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FACULDADE DE ENGENHARIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL
SECÇÃO DE HIDRÁULICA E RECURSOS HÍDRICOS
HIDROLOGIA
MANUAL DA DISCIPLINA
Capítulo 4 – PRECIPITAÇÃO
Capítulo 6 – INFILTRAÇÃO
Capítulo 9 – CHEIAS
BIBLIOGRAFIA
Nota introdutória
O engenheiro Herco Jansen, docente holandês que trabalhou comigo durante vários anos,
teve um papel muito importante na edição deste manual, pondo-o em forma apresentável e
contribuindo para o seu melhoramento. É da sua particular lavra a revisão do capítulo
dedicado ao estudo da água subterrânea.
Introdução à Hidrologia 1-1
1 INTRODUÇÃO À HIDROLOGIA
Embora a Hidrologia abranja o conhecimento da água tanto nos continentes como na atmosfera e
nos oceanos, o estudo dos ramos aéreo e oceânico é feito nas disciplinas específicas de
Meteorologia e Oceanografia, ficando a Hidrologia propriamente dita dedicada ao ramo terrestre.
Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia 1-2
d) no que respeita aos processos de cálculo, ambas as áreas têm beneficiado imenso do acesso
a computadores cada vez mais potentes que, por sua vez, possibilitam o desenvolvimento e
a utilização de programas de cálculo sempre mais sofisticados e o tratamento de
quantidades crescentes de informação. No caso da Hidrologia, as ferramentas mais
utilizadas são a análise estatística e os modelos de simulação hidrológica das componentes
da fase terrestre do ciclo hidrológico, desde a precipitação até ao escoamento.
Sugere-se a leitura do excelente livro de A.K. Biswas, "History of Hydrology", no qual o autor
faz uma interessante recapitulação dos principais marcos no progresso da Hidrologia, desde a
Antiguidade aos fins do século XIX. Os elementos que a seguir se apresentam foram extraídos
desse livro e do "Handbook of Applied Hydrology" de Ven Te Chow.
A civilização egípcia floresceu à volta do Nilo. Para além das extensivas obras de irrigação do
tempo dos Faraós, há a referir a barragem de Saad-El-Kafara, datada de cerca de 2800 a.c. e
cujos encontros permaneceram até aos nossos dias.
Se a Hidráulica, pelo impacto directo das obras, ocupava o primeiro plano, a necessidade de
conhecimentos sobre a ocorrência e a distribuição da água tornava-se também muito importante.
Sendo a irrigação no Nilo feita por inundação, a medição dos níveis nesse rio foi desde logo
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Introdução à Hidrologia 1-3
sendo feita, através dos "nilómetros" (cisternas com escalas graduadas ligadas ao rio por
condutas subterrâneas). O nilómetro de Roda, próximo do Cairo, tem um registo contínuo de
níveis de 641 d.c. a 1890 d.c., constituindo a mais longa série hidrológica do mundo.
A Mesopotâmia (nome que significa "entre rios") era uma região fértil, atravessada pelos rios
Tigres e Eufrates, ambos de regime muito irregular, obrigando a grandes cuidados com os diques
de protecção contra cheias e obras de irrigação. Essa preocupação aparece bem explícita no
famoso Código de Hamurabi, imperador da Babilónia (cerca de 1700 a.c.)
A civilização romana não foi tão fértil como a grega em pensadores, tendo no entanto produzido
grandes obras de engenharia através da aplicação empírica da experiência adquirida. Apesar
disso, Vitruvius apresenta no seu livro "De architectura libridecem" um conceito bastante claro
do ciclo hidrológico, com a precipitação dando origem ao escoamento e a evaporação como
fonte das nuvens. Há a referir ainda Hero de Alexandria que escreve que o caudal depende da
área e da velocidade mas este conceito não se impôs até ao século XVI.
A Idade Média na Europa foi dominada ideologicamente pela Igreja que se opôs fortemente à
pesquisa experimental, baseando-se nos dogmas e na escolástica, para evitar o aparecimento de
heresias. Foi um período de cerca de 13 séculos de fraco desenvolvimento científico com o
correspondente reflexo na Hidrologia.
Leonardo da Vinci, conhecido sobretudo como um pintor de génio, tinha nos seus cadernos de
notas conceitos essencialmente correctos sobre o ciclo hidrológico, sobre o escoamento em
superfície livre e sobre a distribuição de velocidades numa secção.
Bernard Palissy, um cientista francês, apresentou a primeira formulação clara e completa do ciclo
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Introdução à Hidrologia 1-4
O século XVII é o século de Galileo, Kepler, Newton, Harvey, Descartes, Van Leeuwenhoek.
No domínio da Hidrologia salientam-se os nomes de Perrault e Halley.
Benedeto Castelli apresenta uma explicação clara da relação entre caudal, secção transversal e
velocidade, sistematizando ideias anteriores de Hero e Leonardo da Vinci.
Perrault, no seu livro "Da origem das fontes", demonstra brilhantemente que o escoamento no rio
Sena (cabeceiras) podia ser totalmente explicado a partir da precipitação, apresentando um
balanço hídrico rudimentar.
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Introdução à Hidrologia 1-5
A água é o líquido mais abundante na Terra. De facto, existe uma quantidade enorme, estimada
em cerca de 1,600 x 106 km3. Aproximadamente 15 % desta água está quimicamente “presa” na
crusta terrestre. A quantidade de água livre é cerca de 1,386 x 106 km3 (1,386 x 1015 m3). Poderia
parecer que a quantidade de água na Terra fosse quase ilimitada. Contudo, esta imagem muda
bastante se considerar a possibilidade de utilizar essa água. Para tal, pode-se analisar o Quadro
1.1, que mostra a importância das diferentes reservas hídricas.
Deste quadro ressalta imediatamente a pequeníssima fracção de água utilizável pelo Homem em
relação à totalidade da água existente no planeta. Vê-se que cerca de 97.5 % é água salgada e 1.7
% corresponde às zonas polares. Além disso, uma boa parte da água subterrânea está situada a
enormes profundidades o que torna o seu aproveitamento antieconómico nas condições actuais.
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Quadro 1.1. Importância das diversas reservas hídricas (cf. UNESCO, 1978)
Lagos:
doce 91.0 0.007 0.26
Água subterrânea:
doce 10,530 0.76 30.1
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O tempo de residência é o valor que se obtêm dividindo o volume da reserva pelo volume
médio do correspondente fluxo de renovação. Assim, o tempo de residência representa o tempo
médio que uma gota de água permanece numa certa reserva de água antes de passar para uma
outra reserva. O quadro 1.2 apresenta valores do tempo de residência para as várias reservas
hídricas.
Note-se que, enquanto para as águas superficiais, especialmente para os rios, esses tempos são
curtos, para os oceanos, glaciares e águas subterrâneas profundas esses tempos contam-se por
centenas ou milhares de anos. Note-se também que as reservas representam uma imagem
estática, um "instantâneo" das disponibilidades de água e pouco tem a ver com a sua importância
para o ciclo hidrológico (que representa uma imagem dinâmica) onde a contribuição dos rios ou
da atmosfera, por exemplo, é muito superior ao seu volume total instantâneo.
O tempo de residência também tem relevância no âmbito de poluição de recursos hídricos. Por
exemplo, um rio com água poluída poderá, em princípio, ser limpo em relativamente pouco
tempo (teoricamente, em apenas algumas semanas), quando as fontes poluentes deixam de
existir. No caso dum lago grande, a sua limpeza já será um processo de muitos anos.
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Introdução à Hidrologia 1-8
O ciclo hidrológico não tem início ou fim mas é habitual partir-se da evaporação da água dos
oceanos e sua incorporação na atmosfera. Os processos que em seguida se desenrolam estão
apresentados sob forma gráfica no diagrama de Horton, figura 1.1.
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Introdução à Hidrologia 1-9
A parte retida em depressões superficiais divide-se numa componente que se evapora e noutra
que origina escorrimento superficial. A parte que se infiltra contribui, por um lado, para
alimentar o processo de transpiração das plantas e de evaporação a partir do solo; por outro, por
efeito da gravidade, vai alimentar as toalhas de água subterrânea. As águas subterrâneas
contribuem para alimentar a vegetação, a evaporação a partir do solo e os escoamentos dos rios.
Por efeito da gravidade, parte das águas subterrâneas vai ter directamente ao oceano.
O escorrimento superficial sobre o solo dá origem a linhas de água que se fundem em rios os
quais, devido à gravidade, vão descarregar no oceano, alimentando no seu percurso lagos,
pântanos e albufeiras. Em todo este processo, há continuamente evaporação da água da mesma
forma que pode haver precipitação directamente sobre os rios e lagos. Também os rios
contribuem muitas vezes para alimentar as toalhas de água subterrânea com que comunicam.
Com a descarga da água no oceano por escoamento superficial ou escoamento subterrâneo fecha-
se o ciclo hidrológico. O "motor" deste ciclo é a energia solar que, no processo de passagem de
partículas de água para atmosfera por evaporação, lhes transmite a energia potencial necessária
para o seu regresso ao oceano, actuadas pela gravidade a partir da precipitação.
A figura 1.2 faz uma outra representação do ciclo hidrológico. Aí estão indicadas os três ramos
normalmente considerados no ciclo hidrológico: o ramo oceânico, objecto da Oceanografia; o
ramo aéreo ou atmosférico, objecto da Meteorologia; e o ramo terrestre, objecto da Hidrologia.
A figura 1.3 é ainda uma representação descritiva do ciclo hidrológico mas na qual se faz já uma
avaliação quantitativa das variáveis envolvidas. P, E, ET, I, G e Q representam respectivamente a
precipitação, a evaporação, a evapotranspiração, a infiltração, o escoamento subterrâneo e o
escoamento superficial. As percentagens estão expressas em termos da precipitação total anual
média que se estima em cerca de 860 mm.
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Introdução à Hidrologia 1-10
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ds
I -O= na sua forma contínua
dt
ou como
em que I representa a entrada de água no sistema por unidade de tempo, O é a saída de água do
sistema também por unidade de tempo e ΔS é a variação do volume armazenado no interior do
sistema. Designa-se por balanço hídrico a equação da continuidade aplicada a uma certa região
e escrita em função das variáveis do ciclo hidrológico.
As regiões em que fazem estudos de balanços hídricos são definidas normalmente em função do
objectivo que se pretende alcançar, podendo, no entanto, existir restrições de carácter político e
administrativo à livre definição dessas regiões.
A figura 1.4, uma versão mais abstracta do ciclo hidrológico duma região, é útil porque permite
uma tradução fácil do balanço hídrico em termos matemáticos. Na figura 1.4, as variáveis têm o
seguinte significado:
P precipitação;
Q1, Q2 escoamento superficial que entra e sai da região;
G1, G2 escoamento subterrâneo que entra e sai da região;
Ss, Sso, Saq volume armazenado à superfície, no solo e no aquífero (água
subterrânea);
E evaporação a partir de águas superficiais e do solo;
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(P + Q1 + G1) - (Q2 + G2 + E + T) = ΔS
em que ΔS representa a variação total do volume armazenado. Note-se que nesta equação não
aparecem a infiltração, a recarga e a ressurgência que, por serem processos "interiores" à região
em estudo, não afectam o respectivo balanço hídrico.
(P + Q1 + r) - (Q2 + E + T + I) = ΔSs
É um exercício relativamente simples estabelecer os balanços hídricos para outras regiões como,
por exemplo, a camada superficial do solo ou do aquífero. Tenha-se em atenção que todas as
variáveis que intervêm nas equações de balanços hídricos são expressas como volumes por
unidade de tempo.
P - (Q2 + E + T) = 0
O maior obstáculo na resolução de problemas práticos com utilização do balanço hídrico reside
principalmente na dificuldade de medir ou estimar adequadamente as variáveis intervenientes.
Por exemplo, a precipitação é medida pontualmente fazendo-se depois a extrapolação para toda a
área envolvida1. Os caudais em rios podem ser medidos com razoável precisão excepto durante
as cheias. As maiores dificuldades surgem, no entanto, associadas à medição ou estimação dos
valores de infiltração, recarga, escoamento subterrâneo, evaporação, transpiração e volumes
armazenados no solo e em aquíferos.
1
Ver o capítulo sobre precipitação
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Introdução à Hidrologia 1-13
O balanço hídrico é uma ferramenta muito útil e que pode ser utilizada numa grande variedade
de situações como, por exemplo:
• determinação do valor duma variável hidrológica quando todas as restantes que entram no
balanço são conhecidas;
• estimação do erro global cometido na medição ou estimação das variáveis hidrológicas,
quando todas as que entram no balanço hídrico são conhecidas;
• operação de albufeiras;
• avaliação das necessidades de rega.
Toma-se para início do ano hidrológico o fim da época de estiagem o que tem a vantagem de
evitar a divisão duma mesma época de chuvas. Tem também vantagens para a efectivação de
balanços hídricos anuais:
P - (R + E + T) = ΔS
pois no fim da época de estiagem pode aceitar-se que o armazenamento é sempre bastante
pequeno pelo que ΔS é aproximadamente nulo. Procura-se, portanto, que os anos hidrológicos
sejam (estatisticamente) independentes uns dos outros, o que obviamente não aconteceria se, por
exemplo, se se usasse o ano civil.
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EXERCÍCIOS
1. Numa albufeira com uma área de 10 km2 verificaram-se durante um período de 5 dias os
seguintes valores:
- Caudal afluente = 15 m3/seg.
- Caudal efluente = 3 m3/seg.
- Nível da água no 1º dia = 25,0 m.
- Nível da água no 6º dia = 25,4 m.
- Precipitação = 0 mm.
a) Calcule o volume da água perdida por evaporação na albufeira, durante estes 5 dias
b) Calcule a altura média diária de evaporação da albufeira.
2. Considere um lago com uma saída natural. A área do lago é de 500 km2 e a da bacia
drenante de 2800 km2. Durante um ano verificou-se que a precipitação na região foi de 600 mm e
a evaporação no lago de 800 mm, não se tendo verificado uma variação sensível do nível do
lago. O caudal médio descarregado ao longo do ano foi de 9 m3/s.
4. Explique a presença e a ausência de água superficial e água subterrânea numa zona com
dunas (p. ex. a ilha de Inhaca) e numa planície dum rio (p. ex. o rio Incomati).
5. Construiu-se uma barragem numa secção dum rio com uma bacia drenante de 1800 km2.
A albufeira tem uma área inundada média de 35 km2 e uma capacidade de armazenamento de
600 milhões m3. O caudal médio (afluente) do rio é de 5,6 m3/s. A precipitação anual média
ponderada sobre a bacia é de 700 mm. O enchimento da albufeira depois da sua construção levou
5 anos. Durante esse período o caudal médio descarregado pela albufeira foi de 0,5 m3/s. Logo
depois da construção da barragem (durante e depois do enchimento da albufeira) começou-se a
tirar, anualmente, 12 milhões de m3 de água da albufeira para o abastecimento duma vila e para
um regadio.
a) Calcule o caudal médio descarregado pela albufeira depois do seu enchimento (numa
situação de equilíbrio o nível médio da albufeira mantêm-se constante).
b) Calcule as perdas anuais na albufeira por evaporação.
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Introdução à Hidrologia 1-16
6. Na secção de saída (secção de referência) duma bacia hidrográfica de 1600 km2 foi
construída uma barragem com uma albufeira com uma superfície de 35 km2 e uma capacidade de
armazenamento de 600 milhões m3. A albufeira é alimentada por um rio que drena a bacia. O
caudal médio no rio é de 4,5 m3/s. A precipitação anual média naquela zona é de 700 mm. O
enchimento da albufeira depois da sua construção levou 5 anos.
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Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-1
Uma bacia hidrográfica é uma região definida topográficamente, drenada por um curso de água
ou um sistema interligado de cursos de água, tal que a única entrada de água na região seja a
precipitação e todos os caudais efluentes sejam descarregados através de uma única saída (secção
de referência da bacia).
Quando o balanço hídrico é realizado na região correspondente a uma bacia hidrográfica, ele
torna-se consideravelmente simplificado já que a única entrada de água corresponde à
precipitação e a saída de água se faz numa única secção. Também para a gestão dos recursos
hídricos a bacia hidrográfica constitui a unidade mais conveniente pois é a nível da bacia que se
verificam as relações mais estreitas entre:
Tudo isto justifica o papel privilegiado desempenhado pelas bacias hidrográficas em estudos
hidrológicos e de gestão de recursos hídricos. A figura 2.1 representa as principais bacias de
Moçambique e a figura 2.2 a bacia do rio Malema, afluente do rio Lúrio.
A bacia hidrográfica é limitada pela linha de separação das águas. Esta linha passa pelos
pontos de máxima cota entre bacias, seguindo pelas linhas de cumeada, podendo no entanto
existir pontos mais altos no interior da bacia. A linha de separação divide a região onde a
precipitação caída vai dar origem a escoamento drenado através da secção de referência das
regiões vizinhas, drenadas por outros cursos de água.
A definição dos limites da bacia hidrográfica torna-se menos precisa quando se considera o
escoamento subterrâneo. Assim, distingue-se por vezes a linha de separação topográfica ou
superficial da linha de separação freática ou subterrânea. Na situação ilustrada pela figura 2.3,
a precipitação que se infiltra acima da camada geológica impermeável acaba por se escoar numa
bacia vizinha.
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Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-2
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Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-3
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Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-4
Nesta situação, a definição dos limites da bacia hidrográfica não se pode fazer sem ambiguidade
visto que apenas uma parte da precipitação caída acima da camada geológica impermeável se
infiltra enquanto outra parte se transforma em escoamento superficial na bacia. Por outro lado, os
níveis freáticos variam ao longo do ano o que tem como consequência a variação da linha de
separação freática. Por isso, normalmente e para efeitos práticos, despreza-se o efeito introduzido
pelo escoamento subterrâneo, junto aos limites da bacia. A incorreção cometida é negligenciável
com a excepção das bacias com muito pequena dimensão ou com características geológicas
particulares.
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Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-5
- curva hidrodinâmica;
- coeficiente de massividade;
- coeficiente orográfico.
A área de drenagem tem uma importância enorme nos valores dos escoamentos, que se podem,
duma maneira geral, considerar funções crescentes da área. A área da bacia do rio Malema
(centro-norte de Moçambique) é de 2,600 km2.
2.2.2 Perímetro
P 0.282 P
Kc = =
A A
2π
π
Kc é sempre maior ou igual à unidade apenas se tendo Kc = 1 para uma bacia de forma circular.
Kc é um valor adimensional que não depende da área mas da forma da bacia sendo tanto maior
quanto mais essa forma se afaste da circular. Note-se que quanto maior fôr Kc menos compacta é
a bacia. Apresentam-se na figura 2.4 algumas formas esquemáticas de bacias e os respectivos
índices de compacidade. A título de exemplo, a bacia do rio Malema tem um valor de Kc = 1.89.
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Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-6
Se imaginarmos uma precipitação instantânea e uniforme sobre a bacia, o escoamento a que ela
dá origem surgirá concentrado na secção de saída ou mais distribuído ao longo do tempo
conforme a forma da bacia seja próxima da circular ou irregular. Assim, em igualdade de outros
factores, a tendência para grandes cheias será tanto mais acentuada quanto mais próximo da
unidade for o valor de Kc.
O factor de forma, Kf, é a relação entre a largura média e o comprimento da bacia, definido
como o comprimento, L, do seu curso de água mais longo. A largura média, l, é definida como a
largura dum rectângulo com o mesmo comprimento e com a mesma área:
l = A/L
Kf = l/L = A/L2
Se se considerar as primeiras três bacias representadas na figura 2.4, os seus factores de forma
são aproximadamente 0.25, 0.50 e 1. As bacias com factores de forma baixos são as que têm
formas estreitas ou irregulares. Nestes casos, é menos provável a ocorrência de chuvas intensas
cobrindo simultaneamente toda a sua extensão e, por outro lado, os escoamentos resultantes
surgem na secção de saída mais distribuídos ao longo do tempo pelo que, em igualdade de outros
factores, bacias com Kf baixos terão menos tendências para grandes cheias do que bacias com Kf
elevados. O valor de Kf para a bacia do rio Malema é de 0.1 aproximadamente.
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Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-7
Os rios perenes são os que, em condições naturais1, escoam água durante todo o ano quer por
terem afluentes com diferentes regimes de alimentação quer por terem uma alimentação contínua
de águas subterrâneas. É normalmente o caso dos rios mais importantes de Moçambique, como o
Maputo, o Umbelúzi, o Incomáti e o Limpopo, na região sul.
Os rios intermitentes são os que em geral têm água durante a época húmida e secam na estiagem.
Durante a época húmida beneficiam da precipitação e dum nível freático alto enquanto que,
durante a época seca, o lençol freático desce a um nível inferior ao do leito do rio, não
permitindo fazer a sua alimentação. Podem referir-se como exemplo os rios Mazim’chopes e
Govuro.
Os rios efémeros apenas têm água durante e imediatamente a seguir aos períodos de precipitação,
não recebendo escoamento subterrâneo. Podem citar-se como exemplo os rios Movene e
Impamputo.
2.3.2 Ordem
A ordem dos cursos de água é uma classificação que reflecte o grau de ramificação da rede
hidrográfica da bacia. Pode ser feita a partir dum mapa em que estejam representados todos os
canais naturais suficientemente bem definidos quer correspondam a cursos de água perenes,
intermitentes ou efémeros.
Um critério de ordenação que por vezes tem sido seguido é o de considerar como de ordem 1 os
cursos de água que não são afluentes de qualquer outro; de ordem 2 os que são afluentes dos rios
de ordem 1; de ordem n+1 os que são afluentes dos cursos de água de ordem n. Este critério é de
aplicação simples e quase nada dependente do pormenor com que a rede hidrográfica está
representada no mapa. No entanto, apresenta como significativas desvantagens o facto de
poderem surgir como tendo a mesma ordem rios de dimensão totalmente distinta. Em
Moçambique, tanto o Zambeze como o Infulene seriam rios de ordem 1 por este critério.
1
É necessário referir o rio “em condições naturais” por causa das grandes modificações de regime de escoamento introduzidas por tomas
de água e por albufeiras de armazenamento.
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-8
A densidade de drenagem, λ, é a relação entre o comprimento total dos cursos de água duma
bacia, sejam eles perenes, intermitentes ou efémeros, e a área da bacia:
∑i l i
λ=
A
λ é dado em km-1 e varia normalmente entre 0.5 e 3.5 km-1. A densidade de drenagem é também
um indicador da tendência para a ocorrência de cheias numa bacia hidrográfica. Com efeito,
numa bacia bem drenada o escoamento superficial é rapidamente canalizado para linhas de água
bem definidas e pode surgir concentrado na secção de referência da bacia. Naquelas bacias mal
drenadas (λ baixo), a precipitação vai originar sobretudo escoamento sub-superficial e
subterrâneo que se processam com muito mais lentidão, não originando por isso picos de cheia
elevados.
A curva hipsométrica é a curva A(z) em que A é a área da bacia que se situa acima da altitude ou
cota z referida ao nível do mar. A área pode ser expressa em km2 ou em percentagem da área
total da bacia. A curva hipsométrica é obtida a partir da carta hipsométrica, carta onde a
representação das altitudes é feita por curvas de nível ou por qualquer outro processo de
representação gráfica. A figura 2.6 apresenta um exemplo de curva hipsométrica. A figura 2.7
apresenta a curva hipsométrica da bacia do rio Malema.
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Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-9
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-10
∫ 0
z ⋅ da
Z=
Atotal
O integral dá a área limitada pela curva z(A) e pelos eixos coordenados, podendo ser facilmente
calculado por uma fórmula de integração numérica a partir da curva hipsométrica. Um processo
mais expedito é o de assimilar o integral a um somatório:
Atotal n
∫ z ⋅ da = ∑ z i Ai
0 i=1
em que Ai é a área da bacia entre as curvas de nível i e (i+1) e zi a média das altitudes dessas duas
curvas de nível.
Atotal
∫0
h ⋅ da
H=
Atotal
h = z - zconf
ou h = z - z100
já que toda a bacia (100%) do afluente se situa acima de zconf. Daqui se tira imediatamente que
H = Z - z100
A altura média da bacia dá-nos uma ideia se a bacia é muito ou pouco acidentada. Normalmente,
as bacias com maiores alturas médias apresentam quedas mais importantes que podem por vezes
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-11
O perfil do rio é a representação gráfica da função z(L) em que z é a cota duma dada secção do
rio e L a respectiva distância à foz.
A figura 2.8 apresenta a título de exemplo o perfil do rio Malema e dos seus afluentes Namparro,
Mutivasse, Nataleia e Lalace. Note-se que a marcação de distâncias para os afluentes em sentido
contrário ao rio principal, a partir da confluência, torna o gráfico mais legível do que seria se
todas as distâncias fossem marcadas no mesmo sentido. O perfil dum rio dá uma noção imediato
das zonas de quedas importantes, grandes extensões quase planas e mais facilmente inundáveis,
etc.
A inclinação média do leito obtem-se dividindo a diferença entre as cotas máxima e mínima do
leito pelo comprimento do rio. É também possível determinar de modo análogo a inclinação
média dum troço do rio.
A partir da figura 2.8, pode-se calcular que a inclinação média de todo o leito do rio Malema é de
0.00859 mas que o troço de 135 km de jusante tem uma inclinação de apenas 0.00278.
Quanto maior a declividade dos terrenos maior será a velocidade com que se dá o escorrimento
superficial e, consequentemente, menor será o tempo que a água leva a atingir o sistema de
drenagem, facilitando o aparecimento de maiores pontas de cheias. Para tal contribui também o
facto de maior declividade corresponder a uma menor infiltração de água no solo. Por outro lado,
as maiores velocidades agravam o problema da erosão do solo.
• marcam-se, por exemplo a partir duma quadrícula aposta ao mapa da bacia, um número
elevado de pontos no interior da bacia;
• para cada ponto determina-se a declividade a partir das duas curvas de nível entre as quais o
ponto se situa;
• fica-se assim com uma distribuição estatística das declividades o que permite igualmente
obter a declividade média da bacia.
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-12
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Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-13
Um outro método para determinar a declividade média dos terrenos é o método do Alvord.
Suponha-se a bacia representada numa carta com curvas de nível espaçadas de D (por exemplo,
D = 20 metros). A figura 2.9 representa as curvas de nível às cotas n-D, n, n+D.
Considere-se a curva de nível à cota n. A faixa de terreno entre as curvas de nível à cota n-D/2 e
n+D/2 está representada a tracejado na figura.
Se se designar por dn a largura média dessa faixa, a declividade média dos terrenos nessa faixa
será dada por in = D/dn.
Este raciocínio é aplicável a qualquer faixa de terreno correspondente a uma curva de nível da
carta. Portanto, pode-se definir a declividade média dos terrenos da bacia como a média
ponderada das declividades médias de todas as faixas que compõem a bacia.
∑ An i n ∑ DL
I= = D Ln =
∑ An ∑ An A
Este método é, assim, bastante prático pois, conhecido D, basta determinar A com um planímetro
(ou GIS) e medir L com um curvímetro (ou GIS). Note-se que, sendo I um valor adimensional,
se deve exprimir tanto L como D em km e A em km2.
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-14
O rectângulo equivalente é o rectângulo com área e perímetro iguais aos da bacia, isto é:
2(Le+le) = P
Le * le = A
2
P
Le = + P -A Só é válida para P 2 ≥ 16 A
4 16
2
P
le = - P -A
4 16
A bacia do rio Malema tem A = 2,600 km2 e P = 342 km, donde se tira para o rectângulo
equivalente:
Le = 154 km;
le = 17 km.
A figura 2.10 faz a representação do rectângulo equivalente para a bacia do rio Malema. Nele
marcaram-se as várias curvas de nível espaçadas de formas a representarem as correspondentes
áreas. Por exemplo, a área entre as curvas de nível de 700 e 800 m é de 20 x 17 = 340 km2. As
áreas são obtidas a partir da curva hipsométrica.
O índice de declive médio, Ii, entre as curvas de nível de cotas Zi e Zi-1 é dado pela relação:
Z i - Z i -1 2,
Ii =
Xi
em que Xi é a distância entre as duas curvas de nível no rectângulo equivalente. Por exemplo, no
caso da bacia do rio Malema, o índice de declive médio entre as cotas 1,300 e 1,400 m é:
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-15
1,400 - 1,300
I= = 0.0159
6,300
O índice de declive de Roche, Ip, é o índice de declive médio para toda a bacia. No exemplo do
rio Malema, o rectângulo equivalente permite calcular
1,900 - 465
I p= = 0.00932
154,000
O índice de Roche é muito afectado se a bacia tiver pequenas áreas de grande altitude. Afim de
representar mais fielmente as características médias da bacia, o índice de declive global, Ig,
exclui as áreas correspondentes aos 5% mais altos e aos 5% mais baixos da bacia:
Z 5 - Z 95
Ig=
Le
1,400 - 540
Ig= = 0.00558.
154,000
Como é evidente, Ig é sempre inferior a Ip. Os valores de Z5 e Z95 são obtidos a partir da curva
hipsométrica.
Se se considerar um volume de água V caindo duma altura h, a energia potencial que lhe
corresponde é
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-16
Considere-se agora o caso dum rio sem afluentes onde estão identificadas diversas secções
(figura 2.11) e marquem-se os pontos (Vi, hi).
h é a cota da secção e V o volume anual médio que nela se escoa. A área delimitada pela curva
V(h) multiplicada pelo factor 2,722 dá a energia potencial total correspondente ao escoamento do
rio, designando-se por potencial fluvial bruto.
h max
En = 2,722 ∫ Vdh
0
Considere-se agora o caso dum rio com afluentes como se representa na figura 2.12. O processo
de representação da curva V(h) pode ser repetido para o rio principal e para os afluentes, à
semelhança do caso anterior, permitindo determinar o potencial fluvial bruto de cada afluente e
da totalidade da bacia.
A determinação do potencial fluvial bruto implica o conhecimento dos volumes escoados nas
diversas secções. Quando tal não acontece e se dispõe apenas de cartas topográficas com a
indicação da rede de drenagem, pode utilizar-se a curva hidrodinâmica para uma primeira ideia
do potencial energético da bacia.
