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A LEI DAS S / A
COMENTADA
VOLUME I
ARTIGOS 1 o A 120
QUARTIER LATIN
A LEI DAS S/A
COMENTADA
VOLUME I
ARTIGOS 1 o A 1 2 0
Sociedade Anônima
Coordenação:
Rodrigo R. Monteiro de Castro
Leandro Santos de Aragão
Fusões e Aquisições
Aspectos Fiscais e Societários - V edição
lan Muniz
Reorganização Societária
Coordenação:
Rodrigo R. Monteiro de Castro
Leandro Santos de Aragão
PRINCÍPIOS UNIDROIT
Relativos aos Contratos Comerciais
Internacionais
Editor-Responsável:
loão Baptista Villela
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ARTIGOS 1 ° A 1 2 0
QUARTÍER LATIN
Editora Quartier Latin do Brasil
Rua Santo Amaro, 316 - CEP 01315-000
Vendas: Fone (11) 3101-5780
Email: quartierlatin@quartierlatin.art.br
Site: www.quartierlatin.art.br
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EB DAS § / A
Comentada
ARTIGOS 1 ° A 1 2 0
ISBN 85-7674-576-3
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo,
especialmente por sistemas gráficos, microíílmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográficos.
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ticas gráficas da obra e à sua editoração. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art. 184
e parágrafos do Código Penal), com pena de prisão e multa, busca e apreensão e indenizações diversas
!arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais).
COLABORADORA NO VOLUME I:
ANDRÉA BRAGA
A Flávia, com amor.
AGRADECIMENTOS E NOTAS INTRODUTÓRIAS
CAPÍTULO I
CARACTERÍSTICAS E NATUREZA DA COMPANHIA
o u SOCIEDADE ANÔNIMA
Art. I o Características 25
Art. 2° Objeto social 30
Art. 3 o Denominação 40
Art. 4 o Companhia aberta e fechada 50
Art. 4°-A 51
CAPÍTULO I I
CAPITAL SOCIAL
Seção I
.>
Valor
Art. 5 o Fixação no estatuto e moeda 88
Art. 6 o Alteração 97
Seção II
Formação
Art. 7 Dinheiro e bens
o 99
Art. 8 Avaliação
o 102
Art. 9 Transferência dos bens
o H2
Art. 10. Responsabilidade do subscritor 115
CAPÍTULO I I I
AÇÕES
Seção I
Número e Valor Nominal
Art. 11. Fixação no estatuto
Art. 12. Alteração 127
Seção II
Preço de Emissão
Art. 13. Ações com valor nominal 134
Art. 14. Ações sem valor nominal 138
Seção III
Espécies e Classes
Art. 15. Espécies 142
Art. 16. Ações ordinárias 150
Art. 17. Ações preferenciais 154
Art. 18. Vantagens políticas 172
Art. 19. Regulação no estatuto 177
Seção IV
Forma
Art. 20 184
Art. 21. Ações não integralizadas 186
Art. 22. Determinação no estatuto T 186
Seção V
Certificados
Art. 23. Emissão 187
Art. 24. Requisitos 188
Art. 25. Títulos múltiplos e cautelas 190
Art. 26. Cupões 191
Art. 27. Agente emissor de certificados 191
Seção VI
Propriedade e Circulação
Art. 28. Indivisibilidade 194
Art. 29. Negodabilidade 198
Art. 30. Negociação com as próprias ações 200
Art 31. Ações nominativas 220
Art. 32. Ações endossáveis 226
Art. 33. Ações ao portador 226
Art. 34. Ações escriturais 227
Art. 35 231
Art. 36. Limitações à circulação 236
Art. 37. Suspensão dos serviços de certificados 240
Art. 38. Perda ou extravio 243
Seção VII
Constituição de Direitos Reais e outros Ônus
Art. 39. Penhor 244
Art. 40. Outros direitos e ônus 250
Seção VIII
Custódia de Ações Fungíveis
Art. 41 263
Art. 42. Representação e responsabilidade 271
Seção IX
Certificado de Depósito de Ações
Art. 43 275
Seção X
Resgate, Amortização e Reembolso
Art. 44. Resgate e amortização 280
Art. 45. Reembolso 293
CAPÍTULO I V
PARTES BENEFICIÁRIAS
Art. 46. Características
Art. 47. Emissão 306
CAPÍTULO V
DEBÊNTURES
Seção I
Direito dos Debenturistas
Art. 53. Emissões e séries 329
Art. 54. Valor nominal 331
Art. 55. Vencimento, amortização e resgate 337
Art. 56. Juros e outros direitos 345
Art. 57. Conversibilidade em ações 349
Seção II
Espécies
Art. 58 358
Seção III
Criação e Emissão
Art. 59. Competência 367
Axt. 60. Limite de emissão 380
Art. 61. Escritura de emissão 386
Art. 62. Registro 390
Seção IV
Forma, Propriedade, Circulação e Ônus
Art. 63 394
Seção V
Certificados
Art. 64. Requisitos 400
Art. 65. Títulos múltiplos e cautelas 404
Seção VI
Agente Fiduciário dos Debenturistas
Art. 66. Requisitos e incompatibilidades 404
Art. 67. Substituição, remuneração e fiscalização 412
Art. 68. Deveres e atribuições 416
Art. 69. Outras funções 428
Art. 70. Substituição de garantias e modificação da escritura 430
Seção VII
Assembleia de Debenturistas
Art. 71 433
Seção VIII
Cédula de Debêntures
Art. 72 442
Seção IX
Emissão de Debêntures no Estrangeiro
Art. 73 446
Seção X
Extinção
Art. 74 451
CAPÍTULO V I
BÔNUS DE SUBSCRIÇÃO
Art. 75. Características
Art. 76. Competência 463
Art. 77. Emissão 465
Art. 78. Forma, propriedade e circulação 467
Art. 79. Certificados 469
CAPÍTULO V I I
CONSTITUIÇÃO DA COMPANHIA
Seção I
Requisitos Preliminares
Art. 80 471
Art. 81. Depósito da entrada 481
Seção II
Constituição por Subscrição Pública
Art. 82. Registro da emissão 484
Art. 83. Projeto de estatuto 492
Art 84. Prospecto 501
Art. 85. Lista, boletim e entrada 508
Art. 86. Convocação de assembleia 512
Art. 87. Assembleia de constituição 514
Seção III
Constituição por Subscrição Particular
Art. 88 519
Seção IV
Disposições Gerais
Art 89 523
Art. 90 526
Art 91 ..527
Art. 92 529
Art. 93 532
CAPÍTULO V I I I
FORMALIDADES COMPLEMENTARES DA CONSTITUIÇÃO
CAPÍTULO I X
LIVROS SOCIAIS
CAPÍTULO X
ACIONISTAS
Seção I
Obrigação de Realizar o Capital
Art. 106. Condições e mora
Art. 107. Acionista remisso
Art. 108. Responsabilidade dos alienantes 582
Seção II
Direitos Essenciais
Art. 109 585
Seção III
Direito de Voto
Art. 110. Disposições gerais 619
Art. 111. Ações preferenciais 628
Art. 112. Não exercício de voto pelas ações ao portador 639
Art. 113. Voto das ações empenhadas e alienadas fidudariamente 640
Art. 114. Voto das ações gravadas com usufruto 644
Art. 115. Abuso do direito de voto e conflito de interesses 650
Seção IV
Acionista Controlador
Art. 116. Deveres 664
Art. 116-A 665
Art. 117. Responsabilidade 682
Seção V
Acordo de Acionistas
Art 118 » 700
Seção VI
Representação de Acionista Residente
ou Domiciliado no Exterior
Art 119 730
Seção VII
Suspensão do Exercício de Direitos
Art. 120. 731
CAPÍTULO I
Características
"Art. I o . A companhia ou sociedade anônima terá o capital divi-
dido em ações, e a responsabilidade dos sócios ou acionistas será
limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas."
18 ANDRÉ TUNC. Le Droit Anglais lies Sociétés Anonymes. 4a edição, Paris: Economica, p. 18.
§ 3 o A c o m p a n h i a pode ter por objeto participar de outras socie-
dades; ainda que não prevista no estatuto, a participação é facul-
tada como meio de realizar o objeto social, ou para beneficiar-se
de incentivos fiscais."
Sobre esse assunto, ver os arts. 287 e 295 do Código Comercial de 1850 (Lei n° 556/1850),
os arts. 2 o e 3 o do Decreto n° 434/1891 e o art. 2 o do Decreto-Lei n° 2.627/1940.
Ari. 72 da Lei n° 4.137/1962, que foi revogada pela Lei n° 8.884/1994.
TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. I, 2 a edição, Rio de Janeiro:
Forense, 1953, p. 77.
assim, na expressão escrita do motivo para a congregação de inte-
resses das partes em torno da celebração do contrato plurilateral
de sociedade.
Ao se referir ao objeto social como a razão para o empreendi-
mento, pode-se inferir uma idéia de causa do contrato de sociedade; o
objeto social representa, portanto, uma enunciação dos objetivos
empresariais dos contratantes, a fixação das atividades negociais que
foram motivo para a constituição da sociedade.
Nesse sentido, a noção de objeto social repousa na atividade ne-
gociai da empresa, como tal entendida a seqüência ordenada e habi-
tual de atos ou negócios jurídicos de conteúdo econômico, praticados
profissionalmente e com intuito de lucro22.
O § I o determina que a companhia é mercantil ainda que tenha
por objeto atividade civil. A comercialidade decorre do fato de a
sociedade adotar a forma anônima, e não do seu objeto. Dessa forma,
a Lei das S.A. estabelece que toda sociedade anônima se rege pelas
leis e usos do comércio.
O objeto social pode ser compreendido sob 2 (dois) ângulos de
análise: o formal e o substancial23.
Sob o ângulo formal, o objeto social corresponde à definição es-
tatutária da empresa de fins lucrativos, não contrária à lei, à ordem
pública e aos bons costumes; constitui, nesse sentido, uma disposição
estatutária, descrevendo, de modo preciso e completo (§ 2 o ) o âmbito
da atividade empresarial a ser desenvolvida pela companhia.
Já sob o ângulo substancial, o objeto social corresponde, concre-
tamente, às atividades realmente desenvolvidas pela companhia com
finalidades lucrativas.
NELSON E1ZIR1K. Temas de Direito Societário. Rio de Janeira: Renovar, 2005, p. 249-250.
T Ú L I O A S C A R E L L I , "Sviluppo Storico dei Diritto Commerciale". In: Saggi di Diritto
Commerciale. Milano: Giuffrè, 1955, p. 31, observa que: "L'aUività è um fatio di durala (...)
che há perciò um inizio, una fine, una localizzazione nello spazio e che potrà venire
considerata indipendenlemente dal singolo atto, anche insede di conflílli di !egge".
dos. Com efeito, como o objeto social corresponde à empresa, e como
esta corresponde à atividade, a variação dos meios para a consecução
de tal atividade não implica, em princípio, em desvio ou alteração do
objeto social26.
O objeto social pode compreender mais de uma atividade negoci-
ai, congregando diferentes ramos empresariais27. Nesse caso, trata-se
de uma companhia com mais de um objeto essencial, pois atua em
diferentes setores de atividade empresarial.
No direito brasileiro, a sociedade anônima pressupõe sempre a
intenção de lucro. Além da condição da lucratividade, o objeto da
sociedade anônima não poderá ser contrário à lei, à ordem pública
e aos bons costumes. Dessa forma, são também requisitos do obje-
to a sua licitude e a sua possibilidade. A licitude será examinada
pelo Registro Público de Empresas Mercantis quando do arquiva-
mento do ato de constituição da sociedade ou da alteração do esta-
tuto social28.
A possibilidade do objeto social pode ser verificada no momento
da constituição da sociedade, da modificação do objeto ou posterior-
mente. A princípio, a impossibilidade pode sugerir uma idéia apenas
de averiguação da possibilidade no âmbito jurídico. Na realidade, este
ELISABETTA BERTACCHINI. Oggetto Sociale e Interesse Tutelato nelle Società per Azioni.
Milano: Giuffrè, 1995, p. 75.
G I A N L U C A L A V I L L A . L' Oggetto Sociale ..., p. 114.
E U S A B E T T A B E R T A C C H I N I . Oggetto Sociale e Interesse Tutelato nelle Società per
Azioni ..., p. 83.
Na Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, explica-se a razão pela qual os autores
do anteprojeto de lei encamparam, na Lei das S.A., o requisito da precisão do objeto
social, já contido na Lei n° 4.137/1962: "Prescreve que o objeto social seja definido de
modo preciso e completo (art. 2 5 2°), o que constitui providência fundamentai para
defesa da minoria, pois limita a área de discricionariedade de administradores e acionistas
majoritários e possibilita a caracterização de modalidades de abuso de poder". Ver A L F R E D O
LAMY FILHO e JOSÉ L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA. A Lei das S.A. (pressupostos, elaboração,
aplicação). Rio de Janeiro: Renovar, 1992, p. 215.
Sobre esse assunto, FLÁV1A PARENTE. O Dever dc Diligência dos Administradores de
Sociedades Anônimas. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 134, assinala que "os administra-
dores estão, portanto, sujeitos às restrições impostas pela cláusula estatutária que define o
objeto social. Em outras palavras, tal cláusula define o alcance dos atos que os administrado-
res estão autorizados a praticar".
ção dos poderes e das finalidades da companhia, os quais, em parte,
estão contidos no objeto social.
Assim, quando o administrador pratica um ato estranho ao obje-
to social, está ultrapassando os limites que lhe foram impostos, o que
pode acarretar sua responsabilização. Nessa situação, surge uma in-
tensa discussão sobre a eventual responsabilidade da sociedade em
razão daquele ato.
O direito anglo-saxão introduziu o conceito do ato ultra vires,
com vistas a não responsabilizar a sociedade por atos não incluídos
em seu escopo, definido no objeto social34. Nesse sentido, o ato não
vincularia a sociedade perante o terceiro que tivesse celebrado o ne-
gócio jurídico com a sociedade, por intermédio de seu administrador,
pensando tratar-se de ato regular. ,
Como conseqüência da rigidez na aplicação dessa teoria, ainda
que o negócio jurídico redundasse em proveito para a sociedade ou
que o enquadramento do negócio ao objeto social fosse controverso,
estaria a sociedade desobrigada de responder por ele em virtude de o
ato do administrador ter sido considerado ultra v i r e f s .
Tendo em vista a insegurança jurídica decorrente da incerteza da
responsabilização da sociedade por um determinado ato, flexibilizou-se
a regra para que o terceiro de boa-fé fosse resguardado quando não
36 Sobre o assunto, ver L U I Z C A S T Ã O PAES DE BARROS LEÃES, " O Alcance das Limitações
Estatutárias ao Poder de Representação dos Diretores", Revista de Direito Renovar ..., v. 12,
p. 134-140.
37 ANNE GINERET-BROBBEL D O R S M A N . La GMBH & CO.KG allemande et Ia "Commandite
à responsabilité limitée" française: une iilustration de Ia liberte contractuelle eu droit des
sociétés. Paris: L.G.D.J., 1998, p. 166-167, demonstra que, no direito francês, nota-se um
declínio da importância do objeto social. Isso ocorreu porque nas sociedades de respon-
sabilidade limitada, mesmo para os atos praticados pelos administradores em contrarieda-
de ao objeto social, a sociedade é responsabilizada, prevalecendo o interesse da lei em
proteger os terceiros. Essa tendência da minimização da importância do objeto social
verifica-se, também, no direito norte-americano. A lei do estado de Delaware, que é um
estado reconhecidamente avançado no regramento do direito societário, não exige que o
objeto social seja definido precisamente. N a realidade, a lei apenas exige que o objeto
social seja lícito e que seja permitido à sociedade anônima, por lei, realizar aquela ativida-
de, conforme § 102, number 3, Delaware Code, Title 8: "(3) The nature of lhe business or
purposes to be conducted or promoted. It shall be sufficient to state, either alone or with
other businesses or purposes, Chat Che purpose of Clie Corporation rs to engage in any lawful
ací v
' 'ty for which corporations may be organized under the General Corporation Law
ot Delaware, and by such statemenC ali lawful acts and activities shall be within the purposes
of the Corporation, except for express limitations, if any".
38 O art. 29 da Lei n° 8.934/1994 estabelece que "qualquer pessoa, sem necessidade de
provar interesse, poderá consulCar os assentamentos existentes nas juntas comerciais e obter
certidões, mediante pagamento do preço devido".
inútil a publicidade do registro. Assim, não de pode sempre presumir
o conhecimento do objeto por parte de terceiros, cabendo uma análi-
se da situação concreta.
Em princípio, a companhia é responsável pelos atos ultra vires
de seus administradores, eximindo-se se provar que o terceiro tinha
conhecimento do estatuto ou, se, face à sua atividade profissional,
deveria ter diligenciado em conhecê-lo. Diversamente do que ocorre
com o homem comum, o banqueiro ou o empresário, por exemplo,
usualmente examinam, por intermédio de seus advogados, o estatuto
da companhia com a qual contratam.
Outro aspecto relevante quanto à definição do objeto social pre-
ciso e completo refere-se à incidência do artigo 206, inciso II, alínea
"b". A inaptidão da sociedade para alcançar seu fim, isto é, exercer sua
atividade empresarial definida estatutariamente e produzir lucros pode
ocasionar a sua dissolução. Assim, o descumprimento dos propósitos
sociais - exercer atividade empresarial lucrativa - possibilita a acio-
nistas que representem 5% (cinco por cento) ou mais do capital social
o requerimento de sua dissolução.
Reconhecida a relevância do objeto social, entende-se a razão
pela qual o legislador atribuiu o direito de recesso ao acionista que
discordar de sua alteração (artigo 136, inciso VI, e 137). Entretanto,
não é qualquer alteração ou modificação no dispositivo estatutário
que regula o objeto social que dá ao acionista dissidente o direito de
retirar-se da companhia. Para que se justifique o direito de retirada, é
indispensável que a modificação do objeto social seja substancial, de
forma que passe a sociedade a atuar em outro ramo de negócios, o
que pode implicar alteração do risco empresarial assumido pelo acio-
nista39. A mudança do objeto consiste no exercício de atividade di-
versa daquela para a qual a sociedade foi constituída40 (P- scb°.
O Código Civil faz referência apenas às expressões firma ou denominação. O art. 1.155
estabelece que "considera-se nome empresarial a firma ou a denominação adotada, de
conformidade com este Capítulo, para o exercício de empresa".
MODESTO C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, v. 1, 5 a edição,
Sao Paulo: Saraiva, 2007, p. 25.
TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. !, Rio de Janeiro: Forense,
1959, p. 85. Nesse mesmo sentido, C A R L O S F U L G Ê N C I O D A C U N H A PEIXOTO. Socie-
dades por Ações. v. 1, São Paulo: Saraiva, 1972, p. 24.
ALFREDO LAMY FILHO e JOSÉ L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA. A Lei das S.A. Rio de Janeiro:
Renovar, 1992, p. 216.
de um objeto social, o que torna impossível a designação dos fins da
companhia4'.
Porém, em evidente retrocesso, o Código Civil de 2002, ao tratar
dos institutos complementares ao direito de empresa, previu um
regramento próprio para o nome empresarial, no qual determina
que a sociedade anônima utilize denominação designativa do objeto
social43.
Apesar de a Lei das S.A representar lei especial em face do Có-
digo Civil, conforme o reconhecimento feito pelo próprio Código49,
não é possível afastar a aplicação de dispositivo que se refere especifi-
camente à sociedade anônima e é posterior à Lei n° 6.404/197650.
Dessa forma, não se está diante de uma prescrição genérica da
lei sobre a qual seja possível sobrepor o dispositivo especial, oriundo
de uma lei sistematicamente concebida para tratar do instituto da
sociedade anônima31. Ainda que este artigo da Lei das S.A. seja mais
lógico, verossímil e de maior utilidade prática, já que reconhece as
deficiências do sistema em que a denominação social demanda a
47 Conforme os comentários feitos ao art. 2 o da Lei das S.A., há uma tendência no direito
comparado de minimizar a importância da definição precisa e completa do objeto social.
A maior exteriorização dessa tendência encontra-se na forma como o direito do estado de
Delaware trata do assunto, apenas exigindo que o objeto seja lícito e que seja permitido à
sociedade anônima, por lei, realizar aquela atividade. Por essa razão, a necessidade de
indicar o objeto social na denominação demonslra-se ainda mais anacrônica e imprópria,
uma vez que a própria definição de objeto social já se encontra mitigada.
48 Art. 1.160 do Código Civil: "A sociedade anônima opera sob denominação designativa do
objeto social, integrada pelas expressões 'sociedade anônima' ou 'companhia', por extenso
ou abreviadamente. Parágrafo único. Pode constar da denominação o nome do fundador,
acionista, ou pessoa que haja concorrido para o bom êxito da formação da empresa".
49 Art 1.089 do Código Civil: "A sociedade anônima rege-se por lei especial, aplicando-se-lhe,
nos casos omissos, as disposições deste Código".
50 Art. 1.160 do Código Civil.
51 O tratamento de matéria afeta à sociedade anônima no Código Civil torna-se mais anacrô-
nico se considerarmos que a tendência das legislações é o abandono das amplas codificações
que, preíensamente, esgotam o regramento jurídico sobre determinado ramo do direito ou
lhe sen/em como norte, constituição aplicável a determinado ramo, e a adoção dos chama-
dos microssístemas legislativos, informados pela aplicação da Constituição Federal. Nesse
sentido, o Código Civil vem na direção contrária a essa tendência. Sobre o assunto, ver
GUSTAVO TEPEDINO, "Premissas Metodológicas para a Constitucionalização do Direito
Civil". In: Temas de Direito Civil, Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 1-22.
menção ao objeto social, o Código Civil tratou do assunto especifica-
mente52, revogando tacitamente o referido artigo 3o53.
Assim, retorna-se ao sistema anterior à vigente Lei das S.A., em
que as companhias precisavam fazer referência ao objeto social, ain-
da que de maneira genérica. De fato, a referência genérica ao objeto
social - "indústria e comércio", "exportação e importação", "comércio
de bens" - já basta para o cumprimento da exigência legal para as
companhias criadas desde a entrada em vigor do Código Civil de
2002. As companhias criadas sob a égide da Lei n° 6.404/1976, em
respeito ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido, não precisarão
alterar suas denominações para atenderem a essa exigência54.
Todavia, deve ser salientado que a parcela genérica da denomi-
nação não gozará da mesma proteção atribuída às palavras ou expres-
sões que guardem peculiaridade e especificidade e que atendam ao
princípio da novidade55. A este respeito, é importante mencionar que
o direito de uso exclusivo da denominação redunda do respeito ao
princípio da veracidade e da novidade.
Assim, a companhia tem exclusividade sobre a sua denomina-
ção social, pois, como aludido anteriormente, essa representa sua iden-
tidade (§ 2 o ). Tal disposição visa a impedir a concorrência desleal,
assim como a evitar que as conseqüências no abalo de crédito de uma
companhia prejudiquem outra.
66 Sobre esse assunto, ver decisão da 4 a Turma do Superior Tribunal de Justiça proferida nos
autos do Recurso Especial n° 6.169, Rei. Min. Athos Carneiro, j. em 25.06.1991, publica-
do no DJU em 12.08.1991.
67 Isso foi o decidido recentemente pelo Superior Tribunal de Justiça, em caso em que se
pretendia a proteção nacional pela aplicação da Convenção da União de Paris, em detri-
mento do caráter estadual do Registro Público de Empresas Mercantis e do Código Civil de
2002, que previu a proteção em âmbito estadual. Decidiu-se que: "não há que se falar em
extensão da proteção legal conferida às denominações de sociedades empresárias nacionais
a todo o território pátrio, com fulcro na Convenção da União de Paris, porquanto, conforme
interpretação sistemática, nos moldes da lei nacional, mesmo a tutela do nome comercial
estrangeiro somente ocorre em âmbito nacional mediante registro complementar nas Juntas
Comerciais de todos os Estados-membros" (Decisão da 4 a Turma do Superior Tribunal de
Justiça proferida nos autos dos Embargos de Declaração no Agravo Regimental ao Recurso
Especial n° 653.609, Rei. Min. Jorge Scartezzini, i. em 19.05.2005, publicado no DJU em
27.06.2005).
68 P. R. TAVARES PAES. Nova Lei da Propriedade Industrial. São Raulo: Revista dos Tribunais,
1996, p. 83.
69 O art. 122 da Lei n° 9.279/1996, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade
industrial, determina que "são suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visual-
empresarial, com órgãos competentes para o registro e proteção regidos
por leis diversas70. A denominação social pode ou não coincidir com
eventual marca, sendo prudente o registro em ambos os locais, por
parte do empresário, para evitar possíveis coincidências entre uma
parte de uma denominação, como um nome fantasia, com uma marca
já detida por outra sociedade.
O caput deste artigo veda a utilização do vocábulo "companhia"
ao final. Isso porque poderia ocorrer confusão com a firma de socie-
dade em comandita simples ou de sociedade em nome coletivo e,
antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002, com a da socie-
dade de capital e indústria71. Entretanto, a entrada em vigor do Códi-
go Civil afastou essa proibição.
Ainda segundo o caput e também no regime do Código Civil, a
denominação deverá conter alternativamente o vocábulo "sociedade
anônima" ou "companhia", por extenso ou abreviadamente72.
O § I o permite a adoção do nome de um fundador, acionista ou
pessoa que tenha colaborado para o desenvolvimento da empresa. A
utilização de um nome civil, mesmo que de maneira elogiosa e com o
intuito de homenagem, é recomendada apenas quando se tem a au-
torização do seu titular, se ele estiver vivo, ou de seus herdeiros, se
mente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais" e no arl. 123 conceitua como
"I - marca de produto ou serviço: aquela usada para distinguir produto ou serviço de outro
idêntico, semelhante ou afim, de origem diversa; II - marca de certificação: aquela usada para
atestar a conformidade de um produto ou serviço com determinadas normas ou especificações
técnicas, notadamente quanto à qualidade, natureza, material utilizado e metodologia em-
pregada; e III - marca coletiva: aquela usada para identificar produtos ou serviços provindos
de membros de uma determinada entidade".
A confusão não ocorre sem razão. No passado, os nomes comerciais eram requeridos como
marca de fábrica e comércio e era proibido o registro de uma marca que contivesse um
nome comercial de que o requerente do registro da marca não fosse titular. Sobre o assunto,
ver JOSÉ CARLOS T I N O C O SOARES. Nome Comercial. São fòulo: Atlas, 1968, p. 14-18.
SÉRGIO C A M P I N H O . O Direito de Empresa à Luz do Novo Código Civil ..., p. 338. A
sociedade de capital e indústria não é tipo societário existente no Código Civil de 2002.
Art 1.160 do Código Civil, que assim dispõe: "A sociedade anônima opera sob denomina-
ção designativa do objeto social, integrada pelas expressões 'sociedade anônima' ou 'com-
panhia', por extenso ou abreviadamente. Parágrafo único. Pode constar da denominação o
nome do fundador, acionista, ou pessoa que haja concorrido para o bom êxito da formação
da empresa".
estiver morto; a sua utilização sem permissão poderá redundar na
obrigação de modificar o nome futuramente ou de ressarcir o titular
do nome por eventuais prejuízos73. Tal consentimento pode se dar de
forma expressa ou tácita, representando o silêncio uma forma de as-
sentimento. Uma vez dado o consentimento, ele será irrevogável.
Merece relevo o fato de a utilização de nome civil - assim como
a utilização de expressões genéricas - não gozar de exclusividade por
ser possível a existência de nomes civis iguais ou semelhantes74.
A denominação também pode incluir uma sigla pela qual a com-
panhia é mais conhecida. No entanto, nada impede que a companhia
adote uma sigla sem que a mesma conste da denominação social. Em
ambos os casos, como nome empresarial e marca são elementos distin-
tos, com registros em autoridades diversas, vale ser registrada a marca
que se funde em sigla da denominação social para uma maior proteção.
Nos atos e publicações referentes à companhia em constituição,
deve ser acrescentado à denominação a expressão "em organização",
por força de norma da Lei das S.A. (artigo 91). Nesse mesmo sentido,
em todos os atos ou operações que ocorrerem no curso da liquidação
de uma companhia, deve constar o acréscimo de "em liquidação" à
denominação social (artigo 212). No caso de recuperação judicial, tam-
bém vige a exigência, por força da Lei n° 11.101/2005, da inclusão da
expressão "em recuperação judicial"75. No caso das sociedades anôni-
mas estrangeiras, pode-se incluir as palavras "do Brasil" ou "para o
Brasil" às suas denominações oriundas do país de origem76.
Conforme determina a Rule 506 (b) (2) (ii), da SEC norte-americana. Sobre o assunto, leia-se A.
S O R O G H A N . Priva te Offerings: Determining 'Access', 'Investment Sophistication' and 'Ability
to Bear Economic Risk. Securities Regulation Law Journal, Rochester: Thomsom-West, v. 8,
1980. D e acordo com LOUIS LOSS. Fundamentais of Securities Regulation. Boston: Little
Brown and Company, 1988, p. 336: "the re/evant inquiry should be whether the investor can
understand and evaluate the nature of the risk based upon the information supplied to him".
Sobre investidor qualificado, ver o art. 4° da Instrução C V M n° 476/2009 c/c o art. 109 da
Instrução C V M n° 409/2004, com alterações introduzidas pelas Instruções C V M n™ 411/
2004 e 450/2007.
Sobre o assunto, ver Doran v. Petroleum Management Corp., reproduzido em R I C H A R D W.
JENNINGS, H A R O L D MARSH JR. and J O H N C. COFFEE JR. Securities Regulation, Cases
Como o registro tem uma natureza basicamente instrumental,
se os investidores estão de posse de informações que lhes possibili-
tem uma tomada de decisão consciente, não há porque obrigar a com-
panhia emissora a proceder ao registro da oferta perante a Comissão
de Valores Mobiliários. A possibilidade de acesso a tais informações
pode ser presumida caso os ofertados possuam alguma espécie de vín-
culo com a companhia emissora, o qual pode decorrer de fatores como
relações familiares, de amizade, de emprego ou de negócios91.
Assim, no caso de distribuição de valores mobiliários em decor-
rência do exercício do direito de preferência, não há, por definição,
oferta pública, dado o prévio relacionamento existente entre a com-
panhia emissora e os subscritores92. E m tal hipótese, não há necessi-
dade de efetivação do registro, uma vez que já se encontram à
disposição dos acionistas informações necessárias a uma decisão cons-
ciente de investimento93. ;
and Materials. New York: The Foundation Press, 1992, p. 336-337, do qual consta: "The
requirement that ali offerees have available the information registration would provide has
been firmly established by this court as a necessary condition of gaining the private offering
axemption. More specifically, w e shall require on remand that the defendanls demonstrate
that ali offerees, whalever their expertise, had available the information a registration
statement would have afforded a prospective investor in a public offering".
O art. 3 o , § I o , da Inslrução C V M n° 400/2003 expressamente ressalva que não se caracte-
riza como pública a oferta realizada a um grupo de pessoas que mantenha "prévia relação
comercial, creditícia, societária ou trabalhista, estreita e habitual, com a emissora".
Ver o Parecer CVM/SJU n° 005/1986.
Sobre esse assunto, ver a Nota Explicativa C V M n° 19/1980.
LOU1S LOSS. Fundamentais of Securities Regulation ..., p. 338-339.
A utilização dos elementos subjetivos ora comentados para definir
a natureza de determinada oferta de venda de valores mobiliários é ex-
pressamente reconhecida em nosso ordenamento jurídico95. Para a ca-
racterização da oferta como pública ou privada, embora sejam relevantes
os meios utilizados na colocação dos títulos, o elemento essencial e
decisivo refere-se à situação dos ofertados. Independentemente dos
meios utilizados no processo de oferta, determinada distribuição de va-
lores mobiliários não deve ser considerada pública se os ofertados, além
de pessoas certas ou determinadas, forem investidores qualificados e,
em função de suas relações com a companhia emissora ou do fato de
deterem "poder de barganha" perante esta, tiverem acesso ao mesmo
tipo de informação que seria exigido em decorrência do registro96.
OFERTA PÚBLICA COM ESFORÇOS RESTRITOS
O art. 4 o , § 1°, inciso VII, da Instrução C V M n° 400/2003, com a redação dada pela
Instrução C V M n° 482/2010, permite à C V M dispensar o registro das ofertas públicas de
venda de valores mobiliários dirigidas exclusivamente a investidores qualificados, desde
que, nos termos do § 4 o , inciso I, os subscritores declarem que: (i) têm conhecimento e
experiência em finanças e negócios suficientes para avaliar os riscos e o conteúdo da oferta
e que são capazes de assumir tais riscos; e que (ii) tiveram amplo acesso às informações que
julgaram necessárias e suficientes para a decisão de investimento, notadamente aquelas
normalmente fornecidas no Prospecto.
N E L S O N EIZIRIK. Aspectos Modernos do Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar,
1992, p. 21.
Instrução C V M n° 476/2009, com as alterações introduzidas pelas Instruções CVM 488/
2010 e 500/2011.
Determina o art. 6 o da Instrução C V M n° 476/2009 que: "As ofertas públicas com esforços
restritos estão automaticamente dispensadas do registro de distribuição de que trata o
caput do art. 19 da Lei n° 6.385, de 1976".
A Comissão de Valores Mobiliários define como investidores
qualificados: (i) as instituições financeiras; (ii) as companhias segura-
doras e sociedades de capitalização; (iii) as entidades abertas e fecha-
das de previdência complementar; (iv) pessoas físicas ou jurídicas que
possuam investimentos financeiros em valor superior a RS 300.000,00
(trezentos mil reais) e que, adicionalmente, atestem por escrito sua
condição de investidor qualificado mediante termo próprio; (v) os fun-
dos de investimento destinados exclusivamente a investidores quali-
ficados; e (vi) os administradores de carteira e consultores de valores
mobiliários autorizados pela Comissão de Valores Mobiliários, em
relação a seus recursos próprios, observado que: (a) todos os fundos
de investimento são considerados investidores qualificados, mesmo
que se destinem a investidores não qualificados; e (b) as pessoas na-
turais ou jurídicas mencionadas na alínea "(iv)" acima deverão subs-
crever ou adquirir, no âmbito da oferta, valores mobiliários no montante
mínimo de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais)99.
A disciplina da oferta pública de distribuição de valores mobiliá-
rios com esforços restritos tem por fim assegurar: mais agilidade nas
ofertas mediante dispensa do seu registro e de companhia aberta; a
redução dos custos das ofertas, facilitando o acesso dos emissores ao
mercado de capitais; e mais segurança aos emissores quanto à exi-
gência de registro.
Somente podem ser objeto de oferta pública com esforços
restritos de distribuição os seguintes valores mobiliários: (i) notas
comerciais; (ii) cédulas de crédito bancário que não sejam de
responsabilidade de instituição financeira; (iii) debêntures não
conversíveis ou não permutáveis por ações; (iv) cotas de fundos de
investimento fechados; (v) certificados de recebíveis imobiliários ou
do agronegócio; (vi) letras financeiras, desde que não relacionadas a
100 Art. I o , § 1 o , da Instrução CVM n° 476/2009, com as alterações introduzidas pelas Instru-
ções CVM n~ 488/2010 e 500/2011.
I 01 Art. 3 o da Instrução CVM n° 476/2009. Os subscritores ou adquirentes dos valores mobi-
liários deverão apresentar declaração atestando que estão cientes de que: (i) a oferta não foi
registrada na CVM; e (ii) os valores mobiliários ofertados estão sujeitos às restrições de
negociação previstas na Instrução CVM n° 476/2009 (art. 7o).
102 Art 15 da Lei n° 6.385/1976 e art. 2° da Instrução CVM n° 476/2009. Determina, ainda,
essa Instrução que às ofertas públicas com esforços restritos não se aplicam a Instrução
CVM n° 400/2003 e as demais normas da CVM relativas ao procedimento de distribuição
de valores mobiliários específicos (art. 5o), salvo as normas de conduta previstas no art. 48
- exceto o inciso III - que deverão ser observadas (art. 12).
103 Art. 2 o , parágrafo único, da Instrução CVM n° 476/2009.
104 Art 9o, caput, da Instrução CVM n° 476/2009.
prestadas, pela adequação do investimento ao perfil do investidor, bem
como pela guarda, pelo prazo de 5 (cinco) anos, de todos os docu-
mentos relativos à oferta105.
Os investidores qualificados, que adquirirem ou subscreverem
valores mobiliários ofertados com esforços restritos, ficam sujeitos a
um período de restrição de negociação ilock up) de 90 (noventa) dias,
contado da data da subscrição ou aquisição106. Após esse período, os
valores mobiliários poderão ser negociados nos mercados de balcão
organizado e não organizado, mas não em Bolsa de Valores, exceto se
o emissor possuir registro na Comissão de Valores Mobiliários. No
caso de cotas de fundos de investimento, a negociação nesses merca-
dos (balcão organizado e não organizado) será admitida se os fundos
estiverem registrados para funcionamento junto à Comissão de Va-
lores Mobiliários 107 .
Assim, a inexigibilidade do registro do emissor permite que emis-
sores não registrados como companhias abertas — tais como sociedades
anônimas fechadas e sociedades limitadas - utilizem o instrumento.
Podem ser objeto de uma oferta com esforços restritos, por exemplo,
notas promissórias emitidas por uma sociedade limitada e debêntures
emitidas por sociedade anônima fechada.
105 Sobre os deveres do intermediário líder da oferta, ver o art. 11 da Inslrução CVM n° 476/2009.
106 Art. 13 da Instrução CVM n° 476/2009.
107 Art. 14 da Instrução C V M n° 476/2009.
blica e é expressamente previsto em lei, estando, ademais, detalhada-
mente disciplinado por atos normativos da Comissão de Valores
Mobiliários 108 .
O pedido de registro de oferta pública de distribuição de valores
mobiliários deve ser apresentado pelo ofertante emissor em conjunto
com a instituição financeira intermediária da oferta109. Dentre os do-
cumentos que devem obrigatoriamente instruir o pedido de registro,
merece destaque o prospecto da distribuição pública, o qual constitui
o principal documento de caráter informativo a ser fornecido pela
companhia110-111.
Considerando-se, por um lado, a importância de que o prospecto
seja levado ao conhecimento dos investidores antes da tomada de
108 O art. 19, caput, da Lei n° 6.385/1976, determina que "nenhuma emissão pública de
valores mobiliários será distribuída no mercado sem prévio registro na Comissão". Ver, tam-
bém, art 4 o , § 2°, da Lei das S.A., bem como a Instrução C V M n° 400/2003, alterada pelas
Instruções C V M n ra 429/2006, 442/2006, 472/2008, 482/2010 e 488/2010.
109 N E L S O N E I Z I R I K , A R 1 Á D N A B. G A A L , F L Á V I A P A R E N T E e M A R C U S D E FREITAS
HENRIQUES. Mercado de Capitais - Regime jurídico ..., p. 152-160. Tal pedido deverá
estar instruído com os documentos e as informações constantes do Anexo II à Instrução
C V M n° 400/2003, com as alterações introduzidas pela Instrução C V M n° 429/2006.
110 Tal documento, nos termos dos arts. 38 e 39 da Instrução C V M n° 400/2003, com as
alterações introduzidas pela Instrução C V M n° 482/2010, deve conter informação "com-
pleta, precisa, verdadeira, atual, clara, objetiva e necessária, em linguagem acessível, de modo
que os investidores possam formar criteriosamente a sua decisão de investimento" a respeito
(i) da oferta; (ii) dos valores mobiliários objeto da oferta e dos direitos que lhe são
inerentes; (iii) do ofertante; (iv) da companhia emissora e sua situação patrimonial, econô-
mica e financeira; (v) de terceiros garantidores de obrigações relacionadas com valores
mobiliários objeto da oferta; e (vi) de terceiros que venham a ser destinatários dos recursos
captados com a oferta. Outros detalhes a serem trazidos ao conhecimento do público por
meio do prospecto estão previstos no Anexo III da referida Instrução C V M n° 400/2003,
com a alteração introduzida pela Instrução C V M n° 482/2010. O prospecto não pode
omitir dados relevantes nem incluir informações que possam induzir a erro, devendo estar
redigido de maneira clara e precisa.
111 Note que, com as alterações introduzidas pela Instrução C V M n° 482/2010 à Instrução
C V M n° 400/2003, todas as informações sobre a emissora passaram a constar apenas do
Formulário de Referência, o qual deve ser periodicamente atualizado pelas companhias. O
Prospecto deve conter apenas informações sobre os valores mobiliários ofertados e as
características e condições da oferta. O Formulário de Referência substituiu, assim, todas as
seções do Prospecto que continham informações sobre a emissora, devendo ser incorpora-
do ao Prospecto, fisicamente ou por referência ao endereço eletrônico em que pode ser
encontrado. A única exceção é o "Sumário do Emissor", que passou a ser facultativo e, se
incluído no Prospecto, deverá: (i) ter no máximo 15 (quinze) páginas; (ii) ser consistente
com o Formulário de Referência; (iii) informar, com destaque, que as informações comple-
tas sobre a emissora estão no Formulário de Referência; e (v) indicar os 5 (cinco) principais
fatores de risco relativos à emissora.
decisão quanto à compra dos valores mobiliários ofertados, e, por ou-
tro, o fato de que a regulamentação vigente não proíbe a existência de
esforço de vendas antes da concessão do registro pela Comissão de
Valores Mobiliários, essa Autarquia autoriza a utilização, pelo ofer-
tante, do chamado prospecto preliminar112.
As informações constantes do prospecto preliminar, por ainda
não terem sido analisadas pela Comissão de Valores Mobiliários, su-
jeitam-se à complementação e correção, devendo esta possibilidade
ser expressamente informada aos potenciais investidores.
Os investidores poderão efetuar reservas de subscrição ou aqui-
sição com base no prospecto preliminar, as quais somente serão con-
firmadas após o registro da oferta, quando o prospecto definitivo deve
ser disponibilizado aos investidores.
Outro documento que deve ser submetido pelo ofertante com o
pedido de registro de oferta pública, em determinadas situações espe-
cíficas, é o chamado estudo de viabilidade econômica113-114. A exi-
gência de apresentação desse estudo está motivada pela obtenção de
informações mais aprofundadas de companhias cuja atuação ainda
119 Nos lermos do arL 19, § 6o, da Lei n° 6.385/1976, a C V M deve subordinar o registro de
distribuição ã divulgação das informações' necessárias à proteção dos investidores, tal
como exigidas pela regulamentação administrativa.
120 NELSON EIZIRIK. Aspectos Modernos de Direito Societário ..., p. 11-12.
121 Nesse sentido, o Anexo Iii à Instrução C V M n° 400/2003, com a alteração introduzida pela
Instrução CVM n° 482/2010, determina que o prospecto da oferta pública deve expressa-
mente informar que o registro da distribuição não implica, por parle da CVM, garantia de
veracidade das informações prestadas ou um julgamento da qualidade da companhia
emissora ou dos valores mobiliários a serem distribuídos.
Com a entrada em vigor da Lei n° 6.404/1976, todas as compa-
nhias abertas passaram a ser submetidas a um mesmo tratamento
legal e regulamentar, independentemente dos valores mobiliários de
sua emissão que estavam sendo objeto de distribuição no mercado de
valores mobiliários.
No entanto, tal disciplina, uniforme para todas as companhias
abertas, revelou-se, depois de algum tempo, inadequada, por 2 (duas)
razões básicas: não se compatibilizavam as normas regulamentares,
particularmente as referentes à divulgação de informações, com as
reais necessidades dos investidores, que variam em função das dife-
rentes espécies de valores mobiliários; e, assim, custos desnecessários
eram impostos às companhias emissoras.
A regulação do mercado de capitais, particularmente no que se
refere às exigências de disclosure, deve visar a um nível ótimo, que
significa maior proteção possível aos'investidores ao menor custo para
as emissoras de valores mobiliários; dada a competição para a capta-
ção de recursos, em escala global, verifica-se crescente tendência no
sentido da redução dos custos da regulação122.
Com a edição da Lei n° 10.303/2001, admitiu-se a existência de
níveis diferenciados de regulação entre as companhias abertas. Como
a norma do § 3 o do artigo 4 o não é auto-executável, a Comissão de
Valores Mobiliários editou ato normativo por meio do qual estabele-
ceu 2 (duas) categorias de emissores de valores mobiliários, quais se-
jam: (i) categoria A, na qual admite-se a negociação de quaisquer
valores mobiliários em mercados; e (ii) categoria B, que autoriza a
negociação de valores mobiliários em mercados regulamentados, ex-
ceto os seguintes: a) ações e certificados de depósito de ações; ou b)
valores mobiliários que confiram ao titular o direito de adquirir os
títulos mencionados na alínea "a", em conseqüência de sua conver-
131 Arts. 15 e 19, § 4 o , da Lei n° 6.385/1976 e art. 3 o , § 2°, da Instrução C V M n° 400/2003, com
a redação dada pela Instrução C V M n° 482/2010.
132 A distribuição pública de valores mobiliários sem a intermediação de instituição financeira
é considerada infração grave, de acordo com o art. 59, inciso III, da Instrução C V M n° 400/
2003, com as alterações introduzidas pelas Instruções C V M n1* 429/2006, 442/2006, 472/
2008, 482/2010 e 488/2010.
133 A respeito do consórcio de underwriters, ver os arts. 34 e 36 da Instrução C V M n° 400/
2003, com as alterações introduzidas pelas Instruções C V M n™. 429/2006, 442/2006, 472/
2008, 482/2010 e 488/2010.
134 Sobre underwriting, ver NELSON EIZIRIK, A R I Á D N A B. GAAL, FLÁVIA PARENTE e MARCUS
DE FREITAS HENRIQUES. Mercado de Capitais - Regime Jurídico ..., p. 163-187.
A C O N S U L T A S O B R E A V I A B I L I D A D E DA O F E R T A E A C O L E T A DE I N T E N Ç Õ E S
DE INVESTIMENTO (BOOKBUILDINC)
135 Sobre os riscos do processo de oferta pública, ver N E L S O N EIZIRIK, "Negócio Jurídico de
Underwriting - Questões Contemporâneas". In: Ecio Perin Júnior, Daniel Kalansky e Luiz
Peyser (Coord.). Direito Empresarial. Aspectos Atuais de Direito Empresarial Brasileiro e
Comparado. São Paulo: Método, 2005, p. 249-263.
13 6 Art. 43, caput e § 2°, da Instrução C V M n° 400/2003, com a redação que lhe foi dada pela
Instrução C V M n° 482/2010.
137 Art. 43, § I o , da Instrução C V M n° 400/2003.
investimento, com ou sem o recebimento de reservas, a partir da
divulgação do prospecto preliminar e do protocolo do pedido de registro
de distribuição junto ã Comissão de Valores Mobiliários138. Por meio
do referido procedimento, os underwriters buscam identificar a demanda
pelostítulos,aferindo o interesse do mercado pela nova emissão mediante
as diversas propostas de compra recebidas dos potenciais destinatários139.
De posse de tais informações, os underwriters, em conjunto com a
companhia emissora, fixam o preço de lançamento das ações140.
O valor apurado no procedimento de bookbuilding vem sendo
considerado, na prática, como indicativo do preço de mercado para as
ações que ainda não são negociadas no mercado secundário, razão
pela qual a fixação do preço de emissão das ações com base em tal
procedimento atenderia ao disposto no artigo 170, § I o . A adequação
do valor apurado no procedimento de bookbuilding ao critério estabe-
lecido no inciso III do artigo 170 - cotação das ações em Bolsa de
Valores ou no mercado de balcão organizado — constitui uma presun-
ção relativa, podendo ser elidida mediante prova em contrário. Ape-
sar do bookbuilding fundamentar-se nas intenções de investimento
apresentadas pelos investidores consultados pelo coordenador líder,
este dispõe de ampla discricionariedade no momento de escolher as
propostas que serão levadas em consideração para a fixação do preço
final, uma vez que a regulação vigente não determina os critérios que
deverão orientar tal decisão.
Diante da falta de parâmetros legais ou regulamentares, pode ocorrer
a manipulação do procedimento de bookbuilding por parte do
underwriter. E possível que o processo de bookbuilding conduza à fixação
1 - O P A PARA C A N C E L A M E N T O DE R E G I S T R O DE C O M P A N H I A A B E R T A
159
Art. 24, § 3 o , da Instrução C V M n° 361/2002.
De acordo com o § 7 o do art. 24 da Instrução C V M n° 361/2002, "a ata da assembleia
especial a que se refere este artigo indicará, necessariamente, o nome dos acionistas que
Se a nova avaliação resultar em valor superior ao originalmente ofe-
recido, não poderá prosseguir a oferta pública nas condições originais;
porém, o ofertante não terá a obrigação de adquirir as ações de emissão
da companhia por um preço superior ao que se dispusera a pagar.
Na hipótese acima, o ofertante deverá informar, mediante publi-
cação de fato relevante no prazo de 5 (cinco) dias, contados da apre-
sentação do laudo de revisão, se concorda em pagar o valor apurado
na nova avaliação ou se desiste da oferta pública e, consequentemen-
te, do fechamento de capital da companhia161.
1 . 4 - RESGATE DAS AÇÕES REMANESCENTES APÓS
o CANCELAMENTO DO REGISTRO
votarem a favor da proposta de realização de uma nova avaliação, para efeito de eventual
aplicação do § 3o do art. 4°-A da Lei 6.404/1976".
161 Art. 24, inciso IV, da Instrução C V M n° 361/2002.
162 O art. 25-A, incluído na Instrução C V M n° 361/2002 pela Instrução CVM n° 487/2010,
determina que: "O preço do resgate de que trata o § 5o do art. 4° da Lei n" 6.404, de 1976,
deverá ser acrescido de juros à taxa Selic, ou, caso deixe de ser calculada, outra taxa que venha
a substituí-la, desde a data da liquidação da OPA até a data do depósito do resgate. § Io Nas
ofertas para cancelamento de registro cuja contraprestação incluir valores mobiliários: I - o
pagamento do resgate deve ser feito em valores mobiliários da mesma espécie e classe daqueles
oferecidos na OPA; e II - havendo contraprestação também em moeda corrente, o pagamento
do resgate compreenderá: a) a mesma quantidade por ação de valores mobiliários oferecidos
na OPA; e b) o valor em moeda corrente por ação oferecido na OPA, acrescido de juros, nos
termos do caput".
normalmente após a aquisição de 90% (noventa por cento) ou 95%
(noventa e cinco por cento) das ações da companhia163.
Assim, permite-se que a assembleia geral delibere o resgate ape-
nas das ações pertencentes aos acionistas minoritários, permanecen-
do o acionista controlador com a titularidade de suas ações, visto que
estas não são consideradas ações em circulação.
O resgate previsto no § 5 o não depende de aprovação em assem-
bleia especial das ações resgatadas, uma vez que a norma expressamen-
te afastou a incidência do § 6 o do artigo 44. Dessa forma, o § 5 o instituiu
uma nova modalidade de resgate; ao contrário das operações realizadas
com fundamento no artigo 44, são resgatadas as ações pertencentes
apenas aos acionistas minoritários remanescentes, sem sorteio.
A intenção do legislador foi a de permitir que a companhia que
cancelou o registro como aberta não seja obrigada a manter, indefini-
damente, nos seus quadros sociais, uma quantidade muito pequena de
acionistas, possuidores de menos de 5% (cinco por cento) do capital, o
que poderia representar custos desnecessários para a companhia fecha-
da, com serviços de emissão e registro, transferência e guarda de ações.
Tal modalidade de resgate pode ser aprovada, conforme previsto
no § 5 o , após a realização da oferta pública de cancelamento de regis-
tro de companhia aberta e desde que tal oferta tenha efetivamente
resultado no fechamento de capital da companhia164.
CAPITAL SOCIAL
SEÇÃO I
VALOR
controlador solicitar à C V M autorização para não realizar a OPA por aumento de participa-
ção, desde que se comprometa a alienar, para pessoas que não sejam a ele vinculadas, o
excesso de participação no prazo de 3 (três) meses, a contar da ocorrência da aquisição. A
CVM poderá prorrogar uma única vez este prazo, caso verifique, a requerimento do interes-
sado, que a alienação de todo o bloco no prazo inicial poderá afetar significativamente as
cotações das ações na Bolsa de Valores ou no mercado de balcão organizado em que estejam
admitidas à negociação. Caso as ações não sejam alienadas no prazo e na forma previstos, o
acionista controlador deverá apresentar à C V M requerimento de registro de OPA por aumento
de participação no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do término do prazo de 3 (três) meses
acima referido, e, neste caso, poderá ser obrigado a promover a OPA independentemente do
valor eventualmente apontado no processo de revisão solicitado pelos minoritários.
Sobre a origem do conceito de capital social e o especial relevo que adquiriu no âmbito
das sociedades anônimas, T U L U O ASCARELLI. Problemas das Sociedades Anônimas e
Direito Comparado. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 322-326, enfatiza que a "função econô-
mica da sociedade anônima, não pode ser preenchida, a não ser se reconhecida a respon-
sabilidade limitada dos sócios (...). Afinal, a constituição da pessoa jurídica e do patrimônio
separado representa apenas um meio técnico para que os sócios possam exercitar o comér-
cio com responsabilidade limitada (...). Avista, entretanto, da atividade da sociedade
anônima, o seu patrimônio não é estático, não sofre alterações apenas ocasionais, ou
excepcionais; sofre, ao contrário, variações diárias, sendo continuamente diverso seja na
Os princípios que norteiam o capital social são: (i) o da unidade, que
significa que o capital social é único, ainda que a companhia tenha diver-
sasfiliais;(ii) o da fixidez, pelo qual, uma vez definido o capital no estatu-
to social, só pode ser alterado nos casos taxativamente previstos na Lei
das S.A. (artigos 166,168,169,170 e 173); (iii) o da realidade, pelo qual o
capital estipulado no estatuto deve ser real, ou seja, efetivamente forma-
do no ativo da companhia mediante contribuição dos acionistas subscri-
tores das ações; e (iv) o da intangibilidade, segundo o qual os acionistas e
administradores não podem transferir bens do ativo social para o patri-
mônio dos sócios caso o montante do capital social aplicado no ativo
fique reduzido a valor inferior ao fixado no estatuto168.
No plano econômico, o capital pode ser considerado como o
conjunto de recursos com que conta a companhia para o desenvolvi-
mento de suas atividades169. Sob o aspecto contábil, o capital social é
uma conta integrante do patrimônio líquido; nesse sentido, determi-
sua composição, seja na sua importância. Por isso a constituição do patrimônio separado
levanta, nesta hipótese, problemas diversos dos peculiares ao direito comum tradicional:
estes problemas decorrem justamente do fato de, o patrimônio separado nas sociedades
anônimas, ser o instrumento de uma atividade comercial. Cumpre, portanto, de um lado,
proporcionar, aos terceiros, uma tutela no que respeita à gestão da sociedade, respeitada,
entretanto, a necessária elasticidade e liberdade de gestão. É por isso que, especialmente
nos sistemas romanísticos, foi-se elaborando o conceito de capital social, e foram-se
estabelecendo normas que respeitam a integridade deste. Estas normas não deixam de
aparecer nas outras sociedades, em que também, é conhecido o conceito de capital social,
mas adquirem particular relevo nas sociedades anônimas, justamente porque, nestas, os
sócios não respondem pelas dívidas sociais". M A U R O R O D R I G U E S P E N T E A D O . Aumen-
tos de Capital das Sociedades Anônimas. Saraiva: São Paulo, 1988, p. 13, fazendo referên-
cia a Ascarelli, obseiva que "o capital social aparece, assim, nos sistemas legais de filiação
romano-germânica, como um instituto destinado a tornar possível a limitação da responsa-
bilidade, mediante um conjunto de normas inderrogáveis, inclusive de natureza penal,
que visam tutelar aquele patrimônio especial, subtraído do conjunto geral de bens dos
sócios, para formar a base patrimonial da sociedade".
1
JOSÉ L U I Z B U L H Õ E S P E D R E I R A . Finanças e Demonstrações Financeiras da Companhia;
Conceitos Fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2 a edição, 1989, p. 420-422. Ainda
sobre esse assunto, ver C A R L O S E D U A R D O B U L H Õ E S P E D R E I R A , "Capital Social da
Companhia", Revista de Direito Renovar. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, v. 35, maio-agosto,
2006, p. 41-43.
1
69 Sobre esse assunto, ver J. X. C A R V A L H O D E M E N D O N Ç A . Tratado de Direito C o m f ™ I
Brasileiro, v. III, 6 a edição, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1957, p. 29; J O R G E L O B O ,
"Fraude à Realidade e integridade do Capital Social das Sociedades Anônimas", Revista de
Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, São Paulo: Malheiros, v. 70,
abril-junho, 1988, p. 55.
na o artigo 182 que a conta do capital social discriminará o montante
subscrito e, por dedução, a parcela ainda não realizada.
A expressão "capital social" é utilizada com 2 (dois) significados
distintos: montante do capital social fixado no estatuto e capital social
aplicado no ativo patrimonial. Como montante do capital social fixado
no estatuto, é a quantidade de valor financeiro que os sócios declaram
submeter ao regime legal próprio do capital social e que deve existir no
ativo para que a sociedade possa reconhecer lucros e transferir bens do
seu patrimônio para o patrimônio dos sócios170; como capital social
aplicado no ativo patrimonial, constitui uma quota-parte ideal do patri-
mônio líquido, podendo, tal como ocorre com todo o patrimônio líqui-
do, variar e tornar-se inferior ao montante fixado no estatuto171.
Na vigente lei societária, o capital social não mais espelha o total
das prestações dos acionistas, pois nem todas as suas contribuições à
companhia destinam-se, obrigatoriamente, ao capital social, preven-
do a Lei das S.A. o instituto do ágio e definindo-o como a contribui-
ção do subscritor que ultrapassa o valor nominal das ações e que
constitui a reserva de capital (artigo 13, § 2 o ). Sob a égíde do Decre-
to-Lei n° 2.627/1940, as reservas constituídas por ágio de subscrição
tinham uma única destinação: a obrigatória incorporação ao capital
social. A Lei das S.A. permite que as reservas de capital sejam tam-
bém utilizadas para absorver prejuízos que ultrapassem os lucros acu-
mulados e as reservas de lucros, no resgate, reembolso ou compra de
ações, como, também, no resgate de partes beneficiárias e no paga-
mento de dividendo a ações preferenciais, quando essa vantagem lhes
for assegurada (artigo 200).
O capital social é formado de acordo com a modalidade das ações
- com ou sem valor nominal - e do seu preço de emissão, ou seja,
1
72 N o entanto, se na formação do capital social ou em aumentos posteriores a sua constitui-
ção houver emissão dessas ações c o m ágio, o valor respectivo constituirá reserva de capital.
173 M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, v. 1, 5 a edição,
São Paulo: Saraiva, 2007, p. 97-98. Ainda segundo esse autor, do fato de o capital social
não m a i s representar a s o m a de t o d a s as entradas de capital decorreram diversas
conseqüências, tais como: o capital social (i) passou a refletir apenas o número de ações
emitidas, (ii) não mais serve de referência para a emissão de ações preferenciais, e (m) nao
se presta mais a servir de base obrigatória para a distribuição de dividendos (p. 100).
17
4 A alteração do valor do capital social importa em reforma do estatuto social - exceto no
caso de companhia com capital autorizado - e, portanto, somente pode ser deliberado em
assembleia geral; após a f i x a ç ã o do capital no estatuto social, este sofre moditicaçoes
durante a existência da sociedade, em decorrência da capitalização de reservas e o ingresso
de novos recursos.
1
75 Sobre a evolução do significado de patrimônio, bem como sobre o seu conceito jurídico
£ financeiro, ver J O S É L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA. Finanças e Demonstrações Financeiras
da Companhia; Conceitos Fundamentais ..., p. 121-182.
Na constituição da companhia o capital e o patrimônio têm o
mesmo valor, porém, com o funcionamento da sociedade ocorre a sua
separação176; no ativo passa a ser registrado o valor representativo da
subscrição em bens ou dinheiro efetuada pelos acionistas com o fim
de realizar o objeto social; no passivo (na subconta do patrimônio
líquido) é registrado o capital social, por representar um débito da
sociedade para com os sócios177.
A noção de capital social como cifra fixa e imutável foi perdendo
relevância no atual sistema societário brasileiro178. No passado, com o
Decreto n° 434/1891179, as hipóteses de aumento de capital eram
taxativas e tratadas como casos excepcionais. Atualmente, face às
exigências impostas pela dinâmica dos negócios, o capital passou a ter
uma grande mobilidade. Os aumentos de capital - com a modificação,
portanto, de sua cifra — passaram a ser freqüentes em uma companhia.
Dessa forma, a função primordial do capital social é garantir à
sociedade os meios para realizar o seu fim. Na sociedade anônima,
como o sócio não responde com seu patrimônio próprio pelas dívidas
da pessoa jurídica e a sua responsabilidade é limitada ao preço de
183 Nesse sentido, JOSÉ A L E X A N D R E TAVARES GUERREIRO. Regime Jurídico do Capital Auto-
rizado. São Paulo: Saraiva: 1984, p. 28-29, afirma que a doutrina vem minimizando a
relevância da função do capital social como garantia dos credores, pois, fazendo referência
a Ascarelli, entende que "a garantia dos credores não é constituída pelo capital social, mas
pelo patrimônio da sociedade em sua inteireza. Já hoje ninguém duvida de que a cifra do
capital social assume valor essencialmente formal, não coincidente com o substrato patrimonial
real da empresa. É este, em suma, que garante os credores sociais". No mesmo sentido,
GIUSEPPE FERRI. Le Società. Torino: Unione Tipografico-Editrice Torinese, 1971, p. 325,
sustenta que: "Questo però non deve indurre a ritenere che il capitale costituisca ia garanzia
dei creditori sociali: questa è costituita dal patrimônio e cioè daí beni reaii che rientrano in
questo patrimônio".
1 84 M A U R O R O D R I G U E S P E N T E A D O . Aumentos de Capital das Sociedades Anônimas ...,
p. 34-57.
185 MODESTO CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. 1, p. 99-101.
JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREIRO. Regime Jurídico do Capital Autorizado ..., p. 25-26,
No entanto, como as regras relacionadas à realidade e à integri-
dade do capital social prendem-se, a princípio, à tutela de terceiros, o
seu descumprimento enseja, em alguns casos, sanções penais186.
O acionista, ao subscrever ações de uma companhia, contribuin-
do para formação do capital social, torna-se devedor dela, da impor-
tância com que se comprometeu a integralizá-lo, e deverá cumprir
com essa obrigação dentro do prazo determinado no ato de constitui-
ção ou, posteriormente, na assembleia geral que deliberar o seu au-
mento. Quando os acionistas já efetuaram as suas contribuições ao
capital social, tem-se o capital realizado ou integralizado, e, na hipó-
tese de o acionista ter se comprometido com uma determinada quan-
tia que ainda não pagou, tem-se o capital subscrito.
Se o acionista não cumprir com a sua obrigação de integralizar o
capital social dentro do prazo assinalado, a companhia poderá ajuizar
contra ele ação de execução para cobrar as importâncias devidas ou
mandar vender as ações em Bolsa de Valores, por conta e risco do
acionista remisso (artigos 106 e 107) 187 .
entende que "o capital social desempenha funções que transcendem a relação jurídico-
societária entre acionistas e sociedade, fazendo referência a função de produção, que
somente se pode explicar em termos econômicos, afirmando, inclusive que "essa fun-
ção produtiva do capital projeta reflexos de importância na qualificação jurídica do
instituto, na medida em se tem em mira a aplicação dos recursos próprios da empresa
nas atividades de produção, conforme o objeto social".
186 Ver art. 177 do Código Penal.
187 O art. 106 da Lei das S.A. determina que "o acionista é obrigado a realizar, nas condições
previstas no estatuto ou no boletim de subscrição, a prestação correspondente às ações
subscritas ou adquiridas. § 1°. Se o estatuto e o boletim forem omissos quanto ao
montante da prestação e ao prazo ou data do pagamento, caberá aos órgãos da adminis-
tração efetuar chamada, mediante avisos publicados na imprensa, por 3 (três) vezes, no
mínimo, fixando prazo, não inferior a 30 (trinta) dias, para o pagamento. § 2°. O acionista
que não fizer o pagamento nas condições previstas no estatuto ou boletim, ou na
chamada, ficará de pleno direito constituído em mora, sujeitando-se ao pagamento dos
juros, da correção monetária e da multa que o estatuto determinar, esta não superior a
10% (dez por cento) do valor da prestação". O art. 107, por sua vez, estabelece os
procedimentos a serem adotados na hipótese de mora do acionista remisso, determinan-
do que a companhia pode, à sua escolha: "I - promover contra o acionista, e os que com
ele forem solidaríamente responsáveis (art. 108), processo de execução para cobrar as
importâncias devidas, servindo o boletim de subscrição e o aviso de chamada como
títub extrajudicial nos termos do Código de Processo Civil; ou II - mandar vender as
ações em bolsa de valores, por conta e risco do acionista".
O capital inicial de uma sociedade é formado pela contribuição
(ou por parte dela) de todos os acionistas quando da subscrição e in-
tegralização de ações e deve ser expresso em moeda nacional, não
obstante poder ser constituído com qualquer espécie de bens, corpó-
reos ou incorpóreos, suscetíveis de avaliação em dinheiro e créditos.
Assim, o capital pode ser constituído só em dinheiro ou parte em
dinheiro e parte em bens, ou, ainda, somente em bens (artigo 7o).
Note-se, no entanto, que, face ao princípio da realidade do capital, os
bens transferidos pelos acionistas à companhia, a título de sua inte-
gralização, devem representar exatamente os valores que foram por
eles declarados188.
A Lei das S.A. não exige um capital mínimo na constituição da
companhia, pois a forma anônima não está restrita apenas às empre-
sas de grande porte189. Os acionistas têm ampla liberdade na fixação
do valor do capital social que, no entanto, deverá ser compatível com
a consecução do objeto social.
A Lei n° 6.385/1976 prevê que a Comissão de Valores Mobi-
liários poderá subordinar o registro de distribuição pública de valo-
res mobiliários a capital mínimo da emissora190, o que nunca foi
regulamentado. Da mesma forma, algumas leis, como, por exem-
plo, as que regulam as instituições financeiras, sociedades segura-
doras, sociedades de arrendamento mercantil e outras sujeitas à
disciplina especial requerem ou delegam a um órgão poderes para
fixar o seu capital mínimo, por exercerem tais empresas atividades
188 O art. 8 o da Lei das S.A. estabelece os procedimentos relativos à avaliação dos bens com
que os acionistas concorrem para formação do capital social. A formação do capital social
e a avaliação dos bens estão tratadas nos comentários aos arts. 7° e 8o.
189 Consta da Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, que "o Projeto não exige capita!
mínimo na constituição da companhia, porque não pretende reservar o modelo para as grandes
empresas. Entende que, embora muitas das pequenas companhias existentes no País pudessem
ser organizadas como sociedades por quotas, de responsabilidade limitada, não há interesse em
limitar arbitrariamente a utilização da forma de companhia, que oferece maior proteção ao
crédito devido à publicidade dos atos societários e das demonstrações financeiras".
190 Art. 19, § 6o, da Lei nG 6.385/1976.
relacionadas à poupança do público em geral ou por envolverem
risco empresarial191.
Apesar de a Lei das S.A. não exigir capital mínimo na constitui-
ção da companhia, é obrigatória a realização como entrada de 10%
(dez por cento), no mínimo, do preço de emissão das ações subscritas
em dinheiro (artigo 80, inciso II). As instituições financeiras estão
sujeitas, na subscrição do capital inicial e na de seus aumentos, à rea-
lização de 50% (cinqüenta por cento) do valor subscrito192.
O parágrafo único do artigo 5 o foi revogado pela Lei n° 9.249/
1995, que suprimiu a correção monetária das demonstrações finan-
ceiras e instituiu a remuneração do capital próprio, a título de juros,
até o limite anual da taxa de juros de longo prazo - TJLP 1 9 3 .
Alteração
191 Ver o art. 4", inciso XIII, da Lei n° 4.595/1964; art. 1° da Lei n° 5.627/1970; art. 32 inaso
VI, do Decreto-Lei n° 73/1966, com a redação dada pela Lei Complementar n 126/2007,
Lei n° 6.099/1974, com as alterações introduzidas pela Lei n° 7.132/1983; e a Resolução
CMN n° 2.309/1996. Vide, também, os arts. 1.134 a 1.136 e 1.141 do Codigo Civil, que
tratam da sociedade estrangeira.
1
92 Art. 27 da Lei n° 4.595/1964.
193 Arts
- 4 o e 9 o da Lei n° 9.249/1995.
194
Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976.
Estão previstas na Lei das S.A. as seguintes hipóteses de au-
mento do capital social: (i) conversão em ações de debêntures ou par-
tes beneficiárias (artigos 48, § 2 o , e 57); (ii) exercício de direitos
conferidos por bônus de subscrição (artigo 75, parágrafo único) ou
por opção de compra de ações; (iii) emissão de ações dentro do limite
autorizado no estatuto (artigo 168); (iv) capitalização de lucros ou de
reservas (artigo 169); e (v) por deliberação da assembleia geral extra-
ordinária convocada para decidir sobre a reforma do estatuto social,
no caso de inexistir autorização de aumento, ou de estar a mesma
esgotada (artigo 166, inciso IV)195.
A redução do capital social é uma das formas de sua modificação
que pode afetar os direitos dos credores; portanto, a sua deliberação,
mediante assembleia geral extraordinária, só é admitida em 2 (duas)
hipóteses: (i) se houver perda, quando a redução só poderá ser feita
até o montante dos prejuízos acumulados; e (ii) se o capital for exces-
sivo para a realização do objeto social196.
Estão ainda previstas na Lei das S.A. outras possibilidades de
redução do capital social que independem da vontade dos acionistas
e de deliberação da assembleia geral, que caberá apenas homologar o
novo valor do capital: (i) resgate de ações para retirá-las definitiva-
mente do mercado (artigo 44, § I o ); (ii) reembolso de ações, no caso
de não substituição do acionista cujas ações foram reembolsadas (ar-
tigo 45, § 6 o ); e (iii) mora do acionista - caso a sociedade não consiga
dele receber as importâncias não realizadas e se colocar as ações à
venda, não encontrar comprador (artigo 107, § 4 o ).
O capital social - conforme analisado nos comentários ao artigo
5 o — tem a função de instrumento de garantia dos credores da compa-
nhia e de proteção ao crédito, o que justifica a regra de que os credo-
195 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 166 da Lei das S.A.
196 Ver os comentários ao art. 173 da Lei das S.A.
res da companhia podem se opor à deliberação dos acionistas, toma-
da em assembleia geral, de sua redução197.
SEÇÃO II
FORMAÇÃO
Dinheiro e bens
"Art. 7 o . O capital social poderá ser formado com contribuições
em dinheiro ou em qualquer espécie de bens suscetíveis de avalia-
ção em dinheiro."
Avaliação
"Art. 8 o . A avaliação dos bens será feita por três peritos ou por
empresa especializada, nomeados em assembleia geral dos subs-
211 Ver Rjrecer CVM/SJU n° 131/1983: "Os bens a que se refere a lei, podem ser de qualquer
espécie, móveis, imóveis, corpóreos, incorpóreos. Entre os bens incorpóreos acham-se os
direitos ou créditos. Evidentemente, na constituição da sociedade, serão créditos de tercei-
ros; no aumento de capital, de terceiros ou de sócios".
212 TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedade por Ações ..., v. I, p. 116.
213 A CVM, no Parecer CVM/SJU n° 035/1995, se manifestou no sentido de que: "(...) não há
certeza nem liquidez em 'créditos futuros', os quais a bem da verdade, não existem, não
sendo admissível a subscrição com tais créditos de vez que não são suscetíveis de avaliação
em dinheiro".
crítores, convocada pela imprensa e presidida por um dos funda-
dores, instalando-se em primeira convocação com a presença de
subscritores que representem metade, pelo menos, do capital so-
cial, e em segunda convocação com qualquer número.
214 Consta da Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, que o Projeto da Lei das S.A. não
reproduziu a norma do art. 60 do Decreto-Lei n° 2.627/1940, que dispensava a avaliação
de bens pertencentes em comum a todos os subscritores, porque essa dispensa, embora
justificável do ponto de vista do interesse dos subscritores, é incompatível com o requisito
da avaliação na sua função primordial de assegurar a realidade do capital social.
215 CARLOS F U L G È N C I O DA C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 1, São Paulo:
Saraiva, 1972, p. 81 -82, ao examinar as conseqüências que advêm da avaliação de bens,
observa que esta se reveste de grande importância para os sócios, para terceiros e para a
própria sociedade, pois os primeiros "participam de um autêntico valor, em dinheiro de
conta do, na expectativa de avaliação correta dos bens, em contrapartida. Um suas transações
com a sociedade, estranhos a ela, os terceiros somente se baseiam no capital; donde a
necessidade de que este seja sólido, isto é, isento de valores fictícios e falsos. E a avaliação
honesta é que dará essa garantia. Finalmente, a própria sociedade, que depende desses
valores para desenvolver seus negócios; uma boa avaliação será fator importante para, já de
início, fixar-se em melhor conceito".
critores que contribuíram em dinheiro, os investidores e os credores,
assim como prejudicar a continuidade normal da empresa216.
Os subscritores deverão informar no prospecto os bens que
pretendem transferir à companhia no ato de sua constituição e os
acionistas, no boletim de subscrição, os bens que pretendem
incorporar ao capital em seus aumentos217, como pagamento das
ações subscritas ou adquiridas, conforme o caso, e deverão, ainda,
atribuir-lhes um valor218. Dessa forma, a Lei das S.A. determina
que esses bens devem ser previamente avaliados por 3 (três) peritos
ou empresa especializada219-220.
221 Sobre esse assunto,TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedade por Ações ..., v. I, p. 98,
esclarece que "a escolha dos peritos deve obedecer ao critério da competência técnica, não
se desprezando, evidentemente, sua idoneidade moral. Deverão ser pessoas estranhas à
organização da companhia, pois, do contrário, será possível o conflito de interesses." Acres-
centa, ainda, que "qualquer subscritor pode arguir, na assembléia, a suspeição de todos os
peritos ou de alguns deles. O incidente resolver-se-á pelo voto da maioria, da ata devendo
constar, para efeitos futuros, e minuciosamente, os motivos da suspeição".
222 A CVM, no Parecer CVM/SJU n° 049/1985, firmou entendimento no sentido de que "a
especialização mínima, para um perito, obedecerá a legislação específica de sua profissão.
A CVM não pode se imiscuir no mérito de uma avaliação técnica e nem contestar laudo
aprovado por assembleia geral de acionistas". A 8n Câmara Cfvel do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, no julgamento da Apelação Cível n° 1.0024.05.728897-9/001,
Rei. Des. Teresa Cristina da Cunha Peixoto, j. em 06.04.2006, ao examinar a questão da
formação dos peritos, decidiu que: "A Lei n° 6.404/76 que dispõe sobre a sociedade por
ações, não exige que a avaliação de bens para fins de integralização do capital social da
sociedade seja feita apenas por engenheiros credenciados, determinando a sua realização
por três peritos ou por empresa especializada, desde que apresentem um laudo fundamen-
tado, o que restou evidenciado no caso em questão, sendo os peritos subscritores do laudo
capacitados tecnicamente, razão pela qual deve ser provido o recurso interposto em face
de decisão proferida em suscitação de dúvida, determinando-se o registro pretendido (...).
O art. 8o da Lei 6.404/76 não faz referência a formação exigida dos peritos, sendo de se
pressupor que deva ser realizada por pessoas que tenham conhecimento na área relativa ao
bem que se quer utilizar na integralização de capital. No caso dos autos, a perícia foi
realizada por um engenheiro, um contador e um corretor de imóveis. A idoneidade do
laudo de avaliação deverá ser analisada no caso concreto, pois, em tese, os peritos nome-
ados detêm conhecimentos na área imobiliária (...)".
223 O art. 115, § 1o, da Lei das S.A. determina que: "o acionista não poderá votar nas delibe-
rações da assembléia geral relativas ao laudo de avaliação de bens com que concorrer para
a formação do capital social e à aprovação de suas contas como administrador, nem em
Apresentado o laudo pelos peritos será convocada uma nova as-
sembleia geral para deliberar sobre a sua aprovação ou rejeição, ocasião
em que eles estarão presentes para prestar os esclarecimentos que lhes
forem solicitados. No entanto, na prática, é realizada uma única assem-
bleia geral, na qual é deliberada a ratificação da nomeação dos peritos -
que já haviam sido previamente contratados pelos subscritores - e a
aprovação ou rejeição do laudo por eles apresentado.
Não existe uma regra específica sobre critérios de avaliação; o
que a Lei das S.A. determina no § I o é que o laudo deverá ser funda-
mentado, indicando os critérios de avaliação e os elementos de com-
paração adotados225. O valor do bem avaliado pelos peritos poderá ser
igual, superior ou inferior ao que lhe foi atribuído pelo subscritor. Se o
valor indicado pelo perito for idêntico ao do subscritor e a assembleia
quaisquer outras que puderem beneficiá-lo de modo particular, ou em que tiver interesse
conflitante com o da companhia".
224 No mesmo sentido, M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anôni-
mas ..., v. 1, p. 119; T R A J A N O D E M I R A N D A VALVERDE. Sociedade por Ações ..., v. I, p.
97-98; J O S É E D W A L D O TAVARES B O R B A . Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar,
2008, p. 222, C A R L O S F U L C Ê N C I O D A C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações ..., v. 1,
p. 72 e P H I L O M E N O J. D A C O S T A , Anotações às Companhias ..., v. I, p. 161 e 173. Em
sentido contrário, FRAN MARTINS, Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio
de Janeiro: Forense, 1977, p. 65-66.
225 No mesmo sentido, P H I L O M E N O J. D A COSTA. Anotações às Companhias ..., v. I, p. 164;
JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREIRO, "Sobre a Conferência de Bens", Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro ..., v. 48, p. 19-20, ao sustentar que a lei
comercial não prescreve que os bens conferidos ao capital devam ser avaliados necessaria-
mente a preços de mercado e que (i) o § 1 o do art. 8 o apenas determina que o laudo deverá
indicar os critérios de avaliação, a significar que se admite, na espécie, mais de um critério,
desde que devidamente fundamentada sua aplicação; (ii) a lei quando impõe avaliação a
preços de mercado, fá-lo de modo expresso, como ocorre no procedimento de incorpora-
ção de companhia controlada, regulado pelo art. 264; e (iii) a única preocupação do
legislador é a de impedir as super-avaliações, por isso a regra constante do § 4 o do art. 8 o da
Lei das S.A. Não obstante esse entendimento, a 4 o Câmera Cível do Tribunal de Justiça do
Estado do Paraná, no julgamento da Apelação Cível n° 070658701, Rei. Des. Dilmar
Kessler, j. em 22.12.1999, decidiu que: "(...) não se pode olvidar a importância de que os
bens incorporados ao patrimônio da sociedade sejam pelo valor real de mercado. (...)
Existem múltiplos interesses de que os bens ingressem na sociedade pelo valor efetivo de
mercado (...): a) obrigar os demais acionistas a concorrer com quantia maior do que a
devida, no seu direito de preferência, a fim de manter o percentual de sua participação
acionária; b) dos futuros compradores de ações da empresa; c) dos credores que têm na
integridade do capital a sua garantia e no interesse social da preservação e desenvolvimento
da empresa, resguardando-a de riscos no mercado, inclusive de eventual quebra, o que
gera danos para toda a coletividade, com forte repercussão social, máxime o desemprego".
geral o aprovar, está consumada a incorporação do bem ao capital
social, cabendo aos administradores apenas adotar as formalidades
necessárias à transmissão do bem à sociedade.
