclo de vida, função de crescimento; b) a função de
Baltes, Staudinger e Lindenberger (1999) manutenção, incluindo recuperação e
entendem que o desenvolvimento não se resiliência; e c) a função de regulação das
completa em uma determinada fase, mas perdas, aplicada aos estudantes.
se estende ao longo da vida. Quando questionados sobre como o
Com base nessa perspectiva, identifi- estudante se via antes de retornar aos es-
cou-se nos resultados que os respondentes tudos, constatou-se nos resultados que os
permaneceram entre 2 e 39 anos sem estu- respondentes, em sua maioria, se perce-
dar, ocorrendo a maior incidência entre 10 biam sem expectativa de vida (23), com
e 19 anos, identificada em 11 relatos. Es- falta de direcionamento de vida (22) e
ses estudantes selecionaram suas metas desatualizados (18), entre outros as-
dentro de determinadas condições ou li- pectos. Esses resultados indicam que
mitações, inclusive de tempo e recursos vivenciavam um período de estabilidade,

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A qualidade de vida de estudantes que ingressam
na universidade na meia-idade

conforme estudos realizados sobre o de- socioistóricos” (Neri, 1995, p. 24). Esses
senvolvimento adulto, na década de 70, argumentos são confirmados nos relatos de
descritos por Stevens-Long (1979). Con- 15 respondentes quando mencionam que
siderando que o ingresso no ensino su- a troca de experiência é um aspecto positi-
perior se configura, por si só, uma mu- vo a partir da relação com os colegas da
dança na vida de uma pessoa, o retorno universidade, os quais contribuem para o
aos estudos, relacionado com a seleção desenvolvimento pessoal. Segundo
das prioridades de vida, evidencia um Carstensen (1995), na meia-idade, o indi-
novo espaço para a realização pessoal e a víduo tende a buscar informações por meio
aquisição de conhecimentos. da interação com pessoas que possuem
Baltes (1997) defende que, com o au- conhecimentos mais especializados. Entre-
mento da idade, as mudanças no indiví- tanto, os dados apontam para uma percep-
duo que envolvem mais perdas do que ção de estabilidade dos estudantes quanto
ganhos e a manutenção de níveis eleva- às mudanças que ocorreram a partir da re-
dos de funcionamento em todos os domí- lação com os colegas, visto terem mencio-
nios tornam-se pouco prováveis. Ocorre, nado que não houve nenhuma mudança
entretanto, uma seleção de domínios que (21). Carstensen (1995) ressalta que, ao lon-
favorece o indivíduo na preservação de go do tempo, a aquisição de informações
altos níveis de funcionamento. A partir da motiva cada vez menos o contato social.
seleção, procura-se a adequação para que Esses resultados, aparentemente
esses níveis alcancem bom desempenho. dicotômicos, são sustentados na relação
Durante esse processo, é necessário que o originada na busca de informações a par-
indivíduo utilize novas estratégias e que tir da interação com pessoas mais
potencialize reservas. especializadas e não necessariamente com
Dentro dessa perspectiva, a atualiza- todas as pessoas com as quais os estudan-
ção de conhecimentos relatada por 32 estu- tes se relacionam, aqui denominados co-
dantes sobre como se vê ao retornar aos legas (Carstensen, 1995). Apesar desses
estudos, seguida de melhoria na qualidade resultados, identificaram-se na análise
de vida (18), melhoria no relacionamento melhorias na vida dos respondentes após
com a família (15), integração na socieda- o ingresso na universidade. Destaca-se o
de (15), motivado (10), melhoria na comu- aspecto pessoal (26), seguido do familiar
nicação (8), clareza nas idéias (4), rejuve- (18), do trabalho (12), social (12), financei-
nescido (3), mais responsável (3), melhoria ro (3) e nenhuma (3).
na auto-estima (2) e realizado (1), aponta O aspecto familiar, identificado nos
para um aspecto determinante para que resultados relacionados com a melhoria de
esses estudantes tenham atingido os mais vida, pode ser considerado como positivo,
altos níveis de funcionamento (crescimen- uma vez que, na meia-idade, o casal pode
to). Baltes e Baltes (1990) afirmam que o começar a usufruir de vantagens financei-
desenvolvimento assume diferenciadas ras, tendo assim a possibilidade de atingir
formas e direção e varia de acordo com as antigos objetivos e de explorar novas áre-
condições e experiências de vida. Nesse as. Essa fase também é vista em “algumas
sentido, a percepção de si após decidirem famílias [...] como um momento de fruição
ingressar na universidade relatada pelos e conclusão, e como uma segunda oportu-
estudantes investigados, selecionando nidade de consolidar ou expandir, explo-
suas metas de desempenho e procurando rando novas possibilidades e novos papéis”
ir além das condições, impedimentos, li- (Carter, Mcgoldrick, 1995, p. 21).
mites de tempo e recursos, é considerada A respeito da melhoria de vida no
relevante para a identificação das mudan- trabalho, os argumentos de Costa (1998),
ças na qualidade de vida. ao assinalar dois fatores que contribuem
A psicologia do curso de vida leva a para o bem-estar psicológico do indiví-
entender que o indivíduo e o ambiente duo, o de desempenhar uma função pro-
social são mutuamente influentes e se dutiva e o do valor do trabalho para a
mantêm em constante interação dinâmi- sobrevivência do indivíduo, contribuem
ca. Assim, “o desenvolvimento é visto para o entendimento de que, com a entra-
como um processo contínuo de adapta- da na universidade, há viabilidade de os
ção que dura por toda a vida, relacionada estudantes aplicarem no trabalho o conhe-
com processos internos em interação com cimento adquirido ao longo do curso.
as atividades externas e os processos Nesse sentido, Hiestand (1971) enfatiza as

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Denise Maria dos Santos Paulinelli Raposo

quatro mudanças individuais decorren- fundamenta a boa saúde física e a educação


tes do trabalho: a) ocupar uma posição durante o curso de vida; a potencialização
diferente; b) obter uma profissão autôno- do desenvolvimento e a adaptação social do
ma; c) ingressar em trabalhos emergentes; ser humano com vista à qualidade de vida;
e d) trabalhar em diferentes profissões. e a adequação individual e social às ques-
Dentro desse contexto, a otimização dos tões da velhice. A partir dessas proposi-
recursos pertinentes aos objetivos, relacio- ções, a seleção de metas, os objetivos
nada com uma concepção tradicional de otimizados e as mudanças que ocorreram
desenvolvimento, direcionou os estudantes com os estudantes após o ingresso na uni-
ao aumento da eficácia e à busca de níveis versidade indicam uma melhoria na qua-
mais altos de desempenho. Desse modo, a lidade de vida, visto que o manejo dinâ-
compensação foi operacionalizada como for- mico entre ganhos e perdas, otimização
ma de combater perdas/declínios por meio das habilidades, capacidade de reserva e
da seleção de metas. Com base nas mudan- o desenvolvimento do potencial dentro
ças identificadas na análise dos resultados dos limites da plasticidade individual fo-
da pesquisa relativas à compensação das per- ram positivos, considerando o processo
das, os estudantes que selecionaram as me- contínuo de adaptação.
tas de vida e as otimizaram com o objetivo
de realização pessoal mencionaram que, para
a manutenção na universidade, necessitam Considerações finais
de “muita força de vontade para realizar um
sonho” e que pretendem “ajudar os carentes Na investigação sobre a existência de
de uma sociedade marginalizada”. melhorias na qualidade de vida em 36 es-
Dentro dessa proposta de vida, consta- tudantes que ingressaram na universida-
ta-se, nos resultados, que os estudantes de com 45 anos ou mais de idade, foi pos-
pesquisados esperam do futuro um mundo sível constatar aspectos que contribuem
melhor (12), vindo em seguida formação para o desenvolvimento humano no perí-
continuada (9) e transmitir conhecimentos odo da idade adulta. Nessa perspectiva, o
(8). Neri (1995, p. 38) menciona que: indivíduo projeta uma meta (nessa etapa
sua seleção poderá ser eletiva ou baseada
Envelhecer bem depende das chances do em perdas), viabiliza essa meta
indivíduo quanto a usufruir de condições otimizando-a (recursos pertinentes aos
adequadas de educação, urbanização, ha- objetivos), numa tentativa de compensar
bitação, saúde e trabalho durante todo seu as perdas (declínios) em que se definem
curso de vida. Esses são elementos cruciais mudanças em sua vida (Baltes, 1997).
à determinação da saúde (a real e a percebi- De um universo de 36 (27 M e 9 F)
da) e da longetividade; da atividade, da pro- entrevistados com média de 50 anos de
dutividade e da satisfação; da eficácia idade, caracterizou-se o seguinte quadro:
cognitiva e da competência social. Da ca- o maior índice de freqüência apontado
pacidade de manter papéis familiares e uma pelos respondentes relacionado com o
rede de relações informais; das capacida- motivo de ingresso na universidade foi a
des de auto-regulação da personalidade; do realização pessoal, fundamentada nos obs-
nível de motivação individual para a busca táculos que os impediam de retornar às
de informação e para a interação social, atividades intelectuais. Entre os relatos, os
dentre outros indicadores comumente aspectos identificados são relativos a pro-
apontados pela literatura como associados blemas financeiros; em segundo lugar, aos
a uma velhice bem-sucedida. Essa adequa- obstáculos pessoais, seguidos dos famili-
ção é evidentemente relativa às estruturas ares, profissionais, sociais e físicos.
e aos valores vigentes na sociedade, mas é As questões direcionadas para a visão
de se esperar que num sistema social está- pessoal do respondente antes e após o ingres-
vel, que valoriza o ser humano para além so no ensino superior suscitaram respostas
de critérios de produtividade econômica, as negativas, tais como sem expectativa, falta de
pessoas tenham condições mais favoráveis direcionamento de vida, desatualizado, sem
para uma velhice satisfatória. conhecimentos, inútil, ocioso, entre outros,
contrapondo as positivas atualizado, melhoria
A autora resume o envelhecimento bem- na qualidade de vida, melhoria no relaciona-
sucedido considerando um conjunto de ele- mento com a família, integrado na sociedade,
mentos, tais como: a situação econômica, que motivado, melhoria na comunicação, entre

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A qualidade de vida de estudantes que ingressam
na universidade na meia-idade

outros aspectos. Esses dados contribuíram A partir dessas considerações, a visão


para identificar o que permaneceu constan- do envelhecimento não estará centrada so-
te e as mudanças ocorridas no curso de vida mente numa evolução teórica e conceitual,
dos entrevistados. mas também espelhada numa cultura posi-
As mudanças pessoais estabelecidas tiva que nasce, possibilitando o despertar
a partir da relação com os colegas da uni- de um sentimento de esperança de um
versidade não foram identificadas nos re- mundo melhor, de continuar os estudos, de
latos dos respondentes. Os resultados transmitir os conhecimentos adquiridos, da
apontaram aspectos de estabilidade, visto diminuição das diferenças existentes na
que 21 dos pesquisados mencionaram que sociedade e da melhoria financeira, identi-
não ocorreu nenhuma mudança. Esse fato ficado nos relatos dos estudantes.
retoma estudos realizados por McFarlane, Em suma, o desenvolvimento, como já
que, em 1930, realizou uma análise longi- foi ressaltado anteriormente, é um evento
tudinal com sujeitos entrevistados por psi- multideterminado e multifacetado, o que
cólogos clínicos sobre suas vidas pessoais implica estudá-lo integrando aspectos da
e sociais, aos 17 ou 18 anos, aos 30, aos 40 biologia, da antropologia, da sociologia e da
e aos 50 anos, os quais indicam que, em psicologia. Considerando que a Psicologia
geral, as taxas de interação com amigos do Desenvolvimento é uma área do conhe-
íntimos e ocasionais diminuem desde o cimento que estuda o ser humano e seu
início da idade adulta e na meia-idade desenvolvimento em todos os aspectos, des-
(Carstensen, 1995). de o nascimento até a morte, pode-se con-
Considerando os resultados até aqui cluir, com base nos argumentos relatados,
apresentados, as melhorias na vida dos que esse desenvolvimento deve ser visto sob
respondentes após o ingresso na universi- vários prismas: biológicos, psicológicos,
dade projetam-se positivamente, uma vez sociais, num processo de interação.
que as informações apontam para uma ve- Nessa perspectiva, entende-se que este
lhice bem-sucedida à proporção que os in- estudo trouxe contribuições sobre a quali-
divíduos entre 45 e 59 anos não estão mais dade de vida após o ingresso na universi-
limitados a esperar o final da vida. As dade a partir de 45 anos. Demonstra que a
melhorias pessoais, com os familiares, no educação contribui de forma efetiva para
trabalho, no aspecto social e financeiro fa- o bem-estar do indivíduo nos aspectos pes-
vorecem uma visão positiva do futuro. soais, da família e do trabalho.

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Denise Maria dos Santos Paulinelli Raposo, mestre em Psicologia pela Universidade
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Recebido em 25 de janeiro de 2006.


Aprovado em 20 julho de 2006.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 370-381, set./dez. 2006. 381
ESTUDOS

Processos de formação de professoras


iniciantes

Maévi Anabel Nono


Maria da Graça Nicoletti Mizukami

Resumo
Estudos têm evidenciado a importância dos primeiros anos de profissão nos proces-
sos de formação docente. Neste artigo, são analisados processos formativos de professo-
ras iniciantes que atuam na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental,
a partir de dados obtidos em pesquisa realizada no período 2001-2005. Casos de ensino
foram utilizados como instrumentos de pesquisa e permitiram que as iniciantes realizas-
sem descrições e análises de suas trajetórias profissionais. As professoras explicitaram
dúvidas, certezas, equívocos e contradições que orientam e caracterizam suas práticas
docentes nos primeiros anos de docência. Explicitaram, ainda, conhecimentos referentes
ao modo como ensinam conteúdos matemáticos e de linguagem escrita.

Palavras-chave: formação de professores; professoras iniciantes.

Abstract Profissional knowledge of beginning teachers


Studies have evidenced the importance the first years of the teaching career in
the formative processes. This article discusses the professional knowledge of
beginning teachers of the Elementary and Primary School. It is based on research
developed during 2001-2005. One can said that the teaching cases used in the
research allowed the beginning teachers to describe and analyze their own
professional trajectories. The teachers exposed doubts, certainties, mistakes and
contradictions that guided and characterized their professional practice. Teachers
pointed out the knowledge regarding the way they teach mathematical and
Portuguese written language contents.

Keywords: teacher education; beginning teachers.

Considerações iniciais analisados processos formativos de pro-


fessoras iniciantes que atuam na educa-
Diversos estudos têm apontado a im- ção infantil e nos anos iniciais do ensino
portância da investigação de aspectos re- fundamental, a partir de dados obtidos em
lativos à etapa de iniciação na carreira do- pesquisa realizada, no período 2001-2005,
cente (Huberman, 1993; Imbernón, 2001; com a utilização de casos de ensino como
Marcelo Garcia, 1999). Neste artigo, são instrumentos de pesquisa (Nono, 2005).

382 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 382-400, set./dez. 2006.
Processos de formação de professoras iniciantes

Estudos sobre formação de ou legitimar o conhecimento profissional


professores e início na posto em prática.
carreira docente Diferentes fases foram descritas por
Huberman (1993) ao analisar o ciclo de
Conforme assinala Marcelo Garcia vida profissional de professores, confron-
(1999, p. 112), tando dados obtidos em suas investiga-
ções com a literatura referente ao ciclo de
[...] falar da carreira docente não é mais vida humano e com a escassa literatura
do que reconhecer que os professores, do direcionada, mais especificamente, ao es-
ponto de vista do “aprender a ensinar”, tudo da carreira profissional docente. O
passam por diferentes etapas, as quais re- pesquisador focalizou a trajetória profis-
presentam exigências pessoais, profissio- sional de professores do ensino secundá-
nais, organizacionais, contextuais, psico- rio, que lecionavam para alunos com ida-
lógicas, etc., específicas e diferenciadas. de entre 13 e 19 anos, tendo entre 5 e 40
anos de experiência na profissão, com di-
Nesse sentido, as preocupações ferentes vivências institucionais, respon-
norteadoras das pesquisas sobre formação sáveis por diferentes disciplinas. Sem
de professores têm se ampliado cada vez desconsiderar que o desenvolvimento pro-
mais, girando, atualmente, não apenas em fissional docente deve ser descrito muito
torno dos cursos de formação inicial e de mais como um processo do que como uma
questões relativas aos futuros professores, série sucessiva de eventos pontuais,
mas englobando, também, temáticas rela- Huberman (1993) descreve fases na car-
cionadas com os professores principian- reira docente e demonstra que elas são
tes e os professores em exercício. constantemente vivenciadas pelos profes-
Nos diferentes momentos de sua car- sores, embora faça questão de destacar que
reira profissional – formação inicial, iní- o fato de que seqüências possam ser
cio na carreira, etapa em que já possui cer- estabelecidas na descrição da carreira do-
ta estabilidade profissional, período em cente não significa que não existam pro-
que questiona sua opção profissional, pe- fessores que nunca parem de explorar, que
ríodo em que se aproxima de sua aposen- jamais alcancem a estabilidade na profis-
tadoria –, o professor enfrenta diferentes são, que se desestabilizem, a qualquer mo-
necessidades, problemas, expectativas, mento, por razões diversas e imprevistas.
desafios, dilemas, e vai construindo seu Dentre tais fases descritas por
conhecimento profissional. Trata-se, de Huberman (1993) – entrada na carreira,
acordo com Imbernón (2001), de um co- fase de estabilização, fase de experimenta-
nhecimento dinâmico e não-estático que ção ou diversificação, fase de procura de
se desenvolve ao longo da carreira profis- uma situação profissional estável, fase de
sional, em diversos momentos: na experi- preparação da jubilação –, a primeira delas
ência como discente, quando, ainda como se refere a um período de sobrevivência e
aluno, o professor transita pelo sistema descoberta. O aspecto de sobrevivência tem
educativo e assume uma determinada vi- a ver com o “choque de realidade”, com o
são da educação, marcada, por vezes, por embate inicial com a complexidade e a
estereótipos e imagens da docência difí- imprevisibilidade que caracterizam a sala
ceis de serem superados; na etapa de for- de aula, com a discrepância entre os ide-
mação inicial, que deveria ter um papel ais educacionais e a vida cotidiana nas
decisivo não apenas na promoção do co- classes e escolas, com a fragmentação do
nhecimento profissional, mas de todos os trabalho, com a dificuldade em combinar
aspectos da profissão docente, promoven- ensino e gestão de sala de aula, com a falta
do as primeiras eventuais mudanças na de materiais didáticos, etc. O elemento de
forma de o futuro professor encarar atitu- descoberta tem a ver com o entusiasmo do
des, valores e funções relativas à docência; iniciante, com o orgulho de ter sua pró-
na vivência profissional imediatamente pria classe e fazer parte de um corpo pro-
posterior no campo da prática educacio- fissional. Sobrevivência e descoberta ca-
nal, que leva à consolidação de um deter- minham lado a lado no período de entrada
minado conhecimento profissional (as- na carreira. Para alguns professores, o en-
sumindo-se esquemas, pautas e rotinas da tusiasmo inicial torna fácil o começo da
profissão); na formação permanente, que docência; para outros, as dificuldades tor-
tem como uma de suas funções questionar nam o período muito difícil.

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Maria da Graça Nicoletti Mizukami

Marcelo (1998) elabora uma síntese ensino que acompanharão o professor ao


dos principais temas que têm sido abor- longo de sua carreira. De acordo com
dados nas pesquisas sobre formação de Feiman-Nemser (2001), os primeiros anos
professores, identificando aqueles relati- da profissão representam um período in-
vos à pesquisa sobre formação inicial de tenso de aprendizagens e influenciam não
professores, sobre professores principian- apenas a permanência do professor na car-
tes e sobre desenvolvimento profissional. reira, mas também o tipo de professor que
As pesquisas sobre formação inicial se re- o iniciante virá a ser. Marcelo Garcia (1999)
ferem, quase que exclusivamente, aos es- descreve o período de iniciação na
tágios de ensino e seus efeitos sobre futu- docência como o período de tempo que
ros professores. Um outro aspecto bastan- compreende os primeiros anos nos quais
te estudado se refere às crenças dos pro- os professores precisam realizar a transi-
fessores em formação e às mudanças que ção de estudantes a docentes. Trata-se de
nelas são produzidas em conseqüência dos uma etapa de tensões e aprendizagens in-
estágios. As pesquisas sobre professor prin- tensivas em contextos geralmente desco-
cipiante têm procurado caracterizar este nhecidos, durante a qual os principiantes
período do desenvolvimento profissional devem adquirir conhecimento profissio-
docente, centrando-se no estudo do pro- nal, além de conseguir manter certo equi-
cesso de aprender a ensinar durante os líbrio pessoal. Destacam-se como caracte-
primeiros anos de ensino, buscando iden- rísticas desse período a insegurança e a
tificar e analisar problemas e preocupações falta de confiança em si mesmos de que
específicos dos professores que iniciam a padecem os professores iniciantes.
carreira, mudanças sofridas pelo professor Esteve Zaragoza (1999), ao analisar o
ao passar de estudante a docente, papel da mal-estar docente que acomete grande parte
escola na aprendizagem profissional do dos professores nos dias atuais e os meca-
iniciante. Pesquisas sobre desenvolvimen- nismos pelos quais ele é produzido, discu-
to profissional analisam processos de mu- te alguns trabalhos que coincidem em suas
dança vividos pelos professores a partir de conclusões a respeito das dificuldades vi-
dimensões organizacionais, curriculares, vidas pelo professor iniciante para adaptar
didáticas e profissionais, sendo desenvol- a imagem ideal que possui sobre sua pro-
vidos estudos sobre a dimensão pessoal de fissão às carências e contradições que en-
tais processos e sobre a aprendizagem dos contra na instituição educativa concreta em
docentes como pessoas adultas. que começa a trabalhar. O professor
Neste artigo, são focalizadas questões iniciante se vê desarmado e desconcertado
relativas ao professor principiante que aca- ao perceber que a prática real do ensino
ba de adentrar no mundo da profissão do- não corresponde aos esquemas ideais com
cente. Os acontecimentos que marcam as os quais ele foi formado. Tais trabalhos
fases iniciais da carreira docente adquirem apontam que, assim que começa a lecio-
importância fundamental nos processos de nar, o novo professor inicia uma revisão de
aprendizagem profissional. Tardif e suas atividades e ideais, na tentativa de
Raymond (2000) apontam que, entre pro- adaptá-los à dura realidade da sala de aula,
fessores que possuem um emprego estável marcada por uma série de limitações que
no ensino, as bases dos saberes profissio- atuam diretamente sobre seu trabalho, den-
nais parecem ter sido construídas nos anos tre as quais a falta de recursos materiais e
iniciais da docência. O início na carreira condições adequadas de trabalho, o
representa, segundo eles, uma fase crítica acúmulo de exigências, o aumento da vio-
em relação às experiências anteriores e aos lência nas instituições escolares.
ajustes a serem feitos em função da realida- De acordo com Tardif e Raymond
de do trabalho e do confronto inicial com a (2000), o confronto com a realidade força
dura e complexa realidade do exercício da os professores novatos a questionar a visão
profissão. É um período marcado, em geral, idealista que possuem sobre a profissão
pela desilusão e pelo desencanto e que docente. Distanciados dos conhecimentos
corresponde à transição da vida de estudan- acadêmicos e mergulhados no exercício da
te para a vida mais exigente do trabalho. Os profissão, passam a reajustar suas expecta-
primeiros anos de profissão são decisivos tivas e percepções anteriores. Esteve
na estruturação da prática profissional e po- Zaragoza (1999, p. 44-45) recorre ao estu-
dem ocasionar o estabelecimento de rotinas do desenvolvido por Abraham (1975 apud
e certezas cristalizadas sobre a atividade de Esteve Zaragoza, 1999) que classifica, em

