Você está na página 1de 19

12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof.

Pedro Demo

Ensaio 555 - Marx não foi marxista


MARX NÃO FOI MARXISTA

Pedro Demo (2020)

Entre tantas tiradas de Marx durante sua vida, uma das mais intrigantes foi que frequentemente reiterou não se
considerar marxista. Schmidt-Salomon (2005) publicou um texto sobre esta posição tão sui generis, em especial
porque, enquanto muitos tentam empurrar uma carapuça de dogmático em Marx, tinha outra visão teórica e prática
de sua interpretação da história e da sociedade/economia: “Só sei apenas isso, que não sou marxista...” Marx não
viveu na academia; foi um dos “pesquisadores” mais eminentes que não eram acadêmicos, como foi Darwin.
Comparou-se com o físico, como no prefácio do Vol. I de O Capital, ao discutir seu método: assim como o físico
buscava as leis da natureza, ele buscava as leis de sociedade, que se impunham com “necessidade de bronze”
[mit eherner Notwendigkeit]) (MEW , 1983. Vol.23:12. Demo, 1995:109). De fato, Marx viveu uma fase
“determinista”, na gestação da obra em torno de O Capital, quando apontou a “infraestrutura econômica” como
determinação em última instância dos processos sociais, como consta de um de seus intérpretes mais famosos:
Althusser. Em seu assim dito “testamento metodológico” (“Contribuição para a crítica da economia política” [1973]),
foi expressivamente peremptório ao reconhecer o materialismo dialético e histórico como condução determinista da
história (Demo, 1995:108 ss. Althusser, 1971. Althusser & Balibar, 1970). Uma das decorrências mais conhecidas
desse posicionamento rígido foi a percepção da educação como sistema reprodutivo, determinado pela
infraestrutura econômica (Althusser, 1980) e que encontrou no livro de Bourdieu & Passeron (1975) a formulação
mais incisiva. Na América Latina o texto de Harnecker teve particular importância (1972) na formação de cientistas
sociais inspirados no marxismo. 

Não tenho nenhuma pretensão de absolver ou redimir Marx do determinismo, porque passou por esta fase em alto
estilo, quando se fascinou pela ideia de imprimir ao materialismo histórico e dialético a marca científica das
ciências naturais, postulando que o conhecimento científico seria a forma mais elevada do conhecimento,
merecendo acato alinhado, mormente garantindo resultados de maneira peremptória. Marx foi “positivista” por
algum tempo (Demo, 2011), mas, assim como soube desapegar-se de Hegel, soube superar o determinismo, ao
reconhecer, mais para a frente (quando analisou a Comuna de Paris, por volta dos 1870, no texto da Guerra Civil
em França [Marx, 1870-71]) que as “condições subjetivas” são tão importantes quanto as “objetivas” para
transformar a sociedade e a economia (Demo, 2019) . Tenho, porém, a intenção de realçar um lado menos
reconhecido de Marx: o pesquisador aberto, capaz de se autorrenovar, colocando os desafios da realidade acima
dos esquemas mentais forjados para a entender. Mesmo na fase positivista, quando elaborou os Grundrisse (o
“esboço” teórico da estruturação e lógica do Capital) (MEW, 1983. Vol. 31. Marx, 2011), sugeria tratar-se de uma
abordagem inicial, um rascunho para início de conversa. A percepção mais importante, possivelmente, é saber
distinguir a proposta de Marx de como foi elaborada, daquela implantada concretamente, por exemplo, na versão
soviética ou maoísta, ambas fracassadas. Por exemplo, a visão do papel do Estado como garante da cidadania
nunca foi de Marx. Foi de Lênin, ao postular a “ditadura do proletariado” encampada por um Estado prepotente
dominado pela “nomenclatura” (altos funcionários do PC soviético, trabalhadores em cargos técnicos, artistas e
outros que tinham a simpatia do PC) (https://en.wikipedia.org/wiki/Nomenklatura). Esta pretensão foi combatida,
entre outros, por Rosa Luxemburg que incriminou Lenin de confundir ditadura do proletariado com ditadura do
partido: este, ao se privilegiar contraditoriamente, explorava o povo, reeditando a luta de classes no socialismo

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 1/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

“real” (Mishra, 1988). Ao final, o garante da cidadania não seria o Estado, muito menos o mercado, mas o
trabalhador livre associado, como foi o caso da Comuna de Paris, mesmo tendo sido esta um evento fugaz. 

Seria, por outra, exagero ver Marx como exemplo consumado de posição acadêmica aberta, porque, apaixonado
como foi por sua causa contra o Capital em favor do trabalho como referência maior da vida em sociedade e única
fonte de valor econômico, “extrapolava” por vezes, como aconteceu na aceitação da dialética não antagônica,
porque conflito social radical haveria somente até ao capitalismo, uma escatologia utopista autodefensiva. A
própria ideia do “socialismo científico”, elaborada mais diretamente por Engels (1971) indica uma discussão
acirrada entre utopia e ciência (ou entre socialismo meramente ideológico, e socialismo fundado no materialismo
histórico e dialético), com visível rigidez conceitual e prática. Mas vale ressaltar que, em momentos de particular
clarividência, sabia ver em sua obra muito mais uma teorização tentativa, aproximativa, sempre revisável, do que
produto acabado indiscutível. Que muitos marxistas sejam mais marxistas que Marx (mais realistas que o rei!),
sempre foi uma pecha de marxismos obcecados, fechados, ferozes (Gorender, 1999. Konder, 1989) e que se
arruinaram junto com a queda do “socialismo real” (aquele historicamente realizado). 

I. CIÊNCIA E UTOPIA

Antes de analisarmos a posição de Marx como “não marxista”, vamos encarar uma questão de fundo do marxismo
atual, em grande parte reduzida a uma atividade acadêmica tendencialmente rala, localizada, encurralada, bem
diferente do que foi nos anos 1960, em especial sob a égide da Escola de Frankfurt: esta não foi um baluarte
marxista – ao contrário, foi crítica severa – mas, coerente com a posição de Marx de não ser marxista, sempre
mostrou muito apreço pelo marxismo como teorização digna de nota. As novas gerações de estudantes em
ciências humanas e sociais já não leem Marx como autor importante ou imprescindível, em parte porque é possível
ser crítico de muitos outros modos, em parte porque o socialismo real fracassou (em especial a versão soviética).
Dos “socialismos reais” restou, na prática, apenas o chinês, mas numa versão muito sui generis, combinando o
que pareceria impossível: comunista politicamente, liberal economicamente  (Piketty, 2020. Milanovic, 2019). Como
o que importa é a “infraestrutura”, a questão comunista resvalou para os bastidores, tornando-se secundária na
prática, enquanto se badala o triunfo econômico e tecnológico da China, em particular a redução drástica da
“pobreza extrema” (era de 80% nos anos 80; agora gira em torno dos 5%) (World Bank, 2018. World Inequality
Report 2018. 2019). 

A Escola de Frankfurt sempre foi muito cáustica com o “socialismo real”, por ver no sovietismo e maoísmo, em
especial, deturpações grotescas do que seria (ou deveria ser) uma sociedade socialista/comunista. Habermas
dedicou um livro importante para a “reconstrução do materialismo histórico” (1983). Marcuse confrontou-se
diretamente com a versão soviética do socialismo real (2015; 2015a; 2008). Horkheimer e Adorno, enquanto
elaboravam sua “teoria crítica”, incluíam reparos severos aos extremismos ideológicos marxistas (2002. Adorno &
Hoban, 2020). Enquanto a escola apreciava a teorização marxista como tal, mantinha-se coerente com a sugestão
do próprio Marx de “não ser marxista”, também porque a Escola nunca se alinhou a qualquer pretensão ideológica
dominante, preferindo caminho crítico próprio. Sempre foi questionadora do capitalismo, sobretudo da “indústria
cultural” alienante (Kellner, 1989; 1995. Demo, 2019a), mas nunca admitiu que, para questionar o capitalismo,
seria imprescindível embarcar na ideologia marxista (Thompson, 1998; 1995). Esta posição autônoma é hoje típica
de Piketty (2020), possivelmente um dos maiores críticos do capitalismo, sem vínculo com o marxismo.
Independência intelectual é um dos patrimônios mais relevantes e marcantes da academia, quando procura cuidar
da formação autoral dos estudantes, não atrelar a posições predeterminadas, o que prejudica frontalmente a
https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 2/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

formação crítica autocrítica. Podemos, certamente, indicar na postura de Marx um realce ostensivo em favor da
independência intelectual, bem como na da Escola de Frankfurt, ou num autor como Piketty. 