No entanto, se o valor constante do laudo for inferior ao atri-
buído pelo subscritor, este deverá optar se concorda com os peritos
- ocasião em que deverá pagar à sociedade a diferença em dinheiro,
a fim de complementar o valor total das ações subscritas226 - ou se
discorda da avaliação. Na segunda hipótese, nos termos do § 3 o ,
ficará sem efeito o ato de subscrição de ações, seja na constituição
da companhia ou em futuro aumento de capital, pois o subscritor
não está obrigado a transferir um bem à companhia por valor infe-
rior ao pretendido227, salvo se os demais subscritores se manifesta-
rem no sentido de completar em dinheiro a quota dos bens objeto
da avaliação recusada pela assembleia ou pelo ofertante e essa pro-
posta for aprovada pela assembleia dos subscritores228.
Caso os peritos indiquem para o bem um valor superior ao que
lhe foi atribuído pelo subscritor, ele somente poderá ser incorporado
sem prejuízo da responsabilidade de que Irala o § 6" do art 8o". D e acordo com EGBERTO
LACERDA TEIXEIRA e JOSÉ A L E X A N D R E TAVARES GUERREIRO. Das Sociedades Anônimas
no Direito Brasileiro, v. 1, São Raulo: José Bushatsky, 1979, p. 145, a Lei das S.A. "parte
do pressuposto de que não estão em jogo, na conferência de bens, apenas os interesses dos
acionistas subscritores, mas também os interesses de terceiros, principalmente de credores da
sociedade, que devem se louvar nas garantias patrimoniais que esta lhes oferece".
Consta da Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, que, para a maior segurança da
realidade do capita! formado em bens, o § 6 o do art. 8° faz o subscritor (além dos avaliado-
res) responsável pelos danos causados por culpa ou dolo na avaliação.
Consta do art. 177, caput, do Código Penal que está sujeito à reclusão de 1 (um) a 4
(quatro) anos, e multa, se o fato não constitui crime contra a economia popular, aquele que
"promover a fundação de sociedade por ações fazendo, em prospecto ou em comunicação
ao público ou à assembléia, afirmação falsa sobre a constituição da sociedade, ou ocultando
fraudulentamente fato a ela relativo".
N E L S O N EIZIRIK. Aspectos Modernos de Direito Societário. Rio de janeiro: Renovar,
1992, p. 50.
A inexecução de obrigações de meio caracteriza-se pelo desvio
dessa conduta diligente ou pela omissão de determinadas cautelas ine-
rentes à atividade a que o devedor se comprometeu. Ou seja, somente
haverá inadimplemento, e o conseqüente dever de indenizar, se o cre-
dor provar que o devedor não empregou a diligência a que se encontra-
va obrigado. Nas obrigações de resultado, por outro lado, a prestação
consiste em um resultado certo e determinado a ser produzido pelo
devedor. A inexecução caracteriza-se pela não produção do resultado
final prometido, isto é, a ausência deste configura o inadimplemento.
A obrigação assumida pelo avaliador é de meio, posto que a sua
responsabilidade pelos prejuízos causados aos acionistas e terceiros
depende da comprovação da existência de culpa ou dolo. O avaliador
não pode ser responsabilizado apenas em função do resultado de sua
avaliação, isto é, de ele ter apurado um valor distinto daqueles eventu-
almente obtidos por outro perito235. A avaliação de sociedades ou de
bens utilizados para formar o capital ou integralizar aumentos de ca-
pital não possui um único resultado certo e incontestável, pois de-
pende das premissas, metodologias e/ou projeções validamente
adotadas por cada avaliador.
Para que o avaliador possa ser responsabilizado por danos causa-
dos à companhia, aos acionistas, credores e/ou demais investidores é
necessário demonstrar que ele, ao preparar a avaliação, agiu de má-fé,
utilizou dados ou informações incorretos ou, ainda, fundamentou-se
em premissas que, tendo em vista as circunstâncias existentes, não
poderiam ser consideradas razoáveis.
A estas circunstâncias, vale ainda acrescentar a hipótese de ser
demonstrado que o avaliador não utilizou corretamente as técnicas e
as metodologias de cálculo usualmente reconhecidas como pertinen-
tes para a espécie de avaliação realizada236.
Sobre esse a natureza do dever imposto ao avaliador, ver N E L S O N EIZIRIK. Temas de Direito
Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 205-210.
NELSON EIZIRIK. Temas de Direito Societário ..., p. 207-210.
Para os fins do disposto no § 6 o , o subscritor, cuja avaliação dos
bens foi maculada de dolo ou culpa, equipara-se ao avaliador, por ter
sido, em tese, por ela beneficiado.
Prescreve em um ano a ação contra peritos e subscritores para
deles haver reparação civil pela avaliação de bens, contado o prazo da
publicação da ata da assembleia geral que aprovar o laudo (artigo 287).
246 O inciso I do § 2° do art. 156 da Constituição Federal de 1988 determina que o 1TB1 "não
incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica
em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão,
incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade
preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens
imóveis ou arrendamento mercantil".
247 O art. 1.647 do Código Civil determina que "ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum
dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I -
alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis (...)".
248 Arts. 1.390 e seguintes do Código Civil.
249 TRAJANO DE M I R A N D A VALVERDE. Sociedade por Ações ..., v. I, p. 108. O art. 1.393 do
Código Civil, por sua vez, determina que "não se pode transferir o usufruto por alienação,
mas o seu exercício pode ceder-se por título gratuito ou oneroso". Em sentido contrário,
M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. 1, p. 125;
FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio de janeiro; Forense,
p. 71 e C A R L O S F U L C Ê N C I O D A C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 1, São
Paulo: Saraiva, 1972, p. 89.
250 Sobre esse assunto, T R A J A N O D E M I R A N D A V A L V E R D E . Sociedade por Ações ..., v. I,
p. 112, observa que, "como o ato de subscrição em bens não se identifica com a venda
(n° 63), é manifesto que os princípios ou normas legais que regulam a efetivação dessas
garantias hão de seguir, na sua aplicação, os desvios, que a diversidade de natureza
jurídica e a finalidade dos dois atos determinam".
251 T R A J A N O D E M I R A N D A V A L V E R D E . Sociedade por Ações ..., v. I, p. 108 e C A R L O S
F U L G È N C I O D A C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações ..., v. 1, p. 89. Em sentido
contrário, P H I L O M E N O J. DA COSTA. Anotações às Companhias ..., v. I, p. 170 e 179-180,
sustenta que a contribuição com bem para o capital da anônima tem a natureza jurídica de
uma permuta, porque é o ato pelo qual 2 (duas) pessoas transferem reciprocamente a
propriedade de alguma coisa, no caso o bem contra ações. Rara M O D E S T O CARVALHOSA.
Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. 1, p. 126-127, "o enfoque da questão
deve ser inteiramente outro....a conferência de bens ao capital social é simplesmente forma
de pagamento das ações subscritas pelo acionista. Por ter o estatuto estipulado que o
subscritor terá a faculdade de pagar a sua subscrição em dinheiro, ou em bens ou direitos,
caracteriza-se o ato como obrigação alternativa, ou seja, pode o devedor escolhera forma de
cumprira obrigação: pagamento em dinheiro ou em espécie. (...) Portanto, a transmissão da
propriedade do bem conferido se dá a título de pagamento da dívida contraída".
NELSON EIZIRIK-ARTS. 9 ° E 1 0
O art. 456 do Código Civil determina que, "para poder exercitar o direito que da evicção lhe
resulta, o adquirente notificará do litígio o alienante imediato, ou qualquer dos anteriores,
quando e como lhe determinarem as leis do processo". Sobre esse assunto, ver M O D E S T O
CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. 1, p. 130; T R A J A N O DE
M I R A N D A VALVERDE. Sociedade por Ações ..., v. I, p. 114; M O D E S T O C A R V A L H O S A .
Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. 1, p. 131.
T R A J A N O DE M I R A N D A VALVERDE. Sociedade por Ações ..., v. I, p. 113. No mesmo
sentido, C A R L O S F U L C Ê N C I O DA C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 1, São
Paulo: Saraiva, 1972, p. 96; R U Y C A R N E I R O GUIMARÃES. Sociedades por Ações (Notas
de Doutrina e Jurisprudência), v. I, Rio de Janeiro: Forense, 1960, p. 106. Dessa forma,
não se aplica às sociedades anônimas a regra constante do art. 448 do Código Civil.
Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, Capítulo II, Seção II, alínea "í".
pela solvência do devedor263. E em função dessa regra da Lei das S.A.
que o subscritor responde não só pela solvência do devedor ao tempo da
subscrição, como, também, pela solvência futura, ou seja, quando hou-
ver vencimento da dívida; e deverá pagar o valor apurado pelos peritos e
aprovado em assembleia geral e não o valor do crédito264.
Para que a cessão de crédito do subscritor para a sociedade seja
eficaz em relação ao devedor, este deverá ser notificado265.
O crédito referido no parágrafo único deste artigo pode ser real (p. ex.,
hipoteca), pessoal (quirografário) ou título de crédito propriamente dito266.
Se o crédito não for pago no seu vencimento, a sociedade poderá
cobrar do subscritor o objeto da prestação ou a quantia em dinheiro
correspondente ao valor apurado pelos peritos. No entanto, a respon-
sabilidade por créditos é subsidiária e não solidária267. A sociedade
deverá executar o devedor e, na impossibilidade de receber dele, exigir
do subscritor ou acionista o pagamento, observado o valor pelo qual o
crédito foi avaliado pelos peritos e conferido ao capital.
263 ArL 296 do Código Civil. T R A J A N O DE M I R A N D A VALVERDE. Sociedade por Ações ..., v. I,
p. 116, observa que a razão da existência dessa regra (e exceção) na Lei das S.A. deve-se ao fato
de que nas sociedades anônimas o capital deve ser integralizado e corresponder, na sua
expressão em dinheiro, aos valores com que contribuíram os subscritores para a sua formação
e, em sendo assim, a lei não se podia contentar com a garantia da simples existência do
crédito. No mesmo sentido, C A R L O S F U L G Ê N C I O D A C U N H A PEIXOTO. Sociedades por
Ações ..., v. 1, p. 96.
264 M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. 1, p. 131,
observa que "se o crédito não for pago no seu vencimento, tem a companhia o direito de cobrar,
amigável ou judicialmente, o valor a ele atribuído pelos peritos, o que poderá não coincidir com
o seu exato valor. Se houver um deságio no valor do crédito para o efeito de sua conferência ao
capital, podem surgir problemas na sua cobrança junto ao subscritor. Atenção especial, portanto,
deve ser prestada na conferência de créditos a fim de se evitar a diferença entre o seu valor e o que
lhe foi atribuído (deságio) para efeito de conferência ao capital social". No mesmo sentido,
WILSON DE S O U Z A CAMPOS BATALHA. Sociedades Anônimas e Mercado de Capitais, v. I,
Rio de Janeiro: Forense, 1973, p. 192; R U Y CARNEIRO GUIMARÃES. Sociedades por Ações
(Notas de Doutrina e Jurisprudência) ..., v. I, p. 109.
265 De acordo com o art 290 do Código Civil, "a cessão de crédito não tem eficácia em relação
ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em
escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita".
266 P H I L O M E N O J. DA COSTA. Anotações às Companhias ..., v. I, p. 189.
267 M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. 1, p. 132;
W I L S O N DE S O U Z A C A M P O S BATALHA. Sociedades Anônimas e Mercado de Capitais
..., v. I, p. 189.
CAPÍTULO DM
AÇÕES
SEÇÃO I
Fixação no estatuto
'Art. 11. O estatuto fixará o número das ações em que se divide o
capital social e estabelecerá se as ações terão, ou não, valor nominal.
São exemplos os arts. I o (enuncia que a sociedade anônima terá o capital dividido em
ações), 28 (indivisibilidade da ação como fração mínima do capital), 30 (é vedado à
companhia, em princípio, negociar com as próprias ações) e 169 (alteração do valor
nominal da ação ou do seu número, devido ao aumento do capital com aproveitamento de
lucros ou reservas) da Lei das S.A.
São exemplos os arts. 45 (a sociedade ao pagar ao acionista dissidente o valor de suas
ações refere-se à soma de seus direitos e obrigações), 57 (a conversão da debênture em ação
ação ou o comprovante do lançamento a crédito do acionista das suas
ações pela instituição financeira encarregada de sua escrituração270-271.
A ação constitui uma unidade do capital e não pode ser fracio-
nada; assim, é indivisível em relação à sociedade (artigo 28).
Na sociedade por ações, os direitos de participação dos acionis-
tas são organizados em unidades padronizadas, ou quotas-partes iguais,
sem ter em conta o número ou o nome dos acionistas. A cada ação
correspondem iguais direitos de participação, em termos de porcen-
tagem ou de fração.
Quanto aos direitos que conferem, as ações são ordinárias, pre-
ferenciais, de gozo ou fruição (artigo 15). Quanto à forma, são nomi-
nativas, sejam registradas ou escriturais (artigos 20, 31 e 34). As ações
podem ser emitidas com ou sem valor nominal (artigos 14 e 15).
A Lei das S.A. admite 3 (três) espécies de ações - ordinárias,
preferenciais e de fruição - e mais de uma classe em cada espécie.
A igualdade dos direitos de participação compreendidos nas ações
da mesma classe é da essência da companhia, sendo exigida ape-
nas dentro de cada classe; a norma da Lei das S.A. que a impõe é
cogente e não admite disposição estatutária em contrário (artigo
109, § I o ) 272 .
Não obstante a palavra "ação" ter também sido utilizada para sig-
nificar o certificado que a representa, não é mais necessária a existên-
cia física de um documento para que o titular da ação exerça os seus
2 73 Com a extinção, pela Lei n° 8.021/1990, dos títulos ao portador e endossáveis, a única
forma de ação admitida pela Lei das S.A. é a nominativa. Assim, os certificados de ação
perderam a sua principal função que era a de instrumento que legitimava a condição de
sócio. Ver os comentários ao art. 20 da Lei das S.A.
274 Art. 2° da Lei n° 6.385/1976, com as alterações introduzidas pela Lei n° 10.303/2001.
Além das ações, debêntures e bônus de subscrição, são considerados pela Lei n° 6.385/
1976 como valores mobiliários: (i) os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados
de desdobramento; (ii) os certificados de depósito de valores mobiliários; (iii) as cédulas de
debêntures; (iv) as contas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes
de investimento em quaisquer ativos; (v) as notas comerciais; (vi) os contratos futuros, de
opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliários; (vii) outros
contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes; e (viii) quando ofertados
publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem
direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação
de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.
275 TULLIO ASCARELU. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. Tradução de Nicolau Nazo, São
Paulo: Saraiva, 1943, p. 184; TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedade por Ações
..., v. I, p. 119 e 143; WILSON CAMPOS DE S O U Z A BATALHA. Sociedades Anônimas e
Mercado de Capitais, v. I, Rio de Janeiro: Forense, 1973, p. 228.
276 ALFREDO LAMY FILHO, "Usucapião de Ações", Revista de Direito Bancário e do Mercado de
Capitais, São Riulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 26, outubro-dezembro, 2004, p. 184-185.
Sobre a definição legal de valor mobiliário no direito brasileiro e no direito compara-
do, ver CARLOS A U G U S T O DA SILVEIRA L O B O , "Os Valores Mobiliários", Revista de
Direito Bancário e do Mercado de Capitais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 35,
janeiro-março, 2007, p. 27-42.
sujeito passivo da relação jurídica aos proprietários anteriores do títu-
lo, bem como da reivindicação por terceiros.
O valor mobiliário é materializado por um título que é o suporte
do direito. O título nominativo comprova a inscrição no registro de
transferência, que faz presumir a propriedade do titular com força pro-
bante absoluta. O título ao portador é a representação física do direito
que ali se encontra incorporado. N o entanto, os títulos corporificados
em instrumentos estão em via de desaparecimento em face das medi-
das de desmaterialização. E m sua nova acepção, a palavra título de-
signa um valor escriturai sem individualidade 278 .
A ação nominativa - registrada ou escriturai - é considerada títu-
lo de crédito279-280 (p scg) . E m sentido lato, título de crédito é o documen-
286 FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. 1, Rio de Janeiro: Foren-
se, 1977, p. 87.
287 A C V M ainda não emitiu ato normativo regulamentando o valor mínimo das ações confor-
me o disposto no § 3 o do art. 11 da Lei das S.A.
288 Além do valor nominal, fixado no estatuto, as ações possuem outros valores: (i) valor de
emissão; (ii) valor contábil; (iii) valor de Bolsa de Valores; (iv) valor econômico; e (v) valor
de patrimônio líquido. Rara uma análise introdutória do valor da ação, ver FÁBIO U L H O A
C O E L H O , " O Cálculo do Valor do Reembolso". In: Jorge Lobo (Coord.). A Reforma da Lei
das S.A. São Paulo: Atlas, 1998, p. 57 e seguintes. Ver, também, os comentários ao art. 170
da Lei das S.A.
289 A L F R E D O LAMY FILHO, "A Reforma da Lei de Sociedades Anônimas", Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 7,
1972, p. 154.
JEAN-CLAUDE GISLING. La Valeur Nominale des Actions. Montreux: Imprimerie Ganguin
& Laubscher S.A., 1963, p. 73.
é indispensável o valor nominal da ação, basta que a lei determine, na
emissão de ações sem valor nominal, o montante da contribuição do
subscritor que será capitalizado (artigo 14, parágrafo único)291.
A Lei das S.A. instituiu no nosso regime societário as ações sem
valor nominal, com o fim de permitir maior flexibilidade às socieda-
des anônimas em seus aumentos de capital e viabilizar a captação de
recursos no mercado292. A ausência de valor nominal permite que o
preço de emissão das ações seja fixado de acordo com a realidade do
mercado, o que facilita o aumento de capital social, quando necessá-
rio aos interesses da companhia. Nesse caso, o aumento do capital
pode ser realizado sem modificação do número de ações e a alteração
do número dessas ações, no caso de desdobramento ou grupamento,
ocorre sem modificação do valor do capital (artigo 169, § I o ).
Nos aumentos de capital mediante subscrição de novas ações, a
Lei das SA. determina que o seu preço de emissão seja fixado, pela
assembleia geral ou pelo conselho de administração (artigos 166 e 170,
§ 2o), tendo em vista o seu valor real e-não o nominal - quando as ações
têm valor nominal293. Esse valor é apurado, alternativa ou conjunta-
mente, pelos critérios de avaliação das ações: perspectivas de rentabili-
dade, patrimônio líquido e/ou cotação no mercado, se existente.
Na hipótese do valor real das ações, determinado de acordo com
um ou mais dos 3 (três) critérios determinados pela Lei das S.A., ser
inferior ao valor nominal das ações existentes, deve ser observada a
norma de que é vedada a emissão de ações por preço inferior ao seu
valor nominal (artigo 13, caput).
291 FÁBIO KONDER COMPARATO. Ensaios e Pareceres de Direito Empresarial. Rio de Janeiro:
Forense, 1978, p. 100.
292 De acordo com a Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, as ações sem valor
nominal oferecem maior flexibilidade nos aumentos de capital e contribuem para diminuir
a importância injustificada que era atribuída, à época, ao valor nominal das ações pelos
participantes do mercado de capitais brasileiro, em prejuízo do seu funcionamento nor-
mal. Observou, ainda, que a inovação era recomendada tendo em vista a definição mais
estrita dos deveres e responsabilidades do acionista controlador e dos administradores.
293 Ver os comentários ao art. 170, § 1o, da Lei das S.A.
Em regra, todas as ações da companhia deverão ser emitidas com
ou sem valor nominal. No entanto, o § I o admite que, na companhia
com ações ordinárias sem valor nominal, possa ser criada uma ou mais
classes de ações preferenciais com valor nominal. Essa faculdade (de ter
ações com e sem valor nominal) foi útil durante o período inicial de
aplicação da Lei das S.A. - que instituiu as ações sem valor nominal
enquanto não era divulgado no mercado nacional o conhecimento e
funcionamento das companhias com ações sem valor nominal294.
Assim, o estatuto da companhia fixará o valor do capital social e a
categoria das ações em que o mesmo se divide, o que poderá ser feito de
diversas formas: (i) ações ordinárias e preferenciais com valor nominal;
(ii) ações ordinárias e preferenciais sem valor nominal; (iii) ações ordi-
nárias sem valor nominal e ações preferenciais com valor nominal; e
(iv) ações ordinárias sem valor nominal, uma classe de ações preferen-
ciais sem valor nominal e outra classe com valor nominal295.
Alteração
"Art. 1 2 . 0 número e o valor nominal das ações somente poderão
ser alterados nos casos de modificação do valor do capital social
ou da sua expressão monetária, de desdobramento ou grupamen-
to de ações, ou de cancelamento de ações autorizado nesta lei."
amendment of the articles of incorporation into a greater number of share units, like changing
a five dollars bill into 'ones'". H A R R Y H E N N . Handbook of the Law of Corporations and
other Business Entreprises. St. Raul, Minn.: West Publishing Co., 1961, n° 330, p. 512,
observa que o desdobramento é mera alteração do número de ações em que se divide o
capital social, pois: "involve no transfer from supplus to capital or any changes except
adjustments in par value or stated value per share".
300 De acordo com J O S É E D W A L D O TAVARES B O R B A . Direito Societário. Rio de Janeiro:
Renovar, 2008, p. 253, o desdobramento e o grupamento de ações representam procedi-
mentos de natureza técnica destinados "a dar razoabilidade ao valor das ações quando este
se torna demasiadamente elevado ou extremamente diminuto. Um valor muito elevado
pode, em certas circunstâncias, até mesmo dificultar a negociação das ações".
301 Parecer CVM/SJU n° 004/1981.
302 JOSÉ L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA, "Desdobramento de Ações". In: Alfredo Lamy Filho e
José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração, aplica-
ção). v. II, 2 a edição, Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p. 65, observa que: "(...) o desdo-
bramento é mera divisão da ação, e produz, sempre e necessariamente, partes iguais que,
se forem remembradas, terão que recompor o mesmo todo de onde provieram. Como
ensina o dicionário do Aurélio, desdobrar é 'abrir ou estender o que está dobrado, dividir
em dois"'.
303 De acordo com o Parecer CVM/SJU n° 045/1984, "o desdobramento favorece não só a
liquidez das ações, como também está associado a um processo de alta na cotação das
ações, donde constituir-se como informação relevante, capaz de influir ponderavelmente na
cotação dos valores mobiliários, pelo que os diretores das companhias abertas, bem como
outras pessoas elencadas no § 1° do art. 155 da Lei n° 6.404/76 não devem negociar suas
ações em período anterior à sua plena divulgação".
A operação de desdobramento não causa prejuízo aos acionistas
minoritários. Ao contrário, eles se beneficiam do eventual aumento
da liquidez de suas ações304.
O grupamento é a operação inversa a do desdobramento. Tal
como o desdobramento, implica em alteração do número de ações
sem modificação do valor do capital social; a companhia substitui o
número de ações existentes por uma quantidade menor de ações com
o conseqüente aumento de seu valor nominal, quando for o caso.
Essa operação pode ser deliberada em companhias com ações com
valor nominal ou sem valor nominal305. O grupamento não implica
redução da participação dos acionistas no capital da companhia306-307.
S E Ç Ã O OS
P R E Ç O DE E M I S S Ã O
A Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, em seu Capítulo III, Seção II dispõe que:
"No sistema do Projeto, ao contrário do que ocorre nas práticas atuais no nosso mercado, a
emissão de ações por preço superior ao valor nominal (ou seja, com ágio) deverá ser a regra,
e não a exceção, para maior proteção aos acionistas minoritários (art 171, § Io). O artigo 13
mantém a norma da lei em vigor que veda a emissão de ações por preço inferior ao valor
nominal, fundamental à preservação da realidade do capital social".
Ver os comentários ao art. 5 o da Lei das S.A.
T U L L I O ASCARELLI, "Sociedade por Ações - Preferência e Emissão Acima do Par", Revista
Forense. São Paulo: Ed. Forense, v. 98, abril, 1944, p. 280. FRAN MARTINS. Comentários
à Lei das Sociedades Anônimas, v. 1, Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 91-92, observa que:
'(...) sendo, por acaso, emitidas ações por preço inferior ao seu valor nominal, não haveria
equivalência, quanto aos recursos entrados para a sociedade, entre o capital e a contribuição
efetiva dos sócios. Sendo o capital a garantia mínima dos credores, essa garantia não existiria,
visto não corresponderem ao capital as importâncias com que os sócios entraram efetivamen-
te para a sociedade".
FRANCISCO CAMPOS, "Sociedade por Ações - Emissão de Ações com Ágio ou Acima de
seu Valor Nominal", Revista Forense. São Paulo: Ed. Forense, v. 97, janeiro, 1944, p. 327.
No mesmo sentido, C A R L O S F U L G È N C I O DA C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações,
v. 1, São Paulo: Saraiva, 1972, p. 155-156.
Na hipótese de emissão de ações por preço inferior ao valor no-
minal, a lei determina a nulidade do ato ou operação e a emissão
jamais se convalida, por ser ineficaz e insuscetível de ratificação322.
Os terceiros prejudicados de boa-fé têm direito ao ressarcimento
dos danos sofridos, pois, como a Lei das S A . determina que haverá nu-
lidade do ato ou operação, considera-se inexistente a emissão de ações323.
Da nulidade do ato de emissão de ações decorre, ainda, a respon-
sabilidade civil e penal dos infratores. A responsabilidade civil abran-
ge os danos e prejuízos causados à companhia, aos seus acionistas e
credores. Em qualquer das hipóteses, respondem os acionistas - que
contribuíram com o seu voto para o ato nulo - , os fundadores, e os
administradores, conforme o caso.
A responsabilidade penal poderá ocorrer se verificada quaisquer
das hipóteses previstas no Código Penal, na parte que trata das frau-
des e abusos na fundação ou administração das sociedades por ações324.
No sistema da Lei das S.A, a emissão de ações por preço superior
ao valor nominal, ou seja, com ágio, deverá ser a regra e não a exce-
ção325. É por essa razão que a Lei das S.A determina que, nos aumen-
tos de capital por subscrição de ações, o preço de emissão deve ser fixado
de acordo com o valor real da ação, ou seja, deve ser abandonado o valor
nominal como parâmetro para determinar a contribuição do subscritor.
Nessas hipóteses, o preço de emissão deverá ser fixado tendo em vista,
alternativa ou conjuntamente, a perspectiva de rentabilidade da com-
322 Consta do art. 166, incisos V, VI e VII do Código Civil, que é nulo o ato jurídico quando
for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para sua validade ou tiver por
objetivo fraudar lei imperativa ou, ainda, quando a lei taxativamente o declara nulo.
323 P H I L O M E N O J. DA C O S T A . Anotações às Companhias, v. I, São Raulo: Revista dos Tribu-
nais, 1980, p. 241. N o mesmo sentido, C A R L O S EU.LGÊNCIO D A C U N H A PEIXOTO.
Sociedades por Ações ..., v. 1, p. 161 -162; E D U A R D O D E C A R V A L H O . Teoria e Prática das
Sociedades Anônimas, v. I, São Raulo: José Bushatsky, 1960, p. 68; W I L S O N CAMPOS DE
S O U Z A BATALHA. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio de Janeiro:
Forense, 1977, p. 182-183.
324 Vide art. 177 do Código Penal.
325 Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976.
panhia, o valor do patrimônio líquido da ação, e/ou a cotação de suas
ações em Bolsa de Valores ou no mercado de balcão organizado, admi-
tindo ágio ou deságio em função das condições de mercado (artigo
170, § I o ). Mesmo na subscrição inicial, as ações podem ser emitidas
por valor superior ao nominal (artigo 84, inciso III).
O ágio aumenta as reservas da sociedade e contribui para o in-
cremento de valor do seu patrimônio; assim, constitui uma garantia
adicional para as atividades sociais326.
Na subscrição de ações, o ágio existe quando a ação emitida pela
companhia é subscrita por preço de emissão superior ao de sua con-
tribuição para a formação do capital social. Quando a ação tem valor
nominal, o ágio será a parte do preço de .emissão que exceder a esse
valor. Nas ações sem valor nominal, o ágio é a parte do preço de emis-
são que ultrapassa a importância destinada à formação do capital so-
cial fixada, na constituição da companhia, pelos fundadores, e no
aumento de capital, pela assembleia geral ou pelo conselho de admi-
nistração (artigo 14, caput).
Para o investidor, o ágio justifica-se sempre que as ações da com-
panhia apresentam boas perspectivas de rentabilidade. A lei determi-
na que o ágio na subscrição de ações deve ser registrado na escrituração
como reserva de capital327, ou seja, não constitui lucro328.
A reserva de capital, na qual é alocado o valor do ágio, somente
poderá ser utilizada para: (i) absorção de prejuízos que ultrapassarem
FRANCISCO CAMPOS, "Sociedade por Ações - Emissão de Ações com Ágio ou Acima de
seu Valor Nominal", Revista Forense ..., v. 97, p. 328-329. Sobre a justificativa para a
cobrança do ágio, ver A L O Y S I O LOPES PONTES, "Cobrança de Ágio em Aumentos de Capital
de Sociedades Anônimas", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro.
São Raulo: Ed. Malheiros, v. 11, 1973, p. 30; C A R V A L H O DE M E N D O N Ç A . Tratado de Direito
Comercial Brasileiro, v. II, t. II, São Paulo: Bookseller, 2001, n° 1.027, p. 444; C A R L O S
FULGENCIO DA C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações ..., v. 1, p. 158.
Vide comentários ao art. 182, § 1°, alínea "a", da Lei das S.A.
V i C E N Z O ALLEGRI, "SulTimpiego dei sopraprezzo d'emissione delle azioni", Rivista Delle
Società. Milano: Giuffrè, Ano X, 1965, p. 1.009-1.016; G I A N C A R L O FRÈ. Socità per
Azioni; Ciommentario dei Códice Civile a cura de Antonio Scialojà e Giuseppe Branca,
libro quinto-del lavoro, art. 2.325-2.461, Roma: Ed. Del Foro Italiano, 1982, p. 716.
os lucros acumulados e as reservas de lucros; (ii) resgate, reembolso
ou compra de ações; (iii) resgate de partes beneficiárias; (iv) incorpo-
ração ao capital social; e (v) pagamento de dividendo a ações prefe-
renciais, quando essa vantagem lhes for assegurada, (artigo 200).
Ações
j sem valor nominal
"Art. 14. O preço de emissão das ações sem valor nominal será
fixado, na constituição da companhia, pelos fundadores, e no au-
mento de capital, pela assembleia geral ou pelo conselho de admi-
nistração (artigos 166 e 170, § 2 o ).
329 D e acordo com a Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, as ações sem valor
nominal "oferecem maior flexibilidade nos aumentos de capital social, e cuja existência
contribuirá para diminuir a importância atribuída ao valor nominal das ações pelos participan-
tes do nosso mercado de capitais, em prejuízo do seu funcionamento normal".
330 Ver os comentários ao art. 11 da Lei das S.A.
331 Sobre esse assunto, ver M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades
Anônimas, v. 1, 5 a edição, São Raulo: Saraiva, 2007, p. 161.
A principal utilidade prática das ações sem valor nominal é a de
permitir a emissão de ações a preço inferior à contribuição para o
capital social das ações antigas. Na companhia com ações com valor
nominal, se a cotação das ações no mercado é inferior a esse valor, a
sociedade fica praticamente impedida de aumentar o capital, tendo
em vista que a Lei das S.A. veda, expressamente, a emissão de ações
por preço inferior ao seu valor nominal (artigo 13, caput)] não há ra-
zão para os investidores pagarem no mercado primário preço por ação
superior àquele pelo qual podem comprá-la no mercado secundário.
A ação sem valor nominal é de maior utilidade para a companhia,
pois ela tem flexibilidade para fixar o preço de emissão das novas ações
de acordo com as circunstâncias do mercado332.
A ação sem valor nominal não contém a expressão monetária da
sua participação no montante do capital social; é estimada, em prin-
cípio, como fração do capital e negociada a preços de mercado333.
Na constituição da companhia, o preço de emissão das ações
sem valor nominal é estabelecido pelos fundadores e estes não são
obrigados a observar um critério determinado para sua fixação; no
entanto, o prospecto deverá mencionar, com precisão e clareza, os
motivos que justifiquem a expectativa de bom êxito do empreendi-
mento, em especial o preço de emissão das ações (artigo 84, inciso
II), pois a responsabilidade dos acionistas será limitada ao preço de
emissão das ações subscritas334-335 (p- sesJ.
332 JOSÉ LUIZ BULHÕES PEDREIRA, "Definição no Estatuto das Vantagens Ratrimoniais das Ações
Preferenciais". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.:
(pressupostos, elaboração, aplicação), v. II, 2 a edição, Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p. 85.
333 PHILOMENO J. DA COSTA. Anotações às Companhias, v. I, São Raulo: Revista dos Tribu-
nais, 1980, p. 237 e 247; A L F R E D O LAMY FILHO. Temas de S.A. Rio de Janeiro: Renovar,
2007, p. 190.
334 M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. 1, p. 166,
lembra que "no valor de emissão devem-se levar em conta principalmente as necessidades
patrimoniais (capital de investimento) e operacionais (capital de giro) da companhia e,
subsidiariamente, as operações ensejadas pelos recursos da reserva de capital, notadamente
a de negociação da companhia com suas próprias ações (art. 200). Portanto, o valor de
emissão deve ser adequadamente dimensionado quanto ao seu valor total, e equilibrado
quanto à sua destinação".
Nos aumentos de capital, o preço de emissão das ações é fixado
pela assembleia geral ou pelo conselho de administração (artigos 168,
§ I o , alínea "b", e 170, § 2 o ), de acordo com o seu valor real, sem dilui-
ção injustificada da participação dos antigos acionistas, tendo em vista,
alternativa ou conjuntamente, a perspectiva de rentabilidade da com-
panhia, o valor do patrimônio líquido da ação, e/ou a cotação de suas
ações em Bolsa de Valores ou no mercado de balcão organizado336.
O mesmo procedimento deve ser observado na hipótese de ca-
pital autorizado; a cada emissão cabe ao órgão que a autoriza fixar o
valor real da ação, de acordo com os critérios acima referidos.
Na companhia com ações sem valor nominal, a capitalização de
lucros ou reservas poderá ser efetivada sem modificação do número
de ações (artigo 169, § I o ).
A emissão de ações sem valor nominal com parte destinada à
formação de reserva de capital, ou seja, com sobrepreço, é expressa-
mente prevista no parágrafo único deste artigo.
O ágio existe quando a ação emitida pela companhia é subscrita
por preço de emissão superior ao de sua contribuição para a formação
do capital social. Quando a ação tem valor nominal, o ágio será a
parte do preço de emissão que exceder a esse valor337. Nas ações sem
valor nominal, o ágio é a parte do preço de emissão que ultrapassa a
importância destinada à formação do capital social338.
O ágio incrementa as reservas da sociedade e contribui para o
aumento de valor do seu patrimônio, constituindo uma garantia adi-
cional para as atividades sociais339.
Forense, v. 97, janeiro, 1944, p. 328-329. Sobre a razão da existência do ágio, ver
A L O Y S I O LOPES PONTES, "Cobrança de Ágio em Aumentos de Capitai de Sociedades
Anônimas", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Pau-
lo: Ed. Malheiros, v. 11, 1973, p. 30; C A R V A L H O D E M E N D O N Ç A . Tratado de Direito
Comercial Brasileiro, v. II, t. II, São Paulo: Bookseller, 2001, n° 1.027, p. 444; C A R L O S
F U L C Ê N C I O D A C U N H A P E I X O T O . Sociedades por Ações. v. 1, São Paulo: Saraiva,
1972, p. 158.
340 Ver comentários ao art. 182, § 1 o , alínea "a", da Lei das S.A.
341 Sobre esse assunto, ver V I C E N Z O A L L E G R I , "Sull'impiego dei sopraprezzo d'emissione
delle azioni", Rivista Delle Società. Milano: Giuffrè, A n o X, 1965, p. 1.009-1.016;
G1ANCARLO FRÈ. Socità per Azioni; Ciommentario dei Códice Civile a cura de Antonio
Scialojà e Giuseppe Branca, libro quinto-del lavoro, art. 2325-2461, Roma: Ed. Del Foro
Italiano, 1982, p. 716.
De acordo com a Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, "para proteger o interesse
dos demais acionistas, o parágrafo único do artigo 14 veda contribuição para formação do
capital social em montante inferior ao valor de reembolso assegurado prioritariamente a
ações preferenciais".
das ações. Somente a quantia que exceder esse valor poderá formar a
reserva de capital343-344.
SEÇÃO III
ESPÉCIES E C L A S S E S
Espécies
'Art. 15. As ações, conforme a natureza dos direitos ou vantagens que
confiram a seus titulares, são ordinárias, preferenciais ou de fruição.
349 No entanlo, o art. 172 da Lei das S.A., que trata da exclusão do direito de preferência,
determina que o estatuto da companhia aberta que contiver autorização para o aumento
do capital pode prever a emissão, sem clireito de preferência para os antigos acionistas, ou
com a redução do prazo de que trata o § 4 o do art. 171, de ações e debêntures conversíveis
em ações, ou bônus de subscrição, cuja colocação seja feita mediante venda em Bolsa de
Valores ou subscrição pública ou, ainda, permuta de ações em oferta pública de aquisiçao
de controle, nos termos dos arts. 257 e 263 da Lei das S.A. Estabelece, também, que o
estatuto da companhia, ainda que fechada, pode excluir o direito de preferência para
subscrição de ações nos lermos de lei especial sobre incentivos fiscais.
350 Ver os comentários ao art. 109 da Lei das S.A.
351 JOSÉ L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA. Finanças e Demonstrações Financeiras da Companhia;
Conceitos Fundamentais ..., p. 403. Sobre esse assunto, ver, também, EGBERTO LACERDA
TEIXEIRA e JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREIRO. Das Sociedades Anônimas no Direi-
to Brasileiro, v. 1, São Paulo: José Bushatsky, 1979, p. 188.
tal, com prêmio ou sem ele; ou (iii) na acumulação dessas 2 (duas)
preferências e vantagens.
Para que as ações preferenciais, sem direito de voto ou com
restrição ao exercício desse direito, emitidas por companhias abertas,
possam ser admitidas à negociação no mercado de valores mobiliários,
o estatuto deve estabelecer pelo menos um dos 3 (três) tipos de
privilégios previstos no § I o do artigo 17, além de, facultativamente, o
direito de prioridade no recebimento do valor de reembolso na
liquidação da companhia, com prêmio ou sem ele332.
No entanto, para compensar as vantagens atribuídas às ações
preferenciais, elas podem ser privadas do exercício do direito de voto
(artigo 111, caput).Trata-se de uma troca de direitos patrimoniais por
políticos, que só permanece em vigor enquanto for assegurado aos
titulares dessa ação o pagamento do dividendo mínimo ou fixo, pois,
na falta desse pagamento, pelo prazò máximo de 3 (três) exercícios
consecutivos, as ações preferenciais adquirem o direito de voto333.
Não obstante a negação ou restrição do direito de voto aplicada
às ações preferenciais, (i) na constituição do conselho fiscal, os seus
titulares terão direito de eleger, em votação em separado, um membro
e respectivo suplente (artigo 161, § 4 o , alínea "a"); (ii) os titulares de
ação preferencial podem comparecer à assembleia geral e discutir a
matéria submetida à deliberação (artigo 125, parágrafo único); e (iii)
na liquidação da companhia essas ações gozam do direito de voto,
tornando-se ineficazes as restrições ou limitações porventura exis-
tentes; cessando o estado de liquidação, restaura-se a eficácia das res-
trições ou limitações relativas ao direito de voto (artigo 213, § I o ).
Sobre as preferências que devem constar do estatuto de uma companhia para que suas
ações preferenciais sejam negociadas no mercado de valores mobiliários, ver os comentá-
rios ao § 1 o do art. 17 da Lei das S.A. Note-se que, a distinção feita pela Lei n° 10.303/2001
foi entre as ações preferenciais negociadas no mercado de valores mobiliários e as ações
preferenciais que não são negociadas nesse mercado.
Ver os comentários ao art. 111 da Lei das S.A.
Não pode existir ação preferencial sem direito de voto caso não
lhe seja atribuído um privilégio econômico, na repartição dos lucros
ou no reembolso de capital3S4. A negação ou restrição ao direito de
voto às ações preferenciais depende de previsão estatutária clara e
expressa, uma vez que, em princípio, todas as ações têm direito de
voto. Na omissão do estatuto, os titulares de ações preferenciais go-
zam integralmente do direito de voto, sem qualquer restrição.
A Lei das S A . requer que o estatuto da companhia com ações
preferenciais declare as vantagens ou preferências atribuídas a cada
classe dessas ações e as restrições a que ficarão sujeitas (artigo 19) e,
entre essas restrições, autoriza expressamente a exclusão ou limitação
do direito de voto355.
As ações preferenciais podem ser de diversas classes, conforme
os direitos a elas atribuídos. E necessária a aprovação de acionistas
que representem metade, no mínimo, das ações com direito a voto, se
maior quorum não for exigido pelo estatuto da companhia cujas ações
não estejam admitidas à negociação em Bolsa de Valores ou no mer-
cado de balcão, para deliberação sobre alteração nas preferências, van-
tagens e condições de resgate ou amortização de uma ou mais classes
de ações preferenciais, salvo se já previsto ou autorizado pelo estatuto
(artigo 136, inciso II).
Não obstante, a eficácia dessa deliberação depende de prévia apro-
vação ou da ratificação, em prazo improrrogável de um ano, de titulares
de mais da metade de cada classe de ações preferenciais prejudicadas,
reunidos em assembleia especial convocada especificamente para esse
fim (artigo 136, § 2o). O acionista titular de ação preferencial dissidente
354 Sobre esse assunto, ver A L F R E D O L A M Y FILHO, "Doação de Ações Nominativas sem a
Assinatura do Termo no Livro Próprio". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira
(Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração, aplicação), v. II, 2 a edição, Rio de
Janeiro: Renovar, 1996, p. 148; P H I L O M E N O J. DA COSTA, "Direito de Acionista Preferen-
cial", Revista dos Tribunais. São Rwlo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 478, agosto, 1975, p. 39.
355 Ver os comentários ao art. 111 da Lei das S.A.
da deliberação poderá retirar-se da sociedade, mediante reembolso do
valor de suas ações (artigo 137, caput e inciso I).
A ação de fruição, pouco comum na prática do mercado, é aque-
la distribuída ao acionista quando sua ação, ordinária ou preferencial,
é amortizada, ou seja, quando a sociedade distribui aos acionistas im-
portâncias que eles teriam direito a receber na liquidação da socieda-
de, o que somente pode ocorrer à conta de lucros ou reservas
disponíveis, portanto, sem redução do capital social (artigo 44, caput e
§ 2o)356.
O titular das ações de fruição continua acionista da companhia
e tem todos os direitos que lhe conferiam essas ações antes de sua
amortização, salvo o de participar do rateio em caso de liquidação357.
As ações amortizadas só concorrerão ao acervo líquido depois de
assegurado às ações não amortizadas valor igual ao da amortização
(artigo 44, § 5 o ). *
Na vigência do Decreto-Lei n° 2.627/1940, a emissão de ações
preferenciais sem direito de voto era limitada à metade do capital da
companhia. A Lei das S.A., no § 2 o do artigo 15, inovou ao determi-
nar que as ações preferenciais sem direito de voto ou com restrição a
364 Consta do Regulamento do Novo Mercado que o diretor geral da BM&FBovespa poderá
conceder autorização para negociação no Novo Mercado para a companhia que preencher
determinadas condições mínimas, estabelecendo, entre essas condições, que ela "tenha
seu capita! social dividido exclusivamente em ações ordinárias, exceto em casos de
desestatização, se se tratar de ações preferenciais de ciasse especial que tenham por fim
garantir direitos políticos diferenciados, sejam intransferíveis e de propriedade do ente
desestatizante, devendo referidos direitos ter sido objeto de análise prévia pela BOVESPA"
(item 3.1, inciso (vii)).
365 Consta da Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, que essa flexibilidade da Lei das
S.A. de admitir, nas companhias fechadas, mais de uma classe de ações ordinárias, seria
'N&sjoint ventiires, por exemplo, a flexibilidade prevista no artigo
16 é útil, em função, principalmente, do direito de voto em separado
para o preenchimento de determinados cargos de órgãos administra-
tivos. É possível, dessa forma, a repartição da gestão entre os diversos
grupos que se associam no empreendimento comum366-367.
O estatuto da companhia fechada deve regular as classes de ações
ordinárias em função de: (i) conversibilidade em ações preferenciais;
(ii) exigência de nacionalidade brasileira do acionista368; ou (iii) direito
de voto em separado para o preenchimento de determinados cargos de
órgãos administrativos. No silêncio do estatuto, as ações ordinárias se-
rão de classe única. A enumeração das classes de ações ordinárias cons-
tante dos incisos I a III é taxativa369; trata-se de norma que excepciona
a regra geral de que não há classes de ações ordinárias.
373 Nesse sentido se manifestou a 3'1 Turma do Tribunal Federal de Recursos no julgamento da
Apelação Cível n° 99.073-DF: "(...) nas sociedades cujo capital é constituído de classes de
ações ordinárias nominativas, a alteração dos direitos conferidos a uma classe, se não for
regulada no estatuto, há de contar com a prévia concorrência da unanimidade dos acionistas
da classe. Não pode a assembleia geral decidir sobre a modificação dos direitos de uma
classe sem o pressuposto daquela concordância. Pode o estatuto regular a hipótese preven-
do a tomada da decisão dos acionistas da classe por maioria. O que não pode é subsumir
na vontade da assembleia geral a vontade dos acionistas da classe atingida. Trata-se de
restrição à soberania da assembleia geral, prevista no parágrafo único do art. 16 da Lei
6.404/76. A regulamentação exigida é defensiva dos interesses do grupo de acionistas,
submetida a vontade da assembleia geral à vontade do grupo (...)". In: A R N O L D O WALD,
"Interpretação do art. 16 da Lei 6.404/76 - Descabimento de Assembleia Especial de
Acionistas Ordinários de Determinada Classe", Revista dos Tribunais. São fóulo: Ed. Revis-
ta dos Tribunais, v. 626, dezembro, 1987, p. 8.
374 Conforme M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. 1,
p. 195, ao comentar que não pode "o estatuto prever que alterações futuras poderão ser
feitas independentemente da concordância dos titulares das classes atingidas, ou seja, por
maioria dos acionistas com a direito a voto. O que pode o estatuto determinar é a modifica-
ção futura em si mesma". Em sentido contrário, A R N O L D O W A L D , "Interpretação do art. 16
da Lei 6.404/76 - Descabimento de Assembleia Especial de Acionistas Ordinários de
Determinada Classe", Revista dos Tribunais ..., v. 626, p. 7-20. W I L S O N D E S O U Z A
C A M P O S B A T A L H A . Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio de Janeiro:
Forense, 1977, p. 200, sustenta que "pode o estatuto da companhia fechada estabelecer
que a assembleia geral, mediante o quorum e a maioria que especificar, altere o estatuto na
parte em que regula a diversidade de classes de ações ordinárias".
3 75 L U I Z G A S T Ã O PAES D E B A R R O S LEÃES. Pareceres. v. I, São Raulo: Singular, 2004, p.
395-396, observa que "a exigência da concordância da totalidade dos que participam da
mesma classe de ações, para a aprovação do estatuto na parte em que regula a diversida-
de de classes, se justifica, pela razão óbvia de que o objetivo para a adoção de diversas
classes de ações ordinárias é o de permitir, numa companhia fechada, a composição ou
conciliação de interesses, assegurando a todos a imutabilidade das condições acordadas".
Ações preferenciais
"Art. 17. As preferências ou vantagens das ações preferenciais
podem consistir: (Redação dada pela Lei n° 10.303/2001)
§5° Salvo ó caso de ações com dividendo fixo, o estatuto não pode
excluir ou restringir o direito das ações preferenciais de participar
dos aumentos de capital decorrentes da capitalização de reservas
ou lucros (artigo 169). (Redação dada pela Lei n° 10.303/2001)
Recurso Especial n° 267.256-BA, Rei. Min. César Asfor Rocha, j. em 21.08.2001, publicada
no D J U em 05.11.2001, comentada por M A R Í L I A C A M A C H O , "Dividendos de Ações
Preferenciais", Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. São Paulo: Ed.
Revista dos Tribunais, v. 14, outubro-dezembro, 2001, p. 101-113.
378 M O D E S T O C A R V A L H O S A e N E L S O N EIZIRIK. A Nova Lei das S.A. São Paulo: Saraiva,
2002, p. 87-88.
379 Sobre esse assunto, LUIZ C A S T Ã O PAES DE BARROS LEÃES, "Dividendos Mfnimos Cumulativos
e Participantes", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e financeiro. São Raulo: Ed.
Malheiros, v. 109, janeiro-março, 1998, p. 166-167, observa que: "o direito prioritário das ações
pode ser fixo ou mínimo, sendo que o fixo representa um teto, após o qual o acionista não participa
dos lucros remanescentes, e o mínimo, um piso, participando dos lucros remanescentes".
3 80 Sobre a definição de d i v i d e n d o fixo e m í n i m o , ver M A R I A T H E R E Z A W E R N E C K
M E L L O , "Sociedades por Ações", Estudo n° 17. São Paulo: Resenha Universitária,
1979, p. 1 . 0 8 5 - 1 . 0 9 1 .
381 JOSÉ L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA e A L F R E D O L A M Y FILHO, "Ações como ferticipação
Societária". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito das
Companhias, v. i, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 252.
Não é garantido à ação preferencial o recebimento do dividendo
prioritário, fixo ou mínimo, pois este somente pode ser pago se hou-
ver lucro. No caso de ser assegurado a essa ação dividendo cumulati-
vo, o dividendo fixo ou mínimo que deixar de ser pago em um exercício
acumulará ao devido nos exercícios seguintes, e quando a companhia
voltar a realizar lucro a ação preferencial receberá integralmente seus
dividendos. Enquanto os dividendos cumulativos não forem integral-
mente liquidados, nenhum dividendo poderá ser pago aos titulares de
ação ordinária.
O montante do dividendo prioritário, fixo ou mínimo, deve ser
determinado ou determinável no estatuto. E juridicamente impossí-
vel o estatuto criar ação com dividendo prioritário não determinado
nem determinável. A estipulação estatutária que atribui às ações pre-
ferenciais prioridade na distribuição de dividendo sem definir seu
montante cria obrigação de objeto indeterminado382-383.
A Lei n° 9.457/1997 atribuiu às ações preferenciais que possuí-
am, como única vantagem, uma prioridade no reembolso de capital, o
direito a receber dividendos 10% (dez por cento) superiores aos que
382 JOSÉ L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA, "Ações Preferenciais", in: Alfredo Lamy Filho e José Luiz
Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração, aplicação), v. II, T
edição, Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p. 81.
383 Para uma obrigação ser válida, seu objeto há de ser determinado ou determinável. D e
acordo com M A R I A H E L E N A D I N I Z . Curso de Direito Civil: Teoria Geral das Obriga-
ções. v. 2, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 39, a obrigação é determinada quando houver
perfeita individuação do objeto da prestação desde a constituição da relação creditória
e "será determinável quando sua individuação for feita no momento de seu cumprimen-
to, mediante critérios estabelecidos no contrato ou na lei, baseados em caracteres co-
muns a outros bens, seja pela indicação do gênero e da quantidade (CC, art. 243),
denominando-se, por isso, obrigação genérica. A prestação de obrigação genérica deve
ser individualizada para que possa ser cumprida. A determinação dependerá da escolha
do devedor ou de terceiro, (...), convertendo-se, então, a obrigação genérica em obriga-
ção específica". D e acordo c o m C A I O M Á R I O D A SILVA P E R E I R A . Instituições de
Direito Civil. v. II, 22 a edição, atualizado por Maria Celina Bodin de Moraes, Rio de
Janeiro: Forense, 2008, p. 25, "o que não é possível, sob pena de equiparar-se à falta de
objeto e, pois, à ineficácia da obrigação, é a indeterminação definitiva, que importa na
própria negação do vínculo, por ausência de objetivação.Quando o objeto é
indeterminável, ou pela própria natureza, ou porque circunstâncias especiais obstam à
determinação, não há obrigação válida".
fossem pagos aos titulares de ações ordinárias384; esse direito era obri-
gatório para quaisquer ações preferenciais sem voto, desde que os es-
tatutos da companhia não lhes assegurassem dividendos fixos ou
mínimos.
A Lei n° 10.303/2001 estabeleceu nítida distinção entre o regi-
me de privilégios das ações preferenciais sem direito a voto ou com
voto restrito negociadas no mercado de valores mobiliários e as não
negociadas nesse mercado.
No que se refere às ações preferenciais sem direito a voto não
negociadas no mercado de valores mobiliários, emitidas por compa-
nhias abertas ou fechadas, a Lei n° 10.303/2001 restaurou o regime
que vigorava na redação original da Lei das S.A., no qual o estatuto
poderia estabelecer prioridade no reembolso do capital com ou sem
prêmio e, ainda, cumulativa ou alternativamente, determinar o divi-
dendo prioritário, fixo ou mínimo. Essas ações deixaram, indepen-
dentemente de previsão estatutária, de ter a garantia legal de um
dividendo no mínimo 10% (dez por cento) maior do que aquele pago
às ações ordinárias, quando o estatuto não lhes atribua dividendos
fixos ou mínimos385.
Com relação à prioridade no reembolso do capital, com ou sem
prêmio, é importante esclarecer que um dos direitos essenciais de to-
dos os acionistas é o de participar do acervo da companhia, em caso
de liquidação (artigo 109, inciso II). Dessa forma, sendo estabelecida
como vantagem das ações preferenciais a prioridade no reembolso do
384 Essa alteração foi introduzida na Lei das S.A. porque a prática empresarial demonstrou que
a prioridade no reembolso do capital não proporcionava ao preferencialista um benefício
patrimonial efetivo, uma vez que a vantagem a que ele fazia jus somente se verificava no
momento da liquidação da sociedade e, ainda assim, caso restasse algum patrimônio após
o pagamento dos credores da companhia ( N E L S O N EIZIRIK, "Ações Preferenciais. Não
Rigamento de Dividendos. Aquisição do Direito de Voto", Revista de Direito Mercantil,
Industrial, Econômico e Financeiro ..., v. 146, p. 24).
385 Em sentido contrário, C A R L O S A U G U S T O D A SILVEIRA L O B O , "Ações Preferenciais -
Inovações da Lei n° 10.303". In: Jorge Lobo (Coord.). Reforma da Lei das Sociedades
Anônimas: Inovações e Questões Controvertidas da Lei n° 10.303, de 31.10.2001. Rio de
Janeiro: Forense, 2002, p. 108.
capital, o acervo líquido será rateado, em primeiro lugar, para essas
ações e apenas o saldo remanescente será atribuído às demais ações.
Portanto, se o acervo líquido for suficiente para reembolsar apenas
essas ações, os demais acionistas não recebem reembolso de capital.
Se as ações têm valor nominal, a definição estatutária da priorida-
de da ação preferencial requer apenas seu enunciado, uma vez que o
montante do capital a ser restituído prioritariamente é o valor nominal
Nas ações sem valor nominal, todavia, a atribuição de prioridade no
reembolso do capital requer a determinação, no próprio estatuto, do
valor do reembolso prioritário. Se o estatuto confere à preferencial ape-
nas prioridade no reembolso de ação sem valor nominal, mas não de-
termina a importância a reembolsar, não satisfaz ao requisito legal sobre
estipulação das vantagens ou preferências da ação preferencial386. Nes-
se caso, a ação preferencial se equipara à ação ordinária e terá, portanto,
direito de voto, pois não terá sido .a ela atribuída qualquer vantagem
patrimonial a justificar a exclusão ou limitação do direito de voto.
A emissão das ações preferenciais sem direito a voto pressupõe a
atribuição de uma vantagem de natureza patrimonial ou econômica,
vis-à-vis as ações ordinárias, como forma de compensar seus titulares
pela não participação no poder político da companhia. Não existe
ação preferencial sem a atribuição de uma vantagem patrimonial ao
acionista, visto que a subtração do direito de voto só é possível en-
quanto compensada por um privilégio econômico, na repartição dos
lucros ou no reembolso de capital. É por essa razão que a Lei das S.A.
dispõe, nos artigos 19 e 111, que o estatuto da companhia com ações
preferenciais declarará as vantagens ou preferências atribuídas a cada
classe dessas ações e as restrições a que ficarão sujeitas e poderá dei-
xar de conferir a essas ações algum ou alguns dos direitos reconheci-
387 JOSÉ LUIZ BULHÕES PEDREIRA e A L F R E D O LAMY FILHO, "Ações como Participação
Societária". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito das
Companhias v. I, p. 259.
panhia ser aberta apenas em razão de emissão pública de debêntures,
por exemplo, não será obrigatória a observância dos privilégios míni-
mos para as ações preferenciais sem voto, pois não são negociadas no
mercado de valores mobiliários388.
Para que sejam admitidas à negociação no mercado de valores
mobiliários, as ações preferenciais sem voto das companhias abertas,
além do eventual direito de prioridade no reembolso do capital, de-
vem ter, obrigatoriamente, pelo menos um dos seguintes privilégios
mínimos, fixados em seu estatuto: (i) direito a participar numa parce-
la de pelo menos 25% (vinte e cinco por cento) do lucro líquido do
exercício, apurado nos termos do artigo 202 — que regula o dividendo
obrigatório - , sendo que desse montante lhes será garantido um divi-
dendo prioritário de pelo menos 3% (três por cento) do valor do patri-
mônio líquido da ação, e, ainda, o direito de participar do eventual
saldo desses lucros distribuídos, em igualdade de condições com as
ordinárias, depois de a estas assegurado dividendo igual ao mínimo
prioritário; ou (ii) direito ao recebimento de um dividendo, por ação
preferencial, pelo menos 10% (dez por cento) maior do que o atribuído
a cada ação ordinária; ou (iii) direito de receber um dividendo pelo
menos igual ao das ações ordinárias e cumulativamente o direito de
serem incluídas na oferta pública de alienação de controle em igual-
dade de condições com as ações com direito a voto não integrantes
do bloco de controle (artigo 254-A) 389 .
As preferências previstas nas alíneas "a" e "b" do inciso I do § I o
são cumulativas, isto é: o acionista terá prioridade no recebimento de ao
menos 3% (três por cento) sobre o valor do patrimônio líquido da ação
e mais o direito de participar dos lucros eventualmente remanescentes
388 Sobre a alteração dos direitos existentes anteriormente à publicação da Lei n° 10.303/2001
e o prazo dentro do qual o estatuto social deveria ser adaptado para refletir os privilégios
das ações preferenciais negociadas no mercado de valores mobiliários, de acordo com a
nova redação do § 1 o do art. 17, ver MODESTO CARVALHOSA e NELSON EIZIRIK. A Nova
Lei das S/A ..., p. 102-104.
MODESTO CARVALHOSA e NELSON EIZIRIK. A Nova Lei das S/A ..., p. 90-91.
em igualdade de condições com as ordinárias, depois de assegurado a
estas dividendo igual ao mínimo. Ou seja, não há, nesse caso, dividendo
fixo; trata-se de dividendo mínimo, pois essas ações têm direito de par-
ticipar no saldo dos lucros eventualmente remanescentes, após assegu-
rado às ações ordinárias um dividendo igual a esse mínimo390.
Nessa hipótese, o cálculo do dividendo mínimo deve ser efetuado
com base no valor do patrimônio líquido contábil da ação, calculado o
dividendo anual com base nas demonstrações financeiras levantadas
no encerramento do exercício social.
No que se refere aos dividendos intercalares, o percentual de 3%
(três por cento), previsto na alínea "a" do inciso I do § I o , deve ser
calculado com base nas demonstrações financeiras referentes ao pe-
ríodo em que os dividendos serão pagos, sejam elas mensais, trimes-
trais ou semestrais391.
O piso previsto na Lei das S.A., tanto para a parcela do lucro
líquido do exercício a ser distribuída a essas ações preferenciais (25%)
quanto para o dividendo mínimo a ser pago prioritariamente (3% do
valor de patrimônio líquido da ação), pode ser majorado.
Na hipótese de os acionistas titulares de ações preferenciais sem
direito a voto negociadas no mercado de valores mobiliários receberem
os dividendos calculados de acordo com o previsto no inciso I e o
lucro remanescente não for suficiente para garantir aos titulares de
ações ordinárias dividendo igual ao mínimo atribuído às preferenciais,
apenas a sobra lhes será distribuída.
A vantagem a que se refere o inciso II, ou seja, a atribuição às
ações preferenciais sem voto negociadas no mercado de valores mo-
biliários de dividendo, por ação, pelo menos 10% (dez por cento) maior
Sobre a adaptação estatutária decorrente das alterações introduzidas pela Lei n° 10.303/
2001 e o direito de recesso, ver M O D E S T O C A R V A L H O S A e N E L S O N EIZIRIK. A Nova Lei
das S/A ..., p. 100-108; P A U L O C E Z A R A R A C Ã O , "Ações Preferenciais. Adequação às
Regras Impostas pela Lei 10.303/2001", Revista do Direito Bancário, do Mercado de
Capitais e da Arbitragem. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 19, janeiro-março, 2003,
p. 56-72; Decisão da C V M nas Consultas sobre o art. 8° da Lei n° 10.303/2001 e o art. 17,
§ 1°, da Lei n° 6.404/1976, publicada na Revista do Direito Bancário, do Mercado de
Capitais e da Arbitragem. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 19, janeiro-março, 2003,
p. 169-175.
Sobre esse assunto, ver M A U R O R O D R I G U E S P E N T E A D O , "Ações Preferenciais". In: Jorge
Lobo (Coord.). Reforma da Lei das Sociedades Anônimas - Inovações e Questões Contro-
vertidas da Lei n° 10.303, de 31.10.2001. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 196.
Sobre esse assunto, P H I L O M E N O J. DA COSTA. Anotações às Companhias, v. I, São Raulo:
Revista dos Tribunais, 1980, p. 299: "há várias espécies de dividendos, mas não pode
nenhum ser declarado, se não houver lucros apurados antes. Este princípio, mesmo que não
constasse expressamente da lei, tinha que se considerar existente implicitamente. Não se
tanto, não prevalece para a sociedade em liquidação, caso o estatuto
assim disponha. Nessa hipótese, os credores não são prejudicados,
pois receberão seus créditos no processo de liquidação antes do rateio
do acervo líquido397.
A companhia somente pode pagar dividendos à conta de lucro líquido
do exercício e de reserva de lucros (artigo 201, caput), salvo a hipótese
expressamente prevista no § 6o, que permite que o estatuto confira às
ações preferenciais com prioridade na distribuição de dividendo cumulativo
o direito de recebê-lo, no exercício em que o lucro for insuficiente, à
conta das reservas de capital de que trata o § I o do artigo 182.
Somente os dividendos cumulativos podem ser pagos à conta de
reserva de capital e, ainda assim, no exercício em que o lucro apurado
for insuficiente; embora seja exceção ao princípio geral de que os
dividendos somente podem ser distribuídos à conta de lucros ou de
reservas de lucros, não prejudica os credores, que têm no capital social
a sua garantia398.
O § 4 o , que corresponde ao original § 2 o , contém norma supleti-
va de interpretação de disposições estatutárias, para evitar o induzi-
mento em erro de subscritores ou acionistas pela omissão ou má
redação do estatuto399. Se o estatuto estabelece que o dividendo é
cumulativo, o dividendo ou parte dele que deixar de ser pago em um
exercício, por insuficiência de lucro, acumulará para o exercício se-
guinte, e assim por diante, até o pagamento do total acumulado.
402 O art. 8 o da Lei n° 3.031/1990 determinava que: "sempre que houver razões que o justifi-
quem, a União deterá, direta ou indiretamente, ações de classe especial do capital social de
empresas privatizadas, que lhe confiram poder de veto em determinadas matérias, as quais
deverão ser caracterizadas nos estatutos sociais das empresas, de acordo com o estabeleci-
do no art. 6°, inciso XIII e §§ Io e 2" desta lei".
403 A Lei n° 9.491/1997, revogando a Lei n" 8.031/1990, passou a prever para essas ações
"poderes especiais em determinadas matérias", o que ampliou os direitos que poderiam ser
conferidos às golden shares, antes limitados ao direito de veto.
terceiros particulares ou a outros entes públicos. Os poderes conferi-
dos ao ente público titular da golâen share deverão ser detalhadamen-
te especificados no edital de privatização e no contrato de concessão
ou permissão, se for o caso, onde deverá constar a minuta do estatuto
social relacionando minuciosamente tais poderes.
Aspecto importante a respeito da criação da golden share é o rela-
tivo às razões que justificam a outorga de direito de veto ou outros
privilégios ao ente público desestatizante em empresas privadas. Deve
o ente desestatizante apresentar as razões de interesse público que
justifiquem a criação dessas ações de classe especial, as quais deverão
constar do edital de privatização.
Embora o § 7 o não exija que a criação da golden share seja justifi-
cada pelo ente desestatizante, como o faziam as leis de privatizações
anteriores, não se poderia conceber a ingerência do Estado na proprie-
dade e em negócios privados, a não ser: em virtude de interesse público.
O direito de veto do ente público sobre determinadas matérias
acarreta uma diminuição no valor de mercado das empresas privatiza-
das, justificando-se, no entanto, pela prevalência do interesse público
no que se refere à manutenção das atividades empresariais privatizadas,
à qualidade dos serviços prestados ou à fixação de preços públicos.
Outro motivo de interesse público que pode justificar a criação da
golden share é a possibilidade de ocorrência de monopolização ou carte-
lização de determinados setores da atividade econômica, com prejuízo
ou obstrução da livre concorrência. Neste caso, o Estado pode exercer
uma função reguladora dos mercados, mantendo-se por período deter-
minado no controle de certas decisões estratégicas da empresa404.
Vantagens políticas
"Art. 1 8 . 0 estatuto pode assegurar a uma ou mais classes de ações
preferenciais o direito de eleger, em votação em separado, um ou
mais membros dos órgãos de administração.
405 MODESTO CARVALHOSA e NELSON EIZIRIK. A Nova Lei das S/A ..., p. 109-117.
406 Sobre esse assunto, ver as disposições constantes dos estatutos sociais quando da
privatização das seguintes companhias: Companhia Energética do Maranhão - Celmar,
Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. - Embraer e Vale S.A.
aprovarem ou ratificarem a alteração de suas vantagens (artigo 136,
inciso II e § Io)407, tendo os dissidentes, titulares de ações da classe
atingida, o direito de se retirar da sociedade (artigo 137, inciso I).
Como compete ao conselho de administração eleger e destituir
os diretores da companhia e fixar-lhes a remuneração, observado o
que a respeito dispuser o estatuto (artigo 142, inciso II), a destituição
do diretor eleito por titulares de ações preferenciais cujas ações pos-
suem esse direito deverá ser efetivada em assembleia geral, porém
mediante votação em separado dos acionistas que têm o direito de
eleger os administradores, e não pelo voto de todos os acionistas408-409.
O caput deste artigo autoriza a votação em separado dos titulares de
ações preferenciais para eleger determinado administrador, sem esta-
belecer que essa votação seja em assembleia especial, como previsto
no parágrafo único.
407 D e acordo corri o art. 136 da Lei das S.A., a eficácia d a deliberação depende de prévia
aprovação ou da ratificação, em prazo improrrogável de um ano, por titulares dè mais da
metade de cada classe de ações preferenciais prejudicadas, reunidos em assembleia espe-
cial convocada por administradores e instalada com as formalidades da Lei das S.A.
408 Nesse sentido, P H I L O M E N O J. D A C O S T A . Anotações às Companhias, v. I, São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1980, p. 322; J O S É L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA, "Eleição de Adminis-
trador por Ações Preferenciais em 'Joint Venture' Organizada com a Forma de Companhia".
In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos,
elaboração, aplicação). Rio de Janeiro: Renovar, 1992, p. 372-375; R U B E N S R E Q U I A O .
Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. 1, São Raulo: Saraiva, 1980, p. 161. Em
sentido contrário, M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas,
v. 1, 5 a edição, São Raulo: Saraiva, 2007, p. 241.
409 JOSÉ L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA, "Eleição de Administrador por Ações Preferenciais em
'Joint Venture' Organizada com a Forma de Companhia". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz
Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração, aplicação) ..., p. 373,
ao analisar o estatuto de uma companhia na qual se atribuiu ao conselho de administração
competência para eleger todos os diretores à exceção do diretor-superintendente e de outro
diretor inominado, que continuariam a ser eleitos pela assembleia geral pelo voto de uma
determinada classe de ações preferenciais, concluiu que essa regra "é compatível com o
sistema da lei porque embora as normas gerais do item I! do artigo 142 e do artigo 143
atribuam ao Conselho de Administração competência para eleger os diretores, o artigo 1S
(que autoriza o estatuto a assegurar às ações preferenciais o direito de eleger, em votação em
separado, um ou mais membros dos órgãos da administração) não distingue entre Conselho
de Administração e diretoria, nem entre sociedade administrada somente por diretores ou por
Conselho de Administração e diretores. O preceito do artigo 18, como norma especial,
prevalece, na hipótese que regula, sobre as normas gerais do item II do artigo 142 e do artigo
143. O estatuto da companhia com Conselho de Administração pode, portanto, atribuir às
ações preferenciais o direito de eleger um ou mais diretores mediante votação em separado
na Assembleia Geral".
Não obstante constar do dispositivo apenas a expressão "direito
de eleger", a interpretação sistemática da lei permite afirmar que, em
princípio, o administrador é destituído do mesmo modo que é eleito410.
Admitir que o administrador eleito em votação em separado, pelos titu-
lares de ações preferenciais, possa ser destituído de seu cargo por deli-
beração dos demais acionistas, implica negar aplicação ao disposto neste
artigo. Se o administrador eleito pelos titulares de ações preferenciais
pudesse ser destituído, a qualquer tempo, por outros acionistas, a vanta-
gem assegurada às ações preferenciais deixaria de existir.
O mesmo procedimento verifica-se na hipótese de renúncia do
administrador eleito por titulares de determinada classe de ações pre-
ferenciais; o cargo vago deverá ser preenchido por votação desses pre-
ferencialistas.
A eleição do administrador pelos titulares de ações preferenciais é
realizada em votação em separado, entre os próprios preferencialistas
que detêm essa faculdade, a qualquer tempo; ou seja, não é vinculada,
necessariamente, à eleição dos demais administradores da companhia.
A Lei das S.A., ao regular o voto múltiplo, assegura aos titulares
de ações preferenciais, sem direito a voto ou com voto restrito, de emis-
são de companhia aberta que representem, no mínimo, 10% (dez por
cento) do capital social, o direito de eleger e destituir um membro e seu
suplente do conselho de administração, em votação em separado na
assembleia geral; no entanto, ressalva, expressamente, que não terão
esse direito aqueles que houverem exercido a faculdade prevista no es-
tatuto em conformidade com este artigo (artigo 141, § 4 o , inciso II)411.
412 FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio de Janeiro: Forense,
1977, p. 117.
413 Sobre esse assunto, M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anôni-
mas ..., v, 1, p. 239, observa que "o direito de veto assegurado estatutariamente às preferen-
ciais não pode abranger todas as alterações estatutárias, sob pena de não restar à assembleia
geral nenhum poder constitutivo na companhia. Apenas alguns assuntos claramente deter-
minados poderão ser objeto dessa audiência dos titulares de ações preferenciais". A CVM,
no Parecer CVM/SJU n° 013/1996, ao analisar consulta sobre norma estatutária que estabe-
lecia depender da maioria dos titulares de ações preferenciais de determinada classe,
reunidos em assembleia especial, alteração estatutária ou decisão administrativa que impli-
casse em certas situações nela elencadas, ressalvou que o art. 139 prevê que as atribuições
e poderes conferidos por lei aos órgãos de administração não podem ser outorgados a
outro órgão, criado por lei ou pelo estatuto e que o parágrafo único do art. 18, protege os
acionistas preferenciais de alterações estatutárias que afetem seus direitos. Conclui, ainda,
que o art. 139 trata de matéria administrativa e que a administração da companhia é
conferida, por lei, ao conselho de administração e à diretoria, cujas respectivas competên-
cias são indelegáveis, ou seja, "é fundamentada a instituição do direito de veto à alteração
estatutária que venha a restringir direitos ou vantagens. Mas não é lógico que por isso possa
admitir o extremo (e até, pensamos, inviável) de o preferencialista poder ser imiscuir na gestão
da companhia, invadindo a competência legal de órgãos. /I dificuldade prática está em
separar-se o joio do trigo, qual seja, a matéria administrativa da estatutária".
admitidas como acréscimo às vantagens patrimoniais; no regime so-
cietário brasileiro não podem existir ações preferenciais que tenham
apenas vantagens políticas414. A emissão das ações preferenciais sem
direito a voto pressupõe a atribuição de uma vantagem de natureza
patrimonial ou econômica, vis-à-vis as ações ordinárias, como forma
de compensar seus titulares pela não participação no poder político
da companhia. Não existe ação preferencial sem a atribuição de uma
vantagem patrimonial ao acionista, visto que a subtração do direito
de voto só é possível enquanto compensada por um privilégio eco-
nômico, na repartição dos lucros ou no reembolso de capital. É por
essa razão que a Lei das S.A. dispõe, nos artigos 19 e 111, que o
estatuto da companhia com ações preferenciais declarará as vanta-
gens ou preferências atribuídas a cada classe dessas ações e as restri-
ções a que ficarão sujeitas e poderá deixar de conferir a essas ações
algum ou alguns dos direitos reconhecidos às ações ordinárias, in-
clusive o de voto, ou conferi-lo com restrições, observado o disposto
no artigo 109.
Os acionistas titulares de ações preferenciais sem direito a voto
ou com voto restrito, além da faculdade — prevista neste artigo - de ter
uma representação na administração da sociedade, têm o direito de
eleger, em votação em separado, um membro e respectivo suplente
para o conselho fiscal (artigo 161, § 4 o , alínea "a"). Nesse caso, não se
trata de uma faculdade a ser concedida ou não pelo estatuto social,
mas de uma imposição legal, pois se está diante do direito de fiscali-
zar a gestão dos negócios sociais, que constitui direito essencial de
todos os acionistas (artigo 109, inciso III).
417 Sobre a negação ou restrição ao direito de voto às ações preferenciais, ver os comentários
ao art. 111 da Lei das S.A.
418 Sobre o fato de não poder o estatuto privar as ações preferenciais do direito de voto sem
que haja uma adequada compensação pecuniária, ver os comentários aos arts. 17 e 18 da
Lei das S.A. Ver, também, N E L S O N EIZIRIK, "Ações Preferenciais. Não Pagamento de
Dividendos. Aquisição do Direito de Voto", Revista de Direito Mercantil, Industrial,
Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Malheiros, v. 146, abril-junho, 2007, p. 23;
A L F R E D O LAMY FILHO, "Vantagem Patrimonial da Ação Preferencial". In: Alfredo Lamy
Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração,
aplicação), v. II, 2 a edição, Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p. 148-153; P H I L O M E N O J. DA
COSTA, "Direito de Acionista Preferencial", Revista dos Tribunais. São Raulo: Ed. Revista
dos Tribunais, v. 478, agosto, 1975, p. 39. Em sentido contrário, LUIZ C A S T Ã O PAES DE
BARROS LEÃES, "Ações Preferenciais Exclusivamente com Vantagens Políticas". In: Piirece-
res. v. II, São Paulo: Singular, 2004, p. 837-848.
tornando-se ineficazes as restrições ou limitações porventura exis-
tentes; cessando o estado de liquidação, restaura-se a eficácia das res-
trições ou limitações relativas ao direito de voto (artigo 213, § I o ).
Poderá, ainda, o estatuto dispor sobre o resgate e/ou a amortiza-
ção das ações preferenciais e estabelecer o modo de proceder-se a
essas operações (artigo 44, caput). O resgate consiste no pagamento
do valor das ações para retirá-las definitivamente de circulação, com
redução ou não do capital social (artigo 44, § l 0 ) 419 . A amortização
consiste na distribuição aos acionistas, a título de antecipação e sem
redução do capital social, de quantias que lhes poderiam tocar em
caso de liquidação da companhia (artigo 44, § 2 o ).
Salvo disposição em contrário do estatuto social, o resgate de
ações de uma ou mais classes só será efetuado se, em assembleia es-
pecial convocada para deliberar essa matéria específica, for aprovado
por acionistas que representem, no mínimo, a metade das ações da(s)
classe(s) atingida(s) (artigo 44, § 6 o ).
Por fim, o estatuto pode regular a conversão de ações de uma clas-
se em ações de outra classe, ou ainda, de ações preferenciais em ações
ordinárias e de ações ordinárias em ações preferenciais. A conversão de
ações é a operação pela qual as ações de uma espécie ou classe são
substituídas por ações de outra espécie ou classe, com modificações
nos direitos e obrigações dos acionistas420. No caso da conversão de
ações preferenciais em ordinárias, o seu titular deixa de fazer jus às
preferências e vantagens econômicas na distribuição de dividendos ou
no reembolso de capital e passa a deter ações com direito a voto.
FORMA
A espécie da ação - que de acordo com a Lei das S.A. pode ser
ordinária, preferencial ou de fruição431 - determina os diferentes di-
reitos dos acionistas e a sua forma está vinculada ao seu modo de
transferência. Não importa de que espécie é a ação, ela será sempre
nominativa432.
A Lei das S.A., na sua redação original, admitia 3 (três) formas
para as ações: nominativas, endossáveis ou ao portador. No entanto, a
Lei n° 8.021/1990, extinguindo os títulos ao portador e os endossá-
veis, alterou a redação deste artigo e a única forma de ação atualmen-
te admitida pela Lei das S.A. é a nominativa.
A ação nominativa pode apresentar-se sob as formas registrada e
escriturai; é aquela em que o nome do seu titular está inscrito no "Livro
de Registro de Ações Nominativas" da companhia — no caso de ser ela
registrada (artigo 100, inciso I) - ou no registro na conta de depósito
das ações, aberta em nome do acionista nos livros da instituição finan-
ceira depositária de suas ações - no caso de ser ela escriturai (artigo 35).
A propriedade da ação nominativa presume-se pela inscrição do
nome do acionista no "Livro de Registro de Ações Nominativas" ou
pelo extrato fornecido pela instituição custodiante, na qualidade de
proprietária fiduciária das ações (artigo 31, caput). A presunção de
propriedade da ação é relativa {júris tantum), admitindo-se, portanto,
prova em contrário433.
434 Sobre a inutilidade dos certificados de ação, ver os comentários ao art. 11 da Lei das S.A.
435 Ver os comentários ao art. 34 da Lei das S.A.
ARTS. 2 1 E 2 2 - A LEI DAS S / A COMENTADA
Determinação no estatuto
"Art. 2 2 . 0 estatuto determinará a forma das ações e a conversi-
bilidade de uma em outra forma.
436 Sobre as conseqüências da mora do acionista, ver os comentários ao art. 107 da Lei das S.A.
A Lei das S.A., na sua redação original, admitia 3 (três) formas
para as ações: (i) nominativas; (ii) endossáveis; ou (iii) ao portador.
No entanto, a Lei n° 8.021/1990, extinguindo os títulos ao portador
e os endossáveis, derrogou implicitamente o artigo 22. A única forma
de ação atualmente admitida pela Lei das S.A. é a nominativa.
SEÇÃO V
CERTIFICADOS
Emissão
"Art. 23. A emissão de certificado de ação somente será permiti-
da depois de cumpridas as formalidades necessárias ao funciona-
mento legal da companhia.
Requisitos
"Art. 24. Os certificados das ações serão escritos em vernáculo e
conterão as seguintes declarações:
437 Vide os comentários aos arts. 20, 31 e 35, § 1°, da Lei das S.A.
438 Sobre a inutilidade dos certificados de ação, ver os comentários aos arts. 11 e 34 da Lei das S.A.
439 Ver os comentários ao art. 34 da Lei das S.A.
I V - o número de ações ordinárias e preferenciais das diversas clas-
ses, se houver, as vantagens ou preferências conferidas a cada clas-
se e as limitações ou restrições a que as ações estiverem sujeitas;
440 Sobre a inutilidade dos certificados de ação, ver os comentários aos arts. 11 e 20 da Lei
das S.A.