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Processos de formação de professoras iniciantes

quatro grupos, as diversas reações/atitudes adotando, em suas práticas escolares, mo-


dos professores principiantes ao se defron- delos de atuação que não consideram váli-
tarem com uma prática do magistério bas- dos. Alguns professores acabam por ser pes-
tante distante dos ideais pedagógicos assi- soalmente atingidos pelas dificuldades no
milados durante a formação inicial: confronto com a prática, mantendo-se na
profissão à custa de constantes pedidos de
1. O predomínio de sentimentos con- transferência e de muitas faltas ao trabalho;
traditórios, sem conseguir esque- vivem acometidos por doenças mais ou
mas de atuação prática que resol- menos fingidas, para abandonar momenta-
vam o conflito entre ideais e reali- neamente a docência, e, por fim, por doen-
dade. O professor vai adotar uma ças reais, como depressões mais ou menos
conduta flutuante em sua prática graves (Esteve Zaragoza, 1999).
docente e em sua valorização de si Ao analisar a história de vida de uma
mesmo. professora, buscando compreender os pro-
2. A negação da realidade por sua in- cessos de construção/desconstrução de sua
capacidade de suportar a ansieda- identidade profissional, ou seja, tentando
de. O professor vai recorrer a di- captar o movimento de constituição de sua
versos mecanismos de fuga; entre identidade docente ao longo da trajetória
eles, os de inibição e rotinização de profissional e pessoal, e considerando a
sua prática docente são os mais escola – suas condições materiais e
freqüentemente utilizados como institucionais – como a esfera mais imedia-
meio de cortar a implicação pessoal ta da determinação da prática docente, Cal-
no magistério. deira (2000, p. 9) descreve o período de in-
3. O predomínio da ansiedade, quan- serção e iniciação dessa professora na pro-
do o professor se dá conta de que fissão como “uma caminhada de
carece dos recursos adequados para enfrentamentos e conflitos diante dos de-
pôr em prática seus ideais e, ao safios resultantes de sua não-conformação
mesmo tempo, manter o desejo de ao conjunto de padrões cristalizados de
não renunciar a eles e de não cor- comportamento docente, presentes nas ins-
tar sua implicação pessoal no ma- tituições onde desenvolveu seu trabalho”.
gistério. A contínua comparação A partir de pesquisa realizada com
entre sua pobre prática pedagógica professoras iniciantes, Guarnieri (1996)
e os ideais que desejaria alcançar o busca identificar elementos que contribu-
levarão a esquemas de ansiedade am para a compreensão dos processos de
quando o professor reage de forma “aprender a ensinar”. Ao examinar, por
hiperativa, querendo compensar meio de estudo exploratório e de estudo
com seu esforço pessoal os males de caso, o que ocorre com professoras ao
endêmicos do magistério. As ma- iniciar sua carreira docente, focalizando
nifestações depressivas aparecem o que pensam, o que sentem, como avali-
nesse mesmo esquema, quando, na am sua inserção nas escolas, Guarnieri
comparação, o professor chega à (2000) destaca alguns aspectos que reme-
autodepreciação, culpando-se pes- tem aos estudos realizados por Esteve
soalmente por sua incapacidade de Zaragoza (1999). Segundo ela, é possível
chegar à prática dos ideais pedagó- identificar alterações nos ideais sobre a
gicos aprendidos. profissão construídos pelas iniciantes
4. A aceitação do conflito como uma durante a formação inicial e o processo
realidade objetiva, sem maior im- anterior de escolarização, quando depa-
portância que a de buscar respos- ram com a cultura escolar, com as condi-
tas adequadas nos limites de uma ções adversas de seu ambiente de traba-
conduta integrada. lho, permeado por relações hierárquicas
e burocráticas que dificultam a partilha
Se alguns professores acabam conse- de dificuldades, dúvidas e problemas.
guindo manter um certo equilíbrio na pro- Também é possível constatar dificuldades
fissão, outros se mantêm nela reduzindo das professoras iniciantes em lidar com
sua eficácia e renunciando a um ensino de situações relativas ao ensino na sala de
qualidade, escondendo-se atrás de meca- aula. Os resultados de seu estudo
nismos de fuga. Outros, ainda, vivenciam (Guarnieri, 2000) sugerem que as princi-
a docência com uma postura contraditória, piantes não sabem selecionar, organizar,

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priorizar os conteúdos a serem ensinados, Assim como no estudo de Guarnieri


escolher procedimentos para transmitir a (1996), na investigação desenvolvida por
matéria, selecionar atividades para os alu- Castro (1995) pretendeu-se analisar per-
nos, avaliar a classe, cuidar da organiza- cepções dos professores iniciantes a res-
ção e correção dos cadernos dos alunos, peito das principais dificuldades encon-
trabalhar com alunos que apresentam di- tradas no exercício da docência. É pos-
ficuldade para aprender, usar a lousa cor- sível observar, ao comparar resultados de
retamente, distribuir durante um dia de ambos os estudos, que as dificuldades
aula os diferentes componentes explicitadas se assemelham em diversos
curriculares. Tais dificuldades indicam aspectos. De acordo com Castro (1995),
que há aspectos do trabalho do professor ao serem abordadas sobre as principais
que parecem ser melhor percebidos pelas dificuldades encontradas ao ensinar, as
principiantes somente a partir da atuação, professoras iniciantes destacam aquelas
não sendo focalizados durante a forma- referentes a lidar com crianças que apre-
ção inicial. sentam dificuldades de aprendizagem
Ao investigar diferentes fatores que fa- ocasionadas por problemas emocionais,
cilitam e/ou dificultam a ação pedagógica intelectuais ou sociais. Destacam, ainda,
de jovens professores, concluintes ou já dificuldades quanto ao domínio de clas-
habilitados pelo curso de formação para o se – diante da heterogeneidade que ca-
magistério em nível médio, com até cinco racteriza as turmas de alunos – e de con-
anos na função docente, Castro (1995) des- teúdo, declarando achar difícil desenvol-
taca a imagem negativa que os professores ver conceitos (principalmente matemá-
iniciantes entrevistados construíram sobre ticos) que envolvam conhecimentos que
os anos iniciais de seu percurso profissio- não possuem. Castro (1995) afirma que
nal, resultante das situações de isolamen- as iniciantes atribuem diferentes causas
to, da falta de condições de trabalho e de às dificuldades enfrentadas na prática,
apoio técnico-pedagógico compatíveis com destacando a falta de domínio de con-
as dificuldades da prática. Entretanto, tam- teúdos teóricos, principalmente os rela-
bém destaca o fato de que o confronto ini- tivos à Psicologia e à Didática, e a de-
cial com as situações escolares – marcado sarticulação entre os conhecimentos teó-
pelas dificuldades de adaptação pessoal e ricos adquiridos na formação inicial e a
profissional, pela insegurança e despreparo, prática encontrada nas escolas. Para as
por certas dificuldades em lidar com situa- iniciantes, a falta de domínio de conhe-
ções específicas da prática, pelo isolamen- cimentos teóricos e a falta de relação en-
to, pela ausência de comunicação entre os tre tais conhecimentos e a prática cotidi-
próprios colegas de profissão e de apoio na ana geram insegurança no enfrentamento
busca de solução para os problemas e im- de diferentes situações de ensino,
previstos da rotina escolar – não levou os despreparo para criar ou improvisar ati-
professores investigados a desistirem de vidades estimuladoras aos alunos com di-
investir na carreira docente. Ao contrário, ficuldades de aprendizagem e desinfor-
conforme afirma Castro (1995), os profes- mação sobre conteúdos e metodologias
sores buscaram estabelecer um equilíbrio específicos da educação infantil e da edu-
em suas carreiras, enfrentaram os primei- cação inclusiva.
ros obstáculos, valendo-se deles para refor- A falta de conhecimento sobre quais
çar a descoberta de novos caminhos, refle- critérios utilizar para selecionar os conteú-
tindo sobre os problemas vividos e procu- dos que irão ensinar e, mais que isso, a di-
rando reavaliar-se a cada momento. Castro ficuldade em perceber qual a maneira mais
(1995) destaca que, mesmo apontando as adequada de ensinar determinado conteú-
mais variadas dificuldades na prática, tan- do a um grupo específico de alunos tam-
to professores mais experientes quanto me- bém caracterizam o grupo de professores
nos experientes (dentre os iniciantes) de- iniciantes entrevistados por Marcelo Garcia
monstraram boa vontade, entusiasmo, ex- (1992). Alguns desses professores possuem,
pectativa de mudanças em relação à ação ainda, dificuldades em transformar os co-
pedagógica e uma constante procura de nhecimentos que possuem, como especia-
novas informações, além de apresentarem listas, em conteúdos de ensino.
uma forte predisposição de luta e persistên- Ao investigar o processo de socializa-
cia, na busca de um modelo profissional ção profissional de professores iniciantes,
considerado “bom” ou “eficaz”. Freitas (2000) constata, assim como outros

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Processos de formação de professoras iniciantes

investigadores (Caldeira, 1995; Castro, instrumental do iniciante para realizar


1995; Fontana, 2000; Guarnieri, 1996), que aquele trabalho difícil e que não oferece
tais professores, apesar das dificuldades reconhecimento –, mas destaca, entretan-
enfrentadas no início da carreira, tentam, to, que a característica peculiar ao profes-
de todas as formas, permanecer nela e rea- sor iniciante de encarar os problemas que
lizar um bom trabalho, embora nem sem- ocorrem nas aulas como apenas seus aca-
pre sejam bem-sucedidos. O gosto de edu- ba por reverter essa situação, que parece
car crianças e jovens, a vontade de contri- perversa, em um fator que contribui para
buir para o desenvolvimento da sociedade sua socialização profissional; o principi-
e a constatação de que a profissão admite ante acaba, segundo ele, lutando com to-
autonomia de pensamento e de ação a quem das as suas forças para superar as dificul-
a desempenha são motivações para que o dades que encontra e desenvolver estraté-
professor iniciante continue a investir na gias que garantam uma melhor atuação. Na
carreira, tão relevantes, ou mais, que a ne- busca de soluções para enfrentar os pro-
cessidade de obter um salário (Castro, blemas da prática, acaba construindo sa-
1995). Nesse sentido, Freitas (2000, p. 91) beres e, com o tempo, acaba adquirindo
constata que a vontade de acertar e de ser uma segurança maior, uma confiança em
reconhecido, aliada ao compromisso com si mesmo que extrapola do domínio pes-
os alunos, levam os iniciantes a resistir às soal para o relacional, passando a ser res-
dificuldades, pois abandonar a profissão peitado pelos demais professores e profis-
representaria, mais que a perda do empre- sionais da escola.
go, a abdicação de seus projetos pessoais e Com o passar do tempo, conforme evo-
o desmoronamento de sua identidade pro- lui na carreira docente e enfrenta os acon-
fissional. Vale destacar, entretanto, dados tecimentos que marcam sua trajetória nas
americanos levantados por Gold (1996 escolas onde atua e nas classes em que le-
apud Tardif, Raymond, 2000), segundo os ciona, grande parte dos professores
quais 33% dos iniciantes, durante as fases iniciantes desenvolve maior segurança e
iniciais da docência, abandonam a profis- domínio sobre seu trabalho cotidiano e
são ou, ao menos, questionam-se sobre sua sobre as situações em que transcorre, pas-
escolha profissional e sobre a continuida- sando a sentir-se mais confortável diante
de da carreira. das exigências da profissão e da tarefa de
Freitas (2000) assinala o fato de que é ensinar (Tardif, Raymond, 2000). De acor-
comum nas escolas pesquisadas a atribui- do com Freitas (2000), a maior parte des-
ção, aos professores iniciantes, de turmas ses professores deseja permanecer na pro-
de alunos consideradas por profissionais fissão, além de conseguir estabilidade e
que atuam nas escolas como as mais difí- reconhecimento profissional.
ceis – por possuírem alunos com grande Diante do que a literatura tem mostra-
variação nos níveis de aprendizagem e do em relação aos professores que iniciam
que, muitas vezes, não possuem materi- na profissão docente – dificuldades, preo-
ais escolares mínimos e vêm de famílias cupações, sentimentos e aprendizagens –,
caracterizadas pelo baixo poder aquisiti- parece evidente a necessidade de que, es-
vo – e/ou, ainda, de classes situadas nas pecialmente nos primeiros anos da profis-
zonas rurais, onde as condições de traba- são, os professores tenham oportunidades
lho são piores do que nas escolas de zona para conversar com outros colegas a respeito
urbana no que diz respeito à falta de ma- do ensino que estão desenvolvendo, das
terial didático, pouca possibilidade de estratégias de aprendizagem de seus alunos,
troca de experiência e acompanhamen- dos problemas para ensinar e das alternati-
to pedagógico, delegação de turmas vas de atuação (Feiman-Nemser, 2001).
multisseriadas, dificuldade para se conci- Mizukami et al. (2002) destacam o
liar vida profissional e vida pessoal. O pro- fato, embora não se refiram especifica-
fessor iniciante é “presenteado” com as mente ao professor iniciante, de que os
piores turmas, os piores horários e as pio- professores precisam fazer parte de uma
res condições de trabalho, já que os pro- comunidade de aprendizagem – traba-
fessores experientes são os primeiros a lhando com os pares, recebendo apoio e
escolher suas aulas no momento de atri- assessoria de um diretor que compreen-
buição das classes (Esteve Zaragoza, 1999). da as necessidades colocadas pelas polí-
Freitas (2000) analisa tal situação ticas públicas em relação ao papel do pro-
como perversa – quase como uma utilização fessor e às necessidades de mudanças de

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práticas pedagógicas, discutindo suas conteúdo específico é enriquecido por


práticas escolares com outros profissio- outros tipos de conhecimento – dos alu-
nais que possam oferecer sugestões – que nos, do currículo, do contexto (Wilson,
constitua fonte de apoio e de idéias. Shulman, Richert, 1987). Entretanto, a
capacidade dos professores para propor
questões, selecionar atividades, avaliar o
Estudos sobre entendimento dos alunos e tomar deci-
conhecimentos profissionais sões sobre como ensinar depende de
de professores iniciantes como entendem os conteúdos que ensi-
nam (McDiarmid, Ball, Anderson, 1989).
Apesar de todas as adversidades que Ao investigar a base de conhecimen-
caracterizam o início na docência, o pro- to profissional para o ensino – entendida
fessor iniciante busca cumprir sua tare- como um conjunto de compreensões, co-
fa principal: ensinar. Como se dá esse nhecimentos, habilidades e disposições
ensino? Com base em quais conhecimen- que um professor necessita para transfor-
tos se desenvolve? Como são construídos mar o que sabe sobre o conteúdo em for-
e organizados tais conhecimentos? Quais mas de atuação que sejam pedagogica-
as fontes de tais conhecimentos? Estu- mente eficazes e adaptáveis às variações
dos acerca dos conhecimentos que pro- de habilidades e de repertórios apresen-
fessores iniciantes possuem sobre con- tados pelos aluno (Mizukami, 2000) –,
teúdos específicos que ensinam e em tor- Shulman (1989) identificou conhecimen-
no das formas pelas quais eles transfor- tos que a fundamentam: conhecimento
mam esse conhecimento em um ensino pedagógico geral (relativo às teorias e
que promova compreensão nos alunos princípios de ensino e aprendizagem, aos
vêm sendo desenvolvidos (Grossman, alunos, ao manejo de classe e à institui-
Richert, 1988; McDiarmid, Ball, ção em que trabalha), conhecimento de
Anderson, 1989; Wilson, Shulman, conteúdo específico (conceitos e idéias de
Richert, 1987). Tais estudos destacam o uma área de conhecimento; formas de
fato de que, mesmo preocupados em en- construção de conhecimentos em deter-
frentar as dificuldades iniciais da profis- minada área) e conhecimento pedagógico
são, os principiantes efetivamente se pre- do conteúdo.
ocupam com o ensino de conhecimentos Representando uma combinação entre
a seus alunos. Diante das transformações o que sabe sobre a matéria e sobre o modo
que caracterizam a sociedade atual, o de ensiná-la, o conhecimento pedagógico
domínio de conteúdos e de habilidades do conteúdo é apontado como um novo tipo
cognitivas superiores – análise, síntese, de conhecimento da área que é desenvol-
estabelecimento de relações, interpreta- vido pelo professor, ao tentar ensinar um
ção e uso de diferentes linguagens neces- tópico em particular a seus alunos. É novo
sárias para a constante busca da infor- porque é revisto e melhorado pelo docente
mação e do conhecimento – torna-se im- – que lança mão de outros tipos de conhe-
prescindível. O ensino de conteúdos re- cimento – para que possa ser realmente
presenta tarefa mais ampla que transmi- compreendido pelas crianças. Pressupõe
tir informações; trata-se de garantir aos uma elaboração pessoal do professor ao
alunos acesso aos conhecimentos que confrontar-se com o processo de transfor-
lhes permitam participar da vida social mar em ensino o conteúdo aprendido du-
e produtiva e aprendizagens que possi- rante seu processo formativo, incorporan-
bilitem buscar, selecionar, produzir, ana- do, de acordo com Shulman (1986, p. 9):
lisar e utilizar tais conhecimentos dian-
te da complexidade e diversidade das si- [...] aspectos do conteúdo mais relevantes
tuações atuais. para serem ensinados. Dentro da catego-
O conhecimento do conteúdo espe- ria de conhecimento pedagógico do con-
cífico ocupa um lugar central na base de teúdo, incluo, para a maioria dos tópicos
conhecimento para o ensino, influencian- regularmente ensinados de uma área es-
do tanto o que os professores ensinam pecífica de conhecimento, as representa-
como a forma como ensinam (Grossman, ções mais úteis de tais idéias, as analogias
Wilson, Shulman, 1989). Durante o pla- mais poderosas, ilustrações, exemplos,
nejamento e o decorrer das aulas, o co- explanações e demonstrações – em ou-
nhecimento que o professor possui do tras palavras, os modos de representar e

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Processos de formação de professoras iniciantes

formular o conteúdo que o tornam com- processo de transformação, constituído


preensível para os outros. Conhecimento pela interpretação (revisão dos materiais
pedagógico do conteúdo também inclui instrucionais a partir do próprio entendi-
uma compreensão do que torna a apren- mento do conteúdo específico); represen-
dizagem de tópicos específicos fácil ou tação (conjunto de metáforas, analogias,
difícil: as concepções e preconcepções que ilustrações, atividades, exemplos, etc., que
estudantes de diferentes idades e repertó- o professor possa utilizar para transfor-
rios trazem para as situações de aprendi- mar o conteúdo em ensino); adaptação
zagem dos conteúdos e lições freqüente- (ajuste da transformação às característi-
mente ensinados. cas dos alunos em geral); consideração dos
alunos específicos aos quais deve ensinar
Diante das preocupações em torno determinado conteúdo. A instrução con-
dos conhecimentos profissionais docen- siste em aspectos observáveis do compor-
tes, estudos sobre conhecimento pedagó- tamento do professor, como manejo de
gico do conteúdo se configuram como uma classe, explicações, questionamentos, dis-
das contribuições mais poderosas e atu- cussões, etc. A avaliação ocorre durante
ais da investigação sobre formação de pro- e depois da instrução; refere-se à
fessores; trata-se do tipo de conhecimen- checagem da compreensão ou não dos
to específico da profissão docente, im- estudantes em relação ao que foi ensina-
prescindível ao desenvolvimento de um do. Além disso, os professores avaliam seu
ensino que propicie a compreensão, a próprio ensino através do processo de re-
construção e a elaboração de conhecimen- flexão, que representa o processo de
tos pelos alunos (Marcelo Garcia, 1992). aprendizagem a partir da experiência; é o
Evidencia-se na tentativa dos professores momento em que o professor revê seu
de encontrar as melhores formas para re- ensino, reconstituindo eventos, emoções,
presentar suas idéias aos estudantes – acontecimentos. Finalmente, o raciocínio
considerando suas possibilidades de pedagógico envolve nova compreensão
compreensão – e na construção de metá- que é enriquecida, aperfeiçoada; nem
foras, analogias, simulações, representa- sempre vista após cada tópico ensinado,
ções visuais, modelos e de um conjunto pode se desenvolver lentamente, com o
de outros tipos de representações que decorrer das vivências, ou pode surgir a
objetivam comunicar aos alunos aspec- partir de alguma situação com caracterís-
tos dos conteúdos específicos a serem ticas singulares.
ensinados. Ao analisar situações em que Estudos desenvolvidos por Tardif,
professores tentam ensinar conteúdos Lessard e Lahaye (1991) e Tardif (2002)
específicos, de diferentes naturezas, a trouxeram elementos importantes relati-
seus alunos, investigações têm trazido vos à natureza e às fontes dos saberes pro-
importantes elementos para discussões fissionais dos professores. Alguns aspec-
sobre os conhecimentos que fundamen- tos do trabalho docente, não focalizados
tam o ensino e os processos pelos quais nos estudos da base de conhecimento para
ele se desenvolve. o ensino e dos processos de raciocínio pe-
O processo em que professores trans- dagógico, aparecem nas considerações
formam conhecimento em ensino, a par- feitas por estes pesquisadores em relação
tir de uma base de conhecimento profissi- aos saberes docentes e esclarecem ques-
onal, é denominado por Wilson, Shulman tões relativas às origens destes saberes. Se
e Richert (1987) como processo de raciocí- a tipologia dos conhecimentos profissio-
nio pedagógico. Tal processo, conforme nais docentes elaborada por Shulman
descrito pelos pesquisadores, envolve seis (1986) permite discriminar os diferentes
aspectos comuns ao ato de ensinar: com- tipos de conhecimentos que fundamen-
preensão, transformação, instrução, ava- tam o trabalho dos professores e analisar
liação, reflexão e nova compreensão. processos pelos quais são mobilizados e
O raciocínio pedagógico se inicia construídos durante a atividade de ensi-
com a compreensão de idéias e conceitos nar diferentes matérias aos alunos, a
de um mesmo conteúdo e conteúdos re- tipologia desenvolvida por Tardif, Lessard
lacionados, com o entendimento das es- e Lahaye (1991) evidencia as fontes de
truturas e princípios que fundamentam aquisição dos saberes docentes, relacio-
as disciplinas e a construção dos conteú- nando-os com seus modos de integração
dos que a constituem. Envolve, ainda, um no trabalho do professor.

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O quadro a seguir (Tardif, 2002, p. 63) apresenta tal tipologia:

Modos de integração
Saberes dos professores Fontes sociais de aquisição
no trabalho docente

Saberes pessoais dos A família, o ambiente de vida, Pela história de vida e pela
professores. a educação no sentido lato. socialização primária.
Saberes provenientes da A escola primária e secun- Pela formação e pela sociali-
formação escolar anterior. dária, os estudos pós- zação pré-profissionais.
secundários não
especializados.
Saberes provenientes da Os estabelecimentos de Pela formação e pela sociali-
formação profissional para o formação de professores, os zação profissionais nas
magistério. estágios, os cursos de instituições de formação de
reciclagem. professores.
Saberes provenientes dos A utilização das “ferramen- Pela utilização das “ferra-
programas e livros didáticos tas” dos professores: progra- mentas” de trabalho, sua
usados no trabalho. mas, livros didáticos, adaptação às tarefas.
cadernos de exercício,
fichas.
Saberes provenientes de sua A prática do ofício na escola Pela prática do trabalho e pela
própria experiência na e na sala de aula, a experiên- socialização profissional.
profissão, na sala de aula e cia dos pares.
na escola.

Aspectos gerais da pesquisa profissionais pelas professoras, permi-


tindo também que fossem evidenciadas
dúvidas, certezas, equívocos e contradi-
Neste artigo, são apresentados resulta-
ções que orientam e caracterizam suas
dos obtidos em pesquisa que objetivou in-
práticas profissionais. Garantiram, ain-
vestigar processos de formação vividos por
da, que conhecimentos referentes ao
professoras em início de carreira (Nono, modo como ensinam conteúdos matemá-
2005). Participaram do estudo quatro pro- ticos e de linguagem escrita fossem
fessoras iniciantes da educação infantil e explicitados pelas iniciantes.
dos anos iniciais do ensino fundamental,1 Casos de ensino (Merseth, 1996;
com trajetórias diversificadas de entrada na Mizukami, 2000, 2002; Nono, 2001; Nono,
carreira docente, que, no período de coleta Mizukami, 2004; Shulman, 1992) são nar-
de dados (entre 2003 e 2004), possuíam rativas que documentam eventos escola-
entre dois e cinco anos de profissão. res e que trazem detalhes suficientes para
As professoras analisaram individual- que tais eventos sejam analisados e inter-
mente cinco casos de ensino,2 a partir de pretados a partir de diferentes perspecti-
roteiros de questões abertas, e elaboraram vas. São narrativas que permitem o aces-
um caso a partir de situações escolares vi- so aos conhecimentos sobre ensino envol-
vidas nos anos iniciais da docência. Focos vidos nos eventos descritos. Casos vêm
1
As professoras serão chama-
das de Fabiana, Joana,
de análise dos dados coletados foram esta- sendo apontados como importantes ins- Daniela e Mariana, nomes
belecidos tendo em vista os objetivos da trumentos a serem utilizados na investi- fictícios.
2
Os casos de ensino utiliza-
investigação, sendo focalizados diferentes gação e no desenvolvimento da base de dos foram: "A trajetória pro-
conhecimentos profissionais das professo- conhecimento para o ensino e do proces- fissional de Stefânia, profes-
ras iniciantes e processos pelos quais tais sora de Educação Infantil"
so de raciocínio pedagógico. Ao garantir o (Padilha, 2002); "Um dinhei-
conhecimentos foram construídos, organi- acesso – tanto aos investigadores quanto ro, dois dinheiros, três di-
zados e mobilizados por elas no início da aos próprios professores – aos conheci- nheiros..." (Toledo, 1999);
"Escreva do seu jeito"
carreira docente. mentos que fundamentam a atuação do- (Aratangy, 2002); "A Gata
De modo geral, as estratégias de análi- cente, os casos sugerem sua importância Borralheira, a Cinderela e o
Sapatinho Dourado" (Abreu,
se e elaboração de casos de ensino possibi- na estruturação de atividades de forma- 2002); "Produzindo textos"
litaram descrições e análises das trajetórias ção que considerem os conhecimentos (Abreu, 2002a).