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-17
V 1 = V 2 = V 3 = ... = K,
A1 A2 A3
hipótese válida em primeira aproximação desde que toda a área tenha características climáticas,
geológicas e de solos homogéneas. Então:
h max h max
En = 2,722 ∫0
V ⋅ dh = 2,722 K ∫
0
A ⋅ dh
Portanto, se se traçar uma curva semelhante às das figuras 2.11 e 2.12 mas em que os volumes
escoados são substituídos pelas correspondentes áreas de drenagem, teremos a curva
hidrodinâmica.
Para se obter o valor do potencial energético multiplica-se a área delimitada pela curva
hidrodinâmica pelo factor (2,722 * K). O valor de K pode ser estimado por uma das seguintes
vias:
• se numa secção (de preferência, a jusante) se conhecer o valor do volume anual médio V e
sendo A a respectiva área drenante, virá K = V/A, com K em m se V em Mm3 e A em km2.
• se não houver quaisquer dados de escoamento na bacia, utilizar o valor de K calculado para
uma bacia vizinha com características similares.
As figuras 2.13 e 2.14 apresentam as curvas hidrodinâmica e do potencial fluvial bruto da bacia
do Malema. As curvas diferem entre si porque a bacia não tem características homogéneas de
precipitação e, por isso, os escoamentos não são proporcionais às áreas.
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-18
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-19
Manual de Hidrologia
Caracterização de uma Bacia Hidrográfica 2-20
A geologia duma bacia hidrográfica e o tipo de solos dela resultante têm uma grande influência
no movimento da água na bacia, em particular no que toca ao escoamento, superficial e
subterrâneo.
A geologia e os solos duma bacia são também importantes factores condicionantes da erosão
superficial. As formações mais recentes (do Holoceno e Pleistoceno) assim como formações
calcárias e graníticas muito alteradas são as mais facilmente erodíveis. A erosão superficial nos
terrenos da bacia hidrográfica constitui a fonte do caudal sólido que tem de ser transportado pelo
rio.
A cobertura vegetal também tem bastante importância para os fenómenos hidrológicos. Duma
maneira geral, terrenos com florestas e matas têm maiores infiltrações e menores velocidade de
escoamento superficial do que terrenos nus ou cultivados. Isso ajuda a diminuir a erosão
superficial dos terrenos e origina cheias mais prolongadas e menos intensas. Por outro lado, o
tipo de vegetação influencia fortemente o fenómeno de evapotranspiração.
A geologia, os solos e a vegetação têm importância não apenas em grandes bacias hidrográficas
mas mesmo em pequenas bacias urbanas, como é evidenciado pelos grandes problemas de
erosão que se verificam em algumas das principais cidades de Moçambique como Maputo,
Nampula, Nacala e Pemba.
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-1
Uma variável aleatória χ é um variável que toma valores não resultantes de processos e leis
físicas ou relações matemáticas bem determinadas, sendo por isso atribuídos à sorte (acaso). Por
exemplo: o número de pontos no lançamento dum dado.
Uma variável aleatória pode ser discreta ou contínua. É discreta se só pode tomar valores
descontínuos, por exemplo, o número de dias de chuva num ano. A variável aleatória diz-se
contínua quando, num determinado intervalo de valores, limitado ou não, puder tomar qualquer
valor desse intervalo, por exemplo, a precipitação anual.
A população Ω é o conjunto de todos os valores que podem ser assumidos por uma variável
aleatória. Designa-se por amostra a parte observada da população.
A frequência (ou frequência relativa) dum acontecimento Ai é definida por f = n/N em que n é
o número de vezes em que o acontecimento Ai ocorre e N o tamanho da amostra. Por exemplo,
se há um registo de 10 anos de precipitação e se considera o acontecimento de Pano > 1200 mm,
pode acontecer que tal acontecimento ocorra 2 vezes na amostra, então f = 2/10 = 0.2.
A moderna teoria das probabilidades baseia-se numa axiomática desenvolvida por Kolmogorov
da qual se deduzem as seguintes consequências:
P(Ai) ≥ 0;
P(Ω) = 1;
P(A ∪ B) = P(A) + P(B) - P(A ∩ B);
P(A ∩ B) = P(A | B) x P(B) = P(B|A) x P(A);
Se P(A ∩ B) = P(A) x P(B), os acontecimentos são independentes.
Considere-se uma amostra de N valores duma variável aleatória e classifique-se essa amostra por
ordem crescente:
x1 ≤ x2 ≤ ... ≤ xN
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-2
x1 ≥ x2 ≥ ... ≥ xN
Note-se que P(χ ≤xi) + P (χ ≥xi) = P (χ ≤xi) + P(χ >xi) + P(χ =xi) = 1 + P (χ = xi) = F(xi) + G(xi)
Para uma variável aleatória contínua, define-se a função densidade de probabilidade f(x):
dF(x)
f(x) =
dx
dx dx
f ( x ) = Pr ob( x − ≤χ ≤ x+ )
2 2
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-3
A figura 3.1 ilustra as relações entre F(x), G(x) e f(x) para uma variável aleatória contínua.
Considere-se uma série de 50 valores, por exemplo de precipitação anual, ordenados por ordem
crescente. O valor de ordem i = 41 é igualado ou excedido 10 vezes na série correspondendo-lhe
uma probabilidade de não excedência F = 0.804. O intervalo médio entre ocorrências
sucessivas do acontecimento (χ ≥x41) seria então de cerca de 5 anos. Este intervalo médio entre
ocorrências sucessivas dum acontecimento é designado por período de retorno T.
Importa deixar bem claro que o conceito de período de retorno não está associado a qualquer
ideia de repetição cíclica e regular do acontecimento. Se, por exemplo, um acontecimento tem
um período de retorno de 10 anos, isso não quer dizer que tal acontecimento ocorre regularmente
de 10 em 10 anos: ele pode ocorrer em dois anos consecutivos assim como pode não ocorrer
durante trinta anos. Se, porém, dispusermos duma série suficientemente longa, então o intervalo
médio entre ocorrências consecutivas do acontecimento seria de 10 anos.
Então, a probabilidade de que o acontecimento ocorra pelo menos uma vez em N anos
sucessivos será dada por 1-[F(x)]N. Essa probabilidade designa-se por risco hidrológico R(x, N),
conceito com bastante interesse prático como se pode ver pelos exemplos seguintes.
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-4
1º Exemplo) Uma barragem levará 6 anos a ser construída. A sua construção far-se-á com a
protecção de ensecadeiras e desvio do rio através de galerias (como se fez, por exemplo, com a
barragem de Cahora-Bassa). Se adoptar como caudal de dimensionamento das galerias o
correspondente a uma cheia com o período de retorno T = 20 anos, qual é a probabilidade das
ensecadeiras serem galgadas durante a construção?
As galerias deveriam ser dimensionadas para um caudal com um período de retorno de cerca de
60 anos.
3.4.1 Introdução
Na Estatística, a população ou a amostra com que se está a lidar são representadas por um
número relativamente pequeno de parâmetros estatísticos. Trata-se de uma forma sintética de
apresentar as principais características da população ou da amostra, em relação às quais interessa
definir:
- a tendência central;
- a dispersão;
- a assimetria;
- os quantis.
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-5
1 N
m r' =
N
∑x
i =1
r
i para a amostra
μ = μ1'
x = m1'
Define-se momento centrado de ordem r como o momento de ordem r tomando a média como
origem:
-∞
∑( x - x ) i
r
mr =
i=1
para a amostra
N
Os parâmetros que caracterizam a tendência central indicam à volta de que valor se distribuem os
valores da população ou da amostra.
1 N
x=
N
∑x
i =1
i
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-6
A mediana é o valor que divide a população ou a amostra em duas partes de igual probabilidade
acumulada. Para uma população, a mediana é definida tal que:
μ ∞
∫
-∞
f(x) dx = ∫ f(x) dx = 0.5
μ
- se N ímpar, m = int(N/2) + 1
- se N par:
1
x m = (x N + x N )
2 2 +1
2
3.4.4 Dispersão
σ = ∫ (x - μ )
2 2
f(x)dx
+∞
N N
2
∑ ( xi - x )2
i=1 N ∑( x - x )
i=1
i
2
s = * =
N N -1 N -1
N/N-1 é um factor de correcção do viez. Diz-se que um estimador dum parâmetro apresenta viez
quando o seu valor não tende para o valor correspondente da população quando a dimensão da
amostra cresce indefinidamente.
O desvio padrão é a raiz quadrada da variância. Note-se que o desvio padrão é expresso nas
mesmas unidades que a média e que os elementos da amostra ou da população.
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-7
σ s
ηv = cv =
μ x
É um parâmetro adimensional.
A figura 3.2 apresenta duas séries com as mesmas médias mas com diferentes desvios padrão.
3.4.5 Assimetria
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-8
+∞
∫ (x - μ )
3
f(x) dx
γ= -∞
σ3
N N
∑( x - x )
i=1
i
3
N
2 ∑( x - x )
i=1
i
3
N
g= 3
* = 3
*
Ns (N - 1)(N - 2) s (N - 1)(N - 2)
3.4.6 Quantis
ξ p = ∫ f(x) dx = p
-∞
0≤p≤1
3.5.1 Metodologia
A partir duma dada amostra é possível definir a sua função de distribuição empírica. A FDE é, no
entanto, afectada pela dimensão limitada da amostra e, por outro lado, não permite extrapolar
para períodos de retorno superiores à duração da amostra.
Por essa razão, faz-se o ajustamento da amostra a uma função de distribuição teórica (ou lei de
probabilidades ou simplesmente distribuição), procurando-se de entre as várias que têm sido
propostas aquela que melhor se adapte à FDE.
A sequência de cálculo que se adopta para a extrapolação de valores com altos períodos de
retorno, necessários para o dimensionamento de obras hidráulicas, é então a seguinte:
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-9
As distribuições teóricas mais utilizadas em Hidrologia são a Normal (ou de Gauss), a Log-
Normal de 2 parâmetros (Lei de Galton), a Log-Normal de 3 parâmetros, a de Gumbel, a Gama,
a Pearson tipo III e a Log-Pearson tipo III. Neste capítulo apenas se estudará a distribuição
Normal, estudando-se algumas das restantes no capítulo dedicado às cheias.
A estimação pelo método dos momentos consiste em seleccionar os valores dos m parâmetros
da distribuição por forma a que os primeiros m momentos da distribuição sejam iguais aos
correspondentes momentos da amostra.
A distribuição Normal é a lei de probabilidades que melhor tem sido estudada do ponto de vista
teórico. Tem um enorme campo de aplicação não apenas em Hidrologia mas em muitas outras
áreas de Engenharia como a caracterização de solicitações em estruturas ou o controle de
qualidade dos materiais.
A função densidade é:
1 -(x -b )2
f(x) = e 2a 2
a 2π
A função de distribuição é:
x
dF(x)
F(x) = ∫ f(x) dx f(x) =
-∞
dx
A distribuição é simétrica, não sendo integrável analiticamente. F(x) é obtida por integração
numérica e dada em tabelas. A distribuição tem 2 parâmetros: a, b.
- média μ = b;
- variância σ2 = a2;
- coeficiente de assimetria γ = 0.
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-10
1 -(x - μ )2
f(x) = e 2σ 2
σ 2π
As tabelas da distribuição Normal são construídas para uma variável z, variável normal
reduzida, definida por
z = (x – μx)/σx
A tabela 3.1, reproduzida de Lencastre e Franco (1984), dá os valores de F(z) para z de 0.00 a
3.49 em intervalos de 0.01. Atendendo à simetria da distribuição, a tabela permite obter valores
de F(z) para –3.49 ≤ z ≤ 0.
Esta tabela pode ser utilizada para qualquer distribuição Normal mesmo que não tenha μ=0 e
σ=1, bastando para isso fazer a transformação (x-μx)/σx. Da tabela tira-se que as probabilidades
de x estar entre μ+σ e μ-σ; μ+2σ e μ-2σ; μ+3σ e μ-3σ são respectivamente de 68.3%, 95.4% e
99.7%. As probabilidades de 90%, 95% e 99% correspondem aos intervalos μ ± 1.645σ, μ ±
1.96σ, μ ± 2.575σ.
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-11
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-12
Existem métodos analíticos para testar se o ajustamento duma série à Distribuição Normal (ou a
outra distribuição teórica) é aceitável. Estes métodos, como o teste do qui-quadrado e o de
Kolmogorov-Smirnov, serão vistos no capítulo dedicado à estatística de cheias. Um processo
também muito utilizado para verificar se o ajustamento é aceitável é a utilização de papel de
probabilidade, papel com os eixos construídos de tal maneira que, se uma série se ajusta bem à
distribuição representada nesse papel, os seus pontos alinham-se aproximadamente segundo uma
recta. Os pontos têm coordenadas (F(xi), Yi) em que F(xi) é o probabilidade de não excedência
do valor i da série ordenada em ordem crescente ("plotting position") e Yi o valor i da série.
- Califórnia i/N;
- Hazen (2i-1)/2N;
- Weibull i/(N+1);
- Chegadayev (i-0.3)/(N+0.4);
- Blom (i-0.375)/(N+0.25);
- Tukey (3i-1)/(3N+1).
A correlação e regressão lineares constituem uma das ferramentas mais utilizadas em Hidrologia,
essencialmente para:
A figura 3.4 representa genericamente o domínio das variáveis aleatórias x e y com funções de
distribuição de probabilidade respectivamente f(x) e g(y).
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-13
dx dx
P(x - ≤ x ≤ x + ) = P(x) = f(x)dx
2 2
P(y) = g(y)d(y)
dx dx dy dy
P(x - ≤ x ≤ x + ∩ y - ≤ y ≤ y + ) = P(x, y) = f(x)g(x)dx dy se os
2 2 2 2
acontecimentos forem independentes.
Se os acontecimentos não forem independentes, diz-se que há entre as varáveis uma dependência
estocástica. Quando essa dependência é linear, ela é medida pelo coeficiente de correlação
linear ρxy:
y x
∑ ( x - x )( y - y ) ∑ x y - N x y
i i i i
r xy = i=1
= i=1
para a amostra.
(N - 1) s x s y (N - 1) s x s y
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-14
O coeficiente de correlação exprime o grau de associação, mais ou menos elevado, entre duas
variáveis aleatórias. Quando a correlação é elevada, pode estabelecer-se uma regressão linear
duma variável (dependente) sobre a outra (independente), isto é, tentar explicar a variação da
variável dependente como uma função linear da variação da variável independente. Por exemplo,
pode tentar-se estabelecer uma regressão linear do escoamento anual numa bacia em função da
precipitação ponderada sobre a bacia.
Como se sabe, o método dos mínimos quadrados determina os coeficientes por forma a
)
minimizar a soma dos quadrados dos desvios. Designando por y a estimativa de y fornecida
pela regressão linear, ter-se-á:
)
Z = Σi (yi – y i)2 = Σi [yi – (axi + b)]2
= Σi [yi2 – 2 axiyi – 2 byi + (axi + b)2]
= Σi [yi2 – 2 axiyi – 2 byi + a2xi2 + 2axib + b2]
∑x
i=1
i yi - N x y
a= N
∑x
i=1
i
2
- N x2
b= y - ax
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-15
Como ŷ = y , e = 0.
Esta relação evidencia como a variância residual varia com o coeficiente de correlação. Quando
a correlação é perfeita, r=1, os pontos alinham-se todos segundo uma recta e a variância residual
ou variância não explicada pela regressão é nula. À medida que r diminui, se2 vai tendendo para
sy2, ie, a regressão “explica” cada vez menos a variância de y.
Importa notar que, normalmente, a regressão de y sobre x não coincide com a regressão de x
sobre y. Isso só acontece se sy = sx.
Por outro lado, interessa ter uma regra prática que indique quando é que vale a pena utilizar
regressão linear, ou seja, qual o limite inferior para o coeficiente de correlação. Chow (1964)
sugere que se pode usar regressão linear quando ⎮r⎮ > 0.60, o que corresponde a explicar cerca
de 1/3 da variância de y através da regressão. Talvez seja preferível, no entanto, adoptar como
limite inferior para ⎮r⎮ um valor um pouco mais alto como 0.70 (cerca de metade da variância
de y explicada pela regressão) ou 0.80 (variância explicada é cerca de 2/3 da variância total).
Para além disso, importa sempre ver se há uma base física para o estabelecimento da regressão
afim de evitar as correlações espúrias (fruto do acaso, do tamanho limitado da amostra ou da
transformação de variáveis).
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-16
Exemplo: Considerem-se as séries de precipitações anuais nos postos udométricos P621 e P705,
ambos situados na bacia do rio Monapo. Pretende-se estender as duas séries.
Ano 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
P621 (mm) 1162 1069 957 1058 1108 1155 805 936 921 732
P705 (mm) - - - - - - - - - 600
Ano 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
P621 (mm) 858 1094 1027 1139 1047 972 1212 1354 876 -
P705 (mm) 923 1087 1166 1064 1298 931 1121 1249 697 976
Ano 21 22 23 24 25 26 27 28
P621 (mm) - - - - - - - -
P705 (mm) 1316 766 1129 1187 794 1125 890 880
A série P621 tem 19 valores e a P705 também tem 19 valores, sendo o período comum de 10
anos. Pretende-se estender a série P705 para os primeiros nove anos por regressão sobre P621 e
estender esta para os últimos nove anos por regressão sobre P705.
r = 0.80 ; cd = 0.64
y = 1.01x – 28,
Para estender agora a série P621 para os últimos 9 anos, estabelece-se uma outra regressão
linear:
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-17
Um aspecto importante a notar quando se utiliza regressão linear para estimar um número grande
de valores em falta é que a variância da série estendida se reduz em relação à série original,
devido ao facto da regressão não entrar com a variância residual (os valores estimados situam-se
sobre a recta de regressão e não à volta dela). Por exemplo, para a série P705 o desvio padrão da
série original (19 valores) é 205 enquanto a série estendida é 180. A média praticamente não
varia (de 1010 para 1008). Assim as características estatísticas da série mudam, o que não é
desejável.
Para obviar a esse inconveniente, pode-se modificar a expressão da regressão linear para:
y = ax + b + s e z = ax + b + s y 1 - r 2 z
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-18
A nova parcela é uma componente aleatória, obtida por multiplicação do erro padrão da
estimativa por uma variável aleatória z ≡ N(0,1). É possível obter sucessivos valores de z
recorrendo a uma tabela de números aleatórios ou utilizando rotinas de computador (gerador de
números aleatórios). Esta parcela adicional faz com que a variância de y se mantenha (coloca os
pontos fora da recta de regressão).
Não é possível nestas notas introdutórias aprofundar este tema que é, no entanto, extremamente
importante por ser a base dos chamados modelos autoregressivos de geração sintética.
Em situações como esta, uma transformação das variáveis x e y permite mudar uma associação
não linear para uma associação linear a que se podem aplicar as técnicas de correlação e
regressão lineares descritas no tópico anterior. A transformação mais correntemente utilizada em
Hidrologia é a logarítmica que pressupõe que x e y estariam ligados por uma relação do tipo:
y = axb,
ou seja, uma relação linear entre os logaritmos de x e y. Pode dar-se como exemplo a equação da
curva de recessão dum rio alimentado por um aquífero, Qt = Qo e -αt.
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-19
Se o número de valores da amostra for N, m deve ser bastante inferior a N, não devendo como
regra prática exceder N/5. Pode-se então escrever:
Assim temos N equações com m+1 incógnitas (N > m+1), nomeadamente c0, c1, c2, ...., cm.
Determinam-se os coeficientes c0, c1, c2, ...., cm de tal maneira que a soma dos quadrados dos
desvios entre y e a estimativa de y seja minimizada (método dos mínimos quadrados). Da mesma
maneira que no caso da regressão linear simples, minimiza-se o valor de
z = Σi [yi - f(x1i,x2i,....,xmi)]2.
As medidas de correlação linear múltipla mais utilizadas são o erro padrão dos resíduos, o
coeficiente de correlação múltipla, o coeficiente de determinação e os coeficientes de
correlação parciais.
O erro padrão dos resíduos calcula-se da mesma forma que para a regressão linear simples:
ei = y i - yˆ i , e = 0
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-20
N −1 N
s e2 = ∑
( N − 1) ⋅ ( N − m ) i =1
ei2
Coeficiente de determinação
Os coeficientes de correlação parciais ri medem o grau de associação de y com cada uma das
variáveis xi e determinam a parte da variância de y explicada por cada xi.
Para calcular um dado ri, começa-se por se determinar o coeficiente de correlação múltipla, R-i,
obtido sem incluir xi na regressão. Então:
2 R
2
- R -i 2
ri =
1 - R -i 2
A obtenção dos coeficientes de correlação parciais é trabalhosa mas bastante útil pois permite
excluir da regressão variáveis que não ajudam a aumentar a variância explicada.
Manual de Hidrologia
Revisão de Conceitos de Probabilidades e Estatística 3-21
EXERCÍCIOS
1) Calcule a média e o desvio padrão das seguintes séries de precipitações anuais (em 2
zonas diferentes).
Comente os resultados.
2) Reactores nucleares, grandes barragens, diques altos, etc. devem ser projectados de tal
maneira que a probabilidade da sua danificação / galgamento seja da ordem de 1 vez em 10,000
anos (período de retorno de 10,000 anos).
a) Calcule o risco de danos num reactor nuclear assim dimensionado nos primeiros 50 anos
do seu funcionamento.
b) Repita o cálculo para um período de retorno de 1000 anos.
3) Qual é o risco que um acontecimento com período de retorno de N anos ocorra (pelo
menos uma vez) em N anos.
4) O valor da precipitação anual numa zona pode ser caracterizada pela distribuição
Normal. A precipitação anual média é de 723 mm. O desvio padrão é de 212 mm.
Série: 1803 1295 1118 1626 1120 1116 1473 1194 1016 1372 2015 1662 1549 1448
1753 1914 1422 1346 1092 1489 1397 1245 1219
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-1
4 PRECIPITAÇÃO
4.1 ALGUNS ELEMENTOS SOBRE A CIRCULAÇÃO ATMOSFÉRICA
Muita da água que precipita deriva da evaporação nos oceanos e do transporte a longa distância
pela circulação atmosférica. As duas forças motrizes fundamentais da circulação atmosférica
resultam da rotação da Terra e da transferência de energia entre o Equador e os Polos.
A Terra recebe permanentemente calor do sol através da radiação solar e emite calor por re-
radiação ("back radiation") para o espaço. Estes processos estão balanceados em média ao valor
de 210 W/m2. O aquecimento da Terra é, no entanto, desigual: enquanto que, no Equador, a
radiação solar é quase perpendicular à superfície e tem um valor médio de cerca de 270 W/m2, na
região polar, ela atinge a superfície segundo um ângulo oblíquo e tem um valor médio de apenas
cerca de 90 W/m2.
A radiação emitida é uma função da temperatura absoluta da superfície, a qual varia pouco entre
o Equador e os Polos (mais cerca de 20% no Equador). Portanto, a radiação emitida pela Terra é
bastante mais uniforme do que a radiação recebida, provocando assim um desequilíbrio. O
equilíbrio é reposto essencialmente através da circulação atmosférica que transfere energia do
Equador para os Polos (valor médio de cerca de 4 * 109 MW).
Se a Terra fosse uma esfera imóvel, a circulação atmosférica corresponderia à figura 4.1. Junto
do Equador haveria uma ascensão de massas de ar que viajariam na parte superior da atmosfera
em direcção aos Polos, arrefecendo e descendo para as camadas inferiores e voltando para o
Equador (a chamada “ circulação de Hadley”).
A rotação da Terra no sentido Oeste – Leste modifica este modelo simplificado de circulação.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-2
Na célula tropical, o ar aquecido sobe no Equador, dirige-se para o Polo pela camada superior da
atmosfera, arrefece e desce para a superfície próximo da latitude 30º. Junto da superfície divide-
se em dois ramos, um seguindo em direcção ao Polo e o outro retornando ao Equador. Na célula
polar, o ar ascende próximo da latitude 60º, dirigindo-se para o Polo pela camada superior da
atmosfera. Depois arrefece, desce e regressa, próximo da superfície, à latitude 60º.
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Precipitação 4-3
A célula intermédia é o resultado da fracção das outras duas. Próximo da superfície, o ar dirige-
se para o Polo, originando ventos de Oeste.
A distribuição irregular das superfícies dos oceanos e dos continentes, com as correspondentes
diferenças de propriedades térmicas, cria uma variação especial adicional na circulação
atmosférica.
A mudança anual do Equador térmico devido á rotação da Terra à volta do Sol causa uma
correspondente oscilação no padrão de circulação das três células. Quando há uma grande
oscilação, as trocas de ar entre células vizinhas são mais frequentes e completas, possívelmente
resultando numa sequência de anos muitos húmidos. Quando a oscilação é pequena, podem-se
gerar centros estáveis de altas pressões próximos das latitudes 30º, originando extensos períodos
secos.
É preciso notar também que, enquanto na troposfera a temperatura decresce regularmente com a
altitude (a troposfera varia de cerca de 16 km de altura no Equador para cerca de 8 km nos
Polos), junto à ionosfera (que separa a troposfera da estratosfera) há variações muito bruscas de
pressão e temperatura que produzem fortes correntes de ar, designadas como " jet streams", com
velocidades entre 15 e 50 m/s, que se mantêm em movimento durante milhares de quilómetros e
têm uma importante influência no movimento das massas de ar.
O estudo do transporte do vapor de água pela circulação atmosférica às várias altitudes mostra
que o seu fluxo é mais intenso na baixa atmosfera, com um máximo na vizinhança de 1 km de
altitude, sendo práticamente desprezável acima de 6 km de altitude. Para a análise do fluxo de
vapor de água, a Meteorologia utiliza os conceitos matemáticos de divergência dum campo de
vectores: quando há divergência do fluxo numa dada região, isto significa que aí existe uma
fonte de humidade, isto é, em média a evaporação excede a precipitação; quando há
convergência, há um sumidouro de humidade, ou seja, em média a precipitação excede a
evaporação.
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Precipitação 4-4
Portanto, as fontes primárias e mais importantes da humidade para toda a atmosfera encontram-
se nas regiões subtropicais, principalmente sobre os oceanos, onde a evaporação corre
contínuamente. A humidade fornecida é transportada pela circulação atmosférica para as regiões
de convergência onde precipita.
O esquema da circulação atmosférica regional pode ser melhor compreendido através das figuras
4.4 e 4.5 que esquematizam as cartas da pressão atmosférica média, reduzida ao nível médio do
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Precipitação 4-5
A = anti-ciclone;
B = baixas pressões;
E = massa de ar equatorial;
Tmu = massa de ar tropical marítimo;
Tc = massa de ar continental.
Em Janeiro, época do ano em que o sol está para sul do Equador, devido ao forte aquecimento da
massa continental, passam a predominar na região as baixas pressões. A zona intertropical de
baixas pressões é uma zona de convergência, alimentada por massas de ar equatorial e tropical
marítimos e limitada a norte e a sul por camadas de ar tropical continental. As camadas de
transição nos limites da zona de convergência são designadas por frentes intertropicais, norte e
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Precipitação 4-6
A parte de Moçambique a norte do paralelo 20° S fica sob a acção de massas de ar equatorial, E,
e a sul, de massas de ar tropical marítimo instável, Tmu.
Durante a época do ano em que o sol está para norte do Equador, a massa do continente africano
situada ao sul arrefece, o que provoca o avanço e o predomínio dos sistemas de altas pressões. A
FITS passa a estar bastante a norte de Moçambique a partir de Abril e o anticiclone do Índico
migra para norte, fixando-se em cerca de 30° S. Gera-se ainda uma célula anti-ciclónica sobre a
África Austral (deserto do Kalaari).
Assim, a parte de Moçambique a norte do paralelo 20° S fica sob a acção de massas de ar
tropical marítimo, Tmu. A sul desse paralelo, a influência é principalmente de massas de ar
tropical continental, Tc, constituídas por ar quente e seco.
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Precipitação 4-7
O conhecimento actual da Meteorologia diz-nos que são necessárias quatro condições para
produzir as quantidades de precipitação que se verificam:
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Precipitação 4-8
A condensação origina microgotas cujo diâmetro não excede 200 μm, conforme se determinou
teóricamente. Este diâmetro é muito inferior ao das gotas de chuva, razão pela qual se estudam
os mecanismos que permitem o crescimento das microgotas.
Designa-se por coalescência um processo em que as microgotas se aglomeram para dar origem a
gotas maiores. Essa junção pode ter causas diversas como a atracção electrostática, atracção
hidromecânica, indução magnética, colisões de microturbulência, mas todas elas são
consideradas muito fracas para terem uma influência significativa no crescimento. A causa mais
importante é a diferença de velocidades entre gotas pequenas e grandes o que origina choques e a
absorção das gotas pequenas pelas maiores que assim continuam a crescer.
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Precipitação 4-9
A quantidade total de água (sob a forma de vapor, gotas ou cristais de gelo) contida na atmosfera
num dado instante é muito reduzida. Se toda ela fosse condensada e distribuída uniformemente
sobre a Terra, daria uma camada com apenas cerca de 25 mm de altura. Para justificar as
quantidades de precipitação que constantemente se observam é, por isso, necessário que numa
dada região onde se iniciou a precipitação, haja um afluxo de massas de ar húmido que
alimentam a continuação desse precipitação. Este processo é denominado de convergência. As
grandes precipitações só ocorrem em zonas de baixas pressões sobre as quais convergem ventos
que transportam humidade de vastas regiões adjacentes.
Embora grande número de civilizações e culturas conheçam de longa data "o homem que fazia
chover", datam do século passado os esforços mais sérios e sistemáticos para provocar
artificialmente a ocorrência de precipitação. No presente estado de conhecimentos, a precipitação
artificial é originada lançando sobre as nuvens cristais de gelo seco ou iodeto de prato que
actuam como núcleos de condensação e crescimento das gotas.
Os resultados até agora obtidos não evidenciam significativos sucessos mesmo porque se torna
difícil distinguir um eventual aumento de 10 - 15% da precipitação da variabilidade natural da
mesma. Também não se conhecem que efeitos é que a sua aplicação em longa escala terá no
ciclo hidrológico à escala regional e mundial. No entanto, em fins da decada de 70 a precipitação
artificial já era usada nos Estados Unidos em cerca de 7% do território.
