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NEGOCIAÇÃO E GESTÃO DE CONFLITOS DE SEGURANÇA

Para a área da Segurança Pública, as situações críticas e os conflitos necessitam


de atenção especial do operador, seja pela imprevisibilidade e risco iminente
à vida humana que as crises policiais proporcionam, seja pelo número de
envolvidos ou diferentes motivações que os conflitos possam abranger. Por
isso, os responsáveis pelo processo necessitam escolher os métodos adequados
e estar inteiramente focados na resolução do problema.
Negociação e gestão de conflitos de segurança é uma obra que apresenta
técnicas úteis às instituições policiais e de Segurança Pública para melhor
enfrentar essas demandas. Nesse sentido, o leitor é convidado a imergir no
tema, estudando conceitos, características e elementos fundamentais do
gerenciamento de crises.

Marco Antonio da Silva | Otávio Lúcio Roncaglio

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


Marco Antonio da Silva
Otávio Lúcio Roncaglio
ISBN 978-85-387-6581-3

59171 9 788538 765813


Negociação e gestão
de conflitos de
segurança

Marco Antonio da Silva


Otávio Lúcio Roncaglio

IESDE BRASIL
2020
© 2020 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do
detentor dos direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Dan Kosmayer/Shutterstock

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
S581n

Silva, Marco Antonio da


Negociação e gestão de conflitos de segurança / Marco Antonio da
Silva, Otávio Lúcio Roncaglio. - 1. ed. - Curitiba [PR]: IESDE, 2020.
94 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6581-3

1. Administração de conflitos. 2. Mediação. 3. Negociação. I. Roncaglio,


Otávio Lúcio. II. Título.

19-61588
CDU: 347.925

Todos os direitos reservados.

IESDE BRASIL S/A.


Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Marco Antonio Pós-graduado em Psicologia Jurídica pela Pontifícia
Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e em
da Silva Saúde Mental pela Universidade Católica Dom
Bosco de Campo Grande (UCDB-MS). Graduado
em História pelas Faculdades Integradas Espírita
(FIES) e Psicologia pela PUCPR. Oficial superior da
Polícia Militar do Paraná (PMPR). Atuou durante 11
anos como integrante da Equipe de Negociação do
Batalhão de Operações Especiais (BOPE) e participou
diretamente do atendimento de inúmeras ocorrências
críticas. Especializou-se em gerenciamento de crises e
negociação em crises em diversas corporações policiais
brasileiras e no exterior. É professor das disciplinas
relacionadas às crises na Academia Policial Militar do
Guatupê, nos cursos de bombeiros militares e, também,
em órgãos da área de segurança.

Otávio Lúcio Especialista em Gestão Pública pelo Instituto Federal do


Paraná (IFPR) e em Segurança Pública pela Faculdade
Roncaglio São Braz (FSB). Bacharel em Educação Física pela
Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
Oficial da Polícia Militar do Paraná (PMPR). Especializou-
-se em negociação em crises, gerenciamento de crises e
controle de distúrbios civis, realizando diversos cursos
nas áreas, inclusive em outros países. Atualmente é
comandante da Equipe de Negociação do Batalhão de
Operações Especiais (BOPE). É instrutor na Academia
Policial Militar do Guatupê das disciplinas relacionadas
ao gerenciamento de crises. Também atua como
docente e palestrante em órgãos públicos estaduais.
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SUMÁRIO
1 Noções de gerenciamento de crises  9
1.1 Definições essenciais da doutrina de gerenciamento de crises   9
1.2 Aspectos doutrinários do processo de gerenciamento de crises  16
1.3 Tipos de crises e de causadores do evento crítico  22
1.4 Alternativas táticas do gerenciamento de crises  30

2 Aspectos doutrinários da negociação policial  35


2.1 Características da negociação   35
2.2 Objetivos e vantagens da negociação   39
2.3 O negociador e a equipe de negociação   43
2.4 Fases do processo e tipos de negociação   47

3 Comunicação e negociação  55
3.1 Requisitos para a comunicação   55
3.2 Rapport   58
3.3 Barreiras à comunicação e formas de contato   65

4 Gestão de conflitos  76
4.1 Características dos conflitos   76
4.2 Métodos de gestão de conflitos   85
4.3 O profissional de Segurança Pública no manejo de conflitos   91
APRESENTAÇÃO
Resolver crises e conflitos não é tarefa fácil. Passamos a vida lidando
diariamente com situações conflituosas, tentando encontrar a melhor maneira
de administrá-las de acordo com as expectativas que possuímos em relação
ao assunto implicado.
No entanto, para a área da Segurança Pública, as situações críticas
e os conflitos necessitam de atenção especial do operador, seja pela
imprevisibilidade e risco iminente à vida humana que as crises policiais
proporcionam, seja pelo número de envolvidos ou diferentes motivações que
os conflitos possam envolver. Por isso, os envolvidos no processo necessitam
escolher os métodos adequados e estar inteiramente focados na resolução
do problema.
Negociação e gestão de conflitos de segurança é uma obra que apresenta
técnicas que as instituições policiais e de Segurança Pública podem usar para
melhor enfrentar essas questões. Nesse sentido, convidamos você a imergir
no tema, estudando conceitos, características e elementos fundamentais do
gerenciamento de crises. Você vai conhecer a figura do negociador policial,
bem como os aspectos doutrinários da negociação em crises e seus objetivos,
perpassando pelos requisitos de comunicação e pelas dificuldades e barreiras
que possam surgir no processo, descobrindo as formas adequadas de manejo
e gestão de conflitos.
Com o intuito de apenas introduzir o conteúdo, que é vasto e interessante,
a obra procura instigá-lo a buscar mais conhecimentos sobre o tema e
formular suas próprias questões. Além disso, você será desafiado a responder
às atividades que integram e aplicam os assuntos estudados em cada capítulo,
o que proporciona um estudo mais aprofundado.
Bons estudos!
1
Noções de gerenciamento
de crises
Neste capítulo apresentaremos algumas noções básicas
relativas ao processo de gerenciamento de crises policiais, no qual
a atividade de negociação está inserida. É fundamental conhecer
os principais conceitos e aspectos relacionados à doutrina de
gerenciamento de crises antes da entrada no estudo aprofundado
da negociação voltada para a área policial.
Como foco principal deste capítulo, você verá, além do estudo
das principais definições relacionadas ao assunto, as ocorrências
qualificadas como críticas e os tipos de causadores do evento crítico.
Outro ponto importante será o estudo das alternativas táticas do
gerenciamento de crises, que são importantes ferramentas para a
resolução de todo o processo.

1.1 Definições essenciais da doutrina


Vídeo de gerenciamento de crises
O processo denominado gerenciamento de crises policiais é bastante
complexo. Assim, para sua compreensão, é fundamental entender as
definições dos principais termos e itens que fazem parte desse contex-
to. Há muitos aspectos que integram o processo desde seu princípio,
nos anos 1970, nos Estados Unidos.

O entendimento claro dos significados de cada termo que compõe


o processo dará aos responsáveis pelo gerenciamento do evento crítico
condições de conduzi-lo a um desfecho adequado com os meios técni-
cos disponíveis. Já a falta de conhecimento desses aspectos poderá gerar

Noções de gerenciamento de crises 9


dificuldades e dúvidas durante o atendimento da situação, conduzindo a
crise para um eventual desfecho trágico.

Para tanto, serão definidos os seguintes termos atrelados à doutri-


na: crise policial, gerenciamento de crises, ponto crítico, causador do even-
to crítico, refém, vítima e intermediário.

1.1.1 Crise policial


A doutrina policial se apropriou da palavra crise para denominar o
tipo de ocorrência mais complicada que integra o rol de fatos que tem
o dever legal de administrar. É oriunda do latim crisis e do grego krísis,
que, entre seus muitos significados, prevalecem para esse contexto,
conforme o dicionário on-line Michaelis, os seguintes: “conjuntura des-
favorável; situação anormal e grave; conflito, tensão, transtorno” (TRE-
VISAN, 2015).

1 De acordo com Salignac (2011, p. 21), o FBI (Federal Bureau of


1
Em português a sigla significa Investigation ) definiu crise policial como “um evento ou situação
Departamento Federal de
Investigação. É uma agência po- crucial, que exige uma resposta especial da Polícia, a fim de assegurar
licial federal norte-americana, uma solução aceitável”. Esse conceito, estabelecido no princípio dos
controlada administrativamente
estudos sobre gerenciamento de crises (GC), ainda é bastante direto
pelo Departamento de Justiça
dos Estados Unidos. e necessário. Analisando cada parte desse conceito, entendemos que
“situação crucial” remete a algo perigoso em que há risco de morte
aos envolvidos na ocorrência. Já a “resposta especial” da corporação
policial envolvida estabelece que os recursos aplicados para a
resolução da crise devem partir de grupos policiais especializados,
ou seja, treinados e aparelhados para o cumprimento da missão,
após as ações técnicas desenvolvidas pelos policiais que primeiro
se depararam com o evento crítico. E a atribuição, como se vê, é de
exclusividade da corporação policial com responsabilidade territorial
na área em que está ocorrendo o fato, não podendo, de modo algum,
ser transferida para outros segmentos da sociedade, como político,
religioso, imprensa etc. Por fim, a “solução aceitável” indica que a

10 Negociação e gestão de conflitos de segurança


busca pelo resultado adequado é a tônica do trabalho dos policiais
envolvidos na ocorrência.

1.1.2 Gerenciamento de crises (GC)


+ Saiba mais
É o processo estabelecido para possibilitar o atendimento das ocor-
rências policiais críticas, de maneira técnica e integrada por parte de De acordo com o dicionário
on-line Michaelis, doutrina é a
todos os responsáveis pelas ações, visando à resolução aceitável. “instrução ou conhecimento que
se adquire por meio de estudo
Salignac (2011, p. 23) menciona que o FBI conceitua GC como “o
e leitura; erudição, sabedoria,
processo de identificar, obter e aplicar os recursos necessários à an- saber” (TREVISAN, 2015).
tecipação, prevenção e resolução de uma crise”. Esse conceito traduz Segundo Valla (2012, p. 3), para
a atividade policial militar, dou-
a complexidade do processo de GC, que não se encerra no momento
trina é “um conjunto de valores,
da resolução do fato. Corroborando com essa ideia, Silva (2016a, p. 65) princípios gerais, características,
define gerenciamento de crises policiais como: conceitos básicos, concepções
táticas, leis, normas, diretrizes,
um sistema amplo, que congrega diversos atores, funções e técnicas e processos que tem
etapas e estabelece as diretrizes gerais para o atendimento das por finalidade estabelecer as
ocorrências qualificadas como críticas. O foco primordial desse bases para a organização, o
processo sistemático é conduzir a crise ao encerramento ade- preparo e o emprego uniforme
das Polícias Militares na preser-
quado por meio de um trabalho conjunto e harmonioso de todos
vação da ordem pública e nas
os envolvidos, com a utilização de procedimentos técnicos e am- missões decorrentes da situação
parados pelos ditames legais. de forças auxiliares e reserva do
Exército, no âmbito dos respecti-
O entendimento desse processo, bem como de todas as suas carac- vos estados-membros”.
terísticas e especificidades, é fundamental para o desenvolvimento de
um trabalho técnico e integrado na busca incessante pela preservação
das vidas ameaçadas envolvidas.

A gestão de todo o processo de GC é executada por dois elementos


essenciais: o gerente da crise e o comandante do Teatro de Opera-
ções (cmt. TO). O primeiro, autoridade policial com responsabilidade
territorial sobre o local onde ocorre o evento crítico, tem o poder de
decisão sobre as ações a serem implementadas. Já o cmt. TO é a figura
operacional no processo, responsável pela gestão de todos os recursos
humanos e materiais envolvidos no processo. Além disso, com o asses-
soramento dos operadores especializados (Equipe de Negociação, Gru-
po de Intervenção e Grupo de Atiradores de Precisão Policial), planeja

Noções de gerenciamento de crises 11


as ações a serem tomadas no contexto da crise. Por isso, é importante
que essa função recaia no comandante das tropas responsáveis pelo
apoio especializado na crise.

1.1.3 Primeira intervenção em crises (PIC)


Uma das fases do processo de gerenciamento de crises, a PIC “é o
conjunto de ações técnicas a ser aplicado pelo policial militar ou equipe
de policiais militares que primeiro se deparam com ocorrências críti-
cas em andamento” (SILVA, 2016b, p. 57). A doutrina da PIC estabelece
procedimentos essenciais para a minimização dos riscos inerentes ao
início de toda crise policial e auxilia no processo de seu gerenciamento
como um todo. Outras forças de segurança também podem se apro-
priar e aplicar as técnicas, que são traduzidas em dez passos (medidas),
devidamente funcionais e garantidores da segurança de todos os en-
volvidos no processo.

De acordo com a doutrina, os dez passos técnicos de primeira inter-


venção são:

1) localizar o ponto crítico;

2) conter a crise;

3) isolar a crise;

4) estabelecer contato sem concessões;

5) solicitar apoio de área, incluindo equipes de socorro médico;

6) coletar informações;

7) diminuir o estresse da situação;

8) permanecer em local seguro;

9) manter terceiros afastados; e

10) acionar as equipes especializadas.

1.1.4 Ponto crítico


É o local onde se estabeleceu a ocorrência crítica, ou seja, onde
o causador do evento crítico (CEC) se encontra, sozinho ou man-

12 Negociação e gestão de conflitos de segurança


tendo vítimas ou reféns sob ameaça. Para Silva (2016b), é todo o
espaço físico controlado pelo CEC, ao qual ele tem acesso e pode
modificar sua estrutura.

O ponto crítico é a base de todo o processo de gerenciamento de cri-


ses, considerando que toda a sua estrutura será montada a partir des-
se local. Todos os agentes envolvidos estarão focados no lugar onde as
vidas estarão em risco. Com base nessa análise, o conhecimento sobre
aspectos estruturais do ponto crítico traz uma enorme vantagem para
as autoridades policiais envolvidas.

Outro aspecto importante a considerar é que em qualquer lugar


pode ocorrer um evento crítico, por exemplo, uma casa, um quarto,
um carro, um ônibus, a galeria de uma penitenciária, um avião, um lo-
cal aberto, como o meio de uma rua etc. Quanto maior o ponto crítico,
maior é a dificuldade para o gerenciamento da crise, na medida em
que apresenta desafios às equipes especializadas durante o desenvol-
vimento de suas ações.

1.1.5 Causador do evento crítico (CEC)


É a denominação técnica dada a toda pessoa que causa um evento
crítico, ou seja, sua conduta inicia uma ocorrência qualificada como crí-
tica pela doutrina. Identificando o causador, os responsáveis pelo ge-
renciamento da crise terão condições de aplicar as medidas adequadas
para a resolução da ocorrência da melhor forma possível.

Sobre o que conduz a pessoa a ser a geradora de uma crise, Silva


(2016b, p. 40) esclarece que a motivação pode ser a mais variada pos-
sível, citando como exemplos manter reféns após crimes frustrados ou
para conseguir dinheiro, como no caso da extorsão mediante seques-
tro; ameaçar vítimas por questões emocionais ou vingança; agir por
algum tipo de perturbação mental ou de cunho terrorista; ou, ainda,
tentar cometer suicídio.

Basicamente, há quatro tipos de causadores do evento crítico, consi-


derando uma evolução recente da doutrina: criminosos, mentalmen-
te perturbados, terroristas e presos rebelados, acrescentado pelos
doutrinadores. Anteriormente, os presos rebelados estavam inseridos
no tipo criminoso, entretanto, possuem características peculiares que

Noções de gerenciamento de crises 13


os diferenciam dos CEC criminosos, que causam crises fora do sistema
prisional. Na Seção 1.3.2.2, falaremos especificamente de cada um dos
tipos de causadores do evento crítico.

1.1.6 Refém
É a pessoa ameaçada e que representa importantes garantias para
o causador da crise, entre elas sua vida, sua integridade física, sua liber-
dade, além de outros benefícios que surjam durante o gerenciamento
do evento. Assim, podemos dizer que o refém pode ser considerado
“como um ‘objeto de troca’ para o CEC, e, portanto, é negociável, ou en-
tão, ‘trocável’ por outro objeto ou pelo cumprimento de uma exigência
sua” (SILVA, 2016b, p. 42). Quanto aos tipos de reféns, a doutrina esta-
belece dois: o refém tomado e o refém sequestrado.

O refém tomado é aquele capturado pelo causador, geralmente de


modo aleatório e no momento do cometimento de um delito frustrado
pela ação policial. Um exemplo desse tipo de refém é um criminoso
que invade uma lotérica para cometer um roubo e na saída se depara
com uma equipe de policiais militares. Visando garantir sua vida e inte-
gridade física, o criminoso apanha a pessoa mais próxima e, com uma
arma apontada para a cabeça dessa pessoa, exige que os policiais não
se aproximem. Nesse caso, o ponto crítico é conhecido.

Por outro lado, o refém sequestrado se encontra em local des-


conhecido, considerando seu envolvimento em crime de extorsão
mediante sequestro. Por exemplo, nesse tipo de ocorrência, crimi-
nosos capturam uma pessoa de excelente condição financeira e a le-
vam para um cativeiro, exigindo da família dinheiro para a liberação
do sequestrado. Tal exigência é chamada de resgate e os policiais
precisam investigar o caso para localizar o ponto crítico e libertar a
pessoa ameaçada.

1.1.7 Vítima
Diferentemente do refém, a vítima está envolvida na ocorrência
por questões emocionais, vingança ou em decorrência de transtornos
mentais apresentados pelo CEC, conforme esclarece Silva (2016b). Ape-
sar da similaridade das ocorrências, ou seja, tanto vítimas quando re-
féns são ameaçados pelo CEC, as condições de origem do evento é que
os diferenciam.

14 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Salignac (2011) estabeleceu essa diferenciação, salientando que as
vítimas são pessoas capturadas e que não têm valor para os causado-
res, sendo, antes de tudo, objeto de seu ódio. Conhecer tais diferenças
é fundamental para o processo de gerenciamento, pois identificar a
pessoa como sendo uma vítima no ponto crítico muda radicalmente os
rumos técnicos e táticos de uma negociação.
Atividade 1
Percebemos, portanto, que vítimas correm mais riscos na crise do
Diferencie refém de vítima no
que reféns, considerando seu envolvimento passional com o CEC e as contexto do processo de geren-
tendências vingativas dele. Além disso, causadores que capturam víti- ciamento de crises policiais.
mas são suicidas em potencial, o que manifesta seu alto grau de com-
prometimento mental e aumenta o risco para todos no ambiente.

1.1.8 Intermediário
No contexto do gerenciamento de uma crise policial, o intermediário
é aquela pessoa, escolhida e orientada pelos negociadores, que faz
contato verbal com o causador da crise, auxiliando no processo de
resolução. Silva (2016b) estabelece que qualquer pessoa pode ser um
intermediário na ocorrência e que o seu contato orientado e protegido
com o CEC se caracteriza em uma importante ferramenta de barganha,
ou seja, de trocas vantajosas para os policiais com o causador.

É importante esclarecer que, para ser um intermediário e ajudar


as autoridades policiais no gerenciamento da ocorrência, é necessário
que a pessoa – solicitada pelo causador, voluntária para o contato ou,
ainda, selecionada pelos negociadores – seja relevante para auxiliar no
processo. Caso contrário, essa pessoa não deve ser colocada em con-
tato, pois pode aumentar a tensão da ocorrência e piorar as condições
do ambiente, já perigosos e tensos por natureza.

O contato do intermediário com o CEC deve ser breve, protegido e


orientado pelos negociadores. Familiares emocionalmente envolvidos
com o causador são tidos como péssimos intermediários justamente
por sua condição de envolvimento. Pessoas que aparentemente são pi-
vôs da situação atual do causador, como alguém que o traiu ou o aban-
donou, devem ter o contato vedado, mesmo que ele exija de modo
veemente. Pessoas religiosas também não são boas intermediárias,
considerando que as crenças são pessoais e a objetividade fica com-
prometida quando se trata de religião. Por outro lado, pessoas que não
têm vínculos emocionais com o CEC têm sido bons intermediários, por

Noções de gerenciamento de crises 15


exemplo, advogados, diretores de penitenciárias, representantes de
órgãos de direitos humanos, juízes etc.

Atividade 2 Os policiais e as autoridades responsáveis pelo gerenciamento das


Qual é a importância de situações policiais críticas necessitam conhecer a fundo os principais
conhecer e aplicar os aspectos
doutrinários do processo de conceitos da doutrina de GC, que foram abordados nessa seção. Enten-
gerenciamento de crises? der tais definições auxiliará no processo como um todo e minimizará os
riscos dessas situações, que, por sua própria natureza, já apresentam
um grau de perigo elevadíssimo.

1.2 Aspectos doutrinários do processo


Vídeo de gerenciamento de crises
Administrar ocorrências policiais críticas pressupõe um conheci-
mento amplo sobre os mais variados aspectos da doutrina de GC. En-
tendê-los pode fornecer vantagens importantes aos responsáveis pelas
ações que visam ao encerramento pacífico e sem mortes.

Neste momento, estudaremos três aspectos fundamentais e que têm


relação direta com o processo de negociação a ser implementado duran-
te o atendimento: as características de uma crise policial; os objetivos do
processo de gerenciamento de crises; e os critérios de ação que norteiam
o processo decisório para as ações durante a administração da crise.

1.2.1 Características das crises policiais


As ocorrências críticas têm particularidades que as diferenciam das
demais ocorrências qualificadas como corriqueiras pela atividade po-
licial. O estudo de tais características é importante para a antecipação
das ações por parte das forças policiais. Já o desconhecimento pode
fazer com que as autoridades subestimem tais ocorrências e tenham
dificuldades para gerenciá-las quando ocorrerem em seu território.
Assim, os doutrinadores estabeleceram as seguintes características:
imprevisibilidade, risco iminente à vida, urgência, baixa incidência e
complexidade. No Quadro 1, são apresentadas, de maneira resumida,
cada uma dessas características.

