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Revista Serviço Social em Perspectiva

Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. www.periodicos.unimontes.br/sesoperspectiva


Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social

A ORGANIZAÇÃO POLÍTICO-SINDICAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS:


CATEGORIA PROFISSIONAL OU RAMO DE ATIVIDADE ECONÔMICA?

Juliano Zancanelo Rezende1

RESUMO

RESUMO: O presente trabalho busca apresentar a discussão acerca da organização


sindical dos assistentes sociais no Brasil, considerando a relação do movimento
sindical da categoria, imerso na efervescência política de reabertura democrática,
com o movimento que provocou acúmulo para o processo de ruptura com o
conservadorismo no Serviço Social brasileiro. Também pretende analisar o processo
de transição da organização sindical dos assistentes sociais, de categoria
profissional para ramo de atividade econômica, apresentando a tentativa de tal
transição, caracterizada como inconclusa, dada não somente as questões
particulares da categoria profissional, mas também os impactos neoliberais para o
sindicalismo no Brasil.

Palavras-chave: assistente social; organização sindical; transição.

ABSTRACT

ABSTRACT: This article shows the discussion about the social assistant‟s syndical
organization in Brazil, considering the relation of syndical movement in the category,
immerse in the democratic reopening, with the movement that provoked
accumulation for the rupture with conservative Social Work. Also, it‟s intended to
analyze the transition process of social assistant‟s syndical organization, from
categories to branch of economic activity, showing that transition, categorized as
unfinished, given not only particular questions from professional category, but also
the neoliberal impacts to the syndicalism in Brazil.

Keywords: social assistant; syndical organization; transition.

1
Graduando em Serviço Social pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Bolsista de Iniciação Científica do CNPq. Eixo
temático: 3 – Lutas de classes e Movimentos Sociais. e-mail: julianozancanelo@gmai.com
REZENDE, J. Z.
A organização político-sindical dos assistentes sociais: categoria profissional ou ramo de atividade
econômica?

INTRODUÇÃO

O presente trabalho acadêmico busca analisar a organização político-sindical


dos assistentes sociais no Brasil, de modo a problematizar a discussão sobre o
modelo de organização sindical por categoria profissional, o qual vem sendo
impulsionado pela Federação Nacional dos Assistentes Sociais (FENAS),
atualmente. E ainda, pretende abordar a decisão histórica e estratégica da própria
categoria sobre a transição da organização sindical dos assistentes sociais para
ramo de atividade econômica.

Para tal, é necessária uma contextualização sócio-histórica sobre as


contribuições das entidades sindicais de assistentes sociais para o processo que
resultou em uma nova compreensão teórico-metodológica e ético-política da
profissão, referenciada nos conceitos marxistas de análise do real. Tais
contribuições realizaram-se durante a emergência do conhecido novo sindicalismo,
quando diversos movimentos sociais da classe trabalhadora pulsavam em suas
reivindicações e defendiam interesses coletivos em uma perspectiva de classe.

A implementação de políticas neoliberais durante os anos da década de 1990


no Brasil, provocou retrocessos complexos para toda a classe trabalhadora devido à
nova forma de acumulação do capital, caracterizada como flexível. São expressados
nos movimentos sociais de trabalhadores os impactos gerados pela reestruturação
produtiva, especialmente no movimento sindical por estar essencialmente envolvido
com as relações de trabalho. Diante esse cenário, desafios de resistência são
colocados para toda a classe trabalhadora. O processo em curso solapou conquistas
daqueles que somente são possuidores de sua força de trabalho e, nos dias atuais
demonstram a continuidade de suas refrações. Sendo uma delas, a tentativa de
manutenção do caráter corporativista e desmobilizador de parte do sindicalismo
brasileiro.

CONTEXTUALIÇÃO HISTÓRICA

O sindicalismo no Brasil, ao longo da história, passa por diversos momentos


de assenso social provocados pela resistência e lutas políticas do conjunto da classe
trabalhadora, bem como também é caracterizado por momentos de dissenso social
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causados através da intervenção e repressão do Estado, expressadas nos


interesses da classe dominante.