Por outro lado, é preciso notar que a precipitação artificial procura estimular os mecanismos da
condensação e do crescimento das gotas mas não tem qualquer efeito no mecanismo de
acumulação de humidade, já que não é possível criar artificialmente um centro de baixas
pressões.
Embora o maior interesse da precipitação artificial seja para as regiões áridas, ela tem sido
utilizada em outras regiões para dissipar nuvens, evitando a queda de granizo ou geada.
Existe muito difundida a ideia de que áreas onde há grande evaporação têm grande precipitação.
Esta ideia é errada pois, embora a evaporação sobre os continentes corresponda a cerca de 2/3 da
precipitação que sobre eles ocorre, a precipitação não tem apenas essa fonte mas
fundamentalmente a humidade transportada pelos ventos que convergem para as zonas de baixas
pressões.
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Precipitação 4-10
- convectiva;
- orográfica;
- frontal;
- ciclónica.
A precipitação de origem convectiva é causada pela subida duma massa de ar quente, menos
denso, para as camadas superiores da atmosfera, mais frias, onde arrefece, condensa o vapor de
água e precipita. Está associada a um fenómeno de instabilidade provocado por um aquecimento
desigual da superfície do solo (ver a figura 4.6).
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Precipitação 4-11
Nas regiões Centro e Norte, o relevo é acentuado e torna-se evidente a correlação entre os
valores elevados de altitude e de precipitação, veja-se as figuras 4.14 e 4.15. É de notar que a
vertente exposta ao vento tem uma precipitação bastante superior à outra vertente.
Diz-se que há uma frente quando uma massa de ar frio contacta uma massa de ar mais quente,
sendo a superfície de contacto mais ou menos bem definida (figura 4.8). As regiões Centro e Sul
de Moçambique são frequentemente afectadas pelas frentes frias: massas de ar frio provenientes
das regiões temperada e polar deslocam-se e encontram sobre o continente massas de ar quente,
forçando-as a subir. O movimento ascensional induz o arrefecimento da massa de ar quente com
posterior condensação e precipitação. A frente fria pode originar precipitações intensas e
prolongadas sobretudo junto à superfície frontal, podendo a região coberta pela precipitação
estender-se de 50 a 100 km a partir dessa superfície.
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Precipitação 4-12
As chuvas intensas e os ventos fortes dão aos ciclones tropicais características muito destrutivas.
Moçambique, apesar de relativamente protegido pela barreira que Madagáscar constitui, tem
sofrido graves prejuízos com os ciclones, casos do Claude (1966) e Domoína (1984), que
afectaram a região Sul, Felícia (1978) que assolou a Zambézia e Sofala e Nadia (1996) que
provocou grandes destruições na província de Nampula.
A altura de precipitação sobre uma dada área é igual ao volume da precipitação sobre essa área
a dividir pelo valor da área. É normalmente expressa em mm ou em l/m2.
1 mm = 1 l/m2 = 10 m3/ha
4.5.2 Udómetros
Para se garantir a consistência a nível nacional e regional dos valores medidos, os instrumentos
de medição são padronizados quer em relação às suas dimensões quer em relação à sua
localização no terreno.
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Precipitação 4-13
O valor medido é registado diáriamente em impresso próprio por um agente (leitor). O impresso
abrange normalmente o período de 1 mês sendo ao fim desse tempo recolhido e enviado para os
serviços regionais ou centrais para análise (detecção de anomalias), processamento e arquivo. As
medições são feitas sempre à mesma hora, no caso de Moçambique às 9 horas da manhã.
4.5.3 Udógrafos
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Precipitação 4-14
A água proveniente do sifão é recolhida num depósito que serve para controlar a quantidade total
de água registada no período de observação. A figura 4.11 representa um exemplo dum
udograma.
Figura 10 - Udograma
Deste udograma é possível obter, por exemplo, a intensidade média da precipitação entre as 3 e
as 6 horas do dia 1/2 como sendo:
e que a intensidade máxima instantânea foi de cerca de 4.2 mm/h por volta das 4 horas do dia
1/2.
A figura 4.12 representa um udógrafo basculante. A água recolhida vai enchendo o receptáculo
A e quando este tem uma certa quantidade de água (por exemplo equivalente a 2.5 mm) bascula
bruscamente em torno do eixo, começando o enchimento do receptáculo B. De cada vez que há
uma mudança é marcado um traço vertical no gráfico.
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Precipitação 4-15
A principal fonte de erro na medição da precipitação é o vento. A aceleração vertical para cima
imposta ao ar junto dum udómetro transmite uma aceleração semelhante à precipitação,
reduzindo a quantidade que entra no udómetro. Este efeito é mais significativo para pequenas
gotas e, portanto, para chuvisco. Quanto mais alto estiver o udómetro maior será o efeito do
vento pelo que se deve evitar instalar o equipamento nos telhados dos edifícios ou em zonas
muito batidas pelo vento.
A melhor localização é ao nível do solo, com árvores ou sebes para quebrarem o vento desde que
não estejam tão próximas que interceptem a precipitação. Para tal, esses obstáculos devem estar a
uma distância do udómetro superior a metade da sua altura (ver a figura 4.13).
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Precipitação 4-16
Um radar transmite um impulso de energia electromagnética sob a forma dum feixe emitido por
uma antena móvel. Essa onda que viaja com a velocidade da luz é parcialmente reflectida pelas
nuvens ou pelas partículas que precipitam e volta ao radar, sendo captada pela mesma antena. A
energia retornada é o alvo, a quantidade de energia retornada é a potência de retorno e a sua
visualização no ecran do radar é o eco.
A intensidade do eco é uma indicação da grandeza da potência de retorno que, por sua vez,
mede a reflectividade do radar nos hidrometeoros. Essa reflectividade depende da distribuição
dos tamanhos das partículas, do número de partículas por unidade de volume e da forma das
partículas. No entanto, geralmente a reflectividade é tanto maior quanto mais intensa for a
precipitação.
O intervalo de tempo entre a emissão do impulso e o eco mede a distância a que se encontra o
alvo, enquanto que a direcção do alvo corresponde à orientação da antena na altura da emissão.
Assim, rodando a antena torna-se possível definir a extensão superficial duma chuvada.
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Precipitação 4-17
O mesmo relatório da DNA fornecia os seguintes dados sobre a extensão dos registos,
considerando apenas as estações da DNA (quadro 4.1):
Alguma informação adicional sobre as redes udométrica e hidrométrica vem contida em Ataíde
(1974):
Apenas 41 estações das 787 de 1970 estavam equipadas com udógrafos. Tomando 1970 como
ano de referência, o número de anos de funcionamento era o seguinte:
1
Dados da DNA
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Precipitação 4-18
Com base nos dados registados pela rede hidrométrica, foi possível determinar as precipitações
médias nos vários postos e, a partir daí, traçar a carta de isoietas da precipitação anual média em
Moçambique (figura 4.14), apresentada num estudo de Gonçalves (1974). A precipitação
ponderada anual média sobre Moçambique é de cerca de 950 mm, ou seja de 740 biliões de
metros cúbicos. A análise da carta de isoietas permite evidenciar os três factores que influenciam
mais fortemente a ocorrência da precipitação em Moçambique: o relevo, a distância ao litoral e a
latitude.
A latitude influencia a precipitação pois a região Norte tem um regime de chuvas diferente do
das regiões Centro e Sul. Nestas, a precipitação tem origem principalmente a partir de frentes
frias e ciclones ao passo que na região Norte é o movimento (para sul, na época das chuvas) da
zona de convergência intertropical, criando centros de baixas pressões, que é o factor principal a
ter em conta.
A figura 4.16 ilustra a variabilidade temporal das precipitações através do registo das
precipitações anuais em Chokwé entre 1923/1924 e 1981/1982. A precipitação anual média é de
638 mm e o coeficiente de variação da precipitação anual é de 0.28. Os índices de humidade
extremos no período considerado foram de 1.9 em 1949/1950 e de 0.47 em 1939/1940 e
1951/1952. A figura 4.17 ilustra a distribuição ao longo do ano das precipitações mensais média
nos postos P154 (Gurué) e P783 (Malema) evidenciado o semestre húmido e o semestre seco. Na
figura apresentam-se também os coeficientes pluviométricos mensais.
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Precipitação 4-19
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Precipitação 4-20
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Precipitação 4-21
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-22
A partir duma carta onde está delimitada a bacia ou a região cuja precipitação se pretende
calcular e marcados os postos udométricos (dentro da região e à volta), executam-se os seguintes
passos:
i) Liga-se cada posto com todos aqueles que lhe ficam próximos, definindo
segmentos de recta;
ii) Traçam-se mediatrizes desses segmentos. Essas mediatrizes, juntamente com os
limites da região definem polígonos à volta dos vários postos - são os polígonos
de Thiessen;
iii) Medem-se as áreas dos polígonos e a área total da região;
iv) Calculam-se os coeficientes de Thiessen para os vários postos:
Ai
ci =
Atotal
O polígono respeitante a um dado posto é o lugar geométrico dos pontos da região que estão
mais próximos desse posto do que de qualquer outro. O método atribui a todos os pontos dum
polígono uma precipitação igual à registada no respectivo posto o que equivale a admitir que a
variação da precipitação entre dois postos contíguos é linear.
Note-se que mesmos postos fora da região podem ter um polígono dentro dela. A figura 4.18
esclarece o traçado dos polígono e o cálculo de P.
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Precipitação 4-23
O método das isoietas é, como o método de Thiessen, um método de base gráfica. Para se
calcular a precipitação na região, é necessário começar por traçar as isoietas (linhas de igual
precipitação). Para tal, pode utilizar-se o seguinte procedimento (ver também a figura 4.19):
∑i Ai ( Pi + Pi+1 )/2
P=
Atotal
No traçado das isoietas, um hidrologista experiente pode ir além do procedimento atrás indicado,
afeiçoando-as de maneira a entrar em conta com o relevo e a distância ao litoral.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-24
A figura 4.20 apresenta a carta de isoietas na região sul do país, abrangendo as bacias do
Maputo, Tembe, Umbelúzi e Incomati (incluindo as áreas na África do Sul e Suazilândia) do dia
29/01/84 quando ocorreram as chuvadas mais intensas do ciclone Domoína.
A principal vantagem do método de Thiessen sobre o método das isoietas é que os polígonos de
Thiessen não dependem dos valores da precipitação registados nos postos e, portanto, o cálculo
da precipitação ponderada na região faz-se sempre com os mesmos coeficientes. Apenas é
necessário recalcular os polígonos se algum dos postos não tiver registos para a precipitação
ponderada que se pretende calcular.
As isoietas dependem dos valores das precipitações. Isso torna o método muito trabalhoso para
aplicação rotineira, razão pela qual se reserva a aplicação do método das isoietas ao cálculo de
precipitações ponderadas para precipitações médias (anuais, semestrais, mensais), precipitações
com determinada probabilidade de excedência (p.exº 80%) ou para chuvadas extremas.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-25
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-26
Uma outra desvantagem do método das isoietas relativamente ao método de Thiessem é a dose
de subjectividade com que as isoietas são traçadas. Por outro lado, isso permite a um hidrologista
experiente traçar as isoietas entrando em linha de conta com a influência do relevo, distância à
costa e exposição aos ventos húmidos, o que constitui uma vantagem sobre o método de
Thiessen.
Normalmente, as isoietas serão traçadas para situações particulares como, por exemplo, os
valores anuais ou semestrais médios ou para uma chuvada particularmente intensa. Para os
cálculos de rotina, será utilizado o método de Thiessen.
A utilização do computador permite eliminar a parte mais trabalhosa dos dois métodos,
facilitando a sua utilização.
No método das isoietas, poder-se-á utilizar os programas que fazem o traçado de isolinhas (Z =
constante) a partir do conhecimento de valores Z(x,y) num número discreto de pontos como se
faz já com o traçado de curvas de nível a partir do conhecimento dum número de pontos
contatos.
Para o método de Thiessen existem já diversos programas operacionais que fazem o traçado dos
polígonos e calculam os coeficientes Thiessen a partir das coordenadas dos postos udométricos e
dos pontos que definem a fronteira da região, coordenadas essas que se obtêm facilmente se se
dispuser duma mesa digitalizadora.
A experiência indica que, numa dada região, precipitações muito intensas não se verificam
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-27
simultâneamente em todos os pontos. Quando numa região apenas se dispõe de medições num
posto udométrico, a precipitação ponderada deve corresponder a multiplicar a precipitação
pontual por um factor de redução inferior a 1. Óbviamente, esse factor será tanto mais pequeno
quanto maior fôr a área em consideração e mais curta a duração da chuvada.
Estudos feitos nos Estados Unidos pelo US Weather Bureau permitiram a elaboração do gráfico
apresentado na figura 4.21. Este gráfico é apresentado apenas para efeitos ilustrativos e não deve
ser utilizado para cálculos em Moçambique, para cujas condiçoes não foi aferido.
Determinados valores calculados a partir dos registos de precipitação permitem fazer uma
caracterização sumária da precipitação.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-28
Não é invulgar que uma série de registos de precipitação acuse, na sua análise, inconsistência,
i.e., uma subsérie contendo os anos terminais regista características (como a média e o desvio
padrão) muito distintas da subsérie dos anos iniciais. Isso pode ter origem, por exemplo, na
mudança de localização do udómetro, na construção duma habitação demasiado próxima ou na
substituição do aparelho de medida.
Quando isso acontece, é necessário rectificar a série, tornando-a consistente. O método mais
utilizado para a detecção de inconsistência é o método da dupla massa o qual permite que se
faça posteriormente a correcção da série.
Se neste gráfico os pontos se alinharem ao longo duma recta não se detecta inconsistência. Se, no
entanto, se verificar uma situação como a da figura 4.22 em que, a partir dum dado ano, há uma
clara mudança de inclinação que se mantém (verificada pelo menos nos últimos 5 anos), então
pode suspeitar-se de haver inconsistência na série em estudo.
Nesse caso, é preciso verificar o que aconteceu com a estação, se houve uma mudança do local
ou outra causa que possa ser a origem da inconsistência.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-29
Figura 4.22 - Teste de consitência duma série pelo método da dupla massa
É necessária muita cautela na utilização do método da dupla massa. Em primeiro lugar, é preciso
que o desvio se mantenha durante uma série de anos (cinco ou mais); depois, é preciso que as
estações de apoio tenham todas séries de registos consistentes. É igualmente necessário encontrar
a causa física que possa ter originado a inconsistência.
Quando estas condições se verificam, pode rectificar-se a série de forma a torná-la consistente:
pega-se nos valores da subsérie anterior à mudança de declive e multiplica-se os seus valores
pela relação das tangentes. No exemplo da figura 4.22, ter-se-ia de multiplicar os valores
anteriores a 1981 por 0.84/1.40 = 0.60.
Finalmente há que referir que o método da dupla massa só deve ser aplicado para durações
suficientemente longas, ou seja, para séries de precipitação semestral ou anual.
Frequentamente, os registos de precipitação para uma dada estação têm faltas de 1 ou mais dias
e, por vezes, até de períodos mais longos. Para não se perder totalmente a continuidade dos
registos, utilizam-se métodos para estimar os valores em falta, permitindo assim reconstituir os
totais mensais, semestrais e anuais. Os mais utilizados são o método da razão normal, o método
do US National Weather Service e o método da regressão linear múltipla.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-30
P x [( P A ) + ( P B ) + ( PC )]
Px =
3 PA PB PC
Se um ou mais quadrantes não contiverem nenhuma estação, como pode acontecer se a estação
X se localizar na costa, o somatório estende-se apenas aos restantes quadrantes.
Os métodos atrás referidos, embora bastante práticos, só são válidos quando a densidade das
estações é elevada. Quando isso não acontece, é preferível utilizar o método da regressão linear
múltipla.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-31
4.10.1 Introdução
A duração a considerar para a precipitação varia consoante o objecto do estudo, podendo ir desde
poucos minutos em obras urbanas (colectores pluviais) a algumas horas (obras urbanas ou em
rios com pequenas bacias hidrográficas) ou mesmo alguns dias (obras em rios com grandes
bacias hidrográficas).
Procura-se então obter relações entre as seguintes grandezas: a altura de precipitação (ou a
intensidade), a duração da chuvada e a frequência (ou o período retorno).
Uma das relações mais utilizadas envolvendo a altura, a duração e o período de retorno é:
h = a.t n .T m
h = a.t n
Chama-se a atenção que estas relações não são dimensionalmente homogéneas. Por isso, há que
especificar as unidades em que se expressam h e t.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-32
Como se sabe, a intensidade descrece com a duração da chuvada o que implica que o parâmetro
n tenha um valor inferior a 1. A figura 4.24 representa a variação de h e i com t.
h 1
i= = at n −1 =
t n
que é a equação duma recta no espaço logarítmico. Curiosamente, e reforçando a ideia de que as
curvas de possibilidade udométrica constituem uma expressão adequada para as precipitações
intensas, o registo das máximas precipitações registadas no mundo para diferentes durações (ver
o quadro 4.4) adapta-se perfeitamente a uma recta num gráfico com eixos logarítmico como se
pode ver na figura 4.25, retirada de LINSLEY et al. (1977). Estes máximos mundiais (a que se
poderia associar empiricamente o período de retorno de 150 anos, considerando o tempo de
existência de registos fiáveis) correspondem à seguinte relação:
h = 417 t 0.48
com h em mm e t em horas.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-33
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-34
O processo mais directo para se obter curvas de possibilidade udométrica para diversos períodos
de retorno é o seguinte.
Suponha-se que se dispõe duma série de registos de precipitação com uma duração de N anos.
Indo buscar a essa série os maiores valores de precipitação registados para diferentes durações
(15 m, 30 m, 1h, 6 h, etc.) fica-se com um conjunto de pares de valores (hi,ti) ligados a um
período de retorno T = N já que esses valores são igualados ou excedidos uma vez em N anos.
Os parâmetros a, n da correspondente curva de possibilidade udométrica podem ser obtidos
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-35
implantando os pontos (hi,ti) num gráfico com eixos log-log ou através duma regressão linear
simples de ln h sobre ln t.
Se agora se repetir o processo indo buscar à série de registos os segundos maiores valores para as
diversas durações, pode construir-se a curva de possibilidade udométrica para o período de
retorno T = N/2 já que os referidos valores de h são igualados ou excedidos 2 vezes em N anos.
De forma similar se obteriam as de possibilidade udométrica para T = N/3, N/4, N/5, .... as quais
poderiam ser todas representadas num mesmo gráfico como se exemplifica na figura 4.26. Um
gráfico deste tipo permite fácilmente obter por interpolação a altura de precipitação que
corresponde a uma determinada duração para certo período de retorno T, T ≤ N. Chama-se a
atenção que todas estas curvas têm de ter o mesmo valor de n.
Quando se pretende extrapolar para períodos de retorno superiores a N, pode adoptar-se um dos
seguintes procedimentos:
a) Com o conjunto de ternos de valores (h, t,T), ajustar à expressão h = atnTm, calculando os
parâmetros a,n,m por regressão linear múltipla dos logaritmos:
b) para a duração que se pretende estudar, obter os pares de valores (h,T). Isto é equivalente
a atribuir a cada valor de h uma probabilidade empírica de não excedência F = 1 - 1/T . A
partir daí, é possível ajustar a distribuição empírica a uma distribuição teórica que
permite extrapolar para valores altos de T. A distribuição normal adapta-se mal ao estudo
de precipitações intensas sendo, por isso, preferível utilizar uma distribuição de
extremos, como por exemplo Log-Normal ou Gumbel.
Quando não se dispõe dum registo de pluviógrafo, a análise de precipitações intensas fica
limitada a durações não inferiores a 1 dia pois este é o intervalo com que se fazem as leituras. No
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-36
Suponha-se que se dispõe nos vários postos udométricos da região de séries simultâneas de N
anos de registos e que se pretende obter para a região a curva de possibilidade udométrica para
T=N. A forma correcta para se obter a curva seria:
1a) obter o pluviograma ponderado, multiplicando cada pluviograma dum dado posto pelo
respectivo coeficiente de Thiessen e, posteriormente, somando-os;
1b) no caso (vulgar) de não se dispôr de pluviogramas, obter a série de N anos de precipitações
diárias ponderadas na região, multiplicando cada série de registos diários de um dado posto
pelo respectivo coeficiente de Thiessen e, posteriormente, somando-os;
2) obter as curvas de possibilidade udométrica para a região por análise do pluviograma
ponderado (obtido em 1a) ou da série de precipitações diárias ponderadas (obtida em 1b).
A menos que os pluviogramas (por digitalização) e as séries de dados diários existam numa base
de dados em computador, o processo referido é extremamente trabalhoso. Utiliza-se, por isso,
frequentemente um processo mais expedito que consiste em obter a curva de possibilidade
udométrica para a região para um dado período de retorno por ponderação das curvas de
possibilidade udométrica dos diversos postos para o mesmo período de retorno. Assim, a altura
de precipitação para cada duração seria obtida multiplicando a altura em cada posto para essa
duração (dada pela respectiva CPU) pelo correspondente coeficiente de Thiessen e somando os
valores assim obtidos. A CPU para a região seria ajustada aos pares (h,t) assim obtidos.
Este processo expedito é, em geral, pessimista, i.e., fornece valores excessivos de precipitação
visto pressupor a ocorrência simultânea dos valores máximos da precipitação em todos os postos
o que normalmente não se verifica. O método dará valores tanto mais pessimistas quanto menor
fôr a correlação entre as precipitações nos postos udométricos.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-37
EXERCÍCIOS
N.B. Na realidade usa-se sempre uma série mais longa do que 5 anos para calcular valores
característicos.
Ano hidrológico
Mês: '77/'78 '78/'79 '79/'80 '80/'81 '81/'82
Out. 43 61 57 50 115
Nov. 17 89 56 99 189
Dez. 78 87 87 43 56
Jan. 304 129 48 230 27
Fev. 120 24 62 205 22
Mar. 211 153 75 98 60
Abr. 36 37 115 10 194
Mai 41 8 29 159 19
Jun. 1 16 0 12 3
Jul 61 8 8 7 3
Ago. 11 22 32 22 14
Set. 10 14 97 78 12
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-38
O posto L não tem dados desde 1970 enquanto os postos A-J têm séries praticamente completas
até hoje.
A 908 45 F 885 45
B 1021 42 G 933 50
C 870 40 H 927 40
D 1140 60 I 1217 50
E 855 40 J 1020 40
L 948 -
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-39
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-40
3. PREENCHIMENTO DE FALHAS
c) Comente os resultados.
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-41
Analize precipitações intensas de curta duração, usando uma série de valores diários da
precipitação no 1º ano hidrológico (tabela 2) e os valores críticos anuais da precipitação dos 19
anos seguintes (tabela 1).
Manual de Hidrologia
Precipitação 4-42
___ Mês: _
Dia: Out. Nov. Dez. Jan. Fev. Mar. Abr. Mai Jun. Jul. Ago. Set.
1 0 0 0 0 0 0 4 0 0 0 0 4
2 0 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0
3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
4 2 0 71 34 0 0 0 0 0 0 0 0
5 0 0 13 15 0 0 0 0 0 0 0 0
6 0 0 25 0 0 8 0 0 0 6 0 0
7 0 18 18 9 0 21 0 0 0 0 0 0
8 0 0 0 3 0 3 0 0 0 4 0 0
9 0 0 1 62 0 0 0 0 0 0 0 0
10 0 17 0 83 0 0 0 9 0 0 0 28
11 0 0 0 31 0 0 0 11 0 0 0 12
12 0 0 0 18 0 0 0 0 0 0 0 12
13 0 0 0 0 12 0 0 0 0 0 0 0
14 1 0 0 0 3 0 0 0 0 0 0 0
15 0 3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
16 0 0 8 0 0 0 0 0 4 0 0 0
17 0 0 0 13 0 0 0 0 3 0 0 0
18 0 0 55 0 0 0 0 0 0 0 0 0
19 8 0 49 0 0 0 0 0 0 0 0 0
20 12 139 42 4 19 0 0 0 0 0 0 0
21 21 4 44 0 6 17 0 0 0 0 0 0
22 1 0 20 0 2 0 0 6 0 0 0 0
23 7 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0
24 2 0 45 5 0 0 2 0 0 10 0 0
25 6 0 15 5 0 0 0 0 0 0 0 5
26 12 0 0 9 0 0 0 0 0 0 12 0
27 4 0 0 13 0 0 0 0 0 0 15 0
28 0 0 9 0 0 0 0 0 0 0 3 4
29 0 0 4 0 - 0 0 0 0 0 0 1
30 0 0 0 0 - 0 0 0 0 0 0 0
31 0 - 0 0 - 0 - 0 - 0 0 -
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-1
5 EVAPORAÇÃO E EVAPOTRANSPIRAÇÃO
5.1 CONCEITOS BÁSICOS
Do ponto de vista prático e correspondendo àquilo que de facto se pode medir, o que nos interessa
é o excedente da evaporação sobre a condensação. Assim, chamaremos evaporação ao excedente
da transformação líquido → vapor em relação à situação oposta.
A evaporação que se verifica a partir do solo nu depende de um certo número de factores entre os
quais os mais importantes são o estado de humidade do solo, o tipo de solo e a localização da
toalha freática. Se o solo se encontra saturado, a evaporação que lhe corresponde é próxima da
evaporação a partir duma superfície líquida, sugerindo-se multiplicar esta última por 0.9 para se
obter a evaporação a partir do solo.
À medida que o solo vai perdendo a humidade, a água remanescente vai sendo retida com
intensidade crescente por forças de capilaridade e adsorção, dependendo do tipo de solo. A
evaporação torna-se geralmente desprezável depois de se terem evaporado os primeiros 10-15 mm.
Se a toalha freática estiver suficientemente alta para que a água possa atingir a superfície do solo
por capilaridade, a evaporação a partir do solo é elevada e semelhante à situação do solo saturado.
5.1.3 Transpiração
Transpiração é a água perdida pelas plantas através dos estomas (poros) das folhas por
evaporação para a atmosfera. Esta água é substituida pela que a planta vai buscar ao solo através
das raízes.
Numa região em que o solo está revestido de vegetação, é praticamente impossível analisar em
separado a transpiração das plantas e a evaporação a partir do solo, linhas de água e lagoas. Os
dois processos tomados em conjunto designam-se por evapotranspiração.
Pode-se ficar com uma ideia da importância destes fenómenos considerando o exemplo da
albufeira dos Pequenos Libombos, construida, como se sabe, para reforçar o abastecimento de
água à cidade de Maputo.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-2
Considerando que a albufeira tem uma superfície inundada com uma área média de cerca de 30
km2 e que a evaporação anual na albufeira é de cerca de 1700 mm, então o volume evaporado
anualmente em média é de
Do ponto de vista para a utilização da água para o homem, a evaporação constitui uma perda que
interessa minimizar. Várias vias têm vindo a ser consideradas para este efeito:
Considere-se o recepiente fechado representado na figura 5.1 e que contém uma certa quantidade
de água a uma dada temperatura. A situação é estável o que se manifesta pelo nível constante da
água. Isto significa que o número de moléculas de água que passa para a fase de vapor é, em média
ao longo de um intervalo de tempo curto, igual ao número de moléculas que passa da fase de vapor
para a fase líquida. Diz-se então que o ar está saturado e não pode conter mais vapor de água.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-3
À medida que a vaporização da água se vai processando, aumenta a pressão de vapor, aumentam
as colisões entre moléculas gasosas e algumas destas, ficando com energia cinética reduzida,
voltam ao estado líquido. A certa altura atinge-se a estabilidade: a evaporação cessa e a pressão do
vapor mantem-se constante. A pressão do vapor não saturado designa-se por e.
Designa-se por tensão do vapor saturado ew a pressão do vapor quando o espaço já não comporta
mais vapor de água. ew aumenta com a temperatura como é fácil de constatar experimentalmente.
Com efeito, se no recipiente fechado onde a evaporação cessou se produzir um aquecimento, a
evaporação reinicia-se e a pressão do vapor aumenta. Isto deve-se ao facto do aumento da
temperatura conduzir a uma aumento da energia cinética das moléculas da água. A tabela 5.1,
adaptada de FAO 1977, dá os valores da tensão do vapor em função da temperatura do ar, com
pressão atmosférica normal.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-4
a) a radiação solar, que é a principal fonte da energia necessária para a vaporização das moléculas
de água. Por sua vez, a radiação solar é uma função da latitude, dia do ano, hora do dia e
nebulosidade. Outras fontes de energia podem dar um importante contributo local para a
evaporação, por exemplo a entrada num lago de água quente proveniente da refrigeração duma
central térmica.
b) as temperaturas do ar e da água, a pressão atmosférica e a humidade. Todos estes factores
influenciam o défice de saturação. Ora a evaporação é obviamente uma função crescente do défice
de saturação.
c) o vento. Numa situação sem vento, o vapor de água concentrado numa camada da atmosfera
muito próxima da superfície livre da água, camada que se designa por camada evaporante, atinge
o estado de saturação e a evaporação cessa. Para que a evaporação continue, é necessário que essa
camada já saturada seja removida e substituida por ar não saturado. Esse é o papel desempenhado
pelo vento.
A Lei de Dalton, apresentada em princípios do século XIX, diz que a evaporação E varia
linearmente com o défice de saturação do ar [ew(Th) - e(Ts)]:
E = a [ ew(Th) – e(Ts) ]
em que a é uma constante, e é a tensão do vapor não saturado (mbar), ew é a tensão do vapor
saturado (mbar), Th é a temperatura média da camada evaporante, chamada temperatura húmida
(oC) e Ts é a temperatura do ar ambiente, chamada temperatura seca (oC).
A medição directa da tensão do vapor e não é fácil pelo que ela é obtida por via indirecta através
de medição nas estações meteorológicas da humidade relativa U, definida por:
U = e/ew
E = a [ew(Th) - e(Ts)]
Por cada grama de água evaporado, é necessário um número l de calorias, em que l é o calor
latente de vaporização = 590 cal./g. O calor retirado ao líquido pela evaporação seria então:
Qe = ρlE
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-5
A temperatura da camada superficial da água vai baixando até que se atinge o equilíbrio entre a
quantidade de calor Qe que o líquido gasta na evaporação e a quantidade de calor Qh que o meio
ambiente comunica ao líquido.
