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I - INTRODUÇÃO
Esta palestra tem como meta desfazer os preconceitos dos jovens que ainda consideram a
espiritualidade como algo chato, superado, ligado às pessoas de idade avançada e sem relevância para
suas vidas.
É a espiritualidade que dá o sentido mais profundo, energia e gosto à vida. A espiritualidade cristã
se espelha na vida e nos ensinamentos de Jesus Cristo. Ela é uma questão chave e por isso não pode
fugir da necessidade de integração entre Fé e Vida. Um grupo de jovens que não dedica tempo para
aprofundar uma espiritualidade capaz de alimentar a caminhada, está destinado ao fracasso. Não
podemos pressupor que os jovens já são convertidos ou tenham uma espiritualidade cristã só porque
estão num grupo. Podem estar num grupo por uma variedade de motivos. É preciso desenvolver um
itinerário de educação na fé que conduza a uma espiritualidade cristã amadurecida.
4. VALORES DO REINO
A construção do Reino de Deus foi o termo mais usado por Jesus Cristo para exprimir sua
missão. O termo "Reino" expressa o sonho mais profundo do coração humano, em todas as épocas, no
meio de todos os povos. É o anseio e a esperança de que é possível uma convivência humana mais
fraterna e justa. Tudo o que contribui para a construção de uma sociedade justa e fraterna é uma
realização parcial do Reino. O Reino, porém, não se esgota na história humana, mas passa por ela. A
realização plena do Reino vem depois da morte.
O Reino é também um conceito mais amplo do que a Igreja, como reconhece o Concílio Vaticano
lI. A Igreja tem como missão a construção do Reino, junto com todos os homens de boa vontade
inclusive os não crentes.
A espiritualidade do Reino é expressa de uma maneira sucinta no sermão da montanha (Lc 6; Mt
5) que coloca nossa visão de mundo de cabeça para baixo. A felicidade não está nas opções
apresentadas por uma sociedade de consumo, mas pelo contrário nas opções opostas, opção pelo
despojamento, na sede pela justiça, nos corações puros, nos que promovem a justiça, a paz e a
misericórdia, e na perseguição que é a conseqüência de uma vida vivida assim, porque questiona as
pessoas e os sistemas injustos. O Evangelho, quando pregado com autenticidade, sempre questiona e
incomoda.
A espiritualidade do Reino tem como alicerce certos valores que cortam pelas raízes o pecado
social e o pecado pessoal. Sem a vivência destes valores, a espiritualidade cai no formalismo dos
fariseus. A seguir abordamos alguns destes valores: o amor, a cruz e a liberdade;
a). Amor
No Evangelho Jesus não deixa dúvida sobre o valor central e o maior mandamento da Lei no seu
Reino: "Amarás o Senhor teu Deus. Amarás o teu próximo como a ti mesmo" (Mt 22, 36-40). O Novo
Testamento volta insistentemente a reforçar esta afirmação.
A espiritualidade cristã é autêntica somente quando tem como alicerce o amor. A condenação
mais forte de Jesus foi aos fariseus por serem incapazes de amar e serem amados. Em vez de servir,
procuravam ser servidos pelos outros. "Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque devorais as
casas das viúvas e, para se justificar, fazeis longas orações; por isso sofrereis juízo mais severo" (Mt 23,
14).
b). A Cruz
A Cruz é um dos elementos típicos da espiritualidade cristã. Jesus foi categórico: "quem quer ser
meu discípulo, deve tomar a sua cruz e seguir-me" (Mc 8,34). A vida é possível na medida em que somos
capazes de nos perder no outro e em Deus. "Se o grão de trigo, caído na terra, não morrer, fica ele só;
mas se morrer, produz muito fruto" (João 12, 24).
A afirmação "cada um deve aceitar a sua cruz", foi muitas vezes no passado mal entendida. Não
significa uma atitude passiva: "a vida é assim mesmo", "Deus quer assim", mas de enfrentamento de
todas as cruzes, na vida. Neste enfrentamento, as falsas cruzes vão desaparecendo e ficam somente as
verdadeiras cruzes. Alguém escreveu uma oração muita conhecida que exprime bem esta verdade: "Ó
Deus, me dê a coragem de enfrentar o que pode ser mudado e paciência de aceitar o que não tem
solução". A cruz é uma mística para os corajosos e não para os covardes.
A mística da cruz, portanto, provoca uma verdadeira transformação pessoal. Abandonamos a
fantasia de que controlamos tudo. Na cruz morre a ilusão falsa de si e nasce "o homem novo" do qual
fala São Paulo.
Na cruz também morre a falsa visão do mundo. Na cruz, Deus marcou um encontro com todos
que lutam em prol da humanidade pela qual seu Filho morreu. Na cruz, Deus responde ao sofrimento
humano, vem ao seu encontro. A cruz nos ensina que o Evangelho envolve a dimensão profunda de uma
luta contra o mal - o pecado na sua dimensão social e pessoal.
