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POSICIONAMENTO DAS TESES E DISSERTAÇÕES EM EDUCAÇÃO NO

PERÍODO DE 2015-2019 ACERCA DA EDUCAÇÃO POR COMPETÊNCIAS

Diocélia Moura da Silva


Universidade de Passo Fundo
Bolsista CAPES
dioceliamoura@gmail.com
Altair Alberto Fávero
Universidade de Passo Fundo
altairfavero@gmail.com

Palavras-chave: Ensino por competências. Educação básica. Posicionamento político-pedagógico

1 Introdução

O ensino por competência está cada vez mais em voga na educação básica brasileira,
principalmente com a indução provocada pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) a qual
prevê a diluição do conhecimento em competências e habilidades. No entanto, essa tendência centrada
no ensino por competência é problemática na medida em que não se trata de uma proposta “nova” e
que, segundo Silva (2018; 2003), tem fortes influências de um modelo de educação importada e dos
modelos propostos pelo neoliberalismo e as pedagogias focadas no treinamento e desempenho. A
partir dessa contextualização, o presente trabalho apresenta um recorte de uma pesquisa mais ampla
que consistiu na análise de 29 teses e dissertações dos programas de pós-graduação em educação
brasileiros, publicadas no período de 2015-2019, e tem como escopo compreender como esses
trabalhos se posicionam a respeito da educação por competências na educação básica brasileira e
verificar as consequências desse modelo para a educação básica, para as políticas educacionais e o
atual estágio de discussão que essa temática (emprego do conceito) se encontra. O objetivo geral,
consiste em identificar e analisar o posicionamento político-pedagógico nas teses e dissertações
produzidas nos PPGEDU no período de 2015-2019, disponíveis no banco de teses e dissertações da
CAPES, e as possíveis consequência para a educação básica. Tendo como base esse objetivo, o estudo
concentrou-se em construir sua argumentação voltada para responder a seguinte pergunta: o que
dizem a respeito das competências na educação básica as teses e dissertações dos programas de pós-
graduação em educação (PPGEDU) no período de 2015 a 2019? Trata-se de uma pesquisa de natureza
básica: o método empregado é o analítico-hermenêutico; quanto a abordagem do problema, consiste
numa pesquisa qualitativa e quantitativa; quanto aos objetivos, é uma pesquisa descritiva-analítica; e
quanto aos seus procedimentos, caracteriza-se como uma meta-pesquisa. A coleta de dados deu-se
por meio da busca e análise de teses e dissertações disponíveis no catálogo de teses e dissertações da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), donde resultou a amostra
de 29 trabalhos acadêmicos distribuídos entre teses e dissertações.
2 Desenvolvimento

A ideia de competência é formada de um construto, polissêmico e adverso, que gera polêmicas


e posições controversas. Sacristán (2011) ao indagar sobre a que mundo nos leva a educação escolar
diluída em competências, comenta que para uns, educar por competências “conduz a uma sociedade
de indivíduos eficientes na grande engrenagem do sistema produtivo, a qual requer uma adaptação às
exigências da competitividade das economias do mercado global”, nessa ocasião, educar por
competências significa uma formação que é sinônimo de adaptação ao sistema de produção e
competição. Para outros, segue Sacristán (2011, p.8), educar por competências é “um movimento que
enfoca a educação como adestramento, um planejamento em que a competência resume o leque dos
grandes objetivos individuais ou coletivos, intelectuais, afetivos […] da educação”, tal posição
explicita que são definidos os comportamentos, as atitudes, os conhecimentos e habilidades esperadas
do cidadão e profissional do século XXI, os quais são treinados na educação escolar em um processo
de adestramento. Já para outros, educar por competências nos coloca “diante da oportunidade de
reestruturar os sistemas educacionais por dentro, superando o ensino baseado em conteúdos antigos
pouco funcionais, obtendo assim, uma sociedade não apenas eficiente, mas também justa,
democrática e inclusiva” (SACRISTÁN, 2011, p. 8). Nessa perspectiva, é possível apontar dois
grandes grupos de posicionamentos. Num grupo, sublinha-se discussões que apontam as
competências como destrutivas do processo de formação, pois estão em consonância com os
interesses empresariais, conforme também indicam Laval (2004) e Silva (2018; 2003). Também nesse
mesmo grupo, sublinha-se as discussões que compreendem as competências como originadas da
matriz condutivista da qual segundo Ramos (2006) e Silva (2003), surgiu a “pedagogia do domínio”
impulsionada pelos estudos de Bloom, a pedagogia por objetivos em referência ao behaviorismo de
Skinner e a pedagogia tecnicista, pedagogias as quais são criticadas devido ao foco estritamente no
desempenho e no treinamento do comportamento. No outro grupo, sublinha-se a perspectiva, também
defendida por Zabala e Arnau (2010) e Perrenoud (2004), de que a educação por competências traz
uma proposta inovadora que promete superar a ineficiência escolar e reafirmar os princípios
construtivistas de uma educação ativa, de preparo para que o sujeito atenda as exigências do século
XXI. A partir do referencial que fundamenta uma crítica às competências (LAVAL, 2004;
SACRISTÁN, 2011; RAMOS, 2006; SILVA, 2018; 2003), a promessa da educação por competências
que invoca a superação da ineficiência escolar é frágil, pois por trás dela há intenções estratégicas do
mundo capitalista que veste as competências com uma nova roupagem para que essas possam ganhar
status e simpatia popular. Além disso, o próprio discurso dessa promessa é contraditório, pois, ao
mesmo tempo que elas são invocadas como formação integral e ativa, na inserção dessas vem junto
a eliminação das humanidades e das artes, o discurso de preparação para uma falsa empregabilidade
e a estrita preocupação com a funcionalidade do conhecimento que é melhor representado pela ideia
de utilidade do conhecimento para determinado fim.
Com essa base, inspirada pelos estudos de Tonieto (2018) e Tonieto; Fávero (2020), passa-se
a análise das teses e dissertações para apresentar o alinhamento do posicionamento dessas teses e
dissertações, se estão a favor ou contra a educação por competências na educação básica brasileira.
Na análise desses trabalhos, obteve-se o resultado de 17 (ver gráfico 1) a seguir pesquisas que tratam
em suas argumentações de elementos, fatos ou fenômenos que se alinham às críticas da educação por
competências; 9 trabalhos que se alinham a favor do ensino por competências na educação básica e
3 que não demonstram posicionamento claro.
Gráfico 1: Posicionamento das teses e dissertações (2015-2019) acerca da educação por competências