441 Sobre o modo como se prova a propriedade e se opera a transferência da ação nominativa,
ver os comentários aos arts. 20, 31 e 35 da Lei das S.A.
Com a extinção, pela Lei n° 8.021/1990, dos títulos ao portador
e endossáveis, a única forma de ação admitida pela Lei das S.A. é a
nominativa. Assim, os certificados de ação perderam a sua principal
função que era a de instrumento que legitimava a condição de sócio.
Dessa forma, este artigo - assim como os artigos 21, 22, 23,24 e
26 - foi derrogado pelo desuso.
Cupões
"Art. 26. Aos certificados das ações ao portador podem ser ane-
xados cupões relativos a dividendos ou outros direitos.
442 Sobre esse assunto, ver os comentários aos arts. 11 e 20 da Lei das S.A.
443. A Instrução C V M n° 89/1988, com as alterações introduzidas pelas Instruções C V M n<*
212/1994 e 261/1997, que dispõe sobre a autorização para prestação de serviços de ações
escriturais, de custódia de valores mobiliários e de agente emissor de certificados prevê, em
seu art. I o , que: "Art. Io. A prestação dos serviços de ações escriturais, de custódia de valores
mobiliários e de agente emissor de certificados depende de autorização da Comissão de
Valores Mobiliários".
emissão de certificados, escrituração e guarda dos livros de registro e
transferência de ações444.
Uma vez contratados os serviços do agente emissor, somente ele
poderá realizá-los e não mais a própria companhia, até mesmo por-
que os livros estarão sob a sua guarda.
Em princípio, cabe à companhia verificar a regularidade das trans-
ferências e da constituição de direitos ou ônus sobre os valores mobi-
liários de sua emissão; tais atribuições competem ao agente emissor,
quando contratados os seus serviços (artigo 103, caput). A responsa-
bilidade do agente emissor é apenas perante a companhia. Perante os
titulares de valores mobiliários responde a própria companhia pelos
prejuízos causados por vícios ou irregularidades verificadas nos livros
de "Registro de Ações Nominativas", "Transferência de Ações No-
minativas", "Registro de Partes Beneficiárias Nominativas" e "Trans-
ferência de Partes Beneficiárias Nominativas-' (artigo 104, caput).
As dúvidas suscitadas entre o acionista, ou qualquer interessado,
e a companhia, ou o agente emissor, a respeito das averbações orde-
nadas pela Lei das S.A., ou sobre anotações, lançamentos ou transfe-
rência de ações nos livros de registro ou transferência, serão dirimidas
pelo juiz competente para solucionar as questões levantadas pelos
oficiais dos registros públicos, excetuadas as questões atinentes à subs-
tância do direito (artigo 103, parágrafo único).
O agente emissor, além dos serviços de emissão de certificados,
escrituração e guarda dos livros de registro e transferência de ações,
está autorizado a emitir certificados de depósito de ações (artigo 43),
partes beneficiárias (artigo 50, § 2 o ), debêntures (artigo 63, § 2 o ) e
bônus de subscrição (artigo 78, parágrafo único).
PROPRIEDADE E C I R C U L A Ç Ã O
Indivisibilidade
"Art. 28. A ação é indivisível em relação à companhia.
445 De acordo com o art. 87 do Código Civil, "bens divisíveis são os que se podem .(racionar
sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que
se destina". O art. 88, por sua vez, dispõe que "os bens naturalmente divisíveis podem
tornar-se indivisíveis por determinação da lei ou por vontade das partes".
446 CARLOS FULGÊNCIO DA C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 1, São Paulo:
Saraiva, 1972, p. 142.
a Lei das S.A. admite titulares distintos de direitos que são elementos
da ação é a de constituição de usufruto.
No entanto, a incindibiJidade dos direitos que são elementos da
ação não impede a cessão dos direitos de crédito ao dividendo decla-
rado, à quota de rateio repartida, à preferência para subscrever valores
mobiliários em determinada emissão, e ao valor de reembolso nasci-
do do exercício do direito de retirada447.
Note-se que do grupamento de ações podem decorrer frações,
pois ele implica em alteração do número de ações sem modificação
do valor do capitaL social; a companhia substitui o número de ações
existentes por uma quantidade menor com o conseqüente aumento
de seu valor nominal, quando for o caso. Quando o grupamento oca-
sionar a existência de frações de ações, a assembleia geral deverá de-
liberar o procedimento a ser adotado. Em geral, abre-se um prazo
para que os acionistas, comprando ou vendendo ações, componham
as suas frações448.
Não obstante a regra da indivisibilidade, a Lei das S.A. admite que
as ações sejam objeto de propriedade em comum, por acordo entre os
acionistas, ato de disposição inter vivos ou por sucessão mortis causa.
O condomínio acionário rege-se, a princípio, pelas regras co-
muns do condomínio449.
Tratando-se de condomínio de ações, os direitos decorrentes da
copropriedade somente podem ser exercidos por uma única pessoa,
escolhida para ser o representante do condomínio. Os direitos decor-
rentes da qualidade de sócio, inclusive o de voto, não podem ser exerci-
dos individualmente por cada condômino, com relação a sua respectiva
parece (...) que no caso de não ser feito o comunicado do representante do condomínio,
capacitado para exercer os direitos da ação, possa a assembleia deliberar que sejam suspensos
os direitos do acionista, pois, no caso, não há uma suspensão de direitos imposta pela
sociedade, mas simplesmente a incapacidade de serem exercidos tais direitos por falta de
escolha e comunicação à sociedade de um representante dos condôminos. (...) O caso nos
parece diverso da suspensão de direitos, que no nosso entender é pena imposta ao acionista
que não cumpriu certas obrigações em relação à companhia, obrigações essas no interesse da
companhia e não no interesse do condomínio." (grifos do autor). Em sentido contrário,
CARLOS FULGÊNCIO DA C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações ..., v. I, p. 143, T R A J A N O
DE MIRANDA VALVERDE. Sociedade por Ações ..., v. I, p. 138 e M O D E S T O CARVALHOSA.
Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ..., v. I, p. 288, para os quais a companhia pode,
com fundamento nos arts. 120 e 122 da Lei das S.A., suspender o exercício dos direitos
relativos às ações em condomínio até que seja indicado um representante. Ver, também, os
comentários ao art. 120 da Lei das S.A.
Art. 1.325, § 2 o , do Código Civil.
Art. 259, caput, do Código Civil e art. 1.112, inciso IV, do Código de Processo Civil.
apenas libera os condôminos da restrição ao seu direito de exigir a
divisão da coisa comum. Decorrido o prazo acordado de vigência
do condomínio, cada qual poderá pedir a divisão ou a venda. O
condomínio se extinguirá, por conseguinte, com a alienação ou
divisão do bloco de ações457-458.
Na ausência de consenso unânime, o condomínio extingue-se
por ação de divisão459.
Não obstante a indivisibilidade da ação, admite-se a divisibilida-
de do lote de ações. Não se confunde o condomínio de uma ação
com o de um lote de ações, que é, por sua natureza, divisível460, mas
pode tornar-se indivisível por vontade das partes.
Negociabilidade
"Art. 29. As ações da companhia aberta somente poderão ser ne-
gociadas depois de realizados 30% (trinta por cento) do preço de
emissão.
457 O R L A N D O C O M E S . Direitos Reais. 19 a edição, atualizada por Luiz Edson Fachin, Rio de
Janeiro: Forense, 2008, p. 246.
458 D e acordo com a regra do art. 1.320 do Código Civil, podem os condôminos acordar que
fique indivisa a coisa c o m u m por prazo não superior a 5 (cinco) anos, suscetível de
prorrogação ulterior; o mesmo prazo deve ser observado quando a indivisibilidade for
determinada pelo doador ou testador (§§ 1 o e 2 o ).
459 Sobre a extinção de condomínio acionário e a necessidade de intimar todos os condôminos,
ver decisão proferida pela 2Q Turma do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recur-
so Extraordinário n° 88.822-RJ, Rei. Min. Leitão de Abreu, j. em Í2.09.1980.
460 Nesse sentido, M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas ...,
v. I, p. 290. A jurisprudência igualmente reconhece a possibilidade de divisão do lote de
ações, conforme se verifica da ementa do seguinte julgado: "Separação judicial - Partilha
dos bens não efetuada - Alienação a terceiro - Ação de Sociedade Anônima - Inteligência
dos artigos 1.139 do Código Civil e 28 da Lei n° 6.404/76. O disposto no art. 1.139 do
Código Civil não se aplica ao co-herdeiro e nem, tampouco, ao ex-cônjuge, Já que a
universalidade de bens antes da partilha não & impeditiva da alienação a terceiros, desde que
a coisa comum seja divisível. A indivisibilidade da ação, prevista no art. 28 da Lei n. 6.404/
76, refere-se à alienação de uma unidade, não prevalecendo quando se tratar de um grupo
de ações". ( N E L S O N EIZIRIK. Sociedades Anônimas, Jurisprudência, t. I, Rio de Janeiro:
Renovar, 1996, p. 321).
As ações da companhia aberta somente podem ser negociadas
depois de realizados 30% (trinta por cento) do preço de emissão das
ações subscritas pelo acionista. Não se trata da integralização de 30%
(trinta por cento) do capital social, pois o acionista é obrigado a pagar
o preço de emissão das ações subscritas461.
Verificado o pagamento de 30% (trinta por cento) do preço de
emissão das ações subscritas, o acionista pode livremente negociá-
-las, ainda que o capital social não esteja realizado nesse mesmo per-
centual. Por outro lado, ainda que o capital esteja integralizado em
30% (trinta por cento) do seu valor, as ações não integralizadas nesse
percentual não podem ser negociadas.
Essa norma representa uma limitação à negociabilidade das ações
da companhia aberta e tem como objetivos: (i) evitar a especulação
sobre elas quando da constituição da companhia e recente emissão
das ações; (ii) assegurar a integridade do capital social; e (iii) garantir
uma entrada regular do capital462.
O caput refere-se à negociação de ações, portanto não há obstá-
culo à sua transferência a título gratuito antes de verificada a realiza-
ção de 30% (trinta por cento) do preço de emissão das ações. O que a
Lei das S.A. proíbe é negociação e não a transferência das ações463.
FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio de Janeiro: Forense,
1977, p. 172; J. X. C A R V A L H O D E M E N D O N Ç A . Tratado de Direito Comercial Brasileiro.
v. II, l. II, atualizado por Ruymar de Lima Nucci. Campinas: Bookseller, 2001, n° 1.087,
nota 4, p. 499; C A R L O S F U L G Ê N C I O DA C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 1,
São Paulo: Saraiva, 1972, p. 151.
TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. I, 2 a edição, Rio de Janeiro:
Forense, 1953, p. 145.
De acordo com CARLOS F U L G Ê N C I O D A C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações ..., v. 1,
p. 155-156, "a lei quis evitar a especulação, o lançamento de ações à venda, antes que a
sociedade se tivesse firmado ou ao calor das primeiras propagandas. Colocou-as fora do
comércio, mas não inalienáveis. Assim, as ações não podem ser negociadas, mas nada
impede que sejam doadas. Até porque esta forma de transferência não traz, quer para o
publico, quer para a sociedade, nenhum inconveniente, sabido que, na transferência gratui-
ta, não é possível a especulação e em toda a alienação o cedente fica responsável pelo
pagamento das entradas ou prestações que faltarem para integralizar as ações cedidas ou
transferidas. Desta maneira, é lícita a transferência da ação, embora mínimo o valor já pago,
se a titulo gratuito ou por sucessão causa mortis ou pelos meios judiciais, como sejam:
arrematação, adjudicação." Em sentido contrário, M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários
O percentual mínimo de 30% (trinta por cento) aplica-se apenas
às ações subscritas em dinheiro, pois a integralização em bens se efe-
tiva com o cumprimento das formalidades necessárias para sua trans-
missão à companhia464.
Se a ação for negociada em violação ao disposto no caput deste
artigo, o ato será nulo de pleno direito. A companhia poderá cobrar
do acionista a sua integralização ou vender as ações a terceiro na hi-
pótese de o acionista não efetuar o pagamento devido465.
As companhias fechadas não se aplica a regra deste artigo. As
ações podem ser negociadas após cumprido o requisito legal de reali-
zação, como entrada, de 10% (dez por cento), no mínimo, do preço de
emissão das ações subscritas em dinheiro, depositada em instituição
financeira (artigo 80, incisos I e II).
A Lei das S.A. determina que, ainda quando negociadas as ações,
os alienantes continuarão responsáveis solidariamente com os adqui-
rentes pelo pagamento das prestações que faltarem para integralizar
as ações transferidas. Essa responsabilidade cessará, em relação a cada
alienante, no fim de 2 (dois) anos a contar da data da transferência
das ações (artigo 108).
montante do capital social fixado no estatuto, pois o preço pago na compra das ações, o
bem dado em permuta das mesmas ou o crédito extinto mediante dação em pagamento são
substituídos no ativo por ações próprias; e como essas ações conferem direitos à valores do
patrimônio da própria companhia, o patrimônio líquido e o capital social ficam reduzidos no
montante do valor das ações adquiridas".
471 JOSÉ L U I Z B U L H Õ E S PEDREIRA, "Incorporação de Sociedade Controladora pela sua Con-
trolada. Legalidade. Inaplicabilidade do Artigo 30 da Lei das S.A.". In: Alfredo Lamy Filho
e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração, aplicação)
v. II, p. 594-595.
A companhia pode utilizar também os lucros ou reservas dispo-
níveis para adquirir suas próprias ações - por meio de compra e venda,
permuta e dação em pagamento - para permanência em tesouraria
ou cancelamento, desde que a importância utilizada nessa aquisição
não ultrapasse o saldo desses lucros ou reservas, nos termos da alínea
"b" do § 1°.
A companhia pode, ainda, adquirir suas próprias ações mediante
doação sem encargos, pois nessa hipótese não há saída de recursos da
companhia e, portanto, risco de redução do capital social.
A Lei das S.A. determina que nessas aquisições de ações (opera-
ções de resgate, reembolso ou amortização e aquisição para perma-
nência em tesouraria ou cancelamento) sejam utilizadas apenas o saldo
de lucros ou reservas, exceto a legal, a fim de não comprometer o
capital, mas apenas a parcela do patrimônio líquido que o excede.
Podem ser utilizados o saldo da conta de reservas e o lucro do exercí-
cio em andamento, registrado na última demonstração, trimestral ou
semestral, pois o momento para verificar o atendimento aos limites
legais é o da compra das ações, não o da aprovação da operação472.
A reserva legal não pode ser usada pela companhia para a aqui-
sição das próprias ações porque a Lei das S.A. expressamente deter-
mina que ela tem por fim assegurar a integridade do capital social e
que somente poderá ser utilizada para compensar prejuízos ou au-
Art. 2°, inciso XV, da Instrução C V M n° 358/2002, com as alterações introduzidas pelas
Instruções C V M n™ 369/2002 e 449/2007.
operações privadas475 e o preço de aquisição não poderá ser superior
ao valor de mercado das ações476. A alienação de ações em tesouraria,
em condições capazes de afetar substancialmente a formação de pre-
ço em mercado, está sujeita a procedimento especial de negociação
aprovado pela Comissão de Valores Mobiliários477.
A companhia, ainda que autorizada pelo seu conselho de admi-
nistração e atendidos os demais requisitos legais e regulamentares, es-
tará proibida de negociar com suas próprias ações quando: (i) a aquisição
de tais ações importar em diminuição do capital social ou envolver ações
não integralizadas ou pertencentes ao acionista controlador; (ii) dita
aquisição resultar na criação, por ação ou omissão, direta ou indireta-
mente, de condições artificiais de demanda, oferta ou preço das ações
ou envolver práticas não equitativas; e (iii) estiver em curso oferta pú-
blica de aquisição das ações de emissão da companhia478.
Além dessas hipóteses, também é vedada a negociação das próprias
ações (i) antes da divulgação ao mercado de fato ou ato relevante ocorrido
nos negócios da companhia; (ii) caso tenha sido celebrado qualquer
acordo ou contrato visando à transferência do controle acionário da
companhia ou houver sido outorgada opção ou mandato para o mesmo
fim ou se houver intenção de promover incorporação, cisão, fusão,
transformação ou reorganização societária na companhia, enquanto a
operação não for divulgada mediante a publicação de fato relevante; e
(iii) no período de 15 (quinze) dias antes da divulgação das informações
475 Art. 9° da Instrução C V M n° 10/1980, com as alterações introduzidas pelas Instruções CVM
n°» 268/1997 e 390/2003. Sobre o procedimento de colocação no mercado das ações
adquiridas pela própria companhia e a exigência de ser realizada em Bolsa de Valores, ver
Memo CVM/SJU n° 010/1984.
476 Art.12 da Instrução C V M n° 10/1980, com as alterações introduzidas pelas Instruções
C V M n - 268/1997 e 390/2003.
477 Art. 15 da Instrução C V M n° 10/1980, com as alterações introduzidas pelas Instruções
C V M n1* 268/1997 e 390/2003. O art. 23 dispõe que, respeitado o disposto no art. 2 o , a
C V M poderá autorizar, previamente, operações da companhia com as próprias ações que
não se ajustarem às demais normas da Instrução.
478 Art. 2° da Instrução C V M n° 10/1980, com as alterações introduzidas pelas Instruções
C V M n» 268/1997 e 390/2003. Sobre esse assunto, ver Pareceres CVM/SJU n"> 050/1985
e 017/1994.
trimestrais e anuais da companhia479-480. A companhia aberta não pode
negociai" com as próprias ações quando estiver de posse de informação
relevante, não divulgada ao mercado481.
A Comissão de Valores Mobiliários estabelece, ainda, que as
companhias abertas somente podem manter em tesouraria ações de
sua própria emissão até o limite máximo de 10% (dez por cento) das
ações em circulação no mercado de cada espécie ou classe; entende-se
como em circulação no mercado todas as ações representativas do
capital, menos aquelas de propriedade do acionista controlador482-483.
A companhia deve manter registro de todas as operações reali-
zadas com suas próprias ações, no qual devem ser indicadas, separa-
damente, as aquisições e alienações, bem como as seguintes
informações: (i) data; (ii) classe e espécie das ações; (iii) quantidade
de ações adquiridas ou alienadas e o respectivo preço; (iv) a conta do
patrimônio líquido que deu origem aos recursos aplicados na aquisi-
ção; (v) o valor das despesas realizadas; e (vi) o resultado líquido apu-
rado com a alienação.
497 O Código das Sociedades Comerciais de Portugal prescreve, no art. 321, que as aquisições
e alienações das próprias ações devem respeitar o princípio do tratamento igualitário entre
os acionistas, "salvo se a tanto obstar a própria natureza do caso".
498 R U Y C A R N E I R O G U I M A R Ã E S . Sociedade por Ações (Notas de Doutrina e Jurisprudên-
cia). v. I, Rio de Janeiro: Forense, 1960, p.168, ao comentar dispositivo do mesmo teor
constante do Decreto-Lei n° 2.627/1940 e citar a opinião de Gudesteu Pires, assinalou que
"quando a sociedade adquire suas ações pela forma traçada no artigo, isto é, por valor igual
ou inferior à importância que deva ser restituída, pratica operação evidentemente vantajosa,
pois, sem prejudicar a companhia, consegue reduzir o capital na importância prefixada,
despendendo menos do que o valor dessa redução".
Note-se que essa hipótese não causa a redução do capital social
da companhia, apenas efetiva deliberação tomada em assembleia ge-
ral no sentido de reduzir o capital, observados os requisitos impostos
pela Lei das S.A. (artigos 173 e 174). Nessa operação ocorre a redu-
ção da quantidade de ações em que se divide o capital e somente afeta
o valor de patrimônio líquido das ações remanescentes se o preço das
ações compradas em Bolsa de Valores for superior ao valor de patri-
mônio líquido de cada ação antes da compra499.
No entanto, a norma constante da alínea "d" do § I o é de pouca
ou nenhuma utilidade prática, pois nenhum acionista optaria pela
venda de suas ações por preço inferior ao que receberia da companhia
na redução do capital social500.
Essa alternativa aplica-se apenas às companhias abertas, devendo
ser observadas, portanto, as normas expedidas pela Comissão de Valo-
res Mobiliários, de acordo com o disposto" no § 2 o501 . O descumpri-
mento dessa regra importará na nulidade da operação, sem prejuízo da
responsabilidade dos administradores e acionistas controladores502.
De acordo com o § 3 o , é vedado à companhia receber em garan-
tia as suas próprias ações, salvo para assegurar a gestão dos seus admi-
nistradores. Ou seja, a companhia não pode receber como garantia
valores representativos de seu próprio patrimônio, pois não poderia
Ações nominativas
"Art. 31. A propriedade das ações nominativas presume-se pela
i n s c r i ç ã o do nome do acionista no livro de 'Registro de A ç õ e s
Nominativas' ou pelo extrato que seja fornecido pela instituição
custodiante, na qualidade de proprietária fiduciária das ações.
(Redação dada pela Lei n° 10.303/2001)
Ver decisão da 9a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro proferida
nos autos da Apelação Cível n° 2002.001.18426, Rei. Des. Laerson Mauro, j. em 17.12.2002.
Ver os comentários ao art. 23 da Lei das S.A.
A Instrução CVM n° 115/1990 dispõe sobre a prestação de serviço de custódia fungível de
ações nominativas. Nos termos do art. 6 o , o acionista pode exercer seus direitos em
assembleia geral simplesmente apresentando um comprovante emitido pela instituição
prestadora dos serviços de custódia. No art. 7 o , por sua vez, há a previsão de que a
instituição custodiante, "por ocasião do exercício do direito de voto, exercício de direito de
preferência, distribuição de dividendos ou bonificações e em qualquer caso, no último dia
útil de cada trimestre civil", deverá fornecer à companhia a lista dos titulares de ações em
custódia. Ou seja: a lista emitida pela instituição custodiante servirá para a companhia
conhecer seus próprios acionistas.
Ver os comentários ao art. 41 da Lei das S.A.
artigo 41 e a transferência das ações à instituição depositária, desde que
expressamente autorizada pelo depositante, serve apenas para o fim de
permitir a guarda, o controle, a administração e a viabilização da nego-
ciação dos valores depositados, sem a alteração dos registros da compa-
nhia a cada transferência autorizada520. A propriedade dos valores
mobiliários depositados somente é transferida de volta ao depositante
nos registros da companhia quando extinta a custódia, pelo equivalen-
te ao saldo remanescente na sua conta de depósito521.
A presunção de propriedade de que trata este artigo é relativa
(júris tantum), ou seja admite-se prova em contrário522. Essa presun-
ção somente pode ser elidida após decisão judicial que declare a nuli-
dade do registro no "Livro de Registro de Ações Nominativas" ou do
extrato emitido pela instituição custodiante523.
O acionista só pode exercer os direitos de participar das delibera-
ções sociais, votar e receber dividendos se o seu nome estiver inscrito
no "Livro de Registro de Ações Nominativas" ou no extrato emitido
pela instituição custodiante524. Por isso, pode a companhia exigir do
redação dada pela Lei n" 6.616/78, oferecer parecer ou prestar esclarecimentos em juízo,
depois de ler sido intimada; 5. A cláusula pela qual os adquirentes das ações ofertadas
somente teriam direito a dividendos e bonificações novas a partir da efetiva transferência
dos títulos, nos termos do artigo 31 § Io da Lei n° 6.404, é ilegal, de vez que pretende
modificar a própria lei, através de uma distorção interpretativa. Cabe à CVM mandar
retirá-la dos editais, com base no artigo 20 inciso III da Resolução n° 39". Vide também
o Parecer CVM/SJU n° 034/1980, por meio do qual essa Autarquia se manifestou no
sentido de que "o acionista que adquiriu ações ordinárias nominativas antes da declara-
ção de dividendos pela Assembleia Geral da companhia, é o titular deste direito, ainda
que seu nome não esteja inscrito no livro de 'Registro de Ações Nominativas'. O não
recebimento de dividendos cuja responsabilidade caiba à Bolsa de Valores e à corretora que
intermediou a operação, enseja direito de ação do acionista prejudicado contra qualquer das
duas, ou ainda, contra o fundo de Garantia, a fim de ressarcir-se de seus prejuízos".
525 É em decorrência dessa identificação do acionista que consta do § 1 o do art. 205 que os
dividendos poderão ser pagos por cheque nominativo remetido por via postal para o
endereço comunicado pelo acionista à companhia, ou mediante crédito em conla bancá-
ria aberta em seu nome.
526 Consta do art. 167 do Código Civil que "é nulo o negócio jurídico simulado, mas subsis-
tirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma". O § 1 o determina que
"haverá simulação nos negócios jurídicos quando: I - aparentarem conferir ou transmitir
direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; II -
contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; III - os instrumen-
tos particulares forem antedatados, ou pós-datados". O § 2° dispõe que são ressalvados os
direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraenles do negócio jurídico simulado.
527 M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, v. 1, 5 a edição,
São Paulo: Saraiva, 2007, p. 328; E G B E R T O L A C E R D A TEIXEIRA e J O S É A L E X A N D R E
TAVARES GUERREIRO. Das Sociedades Anônimas no Direito Brasileiro, v. 1, São Paulo:
José Bushalsky, 1979, p. 232.
528 CARLOS F U L G È N C I O D A C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 1, São Paulo: Sarai-
va, 1972, p. 255, observa que a sociedade não pode, de modo próprio ou por solicitação de
apenas um dos interessados, fazer substituição da inscrição, sob a alegação do título não
pertencer àquele, cujo nome figura no livro. A modificação só é efetivada: ou com o
consentimento das 2 (duas) partes ou em virtude de decisão judicial. Com relação ao terceiro
adquirente de boa-fé, esse autor entende que cumpre dar "toda força probante ao registro
antes de retificado e, portanto, garantir os negócios realizados por terceiros de boa fé, durante
o tempo em que o registro foi inatacado". Sobre a anulação do registro e a condição do
lerceiro^adquirente de boa-fé, ver, também, TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades
por Ações. v. I, 2 a edição, Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 186-187.
A companhia é responsável pelos prejuízos que causar aos inte-
ressados por vícios ou irregularidades existentes nos livros de "Regis-
tro e Transferência de Ações Nominativas" (artigo 104, caput), uma
vez que a ela cabe verificar a regularidade das transferências e da cons-
tituição de direitos ou ônus sobre os valores mobiliários de sua emis-
são. As dúvidas suscitadas entre o acionista ou qualquer interessado e
a companhia a respeito das averbações ordenadas pela Lei das S.A.
nos livros de "Registro e Transferência de Ações" serão dirimidas pelo
juiz competente para solucionar as dúvidas levantadas pelos oficiais
dos registros públicos, excetuadas as questões atinentes à substância
do direito529.
Os ônus que gravam as ações nominativas, bem como qualquer
circunstância que limite ou impossibilite a sua livre circulação, deve-
rão ser averbados no "Livro de Registro de Ações Nominativas" como
condição, inclusive, para serem oponíveis perante terceiros (artigos
39, caput e § I o , 40 e 100, inciso I, alínea "f").
A transferência das ações nominativas registradas opera-se so-
mente por termo lavrado no "Livro de Transferência de Ações No-
minativas", datado e assinado pelo cedente e pelo cessionário, ou seus
legítimos representantes530. Mas o lançamento do termo de cessão
nesse livro não é suficiente para que o cessionário exerça os seus di-
reitos de acionista; com base nesse termo será efetuada a averbação
da transferência e o lançamento do nome do cessionário no "Livro
Ações endossáveis
"Art. 32 (Revogado pela Lei n° 8.021/1990)"
Ações ao portador
"Art. 33 (Revogado pela Lei n° 8.021/1990)"
nieníes do regime anterior, e m que havia dúvidas sobre o assunto, tendo vários autores
sustentado que a transferência por ato extrajudicial somente era permitida mediante termo
lavrado no "Livro de Transferência de Ações Nominativas", o que importava submeter as
ações nominativas a regime de registro de propriedade mais formal do que o próprio
Registro de Imóveis.
537 Ver decisão da 3 a Turma do Superior Tribunal de Justiça proferida nos autos do Recurso
Especial n° 40.276-0-RJ, Min. Eduardo Ribeiro, j. em 07.12.1993, publicado no D J U em
07.03.1994.
538 Sobre a transferência de ações nominativas resultantes de negociação privada, ver os Pareceres
CVM/SJU n"5 048/1983 e 062/1984. Neste último, a C V M afirma que "atentos ao princípio de
que a lei não emprega palavras inúteis, incluimo-nos na corrente daqueles que admitem, sem
qualquer dúvida, a possibilidade legal de se procederem transferências de propriedade de ações
nominativas pela simples averbação de títulos extrajudiciais no livro competente, desde que
estes, obviamente, atendam aos requisitos impostos pela legislação aplicável".
Ver decisão da 3 a Turma do Superior Tribunal de Justiça proferida nos autos do Recurso
Especial n° 40.276-0-RJ, Rei. Min. Eduardo Ribeiro, j. em 07.12.1993, publicado no D j U
em 07.03.1994, In: Revista do Superior Tribunal de Justiça, v. 57, Brasília, 1989, p. 435.
A Lei das S.A., na sua redação original, admitia 3 (três) formas
para as ações: nominativas; endossáveis; e ao portador. As ações en-
dossáveis foram introduzidas em nosso ordenamento jurídico pela
Lei n° 4.728/1965 e os dispositivos que tratavam dessa matéria540
foram posteriormente revogados pela Lei n° 6.404/1976, que regulou
essas ações no artigo 32. As ações ao portador, por sua vez, eram re-
guladas pelo Decreto-Lei n° 2.627/1940 e foram mantidas pelo arti-
go 33 da Lei das S.A.
No entanto, a Lei n° 8.021/1990, extinguindo os títulos ao por-
tador e os endossáveis, alterou a redação do artigo 20 da Lei das S . A ,
e a única forma de ação atualmente admitida é a nominativa341.
Ações escriturais
"Art. 3 4 . 0 estatuto da companhia pode autorizar ou estabelecer
que todas as ações da companhia, ou uma ou mais classes delas,
sejam mantidas em contas de depósito, em nome de seus titula-
res, na instituição que designar, sem emissão de certificados.
Limitações à circulação
"Art. 36. O estatuto da companhia fechada pode impor limita-
ções à circulação das ações nominativas, contanto que regule
minuciosamente tais limitações e não impeça a negociação, nem
sujeite o acionista ao arbítrio dos órgãos de administração da
companhia ou da maioria dos acionistas.
566 Sobre esse assunto, a CVM, no Parecer CVM/SJU n° 059/1980, se manifestou no sentido de
que "a necessidade de submeter, à aprovação prévia de terceiros, alteração na composição
acionária de sociedade anônima, constitui limitação à circulação de suas ações. Somente às
companhias fechadas, e desde que regulada minuciosamente no estatuto, é admissível a
imposição de limitações à circulação de ações nominativas (art. 36, Lei n" 6.404/76). Ê
ineficaz a cláusula contratual que produza efeitos contrários ã lei. A inclusão, em edital de
oferta pública de ações, de condições à habilitação na oferta, impostas por cláusula ineficaz,
importa em fornecimento de informação inexata ao público-investidor".
567 ALBERTO MUSSO. La Rilevanza Esterna dei Socio nelle Società di Capitali. Milano: Giuffrè,
1996, p. 14, salienta que "in ogni caso, 1'ammissibilità delle clausola di gradimento e delle
clausola de prelazione, ache nella società per azioni, consentono di configurare una tipologia
societaria siffata avente connotazioni de intuitus personae, che si discosta validamente dal
carattere eminentemente capitalistico previsto dal modello legale, a prescindere dalle variegate
tesisui limiti e sullefficacia deipatti in questione, sopra ricordate".
568 RUBENS REQUIÃO. Aspectos Modernos de Direito Comercial (estudos e pareceres). v. 3,
São Paulo: Saraiva, 1977, p. 244, observa que "essa faculdade de restringira negociabilidade
das ações da companhia fechada dá-lhe o nítido sabor de sociedade constituída com
intuitus personae, na qual os sócios escolhem os seus companheiros. A norma impede o
ingresso de estranhos à sociedade tendo em vista a confiança mútua ou os laços familiares
dos sócios, que os ligam. A affectio societatis surge nessas sociedades com toda a nitidez,
como em qualquer outra das sociedades de tipo personalista. Seus interesses estão, pois,
regulados pelo contrato, o que explica a pouca ingerência da fiscalização de órgãos públicos
em seus negócios".
569 Sobre esse assunto, T R A J A N O D E M I R A N D A VALVERDE. Sociedades por Ações. v. 1, 2 a
edição, Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 198, observa que "as disposições restritivas são
licitas todas as vezes que não tiverem por efeito impedir a transferência das ações, tornando,
por assim dizer, o acionista prisioneiro do seu título, mas simplesmente o de regulamentar o
exercício desse direito, rodeando-o de garantias e precauções".
570 Na opinião de FÁBIO K O N D E R COMPARATO. O Poder de Controle na Sociedade Anôni-
ma. 4 a edição, Rio de janeiro: Forense, 2005, p. 146-147, a violação de disposições
estatutárias que contenham limitação à circulação de ações não implica nulidade do
negócio de transferência, mas a sua ineficácia em relação à sociedade.
As disposições estatutárias que criam limitação à circulação de
ações contêm normas de natureza contratual que excepcionam o
princípio da livre transmissibilidade da ação e devem, portanto, ser
interpretadas restritivamente. Essas restrições são lícitas apenas
quando não tiverem por fim impedir a negociação das ações571. As
limitações à circulação de ações são especificadas, em regra, em fun-
ção de condições pessoais dos acionistas. Não obstante ser a socie-
dade anônima classificada como uma sociedade de capitais, pode,
na sociedade fechada, predominar o intuitu personae, pois, em al-
guns casos, a identidade e/ou as características dos acionistas po-
dem ser essenciais ao desenvolvimento dos negócios sociais. Em
algumas companhias, a restrição à circulação de ações tem por fim
garantir a estabilidade da sua administração572 e a manutenção do
controle societário5'3.
Uma das formas mais comuns no direito societário de limitação
da circulação das ações é a que determina o direito de preferência dos
demais acionistas no caso de alienação de ações. No entanto, é veda-
do ao estatuto subordinar a transferência de ações à simples aprova-
ção dos demais acionistas, uma vez que a Lei das S.A. é expressa ao
determinar que o estatuto não pode submeter o acionista ao arbítrio
dos órgãos de administração ou da maioria dos acionistas. O estatuto
deverá regular detalhadamente os procedimentos relativos ao exercí-
cio do direito de preferência pelos demais acionistas e pela própria
574 O Código Civil, ao tratar no art. 122 "Da Condição, Do Termo e Do Encargo", determina
que: "são lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos
bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o
negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes". No art. 489, ao tratar
especificamente "Da Compra e Venda", estabelece que "nulo é o contrato de compra e
venda, quando se deixa ao arbítrio exclusivo de uma das partes a fixação do preço".
575 C A R L O S F U L G Ê N C I O D A C U N H A P E I X O T O . Sociedades por Ações. v. 1, São Raulo:
Saraiva, 1972, p. 313.
576 Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976.
As restrições à circulação das ações podem decorrer, também, de
acordos de acionistas, mediante pacto denominado "acordo de blo-
queio", mediante o qual os acionistas obrigam-se a não transferir as
suas ações a terceiros sem a anuência dos demais pactuantes ou sem
antes dar a estes o direito de preferência na aquisição de ações577.
Para que essa restrição seja oponível perante terceiros, deverá ser aver-
bada no "Livro de Registro de Ações Nominativas" ou nos livros da
instituição financeira o qual será anotado no extrato da conta de
depósito fornecido ao acionista - e, após essa averbação, as ações
objeto do acordo de acionistas não poderão ser negociadas em Bolsa
de Valores ou no mercado de balcão (artigo 118, §§ I o e 4 o ). Tendo
em vista que o acordo de acionistas obriga apenas as partes contra-
tantes, nada obsta a que os "acordos de bloqueio" sejam pactuados
em companhias abertas. Neste caso, a limitação à circulação de ações
não decorrerá de regra estatutária, prevalecendo, portanto, a liberda-
de de contratar.
578 Ver os comentários aos arts. 20, 31 e 35, § I o , da Lei das S.A.
579 Sobre a inutilidade dos certificados de ação, ver os comentários aos arts. 11 e 20 da Lei
das S.A.
580 A CVM, no Parecer CVM/SJU n° 100/1978, manifestou-se no sentido de que "deve-se
observar que, embora o já referido artigo 37 da Lei 6.404/76, ao mencionar 'serviços de
transferência, conversão e desdobramento. de certificados' pudesse dar a entender que a
suspensão sú se referisse a ações representadas por certificados, a doutrina, percebendo que
aquela redação não foi das mais felizes, propôs que o dispositivo fosse entendido como se
referindo a 'serviços de transferência e conversão de ações e desdobramento de certificados'.
(...) Essa distinção é importante para afastar dúvidas quanto ao fato de o dispositivo ser
também aplicável às. ações escriturais. Além dessa interpretação doutrinária, a suspensão dos
serviços de registro também pode atingir as ações escriturais pelo fato de vários dos motivos
justificadores daquela suspensão também permanecerem quando as ações da companhia
forem escriturais. Assim, a suspensão dos serviços de registro pode atingir as ações nominativas,
as ações escriturais e as ações endossáveis (a transferência das duas primeiras opera-se pelo
registro, a das últimas é apenas averbada para ter eficácia perante a companhia)". No mesmo
sentido é a opinião de M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades
Anônimas, v. 1, 5 n edição, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 367, ao mencionar que "não
obstante, a supressão dos certificados, pelo desuso conseqüente de sua incompatibilidade
com o ordenamento, não retira, de forma alguma, a vigência do art. 37, pois outro é o seu
objetivo. Trata-se ele, com efeito, da suspensão do direito material de transferência e desdo-
bramento de ações negociadas em Bolsa".
581 A Lei n° 4.728/1965, ao introduzir no nosso ordenamento a regra constante do art. 37 da
Lei das S.A., dispunha, nos §§ 11 e 12 do art. 34, que: "§ 11. As sociedades por ações são
obrigadas a comunicar, às Bolsas nas quais os seus títulos são negociados, a suspensão
transitória de transferência de ações no livro competente, com 15 (quinze) dias de antece-
dência, aceitando o registro das transferências que lhes forem apresentadas com data ante-
rior. § 12. É facultado as sociedades por ações o direito de suspender os serviços de
conversão, transferência e desdobramento de ações, para atender a determinações de
assembleia-geral, não podendo fazê-lo, porém, por mais de 90 (noventa) dias intercalados
durante o ano, nem por mais de 15 (quinze) dias consecutivos".
Dessa forma, a companhia, antes da realização da assembleia
geral, pode suspender os serviços de registros relacionados à transfe-
rência de suas ações, desde que: (i) o faça por um breve período, não
superior, cada um, a 15 (quinze) dias, nem ao total de 90 (noventa)
dias durante o ano; (ii) comunique o fato à Bolsa de Valores; e (iii)
providencie a publicação de anúncios em jornais.
Tendo em vista a redação objeto do caput deste artigo, o qual
restringe a aplicação do dispositivo às "companhias abertas" e se refe-
re à necessidade de "publicação de anúncio" e "comunicação às bol-
sas de valores", a suspensão dos serviços de transferência de ações
abrange, essencialmente, as negociações com ações realizadas no
âmbito das Bolsas de Valores, não atingindo, portanto, as ações re-
presentativas do controle acionário da companhia582.
Este artigo estabelece apenas uma faculdade em benefício da
companhia, que pode, durante períodos determinados e desde que
tenha previamente informado os acionistas e a Bolsa de Valores, abs-
ter-se de promover os registros das transferências de propriedade das
ações realizadas em Bolsa. Tal faculdade configura medida de inte-
resse interno da sociedade, pois visa a facilitar a organização das as-
sembléias gerais e de outros eventos societários das companhias
abertas583. Com a suspensão dos serviços de transferências de ações
negociadas em Bolsa de Valores, torna-se possível determinar, com
antecedência, o colégio acionário votante nas assembleias gerais584.
Perda ou extravio
as razões que geralmente são aceitas para essa medida, encontra-se comumente a de permitir
determinar o colégio acionário votante em assembleia geral. Outro fundamento aceito é o de
permitir organizar os serviços de pagamento de dividendos".
nhia exigir do titular, p a r a satisfazer dividendo e demais direitos,
garantia idônea d e sua eventual restituição."
A L e i n ° 8 . 0 2 1 / 1 9 9 0 , c o m o o b j e t i v o d e i d e n t i f i c a r os
contribuintes que o p e r a m n o m e r c a d o f i n a n c e i r o e d e capitais,
extinguiu os títulos ao portador e endossáveis 5 8 5 . A s s i m , o certificado
d e ação p e r d e u , t a m b é m , a s u a p r i n c i p a l f u n ç ã o , que era a de
instrumento que legitimava a condição de sócio.
D e s s a forma, o artigo 38 foi derrogado pelo desuso.
SEÇÃO VII
C O N S T I T U I Ç Ã O DE D I R E I T O S REAIS E O U T R O S ÔNUS
Penhor
"Art. 3 9 . 0 p e n h o r OIL c a u ç ã o d e ações se constitui p e l a averbação
do respectivo i n s t r u m e n t o n o livro d e R e g i s t r o de A ç õ e s N o m i -
nativas. ( R e d a ç ã o d a d a p e l a L e i n ° 9 . 4 5 7 / 1 9 9 7 )
590 O R L A N D O GOMES. Direitos Reais. 19° edição, atualizada por Luiz Edson Fachin, Rio de
Janeiro: Forense, 2008, p. 391-392.
Sobre as diferenças e vantanges entre o penhor de ações e a alienação fiduciária em
591
garantia, ver os comentários ao art. 40 da Lei das S.A.
Art. 1.421 do Código Civil. Consta do art. 1.434 do Código Civil que "o credor não pode ser
constrangido a devolver a coisa empenhada, ou uma parte dela, antes de ser integralmente
pago, podendo o juiz, a requerimento do proprietário, determinar que seja vendida apenas
uma das coisas, ou parte da coisa empenhada, suficiente para o pagamento do credor".
cio tem (i) direito a excutir a coisa empenhada e preferir, no paga-
mento, a outros credores 5 9 3 ; e (ii) a faculdade de buscar o bem grava-
do com direito real de penhor da mão de quem quer que ele esteja
para satisfação de seu crédito 5 9 4 .
O penhor de ações constitui modalidade de penhor especial re-
gulado por este artigo, aplicando-se-lhe subsidiariamente as regras
do C ó d i g o Civil 5 9 5 .
N o que diz respeito às ações, caução e penhor são vocábulos
sinônimos. T e n d o em vista que somente os bens sujeitos à alienação
p o d e m ser penhorados ou caucionados, não é possível dar em garan-
tia as ações gravadas c o m cláusula de inalienabilidade e as ações de
companhia aberta antes de realizados os 30% (trinta por cento) do
preço de emissão (artigo 29) S 9 6 .
O u t r o s direitos e ônus
607 Os arts. 50, 63 e 78, parágrafo único, respectivamente, da Lei das S.A. determinam que
aplica-se às partes beneficiárias, às debêntures e aos bônus de subscrição, no que couber,
o disposto nas Seções V a VII do Capítulo III da Lei das S.A.
608 Ver arts. 1.390 e seguintes do Código Civil. O Código Civil de 1916 conceituava o
usufruto no art. 713 como "direito real de fruir as utilidades e frutos de uma coisa, enquanto
temporariamente destacado da propriedade".
fica privado de usar e fruir, atividades que, em princípio, são típicas do
exercício do domínio 609 .
O fideicomisso resulta de uma disposição pela qual alguém - o
fideicomitente - institui herdeiros ou legatários, impondo a u m deles
- o fiduciário - a obrigação de, por sua morte, a certo tempo ou sob
certa condição, transmitir ao outro, que se chama fideicomissário, a
herança ou o legado 610 - 611 - 612 .
A alienação fiduciária em garantia constitui-se por meio da trans-
ferência ao credor do domínio, independentemente de sua tradição,
em garantia do pagamento de u m a obrigação. O direito do credor
sobre o bem resolve-se com o pagamento da dívida garantida 6 1 3 .
O instituto da alienação fiduciária em garantia de bens móveis
foi inserido em nosso ordenamento jurídico pela L e i n° 4.728/1965 6 1 4
que foi, posteriormente, alterada pelo D e c r e t o - L e i n° 911/1969. A
propriedade fiduciária foi regulada pelo C ó d i g o Civil de 2002 6 1 5 , no
entanto, ao contrário da L e i n ° 4 . 7 2 8 / 1 9 6 5 , o C ó d i g o Civil não limi-
tou a sua utilização ao mercado de capitais. Posteriormente, a L e i n°
10.931/2004 6 1 6 alterou o Decreto-Lei n° 9 1 1 / 1 9 6 9 e as Leis n os 4.591/
609 PONTES DE MIRANDA. Tratado de Direito Privado, t. XIX, 3 a edição, São Raulo: Revista
dos Tribunais, 1983, p. 13.
610 O R L A N D O GOMES. Direitos Reais. 19 a edição, atualizada por Luiz Edson Fachin, Rio de
Janeiro: Forense, 2008, p. 336.
611 O art. 1.951 do Código Civil determina que "pode o testador instituir herdeiros ou legatá-
rios, estabelecendo que, por ocasião de sua morte, a herança ou o legado se transmita ao
fiduciário, reso!vendo-se o direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição,
em favor de outrem, que se qualifica de fideicomissário". O art. 1.952 estabelece que a
substituição fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da
morte do testador; se o fideicomissário já tiver nascido ao tempo da morte do testador, ele
adquirirá a propriedade do bem fideicometido, convertendo-se em usufruto o direito do
fiduciário. Ver, também, arts. 1.953 e seguintes do Código Civil.
612 Sobre o fideicomisso, ver CLOVIS BEVILAQUA. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil
Comentado, v. 6, Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1955, p. 161-170.
613 CAIO MARIO DA SILVA PEREIRA. Instituições de Direito Civil. v. IV, 19a edição, Rio de
Janeiro: Forense, 2008, p. 426.
614 Art. 66 da Lei n° 4.728/1965, revogado pela Lei n° 10.931/2004.
615 Arts. 1.361 a 1.368 do Código Civil.
616 A Lei n" 10.931/2004 dispôs sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias,
Letra de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Imobiliário e Cédula de Crédito Bancário.
1964, 4.728/1965 - na qual introduziu o artigo 6 6 - B , definindo os
critérios da constituição da propriedade fiduciária em garantia no
âmbito do mercado de capitais - e 1 0 . 4 0 6 / 2 0 0 2 ( C ó d i g o Civil) - ao
qual acrescentou o artigo 1 . 3 6 8 - A , segundo o qual as demais espécies
de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à
disciplina específica das respectivas leis especiais, aplicando-se as re-
gras do C ó d i g o Civil naquilo que não for incompatível c o m a legisla-
ção especial 617 - 618 - 619
617 Consta do art. 55 da Lei n° 10.931/2004 que a Seção XIV da Lei n° 4.728/1965 passa a
vigorar com a seguinte redação: "Alienação Fiduciária em Garantia no Âmbito do Mercado
Financeiro e de Capitais: Art. 66-B. O contrato de alienação fiduciária celebrado no âmbito
do mercado financeiro e de capitais, bem como em garantia de créditos fiscais e previdenciários,
deverá conter, além dos requisitos definidos na Lei n" 10.406, de 10 de janeiro de 2002 -
Código Civil, a taxa de juros, a cláusula penal, o índice de atualização monetária, se houver,
e as demais comissões e encargos. § 1° Se a coisa objeto de propriedade fiduciária não se
identifica por números, marcas e sinais no contrato de alienação fiduciária, cabe ao proprie-
tário fiduciário o ônus da prova, contra terceiros, da identificação dos bens do seu domínio
que se encontram em poder do devedor. § 2° O devedor que alienar, ou der em garantia a
terceiros, coisa que já alienara fiduciariamente em garantia, ficará sujeito à pena prevista no
art 171, § 2°, I, do Código Penal. § 3a É admitida a alienação fiduciária de coisa fungível e
a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito, hipóteses
em que, salvo disposição em contrário, a posse direta e indireta do bem objeto da proprieda-
de fiduciária ou do título representativo do direito ou do crédito é atribuída ao credor, que,
em caso de inadimplemento ou mora da obrigação garantida, poderá vender a terceiros o
bem objeto da propriedade fiduciária independente de leilão, hasta pública ou qualquer
outra medida judicial ou extrajudicial, devendo aplicar o preço da venda no pagamento do
seu crédito e das despesas decorrentes da realização da garantia, entregando ao devedor o
saldo, se houver, acompanhado do demonstrativo da operação realizada. § 4" No tocante
à cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou sobre títulos de crédito aplica-se,
também, o disposto nos arts. 18 a 20 da Lei n" 9.514, de 20 de novembro de 1997. § 5o
Aplicam-se à alienação fiduciária e à cessão fiduciária de que trata esta Lei os arts. 1.421,
1.425, 1.426, 1.435 e 1.436 da Lei n" 10.406, de 10 .de janeiro de 2002. § 6° Não se aplica
à alienação fiduciária e à cessão fiduciária de que trata esta Lei o disposto no art. 644 da Lei
n" 10.406, de 10 de janeiro de 2002". Relativamente aos aspectos processuais, a Lei n°
10.931/2004, no art. 56, também alterou a redação dos arts 3 o e 8 o do Decreto-Lei n°
911/1969, determinado, ainda, que "o procedimento judicial disposto neste Decreto-Lei
aplica-se exclusivamente às hipóteses da Seção XIV da Lei no 4.728, de 14 de julho de
1965, ou quando o ônus da propriedade fiduciária tiver sido constituído para fins de
garantia de débito fiscal ou previdenciário" (Art. 8°-A).
61 8 Sobre esse assunto, MELHIN NAMF.M C H A L H U B . Negócio Fiduciário - Alienação Fiduciária.
4a edição, Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 155, assinala que: "existem no direito positivo
brasileiro duas espécies de propriedade fiduciária de bens móveis, para fins de garantia: uma
de aplicação geral como garantia de dívida, sem restrições quanto à pessoa do credor,
regulamentada pelos arts. 1.361 a 1.638 do Código Civil, e outra exclusivamente para
garantia de créditos constituídos no âmbito do mercado financeiro e de capitais, bem como
do fisco e da previdência social, caracterizada pelas disposições especiais definidas pelo art.
66B e seus parágrafos pela Lei n° 4.728/65. Quanto às normas processuais, a mesma Lei n"
10.931/2004 alterou os procedimentos relativos à busca e apreensão do bem objeto da
O Código Civil regula a propriedade fiduciária de coisa móvel
infiingível para fins de garantia do cumprimento de uma obrigação.
As suas disposições não se aplicam, por exemplo, à propriedade fidu-
ciária de que tratam os artigos 41 e 42 da Lei das S.A., pois esta não
tem por fim a garantia, mas a guarda, o controle, a administração e a
viabilização de negociação com valores mobiliários 6 2 0 .
Outras cláusulas e ônus podem gravar as ações, tais como a pe-
nhora, o arresto, o seqüestro, as cláusulas de inalienabilidade, inco-
municabilidade, impenhorabilidade, etc.
O s ônus e direitos que gravam as ações para ter validade perante
terceiros e a própria companhia emissora deverão ser averbados: se as
ações forem nominativas, no livro de "Registro de Ações Nominati-
vas" 621 ; se forem escriturais, nos livros da instituição financeira.
Embora tenha surgido c o m finalidade de caráter basicamente
alimentar, o usufruto transformou-se em instituto de conteúdo mais
amplo, podendo ter inclusive natureza mercantil, como ocorre com o
usufruto de ações, que se transformou em instrumento relevante de
operações comerciais e bancárias 6 2 2 . N e s s e tipo de usufruto, o usufru-
propriedade fiduciária, dando nova redação ao art. 3" do Decreto-Lei n" 91 i/69 e restringin-
do esse procedimento de busca e apreensão às operações do mercado financeiro e de
capitais e às garantias dos créditos fiscais e previdenciários. Assim, de acordo com essa
legislação, dois são os procedimentos aplicáveis à propriedade fiduciária de bens móveis: a
ação de reintegração de posse, de que tratam os arts. 926 e seguintes do Código de Processo
Civil, e a ação autônoma de busca e apreensão, de que trata o art. 3° do Decreto-Lein°9n/
69, sendo que para esta última só estão legitimadas as pessoas jurídicas de direito privado
integrantes do mercado financeiro e de capitais e as pessoas jurídicas de direito público
titulares de créditos fiscais e previdenciários".
619 Sobre a alienação fiduciária em garantia, ver ANDRÉ CARVALHO NOGUEIRA, "Proprieda-
de Fiduciária em Garantia: o Sistema Dicotômico da Propriedade no Brasil", Revista de
Direito Bancário e do Mercado de Capitais. São Paulo: Afiliada, v. 39, janeiro-março,
2008, p. 56-78.
620 Ver os comentários ao art. 41 da Lei das S.A.
621 A Lei das S.A., no art. 100, inciso I, alfnea "(", expressamente determina que no livro de Registro
de Ações Nominativas deverão ser averbados o penhor, o usufruto, o fideicomisso, a alienação
fiduciária em garantia ou qualquer ônus que grave as ações ou obste sua negociação.
A R N O L D O WALD, "Do Regime Jurídico do Usufruto de Cotas de Sociedade de Res-
ponsabilidade Limitada e de Ações de Sociedades Anônimas", Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais,
v. 77, janeiro-março, 1990, p. 7.
tuário não tem a propriedade das ações - que é do nu proprietário
mas tem o direito de receber os dividendos delas decorrentes 6 2 3 . A d -
mite-se que o direito de voto da ação gravada c o m usufruto seja regu-
lado no ato de constituição do gravame, e, caso isso não ocorra,
somente poderá ser exercido mediante prévio acordo entre o proprie-
tário e o usufrutuário 6 2 4 . D e s s a forma, é de todo recomendável que
também se averbe o acordo entre proprietário e usufrutuário, relativo
ao exercício do direito de voto, no livro de "Registro de A ç õ e s N o m i -
nativas", ou nos livros da instituição financeira depositária, conforme
sejam as ações registradas ou escriturais.
N o fideicomisso, tal c o m o no usufruto, ocorre a utilização e frui-
ção do bem, em caráter temporário. C o m a morte do fiduciário, o
decurso do prazo fixado pelo testador o u a realização da condição por
ele imposta, a propriedade transfere-se ao fideicomissário. N o caso
do fideicomisso acionário, as ações são transferidas ao fiduciário, que
as recebe na qualidade de proprietário - e m b o r a a propriedade seja
resolúvel - , investido dos direitos d e u s o e fruição 6 2 5 . C a b e a ele, por-
tanto, não só o direito ao recebimento dos dividendos, c o m o também
o direito de voto 6 2 6 .
623 O art. 205 da Lei das S.A. estabelece que "a companhia pagará o dividendo de ações
nominativas à pessoa que, na data do ato de declaração do dividendo, estiver inscrita como
proprietária ou usufrutuária da ação".
624 Ver os comentários ao art. 114 da Lei das S.A.
625 De acordo com C A I O M A R I O DA SILVA PEREIRA. Instituições de Direito Civil..., v. IV,
p. 22, a posse, em nosso direito positivo, não exige "a intenção do dono, e nem reclama
o poder físico sobre a coisa. É relação de fato entre a pessoa e a coisa, tendo em vista a
utilização econômica desta. É a exteriorização da conduta de quem procede como normal-
mente age o dono. É a visibilidade do domínio (Código Civil, art 1.196)". Determina o art.
1.204 do Código Civil que "adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível
o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade".
626 No mesmo sentido, FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio
de Janeiro: Forense, 1977, p. 232; E C B E R T O L A C E R D A TEIXEIRA e JOSÉ A L E X A N D R E
TAVARES GUERREIRO. Das Sociedades Anônimas no Direito Brasileiro, v. 1, São Paulo:
Ed. José Bushatsky, 1979, p. 248; JOSÉ W A L D E C Y LUCENA. Das Sociedades Anônimas -
Comentários à Lei (arts. 1 o a 120). v. I, Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 413; CARLOS
FULGÊNCIO DA C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 1, São Paulo: Saraiva, 1972,
p. 329. Em sentido contrário, WILSON CAMPOS DE S O U Z A BATALHA. Comentários à Lei
das Sociedades Anônimas, v. I, Rio de Janeiro: Forense, p. 290.
O usufrutuário e o nu-proprietário são titulares simultâneos de
direitos, embora este último não tenha os direitos de uso e fruição do
bem; fiduciário e fideicomissário são titulares sucessivos dos direitos,
pois o fiduciário tem a plena propriedade do bem, até o momento em
que se dá o evento translatício, quando, então, passa o bem ao fidei-
comissário 627 .
N a alienação fiduciária em garantia, o adquirente do bem (credor
fiduciário) não é o seu pleno proprietário; detém a propriedade resolú-
vel e deve respeitar o direito de uso do alienante (devedor fiducian-
te)628-629. O devedor fiduciante conserva a posse direta do bem. Assim,
o credor fiduciário não tem direito ao recebimento dos dividendos 630
nem ao exercício do direito de voto. A propósito, a Lei das S.A. deter-
mina expressamente que o credor garantido por alienação fiduciária da
ação não poderá exercer o direito de voto e que o devedor poderá exer-
cê-lo nos termos do contrato (artigo 113, parágrafo único).
A alienação fiduciária em garantia, comparativamente ao penhor
de ações, tem sido, na prática, mais utilizada. N o penhor, o credor
pignoratício tem (i) u m direito real sobre coisa alheia; (ii) o direito de
excutir a coisa empenhada e preferir, no pagamento, a outros credo-
res 631 ; e (iii) a faculdade de buscar o bem gravado da mão de quem
quer que ele esteja para satisfação de seu crédito 632 . O s bens empe-
627 CAIO MARIO DA SILVA PEREIRA. Instituições de Direito Civil..., v. IV, p. 291.
628 Determina o § 2 o do art. 1.361 do Código Civil que "com a constituição da propriedade
fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tomando-se o devedor possuidor direto da
coisa." E o art. 1.363 estabelece que "antes de vencida a dívida, o devedor, a suas expensas
e risco, pode usar a coisa, segundo sua destinaçâo, sendo obrigado como depositário: I - a
empregar na guarda da coisa a diligência exigida por sua natureza; li-a entregá-la ao credbr,
se a dívida não for paga no vencimento".
629 Sobre esse assunto, ver O R L A N D O GOMES. Direitos Reais..., p. 386-390; CAIO MARIO
DA SILVA PEREIRA. Instituições de Direito Civil..., v. IV, p. 434.
63 0 No mesmo sentido, EGBERTO LACERDA TEIXEIRA e JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUER-
REIRO. Das Sociedades Anônimas no Direito Brasileiro..., v. 1, p. 249; JOSÉ E D W A L D O
TAVARES B O R B A . Direito Societário. 11 a edição, Rio de Janeiro: Renovar, 2008,
p. 273. Em sentido contrário, FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades
Anônimas..., v. I, p. 232-233.
631 Art. 1.422 do Código Civil.
632 Art. 1.419 do Código Civil.
nhados continuam no patrimônio do devedor e sujeitam-se, portan-
to, aos efeitos da recuperação judicial de empresas 6 3 3 . N a alienação
fiduciária em garantia, o devedor transmite ao credor a propriedade
resolúvel do bem, tendo ele, portanto, direito real sobre coisa própria.
O bem dado em garantia é excluído do patrimônio do devedor e inse-
rido no patrimônio do credor, embora c o m as restrições próprias à
natureza fiduciária da transmissão 6 3 4 . O credor fiduciário, por adquirir
a propriedade do b e m (ainda que resolúvel e vinculada a u m a deter-
minada finalidade), fica imune contra eventuais riscos patrimoniais
do devedor, m e s m o no caso de sua insolvência, falência ou recupera-
ção judicial 6 3 S - 6 3 6 .
Q u a n t o às demais cláusulas ou ônus, é necessário examinar a
sua natureza para conhecer os seus efeitos sobre a livre transferibili-
633 Sobre esse assunto, ver o § 5° do art. 49 da Lei n° 11.101/2005: "Tratando-se de crédito
garantido por penhor sobre títulos de crédito, direitos creditórios, aplicações financeiras ou
valores mobiliários, poderão ser substituídas ou renovadas as garantias liquidadas ou vencidas
durante a recuperação judicial e, enquanto não renovadas ou substituídas, o valor eventu-
almente recebido em pagamento das garantias permanecerá em conta vinculada durante o
período de suspensão de que trata o § 4o do art. 6° desta Lei".
634 MELHIN NAMEM C H A L H U B . Negócio Fiduciário - Alienação Fiduciária..., p. 107-108.
635 A Lei n° 11.101/2005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e falência do
empresário e da sociedade empresária, excluiu dos efeitos da insolvência os bens objeto de
propriedade fiduciária em geral e os integrantes do patrimônio de afetação, conforme consta
do § 3 o do art. 49 e do inciso IX do art. 119: "Art. 49. § 3°. Tratando-se de credor titular da
posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de
proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham
cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias,
ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se
submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade
sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitin-
do, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4° do art. 6o desta Lei, a venda
ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade
empresarial."; "Art. 119. Nas relações contratuais a seguir mencionadas prevalecerão as
seguintes regras: (...) IX - os patrimônios de afetação, constituídos para cumprimento de
destinação específica, obedecerão ao disposto na legislação respectiva, permanecendo seus
bens, direitos e obrigações separados dos do falido até o advento do respectivo termo ou até
o cumprimento de sua finalidade, ocasião em que o administrador judicial arrecadará o saldo
a favor da massa falida ou inscreverá na classe própria o crédito que contra ela remanescer".
636 Sobre esse assunto, MELHIN NAMEM C H A L H U B , "A cessão fiduciária e a recuperação
judicial". Valor Econômico. Rio de Janeiro, Legislação e Tributos, p. E4, publicado em
24.07.2009, observa que: "(...) é preciso ter presente que a desvinculação dos bens objeto de
propriedade fiduciária dos efeitos da recuperação judicial confere segurança jurídica inigualável
a essa garantia, tornando-a um elemento catalisador do desenvolvimento econômico e social,
por conta do efeito do aumento da oferta de crédito e da redução do custo do dinheiro".
dade das ações. A s cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e
incomunicabilidade constituem restrições impostas pelo testador ou
doador ao direito de propriedade do herdeiro, legatário ou donatário, e
visam, respectivamente, a proibir a alienação do bem gravado, a im-
pedir a sua penhora por dívidas contraídas por seu titular ou a evitar
que ele venha a integrar o patrimônio comum, no caso de o proprie-
tário casar-se sob o regime de comunhão de bens 6 3 7 .
Tais cláusulas implicam evidente restrição ao direito de proprie-
dade, pois retiram do titular u m dos seus atributos básicos, qual seja, a
possibilidade de dispor da coisa. Ademais, prejudicam a plena realiza-
ção de um dos princípios fundamentais da atividade econômica, pois
impedem a livre circulação dos bens gravados 6 3 8 .
O caráter excepcional destas limitações ao direito de proprieda-
de foi consagrado no C ó d i g o Civil, que condiciona os gravames de
inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade atribuídos
aos bens da legítima à existência de justa causa 6 3 9 . O u seja, a imposi-
ção pelo testador de ônus de tão graves conseqüências somente será
possível se houver indicação de u m a justa causa 6 4 0 .
Face ao seu caráter excepcional, as cláusulas de inalienabilidade,
impenhorabilidade e incomunicabilidade devem ser interpretadas res-
tritivamente, a fim de limitar o seu alcance para não contrariarem os
interesses legítimos dos próprios donatários, legatários ou herdeiros,
em benefício dos quais foram instituídas.
637 Consta do art. 1.911 do Código Civil que "a cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens
por ato de liberalidade, implica impenhorabilidade e incomunicabilidade".
638 Sobre as críticas à instituição da cláusula de inalienabilidade, ver SILVIO RODRIGUES.
Direito Civil. v. 7, 25 a edição, São Paulo: Saraiva, 2002, p. 191; A N A LUIZA MAIA
NEVARES, "As Cláusulas de Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade
sob a Ótica Civil-Constitucional", Revista Trimestral de Direito Civil. Rio de Janeiro:
Padma, Ano 2, v. 5, janeiro-março, 2001, p. 235.
639 O Código Civil dispõe no art. 1.848 que "salvo se houver justa causa, declarada no
testamento, não pode o testador estabelecer cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade,
e de incomunicabilidade sobre os bens da legítima".
Sobre esse assunto, ver G1SELDA MARIA FERNANDES NOVAES HIRONA. Comentários ao
Código Civil. V. 20, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 258-259.
Aliás, u m dos princípios que deve informar a matéria reside
justamente na finalidade a ser alcançada quando da instituição das
cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabili-
dade. Via de regra, os doadores ou testadores, ao estabelecerem tais
cláusulas, visam à proteção dos beneficiários. B u s c a m , mediante es-
tas limitações ao direito de propriedade, proporcionar-lhes mais segu-
rança. A aposição de tais gravames denota a preocupação dos doadores
e testadores de garantir, no futuro, bem-estar aos beneficiários.
do art 1.899 que "quando a cláusula testamentária for suscetível de interpretações diferen-
tes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador".
644 Os frutos podem ser definidos como todo bem ou utilidade que provém diretamente de
uma coisa cuja percepção mantém intacta'a substância desta; constituem frutos as rique-
zas normalmente produzidas pela coisa, sem alteração de sua substância. Sobre os
requisitos essenciais para a caracterização dos frutos, ver O R L A N D O GOMES. Introdu-
ção ao Direito Civil. 19a edição, atualizada por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de
Brito, Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 232; e sobre a classificação dos frutos, ver MARIA
HELENA DINIZ. Curso de Direito Civil Brasileiro, v. 1, 20 a edição, São Raulo: Saraiva,
1993, p. 169.
645 Sobre esse assunto, C L O V I S B E V I L A Q U A . Código Civil dos Estados Unidos do Brasil
Comentado, v. 6, Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1955, p. 188, observa que: "A
inalienabilidade não se estende aos frutos dos bens da legítima, os quais, consequentemente,
podem ser penhorados, seqüestrados ou arrestados, por dívidas do herdeiro. O destino
próprio dos frutos e rendimentos é serem consumidos e aplicados na satisfação das
necessidades do proprietário, que, sendo possível, acumularia as sobras, para aumento do
seu patrimônio. Se aos frutos e rendimentos se estendesse a inalienabilidade, seriam eles,
de todo inúteis ao herdeiro, e inúteis o legado e a herança sujeitos a essa cláusula. Mas, se
o testador, determinar que os frutos e rendimentos dos bens que submeteu à condição de
inalienabilidade ficarão isentos de execuções pendentes e futuras, ficarão eles impenhoráveis,
não obstante serem alienáveis, por atos voluntários do herdeiro". No mesmo sentido,
CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA. Instituições de Direito Civil..., v. IV, p. 109, também
concluiu que a inalienabilidade não deve atingir os frutos ou rendimentos dos bens
principais, admitindo-se, entretanto, que sobre eles possam incidir as cláusulas de
incomunicabilidade e impenhorabilidade.
646 Sobre esse assunto, C A I O MÁRIO DA SILVA PEREIRA. Instituições de Direito Civil..., v.
IV, p. 109, observa que: "(...) retirada ao dominus a faculdade de dispor dos frutos da
coisa, além de se lhe recusar a sua disponibilidade, a propriedade se esvazia de conteúdo
a tal ponto, que se converte em nada. Além disso, sob o aspecto social é inconveniente,
porque o bem, que não pode ser alienado e de que se não utilizam os frutos, ê elemento
negativo como riqueza coletiva". Esse é também o entendimento do Supremo Tribunal
Federal, conforme consta do voto proferido pelo Ministro Lafayette de Andrade no
Recurso Extraordinário n° 19.653, j. em 30.10.1951.
rem derivadas (artigo 169, § 2 o ) . A s ações "bonificadas" constituem
extensão do bem, não frutos; assim, as ações novas são atribuídas
ao proprietário das ações primitivas c o m os gravames que elas j á
apresentavam.
A L e i das S . A . determina expressamente que, no usufruto e no
fideicomisso, o direito de preferência à subscrição de ações, quando
não exercido pelo acionista até 10 (dez) dias antes do vencimento
do prazo, p o d e r á sê-lo pelo usufrutuário ou fideicomissário 6 4 7 . A s -
sim, as p e s s o a s l e g i t i m a d a s à subscrever as ações s ã o o n u - p r o p r i -
etário e o fiduciário, m a s casos estes n ã o e x e r ç a m o seu direito de
preferência dentro d o p r a z o a s s i n a l a d o p e l a L e i d a S . A . , esse di-
reito p o d e r á ser exercido p e l o u s u f r u t u á r i o o u f i d e i c o m i s s á r i o , que
subscreverão as ações e m n o m e p r ó p r i o , s e n d o , p o r t a n t o , auto-
m a t i c a m e n t e , os seus titulares 64 ®.
S e as ações f o r e m subscritas p e l o nu-proprietário, salvo esti-
pulação e m contrário n o ato de instituição do usufruto, este adqui-
rirá as novas ações s e m restrições, p o r q u e elas i n t e g r a m o seu capital.
N o caso de serem subscritas p e l o fiduciário, as ações deverão ser,
posteriormente, entregues ao fideicomissário, pois admitir-se o con-
trário seria aceitar que o f i d e i c o m i s s á r i o , q u e originariamente teria
direito de receber ações representativas d e u m determinado per-
centual de participação n o capital d e u m a c o m p a n h i a , recebesse
u m percentual inferior 6 4 9 .
SEÇÃO VIIS
C U S T Ó D I A DE A Ç Õ E S FUNGÍVEIS
§ 5 o A instituição t e m as o b r i g a ç õ e s d e depositária e r e s p o n d e
perante o acionista e terceiros pelo d e s c u m p r i m e n t o d e suas obri-
g a ç õ e s . " (Incluído pela L e i n ° 1 0 . 3 0 3 / 2 0 0 1 )
663 Sobre a origem das ações em custódia, ALFREDO LAMY FILHO e JOSÉ LUIZ BULHÕES
PEDREIRA, In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito das
Companhias, v. I, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 535, observam que: "Antes da LSA, as
ações em circulação no mercado em regra tinham a forma ao portadorsalvo aquelas que,
por exigência legal, deviam ser nominativas, e os acionistas mantinham essas ações em
custódia em bancos para evitar os riscos de extravio ou destruição de certificados; e como a
lei exigia que dos certificados de ações ao portador constasse o número de ordem das ações,
o banco depositário era obrigado a restituir ao depositante o mesmo certificado recebido em
depósito, o que implicava elevados custos administrativos. O depósito de ações fungíveis foi
criado com o objetivo de reduzir esses custos, ao permitir que o banco considere como
coisas fungíveis todas as ações da mesma espécie, classe e companhia recebidas de diversos
depositantes, e mantenha, portanto, apenas o controle do número total das ações recebidas
com o que pode restituir a cada depositante a quantidade de ações dele recebidas em
quaisquer certificados, e não. nos mesmos certificados recebidos".
664 Consta da Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, que "os artigos 41 e 42, com o
objetivo de reduzir os custos de administração de carteiras de títulos, regulam modalidade de
serviços de custódia de instituições financeiras que dispensará o registro e manipulação, em
separado, dos certificados recebidos de cada depositante. Como os valores mobiliários são
títulos de massa, que conferem - dentro de cada espécie e classe - iguais direitos, não há
inconvenientes em que a instituição depositária devolva aos custodiantes, ação igual, embo-
ra com outro número de ordem e representada por certificado diverso".
665 A Lei n° 6.385/1976 determina no parágrafo único do artigo 24 que: "Considera-se custó-
dia de valores mobiliários o depósito para guarda, recebimento de dividendos e bonificações,
resgate, amortização ou reembolso, e exercício de direitos de subscrição, sem que o deposi-
tário tenha poderes, salvo autorização expressa do depositante em cada caso, para alienar os
valores mobiliários depositados ou reaplicar as importâncias recebidas".
666 Arts. 1.361 a 1.368-A do Código Civil. Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 40
da Lei das S.A.
667 Sobre esse assunto, ver JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREIRO, "Propriedade Fiduciária
de Ações". In: JORGE L O B O (Coord.). Reforma da Lei das Sociedades Anônimas: Inovações
e Questões Controvertidas da Lei n° 10.303, de 31.10.2001. Rio de Janeiro: Forense,
2002, p. 51-59.
668 Ainda sobre esse assunto, MELHIM NAMEM CHALHUB, "Propriedade Fiduciária de Bens
Móveis em Garantia", Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitra-
gem. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 21, julho-setembro, 2003, p. 302-303,
informa que "(...) o Código Civil regulamentou apenas uma espécie de propriedade fiduciária
A s disposições sobre custódia de ações fungíveis, de acordo com
o § 2 o , aplicam-se, no que couber, aos demais valores mobiliários:
debêntures, bônus de subscrição e quotas de fundos de investimentos
em ações.
E s t e artigo foi alterado pela L e i n ° 1 0 . 3 0 3 / 2 0 0 1 , que deu nova
redação ao antigo parágrafo único: renumerou-o para § I o e acres-
centou a este dispositivo os § § 2 ° a 5 o . E s s a alteração instituiu a pro-
priedade fiduciária de ações, modificando a natureza da custódia de
ações fungíveis, que passou a ter características híbridas de proprieda-
de fiduciária e de depósito, mantendo, no entanto, o regime de indis-
ponibilidade das ações custodiadas. N a realidade, a L e i n° 10.303/
2 0 0 1 apenas incorporou à L e i das S . A . u m sistema de custódia que já
havia sido adotado na prática pelo M ó d u l o N a c i o n a l de Debêntures —
S N D , atual denominação do Sistema N a c i o n a l de Debêntures - S N D .
N a vigência da L e i das S . A . , foi criado o M ó d u l o Nacional de
Debêntures — S N D —, concebido p a r a processar eletronicamente o
registro, a custódia e a liquidação financeira das operações c o m de-
bêntures.
670 MODESTO CARVALHOSA e NELSON EIZIRIK. A Nova Lei das S/A. São Raulo: Saraiva,
2002, p. 124-29.
671 Art. 293, caput, da Lei das S.A. c/c o art. 24 da Lei n° 6.385/1976, com a redação dada pelo
Decreto n° 3.995/2001. Este Decreto retirou as Bolsas de Valores do rol dos autorizados a
exercer a custódia e acrescentou em seu lugar as entidades de compensação e liquidação,
incorporando normas da Resolução do Conselho Monetário Nacional n" 2.690/2000 (art 74)
e da Instrução CVM n° 115/1990 que, no parágrafo único do art. I o , estabeleceu que tão logo
fosse implementado o sistema de compensação e liquidação de operações previsto no art. 74
do Regulamento Anexo à Resolução n° 1.656/1989, as Bolsas de Valores deveriam transferir
para sociedade anônima, que fosse constitufda com essa finalidade, a prestação do serviço de
custódia para guarda, controle e administração de ações fungíveis. No caso da Bolsa de Valores
de Sao Paulo, a sociedade, à época, criada para operar esse sistema foi a CBLC que, posterior-
mente (em 28.11.2008), foi incorporada pela BM&FBovespa. Consta da atual redação do art.
24 da Lei n° 6.385/1976, com a alteração introduzida pelo Decreto n° 3.995/2001, que
"compete à Comissão autorizar a atividade de custódia de valores mobiliários, cujo exercício será
privativo das instituições financeiras e das entidades de compensação e liquidação."
672 Instrução CVM n° 115/1990 que dispõe sobre a prestação de serviço de custódia fungível de
ações nominativas. Ver, também, a (i) Instrução CVM n° 310/1999, com as alterações introduzidas
pela Instrução CVM n° 441/2006, que versa sobre as obrigações do custodiante e subcuslodiante
de valores mobiliários; e (ii) Deliberação CVM n° 472/2004, que trata dos registros mantidos
pelas instituições autorizadas pela CVM a prestar serviços de custódia de ações fungíveis.
673 Ver os comentários ao art. 31 da Lei das S.A.
674 No que se refere à ação escriturai, o art. 31 da Lei das S.A., com a redação dada pela Lei n°
10.303/2001, expressamente determina que a sua propriedade presume-se pelo extrato
fornecido pela instituição depositária, na qualidade de proprietária fiduciária.
A propriedade adquirida pela instituição depositária é limitada e
resolúvel, pois (i) a transferência t e m por f i m apenas a guarda, o
controle, a administração e a viabilização das operações com valores
mobiliários depositados n o â m b i t o dos sistemas de negociação e
liquidação, ou seja, o fiduciário não p o d e dispor das ações; e (ii) pode
ser extinta a qualquer tempo, mediante a rescisão do contrato pelo
depositante, retornando a ação, ou outro valor mobiliário depositado,
ao seu p a t r i m ô n i o . A s s i m , os valores m o b i l i á r i o s transferidos à
instituição depositária, durante o prazo e m que vigorar a custódia,
não integram, para quaisquer fins, o seu patrimônio 6 7 5 . A instituição
depositária, a despeito de receber a propriedade fiduciária dos valores
custodiados, terá as m e s m a s obrigações do depositário, de acordo com
o regulado pelo C ó d i g o Civil 6 7 6 - 6 7 7 .
das ações é transferida ao depositário, que não pode obstar o exercício do direito de
propriedade do depositante".
681 CAIO MÁRIO D A SILVA PEREIRA. Instituições de Direito Civil. Contratos, vol. III. 14 a
edição. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 32, observa que "o depósito é regular quando tem
por objeto coisas não fungíveis, obrigando-se o depositário a restituir especificadamente a
própria coisa depositada, que se identifica pelos seus caracteres individuais. Chama-se irregu-
lar, quando incide sobre coisas fungíveis, obrigando-se o depositário a restituir objetos do
mesmo gênero, qualidade e quantidade - tantumdem eiusdem generis. Há, neste caso,
transferência de domínio da coisa depositada, regulando-se o contrato pelas disposições
relativas ao mútuo (Código Civil, artigo 645), cuja dogmática atrai, embora as duas espécies
contratuais continuem passíveis de distinção. Mas não é sempre que a fungibilidade do
objeto cria o depósito irregular. Se ficar caracterizada a obrigação de devolver a mesma coisa,
embora fungível, o depósito é regular. Para que se tenha como irregular, é mister que ocorram
dois fatores, que se apuram em razão da destinação econômica do contrato: o primeiro
material, é a faculdade concedida ao depositário de consumir a coisa; o segundo, anímico,
é o propósito de beneficiar o depositário. Sem perder de vista que o depósito se presume
regular, deve o interessado dar prova que o ilida, podendo demonstrar o seu caráter irregular
por vários meios, como sejam a profissão do depositário, o modo de sua realização etc.".
682 O Código Civil, no art. 586, define o mútuo como o empréstimo de coisas fungíveis em
que o mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo
gênero, qualidade e quantidade.
683 Sobre o funcionamento da custódia de títulos e valores mobiliários, ver VALDIR CARLOS
PEREIRA FILHO, "Clearing Houses: Aspectos Jurídicos Relevantes e seu Papel no Merca-
do de Capitais e no Sistema de Pagamentos Brasileiro", Revista de Direito Bancário, do
Mercado de Capitais e da Arbitragem. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 27,
janeiro-março, 2005, p.76-77. Ver, também: Comissão de Valores Mobiliários (CVM),
"Os Serviços de Custódia de Ações Escriturais", abril de 1999. Disponível em: chltp://
www.cvm.gov.br/portyprotinv/caderno2.asp>.
valores mobiliários depositados somente é transferida de volta ao de-
positante nos registros da companhia quando extinta a custódia, pelo
equivalente ao saldo remanescente na sua conta de depósito 6 8 4 .