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Processos de formação de professoras iniciantes

profissionais dos professores e que permi- de 3º e 4º anos que estavam aprendendo a


tam seu desenvolvimento. produzir textos. No ano de 2004, Daniela
Além disso, a importância dos casos foi contratada por uma creche inaugurada
de ensino aumenta quando se considera em um dos distritos do município de Jaú/
que os processos de aprender a ensinar SP para trabalho em tempo integral na edu-
ocorrem na interação do professor com o cação infantil. Concluiu o curso de Pedago-
contexto no qual leciona. Situações espe- gia e cursava, durante a coleta de dados,
cíficas são fundamentais nos processos de especialização em Psicopedagogia. A pro-
construção dos conhecimentos profissio- fessora Mariana, com aproximadamente
nais docentes. Ao apresentarem situações cinco anos de experiência docente, forma-
escolares singulares, os casos de ensino da também em Letras, concursada pela Pre-
possibilitam a análise de questões estrita- feitura Municipal de Jaú/SP, lecionava, em
mente relacionadas ao contexto escolar e 2003, numa turma de 4º ano do ensino fun-
de sala de aula – que envolvam as impli- damental e numa pré-escola (5-6 anos) e,
cações sociais, econômicas e políticas da em 2004, numa pré-escola (5-6 anos) e na
atividade de ensinar – e, ainda, permitem disciplina Inglês nos anos finais do ensino
que professores, conjuntamente, discutam fundamental, em escola municipal. Mariana
e analisem tais situações, refletindo sobre se preparava para prestar concurso público
conhecimentos profissionais próprios da estadual para lecionar nos anos finais do
docência que lhes possibilitam transfor- ensino fundamental e no ensino médio, fre-
mar conhecimentos que ensinam de modo qüentando, ainda, um curso de Libras (Lín-
que os alunos possam aprendê-los. gua Brasileira de Sinais) e outro de especia-
Na investigação que fundamenta este lização em Literatura. A professora Joana,
artigo (Nono, 2005), casos de ensino foram com aproximadamente dois anos de carrei-
utilizados como ferramentas formativas e ra, possuía experiência docente em escolas
investigativas, revelando-se importantes estaduais, onde atuou como professora-
instrumentos para promoção e investiga- substituta por um ano. Em 2003 lecionava
ção dos processos formativos vividos pelas em uma turma de 2ª série do ensino funda-
professoras em início de carreira.3 mental, em escola municipal, com contrato
Em relação às professoras participan- de trabalho anual. Concluiu o curso de Pe-
tes da pesquisa, é possível caracterizá-las, dagogia. Morando em outra cidade e lecio-
antes de mais nada, em relação ao tempo de nando em Jaú/SP, Joana passava duas horas
experiência docente e à formação para a de seus dias em viagens de ônibus, ficando
docência recebida. Fabiana possuía, no pe- impossibilitada, segundo ela, de trabalhar
ríodo 2003-2004, aproximadamente quatro em outro período ou de realizar algum cur-
anos de experiência docente em escola par- so relativo à profissão.
ticular, trabalhando, desde 1999, com cri-
anças de 1-2 anos de idade, na educação
infantil, e, também, com crianças de 4-5 Resultados e discussão
anos; concluiu o curso de Pedagogia e fre-
qüentava especialização em Psicopedagogia. As professoras iniciantes e o
A professora Daniela possuía, durante o ingresso na profissão docente
período de coleta de dados (2003-2004),
aproximadamente três anos de experiência A partir dos dados obtidos por meio
docente, tendo iniciado sua carreira em das estratégias de análise e elaboração de
3
Maior aprofundamento na
definição de casos de ensi- 2001, trabalhando em uma turma de 1ª sé- casos de ensino, foi possível constatar que
no pode ser encontrado no rie do ensino fundamental, em escola par- as professoras iniciantes, ao descrever suas
artigo "Sobre casos de ensi-
no", das mesmas autoras ticular, inicialmente como professora-au- trajetórias profissionais e processos
(Nono, Mizukami, 2004a). xiliar e, logo em seguida, como professora- formativos, procuram estabelecer relações
Análises mais aprofundadas
sobre as possibilidades
substituta da titular, que esteve em licen- entre as situações vividas nos anos inici-
formativas e investigativas ça-maternidade. Em 2003, lecionava na ais da carreira e alguns elementos, tais
dos casos de ensino podem educação infantil, numa turma com crian- como escolarização prévia, formação ini-
ser encontradas em Nono
(2005). Neste artigo, optou- ças de 6 anos de idade, na mesma escola cial, exigências da prática, escola/ambi-
se por focalizar não exata- particular e, também, em escola pública ente de trabalho, políticas públicas edu-
mente a discussão sobre o
potencial dos casos, mas a estadual, em classes de reforço escolar, com cacionais, conhecimentos fundamentais
discussão sobre os processos um grupo de crianças do 1º ao 3º ano do para enfrentar os primeiros anos de ensino,
de formação de professoras
iniciantes evidenciados pelo
ensino fundamental que estavam sendo fontes de aprendizagem profissional, pais e
uso dos casos. alfabetizadas e com um grupo de crianças alunos, aprendizagens vividas no início na

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Maévi Anabel Nono
Maria da Graça Nicoletti Mizukami

carreira, principais dificuldades, obstácu- conjuntos, tais registros mostram diferen-


los, desafios, preocupações, dilemas e inte- tes trajetórias de principiantes que passam
resses encontrados na entrada na carreira. por um período intenso de descobertas e
As iniciantes procuram analisar pro- de tentativa de sobrevivência na profissão
cessos vividos no início na docência, bus- (Huberman, 1993) – trajetórias mais fáceis
cando apontar fatores que facilitaram ou para algumas, muito mais difíceis para
dificultaram sua iniciação profissional. outras. Os registros sugerem que, das qua-
Procuram traçar seu próprio perfil profis- tro professoras, três – com 3-5 anos de
sional, apontando aspectos que proporci- carreira – sobreviveram às maiores dificul-
onaram sua construção e reconstrução dades, passando a aceitar a ansiedade e
constantes. Embora tenham analisado as- os conflitos como característicos da
pectos comuns em suas trajetórias, a par- docência e como fontes de aprendizagem
tir dos casos de ensino apresentados, cada profissional, desenvolvendo maior segu-
professora imprimiu uma marca pessoal rança e domínio sobre as situações cotidi-
em seus registros, mostrando diferenças anas que enfrentam (Tardif, Raymond,
nas formas de encarar os primeiros anos 2000). Uma delas, entretanto, com apenas
de profissão. dois anos de carreira, enfrentava um pe-
Nas análises que realizaram, expres- ríodo de quase abandono da profissão,
saram aspectos marcantes de sua trajetó- sentindo-se pessoalmente atingida pelas
ria pessoal, mostrando que, apesar das pe- dificuldades no confronto com a prática
culiaridades que caracterizam a entrada na (Esteve Zaragoza, 1999).
carreira, cada professora vivencia esse Aspectos comuns nos registros das
momento de forma particular, a partir de professoras se referem às formas como
conhecimentos que possui sobre a profis- encaram os processos de desenvolvimen-
são, das relações que estabelece com cole- to profissional docente. As principiantes
gas de trabalho, pais de alunos, alunos, da explicitam e discutem o caráter de conti-
maneira como ingressa na primeira esco- nuidade da aprendizagem da profissão e a
la. Assim, verifica-se, nos registros da pro- dimensão formativa da escola/ambiente de
fessora Joana, por exemplo, forte tendên- trabalho. Trechos de seus registros apon-
cia em buscar compreender os sentimen- tam para um reconhecimento de que a for-
tos contraditórios que têm marcado seus mação docente não se encerra no curso de
primeiros anos de profissão e que a têm formação inicial, mas continua acontecen-
impulsionado a desistir. Tal busca conduz do ao longo da carreira, principalmente no
a descrição de sua entrada na carreira. próprio ambiente de trabalho do profes-
Enquanto isso, Mariana, já desprovida des- sor, na troca de experiências com os cole-
te sentimento de instabilidade na profis- gas e com os alunos.
são que marca os registros de Joana – por
ter estabilidade garantida por aprovação Aprendi esses conhecimentos na escola,
em concurso público –, mostra preocupa- junto com os alunos (Mariana). Venho
ção em manter um ensino de qualidade ao aprendendo bastante a cada dia na sala
longo da carreira. Daniela focaliza sua pre- de aula. [...] Acredito que a aprendizagem
ocupação em como conseguir exercer com da profissão docente começa na busca de
autonomia a docência, diante da forte in- informação a respeito e não termina nun-
fluência que tem sofrido em seus anos ca, pois a cada momento surgem novos
como professora de escola particular. Já conflitos nos quais temos que parar, bus-
para Fabiana, a maior preocupação está em car novas hipóteses e por em prática tudo
como lidar com as crianças pequenas e que sabemos; dessa forma, estamos sem-
suas interferências no seu trabalho. pre aprendendo (Joana). [...] a formação
Assim como apontam estudos sobre docente nunca se acaba, ela começou
professores principiantes, anteriormente quando decidi tornar-me uma professo-
discutidos, a entrada na carreira parece ra e não se acabará enquanto o mundo
marcada, nos registros das professoras, estiver mudando continuamente, junto
por aprendizagens diversas, pelo conví- com o ser humano (Fabiana). Penso que a
vio de sentimentos contraditórios em re- escola é o espaço principal para a forma-
lação à profissão, pela busca excessiva de ção do professor. É nela que as discus-
superação de obstáculos, por fortes exi- sões sobre a própria realidade aparecem
gências pessoais em relação ao próprio de- e são refletidas para que haja mudança
sempenho profissional. Analisados em de comportamentos e atitudes. Acho

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Processos de formação de professoras iniciantes

importantíssimo ter uma equipe unida A disposição para aprender novos conteú-
onde pode-se trocar idéias e opiniões, dos – demonstrada durante a formação ini-
aprendendo com quem tem mais experi- cial – parece se confirmar. Diante das difi-
ência. Daí é que se dá a formação contí- culdades no domínio de um ou outro con-
nua do educador (Daniela). teúdo, as professoras declaram: “[tenho]
buscado ajuda com alguns professores, pe-
Aparentemente, as professoras atribu- guei alguns livros [...] estou correndo atrás
em ao professor um papel ativo em sua e acredito que venho cumprindo meu pa-
aprendizagem da profissão e defendem a pel” (Joana). “[...] Agora tenho corrido atrás
criação de espaços coletivos nas escolas dos prejuízos. Me atualizo com os cursos
para trocas de experiências e construção de que freqüento, com as capacitações, com
novos conhecimentos sobre o ensino, re- os grupos de estudo e nas próprias pesqui-
conhecendo o valor dos saberes profissio- sas que faço quando é necessário”
nais construídos no cotidiano escolar. Vale (Daniela). Trecho escrito pela professora
destacar que, durante o curso de formação Mariana demonstra sua constatação de que
inicial, as professoras já apontavam a apren- o ideal é aprender os conteúdos no exercí-
dizagem da profissão docente como um cio da docência, diante da necessidade:
processo contínuo (Nono, 2001). O que não “[...] hoje devido a necessidade e até por
acontecia, naquele momento, era a valori- interesse, busco informações, leio muito,
zação do ambiente escolar como local de enfim, me amadureci. Em um contexto
aprendizagem da docência. Aspectos rela- anterior não tinha porquê me dedicar a elas
cionados com a organização escolar e suas [determinadas áreas do conhecimento]”.
possíveis influências no trabalho de sala Os registros permitiram a constatação
de aula não eram discutidos pelas futuras de certa preocupação das professoras com
professoras ao analisar situações de ensi- a transformação dos conhecimentos que
no. A entrada na profissão parece ter pro- possuem em ensino. Mariana afirma que
piciado o estabelecimento de relações en- não tem o que superar em termos de lacu-
tre sala de aula e escola. nas em uma ou outra área do conhecimen-
Ao discutir o significado do curso de to: “[...] só corro atrás da didática de como
formação inicial em seu processo de de- passar aos alunos”. “Acredito que na Mate-
senvolvimento profissional, as iniciantes mática tenho uma certa dificuldade para
destacam a importância de que ele se ca- transmitir com clareza alguns conteúdos
racterize pela articulação entre teoria e [...]. Na área de Artes também tenho encon-
prática. O curso de formação inicial é trado certas dificuldades, me faltam, talvez,
apontado como apenas uma das fontes de idéias de atividades [...]”, acrescenta Joana.
aprendizagem profissional docente. Des- Vale destacar, entretanto, que, mesmo
tacam também saberes advindos de sua a disposição das principiantes para apren-
própria história de vida, de sua der os conteúdos antes de ensiná-los – su-
escolarização anterior, da sua própria ex- prindo assim lacunas da trajetória escolar –
periência na sala de aula e na escola, de parece insuficiente quando se desconhece
seus estudos teóricos (Tardif, 2002). a própria defasagem. Os dados sugerem, por
exemplo, que, em muitos momentos, as
iniciantes acabam recorrendo aos modelos
As professoras iniciantes e o pedagógicos aos quais foram expostas, ape-
ensino de conteúdos nos sar de explicitarem sua preocupação em
primeiros anos de organizar situações de ensino diferentes
escolarização daquelas que vivenciaram na infância.
Equívocos e lacunas nos conhecimentos
Os dados obtidos sinalizam lacunas que devem ensinar parecem interferir na
que as professoras iniciantes possuem em seleção de procedimentos de ensino, na
algumas áreas do conhecimento que de- avaliação do entendimento dos alunos, na
vem ensinar. Algumas dessas lacunas são análise das estratégias de aprendizagem
percebidas por elas, outras não. Permane- elaboradas pelas crianças, influenciando,
ce sua crença – evidenciada durante o cur- portanto, todo o processo de raciocínio pe-
so de formação inicial (Nono, 2001) – de dagógico vivido pelas professoras. Esse pro-
que o domínio de conteúdos específicos cesso se inicia com a compreensão de idéi-
pode ser alcançado durante o exercício da as e conceitos dos conteúdos que se quer
docência, sempre que a prática solicitar. ensinar e de conteúdos relacionados a eles.

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Falhas nessa compreensão parecem inter- Tratando especificamente das formas


ferir em todos os demais momentos dele. como as professoras iniciantes encaram e
Ao focalizar, por exemplo, conhecimen- utilizam as estratégias pessoais das crian-
tos das principiantes sobre conteúdos rela- ças no ensino da Matemática – e o modo
tivos à Matemática, surgem evidências de como avaliam o uso que fazem delas –
que concebem as quatro operações funda- nota-se que, ao desconhecer, elas mesmas,
mentais (soma, subtração, multiplicação e diversas estratégias de resolução de um
divisão) como tendo apenas um significa- mesmo algoritmo ou situação-problema,
do: aquele ensinado durante seu processo acabam por lidar, algumas vezes, de for-
de escolarização anterior. O fato é que to- ma superficial com as hipóteses das cri-
das as quatro operações têm mais de um anças, encarando-as muito mais como des-
significado, ou mais de um uso (Brasil, cobertas e invenções do que como cons-
1997). Ao desconhecer os diversos signifi- truções dos alunos em seu processo de
cados das operações, acabam recorrendo a aprendizagem. Observa-se que Joana che-
práticas de ensino a que foram expostas na ga a se espantar com as estratégias elabo-
infância para ensiná-las. Joana, por exem- radas pelos alunos. Esta professora, ao re-
plo, organiza suas aulas pautada no seguinte fletir sobre seu ensino, avalia positivamen-
roteiro: explicação do conteúdo (recorren- te o fato de deixar que as crianças expo-
do à apresentação de definições e exem- nham tais estratégias, mas não parece no-
plos), apresentação de exercícios de aplica- tar que deveria partir delas para organizar
ção do que foi ensinado e correção deles na seu ensino, na medida em que parece co-
lousa. Parece não analisar as representações nhecer apenas estratégias convencionais
escritas das crianças e suas hipóteses de de resolução de problemas.
resolução das situações-problema propos- No que se refere aos conhecimentos
tas. Embora acolha as representações das das principiantes sobre conteúdos relati-
crianças, sua preocupação parece voltada vos à leitura e à escrita, os dados sugerem
para a aprendizagem da resolução da ‘con- que, neles, também estão presentes lacu-
ta armada’. Joana afirma lidar com as estra- nas que, por vezes, interferem nas formas
tégias pessoais das crianças, mas, aparen- como as professoras tentam ensinar. Os
temente, tais estratégias não representam diversos conhecimentos lingüísticos que
ponto de partida nas situações de ensino devem fundamentar o ensino e a aprendi-
que organiza nem são tidas como forma de zagem da lecto-escrita – relativos aos as-
compreender como os alunos aprendem os pectos fonológicos, ortográficos,
conceitos matemáticos. morfossintáticos, semânticos, textuais,
Daniela, assim como Joana, também discursivos da língua e aos gêneros textu-
explicita sua valorização das explicações ais – não são apontados pelas principian-
prévias nas aulas envolvendo a aprendi- tes como norteadores dos planejamentos
zagem de conceitos matemáticos, embora de suas aulas.
descreva, também, aulas centradas nas ati- Foi possível constatar uma disposição
vidades das crianças e na resolução de si- das iniciantes para desenvolver práticas
tuações-problema como desencadeadoras escolares pautadas na construção do co-
da aprendizagem. Daniela tende a valori- nhecimento pela criança e na valorização
zar as ações das crianças em seu aprendi- de suas hipóteses sobre a escrita e a leitu-
zado, criando oportunidades para que ra. Referem-se, constantemente, aos níveis
pensem, troquem idéias, façam descober- de aprendizagem e de escrita das crian-
tas, utilizem e ampliem seus conhecimen- ças, destacando a necessidade de que as
tos. Mariana, assim como Joana, também professoras consigam identificá-los e
descreve situações em que utiliza situa- considerá-los em seu ensino. Ao analisar
ções-problema como forma de aplicação uma das situações de ensino propostas,
de conceitos anteriormente ensinados, Daniela escreve que “[...] deu pra perce-
afirmando que “[...] depois que as crian- ber que, diante da dificuldade encontrada
ças compreenderem o processo, faria al- (uns não se contentavam só com as infor-
gumas situações-problema, coletivo e in- mações da capa, outros já conheciam as
dividualmente, verificando todo o proces- letras e arriscavam palpites, outros já ten-
so”. Entretanto, também destaca a impor- tavam uma leitura silábica, reconhecen-
tância de que os alunos tenham espaço do algumas letras), as crianças estão em
para criar suas estratégias, apresentá-las diferentes níveis: uns pré-silábicos anali-
aos colegas e discuti-las. sando somente imagens, outros silábicos

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Processos de formação de professoras iniciantes

e outros até mesmo silábicos alfabéticos”. materiais que utiliza na alfabetização, de


Fabiana destaca que “[...] no início desse aspectos que devem ser trabalhados na
trabalho [com alfabetização] não conhe- aquisição da escrita.
cia muito bem os níveis de escrita e, con- Em relação às formas como as
seqüentemente, não saberia avaliar e tra- iniciantes se referem e utilizam os conhe-
balhar com as dificuldades das crianças”. cimentos prévios das crianças relativos ao
Avalia seus alunos de 5-6 anos de idade sistema de escrita, verifica-se que Fabiana
dizendo que “[...] a maioria está no nível e Mariana expressam sua crença de que a
silábico com valor sonoro e alguns em aprendizagem da leitura e da escrita da
transição para o silábico alfabético maioria de seus alunos tenha ocorrido es-
(Emília Ferreiro)”. tritamente no ambiente escolar, sendo que
Em algumas análises, entretanto, apenas alguns deles, segundo elas, sofre-
transparece um uso inadequado e, por ve- ram interferências do ambiente familiar.
zes confuso, das descobertas em torno dos Apenas Daniela destaca a importância dos
níveis de escrita das crianças. Mariana as- conhecimentos sobre a escrita construídos
sim escreve acerca de seus alunos: pelos alunos antes da escolarização, no
contato com outros adultos e com materi-
[...] possuem algumas dificuldades, nem al impresso freqüente nos ambientes ur-
sei se deveria chamar assim; estão em um banos. Um dos conhecimentos que a cri-
nível em que escrevem palavras simples, ança já possui ao entrar na escola, segun-
utilizando das sílabas; pois ainda estão do ela, diz respeito às funções sociais da
na fase em que é difícil utilizar M, N, ÃO, escrita. Ao destacar esses conhecimentos
AM nas terminações de palavras; mas quando analisa os processos de aprendi-
acho normal. [...] eles sabem pouco so- zagem de seus alunos, Daniela, ao mes-
bre leitura, mas acredito que estão em mo tempo, demonstra valorizar as concep-
nível correto [...]. ções que as crianças construíram fora do
ambiente escolar e explicita sua compre-
Seus relatos demonstram uma ten- ensão da escrita como algo mais que um
dência a utilizar as pesquisas de Ferreiro produto escolar.
(1990) como justificativa para a não-apren- De modo geral, é possível constatar,
dizagem de algumas crianças. Ao analisar, tanto no que diz respeito ao ensino de con-
por exemplo, trecho das análises realiza- teúdos relativos à Matemática quanto aos
das por Fabiana, nota-se que – apesar de conteúdos relativos à leitura e à escrita, que
destacar a importância de que a professo- as professoras iniciantes vivenciam um
ra identifique a fase de escrita da criança momento de transição entre a adoção de
para poder atuar –, ao descrever sua atua- práticas que parecem valorizar e de práti-
ção, a avaliação do nível da escrita dos cas semelhantes àquelas a que foram ex-
alunos aparece ao final de um conjunto postas durante seu processo de
de atividades. escolarização. Weisz (2002, p. 58-59)
Ao focalizar, portanto, procedimen- enfatiza que:
tos metodológicos utilizados pelas
iniciantes ao lidar com alfabetização, Quando se tenta sair de um modelo de
nota-se que trechos escritos por Mariana aprendizagem empirista para um modelo
sugerem que as atividades de ensino de- construtivista, as dificuldades de enten-
senvolvidas em classe independem, de dimento às vezes são graves. [...] Se o pro-
certa forma, da consideração do nível de fessor procura inovar sua prática, adotan-
escrita das crianças. Vê-se que ela elenca do um modelo de ensino que pressupõe a
um rol de atividades que são realizadas construção de conhecimento sem compre-
cotidianamente. Depoimentos da profes- ender suficientemente as questões que lhe
sora Daniela, por outro lado, sugerem uma dão sustentação, corre o risco, grave no
utilização mais continuada das hipóteses meu modo de ver, de ficar se deslocando
das crianças para orientar suas interven- de um modelo que lhe é familiar para o
ções. Nota-se também que, nas análises outro, meio desconhecido, sem muito
sobre seu ensino, procura, mais que domínio de sua própria prática – ‘mesclan-
elencar atividades que desenvolve, tratar do’, como se costuma dizer. [...] É fácil nos
de suas concepções sobre funções da es- perdermos em nossa prática educativa
cola no ensino da leitura/escrita e sobre quando não nos damos conta do que ori-
como a criança aprende, dos objetivos dos enta de fato nossas ações.

