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INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIO - IBET

ESPECIALIZAÇÃO STICTO SENSU EM DIREITO TRIBUTÁRIO

FERNANDA PEREIRA MARTINS

ANÁLISE DO ARTIGO 149, VII, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL SOB A


PERSPECTIVA DO CONTRUCTIVISMO LÓGICO-SEMÂNTICO

São Paulo
2022
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

1. Constructivismo Lógico-Semântico – Breves notas sobre o método de análise

2. Regra-matriz de incidência tributária – Ferramenta para análise do artigo 149, VII,


do CTN

3. Análise do artigo 149, VII, do CTN


3.1. Alcance do enunciado do inciso VII do artigo 149 do CTN – Enfoque da questão
3.1.1. Leis ordinárias que estabelecem responsabilidade solidária de terceiro – ADI
do STF que afasta a sua competência – Atribuição das normas gerais.
3.1.2. Análise do artigo 149, VII, do CTN como norma geral que pode instituir
responsabilidade solidária de terceiros?
3.1.2.1. Sujeição passiva: contribuinte e responsável tributário
3.1.2.2. Artigo 124, I, do CTN – Interesse comum
3.1.2.3. O terceiro do artigo 149, VII, do CTN e a impossibilidade de construção da
regra-matriz de responsabilidade tributária
3.2. Artigo 124, II, do CTN como norma aberta autorizadora de novas hipóteses de
responsabilidade tributária.
3.3. Revisão de ato que na linguagem das provas demonstra ocultação do sujeito
passivo
3.3.1. Decadência para o desfazimento do negócio jurídico.

CONCLUSÃO
INTRODUÇÃO
Introdução (Marina citando João Maurício)Observações:
1) Justificativa da escolha
2) Explicitação metodológica
3) Resumo do conteúdo (plano de exposição)
4) Informar as premissas.
5) Abordagem estritamente normativa do direito – conjunto de normas (p. XXIII)
6) Aspecto dogmático (Tércio – Introdução ao Estudo do Direito – p. XXVII)
O trabalho a ser desenvolvido pretende estudar de forma analítica
o texto normativo relativo ao artigo 149, VII, do Código Tributário
Nacional - CTN, diante da necessidade de se investigar melhor o seu
alcance, uma vez que há escassez de trabalhos doutrinários sobre as
possibilidades encartadas por tal dispositivo.
O estudo proposto visa colaborar com o processo investigativo
dos problemas que o enunciado do artigo 149, VII, do CTN deixa em
aberto, a partir da análise das relações de coordenação e subordinação
desse dispositivo com as demais normas do sistema jurídico, cumprindo
o mister de explorar as normas do sistema jurídico no seu aspecto
sintático, semântico e pragmático.
Em razão disso, pretende-se responder a seguinte pergunta: O
terceiro, referido no inciso VII do artigo 149, do CTN, pode figurar como
sujeito passivo na relação jurídico-tributária constituída pela revisão do
lançamento?
Por hipótese, entendemos que o inciso VII do artigo 149 do CTN
não se presta a criar forma de responsabilidade tributária, ou seja, não
autoriza a inclusão do terceiro que participou do ilícito na relação
jurídico-tributária.
Há, contudo, na doutrina a posição de que esse terceiro citado no
artigo 149, VII, do CTN seria o “efetivo realizador do fato jurídico
tributário, partícipe dos atos negociais que se encontravam ocultos em
razão do pacto simulatório perpetrado com o auxílio de interposta
pessoa”1; levando a entendermos que se de fato o terceiro estiver
ocultado da condição de contribuinte ou responsável, deverá participar
da relação jurídica-tributária, ocupando a posição de sujeito passivo; do
contrário, pensamos que não é possível a sua inclusão nessa relação.
1
FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária. 4ª ed. São Paulo: Noeses, 2020, pg. 207.
Propõe-se neste trabalho a análise do artigo 149, VII, do CTN à
luz do Constructivismo lógico-semântico, de modo que não se tem como
iniciar o percurso dessa análise, sem antes conhecermos o direito pela
visão dessa Escola Jurídica. Assim, vamos traçar os principais conceitos
advindos desse método de conhecimento do direito, necessários à
incursão que faremos nos próximos capítulos. Criada pelos professores
Lourival Vilanova e Paulo de Barros Carvalho, o Constructivismo lógico-
semântico é escola de base epistemológica, que estuda o direito como
linguagem, analisando-o em seus aspectos sintático, lógico, semântico e
pragmático. A escola do Constructivismo Lógico-Semântico entende que
a realidade é constituída pela linguagem.
Nesse sentido, Aurora Tomazini de Carvalho 2 enuncia que “a
realidade se constitui pela linguagem e que só conhecemos aquilo que
constituímos linguisticamente em nosso intelecto”.
Com o advento da filosofia da linguagem, cujo marco inicial é a
obra de Wittgenstein (...) passou-se a considerar a linguagem
como algo independente do mundo da experiência e, até
mesmo, a ela sobreposta, originando o movimento hoje
conhecido como giro linguístico.3
O Constructivismo Lógico-Semântico, para melhor estudar a
norma jurídica tributária de incidência, promoveu o recorte necessário a
sua análise, assim, desenvolveu a chamada Regra-Matriz de Incidência
Tributária., que é instrumento que possibilita segregar, recortar o direito,
na espécie o direito tributário 4. A RMIT é utilizada como ferramente para
controlar a aplicação de da norma tributária da forma mais objetiva
possível.
Pelo trabalho aqui desenvolvido envolver tema sobre a
possibilidade de constituição de responsabilidade tributária de terceiro,
2
CARVALHO, Aurora Tomazini. A regra-matriz como esquema lógico de interpretação dos
textos jurídicos. In: BRITTO, Lucas Galvão; CARVALHO, Paulo de Barros. Lógica e Direito. 1
ed. São Paulo: Noeses, 2016. p.393.
3
TOMÉ. Fabiana Del Padre. A prova no direito tributário: de acordo com o código de processo
civil de 2015. 4 ed. São Paulo: Noeses, 2016. p.8.
4
“A regra-matriz de incidência tributária foi pensada por Paulo de Barros Carvalho a partir das
lições de Lourival Vilanova. É, portanto, um desdobramento do ‘Constructivismo Lógico-
Semântico’ que se apresenta como ‘meio e processo para construção rigorosa do discurso’ que
possibilita o exame da linguagem do direito positivo.” DUCCI, Renata Flório de Oliveira; BRAZ,
Jacqueline Mayer da Costa Ude. A norma de responsabilidade e a regra-matriz de incidência
tributária. In: MACHADO, Hugo de Brito; Ávila, Huberto; MARTINS, Ives Granda da Silva.
Revista brasileira de direito tributário e finanças públicas, n. 87. Porto Alegre: Magister, 2021.
P. 24.
por meio do artigo 149, VII, do CTN, é que se pretende demonstrar que
a partir da RMIT é possível adotar mesma estrutura de análise utilizada
para a incidência tributária para outros fenômenos jurídicos, como a
incidência da norma que constitui a responsabilidade tributária.

1. O Contructivismo Lógico-Semântico – Notas introdutória


imprescindível à compreensão da análise proposta
O trabalho que apresentamos tem por escopo promover uma
análise do artigo 149, VII, do Código Tributário Nacional e para
cumprirmos este mister, entendemos necessário inaugurar essa
travessia contextualizando o Constructivismo Lógico-Semântico, uma
vez que a análise pretendida tomará por base as suas premissas.
Daremos, então, início a este capítulo com a afirmação de que:
analisar nada mais é senão conhecer5.
Conhecer, assim, é tentar compreender aquilo o que nos cerca,
isto é, a realidade fenomênica, pelo método analítico. Para se conhecer
determinado objeto, tem-se que recortá-lo do resto do mundo, numa
atividade denominada abstração isoladora 6.
O estudo da forma como conhecemos as coisas, como captamos
a realidade que nos cerca, cabe à Filosofia do Conhecimento. Ela se
divide em: Filosofia da Linguagem e Filosofia da Consciência.
Para a Filosofia da Linguagem, o conhecimento é linguagem e é
ela que constitui o objeto: “a linguagem não mais para comunicar o
resultado do conhecimento (função descritiva da linguagem), mas, como
condição de possibilidade para o próprio conhecimento (função
constritiva da linguagem)”7.
Conhecer algo, então, é produzir uma proposição correspondente
a esse algo. É por meio da atribuição do sentido, que o homem conhece

5
“o conhecimento humano se estrutura em três processos: (i) atribuição de nomes, que nos
garante a identificação do objeto, que reflete um conceito (ideia) do objeto; (ii) definição, que
nos permite a delimitação e o conhecimento (em sentido estrito – proposicional) do objeto,
delimitando as características, associamos um termo (nome) a outros produzindo um juízo
(proposição) sobre o objeto; e a (iii) racionalização, que nos autoriza credenciar o
conhecimento (proposição) como verdadeiro, formamos o raciocínio pela relação criadas entre
as proposições. AURORA – CLS v.3 – Pg 26. – EU: LER FABIANA – DAS PROVAS.
6
Hursserl
7
Silvia – RMIT – p.8
as coisas apresentadas à sua experiência e assim o faz por meio de
uma linguagem. Existe, por consequência, a realidade de dentro (a
inteligível) que cria a que está fora do ser (a experimentada).
Dito isso, reconhece-se duas realidades: a que está dentro do ser
(constituída em linguagem) e a que está fora do ser, mas que a ele é
inacessível. Em síntese, a Filosofia da Linguagem tem por base
entender o conhecimento enquanto linguagem 8.
Com efeito, para se conhecer um dado objeto, deve-se
empreender sua análise a partir de um método, como fora proposto pela
por Edmund Husserl em sua fenomenologia9. E para o Constructivismo
Lógico-Semântico, o método por ele utilizado parte do direito como
construção linguística, fincado que está nas ideais da filosofia da
linguagem, no modelo conhecido como giro-linguístico (firmado pelo
Círculo de Viena)10.
O Constructivismo Lógico-Semântico é uma Escola do
Pensamento Jurídico e é um método. Na perspectiva de Escola, o
Constructivismo Lógico-Semântico estuda o direito delimitando
precisamente seu objeto e utilizando-se de um método. Enquanto
método, o Constructivismo Lógico-Semântico fixa um modelo de
conhecimento do direito como linguagem, como texto.
O Constructivismo Lógico-Semântico é, portanto, uma Escola
científica11 que se utiliza do método de enxergar o direito enquanto
linguagem, e delimita o objeto estudado: o direito positivo. Mais
especificamente, esse método é denominado analítico-hermenêutico 12
apto, no nosso sentir, como o mais adequado para a investigação do
artigo 149, VII, do Código Tributário Nacional.

8
CLS . V.3. AURORA, página 22.
9
Silvia – RMIT – pg 15.
10
Silvia – RMIT teoria à prática – p. 10 – “Pensar o Direito dentro do modelo proposto pelo Giro
Linguístico, implica nos seguintes pressupostos [...] percebe-se p direito positivo como um corpo de
linguagem prescritiva que constitui a realidade jurídica”.
11
“para a epistemologia o caminho para se ter contato com os objetos é a compreensão, sendo
um método empírico dialético [...] que é próprio dos objetos culturais (pois se vai dos fatos aos
valores e dos valores aos fatos).” CLS v. 3(p. 16)
12
Silvia – Análise da norma... – pg 4.
Entendendo-se como sendo o homem quem, por meio da
linguagem, constitui todo e qualquer objeto, dentro de uma cultura 13,
revela-se o direito como um objeto cultural; tomando-se esse por todo
aquele produzido pelo homem, que modifica a natureza circundante,
visando implantar valores.
A Escola do Constructivismo Lógico-Semântico, que estuda o
direito como texto14, deve buscar auxílio em outras ciências para melhor
conhecer o seu objeto. Por essa razão a semiótica e a lógica são
instrumentos essenciais.
A semiótica é a ciência que se ocupa dos signos, esse entendido
como unidade da linguagem. Signo é relação que se estabelece entre o
suporte físico do texto e sua significação 15. Uma vez que o direito é
tomado como linguagem, a sua análise deve se valer dos conceitos
desenvolvidos pela semiótica.
A semiótica observa a linguagem sobre três prismas: o sintático,
que cuida da estrutura da linguagem, da relação entre os signos; o
semântico, que analisa o conteúdo, isto é, a relação do suporte físicos
com o conteúdo e o pragmático, que se ocupa da utilização da
linguagem, da relação dos signos com os que os utentes. (VER p. 12 de
Silvia – RMIT)
A sua vez, a lógica, enquanto ciência que estuda a estrutura
formal de uma linguagem, seu aspecto sintático, permite que possamos
entender a estrutura implicacional da norma: D(H-C), isto porque, as
normas são sintaticamente homogêneas (apresentando todas as
mesmas estruturas) e semanticamente e pragmaticamente
heterogêneas16. O campo da lógica aplicada ao direito é a lógica
deôntica, que é específica para as linguagens normativas, do dever-ser.
O que a Ciência do Direito é capaz de produzir é uma perspectiva
sobre o objeto, já que a verdade se dá, apenas sobre as relações entre
13
OLEINIK, Rosana. Teoria da norma jurídica e a regra-matriz de incidência como técnica de
interpretação do direito. In: CARVALHO, Paulo de Barros. Construtivismo Lógico-semântico.
Vol I. São Paulo: Noeses, 2019. p.208.
14
Tudo o que é passível de interpretação é texto – PBC.
15
Curso de Direito PBC, p. 179
16
Silvia – RMIT – pg. 13: “apesar de ser fechado sintaticamente em razão da obediência ao padrão
normativo na forma estrutural D(h-C), permite a constituição de inúmeras hipóteses de incidência, em
consonância com a conduta que o legislador pretende regular.”
linguagens (premissas/conclusões), isto é, de modo logicamente
estruturado.
Com efeito, verifica-se que a denominação Constructivismo
Lógico-Semântico decorre do método de observar o direito como objeto
constituído (culturalmente) pelo ser humano a partir da linguagem,
presando pela definição precisa dos conceitos e coerência lógica do
discurso, noutras palavras, utilizando-se da amarração lógico-semântica
de conceitos17, próprio do discurso científico, de modo a tratar com
conceitos unívocos, retirando a vaguidade e ambiguidade do texto.
Para essa Escola do Pensamento Jurídico, o direito é um
conjunto de normas jurídicas válidas. Uma vez que o método utilizado
separa o plano da expressão do plano do conteúdo do texto, deve-se
distinguir também a norma jurídica em sentido amplo da norma jurídica
em sentido estrito18.
No plano da expressão, tem-se o texto produzido pelo legislador,
frases ou enunciados prescritivos. Já no plano do conteúdo, encontra-se
as proposições jurídicas, que são os juízos construídos na mente do
intérprete a partir dos enunciados.
A mensagem legislativa com um sentido prescritivo completo,
capaz de mudar a conduta intersubjetiva da forma pretendida pela
sociedade, nasce da proposição jurídica, isto é, do sentido retirado do
enunciado, construindo-se a norma jurídica em sentido estrito.
A norma jurídica em sentido estrito é construída, pelo processo da
interpretação (na mente do intérprete), tendo por base o texto normativo
(enunciado prescritivo, donde se extrai a proposição), a partir da
combinação de uma proposição-hipótese e uma proposição-
consequência, por meio de um vínculo implicacional formando essa
estrutura, denominada, estrutura lógica hipotético-condicional, assim
representada: D(H-C). Elas se formam, portanto, na subjetividade do
intérprete. O processo interpretativo é representado, dentro da Escola do

17
PBC – CLS – pg. 23
18
Silvia – Análise da norma ... – pg 1 e 2: “norma jurídicas, aqui consideradas como ‘significações
construídas a partir dos textos jurídicos positivados e estruturadas consoante a forma lógica dos juízos
condicionais – PBC Cusro de Direito...
Constructivismo Lógico-Semântico, pelo chamado percurso gerador de
sentido19.
As normas jurídicas em sentido amplo, em contrapartida, são
aquelas sinônimo das proposições jurídica retiradas dos enunciados,
que se encontram objetivamente nos textos normativos e que não
formam o juízo hipotético-condicional.
Por ser a norma jurídica em sentido estrito aquela capaz de
mudar condutas conforme a vontade de determinada sociedade 20, é que
se passa a chamá-la de norma jurídica 21; enquanto, a norma jurídica em
sentido amplo, de enunciado prescritivo.
A norma jurídica deve descrever hipoteticamente um fato de
possível ocorrência no contexto social (proposição-hipótese) e que, por
um vínculo implicacional, redunda na imposição de um comportamento
pretendido (proposição-consequência). Esse comportamento diz
respeito a uma conduta, obrigatória, permitida ou proibida, que ligam
duas ou mais pessoas.
[Ocorrendo um evento no mundo dos fenômenos e esse é
capturado e relatado por uma linguagem verte-se em fato (é o relato
linguístico de um evento).- ver Marina – revisão de lançamento – p. 101.]
Se esse fato corresponder à proposição-hipótese contida na norma
jurídica e uma autoridade competente produzir linguagem, nos termos
previstos em outra norma (que trata do procedimento) 22, esse fato se
torna um fato jurídico, num processo chamado de subsunção.
Quando se diz fato hipoteticamente previsto na norma jurídica, é
importante diferenciar de evento, porquanto o direito não incide sobre o