A custódia de ações fungíveis t a m b é m transfere à instituição fi-
nanceira depositária, e m caráter provisório, independentemente de
procuração, o direito de receber, em n o m e do efetivo titular, dividen-
dos, bonificações e o de exercer o direito de preferência para a subs-
crição de ações (artigo 42, caput). N o entanto, a transferência da
propriedade fiduciária não outorga às instituições depositárias o direi-
to de votar c o m as ações custodiadas (artigo 126, inciso II) 6 8 5 .
A instituição financeira t e m as obrigações de depositária e res-
ponde perante o acionista e terceiros pelo seu descumprimento, con-
forme estabelece o § 5 o . A c o m p a n h i a emissora não tem qualquer
responsabilidade pelo contrato de prestação de serviços de custódia
fungível, que é celebrado apenas entre o acionista, n a qualidade de
depositante, e a instituição financeira ou a entidade de compensação
e liquidação, na qualidade de depositária 6 8 6 . N ã o obstante, a institui-
ção depositária, de acordo c o m o § 3 o , é obrigada a comunicar à com-
panhia emissora das ações: (i) imediatamente, o n o m e do proprietário
efetivo quando houver qualquer evento societário que exija a sua iden-
tificação, tais c o m o a subscrição de ações, a realização de assembleia
geral e o recebimento de dividendos 6 8 7 ; e (ii) no prazo de até 10 (dez)
Representação e responsabilidade
"Art. 42. A instituição financeira representa, perante a compa-
nhia, os titulares das ações recebidas em custódia nos termos do
artigo 41, para receber dividendos e ações bonificadas e exercer
direito de preferência para subscrição de ações.
694 A Lei das S.A. determi na no § 2 o do art. 205 que "os dividendos das ações em custódia
bancária ou em depósito nos Lermos dos arts. 41 e 43 serão pagos pela companhia à
instituição financeira depositária, que será responsável pela sua entrega aos titulares das
ações depositadas".
695 Art. 24, parágrafo único, da Lei n° 6.385/1976.
696 Consta da Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, que, "para evitar que as institui-
ções financeiras depositárias possam influir sobre a orientação das companhias exercendo,
sem mandato expresso, o direito de voto correspondente às ações de que são depositárias,
o artigo 42 limita seus poderes de representação ao exercício de direitos patrimoniais".
A Lei n° 6.385/1976, no art. 25, determinou que, "salvo mandato expresso com prazo não
superior a um ano, o administrador de carteira e o depositário de valores mobiliários não
podem exercer o direito de voto que couber às ações sob sua administração ou custódia".
da companhia emissora, além do documento de identidade, exibirão
ou depositarão na companhia, se o estatuto o exigir, comprovante
expedido pela instituição depositária (artigo 126, inciso H) 698 - 699 .
Sempre que houver distribuição de dividendos ou bonificação de
ações e, em qualquer caso, ao menos u m a vez por ano, a instituição
depositária fornecerá à companhia a lista dos depositantes de ações,
assim como a quantidade de ações de cada um, nos termos do § I o . A
instituição depositária t a m b é m é obrigada a comunicar à companhia
emissora: (i) imediatamente, o n o m e do proprietário efetivo quando
houver qualquer evento societário que exija a sua identificação, como
a subscrição de ações e a realização de assembleia geral; e (ii) no pra-
zo de até 10 (dez) dias, a contratação da custódia e a criação de ônus
ou gravames sobre as ações (artigo 41, § 3 o ) 7 0 0 .
S E Ç Ã O BX
C E R T I F I C A D O DE D E P Ó S I T O D E A Ç Õ E S
V I - o n o m e e a qualificação d o d e p o s i t a n t e ;
§ 2 o E m i t i d o o certificado d e d e p ó s i t o , a s a ç õ e s d e p o s i t a d a s , seus
rendimentos, o valor de resgate o u de amortização não poderão
ser objeto d e p e n h o r a , arresto, s e q ü e s t r o , b u s c a o u a p r e e n s ã o , o u
q u a l q u e r o u t r o e m b a r a ç o q u e i m p e ç a s u a e n t r e g a a o titular d o
certificado, m a s e s t e p o d e r á ser o b j e t o d e p e n h o r a o u d e qualquer
m e d i d a cautelar p o r o b r i g a ç ã o d o s e u titular.
§ 3 o O s certificados d e d e p ó s i t o d e a ç õ e s s e r ã o n o m i n a t i v o s , p o -
d e n d o ser m a n t i d o s s o b o s i s t e m a escriturai. ( R e d a ç ã o d a d a p e l a
Lei n° 9.457/1997)
§ 5 o A p l i c a m - s e ao e n d o s s o d o certificado, n o q u e couber, as n o r -
m a s q u e r e g u l a m o e n d o s s o d e títulos c a m b i á r i o s . "
707 Ver o art. 24 da Lei n° 6.385/1976, com a redação dada pelo Decreto n° 3.995/2001. Este
Decreto retirou as Bolsas de Valores do rol dos autorizados a exercer a custódia e acrescen-
tou em seu lugar as entidades de compensação e liquidação, adaptando a lei à realidade
do mercado e incorporando normas da Resolução do C M N n° 2.690/2000 (art. 74) e da
Instrução C V M n° 115/1990, que, no parágrafo único do art. I o , estabeleceu que tão logo
fosse implementado o sistema de compensação e liquidação de operações previsto no art.
74 do Regulamento Anexo à Resolução n° 1.656/1989, as Bolsas de Valores deveriam
transferir para sociedade anônima, que fosse constituída com essa finalidade, a prestação
do serviço de custódia para guarda, controle e administração de ações fungíveis. No caso
da Bolsa de Valores de São Pãuío, a sociedade, à época, criada para operar esse sistema foi
a C B L C que, posteriormente (em 28.11.2008), foi incorporada pela BM&FBovespa. Dessa
forma, consta da atual redação do art. 24 da Lei n° 6.385/1976 que "compete à Comissão
autorizar a atividade de custódia de valores mobiliários, cujo exercício será privativo das
instituições financeiras e das entidades de compensação e liquidação".
703 De 2cordo com a BM&FBovespa, "Units são ativos compostos por mais de uma classe de
valores mobiliários, como uma ação ordinária e um bônus de subscrição, por exemplo,
negociados em conjunto. As units são compradas e/ou vendidas no mercado como uma
unidade". Disponível em: <http://www.bovespa.com.br/mercado/rendavariavel>. Sobre esse
assumo, ver a decisão proferida pela CVM no Processo Administrativo n° RJ 2009/7176, j".
em 18.08.2009, que analisou a oferta pública de units do Banco Santander S.A.
709 Até o final de 2010, o mercado brasileiro só tinha BDRs não patrocinados, ou seja, trazidos
por instituições financeiras depositárias no Brasil. Sobre os certificados de depósito de
D e acordo com o § 1°, a instituição financeira depositária res-
ponde perante o titular do certificado de depósito de ações pela sua
origem e autenticidade. O § 2 o determina que as ações depositadas,
seus rendimentos, o valor de resgate ou amortização não podem, du-
rante a existência dos certificados, ser objeto de penhora, arresto, se-
qüestro, busca ou apreensão, mas que os certificados podem ser objeto
de penhora ou de qualquer outra medida cautelar por obrigação do
seu titular.
Valores Mobiliários - BDRs, vera Instrução CVM n° 332/2000, com as alterações introduzidas
pelas Instruções CVM nos 431/2006, 456/2007, 480/2009 e 493/2001. A CVM, por meio
da Instrução CVM n" 493/2011, flexibilizou a aplicação em BDRs nfvel 1 - certificados
com lastro em ações de companhia com sede no exterior, permitindo que esses tftulos
sejam negociados tanto por entidades de previdência complementar como por pessoas
físicas ou jurídicas com investimento superior a R$ 1 milhão. A Instrução C V M n° 332/
2000, em seu art. I o , inciso I, define como BDRs "os certificados representativos de valores
mobiliários de emissão de companhia aberta, ou assemelhada, com sede no exterior e
emitidos por instituição depositária no Brasil" e (i) no inciso III, com a redação dada pela
Instrução CVM n° 431/2006, a instituição depositária como "a instituição que emitir, no
Brasil, o correspondente certificado de depósito, com base nos valores mobiliários custodiados
no exterior"; (ii) no inciso IV, a empresa patrocinadora como "a companhia aberta, ou
assemelhada, com sede no exterior, emissora dos valores mobiliários objeto do certificado de
depósito, e que seja sujeita à supervisão e fiscalização de entidade ou órgão similar á CVM";
e (iii) no inciso V, programas de BDRs como "a classificação dos BDRs, de acordo com suas
características de divulgação de informações, distribuição e negociação e a existência, ou
não, de patrocínio das empresas emissoras dos valores mobiliários objeto do certificado de
depósito." De acordo com o § 1° do art. 3 o da Instrução C V M n° 332/2000, com as
alterações introduzidas pela Instrução C V M n° 456/2007 e 493/2011, o "programa de BDR
patrocinado caracteriza-se por ser instituído por uma única instituição depositária, contrata-
da pela companhia emissora dos valores mobiliários objeto do certificado de depósito,
podendo ser classificado nos seguintes níveis: I - BDR Patrocinado Nível I - caracteriza-se
por: a) negociação em mercado de balcão não organizado ou em segmentos específicos
para BDR Nível I de entidade de mercado de balcão organizado ou bolsa de valores; b)
divulgação, no Brasil, das informações que a companhia emissora está obrigada a divulgar em
seu país de origem, acrescida daquelas mencionadas no § 3°; c) dispensa de registro de
companhia, na CVM; e d) aquisição exclusiva por: 1. instituições financeiras; 2. fundos de
investimento; 3. administradores de carteira e consultores de valores mobiliários autorizados
pela CVM, em reiação a seus recursos próprios; 4. empregados da empresa patrocinadora ou
de outra empresa integrante do mesmo grupo econômico; 5. entidades fechadas de previ-
dência complementar; e 6. pessoas físicas ou jurídicas com investimentos financeiros
superiores a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais); II - BDR Patrocinado Nível li -
caracteriza-se por: a) admissão à negociação em bolsa de valores ou em mercado de
balcão organizado; e b) registro de companhia, na CVM. III - BDR Patrocinado Nível III -
caracteriza-se por: a) distribuição pública no mercado; b) admissão à negociação em bolsa
de valores ou em mercado de balcão organizado; e c) registro de companhia, na CVM."
Nos termos do § 2°, caracteriza-se por BDR não patrocinado "o programa instituído por
uma ou mais instituições depositárias emissoras de certificado, sem um acordo com a
companhia emissora dos valores mobiliários objeto do certificado de depósito, somente
admitindo negociação nos moldes do BDR Patrocinado Nível I."
O s certificados de depósito de ações são nominativos e podem,
nos termos do § 3 o , ser mantidos sob o sistema escriturai. Poderão,
também, a pedido do seu titular e por sua conta, ser desdobrados ou
grupados, o que implica a unificação ou separação de registros, seja
no "Livro de Registro de A ç õ e s Nominativas" ou nas contas de de-
pósito de certificados de ações escriturais. N o s termos do § 5 o , as
normas que regulam o endosso de títulos cambiários aplicam-se, no
que couber, ao endosso do certificado de depósito de ações 7 1 0 .
A s disposições sobre o certificado de depósito de ações constan-
tes deste artigo aplicam-se a todos os valores mobiliários e não ape-
nas às ações 7 1 1 .
SEÇÃO X
Resgate e amortização
"Art. 4 4 . O estatuto o u a a s s e m b l e i a g e r a l extraordinária p o d e
autorizar a aplicação d e lucros o u reservas n o resgate o u n a a m o r -
tização de ações, d e t e r m i n a n d o as c o n d i ç õ e s e o m o d o de proce-
der-se à operação.
710 Sobre esse assunto, FÁBIO U L H O A C O E L H O . Curso de Direito Comercial, v. 2, 13'1 edição,
São Paulo: Saraiva, 2009, p. 134-135, observa que "a instituição financeira que atua como
agente emissor de certificado pode emitir em favor do acionista o CDA (certificado de depósito
de ações). Trata-se de valor mobiliário que comporta circulação por endosso em preto (LSA,
art 43, § 5°; Lei n. 8.088/90, art 79, § 2o). Sua finalidade é instrumentalizar a negociação das
ações nominativas, cujo registro se encontra a cargo do banco emitente. Assim, o acionista,
quando alienar a sua participação societária, poderá simplesmente endossar o CDA para o
adquirente.Quem vende a ação depositada é o endossante do certificado de depósito; quem
compra, o endossatário. Este último, por sua vez, exibindo o CDA endossado em seu favor à
instituição financeira que o emitiu, pode solicitar desta a atualização dos registros nos livros de
transferência de ações, de modo que passe a constar em seu nome a participação societária."
711 A Lei n° 6.385/1976, no inciso III do art. 2 o , com a redação que lhe foi dada pela Lei n°
10.303/2001, determina que são valores mobiliários sujeitos ao regime da lei os certifica-
dos de depósito de valores mobiliários.
capital social, mantido o mesmo capital, será atribuído, quando
for o caso, novo valor nominal às ações remanescentes.
Resgate
O resgate consiste na operação pela qual a companhia paga ao
acionista o valor de suas ações, retirando-as definitivamente de circu-
lação. Assim, constitui modo de extinção da ação.
Trata-se de modalidade de negócio jurídico unilateral, ou seja,
aquele que contém manifestação de vontade de apenas u m a parte e
cujas conseqüências jurídicas são sofridas pela outra parte, indepen-
dentemente de sua vontade 7 1 2 - 7 1 3 .
D e acordo com a redação original deste artigo, o resgate poderia
ser aprovado exclusivamente pela assembleia geral extraordinária da
companhia, submetendo-se os acionistas a tal manifestação unilate-
ral da sociedade. N o entanto, a L e i n ° 1 0 . 3 0 3 / 2 0 0 1 , ao acrescentar o
§ 6 o ao artigo 44, passou a condicionar a eficácia do resgate de deter-
minada classe de ações à aprovação, e m assembleia especial, por titu-
lares de, no mínimo, 5 0 % (cinqüenta p o r cento) das ações da classe
atingida. A realização d a assembleia especial das ações resgatadas
somente p o d e ser dispensada nas hipóteses e m que exista previsão
estatutária expressa nesse sentido. -
Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 256;
TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. 1. Rio de Janeiro; Forense,
1953, p. 153; e PHILOMENO J. COSTA. Operações da Anônima com as Ações de seu
Capital..., p. 92. Em sentido contrário, ALFREDO LAMY FILHO e JÒSÉ LUIZ BULHÕES
PEDREIRA, "Ação como Participação Societária". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões
Pedreira (Coord.). Direito das Companhias, v. I, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 267.
LUIS^ LORIA FLAKS, "Aspectos Societários do Resgate de Ações", Revista de Direito Mer-
cantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 123,
julho-setembro, 2001, p. 135.
As outras hipóteses em que pode haver redução de capital sem que, necessariamente, se
enquadrem nas 2 (duas) modalidades previstas no art. 173 da Lei das S.A. são as reguladas
A L e i das S . A . refere-se genericamente à aplicação de lucros ou
reservas no resgate ou na amortização de ações. Portanto, é possível a
utilização dos lucros do exercício, b e m c o m o das reservas estatutárias
de lucros criadas para esse fim (artigo 194) e das reservas de capital
(artigo 200, inciso II) 7 2 1 . A reserva legal não p o d e ser utilizada, pois -
nos termos da L e i das S . A . - tem por fim assegurar a integridade do
capital social e só p o d e ser aplicada para compensar prejuízos ou au-
mentar o capital (artigo 193, § 2 o ) . A i n d a que seja previsto no estatu-
to u m a reserva específica para o resgate de ações, esta não poderá ser
constituída, em cada exercício, e m prejuízo d o dividendo obrigatório
e do dividendo das ações preferenciais (artigos 2 0 2 e 2 0 3 ) .
nos arts. (i) 45, § 6o, que trata da operação de reembolso e estipula que, "se no prazo de 120
(cento e vinte) dias, a contar da publicação da ata da assembleia, não forem substituídos os
acionistas cujas ações tenham sido reembolsadas à conta do capital social, este considerar-se-á
reduzido no montante correspondente, cumprindo aos órgãos da administração convocar a
assembleia geral, dentro de 5 (cinco) dias, para tomar conhecimento daquela operação"; e (ii)
107, § 4o, que estabelece a possibilidade de redução do capital nos casos em que o acionista
não cumprir a obrigação de integralizar suas ações e a companhia não conseguir, por
qualquer dos meios previstos na Lei das S.A., promover tal integralização.
721 Sobre a possibilidade de o resgate ser efetivado mediante a utilização de reservas de reavaliação,
a CVM, no Parecer CVM/SJU n° 052/1985, se manifestou no sentido de que "a reserva de
reavaliação não configura uma reserva de lucros no sentido técnico-jurídico. Registra tão
somente ganhos potenciais de natureza não operacional ainda não realizados econômica e
financeiramente. Não pode, em conseqüência, ser utilizada no resgate de ações". A Lei n°
11.638/2007, em seu art 6o, proibiu que novas reavaliações fossem feitas a partir do início de
2008. A partir de 01.01.2008, devem ser classificadas como Ajustes de Avaliação Patrimonial,
enquanto não computadas no resultado do exercício em obediência ao regime de competên-
cia, as contrapartidas de aumentos ou diminuições de valor atribuído a elementos do ativo e
do passivo, em decorrência da sua avaliação a preço de mercado, conforme § 3 o do art. 182
da Lei das S.A. Sobre esse assunto, ver os comentários aos arts. 176 e 182 da Lei das S.A.
722 MODESTO C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas..., v. 1, p. 428;
EGBERTO LACERDA TEIXEIRA e JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREIRO. Das Sociedades
Nesse sentido, por analogia ao artigo 170, § I o , o valor do resga-
te não pode ser inferior ao resultante da aplicação, isolada ou cumula-
tivamente, dos 3 (três) parâmetros que devem ser utilizados para a
fixação do preço de emissão em aumento de capital: (i) valor de patri-
mônio líquido da ação; (ii) cotação em Bolsa de Valores ou mercado
de balcão organizado; ou (iii) valor de suas perspectivas de rentabili-
dade 723 . O preço de resgate pode corresponder ao valor real da ação,
apurado de acordo com a sua cotação no mercado secundário 7 2 4 ou,
ainda, com base em avaliação a preços de mercado do patrimônio
da companhia 7 2 5 - 7 2 6 .
D a d o o caráter cogente do resgate, para o acionista, a compa-
nhia pode estabelecer u m valor que compense a perda por ele sofrida,
nele embutindo um prêmio pela perda compulsória de sua condição
de acionista 727 . Tal prêmio não é obrigatório, pois poderia prejudicar
os acionistas cujas ações não são objeto do resgate.
Anônimas no Direito Brasileiro, v. 1, São FSulo: José Bushatsky, 1979, p. 255; FÁBIO
KONDER COMPARATO, "Funções e Disfunções do Resgate Acionário", Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 73,
janeiro-março, 1989, p. 71.
723 MODESTO CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas..., v. 1, p. 428.
724 EGBERTO LACERDA TEIXEIRA e JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREIRO. Das Sociedades
Anônimas no Direito Brasileiro..., v. 1, p. 255.
725 FÁBIO KONDER COMPARATO, "Funções e Disfunções do Resgate Acionário", Revista de
Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro..., p. 71.
72 6 Nesse sentido é a decisão do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso
Especial n° 68.378-5-PR, Rei. Min. Eduardo Ribeiro, j. em 08.08.1995. Disponível em:
<http:www.stj.gov.br>: "Sociedade Anônima - Resgate. Não contraria a lei a decisão que, à
míngua de disposição estatutária, determinou que o preço tivesse em conta o patrimônio
líquido, não simplesmente por sua expressão contábil, mas como apurado, em vista dos
valores reais, consoante o mercado. (...) O invocado artigo 170, que subsidiariamente se
admite aplicável, nem mesmo se refere a patrimônio líquido, tal apurado em balanço, como
o faz, por exemplo, o artigo 45, § 1°, a o cuidar do reembolso. /I expropriação das ações -
que a tanto corresponde o resgate - há de fazer-se sem prejuízo para o acionista, o que
ocorreria, caso o preço se baseasse em elementos alheios à realidade. Isso só se poderá
verificar havendo determinação estatutária, na medida em que seja lícito entender que o
acionista deu ao procedimento anuência prévia. Na hipótese em julgamento o estatuto só
contêm disposição genérica, não se impondo o exame de tal possibilidade e dos tempera-
mentos que, mesmo a aí, se possam fazer admissíveis".
727 NELSON EIZIRIK. Aspectos Modernos do Direito Societário..., p. 112.
O s entendimentos doutrinários, no sentido de se estabelecer
parâmetros mínimos para a fixação do valor de resgate, têm por fun-
damento a preocupação em proteger os acionistas minoritários con-
tra eventuais abusos praticados pela companhia, evitando que esta
possa atribuir valor iníquo às ações a serem resgatadas 7 2 8 .
N o entanto, tal preocupação somente se justifica nas hipóteses
de resgate não previsto no estatuto social, em que a assembleia geral
fixa as suas condições, inclusive o preço, no m o m e n t o em que a ope-
ração é efetivada. N o s casos e m que as ações são emitidas e subscritas
com direito ao resgate e as condições de sua implementação são pré-
via e detalhadamente fixadas no estatuto social, não há que se cogitar
a possibilidade de abuso perpetrado contra o titular das ações resgatá-
veis, pois o investidor j á possui prévio conhecimento das condições
em que se efetivará a operação, tendo c o m elas aquiescido ao subscre-
ver ou adquirir a ação resgatável, razão pela qual ele não poderá alegar
prejuízo no m o m e n t o da concretização do resgate.
De acordo com o art. 481 do Código Civil, "pelo contrato de compra e venda, um dos
contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço
em dinheiro".
O Código Civil, no art. 356, estabelece que: "O credor pode consentir em receber prestação
diversa da que lhe é devida".
Consta do art. 533 do Código Civil que: "Aplicam-se à troca as disposições referentes à
compra e venda, com as seguintes modificações: I - salvo disposição em contrário, cada um
dos contratantes pagará por metade as despesas com o instrumento de troca; U- éanulável
a troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes, sem consentimento dos
outros descendentes e do cônjuge do alienante".
D e acordo com o § 4 o , o resgate deve, em regra, abranger a tota-
lidade das ações de u m a m e s m a espécie ou classe e, no caso de resga-
te parcial, ocorre mediante sorteio. O u seja, a própria L e i das S.A.
expressamente prevê a hipótese de o resgate não atingir simultanea-
mente todas as ações de u m a m e s m a espécie ou classe, determinando
que tal situação seja solucionada mediante sorteio realizado pela com-
panhia, cujo objetivo é assegurar o caráter impessoal do resgate, im-
pedindo que o instituto seja utilizado para possibilitar a exclusão de
determinados acionistas da companhia 7 3 5 - 7 3 6 . D e acordo c o m a L e i
das S.A., a instituição financeira autorizada pela C o m i s s ã o de Valo-
res Mobiliários a prestar serviços de custódia de ações fungíveis pode
contratar custódia e m que as ações de cada espécie e classe sejam
recebidas em depósito c o m o valores fungíveis 7 3 7 ; assim, nos termos
da parte final do § 4 o deste artigo, sorteadas as ações custodiadas, a
instituição financeira depositária especificará, mediante rateio, quais
as que serão resgatadas, se outra f o r m a não estiver prevista no contra-
to de custódia.
MODESTO CARVALHOSA e N E L S O N EIZIRIK. A Nova Lei das S/A. São Raulo: Saraiva,
2002, p. 137-138.
Ver os comentários ao § 1°, alínea "c", do art. 117 da Lei das S.A.
MODESTO CARVALHOSA e NELSON EIZIRIK. A Nova Lei das S/A..., p. 141-142.
companhia aberta fixado na regulamentação da C o m i s s ã o de Valores
Mobiliários, remanescerem em circulação menos de 5% (cinco por
cento) do total das ações emitidas pela companhia, conforme consta,
expressamente, do § 5 o do artigo 4 o .
AMORTIZAÇÃO
Reembolso
No mesmo sentido, ALFREDO LAMY FILHO e JOSÉ LUIZ BULHÕES PEDREIRA, "Ação
como Participação Societária". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.).
Direito das Companhias..., v. I, p. 269.
lado com base no valor econômico d a companhia, a ser apurado em
avaliação (§ § 3 o e 4 o ) . (Redação d a d a pela L e i n° 9.457/1997)
As seguintes matérias, constantes da Lei das S.A., quando aprovadas em assembleia geral,
autorizam o acionista dissidente da deliberação a exercer o direito de recesso: (i) Art. 137,
caput - criação de ações preferenciais ou aumento de classe existente, sem guardar propor-
ção com as demais espécies e classes; alteração nas preferências, vantagens e condições de
resgate ou amortização de uma ou mais classes de ações preferenciais, ou criação de nova
A operação de reembolso decorre de manifestação unilateral de
vontade do acionista dissidente nas hipóteses de exercício do direito
de recesso previstas na L e i das S . A . e/ou no estatuto social e tem por
objeto, em princípio, todas as ações do capital social da companhia de
titularidade desse acionista 7 4 6 .
O critério para a determinação do valor de reembolso, de acordo
com as novas regras fixadas pela L e i n ° 9.457/1997, que alterou o
artigo 4 5 - está estabelecido, em princípio, no § I o deste artigo, ao
estipular que este deve corresponder ao valor de patrimônio líquido da
companhia, conforme apurado no último balanço aprovado pela as-
sembleia geral. T a l critério somente p o d e ser afastado caso o estatuto
social tenha previsto expressamente a possibilidade de o valor de re-
embolso ser calculado c o m base no valor econômico da companhia 7 4 7 ,
hipótese em que o montante devido aos acionistas dissidentes deverá
ser aferido por meio de avaliação realizada na f o r m a estabelecida nos
§§ 3 o e 4 o . Inexistindo previsão estatutária expressa, mantém-se o
cálculo do reembolso c o m base no valor de patrimônio líquido 7 4 8 .
classe mais favorecida; redução do dividendo obrigatório; fusão da companhia ou sua incorpo-
ração em outra; participação em grupo de sociedades (art 265); mudança do objeto da compa-
nhia; e cisão da companhia; (ii) Art 252, §§ I o e 2° - incorporação de todas as ações do capital
social ao patrimônio de outra companhia brasileira, para convertê-la em sua subsidiária integral;
(iii) Art. 256, § 2° - a compra, por companhia aberta, do controle de qualquer sociedade
mercantil se o preço de aquisição ultrapassar uma vez e meia o maior dos 3 (três) valores de que
trata o inciso li do caput desse artigo; e (iv) Art. 264, § 3 o - incorporação, pela controladora, de
companhia controlada, se as relações de substituição das ações dos acionistas não controladores,
previstas no protocolo de incoiporação, forem menos vantajosas que as resultantes da compa-
ração prevista no próprio art. 264. Outras hipóteses em que o acionista pode pedir o reembolso
de suas ações são; (i) art. 223, § 4 o - quando na incorporação, fusão, ou cisão envolvendo
companhia aberta, as sociedades que a sucederem não providenciarem o registro de companhia
aberta e/ou não promoverem a admissão de negociação das novas ações no mercado secundá-
rio, no prazo máximo de 120 (cento e vinte) dias, contados da data da assembleia geral que
aprovar a operação; e (ii) Art. 236, parágrafo único - quando a pessoa jurfdica de direito público
adquirir, por desapropriação, o controle de companhia em funcionamento.
746 Ver os comentários ao art. 137 da Lei das S.A.
747 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 17G, § I o , da Lei das S.A. x
748 NELSON EIZIRIK. Reforma das S/A e do Mercado de Capitais. 2 a edição, Rio de Janeiro:
Renovar, 1998, p. 84.
no prazo de 1 (um) ano, após a referida alteração estatutária, aprovar
operação que enseje direito de recesso sendo o valor de reembolso
menor ao que teriam direito os acionistas dissidentes se considerado
o critério anterior, sob pena de ser caracterizado o exercício abusivo
do poder de controle e infração grave nos termos do artigo 11, § 3 o ,
da Lei n° 6.385/1976 7 4 9 .
O balanço a ser adotado para efeitos de se apurar o valor de re-
embolso é o último aprovado pela assembleia geral da companhia;
corresponde àquele levantado ao final de cada exercício social e que,
na forma prevista na L e i das S.A. (artigo 132), deve ser submetido à
apreciação da assembleia geral ordinária, a ser realizada nos 4 (qua-
tro) primeiros meses do exercício subsequente.
O fato de a Lei das S.A. referir-se no § I o ao " ú l t i m o balanço
aprovado pela assembleia geral', deixa claro que, em regra, não se faz
necessário o levantamento de balanço especial para se apurar o valor
de reembolso devido aos acionistas dissidentes.
A única hipótese em que a L e i das S.A. faculta a elaboração de
balanço especial é a prevista no § 2 ° desse artigo. O u seja, se a delibe-
ração que der ensejo ao exercício do direito de retirada ocorrer mais
de 60 (sessenta) dias após a data do último balanço da companhia, os
acionistas dissidentes poderão requerer o levantamento de balanço
especial para a determinação do valor de reembolso.
Tal regra visa a possibilitar que o valor de reembolso retrate, com
mais fidelidade, a situação patrimonial da companhia no momento
em que o acionista exerce o direito de recesso, de forma que ele possa
abranger, por exemplo, eventuais lucros aferidos pela companhia en-
tre a data do último balanço aprovado pela assembleia geral e a data
em que for deliberada a operação ensejadora do direito de retirada.
O balanço especial a que se refere o § 2 o deve ser elaborado com
base nos mesmos requisitos e procedimentos utilizados para a ela-
Art. I o , inciso IX, da Instrução CVM n° 323/2000. Sobre o abuso do poder de controle, ver
os comentários ao art. 116 da Lei das S.A.
boração do balanço ordinário da companhia, isto é, aquele levantado
ao final de cada exercício social. N ã o faria sentido que os critérios
estabelecidos pela Lei das S.A., como regra geral, para determinar o
valor de reembolso, isto é, aqueles utilizados para a elaboração do úl-
timo balanço ordinário, fossem alterados apenas pelo fato de haver
um lapso de tempo superior a 60 (sessenta) dias desde o levantamen-
to do balanço ordinário 750 . O caráter especial do balanço refere-se
apenas à data extraordinária em que ele deve ser levantado 751 .
Caso o acionista solicite, juntamente com o reembolso, o levan-
tamento de balanço especial, nos termos do § 2 o , a companhia paga-
rá imediatamente a ele 80% (oitenta por cento) do valor de reembolso,
calculado com base no último balanço e, levantado o balanço especial,
pagará o saldo no prazo de 120 (cento e vinte) dias, a contar da data
da deliberação da assembleia geral. N a hipótese de ser constatado,
após o levantamento do balanço especial, que os 80% (oitenta por
cento) do valor de reembolso antecipadamente recebido pelo acio-
nista dissidente constituem valor superior ao efetivamente devido, ele
deverá devolver à companhia a diferença.
D e acordo com os § § 3 o e 4?, na hipótese de o estatuto determinar
a avaliação da ação para efeito de pagamento do valor de reembolso,
deverão ser indicados 3 (três) peritos ou empresa especializada, por
meio de lista sêxtupla ou tríplice, respectivamente, pelo conselho de
administração ou, se não houver, pela diretoria, e escolhidos pela
assembleia geral em deliberação tomada por maioria absoluta de votos,
não se c o m p u t a n d o os votos em branco, cabendo a cada ação,
independentemente de sua espécie ou classe, o direito a um voto 752 .
O l a u d o dos peritos ou da e m p r e s a e s p e c i a l i z a d a deverá ser
fundamentado, com a indicação dos critérios de avaliação e dos
755 ALFREDO LAMY FILHO, "Regularidade de Dividendos Ragos 'In Natura'". In: Alfredo Lamy
Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração,
aplicação), v. II, 2 a edição, Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p. 501.
para com os acionistas que deixaram de receber o dividendo obrigató-
rio, a qual deve ser quitada assim que sua situação financeira permitir.
Tratando-se, portanto, de u m a reserva que a própria L e i das S . A . vin-
culou a uma destinação específica, não se pode equipará-la às demais
reservas de lucros possuídas pela companhia nem utilizá-la para ou-
tras finalidades, que não aquelas expressamente admitidas no dispo-
sitivo legal que autoriza a sua constituição.
D e acordo com o § 5 o , possuindo a companhia lucros ou reservas
disponíveis em montante suficiente para o pagamento do valor de re-
embolso, tal alternativa deve ser adotada, a fim de evitar que o exercício
do direito de recesso acarrete a redução do capital social 756 . Porém, se a
companhia não tiver lucros ou reservas disponíveis em montante sufi-
ciente para fazer face ao pagamento do valor de reembolso, este deverá
ser feito tendo como contrapartida o capital social. Nessa hipótese, o §
6 o ainda concede à companhia o prazo de 120 (cento e vinte) dias para
que ela aliene as ações reembolsadas, a fim de que os antigos acionistas
dissidentes sejam substituídos, sem necessidade de redução do capital
social. N ã o sendo possível à companhia vender as ações nesse prazo, o
capital social deverá ser automática e compulsoriamente reduzido no
montante correspondente ao valor das ações reembolsadas e não alie-
nadas. Caberá, então, aos administradores da companhia, convocar, no
prazo de 5 (cinco) dias, a assembleia geral para tomar conhecimento da
situação e homologar a redução do capital.
PARTES BENEFICIÁRIAS
Características
763 Sobre a origem das partes beneficiárias, crítica a esses títulos negociais e a sua regulação no
direito comparado, ver MODESTO CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anô-
nimas. v. 1, 5 a edição, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 461-482.
764 . A Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, ao tratar das parles beneficiárias, dispôs
que "o Projeto mantém as partes beneficiárias, por sua utilidade na composição de interesses
quando a empresa requer contribuição especial, distinta da dos demais acionistas, principal-
mente se consiste em bem cujo valor somente pode ser realizado pelo seu uso; mas introduz
na legislação em vigor diversas inovações destinadas a evitar abusos da maioria na criação de
partes beneficiárias (...)".
765 O art. 189 da Lei das S.A. determina que "do resultado do exercício serão deduzidos, antes
de qualquer participação, os prejuízos acumulados e a provisão para o Imposto sobre a
Renda".
766 Estabelece o art. 190 da Lei das S.A. que "as participações estatutárias de empregados, adminis-
tradores e partes beneficiárias serão determinadas, sucessivamente e nessa ordem, com base nos
lucros que remanescerem depois de deduzida a participação anteriormente calculada".
Todas as partes beneficiárias emitidas por uma companhia asse-
o-uram iaaiais
í> o
direitos, isto é, não podem ter características _diferentes
umas das outras. Constituem, portanto, uma classe única. E por essa
razão que a Lei das S.A. expressamente determina que é proibida a
criação de mais de uma classe ou série de partes beneficiárias.
As partes beneficiárias estão em desuso, tendo em vista que a
sua existência reduz o valor das companhias no mercado, sem qual-
quer contrapartida financeira, quando atribuídas gratuitamente767-768.
Emissão
"Art. 47. As partes beneficiárias poderão ser alienadas pela com-
panhia, nas condições determinadas pelo estatuto ou pela assem-
bleia geral, ou atribuídas a fundadores, acionistas ou terceiros,
como remuneração de serviços prestados à companhia.
767 De acordo com ALFREDO LAMY FILHO, "Partes Beneficiárias. Extinção Mediante Compra
para Posterior Capitalização dos Créditos - Voto dos Portadores dos Títulos - e Controladores
- na Assembleia Geral que Deliberou a Matéria". In: Temas de S.A. Rio de Janeiro: Renovar,
2007, p. 267, há "hoje uma forte tendência pela extinção das partes beneficiárias pelas
companhias que desejam seguir o rumo da modernização, atraindo investidores".
768 Ver os comentários ao art. 47 da Lei das S.A.
De acordo com o disposto no caput deste artigo, as partes bene-
ficiárias podem ser alienadas pela companhia, nas condições fixadas
pelo estatuto ou pela assembleia geral ou, ainda, atribuídas a funda-
dores, acionistas ou terceiros, como remuneração de serviços presta-
dos à companhia769. Na hipótese de serem alienadas pela companhia,
o produto da alienação deverá ser registrado como reserva de capital,
nos termos determinados pela Lei das S.A.770. E indispensável que a
atribuição de partes beneficiárias a fundadores, acionistas ou terceiros
seja feita a título de contraprestação de serviços prestados à compa-
nhia, sob pena de se caracterizar ato de liberalidade e abuso de poder.
De acordo com a redação original do parágrafo único, a criação
das partes beneficiárias em companhias abertas somente poderia ocorrer
para alienação onerosa. O único caso de atribuição gratuita nas
companhias abertas era o de cessão a sociedades ou fundações
beneficentes de seus empregados. Nas sociedades fechadas admitia-se
tanto a atribuição gratuita como a alienação onerosa de partes
beneficiárias. No entanto, a Lei n° 10.303/2001, dando nova redação
ao parágrafo único do artigo 47, proibiu a emissão de partes beneficiárias
pelas companhias abertas.
A Lei das S.A. confere o direito de preferência para subscrição
de partes beneficiárias conversíveis para alienação onerosa (artigo 171,
§ 3o), o que não ocorre na emissão gratuita desses títulos, em decor-
ROMANO CRiSTIANO. Características e Títulos da S.A. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1981, p. 95, ao tecer críticas sobre a existência das partes beneficiárias, observa que: "A
atribuição de partes beneficiárias a diretores (...) desvirtua o instituto, uma vez que o trabalho
dos diretores não pode em qualquer hipótese ser classificado como contribuição especial, e
permite seja burlada a lei na parte em que estabelece limites a remunerações mensais e gratifica-
ções anuais. A atribuição de partes beneficiárias a empregados ou a sociedades e fundações
benefícentes de empregados pode tornar-se incompatível - no sentido de prejudicial para a
empresa - com o reconhecimento legislativo, cada vez maior e mais preciso, do direito de cada
empregado a participar, individualmente, dos lucros da empresa. Por derradeiro, não se enten-
de, também, a emissão de partes beneficiárias para venda. Precisando de capitais, não tem a
empresa inúmeros outros meios para obtê-los, inclusive junto ao grande público?".
Consta da alínea "b" do § 1 o do art. 182 da Lei das S.A. que serão classificadas como
reservas de capital as contas que registrarem: "o produto da alienação de partes beneficiárias
e bônus de subscrição". Sobre esse assunto e a compatibilidade com as normas do IFRS, ver
os comentários ao art. 182 da Lei das S.A.
rência da natureza especial de tais negócios. Na emissão gratuita, as
partes beneficiárias são atribuídas a fundadores, acionistas ou tercei-
ros como remuneração de serviços prestados.
Resgate e conversão
"Art. 4 8 . 0 estatutofixaráo prazo de duração das partes beneficiá-
rias e, sempre que estipular resgate, deverá criar reserva especial
para esse fim.
771 Sobre a extinção das partes beneficiárias, ver LUIZ G A S T Ã O PAES DE BARROS LEÃES,
"Extinção Extraordinária de Parles Beneficiárias". In: Pareceres. v. I, São fciulo: Singular,
2004, p. 672-675.
772 Ver os comentários ao art. 46 da Lei das S.A.
773 Sobre o resgate, T R A J A N O DE M I R A N D A VALVERDE. Sociedades por Ações. v. I, 2 a
edição, Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 220, observa que: "com o objetivo de impedir que
as partes beneficiárias pesem, indefinidamente, sobre a sociedade anônima, manda a lei que
os estatutos criem um fundo de resgate delas, fixando as respectivas condições. Os estatutos,
portanto, seja ao se constituir a sociedade, seja em virtude de sua reforma deverão estabele-
cer: a) a percentagem que dos lucros há de ser retirada para a constituição do fundo de
resgate; b) o prazo para o resgate das partes beneficiárias; c) o preço dele, ou mediante que
elementos será o mesmo fixado; d) se o resgate se fará por meio de sorteio ou deverão, em
certa data, ser resgatadas todas as partes beneficiárias'".
774 Ver os comentários ao art. 49 da Lei das S.A.
775 Sobre a reserva para conversão de parles beneficiárias, a CVM, no Parecer CVM/SJU n° 109/
1983, entendeu que "a reserva para conversão não está limitada pelo percentual máximo de
participação nos lucros determinado para a 'reserva de resgate' indicado na Lei n" 6.404/76
em seu artigo 46, § 2", mas está balizada pela disposição da lei societária em seu artigo 194,
inciso III, que disciplina os parâmetros para as reservas estatutárias, e pelas normas dos artigos
198 e 203 dessa lei, os quais impedem a apropriação dos lucros em prejuízo do dividendo
obrigatório e do dividendo da ação preferencial".
dimento do preço de emissão das ações776-777. Com a capitalização da
reserva haverá aumento do capital social com a conseqüente emissão
de novas ações; os antigos acionistas terão direito de preferência para
a subscrição das partes beneficiárias conversíveis em ações emitidas
para alienação onerosa; no entanto, não haverá direito de preferência
na conversão desses títulos em ações (artigo 171, § 3o)778.
0 § 3 o , por sua vez, determina que, no caso de liquidação da com-
panhia, solvido o passivo exigível, os titulares das partes beneficiárias
terão direito de preferência sobre o que restar do ativo até a importância
da reserva para resgate ou conversão. Portanto, se a companhia entra
em liquidação e existe reserva de resgate constituída para esse fim, os
titulares das partes beneficiárias possuirão direito de preferência sobre a
sobra do ativo até a importância dessa reserva.
Certificados
7/6 Sobre esse assunto, ver P H I L O M E N O J. DA COSTA. As Partes Beneficiárias. São Paulo:
Saraiva, 1965, p. 94.
777 Consta da Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, que "a conversão em capital
pressupõe a constituição de reserva com esse fim e será procedida mediante capitalização
dessa reserva".
778 Sobre a conversão de partes beneficiárias, JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA. Das Debên-
tures. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 228, conclui que: "(...) a conversão não depende
da vontade do titular da parte beneficiária; ademais, somente poderá ocorrer se a reserva para
tanto destinada acumular recursos bastantes; o custo das ações será o que corresponder ao
efetivo preço de emissão na data da conversão, pelo que o montante destinado ao resgate
será dividido pelo preço de emissão, de modo a determinar o número de ações por parte
beneficiária. A parte beneficiária conversível não ê, pois, um título de subscrição de ações (...).
A subscrição envolve um ato de vontade do subscritor, o que, nesta hipótese, inocorre. As
ações destinadas à conversão das partes beneficiárias serão distribuídas pela sociedade,
independentemente de subscrição, mediante a capitalização da reserva destinada ao resgate".
IV - o número de partes beneficiárias criadas pela companhia e o
respectivo número de ordem;
781 A Lei n° 10.303/2001, ao dar nova redação ao art. 2 o da Lei n° 6.383/1976, eliminou do
inciso l as partes beneficiárias, excluindo-as, assim, do rol de valores mobiliários sujeitos
ao regime dessa lei.
732 Ver os comentários ao art. 31 da Lei das S.A.
783 Ver os comentários ao art. 35 da Lei das S.A.
desses títulos opera-se por termo lavrado no "Livro de Transferência
de Partes Beneficiárias Nominativas", datado e assinado pelo cedente
e pelo cessionário, ou seus legítimos representantes (artigo 31, § I o );
pelo lançamento efetuado pela instituição depositária em seus livros,
a débito da conta de partes beneficiárias do alienante e a crédito da
conta do adquirente, à vista de ordem escrita do alienante, ou de
autorização ou ordem judicial (artigo 35, § I o ); ou, ainda, na hipótese
de transferência em virtude de transmissão por sucessão universal ou
legado, de arrematação, adjudicação ou outro ato judicial, ou por
qualquer outro título, mediante averbação no "Livro de Registro de
Partes Beneficiárias Nominativas" (artigo 31, § 2 o ).
As dúvidas suscitadas a respeito das averbações ordenadas pela
Lei das S.A., ou sobre anotações, lançamentos ou transferências de
partes beneficiárias nos "Livros de Registro e Transferência de Partes
Beneficiárias", serão dirimidas pelo juiz competente para solucionar as
dúvidas levantadas pelos oficiais dos registros públicos, excetuadas as
questões atinentes à substância do direito (artigo 103, parágrafo único).
As partes beneficiárias podem ser objeto de depósito com emis-
são de certificados, nos termos do artigo 43.
Por disposição expressa do caput deste artigo, aplicam-se às par-
tes beneficiárias as normas da Lei das S.A. objeto dos artigos 39 e 40
sobre a constituição de direitos reais e outros ônus sobre as ações
nominativas.
DEBÊNTURES
Características
"Art. 52. A companhia poderá emitir debêntures que conferirão
aos seus titulares direito de crédito contra ela, nas condições cons-
tantes da escritura de emissão e, se houver, do certificado." (Re-
dação dada pela Lei n° 10.303/2001)
736 Art 2o, inciso I, da Lei n° 6.385/1976, com a redação dada pela Lei n° 10.303/2001.
787 Sobre a debênture como valor mobiliário, ver o Parecer CVM/PJU n° 019/2002.
783 Em 27.06.2011, entrou em vigor a Lei n° 12.431/2011 que, dentre outras providências,
alterou a redação dos seguintes dispositivos que tratam das debêntures: art 55, §§ 1° a 4o;
art. 59, §§ I o a 4o; e art. 66, § 3o, alfnea "a". De acordo com o edital de audiência pública
SDM n° 01/2011 da CVM, a Medida Provisória n° 517/2010, que deu origem à Lei n°
12.431/2011, teve por fim adequar o regime legal ao qual as debêntures estão sujeitas a
processos mais flexíveis de emissão e viabilizar a formação de um mercado secundário mais
dinâmico para esses título. Assim esclareceu que: "As alterações têm o intuito, principalmen-
te, de simplificar o processo de emissão de debêntures pelas companhias, oferecendo mais
flexibilidade na utilização de tais instrumentos, tornando possível a administração de riscos de
mercado e melhorando as condições para a sua negociação em mercados secundários. Os
principais objetivos da MP, no que diz respeito à Lei das S/A, são: i. flexibilizar a recompra de
A palavra "debênture", ainda que decorrente da prática financeira
inglesa, é de procedência latina, designando o devere, a dívida pecuniá-
ria; trata-se a debênture de documento comprobatório de uma dívida da
companhia789. Assim, designa o direito de crédito de seutitularcontra a
companhia emissora, em razão de um empréstimo por ela contraído790.
As debêntures, embora constituindo títulos há muito regulados
entre nós (desde 1893, mediante o Decreto n° 177-A) passaram a ser,
a partir da promulgação da Lei das S.A., utilizadas cada vez mais
intensamente pelas companhias no processo de financiamento de
suas atividades791.
A Lei n° 10.303/2001 alterou a redação do artigo 52 apenas para
deixar expresso que a emissão do certificado de debêntures é faculta-
tiva. Com a extinção, pela Lei n° 8.021/1990, dos títulos ao portador
e endossáveis, só se admite na Lei das S.A. debêntures nominativas
ou escriturais792. Assim, os certificados perderam a sua função, que
era a de materializar a titularidade das debêntures e os direitos de
crédito por elas conferidos793.
debêntures pelo emissor, permitindo uma melhor administração da exposição deste ao mer-
cado e de seu padrão de endividamento; ii. estabelecer a competência do conselho de
administração para a deliberação sobre emissão de debêntures de qualquer espécie, aí
incluídas as debêntures conversíveis, às quais se aplicarão as regras de capital autorizado
iii. permitir a realização de emissões concomitantemente, facultando um aproveitamen-
to mais eficiente, pelo emissor, de janelas de oportunidade para papéis com diferentes
características; (...) v. permitir a contratação de um mesmo agente fiduciário para diferentes
emissões de uma mesma companhia, nos termos da regulamentação a ser expedida pela
Comissão de Valores Mobiliários. Hoje, a demanda do mercado é maior do que a real oferta
de tais serviços, já havendo a CVM se deparado, por mais de uma vez, com pleitos de
flexibilização do regime."
789 Sobre a origem da expressão "debênture" e a sua história, ver WALDEMAR FERREIRA.
Tratado das Debêntures. v. I, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1944, p. 23 e seguintes.
790 NELSON EIZIRIK. Aspectos Modernos do Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar,
1992, p. 86.
791 De acordo com a Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, o Projeto reformulou
inteiramente o instituto da debênture regulado pelo Decreto n° 177-A/1893, "expedido em
reação ao encilhamento de 1891, e cuja rigidez contribuiu para a pouca utilização, entre
nós, dessa modalidade de valor mobiliário como instrumento de financiamento da compa-
nhia mediante empréstimos distribuídos no mercado de capitais".
792 Ver os comentários ao art. 63 da Lei das S.A.
793 Sobre esse assunto, ver os comentários aos arts. 64 e 65 da Lei das S.A.
A propriedade da debênture nominativa presume-se pela inscri-
ção do nome do debenturista no "Livro de Registro de Debêntures
Nominativas" - embora este não esteja expressamente regulado pelo
artigo 100 - e a sua transferência ocorre por meio de termo assinado
no "Livro de Transferência de Debêntures Nominativas"; por essa
razão, o certificado não tem utilidade. As debêntures escriturais são
registradas nos livros da instituição financeira contratada para prestar
esse serviço e não comportam a emissão de certificados.
Atualmente, as debêntures constituem valores mobiliários de larga
utilização por parte das companhias abertas no processo de captação
de recursos do público investidor. Tal se deve ao adequado tratamento
que foi conferido à sua regulação, contido na Lei das S.A. e em al-
guns dispositivos da Lei n° 6.385/1976, assim como às vantagens
econômicas que usualmente apresentam para a companhia emissora:
taxas de juros inferiores às cobradas pelos bancos e maior prazo para
pagamento do mútuo794.
A debênture resulta de uma declaração unilateral de vontade da
companhia, manifestada por meio da escritura de emissão de debên-
tures'95-796 e, enquanto esses títulos não forem colocados em circula-
ção, têm eficácia restrita.
No momento em que são adquiridas por terceiros, a companhia
passa a ter uma dívida para com os tomadores das debêntures e estes
794 No que se refere à contabilização das debêntures, as companhias abertas devem observar
os seguintes Pronunciamentos Contábeis: (i) CPC 08 (RI) - "Custos de Transação e Prêmios
na Emissão de Títulos e Valores Mobiliários", aprovado pela Deliberação C V M n° 649/
2010; (ii) CPC 38 - "Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração", aprovado
pela Deliberação CVM n° 604/2009; (iii) CPC 39 - "Instrumentos Financeiros: Apresenta-
ção", aprovado pela Deliberação C V M n° 604/2009; e (iv) CPC 40 - "Instrumentos Finan-
ceiros: Evidenciação", aprovado pela Deliberação C V M n° 604/2009.
795 Ver os comentários ao art. 61 da Lei das S.A.
796 Sobre esse assunto, a CVM, no Parecer CVM/SJU n° 037/1982, observou que: "(...) a
debênture, na sua criação, não nasce de um acordo bilateral em que as partes pudessem
convencionar garantias ou quaisquer cláusulas. Mas, configurando uma declaração unilate-
ral de vontade, a do emissor, o qual deve, na escritura de emissão, estabelecer as caracterís-
ticas, condições, garantias do papel, faculta a este determinar as cláusulas que melhor lhe
convenham. Cabe, ao tomador, avaliar o risco do papel, em face da capacidade da empresa
emissora e das garantias oferecidas".
um crédito contra a companhia, de acordo com as condições cons-
tantes da escritura de emissão.
A finalidade econômica da debênture consiste em possibilitar o
financiamento da companhia emissora, mediante empréstimo con-
traído junto a restrito círculo de pessoas (quando se trata de uma
emissão privada) ou mediante apelo à poupança popular (no caso de
emissão pública colocada no mercado de capitais). E uma forma de a
companhia contrair um empréstimo junto ao público, quando neces-
sita de recursos e não deseja recorrer às instituições financeiras nem
aumentar o seu capital social, com a emissão de novas ações, pois
essa alternativa pode não ser do interesse dos acionistas, tanto pelo
fato de não terem a intenção de subscrever ações quanto o de permi-
tir o ingresso de terceiros no capital da companhia79'.
Tendo em vista que as debêntures têm como finalidade econô-
mica proporcionar o financiamento da companhia emissora, a dou-
trina brasileira798 e estrangeira799 são praticamente unânimes em
797 Sobre esse assunto,. FRANCISCO JOSÉ PINHEIRO GUIMARAES, "Debêntures". In: Alfredo
Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito das Companhias, v. I, Rio de
Janeiro: Forense, 2009, p. 582, observa que: "As condições de mercado, o destino a ser dado
aos recursos captados, a expectativa de retorno do investimento ou, ainda, o excesso de capita!
de risco na composição do capital total da companhia são alguns dos fatores que podem
justificar o desinteresse dos acionistas em aportar capital de risco adicional na companhia. Por
outro lado, as características financeiras do empréstimo pretendido pela companhia -geralmen-
te por prazo mais longo e a juros mais baixos do que os empréstimos bancários tradicionais -
podem não ser suficientemente atrativos para as instituições financeiras". De acordo com JOSÉ
EDWALDO TAVARES BORBA. Das Debêntures. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 7-8, a
debênture é uma alternativa à "contratação de um empréstimo bancário. Sendo, ordinariamen-
te, um título de longo prazo, presta-se a debênture a atender às necessidades de investimento
da sociedade, mediante a captação da poupança privada. 7\s taxas de juros das debêntures
flutuam, via de regra, muito abaixo das praticadas pelas instituições financeiras, e as condições
gerais da operação são normalmente mais flexíveis (...), as companhias emitem debêntures com
o objetivo de financiar os seus projetos de expansão e crescimento, ou até mesmo para reciclar
os seus débitos, substituindo dívidas mais onerosas e de curto prazo, por títulos com encargos
menores e prazos mais confortáveis".
798 J.X. CARVALHO DE MENDONÇA. Tratado de Direito Comercial Brasileiro, v. III, t. 3,
atualizado por Ruymar de Lima Nucci. Campinas: Bookseller, 2001, p. 123; WALDEMAR
FERREIRA. Tratado das Debêntures..., v. I, p. 225; FRAN MARTINS. Comentários à Lei das
Sociedades Anônimas, v. I, Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 302; ECBERTO LACERDA
TEIXEIRA e JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREIRO. Das Sociedades Anônimas no Direito
Brasileiro, v. 1, São Raulo: Ed. José Bushatsky, 1979, p. 346.
799 ANTONIO BRUNETTI. Trattado dei Diritto delle Società. v. II, 2" edição, Milão: A. Giuífre,
1948, p. 432; FRANCESCO GALGANO. La Società per Azioni, Lc Altre Società de Capitali,
caracterizá-las como um contrato de mútuo mercantil. Trata-se, na
realidade, de um mútuo de natureza especial, uma vez que a quantia
mutuada é dividida em frações, correspondentes ao número de de-
bêntures subscritas800.
Como a criação da debênture é negócio jurídico unilateral, a sua
emissão pode ser motivada por negócio distinto do mútuo, tal como
os de permuta e dação em pagamento. E possível que uma mesma
série tenha a sua colocação motivada por negócios jurídicos distintos,
como, por exemplo: uma parte da série é destinada a uma efetiva cap-
tação de recursos para a sociedade, outra parte a garantir suas obriga-
ções e, ainda, uma última parte à efetivação de doação a uma fundação
de empregados801. Assim, o mútuo não é a única hipótese a dar causa
a uma emissão de debêntures, que poderá originar-se, também, de ope-
rações de novação, transação, dação em pagamento, tendo por base a
quitação de dívidas anteriormente assumidas pela companhia ou obri-
gações contratuais. Pode, ainda, a emissão ter como causa a liquidação
de debêntures anteriormente emitidas e colocadas em circulação802.
As debêntures encontram-se, assim, vinculadas a um contrato
subjacente, cujos termos constam da escritura de emissão e dos pró-
prios certificados, se existentes. O titular da debênture é credor efeti-
vo e incondicional da companhia emissora, exceto nos casos de
debêntures com participação nos lucros803.
809 Sobre a desmaterialização dos títulos de crédito, ver NELSON EIZIRIK. Temas de Direito
Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 413-419.
810 JOSÉ EDWALDO TAVARES. Das Debêntures..., p. 126.
811 Ver decisão da 3 a Turma do Superior Tribunal de Justiça proferida no julgamento do Agravo
Regimental ao Agravo de Instrumento n° 107.738-SP, Rei. Min. Eduardo Ribeiro, j. em
14.10.1997, publicado no DJU em 09.12.1997.
contra a companhia, o crédito das partes beneficiárias é eventual, tendo
em vista o pagamento depender da existência de lucros; o crédito das
debêntures é certo, pois no seu vencimento deverão ser resgatadas
pela companhia.
A Lei das S.A. distingue 2 (dois) momentos no negócio jurídico da
debênture: a emissão, enquanto manifestação de vontade da companhia
(artigos 53,59 e 60) e a subscrição (artigo 57, § I o ), enquanto manifesta-
ção, por parte dos tomadores, da aceitação da oferta da companhia812.
De todos os tipos de sociedades, civis e comerciais, somente as
sociedades anônimas e comanditas por ações (artigo 280 c/c artigo
283) podem emitir debêntures. E vedado às instituições financeiras a
emissão de debêntures813-814 (p-se&); aquelas que não recebem depósitos
812 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art.-53 da Lei das S.A.
813 Não obstante a vedação da emissão de debêntures por parte das instituições financeiras, foi
promulgada a Lei n° 12.249/2010 decorrente da conversão da Medida Provisória n° 472/2009,
que trata, entre outros assuntos, da letra financeira. Os arts. 37 a 43 dispõem que: "Ari 37. As
instituições financeiras podem emitir Letra Financeira - LF, título de crédito que consiste em
promessa de pagamento em dinheiro, nominativo, transferível e de livre negociação. Art. 38. A
Letra Financeiraserá emitida exclusivamente sob a forma escriturai, mediante registro em sistema de
registro e de liquidação financeira de ativos autorizado pelo Banco Central do Brasil, com as
seguintes características: I - a denominação Letra Financeira; II -o nome da instituição financeira
emitente; III-o número de ordem, o locale a data de emissão; IV-o valor nominal; V- a taxa de
juros, fixa ou flutuante, admitida a capitalização; VI-a cláusula de correção pela variação cambial,
quando houver; VII - outras formas de remuneração, inclusive baseadas em índices ou taxas de
conhecimento público, quando houver; VIII - a cláusula de subordinação, quando houver; IX
-a data de vencimento; X-o local de pagamento; XI-o nome da pessoa a quem se deve pagar;
Xtl - a descrição da garantia real ou fidejussória, quando houver; XIII - a cláusula de pagamento
periódico dos rendimentos, quando houver. § i" A Letra Financeira é título executivo extrajudicial,
que pode ser executado independentemente de protesto, com base em certidão de inteiro teor
dos dados informados no registro, emitida pela entidade administradora do sistema referido no
caput § 2° A Letra Financeira pode, dependendo dos critérios de remuneração, gerar valor de
resgate inferior ao valor de sua emissão. § 3° A transferência de titularidade da Letra Financeira
efetiva-se por meio do sistema referido no caput deste artigo, que manterá registro da seqüência
histórica das negociações. Art. 39. A distribuição pública de Letra Financeira observará o disposto
pela Comissão de Valores Mobiliários. An 40. A Letra Financeira pode ser emitida com cláusula de
subordinação aos credores quirografários, preferindo apenas aos acionistas no ativo remanescen-
te, se houver, na hipótese de liquidação ou falência da instituição emissora. Parágrafo único. A
Letra Financeira de que trata o caput pode ser utilizada como instrumento de dívida, para fins de
composição do capital da instituição emissora, nas condições especificadas em regulamento do
CMN. Art. 41. Incumbe ao CMN a disciplina das condições de emissão da Letra Financeira, em
espec/a / os seguintes aspectos: I -o tipo de instituição financeira autorizada à sua emissão; II-a
utilização de índices, taxas ou metodologias de remuneração; III - o prazo de vencimento, não
inferior a 1 (um) ano; IV - as condições de resgate antecipado do título, que somente poderá
ocorrerem ambiente de negociação competitivo, observado o prazo mínimo de vencimento; e V
- os limites de emissão, considerados em função do tipo de instituição financeira. Art. 42.
do público podem emitir debêntures, desde que previamente autori-
zadas pelo Banco Central do Brasil, em cada caso815. As companhias
securitizadoras de créditos financeiros podem emitir, para distribui-
ção pública, debêntures simples, de acordo com as normas da Comis-
são de Valores Mobiliários816.
Enquanto a companhia visa, por meio da emissão de debêntu-
res, a captar recursos para financiar suas atividades, o debenturista, ao
subscrever as debêntures e pagar à companhia o preço de emissão,
Aplica-se à Letra Financeira, no que não contrariar o disposto nesta Lei, a legislação cambial.
Parágrafo único. O Banco Central do Brasil produzirá e divulgará, para acesso público por
meio da internet, relatório anual sobre a negociação de Letras Financeiras, com informações
sobre os mercados primário e secundário do título, condições financeiras de negociação,
prazos, perfil dos investidores e indicadores de risco, quando houver. Ari 43. As instituições
financeiras podem emitir Certificado de Operações Estruturadas, representativo de operações
realizadas com base em instrumentos financeiros derivativos, nas condições especificadas em
regulamento do CMN." Sobre a Letra Financeira, ver, também, as Instruções C V M n™ (i) 400/
2003, art. 13-A; (ii) 476/2009; e (iii) 480/2009, art. 7°. A CVM, em 16.12.2010, editou a
Instrução C V M n° 488/2010, que alterou e acrescentou artigos às Instruções CVM n™ 400/
2003, 476/2009 e 480/2009, com o objetivo de regulamentar as ofertas públicas de
distribuição de Letras Financeiras.
81 4 A Resolução CMN n° 3.836/2010 dispõe sobre a emissão de Letra Financeira por parte das
instituições financeiras que especifica, informando que se trata de uma espécie de debên-
ture das instituições financeiras, pois constitui instrumento de captação de recursos de
longo prazo. É um título de crédito que consiste em promessa de pagamento em dinheiro,
nominativo, transferível e de livre negociação e pode ser emitida com cláusula de subordi-
nação aos credores quirografários, preferindo apenas aos acionistas no ativo remanescente,
se houver, na hipótese de liquidação ou falência da instituição emissora. Estão autorizados
a emitir Letras Financeiras: (i) os bancos múltiplos, (ii) os bancos comerciais, (iii) os bancos
de investimento, (iv) as sociedades de crédito, financiamento e investimento, (v) as caixas
econômicas, (vi) as companhias hipotecárias e (vii) as sociedades de crédito imobiliário. A
Letra Financeira tem prazo mínimo de 2 (dois) anos, vedado o resgate, total ou parcial,
antes do vencimento pactuado, e com valor nominal unitário mínimo de R$ 300.000,00
(trezentos mil reais). A Letra Financeira pode ter como remuneração taxa de juros prefixada,
combinada ou não com taxas flutuantes, sendo vedada a emissão com cláusula de variação
cambial. É admitido o pagamento periódico de rendimentos em intervalos de, no mínimo,
180 (cento e oitenta) dias. A Resolução CMN n° 3.933/2010, regulou a emissão de Letra
Financeira pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
815 Art. 35, parágrafo único, da Lei n° 4.595/1964, com a redação dada pelo Decreto-Lei n°
2.290/1986.
81 6 Instrução CVM n° 281/1998, com as alterações introduzidas pelas Instruções CVM n05 307/
1999 e 480/2009. Constam do Anexo 32 - II da Instrução C V M n° 480/2009 regras
específicas para securitizadoras, determinando que os emissores que tenham como objeto
a securitização de créditos devem acrescentar ao formulário de informações trimestrais -
1TR e ao formulário de demonstrações financeiras padronizadas - DFP, "as informações
financeiras independentes relativas a cada um dos patrimônios separados por emissão de
certificados de recebiveis ou debêntures em regime fiduciário." (art. I o , inciso II).
tem a expectativa de receber determinada remuneração. Na data de
vencimento das debêntures, a companhia deverá resgatá-las, pagan-
do o valor devido aos debenturistas, com o objetivo de devolver o
dinheiro que lhe foi emprestado.
Normalmente a debênture atribui uma remuneração ao seu titular,
que. consiste no pagamento de correção monetária (artigo 54, § I o ) 817 e
determinada taxa de juros, fixa ou variável, especificada na escritura de
emissão818; no entanto, é possível a emissão de debêntures que assegu-
rem apenas participação nos lucros e prêmio de reembolso819. As com-
panhias podem emitir debêntures com a finalidade de mantê-las em
tesouraria e, posteriormente, definir o momento mais adequado para
colocá-las em circulação; enquanto permanecerem em tesouraria, não
terão os direitos das debêntures já lançadas, tais como: amortização, o
de votar em assembleia de debenturistas e o de receber remuneração.
Todas as debêntures têm valor nominal expresso em moeda
nacional, salvo o caso de obrigação que tenha o pagamento estipulado
em moeda estrangeira820, e podem ser emitidas por companhias abertas
ou fechadas. As companhias fechadas podem emitir debêntures, desde
que não sejam conversíveis ou permutáveis por ações, destinadas a
agentes financeiros específicos ou por meio de subscrição pública.
A Comissão de Valores Mobiliários, ao regular as ofertas públi-
cas de valores mobiliários distribuídas com esforços restritos, deter-
minou que (i) estão dispensadas do registro de distribuição de que
trata o artigo 19 da Lei n° 6.385/1976 e a elas não se aplicam as
normas da Autarquia relativas ao procedimento de distribuição de
817 A Lei n° 12.431/2011, com o fim de solucionar uma distorção que já havia sido identificada
pelo mercado, tratou da correção monetária das debêntures nos seguintes termos: "Art. 8o
As debêntures e as letras financeiras podem sofrer correção monetária em periodicidade igual
àquela estipulada para o pagamento periódico de juros, ainda que em periodicidade inferior
a um ano".
818 Ver os comentários aos arts. 54 e 61 da Lei das S.A.
819 Ver os comentários ao art. 56 da Lei das S.A.
820 Ver os comentários ao art. 54 da Lei das S.A.
valores mobiliários821; (ii) deverão ser destinadas exclusivamente a in-
vestidores qualificados e intermediadas por integrantes do sistema de
distribuição de valores mobiliários822; (iii) será admitida a procura de,
no máximo, 50 (cinqüenta) investidores qualificados e as debêntures
ofertadas deverão ser subscritas por, no máximo, 20 (vinte)823. Ade-
mais, tais companhias fechadas ficam sujeitas a: (i) submeter suas
demonstrações financeiras a auditoria, por auditor registrado na Co-
missão de Valores Mobiliários; (ii) divulgar suas demonstrações fi-
nanceiras, acompanhadas de notas explicativas e parecer dos auditores
independentes; (iii) observar as regras sobre dever de sigilo e vedação
às negociações824; e (iv) divulgar por meio da rede mundial de com-
putadores a ocorrência de fato relevante, comunicando imediatamente
ao intermediário líder da oferta825.
A emissão de debêntures pode ser pública ou particular. Na hi-
pótese de emissão pública, a companhia deve observar as disposições
legais e regulamentares sobre o seu registro na Comissão de Valores
Mobiliários826-827 e fica submetida às normas que regulam as ofertas
SEÇÃO B
Emissões e séries
"Art. 53. A companhia poderá efetuar mais de uma emissão de
debêntures, e cada emissão pode ser dividida em séries.
843 A Lei n° 12.431/2011 tratou da correção monetária das debêntures nos seguintes termos:
"Art. 8° As debêntures e as letras financeiras podem sofrer correção monetária em periodici-
dade igual àquela estipulada para o pagamento periódico de juros, ainda que em periodici-
dade inferior a um ano".
844 Sobre o prêmio de reembolso das debêntures, ver os comentários ao art. 56 da Lei das S.A.
845 Quando o valor nominal é idêntico ao valor de emissão das debêntures, diz-se que as
debêntures foram emitidas "ao par" e quando o valor de emissão é inferior ao valor
nominal, diz-se que foram emitidas "abaixo do par".
Nesse sentido, LUIZ C A S T Ã O PAES DE BARROS LEÃES. Comentários à Lei das Sociedades
Anônimas, v. 2, São Paulo: Saraiva, 1978, p. 19; ERANCISCO JOSÉ PINHEIRO GUIMA-
RÃES, "Debêntures". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito
das Companhias, v. 1, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 588; JOSÉ WALDECY LUCENA.
Das Sociedades Anônimas - Comentários à Lei (arts. 1° a 120). v. í, Rio de Janeiro: Renovar,
2009, p. 551. Em sentido contrário, FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades
Anônimas, v. |, Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 322-323.
dentro dos limites por ela fixados (artigo 59, § 3o)847. A Lei das S . A
não fixou um valor mínimo para as debêntures, cabendo à assembleia
geral ou ao conselho de administração, quando for o caso, estabelecer o
valor que julgar conveniente.
O valor nominal deverá ser expresso em moeda nacional, salvo
nos casos de obrigação que, nos termos da legislação em vigor, possa
ter o pagamento estipulado em moeda estrangeira. São nulos de pleno
direito os contratos, títulos, obrigações e quaisquer documentos que,
exeqüíveis no Brasil, estipulem pagamento em moeda estrangeira848.
Essa vedação não se aplica, por expressa disposição legal, aos
empréstimos e quaisquer outras obrigações cujo credor ou devedor
seja pessoa residente e domiciliada no exterior849-850. Dessa forma,
uma emissão de debêntures que seja destinada à colocação no exterior
poderá ter seu valor nominal expresso em moeda estrangeira851. A
847 A CVM, por meio da Instrução C V M n° 194/1992, alterou o valor nominal unitário mínimo
para emissão de debêntures com cláusula de variação cambial previsto na Resolução C M N
n° 1.833/1991.
848 Art. I o do Decreto-Lei 857/1969, que consolidou a legislação sobre moeda de pagamen-
to de obrigações exeqüíveis no Brasil. Também tratam desse assunto as Leis n°s: (i) 7.801/
1989 (expediu normas de ajustamento do Programa de Estabilização Econômica, de que
trata a Lei n° 7.730/1989), art. 4 o , § 2 o ; (ii) 8.880/1994 (dispõe sobre o Programa de
Estabilização Econômica e o Sistema Monetário Nacional e instituiu a Unidade Real de
Valor), art. 6 o ; (iii) 9.069/1995 (que dispõe sobre o Plano Real, o Sistema Monetário
Nacional e estabelece regras e condições de emissão do Real e os critérios para conversão
das obrigações para o Real), art. 27; e (iv) 10.192/2001 (dispõe sobre medidas complemen-
tares ao Plano Real), art. 1 o , parágrafo único.
849 Consta do art. 2 o do Decreto-Lei n° 857/1969 que a vedação constante do art 1 o não se aplica
"I - aos contratos e títulos referentes a importação ou exportação de mercadorias; II - aos
contratos de financiamento ou de prestação de garantias relativos às operações de exportação de
bens de produção nacional, vendidos a crédito para o exterior; III - aos contratos de compra e
venda de câmbio em geral; IV — aos empréstimos e quaisquer outras obrigaçoes cujo credor ou
devedor seja pessoa residente e domiciliada no exterior, excetuados os contratos de locação de
imóveis situados no território nacional; V - aos contratos que tenham por objeto a cessão,
transferência, delegação, assunção ou modificação das obrigações referidas no item anterior,
ainda que ambas as partes contratantes sejam pessoas residentes ou domiciliadas no país.
Parágrafo único. Os contratos de locação de bens móveis que estipulem pagamento em moeda
estrangeira ficam sujeitos, para sua validade a registro prévio no Banco Central do Brasil".
850 O Código Civil dispõe no art. 318 que "são nulas as convenções de pagamento em ouro ou
em moeda estrangeira, bem como para compensar a diferença entre o valor desta e o da
moeda nacional, excetuados os casos previstos na legislação especial".
851 No mesmo sentido, EGBERTO LACERDA TEIXEIRA e JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREI-
RO. Das Sociedades Anônimas no Direito Brasileiro, v. 1, São Raulo: Ed. José Bushatsky,
1979, p. 349-350; JOSÉ E D W A L D O TAVARES BORBA. Das Debêntures. Rio de Janeiro:
Lei das S.A. determina que as companhias brasileiras dependem de
prévia aprovação do Banco Central do Brasil para emitir debêntures
no exterior com garantia real ou flutuante de bens situados no País e
que, em qualquer caso, somente poderão ser remetidos para o exterior
o principal e os encargos de debêntures registradas nessa Autarquia
(artigo 73, uijnit e § 2 o ).
A Lei das S.A. permite, no § I o , a correção monetária do valor
nominal, desde que essa disposição conste da escritura de emissão
(artigo 59, inciso IV). O fundamento da correção monetária é o de
evitar prejuízo ao debenturista em função da desvalorização da moe-
da852-853. A Lei n° 10.303/2001 renumerou o parágrafo único desse
artigo para o atual § I o e deu ao mesmo nova redação, passando a
permitir a correção monetária do valor nominal das debêntures com
base em índices não expressamente vedados em lei854. Dessa forma, a
Renovar, 2005, p. 34. Este autor observa que a hipótese da debênture emitida em moeda
estrangeira não se confunde com a correção cambial do título: " O título emitido em moeda
estrangeira será resgatado na própria moeda de emissão, mediante o competente fechamen-
to do câmbio. Convém lembrar que a colocação desses títulos, tendo sido efetuada no
exterior, gerara, na oportunidade da colocação, um ingresso de divisas no país, com o
competente registro desse investimento no Banco Central do Brasil. Essa colocação de
debêntures no exterior poderá se fazer inclusive através do sistema de ADR's".
A correção monetária das debêntures foi inserida em nosso ordenamento jurídico por meio
da Lei n° 4.728/1965, cujo art. 26 determinava que: "As sociedades por ações poderão
emitir debêntures, ou obrigações ao portador ou nominativas endossáveis, com cláusula de
correção monetária, desde que observadas as seguintes condições: I - prazo de vencimento
igual ou superior a um ano; li - correção efetuada em períodos não inferiores a três meses,
segundo os coeficientes aprovados pelo Conselho Nacional de Economia para a correção
dos créditos fiscais; III - subscrição por instituições financeiras especialmente autorizadas
pelo Banco Central, ou colocação no mercado de capitais com a intermediação dessas
instituições." A Lei n° 12.431/2011, no art. 8o, tratou da correção monetária das debêntures
determinando que podem ser corrigidas monetariamente em periodicidade igual àquela
estipulada para o pagamento de juros, ainda que inferior a um ano.
853 A CVM, no ftirecer CVM/SJU n° 42/1982, se manifestou no sentido de que: "Ainda que não
estipulado o pagamento de juros, a debênture não pode deixar de oferecer uma vantagem
pecuniária ao debenturista, tendo em vista que a remuneração do capital é da própria
essência do empréstimo comercial. A debênture poderá deixar de prever a correção monetá-
ria do valor nominal das debêntures. Ê vedada a prefixação da correção monetária do valor
nominal das debêntures." No mesmo sentido é o Rarecer CVM/SJU n° 057/1982: "Constitu-
indo-se em faculdade, pode a debênture deixar de assegurar ao debenturista a sua liquidação
pelo valor nominal corrigido monetariamente."
Anteriormente à Lei n° 10.303/2001, várias discussões ocorreram sobre a permissão da corre-
ção monetária das debêntures com base na variação cambial e a periodicidade do .reajuste.
debênture poderá conter cláusula de correção monetária, com base
nos coeficientes fixados para correção de títulos da dívida pública, na
variação da taxa cambial ou em outros referenciais não expressamen-
te vedados em lei, tendo a companhia ampla liberdade na fixação
desses índices855; a periodicidade poderá ser igual à estipulada para
pagamento de juros, ainda que com freqüência inferior a um ano856.
A Lei n° 10.303/2001 também acrescentou o § 2 o a este artigo,
criando a opção em favor dos debenturistas, a ser estabelecida na
escritura de emissão, quando do vencimento, amortização ou resgate,
de receber o pagamento da obrigação representada pelas debêntures
em dinheiro ou bens avaliados por 3 (três) peritos ou empresa
especializada, nos termos do artigo 8 o da Lei das S.A. 857 . A razão da
avaliação é a necessidade de verificar a correspondência entre o valor
dos bens e o da dívida assumida pela companhia, a fim de que os
debenturistas possam exercer a opção quanto à moeda de pagamento.
A Lei das S.A. não determinou o momento da avaliação dos bens.
Cabe à assembleia geral ou ao conselho de administração, conforme o
caso, ao deliberar sobre a emissão de debêntures, definir, por exemplo,
os peritos ou a empresa especializada que procederá à avaliação dos
Sobre esses assuntos, ver M O D E S T O CARVALHOSA e NELSON EIZIRIK. A Nova Lei das S/A.
São Paulo: Saraiva, 2002, p. 159-164.
855 A C V M e o BACEN, ao tratarem da remuneração das debêntures de distribuição pública,
determinaram na Decisão-Conjunta Bacen/CVM n° 013/2003 que alternativamente a uma
taxa de juros prefixada, taxa referencial - TR, taxa de juros de longo prazo - TJLP, taxa
básica financeira - T B F ou taxa flutuante, "é admitida a emissão de debêntures com cláusula
de correção, com base nos coeficientes fixados para correção de títulos da dívida pública
federal, na variação da taxa cambial ou em índices de preços, ajustada, para mais ou para
menos, por taxa fixa." (art. 2o). Determinou, ainda, no parágrafo único do mesmo artigo que
"na emissão de debêntures com cláusula de correção monetária com base em índice de
preços, deve ser atendido o prazo mínimo de um ano para vencimento ou repactuação e
observado que: I - o índice de preços deve ter série regularmente calculada e ser de
conhecimento público; II - a periodicidade de aplicação da cláusula de correção monetária
não pode ser inferior a um ano; III - o pagamento do valor correspondente à correção
monetária somente pode ocorrer por ocasião do vencimento ou da repactuação das debên-
tures; e IV -o pagamen to de juros e a amortização realizados em períodos inferiores a um ano
devem ter como base de cálculo o valor nominal das debêntures, sem considerar a correção
monetária de período inferior a um ano."
856 Art. 8o da Lei n° 12.431/2011.
857 Sobre a avaliação de bens, ver os comentários ao art. 8 o da Lei das S.A.
bens, ou determinar que os avaliadores serão indicados pelo agente
fiduciário, ou escolhidos pelos próprios debenturistas reunidos em
assembleia especial. A regra sobre a nomeação dos peritos, bem como
o momento em que a avaliação será realizada, deverá constar da escritura
de emissão, assim como a especificação dos bens que serão objeto do
pagamento das debêntures, à opção do debenturista. A avaliação pode
ser efetuada em momento imediatamente antecedente ao vencimento,
amortização ou resgate das debêntures858.
O laudo de avaliação dos bens objeto do pagamento das debên-
tures deverá ser aprovado em assembleia geral de acionistas, nos ter-
mos do/artigo 8o. Após a aprovação do laudo, cada debenturista terá a
opção entre receber o valor do seu crédito em moeda ou em bens e
direitos.
O § 2 o , acrescentado à Lei das S.A. pela Lei n° 10.303/2001,
apenas tornou expressa uma prática já difundida no mercado por meio
das chamadas "debêntures imobiliárias". Esses títulos já eram emitidos
no financiamento de grandes empreendimentos imobiliários, como
shopping centers que contam com investimentos de fundos de pensão.
Esses fundos, estando obrigados a observar certas limitações quanto
a tipos de ativos e montantes a serem investidos, adquirem essas
debêntures com a faculdade de, na data do vencimento, optar pelo
recebimento em dinheiro ou em unidades imobiliárias decorrentes
do empreendimento. Essa prática também era adotada pelo BNDES
Participações S.A. - BNDESPar, com a emissão das chamadas
"debêntures transformáveis". Os titulares dessas debêntures, na data
do vencimento, podem optar por receber seu pagamento em dinheiro
ou em ações de outra companhia, conforme estipulado na escritura
de emissão859.
858 No mesmo senlido, LUIZ L E O N A R D O CANTID1ANO. Reforma da Lei das S.A. Comentada.
Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 111-112; JOSÉ WALDECY LUCENA. Das Sociedades
Anônimas - Comentários à Lei (arts. I o a 120)..., v. I, p. 549.