16 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Quadro 1
Características das crises policiais

Toda crise é imprevisível, não se sabe quando nem onde ocorrerá


(SILVA, 2016a). Sabemos, entretanto, que sua eclosão é certa, ou seja,
as corporações policiais responsáveis territorialmente precisam se
antecipar para ter uma capacidade de resposta adequada. A prepara-
Imprevisibili- ção anterior perpassa pelo treinamento do efetivo regular e especia-
dade lizado, pela aquisição de equipamentos específicos e, também, pela
conscientização das autoridades governamentais e dos comandantes
da corporação sobre a importância da preparação antecipada para
esse tipo de evento, considerando que toda ocorrência policial pode
evoluir para uma situação de crise.
A ameaça à vida é o componente essencial do evento crítico, mesmo
quando a vida em risco é a do próprio causador da crise, como no
caso de um indivíduo suicida (SALIGNAC, 2011). Essa característica
serve para alertar as autoridades do perigo imediato que correm as
Risco iminente
pessoas ameaçadas e envolvidas diretamente na situação, as quais
à vida
se encontram numa condição arriscada e com ameaça iminente de
morte enquanto o evento crítico estiver acontecendo. Assim, o traba-
lho dos responsáveis é minimizar os riscos e focar na preservação de
todas as vidas envolvidas.
O atendimento a uma crise policial deve ter caráter imediato, ou seja,
não se pode perder tempo para atendê-la, considerando a vida das
pessoas em risco. Ao ser acionada para verificar uma suposta ocor-
rência crítica em andamento, a equipe policial militar não pode des-
considerar essa característica, sob pena de inocentes serem mortos
Urgência pela eventual demora nas ações a serem tomadas. A chegada breve
ao local da ocorrência, aliada à tomada das ações técnicas necessá-
rias para o caso específico, será o diferencial para a preservação das
vidas em risco. Isto posto, entendemos que o caráter urgente das
crises as torna ocorrências difíceis de serem atendidas, mas que em
nenhum momento devem ser subestimadas.
As crises policiais não são ocorrências simples de serem resolvidas,
isto é, envolvem muitas variáveis que as tornam complexas. Esse
pressuposto nos leva ao entendimento de que policiais das tropas
regulares não têm as ferramentas adequadas e necessárias para o
seu gerenciamento. Considerando essa característica da complexida-
de, as equipes regulares devem realizar a primeira intervenção do
Complexidade evento e acionar as equipes especializadas para que, com as ferra-
mentas adequadas, atuem diretamente na crise, com o objetivo de
encerrar a situação e preservar as vidas envolvidas. Há necessidade
de muitos recursos para sua solução (SALIGNAC, 2011). Basicamente,
essa característica deixa clara a necessidade de atuação das equipes
especializadas e, também, de toda a estrutura montada para o ge-
renciamento da ocorrência, conforme o estabelecido pela doutrina.

(Continua)

Noções de gerenciamento de crises 17


As crises policiais ocorrem com uma frequência menor do que as
ocorrências policiais corriqueiras. Não deveria ser diferente, consi-
derando o altíssimo risco imposto por qualquer crise policial. Como
visto, o atendimento a uma crise policial necessita do empenho de
uma série de operadores e ferramentas, tornando-se difícil sua reso-
lução. Assim, mesmo sendo de baixa incidência, uma crise policial não
deve ser subestimada e todo o aparato para seu atendimento deve
estar em condições. Portanto, a preparação é fundamental, mesmo
Baixa incidência
para aquela única ocorrência que aconteça em um mês, por exemplo.
Um aspecto negativo da baixa incidência pode ser a falta de investi-
mentos por parte das autoridades em grupos especializados e em
equipamentos para tal. Se a crise não ocorre com regularidade em
nosso território, para que investir? Talvez essa seja a pergunta pro-
ferida pelas autoridades que necessitam de resultados. Silva (2016a,
p. 45) conclui que “uma única crise mal gerenciada pode arruinar,
irremediavelmente, a imagem da corporação responsável”.

Fonte: Elaborado pelos autores.

1.2.2 Objetivos do processo de gerenciamento de


crises
As corporações policiais precisam gerenciar as crises de sua compe-
tência sem nunca perder de vista os objetivos traçados pela doutrina,
os quais são basilares para a busca do tão esperado resultado aceitável.
Objetivos, nesse caso, são as metas fundamentais a serem atingidas ao
final do trabalho e são três: preservar vidas, aplicar a lei e restabelecer
a ordem. Silva (2016a, p. 46) estabelece que “os três objetivos foram es-
tabelecidos na mesma ordem apresentada, que é axiológica, de valor”.
A seguir são apresentadas explicações sobre cada um dos objetivos.
•• Preservar vidas: é estabelecido como o objetivo primordial e
mais importante de todo o processo de gerenciamento de crises.
Considerando que a perda de vidas é irreversível, as autoridades
gestoras da crise devem dar prioridade máxima à preservação
das vidas, independentemente da condição do envolvido. Nesse
momento, a preservação das vidas precede, inclusive, a aplicação
da lei, que ocorrerá após o encerramento da ocorrência, mesmo
que leve horas ou dias para isso. Portanto, a vida das pessoas
ameaçadas pelo causador da crise, dos terceiros – inocentes que

18 Negociação e gestão de conflitos de segurança


ficam nas proximidades do ponto crítico –, dos policiais que che-
gam para atender à ocorrência e, também, dos próprios causado-
res devem ser preservadas. Eventualmente, porém, o causador
assume um risco de ser neutralizado pelas equipes policiais em
detrimento da preservação da vida dos inocentes. Mesmo nesse
caso, a lei ampara a ação policial, que preza pela vida dos inocen-
tes, invocando o princípio da legítima defesa de terceiros.
•• Aplicar a lei: a aplicação da lei é outro objetivo que segue a preser-
vação das vidas envolvidas. O causador da crise, se for considera-
do do tipo criminoso, ou seja, se sua ação estiver enquadrada pela
legislação em vigor como crime, deverá ser encaminhado para a
delegacia e apresentado à Justiça para responder por seus atos.
Tal preceito impede, por exemplo, que os gestores da crise deixem
o CEC fugir em troca da liberação de todos os eventuais reféns.
Nesse caso, a vida dos inocentes seria preservada, entretanto, a lei
não seria aplicada, o que contraria a doutrina estabelecida. Obvia-
mente, a fuga do CEC impõe enorme risco às pessoas que estão
nas proximidades e a morte de apenas um inocente que nem
estava no ponto crítico destruirá a reputação da corporação en-
volvida e as condutas serão passíveis de responsabilizações.
•• Restabelecer a ordem: a eclosão de uma crise torna o ambien-
te em torno do ponto crítico altamente desordenado e perigoso.
As pessoas que vivem ou trabalham na região precisarão sair de
suas casas e dos locais de trabalho por questões óbvias de se-
gurança. O trânsito nas ruas, no entorno desse local, precisará
ser fechado e desviado para evitar que inocentes se coloquem
em risco ao se aproximarem do ponto crítico. A rotina da região
será enormemente afetada pela crise instalada e assim perma-
necerá até o seu encerramento. Ao final, com os dois primeiros
objetivos (preservação das vidas e aplicação da lei) cumpridos,
restará o terceiro objetivo, que é o restabelecimento da ordem
no local da ocorrência. Desse modo, as autoridades policiais de-
verão empregar os esforços para fazer com que a rotina da re-
gião volte ao normal o mais breve possível, sempre mantendo a
segurança das pessoas afetadas.

Noções de gerenciamento de crises 19


1.2.3 Critérios de ação para o gerenciamento de crises
São princípios norteadores para auxiliar os gestores da ocorrência
crítica. Segundo Silva (2016a), para direcionar e facilitar o processo deci-
sório no curso de uma crise, os doutrinadores de GC criaram os chama-
dos critérios de ação, que servem como referenciais e orientam a tomada
das decisões em ocorrências dessa natureza. Basicamente, uma respos-
ta positiva a todos os critérios estabelecidos pela doutrina possibilita a
implementação de determinada ação planejada durante o evento.

Estudaremos, a seguir, cada um dos três critérios previstos pela


doutrina: necessidade, validade do risco e aceitabilidade. O primeiro
critério a ser respondido para possibilitar a tomada da ação planeja-
da é o da necessidade, isto é, a resposta precisa indicar que a ação a
ser tomada é extremamente necessária naquele momento para o con-
texto da ocorrência. Salignac (2011, p. 25), esclarece que “o critério da
necessidade indica que toda ação somente deve ser realizada quando
for indispensável”. Por exemplo, uma ação tática para o resgate de re-
féns em ambiente confinado e planejada pelo grupo de intervenção
(GI), não será necessária se o CEC estiver colaborativo e mantendo uma
negociação com os operadores especialistas. Entretanto, a análise mu-
dará de figura se o CEC deixar de colaborar e cortar o contato com os
negociadores. Nesse momento, poderá ser necessária a intervenção
tática para se resguardar a vida dos inocentes. É importante lembrar
que a implementação dessa ou de qualquer outra ação na crise preci-
sará passar pelos próximos outros dois critérios.

Aliada ao critério da necessidade, a validade do risco é outro pon-


to importante a ser analisado, merecendo atenção dos gestores da cri-
se. Basicamente, uma ação poderá ser implementada se “valer o risco”,
ou seja, quando a preservação das vidas superar qualquer perigo ou
ameaça gerados pela ação necessária a ser tomada para a resolução do
evento. Salignac (2011, p. 25) aponta que o critério da validade do risco
“preconiza que toda e qualquer ação tem que levar em conta se os riscos
dela advindos são compensados pelos resultados obtidos”. Por exemplo,
apesar do risco aumentado durante uma invasão tática pelo grupo de
intervenção para o resgate dos reféns em uma crise em que o CEC parou
de responder e deu indícios de que matará os reféns, trata-se de um
risco calculado e justificado. Por outro lado, citando um exemplo de um
CEC suicida armado que exige a presença da pessoa que aparentemente

20 Negociação e gestão de conflitos de segurança


é a pivô de sua situação desesperadora para falar com ele, nesse caso
temos um risco que não pode ser testado, pois o CEC poderá tomar uma
atitude violenta quando vir essa pessoa, bem como cometer suicídio na
frente dela, para deixá-la viver com a culpa de sua morte.

O critério da aceitabilidade tem três dimensões: legal, moral e éti-


ca. Portanto, o questionamento a ser feito a respeito desse importante
critério é se a decisão a ser tomada é aceitável sob os pontos de vista
legal, moral ou ético. A Figura 1, a seguir, explica essas dimensões.

Figura 1
Dimensões do critério da aceitabilidade

A aceitabilidade legal indica que todas as


ações a serem tomadas na crise devem estar
amparadas pelas normas legais vigentes,
não se justificando burlar a lei sob o pretexto
de resolução do evento, por mais difícil e
complicado que seja.

A aceitabilidade moral impõe que as ações a


serem realizadas necessitam estar ancoradas
nos pressupostos da moralidade e nos bons
costumes. Um exemplo prático que fere esse
Aceitabilidade princípio é a troca de reféns. Justamente
pela questão moral envolvida, que nos faz
questionar: se uma vida é mais importante
que outra. Por isso, essa prática é vedada
durante o gerenciamento de uma crise policial.

A aceitabilidade ética, baseada no respeito


às regras preestabelecidas pela doutrina de
gerenciamento de crises, dita que os gestores
do evento crítico não podem praticar ações que
causem constrangimento ao seu grupo policial
nem as exigir de seus subordinados (SALIGNAC,
2011). Um exemplo clássico para esse critério
é determinar que um policial disfarçado seja
trocado por um refém, com a missão de dominar
o CEC quando tiver uma chance no interior do
ponto crítico. Tão arriscada quanto contrária
aos protocolos de procedimentos policiais, tal
ação fere o princípio da aceitabilidade ética, não
podendo ser utilizada. Quem a utilizar, assume
o risco do resultado trágico.

Fonte: Elaborada pelos autores.

Noções de gerenciamento de crises 21


Desse modo, os critérios de ação são norteadores fundamentais
para que os gestores decidam correta e tecnicamente durante a atua-
ção em uma ocorrência crítica. Todos os critérios precisam ser avalia-
dos criteriosamente para cada ação pensada e planejada, e, caso sejam
respondidos positivamente, a ação poderá ser implementada.

1.3 Tipos de crises e de causadores do


Vídeo evento crítico
A doutrina de gerenciamento de crises permite fazer qualificações
tipológicas de crises e causadores do evento crítico com o intuito de
tornar seu entendimento mais acessível e, também, de auxiliar os ope-
radores que atuam na crise com informações específicas sobre os tipos
envolvidos. Longe de impor rótulos aos causadores e às ocorrências
que causam, a tipologia, nesse aspecto, tem o objetivo de facilitar o tra-
balho dos gestores do evento crítico. Primeiramente, estudaremos os
tipos de crises estabelecidos pela doutrina e, depois, as características
dos causadores das crises.

1.3.1 Tipos de crises


De acordo com Silva (2016a), são as ocorrências policiais qualificadas
como críticas pela doutrina atual de GC que necessitam de todo o apa-
rato de gerenciamento para sua resolução. A Figura 2 mostra os princi-
pais tipos de crises.

Figura 2
Tipos de crises

Roubos ou outros crimes frustrados com tomadas de reféns

Ocorrência crítica que se estabelece quando o criminoso tem


Cube29/Shutterstock

sua prática de roubo, ou outro tipo de crime, interrompida


por policiais militares ou outros integrantes de forças de
segurança e, acuado, toma reféns para garantir sua
integridade física. Diante disso, os reféns se tornam escudos
humanos para garantir a vida, a integridade física, além de
outros benefícios para o causador.

(Continua)

22 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Extorsões mediante sequestro

Tipo de crise causada por quadrilha organizada, que sequestra

Cube29/Shutterstock
uma pessoa de notório poder financeiro, deixando-a em
cativeiro e fazendo exigência de resgate para a família. Essa
pessoa é chamada de refém sequestrado, e o ponto crítico
não é conhecido, sendo necessárias investigações para sua
localização e ações policiais visando a libertação. O crime está
tipificado no artigo 159 do Código Penal brasileiro.

Rebeliões com reféns em estabelecimentos prisionais, unidades de


internação, cadeias públicas e delegacias
Cube29/Shutterstock

Tipo de crise observada em locais de concentração de presos,


sejam condenados, provisórios ou apreendidos, como os
menores infratores em unidades de internação. Presos
rebelados, quando conseguem tomar reféns, principalmente
agentes penitenciários, iniciam um evento crítico, sendo
necessárias ações policiais técnicas estabelecidas pela
doutrina de gerenciamento de crises para encerrá-la.

Mentalmente perturbados, barricados ou não, com tomada de vítimas,


reféns ou sozinhos

Sozinho ou ameaçando outras pessoas, o mentalmente


perturbado apresenta alterações comportamentais que
infligem grandes riscos a ele próprio e a quem está a sua volta.
Cube29/Shutterstock

Ele faz reféns quando, por exemplo, sob influência de drogas


(daí a perturbação mental), é flagrado na prática de um delito.
Apesar do crime, a conduta alterada está caracterizada. Mais
comum, entretanto, é o caso do perturbado que ameaça uma
vítima, por uma questão emocional, e o CEC decide matar essa
pessoa que considera ser sua desafeta. Por fim, o mentalmente perturbado sozinho,
barricado ou em lugar aberto (em uma rua, por exemplo), é aquele que, motivado por
sua perturbação, age de maneira descontrolada e perigosa, cabendo a intervenção
policial técnica.

Criminosos sozinhos e barricados contra a ação da polícia


Magicleaf/Shutterstock

Indivíduos em fuga após prática delituosa invadem locais sem


pessoas, para se esconder e se proteger contra a ação dos
policiais que estão em seu encalço. Esse é o cenário básico
nesse tipo de ocorrência: apesar de não haver reféns no
ponto crítico, os CECs se encontram armados e barricados,
caracterizando, assim, a ocorrência crítica, com todas as suas
especificidades e gravidade inerentes.

(Continua)

Noções de gerenciamento de crises 23


Movimentos sociais ou grupos sociais específicos com tomada de
reféns ou vítimas

Quando os denominados movimentos sociais, de qualquer


natureza, durante a prática de suas atividades reivindicatórias
Leremy/Shutterstock

tomam pessoas como reféns ou vítimas, produzem crises


que requerem o atendimento especializado previsto pela
doutrina de GC. Nos grupos sociais específicos estão os
indígenas, que eventualmente fazem pessoas como reféns
para conseguir resposta às suas causas. Em qualquer crise
que envolva indígenas, a Polícia Federal e a Funai (Fundação
Nacional do Índio) devem ser contatadas para gerenciar a
ocorrência, contando com o apoio das forças policiais locais.

Tentativas de suicídio

Tipo de crise causada por pessoa mentalmente perturbada e


encontrada no ensaio para a própria morte. As corporações
policiais precisam investir em treinamento dos negociadores
policiais para esse tipo crise, considerando sua gravidade e a
necessidade de se acolher o suicida, pessoa que sofre
Leremy/Shutterstock

intensamente e que precisa de ajuda para sair da condição de


risco em que se encontra. Diversos fatores podem ser
considerados para culminar com o ato autodestrutivo de uma
pessoa, sendo fundamental o estudo de tais fatores para o
entendimento dos problemas que ela enfrenta. Quanto aos meios
para a consecução do ato fatal, são os mais diversos possíveis, entre eles: armas de fogo,
armas brancas, cordas, fogo, gás, substâncias tóxicas, ingestão de medicamentos
controlados, quedas de locais altos etc. Quanto à corporação que deve gerenciar a crise,
o entendimento técnico é que à Polícia Militar cabe atender às crises em que os suicidas
estejam portando armas de qualquer tipo, incluindo objetos que sirvam como uma, e ao
Corpo de Bombeiros àquelas crises em que o causador se encontra desarmado.

Ocorrências que envolvem artefatos explosivos

A utilização de explosivos por causadores de crises torna as


ocorrências mais destrutivas, aumentando exponencialmente
seu risco, que já é elevado. Além das equipes especializadas
Digital Bazaar/Shutterstock

tradicionais para o atendimento da ocorrência, ainda há a


necessidade da presença dos técnicos explosivistas policiais
da corporação, munidos com seus equipamentos específicos
para o apoio. Outra modalidade de crise com explosivos é
aquela em que os artefatos são encontrados após o uso por
criminosos ou deixados com o objetivo de causar danos em outras
pessoas, como no caso de vingança. Em todas as ocorrências críticas envolvendo
explosivos, os policiais primeiros interventores devem se ater a todas as cautelas de
segurança que o caso requer e acionar os especialistas na atividade, visando minimizar
os riscos causados por esse tipo de crise.
(Continua)

24 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Ações terroristas (atentados ou tomadas de reféns ou vítimas)

Quando agem motivados por questões ideológicas, políticas,


religiosas, separatistas etc., os terroristas causam um tipo de
crise dos mais difíceis de serem gerenciados. Terroristas

Leremy/Shutterstock
também tomam reféns quando querem obter vantagens
em troca deles, como dinheiro para o grupo, libertação de
colegas presos etc. Já o assassinato de vítimas serve aos
terroristas como meio para demonstrar que não estão
brincando e para exigir suas reivindicações das autoridades
confrontadas, geralmente na busca pelo poder ou afirmação religiosa radical. Para o
FBI, terrorismo é “o uso ilegal da força ou violência contra pessoas ou propriedades
para intimidar ou coagir um governo, uma população civil, ou qualquer segmento
dela, em apoio a objetivos políticos ou sociais” (WHITTAKER, 2005, p. 18).

Ocorrências envolvendo atiradores ativos

Tipo de crise breve em que mentalmente perturbados ou


terroristas invadem locais públicos ou privados na posse
de armas de fogo e atiram em alvos aleatórios com o
intuito de causar a morte do maior número de pessoas.
Leremy/Shutterstock

Bastante comum nos Estados Unidos e outros países,


essa é uma ocorrência que vem ganhando notoriedade
no Brasil, obrigando as forças policiais a se prepararem e
a conscientizarem a comunidade local sobre como se
defender quando eclodir esse tipo de crise. Os locais mais visados são escolas,
universidades, casas de shows, igrejas, locais de transporte público etc. Além das
motivações terroristas, atiradores ativos também agem por questões pessoais,
como vingança contra a prática de bullying no estabelecimento de ensino que
frequentam, por exemplo.

Tomada de aeronaves por criminosos, terroristas ou


mentalmente perturbados

As regras de segurança, aumentadas após os atentados de


Aha-Soft/Shutterstock

11 de setembro de 2001, dificultaram enormemente a


tomada de aeronaves em todo o mundo. Entretanto, essa
é uma crise que não pode ser subestimada, podendo ser
causada por indivíduos criminosos, terroristas ou, ainda,
mentalmente perturbados. Caso ocorra, medidas efetivas
das autoridades precisam ser tomadas rapidamente. No
Brasil, de acordo com as normas federais, a responsabilidade
de atuação nesse tipo de crise é da Polícia Federal, conforme a
Instrução Normativa n. 13/2005, segundo Silva (2016a).

(Continua)

Noções de gerenciamento de crises 25


Acidentes de grandes proporções

Enquadram-se aqui desastres de dimensões imensas,


naturais ou provocados pelo homem, que necessitam de um
atendimento coordenado e controlado das autoridades de

Alexey Blogoodf/Shutterstock
defesa civil, bombeiros e integrantes das forças de segurança
pública. Uma ferramenta muito importante para o
gerenciamento desse tipo de evento emergencial é o
chamado Sistema de Comando de Incidentes (SCI), elaborado
pelos norte-americanos para o atendimento dos incêndios
florestais no estado da Califórnia na década de 1970. Tal
metodologia se mostrou eficiente e foi amplamente difundida em outros países,
chegando inclusive ao Brasil. Exemplos desse tipo de crise: queda de aeronaves
comerciais, rompimento de barragens de rejeitos de minério, acidentes com
produtos radioativos, incêndios florestais, enchentes etc.

Fonte: Elaborada pelos autores.


Livro Como verificado na Figura 2, as ocorrências críticas apresentam
peculiaridades, mas que, em sua essência, são episódios complexos e
Divulgação

difíceis de serem gerenciados. As autoridades responsáveis pelas res-


postas a tais ocorrências precisam investir em grupos especializados,
tanto humana quanto materialmente, além de se engajar em sua pre-
venção e, em caso de eclosão, empenhar todos os esforços para solu-
cioná-la de maneira técnica e adequada.

MCMAINS, M. J.; MULLINS,


W. C. Crisis negotiations:
1.3.2 Tipos de causadores do evento crítico
managing critical inci-
dents and hostage situa- Considerando a necessidade imperiosa do estudo aprofundado de
tions in law enforcement cada tipo de causador, a doutrina estabeleceu várias categorias espe-
and corrections. 5. ed.
Waltham: Anderson Pu- cíficas, cada uma com suas características mais relevantes. O objetivo
blishing, 2014. da análise tipológica é entender as características e as nuances de cada
Esse livro, original em in-
glês, traz toda a doutrina indivíduo causador, visando aplicar as medidas cabíveis e necessárias
de negociação em crises para fazê-lo desistir da ideia de continuar promovendo a crise e mini-
pelas mãos de dois es-
pecialistas norte-ameri- mizando os altos riscos aos envolvidos. A seguir, há um estudo básico
canos. A obra se baseia sobre cada um dos tipos.
em anos de pesquisa e na
experiência prática dos
dois autores para explicar
conceitos e técnicas ne-
1.3.2.1 Criminoso
cessárias para o negocia-
É o tipo de causador motivado por sua conduta delituosa, ou seja,
dor aplicar os princípios
da negociação em crises. a prática criminosa o leva a originar um evento caracterizado como
crítico. O roubo é o tipo de crime mais comum verificado, momento

26 Negociação e gestão de conflitos de segurança


em que o CEC é flagrado por forças de segurança no local do ato e,
não conseguindo fugir, toma pessoas como reféns, ameaçando-as
com armas, com o intuito de garantir sua vida, sua integridade físi-
ca, sua liberdade, valores ou a obtenção de qualquer outra vantagem
para si (SILVA, 2016a).

