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, 2017 277
ISSN 1980-5098
AVALIAÇÃO SILVICULTURAL DE DEZ ESPÉCIES NATIVAS DA MATA ATLÂNTICA
RESUMO
ABSTRACT
Along with the forecast shortage of the Amazonian forest resources is imminent the need for studies
concerning the silvicultural potential of species from other regions like the Atlantic Forest. The purpose
of this study was to evaluate the silvicultural characteristics of Astronium concinnum, Cariniana legalis,
Goniorrhachis marginata, Kielmeyera albopunctata, Lecythi pisonis, Manilkara bella, Basiloxylon
brasiliensis, Spondias venulosa, Vitex sp. and Zeyheria tuberculosa, native Atlantic Forest species occurring
in Espírito Santo state. The species were planted in full sun in pure stands, with spacing of 2 x 2 m. The
stands had ages between 21 and 25 at the time of final evaluation and were conducted at Vale Nature
Reserve, in the municipalities of Sooretama and Linhares, ES state. The variables collected and analyzed
annually were: failure of plant, plant health, breaking, forking, stem form, diameter at breast height, total
height and volumetric average annual increment. The volume was estimated using models developed
for each species. It was verified expressive faults planting only Cariniana legalis, Zeyheria tuberculosa
and Goniorrhachis marginata. Only Vitex sp. presented phytosanitary restrictions. Spondias venulosa,
Goniorrhachis marginata and Kielmeyera albopunctata stood out with the highest rates of breakage.
Goniorrhachis marginata, Manilkara bella and Basiloxylon brasiliensis stood out with the lowest levels of
bifurcation. Manilkara bella, Cariniana legalis e Zeyheria tuberculosa stood out as the form of a straight
stem form. Spondias venulosa presented an expressive and superior to other species growth. More studies are
needed to support the economic reforestation of that species, emphasis on studies of genetic improvement,
silvicultural techniques, techniques of sawing and timber technology that points out the skills to use.
Keywords: timber production; forest resources; forest management.
INTRODUÇÃO
Apesar da importância da biodiversidade e dos serviços ambientais prestados pela Mata Atlântica
para a maioria da população brasileira, monitoramentos recentes indicam que suas florestas ainda passam
por um processo contínuo de desmatamento e fragmentação (HIROTA, 2013). A drástica redução da área
de ocupação desse bioma confirma sua fragilidade e compromete sua biodiversidade.
Para a efetiva conservação da Mata Atlântica, produtores rurais devem ser envolvidos e estimulados
a adotarem práticas sustentáveis em suas propriedades, gerando benefícios ambientais e econômicos diretos.
Para isso, estudos sobre as características silviculturais das espécies nativas devem ser realizados com a
finalidade de gerar conhecimento e possibilitar o desenvolvimento de tecnologias de cultivo.
As tecnologias silviculturais amplamente desenvolvidas nas últimas décadas restringem-se a poucas
espécies arbóreas, notadamente exóticas. Na região sudeste, em especial, esse desenvolvimento se restringe
às espécies dos gêneros Pinus e Eucalyptus. A preferência pelo cultivo de espécies exóticas deve-se, dentre
outros fatores, à falta de conhecimento técnico sobre o manejo de espécies nativas e ao direcionamento do
poder público, que investiu em pesquisa e desenvolvimento tecnológico e induziu, por meio de incentivos
fiscais, o plantio de espécies exóticas (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PRODUTORES DE FLORESTAS
PLANTADAS, 2012; BRANCALION et al., 2012; YOUNG, 2003). O incentivo e o desenvolvimento
silvicultural restritos ao cultivo de espécies exóticas não só subutilizam o potencial de mercado de muitas
espécies nativas, muitas das quais raras em paisagens rurais devido à exploração irracional no passado
recente, mas limitam também a conservação e o resgate genético das mesmas, mantendo a condição de
extinção local de muitas espécies.
Não é comum na literatura científica brasileira estudos de avaliação silvicultural de espécies
nativas da Mata Atlântica. Quando estudos sobre essas espécies são publicados, geralmente se referem
a levantamentos florísticos e fitossociológicos e a componentes químicos de suas estruturas. Dados de
crescimento, quando encontrados, estão relacionados, em sua maioria, a trabalhos de recuperação
ambiental. Os dados silviculturais mais relevantes podem ser encontrados nas publicações de Carvalho
(2003; 2006; 2010).