Períodos relevantes para o movimento sindical no Brasil, conforme ANTUNES


(1985), por exemplo, foi na década de 1930 quando a Lei de sindicalização,
promulgada por Getúlio Vargas, provocou uma grande estagnação sindical. Outro
marco de dissenso do sindicalismo no Brasil foi o golpe civil militar de 1964 que se
utilizou do aparato coercitivo do Estado, através da força e da lei, para protagonizar
o que ficou conhecido como “a longa noite do sindicalismo brasileiro” (ANTUNES,
1985, p.75). Já em 1978 consolida-se o chamado novo sindicalismo, marcado pelas
grandes greves das áreas industriais, principalmente organizadas pelo Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC paulista, passando por cima da lei que proibia as greves e
mostrando seu caráter combativo frente ao Estado e ao patronato.

Assim como expressam os grifos de ABRAMINDES (2009), o novo


sindicalismo foi um dos principais pilares que impulsionou a ação política articulada
dos diversos movimentos sociais da classe trabalhadora. Por exemplo, rebatendo
toda essa nova movimentação conjuntural nas ações políticas das entidades
sindicais de Assistentes Sociais a partir da década de 1970.

No contexto da ambiência político-social e cultural, do final dos anos 1970


aos anos de 1980, as vanguardas profissionais, com militância político-
sindical e profissional na categoria se inserem nas lutas sociais em curso na
sociedade brasileira, no momento histórico de lutas e conquistas da classe
trabalhadora organizada, sob a autonomia e independência de classe.
(ABRAMIDES, 2009, p.89)

Todo esse viés sindical classista, combativo e autônomo deu forma na


atuação política de boa parte dos assistentes sociais enquanto militantes e
sindicalistas, provocando uma nova reflexão no que se refere tanto à atuação
político-sindical dos profissionais quanto à compreensão teórico-metodológica do
Serviço Social, questionando as amarras do Serviço Social tradicional. O que
culminou em um relevante debate interno da profissão acerca de um novo projeto
profissional que potencializasse o polo da classe trabalhadora na balança da
contradição entre capital e trabalho. Foi nesse cenário que as entidades sindicais da
Comissão Executiva Nacional de Entidades Sindicais de Assistentes Sociais
(CENEAS) e da Associação Nacional dos Assistentes Sociais (ANAS), embutidas na
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perspectiva do sindicalismo de novo tipo, foram extremamente necessárias no que


se refere ao processo de intenção de ruptura com o conservadorismo para o Serviço
Social.

A expressão dessas ações sindicais organizadas pela CENEAS e ANAS se


consolidou no III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS). A articulação
dessas entidades sindicais junto ao forte movimento sindical e popular combativos e
expressou em condições objetivas para a determinação do caráter de ruptura com o
conservadorismo do III CBAS, batizado de Congresso da Virada. (ABRAMIDES,
2009)

ABRAMIDES (2009) expressa, que aconteceu também um movimento por


dentro das entidades sindicais de disputa política pelas direções dos conselhos
regionais e conselho federal de assistentes sociais, com o objetivo de conquistar
hegemonia política no viés de ruptura com o conservadorismo, visto que a maioria
das direções das entidades do exercício profissional possuía posição política
referente à conservação e modernização do caráter profissional.

Essas entidades sindicais da CENEAS e da ANAS, majoritariamente,


compuseram comandos de greves unificados com outras entidades sindicais de
diversas categorias profissionais, e variadas lutas conjuntas em defesa dos direitos
trabalhistas de maneira solidária a outros trabalhadores, participando também do
processo de construção da Central Única dos trabalhadores (CUT).