859 MODESTO CARVALHOSA e NELSON EIZIRIK. A Nova Lei das S/A..., p. 165.
A opção quanto ao objeto do pagamento constitui obrigação al-
ternativa da companhia860. Constando a opção da moeda de paga-
mento da escritura de emissão, o debenturista terá o direito potestativo
de escolher, quando do vencimento, amortização ou resgate das de-
bêntures, como receberá o seu crédito: em dinheiro ou em bens, indi-
cados na escritura e avaliados pelos peritos861.
Vencimento, amortização e resgate
"Art. 55. A época de vencimento da debênture deverá constar da
escritura de emissão e do certificado, podendo a companhia esti-
pular amortizações parciais de cada série, criar fundo de amorti-
zação e reservar-se o direito de resgate antecipado, parcial ou total,
dos títulos da mesma série.
860 O art. 252 do Código Civil, ao tratar de obrigações alternativas, dispõe que a escolha do
objeto do pagamento caberá ao devedor, salvo estipulação em contrário. Por sua vez, o §
2 o do art. 54 da Lei das S.A., incluído pela Lei n° 10.303/2001, determina que cabe ao
credor debenturista a escolha.
Consta do caput do art. 61 da Lei das S.A. que "a companhia fará constar da escritura de emissão
os direitos conferidos pelas debêntures, suas garantias e demais cláusulas ou condições".
I - por valor igual ou inferior ao nominal, devendo o fato constar
do relatório da administração e das demonstrações financeiras;
ou (Incluído pela Lei n° 12.431/2011).
862 Consta do art. 59, inciso VI, da Lei das S.A. que, na deliberação sobre emissão de debên-
tures deverá ser determinado, observado o que a respeito dispuser o estatuto, "a época e as
condições de vencimento, amortização ou resgate".
863 Sobre o prazo de prescrição para cobrança da dívida debenturística, ver os comentários ao
art. 287 da Lei das S.A.
sas operações, em geral, constam das escrituras de emissão, pois evitam o
desembolso pela companhia de quantias vultosas no momento do ven-
cimento das debêntures. Por meio da amortização e do resgate a compa-
nhia pode liberar-se antecipadamente das obrigações representadas pelas
debêntures, em épocas e nas condições fixadas na escritura de emissão.
A amortização é a operação mediante a qual a companhia efetua
pagamentos parcelados das debêntures antes do seu vencimento. A amor-
tização é parcial em relação ao valor da debênture e integral em relação
à série, pois se fosse relativamente ao valor do título, eqüivaleria ao res-
gate864. As debêntures amortizadas devem ser canceladas. A compa-
nhia pode, a seu critério, constituir um fundo de amortização para as
debêntures, que deverá constar da escritura de emissão, o qual é destina-
do a cobrir as despesas com o seu pagamento, de acordo com o crono-
grama de amortização865.
O resgate antecipado é o negócio jurídico por meio do qual a com-
panhia retira as debêntures de circulação antes do seu vencimento,
mediante o pagamento do seu valor. O resgate pode ser total ou parcial
das debêntures de uma série. O resgate é em relação ao valor integral da
debênture e pode alcançar somente uma parte da série, quando for par-
cial, ou toda a série, quando total. Ao contrário da amortização, o resga-
te é integral em relação à debênture e parcial em relação à série866.
e integral (ou parcial) em relação à série; enquanto o resgate refere-se ao valor integral do
título, mas alcançando somente uma parte da série (resgate parcial), embora possa também
alcançar toda a série (resgate total). Daí que a amortização não pode ser do valor integral da
debênture, porquanto isso seria resgate; nem pode o resgate ser do valor parcial da debên-
ture, já que isso seria amortização. Ou seja, amortização - valor parcial da debênture e série
integral ou parcial; resgate = valor integral do título e série parcial ou integral."
367 Até setembro de 2011 a C V M não havia emitido ato normativo regulando o disposto no
inciso II, § 2o, do art. 55 da Lei das S.A.
868 Sobre esse assunto, JOSÉ E D W A L D O TAVARES BORBA. Das Debêntures. Rio de janeiro:
Renovar, 2005, p. 64, entende que o legislador no § 1° do art. 55 da Lei das S.A. "utilizou
hipótese de constar da escritura a amortização parcial de uma série
mediante o pagamento de um percentual de parte das debêntures em
circulação, o pagamento de cada parcela da amortização seria deter-
minado mediante sorteio869. Quando ocorresse a amortização de to-
das as debêntures de uma série, não haveria necessidade de sorteio,
pois a companhia pagaria igual valor a cada uma.
Ocorre que, em 27.06.2011, entrou em vigor a Lei n° 12.431/2011,
que alterou o disposto no § I o deste artigo, determinando que a amorti-
zação de debêntures da mesma série deve ser feita mediante rateio.
Ainda conforme a redação original do § I o , a mesma regra da
amortização aplicava-se ao resgate parcial de uma série: as debêntures
a serem resgatadas eram determinadas mediante sorteio, salvo se esti-
vessem cotadas por preço inferior ao valor nominal, hipótese em que a
companhia poderia efetuar o resgate antecipado por compra em Bolsa.
O sorteio tem por fim assegurar o tratamento igualitário aos debentu-
ristas; como será resgatada parte das debêntures de uma mesma série,
realiza-se o sorteio para definir quais os títulos serão objeto de resgate.
Com a promulgação da Lei n° 12.431/2011, parte da regra que
constava do § I o foi transferida para o novo § 2 o . Com efeito, a única
modificação introduzida no § 2 o foi a de que devem ser observadas as
regras expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários na hipótese
de resgate parcial das debêntures da mesma série mediante compra
870 A CVM, no Fàrecer CVM/SJU n° 074/1982, em resposta à consulta sobre aquisição facul-
tativa de debêntures, se manifestou no sentido de que: "Facultativa para a companhia essa
forma de aquisição prevista no § 2° do artigo 55 da Lei n" 6.404/76 não precisa ser
dausulada na escritura de emissão, constitui negócio bilateral consensual, não obrigando o
debenturista à sua aceitação".
871 Sobre esse assunto, EGBERTO LACERDA TEIXEIRA e JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREI-
RO. Das Sociedades Anônimas no Direito Brasileiro, v. 1, São Raulo: Ed. José Bushatsky,
1979, p. 351-352, observam que: "Silenciou a lei quanto à necessidade de dita aquisição
compreender todas as debêntures emitidas, de processar-se mediante sorteio ou compra em
bolsa e de efetuar-se à conta de lucros líquidos. Diante da omissão do legislador, presume-se
que tais requisitos não necessitem ser cumpridos, muito embora o princípio de igualdade de
tratamento a todos os debenturistas dentro da mesma série recomende, pelo menos o sorteio
ou a compra em bolsa, como meio de evitar fraudes, quando a aquisição não abranja todas
as debêntures emitidas ou todas da mesma classe. A lei, porém, contentou-se com exigir que
o fato conste do relatório da administração e das demonstrações financeiras".
872 Conforme observa FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio
de Janeiro: Forense, 1977, p. 330, "a aquisição das debêntures pela sociedade também não
prejudica os acionistas, pois os juros que referidas debêntures deveriam vencer seriam tira-
dos, naturalmente, dos lucros sociais, em princípio distributíveis aos acionistas, não houvesse
esse encargo da sociedade".
873 Nesse sentido, JOSÉ E D W A L D O TAVARES BORBA, "Debêntures", Revista de Direito Mer-
cantil Industrial Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 26,
1977, p. 141, conclui que: "A aquisição distingue-se fundamentalmente do resgate, pois
que não extingue o título como este. A debênture adquirida nos termos do § 2o do art. 55
poderá ser recolocada no mercado pela sociedade quando lhe for oportuno. A aquisição
representa um bom instrumento para a sustentação do valor das debêntures no mercado.";
]OSÉ WALDECY LUCENA. Das Sociedades Anônimas - Comentários à Lei (arts. I o a
120)..., v. I, p. 567. Em sentido contrário, FRAN MARTINS. Comentários à Lei das
Sociedades Anônimas..., v. I, p. 330, para quem essas debêntures devem ser, obrigatoria-
mente, canceladas.
debêntures por valor igual ou inferior ao nominal, a única exigência
legal é a de que a aquisição se revista de publicidade e divulgação; por
essa razão, a companhia deve fazer constar a aquisição de suas próprias
debêntures no relatório da administração e nas demonstrações con-
tábeis, uma vez que esses títulos constituem uma obrigação da com-
panhia, figuram em conta específica do seu passivo e a sua aquisição
implica redução dessa conta.
A Lei n° 12.431/2011 inovou acerca da aquisição, pela compa-
nhia, de debêntures de sua própria emissão, ao acrescentar o inciso II
ao novo § 3 o , admitindo tal aquisição inclusive por valor superior ao
nominal, desde que observadas as regras expedidas pela Comissão de
Valores Mobiliários875.
Na hipótese de recolocação das debêntures adquiridas pela com-
panhia, elas manterão as mesmas condições constantes da escritura
de emissão que lhes deram origem, pois não se trata de uma nova
emissão. A única alteração que pode ocorrer é nas condições de re-
muneração das debêntures, como, por exemplo, modificação da taxa
de juros876, pois este pode ter sido, inclusive, o motivo pelo qual a
874 Sobre esse assunto, a CVM, no Parecer CVM/SJU n° 074/1982, entendeu que: "Estariam
deste modo juridicamente admitidas as situações de compra das suas debêntures pela
companhia, eis que a lei o permite expressamente, e a recolocação no mercado, posto que
a legislação reguladora dos títulos de crédito a faculta e a lei societária não a proíbe; antes,
remete a disciplina dos títulos para aquela legislação específica".
875 Até setembro de 2011 a C V M não havia editado ato normativo regulando o § 3 o , inciso II,
do art. 55 da Lei das S.A.
876 A C V M , no Parecer CVM/PJU n° 006/2001, ao analisar consulta sobre aquisição de
debêntures pela própria companhia para realização de alterações nas condições originai?
de emissão, se manifestou no sentido de que: "Não obstante expressamente autorizada por
lei a hipótese de aquisição de debêntures pela própria companhia emissora, não sendo
vedado que esta, concomitantemente como debenturista única, aprove alterações substan-
ciais nas condições da emissão, somente o registro próprio (e não mera 'atualização') dessa
outra emissão na CVM garante a efetiva e transparente divulgação de informações ao público
investidor, preservando os interesses e a credibilidade do mercado dc valores mobiliários. (...)
Entendemos, porém, que ao adquirir todas as debêntures e deliberar pela modificação das
condições da emissão, alterando prazo de vencimento e outras disposições, tudo com o
objetivo de, posteriormente, recolocar os valores mobiliários no mercado secundário em
condições que entende mais convenientes, a companhia esta*, na prática, incorrendo em
uma nova emissão pública, gerando, por conseqüência, a exigência do novo registro, à luz
do art. 19 da Lei ri" 6.385, de 1976, com vistas ao atendimento do caráter instrumental da
atuação da CVM, preconizado por Eizirik".
companhia adquiriu suas próprias debêntures: o debenturista pode
ter recusado a repactuação da taxa de juros877. A companhia, ao ad-
quirir suas próprias debêntures, pode encontrar, posteriormente, in-
vestidores interessados em comprá-las nas condições oferecidas aos
debenturistas e que não foram por eles aceitas878.
As debêntures adquiridas pela companhia podem ser objeto de
locação a terceiros; porém, como são títulos fora de circulação, não
poderão ser negociadas pelo locatário879.
O antigo § 3 o foi renumerado para § 4 o pela Lei n° 12.431/
2011. De acordo com este dispositivo é possível a emissão de debên-
tures cujo vencimento somente ocorra nos casos de inadimplemento
da obrigação de pagar juros e dissolução da companhia, ou de outras
condições previstas no título. São as -denominadas debêntures perpé-
tuas ou permanentes. O seu vencimento não é determinado, mas de-
terminável a sua ocorrência face à verificação de um dos casos
previstos na Lei das S.A. — inadimplemento da obrigação de pagar
juros e dissolução da companhia — ou outras hipóteses expressamen-
te definidas na escritura de emissão880.
877 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 56 da Lei das S.A.
878 Sobre a recolocação das debêntures, a CVM, no Parecer CVM/SJU n° 074/1982, se mani-
festou no sentido de que essa operação "poderia efetivar-se a qualquer momento, como
negócio em mercado, por assim dizer espontâneo; ou, como se tem visto em cláusulas de
escritura de emissão de algumas companhias, associando-se o mecanismo àquele de altera-
ção nas condições de remuneração, pela variação das taxas de juros. Neste caso, quando o
debenturista não aceita as alterações propostas, a companhia se verá adstrita a adquirir seus
títulos, como forma de devolver-lhe o capital investido. (...) Desta forma, o mecanismo de
recolocação das debêntures, pela companhia que as tenha comprado, torna-se visível no
mercado, pelo sistema de publicidade e informação que a lei previu, prescindindo do exame
de mérito ou análise dos pressupostos financeiros da operação, os quais serão avaliados
pelos interessados à vista das informações prestadas pela emissora".
879 Conforme observa M O D E S T O CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anôni-
mas..., v. 1, p. 650, esses títulos "prestam-se a operações de locação a terceiros, que
necessitam caucioná-los em certames públicos ou destiná-los a qualquer outro fim lícito. Essa
prática de largo uso, tem trazido receitas adicionais à companhia emissora, correspondentes
ao valor dessa mesma locação. (...) não pode o locatário colocá-las em circulação, devendo
necessariamente retê-las em seu patrimônio. E por isso não podem esses títulos, enquanto
locados, ser apresentados para pagamento ou resgate ou ao exercício de quaisquer direitos
que não sejam aqueles de estrita conservação de direitos".
880 Assim se manifestou também a CVM no Rsrecer CVM/SJU n° 015/1988.
Juros e outros direitos
"Art. 56. A debênture poderá assegurar ao seu titular juros, fixos
ou variáveis, participação no lucro da companhia e prêmio de
reembolso."
881 Consta do inciso VII do art. 59 da Lei das S.A. que a assembleia geral deverá fixar,
observado o que a respeito dispuser o estatuto, "a época e as condições de pagamento dos
juros, da participação nos lucros e do prêmio de reembolso, se houver".
882 De acordo com a Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, "os artigos 53 a 57
asseguram à companhia ampla liberdade na definição das vantagens conferidas pelas debên-
tures aos seus titulares".
883 Nesse sentido, JOSÉ E D W A L D O TAVARES BORBA. Das Debêntures. Rio de Janeiro: Renovar,
2005, p. 45-46, ao observar que a Lei das S.A. utiliza no art. 56 a expressão "a debênture
poderá assegurai, conclui que: "Vê-se, portanto, que os juros, a participação nos lucros e o
prêmio de reembolso não são cumulativa ou alternativamente obrigatórios. Caberá, por conse-
guinte, à escritura de emissão escolher todas as vantagens a que se refere a lei, ou algumas delas
em conjunto, ou qualquer delas isoladamente." No mesmo sentido, M A R C O S S H I G U E O
TAKATA, "Debêntures, Inconfundibilidade com Mútuo: Natureza e Caracteres Jurídicos,
Alguns Aspectos Tributários". In: Roberto Quiroga Mosquera (Coord.). O Direito Tributário e
o Mercado Financeiro e de Capitais. São Raulo: Dialética, 2009, p. 347; JOSÉ W A L D E C Y
LUCENA. Das Sociedades Anônimas - Comentários à Lei (arts. 1° a 120). v. I, Rio de Janeiro:
Renovar, 2009, p. 588-589. A C V M também se manifestou nesse sentido, no Rjrecer CVM/
SJU n° 057/1982. Em sentido contrário - entendendo que às debêntures devem sempre ser
atribuídos juros MODESTO CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas,
v. 1, 5 a edição, São Raulo: Saraiva, 2007, p. 659; FRAN MARTINS. Comentários à Lei das
Sociedades Anônimas, v. I, Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 332.
884 Nesse sentido manifestou-se a C V M no Parecer CVM/SJU n° 042/1982: "Assim, ainda que
não se estipule juros, a debênture deve atribuir a seus tomadores outras vantagens pecuniárias,
como as enumeradas no artigo 56 da Lei das Sociedades por Ações - participação no lucro
Os juros constituem a remuneração do capital investido na aqui-
sição das debêntures e podem ser atribuídos a critério da companhia,
fixos ou variáveis. Os juros fixos são aqueles que definem um percen-
tual determinado, tendo a data de sua fluência definida na escritura
de emissão de debêntures. Os juros variáveis, por sua vez, são aqueles
que dependem da ocorrência de um evento futuro. Uma vez atribuí-
dos juros fixos às debêntures, deverá constar clara e expressamente da
escritura de emissão a taxa e a sua periodicidade e, na hipótese dos
juros variáveis, o modo de sua determinação885.
Tendo em vista que a debênture é um título de longo prazo e que
as taxas de juros no mercado sofrem mutações, 2 (duas) hipóteses po-
dem ocorrer: (i) a repactuação da taxa de juros; ou (ii) a previsão, na
escritura de emissão, de ajuste periódico dos juros. A repactuação cons-
titui renegociação da taxa de juros a cada período, ou seja, consta da
escritura de emissão uma taxa de juros que vigerá por um período deter-
minado e, a cada novo período, a companhia emissora fixará, de acordo
com os seus critérios, uma nova taxa de juros, a qual cada um dos de-
benturistas, poderá, de acordo com sua conveniência e interesse, aceitar
ou recusar, solicitando, nesse caso, o resgate antecipado de suas debên-
tures. O ajuste periódico das debêntures deve ser objeto de cláusula ex-
pressa na escritura de emissão, na qual a fórmula e as condições do
890 Nesse sentido, FRANCISCO JOSÉ PINHEIRO GUIMARÃES, "Debêntures". In: Alfredo Lamy
Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito das Companhias, v. I, Rio de Janeiro:
Forense, 2009, p. 594. Em sentido contrário, LUIZ MÉLEGA. Direito Societário: Lei das
Outro rendimento que pode ser atribuído às debêntures, tam-
bém regulado nesse artigo, é o prêmio de reembolso, pago quando do
vencimento, amortização ou resgate antecipado da debênture e equi-
valente a uma quantia fixa em moeda corrente nacional ou a um per-
centual determinado sobre o valor nominal da debênture, devendo
constar expressamente da escritura de emissão892.
0 prêmio de resgate é uma modalidade do prêmio de reembolso
que não se confunde com o ágio na emissão da debênture. Na emis-
são de debêntures com deságio, ou seja, abaixo do par, a diferença
entre o valor pago pela debênture e aquele pelo qual o título será re-
embolsado, resgatado ou amortizado é denominado "prêmio de emis-
são". O prêmio de resgate constitui uma vantagem adicional que,
estando prevista na escritura de emissão, acresce ao valor nominal do
título na hipótese de seu resgate antecipado.
Conversibilidade em ações
"Art. 57. A debênture poderá ser conversível em ações nas condi-
ções constantes da escritura de emissão, que especificará:
Sociedades por Ações. São Raulo: LTr, 2000, p. 33; M A R C O S S H I C U E O TAKATA, "Debên-
tures, Inconfundibilidade com Mútuo: Natureza e Caracteres Jurídicos, Alguns Aspectos
Tributários". In: Roberto Quiroga Mosquera (Coord.). O Direito Tributário e o Mercado
Financeiro e de Capitais..., p. 348-349.
JOSÉ E D W A L D O TAVARES BORBA. Das Debêntures..., p. 56, entende que: "Com relação
ao imposto de renda, a sua prévia provisão afigura-se pertinente, porquanto, sendo o
imposto um gravame que atinge o lucro do exercício, a sua incidência, sob o aspecto
material, representa um redutor desse lucro. Os prejuízos acumulados, que provêm de outros
exercícios, não poderão, contudo, reduzir'a base de cálculo das participações dos
debenturistas, uma vez que estas têm por pressuposto o lucro do exercício. (...) Os
debenturistas são credores da sociedade, e, nessa qualidade, participam do lucro produzido
pela companhia no exercício-base referenciado; os prejuízos de exercícios anteriores não
poderão atingi-los, posto que são estranhos à sua condição jurídica."
Sobre o valor do prêmio de reembolso, a CVM, no Parecer CVM/SJU n° 057/1982, manifes-
tou-se no sentido de que: " O valor do prêmio de reembolso, a ser pago ao debenturista
quando do resgate ou amortização de debêntures, juntamente com a devolução da quantia
mutuada, não está limitado na lei cabendo à companhia estabelecê-lo na deliberação
assemblear que decidir sobre o lançamento das debêntures".
II - a espécie e a classe das ações em que poderá ser convertida;
900 Sobre o resgate antecipado da debênture conversível, ver JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA.
Das Debêntures. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 234-238.
vas à incidência da taxa de juros e o direito à percepção de dividendos
sejam reguladas na escritura de emissão, pois, na data em que o de-
benturista exerce o direito ã conversão de suas debêntures em ação,
ele deixa de ser credor e passa a ser acionista da companhia. N a omis-
são da escritura, tendo em vista que os lucros enquanto não delibera-
da a sua distribuição pertencem à companhia, o novo acionista terá
direito à plena participação nos dividendos que vierem a ser delibera-
dos; já os juros vincendos não mais serão devidos após a data do exer-
cício da conversão.
A Lei das S.A. prevê expressamente como modalidade de au-
mento de capital a conversão em ações de debêntures ou partes bene-
ficiárias e o exercício de direitos conferidos por bônus de subscrição
ou de opção de compra de ações (artigo 166, inciso IH). O direito à
conversão de debêntures em ações, o seu exercício e o conseqüente
aumento de capital é, por disposição legal, previamente aprovado na
assembleia geral que deliberar sobre a criação de debêntures conver-
síveis ou, na companhia aberta, pelo conselho de administração, des-
de que dentro dos limites do capital autorizado e quando permitido
pelo estatuto social, que deverá, nessa hipótese, especificar o limite do
aumento de capital decorrente da conversão das debêntures em valor
do capital ou em número de ações e as espécies e classes de ações que
poderão ser emitidas (artigo 59, § 2 o ). De qualquer forma, as condi-
ções da conversão devem ser expressamente reguladas na escritura de
emissão dessas debêntures901. O aumento de capital decorrente da
conversão de debêntures em ações é automático e não depende de
Determina a Lei das S.A., no inciso IV do art. 122, que compete privativamente à
assembleia geral, autorizar a emissão de debêntures. Consta, também, do art. 59, inciso
V, que a "deliberação sobre emissão de debêntures é da competência privativa da assembleia
geral, que deverá deliberar, observado o que a respeito dispuser o estatuto" sobre "a
conversibilidade ou não em ações e as condições a serem observadas sobre a emissão".
A Lei n° 12.431/2011 alterou o art. 59 da Lei das S.A. atribuindo ao conselho de
administração das companhias abertas poder para aprovar emissões de debêntures de
qualquer espécie, inclusive as conversíveis em ações. Ver os comentários ao art. 59 da
Lei das S.A.
deliberação de assembleia geral902-903. Dentro dos 30 (trinta) dias sub-
sequentes à efetivação do aumento, a companhia requererá ao Regis-
tro Público de Empresas Mercantis a sua averbação (artigo 166, §
I o ); na primeira assembleia geral subsequente à conversão deverá ser
ajustado o estatuto para refletir o real capital social.
O § I o determina que os acionistas da companhia emitente
têm direito de preferência para subscrever a emissão de debêntu-
res conversíveis em ações, observado o disposto nos artigos 171 e
172 da Lei das S.A. 904 .
SEÇÃO 01
ESPÉCIES
912 Art. 1.431 do Código Civil: "Constitui-se o penhor pela transferência efetiva da posse que,
em garantia do débito ao credor ou a quem o represente, faz o devedor, ou alguém por ele,
de uma coisa móvel, suscetível de alienação".
913 Art. 1.361 do Código Civil: "Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel
infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor".
914 A alienação Fiduciária em garantia constitui-se por meio da transferência ao credor do
domínio, independentemente de sua tradição, em garantia do pagamento de uma obriga-
ção. O direito do credor sobre o bem resolve-se com o pagamento da dívida garantida.
Sobre esse assunto, ver CAIO MARIO DA SILVA PEREIRA. Instituições de Direito Civil. v. IV,
19a edição, Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 426.
915 Arts. 1.473 a 1.501 do Código Civil.
916 Arts. 1.506 a 1.510 do Código Civil.
91 7 Sobre a constituição de caução de ações como garantia real de emissão de debêntures, ver
o Parecer CVM/PJU n° 007/2001, por meio do qual essa autarquia manifestou-se no
sentido de que: "I. Não existe óbice legal ã constituição de caução ou penhor de ações
como garantia real de emissão de debêntures, já que se trata de hipótese expressamente
prevista em lei (...); II - A caução e o penhor, como espécies de direito real em garantia, têm
como principais características a vinculação da coisa móvel ao cumprimento da obrigação
assumida, e a necessidade que essa coisa seja, por sua própria natureza, passível de livre
alienação (...), sob pena de se inviabilizar o direito do credor de requerer a venda judicial do
bem, satisfazendo assim o seu crédito (...)".
sificado como quirografário contra a companhia emissora e concor-
rerá com os demais credores dessa natureza. O bem dado em garantia
fica vinculado à dívida da companhia mesmo na hipótese dela (ou do
terceiro garantidor) alienar o bem gravado a terceiro918.
Admite-se a constituição de garantia em valor inferior ao das
debêntures emitidas e por ela garantidas. E imprescindível, no entan-
to, que esse fato conste expressamente da escritura de emissão919. As
garantias reais podem ser destinadas a assegurar o cumprimento da
obrigação de todas as séries de uma emissão ou especificamente a
uma ou mais séries. Em qualquer situação, é sempre necessária a ava-
liação dos bens dados em garantia das debêntures920.
A garantia real é constituída por documento próprio ou pela es-
critura de emissão; de qualquer forma deverá constar da própria escri-
tura a garantia, se houver (artigo 59, inciso III). Ademais, a Lei das
S.A. determina que nenhuma emissão de debêntures será feita sem
que tenham sido satisfeitos os seguintes requisitos: (i) arquivamento,
921 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 62 da Lei das S.A.
922 Dispõe o art. 1.492 do Código Civil que: "As hipotecas serão registradas no cartório do
lugar do imóvel, ou no de cada um deles, se o título se referir a mais de um. Parágrafo único.
Compete aos interessados, exibindo o título, requerer o registro da hipoteca". Se a garantia
real for a hipoteca, é necessário a averbação no Registro de Imóveis; se o penhor for de
coisa móvel o registro deverá ser feito em Cartório de Títulos e Documentos.
923 Sobre o penhor de direitos creditórios, ver o Parecer CVM/SJU n° 013/1996 e o Parecer
CVM/PjU n° 007/2001. Sobre o penhor de créditos ordinários, portanto, eventuais e
incertos, ver o Parecer CVM/SJU n° 056/1981.
924 JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA. Das Debêntures. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 73.
925 Sobre a garantia flutuante, ver LUIZ GASTÃO PAES DE BARROS LEÃES, "Debêntures". In:
Estudos e Pareceres sobre Sociedades Anônimas. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais,
1989, p. 82-94.
se o dinheiro em caixa for insuficiente à satisfação do total devido aos
credores de determinada classe, o pagamento deverá ser feito parcial e
proporcionalmente ao crédito de cada credor. Na hipótese de falência
da companhia emissora, os titulares de debêntures com garantia flutuante
preferem aos credores sem garantia ou preferência. No entanto, os
credores trabalhistas, fiscais, os que possuem garantia real e privilégio
especial, preferem aos que possuem créditos com privilégio geral.
Os credores com direitos reais constituídos após a emissão das
debêntures flutuantes preferem os titulares dessas debêntures até o
valor da excussão dos bens gravados.
De acordo com o § 3 o , as debêntures com garantia flutuante de
nova emissão são preferidas pelas de emissão ou emissões anteriores,
e a prioridade se estabelece pela data da inscrição da escritura de emis-
são na Junta Comercial; já dentro da mesma emissão as séries con-
correm em igualdade.
A companhia pode efetuar mais de uma emissão de debêntures
e cada emissão pode ocorrer em série única ou em 2 (duas) ou mais
séries. As emissões podem ser concomitantes, ou seja, não há mais a
obrigatoriedade de colocação de todas as debêntures das séries de
emissão anterior e o cancelamento das séries não colocadas como
condição para a realização de uma nova emissão926.
A Lei das S.A., no § 6 o , admite que as debêntures emitidas por
companhia integrante de grupo de sociedades, constituído de acordo
com o artigo 265, tenham garantia flutuante do ativo de 2 (duas) ou
mais sociedades do grupo. Nessa hipótese, o privilégio geral assegu-
rado pela garantia flutuante do ativo de outra companhia integrante
929 No mesmo sentido, JOSÉ E D W A L D O TAVARES BORBA. Das Debêntures..., p. 79, observa
que: "Não admite a lei uma debênture de natureza híbrida, ao mesmo tempo garantida e
subordinada. Ainda que a garantia seja outorgada por terceiras, a hipótese será a de um título
com garantia, o que lhe retirará o pressuposto da subordinação (...) Algumas emissões de
debêntures subordinadas têm sido lastreadas, a despeito da subordinação, com determina-
das garantias, como, por exemplo, um penhor de ações outorgado por terceiro. Trata-se de
anomalia cuja conseqüência deverá ser a conversão do título, que deixará de ser uma
debênture subordinada para tornar-se uma debênture com garantia real."; JOSÉ WALDECY
LUCENA. Das Sociedades Anônimas - Comentários à Lei (arts. 1o a 120)..., v. I, p. 616. Em
sentido contrário, GUILHERME R1ZZIERI DE G O D O Y FERREIRA, "Debêntures Subordina-
das com Garantia Real e Falência", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e
financeiro. São Fiaulo: Ed. Malheiros, v. 130, abril-junho, 2003, p. 121.
930 Art. 12, incisos IX, X e XI, da Instrução CVM n° 28/1983, com as alterações introduzidas
pelas Instruções CVM n " 123/1990 e 490/20-11, que dispõe sobre o exercício da função
de agente fiduciário do debenturista.
S E Ç Ã O S5J
CRIAÇÃO E EMISSÃO
Competência
"Art. 59. A deliberação sobre emissão de debêntures é da compe-
tência privativa da assembleia geral, que deverá fixar, observado o
que a respeito dispuser o estatuto:
931 Sobre o quorum de instalação e deliberaçao da assembleia geral, ver os comentários aos
arts. 125 e 129, respectivamente, da Lei das S.A.
932 Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976.
tures com cláusula de conversibilidade em ações, observado o dispos-
to nos artigos 171 e 172933.
A assembleia geral, ao deliberar a emissão de debêntures, deverá
observar as regras constantes do estatuto social e definir (i) o valor da
emissão, os critérios de determinação do seu limite, se a emissão será
em série única ou em várias séries; (ii) o número e o valor nominal das
debêntures; (iii) as garantias, reais ou a garantia flutuante, se houver;
(iv) as condições de correção monetária, se for o caso; (v) as condi-
ções de conversibilidade, se as debêntures forem conversíveis em
ação934; (vi) a época e as condições de vencimento, amortização e
resgate; (vii) a época e as condições do pagamento de juros, da parti-
cipação nos lucros e do prêmio de reembolso, se houver; e (viii) o
modo de subscrição oü colocação e o tipo das debêntures.
O antigo § I o deste artigo foi renumerado, pela Lei n° 12.431/
2011, com poucas adaptações, para § 4 o , segundo o qual, nos casos de
emissão de debêntures simples e sem garantia real, as deliberações
referentes (i) à época e às condições de vencimento, amortização ou
933 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 57 da Lei das S.A.
934 De acordo com o art. 15 da Instrução CVM n° 481/2009, "sempre que a assembleia geral for
convocada para deliberar sobre a emissão de debêntures ou bônus de subscrição, a compa-
nhia deve fornecer, no mínimo, as informações indicadas no Anexo 15 à presente Instrução".
Segundo o Anexo 15, em caso de emissão de debêntures a companhia deverá: "a. Informar
o valor máximo da emissão; b. Informar se a emissão será dividida em séries; c. Informar o
número e o valor nominal das debêntures de cada série; d. Informar a destinação dos
recursos; e. Explicar, pormenorizadamente, as razões da emissão e suas conseqüências; f.
Informar a remuneração das debêntures; g. Informar a espécie das debêntures a serem
emitidas e descrever as garantias, se houver; h. Informar o prazo e as condições de vencimen-
to, amortização e resgate, inclusive as hipóteses de vencimento antecipado, se houver; i.
Informar se a subscrição será pública ou particular; j. Informar as matérias cuja definição será
delegada ao conselho de administração; k. Identificar o agente fiduciário; I. Informar a
classificação de risco da emissão, se houver; m. Informar o mercado secundário em que as
debêntures serão negociadas, se for o caso; n. Em caso de emissão de debêntures conversí-
veis: (i) Informar a relação de conversão; (ii) justificar, pormenorizadamente, os aspectos
econômicos que determinaram a fixação da relação de conversão; (iii) Fornecer opinião dos
administradores sobre os efeitos do aumento de capital, sobretudo no que se refere à
diluição provocada pelo aumento; (iv) Fornecer cópia de todos os laudos e estudos que
subsidiaram a fixação da relação de conversão; (v) Informar os termos e condições a que está
sujeita a conversão; (vi) Descrever os direitos, vantagens e restrições das ações resultantes da
conversão; (vii) Informar se os acionistas terão direito de preferência para subscrever as
debêntures, detalhando os termos e condições a que esse direito está sujeito; e (viii) Apre-
sentar percentual de diluição potencial resultante da emissão".
resgate das debêntures; (ii) à época e as condições do pagamento dos
juros, da participação nos lucros e do prêmio de reembolso, se houver;
e (iii) ao modo de subscrição ou colocação, e o tipo das debêntures935,
podem ser definidas pela própria assembleia geral ou delegadas ao
conselho de administração.
Além disso, o § 4 o também permite que se delegue ao conselho
de administração, nas hipóteses acima, a deliberação sobre a oportu-
nidade da emissão. Quando isso ocorre, a assembleia geral aprova a
emissão, fixando as características básicas das debêntures, que estão
elencadas nos incisos I a V do caput; caberá ao conselho de adminis-
tração decidir qual o momento mais adequado para proceder à efetiva
emissão e colocação das debêntures, tendo em vista as condições do
mercado. A delegação ao conselho de administração da deliberação
sobre o momento mais oportuno para proceder à efetiva criação e
colocação dos papéis constitui praxe bastante comum, flexibilizando
o processo decisório e permitindo à companhia escolher, com maior
rapidez, qual o timing mais adequado para o sucesso da operação.
O § I o original já havia sido alterado pela Lei n° 10.303/2001
que outorgou competência originária e concorrente ao conselho de
administração para deliberar sobre a emissão de debêntures simples,
não conversíveis em ação e sem garantia real936. Ocorre que a Lei n°
935 Sobre a expressão "tipo das debêntures", a CVM, no Parecer publicado na Revista da CVM,
v. 2, setembro-dezembro, 1984, p. 31-35, se manifestou no sentido de que: "Cumpre
observar que, ao se referir, no inciso Vill, ao tipo de debêntures, a lei não definiu o que seria
tipo. Alguns doutrinadores e o próprio mercado passaram a entender, à falta de definição no
texto legal, que tipo se referia à emissão com ágio ou deságio. (...) Aurélio Buarque de
Holanda, em Novo Dicionário, define: 'Tipo Ido Cr. Typosl; cunho, molde, sinal. s.m. 1.
Aquilo que inspira fé como modelo. 2. Coisa que reúne em si os caracteres distintivos de uma
classe; símbolo. 3. Exemplar, modelo...' Quer nos parecer que o legislador, ao empregar o
termo tipo, quis se referir exatamente a exemplar, modelo. (...) Quer nos parecer que, ao se
referir a tipo das debêntures, a lei societária quis abranger os diversos modelos com que os
títulos podem se apresentar, motivo pelo qual pode-se entender que o tipo a que se refere o
inciso VIII do art. 59 abrange também a forma das debêntures."
936 Essa alteração foi refletida também no art. 122 da Lei das S.A., que trata das matérias de
competência privativa da assembleia geral. O novo inciso IV desse artigo, também alterado
pela Lei nc 10.303/2001, passou a ressalvar a competência do conselho de administração
para os casos previstos no § 1o do art. 59.
12.431/2011, além de renumerá-lo para § 4 o , deu nova redação ao §
I o para conferir ao conselho de administração de companhia aberta
competência para deliberar sobre a emissão de debêntures não con-
versíveis em ações, salvo disposição estatutária em contrário. Trata-se
de competência originária decorrente da lei, que, entretanto, pode ser
afastada pelo estatuto social. Essa competência não se confunde com
a faculdade acima analisada, regulada no atual § 4 o , de delegação de
poderes da assembleia geral ao conselho de administração, já prevista
na redação original da Lei n° 6.404/1976 e mantida pelas Leis nos
10.303/2001 e 12.431/2011.
A competência originária - porém não exclusiva — outorgada
ao conselho de administração restringe-se à deliberação sobre a
emissão de debêntures não conversíveis em ação, salvo disposi-
ção estatutária em contrário. A autorização para emissão de de-
bêntures conversíveis, a seu turno, depende de previsão expressa
do estatuto social, nos termos do § 2 o .
A Lei n° 12.431/2011 também deu nova redação ao § 2 o ,
atribuindo ao conselho, de administração, quando autorizado pelo
estatuto da companhia aberta, dentro dos limites do capital autorizado,
competência para deliberar sobre a emissão de debêntures conversíveis
em ações, especificando o limite do aumento de capital decorrente da
conversão de debêntures, em valor do capital ou em número de ações,
e as espécies e classes de ações que poderão ser emitidas. Assim, o
conselho de administração passou a ter competência para deliberar
sobre a emissão de debêntures conversíveis em ações, o que,
anteriormente à entrada em vigor da Lei n° 12.431/2011, só podia
ser feito pela assembleia geral.
Nas companhias abertas, a competência para deliberar sobre a
emissão de debêntures é privativa da assembleia geral na hipótese de
emissão de debêntures conversíveis em ações e caso não conste do
estatuto social autorização para o conselho de administração sobre ela
deliberar. Assim, a partir da edição da Lei n° 12.431/2011, nas compa-
nhias abertas, o conselho de administração pode ter competência para
deliberar sobre a emissão de debêntures de qualquer espécie.
Até a entrada em vigor da Lei n° 12.431/2011, a competência
outorgada ao conselho de administração restringia-se à deliberação
sobre a emissão de debêntures (i) simples, (ii) não conversíveis em
ação e (iii) sem garantia real. Por debêntures simples, entende-se aque-
las sem garantia flutuante, ou seja, sem o privilégio geral sobre o ativo
da companhia. Não possuem preferência no recebimento de seu cré-
dito em caso de liquidação da sociedade e podem ser equiparadas aos
credores quirografários ou serem subordinadas a esses credores, so-
mente preferindo aos acionistas no eventual ativo remanescente. Es-
sas condições eram cumulativas. Na ausência de quaisquer delas, a
deliberação sobre a emissão de debêntures competia à assembleia geral.
A companhia pode assumir na escritura de emissão das debêntu-
res simples, não conversíveis em ação e sem garantia real, a obrigação
de não alienar ou onerar bem imóvel ou outro bem sujeito a registro de
propriedade (artigo 58, § 5 o ), pois esse direito não confere aos titulares
dessas debêntures qualquer privilégio ou garantia concreta; o exercício
desse direito tem por fim evitar que uma eventual dilapidação do patri-
mônio da companhia possa prejudicar a liquidação dessas debêntures.
Há 2 (dois) momentos no negócio jurídico da debênture: a emissão,
enquanto manifestação de vontade da companhia e a subscrição, en-
quanto manifestação, por parte dos tomadores, da aceitação da oferta da
companhia937. A emissão das debêntures constitui a sua criação e oferta
aos interessados. A subscrição designa o ato mediante o qual os tomado-
res dos títulos manifestam a sua aceitação, assinando o boletim de subs-
crição e tornando-se, a partir daquele momento, debenturistas938. Assim,
937 Sobre as 2 (duas) fases do negócio jurídico da debênture, ver os comentários ao art. 53 da
Lei das S.A.
938 NELSON EIZIRIK, "Emissão de Debêntures", Revista dos Tribunais. São Raulo: Ed. Revista dos
Tribunais, v. 721, novembro, 1995, p. 53 ou na Revista de Direito Mercantil, Industrial,
Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 101, janeiro-março, 1996,
p. 37-48.
a assembleia geral ou o conselho de administração, conforme o caso,
autoriza a emissão de debêntures e estabelece as suas características e a
escritura de emissão dá existência jurídica a esses títulos. No entanto,
para que as debêntures sejam colocadas em circulação, são necessários os
seguintes registros: (i) das garantias reais, se existentes; (ii) da própria
escritura na Junta Comercial; e, (iii) tratando-se de emissão pública, na
Comissão de Valores Mobiliários, além da interveniência do agente fi-
duciário na escritura de emissão939-940.
A subscrição de debêntures pode ser realizada à vista ou parcela-
damente. No passado, entendia-se que o pagamento das debêntures
deveria ocorrer obrigatoriamente à vista. Tal concepção decorria basi-
camente do fato de serem as debêntures títulos ao portador. Vedada a
emissão de títulos ao portador, com o advento da Lei n° 8.021/1990,
não há, em princípio, impedimento à colocação de debêntures nomi-
nativas ou escriturais com pagamento parcelado. Deve a companhia,
porém, por razões de cautela, promover a transferência gradual da
propriedade das debêntures, condicionando-a ao efetivo pagamento
das parcelas por parte do adquirente.
Assim, admite-se em emissões de debêntures divididas em séries,
que o pagamento seja feito parceladamente - por exemplo: podem
ser emitidas debêntures das séries A, B e C, integralizadas as da série
A à vista, no ato da subscrição, e as demais em datas futuras, fixadas
na escritura de emissão. Em emissões de debêntures destinadas ao
financiamento de empreendimentos imobiliários (construção de
shopping centers, hotéis, hospitais, etc.) tem sido utilizado o expediente
939 Consta do caput e do § 1o do art. 61 da Lei das S.A. que: "A companhia fará constar da
escritura de emissão os direitos conferidos pelas debêntures, suas garantias e demais cláusu-
las ou condições. § Io A escritura de emissão, por instrumento público ou particular, de
debêntures distribuídas ou admitidas à negociação no mercado, terá obrigatoriamente a
intervenção de agente fiduciário dos debenturistas (art. 66 a 70)." O art. 66 da Lei das S.A.,
por sua vez, estabelece que o "agente fiduciário será nomeado e deverá aceitar a função na
escritura de emissão de debêntures."
Sobre os requisitos indispensáveis à emissão de debêntures, ver os comentários ao arl. 62
da Lei das S.A.
de emitir-se várias séries de debêntures, cuja subscrição ocorre de
forma vinculada ao cumprimento do cronograma de execução de obras.
A emissão de debêntures pode ser pública ou privada. A emissão
privada é efetuada de forma direta pela companhia emissora e não se
destina ao público. A emissão pública implica em captação de recur-
sos junto a investidores individuais e institucionais941. A companhia
para proceder a uma emissão pública de debêntures, deve registrá-la
na Comissão de Valores Mobiliários942. Nos termos da Lei das S.A.
(artigo 4 o , § I o ), somente os valores mobiliários das companhias re-
gistradas na Comissão de Valores Mobiliários, ou seja, das compa-
nhias abertas, podem ser objeto de distribuição no mercado e de
negociação em Bolsa de Valores e no mercado de balcão943. O regis-
tro da emissão pública de debêntuxes objetiva basicamente proteger
os tomadores dos valores mobiliários, impondo à companhia a obri-
gação de prestar as informações previstas na Lei das S.A. e na regula-
mentação administrativa da Comissão de Valores Mobiliários.
A Comissão de Valores Mobiliários pode indeferir o pedido de
registro da emissão pública apenas nas hipóteses de (i) a companhia
não apresentar as informações consideradas necessárias à correta ava-
liação, por parte dos investidores, sobre o mérito do empreendimento,
as quais estão minuciosamente descritas nas normas administrativas
por ela baixadas, ou caso a companhia apresente tais informações de
941 Sobre a diferenciação entre a emissão pública e privada de valores mobiliários e a sua
colocação, ver os comentários ao art. 4o da Lei das S.A. Ver, lambem, NELSON EIZIRIK,
ARIÁDNA B. GAAL, FLÁVIA PARENTE e MARCUS DE FREITAS l-IENRIQUES. Mercado de
Capitais - Regime Jurídico. 2a edição, Rio de Janeiro; Renovar, 2008, p. 135-162. Ver,
também, o art. 3 o da Instrução CVM n° 400/2003, com as alterações introduzidas pelas
Instruções CVM n« 482/201 0.
942 Art. 19 da Lei n° 6.385/1976.
943 Note-se que a CVM, ao regular, por meio da Instrução CVM n° 476/2009, com as alterações
introduzidas pelas Instruções CVM nm 482/2010, 488/2010 e 500/2011, as ofertas públi-
cas de valores mobiliários distribuídas com esforços restritos, determinou, no art. 5o, que a
elas não se aplicam a Instrução CVM n° 400/2003, bem como as alterações introduzidas
pelas Instruções CVM n05 429/2006, 442/2006, 472/2008, 482/2010 e 488/2010, e as
demais normas da CVM relativas ao procedimento de distribuição de valores mobiliários
específicos. Assim, as sociedades fechadas podem, por exemplo, realizar uma emissão
pública de debêntures. Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 52 da Lei das S.A.
maneira incompleta ou insatisfatória944; e (ii) o estatuto da compa-
nhia conter dispositivos ilegais, ou os atos societários que precederem
a emissão serem irregulares ou viciados. Em tais casos, o deferimento
do pedido do registro é condicionado ao atendimento das exigênci-
as formuladas pela Comissão de Valores Mobiliários, inclusive quan-
to às necessárias alterações no estatuto social da companhia para
adaptá-lo à Lei das S.A. 945 .
A Comissão de Valores Mobiliários pode aprovar padrões de clá-
usulas e condições que devem, obrigatoriamente, ser adotados nas
escrituras de emissão de debêntures destinadas à negociação em Bol-
sa de Valores ou no mercado de balcão, e recusar a admissão ao mer-
cado da emissão que não satisfaça a esses padrões (artigo 61, § 3 o ).
O ato da Comissão de Valores Mobiliários de aprovar ou desa-
provar o pedido de emissão pública de debêntures é necessariamente
vinculado, uma vez que a Lei das S.A. e a regulamentação adminis-
trativa estabelecem os requisitos e as condições para a sua prática.
Não há, no caso, poder discricionário da Comissão de Valores Mobi-
liários; não pode essa Autarquia indeferir o pedido de registro da emis-
são por razões de conveniência ou oportunidade.
Caso uma emissão pública de debêntures não seja registrada, a
Comissão de Valores Mobiliários pode determinar a sua suspensão.
Idêntica providência pode ser adotada por essa Autarquia na hipótese
em que, embora registrada a emissão, seja ela fraudulenta ou ilegal,
ou ainda estejam a oferta, a promoção e os anúncios publicitários
ocorrendo em condições diversas daquelas constantes do registro946.
Tratando-se de emissão pública sem o necessário registro, entende-
se que o ato de subscrição é nulo. A nulidade, no caso, decorre da
944 Instrução CVM n° 400/2003, com as allerações introduzidas pelas Instruções CVM n" 429/
2006, 442/2006, 472/2008, 482/2010 e 488/2010, Anexos I e II, com a alteração da
Instrução CVM n° 429/2006, e art. 16.
945 Art. 16, § I o , da Instrução CVM n° 400/2003.
946 Art. 20 da Lei n° 6.385/1976.
preterição de formalidade essencial - o registro na Comissão de
Valores Mobiliários - à realização de uma oferta pública de títulos
no mercado de capitais, com a captação da poupança popular947.
Caracterizada a emissão pública sem registro, a Comissão de
Valores Mobiliários pode determinar a instauração de inquérito
administrativo para apurar a responsabilidade disciplinar das
pessoas envolvidas, como os administradores, acionista
controlador e underwriters.
Nenhuma emissão pública de debêntures pode ser realizada sem a
participação de uma instituiçãofinanceiraatuando como underwriter, res-
salvadas as hipóteses de dispensa pela Comissão de Valores Mobiliários948.
A própria Lei das S A. determina que a emissão pública de valores mobiliá-
rios deve ser necessariamente realizada com a intermediação de instituição
financeira (artigo 82). Estão habilitadas a atuar como underwriters as ins-
tituiçõesfinanceirasintegrantes do sistema de distribuição de valores mo-
biliários, a saber, os bancos de investimento; os bancos múltiplos com
carteira de investimentos; as sociedades corretoras; e as sociedades distri-
buidoras de títulos e valores mobiliários949-950.
O contrato de underwriting pode ser firmado com 1 (uma) ou
com várias instituições financeiras. Nessa última hipótese, caracteri-
za-se o consórcio de underwriters, aplicando-se, consequentemente,
as disposições constantes dos artigos 278 e 279. Há 3 (três) modali-
dades de underwriting, tendo em vista as obrigações assumidas pela
instituição financeira: (i) firme; (ii) com garantia de sobras; e (iii) de
951 Sobre underwriting, ver NELSON EIZIRIK, ARIÁDNA B. CAAL, FLÁVIA PARENTE e MARCUS
DE FREITAS HENRIQUES. Mercado de Capitais - Regime Jurídico..., p. 163-191,
952 Art. 21, § 4°, da Lei n° 6.385/1976, com a redação dada pela Lei n° 9.457/1997.
mercado ocorre basicamente no Módulo Nacional de Debêntures -
SND953. Trata-se de um sistema automatizado de negociação, custódia
e liquidação financeira de debêntures, que funciona, em termos nacio-
nais, por meio da rede de terminais de computadores da CETIP S.A.
Balcão Organizado de Ativos e Derivativos954. O SND consiste em
um sistema mediante o qual são processados eletronicamente o regis-
tro, a custódia, a negociação e a liquidação financeira das operações
com debêntures realizadas no mercado secundário; nesse sistema as
debêntures são negociadas via computador e são processados automa-
ticamente todos os eventos a elas relativos, tais como pagamento de
juros, repactuação, resgate, etc., sendo os recursos creditados ou debita-
dos diretamente na conta dos participantes. O SND acata diretamente
as negociações realizadas no mercado de balcão, bem como as transa-
ções fechadas na plataforma de negociação da Cetipnet - Sistema de
Negociação Eletrônica de Títulos, cujo propósito é servir como portal
de negociação com títulos públicos e privados.
O Módulo de Distribuição de Títulos - SDT, também adminis-
trado pela CETIP, permite a colocação de debêntures no mercado
primário, mediante o processamento eletrônico das operações. Os sis-
temas SND e S D T proporcionaram, a partir de sua implantação, ocor-
rida em 1988, maior segurança às negociações com debêntures, tanto
no mercado primário como no mercado secundário. O S D T simplifi-
cou o processo de colocação primária de debêntures, permitindo a
liquidação financeira das operações via reserva bancária das institui-
953 O SND foi constituído em 1988 sob a denominação Sistema Nacional de Debêntures,
como fruto de uma parceria entre a Associação Nacional das Instituições do Mercado
Financeiro (ANDIMA) - antiga denominação da Associação Brasileira das Entidades dos
Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA) - e a CETIP S.A. Balcão organizado de Ativos
e Derivativos.
954 A CETIP constitui uma câmara de compensação e liquidação que efetua a custódia
escriturai de ativos e contratos, registra operações realizadas no mercado de balcão,
processa a liquidação financeira e oferece ao mercado uma plataforma eletrônica para a
realização de diversos tipos de operações online, tais como: leilões e negociação de
títulos públicos, privados e valores mobiliários de renda fixa. A CETIP também é respon-
sável pelos serviços de custódia prestados aos investidores dentro do SND e do Módulo
de Distribuição de Títulos - SDT.
ções financeiras participantes, sem a necessidade de assinatura de
cheques e preenchimento de boletins de subscrição, os quais são
emitidos automaticamente pelo próprio Sistema955-956.
As debêntures têm obrigatoriamente valor nominal957; determi-
na a Lei das S.A. que as debêntures da mesma série terão igual valor
nominal e conferirão aos seus titulares os mesmos direitos (artigo 53,
parágrafo único). No entanto, de acordo com o § 3 o deste artigo, com
a redação dada pela Lei n° 12.431/2011, a assembleia geral pode de-
liberar que a emissão terá valor e número de série indeterminados,
dentro dos limites por ela fixados. Não obstante, o artigo 60 estabele-
ce a regra de que o valor total das emissões de debêntures, excetuados
os casos previstos em lei especial, não pode ultrapassar o capital social
da companhia e que esse limite pode ser excedido até alcançar (i)
80% (oitenta por cento) do valor dos bens gravados, próprios ou de
terceiros, no caso de debêntures com garantia real; e (ii) 70% (setenta
por cento) do valor contábil do ativo da companhia, diminuído do
montante das suas dívidas garantidas por direitos reais, no caso de
debêntures com garantia flutuante.
A Lei das S.A. não fixou um valor mínimo para as debêntures,
cabendo à assembleia geral ou ao conselho de administração, confor-
me o caso, estabelecer o valor que julgar conveniente aos interesses
da companhia958.
Ao longo de sua existência, a companhia pode realizar o número
de emissões de debêntures que julgar conveniente. Trata-se de deci-
955 Os sistemas SND e SDT são disciplinados mediante normas de auto-regulação, de conteú-
do corporativo, contidas nos respectivos Regulamentos de Operações. O SND foi oficial-
mente reconhecido pelas autoridades fiscais e monetárias com a edição da Instrução
Normativa da SRF n" 56/1988 e da Resolução CMN n" 1.883/1991.
956 Sobre o SND, ver LUIZ CASTÃO PAES DE BARROS LEAES, "O Regulamento do Sistema
Nacional de Debêntures". In: Pareceres. v. II, São Paulo: Editora Singular, 2004, p.
1.111-1.129.
957 Sobre o valor nominal das debêntures, ver os comentários ao art. 54 da Lei das S.A.
958 A CVM, por meio da instrução CVM n° 194/1992, alterou o valor nominal unitário mfnimo
para emissão de debêntures com cláusula de variação cambial previsto na revogada Reso-
lução CMN n° 1.833/1991.
são interna corporis, relativa ao grau de endividamento considerado
adequado pelos acionistas e administradores. A companhia pode rea-
lizar emissões de debêntures de forma concomitante; ou seja, não
precisa mais colocar todas as debêntures de uma emissão ou toda a
série - se a emissão for dividida em séries - ou, ainda, cancelar a emis-
são anterior ou as séries não colocadas para proceder a uma nova
emissão de debêntures. O dispositivo que continha essa regra - § 3 o
da redação original deste artigo - foi substituído e alterado pela Lei
n° 12.431/2011.
Na hipótese de uma emissão ou série de debêntures não ser inte-
gralmente subscrita, a companhia não poderá desistir da colocação
dos títulos e devolver aos subscritores o valor pago, salvo se a desis-
tência for expressamente regulada na escritura de emissão; caso con-
trário, a colocação deverá ser feita no volume subscrito, pois a
subscrição é a manifestação, por parte dos tomadores, da aceitação da
oferta da companhia, que fica a ela vinculada.
Limite de emissão
'Art. 60. Excetuados os casos previstos em lei especial, o valor
total das emissões de debêntures não poderá ultrapassar o capital
social da companhia.
959 Sobre a necessidade de avaliação dos bens dados em garantia das debêntures, ver os
comentários ao art. 58 da Lei das S.A.
960 A expressão "garantia progressiva" é utilizada por JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA.
Direito Societário. 11a edição, Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 293.
961 Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976.
962 Sobre o § 2° do art. 60 da Lei das S.A., a CVM, no Rarecer CVM/SJU n° 056/1981,
manifestou-se no sentido de que o significado dessa regra "é facultar à companhia prometer
dar em garantia real bens de seu ativo a serem adquiridos mediante investimento dos recursos
captados junto aos tomadores das debêntures. Esta a razão de ficarem os referidos recursos
sob o controle do agente fiduciário, que só os poderá liberar, sob pena de responsabilidade,
para a aquisição de bens (investimentos) aptos a serem, de imediato, dados em garantia real
da emissão, respeitando o limite de 80% dos bens gravados."
com garantia real preferem às debêntures com garantia flutuante. A
determinação da Lei das S.A. é a de, nesse caso, deduzir do ativo todas
as dívidas da companhia garantidas por direitos reais e não apenas as
debêntures com garantia real. O limite é calculado sobre o valor do
ativo após a colocação da emissão, na hipótese desta acrescer ao ativo.
Se a companhia emissora integrar grupo de sociedades - constituído
de acordo com o artigo 265 - e a garantia flutuante abranger os ativos
de 2 (duas) ou mais sociedades do grupo963, o limite da emissão deverá
considerar o conjunto de ativos que constitui a garantia.
A emissão de debêntures subordinadas, de acordo com o § 4 o , não
está sujeita a qualquer limite, porque os seus titulares, na hipótese de
liquidação da companhia, preferem apenas aos acionistas964. Neste caso,
poderá a companhia emitir debêntures (subordinadas) no limite que
julgar conveniente aos seus interesses, ressalvado o disposto no § 3 o .
Assim, caso a companhia emita (i) debêntures sem preferência,
prevalecerá o valor do capital social. O limite do capital social prevalece
para a totalidade das emissões, ou seja, se a companhia efetuar várias
emissões, o valor total delas não poderá ser superior ao valor do capital
social; (ii) debêntures com garantia real, o limite constituído pelo capital
social poderá ser ultrapassado até alcançar 80% (oitenta por cento) do
valor dos bens gravados, próprios ou de terceiros; (iii) debêntures com
garantia flutuante, a regra geral também poderá ser ultrapassada até atingir
70% (setenta por cento) do valor contábil do ativo da companhia, dimi-
nuído do montante das suas dívidas garantidas por direitos reais; (iv)
debêntures subordinadas, a emissão não estará sujeita a qualquer limite;
(v) debêntures com garantia flutuante e sem preferência, o somatório
das várias emissões terá como limite máximo o da garantia flutuante -
70% (setenta por cento) do valor contábil do ativo da companhia, dimi-
nuído do montante das suas dívidas garantidas por direitos reais. O limi-
963 Sobre esse assunto, ver os comenlários ao art. 58 da Lei das S.A.
964 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 58 da Lei das S.A.
te será o valor do capital social, se o valor contábil do ativo for inferior a
ele; (vi) debêntures com garantia flutuante e com garantia real, o limite
será estabelecido em função da garantia flutuante, pois a Lei das S.A.
determina que se subtraia do percentual de 70% (setenta por cento) do
valor do ativo contábil, as dívidas da companhia garantidas com direitos
reais965-966; e (vii) debêntures sem preferência e realize outra emissão de
debêntures com garantia, o valor da emissão destas últimas será a dife-
rença entre as debêntures sem preferência já emitidas e o limite das
debêntures com garantia real ou flutuante, conforme o caso.
Uma companhia que tenha emitido debêntures com garantia só
poderá, posteriormente, emitir debêntures sem preferência, se o limi-
te da espécie das debêntures garantidas (real ou flutuante) não tiver
sido ultrapassado, pois este deverá ser respeitado.
Assim, por exemplo, uma companhia com capital social de RS
80 milhões que tenha emitido debêntures no valor de R$ 200 mi-
lhões com garantia real de bem avaliado em RS 300 milhões, somen-
te poderia fazer uma emissão de debêntures sem preferência até o
valor de R$ 40 milhões, pois o total das emissões corresponderia a RS
240 milhões, que é equivalente a 80% (oitenta por cento) do valor do
bem dado em garantia.
965 O art. 58, § 2 o , da Lei das S.A. admite a constituição das garantias reais e flutuante
cumulativamente para a mesma emissão.
966 Sobre esse assunto, a CVM, no Parecer CVM/SJU n° 037/1983, entendeu que: "A garantia
flutuante alcança todos os bens do ativo da empresa, deixando, porém todos eles livres para
irem e virem, vale dizer, flutuar. Isto significa que os bens dados em privilégio geral (sinônimo
da garantia flutuante) podem ser alienados e, consequentemente, podem ser gravados com
ônus reais. (...) Na ordem de preferência, o credor garantido por ônus real precede o que
tem privilégio especial e geral. A cumulação das garantias não acarreta um acréscimo em
quantidade, por assim dizer, do patrimônio afetado à obrigação, mas altera a ordem de
preferência no concurso creditório, quando ele se instalar. Introduz, desta forma, uma
mudança de qualidade relevante para o credor, capaz de tornar mais atrativo, para ele, a
debênture. (...) A eficácia da cumulação, do ponto de vista econômico, torna-se evidente
quando se atenta para o fato de que, caso a garantia real seja insuficiente, perdura o privilégio
geral que alcança todos os demais bens. (...) Se cada série, ou cada emissão tiver garantias
diferentes, flutuante e real, por ex., o limite será estabelecido em função da garantia flutuante,
uma vez que a lei determina que se diminuam do percentual de 70% do valor do ativo
contábil, as dívidas da companhia garantidas com direitos reais. Nesta hipótese, o limite da
emissão total definida pelo valor do ativo contábil deve ser fixado levando em conta todas as
emissões já efetivadas, as quais devem ser computadas para se obter o valor global permitido."
Na hipótese de serem emitidas debêntures com garantia real so-
bre bens com valor inferior ao do total da emissão, prevalece a regra
geral de que o valor total das emissões de debêntures não poderá ul-
trapassar o capital social da companhia967.
Algumas leis especiais podem estabelecer que a emissão de de-
bêntures seja efetuada acima do valor do capital social ou determi-
nar restrições à emissão, como, por exemplo, a Lei n° 4.595/1964,
cujo artigo 35 veda a emissão de debêntures por parte das institui-
ções financeiras, salvo as que não recebem depósito do público e
desde que previamente autorizadas pelo Banco Central do Brasil,
em cada caso968.
Nos termos do § 3 o , a Comissão de Valores Mobiliários poderá
fixar outros limites para emissões de debêntures negociadas em Bolsa
de Valores ou no Balcão, ou a serem distribuídas no mercado. Essa
regra tem por fim proteger os investidores do mercado, pois o grau de
segurança dos credores varia conforme o tipo de atividade ou empre-
endimento da companhia emissora e da espécie dos bens que garan-
tem as debêntures. Portanto, o Emite geral de emissão fixado na Lei
das S.A., se inadequado em algumas hipóteses, pode ser substituído
mediante normas específicas expedidas pela Comissão de Valores Mo-
biliários. Os limites estabelecidos por essa Autarquia, não obstante o
disposto no § 4 o , podem alcançar as debêntures subordinadas, tendo
em vista que o § 3 o preyê a possibilidade de fixação de outros limites
para emissões de debêntures negociadas em Bolsa de Valores ou no
mercado de balcão.
Escritura de emissão
"Art. 61. A companhia fará constar da escritura de emissão os di-
reitos conferidos pelas debêntures, suas garantias e demais cláusu-
las ou condições.
969 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 59 da Lei das S.A.
além da interveniência do agente fiduciário na referida escritura de
emissão970.
Uma vez aprovada a emissão de debêntures, deverá ser providen-
ciada a escritura de emissão, que é o instrumento por meio do qual a
companhia estabelece os direitos conferidos pelas debêntures, suas
garantias e demais cláusulas e condições.
Deverão constar da escritura de emissão todas as condições que
tiverem sido deliberadas pela assembleia geral ou pelo conselho de
administração, conforme o caso, além de outras características das
debêntures, uma vez que os direitos e garantias dos debenturistas dela
decorrem. Os termos da escritura de emissão devem regular as rela-
ções jurídicas entre a companhia e a comunhão de debenturistas des-
de a emissão até o vencimento ou resgate dos títulos, ressalvado o
interesse da companhia emissora de modificar as condições previstas
na escritura ao longo desse período.
O órgão competente deverá, obrigatoriamente, fixar (i) o valor
da emissão ou os critérios de determinação do seu limite, e a sua
divisão em séries, se for o caso; (ii) o número e o valor nominal das
debêntures; (iii) as garantias reais ou flutuante, se houver; (iv) as
condições de correção monetária, se houver; (v) a conversibilidade
ou não em ações e as condições a serem observadas na conversão;
(vi) a época e as condições de vencimento, amortização ou resgate;
(vii) a época e as condições do pagamento dos juros, da participação
nos lucros e do prêmio de reembolso, se houver; (viii) o modo de
subscrição ou colocação e o tipo das debêntures.
Além dessas condições básicas, também deverão constar da es-
critura de emissão as regras sobre a nomeação e substituição do agen-
te fiduciário, seus deveres e atribuições, as regras sobre a convocação
e deliberação das assembleias de debenturistas, bem como todas as
971 A Lei das S.A. delermina no § 5o do art. 71 que a "escritura de emissão estabelecerá a maioria
necessária, que não será inferior à metade das debêntures em circulação, para aprovar
modificação nas condições das debêntures."
972 JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA. Das Debêntures. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p.
100, cita como exemplos de obrigações da companhia que também podem constar da
escritura de emissão, "a de não elevar o seu endividamento acima de determinado teto, a de
promover a venda de determinados ativos estranhos ao foco do negócio, a de submeter
certas despesas à prévia autorização do agente fiduciário, (...), restrições à venda de bens
integrantes do ativo permanente, foro de eleição, e, mediante a interveniência dos
controladores, regras sobre a manutenção do controle da sociedade, assim como limitações
á distribuição de dividendos, ressalvado naturalmente o dividendo obrigatório. (...) Uma
outra obrigação especial, que merece destacada preferência, é a condição 'pari pasu', muito
comum no direito francês, e que se destina a impedir, durante a vigência das debêntures, que
a outros débitos ou obrigações da emissora sejam conferidas garantias ou privilégios que nao
sejam também outorgados às debêntures da emissão ou série considerada."
são de debêntures destinadas à negociação em Bolsa ou no mercado
de balcão e recusar a admissão ao mercado da emissão que não satis-
faça a esses padrões, conforme estabelece o § 3°973-974. Com base nessa
regra, a Comissão de Valores Mobiliários criou as debêntures padro-
nizadas, estabelecendo padrões de cláusulas e condições que devem
ser adotados nas suas escrituras de emissão975-976.
De acordo com o modelo de escritura de emissão estabelecido
pela Comissão de Valores Mobiliários, as debêntures padronizadas
devem, obrigatoriamente, adotar a forma escriturai e ser da espécie
subordinada ou sem preferência. Elas são admitidas à negociação em
segmento especial da Bolsa de Valores ou entidade do mercado de
balcão organizado; são objeto de atividade permanente por parte dos
977 O art. da Instrução CVM n° 404/2004 estabelece que as debêntures padronizadas são
negociadas em segmento especial da Bolsa de Valores ou entidade de mercado de balcão
organizado, que: (í) ofereça, de modo transparente, mecanismos de formação de preço com
amplo acesso dos investidores; (ii) promova cotações em percentual do valor do principal
dos títulos; e (iii) esteja integrado a câmaras de liquidação e custódia autorizadas a
funcionar no Raís.
973 A Instrução CVM n° 404/2004, ao determinar, no art. 2°, inciso IV, que as debêntures
padronizadas devem ser objeto de "atividade permanente por parte dos formadores de
mercado" visa à incrementação do mercado secundário desses títulos, na medida em que
o objetivo primordial dos market makers é fomentar a liquidez de valores mobiliários
negociados publicamente, mediante a garantia de oferta de compra e venda de tais
ativos. A atuação obrigatória de formadores de mercado tem como finalidade propiciar a
existência permanente de um valor indicativo para a realização de negócios com as
debêntures padronizadas. A atividade de formador de mercado está regulada na Instru-
ção CVM n° 384/2003 e deve, nos termos do art. 2", ser exercida por pessoas jurídicas
cadastradas junto às Bolsas de Valores e às entidades de mercado de balcão organizado.
A sua atuação nos mercados de renda fixa administrados pela BM&FBovespa está disci-
plinada na Resolução n° 300/2004-CA.
979 Sobre a emissão pública e privada de debêntures e o registro da emissão na Comissão de
Valores Mobiliários, ver os comentários ao art. 59 da Lei das S.A.
§ 2 o O agente fiduciário e qualquer debenturista poderão promo-
ver os registros requeridos neste artigo e sanar as lacunas e irre-
gularidades porventura existentes nos registros promovidos pelos
administradores da companhia; neste caso, o oficial do registro
notificará a administração da companhia para que lhe forneça as
indicações e documentos necessários.
981 De acordo com o art 167, inciso I, itens 2, 4 e 11, da Lei n° 6.015/1973 - que dispõe sobre
os registros públicos - , serão registrados no Registro de Imóveis as (i) hipotecas legais,
judiciais e convencionais; (ii) o penhor de máquinas e de aparelhos utilizados na indústria
e em funcionamento, com os respectivos pertences ou sem eles; e (iii) a anlicrese.
982 MODESTO CARVALHOSA e NELSON EIZIRIK. A Nova Lei das S/A. São Raulo: Saraiva,
2002, p. 173.
983 Determina a Lei das S.A., no § 1 o , alínea " a " , do art. 68, que s ã o deveres d o agente fiduciário
"proteger os direitos e interesses dos debenturistas, empregando no exercício da função o
cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de
De acordo com o § 3 o , os aditamentos à escritura de emissão
devem ser averbados nos mesmos registros; ou seja, o aditamento
não pode ser feito por meio de registro autônomo, só à margem do
registro inicial da emissão. A substituição, em caráter permanente, do
agente fiduciário, por exemplo, será objeto de aditamento à escritura
de emissão, que deverá ser averbado na Junta Comercial na qual foi a
mesma registrada984.
O Registro Público de Empresas Mercantis deve manter livro
especial para inscrição das emissões de debêntures, no qual serão ano-
tadas as condições essenciais de cada emissão. O § 4 o teve a sua reda-
ção original modificada pela Lei n° 10.303/2001, apenas para
determinar que a obrigação de manter livro especial é, em decorrên-
cia da alteração do inciso II deste artigo, do Registro Público de Em-
presas Mercantis e não mais do Registro de Imóveis.
SEÇÃO SV
F O R M A , PROPRIEDADE, C I R C U L A Ç Ã O E Ô N U S
seus próprios bens." A CVM, por sua vez, por meio da Instrução CVM n° 28/1983 - que
dispõe sobre o exercício da função de agente fiduciário dos debenturistas com as
alterações introduzidas pelas Instruções CVM n" 123/1990 e 490/2011, determinou, no
art. 12, inciso VI, que são deveres do agente fiduciário "promover nos competentes órgãos,
caso a companhia não o faça, o registro da escritura de emissão e respectivos aditamentos,
sanando as lacunas e irregularidades porventura neles existentes; neste caso, o oficial do
registro notificará a administração da companhia para que esta lhe forneça as indicações e
documentos necessários".
984 Art. 5o da Instrução CVM n° 28/1983, com as alterações introduzidas pelas Instruções CVM
n" 123/1990 e 490/2011.
§ 2o A escritura de emissão pode estabelecer que as debêntures
sejam mantidas em contas de custódia, em nome de seus titula-
res, na instituição que designar, sem emissão de certificados, apli-
cando-se, no que couber, o disposto no artigo 41." (Incluído pela
Lei n° 10.303/2001)"
986 Ver decisão da 9a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro proferida
nas autos da Apelação Cível n° 2002.001.18426, Rei. Des. Laerson Mauro, j. em
17.12.2002, publicado no DORJ em 24.02.2003, disponível em: <www.tj.rj.gov.br>.
987 Ver os comentários aos arts. 23 e 31 da Lei das S.A.
cados, propriedade e circulação, constituição de direitos reais e outros
ônus sobre as ações988.
A Lei n° 10.303/2001 renumerou o antigo parágrafo único do
artigo 63 para o atual § I o . De acordo com o § I o , as debêntures
podem ser objeto de depósito com emissão de certificado989. Ocorre
que, com a extinção pela Lei n° 8.021/1990 dos títulos ao portador e
endossáveis, tornou-se dispensável a emissão de certificados que re-
presentem as debêntures nominativas registradas e impossível a re-
presentação por certificados das debêntures escriturais.
Os títulos escriturais têm sua existência apenas na forma de re-
gistros, em livros ou em meios magnéticos, mantidos por instituições
financeiras ou sistemas eletrônicos de negociação, e constituem uma
modalidade de títulos nominativos990. Os títulos nominativos regis-
trados, por sua vez, podem ser ou não corporificados em cártulas ou
certificados. Assim, os títulos cartulares são aqueles que se encon-
tram consubstanciados em documentos físicos. Os títulos escriturais
e os sistemas de negociação e registros de ativos financeiros são cada
vez mais utilizados na prática comercial, tendo em vista a rapidez
com que os negócios se desenvolvem e a segurança que os registros
eletrônicos oferecem aos contratantes.
A Lei das S.A., ao regular a forma escriturai, implantou um siste-
ma de registros e de custódia que, documentando os valores mobiliários
escriturais, substituiu as entregas materiais dos títulos por anotações
contábeis, caracterizando-os como valores fungíveis para garantir sua
negociação sem a manipulação física de papéis, mas com toda a segu-
rança da existência do bem assegurada nos assentamentos contábeis991.
988 Ver os comentários aos arts. 23, 31, 34, 35, 39 e 40 da Lei das S.A.
989 Sobre o certificado de debêntures, ver os comentários ao art. 64 da Lei das S.A.
990 Ver os comentários aos arts. 34 e 35 da Lei das S.A.
991 MIGUEL REALE e JUDITH MARTINS COSTA, "Da Prescrição Aquisitiva de Ações Escriturais",
Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 27,
janeiro-março, 2005, p. 18. Sobre esse assunto, LUIZ GASTÃO PAES DE 3ARROS LEÃES.
A desmaterialização dos títulos de créditos, substituídos pelos re-
gistros eletrônicos, constitui uma nítida tendência nos dias atuais, indi-
cando a necessidade de uma nova disciplina jurídica condizente com a
realidade tecnológica que ora se apresenta992. Impõe-se, em especial,
disciplinar a cobrança dos referidos títulos. Os títulos de crédito são tra-
dicionalmente instrumentos que, preenchidas as formalidades legais,
possibilitam a execução imediata do crédito neles corporificado, dispen-
sando o procedimento probatório que busque atestar a existência do
negócio jurídico que originou o crédito. De acordo com o Código de
Processo Civil, o credor deve instruir a ação executiva com o próprio
título de crédito993. A interpretação restritiva de tal dispositivo impediria,
a princípio, a cobrança judicial do título escriturai, que não se encontra
consubstanciado em um suporte físico, não estando materializado em
um certificado ou cártula. No entanto, a definição clássica dos títulos de
crédito não se coaduna com os modernos sistemas de negociação de
títulos, cada vez mais emitidos sob a forma escriturai. Da desmateriali-
zação dos títulos de crédito decorre a atribuição de importância relativa
ao requisito da cartularidade994-995. O Código Civil, ao disciplinar os tí-
Esfudos e Pareceres sobre Sociedades Anônimas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 58,
entende que "embora a noção de documento tenha sempre se baseado no papel como suporte
da materialidade do fato, é perfeitamente possível que se admita que esse fato se materialize em
outro suporte. A fita magnética, por exemplo, se constitui num material plenamente apto a
produzir um documento, tão válido e eficaz quanto oéo papel; nem poderia ser de outra forma,
o que importa, evidentemente, não é o tipo de material empregado na constituição de um
determinado documento, mas sim a sua aptidão para representar, com autenticidade, uma
declaração de vontade positiva ou negativa, um certo fato ou ainda um direito."
992 Nesse sentido, FÁBIO ULHOA COELHO. Curso de Direito Comercial, v. 1. São Paulo:
Saraiva, 2000, p. 378-379; e PAULO SALVADOR FRONTINI, "Títulos de Crédito e Títulos
Circulatórios: O Que a Informática lhes Reserva", Revista dos Tribunais. São Paulo: Ed.
Revista dos Tribunais, v. 730, agosto, 1996, p.. 50-67.
993 Art 614, inciso 1, do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n° 11.382/2006.
994 A Lei n° 9.492/1997 regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros
documentos de dívida. No parágrafo único do art. 8o permite o protesto das duplicatas
mercantis e de prestação de serviços por meio magnético ou de gravação eletrônica de
dados, respondendo o apresentante pelos dados fornecidos ao cartório de protestos e
devendo constar do instrumento de protesto as indicações feitas. O parágrafo único do art.
22 da Lei n° 9.492/1997, por sua vez, dispensa, no registro e no instrumento de protesto,
a transcrição literal do título ou documento de dívida, quando o tabelião de protesto
conservar em seus arquivos gravação eletrônica da imagem, cópia reprográfica ou micrográfica
do título ou documento de dívida.
995 NELSON EIZIRIK. Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 407-420.
tulos de crédito, prevê a possibilidade de sua emissão a partir de caracte-
res criados em computador ou meio técnico equivalente. Assim, as de-
bêntures escriturais têm natureza de título executivo996-997-998.
O § 2 o foi introduzido pela Lei n° 10.303/2001 a fim de permitir
que as debêntures sejam mantidas em conta de custódia, nos termos
do artigo 41 da Lei das S.A., o qual também foi objeto de alteração da
Lei n° 10.303/2001 ao instituir um novo sistema legal de custódia de
ações fungíveis999. De acordo com as alterações introduzidas por essa
lei na Lei das S.A., o custodiante passou a ser considerado proprietá-
SEÇÃO V
CERTIFICADOS
Requisitos
1 003 Ver os comentários aos arts. 23, 31, 34, 35, 39 e 40 da Lei das S.A.
para o exercício dos seus direitos1004-1005. A debênture escriturai, face à
sua própria natureza, não comporta a emissão de certificados1006.
Assim, após a extinção das debêntures ao portador e endossáveis,
o artigo 64 foi derrogado pelo desuso, pois os certificados passaram a
ser desnecessários1007. De qualquer forma, uma vez emitidos para as
debêntures nominativas registradas, deverão observar os requisitos cons-
tantes deste artigo. Note-se, no entanto, que o inciso IV determina que
deverá constar do certificado "a data e ofício do registro de imóveis em que
foi inscrita a emissão". Ocorre que a Lei n° 10.303/2001 alterou, no
inciso II do artigo 62, a competência para o registro da emissão de
debêntures, substituindo a competência do Registro de Imóveis pela
do Registro Público de Empresas Mercantis1008. Assim, face a essa al-
teração, passou a ser obrigatória a inscrição da escritura de emissão no
Registro Público de Empresas Mercantis1009. No Registro de Imóveis,
a partir da Lei n° 10.303/2001, serão averbadas apenas as escrituras de
emissão quando nelas forem constituídas garantias reais, observado o
disposto na Lei de Registro Público, ou delas constarem cláusula de
inalienabilidade ou de não oneração de bem imóvel1010.
1 004 Ver os comentários aos arts. 20, 31 e 35, § I o , da Lei das S.A.
1005 Sobre a inutilidade dos certificados de ação, ver os comentários aos arts. 11 e 34 da Lei das S.A.
1 006 Ver os comentários aos arts. 34 e 63 da Lei das S.A.
1 007 Sobre os certificados de debêntures, a 3a Turma do Superior Tribunal de Justiça no julga-
mento do Agravo Regimental n° 107.738-SP, Rei. Min. Eduardo Ribeiro, j. em 14.10.1997,
publicado no DJU em 09.12.1997, assim se manifestou: "Debêntures. Não expedidos os
certificados, o que cumpria fosse feito pela companhia, não há como pretender que, para
cobrança dos valores correspondentes às debêntures, sejam eles exibidos. Constando da
escritura de emissão a obrigação de pagar, com as especificações necessárias, e sendo
completada com os recibos e boletins de subscrição, permitindo a identificação dos credo-
res, não se pode negar a natureza de título executivo."
1 008 Consta da alínea "e" do inciso II do art. 32 da Lei n° 8.934/1994, que disciplina o Registro
Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins, que o registro compreende o arquiva-
mento "de atos ou documentos que, por determinação legal, sejam atribuídos ao Registro
Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins ou daqueles que possam interessar ao
empresário e às empresas mercantis".