Vale, porém, ressaltar, uma ironia do destino em relação ao marxismo na Escola de Frankfurt. Enquanto Marx e
Engels acentuaram claramente o fundamento científico do socialismo, para distingui-lo do utópico (Engels, 1971) e
para vendê-lo como algo comprovado tal qual um produto finalizado das ciências naturais, os frankfurteanos
sublinhavam o valor “utópico” do marxismo. Esta valorização da utopia vinha de um autor importante
contemporâneo, Bloch (1995; 1995a; 1995b; 1961; 2000) – O princípio esperança; A Ontologia do ainda-não-ser –
que se propôs repensar o conceito em outra direção. Na acepção mais comum, segue-se a etimologia: em grego,
utopia significa “não lugar”, ou expectativa irrealizável, busca do impossível. Na visão de Bloch, esta condição de
irrealizável é que turbina o realizável, forçando a busca por superações alternativas incansáveis. Esposa-se a
noção de realidade como dinâmica potencial aparentemente inesgotável, repleta de alternativas radicais, não como
referência fixa dada, sempre limitada e acanhada. Mantém-se a etimologia: utopia não se realiza, por definição;
mas o irrealizável, ao invés de comparecer como alucinação, apresenta-se como instigação incansável de
superação da realidade dada, em nome de potencialidades sempre disponíveis. Em parte, esta ideia emerge no
Homo deus de Harari (2017), quando se consideram limites como desafios, tentando tornar possível o que
pareceria impossível, tal qual tornar-se deus para os humanos. Humanos, porém, são limitados – o Homo sapiens
sabe disso (Harari, 2015) – mas, quando perde a noção de utopia, contenta-se com o que tem, com a realidade
dada. Utopia é o acicate que nos espicaça a buscar sempre mais, a nos superar, a ver em limites apenas desafios.
Quem desiste da utopia, não vai além do próprio tamanho. Humanos tiveram, em sua história, momentos de
superação espetacular, porque acreditaram ser possível o impossível, não literalmente, mas no sentido de que
forçar a alternativa radical é a função imorredoura da utopia: o irrealizável como parte do realizável. 

A intepretação marxista da utopia foi de proposta alucinada, ideológica, voluntarista, ingênua, por desprezar a
determinação da infraestrutura, o que, ao final, pode ser: querer o impossível pode ser enfermidade mental
comprometedora. Mas uma coisa é manter o mundo da lua como desafio sempre aberto (contos de fada, por
exemplo), outra é pretender morar por lá. Querer morar por lá é alucinação, alienação; mas afrontar limites é um
gesto de ousadia fundante da espécie. Por esta razão, Bloch revidou ao socialismo soviético o reparo de que não
lhe faltava ciência; faltava-lhe utopia. Ele polemizava com Suslow, ideólogo maior do regime que, no XXII
Congresso do Partido Comunista Soviético (31 de outubro de 1961), sancionou em seu Programa o seguinte:
“Comunismo é uma ordem social sem classes, na qual os meios de produção serão propriedade conjunta do povo
e todos os membros da sociedade se tornarão, em termos sociais, completamente iguais, e na qual, juntamente
com o desenvolvimento total dos indivíduos sobre a base da ciência e da técnica em constante progresso, também
hão de crescer as formas produtivas e hão de fluir mais plenamente todas as fontes de riqueza social, e onde há
de imperar o princípio grandioso: cada qual segundo sua capacidade e ada qual segundo suas necessidades. O
Comunismo é uma sociedade altamente organizada de homens trabalhadores livres, com alta consciência, na qual
haverá a vigência da autogestão social, na qual o trabalho para o bem-estar da sociedade se tornará a primeira
necessidade vital para todos, a necessidade conscientizada, e cada qual aplicará suas capacidades com o maior
proveito em prol do povo” (Leohnard, 1970:232. Demo, 1995:106). Em 30 de janeiro a 2 de fevereiro de 1962,
Suslow proclamou ao “comunismo científico”, no eco de Engels do “socialismo científico”, presumivelmente
atingindo sua fase final. Em 1966, apareceu a elaboração oficial de Fundamentos do comunismo científico, em
600.000 exemplares. 

Esta pretensão foi ridicularizada por Bloch e Marcuse (1960), também por Bettelheim (1976) ao analisar “a luta de
classes na União Soviética”, em especial porque se tentava negar as desigualdades grotescas e repugnantes da
sociedade soviética, ao lado da incapacidade de conduzir uma economia produtiva a serviço de todos. O trecho
citado enfeixa o miolo da proposta da sociedade comunista marxista, mas não combinava, nem um pouco, com a
situação concreta em que se encontrava a União Soviética nos anos 1960, enredada em ditadura extremista e
inoperância econômica que exacerbaram as desigualdades sociais, o que iria, mais de 20 anos depois, eclodir no
colapso do sovietismo. Sobretudo Bloch brandia o argumento de que, abandonando a noção de utopia, a União
Soviética adotou miopia totalmente alienada e doentia, ao pretender fantasiar que já estava na fase comunista da
igualdade essencial de todos na sociedade. Utopia emergia, então, como abertura sadia para autocrítica sempre
disponível de gente capaz de se autorrenovar. Marx, ao alegar inúmeras vezes que não era marxista, tremulava

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 3/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

esta bandeira instigante e, de fato, várias vezes na vida mudou de posição, mesmo que mantivesse uma visão, ao
final, fechada de socialismo/comunismo. 

A visão positivista de ciência empurra-a para a obtenção de resultados definitivos, comprovados, enquanto outros
preferem ver ciência como convite ao pensamento aberto, sempre em revisão, turbinada pela utopia de teorias e
resultados jamais concluídos ou finais. Harari sinaliza esta percepção no Homo sapiens (2015): ciência se
autorrenova porque se mede pelo que lhe falta, não pelo que já conquistou (Firestein, 2012. Feyerabend, 1977;
1979). De fato, na história das tecnologias é visível o ímpeto indomável, teimoso, de humanos inconformados com
seus limites, sempre prontos a desafiar o que parece impossível (Steinhardt, 2019). O positivismo, porém, continua
namorando teorias finais ou de tudo, como foi o caso notório de Hawking (2006): o risco maior do positivismo é não
se questionar mais, presumindo ser inquestionável. O êxito é a sepultura do futuro, como disse Christensen num
texto lapidar voltado para as empresas, sob o epíteto de “o dilema do inovador” (2002. Christensen et alii, 2011):
quem descansa nos louros da vitória pode acordar derrotado (Wheeler, 2019). No esporte é comum a pretensão de
superar desafios aparentemente impossíveis (quebrar recordes, por exemplo) (Ericsson & Pool, 2016. Kotler,
2014), assim como persiste a volúpia supina das potências globais em ocupar o topo a qualquer preço (Lee, 2018.
Wohlforth & Hendrix, 2016. Kaku, 2018), ou da engenharia genética de interferir, temerariamente, na genética
humana (Metzl, 2019. Tegmark, 2017. Ball, 2018). Utopia, então, pode abarcar a ideia de enfermidade humana da
megalomania ou alienação, como viam Marx e Engels (Shermer, 2018), ou a perspectiva da exploração infindável
das potencialidades aparentemente inesgotáveis da realidade sempre prenhe. Aí está a diferença entre uma
ciência que se dedica a dominar a realidade, impondo-lhe termos finais de funcionamento, e outra que a toma
como desafio de exploração interminável e sustentável. 

Marx titubeia entre os dois lados, marcantemente. Na sugestão tão sui generis de que não era marxista aparecia o
senso formidável de abertura acadêmica, ao considerar suas teorizações como exercícios exploratórios para
debate, sempre revisáveis, porque é fundamental continuar aprendendo na vida, mas em outros momentos ele
insistia na escatologia socialista/comunista. 

II. CONTEXTO DA REAÇÃO DE MARX

Marx faleceu em 14 de março de 1883, deixando legado astronômico intelectual, acadêmico, cultural, ideológico,
numa obra monumental, cujo próprio volume contribuiu ainda mais para vê-la como inacabada. De fato, ele mudou
o modo de analisar a realidade, conforme foi avançando em seus estudos, práticas, embates, êxitos e fracassos,
num gesto em si nobre de abertura saudável: não havendo palavra final em ciência, nem por parte do cientista
(não há cientista final), nem por parte da realidade (não sabemos o que é a realidade, muito menos “final”), é
prudente manter-se aberto, para não ser contornado por novas teorizações ou por novas descobertas científicas.
Tinha consciência de que não resolvera todas as lacunas e contradições, o entendimento do capitalismo era
mesmo algo controverso, embora tivesse desvendado muitas marcas fundamentais, como da mais-valia, do
trabalho como única fonte de valor econômico, da exploração da mão de obra em favor do capital, da luta de
classes, do papel da infraestrutura etc. Enquanto, na dimensão política lutava pela implantação do socialismo, que
viria em países capitalistas mais avançados (daí ter-se mudado para a Inglaterra, porque era o país capitalista
mais desenvolvido e onde – assim supôs erroneamente – iria ver a superação do capitalismo com os próprios
olhos), no plano acadêmico mantinha-se pesquisador solícito, disponível, capaz de mudar de ideia. Conhecemos,
em geral, melhor a primeira parte (voluntarismo político), mas podemos apreciar igualmente sua preocupação em
afastar-se de dogmáticos e puxa-sacos que achavam “bonito” enfatuar-se como “marxistas” e que ele mesmo
https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 4/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

negava ser. Marcantemente, a obra marxista, mesmo contendo muitas contradições e lacunas, nunca deixou de
fascinar a academia, sobretudo parte da juventude, que via em suas teorizações, menos a possível ciência em
jogo, e muito mais as utopias que arrastam multidões. O fracasso sonoro do sovietismo (também do maoísmo)
contribuiu enormemente para o desencanto de muita gente, mas, como se diz, “a utopia socialista” continua de pé.
Ponto alto desse fascínio foram os levantes culturais dos anos 60, que mobilizaram a juventude do mundo todo em
torno de alguns ideais de libertação, que também iam muito além das pretensões de Marx: este quis libertar o
trabalho humano do jugo do capital e não constava em sua agenda apelar para excessos de reuniões e agendas
juvenis que, ao mesmo tempo, fascinaram e assustaram o mundo, adotando música pesada, entorpecentes,
rebeldias contumazes, provocações libertárias em termos de comportamento sexual, etc. A contribuição de Marx a
isso seria, quando muito, o pano de fundo utópico, no sentido ao avesso de sua obra: forçar os limites da
sociedade, explodindo normas, sanções, conformismos, socializações etc. 