Qh = b (Ts-Th)
E = cQh = c'(Ts-Th)
Como a tabela 5.1 fornece valores de ew para a pressão atmosférica normal, p = 1000 mbar, a
expressão acima foi modificada para outros valores de p:
p
[ew(Th) - e(Ts)] = A (Ts-Th)
1000
p
⇒ e(Ts) = ew(Th) - A (Ts-Th)
1000
U = e/ew = e(Ts)/ew(Ts)
1 p
⇒U = [ ew ( T h ) - A( T s - T h )] (Fórmula do psicrómetro)
ew ( T s ) 1000
Assim, para se determinar U, usa-se um aparelho designado por psicrómetro (figura 5.2) que é
composto por dois termómetros: o termómetro seco, que mede a temperatura do ar ambiente, Ts, e
o termómetro húmido que mede a temperatura da camada evaporante, Th. O termómetro húmido
tem o depósito de mercúrio envolvido por um pano que se mantém constantemente húmido por
ligação com um depósito de água. Obtidos Ts e Th, p é lido num barómetro e ew(Th) e ew(Ts) são
obtidos através da tabela 5.1.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-6
Note-se que foi considerada apenas a troca convectiva do calor, Qh, entre o meio ambiente e o
psicrómetro. Como adiante se verá, verifica-se sempre também troca de calor por radiação. Pode-
se evitar a recepção de radiação da atmosfera (de ondas curtas) colocando o psicrómetro num
abrigo. Para evitar a emissão de radiação (de ondas longas) pelo próprio psicrómetro, seria
necessário utilizar um tipo de psicrómetro com 'cortina polida'. A maioria dos psicrómetros em
Moçambique não tem uma tal protecção, razão pela qual se deve contar com um erro de medição
de cerca de 5% para valores normais de humidade.
5.2.1 Introdução
Para a determinação da evaporação em superfícies líquidas existem vários métodos, dos quais os
mais importantes são:
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-7
Este método pode ser utilizado em lagos e albufeiras. A equação do balanço hídrico em termos de
volumes de água escreve-se:
E = I + P - O - ΔS - G,
Desde que todos os termos do 2º membro da igualdade se possam medir com precisão, o método
fornece bons resultados. Normalmente, o termo mais difícil de obter é G (infiltração e escoamento
subterrâneo). Sempre que se estime que G possa tomar valores da mesma ordem de grandeza que a
evaporação, o método do balanço hídrico não deve ser utilizado pois o erro relativo com que a
evaporação é estimada é grande.
Surgem também, por vezes, problemas de ordem prática: nas albufeiras de Cahora- Bassa,
Massingir e Corumana, o regolfo das albufeiras chega à fronteira pelo que uma estação de medição
do volume afluente I teria de ser instalada já num país vizinho com todas as dificuldades que isso
implica. Assim, nessas albufeiras a evaporação é estimada por outros métodos e o balanço hídrico
é utilizado para calcular o volume afluente.
Assim como o balanço hídrico exprime a equação da continuidade aplicada ao volume de água
contido num domínio, o balanço energético exprime a equação da continuidade aplicada à
quantidade de energia num domínio como um lago ou uma albufeira.
• radiação solar
• energia armazenada
• troca de energia entre a água e a atmosfera
• troca de energia entre a água e a terra
• energia gasta na evaporação.
Considere-se então a figura 5.3 e as seguintes grandezas expressas em cal/cm2: Qs, Qsr, Qlw, Qh, Qe,
Qv e ΔQ. A equação do balanço energético para a água para um dado intervalo de tempo escreve-
se:
Qs - Qsr - Qlw - Qh - Qe + Qv = ΔQ
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-8
Qs é a radiação solar incidente ou radiação global. A quantidade de energia solar que atinge o
topo da atmosfera terrestre chama-se constante solar e designa-se por I0. A tabela 5.2 dá os
valores de I0 em função da latitude e do mês (Dunne e Leopold, 1978). Qs é uma fracção de I0 que,
após atravessar a atmosfera, incide sobre a superfície da água e é composta na sua quase totalidade
por radiações com comprimentos de onda entre 0.3 e 3 μm.
Tabela 5.2 Radiação solar média recebida num plano horizontal no limite superior da
atmosfera, I0 (cal/cm2/dia).
Latitude Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.
70°N - 65 255 540 800 1000 870 670 400 140 5 -
60°N 75 205 400 655 860 975 925 750 500 275 110 55
50°N 200 350 540 750 910 985 950 820 620 430 155 175
40°N 355 490 650 820 880 985 960 870 740 550 395 325
30°N 500 620 750 870 945 975 955 900 795 670 540 365
20°N 640 725 820 895 930 930 930 900 850 760 660 610
10°N 755 820 870 895 885 870 870 885 880 830 770 730
0 855 885 895 870 820 790 795 840 880 885 860 840
10°S 930 930 885 810 730 685 705 770 845 900 920 930
20°S 985 940 855 740 630 570 595 680 790 900 965 990
30°S 1015 930 800 640 505 445 465 575 725 870 985 1030
40°S 1020 895 715 525 375 305 335 450 630 810 960 1045
50°S 1000 835 620 400 240 175 200 315 505 735 950 1040
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-9
A fórmula de Angström é:
n
Qs = I0 (a + b )
N
O número máximo possível de horas de insolação num certo intervalo de tempo, N, é função da
latitude e da época do ano. A tabela 5.3 dá os valores mensais de N.
A n/N chama-se insolação relativa. Considera-se que o seu valor é elevado se for superior a 0.8
(céu limpo); é baixo se for inferior a 0.6 (céu pouco nublado).
Latitude Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.
50°N 265 280 366 415 480 490 495 450 380 330 274 252
40°N 303 300 370 400 445 450 455 425 375 345 300 290
30°N 324 314 370 388 425 420 430 410 370 353 320 316
20°N 341 324 370 378 407 400 410 400 366 360 335 338
10°N 360 327 370 370 390 380 390 385 366 366 352 356
0 375 340 375 363 375 363 375 375 363 375 363 375
10°S 388 350 378 355 363 346 360 364 360 380 378 396
20°S 410 360 378 350 346 328 340 344 360 388 393 414
30°S 430 370 380 342 330 306 328 345 360 404 410 435
40°S 466 380 385 334 310 280 302 330 360 415 432 463
50°S 490 403 387 320 276 242 266 315 356 427 465 508
A tabela 5.4 dá alguns valores dos parâmetros a e b apresentados por diversos autores. Para
Moçambique recomenda-se usar os parâmetros segundo Glover et al (1958).
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-10
Local a b Fonte
Mundo 0.23 0.48 Black e tal. (1954)
Mundo 0.29 0.52 Glover et al.(1958)
Camberra 0.25 0.54 Penman (1948)
África Ocid. 0.12-0.26 * 0.39-0.50 * Davies (1996)
* Varia com o mês
A fórmula de Black é:
Qsr é a radiação solar reflectida. É uma fracção pequena da radiação solar incidente. A parte que
é reflectida depende da superfície sobre a qual a radiação incide. Essa característica de
reflectividade duma superfície chama-se albedo, a. Qsr é dada por
Qsr = a Qs
Normalmente, considera-se para a água um valor entre 0.05 e 0.10, sendo o valor mais usual 0.06.
Qlw é a radiação de ondas longas ("long wave radiation"). Esta é a forma pela qual a Terra irradia
para a atmosfera o calor acumulado.
Parte desta radiação é absorvida pela atmosfera (pelo vapor de água, nuvens e dióxido de carbono)
e enviada novamente para a Terra. Como é muito difícil medir esta radiação, tem-se procurado
desenvolver expressões que a relacionem com variáveis medidas à superfície da Terra, das quais a
mais influente é a temperatura.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-11
em que
σ = constante de Stefan-Boltzmann = 1.17*10-7 cal/cm2 K4 dia;
Ts = temperatura da superfície da terra (K);
T2 = temperatura do ar a 2 metros do solo (K);
e2 = tensão do vapor a 2 metros do solo (mbar);
C = nebulosidade, em décimos;
a = constante dependente do tipo de nuvens: 0.25 para nuvens altas, 0.6 para
nuvens médias, 0.9 para nuvens baixas;
c, d = coeficientes empíricos que variam conforme o local (ver tabela 5.6).
Se não se dispuser de dados para o tipo de nuvens, pode-se tomar a = 0.8 ou, em alternativa,
substituir o factor (1 - aC) por (0.1 + 0.9 n/N) em que n/N é a insolação relativa. Para c e d podem
tomar-se os valores médios de 0.53 e 0.052 respectivamente.
Também aqui se pode substituir (1 - aC) por (0.1 + 0.9 n/N). Segundo Dunne e Leopold (1978), os
erros destas equações excedem frequentemente ± 25% em valores diários mas reduzem-se a ± 15-
20% para valores mensais.
A radiação útil, Qn, é a radiação efectivamente disponível para a evaporação. É a radiação global
subtraída da radiação reflectida e da radiação de onda longa:
A radiação útil pode ser medida directamente utilizando um radiómetro mas esse equipamento
apenas existe num número restrito de estações meteorológicas.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-12
A energia gasta na evaporação, Qe, é igual ao produto da massa evaporada pelo calor latente da
vaporização (l = 590 cal./g). Qe pode ser expresso por unidade de área.
Porque Qh = b(Th-Ts)
Qe = ρ l E = a'[ew(Th) - e(Ts)]
Qh p Th -Ts
R= =A
Qe 1000 ew ( T h ) - e( T s )
Note-se que numa situação de equilíbrio, quando não há radiação, seria Qh = -Qe e R = -1, como se
viu ao deduzir a fórmula do psicrómetro. A definição e as grandezas das variáveis que intervêm no
cálculo de R são as mesmas da referida fórmula do psicrómetro.
A energia aduzida, Qv, representa a quantidade de calor transportada pelas massas de água que
entram ou saem do lago. Qv é calculado a partir da massa m e da temperatura T do caudal afluente
(ou efluente) em relação a uma temperatura arbitrada de referência (normalmente 0 °C). Como o
calor específico da água, c, é, para as temperaturas normais, igual a 1 cal./g./°C, a energia aduzida
será:
em que Vaf é o volume da água que entra (se sai, toma-se V negativo), T a temperatura dessa água e
T0 a temperatura de referência. Dividindo Qv pela área do lago, obtem-se o seu valor em cal/cm2.
Como o que nos interessa é calcular E (altura de evaporação), pode-se reescrever a equação do
balanço energético:
Qs - Qsr - Qlw - Qh - Qe + Qv = ΔQ
⇒ Qe + Qh = Qs - Qsr - Qlw + Qv - ΔQ
⇒ Qe(1+R) = Qs - Qsr - Qlw + Qv - ΔQ
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-13
Q n + Q v - ΔQ
Qe =
1+ R
Porque Qe = ρlE:
Q n + Q v - ΔQ
E=
ρl(1 + R)
O método do balanço energético aplicado a períodos de um mês com medição cuidadosa das
várias grandezas pode conduzir a estimativas da evaporação com uma precisão de 5 a 10%. Trata-
se, porém, dum processo muito dispendioso. Quando se utilizam equações empíricas, com
períodos mensais, o erro andará na ordem de 10-20% o que é aceitável para aplicações práticas.
O vento é um dos factores que exerce grande influência na evaporação. Então, por generalização
da lei de Dalton, pode escrever-se:
E = C f(u) [ew(Th)-e(Ts)]
em que C é uma constante a determinar localmente, f(u) é uma função da velocidade do vento. C e
f(u) têm de ser calibrados através dum outro método (balanço hídrico ou balanço energético).
Dunne e Leopold (1978) apresentam um método simples para essa calibração em pequenos lagos e
reservatórios, admitindo que:
f(u) = u2,
Fazendo medições de u2, Th e Ts e das variações de nível do lago apenas devido à evaporação (i.e.
subtraindo os efeitos dos escoamentos afluente e efluente), o gráfico de Δh (cm/dia) versus u2[ew
(Th)-e(Ts)] dá aproximadamente uma recta cujo declive é C. Com u2 em m/s, ew e e em mbar,
Viessman et al. (1977) sugerem que C pode ser calculado por:
C = 0.0146/A0.05,
Penman desenvolveu o método para um lago tal que seja aceitável dizer que:
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-14
ΔQ - Qv = 0
Se não houvesse energia aduzida, conviria tomar intervalos de tempo relativemente curtos (7 - 10
dias), para que ΔQ ≈ 0. Se houvesse energia aduzida, significaria que ΔQ = Qv, pois mudanças na
energia acumulada no lago devem-se apenas ao calor aduzido pelas massas de água que entram ou
saem do lago. Assim, a água evaporada é substituida pela mesma quantidade de água à mesma
temperatura (ou por outra combinação volume-temperatura que apresente a adução da mesma
quantidade de calor).
Qn = Qh + Qe = Qe (1 + R) (cal/cm2),
N = E (1 + R),
em que N = Qn/ρl
Esta equação traduz o facto óbvio de que, não havendo variações na energia armazenada, a
radiação útil é distribuida pela radiação necessária para a evaporação e pela radiação transferida
para a atmosfera por trocas turbulentas.
Penman considerou:
( )- ( )
Δ = dew ≈ ew T h e w T s
dT s Th -Ts
H A ew ( T h ) - ew ( T s ) A ⎛ ew ( T s ) - e( T s ) ⎞
⇒ R= = = ⎜1 - ⎟
E Δ ew ( T h ) - e( T s ) Δ ⎜⎝ ew ( T h ) - e( T s ) ⎟⎠
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-15
Ea = C f(u) [ew(Ts)-e(Ts)]
O valor de C f(u) pode calcular-se com várias fórmulas empíricas. Penman propôs:
em que
ou
Ea = (0.13 + 0.14 u2) [ew(Ts) - e(Ts)]
Thornthwaite e Holzman desenvolveram uma fórmula mais sofisticada, com uma base física,
analizando o processo de transporte turbulento:
ρaε κ 2 uz
C f(u) = 2
P ⎡ ⎛ z ⎞⎤
⎢ln⎜⎜ ⎟⎟⎥
⎣ ⎝ z0 ⎠⎦
em que
ρa = densidade do ar (g./cm3);
ε = ratio entre os pesos moleculares do vapor de água e do ar (= 0.622);
κ = constante de Von Kármán (= 0.41);
uz = velocidade do vento à altura z (m/s);
z0 = rugosidade da superfície (para água cerca de 0.05 cm, se não há vento).
P P kg g
ρa = = 0.3484 * ( 3 ) = 0.3484 * 10-3 ( 3 )
RT T m cm
com P em mbar e T em K.
3.64 uz
Ea = 2
[ ew ( T s ) - e( T s )]
T s ⎡ ⎛ z ⎞⎤
⎢ln⎜⎜ ⎟⎟⎥
⎣ ⎝ z o ⎠⎦
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-16
em que
Então:
E a = ew ( T s ) - e( T s )
E ew ( T h ) - e( T s )
H A
= (1 - E a )
E Δ E
Δ
N
+ Ea
E= A
Δ
+1
A
que é a fórmula de Penman para P = 1,000 mbar.
Δ
é o parâmetro adimensional de Penman, dado na tabela 5.7.
A
T (°C) 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
Δ/A 0.67 0.90 1.23 1.61 2.14 2.77 3.57 4.57 5.70 7.10 8.77
A fórmula de Penman é válida para P = 1,000 mbar. Para P ≠ 1,000 basta substituir na fórmula A
P Δ +
por A' = A . é calculado para uma temperatura T= T h T s .
1000 A 2
De todos os métodos analíticos, o método de Penman é aquele que oferece o melhor compromisso
entre uma base teórica suficientemente sólida e a facilidade de aplicação prática. O método deve
ser usado para períodos da ordem de 7-10 dias e nunca em períodos superiores a 1 mês (para que
ΔQ ≈ 0).
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-17
Para além dos métodos analíticos referidos nos pontos anteriores, a evaporação pode ser medida
directamente. Os instrumentos mais usados para esse efeito são o evaporímetro ou atmómetro e a
tina evaporimétrica.
O evaporímetro não mede, portanto, directamente a evaporação da superfície líquida embora esta
esteja certamente relacionada com a evaporação latente.
A figura 5.5 representa dois tipos de evaporímetros frequentemente usados: "Black Bellani" e o
"Piche". O "Black Bellani" segue a definição dada para a evaporação latente. Tem uma placa de
porcelana porosa e negra, com 7.5 cm de diâmetro, permanente humidecida através do seu
contacto com um recipiente que é alimentado por um reservatório graduado. É possível ler
diariamente no reservatório a altura da água evaporada através da placa porosa.
O evaporímetro "Piche" utiliza um disco de papel poroso (papel de filtro) em lugar da placa negra.
O disco está preso por uma mola a um tubo graduado com água que mantem o disco
permanentemente humidecido. A perda de água evaporada através do disco pode ser lida
diariamente no tubo graduado. Em Moçambique, apenas se tem utilizado o evaporímetro "Piche".
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-18
Também a tina Colorada é uma tina enterrada, de secção quadrada, com 0.914 m de lado (3 pés) e
0.457 m de profundidade.
A tina de classe A do USWB está representada na figura 5.6. Trata-se de um tanque circular,
construido em chapa de aço galvanizado, assente sobre um estrado de madeira, com as dimensões
constantes da figura. O nível da água na tina deve ser sempre mantido a uma distância de 5 a 7.5
cm do bordo superior da tina.
a) Tinas enterradas
- as tinas enterradas (com a boca aproximadamente ao nível da superfície do terreno)
recolhem muito lixo;
- quaisquer perdas de água (devido a um furo na chapa) não se detectam facilmente;
- as trocas de calor através das paredes da tina dependem do solo circundante e das
suas condições de humidade.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-19
b) Tinas flutuantes
- a tina flutuante pode receber ou perder água devido à ondulação;
- a sua operação é difícil.
No entanto, a experiência indica ser preferível a utilização de tinas colocadas acima do solo, como
a tina de classe A do USWB.
A medição da evaporação numa tina é feita normalmente uma vez por dia, sendo o processo de
medição o seguinte:
- instala-se na tina uma escala graduada à qual fica ligado um estilete móvel. O zero
da escala corresponde à posição em que a ponta do estilete toca na superfície da
água;
- após o período em que se registou a evaporação (um dia), a superfície da água terá
baixado. Esse abaixamento é medido deslocando o estilete até a ponta tocar
novamente na superfície da água e lendo o deslocamento na escala graduada. Essa
altura é a altura da evaporação;
- caso nessa altura se tenha registado precipitação, é preciso somar à altura
determinada anteriormente o valor da precipitação. Note-se que, neste caso, pode
acontecer que a superfície da água esteja acima e não abaixo do nível de referência.
Como se disse anteriormente, a evaporação medida numa tina evaporimétrica simula melhor a
realidade da evaporação a partir duma superfície líquida do que a medição num evaporímetro
como o “Piche”, sendo por isso preferível utilizar dados de tina, sempre que possível. Como
principais dificuldades à utilização da tina podem apontar-se:
Em relação a este último aspecto, usa-se por vezes uma rede metálica a cobrir a tina. Esta solução
traz, porém, o inconveniente de alterar o valor da radiação recebida pela tina.
- a radiação que a tina recebe pela superfície lateral e pelo fundo é uma proporção
muito mais elevada da radiação recebida pela superfície líquida do que no caso dum
lago;
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-20
- a evaporação numa superfície líquida cria o chamado “efeito de oásis” (efeito local
de diminuição da temperatura e aumento da humidade relativa). Se a camada
saturada que se forma é removida pelo vento, o processo de evaporação recomeça. A
remoção da camada saturada acontece muito mais facilmente na tina do que num
lago em virtude da pequena dimensão da superfície da tina;
- os bordos da tina criam uma turbulência adicional, aumentando o efeito do vento na
remoção da camada saturada;
- devido ao pequeno volume de água que a tina contem, a temperatura da água na tina
é homogénea, não existindo a estratificação térmica característica dos lagos e
albufeiras.
Todos estes factores induzem a que a evaporação na tina seja bastante superior à evaporação que
se verifica no lago. Por este motivo, a evaporação medida na tina deve ser multiplicada por um
coeficiente de redução para se obter a evaporação num lago ou albufeira. Este coeficiente é
chamado de “coeficiente de tina” e é inferior à unidade. Pode-se aferir o valor do coeficiente da
tina (que varia conforme o local e a época do ano) se se dispuser de algum outro método preciso
para a determinação da evaporação como, por exemplo, o método do balanço energético.
Ainda não foi feita (1996) nenhuma aferição em Moçambique. Sugere-se por isso a adopção do
valor médio de 0.7 para o coeficiente da tina, valor comummente adoptado para a tina de classe
“A” em zonas onde tal coeficiente não foi determinado.
Segundo dados de Loureiro (1984), existiam em Moçambique 132 estações dispondo de tina
evaporimétrica ou evaporimetro “Piche” ou ambos, com a seguinte distribuição:
122 estações pertenciam ao INAM e 10 à DNA. Tomadas em conjunto, elas conduziam a uma
densidade de 5,900 Km2/estação, o que se pode considerar uma densidade bastante baixa.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-21
Devido ao pequeno número de estações dotados de tina (50), há todo o interesse de tentar
correlacionar os dados de tina com os de evaporimetro para se poder estimar a evaporação de
superfícies líquidas a partir da evaporação latente medida pelo evaporimétro. A correlação teria de
ser estabelecida usando as estações comuns (dispondo de tina + evaporimetro). Tal estudo foi
realizado por Carvalho e Loureiro (1974) mas usando poucas estações (9) e dispondo de poucos
anos de dados comuns (4 a 6). Obtiveram-se coeficientes de correlação iguais ou superiores a 0.7
em 7 dos 9 casos. Interessa, portanto, retomar e estender o estudo realizado.
Os seres vivos transpiram, ie, perdem água por evaporação a partir de poros microscópicos
situados na pele ou nas folhas. A transpiração é um processo quantitativamente importante quando
se considera a abundância geral da vegetação.
O sistema de raízes duma planta absorve água do solo, a maior parte da qual não é utilizada pela
planta, perdendo-se para a atmosfera através dos poros nas folhas.
A transpiração é, portanto, afectada pelos mesmos factores que influenciam a evaporação (radiação
solar, temperatura, vento, humidade relativa). No entanto, para além destes factores, a transpiração
depende também de:
No que respeita ao teor da humidade do solo, verifica-se que a transpiração duma planta vai
decrescendo com o teor de humidade do solo a partir da situação de capacidade de campo e cessa
quase totalmente quando se atinge o ponto de emurchecimento.
A capacidade de campo é o teor de humidade dum solo inicialmente saturado após ter cessado a
percolação, correspondendo à quantidade de água que fica retido no solo contra a acção da
gravidade.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-22
5.5 EVAPOTRANSPIRAÇÃO
Tal como para a evaporação, também se usam métodos analíticos e medições para determinar a
evapotranspiração potencial. No entanto, devido à maior complexidade do fénomeno da
evapotranspiração, verifica-se um maior recurso a métodos semi-empíricos.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-23
O método do balanço energético referido em 5.2.3 pode também ser utilizado para a determinação
da evapotranspiração potencial. A equação do balanço energético para uma superfície revestida de
vegetação e para um dado intervalo de tempo escreve-se:
em que
Qs = radiação solar incidente;
Qsr = radiação solar reflectida; Qsr = aQs em que a é o albedo;
Qlw = radiação de ondas longas;
Qh = calor transferido por trocas turbulentas;
Qet = energia gasta na evapotranspiração;
Qv = energia aduzida ao solo e plantas; é habitualmente desprezável;
ΔQ = variação da energia armazenada no solo e vegetação; pode-se considerar
nula para períodos de tempo não inferiores a 1 dia.
Dividindo por ρl, obtemos ETp = N/(1+R), com ETp = Qet/ρl e N = Qn/ρl.
Tabela 5.8 Valores médios diários de albedo para diversos tipos de cobertura do solo
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-24
No caso das culturas, as variações dos valores do albedo resultam da variação do poder reflectivo
durante o período vegetativo das culturas.
Também o método de Penman pode ser aplicado para a estimação da evapotranspiração potencial.
Partindo da equação do balanço energético referida no parágrafo anterior, chega-se a
Δ
N + Ea
ET p = ΔA
+1
A
Para o cálculo do valor da evaporação isotérmica Ea pode-se utilizar a fórmula de Van Bavel:
3.64 uz
Ea = 2
(1 - U) ew ( T s )
T s ⎡ ⎛ z ⎞⎤
⎢ln⎜⎜ ⎟⎟⎥
⎣ ⎝ z o ⎠⎦
em que
Ea = evapotranspiração isotérmica (cm/dia);
Ts = temperatura do ar (K);
uz = velocidade de vento (km/dia) medida a uma altura z acima da vegetação.
Normalmente, a medição faz-se 2 m acima do solo;
zo = rugosidade da superfície. Toma-se zo ≈ 0.1 da altura da vegetação;
U = humidade relativa (adimensional);
ew = tensão do vapor saturado (mbar).
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-25
Nesta equação não se tem em conta a variação do armazenamento de água no solo pelo que estes
lisímetros devem ser usados quanto esta variação for pequena.
Os lisímetros dos tipos b) e c) medem a variação do peso registado o que equivale a uma variação
do volume de água armazenada no solo, entrando seguidamente com a equação do balanço
hídrico:
Através da irrigação, o solo é mantido em condições próxima da saturação, pelo que o valor
determinado corresponde a evapotranspiração potencial. Os lisímetros são instrumentos pouco
práticos e apenas são utilizados normalmente em grandes explorações agrícolas e centros de
investigação.
Embora a tina meça a evaporação duma superfície líquida, é possível usar os seus valores para
estimar a evapotranspiração potencial multiplicando-os por determinados factores de correcção.
A tabela 5.9 (adaptada a partir de FAO, 1977) apresenta esses factores de correcção em função da
colocação da tina no terreno, humidade relativa e velocidade média diária do vento. Os
coeficientes apresentados variam de 0.35 a 0.85.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-26
Tabela 5.9 Coeficiente de tina evaporimétrica classe "A" para diferentes coberturas do
solo, diferentes valores de humidade média relativa e velocidade média do
vento.
Tina
Caso A: Tina num terreno com uma Caso B: Tina num terreno inculto e
evaporimétrica
cultura verde de pequeno porte seco *)
classe “A”
Humidade média Baixa Média Elevada Baixa Média Elevada
relativa (%) <40 40-70 >70 <40 40-70 >70
Extensão da Extensão do
Velocidade media cultura a terreno a
do vento (km/dia) barlavento da tina barlavento da
(m) tina (m)
1 0.55 0.65 0.75 1 0.7 0.8 0.85
Fraco 10 0.65 0.75 0.85 10 0.6 0.7 0.8
(<175) 100 0.7 0.8 0.85 100 0.55 0.65 0.75
1000 0.75 0.85 0.85 1000 0.5 0.6 0.7
O método de Thornthwaite é um método semi-empírico que foi derivado por correlação entre
temperaturas do ar e evapotranspiração potencial a partir dum grande número de medições das
mesmas. O procedimento é o seguinte:
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-27
ETp,φ = K ETp,0,
Latitude Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.
60°N 0.54 0.67 0.97 1.19 1.33 1.56 1.55 1.331.07 0.84 0.58 0.48
50°N 0.71 0.84 0.98 1.14 1.28 1.36 1.33 1.211.06 0.90 0.76 0.68
40°N 0.80 0.89 0.99 1.10 1.20 1.25 1.23 1.151.04 0.93 0.83 0.78
30°N 0.87 0.93 1.00 1.07 1.14 1.17 1.16 1.111.03 0.96 0.89 0.85
20°N 0.92 0.96 1.00 1.05 1.09 1.11 1.10 1.071.02 0.98 0.93 0.91
10°N 0.97 0.98 1.00 1.03 1.05 1.06 1.05 1.041.02 0.99 0.97 0.96
0 1.00 1.00 1.00 1.00 1.00 1.00 1.00 1.001.00 1.00 1.00 1.00
10°S 1.05 1.04 1.02 0.99 0.97 0.96 0.97 0.981.00 1.03 1.05 1.06
20°S 1.10 1.07 1.02 0.98 0.93 0.91 0.92 0.961.00 1.05 1.09 1.11
30°S 1.16 1.11 1.03 0.96 0.89 0.85 0.87 0.931.00 1.07 1.14 1.17
40°S 1.23 1.15 1.04 0.93 0.83 0.78 0.80 0.890.99 1.10 1.20 1.25
50°S 1.33 1.19 1.05 0.89 0.75 0.68 0.70 0.820.97 1.13 1.27 1.36
O método de Blaney - Criddle foi desenvolvido para a região ocidental dos Estados Unidos e
depois foi sendo aplicada a outras regiões áridas no mundo, registando-se resultados favoráveis.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-28
em que
Tabela 5.11 Valor médio diário (em percentagem, p, do número total anual de horas de
insolação) para diferentes latitudes.
Norte Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.
Latitude
Sul *) Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez. Jan. Fev.Mar. Abr. Mai. Jun.