19
Num primeiro momento, o intérprete entra em contato com um dado objetivo, a literalidade textual,
um aglomerado de frases ordenadas que forma o plano de expressão do direito positivo (S1). Partindo
deste plano, com a leitura dos enunciados prescritivos, o intérprete vai atribuindo sentido (valores) aos
símbolos que os compõem e, assim, construindo em sua mente significações, que constituem o plano
das proposições ainda não deonticamente estruturados (S2). Estas proposições isoladas, no entanto,
ainda não contêm um sentido prescritivo completo, capaz de regulamentar condutas, é preciso, então,
que o intérprete as uma na forma implicacional D(H-C). Assim, ele junta algumas das significações na
posição sintática de hipóteses (causa) e outras, no lugar de consequente (efeito), ingressando no plano
das normas jurídicas em sentido estrito (S3).
20
Silvia – Análise da norma – p. 5: a mensagem prescritiva do direito, como única linguagem competente
capaz de regular as condutas intersubjetivas, ao verter os acontecimentos sociais em fatos jurídicos.
21
“uma norma é jurídica quando pode ser aplicada coercitivamente pelo Poder Judiciário em caso de
descumprimento de suas disposições – MARINA – PG. 123.
22 As normas jurídicas sempre entram aos pares: norma introdutória – veículo introdutor – e norma introduzida
evento, mas sobre a sua versão linguística, constituindo o fato jurídico, e
é sobre ela que os efeitos são produzidos). Razão pela qual se diz que o
direito cria sua própria realidade, que é paralela aos eventos sociais.
Uma vez constituído esse fato jurídico 23, automaticamente haverá
a ocorrência do efeito jurídico previsto na proposição-consequência
contida naquela norma jurídica, pelo processo chamado de implicação.
Só será relevante para o direito o evento que estiver demarcado
na norma geral e abstrata, para construir a norma individual e concreta,
donde nascerá o fato jurídico.
Pela subsunção do fato à hipótese normativa, por meio de
linguagem competente, constitui-se o fato jurídico 24 e pela implicação
instaura-se o efeito correspondente à conduta intersubjetiva que a
norma quer regular.
Os efeitos jurídicos constituem-se sempre numa relação jurídica
ligando dois ou mais sujeitos, onde um tem o direito subjetivo e o outro o
dever jurídico de cumprir). Essa relação jurídica é vínculo abstrato que
se instaura pela incidência da norma jurídica. Esse vínculo criado pela
relação jurídica instaurada corresponde sempre a uma permissão,
proibição ou obrigação (que representam os modais deônticos).
Nesta altura já se pode tratar essa norma jurídica como geral e
abstrata, ou seja, aquela norma construída na mente do intérprete a
partir do percurso gerador de sentido.
Com a incidência que se dá pelo processo da subsunção e da
implicação, isto é, com a constituição do fato jurídico e a imputação da
relação jurídica, é que se diz que é aplicada a norma jurídica geral e
abstrata sobre o caso concreto, constituindo norma individual e
concreta25. A norma jurídica geral e abstrata é denominada pela Escola
23 “
A hermenêutica atual fala em três níveis, tais como a leitura, a interpretação e a compreensão. [...]
este processo é chamado como a inesgotabilidade do sentido, tendo em vista que por mais que
percorramos esse caminho gerador de sentidos, nunca chegaremos ao final, por é inesgotável. A
interpretação é um processo, ou um percurso gerador de sentido”. [...] neste processo terá
compreensões diferentes. (ver Hursserl) – p. 13 A inesgotabilidade da interpretação, condicionada à
intertextualidade (contexto) do direito.
24 A constituição do fato jurídico pelo aplicador do direito importa sempre em um ato de valoração com relação aos fatos alegados e as provas apresentadas. Essa temática será

melhor desenvolvida no capítulo adiante sobre a linguagem das provas

25
Aplicar a norma é, portanto, positivar uma interpretação possível a se atribuído aos textos
jurídicos; ressalvando que toda construção normativa deve ser pautada em enunciados
jurídicos para garantir que o direito foi aplicado; bem assim deve-se garantir que o fato foi
do Constructivismo Lógico-Semântico de regra-matriz de incidência
tributária26.
Delineado, então, o sistema de referência que se adotará neste
trabalho e identificado o método que alicerçará a análise proposta,
entende-se necessário ainda, no próximo capítulo, ingressar na análise
da estrutura lógico-sintática da norma jurídica, por meio da investigação
da chamada regra-matriz de incidência tributária.
2. Regra-matriz de incidência tributária – Ferramenta epstemológica do
Constructivismo lógico-semântico

A regra-matriz de incidência tributária é ferramenta teórica


desenvolvida no seio da escola do Constructivismo lógico-semântico
para o estudo da norma jurídica. E, por meio dessa técnica também é
possível, a partir dos enunciados dos textos jurídicos, construir a norma
geral e abstrata de um tributo27.
Como teoria, a regra-matriz de incidência tributária permite a
melhor compreensão do objeto a ser analisado, no caso o direito
tributário. Nas palavras de seu criador, Paulo de Barros Carvalho,
Enquanto proposta epistemológica para efeito de isolamento da unidade
de percussão da norma jurídica tributária, a regra-matriz de incidência
tem cumprido admiravelmente os propósitos de sua concepção.28

aquele constituído pelo fundamento das provas lícitas. Assim, o intérprete está vinculado à
observação da linguagem das provas e do texto normativo, parte essa que será melhor
desenvolvida no capítulo próprio.
26
PBC – Fundamentos jurídicos da incidência – p. 62 – “a regra-matriz de incidência tributária é u’a
norma geral e abstrata que atinge as condutas intersubjetivas por intermédio do ato jurídico
administrativo do lançamento ou de ato do particular, veículos que introduzem no sistema norma
individual e concreta.
27
De uma percepção fragmentária dos elementos que, meramente ajuntados, se ofereciam à
observação do cientista, passou-se a uma compreensão una, incindível, indecomponível e que
corresponde, estritamente, ao mínimo deôntico com sentido completo, vale dizer, à mensagem
do legislador, operando com norma geral e abstrata, em que estatui uma classe de notas que
os acontecimentos do mundo devem conter para serem considerados fatos jurídicos tributários,
imputando-se a eles, enquanto fatos concretos, a eficácia jurídica de irradiarem uma relação
deonticamente modalizada (proibido, permitido e obrigado), entre dois ou mais sujeito de
direito, vínculo igualmente previsto em seus traços de presença imprescindível. (CARVALHO,
Paulo de Barros. Direito Tributário: reflexões sobre filosofia e ciência em prefácios. São Paulo:
Noeses, 2019. p.88-89.)
28
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: reflexões sobre filosofia e ciência em
prefácios. 1 ed. São Paulo: Noeses, 2019, p.87.
O cientista do direito vale-se da regra-matriz de incidência
tributária como categoria de estudo do direito tributário para formular, em
termos lógico-sintáticos, a estrutura de uma norma jurídica tributária. 29
Lucas Galvão Britto é assertivo ao afirmar que30:
Para além da consistência teórica dessa técnica, o bom êxito
que a regra-matriz de incidência tributária tem alcançado em
meio a estudos no Brasil e no exterior se deve à sua
capacidade de funcionar como um “mapa” da norma de
incidência de um tributo. Seu esquema lógico permite ao
intérprete compor o sentido da norma de incidência dos tributos
a partir dos dispositivos espalhados ao longo de extensos
diplomas normativos e até mesmo de documentos de distintas
hierarquias, como acontece com frequência na experiência
brasileira.

Ao se preencher os conteúdos da estrutura lógica da regra-matriz


de incidência com os enunciados do direito positivo, surge a norma
jurídica em sentido estrito, na sua acepção geral e abstrata, contendo o
mínimo necessário para a imposição tributária 31. Portanto, a regra-matriz
de incidência tributária é, também, denominação utilizada para norma
jurídica em sentido estrito32.
A regra-matriz de incidência, enquanto esquema lógico, deve
conter os critérios33 essenciais para a compreensão da mensagem
29
“A perspectiva analítica, portanto, é uma instância de controle da linguagem jurídica, de
redução de complexidades, na qual se afere sua estrutura, facilitando enormemente, a
posterior composição da norma em sua integralidade, em posterior momento hermenêutico.”
OLEINIK, Rosana. Teoria da norma jurídica e a regra-matriz de incidência como técnica de
interpretação do direito. In: CARVALHO, Paulo de Barros. Construtivismo Lógico-semântico.
Vol I. São Paulo: Noeses, 2019. p.311.
30
BRITTO, Lucas Galvão. Tributar na era da técnica: como as definições feitas pelas agências
reguladoras vêm influenciando a interpretação das normas tributárias. São Paulo: Noeses,
2018. p.819.
31
(A regra-matriz de incidência) “pode ser entendida tanto como estrutura lógica, quanto como
norma jurídica em sentido estrito. No primeiro caso, ela é desprovida de conteúdo jurídico.
Trata-se de uma estrutura abstrata, constituindo um sistema sintático, um esquema lógico-
semântico, que auxilia o intérprete na construção da norma jurídica. Já no segundo, surge
quando preenchidos semanticamente todos os campos sintáticos desse esquema.” BRAZ,
Jacqueline Mayer da Costa Ude. Substituição tributária no ICMS: construção de sentido e
aplicação. 1ª ed. São Paulo: Noeses, 2020. p.50. E-book. Disponível em: Amazon.com.br
eBooks Kindle: Substituição Tributária no ICMS: Construção de Sentido e Aplicação, Braz,
Jacqueline Mayer Da Costa Ude. Acesso em: 25 de mar. 2022.
32
“Por isso, uma vez aceita a possibilidade de uso da regra-matriz de incidência tributária para
explicar a norma tributária em sentido estrito, estará automaticamente, aceita a possibilidade de
se valer deste modelo para explicar as demais normas tributárias gerais e abstratas [...]”.
GAMA, Tácio Larcerda. Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 3
ed. São Paulo: Noeses, 2020. p.278.
33
“A exposição da fórmula da regra-matriz de incidência tributária evidência que suas variáveis
recebem o nome de critérios. A escolha dessa palavra para designá-los revela uma
interessante característica do fenômeno por ela estudado.” BRITTO, Lucas Galvão. Tributar na
normativa, de modo a preservar o núcleo da incidência dentro do
emaranhado de enunciados normativos existentes no texto tributário.
Não por outro motivo, a regra-matriz de incidência tributária é também
chamada de norma padrão de incidência.
Tem-se como critérios mínimos necessários à formulação da
norma geral e abstrata (i) o critério material, (ii) o critério espacial, o (iii)
o critério temporal, formando, eles, o antecedente da norma, e o (iv)
pessoal e (v) quantitativo, formando o consequente da norma jurídica
tributária.
Em breves notas, importante delimitar cada critério da regra-
matriz de incidência tributária, a saber: (i) critério material, que atina com
o evento a que a Constituição Federal elegeu como materialidade para a
cobrança do tributo; (ii) o critério espacial e o (iii) critério temporal, que
atinam, respectivamente, com o espaço geográfico e o tempo, onde
esse evento tem que ocorrer e em que momento para que seja possível
a instauração do tributo; (iv) o critério pessoal, que trata de quem deve
pagar o tributo, ou seja, o contribuinte e a quem deve pagar, o ente
tributante, (v) o critério quantitativo, dividido em base de cálculo e
alíquota, esse que estabelece o quantum da obrigação surgida do
sujeito passivo (contribuinte) para o sujeito ativo (ente tributante).
Uma vez preenchidos os critérios que constituem a estrutura
lógico-sintática da norma jurídica, pode-se dizer que passa a existir a
norma jurídica geral e abstrata.
Como formulação da estrutura lógica da norma jurídica, a regra-
matriz de incidência tributária permite saber o comando da mensagem
legislada, como adverte Aurora Tomazini Carvalho 34:
Mas como a lógica pode nos ajudar com o estudo do direito?
Bom, já é um grande avanço para responder essa pergunta
considerar que o legislador ao prescrever condutas
intersubjetiva produz uma linguagem (os textos do direito
positivo) e cria essa linguagem estabelecendo vínculos
implicativos entre um acontecimento do mundo fenomênico e a
conduta que ele quer ver cumprida pela sociedade. Outro

era da técnica: como as definições feitas pelas agências reguladoras vêm influenciando a
interpretação das normas tributárias. São Paulo: Noeses, 2018. p.846.
34
CARVALHO, Aurora Tomazini. A regra-matriz como esquema lógico de interpretação dos
textos jurídicos. In: BRITTO, Lucas Galvão; CARVALHO, Paulo de Barros. Lógica e Direito. 1
ed. São Paulo: Noeses, 2016. p.404.
avanço é entender que o estudo da Lógica se volta para as
estruturar de uma linguagem. É que o estudo da Lógica
Jurídica, será responsável por identificar as estruturas da
linguagem produzida pelo legislador, nos auxiliando a melhor
lidarmos com ela.

A regra-matriz de incidência utiliza-se da lógica para a verificação,


a partir dos enunciados contidos no texto de lei, da formação válida da
norma jurídica.
Com efeito, o instrumento lógico da regra-matriz de incidência
teve por fonte o arquétipo da norma jurídica proposto por Hans Kelsen,
onde se tem: D(p→q)35. Em linguagem desformalizada, essa estrutura
diz-se que: dado o fato “p” então deve-ser “q”.
Tal modelo desenvolvido por Kelsen, revelador de um juízo
hipotético condicional, diferencia as leis naturais – em que o conectivo
condicional ligando um antecedente a um consequente decorreria da
causalidade natural –, das leis jurídicas – em que o condicional
decorreria da vontade do legislador. 36
Inspirado nesse arquétipo da norma jurídica, Paulo de Barros
Carvalho propôs a regra-matriz de incidência tributária, cuja fórmula é
assim escrita: D{[Cm(v.c).Ce.Ct]→[Cp(sa.sp).Cq(bc.al)]}; onde D é o
dever-ser neutro (chamado também de functor-de-functor); cm é o
critério material composto de um verbo (v) e seu complemento (c), Ce é
o critério espacial e Ct o critério temporal, Cp é o critério pessoal
composto pelo sujeito ativo (sa) e pelo sujeito passivo (sp) e Cq é o
critério quantitativo composto pela base de cálculo (bc) e pela alíquota

35
“A estrutura da norma, como vimos em Kelsen, é composta por uma proposição-pressuposto
e uma proposição-consequente, enlaçadas por um functor deôntico neutro, donde aquela
descreve (descritor) uma situação possível de ocorrência factual, enquanto esta prescreve
(prescritor) uma conduta intersubjetiva.(...) Com isso, dada uma mesma estrutura para todas as
normas, a lembrar, D(p→q), em que p refere-se a uma proposição pressuposto, identificada
como um fato social possível, e q uma proposição-consequente, referente a prescrição de uma
conduta, Paulo de Barros Carvalho identifica os critérios necessários para, formalmente,
construir p e q, a saber: (i) critério material, espacial e temporal constituem p (proposição-
pressuposto); (ii) critério pessoal e prestacional constituem q (proposição-consequente).”
MARTINS, Bruce Bastos. Introdução ao estudo do constructivismo lógico-semântico no direito e
a regra matriz de incidência jurídica: breve passagem das reflexões lógicas de Descartes até
Paulo de Barros Carvalho. In: CARVALHO, Paulo de Barros. Construtivismo Lógico-semântico.
Vol III. São Paulo: Noeses, 2019. p.202-204.
36
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: fundamentos Jurídicos da Incidência. 10 ed.
São Paulo: Saraiva, 2015. p.52.
(al); e o símbolo “.” é o conectivo conjuntor e “→” é o conectivo
condicional.
A regra-matriz de incidência utiliza-se da lógica para verificar a
validade da norma jurídica; assim, não sendo possível extrair dos
enunciados prescritivos contidos no texto jurídico o preenchimento
semântico para os critérios necessários à composição da “estrutura
mínima e irredutível”37 que se manifesta o deôntico, não se pode ter a
instituição do tributo38.
Noutras palavras, a regra-matriz de incidência tributária, enquanto
norma geral e abstrata, deve conter os critérios 39 essenciais para que
possa se estabelecer a incidência normativa, isto é, para que a norma
individual e concreta possa surgir. Mas, uma vez não sendo esses
critérios preenchidos, não haverá incidência válida, não se podendo
cogitar de norma jurídica individual e concreta.

2.1. Regra-matriz de incidência: fundamento de validade para a norma


individual e concreta
Enquanto modelo de regra de que se vale a Ciência do Direito, a
regra-matriz de incidência tributária dá o alicerce necessário à análise do
direito para a construção da norma jurídica válida, porquanto lhe permite
exercitar sua análise analítica, através de seu processo de formalização.

37
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5 ed. São Paulo:
Noeses, 2013. p.611.
38
“As funções operativas do esquema lógico da regra-matriz são basicamente delimitar o
âmbito da incidência da norma e controlar a constitucionalidade e legalidade normativa. Sendo
assim, ao preencher com o conteúdo dos textos positivados o esquema da regra-matriz de
incidência, o intérprete delimita a extensão dos conceitos conotativos da hipótese e do
consequente. Projetando isso na linguagem da realidade social, os acontecimentos capazes de
estabelecer as relações jurídicas ficam delimitados, o que também ocorre com o conteúdo
dessas relações.” BRAZ, Jacqueline Mayer da Costa Ude. Substituição tributária no ICMS:
construção de sentido e aplicação. 1ª ed. São Paulo: Noeses, 2020. p.51. E-book. Disponível
em: Amazon.com.br eBooks Kindle: Substituição Tributária no ICMS: Construção de Sentido e
Aplicação, Braz, Jacqueline Mayer Da Costa Ude. Acesso em: 25 mar. 2022.
39
“‘Critério’, vemos que uma de suas acepções que se preserva desde origem grega do termo é
a de “regra para distinguir o verdadeiro do falso”. Trata-se de noção que se coaduna com a
compreensão dos critérios da regra-matriz de incidência tributária, pois o alcance das
propriedades por eles determinadas determina uma regra para distinguir, não a verdade ou a
falsidade, mas os fatos que podem ensejar a incidência fiscal, separando-os de todos os
acontecimentos que nos darão cabimento à cobrança do tributo.” BRITTO, Lucas Galvão.
Tributar na era da técnica: como as definições feitas pelas agências reguladoras vêm
influenciando a interpretação das normas tributárias. São Paulo: Noeses, 2018. p.863.
Nesse sentido, valiosos são os ensinamentos de Lucas de Britto
Galvão40:
Sendo operação lógica, convém examiná-la pelos estudos de
lógica. Seguindo essa senda, como anota Cesar Mortari, há
duas formas de apontar que um elemento pertence a um
conjunto: a enumeração e a descrição. Quando enumeramos,
seguimos a via da denotação e designamos os elementos do
conjunto um a um, buscando o seu nome próprio; quando,
porém, descrevemos esse conjunto, fazemos uso da conotação
para aludir indiretamente aos elementos por meio de suas
propriedades: os atributos cuja presença ou ausência são
determinantes para julgar se um membro qualquer pertence ou
não pertence ao conjunto. (...). Desse modo, os critérios da
regra-matriz de incidência tributária cumprem uma importante
função de delinear, em conjunto, quais serão as propriedades
que os elementos (acontecimentos da vida social) devem
apresentar para pertencer à classe dos fatos descritos na
norma geral e abstrata, perfazendo a primeira das operações
lógicas envolvidas na incidência, a subsução.

A norma jurídica geral e abstrata, revelada como a regra-matriz


de incidência de um determinado tributo, funciona, portanto, como perfil
a conferir fundamento de validade à norma individual e concreta lançada
no ordenamento41.
Decorre da regra-matriz de incidência de um determinado tributo,
enquanto norma jurídica geral e abstrata, a sua condição de fundamento
de validade da norma jurídica individual e concreta que insira no sistema
jurídico a cobrança do tributo. Na hipótese de faltar à norma individual e
concreta alguns dos critérios contidos na sua respectiva regra-matriz de
incidência tributária, ou de lhes serem diferentes dos critérios nela
previstos, tem-se um ilícito na criação da norma.

40
BRITTO, Lucas Galvão. Tributar na era da técnica: como as definições feitas pelas agências
reguladoras vêm influenciando a interpretação das normas tributárias. São Paulo: Noeses,
2018. p.846.
41
“Essa delimitação do campo da incidência também possibilita o controle do ato, que toma a
regra-matriz como fundamento jurídico, ou do próprio ato legislativo que a criou. Assim, a
norma individual e concreta deve se coadunar com a regra-matriz de incidência, que a
fundamentou. Caso não ocorra, o ato deverá ser questionado. A constitucionalidade da regra-
matriz, enquanto norma jurídica, também pode ser objeto de análise para se verificar a sua
consonância com as normas de que ela retira fundamento.” BRAZ, Jacqueline Mayer da Costa
Ude. Substituição tributária no ICMS: construção de sentido e aplicação. 1ª ed. São Paulo:
Noeses, 2020. p.54. E-book. Disponível em: Amazon.com.br eBooks Kindle: Substituição
Tributária no ICMS: Construção de Sentido e Aplicação, Braz, Jacqueline Mayer Da Costa Ude .
Acesso em: 25 mar. 2022.
Nesse sentido, nota que merece destaque é a encartada por
Paulo de Barros Carvalho42:
Quando os desacertos de linguagem envolverem duas ou mais
normas, sendo uma delas, obrigatoriamente, individual e
concreta, e outra, também necessariamente, geral e abstrata,
teremos erro de direito

Sobre o tema do erro que pode ocorrer na enunciação de textos


normativos, a que Tácio Lacerda Gama chama de ilícitos
monogenéticos,43 temos que44:
Por força disto, são tão difundidas as expressões erro de fato e
erro de direito, para expressar, também elas, a criação ilícita de
normas.
(...)
Assim, o erro de direito e erro de fato designam,
respectivamente, incompatibilidade da norma individual e
concreta com a norma que lhe serve de fundamento; e
incompatibilidade da norma individual e concreta com a
linguagem das provas.
No primeiro caso, a norma viola a competência. No segundo, a
violação é indireta, pois a norma constitui fato diverso daquele
que era para ser constituído. Num caso, o problema é
internomartivo e se comprova mediante o confronto entre
normas. Já no outro, o problema é interno à norma individual e
concreta e se comprova confrontando as provas, relativamente
ao fato, com a descrição feita no antecedente da norma.