Schmid-Salomon reconhece que o marxismo não morreu, nem vai morrer, porque, mesmo contraditoriamente,
tocou algumas das cordas mais sonoras da alma humana, em cuja profundidade não só lógica e racionalidade são
referências importantes, mas igualmente utopias, esperanças, contradições, ambiguidades etc. Em vida, Marx se
confrontou constantemente com versões diversas e disparatadas do que seria “marxismo”, uma das razões para
algo sempre citado: “Tudo que sei é que não sou marxista” (MEW, 1983, Vol. 37:450). Esta frase não consta em
escritos do próprio Marx, mas Engels em cartas atesta que Marx teria dito (MEW, 1983. Vol. 35:388; MEW, 1983,
Vol. 37:436. MEW, 1983, Vol. 22:69. Engels, 1924) (Kehl, 2018. Börner, 2018). A interpretação do dito é muito
controversa: por parte de quem veria nele uma fraqueza de Marx, é contestado como expressão desimportante;
por parte de quem veria nele uma virtude acadêmica, é aplaudido, como sugiro aqui. O fato de haver gente que
bravateava seu alinhamento ao marxismo indica, em parte, um êxito precoce da teorização marxista, como indica
divergências na concepção e prática: neste contexto aparece a reação de Marx de negar ser marxista, porque
divergia de asseclas obcecados, como no caso do marxismo francês, puxado por Charles Lonquet e Paul Lafargue
(seus genros). Mas seria precipitado extrair daí que Marx quisesse abjurar o dogmatismo de sua obra, embora
parecesse preocupar-se com o aproveitamento duvidoso de suas análises do capitalismo. Então, a expressão
insinuaria: se isto é marxismo, então não sou marxista. Schmidt-Salomon propôs-se a dissecar,
aproximativamente, a pletora de marxismos ou pretensos marxismos que viriam a se revelar mais ainda após a
morte, um fenômeno em si esperado, porque todo movimento político, não só teórico, implica alinhamentos
díspares, até mesmo antagônicos: unidade ideológica, se existisse, implica desistir da ideologia, o que é
certamente ingênuo esperar. A democracia, por isso, advoga o pluripartidarismo, tentando valorizar as
divergências, desde que democráticas. Interesse notável sempre teve o marxismo-leninismo, como variante mais
famosa, também mais problemática. Vale realçar a ligação da socialdemocracia com o marxismo, também de
Spartakusbund (Liga Epartaquista, ou Liga Spartacus) (https://en.wikipedia.org/wiki/Spartacus_League),
movimento revolucionário alemão na Primeira Guerra (Priestand, 2009), oriundo da esquerda da socialdemocracia
(Rosa Luxemburg, Liebknect, Zetkin, Mehring etc.), sob a égide de Spartacus, líder da maior rebelião escrava da
Roma Antiga (73 aC a 71 aC). Foram importantes as dissidências do socialismo burocráticos do Bloco Oriental,
também os movimentos na China, Camboja e América latina, com realce para a Teoria Crítica, ao lada da “Nova
Esquerda” e da influência do pensamento marxista sobre a arte e filosofia francesa. Ao final, Schmid-Salomon se
pergunta pelo que restou do marxismo... 

Não há aqui pretensão de dar conta da questão, por ser grande demais, além dos infindos matizes envolvidos. Na
América Latina há o fenômeno cubano que, marcantemente, ainda detém charme utópico relevante, sobretudo em
termos educacionais, embora economicamente não tenha se resolvido (Carnoy, 2007), ao lado de tentativas
intermitentes constantes como da Venezuela, Bolívia, Equador, sendo questão das mais complicadas a dificuldade
de seguir rota alternativa na política econômica, logo sufocada pelo neoliberalismo global. É fato, porém, que o
marxismo recuou enormemente, também na academia, em especial com a queda estrondosa do sovietismo e com
a versão provocativa chinesa atual (comunismo mesclado com liberalismo), embora a direita persista em ver no
comunismo um espantalho sempre de plantão. O êxito chinês precisa ser contextualizado, porque a superação da
pobreza extrema (a $1,90 diário), mesmo tão marcante, é totalmente insuficiente, sem falar na retomada da
concentração da renda (Piketty, 2020). Num lado, o regime chinês aprendeu do fracasso maoísta (economia
precisa funcionar e a que mais bem funciona é a liberal; logo, adotou-se a posição liberal flagrante, em parte por
coerência marxista: Marx sempre alegou que socialismo só seria viável após o capitalismo resolvido). Noutro, tenta

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 5/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

formular modelo próprio econômico e democrático, numa busca frenética da liderança mundial econômica e
tecnológica (Lee, 2018. Milanovic, 2019). 

III. “DITADURA DO PROLETARIADO” NA RÚSSIA

No começo do século XX uma versão do marxismo, o marxismo-leninismo, emergiu com a pretensão de ser “o
marxismo” tout court (Schmidt-Salomon, 1999), embora para muitos, também para Schmidt-Salomon, existam
posições irreconciliáveis nos dois lados, como na diferença entre socialização e estatização. Socialização para
Marx indicava a Associação livre dos produtores (não condução centralizada do Partido), supressão de modos
alienados de produzir e consumir (não produção anônima em massa em fábricas e unidades coletivas), seu
objetivo era a realização do indivíduo e da espécie (não a submissão do indivíduo sob um coletivo burocrático
organizado). Para Marx era crucial superar o trabalho alienado (sob o tacão da mais-valia), para tonar-se o
trabalho “expressão livre da vida, daí o desfrute da vida... No trabalho estaria... a propriedade de minha
individualidade, pois afirma minha vida individual. O trabalho seria propriedade verdadeira ativa” (MEW, 1983, Vol.
40:463). A alienação mais terrível para Marx é a do trabalho, por ser este definição central da vida humana (hoje
esta tese é vista como excessiva, porque a vida como um todo aponta para outras marcas tão essenciais como
trabalho, incluindo cooperação, felicidade, aprendizagem etc.) (Habermas, 1980; 1982), captada pela mais-valia:
vender a força de trabalho por preço vil, sendo que trabalho seria a única fonte do valor econômico. O trabalhador
é o proprietário verdadeiro do resultado do trabalho, não o capital, que açambarca o posto. Na medida em que
alienação é a perda da própria essência, ser destituído do resultado do trabalho em favor do capital é perder sua
essência. A estatização, ao invés de socializar os meios de produção, concentrou numa burocracia atroz,
reeditando a alienação sob outro disfarce: a submissão a um Estado massacrante que cumpre abater (MEW, 1983,
Vol. 3:77). Na Comuna de Paris, Marx exarou frontalmente sua repulsa à máquina centralizada estatal, que
comparou com o sufocamento de uma sucuri (MEW, 1983, Vol. 17:538). O controle do Estado tornou-se o botim
central da classe dirigente, mudando apenas de algoz: o que fazia o capital para sufocar o trabalhador, fazia agora
o Estado, razão pela qual é impraticável associar Marx com a versão da ditadura do proletariado soviética, que foi
apenas do Partido centralizador e opressor. A visão do Estado como entidade necessária e subserviente à
associação dos trabalhadores livres (de tamanho mínimo) (Demo, 2019) nada tem a ver com a versão soviética,
maoísta, nem chinesa atual (MEW, 1983, Vol. 17:539). A revolução popular prevista por Marx implicava o abate do
aparato do Estado, mão para eliminar o Estado, mas para transformar em entidade estritamente a serviço da
sociedade (Id.:544). 