Para melhor aproveitamento das características edafoclimáticas favoráveis e do potencial de muitas
espécies nativas para a silvicultura, é imprescindível que se conheça o comportamento silvicultural dessas
espécies em plantios experimentais. Esse conhecimento possibilitará o desenvolvimento de programas mais
amplos de cultivo dessas espécies envolvendo atividades essenciais para sua silvicultura como seleção
genética, desenvolvimento de modelos de reflorestamento e de tecnologias de produção de multiprodutos
da floresta. Ressalta-se, ainda, que, além de retornos econômicos, seria possível resgatar alguns dos serviços
ambientais prestados pelas florestas naturais.
Em geral, os estudos de potencial silvicultural de espécies nativas dão ênfase às características de
crescimento das plantas em diâmetro, altura e volume. É conhecimento comum que essas características
são de grande importância em estudos de potencial silvicultural. No entanto, outras, igualmente relevantes
para a recomendação de uso de uma espécie ou que indiquem a qualidade da madeira e o seu potencial de
Ci. Fl., v. 27, n. 1, jan.-mar., 2017
Avaliação silvicultural de dez espécies nativas da Mata Atlântica 279
uso, são negligenciadas em muitos estudos, a exemplo da taxa de sobrevivência, fitossanidade, tortuosidade
e ramificação do tronco.
Desse modo, o objetivo do presente estudo foi avaliar características silviculturais de dez espécies
aarbóreas nativas da Mata Atlântica, plantadas na forma de povoamentos puros, pretendendo-se, assim,
ampliar o conhecimento das mesmas e as possibilidades de uso.
MATERIAL E MÉTODO
O estudo foi realizado na Reserva Natural Vale (RNV), situada entre os municípios de Linhares
e Sooretama, no estado do Espírito Santo. As áreas dos povoamentos estudados pertencem à formação
denominada Tabuleiros Costeiros, cujo relevo varia de plano a suave ondulado. A altitude da área varia de
50 a 60 metros. A vegetação nativa da região é classificada como Floresta Ombrófila densa de terras baixas
(VELOSO et al., 1991).
Os solos da região são classificados como Argissolo Amarelo distrófico (KINDEL; GARAY, 2001).
Segundo Garay et al., (1995), esses solos apresentam normalmente horizonte A moderado e horizonte B
textural e uma típica pobreza química do solo.
Segundo a classificação de Köppen, o clima da região é do tipo Awi, sendo quente e úmido, com
estação chuvosa no verão e seca no inverno. Dados médios da série histórica indicam que a precipitação
média anual é de 1.283 mm (INSTITUTO CAPIXABA DE PESQUISA, ASSISTÊNCIA E EXTENSÃO
RURAL, 2012). A temperatura média anual é de 24,5ºC, com máxima de 32ºC e mínima de 17ºC. A umidade
média relativa do ar é de 83%. A velocidade média dos ventos, a 50 metros de altura, é em torno de 5 m
s-1 (AGÊNCIA DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE ENERGIA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, 2012).
As espécies avaliadas (Tabela 1) foram plantadas em povoamentos puros a pleno sol. Cada
povoamento foi implantado em uma parcela de observação de 784 m², com espaçamento de 2 x 2 metros,
totalizando 196 indivíduos. Apenas o povoamento de Basiloxylon brasiliensis foi implantado em uma área
de 588 m², com 147 indivíduos.
TABELA 1: Caracterização dos povoamentos das espécies arbóreas nativas da Mata Atlântica implantadas
em plantios puros, no espaçamento de 2 x 2 metros em Linhares - ES.
TABLE 1: Characterization of stands of native tree species of the Atlantic Forest implemented in pure
stands with spacing of 2 x 2 meters in Linhares, ES state.
Espécie Implantação Idade1 Tratos silviculturais
Astronium concinnum Schott -
nov./87 22 Adubação: 200 g de superfosfato simples por
gonçalo-alves, guaribu-preto
cova no plantio, 20 g de cloreto de potássio e 30 g
Cariniana legalis (Mart) Kuntze.
nov./87 22 de sulfato de amônio em cobertura, aos 120 dias.
- jequitibá-rosa
Controle sistemático de gramíneas. Desbastes e
Kielmeyera albopunctata Saddi. desramas circunstanciais.
nov./87 23
- nagibe
Lecythis pisonis Cambess. -
mar./88 22
sapucaia-vermelha Adubação: 200 g de superfosfato simples por
Manilkara bella Monach. - cova no plantio, 20 g de cloreto de potássio e 30 g
nov./87 22
paraju, maçaranduba-vermelha de sulfato de amônio em cobertura, aos 120 dias.