Por esse motivo, não havendo na expedição da norma individual


e concreta os elementos mínimos contidos na norma geral e abstrata
correspondente, ou lhes sendo diversos, a norma expedida não poderá
subsistir, uma vez que, pelo erro de direito, não terá fundamento de
validade.

2.2. A regra-matriz de incidência tributária e sua relação com as demais regras-


matrizes

42
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 30 ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
p.420.
43
“ix. denominamos de ‘ilícito monogenético’ a conduta de criar uma norma sem fundamento
na norma de competência”. GAMA, Tácio Larcerda. Competência tributária: fundamentos para
uma teoria da nulidade. 3 ed. São Paulo: Noeses, 2020. p.345.
44
GAMA, Tácio Larcerda. Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 3
ed. São Paulo: Noeses, 2020. p.358-360.
A regra-matriz, enquanto mapa da incidência, não se submete
apenas aos domínios do direito tributário45.
Em obra dedicada à teoria da regra-matriz de incidência, Antônio
Machado Guedes Alcoforado é assertivo ao dizer: 46
a adequada utilização dessa teoria, como método, aperfeiçoa a
produção da Ciência do Direito, em face da redução de suas
incoerências, vaguidades, ambiguidades e, por conseguinte,
possibilita uma melhor compreensão do fenômeno jurídico em
qualquer ramo do Direito.

Revela-se possível, então, falar de regras-matrizes de incidência


não só em relação ao fenômeno da incidência tributária, mas também a
outros fenômenos de incidência normativa, uma vez que é certo ser o
direito positivo homogeneamente sintático47.
Eis a importância do estudo da regra-matriz de incidência para a
Ciência do Direito, porquanto auxilia na análise do direito positivo e no
processo interpretativo necessário à construção da norma jurídica geral
e abstrata a ser formada da colheita dos enunciados espalhados pelos
textos jurídicos.

2.3. Construção da regra-matriz de responsabilidade tributária a partir do


enunciado contido no artigo 135 do CTN
Visto que a regra-matriz de incidência, enquanto ferramenta no
processo interpretativo, pode ser utilizada não só para a construção da
norma de incidência tributária, mas também para a construção de outras
45
“A teoria da regra-matriz de incidência – RMI, como norma geral e abstrata preenchida pelo
intérprete com os recursos da semântica e da pragmática para a construção da norma que
incide em qualquer ramo do Direito. Ex.: norma de incidência de responsabilidade tributária,
norma de incidência de sanção penal.” ALCOFORADO, Antônio Machado Guedes. A teoria da
regra-matriz de incidência como parte do método hermenêutico-filosófico científico denominado
constructivismo lógico-semântico. In: CARVALHO, Aurora Tomazini; CARVALHO, Paulo de
Barros. Construtivismo lógico-semântico. 1 ed. São Paulo: Noeses, 2018, p. 80.
46
ALCOFORADO, Antônio Machado Guedes. A teoria da regra-matriz de incidência como parte
do método hermenêutico-filosófico científico denominado constructivismo lógico-semântico. In:
CARVALHO, Aurora Tomazini; CARVALHO, Paulo de Barros. Construtivismo lógico-semântico.
1 ed. São Paulo: Noeses, 2018, p. 53
47
“Ao observar que as normas de incidência possuem um mesmo padrão sintático, compostas
por conteúdos mínimos, ou seja, apenas aqueles absolutamente necessários para identificar o
fato e a relação jurídica dele decorrente, Paulo de Barros Carvalho criou um método para ‘isolar
as variáveis envolvidas na composição dos fatos jurídicos e relações jurídicas’”. DUCCI,
Renata Flório de Oliveira; BRAZ, Jacqueline Mayer da Costa Ude. A norma de
responsabilidade e a regra-matriz de incidência tributária. In: MACHADO, Hugo de Brito; Ávila,
Huberto; MARTINS, Ives Granda da Silva. Revista brasileira de direito tributário e finanças
públicas, n. 87. Porto Alegre: Magister, 2021. P. 24
normas, passa-se a análise da regra-matriz de responsabilidade
tributária.
Para tanto, vamos eleger a responsabilidade prevista no artigo
135 do CTN, porquanto é terreno fértil que abarca modalidade de
responsabilidade como penalidade, que servirá de importante
instrumento para a análise do artigo 149, VII, do CTN.
Na hipótese do artigo 135 do CNT para a ocorrência da
responsabilidade tributária é necessário que a sua materialidade seja
conjugada de fato jurídico tributário com outro fato ilícito. Teremos,
portanto, no antecedente da norma de responsabilidade um enunciado
molecular assim composto: um fato jurídico tributário conjugado com o
evento, no caso, ilícito48.
Pela ocorrência da regra-matriz da responsabilidade tributária,
tem-se que ou se impede o lançamento contra o contribuinte pela
ineficácia sintática da regra-matriz de incidência, ante a existência de
norma de responsabilidade inibidora da incidência dessa, não se
juridicizando o fato tributário ou revoga/anula o crédito tributário já
lançado, alterando a pessoa que vai integrar o polo passivo da
obrigação tributária49.
Para a emissão de norma jurídica individual e concreta de
responsabilidade, é necessário que haja a realização do fato jurídico
tributário, mas que, em razão de fato ilícito praticado pelo responsável,
não se dê o cumprimento da relação jurídico-tributária entre o
contribuinte e o fisco, atraindo assim a formação da relação jurídica do
responsável com o fisco.

48
“a regra de responsabilidade tributária descreve na sua hipótese dois núcleos cumulativos,
inseparáveis e logicamente dependentes, que correspondem às notas do fato jurídico tributário
em sentido estrito conjugado às notas indicativas de outro evento qualquer, lícito ou ilícito. Ou
seja, o antecedente normativo será sempre composto por dois verbos, por duas condutas. É
justamente este ‘fato complexo’ a causa eleita pelo legislador para a imputação da
responsabilidade”. DARZÉ, Andréa M. Responsabilidade tributária: solidariedade e
subsidiariedade. São Paulo: Noeses, 2010. p.124/125.
49
“Por enquanto, importa deixar consignado que, em nossa opinião, dois são efeitos mais
comuns que provoca: i. a ineficácia técnico-sintática do enunciado sobre a sujeição passiva que
compõe a regra-matriz de indicência em sentido amplo; ou ii. a necessidade de positivação de
nova norma individual e concreta que: ii.1 revoga parcialmente, ou ii.2. que irá existir
conjuntamente com a norma que constitui o crédito tributário em face do sujeito que realizou o
fato tributário”. DARZÉ, Andréa M. Responsabilidade tributária: solidariedade e
subsidiariedade. São Paulo: Noeses, 2010. p.89/90.
Comungamos do entendimento50, importante frisar, de que a
responsabilidade tributária autoriza a criação de regra-matriz própria.
Não entendemos, portanto, que a responsabilidade tributária implica
apenas na alteração do critério pessoal da regra-matriz de incidência
tributária51.
De tudo o que foi dito sobre a regra-matriz de incidência, em que
ela figura tanto como ferramenta no processo interpretativo dos textos
normativos, como também norma jurídica em sentido estrito, na
qualidade de geral e abstrata, cabe, igualmente, à regra-matriz de
responsabilidade tributária.
É que, por meio da fórmula da regra-matriz de responsabilidade,
será visto que o contribuinte não integra a relação jurídico-tributária,
como também no critério material não se terá tão somente um evento
tributário, mas igualmente se terá a previsão de outro fato, que no caso
em análise (responsabilidade capitulada no artigo 135 do CTN) será um
fato ilícito.
Exsurge do exposto a importância de construir uma regra-matriz
de responsabilidade tributária para o estudo do tema. Uma vez
preenchido a formulação da regra-matriz de responsabilidade por meio
dos enunciados prescritivos, é possível se ter bases sólidas para
analisar o fundamento de validade das normas individuais e concretas
de responsabilidade que são lançadas no sistema.
Como norma que dá fundamento de validade à norma individual e
concreta de responsabilidade, se a regra-matriz de responsabilidade não
for observada nos rigores de seus critérios, não se poderá falar em
emissão de norma válida a possibilitar o cumprimento de qualquer
obrigação pelo sujeito passivo daquela relação, no caso o responsável
tributário.

50
ALCOFORADO, Antônio Machado Guedes. A teoria da regra-matriz de incidência como
parte do método hermenêutico-filosófico científico denominado constructivismo lógico-
semântico. In: CARVALHO, Aurora Tomazini; CARVALHO, Paulo de Barros. Construtivismo
lógico-semântico. 1 ed. São Paulo: Noeses, 2018, p. 86.
51
DUCCI, Renata Flório de Oliveira; BRAZ, Jacqueline Mayer da Costa Ude. A norma de
responsabilidade e a regra-matriz de incidência tributária. In: MACHADO, Hugo de Brito; Ávila,
Huberto; MARTINS, Ives Granda da Silva. Revista brasileira de direito tributário e finanças
públicas, n. 87. Porto Alegre: Magister, 2021.
Inicia-se, de logo, fazendo as distinções necessárias entre a
regra-matriz de incidência tributária e a regra-matriz de
responsabilidade52. Em que a primeira tem no seu antecedente uma
hipótese de incidência tributária; enquanto a segunda tem no seu
antecedente um fato não tributário que, no caso da responsabilidade do
artigo 135 do CTN é um fato ilícito53.
Não se pode, nesse diapasão, deixar também de diferenciar o
consequente da regra-matriz de responsabilidade do consequente da
regra-matriz de incidência tributária. Naquele, tem-se em seu critério
pessoal, na qualidade de sujeito passivo, um terceiro com obrigação de
pagar o tributo, no outro, tem-se o contribuinte.
De notar que, a regra-matriz de responsabilidade tem no critério
pessoal, na condição de sujeito passivo, aquele que não praticou o
verbo contido no critério material da regra-matriz de incidência tributária,
mas sim aquele que praticou fato não tributário, a que se denomina de
responsável tributário.
Da distinção entre o contribuinte o responsável 54, não se tem
dúvida que antecedente da regra-matriz de responsabilidade difere do
antecedente da regra-matriz de incidência tributária, sendo certo que,
pelo antecedente dessas duas normas serem distintos, é que se
entende pela impossibilidade de serem traduzidas com iguais equações
dentro da linguagem lógica das formulações55.
Na regra-matriz de incidência tributária tem-se no antecedente a
prática de um ato lícito (conforme prescreve o artigo 3º do Código
52
“também nos sentimos habilitados a definir a responsabilidade tributária como norma jurídica
que prescreve em seu antecedente notas de um fato não tributário (lícito ou ilícito), mas que
tem como pressuposto necessário um fato tributário (ainda que presumido).” DARZÉ, Andréa
M. Responsabilidade tributária: solidariedade e subsidiariedade. São Paulo: Noeses, 2010. p.
87.
53
“Daí entendemos ser perfeitamente possível estabelecer o fato ilícito como antecedente da
regra de responsabilidade, sem que isso implique qualquer violação ao conceito constitucional
de tributo.” DARZÉ, Andréa M. Responsabilidade tributária: solidariedade e subsidiariedade.
São Paulo: Noeses, 2010. p. 103.
54
Com efeito, o Código Tributário Nacional define, no seu artigo 121, o contribuinte como o
sujeito que dever ter relação pessoal e direta com o fato tributário, enquanto o responsável
como o sujeito que, ao ser designado por lei, fique obrigado ao pagamento do tributo sem
revestir-se da condição de contribuinte.
55
“Afinal, uma coisa é o fato tributário, outra, bem diferente, é o fato da responsabilidade. Esse
pressupõe aquele, mas com ele não se confunde.” DARZÉ, Andréa M. Responsabilidade
tributária: solidariedade e subsidiariedade. São Paulo: Noeses, 2010. p. 103.
Tributário Nacional), representada pelo seu critério material, composto
do verbo e seu complemento. Enquanto, na regra-matriz de
responsabilidade, pode haver hipóteses de fato ilícito como antecedente
sem que isso viole a definição de tributo, pois o fato da responsabilidade
é distinto do fato tributário, embora esse seja o pressuposto daquele.
Para melhor elucidar o que estamos tratando, pertinente é a
narrativa de Andréa M Darzé56 sobre o tema:
A regra de responsabilidade tributária descreve nas suas
hipóteses dois núcleos cumulativos, inseparáveis e
logicamente dependentes, que correspondem às notas do fato
jurídico tributário em sentido estrito conjugado às notas
indicativas de outro evento qualquer: lícito ou ilícito. Ou seja, o
antecedente normativo será sempre composto por dois verbos,
por duas condutas. É justamente este “fato complexo” a causa
eleita pelo legislador para a imputação da responsabilidade.

Na citada obra, em nota antecedente, tem-se o seguinte


esclarecimento57:
não é qualquer fato ilícito que pode ensejar a atribuição de
sanção dessa natureza; deve ser fato que represente obstáculo
à positivação da regra-matriz de incidência tributária

Portanto, a responsabilidade tributária não representa apenas


uma alteração do critério pessoal da regra-matriz de incidência tributária,
eis que, o evento previsto na norma que estabelece a responsabilidade
é distinto do que compõe o critério material da regra-matriz de incidência
tributária.
Em termos formais, podemos representar a regra-matriz da
responsabilidade contida no artigo 135 do CTN, da seguinte forma:
D {F→[(S R S’’). – (S R S’)]}. Onde: D é o functor-de-functor,
neutro, não modalizado (dever-ser); F é o antecedente da norma de
responsabilidade, que corresponde a conduta dolosa praticada por S’’ (a
exemplo do sócio que age com excesso de poderes); (S R S’’) é a
relação jurídica de responsabilidade mantida entre o sujeito ativo da
relação jurídica e o sócio; S é o sujeito ativo da relação jurídica (por

56
DARZÉ, Andréa M. Responsabilidade tributária: solidariedade e subsidiariedade. São Paulo:
Noeses, 2010. p. 124/125.
57
DARZÉ, Andréa M. Responsabilidade tributária: solidariedade e subsidiariedade. São Paulo:
Noeses, 2010. p. 96)
exemplo, o fisco); S’ é o contribuinte; S’’ é o responsável; R é o objeto
prestacional; o símbolo “.” é o conectivo conjuntor; o símbolo “→” é o
conectivo condicional e – (S R S’) é a negação da relação entre o sujeito
ativo da relação jurídico tributária e o contribuinte.
Diante da configuração dessa hipótese de responsabilidade,
prevista pelo artigo 135 do CTN, cuja responsabilidade do terceiro é
pessoal, haverá a incidência da regra-matriz de responsabilidade
tributária aplicável à essa subespécie, modificando a sujeição passiva da
regra-matriz de incidência, para incluir o infrator como o responsável
pelo cumprimento da obrigação.
Com efeito teremos a que regra-matriz de responsabilidade,
formada a partir do artigo 135 do CTN, anula ou impede a incidência da
regra-matriz de incidência tributária, em razão da ineficácia técnico-
sintática do enunciado sobre a sujeição passiva que compõe essa
norma, conforme ocorrer o momento de sua incidência.
Ainda, nas palavras de Andréa M. Darzé58, temos que:
Também aqui o legislador foi explícito ao indicar o produto de
relações que se estabelece entre a presente norma e a regra-
matriz de incidência em sentido amplo. Ao afirmar que a
responsabilidade do terceiro é pessoal, deixou claro que a
inserção da norma de responsabilidade no sistema revoga ou
mesmo impede a incidência daquela outra na qual o
contribuinte ocupar o lugar sintático de sujeito passivo. Essas
variações de efeitos, é bom que se esclareça, leva em conta
apenas o estágio do processo de positivação no qual se
certifica a ocorrência do ilícito – se anterior ou posterior à
lavratura da norma individual e concreta em face do
contribuinte (...).

De esclarecer, por oportuno, que a citada Autora faz uso da


expressão norma geral e abstrata em sentido estrito no lugar de regra-
matriz de responsabilidade tributária, contudo, neste trabalho, por se
entender pela possibilidade de poder falar-se em regra-matriz de
responsabilidade tributária, utilizaremos essas duas como expressões
correspondentes. Ademais, ela utiliza-se da expressão norma geral e
abstrata em sentido amplo para se referir à regra-matriz de incidência
tributária, que, uma vez conjugada com a norma de responsabilidade,
58
DARZÉ, Andréa M. Responsabilidade tributária: solidariedade e subsidiariedade. São Paulo:
Noeses, 2010. p. 177/178.
formaria a chamada norma geral e abstrata em sentido estrito, que para
nós nada mais é senão a regra-matriz de responsabilidade tributária 59.
De destacar que, conforme for a subespécie da responsabilidade
tributária de que se trate (quer por sucessão, quer por infração, quer por
substituição), o resultado produzido pela incidência da regra-matriz de
responsabilidade será distinto de acordo com o evento ensejador da
responsabilidade60.
No caso em análise, abordou-se, tão somente o efeito produzido
pela regra-matriz de responsabilidade construída a partir do artigo 135
do CTN.
Ademais, sobre a possibilidade da construção da regra-matriz de
responsabilidade tributária, há autores que que entendem
diferentemente, é o caso de Renata Flório de Oliveira Ducci e Jaqueline
Mayer da Costa Ude Braz61, que pela precisão e síntese com que tratam
do tema, no ponto em que divergem do aqui abordado, merece
destaque:
A norma de responsabilidade tributária é norma jurídica em
sentido amplo, ou seja, a partir dela, não é possível a
construção de um juízo hipotético-condicional. Desse modo, no
momento da construção da norma jurídica aplicável ao caso, a
norma de responsabilidade altera a sujeição passiva no critério
pessoal da regra-matriz de incidência.
(...)
No caso da responsabilidade pessoal, prevista no artigo 135 do
CTN, a norma jurídica em sentido amplo de responsabilidade
altera a regra-matriz de incidência tributária para fazer com que
o terceiro componha o polo passivo na relação jurídica que
tenha por objeto o tributo.