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Transitando entre uma maneira tradi- e ideais sobre a profissão às condições re-
cional de ensinar e uma perspectiva ais de trabalho que encontram, procuran-
construtivista de encarar o processo de do lidar com uma série de limitações que
aprendizagem dos alunos, parece funda- atuam diretamente sobre seu trabalho, ten-
mental que as iniciantes tenham clareza tando permanecer na profissão e manter
de como as crianças aprendem e de quais um certo equilíbrio diante dos sentimen-
suas possibilidades de ensino. tos contraditórios que marcam a entrada
na carreira. Burke (1990 apud Marcelo
Garcia, 1999) afirma que a evolução do
Considerações finais ciclo vital do professor deve ser entendi-
da em função de duas grandes dimensões:
Os dados demonstram forte implica- pessoal e organizacional. Do ponto de vis-
ção das professoras principiantes em sua ta pessoal, existem diversos fatores que
própria aprendizagem profissional da influenciam os professores: relações fami-
docência e explicitam sua disposição para liares, crises pessoais, etc. O ambiente
expor suas formas de atuação, a partir da organizacional influencia a carreira por
elaboração e análise de casos de ensino. meio dos estilos de gestão encontrados, das
Retratam as iniciantes como profissionais expectativas sociais em relação à profis-
dispostas a pensar sobre seu ensino, cons- são, etc. Nos dados obtidos, foram eviden-
truir conhecimentos durante sua atuação, ciadas as influências de aspectos pessoais
rever e retomar suas práticas para garantir e organizacionais nos processos de forma-
a aprendizagem das crianças. Mostram ção das professoras iniciantes.
que, apesar de iniciantes e de todas as Conforme salienta Huberman (1993),
adversidades que caracterizam esse perío- foi possível constatar que essa fase da car-
do da carreira, sentem-se capazes de to- reira não é vivenciada exatamente da mes-
mar decisões e ter opiniões, transitando ma maneira por todos os professores. As
para uma fase de estabilização na carreira formas como cada professora lida com os
(Huberman, 1993). Apontam diversos co- aspectos que caracterizam a entrada na
nhecimentos profissionais que mobilizam profissão podem variar, sendo tal período
para desenvolver seu ensino: conhecimen- encarado a partir de diversas perspectivas
to pedagógico geral, conhecimento do con- e conhecimentos anteriores.
teúdo específico, conhecimento pedagógi- Os resultados desta investigação pa-
co do conteúdo. Sendo preenchidas algu- recem confirmar a necessidade de que se-
mas lacunas em seus conhecimentos pro- jam organizados programas de iniciação
fissionais – evidenciadas nos dados obti- ao ensino para professoras principiantes
dos –, poderão, cada vez mais, levantar que respondam “[...] à concepção de que a
novas dúvidas sobre sua atuação, impli- formação de professores é um contínuo
cando-se, constantemente, em seus proces- que tem de ser oferecida de um modo
sos de desenvolvimento profissional. adaptado às necessidades de cada momen-
Transparece, nos dados obtidos, a dis- to da carreira profissional” (Marcelo
posição das principiantes para refletir so- Garcia, 1999, p. 119). Tais programas de-
bre sua prática de ensino e orientar suas vem ser compreendidos como um “[...] elo
intervenções pelas observações e análises imprescindível que deve unir a formação
que realizam diante da participação das inicial ao desenvolvimento profissional ao
crianças nas aulas que propõem. Confir- longo da carreira docente”. É necessário
ma-se a necessidade de seu envolvimento que levem em conta diferentes conheci-
em programas de formação continuada que mentos profissionais que orientam as prá-
permitam a revisão e a ampliação de seus ticas escolares adotadas pelas principian-
conhecimentos profissionais. tes e utilizem estratégias diversificadas que
Para finalizar, vale destacar que, ao promovam processos de desenvolvimen-
caracterizar as professoras iniciantes que to profissional docente.
participaram desta investigação, foram Neste artigo, procurou-se apontar al-
obtidos resultados semelhantes àqueles guns destes conhecimentos, evidenciados
encontrados em estudos realizados por Cal- pela utilização de uma das estratégias pos-
deira (1995), Castro (1995), Fontana (2000), síveis de serem utilizadas em tais progra-
Guarnieri (1996). Trata-se de um período de mas: a análise e elaboração de casos de
sobrevivência e descoberta, no qual as pro- ensino. Os dados revelam a complexidade
fessoras procuram ajustar suas expectativas que caracteriza os processos de formação

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Processos de formação de professoras iniciantes

de professoras em início de carreira e, ao A produção sobre o tema vem crescendo


mesmo tempo, evidenciam o potencial dos nos últimos anos, e novas pesquisas têm
casos de ensino como estratégias para pro- sido desenvolvidas (Corsi, Lima, 2005;
mover e investigar tais processos. Mariano, 2005; Lima, 2006), o que tem re-
Objetivou-se, também, neste artigo, velado a importância das investigações
sistematizar pesquisas sobre formação de sobre esse momento peculiar da profissão
professores principiantes já realizadas. docente: a entrada na profissão.

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Maévi Anabel Nono, doutora em Educação pela Universidade Federal de São


Carlos-SP (UFSCar), é docente do Departamento de Educação do Instituto de Biociências,
Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista – Câmpus de São José do
Rio Preto (Ibilce/Unesp). Atua em ensino, pesquisa e extensão na área de Formação de
Professores.
maevi@ibilce.unesp.br

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 382-400, set./dez. 2006. 399
Maévi Anabel Nono
Maria da Graça Nicoletti Mizukami

Maria da Graça Nicoletti Mizukami, doutora em Ciências Humanas pela Pontifícia


Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), com pós-doutorado na Santa Clara
University/Teacher Education Program, é docente do Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal de São Carlos-SP (UFSCar), área de concentração
em Metodologia de Ensino. Atua em ensino (graduação e pós-graduação), pesquisa e
extensão na área de Formação de Professores.
gramizuka@gmail.com

Recebido em 15 de maio de 2006.


Aprovado em 28 de novembro de 2006.

400 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 382-400, set./dez. 2006.
ESTUDOS

Profissionalização dos professores


universitários: raízes históricas,
problemas atuais

Renata Aparecida Belei


Sandra Regina Gimeniz-Paschoal
Edinalva Neves Nascimento
Ana Clara Bortoleto Nery

Resumo
No Brasil, muitos docentes do ensino superior não possuem formação pedagógica ou
didática. O objetivo deste trabalho foi desvelar elementos do processo histórico de
profissionalização do ensino superior no País, relacionando-os com problemas atuais
encontrados nos processos de ensino-aprendizagem. Foi realizada revisão de literatura,
na qual se utilizaram os unitermos “história”, “formação”, “professores” e “ensino superi-
or”. Os resultados apontaram possíveis origens das falhas no processo de ensino-aprendi-
zagem, em decorrência das formas pelas quais se inicia e se estrutura o ensino superior
no Brasil, o que sugere reflexões para mudanças, como revisão do método de seleção de
professores, equilíbrio da formação didática e pedagógica com a formação específica,
formas de ingresso e de atuação docente e incentivo à formação continuada.

Palavras-chave: histórico; profissionalização; ensino superior.

Abstract The academical teachers’ professionalization:


historical roots, current problems

In Brazil, many teachers of higher education do not have pedagogic or didactic


formation. This objective of this work was to approach the elements of the historical
process of professionalization of the higher education in the country, relating them with
the current problems found in the teaching-learning processes. A literature revision was
made, in which the terms “history”, “formation”, “teachers” and “higher education” were
used. The results pointed possible origins of flaws in the teaching-learning processes, due
to how the higher education in Brazil begins and is structured, what suggests reflections
for changes, as a revision of the method of teachers’ selection, the balance of didactic and
pedagogic with the specific formation, entrance ways, academic performance and incen-
tives to the continuous educational formation.

Keywords: historical; professionalization; higher education.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006. 401
Renata Aparecida Belei
Sandra Regina Gimeniz-Paschoal
Edinalva Neves Nascimento
Ana Clara Bortoleto Nery

Introdução de enfermagem e verificou que, mesmo com


a reforma curricular e com a implantação
de um currículo integrado, o processo de
No Brasil, o ensino superior tem caracte-
ensino sobre o tema ainda apresentava fa-
rísticas particulares e apresenta inúmeros pro-
lhas, permitindo que o risco de acidente se
blemas, como deterioração salarial, despres-
mantivesse elevado entre os acadêmicos.
tígio profissional e precariedade da formação
docente (Godoy, 1983; Schwartzman, 1988). Segundo Ramos e Júnior (1992), são
Atualmente são vários os cursos ministrados muitas as causas da decadência do ensino
por professores de formação diferenciada, com universitário específico para os cursos da
trajetórias diferentes, mas com uma caracte- área da saúde, destacando-se o erro peda-
rística que acompanha a maioria dos docen- gógico, as muitas responsabilidades do
tes: formação pedagógica ou didática ausente profissional/professor, o despreparo
ou precária. humanístico, vocacional e psicológico do
Encontram-se nessa situação enfer- docente e do aluno, o número excessivo
meiros, médicos, advogados, engenheiros de cursos, a desproporção numérica do-
e outros profissionais que passaram a ocu- cente-aluno, os recursos humanos inade-
par o cargo de docente e que almejam re- quados de docentes e pessoal técnico, etc.
passar suas habilidades profissionais para Um ponto importante também apon-
a carreira de professor. Muitos têm êxito, tado pelos autores é a supervalorização do
mas a grande maioria segue a trajetória curso de pós-graduação em detrimento da
acadêmica driblando os obstáculos e difi- graduação. Deixam-se para depois ques-
culdades inerentes ao desenvolvimento do tões extremamente relevantes para a for-
processo de ensino-aprendizagem. mação, resultando num profissional in-
Nos cursos de graduação desses profis- completo, sem preparo técnico-científico
sionais, de forma geral, não são contempla- e até psicológico, não condizente com o
dos aspectos pedagógicos mínimos necessá- perfil exigido pela sociedade. E de onde
rios à carreira docente (Pimenta, Anastasiou, vêm todos estes problemas?
2002). Como os cursos de graduação se divi- De acordo com Nóvoa (1992), uma das
dem em bacharelado e licenciatura, somen- formas de se compreender os problemas
te neste segundo caso há preocupação com atuais relacionados com o processo de en-
a formação do professor, ainda que mínima sino-aprendizagem é procurar entender o
e muitas vezes desarticulada com a forma- processo histórico de profissionalização,
ção específica da área do curso. pois daí se originaram algumas caracterís-
Acontece que muitos bacharéis se tor- ticas que se mostram presentes ainda hoje
nam professores da educação superior. Nes- no processo de trabalho dos profissionais
ses casos, as disciplinas de metodologia do do ensino superior.
ensino superior ou de didática ficam restri- Logo, o objetivo deste trabalho foi bus-
tas a cursos de pós-graduação e, infelizmen- car as raízes históricas da problemática
te, algumas vezes, são optativas. O próprio acima apontada, de forma não exaustiva,
processo seletivo de muitas faculdades e nos estudos desenvolvido na área de his-
universidades exigem apenas titulação e tória da formação dos professores univer-
experiência profissional, mas não específi- sitários no Brasil, relacionando-as com a
ca para o ensino, não sendo avaliada a for- situação atual do ensino nos cursos de gra-
mação pedagógica dos futuros docentes do duação. O recorte utilizado preocupa-se
ensino superior, como ocorre, com freqüên- com a formação nos bacharelados, ainda
cia, nos cursos da área da saúde, dos quais que não encontremos estudos específicos
nos ocupamos em nossas pesquisas. sobre esta modalidade da educação supe-
Nas últimas décadas muito se falou so- rior. Para isto, foi realizado um levanta-
bre mudanças na formação dos profissionais mento bibliográfico utilizando-se os se-
e sobre a necessidade de se reverem progra- guintes unitermos: “história”, “formação”,
mas, currículos e projetos pedagógicos “professores”, “ensino superior”.
(Moreira, Silva, 2000; Sena, 2000; Sacristãn,
Pérez Gomes, 2000). Entretanto, nem sem-
pre os problemas encontrados no processo Características da criação dos
de ensino são decorrentes de negligência ou cursos superiores no Brasil
da falta de mudanças curriculares.
Belei (2003) analisou a ocorrência de Segundo Schwartzman (1982), no Bra-
acidente com material biológico num curso sil, até o início da República, a produção

402 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006.
Profissionalização dos professores universitários:
raízes históricas, problemas atuais

científica apresentou características mui- saído da universidade pombalina no final


to precárias, com a criação de centros de do século 18 (Cavalcanti, 2004).
estudos e escolas burocratizadas, os quais Com a República surgiram novas pri-
dependiam totalmente do Império, de oridades, novos pólos de crescimento e
onde provinham os recursos e as determi- novas preocupações que se voltaram, prin-
nações referentes aos modelos intelectu- cipalmente, para a agricultura, a saúde
ais e institucionais, principalmente em pública e os recursos minerais.
São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Bahia. A mudança do foco da pesquisa, que
As atividades científicas não eram de acadêmica passou a ser mais aplicada,
valorizadas e nem recebiam investimen- favoreceu a criação de institutos de pes-
tos governamentais, o que se refletia nas quisa, como o Oswaldo Cruz. Entretanto,
ciências e na educação superior, principi- as transformações voltadas para uma for-
antes no Brasil. O século 17 marcou o iní- mação técnico-profissional que atendesse
cio da institucionalização da ciência eu- às necessidades da nascente industrializa-
ropéia, culminando com a síntese ção e ao crescimento da agricultura, ainda
newtoniana que estabeleceu um modelo não permitiriam um equacionamento
intelectual a ser seguido, um paradigma satisfatório do problema da implantação da
que permitiu distinguir com clareza o que ciência moderna no Brasil (Stepan, 1975;
devia ou não ser entendido como ciência Cavalcanti, 2004).
(Schwartzman, 1982). Inicialmente, os temas eram discu-
Os trabalhos dos naturalistas desta- tidos pelos cientistas de acordo com os
caram-se no século 18, descrevendo e de- princípios da ciência européia do século
senvolvendo sistemas de classificação de 19, resumindo-se à história natural
plantas, animais e fenômenos geológicos, taxonômica, à astronomia anterior à
quando, também, foram lançadas as ba- astrofísica, à medicina bacteriana, às
ses iniciais das teorias evolucionistas e geociências de tipo exploratório e descri-
Lavoisier deu inicio à química moderna. tivo, à química tradicional. O ensino não
Avançaram os estudos da matéria, da ele- era direcionado para abrir novas frontei-
tricidade, do magnetismo e dos fenôme- ras e para descobrimentos importantes
nos de calor e energia (Masetto, 2002). (Schwartzman, 1982). Apenas eram re-
Em Portugal, o jugo clerical da Con- passados os conhecimentos descobertos
tra-Reforma e da Inquisição isolava o País, no passado.
impedindo-o de acompanhar a evolução Todos os conhecimentos importantes
da ciência. Somente com a Reforma provinham de pesquisadores estrangeiros
Pombalina rompeu-se esse isolamento, que aqui se radicavam ou, em menor grau,
mas não de modo suficiente para se esta- de brasileiros formados no exterior. Tudo o
belecer o início de uma comunidade ci- que era relacionado com a ciência se firmou
entífica como ocorrera em outros países fora do sistema de educação superior, que
(Schwartzman, 1982). Essa situação cau- não tinha nem lugar para a pesquisa cien-
sou fortes repercussões no Brasil, colô- tífica. Somente em poucos lugares havia
nia portuguesa. desenvolvimento das ciências, como no
No período colonial não existia en- Observatório Nacional, no Instituto Agro-
sino superior no Brasil, salvo para as nômico e no Instituto de Manguinhos
carreiras eclesiásticas. Foi um período (Schwartzman, 1982).
marcado por faculdades isoladas que se Na virada do século 20, havia no Bra-
destinavam apenas à formação e à trans- sil apenas uma instituição diretamente
missão de conhecimento para alguns pertencente ao âmbito universitário, na
poucos privilegiados (Cavalcanti, 2004, p. qual se comprova a existência de espírito
227). Nessa época, a escola era extrema- científico e gosto pela experimentação. Tal
mente elitizada e sem foco no processo exceção, segundo Schwartzman (1982), era
de ensino-aprendizagem (Masetto, 2002). a Escola de Medicina da Bahia.
A instauração de uma universidade Na França, o sistema de educação su-
somente foi cogitada no período final des- perior foi reformado a partir do período
se ciclo, quando do término dos movimen- napoleônico. Foram estabelecidos dois ti-
tos que causaram a reforma da monarquia pos de instituições: de um lado, as écoles,
e, logo depois, o início do processo de in- escolas especializadas para formação de
dependência. Essa iniciativa partiu de José uma elite técnica e administrativa; de ou-
Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838), tro, as facultés, estabelecimentos de ensino

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006. 403
Renata Aparecida Belei
Sandra Regina Gimeniz-Paschoal
Edinalva Neves Nascimento
Ana Clara Bortoleto Nery

para formação de professores ou profissio- a fundação das universidades de São


nais liberais, sendo controladas e fiscaliza- Paulo (1934) e do Distrito Federal (1935).
das pelo poder central (Fernandes, 2002). Todos esses fatores impulsionaram a pro-
A estrutura rígida do sistema dução intelectual no País, sendo vista
napoleônico fez com que prevalecesse na como um foro privilegiado de transmis-
ciência um espírito conservador, tal como são e de produção de conhecimentos,
ocorreu em vários outros aspectos da vida bem como de ensino de ciência e de tra-
francesa. Sem dúvida, esse modelo inspi- balho científico.
rou a estrutura oficial de educação supe-
rior no Brasil, voltada para a profissio-
nalização, o que supervalorizou as ciên- Expansão do ensino
cias exatas e tecnológicas em detrimento superior
da filosofia, teologia e ciências humanas
(Masetto, 2002). Com a fundação dessas universidades
Nas primeiras escolas do Brasil, os cur- houve um incentivo ao desenvolvimento
rículos eram seriados, com programas fe- das humanidades e, a partir da década de
chados e disciplinas destinadas a formar 70, a expansão do ensino superior proces-
professores competentes em uma determi- sou-se de forma muito acelerada, fora dos
nada área ou especialidade. Já vigorava o grandes centros urbanos e com o predomí-
sistema de aprendizado no qual o docente nio da iniciativa privada que foi apoiada
deveria transmitir aquilo que sabia, para o por grandes empresários (Schwartzman,
aluno que nada conhecia. E o resultado da 1991). No período de 1962-1973, o núme-
aprendizagem era avaliado pelo mesmo ro de estudantes universitários pulou de
profissional, que dizia se o aluno estava 100 mil para 800 mil e os do ensino supe-
apto ou não para exercer determinada pro- rior privado passou de 40 mil para 500 mil
fissão. Em caso positivo, o aluno recebia (Silva Junior, Sguissardi, 2001).
um diploma que certificava sua competên- O ensino superior privado, segundo
cia profissional. Caso contrário, repetia o Silva Junior e Sguissardi (2001), expandiu-
curso (Masetto, 2002). se, organizou-se e tornou-se hegemônico
Na época, aprender era conseguir re- no nível administrativo, determinando
petir o que o professor tinha ensinado e, muitas das medidas políticas e de legis-
quando a avaliação revelava um fracasso lação educacional nas esferas do Execu-
nesse sentido, a culpa era totalmente do tivo e Legislativo. Por esta razão, esse
aluno. Jamais era questionado se o profes- ramo empresarial continua organizado e
sor era um bom profissional. Não existia sólido, tanto na economia como na polí-
discussão sobre sua formação e, conse- tica brasileira.
qüentemente, sobre o seu preparo para o Dados da Unesco demonstram que o
trabalho na docência. número de professores universitários, entre
Os cursos superiores procuravam pro- 1950 e 1992, saltou de 25 mil para 1 milhão,
fissionais que tinham sucesso em suas ati- ou seja, o aumento foi de 40 vezes. No en-
vidades profissionais, convidando-os a tanto, são quase todos professores improvi-
ensinarem seus alunos a serem tão bons sados, sem preparo para desenvolver a fun-
quanto eles. Praticamente se exigia o ba- ção de pesquisador e sem formação pedagó-
charelado e as competências profissionais, gica (Pimenta, Anastasiou, 2002).
pois “quem sabe, automaticamente, sabe Atualmente discute-se o processo de
ensinar” (Masetto, 2002, p. 11). ensino-aprendizagem nos cursos de ensi-
Foi somente a partir da metade da dé- no superior da área da saúde e destaca-se
cada de 20 que os membros das associa- a necessidade do retorno social, mas os
ções brasileiras de educação e de ciência docentes ainda não apresentam formação
começaram a debater as funções da uni- e recursos suficientes para atender à de-
versidade, inclusive em relação ao seu pa- manda de ensino, pesquisa e extensão.
pel na comunidade, apresentado na forma Segundo Cunha (1982), hoje existem
de projetos de extensão. sete vezes mais estudantes e instituições
Na década de 30 foram realizadas de ensino no País do que na década de 30.
mudanças importantes, impulsionadas Conseqüentemente, houve um crescimen-
pela reforma da Universidade do Rio de to do número de tarefas dos docentes, mas
Janeiro, elaboração do Estatuto das Uni- estes não apresentam mecanismos para
versidades Brasileiras (1933), assim como darem conta desta demanda.

404 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006.
Profissionalização dos professores universitários:
raízes históricas, problemas atuais

Cobra-se do processo de ensino-apren- Cunha (2002, p. 83) afirma que a vo-


dizagem que exista enfoque nas áreas do cação é um assunto bastante complexo e
conhecimento, do relacionamento afetivo- que parece ser mais influenciada pelo am-
emocional, das habilidades, das atitudes e biente social (e relações estabelecidas neste
dos valores. Entretanto, como cobrar tais meio) do que por características naturais.
particularidades de um educador que não Um ambiente bem preparado pode ajudar
teve formação para o ensino? Como cobrar na formação de um bom docente. Mas será
de um profissional que não foi preparado que as instituições propiciam um ambien-
para mediar o processo de aprendizagem? te adequado para a capacitação do docen-
Rossit e Zuliani (2004) relatam que o te? E, quando capacitado, há condições
sistema educacional brasileiro vem acu- para o desenvolvimento de uma prática de
mulando, ao longo de muitos anos, histó- ensino apropriada, amparada por conhe-
rias de fracasso no processo de ensino- cimento, discussão e reflexão?
aprendizagem. Culturalmente, esta derro- Nóvoa (1991) sugere que o aprendiza-
ta é delegada às características inatas do do dos professores deva ser realizado na
aluno e às condições do ambiente, mas prática cotidiana e coletivamente, de for-
muito se deve à maneira como os educa- ma a construir o elo entre ensino, pesqui-
dores atuam, aos métodos que escolhem, sa e extensão. Dessa forma, será construído
às atitudes que adotam no cotidiano de o ensino pelos próprios professores e na
trabalho e, também, à impossibilidade de perspectiva da produção de conhecimen-
utilização de métodos apropriados, capa- to, que será aplicado nestas duas verten-
zes de oferecer um ensino que promova tes, ou seja, pesquisa e extensão.
uma aprendizagem efetiva. Infelizmente não é esta a realidade
Coolahan (2002) afirma que na carreira brasileira. O preparo adequado dos docen-
do docente do ensino superior se interpõem tes ficou em segundo plano devido à gran-
inúmeros obstáculos, principalmente os de de demanda por esses profissionais e por
ordem didática e pedagógica, em virtude do interesses econômicos.
contexto mundial, no qual a educação ain-
da necessita de muito mais investimentos.
O curso superior é o único que não Avaliação da aprendizagem
requer uma formação específica para o no ensino superior
magistério. O ensino fundamental e o mé-
dio exigem formação superior em pedago- Para Pimenta e Anastasiou (2002), ge-
gia e/ou licenciatura; no entanto, para le- ralmente não se exige formação pedagógi-
cionar no curso superior basta ser gradua- ca na docência do ensino superior porque,
do em qualquer especialidade. As institui- aparentemente, é suficiente o domínio de
ções de ensino têm procurado mudanças, conhecimentos específicos, pois o que va-
fazendo concursos públicos nos quais se loriza o docente universitário é a pesquisa
exige mestrado e doutorado, mas ainda não e/ou o exercício profissional no campo.
oferecem preparação específica para o ma- Deste ponto de vista, todo professor auto-
gistério superior (Cunha, 1985, 2004). maticamente é aquele que ensina, isto é,
Não se exige formação pedagógica dispõe os conhecimentos aos alunos.
para ingressar na carreira docente, mas a Na maioria das instituições de ensino
maioria dos trabalhos que questionam o superior, os profissionais são experientes,
processo de ensino-aprendizagem é de titulados em diversas áreas, desenvolvem
docentes universitários. Exige-se experi- pesquisas em áreas específicas, mas são
ência em docência, mas esta é avaliada totalmente despreparados para o ensino.
usualmente pelo tempo já dedicado à fun- Muitos não têm conhecimento científico
ção, ou seja, uma análise quantitativa e do que seja e do que precisa o processo de
superficial. ensino-aprendizagem (Wahrhaftig,
Pede-se também graduação na área Ferrazza, Raupp, 2001).
específica e titulação de especialista, mes- E essa situação é um problema do
tre ou doutor, subentendendo-se que quem professor e/ou das instituições de ensino
é formado sabe formar novos profissionais. e governamentais. Deve-se lembrar que,
Isto nos remete ao pensamento marcante como não há formação específica para
de anos atrás, quando se acreditava que professor universitário, a busca é indivi-
para ser um bom professor bastaria existir dual, mediante cursos, congressos, pós-
a vocação (Fernandes, 2002). graduação, etc. Entretanto, o incentivo

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Renata Aparecida Belei
Sandra Regina Gimeniz-Paschoal
Edinalva Neves Nascimento
Ana Clara Bortoleto Nery

(incluindo oferecimento de condições Anastasiou, 2002). Essa estratégia do go-


reais para o docente operacionalizar suas verno pode até ser uma forma de
ações voltadas para o processo de ensi- mensuração, mas, para o docente, esse
no-aprendizagem, bem como a cobrança tipo de resultado não lhe agrega valor,
e a valorização do docente) deve partir pois não serve de critério para, por exem-
também da instituição à qual ele está vin- plo, conceder um financiamento para
culado, assim como dos órgãos federais, ações/pesquisas relativas ao ensino.
como o Ministério da Educação (MEC), a A Lei nº 9.394/96 não concebe a
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pes- docência como um processo de forma-
soal de Nível Superior (Capes) e o Con- ção, mas sim como preparação titulada
selho Nacional de Desenvolvimento Ci- para o exercício do magistério superior,
entífico e Tecnológico (CNPq). que será realizada prioritariamente (não
Ressaltam Pimenta e Anastasiou exclusivamente) em pós-graduação
(2002, p. 39) que: stricto sensu. Por outro lado, há um au-
mento na oferta de lato sensu ou de dis-
[...] as necessidades atuais apontam para ciplinas de Metodologia do Ensino Su-
uma formação mais voltada para um cam- perior ou Didática do Ensino Superior
po específico e pedagógico para o docen- para auxiliar na formação docente. Po-
te de curso superior, preparando-o para rém, ainda que tais disciplinas pudes-
participar de processos curriculares, ad- sem ajudar na resolução do problema,
ministrativos, gerenciais, políticos, finan- elas não são uma exigência da legisla-
ceiros, etc. ção (Pimenta, Anastasiou, 2002, p. 41).
Para Ramos-Cerqueira e Lima (2002),
Sabe-se que o grau de qualificação é o profissional que ingressa na carreira do-
um fato-chave no fomento da qualidade em cente encontra um caminho difícil. Ele de-
qualquer profissão – especialmente na edu- para-se com departamentos estruturados há
cação que experimenta constante mudan- muitos anos, com disciplinas já organiza-
ça. Entretanto, para Silva Junior e das, métodos estabelecidos, rotinas implan-
Sguissardi (2001), deve-se dar preferência tadas e é colocado nas engrenagens de um
à formação específica para o processo edu- processo de trabalho já existente. É comum
cacional, em primeiro plano. o docente iniciar sua carreira sem o rece-
De acordo com Pimenta e Anastasiou bimento de orientação quanto a proces-
(2002), a legislação contempla esses as- sos de planejamento e métodos de ensi-
pectos falhos no ensino superior, apon- no ou de avaliação, orientação essa que
tando caminhos que amenizam estes pro- lhe permitiria refletir sobre a própria
blemas. A Lei de Diretrizes e Bases da práxis. Ele necessita atuar em sua disci-
Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) e o plina, em seu departamento, o que o man-
Decreto n° 2.207/97, que regulamenta o tém isolado dos demais professores e,
Sistema Federal de Ensino, exigem pre- muitas vezes, distante da prática. Porém,
paração pedagógica para o exercício da precisa demonstrar que detém todo o co-
docência no ensino superior. Detalhando, nhecimento, transmitindo-o aos estudan-
estabelecem que, no segundo ano de vi- tes, como no modelo jesuítico, no qual os
gência, a instituição de ensino deve con- padres representavam o total poder no
tar com 15% dos docentes com titulação setor educacional.
stricto sensu, dos quais 5% devem ser dou- Neste âmbito, acabam sendo realiza-
tores; no quinto ano os valores se modifi- das experiências como a construção cole-
cam para 25%, dos quais 10% seriam dou- tiva de projetos pedagógicos institucionais
tores; e, no oitavo ano, essa proporção pas- e de revisões metodológicas na direção de
sa para 1/3, dos quais 15% seriam douto- um processo dialético de construção do co-
res. Entretanto, estes aspectos exigidos nhecimento, que se evidencia em ativida-
pela LDB garantem formação específica des de ensino com pesquisa, ensino por
para o processo educacional? projetos, etc. Nessa realidade, os profes-
Atualmente, a Lei nº 9.394/96 esta- sores e alunos assumem o papel de con-
belece que a docência no ensino superi- dutores do processo de fazer da universi-
or será preparada nos programas de pós- dade um espaço de construção de cidada-
graduação stricto sensu, mas a competên- nia, de resolução das questões sociais, de
cia docente é mensurada pelos resulta- formação profissional qualificada e atua-
dos dos alunos na avaliação (Pimenta, lizada (Galasso, 2002).