Vitex sp. - tarumã nov./87 23 Controle sistemático de gramíneas. Desbastes e
Zeyheria tuberculosa (Vell) desramas circunstanciais.
nov./87 22
Bureau ex Verl. - ipê-felpudo
Spondias venulosa (Engl) Engl. -
dez./88 21 Adubação: 200 g de superfosfato simples por cova
cajá-nativo, cajá-grande
no plantio. Controle sistemático de gramíneas.
Goniorrhachis marginata Taub. - Desbastes e desramas circunstanciais.
mar./89 21
guaribu-amarelo, itapicuru
Adubação: 250 kg/ha de superfosfato simples no
Basiloxylon brasiliensis plantio e 60 kg/ha de cloreto de potássio e 100 kg/
(Allemão) K. Schum - farinha- set./83 25 ha de sulfato de amônio em cobertura, aos 60 dias.
seca Controle sistemático de gramíneas. Desbastes
circunstanciais.
Em que: 1 Idade do povoamento, em anos, no último ano de avaliação.
quarto de Lecythis pisonis e no décimo quinto ano de Kielmeyera albopunctata. Assim, o percentual de
indivíduos de cada classificação referiu-se apenas a essas idades. Essa estratégia teve que ser utilizada
devido aos desbastes circunstanciais que eram direcionados aos indivíduos mais tortuosos.
As características qualitativas foram analisadas de forma descritiva, buscando-se identificar a
relação entre os resultados encontrados e as características ecológicas das espécies e as técnicas silviculturais
aplicadas.
O IMAv foi estimado por meio da aplicação de modelos volumétricos que tiveram suas equações
ajustadas por Martins (2012), em estudo realizado nos mesmos povoamentos. Os modelos utilizados
foram Ogaya (OGAYA, 1968) para Astronium concinnum, Kielmeyera albopunctata, Zeyheria tuberculosa
e Basiloxylon brasiliensis; Stoat (STOAT, 1945) para Lecythis pisonis e Manilkara bella; Spurr linear
(SPURR, 1952) para Vitex sp. e Cariniana legalis; e Schumacher e Hall (SCHUMACHER; HALL, 1933)
para Spondias venulosa e Goniorrhachis marginata.
Os valores médios de DAP, H e IMAv das espécies foram comparados estatisticamente pelo teste t.
A análise foi realizada somente com os dados obtidos aos 21 anos de idade dos povoamentos, maior idade
na qual todos os povoamentos foram avaliados. Apenas os povoamentos que apresentaram distribuição
normal para as referidas variáveis foram comparados pelo teste t, sendo a normalidade dos dados verificada
pelo teste de Lilliefors.
TABELA 2: Características qualitativas avaliadas nos povoamentos das espécies arbóreas nativas da Mata
Atlântica implantadas em plantios puros, no espaçamento de 2 x 2 metros em Linhares - ES,
e suas respectivas classificações.
TABLE 2: Qualitative characteristics evaluated of stands of native tree species of the Atlantic Forest
implemented in pure stands with spacing of 2 x 2 meters in Linhares, ES state, and their
respective classifications.
Característica Classificação
Planta morta
Falha de plantio
Planta viva
Árvore sadia
Árvore pouco doente (25 a 50% da árvore danificada)
Fitossanidade
Árvore muito doente (50 a 100% da árvore danificada)
Árvore morta
Árvore quebrada
Suscetibilidade à quebra
Árvore normal
Árvore bifurcada
Bifurcação
Árvore normal
Retilíneo
Levemente tortuoso
Forma do fuste
Tortuoso
Malformado
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Sobrevivência
Não foram verificadas expressivas falhas de plantio para a maioria das espécies estudadas
(Tabela 3). Apenas três espécies apresentaram valores superiores a 5%, com destaque para Cariniana
legalis. Essa observação corrobora as informações da literatura sobre as espécies, que as classificam como
potenciais heliófilas, com exceção de Cariniana legalis.
Segundo Oberbauer et al. (1993), citados por Tanaka e Vieira (2006), espécies tolerantes à sombra
são menos hábeis para se adaptar a locais abertos. Assim, Cariniana legalis pode ter apresentado restrições
ao plantio a pleno sol, pois essa espécie é classificada como secundária tardia e semi-heliófila, que não
regenera naturalmente em áreas abertas (CARVALHO, 2003).