[...] o polo combativo dos assistentes sociais com militância político-sindical


esteve majoritariamente inserido. De um lado, na Articulação Nacional dos
Movimentos Populares e Sindicais – Anampos e, posteriormente no Novo
Sindicalismo Classista, por intermédio da Central única dos Trabalhadores –
CUT, fundada em 1983, e de outro lado, no acompanhado dos movimentos
populares, posteriormente organizados na Central dos Movimentos
Populares – CMP, fundada em 1993. (ABRAMIDES, 2009, p.89)

Nos grifos de ABRAMIDES (2009), sob a convicção de uma necessária


articulação do conjunto das entidades sindicais da profissão, foi realizado na cidade
de São Paulo o III Encontro Nacional das Entidades Sindicais dos Assistentes
Sociais, na perspectiva de elaboração de uma estratégia política unitária e
interventiva para o III CBAS, compreendendo de antemão o caráter conservador do
congresso pela linha modernizadora da comissão organizadora, posto o projeto
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profissional em disputa e a intenção dessas entidades sindicais combativas de


romper com a lógica do conservadorismo na profissão. O caráter conservador do III
CBAS se manifesta inicialmente pela instituição de uma comissão de homenagem
aos dirigentes do regime autocrático, e pela dinâmica do congresso que não
proporcionava uma análise ampla do momento político do país e por conseqüência,
das refrações da questão social de maneira concreta.

Segundo os escritos de ABRAMIDES (2009), as entidades sindicais interviram


também diretamente nas assembléias permanentes do congresso, causando
alterações na programação pré-estabelecida do III CBAS, massificando a
participação de profissionais da base dessas entidades nos espaços de incidência
na dinâmica de todo o congresso. Como exemplo, essas ações organizadas
resultaram na suspensão das visitas a instituições, passando o recurso financeiro do
fretamento dos ônibus que transportariam os congressistas até às instituições, para
o fundo de greve dos trabalhadores do ABC paulista e de demais categorias. Além
de ser aprovado um determinante manifesto do III CBAS que denunciava
expressamente o caráter antidemocrático e conservador no congresso, e propunha a
direta intervenção das entidades sindicais da categoria nos espaços do III CBAS,
reconhecendo a participação dos movimentos sociais e sindicais da classe
trabalhadora no evento. Como fato político a comissão de honra proposta pela
comissão organizadora foi trocada por uma homenagem “a todos os trabalhadores
que lutaram e morreram pelas liberdades democráticas” (ABRAMIDES e CABRAL,
2009, p.67), que foi composta por representações das entidades democráticas e
populares.

O III CBAS foi caracterizado pela forte e organizada intervenção das


entidades sindicais que conduziram estrategicamente as direções políticas do
evento, mas para além da questão episódica do congresso o seus desdobramentos:

[...] se farão sentir no processo de democratização das demais entidades


das categorias, na própria identificação dos assistentes sociais como
trabalhadores assalariados, e na legitimação e fortalecimento das entidades
sindicais e no compromisso histórico com a classe trabalhadora na
perspectiva emancipatória. (ABRAMIDES e CABRAL, 2009, p.68).

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De acordo com ABRAMIDES (2009), o processo de disputa de hegemonia na


perspectiva de um projeto político-profissional crítico e atrelado às lutas sociais da
classe trabalhadora é forjado no auto reconhecimento do assistente social, inserido
nas lutas sindicais e populares, enquanto trabalhador assalariado e pertencente à
classe explorada na sociabilidade dada pela contradição entre capital e trabalho.

A imersão desses assistentes sociais nas lutas dos movimentos sindical e


popular se desdobrou pelo viés classista, em um crescimento da quantidade de
entidades sindicais de assistentes sociais, o que possibilitou uma articulação política
planejada no que se refere, por exemplo, a disputa de hegemonia política por um
projeto ético-político da profissão reconhecido nos interesses históricos da classe
trabalhadora.

Conforme ABAMIDES e CABRAL (2009), no segundo Congresso da Central


Única dos trabalhadores, que aconteceu em 1986, foi deliberada pelo conjunto das
entidades sindicais uma alteração da estrutura sindical brasileira, de categoria
profissional para ramo de atividade econômica. A ANAS e suas entidades sindicais
filiadas decidiram pela construção da deliberação da CUT, de modificação da
estrutura sindical fragmentada para uma estrutura que aglutinasse grandes números
de trabalhadores por ramo de atividade econômica. Porém, essa transição da
estrutura sindical, devido á várias intercorrências políticas e organizativas, não pôde
ser concluída pelo conjunto dos sindicatos filiados à CUT.