60° 0.15 0.20 0.26 0.32 0.38 0.41 0.40 0.340.28 0.22 0.17 0.13
58° 0.16 0.21 0.26 0.32 0.37 0.40 0.39 0.340.28 0.23 0.18 0.15
56° 0.17 0.21 0.26 0.32 0.36 0.39 0.38 0.330.28 0.23 0.18 0.16
54° 0.18 0.22 0.26 0.31 0.36 0.38 0.37 0.330.28 0.23 0.19 0.17
52° 0.19 0.22 0.27 0.31 0.35 0.37 0.36 0.330.28 0.24 0.20 0.17
50° 0.19 0.23 0.27 0.31 0.34 0.36 0.35 0.320.28 0.24 0.20 0.18
48° 0.20 0.23 0.27 0.31 0.34 0.36 0.35 0.320.28 0.24 0.21 0.19
46° 0.20 0.23 0.27 0.30 0.34 0.35 0.34 0.320.28 0.24 0.21 0.20
44° 0.21 0.24 0.27 0.30 0.33 0.35 0.34 0.310.28 0.25 0.22 0.20
42° 0.21 0.24 0.27 0.30 0.33 0.34 0.33 0.310.28 0.25 0.22 0.21
40° 0.22 0.24 0.27 0.30 0.32 0.34 0.33 0.310.28 0.25 0.22 0.21
35° 0.23 0.25 0.27 0.29 0.31 0.32 0.32 0.300.28 0.25 0.23 0.22
30° 0.24 0.25 0.27 0.29 0.31 0.32 0.31 0.300.28 0.26 0.24 0.23
25° 0.24 0.26 0.27 0.29 0.30 0.31 0.31 0.290.28 0.26 0.25 0.24
20° 0.25 0.26 0.27 0.28 0.29 0.30 0.30 0.290.28 0.26 0.25 0.25
15° 0.26 0.26 0.27 0.28 0.29 0.29 0.29 0.280.28 0.27 0.26 0.25
10° 0.26 0.27 0.27 0.28 0.28 0.29 0.29 0.280.28 0.27 0.26 0.26
5° 0.27 0.27 0.27 0.28 0.28 0.28 0.28 0.280.28 0.27 0.27 0.27
0° 0.27 0.27 0.27 0.27 0.27 0.27 0.27 0.270.27 0.27 0.27 0.27
*
) Latitude de hemisfério Sul: desfasar de 6 meses, como indicado.
A figura 5.8 permite obter directamente o valor de ETp a partir do conhecimento de p (0.46 T + 8).
Quer o método de Thornthwaite quer o método de Blaney-Criddle foram derivados para condições
específicas que, quando não verificadas, podem originar erros grosseiros.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-29
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-30
Em casos especiais ainda pode-se aplicar o método do balanço hídrico ou o método do balanço
energético.
No que diz respeito ao método de balanço energético, pode-se referir que foram recentemente
desenvolvidos métodos para determinar a evapotranspiração efectiva a partir de imagens de
satélite. Trata-se porém dum método bastante dispendioso por necessitar dum grande número de
imagens.
em que
P = precipitação;
ETe = evapotranspiração efectiva;
Q = escoamento superficial;
R = recarga da água subterrânea;
ΔSs = variação do armazenamento superficial;
ΔSso = variação do armazenamento no solo.
A fracção da humidade do solo utilizável pelas plantas designa-se por nu = nw - n0, em que nw e n0
são respectivamente o teor da humidade do solo e o teor de humidade no ponto de
emurchecimento. nu é um valor adimensional (fracção). Se se multiplicar pela profundidade do
solo atingida pelas raízes, esse valor passa a se expresso em altura de água, Nu.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-31
SH = P - ETp - ΔSso
até Sso = Nr (Nr é a capacidade de campo, expressa em altura, sendo o limite superior de Sso). A
tabela 5.12 apresenta alguns valores característicos da capacidade de campo, nr, e o ponto de
emurchecimento, n0, para vários solos.
Neste caso não há escoamento nem recarga da água subterrânea. Numa sucessão de i períodos com
défice hídrico, ΔSso é calculado do seguinte modo:
i
L(i) = ∑ [P(j) - ET p (j)] L(i) < 0
j=1
Δ S so (i) = N u e
Nu
- S so (i - 1)
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-32
A comparação das duas figuras mostra que a ETe se aproxima de ETp em zonas de precipitação
elevada, afastando-se bastante dela e assemelhando-se aos valores de precipitação em zonas de
baixa precipitação como o interior da Província de Gaza e o sul da Província de Tete.
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-33
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-34
Manual de Hidrologia
Evaporação e Evapotranspiração 5-35
EXERCÍCIOS
2. Calcule o valor médio da radiação global em Maputo em Maio, sabendo que n/N = 0.70 e
C = 0.35
Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set
P(mm) 87 105 142 232 195 136 76 66 38 18 13 46
ETp (mm) 96 135 146 160 142 91 62 29 18 22 34 68
Manual de Hidrologia
Infiltração 6-1
6 INFILTRAÇÃO
6.1 O PROCESSO FÍSICO DA INFILTRAÇÃO
Define-se infiltração como sendo o movimento de água para dentro do solo por efeito da
gravidade e da acção capilar. O movimento de água já no interior do solo designa-se por
percolação.
P - I - Q = ΔS
o que significa que apenas ocorre escoamento superficial quando P > I + ΔS, ou seja, quando a
precipitação excede a infiltração e se encheram as depressões superficiais. Como a capacidade de
armazenamento à superfície do terreno é normalmente bastante pequena, pode-se aceitar que
ocorre escoamento superficial quando a precipitação excede a infiltração.
A água que atinge o solo penetra nele através do poros devido à acção da gravidade. A entrada
da água faz-se mais facilmente pelos poros de maiores dimensões onde a resistência ao
escoamento é mais pequena. Por outro lado as forças de capilaridade provocam o movimento da
água verticalmente, para baixo ou para cima, ou horizontalmente sendo a sua acção tanto mais
importante quanto menor for o diâmetro dos poros. Assim, a acção da capilaridade permite
retirar água dos poros maiores para os mais pequenos.
Manual de Hidrologia
Infiltração 6-2
Há uma série de factores que influenciam a capacidade de infiltração dum solo ao longo duma
chuvada. Os princípios são os seguintes:
a) textura do solo – se um solo tem uma textura grosseira, como os solos arenosos, os poros são
grandes pelo que a entrada da água no solo é fácil e a velocidade de percolação é grande,
significando uma elevada capacidade de infiltração. Pelo contrário, num solo de textura fina,
como uma argila, os poros são muito pequenos e dificultam a entrada da água e o movimento da
água no interior do solo.
O quadro 6.1 apresenta valores mínimos (constantes) da capacidade de infiltração, f, para vários
tipos de solos e após longos períodos de humedecimento (solos cultivados), cf. Ven Te Chow
(1964);
Manual de Hidrologia
Infiltração 6-3
b) duração da chuvada - se uma chuvada durar bastante tempo, a capacidade de infiltração vai-
se reduzindo devido à progressiva saturação da camada superficial do solo;
d) humidade do solo no início da chuva - quanto mais húmido está o solo no início da chuvada
menor é a capacidade de infiltração e a infiltração. Se o solo estiver muito seco, não só o efeito
do armazenamento da água na camada superficial do solo é mais importante mas também o
humedecimento inicial provoca um forte efeito de capilaridade que reforça a acção da gravidade
para facilitar a infiltração;
e) compactação devido à chuva - o impacto das gotas de água em solos de textura fina destrói
os agregados estruturais de partículas e origina uma crosta superficial em que as partículas finas
preenchem os poros maiores, reduzindo substancialmente a capacidade de infiltração;
f) compactação devido ao tráfego - o tráfego pode ser de veículos, homens ou animais (como
em estradas de terra, campos de jogos, pastos muito utilizados). A consequência é uma grande
redução da capacidade de infiltração;
Manual de Hidrologia
Infiltração 6-4
A capacidade de infiltração pode ser medida com infiltrómetros que são tubos abertos nas
extremidades, com 10 a 30 cm de diâmetro, que se enterram entre 5 e 50 cm no solo. Coloca-se
água no tubo com uma altura de 1 a 2 cm que se mantêm a nível constante, através da ligação a
um reservatório graduado. A água necessária para manter o nível constante define a capacidade
de infiltração. Os valores obtidos são pouco rigoroso sendo 2 a 10 vezes superiores aos que se
verificam durante uma precipitação nas mesmas condições do solo.
Manual de Hidrologia
Infiltração 6-5
Diversas fórmulas têm sido propostas para a determinação da infiltração, como as fórmulas de
Horton e Philip.
f = fc + (f0-fc)e-kt,
em que
f0 = valor inicial da capacidade de infiltração, para t=0;
fc = valor mínimo da capacidade de infiltração;
k = constante característica do solo;
t = tempo desde o início da chuvada.
1 1
f = S t- 2 + A
2
A fórmula parece ajustar-se melhor às observações do que a fórmula de Horton, sem no entanto
resolver a dificuldade principal que é a determinação dos parâmetros que nelas intervêm.
Quer a fórmula de Horton quer a de Philip são válidas apenas enquanto a intensidade de
precipitação excede a capacidade de infiltração. Quando isso não acontece, a capacidade de
Manual de Hidrologia
Infiltração 6-6
infiltração deixa de decrescer e aumenta novamente porque a percolação da água no solo faz com
que este deixe de estar saturado.
Designa-se por precipitação útil aquela parcela da precipitação que origina escoamento
superficial sendo a parte restante da precipitação aquela que se infiltra.
Um método pouco rigoroso mas prático e por isso muitas vezes utilizado é o do índice-φ. Este
método assume que a infiltração se processa a uma taxa constante durante toda a chuvada,
hipótese que se torna mais válida para chuvadas longas ou chuvadas em que o solo já se encontre
muito húmido.
Calculando o índice-φ para várias chuvadas, pode-se obter um valor médio. Esse valor médio
pode ser usado para o problema inverso: dada uma precipitação, saber qual a precipitação útil.
Para tal, basta subtrair ao hietograma o valor constante do índice-φ.
A partir da água infiltrada, a humidade no solo vai aumentando. À medida que o solo se torna
mais húmido, aumenta a sua capacidade para propagar a humidade até que consegue propagá-la
à mesma velocidade com que ela entra no solo. Quando se atinge esta situação, o teor de
humidade da camada superficial mantem-se constante e esse teor vai-se propagando para baixo,
pondo sucessivas camadas com um teor de humidade tal que a condutividade hidráulica (será
definida mais tarde) iguala a capacidade de infiltração. Podem ser consideradas as seguintes
zonas (ver a figura 6.5):
Manual de Hidrologia
Infiltração 6-7
Quando a infiltração cessa, o solo começa a drenar e reduz a velocidade de percolação que tende
para zero à medida que o teor de humidade se aproxima da capacidade de campo. Nas camadas
em que se atingiu a capacidade de campo, cessa o escoamento de água para baixo. A água que
entretanto percolou e drenou vai atingir uma zona inferior saturada, que constitui uma reserva de
água subterrânea ou aquífero. Esta quantidade de água percolada representa a recarga do
aquífero. A figura 6.6, retirada de Dunne e Leopold (1978), mostra a evolução do teor de
humidade do solo a partir do momento de cessação da chuva e consequentemente da infiltração.
Manual de Hidrologia
Infiltração 6-8
por secagem: recolhem-se várias amostras de solo; cada amostra é pesada, secada e novamente
pesada; a diferença de pesos corresponde ao volume de água contida no solo;
através duma sonda de neutrões: a sonda emite neutrões rápidos; parte deles colide com os
átomos de hidrogénio de água e são retardados; um aparelho mede a percentagem de neutrões
lentos que será tanto maior quanto maior a humidade do solo;
através do tensiómetro: o tensiómetro é um bolbo de porcelana porosa, cheio de água, ligado a
um manómetro; colocando o bolbo em contacto com o solo não saturado, a água passa do bolbo
para o solo, reduzindo a pressão medida no manómetro.
Pode-se estimar a capacidade de absorção do solo para uma dada chuvada. Conhecendo o teor de
humidade do solo ou admitindo que este está à capacidade de campo, o volume de poros vazios
por unidade de área (expresso em altura) é igual ao produto da profundidade do solo não
saturado pela diferença entre a porosidade e a capacidade de campo. Este volume representa a
capacidade de absorção do solo. O mesmo princípio pode ser aplicado para o estudo da absorção
pelo solo de efluentes de fossas sépticas.
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Infiltração 6-9
Exercício
Numa área de 250 hectares foram registadas 3 chuvadas (as alturas foram medidas em mm).
Hora 1 2 3 4 5 6 7 8 9
Chuvada 1 2 6 7 10 5 4 4 2 0
Chuvada 2 4 9 15 12 5 0 0 0 0
Chuvada 3 3 8 11 4 12 3 0 0 0
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-1
7 ÁGUA SUBTERRÂNEA
7.1 INTRODUÇÃO
A água subterrânea tem grande importância para o abastecimento de água para fins
domésticos e industriais e água para a rega. A utilização da água subterrânea apresenta
algumas vantagens em relação à água superficial. As reservas de água subterrânea são muito
superiores às de água superficial (cerca de 300 vezes maiores; ver o capítulo 1). Além disso a
disponibilidade da água subterrânea geralmente mostra menor variabilidade temporal, devido
à maior quantidade de armazenamento e a menor exposição às perdas (como por exemplo a
evaporação nas albufeiras). A água subterrânea também se distribui por áreas extensas em
lugar de estar concentrada (como a água superficial). Finalmente, a água subterrânea é
geralmente de melhor qualidade que a água superficial, visto beneficiar dum sistema natural
de filtração e tempos de residência (no solo) relativamente longos, que asseguram a ausência
de bactérias e vírus.
Uma desvantagem em relação à água superficial é que o acesso pode ser mais difícil (por
razões técnicas ou económicas), que exige pesquisas mais complexas e dispendiosas. Ainda
de salientar que muitas das vezes (em Moçambique) o caudal só permita pequenos
aproveitamentos.
Uma vez que a água subterrânea tem uma importância numa perspectiva da utilização da
mesma, a maior parte da bibliografia sobre água subterrânea trata da localização de recursos
hídricos subterrâneos e a sua exploração. Porém, em projectos de construção, mesmo que não
directamente visem a exploração da água subterrânea, não se pode ignorar aspectos
geohidrológicos.
No que segue são tratados alguns assuntos da Geohidrologia. O parágrafo 7.2 trata das
definições e conceitos básicos da Geohidrologia. A ocorrência de água subterrânea é
abordada no parágrafo 7.3. Parágrafo 7.4 trata da hidráulica do escoamento subterrâneo. Nos
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-2
7.2.1 Introdução
Por seu lado, a Hidrogeologia é a parte da Geologia que se preocupa com a ocorrência da
água subterrânea. Em princípio, a Geohidrologia tem um carácter mais quantitativo do que a
Hidrogeologia mas frequentemente as duas disciplinas confundem-se.
Na zona de saturação a água fica sob pressão hidrostática. Esta zona designa-se também
como 'zona saturada'. Apenas a água da zona saturada constitui a água subterrânea.
O lençol ou toalha ou nível freático é o nível do solo abaixo do qual os poros estão
completamente preenchidos por água. O solo então está saturado e a pressão da água iguala a
pressão atmosférica.
Um aquífero é uma unidade geológica saturada que fornece água a poços, furos e nascentes
em proporção suficiente, de modo que possam servir como proveitosas fontes de
abastecimento. Pode-se também definir um aquífero simplesmente como uma camada de solo
permeável que contém água e pode cedê-la com facilidade. A grande maioria dos aquíferos
em exploração é constituída por materiais de textura grosseira (areia, areão, cascalho), rocha
calcária (onde a água forma cavidades por dissolução do material), rocha fracturada ou
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Água Subterrânea 7-3
falhas. As formações argilosas são aquíferos fracos. A água subterrânea pode ser encontrada
num único aquífero contínuo ou em várias aquíferos, separados por aquicludos ou aquitardes.
Um aquícludo é uma camada impermeável que não deixa passar água embora possa contê-la,
como acontece nos sedimentos com poros não-ligados ou sedimentos com poros não-ligados,
ou sedimentos com poros muito pequenos (por exemplo estratas de argila compacta). Outros
exemplos de aquicludos são rochas ígneas e metamórficas não fracturadas.
Um aquitardo é uma camada de solo semi-permeável que só deixa passar um fluxo de água
relativamente baixo. Toma-se em conta apenas o fluxo de água na direcção vertical, pois o
escoamento na direcção horizontal é desprezável (comparado com o fluxo de água nos
aquíferos).
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-4
As duas propriedades dum aquífero relativo à sua função de armazenamento de água são a
porosidade e o rendimento específico.
A porosidade diminui com o aumento do diâmetro médio das partículas (argila é mais porosa
que areia grossa), porque materiais grosseiros são menos uniformes, resultando em menor
espaço vazio entre os grãos. A figura 7.5 mostra a relação entre a porosidade e a
granulometria.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-5
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-6
Embora a porosidade represente a quantidade de água que um aquífero pode conter, não
indica quanta água possa fornecer. Quando a água é drenada num material pela acção de
gravidade, só parte do volume total armazenado nos seus poros é libertada. A quantidade que
a unidade de volume do material fornece chama-se rendimento específico, sendo um
parâmetro adimensional. Então o rendimento específico Sy (em inglês 'specific yield') é
definido como a relação entre o volume de água drenada por gravidade num solo inicialmente
saturado e o volume total do solo. Também se chama cedência específica. O quadro 7.3
apresenta alguns valores representativos para o rendimento específico de varias rochas.
Figura 7.5 Relação entre o diâmetro dos grãos e alguns parâmetros dos materiais subterrâneos
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-7
Note que a argila e o silte têm um rendimento específico bastante baixo, embora a porosidade
seja normalmente alta.
Exemplo:
Esse simples exemplo mostra como a função de armazenamento dum aquífero torna possível
o uso da água subterrânea com uma taxa constante, embora possa ser intermitente ou
irregular a recarga do aquífero. Sob este ponto de vista, os reservatórios de água
subterrânea são muito mais eficientes que os de água de superfície, dada a sua enorme
capacidade.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-8
Normalmente, Sy >> h * Ss. Por isso, o coeficiente de armazenamento é muito maior num
aquífero freático do que num aquífero confinado.
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Água Subterrânea 7-9
Exercício 1)
Considere o aquífero do exemplo anterior. Qual seria o volume de água que retiraria do
aquífero se o nível piezométrico sofresse um abaixamento de 2 m, supondo que Ss = 5 * 10-5
m-1, S = 0.20, e que o aquífero era:
a) freático;
b) confinado.
A propriedade dum solo relacionada com a sua capacidade de transportar água é chamada
permeabilidade (em inglês 'permeability').
Para obter uma permeabilidade alta não é suficiente que o aquífero tem uma porosidade alta.
Os poros (e fissuras) também devem ser ligados. Uma porosidade alta então não sempre
corresponde com uma permeabilidade alta.
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Água Subterrânea 7-10
O potencial dum aquífero não só depende da sua permeabilidade, mas também da sua
espessura. A capacidade dum aquífero para transportar água é caracterizada pela
transmissividade (em inglês ‘transmissivity’). A transmissividade (T) dum aquífero é o
produto da sua permeabilidade pela espessura (H). Tem as dimensões dum ‘caudal
específico’ (geralmente em m2/dia);
T = K * H (em m2/dia)
No caso dum aquitardo é mais comum falar sobre a sua resistência hidráulica em vez de a sua
permeabilidade. A resistência hidráulica (c) duma camada semi-permeável (que
principalmente deixa passar a água na direcção vertical) é a razão entre a espessura H da
camada e a sua permeabilidade K. As suas unidades são [T], expressando-se normalmente em
dias. Pode-se notar que a resistência hidráulica aumenta com a espessura da camada e
diminui com a sua permeabilidade:
H
c= (em dias)
K
Para a caracterização dum aquífero, importa conhecer a variação das suas características
(principalmente a permeabilidade) em diversas direcções e de ponto para ponto.
Diz-se que um aquífero é isotrópico se, em qualquer ponto, as suas características hidráulicas
não variam com a direcção. Caso isso não se verifique, o aquífero diz-se anisotrópico.
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Água Subterrânea 7-11
Define-se como recarga (R) a fracção da precipitação que se infiltra e percola até ao lençol
freático. A recarga depende das características da zona não-saturada (camadas superficiais),
da zona de recarga e da forma como ocorre a precipitação.
Define-se como resurgência a água que sobe de um aquífero para as estratas mais
superficiais. Ocorre quando o nível piezométrico dum aquífero mais profundo é mais alto que
o dum aquífero mais superficial (ou do nível freático).
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Água Subterrânea 7-12
As rochas ígneas são formadas a partir de magma vindo do interior da terra. Existem rochas
ígneas intrusas ou plutónicas, formadas subterraneamente (exemplos: granito, sienito,
diorito), e rochas ígneas extrusas ou vulcânicas, formadas na superfície por vulcões
(exemplos: riolitos, basaltos). Os minerais mais importantes nas rochas ígneas são o quartzo,
alcali-feldspato, plagioclase e mica.
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Água Subterrânea 7-13
Figura 7.8 Perfil típico dum aquífero numa rocha ígnea ou metamórfica
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-14
Contudo, uma excepção é o mármore carsificado, que pode ter características hidráulicas
muito boas. Também algumas rochas ígneas extrusas como basaltos podem, as vezes, ter boas
características hidráulicas, dependendo da presença de fracturas de refrigeração e da
meteorização das várias estratas. Riolitos são geralmente menos permeáveis que basaltos.
Rochas sedimentares
Sedimentos
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Água Subterrânea 7-15
Quase todos os elementos podem estar presentes na água subterrânea, dependendo do tipo de
aquífero, os processos hidroquímicos nele, bem como a quantidade e qualidade da recarga,
intrusões salinas, métodos de rega, contaminações, etc. Para cada elemento existem normas
para as várias finalidades da água, das quais as normas para o consumo humano (por exemplo
as normas da OMS) são as mais rigorosas. Essas normas também incluem limites para a
presença de bactérias na água.
A maioria dos elementos na água subterrânea estão presentes como iões. Obviamente a soma
dos catiões (em equivalentes) deve ser igual à soma dos aniões. Os catiões mais abundantes
na água subterrânea são sódio (Na+), potássio (K+), cálcio (Ca2+) e magnésio (Mg2+). Os
aniões mais abundantes são o cloreto (Cl-), hidrocarbonato (HCO3-), carbonato (CO32-),
sulfato (SO42-) e nitrato (NO3-). Esses são chamados os iões principais na água subterrânea.
Outros iões e moléculas podem existir em quantidades reduzidas, mas ainda podem ter uma
importância para a saúde (por exemplo fluórido, nitrito, metais pesados), a agricultura (boro)
e a projecto d furos (ferro e manganês).
Muitas rochas ígneas, como granitos e basaltos, são rochas que por si mesmas quase não
contribuem para sais na água, que portanto, podem ter água de muita boa qualidade. O
mesmo pode-se dizer sobre quartzitos e grés (com muito quartzo). A salinidade pode ser da
ordem de 300-500 mg/l. Por outro lado, pequenos sistemas aquíferos (superficiais) em rochas
muito sensíveis a contaminações, a jusante de centros populacionais, a água subterrânea pode
ter um teor alto de nitrato. Em áreas irrigadas aquíferos superficiais podem sofrer de
salinização.
Carbonatos, como os calcários e dolomitos, podem contribuir com elementos para a água
subterrânea, mas a qualidade mantém-se a um nível apropriado. Contudo, esta água é
geralmente muito dura, devido a solução de carbonato de cálcio e (também no caso de
dolomitos) e magnésio. A salinidade pode ser na ordem de 500-800 mg/l.
Evaporitos, como gipso, podem enriquecer a água subterrânea com sais dissolvidos, que
muitas das vezes resulta em água não potável, atingindo salinidades até 4000 mg/l.
Como já foi mencionado, a composição mineralógica pode mudar bastante, devido a recarga
com água duma composição diferente, bem como processos hidroquímicos na zona não-
saturada e no próprio aquífero. Um dos processos mais importantes é a salinização, que pode
acontecer por:
- transgressões;
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-16
Como exemplo duma mudança da composição de água subterrânea pode-se referir muitos
aquíferos em Gaza e Inhambane, contendo grés ou calcário, que hoje em dia têm água
salobra, devido as transgressões marinhas no Cretácio, Eoceno, Oligoceno e Mioceno (entre
há mais que 100 milhões e cerca de 15 milhões de anos). A posterior fraca recarga não foi
suficiente para substituir toda a água salgada por doce.
7.4.1 Introdução
O movimento da água entre um ponto e outro sucede sempre que entre esses se estabelece
uma diferença de pressão. Henry Darcy, engenheiro francês, investigou o fluxo de água
através de camadas de areia, publicando o resultado de suas pesquisas em 1856. Mostrou que
o escoamento da água através duma coluna de areia ou outro material permeável saturado é
proporcional à diferença de pressão hidráulica nos extremos da coluna e inversamente
proporcional ao comprimento da coluna (ver figura 7.9). Esta é conhecida como Lei de
Darcy, ainda hoje utilizada como princípio básico da hidráulica do escoamento subterrâneo.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-17
ν = −K
(ϕ 2 − ϕ1 )
L
em que,
v velocidade de escoamento (m/dia);
φ2- φ1 diferença de pressões hidráulicas (m);
L distância entre os pontos onde as pressões φ2 e φ1 foram medidas (m);
K constante de proporcionalidade (m/dia);
O valor de (φ2- φ1)/L chama-se gradiente hidráulico (i = grad(φ)) que é adimensional. Assim
pode-se escrever:
v = −K ⋅ i
Pode-se logo ver que a constante de proporcionalidade tem as dimensões duma velocidade
(m/dia). De facto, esta constante de proporcionalidade é a permeabilidade (K). Quando se
introduzir areia mais grossa (que tem maior permeabilidade) na coluna, registar-se-á uma
velocidade maior de escoamento. O sinal negativo exprime que o escoamento vai no sentido
contrário ao do gradiente hidráulico.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-18
Para areão, areia, silte e argila o valor da porosidade efectiva é aproximadamente igual a o
rendimento específico.
q = −K ⋅ H ⋅ i
em que,
q fluxo unitário - caudal específico (caudal por metro de largura, m2/dia)
H espessura do aquífero (m)
Uma vez que o valor K · H representa a transmissividade (T) do aquífero, pode-se escrever:
q = −T ⋅ i
vx = −K x ⋅ ix
em que
vx velocidade do escoamento no sentido x (m/dia)
Kx permeabilidade no sentido x (m/dia)
ix ∂ϕ / ∂x , gradiente hidráulico no sentido x (adimensional)
Expressões análogas podem-se estabelecer para vy e vz. Note que no caso dum aquífero
isotrópico Kx = Ky = Kz = K.
Tem interesse considerar a situação do meio estratificado, i.e., meio composto por camadas
paralelas, cada uma delas homogénea e isotrópica, mas com diferenças de permeabilidade
entre as várias camadas.
Neste caso o caudal por unidade de superfície (velocidade) da ág’ua subterrânea é igual em
todas as camadas atravessadas, sendo v (ver figura 7.10, 1ª imagem). Para ca’da uma das
camadas j pode-se escrever:
v = − K j ⋅ i j = − K j ⋅ Δh j H j
⇒ Δh j = −v ⋅ H j K j
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-19
A perda de carga total do escoamento ao atravessar as várias camadas, Δh, calcula-se como:
Δh = ∑ j Δh j = −v∑ j (H j / K j )
Para todo o sistema aquífero (com comprimento total H e no qual o fluxo v se processa com a
mesma perda de carga total Δh) pode-se escrever a lei de Darcy:
em que
Keq permeabilidade equivalente de todo sistema aquífero
⇒ K eq. = −v ⋅ H / Δh = ∑ j H j ∑ (H
j j / K j )=∑j H j ∑C
j j = Kv
em que
cj resistência hidráulica da camada j (dias)
Kv permeabilidade no sentido vertical (m/dia)
Dado que a resistência hidráulica de todo o sistema aquífero na direcção vertical igual a
H/Kv, pode-se também concluir que um caudal que atravessa um aquífero estratificado
enfrente (na direcção do caudal) uma resistência hidráulica igual ao somatório das
resistências hidráulicas das estratas atravessadas.
[Note que existe uma equivalência com a lei de Ohm, no tocante a resistências em série].
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-20
Neste caso o gradiente do escoamento subterrâneo é igual em todas camadas (ver figura 7.10,
2ª imagem). Para cada uma das camadas j pode-se escrever:
q j = − K j ⋅ H j ⋅ i = − K j ⋅ H j ⋅ ΔH L
em que
qj caudal específico (caudal por metro de largura) na camada j (m2/d)
q = ∑ j Δq j = −∑ j (K j ⋅ H j ) ⋅ Δh L = − Δh L ⋅ ∑ j (K j ⋅ H j )
Para todo o sistema aquífero (com espessura total H) e no qual o fluxo q se processa com a
mesma perda de carga total (Δh) pode-se escrever a lei de Darcy:
q = − K eq. ⋅ H ⋅ i = − K eq. ⋅ ∑ j H j ⋅ Δh L
em que
Keq. Permeabilidade equivalente de todo o sistema aquífero
⇒ K eq. = − (q ⋅ L ) (Δh ⋅ H ) = (∑ K
j j ⋅Hj )∑H
j j = ∑jTj ∑ j
H j = Kh
em que
Tj transmissividade da camada j (m2/d)
Kh permeabilidade no sentido horizontal (m/dia)
[Note que existe uma equivalência com a lei de Ohm, no tocante as condutividades].
Exercício 2)
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-21
Solução:
Camada Δh chor cver T q
2
(m) (dias) (dias) (m /dia) (m2/d)
1 0.008 200 2 50 0.05
2 0.197 100000 500 0.05 0.00005
3 0.003 50 0.75 300 0.3
4 0.79 200000 2000 0.05 0.00005
5 0.012 1000 30 30 0.03
Para todos os aquíferos do exemplo, o escoamento vertical é menos que 0.02% do que o
escoamento horizontal. Geralmente o escoamento vertical nos aquíferos pode ser desprezado
em relação ao escoamento horizontal, razão pela qual se diz muitas vezes que ‘nos aquíferos
só se verifica escoamento na direcção horizontal’.
Os aquitardos, neste exemplo, contribuem em quase 99% para o total da resistência hidráulica
vertical. Geralmente a resistência hidráulica vertical nos aquíferos pode ser desprezada.
Assim, quase não se verifica uma perda de carga nos aquíferos na direcção vertical. Isso tem
uma vantagem na instalação de piezómetros para registrar níveis piezométricos. A
profundidade do filtro não é muito critica no caso de um bom aquífero; basta instalar o filtro
dentro do aquífero.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-22
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-23
Como as variações de nível nos aquíferos são bastante lentas, é possível estudar muitos
problemas práticos numa situação de regime permanente. Noutros casos, porem, terá de se
fazer o estudo considerando regime variável.