O elevado percentual de falhas de plantio observado no povoamento de Zeyheria tuberculosa não era
esperado, uma vez que essa espécie possui plasticidade edafoclimática e capacidade de colonizar pastagens
degradadas (CARVALHO, 2003). Sua adaptabilidade a diferentes condições de luz foi confirmada por
Engel e Poggiani (1990), que registraram índices de sobrevivência de 96,3% a 100%. Carvalho (2003),
porém, registrou valores de falhas de plantio para essa espécie que variaram de 6,3% a 30,5%. O elevado
percentual de falha indica que mesmo para algumas espécies tidas como ruderais, o desenvolvimento de
tratamentos silviculturais adequados são fundamentais para o seu melhor desempenho em plantios.
Apesar de a falha de plantio ser um importante critério de avaliação silvicultural, ela não pode
encerrar uma análise da capacidade de adaptação de uma espécie em um sítio. De acordo com Andrade
(1991), a taxa de mortalidade pode ser decorrente não só da adaptabilidade da espécie, mas também de falhas
técnicas na produção e plantio das mudas, de incêndios, de ataques localizados de formigas cortadeiras ou
de outras pragas e doenças.
TABELA 3: Percentual de indivíduos (%) encontrados em cada classificação das características qualitativas
avaliadas de espécies arbóreas nativas da Mata Atlântica em plantios puros, no espaçamento
de 2 x 2 metros em Linhares - ES.
TABLE 3: Percentage of individuals (%) found in every classification of the qualitative characteristics
evaluated of native tree species of the Atlantic Forest in pure stands with spacing of 2 x 2
meters in Linhares, ES state.
Susceptibilidade
Sobrevivência Fitossanidade
à quebra
Espécie
Pouco
Falha de plantio Muito doente Morto Quebrado
doente
Astronium concinnum 1 10 1 0 9
Cariniana legalis 20 2 0 0 7
Kielmeyera albopunctata 2 1 0 0 22
Lecythis pisonis 0 3 0 0 6
Manilkara bella 3 1 0 0 11
Vitex sp. 0 19 7 0 19
Zeyheria tuberculosa 14 2 1 0 17
Spondias venulosa 2 5 1 0 30
Goniorrhachis marginata 12 5 1 1 26
Basiloxylon brasiliensis 3 1 2 0 17
Bifurcação Forma de fuste
Espécie Levemente
Bifurcado Retilíneo Tortuoso Malformado
tortuoso
Astronium concinnum 88 0 96 3 1
Cariniana legalis 34 8 83 3 6
Kielmeyera albopunctata 84 0 79 21 0
Lecythis pisonis 97 0 99 1 0
Manilkara bella 5 9 90 0 1
Vitex sp. 95 0 59 41 0
Zeyheria tuberculosa 22 6 84 7 3
Spondias venulosa 97 0 1 99 0
Goniorrhachis marginata 0 0 63 37 0
Basiloxylon brasiliensis 18 2 96 2 0
Fitossanidade
Suscetibilidade à quebra
Observou-se que os maiores percentuais de quebra tenderam a se concentrar nas espécies que
possuem madeiras com menores valores de densidade (CARVALHO, 2003; 2006; 2010; GONZAGA, 2006;
INSTITUTO DE PESQUISAS TECNOLÓGICAS DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2012; LORENZI,
2008; 2009; IBAMA, 2012), em Goniorrhachis marginata, entretanto, não seguiu essa tendência. Dentre
as espécies avaliadas, esta possui o segundo maior valor de densidade média da madeira e, ainda assim,
apresentou o segundo maior percentual de indivíduos quebrados.
A diferença na suscetibilidade à quebra de Spondias venulosa e de Basiloxylon brasiliensis, que
possuem as madeiras de mais baixa densidade e são tipicamente da fase inicial de sucessão, provavelmente,
deve-se aos diferentes padrões alométricos e às estratégias de ocupação em espécies arbóreas pioneiras,
evidenciados por Fontes (1999). Essas diferenças são evidentes ao se observar que Spondias venulosa
apresentou elevado índice de bifurcação e tortuosidade do tronco, enquanto que Basiloxylon brasiliensis
apresentou baixos índices de bifurcação e tortuosidade.