59
“A despeito disso, no decorrer do presente trabalho, ora utilizaremos a expressão regra-
matriz de incidência tributária neste sentido mais restrito, ora em acepção ampla, querendo nos
referir à norma instituidora do tributo ‘antes’ de sofrer a interferência dessas normas – em
especial, das regras de responsabilidade -, que direta ou indiretamente delineiam a obrigação
de pagar tributos, elucidando sempre a significação com que a empregamos.” DARZÉ, Andréa
M. Responsabilidade tributária: solidariedade e subsidiariedade. São Paulo: Noeses, 2010. p.
26/27.
60
Os diferentes resultados do cálculo de relações entre os enunciados normativos que versam
sobre a sujeição passiva tributária (...) na medida em que tratarmos de cada subespécie de
responsabilidade. DARZÉ, Andréa M. Responsabilidade tributária: solidariedade e
subsidiariedade. São Paulo: Noeses, 2010. p.89.
61
DUCCI, Renata Flório de Oliveira; BRAZ, Jacqueline Mayer da Costa Ude. A norma de
responsabilidade e a regra-matriz de incidência tributária. In: MACHADO, Hugo de Brito; Ávila,
Huberto; MARTINS, Ives Granda da Silva. Revista brasileira de direito tributário e finanças
públicas, n. 87. Porto Alegre: Magister, 2021. P. 38/39.
Quadra esclarecer, todavia, para os fins deste trabalho, que a
norma de responsabilidade contida no dispositivo analisado (artigo 135
do CTN) é norma jurídica em sentido lato, ou seja, é aqui entendida
como enunciado normativo. Contudo, juntamente com outros
enunciados prescritivos, que tratam da materialidade do tributo, dos
sujeitos, da alíquota etc., formam a regra-matriz de responsabilidade
tributária, isto é, norma geral e abstrata, que servirá como fundamento
de validade da norma individual e concreta de responsabilidade, emitida
quando o evento previsto naquela norma geral e abstrata for vertido em
linguagem competente. Com efeito, “Ausente qualquer das partes e não
se terá suporte fático suficiente para a sua incidência”. 62
De tudo que foi exposto, entende-se pela importância da
construção da regra matriz de responsabilidade tributária, ante a sua
utilidade prática na verificação da validade da norma jurídica individual e
concreta e será ferramenta essencial para analisar a possibilidade de
construção da regra-matriz de responsabilidade tributária a partir do
enunciado contido no artigo 149, VII, do CTN, que é o objeto de análise
deste trabalho.

3. Análise do artigo 149, VII, do CTN


Para dar início ao tema é fundamental fazer alguns recortes, de
modo a poder analisar os institutos que o cercam.
Inicialmente é de se ver o que trata o artigo 149 do CTN, verbis:
Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela
autoridade administrativa nos seguintes casos:
I - quando a lei assim o determine;
II - quando a declaração não seja prestada, por quem de
direito, no prazo e na forma da legislação tributária;
III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha
prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de
atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido
de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa,
recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo
daquela autoridade;
IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a
qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo
de declaração obrigatória;

62
DARZÉ, Andréa M. Responsabilidade tributária: solidariedade e subsidiariedade. São Paulo:
Noeses, 2010. p. 125.
V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da
pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se
refere o artigo seguinte;
VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo,
ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de
penalidade pecuniária;
VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em
benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;
VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não
provado por ocasião do lançamento anterior;
IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu
fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou
omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade
especial.
Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada
enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.

O artigo 149 transcrito trata das hipóteses de revisão de


lançamento, e o presente estudo tem por objeto especificamente a
análise do seu inciso VII. Com efeito, apesar disso, entendemos
necessário abordar, inicialmente, a figura da revisão do lançamento,
para, só a partir daí, tratarmos propriamente do inciso VII do artigo 149
do CTN e dos efeitos que ele pode gerar63.
O Lançamento será aqui tomado como norma geral e concreta 64
que introduz norma individual e concreta, resultante da aplicação da
regra-matriz de incidência tributária, criadora de uma relação jurídica de
natureza tributária, tendo por finalidade a constituição do crédito
tributário.
A revisão do lançamento, a sua vez, é ato 65 apto a alterar a norma
geral e concreta do lançamento, nas hipóteses taxadas pelo artigo 149
do CTN. Ao se travar contato com o texto do referido artigo, verifica-se
que as hipóteses passíveis de autorizar a revisão do lançamento são
tanto aquelas que tocam ao defeito de forma, como as que tocam o
defeito no conteúdo do ato de lançamento, além, também, de outras
hipóteses que a lei determine66.
63
Quando se fala dos efeitos que o artigo 149, VII, do CTN pode gerar, fala-se precisamente na
construção da norma geral e abstrata formulada a partir do enunciado nele contido.
64
Falar por que norma geral e concreta – Marina ou Tácio.
65
Aqui não se adentrará na diferença se lançamento é ato ou procedimento, uma vez que não interessa
ao estudo proposto, sem desconhecer da importância que o tema suscita.
66
ALINE: verificar se temos como afirmar que essa lei se refere à lei complementar federal, de cariz de
norma gerais, uma vez que não caberia à lei ordinária ampliar as hipóteses traçadas por lei
complementar. Entendo que nesse caso tem-se reserva de matéria à lei complementar
Tomaremos aqui a revisão do lançamento como àquela
decorrente das hipóteses do artigo 149 do CTN, sem desconhecer,
contudo, que o artigo 145 67 do mesmo diploma legal, também, traz a
previsão de revisão do lançamento.
Noutros termos, a revisão de lançamento será tratada no sentido
estrito, entendida a revisão de que cuida o artigo 149 do CTN, isto é,
denominada, portanto, aqui de revisão de ofício, sem nos utilizarmos da
revisão de lançamento no sentido lato, sendo essa a que atina a
qualquer ato que possa alterar o lançamento, tal como a impugnação
administrativa ou judicial do sujeito passivo e o recurso de ofício.
Detendo-se no ângulo da revisão de ofício imposta pelo artigo 149
do CTN, pode-se observar que, exceto os seus incisos VII e IX, a
revisão não se refere ao lançamento tributário, mas sim de revisão de
ato praticado pelo sujeito passivo 68. Contudo, o caput do artigo 149 não
se refere apenas à revisão de ofício, mas também autoriza o próprio ato
de lançamento originário. (DESENVOLVER – MARINA E DEMAIS)
Pode-se dizer que a revisão é ato ou procedimento que o sujeito
competente pode corrigir possíveis defeitos no lançamento ou no
autolançamento produzido pelo sujeito passivo, produzindo, assim,
novos efeitos.

3.1. Alcance do enunciado do inciso VII do artigo 149 do CTN – Enfoque da


questão
O artigo 149, VII, do CTN, ao determinar que a revisão de ofício
do lançamento tributário é cabível quando se comprove que o sujeito
passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou
simulação, quer se referir aos casos em que a ação do sujeito passivo,

67
Art. 145. O lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo só pode ser alterado em virtude
de: I - impugnação do sujeito passivo; II - recurso de ofício; III - iniciativa de ofício da autoridade
administrativa, nos casos previstos no artigo 149.

68
Diferencia-se para fins deste estudo, o autolançamento do lançamento efetuado pela autoridade
fiscal, que, nos termos do artigo XXX é atividade exclusiva dela.
ou do terceiro em seu benefício, levou à supressão ou redução do
crédito tributário constituído69.
Havendo a revisão de ofício do lançamento ou do ato de
lançamento70, a questão a ser investigada atina quanto à possibilidade
de o terceiro – mencionando no dispositivo analisado – figurar no polo
passivo do lançamento tributário se agir com dolo, fraude ou simulação
em benefício do sujeito passivo, auxiliando-o a suprimir ou reduzir
tributo.
Ou seja, é de se indagar se esse terceiro de que cuida o inciso VII
do artigo 149 do CTN, poderia figurar no polo passivo como responsável
solidário. Mais precisamente, se lei estadual poderia se valer desse
dispositivo para lhe servir de fundamento de validade, em face do que já
restou decidido pelo Supremo Tribunal Federal na ADI e o no RE de
repercussão geral.
Daremos início à essa incursão, portanto, a partir dos estudos de
caso contidos nas referidas ADIs e RE, que julgou inconstitucional as
leis que estabelecem responsabilidade solidária de terceiro que em
auxílio do sujeito passivo descumpre a obrigação tributária.

Assim, notável é a importância de delimitar com precisão as


definições de cada instituto de modo a atingir a melhor exegese seja do
cientista, seja do aplicador do direito.

3.1.1. Leis ordinárias que estabelecem responsabilidade solidária de terceiro –


ADI do STF
Para o caso, trataremos da ADI 4.845/MT, da relatoria do Ministro
Roberto Barroso, que decidiu, com supedâneo no julgamento do
Recurso Extraordinário 562.276, submetido à sistemática da
repercussão geral, pela inconstitucionalidade formal de lei do Estado do
Mato Grosso que pretendeu constituir nova forma de responsabilidade a

69
MARIA RITA FERRAGUR – PEGAR REFERÊNCIA
70
Propondo-se, neste caso, o lançamento de ofício originário
toda pessoa que intervenha no cumprimento de obrigação tributária.
Veja-se:

Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO


DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DE TERCEIROS POR
INFRAÇÃO. LEI ESTADUAL EM CONFLITO COM
REGRAMENTO DA NORMA GERAL FEDERAL.
INCONSTITUCINALIDADE FORMAL.
1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade que tem por
objeto o parágrafo único do art. 18-C da Lei nº 7.098/1998,
acrescentado pelo art. 13 da Lei nº 9.226/2009, do Estado do
Mato Grosso, que atribui responsabilidade solidária por
infração a toda pessoa que concorra ou intervenha, ativa ou
passivamente, no cumprimento de obrigação tributária,
especialmente a advogado, economista e correspondente
fiscal.
2. Ainda que a norma impugnada trate exclusivamente de
Direito Tributário (CF, 24, I) e não de regulamentação de
profissão (CF, art. 22, XVI), há vício de inconstitucionalidade
formal. Ao ampliar as hipóteses de responsabilidade de
terceiros por infração, prevista pelos arts. 134 e 135 do Código
Tributário Nacional – CTN, a lei estadual invade competência
do legislador complementar federal para estabelecer as normas
gerais na matéria (art. 146, III, b, da CF).
3. A norma estadual avançou em dois pontos de forma
indevida, transbordando de sua competência: (i) ampliou o rol
das pessoas que podem ser pessoalmente responsáveis pelo
crédito tributário; (ii) dispôs diversamente do CTN sobre as
circunstâncias autorizadoras da responsabilidade pessoal do
terceiro.
4. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.
Fixação da seguinte tese: “É inconstitucional lei estadual que
disciplina a responsabilidade de terceiros por infrações de
forma diversa da matriz geral estabelecida pelo Código
Tributário Nacional”.

A lei do Estado do Mato Grosso a que se refere a ADI trazida para


estudo, determina deve responder solidariamente com o sujeito passivo
por infrações praticadas toda pessoa que concorra ou intervenha, ativa
ou passivamente, no cumprimento da referida obrigação.
Como se verifica da ementa acima transcrita, o STF entendeu que
essa lei estadual era inconstitucional por ter ampliado o rol das pessoas
responsáveis pelo crédito tributário e, também, por ter disposto
contrariamente ao CTN sobre as circunstâncias autorizadoras da
responsabilidade pessoal do terceiro. No voto do relator, deixa-se claro
que a lei objeto da ADI “alterou a matriz de responsabilização prevista
no art. 135 [...] ampliando o rol de terceiros que poderia responder pelo
crédito tributário na hipótese de prática de infrações”.
Assim, por este argumento o ministro-relator entendeu que o que
poderia respaldar a responsabilidade de terceiros seria o artigo 135,
descumprindo a previsão ali contida, inquinou-se de inconstitucional a lei
do Estado de Mato Grosso.
Ainda, do voto se colhe que a lei estadual também seria
inconstitucional por ter estabelecido a responsabilização do terceiro nas
hipóteses de infração praticada com omissão ou fraude, adotando
critérios diversos do previsto no CTN. Isto porque: “conforme a norma
geral federal, para haver responsabilidade tributária pessoal do terceiro,
este deve ter praticado ato com excesso de poderes ou infração de lei,
contrato social ou estatuto (CTN, art. 135, caput)
Desse julgamento, e dos demais que o seguiram 71, ressalta-se o
entendimento de que a inconstitucionalidade ressai da não observância
dos requisitos estabelecido pelo CTN da responsabilidade por infração,
criando novas formas de responsabilidade.
Por esse entendimento apenas por meio da norma geral (lei
complementar) é que se poderia inovar na ordem jurídica, ampliando as
hipóteses de responsabilidade tributária.
Desse modo, propomos verificar o acerto desse entendimento a
partir da análise da competência para instituir novas espécies de
responsabilidades.

3.1.2. Instituição de novas hipóteses de responsabilidade: lei complementar ou


lei ordinária?
A Responsabilidade tributária é analisada enquanto matéria
submissa a normas gerais de Direito Tributário e, portanto, tratada em lei
complementar embora com a preservação das competências tributarias
atribuídas pela Constituição Federal de 1988 aos entes federados
(União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Saindo do maniqueísmo
surgido por ocasião das construções doutrinarias denominadas de
71
INSERIR AS outras ADIs
correntes dicotômica e tricotômica no pertinente à análise das normas
gerais, busca o alcance desse regramento com vistas a harmonia do
sistema tributário brasileiro.
As normas gerais de direito tributário, apesar de serem editadas
pelo Congresso Nacional, não são de inciativa da União enquanto
representante de uma das pessoas jurídicas de direito publico interno,
mas sim da República Federativa brasileira, são, portanto, lei nacional,
regidas por um regime jurídico especial. À União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios cabe a competência suplementar vez
que são as únicas pessoas habilitadas pelo sistema para criarem em
abstrato a norma padrão de incidência dos tributos (ou seja, eles detêm
a competência tributária).
Na ausência de normas gerais veiculadas por lei complementar
(de caráter nacional), é facultado aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municipios, nesse particular, preencherem essa lacuna apenas para
exercer sua competência própria. O STF (RE 414.259 - AgR/MG) tem
posição assente de que na ausência de lei completar nacional
veiculadora das normas gerais necessárias à instituição de impostos na
Constituição Federal, ficam, as unidades federativas, legitimadas a
editarem normas gerias no exercício da competência concorrente,
prevista no §4° do art. 24, até o advento da Lei Complementar de caráter
nacional.
Daí ressai que a competência da União, na qualidade de
representante da República Federativa do Brasil, para edição de normas
gerais, deflui tanto do artigo 24, §1° como do artigo 146, ambos da CF, e
só ela nessa condição, pode editar normas gerias em direito tributário de
forma plena, sendo o veículo introdutor apropriado a lei complementar
federal.
Válida a lembrança de Paulo de Barros Carvalho 72 de que a tarefa
da lei complementar há de ser analisada no contexto constitucional,
atendo-se a tarefa de elucidar e reforçar os comandos veiculados pelo
constituinte.

72
CURSO (?)
A Constituição Federal atribuiu a Lei Complementar a
incumbência de servir de vínculo introdutor de normas gerais, conforme
descrição contida no seu artigo 146.
A sua vez, o artigo 24 da Constituição da República em seus
parágrafos outorga igualmente como já esclarecido, às ordens jurídicas
parciais a competência plena, para atender as respectivas
peculiaridades (§3°), na hipótese de ausência de normas gerais de
direito tributário editada pela ordem jurídica total. No pertinente ao §2°, a
edição de lei por parte das ordens jurídicas parciais em caráter
suplementar pode ser exercida, desde que respeitados os limites
impostos pela norma geral editada pela ordem jurídica total.
As normas gerais articulam o sistema tributário da Constituição às
legislações fiscais das ordens jurídicas parciais. São normas sobre como
fazer normas em sede de tributação. Discorrendo sobre a abrangência
das normas gerais, leciona o doutrinador Marco Aurelio Greco:
esta dição constitucional (estabelecer normas gerais
em matéria de legislação tributária) é mais abrangente
que a utilizada pela Constituição anterior (normas
gerais de Direito Tributário) e ampliada a adotada pelo
seu art. 24, I, pois abre espaço para a lei
complementar atuar como elemento estruturante do
ordenamento tributário. Vale dizer, não apenas
dispondo sobre prerrogativas do Fisco, direito dos
contribuintes, elementos fundamentais da obrigação
etc. (os chamados Direito Tributário material e formal)
- possibilidade que já advém do art. 24, I, - mas
também sobre as relações e fórmulas de conjugação
e composição entre as várias normas que integram a
legislação interna. Ou seja, abre espaço para a lei
complementar dizer como devem e podem se
relacionar as várias normas do sistema.

Contudo, o tema sabre normas gerais e ainda muito controvertido


desde seu conceito, como seu alcance, todavia, para o objetivo do
presente trabalho - que e o de identificar qual o alcance das normas
gerais na eleição do sujeito passivo da relação tributária, em especial do
responsável tributário – entende-se não ser necessário explorar todas as
visões que o tema abarca, adotando-se aqui, para tanto, a posição
firmada pelo Ministro Joaquim Barbosa do STF, como bastante para
este mister externada no {...}
Feitas as exposições necessárias para o tema, importante
incursionar na competência legislativa no tocante à eleição da sujeição
passiva, uma vez que a Constituição não definiu o critério pessoal da
regra matriz de incidência (RMIT) – VERIFICAR SE ISSO FICOU BEM
EXPOSTO NO CAPÍTULO DA RMIT.
Apesar de a Constituição só ter determinado as materialidades
para os entes políticos, sem definir os demais aspectos contidos na
RMIT, a delimitação do critério material do tributo per si vincula o
legislador infraconstitucional. Entende-se, assim, que as normas gerais a
serem introduzidas pela lei complementar têm o condão de harmonizar o
sistema, para que não haja desvio por parte dos estados, como
acontece com os casos aqui analisados. O artigo 146 da CF é taxativo
ao dizer que cabe à lei complementar introduzir normas gerais sobre o
contribuinte73, bem como obrigação.
Com efeito, o CTN trouxe no seu texto a definição de contribuinte
e de responsável tributário, assim, as leis ordinárias dos entes
tributantes devem respeitar esse comando por determinação
constitucional.
Paulo de Barros Carvalho, Geraldo Ataliba, Jose Souto Maior
Borges, Marçal Justen Filho, Clélio Chiesa, Maria Rita Ferragut dentre
tantos outros defendem a existência de definição constitucional precisa
da materialidade dos fatos geradores dos tributos, cuja competência
também foi detalhadamente repartida entre os entes tributantes. É o que
se vê do trecho abaixo:
a Constituição não prescreve quem deva ser o sujeito
passivo das relações jurídicas tributarias, deixando para o
legislador infraconstitucional essa atribuição. Mas será que
qualquer pessoa pode ser colocada, pela lei, na posição
de sujeito passivo, ou existe algum limite a definição
legal da
responsabilidade tributaria?
Entendemos que o legislador ordinário é livre para eleger
qualquer pessoa como responsável, dentre aquelas
pertencentes ao conjunto de indivíduos que estejam (i)
indiretamente vinculados ao fato jurídico tributário ou (ii)
direta ou indiretamente vinculadas ao sujeito que o praticou.
Esses limites fundamentam-se na Constituição e são
aplicáveis com a finalidade de assegurar que a cobrança

73
Maria Rita ou Darzé que diz aqui se referir à sujeição passiva – procurar!
do tributo não seja confiscatória e atenda a capacidade
contributiva, pois se qualquer pessoa pudesse ser
obrigada a pagar tributos por conta de fatos praticados por
outras, com quern não detivesse qualquer espécie de
vinculo (com a pessoa ou com o fato), o tributo teria
grandes chances de se tornar confiscatório, já que poderia
incidir sobre o patrimônio do obrigado e não sobre a
manifestação de riqueza ínsita ao fato constitucionalmente
previsto. Se o vínculo existir, torna-se possível a
preservação do direito de propriedade e do não confisco.