406 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006.
Profissionalização dos professores universitários:
raízes históricas, problemas atuais

As raízes históricas dos problemas que atuam em cursos não pertencentes à


atuais estão sendo superadas em algumas área da educação.
instituições brasileiras. Entretanto, inici- É importante destacar também as res-
ativas como mudança curricular, adoção ponsabilidades dos profissionais atuantes
de metodologias de ensino-aprendizagem em órgãos governamentais municipais,
baseadas em problematização, integração estaduais e federais. Esses profissionais
de conteúdos e de docentes, inclusão do deveriam exercer ativamente o papel de
aluno na seleção de conteúdos e na busca incentivadores de mudanças, elaborando
de conhecimentos, descentralização do en- leis específicas, priorizando recursos para
sino, preparo didático-pedagógico dos do- a capacitação e para incentivar a produ-
centes, discussões interdisciplinares de ção, destinando recursos à educação su-
formas de avaliação docente/aluno, den- perior. Mesmo o papel dos reitores de uni-
tre outras, são reduzidas e localizadas e versidade deveria ser ampliado, especial-
não chegam a mudar o quadro geral que mente no caso das públicas, sendo per-
este estudo tenta mostrar, mas servem mitida uma atuação mais decisiva junto
como exemplos de caminhos promissores ao Legislativo. Dessa forma, o peso de su-
para a superação das marcas históricas. perar os equívocos da história no contex-
Os docentes devem rever sua forma to atual do ensino superior não recairia
de organização pedagógica, realizada ge- apenas sobre o docente.
ralmente de forma isolada, sem vínculos
com outros profissionais ou com diferen-
tes instituições e áreas, sem apoio peda- Conclusão
gógico que auxilie sua práxis. Oficinas
didático-pedagógicas podem ajudar na A situação escolar brasileira e os pro-
melhoria da prática docente, mas esforços blemas que a agravam têm seus alicerces
individuais e coletivos nessa busca devem nas instituições de ensino superior, onde
ser incentivados. se formam os docentes, os planejadores e
São necessárias articulações entre os os administradores do sistema. Se não exis-
docentes para modificar normas e roti- tir uma capacitação específica, além do
nas relacionadas com a seleção de pro- diploma de bacharel e dos cursos de
fissionais da educação, sua avaliação mestrado e doutorado, os docentes conti-
profissional e promoção. Por que vincu- nuarão formando outros profissionais (e
lar a ascensão apenas à titulação e ao docentes) da mesma forma como foram
tempo de serviço? Por que não conceder ensinados.
aumento salarial ou de status com base O ensino na universidade constitui um
na elaboração ou implantação de metas/ processo de busca, de construção científi-
ações voltadas para a melhoria de práti- ca e de crítica do conhecimento produzi-
cas pedagógicas que auxiliem o proces- do, inclusive de análise crítica do desem-
so de ensino e aprendizagem? penho desse conhecimento na construção
Os profissionais do ensino superior da sociedade. Por isso, as falhas na forma-
devem possuir conhecimentos dos aspec- ção de professores para o ensino superior
tos psicológicos relacionados com a for- devem ser consideradas como um proble-
mação, devendo preocupar-se não apenas ma que necessita de profunda reflexão e
com questões curriculares e pedagógicas, de iniciativas para a mudança.
mas também com o modelo de relação pro- Todas as instituições de ensino supe-
fessor-aluno, com aspectos psicológicos do rior devem preocupar-se com a qualidade
comportamento de aprender (Gaillard, dos resultados do seu ensino, que repro-
Krishna, Waast, 1997; OECD, 2000; Ra- duzirá a importância da preparação políti-
mos-Cerqueira, Lima, 2002). ca, científica e pedagógica de seus docen-
Os docentes do ensino superior pre- tes e se traduzirá numa preparação mais
cisam tomar consciência da responsabi- condizente com as necessidades atuais dos
lidade pela formação de futuros profissio- discentes/futuros profissionais, em especi-
nais, atuando ativamente por mudanças, al dos futuros docentes que irão se tornar
cobrando das instituições de ensino o in- os que planejam e administram o próprio
centivo para participarem de cursos espe- sistema educacional.
cíficos da área de educação, mantendo re- Educadores e estudiosos que estive-
lações contínuas com temas pedagógicos rem em qualquer posto, desde o da sua
e educacionais, principalmente para os própria sala de aula ou no contexto de

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Sandra Regina Gimeniz-Paschoal
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ensino a distância, num colegiado da ins- Todo o contexto histórico da forma-


tituição acadêmica, num posto do gover- ção da comunidade científica brasileira
no municipal, estadual ou federal, num pode também mostrar seus reflexos na
cargo legislativo, etc., devem promover atuação profissional dos professores uni-
discussões e potencializar mudanças no versitários, ainda com carências didáti-
processo de trabalho dos docentes e na cas e metodológicas em seu trabalho. É
formação dos discentes do ensino supe- importante que os educadores do ensi-
rior, com vista a incluir a abordagem de no superior procurem compreender esta
elementos relevantes para o processo relação e ousem operacionalizar mudan-
educacional, para se construir uma pe- ças, unindo esforços para buscar solu-
dagogia diferenciada que valorize todos ções para problemas atuais encontrados
os protagonistas do processo, que privi- na maioria das instituições do País, que
legie a formação do cidadão e a constru- podem ser fruto da história da formação
ção de competências. de professores no Brasil.

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Renata Aparecida Belei, doutoranda em Educação pela Universidade Estadual


Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp/Campus de Marília-SP).
rabelei@yahoo.com.br;ccihhurnp@uel.br.

Sandra Regina Gimeniz-Paschoal, doutora em Psicologia pela Universidade de São


Paulo (USP), é docente do curso de Fonoaudiologia e do Programa de Pós-Graduação

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006. 409
Renata Aparecida Belei
Sandra Regina Gimeniz-Paschoal
Edinalva Neves Nascimento
Ana Clara Bortoleto Nery

em Educação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp/


Campus de Marília-SP)
sandragp@marilia.unesp.br

Edinalva Neves Nascimento, doutoranda em Educação pela Universidade Estadu-


al Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp/Campus de Marília-SP).
ediquata@flash.tv.br; edinalva@marilia.unesp.br

Ana Clara Bortoleto Nery, doutora em Educação pela Faculdade de Educação da


Universidade de São Paulo (Feusp), é docente do curso de Pedagogia e do Programa de
Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Fi-
lho” (Unesp/Campus de Marília-SP).
anacnery@marilia.unesp.br.

Recebido em 30 de janeiro de 2006.


Aprovado em 17 de novembro de 2006.

410 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006.
CIBEC

Teses e dissertações
recebidas

São divulgadas as referências bibliográficas das teses recebidas pelo Cibec no período
anterior ao lançamento do número subseqüente da RBEP. Todo o acervo das teses
indexadas poderá ser acessado diretamente no Cibec ou via Internet.

Avalia o Programa de Desenvolvimento de


ALVES, Maria Teresa Gonzaga. Efeito- Habilidades Sociais, estruturado para
escola e fatores associados ao progresso orientar alunos com problemas
acadêmico dos alunos entre o início da 5ª disciplinares. Seguindo o modelo proposto
série e o fim da 6ª série do ensino pela biblioterapia do desenvolvimento,
fundamental: um estudo longitudinal em utilizou textos, cenas de filmes e imagens
escolas públicas no município de Belo para apresentar informações que
Horizonte – MG. 2006. 189 f. Tese enfatizem a necessidade de revisão e
(Doutorado em Educação) – Faculdade de aprimoramento de habilidades nas esferas
Educação, Universidade Federal de Minas cognitiva, pessoal e social.
Gerais, Belo Horizonte, 2006.

Orientador: José Francisco Soares


BEIRA, Cristiane Maria Lenzi. Pais na
Tem por objetivo medir o efeito-escola creche: o que se ensina e o que se aprende.
de sete estabelecimentos públicos de 2006. 130 f. Dissertação (Mestrado em
ensino localizados na mesma região da Psicologia Escolar) – Centro de Ciências
cidade de Belo Horizonte, que tem o da Vida, Pontifícia Universidade Católica
perfil socioeconômico relativamente de Campinas, Campinas, 2006.
homogêneo. Este estudo tem contribuições
metodológicas importantes para a inves- Orientadora: Josiane M. de Freitas
tigação do efeito-escola em perspectiva Tonelloto
logitudinal e para as pesquisas que fazem
integração entre metodologias quanti- Avaliação de um programa de participação
tativas e qualitativas. de mães e pais em uma instituição
educacional em benefício do desenvol-
vimento da criança, possibilitando a
obtenção de efeitos positivos para a relação
BACHERT, Cristina Maria D’Antona. desenvolvimento-aprendizagem, caso
Estratégias de biblioterapia de viabilizasse a participação e colaboração da
desenvolvimento aplicadas na orientação família na rotina das crianças na creche,
de problemas de disciplina. 2006. 181 f. bem como no acompanhamento das
Dissertação (Mestrado em Psicologia) – atividades desenvolvidas.
Programa de Pós-Graduação na área de
Psicologia, Pontifícia Universidade
Católica de Campinas, Campinas, 2006.
BELEZE, Bruna Carolina Mendes.
Orientadora: Maria Helena Mourão Alves Distanciamentos e aproximações entre a
de Oliveira pesquisa e a prática sobre formação

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 411-415, set./dez. 2006. 411
Teses e dissertações recebidas

continuada de professores de matemática.


2006. 75 f. Dissertação (Mestrado em CORRER, Adilson Roberto. A filosofia na
Educação) – Programa de Pós-Graduação Ratio Studiorum. 2006. 91 f. Dissertação
em Educação, Universidade Metodista de (Mestrado em Educação) – Programa de
Piracicaba, Piracicaba, 2006. Pós- Graduação em Educação, Uni-
versidade Metodista de Piracicaba,
Orientadora: Roseli Pacheco Schnetzler Piracicaba, 2006.
Aborda a formação continuada de Orientador: José Maria de Paiva
professores de matemática ao investigar
distanciamentos e aproximações entre o Consiste numa pesquisa da disciplina
que tem sido proposto pela pesquisa na Filosofia no plano pedagógico da
área da educação matemática e opiniões Companhia de Jesus, a Ratio Studiorum,
de professores sobre programas de ensinada no início da formação
formação continuada. educacional da cultura colonial brasileira,
bem como em todo contexto do século 16,
e com traços de influências ainda na
atualidade.
CARDINALLI, Cristiane C. B. Uma análise
da configuração subjetiva do aluno com
dificuldade de aprendizagem. 2006.
Dissertação (Mestrado em Psicologia DAROS, Sônia Cristina Pavanelli.
Escolar) – Centro de Ciências da Vida, Oralidade: uma perspectiva de ensino.
Pontifícia Universidade Católica de 2006. 60 f. Tese (Doutorado em Educação)
Campinas, Campinas, 2006. – Programa de Pós-Graduação em
Educação, Universidade Metodista de
Orientador: Fernando Luís González Rey Piracicaba, Piracicaba, 2006.
Analisa a influência de aspectos subjetivos Orientadora: Maria Cecília Rafael Góes
no processo de ensino-aprendizagem de
crianças que apresentam dificuldades em Estuda a viabilidade dos estudos de
conteúdos escolares. Considerando que a oralidade em aulas de língua materna,
aprendizagem escolar não envolve apenas sobretudo porque essa inclusão possibilita
estruturas cognitivas, mas também é a observação da língua em pleno
influenciada pelos aspectos afetivos, é funcionamento, sendo indispensável a
importante estudar os elementos subjetivos capacitação dos professores para o
que atuam nesse processo visando uma tratamento dessa matéria, tanto dos
educação mais comprometida com a licenciados, através de cursos de formação
formação do indivíduo. continuada, quanto daqueles que tiveram
a incorporação dessa área de estudos nos
seus cursos de formação inicial.

COMASSETTO, Ademar Valdir. Proposta


de um plano de ações para a superação
docente dos professores da disciplina DESUÓ, Naê Prada Rodrigues. Novas
educação física do Cefetes. 2006. 133 f. tecnologias em tempos de capitalismo
Dissertação (Mestrado em Educação) – global: da atualidade da crítica de T. W.
Programa de Pós-Graduação, Universidade Adorno à técnica. 2006. 136 f.
Metodista de Piracicaba, Piracicaba, 2006. Dissertação (Mestrado em Educação) –
Programa de Pós- Graduação em
Orientador: Ademir Gebara Educação, Universidade Metodista de
O estudo apresenta à Coordenadoria de Piracicaba, 2006.
Educação Física do Centro Federal de Orientador: Bruno Pucci
Educação Tecnológica do Espírito Santo
um plano de ações, com base nas opiniões Direciona-se para a compreensão do que
dos professores de Educação Física, como Theodor W. Adorno, pensador alemão da
subsídio para que o corpo docente dessa Teoria Crítica da Sociedade, da Escola de
coordenadoria elabore um programa de Frankfurt, entende por técnica, do seu
formação continuada. posicionamento ante ela, bem como para

412 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 411-415, set./dez. 2006.
Teses e dissertações recebidas

a investigação sobre em que medida sua Orientador: Júlio Romero Ferreira


crítica à técnica permanece atual, tendo
em vista as manifestações da tecnologia Investiga a inclusão social do deficiente
nos dias de hoje. Investiga até que ponto visual em Sorocaba, São Paulo, tendo
o diagnóstico adorniano em relação como princípios norteadores que, na
à técnica se mostra pertinente no inclusão social, o acesso ao mundo do
questionamento das novas tecnologias. trabalho é importante e a educação
é fundamental nessa conquista. Pauta-
dos nesses princípios, foi feito um
levantamento de dados estatísticos
FERREIRA, Marcela Casacio. Encontrando referentes às matrículas dos alunos
a criança adotiva: um passeio pelo incluídos nas classes regulares e dos
imaginário coletivo de professores à luz alunos matriculados na educação
da psicanálise. 2006. 288 f. Tese especial nas redes pública e privada de
(Doutorado em Psicologia) – Pontifícia ensino.
Universidade Católica de Campinas,
Campinas 2006.

Orientadora: Tânia Maria José Aiello- GANDINI JÚNIOR, Antonio. Aponta-


Vaisberg mentos sobre as políticas públicas
dirigidas à infância e à adolescência no
A presente pesquisa insere-se num
conjunto de pesquisas psicanalíticas sobre Estado de São Paulo. 2006. 185 f.
o imaginário social, focalizando a Dissertação (Mestrado em Educação) –
problemática da adoção. Faculdade de Ciências Humanas,
Universidade Metodista de Piracicaba,
Piracicaba, 2006.

FONSECA, Alice Barros. Um olhar sobre Orientador: Cleiton de Oliveira


a atuação do diretor de escola da rede Examina o sistema de atendimento do
estadual paulista a partir de sua adolescente infrator no Estado de São
percepção: o caso da Diretoria Regional d Paulo, analisando a história das políticas
Ensino de Piracicaba – SP. 2006. 146 f. públicas desenvolvidas, a legislação
Dissertação (Mestrado em Educação) – vigente de cada período e as propostas
Programa de Pós-Graduação em Educação,
governamentais adotadas. Os proce-
Universidade Metodista de Piracicaba,
dimentos metodológicos utilizados
Piracicaba, 2006.
foram a revisão bibliográfica, a análise
Orientador: Cleiton de Oliveira documental e o levantamento de dados
oficiais sobre a situação do atendimento
Enfoca alguns aspectos relacionados ao prestado ao adolescente infrator.
dia-a-dia do administrador escolar sob sua
própria ótica, abordando os problemas e/
ou dificuldades e as possibilidades
existentes no desempenho de sua função. GOUVEIA, Juliana Amazonas. Stress em
O objeto de estudo é diretor de escola de escolares: percepção do professor e
ensino fundamental e médio da rede diferenças entre os gêneros. 2006. 76 f.
pública de ensino do Estado de São Paulo Dissertação (Mestrado em Psicologia) –
que atua na Diretoria Regional de Ensino Centro de Ciências da Vida, Pontifícia
de Piracicaba. Universidade Católica de Campinas,
Campinas, 2006.

Orientadora: Marilda Emmanuel de


FREITAS, Vilma da Conceição Gavarrão Novaes Lipp
de. A inclusão social do deficiente visual
em Sorocaba. 2006. 141 f. Dissertação Investiga se há diferenças entre o nível de
(Mestrado em Educação) – Programa de stress e a sintomatologia de meninos e
Pós-Graduação em Educação, Uni- meninas em idade escolar e se o professor
versidade Metodista de Piracicaba, é capaz de perceber sinais de stress
Piracicaba, 2006. presentes em seus alunos.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 411-415, set./dez. 2006. 413
Teses e dissertações recebidas

A gastronomia como curso superior é uma


JORGE, Thelma Cerqueira. Avaliação do área nova, ainda em expansão, e, por isso,
processamento auditivo em pré-escolares. há falta de professores titulados,
2006. 91 f. Dissertação (Mestrado em especialmente para as disciplinas
Psicologia Escolar) – Centro de Ciências práticas, que ensinem as técnicas
da Vida, Pontifícia Universidade Católica culinárias nos laboratórios de cozinha.
de Campinas, Campinas, 2006. Esse estudo tem por objetivo conhecer que
saberes os professores de prática sem
Orientadora: Josiane Maria de Freitas formação específica para docência
Tonelotto mobilizam para ensinar. A investigação
acontece no curso superior de tecnologia
A avaliação do processamento auditivo em gastronomia do Senac de Águas de São
é um ganho no diagnóstico dos distúrbios Pedro, interior de São Paulo.
da comunicação humana e na identificação
de crianças de risco para distúrbios de
aprendizagem. Os indivíduos com
desordem do processamento auditivo
tendem a apresentar manifestações MONTANHINI, Wagner. Educação e
comportamentais características, ocorrendo cultura: a aprendizagem de ser vila de São
de forma isolada ou associada, quanto à Paulo do Campo (1563-1655). 2006. 229 f.
comunicação oral e escrita, ao Tese (Doutorado em Educação) – Programa
comportamento social, ao desempenho de Pós-Graduação em Educação,
escolar e à audição. Universidade Metodista de Piracicaba,
Piracicaba, 2006.

Orientador: José Maria de Paiva


É um estudo voltado para a história da
JUSEVICIUS, Vanessa Cristina Cabrelon. formação da então Vila de São Paulo do
Subjetividade em sala de aula: a relação
Campo e que tem como questão principal
professor-aluno no ensino superior. 2006.
a formação de uma cultura, atento às
127 f. Tese (Doutorado em Psicologia) –
qualidades de cada ator social, às suas
Centro de Ciências da Vida, Pontifícia
relações e comportamentos num contexto
Universidade Católica de Campinas, histórico único, observando a formação de
Campinas, 2006. redes de significados e de estruturas
Orientador: Fernando Luis González Rey sociais, bem como a transferência de
saber-ser de uma geração a outra.
Investiga a subjetividade presente em sala
de aula do ensino superior, a partir de uma
análise da relação professor-aluno, e as
implicações decorrentes para o processo OLIVEIRA, Lilian Sarat de. Martha Watts:
de construção do conhecimento. Encontra- um olhar sobre o Brasil. 2006. 74 f.
se fundamentada nos princípios da Dissertação (Mestrado em Educação) –
epistemologia qualitativa e nos Programa de Pós-Graduação em Educação,
referenciais teóricos da subjetividade e da Universidade Metodista de Piracicaba,
psicologia histórico-cultural. Piracicaba, 2006.

Orientador: Ademir Gebara


Analisa, mediante o conceito de
MIYAZAKI, Márcia Harumi. Ensinando e representação, a imagem do nosso país
aprendendo gastronomia: percursos de construída por essa estrangeira, através de
formação de professores. 2006. 114 f. suas missivas, que nos trazem
Dissertação (Mestrado em Educação) – informações de temas variados, como
Programa de Pós-Graduação em Educação, religião, costumes, educação, escravidão,
Universidade Metodista de Piracicaba, mulheres e, também, sobre a cidade de
Piracicaba, 2006. Piracicaba, lugar escolhido pela Igreja
Metodista do sul dos Estados Unidos para
Orientadora: Sueli Mazzilli a abertura do Colégio Metodista

414 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 411-415, set./dez. 2006.
Teses e dissertações recebidas

conhecido até os nossos ias como posicionar criticamente em relação à


Piracicabano, embrião da Universidade realidade que o cerca.
Metodista de Piracicaba.