O processo de negociação com um indivíduo do tipo criminoso se


dará com enfoque na garantia de sua vida, considerando que se ele
tomou pessoas ou se barricou sozinho para se proteger da ação po-
licial, quer continuar vivendo. Silva (2016a) esclarece que, em geral,
os criminosos prezam por suas vidas (daí o motivo de usarem reféns
como “escudos” ou se barricarem), o que, em tese, torna o processo
de negociação menos difícil. Para Salignac (2011, p. 139), nesse tipo de
crise “o ganho de tempo produzirá resultados não só na diminuição das
expectativas do provocador como no estabelecimento do bom relacio-
namento com o negociador”.

Além de crimes frustrados em locais conhecidos, os causadores cri-


minosos também provocam o tipo de crise denominada extorsão me-
diante sequestro, já estudada na Seção 1.3.1. Nesse caso, o ponto crítico
é desconhecido, ou seja, as autoridades não sabem qual o paradeiro do
refém, que foi levado para um cativeiro, sendo mantido incomunicável
até que a família efetue o pagamento do resgate.

1.3.2.2 Terroristas
Diferentemente dos causadores criminosos, os terroristas agem
por fanatismo político, religioso, ideológico ou social, intenções separa-
tistas, entre outros motivos. Silva (2016a) diz que os terroristas atuam
com o intuito de intimidar, coagir e desestabilizar o Estado constituí-
do, afetando comportamentos pela instauração do medo. Esse tipo de
causador, além da prática de atentados violentos em locais públicos,
contra pessoas comuns ou agentes públicos, toma reféns, exigindo
das autoridades, por exemplo, dinheiro para o grupo ou a libertação
de colegas presos. Quando os terroristas ameaçam vítimas, o intuito é
demonstrar poder e pressionar as autoridades contrárias. Invariavel-
mente, a divulgação dos assassinatos dessas vítimas em transmissões
televisivas provoca o pânico e o terror na sociedade, objetivos desse
tipo de causador.

Noções de gerenciamento de crises 27


Segundo Salignac (2011), a busca de visibilidade pelos terroristas
é tentada por meio de ações ousadas e organizadas, que demandam
grande logística, sendo que a captura de pessoas garante imediata re-
percussão e acesso à mídia, já que a publicidade dos atos é prioritária
nesses casos. Em resumo, os terroristas agem fundamentados na vio-
lência, provocando assassinatos, sequestros, explosões e incêndios em
locais públicos, além da captura de reféns ou vítimas. Ainda segundo
Salignac (2011), a escolha dos alvos pelos terroristas perpassa pelas se-
guintes propriedades: seu valor simbólico, seu valor propagandístico,
a possibilidade de êxito da ação e, também, a vulnerabilidade do alvo.

1.3.2.3 Mentalmente perturbados


Os causadores da crise denominados mentalmente perturbados são
os que apresentam condutas comportamentais alteradas e perigosas,
motivadas pela perturbação mental que lhes afeta. Diversos fatores
podem abalar mentalmente uma pessoa, tornando o gerenciamento
da crise com esse tipo de CEC complicado e de difícil resolução, consi-
derando o contato confuso, nervoso e de cunho emocional. Constante-
mente, mas não em todos os casos, dadas suas características, as crises
que envolvem indivíduos mentalmente perturbados terminam com a
ação pontual dos grupos de intervenção.

Silva (2016a) apresentou um estudo sobre os fatores encontrados


em pessoas mentalmente perturbadas que causam ocorrências críti-
cas. A conclusão foi de que são três as condições: presença de trans-
tornos mentais, abalos emocionais súbitos e abuso de drogas lícitas ou
ilícitas. Vejamos cada um deles:
•• Presença de transtornos mentais: a condição mental mórbida
conduz o CEC a originar uma crise, como um suicida em um qua-
dro depressivo. Tal crise precisa de todo o aparato do GC para a
solução aceitável. Os distúrbios mais comuns são a depressão, o
transtorno bipolar, a esquizofrenia, transtornos de personalidade
etc. Cabe salientar que nem todo mentalmente perturbado pos-
sui algum transtorno mental, como veremos nos fatores a seguir.
•• Abalos emocionais súbitos: a alteração mental nesse caso se
dá em virtude de o CEC ter presenciado ou tomado conhecimen-
to de alguma situação traumática ou inesperada que o afete

28 Negociação e gestão de conflitos de segurança


enormemente. Com base nessa constatação, o causador pode
agir com intenções vingativas contra desafetos ou com violência
contra si mesmo, dando origem ao evento crítico. São exemplos
de fatos geradores de abalos emocionais regularmente verifi-
cados em crises: separações amorosas conflituosas; perdas de
emprego; flagrantes de traições conjugais; questões envolven-
do dívidas monetárias etc.
•• Abuso de drogas lícitas ou ilícitas: sem caracterizar transtor-
no (caso contrário estaria no primeiro fator estudado), o abuso
de drogas pode afetar grandemente a condição mental de um
indivíduo e fazê-lo causar uma ocorrência crítica. Como as dro-
gas alteram o comportamento e podem distorcer o pensamento,
complicam o trabalho dos gestores do evento.

De acordo com Salignac (2011), a negociação com pessoas porta-


doras de distúrbios mentais ou comportamentais exige, além do do-
mínio das técnicas adequadas, doses extras de paciência e percepção
dos limites negociais, pois não é incomum, em diversos desses casos, o
encerramento por meio de uma intervenção tática.

1.3.2.4 Presos rebelados


Separar a figura do preso rebelado daquela dos criminosos co-
muns apresenta importante vantagem para a caracterização do
tipo de causador, a começar pela condição em que ambos se en-
contram. O criminoso está em liberdade e é encontrado na prática
criminosa, enquanto o preso já está encarcerado, por vezes conde-
nado por vários delitos e na presença de outros detentos. As exi-
gências de ambos também costumam ser diversas, logo, o estudo
separadamente é necessário.

Uma crise com presos rebelados costuma ser violenta e não são ra-
ras as vezes em que termina com mortos e feridos. Os líderes da rebe-
lião desafiam as autoridades gestoras da crise e exigem ações pontuais
que os favoreçam, em troca da libertação de reféns ou vítimas que se
encontram ameaçados no ponto crítico. Salignac (2011) pontua as prin-
cipais exigências de causadores presos rebelados aos negociadores, os
quais precisam estar atentos às demandas: melhoria das condições de

Noções de gerenciamento de crises 29


vida na prisão; melhoria da qualidade das refeições; maior flexibilidade
nos horários de visita; protesto contra maus-tratos; corrupção dos ad-
ministradores ou carcereiros; e cumprimento de medidas jurídicas em
favor dos prisioneiros.

Roncaglio (2017, p. 24) conceitua os causadores do evento crítico pre-


sos rebelados como “indivíduos que geram crises em virtude das espe-
cificidades da vida em cárcere, podendo ou não apresentar alterações
comportamentais e/ou adotar ações com características terroristas”.

Em resumo, presos rebelados são causadores difíceis, exigindo dos


negociadores muita paciência e dos gestores articulações com os admi-
nistradores do estabelecimento prisional, considerando que qualquer
ação a ser implementada deve passar pela ciência dessas autoridades,
evitando-se assim conflitos institucionais.

1.4 Alternativas táticas do


Vídeo gerenciamento de crises
A doutrina atual de gerenciamento de crises estabelece opções de
atuação dos policiais para a resolução do evento crítico. São as tecnica-
mente chamadas alternativas táticas do GC, ferramentas indispensáveis,
nas quais autoridades policiais e governamentais precisam investir
para não serem surpreendidas no momento do fato. A falta de inves-
timentos em grupos policiais especiais, tanto humanos quanto mate-
riais, podem trazer resultados nefastos à corporação policial envolvida,
como constantemente verificado na imprensa.

São quatro alternativas previstas pela doutrina, as quais estudare-


mos individualmente a seguir: negociação, técnicas não letais, tiro de
comprometimento e invasão tática.

1.4.1 Negociação
É a primeira alternativa a ser considerada no processo de geren-
ciamento e a que impõe menor risco aos envolvidos (SILVA, 2016a),
considerando o uso do diálogo e do poder de convencimento para a
conclusão sem mortes no ponto crítico. Tal alternativa deve ser aplica-
da por especialistas, conforme esclarece Silva (2016a, p. 199):

30 Negociação e gestão de conflitos de segurança


por ser uma atividade extremamente complexa e especializa-
da, a negociação pressupõe policiais devidamente treinados e
experientes. Ademais, dada sua complexidade, o trabalho deve
ser realizado em equipe, em que cada integrante tem uma mis-
são predefinida e de caráter fundamental. Portanto, a doutrina
considera altamente condenável o emprego de pessoas não po-
liciais, autoridades ou não, ou de policiais despreparados direta-
mente nas negociações.

As corporações policiais que investem em equipes de negociadores Atividade 3


possuem vantagens incomensuráveis em relação àquelas que não in- Explique por que a aplicação
técnica da alternativa tática
vestem. Os resultados positivos e as estatísticas são claras e objetivas. negociação é fundamental para
Entretanto, caso não haja condições de se negociar com o CEC, o que os rumos da ocorrência crítica.
pode ocorrer por diversos fatores motivados pelas condições do pró-
prio causador, outras alternativas podem ser consideradas e, com o
planejamento adequado, implementadas. Apesar da utilização das ou-
tras três alternativas, os negociadores ainda apresentam um papel fun-
damental no contexto, realizando, por exemplo, a negociação tática,
em que preparam o terreno para a aplicação da alternativa escolhida,
auxiliando os operadores táticos em suas ações.

1.4.2 Técnicas não letais Vídeo


Alternativa tática a ser aplicada pelos operadores integrantes do GI, Assista ao vídeo Os negocia-
após esgotadas as possibilidades de negociação no contexto do geren- dores da polícia de Nova York,
publicado pelo canal Marco
ciamento. Nessa alternativa, o enfoque é na manutenção da vida do Antonio Silva, para saber mais
causador, bem como na eliminação do risco que ele proporciona. Ao sobre o trabalho da equipe de
negociações de reféns (Hostage
sair vivo da crise, o CEC será levado para a delegacia e apresentado à
Negotiations Team – HNT) do
Justiça para responder por seus atos em caso de cometimento de crime Departamento de Polícia de
ou para tratamento médico psiquiátrico em caso de a motivação ter Nova York (NYPD), os criadores
da doutrina nos anos 1970. O
sido perturbação mental.
documentário clássico, de 1999,
Segundo Silva (2016a), há várias técnicas não letais relacionadas cujo título original é Talk to me:
hostage negotiators of the NYPD,
pela doutrina e passíveis de serem utilizadas: imobilizações táticas; mostra como os negociadores
uso de instrumentos de menor potencial ofensivo (IMPO), como agen- lidam com situações críticas.
tes químicos (gás lacrimogêneo, gás pimenta e outros); dispositivos Talk to me (“Fale comigo”, em
tradução literal) é o lema da
eletrônicos, comumente chamados de armas de choque; munições de HNT.
impacto controlado (MIC), como elastômero (borracha); entre outras. Disponível em: https://
Durante uma crise, é fundamental que os operadores do GI treinem e www.youtube.com/watch?-
v=PS_Kw2ntyiM. Acesso em: 2
tenham várias técnicas à disposição para utilizar aquela que melhor se nov. 2019.
enquadra na resolução do caso específico.

Noções de gerenciamento de crises 31


1.4.3 Tiro de comprometimento
Alternativa importante ao contexto do gerenciamento que deve ser
executada pelo atirador de precisão policial (comumente conhecido
como sniper policial), integrante de um grupo altamente treinado e pos-
suidor de armas específicas e equipamentos especialmente prepara-
dos para a missão. Os operadores dessa alternativa necessitam passar
por intenso treinamento, considerando que o disparo, se necessário e
autorizado pelo gerente da crise, precisa ter 100% de eficácia. O erro
pode comprometer toda a situação e expor ainda mais risco à vida de
inocentes, por isso ele não é admitido.

A neutralização total do risco que o CEC representa, dependendo


do contexto, pode ser letal ou não letal (como um tiro antimaterial na
arma de um suicida, por exemplo). Por ser uma alternativa complexa, o
tiro é o último recurso dos atiradores de precisão. De acordo com Silva
(2016a), antes disso, eles possuem outras missões importantes, como
observar e coletar informações acerca do ponto crítico e apoiar os ope-
radores táticos com cobertura de fogo, em um momento em que uma
eventual invasão tática seja autorizada e realizada.

1.4.4 Invasão tática


Alternativa derradeira a ser considerada em um evento crítico e que
impõe maior risco às pessoas ameaçadas pelo causador, incluindo aos
policiais que participam da ação. Deve ser aplicada pelo GI e utilizada
em ocorrências críticas cujo ponto crítico é confinado, ou seja, é pre-
ciso transpor obstáculos para se ter acesso ao ambiente e partir para
a necessária ação de neutralização do CEC, de modo letal ou não. De
acordo com Silva (2016a, p. 205),
para que uma invasão tática seja implementada, os policiais in-
tegrantes do grupo de intervenção precisam estar devidamente
treinados e equipados para os procedimentos. É uma ação extre-
mamente arriscada e complexa, cujo risco pode ser minimizado
caso os operadores estejam plenamente capacitados.

32 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Assim como as demais ações desempenhadas durante o GC para a
solução do evento crítico, uma invasão tática precisa passar pelo crivo
dos critérios de ação, a fim de que seja autorizada pelos gestores. Por
ser muito arriscada, sua realização por amadores ou pessoas não trei-
nadas e sem armamentos e equipamentos específicos não é possível.

Por fim, é necessário ressaltar que as alternativas táticas aqui es-


tudadas podem ser aplicadas individualmente ou de maneira combi-
nada, momento em que os operadores das três equipes responsáveis
(Equipe de Negociação, Grupo de Intervenção e Grupo de Atiradores de
Precisão Policial) se ajudam mutuamente na busca pelo tão esperado
resultado satisfatório da ocorrência policial crítica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Gerenciar crises policiais é uma atividade extremamente complexa.
Todos os aspectos doutrinários esmiuçados neste capítulo representam
norteadores ao trabalho policial em campo – local onde a crise está ocor-
rendo. Logo, conhecer e estudar a teoria minimizará os riscos inerentes
à atividade na prática e auxiliará os gestores do evento no atendimento
técnico que os inocentes merecem.

REFERÊNCIAS
RONCAGLIO, O. L. O gerenciamento de crises em estabelecimentos prisionais e a especificidade
do causador do evento crítico preso rebelado. Curitiba: FSB, 2017.
SALIGNAC, A. O. Negociação em crises: atuação policial na busca da solução para eventos
críticos. São Paulo: Ícone, 2011.
SILVA. M. A. Gerenciamento de crises policiais. Curitiba: InterSaberes, 2016a.
SILVA. M. A. Primeira intervenção em crises policiais: teoria e prática. 2. ed. Curitiba: AVM, 2016b.
TREVISAN, R. (coord.). Michaelis. Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. São Paulo:
Melhoramentos, 2015. Disponível em: https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/
busca/portugues-brasileiro/crise/. Acesso em: 12 nov. 2019.
TREVISAN, R. (coord.). Michaelis. Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. São Paulo:
Melhoramentos, 2015. Disponível em: https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/
busca/portugues-brasileiro/doutrina/. Acesso em: 12 dez. 2019.
VALLA, W. O. Doutrina de emprego de Polícia Militar e Bombeiro Militar. 3. ed. Curitiba: AVM,
2012.
WHITTAKER, D. J. Terrorismo: um retrato. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 2005.

Noções de gerenciamento de crises 33


GABARITO
1. Refém e vítima são pessoas ameaçadas na ocorrência crítica. Entretanto, são diferentes
em sua essência, tornando necessário o entendimento de suas particularidades.
Refém é uma pessoa tomada como garantia de vida pelo CEC, no momento em que é
flagrado em uma eventual prática delituosa. É praticamente um escudo do causador,
que garante a ele sua integridade física, sua liberdade (até então não foi preso) e,
também, outros benefícios, logo é “trocável” por algo. Já a vítima é a pessoa envolvida
na ocorrência por questões emocionais e ao CEC só interessa para cumprir seu
desejo de vingança, como a morte da vítima, por exemplo. Esse tipo de pessoa corre
muito mais risco de morrer no ponto crítico, considerando seu envolvimento com o
causador, não sendo vista por ele como um objeto de troca.

2. Gerenciar crises com técnica e com todos os meios adequados minimiza os riscos já
inerentes a esse tipo de ocorrência policial. O gerenciamento de crises é um processo
sistemático que auxilia os operadores envolvidos na busca de sua solução aceitável, ou
seja, com todas as vidas preservadas. Logo, conhecer todas as particularidades desse
processo, entender os conceitos relativos e, principalmente, aplicar os procedimentos
já amplamente testados e utilizados em situações reais trará uma vantagem muito
grande aos envolvidos.

3. A negociação é fundamental na ocorrência e precisa ser a primeira a ser tentada


durante a gestão da crise. O processo negocial é técnico e somente deverá ser aplicado
por profissionais especialistas, treinados, experientes e integrantes de uma equipe
completa. Os especialistas utilizam técnicas de convencimento e persuasão para
fazer o CEC sair da situação e liberar os inocentes no ponto crítico. O encerramento
da ocorrência com diálogo é o princípio fundamental dessa alternativa tática. Dessa
forma, a negociação tem o poder de preservar todas as vidas na crise apenas com o
uso da conversa. Além disso, minimiza os riscos para todos os envolvidos, evita as
questões judiciais posteriores e, principalmente, salva vidas. Caso seja necessário, os
negociadores auxiliam os operadores táticos durante a consecução de suas ações.

34 Negociação e gestão de conflitos de segurança


2
Aspectos doutrinários
da negociação policial
Negociar significa fazer um negócio, ajustar ou celebrar um
contrato ou um acordo. Esse ajuste deve ser celebrado entre
agentes, entre partes que precisam acordar em determinado
ponto para que a negociação seja efetiva.
Sendo assim, no que se refere à negociação em crises policiais, as
partes envolvidas são o negociador (assessorado por uma equipe de
profissionais) e a pessoa que deu causa a uma crise, o causador do
evento crítico (CEC). Para alcançar esse acordo proveitoso durante
uma situação em que a tensão é constante, o negociador precisa
lançar mão de técnicas adequadas para tal. A empatia, a persuasão,
a barganha e o convencimento devem ser colocados em prática em
busca da resolução do evento crítico.
O negociador precisa ter sempre em mente que o processo
negocial numa crise jamais deve se assemelhar a uma competição,
e sim se constituir num processo conjunto de tomada de decisões
em busca do consenso entre as partes.
Em uma negociação, tão importante quanto ouvir o que foi dito,
é interpretar o que não é falado.

2.1 Características da negociação


Vídeo O conceito de negociação em crises mais disseminado pelas institui-
ções policiais é “toda ação que objetiva conseguir um intercâmbio, uma
transação na qual as partes estão dispostas a ceder algo para conseguir
um acordo proveitoso para ambos” (OLIVEIRA, 2008, p. 11).

Ao longo do tempo, a negociação em crises passou por alterações


no seu modo de condução. Podemos dizer que o objetivo final – a re-
solução pacífica da crise – permaneceu intacto, porém a forma como se
alcança isso sofreu considerável evolução.

Aspectos doutrinários da negociação policial 35


De acordo com Silva, Silva e Roncaglio (2020, no prelo), no passado
tudo era permitido para que uma crise fosse encerrada sem a neces-
sidade do uso da força. Falsas promessas, ameaças, blefes, mentiras e
truques eram usados de modo demasiado e até inconsequente para
afastar o CEC de seu intento. A concepção ganhar-perder, em que a
Polícia ganhava e o causador perdia, imperava.

Com essa postura, a Polícia enganava o causador direcionando para


o desfecho da situação, fazendo-o acreditar que um acordo estava sen-
do firmado. Com esse causador seria impossível negociar novamente
em outra situação, pois a palavra do negociador seria posta em xeque.
Durante uma crise em que uma mentira foi dita, caso descoberta, se-
ria muito difícil para o negociador contornar a situação e retomar a
negociação.

Talvez algumas pessoas pensem que seria praticamente impossível


que um CEC gerasse outra crise e se deparasse com a mesma equipe
de negociação. No entanto, há casos que provam o contrário, como os
exemplos a seguir.

No ano de 2014, no estado do Paraná, foram registradas pela Equipe de Negociação


do Batalhão de Operações Especiais (BOPE), da Polícia Militar do Paraná (PMPR), 28
crises em estabelecimentos prisionais, onde presos se rebelavam e tomavam reféns.
Essa equipe identificou o mesmo detento envolvido diretamente na crise em três
ocasiões distintas. Na primeira delas, esse detento foi o líder da rebelião e mantinha
contato com o negociador. Na segunda, foi um dos CECs, ficava em segundo plano
e não mantinha o contato direto com a equipe de negociação. Na última situação,
o mesmo indivíduo foi um dos reféns tomados durante a crise por ser desafeto dos
líderes da rebelião.
Em outro exemplo, agora no ano de 2019, uma mulher, abalada pelo término do
relacionamento amoroso, gerou uma ocorrência de tentativa de suicídio. Na semana
seguinte, ela se evadiu do hospital em que estava internada e causou outra crise. Nas
duas oportunidades, a Equipe de Negociação do BOPE/PMPR negociou com a CEC.

Para Garbelini (2016), a negociação deve ser usada para resolver


situações em que as partes apresentem interesses opostos, buscando
um acordo satisfatório para ambos, ainda que todas as expectativas
não sejam contempladas.

Atualmente, as instituições policiais que dispõem de equipes de


negociação comprometidas com a atuação técnica em crises policiais

36 Negociação e gestão de conflitos de segurança


se alicerçam na concepção ganhar-ganhar, em que Polícia e causador
saem ganhando. Para isso, alguma das partes, ou ambas, precisa ce-
der. Durante a negociação técnica (ver item 2.4.2.1), não existe espaço
para truques, ou seja, a verdade é o principal pilar em que o negociador
se apoia em todas as suas ações. Muitas vezes, a verdade não é o que
o CEC gostaria de ouvir, contudo, por meio de técnicas e ferramentas
adequadas o negociador consegue expor os motivos daquela informa-
ção e prosseguir com a negociação. Desse modo, sempre será possível
negociar novamente com o causador, seja na mesma ocorrência ou em
outra futura, pois a palavra empenhada, principal recurso do negocia-
dor, não foi comprometida. Atividade 1
A principal característica da negociação é a pacificidade, e é impor- Discorra sobre a concepção
tante distingui-la de passividade, porque, ao contrário do que talvez ganhar-ganhar na evolução
da doutrina de negociação
pareça, o negociador deve manter-se ativo, utilizando todos os recur- em crises.
sos necessários para manter diálogo com o CEC, focando na resolução
aceitável da ocorrência.

O único “armamento” disponível ao negociador durante uma crise é a


palavra, sendo assim, a alternativa tática que mais se aproxima do prin-
cipal objetivo do gerenciamento de crises (GC) é a negociação. Os riscos
aos envolvidos no evento se minimizam ao extremo quando a negocia-
ção é colocada em prática (SILVA, M. A.; SILVA, L. F.; RONCAGLIO, 2020
no prelo).