No entanto, é comum encontrar em esquerdas a visão do Estado como garante da cidadania, confundindo a
versão soviética do Estado com a visão de Marx, totalmente contrária. Em parte, isto ocorre, não só por
alinhamento a socialismos reais fracassados, mas também por leitura curta ou nenhuma de Marx, no caso em
especial da Comuna da Paris (Guerra Civil em França) (Demo, 2019): Marx não propõe abolir o Estado, como não
propõe abolir o mercado. Sua posição foi que ambos são entidades fundamentais da sociedade, mas cumpre
impedir sua “alienação”, no sentido preciso de coibir que mercado e Estado se conjuguem para explorar o
trabalhador. O garante da cidadania, então, não será, jamais, Estado e muito menos mercado, mas o trabalhador
livre associado, tal qual descrito na Comuna de Paris, um texto da velhice de Marx (1870). Naturalmente está por
trás o conceito e sobretudo a prática muito contestada da “ditadura do proletariado” que logo virou ditadura do
partido ou da nomenclatura, como Rosa Luxemburg reclamou com Lênin. Para Marx não adiantava trocar de
explorador: capital ou Estado. Era imprescindível colocar Estado e capital sob o controle laboral. Então, primeiro,

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 6/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

não se trata de abolir nem o Estado, nem o mercado; segundo, o objetivo é saber usar para o bem comum Estado
e mercado, como instrumentações da democracia/república. Sempre incomodou a noção de “ditadura do
proletariado”, porque era força de expressão, quando muito. O proletariado não tem como ser “ditador”; a ditadura
vai ser conduzida por “representantes” dele, em geral usurpadores, como é comum em concentrações tão
enormes de poder. Embora se possam fazer distinções pertinentes entre leninismo, estalinismo, maoísmo e outros
ismos, o fato mais angustiante é que se preconiza um ditador no poder. 

Pode ser parte dessa discussão que Lenin ignorou o postulado marxista de que socialismos seria o produto natural
do desenvolvimento capitalista, não da miséria generalizada das massas, como era o caso russo. Esta situação foi
considerada argumento a mais para inventar um Estado centralizado brutal, sempre sob a alegação fátua de que,
com isso, o proletariado estaria no poder. Lenin sempre acentuou que seria ingênuo fazer uma revolução socialista
sem tomar o Estado, valorizando bem mais o voluntarismo político do que o desenvolvimento da infraestrutura
econômica, que nunca foi resolvido minimamente na União Soviética (Shub, 1976:222ss). Rússia estava mal e mal
saindo do feudalismo, e não tinha passado adequadamente pela fase capitalista capaz de produzir meios
suficientes de subsistência da sociedade; socialismo combina com abundância material, não com escassez
gritante. Na prática, Lenin aproveitou-se da debilidade geral do regime, da insatisfação ingente da população, da
incapacidade de reação das elites e dos militares, deu um golpe e apossou-se do Estado, adulterando frontalmente
a proposta marxista, começando pela ideia extravagante de que um grupo seleto lideraria a luta socialista em
nome do proletariado (Lenin, 1983:333-541). Entrava em cena uma outra teoria do Estado, tipicamente leninista ou
soviética, na qual o aparato estatal iria subjugar o proletariado (Id., Vol. 3:461-584). A concentração estatal se
justificou também pela teoria do imperialismo: era preciso um Estado forte para contrapor-se ao movimento
capitalista de dominação global, implicando também desenvolvimento de poderio militar compatível, um
desdobramento que iria redundar na Guerra Fria. 

Schmidt-Salomon acena com a pretensão de evitar uma injustiça a Marx, que agora leva a fama de traidor dos
proletários, por conta da má condução da revolução socialista na Rússia (1999), e chama Marx de “Filósofo”,
embora sua pretensão maior sempre tenha sido ser visto como economista líder na Europa. Marx, na prática,
embora tenha participado sempre de movimentos sociais e tenha se mantido extremamente ativo em vida em
termos políticos, não liderou nenhuma revolução concreta, fato que facilmente o empurra para a condição de
“teórico” incorrigível. Lenin insinuava esta diferença a ser respeitada: uma coisa é escrever sobre socialismo, outra
é implantar num país convulsionado e atrasado como a Rússia, exigindo reescrever as teorias. Na Comuna de
Paris, porém, Marx fizera esforço paradigmático de justificar um sistema de organização do poder estritamente
democrático – talvez a proposta mais radical de democracia direta (Demo, 1983): a comuna era a célula básica,
matriz do poder, uma entidade pequena, onde a gestão era feita face à face; toda instância acima era derivada,
cabendo sempre a última palavra à comuna; o poder de instâncias superiores não era superior, mas apenas tinha
o poder delegado da comuna. Marx queria evitar o que é comum hoje em assembleias gerais de grevistas, por
exemplo: reunindo milhares de pessoas, a discussão é impraticável; não se pode deliberar; o que ocorre é a
manipulação da assembleia por uma “vanguarda” que se autointitula representante. A regra seria: a base do poder,
a comuna, não é substituível por nenhuma instância acima, porque esta nunca é superior, é estritamente inferior.
Como, porém, Lenin iria conduzir a Rússia com base em comunas? De fato, por mais que a ideia da comuna tenha
um charme irresistível, humanista, participativo, cooperativo, governar um país implica fazê-lo com
“representantes”, cujo vínculo com a base ou com o povo acaba desaparecendo. Dizer que nossos congressistas
representam o povo é cinismo grotesco, embora formalmente seja o caso. 

IV. SOCIALDEMOCRACIA E LIGA DE SPARTACUS

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 7/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

Lembra Schmidt-Salomon que socialdemocracia surgiu na Alemanha em 1848, tornando-se rapidamente conceito
chave do movimento laboral. Seu objetivo era a realização de uma sociedade solidária com base na
democratização de partes sensíveis da sociedade, sobretudo da economia. Em 1890, conceitos de Marx e Engels
penetraram o movimento, virando Partido alemão, com influência importante até ao programa de Godesberg de
1959. Hoje o vigor original se perdeu, engolido pelo liberalismo generalizado e pouco ou nada tem a ver com
algum marxismo. É sintomático que mesmo na Fundação Friedrich Ebert (do SPD) já não existe referência a Marx.
Mesmo assim, houve o que aclamar, sobretudo a ideia de cogestão empresarial dos trabalhadores (no pós-
Segunda Guerra), que pode, de fato, melhorar a produtividade, além de reduzir fortemente a desigualdade, como
analisa Piketty (2020). Por conta de contradições na obra marxista, o movimento laboral também flutuava em
busca de norte, o que sempre era motivo para lideranças açambarcarem o poder e se declararem representantes
do povo (Schmidt-Salomon, 2005a). Líderes dessa socialdemocracia, como Rosa Luxemburg, Liebknecht e outros
sempre exigiram muito mais do movimento, em particular uma relação de reciprocidade democrática entre capital e
trabalho (Jestrabek, 2003. Petrovic, 1980). Por isso, igualmente, houve um choque com Lenin, quando se objetou
que a ditadura do proletariado nunca existira; existia apenas uma ditadura do partido, totalmente divorciada do
marxismo ou extremamente privilegiada (nomenclatura). 

Hoje a socialdemocracia está totalmente desfigurada, mas, como Piketty acentua com grande verve (2020), foi um
dos baluartes para tachar ingresso e capital em grande proporção, a ponto de implantar sociedades bem mais
igualitárias e o welfare state. Ao lado disso, a cogestão na empresa foi, mesmo sempre realizada parcialmente,
grande conquista que poderia ser pleiteada, também como tática para melhorar a produtividade: os trabalhadores
em geral tendem a trabalhar mais e melhor, se tiveram na empresa a posição de cogestão. Incomoda a socialistas
mais radicais que se adote uma estratégia tão lenta de avanço, passo a passo, podendo demorar indefinidamente,
enquanto a miséria das massas urge. Em alguns países, sobretudo nos Estados Unidos, qualquer referência ao
socialismo ou mesmo ao “social” causa arrepios na direita, porque se imagina retomar a versão soviética do
socialismo. Primeiro, ignora-se que o sovietismo ruiu fragorosamente; aliás, nenhum socialismo real deu certo, no
sentido de propor um sistema produtivo efetivo e vinculado ao bem comum. Segundo, o que temos hoje é a versão
chinesa, extremamente diversa das versões históricas anteriores, que observamos atentamente porque, sendo em
geral repudiado o regime ditatorial comunista, reverenciamos o êxito econômico, mesmo sendo escrachadamente
liberal (Rindermann, 2018. Rosling, 2018). O fato mais duro atual é bem outro: não há mais espaço para a
condução alternativa da política econômica, no que a experiência chinesa é usada como argumento superlativo, o
que leva regimes “socialistas” ou  simpatizantes à insolvência econômica. 

V. “O PARTIDO SEMPRE TEM RAZÃO”

O Bloco Socialista Oriental dos países europeus dominados pelo sovietismo é outra referência importante de um
tipo de socialismo real, marcado também por dissidências muito relevantes, como a primavera de Praga e muitos
acadêmicos rebeldes (Bahro, 1990). A própria adjetivação do socialismo como “real”, indicava que uma coisa era a
proposta original marxista, bem outra como ia se realizando nos países que adotavam o socialismo. Um dos
problemas mais visíveis nesse bloco foi a dificuldade de controlar acadêmicos dissidentes, também porque
acadêmicos alinhados de alto nível eram ralos. Stalin promovera expurgo implacável a dissidentes, mas que nunca
conseguiu sufocar de modo efetivo, também em etapas posteriores. Citam-se Sacharow e Kopelew na União
Soviética; a “Primavera de Praga”; e na Alemanha Oriental, Bloch, Havemann, Biermann e Bahro. Eram sempre
https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 8/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

tachados de “revisionistas burgueses” e tinham em comum, entre outras coisas, certo apego ao “jovem” Marx. O
jugoslavo Petrovic, em cuja Revista “Praxis” muitos “revisionistas” publicavam, resumiu o consenso dos dissidentes
em dois pontos: i) “O socialismo, como foi concebido por Marx, não é ditadura burocrática, mas comunidade
humana dos homens libertos. Por isso, não pode ser efetivado nem por regulamentação estatal da vida social, nem
por medidas repressivas, mas só pelo desenvolvimento da democracia, da eliminação do Estado e a introdução da
autogestão laboral na produção. Ii) o estalinismo não é grau novo do desenvolvimento do marxismo, mas, antes,
uma negação de sua essência... Marxismo é uma filosofia humanista da liberdade, o estalinismo uma justificação
pseudofilosófica da escravidão” (Petrovic, 1980:180). 