A lei complementar é figura do repertório legislativo da ordem


jurídica federal, sendo posta no ordenamento pelos órgãos legisferantes
da União embora o âmbito de validade de suas normas não se cinge ao
plano federal. E instrumento de legislação nacional, alcançando conjunta
ou isoladamente a esfera jurídica das pessoas políticas de direito
constitucional interno.
Verificado que só à lei complementar cabe a instituição do
responsável tributário, não podendo as ordens jurídicas parciais inovar
neste contexto, é de se investigar se o artigo 149, VII, do CTN, prevendo
a hipótese de revisão de ofício nas hipóteses de fraude, dolo, ou
simulação, ao trazer a figura do terceiro que age em benefício do sujeito
passivo para descumprimento da obrigação tributária, seria norma a dar
fundamento de validade às normas estaduais que pretendam
responsabilizar terceiros que não os citados nos artigo 135 do CTN. É o
que se verá a seguir.

3.1.3. Análise do artigo 149, VII, do CTN como norma geral que pode instituir
responsabilidade solidária de terceiros?
Para se analisar o artigo 149, VII, do CTN é necessário fazer os
recortes de modo a destacar os institutos que lhe tocam.
Inicia-se, portanto, pela investigação do interesse comum de que
cuida o artigo 124, I, do CTN para saber o alcance dessa expressão e se
o terceiro que age em benefício do sujeito passivo poderia ser alcançado
pela conjugação desse enunciado com o enunciado do artigo 149, VII,
do CTN. Na sequência, primordial, enquadrar quem é o terceiro de que
cuida o dispositivo em análise para se verificar se ele pode ocupar o
critério pessoal da regra-matriz de responsabilidade tributária.
Isto porque, há doutrina que entende que o artigo 149, VII é
fundamento válido para a responsabilização do terceiro na hipótese ali
enunciada. Nesse sentido, Maria Rita Ferragut74 dispõe:
O pressuposto de aplicabilidade do art. 149, VII, do CTN é a
prática de um ilícito mediante dolo, fraude ou sonegação, pelo
sujeito passivo ou terceiro [...]. Nessas situações, a norma
mantém intactos a personalidade jurídica e os atos
fraudulentos (desde que efetivamente existentes), mas autoriza
que a Autoridade Administrativa determine que todos os
envolvidos no ilícito responsam pelo passivo fiscal.
[...]
o art. 149, VII, é o correto fundamento de validade porque tanto
o contribuinte quanto o terceiro em seu benefício agiram
conjuntamente em prol desses escusos fins (fraudulentos).
Foge-se, com isso, da interminável discussão do que venha a
ser o “interesse comum” do art. 124, I, do CTN.
Por fim, não compartilhamos do entendimento de que o art. 149
autoriza que o crédito tributário seja constituído somente em
face do efetivo realizador do fato jurídico tributário, partícipe de
atos negociais que se encontravam ocultos em razão de pacto
simulatório perpetrado com o auxílio de interposta pessoa, não
configurando hipótese de solidariedade tributária.

Do excerto acima, delimita-se a importância de explorar


primeiramente o artigo 124, I, do CTN, a fim de identificar a possibilidade
de haver solidariedade tributária entre aquele que pratica o fato jurídico
tributário e o terceiro que o auxilia com ato ilegal para a sonegação de
tributos.

3.1.2.1. Artigo 124, I, do CTN – Interesse comum – Possibilidade de


solidariedade passiva entre o contribuinte e o responsável tributário?
Para dar-se início a essa investigação, é necessário recortar o
enunciado do artigo 124, I, fazendo de logo a distinção entre o
contribuinte e o responsável tributário e, ao depois, buscar o alcance da

74
Resp Trib 204/207
expressão “interesse comum”, para verificar se a solidariedade pode
alcançar tanto a figura do contribuinte, como do responsável tributário.

Pelo estudo da Lógica se observa a estrutura da linguagem, ou


seja, o seu aspecto formal; pela Lógica Jurídica, tem-se em conta a
estrutura da linguagem jurídica, em que o legislador, objetivando regular
condutas intersubjetivas, estrutura a linguagem em relação de causa e
efeito, entre o fato do mundo social por ele eleito e o comportamento
pretendido, apresentando, assim, um dever-ser.
Por meio da estrutura Lógica das Classes, podemos precisar
definições, tarefa imprescindível para a construção válida da norma
jurídica.

A análise do dispositivo normativo do artigo 149, VII, do CTN


passa pela definição da sujeição passiva, isto é, de contribuinte e
responsável, contida no artigo 121, parágrafo único, inciso I e II do CTN.
Com efeito, para uma melhor leitura do referido dispositivo (artigo 149,
VII, do CTN), deve-se ter em conta o alcance da expressão interesse
comum contida no artigo 124, I, do CTN.
Sobreleve-se que o ato de definir é que tem o condão de fazer a
classificação, ou separar em classes. Como se verificou da definição
contida no artigo 121 do CTN, a classe formada da sujeição passiva
(qualidade de gênero), subdivide-se nas subclasses: contribuinte e
responsável tributário, como suas espécies. Não se pode, portanto,
ignorar as definições prescritas pelo legislador, ora atribuindo a um
objeto as características de outro, que justamente lhes predicam as
diferenças formando subclasses distintas, embora pertencentes ao
mesmo gênero.

É próprio do ser humano a atitude de classificar as coisas,


classificamos quando nominados, ou seja, quando atribuímos nome às
coisas. O nome coloca numa mesma classe os objetos que têm os
mesmos atributos.
Neste sentido, colha-se as lições de Paulo de Barros Carvalho:
Os nomes são palavras tomadas voluntariamente para
designar indivíduos e seus atributos num determinado contexto
de comunicação. Ao mesmo tempo em que todos os nomes
são nomes de alguma coisa, real ou imaginária, nem todos as
coisas têm nome privativo. (...)
Com efeito nome geral é susceptível de ser aplicado, no
mesmo sentido, a um número indefinido de coisas.
Um nome geral denota uma classe de objetos que apresentam
o mesmo atributo. Neste sentido, “atributo” significa a
propriedade que certo objeto manifesta (...)
Portanto, todo o nome, geral ou individual, cria uma classe de
objetos (...)
Definamos, então, classe como “a extensão de um conceito
geral ou universal”, na lição de Albert Menne, lembrando que o
nome individual tem o condão de exaurir seu universo, sendo,
portanto, também universal. Ou, finalmente, como a relação
dos nomes de objetos que satisfazem a função proposicional
“f(x)”. (CARVALHO, 2018, p.123)

Antes de adentrar propriamente na investigação do termo


definição, importante são as considerações entretecidas por Tárek
Moysés Moussallem:
As palavras são símbolos (convencionais ou arbitrários) que
representam algo no mundo físico ou imaginário. De certa
maneira, os homens as utilizam para, por assim, dizer, “cortar”
o mundo em pedaços e reduzir complexidades na realidade.
Nomear é separar. (...)
A relação palavra-realidade é denominada significado. Ao
atribuírem significados às palavras, os seres humanos criam
essa relação. (...)
Distinguem os lógicos, dois sentidos para a palavra
“significado”: (i) conotação (ou designação) e (ii) denotação.
(MOUSSALLEM, 2016, p.252)

Assim, sobre definição, anote-se as palavras de Pedro de Oliveira


Rocha:
Ao definir o que uma realidade é, firma também tudo o que ela
não é, permitindo arrolar, sob o mesmo conceito, fenômenos
semelhantes. Sempre que uma mesma característica for
identificada, estar-se-á diante da mesma classe de realidades.
(...) Daí porque “classificar é parte intrínseca do conhecer”.
Todo conhecimento pressupõe classificação.
Constantemente recortamos o mundo e categorizamos
manifestações, reunindo-as segundo certas semelhanças para
ordenar a realidade e proporcionar uma visão clara daquilo que
nos instiga. E o fazemos principalmente por meio das
operações lógicas de definição e classificação. Ao organizar
conjuntos, classificamos; ao passo que, ao explanar as
propriedades do objeto e sob que condições o isolamos,
definimos. (...) Toda definição é classificatória, compondo
automaticamente uma classe e sua complementar; ao passo
que toda classificação é, de modo semelhante, definitória, pois
cada classe diz, com as características selecionadas, o que é
ou o que não é algo, permitindo compor uma definição.
(ROCHA, 2019, p.67)

Noutra passagem da citada obra de Tárek Moysés Moussallem, o


referido autor acrescenta que se deve distinguir as definições
conotativas, das definições denotativas. Nas suas palavras:
Na definição denotativa (...) enunciam-se os elementos da
classe (“ x ϵ Κ onde se lê: “x” – elemento – pertence à classe
“K”). Assim, se alguém (...) pergunta “Que é causa excludente
de ilicitude?” A resposta pode ser: “Legítima defesa”, “estado
de necessidade” e “estrito cumprimento do dever legal”.
Por outro lado, a definição conotacional (...) indica as
características definitórias das coisas sob as quais a palavra se
subsome. São normalmente aquelas dadas pelos “dicionários”
(MOUSSALLEM, 2016, p. 256)

É pela definição do objeto que é possível classificá-lo, tornando


possível que se criem classes; com efeito, pela pertinência dos
esclarecimentos feitos por Aurora Tomazini de Carvalho, temos que:
Quando atribuímos nome a algo, formamos um conjunto, de
modo que todos os objetos pertencentes àquele conjunto terão
aquele nome. Para identificarmos os objetos pertencentes ao
conjunto criamos o conceito, delimitado por aquilo que
denominamos características definitórias, requisitos, atributos,
ou critérios exigidos para incluirmos um objeto numa classe
(CARVALHO, 2019, p.340)

Segue a autora, tecendo valiosa lição, veja-se:


O sucesso das classificações, entretanto, não depende apenas
do ajuste ao processo de divisão, mas sobretudo, de uma
definição adequada da extensão das classes que a compõem.
A definição demarca o campo de abrangência das classes.
(CARVALHO, 2018, p.365)

Contudo, importante ter-se em conta que as classes são


abstrações, ou seja, que elas não têm existência concreta, que “São
constructos mentais, parte do intelecto humano, o resultado de juízos de
valor sobre a adequação de indivíduos a um conceito” (ROCHA, 2019,
p.69-70).
No pertinente à Lógica das Classes, com a clareza que lhe é
peculiar, discorre Aurora Tomazini de Carvalho:
A Lógica das Classes é um segmento da Lógica dos Termos, a
qual compreende o estudo da composição interna das
proposições simples, resultantes da cópula alética entre sujeito
e predicado ‘S é P’, ou em termos formais S(P).
Toda classe, ou conjunto (como a chamamos na vida
cotidiana), é delimitada por uma função proposicional. Uma
classe x tem por elementos todos os objetos que satisfaçam
sua função e somente eles “f(x). Nestes termos, dá-se o nome
de função proposicional aos parâmetros que definem a classe.
(...)
Em linguagem formal, para representarmos simbolicamente as
classes, utilizamo-nos de constantes maiúsculas como K, L, M,
S, etc. (...) ao conjunto de requisitos que fazem com que alguns
objetos pertençam a certa classe (K, L, M, S) atribuímos o
nome de conotação e a totalidade dos elementos que a ela
pertencem, denominamos de denotação. Quanto maior a
conotação, menor a denotação da classe. (...)
A classe é o âmbito de aplicação de um conceito, sua
conotação é a totalidade dos requisitos que delimitam este
conceito e a sua denotação são todos os objetos que cabem no
âmbito do conceito. (CARVALHO, 2019, p.341-342)

A teoria das classes, como segmento da Lógica 75, como se vê,


volta sua atenção para a definição, contudo, igualmente o faz para as
operações de classificação e divisão.
De se ver que classificar é separar os objetos de acordo com
suas semelhanças, distribuindo-os em classes. Assim, ao classificar, os
grupos formados se chamam de gênero ou espécies, em que gênero é o
grupo mais extenso que contém as espécies, e, por evidente, as
espécies são grupos que compõem o gênero.
Pois bem, é por meio da divisão que se separa as espécies de um
gênero, e é esse processo que permite classificar os termos. Sobre esse
tema, anote-se as lições de Paulo Barros de Carvalho:
A presença de atributos ou caracteres que distinguem
determinada espécie de todas as demais espécies de um
mesmo gênero denomina-se “diferença”, ao passo que
“diferença específica” é o nome que se dá ao conjunto das
qualidades que se acrescentam ao gênero para a
determinação da espécie, de tal modo que é lícito enunciar: “a
espécie é igual ao gênero mais a diferença específica (...)
Obviamente que as qualidades somente gerais não se prestam
à divisão do gênero em espécies (CARVALHO, 2018, p.124)

75
A lógica reserva à temática da classificação um capítulo inteiro, denominado, Teoria das
Classes, em que se estuda o conceito de classe e o quadro de suas propriedades gerais
(CARVALHO, 2018, p.127).
Assim, toda classe pode ser dividida em outras classes, formando
subclasses e esse processo de classificar, ou seja, separar em classe, é
ilimitado.
Importante destacar que o gênero, que compreende as espécies,
denota mais do que as espécies, porque é predicado de um maior
número de objetos, em contrapartida, a espécie deve conotar mais que o
gênero, porquanto além de conotar todos os predicados do gênero,
conota também a diferença específica.
Deve-se, pela pertinência, por fim, anotar o que nos ensina Pedro
de Oliveira Rocha:
Classificar é operação lógica (mental) que consiste em dispor
elementos em classes consoante um critério escolhido a partir
dos interesses daquele que classifica. A um só tempo, significa
aglutinar em razão da presença e separar em razão da
ausência de um mesmo predicado. (...) Em outras palavras,
sempre que se formar uma classe, cada indivíduo do universo
do discurso deve pertencer à classe (atendendo ao critério) ou
não pertencer a ela (não atendendo ao critério), sem terceira
opção. Eis o princípio da dicotomia, aplicável às classificações
e às divisões, consequência direta da lei lógica do terceiro
excluído (...)
Bastante assemelhada à operação de classificação é o
processo de divisão lógica. Enquanto a classificação parte dos
elementos para chegar às classes, reunindo-os sob um critério,
a divisão segue o caminho inverso, partindo de um gênero
conhecido para segregar as espécies (subclasses) em razão
das diferenças específicas. Classificação e divisão
basicamente representam o mesmo processo vislumbrado em
sentidos opostos, submetendo-se às mesmas regras. (ROCHA,
2019, p.68)

No direito positivo, a definição tem característica própria, pois,


apesar de descrever objetos, elementos, ela tem função de impor
comandos, pelo seu caráter prescritivo.
A propósito, veja-se o que ensina Lucas Galvão de Britto:
Durante um bom tempo, foi dito que a definição e classificação
não eram atribuições do legislador, mas sim, da ciência do
direito. Como, porém, seria possível explicar a atividade do
legislador, ao segregar certas condutas do conjunto universo
das relações intersubjetivas, para rotulá-las como ilícitas,
deixando as demais (o seu conjunto complemento) marcadas
pela licitude? Como identificar os sujeitos de uma relação, ou
mesmo isolar do universo de coisas existentes na realidade
social o próprio núcleo de um comando jurídico, a prestação
pretendida, senão pelo caminho das definições? Não há como
construir esquemas jurídicos sem uso de definições e
classificações (BRITTO, 2016, p.349-350).

Sobre o tema, segue o referido autor, trazendo importante


esclarecimento:
É bem verdade que a definição meramente descritiva não é o
caminho do discurso do direito positivo, tampouco tem a
classificação ali realizada apenas propósitos gnosiológicos.
Trata-se de discurso prescritivo, que se serve desses
expedientes lógicos para dar ordens. É com esse cuidado que
devemos tratar das expressões definições e classificações no
direito positivo, ainda que a forma dos enunciados com que se
apresentem possa ser alética, a proposição jurídica terá
sempre a forma deôntica, uma vez que os enunciados sejam
articulados na estrutura de uma norma jurídica. (BRITTO,
2016, p.350)

Valiosa contribuição nos dá Tárek Moysés Moussallem quanto a


definições legais, relacionando-as com a técnica do percurso gerador de
sentido, confira-se:
As definições legais enquanto enunciados estariam no plano da
expressão (como um artigo, parágrafo ou inciso) de
determinado texto legal, ao passo que, o sentido construído
pela leitura de um enunciado definitório, estaria naquele
subsistema S2 de significações isoladas a que faz alusão
PAULO DE BARROS CARVALHO quando do estudo do
percurso gerador de sentido no sistema jurídico (...). Assim o
debate sobre se as “definições legais” são “normas” envolve
necessariamente esclarecer o conceito de norma. Contudo,
isso não retira, em hipótese alguma, o caráter prescritivo da
definição legal. (MOUSSALLEM, 2016, p.264)

Nesse sentido, quando o artigo 121 do Código Tributário Nacional


– CTN define contribuinte e responsável tributário, delimita o alcance de
cada expressão e, assim, não admite inovações fora desses contornos
legais nele estabelecidos, confira-se:
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa
obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária:
Parágrafo único: O sujeito passivo da obrigação principal diz-
se:
I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a
situação que constitua o respectivo fato gerador;
II – responsável, quando, sem revestir a condição de
contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de
lei.

O sujeito passivo, integrante que é do consequente da norma


jurídica tributária, constitui a classe das pessoas obrigadas ao
pagamento de tributo ou penalidade pecuniária, que se divide em duas
subclasses: contribuinte e responsável.
Na dicção da lei, contribuinte é aquele que tem relação pessoal e
direta com o fato gerador e responsável é aquele, acerca do qual se
exclui o predicado que qualifica o contribuinte, mas também tem a
obrigação de pagar o tributo desde que expressamente determinado por
lei.
Verifica-se, portanto, que a sujeição passiva é gênero e que
contribuinte e responsável são suas espécies. A esse respeito, Tárek
Moysés Moussallem arremata de forma precisa:
Na forma clássica, ela opera por gênero próximo e diferença
específica. Essas expressões podem ser explicadas em termos
de teoria das classes na lição de IRVING COPI: “A classe cujos
membros se dividem em subclasses é o gênero e as diversas
subclasses são as espécies” (...). Assim, toda “espécie” possui
as características definidoras do gênero (gênero próximo) mais
a sua própria (diferença específica). (MOUSSALLEM, 2016, p.
256)

Pelas lições Renato Becho, fica claro que o responsável é


espécie, isto é, subclasse da classe da sujeição passiva:
O responsável, assim, é identificado por exclusão: aquele que
tenha que pagar tributo sem ter relação pessoal e direta com o
fato econômico.” (BRECHO, 2014, p.31)

Ora, em que pese a positivação, pelo legislador, das definições do


sujeito passivo, o tema ainda rende inesgotáveis divergências (DARZÉ,
2010). Contudo, apesar de os limites – que demarcam o conceito dos
dois entes que compõem a estrutura da sujeição passiva no direito
tributário – ainda serem motivo de controvérsia, o presente trabalho,
para os fins a que se propõe, vale-se da definição prescrita pelo artigo
121 do CTN.
Parte-se, desse modo, da exegese do artigo 121 do CTN de que
não se pode atribuir cariz de responsabilidade àquele que tenha
praticado o fato gerador, pois essa é a atribuição da subclasse
contribuinte, dentro do gênero da sujeição passiva.
Noutras palavras, o CTN diz contribuinte como aquele que tenha
“relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato
gerador” e prescreve a situação do responsável, como aquele que esteja
obrigado ao pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária sem
revestir-se da condição de contribuinte, desde que designado por lei
(aqui, entenda-se, por imposição constitucional, lei complementar).
Dentro, ainda, dos ensinamentos da Professora Maria Rita
Ferragut, extraímos a distinção entre contribuinte e o responsável
tributário nos seguintes termos:
Contribuinte é a pessoa que realizou o fato jurídico tributário, e
que cumulativamente encontra-se no polo passivo da relação
obrigacional. Se uma das duas condições estiver ausente, ou o
sujeito será o responsável, ou será o realizador do fato jurídico,
mas não o contribuinte (FERRAGUT, 2020, p.10).