Vimos anteriormente que empatia, persuasão e barganha se fazem


presentes numa negociação. Mas essa empatia deve estar relacionada
a quê? Qual item ou exigência o negociador deve barganhar? A respos-
ta para esses questionamentos reside nas necessidades do CEC duran-
te a crise. Costuma-se afirmar que as “necessidades insatisfeitas são o
motor principal do processo negocial” (SILVA, L. F., 2005, p. 30). Nesse
momento, é muito importante saber identificá-las de maneira eficaz.

Necessário é aquilo que é indispensável, essencial. Portanto, tam-


bém é essencial que o negociador saiba perceber as necessidades do
causador, que algumas vezes são abertamente faladas, mas, em ou-
tras, podem estar camufladas em discursos e/ou atitudes, cabendo a
esse profissional extraí-las do contexto. Recorremos, então, à hierar-
quia das necessidades de Maslow, que pode ser visualizada como uma
pirâmide (Figura 1).

Aspectos doutrinários da negociação policial 37


Figura 1
Pirâmide de Maslow

ção
liza
rea
Realização do

tor
próprio potencial e

Au
autodesenvolvimento Necessidades
contínuo. secundárias

Autodepreciação, autoconfiança,
a necessidade de aprovação social
im

e de respeito, status, prestígio e


Est

consideração.

Necessidade de associação, participação,


is
cia

aceitação por parte dos companheiros, troca de


So

amizade, afeto e amor.


a

Estabilidade, busca de proteção contra ameaça ou



ura

privação e fuga do perigo. Surgem no comportamento


quando as necessidades fisiológicas estão
seg

relativamente satisfeitas.
De

Necessidades
primárias
Necessidades de alimentação (fome e sede), de sono
s
ica

e repouso (cansaço), de abrigo (frio ou calor), desejo


óg

sexual etc., relacionadas com a sobrevivência do


iol

indivíduo e com a preservação da espécie.


Fis

Fonte: Elaborada pelos autores com base em Chiavenato, 2003, p. 329-331.

Criada pelo psicólogo estadunidense Abraham Harold Maslow,


essa pirâmide representa hierarquicamente as necessidades huma-
nas, estando em sua base, ou próximo dela, aquelas que são essen-
ciais, indispensáveis para a sobrevivência (necessidades primárias).
No outro extremo, no topo da pirâmide, estão as variáveis relacio-
nadas à estima e à realização pessoal, o que consideramos desejos
(necessidades secundárias).

Ao identificar as reais necessidades do CEC, o negociador deve di-


recionar as negociações para aquilo de que o CEC realmente precisa,
distinguindo-as e afastando-as dos desejos manifestados por ele. Agin-
do assim, a probabilidade de barganhar algo de grande valia (libertação
de reféns ou até mesmo a rendição do CEC) é muito grande, uma vez

38 Negociação e gestão de conflitos de segurança


que o causador terá aquilo que é imprescindível para sua vida. Para
esclarecer, apresentaremos dois exemplos.

Imagine que a preocupação do causador é com segurança, algo que está muito pró-
ximo da base piramidal, ou seja, ele precisa estar seguro para sobreviver, seu temor
relaciona-se diretamente com sua integridade física. Por mais que realize outras exi-
gências (desejos), o negociador percebe e consegue fazer com que o causador tam-
bém perceba que sua maior necessidade é segurança. Com a propositura de maneira
compreensível ao CEC, a tendência de um acordo satisfatório para ambos é grande.
Da mesma forma, se o indivíduo que está inserido numa crise há várias horas numa
sala sem nenhum tipo de recurso, passará a exigir alimentação e água, ou seja, ne-
cessidades vitais. Com certeza a entrega de algum desses itens (após avaliação dos
critérios de ação) permitirá ao negociador estabelecer uma troca considerável que
trará benefícios para o gerenciamento do evento crítico.

Corroborando com esses exemplos, cabe destacar a importância do


ponto crítico. Sabemos que ponto crítico é o espaço físico dominado
pelo causador, portanto, quanto menor for esse espaço, quanto menos
recursos estiverem disponíveis no local, maiores serão as chances de
o negociador realizar importantes trocas ou até acordar o desfecho da
situação sem conceder um item sequer, pois é natural que o CEC apre-
sente suas reais necessidades antes, do que se estivesse em um espaço
maior, com alimentação, banheiro e comunicação, por exemplo.

Logo, podemos afirmar que o tamanho do ponto crítico, bem


como os recursos existentes nele, interferem diretamente na duração
de uma crise.

2.2 Objetivos e vantagens da negociação


Vídeo
2.2.1 Objetivos da negociação
Durante o contato com o CEC, a equipe de negociação visa ganhar
tempo, abrandar as exigências expostas pelo causador, coletar o máxi-
mo de informações, além de proporcionar suporte tático ao grupo de
intervenção e grupo de atiradores de precisão, como veremos adiante.

Aspectos doutrinários da negociação policial 39


Filme
2.2.1.1 Solucionar a crise

Divulgação
Chegar a uma solução pacífica para a crise é o que se busca por
meio da negociação, sendo este o principal objetivo. No entanto, num
evento crítico os fins não justificam os meios, basta lembrarmos o en-
tendimento da concepção ganhar-ganhar. Negociação policial em cri-
ses não é um jogo em que tudo é possível, mesmo que o objetivo seja
o desfecho não violento da ocorrência.

É necessário preparo, estudo, dedicação e atenção às técnicas para


A negociação (1998), diri- que o caminhar, do início ao término da negociação, seja profissional e
gido por F. Gary Gray, é
um filme policial, de his-
transcorra com fluidez.
tória ficcional, que apre-
senta vários aspectos do
A negociação é um processo na maioria das vezes lento, porém efi-
processo de negociação caz. Ele apresenta, além da solução da crise, objetivos secundários que
policial aplicados em
ocorrências críticas. É
subsidiam as decisões do gerente da crise, o preparo para atuação do
possível identificar ele- grupo de intervenção e grupo de atiradores de precisão, além de corro-
mentos da negociação
estudados nesse capí-
borar com o próprio contato do negociador com o CEC.
tulo, como barganha,

2.2.1.2 Ganhar tempo


ganho de tempo, coleta
de informações e a con-
cepção ganhar-ganhar. É
importante assistir com Salignac (2011) enfatiza a importância de se ganhar tempo. É neces-
senso crítico, conside-
sário ganhar todo tempo possível durante uma crise. Da extensão do
rando se tratar de uma
obra hollywoodiana. tempo conquistado pelo negociador derivam todos os fatores prepon-
derantes no gerenciamento de uma crise.

2.2.1.3 Abrandar as exigências


À medida que a negociação flui, o negociador consegue identificar
as necessidades verdadeiras do causador, pode abrandar suas exigên-
cias e, consequentemente, diminuir suas expectativas por algo que seja
inviável de ser concedido.

2.2.1.4 Coletar informações


Durante o transcorrer de uma crise, as informações advêm de duas
formas: de fora do ponto crítico ou de dentro do ponto crítico; sendo
as fontes externas de informação o solicitante da ocorrência, parentes
das pessoas inseridas no evento, terceiros que perceberam o início da
crise (testemunhas), redes sociais etc.

40 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Essas informações são valiosas, considerando que não existem in-
formações rasas ou pobres, porém devem ser filtradas devido à menor
confiabilidade dessas fontes. Já as informações que derivam do interior
do ponto crítico são trazidas pela observação dos atiradores de pre-
cisão (posicionados em locais estratégicos), por pessoas egressas do
ponto crítico (reféns ou vítimas libertas), pelo próprio causador durante
os contatos com o negociador e, ainda, pela observação dos integran-
tes da equipe de negociação. Portanto, a negociação se revela como
uma confiável fonte para coleta de informações.

2.2.1.5 Proporcionar suporte tático


Partindo dos objetivos anteriormente citados, é possível proporcionar
suporte tático ao grupo de intervenção e ao grupo de atiradores de preci-
são, que adaptarão suas ações, constantemente, à medida que o tempo
vai passando e as informações vão se acumulando durante a crise.

2.2.2 Vantagens da negociação


Acabamos de analisar os objetivos da negociação em crises policiais
e afirmamos que o ganho de tempo é preponderante no GC. Nesse
sentido, compreendemos que muitas coisas dependem diretamente
e/ou são facilitadas e melhoradas à medida que o tempo vai passando
de maneira benéfica.

O trabalho de coleta de informações, já mencionado anteriormen-


te, pode ser pormenorizado e, assim, o cruzamento das informações
de fontes diversificadas se torna possível. No momento de tomada de
decisão e com informações filtradas e melhor qualificadas, com mais
tempo para avaliação de estratégias e das alternativas a serem em-
pregadas, os critérios de ação podem ser analisados com maior tran-
quilidade, aumentando a precisão na decisão e diminuindo o risco de
decisões precipitadas, fazendo com que os resultados das ações colo-
cadas em prática sejam satisfatórios.

Concomitantemente com o processo de gestão das informações, os


grupos de intervenção aperfeiçoam seus planejamentos (emergencial
ou programado) quase que minuto a minuto, adaptando-se às novas
possibilidades que vão surgindo, diminuindo as possíveis implicações
legais resultantes de uma ação com o uso da força, seja ela por meio

Aspectos doutrinários da negociação policial 41


de uma técnica não letal ou com a execução de um tiro de comprome-
timento em casos mais extremos.

O causador, que estava agitado, tenso e estressado no início da cri-


se, pois vislumbrava fuga ou um possível confronto com a força policial,
com o passar do tempo retoma sua racionalidade, os níveis de estresse
e ansiedade são reduzidos e, consequentemente, a possibilidade de
pessoas feridas diminui (SALIGNAC, 2011).

Ainda, com o ganho de tempo, é possível trabalhar com barganhas


mais substanciais em virtude do aumento de necessidades básicas e do
crescente grau de dependência que o indivíduo terá do negociador.

Com todas essas vantagens apresentadas, os riscos de um evento


crítico são minimizados ao extremo. Inversamente proporcionais ao
risco, as chances de preservação das vidas e da integridade física de
todos os envolvidos se agigantam, rumando a crise para um desfecho
bem-sucedido.

2.2.2.1 Desvantagens decorrentes do prolongamento do


tempo
A negociação policial em crises não é uma ciência exata. Em grande
parte das ações relacionadas ao processo, podemos constatar prós e
contras, por isso cada ação deve ser criteriosamente avaliada antes de
colocada em prática.

Observamos várias vantagens conquistadas com o ganho de tempo


em uma crise, todavia, devemos estar cientes dos pontos negativos que
podem ser trazidos à tona à medida que o evento crítico se prolonga,
principalmente quando esse prolongamento for excessivo.

A pressão sofrida durante o GC é a principal desvantagem que os


operadores especialistas têm de enfrentar. Essa pressão se dá em
virtude da exaustão de policiais e de integrantes de órgãos de apoio
que porventura se encontrem no local da crise desde seu início e aca-
bem acometidos pelo cansaço físico. Algumas vezes, a pressão parte
de comandantes circunscricionais em virtude do grande contingente
empregado em situações desse tipo e da dificuldade em proporcionar
revezamento de efetivo e/ou recursos logísticos suficientes para aten-
der à demanda.

42 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Há também a pressão exercida por autoridades políticas que, em-
bora não exerçam diretamente papel decisório em situações críticas,
acabam interferindo, principalmente com o passar do tempo, forçan-
do prematuramente um desfecho satisfatório. O mesmo acontece em
relação à mídia, que se embasando em entrevistas com “especialistas”
sobre o tema e/ou noticiando a ocorrência de maneira, às vezes, desvir-
tuada, acaba interferindo na opinião pública negativamente, fazendo
com que a pressão externa sobre o gerente da crise e demais envolvi-
dos aumente.

Buscando alcançar o objetivo primordial do GC, que é preservar vi-


das, a instituição policial responsável pelo evento fará tudo o que for
possível para minimizar os riscos às pessoas envolvidas diretamente
na ocorrência (CEC, reféns, vítimas e policiais), bem como àquelas que
buscam acompanhar a situação por ofício (imprensa) ou por curiosi-
dade. Sendo assim, vias públicas serão bloqueadas, estabelecimentos
comerciais fechados, residências evacuadas e transporte coletivo des-
viado para uma rota alternativa. Esse transtorno prolongado à rotina
da cidade pode gerar pressões, por parte de populares, sobre a polí-
cia, entretanto, devemos ter em mente que tudo se faz necessário por
questões de segurança.

Por isso, ao estudarmos e conhecermos os objetivos de uma nego-


ciação policial, fica evidente que a boa administração do tempo e de
todas as peculiaridades advindas com o passar das horas é essencial
para o gerenciamento de uma crise.

2.3 O negociador e a equipe de negociação


Vídeo Negociador é o policial especializado e ex-
1
perimentado em negociação em crises, que
Para que o negociador seja o
atua como porta-voz das autoridades durante único canal de comunicação
o evento, não tendo poder decisório sobre as do CEC, é preciso que a crise
ações. Ele deve ser o único canal de comunica- esteja completamente isolada.
1
Entendemos por isolada a
ção entre o CEC e o exterior do ponto crítico . ocorrência em que o causador
não possui nenhuma forma de
O negociador busca acordar uma solu-
contato com o mundo externo,
ção pacífica para a ocorrência, minimizando seja verbal ou não verbal,
riscos aos envolvidos e garantindo as trata- independentemente do recurso
que possa utilizar.
tivas estabelecidas durante a negociação.

Aspectos doutrinários da negociação policial 43


Para tanto, cabe ao negociador policial extrair as necessidades do
CEC entranhadas em suas exigências.

A função do negociador exige características especiais do profissio-


nal que se voluntaria para tal encargo. O voluntariado é um dos prin-
cipais pontos observados pelos negociadores veteranos ao selecionar
pessoas para essa nobre missão.

Durante uma ocorrência crítica, o negociador se depara com


pessoas dos mais variados tipos, influenciadas por diversos fatores
que refletem em seus comportamentos. Por conseguinte, o pos-
tulante a negociador deve possuir características cognitivas e de
personalidade favoráveis às suas atribuições segundo parâmetros
de perfil profissiográfico específico. Algumas dessas facetas são ex-
plicitadas no Quadro 1, em que a primeira coluna representa a ca-
racterística avaliada, a segunda registra sua descrição e a terceira
revela a intensidade que essa característica precisa ser evidenciada
em um negociador.

Quadro 1
Perfil do negociador

Característica Descrição Nível


A faceta de vulnerabilidade avalia a fragilidade
Vulnerabilidade Baixo
emocional das pessoas.
A faceta instabilidade emocional avalia o quanto as
Instabilidade pessoas descrevem-se como irritáveis, nervosas e Muito baixo
com grandes variações de humor.
A faceta passividade avalia o nível de atividade das
Passividade pessoas e seu empenho para resolver situações Baixo
rapidamente.
A faceta confiança agrupa itens que descrevem o
Confiança quanto as pessoas confiam nos outros e acreditam Médio
que esses não as prejudicarão.
Capacidade de visualização, isto é, de formar re-
Raciocínio espacial presentações mentais visuais e manipulá-las trans- Alto
formando-as em novas representações.
Capacidade de abstrair-se de tudo e fixar a aten-
Atenção concentrada Alto
ção em um objeto.
Capacidade de raciocínio geral e velocidade de
Inteligência não verbal Alto
processamento.
Essa faceta é composta de itens que indicam o
quanto as pessoas tomam a iniciativa em situações
Dinamismo – assertividade Alto
variadas, o quanto colocam suas ideias em prática
e seu nível de atividade.

Fonte: Elaborado pelos autores com base em Polícia Militar do Paraná, 2017.

44 Negociação e gestão de conflitos de segurança


O negociador deve lançar mão de uma diversidade de técnicas e
ferramentas de negociação que visam, num escalonamento gradual,
à mudança do comportamento do CEC. No entanto, para que isso seja
alcançado, o negociador precisa ter autocontrole e adaptar-se à especi- 2
2
ficidade da ocorrência em questão, sendo, sobretudo, resiliente . Para a negociação policial em
crises, resiliência é a capacidade
Ferraz (2015) aponta que um bom negociador tem comportamen- que o negociador apresenta ao
to assertivo, trabalha em constante dissociação reconhecendo que enfrentar situações adversas,
estressantes e os obstáculos que
seus sentimentos e convicções podem influenciar sua comunicação;
possam surgir durante uma cri-
é empático, pois é tolerante com relação ao sentimento alheio, ten- se, mantendo-se estável técnica
ta ouvir conforme a perspectiva do outro e não de acordo com seu e emocionalmente.
ponto de vista e sempre demonstra interesse; transmite segurança
em suas mensagens; esforça-se para dar o feedback na comunicação
e aceita que a comunicação pode ser imperfeita; sempre que possí-
vel mantém contato visual durante uma negociação face a face; está
consciente de sua linguagem corporal para não se trair e sabe explo-
rar a vantagem do silêncio.

Pelos olhos do CEC, o negociador deve ser visto como a pessoa que
vai ajudá-lo, todavia, também deve ser enxergado como uma potencial
ameaça. Parece contrassenso, mas não é. Como único canal de comu-
nicação com o CEC, tudo que acontecer durante o processo de nego-
ciação passa pelo negociador. Além do diálogo, as orientações quanto
à recepção de pessoas, movimentação de efetivos, aproximação de in-
termediários e do grupo de intervenção para entrega de itens, tudo é
informado, garantido e empenhado pelo negociador, fazendo com que
o CEC perceba que uma possível intervenção tática pode depender de
uma simples sinalização do negociador ou da ausência dele.

O negociador deve estar comprometido com o processo negocial em


busca de seu principal objetivo, que é o de findar a crise pacificamente,
e, com o mesmo comprometimento, reconhecer a necessidade de mi-
gração para uma das outras alternativas táticas previstas pela doutrina.

Finalmente, é imprescindível reconhecer a necessidade do trabalho


em equipe. Assim como no ditado popular, “uma andorinha só não faz
verão”, um negociador, mesmo que atenda a toda a qualificação até
aqui mencionada não consegue, sozinho, colocar em prática seu papel.

Com o suporte de uma equipe estruturada, o negociador principal,


que é quem fará os contatos diretos com o CEC, receberá o assessora-

Aspectos doutrinários da negociação policial 45


mento técnico, logístico, tecnológico e psicológico para desempenhar
seu papel, que são as várias funções realizadas pelos integrantes de
uma equipe de negociação.

Uma instituição comprometida com o tema mantém uma equipe de


negociação composta, além do negociador principal, de:
•• comandante da equipe: policial responsável pela definição das
funções a serem desempenhadas durante a crise, coordena todo
o trabalho da equipe e se relaciona diretamente com o coman-
dante do grupo de intervenção, com o comandante do teatro de
operações e com o gerente da crise;
•• negociador secundário: policial encarregado de assessorar tec-
nicamente o negociador principal, devendo estar pronto para
substituí-lo caso necessário, incumbido também da observação
da comunicação não verbal do CEC;
•• negociador anotador: é o responsável pelo registro cronoló-
gico da negociação, além de auxiliar na manutenção dos cha-
3 3
mados quadros de situação com as principais informações
Locais destinados às informa-
acerca da crise e realizar entrevistas com pessoas egressas do
ções pontuais sobre a crise,
objetivando uma visualização ponto crítico;
rápida, precisa e atualizada dos
•• assessor logístico: profissional que zela pelos equipamentos uti-
principais fatos em andamento.
lizados pela célula de negociação, exerce a função de motorista
e, também, se encarrega do registro de imagens (foto/vídeo) e
áudios;
•• assessor psicológico: policial graduado em Psicologia que reali-
za a elaboração do perfil psicológico e define a estrutura psíquica
do CEC, além disso, trabalha com o monitoramento e a manuten-
ção da saúde mental dos negociadores;
•• assessor tecnológico: encarrega-se das ferramentas tecnológi-
cas disponíveis no auxílio do trabalho da célula de negociação,
monitora imagens e realiza filtros em bancos de dados e redes
sociais.

2.3.1 O comandante como negociador


É completamente aceitável que policiais que ocupam os mais altos
postos e hierarquias em suas instituições possuam conhecimento ou

46 Negociação e gestão de conflitos de segurança


sejam especialistas em negociação em crises e que até mesmo tenham
atuado durante anos como negociadores. Entretanto, não se admite
que comandantes, principalmente aqueles que assumirão o papel de
gerente da crise, queiram negociar diretamente.

A ocorrência crítica acaba trazendo evidências e exposições aos


diretamente envolvidos no evento, dessa forma, o comandante ficará
exposto de tal forma que pode comprometer suas ações decisórias.
Xingamentos, menosprezo, nível de irritação e estresse por parte do
causador também podem colaborar para essa exposição.

Somado a isso, caso esteja desempenhando a função de gerente da


crise, o comandante poderá ser pressionado de modo muito particu-
lar pelo CEC, pois este poderá saber das responsabilidades de decisão
por parte do comandante e lhe cobrará o retorno imediato de suas
solicitações.

Sendo assim, o comandante deve gerir a situação do posto de co- 4


4
mando com toda a tranquilidade possível para tomar suas decisões Centralização física do local onde
devem ser tomadas as decisões.
analisando coerentemente os critérios de ação e com o assessora-
Deve ser reservado, com acesso
mento especializado da equipe de negociação e do grupo de inter- restrito, não muito distante do
venção, diferentemente do que faria se estivesse em contato direto ponto crítico (SILVA, M. A., 2016).
com o causador.

É muito importante salientar, diante do que vimos até aqui, que um


único policial não consegue desenvolver satisfatoriamente o processo
de negociação em crises, em virtude dos inúmeros detalhes e minúcias
que envolvem o tema.

2.4 Fases do processo e tipos de negociação


Vídeo
2.4.1 Fases do processo de negociação
Todo processo é caracterizado por ações em sequência, e com a
negociação não é diferente. Em seguida, estudaremos as fases do
processo de negociação, as quais se relacionam ao tempo crono-
lógico da crise e a fatores técnicos relacionados aos objetivos da
negociação.

Aspectos doutrinários da negociação policial 47


2.4.1.1 Preparação ou pré-negociação
Fase que antecede o processo da negociação, antes de qualquer
tipo de diálogo com o CEC. Pode ser iniciada no deslocamento ao local
da crise, assim como no próprio local da ocorrência.

Site Nesse momento, deve ser realizada uma conversa aproximada com
O blog do Program on Ne- os primeiros interventores a fim de que todas as informações colhidas
gotiation (PON), um pro- durante a primeira intervenção sejam revisadas. Contatos com outras
grama de negociação da
faculdade de Direito da fontes de informações também podem ser realizados, tais como teste-
Universidade de Harvard, munhas e familiares previamente identificados. Essas pessoas devem
conta com diversos docu-
mentos e artigos interes- ser apresentadas aos negociadores.
santes sobre negociação.
Esse blog faz análises de Nessa fase, a equipe de negociação reunida e devidamente escala-
negociações em diversas da em suas funções discute os primeiros contatos a serem realizados
áreas, como negócios, go-
verno, educação e direito. com o causador, estabelecendo os objetivos iniciais. Uma sugestão de
A página sobre negocia- objetivo para os primeiros contatos entre negociador e CEC pode ser a
ção de crises tem lições
tiradas de situações de visualização dos reféns e a confirmação sobre a condição de saúde de
negociação e técnicas dos todos os envolvidos.
negociadores de reféns
que podem ajudar a me- Ainda tratando-se de objetivos iniciais durante a preparação para os
lhorar suas habilidades
em negociação.
contatos, é necessário reunir-se com o gerente da crise e definir a pos-

HARVARD LAW SCHOOL. Program on


sibilidade de realização de concessões iniciais para estimular o vínculo
Negotiation. Daily blog. Disponível do CEC com o negociador.
em: https://www.pon.harvard.edu/
category/daily/crisis-negotiations/. A definição de estratégias iniciais e a escolha das táticas de negocia-
Acesso em: 17 nov. 2019.
ção mais adequadas para o início do processo serão realizadas durante
a fase da preparação ou pré-negociação.