Lembrando o que Bloch falava da cristandade – “o melhor que proporcionou foram seus hereges” – aplicava-se
também ao marxismo-leninismo, em especial na Europa oriental, que tinha um nível de desenvolvimento mais
visível, com sistemas educacionais e universitários mais avançados. O apego ao “jovem” Marx era compreensível
por conta de ser mais fácil o uso “revolucionário” dos textos, mas enviesava a discussão, porque ignorava as
mudanças de posição vividas por Marx e que não podem ser olvidadas. Marxismo apelativo tem pouco chance de
fazer vingar propostas mais fundadas e realistas, já que o próprio Marx, em sua maturidade, se desapegou de
textos de seu passado, naturalmente. Por exemplo, dificilmente se pode fundamentar em Marx propostas
voluntaristas juvenis, como se revolução fosse resultado retórico. Para Marx era muito mais importante o
desenvolvimento das forças produtivas, a infraestrutura, mesmo que tenha, no fim da vida, abandonado o
positivismo mais frontal das ciências naturais (Bahro, 1990). 

A noção de que o partido sempre tem razão soava à debilidade mental entre os mais lúcidos e críticos acadêmicos,
porque não toleravam tais alinhamentos que pressupõem subserviência indigna. Ao mesmo tempo, percebiam que
a liderança partidária amealhava privilégios escorchantes, totalmente negados aos trabalhadores, ferindo de morte
a proposta marxista original. Ao lado disso, o Estado se tornara ainda mais corrupto, porque é o destino natural de
tais concentrações desarvoradas de poder . 

VI. “DA ARMA DA CRÍTICA PARA A CRÍTICA DAS ARMAS”

Analisando outras versões do marxismo, da China, Camboja e América Latina, ou seja, além da Europa oriental e
ocidental, percebemos outras faces, também por termos outras culturas em jogo (Courtois et alii, 1998.
Mecklenburg & Wippermann, 1998). De todos os modos, isto indica que o marxismo tinha potencial para atingir
todos os cantos do mundo. Na China, o Partido Comunista tomou o poder, em meio à Guerra Civil, de 1946 a
1949, sob a liderança de Mao, para instituir uma variante chinesa. Ao tempo do “Grande Salto” (1958-60) tinha
como meta uma industrialização rápida e a desburocratização do círculo do poder. Na prática, nada deu certo e a
fome se disseminou mais ainda, custando a vida de milhões de chineses. Seguindo a fase da consolidação, o
poder do Partido cresceu ainda mais, exigindo outro movimento de desburocratização, chamado de “Revolução
Cultural”, desde 1966. Os asseclas maiores de Mao foram os jovens urbanos, que usaram de violência contra os
antigos detentores do poder e sua cultura atrasada. Ao final, a Revolução Cultural foi desastrosa, redundando no
reforço de velhas estruturas de poder, num alinhamento infeliz com o experimento soviético. Na verdade, ficou
claro que este tipo de socialismo não resolvia a questão mais central para Marx, que era a condução da política
econômica voltada para os trabalhadores, o que seria mudado drasticamente no atual comunismo chinês: primeiro,
resolver a economia, aderindo ao liberalismo de mercado. 

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 9/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

Entretanto, apesar do fracasso do maoísmo, Mao emergiu como ídolo ocidental desde 1968, enquanto se
esmagavam movimentos rebeldes estudantis, replicando ditadura ostensiva à la Stalin e similares. O autoritarismo
brutal de Mao foi questionado nos 1970, também no Ocidente, restando um gosto amargo de liderança muito
controversa, inútil na prática para melhorar a vida do trabalhador chinês, mas, mesmo assim, aclamada por
ocidentais carentes de líderes fortes. A “revolução cultural” sempre teve enorme charme, pela própria ideia de que
o caminho mais digno de transformação social é pela cultura, implicando libertação emancipatória, que deveria
impor-se à economia. Embora se possa, com algum esforço, achar um lugar na teoria marxista para a revolução
cultural, a propensão de Marx sempre foi na direção da revolução infraestrutural (econômica). Certamente este
determinismo marxista deve ser questionado, também porque Marx se livrou dela ao fim da vida, pelo menos na
Comuna de Paris. Schmidt-Salomon não contempla a  versão atual chinesa do comunismo, mas é sintomático que
sua bandeira maior seja econômica, deixando a questão comunista no segundo plano. Tem tido muito êxito
econômico, tipicamente liberal, levando o país perto da liderança mundial econômica e tecnológica (Lee, 2018.
Milanovic, 2019). É interessante que a China atual mantém uma coerência programática marxista: antes do
comunismo, há que resolver o capitalismo. Assim se fez: o investimento mais frontal e massivo chinês é na
economia, que precisa ser competitiva, produtiva, gerando a abundância material. Ideologia não rege a economia
(ao contrário da revolução cultural maoísta), pois é ao avesso. A China não está conseguindo o igualitarismo
econômico, porque é impossível sob o liberalismo, o que aparece no crescimento da concentração da renda
(Piketty, 2020). 

Outra versão asiática do marxismo surgiu no Camboja, do Khmer Vermelho, manchada por violência sem
precedentes sob a bandeira do marxismo. Foi morto um terço da população. Era punido com morte, não só o
crítico do regime, também cultos religiosos, com moralismos gritantes ditatoriais. Abateu a economia capitalista
incipiente e passou para a coletivização truculenta, o que redundou no desparecimento do sistema produtivo. O
regime de terror foi inaudito, o que tornou sua ligação com o marxismo algo totalmente cínico. Tratando-se de uma
cultura muito diferente das ocidentais, é difícil avaliar o que realmente aconteceu. O caso cubano foi visto,
primeiro, como êxito socialista na tomada do poder por Fidel Castro, embora o choque com Che Guevara,
relembre a distância entre falar de revolução e fazê-la acontecer. A necessidade de alimentar os cubanos sempre
acabou falando mais alto, endurecendo o regime respectivamente. A insistência sobre educação foi um charme
iniludível (Carnoy, 2007), mas também ambíguo, porque educação foi usada como palco de programação
ideológica: é difícil apreciar uma educação que não gera dissidentes. Cuba virou ícone do socialismo mundial,
também por conta de sua resistência aos Estados Unidos que garroteiam inclementemente sua economia, mas
tem um legado também dúbio, porque a pobreza socioeconômica (e política) persiste. 

Na América Latina o que mais chama a atenção é para a inviabilidade de política econômica alternativa,
massacrada de imediato pelo liberalismo ostensivo, e que repercute em situações de inviabilização econômica do
país, como é o caso da Venezuela: está totalmente arruinada economicamente, o que impede qualquer proposta
alternativa. Eis a diferença para a proposta chinesa atual: primeiro há que resolver a economia, mesmo que seja
pela via liberal. A arma da crítica não substitui a crítica das armas, porque é preciso substituir o poder material pelo
poder material (Dalemagne et alii, 1973). 

VII. A “TEORIA CRÍTICA” INICIAL

É importante para a cultura política da esquerda na Alemanha um grupo pequeno de intelectuais judeus, que nos
1920 iniciou a revisar a teoria marxista, sob a batuta de Horkheimer, no Instituto de Pesquisa Social em Frankfurt,
https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 10/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

tornando-se referência maior de movimentos da juventude inspirados em Marcuse, Fromm e Adorno. A questão
crucial era: i) por que na Alemanha não era viável a revolução socialista, embora as condições fossem dadas? ii)
por que a revolução leninista levava a um regime totalitário? O grupo misturava bem aportes marxistas e
freudianos e por isso podia questionar o conceito de Autoridade (Horkheimer et alii, 1936/1987). Enquanto traços
autoritários dominam a sociedade, não haveria espaço para uma revolução socialista. O proletariado, sobre o qual
a esperança recaía de sujeito revolucionário, não se apresentava como alternativa, já que mantinha traços
autoritários ostensivos. A tomada de poder do nazismo, que obrigou o Instituto a migrar para os Estados Unidos,
parecia confirmar a hipótese. Enquanto Fromm, no exílio americano com seu best-seller “Fuga da liberdade”
praticava uma análise freudomarxista exitosamente do nacional-socialismo (1989), Horkheimer e Adorno
trabalhavam no seu livro famoso “Dialektik der Aufklärung” (1969), reinventando o Iluminismo libertário. A
inteligência instrumentalista sufocava a libertação civilizatória, camuflando nova barbárie. Era visível o pessimismo
cultural envolvido (também um elitismo cultural), ao lado de um teoricismo exacerbado (Marcuse, 1994; 1966). 