Valiosas, também, para compreensão do assunto, são as


palavras de Andréa M. Darzé, confira-se:
Tecidos esses esclarecimentos, infere-se que, para um sujeito
ser qualificado juridicamente como contribuinte, é necessário,
para além de figurar no polo passivo da relação tributária sticto
sensu, que participe diretamente da materialidade do tributo,
realizando pessoalmente o verbo que consubstancia seu
núcleo. A contrario sensu, a pessoa vinculada apenas
indiretamente ao fato imponível, que participa da compostura
do suporte factual da tributação, sem, contudo, executar a
conduta (verbo) descrita no critério material da hipótese
normativa, poderá vir a ser definida como responsável, caso
seja posta no polo passivo da obrigação. (DARZE, 2010, p.83)

Dito isto, há, assim, no CTN a definição de contribuinte e de


responsável tributário que, como se viu, distinguem-se pela relação
pessoal e direta que têm com a hipótese de incidência, isto é, com a
previsão presente no antecedente da norma que regula eventos de
natureza tributária que o direito pretende ver tutelado.
Pela teoria das classes, se um objeto x é um elemento da classe
K, ou seja, se a toda propriedade de objetos se pode fazer corresponder
uma classe univocamente determinada (TARSKI, 1985), assim, as
propriedades que delimitam, definem o contribuinte são justamente
aquelas que tem por predicado a prática do fato gerador do tributo.
A redação do artigo 121, parágrafo único, inciso I, do CTN é
explícita ao definir o contribuinte, como aquele que “tenha relação
pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador”.
Portanto, “a relação do contribuinte com o fato gerador, na
realidade, antecede ao próprio nascimento da obrigação tributária”.
(BRECHO, 2014, p.31)

Dentro do conceito de contribuinte e de responsável tributário


dado pelo artigo 12176 do CTN, observa-se que é delimitado o alcance
de cada expressão, não podendo haver inovações fora desses
contornos legais.
O CTN impõe o contribuinte como aquele que tenha “relação
pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador”,
prescrevendo, assim, contrariamente a situação do responsável, como
aquele que esteja obrigado ao pagamento do tributo ou da penalidade
pecuniária sem revestir-se da condição de contribuinte, desde que
designado por lei (aqui, entenda-se, por imposição constitucional, lei
complementar)77.
Tem-se na figura do contribuinte aquele que tem relação pessoal
e direta com a situação que constitua o fato gerador (artigo 121,
parágrafo único, I, do CTN), ou, de maneira mais simples, aquele que
pratica o fato gerador do tributo, e na figura do responsável, aquele que,
por exclusão, não tem relação pessoal e direta com a hipótese de
incidência.
RETOMAR A QUESTÃO DA PREVISÃO CONSTITUCIONAL DA
FIGURA DO SUJEITO PASSIVO DE QUE NÃO PODE FUGIR DA

76
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade
pecuniária:
Parágrafo único: O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;
II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de
lei.
77
“Consideramos que a classificação mais acertada para as normas de sujeição passiva é a que as divide em
contribuintes e responsáveis, utilizando como critério o grau de proximidade que a pessoa compelida ao pagamento
do tributo mantém com o fato jurídico tributário. Sendo pessoal e direta, ter-se-á a figura do contribuinte. Acaso
inexistente ou de outra natureza que não pessoal e direita, ter-se-á responsável” (DARZE, 2010, p. 138). No mesmo
sentido: “Contribuinte é a pessoa que realizou o fato jurídico tributário, e que cumulativamente encontra-se no
polo passivo da relação obrigacional. Se uma das duas condições estiver ausente, ou o sujeito será o responsável, ou
será o realizador do fato jurídico, mas não o contribuinte” (FERRAGUT, 2020, p. 10).
MATERIALIDADE RECORTADA E DISTRIBUÍDA AOS ENTES
TRIBUTANTES.
O Código Tributário Nacional – CTN é a legislação, recepcionada
pela Constituição Federal de 1988 como lei complementar, de caráter
nacional, que regula a matéria tributária no direito brasileiro. Nos
diversos dispositivos do CTN encontram-se enunciados prescritivos 78
relativos ao sujeito passivo da relação jurídico-tributária. Aos fins
propostos pelo presente trabalho, as definições prescritas pelo artigo
121 do CTN no que tocam o contribuinte e o responsável são
suficientes.

3.1.2.1.2. O alcance da expressão interesse comum para a caracterização da


solidariedade passiva
O artigo 124, I, do CTN dispõe que: “são solidariamente obrigadas
as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o
fato gerador da obrigação principal.”
Sobre a solidariedade passiva, valemo-nos dos ensinamentos de
Paulo de Barros Carvalho:
A solidariedade passiva de que se utiliza o direito tributário
nada mais é do que a figura prevista no art. 264, do Código
Civil brasileiro, pressupondo mais de um devedor, na mesma
relação jurídica, cada um obrigado ao pagamento da dívida
integral.
[...]
O critério será aplicável unicamente em circunstâncias em que
não haja bilateralidade no seio do evento tributado, como, por
exemplo, no caso do IPTU, quando duas ou mais pessoas são
proprietárias do mesmo imóvel. Havendo, porém, interesses
contrapostos, objetivos antagônicos no núcleo da ocorrência
que recebe a percussão da norma tributária, a solidariedade vai
instalar-se entre os sujeitos que estiveram no mesmo polo da

78
Pela linha metodológica adotada no presente trabalho do Constructivismo Lógico Semântico,
entende-se por enunciado prescritivo os textos de lei ainda não submetidos ao intérprete,
construtor da norma jurídica em sentido estrito. Nas palavras de Noberto Bobbio: “por
enunciado prescritivo entendemos a forma gramatical e linguística pela qual um determinado
significado é expresso” (DARZÉ, 2010, p. 14).
relação, se e somente se for esse o lado escolhido pela lei para
receber a carga tributária
Em estreita síntese, quero deixar consignado que solidariedade
mesmo haverá, tão somente, na circunstância de existir uma, e
somente uma relação obrigacional, em que dois ou mais
sujeitos de direito se encontrem jungidos a satisfazer a
integralidade da prestação tributária. Ali, onde nos deparamos
com duas relações, entretecidas por preceitos de lei, para se
obter a segurança do adimplemento prestacional de uma delas,
não teremos, a bem do rigor jurídico, o laço da solidariedade
que prende os sujeitos passivos
(CARVALHO, 2015, p. 231/233).

A solidariedade, portanto, decorre apenas de uma única relação:


aquela que nasce da ocorrência da hipótese prevista na norma jurídico-
tributária, donde pode haver mais de um sujeito passivo.
Merece destaque ainda o comentário ao artigo 124 do CTN, feito
por Mizabel Derzi e Aliomar Baleeiro, em que revela de forma precisa o
instituto da solidariedade79:
79
Doutrina utilizada pelo STF no Recurso Extraordinário nº 562.276-PR: DIREITO TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE
TRIBUTÁRIA. NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO. ART 146, III, DA CF. ART. 135, III, DO CTN. SÓCIOS DE
SOCIEDADE LIMITADA. ART. 13 DA LEI 8.620/93. INCONSTITUCIONALIDADES FORMAL E MATERIAL. REPERCUSSÃO
GERAL. APLICAÇÃO DA DECISÃO PELOS DEMAIS TRIBUNAIS.
VOTO
[...]
5. Essencial à compreensão do instituto da responsabilidade tributária é a noção de que a obrigação do terceiro, de
responder por dívida originariamente do contribuinte, jamais decorre direta e automaticamente da pura e simples
ocorrência do fato gerador do tributo. Do fato gerador, só surge a obrigação direta do contribuinte.
Isso porque cada pessoa é sujeito de direitos e obrigações próprios e o dever fundamental de pagar tributos está
associado às revelações de capacidade contributiva a que a lei vincule o surgimento da obrigação do contribuinte. A
relação contributiva dá-se exclusivamente entre o Estado e o contribuinte em face da revelação da capacidade
contributiva deste.
Não é por outra razão que se destaca repetidamente que o responsável não pode ser qualquer pessoa, exigindo-se
que guarde relação com o fato gerador ou com o contribuinte, ou seja, que tenha a possibilidade de influir para o
bom pagamento do tributo ou de prestar ao fisco informações quanto ao surgimento da obrigação.
Efetivamente, o terceiro só pode ser chamado a responder na hipótese de descumprimento de deveres de
colaboração para com o Fisco, deveres estes seus, próprios, e que tenham repercutido na ocorrência do fato
gerador, no descumprimento da obrigação pelo contribuinte ou em óbice à fiscalização pela Administração
Tributária. O professor espanhol Lago Montero, em sua obra La sujeción a los diversos deberes y obligaciones
tributários (Madrid: Marcial Pons, 1998), destaca, com clareza, que “no es posible la responsabilidad cuando la
conducta dei hipotético responsable no produce un daño a los, in ter es de la Hadenda Pública, que sea imputable al
mismo”.
(...)
A relação de responsabilidade tributária não se confunde, pois, com a relação contributiva. Embora a pressuponha e
só se aperfeiçoe em face da inadimplência do tributo pelo contribuinte, decorre de norma específica e tem seu
pressuposto de fato próprio.
(...)
11. (...)
A solidariedade não é espécie de sujeição passiva por
responsabilidade indireta, como querem alguns. O Código
Tributário Nacional, corretamente, disciplina a matéria em
seção própria, estranha ao Capítulo V, referente à
reponsabilidade. É que a solidariedade é simples forma
de garantia, a mais ampla das fidejussórias.
Quando houver mais de um obrigado no polo passivo da
obrigação tributária (mais de um contribuinte, ou
contribuinte e responsável, ou apenas uma pluralidade de
responsáveis), o legislador terá de definir as relações
entre os coobrigados. Se são eles solidariamente
obrigados, ou subsidiariamente, com benefício de ordem
ou não etc. A solidariedade não é, assim, forma de
inclusão de um terceiro no polo passivo da obrigação
tributária, apenas maneira de graduar a responsabilidade
daqueles sujeitos que já compõe o polo passivo (DERZI;
BALEEIRO, 2018, p. 729).

Dito isto, ao se analisar o conteúdo semântico da expressão


interesse comum para configuração da solidariedade na sujeição
passiva, esse deve ser feito a partir do seguinte enunciado: interesse na
situação que constitua o fato gerador da obrigação principal.
A expressão interesse comum não pode dizer respeito a qualquer
interesse, porquanto tem por prescrição ser somente o interesse comum
na situação prevista no antecedente da norma tributária.
Com efeito, é de se ver que o interesse, que conduz à
solidariedade na hipótese do inciso I do artigo 124 do CTN, só pode ser
o interesse comum na realização do verbo contido no critério material da
regra-matriz de incidência tributária80.
Desse modo, quando o art. 121 do CTN refere-se ao contribuinte e ao responsável como sujeitos passivos da
obrigação tributária principal, deve-se compreender que são sujeitos passivos de relações jurídicas distintas, com
suporte em previsões legais e pressupostos de fato específicos, ainda que seu objeto possa coincidir - pagar tributo
próprio (contribuinte) ou alheio (responsável).
(STF – RE: 562.276 PR, Relator: Min. Ellen Gracie, Data de Julgamento: 18/09/2014, Tribunal Pleno).

80
Andrea Darzé pondera que: “O mero interesse social, moral ou econômico no pressuposto fático do tributo não
autoriza a aplicação do artigo 124, I, do CTN. Deve haver interesse jurídico comum, que surge a partir da existência
Verifica-se, assim, que só quem pode ter interesse comum na
situação que constitua o fato gerador é o contribuinte, uma vez que o
CTN determina que é o contribuinte que tem relação direta com o fato
gerador que constitua a obrigação tributária.
É o contribuinte quem pode praticar o fato previsto no
antecedente da norma tributária, só é ele quem tem relação pessoal e
direta com a hipótese de incidência contida na regra-matriz de incidência
tributária. A sua vez, o responsável é aquele que tem relação indireta
com o fato gerador da obrigação tributária. Logo, não pode haver
interesse comum sem se estar na condição de contribuinte.
Andrea Darzé lembra que deve ser levado em conta o vínculo
jurídico existente entre o sujeito passivo da obrigação e o fato que
caracteriza a materialidade do tributo e não o vínculo meramente
econômico:
Por outro lado, não há interesse jurídico quando os sujeitos
compartilham somente outros fatos decorrentes da riqueza
manifestada pelo fato típico (interesse econômico), o que
não autoriza que se equipare interesse comum ao
econômico.
Para nós, e a situação que aponta para a relação jurídica
originária do fato tributário, ou seja, a relação jurídica
privada qual o legislador contempla o fato que interessa ao
direito tributário (ato ou negócio jurídico).

A sua vez, importante também ter em mente o conceito de


interesse comum trazido pelo artigo 124, I, do CTN, uma vez que o fisco
vem se apropriando indevidamente dessa expressão, como bem
observa Caio Augusto Takano:
Diante desse cenário, somado aos inerentes desafios do tema,
impostos pelo próprio ordenamento jurídico, que conta com
apenas dois dispositivos no Código Tributário Nacional para
gizar os contornos típicos da solidariedade tributária, abriu-se
de direitos e deveres idênticos, entre as pessoas situadas no mesmo polo da relação jurídica de direito privado
tomada pelo legislador como suporte factual da incidência do tributo, ou mais de uma pessoa realizando o verbo
eleito como critério material do tributo, quando esta representar uma situação jurídica (DARZE, 2010, p. 231). E
continua: “Sendo este o contexto normativo no qual está inserida a expressão interesse comum na situação que
constitua fato gerador da obrigação principal, entendemos que apenas se pode validamente imputar solidariedade
com fundamento no inciso I do artigo 124 do CTN àqueles sujeitos que tenham interesse jurídico comum no fato
descrito no antecedente da regra-matriz de incidência, não qualquer outro fato, como o é o fato da
responsabilidade.
Afinal, se a solidariedade tributária não se presume, decorre sempre de previsão legal, e não foi esta a opção
adotada pelo legislador, que a restringiu às hipóteses de interesse comum no fato jurídico tributário, não é o
intérprete que poderá ampliá-la de modo a alcançar realidade não contemplada por lei (DARZÉ, 2010, p. 241).
caminho para que os Fiscos construíssem propostas
interpretativas ao art. 124, inc. I, do CTN, valendo-se da
vagueza da expressão “interesse comum” para ampliar o
escopo de aplicação da solidariedade em matéria tributária,
aumentando-se as garantias do crédito tributário. (TAKANO,
2018, p.20)

A justiça brasileira vem incorrendo em erro ao atribuir a


responsabilidade tributária, com base no artigo 124, I, do CTN. Ora, o
ordenamento jurídico pátrio não pode comportar o alcance semântico que tais
decisões vem dando ao artigo 124, I, do CTN, aplicando-o ao responsável
tributário, quando tal dispositivo se dirige exclusivamente ao contribuinte.
Assim, passa-se à colação de alguns excertos para ilustrar o que aqui se
afirma:

TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA


SÓCIAEXECUTADA. REDIRECIONAMENTO. GRUPO ECONÔMICO DE
FATO.RECONHECIMENTO.
(...)
4. É cediço que a simples existência de grupo econômico não autoriza, incontinenti, a
responsabilidade solidária, bem como constrição de bens pertencentes a Empresas
diversas da Executada. No entanto, em casos excepcionais, especialmente quando se
configura a confusão entre os patrimônios das Empresas ou fraude, objetivando lesar o
credor fazendário e o regime legal da responsabilidade tributária, mantendo os débitos
fiscais com Empresas sem patrimônio e desonerando aquelas que realmente usufruem
das vantagens da atividade econômica, evidencia-se o grupo econômico
fraudulento/abusivo, justificando-se a incidência da solidariedade configurada no art. 124
do CTN, como forma de se assegurar o pagamento dos credores.
(...)
12. A responsabilização tributária de terceiros, no caso de formação de grupo econômico,
não está restrita à hipótese do art. 135, III, do CTN, norma legal que cuida da
responsabilidade dos sócios administradores, mas se dá pela incidência conjunta dessa
norma com a do art. 124, I, do CTN.
13. Em outras palavras, os atos da empresa são sempre praticados através da vontade de
seus dirigentes, de seus representantes. Daí a solidariedade destes em relação às
obrigações que contraem em nome daquela. A responsabilidade solidária em tal caso é
presumida posto que a situação configurada na lei (art.124, I) é aquela em que todos os
envolvidos ganham simultaneamente com o fato econômico (fato gerador).
(TRF-5 – Ap: 0805301-44.2020.4.05.8300, Relator: Des. Cid Marconi, Data de Julgamento:
25/03/2021, 3ª Turma)

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM EXECUÇÃOFISCAL.


