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A desumanização da humanidade

O inferno não são os outros, pequena Hala. Eles são o paraíso,


porque um homem sozinho é apenas um animal. A humanidade
começa nos que te rodeiam, e não exatamente em ti. (p.15)

A obra resenhada, A desumanização, lançada em 2013 pela Porto Editora


Lda, em Portugal, em seguida, aqui no Brasil em 2014, pela editora Cosac Naify, é
um romance Português de 160 páginas, para ser lida com o coração. Seu autor,
Valter Hugo Mãe, nascido em Saurimo, Angola, no ano de 1971, Formado em Direito
e Literatura portuguesa moderna e contemporânea em Portugal, onde vive até hoje,
ganhou vários Prêmios, com suas publicações, entre eles o Prêmio Literário José
Saramago, 2006, com o livro o remorso de baltazar, 2004; o Prêmio Portugal
Telecom de Melhor Livro do Ano, com o apocalipse dos trabalhadores, 2011, e os
seus três últimos livros foram publicados no Brasil pela Cosac Naify. Mãe escreveu
alguns livros infanto-juvenis, entre os quais O rosto e As mais belas coisas do
mundo.
A desumanização, o mais recente romance do autor, tem como paisagem os
mistérios e as belezas dos confins da Islândia, que conta a história de Halla, uma
menina de 11 anos, que acabara de perder sua irmã gêmea, Sigridur. É Halla que
narra sua própria história, a qual é cheia de conflitos internos e externos.
Ela nos conta, por meio de seus devaneios sobre a vida, sobre sua relação
com seus pais, como será viver sem seu espelho, sua irmã gêmea. Por um lado ela
tem seu pai, um poeta, muito compreensivo com ela, lhe ensina as razões da vida,
os valores pessoais e ensinamentos de ouro por meio de seus poemas, os quais ela
tem muito carinho. De outro lado, sua mãe, sempre doente e apática com ela depois
da morte de Sigridur. A obra não mostra como era a vida dessa família antes da
morte, mas após esse terrível acontecimento, percebe-se o afastamento e a frieza
que cerca Halla e seus pais. No desenrolar da história Halla tem um envolvimento
emocional e fisíco com Einar, um garoto mais velho, que era amigo de infância das
duas irmãs, mesmo enfatizando que Sigridur aconselhara Halla a não namorar ele.
Desse envolvimento, nasce uma criança, porém não “vinga”, o que acaba
chocando Halla e Einar, que resolvem fugir juntos para outra cidade. O que é mais
chocante nessa obra é que, de um lado, uma figura materna (mãe de Halla)
totalmente violenta e que rejeita a menina dia após dia, inclusive o bebê, de outro
lado, Halla com um instinto maternal aflorado, e que apesar de ser uma criança,
assume esse filho com todo amor, na esperança de que sua falecida irmã renasça
de seu ventre.
Enfim, A desumanização de Valter Hugo Mãe, de linguagem rebuscada mas
ao mesmo tempo delicada, escrita em português de Portugal, é uma história linda,
mas ao mesmo tempo triste. Linda porque traz muitas divagações de Halla, e por ser
ela apenas uma menina, nos faz para e perceber quão maduros e sensíveis são os
seus pensamentos e sua maneira de encarar a vida. Triste porque o desfecho nos
faz pensar profundamente nessa questão da desumanização abordada na obra.
A humanidade caminhando para desumanização, essa pode ser uma das
ideias assimiladas na leitura dessa obra, já que é uma obra contemporânea, escrita
dentro de um contexto de sociedade que faz laços estreitos com a conectividade
social, e que acaba desfazendo os laços da interação, que é o que nos deixa mais
humanos.

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