1009 Ver os comentários ao art. 62 da Lei das S.A.
1010 De acordo com o art. 167, inciso I, itens 2, 4 e 11 da Lei n° 6.015/1973 - que dispõe sobre
os registros públicos serão registrados no Registro de Imóveis: (i) as hipotecas legais,
judiciais e convencionais; (ii) o penhor de máquinas e de aparelhos utilizados na indústria
e em funcionamento, com os respectivos pertences ou sem eles; e (iii) a anticrese.
ARTS. 6 5 E 6 6 - A LEI DAS S / A COMENTADA
SEÇÃO V I
A G E N T E F I D U C I Á R I O D O S DEBENTURISTAS
Requisitos e incompatibilidades
"Art. 66. O agente fiduciário será nomeado e deverá aceitar a
função na escritura de emissão das debêntures.
1011 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 64 da Lei das S.A.
órgão de administração da companhia e as instituições financeiras
que, especialmente autorizadas pelo Banco Central do Brasil, te-
nham por objeto a administração ou a custódia de bens de terceiros.
1012 PAUL L. DAVIES. Gower and Davies: Principies of Modern Company Law. 7a' edition,
London: Sweet and Maxwell, 2003, p. 810.
1013 De acordo com o § 1 ° do art. 61 da Lei das S.A., "a escritura de emissão, por instrumento
público ou particular, de debêntures distribuídas ou admitidas à negociação no mercado
terá obrigatoriamente a intervenção de agente fiduciário dos debenturistas (arts. 66 a
70)." Por serem consideradas ofertas públicas, é obrigatória a nomeação de agente
fiduciário nas emissões de debêntures não conversíveis distribuídas com esforços restri-
tos de que trata a Instrução CVM n° 476/2009, com as alterações introduzidas pelas
Instruções CVM n<* 482/2010, 488/2010 e 500/2011.
1014 Tal dever também está inserido no art. 12 da Instrução CVM n° 028/1983, que disciplina
o exercício da função de agente fiduciário dos debenturistas, com as alterações introduzidas
pela Instrução CVM n° 490/2011.
1015 Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976.
É ele o representante legal da vontade da comunhão perante tercei-
ros por manifestação de vontade da assembleia de debenturistas, ór-
gão coletivo de deliberação1016.
Na emissão pública de debêntures, o exercício individual dos direitos
de cada debenturista é, em princípio, mais difícil, tendo em vista os
diversos interesses de cada um; por isso o agente fiduciário assume
papel relevante. A obrigatoriedade de nomeação de agente fiduciário
dos debenturistas somente se configura na hipótese de emissão pública
de debêntures a serem distribuídas no mercado de valores mobiliários
(artigo 61, § lo)1017-1018. Assim, nas emissões particulares a indicação
do agente fiduciário é facultativa; uma vez indicado, a ele caberá a
proteção e defesa dos interesses dos debenturistas. Na ausência de
indicação do agente fiduciário, qualquer debenturista, individualmente,
tem legitimidade para agir em juízo diante do inadimplemento da
companhia emissora.
Deverão assinar a escritura de emissão, além da companhia emis-
sora, por meio de seus representantes e do terceiro garantidor, se hou-
ver, o agente fiduciário, para aceitar a nomeação e concordar com
suas cláusulas e condições, tendo em vista, inclusive, que as suas res-
ponsabilidades e remuneração encontram-se nela determinadas1019.
A proteção eficiente dos direitos e interesses dos debenturistas
requer fiscalização permanente por pessoa habilitada, com as respon-
sabilidades de administrador de bens de terceiro, independente da
companhia devedora e dos demais interessados na distribuição de
1024 Art. 8o da Instrução CVM n° 28/1983, com as alterações introduzidas pelas Instruções CVM
n"" 123/1990 e 490/2011.
1025 A CVM, por meio da Instrução CVM n° 28/1983, com as alterações introduzidas pela
Instrução CVM n° 490/2011, ao tratar das incompatibilidades e restrições, determinou no
art. 10 que: "Art. 10. Não pode ser agente fiduciário: I - pessoa natural ou instituição
financeira: a) que já exerça a função em outra emissão da mesma companhia; b) que exerça
cargo ou função, ou preste auditoria ou assessoria de qualquer natureza à companhia
emissora, sua coligada, controlada ou controladora, ou sociedade integrante do mesmo
grupo; c) que seja associada a outra que já exerça as funções de agente fiduciário• nas
condições previstas nas alíneas anteriores; d) que, de qualquer outro modo, se coloque em
A configuração de conflito de interesses no exercício da função de
agente fiduciário depende de uma análise caso a caso, com o objetivo
de verificar a existência de circunstância em que o interesse do agente
fiduciário se oponha ao interesse da comunhão dos debenturistas1026.
A Comissão de Valores Mobiliários estabeleceu uma relação
exemplificativa de hipóteses em que pode existir algum conflito de
interesses que impeça o exercício da função de agente fiduciário, a
saber1027: 1. pessoa natural ou instituição financeira que: (i) exerça
cargo ou função, ou preste auditoria ou assessoria de qualquer nature-
za a companhia emissora, sua coligada, controlada ou controladora,
ou sociedade integrante do mesmo grupo1028; (ii) seja associada a ou-
ligação, lenha ela caráter permanente ou eventual, que se apresenta como caracterizadora
de interdependência, inconciliável com a posição de 'independente da companhia emissora'
pretendida pelo legislador da Lei n° 6.404/76."
1029 Com relação à palavra "associada", obseiva a Nota Explicativa CVM n° 27/1983 que ela "refere-
se ao sócio, ao membro de uma sociedade, à pessoa que se agregou a uma sociedade. Portanto,
encontram-se aqui incluídas as pessoas que fazem parte, como membro, como sócio, de uma
mesma organização, da qual outro membro ou sócio já esteja exercendo a função de agente
fiduciário de debêntures emitidas por uma mesma companhia ou por companhia a ela coligada,
por ela controlada, que. a controle ou ainda, que integre o mesmo grupo societário, de fato ou
de direito. O objetivo dessa regra foi o de vedar o exercício das funções de agente fiduciário a
escritórios ou sociedades de profissionais em cada um dos sócios assume individualmente a
posição de agente fiduciário em mais de uma emissão de debêntures da mesma companhia ou de
companhia coligada, controlada, controladora ou integrante do mesmo grupo societário. Na
verdade é o escritório ou a sociedade de profissio-nais que está atuando como agente fiduciário,
apenas o nome do agente é que se modifica em cada emissão ou em cada série, obviando, desta
forma, a vedação expressa contida no an. 66, § 3o, 'a' da Lei 6.404/76."
1030 Art. 10 da Instrução CVM n° 28/1983, com as alterações introduzidas pela Instrução CVM
n° 490/2011.
ocorrendo algum fato que o impeça de continuar a exercer a sua fun-
ção, deverá ser convocada a assembleia de debenturistas para esco-
lher e nomear um novo agente fiduciário1031-1032.
Substituição, remuneração e fiscalização
"Art. 67. A escritura de emissão estabelecerá as condições de subs-
tituição e remuneração do agente fiduciário, observadas as nor-
mas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários.
1037 Art. 3 o da Instrução CVM n° 028/1983, com as alterações introduzidas pelas Instruções
CVM n™ 123/1990 e 490/2011.
1038 Sobre a assembleia de debenturistas, sua convocação, instalação e deliberação, ver os
comentários ao art. 71 da Lei das S.A.
1 039 Art. 2° da Instrução CVM n° 028/1983, com as alterações introduzidas pela Instrução CVM
n° 490/2011.
1 040 Art. 4° c/c art. 8o da Instrução CVM n° 028/1983.
1 041 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 62 da Lei das S.A.
do de continuar a exercer a função deverá comunicar imediatamente
o fato aos debenturistas e pedir sua substituição (artigo 66, § 4 o ). O
agente fiduciário não pode abandonar de imediato as suas funções,
devendo aguardar a nomeação de seu sucessor1042.
Determina a Comissão de Valores Mobiliários que (i) sob hipóte-
se alguma a função do agente fiduciário poderá ficar vaga por período
superior a 30 (trinta) dias e que dentro desse prazo deverá ser realizada
assembleia dos debenturistas para a escolha do novo agente fiduciário;
(ii) a assembleia de debenturistas pode ser convocada pelo próprio agente
fiduciário a ser substituído, pela companhia emissora, por debenturistas
que representem 10% (dez por cento), no mínimo, dos títulos em circu-
lação, ou pela própria Autarquia; e (iii) nos casos de vacância ela poderá
nomear substituto provisório1043. Essa última hipótese está expres-
samente prevista no parágrafo único, que determina, também, que a
Comissão de Valores Mobiliários fiscalizará o exercício da função
de agente fiduciário das emissões distribuídas no mercado, ou de de-
bêntures negociadas em Bolsa ou no mercado de balcão, podendo,
além de nomear substituto provisório, nos casos de vacância, sus-
pender o agente fiduciário de suas funções e nomear-lhe substituto,
se deixar de cumprir os seus deveres.
1 042 Sobre esse assunto, a CVM, no Rarecer PFE/CVM n° 005/2003, se manifestou no sentido de que:
"(...) o agente fiduciário que se tome irregular por motivo superveniente, continua a exercer seu
munus, até que outro venha a substituí-lo. Não deixa ele de ser o representante dos debenturistas,
nem de defender os seus interesses. (...) O próprio art. 71, § 1°, da Lei n" 6.404/76, concede ao
agente fiduciário a faculdade de convocar assembleia de debenturistas para a deliberação de sua
substituição, o que denota, mais uma vez, a permanência do mesmo em suas funções." Por outro
lado, consta da Nota Explicativa CVM n° 27/1983 que: "Com o intuito de bem delimitar o
período durante o qual se configura a responsabilidade de cada agente fiduciário, o art. 6° da
Instrução estabelece o termo inicial para o exercício de suas funções: a data da escritura de
emissão, ou, quando for o caso, a data em que se efetivou o aditamento à escritura, relativo à
subitituição do agente. A partir desse momento, até sua efetiva substituição, isto é, até que outro
agente fiduciário inicie o exercício de suas funções, será ele responsável pelos atos que praticar. Para
evitar interpretações tendentes a isentar de responsabilidade o agente fiduciário durante o interregno
que medeia entre as tratativas para a escolha de novo agente e a assunção das funções pelo agente
fiduciário escolhido, a Instrução impõe ao agente fiduciário o dever de permanecer no exercício de
suas funções até sua efetiva substituição." No mesmo sentido, MODESTO CARVALHOSA. Co-
mentários à Lei de Sociedades Anônimas..., v. 1, p. 802-803.
1 043 Art. 2°, §§ I o , 2o e 3o, da Instrução CVM n° 028/1983, com as alterações introduzidas pelas
Instrução CVM n° 490/2011.
Assim, no acompanhamento e fiscalização do exercício das fun-
ções do agente fiduciário, a Comissão de Valores Mobiliários poderá,
se ele deixar de cumprir com seus deveres, suspendê-lo, cautelarmente,
de suas funções e nomear substituto ou, até mesmo, destituí-lo, ocasião
em que também nomeará um substituto até que os debenturistas reu-
nidos em assembleia elejam um novo agente fiduciário1044-1045.
Deveres e atribuições
"Art. 68. O agente fiduciário representa, nos termos desta Lei e
da escritura de emissão, a comunhão dos debenturistas perante a
companhia emissora.
1044 Sobre os deveres e atribuições do agente fiduciário, ver os comentários aos arts. 68 e 69 da
Lei das S.A.
1045 Art. 18 da Instrução CVM n° 028/1983. Consta do art. 19, com a redação dada pela
instrução CVM n° 490/2011, que: "Considera-se infração grave, para efeito do disposto no
art 11, § 3", da Lei n" 6.385, de 1976, o descumprimento do disposto nos arts. 7"; 8°; 10;
12, incisos I a XVIII e XXI a XXV; e 13 desta Instrução". Consta, ainda, do art. 9o, inciso V,
da Lei n° 6.385/1976, com a redação dada pela Lei n° 10.303/2001, que a CVM poderá,
observado o disposto no § 2 o do art. 15, "apurar, mediante processo administrativo, atos
ilegais e práticas não equitativas de administradores, membros do conselho fiscal e acionistas
de companhias abertas, dos intermediários e dos demais participantes do mercado."
c) notificar os debenturistas, no prazo máximo de 60 (sessenta)
dias, de qualquer inadimplemento, pela companhia, de obriga-
ções assumidas na escritura da emissão. (Redação dada pela Lei
n° 10.303/2001)
1 046 Sobre a assembleia de debenturistas, ver os comentários ao art. 71 da Lei das S..
1047 Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976.
1 048 Ver os comentários ao art. 66 da Lei das S.A.
cio da função o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo
costuma empregar na administração de seus próprios bens; (iii) elabo-
rar relatório e colocá-lo anualmente ã disposição dos debenturistas; e
(iv) notificar os debenturistas, no caso de inadimplemento pela compa-
nhia, de obrigações assumidas na escritura da emissão. O elenco dos
deveres do agente fiduciário, previstos na Lei das S.A., não é taxativo; a
Comissão de Valores Mobiliários adicionou diversos deveres a essa re-
lação e outros ainda poderão ser atribuídos na escritura de
emissão1049-1050tp'ses")-1051íp'ses':i. Os deveres, atribuições e responsabilida-
des do agente fiduciário estabelecidos pela Lei das S.A. e pelas normas
regulamentares da Comissão de Valores Mobiliários são de ordem pú-
1 049 Determina a CVM, no art. 12 da Instrução CVM n° 28/1983, com as alterações introduzidas
pela instrução CVM n° 490/2011, que também são deveres do agente fiduciário: (i) renun-
ciar à função, na hipótese da superveniência de conflito de interesses ou de qualquer outra
modalidade de inaptidão; (ii) conservar em boa guarda toda a escrituração, correspondên-
cia e demais papéis relacionados com o exercício de suas funções; (iii) verificar, no
momento de aceitar a função, a veracidade das informações contidas na escritura de
emissão, diligenciando no sentido de que sejam sanadas as omissões, falhas ou defeitos de
que tenha conhecimento; (iv) promover nos competentes órgãos, caso a companhia não o
faça, o registro da escritura de emissão e respectivos aditamentos, sanando as lacunas e
irregularidades porventura neles existentes; (v) acompanhar a observância da periodicida-
de na prestação das informações obrigatórias, alertando os debenturistas acerca de eventu-
ais omissões ou inverdades constantes de tais informações; (vi) emitir parecer sobre a
suficiência das informações constantes das propostas de modificações nas condições das
debêntures; (vii) verificar a regularidade da constituição das garantias reais, flutuantes e
fidejussórias, bem como o valor dos bens dados em.garantia, observando a manutenção de
sua suficiência e exequibilidade; (viii) examinar a proposta de substituição de bens dados
em garantia, quando esta estiver autorizada pela escritura de emissão, manifestando a sua
expressa e justificada concordância; (ix) intimar a companhia a reforçar a garantia dada, na
hipótese de sua deterioração ou depreciação; (x) solicitar, quando julgar necessário para o
fiel desempenho de suas funções, certidões atualizadas dos distribuidores cíveis, das Varas
de Fazenda Pública, cartórios de protesto, Juntas de Conciliação e Julgamento, Procurado-
ria da Fazenda Pública, onde se localiza a sede do estabelecimento principal da compa-
nhia emissora e, também, da localidade onde se situe o imóvel hipotecado; (xi) solicitar,
quando considerar necessário, auditoria extraordinária na empresa; (xii) examinar, enquan-
to puder ser exercido o direito à conversão de debêntures em ações, a alteração do estatuto
da companhia emissora que objetive mudar o objeto da companhia, ou criar ações prefe-
renciais ou modificar as vantagens das existentes, em prejuízo das ações em que são
conversíveis as debêntures, cumprindo-lhe convocar assembleia especial dos debenturistas
para deliberar acerca da matéria ou aprovar a alteração proposta, nos termos do § 2" do art.
57 da Lei das S.A.; (xiii) convocar, quando necessário, a assembleia de debenturistas, por
meio de anúncio publicado, pelo menos por 3 (três) vezes, nos órgãos de imprensa onde
a companhia emissora deve efetuar suas publicações; (xiv) comparecer à assembleia dos
debenturistas a fim de prestar as informações que lhe forem solicitadas; (xv) publicar, nos
órgãos da imprensa onde a companhia emissora deva efetuar suas publicações, anúncio
comunicando aos debenturistas que o relatório se encontra à sua disposição; (xvi) manter
blica; por essa razão, o § 6 o não admite na escritura de emissão cláusu-
las que possam restringi-los. Na hipótese de constar da escritura algu-
ma cláusula nesse sentido, será reputada como não escrita1052.
Nos termos da alínea "a" do § I o , o agente fiduciário deve agir
como se fosse o titular de todas as debêntures, adotando a postura dili-
gente que todo homem ativo e probo empregaria na administração de
seus próprios bens. Aplicam-se ao agente fiduciário os princípios refe-
rentes ao dever de diligência do administrador da companhia1053.
O relatório anual elaborado pelo agente fiduciário tem por fim
informar aos debenturistas os fatos relevantes ocorridos com as debên-
tures durante o exercício e deverá ser colocado à sua disposição dentro
de 4 (quatro) meses contados do término do exercício social, ao menos,
nos seguintes locais: (i) na sede da companhia; (ii) no seu escritório ou,
quando instituição financeira, no local por ela indicado; (iii) na Comis-
são de Valores Mobiliários; (iv) nas Bolsas de Valores, quando for o
caso; e (v) na instituição que liderou a colocação das debêntures1054.
Constarão do relatório anual informações relativas (i) à execução
das obrigações assumidas pela companhia; (ii) aos bens garantidores
das debêntures; (iii) à constituição e aplicação do fundo de amortiza-
atualizada a relação dos debenturistas e seus endereços, mediante, inclusive, gestões junto
à companhia emissora; (xvii) coordenar o sorteio das debêntures a serem resgatadas ou
amortizadas, inutilizando os certificados correspondentes às debêntures resgatadas; e (xviii)
fiscalizar o cumprimento das cláusulas constantes da escritura de emissão, especialmente
daquelas impositivas de obrigações de fazer e de não fazer.
1 050 Ver os comentários ao art. 69 da Lei das S.A.
1051 Consta da Nota Explicativa CVM nD 27/1983 que a Instrução CVM n° 28/1983 adotou no
art. 12 "a política de arrolar os deveres básicos que considera indispensáveis ao fiel e eficaz
desempenho da função de agente fiduciário. Tais deveres agregam aqueles que se encon-
tram especificados na Lei n" 6.404/76 a outros que a vivência da matéria indica como
necessários a uma atuação positiva e eficiente. Esta listagem, porém, não pretende esgotar o
elenco de atribuições que o agente fiduciário pode vir a ser solicitado a executar, visando ao
atingimento de seu objetivo principal: a defesa dos direitos e dos interesses dos debenturistas."
1 052 A mesma regra consta do art. 16 da Instrução CVM n°28/1983, com as alterações introduzidas
pelas Instruções CVM n m 123/1990 e 490/2011.
1053 Ver os comentários ao art. 153 da Lei das S.A.
1054 Art. 12, incisos XVIII e XIX, da Instrução CVM n° 28/1983, com as alterações introduzidas
pela Instrução CVM n" 490/2011.
ção, se houver; e (iv) à declaração do agente sobre sua aptidão para
continuar no exercício da função, ou seja, de que não ocorreu nenhum
fato que tenha criado impedimento ou incompatibilidade para ele.
Na elaboração do relatório anual, o agente fiduciário deve revisar
criticamente as informações que receber da companhia, para atender
ao dever de diligência.
A Lei das S.A. prevê, no § 2 o , que a escritura de emissão deve
dispor sobre o modo de cumprimento do dever de elaborar o relatório
anual. A Comissão de Valores Mobiliários determinou que o relatório
deverá conter, além do disposto no parágrafo acima, no mínimo, as
seguintes informações: (i) eventual omissão ou inverdade, de que o
agente fiduciário tenha conhecimento, contida nas informações
divulgadas pela companhia ou, ainda, o inadimplemento ou atraso na
obrigatória prestação de informações pela companhia; (ii) alterações
estatutárias ocorridas no período; (iii) comentários sobre as
demonstrações financeiras da companhia, enfocando os indicadores
econômicos,financeirose de estrutura de capital da empresa; (iv) posição
da distribuição ou colocação das debêntures no mercado; (v) resgate,
amortização, conversão, repactuação e pagamento de juros das
debêntures realizados no período, bem como aquisições e vendas de
debêntures efetuadas pela companhia emissora; (vi) acompanhamento
da destinação dos recursos captados por meio da emissão de debêntures,
de acordo com os dados obtidos junto aos administradores da companhia
emissora; (vii) relação dos bens e valores entregues à sua administração;
(viii) cumprimento de outras obrigações assumidas pela companhia na
escritura de emissão; (ix) declaração acerca da suficiência e
exequibilidade das garantias das debêntures; e (x) existência de outras
emissões de debêntures, públicas ou privadas, feitas por sociedade
coligada, controlada, controladora ou integrante do mesmo grupo da
emissora em que tenha atuado como agente fiduciário no período, bem
como as seguintes informações sobre tais emissões: a) eventual omissão
ou inverdade, de que tenha conhecimento, contida nas informações
divulgadas pela companhia ou, ainda, o inadimplemento ou atraso na
obrigatória prestação de informações pela companhia; b) alterações
estatutárias ocorridas no período; c) comentários sobre as demonstrações
financeiras da companhia, enfocando os indicadores econômicos,
financeiros e de estrutura de capital da empresa; d) posição da distribuição
ou colocação das debêntures no mercado; e) resgate, amortização,
conversão, repactuação e pagamento de juros das debêntures realizados
no período, bem como aquisições e vendas de debêntures efetuadas pela
companhia emissora; f) constituição e aplicações do fundo de amortização
de debêntures, quando for o caso; g) acompanhamento da destinação
dos recursos captados por meio da emissão de debêntures, de acordo com
os dados obtidos junto aos administradores da companhia emissora; h)
relação dos bens e valores entregues à sua administração; i) cumprimento
de outras obrigações assumidas pela companhia na escritura de emissão;
j) declaração acerca da suficiência e exequibilidade das garantias das
debêntures; k) existência de outras emissões de debêntures, públicas ou
privadas, feitas por sociedade coligada, controlada, controladora ou
integrante do mesmo grupo da emissora em que tenha atuado como
agente fiduciário no período, bem como os seguintes dados sobre tais
emissões: 1. denominação da companhia ofertante; 2. valor da emissão;
3. quantidade de debêntures emitidas; 4. espécie; 5. prazo de vencimento
das debêntures; 6. tipo e valor dos bens dados em garantia e denominação
dos garantidores; 7. eventos de resgate, amortização, conversão,
repactuação e inadimplemento no período; e 1) declaração sobre sua
aptidão para continuar exercendo a função de agente fiduciário1055.
O agente fiduciário também é obrigado, nos termos da alínea "c"
do § I o , a notificar os debenturistas, no prazo máximo de 60 (sessen-
ta) dias, de qualquer inadimplemento, pela companhia, de obrigações
1055 Art. 12, inciso XVII, da Instrução CVM n° 28/1983, com as alterações introduzidas pela
Instrução CVM n° 490/2011. As informações sobre a existência de outras emissões de
debêntures, públicas ou privadas, feitas por sociedade coligada, controlada, controladora
ou integrante do mesmo grupo da emissora em que tenha atuado como agente fiduciário no
período, deverão ser, nos termos do inciso XXV do art. 12, divulgadas pelo agente fiduciário
em sua página na rede mundial de computadores tão logo delas tenha conhecimento.
assumidas na escritura de emissão. Algumas obrigações constantes
da escritura de emissão são do imediato conhecimento dos deben-
turistas, quando descumpridas pela companhia emissora, tal como o
não cumprimento do dever de pagar juros. No entanto, o conheci-
mento do inadimplemento de outras obrigações depende do exercí-
cio de fiscalização por parte do agente fiduciário.
A Lei n° 10.303/2001 alterou a redação original da alínea "c" do
§ I para diminuir de 90 (noventa) para 60 (sessenta) dias o prazo
o
1056 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 59 da Lei das S.A.
1057 MODESTO CARVALHOSA e NELSON EIZIRIK. A Nova Lei das S/A. São Raulo: Saraiva,
2002, p. 176-177.
conforme expressamente previsto no § 4o1058. O que se exige do agente
fiduciário é uma atuação diligente, pois sua inércia ou omissão acar-
retará a sua responsabilidade pelos prejuízos daí resultantes1059. A Co-
missão de Valores Mobiliários não tem competência para imiscuir-se
na escolha do meio a ser utilizado pelo agente fiduciário na cobrança
do crédito debenturístico1060.
O agente fiduciário é o próprio autor da ação quando visa à
proteção dos direitos e interesses da comunhão dos debenturistas.
Ou seja, atua, nesse caso, como substituto processual, sendo a sua
legitimação extraordinária e exclusiva1061-1062-1063. Como substituto
processual, o agente fiduciário não depende da deliberação dos de-
benturistas para decidir sobre as medidas judiciais que serão adota-
das na hipótese de inadimplemento da companhia emissora. Nesse
1058 Art. 12 da Instrução CVM n° 028/1983, com as alterações introduzidas pela Instrução
CVM n° 490/2011. De acordo com o art. 19, considera-se infração grave para o efeito do
disposto no art 11, § 3°, da Lei n° 6.385/1976, o descumprimento do disposto no art. 12,
incisos i a XVIII e XXI a XXV.
1059 Nota Explicativa CVM n° 27/1983.
1060 Sobre esse assunto, assim se manifestou a CVM no fórecer CVM/PJU n° 015/2002: "A CVM
não possui competência para determinar ao agente fiduciário a escolha do melhor meio de
cobrança do crédito debenturístico, podendo, entretanto, aplicar-lhe sanção administrativa,
caso verifique que tal escolha representa maior ônus aos seus representados, por constituir
violação do seu dever de diligência."
1061 A CVM já se manifestou, nesse sentido, no ftirecer PFE/CVM n° 005/2003.
1062 Consta do art. 6o do Código de Processo Civil que: "Ninguém poderá pleitear, em nome
próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei." De acordo com CÂNDIDO RANGEL
DINAMARCO. Instituições de Direito Processual Civil. v. II, 5a edição, São fòulo: Malheiros,
2005, p. 310-311, "substituto processual é a pessoa que recebe da lei legitimidade para aluar
em juízo no interesse alheio, como parte principal, não figurando na relação jurídico-material
controvertida. Atuar como parte é fazê-lo em nome próprio, ou seja, não como representante.
O representante não é parte no processo, mas o substituo processual o é (...). /I locução
substituição processual, muito usual em doutrina, não indica a sucessão de partes nem traz em
si qualquer idéia de um movimento consistente em pessoa que sai e pessoa que entra na
relação processual (...): substituto processual é o legitimado extraordinário.(...) Diz-se extraor-
dinária essa legitimidade, em oposição à legitimidade ordinária, porque ela é outorgada em
caráter excepcional e não comporta ampliações."
1063 Em sentido contrário, JOSÉ WALDECY LUCENA. Das Sociedades Anônimas - Comentários
à Lei (arts. 1 o a 120). v. I, Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 712-713, ao entender que o
agente fiduciário é representante ex lege da comunhão de debenturistas, não podendo ser
considerado substituto processual e nem tem legitimação extraordinária. No mesmo senti-
do, MARIO ENCLER PINTO JÚNIOR, "Debêntures. Direitos de Debenturistas. Comunhão
e Assembleia. Agente Fiduciário", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e
Financeiro. São Raulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 48, outubro-dezembro, 1982, p. 27.
caso, o agente fiduciário poderá declarar o vencimento antecipado
das debêntures e promover a execução do principal e dos juros a que
fazem jus. O procedimento de cobrança das debêntures inclui a ex-
cussão das garantias, se houver. Na ausência de outros meios para a
realização do crédito debenturístico, o agente fiduciário poderá re-
querer a falência da companhia emissora1064.
O debenturista não tem individualmente legitimidade para ajuizar
ação contra a companhia emissora na hipótese de descumprimento
das obrigações por ela assumidas na escritura de emissão, a qual é ex-
clusiva do agente fiduciário, exceto na emissão privada de debêntures
em que não for nomeado agente fiduciário1065-1066-1067; nesse caso, qual-
1064 O art. 97 da Lei ri" 11.101/2005 - Lei dé Recuperação e Falência de Empresas - determina,
no inciso IV, que qualquer credor, pessoa física ou jurídica, pode requerer a falência do
devedor.
1065 Nesse sentido, já se manifestou a I a Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado do Rio
Grande do Sul, no julgamento do Agravo de Instrumento n° 186.055.737, Rei. Des. Luiz Felipe
Azevedo Gomes, j. em 30.09.1986: "Agente Fiduciário. Legitimação Ativa. Responsabilidade
Perante os Debenturistas. No sistema da Lei n. 6.404 de 1976, o agente fiduciário representa em
juízo a comunhão dos debenturistas, sendo o único legitimado a promover a execução das
garantias reais dadas pela companhia inadimplente. Permanecendo inerte, responde perante os
debenturistas pelos prejuízos decorrentes de sua omissão." No mesmo sentido é a decisão desse
mesmo tribunal no julgamento da Apelação Cível n° 186.065.652, Rei. Des. João Andrades
Carvalho, j. em 20.01.1988. Em sentido contrário é a decisão da 6a Câmera Cível do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro no julgamento da Apelação Cível n° 1998.001.13796, Rei.
Des. Walter felippe DAgostino, j. em 05.08.1999, publicada no DORJ em 18.08.1999.
1 066 Sobre esse assunto, JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA. Das Debêntures. Rio de Janeiro:
Renovar, 2005, p. 160-161, observa que: "A doutrina e a jurisprudência não são uniformes
quanto ã exclusividade da legitimação. Entretanto, pode-se afirmar que esta decorre da
natureza do direito e da instrumentalidade da substituição. O direito, por ser coletivo,
compete à comunhão, que não pode ser representada por um debenturista isolado, tanto
que lhe falta a necessária legitimação. Além disso, a lógica do sistema, cujo objetivo é evitar
a dispersão de providências e a precipitação de determinadas ações, milita em favor da
exclusividade. O agente fiduciário detém a exclusividade da legitimação porque somente ele
recebeu da lei a faculdade de agir no interesse da coletividade." MARIO ENGLER PINTO
JÚNIOR, "Debêntures. Direitos de Debenturistas. Comunhão e Assembleia. Agente
Fiduciário", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro..., v. 48, p. 30,
entende que a possibilidade de ações individuais por parte de cada debenturista "fica restrita
aos casos de lesão de caráter particular, verbi gratia, quando, a sociedade se recusa ao
pagamento do crédito de determinado obrigacionista, não o fazendo em relação aos demais."
1067 No mesmo sentido, MODESTO CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anôni-
mas. v. 1, 5a edição, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 820-821; FÁBIO ULHOA COELHO.
Curso de Direito Comercial, v. 2, 13a edição, São Riulo: Saraiva, 2009, p. 156. Em sentido
contrário, SÉRGIO CAMP1NHO, "Notas Breves sobre o Agente Fiduciário dos Debenturistas
e a sua Legitimação Processual", Revista Semestral de Direito Empresarial. Rio de Janeiro:
Renovar, v. 2, janeiro-junho, 2008, p. 64; PAULO CEZAR ARAGÃO, "Aspectos Processuais
quer debenturista poderá ingressar em juízo. No entanto, face ao prin-
cípio da unicidade do mútuo debenturístico, se executar a companhia
emissora, terá que cobrar toda a dívida debenturístáca; ou seja, a ação
compreenderá não apenas o seu crédito, mas o de todas as debêntures
da mesma emissão ou série, sem qualquer privilégio ou preferência para
o debenturista autor da ação1068.
Assim, o debenturista só pode agir individualmente contra a com-
panhia (i) nas emissões privadas em que não seja nomeado agente
fiduciário; (ii) quando ela lhe causar um prejuízo particular, não rela-
cionado à comunhão de debenturistas1069; ou (iii) na hipótese previs-
ta na alínea "d" do § 3 o , ou seja, quando a assembleia de debenturistas
deliberar retirar do agente fiduciário a representação da comunhão
em processos de falência, recuperação judicial, intervenção ou liqui-
dação extrajudicial da companhia emissora1070.
Consta do § 3 o que é especialmente facultado ao agente fiduciário
no caso de inadimplemento da companhia: (i) declarar, observadas as
condições da escritura de emissão, antecipadamente vencidas as
debêntures e cobrar o seu principal e acessórios1071; (ii) executar garantias
reais, receber o produto da cobrança e aplicá-lo no pagamento, integral
ou proporcional, dos debenturistas; (iii) requerer a falência da companhia
da Legislação Socielária", Revista dos Tribunais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v.
641, março, 1989, p. 68; PAULO FERNANDO CAMPOS SALLES DE TOLEDO, "Recupe-
ração Judicial - Sociedades Anônimas - Assembleia Geral de Credores - Liberdade de
Associação - Boa Fé Objetiva - Abuso de Direito - Cram Down - Par Condido
Creditorum", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São
Paulo: Ed. Malheiros, v. 142, abril-junho, 2006, p. 268.
1 068 Nesse sentido, MODESTO CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas....
v. 1, p. 821-822; JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA. Das Debêntures..., p. 163-164.
1 069 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 71 da Lei das S.A.
1070 Sobre esse assunto, JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA. Das Debêntures..., p. 157, observa
que: "O legislador inibiu a ação individual nas matérias de interesse da coletividade, a fim de
melhor tutelar esses interesses. A precipitação de um debenturista, ao requerer a falência da
emissora, ou ao promover a inoportuna execução das garantias poderia trazer grandes prejuízos
para a comunhão, na medida em que, eventualmente, comprometeria, de forma irremediável,
a capacidade de pagamento da emissora e a conseqüente realização dos créditos."
1071 Ver a decisão do Colegiado da CVM proferida no Processo Administrativo Sancionador
CVM n° RJ 2003/5137, Rei. Dír. Sérgio Weguelim, j. em 29.03.2006.
emissora, se não existirem garantias reais; (iv) tomar qualquer providência
necessária para que os debenturistas realizem os seus créditos; (v)
representar os debenturistas em processos de falência, recuperação judicial,
intervenção ou liquidação extrajudicial da companhia emissora, salvo
deliberação em contrário da assembleia dos debenturistas. As atribuições
do agentefiduciárioconstantes da Lei das S.A. são exemplificativas, pois,
conforme o disposto na alínea "e" do § 3 o , ele deve "tomar qualquer
providência necessária para que os debenturistas realizem os seus créditos
De acordo com a Comissão de Valores Mobiliários, o agente fidu-
ciário (i) somente se eximirá da responsabilidade pela não adoção das
medidas previstas nas alíneas "(i)" a "(iv)" acima se, convocada a assem-
bleia dos debenturistas, ele assim for autorizado por deliberação toma-
da pela unanimidade dos titulares de debêntures em circulação, pois o
crédito de cada debenturista tem caráter pessoal e autônomo; assim, a
decisão de não executá-lo somente pode ser tomada pelo próprio cre-
dor; e (ii) poderá deixar de representar os debenturistas em processos de
falência, recuperação judicial, intervenção ou liquidação extrajudicial
da companhia emissora na hipótese de deliberação tomada nesse sen-
tido pela maioria dos titulares de debêntures em circulação1072. Nesse
caso, cada credor representará os seus próprios interesses perante a fa-
lida ou a empresa sob recuperação, intervenção ou liquidação.
As despesas da emissão de debêntures, inclusive as relativas à
remuneração do agente fiduciário e as necessárias à proteção dos di-
reitos e interesses dos debenturistas são suportadas pela compa-
nhia1073-1074. O agente fiduciário não é obrigado a arcar com os seus
Outras funções
'Art. 69. A escritura de emissão poderá ainda atribuir ao agente fidu-
ciário as funções de autenticar os certificados de debêntures, admi-
nistrar o fundo de amortização, manter em custódia bens dados em
garantia e efetuar os pagamentos de juros, amortização e resgate."
1 081 Sobre as garantias das debêntures, ver os comentários a o art. 5 8 da Lei das S.A.
1082 Art. 15 da Instrução CVM n° 2 8 / 1 9 8 3 , c o m as alterações introduzidas pelas Instruções
CVM n'* 123/1990 e 4 9 0 / 2 0 1 1 , e Nota Explicativa CVM n° 27/1983.
logicamente, de bens dados em garantia real, uma vez que a garantia
flutuante compreende o ativo da companhia emissora que inclui
bens que podem ser por ela negociados a qualquer momento1083.
Assim, desde que previsto na escritura, ou aprovado pela companhia
emissora e pela comunhão de debenturistas, os bens dados em
garantia poderão ser substituídos. No entanto, a previsão da
substituição não gera para a companhia e para os debenturistas
nenhum direito ou obrigação. Trata-se apenas de uma possibilidade
prevista na escritura de emissão.
A substituição, contudo, depende da concordância do agente fi-
duciário, que deverá (i) verificar se o bem dado em substituição possui
o mesmo valor e liquidez do bem substituído; e (ii) apresentar uma
justificativa econômica e jurídica para aceitar a substituição, ou para
recusá-la1084. Não é necessário que ós bens possuam a mesma nature-
za1085. O agente fiduciário deverá, ainda, praticar os atos necessários à
constituição da garantia sobre o novo bem e à liberação do gravame
incidente sobre o bem substituído1086.
Uma vez aceita a substituição, será assinado o termo aditivo à
escritura de emissão, que deverá ser, a fim de tornar regular o instru-
mento e conferir publicidade ao ato, averbado no Registro Público
de Empresas Mercantis — que é exercido no âmbito estadual pelas
ASSEMBLEIA DE DEBENTURISTAS
(art. 71). Ou seja, a norma em testilha confere somente dois caminhos: ou a sociedade
devedora envolvida na reorganização promete, no protocolo (art. 224), resgatar os
debenturistas que assim o desejarem, no prazo legal consignado, ou se submete à exigência
dos debenturistas de resgate total dessas debêntures, anteriormente à consumação do
negócio reorganizativo. Notamos, portanto, que o fim da lei é assegurar a preservação da
proteção do patrimônio da sociedade, que é justamente a garantia da dívida. Ou seja, trata-
se de uma garantia mínima que a lei concede aos debenturistas, justamente para preservar o
instituto (debênture), visualizando, à ciência certa, a segurança jurídica. E, por exprimir um
princípio cuja manutenção é necessária à ordem social, qual seja a proteção da poupança
popular, a mencionac/a norma é de ordem pública e, por conseguinte, imperativa e cogente."
1094 Sobre a aplicação à assembleia de debenturistas das disposições da Lei das S.A. referentes à
assembleia geral de acionistas, a I a Câmara Cível d o Tribunal de Alçada do Estado do Rio
Grande do Sul, no julgamento do Agravo de Instrumento n° 186.055.737, Rei. Des. Luiz Felipe
Na hipótese de emissão de debêntures com mais de 1 (uma) sé-
rie, em que o assunto a ser deliberado não for comum a toda emissão,
a assembleia de debenturistas deverá ser realizada por série, ou seja,
não será uma única assembleia de todos os debenturistas da mesma
emissão. No caso de envolver matérias de interesse comum da emis-
são e questões particulares de algumas séries, poderá ser realizada uma
única assembleia de debenturistas e as deliberações ocorrerão em se-
parado, sendo a ata dividida em seções, devendo constar de cada uma
delas o respectivo quorum de instalação e deliberação1095.
Conforme consta do § I o , a assembleia de debenturistas pode ser
convocada pelo agente fiduciário, pela companhia emissora, por de-
benturistas que representem 10% (dez por cento), no mínimo, dos títu-
los em circulação, e pela Comissão de Valores Mobiliários. A convocação,
salvo disposição em contrário da escritura de emissão, far-se-á median-
te anúncio publicado por 3 (três) vezes, no mínimo, contendo, além do
local, data e hora da assembleia, a ordem do dia (artigo 124, caput). Na
companhia fechada, a primeira convocação deverá ser feita com 8 (oito)
dias de antecedência, no mínimo, contado o prazo da publicação do
primeiro anúncio; não se realizando a assembleia, será publicado novo
anúncio, de segunda convocação, com antecedência mínima de 5 (cin-
co) dias. Na companhia aberta, o prazo de antecedência da primeira
convocação será de 15 (quinze) dias e o da segunda convocação de 8
(oito) dias (artigo 124, § I o ). Os anúncios indicarão, com clareza, o
lugar da reunião, que não poderá ser realizada fora da localidade da sede
da companhia emissora (artigo 124, § 2 o ).
De acordo com o § 3 o , a assembleia se instalará, em primeira
convocação, com a presença de debenturistas que representem meta-
1105 Determina o art. 187 do Código Civil que: "Também comete ato ilícito o titular de um direito
que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou
social, pela boa-fé ou pelos bons costumes."
1106 MARIO ENGLER P I N T O J Ú N I O R , " D e b ê n t u r e s . Direitos d e Debenturistas. C o m u n h ã o e
Assembleia. Agente Fiduciário", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Finan-
c e i r o . S ã o Paulo: Ed. Revista d o s Tribunais, v. 4 8 , o u t u b r o - d e z e m b r o , 1 9 8 2 , p. 3 2 - 3 3 ,
observa que: "O debenturista não está obrigado a votar conforme o interesse social. Entretan-
to, tem dever de fidelidade aos interesses da comunhão a que pertence, podendo ser respon-
sabilizado pelo abuso no exercício do direito de voto, com fundamento em princípio jurídico
consagrado no direito comum. A aplicação subsidiária dos dispositivos que regem a assembleia
geral dos acionistas (art. 71, § 2") também corrobora este entendimento, diante da previsão
contida no art 115 da Lei acionária. (...) A situação conflituosa, capaz de gerar obstáculo ao
exercício do voto por parte do debenturista, não deve ter como parâmetro o interesse social,
mas o interesse da própria categoria. Este é o verdadeiro bem jurídico a ser tutelado."
1107 S o b r e e s s e assunto, ver MARIO ENGLER PINTO J Ú N I O R , " D e b ê n t u r e s . Direitos d e
Debenturistas. C o m u n h ã o e Assembleia. Agente Fiduciário", Revista de Direito Mercantil,
Industrial, E c o n ô m i c o e Financeiro..., v. 4 8 , p. 33-35; JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA.
D a s Debêntures..., p. 145-148; PAULO FERNANDO CAMPOS SALLES DE TOLEDO, "Recu-
peração Judicial - S o c i e d a d e s A n ô n i m a s - A s s e m b l e i a Geral d e Credores - Liberdade de
Associação - Boa Fé Objetiva - Abuso de Direito - Cram Down - Par Condido Creditorum",
Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Malheiros,
V. 1 4 2 , abril-junho, 2 0 0 6 , p. 2 6 7 - 2 6 9 ; A R N O L D O WALD, " O Regime Jurídico da Comu-
nhão de Debenturistas e as C o n d i ç õ e s d e Validade e Oponibilidade das Deliberações
Assembleares", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São
Raulo: Ed. Revista d o s Tribunais, v. 9 4 , abril-junho, 1 9 9 4 , p. 6-9. Esse último autor fez,
inclusive, uma c o m p a r a ç ã o entre os direitos essenciais dos acionistas e dos debenturistas.
acentuada ao interesse individual de cada credor, somente podendo
ser modificada com o consentimento unânime dos debenturistas1108.
A fim de identificar os limites ao poder da assembleia de deben-
turistas de alterar, por deliberação majoritária, as condições de emis-
são das debêntures previstas na escritura, deve-se distinguir as
condições substanciais das condições acessórias. As condições subs-
tanciais, por pertencerem à órbita dos direitos individuais dos titula-
res das debêntures, são modificáveis apenas mediante a manifestação
unânime dos debenturistas. Já as condições acessórias, que se relacio-
nam com os interesses da comunhão de debenturistas, podem ser
alteradas com a aprovação do quorum mínimo previsto no § 5o1109.
As condições substanciais são aquelas relacionadas à própria es-
sência do direito de crédito conferido pelas debêntures, representada
pelo seu conteúdo patrimonial básico, como é o seu valor, ao passo
que as condições acessórias dizem respeito aos elementos que com-
plementam este direito de crédito, como é o caso das cláusulas que
definem prazos, garantias e formas de exercício do direito1110-1111(p seg).
C É D U L A DE D E B Ê N T U R E S
1118 Sobre esse assunto, ver os comentários a o art. 5 9 da Lei das S.A.
ordem, o local e a data da emissão; (iii) a denominação Cédula de
Debêntures; (iv) o valor nominal e a data do vencimento; (v) os juros,
que poderão ser fixos ou variáveis, e as épocas do seu pagamento; (vi)
o lugar do pagamento do principal e dos juros; (vii) a identificação
das debêntures-lastro, do seu valor e da garantia constituída; (viii) o
nome do agente fiduciário dos debenturistas; (ix) a cláusula de correção
monetária, se houver; e (x) o nome do titular.
SEÇÃO J X
E M I S S Ã O DE D E B Ê N T U R E S N O ESTRANGEIRO
1119 Consta do art. 9 o da Lei de Introdução às Normas d o Direito Brasileiro que: "Art. 9°. Para
qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. § I Destinando-
se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta obsenmda,
admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato. § 2o. A
obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente."
1120 Art. I o do Decreto-Lei n° 8 5 7 / 1 9 6 9 que consolidou a legislação sobre moeda d e pagamen-
to de obrigações exeqüíveis no Brasil. Também tratam desse assunto a s Leis n'": (i) 7.801/
1 9 8 9 (expediu normas de ajustamento d o Programa de Estabilização Econômica, d e que
não se aplica, por expressa disposição legal, aos empréstimos e quais-
quer outras obrigações cujo credor ou devedor seja pessoa residente e
domiciliada no exterior1121-1122. Dessa forma, uma emissão de debên-
tures no Brasil destinada à colocação no exterior poderá ter seu valor
nominal expresso em moeda estrangeira1123-1124.
No mercado norte-americano, em geral, a colocação de debên-
tures é feita por meio dos American Depositary Receipts - ADRs, que
são certificados de valores mobiliários, emitidos por instituições fi-
nanceiras americanas, com lastro em papéis de companhias estran-
geiras1125. A vantagem da emissão dos ADRs é que a instituição
financeira que faz a intermediação da operação - o underwriter -
figura como o titular das debêntures cujos ADRs são adquiridos pe-
los investidores. Assim, é o underwriter quem representa esses inves-
1126 Sobre esse assunto, ver JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA. Das Debêntures..., p. 187.
1127 Dispõe o art. 1.492 do Código Civil: "As hipotecas serão registradas no cartório do lugar do
imóvel, ou no de cada um deles, se o título se referir a mais de um. Parágrafo único. Compete
aos interessados, exibindo o título, requerer o registro da hipoteca."
1128 Sobre esse assunto, ver os comentários a o art. 5 8 da Lei das S.A.
1129 D e acordo c o m o art. 167, inciso I, itens 2, 4 e 11, da Lei n° 6 . 0 1 5 / 1 9 7 3 - q u e dispõe sobre
o s registros públicos - , serão registrados no Registro de Imóveis: (i) a s hipotecas legais,
judiciais e convencionais; (ii) o penhor de máquinas e d e aparelhos utilizados na indústria
e em funcionamento, com os respectivos pertences ou sem e l e s ; , e (iii) a anticrese.
exterior, é necessário o registro na Junta Comercial do documento
equivalente à escritura de emissão, observado o disposto no § 3°.
De acordo com a regra do caput, além do registro das garantias, é
indispensável a prévia aprovação do Banco Central do Brasil para
que as companhias brasileiras possam emitir debêntures no exterior,
com garantia real ou flutuante de bens situados no País; o que não se
aplica quando as debêntures são emitidas no Brasil para colocação no
exterior, caso em que bastará o simples registro da emissão no Banco
Central do Brasil.
O registro da emissão de debêntures no Banco Central do Brasil
justifica-se, inclusive, em função da regra constante do § 2 o , pois é
condição para que seja possível o pagamento e remessa em moeda
estrangeira, por companhia brasileira ou estrangeira autorizada a fun-
cionar no País, do valor das debêntures emitidas no exterior, dos juros
e eventuais amortizações a elas correspondentes.
Este artigo visa também a proteger o credor da companhia es-
trangeira por obrigações contraídas no País1130, evitando que os bens
dessa companhia sirvam de garantia dos credores externos em prejuízo
dos credores nacionais, ressalvada a hipótese de os recursos captados
no exterior serem aplicados em suas atividades no Brasil. Assim, os
credores por obrigações contraídas no Brasil têm preferência sobre os
créditos de debêntures emitidas no exterior por companhia estran-
geira autorizada a funcionar no País; porém, nos termos do § I o , essa
regra não se aplica na hipótese de prévia autorização pelo Banco Cen-
tral do Brasil e de o produto da emissão ser aplicado em estabeleci-
mento situado em território nacional.
Estabelece o § 3° que a emissão de debêntures no exterior por
companhia brasileira deverá observar o requisito de arquivamento na
Junta Comercial dos seguintes documentos: (i) ata da assembleia ge-
ral ou do conselho de administração que deliberou sobre a emissão e
sua respectiva publicação (artigo 62, inciso I); (ii) escritura de emissão
ou documento equivalente lavrado no exterior, observadas as exigên-
cias da legislação local (artigo 62, inciso II); e (iii) todos os que forem
exigidos pelas leis do lugar da emissão1131. Esses documentos deverão
ser autenticados de acordo com as exigências do país de origem, lega-
lizados pelo consulado brasileiro no exterior e traduzidos por tradutor
público juramentado. Aplica-se também essa regra para a hipótese de
a emissão ser efetuada no exterior por companhia estrangeira autori-
zada a funcionar no País.
De acordo com o § 4 o , as debêntures emitidas no exterior, por
empresa brasileira ou estrangeira, dependem de prévia autorização da
Comissão de Valores Mobiliários para serem negociadas no País. Essa
Autarquia analisará a legalidade da emissão e as suas condições para
permitir o registro da distribuição. A emissão e colocação de debên-
tures no exterior não dependem de nenhuma manifestação da Co-
missão de Valores Mobiliários.
SEÇÃO X
EXTINÇÃO
BÔNUS DE SUBSCRIÇÃO
Características
"Art. 75. A companhia poderá emitir, dentro do limite de aumen-
to de capital autorizado no estatuto (artigo 168), títulos negociá-
veis denominados 'Bônus de Subscrição'.
1136 No mesmo sentido, M A U R O BRANDÃO LOPES. S.A.: Títulos e Contratos Novos..., p. 85;
MARIA LÚCIA DE ARAÚJO CINTRA. A s p e c t o s l u r í d i c o s d o B ô n u s d e S u b s c r i ç ã o . S ã o
Paulo: Universidade d e São fculo, 1980, p. 102.
Assim se manifestou, também, a CVM no Parecer CVM/SJU n° 0 2 7 / 1 9 8 6 . Nesse parecer, a
CVM a o tratar d a s sobras d e b ô n u s de s u b s c r i ç ã o não adquiridos, concluiu q u e "extin-
guem-se automaticamente quando do efetivo aumento de capital a que se referirem."
O preço do bônus não foi regulado pela Lei das S.A., podendo,
portanto, ser fixado de acordo com projeções e estudos financeiros
elaborados pela companhia. A Lei das S.A. apenas determina que
será classificada como reserva de capital a conta que registrar o pro-
duto da alienação de bônus de subscrição (artigo 182, § I o ).
O preço pelo qual as ações poderão ser subscritas ou os critérios
para a sua determinação deverão ser fixados no momento em que a
assembleia geral, ou o conselho de administração, deliberar sobre a
emissão dos bônus, sem diluição injustificada da participação dos an-
tigos acionistas, observado o disposto no § I o do artigo 170: perspec-
tiva de rentabilidade da companhia; patrimônio líquido da ação; e/ou
cotação das ações em Bolsa de Valores ou mercado de balcão organi-
zado. Em geral, o preço é fixado em valor superior à cotação das ações
da companhia no mercado no momento da emissão dos bônus, tendo
em vista o seu prazo de vigência e as suas condições. É recomendável,
a fim de evitar divergências entre a companhia e os titulares dos bô-
nus, que o preço de emissão seja claramente fixado e não apenas os
critérios para a sua determinação quando da subscrição de ações.
Para a companhia emissora, os bônus de subscrição podem ser-
vir para a captação de recursos junto a terceiros ou para estimular a
colocação de outros valores mobiliários de sua emissão1138. São emiti-
dos para alienação onerosa ou para serem atribuídos como vantagem
adicional aos subscritores de ações ou debêntures da companhia (ar-
tigo 77, capui)\ quando negociados separadamente da emissão de ações
ou debêntures terão sempre caráter oneroso1139.
Ao direito subjetivo do proprietário do bônus de subscrever ações
de emissão da companhia corresponde o dever jurídico desta, por oca-
Competência
"Art. 76. A deliberação sobre emissão de bônus de subscrição
compete à assembleia-geral, se o estatuto não a atribuir ao conse-
lho de administração."
11 5 2 Sobre esse assunto, ver PAULO CÉSAR ARAGÃO, " O p ç õ e s de Compra de Ações e Bônus de
Subscrição", Revista dos Tribunais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 631, maio, 1988,
p. 63-70; C L Á U D I O KOHLER, " B ô n u s d e S u b s c r i ç ã o " , Revista dos Tribunais..., v. 6 4 1 ,
p. 104-105; MARIA LÚCIA DE ARAÚJO CINTRA. Aspectos Jurídicos do Bônus de Subscri-
ção..., p. 54-81; MAURO BRANDÃO LOPES. S.A.: Títulos e Contratos Novos..., p. 77-92.
em valor do capital ou em número de ações e as espécies e classes de
ações que poderão ser emitidas (artigo 168, § I o , alínea "a"). Daí decorre
que a quantidade de bônus de subscrição a ser emitida pela companhia
dependerá do número e valor das ações correspondentes ao limite do
capital autorizado previsto no estatuto.
A assembleia competente para aprovar a emissão de bônus é a
extraordinária (artigo 131), cuja instalação não depende de quorum
especial, pois não tem por objeto a reforma do estatuto (artigo 135),
deliberando por maioria absoluta de votos (artigo 129), salvo se maior
quorum for previsto no estatuto da companhia fechada (artigo 129, §
I o ). A matéria deverá constar expressamente do edital de convocação
e os acionistas dissidentes não têm direito de recesso1153.
Se a competência para deliberar sobre a emissão dos bônus de
subscrição for do conselho de administração, a decisão será tomada
por maioria de votos, podendo o estatuto estabelecer quorum qualifi-
cado (artigo 140, inciso IV). A ata da reunião do conselho de admi-
nistração que deliberar sobre a emissão de bônus deverá ser arquivada
na Junta Comercial e publicada (artigo 142, § I o ).
O conselho fiscal, se em funcionamento, deverá opinar sobre a
proposta de emissão de bônus de subscrição e um de seus membros
deverá comparecer à assembleia geral ou à reunião do conselho de
1153 De acordo com o art. 15 da Instrução CVM n° 481/2009, "sempre que a assembleia geral for
convocada para deliberar sobre a emissão de debêntures ou bônus de subscrição, a compa-
nhia deve fornecer, no mínimo, as informações indicadas no Anexo 15 ã presente Instrução".
Segundo o Anexo 15, em c a s o de emissão de bônus de subscrição a companhia deverá: "a.
Informar o número de bônus a serem emitidos; b. Explicar, pormenorizadamente, as razões da
emissão e suas conseqüências; c. Informar o preço de emissão e o preço de exercício dos
bônus; d. Informar o critério utilizado para a determinação do preço de emissão e do preço de
exercício, justificando, pormenorizadamente, os aspectos econômicos que determinaram a sua
escolha; e. Fornecer opinião dos administradores sobre os efeitos do aumento de capital,
sobretudo no que se refere à diluição provocada pelo aumento; f. Fornecer cópia de todos os
laudos e estudos que subsidiaram a fixação do preço de emissão e preço de exercício; g.
informar os termos e condições a que está sujeito o exercício do bônus; h. Informar se os
acionistas terão direito de preferência para subscrever os bônus, detalhando os termos e
condições a que esse direito está sujeito; /'. Informar se a subscrição será pública ou particular;
j. Informar as matérias cuja definição poderá ser delegada ao conselho de administração; k.
Informar o mercado secundário em que os bônus serão negociados, se for o caso; I. Descrever
os direitos, vantagens e restrições das ações resultantes do exercício do bônus de subscrição;
m. Apresentar percentual de diluição potencial resultante da emissão."
administração para responder aos eventuais pedidos de informação
(artigo 164, capuí).
O titular dos bônus tem o direito de conversão do título em
ações mediante o pagamento do seu preço de emissão. Assim, quan-
do do exercício do direito de subscrever as ações, não será neces-
sário observar as formalidades legais de aumento de capital em
assembleia geral e de alteração do estatuto, pois essa deliberação
foi tomada quando da decisão sobre a emissão dos bônus1154.
Emissão
"Art. 77. Os bônus de subscrição serão alienados pela companhia
ou por ela atribuídos, como vantagem adicional, aos subscritores
de emissões de suas ações ou debêntures.
11 5 5 Sobre esse assunto, ver os comentários a o art. 171 da Lei das S.A. Ver, também, MAURO
B R A N D Ã O LOPES. S.A.: T í t u l o s e C o n t r a t o s Novos. S ã o Paulo: Revista dos Tribunais,
1 9 7 8 , p. 8 2 - 8 4 .
Tendo em vista o disposto no § 3 o do artigo 171 e o fato de que
os bônus conferem ao seu titular o direito de conversão em ações
mediante o pagamento do seu preço de emissão, o direito de prefe-
rência dos antigos acionistas deve ser exercido no momento da emis-
são do título; não podem eles exigir que lhes seja outorgada nova
oportunidade de subscrição preferencial na época do exercício dos
direitos conferidos pelos bônus. Assim, de acordo com o § 4 o do arti-
go 171, o órgão competente (assembleia geral ou conselho de admi-
nistração) que aprovar a emissão dos bônus deverá fixar prazo, não
inferior a 30 (trinta) dias, para o exercício do direito de preferência,
observado o disposto no artigo 172.
O artigo 172, por sua vez, trata da exclusão do direito de prefe-
rência que, no caso dos bônus de subscrição, somente ocorrerá nas
seguintes hipóteses: (i) por disposição estatutária, na companhia aberta
que contiver autorização para o aumento do capital e cuja colocação
dos bônus seja feita por meio de venda em Bolsa de Valores ou subs-
crição pública, ou, ainda, permuta por ações em oferta pública de aqui-
sição de controle (artigo 172 c/c artigos 257 a 263); e (ii) por disposição
estatutária, ainda que companhia fechada, nos termos de lei especial
sobre incentivos fiscais (artigo 172, parágrafo único). Na conversão
de bônus de subscrição em ações não há direito de preferência (artigo
171, § 3 o , parte final).
CONSTITUIÇÃO DA COMPANHIA
SEÇÃO I
R E Q U I S I T O S PRELIMINARES
1163 O Código Civil, no art. 166, determina que: "É nulo o negócio jurídico quando: I -
celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II - for ilícito, impossível ou indeterminável o
Ainda que o regime jurídico das sociedades anônimas no Brasil
oscile entre o contratualismo e o institucionalismo, prevalece entre nós
a orientação do primeiro: a sociedade é definida como um contrato,
mediante o qual as partes obrigam-se a combinar seus esforços e recur-
sos para lograr um fim comum"64-1165. Consta do artigo 83 que "opro-
jeto de estatuto deverá satisfazer todos os requisitos exigidos para os contratos
das sociedades mercantis em geral e aos peculiares às companhias, e conterá
as normas pelas quais se regerá a companhia". O contrato de companhia é
(i) nominado, pois as regras que o disciplinam são previstas em lei; (ii)
associativo, pois as partes contratantes podem ser substituídas median-
te transferência de suas ações; (iii) de formação sucessiva, pois, uma vez
celebrado, pode ser modificado por deliberação da maioria dos contra-
tantes; e (iv) solene, tendo em vista prescrever a lei forma especial e os
requisitos específicos para a sua constituição.
A companhia pode ser constituída por subscrição pública (arti-
gos 82 a 87) ou por subscrição particular (artigo 88). Na constituição
da companhia, alguns procedimentos iniciais devem ser observados,
na seguinte ordem: (i) elaboração, pelos fundadores, do projeto do
estatuto social (artigo 83) e da lista ou boletim de subscrição (artigos
85 e 88, § I o ) ou da escritura pública. Se a companhia for constituída
por subscrição pública, será necessário o prévio registro da emissão na
Comissão de Valores Mobiliários e a subscrição só poderá ser efetua-
da com a intermediação de instituição financeira (artigo 82, caput)-,
(ii) assinatura desses 2 (dois) documentos - projeto do estatuto social
e lista ou boletim de subscrição - pelos subscritores das ações; (üi)
seu objeto; III -o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; IV-não revestir
a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para
a sua validade; VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII - a lei taxativamente o declarar
nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção."
11 6 4 Sobre esse assunto e a plurilateralidade desse contrato, ver TULLIO ASCARELU. Problemas
das Sociedades Anônimas e Direito Comparado. São Raulo: Bookseller, 2001, p. 372-452.
11 6 5 Rara um b o m resumo d o confronto entre institucionalismo e contratualismo, ver CALIXTO
S A L O M Ã O FILHO. O N o v o D i r e i t o Societário. 3 " e d i ç ã o , S ã o Paulo: Malheiros, 2 0 0 6 ,
p. 2 5 - 4 9 .
pagamento da entrada; (iv) depósito bancário da parte do capital rea-
lizado em dinheiro; (v) realização da assembleia geral de constituição
ou assinatura da escritura pública aprovando o projeto de estatuto
social, declarando constituída a companhia e nomeando os primeiros
administradores; (vi) arquivamento dos atos constitutivos no Regis-
tro Público de Empresas Mercantis - que é exercido no âmbito esta-
dual pelas Juntas Comerciais1166-, mediante o qual a sociedade adquire
personalidade jurídica. Se a companhia for constituída por escritura
pública, bastará o arquivamento da sua certidão (artigo 96); e (vii) os
administradores eleitos deverão providenciar, nos 30 (trinta) dias sub-
sequentes ao arquivamento, a publicação dos atos constitutivos, bem
como da certidão emitida pela Junta Comercial, no órgão oficial do
local da sede da companhia (artigo 98).
Um exemplar da publicação também deverá ser arquivado na
Junta Comercial e a certidão dos atos constitutivos, passada por esse
órgão, será o documento hábil para a transferência, no Registro Pú-
blico competente, dos bens com que o subscritor tiver contribuído
para a formação do capital social (artigo 98, §§ I o e 2o)1167.
A companhia pode ter mais de um fundador, podendo exercer
essa função tanto a pessoa física como a jurídica, bem como
empreendedores, atuando profissionalmente e sendo, portanto,
remunerados pelos serviços que prestarem nessa qualidade. A Lei das
S.A. estabelece que, na constituição por subscrição pública, o prospecto
deverá mencionar as vantagens particulares a que terão direito os
1170 • Determina a Lei das S.A., no § 1° do art. 3 o , que "o nome do fundador, acionista, ou pessoa
que por qualquer outro modo tenha concorrido para o êxito da empresa, poderá figurar na
denominação." N o m e s m o sentido é o parágrafo único d o art. 1 . 1 6 0 d o Código Civil.
1171 C o n f o r m e PAUL DAVIES. G o w e r a n d D a v i e s : P r i n c i p i e s o f M o d e r n C o m p a n y L a w . 71'1
edition, London: Sweet and Maxwell, 2 0 0 3 , p. 90, em b e m humorada observação sobre a
figura d o company promoter, equivalente à d o nosso "fundador": "If, in a psychoanalysfs
Consulting room, we were asked to say what picture formed in our minds at the mention of the
expression 'company promoter', most of us would probably confess that we envisaged a
character of dubious repute and antecedents who infests the commercial demi-monde with
a menagerie of bulls, bears, stags and sharks as his familiars, and who, after rising to affluence
by preying on the susceptibilities of a guliible public, finally redres from the scene in the
blaze of a sensationa! suicide or Old Bailey Trial. In other words, we should envisage
someone whose profession it was to form bogus companies and foist them ofi on the public
to the /atter's detriment and his own profit. Such figures have existed and it is probably too
much to hope that they will ever be entirely eradicated, but event in their Edwardian heyday
they formed only minutest fraction of those whom the Law classifies as promoters."
1172 O Código Penal, nos arts. 177 e 168, tipifica c o m o crime (i) de fraude e abuso, por parte
dos fundadores, "promover a fundação de sociedade por ações fazendo, em prospecto ou
em comunicação ao público ou à assembleia, afirmação falsa sobre a constituição da socie-
dade, ou ocultando fraudulentamente fato a ela relativo", prevendo para esse crime pena
de 1 (um) a 4 (quatro) anos de reclusão e multa, se o fato não constitui crime contra a
economia popular (art. 177); e (ii) d e apropriação indébita, "apropriar-se de coisa alheia
móvel, de que tem a posse ou a detenção", também prevendo a pena de reclusão de I (um)
a 4 (quatro) anos e multa. A pena é aumentada em 1/3 (um terço) quando o agente recebe
a coisa em depósito necessário, em razão de ofício, emprego ou profissão (art. 168).
ou em outro estabelecimento bancário autorizado pela Comissão de
Valores Mobiliários, da parte do capital realizado em dinheiro.
O estatuto da companhia fixará o valor do capital social, expres-
so em moeda nacional, bem como o número das ações em que se
divide, estabelecendo se terão, ou não, valor nominal (artigos 5 o e 11).
Assim, conforme o disposto no inciso I, todas as ações em que se
divide o capital deverão ser subscritas por, ao menos, 2 (duas) pessoas.
O requisito da subscrição da totalidade das ações justifica-se na
medida em que, no plano econômico, o capital pode ser considerado
como o conjunto de recursos com que conta a companhia para o
desenvolvimento de suas atividades1173. Nas sociedades em que o só-
cio não responde com o seu patrimônio próprio pelas dívidas da com-
panhia - como é o caso das sociedades anônimas - o capital social
constitui uma noção construída na prática mercantil para possibilitar
a garantia dos credores e o funcionamento da empresa. A função
primordial do capital social é garantir à sociedade os meios para reali-
zar o seu fim1174. Na sociedade anônima, como o sócio não responde
com seu patrimônio próprio pelas dívidas da pessoa jurídica e a sua
responsabilidade é limitada ao preço de emissão das ações subscritas
ou adquiridas (artigo I o ), a estipuiação do capital social no estatuto
define os direitos e obrigações dos sócios1175-1176. Como as regras re-
lacionadas à realidade e integridade do capital destinam-se, a princí-
pio, à tutela de terceiros, o seu descumprimento enseja, em alguns
11 84 Ver os comentários a o art. 182, § 1°, alínea "a", da Lei das S.A.
1185 Art. 2 7 da Lei n° 4 . 5 9 5 / 1 9 6 4 . Sobre esse assunto, ver a Resolução C M N n° 2 . 6 0 7 / 1 9 9 9 ,
q u e estabelece limites mínimos d e capital realizado e patrimônio líquido das instituições
financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil.
O preço de emissão das ações subscritas em dinheiro deverá ser
realizado em moeda corrente ou cheque. Esse requisito não se aplica
à subscrição em bens, pois, nessa hipótese, as respectivas ações são
integralmente realizadas após a avaliação dos bens e a sua aprovação
pela assembleia geral1186-1187. O percentual mínimo de realização, como
entrada, do preço de emissão das ações subscritas em dinheiro, refe-
re-se a cada ação e não ao total do capital subscrito em dinheiro1188.
De acordo com o inciso III, a constituição da companhia de-
pende, ainda, do depósito, da parte do capital realizado em dinheiro,
no Banco do Brasil S.A., ou em outro estabelecimento bancário au-
torizado pela Comissão de Valores Mobiliários. Ou seja, toda a quan-
tia paga no ato da subscrição de ações deve ser depositada e não apenas
o percentual mínimo de 10% (dez por cento), de que trata o inciso II.
A Comissão de Valores Mobiliários autorizou todos os bancos
comerciais a receber em depósito a realização inicial, em dinheiro, do
capital da companhia por ocasião de sua constituição1189, o que se
aplica apenas às companhias abertas; as sociedades fechadas conti-
nuam obrigadas a efetuar esse depósito no Banco do Brasil S.A.
Os fundadores deverão providenciar o depósito da parte do ca-
pital realizado em dinheiro no prazo de 5 (cinco) dias contado do
recebimento das quantias, em nome do subscritor e a favor da socie-
dade em organização, que somente após adquirir personalidade
SEÇÃO LI
Registro da emissão
"Art. 82. A constituição de companhia por subscrição pública
depende do prévio registro da emissão na Comissão de Valores
Mobiliários, e a subscrição somente poderá ser efetuada com a
intermediação de instituição financeira.
1199 Sobre os vícios sanáveis, insanáveis e as suas conseqüências, ver os comentários ao art. 97
da Lei das S.A.
§ 2 o A Comissão de Valores Mobiliários poderá condicionar o
registro a modificações no estatuto ou no prospecto e denegá-lo
por inviabilidade ou temeridade do empreendimento, ou inido-
neidade dos fundadores."
1203 Consta do art. 19, § 3o, da Lei n° 6.385/1976 que: "Caracterizam a emissão pública: I -a
utilização de listas ou boletins de venda ou subscrição, folhetos, prospectos ou anúncios
destinados ao público; II - a procura de subscritores ou adquirentes para os títulos por meio
de empregados, agentes ou corretores; III - a negociação feita em loja, escritório ou estabe-
lecimento aberto ao público, ou com a utilização dos serviços públicos de comunicação.
1204 Art. 3 o da Instrução CVM n° 4 0 0 / 2 0 0 3 , com as alterações introduzidas pela Instrução CVM
n° 4 8 2 / 2 0 1 0.
forem investidores qualificados e, em função de suas relações com a
companhia emissora ou do fato de deterem "poder de barganha" pe-
rante esta, tiverem acesso ao mesmo tipo de informação que seria
exigido em decorrência do registro1205-1206-1207.
A subscrição pública na constituição de companhia somente
poderá ser efetuada com a intermediação de instituição financeira,
conforme o disposto no caput deste artigo. A própria Lei das S.A.
estabelece que o prospecto deverá mencionar "a instituição financeira
intermediária do lançamento, em cujo poder ficarão depositados os origi-
nais do prospecto e do projeto de estatuto, com os documentos a que fizerem
menção, para exame de qualquer interessado' (artigo 84, inciso XII).
De acordo com a Lei n° 6.385/1976, as instituições financeiras
intermediárias são aquelas que têm por objeto distribuir emissão de
valores mobiliários como agentes dos fundadores ou da companhia
emissora ou, ainda, por conta própria, subscrevendo ou comprando a
emissão para colocá-la no mercado1208. A atuação das instituições fi-
1 209 Sobre o underwriting, ver os comentários a o art. 5 9 da Lei das S.A. Ver, também, NELSON
EIZIRIK, ARIÁDNA B. C A A L , FLÁVIA PARENTE e M A R C U S DE FREITAS HENRIQUES.
M e r c a d o de Capitais - R e g i m e Jurídico..., p. 1 6 3 - 1 9 1 . A distribuição pública de valores
mobiliários sem a intermediação de instituição financeira é considerada infração grave, de
a c o r d o c o m o art. 5 9 da Instrução CVM n° 4 0 0 / 2 0 0 3 , c o m as alterações introduzidas pelas
Instruções C V M n"" 4 2 9 / 2 0 0 6 , 4 4 2 / 2 0 0 6 , 4 7 2 / 2 0 0 8 , 4 8 2 / 2 0 1 0 e 4 8 8 / 2 0 1 0 .
1210 Art. 3 8 da Instrução CVM n° 4 0 0 / 2 0 0 3 , c o m as alterações introduzidas pelas Instruções
CVM n1» 4 2 9 / 2 0 0 6 , 442/2006, 472/2008 e 482/2010 e 488/2010.
1211 Art. 7° da Instrução C V M n° 4 0 0 / 2 0 0 3 , c o m as alterações introduzidas pelas Instruções
CVM n » 4 2 9 / 2 0 0 6 , 442/2006, 472/2008, 482/2010 e 488/2010.
1212 Art. 3 3 da Instrução CVM n° 4 0 0 / 2 0 0 3 , c o m a s alterações introduzidas pela Instrução
CVM n° 4 8 8 / 2 0 1 0 . Sobre as cláusulas obrigatórias d o contrato de distribuição de valores
mobiliários, ver os Anexos VI e VIII dessa Instrução, com a redação que lhe foi dada pela
Instrução CVM n° 4 8 2 / 2 0 1 0 .
pela companhia para, posteriormente, vendê-los ao público; (ii) com
garantia de sobras, na qual a instituição financeira assume a obriga-
ção de subscrever as sobras, após a colocação dos títulos no merca-
do; ou (iii) de melhor esforço, em que a instituição financeira não
garante a subscrição dos títulos emitidos pela companhia, compro-
metendo-se apenas a realizar seus melhores esforços para vender os
papéis junto ao público, não sendo obrigada a adquiri-los no caso
de insucesso da colocação.
As instituições financeiras intermediárias poderão se organizar
sob a forma de consórcio, com o fim específico de distribuir ações no
mercado e/ou garantir a subscrição da emissão. As cláusulas relativas
ao consórcio deverão ser formalizadas no mesmo instrumento do
contrato de distribuição1213-1214.
A Lei das S.A. determina que os fundadores e as instituições
financeiras intermediárias são responsáveis, de acordo com as respec-
tivas atribuições, pelos prejuízos resultantes da inobservância dos pre-
ceitos legais (artigo 92). A Instituição financeira intermediária deverá
tomar todas as cautelas, respondendo pela falta de diligência ou omis-
são, para assegurar que as informações constantes do estudo de viabi-
lidade econômico-financeira do empreendimento são corretas,
suficientes, verdadeiras e consistentes, permitindo aos investidores a
tomada de decisão fundamentada a respeito da oferta1215. De acordo
com o Código Penal, é crime de fraude e abuso promover a fundação
de sociedade por ações fazendo, em prospecto ou em comunicação
ao público ou à assembleia, afirmação falsa sobre a constituição da
sociedade, ou ocultando fraudulentamente fato a ela relativo1216.
1220 Consta do art. 16, caput, da Instrução C V M n° 400/2003, com as alterações introduzidas
pelas Instruções CVM n™ 429/2006, 442/2006, 472/2008, 482/2010 e 488/2010, que:
"O pedido de registro pode ser indeferido nas seguintes hipóteses: I - por inviabilidade ou
temeridade do empreendimento ou inidoneidade dos fundadores, quando se tratar de
constituição de companhia; ou II - quando não forem cumpridas as exigências formuladas
pela CVM, nos prazos previstos nesta Instrução."
1221 De acordo com o art. 7°, inciso II, da Lei n° 7.492/1986, que define os crimes contra o
sistema financeiro nacional, está sujeito à pena de reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos e
multa aquele que emitir, oferecer ou negociar, de qualquer modo, títulos ou valores
mobiliários "sem registro prévio de emissão junto ã autoridade competente, em condi-
ções divergentes das constantes do registro ou irregularmente registrados". A distribuição
pública de valores mobiliários sem prévio registro na CVM ou efetivada sem a intermediação
de instituição financeira é considerada infração grave nos termos do art. 11, § 3o, da Lei
n° 6.385/1976, com a redação dada pela Lei n° 9.457/1997.
nos, 2 (duas) pessoas de todas as ações em que se divide o capital
social; (ii) pagamento, como entrada, de 10% (dez por cento), no mí-
nimo, do preço de emissão das ações subscritas em dinheiro; e (iii)
depósito, no Banco do Brasil S.A., ou em outro estabelecimento ban-
cário autorizado pela Comissão de Valores Mobiliários, da parte do
capital realizado em dinheiro (artigo 80, caput).
Projeto de estatuto
1 222 TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. I, 2 a edição, Rio de Janeiro:
Forense, 1953, p. 241.
1223 RICARDO OLIVERA GARCfA. Estúdios de Derecho Societário. Buenos Aires: Rubinzal-Culzoni
Editora, 2005, p. 549 e seguintes.
(vii) a participação dos sócios nos lucros e nas perdas; e (viii) a demons-
tração de lucros ou prejuízos acumulados (artigos 186 e seguintes)1224.
Além dos requisitos gerais exigidos para todas as sociedades, tam-
bém deverão ser inseridas no estatuto social normas indispensáveis
às companhias, tais como: (i) determinação do número de ações em
que se divide o capital (artigo 11); (ii) espécies e classes de ações (ar-
tigo 15); (iii) assembleia geral (artigos 121 e 135); (iv) conselho de
administração e diretoria, ou apenas diretoria, conforme o caso (arti-
gos 138, 140 e 142); (v) conselho fiscal (artigo 161); (vi) exercício
social e demonstrações financeiras (artigos 175 e 176); (vii) dissolu-
ção e liquidação da companhia (artigos 206 a 218); e (viii) distribui-
ção de dividendos (artigo 202).
O estatuto não pode alterar normas obrigatórias previstas na Lei
das S.A., nem limitar ou privar os acionistas de seus direitos essenciais
(artigo 109). Poderá, no entanto, estabelecer, adicionalmente, outras
cláusulas - facultativas —, desde que não sejam contrárias à lei e às
normas regulamentares do Registro Público de Empresas Mercantis
e da Comissão de Valores Mobiliários, no caso de companhias abertas,
como, por exemplo: (i) vantagens e preferências atribuídas aos
acionistas titulares de ações preferenciais (artigos 17 e 18); (ii) resgate
e amortização de ações (artigo 44); (iii) partes beneficiárias, apenas
nas companhias fechadas (artigos 46 a 51); (iv) bônus de subscrição
(artigos 75 a 79); (v) solução de conflitos por arbitragem (artigo 109,
§ 3 o ); (vi) participação dos administradores no lucro da companhia
(artigo 152, § I o ); (vii) criação de órgãos técnicos e consultivos (artigo
160); (viii) declaração de dividendos intermediários (artigo 204, § 2o);
(ix) transformação da companhia (artigo 221), etc.
À exceção da sede e do prazo de duração, os demais requisitos
obrigatórios ante elencados são expressamente regulados pela Lei das
1224 Art. 997, incisas II, III, VI e VII, do Código Civil. Os demais incisos desse artigo não se
aplicam às sociedades anônimas.
S.A. Relativamente à sede, é no local onde está situada a da companhia
que são cumpridas as formalidades exigidas pela Lei das S.A, tais como:
(i) arquivamento dos atos constitutivos na Junta Comercial (artigo 94);
(ii) publicações em Diário Oficial e em jornal de grande circulação
(artigos 98 e 289); (iii) arquivamento de acordos de acionistas (artigo
118); (iv) realização de assembleia geral (artigo 124, § 2 o ); (v)
disponibilização de documentos pertinentes à matéria a ser debatida
em assembleia geral extraordinária (artigo 135, § 3o); (vi) arquivamento
dos documentos comprobatórios dos requisitos exigidos em lei para a
investidura em cargo de administração de companhia (artigo 147, caput),
etc. O Código Civil estabelece que o domicílio das pessoas jurídicas é o
lugar onde funciona a sua administração ou onde elegerem domicílio
especial no seu estatuto social1225. Por sua vez, o Código de Processo
Civil estabelece que é competente o foro do lugar onde está a sede da
pessoa jurídica para a ação em que ela for ré e onde se acha a sua sucursal
quanto às obrigações que ela contraiu1226. Assim, se a companhia tiver
filiais em diferentes lugares, cada um deles será considerado domicílio
para os atos nele praticados.
A mudança da sede da companhia implica em reforma do esta-
tuto social mediante deliberação de acionistas reunidos em assem-
bleia geral extraordinária (artigo 122, inciso I, c/c artigo 132).