É possível que, além de fatores genéticos e externos, como a força dos ventos, algumas práticas
silviculturais adotadas, como o reduzido espaçamento inicial e os desbastes, tenham influenciado a quebra
do fuste das árvores avaliadas. Em se tratando dos desbastes, sua influência pode ter sido por meio de danos
causados durante as derrubadas e pela abertura de espaços que possibilitaram a entrada de maiores correntes
de vento. Martins et al. (1997), avaliando o impacto da exploração de madeira em florestas naturais,
observaram que, em média, 22,9 % do número total de árvores por hectare foram severamente danificadas.
A influência dos desbastes foi mais evidente quando se verificou que as idades de máxima ocorrência
de quebra foram próximas das idades de primeiro desbaste intenso, por volta de seis e sete anos. Um
exemplo é o Vitex sp., que apresentou elevado índice de quebra e passou por quatorze intervenções de
desbastes. É possível que a adoção de desbastes seletivos nesses povoamentos de alta densidade de plantas,
ao invés de sistemáticos ou mistos, possa ter influenciado nos percentuais de quebra obtidos.
Bifurcação
Goniorrhachis marginata foi a espécie que apresentou o menor percentual de indivíduos com
bifurcação de fuste. Apesar de não haver relatos de avaliação desta espécie em outros plantios, além de
fatores genéticos é possível que o espaçamento reduzido possa ter influenciado na ausência de bifurcação
nos indivíduos dessa espécie.
O comportamento de Vitex sp. concorda com o descrito na literatura para Vitex megapotâmica
(CARVALHO, 2006), apresentando ramificação dicotômica e copa irregular.
Apenas no povoamento de Cariniana legalis foram verificadas quantidades medianas de indivíduos
bifurcados, indicando que a característica bifurcação, quando manifestada, tende a ocorrer na maior parte
dos indivíduos dos povoamentos dessas espécies quando plantadas na mesma condição.
Um aspecto importante e que deve ser considerado é a altura de ocorrência da bifurcação
ou o comprimento do fuste comercial. A diferença entre a altura total da planta e a altura do fuste
comercial indica possíveis perdas de rendimento no processamento e/ou na qualidade da madeira
(MATTOS et al., 2003). Nas análises visuais de campo, observou-se que as plantas de Astronium concinnum,
Cariniana legalis e Basiloxylon brasiliensis apresentaram ramificações na parte mais alta de seus troncos
e, portanto, fustes comerciais mais extensos. Essa característica reduz possíveis perdas de rendimento no
processamento como, por exemplo, para Astronium concinnum, que apresentou um dos maiores percentuais
de indivíduos bifurcados.
O elevado índice de árvores bifurcadas encontrado para Lecythis pisonis corrobora as informações
da literatura, que a cita como espécie de forma irregular, sem dominância apical definida e ramificação
pesada sem desrama natural (CARVALHO, 2006). Contudo, a observação de indivíduos de Lecythis
pisonis remanescentes de antigas florestas indica que esta espécie, quando se desenvolve à sombra ou com
competição lateral, pode não manifestar a ramificação encontrada quando plantada a pleno sol. Alguns
autores citam espécies que apresentam comportamento semelhante, com tronco longo e livre de galhos em
plantio consorciado com uma espécie de mais rápido crescimento e tronco curto e engalhado em plantios
puros (CARVALHO, 2010; KAGEYAMA; CASTRO, 1989). Schilling et al. (1998) afirmam ainda que a
ramificação é uma característica de menor herdabilidade, sendo, portanto, muito mais afetada pelo ambiente
ou pelo espaço disponível para desenvolvimento do que por fatores genéticos.
Segundo Whatley e Whatley (1982), citados por Engel e Poggiani (1990), a capacidade de
desenvolvimento das espécies em diferentes graus de sombreamento é importante principalmente na fase
juvenil por condicionar mudanças morfogenéticas e fisiológicas. Kageyama e Castro (1989) destacam
que o conhecimento da ecologia das espécies florestais é muito importante, pois estas possuem ritmos de
crescimento e necessidades ecológicas diferentes nos diversos estágios de desenvolvimento.