SIMONI, Rosa Franca Leone. Memórias em


movimento: a compreensão de ir sendo
PESTANA, Maria Inês Gomes de Sá. A professora nos múltiplos fios da narrativa.
Polissemia da noção de competência: uma 2006. 120 f. Tese (Doutorado em Educação)
análise do conteúdo do discurso do setor
– Programa de Pós-Graduação em
público sobre gestão, avaliação e
Educação, Universidade Metodista de
certificação de competências. 2006. 139
Piracicaba, Piracicaba, 2006.
f. Dissertação (Mestrado em Educação) –
Programa de Pós-Graduação em Educação, Orientadora: Maria Cecília Carareto
Pontifícia Universidade Católica de São Ferreira
Paulo, São Paulo, 2006.
Esta pesquisa adotou como metodologia a
Orientadora: Clarilza Prado de Sousa história de vida de quatro professoras, com
idades entre 34 e 60 anos, que trabalham
Propõe-se desvelar sentidos, expectativas, em uma escola da rede particular da cidade
imagens e atitudes associada à noção de de São Carlos. Compreende, mediante o
competência, no âmbito das relações entre
estudo das memórias das professoras
educação e trabalho. O estudo demonstra
participantes da pesquisa, como cada uma
que, ao associar competência, emprega-
se vê sendo professora, como se relaciona
bilidade e profissionalismo, o discurso
com o mundo objetivo, que vozes matizam
subordina a educação e conceitos seus textos, com que dialoga, enfim, como
oriundos da psicologia educacional às cada uma assume ser professora.
demandas socioeconômicas dos novos
modelos de articulação produtiva, além
de compreender o sujeito de uma forma
idealizada e não situada.
VARGAS, Moema Crisóstomo Guimarães.
Significações e sentidos produzidos sobre
o lugar da direção no processo de formação
REIS, Edna dos. Produção de textos no docente na escola. 2006. 107 f. Dissertação
Cefet – ES: uma estratégia pedagógica. (Mestrado em Educação) – Programa de
2006. 100 f. Dissertação (Mestrado em Pós-Graduação em Educação, Universidade
Educação) – Programa de Pós-Graduação, Metodista de Piracicaba, Piracicaba, 2006.
Universidade Metodista de Piracicaba,
Piracicaba, 2006. Orientadora: Maria Nazaré da Cruz

Orientadora: Anna Maria Lunardi Padilha Relato de uma experiência escolar de


formação de professores vivida em prática
Trata-se de uma estratégia pedagógica que de diretoria de escola. O objetivo é
privilegia o atendimento individualizado entender como se dá as interlocuções entre
do aluno e a formação de leitores e autores professor/professor, professor/coordenador
de textos significativos e pessoais. e professor/diretoria, em que condições
D á ê n f a s e a o t exto como cerne do elas são produzidas e como a situação
trabalho pedagógico, pois, dessa forma, social determina as mais diversas
o aluno passa a ter condições de se expressões manifestas.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 411-415, set./dez. 2006. 415
Índice do
RBEP volume 87

Este índice refere-se às matérias do volume 87 (números 215, 216 e 217) da Revista
Brasileira de Estudos Pedagógicos. Divide-se em três partes, de acordo como os diferentes
pontos de acesso: Assuntos, Autores e Títulos.

Quanto ao Índice de Assuntos:


• os termos usados para indexação são extraídos do Thesaurus Brasileiro de
Educação (Brased);
• cada palavra dos termos compostos abre uma entrada, por exemplo:
Avaliação do ensino superior
ensino superior, Avaliação do
superior, Avaliação do ensino

Quanto ao Índice de Autores:


• arrolados pelo último sobrenome;
• um traço é usado para substituir o nome quando há mais de uma entrada para o
mesmo autor.

Quanto ao Índice de Títulos:


• os artigos que iniciam o título não são considerados;
• o título vem destacado em negrito;
• o subtítulo não tem destaque, vem impresso em claro.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 417
Índice de assuntos

(Brased), Thesaurus Brasileiro da questões socioculturais e pedagógicas.


Educação RBEP, v. 87, n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006.
LO MONACO, Gaetano. O Thesaurus Seção: Estudos.
Brasileiro da Educação. RBEP, v. 87, n.
215, p. 81-86, jan./abr. 2006. Seção: Cibec. Aspectos socioculturais
MACEDO, Maria do Socorro Alencar
ação, Lucro de Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury. Perfil
PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE, de professores do primeiro ciclo: questões
Maria da Conceição Lima de. Lucro de socioculturais e pedagógicas. RBEP, v. 87,
ação: um exame das condições de n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006. Seção:
possibilidades de magistério oficial. RBEP, Estudos.
v. 87, n. 215, p. 9-18, jan./abr. 2006. Seção:
Estudos. Brasil
ABREU, Jayme. Uma política para a
adulta, Idade pesquisa educacional no Brasil. RBEP, v.
RAPOSO, Denise Maria dos Santos 87, n. 215, p. 77-80, jan./abr. 2006. Seção:
Paulinelli. A qualidade de vida de Segunda Edição.
estudantes que ingressam na universidade
na meia-idade. RBEP, v. 87, n. 217, p. 370- Brasileiro da Educação (Brased),
381, set./dez. 2006. Seção: Estudos. Thesaurus
LO MONACO, Gaetano. O Thesaurus
Aids/HIV Brasileiro da Educação. RBEP, v. 87, n. 215,
BELLINI, Marta; FRANSSON, Priscila p. 81-86, jan./abr. 2006. Seção: Cibec.
Caroza. A metáfora guerra na
comunicação das idéias de HIV/Aids em campo, Educação do
livros didáticos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 327- HAGE, Salomão Mufarrej. Movimentos
338, set./dez. 2006. Seção: Estudos. sociais do campo e a afirmação do direito
à educação: pautando o debate sobre as
Aluno da escola pública escolas multisseriadas na Amazônia
MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da Paraense. RBEP, v. 87, n. 217, p. 302-312,
escola pública": o que dizem as set./dez. 2006. Seção: Estudos.
professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349-
359, set./dez. 2006. Seção: Estudos. Carisma
PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE,
Argumentação de Arthur Ramos Maria da Conceição Lima de. Lucro de
SIRCILLI, Fabíola. A argumentação de ação: um exame das condições de
Arthur Ramos a favor da psicanálise na possibilidades de magistério oficial. RBEP,
educação. RBEP, v. 87, n. 216, p. 270-271, v. 87, n. 215, p. 9-18, jan./abr. 2006. Seção:
maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa. Estudos.

Arthur Ramos, Argumentação de Carreira do magistério


SIRCILLI, Fabíola. A argumentação de VALLE, Ione Ribeiro. Carreira do
Arthur Ramos a favor da psicanálise na magistério: uma escolha profissional
educação. RBEP, v. 87, n. 216, p. 270-271, deliberada? RBEP, v. 87, n. 216, p. 178-187,
maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa. maio/ago. 2006. Seção: Estudos.

Aspectos pedagógicos ciclo, Primeiro


MACEDO, Maria do Socorro Alencar MACEDO, Maria do Socorro Alencar Nunes;
Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury. MORTIMER, Eduardo Fleury. Perfil de
Perfil de professores do primeiro ciclo: professores do primeiro ciclo: questões
R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 419
Índice de assuntos

socioculturais e pedagógicas. RBEP, v. 87, n. alternativa viável para a gestão escolar?


215, p. 29-43, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p.
313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
cidadania, Formação da
GONÇALVES, Maria Augusta Salin; Corpo docente
PIOVESAN, Orene Maria. Processo de VALLE, Ione Ribeiro. Carreira do
construção de normas na escola e magistério: uma escolha profissional
formação para a cidadania. RBEP, v. 87, n. deliberada? RBEP, v. 87, n. 216, p. 178-
216, p. 210-219, maio/ago. 2006. Seção: 187, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
Estudos.
Cultura de massa
Ciências humanas D'ANGELO, Martha. Filosofia e Educação
RIBEIRO, Ormezinda Maria. E se Narciso em Walter Benjamim. RBEP, v. 87, n. 215,
conhecesse Alice? Conjeturas a respeito de p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.
um tema da educação. RBEP, v. 87, n. 215,
p. 44-52, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. cultura, Natureza humana e
ANDRADE, Erica Natacha Fernandes de.
Comunidade Natureza humana e cultura: um estudo
REIS, Edmerson dos Santos; BARROS, sobre as concepções psicológicas de John
Edonilce da Rocha. A experiência de uma Dewey. RBEP, v. 87, n. 216, p. 267-269,
escola rural no contexto do projeto de maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa.
desenvolvimento local de Massaroca,
semi-árido baiano. RBEP, v. 87, n. 216, p. Custos educacionais
236-248, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES,
Candido Alberto. Cooperativismo:
Concepções psicológicas de John Dewey alternativa viável para a gestão escolar?
ANDRADE, Erica Natacha Fernandes de. Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p.
Natureza humana e cultura: um estudo 313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
sobre as concepções psicológicas de John
Dewey. RBEP, v. 87, n. 216, p. 267-269, Dádiva
maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa. PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE,
Maria da Conceição Lima de. Lucro de
Condições de trabalho ação: um exame das condições de
PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE, possibilidades de magistério oficial. RBEP,
Maria da Conceição Lima de. Lucro de v. 87, n. 215, p. 9-18, jan./abr. 2006. Seção:
ação: um exame das condições de Estudos.
possibilidades de magistério oficial. RBEP,
v. 87, n. 215, p. 9-18, jan./abr. 2006. Seção: Definição piagetiana de número
Estudos. NOGUEIRA, Clélia Maria Ignatius. A
definição de número: uma hipótese sobre
Construção de normas a hipótese de Piaget. RBEP, v. 87, n. 216,
GONÇALVES, Maria Augusta Salin; p. 135-144, maio/ago. 2006. Seção:
PIOVESAN, Orene Maria. Processo de Estudos.
construção de normas na escola e formação
para a cidadania. RBEP, v. 87, n. 216, p. 210- Delegação de poder
219, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. MAURÍCIO, Lúcia Velloso. Represen-
tações de professores sobre cotidiano
continuada, Formação escolar. RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209,
CANEN Ana; SANTOS, Angela Rocha dos. maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
Construção e reconstrução multicultural
de identidades docentes: pensando na democrática, Educação
formação continuada de coordenadores MOGILKA, Maurício. A formação humana
pedagógicos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 339- no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87,
348, set./dez. 2006. Seção: Estudos. n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção:
Estudos.
Cooperativismo educacional
ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES, SILVA, Cecília Maria Siqueira. A
Candido Alberto. Cooperativismo: dimensão estética e democrática da

420 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006.
Índice de assuntos

experiência: uma contribuição da filosofia das idéias de HIV/Aids em livros didáticos.


deweyana para novas propostas RBEP, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez.
educacionais. RBEP, v. 87, n. 217, p. 360- 2006. Seção: Estudos.
369, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
distância, Educação a
Democratização da escola BATISTA, Erlinda M.; GOBARA, Shirley
MAURÍCIO, Lúcia Velloso. Representa- T. As concepções de professores de um
ções de professores sobre cotidiano curso a distância sobre o papel do fórum
escolar. RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209, on-line. RBEP, v. 87, n. 216, p. 249-261,
maio/ago. 2006. Seção: Estudos. maio/ago. 2006. Seção: Estudos.

Demografia docente, Corpo


SOARES, Sergei. Aprendizado e seleção: VALLE, Ione Ribeiro. Carreira do
uma análise da evolução educacional magistério: uma escolha profissional
brasileira de acordo com uma perspectiva deliberada? RBEP, v. 87, n. 216, p. 178-187,
de ciclo de vida. RBEP, v. 87, n. 216, p. maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
145-177, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
docente, Identidade
Descentralização CANEN Ana; SANTOS, Angela Rocha dos.
PARENTE, Cláudia da Mota Darós. Construção e reconstrução multicultural
Assistência financeira do FNDE/MEC a de identidades docentes: pensando na
programas e projetos educacionais: formação continuada de coordenadores
formato e implicações. RBEP, v. 87, n. 215, pedagógicos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 339-
p. 19-28, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. 348, set./dez. 2006. Seção: Estudos.

Desenvolvimento humano docente, Profissão


RAPOSO, Denise Maria dos Santos PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE,
Paulinelli. A qualidade de vida de Maria da Conceição Lima de. Lucro de ação:
estudantes que ingressam na universidade um exame das condições de possibilidades
na meia-idade. RBEP, v. 87, n. 217, p. 370- de magistério oficial. RBEP, v. 87, n. 215, p.
381, set./dez. 2006. Seção: Estudos. 9-18, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.

Desenvolvimento local documentária, Linguagem


REIS, Edmerson dos Santos; BARROS, LO MONACO, Gaetano. O Thesaurus
Edonilce da Rocha. A experiência de uma Brasileiro da Educação. RBEP, v. 87, n. 215,
escola rural no contexto do projeto de p. 81-86, jan./abr. 2006. Seção: Cibec.
desenvolvimento local de Massaroca,
semi-árido baiano. RBEP, v. 87, n. 216, p. Educação (Brased), Thesaurus Brasileiro
236-248, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. da
LO MONACO, Gaetano. O Thesaurus
Dewey, Concepções psicológicas de John Brasileiro da Educação. RBEP, v. 87, n. 215,
ANDRADE, Erica Natacha Fernandes de. p. 81-86, jan./abr. 2006. Seção: Cibec.
Natureza humana e cultura: um estudo
sobre as concepções psicológicas de John Educação a distância
Dewey. RBEP, v. 87, n. 216, p. 267-269, BATISTA, Erlinda M.; GOBARA, Shirley
maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa. T. As concepções de professores de um
curso a distância sobre o papel do fórum
Diálogo on-line. RBEP, v. 87, n. 216, p. 249-261,
GONÇALVES, Maria Augusta Salin; maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
PIOVESAN, Orene Maria. Processo de
construção de normas na escola e Educação democrática
formação para a cidadania. RBEP, v. 87, n. MOGILKA, Maurício. A formação humana
216, p. 210-219, maio/ago. 2006. Seção: no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87,
Estudos. n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção:
Estudos.
didáticos, Livros
BELLINI, Marta; FRANSSON, Priscila SILVA, Cecília Maria Siqueira. A dimensão
Caroza. A metáfora guerra na comunicação estética e democrática da experiência: uma

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 421
Índice de assuntos

contribuição da filosofia deweyana para um tema da educação. RBEP, v. 87, n. 215,


novas propostas educacionais. RBEP, v. 87, p. 44-52, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.
n. 217, p. 360-369, set./dez. 2006. Seção:
Estudos. educacional, Cooperativismo
ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES,
Educação do campo Candido Alberto. Cooperativismo:
HAGE, Salomão Mufarrej. Movimentos alternativa viável para a gestão escolar?
sociais do campo e a afirmação do direito Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p.
à educação: pautando o debate sobre as 313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
escolas multisseriadas na Amazônia
Paraense. RBEP, v. 87, n. 217, p. 302-312, educacional, Pesquisa
set./dez. 2006. Seção: Estudos. ABREU, Jayme. Uma política para a
pesquisa educacional no Brasil. RBEP, v.
Educação 87, n. 215, p. 77-80, jan./abr. 2006. Seção:
RIBEIRO, Ormezinda Maria. E se Narciso Segunda Edição.
conhecesse Alice? Conjeturas a respeito de
um tema da educação. RBEP, v. 87, n. 215, educacional, Política
p. 44-52, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. HAGE, Salomão Mufarrej. Movimentos
sociais do campo e a afirmação do direito
educação, Financiamento da à educação: pautando o debate sobre as
PARENTE, Cláudia da Mota Darós. escolas multisseriadas na Amazônia
Assistência financeira do FNDE/MEC a Paraense. RBEP, v. 87, n. 217, p. 302-312,
programas e projetos educacionais: set./dez. 2006. Seção: Estudos.
formato e implicações. RBEP, v. 87, n. 215,
p. 19-28, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. PARENTE, Cláudia da Mota Darós.
Assistência financeira do FNDE/MEC a
educação, História da programas, as e projetos educacionais:
FERREIRA, António Gomes Alves; formato e implicações. RBEP, v. 87, n. 215,
GONDRA, José G. Idades da vida, infância p. 19-28, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.
e a racionalidade médico-higiênica em
Portugal e no Brasil (séculos 17-19). RBEP, educacional, Sistema
v. 87, n. 216, p. 119-134, maio/ago. 2006. SOARES, Sergei. Aprendizado e seleção:
Seção: Estudos. uma análise da evolução educacional
brasileira de acordo com uma perspectiva
educação, Psicanálise na de ciclo de vida. RBEP, v. 87, n. 216, p.
SIRCILLI, Fabíola. A argumentação de 145-177, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
Arthur Ramos a favor da psicanálise na
educação. RBEP, v. 87, n. 216, p. 270-271, educativa, Prática
maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa. MOGILKA, Maurício. A formação humana
no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87,
educação, Sociologia da n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção:
PORTES, Écio Antônio. Algumas Estudos.
dimensões culturais da trajetória de
estudantes pobres no ensino superior Ensino e pesquisa
público: o caso da UFMG. RBEP, v. 87, n. D'ANGELO, Martha. Filosofia e Educação
216, p. 220-235, maio/ago. 2006. Seção: em Walter Benjamim. RBEP, v. 87, n. 215,
Estudos. p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.

educacionais, Custos Ensino fundamental


ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES, ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES,
Candido Alberto. Cooperativismo: Candido Alberto. Cooperativismo:
alternativa viável para a gestão escolar? alternativa viável para a gestão escolar?
Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p. Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p.
313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos. 313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos.

educacionais, Teorias Ensino médio


RIBEIRO, Ormezinda Maria. E se Narciso ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES,
conhecesse Alice? Conjeturas a respeito de Candido Alberto. Cooperativismo:

422 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006.
Índice de assuntos

alternativa viável para a gestão escolar? escolares, Trajetórias


Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p. PORTES, Écio Antônio. Algumas
313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos. dimensões culturais da trajetória de
estudantes pobres no ensino superior
Ensino superior público: o caso da UFMG. RBEP, v. 87, n.
BELEI, Renata Aparecida; GIMENIZ- 216, p. 220-235, maio/ago. 2006. Seção:
PASCHOAL, Sandra Regina; NAS- Estudos.
CIMENTO, Edinalva Neves; NERY, Ana
Clara Bortoleto. Profissionalização dos Escolas multisseriadas
professores universitários: raízes HAGE, Salomão Mufarrej. Movimentos
históricas, problemas atuais. RBEP, v. 87, sociais do campo e a afirmação do direito
n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006. Seção: à educação: pautando o debate sobre as
Estudos. escolas multisseriadas na Amazônia
Paraense. RBEP, v. 87, n. 217, p. 302-312,
PORTES, Écio Antônio. Algumas set./dez. 2006. Seção: Estudos.
dimensões culturais da trajetória de
estudantes pobres no ensino superior escrita, Práticas de leitura e
público: o caso da UFMG. RBEP, v. 87, n. MAIMONI, Eulália H.; RIBEIRO,
216, p. 220-235, maio/ago. 2006. Seção: Ormezinda Maria. Família e escola: uma
Estudos. parceria necessária para o processo de
letramento. RBEP, v. 87, n. 217, p. 291-301,
escola pública, Aluno da set./dez. 2006. Seção: Estudos.
MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da
escola pública": o que dizem as estética, Experiência
professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349- SILVA, Cecília Maria Siqueira. A dimensão
359, set./dez. 2006. Seção: Estudos. estética e democrática da experiência: uma
contribuição da filosofia deweyana para
Escola rural novas propostas educacionais. RBEP, v. 87,
REIS, Edmerson dos Santos; BARROS, n. 217, p. 360-369, set./dez. 2006. Seção:
Edonilce da Rocha. A experiência de uma Estudos.
escola rural no contexto do projeto de
desenvolvimento local de Massaroca, Estudantes pobres
semi-árido baiano. RBEP, v. 87, n. 216, p. PORTES, Écio Antônio. Algumas
236-248, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. dimensões culturais da trajetória de
estudantes pobres no ensino superior
escola, Democratização da público: o caso da UFMG. RBEP, v. 87, n.
MAURÍCIO, Lúcia Velloso. Represen- 216, p. 220-235, maio/ago. 2006. Seção:
tações de professores sobre cotidiano Estudos.
escolar. RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209,
maio/ago. 2006. Seção: Estudos. Estudo quantitativo
MACEDO, Maria do Socorro Alencar
escola, Família e Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury. Perfil
MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da de professores do primeiro ciclo: questões
escola pública": o que dizem as socioculturais e pedagógicas. RBEP, v. 87,
professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349- n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006. Seção:
359, set./dez. 2006. Seção: Estudos. Estudos.

escolar, Fracasso Experiência estética


MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da SILVA, Cecília Maria Siqueira. A dimensão
escola pública": o que dizem as estética e democrática da experiência: uma
professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349- contribuição da filosofia deweyana para
359, set./dez. 2006. Seção: Estudos. novas propostas educacionais. RBEP, v. 87,
n. 217, p. 360-369, set./dez. 2006. Seção:
escolar, Prática Estudos.
MAURÍCIO, Lúcia Velloso. Represen-
tações de professores sobre cotidiano experiência, Reconstrução da
escolar. RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209, SILVA, Cecília Maria Siqueira. A dimensão
maio/ago. 2006. Seção: Estudos. estética e democrática da experiência: uma

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 423
Índice de assuntos

contribuição da filosofia deweyana para Formação integral


novas propostas educacionais. RBEP, v. 87, MOGILKA, Maurício. A formação humana
n. 217, p. 360-369, set./dez. 2006. Seção: no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87,
Estudos. n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção:
Estudos.
Família e escola
MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da Formação política
escola pública": o que dizem as D'ANGELO, Martha. Filosofia e Educação
professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349- em Walter Benjamim. RBEP, v. 87, n. 215,
359, set./dez. 2006. Seção: Estudos. p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.

Família Formação profissional


MAIMONI, Eulália H.; RIBEIRO, CAVALCANTE, Maria Marina Dias;
Ormezinda Maria. Família e escola: uma FERREIRA, Eveline Andrade; CARNEIRO,
parceria necessária para o processo de Isabel Magda Said Pierre. A prática
letramento. RBEP, v. 87, n. 217, p. 291-301, educacional do pedagogo em espaços
set./dez. 2006. Seção: Estudos. formais e não-formais. RBEP, v. 87, n. 216,
p. 188-197, maio/ago. 2006. Seção:
Figuras de retórica Estudos.
BELLINI, Marta; FRANSSON, Priscila
Caroza. A metáfora guerra na comunicação Fórum on-line
das idéias de HIV/Aids em livros didáticos. BATISTA, Erlinda M.; GOBARA, Shirley
RBEP, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez. T. As concepções de professores de um
2006. Seção: Estudos. curso a distância sobre o papel do fórum
on-line. RBEP, v. 87, n. 216, p. 249-261,
filosófica, Tradição maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
D'ANGELO, Martha. Filosofia e Educação
em Walter Benjamim. RBEP, v. 87, n. 215, Fracasso escolar
p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da
escola pública": o que dizem as
Financiamento da educação professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349-
PARENTE, Cláudia da Mota Darós. 359, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
Assistência financeira do FNDE/MEC a
programas e projetos educacionais: fundamental, Ensino
formato e implicações. RBEP, v. 87, n. 215, ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES,
p. 19-28, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. Candido Alberto. Cooperativismo:
alternativa viável para a gestão escolar?
Formação continuada Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p.
CANEN, Ana; SANTOS, Angela Rocha dos. 313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
Construção e reconstrução multicultural de
identidades docentes: pensando na Gestão participativa
formação continuada de coordenadores ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES,
pedagógicos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 339- Candido Alberto. Cooperativismo:
348, set./dez. 2006. Seção: Estudos. alternativa viável para a gestão escolar?
Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p.
Formação da cidadania 313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
GONÇALVES, Maria Augusta Salin;
PIOVESAN, Orene Maria. Processo de Higiene
construção de normas na escola e formação FERREIRA, António Gomes Alves;
para a cidadania. RBEP, v. 87, n. 216, p. 210- GONDRA, José G. Idades da vida, infância
219, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. e a racionalidade médico-higiênica em
Portugal e no Brasil (séculos 17-19). RBEP,
Formação de professores v. 87, n. 216, p. 119-134, maio/ago. 2006.
NONO, Maévi Anabel; MIZUKAMI, Maria Seção: Estudos.
da Graça Nicoletti. Processos de formação
de professoras iniciantes. RBEP, v. 87, n. História da educação
217, p. 382-400, set./dez. 2006. Seção: FERREIRA, António Gomes Alves;
Estudos. GONDRA, José G. Idades da vida, infância

424 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006.
Índice de assuntos

e a racionalidade médico-higiênica em estudantes que ingressam na universidade


Portugal e no Brasil (séculos 17-19). RBEP, na meia-idade. RBEP, v. 87, n. 217, p. 370-
v. 87, n. 216, p. 119-134, maio/ago. 2006. 381, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
Seção: Estudos.
Identidade docente
História da infância CANEN Ana; SANTOS, Angela Rocha dos.
FERREIRA, António Gomes Alves; Construção e reconstrução multicultural
GONDRA, José G. Idades da vida, infância de identidades docentes: pensando na
e a racionalidade médico-higiênica em formação continuada de coordenadores
Portugal e no Brasil (séculos 17-19). RBEP, pedagógicos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 339-
v. 87, n. 216, p. 119-134, maio/ago. 2006. 348, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
Seção: Estudos.
Identidade profissional
Histórico VALLE, Ione Ribeiro. Carreira do
BELEI, Renata Aparecida; GIMENIZ- magistério: uma escolha profissional
PASCHOAL, Sandra Regina; NASCI- deliberada? RBEP, v. 87, n. 216, p. 178-187,
MENTO, Edinalva Neves; NERY, Ana Clara maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
Bortoleto. Profissionalização dos professo-
res universitários: raízes históricas, infância, História da
problemas atuais. RBEP, v. 87, n. 217, p. FERREIRA, António Gomes Alves;
401-410, set./dez. 2006. Seção: Estudos. GONDRA, José G. Idades da vida, infância
e a racionalidade médico-higiênica em
HIV/Aids Portugal e no Brasil (séculos 17-19). RBEP,
BELLINI, Marta; FRANSSON, Priscila v. 87, n. 216, p. 119-134, maio/ago. 2006.
Caroza. A metáfora guerra na comuni- Seção: Estudos.
cação das idéias de HIV/Aids em livros
didáticos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 327-338, iniciantes, Professores
set./dez. 2006. Seção: Estudos. NONO, Maévi Anabel; MIZUKAMI, Maria
da Graça Nicoletti. Processos de formação
humana e cultura, Natureza de professoras iniciantes. RBEP, v. 87, n.
ANDRADE, Erica Natacha Fernandes de. 217, p. 382-400, set./dez. 2006. Seção:
Natureza humana e cultura: um estudo Estudos.
sobre as concepções psicológicas de John
Dewey. RBEP, v. 87, n. 216, p. 267-269, integral, Formação
maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa. MOGILKA, Maurício. A formação humana
no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87,
humanas, Ciências n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção:
RIBEIRO, Ormezinda Maria. E se Narciso Estudos.
conhecesse Alice? Conjeturas a respeito de
um tema da educação. RBEP, v. 87, n. 215, Interação
p. 44-52, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. BATISTA, Erlinda M.; GOBARA, Shirley
T. As concepções de professores de um
humanista, Pedagogia curso a distância sobre o papel do fórum
MOGILKA, Maurício. A formação humana on-line. RBEP, v. 87, n. 216, p. 249-261,
no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção:
Estudos. Intuicionismo
NOGUEIRA, Clélia Maria Ignatius. A
humano, Desenvolvimento definição de número: uma hipótese sobre
RAPOSO, Denise Maria dos Santos a hipótese de Piaget. RBEP, v. 87, n. 216, p.
Paulinelli. A qualidade de vida de 135-144, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
estudantes que ingressam na universidade
na meia-idade. RBEP, v. 87, n. 217, p. 370- John Dewey, Concepções psicológicas de
381, set./dez. 2006. Seção: Estudos. ANDRADE, Erica Natacha Fernandes de.
Natureza humana e cultura: um estudo
Idade adulta sobre as concepções psicológicas de John
RAPOSO, Denise Maria dos Santos Dewey. RBEP, v. 87, n. 216, p. 267-269,
Paulinelli. A qualidade de vida de maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 425
Índice de assuntos

leitura e escrita, Práticas de médio, Ensino


MAIMONI, Eulália H.; RIBEIRO, ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES,
Ormezinda Maria. Família e escola: uma Candido Alberto. Cooperativismo:
parceria necessária para o processo de alternativa viável para a gestão escolar? Um
letramento. RBEP, v. 87, n. 217, p. 291-301, estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p. 313-
set./dez. 2006. Seção: Estudos. 326, set./dez. 2006. Seção: Estudos.