Encerra-se, o ciclo de organizações político-sindical dos assistentes sociais


por categoria profissional. O fato de sindicalmente os assistentes sociais se
inserirem por ramo de atividade econômica não deixa de colocar uma
questão: a profissão continua tendo o seu significado social no interior da
divisão sociotécnica do trabalho. (ABRAMIDES, CABRAL e FARIA, 2000,
p.4 apud ABRAMIDES e CABRAL, 2009, p.101.)

Como escreve CARDOSO (2016), nos anos da década de 1980 as entidades


sindicais de assistentes sociais realizaram significativas lutas econômicas da
categoria, e possuíam reconhecimento diante outros sindicatos, haja vista a
constante articulação entre essas entidades sindicais. Afinal, as reivindicações das
diversas categorias profissionais, por maisque essas possuem particularidades,
seguiam as mesmas tendências referentes às relações de compra e venda da força
de trabalho, como salário e condições de trabalho por exemplo.
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Portanto, essa articulação do movimento sindical dos assistentes sociais com


as lutas de outros movimentos sociais de trabalhadores contribuiu para uma reflexão
coletiva sobre a importância de aderir á nova estrutura sindical proposta no II
Congresso da CUT. Ou seja, a relação de solidariedade de classe entre esses
diversos movimentos da classe trabalhadora proporcionou uma reflexão do conjunto
da categoria, de forma hegemônica, para a deliberação estratégica de transição da
organização sindical para ramo de atividade econômica.

Mesmo com a posição política hegemônica da profissão pela transição da


estrutura sindical, alguns sindicatos de assistentes sociais, pouco expressivos, se
mantiveram ou encerraram suas atividades temporariamente e retornaram seu
funcionamento tempos depois. (ABRAMIDES e CABRAL, 2009)

Em concordância com CARDOSO (2016), mesmo que o processo de


transição “inconclusa” da organização sindical dos assistentes sociais foi
caracterizado por particularidades da profissão, como o esvaziamento dos sindicatos
de categoria pela adesão da maioria dos assistentes sociais aos sindicatos por ramo
de atividade econômica, e pela manutenção de algumas entidades sindicais da
categoria por não levarem em consideração a deliberação estratégica da IV
Assembléia Sindical, a qual concluiu a necessidade de transição da organização
sindical para ramo de atividade econômica, também devemos atentar para as
modificações estruturais das relações socioeconômicas do mundo do trabalho.

OS IMPACTOS NEOLIBERAIS E O SINIDCALISMO DE CONCILIAÇÃO

Como expressa a autora ABRAMIDES (2009), a investida neoliberal no Brasil,


a partir dos anos de 1990, e todos os rebatimentos da flexibilização e precarização
das relações de trabalho contribuíram para a substituição de um sindicalismo
combativo e classista, que tornavam publicas e políticas suas reivindicações através
da ação política direta, em um denominado sindicalismo cidadão com ilusão
esperançosa na democracia burguesa, e que priorizava as lutas institucionais e as
conquistas meramente imediatas, sem protagonizar a luta independente e combativa
da classe trabalhadora.

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Nos grifos de BADARÓ (2009) é possível constatar que, a partir de um grande


acordo nacional entre forças políticas conservadoras durante os anos da década de
1990, o Estado gerenciando os interesses do capital, provocou uma série de
retrocessos para os trabalhadores, dentre os quais cita o autor:

[...] privatizações em larga escala; redução drástica dos investimentos do


Estado em políticas sociais; reforma administrativa (para reduzir os gastos
com funcionários e implantar a lógica do Estado mínimo); reforma
previdenciária (reduzindo direitos de seguridade dos trabalhadores);
flexibilização da legislação trabalhista. (BADARÓ, 2009, p. 131)

Como cita o estudioso BADARÓ (2009), todo o cenário dado a partir da


acumulação flexível do capital, impactou diretamente sobre o sindicalismo brasileiro,
como todos os ataques aos direitos sociais dos trabalhadores e uma profunda
precarização das relações de trabalho, provocou desemprego estrutural e gerou um
significativo processo de diminuição da filiação sindical.