Percebe-se, assim, que é muito importante o conhecimento da ecofisiologia das espécies para o
planejamento de projetos de povoamentos comerciais. Uma mesma espécie que apresenta baixo potencial
silvicultural para um determinado fim em um sistema de plantio pode responder melhor em relação a
algumas características em outro sistema (por exemplo, em plantios homogêneos ou em plantios mistos
com espécies de ritmos distintos de crescimento). Além disso, para povoamentos comerciais com produção
voltada para uso em serraria, a possibilidade de ganhos de rendimento no processamento do fuste e a
redução da necessidade de se efetuar a desrama podem determinar um significativo e positivo impacto
econômico.
Forma do fuste
De maneira geral, houve predomínio de fustes levemente tortuosos, com exceção de Spondias
venulosa, que apresentou predominância de fustes tortuosos. Isso indica que as espécies apresentaram boas
condições de fuste para produção de madeira voltada para serraria.
O povoamento de Cariniana legalis foi o que apresentou o maior índice de árvores malformadas, o
que pode estar relacionado com o elevado índice de falha de plantio. Os resultados indicam que Cariniana
legalis pode ter tido problemas adaptativos na condição em que foi plantada ou ainda que pode ter ocorrido
problemas na qualidade das mudas ou no procedimento de plantio. Para essa espécie, Silva (2013) observou
fustes retos e sem ramificações em reflorestamentos mistos, nos quais os indivíduos cresceram com
sombreamento parcial.
É provável que a alta densidade inicial de plantio (2.500 plantas ha-1) tenha influenciado na reduzida
tortuosidade da maioria das espécies. Além disso, é possível que a subjetividade intrínseca do tipo de
avaliação (avaliação visual), o número relativamente alto de categorias de classificação (4) e o rigor nas
avaliações de campo tenham resultado na baixa incidência de fustes retilíneos. Todos esses fatores podem
ter contribuído para a elevada frequência de fustes levemente tortuosos.
Dendrometria
Spondias venulosa apresentou o DAP significativamente superior ao das demais espécies avaliadas
aos 21 anos de idade (Tabela 4). O IMAv e a H dessa espécie também foram superiores ao das demais em
valores absolutos. No entanto, não foi possível verificar se essa diferença foi significativa estatisticamente.
Contudo, apesar do destacado crescimento volumétrico, essa espécie pode apresentar limitações
para a utilização em serraria, pois, nas condições avaliadas, o povoamento apresentou elevado percentual
de indivíduos bifurcados (97%) e tortuosos (99%). Em se tratando da tortuosidade, há grande perda de
rendimento no processamento da madeira, o que pode ser compensando pelo rápido crescimento da espécie.
Segundo Justiniano et al. (2001), a madeira dessa espécie pode ser usada para compensados, carpintaria
interior, molduras, embalagens e aeromodelismo, além de outros usos.
Segundo Marchesan (2012) e Rocha (2002), a dimensão da tora é um dos principais fatores que
afetam o rendimento volumétrico no processamento. Considerando um DAP mínimo para utilização em
serraria de 15 cm, Spondias venulosa, com apenas seis anos de formação, já apresentou DAP médio superior
a esse valor (Figura 1). Aos 21 anos de idade, o DAP médio do povoamento chegou a 32,3 cm.
Os povoamentos de Goniorrhachis marginata, Vitex sp. e Manilkara bella, mesmo em idades
superiores a 20 anos, produziram toras com DAP médio inferior a 15 cm (Figura 2). Por essa razão, o
plantio dessas espécies para a utilização em serraria só será economicamente viável se for obtido alto valor
TABELA 4: Valores médios de diâmetro a altura do peito (DAP), altura total (H) e incremento médio anual
volumétrico (IMAv) de espécies arbóreas nativas da Mata Atlântica em plantios puros, no
espaçamento de 2 x 2 metros em Linhares - ES, aos 21 anos de idade.
TABLE 4: Mean values of diameter at breast height (DAP), total height (H) and volumetric mean annual
increment (IMAv) of native tree species of the Atlantic Forest in pure stands with spacing of 2
x 2 meters in Linhares, ES state, at 21 years old.
Espécie DAP (cm) H (m) IMAv (m³)
Spondias venulosa 32,3 a 17,5 (-) 0,7415 (-)
Cariniana legalis 18,6 b 13,7 (-) 0,1648 (-)
Zeyheria tuberculosa 18,4 b 12,3 b 0,1987 a
Basiloxylon brasiliensis 17,9 bc 14,3 a 0,1796 ab
Kielmeyera albopunctata 17,6 bc 14,1 (-) 0,1678 b
Lecythis pisonis 16,1 c 13,4 (-) 0,1866 (-)
Astronium concinnum 15,5 cd 13,6 a 0,1373 c
Goniorrhachis marginata 14,6 d 11,9 b 0,0989 (-)
Vitex sp. 13,5 de 10,4 c 0,0850 d
Manilkara bella 12,9 e 11,7 (-) 0,1166 c
Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem significativamente entre si, pelo teste t, a 5 % de probabilidade.