Letramento Metáforas
MAIMONI, Eulália H.; RIBEIRO, BELLINI, Marta; FRANSSON, Priscila
Ormezinda Maria. Família e escola: uma Caroza. A metáfora guerra na
parceria necessária para o processo de comunicação das idéias de HIV/Aids em
letramento. RBEP, v. 87, n. 217, p. 291-301, livros didáticos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 327-
set./dez. 2006. Seção: Estudos. 338, set./dez. 2006. Seção: Estudos.

Linguagem documentária Movimentos sociais


LO MONACO, Gaetano. O Thesaurus HAGE, Salomão Mufarrej. Movimentos
Brasileiro da Educação. RBEP, v. 87, n. 215, sociais do campo e a afirmação do direito
p. 81-86, jan./abr. 2006. Seção: Cibec. à educação: pautando o debate sobre as
escolas multisseriadas na Amazônia
Livros didáticos Paraense. RBEP, v. 87, n. 217, p. 302-312,
BELLINI, Marta; FRANSSON, Priscila set./dez. 2006. Seção: Estudos.
Caroza. A metáfora guerra na comunicação
das idéias de HIV/Aids em livros didáticos. mudança, Resistência à
RBEP, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez. MAURÍCIO, Lúcia Velloso. Represen-
2006. Seção: Estudos. tações de professores sobre cotidiano
escolar. RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209,
local, Desenvolvimento maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
EIS, Edmerson dos Santos; BARROS,
Edonilce da Rocha. A experiência de uma Multiculturalismo
escola rural no contexto do projeto de CANEN Ana; SANTOS, Angela Rocha
desenvolvimento local de Massaroca, dos. Construção e reconstrução multi-
semi-árido baiano. RBEP, v. 87, n. 216, p. cultural de identidades docentes:
236-248, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. pensando na formação continuada de
coordenadores pedagógicos. RBEP, v. 87,
Logicismo n. 217, p. 339-348, set./dez. 2006. Seção:
NOGUEIRA, Clélia Maria Ignatius. A Estudos.
definição de número: uma hipótese sobre
a hipótese de Piaget. RBEP, v. 87, n. 216, p. multisseriadas, Escolas
135-144, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. HAGE, Salomão Mufarrej. Movimentos
sociais do campo e a afirmação do direito
Lucro de ação à educação: pautando o debate sobre as
PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE, escolas multisseriadas na Amazônia
Maria da Conceição Lima de. Lucro de Paraense. RBEP, v. 87, n. 217, p. 302-312,
ação: um exame das condições de set./dez. 2006. Seção: Estudos.
possibilidades de magistério oficial. RBEP,
v. 87, n. 215, p. 9-18, jan./abr. 2006. Seção: Natureza humana e cultura
Estudos. ANDRADE, Erica Natacha Fernandes de.
Natureza humana e cultura: um estudo
magistério, Carreira do sobre as concepções psicológicas de John
VALLE, Ione Ribeiro. Carreira do Dewey. RBEP, v. 87, n. 216, p. 267-269,
magistério: uma escolha profissional maio/ago. 2006. Seção: Notas de
deliberada? RBEP, v. 87, n. 216, p. 178-187, Pesquisa.
maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
normas, Construção de
massa, Cultura de GONÇALVES, Maria Augusta Salin;
D'ANGELO, Martha. Filosofia e Educação PIOVESAN, Orene Maria. Processo de
em Walter Benjamim. RBEP, v. 87, n. 215, construção de normas na escola e
p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. formação para a cidadania. RBEP, v. 87, n.

426 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006.
Índice de assuntos

216, p. 210-219, maio/ago. 2006. Seção: RBEP, v. 87, n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006.
Estudos. Seção: Estudos.

número, Definição piagetiana de Pedagogo


NOGUEIRA, Clélia Maria Ignatius. A CAVALCANTE, Maria Marina Dias;
definição de número: uma hipótese sobre FERREIRA, Eveline Andrade; CARNEIRO,
a hipótese de Piaget. RBEP, v. 87, n. 216, Isabel Magda Said Pierre. A prática
p. 135-144, maio/ago. 2006. Seção: educacional do pedagogo em espaços
Estudos. formais e não-formais. RBEP, v. 87, n. 216,
p. 188-197, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
on-line, Fórum
BATISTA, Erlinda M.; GOBARA, Shirley Perfil de professores
T. As concepções de professores de um MACEDO, Maria do Socorro Alencar
curso a distância sobre o papel do fórum Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury. Perfil
on-line. RBEP, v. 87, n. 216, p. 249-261, de professores do primeiro ciclo: questões
maio/ago. 2006. Seção: Estudos. socioculturais e pedagógicas. RBEP, v. 87,
n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006. Seção:
Participação social Estudos.
SILVA, Cecília Maria Siqueira. A
dimensão estética e democrática da Pesquisa educacional
experiência: uma contribuição da filosofia ABREU, Jayme. Uma política para a
deweyana para novas propostas pesquisa educacional no Brasil. RBEP, v.
educacionais. RBEP, v. 87, n. 217, p. 360- 87, n. 215, p. 77-80, jan./abr. 2006. Seção:
369, set./dez. 2006. Seção: Estudos. Segunda Edição.

participativa, Gestão pesquisa, Ensino e


ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES, D'ANGELO, Martha. Filosofia e Educação
Candido Alberto. Cooperativismo: em Walter Benjamim. RBEP, v. 87, n. 215,
alternativa viável para a gestão escolar? p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.
Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p.
313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos. Pesquisa-ação
CANEN, Ana; SANTOS, Angela Rocha dos.
Pedagogia Construção e reconstrução multicultural de
CAVALCANTE, Maria Marina Dias; identidades docentes: pensando na
FERREIRA, Eveline Andrade; CARNEIRO, formação continuada de coordenadores
Isabel Magda Said Pierre. A prática pedagógicos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 339-
educacional do pedagogo em espaços 348, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
formais e não-formais. RBEP, v. 87, n. 216,
p. 188-197, maio/ago. 2006. Seção: piagetiana de número, Definição
Estudos. NOGUEIRA, Clélia Maria Ignatius. A
definição de número: uma hipótese sobre
Pedagogia humanista a hipótese de Piaget. RBEP, v. 87, n. 216,
MOGILKA, Maurício. A formação humana p. 135-144, maio/ago. 2006. Seção:
no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87, Estudos.
n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção:
Estudos. pobres, Estudantes
PORTES, Écio Antônio. Algumas
pedagógica, Práxis dimensões culturais da trajetória de
ABREU, Jayme. Uma política para a estudantes pobres no ensino superior
pesquisa educacional no Brasil. RBEP, v. público: o caso da UFMG. RBEP, v. 87, n.
87, n. 215, p. 77-80, jan./abr. 2006. Seção: 216, p. 220-235, maio/ago. 2006. Seção:
Segunda Edição. Estudos.

pedagógicos, Aspectos poder, Delegação de


MACEDO, Maria do Socorro Alencar MAURÍCIO, Lúcia Velloso. Representações
Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury. de professores sobre cotidiano escolar.
Perfil de professores do primeiro ciclo: RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209, maio/ago.
questões socioculturais e pedagógicas. 2006. Seção: Estudos.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 427
Índice de assuntos

Política educacional professores, Formação de


HAGE, Salomão Mufarrej. Movimentos NONO, Maévi Anabel; MIZUKAMI, Maria
sociais do campo e a afirmação do direito da Graça Nicoletti. Processos de formação
à educação: pautando o debate sobre as de professoras iniciantes. RBEP, v. 87, n.
escolas multisseriadas na Amazônia 217, p. 382-400, set./dez. 2006. Seção:
Paraense. RBEP, v. 87, n. 217, p. 302-312, Estudos.
set./dez. 2006. Seção: Estudos.
professores, Perfil de
PARENTE, Cláudia da Mota Darós. MACEDO, Maria do Socorro Alencar
Assistência financeira do FNDE/MEC a Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury.
programas, as e projetos educacionais: Perfil de professores do primeiro ciclo:
formato e implicações. RBEP, v. 87, n. 215, questões socioculturais e pedagógicas.
p. 19-28, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. RBEP, v. 87, n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006.
Seção: Estudos.
política, Formação
D'ANGELO, Martha. Filosofia e Educação Profissão docente
em Walter Benjamim. RBEP, v. 87, n. 215, PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE,
p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. Maria da Conceição Lima de. Lucro de ação:
um exame das condições de possibilidades
Prática educativa de magistério oficial. RBEP, v. 87, n. 215, p.
MOGILKA, Maurício. A formação humana 9-18, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.
no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87,
n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção: profissional, Formação
Estudos. CAVALCANTE, Maria Marina Dias;
FERREIRA, Eveline Andrade; CARNEIRO,
Prática escolar Isabel Magda Said Pierre. A prática
MAURÍCIO, Lúcia Velloso. Representações educacional do pedagogo em espaços
de professores sobre cotidiano escolar. formais e não-formais. RBEP, v. 87, n. 216,
RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209, maio/ago. p. 188-197, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
2006. Seção: Estudos.
profissional, Identidade
Práticas de leitura e escrita VALLE, Ione Ribeiro. Carreira do
MAIMONI, Eulália H.; RIBEIRO, magistério: uma escolha profissional
Ormezinda Maria. Família e escola: uma deliberada? RBEP, v. 87, n. 216, p. 178-
parceria necessária para o processo de 187, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
letramento. RBEP, v. 87, n. 217, p. 291-301,
set./dez. 2006. Seção: Estudos. Profissionalização
BELEI, Renata Aparecida; GIMENIZ-
Práxis pedagógica PAS CHOAL, Sandra Regina; NAS-
ABREU, Jayme. Uma política para a CIMENTO, Edinalva Neves; NERY, Ana
pesquisa educacional no Brasil. RBEP, v. Clara Bortoleto. Profissionalização dos
87, n. 215, p. 77-80, jan./abr. 2006. Seção: professores universitários: raízes
Segunda Edição. históricas, problemas atuais. RBEP, v. 87,
n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006. Seção:
Primeiro ciclo Estudos.
MACEDO, Maria do Socorro Alencar
Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury. Psicanálise na educação
Perfil de professores do primeiro ciclo: SIRCILLI, Fabíola. A argumentação de
questões socioculturais e pedagógicas. Arthur Ramos a favor da psicanálise na
RBEP, v. 87, n. 215, p. 29-43, jan./abr. educação. RBEP, v. 87, n. 216, p. 270-271,
2006. Seção: Estudos. maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa.

Professores iniciantes psicológicas de John Dewey, Concepções


NONO, Maévi Anabel; MIZUKAMI, Maria ANDRADE, Erica Natacha Fernandes de.
da Graça Nicoletti. Processos de formação Natureza humana e cultura: um estudo
de professoras iniciantes. RBEP, v. 87, n. sobre as concepções psicológicas de John
217, p. 382-400, set./dez. 2006. Seção: Dewey. RBEP, v. 87, n. 216, p. 267-269,
Estudos. maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa.

428 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006.
Índice de assuntos

pública, Aluno da escola didáticos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 327-338,


MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da set./dez. 2006. Seção: Estudos.
escola pública": o que dizem as
professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349- rural, Escola
359, set./dez. 2006. Seção: Estudos. REIS, Edmerson dos Santos; BARROS,
Edonilce da Rocha. A experiência de uma
Qualidade de vida escola rural no contexto do projeto de
RAPOSO, Denise Maria dos Santos desenvolvimento local de Massaroca,
Paulinelli. A qualidade de vida de semi-árido baiano. RBEP, v. 87, n. 216, p.
estudantes que ingressam na universidade 236-248, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
na meia-idade. RBEP, v. 87, n. 217, p. 370-
381, set./dez. 2006. Seção: Estudos. Salário-educação
PARENTE, Cláudia da Mota Darós.
quantitativo, Estudo Assistência financeira do FNDE/MEC a
MACEDO, Maria do Socorro Alencar programas, as e projetos educacionais:
Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury. formato e implicações. RBEP, v. 87, n. 215,
Perfil de professores do primeiro ciclo: p. 19-28, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.
questões socioculturais e pedagógicas.
RBEP, v. 87, n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006. Seleção
Seção: Estudos. SOARES, Sergei. Aprendizado e seleção:
uma análise da evolução educacional
Ramos, Argumentação de Arthur brasileira de acordo com uma perspectiva
SIRCILLI, Fabíola. A argumentação de de ciclo de vida. RBEP, v. 87, n. 216, p.
Arthur Ramos a favor da psicanálise na 145-177, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
educação. RBEP, v. 87, n. 216, p. 270-271,
maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa. Sistema educacional
SOARES, Sergei. Aprendizado e seleção:
Reconstrução da experiência uma análise da evolução educacional
SILVA, Cecília Maria Siqueira. A brasileira de acordo com uma perspectiva
dimensão estética e democrática da de ciclo de vida. RBEP, v. 87, n. 216, p.
experiência: uma contribuição da filosofia 145-177, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
deweyana para novas propostas
educacionais. RBEP, v. 87, n. 217, p. 360- sociais, Movimentos
369, set./dez. 2006. Seção: Estudos. HAGE, Salomão Mufarrej. Movimentos
sociais do campo e a afirmação do direito
Repetência à educação: pautando o debate sobre as
SOARES, Sergei. Aprendizado e seleção: escolas multisseriadas na Amazônia
uma análise da evolução educacional Paraense. RBEP, v. 87, n. 217, p. 302-312,
brasileira de acordo com uma perspectiva set./dez. 2006. Seção: Estudos.
de ciclo de vida. RBEP, v. 87, n. 216, p.
145-177, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. sociais, Representações
MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da
Representações sociais escola pública": o que dizem as
MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349-
escola pública": o que dizem as 359, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349-
359, set./dez. 2006. Seção: Estudos. social, Participação
SILVA, Cecília Maria Siqueira. A dimensão
Resistência à mudança estética e democrática da experiência: uma
MAURÍCIO, Lúcia Velloso. Representa- contribuição da filosofia deweyana para
ções de professores sobre cotidiano novas propostas educacionais. RBEP, v. 87,
escolar. RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209, n. 217, p. 360-369, set./dez. 2006. Seção:
maio/ago. 2006. Seção: Estudos. Estudos.

retórica, Figuras de socioculturais, Aspectos


BELLINI, Marta; FRANSSON, Priscila MACEDO, Maria do Socorro Alencar
Caroza. A metáfora guerra na comuni- Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury. Perfil
cação das idéias de HIV/Aids em livros de professores do primeiro ciclo: questões

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 429
Índice de assuntos

socioculturais e pedagógicas. RBEP, v. 87, Terminologia


n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006. Seção: LO MONACO, Gaetano. O Thesaurus
Estudos. Brasileiro da Educação. RBEP, v. 87, n.
215, p. 81-86, jan./abr. 2006. Seção: Cibec.
Sociologia da educação
PORTES, Écio Antônio. Algumas dimensões Thesaurus Brasileiro da Educação
culturais da trajetória de estudantes pobres (Brased)
no ensino superior público: o caso da UFMG. LO MONACO, Gaetano. O Thesaurus
RBEP, v. 87, n. 216, p. 220-235, maio/ago. Brasileiro da Educação. RBEP, v. 87, n.
2006. Seção: Estudos. 215, p. 81-86, jan./abr. 2006. Seção: Cibec.

Subjetividade trabalho, Condições de


MOGILKA, Maurício. A formação humana PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE,
no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87, Maria da Conceição Lima de. Lucro de
n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção: ação: um exame das condições de
Estudos. possibilidades de magistério oficial. RBEP,
v. 87, n. 215, p. 9-18, jan./abr. 2006. Seção:
superior, Ensino Estudos.
BELEI, Renata Aparecida; GIMENIZ-
PAS CHOAL, Sandra Regina; NAS- Tradição filosófica
CIMENTO, Edinalva Neves; NERY, Ana D'ANGELO, Martha. Filosofia e Educação
Clara Bortoleto. Profissionalização dos em Walter Benjamim. RBEP, v. 87, n. 215,
professores universitários: raízes p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.
históricas, problemas atuais. RBEP, v. 87,
n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006. Seção: Trajetórias escolares
Estudos. PORTES, Écio Antônio. Algumas
dimensões culturais da trajetória de
PORTES, Écio Antônio. Algumas dimen- estudantes pobres no ensino superior
sões culturais da trajetória de estudantes público: o caso da UFMG. RBEP, v. 87, n.
pobres no ensino superior público: o caso 216, p. 220-235, maio/ago. 2006. Seção:
da UFMG. RBEP, v. 87, n. 216, p. 220-235, Estudos.
maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
vida, Qualidade de
Teorias educacionais RAPOSO, Denise Maria dos Santos
RIBEIRO, Ormezinda Maria. E se Narciso Paulinelli. A qualidade de vida de
conhecesse Alice? Conjeturas a respeito de estudantes que ingressam na universidade
um tema da educação. RBEP, v. 87, n. 215, na meia-idade. RBEP, v. 87, n. 217, p. 370-
p. 44-52, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. 381, set./dez. 2006. Seção: Estudos.

430 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-436, set./dez. 2006.
Índice de Autores

ABREU, Jayme. Uma política para a CANEN, Ana; SANTOS, Angela Rocha
pesquisa educacional no Brasil. RBEP, v. dos. Construção e reconstrução multi-
87, n. 215, p. 77-80, jan./abr. 2006. Seção: cultural de identidades docentes:
Segunda Edição. pensando na formação continuada de
coordenadores pedagógicos. RBEP, v. 87,
ANDRADE, Erica Natacha Fernandes de. n. 217, p. 339-348, set./dez. 2006. Seção:
Natureza humana e cultura: um estudo Estudos.
sobre as concepções psicológicas de John
Dewey. RBEP, v. 87, n. 216, p. 267-269, CARNEIRO, Isabel Magda Said Pierre;
maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa. FERREIRA, Eveline Andrade; CAVAL-
CANTE, Maria Marina Dias. A prática
ANDRADE, Maria da Conceição Lima de; educacional do pedagogo em espaços
PEREIRA, Gilson R. de M. Lucro de ação: formais e não-formais. RBEP, v. 87, n. 216,
um exame das condições de possibilidades p. 188-197, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
de magistério oficial. RBEP, v. 87, n. 215,
p. 9-18, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. CAVALCANTE, Maria Marina Dias;
FERREIRA, Eveline Andrade; CARNEIRO,
ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES, Isabel Magda Said Pierre. A prática
Candido Alberto. Cooperativismo: educacional do pedagogo em espaços
alternativa viável para a gestão escolar? formais e não-formais. RBEP, v. 87, n. 216,
Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, p. p. 188-197, maio/ago. 2006. Seção:
313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos. Estudos.

BARROS, Edonilce da Rocha; REIS, D'ANGELO, Martha. Filosofia e Educação


Edmerson dos Santos. A experiência de em Walter Benjamim. RBEP, v. 87, n. 215,
uma escola rural no contexto do projeto p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.
de desenvolvimento local de Massaroca,
semi-árido baiano. RBEP, v. 87, n. 216, p. FERREIRA, António Gomes Alves;
236-248, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. GONDRA, José G. Idades da vida, infância
e a racionalidade médico-higiênica em
BATISTA, Erlinda M.; GOBARA, Shirley Portugal e no Brasil (século 17-19). RBEP,
T. As concepções de professores de um v. 87, n. 216, p. 119-134, maio/ago. 2006.
curso a distância sobre o papel do fórum Seção: Estudos.
on-line. RBEP, v. 87, n. 216, p. 249-261,
maio/ago. 2006. Seção: Estudos. FERREIRA, Eveline Andrade; CAVAL-
CANTE, Maria Marina Dias; CARNEIRO,
BELEI, Renata Aparecida; GIMENIZ- Isabel Magda Said Pierre. A prática
PASCHOAL, Sandra Regina; NAS- educacional do pedagogo em espaços
CIMENTO, Edinalva Neves; NERY, Ana formais e não-formais. RBEP, v. 87, n. 216,
Clara Bortoleto. Profissionalização dos p. 188-197, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
professores universitários: raízes
históricas, problemas atuais. RBEP, v. 87, FRANSSON, Priscila Caroza; BELLINI,
n. 217, p. 401-410, set./dez. 2006. Seção: Marta. A metáfora guerra na comunicação
Estudos. das idéias de HIV/Aids em livros didáticos.
RBEP, v. 87, n. 217, p. 327-338, set./dez.
BELLINI, Marta; FRANSSON, Priscila 2006. Seção: Estudos.
Caroza. A metáfora guerra na
comunicação das idéias de HIV/Aids em GIMENIZ-PASCHOAL, Sandra Regina;
livros didáticos. RBEP, v. 87, n. 217, p. BELEI, Renata Aparecida; NASCIMENTO,
327-338, set./dez. 2006. Seção: Estudos. Edinalva Neves; NERY, Ana Clara Bortoleto.
R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 431
Índice de autores

Profissionalização dos professores uni- RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209, maio/ago.


versitários: raízes históricas, problemas 2006. Seção: Estudos.
atuais. RBEP, v. 87, n. 217, p. 401-410, set./
dez. 2006. Seção: Estudos. MAZZOTTI, Alda Judith. O "aluno da
escola pública": o que dizem as
GOBARA, Shirley T.; BATISTA, Erlinda M. professoras. RBEP, v. 87, n. 217, p. 349-
As concepções de professores de um curso 359, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
a distância sobre o papel do fórum on-line.
RBEP, v. 87, n. 216, p. 249-261, maio/ago. MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti;
2006. Seção: Estudos. NONO, Maévi Anabel. Processos de
formação de professoras iniciantes. RBEP,
GOMES, Candido Alberto; ARAÚJO, v. 87, n. 217, p. 382-400, set./dez. 2006.
Gerrá Leite Correia de. Cooperativismo: Seção: Estudos.
alternativa viável para a gestão escolar?
Um estudo de caso. RBEP, v. 87, n. 217, MOGILKA, Maurício. A formação humana
p. 313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos. no horizonte da integralidade. RBEP, v. 87,
n. 215, p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção:
GONÇALVES, Maria Augusta Salin; Estudos.
PIOVESAN, Orene Maria. Processo de
construção de normas na escola e formação MORTIMER, Eduardo Fleury; MACEDO,
para a cidadania. RBEP, v. 87, n. 216, p. 210- Maria do Socorro Alencar Nunes. Perfil
219, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. de professores do primeiro ciclo: questões
socioculturais e pedagógicas. RBEP, v. 87,
GONDRA, José G. FERREIRA, António n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006. Seção:
Gomes Alves. Idades da vida, infância e a Estudos.
racionalidade médico -higiênica em
Portugal e no Brasil (século 17-19). RBEP, NASCIMENTO, Edinalva Neves; BELEI,
v. 87, n. 216, p. 119-134, maio/ago. 2006. Renata Aparecida; GIMENIZ-PASCHOAL,
Seção: Estudos. Sandra Regina; NERY, Ana Clara Bortoleto.
Profissionalização dos pro-fessores
HAGE, Salomão Mufarrej. Movimentos universitários: raízes históricas, problemas
sociais do campo e a afirmação do direito atuais. RBEP, v. 87, n. 217, p. 401-410, set./
à educação: pautando o debate sobre as dez. 2006. Seção: Estudos.
escolas multisseriadas na Amazônia
Paraense. RBEP, v. 87, n. 217, p. 302-312, NERY, Ana Clara Bortoleto; BELEI, Renata
set./dez. 2006. Seção: Estudos. Aparecida; GIMENIZ-PASCHOAL, Sandra
Regina; NASCIMENTO, Edinalva Neves.
LO MONACO, Gaetano. O Thesaurus Profissionalização dos professores
Brasileiro da Educação. RBEP, v. 87, n. 215, universitários: raízes históricas,
p. 81-86, jan./abr. 2006. Seção: Cibec. problemas atuais. RBEP, v. 87, n. 217, p.
401-410, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
MACEDO, Maria do Socorro Alencar
Nunes; MORTIMER, Eduardo Fleury. NOGUEIRA, Clélia Maria Ignatius. A
Perfil de professores do primeiro ciclo: definição de número: uma hipótese sobre
questões socioculturais e pedagógicas. a hipótese de Piaget. RBEP, v. 87, n. 216,
RBEP, v. 87, n. 215, p. 29-43, jan./abr. 2006. p. 135-144, maio/ago. 2006. Seção:
Seção: Estudos. Estudos.