Posicionamentos

Critica a educação por competências

3
Defende a educação por competências
10%

9 Não há posicionamento
17
31%
59%

Total: 29 trabalhos
Fonte: elaborado pela autora
Esses 17 trabalhos (teses e dissertações) que alinham seus posicionamentos contra a educação
por competências, defendem que da relação educação escolar e pedagogia das competências nasce
uma formação influenciada pelo discurso neoliberal da empregabilidade que dita uma forma de
desenvolver a adaptação e a flexibilidade dos estudantes para se adaptarem ao século XXI. Também
nasce uma formação fragmentada, aligeirada que secundariza o conhecimento, fato que resulta na
retirada do direito dos mais pobres ao acesso do conhecimento mais elaborado e na transformação da
educação em um processo de adestramento (treinamento do desempenho e comportamento).
Expressões como ‘retirar os direitos dos mais pobres quanto ao acesso ao conhecimento’, ‘negar a
formação realmente humana tornando-a instrumento de domínio da técnica para a empregabilidade’,
conformar/adaptar o sujeito dentro dessa lógica naturalizando as desigualdades sociais, o desemprego
e a falta de condições mínimas de sobrevivência’, foram as mais atribuídas por esses trabalhos para
designar seus posicionamentos quanto aos objetivos que a educação por competências tende a atingir
na educação básica. Tais posicionamentos apontam o alinhamento da noção de competência com o
neoliberalismo e condutivismo.
Quanto as teses e dissertações que se alinham a defesa da educação por competências (9),
apresentam trechos que salientam os posicionamentos a favor, nesses trechos há expressões que
definem uma possível promessa da educação por competências para superar a ineficiência escolar.
Portanto, ‘superar a educação tradicional passiva e desenvolver uma educação para a resolução de
problemas em situações profissionais e sociais’, ‘educar paras demandas do século XXI’, ‘capacitar
o aprender a aprender’ e ‘mobilizar pensamento crítico’, são as expressões mais encontradas na
argumentação dessas pesquisas para designar os objetivos que a educação por competências promete
alcançar na educação básica brasileira, os quais representam ideais construtivistas da visão sobre as
competências.

3 Considerações conclusivas/parciais

As conclusões da análise da amostra apontam, principalmente, que o posicionamento das teses


e dissertações é explicitado em duas concepções antagônicas. A primeira concepção entende a
educação por competências como aliada ao condutivismo e neoliberalismo dialogando com a
argumentação que se alinha contra a educação por competências na educação básica, pois é um
retrocesso formativo. A segunda concepção é formada sob a visão de que educação por competências
traz ideais construtivistas, se destacando como oportunidade ou promessa de avanço formativo. A
maior representatividade dos trabalhos mostra que a educação por competências não supera os ideais
condutivistas e neoliberais, portanto, as competências na educação são contraditórias descontruindo
a promessa de avanço formativo. A consequência para a educação básica é a negligência da formação
humana alargada e a transformação das políticas educacionais em técnicas-instrutivas. Coloca-se
como desafio o debate nacional e a análise das políticas educacionais em curso tendo em vista as
consequências que a educação por competências traz para a educação básica brasileira e para o
desenvolvimento humano.

Referências

LAVAL, Christian. A escola não é uma empresa: o neo-liberalismo em ataque ao ensino público.
Londrina: Planta, 2004.

PERRNOUD, Fhilipe. De uma metáfora a outra: transferir ou mobilizar conhecimento. In: DOLZ,
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RAMOS, Marise Nogueira. A pedagogia das competências: autonomia ou adaptação? São Paulo:
Cortez, 2006.

SACRISTÁN, J. G. Dez teses sobre a aparente utilidade das competências em educação. In:
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SILVA, Monica Ribeiro da. Competências: a pedagogia do “Novo Ensino Médio”. 2003. 305 f.
Tese (Doutorado em Educação: História, Política e Sociedade) – Pontifícia Universidade Católica
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TONIETO, C. Características epistemológicas das teses de Política Educacional no triênio


2010-2012. Tese (Doutorado em Educação). Passo Fundo: UPF, 2018.

TONIETO, C.; FÁVERO, A.A. A pesquisa em política educacional: análise de aspectos teórico-
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ZABALA, Atoni.; ARNAU, Laia. Como aprender e ensinar competências. Porto Alegre:
Artmed, 2010.

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