2.4.1.2 Discussão
A fase da discussão é a primeira e mais extensa parte da negocia-
ção propriamente dita. Trata-se de todo o desenvolvimento do contato
com o CEC visando identificar suas reais necessidades.

Essa é a fase em que o negociador começa a colocar em prática as


técnicas necessárias para conduzir o evento a um desfecho pacífico,
lembrando que tudo dependerá do retorno do CEC e do estímulo que
o negociador proporcionará. Iniciam-se as exposições de motivações e
algumas exigências por parte do causador, fazendo com que as barga-
nhas e trocas sejam possíveis.

48 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Durante a fase da discussão é possível delimitarmos a chamada
zona de negociação. Cada uma das partes de uma negociação em cri-
ses, CEC e negociador, possui uma variável com dois pontos extremos,
o ponto muito favorável (PMF) e o ponto limite (PL) ou o mínimo
aceitável. Esses pontos são invertidos, uma vez que os objetivos das
partes, no início da crise, são distintos e, muitas vezes, afastados. Ao
traçarmos uma linha perpendicular nesses pontos teremos a zona
de negociação na área coincidente entre as variáveis do CEC e do
negociador. Sendo assim, é de fundamental importância que essa
zona seja delimitada, pois um acordo será efetivamente firmado se
a proposta estiver dentro da zona de negociação.

Quando o PL de uma das partes for coincidente com o PMF da ou-


tra, a zona de negociação é maior, conforme mostra a Figura 2.

Figura 2
Zona de negociação 1

PL PMF
NEGOCIADOR
ZONA DE NEGOCIAÇÃO
CEC
PMF PL

Fonte: Elaborada pelos autores.

Quando os pontos (PL e PMF) não coincidem, temos uma zona de


negociação diminuída, como demonstrado na Figura 3.

Figura 3
Zona de negociação 2

PL PMF
NEGOCIADOR
ZONA DE NEGOCIAÇÃO

CEC
PMF PL

Fonte: Elaborada pelos autores.

2.4.1.3 Proposta
Demarcada a zona de negociação, em virtude da intercambiali-
dade de objetivos, o negociador deve identificar e/ou buscar, dentro
dessa área, um ponto comum de interesse. Esse ponto deve ser sa-
tisfatório para ambos e utilizado na proposição do encerramento da
crise. A Figura 4 representa o ponto de acordo.

Aspectos doutrinários da negociação policial 49


Figura 4
Ponto de acordo

ACORDO
PL PMF
NEGOCIADOR

CEC
PMF PL

Fonte: Elaborada pelos autores.

Esta é uma fase crucial para o desfecho da situação, momento em


que não se admite pressa, portanto, a avaliação minuciosa de contra-
propostas é necessária.

A proposta pode advir de qualquer uma das partes, do negociador


ou do CEC. Alguns especialistas afirmam que, caso a proposta de en-
cerramento da crise venha do CEC, mesmo sendo boa, não deve ser
aceita de imediato. Entretanto, isso é muito relativo. Tudo depende
da situação que envolve essa proposta e do sentimento que o nego-
ciador captura dessa ação. É muito superficial dizermos a negociado-
res em formação para que barganhem sempre, mesmo se for algo
muito bom. Tudo depende. O fato é que não podemos jamais perder
a oportunidade de encerrar pacificamente uma crise, desde que de
maneira coerente e com embasamento nos procedimentos técnicos
e na legalidade.

2.4.1.4 Acordo
Última fase do processo de negociação, envolve diretamente a ava-
liação da proposta e as possíveis contrapropostas, realizadas na fase
anterior com o objetivo de findar a crise. Mais uma vez, os critérios de
ação do GC são evidenciados para auxiliar essa ponderação.

Atividade 2 Avaliados todos os termos propostos, é necessário o estabeleci-


Cite as fases do processo de mento de garantias e normas de segurança para o processo de ren-
negociação, pontuando suas dição. Nesse momento de grande tensão, o negociador deve explicar
principais características.
minuciosa e sequencialmente as medidas que serão adotadas duran-
te a rendição, principalmente aquelas relacionadas à segurança dos
envolvidos, determinando quando, quem e de que forma as ações
são levadas a efeito durante esse procedimento que encerra o evento
crítico.

50 Negociação e gestão de conflitos de segurança


2.4.2 Tipos de negociação
Negociação, na essência da palavra, ocorre todo dia, a qualquer
momento. Pode ser de modo ocasional, quando pessoas celebram
acordos em meio ao trânsito caótico das grandes cidades, de dentro
de seus carros, cedendo passagem para que outro motorista tome a
direção desejada ou em negociações colaborativas, mais equilibradas,
como ocorre nos grandes contratos comerciais.

Na imensa maioria das ocorrências qualificadas como críticas, a ne-


gociação estará presente buscando a resolução pacífica da situação.
Mesmo percebendo a ineficácia do processo negocial, o negociador
permanecerá negociando.

Ainda que a percepção de que a crise não findará por meio do diá-
logo com o negociador, este permanecerá em contato com o CEC. O
que muda é o foco pelo qual o processo prossegue. Para tanto, serão
expostos agora os dois tipos de negociação em crises: negociação téc-
nica e negociação tática.

2.4.2.1 Negociação técnica


Também conhecida como negociação pura ou real, a negociação
técnica é o processo que busca promover uma mudança no comporta-
mento do CEC, convencendo-o de que a opção pela resolução pacífica
e sua consequente rendição é o melhor caminho.

Durante a negociação técnica não existe a necessidade do emprego


da força. O negociador utiliza técnicas específicas de negociação que,
em sua maioria, se baseiam no padrão de comunicação e persuasão.

Sampaio (2018) destaca que na negociação técnica ocorre o atendi-


mento de reivindicações razoáveis do CEC, desde que estejam ampara-
das pelos critérios de ação do GC.

As fases do processo de negociação são mais evidentes na negocia-


ção técnica, principalmente as duas últimas (proposta e acordo), uma
vez que, após identificado um ponto satisfatório e aceitável para am-
bos, negociador e CEC acordam o desfecho da ocorrência.

Aspectos doutrinários da negociação policial 51


2.4.2.2 Negociação tática
Chamada por alguns de negociação preparatória, é o processo pelo
qual o negociador permanece em contato com o CEC, porém o foco
migra da resolução e encerramento da crise por meio da negociação
técnica para o suporte necessário às demais alternativas táticas. Para
tanto, segundo Salignac (2011), a coleta e análise de informações pros-
seguem para atender aos anseios dos grupos de intervenção e de ati-
radores de precisão.

Diante dessas informações o negociador inicia a preparação do am-


biente, dos reféns e dos causadores para um eventual emprego de for-
ça, seja ela letal ou não.

O objetivo principal da negociação tática é prover suporte tático e


minimizar os riscos quando da execução de outra alternativa tática,
portanto, a equipe de negociação possui importante papel tático.
Salientamos que a importância tática do negociador advém, inclusi-
ve, da negociação técnica, por meio do ganho de tempo e da coleta
de informações.

Manter diálogo frequente e sem pausas com o CEC, prolongar a


crise para estimular vínculos entre causadores e pessoas tomadas,
permitir a aproximação imperceptível do grupo de intervenção, cole-
tar imagens, identificar líderes e posicionamento dos causadores e dos
reféns/vítimas no interior do ponto crítico, detectar pontos de acessos
barricados, conduzir os reféns/vítimas para locais de menor perigo, fa-
cilitar a ação dos atiradores de precisão, fazer concessões significativas
que induzam o CEC a acreditar que vai atingir seus objetivos (ficando
menos atento e mais vulnerável) são exemplos de ações desempenha-
das pelo negociador que contribuem para ações táticas.

Atividade 3 Para finalizar, cabe ressaltar que, durante uma crise policial, a equi-
De maneira sintética, dife- pe de negociação atua antes mesmo de chegar ao local da ocorrência,
rencie negociação técnica de pois quando é acionada já iniciam contatos para coletar informações e
negociação tática.
orientar os primeiros interventores, o que perdura durante todo o des-
locamento. No local, mesmo que a negociação técnica seja infrutífera,
a equipe de negociação parte para a negociação tática e permanece
em atividade, após o desfecho da situação, entrevistando envolvidos e
armazenando dados para posterior confecção de relatórios.

52 Negociação e gestão de conflitos de segurança


CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao encerrarmos este capítulo, percebemos que a negociação em cri-
ses policiais é uma missão completamente técnica, que deve ser coloca-
da em prática por policiais selecionados e capacitados profissionalmente
para essa função.
No estado do Paraná, conforme os registros da Equipe de Negociação
do BOPE/PMPR, cerca de 71% das ocorrências críticas foram encerradas
pacificamente por meio da negociação (MOSER, 2017).
Tal dado demonstra a eficácia e a necessidade desse processo. No
entanto, vale lembrar que uma instituição comprometida com o tema pre-
cisa investir em uma equipe de negociação sólida, bem como nos demais
grupos indispensáveis ao GC (grupo de intervenção, grupo de atiradores
de precisão e grupo antibombas) para que todas as alternativas táticas
estejam disponíveis quando uma crise policial eclodir.

REFERÊNCIAS
CHIAVENATO, I. Introdução à teoria geral da administração: uma visão abrangente da
moderna administração das organizações. 7. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003.
FERRAZ, E. Negocie qualquer coisa com qualquer pessoa. São Paulo: Gente, 2015.
GARBELINI, V. M. P. Negociação e conflitos. Curitiba: InterSaberes, 2016.
MOSER, G. A negociação como alternativa tática empregada no gerenciamento de ocorrências
críticas da Polícia Militar do Paraná para a solução de crises. Curitiba: FSB, 2017.
OLIVEIRA, A. F. R. Manual de gerenciamento de crises. Rio de Janeiro: Instituto de Segurança
Pública, 2008.
POLÍCIA MILITAR DO PARANÁ. Diretoria de Ensino e Pesquisa. Concurso ao IV Curso de
capacitação de negociação em crises – Turma 2017 – Categoria oficiais e praças – Edital nº
001 – Abertura do certame. Paraná, 2017.
SALIGNAC, A. O. Negociação em crises: atuação policial na busca da solução para eventos
críticos. São Paulo: Ícone, 2011.
SAMPAIO, I. Momento crítico. Fortaleza: Edição Independente, 2018.
SILVA, L. F. Técnicas e Táticas de Negociação em Crises. Curitiba, 2005. Curso de Primeira
Intervenção em Crises, Companhia de Polícia de Choque, PMPR.
SILVA, M. A. Gerenciamento de crises policiais. Curitiba: InterSaberes, 2016.
SILVA, M. A.; SILVA, L. F.; RONCAGLIO, O. L. Negociação em crises policiais – teoria e prática.
2020. No prelo.

Aspectos doutrinários da negociação policial 53


GABARITO
1. A concepção ganhar-ganhar utilizada na atualidade refere-se ao acordo proveitoso
para ambos (negociador e CEC), em que as duas partes saem satisfeitas com o
desfecho, uma vez que a negociação foi conduzida pela verdade exposta pelo
negociador, sendo possível voltar a negociar futuramente.

2. Preparação ou pré-negociação: coleta e revisão de informações, estabelecimento dos


objetivos iniciais e definição de estratégias iniciais. Discussão: desenvolvimento do
contato com o CEC, delimitação da zona de negociação. Proposta: identificação de um
ponto comum de interesse utilizado para propor o encerramento da crise. Acordo:
avaliação da proposta e das contrapropostas, estabelecimento de garantias para o
processo de rendição.

3. A negociação técnica, também conhecida como pura ou real, visa desfazer a intenção
do CEC, encerrando a crise pacificamente, por meio do diálogo. Já a negociação tática
ou preparatória é colocada em prática com a intenção de auxiliar a execução das
demais alternativas táticas (técnicas não letais, tiro de comprometimento e invasão
tática).

54 Negociação e gestão de conflitos de segurança


3
Comunicação e negociação
A essência de todo processo de negociação é a comunicação.
O negociador precisa comunicar-se, manter diálogo com outra
pessoa (o CEC) para conhecer a motivação e entender a situação
em que ela se encontra.
Muitas pessoas apresentam dificuldade para se comunicar e
conversar com outras, seja qual for o assunto, independentemente
do estado emocional do interlocutor. O negociador não deve ter
essa dificuldade.
Ele é um comunicador, mas um comunicador diferente,
que conversa com pessoas em diversos estados emocionais,
estressadas e irritadas, armadas, que farão exigências e
apresentarão ansiedades, algumas vezes desacreditadas da
própria vida. Nesse cenário, a linguagem coloquial, a velocidade
de raciocínio, a maneira com que as palavras são colocadas, a
linguagem não verbal e a percepção dos sinais emitidos pelo CEC
farão toda a diferença.

3.1 Requisitos para a comunicação


Vídeo Para O’Connor e Seymour (1995), em uma comunicação face a face,
55% das reações estão relacionadas a estímulos não verbais, 38% rela-
cionam-se aos sons da conversa (tonalidade de voz, velocidade da fala,
ruídos concorrentes com o diálogo) e 7% referem-se às palavras utiliza-
das. Ainda assim, toda palavra deve ser rapidamente ponderada antes
de ser dita com intuito de evitar desacertos, principalmente aqueles
relacionados à má interpretação.

De acordo com Tubbs e Moss (2003 apud FAUAT; COSTA, 2018), sete
elementos compõem o processo de comunicação organizacional, são

Comunicação e negociação 55
eles: emissor, receptor, estímulo, mensagem, canal, feedback e barrei-
ras/interferências, sendo um modelo que bem representa a comunica-
ção e seus requisitos.
A partir da identificação do modelo de comunicação de Tubbs,
foram definidos sete elementos que compõem o processo da
comunicação organizacional no contexto de instituições finan-
ceiras governamentais. O primeiro elemento é o comunicador 1,
no papel primordial de emissor (representado pelos gestores).
O segundo elemento é o comunicador 2, no papel primordial de
receptor (representado pelos analistas). O terceiro, a mensagem,
significa todas as informações trocadas entre os comunicadores
1 e 2, ou seja, todas as informações relacionadas ao sistema de
normas das organizações estudadas e que são trocadas, princi-
palmente, mas não somente, entre gestores e analistas de risco de
crédito. O quarto elemento, o canal, constitui o veículo por meio
do qual a mensagem (escrita ou falada) é transmitida, como, por
exemplo, caixas postais, telefones e veículos digitais. O quinto
elemento são as interferências ou barreiras de comunicação, as
quais são constituídas por qualquer problema, de ordem técnica
e semântica, que distorça o significado da mensagem entre os
comunicadores. O sexto elemento é o feedback, que é o retorno
ao comunicador 1 (gestores) como resultado do comportamento
por ele gerado, sendo uma característica essencial dos relaciona-
mentos dele com seus interlocutores (principalmente analistas),
assim como uma importante fonte de informação sobre ele pró-
prio. Finalmente, o sétimo elemento é o estímulo (insumo), que
se refere a tudo o que o emissor e o receptor sabem, assim como
suas experiências a partir do mundo físico ou social, com base
nos seus sentidos. (FAUAT; COSTA, 2018, p. 70)

Além desses elementos, outro bastante importante é o código. Du-


rante uma negociação, assim como em qualquer processo de comuni-
cação, um código, mutuamente conhecido, precisa ser eleito para que
a conversa seja levada a efeito. Na maioria das vezes a linguagem ver-
bal (falada ou escrita) é o código utilizado para transmitir a mensagem,
que é o conteúdo do que se quer comunicar. A mensagem é enviada
por meio de um canal, ou seja, a forma como a comunicação é efetiva-
da, o recurso utilizado para tal (telefone, internet, cartas etc.).

Na negociação, negociador e CEC alternam-se nas posições de emis-


sor e receptor. O emissor organiza e adapta suas ideias e percepções
para transmitir a mensagem de modo acessível ao receptor, que, por

56 Negociação e gestão de conflitos de segurança


sua vez, necessita absorver, compreendendo a mensagem recém-rece-
bida, e, para isso, deve estar atento ao emissor e questioná-lo em caso
de dificuldade na assimilação da mensagem.

Figura 1
Requisitos para a comunicação

Iesde Brasil S/A


Canal

Código
Mensagem

Emissor Receptor

Feeedback

Fonte: Elaborada pelos autores.

O feedback é um importante recurso no desenvolvimento da comu-


nicação. Por meio dele, o emissor abstrai informações do retorno emi-
tido pelo receptor quanto a sua mensagem. É utilizado para avaliar se
o discurso foi realmente compreendido e, no caso de uma negociação
policial, verificar como a mensagem foi recebida/aceita pelo receptor.
O feedback pode ser exposto com palavras, por meio de aceitação, ne-
gativa ou imparcialidade referente à mensagem. Pode também estar
camuflado em gestos e manifestações corporais, expressões faciais
etc. Caso não ocorra nenhum tipo de reação por parte do receptor, o
emissor deverá provocar o feedback questionando-o diretamente so-
bre a compreensão do que foi dito. Atividade 1
Analise a afirmação: “para uma
A equipe de negociação precisa estar atenta às informações
boa comunicação, tão impor-
existentes no retorno do CEC para cada mensagem transmitida tante quanto falar é a maneira
pelo negociador, pois, por meio dessas mensagens, será colocada como se fala”. Baseando-se na
primeira seção deste capítulo,
em prática uma das principais características necessárias ao nego-
explique-a.
ciador: a empatia.

Comunicação e negociação 57
Weiss (2018) complementa que a maneira como o negociador se
comunica pode fazer toda a diferença. Para o autor “a linguagem que
usa e o modo como cria o entendimento, como resolve os problemas
em comum e determina o processo de negociação com a outra parte,
aumentam a eficiência da negociação” (WEISS, 2018, p. 24). Isso gera
acordos claros e compreensíveis e auxilia a criação de melhores rela-
cionamentos, facilitando eventuais negociações com o mesmo CEC.

3.2 Rapport
Vídeo Derivado do verbo francês rapporter, que significa “trazer de volta”
(relação), a palavra inglesa rapport refere-se a uma relação ou a uma
comunicação caracterizada por harmonia, sintonia, entendimento ou
empatia (SANDOVAL; ADAMS, 2001; MCLANACHAN, 2014 apud OLIVEI-
RA, 2017).

É o processo que leva à harmonia entre pessoas por meio do acom-


panhamento da fisiologia e da linguagem, resultando numa forte
sensação recíproca de confiança e compreensão, potencializando o re-
sultado da comunicação.

Para O’Connor e Seymour (1995), rapport é o vínculo psicológico de


confiança, com base na empatia, que se desenvolve entre as pessoas
– neste caso, entre o CEC e o negociador – e que pode ser construído
conscientemente por meio da comunicação, aliada às técnicas de nego-
ciação. Cabral e Nick (2006, p. 341) definem vínculo como uma “conexão
entre estímulo e reação ou, mais genericamente, entre dois processos
psicológicos de qualquer natureza”. Já o dicionário de Psicologia da APA
(AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION, 2010, p. 1017) estabelece
que vínculo, para a ciência psicológica, é um “relacionamento entre
dois ou mais indivíduos que significa confiança e aliança”.

Atividade 2 Desse modo, o negociador e o causador precisam estabelecer uma


Discorra brevemente sobre a aliança e estar conectados psicologicamente para que a confiança mútua
importância da empatia na seja estabelecida. Esse processo objetiva o encerramento pacífico da ocor-
comunicação.
rência crítica, com o CEC sendo influenciado a agir de maneira não violenta
contra outras pessoas ou contra si mesmo, no caso de um suicida.

A postura e a qualidade vocal do negociador, suas expressões fa-


ciais, seus movimentos e gestos são alguns dos fatores que colaboram

58 Negociação e gestão de conflitos de segurança


para o surgimento do rapport. Além disso, o modo como o negociador
transmite suas mensagens durante a conversação pode ter grande im-
pacto sobre os rumos do processo negocial. Por esse motivo, é funda-
mental que o negociador, juntamente com sua equipe, avalie de modo
criterioso as mensagens que serão enviadas, bem como aquelas que
não devem ser direcionadas ao causador, para evitar o aumento da
tensão no ponto crítico.

Pessoas que desenvolvem o rapport tendem a se comunicar com


mais fluidez, pois apresentam menos resistência ao outro (O’CONNOR;
SEYMOUR, 1995). Nesse contexto, a empatia recebe enorme destaque.

3.2.1 Empatia
Ser empático é “calçar os sapatos” do outro para compreender os
sentimentos dele. É tentar enxergar as coisas sob a ótica da outra pes-
soa levando em consideração o momento em que se encontra. Para o
dicionário de Psicologia da APA, empatia é:
compreender uma pessoa a partir do quadro de referência dela
e não do próprio, de modo a experimentar de modo vicário os
sentimentos, percepções e pensamentos dela. A empatia não
envolve por si mesma a motivação para ajudar, embora possa se
transformar em consideração pelo outro ou sofrimento pessoal,
o que pode resultar em ação. (AMERICAN PSYCHOLOGICAL AS-
SOCIATION, 2010, p. 335)

Assim, podemos dizer que demonstrar empatia por alguém é com-


preender o posicionamento daquela pessoa, perceber o que a faz pen-
sar e agir de tal maneira em virtude de tudo aquilo que ela possa estar
vivendo, sem a concordância ou aprovação dos seus atos.

Uma pessoa que tem simpatia por outra, ou por uma causa especí-
fica, concordará com os atos e apoiará as ações da outra. Sendo assim,
um negociador necessita ser empático, e, caso demonstre simpatia
pelo CEC e suas ações, deverá ser substituído.

Portanto, empatia não é o mesmo que piedade ou consenso. Para


ser empática uma pessoa não precisa sentir exatamente o que a outra
está sentindo. Isso é impossível. A palavra-chave aqui é compreensão.
Imagine a situação hipotética a seguir.

Comunicação e negociação 59
Um homem armado pratica um roubo a um supermercado. Vê-se frustrado pela polícia
no momento da fuga e retorna ao estabelecimento, onde, para não ser preso naquele
momento e não confrontar com os policiais, toma um refém.
Durante a negociação, o negociador extrai do CEC a motivação daquela ação delituosa. O
CEC expõe que está desempregado há dois anos, que cinco pessoas moram em sua casa
e dependem diretamente dele, que seu neto recém-nascido está passando fome e, como
último recurso que encontrou em meio a sua lastimável vida, cometeu o roubo para levar
comida para sua família.
Sendo empático, o negociador enxergará toda a situação do ponto de vista do CEC, com-
preenderá os motivos que o levaram a se envolver naquela situação, no entanto, não se
posicionará a favor do CEC quanto a sua atitude, até porque a conduta escolhida pelo
causador é criminosa. Ainda assim, o negociador relatará ao CEC o entendimento e a
compreensão do que lhe foi dito e juntos buscarão a melhor solução para o problema.