→ ∂v x ∂v y ∂v z
div v = + + =0
∂x ∂y ∂z
Exercício 4)
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Água Subterrânea 7-24
∂ ⎛ ∂ϕ ⎞ ∂ ⎛ ∂ϕ ⎞ ∂ ⎛ ∂ϕ ⎞
⎜− Kx ⎟+ ⎜⎜ − K y ⎟⎟ + ⎜ − K z ⎟=0
∂x ⎝ ∂x ⎠ ∂ y ⎝ ∂y ⎠ ∂ z ⎝ ∂z ⎠
Pois:
∂K x ∂ϕ ∂ 2ϕ ∂K y ∂ϕ ∂ 2ϕ ∂K z ∂ϕ ∂ 2ϕ
− − Kx 2 − − Ky 2 − − Kz 2 = 0
∂x ∂x ∂x ∂y ∂y ∂y ∂z ∂z ∂z
Esta equação representa a forma geral de escoamento subterrâneo num aquífero confinado
(heterogéneo e anisotrópico) em regime permanente.
Substituindo:
∂ 2ϕ ∂ 2ϕ ∂ 2ϕ
Kx 2 + Ky 2 + Kz 2 = 0
∂x ∂y ∂z
Esta equação representa a forma geral de escoamento subterrâneo num aquífero confinado
homogéneo e anisotrópico em regime permanente.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-25
No caso dum aquífero confinado homogéneo e isotrópico em regime variável deduz-se que:
∂ 2ϕ ∂ 2ϕ ∂ 2ϕ S f ∂ϕ
+ + =
∂x 2 ∂y 2 ∂z 2 Kh ∂t
Mesmo no caso mais simples dum aquífero confinado homogéneo e isotrópico com regime
permanente, a equação de Laplace muita das vezes não se consegue integrar analiticamente,
fazendo-se a integração por métodos numéricos, como o método dos elementos diferenciais,
elementos finitos, elementos analíticos, bem como por outros métodos.
Definindo-se desta forma Ф e Ψ, pode-se mostrar que as duas funções são ortogonais em
qualquer ponto.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-26
Assim a rede de fluxo resulta num conjunto de quadrados (aproximados) e dela se podem
calcular velocidade, caudais e perdas de carga. A figura 7.14 mostra um exemplo duma tal
rede para escoamento subterrâneo abaixo de uma barragem, com as funções de potencial e de
corrente. Refer-se também às disciplinas de Hidráulica e Mecânica de Solos.
Figura 7.14 Exemplo duma rede com linhas equipotenciais e linhas de corrente
Exercício 5)
7.5.3.1 Introdução
Para casos simples ainda podem ser utilizados métodos analíticos. Assim, ir-se-á tratar
essencialmente de escoamento em regime permanente, em aquíferos confinados, que são
homogéneos e isotrópicos.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-27
⇒ ϕ1 = − c 2 K ⇒ c 2 = − K ⋅ ϕ1
⇒ ϕ 2 = − c1 L K − c 2 / K = −c1 L / K + ϕ1 ⇒ c1 = − K ⋅ (ϕ 2 − ϕ1 ) / L
v = − K dϕ dx = K (ϕ1 − ϕ 2 )L
Exercício 6)
Num aquífero confinado como o ilustrado na figura 7.15, com φ1=45m, φ2=40m, L=1000m,
H=30m e K=10-4m/s, determine o caudal que se escoa por metro de largura.
Exercício 7)
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-28
Resolução:
q = 0.20 × 30 = 6m 3 / d / m
q = K eq H (ϕ1 − ϕ 2 ) / L ⇒ K eq = (6 × 200) / (30 × 40) = 1m / d
H 200
= =1 ⇒ l = 16.3m
Hj l 200 − l
∑j K 0.1 + 5
j
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-29
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-30
dϕ Q 1 dϕ Q0 1 Q0 1
vr = − K =− 0 ⇒ = =
dr 2πH r dr 2πKH r 2πT r
Chega-se portanto a:
Q0 ⎛ r0 ⎞
ϕ0 − ϕ = s = ln⎜ ⎟ (eq. de Thiem)
2πT ⎝ r ⎠
Como na prática não se está no centro de uma ilha circular, toma-se para r0 (raio de influência
do poço) a distância para a qual já se faz sentir muito pouco a acção do poço, i.e. o
rebaixamento é negligenciável. Se se instalarem vários piezómetros (poços ou furos onde se
pode medir o nível de água) a distâncias ri e se medirem os rebaixamentos si para um dado
caudal extraído em regime permanente, é possível marcar num gráfico em papel semi-
logarítmico os pontos [si, ln(ri)] e traçar a recta que melhor se ajusta a esses pontos. Para s=0
obter-se-á o valor de ln(r0). Para r = rp obtem-se o rebaixamento teórico no poço, sp. Este
valor pode diferir do valor real medido no poço, spr, devido às perdas de carga à entrada do
poço. Chama-se raio equivalente do poço, re, ao valor de r que corresponde a spr na equação
de Thiem. Após o traçado da recta, é possível obter o valor da transmissividade T e da
permeabilidade K a partir de
Q
T = 0 Δ ln (r )
2πΔs
T
K=
H
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-31
Exercício 8)
Num aquífero confinado, está a ser bombado dum furo um caudal constante de 100 l/s
verificando-se rebaixamentos de 10 m e 7 m em dois poços de observação, situados a
distâncias de 10 m e 30 m do furo de bombagem. Sabendo que o raio do furo é de 0.15 m e
que a espessura do aquífero é de 40 m, determinar a permeabilidade do aquífero, o
rebaixamento teórico no poço, a distância a partir da qual o rebaixamento é inferior a 2 m e
o raio de influência do poço.
Exercício 9)
Utilizando os dados relevantes do exemplo anterior, calcular o caudal que se poderia extrair
se se limitasse o rebaixamento no poço a 10 m.
Muitas das vezes a espessura do aquífero é suficientemente grande para que o furo ou poço
não abranja a totalidade da espessura, figura 7.19. Apenas num certo comprimento menor que
H se estabelece uma zona filtrante por onde se processa a entrada de água no poço. As linhas
de corrente já não são horizontais e há um afastamento em relação à teoria dos poços
completos.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-32
7.6.1 Introdução
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-33
O engenheiro francês Jules Dupuit apresentou em 1863 a seguinte hipótese para permitir
determinar uma equação do escoamento subterrâneo em aquíferos freáticos que se pudesse
analisar com mais facilidade:
- numa secção transversal qualquer, a distribuição de velocidades é uniforme;
- a componente vertical da velocidade em qualquer ponto é desprezável, portanto vz = 0. O
que não é válido em zonas do aquífero onde a curvatura da toalha freática seja acentuada
como acontece na vizinhança de valas ou poços para onde se dá o escoamento.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-34
Pois:
2 2 2
⎛h⎞ ⎛h⎞ ⎛h⎞
∂ ⎜ ⎟
2
∂2⎜ ⎟ ∂2⎜ ⎟
∂K x ∂h 2 ∂K y ∂h 2 ∂K z ∂h 2
− h − Kx ⎝ 2⎠ − h − K y ⎝ 2⎠ − h − Kz ⎝ 2⎠ + R = 0
∂x ∂x ∂x ∂y ∂y ∂y ∂z ∂z ∂z
∂K x ∂h 1 ∂ h
2 2
∂K y ∂h 1 ∂ h
2 2
∂K z ∂h 1 ∂ h
2 2
− h − Kx − h − Ky − h − Kz +R=0
∂x ∂x 2 ∂x 2
∂y ∂y 2 ∂y 2
∂z ∂z 2 ∂z 2
Esta equação representa a fórmula geral de escoamento subterrâneo num aquífero freático
(heterogéneo e anisotrópico) em regime permanente, com recarga R mas sem alimentação de
aquíferos mais profundos.
Substituindo:
∂ 2h2 ∂ 2h2 ∂ 2h2
Kx + K y + K z +R=0
∂x 2 ∂y 2 ∂z 2
Esta equação representa a forma geral de escoamento subterrâneo num aquífero freático
homogéneo e anisotrópico em regime permanente, com recarga R, sem alimentação de
aquíferos mais profundos.
Note-se que num aquífero freático a cota piezométrica n é dada por h, altura da toalha freática
acima da camada impermeável suposta horizontal.
∂2h2 ∂2h2
+ =0
∂x 2 ∂y 2
Tal como no caso dos aquíferos confinados esta’s equações podem ser integradas usando
métodos numéricos embora com a dificuldade adicional da fronteira superior do domínio
(que é a superfície freática) não estar definida a priori.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-35
A integração conduz-nos a:
d h2 ( )
= c1 ⇒ h 2 = c1 x + c 2
dx
x = 0 : h = h0
Condições de fronteira:
x = L : h = h1
h02 = c 2
⇒
h12 = c1 L + c 2 ( )
⇒ c1 = h12 − h02 / L
h02 − h12
h =h −
2 2
0 x
L
Note-se que a variação de h com x não é linear, contrariamente ao que acontece com os
aquíferos confinados. De facto a forma é parabólica.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-36
Exercício 10)
Considere um aquífero freático como o representado na figura 7.21, com L=500m, h0=20m,
h1=15m, K=7.5m/d. Não há recarga. Calcule:
- o caudal que se escoa da vala 1 para a vala 2;
- a velocidade aparente na secção x=250m.
Se se considerar uma secção a uma distância x da origem, o caudal que atravessa essa secção
é (pela condição da continuidade em regime permanente):
Continuidade: q x + dx = q x + dq ⇒ dq = q x + dx − q x = R ⋅ dx ⇒ q = R ⋅ x + c1
⇒
dh 2
( )
=−
2R
x ⇒
R
h 2 = − x 2 + c2
dx K K
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-37
K 4 K ⎣⎢⎝ 2 ⎠ ⎦⎥
RL2
2
hmax = h12 +
4K
Exercício 11)
Na situação representada na figura 7.22 considere que a recarga durante uma chuvada
muito intensa é de 15 mm/dia. Supondo que se trata de uma área agrícola em que o máximo
nível freático deve estar pelo menos 0.75 m abaixo da superfície do terreno, determine o
valor correspondente de h1.
Solução: h1 = 5.19 m.
Exercício 11)
Considere o aquífero freático representado na figura 7.22, porém com níveis nas valas
diferentes (h1 e h2). Determine as expressões de cálculo de L, hmax, h, e dos caudais que se
escoam para as valas. (Obs: Os exemplos anteriores constituem casos particulares deste
para h1 = h2 ).
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-38
Figura 7.23 Escoamento para valas num aquífero freático com ressurgência
q = R ⋅ x − vz ⋅ x
L2
⇒ C1 = (R − v z ) + Kh12
4
⎛ L2 ⎞
(
⎜⎜ − x 2 ⎟⎟(R − v z ) = K h 2 − h12 )
⎝ 4 ⎠
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-39
Nesta equação, R, hs, h1, c, K e L são dados pelo que a única incógnita é h0 (que se determina
facilmente visto tratar-se duma equação do 2º grau). A substituição do valor de h0 na fórmula
permite calcular o valor de vz, valor importante para dimensionar os drenos (o caudal a
descarregar é de R ⋅ L / 2 − v z ⋅ L / 2 por metro de comprimento do dreno).
Figura 7.24 Escoamento para um poço num aquífero confinado com recarga
Neste caso existe uma superfície cilíndrica concêntrica com o poço à distância r0, sendo o
divisor de águas (gradiente de nível freático é nulo), que então não é atravessado por nenhum
caudal. A distância desse divisor de águas (r0) está sendo determinada pelo caudal bombado
do poço em relação à recarga. Pode-se tomar rp ≈ 0. As superfícies equipotenciais são
cilindros (figura 7.25). Devido à recarga, na figura 7.25 Qp > Q1 > Q2 (se Q for definido no
sentido do poço).
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-40
Considere-se uma superfície cilíndrica com o poço a uma distância genérica r do poço, com
espessura dr. O caudal que atravessa essa superfície é (pela condição de continuidade em
regime permanente):
Lei de Darcy: v r = − K ⋅ dh dr ;
q r = − K ⋅ h ⋅ dh dr
Q = −2π ⋅ r ⋅ K ⋅ h ⋅ dh / dr
Somando as variáveis:
Q dr R
− 0 + rdr = −hdh
2πK r 2 K
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-41
Sendo a equação geral que define o nível freático em função do caudal bombado.
A distância da linha de separação das águas, r0, calcula-se assim:
Q = 0 ⇒ π ⋅ r02 ⋅ R − Q0 = 0
Q0
⇒ r0 =
Rπ
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-42
s1 = h0 − h1
s 2 = h0 − h2
Q0 ⎛ r0 ⎞
h02 − h12 = ln⎜ ⎟
πK ⎜⎝ r1 ⎟⎠
Q ⎛r ⎞
h02 − h22 = 0 ln⎜⎜ 0 ⎟⎟
πK ⎝ r2 ⎠
Q0 ⎛ r1 ⎞
⇒ h12 − h22 = ln⎜ ⎟
πK ⎜⎝ r2 ⎟⎠
Q0 ⎛r ⎞
⇒ K= ln⎜⎜ 1 ⎟⎟
( )
π h1 − h2 ⎝ r2 ⎠
2 2
Características do poço
( )( )
O rebaixamento no poço, sp, é dado por s p = h0 − h p . Como h02 − h p2 = h0 − h p ⋅ h0 + h p ,
então
Q ⎛r ⎞
Sp = ln⎜ 0 ⎟
( )
πK h0 + h p ⎜⎝ rp ⎟⎠
Esta equação que relaciona o rebaixamento no poço com o caudal chama-se curva
característica do poço.
hp Q
⇒ = 1−
h0 Qmax
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-43
A experiência indica que se deve explorar um poço num aquífero freático com valores de
rebaixamento sp entre 0.5h0 e 0.75h0. Isso corresponde a extrair um caudal Q entre 0.75 e
0.94 do caudal máximo.
Pequenos rebaixamentos
Exercício 13)
Exercício 14)
Considere um poço completo num aquífero freático sujeito a recarga (constante). Num
piezómetro a 100m do poço regista-se um nível freático de 22.30m (acima da base do
aquífero). Supondo que rp=0.2m, Q0=90m3/h, K=25m/d, recarga R=170mm/ano, determine:
a) qual o nível atingido pela água no poço;
b) qual a distância do divisor da água subterrânea;
c) qual o nível da superfície freática no divisor da água.
Solução:
a) 18.07m;
b) 1215m;
c) 23.50m.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-44
Da mesma maneira como no caso de um aquífero confinado, pode-se derivar a equação geral
de escoamento subterrâneo num aquífero semi-confinado, homogéneo e isotrópico em regime
permanente:
∂ 2ϕ ∂ 2ϕ (ϕ − ϕ c ) (ϕ − ϕ b )
− KH 2 − KH 2 + + =0
∂x ∂y cc cb
Vê-se logo que para uma aquífero confinado (cb e cc infinitésimos) esta equação deduz-se à
equação de Laplace para escoamentos bidimensional.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-45
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-46
C1 = (ϕ j − h1 )e λ
−
⇒ ϕ j = C1e λ
+ h1 ⇒
Assim:
x− x j
ϕ = (ϕ j − h1 )e
−
λ
+ h1
Porque q = − KH dϕ dx :
x − x1 x − x1
λ
q = (ϕ j − h1 ) = (ϕ j − h1 ) e
KH −
λ
−
λ
e
λ c
Se a barragem for impermeável, o caudal abaixo da barragem será constante, q0. No ponto
x = x j ainda q = q0, então pode-se escrever:
λ
q0 = (ϕ − h1 ) ⇒ ϕ j = h1 + q0
c
λ
j
c
x − x1
c −
⇒ ϕ = q0 e λ
+ h1
λ
x − x1
−
e q = q0 ⋅ e λ
Da mesma maneira obtem-se as equações para montante da barragem (neste caso C1=0):
c
ϕ m = h0 − q 0
λ
xm − x
c −
⇒ ϕ = −q0 e λ
+ h0
λ
x − xm
−
e q = q0 ⋅ e λ
Para o escoamento abaixo da barragem, pode-se aplicar a lei de Darcy (aquífero confinado),
que resulta em:
⎛ c⎞
⎜ h1 − h0 + 2q 0 ⎟
dϕ (ϕ j − ϕ m ) λ⎠
q = − KH = − KH = − KH ⎝
dx L L
(h0 − h1 )KH
⇒ q0 =
L + 2λ
Quando o aquífero não tiver outras fontes de descarga, o q0 representa a ressurgência total a
jusante da barragem (por metro de comprimento).
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-47
Exercício 15)
Verifique as equações.
Exercício 16)
Considere uma barragem construída numa zona com aquífero semi-confinado. Pretende-se
instalar um sistema de drenagem a jusante para manter aí o nível freático em 1.5m abaixo da
superfície do terreno. Assuma este nível freático uniforme. Também assuma o nível da
albufeira constante, sendo 10m acima do terreno. A transmissividade do aquífero é
100m2/dia, a resistência hidráulica da camada semi-permeável é de 50 dias. A largura da
barragem é de 70m. Calcule:
a) o nível piezométrico a 50m a jusante da barragem;
b) a intensidade da ressurgência a 50m;
c) repita essas perguntas para outros valores de transmissividade e resistência
hidráulica e avalie o significado do ‘factor de dispersão’.
Solução:
a) 0.40m (acima da superfície do terreno)
b) 37.9mm/dia
c) se λ fosse alto, implicaria que as linhas de corrente são mais dispersadas, e a
ressurgência atinge uma maior distancia.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-48
O equilíbrio das forças verticais ao nível da base da camada semi-permeável traduz-se pela
seguinte equação:
(H t − H e )ρ t g + H s ρ s g = (ϕ + H s )ρg
ρs ρ
⇒ He = Ht + Hs − (ϕ + H s )
ρt ρt
He deve ser sempre inferior ao valor dado pela expressão acima visto que se for superior o
peso do terreno não é suficiente para resistir à subpressão da água e a camada semi-
permeável rompe. Habitualmente, toma-se um factor de segurança de 1.5, isto é, adopta-se
He’=He/1.5, sendo He dado pela expressão acima.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-49
7.8.1 Introdução
Nessas condições, o equilíbrio estático num ponto genérico da interface é expresso por:
(h + z )ρ d g = zρ s g
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-50
ρd é praticamente igual a 1000 kg/m3 enquanto para ρs se pode tomar o valor médio de 1025
kg/m3. Chega-se então à relação:
ρd
z= h ≈ 40h
(ρ s − ρ d )
Portanto, a interface situa-se a uma profundidade, sob o nível do mar, igual a cerca de 40
vezes a altura da água doce sobre o nível do mar, na mesma vertical.
Note-se que a teoria de Badon Ghyben-Herzberg, mesmo aceitando que não haja uma zona
de mistura, não descreve correctamente a posição da interface junto ao afloramento do
aquífero no mar por não considerar a aceleração do escoamento devido ao estreitamento da
secção, nem o surgimento de componentes verticais da velocidade.
Também em Moçambique já se tem verificado situações como esta, por exemplo com os
campos de furos para o abastecimento de água a Pemba.
Depois de criado o problema, a sua resolução é difícil e lenta podendo referir-se os seguintes
métodos:
- redução do caudal bombado;
- recarga artificial da água doce;
- manutenção duma barreira à intrusão salina por uma linha de poços de injecção;
- construção de barreiras físicas subterrâneas.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-51
Na exploração de água subterrânea em ilhas marítimas (como Inhaca, Bazaruto, etc.) deve-se
tomar todas as precauções para evitar a salinização do aquífero, dado o equilíbrio muito
crítico entre a água doce e a água salgada. Considere-se por exemplo uma ilha circular, cujo
subsolo consiste dum aquífero freático, que está sujeito à recarga R (ver a figura 7.31).
Da mesma maneira que no parágrafo 7.6.3.4 aplica-se a equação de continuidade para obter a
uma distância r do centro da ilha:
Qr = πr 2 R (escoamento na direcção do mar)
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-52
Rr02
⇒ = c1
2 K (1 + γ )γ
⇒z =
(
R r02 − r 2
2 )
2 K (1 + γ )γ
Da mesma maneira que no caso de ilhas, a exploração da água subterrânea em faixas de terra,
circundadas pelo mar (como por exemplo a península de Macaneta) deve ser realizada com
muito cuidado. Considere-se uma faixa infinita cujo subsolo consiste dum aquífero freático,
que está sujeito a recarga R, neste caso por metro de comprimento do aquífero (ver também a
figura 7.31, substituindo r por x e r0 por L). Determina-se a expressão da superfície freática
no aquífero, limitado pelo mar (escoamento unidireccional).
Da mesma maneira que no parágrafo 7.5.3.2 aplica-se a equação de continuidade para obter:
q = R⋅x
⎛ h ⎞ dh K
Rx = − K ⎜⎜ h + ⎟⎟ ⇒ Rxdx = − Khdh − hdh
⎝ γ ⎠ dx γ
K
⇒ Rx 2 = − Kh 2 − h 2 + c1
γ
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-53
Condição de fronteira: x = L; h = 0
⇒ RL2 = c1
⇒ h2 =
(
Rγ L2 − x 2 )
K (γ + 1)
7.9.1 Introdução
A DNA dispõe duma base de dados com a informação sobre a litologia dos furos realizados e
outros dados como a produtividade e a qualidade da água. No entanto, nem a DNA nem
nenhuma outra autoridade do País (ainda) fazem a monitoria sistemática dos aquíferos
(qualidade e níveis). A DNA não tem informação sobre quantos furos estão de facto em
exploração, qual o caudal médio extraído, etc. Ainda não existe uma rede de piezómetros de
observação, nem para os principais aquíferos identificados. Apenas os aquíferos de Pemba e
de Infulene são monitorados por estarem ligados a sistemas de abastecimento urbanos.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-54
No que respeita aos recursos de águas subterrâneas, a informação existente é insuficiente para
uma avaliação precisa do seu potencial. Moçambique pode ser dividido em três unidades
hidrogeológicas que coincidem com as três unidades geológicas principais, incluindo:
- os aquíferos que ocorrem nas formações geológicas do Complexo Cristalino (rochas
ígneas e metamórficas pré-câmbricas);
- os aquíferos que ocorrem nas formações do Karroo;
- os aquíferos englobados nas formações sedimentares pós-Karroo.
Manual de Hidrologia
Água Subterrânea 7-55
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-1
8 ESCOAMENTO SUPERFICIAL
Finalmente, a água infiltrada que atinge o nível freático constitui a recarga do aquífero,
elevando o nível freático ou a carga piezométrica. Se o aquífero é interceptado por uma linha
de água, ele escoa para essa linha de água um caudal superior ao anterior à recarga.
As figuras 8.1 a 8.4 ilustram estes conceitos. Na figura 8.1, i(t) é a intensidade de precipitação
e f(t) é a capacidade de infiltração que vai decrescendo com o tempo, tendendo para um valor
constante. Nem toda a precipitação que excede a capacidade de infiltração origina escoamento
superficial: a área a sombreado escuro corresponde a precipitação que preenche o
armazenamento em depressões. A parte a tracejado corresponde à precipitação útil que
origina o escoamento superficial.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-2
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-3
Em termos da utilização da água superficial, o maior interesse reside nos caudais que se
escoam nas linhas de água permanentes, embora o escoamento superficial laminar tenha
também importância para diversos problemas (simulação hidrológica, rega por gravidade,
erosões).
V = ∫T Q dt
Designa-se por caudal específico o caudal por unidade de área de bacia de drenagem da
secção onde o caudal é observado.
Existem diversos processos para a medição do caudal numa dada secção dum rio ou dum
canal. Os que se utilizam em Moçambique são o método da secção – velocidade e o método
estrutural. Para além destes, podem referir-se ainda o método da diluição e o método de ultra-
sons.
Q = ∫A v dA
Este é o método normalmente mais utilizado, não apenas em Moçambique mas em todo o
Mundo.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-4
d) determina-se a velocidade média em cada uma das verticais 1 a n-1 pelo processo que
será explicado mais adiante
e) obtem-se o caudal qi em cada faixa multiplicando a área da faixa pela velocidade
média vi na respectiva vertical
f) o caudal total é dado por Q = ∑ qi
qi =
l
[ 2 (hi −1 v i −1 + hi v i ) + hi v i −1 + hi −1 v i ]
6
i = 1, n ho = hn = vo = vn = 0
n
Q = ∑ qi
i =1
Esta fórmula é considerada a mais precisa para o cálculo do caudal mas é pouco utilizada.
v i (hi −1 + 2hi + hi −1 )
l
qi =
4
Q = ∑ qi
i
i = 1, n-1 h o = hn = 0
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-5
qi = l vi hi
Q = ∑ qi
i
i = 1, n-1
v i + v i −1 h + hi −1
qi = l ( ) ( i )
2 2
Q = ∑ qi
i
i = 1, n ho = hn = vo = vn = 0
Normalmente, as diferenças nos resultados são muito pequenas pelo que se podem usar as
fórmulas mais simples.
Embora se pudesse esperar que a velocidade pontual máxima se registasse num ponto da
superfície livre da água, medições rigorosas têm mostrado que ela se regista um pouco abaixo
da superfície livre, por causa da tensão tangencial criada pela resistência do ar ao escoamento.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-6
Assim, em cada vertical existe um perfil de velocidades como o da figura 8.7, em que a
velocidade cresce desde junto ao leito até um valor máximo próximo da superfície. O
aumento da velocidade é rápido junto ao leito e lento junto à superfície.
Teóricamente, para se obter a velocidade média em cada vertical teria de se traçar o perfil de
velocidades a partir da determinação das velocidades pontuais num certo número de pontos; e
obter o valor médio v. Como, no entanto, a determinação de cada velocidade pontual é um
processo trabalhoso e moroso, procurou-se minimizar esse trabalho, fazendo medições de
velocidade apenas em 1 ou 2 pontos em cada vertical.
Para isso, admite-se que o perfil de velocidades segue uma lei parabólica, hipótese que tem
uma base teórica e uma boa correspondência com os dados de observação.
y = b v2
v=a y
v max = a h max
2 2 3
Área = v max h max = ah max 2 = h max v
3 3
2 1 2
v = ah max 2 = v max
3 3
Figura 8.7 – Perfil de velocidades
Se se medir a velocidade a uma profundidade de (1-0.44) hmax = 0.56 hmax ≅ 0.6 hmax, o valor
obtido é igual à velocidade média.
Por vezes, opta-se por obter a velocidade média a partir das medições das velocidades em 2
pontos, a profundidade 0.2 hmax e 0.8 hmax.
Com efeito,
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-7
Para medir a velocidade num certo ponto da secção transversal, basta colocar o molinete nesse
ponto e medir o número de rotações efectuado em certo tempo. Convém que o intervalo do
tempo não seja muito curto, nunca inferior a 1 minuto. A velocidade é dada por:
v = a + b·n
Os parâmetros a, b devem ser periodicamente aferidos (p.ex, uma vez por ano) visto que o
próprio funcionamento em condições normalmente turbulentas de escoamento altera os seus
valores. Essa aferição exige uma estrutura de calibração onde se segue um processo inverso
do da medição: a velocidade é conhecida e os parâmetros a e b não são.
Para isso, é preciso dispôr dum bom canal de calibração de molinetes. Neste canal move-se
um carro cuja velocidade é rigorosamente controlada por equipamento electrónico. O
molinete a calibrar está solidário com o carro. A água no canal está parada pelo que a
velocidade medida pelo molinete é a velocidade do movimento do carro. O carro pode
deslocar-se a uma velocidade pré-fixada (normalmente entre 0.1 e 10 m/s). Fixando uma certa
velocidade, regista-se o número n de rpm dado pelo molinete; repete-se o processo para vários
valores de velocidade. Finalmente os parâmetros a e b são obtidos a partir da recta de
regressão linear simples de v sobre n.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-8
2 2
v= v max ≅ v sup
3 3
toma-se na prática
v = 0.75v sup
visto vsup ser na realidade inferior a vmax devido à tensão tangencial criada pela resistência do
ar.
Para se fazer uma medição com flutuador, escolhem-se duas secções num troço recto do rio
ou canal e a uma distância L entre si; lança-se o flutuador a montante da primeira secção e
mede-se o tempo t que ele leva a percorrer a distância L. Ter-se-á então
L − L
vsup = e v = 0.75
t t
• a vau: este processo é bastante prático quando o escoamento se processa com pequenas
alturas e baixas velocidades, não devendo ser utilizado se a altura do escoamento for
superior a 1 metro
• de barco: este processo torna-se bastante mais moroso pela necessidade de posicionar o
barco na posição correcta para cada medição de velocidade pontual
• a partir de um teleférico: para secções largas e sujeitas a cheias de rios importantes pode
ser vantajosa a instalação dum teleférico do qual se suspende o molinete. Este processo é
expedito, preciso e funciona durante as cheias (o que não acontece com os dois métodos
anteriores) mas o investimento inicial necessário é alto.
• A partir duma ponte: as pontes são secções privilegiadas de medição, podendo esta ser
feita com rapidez e rigor mesmo durante cheias.
Durante as cheias o escoamento é fortemente turbulento pelo que convém medir a velocidade
em vários pontos em cada vertical de forma a que os perfis de velocidades fiquem bem
definidos.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-9
O método estrutural para a medição de caudal toma esse nome porque assenta na utilização
duma estrutura hidráulica, como o descarregador duma barragem ou um canal Parshall, em
que há uma relação fixa entre altura e caudal, obtida teoricamente ou por modelo reduzido em
laboratório (p. exº o LEM obteve essa relação para o descarregador situado em Goba através
de ensaios em modelo reduzido). Além do canal Parshall e dos descarregadores de barragens e
açudes (descarregadores de soleira espessa) também se utilizam por vezes descarregadores de
soleira delgada, os quais são construídos especificamente para a medição de caudais.
Como se disse atrás, o método estrutural utiliza a relação biunívoca entre caudal e altura do
escoamento através da estrutura para obter o caudal a partir duma simples medição da altura:
h → Q = f (h). A relação Q = f (h) pode ser estabelecida teoricamente para as estruturas com
formas estudadas e por via laboratorial, utilizando modelos reduzidos, nos outros casos.