(-) os dados não apresentaram distribuição normal pelo teste de Lilliefors e, portanto, não foram comparados pelo
teste t.
pecuniário no mercado, o suficiente para compensar o lento crescimento das árvores dessas espécies.
Os povoamentos de Zeyheria tuberculosa, Cariniana legalis, Basiloxylon brasiliensis, Kielmeyera
albopunctata, Astronium concinnum e Lecythis pisonis, apresentaram valores médios de DAP iguais ou
superiores a 15 cm apenas nas idades de 15, 16, 17, 17, 17 e 18 anos, respectivamente. Como as dimensões
mínimas de corte dessas espécies foram relativamente próximas, a escolha daquela(s) a ser(em) implantada(s)
em plantios comerciais dependerá do valor de mercado da madeira de cada espécie.
Considerando um DAP mínimo para utilização em serraria de 20 cm, apenas os povoamentos de
Basiloxylon brasiliensis e Spondias venulosa apresentaram DAP médio superior a esse valor no último ano
de avaliação (Figura 1). O povoamento de Basiloxylon brasiliensis atingiu DAP superior a 20 cm após 23
anos de formação, já Spondias venulosa, entre 10 e 11 anos. Isso mostra que o (longo) tempo necessário
para se obter o retorno econômico com o plantio das demais espécies avaliadas poderia inviabilizar um
investimento.
Drumond et al. (1998) verificaram em plantios de eucalipto com oito anos de idade na região dos
Tabuleiros Costeiros, em Sergipe, valores de DAP variando de 8,9 a 9,7 cm para Corymbia citriodora, de
9,3 cm para Eucalyptus grandis e de 9,1 a 10,5 cm para Eucalyptus urophylla. Apenas os povoamentos
de Kielmeyera albopunctata, Lecythis pisonis, Zeyheria tuberculosa, Astronium concinnum e Spondias
venulosa apresentaram valores de DAP semelhantes ou superiores aos obtidos por esses autores. Dentre
essas espécies, destacam-se o Astronium concinnum, com DAP médio de 11 cm, e Spondias venulosa,
com DAP de 18 cm, na referida idade. Todavia, é necessário avaliar as características que influenciam no
rendimento da produção madeireira, como tortuosidade e bifurcação.
De forma geral, as espécies apresentaram incremento médio anual volumétrico (IMAv) máximo em
idades precoces (Figuras 3 e 4). Constata-se que o espaçamento de plantio reduzido antecipou a competição
entre os indivíduos e que os desbastes realizados não foram realizados no tempo e em intensidades suficientes
para evitar a estagnação do crescimento.
Carvalho (2003; 2006; 2010) apresentou dados de crescimento de plantios de espécies nativas em
diversas idades e em diferentes Estados do Brasil. Zeyheria tuberculosa apresentou IMAv variando de
5,65 a 24,00 m³ ha-1 ano-1 e DAP médio variando de 15,1 a 22,4 cm. Cariniana legalis apresentou valores
de IMAv variando de 4,30 a 21,70 m³ ha-1 ano-1 e DAP médio variando 3,0 a 17,3 cm. Lecythis pisonis
FIGURA 1: Diâmetro a altura do peito (DAP) médio das cinco espécies arbóreas nativas da Mata Atlântica
de maior crescimento, implantadas em plantios puros no espaçamento de 2 x 2 metros em
Linhares - ES.
FIGURE 1: Diameter at breast height of the average (DAP) of five native tree species of the Atlantic Forest
of highest growth, implemented in pure stands with spacing of 2 x 2 meters in Linhares, ES
state.
FIGURA 2: Diâmetro a altura do peito (DAP) médio das cinco espécies arbóreas nativas da Mata Atlântica
de menor crescimento, implantadas em plantios puros no espaçamento de 2 x 2 metros em
Linhares - ES.