As declarações empáticas transmitem compreensão daquilo que foi


dito e/ou percebido. Por meio delas o CEC terá certeza de que está sen-
do ouvido de maneira plena, pois o negociador retorna, verbalmente,
essa informação a ele.

E como demonstrar empatia por uma pessoa e suas ações quando


ela está inserida no contexto de uma crise policial? É preciso que o ne-
gociador esteja atento ao que a pessoa diz e/ou observe sua disposição
emocional ou física. Formular declarações empáticas exige ouvir cui-
dadosamente quem fala (escuta ativa) para que se entenda o que está
sendo dito (SCHAFER; KARLINS, 2015). A Figura 2, a seguir, apresenta
alguns exemplos.

Figura 2
Declarações empáticas

Agora que você se


Então você está tranquilizou...
cansado...
Entendi o que me disse e
Percebo que você imagino a dificuldade que você
está triste... está tendo...

Compreendo a sua Parece que você está


difícil situação... mais contente...

Fonte: Elaborada pelos autores.

60 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Greenstone (2005) esclarece que a chave para uma escuta eficaz é
ouvir com precisão o conteúdo de qualquer comunicação. Isso se cha-
ma habilidade da empatia. Para ele, empatia é a capacidade de entrar
no mundo do sujeito e refletir sobre a compreensão desse mundo para
o próprio sujeito. Ainda segundo o autor, a empatia pode ser de dois
tipos, conforme mostra a Figura 3.

Figura 3
Tipos de empatia

Iesde Brasil S/A


Empatia passiva Empatia ativa

É o ato de ouvir os fatos profundos Refere-se à capacidade de refletir o


contidos nas palavras e os entendimento para a outra pessoa de
sentimentos contidos na linguagem uma maneira que gere acolhimento,
corporal, na intensidade e no tom de confiança e vontade de ele se abrir
voz do causador. no diálogo.

Fonte: Adaptada de Greenstone, 2005, p. 126.

Geralmente, a empatia ativa é uma habilidade difícil para os nego-


ciadores iniciantes, que tendem a lidar apenas com fatos superficiais
apresentados pelo causador. Por isso, a prática é fundamental.

Ao exteriorizar preocupação pelo que foi dito e, consequentemen-


te, pelo outro, as declarações empáticas contribuem diretamente para
a solidificação do rapport, uma vez que as pessoas enunciam predis-
posição a gostar de quem prestou atenção nelas. Tanto é que basta
demonstrarmos a percepção de um fato acontecido com um desco-
nhecido para, na maioria das vezes, iniciar uma conversa.

Comunicação e negociação 61
3.2.2 Escuta ativa
Webster (2003) relata que o FBI, desde os anos 70, vinha formando
seus negociadores com foco na resolução de ocorrências envolvendo
reféns. No entanto, no início da década de 90, a instituição passou a
reavaliar a forma de comunicação de seus negociadores em virtude dos
diferentes tipos de ocorrências críticas que se apresentavam. A denomi-
1 nada escuta ativa, então, surge como a ferramenta fundamental na cria-
A FBI Academy fica localizada ção de vínculos entre negociador e causador, passando a integrar, como
na cidade de Quantico, no metodologia basilar, os cursos da Academia de Treinamento do FBI .
1

estado norte-americano da
Virgínia, e é “dedicada a ser o Dedicação à comunicação é a principal característica da escuta ati-
principal centro de pesquisa va. Consiste em ouvir atentamente a pessoa com quem se está conver-
e de aprendizado da polícia e
defensora das melhores práticas sando, focando todas as palavras ditas e, sobretudo, compreendendo
policiais em todo o mundo” (FBI, as mensagens transmitidas, os sentimentos e as expectativas, demons-
2019, tradução nossa).
trando empatia pelas necessidades dessa pessoa (SALIGNAC, 2011).

A escuta ativa é uma forma dinâmica de demonstrar atenção ao ou-


tro e ao que vem sendo dito. Revela-se uma ferramenta afetiva e efeti-
va. Afetiva, pois estimula a confiança do CEC no negociador, essencial
para o rapport; e efetiva porque propicia o ganho de tempo, a coleta de
informações e a manutenção da tranquilidade no ponto crítico.

À medida que os contatos se intensificam, é normal que o CEC comece


a contar sua motivação inicial e passe a falar sobre si. É nesse momento
que o negociador, por meio das habilidades de escuta ativa, deve deixar o
causador ciente de que está sendo ouvido e compreendido, aceitando o
negociador como alguém que merece saber sobre sua pessoa. Para isso,
passamos a discorrer sobre as maneiras de empregar a escuta ativa.

O negociador deve demonstrar interesse nas ideias e nos sentimen-


tos do CEC, mesmo que discorde deles, evitando críticas e pré-julga-
mentos, evidenciando que ele é merecedor de respeito.

A concentração é fundamental e a concorrência de estímulos atra-


palha. Outros policiais conversando próximo e até a orientação vinda
do negociador secundário podem distrair o negociador principal. Para
que possa se concentrar, estar atento o tempo todo e disponível ao
diálogo com o CEC, deve ouvi-lo sem pressa (evitando olhar o relógio, a
não ser que faça parte de uma estratégia). O tempo é do CEC, quanto
mais ele fala, mais confessa suas emoções e mais informações podem
ser coletadas.

62 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Uma das principais características da escuta ativa é o feedback, seja
verbal ou não. É importante que o negociador dê retorno ao CEC, além
das palavras e expressões sonoras (“aham”, “uhum”), utilizando gestos,
expressões faciais e movimentos de cabeça, sendo sempre coerente
na comunicação (consonância entre linguagem verbal e não verbal). Se,
por algum acaso, o negociador não ouvir ou não entender o que foi
dito, deve indagar ao CEC quanto ao significado da mensagem para que
não restem dúvidas. Da mesma forma, ao perceber a incompreensão
por parte do CEC, o negociador deverá indagá-lo para garantir que a
mensagem foi entendida (SILVA, M. A.; SILVA, L. F.; RONCAGLIO, 2020,
no prelo).

Schafer e Karlins (2015) afirmam que normalmente pensamos qua-


tro vezes mais rápido do que uma pessoa pode falar. Então, por mais
que necessitemos raciocinar lógica e rapidamente, algumas vezes an-
tevendo situações, não devemos tentar formular respostas enquanto
ouvimos. Certamente perderemos trechos importantes da mensagem
e seremos flagrados pela outra parte, pois é fato que quem fala perce-
be quando não está sendo ouvido.

O negociador deve gerir o silêncio, evitando interromper o CEC ou


completar as frases alheias para acelerar a troca entre emissor e re-
ceptor. As pessoas gostam de quem as deixam falar, principalmente
quando o assunto são elas mesmas.

Caso a forma de contato escolhida e as condições de segurança per-


mitam, o contato visual, durante os contatos, deve ser mantido pelo
maior tempo possível.

Um foco especial deve ser desprendido sobre as possíveis respostas


ou afirmações do negociador quanto ao que é exposto pelo CEC. Está
claro que respostas hostis, com reações condenatórias ou sarcásticas,
não trazem benefício algum e prejudicam os interesses da escuta ativa.

Afirmações de avaliação também devem ser evitadas, mesmo quan-


do o CEC questiona diretamente o negociador, por exemplo: “Você
acha que estou certo?”. Como já dito, o juízo de valor é inadequado.

O discurso tranquilizador pode, esporadicamente, ser utilizado na


tentativa de minimizar o sofrimento do indivíduo, por exemplo, expon-
do que tudo ficará bem se mantiver o diálogo com o negociador. As
respostas de sondagem também são bem-vindas porque buscam mais

Comunicação e negociação 63
Site informações, porém é preciso ter cuidado para não parecer um interro-
GOLFINHO. O portal da PNL no gatório ou que o problema do CEC ficou em segundo plano.
Brasil. Disponível em https://
A declaração empática, a qual demonstra compreensão, é a forma
golfinho.com.br/search/site/
comunicacao. Acesso em: 1 mais importante e eficaz de demonstrar para a outra pessoa que ela
dez. 2019. realmente está sendo ouvida.
Esse site é considerado
uma das principais refe-
É evidente que a escuta ativa apresenta melhores resultados na ne-
rências em Programação gociação face a face, devido à melhor possibilidade de recepção das
Neurolinguística (PNL) do
Brasil na internet. Nele é
mensagens do CEC, bem como maiores chances de feedback. Todavia,
possível encontrar vasto deve ser empregada independentemente da forma com que os con-
material sobre a eficácia
de uma boa comunica-
tatos são realizados. Um exemplo muito simples, e que a maioria das
ção; a importância da pessoas realiza inconscientemente, é a comunicação por telefone. Ao
comunicação não verbal;
novas tendências da co-
passo que o emissor profere suas mensagens, o receptor lhe dá retor-
municação interpessoal, nos pontuais por meio de “aham”, “sei”, “entendi”, para que o emissor
entre outros assuntos. O
nome do site foi inspirado
tenha a certeza de que está sendo ouvido. Quando esse retorno não
no livro A Estratégia do existe, é comum que o emissor acredite que a ligação caiu ou indague
Golfinho, de Dudley Lynch
e Paul L. Kordis.
se a outra parte ainda se encontra na linha, o que o faz crer que sua
mensagem possa não ter sido assimilada por completo.

McMains e Mullins (2014) esclarecem que as técnicas de escuta ativa


são fundamentais às negociações em crises policiais e, por esse moti-
vo, os operadores devem treiná-las e utilizá-las durante o processo de
diálogo com o causador. Os autores descrevem algumas técnicas de
escuta ativa voltadas para a área da negociação policial, as quais estão
relacionadas resumidamente no Quadro 1.

Quadro 1
Técnicas de escuta ativa

Resposta na qual o negociador, com suas próprias palavras, repete ao causador a essên-
cia da mensagem que este acabou de emitir. Demonstra que o negociador está atento
Paráfrase à fala do causador e entendendo suas colocações. Podemos começar a frase com “Pelo
que eu entendi...”.
Técnica que permite enquadrar um comportamento em palavras, por exemplo, após o
Nomear os causador esmurrar uma parede, o negociador fala: “Vejo que você está zangado, quer me
sentimentos dizer o que está acontecendo?”. Essa técnica auxilia o desenvolvimento do rapport entre
o negociador e o causador.
Resposta pela qual o negociador demonstra ao causador que realmente está compreen-
Reflexão de dendo os fatos e os sentimentos que ele está transmitindo. É usada para ajudar a identi-
significados ficar o que o causador precisa e para fortalecer a relação entre os interlocutores.
Depois de um período de negociação longo, esta técnica permite ao negociador resumir
Reflexão os principais fatos e sentimentos demonstrados pelo causador, lembrando-o dos pro-
resumida gressos positivos obtidos durante o processo de diálogo, desde o início da crise.

(Continua)

64 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Técnica utilizada para manter o causador conversando apenas com a utilização de pe-
Incentivos quenas palavras ao final de sua fala, tais como “sim..”, “entendi...”, “e...”, “uhum”. Acenos
mínimos com a cabeça e posição do corpo também podem incentivar o causador a continuar
falando.
Com o uso de questões abertas evitamos respostas apenas do tipo “sim” e “não” e se
Questões encoraja o causador a continuar falando e a contar sua história. Além disso, ao ter de
abertas elaborar suas respostas, o causador ocupa sua mente e possibilita ganho de tempo im-
portante durante o processo de negociação.
O negociador expressa suas emoções em resposta ao causador. Por exemplo, após um
ataque verbal do causador, o negociador pode dizer: “Sabe, fico frustrado quando você
Minha grita comigo”. O negociador está deixando sutilmente claro que a agressividade verbal do
mensagem causador não está ajudando a resolver a situação. A fórmula básica é “Eu me sinto ______
quando você ______ porque ______.”
Não dizer nada quando o causador terminar de falar pode encorajá-lo a preencher o
Silêncio e pau- espaço vazio com comunicados ou informações adicionais. Uma boa gestão do silêncio
sas efetivas pode encorajar o discurso.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Como visto, para que o processo de negociação se concretize, é


necessário que negociadores sejam muito bons ouvintes, pois um
dos componentes mais importantes da comunicação é a capacidade
de ouvir o outro. Numa situação de crise, momento em que vidas
estão em risco, os profissionais da negociação precisam entender
que a preservação das vidas envolvidas depende de seu empenho e,
principalmente, de sua habilidade em escutar positivamente o cau-
sador da crise.

3.3 Barreiras à comunicação e


Vídeo formas de contato

3.3.1 Barreiras à comunicação


Durante uma crise policial muita coisa acontece ao mesmo tempo.
A afinidade entre os profissionais empenhados nas mais variadas mis-
sões interfere positivamente no contato do negociador com o CEC, as-
sim como ingerências interferem negativamente na comunicação e no
gerenciamento da ocorrência como um todo.

Comunicação e negociação 65
3.3.1.1 Barreiras externas
São consideradas barreiras externas aquelas alheias à vontade do
receptor/emissor, conforme apresenta a Figura 4.

Figura 4
Exemplos de barreiras externas

kornn/Shutterstock Ruídos

Barulhos decorrentes de movimentações externas, como


trânsito, aglomeração de pessoas próximas do ponto crítico,
que podem ser resolvidos com a melhora no isolamento; e
aqueles cuja resolução se mostra dificultosa – é o caso dos
ruídos decorrentes de intempéries temporais, por exemplo.

Distância
HN Works/Shutterstock

Trata-se da distância entre negociador e CEC, decorrente da


localização e do posicionamento do causador no ponto
crítico, de quesitos de segurança que impedem a
aproximação da equipe de negociação, da dimensão do
espaço corporal e/ou de patologias do CEC.

Código
AVIcon/Shutterstock

Quando o código (linguagem) utilizado é desconhecido por


uma das partes, torna-se uma barreira na comunicação. O
CEC pode, por exemplo, utilizar um idioma desconhecido
pelo negociador ou LIBRAS (linguagem de sinais). Nesses
casos, a equipe de negociação deve buscar intérpretes
idôneos para que sejam utilizados como intermediários.

Complexidade da mensagem
Leremy/Shutterstock

Ocorre com a utilização de dialetos regionais, gírias ou


vocabulário próprio. Fato observado na negociação com
presos rebelados. Daí a importância de conhecer os
vocábulos utilizados por determinados grupos. A mesma
barreira poderá existir caso o negociador opte por uma
linguagem mais formal, como um vocabulário jurídico.

(Continua)

66 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Reservoir Dots/Shutterstock
Canal de comunicação

Está relacionado a equipamentos com defeito ou


escolha equivocada da melhor forma de contato. Esse
problema pode ser resolvido com a habilidade do
negociador na troca do equipamento e/ou mudança
do contato para outra forma disponível.

Competição de mensagens
TaLaNoVa/Shutterstock

Competição de mensagens das mais variadas formas


pode interferir na negociação. Diálogos paralelos entre
outros policiais, movimentação de efetivos, problemas
no isolamento são alguns exemplos de concorrência
para o negociador, que podem fazer com que o CEC
desvie sua atenção.

Fonte: Elaborada pelos autores.

As barreiras externas, então, são aquelas que independem do ne-


gociador e do CEC, por isso dizemos que são alheias às suas vontades,
entretanto, interferem negativamente no processo de comunicação.
Embora dependam de outros fatores, além daqueles intrínsecos ao re-
ceptor/emissor, todas as barreiras externas podem ser superadas total
ou parcialmente, com a diminuição da distância, a troca do canal de
comunicação ou a escolha de ambientes menos ruidosos, por exemplo.

3.3.1.2 Barreiras internas


As barreiras internas são as que estão ligadas diretamente ao con-
tato entre negociador e CEC, como mostra a Figura 5.

Figura 5
Exemplos de barreiras internas

Dificuldade de expressão
Leremy/Shutterstock

Dificuldade de o CEC se expressar, de ordenar suas


ideias, algumas vezes falando desconexamente,
principalmente quando é portador de algum
transtorno mental ou quando existe o consumo de
drogas, sejam elas ilícitas ou não.

(Continua)

Comunicação e negociação 67
Timidez

Timidez ou receio da exposição é uma barreira na

Leremy/Shutterstock
maioria das vezes observada nas crises que envolvem
CECs abalados emocionalmente em virtude de
descontentamentos familiares e afetivos (morte de
entes queridos, traição), problemas laborais ou
financeiros (perda de emprego, dívidas adquiridas)
e/ou tentativas de suicídio. Pessoas nessas condições
precisam ser constantemente estimuladas pelo
negociador, o qual deve compreender os motivos de
tal bloqueio.

Desinteresse ou desmotivação
Leremy/Shutterstock

Desinteresse ou desmotivação também se relacionam


com descontentamentos familiares e afetivos (morte de
entes queridos, traição), problemas laborais ou
financeiros (perda de emprego, dívidas adquiridas) e/ou
tentativas de suicídio e necessitam de incessante
provocação para o diálogo por parte do negociador.

Escolha do receptor
Leremy/Shutterstock

Em ocorrências com múltiplos CECs a escolha


inadequada do receptor pode trazer prejuízo à
comunicação. Exemplo facilmente detectado nas crises
com presos rebelados, em que vários querem falar ao
mesmo tempo, alguns mais tensos ou irritados que
outros, ou, ainda, quando é escolhido aquele que não
possui poder sobre os demais, com quem os acordos
estabelecidos não surtirão os efeitos desejados.

Escolha do momento

Escolha inadequada do momento para realizar os


Leremy/Shutterstock

contatos é um fator que precisa ser constantemente


avaliado pela equipe de negociação. As pausas
estabelecidas precisam ser respeitadas, bem como o
horário definido para novo contato precisa ser cumprido,
salvo em situações extraordinárias ocorridas nos
intervalos e que necessitem ser repassadas ao CEC ou
seja necessário mantê-lo em atividade.

(Continua)

68 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Uso excessivo de intermediários

Equipes de negociação menos experientes acabam


iconim/Shutterstock

criando barreiras à comunicação ao utilizar intermediários


de maneira excessiva. Com a intenção de solucionar a
crise, algumas equipes veem nos intermediários a ponte
para o desfecho da situação e acabam os utilizando
indiscriminadamente, fazendo com que o CEC não crie
vínculo com apenas uma pessoa (o negociador), mas eleja
aquela que melhor se encaixa em seus anseios, pois
conversou com inúmeras pessoas.

Distorções de mensagens
Leremy/Shutterstock

Muitas vezes, numa negociação podem surgir distorções


de mensagens, uma barreira para a negociação em
crises. Essas distorções podem ocorrer por omissão,
acréscimo ou abreviação de palavras; por conclusões ou
deduções; ou, ainda, pela diferente interpretação do
sentido das palavras.

Hostilidade
Leremy/Shutterstock

Hostilidade excessiva do CEC fará com que o negociador


exponha a dificuldade em conversar com ele e tente trazê-
lo para a tranquilidade, caso contrário, na existência de
múltiplos causadores, o negociador deve tentar direcionar
o contato a outra pessoa.

u Incoerência de comunicação
to !
Es o!!
Leremy/Shutterstock

lm
ca Uma pessoa coerente na comunicação é aquela que
adapta e sincroniza a linguagem verbal e não verbal com
os demais recursos disponíveis (tom de voz, por exemplo).
Nesse sentido, seria incoerente a pessoa que esbraveja a
frase “Estou muito calmo!” ou aquela que diz um “sim”
balançando a cabeça negativamente.

(Continua)

Comunicação e negociação 69
Preconceito

O preconceito continua sendo uma das principais

RedKoala/Shutterstock
barreiras internas à comunicação de modo geral.
Divergências de crenças e valores, juízos preestabelecidos
e familiaridades contribuem para isso. O negociador
precisa se despir de qualquer tipo de preconceito ante
uma negociação, pois poderá ser indagado a respeito,
devendo deixar clara sua neutralidade e que suas
opiniões não importam. O importante é a vida e a
integridade física de todos que ali estão.

Deficiência visual, auditiva e distúrbios da fala

Por fim, deficiência visual e auditiva e distúrbios da fala


grmarc/Shutterstock

farão com que a equipe de negociação busque a melhor


forma de contato com a pessoa com deficiência (PcD). A
adoção de bilhetes ou mensagens seria uma alternativa
para deficientes auditivos e surdos. Em contrapartida,
para os deficientes visuais poderia ser sugerido o
console de negociação, permitindo que o causador o
utilize em lugar que julgue seguro para si.

Fonte: Elaborada pelos autores.

Além de se relacionarem diretamente ao contato entre negociador e


CEC, as barreiras internas são aquelas, como o nome sugere, oriundas
de questões internas referentes ao receptor/emissor. Elas surgem de
problemas fisiológicos e/ou psicológicos e, também, podem estar vin-
culadas diretamente às crenças e ideais das partes em comunicação.
São muito difíceis de serem superadas e suas transposições dependem
diretamente da habilidade do negociador em contornar tais situações.

3.3.2 Formas de contato


Durante uma negociação, vários aspectos influenciam a escolha da
Desafio
forma como os contatos com o CEC serão realizados. A tipologia do
Na escolha da forma de conta- CEC; o armamento de que ele dispõe; a dimensão do ponto crítico; a
to a ser utilizado com o CEC,
qual fator deve ser observado distância entre as partes; a segurança; os equipamentos disponíveis; os
com maior atenção pela investimentos por parte da instituição; o momento específico do pro-
equipe de negociação? cesso de negociação são alguns critérios que interferem na forma de
contato utilizada.

70 Negociação e gestão de conflitos de segurança


3.3.2.1 Mensagem e bilhete
Os contatos realizados por mensagem e bilhete não são muito efi-
cazes por serem um tanto impessoais. A pessoa que redige, neste caso
o CEC, pode modificá-la diversas vezes antes de enviá-la. Em contrapar-
tida, a equipe de negociação poderá discutir antes de cada mensagem
enviada.

Por meio de mensagens ou bilhetes, perdemos aquelas afirmações


instintivas que podem revelar coisas importantes. Muitas emoções são
perdidas, pois não ouvimos a entonação da voz, se existe embargo,
irritação ou amenidade na fala. Sem falar da linguagem não verbal, que
é inexistente.

Normalmente são utilizados durante os contatos iniciais em razão


de desconfianças por parte do CEC no que se refere a sua própria expo-
sição. Caberá ao negociador, caso inicie a negociação por esse método,
migrar para outro tipo de contato mais proveitoso.

3.3.2.2 Megafone
Geralmente é utilizado quando existe dificuldade de aproximação,
problemas de segurança ou barreiras à comunicação, sejam físicas ou
derivadas de ruídos. Essa forma de contato acaba se tornando mais
impessoal que as mensagens ou bilhetes, uma vez que o CEC ouve o
negociador, porém o contrário não acontece.

Também é muito utilizado nos primeiros contatos para expor a ne-


cessidade de aproximação, acordadas as condições de segurança, ou
até cessarem os ruídos que comprometam o diálogo.