Por exemplo, para um descarregador onde o escoamento se processa sem afogamento tem-se:
Q = μ B 2g h3 / 2
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-10
Q = (μ + η B) h ξ
De qualquer forma, sempre que uma estrutura esteja disponível (como é o caso dos
descarregadores das barragens) ela deve ser aproveitada para a medição de caudais.
O método da diluição tem uma utilização restrita e não tem sido aplicado em Moçambique.
Ele consiste na injecção dum caudal constante q duma solução muito concentrada dum
determinado produto químico (inexistente ou com pequena concentração na água em
condições naturais) numa secção a montante e na medição da concentração desse produto a
jusante, após se completar o processo de difusão.
O cálculo do caudal Q é feito considerando que a concentração inicial do produto químico era
ci, a concentração final medida a jusante era cf e co era a concentração natural do produto na
água.
ci − c f
q ci + Q co = (q + Q) c f → Q=q
c f − co
Isto implica que ci deve ser bastante alto para que cf seja claramente superior a co.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-11
- ci tem de ser elevado o que implica bastantes custos (instalação de injecção, material)
- tem de se manter a injecção durante bastante tempo para garantir o estabelecimento de
regime permanente
- os traçadores utilizados apresentam impactos ambientais negativos (cor, radiação) e são
caros. Tal não é o caso do cloreto de sódio mas este tem a desvantagem de existir em
concentrações relativamente elevadas na água, dando resultados pouco precisos.
É possível aplicar o método sem se ter regime permanente mas tal obriga a aceitar hipóteses
sobre o processo de difusão, introduzindo uma fonte adicional de erro no cálculo do caudal.
O método dos ultra-sons permite determinar a velocidade (média) a uma dada profundidade y.
Fazendo essa determinação para diversos valores de y, o caudal é obtido somando os caudais
parciais obtidos através dos produtos das velocidades pelas respectivas áreas de influência.
Este método está ainda numa fase que se pode considerar experimental e a sua utilização
presente está limitada a canais artificiais com fundo horizontal, secção simétrica não erodível
e sem vegetação e num alinhamento rectilíneo. Tem custos elevados de investimento e de
O&M.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-12
L L L ⎛1 1⎞
t1 = t2 = → V= ⎜⎜ − ⎟⎟
c + V cos θ c − V cos θ 2 cos θ ⎝ t1 t 2 ⎠
Com a excepção do método estrutural (que, como se viu, está limitado às situações pouco
frequentes em que se dispõe duma estrutura descarregadora), os restantes métodos de medição
de caudal (secção-velocidade, diluição) exigem pessoal especializado a nível médio
(hidrometrista) e cada medição demora horas. Não é portanto viável medir diariamente
caudais nas muitas secções dos rios do país em que tal seria necessário.
Procura-se então estabelecer em cada secção de interesse uma relação entre o caudal Q que
passa na secção e a altura do escoamento h, relação que é, em certas condições, biunívoca.
Designa-se por curva de vazão a função Q (h) que permite obter o caudal a partir da
correspondente altura do escoamento. Note-se que a utilização do método estrutural exige o
estabelecimento da relação Q = Q (h).
Uma vez definida a curva de vazão, o problema da medição de caudal transforma-se num
problema bastante mais simples que é o da medição do nível da água do rio - medição que
pode ser feita por uma pessoa bastante menos qualificada que um hidrometrista. Mede-se
então diariamente (ou várias vezes por dia durante as cheias) o nível no rio, obtendo-se a
altura do escoamento; a função Q (h) determina os correspondentes valores de caudal.
O estabelecimento da curva de vazão numa dada secção dum rio é feito a partir duma série de
medições de caudal, feitas ao longo dum ano hidrológico. As medições devem ser executadas
em períodos onde se verifiquem diferentes alturas do escoamento, desde alturas muito
reduzidas em época de estiagem até alturas elevadas durante cheias, cobrindo assim uma
grande gama de caudais.
Ao conjunto de pares (Q, h) resultante dessas medições ajusta-se uma expressão geral do tipo
Q = a (h – ho)b
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-13
Esta função Q (h) de tipo exponencial corresponde bastante bem às observações de campo.
Os parâmetros a e b são obtidos com relativa facilidade por meio de regressão linear
trabalhando no espaço logarítmico.
Não é demais salientar a importância de se medirem caudais tão altos quanto possível e da
necessidade de rigor na execução das medições.
É muito difícil medir caudais durante cheias: a medição é perigosa por causa da grande altura
e velocidade do escoamento, além de dificuldades agravadas de acesso à secção de medição.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-14
A curva de vazão estabelecida para uma determinada gama de caudais não deve ser
extrapolada para um caudal muito superior ao máximo caudal medido, por um lado porque
podem verificar-se mudanças bruscas na forma da secção, figura 8.12; por outro, porque
haver grandes modificações na rugosidade do leito, sobretudo quando o escoamento ultravaza
o leito menor, figura 8.13.
Diversas vias têm sido propostas para estender a curva de vazão para caudais e alturas
superiores aos máximos medidos. Apresentam-se de seguida algumas dessas vias.
Verifica-se que esta relação U(R) em papel log-log se mantém aproximadamente linear para
caudais altos.
Infelizmente, a relação U(R) não se mantém linear no espaço logarítmico quando a secção
inclui a planície de inundação.
Q = Ks A R2/3 J1/2
Neste processo aceita-se como aproximação suficiente que J = Jo. No caso de haver
inundação das margens, a secção é dividida em partes, obtendo-se uma rugosidade
equivalente neq. O valor de Ks é calibrado para os mais altos valores de Q medidos.
3º Processo) Consiste em estimar o caudal duma cheia real a partir das marcas deixadas pela
cheia em árvores, casas, etc. Tomam-se 2 secções distanciadas de pelo menos 75 vezes a
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-15
2 2
1
K = AR 3 = K s AR 3
n
h1 − h2
Q = K2
K 2 ⎡ ⎛ A2 ⎞ ⎤
2 2
K2
L+ ⎢1 − ⎜ ⎟ ⎥ (1 − r )
K1 2 gA22 ⎢ ⎜⎝ A1 ⎟⎠ ⎥
⎣ ⎦
sendo L a distância entre secções, r = 0 ou 0.5 conforme se tenha uma contracção ou uma
expansão do escoamento e hi, Ai, Ki são a altura do escoamento, a área e a capacidade de
vazão da secção i
Assim, conhecido o nível atingido por uma cheia, é fácil obter A e Jw e daí o caudal máximo
da cheia.
A medição da altura hidrométrica num rio ou curso de água é feita habitualmente com recurso
a escalas. As escalas são réguas graduadas que se colocam por troços verticais, figura 8.14, de
forma a permitir uma fácil leitura do nível da água no rio, donde se obtém a altura do
escoamento (por subtracção do “zero” da escala). Por vezes, a escala é colocada inclinada
sobre a margem, alterando-se a graduação de forma a fazer-se uma leitura directa
considerando essa inclinação.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-16
Instalada a escala e determinado o seu “zero”, o leitor faz uma leitura diária a uma hora fixa e,
em período de cheias, várias leituras por dia.
Para se obter um registo contínuo de caudais, sobretudo durante as cheias, pode-se instalar em
secção de rios importantes um limnígrafo, aparelho que faz um registo contínuo de níveis,
figura 8.15
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-17
Tem-se então
pleito = γh + patm
→ h = (pleito - patm) /γ
O registador digital armazena os valores de h (que ele próprio calcula) em intervalos de tempo
fixo, p. ex. 5 minutos. Os registos, sendo digitais, podem depois ser transferidos directamente
para computador, evitando o processo de transcrição que é sempre fonte de erros.
Designa-se por estação hidrométrica a instalação numa dada secção dum rio para se
proceder à medição de alturas do escoamento e caudais e onde, em princípio, ficará
estabelecida uma curva de vazão.
A escolha duma secção para implantar uma estação hidrométrica deve ser bastante criteriosa.
Em condições ideais, tal secção deve obedecer cumulativamente às seguintes condições:
a – deve situar-se na parte média dum troço rectilíneo do rio, com um comprimento
mínimo de 3 vezes a largura da secção e inclinação constante;
b – ser estável (sem erosão nem sedimentação acentuada);
c – não ser afectada por regolfo, marés, confluências;
d – não ter vegetação;
e – o escoamento deve processar-se num leito bem definido;
f – o local deve ser sempre acessível, mesmo com mau tempo e durante cheias;
g – deve haver possibilidade de recrutar localmente um observador/leitor.
Podem adoptar-se diversos processos para estimar esses escoamentos, de acordo com a
informação disponível. O problema coloca-se igualmente para preenchimento de falhas em
séries de registos de escoamento.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-18
Por vezes, não se dispõe de dados de escoamento numa dada secção dum rio (onde, por
exemplo, se quer construir uma pequena barragem ou localizar uma toma de água) mas eles
existem numa outra secção do rio, não muito afastada, a montante ou jusante.
Nessas condições, poderá admitir-se que o caudal específico (caudal por unidade de área,
Q/A) é o mesmo nas duas secções.
Q1 Q A1
= 2 → Q1 = Q2
A1 A2 A2
Esta relação mostra-se válida quando as duas secções têm as mesmas características
fisiográficas e de precipitação. Se, por exemplo, a precipitação ponderada sobre as bacias das
secções 1 e 2 é bastante diferente, deverá modificar-se a expressão acima para entrar em conta
com esta variação:
Q1 Q2 A P1
= → Q1 = 1 Q2
A1 P1 A2 P2 A2 P2
Note-se que esta última expressão corresponde a considerar que o coeficiente de escoamento
é o mesmo nas duas bacias drenantes, entendendo-se como coeficiente de escoamento a
relação entre o volume precipitado e o volume escoado.
em que
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-19
Nas albufeiras existem registos (diários) dos volumes armazenados (normalmente, registam-
se alturas de água na albufeira e transformam-se em volumes através da curva de volumes
armazenados); descargas (descargas de fundo, toma de água, circuito para central
hidroeléctrica, descarregador de cheias); precipitação e evaporação. A única incógnita da
equação do balanço hídrico é então, o escoamento afluente.
A fórmula de Turc é uma fórmula semi-empírica que poderá ser utilizada caso não se
disponha de nenhumas medições de caudal na bacia em estudo.
A fórmula escreve-se:
DE = P – R
P
DE =
P2
0.9 +
L2
Assim, a partir dos valores anuais de T e P, pode-se calcular facilmente L e DE e daí obter a
série de valores anuais de escoamento R.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-20
Em pequenas bacias hidrográficas, com relevo pouco acentuado e solos permeáveis com
grande capacidade de infiltração, pode-se utilizar-se o método do balanço hídrico sequencial,
proposto por Thornthwaite e Mather.
Após um episódio de precipitação suficiente para saturar o solo, este começa a drenar. Depois
dum período de tempo suficientemente longo, a drenagem cessa e uma certa quantidade de
água permanece na camada superior do solo, sendo a acção da gravidade contrariada pelos
efeitos de capilaridade e absorção.
Designa-se por capacidade de campo, nr, a relação adimensional entre o volume de água vr
que fica retido contra a acção da gravidade e o volume total do solo vt.
vr
nr =
vt
vo
no =
vt
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-21
O método considera que, em cada intervalo de tempo, se pode registar um superavit hídrico,
SH, ou um défice hídrico, DH.
ΔSs = P - ETp
Nos períodos com défice hídrico (períodos secos), o solo vai perdendo água por
evapotranspiração. O método de Thornthwaite-Mather apresenta as seguintes equações:
L
S s = nu e nu
∑ [P ( j ) − ET ]
i
L(i ) = p ( j) L<0
j =1
L(i )
Δ S s = nu e nu
− S s (i − 1)
sendo i para o período em estudo e j os períodos secos anteriores.
O balanço hídrico sequencial deve começar a ser aplicado no fim do período de estiagem
quando se pode admitir que os armazenamentos de água são nulos.
O método tem como base a hipótese de que o “input” precipitação irá, em primeiro lugar,
satisfazer o consumo de evapotranspiração e o armazenamento de água no solo. Isso só é
válido quando se tem precipitações cuja intensidade não excede a capacidade de infiltração
nos solos, o que nem sempre acontece nos climas tropicais.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-22
Com bastante frequência, os registos de escoamento numa dada secção apresentam falhas.
Existem diversos métodos para se preencherem falhas, apresentando-se alguns de fácil
aplicação.
Pode então estabelecer-se a equação de regressão de Ri sobre Pi para os anos em que não há
falhas:
R= a+bP
A equação pode depois ser utilizada para determinar os escoamentos anuais nos anos com
falhas a partir das precipitações anuais nesses anos.
Com os escoamentos anuais, pode-se fazer a estimação dos escoamentos mensais nos meses
com falhas, utilizando-se, por exemplo, para esses meses as percentagens do escoamento
anual correspondentes a um ano médio.
Como as séries de precipitação são, geralmente, mais extensas que as séries de escoamento, o
mesmo método pode ser usado para fazer a extensão das séries de escoamento. No entanto,
nesse caso a equação deve ser acrescida duma componente aleatória para que se mantenha a
variância da série de escoamentos.
RA = a + b RB
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-23
Cada estação hidrométrica produz uma série cronológica de caudais, calculados por um dos
processos indicados anteriormente. A representação gráfica duma série cronológica de caudais
designa-se por hidrograma.
Poderá haver um valor diário, vários valores por dia ou um registo contínuo de limnigrafo.
Uma primeira série que se estabelece é a do caudal médio diário ou, simplesmente, caudal
diário. É uma série com 365N valores, sendo N o número de anos com medições.
A média dos caudais diários dum mês dá o caudal médio mensal ou, apenas, caudal mensal,
definindo-se assim a correspondente série cronológica, com 12N valores. A média dos
caudais diários dum ano hidrológico dá o caudal médio anual ou, só, caudal anual, permitindo
obter a respectiva série cronológica, com N valores.
Para além destas três séries cronológicas de caudais, há duas outras com interesse para as
aplicações de Hidrologia:
Rios de bacias com grandes áreas ou com aquíferos importantes apresentam normalmente um
regime de escoamento mais regular que rios de bacias pequenas e não alimentados por água
subterrânea.
Neste exemplo, a altitude é um factor mais importante que a área da bacia visto que a
precipitação é, sobretudo, de origem orográfica: nas cabeceiras, zona de altitude elevada, a
precipitação anual média é de cerca de 2,000 mm ao passo que na bacia intermédia e no Baixo
Malema ela ronda os 900 mm.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-24
Para além das séries cronológicas, um bom processo de caracterizar o regime de escoamento
dum rio é o de traçar a curva de duração dos caudais diários.
Dispondo-se duma série cronológica de N anos, ou seja, 365N valores de caudais diários, a
curva de duração obtém-se pelo seguinte processo:
• a série de caudais diários é ordenada por ordem decrescente, sendo Q1 o valor máximo
registado e Q365N o valor mínimo;
• para um caudal Qi o número médio de dias por ano em que esse caudal é igualado ou
excedido é i/N
365 − t n
Q t = Q 365 + (Q − Q 365 ) ( n + 1) (
)
365
sendo n um parâmetro de ajustamento e t o número médio de dias por ano em que Qt é
igualado ou excedido.
A figura 8.17 representa a curva de duração dos caudais médios diários do rio Mondego em
Coimbra em 1970-71 (extraído de Lencastre e Franco 1984), apresentando a forma
característica das curvas de duração que é uma exponencial negativa. Sobrepôs-se a curva
teórica de Coutagne.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-25
Dispondo das séries cronológicas e da curva de duração, é possível fazer análises estatísticas
que permitam determinar certos valores característicos que sintetizem os valores médios e a
variabilidade dos caudais e escoamentos.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-27
Atendendo à forma da curva de duração, o caudal anual médio é sempre superior ao caudal
característico mediano, sendo essa diferença tanto maior quanto mais irregular for o regime de
escoamento do rio.
8.8.1 Componentes
O caudal que se regista numa dada secção dum rio resulta de 4 componentes correspondentes
aos processos que, a partir da precipitação, conduzem a água até ao rio. Essas componentes
são:
• escoamento directo – resulta da precipitação útil sobre a bacia, cessa algum tempo após o
fim da precipitação:
• escoamento de base – resulta da alimentação do rio por água subterrânea, pode continuar
por longos períodos em que não há precipitação;
• escoamento intermédio ou sub-superficial – resultante da água que se escoa na camada
superficial do solo, cessa com pouco atraso em relação ao escoamento directo;
• escoamento resultante da precipitação sobre a rede hidrográfica – cessa rapidamente após
o fim da precipitação.
Assim, em primeira análise, pode-se considerar que um hidrograma de caudais diários resulta
da sobreposição do escoamento directo com o escoamento de base.
Em períodos sem precipitação, em que o aquífero interceptado pelo rio não está a receber
recarga, o nível (em aquíferos freáticos) ou a carga (em aquíferos confinados) vai decrescendo
e, consequentemente, diminui o caudal com que o aquífero alimenta o rio. Este efeito é
traduzido por uma exponencial negativa do tipo
Qt = Q0 ⋅ e −αt
ln Qt = ln Qo - αt
ou seja, representa uma recta. Desta forma, se se traçar o hidrograma dos caudais em papel
semi-logarítmico, aqueles períodos em que apenas existe escoamento de base aparecem no
gráfico como troços rectos de inclinação - α , paralelas entre si.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-28
A figura 8.18 ilustra um processo relativamente expedito para se fazer essa separação das
componentes.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-29
O hidrograma resultante da precipitação numa bacia tem uma forma bastante característica,
representada na figura 8.19. É um hidrograma assimétrico, com assimetria positiva.
Manual de Hidrologia
tb = t p + td = tr + tc + te
Escoamento Superficial 8-30
Entre as características da bacia, têm particular importância a área, a forma da bacia, a rede
hidrográfica, o declive dos terrenos e das linhas de água, os armazenamentos naturais e
artificiais, a geologia, os solos e a cobertura superficial.
A floresta plantada significa que, numa grande área da bacia, um certo coberto vegetal foi
substituído por outro. A floresta plantada vai dar origem a:
Por outro lado, a floresta faz com que a velocidade do escoamento laminar seja baixa,
diminuindo o seu potencial de erosão.
O abate das florestas naturais, que se vem processando a ritmos elevados em quase todos os
países do Terceiro Mundo (e Moçambique não é excepção), seja para utilização como
combustível doméstico seja para abertura de novas áreas agrícolas, tem os resultados opostos:
menor infiltração, menor recarga de aquíferos, maiores caudais de ponta nas pequenas e
médias cheias e, principalmente, maior facilidade de erosão.
A urbanização pode também ter um impacto forte quando abrange uma percentagem
significativa da área da bacia. A urbanização traduz-se pela transformação da cobertura
natural (vegetal), que permitia a infiltração e oferecia grande resistência ao escoamento
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-31
Estes efeitos – aumento do caudal de ponta, erosão – estão a tornar-se bem visíveis em
algumas das principais cidades de Moçambique como Maputo, Nampula, Nacala e Pemba.
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-32
EXERCÍCIOS
1. Numa secção transversal dum rio, fez-se o seu levantamento e mediram-se as velocidade
médias nas respectivas verticais, conforme se apresenta na tabela seguinte
x(m) 0 3 6 9 12 15 18 21 24 27 30 33 36
h(m) 0 0.3 0.7 1.0 1.4 2.1 2.4 3.0 1.6 1.5 1.4 0.6 0
v(m/s) 0.1 0.3 0.6 0.8 1.1 1.2 1.5 1.0 1.0 0.9 0.4
2. Admita que o perfil de velocidade numa vertical se ajusta a uma parábola do 3º grau.
Indique a que profundidade a velocidade pontual iguala a velocidade média.
3. A concentração natural de cloreto de sódio num rio era de 50mg/l. Supondo que o máximo
caudal injectável duma solução concentrada de cloreto de sódio era de 25 l/s, que cf devia ser
pelo menos igual a 2 co e que se pretendia medir caudais na ordem de 0.5 – 2 m3/s, qual seria
a concentração da solução a injectar?
4. Numa secção cujo zero da escala é ho 0.115 m, obtiveram-se ao longo dum ano hidrológico
os seguintes resultados de medições de caudal.
5. Determine o caudal médio que entrou na barragem da Corumana num período de 24 horas
em que se registaram os seguintes dados:
Manual de Hidrologia
Escoamento Superficial 8-33
7. Calcule os escoamentos mensais num dado ano numa pequena bacia hidrográfica,
utilizando o método do balanço hídrico sequencial (Thornthwaite-Mather), com os seguintes
dados:
nu = 100 mm
P (Out-Set): 87/105/142/132/95/132/76/79/38/13/18/48 mm
8. Numa pequena bacia hidrográfica, dispõe-se das seguintes séries de valores anuais de
precipitação ponderada e de escoamentos.
Ano 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
P (mm) 1,162 1,069 957 1,058 1,108 1,155 805 936 921 732
R (mm) - - - - - - - - 223 150
11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
858 1,094 1,027 1,139 1,298 972 1,212 1,354 876 965
234 272 291 240 197 217 - 312 205 182
b) utilize a regressão linear para preencher a falha da série de escoamentos (ano 17)
c) utilize a regressão linear para estender a série de escoamentos para os anos 1-8
Manual de Hidrologia
Cheias 9-1
9 CHEIAS
9.1 INTRODUÇÃO
Do ponto de vista da Hidrologia, considera-se que há uma cheia sempre que o caudal dum rio
extravasa o leito menor, onde corre normalmente, e inunda áreas mais ou menos extensas.
As cheias são uma das calamidades naturais que maiores prejuízos materiais e perda de vidas
humanas têm provocado em diversas regiões do Mundo. Moçambique tem sofrido bastante com
este fenómeno, ilustrado nos anos mais recentes com as grandes cheias dos rios Zambeze (1978),
Limpopo (1977, 1981, 1996, 2000), Incomati (1976, 1984, 1985, 1996, 2000), Umbelúzi (1984,
1996, 2000) e Maputo (1984). Naturalmente, tem-se dedicado grande atenção quer ao estudo do
próprio fenómeno quer às medidas que permitam minimizar os seus impactos negativos.
Existe uma variedade de medidas destinadas a esse fim as quais são habitualmente agrupadas em
medidas estruturais e medidas não estruturais.
• as albufeiras que permitem encaixar uma parte do volume da cheia afluente, diminuindo os
caudais máximos para jusante;
• os diques de protecção de áreas inundáveis;
• a regularização fluvial, tendente a permitir que a um mesmo nível de água corresponda um
maior caudal escoado;
• a utilização de zonas de encaixe de cheias, áreas para onde parte do escoamento é dirigida e
cuja inundação não provoca danos materiais apreciáveis, reduzindo assim os caudais para
jusante.
Quer para o dimensionamento de obras hidráulicas de protecção contra cheias (caso de diques e
barragens) quer para o planeamento de medidas não estruturais torna-se necessário analisar a
distribuição de frequências dos caudais de cheias para se poder determinar um caudal de
dimensionamento. Definida essa distribuição de frequências, cada valor de caudal fica associado
a uma certa probabilidade de não excedência e, portanto, a um risco de que a estrutura
dimensionada com esse valor se revele insuficiente para cumprir a finalidade a que se destinava.
Há por isso, que adoptar valores bastante altos de probabilidades de não excedência que se
considerem socialmente aceitáveis. No entanto, quanto mais alto a probabilidade de não
excedência, maior será o valor do caudal e, portanto, mais cara será e estrutura. Torna-se, assim
necessário estabelecer um compromisso entre o desejo dum nível mais alto de segurança e o dum
custo dentro de limites aceitáveis.
Manual de Hidrologia
Cheias 9-2
Para o estudo hidrológico das cheias, é necessário determinar o caudal de pico da cheia, que é
o valor utilizado para o dimensionamento de muitas obras hidráulicas. Existem, no entanto,
situações em que não é suficiente conhecer apenas o caudal de pico mas também o
hidrograma da cheia, por exemplo, no estudo de propagação de cheias em albufeiras ou em
rios.
Diversos métodos de cálculo são utilizados para fazer essa determinação. Far-se-á aqui a
apresentação dos seguintes:
• fórmulas empíricas
• fórmulas cinemáticas
• métodos estatísticos
• método do hidrograma unitário
Não cabe no âmbito deste manual a apresentação de modelos mais complexos baseados na
simulação em computador das várias componentes do ciclo hidrológico – precipitação,
infiltração, evaporação e evapotranspiração, recarga de aquíferos, escoamento superficial e
escoamento de base.
Diversas fórmulas empíricas foram apresentadas para a estimação de caudais de cheias. Essas
fórmulas foram derivadas com base em experiências de determinadas regiões do globo pelo que
a sua aplicação a outras regiões deve ser feita com muita cautela.
Manual de Hidrologia
Cheias 9-3
⎛ 2900 ⎞
Q p = A⎜ ⎟ com Qp em m3/s e A em km2
⎝ 90 + A ⎠
A fórmula é válida para bacias com áreas inferiores a 1,000 km2. A fórmula de Whistler
escreve-se
⎛ 1538 ⎞
Q p = A⎜ 0.054 + ⎟
⎝ 259 + A ⎠
Estas duas fórmulas associam o caudal de pico apenas à área da bacia. A fórmula de Iskowski
inclui, para além da área da bacia, também a precipitação anual média sobre a bacia.
Q p = KmPA
Quanto aos valores de m, eles podem ser estimados a partir da tabela seguinte.
A(km2) 100 200 600 1000 2000 3000 4000 5000 10000
M 7.40 6.87 5.60 4.70 3.78 3.45 3.25 3.13 3.02
Uma das fórmulas mais utilizadas na África Austral e, particularmente na África do Sul, é a
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Cheias 9-4
A fórmula escreve-se
1− 0.1 K
⎛ A ⎞
Q p = 10 ⎜ 8 ⎟
6
⎝ 10 ⎠
A fórmula de Francou-Rodier dá melhores resultados para bacias com áreas entre 300 e 10,000
km2, não devendo ser utilizada para bacias com menos de 100 km2.
O método proposto pelo SCS consiste em determinar o tempo total do escoamento da água
precipitada, considerando a fase do escoamento laminar e a do escoamento unidimensional em
linhas de água. A velocidade do escoamento laminar pode ser obtida por consulta dum gráfico
preparado pelo SCS, em que as variáveis são o declive do terreno e o tipo de cobertura vegetal
ou revestimento. A velocidade no escoamento unidimensional pode ser determinada usando a
fórmula de Manning-Strickler.
Trata-se dum processo bastante trabalhoso e que exige bastante informação para que da sua
aplicação se obtenham melhores resultados do que com outros processos de cálculo.
4 A + 1.5L
tc =
0.8 H
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Cheias 9-5
Manual de Hidrologia
Cheias 9-6
L1.155
t c = 0.95
Δh 0.385
Qp = c i A
A fórmula Racional dá bons resultados para pequenas bacias onde é admissível que a
precipitação intensa atinja simultaneamente toda a bacia.
Na África do Sul, a fórmula Racional é aplicada a uma gama muito extensa, desde pequenas
bacias urbanas até bacias com áreas de 5,000 km2, considerado o limite superior de aplicação
deste método. O coeficiente c é uma função de diversos factores. O DWAF da África do Sul
considera os seguintes aspectos na determinação do valor de c:
- em áreas relvadas
- arenosas, declive < 2% 0.05 – 0.10
- arenosas, declive > 7% 0.15 – 0.20
- solos pesados, declive < 2% 0.13 – 0.17
- solos pesados, declive > 7% 0.25 – 0.35
- em áreas residenciais com moradias 0.30 – 0.50
- em áreas residenciais com prédios 0.50 – 0.70
- em áreas industriais 0.50 – 0.90
- em áreas de comércio concentrado 0.70 – 0.95
- em áreas de comércio disperso 0.50 – 0.70
- em ruas e avenidas 0.70 – 0.95
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Cheias 9-7
O DWAF recomenda que, em zonas de floresta, se considere o solo como muito permeável. O
valor de c é a soma de cy, cp, e cv.
c) efeito do período de retorno
Quanto maior for o período de retorno considerado, tanto maior tenderá a ser o valor de c, devido
à saturação dos solos e à maior velocidade do escoamento. Para tomar esse efeito em conta, o
DWAF propõe ajustar o valor de c para áreas rurais multiplicando o coeficiente por um factor fT
inferior à unidade.
Para áreas urbanas, considera-se que o valor de c para períodos de retorno iguais ou superiores a
50 anos é igual a 1.
Quando uma bacia inclua áreas urbanas e rurais, o DWAF diz que o valor de c se obtém
ponderando os valores de curb e de crur tomando como pesos as respectivas áreas relativas.
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Cheias 9-8
λAh
Qp =
tc
em que Qp é dado em m3/s, A em km2, h é a altura de precipitação em mm correspondente a uma
duração igual à do tempo de concentração e para um período de retorno T, tc é o tempo de
concentração em horas, e λ é um parâmetro função da área da bacia.
com Qp em m3/s, A em km2, hu (precipitação útil) em mm, tp (tempo para o pico) em horas. K é
um factor de ponta que assume os valores de 0.5 para bacias muito planas, 0.75 para bacias com
declive médio e 1 para bacias com declive forte.
hu =
(h − h0 )2
h + 4h0
em que h0 corresponde às perdas iniciais (por infiltração e armazenamento superficial) antes de
se iniciar o escoamento superficial laminar. Para o cálculo de h0, o SCS apresenta a seguinte
fórmula
5080
h0 = − 50.8
N
N é o chamado número do escoamento. O valor de N a ser utilizado em cada caso pode ser
obtido a partir da tabela 9.2 extraída de Lencastre e Franco 1984. N depende das características
da bacia e também do estado de humedecimento do solo anteriormente à chuvada.
t p = 0.5t r + 0.6t c
h0
tr = t −
h/t
em que tr é a duração da chuvada útil.
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Cheias 9-9
Manual de Hidrologia
Cheias 9-10
9.5.1 Metodologia
Estes passos de cálculo irão ser vistos mais em pormenor na sequência do presente capítulo.