REDIRECIONAMENTO. INDÍCIOS DA FORMAÇÃO DE GRUPO ECONÔMICO.CONFUSÃO
PATRIMONIAL. ART. 124, II, DO CTN. OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS: SOLIDARIEDADE.
PRECEDENTES DESTA CORTE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Verificada a existência de sociedades controladas, informalmente, por um grupo
econômico, há presunção legal de responsabilidade solidária entre todos os integrantes
do grupo (CTN, art. 124 e seu parágrafo único), que podem ser incluídos no polo passivo
da execução fiscal, independentemente da comprovação de dissolução irregular da
devedora principal ou do atendimento aos requisitos do art. 135 do CTN.
(TRF-1 – Aga: 1005519-41.2018.4.01.0000, Relator: Marcos Augusto de Sousa. Data de
Julgamento: 27/04/2020, 8ª Turma)

Evidencia-se o equívoco que vêm incorrendo os julgados, que perfilham


nesse mesmo sentido, porquanto se valem de dispositivo impróprio (artigo 124,
I, do CTN) para atribuir responsabilidade de terceiros no cumprimento de suas
obrigações.
Ainda, colaciona-se mais uma decisão, que abaixo se transcreve seu
excerto. A importância de trazer à colação essa decisão se dá porque, apesar de
ela reconhecer que o interesse comum se refere à prática do fato gerador,
impropriamente utiliza o artigo 124, I, do CTN para atribuir a responsabilidade
do terceiro nessa hipótese. Fica claro, portanto, com as vênias necessárias,
haver uma confusão feita no julgado entre o interesse comum no fato gerador
e o interesse econômico de que possa decorrer o fato gerador. E desse último
interesse como se viu, não enseja a solidariedade do artigo 124, I, do CTN,
confira-se:

DIREITO CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO


FISCAL. PIS/COFINS. INCIDÊNCIA SOBRE O ISS. DEMONSTRAÇÃO DO EXCESSO DE
EXECUÇÃO. AUSÊNCIA. ONUS DA PROVA. INEFICÁCIA DA DISCUSSÃO DA TESE PARA
DESCONSTITUIÇÃO DA CDA. GRUPO ECONÔMICO DE FATO. PRESCRIÇÃO PARA
REDIRECIONAMENTO. PARCELAMENTO DA DÍVIDA. INTERRUPÇÃO E SUSPENSÃO DO
PRAZO. ARTIGO 124, I, CTN. INTERESSE COMUM. PRÁTICA CONJUNTA DO FATO GERADOR.
ARTIGO 50 DO CÓDIGO CIVIL. ABUSO DE PERSONALIDADE JURÍDICA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. RECONHECIMENTO PARCIAL.
(...)
9. (...). Diversamente, a previsão de solidariedade passiva do artigo 124, I, do CTN, não
exige, como conditio sine qua non, infração de qualquer sorte - basta a existência de
interesse no suporte fático concreto da hipótese tributária. Entretanto, a interpretação
jurisprudencial deste dispositivo resta consolidada no sentido de que o interesse em
comum referido no texto não é econômico, mas jurídico, traduzido na exigência de que o
fato gerador, em específico, tenha sido praticado, conjuntamente, entre dois ou mais
entes jurídicos – que, assim, respondem solidariamente.
10. A documentação contida na execução fiscal permite vislumbrar a existência de grupo
econômico de fato entre (i) PEDRALIX S/AINDÚSTRIA E COMÉRCIO; (ii) CONSTRUTORA LIX
DA CUNHAS/A; (iii) LIX EMPRENDIMENTOS E CONSTRUÇÕES, (iv) LIXINCORPORAÇÕES E
CONSTRUÇÕES; (v) LIX CONSTRUÇÕESLTDA; (vi) CBI INDUSTRIAL LTDA; e (vii) CBI
CONSTRUÇÕESLTDA. Evidencia-se que as empresas atuam em atividades relacionadas à
incorporação e comercialização de imóveis, projetos arquitetônicos e de engenharia,
produção e comércio de materiais para construção e construção, propriamente dita, de
edifícios, áreas afins e com caráter de complementariedade, portanto.
11. As cópias das fichas cadastrais emitidas pela JUCESP demonstram que várias das
empresas possuem endereços idênticos e são sócias umas das outras, havendo identidade
entre alguns sócios, com algumas pequenas variações. A existência, pois, de atuação em
áreas afins e em caráter de complementariedade, identidade de vários sócios e
participação de empresas nos quadros sociais/acionários umas das outras revela
interesses e direção econômica convergentes, e unidade gerencial, características próprias
de empresas componentes de agrupamento econômico que, à míngua de registro,
constitui “grupo econômico de fato”.
12. Além da constatação de formação do grupo econômico informal (de fato), não é
possível afastar o “interesse comum” das empresas na composição e obtenção de
faturamento umas das outras, o que constitui fato gerador das contribuições sociais
previstas na LC 07/1970 e LC70/1991. Tal interesse não se restringe à esfera econômica,
mas atinge área jurídica, já que há efetiva prática do fato gerador em comum pelas
empresas, em que se compartilha/transfere informalmente o faturamento de uma
companhia para outra.
13. A executada originária, PEDRALIX S/A INDÚSTRIA ECOMÉRCIO, paralisou atividades,
conforme notícia publicada nas “Informações Trimestrais (ITR)” prestadas à “Comissão de
Valores Mobiliários (CVM)” pela CONSTRUTORA LIX DA CUNHA S/A, na qualidade de
companhia controladora, aos acionistas, em junho e setembro/2010. Esta última
informação, além de registrar a paralisação das atividades da PEDRALIX S.A. INDUSTRIA E
COMÉRCIO, revela o papel de companhia controladora do grupo econômico reconhecido
pela própria CONSTRUTORA LIX DA CUNHA S/A. Neste sentido, cabe destacar que, em
outro documento dos autos, há demonstração de que a companhia também é tida como
controladora das empresas LIXINCORPORAÇÕES E CONSTRUÇÕES, LIX CONSTRUÇÕES
LTDA e LIX EMPRENDIMENTOS E CONSTRUÇÕES.
14. Embora, conforme visto, a executada originária, PEDRALIX S.A.INDUSTRIA E
COMÉRCIO, esteja com atividades paralisadas desde2010, houve transmissão de DCTFs,
com declarações de apuração de faturamento/receita no período, o que revela fortes
indícios de que a companhia controladora e outras integrantes do grupo econômico
utilizam-na para declarar parte ou totalidade de seu faturamento e, desta forma, diante
do esvaziamento patrimonial da PEDRALIX (inexistência de bens penhoráveis na execução
fiscal principal e outras ajuizadas, tanto que houve necessidade da controladora oferecer
bem para possibilitar a oposição dos embargos do devedor), deixar de recolher tributos e
frustrar a pretensão do Fisco em recuperar valores devidos pelas executadas, revelando a
hipótese de abuso de personalidade jurídica por desvio de finalidade, pela “utilização da
pessoa jurídica com o propósito de lesar credores”, nos termos do artigo 50, caput, c/c §
1º, do Código Civil, a autorizar assim a corresponsabilização.
15. Verifica-se ainda que, sendo o faturamento fato gerador do PIS/COFINS executado, e
estando suficientemente provado, sem indicativos em contrário, que houve prática
conjunta dos fatos geradores que geraram o débito executado por empresas integrantes
do grupo econômico, tem cabimento, na espécie, a responsabilização solidária prevista no
artigo 124, I, CTN. Constata-se ainda a prática, pelo grupo econômico, de utilizar o
patrimônio de uma companhia para quitação de dívidas de outra, e de realizar
empréstimos a outras empresas do grupo. Neste sentido, em ficha cadastral da JUCESP
consta a realização de empréstimos com garantia através de bens de outras empresas do
grupo, oferecimento de bens para garantir débitos de outras empresas, alienação de bens
para pagamento de dívidas de empresas do grupo. Tais fatos indicam “abuso de
personalidade jurídica pela confusão patrimonial”, por “ausência de separação de fato
entre os patrimônios, caracterizada por [...] transferência de ativos ou de passivos sem
efetivas contraprestações”, nos termos do artigo 50, caput, c/c § 2º, II, do Código Civil, o
que autoriza, outrossim, a corresponsabilização.
(TRF – 3 – ApCiv: 0009865-21.2015.4.03.6105. Relator: Luiz Carlos Hiroki Muta. Data de
Julgamento: 27/04/2020, 3ª Turma).
Com efeito, tais decisões servem para exemplificar os desacertos que
vêm sendo cometidos pelos Tribunais Federais, uma vez que nelas se
confundem a disposição contida no artigo 124, I, do CTN, desvirtuando assim o
seu alcance.

Decisão do STJ colocou um ponto final à discussão havida se o


artigo 124, I, do CTN poderia gerar tornar o responsável tributário
solidariamente obrigado com o contribuinte 81. Assim, o voto do ministro-
relator do REsp XXX assim sentenciou:
A Primeira Turma do STJ, quando do julgamento do REsp
1.775.269/PR, à unanimidade, asseverou que a expressão interesse
comum não pode ser confundida com qualquer outro interesse, senão o
interesse na prática do fato gerador. É o que se colhe do excerto desse
decisum ora transcrito, in verbis:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL.


REDIRECIONAMENTO A PESSOA JURÍDICA. GRUPO
ECONÔMICO "DE FATO". INCIDENTE DE
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.
CASO CONCRETO. NECESSIDADE.(...)
VOTO
(...)
A propósito, importante destacar que o interesse comum do
inciso I diz respeito ao interesse jurídico das pessoas na
relação jurídico-tributária, que se dá quando os sujeitos,
conjuntamente, fazem parte da situação que permite a
ocorrência do fato gerador.
Por isso, afirma-se que o só interesse econômico decorrente
da situação não legitima a atribuição da responsabilidade.
(...)
De fato, esse é o pacífico entendimento jurisprudencial deste
Tribunal Superior; dentre outros, confiram-se: AREsp
1198146/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA
TURMA, julgado em 04/12/2018, DJe 18/12/2018; REsp
884.845/SC, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA,
julgado em 05/02/2009, DJe 18/02/2009; REsp 834.044/RS,
Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado
em 11/11/2008, DJe 15/12/2008.
Nessa linha, [...] tanto a doutrina quanto a jurisprudência
rechaçam a interpretação de interesse comum como sendo
sinônimo de interesse econômico, exigindo que a solidariedade
advenha de interesse jurídico compartilhado. [...] Aplicando-se
o raciocínio acima aos grupos econômicos, constata-se que
somente haverá solidariedade entre seus integrantes quando
81
COLOCAR AS DECISÕES DO TRF
tais sujeitos participem na constituição do fato jurídico
tributário. Ser parte de um grupo econômico, de per si, não
representa a existência de um vínculo de solidariedade. [...] A
única maneira pelo qual o agrupamento pode efetivamente
responder, dentro dos dispositivos da lei tributária, é em caso
de prática conjunta do fato tributário, nos termos do art. 124, I,
da norma em comento (capítulo VI).
(...)
(REsp 1775269/PR, Rel: Ministro Gurgel de Faria. Data de
Julgamento: 21/02/2019, 1ª Turma).

Importante frisar que essa posição da Primeira Turma do Superior


Tribunal de Justiça no julgado em análise, sob a relatoria do Ministro
Gurgel de Faria, tornou-se marco importante, uma vez que, à
unanimidade, reconheceu que o enunciado contido no artigo 124, I, do
CTN não poderia se confundir com o interesse econômico, porquanto o
interesse no resultado econômico do evento não legitimaria a atribuição
da responsabilidade. Nesse sentido, apenas o interesse jurídico havido
entre os sujeitos, quando em conjunto fazem parte da situação que
permite a ocorrência do fato gerador, é que autoriza a atribuição da
solidariedade.
Dessa sodalícia decisão verifica-se o desacerto das decisões dos
tribunais regionais federais acima transcritas em que se confundiu o
interesse comum com as hipóteses de formação do grupo econômico, já
que apenas uma pessoa jurídica, nesse caso de grupo econômico, é
quem pratica o evento tributário, ainda que esse repercuta
economicamente para outras pessoas. É o que se colhe das palavras do
relator do REsp em análise, que diz: “Ser parte de um grupo econômico,
de per si, não representa a existência de um vínculo de solidariedade”
Clara é a posição defendida neste trabalho, alinhada ao
entendimento do STJ, em que o interesse comum só pode se referir à
prática de eventos subsumíveis à hipótese de incidência prevista na
respectiva regra matriz de incidência tributária.
Logo, esse julgado do STJ evidencia que não pode ser dada ao
dispositivo contido no artigo 124, I, do CTN a extensão conferida pelos
julgados dos Tribunais Regionais Federais, os quais o utilizam para a
atribuição de responsabilidade de terceiros.
Pela investigação da regra inserta no artigo 124, I, do CTN
verifica-se que ela se destina ao sujeito passivo qualificado como
contribuinte, não podendo se referir ao responsável tributário em razão
dos postulados trazidos pelo CTN e, portanto, não se prestando a
caracterizar a responsabilidade tributária.

Assim, não se pode outorgar ao responsável a característica de


interesse comum, pois, como se vê do artigo 124, I, do CTN, esse
interesse só liga os sujeitos que pratiquem o verbo que constitui o fato
jurídico tributário, atributo exclusivo do contribuinte, espécie distinta do
responsável, dentro do gênero da sujeição passiva.
Ademais, por interesse comum não se pode atribuir o conceito
dado pela linguagem ordinária, uma vez que pela prescrição da lei, só
terão interesse comum aqueles que ajam conjuntamente na situação
que constitua o fato gerador, logo, somente ao contribuinte se pode
atribuir a expressão interesse comum. Nesse sentido, colha-se
importante lição de Tárek Moysés Moussallem:
O direito positivo não “adota” teorias: cria-as. Aliás, pelo ponto
de vista normativo, muitos “conceitos” jurídicos são distintos
daqueles atribuídos pela linguagem ordinária do dia a dia.
(MOUSSALLEM, 2016, p.251)

Do exposto, propomos como definição conotativa 82 do interesse


comum passível de gerar a solidariedade na sujeição passiva,
consoante reza o inciso I do artigo 124 do CTN, a seguinte: o interesse
comum significa vínculo entre dois ou mais contribuintes atuando em
conjunto.

3.1.2.3. O terceiro do artigo 149, VII, do CTN e a impossibilidade de construção


da regra-matriz de responsabilidade tributária

82
No âmbito da ciência do direito, o jurista deve preferir as definições conotativas (por gênero e
diferença específica) às denotativas por serem mais adequadas ao conhecimento científico.
(MOUSSALLEM, 2016, p.268)
Assim, é que pela teoria das classes, pode-se de forma objetiva
identificar, a partir das definições prescritas pelas normas jurídicas, qual
a posição desse terceiro.
Do ponto de vista lógico-estrutural, é fato, que dentre as regras
técnicas da definição, encontra-se a que determina que “O definies não
deve ser negativo em significação, ao menos que o definiendum83 seja
primordialmente negativo em sua significação”. ( MOUSSALLEM, 2016,
p.261)
Contudo, o referido autor elucida que a definição pela negativa é
possível quando a negação for característica definitória do definiendum,
dando como exemplo de órfão (definiendum) “como ‘filho que não possui
pai nem mãe’ (definies). Aqui a negatividade (não ter pais vivos) é uma
das características definitórias da palavra ‘órfão’”. ( MOUSSALLEM, 2016,
p.261)
Ademais, explica, o citado autor, que, igualmente, é possível a
definição pela negativa se decorrentes de classes complementares,
confira-se:
A negatividade também tem funcionalidade nas definições
decorrentes de classes complementares. De acordo com
LEÔNIDAS HEGENBERG, classe complementar de A é o
“conjunto formado por elementos (do universo) não
pertencentes à Classe A”. Simboliza-se a classe e sua
complementar pelas letras K e K’, respectivamente. (...). Dentro
do universo dos fatos jurídicos (classe universal – “V”), temos a
classe “K” cujos membros são os “fatos jurídicos lícitos” e a
classe “K”, cujos elementos são fatos jurídicos ilícitos”. Isso
decorre do fato de que toda classe complementar K’ é a
negação da original K. Logo, a negatividade é a característica
intrínseca à classe complementar. (MOUSSALLEM, 2016,
p.261-262)

Ora, para se definir o terceiro citado no artigo 149, VII, do CTN,


deve-se verificar que ele faz parte da classe complementar da sujeição
passiva. Noutras palavras, como se viu da transcrição acima, a classe
complementar da sujeição passiva é o conjunto formado (do universo)
não pertencente a classe sujeição passiva. Logo, justifica-se a escolha

83
A palavra cujo conceito se busca definir se chama definiendum e as palavras usadas para
definir se denominam definies (MOUSSALLEM, 2016, p.253)
das palavras, usadas pera definir (definiens) esse terceiro (definiendum),
pela negativa.
Diante disso, propomos como definição conotativa do “terceiro”
(na condição indicada pelo artigo 149, VII, do CTN), a seguinte: terceiro
significa pessoa que não se enquadra na condição de sujeito passivo da
relação jurídico-tributária.

Entende-se a relevância de buscar quem seria então o terceiro


citado no artigo 149, VII, do CTN, uma vez que, como se viu, não é
possível falar em solidariedade por interesse comum

A questão a ser analisada é a posição que esse terceiro ocupa no


lançamento ou na sua revisão. Assim, valendo-se da teoria das classes
pode-se chegar à definição desse terceiro – mencionado no referido
dispositivo do CTN –, de modo a saber se ele pode figurar no polo
passivo da relação jurídico tributária a ser constituída, inclusive por meio
de revisão de lançamento. Nesse percurso, este estudo se utiliza
também da teoria das classes na definição de interesse comum citado
no artigo 124, I, do CTN. Com efeito, uma vez conjugada as definições
de interesse comum e do terceiro citado no artigo 149, VII, do CTN,
torna possível identificar se esse terceiro poderia participar da relação
jurídica tributária estabelecida em razão do lançamento tributário ou de
sua revisão, na qualidade de responsável. Pela análise, chega à
conclusão de que esse terceiro, apontado no artigo 149, VII, do CTN,
caso aja com dolo, fraude ou simulação para beneficiar o sujeito passivo
por interesse econômico, não pode figurar no lançamento de ofício ou de
sua revisão, pois na hipótese não há que se falar de interesse comum a
atrair responsabilidade tributária.

(Pegar com Ítalo e com Aline – MG – decisões que indevidamente


coloquem o artigo 149, VII como indevidamente para atribuir
responsabilidade).
RETOMAR A REGRA-MATRIZ DE RESPONSABILIDADE

3.3. Artigo 124, II, do CTN como hipótese de atribuição de novas hipóteses de
responsabilidade tributária.

Por assim ser, quando o CTN no inciso II do artigo 124 impoe que a
responsabilidade solidaria da sujei9ao passiva pode se dar por deterrnina9ao
expressa de lei, entende-se, essa, por lei dos entes politicos, nao sendo necessaria lei
complementar para sua criac;ao.
Contrario sensu ea posi<;:ao de Julio de Oliveira e Sergio Vasconcelos, em
artigo publicado25, para quern o dispositi o normativo do inciso II do artigo 124 do C
ao mencionar pessoas designadas por lei, impoe a exigencia de lei complementar
confira se:

Dessa forma, quando a reda9ao do art. 124, II, menciona que sao
solidariamente obrigadas as pessoas expressamente designadas por lei, isso
nao significa que esse dispositivo legal esta autorizando o legislador a criar
novos casos de responsabilidade tributaria sem a observancia dos requisites
exigidos pelo art. 128 do CTN, tampouco das normas gerais de
responsabilidade tributaria de terceiros, estabelecidas em carater geral pelos
arts. 134 e 135.
a verdade, ele dispoe que, na hip6tese em que exista uma pluralidade de
sujeitos passives em uma rela9ao juridico-tributaria, se um deles (ou todos)
for considerado como responsavel tributario, a lei com lementar pode
estabelecer que eles respondam solidariamente pelo debito tributario. (grifos
nao constam do original)

Nota-se que o posicionamento dessa doutrina difere-se do que se defende no


presente trabalho nao s6 no que se refere ao veiculo exigido para configura<;:ao de
novas previsoes de solidariedade passiva, como tambem, no entendimento26 de que e

vedado as ordens parciais a cria<;:ao de novas hip6teses de responsabilidades.