Observa-se, portanto, um quadro de condicionantes extremamente


negativos para o movimento sindical brasileiro, resultante tanto das
consequências do processo de reestruturação produtiva, quanto dos
problemas decorrentes da manutenção das bases da estrutura sindical
corporativista. (BADARÓ, 2009, p.135)

Além das modificações no âmbito produtivo e econômico, e também da


estrutura sindical brasileira, acontece uma alteração no que se refere ao caráter
político das lideranças sindicais durante a década de 1990. A criação da Central
Força Sindical expressa um giro no caráter combativo e autônomo de parte do
sindicalismo brasileiro para uma perspectiva sócio-política de alinhamento com o
capital e o Estado, objetivando uma relação de conciliação entre capital e trabalho. A
Central Única dos Trabalhadores sofre um processo de transformação ao longo dos
anos da década de 1990, sendo colocada como postura política da Central a
negociação com o capital e a colaboração de classes. (BADARÓ, 2009)

No primeiro semestre de 1999, a grande bandeira política dos líderes


sindicais do ABC foi a diminuição dos impostos incidentes sobre a produção
e comercialização de veículos. Ou seja, para supostamente defender
empregos, tais lideranças apontaram como saída a preservação dos altos
patamares de lucratividade das empresas [...] A isso chamaram „sindicato
cidadão‟, pois diziam que agora as entidades eram capazes de discutir
políticas públicas, econômicas nesse caso, e „propositivamente‟ apresentar
alternativas. (BADARÓ, 2009, p.140)

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Com grande parte do sindicalismo brasileiro pautado estritamente nas


reformas da ordem burguesa a CUT abandonou sua perspectiva classista, que foi
forjada em um grande momento de efervescência política durante o ápice do novo
sindicalismo, e abraçou o que ficou conhecido como sindicalismo cidadão ou
propositivo.

A intenção, ao menos no discurso, era oferecer condições para que os


sindicatos propusessem alterativas concretas aos problemas da política
econômica no país, e não apenas se restringissem às reações defensivas.
De certo modo, o argumento serviu de arcabouço para substituir a
estratégia de ruptura com o corporativismo – que se apoiava na política de
denuncia referente ao atrelamento dos sindicatos ao Estado e imprimi-lhes
um caráter classista – pelo de conciliação. (CARDOSO, 2016, p. 317)

Assim como escreve CARDOSO (2016), o oitavo congresso da CUT


demonstrou o aparecimento de setores oposicionistas dentro da própria central, que
discordavam da política de conciliação de classes da CUT e do abandono das
bandeiras classistas que deram gênese à Central. Esse mesmo congresso
expressou também o afastamento da campanha pela transição da organização
sindical para ramo de atividade econômica, visto a conjuntura política e o interesse
financeiro de maior arrecadação para a própria central sindical.

Em uma conjuntura neoliberal, e de crescimento de setores de oposição à


parte majoritária e direção da CUT, somado ao processo de desfiliação de entidades
sindicais por discordarem dos rumos da Central Única dos Trabalhadores, no ano
2000, com a permanência de cinco entidades sindicais de assistentes sociais, é
criada a Federação Nacional dos Assistentes Sociais (FENAS) de modo a engrossar
as fileiras da CUT e do sindicalismo corporativista.

Conforme CARDOSO (2016), ao contrário do que aconteceu no surgimento


da ANAS, quando através de um amplo debate da categoria profissional a criação
da entidade foi deliberada e legitimada de forma coletiva, a FENAS além de ter tido
em sua fundação somente cinco sindicatos de categoria e ter uma inexpressiva
representação, os seus fundadores desconsideraram o que foi orientado pela
categoria por meio do CFESS.