Os verdadeiros revolucionários se alimentam em última instância, de forças espirituais. As
pequenas vitórias conseguidas no meio de tantas derrotas não são suficientes para alimentar a luta de
libertação por um Reino justo e fraterno que começa agora. "O Reino de Deus está no meio de vocês"
(Lc 17, 21). Por este motivo a alegria no meio das cruzes que carregaram, foi uma característica dos
cristãos logo após a morte de Jesus: "Deixaram o Sinédrio, muito alegres de terem sido julgados dignos
de sofrer afrontas por esse Nome" (At 5, 40-41).
c). Liberdade
Hoje, para um número cada vez maior de pessoas, o destino e ideal da humanidade são
concebidos em termos de liberdade: libertação do pecado pessoal e do pecado social. O anseio de
liberdade motivou as grandes mudanças históricas deste século. Na teologia da América latina a
salvação que Jesus veio nos trazer é concebida em termos de libertação. Para a juventude a liberdade é
um valor central na sua maneira de conceber a vida e o mundo. Falamos de libertação que é
transcendental. É total porque ataca as raízes de todas as formas de opressão e dominação. Outras
formas de libertação são parciais. A libertação transcendental inclui os outros tipos de libertação.
► O Deus da Bíblia: O Deus da Bíblia se apresenta como libertador de seu povo do pecado e de suas
conseqüências. O primeiro grande ato de libertação acontece no êxodo. Deus escuta a voz do sofrimento
do seu povo, escravo no Egito e o conduz através do deserto à terra prometida. Deus se manifesta na
luta de libertação de um povo: "Eu vi a aflição do meu povo no Egito... e resolvi libertá-lo" (Ex 3, 7). Não é
um Deus fora da história.
A Opção Libertadora coincide com a construção do Reino. Nos dois textos clássicos de São
Lucas (Lc 4,14-22 e Lc 7,21-22), resume-se todo o esforço de evangelização em termos de libertação
dos pobres, dos cativos, dos cegos e dos oprimidos. O Espírito de Deus é libertador, portanto qualquer
tipo de espiritualidade que oprime e mata a iniciativa e a criatividade das pessoas não vem de Deus.
► A Credibilidade de Nossa Pregação: Os temas da liberdade e da libertação colocam uma questão
fundamental para que nossa pregação possa ter credibilidade: o amor deve se tornar eficaz e histórico. A
prova de uma pregação cada vez mais encarnada e realista é o grande número de mártires na Igreja da
América Latina. Tertuliano, nos primeiros anos do cristianismo afirmava: "o sangue dos mártires é a
semente da Igreja".
► Conceitos Errados: Alguns jovens confundem liberdade com libertinagem. Na realidade, estão partindo
de um conceito de liberdade que faz com que qualquer escolha seja impossível. Toda escolha envolve a
renúncia. Para se formar como bom profissional tem que renunciar a "liberdade" de aproveitar muitas
oportunidades de lazer. Até que ponto, por exemplo, a liberdade de poder me viciar em tóxicos é
liberdade ou escravidão? Até que ponto pode realizar o sonho de todo coração humano, de um amor
duradouro; a ausência da renúncia, do sacrifício e da disciplina?
5. A ORAÇÃO
Freqüentemente os jovens identificam espiritualidade com oração. Mas até agora não falamos de
oração. A espiritualidade é mais ampla. Quando as pessoas estão se esforçando para pautar suas vidas
nos valores do Reino e têm consciência da presença do Senhor da Criação nas suas vidas, já estão
vivendo a espiritualidade, embora que falte algo. Falta a oração.
A oração também é importante. É uma das formas de viver a espiritualidade. Sem oração não há
espiritualidade cristã. Mas, os momentos especiais de oração, de retiro, só têm sentido se o corriqueiro
da vida é levado a sério. Ao mesmo tempo, embora, os momentos de oração pessoal sejam
fundamentais para fortalecermos nossa espiritualidade, devemos lembrar que espiritualidade não se
resume a momentos ou atos. É uma questão de atitude.
► O específico da mística cristã: A mística cristã é diferente de qualquer outra motivação ou
mística, no sentido de que o seu específico, seu ponto de partida é a fé em Jesus Cristo. Quando esta
mística é vivida coerentemente, ela imprime uma qualidade de sacrifício, de luta, de perseverança, de
vida e de relacionamento entre os membros do próprio grupo e com as pessoas fora dele.
O desafio, portanto, é descobrir meios de criar na pessoa uma estrutura de fé que possa ajudá-Io
a fazer frente aos desafios do secularismo e às tentações de reduzir o grupo a uma clínica psicológica ou
a uma associação política. É o desafio de síntese entre a fé e a vida, a oração e a ação, a oração e o
trabalho.
A oração sempre significa centrar nossa vida em Deus, colocando-nos em contato com Ele. A
oração também nos coloca diante das grandes interrogações da vida: o sentido da própria vida, a morte,
nosso destino, o sofrimento, o mal, a felicidade, o fracasso. A oração não é algo complicado; não
precisamos de condições especiais. É só fazer silêncio para entrar em contato com Deus. A oração
assim, nos unifica interiormente.
Assistimos a proliferação de dois tipos de grupos contrastantes no trabalho pastoral com jovens.
De um lado grupos espiritualistas que reduzem a fé cristã apenas à oração. São grupos que nas palavras
de um jovem "estão tocando violão e cantando aleluia enquanto o mundo está pegando fogo". Do outro
lado são os grupos que traduzem tudo em luta pela justiça social. Precisamos encontrar o equilíbrio de
Santo Inácio que falava de contemplação e ação; e de São Bento que falava em oração e trabalho.
6. ESPÍRITO SANTO
Quem conduz a igreja não é o papa, o bispo, o padre ou uma liderança leiga. Somos conduzidos
pelo Espírito Santo. "Ides receber uma força, a do Espírito Santo, que virá sobre vós, e serão então
minhas testemunhas em Jerusalém... e até aos confins da terra" Cf (At 1, 8). Estamos convencidos que o
Espírito Santo é o protagonista da Missão.