No que se refere ao prazo, a Lei das S.A. não exige que o estatu-
to fixe o prazo de duração da companhia, que poderá ser por tempo
determinado ou indeterminado; no silêncio do estatuto, será consi-
1 225 Art. 75, inciso IV, do Código Civil. De acordo com os §§ I o e 2 o desse artigo: "§ 1° Tendo
a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será
considerado domicílio para os atos nele praticados. § 2o. Se a administração, ou diretoria,
tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica, no tocante às
obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento sito no
Brasil, a que ela corresponder."
1226 Art. 100, inciso IV, alíneas "a" e "b", do Código de Processo Civil. Sobre esse assunto, o
Supremo Tribunal Federal editou a Súmula n° 363, do seguinte teor: "a pessoa jurídica de
direito privado pode ser demandada no domicílio da agência, ou estabelecimento, em que se
praticou o ato."
derado indeterminado1227. Findo o prazo de duração, se não houver
prorrogação, a sociedade se dissolverá, de pleno direito (artigo 206,
inciso I, alínea "a"). O prazo indeterminado não causa dano algum
aos acionistas, que podem retirar-se da companhia mediante a alie-
nação de suas ações.
As sociedades de prazo determinado e indeterminado podem, an-
tes da expiração de seu prazo de duração ou a qualquer tempo, extin-
guir-se: I - de pleno direito (i) nos casos previstos no estatuto; (ii) por
deliberação da assembleia geral (artigo 136, inciso X); (iii) pela exis-
tência de um único acionista, verificada em assembleia geral ordiná-
ria, se o mínimo de 2 (dois) não for reconstituído até à do ano seguinte;
ou (iv) pela extinção, na forma da lei, da autorização para funcionar; II
- por decisão judicial (i) quando anulada a sua constituição, em ação
proposta por qualquer acionista; (ii) quando provado que não pode
preencher o seu fim, em ação proposta por acionistas que represen-
tem 5% (cinco por cento) ou mais do capital social; ou (iii) em caso de
falência; e III - por decisão da autoridade administrativa competente,
nos casos e na forma previstos em lei especial (artigo 206).
Assim, deverão constar do estatuto normas sobre os direitos e
obrigações dos acionistas, a relação jurídica entre eles e todas as re-
gras pelas quais se regerá a companhia; poderá, ainda, prever um regi-
mento interno com o fim de definir, por exemplo, as atribuições dos
diretores e dos empregados.
O estatuto aprovado pelos acionistas constitui o contrato que
regulará a vida interna da companhia; tendo em conta os preceitos
legais, prevê um direito interno, particular, característico da entidade de
direito privado, de acordo com a vontade de seus integrantes1228. Essa
1227 O Código Civil determina, no art. 997, inciso II, que o contrato da sociedade deverá
mencionar, além das cláusulas estipuladas pelas partes, o seu prazo de duração.
1228 De acordo com J. X. CARVALHO DE MENDONÇA. Tratado de Direito Comercial Brasilei-
ro. v. II, t. II, atualizado por Ruymar de Lima Nucci. Campinas: Bookseller, 2001, p. 356:
"A carta que rege a sociedade anônima e da qual não se pode esta afastar, em outros termos,
as bases, cláusulas e condições do respectivo contrato são formulados em uma peça ou
vontade que deu origem à criação da sociedade e determinou a estrutura
de seu ato constitutivo vai também indicar a maneira segundo a qual se
desenvolverão as atividades para as quais foi instituída, informando todo
o seu funcionamento.
As normas estabelecidas no estatuto das sociedades integram
sua disciplina interna e possuem força de direito inerente ao agrupa-
mento, devendo ser observadas, permanentemente, por todos os seus
integrantes; assim, o regime fixado no ato constitutivo das entidades
apresenta caráter cogente.
Em relação ao conteúdo das normas estatutárias, não havendo
vedação legal ou constitucional, vigora o princípio da plena liberdade
de contratar; pode-se regular tudo o que não for contrário às normas
legais. Por essa razão, não existe uma padronização para o estatuto
social. Existem preceitos obrigatórios, impostos por lei, mas cada com-
panhia há de considerar na elaboração de sua "lei interna" os dados
fundamentais de sua constituição como fatores de ordenamento de
sua atividade, especialmente no que se refere ao funcionamento de
seus órgãos.
O poder de livre auto-organização no estatuto decorre do exercí-
cio da autonomia privada das pessoas jurídicas. O conceito de auto-
nomia encontra-se relacionado à faculdade que determinadas
entidades detêm de se organizar juridicamente, criando direito pró-
prio, isto é, de se autorregularem. O âmbito conferido pelo direito
para os indivíduos autorregularem seus interesses particulares, crian-
do para si próprias normas individuais, contudo, não é ilimitado, de-
vendo ser exercido tendo em vista as normas legais existentes; a
atividade normativa dos particulares retira o seu fundamento de vali-
dade do ordenamento legal, que deve ser obedecido para que o exercí-
cio do poder individual de criar normas singulares seja lícito.
1229 TULLIO ASCARELLI. Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Comparado. 2'' edi-
ção, São Paulo: Saraiva, 1969, p. 271-272.
1230 RACHEL SZTAJN. Contrato de Sociedade e Formas Societárias. São Pauto: Saraiva, 1989,
p. 41.
1231 CALIXTO SALOMÃO FILHO. O Novo Direito Societário. 2 a edição, São Paulo: Malheiros,
2006, p. 42.
Assim, as partes não se obrigam umas frente às outras, mas buscam,
no estatuto, estabelecer um complexo de normas e de procedimentos
que disciplinam a organização com a qual desenvolverão a atividade
economica1 .
Foi também a doutrina alemã que desenvolveu a análise mais
adequada à qualificação jurídica do estatuto, a chamada "teoria nor-
mativa modificada" ( m o d i f i z i e r t e Normentheorie), segundo a qual,
embora o ato constitutivo da sociedade possa ser qualificado como
um negócio jurídico, as normas reguladoras da companhia devem ser
tratadas como direito objetivo1233.
Estamos, assim, frente a um "contrato normativo", que, como
forma de organização privada, é fonte de produção de normas obriga-
tórias, criando direitos e impondo deveres1234.
Assim, o estatuto apresenta um caráter normativo, que se verifi-
ca, aliás, na sua própria redação, uma vez que é normalmente com-
posto de artigos, parágrafos, alíneas, como na lei ou num regulamento.
Trata-se de um conjunto de normas jurídicas, integrantes do ordena-
mento societário, embora limitadas, em sua eficácia, à regulação de
uma determinada companhia.
O ordenamento jurídico apresenta uma estrutura hierárquica (a
célebre "pirâmide" de Hans Kelsen) e escalonada de normas. Dessa
forma, as normas que compõem o ordenamento não estão todas no
mesmo plano, há normas superiores e inferiores. As normas inferio-
res dependem das normas superiores, delas retirando o fundamento
de sua validade. Com efeito, as normas inferiores valem como nor-
mas jurídicas na medida em que retiram seu fundamento das normas
1238 Consta do art. 38 da Instrução CVM n° 400/2003, com as alterações introduzidas pelas
Instruções C V M n® 429/2006, 442/2006, 472/2008, 482/2010 e 488/2010, que o
"prospecto é o documento elaborado em conjunto com a instituição líder da distribui-
ção, obrigatório nas oíertas públicas de distribuição de que trata esta Instrução, e que
contém informação completa, precisa, verdadeira, atual, clara, objetiva e necessária, em
linguagem acessível, de modo que os investidores possam formar criteriosamente a sua
decisão de investimento." Não obstante, as regras específicas sobre prospecto editadas
pela CVM aplicam-se apenas às ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários
(arts. 39 a 42 da Instrução CVM n° 400/2003, com a redação que lhe foi dada pelas
Instruções CVM n™ 482/2010 e 488/2010).
O deferimento do pedido de registro pela Comissão de Valores
Mobiliários poderá ser condicionado a modificações no estatuto so-
cial, assim como no prospecto (artigo 82, § 2 o ). Quando se tratar de
constituição de companhia, o indeferimento pode ocorrer por invia-
bilidade ou temeridade do empreendimento ou inidoneidade dos fun-
dadores ou, ainda, quando não forem cumpridas as exigências
formuladas pela Comissão de Valores Mobiliários, nos prazos por ela
assinalados1239. Trata-se da única hipótese em que a Comissão de Va-
lores Mobiliários pode indeferir o registro por inviabilidade do em-
preendimento ou inidoneidade das partes1240.
Este artigo elenca 12 (doze) requisitos que deverão, obrigatoria-
mente, constar do prospecto1241:
a) o valor do capital social a ser subscrito, o modo de sua realiza-
ção, que poderá ser em dinheiro ou bens, e a existência ou não de
capital autorizado, devendo também constar do prospecto o limite da
autorização, as espécies e classes de ações que poderão ser emitidas,
bem como o órgão competente para deliberar sobre o aumento (as-
sembleia geral ou conselho de administração). Esse requisito justifi-
ca-se face à possibilidade de os subscritores terem a sua posição
acionária modificada em decorrência do aumento do capital;
b) a parte do capital a ser formada com bens, a discriminação
desses bens, quando são de propriedade dos fundadores, e o valor a
eles e por eles atribuído. Os subscritores que não forem fundadores
somente poderão integralizar suas ações em bens se o prospecto
expressamente admitir e deverão negociar essa possibilidade com
1239 Consta do art. 16, caput, da Instrução CVM n° 400/2003, com as alterações introduzidas
pelas Instruções CVM n™ 429/2006, 442/2006, 472/2008, 482/2010 e 488/2010, que:
"O pedido de registro pode ser indeferido nas seguintes hipóteses: I - por inviabilidade ou
temeridade do empreendimento ou inidoneidade dos fundadores, quando se tratar de
constituição de companhia; ou II - quando não forem cumpridas as exigências formuladas
pela CVM, nos prazos previstos nesta Instrução."
1240 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 82 da Lei das S.A.
1241 As regras sobre prospecto constantes da Instrução CVM n° 400/2003 também se aplicam,
no que couber, ao prospecto de constituição de companhia por subscrição pública.
os fundadores previamente à subscrição pública das ações. Os bens
que servirão de pagamento das ações subscritas deverão ser avalia-
dos, pois o que compõe o capital da companhia é o valor atribuído
aos bens1242;
c) o número, as espécies e classes de ações em que se dividirá o
capital, o valor nominal das ações, se for o caso, e o preço de emissão
das ações1243. O prospecto deverá, ainda, especificar as vantagens e
preferências das ações preferenciais, se houver,
d) a importância da entrada a ser realizada no ato da subscrição.
A Lei das S.A. exige a subscrição da totalidade das ações, mas a rea-
lização pode ser parcial, isto é, de no mínimo 10% (dez por cento) do
preço de emissão das ações subscritas em dinheiro (artigo 80, inciso
II)1244. No entanto, o prospecto pode fixar uma entrada superior a
10% (dez por cento);
e) as obrigações assumidas pelos fundadores, os contratos assi-
nados no interesse da futura companhia e as quantias já despendidas
e por despender. Essa exigência justifica-se por dar mais transparên-
cia ao ato constitutivo, evitando que os subscritores tomem conheci-
mento desses fatos e documentos e, em conseqüência, dos direitos e
obrigações que caberão à companhia apenas após a sua constituição.
Os fundadores podem fazer constar do prospecto que, não se consti-
tuindo a companhia, as quantias já despendidas serão rateadas entre
os subscritores. Caso não conste do prospecto essa declaração, todas
as despesas correrão por conta dos fundadores1245;
1242 Sobre a avaliação de bens com que com que os subscritores concorrem ã formação do
capital social, ver os comentários ao art. 8 o da Lei das S.A.
1 243 Sobre esse assunto, ver os comentários aos arts. 11 a 17 da Lei das S.A.
1244 Sobre esse assunto, ver os comentários ao arl. 80 da Lei das S.A.
1 245 No mesmo sentido, TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. I,
211 edição, Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 268. Em senlido contrário, MODESTO
CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, v. 2, 4'1 edição, São Paulo:
Saraiva, 2008, p. 123; JOSÉ WALDECY LUCENA. Das Sociedades Anônimas - Comen-
tários à Lei (arts. 1" a 120). v. I, Rio dejaneiro: Renovar, 2009, p. 846; CARLOS FULCÊNCIO
DA CUNHA PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 1, São Paulo: Saraiva, 1972, p. 41.
f) as vantagens particulares a que terão direito os fundadores ou
terceiros, e o dispositivo do projeto do estatuto que as regula. Os fun-
dadores podem exercer a sua função profissionalmente, sendo, por-
tanto, remunerados pelos serviços que prestarem nessa qualidade após
a constituição da companhia. Por essa razão, a Lei das S.A. estabele-
ce que o prospecto deverá mencionar as vantagens particulares a que
terão direito os fundadores1246-1247. Mas nenhuma remuneração po-
derá ser efetuada por conta do capital da companhia1248. As compa-
nhias abertas, com a edição da Lei n° 10.303/2001 foram proibidas
de emitir partes beneficiárias, razão pela qual os fundadores não po-
derão ser por elas remunerados;
g) a autorização governamental para constituir-se a companhia,
se necessária. Algumas companhias brasileiras dependem de autori-
zação governamental, tais como as instituições financeiras e as segu-
radoras, hipótese em que tal permissão deverá constar do prospecto1249;
h) as datas de início e término da subscrição e as instituições
autorizadas a receber as entradas. Os fundadores devem estabelecer
as datas inicial e final da subscrição. A data do término é fundamen-
tal, pois o subscritor, ao aceitar ingressar na companhia, tem a expec-
tativa de que ela se constitua dentro de determinado prazo; esgotado
o prazo, o subscritor poderá requerer a devolução do depósito efetua-
1 246 Sobre esse assunto e sobre as despesas de constituição da companhia, verTULLIO ASCARELLI,
"Despesas de Constituição e Capital Social", Revista dos Tribunais. São Paulo: Publicação
Oficial dos Trabalhadores do Tribunal de Apelação de São Paulo, v. CXLIV, Ano XXXII,
1943, p. 437-444.
1247 Sobre a remuneração dos fundadores, MODESTO CARVALHOSA. Comentários à Lei de
Sociedades Anônimas..., v. 2, p. 123, entende que, em decorrência da proibição das
companhias abertas emitirem partes beneficiárias, o inciso VI do art. 84 foi derrogado,
ficando, portanto, revogadas todas as vantagens que podiam ser atribuídas aos fundadores.
1248 TULLIO ASCARELLI. Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Comparado. São
Fciulo: Bookseller, 2001, p. 674.
1249 Consta do art. 1.132 do Código Civil que: "Art. 1.132. As sociedades anônimas nacionais,
que dependam de autorização do Poder Executivo para funcionar, não se constituirão sem
obtê-la, quando seus fundadores pretenderem recorrer a subscrição pública para a forma-
ção do capital. § 1° Os fundadores deverão juntar ao requerimento cópias autênticas do
projeto do estatuto e do prospecto. § 2o Obtida a autorização e constituída a sociedade,
proceder-se-á à inscrição dos seus atos constitutivos".
do. Caso a companhia não seja constituída dentro de 6 (seis) meses
da data do depósito, o banco restituirá as quantias depositadas direta-
mente aos subscritores junto com os rendimentos decorrentes do va-
lor depositado (artigo 81, parágrafo único). Também deverá constar
do prospecto o nome da instituição financeira autorizada a receber as
entradas. A Comissão de Valores Mobiliários autorizou todos os bancos
comerciais a receber em depósito a realização inicial, em dinheiro, do
capital da companhia por ocasião de sua constituição1250;
i) a solução prevista para o caso de excesso de subscrição. Deve-
rão constar do prospecto os procedimentos que serão adotados na
hipótese de excesso de subscrição, como, por exemplo, a prevalência
da ordem cronológica, do rateio entre todos os subscritores, com a
devolução a eles do excesso e a conseqüente redução de suas partici-
pações no capital da companhia, ou da limitação da participação de
cada um. Não se admite o aumento do capital fixado no estatuto e
constante do prospecto para aproveitar as subscrições que excederam
o valor neles estabelecidos. E importante, a fim de evitar discussões
sobre o momento em que os valores objeto do excesso serão devolvi-
dos aos subscritores, que o prospecto estabeleça que esses valores se-
rão por eles levantados junto à instituição financeira depositária,
mediante ofício do presidente da assembleia de constituição acom-
panhado de cópia da respectiva ata, na qual constará a deliberação
sobre essa matéria;
j) o prazo dentro do qual deverá realizar-se a assembleia de cons-
tituição da companhia, ou a assembleia preliminar para avaliação dos
bens, se for o caso. Assim, é possível, inicialmente, uma assembleia
geral de avaliação dos bens com que os subscritores pretendem con-
tribuir para a formação do capital. No entanto, na prática, é realizada
uma única assembleia, a de constituição da companhia, na qual é
deliberada a ratificação da nomeação dos peritos - que já haviam sido
1 251 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 8o da Lei das S.A.
1252 Art. 11, § 3o, da Lei n° 6.385/1976, com a redação dada pela Lei n° 9.457/1997, e art.
59 da Instrução CVM n° 400/2003, com a redação que lhe foi dada pela Instrução
CVM n° 482/2010.
cia, estado civil, profissão e documento de identidade, ou, se pes-
soa jurídica, pela firma o u denominação, nacionalidade e sede,
devendo especificar o número das ações subscritas, a sua espécie
e classe, se houver mais de u m a , e o total d a entrada.
1 253 Determina o Código Civil no art. 972 que: "Podem exercer a atividade de empresário os que
estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos." Estabelece,
ainda, no art. 104, inciso I, que a validade do negócio jurídico requer agente capaz.
1254 De acordo com o art. 3 o do Código Civil são absolutamente incapazes de exercer pessoal-
mente os atos da vida civil: "I os menores de 16 (dezesseis anos); II - os que, por
enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática
desses atos; III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade."
Já o art. 4 o estabelece que: "São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os
exercer: l - os maiores de 16 (dezesseis) e menores de 18 (dezoito) anos; II - os ébrios
habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento
reduzido; III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; IV - os pródigos." A
menoridade cessa aos 18 (dezoito) anos completos, podendo o menor com 16 (dezesseis)
anos ser emancipado (art. 5°, caput e parágrafo único, inciso I, do Código Civil).
1 255 Sobre o exercício da tutela e da curalela, ver, respectivamente, os arts. 1.740 e seguintes e
1.767 a 1.783 do Código Civil.
O subscritor, no ato da subscrição das ações a serem realizadas
em dinheiro, pagará a entrada e assinará a lista ou o boletim autentica-
dos pela instituição autorizada a receber as entradas, qualificando-se
pelo nome, nacionalidade, residência, estado civil, profissão e docu-
mento de identidade, ou, se pessoa jurídica, pela firma ou denomina-
ção, nacionalidade e sede, devendo especificar o número das ações
subscritas, a sua espécie e classe, se houver mais de uma, e o total da
entrada. Essa exigência justifica-se na medida em que é fundamental
identificar o subscritor a fim de tornar possível a sua execução, na
hipótese de ser verificada a mora (artigo 107) e impedir fraudes na
subscrição de ações.
Na ausência de assinatura do subscritor no boletim de subscri-
ção e/ou de pagamento da entrada, a subscrição é nula, pois a Lei das
S.A. prescreve a obrigatoriedade desses requisitos. De acordo com o
Código Civil: (i) a validade do negócio jurídico requer agente capaz,
objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei; e (ii) é nulo o
negócio jurídico quando não revestir a forma prescrita em lei1256. Sendo
o negócio jurídico nulo, ele não é suscetível de confirmação nem con-
valesce pelo decurso do tempo1257.
Na subscrição em bens, não se realiza entrada no ato de subscri-
ção, portanto, o subscritor apenas assinará a lista ou o boletim de
subscrição, observadas as exigências previstas no caput deste artigo e
acima mencionadas, e especificará os bens com que realizará as ações
subscritas. Esses bens serão avaliados e o respectivo laudo será sub-
metido à aprovação da assembleia geral dos subscritores1258.
A fim de facilitar a subscrição de ações em dinheiro, a Lei das
S.A. permite, no parágrafo único, que ela seja efetuada por carta diri-
gida à instituição financeira, nas condições previstas no prospecto,
1 259 Consta do art. 662 do Código Civii que: "Os atos praticados por quem não tenha mandato,
ou o tenha sem poderes suficientes, são ineficazes em relação àquele em cujo nome foram
praticados, salvo se este os ratificar. Parágrafo único. A ratificação há de ser expressa, ou
resultar de ato inequívoco, e retroagirá à data do ato."
1 260 Nesse sentido, TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. I, 2" edição,
Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 276.
e, em segunda convocação, com qualquer número. Cada ação dá direito
a um voto e a maioria não tem o poder de alterar o projeto de estatuto.
Não havendo oposição de subscritores que representem mais da
metade do capital social e verificando-se que foram observadas as
formalidades legais, a sociedade é declarada constituída (artigo 87,
caput e §§ 2 o e 3 o ).
De acordo com a Lei das S.A., a ação para anular a constituição
da companhia, por vício ou defeito, prescreve em 1 (um) ano, contado
da publicação dos seus atos constitutivos (artigo 285, caput).
Convocação d e assembleia
1261 Sobre a subscrição parcial e o requisito da subscrição da totalidade das ações, ver os
comentários ao art. 80 da Lei das S.A. e o Parecer de Orientação CVM n° 08/1981.
No caso de excesso de subscrição, deverão ser observadas as re-
gras previstas no prospecto (artigo 84, inciso IX), como, por exemplo,
a prevalência da ordem cronológica - as subscrições mais antigas - ,
do rateio entre todos os subscritores, com a devolução a eles do exces-
so e a conseqüente redução de suas participações no capital da com-
panhia, ou da limitação da participação de cada um. Não se admite o
aumento do capital fixado no estatuto e constante do prospecto para
aproveitar as subscrições que excederam o valor neles estabelecidos1262.
Verificado o atendimento dos requisitos preliminares (artigos 80
a 82), com a subscrição de todas as ações em que se divide o capital
social, seguir-se-á a fase da constituição da companhia propriamente
dita. Os fundadores convocarão a assembleia geral, dentro do prazo
estabelecido no prospecto (artigo 84, inciso X), mediante anúncio
publicado por 3 (três) vezes, no mínimo, que deverá conter o local, a
data, a hora da assembleia e a indicação da ordem do dia, ou seja,
deliberar sobre: (i) a avaliação dos bens com que os subscritores tive-
rem contribuído para a formação do'capital, se for o caso; ou, na hipó-
tese de subscrição apenas em dinheiro; (ii) a constituição da companhia,
com a conseqüente aprovação do projeto do estatuto social (artigo
124, caput). Na hipótese de os fundadores não convocarem a assem-
bleia de constituição, os subscritores poderão fazê-lo.
No caso de subscrição em bens, a sua avaliação será efetuada de
acordo com as regras do artigo 8o e a assembleia de constituição deverá
ser precedida de uma outra com a finalidade de nomear os peritos ou a
empresa especializada1263. Na prática, porém, previamente à assembleia
de constituição, os fundadores contratam os peritos ou a empresa espe-
cializada e solicitam a avaliação dos bens. Assim, é realizada uma única
assembleia para ratificar a nomeação dos peritos, aprovar os laudos, que
já haviam sido por eles elaborados, e a constituição da companhia.
1262 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 84 da Lei das S.A.
1263 Sobre a avaliação dos bens, ver os comentários ao art. 8o da Lei das S.A.
Tratando-se de subscrição pública, o prazo de antecedência da
primeira convocação para a assembleia será de 15 (quinze) dias, con-
tado da publicação do primeiro anúncio, e o da segunda convocação
com antecedência de 8 (oito) dias. Na hipótese de subscrição particu-
lar, a convocação será feita com 8 (oito) dias de antecedência e a se-
gunda com no mínimo 5 (cinco) dias (artigo 124, § I o ) 1264 .
Na assembleia de constituição, todos os subscritores têm direito
de voto, não importando a espécie de suas ações. A companhia so-
mente deixará de ser constituída se houver oposição de subscritores
que representem mais da metade do capital social (artigo 87, § 3o),
não tendo a maioria poder para alterar o projeto de estatuto (artigo
87, §2°).
Caso a companhia não se constitua dentro do prazo de 6 (seis)
meses da data do depósito, a instituição financeira restituirá as quan-
tias depositadas diretamente aos subscritores (artigo 81, parágrafo
único), sem prejuízo da responsabilidade dos fundadores pelos even-
tuais danos causados.
A s s e m b l e i a de constituição
1264 Na convocação, serão observadas as regras do art. 289, além daquelas constantes do
art. 124, § 1o, da Lei das S.A., com as alterações que lhes foram introduzidas pelas Leis
n™ 9.457/1997 e 10.303/2001,
§ 2 o C a d a ação, independentemente de sua espécie ou classe, dá
direito a u m voto; a maioria não tem poder para alterar o projeto
de estatuto.
1269 Sobre esse assunto, TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. I, 2 J
edição, Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 285, observa que: "(...) não se poderá considerar
como alteração, modificação ou derrogação de cláusulas ou artigos dos estatutos, as emen-
das e correções destinadas a sanar faltas ou irregularidades. Assim, como é possível, após a
constituição da sociedade, e por força de exigência do Registro do Comércio (...), sanar
defeitos ou vícios dos estatutos, com razão maior, positivada a falta ou a irregularidade, antes
da constituição da sociedade, pode a assembleia, por deliberação de subscritores, que
representem metade, no mínimo, do capital social, aprovar as emendas e correções necessá-
rias. Uma disposição estatutária que ferisse a lei, ou contrariasse preceito de ordem pública,
não poderia, é evidente, ser mantida."
do capital social, a companhia poderá ser declarada constituída ainda
que a maioria dos presentes vote contra a constituição1270.
A subscrição de ações é declaração unilateral e irretratável de
vontade, mas o subscritor pode comparecer à assembleia geral e votar
contra a constituição da companhia. No entanto, uma vez constituí-
da, é obrigado a realizar, nas condições previstas no estatuto ou no
boletim de subscrição, a prestação correspondente às ações subscritas
ou a d q L i i r i d a s (artigos 85 e 106, capui).
Declarada a constituição, procede-se à eleição dos primeiros
administradores e, se for o caso, dosfiscais,com afixaçãodos respectivos
honorários, observadas as regras do estatuto social, pois, nesse momento,
a companhia já foi declarada constituída e o estatuto social aprovado.
Deverão ser observadas, também, as normas da Lei das S.A. sobre o
exercício do voto e a eleição em separado dos membros do conselho de
administração (artigo 141), os requisitos e impedimentos dos
administradores (artigos 146 e 147) e dos membros do conselho fiscal
(artigo 162).
Na eleição do conselho fiscal deverão ser observadas as regras
do artigo 161. Assim, os seus membros serão eleitos apenas na hipó-
tese de o estatuto regular o seu funcionamento de modo permanente
ou a pedido de subscritores que representem ao menos 10% (dez por
cento) das ações com direito a voto ou 5% (cinco por cento) das ações
sem direito a voto.
Não havendo mais deliberações a serem tomadas, lavrar-se-á a
ata, em duplicata, que será, nos termos do § 4 o , depois de lida e apro-
vada, assinada por todos os subscritores presentes, ou por quantos
bastem à validade das deliberações. Um exemplar ficará em poder da
companhia e o outro deverá ser levado a registro na Junta Comercial.
S E Ç Ã O III
C O N S T I T U I Ç Ã O POR S U B S C R I Ç Ã O PARTICULAR
1271 Sobre a figura do "fundador", ver os comentários ao art. 80 da Lei das S.A.
1272 No mesmo sentido, CARLOS A U G U S T O DA SILVEIRA LOBO, "Constituição por Subscri-
ção Particular". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito das
Companhias, v. I, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 698, observa que: "Na prática se vê
com freqüência, em constituições de companhias por subscrição particular, subscritores
que nada mais fazem do que assinar o boletim de subscrição, aceitando passivamente
participar da constituição da companhia, confiados na idoneidade daqueles que realmen-
te exerceram as funções de fundador. (...) Cabe responsabilizar solidariamente todos os
subscritores pelos atos e omissões dolosos ou culposos dos que efetivamente funcionaram
como fundadores da companhia? A nosso ver a presunção constante da parte final do
artigo 88 é relativa, pois também na subscrição particular são os fatos que identificam a
qualidade de fundador."
1273 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 82 da Lei das S.A.
Além das regras previstas nos artigos 86 e 87, devem ser cumpri-
dos, tanto na subscrição pública como na particular - seja por assem-
bleia geral ou escritura pública - , os requisitos preliminares constantes
dos artigos 80 e 81, a saber: (i) subscrição por, pelo menos, 2 (duas)
pessoas de todas as ações em que se divide o capital social; (ii) paga-
mento, como entrada, de 10% (dez por cento), no mínimo, do preço
de emissão das ações subscritas em dinheiro; e (iii) depósito, no Ban-
co do Brasil S.A., ou em outro estabelecimento bancário autorizado
pela Comissão de Valores Mobiliários, da parte do capital realizado
em dinheiro, que deverá ser feito pelo fundador, em nome do subscri-
tor e a favor da sociedade em organização, no prazo de 5 (cinco) dias,
contado do recebimento das quantias.
Na constituição particular por escritura pública, o § 2 o estabele-
ce os elementos indispensáveis: (i) a assinatura de todos os subscrito-
res, o que implica no seu consentimento para a constituição da
companhia; (ii) a qualificação dos subscritores, nos termos do artigo
85; (iii) o inteiro teor do estatuto da companhia, que nesse caso não
precisa ser assinado pelos subscritores; (iv) a relação das ações toma-
das pelos subscritores — com a especificação do número, espécie e
classe - e a importância das entradas pagas; (v) a transcrição do reci-
bo do depósito da parte do capital realizado em dinheiro (artigo 80,
inciso III); (vi) a transcrição do laudo de avaliação dos peritos, caso
tenha havido subscrição do capital social em bens (artigo 8o), o que
dispensa as assembleias preliminares; e (vii) a nomeação dos primei-
ros administradores e, quando for o caso, dos fiscais, com a fixação
dos respectivos honorários e especificação do término dos mandatos.
O subscritor pode fazer-se representar na assembleia geral de
constituição ou escritura pública por procurador com poderes especiais
(artigo 90). Para a eficácia da constituição da companhia, todos os
subscritores ou seus respectivos procuradores, quando for o caso,
deverão assinar a escritura, ao contrário do que ocorre com a ata da
assembleia geral, para a qual é suficiente a assinatura dos subscritores
presentes ou de quantos bastem à validade das deliberações (artigo
87, § 4°).
Os fundadores entregarão aos administradores eleitos todos os
documentos, livros ou papéis relativos à constituição da companhia
ou a esta pertencentes (artigo 93). Como nenhuma companhia po-
derá funcionar sem que sejam arquivados e publicados os seus atos
constitutivos (artigo 94), na constituição por assembleia deverão ser
observadas as formalidades complementares constantes do artigo 95
e na constituição por escritura pública bastará o arquivamento da cer-
tidão do instrumento (artigo 96)1274. Arquivados os documentos rela-
tivos à constituição da companhia, os seus administradores deverão
providenciar, nos 30 (trinta) dias subsequentes, a publicação deles,
bem como a da certidão do arquivamento, em órgão oficial do local
de sua sede. Também deverá ser arquivado na Junta Comercial um
exemplar do órgão oficial (artigo 98, caput e § I o ).
A certidão dos atos constitutivos após o arquivamento na Jun-
ta Comercial será o documento hábil para a transferência, por trans-
crição no registro público competente, dos bens com que o
subscritor tiver contribuído para a formação do capital social (arti-
go 98, § 2°).
SEÇÃO IV
DISPOSIÇÕES GERAIS
A Lei das S.A. prevê que o capital social pode ser formado com
contribuições em dinheiro ou em qualquer espécie de bens suscetí-
veis de avaliação em dinheiro (artigo 7 o ) e, na falta de declaração ex-
Sobre esse assunto, ver, também, os comentários ao art. 87 da Lei das S.A.
pressa em contrário, os bens transferem-se à companhia a título de
propriedade (artigo 9o).
Quando a integralização das ações subscritas ocorre em dinhei-
ro, o subscritor, no ato da constituição da companhia, paga pelo me-
nos 10% (dez por cento) do valor das ações subscritas e essa
importância é depositada no Banco do Brasil S.A. ou em outro esta-
belecimento bancário autorizado pela Comissão de Valores Mobiliá-
rios (artigo 80). No entanto, se o subscritor oferecer bens para
pagamento das ações subscritas, esses deverão ser avaliados, pois o
que compõe o capital da companhia é o valor atribuído aos bens1275.
Na incorporação de imóveis com que os subscritores tiverem con-
tribuído para a formação do capital social, dispensa-se a formalidade da
escritura pública para a sua conferência. A ata da assembleia geral com
a identificação do bem é suficiente. O dispositivo excepciona a regra do
Código Civil, que estabelece que "não dispondo a lei em contrário, a es-
critura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à
constituição, tranfierência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre
imóveis de valor superior a 30 (trinta) vezes o maior salário mínimo vi-
gente no País."u7e. Na hipótese de a companhia ser constituída por es-
critura pública, este dispositivo não se aplica, pois já estará nela regulada
a transferência do imóvel do subscritor para a companhia1277.
Para a efetiva transferência e registro do imóvel em nome da
companhia, é indispensável a certidão dos seus atos constitutivos pas-
sada pela Junta Comercial em que tiverem sido arquivados: esse é o
documento hábil para a transferência, por transcrição, no registro
público competente, dos bens com que o subscritor tiver contribuído
para a formação do capital social. A ata da assembleia geral que apro-
1 275 Sobre a avaliação de bens, ver os comentários ao art. 8o da Lei das S.A.
1276 Art. 108 do Código Civil.
1277 Consta do art. 215, caput, do Código Civil que: "Art. 215. A escritura pública, lavrada em
notas de tabelião, é documento dotado de fé pública, fazendo prova plena."
var a incorporação de bens ao capital deverá identificá-los com preci-
são, mas poderá descrevê-los sumariamente, desde que seja suple-
mentada por declaração, assinada pelo subscritor, contendo todos os
elementos necessários à transcrição no registro público (artigo 98, §§
]0 e 2O)1278_1279_
1278 Sobre esse assunto, o art. 221 da Lei n° 6.015/1973, com as alterações introduzidas pelas
Leis n05 6.216/1975 e 12.424/2011, determina que: "Art. 221. Somente são admitidos a
registro: I - escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros; II - escritos
particulares autorizados em lei, assinados pelas partes e testemunhas, com as firmas reconhe-
cidas, dispensado o reconhecimento quando se tratar de atos praticados por entidades
vinculadas ao Sistema Financeiro da Habitação; III - atos autênticos de países estrangeiros,
com força de instrumento público, legalizados e traduzidos na forma da lei, e registrados no
cartório do Registro de Títulos e Documentos, assim como sentenças proferidas por tribu-
nais estrangeiros após homologação pelo Supremo Tribunal Federal; IV - cartas de sentença,
formais de partilha, certidões e mandados extraídos de autos de processo; e V-contratos ou
termos administrativos, assinados com a União, Estados e Municípios no âmbito de progra-
mas de regularização fundiária, dispensado o reconhecimento de firma."
1279 Consta dos arts. 35 e 64 da Lei n° 8.934/1994, que dispõe sobre o Registro Público de
Empresas Mercantis e Atividades Afins, que: (i) "Ari 35. Não podem ser arquivados: (...) VII -
os contratos sociais ou suas alterações em que haja incorporação de imóveis à sociedade, por
instrumento particular, quando do instrumento não constar: a) a descrição e identificação do
imóvel, sua área, dados relativos ã sua titulação, bem como o número da matrícula no registro
imobiliário; b) a outorga uxória ou marítal, quando necessária."; (ii) "Art. 64. A certidão dos atos
de constituição e de alteração de sociedades mercantis, passada pelas juntas comerciais em que
foram arquivados, será o documento hábil para a transferência, por transcrição no registro
público competente, dos bens com que o subscritor tiver contribuído para a formação ou
aumento do capital social." Ver, também, o art. 53 do Decreto n° 1.800/1996, com as alterações
introduzidas pelo Decreto n° 3.344/2000.
1280 Sobre esse assunto, a Constituição Federal, no art. 156, § 2o, inciso I, determina que o
imposto de transmissão inter vivos, de que trata o inciso II do caput desse artigo, "não incide
"Art. 9 0 . 0 subscritor pode fazer-se representar na assembleia ge-
ral ou na escritura pública por procurador com poderes especiais."
1286 Determina a Lei n° 8.934/1994, que disciplina o Registro Público de Empresas Mercantis e
Atividades Afins, no art. 3 o que: "Os serviços do Registro Público de Empresas Mercantis e
Atividades Afins serão exercidos, em todo o território nacional, de maneira uniforme, harmôni-.
ca e interdependente, pelo Sistema Nacional de Registro de Empresas Mercantis (Sihrem),
composto pelos seguintes órgãos: I - o Departamento Nacional de Registro do Comércio,
órgão central Sinrem, com funções supervisora, orientadora, coordenadora e normativa, no
plano técnico; e supletiva, no plano administrativo; II - as juntas Comerciais, como órgãos
locais, com funções executora e administradora dos serviços de registro."
deverão providenciar o arquivamento, na Junta Comercial, de todos os
atos constitutivos, nos termos dos artigos 95, 96 e 98.
Assim, os administradores é que passam a ser solidariamente res-
ponsáveis perante a companhia pelos prejuízos causados pela demora
no cumprimento das formalidades complementares à constituição e
a companhia não responde pelos atos ou operações praticados pelos
primeiros administradores antes de cumpridas essas formalidades, salvo
deliberação em sentido contrário da assembleia geral (artigo 99).
1 287 Sobre a figura do "fundador", ver os comenlários ao arl. 80 da Lei das S.A.
ceiras, no âmbito das respectivas atribuições, são responsáveis inde-
pendentemente do prejuízo decorrente da sua conduta ter causado
ou não a anulação da constituição da companhia.
A subscrição de ações na constituição de companhia por subs-
crição pública somente poderá ser efetuada com a intermediação de
instituição financeira (artigo 82)1288. Por isso, a responsabilidade dela
foi expressamente prevista no caput deste artigo, com a ressalva de
que os fundadores e as instituições financeiras que participarem da
constituição por subscrição pública responderão no âmbito das res-
pectivas atribuições.
Os fundadores, de acordo com o parágrafo único, são solidaria-
mente responsáveis pelos prejuízos decorrentes de culpa ou dolo em
atos ou operações anteriores à constituição da companhia, tais como:
(i) a omissão das palavras "em organização" após a denominação da
companhia que está em fase de constituição (artigo 91); (ii) as despe-
sas incorridas durante essa fase; (iii) os contratos celebrados com ter-
ceiros em benefício da futura companhia; (iv) as obrigações assumidas
por conta da sociedade; e (v) as declarações constantes do prospecto,
etc.1289. Ou seja, os fundadores não respondem apenas pelos prejuí-
zos resultantes da inobservância dos preceitos legais, mas, também,
por aqueles que resultarem de atos anteriores à constituição, desde
que provada a sua culpa ou dolo. Nessa hipótese, todos os fundadores
podem ser responsabilizados, independentemente de terem partici-
pado ou não do ato culposo ou doloso, cabendo ação de regresso1290.
1288 Sobre as instituições financeiras intermediárias e a constituição por subscrição pública, ver
os comentários ao art. 82 da Lei das S.A.
1289 FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. I, Rio de Janeiro: Forense,
1977, p. 530, observa que: "Essa solidariedade decorre do fato de que os fundadores,
estando investido de poderes para a constituição da sociedade e realização de atos ou
operações em favor da mesma, devem praticar tais atos ou operações de comum acordo.
Seria, de fato, se não impossível mas pelo menos muito difícil estipular quais os atos que
poderiam ser praticados exclusivamente por certos fundadores, não por outros."
1290 CARLOS FULGÊNCIO DA CUNHA PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 2, São Paulo: Sarai-
va, 1972, p. 95-96, observa que: "A solidariedade imposta pela lei aos fundadores tem sua
razão de ser, pois a vigilância de um poderia evitar o ato lesivo ou contrário à lei. De falo,
A solidariedade entre os fundadores é de ordem pública e, por-
tanto, é nula qualquer disposição estatutária ou deliberação da assem-
bleia geral que disponha em sentido contrário1291.
Devem constar do prospecto as obrigações assumidas pelos fun-
dadores, os contratos assinados no interesse da futura companhia e
as quantias já despendidas e por despender (artigo 84, inciso V). Essa
exigência tem por fim dar maior transparência ao ato constitutivo,
permitindo que os subscritores tomem conhecimento desses fatos e
documentos e, em conseqüência, dos direitos e obrigações que cabe-
rão à companhia apenas após a sua constituição.
Assim, os fundadores não poderão ser responsabilizados pelas
obrigações assumidas anteriormente à constituição da companhia se
elas constarem expressamente da ata da assembleia geral ou da escri-
tura pública, no caso de constituição por subscrição particular, ou do
prospecto, na hipótese de constituição por subscrição pública.
Cabe à companhia, por deliberação da assembleia geral extraor-
dinária1292, decidir se promoverá a ação de responsabilidade civil con-
tra os fundadores e a instituição financeira intermediária, se for o caso,
sem prejuízo dessa medida ser tomada pelos acionistas ou terceiros
diretamente prejudicados.
Na hipótese do arquivamento dos atos constitutivos da compa-
nhia ser negado por inobservância de prescrição ou exigência legal,
os primeiros administradores deverão convocar imediatamente a as-
sembleia geral para sanar a falta ou a irregularidade e deliberar se a
companhia deverá promover a responsabilidade civil dos fundadores
(artigo 97, § I o ). Prescreve em 3 (três) anos a ação contra os fundado-
o erro de todos foi cometido pela negligência de um só, pois a vigilância de um seria suficiente
para impedir o erro. Daí ser cada um responsável pelo todo."
1291 De acordo com TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. I, 2 a edição,
Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 298, "nenhum valor teria a disposição estatutária ou a
resolução da assembleia geral que declarasse isentos os fundadores da responsabilidade previs-
ta nesse dispositivo. É preceito de ordem pública, que a vontade das partes não pode elidir."
1292 Sobre a assembleia geral extraordinária, ver os comentários aos arls. 131 e 135 da Lei das S.A.
res para deles haver reparação civil por atos culposos ou dolosos, no
caso de violação da lei ou do estatuto, contado o prazo da data da
publicação dos atos constitutivos da companhia (artigo 287, inciso II,
alínea "b"). Ou seja, mesmo após ter sido sanada a irregularidade de-
corrente da inobservância de preceitos legais, a companhia pode pro-
mover a ação de responsabilidade civil contra os fundadores1293.
Com a constituição da companhia, cessam as funções dos fun-
dadores, que deverão entregar aos primeiros administradores eleitos
todos os documentos, livros ou papéis relativos à sua constituição ou
a ela pertencentes (artigo 93) e esses passam a ser solidariamente
responsáveis perante a companhia pelos prejuízos causados pela de-
mora no cumprimento das formalidades complementares à consti-
tuição (artigo 99, caput).
"Art. 93. O s fundadores entregarão aos primeiros administrado-
res eleitos todos os documentos, livros o u papéis relativos à cons-
tituição da companhia o u a esta pertencentes."
1293 Além da responsabilidade civil, cabe, também, conforme o caso, responsabilidade penal.
O Código Penal tipifica como crime (i) de fraude e abuso, por parte dos fundadores,
"promover a fundação de sociedade por ações fazendo, em prospecto ou em comunicação
ao público ou à assembleia, afirmação falsa sobre a constituição da sociedade, ou ocultando
fraudulentamente fato a ela relativo", prevendo para esse crime pena de 1 (um) a 4 (quatro)
anos de reclusão e multa, se o fato não constitui crime contra a economia popular (art. 177,
caput); e (ii) de apropriação indébita, "apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a
posse ou a detenção", também prevendo a pena de reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e
multa (art. 168). Sobre o crime de fraude e abuso, ver PAULO JOSÉ DA COSTA JÚNIOR.
Direito Penal Societário. 3 a edição, São Paulo: Perfil, 2005, p. 33-49. O fundador incorre
no crime de apropriação indébita quando, por exemplo, se apropria dos valores que
recebeu dos subscritores em dinheiro a título de integralização de suas ações, não efetuan-
do o depósito no Banco do Brasil S.A,, nos termos do art. 80 da Lei das S.A.
1294 Sobre as funções dos fundadores, ver os comentários ao art. 80 da Lei das S.A.
Como nenhuma companhia pode funcionar sem que sejam arqui-
vados e publicados os seus atos constitutivos (artigo 94), os primeiros
administradores deverão, na constituição por assembleia, observar as for-
malidades complementares constantes do artigo 951295 e , na constituição
por escritura pública, efetuar o registro, na Junta Comercial, da certidão
do instrumento (artigo 96). Arquivados os documentos relativos à cons-
tituição da companhia, deverão, ainda, providenciar, nos 30 (trinta) dias
subsequentes, a sua publicação, bem como a da certidão do arquivamen-
to, em órgão oficial do local de sua sede. Também deverá ser arquivado na
Junta Comercial um exemplar do órgão oficial (artigo 98, caput e § I o ).
A certidão dos atos constitutivos após o arquivamento na Junta
Comercial será o documento hábil para a transferência, por transcri-
ção, no registro público competente, dos bens com que o subscritor
tiver contribuído para a formação do capital social (artigo 98, § 2 o ).
Assim, após a constituição da companhia, os administradores é que
passam a ser solidariamente responsáveis perante ela pelos prejuízos
causados pela demora no cumprimento das formalidades complementares
e a companhia não responde pelos atos ou operações praticados pelos
primeiros administradores antes de cumpridas essas formalidades, salvo
deliberação em sentido contrário da assembleia geral (artigo 99).
Não obstante a extinção da figura do fundador, ele continua res-
ponsável pelos atos praticados anteriormente à constituição da compa-
nhia (artigo 92). Na hipótese de os fundadores retardarem a entrega ou
se recusarem a entregar aos primeiros administradores os documentos
relativos à constituição da companhia, caberá ação de busca e
apreensão1296 e, no caso de prejuízos para a companhia, ação de indeni-
zação, pois, por meio da assembleia geral ou da escritura, a companhia
é constituída, mas só adquire personalidade jurídica com o arquiva-
mento dos seus atos constitutivos na Junta Comercial.
1 295 Sobre esse assunto, ver, também, os comentários ao arl. 87 da Lei das S.A.
1 296 Determina o Código de Processo Civil, no art. 839, que: "Art. 839. O juiz pode decretar a
busca e apreensão de pessoas ou de coisas.".
CAPÍTULO V I U
Arquivamento e publicação
"Art. 94. N e n h u m a companhia p o d e r á funcionar sem que sejam
arquivados e publicados seus atos constitutivos."
1297 Sobre esse assunto, JOSÉ WALDECY LUCENA. Das Sociedades Anônimas - Comentários à
Lei (arts. 1 o a 120). v. I, Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 899, observa que: "A declaração
de que a sociedade encontra-se constiluida, proferida pelo presidente da assembleia (art. 87,
§ 3°), ou lançada na escritura pública de constituição pelos subscritores-fundadores, sim-
plesmente encerra a fase conclusiva, para dar início à fase personificativa."
1298 A Lei n° 8.934/1994, que dispõe sobre o Registro Público de Empresas Mercantis e
Atividades Afins, estabelece no art. 1o que: "Art. 1". O Registro Público de Empresas
Mercantis e Atividades Afins, subordinado às normas gerais prescritas nesta lei, será exerci-
do em todo o território nacional, de forma sistêmica, por órgãos federais e estaduais, com
as seguintes finalidades: I - dar garantia, publicidade, autenticidade, segurança e eficácia
A companhia só adquire personalidade jurídica com o registro
dos seus atos constitutivos no Registro Público de Empresas Mer-
cantis1299. Além disso, o registro tem efeito comprobatório, pois prova
a existência e veracidade do ato. Por isso, a companhia não pode fun-
cionar sem que sejam arquivados e publicados seus atos constitutivos.
Ou seja, os primeiros administradores não deverão praticar atos para
a consecução do objeto social antes que os atos constitutivos estejam
arquivados e publicados.
O Registro Público de Empresas Mercantis é exercido em todo
o território nacional pelo Sistema Nacional de Registro de Empresas
Mercantis (Sinrem), que é composto (i) pelo Departamento Nacio-
nal de Registro do Comércio (DNRC), órgão central do Sinrem, com
funções supervisora, orientadora, coordenadora e normativa, no pla-
no técnico; e supletiva, no plano administrativo; e (ii) pelas Juntas
Comerciais, como órgãos estaduais, com funções de executar e admi-
nistrar os serviços de registro1300.
aos atos jurídicos das empresas mercantis, submetidos a registro na forma desta lei; II -
cadastrar as empresas nacionais e estrangeiras em funcionamento no País e manter atualizadas
as informações pertinentes; III - proceder à matrícula dos agentes auxiliarei do comércio,
bem como ao seu cancelamento." Por sua vez, consta do art. 2° que: "Art. 2o. Os atos das
firmas mercantis individuais e das sociedades mercantis serão arquivados no Registro Público
de Empresas Mercantis e Atividades Afins, independentemente de seu objeto, salvo as
exceções previstas em lei. Parágrafo único. Fica instituído o Número de Identificação do
Registro de Empresas (NIRE), o qual será atribuído a todo ato constitutivo de empresa,
devendo ser compatibilizado com os números adotados pelos demais cadastros federais, na
forma de regulamentação do Poder Executivo."
1 299 O Código Civil, no caput do art. 45, estabelece que: "Art. 45. Começa a existência legal das
pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro
(...)." Consta do art. 985 que: "A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição,
no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos. (...)" O art. 1.150, por sua
vez, determina que: "Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao
Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples
ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele
registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária."
1300 Art. 3 o da Lei n° 8.934/1994. Sobre o DNRC, consta do art. 4o que esse órgão lem por
finalidade: "I - supervisionar e coordenar, no plano técnico, os órgãos incumbidos da execu-
ção dos serviços de Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Alins; II - estabelecer
e consolidar, com exclusividade, as normas e diretrizes gerais do Registro Público de Empresas
Mercantis e Atividades Afins; III - solucionar dúvidas ocorrentes na interpretação das leis,
regulamentos e demais normas relacionadas com o registro de empresas mercantis, baixando
Há uma Junta Comercial em cada unidade federativa, com sede
na capital e jurisdição na área da circunscrição territorial respectiva -
subordinada, administrativamente, ao governo da unidade federativa
de sua jurisdição e, tecnicamente, ao Departamento Nacional de Re-
o-istro do Comércio. Incumbe à Junta Comercial, entre outras com-
O
petências, arquivar: (i) os documentos relativos à constituição, alteração,
dissolução e extinção de sociedade individual, sociedades empresárias
e cooperativas; (ii) os atos relativos a consórcio e grupo de sociedade
de que trata a Lei das S.A.; (iii) os atos concernentes a sociedades
estrangeiras autorizadas a funcionar no País; (iv) as declarações de
microempresa; e (v) os documentos que, por determinação legal, se-
jam atribuídos ao Registro Público de Empresas Mercantis ou da-
queles que possam interessar às sociedades1301.
Os atos constitutivos, após registrados, tornam-se públicos, ou seja,
acessíveis a todos os interessados1302. Assim, qualquer pessoa pode ob-
instruções para esse fim; IV-prestar orientação às Juntas Comerciais, com vistas à solução de
consultas e à observância das normas legais e regulamentares do Registro Público de Empre-
sas Mercantis e Atividades Afins; V - exercer ampla fiscalização jurídica sobre os órgãos
incumbidos do Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins, representando
para os devidos fins âs autoridades administrativas contra abusos e infrações das respectivas
normas, e requerendo tudo o que se afigurar necessário ao cumprimento dessas normas; VI
- estabelecer normas procedimentais de arquivamento de atos de firmas mercantis individuais
e sociedades mercantis de qualquer natureza; VII promover ou providenciar, supletivamente,
as medidas tendentes a suprir ou corrigir as ausências, falhas ou deficiências dos serviços de
Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins; VIII - prestar colaboração técnica
e financeira às juntas comerciais para a melhoria dos serviços pertinentes ao Registro Público
de Empresas Mercantis e Atividades Afins; IX - organizar e manter atualizado o cadastro
nacional das empresas mercantis em funcionamento no País, com a cooperação das juntas
comerciais; X - instruir, examinar e encaminhar os processos e recursos a serem decididos
pelo Ministro de Estado da Indústria, do Comércio e do Turismo, inclusive os pedidos de
autorização para nacionalização ou instalação de filial, agência, sucursal ou estabelecimento
no País, por sociedade estrangeira, sem prejuízo da competência de outros órgãos federais;
XI - promover e efetuar estudos, reuniões e publicações sobre assuntos pertinentes ao
Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins."
1301 Arts. 5°, 6 o e 8 o c/c art. 32, inciso li, da Lei n° 8.934/1994.
13 02 De acordo com o art 29 da Lei n° 8.934/1994, "qualquer pessoa, sem necessidade de provar
interesse, poderá consultar os assentamentos existentes nas juntas comerciais e obter certidões,
mediante pagamento do preço devido." O art. 54 dessa lei, por sua vez, estabelece que: "A
prova da publicidade de atos societários, quando exigida em lei, será feita mediante anotação
nos registros da junta comercial à vista da apresentação da folha do Diário Oficial, ou do jornal
onde foi feita a publicação, dispensada a juntada da mencionada folha."
ter certidão do seu conteúdo, sem necessidade de justificar a razão e
terceiros não podem alegar que não têm conhecimento de tais atos1303.
Os documentos necessários ao registro deverão ser arquivados na
Junta Comercial no prazo de 30 (trinta) dias, contado dalavratura da ata
da assembleia geral de constituição ou da escritura pública, a cuja data
retroagirão os efeitos do arquivamento. Requerido o registro após esse
prazo, somente produzirá efeito a partir da data de sua concessão1304.
O registro tem, ainda, a função de dar autenticidade, segurança e
eficácia aos atos jurídicos das companhias, conservando-os a fim de
evitar a sua deterioração.
Enquanto a sociedade encontrar-se legalmente constituída, mas
sem o arquivamento de seus atos constitutivos na Junta Comercial,
ela não fica subordinada às regras da sociedade em comum, confor-
me disposição expressa do Código Civil1305. Assim, no que se refere à
responsabilidade perante terceiros, os primeiros administradores são
solidariamente responsáveis perante a companhia pelos prejuízos de-
correntes da demora no cumprimento das formalidades complemen-
tares à sua constituição (artigo 99, caput). A companhia não responde
pelos atos ou operações praticados pelos primeiros administradores
antes de cumpridas as formalidades de constituição, salvo deliberação
em contrário da assembleia geral (artigo 99, parágrafo único).
1303 O Código Civil, no art. 1.154, determina que: "Art. 1.154. O ato sujeito a registro, ressalva-
das disposições especiais da lei, não pode, antes do cumprimento das respectivas formalida-
des, ser oposto a terceiro, salvo prova de que este o conhecia. Parágrafo único. O terceiro
não pode alegar ignorância, desde que cumpridas as referidas formalidades."
1304 Determina o Código Civil, nos §§ 1 o a 3 o do art. 1.151, que: "Art. 1.151. (...) § 1° Os
documentos necessários ao registro deverão ser apresentados no prazo de trinta dias, con-
tado da lavratura dos atos respectivos. § 2" Requerido além do prazo previsto neste artigo,
o registro somente produzirá efeito a partir da data de sua concessão. § 3o As pessoas
obrigadas a requerer o registro responderão por perdas e danos, em caso de omissão ou
demora." No mesmo sentido, o art. 36 da Lei n° 8.934/1994 e o art. 33 do Decreto n°
1.800/1996.
1305 O Código Civil, ao tratar da sociedade não personificada, estabelece, no art. 986, que:
"Art. 986. Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade, exceto por
ações em organização, pelo disposto neste Capitulo, observadas, subsidiariamente e no
que com ele forem compatíveis, as normas da sociedade simples."
Assim, no período compreendido entre a constituição da com-
panhia e o arquivamento e publicação de seus atos constitutivos, ela
encontra-se regularmente constituída, porém não pode funcionar, por
não ter, ainda, adquirido personalidade jurídica1306.
Companhia constituída por assembleia
"Art. 95. S e a companhia houver sido constituída por deliberação
em assembleia geral, deverão ser arquivados no registro do co-
mércio do lugar da sede:
1306 De acordo com FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. 4 a edição,
revista e atualizada por Roberto Papini, Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 328: "Não se
trata, na verdade, de uma sociedade de fato mas de uma sociedade em vias de regulariza-
ção, cujo funcionamento normal ainda não se verifica pelo motivo de ser a constituição
sucessiva, exigindo a lei uma série de atos para o reconhecimento da personalidade jurídica."
O Registro do Comércio teve a sua denominação alterada, pela
Lei n° 8.934/1994, para Registro Público de Empresas Mercantis1307.
A Lei das S.A. determinou que nenhuma companhia pode funcionar
sem que sejam arquivados e publicados os seus atos constitutivos (ar-
tigo 94)1308. A Lei n° 8.934/1994 e o Decreto n° 1.800/1996 estabe-
leceram os procedimentos que devem ser adotados no arquivamento.
Este artigo elencou os documentos que, na hipótese da compa-
nhia ter se constituído por assembleia geral, seja na subscrição pública
ou particular, deverão ser apresentados à Junta Comercial: (i) um exem-
plar do estatuto social, assinado por todos os subscritores (artigo 88, §
I o ), se a constituição for particular; (ii) os originais do estatuto e do
prospecto, assinados pelos fundadores, bem como do jornal em que
tiverem sido publicados, se a constituição for pública; (iii) a relação com-
pleta, autenticada pelos fundadores ou pelo presidente da assembleia,
dos subscritores do capital social, com a qualificação, número das ações
e o total da entrada de cada subscritor (artigo 85); (iv) o recibo do depó-
sito a que se refere o inciso III do artigo 80; (v) 2 (duas) vias das atas das
assembleias realizadas para a avaliação de bens quando for o caso (arti-
go 8o); e (vi) 2 (duas) vias da ata da assembleia geral dos subscritores
que houver deliberado a constituição da companhia (artigo 87).
O prazo para apresentação, à Junta Comercial, dos documentos
referidos neste artigo é de 30 (trinta) dias, contado da lavratura da ata
da assembleia geral de constituição ou da escritura pública, a cuja data
retroagirão os efeitos do arquivamento. Requerido o registro após esse
prazo, somente produzirá efeito a partir da data de sua concessão1309.
1307 Sobre o Registro Público de Empresas Mercantis, suas atribuições e competências, ver os
comentários ao art. 94 da Lei das S.A.
1308 O Código Civil, no art. 1.150, determina que: "Art. 1.150. O empresário e a sociedade
empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas
Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil de Pessoas jurídicas, o qual deverá
obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos
tipos de sociedade empresária."
1309 Determina o Código Civil, nos §§ 1 o a 3 o do art. 1.151, que: "Art. 1.151. (...) § 1° Os
documentos necessários ao registro deverão ser apresentados no prazo de trinta dias, con-
Para que os atos constitutivos possam ser arquivados, é necessário
que tenham o visto de um advogado1310 e sejam apresentados em con-
junto com (i) um requerimento dirigido ao presidente da Junta Comer-
cial, assinado por um procurador1311; (ii) a declaração dos administradores,
firmada sob as penas da lei, de que não estão impedidos de exercer o
comércio ou a administração de sociedade mercantil1312; (iii) a ficha do
Cadastro Nacional de Empresas Mercantis - CNE, de acordo com o
modelo aprovado pelo Departamento Nacional do Registro do Comér-
cio (DNRC)1313; (iv) o comprovante de pagamento das custas devidas1314;
e (v) a prova de identidade dos titulares e dos administradores1315-1316.
tado da lavratura dos atos respectivos. § 2o Requerido além do prazo previsto neste artigo, o
registro somente produzirá efeito a partir da data de sua concessão. § 3o As pessoas obrigadas
a requerer o registro responderão por perdas e danos, em caso de omissão ou demora." No
mesmo sentido, o art. 36 da Lei n° 8.934/1994 e o art. 33 do Decreto n° 1.800/1996.
1310 A Lei n° 8.906/1999, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados
do Brasil, determina, no § 2° do art. 1o, que: "Os atos e contratos constitutivos de pessoas
jurídicas, sob pena de nulidade, só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes,
quando visados por advogados." Consta, também, do art. 36 do Decreto n° 1.800/1996
que: "O ato constitutivo de sociedade mercantil e de cooperativa somente poderá ser
arquivado se visado por advogado, com a indicação do nome e número de inscrição na
respectiva Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil."
1311 Art. 33 do Decreto n° 1.800/1996, que regulamenta a Lei n° 8.934/1994.
1312 Art. 37, inciso II, da Lei n° 8.934/1994, com a redação que lhe foi dada pela Lei n°
10.194/2001.
1313 Art. 37, inciso III, da Lei n° 8.934/1994.
1314 Art. 37, inciso IV, da Lei n° 8.934/1994.
1315 Art. 37, inciso V, da Lei n° 8.934/1994.
1316 Os documentos apresentados a arquivamento não poderão conter emendas, rasuras e
entrelinhas, admitida a ressalva expressa no próprio instrumento ou certidão, com a assina-
tura das partes ou do tabelião, conforme o caso - assembleia geral ou escritura pública. Os
atos levados a arquivamento são dispensados de reconhecimento de firma, exceto quando se
tratar de procuração por instrumento particular ou de documentos oriundos do exterior, se,
neste caso, tal formalidade não tiver sido cumprida no consulado brasileiro, nos termos dos
arts. 35 e 39 do Decreto n° 1.800/1996. De acordo com o art. 35 da Lei n° 8.934/1994, não
podem ser arquivados: "I - os documentos que não obedecerem às prescrições legais ou
regulamentares ou que contiverem matéria contrária aos bons costumes ou à ordem pública,
bem como os que colidirem com o respectivo estatuto ou contrato não modificado anterior-
mente; II - os documentos de constituição ou alteração de empresas mercantis de qualquer
espécie ou modalidade em que figure como titular ou administrador pessoa que esteja conde-
nada pela prática de crime cuja pena vede o acesso à atividade mercantil; III - os atos
constitutivos de empresas mercantis que, além das cláusulas exigidas em lei, não designarem o
respectivo capital, bem como a declaração precisa de seu objeto, cuja indicação no nome
empresarial é facultativa; IV - a prorrogação do contraio social, depois de findo o prazo nele
fixado; V - os atos de empresas mercantis com nome idêntico ou semelhante a outro já
existente; VI - a alteração contratual, por deliberação majoritária do capital social, quando
houver cláusula restritiva; VII - os contratos sociais ou suas alterações em que haja incorpo-
De posse desses documentos, a Junta Comercial examinará se as
prescrições legais foram observadas na constituição da companhia e
se no estatuto existem cláusulas contrárias à lei, à ordem pública e aos
bons costumes (artigo 97). Proferido o arquivamento, os administra-
dores providenciarão, nos 30 (trinta) dias subsequentes, a publicação
da sua certidão e dos atos constitutivos, em órgão oficial do local de
sua sede (artigo 98, capui). Após o cumprimento dessas formalidades,
a companhia estará apta a entrar em funcionamento.
Os primeiros administradores são solidariamente responsáveis
perante a companhia pelos prejuízos causados pela demora no cum-
primento dessa formalidade, que é complementar à constituição (ar-
tigo 99, capui).
1318 Sobre o Registro Público de Empresas Mercantis, suas atribuições e competências, bem
como os procedimentos que devem ser adotados no arquivamento dos atos constitutivos,
ver os comentários aos arts. 94 e 95 da Lei das S.A.
1319 O Código Civil, no art. 1.150, determina que: "Art. 1.150. O empresário e a sociedade
empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas
Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas, o qual deverá
obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos
tipos de sociedade empresária."
1320 Sobre esse assunto, CARLOS AUGUSTO DA SILVEIRA LOBO, "Formalidades Complementa-
res". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito das Companhias,
v. I, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 748, observa que: "Em suma, o controle da legalidade
dos atos levados a registro pelas juntas comerciais ê limitado porque: 'deve ater-se aos dados
constantes dos documentos apresentados, não lhe cabendo fazer investigação de provas
outras; (ii) não se arvora em solucionar matérias controvertidas de fato ou de direito (PETIPIERRE
SAUVIN, 1976, p. 128); e (iii) não pode ingressar no exame da extensão e da validade dos
direitos subjetivos dos participantes dos atos levados a registro'."
1 321 Citem-se os seguintes exemplos de formalidades legais que devem ser objeto de análise do
Registro Público de Empresas Mercantis: (i) se as assembleias foram regularmente convocadas;
(ii) se foi observado o quorum de deliberação determinado na Lei das S.A.; (iii) o atendi-
mento dos requisitos constantes dos arts. 80 e 81 da Lei das S.A.; (iv) se todos os subscritores
assinaram o estatuto e o boletim de subscrição, no caso de subscrição particular; (v) se o
estatuto e o prospecto foram assinados por todos os fundadores, no caso de subscrição
pública; (vi) se a companhia constituída por subscrição pública foi previamente registrada
na CVM; (vii) se foi apresentado e devidamente aprovado o laudo dos peritos, no caso de
conferência de bens para o capital social; (viii) se constam da escritura pública todas as
prescrições legais, conforme estabelecido no § 2 o do art. 88 da Lei das S.A.
cia1322. As exigências formuladas pela Junta Comercial deverão ser
cumpridas no prazo de 30 (trinta) dias, contado do dia subsequente
àquele em que o interessado delas tomou ciência ou da publicação do
despacho. Decorrido esse prazo sem que a companhia se manifeste,
será considerado como novo pedido de arquivamento, sujeito ao pa-
gamento de novas custas1323.
Vícios ou irregularidades insanáveis são aqueles que impedem a
constituição da companhia, como, por exemplo, quando ela é consti-
tuída para exercer atividades ilícitas, contrárias à lei, à ordem pública e
aos bons costumes1324.
Estando os primeiros administradores de acordo com a exigên-
cia formulada, convocarão imediatamente a assembleia geral para sa-
nar a falta ou irregularidade apontada, ou autorizar as providências
que se fizerem necessárias, independentemente de a companhia ter
sido constituída por assembleia ou escritura pública, pois a Lei das
S.A. não fez essa distinção.
Na convocação da assembleia deverão ser observadas as normas
da Lei das S.A. sobre o modo e local de convocação: (i) por anúncio
publicado por 3 (três) vezes, no mínimo, com a indicação do local,
data e hora da assembleia geral e a ordem do dia; (ii) a primeira con-
LOBO, "Formalidades Complementares". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedrei-
ra (Coord.). Direito das Companhias..., v. I, p. 744-745; JOSÉ WALDECY LUCENA. Das
Sociedades Anônimas - Comentários à Lei (arts. I o a 120). v. I, Rio de Janeiro: Renovar,
2009, p. 911; FRAN MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. 4 a edição,
revista e atualizada por Roberto Ffeipini, Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 333.
1326 CARLOS F U L C Ê N C I O DA C U N H A PEIXOTO. Sociedades por Ações. v. 2, São Paulo:
Saraiva, 1972, p. 146.
1 327 Art. 44, inciso I, da Lei n° 8.934/1994 e arts. 64, inciso I, e 65 do Decreto n° 1.800/1996.
instância administrativa1328. Os recursos não têm efeito suspensivo e
devem ser interpostos no prazo máximo de 10 (dez) dias úteis, a con-
tar da data em que a companhia tomou ciência do despacho ou de
sua publicação1329.
O pedido de reconsideração suspende o prazo para cumprimen-
to das exigências formuladas; a sua contagem recomeça a partir do
dia subsequente à data da ciência pela companhia ou da publicação
do despacho que mantiver a exigência, no todo ou em parte1330.
Os primeiros administradores, quando entenderem que o inde-
ferimento do registro, ou a exigência formulada, excede a competên-
cia da análise formal dos atos constitutivos que cabe às Juntas
Comerciais, poderão, também, impetrar, perante a Justiça Federal,
mandado de segurança contra o despacho da Turma ou a decisão do
Plenário e do Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior que indeferir pedido de arquivamento1331. Assim,
relativamente ao controle da legalidade dos atos constitutivos, há 2
(dois) órgãos competentes: o Registro Público de Empresas Mercan-
tis e o Poder Judiciário.
Com o registro dos atos constitutivos pela Junta Comercial, a
companhia adquire personalidade jurídica, mas só poderá entrar em
funcionamento após a sua publicação (artigo 94)1332. Assim, os pri-
meiros administradores são solidariamente responsáveis perante a
1328 Art. 41 da Lei ri0 8.934/1994. Consta do art. 23 do Decreto n° 1.800/1996, que compete
às Turmas julgar, originariamente, os pedidos de arquivamento dos atos sujeitos ao regime
de decisão colegiada, bem como julgar os pedidos de reconsideração de seus despachos
(incisos l e II). Ao Plenário compete, entre outros, julgar os recursos interpostos das
decisões definitivas, singulares ou colegiadas (art. 21, inciso I). Sobre o processo decisório,
ver, também, os arts. 49 a 52 e 65 do Decreto n° 1.800/1996.
1329 Arts 46, 47, 49 e 50 da Lei n° 8.934/1994. Ver, também, o art. 69 do Decreto n° 1.800/1996,
com a redação que lhe foi dada pelo Decreto n° 3.395/2000, bem como os arts. 73 e 74.
1330 Art. 65, § 2o, do Decreto n° 1.800/1996.
1331 De acordo com o Supremo Tribunal Federai, a competência para o julgamento de ação
ordinária de anulação de concessão de registro ou de mandado de segurança é da Justiça
Federal, conforme decisão da I a Turma proferida nos autos do Recurso Extraordinário n°
199793-RS, Rei. Min. Octavio Gallotti, j. em 04.04.2000, publicada no DJU em 18.08.2000.
1 332 Sobre a aquisição da personalidade jurídica, ver os comentários ao art. 81 da Lei das S.A.
companhia pelos prejuízos causados pela demora no cumprimento
das formalidades complementares à constituição (artigo 99).
Determina o § 3 o que a criação de sucursais, filiais ou agências,
mediante deliberação da assembleia geral, do conselho de adminis-
tração ou da diretoria, conforme o disposto no estatuto social, será
arquivada no Registro Público de Empresas Mercantis. Se a filial for
instalada no próprio local da sede da companhia, basta o arquiva-
mento da ata na mesma Junta Comercial em que foram registrados
os seus atos constitutivos; se for instalada em outra jurisdição, a ata
será arquivada, inicialmente, na Junta Comercial do local da sede da
companhia e, em seguida, de posse da certidão desse arquivamento,
deverá ser providenciado o seu registro na Junta Comercial do local
onde for instalada a filial1333. O mesmo procedimento deve ser adota-
do no caso de criação de sucursais ou agências1334.
1333 Sobre esse assunto, ver os itens 8 a 10 da Instrução Normativa D N R C n° 100/2006, que
aprovou o "Manual de Atos e Registro Mercantil das Sociedades Anônimas".
1334 Sobre filial, sucursal e agência, FÁBIO U L H O A C O E L H O . Curso de Direito Comercial,
v. 1, 14a edição, São Raulo: Saraiva, 2010, p. 100, observa que: "A sociedade empresária
pode ser titular de mais de um estabelecimento. Nesse caso, aquele que ela considerar mais
importante será a sede, e o outro ou outros as filiais ou sucursais (para as instituições
financeiras, usa-se a expressão 'agência', para mencionar os diversos estabelecimentos). Em
relação a cada um dos seus estabelecimentos, a sociedade empresária exerce os mesmos
direitos, sendo irrelevante a distinção entre sede e filiais, para o direito comercial. Para os
objetivos das regras de competência judicial, no entanto, ganha relevo a identificação da
categoria própria do estabelecimento, porque a ação contra a sociedade empresária deve ser
proposta no foro do lugar de sua sede, ou no de sua filial, segundo a origem da obrigação
(CPC, art. 100, IV, a e b;. Quando se trata, por outro lado, de pedido de falência ou de
recuperação judicial, o juízo competente será o do principal estabelecimento da sociedade
devedora, sob o ponto de vista econômico, independentemente de ser a sede ou uma filial
(LF, art. 3o). A distinção, por conseguinte, entre as duas espécies de estabelecimento do
mesmo empresário (sede ou filial), abstraídos os aspectos pertinentes à competência judicial,
nao apresenta maiores desdobramentos para o direito" LUIZ TZIRULNIK. Empresas e
Empresários no Novo Código Civil. 2 a edição, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p.
32, por sua vez, observa que: "luridicamente, filial é definida como sociedade empresarial
que, embora atue sob a direção e a administração de outra, a matriz, mantém a sua
personalidade jurídica e o seu patrimônio, porém preservando a sua autonomia diante da lei
e do publico, motivo pelo qual não há de ser confundida com sucursal nem com agência.
Agencia, em essência, refere-se à empresa especializada em prestação de serviços, cuja
tunçao e eminentemente a de intermediária. Sucursal, por sua vez, refere-se a estabelecimen-
to empresarial acessório e distinto do estabelecimento principal, a cuja administração esta
ligada, sem, contudo, constituir nem filial nem agência"
Publicação e transferência de bens
"Art. 98. Arquivados os documentos relativos à constituição da
companhia, os seus administradores providenciarão, nos 30 (trin-
ta) dias subsequentes, a publicação deles, bem como a de certidão
do arquivamento, em órgão oficial do local de sua sede.
Tendo em vista que a Lei das S.A., no artigo 94, determina que
nenhuma companhia poderá funcionar sem que sejam arquivados e
publicados seus atos constitutivos, este artigo estabelece, no caput,
que, uma vez arquivados, de acordo com o previsto no artigo 97, os
primeiros administradores providenciarão, nos 30 (trinta) dias subse-
quentes, a sua publicação em órgão oficial do local da sede da compa-
nhia, bem como da certidão do arquivamento1335.
De acordo com o art. 29 da Lei n° 8.934/1994, que disciplina o Registro Público de Empresas
Mercantis e Atividades Afins, "qualquer pessoa, sem necessidade de provar interesse, poderá
consultar os assentamentos existentes nas juntas comerciais e obter certidões, mediante
pagamento do preço devido." O art. 54, por sua vez, estabelece que: "A prova da publicidade
de atos societários, quando exigida em lei, será íeita mediante anotação nos registros da junta
comercial à vista da apresentação da folha do Diário Oficial, ou do jornal onde foi feita a
pubhcaçao, dispensada a juntada da mencionada folha "
cionam com a companhia não podem alegar que não têm conhe-
cimento do ato1337-1338.
Os §§ 2 o e 3 o tratam do registro e transferência dos bens com
que os subscritores tiverem contribuído para a formação do capital
social. De acordo com o artigo 89, não se exige escritura pública na
incorporação de imóveis com que os subscritores tiverem contribuído
para a formação do capital social. Este dispositivo excepciona a regra
do Código Civil que estabelece que "não dispondo a lei em contrário, a
escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à
constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais so-
bre imóveis de valor superior a 30 (trinta) vezes o maior salário mínimo
vigente no País"1339.
Nos termos do § 2 o , para a efetiva transferência e registro do
bem em nome da companhia, é indispensável que a certidão dos seus
atos constitutivos passada pela Junta Comercial (artigo 97) seja ar-
quivada no Registro Público competente, pois é o documento hábil
para a transferência, por transcrição, nesse órgão, dos bens com que o
subscritor tiver contribuído para a formação do capital social.
Tratando-se, por exemplo, de bem imóvel, a certidão dos atos
constitutivos emitida pela Junta Comercial será registrada, pelo oficial
do Registro de Imóveis, junto à respectiva matrícula do referido
bem1340-1341. Tratando-se de bens móveis, deve-se observar as regras do
1337 O Código Civil, no art. 1.154, determina que: "Art 1.154. O ato sujeito a registro, ressalva-
das disposições especiais da lei, não pode, antes do cumprimento das respectivas formalida-
des, ser oposto a terceiro, salvo prova de que este o conhecia. Parágrafo único. O terceiro
não pode alegar ignorância, desde que cumpridas as referidas formalidades."
133 8 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 94 da Lei das S.A.
1339 Art. 108 do Código Civil.
1340 A Lei n" 6.015/1973 (Lei dos Registros Públicos) estabelece no item 32 do inciso I do art.
167, com a redação dada pela Lei n° 6.216/1975, que, no Registro de Imóveis, além da
matrícula, serão feitos registros "da transferência de imóvel a sociedade, quando integrar
quota social".
1341 O Código Civil, ao tratar da aquisição da propriedade imóvel, determina, nos arts. 1.245
e 1.246, que: "Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título
translativo no Registro de Imóveis (...) Art. 1.246. O registro é eficaz desde o momento em
que se apresentar o título ao oficial do registro, e este o prenotar no protocolo."
direito comum e, para outros, as regras que decorrem de leis especiais,
como é o caso das patentes de invenção; o pedido de averbação da
transferência, acompanhado da certidão dos atos constitutivos emitida
pela Junta Comercial, deverá ser formulado ao Instituto Nacional de
Propriedade Industrial1342-
Por essa razão, determina o § 3 o que a ata da assembleia geral
que aprovar a incorporação de bens ao capital deverá identificá-los
com precisão. Admite também a norma a descrição sumária do bem,
mas exige, nessa hipótese, que ela seja suplementada por declaração,
assinada pelo subscritor, contendo todos os elementos necessários à
transcrição no registro público1343-1344.
1342 A Lei n° 9.279/1996, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial,
determina, nos arts. 58, 59 e 60, que: "Art. 58. O pedido de patente ou a patente, ambos
de conteúdo indivisível, poderão ser cedidos, total ou parcialmente. Art. 59. O INPI fará as
seguintes anotações: I - da cessão, fazendo constar a qualificação completa do cessionário;
II - de qualquer limitação ou ônus que recaia sobre o pedido ou a patente; e III - das
alterações de nome, sede ou endereço do depositante ou titular. Art. 60. As anotações
produzirão efeito em relação a terceiros a partir da data de sua publicação."
1343 Sobre esse assunto, o art. 221 da Lei n° 6.015/1973, com as alterações introduzidas pelas Leis
n™ 6.216/1975 e 12.424/2011, determina que: "Art 221. Somente são admitidos a registro:
I - escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros; II - escritos particulares
autorizados em lei, assinados pelas partes e testemunhas, com as firmas reconhecidas, dispen-
sado o reconhecimento quando se tratar de atos praticados por entidades vinculadas ao Sistema
Financeiro da Habitação; III - atos autênticos de países estrangeiros, com força de instrumento
público, legalizados e traduzidos na forma da lei, e registrados no cartório do Registro de Títulos
e Documentos, assim como sentenças proferidas por tribunais estrangeiros após homologação
pelo Supremo Tribunal Federal; IV - cartas de sentença, formais de partilha, certidões e manda-
dos extraídos de autos de processo; eV - contratos ou termos administrativos, assinados com a
União, Estados e Municípios no âmbito de programas de regularização fundiária e de programas
habitacionais de interesse social, dispensado o reconhecimento de firma." Consta, também, do
art. 225, com a redação dada pela Lei n° 6.216/1975, que: "Os tabeliães, escrivães e juizes farão
com que, nas escrituras e nos autos judiciais, as partes indiquem, com precisão, os característi-
cos, as confrontações.e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes
e, ainda, quando se tratar só de terreno, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro,
em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos
interessados certidão do registro imobiliário."
1344 Consta dos arts. 35 e 64 da Lei n° 8.934/1994 que: (i) "Art. 35. Não podem ser arquivados:
(...) VII - os contratos sociais ou suas alterações em que haja incorporação de imóveis t
sociedade, por instrumento particular, quando do instrumento não constar: a) a descrição e
identificação do imóvel, sua área, dados relativos à sua titulação, bem como o número da
matrícula no registro imobiliário; b) a outorga uxória ou marital, quando necessária."; (ii) "Ari.
64. A certidão dos atos de constituição e de alteração de sociedades mercantis, passada
pelas juntas comerciais em que foram arquivados, será o documento hábil para a transferên-
cia, por transcrição no registro público competente, dos bens com que o subscritor tiver
contribuído para a formação ou aumento do capital social." Ver, também, o art. 53 do
Decreto n° 1.800/1996, com a redação dada pelo Decreto n° 3.344/2000.