3.3.2.3 Cobertura
Entendemos por cobertura o anteparo que oferece proteção balísti-
ca à equipe de negociação. Muros, paredes, postes de concreto, blocos
de motores de automóveis e veículos blindados são alguns exemplos
de cobertura, ao passo que uma pessoa estará encoberta quando não
pode ser visualizada, ou seja, cortinas, tapumes, biombos e vegetação
densa exemplificam essa situação. Uma pessoa pode estar coberta
atrás de um vidro blindado e não estar encoberta, pois sua visualização

Comunicação e negociação 71
é possível. Desse modo, o negociador poderá negociar por meio de
coberturas e, nesse caso estará em segurança, porém, com dificuldade
em interpretar a linguagem não falada (postura corporal, gestos, ex-
pressões faciais etc.).

3.3.2.4 Face a face


A negociação face a face sem sombra de dúvidas é a forma de con-
tato mais utilizada no Brasil. O fator cultural é preponderante para essa
afirmação, no entanto, algumas instituições acabam minimizando as-
pectos de segurança em prol do diálogo com o causador, o que jamais
deve ser feito.

A equipe de negociação deve permanecer em segurança, com a uti-


lização de escudos balísticos e sob constante cobertura do grupo de
intervenção e dos atiradores de precisão, que delimitam a área de se-
gurança para o contato.

No que se refere ao processo de negociação, é a forma de contato


mais eficaz, pois permite a utilização da linguagem verbal e não verbal
por ambas as partes. Quanto à comunicação, pouca coisa se perde de-
vido ao frequente contato visual. É preciso dar atenção especial para o
espaço corporal do CEC, às vezes um passo adiante pode comprometer
todo o processo, portanto cada ação deve ser descrita minuciosamente
ao CEC e um acordo inicial de não agressão mútua deve ser estabe-
lecido, garantindo que o diálogo permanecerá sem problemas e que
outras atitudes não serão necessárias.

O negociador secundário precisa ser cauteloso no auxílio ao nego-


ciador principal para que tal ação não seja mal interpretada pelo CEC. A
utilização de um bloco de notas composto de pequenas folhas de papel
adesivo com as orientações escritas cumpre bem esse papel.

3.3.2.5 Rádio ou telefone


Em comparação com outras formas de contato, a utilização de rádio
ou telefone é muito mais eficaz que mensagens, bilhetes ou megafone,
pois permite a constante avaliação do retorno imediato por parte do
CEC e, algumas vezes, a comunicação entre os integrantes da equipe de

72 Negociação e gestão de conflitos de segurança


negociação. Contudo, acaba sendo menos eficiente que o contato face
a face pela perda da comunicação não verbal. Com relação à seguran-
ça, é uma das formas de contato mais seguras em virtude da possibili-
dade de manter distância do ponto crítico e, inclusive, permanecer em
outras instalações.

O ponto negativo desse tipo de contato é a dificuldade em manter


o CEC completamente isolado. Uma crise isolada é aquela em que o
causador não tem nenhuma forma de contato com o mundo externo,
estimulando sua dependência pelo negociador, que é quem lhe ouvirá
e lhe dará todos os retornos de que precisa.

Nesse contexto, o isolamento completo de uma crise (corte de ener-


gia, telefone, bloqueio de sinais) torna-se tarefa difícil na atualidade. Se
o contato com o negociador é realizado por telefone, nos momentos de
pausa na negociação outras pessoas poderão contatar o CEC e interfe-
rir no processo negocial.

3.3.2.6 Console de negociação


O console de negociação, vulgarmente chamado de maleta de nego-
ciação, é a melhor forma de contato entre negociador e CEC. Necessita
de investimento por parte da instituição policial para a aquisição de tal
equipamento, o qual, por suas características, permite uma negocia-
ção tão eficaz quanto a face a face e tão segura quanto o contato por
telefone.

Composto de diversos elementos, o equipamento possui um con-


sole central pelo qual o negociador, por meio de fones com microfone,
estabelecerá contato. Na outra extremidade há um case para arremes-
so que comporta um telefone para que o CEC se comunique.

Independentemente da forma de contato adotada pelo negociador


durante a ocorrência crítica, sua experiência, seu treinamento e em-
penho serão os diferenciais na busca pelo resultado aceitável da crise,
ou seja, com todas as vidas no ponto crítico preservadas. Portanto, o
processo de negociação policial, que utiliza como base os princípios
da comunicação, é uma ferramenta extremamente importante para
a preservação das vidas humanas em risco, em diversos contextos e
situações.

Comunicação e negociação 73
Artigo

https://www.revistarazonypalabra.org/index.php/ryp/issue/view/17

O artigo As habilidades de comunicação e negociação do gestor facilitador, dos


autores Perez e Aranha, publicado na revista Razón y Palabra, em 2017, foca
a integração das habilidades de comunicação oral, não oral, estratégica e
efetiva, desenvolvidas por gestores, com a negociação, buscando alicerçar a
confiança entre os envolvidos. Além disso, mostra os benefícios dessas habili-
dades, por meio da comunicação efetiva, e de que forma o uso da tecnologia
pode impactar a comunicação e a negociação.

Acesso em: 1 dez. 2019.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste capítulo, ao relacionarmos comunicação e negociação, denota-
mos a necessidade do conhecimento de técnicas de contato por parte
do negociador, evidenciando que o bom comunicador é aquele que sabe
ouvir, compreender a mensagem que lhe é repassada e demonstrar tal
compreensão, recebendo e fornecendo feedback.
Da boa comunicação, alicerçada na empatia e escuta ativa, nasce o
rapport como importante vínculo entre negociador e causador. Essa co-
municação pode ser comprometida por algumas barreiras e influenciada
pelo tipo de contato estabelecido entre as partes, explicitando a interde-
pendência dos diversos fatores aqui abordados, os quais precisam ser
manejados tecnicamente visando a uma boa comunicação e, consequen-
temente, a um acordo proveitoso para os envolvidos e ao encerramento
da crise.

REFERÊNCIAS
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ArtMed, 2010.
CABRAL, A.; NICK, E. Dicionário técnico de psicologia. São Paulo: Cultrix, 2006.
FAUAT, A. M.; COSTA, S. M. de S. Comunicação organizacional e padrões de comportamento
informacional de gestores e analistas de risco de crédito em instituições financeiras
governamentais. In: COSTA, S. M. S.; LEITE, F. C. L.; TAVARES, R. B. (orgs.). Comunicação da
informação, gestão da informação e gestão do conhecimento. Brasília: Ibict, 2018. p. 67-87.
FBI. Training Academy. 2019. Disponível em: https://www.fbi.gov/services/training-
academy. Acesso em: 3 dez. 2019.
GREENSTONE, J. L. The Elements of police hostage and crisis negotiations: critical incidents
and how to respond to them. New York: Routledge, 2005.

74 Negociação e gestão de conflitos de segurança


MCMAINS, M. J.; MULLINS, W. C. Crisis negotiations: managing critical incidents and hostage
situations in law enforcement and corrections. 5. ed. Waltham: Anderson Publishing, 2014.
O’CONNOR, J.; SEYMOUR, J. Introdução à programação neurolinguística: como entender e
influenciar pessoas. São Paulo: Summus, 1995.
OLIVEIRA, O. E. “Você sabe com quem está falando?”: usando a programação neurolinguística
na aplicação da lei. João Pessoa: Ideia, 2017.
SALIGNAC, A. O. Negociação em crises: atuação policial na busca da solução para eventos
críticos. São Paulo: Ícone, 2011.
SCHAFER, J.; KARLINS, M. Manual de persuasão do FBI. São Paulo: Universo dos Livros, 2015.
SILVA, M. A.; SILVA, L. F.; RONCAGLIO, O. L. Negociação em crises policiais – teoria e prática.
2020. No prelo.
WEBSTER, M. Do crisis negotiators practice what they preach? Crisis negotiator, v. 3, n. 4.
Phoenix, AZ: NTOA, 2003. p. 10-12.
WEISS, J. Negociações eficazes. Rio de Janeiro: Sextante, 2018.

GABARITO
1. De acordo com O’Connor e Seymour (1995), em uma comunicação face a face, ou seja,
aquela em que receptor e emissor se observam, 55% das reações relacionam-se à
comunicação não verbal (gestos, roupas, posicionamento corporal, expressões faciais),
38% relacionam-se aos sons que envolvem a conversa (tonalidade de voz, velocidade
da fala, ruídos concorrentes com o diálogo) e apenas 7% referem-se às palavras ditas
pelo emissor. Sendo assim, 93% da comunicação é dependente de fatores distintos,
que vão melhor significar a fala e facilitar a compreensão e assimilação pelo receptor.

2. Para uma boa comunicação, aquela em que se espera resultados positivos, as partes
evolvidas (emissor e receptor) precisam estar conectadas, vinculadas. Denominamos
essa vinculação de rapport. A empatia é o principal fator gerador do rapport, pois o
comunicador se esforça para compreender o posicionamento e as ideias do outro
e, com o mesmo esforço, consegue demonstrar essa compreensão, construindo
conexões sólidas e ganhando a confiança da outra parte.

Desafio

O principal fator a ser observado pela equipe de negociação, no momento da escolha da forma de contato com
o CEC, é a segurança. Os negociadores precisam estar protegidos para trabalhar. É evidente que, ao eleger deter-
minados tipos de contato, podemos perder o contato visual com o CEC e com o local em que ele está inserido,
acarretando prejuízos na coleta de informações. Todavia, esses fatores não devem ser priorizados em detrimento
da segurança da equipe.

Comunicação e negociação 75
4
Gestão de conflitos
Este capítulo tratará das peculiaridades da gestão de conflitos
na área da Segurança Pública. Primeiramente serão apresentadas
as características dos conflitos, passando por sua conceituação e
diferenciação do termo violência. Para o entendimento desse fenô-
meno humano, também será feito um estudo sobre suas causas,
tipos e interações.
Na sequência, será explorado o processo de evolução da ges-
tão de conflitos no tempo, destacando sua importância e situando-
-o na atualidade. Por fim, serão apresentados os métodos usuais
para a administração dos conflitos e como o profissional de Se-
gurança Pública atua nessa tão importante área de resolução de
problemas.

4.1 Características dos conflitos


Vídeo Conflito é um desentendimento entre pessoas (duas ou mais) sobre
determinado tema, cujos interesses circundam o mesmo assunto em
específico. Silva (2002, p. 116) explana que a palavra tem sua origem
no “latim conflictu, conflito, choque, luta, bater uma coisa em outra. Sua
formação também alude ao particípio conflectum, do verbo conflere,
chorar junto”.

O dicionário de psicologia da APA (AMERICAN PSYCHOLOGICAL


ASSOCIATION, 2010, p. 214) define conflito, na área das relações inter-
pessoais, como “a discordância, discórdia ou atrito que ocorre quando
as ações ou crenças de um ou mais indivíduos são inaceitáveis para os
outros, que resistem a elas”.
Glossário
É errôneo afirmar que todo conflito é contraproducente. Na maio-
contraproducente: não ria das vezes até pode ser, uma vez que as partes podem se desencon-
produtivo, que produz efeitos
indesejados. trar na busca por interesses antagônicos que coexistem dentro de uma
mesma pauta. No entanto, alguns conflitos podem ser benéficos, prin-

76 Negociação e gestão de conflitos de segurança


cipalmente aqueles em que os envolvidos apresentam ideias comuns,
porém com diferentes projeções para alcançá-las.

Garbelini (2016) expõe que a origem dos conflitos se confunde com


a origem da convivência em sociedade, em virtude das necessidades
humanas e das consequentes divergências de ideias e opiniões, fazen-
do, assim, parte do processo evolutivo da humanidade. Logo, podemos
dizer que a vida social aflorou os conflitos e exigiu do homem o desen-
volvimento de uma capacidade de gerenciamento para tais divergên-
cias, visando à manutenção das relações em sociedade.

Sendo assim, para Dorecki (2017, p. 18), “os conflitos desencadeiam


discussões, choques e até mesmo lutas e guerras; por outro lado, po-
dem ensejar soluções e, em alguns casos, evolução de um cenário”.
Garbelini (2016, p. 23) complementa que
o conflito surge quando existem interesses e visões antagôni-
cas entre vários indivíduos, equipes ou organizações, gerando,
muitas vezes, sentimentos de estranheza e hostilidade entre as
partes, até que a situação seja resolvida. Nesse processo, as par-
tes veem-se como oponentes e concorrentes até que haja uma
resolução do foco gerador.

Logo, os conflitos fazem parte da evolução humana e podem de-


sencadear atritos, bem como direcionar soluções ou canalizar boas
práticas.

4.1.1 Conflito X violência


Talvez seja senso comum associarmos conflito à violência, uma vez
que, de acordo com o dicionário Michaelis (TREVISAN, 2015), algumas
possíveis definições para a palavra conflito são: oposição violenta, cho-
que, colisão, luta, encontro violento, guerra ou briga.

Contudo, é necessário distinguir o conflito em sua essência, com as


possibilidades de resposta apresentadas à ação conflituosa.

O conceito de conflito como sendo um desentendimento entre pes-


Atividade 1
soas, para alguns, poderia ensejar uma briga, já que as pessoas não
estão em sintonia, mas esse desentendimento, por si só, é insuficiente Conflito é o mesmo que briga?
Todo conflito é prejudicial?
para vincularmos o conflito a uma ação de violência. Pessoas podem se
desentender de modo pacífico.

Gestão de conflitos 77
Moreira (2011, p. 33) ensina que “a palavra violência vem do latim
vis, que significa força, vigor, potência. Assim, em sua herança etimoló-
gica, a ideia de violência contém elementos essenciais a todo ser, como
o vigor e a potência”.

Para conceituar violência, com o objetivo de diferenciá-la de


conflito, invocamos novamente o dicionário de Psicologia da APA
(AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION, 2010, p. 1018), que a de-
fine como “a expressão da hostilidade e raiva com a intenção de ferir
ou prejudicar pessoas ou propriedade através da força física, paixão ou
intensidade de emoções ou declarações”.

Portanto, a briga, como os atos violentos em geral, é uma possibili-


dade que as partes conflituosas podem utilizar para responder e tentar
resolver um conflito. Infelizmente, é comum observarmos desenten-
dimentos no trânsito geradores de embates com luta corporal. Nesse
caso, as partes, ou ao menos uma delas, escolheu essa medida para
“resolver” o conflito.

A violência, entendida como uma forma de agressão, deve ser disso-


ciada da essência do conceito de conflito, com o qual, invariavelmente,
está vinculada, em decorrência de sua banalização e da popularização
imprecisa, principalmente na área da Segurança Pública. Isto posto,
concordamos com Moreira (2011, p. 40), que explica que “a violência
no conflito representa um instrumento de interação entre os agentes”.

Se os recursos violentos são uma das formas de resposta ao con-


flito, quais seriam as outras? A resposta para essa questão é o fator
motivador deste capítulo, e, logo mais, na próxima seção, discutiremos
os métodos de gestão de conflitos.

4.1.2 Causas dos conflitos


Podem ser inúmeras as motivações para os conflitos, como peque-
nas divergências entre irmãos sobre a escolha de um brinquedo; um
casal que não entra em acordo em relação ao programa de televisão;
discussões de trânsito; desacordos comerciais entre consumidor e
prestador de serviço; entraves trabalhistas; manifestações sociais; gre-
ves; discussões políticas etc.

78 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Nascimento e El Sayed (2002) apontam que, para uma gestão de
conflito adequada, é fundamental o conhecimento de suas possíveis
causas. De um modo geral, citam as seguintes:
•• Experiência de frustração de uma ou ambas as partes: algum
tipo de interferência ou limitação pessoal, técnica ou comporta-
mental pode gerar incapacidade para o atingimento de metas ou
satisfação de desejos, estimulando o conflito;
•• Diferenças de personalidade: geram desavenças nos ambien-
tes sociais (familiar ou de trabalho), principalmente quando aflo-
ram características indesejáveis de modo a afetar a outra pessoa
envolvida;
•• Existência de metas diferentes: tensões se tornam evidentes
na busca por resultados a serem atingidos quando há estabeleci-
mento de metas diferentes para pessoas que atuam em um mes-
mo ambiente, por exemplo, o de trabalho;
•• Diferenças em termos de informações e percepções: cada
pessoa tem um ponto de vista ou um olhar particular sobre as
questões propostas; o conflito ocorre quando não se leva em
conta que a outra parte pode ter uma forma diferente de ver e
analisar as coisas.

Sob outra ótica, Dorecki (2017) sugere que as razões para conflitos,
relacionadas à Segurança Pública, confundem-se com as causas de tu-
multos e de distúrbios civis, sendo, nesse caso, elencadas conforme
mostra o Quadro 1.

Quadro 1
Causas dos conflitos relacionados à Segurança Pública

Sociais
Leremy/Shutterstock

Aquelas decorrentes de conflitos raciais, religiosos,


motivadas por eventos esportivos ou ainda relacio-
nadas a preconceitos.

Políticas
Leremy/Shutterstock

Possuem motivação ideológica, desencadeando


conflitos de grandes proporções, podendo atingir
diretamente o governo.

(Continua)

Gestão de conflitos 79
Alex Blogoodf/Shutterstock
Consequentes de calamidades públicas

Motivadas por catástrofes naturais ou acidentes de


grandes proporções.

Econômicas
IhorZigor/Shutterstock

Má distribuição da renda; desequilíbrio econômico


entre regiões; divergências trabalhistas; desacordos
comerciais.

Decorrentes da omissão ou falência das


Leremy/linear_design/
Shutterstock

autoridades constituídas

Relacionadas ao descrédito atribuído às autorida-


des, em virtude da inoperância ou total ausência
do Estado no exercício de suas atribuições.

Fonte: Elaborado pelos autores com base em Dorecki, 2017, p. 20-23.

Por isso, o conhecimento dos fatores que motivam os conflitos


torna-se imprescindível ao profissional de segurança pública na esco-
lha da melhor forma de intervenção, de acordo com o caso.

4.1.3 Tipos de conflitos


Ao longo do tempo, várias tipologias sobre o fenômeno do conflito
foram elaboradas. Estudiosos no assunto se dispuseram a relacionar
suas características e fatores desencadeantes, catalogando-os para fa-
cilitar seu entendimento. Apresentaremos a tipologia encontrada em
Dorecki (2017), adaptada para a atividade de Segurança Pública. Para o
autor, os conflitos podem ser divididos em:
•• Conflito evidente: existe de fato e é percebido de maneira real
e objetiva, por exemplo, quando vizinhos promovem uma dispu-
ta acerca dos limites territoriais de suas propriedades. Caso não
haja entendimento e cooperação mútua entre as partes para a
resolução do impasse, esses conflitos são difíceis de serem resol-
vidos amigavelmente, terminando muitas vezes na esfera judicial.

80 Negociação e gestão de conflitos de segurança


•• Conflito eventual: quando as partes não percebem ou não reco-
nhecem recursos alternativos para a resolução do impasse, man-
tendo, desse modo, o conflito real. Por exemplo, uma discussão
entre vizinhos em virtude da utilização de música em alto volume
por parte de um deles. Caso não haja entendimento entre os con-
flitantes para um acordo, principalmente por tensões já preesta-
belecidas, é um tipo difícil de se resolver. Invariavelmente, forças
policiais serão chamadas.
•• Conflito reivindicatório: nesse caso, uma das partes se manifes-
ta de modo a ser percebida efetivamente, pressionando a outra
parte para que esta tome medidas de seu interesse ou favorável
a seu grupo. Na área da Segurança Pública, são bastante comuns
as manifestações de cunho reivindicatório, momento em que
grupos de pessoas ligadas por questões comuns agem para exi-
gir das autoridades públicas ações imediatas para a resolução de
problemas, como a obstrução de uma via perigosa para exigir a
implantação de uma lombada na pista e, assim, diminuir o risco
de atropelamentos no local.
•• Conflito equivocado: nesse tipo, o conflito se dá, geralmente, so-
bre questões equivocadas, havendo engano quanto ao seu obje-
to e em relação às percepções sobre seu real objetivo. Tal engano
pode ser inconsciente ou criado para que alguém ou um grupo
de pessoas ganhe alguma vantagem com o enfrentamento. Por
exemplo, quando sindicalistas fomentam uma greve de determi-
nada classe de trabalhadores para obtenção de vantagens para
si próprios e não para os operários, os quais são manipulados e
usados como massa de manobra.
•• Conflito oculto: ocorre quando uma das partes aparenta não
estar vivenciando o conflito de maneira consciente, ou seja, da
maneira como deveria, tendo em vista ele ter sido reprimido ou
encoberto. Um exemplo, na área da Segurança Pública, é o fato
de uma mulher, vítima de constantes abusos e agressões por par-
te do seu companheiro, não o denunciar por considerar tal con-
duta como algo natural e inerente à figura masculina, a qual deve
suportar para o bem dos filhos.
•• Conflito suposto: é um conflito falso, ou seja, em que houve
uma percepção errônea ou interpretação equivocada sobre ele,
não havendo fundamentos para sua existência. Como exemplo,
na área de Segurança Pública, podemos citar o caso de uma víti-

Gestão de conflitos 81
ma de roubo que reconhece e acusa a pessoa errada pelo crime,
considerando apenas a vestimenta similar à do verdadeiro crimi-
noso. Com a apresentação de outros recursos disponíveis, como
provas, imagens, depoimento de outras testemunhas, o equívoco
pode ser desfeito. Um conflito pode, obviamente, iniciar-se como
falso, mas expor novos motivos e comportamentos que o trans-
formem em verdadeiro, bastando uma análise mais apurada.

Os tipos de conflitos não se excluem. Deutsch (2004, p. 39) esclarece


ainda que “em qualquer situação de conflito, a interação entre as par-
tes envolvidas pode transformá-lo de um tipo em outro”. Assim, pode
haver um conflito evidente sobre uma questão, um conflito equivocado
sobre outra, e percepções incorretas em relação a várias das questões
conflituosas.

Dessa maneira, é importante que os gestores de conflitos reco-


nheçam cada tipo de desacordo para que possam traçar as estra-
tégias necessárias e adequadas para a busca do esperado acordo
entre as partes conflitantes.

4.1.4 Interações humanas e conflitos


Chiavenato (2014) expõe quatro níveis de abrangência dos conflitos
relacionados às interações entre os indivíduos. O nível organizacional
refere-se aos conflitos generalizados dentro de uma instituição; o nível
intergrupal caracteriza-se pelos conflitos advindos de divergências ou
oposição de interesses entre grupos de pessoas; o terceiro nível evi-
dencia os conflitos interpessoais; e o quarto nível trata dos conflitos
internos, em que a pessoa está conflitante consigo mesma, é chamado
de nível intraindividual.

Para a Segurança Pública, essas quatro formas de interações po-


dem ser admitidas, no entanto, algumas delas merecem destaque, em
virtude da probabilidade e frequência com que ocorrem, bem como
dos reflexos que podem gerar. Sobre as interações humanas e os con-
flitos, Deutsch (2004, p. 34) escreve:
o conflito previne estagnações, estimula interesse e curiosida-
de, é o meio pelo qual os problemas podem ser manifestados
e no qual chegam as soluções, é a raiz da mudança pessoal e
social. O conflito é frequentemente parte do processo de tes-
tar e de avaliar alguém e, enquanto tal, pode ser altamente
agradável, na medida em que se experimenta o prazer do uso

82 Negociação e gestão de conflitos de segurança


completo e pleno da sua capacidade. De mais a mais, o con-
flito demarca grupos e, dessa forma, ajuda a estabelecer uma
identidade coletiva e individual; o conflito externo geralmente
fomenta coesão interna.