A Escola de Frankfurt já foi objeto de muita crítica, em grande parte merecidamente, começando pelo
determinismo da indústria cultural (Kellner, 1989), pelo elitismo cultural e respectivo despeito pelas massas,
também pelo teoricismo exagerado, o que acabou prejudicando a continuação da Escola, que está objetivamente
extinta. Cabe acentuar, porém, que, ao contrário de outras escolas que se alinharam a Marx, esta sempre manteve
independência intelectual marcante, porque nunca abonou a ideia de filiação. Filiação é para mentes sem
autonomia suficiente. Neste sentido, pode ter sido marxista na acepção de Marx, quando alegava não ser marxista.
A mistura de Freud e Marx, embora possa ser produtiva, como parece ser sido em Fromm, pode também ajuntar
alhos e bugalhos, numa meleca pouco confiável. Schmidt-Salomon não toca na crítica ao positivismo, que foi um
dos baluartes na busca por alternativas ao método científico canônico, tendo sido uma retaguarda fundamental da
pesquisa qualitativa. 

VIII. DA “MOVA ESQUERDA” AUTORITÁRIA À RAF

Razões que levaram ao surgimento das “Novas Esquerdas” autoritárias e do movimento estudantil com elas ligado,
são múltiplas e já bem documentadas, entre elas: i) a insuficiente elaboração do nacional-socialismo  ligada com o
reconhecimento de que os nacionais-socialistas da época detinham posições de comando no establishment social
da Alemanha Oriental; ii) a indignação sobre a Guerra do Vietnã, interpretada como ato de imperialismo; iii) os
relatos recebidos com entusiasmo excessivo sobre lutas de libertação na Ásia, África e América Latina; iv) a
política mudada de educação que fazia de universidades de elite universidades de massa; v) a revolução sexual
que questionou radicalmente modelos tradicionais de relação; vi) a música pop e rock  que como megafone da
juventude rebelde no seu batimento para frente turbinava o ambiente geral de rompimento (Schmidt-Salomon,
2005:65). O acesso à literatura da teoria marxista se abriu como nunca, tendo como um dos resultados a pressão
sobre os jovens de se alfabetizarem em marxismo, se expressarem ou adornarem de fraseologia marxista,
misturando alguma abertura de expressão com dogmatismo socialista. A pretensão antiautoritária própria de gente
crítica foi recuando, dando lugar a certezas incontestáveis das esquerdas iluminadas. Vale lembrar: i) a frustração
própria da decepção da expectativa ingênua revolucionária dos agitadores (ao contrário da França que mostrou
solidariedade com os estudantes rebeldes, os trabalhadores alemães nunca o fizeram e nunca entenderam); ii) a
interpretação equivocada da situação social (os terroristas posteriores criam poder com suas ações esvaziar o
“caráter fascistoide do sistema” e com isso mobilizar as “massas”); iii) as reações desmedidas duras do Estado e
da mídia às provocações dos estudantes rebeldes (Tod Benno Ohnesorgs, Provocações de BILD contra Dutschke

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 11/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

etc.). Este aguçamento devastador em escala é bem demonstrado no exemplo da antes jornalista e depois
terrorista Ulrike Meinhof. Paralelo histórico encontra-se em Liebknecht, que, sob a pressão do sistema, de um
socialdemocrata reflexivo evolucionário virou agitador militante. 

Quanto a RAF (Rote Armee Fraktion – Fração do Exército Vermelho)


(https://pt.wikipedia.org/wiki/Fra%C3%A7%C3%A3o_do_Ex%C3%A9rcito_Vermelho), foi uma organização
guerrilheira alemã de extrema-esquerda, de 1970, e que se dissolveu em 1998, voltada para combater o “Estado
Fascista”. Num primeiro momento, houve apoio das esquerdas, mas, com o vínculo terrorista, a proposta foi se
esvaziando, em especial porque a violência extremista era usada (Wisnewski et alii, 1993). Em parte o argumento
contrário ao extremismo de esquerda se espelhava na ideia de não ser possível justificar atrocidades das
esquerdas que condenamos na direita. Ao mesmo, era impróprio pendurar tais propostas no marxismo.

IX. INFLUÊNCIA DO MARXISMO NAS ARTES E NA FILOSOFIA FRANCESA

Segundo Schmidt-Salomon, é difícil achar algum artista do século XX que não foi influenciado, de alguma forma,
pelo marxismo. Embora esta afirmação me pareça muito excessiva, desvela o quanto culturas criativas e
alternativas achavam no marxismo alguma inspiração, escavada na potencialidade utópica. Citam-se Picasso,
Kahlo, Brecht, Mann, Chaplin... Um dos motes mais usados era usar a arte para derrubar toda forma de servidão,
em nome da utopia de uma ordem mundial justa. Era claro que tais manifestações contraditavam abertamente os
socialismos reais, sem falar que preferiam o toque utópico ao científico no socialismo. A isto acresce a influência
sobre a filosofia francesa, como sobre Sartre e Camus, que também questionavam veementemente as versões do
socialismo real (Camus, 2001). Duas indagações emergiram mais provocativas: i) problema do poder (se Marx e
seguidores conseguiriam resolver o desafio de modo satisfatório); ii) a rejeição teórica e desumanidade prática de
todas as narrativas salvacionistas, inclusive marxistas. Filosofias pós-estruturalistas e pós-modernas, com grande
inspiração francesa, iriam desfraldar bandeiras importantes em termos de relativizar (sem relativismo) validades
pretendidas ou verdades consideradas universais, já que todas têm dono. 

Possivelmente, Marx não esperaria ter tamanho acato nas artes e filosofia, também porque, na interpretação mais
rígida de sua obra (althusseriana, digamos), as dimensões não infraestruturais estritas não conduzem a história.
Marx sempre acreditou que a mudança, para ser efetiva, profunda, radical e definitiva teria de provir da raiz da
sociedade, que ele chamava de infraestrutura econômica. A isto também atribuía a virtude de ser proposta
“científica”, não “utópica”. O lado determinista desta posição já não faz sentido, tanto que o impacto do marxismo
nas artes e filosofia pode ser considerado como contra-argumento: a sociedade tem infindas determinações, e
todas são, a seu modo, importantes em sua estruturação e desestruturação. As pessoas podem mudar de vida por
inúmeras razões, também não infraestruturais, como religião, sentido da vida, experiências dramáticas etc.
Continuamos acreditando que é possível ter nas artes, na filosofia, na cultura, e em outras dimensões não
materiais, aliados potenciais formidáveis de mudança.

X. O QUE RESTA DO MARXISMO?


https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 12/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

Muita água rolou desde a morte de Marx em 1883. É inegável que sua influência foi muitíssimo além do que
poderia ter imaginado, em especial muitas decorrências posteriores também contraditaram a doutrina original, em
parte como efeito natural (não sendo uma proposta acabada, a experimentação alternativa sempre está na ordem
do dia), em parte porque há muitas contradições no corpus teórico marxista, algo também natural, por tratar-se de
uma obra astronômica e que se estendeu por várias fases de desenvolvimento. O fato mais marcante foi que
socialismos reais à la versão soviética parecem pouco prováveis, embora existam iniciativas eventuais pelo
mundo, mas sem chance efetivar política econômica alternativa, já que o ambiente liberal draconiano sufoca de
imediato. Há que se levar em conta, porém, que o modelo sempre foi economicamente improdutivo, não
competitivo, induzindo a escassez, o desabastecimento, sem falar na corrupção intensa das economias
planejadas. O exemplo atual da China, que persiste comunista, mas adotou o liberalismo na economia, indica que
a versão dos socialismo real não está mais em pauta. Há nesta posição uma ortodoxia marxista bem interessante,
já que Marx sempre defendeu a ideia de que o socialismo só é viável após resolver o capitalismo, tendo como um
dos argumentos mais perspicazes que socialismo precisa lidar com a abundância material, não com a escassez. A
versão cubana também parece esgotada, embora tenha charme próprio e subsista até hoje, mas numa “bolha”. A
proposta chinesa parece ter sido um divisor de águas mais ou menos definitivo: quem se propõe chegar ao
socialismo e ao comunismo, precisa resolver a questão econômica, antes de mais nada e acima de tudo. Embora
esta tese esteja manchada pelo determinismo infraestrutural, tem sua validade relativa importante: o êxito chinês é
tipicamente econômico e tecnológico. No lado político, que está mais ou menos “de molho”, as esquerdas globais
em geral condenam a repressão, sobretudo da juventude dissidente (o caso de Hong Kong é emblemático), bem
como a repressão estatal, a vigilância digital da população, o sistema opressivo de educação voltado
obsessivamente para a competitividade e produtividade (Zhao, 2014; 2018). 