0 Pretoria Excelso alinhado a essa mesma posic;ao aqui enfrentada de


que o inciso I do artigo 124 do CTN refere-se ao contribuinte, atraves de voto
da Ministra relatora, Ellen Gracie, no RECURSO EXTRAODINARIO O
562.276 - PR,

julgado pelo plenario acolheu a posic;ao defendida par Mizabel Derzi, coma
razao de decidir, confira-se:
DIREITO TRIBUTARlO. RESPO SABILIDADE TR.IBUTAfUA.
ORMAS GERAIS DE DIREITO TR.IBUTARIO. ART 146, ill, DA CF..
ART. 135, III, DO CT . s6cros DE SOCIEDADE LIMITADA. ART.
13
DA LEI 8.620/93. INCONSTITUCIO ALIDADES FORMAL E
MATERIAL. REPERCUSSAO GERAL. APLICA<;:AO DA DECIS.A.6
PELOS DEMAIS TR.IBUNAIS.
(...)
0 preceito do art. 124, II, no sentido de que silo solidariamente obrigadas
"as pessoas expressamente designadas por lei", nao autoriza o legislador
a criar novos casos de responsabilidade tributaria sem a observancia dos
requisitos exigidos pelo art. 128 do CTN, tampouco a desconsiderar as
regras matrizes de responsabilidade de terceiros estabelecidas em
carater geral pelos arts. 134 e 135 do mesmo diploma. A previsao legal de
solidariedade entre devedores - de modo que o pagamento efetuado por
um aproveite aos demais, que a interrup<;ao da prescri<;iio, em favor ou
contra um dos obrigados, tambem !hes tenha efeitos comuns e que a
isen<;ao ou remissao de credito exonere a todos os obrigados quando nao
seja pessoal (art.125 do CTN) - pressupoe que a pr6pria condi<;ao de
devedor tenha sido estabelecida validamente.
3. A responsabilidade tributaria pressupoe duas norrnas autonornas:
a regra matriz de incidencia tributaria e a regra matriz de
responsabilidade tributaria, cada uma com seu pressuposto de fato e seus
sujeitos pr6prios. A referencia ao responsavel enquanto terceiro (dritter
Persone, terzo ou tercero) evidencia que nao participa da rela9ao
contributiva, mas de uma rela<;ao especifica de responsabilidade
tributaria inconfundivel' com aquela: 0 'terceiro" s6 pode ser
chamado responsabilizado na hip6tese de descumprimento de
deveres pr6prios de colabora<;ao para com a Administra<;ao
Tributaria, estabelecidos, ainda que a contrario sensu, na regra matriz de
responsabilidade tributaria; e desde que tenha contribuido para a
situa<;ao de inadimplemento pelo contribuinte.

A posii;:ao dos tribunais superiores, sobre o inciso II do ai1igo 124, CTN,


perfilha o mesmo sentido de que o dispositivo em questao se destina ao responsavel
tributario verbis:
0 art. 124, II do CTN, segundo se entende, nao autoriza a responsabiliza9iio
de quern nao tenha sem vincula9ao ao fato gerador. Eis a li9ao do Professor
PAULO DE BARROS CARVALHO, com essa orienta9ao:
(...) propositadamente, deixamos para o final a men9ao ao inc. II do art. 124,
que declara solidariamente obrigadas as pessoas expressamente designadas
por lei. Ajeita-se aqui uma advertencia sutil, mas de capitular relevo. 0
territ6rio de elei9ao do sujeito passivo <las obriga9oes tributarias e, hem
assim, <las pessoas que devam responder solidariamente pela divida, esta
circunscrito ao ambito da situa9ao factual contida na outorga de competencia
impositiva, cravada no texto da Constitui9ao. A lembran9a desse obstaculo
sobranceiro impede que o legislador ordinario, ao expedir a regra-matriz de
incidencia do tributo que cria, traga para o t6pico de devedor, ainda que
solidario, alguem que nao tenha participado do fato tipico. Falta a ele,
legislador competencia constitucional para fazer recair a carga juridica do
tributo sobre pessoa alheia ao acontecimento gravado pela incidencia (Curso
de Direito Tributario, Sao Paulo, Saraiva, 1996, pp. 216-217).
[...]
contudo, segundo as lic;oes dos doutrinadores, sempre se requer ue estejarn
atendidos ou satisfeitos os requisitos dos arts. 124 e 128 do CTN.1

(JUNTAR COM A PARTE DE HENRIQUE – DISSECAR BEM EM


JULGAMENTO – ALINE)

3.4. Revisão de ato que na linguagem das provas demonstra ocultação do


sujeito passivo (USAR: Análise do artigo 116 do CTN – artigo com Roberta).

construiu as seguintes definições:


(i) Do contribuinte e responsável tributário, adotou-se a definição
legal do artigo 121 do CTN, qual seja: contribuinte como pessoa
que tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o
respectivo fato gerador, ficando, por isso, obrigada ao pagamento
de tributo ou penalidade pecuniária. E responsável, quando, sem
revestir a condição de contribuinte, sua obrigação de pagar tributo
ou penalidade pecuniária decorra de disposição expressa de lei.
(ii) Do interesse comum como vínculo entre dois ou mais
contribuintes atuando em conjunto.
Tais definições foram essenciais e necessárias para se chegar à
definição do terceiro, citado pelo artigo 149, VII, do CTN, como pessoa
que não se enquadra na condição de sujeito passivo da relação jurídico-
tributária.
Assim, por meio dessas definições conotativas, é que se pode
analisar com maior precisão o comando normativo inserto no artigo 149,
VII, do CTN: regra dirigida para que o lançamento tributário ou sua
revisão só possa constituir relação jurídica (tributária) entre o fisco e o
contribuinte ou o fisco e o responsável, nesta última hipótese, se esse
ato (lançamento ou revisão) tiver por objetivo a constituição da
responsabilidade tributária.
Diante disso, é que o lançamento ou sua revisão não pode firmar
relação jurídica (tributária) entre o fisco e o terceiro, que, por qualquer
interesse, agir com simulação, dolo ou fraude em benefício do sujeito
passivo. Isto porque, o interesse, que gera a solidariedade passiva, é
apenas o denominado “interesse comum” na prática do fato gerador,
atributo exclusivo do contribuinte.
Para figurar, portanto, na relação jurídico tributária a ser
constituída pelo lançamento ou sua revisão, ou esse terceiro é o
contribuinte ocultado pelo dolo, fraude ou simulação, ou é o responsável,
igualmente, ocultado pelo mesmo expediente, nas hipóteses de
lançamento para constituir responsabilidade tributária.

Verificado que o artigo 149, VII, do CTN não se presta atribuir


responsabilidade a terceiro, logo não é enunciado com o qual se possa
construir a regra-matriz de responsabilidade tributária, é importante
verificar qual então o alcance dele e qual a norma jurídica que a partir
dele é possível construir.

Entende-se, assim, que somente o contribuinte ou o responsável


poderá figurar, na condição de sujeito passivo, no lançamento tributário,
ou na sua revisão, conforme for o caso, ainda que antes da linguagem
das provas firmada por um desses atos estivessem ocultados de uma
dessas condições, figurando um ou outro até então como terceiro.
Afasta-se, destarte, a possibilidade de se pensar nesse terceiro
como responsável pela invocação imprópria 84 do interesse comum
previsto no inciso I do artigo 124, do CTN.

84
Atribuindo conceito ordinário e não jurídico, v.g.: como sinônimo de interesse econômico.
Como se viu, ainda que haja qualquer ato doloso, fraudulento ou
simulado desse terceiro em benefício do sujeito passivo a ocultar o fato
jurídico tributário, não poderá ele participar da relação jurídica tributária
a ser constituída desse fato.

na situação de esse terceiro estar na condição de verdadeiro


contribuinte, antes ocultada pela simulação, dolo ou simulação, deverá
ele participar do polo passivo do lançamento. E, também, se esse
terceiro estiver na posição de responsável, antes ocultada, igualmente,
pelo dolo, fraude ou simulação, nos casos de lançamento por
responsabilidade tributária, deverá figurar no polo passivo do
lançamento

O presente trabalho tem por escopo trazer elemento capazes de


melhor precisar o alcance da previsão contida no inciso VII do 149 do
Código Tributário Nacional, que diz:
Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela
autoridade administrativa nos seguintes casos:
VII – quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em
benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação.

O evento previsto na norma, uma vez relatado em linguagem


competente, por meio do lançamento tributário, constitui o fato jurídico
infracional gerando o vínculo entre o sujeito ativo e o sujeito passivo.
Ocorre que, caso o fisco venha a verificar uma das hipóteses do
artigo 149, VII, do CTN, isto é, prevendo que o sujeito passivo, ou que o
terceiro em benefício desse, agindo com dolo, fraude ou simulação,
ocultou a ocorrência do fato gerador do tributo, fica autorizado a
promover o lançamento ou a sua revisão.
Para melhor ilustrar a situação, tome-se a exemplo, uma
sociedade, com separação apenas formal, que, agindo com simulação,
ocultou o fato gerador do tributo ou da responsabilidade tributária; tal
situação autoriza o fisco a promover o lançamento ou sua revisão contra
o então terceiro, desde que tenha demonstrado, por meio da linguagem
das provas, que esse terceiro é, na verdade, o real sujeito passivo.
Ora, de se ver que, pelo inciso VII do artigo 149 em análise, o
terceiro somente poderia participar do lançamento ou de sua revisão,
nas seguintes hipóteses:
(i) se estivesse ocupando a posição de contribuinte, que, pela
simulação, dolo ou fraude, havia dela se ocultado; ou
(ii) se estivesse, pela simulação, dolo ou fraude, ocultado de sua
verdadeira condição de responsável, em se tratando de
lançamento a constituir o fato gerador da responsabilidade
tributária.
Nesse toar, confira-se elucidativo trecho de Andréia M. Darzé,
quando diz:
Como vimos é relativamente comum [...] que a
responsabilidade de terceiros somente seja apurada quando já
em curso o processo administrativo ou de execução fiscal, não
por negligência do Fisco, mas por artifícios do próprio sujeito
passivo na tentativa de ocultar a sua real ocorrência. [...]
No primeiro caso, como o erro da Administração ao emitir o
lançamento foi provocado por culpa, omissão, dolo, fraude ou
simulação do próprio sujeito passivo ou de terceiros, autorizada
está a sua revisão de ofício, nos termos de quase todos os
incisos do artigo 149 do CTN. [...]
Diversamente das situações anteriormente expostas, o
problema aqui se refere às provas, as quais, afastados os
elementos ardilosos empreendidos pelos particulares, apontam
para nova situação jurídica, que não aquela formalizada no
lançamento. Trata-se de erro de fato, o que torna a revisão
perfeitamente possível (DARZÉ, 2010, p.384)

De se observar que a situação, relatada por Andréia M. Darzé,


não trata de terceiro propriamente dito, mas sim de contribuinte ou
responsável que por meio ardiloso se ocultou de tal condição, mas, uma
vez revelada pela linguagem das provas, torna possível sua inclusão no
polo passivo do lançamento ou revisão.
Contudo, deve-se verificar o prazo que torna possível o
lançamento ou sua revisão, como bem alerta a citada autora:
Assim, somente será legítima a inclusão dos codevedores
solidários no polo passivo do tributo, se procedida no prazo de
cinco anos contados a partir do primeiro dia do exercício
seguinte ao i. da realização do fato jurídico tributário; ou ii. Do
fato da responsabilidade solidária, o que vier por último.
Apenas a conjugação desses dois elementos é que se terá a
completa subsunção aos critérios definidos na hipótese da
norma geral e abstrata que lhe fundamenta, que é,
invariavelmente, molecular, como já anotamos. (DARZÉ,
2010, p.385)

Já, para Maria Rita Ferragut, o artigo 149, VII, do CTN trata de
simulação de autonomia jurídica entre o sujeito passivo e o terceiro;
assim, haveria a prática do fato por apenas uma dessas pessoas (a
única que efetivamente existe), responsabilizando a pessoa existente
pelos débitos da fictícia, confira-se:
O pressuposto de aplicabilidade do art. 149, VII, do CTN é a
prática de um ilícito mediante dolo, fraude ou sonegação, pelo
sujeito passivo ou terceiro, tais como na simulação da
existência de personalidade jurídica, no conluio para obtenção
de um benefício fiscal ou para conferir aparência de legalidade
a uma operação ficta. Nessas situações a norma mantém
intactos a personalidade jurídica e os atos fraudulentos (desde
que efetivamente existentes), mas autoriza que a Autoridade
Administrativa determine que todos os envolvidos no ilícito
respondam pelo passivo fiscal (FERRAGUT, 2020, p.204-205)

3.2.1. Decadência para o desfazimento do negócio jurídico.

CONCLUSÃO
Qualquer estudo que tenha o status de científico deve provar o
seu próprio método, uma vez que emprega linguagem e raciocínio
(ECHAVE; URQUIJO; GUIBOURG, 2008, p.31). A função da Lógica,
pois, é estabelecer esse controle de validade do raciocínio.
A seu turno, “raciocinar ‘consiste em manipular a informação
disponível – aquilo que sabemos, ou supomos ser verdadeiro – construir
consequências disso, obtendo informação nova’”. (CARVALHO, 2019,
p.199)
Quando a Lógica é aplicada à ciência do direito, ela recebe o
predicado de Lógica Jurídica, assim, temos nas palavras de Tarek
Moussallem que:
A lógica aplicada à Ciência do Direito denomina-se lógica
jurídica que é a análise das categorias aléticas ou apofânticas
presentes nos enunciados descritivos (que tem por valor a
verdade ou a falsidade). Por isso as leis lógicas são
estruturantes do discurso descritivo (leis da não-contradição,
do terceiro excluído e da identidade) (MOUSSALLEM, 2020,
p.161).

Contudo, quando a Lógica é empregada em relação ao direito


positivo, passa a denominar-se Lógica Deôntica, na qual se observa a
interdefinibilidade dos modais deônticos e todas as demais operações
de deduções no interior do direito positivo (MOUSSALLEM, 2020,
p.162).
O direito positivo é construído por meio da interpretação, pois é
fato cultural e como tal é apreendido por meio da compreensão, que, a
sua vez, nada mais é do que interpretação, pois dele se atribui sentido
aos suportes físicos. Assim, no direito, no ato da interpretação “o sujeito
vai do enunciado à norma num espiral hermenêutico como bem notou
Paulo de Barros Carvalho” (MOUSSALLEM, 2020, p.167).
O espiral que trata Tarek Moussallem vem da imagem do
chamado “percurso gerador de sentido”, idealizado pelos mestres Paulo
de Barros Carvalho e Lourival Vilanova, criadores do Constructivismo
Lógico Semântico, metodologia de cariz epistemológico. 85
Pela sua pertinência, deve-se esclarecer, em breve síntese, que o
percurso gerador de sentido é mecanismo desenvolvido pela linha
metodológica do constructivismo lógico-semântico, para a construção da

85
O Constructivismo Lógico-Semântico, firme no pressuposto da necessária função constitutiva
da linguagem, insere-se no contexto da Filosofia da Linguagem e traz o ser humano – produtor
de textos – para o centro das teorias da norma jurídica e do ordenamento jurídico. (...)
Providência desse quilate, de cunho epistemológico, permite que a linguagem prescritiva do
direito positivo e a linguagem descritiva da Ciência do Direito sejam vivamente potencializadas
pela utilização dos instrumentos utilizados pela Semiótica para sua análise, forçando as
amarrações lógico-semântico-pragmáticas de todos aqueles que tomam o direito positivo como
objeto de conhecimento, seja para realizar incidências (agentes competentes), seja para emitir
proposições descritivas (cientistas dogmáticos do direito). (LINS, 2019, p.13-14)
norma jurídica86, fruto do processo interpretativo, onde por meio desse
método se explora os quatro planos existentes no texto jurídico.
Assim, o exegeta tem no plano S1, o plano do enunciado; no S2,
o plano das proposições; no S3, o plano das normas jurídicas e no plano
S4, o plano da sistematização.
O S1 é o plano onde o intérprete se depara com o texto, dentro da
percepção sintática, morfológica das palavras que ele contém, embora
ainda não extraindo o sentido que aquele conjunto de palavras tem
dentro daquele enunciado.
Já no plano S2, o intérprete vai buscar o significado semântico
daquele enunciado, dando-lhe sentido completo, contudo, neste
momento, ainda não se extrai do texto uma regra jurídica, não se
constrói a norma, essa que exige a expressão do dever-ser, isto é,
aquela que diz que dado determinado fato, deve ser que se adote
determinada conduta a ser observada pelo destinatário da mensagem
prescritiva, isso que só ocorrerá no plano S3.
Por fim, no plano S4, é que, com a norma já construída, o
intérprete vai verificar, dentro do sistema analisado, a sua pertinência e
validade, em uma análise de coordenação e subordinação com as
outras normas ali existentes.
Em arremate, imprescindível são as lições objetivas de Aurora
Tomazini de Carvalho sobre esse tema, que bem resumem o percurso
gerador de sentido do texto jurídico, assim vazadas:
Explicando: a compreensão dos textos jurídicos é um trabalho
construtivo, resultado de um esforço intelectual. Num primeiro
momento, o intérprete entra em contato com um dado objetivo,
a literalidade textual um aglomerado de frases ordenadas que
formam o chamado plano de expressão (S1...). Partindo deste
plano, com a leitura dos enunciados prescritivos, o intérprete
vai atribuindo valores aos símbolos que os compõem e, assim,
construindo em sua mente significações, que constituem o

86
Somente a norma jurídica, tomada em sua integralidade constitutiva, terá o condão de
expressar sentido cabal dos mandamentos da autoridade que legisla.
Isso não que dizer que seja impossível elaborar, a partir da redação de um único artigo de
qualquer documento jurídico-positivo, uma norma na plenitude de sua inteireza lógica. (...) Ao
travar contato com a materialidade física do texto legislado, sabe ele, perfeitamente, que pode
ter de percorrer longo caminho, em termos de integração do sistema, de modo que, na maioria
dos casos, sairá à busca de outros enunciados, muitas vezes em diplomas diferentes daquele
que examina, tudo para montar uma única regra do conjunto, obtendo, então, a plena
esquematização formal da mensagem positivada. (CARVALHO, 2015, p.45)
plano das proposições, ainda não deonticamente estruturadas
(S2...). Como a estruturação destas proposições na forma
implicacional (...), o intérprete junta algumas das significações
construídas na proposição sintática de hipóteses e outras, no
lugar do consequente, ingressando no plano das normas
jurídicas (S3...). E, por fim, ordenar as significações
normativas, construídas no plano S3, de acordo com os
critérios de subordinação e coordenação, compondo os
vínculos que se estabelecem sistematicamente entre as
normas, para construir seu sistema normativo (S4...)
(CARVALHO, 2019, p.258-259).

Ao passar por esses quatro planos, pode-se afirmar que o


exegeta construiu a norma jurídica, atendo-se à sintaxe, à semântica, à
estrutura lógica do enunciado do texto legislado e à sua validade dentro
do sistema.
Analisar, portanto, a trajetória por esses quatro planos, garante ao
intérprete não ultrapassar à previsão contida no texto legal, impedindo,
assim, alcançar realidade não legislada, como também utilizar norma
inexistente ou inválida no sistema jurídico observado.
Sobre o tema, importante síntese traz Robson Maia Lins, note-se:
O direito positivo, sob tal perspectiva, corresponde ao suporte
físico ou signo; com a interpretação do enunciado prescritivo
individualmente considerado temos o significado ou proposição
jurídica; em seguida, formam-se as significações estruturadas
que são as normas jurídicas (ideias, conceitos produzidos em
nossa mente). (LINS, 2019, p.36)

Ora, a linha do Constructivismo Lógico Semântico se vale,


também, da parte sintática do direito positivo, mas é por meio da lógica,
do processo de desformalização que preenchendo o conteúdo
semântico, constrói-se rigorosamente conceitos jurídicos.

Logo, em síntese conclusiva, o terceiro, citado no artigo 149, VII,


do CTN, não terá para si atraída a responsabilidade, isto é, não poderá
figurar como sujeito passivo do lançamento tributário ou de sua revisão,
na hipótese de, agindo com dolo, fraude ou simulação, por qualquer
interesse, vir a ocultar o fato jurídico tributário.

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