O próprio discurso que fundamentava a criação da FENAS, ao afirmar que


não havia tolerância para o debate acerca das questões sindicais por parte
do conjunto CFESS/CRESS, desfez-se quando o Conselho (2001), em seu

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texto: “A contribuição do CFESS para o debate sindical”, relata que a


discussão aconteceu pouco tempo antes da criação da FENAS e que, nela,
a categoria não orientou o retorno dos seus sindicatos, tampouco sua
reinserção nestes espaços. (CARDOSO, 2016, p.323)

Observando os materiais da Federação disponíveis em seu próprio site2,


podemos verificar a manutenção do corporativismo sindical operado pela FENAS. A
defesa meramente dos interesses imediatos e econômicos da categoria dos
assistentes sociais em espaços governamentais, os quais muita das vezes são
esvaziados da concepção crítica sobre a intervenção profissional do assistente
social, ditam o cotidiano da entidade. Ainda, cabe salientar questionamentos sobre a
representação da categoria profissional pela Federação em tais espaços sem as
devidas deliberações coletivas.

Além das ações sindicais da FENAS girarem entorno de questões


corporativistas, e ao invés de compreender o papel do sindicato para além de sua
função essencial, a qual é a de regular a compra e venda da força de trabalho, não
demonstram uma consciência de classe no que tange a luta contra os ataques do
grande capital. A Federação também é caracterizada por práticas burocráticas,
assim como fala CARDOSO (2016). Para exemplificar, CARDOSO (2016) relata que
uma dirigente sindical ocupou a presidência da FENAS do ano 2000 até 2012, e ao
observar o site da Federação, através de seu link3, pode-se verificar que a mesma
dirigente sindical está eleita como Presidenta da entidade federativa até o ano de
20194.

De acordo com o site eletrônico da FENAS, atualmente existem dezenove


entidades sindicais de assistentes sociais em todo território brasileiro, e destes, onze
sindicatos estão filiados à FENAS. Também existem algumas outras entidades que
estão em processo de reabertura como nos estados de Minas Gerais e Espirito
Santo.

[...] a analise cuidadosa da sua pratica sindical evidencia que essa Federação foi
gestada a partir de uma avaliação reducionista e precipitada, pautada nos marcos da
crise do sindicalismo no Brasil e aliada à tentativa de recuperação do sindicalismo
cutista, considerando-se o aprofundamento da sua crise de legitimidade. A
(re)abertura de novas entidades filiadas à CUT proporcionaria o aumento do número

2
Site da FENAS disponível em: http://www.fenas.org.br
3
Ao acessar o link - http://www.fenas.org.br/diretoria.php pode-se verificar a composição da diretoria da FENAS, atualmente.
4
Federação Nacional dos Assistentes Sociais - Gestão 2015-2019.
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de sindicatos na sua base, bem como do quantitativo de verbas repassadas para a


sua existência e manutenção. (CARDOSO, 2016, p.325)

De acordo com BADARÓ (2009), em conseqüência á todo esse processo de


alteração e precarização das relações de trabalho, intensificação das políticas
neoliberais, e transformação da posição política de grande parte das lideranças
sindicais, é refletido em uma necessidade de reorganização sindical no Brasil.

CONCLUSÃO

O sindicalismo brasileiro no tempo e na história sofreu diversos momentos de


modificação em sua estrutura organizativa e em sua posição sócio-política, devido
ao movimento da realidade pautado estruturalmente nas relações sociais da ordem
societária do capital, e conseqüentemente devido à constante luta de classes e suas
correlações de forças.

Com o marco da reestruturação produtiva do capital e com a implementação


das políticas neoliberais, as relações de compra e venda da força de trabalho, as
quais as entidades sindicais desempenham função reguladora lutando pela garantia
de condições de trabalho e de reprodução da vida social da classe que vive do
próprio trabalho, sofrem estruturalmente um processo de flexibilização e
precarização crescente. O perfil do trabalhador assalariado, estando o assistente
social incluído neste perfil de assalariamento, também passa por modificações,
como a polivalência e a adaptação às mudanças, se tornando um trabalhador
flexível, ainda mais precarizado e pertencente à uma classe social hifenizada, assim
como fala AGUENA (2008).