No entanto, é míope completamente olhar apenas para os percalços dos marxismos, porque isto não redime o
capitalismo, que vive enfiado em crises, uma pior que a outra (Harvey, 2014). O tema da concentração da renda
ganhou contornos vívidos, bem analisados na obra de Piketty (2020), bem como o reconhecimento crescente de
que superar a pobreza extrema não é meta digna de nota, é mera obrigação. Duvida-se que seja viável recompor o
welfare state, que prevê alocar mais da metade no meio da pirâmide socioeconômica, mesmo que seja feito ainda
insuficiente. Os países mais atrasados da África não têm nenhuma chance de, um dia, serem como os Estados
Unidos, seguindo a rota desenvolvimentista liberal... O capitalismo persiste colonialista ao extremo, imperialista,
tendo a exclusão de maiorias na sua própria lógica produtiva. Hoje talvez tenhamos de engolir que a proposta
marxista, em suas versões mais práticas, não tem resolvido o problema, com exceção – digamos – da China atual,
mas que reformulou inteiramente a proposta política e econômica. A questão da sustentabilidade também é
dramática no capitalismo, porque este não consegue ver o planeta como morada comum; vê como recurso a ser
explorado no mercado livre. Schmidt-Salomon cita uma passagem muito clarividente de Marx: “Mesmo uma
sociedade inteira, uma nação, ou todas as sociedades tomadas em conjunto, não são proprietárias da Terra. São
apenas posseiros, desfrutadores e precisam deixá-la melhorada como boni patres famílias às novas gerações”
(MEW, 1983, Vol. 25:784). 

Como atesta Milanovic (2019), “o capitalismo reina sozinho”. Por ser sistema dominante e, em geral, pouco
questionado, também porque é proibido terminantemente inventar alguma política econômica alternativa, tornou-se
dever de cada de todos. Mas é insensibilidade escrachada não auscultar no fundo dos fundos que muita gente
está insatisfeita com o capitalismo, porque não faz sentido colocar o mercado, que é meio, como fim da sociedade.
Piketty é hostilizado, por vezes, pela ortodoxia liberal, porque não acredita que o liberalismo tenha condição de
oferecer sociedades minimamente adequadas, enquanto a ortodoxia toma como uma obviedade que fora do
capitalismo não há salvação. O próprio Banco Mundial reconhece que a tendência à informalização do mercado
não tem mais volta – alguns países já têm perto de 80% da mão obra no setor informal. Uma economia na qual
caibam todos parece miragem, definitivamente. Marx tinha razão: o capital existe para o trabalho, não ao contrário.
Sua proposta falhou em muitas circunstâncias, em particular nos socialismos reais, onde, ao lado da inoperância

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 13/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

produtiva econômica a ditadura do proletariado não foi além da ditadura do partido ou da nomenclatura.
Democracias capitalistas são muito precárias, mas seriam preferíveis. 

CONCLUSÃO

No Ocidente, o marxismo em geral teve maior charme naquilo que tentou desqualificar: na utopia socialista. A ideia
de socialismo científico tem certamente muito a ver com Marx, porque, mesmo vivendo fora da academia, tinha
vida acadêmica intensa. Mas, ao adotar vieses deterministas positivistas, a teoria marxista se ressecou em grande
parte, e, em experimentos concretos de grande porte, não deu certo. Mas a chama socialista não se apaga,
sobretudo sua utopia, no bom sentido. A versão atual chinesa segue à risca o socialismo científico, imprimindo uma
velocidade inaudita de competitividade e produtividade, também de avanço tecnológico frenético, enquanto outros,
sobretudo jovens, buscam no marxismo a inspiração utópica: uma outra forma de vida, longe da determinação da
infraestrutura. 

Não se pode negar que Marx sempre percebeu que sua obra era um tipo de olhar do fenômeno capitalista e suas
teorizações tentativas aproximativas de entendê-lo, e nisto podemos encaixar a ideia tão sui generis de que ele
mesmo não se tinha por marxista. Era uma maneira de questionar versões que se queriam marxistas, mas ele não
as apadrinhava, por vê-las imaturas, pouco elaboradas, ou bajuladoras. Esta posição não oculta sua propensão
determinista em termos do curso da história, mas permite distinguir entre o Marx da luta concreta, da práxis, da
pretensão de mudança, e o Marx voltado para a pesquisa aberta, buscando entender um fenômeno imenso que ia
além de suas elaborações. 

Sua maior habilidade, contudo, não foi econômica – os socialismos reais foram economicamente desastrosos, sem
exceção – mas “utópica”, inspirando a muita gente interessada em modelos alternativos de sociedade. Foi e ainda
é, relativamente, impressionante o alcance da teorização marxista em outras esferas da sociedade não
infraestruturais, como artes, filosofia, cultura, esporte, educação etc. E isto marca uma condição que pode intrigar
a muitos: de um lado, marxismo é usado para abrir as cabeças; noutro; para fechar. Depende do contexto, do
propósito, do sentido. Não é, claro, correto identificar marxismo com crítica, porque a prática da crítica (sobretudo
autocrítica) não pode alinhar-se a autores e teorias. Marxismo como via única crítica é miopia subserviente. Crítica
autocrítica é um gesto de autoria profunda, não de alinhamento. Aí torna-se muito interessante e chamativa a
expressão de Marx de que não seria marxista, porque acena para o compromisso de não se alinhar. Gente
alinhada perdeu a cabeça. Na prática, tivemos e ainda temos marxismos fechados, obcecados, extremistas que
não combinam com a visão da libertação do trabalho humano como sentido fundamental da vida. 

Ao final, é importante refletir também sobre o recuo imenso que o marxismo sofreu na academia nas novas
gerações de estudantes. Estaria perdendo sua verve utópica também? Mantemos, porém, a convicção de que boa
formação acadêmica é crítica autocrítica, embora seja viés impróprio postular que o único jeito de ser critico é ser
marxista. Daí o charme da tirada de Marx de que, ele mesmo, não seria marxista...

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 14/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

REFERÊNCIAS

ADORNO, T. & HOBAN, W. 2020. Aspects of the new right-wing extremism. Polity. 

ALTHUSSER, L. & BALIBAR, E. 1970. Para Leer el Capital. Siglo XXI, México. 

ALTHUSSER, L. 1971. La Revolución Teórica de Marx. Siglo XXI, México. 

ALTHUSSER, L. 1980. Ideologia e Aparelhos ideológicos do Estado. Editorial Presença, Lisboa. 

BAHRO, R. 1990. Die Alternative. Zur Kritik des real existierenden Sozialismus. Berlin.

BALL, P. 2018. Beyond weird. Vintage Digital, N.Y. 

BETTELHEIM, C. 1970. A luta de classes na União Soviética. Paz e Terra. 

BLOCH, E. 1961. Zur Ontologie des Noch-Nicht-Seins. Suhrkamp. Frankfurt. 

BLOCH, E. 1995. The principle of hope. Vol. 1. MIT Press. 

BLOCH, E. 1995a. The principle of hope. Vol 2. MIT Press. 

BLOCH, E. 1995b. The principle of hope. Vol. 3. MIT Press. 

BLOCY, E. 2000. The spirit of utopia. Stanford U. Press. 

BORNER, M. 2018. „Alles, was ich weiß, ist, dass ich kein Marxist bin!" Karl Marx und der Marxismus.
Wissenschaftliche Tagung der Promovierenden in Kooperation mit den Vertrauensdozentinnen und
Vertrauensdozenten der Hans-Böckler-Stiftung – H/SOZ/KULT – https://www.hsozkult.de/event/id/event-86312

BOURDIEU, P. & PASSERON, J.C. 1975. A Reprodução - Elementos para uma teoria do sistema educativo.
Francisco Alves, Rio de Janeiro.

CAMUS, A. 2001. Der Mensch in der Revolte. Reinbek 

CARNOY, M. 2007. Cuba’s Academic Advantage: Why students in Cuba do better in school. Stanford U. Press,
Stanford. 

CHRISTENSEN, C.M. 2002. The Innovator’s Dilemma. Collins Business Essentials, Harvard.

CHRISTENSEN, C.M., CYER, J., GREGERSEN, H. 2011. The Innovator’s DNA: Mastering the five skills of
disruptive innovators. Harvard Business Review Press, Cambridge. 

COURTOIS, S. et alii. 1998. (Hg.). Schwarzbuch des Kommunismus. Unterdrückung, Verbrechen und Terror.
München. 

DALLEMAGNE, N. et alii. 1973. Die Waffe der Kritik kann die Kritik der Waffen ninch ersetzen. Verlag Olle +
Wolter. 

DEMO, P. 1983. Participação é Conquista – Noções de política social participativa. Cortez, São Paulo. 

DEMO, P. 2011. Forças e fraquezas do positivismo. https://docs.google.com/document/d/e/2PACX-


1vTN0QxDDsQI85ADHBuQRVe_mEkVVfLV3dj6PB-mioHtKH7nkIIYSTILr7xP5RnYsNT7H-P_J3iIqoll/pub

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 15/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

DEMO, P. 2019. Direitos Humanos Supremacistas à Brasileira – De como fabricar cidadanias privilegiadas –
https://drive.google.com/file/d/1q9IkToL5jPHSSfEXbJa8DAy8n-KWORjM/view

DEMO, P. 2019a. Indústria Cultural – Combate à pobreza política à la Escola de Frankfurt –


https://docs.google.com/document/d/e/2PACX-1vQd64ItDc02bhh8W5fT9wMSghAyNOke5FjjHYS-
gmWyYwUAzU5UOX9_ZWjXGc9HLYLFUbo33pAZs6NN/pub

ENGELS, F. 1924. Engels to E. Bernstein in Zurich (1882) -


https://web.archive.org/web/20100105204518/http://www.marxists.org/archive/marx/works/1882/letters/82_11_02.ht
m

ENGELS, F. 1971. Do Socialismo Utópico ao Socialismo Científico. Estampa, Lisboa. 