FIGURE 2: Diameter at breast height of the average (DAP) of five native tree species of the Atlantic Forest
of smaller growth, implemented in pure stands with spacing of 2 x 2 meters in Linhares, ES
state.
apresentou DAP médio variando de 2,6 a 21,0 cm. Vitex sp. apresentou DAP médio variando de 4,1 a 9,5
cm. Silva (2013) apresentou uma estimativa de DAP de 21 cm para Cariniana legalis aos 20 anos em
sítios de produtividade moderada. Segundo Carpanezzzi (1996), citado por Carvalho (2010), plantios com
espécies nativas no sul do país possuem produtividade média anual estimada em 8 m³ ha-1 em rotação de
40 anos.
Os baixos crescimentos diamétrico e volumétrico alcançados após o longo período de avaliação
para a maioria das espécies são fatores importantes a serem considerados, pois podem inviabilizar plantios
comerciais dessas espécies. Nesse caso, o melhoramento genético e a definição de práticas silviculturais
mais adequadas visando à produção madeireira, inexistentes para essas espécies, é imprescindível.
Contudo, deve-se considerar que os solos de Tabuleiros Costeiros são pobres em nutrientes e possuem
FIGURA 3: Incremento médio anual volumétrico (IMAv) das cinco espécies arbóreas nativas da Mata
Atlântica de maior crescimento, implantadas em plantios puros no espaçamento de 2 x 2
metros em Linhares - ES.
FIGURE 3: Average annual volume increment (IMAv) of five native tree species of the Atlantic Forest of
highest growth, implemented in pure stands with spacing of 2 x 2 meters in Linhares, ES state.
FIGURA 4: Incremento médio anual volumétrico (IMAv) das cinco espécies arbóreas nativas da Mata
Atlântica de menor crescimento, implantadas em plantios puros no espaçamento de 2 x 2
metros em Linhares - ES.
FIGURE 4: Average annual volume increment (IMAv) of five native tree species of the Atlantic Forest of
smaller growth, implemented in pure stands with spacing of 2 x 2 meters in Linhares, ES state.
horizonte superficial arenoso de baixa capacidade de retenção de nutrientes e água (GARAY et al., 2003;
LIMA NETO et al., 2009) e que talvez as práticas corretivas adotadas na época podem não ter amenizado
essas deficiências. É provável ainda que a não utilização do critério técnico de desbaste com base no máximo
incremento médio anual em volume possa ter influenciado negativamente nos crescimentos apresentados.
Ressalta-se a importância de estudos de tecnologia da madeira que visem identificar os usos mais
apropriados, contribuindo, assim, para o melhor aproveitamento dessas e outras espécies nativas. Esses
estudos devem também levar em consideração a idade dos indivíduos plantados.
A escolha de uma ou outra espécie para plantios econômicos pode ser também influenciada pela
possibilidade de comercialização de produtos florestais não madeireiros, como a comercialização de castanhas
e frutos para Lecythis pisonis e Spondias venulosa, respectivamente (INHETVIN, 2010; JUSTINIANO
et al., 2001), já que a produção dos mesmos poderia gerar rendimentos periódicos intermediários até se
chegar no corte final do povoamento.
CONCLUSÕES
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a empresa Vale S.A. pela disponibilização dos dados e apoio nos trabalhos de
campo no âmbito do projeto: “Estudos de Silvicultura Tropical, Ecologia e Manejo Florestal e Recuperação
de Áreas Degradadas”, por meio de convênio realizado entre a empresa e a Universidade Federal do Espírito
Santo/Departamento de Ciências Florestais e da Madeira.
REFERÊNCIAS
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p. 48-52, 1945.
TANAKA, A.; VIEIRA, G. Autoecologia das espécies florestais em regime de plantio de enriquecimento
em linha na floresta primária da Amazônia Central. Acta Amazonica, Manaus, v. 36, n. 2, p. 193-204, 2006.
VELOSO, H. P.; RANGEL FILHO, A. L. R.; LIMA J. C. A. Classificação da vegetação brasileira
adaptada a um sistema universal. Rio de Janeiro: IBGE, 1991. 123 p.
YOUNG, C. E. F. Economia do Extrativismo em Áreas de Mata Atlântica. In: SIMÕES, L. P.; LINO, C. F.
(Org.). Sustentável Mata Atlântica: a exploração de seus recursos florestais. 2. ed. São Paulo: SENAC,
2003.
WHATLEY, J. M.; WHATLEY, F. R. A luz e a vida das plantas. São Paulo: EPU/EDUSP, 1982. 101
p. (Temas de Biologia, 30).