Com os ditames da internacionalização do capital e da acumulação flexível,


as táticas e estratégias de lutas sindicais não são nada fáceis, sendo somado um
processo de retrocessos organizacionais e políticos de parte dos sindicatos
brasileiros, o que, atualmente, colabora para um refluxo da mobilização social da
base de trabalhadores.

Sendo levado em consideração todo esse cenário, pautar a organização


político-sindical por categoria profissional é contribuir para uma maior fragmentação
das lutas sindicais/sociais e para um distanciamento da classe trabalhadora no que

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se refere o seu reconhecimento enquanto classe que sofre a exploração do trabalho


por outra classe que detém a riqueza socialmente produzida. Se o trabalhador
assalariado está inscrito sob a divisão sócio-técnica do trabalho e participa de um
processo de trabalho coletivo e socialmente combinado, suas reivindicações e
formas de lutas referentes às relações de trabalho devem estar situadas em seu
ramo de atividade econômica e organizadas por sindicatos de tais ramos.

No caso do conjunto profissional dos assistentes sociais, que também sofrem


com todo o processo supracitado, a heterogeneidade dos espaços sócio-
ocupacionais os quais esses profissionais estão inseridos é mais um elemento que
comprova a necessidade da organização da categorial profissional em entidades
sindicais por ramo de atividade econômica.

É correto que as entidades sindicais de assistentes sociais,principalmente


durante o período dos anos da década de 1980, tiveram grande contribuição paras
as lutas sociais da classe trabalhadora, estimulando e participando da construção da
CUT com um viés combativo e classista. E que também contribuíram para com a
reflexão da categoria sobre a necessidade de um projeto profissional hoje
referenciado a partir da vertente cunhada por NETTO (1988) como intenção de
ruptura com o conservadorismo. Porém, nos dias atuais o movimento da realidade é
distinto ao do passado recente. A própria categoria decidiu historicamente por
efetuar a transição da organização sindical de categoria profissional para ramo de
atividade econômica, reconhecendo sua necessidade estratégica.

O que a conjuntura necessita não é a reafirmação de um sindicalismo


corporativista e fragmentado, como a FENAS propõe com a retomada das entidades
sindicais dos assistentes sociais por categoria profissional, sem a devida
legitimidade da categoria de forma hegemônica ou majoritária, posto sua
inexpressividade nas lutas sociais da classe trabalhadora. E ainda, considerando
que os assistentes sociais estão organizados em sindicatos de acordo com o espaço
sócio-ocupacional em que estão inseridos, haja vista a similaridade das demandas e
reivindicações econômicas das diversas categorias que fazem parte do mesmo ramo
de atividade econômica, a organização por categoria profissional provocaria uma

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fragmentação da força política dos trabalhadores do mesmo ramo para os processos


de lutas, mesmo que econômicas e imediatas.

É necessário que o conjunto da categoria dos assistentes sociais reafirme a


organização sindical por ramo de atividade econômica, sendo compreendida a
importância da atuação político-sindical em um organismo societário estabelecido
pela contradição entre capital e trabalho. Estando a organização sindical por ramo
de atividade econômica articulada com uma atuação político-sindical a partir de uma
perspectiva combativa e classista, que defenda de maneira intransigente não
somente as reivindicações do coletivo de trabalhadores que cada sindicato
representa, mas também os interesses históricos da classe trabalhadora,
estabelecendo rompimento com a estrutura sindical corporativista e pelega.

Em tempos como o atual, o movimento sindical combativo precisa disputar a


base de trabalhadores dos sindicatos que estão sob a direção corporativista e
estadista. Estar atrelado aos movimentos sociais de igual tendência, conformando
frentes classistas que combatam as investidas do capital, e buscando a
emancipação política como meio para um horizonte pautado em um projeto
societário que não seja caracterizado pela exploração e opressão dos homens e das
mulheres.

REFERÊNCIAS
ABRAMIDES, Maria B. C. A organização político-sindical dos assistentes sociais:
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