As interações intergrupais geralmente possuem causas sociais ou


políticas e se caracterizam pela formação de grupos facilmente identifi-
cados, seja pela indumentária, seja pela postura que adotam, que pode
conflitar com grupos divergentes. Como exemplo citamos as torcidas
organizadas de equipes esportivas, os movimentos partidários, os gru-
pos com posicionamento racista, os grupos religiosos e/ou seguidores
de determinada doutrina.

Talvez a forma de conflito mais comum, as interações interpessoais


merecem relevância devido às inúmeras motivações que podem apre-
sentar. Basta imaginarmos um assunto qualquer para, na sequência,
pensarmos em um possível conflito entre duas pessoas. Uma discus-
são entre vizinhos, o som alto na praia, a “fechada” no trânsito, a pro-
cura de uma mesa livre na praça de alimentação, os filhos discutindo
na sala, o troco errado no supermercado etc. Em todas essas situações
pode ser necessária a atuação de um agente de Segurança Pública.

Para ilustrar e facilitar o entendimento da dimensão do problema,


vale expor o trabalho realizado por Otávio Lúcio Roncaglio, por inter-
médio da Equipe de Negociação do BOPE/PMPR, com os Centros de 1
1
Socioeducação (Censes) do Paraná, no ano de 2018, em que foram Os Censes são estabelecimentos
elencadas as seguintes possibilidades de interações interpessoais ge- destinados ao cumprimento
de medidas socioeducativas
radoras de conflitos nas unidades:
(liberdade assistida, prestação
•• profissional e adolescente; de serviço à comunidade,
advertência, semiliberdade
•• adolescente e adolescente; e internação) a adolescentes
•• profissional e familiar do adolescente; que cometem atos infracionais
pertencentes à Secretaria de
•• adolescente e familiar do adolescente; Justiça, Família e Trabalho do
estado do Paraná.
•• profissional e profissional;
•• profissional e outras instituições.

Os conflitos intraindividuais também exigem atenção por parte das


instituições de Segurança Pública, uma vez que podem estar relaciona-
dos a abalos emocionais, transtornos mentais (depressão e transtor-
nos de humor) ou uso de entorpecentes, e, por isso, serem estopins
para ocorrências de tentativa de suicídio e até mesmo desencadeado-
res de situações de interações interpessoais.

Gestão de conflitos 83
4.1.5 A gestão de conflitos no tempo
A gestão de conflitos é um processo de interação humana. Inde-
pendentemente da forma e qualidade com que as pessoas interagem,
existe a necessidade de relacionamento entre as partes. Esse relaciona-
mento pode ser muito breve, somente durante o período conflituoso,
ou então extremamente longo, quando já existe algum tipo de vínculo
anterior ao conflito, e existirá posterior a ele. Assim, a evolução do pro-
cesso de gestão de conflitos aponta como principal fator o envolvimen-
to entre as partes.

No passado, o foco era o problema gerador do conflito e sua con-


sequente resolução, uma vez que os conflitos eram considerados ruins
e contraproducentes, sendo necessária sua eliminação (GARBELINI,
2016). Essa afirmação era facilmente observada quando se tratava dos
métodos de resolução de conflitos. O termo resolução demonstrava
que o foco era extinguir o problema.

As pessoas e os relacionamentos interpessoais são a base dos


métodos de gestão de conflitos na atualidade. Ao substituirmos re-
solução por gestão, objetivamos as pessoas e as relações entre si, tor-
nando a resolução do problema uma consequência do processo. A
Figura 1 representa a mudança de foco na gestão de conflitos com o
passar dos anos.

Figura 1
Mudança no foco dos conflitos

Resultado do problema Pessoas


(objeto do conflito) (relacionamento interpessoal)

Fonte: Roncaglio, 2017.

Pode ser que em alguns conflitos, aqueles instantâneos e gerados


ao acaso, os envolvidos possam nunca mais se encontrar e, assim, o
relacionamento entre eles não pareça tão importante. Todavia, grande
parte dos conflitos ocorre com pessoas que fazem parte do cotidiano
umas das outras – no trabalho, na faculdade, na vizinhança, nas insti-

84 Negociação e gestão de conflitos de segurança


tuições etc. Nesses casos, o relacionamento pós-conflito torna-se inevi-
tável, pois as pessoas se encontrarão no futuro e terão de se relacionar,
por mais que seja o mínimo possível e aceitável para elas.

Nesse contexto, Robbins (2002 apud GARBELINI, 2016, p.26) apre-


senta três abordagens para a evolução do processo de gestão de
conflitos.
Visão tradicional: todo conflito era considerado ruim e, portan-
to, deveria ser evitado. O conflito era visto como uma caracterís-
tica negativa no processo administrativo, sendo, por essa razão,
contraproducente e resultante de falhas na comunicação e de
falta de confiança entre as pessoas; portanto, poderia ser decor-
rente de uma falha dos administradores ao gerir as necessidades
e aspirações de seus funcionários.
Visão das relações humanas: o conflito é percebido como
uma consequência natural e inevitável quando existem pesso-
as com ideias, necessidades e atitudes diferentes trabalhando
no mesmo ambiente. Nessa visão, os conflitos são inerentes às
relações sociais, não sendo necessariamente ruins; podem ser
considerados uma força positiva que impulsiona o desempenho
do grupo e da produtividade.
Visão interacionista: é a abordagem mais recente, para a qual,
além de uma força positiva, o conflito é considerado necessá-
rio ao desempenho eficaz de um grupo e, consequentemente,
para a organização, impulsionando a criatividade e a inovação,
aumentando, assim, a produtividade.

Podemos destacar, então, que os conflitos vêm sendo encarados de


maneira distinta do que no passado. Com a existência de conflitos, des-
de que bem administrados, são possíveis ganhos em níveis pessoais e
institucionais, tudo graças à mudança de foco observada com o passar
do tempo.

4.2 Métodos de gestão de conflitos


Vídeo Apresentaremos quatro métodos de gestão, ou administração, de
conflitos. Cada um com características próprias e com formas distin-
tas de interação entre os atores envolvidos, sejam aqueles conflitantes,
sejam os que conduzem o processo. São eles: negociação, arbitragem,
conciliação e mediação.

Gestão de conflitos 85
Garbelini (2016) esclarece que, das quatro estratégias citadas, a ne-
gociação é a única que não precisa envolver uma terceira pessoa, pois o
Site conflito deve ser resolvido com um acordo entre as partes. Já as demais
Na página da Escola Nacio- envolvem a participação, ainda que de modo não tão ativo, de um ter-
nal de Prevenção e Solução
de Conflitos (Enapres), su- ceiro para auxiliar no processo em busca de acordo.
bordinada à Secretaria Na-
cional de Justiça (Senajus) Além disso, são considerados métodos alternativos para a solução
e ao Ministério da Justiça e de conflitos que não envolvem o Poder Judiciário. É importante salien-
Segurança Pública, é pos-
sível encontrar materiais tar que, para a execução dos papéis de conciliadores, mediadores ou
pedagógicos, didáticos e árbitros, há a necessidade de formação adequada para a atividade. No
pesquisas acadêmicas so-
bre meios alternativos de caso da negociação no âmbito policial, também há formação específica,
solução de conflitos. Essa sendo este um pré-requisito ao operador da área.
escola é uma ferramen-
ta que tem o objetivo de
fornecer capacitações e
treinamentos para o de- 4.2.1 Negociação
senvolvimento de técnicas
de solução pacífica de con- É um processo de tomada de decisões para se atingir um consenso
flitos por meio de cursos entre duas partes. Trata-se do único método de gestão de conflitos em
gratuitos, presenciais e a
distância. que as partes conflitantes interagem sozinhas para administrar o pro-
Disponível em: https://www.justica. blema, sem a presença de um terceiro que conduza o embate.
gov.br/seus-direitos/politicas-de-
-justica/enam-2017. Acesso em: 16 Oliver (2014, p. 11) afirma que a “negociação é uma transação na
dez. 2019. qual ambas as partes têm a possibilidade de vetar o resultado final.
Ela requer o consentimento voluntário de ambas as partes”. Podemos
dizer que a negociação é um processo de dar e receber, em que as di-
vergências são resolvidas por consenso.

Na Figura 2, as letras X e Y ilustram cada uma das partes inseridas


no processo negocial.

Figura 2
Esquematização do processo de negociação

X Y
Fonte: Elaborada pelos autores com base em Senasp/MJ, 2009, p. 16.

O negociador necessita possuir várias habilidades para o desempe-


nho de seu papel. Weiss (2018, p. 11) explicita que “os melhores nego-
ciadores – os que com frequência obtêm o que querem – são os mais
bem preparados e os mais criativos”.

86 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Esse mesmo autor desenvolveu uma ferramenta para auxiliar o
processo negocial denominada Sete Elementos (WEISS, 2018). São eles:
interesses, opções, critérios, alternativas, compromissos, comunicação
e relacionamento. Assim, tanto na área policial – em que se busca a
solução para um grave impasse com riscos às vidas –, como na área
empresarial, a meta de acordo buscada pelo negociador deve:
•• Satisfazer os principais interesses de todos (os seus e os da
outra parte);
•• Ser a melhor de diversas opções;
•• Obedecer a critérios justos e legítimos;
•• Ser melhor que as alternativas;
•• Ser feita de compromissos claros e viáveis;
•• Resultar de uma comunicação eficaz;
•• Ajudar a criar o tipo de relacionamento que o negociador dese-
ja. (WEISS, 2018, p. 20, grifos do original)

Desta maneira, a negociação é uma excelente ferramenta para a


solução de conflitos, pois o resultado satisfatório é buscado entre as
partes, sem a interferência de terceiros.

4.2.2 Arbitragem
O processo arbitral, regulado pela Lei Federal n. 9.307, de 23 de se-
tembro de 1996 (BRASIL, 1996), é muito semelhante ao processo judi-
cial. Nele as partes, em comum acordo e por livre vontade, escolhem o
árbitro, que não é um juiz e deve ser especialista na área ou tema em
que reside o conflito. Ele toma uma decisão sobre o conflito após ouvir
as partes, que não se comunicam.

É obtido, portanto, um resultado e o conflito pode ser encerrado


após o processo arbitral, contudo, o relacionamento entre as partes
pode sair prejudicado, uma vez que o árbitro precisa tomar partido ba-
seando-se no que ouviu de cada lado.

Na Figura 3, as letras X e Y ilustram cada uma das partes inseridas no


processo arbitral, e a letra A representa o terceiro envolvido, o árbitro.

Gestão de conflitos 87
Figura 3
Esquematização do processo de arbitragem

X Y
Fonte: Elaborada pelos autores com base em Senasp/MJ, 2009, p. 16.

Garbelini (2016) esclarece que a arbitragem é um método adequado


para soluções rápidas de conflitos, principalmente entre organizações
Glossário e seus colaboradores ou entre outras organizações, considerando o
morosidade: vagarosidade, fato de estar fora do Poder Judiciário, com sua morosidade peculiar.
demora.
Nesse método, as partes controlam o processo, o que pode gerar so-
luções baseadas apenas no princípio da equidade, sem aplicação de
nenhuma lei ao caso.

4.2.3 Conciliação
A conciliação, assim como a arbitragem, é uma forma de resolução
administrada por um terceiro com autoridade decisória.

Nesse método as partes relacionam-se entre si com a administra-


ção do conciliador, o qual sugere e elabora propostas, além de apontar
vantagens e desvantagens no ponto de vista de cada um, tudo para
auxiliar as partes a chegarem a um consenso.

O denominado conciliador incentiva o relacionamento proveitoso


dos envolvidos, contudo, na inexistência de acordo, esse decide sobre
o conflito. Sendo assim, a busca pela melhora na relação entre as pes-
soas fica em segundo plano.

88 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Na Figura 4, as letras X e Y ilustram cada uma das partes inseridas
no processo de conciliação, e a letra C representa o terceiro envolvido,
o conciliador.

Figura 4
Esquematização do processo de conciliação

X Y
Fonte: Elaborada pelos autores com base em Senasp/MJ, 2009, p. 16.

Durante o processo de busca para a solução do conflito, o conci-


liador faz sugestões, interfere nas conversações e oferece conselhos,
sempre induzindo as partes ao acordo, diferentemente do processo
de mediação. A conciliação, portanto, procura minimizar as perdas
potenciais de uma negociação que entrou em sua fase conflituosa
Vídeo
(GARBELINI, 2016).
O canal MediAções Brasil é
especializado em media-

4.2.4 Mediação ção de conflitos e práti-


cas colaborativas e conta
com diversos vídeos que
A mediação de conflitos é um instrumento para tratamento de di- explanam sobre os méto-
vergências interpessoais. Seu objetivo nem sempre é um acordo, mas dos de gestão de conflitos
e entrevistas com espe-
a transformação do padrão de comunicação e relacionamento dos en- cialistas nessa temática,
volvidos, visando ao entendimento. visando à troca de infor-
mações com pessoas que
O mediador também é escolhido pelas partes para atuar como um procuram meios de solu-
cionar conflitos.
terceiro facilitador da comunicação e deve ser completamente impar-
Disponível em: https://www.
cial, tanto que a principal característica exigida ao mediador é a neu-
youtube.com/channel/UCiR6oUU-
tralidade. Garbelini (2016, p. 141) expõe que o mediador “deve ser gFfJe8dm4cfwEAww. Acesso em:
17 dez. 2019.
imparcial, o que significa que ele não pode tender para nenhum dos
lados do conflito nem influenciar ou persuadir as pessoas a entrar em
acordo, mas agir quando for solicitado”.

Gestão de conflitos 89
Glossário Desta forma, diferentemente do árbitro, o mediador não decide pelas
paridade: igualdade. partes, tampouco sugere, direciona ou aconselha, como faz o conciliador.
O mediador promove o bom ambiente, a paridade e a isonomia en-
isonomia: princípio do Direito, quanto o conflito é colocado em evidência.
garantido pela Constituição, de
acordo com o qual todos são Na Figura 5, as letras X e Y representam cada uma das partes inseri-
iguais perante a lei. das no processo de mediação, e a letra M representa o terceiro envol-
vido, o mediador.

Figura 5
Esquematização do processo de mediação

X Y
Fonte: Elaborada pelos autores com base em Senasp/MJ, 2009, p. 16.

Para Dorecki (2017, p. 68) a mediação de conflitos é:


a maneira mais eficaz para solucionar conflitos na área de segu-
rança pública, porque durante todo o processo almeja-se a har-
monia social nas mais diversas relações. É o resgate da cultura
baseada no diálogo, inclusive porque trata alguns tipos de con-
flito como uma etapa necessária para se progredir em direção à
solução. As práticas de mediação são reflexo de uma visão ino-
vadora na área de segurança pública, pois vão além de objetivos
como a tranquilidade e a ordem pública, enveredando pelo ca-
minho de uma cultura de harmonia e paz social. Elas deixam de
lado a transferência do problema e de sua solução para terceiros
(outros órgãos públicos).

No Brasil, a conciliação e a mediação são orientadas pela Lei Federal


n. 13.140, de 26 de julho de 2015, com o seguinte objetivo:
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a mediação como meio de solução
de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de
conflitos no âmbito da administração pública.

90 Negociação e gestão de conflitos de segurança


Parágrafo único. Considera-se mediação a atividade técnica Atividade 2
exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, es- Com base no exposto na Seção
colhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identifi- 4.2, explique a interação dos
car ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia. indivíduos nos quatro métodos
(BRASIL, 2015) de gestão de conflitos.

Foram expostos aqui quatro métodos para a gestão de conflitos


com especificidades particulares, porém, de acordo com Roncaglio
(2017), com uma essencial semelhança, a pacificidade. Todos eles,
independentemente da forma com que os envolvidos interagem en-
tre si, alicerçam-se no diálogo como principal ferramenta na busca
de seus objetivos.

4.3 O profissional de Segurança Pública


Vídeo no manejo de conflitos
Diante do que foi tratado e exemplificado até aqui, torna-se eviden-
te que o profissional de Segurança Pública, pela natureza do seu ofí-
cio, pode, com extrema frequência, enxergar-se inserido em conflitos
motivados pelos mais variados fatores e envolvendo diversos tipos de
pessoas.

Da mesma forma, é senso comum que em determinadas situações


o policial necessite usar a força (de maneira gradual) como forma de
responder à ocorrência que lhe é apresentada.

Entretanto, priorizamos os métodos explorados na seção anterior,


os quais objetivam nortear a atuação policial frente aos conflitos. Na
essência, nenhum profissional de segurança pode e/ou consegue as-
sumir a posição de árbitro, conciliador ou mediador, exceção feita aos
negociadores policiais.

Exemplificando: um policial não consegue ser um árbitro, pois este,


além de ser um especialista no tema conflitante, necessita ser escolhi-
do pelas partes, o que se torna praticamente impossível ao policial, que
é direcionado para a ocorrência por meio de uma central de operações
ou por solicitação popular durante o patrulhamento.

Gestão de conflitos 91
Da mesma forma acontece com os papéis de conciliador e media-
dor, os quais denotam requisitos específicos que dificilmente sejam
cumpridos pela equipe policial destinada à ocorrência.

Ao afirmarmos que o objetivo na apresentação desses métodos é


apontar um norte ao policial, estamos dizendo que o policial jamais
será conciliador, mediador ou árbitro, no entanto, pode trabalhar
com conciliação, mediação, arbitragem e negociação. No caso da ne-
gociação policial em crises, o policial necessita de treinamento e de
certas habilidades para desempenhar essa função, bem como fazer
parte do grupo especializado de sua corporação que atue direta-
mente nessa área.

No serviço normal diário, existem situações em que o profissional


de Segurança Pública precisa separar os conflitantes, ouvi-los separa-
damente e tomar uma decisão, trabalhando, assim, com arbitragem.
Ou, então, situações em que esse profissional permite o diálogo não
violento entre as partes e faz propostas buscando o consenso de am-
bas, como se faz em uma conciliação. Há, ainda, situações em que, de
modo completamente imparcial, deverá auxiliar na melhora da comu-
nicação dos indivíduos em conflito, como faria um mediador.

De acordo com Roncaglio (2017), independentemente da forma de


condução eleita frente ao conflito, a principal característica que deve
ser apresentada pelo policial é a dissociação. Dissociar é separar o
pessoal do profissional, ou seja, não tomar partido, não se ofender,
não se emocionar demasiadamente com a situação. Nesse contexto,
familiaridades e semelhanças com a vida pessoal podem dificultar a
dissociação. O policial não pode deixar que suas convicções, crenças,
interesses e vontades pessoais interfiram no manejo dos conflitos.
Atividade 3 Da mesma maneira que ocorre com a comunicação durante uma
Comente a importância da negociação, é importante que o profissional de Segurança Pública, no
dissociação, apresentada pelo
manejo dos mais variados conflitos, trabalhe com escuta ativa e empa-
profissional de Segurança Públi-
ca no manejo de conflitos. tia. É extremamente eficaz que os conflitantes se percebam compreen-
didos sobre suas aspirações.

Uma sugestão é que no início do atendimento da ocorrência seja


propiciado que o envolvido exponha suas emoções, desde que de
maneira não violenta, é claro. Portanto, é interessante deixá-lo falar,

92 Negociação e gestão de conflitos de segurança


e isso pode ser estimulado com a utilização de perguntas abertas,
objetivando respostas mais elaboradas e carregadas de informações
sobre o conflito. À medida que se percebe uma evolução positiva na
situação, as perguntas fechadas podem ser empregadas, haja vista
que elas empenham as palavras e amarram atitudes com respostas
simples de “sim” ou “não”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Gerenciar conflitos é uma atribuição difícil, e isso pode ser confirmado
pela necessidade imperiosa de profissionais especializados e capacitados.
Tal preparo percorre conhecimentos conceituais básicos, passando pelo
estudo das causas e fatores desencadeantes que levam às situações con-
flituosas e, também, por estudos aprofundados sobre o método escolhi-
do para a gestão dos conflitos.
É bem verdade que na vida cotidiana acabamos por gerenciar conflitos
e resolver problemas pequenos a cada instante. Entretanto, é necessário
separar o trabalho técnico e profissional do amador, que possui suas limi-
tações naturais. Da mesma forma, os operadores da área da Segurança
Pública necessitam conhecer e aplicar todos os preceitos técnicos neces-
sários para que consigam as soluções aceitáveis dos confrontos em que
estiverem envolvidos.

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ArtMed, 2010.
BRASIL. Lei n. 9.307, de 23 de setembro de 1996. Diário Oficial da União, Poder Legislativo,
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WEISS, J. Negociações eficazes. Rio de Janeiro: Sextante, 2018.

GABARITO
1. Conflito não pode ser confundido com briga, pois a briga, assim como qualquer outra
forma violenta, é uma resposta ao conflito. Pessoas podem tentar responder e/ou
resolver um conflito brigando. Por outro lado, os conflitos bem geridos podem trazer
resultados satisfatórios, apresentando importantes avanços no tema conflitante. Por
isso, a gestão de conflitos faz parte do processo evolutivo da humanidade e faz com
que nem todo conflito seja prejudicial.

2. Negociação: as duas partes conflitantes interagem entre si buscando gerenciar a


situação.
Arbitragem: o árbitro ouve separadamente cada uma das partes e toma uma decisão
sobre o assunto conflitante.
Conciliação: as partes interagem entre si sob a orientação do conciliador, que, por sua
vez, decidirá sobre o tema caso não ocorra acordo anterior entre os conflitantes.
Mediação: mediador e conflitantes interagem juntos focando o relacionamento e a me-
lhora no padrão de comunicação entre as partes em conflito.

3. Dissociação é uma característica fundamental ao profissional de Segurança Pública


frente aos conflitos, pois ela permite sua atuação com total isenção. A dissociação
refere-se ao afastamento das convicções pessoais do agente de segurança, de um
possível pré-julgamento, ou tendência em se posicionar favoravelmente a um dos
lados conflitantes, em detrimento da sua atuação profissional.

94 Negociação e gestão de conflitos de segurança


NEGOCIAÇÃO E GESTÃO DE CONFLITOS DE SEGURANÇA
Para a área da Segurança Pública, as situações críticas e os conflitos necessitam
de atenção especial do operador, seja pela imprevisibilidade e risco iminente
à vida humana que as crises policiais proporcionam, seja pelo número de
envolvidos ou diferentes motivações que os conflitos possam abranger. Por
isso, os responsáveis pelo processo necessitam escolher os métodos adequados
e estar inteiramente focados na resolução do problema.
Negociação e gestão de conflitos de segurança é uma obra que apresenta
técnicas úteis às instituições policiais e de Segurança Pública para melhor
enfrentar essas demandas. Nesse sentido, o leitor é convidado a imergir no
tema, estudando conceitos, características e elementos fundamentais do
gerenciamento de crises.

Marco Antonio da Silva | Otávio Lúcio Roncaglio

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


Marco Antonio da Silva
Otávio Lúcio Roncaglio
ISBN 978-85-387-6581-3

59171 9 788538 765813

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