MAIMONI, Eulália H.; RIBEIRO, NONO, Maévi Anabel; MIZUKAMI, Maria


Ormezinda Maria. Família e escola: uma da Graça Nicoletti. Processos de formação
parceria necessária para o processo de de professoras iniciantes. RBEP, v. 87, n.
letramento. RBEP, v. 87, n. 217, p. 291-301, 217, p. 382-400, set./dez. 2006. Seção:
set./dez. 2006. Seção: Estudos. Estudos.

MAURÍCIO, Lúcia Velloso. Representações PARENTE, Cláudia da Mota Darós.


de professores sobre cotidiano escolar. Assistência financeira do FNDE/MEC a

432 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006.
Índice de autores

programas e projetos educacionais: de um tema da educação. RBEP, v. 87, n.


formato e implicações. RBEP, v. 87, n. 215, 215, p. 44-52, jan./abr. 2006. Seção:
p. 19-28, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. Estudos.

PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE, RIBEIRO, Ormezinda Maria; MAIMONI,


Maria da Conceição Lima de. Lucro de Eulália H. Família e escola: uma parceria
ação: um exame das condições de necessária para o processo de letramento.
possibilidades de magistério oficial. RBEP, RBEP, v. 87, n. 217, p. 291-301, set./dez.
v. 87, n. 215, p. 9-18, jan./abr. 2006. Seção: 2006. Seção: Estudos.
Estudos.
SANTOS, Angela Rocha dos; CANEN,
PIOVESAN, Orene Maria; GONÇALVES, Ana. Construção e reconstrução
Maria Augusta Salin. Processo de multicultural de identidades docentes:
construção de normas na escola e pensando na formação continuada de
formação para a cidadania. RBEP, v. 87, n. coordenadores pedagógicos. RBEP, v. 87,
216, p. 210-219, maio/ago. 2006. Seção: n. 217, p. 339-348, set./dez. 2006. Seção:
Estudos. Estudos.

PORTES, Écio Antônio. Algumas dimensões SILVA, Cecília Maria Siqueira. A dimensão
culturais da trajetória de estudantes pobres estética e democrática da experiência: uma
no ensino superior público: o caso da contribuição da filosofia deweyana para
UFMG. RBEP, v. 87, n. 216, p. 220-235, maio/ novas propostas educacionais. RBEP, v. 87,
ago. 2006. Seção: Estudos. n. 217, p. 360-369, set./dez. 2006. Seção:
Estudos.
RAPOSO, Denise Maria dos Santos
Paulinelli. A qualidade de vida de SIRCILLI, Fabíola. A argumentação de
estudantes que ingressam na uni-versidade Arthur Ramos a favor da psicanálise na
na meia-idade. RBEP, v. 87, n. 217, p. 370- educação. RBEP, v. 87, n. 216, p. 270-271,
381, set./dez. 2006. Seção: Estudos. maio/ago. 2006. Seção: Notas de Pesquisa.

REIS, Edmerson dos Santos; BARROS, SOARES, Sergei. Aprendizado e seleção:


Edonilce da Rocha. A experiência de uma análise da evolução educacional
uma escola rural no contexto do projeto brasileira de acordo com uma perspectiva
de desenvolvimento local de Massaroca, de ciclo de vida. RBEP, v. 87, n. 216, p.
semi-árido baiano. RBEP, v. 87, n. 216, 145-177, maio/ago. 2006. Seção: Estudos.
p. 236-248, maio/ago. 2006. Seção:
Estudos. VALLE, Ione Ribeiro. Carreira do
magistério: uma escolha profissional
RIBEIRO, Ormezinda Maria. E se Narciso deliberada? RBEP, v. 87, n. 216, p. 178-187,
conhecesse Alice? Conjeturas a respeito maio/ago. 2006. Seção: Estudos.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 433
Índice de títulos

Algumas dimensões culturais da CANEN, Ana; SANTOS, Angela Rocha


trajetória de estudantes pobres no ensino dos. RBEP, v. 87, n. 217, p. 339-348, set./
superior público: o caso da UFMG. dez. 2006. Seção: Estudos.
PORTES, Écio Antônio. RBEP, v. 87, n. 216,
p. 220-235, maio/ago. 2006. Seção: Cooperativismo: alternativa viável para a
Estudos. gestão escolar? Um estudo de caso.
ARAÚJO, Gerrá Leite Correia de; GOMES,
"aluno da escola pública": o que dizem as Candido Alberto. RBEP, v. 87, n. 217, p.
professoras, O. 313-326, set./dez. 2006. Seção: Estudos.
MAZZOTTI, Alda Judith. RBEP, v. 87, n.
217, p. 349-359, set./dez. 2006. Seção: definição de número: uma hipótese sobre
Estudos. a hipótese de Piaget, A.
NOGUEIRA, Clélia Maria Ignatius. RBEP,
Aprendizado e seleção: uma análise da v. 87, n. 216, p. 135-144, maio/ago. 2006.
evolução educacional brasileira de Seção: Estudos.
acordo com uma perspectiva de ciclo de
vida. dimensão estética e democrática da
SOARES, Sergei. RBEP, v. 87, n. 216, p. experiência: uma contribuição da filosofia
145-177, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. deweyana para novas propostas
educacionais, A.
argumentação de Arthur Ramos a favor SILVA, Cecília Maria Siqueira. RBEP, v. 87,
da psicanálise na educação, A. n. 217, p. 360-369, set./dez. 2006. Seção:
SIRCILLI, Fabíola. RBEP, v. 87, n. 216, p. Estudos.
270-271, jan./abr. 2006. Seção: Notas de
pesquisa. E se Narciso conhecesse Alice?
Conjeturas a respeito de um tema da
Assistência financeira do FNDE/MEC a educação.
programas e projetos educacionais: RIBEIRO, Ormezinda Maria. RBEP, v. 87,
formato e implicações. n. 215, p. 44-52, jan./abr. 2006. Seção:
PARENTE, Cláudia da Mota Darós. RBEP, Estudos.
v. 87, n. 215, p. 19-28, jan./abr. 2006. Seção:
Estudos. experiência de uma escola rural no
contexto do projeto de desenvolvi-
Carreira do magistério: uma escolha mento local de Massaroca, semi-árido
profissional deliberada? baiano, A.
VALLE, Ione Ribeiro. RBEP, v. 87, n. 216, REIS, Edmerson dos santos; BARROS,
p. 178-187, maio/ago. 2006. Seção: Edonilce da Rocha. RBEP, v. 87, n. 216,
Estudos. p. 236-248, maio/ago. 2006. Seção:
Estudos.
concepções de professores de um curso a
distância sobre o papel do fórum on-line, Família e escola: uma parceria necessária
As. para o processo de letramento.
BATISTA, Erlinda M.; GOBARA, Shirley MAIMONI, Eulália H.; RIBEIRO, Orme-
T. RBEP, v. 87, n. 216, p. 249-261, maio/ zinda Maria. RBEP, v. 87, n. 217, p. 291-
ago. 2006. Seção: Estudos. 301, set./dez. 2006. Seção: Estudos.

Construção e reconstrução multicultural Filosofia e Educação em Walter


de identidades docentes: pensando na Benjamim.
formação continuada de coordenadores D'ANGELO, Martha. RBEP, v. 87, n. 215,
pedagógicos. p. 68-75, jan./abr. 2006. Seção: Estudos.
434 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006.
Índice de títulos

formação humana no horizonte da prática educacional do pedagogo em


integralidade, A. espaços formais e não-formais, A.
MOGILKA, Maurício. RBEP, v. 87, n. 215, CAVALCANTE, Maria Marina Dias;
p. 53-67, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. FERREIRA, Eveline Andrade; CAR-
NEIRO, Isabel Magda Said Pierre. RBEP,
Idades da vida, infância e a v. 87, n. 216, p. 188-197, maio/ago. 2006.
racionalidade médico-higiênica em Seção: Estudos.
Portugal e no Brasil séculos 17-19.
FERREIRA, António Gomes Alves; Processo de construção de normas na
GONDRA, José G.RBEP, v. 87, n. 216, p. escola e formação para a cidadania.
119-134, maio/ago. 2006. Seção: Estudos. GONÇALVES, Maria Augusta Salin;
PIOVESAN, Orene Maria. RBEP, v. 87, n.
Lucro de ação: um exame das condições 216, p. 210-219, maio/ago. 2006. Seção:
de possibilidades de magistério oficial. Estudos.
PEREIRA, Gilson R. de M.; ANDRADE,
Maria da Conceição RBEP, v. 87, n. 215, Processos de formação de professoras
p. 9-18, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. iniciantes.
NONO, Maévi Anabel; MIZUKAMI,
metáfora guerra na comunicação das Maria da Graça Nicoletti. RBEP, v. 87,
idéias de HIV/Aids em livros didáticos, A. n. 217, p. 382-400, set./dez. 2006. Seção:
BELLINI, Marta; FRANSSON, Priscila Estudos.
Caroza. RBEP, v. 87, n. 217, p. 327-338,
set./dez. 2006. Seção: Estudos. Profissionalização dos professores
universitários: raízes históricas,
Movimentos sociais do campo e a problemas atuais.
afirmação do direito à educação: BELEI, Renata Aparecida; GIMENIZ-
pautando o debate sobre as escolas PAS C H OA L , S a n d r a Re g i n a ; N AS -
multisseriadas na Amazônia Paraense. CIMENTO, Edinalva Neves; NERY, Ana
HAGE, Salomão Mufarrej. RBEP, v. 87, n. Clara Bortoleto. RBEP, v. 87, n. 217, p.
217, p. 302-312, set./dez. 2006. Seção: 401-410, set./dez. 2006. Seção:
Estudos. Estudos.

Natureza humana e cultura: um estudo qualidade de vida de estudantes que


sobre as concepções psicológicas de John ingressam na universidade na meia-
Dewey. idade, A.
ANDRADE, Erica Natacha Fernandes de. RAPOSO, Denise Maria dos Santos
RBEP, v. 87, n. 216, p. 267-269, jan./abr. Paulinelli. RBEP, v. 87, n. 217, p. 370-381,
2006. Seção: Notas de Pesquisa. set./dez. 2006. Seção: Estudos.

Perfil de professores do primeiro ciclo: Representações de professores sobre


questões socioculturais e pedagógicas. cotidiano escolar.
MACEDO, Maria do Socorro Alencar Nunes; MAURÍCIO, Lúcia Velloso. RBEP, v. 87, n.
MORTIMER, Eduardo Fleury. RBEP, v. 87, n. 216, p. 198-209, maio/ago. 2006. Seção:
215, p. 29-43, jan./abr. 2006. Seção: Estudos. Estudos.

política para a pesquisa educacional no Thesaurus Brasileiro da Educação, O.


Brasil, Uma. LO MONACO, Gaetano. RBEP, v. 87, n.
ABREU, Jayme. RBEP, v. 87, n. 215, p. 77- 215, p. 81-86, jan./abr. 2006. Seção:
80, jan./abr. 2006. Seção: Segunda Edição. Cibec.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 417-435, set./dez. 2006. 435
Agradecimentos

Os números 215, 216 e 217 da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP),


correspondentes ao volume 87, não teriam sido publicados sem a relevante colabora-
ção dos seguintes pareceristas ad hoc:

Alcina Maria
Alípio Casali
Álvaro Moreira Hipolito
Ana Shirley de França Moraes
Anamaria Gonçalves B.de Freitas
Ana Canen
Ana Waleska Mendonça
Andrea Puppin
Anna Chrystina Mignot
Antonio Davi Cattani
Antonio Joaquim Severino
Antonio Fernando S. Guerra
Beatriz Fétizon
Candido Gomes
Carlota Boto
Carmen Campoy Scriptori
Cássia Ferri
Célia Linhares
Celso Favaretto
Celso dos Santos Vasconcellos
Cipriano Luckesi
Cláudia Barcelos Abreu
Cláudia de Oliveira Fernandes
Danilo Streck
Denise de Freitas
Dermeval Saviani
Diana Vidal
Elcia Esnarriaga de Arruda
Elcie Masini
Eliane Giachetto Saravali
Fernando Becker
Gilson Pereira
Heloisa Luck
Helenise Sangoi Antunes
Henrique Breuckmann
Ilma Passos de Alencastro Veiga
Ione Ribeiro Valle
Iria Brzezinski
Ivana Maria Ibiapina
José Carlos Libaneo
José Gonçalves Gondra
Júlio Groppa
Leda Scheibe

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 437-438, set./dez. 2006. 437
Agradecimentos

Leila Mury Bergmann


Leziany Daniel
Libânia Xavier
Lúcia Regina Vilarinho
Luzia Marta Bellini
Marcus Vinicius da Cunha
Maria Amélia Azevedo
Maria do Carmo de Lacerda Peixoto
Maria do Rosário Silveira Porto
Maria Emília Engers
Maria Rita Aprile
Marilda Aparecida Behrens
Marli Eliza Dalmazo Afonso de André
Marta Bellini
Marta Maria de Araújo
Myriam Krasilchik
Neise Deluiz
Nicholas Davies
Nídia Pontuschka
Olinda Evangelista
Paulino José Orso
Paulo Padilha
Pedro Jacobi
Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva
Romualdo de Oliveira
Rubens Barbosa de Camargo
Selma Garrido Pimenta
Sérgio Eduardo Castanho
Silk Weber
Silvia Elizabeth Moraes
Telma Pileggi Vinha
Vera Candau
Vitor Paro
Wojciech Andrzej Kulesza
Zacarias Jaegger Gama

438 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 437-438, set./dez. 2006.
Instruções para
RBEP colaboração

APRESENTAÇÃO atendimento das condições especificadas nas


Normas para Apresentação de Originais, que se
encontram a seguir.
Criada em 1944, a Revista Brasileira de O setor de revisão reserva-se o direito de
Estudos Pedagógicos (RBEP) tem periodicida- efetuar alterações nos originais, respeitados o
de quadrimestral. Publica artigos inéditos de estilo e as opiniões dos autores, com vistas a
natureza técnico-científica, resultantes de es- manter a homogeneidade e a qualidade da re-
tudos e pesquisas que contribuam para o de- vista.
senvolvimento do conhecimento educacional Os autores receberão três exemplares pelo
e que possam oferecer subsídios às decisões trabalho publicado na revista.
políticas na área. Seu público leitor é formado As colaborações deverão ser enviadas para
por professores, pesquisadores e alunos de gra- o seguinte endereço:
duação e pós-graduação, técnicos e gestores da
área de educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
A RBEP compõe-se das seguintes seções: Educacionais (Inep/MEC)
Coordenação-Geral de Linha Editorial e
""Estudos" – Publica artigos inéditos, resul- Publicações
tantes de estudos, pesquisas, debates e experi- Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Ane-
ências relacionadas à educação e áreas afins. xo 1, Sala 418
"Cibec" – Publica os resumos das teses e CEP 70047-900 – Brasília-DF – Brasil
dissertações recebidas pelo do Centro de In- Fones: (61) 2104-8438 e (61) 2104-8042
formações e Biblioteca em Educação (Cibec). Fax: (61) 2104-9441
"Notas de Pesquisa" – Comunica os resul- editoria@inep.gov.br
tados, mesmo parciais, de pesquisas em anda- rbep@inep.gov.br
mento ou recém-concluídas sobre temas edu-
cacionais.
"Resenhas" – Analisa criticamente os lan-
çamentos recentes na área. NORMAS PARA
A APRESENTAÇÃO
A RBEP acha-se aberta a sugestões e à in- DE ORIGINAIS
dicação de trabalhos e contribuições que façam
avançar o conhecimento e estimulem a refle-
xão sobre a educação. Com vistas a facilitar o tratamento e a dis-
seminação dos trabalhos enviados para publi-
cação nos periódicos do Inep, apresentamos
algumas normas técnicas para o estabeleci-
NORMAS EDITORIAIS mento de padrões de estilo e apresentação dos
textos.
Os artigos poderão ser redigidos em por-
tuguês ou espanhol. Mídia
Os artigos encaminhados são submetidos
à aprovação de, pelo menos, três especialistas Os originais deverão ser encaminhados em
reconhecidos nos temas abordados. De acordo papel formato A-4 (3 cópias) e em disquete ou
com os pareceres emitidos, o artigo será pro- CD, ou ainda mediante correio eletrônico, em
gramado para publicação ou devolvido ao au- arquivo formato Word. Os originais deverão ser
tor, para ajustes ou reformulação e posterior digitados em espaço 2, com a extensão máxima
envio, quando será novamente avaliado. A de 40 laudas de 1.4000 caracteres, com espaço,
aprovação final dos artigos é de responsabili- cada lauda.
dade do Comitê Editorial da RBEP.
A aceitação do artigo implica automatica- Ilustrações
mente a cessão dos direitos autorais relativos
ao trabalho. As ilustrações deverão ser limitadas à
A publicação de qualquer matéria está compreensão do texto e poderão ser enviadas
subordinada à prévia aprovação do Inep e ao em papel, desde que possuam nitidez, ou em

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 439-441, set./dez. 2006. 439
Instruções para colaboração

meio magnético com 300 dpi de resolução (não informação também deve constar após a sua
serão aceitas cópias xerox ou fax). As ilustra- identificação.
ções devem vir acompanhadas das fontes e de
título que permita compreender o significado • Livros (um autor)
dos dados reunidos e somente serão aceitas se
em condições de fácil reprodução. FLORIANI, José Valdir. Professor e pes-
quisador: exemplificação apoiada na
Título Matemática. 2. ed. Blumenau: Furb,
2000. 142 p. (Programa Publicações de
O título do artigo deve ser breve, específi- Apoio à Formação Inicial e Continuada
co e descritivo, contendo as palavras represen- de Professores).
tativas do seu conteúdo, e vir no idioma origi-
nal e em inglês. • Livros (dois autores)

Resumos DAMIÃO, Regina Toledo; HENRIQUES,


Antonio. Curso de direito jurídico. São
Os artigos enviados para a RBEP deverão Paulo: Atlas, 1995.
ser acompanhados, obrigatoriamente, de resu-
mos em português e inglês, com 10 linhas no • Capítulos de livro
máximo.
REGO, L. L. B. O desenvolvimento
Palavras-chave cognitivo e a prontidão para a alfabetiza-
ção. In: CARRARO, T. N. (Org.). Aprender
Os artigos enviados à RBEP devem conter pensando. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 1991.
palavras-chave, referentes ao seu conteúdo, es- p. 31-40.
colhidas em vocabulário livre ou controlado.
• Artigos de periódico
Citações
GOROVITZ, Matheus. Da educação do
As citações no texto, até três linhas, de- juízo de gosto. Revista Brasileira de Estu-
vem vir entre aspas e acompanhadas por uma dos Pedagógicos, Brasília, v. 79, n. 193, p.
chamada entre parênteses para o autor, o ano e 86-94, set./dez. 1998.
o número da página da publicação.
As citações destacadas com recuo devem • Teses e dissertações
vir sem aspas, em corpo 10 e em fonte normal.
A referência bibliográfica completa da ci- ARAÚJO, U. A. M. Máscaras inteiriças
tação virá em lista única ao final do artigo. A tukúna. 1985. 102 f. Dissertação (Mestrado
exatidão e a adequação das citações e referên- em Ciências Sociais) – Fundação Escola
cias a trabalhos consultados e mencionados no de Sociologia e Política de São Paulo, São
texto são de responsabilidade do autor. Paulo, 1986.

Notas • Artigos de jornal com autor identificado

As notas de rodapé devem ser evitadas. LEAL, L. N. MP fiscaliza com autonomia


Quando necessárias, que tenham a finalida- total. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, p. 3,
de de: indicações bibliográficas; observações 25 abr. 1999.
complementares; realizar remissões internas
e externas; introduzir uma citação de refor- • Artigos de jornal sem identificação de
ço e fornecer a tradução de um texto. As in- autor
dicações das fontes deverão ser feitas nos
textos. ARRANJO tributário. Diário do Nordeste
Online, Fortaleza, 27 nov. 1998. Disponível
Referências bibliográficas em: http://www.diariodonordeste.com.br.
Acesso em: 28 nov. 1998.
As referências bibliográficas devem cons-
tituir uma lista única no final do artigo, em or- • Decretos, Leis
dem alfabética por sobrenome de autor; devem
ser completas e elaboradas de acordo com as BRASIL. Lei nº 9.887, de 7 de dezembro
normas da Associação Brasileira de Normas de 1999. Altera a legislação tributária fe-
Técnicas (ABNT) - NBR 6.023. deral. Diário Oficial [da] República Fede-
Quando se tratar de obra consultada on- rativa do Brasil, Brasília, DF, 8 dez. 1999.
line, é necessário indicar o endereço eletrônico Disponível em: <http://www.in.gov.nbr/
e a data quando foi acessada; se a obra estiver mp_leis/leis_texto.asp?ld=LEI%209887>.
em suporte eletrônico (DVD, CD-ROM), essa Acesso em: 22 dez.1999.

440 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 439-441, set./dez. 2006.
Instruções para colaboração

• Constituição Federal Destaques

BRASIL. Constituição (1988). Emenda O uso de negrito deve ficar restrito aos tí-
constitucional nº 9, de 9 de novembro de tulos e intertítulos; o de itálico, apenas para
1995. Lex: legislação federal e marginália, destacar conceitos ou grifar palavras em língua
São Paulo, v. 59, p. 1996, out./dez. 1995. estrangeira.

• Trabalhos publicados em Anais de Reedição


Congresso
Textos para reedição deverão ser apresen-
GUNCHO, M. R. A educação a distância e tados na forma originalmente publicada, de
a biblioteca universitária. In: SEMINÁRIO modo a assegurar a indicação da fonte primiti-
DE BIBLIOTECAS UNIVERSITÁRIAS, va. No caso de tradução, anexar cópia da folha
10., 1998. Fortaleza. Anais... Fortaleza: Tec de rosto da publicação original.
Treina, 1998. 1 CD-ROM.
Currículo
Siglas
Devem constar do trabalho informações
As siglas devem vir acompanhadas do quanto à titulação acadêmica do autor e res-
nome por extenso. pectiva instituição; atividades que desempe-
nha; instituição a que está vinculado; ende-
Ex.: Centro de Informação e Biblioteca em reços residencial, profissional e eletrônico
Educação (Cibec). completos.

Somente serão aceitos os trabalhos que preencherem as condições acima

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 87, n. 217, p. 439-441, set./dez. 2006. 441
Esta obra foi impressa em Brasília,
em dezembro de 2006.
Capa impressa em papel cartão supremo 250g
e miolo em papel off-set 90g.
Texto composto em ZapfEllipt BT corpo 10.

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