ERICSSON, A. & POOL, R. 2016. Peak: Secrets from the new science of expertise. Eamon Dolan/Houghton Mifflin
Harcourt, N.Y. 

FEYERABEND, P. 1977. Contra o Método. Francisco Alves, Rio de Janeiro.

FEYERABEND, P. 1979. Erkenntnis für freie Menschen. Suhrkamp, Frankfurt.

FIRESTEIN, S. 2012. Ignorance – How it drives science. Oxford University Press, Oxford. 

FROMM, E. 1989. Gesamtausgabe, Vol. 1. München 

GORENDER, J. 1999. Marxismo sem Utopia. Editora Ática, São Paulo.

HABERMAS, J. 1980. A Crise de Legitimação do Capitalismo Tardio. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro. 

HABERMAS, J. 1982. Conhecimento e Interesse. Zahar, Rio de Janeiro. 

HABERMAS, J. 1983. Para a Reconstrução do Materialismo Histórico. Brasiliense, São Paulo. 

HARARI, Y.N. 2015. Sapiens: A brief history of humankind. Harper, London. 

HARARI, Y.N. 2017. Homo Deus – A brief history of tomorrow. Harper, London. 

HARNECKER, M. 1972. Los conceptos elementales del materialismo histórico. Siglo XXI, México. (1973. Os
conceitos elementares do materialismo histórico. Santiago).

HARVEY, D. 2014. Seventeen contradictions and the end of capitalism. Profile Books, London. 

HAWKING, S.W. 2006. The Theory of Everything: The origin and fate of the universe. Phoenix Books, Beverly Hills.

HORKHEIMER, M. & ADORNO, T. 2002. Dialectic of Enlightenment. Stanford U. Press. 

HORKHEIMER, M. & ADORNO, T.W. 1969. Dialektik der Aufklärung. Frankfurt/M.

HORKHEIMER, M., FROMM, E., MARCUSE, H. et alii. 1936/1987. Studien über Autorität und Familie.
Forschungsberichte aus dem Institut für Sozialforschung. Lüneburg. 

JESTRABK, H. (Hrsg.). 2003. Rosa Luxemburg. Freidenkerin des Socialismo. Aschaffenburg.

KAKU, M. 2018.  The future of humanity: Terraforming Mars, interstelar travel, immortality, and our destiny beyond
Earth. Doubleday, N.Y.

KEHL, D. 2018. Alles, was ich Weiss, ist, dass ich kein Marxist bin”!? Zum historischen Kontext eins Marx-Zitats. 
Solidarität.Info – https://solidaritaet.info/2018/07/alles-was-ich-weiss-ist-dass-ich-kein-marxist-bin/

KELLNER, D. 1989. Critical Theory, Marxism, and Modernity. The J. Hopkins University Press, New York.

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 16/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

KELLNER, D. 1995. Media & Culture – Cultural studies, identity and politics between the modern and the
postmodern. Routledge, New York.

KONDER, L. 1989. A derrota da dialética. Editora Campus, São Paulo. 

KOTLER, S. 2014. The rise of superman: Decoding the science of ultimate human performance. Amazon
Publishing. 

LEE, K-F. 2018. AI Superpowers: China, Silicon Valley, and the new world order. Houghton Mifflin Harcourt, N.Y. 

LENIN, W.I. 1983. Ausgewählte Werke, Vol. 6. Berlin. 

LEONHARD, W. 1970. Die Dreipaltung des Marxismmus. Econ, München. 

MARCUSE, H. 1960. Soviet Marxism. Columbia U. Press. 

MARCUSE, H. 1966. Repressive Toleranz. In: Wolff, R.P./Moore, B./Marcuse, H.: Kritik der reinen Toleranz.
Frankfurt/M.

MARCUSE, H. 1994. Der eindimensionale Mensch. Studien zur Ideologie der fortgeschrittenen
Industriegesellschaft. München.  

MARCUSE, H. 2008. Razão e revolução. Paz e Terra. 

MARCUSE, H. 2015. O homem unidimensional: Estudos da ideologia da sociedade industrial avançada. Edipro. 

MARCUSE, H. 2015. Soviet Marxism, a critical analysis. Andesite Press. 

MARX, K. 1871/1970. A Guerra Civil em França. Editorial Avante -


http://www.dorl.pcp.pt/images/classicos/guerracivil.pdf

MARX, K. 1973. Contribuição para a crítica da economia política. Estampa, Lisboa. 

MARX, K. 2011. Grundrisse. Boitempo. 

MARX/ENGELS WERKE. 1983. Dietz Verlag, Berlin (Ost). 

MECKLENBURG, J. & WIPPERMANN, W. 1998. (Hg.). Roter Holocaust? Kritik des Schwarzbuch des
Kommunismus. Hamburg. 

METZL, J. 2019. Hacking Darwin: Genetic engineering and the future of humanity. Sourcebooks, N.Y. 

MILANOVIC, B. 2019. Capitalism, alone – The future of the system that rules the world. Harvard U. Press. 

MISHRA, V. 1988. Vladimir Ilich vs Rosa Luxemburg – A study based on Lenin’s writings. Marxist Internet Archive –
https://www.marxists.org/reference/archive/mishra/1988/11/x02.htm

PETROVIC, G. 1980. Die Revolution denken. In: Raddatz, F. (Hrsg.). Warum ich Marxist bin. Frankfurt. 

PIKETTY, T. 2020. Capital and Ideology. Harvard U. Press. 

PRIESTAND, D. 2009. Red Flag: A History of Communism. Grove Press, N.Y.

RINDERMANN, H. 2018. Cognitive Capitalism – Human Capital and the wellbeing of nations. Cambridge U. Press. 

ROSLING, H. 2018. Factfulness: Ten reasons we’re wrong about the world – and why things are better than you
think. Flatiron Books, N.Y. 

SCHMIDT-SALOMON, M. 1999. “Proletarier aller Länder verzeiht mir?” Pladoyer fur einen zu Unrecht angeklagten
Philosophen. Aufklärung und Kritik 2 – http://www.schmidt-salomon.de/marxismen.pdf

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 17/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

SCHMIDT-SALOMON, M. 2005. “Ich weiss nur dies, dass ich kein Marxist bin...” – Karl Marx und die Marxismen –
Aufklärung und Kritik, Sonderhefte 10/2005:53-70 - http://www.schmidt-salomon.de/marxismen.pdf

SCHMIDT-SALOMON, M. 2005a. Mythos Marx? Grundrisse des Lebens und Werks des Philosophen, Ökonomen
und Politikers Karl Marx. In: Aufklärung und Kritik Sonderheft Karl Marx. 

SHERMER, M. 2018. Heavens on Earth: The scientific search for the afterlife, immortality and utopia. Robinson,
Amazon Digital Service. 

SHUB, D. 1976. Lenin: Geburt des Bolschewismus. München. 

STEINHARDT, P. 2019. The Second kind of impossible: The extraordinary quest for a new form of matter. Simon &
Schuster, N.Y. 

TEGMARK, M. 2017. Life 3.0: Being human in the age of artificial intelligence. Knopf. N.Y.

THOMPSON, J.B. 1995. Ideologia e Cultura Moderna – Teoria social crítica na era dos meios de comunicação de
massa. Vozes, Petrópolis. 

THOMPSON, J.B. 1998. A Mídia e a Modernidade – Uma teoria social da mídia. Vozes, Petrópolis. 

WHEELER, T. 2019. From Gutenberg to Google: The history of our future. Brookings Institution Press. 

WISNEWSKI, G. et alii. 1993. Das RAF-Phantom. Wozu Politik und Wirtschaft Terroristen brauchen. München. 

WOHLFORTH, C. & HENDRIX, A.R. 2016. Beyond Earth: Our path to a new home in the planets. Pantheon, N.Y. 

WORLD BANK (WB). 2018. Poverty and shared prosperity 2018 – Piecing together the poverty puzzle.
Washington. - https://openknowledge.worldbank.org/bitstream/handle/10986/30418/9781464813306.pdf 

WORLD INEQUALITY REPORT 2018. 2019. Chancel, L. et alii (Coords.). World Inequality Lab. Paris School of
Economics  – https://wir2018.wid.world/files/download/wir2018-full-report-english.pdf

ZHAO, Y. 2014. Who is afraid of the big bad dragon: Why China has the best (and the worst) education system in
the world. Jossey-Bass, San Francisco. 

ZHAO, Y. 2018. What works may hurt – Side effects in education. Teachers College Press. 

Postado há 28th December 2020 por Prof. Pedro Demo


Marcadores: marxista

0 Adicionar um comentário

Digite um comentário

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 18/19
12/05/2023, 14:56 Ensaio 555 - Marx não foi marxista | Prof. Pedro Demo

https://pedrodemo.blogspot.com/2020/12/ensaio-555-marx-nao-foi-marxista.html?q=555 19/19

Você também pode gostar