Na análise admite-se que a série de caudais instantâneos máximos anuais constitui uma amostra
aleatória, isto é, que os elementos da série são independentes e têm a mesma distribuição de
probabilidades. Com efeito, geralmente os factores naturais que determinam a ocorrência dos
caudais instantâneos máximos anuais podem ser considerados independentes, nos diferentes anos
hidrológicos. No entanto, esta situação pode ser alterada quer devido a modificações nas
condições físicas das bacias hidrográficas (p.ex. pelo desenvolvimento de actividades humanas
como a urbanização, agricultura intensiva, deflorestação, etc.) quer devido a modificações
relacionadas com o sistema de medição dos caudais (p.ex. mudança do equipamento ou do local
da medição) ou outras.
A aleatoriedade das séries de registos não pode ser provada mas a hipótese de aleatoriedade pode
ser rejeitada se a série mostrar desvios sistemáticos tais como:
Para analisar a aleatoriedade duma série utilizam-se diversos testes estatísticos dos quais se irão
referir apenas os seguintes:
Manual de Hidrologia
Cheias 9-11
∑ ( x - x )( x
i=1
i i+1 - x)
N
r1 = N
*
N -1
∑( x - x )
2
i
i=1
1 (1 + r1 )
Z = ln
2 (1 - r1 )
Considere-se a série Y obtida por ordenação da série X e considere-se a série X dividida em duas
subsérie X1 e X2, em que X1 contem a primeira metade da série X, e X2 a segunda metade.
Considere-se agora a série Z definida da seguinte maneira (i = 1, 2, ....., N):
zi = 1 se yi é um elemento de X1
zi = 2 se yi é um elemento de X2
A estatística do teste é R = número de vezes em que zi+1 ≠ zi. Se a série X for homogénea, os
sucessivos elementos de Y estarão bem repartidos pelas subséries X1 e X2 e o valor de R será
médio.
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Cheias 9-12
N 15 17 19 21 23 25 27 29 31 33 35
Rinf. 6 6 7 8 9 10 11 11 12 13 13
Rsup. 12 13 14 15 16 17 18 20 21 22 24
Sempre que o valor de R não steja entre os limites definidos neste quadro pode rejeitar-se a
hipótese de homogeneidade da série X com um nível de confiança de 95%.
Um valor alto de RT indica a existência dum efeito de tendência. Para o teste, utiliza-se uma
transformação de RT:
1
⎛ N −2 ⎞2
Z = RT ⎜⎜ 2
⎟
⎟
⎝ 1 − RT ⎠
Z segue uma distribuição de Student com N-2 graus de liberdade. O quadro seguinte dá valores
limite superiores para ⎮Z⎮ para diversos valores de N, considerando um nível de confiança de
95%.
N-2 10 15 20 25 30
Zsup. 2.228 2.131 2.086 2.060 2.042
Quando a hipótese de aleatoriedade fôr rejeitada em mais do que um dos testes pode-se
considerar que a série não é aleatória ao nível de confiança de 95% e não pode ser utilizada para
se fazer o ajustamento a uma distribuição de extremos.
No entanto, pode ser possível através duma análise mais profunda da série determinar as causas
da não aleatoriedade e, a partir daí, transformar por meio duma modificação adequada a série
dada numa outra, aleatória. Poderá então utilizar-se a série transformada para se fazer o
ajustamento a uma distribuição de extremos.
Manual de Hidrologia
Cheias 9-13
Embora tenham sido apresentados muitos argumentos teóricos em favor de cada uma destas
distribuições, todos se baseiam em premissas que são violadas nas aplicacões. Assim, tem-se
adoptado uma atitude mais pragmática de aceitar todas estas distribuições como modelos
possíveis, fazer a especificação do modelo e posteriormente a sua avaliação estatística.
Manual de Hidrologia
Cheias 9-14
A estimação pelo método dos momentos é a mais simples de se fazer e consiste em seleccionar
os valores dos m parâmetros da distribuição por forma a que os primeiros m momentos da
distribuição (ou suas transformações) sejam iguais aos correspondentes momentos ou
transformações da amostra. Normalmente, pretende-se que a média a e variância (e o coeficiente
de assimetria, no caso de distribuições com 3 parâmetros) da distribuição e da amostra sejam
iguais.
∏ f( x | θ )
i=1
i
que é a função de verosimilhança. A estimação dos parâmetros faz-se tomando derivadas parciais
da função de verosimilhança ou da sua transformação logarítmica em relação a cada um dos
parâmetros e igualando a zero o que dá um número de equações igual ao número de parâmetros.
O método dos mínimos quadrados consiste em estimar os parâmetros da distribuição por forma
a minimizar a soma S dos quadrados dos desvios entre as probabilidades empíricas, Yi, e as
probabilidades teóricas indicadas pelo modelo F(xi⎮θ):
N
S = ∑ [ Y i - F( xi |θ ) ] 2
i=1
Manual de Hidrologia
Cheias 9-15
A estimação dos parâmetros faz-se tomando derivadas parciais de S em relação a cada um dos
parâmetros e igualando a zero.
Embora geralmente a estimação pelo método da máxima verosimilhança seja a mais eficiente, a
derivação dos estimadores é morosa e frequentemente torna-se necessário recorrer a processos
iterativos para a sua determinação.
O método dos momentos conduz a bons resultados quando a amostra tem uma grande dimensão
mas em pequenas amostras os erros de amostragem originam estimadores de fraca qualidade,
particularmente para distribuições de mais de 2 parâmetros.
Feitas estas reservas, ir-se-á utilizar no que se segue apenas o método dos momentos para a
estimação dos parâmetros.
Diz-se que uma variável se ajusta a uma distribuição Log-Normal de 2 parâmetros ou Lei de
Galton quando é possível ajustar uma distribuição Normal à transformação logarímica dessa
variável.
z
1 z2
F(z) = ∫ e 2 dz - ∞ < z < +∞
-
-∞ 2π
em que z é a variável normal reduzida, com média nula e variância unitária. Definida desta
maneira, a distribuição Normal é padronizada e não tem parâmetros.
Se x é uma variável normal com média μx e desvio padrão σx, a função de distribuição terá 2
parâmetros (μx e σx):
x
1 1 x-μ x
2
F(x) = ∫ e
- (
2 σx
)
dx - ∞ < x < +∞
- ∞ σ x 2π
x - μx
z=
σx
A função de distribuição Normal não pode ser integrada analíticamente, razão porque se utilizam
aproximações numéricas (alternativa bastante conveniente para o cálculo em computador) ou
tabelas de valores da distribuição padronizada como a que se reproduziu no capítulo 3 deste
manual.
Manual de Hidrologia
Cheias 9-16
Se x ajustar a uma distribuição LN2 isso significa que y = ln(x) se ajusta a uma distribuição
Normal. O domínio da variável x será 0 < x < +∞, ie, x é sempre positivo. Por outro lado, a
distribuição LN2 tem assimetria positiva. A função de distribuição LN2 é:
x 2
1 1 ln (x)- μ y
F(x) = ∫ e
- (
2 σy
)
dx - 0 < x < +∞
0 x σ y 2π
Tendo apenas 2 parâmetros a distribuição LN2 permite o ajustamento a uma variável com dadas
média e variância e com assimetria positiva mas não permite garantir que a assimetria da
distribuição iguale a assimetria da variável. O coeficiente de assimetria da distribuição LN2 é
obtido em função do coeficiente de variáção de x, cv:
γ = Cv3 + 3 Cv
Diz-se que uma variável se ajusta a uma distribuição Log-Normal de 3 parâmetros quando é
possível ajustar uma distribuição Normal à variável transformada y:
y = ln (x – x0)
1
- γ + ( γ 2x + 4 )2
G= x
2
Manual de Hidrologia
Cheias 9-17
2
1 - G3
C= 1
G3
1
σ y = [ ln(1 + C 2 ) ] 2
σ2
μ y = ln( σ x ) - y
C 2
σx
x0 = μ x -
C
y - μy ln(x - x0 ) - μ y
z= =
σy σy
F = 1 – 1/T
z = z(F)
y = z σy + μy
x = ey + x0
Se, ao invés, se quiser determinar o período de retorno T que corresponde a certo caudal x, basta
seguir o caminho inverso:
y = ln(x-x0)
z = (y-μy)/σy
F = F(z)
T = 1/(1-F)
Manual de Hidrologia
Cheias 9-18
Os parâmetros a e x0 podem ser estimados pelo método dos momentos pelas seguinte expressões:
a = π/(√6*σx) = 1,2825/σx
x0 = μx – 0,57721/a = μx – 0,4500σx
O ajustamente iguala a média e a variância da distribuição às da amostra mas não permite impôr
um dado valor do coeficiente de assimetria. Este é constante para o caso da distribuição de
Gumbel:
γ = 1,29857
ln [- ln(F)]
X =- + x0
a
a qual é dada em tabelas ou pode ser obtida por um método de aproximação numérica.
Os parâmetros da distribuição G2 são estimados pelo método dos momentos igualando a média e
a variância da distribuição às da amostra, chegando-se às seguintes expressões:
2
α=σx
μx
2
μ μ
β = x2 = x
σx α
Manual de Hidrologia
Cheias 9-19
2
γ=
β
1 1 3
x = αβ (1 - +z )
9β 9β
em que x é a variável gama e z a variável normal reduzida de igual probabilidade. Note-se que a
transformação de Wilson-Hilferty só se mantem válida para γ ≤ 3, devendo usar-se a
transformação de Kirby para valores de γ superiores a 3.
x 1 1
( )3 - 1 +
αβ 9β
z=
1
9β
A distribuição de Pearson tipo 3 pode obter-se a partir da distribuição G2, através da introdução
dum parâmetro adicional de localização, x0:
x - x0
(x - x0 )β -1 e- α
x
F(x) = ∫ β -1 dx x0 < x < ∞
0 α
| α | Γ( β )
Os três parâmetros da distribuição são então α, β e x0. A sua estimação pelo método dos
momentos faz-se igualando a média, a variância e o coeficiente de assimetria da distribuição aos
correspondentes valores da amostra, através das seguintes expressões:
γx
α=σx
2
Manual de Hidrologia
Cheias 9-20
4
β= 2
γx
2σ x
x0 = μ x -
γx
Também para a distribuição de Pearson tipo 3 se torna mais simples trabalhar no espaço normal
através da transformação de Wilson-Hilferty (ou, no caso de γ > 3, através da transformação de
Kirby). A transformação de Wilson-Hilferty é neste caso:
3
⎛ 1 1 ⎞
x = αβ ⎜⎜ 1 - +z ⎟ + x0
⎝ 9β 9 β ⎟⎠
em que x é a variável Pearson tipo 3 com parâmetros α, ß e x0, e z é a variável normal reduzida
de igual probabilidade.
x - x0 1 1
( )3 - 1 +
αβ 9β
z=
1
9β
y = ln(x)
Manual de Hidrologia
Cheias 9-21
- rejeitar a hipótese de ajustamento quando ela é correcta e deveria ter sido aceite; erro do tipo
I;
- aceitar a hipótese quando ela é errada e deveria ter sido rejeitada; erro do tipo II.
Veja-se, por exemplo, o caso da função y = x2 que é uma parábola do 2º grau. Se no entanto, a
função for implantada num sistema de eixos log-log ela aparece como uma recta. A função
também aparece como uma recta se o eixo dos xx for linear e, no eixo dos yy, valores de y forem
marcados a distância √y.
Torna-se assim possível desenhar os chamados papéis de probabilidade: papeis onde estão
implantadas quadrículas correspondentes a sistema de eixos tais que a representação neles de
deteminadas funções de distribuição aparece como uma recta. São especificalmente utilizados
papeis de probabilidade para as seguintes distribuições:
- Normal;
- Log-Normal;
- Gumbel;
- Log-Gumbel.
Se uma variável aleatória x segue a distribuição Normal, então a implantação dos pontos com
coordenadas (Pi ,xi) aparecerá no papel de probabilidade Normal com um alinhamento
Manual de Hidrologia
Cheias 9-22
Caso a implantação dos pontos origine uma configuração rectilínea, pode-se fazer o traçado
duma recta que minimize as distâncias (ou os seus quadrados) aos pontos e utilizar essa recta
para obter o caudal que corresponde a um certo período de retorno e vice-versa. Se a
configuração dos pontos não é rectilínea isso constitui um indicativo que a distribuição Normal
não é um modelo que se ajusta bem à série em estudo.
O papel de probabilidade Log-Normal pode ainda ser utilizado para testar o ajustamento a uma
distribuição LN3. Surge, no entanto, neste caso uma dificuldade: no eixo das ordenadas devem
ser marcados os valores de (x-x0) o que obriga ao cálculo analítico de x0 ou a traçarem-se
gráficos com diversos valores de x0 a ver se algum se configura como uma recta.
O papel de probabilidade Gumbel usa um eixo (das ordenadas) linear para os caudais e o outro
eixo (das abcissas) com escala duplamente logarítmica para as probabilidades. Se o eixo dos
caudais for logarítmico em vez de linear, o papel permitirá testar o ajustamento a uma
distribuição Log-Gumbel, distribuição em que é a amostra logarítmizada que se ajusta a uma
distribuição Gumbel.
A grande variedade de formas possíveis com as distribuições baseadas na função Gama não
permite que haja um papel de probabilidade para estas distribuições embora seja possível
construir um papel de probabilidade específico para uma amostra com um dado valor do
coeficiente de assimetria.
Manual de Hidrologia
Cheias 9-23
M
( O j - E j )2
χ2= ∑
j=1 Ej
Os intervalos não têm de ser iguais embora haja vantagem em que o sejam. Quando os intervalos
são iguais, Ej é constante para qualquer j, Ej = N/M.
M
M
χ2= − N +
N
∑O
j=1
2
j
Os valores de Oj são obtidos calculando os valores limites de x que correspondem aos limites dos
intervalos em termos de probabilidades, i/M, e contabilizando os elementos da amostra contidos
em cada intervalo.
O quadro seguinte apresenta valores da distribuição χ2 para 1-α = 0.95 em função do número de
graus de liberdade:
v 1 2 3 4 5 6
χ0,952 3.841 5.991 7.815 9.488 11.070 12.592
Considere-se que a série X é ordenada por ordem crescente (x1 < x2 < ... < xN) e que
probabilidade empírica de não excedência do valor xi é dada pela “plotting position” de Weibull:
Pi = i / N+1
A função de distribuição empírica é uma função em escada e por isso a “distância” entre ela e a
função de distribuição teórica deve ser medida à esquerda e à direita de cada ponto. A expressão
Manual de Hidrologia
Cheias 9-24
para o cálculo de D é:
i -1 i
Di = max [| - F( xi ) | ;| - F( xi ) |]
N +1 N +1
O teste pode formular-se da seguinte maneira: a hipótese de que a distribuição teórica se ajusta à
série em estudo é rejeitada com nível de confiança 1-α se D > D1-α, em que D1-α é o valor crítico,
máximo aceitável para esse nível de confiança.
Para o caso das distribuições Normal e Log-Normal com os parâmetros estimados pelo método
dos momentos, o valor crítico para um nível de confiança de 95% é dado por
1.094
D0.95 = 0.85
N - 0.01 +
N
No caso da distribuição de Gumbel com os parâmetros estimados pelo método dos momentos, o
valor crítico para o nível de confiança 1-α = 0.95 é dado por
0.935
D0.95 = 0.85
N - 0.01 +
N
Para as distribuições baseadas na função Gama não é possível definir com rigor o valor crítico
mas apenas um limite superior desse valor crítico. Esse limite superior é dado por:
1.358
D s,0.95 = 0.11
N + 0.12 +
N
Os valores de Ds, 0.95 devem ser reduzidos entre 20% e 35% para se ter uma melhor estimativa
dos valores críticos.
Se um modelo de distribuição de extremos não é rejeitado nem pelo teste do χ2 nem pelo teste de
Kolmogorov-Smirnov então ele pode ser utilizado para a previsão de caudais de cheia.
Se tratar do problema de dimensionar uma obra hidráulica, será necessário definir os períodos de
retorno e, a partir daí, seguir os procedimentos de cálculo apresentados nos capítulos dedicados a
cada uma das distribuições teóricas.
Manual de Hidrologia
Cheias 9-25
Uma questão que pode surgir é quando se experimenta ajustar diversas distribuições teóricas a
uma dada série e mais do que uma dessas distribuições não é rejeitada por nenhum dos testes de
ajustamento. Nessas condições, torna-se necessário discriminar entre as distribuições não
rejeitadas para escolher aquela que proporcina o melhor ajustamento. Um dos processos para se
fazer esta escolha é a utilização dos chamados “índices de adaptabilidade” de que a seguir se
apresenta um exemplo:
2
⎡ i
N
⎤
IA j = ∑ ⎢ - F j ( xi )⎥
i=1 ⎣ N + 1 ⎦
em que a série X está ordenada por ordem crescente, Fj é a j-ésima distribuição não rejeitada
pelos testes de ajustamento e IAj o correspondente valor índice de adaptabilidade. Como é
evidente, deve ser escolhida a distribuição que apresenta o menor valor do índice de
adaptabilidade.
9.6.1 Introdução
O método do hidrograma unitário foi proposto por SHERMAN nos Estados Unidos em 1932 e
tornou-se a partir de então um dos métodos mais utilizados para a obtenção do hidrograma de
escoamento directo resultante de precipitação intensa, aplicando-se fundamentalmente ao estudo
de cheias.
O método do hidrograma unitário não só dá o caudal de pico mas dá também todo o hidrograma
da cheia, enquanto que os outros métodos citados se limitam a dar o caudal de pico.
Nos pontos seguintes far-se-á o estudo dos conceitos principais do hidrograma unitário e suas
aplicações; formas de obtenção do hidrograma unitário a partir de registos hidrometeorológicos;
derivação do hidrograma unitário na ausência de registos de escoamentos e a precipitação de
projecto a ser considerada.
Manual de Hidrologia
Cheias 9-26
Este tipo de escoamento superficial que resulta imediatamente a partir da precipitação é chamado
escoamento directo enquanto que o escoamento superficial alimentado por aquíferos constitui o
escoamento de base. A componente da precipitação que origina o escoamento directo designa-
se por precipitação útil.
Já se viu anteriormente como um hidrograma de escoamento total pode ser decomposto nas suas
componentes de escoamento directo e escoamento de base.
A duração do escoamento directo é designada por tempo base, tb. O tempo base é a soma do
tempo de crescimento, tp (desde o início do escoamento directo até ao pico do hidrograma) e do
tempo de decrescimento, td (desde o pico até ao fim do hidrograma). O tempo base é também
igual à soma de três outros tempos:
- o tempo de precipitação, tr (duração da precipitação útil);
- o tempo de concentração, tc (tempo necessário para que a gota de água caída no ponto da
bacia hidraulicamente mais distante da secção de saída chegue a essa secção; é uma
característica constante de cada bacia);
- o tempo de esvaziamento, te (duração do escoamento armazenado na rede hidrográfica
desde a cessação da precipitação até ao fim do escoamento directo).
Manual de Hidrologia
Cheias 9-27
duração tr e uma altura de precipitação unitária (normalmente 1 cm) como sendo o hidrograma
de escoamento directo resultante dessa chuvada útil. O hidrograma unitário está portanto
associado a uma certa duração da chuvada útil.
O hidrograma tem uma forma bem definida, normalmente traduzida por ordenadas/caudais em
intervalos de tempo iguais. O hidrograma unitário é caracterizado também pelo caudal de pico e
pelo tempo base.
Estes dois postulados implicam uma relação de linearidade entre a precipitação útil e o
escoamento directo. Esta relação não é inteiramente válida sobretudo para bacias hidrográficas
muito grandes. Não se aconselha por isso a utilização do hidrograma unitário em bacias que
excedem os 1,000 km2. Uma das maiores dificuldades práticas é a determinação da precipitação
útil a partir da precipitação total.
Vejamos em primeiro lugar como, dado Hutr, se pode obter Huntr. Se virmos que o Hutr
corresponde a uma chuvada com a duração de tr horas, para obtermos o Huntr vamos considerar
n chuvadas consecutivas de tr horas e cada uma delas com uma altura de precipitação de 1 cm. O
hidrograma resultante obtem-se facilmente aplicando o princípio da sobreposição.
O hidrograma resultante ainda não é Huntr pois embora corresponda a uma chuvada com duração
de ntr horas, a altura da precipitação que o origina é n cm e não 1 cm como implica a definição de
hidrograma unitário. Para obter o Huntr basta então aplicar o princípio da proporcionalidade e
multiplicar todas as ordenadas do hidrograma resultante por 1/n.
Como se disse atrás, a obtenção dum hidrograma unitário para uma chuvada com duração αtr
Manual de Hidrologia
Cheias 9-28
com α < 1 é mais complicada. Para esse efeito usa-se o método da curva em S.
Como se dispõe do Hutr, pode-se considerar uma sucessão de chuvadas com duração tr e altura
unitária (donde i = 1/tr) e obter o hidrograma resultante pela sobreposição de sucessivos Hutr
desfasados de tr (figura 9.2).
A partir da curva em S de intensidade 1/tr é simples obter o hidrograma unitário para a duração
αtr:
- consideram-se duas curvas em S, idênticas mas desfasadas de t1 = αtr. Esta situação equivale
a considerar que a segunda curva em S foi originada por uma chuvada que se iniciou t1 após
a primeira (figura 9.3);
- subtrai-se a 2ª curva em S da primeira, obtendo-se assim um hidrograma que resulta duma
chuvada com duração t1 e altura t1 * 1/tr. Não é ainda o hidrograma unitário visto que
h=t1/tr≠1;
- o HUt1 é obtido dividindo as ordenadas do hidrograma anterior por t1/tr = α.
Note-se que este processo não deve ser utilizado para α muito pequeno (α < 0.25) porque, como
o HUtr é dado de forma discreta, a curva em S tem de ser afeiçoada: quanto mais pequeno fôr t1,
maior será o erro derivado desse afeiçoamento.
Note-se que embora um hidrograma seja uma função contínua de tempo ele é dado de forma
discreta em intervalos de tempo iguais à duração da chuvada.
Manual de Hidrologia
Cheias 9-29
Considere-se então uma chuvada com duração, por exemplo, de 6 horas sobre uma dada bacia e
que originou um pico de escoamento. Admitamos, para começar, que a intensidade da
precipitação era constante ao longo das 6 horas.
Por vezes, a informação hidrográfica disponível não inclui chuvadas isoladas mas sequências de
chuvadas com intensidade variável, originando um hidrograma complexo. Nesses casos, pode-se
tentar determinar um hidrograma unitário utilizando o método da convolução discreta.
- divide-se a chuvada em n intervalos Δt, com intensidade constante em cada intervalo → h1,
h2,... hn;
Manual de Hidrologia
Cheias 9-30
- divide-se o hidrograma em (m-1) intervalos Δt, definindo as ordenadas Q1, Q2, ..., Qm;
- designam-se as ordenadas do hidrograma unitário HUΔt por u1, u2,...É fácil de ver que o
HUΔt terá (m-n+1) ordenadas.
- a aplicação dos postulados da proporcionalidade e da sobreposição origina um sistema de m
equações lineares a (m-n+1) incógnitas, permitindo obter as ordenadas do HUΔt (apesar do
sistema de equações ser sobredeterminado, como adiante se verá).
h1u1 = Q1
h1u2 + h2u1 = Q2
h1u3 + h2u2 + h3u1 = Q3
.....
h1um + h2um-1 + h3um-2 + ..... + hnum-n+1 = Qm
n
Ou então: ∑h u
i=1
i j -i+1 = Q j (j = 1,..., m)
O sistema é sobredeterminado porque tem m equações e (m-n+1) incógnitas, logo (n-1) equações
em excesso. Assim, as últimas (n-1) equações confirmam os valores já obtidos ou conduzem a
um sistema impossível, sem solução.
Pode-se tentar desenhar o hidrograma e depois corrigi-lo à mão para eliminar os erros. De facto,
o que acontece é que, como as medições bem como as transformações para se obter a
precipitação útil e o escoamento directo não são exactas, há um erro em cada equação que se vai
transmitindo e acumulando de equação para equação.
Uma das vias para tentar resolver o problema é escrever as equações incluindo os erros e
utilizando o método dos mínimos quadrados, como se segue.
∑h u
i=1
i j -i+1 + ei = Q j (j = 1,..., m)
∑e
i=1
i
2
=z.
∂z
Para tal, terá de se verificar = 0 (j = 1, ..., m-n+1). Obtem-se agora um sistema de (m-n+1)
∂uj
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∂z
equações = 0 a (m-n+1) incógnitas uj, donde o sistema é determinado.
∂uj
m
∂ ∑ ei 2
∂z m
∂
= i=1 = 2 ∑ ei ei (j = 1, ...., m - n + 1)
∂uj ∂uj i=1 ∂uj
Existem métodos mais sofisticados para se obter um melhor hidrograma unitário, nomeadamente
evitando o aparecimento de ordenadas negativas e formas incorrectas.
Hidrogramas unitários sintéticos foram propostos por diversos autores como Snyder e Clarke.
Em seguida apresentam-se os hidrogramas sintéticos propostos pelo Soil Conservation Service
(SCS) e por Mockus.
tr +
tp= t l ( t p , t r , t l em horas)
2
649.8 l 0.8 (0.03937 S + 1 )0.7
tl =
1900 i0.5
5080
S = 5 h0 , h0 = - 50.8
N
0.208 A
qp =
tp
em que
l = comprimento do rio principal (km);
i = declive médio da bacia (%);
S = retenção potencial (mm);
h0 = perdas iniciais por infiltração e armazamento (mm);
N = número do escoamento ('curve number') do SCS;
A = área da bacia (km2);
qp = caudal de pico correspondente a uma precipitação útil de 1 mm (m3/s).
q t
O SCS definiu um hidrograma adimensional = f( ) que se apresenta na tabela seguinte.
qp tp
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t/tp 0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9
q/qp 0.0 0.015 0.075 0.16 0.28 0.43 0.60 0.77 0.89 0.97
t/tp 1.0 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 1.6 1.8 2.0 2.2
q/qp 1.0 0.98 0.92 0.84 0.75 0.66 0.56 0.42 0.32 0.24
t/tp 2.4 2.6 2.8 3.0 3.5 4.0 4.5 5.0
q/qp 0.18 0.13 0.098 0.075 0.036 0.018 0.009 0.004
Este HUtr corresponde a uma altura de precipitação útil de 1 mm. Para ser transformado num
hidrograma unitário não adimensional é necessário calcular tp e qp pelas fórmulas anteriores,
obtendo-se depois o HU como q = f(t).
tb = 2.67 tp
tp, qp calculados da mesma maneira que para o hidrograma unitário sintético do Soil
Conservation Service.
Uma questão que se coloca é a relação entre o período de retorno da precipitação e o período de
retorno do escoamento. Devido ao efeito de armazenamento da bacia, o período de retorno da
cheia é inferior ao da precipitação, efeito tanto menos sensível quanto maior for o período de
retorno. O National Environmental Research Counsil, do Reino Unido, indicava em 1975 a
seguinte relação:
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Para períodos de retorno iguais ou superiores a 100 anos, os dois períodos do retorno são
aproximadamente iguais.
Para definir o hietograma de projecto para um dado período de retorno pode-se utilizar a
metodologia proposta pelo Corps of Engineers em 1975:
h1 = a trn
h2 = a (2tr)n - h1
h3 = a (3tr)n - (h1 + h2)
.....
m -1
hm = a ( mt r ) - ∑ hi
n
i=1
Um outro método, mais prático mas exigindo dados para o seu cálculo, é o método do índice-Φ
(ver também o capítulo 5). Se para várias chuvadas se obtiver o hidrograma do escoamento
directo, pode-se calcular para cada uma delas a precipitação útil e daí a perda por infiltração e
armazenamento. Calculando o valor médio da perda para as várias chuvadas (que é o índice-Φ),
Manual de Hidrologia
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admite-se que esse valor médio será a perda em qualquer chuvada. O índice-Φ corresponde,
portanto, a uma intensidade constante que se subtrai à intensidade da precipitação total para se
obter a intensidade da precipitação útil.
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EXERCÍCIOS
1. Dada uma bacia com uma área de 2,000 km2, determinar o caudal de pico para um
período de retorno de 100 anos. A curva de possibilidade udométrica é dada por h = 8 t0.4 T0.2.
Tome um coeficiente c = 0.45 para a fórmula Racional; o nº de escoamento é 85; o comprimento
do rio principal é de 80 km e a altura média é 250 m. Utilize as fórmulas de Giandotti e Racional
e o método do SCS.
2. Determine os caudais de cheia do rio Pungoé para certos períodos de retorno e calcule
riscos hidrológicos, usando vários modelos estatísticos. É dada uma série de caudais instantâneos
máximos anuais do rio Pungoé (estação E65) de 25 anos. O coeficiente de assimetria da série foi
calculado, sendo 1.956.
3. Numa dada bacia hidrográfica, o hidrograma unitário para uma chuvada útil com a
duração de 6 horas (HU6) é definido pelas seguintes ordenadas (em m3/s) dadas em intervalos de
6 horas [Nota: As ordenadas de qualquer HU em princípio devem ser dadas com intervalos de
tempos iguais ao da chuvada útil para o qual o HU é definido]
t (h) 0 6 12 18 24 30 36 42 48
HU6 (m3/s) 0 7.5 38.5 32 25 19 12 5 0
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4. Numa bacia com uma área de 300 km2 registou-se durante 6 horas uma chuvada com
uma intensidade de 6 mm/h. Os caudais medidos de 6 em 6 horas desde o início da precipitação
foram, em m3/s, 18 / 36 / 105 / 93 / 81 / 69 / 57 / 45 / 36 / 33 / 30 / 27 / 25 / 23 / 22 / 20. Obtenha
o HU6.
5. Uma precipitação (útil) definida por três chuvadas de 6 horas cada, com altura de 6 cm, 1
cm e 12 cm, originaram o seguinte hidrograma de escoamento directo (ordenadas de 6 em 6
horas):
(h) 0 6 12 18 24 30 36 42 48 54 60
Qd (m3/s) 0 47 230 290 610 500 375 250 145 60 0
6. Determine o hietograma de projecto para ser usado com um HU6 numa bacia com tempo
de concentração de 24 horas. A curva de possibilidade udométrica é h = 1.75 t0.4 (com h em cm, t
em horas) para um período de retorno de 50 anos. Admita que se trata já de precipitação útil.
Manual de Hidrologia
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