Assim, os primeiros administradores deverão, após o arquivamento
dos atos constitutivos da companhia, providenciar a transferência, por
transcrição, no registro público competente, dos bens conferidos ã reali-
zação do capital, sob pena de serem solidariamente responsáveis peran-
te a companhia pelos prejuízos causados pela demora no cumprimento
das formalidades complementares à constituição (artigo 99, caput).
Responsabilidade dos primeiros administradores
"Art. 99. Os primeiros administradores são solidariamente res-
ponsáveis perante a companhia pelos prejuízos causados pela
demora no cumprimento das formalidades complementares à
sua constituição.
to, dar publicidade dos atos constitutivos a terceiros, bem como conferir
autenticidade, segurança e eficácia a esses atos1346.
Por essa razão, os primeiros administradores são solidariamente
responsáveis perante a companhia pelos prejuízos causados pela de-
mora no cumprimento das formalidades complementares à sua cons-
tituição. A solidariedade decorre do fato de que qualquer um deles
pode praticar os atos necessários ao funcionamento regular da com-
panhia. Assim, enquanto a sociedade encontrar-se legalmente cons-
tituída, mas sem o arquivamento de seus atos constitutivos na Junta
Comercial, ela não fica subordinada ao regime das sociedades em
comum, conforme o previsto no caput deste artigo e disposição ex-
pressa do Código Civil1347.
No intervalo entre a constituição, o arquivamento e publicação
dos atos constitutivos na Junta Comercial, os primeiros administra-
dores, não obstante já eleitos, não têm, ainda, a presentação da com-
1345 Determina o Código Civil, nos §§ I o a 3 o do art. 1.151, que: "Art. 1.151. (...) § 1° Os
documentos necessários ao registro deverão ser apresentados no prazo de trinta dias, con-
tado da lavratura dos atos respectivos. § 2° Requerido além do prazo previsto neste artigo,
o registro somente produzirá efeito a partir da data de sua concessão. § 3° As pessoas
obrigadas a requerer o registro responderão por perdas e danos, em caso de omissão ou
demora." No mesmo sentido, o art. 36 da Lei n° 8.934/1994, que dispõe sobre o Registro
Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins, e o art. 33 do Decreto n° 1.800/1996.
1346 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 94 da Lei das S.A.
1347 O Código Civil, ao tratar da sociedade não personificada, estabelece, no art. 986, que:
"Art. 986. Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade, exceto por
ações em organização, pelo disposto neste Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que
com ele forem compatíveis, as normas da sociedade simples."
panhia, uma vez que ela ainda não adquiriu personalidade jurídica.
Assim, não podem praticar atos para a consecução do seu objeto so-
cial até que os documentos relativos à constituição estejam arquiva-
dos e publicados (artigo 94). Nesse sentido, o parágrafo único
determina que a companhia não responde pelos atos ou operações
praticados pelos primeiros administradores antes de cumpridas as for-
malidades de constituição, salvo deliberação em contrário da assem-
bleia geral.
Tendo em vista que o efeito do arquivamento retroage à data da
constituição, se ele for providenciado dentro do prazo de 30 (trinta)
dias, os atos praticados pelos primeiros administradores, no intervalo
entre a constituição e o arquivamento dos atos constitutivos, serão le-
gítimos. Ou seja, nessa hipótese, a companhia assumirá os atos ou ope-
rações por eles praticados, salvo se tiverem agido com culpa ou dolo, ou
com violação da lei ou do estatuto. A responsabilidade dos primeiros
administradores é a mesma determinada pela Lei das S.A. em seu arti-
go 158, à exceção da solidariedade entre eles prevista neste artigo.
Na hipótese dos primeiros administradores requererem o arqui-
vamento dos atos constitutivos após decorrido o prazo de 30 (trinta)
dias de sua lavratura e a assembleia geral aprovar os atos e operações
por eles praticados - ainda que de forma genérica, ou seja, sem espe-
cificar cada um deles - a companhia passa a ser responsável por tais
atos. Não há, nesse caso, que se falar em ratificação ou consolidação
das operações praticadas, mas de substituição da responsabilidade dos
administradores pela companhia.
CAPÍTULO I X
LIVROS SOCIAIS
1348 Consta do art. 149 da Lei das S.A. que: "Os conselheiros e diretores serão investidos nos
seus cargos mediante assinatura de termo de posse no livro de atas do conselho de adminis-
tração ou da diretoria, conforme o caso."
1349 A Lei das S.A. determina no art. 127 que: "Antes de abrir-se a assembleia, os acionistas
assinarão o 'Livro de Presença', indicando o seu nome, nacionalidade e residência, bem
como a quantidade, espécie e classe das ações de que forem titulares."
1350 O Código Civil, no art. 1.181, estabelece que: "Salvo disposição especial de lei, os livros
obrigatórios e, se for o caso, as fichas, antes de postos em uso, devem ser autenticados no
Registro Público de Empresas Mercantis."
1351 Sobre os livros obrigatórios da sociedade empresária, ver os arts. 1.179 a 1.195 do Código
Civil e arts. 378 e 379 do Código de Processo Civil.
1352 Sobre esse assunto, ver a Instrução Normativa D N R C n° 107/2008 que trata dos procedi-
mentos para a validade e eficácia dos instrumentos de escrituração dos empresários,
sociedades empresárias, leiloeiros, tradutores públicos e intérpretes. O s arts. 12 a 15 dessa
Instrução tratam especificamente da autenticação de livros em papel, fichas ou folhas
contínuas e avulsas.
1353 Sobre esse assunto, ver os comentários aos arts. 63 e 75 da Lei das S.A.
1354 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 31 da Lei das S.A.
representantes (artigo 31, § I o ). A mesma regra aplica-se às partes
beneficiárias (artigo 50), às debêntures (artigo 63) e aos bônus de subs-
crição (artigo 78). A transferência das ações escriturais opera-se por
lançamento efetuado pela instituição depositária em seus livros, a
débito da conta de ações do alienante e a crédito da conta de ações do
adquirente, à vista de ordem escrita do alienante, ou de autorização
ou ordem judicial, em documento hábil que ficará em poder da insti-
tuição (artigo 35, § I o ).
Os registros constantes dos livros enumerados nos incisos I a III
podem produzir efeitos perante terceiros, tendo, portanto, esses livros
caráter de registro público; os demais livros, relacionados nos incisos
IV a VII, referem-se à administração da companhia. Por essa razão, o
§ I o estabelece que qualquer pessoa pode requerer certidões dos as-
sentamentos constantes dos "Livros de Registro e Transferência de
Ações Nominativas, Partes Beneficiárias Nominativas e Debêntures
Nominativas", desde que se destinem à defesa de direitos e esclareci-
mento de situações de interesse pessoal ou dos acionistas ou do mer-
cado de valores mobiliários. A companhia poderá cobrar o custo desse
serviço e, caso entenda que é descabido o motivo alegado para o re-
querimento da certidão, poderá negá-lo, cabendo, do indeferimento
do pedido, recurso à Comissão de Valores Mobiliários, se for o caso1355.
Tanto os acionistas das companhias abertas quanto os das socieda-
des fechadas poderão ajuizar ação, com pedido de tutela antecipada,
com o intuito de obter a certidão.
Tratando-se de ações escriturais, em que os registros são efetua-
dos pela instituição depositária, esta é que deverá fornecer as certi-
dões dos extratos das contas de depósito.
1 355 Sobre a emissão da certidão dos assentamentos dos livros da companhia, ver o Parecer de
Orientação C V M n" 30/1996 e a decisão da 3 a Turma do Superior Tribunal de Justiça
proferida nos autos do Recurso Especial n° 238.618-SP, Rei. Min. Nancy Andrighi, j. em
15.10.2001, publicada no D J U em 18.02.2002.
Relativamente às informações que devem ser fornecidas pela
companhia ou pela instituição depositária, a Comissão de Valores
Mobiliários já se manifestou no sentido de que são apenas aquelas
objeto do "Livro de Registro de Ações Nominativas" e constantes
das alíneas "a" a "f" do inciso I, a saber: (i) o nome do acionista e o
número das suas ações; (ii) as entradas ou prestações de capital reali-
zado; (iii) as conversões de ações, de uma em outra espécie ou classe;
(iv) o resgate, reembolso e amortização das ações, ou de sua aquisição
pela companhia; (v) as mutações operadas pela alienação ou transfe-
rência de ações; e (vi) o penhor, usufruto, fideicomisso, a alienação
fiduciária em garantia ou qualquer ônus que grave as ações ou obste
sua negociação. Esclareceu, ainda, essa Autarquia que a companhia
não é obrigada a fornecer o endereço dos acionistas ou quaisquer ou-
tros dados cadastrais que são para uso da sociedade, ressalvada a hi-
pótese de que trata o § 3 o do artigo 126 em que acionista titular de
ações, com ou sem voto, que represente mais de 5% (cinco por cento)
do capital social pode solicitar a relação de endereço dos acionistas
aos quais a companhia enviou pedidos de procuração1356-1357 (P-
especffica, ainda que sucinta, para legitimar o seu deferimento> devendo tal justificativa identi-
ficar (i) o direito a ser defendido ou a situação de interesse pessoal a ser esclarecida, e (ii) em
que medida a divulgação dos assentamentos dos livros sociais é necessária para o esclarecimen-
to da situação de interesse pessoal ou defesa do direito em questão. A companhia está
obrigada a fornecer certidão dos assentamentos quando forem necessários e suficientes para o
esclarecimento da situação de interesse pessoal ou a defesa do direito identificado no pedido.
O fornecimento da lista integral dos acionistas, com base no disposto no § 1° do art. 100 da
LSA, só se impõe nos casos em que estiver devidamente justificado que o direito violado ou em
vias de ser violado é inerente â qualidade de acionista, sendo a sua defesa de interesse de todos
os acionistas." Essa mesma decisão cita, exemplificativamente, as seguintes hipóteses em que
cabe o fornecimento da lista integral de acionistas com base no § I o do art. 100 da Lei das
S.A., por configurarem casos em que os acionistas devem atuar conjuntamente para defender
algum direito: (i) ação de responsabilidade a ser proposta por acionistas (art. 159, § 1°); (ii)
ação de exibição integral dos livros da companhia (art. 105, § 4 o ); e (iii) o pedido de lista
voltado a facilitar a formação de quorum necessário à convocação da assembleia geral, desde
que seja demonstrado que a deliberação a ser incluída na ordem do dia tenha o nítido caráter
de defesa de direitos. N o mesmo sentido são as seguintes decisões: (i) Processo Administra-
tivo C V M n° RJ 2003/0023, Rei. Dir. Waldimir Castelo Branco Castro, j. em 10.06.2003; (ii)
Processo Administrativo C V M n° RJ 2006/8588, Rei. Dir. Pedro Oliva Marcilio de Sousa, j.
em 19.12.2006; (iii) Processo Administrativo C V M n° 2007/1488, Rei. Dir. Maria Helena
Santana, j. em 28.06.2007; (iv) Processo Administrativo C V M n° SP 2006/0162, Rei. Dir.
Pedro Oliva Marcilio de Sousa, j. em 03.07.2007; (v) Processo Administrativo C V M n° RJ
2007/13822, Rei. Dir. Sérgio Weguelin, j. em 25.03.2008; e (vi) Processo Administrativo
C V M n° RJ 2010/2689, Rei. Dir. Marcos Barbosa Pinto, j. em 20.07.2010.
1357 Em sentido contrário, ou seja, da legitimidade do pedido de lista de acionista com base no §
I o do art. 100 da Lei das S.A., com o fim de discutir assuntos relativos à companhia e traçar
estratégias comuns de atuação em assembleias gerais, foram as seguintes decisões: (i) Processo
Administrativo C V M n° RJ 2001/10680, Rei. Dir. Waldimir Castelo Branco Castro, j. 29.10.2002;
(ii) Processo Administrativo C V M n° 2003/6440, Rei. Dir. Norma Jonssen Parente, j. em
31.03.2004; (iii) Processo Administrativo C V M n° RJ 2004/0203, Rei. Dir. Wladimir Castelo
Branco Castro, j. em 16.04.2004; e (iv) Processo Administrativo RJ n° 2004/0712, Rei. Dir.
Wladimir Castelo Branco Castro, j. em 29.04.2004.
bações por ela ordenadas, ou sobre anotações, lançamentos ou trans-
ferência de ações, partes beneficiárias, debêntures ou bônus de subs-
crição, nos livros de registro ou transferência, serão dirimidas pelo
juiz competente para solucionar as dúvidas levantadas pelos oficiais
dos registros públicos, excetuadas as questões atinentes à substância
do direito (artigo 103, parágrafo único).
Nas companhias abertas, os livros referidos nos incisos I a V do
caput deste artigo poderão ser substituídos, observadas as normas expe-
didas pela Comissão de Valores Mobiliários, por registros mecanizados
ou eletrônicos, nos termos do § 2 o , com a redação dada pela Lei n°
12.431/2011. Os bancos comerciais e de investimento, as sociedades
corretoras e distribuidoras, outras entidades equiparadas e as Bolsas de
Valores são autorizados, pela Comissão de Valores Mobiliários, a pres-
tar serviços de ações escriturais, custódia de valores mobiliários e de
agente emissor de certificados, desde que comprovem possuir condi-
ções técnicas, operacionais e econômico-financeiras adequadas1358.
1358 Instrução C V M n° 89/1988, com as alterações introduzidas pelas Instruções C V M n°5 212/1994
e 261/1997.
certificado da ação, no qual serão averbados a transferência e o
nome e qualificação do adquirente.
1359 Sobre esse assunto, ver os comentários aos arts. 11 e 20 da Lei das S.A.
13 60 D e acordo com a Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, as instituições financeiras
especializadas na escrituração de livros de ações e na emissão de certificados substituem,
com as vantagens de menor custo e maior segurança, os departamentos de acionistas que
as companhias abertas eram obrigadas a manter. Observa, ainda, que os arts. 101 e 102 da
Lei das S.A. simplificam formalidades e autorizam a adoção de métodos de escrituração
mais econômicos.
Uma vez contratados os serviços do agente emissor, somente ele
poderá realizá-los e não mais a própria companhia, até mesmo por-
que os livros estarão sob a sua guarda1361.
O agente emissor deve (i) manter os registros de propriedade das
ações, partes beneficiárias, debêntures e bônus de subscrição mediante
sistemas adequados e aprovados pela Comissão de Valores
Mobiliários1362; e (ii) preparar, anualmente, lista dos seus titulares, com
o número dos títulos de cada um, a qual será encadernada, autenticada
no Registro Público de Empresas Mercantis e arquivada na companhia,
sem prejuízo de ser por essa requerida quando julgar conveniente. Essa
lista tem a mesma finalidade do livro e é prova júris tantum de
propriedade das ações.
A escrituração do agente emissor deve ser efetuada de acordo com
as regras editadas pela Comissão de Valores Mobiliários. Ele deve dili-
genciar para que os atos de emissão e substituição de certificados, de
transferência e averbação nos livros sejam praticados no menor prazo
possível, não excedentes a 60 (sessenta) dias da data: (i) da homologação
do aumento de capital, nos casos de subscrição de valores mobiliários; e
(ii) do recebimento dos documentos pertinentes, nos demais casos1363.
A companhia responde diretamente perante os titulares de valo-
res mobiliários e terceiros interessados por erro ou irregularidade na
prestação de serviços do agente emissor (artigos 34, § 3 o , e 104), porém
tem direito de regresso contra a instituição prestadora dos serviços. No
entanto, os titulares de valores mobiliários da companhia e terceiros
interessados poderão acionar diretamente a instituição financeira1364-1365-
Ações escriturais
"Art. 102. A instituição financeira depositária de ações escritu-
rais deverá fornecer à companhia, ao menos uma vez por ano,
cópia dos extratos das contas de depósito das ações e a lista dos
acionistas com a quantidade das respectivas ações, que serão en-
cadernadas em livros autenticados no registro do comércio e ar-
quivados na instituição financeira."
1 368 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 20 da Lei das S.A.
sobre os valores mobiliários de sua emissão e estende essa responsabilidade
ao agente emissor de certificados e à instituiçãofinanceiradepositária das
ações escriturais, nos termos dos artigos 27 e 34, respectivamente1369-1370.
Essa regra justifica-se na medida em que a propriedade das ações
nominativas presume-se pela inscrição do nome do acionista no "Livro
de Registro de Ações Nominativas" ou pelo extrato fornecido pela
instituição custodiante, na qualidade de proprietária fiduciária das ações
(artigo 31, caput). Assim, a presunção de propriedade é relativa {júris
tantum), admitindo-se prova em contrário1371.
Os assentamentos constantes dos livros da companhia servem de
prova perante terceiros e junto aos titulares de valores mobiliários de sua
emissão; por essa razão, a Lei das S.A. permite que qualquer pessoa,
desde que se destine à defesa de direitos e esclarecimentos de situações de
interesse pessoal ou dos acionistas ou do mercado de valores mobiliários,
possa requerer certidões das averbações constantes dos "Livros de Re-
gistro e Transferência de Ações Nominativas, Partes Beneficiárias No-
minativas, Debêntures e Bônus de Subscrição" (artigo 100, § Io)1372.
1369 Constava da Lei n° 4.728/1965, que disciplinava o mercado de capitais, que: "Art. 36. A
sociedade emitente fiscalizará, por ocasião da averbação ou emissão do novo certificado, a
regularidade das transferências e dos direitos constituídos sôbre a ação. § J ° As dúvidas
suscitadas entre a sociedade emitente e o titular da ação ou qualquer interessado, a
respeito das emissões ou averbações previstas nos artigos anteriores, serão dirimidas pelo
juiz competente para solucionar as dúvidas levantadas pelos oficiais dos registros públi-
cos, excetuadas as questões atinentes à substância do direito. (...) § 3o Nas transferências
feitas por procurador ou representante legal do cedenle, a sociedade emitente fiscalizará a
regularidade da representação e arquivará o respectivo instrumento."
1370 Sobre a custódia de valores mobiliários e suas características, ver os comentários aos arts.
31 e 41 da Lei das S.A.
1371 A C V M , nos arts. 6 o e 7 o da Instrução C V M n° 115/1990, determina que: "Art. 6° Os titulares
de ações em custódia nos termos desta Instrução poderão participar das assembleias gerais
das companhias emissoras das ações custodiadas ou nelas se fazer representar, e exercer o
direito de voto, exibindo ou depositando na companhia, se o estatuto o exigir, comprovante
expedido pela Bolsa de Valores. Art. 7 o A Bolsa de Valores depositária fornecerá, à compa-
nhia, a lista dos titulares de ações em custódia, assim como a quantidade de ações de que
cada um deles é titular, sempre que solicitado, por ocasião do exercício do direito de voto,
exercício do direito de preferência, distribuição de dividendos ou bonificações, e, em qual-
quer caso, no último dia útil de cada trimestre civil."
1372 Não obstante os Livros de Registro e Transferência de Debêntures e Bônus de Subscrição
Nominativos não estarem expressamente previstos no art. 100 da Lei das S.A., devem ser
criados, de acordo com as regras dos livros utilizados pelas ações nominativas, tendo em
vista que às debêntures e aos bônus de subscrição Nominativos aplica-se, no que couber,
Ainda que a companhia delegue poderes para a prática de atos
relativos à averbação e transferência de ações nominativas, ela será
sempre responsável perante os acionistas e terceiros pela regularidade
desses atos. Em qualquer caso, a companhia tem ação regressiva con-
tra os agentes emissores de certificados ou, relativamente às ações
escriturais, contra as instituições financeiras depositárias dessas
ações1373. Assim, os agentes emissores e as instituições financeiras
depositárias respondem apenas perante a companhia.
Os assentamentos efetuados nos livros societários e nos livros da
instituição financeira depositária das ações escriturais têm caráter de
registro público. Assim, as dúvidas suscitadas entre o acionista, ou
qualquer interessado, e a companhia, o agente emissor de certificados
ou a instituição financeira depositária das ações escriturais, a respeito
das averbações ordenadas pela Lei das S.A., ou sobre anotações,
lançamentos ou transferências de ações, partes beneficiárias, debêntures,
ou bônus de subscrição, nos "Livros de Registro ou Transferência", serão
dirimidas pelo juiz competente para solucionar as dúvidas levantadas
pelos oficiais dos registros públicos1374.
o disposto nas seções V a VII do Capítulo III, ou seja, as normas relativas aos certificados,
propriedade e circulação, constituição de direitos reais e outros ônus sobre as ações. Sobre
esse assunto, ver os comentários aos arts. 63 e 75 da Lei das S.A.
1373 Sobre o "agente emissor" e a instituição financeira depositária, ver os comentários aos
arts. 2 7 e 34 da Lei das S.A; e sobre a constituição de direitos ou ônus sobre valores
mobiliários, ver os comentários aos arts. 39 e 4 0 da Lei das S.A.
1374 Consta do art. 198 da Lei n° 6.015/1973, com a redação que lhe foi dada pela Lei nD 6.216/
1975, que: "Art 198. Havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito. Não
se conformando o apresentante com a exigência do oficial, ou não a podendo satisfazer,
será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competen-
te para dirimí-la, obedecendo-se ao seguinte: I - no Protocolo, anotará o oficial, à margem da
prenotação, a ocorrência da dúvida; II - após certificar, no título, a prenotação e a suscitação
da dúvida, rubricará o oficial todas as suas folhas; III - em seguida, o oficial dará ciência dos
termos da dúvida ao apresentante, fornecendo-lhe cópia da suscitação e notificando-o para
impugná-la, perante o juízo competente, no prazo de 15 (quinze) dias; IV - certificado o
cumprimento do disposto no item anterior, remeter-se-ão ao juízo competente, mediante
carga, as razões da dúvida, acompanhadas do título." Por sua vez, o caput do art. 204 do
mesmo diploma legal, com a redação que lhe foi dada pela Lei n° 6.216/1975, determina
que: "Art. 204. A decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do
processo contencioso competente."
No entanto, a solução de tais dúvidas limita-se à análise dos docu-
mentos apresentados à companhia para verificar se são suficientes e sa-
tisfatórios ao fim a que se destinam. O juiz da Vara de Registros Públicos
não tem competência para julgar questões referentes à substância do
direito; a análise do mérito compete ao juiz da Vara Cível.
Responsabilidade da companhia
"Art. 104. A companhia é responsável pelos prejuízos que causar
aos interessados, por vícios ou irregularidades verificados nos li-
vros de que tratam os incisos I a III do artigo 100. (Redação dada
pela Lei n° 9.457/1997)
1375 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 158 da Lei das S.A.
for causado pelo agente emissor (artigo 27) ou pela instituição depo-
sitária de ações escriturais (artigo 34), a companhia continuará res-
ponsável perante os acionistas e terceiros interessados, mas terá ação
regressiva contra aqueles1376.
Determina o parágrafo único que a companhia deve diligenciar
para que os atos de emissão e substituição de certificados e de trans-
ferências e averbações nos livros sociais sejam praticados no menor
prazo possível, não excedendo o fixado pela Comissão de Valores
Mobiliários, respondendo perante acionistas e terceiros pelos prejuí-
zos decorrentes de atrasos culposos1377. Assim, não basta o atraso no
registro
O
de emissão ou na transferência dos valores mobiliários; faz-se 7
13 76 Sobre esse assunto, ver os comentários aos arts. 34 e 103 da Lei das S.A.
1377 A C V M , por meio da Instrução C V M n° 89/1988, com as alterações introduzidas pelas
Instruções C V M n05 212/1994 e 261/1997, estabeleceu, no art. 14, que o agente emissor
deve diligenciar a fim de que os atos de transferência e averbações nos livros sejam
praticados no menor prazo possível, não excedente a 60 (sessenta) dias da data (i) da
homologação do aumento de capital, nos casos de subscrição de valores mobiliários; ou
(ii) do recebimento dos documentos pertinentes, nos demais casos.
das S. A., a gestão dos negócios sociais (artigo 109, inciso III). Em-
bora seja titular desse direito, o acionista não tem total liberdade
para escolher o meio mediante o qual o exercerá, posto que os
instrumentos de fiscalização são exclusivamente aqueles previstos
na Lei das S.A.: (i) participação na assembleia geral (artigo 121);
(ii) recebimento de informações financeiras (artigos 133 e 135, §
3 o ); (iii) funcionamento do conselho fiscal (artigo 161); (iv) aces-
so aos livros da companhia (artigos 100, § I o , e 105); (v) auditoria
independente (artigo 177, § 3 o ); e (vi) acesso às informações refe-
rentes a fatos relevantes e operações realizadas pelos administra-
dores (artigo 157, §§ I o e 4 o ) 1378 .
Embora o pedido de exibição judicial de livros possa ser pro-
posto como medida preventiva1379, nada impede que constitua ação
principal, posto que caracteriza pretensão de direito material autô-
noma que visa à assegurar ao acionista demandante o seu direito de
fiscalizar os negócios sociais1380.
Não obstante constituir uma das formas do exercício do direito
de fiscalização do acionista, a exibição de livros tem caráter
excepcional, tendo em vista que a regra geral deve ser a da proteção
do sigilo negociai1381.
Para requerer a exibição de livros, é indispensável que sejam apon-
tados atos violadores da lei ou do estatuto, ou haja fundada suspeita
de graves irregularidades praticadas por qualquer dos órgãos da com-
panhia. Atendidos esses pressupostos, o acionista ou o grupo de acio-
nistas que representem, no mínimo, 5% (cinco por cento) do capital
social, poderá solicitar judicialmente a exibição por inteiro dos livros
1382 N o entanto, até novembro de 2 0 1 1 , a C V M ainda não havia emitido ato normativo
regulando essa matéria,
1383 Nesse sentido, F R A N M A R T I N S . Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. 4° edição,
revista e atualizada por Roberto Rapini, Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 354.
CAPÍTULO X
ACIONISTAS
SEÇÃO fl
O B R I G A Ç Ã O DE REALIZAR O CAPITAL
Condições e mora
"Art. 1 0 6 . 0 acionista é obrigado a realizar, nas condições previs-
tas no estatuto ou no boletim de subscrição, a prestação corres-
pondente às ações subscritas ou adquiridas.
1384 Consta dos arts. 368 e 369 do Código Civil que: "Art. 368. Se duas pessoas forem ao mesmo
tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compen-
sarem. Art. 369. A compensação efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis."
1385 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 5° da Lei das S.A. Sobre a subscrição, ver,
também, os comentários ao art. 80 da Lei das S.A.
1 386 Sobre a obrigação de integralização das ações na constituição da companhia e nos aumen-
tos de capital, ver os comentários aos arts. 80 e 166 da Lei das S.A.
S.A. determina que o acionista, ao alienar as ações por ele subscritas,
fica responsável, solidariamente com os adquirentes, pelo pagamento
das prestações que faltarem para integralizar as ações (artigo 108, caput).
Caso as condições do pagamento do preço de emissão das ações -
como o montante de cada parcela e o prazo de vencimento — não se-
jam reguladas no boletim de subscrição ou no estatuto social, a assem-
bleia geral, ou o conselho de administração, na hipótese de capital
autorizado, deverá deliberar sobre o assunto, e se fará a chamada - ou
seja, um "convite" para a realização do capital subscrito -, nos termos
do § I o , mediante avisos publicados no Diário Oficial e em outro jornal
de grande circulação editado na localidade em que está situada a sede
da companhia (artigo 289).
O § 2 o estabelece que o acionista que não fizer o pagamento nas
condições previstas no estatuto ou boletim, ou na chamada, ficará de
pleno direito constituído em mora, sujeitando-se ao pagamento dos
juros, da correção monetária e da multa que o estatuto determinar,
esta não superior a 10% (dez por cento) do valor da prestação. Assim,
a constituição em mora não depende de notificação judicial ou extra-
judicial, conforme prevê o Código Civil1387, pois é caracterizada a par-
tir do vencimento do prazo fixado no estatuto ou no boletim de
subscrição e, no caso de chamada, após vencido o prazo constante da
publicação.
Além dos juros, da correção monetária e da multa que o estatuto
eventualmente determinar, o acionista remisso - isto é, aquele que ficou
em mora com a obrigação de realizar o capital - estará, também, sujeito
a ter suspenso o exercício dos direitos da ação enquanto não pagar as
prestações devidas1388, à ação de execução ou à venda de suas ações em
1387 De acordo com o art. 397 do Código Civil, "o inadimplemento da obrigação, positiva e
líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor. Parágrafo único. Não
havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial."
1388 Sobre a suspensão dos direitos dos acionistas constituídos em mora, ver os comentários ao
art. 120 da Lei das S.A.
Bolsa de Valores (artigo 107), bem como ao pagamento das despesas
que a companhia vier a incorrer para a satisfação do seu crédito.
Com relação à correção monetária, aplica-se ao estatuto das com-
panhias a norma prevista na Lei n° 9.069/1995, que vedou a cláusula
de correção monetária com periodicidade inferior a 1 (um) ano1389.
A assembleia geral pode alterar as condições previstas no estatuto
referentes ao montante da prestação e ao prazo ou data do pagamento
das ações subscritas, desde que observado o quorum previsto no artigo
135 para a sua alteração; a assembleia geral extraordinária somente se
instalará em primeira convocação com a presença de acionistas que
representem 2/3 (dois terços), no mínimo, do capital com direito a voto1390.
A companhia não pode cobrar do acionista a integralização das ações
subscritas antes do seu vencimento, nem tem ele a faculdade de anteci-
par as importâncias a que se obrigou a pagar, salvo disposição em contrá-
rio no estatuto, pois o prazo foi fixado de acordo com a conveniência da
companhia Na hipótese de a companhia aceitar o pagamento antecipa-
do, não poderá tratar de modo diferenciado os acionistas que integraliza-
ram as suas ações e os que ainda não integralizaram, inclusive para efeito
de pagamento de dividendos, uma vez que esses são distribuídos de acor-
do com a participação do acionista no capital da companhia1391.
1389 Consta do § 1 o d o art. 2 8 d a Lei n° 9 . 0 6 9 / 1 9 9 5 q u e "é nula de pleno direito e não surtirá
nenhum efeito cláusula de correção monetária cuja periodicidade seja inferior a um ano."
1390 N o mesmo sentido, J O S É W A L D E C Y L U C E N A . Das Sociedades Anônimas - Comentários à Lei
(arts. I o a 120). v. I, Rio de Janeiro: Renovar, 2 0 0 9 , p. 967; e m sentido contrário, M A R C E L O
B A R B O S A , "Obrigações dos Acionistas", in: Alfredo L a m y Filho e José L u i z Bulhões Pedreira
(Coord.). Direito das Companhias, v. I, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 286.
1391 Sobre esse assunto, E G B E R T O L A C E R D A T E I X E I R A e J O S É A L E X A N D R E T A V A R E S G U E R R E I -
R O . Das Sociedades Anônimas no Direito Brasileiro, v. 1, São Raulo: José Bushatsky, 1979,
observam que: "Ora, no silêncio dos estatutos e na falta de resolução clara e prévia da
assembleia geral, reconhecer às ações integralizadas o direito a dividendo maior que o
destinado às ações não integralizadas (porém não constituídas em mora) é, de outro modo,
criar preferência não desejada pelos acionistas, nem autorizada pela sistemática legal. Assim,
a diversidade de dividendos somente seria admissível, em nosso entender, quando expressa-
mente prevista pelos estatutos. A regra da igualdade de tratamento dos acionistas não
permite, salvo previsão estatutária, conceder maior dividendo às ações espontaneamente
integralizadas das que se sujeitaram ao limite da chamada feita pela administração".
Havendo mora do acionista na integralização das ações subscritas
e existindo previsão estatutária expressa, nada obsta que seja dado tra-
tamento diferenciado aos acionistas que integralizaram as suas ações e
aos que se tornaram remissos, inclusive no que se refere ao pagamento
de dividendos1392. Na ausência de regra estatutária, é inadmissível o
tratamento diferenciado1393; poderá a companhia, nessa hipótese, com
base no artigo 120, suspender o exercício dos direitos do acionista. O
acionista, no entanto, não pode ficar à espera, indefinidamente, que a
assembleia decida aplicar-lhe a penalidade de suspensão de direitos.
Assim, no silêncio do estatuto, deve a deliberação ser adotada na pri-
meira assembleia geral extraordinária realizada após a constatação do
ato praticado em violação da lei ou do estatuto, sob pena de precluir a
possibilidade de ser aplicada a sanção1394.
Acionista remisso
"Art. 107. Verificada a mora do acionista, a companhia pode, à
sua escolha:
1395 D e acordo com o arí. 394 do Código Civil, "considera-se em mora o devedor que não
efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei
ou a convenção estabelecer."
1396 Ver os comentários ao art. 120 da Lei das S.A.
1397 P A U L O C E Z A R A R A G Ã O , "Aspectos Processuais da Legislação Societária", Revista dos
Tribunais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 641, março, 1989, p. 69.
1398 Determina o Código de Processo Civil no art. 585, inciso VIII, incluído pela Lei n° 11.382/
2006, que são títulos executivos extrajudiciais todos aqueles a que a lei atribui expressa-
mente força executiva.
1399 Art. 100, inciso IV, alínea "d", do Código de Processo Civil.
Caso a companhia opte pela venda das ações em Bolsa de Va-
lores, deverá, conforme determina o § 2°, publicar aviso, por 3 (três)
vezes, com antecedência mínima de 3 (três) dias, no Diário Oficial
e em outro jornal de grande circulação (artigo 289). Caso o acionis-
ta não efetue o pagamento devido, a companhia providenciará a
venda das ações em leilão especial na Bolsa de Valores do lugar da
sede social, ou, se não houver, na mais próxima1400. O acionista po-
derá, antes de realizado o leilão especial, purgar a mora e requerer o
cancelamento do leilão, mantendo, assim, o seu status socii. O can-
celamento do leilão só será possível se o acionista remisso pagar
todos os valores em atraso, bem como o montante integral das des-
pesas incorridas pela companhia para satisfazer o seu crédito e, se
previstos no estatuto, juros e multa.
Não se aplica ao leilão especial para a venda de ações na Bolsa de
Valores o requisito do registro prévio da emissão na Comissão de Valo-
res Mobiliários, pois se trata, nessa hipótese, de cobrança pela compa-
nhia de crédito decorrente do inadimplemento de acionista remisso.
Do produto da venda serão deduzidas as despesas com a operação e, se
previstos no estatuto, os juros, correção monetária e multa, ficando o
saldo à disposição do ex-acionista, na sede da sociedade.
A liberdade que tem a companhia de optar entre executar o acio-
nista remisso ou mandar vender as ações em Bolsa de Valores não pode
ser excluída ou limitada pelo estatuto ou boletim de subscrição. Ou seja,
não se admite estipulação que assegure ao subscritor, em caso de inadim-
plemento da obrigação de integralizar o capital, o direito de não ser
executado e/ou de não ter as suas ações vendidas em Bolsa. Nos ter-
mos do § I o , o subscritor de boa-fé terá ação contra os fundadores,
administradores ou acionistas controladores, conforme o caso, por qual-
1400 A CVM, por mejo da Instrução C V M n° 160/1991 - que dispõe sobre operações sujeitas a
procedimentos especiais nas Bolsas de Valores - , com as alterações introduzidas pela
instrução C V M n° 252/1996, determina, no inciso III do art. 2°, que as Bolsas de Valores
deverão adotar procedimentos especiais para as operações que envolvam venda de ações
de acionistas em mora.
quer estipulação nesse sentido, para haver perdas e danos sofridos, sem
prejuízo da responsabilidade penal que no caso couber.
Ainda que a companhia exerça uma das alternativas prevista
no caput, poderá, conforme lhe faculta o § 3 o , mesmo após iniciada
a cobrança judicial, mandar vender a ação em Bolsa de Valores; po-
derá, também, ou promover a cobrança judicial se as ações ofereci-
das em Bolsa não encontrarem tomador, ou se o preço apurado não
bastar para pagar os débitos do acionista1401.
Na hipótese de a companhia não conseguir efetuar a integraliza-
ção das ações por qualquer dos meios previstos no caput, poderá decla-
rar caduco o direito do acionista de integralizá-las e fazer suas as entradas
realizadas. Assim, o acionista remisso deixa de ter participação no capi-
tal da companhia, proporcional ao montante das ações não integraliza-
das; não terá mais oportunidade de quitar a sua dívida e perderá as
importâncias que pagou a título de entrada e realizações posteriores.
A companhia não pode fazer suas as entradas com a simples
verificação da mora do acionista remisso; é necessário adotar um dos
procedimentos objeto do caput e apenas se não obtiver êxito declarará
caduco o direito do acionista remisso. A companhia não é obrigada a
adotar os 2 (dois) procedimentos previstos na Lei das S.A. - isto é, a
execução judicial e o leilão especial - para declarar caducas as ações,
pois pode agir de uma forma ou de outra ou, ainda, adotar ambos os
procedimento s1402.
Estabelece o § 4 o uma exceção à proibição da companhia de
negociar com as próprias ações (artigo 30, § I o , alínea "b"), tendo em
vista que lhe faculta integralizar ações do acionista remisso com lu-
1401 A L F R E D O SÉRGIO L A Z Z A R E S C H I NETO. Lei das Sociedades por Ações Anotada. 3 a edição,
São Paulo: Saraiva, 2010, p. 143, observa que: "A companhia tem ampla liberdade para
tomar as medidas que entender cabíveis, bem como desistir daquelas já tomadas e decidir
pela adoção de outras. A lei objetiva garantir a total integralização do capital social."
1402 No mesmo sentido, JOSÉ W A L D E C Y L U C E N A . Das Sociedades Anônimas - Comentários à
Lei (arts. 1o a 120). v. I, Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 978. Em sentido contrário, FRAN
MARTINS. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. 4" edição, revista e atualizada por
Roberto Papini, Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 362.
cros ou reservas disponíveis, exceto a legal. As ações permanecerão
em tesouraria ou serão canceladas, sem diminuição do capital social.
Caso a companhia não tenha lucros e reservas disponíveis para
adquirir as ações ou sendo insuficiente o seu valor, terá o prazo de 1
(um) ano para vender a terceiros as ações caídas em comisso. Findo
esse prazo e não tendo sido encontrado comprador, a assembleia geral
deliberará sobre a redução do capital em importância correspondente.
Tendo em vista que não se trata, nessa hipótese, de redução
voluntária do capital social, mas de redução compulsória, não de-
pende de deliberação assemblear, pois decorre da lei, embora deva
ser homologada em assembleia geral, visando a legalizar uma situa-
ção, de fato, já ocorrida1403.
Por essa razão, a Lei das S.A., ao regular a redução do capital
social com restituição aos acionistas de parte do valor das ações e
estabelecer que só se tomará efetiva 60 (sessenta) dias após a realiza-
ção da assembleia geral (artigo 174), ressalva, expressamente, as hi-
póteses de ações caídas em comisso e de reembolso das ações dos
acionistas que exerceram o direito de recesso (artigo 45).
1404 Sobre esse assunto, ver os comentários ao art. 5 o da Lei das S.A.
1405 A Lei das S.A. prevê em diversos outros artigos normas que tratam da realidade e integridade
do capital social, tais como: (i) as que proíbem a emissão de ações abaixo do valor nominal
(art. 13); (ii) as que regulam a irrevogabilidade das prestações a que os sócios se obrigaram
na integralização no capital (arts. 106 e 107); (iii) as que estabelecem a necessidade de se
avaliar os bens com que o acionista concorre para o capital social (art. 8 o ); (iv) as que
determinam o depósito bancário da entrada, na subscrição em dinheiro, quando da cons-
tituição da companhia (arts. 80, inciso II, e 81); (v) as que disciplinam no interesse de
terceiros a redução do capital social (art. 174); (vi) as que vedam a distribuição de dividen-
dos sem lucros (art. 201) e a compra das próprias ações pela companhia com redução do
capital social (art. 30, § I o , alínea "b"); e (vii) as que disciplinam a elaboração anual das
demonstrações financeiras e a constituição da reserva legal (art. 193).
lizado nesse mesmo percentual. Por outro lado, ainda que o capital es-
teja integraiizado em 30% (trinta por cento) do seu valor, as ações não
integralizadas nesse percentual não podem ser negociadas1406.
Tratando-se de responsabilidade solidária, a sociedade pode exi-
gir de qualquer um dos adquirentes das ações, ou de todos conjunta-
mente, o pagamento das prestações devidas1407. Aquele que efetuar o
pagamento terá direito de regresso e somente poderá cobrar o valor
pago dos adquirentes posteriores e não dos que lhe antecederam1408.
A responsabilidade de cada alienante cessa ao fim de 2 (dois)
anos a contar da data da transferência das ações. Assim, o acionista
que ainda não integralizou as suas ações, ao aliená-las, continua res-
ponsável pelo pagamento das prestações que faltarem para integrali-
zar as ações transferidas pelo prazo de 2 (dois) anos, contado, no caso
de ações registradas, da data do termo de cessão lavrado no "Livro de
Transferência de Ações Nominativas"; tratando-se de ações escritu-
rais, da data constante dos livros da instituição financeira depositária.
Esse prazo é de decadência, portanto, não está sujeito à suspensão ou
interrupção1409-1410.
SEÇÃO I I
DIREITOS ESSENCIAIS
1412 R I C H A R D A. POSNER. Economic Analysis of the Law. 5"' edition, New York: Aspen Law &
Business, 1995, p. 452.
1413 MELVIN A R O N EISENBERC. The Structure of the Corporation - A Legal Analysis. Boston:
Little Brown and Company, 1976, p. 2 e seguintes.
1414 Sobre o "status socii", ver D A N I E L A R A M O S M A R Q U E S M A R I N O , " O Status Socii". In:
Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França (Coord.). Direito Societário Contemporâneo I.
São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 163-182.
A expressão "estado de acionista" designa a relação entre o
acionista e a sociedade, tendo sido consagrada pela doutrina italiana,
em evidente equiparação ao "estado de cidadão". Embora incorporada
à linguagem jurídico-societária, é discutível, uma vez que difere a
situação do cidadão da situação do acionista: a qualidade do primeiro
é obrigatória, a do sócio voluntária; para o acionista, os direitos e
obrigações criam o seu estado, diversamente do que ocorre com o
cidadão, cujos direitos e obrigações decorrem do seu estado1415.
Existem outros direitos previstos na Lei das S.A. que são igual-
mente inderrogáveis1416. A relação prevista neste artigo não é exausti-
va, mas apenas enumera aqueles direitos que constituem as bases
essenciais do contrato social. Assim, por exemplo, são igualmente
prerrogativas individuais dos acionistas, das quais não podem ser pri-
vados por deliberação da assembleia ou por previsão estatutária, as de:
(i) ter sua responsabilidade limitada ao preço de emissão das ações
subscritas ou adquiridas, em todas as companhias1417; (ii) transferir
livremente suas ações, no caso das companhias abertas1418; (iii) parti-
cipar na oferta pública por ocasião da alienação do controle acionário
de companhia aberta1419; (iv) convocar a assembleia quando os admi-
nistradores retardarem a sua convocação1420; e (v) propor ação de res-
ponsabilidade contra os administradores1421.
Ao assegurar aos acionistas certos direitos essenciais, objetiva a
Lei das S.A. garantir a estabilização nas relações de poder internas à
companhia: o poder do controlador não é exercido ilimitadamente; e
1425 W A L D I R I O BULGARELLI. Regime Jurídico da Proteção às Minorias nas S/A. Rio de Janei-
ro: Renovar, 1998, p. 40.
1426 G E O R G E RIPERT. Traité Élementaire de Droit Commercial. fòris: Librairie Générale de
Droit et de Jurisprudence R. Pichon, 1951, p. 439, ao analisar os direitos individuais dos
acionistas, assinala que: "A comparação da sociedade a um estado de constituição demo-
crática permite atribuir outro fundamento aos direitos do acionista; assim como existem
direitos do homem e do cidadão que o poder público deve respeitaro acionista tem direitos
individuais que o poder constituído da sociedade não pode suprimir ou afetar".
1427 W A L D Í R I O BULGARELLI. Regime Jurídico da Proteção às Minorias nas S/A..., p. 40.
1428 D O M I N I Q U E SCHMIDT. Les Droits de Ia Minorité dans Ia Société Anonyme. Paris: Sirey,
1970, p. 3.
para efeitos legais, classificações doutrinárias de acionistas minoritá-
rios tendo em vista os objetivos de seu investimento na sociedade
("rendeiros" ou "capitalistas"), a motivação de sua participação ("acio-
nistas especuladores" ou "acionistas empresários"), ou, ainda, sua maior
ou menor organização ("minorias orgânicas" ou "anômicas").
Da mesma forma, hoje já não tem maiores conseqüências práti-
cas a discussão sobre a qualificação de acionistas minoritários como
sendo apenas os titulares de ações ordinárias ou todos os acionistas,
votantes ou não, exceto no que diz respeito à composição do conse-
lho fiscal (artigo 161), no qual há membros indicados pelos preferen-
cialistas e pelos minoritários com direito a voto1429.
Assim, são considerados acionistas minoritários, em princípio,
todos aqueles que não fazem parte do grupo controlador, ou, na dic-
ção da Lei das S.A., os titulares das ações em circulação no mercado
(artigo 4 o , § 4o); portanto, acionista minoritário é sinônimo de acio-
nista não controlador.
Este artigo regula os seguintes direitos como essenciais: (i) par-
ticipar dos lucros sociais; (ii) participar do acervo, no caso de liquida-
ção; (iii) fiscalizar a gestão dos negócios sociais; (iv) preferência para
subscrição de ações e demais valores mobiliários conversíveis em ações;
e (v) retirar-se da sociedade nos casos previstos na Lei das S.A.
dividendos não implica o nâo-preenchimento do objeto social pela sociedade. A prova, a ser
feita na ação de dissolução com fundamento no art. 206, II, b, é da incapacidade de a
sociedade produzir lucros, na consecução de seu objeto, e não da não-distribuição de
dividendos. Esta não-distribuição, quando não tem apoio estatutário, deve ser objeto de ação
judicial, por parte de acionista, para anular a deliberação a respeito, que fira a lei ou estatuto."
1435 H E R N A N I ESTRELA. Direito Comercial (Estudos). Rio de Janeiro: José Konfino Editor,
1969, p. 190.
1436 GIUSEPPE FERRI. Le Società. Torino: Unione Tipografico-Editrice Torinese, 1971, p. 414.
1437 Art. 8 o , inciso V, da Lei n° 6.385/1976.
participação no lucro a que tenham direito os debenturistas, empre-
gados, administradores, etc.1439 (artigos 189, 190 e 201).
Não existe, em nosso sistema jurídico, o chamado "dividendo de
lealdade", que constitui aquele pago aos acionistas fiéis à companhia,
que aceitam nela permanecer em troca de dividendos superiores ao
Wal
O
ou estatutário1440.
Caso a situação financeira da companhia não permita a distri-
buição de dividendos, em razão de prejuízos acumulados ou apurados
no exercício social, não obstante o acionista não possa exercer na-
quele período o seu direito de participar nos lucros, o mesmo perma-
nece inalterado, por força de disposição expressa da Lei das S.A. (artigo
202, § 5 o ). Assim, se não houver lucro a ser distribuído aos acionistas,
o direito ao dividendo permanece íntegro, tornando-se exigível quan-
do houver "lucro", inclusive em relação aos períodos em que se man-
teve suspenso1441.
Uma vez levantado e aprovado o balanço e verificada a existên-
cia de lucro líquido, apurado na forma da Lei das S.A.1442, o acionista,
que já detinha o direito potencial de receber os lucros, adquire, a partir
desse momento, o direito ao seu exercício. Trata-se de um direito sub-
jetivo do acionista, correspondente à obrigação da companhia de per-
seguir um fim lucrativo1443.
O direito ao dividendo constitui um direito expectativo, não uma
mera expectativa de direito1444, ou seja, já integra o universo jurídico,
da mesma forma que ocorre com o direito de preferência à subscrição
1450 OSMAR ERINA CORRÊA LIMA. O Acionista Minoritário no Direito Brasileiro. Rio de
Janeiro: Forense, 1994, p. 29; J O R G E L O B O . Direitos dos Acionistas..., p. 159.
1451 FÁBIO U L H O A C O E L H O . Curso de Direito Comercial, v. 2, 6 a edição, São Paulo: Saraiva,
2003, p. 291.
independente (artigo 177, § 3o); e (vi) acesso às informações referen-
tes a fatos relevantes e operações realizadas pelos administradores
(artigo 157, §§ I o e 4 o ).
Mediante participação na assembleia geral ordinária, podem os
acionistas fiscalizar a gestão dos negócios sociais. Os titulares de ações
preferenciais, embora não dispondo do direito de voto, podem com-
parecer à assembleia, consultar as demonstrações financeiras e mes-
mo discuti-las no conclave1452, tendo ainda ampla liberdade para pedir
esclarecimentos aos administradores e aos auditores. Havendo ne-
cessidade de esclarecimentos adicionais, pode a deliberação sobre a
aprovação das contas ser adiada e ordenada diligência para atender às
solicitações de informações dos acionistas1453. Os titulares de ações
ordinárias não só detêm os direitos acima, como também o de apro-
var, com ou sem ressalvas, as demonstrações financeiras ou rejeitá-las.
A aprovação das contas constitui uma declaração de vontade por par-
te da assembleia geral ordinária, não se restringindo, pois, ao mero
atendimento de formalidade legal, uma vez que os acionistas têm um
poder discricionário em relação à sua apreciação1454. A aprovação sem
reservas opera a desoneração da responsabilidade dos administrado-
res e membros do conselho fiscal1455.
Constitui elemento essencial do direito de fiscalizar o exame dos
documentos que devem ser colocados à disposição de todos os acio-
nistas antes da realização da assembleia geral ordinária: (i) relatório
da administração; (ii) cópia das demonstrações financeiras; (iii) pare-
1477 P A U L L. DAVIES. Modem Company Law. 7"' edition, London: Sweet & Maxwell, 2003,
p. 632.
mero proporcional ao percentual de ações de que seja titular, de forma
a manter a sua posição no capital social após o seu aumento. O objeto
do direito não é uma quantidade determinada de ações, mas a manu-
tenção de determinada participação acionária.
Idêntico direito é assegurado à subscrição de debêntures conver-
síveis em ações, bônus de subscrição e partes beneficiárias conversí-
veis em ações (artigo 171, § 3 o ), sob o mesmo fundamento de impedir
a diluição da participação dos antigos acionistas.
O direito de preferência pode ser estatutariamente suprimido, ou
ter o seu prazo de exercício reduzido, nas companhias abertas de ca-
pital autorizado, quando a colocação dos valores mobiliários for reali-
zada mediante: venda em Bolsa de Valores; subscrição pública;
permuta por ações, em oferta pública de aquisição de controle1478.
Na conversão de debêntures e partes beneficiárias em ações, ou
na outorga e no exercício de opção de compra de ações, não haverá
direito de preferência (artigo 171, § 3 o ).
Os acionistas podem livremente ceder o seu direito de preferên-
cia. Trata-se, portanto, de um direito que pode ser transacionado au-
tonomamente, constituindo um valor mobiliário1479 dotado de livre
negociabilidade no mercado de capitais.
E) DIREITO DE RECESSO
1490 fâra um resumo e exposição das principais correntes existentes sobre a divergência acerca
da natureza jurídica da arbitragem, vide J A C O B D O L I N G E R e C A R M E N T I B U R C I O . Direito
Internacional Privado: Arbitragem Comercial Internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003,
p. 9 4 - 9 7 . A mesma divergência encontra-se no direito c o m p a r a d o , c o m o demonstram
A L A N S C O T T R A U e C A T H E R I N E P É D A M O N , La contractualisation de 1'arbitrage: le
modèle américain, 2 0 0 1 . Disponível em: <http://wvvw.kluwerarbitration.com/arbitration/
arb/home/ipn/defauIt.asp?ipn=22649>, publicado originalmente na Revue de 1'Arbitrage:
"La double nature de 1'arbitrage est parfaitement admise dans le système américain comme
dans Ia plupart des pays européens. C'est à Ia fois un accord conventionnel entre des parties
qui organisent librement le règlement de leurs conflils et l'exercice d'un pouvoir juridictionnel
par un juge privé. Toute résolution de litiges par la voie de 1'arbitrage reflète Ia tension entre
Ia nature conventionnelle et la nature juridictionnelle de l'institution".
1491 Art. 18 da Lei n° 9.307/1996.
1492 Sobre esse assunto, ver M A R C E L O D I A S G O N Ç A L V E S V I L E L A . Arbitragem no Direito
Societário. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 191-192.
1493 Art. 31 da Lei n° 9.307/1996.
1494 Art. 1 o da Lei n° 9.307/1996.
1495 A especialização do julgador é apontada como uma das vantagens que ensejam a diminui-
ção dos custos do processo, tanto ao se considerar o seu tempo de duração como o seu
custo financeiro ( B R U C E L. B E N S O N . Arbitration,1999, In: Encyplopedia of Law and
Economics, versão on-line. Disponível em: < h t t p : / / e n c y c l o . f i n d l a w . c o m / t a b l e b i b . h t m l > .
1496 As sociedades anônimas abertas, sujeitas ao controle e fiscalização da C V M , permanecem
obrigadas a divulgar fatos relevantes conforme definidos em lei (art. 157, § 4 o , da Lei das
S.A. e Instrução C V M n° 358/2002, alterada pelas Instruções C V M n " 369/2002 e 449/
2007), devendo essa regra se sobrepor à da confidencialidade do processo arbitrai. O art. 2 o ,
parágrafo único, da Instrução C V M n° 358/2002, arrola uma série de exemplos do conceito
de fato relevante, dentre os quais figura a "propositura de ação judicial que possa vir a
afetar a situação econômico-financeira da companhia".
Especificamente quanto aos litígios societários, a arbitragem pode
propiciar a permanência da harmonia nas relações entre os sócios, em
virtude de ser um meio de solução de controvérsias reconhecidamente
menos litigioso que a jurisdição estatal1497. Com efeito, a arbitragem
guarda um elemento cooperativo, o que auxilia a conservação de outras
relações jurídicas não controversas existentes entre as partes.
Visando a dar concreção e viabilidade à instauração do juízo arbitrai,
é recomendável que a câmara arbitrai seja indicada na cláusula estatutá-
ria, mediante a chamada "cláusula compromissória cheia"1498. Tal cláusu-
la toma inquestionável a competência da câmara e evita discussões que
podem inviabilizar, na prática, a solução do conflito pela via arbitraL
Ainda que os atributos da arbitragem sejam reconhecidos como
boas práticas da chamada "governança corporativa" para resolver litígios
interna corporis, nem todas as companhias, mesmo as abertas, têm
adotado a arbitragem em seus estatutos sociais1499. No mesmo sentido,
verifica-se no direito comparado uma utilização da via arbitrai
preponderantemente para a solução dos litígios em sociedades de caráter
personalista, onde a figura do sócio é mais visível, prevalecendo sobre o
caráter capitalista1500.
relata que na Espanha, França, Suíça e Alemanha há predileção pelo uso da arbitragem em
sociedades personalistas.
1501 Decreto Legislativo n° 5/2003, art. 34, n. 1 "Cli a ti/ costitutivi delle società, ad eccezione di
quelle che fanno ricorso al mercato dei capitale di rischio a norma deífarticolo 2325-bis dei
códice civile, possono, mediante c/auso/e compromissorie, prevedere Ia devoluzione ad
arbitri di alcune ovvero di tutte le controversie insorgenti tra i soei ovvero tra i soei e la società'
che abbiano ad oggetto diritti disponibili relativi al rapporto sociale". F I L I P P O D A N O V I ,
; L'arbitrato nella Riforma dei Diritto Processuale Societário, 2 2 . 0 7 . 2 0 0 4 , disponível em:
< h t t p : / / w w w j u d i c i u m . o r g / n e w s / i n s _ 2 2 _ 0 6 _ 0 4 / d a n o v L p r o c _ s o c . h t m l > , ao comentar so-
bre a exclusão das companhias abertas, observa que: "La ratio di tale esclusione è stata
individuata in ciò che la fisionomia delia partecipazione a tali società è radicalmente diversa da
quanto avviene tradizionalmente, poiché riguarda terzi investitori che non hanno alcun
interesse al concreto funzionamento delia società, bensi unicamente aWandamenlo delia
stessa sul mercato, conseguentemente, essi si preoccupano soltanto di tale ultimo aspetto e
di rego/a non compiono alcuna indagine suíVatto costitutivo o sullo statuto".
1 502 O Decreto Legislativo n° 5/2003, no art. 34, n° 6, prevê que: "Le modifiche dell'aUo
costitutivo mlroduttive o soppressive di clausole compromissorie, devono essere approvate
so
° che rappresentino almeno i due terzi dei capitale sociale. I soei assenti o dissenzienti
possono, entro , successivi novanta giorni, esercitare il diritto di recesso."
bilidade subjetiva, ou rationepersonae, que consiste na identificação das
pessoas que estão sujeitas à cláusula compromissória estatutária.
Com relação à arbitrabilidade objetiva, a Lei n° 9.307/1996 es-
tabeleceu que podem ser dirimidas pela via arbitrai questões relativas
a "direitos patrimoniais disponíveis"1503. No mesmo sentido, dispõe o
Código Civil ser vedado o compromisso para solução de conflitos de
Estado, de direito pessoal de família e de outros que não tenham ca-
ráter estritamente patrimonial1504.
Embora não exista uniformidade no Direito Comparado no tra-
tamento da matéria, o sistema jurídico brasileiro adotou os critérios
da patrimonialidade e da disponibilidade para a definição da arbitra-
bilidade objetiva. Ou seja, conflitos envolvendo direitos com conteú-
do patrimonial e que podem ser objeto de disposição por parte de seu
titular são passíveis de solução pela via arbitrai1505.
A disponibilidade do direito caracteriza-se pela suficiência da
vontade do titular do patrimônio para dele dispor com exclusividade,
pois nele não se mesclam outros interesses que não os dele próprio1506.
A incidência de norma de ordem pública sobre a matéria não im-
pede a utilização da arbitragem, uma vez que o árbitro, da mesma forma
que ocorre com o juiz, submete-se à ordem pública. Assim, por exem-
plo, se a Lei das S.A. não permite que um órgão, criado pelo estatuto, se
substitua nas atribuições conferidas aos órgãos nela previstos (artigo
139), o árbitro estará obrigado a dar cumprimento ao mandamento da
norma imperativa, reconhecendo como nulas as cláusulas estatutárias
que disponham em sentido contrário à Lei das S.A
507 Ver os comentários aos arts. 115 e 117 da Lei das S.A.
ligados ao exercício do direito de recesso; interpretação de cláusulas
estatutárias; questões relacionadas ao pagamento de dividendos;
operações de reestruturação societária, resguardados os direitos de
terceiros1508. Também podem ser objeto de arbitragem litígios
envolvendo o ressarcimento de perdas e danos sofridos por acionistas
minoritários em decorrência do exercício abusivo do poder de controle
e de atos ilegais da companhia.
Embora a Lei das S.A. mencione apenas as divergências entre
os acionistas e a companhia, ou entre acionistas controladores e os
minoritários, nada impede que o estatuto social relacione outros con-
flitos como passíveis de solução mediante a via arbitrai. Assim, even-
tuais divergências entre integrantes do mesmo bloco de controle ou
entre 2 (dois) grupos de acionistas minoritários, ou entre administra-
dores e acionistas, ou entre o conselho de administração e o conselho
fiscal, ou mesmo entre membros de um mesmo órgão de administra-
ção, desde que exista previsão expressa no estatuto, poderão ser obje-
to de arbitragem. O dispositivo legal deve ser interpretado tendo em
vista o princípio favor arbitratis: se os acionistas decidiram submeter
determinados litígios à arbitragem, mediante cláusula compromissó-
ria estatutária, tal vontade deve ser respeitada.
A arbitrabilidade subjetiva no âmbito societário refere-se à iden-
tificação daqueles que estão vinculados à cláusula compromissória
estatutária.
Um dos maiores problemas para a utilização da arbitragem em
matéria societária diz respeito ao consentimento, à exposição da von-
tade em subtrair da apreciação judicial os litígios que venham a surgir
com outros acionistas ou com a sociedade.
1513 MARIA JOSÉ C A R A Z O LIÉBANA. El Arbitraje Societário. Madrid: Marcial Pons Ediciones
Jurídicas e Sociales, 2005, p. 221.
1514 Em sentido contrário, a Procuradoria da Junta Comercial do Estado de São Paulo, ao
analisar, nos autos do Processo n° 1240125/08-2, j. em 23.09.2008, consulta feita pela 6 a
Turma de Vogais, referente à legalidade de dispositivo estatutário, objeto de deliberação de
acionistas em assembleia geral extraordinária em cujo conclave foi, por maioria, aprovada
A prática vem demonstrando que a arbitragem apresenta inú-
meras vantagens sobre o contencioso judicial, particularmente no di-
reito societário, que demanda soluções rápidas e tecnicamente
consistentes. A solução aqui preconizada concilia a necessidade de
ser preservada a vontade das partes com a possibilidade de utilização
crescente e segura da arbitragem na solução dos conflitos societários.
Há manifestações, majoritárias na doutrina, propugnando que
a regra geral da prevalência da deliberação majoritária não deve ser
excepcionada no caso de decisão de inclusão de cláusula compro-
missória estatutária1515-1516, sob o argumento de que a arbitragem
estatutária não representa uma situação especial que comporte tra-
tamento jurídico, diferenciado das outras relações jurídicas privadas
onde a cláusula possa ser encontrada1517.
a reforma do estatuto social para inserir cláusula segundo a qual todos os litígios decorren-
tes da relação jurídica societária passariam a ser dirimidos por arbitragem, se manifestou no
sentido de que a cláusula compromissória "somente pode vingar se o acionista expressa-
mente abrir mão dos meios garantidos pelo Estado. (...) o principio da maioria vigente na
sociedade anônima não pode reduzir um direito essencial subjetivo. (...) sem a adesão de
todos os acionistas não há a possibilidade de uma alteração estatutária introduzir no estatuto
a cláusula compromissória de arbitragem (...)."
1515 P E D R O A. BATISTA MARTINS, "A Arbitragem nas Sociedades de Responsabilidade Limitada".
In: josé Maria Rossani Garcez e Pedro A. Batista Martins (Coord.). Reflexões sobre Arbitragem
- In Memoriam do Desembargador Cláudio Vianna de Lima. São Paulo: Ltr, 2002 e no mesmo
trabalho republicado na Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São
ftulo: Ed. Malheiros, v. 126, abril-junho, 2002; P A U L O C E Z A R A R A G Ã O , "A Arbitragem na
Lei das Sociedades Anônimas", palestra proferida no âmbito do 1 o Ciclo de Palestras sobre
arbitragem, realizada pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas-Rio (FCV-RJ) e pela
Câmara de Arbitragem da FGV, Rio de Janeiro, realizada em 20.08.2003; LUIS LORIA FLAKS,
"A Arbitragem na Reforma da Lei das S.A.", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico
e Financeiro. Sao Paulo: Ed. Malheiros, v. 131, julho-setembro, 2003, p. 100-121; DANIELA
BESSONE BARBOSA MOREIRA, "A Convenção Arbitrai em Estatutos e Contratos Sociais". In:
Ricardo Ramalho Almeida (Coord.). Arbitragem Interna e Internacional (Questões de Doutrina
e da Prática). Rio de Janeiro: Renovar, 2003; JOSÉ V I R G Í L I O LOPES ENEI, "A Arbitragem nas
Sociedades Anônimas", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São
Raulo: Ed. Malheiros, v. 129, janeiro-março, 2003, p. 136-173; M A R C E L O DIAS GONÇALVES
VILELA. Arbitragem no Direito Societário..., p. 200-202; M A R C E L O FORTES BARBOSA FI-
LHO. Sociedade Anônima Atual. São Raulo: Atual, 2004, p. 110.
1516 DANIELA BESSONE B A R B O S A MOREIRA, "A Convenção Arbitrai em Estatutos e Contratos
Sociais", In: Ricardo Ramalho Almeida (Coord.). Arbitragem Interna e Internacional (Ques-
tões de Doutrina e da Prática)..., p. 3 7 0 , não vê " c o m o se possa opor a cláusula
compromissória ao acionista dissidente, assim entendido aquele que tenha manifestado
expressamente discordância quanto ã sua inclusão no contraio social."
1517 J U L I A N A K R U E G E R PELA, "Notas sobre a Eficácia da Cláusula Compromissória Estatutária",
Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Raulo: Ed. Malheiros,
v. 126, abril-junho, 2002, p. 129-139.
A solução do direito italiano deveria inspirar nosso legislador,
permitindo a inclusão de cláusula compromissória no estatuto, po-
rém conferindo aos dissidentes o direito de recesso. Em tal sistema,
a cláusula vincula a todos, menos aos que manifestarem o seu dese-
jo de retirada, mediante o recebimento do valor de suas ações. Pre-
sume-se que os acionistas remanescentes não se opõem à alteração
do estatuto, vinculando-se, portanto, à cláusula compromissória.
SEÇÃO IO
D I R E I T O DE V O T O
1 524 ROBERT CHARLES CLARK. Corporate Law. Boston: Little, Brown and Company, p. 390.
1 525 Nos Estados Unidos, desde meados de 1850, quase todas as legislações estaduais adota-
ram o princípio do "one share, one vote". A propósito: C. A. D U N L A V Y e M A D I S O N ,
"Corporate Covernance in Late 19 Century Europe and the U.S.: the Case of Shareholder
Voting Rights". In: Klaus J. Hopt, Hideki Kanda, Mark J. Roe, Eddy Wymeersch and Stefan
Prigge (Coord.). Comparative Corporate Governance - The State of the Art and Emerging
Research. New York: Oxford University Press, 1998, p. 27 e seguintes.
1526 Sobre a distinção entre o voto plural e o voto privilegiado, T R A J A N O DE M I R A N D A
VALVERDE. Sociedades por Ações. v. II, 2'1 edição, Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 56-57,
observa que "(...) as de voto privilegiado são freqüentemente chamadas ações de voto
múltiplo ou de voto plural. Mas a sinonfmia é inexata, já que, como no direito brasileiro
atual, podem haver ações com ou sem direito de voto. E, coexistindo, embora em categoria
ou classes diferentes, constitui, evidentemente, um privilégio o direito de voto exercido
pelos titulares de ações ordinárias ou comuns, ou pelos acionistas preferenciais de uma
classe, se os de outra não o têm. Ações de voto privilegiado é a designação genérica, que
Na Argentina, onde é aceita a instituição do voto plural, a lei esta-
belece uma série de restrições à sua emissão, entre as quais: deve ser
suprimido o voto plural das companhias que emitem publicamente suas
ações; limitação da pluralidade a 5 (cinco) votos por ação; às ações pre-
ferenciais deve ser outorgado o direito de voto em certas deliberações.
No Brasil, a legislação societária não aceita o voto plural, que não se
confunde com o voto múltiplo e nem com a golden share, pois esta última
é ação de classe especial - inserida em nosso regime societário (artigo 17,
§ 7o) pela Lei n° 10.303/2001 - que confere aos entes públicos desesta-
tizantes (seus titulares) o direito de veto ou privilégios sobre determina-
das deliberações. A Lei das S.A. previu, além do procedimento ordinário,
a eleição pelo processo do voto múltiplo, por meio da qual se atribui a
cada ação tantos votos quantos sejam os membros do conselho de admi-
nistração, reconhecido ao acionista o direito de cumular os votos num só
candidato ou distribuí-los entre vários1527. O voto múltiplo foi introduzi-
do pela Lei das S A . com o objetivo de viabilizar a eleição de representan-
tes dos acionistas minoritários no conselho de administração.
Assim, a Lei das S.A. segue orientação dominante em quase
todos os sistemas jurídicos: todas as ações ordinárias votam e todos
os votos têm o mesmo peso.
E interessante notar que, nos Estados Unidos, onde a matéria é
regulada pelas leis estaduais, a lei societária de Delaware permite às
companhias estabelecerem livremente, em seus estatutos, a discipli-
na do voto1528: (i) podem conferir a cada ação qualquer número de
ser/e para assinalar toda e qualquer desigualdade no direito de voto, pelo que abrange as
numerosas variedades ou combinações sobre o direito de voto: ações de voto plural,
múltiplo, desigual, de direção, ações maiores, etc., designações nem sempre, é verdade,
apropriadas." Ainda sobre os conceitos de voto privilegiado, voto plural, voto duplo e
voto múltiplo, ver R E N A T O V E N T U R A RIBEIRO. Direito de Voto Nas Sociedades Anôni-
mas. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 235-249.
1527 Ver os comentários ao art. 141 da Lei das S.A.
1523 Ver General Corporation Law, Title 8, Cbapter 1, Subchapter VII, § 212, disponível em:
<http://delcode.delaware.gov:>, que determina que: "unless otherwise providedin the certificate
oí incorporation and subject to § 213 of this title, each stockholder shall be entitled to 1 vote
votos, ou negar-lhes o direito; (ii) podem atribuir o direito de voto aos
debenturistas; (iii) os votos podem ser cumulativos ou não; (iv) os
acionistas podem votar pessoalmente ou mediante procuração; e (v)
podem ainda estabelecer super-maiorias para determinadas matérias.
No entanto, as companhias seguem, quase todas, o mesmo modelo:
cada ação tem direito a 1 (um) voto e só os acionistas votam; em com-
panhias abertas praticamente não se verifica a adoção do voto plural,
nem a emissão de ações sem direito de voto ou com voto restrito1529.
O direito de voto constitui o meio mediante o qual os acionistas
participam das deliberações das assembleias gerais, colaborando para
a formação da vontade social, o que pressupõe, em princípio, ação
orientada para o fim e no interesse da companhia1530.
A natureza jurídica do direito de voto é objeto de grande discus-
são doutrinária: ora é tido como um direito próprio do acionista, a ser
exercido no seu interesse individual, ora como um direito social, em-
bora exercido individualmente pelo acionista1531. Se constituir um di-
reito próprio pode ser exercido no interesse direto de cada acionista,
em seu benefício pessoal e exclusivo. Tratando-se, por outro lado, de
um direito social, deve ser exercido para beneficiar diretamente a com-
panhia, contribuindo para a formação da vontade social.
for each share of capital stock held by such stockholder. If the certificate of incorporation
provides for more or less than 7 vote for any share, on any matter, every reference in this
chapter to a majority or other proportion of stock, voting stock or shares shall refer to such
majority or other proportion of the votes of such stock, votfng stock or shares."
1529 DANIEL R. FISCHEL, "Organized Exchanges and the Regulation of Dual Class Common
Stock", Chicago University Law Review. v. 54, 1987, p. 119; JOEL SELIGMAN, "Equal
Protection in Shareholder Voting Rights: The One Common Share, One Vote Controversy".
Georgetown Washington Law Review. v. 54, 1986, p. 687.
1530 ALFREDO LAMY FILHO e JOSÉ LUIZ BULHÕES PEDREIRA, "Abuso do Poder de Controle
em Aumento do Capital Social de Banco Comercial". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz
Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração, aplicação), v. 2,
2 a edição, Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p. 228.
1531 Sobre esse assunto, ver T R A J A N O DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações. v. I,
2 a edição, Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 55; D O M I N I Q U E SCHMIDT. Les Droits de
Ia Minorité dans la Société Anonyme. Paris: Sirey, 1970, p. 38-39.
A Lei das S.A., ao dispor, no artigo 115, que o acionista deve
exercer o direito de voto no interesse da companhia, considerando
abusivo o voto exercido com o fim de obter vantagem a que não faz
jus e de que resulte ou possa resultar prejuízo para a companhia ou
para os demais acionistas, inequivocamente consagrou o princípio de
que o voto deve ser exercido no interesse social. O interesse da com-
panhia não constitui um somatório dos interesses privados dos acio-
nistas, nem um interesse autônomo, desvinculado dos interesses dos
sócios, mas o interesse dos sócios, em tal qualidade, norteado no sen-
tido da realização lucrativa do objeto social1532. Assim, a Lei das S.A.
prevê sanções decorrentes do exercício do voto no interesse exclusivo
do acionista, quando conflitante com o interesse da sociedade1533-1534.
O exercício do direito de voto não se dá unicamente pela ma-
nifestação monossilábica do "sim" ou "não", pois nele se compreen-
dem: o ingresso e a presença na assembleia geral; a palavra; a
1540 Model Business Corporation Act, § 7.30. O Código Penal, no art. 177, § 2 o , dispõe que
"incorre na pena de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, o acionista que,
a fim de obter vantagem para si ou para outrem, negocia o voto nas deliberações de
assembleia geral". D a mesma forma, a lei societária de Nova Iorque proíbe a venda de votos
(N.Y. Bus. Corp Law 609 (e)).
1541 F R A N K H. E A S T E R B R O O L and D A N I E L R. FISHEL. The Economic Slructure of Corporate
Law ..., p. 74.
1542 A Lei de Delaware, por exemplo, estabelece o prazo máximo de 10 (dez) anos {§ 218).
1543 F R A N K H. E A S T E R B R O O K and DANIEL R. FISHEL. The Economic Structure of Corporate
Law ..., p. 65.
A Lei das S.A. expressamente admite que os acionistas nomeiem
procuradores, acionistas ou não, para exercerem, em seu nome, o direito
de voto. No entanto, o procurador deverá ser, obrigatoriamente,
acionista, administrador da companhia ou advogado; nas companhias
abertas o procurador poderá ser instituição financeira (artigo 126, §
I o ). Nessa hipótese não há cessão, mas mera representação para o
exercício do direito de voto.
Ademais, de acordo com o § I o , o estatuto pode estabelecer limi-
tação ao número máximo de votos de cada acionista. Visa o dispositi-
vo a instituir procedimento altamente benéfico para as minorias
acionárias, minimizando o poder do bloco de controle e incentivando
a "pulverização" de ações, o que é salutar nas companhias abertas1544.
Não consta da Lei das S.A. o tipo de limite de votos que pode
ser estabelecido no estatuto. As modalidades mais utilizadas são:
(i) número absoluto de votos que podem ser manifestados por cada
acionista; (ii) número de ações determinado pelo respectivo valor
nominal, ou por determinada porcentagem do valor do capital so-
cial; (iii) porcentagem do número total de ações votantes da com-
panhia ou das ações votantes cujos titulares estejam presentes ou
representados na assembleia; e (iv) relação decrescente com o nú-
mero de ações de que o acionista é titular1545.
1 544 A limitação ao número de votos de cada acionista foi introduzida no estatuto de algumas
companhias abertas brasileiras que pulverizaram o seu controle acionário, tais como a
Embraer - Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. (Ver art. 4 o , III, letra "a", do Estatuto Social,
disponível em: <http://www.embraer.com.br> e lojas Renner S.A. (ver art. 10, § 3°, do
Estatuto Social, disponível em <http://www.lojasrenner.com.br/ri>. Sobre esse assunto, ver
N E L S O N E I Z I R I K , A R I Á D N A B. G A A L , F L Á V I A P A R E N T E e M A R C U S DE FREITAS
HENRIQUES. Mercado de Capitais - Regime Jurídico. 2a edição, Rio de Janeiro: Renovar,
2008, p. 380-383; LUIZA RANGEL DE MORAES, "A Pulverização do Controle Acionário",
Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribu-
nais, V. 32, abril-junho, 2006, p. 49-84. A BM&FBovespa também inseriu em seu estatuto
social cláusula regulando a limitação do exercício do direito de voto (ver art. 7° do Estatuto
Social, disponível em: <http://www.bmfbovespa.com.br/ri>).
1 545 JOSÉ L U I Z BULHÕES PEDREIRA, "Limite Estatutário do Direito de Voto". In: Alfredo Lamy
Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração,
aplicação)..., v. 2, p. 75.
Vale ressaltar que, face ao disposto no § I o do artigo 109, a
limitação ao número de votos de cada acionista não pode ser apli-
cada apenas a determinados acionistas, mas a todos os titulares de
ações da mesma classe.
Ações preferenciais
"Art. 1 1 1 . 0 estatuto poderá deixar de conferir às ações preferen-
ciais algum ou alguns dos direitos reconhecidos às ações ordiná-
rias, inclusive o de voto, ou conferi-lo com restrições, observado
o disposto no artigo 109.
1550 D e acordo com o item 4.1, inciso (vi), do Regulamento de Práticas Diferenciadas de
G o v e r n a n ç a C o r p o r a t i v a N í v e l 2 d a B M & F B o v e s p a , d i s p o n í v e l em: chttp://
www.bovespa.com.br/ri>, as companhias abertas listadas nesse segmento que tiverem emi-
tido ações preferenciais devem conferir direito de voto a essas espécies de ações, no mínimo,
nas seguintes hipóteses: (i) transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia; (ii)
aprovação de contratos entre a companhia e o acionista controlador, diretamente ou por
meio de terceiros, assim como de outras sociedades nas quais o acionista controlador tenha
interesse, sempre que, por força de disposição legal ou estatutária, sejam deliberados em
assembleia geral; (iii) avaliação de bens destinados à integralização de aumento de capital
da companhia; (iv) escolha de empresa especializada para determinação do valor econômi-
co da companhia; e (v) alteração ou revogação de dispositivos estatutários que alterem ou
modifiquem quaisquer das exigências previstas no item 4.1 do Regulamento.
1551 M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, v. 2, 4 a edição,
São Paulo: Saraiva, 2008, p. 413.
n° 2.627/1940 dispunha que as ações preferenciais adquiririam o direi-
to de voto quando deixassem de ser pagos os dividendos fixos1552, não
mencionando os dividendos mínimos, que foram introduzidos em nosso
ordenamento jurídico com a promulgação da Lei das S.A.
Este dispositivo justifica-se na medida em que, não se concreti-
zando a vantagem econômica que deveria ser auferida pelos titulares
de ações preferenciais, não mais cabe a restrição política a que esta-
vam submetidos. Assim, aqueles acionistas que foram privados do
direito de voto poderão participar ativamente nas deliberações sociais
e nos esforços para a recuperação financeira da companhia.
Qual o fundamento econômico da norma?1553 Para a teoria do
mercado perfeito, o pagamento de dividendos não afeta o valor da
empresa, cujas ações são negociadas no mercado, que é determina-
do pela política de investimentos, devendo ser pagos dividendos
quando não existe a alternativa de reinvestimento nos negócios so-
ciais. Quando os lucros são reinvestidos, as ações valorizam-se no
mercado. O importante não é o pagamento de dividendos, mas sim
a política de investimentos da companhia1554.
Já para a teoria do mercado imperfeito1555, o valor da ação fundamen-
ta-se, basicamente, nas expectativas futuras de pagamento de dividendos,
que refletem a operação da empresa. Ademais, os acionistas podem não
confiar na administração da companhia, preferindo receber os dividendos
a delegar aos administradores a política de reinvestimento dos lucros1356.
A Lei das S.A. adota posição semelhante à da teoria do mercado
imperfeito, condicionando a restrição ao direito de voto ao pagamento
1557 Sobre esse assunto, ver as seguintes decisões: (i) da 3 a Câmara do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo, nos autos da Apelação Cfvel n° 277.760-4/9-00, Rei. Des. Alfredo
Migliore, j. em 31.08.2004; (ii) da 4 a Turma do Superior Tribunal de Justiça, proferida nos
autos do Recurso Especial n° 267.256-BA, Rei. Min. César Asfor Rocha, j. em 21.08.2001,
publicada no D J U em 05.11.2001; (iii) da 5 a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado
do Rio de Janeiro, proferida nos autos da Apelação Cível n° 1.250/97 (Proc.0000349-
09.1997.8.19.0000), Rei. Des. Carlos Ferrari, j. em 11.11.1997, publicada no D O R J em
21.11.1997; (iv) da 4 a Turma do Superior Tribunal de Justiça, proferida nos autos do Recurso
Especial n° 137.339-SP, Rei. Min. Barras Monteiro, j. em 02.10.2003, publicada no DJU em
15.12.2003; (v) da 3 a Câmara do Tribunal de Justiça do Estado de São fàulo, proferida nos
autos da Apelação Cível n° 242.840-4/3-00, Rei. Des. Alfredo Migliore, j. em 31.08.2004.
Em sentido contrário, ver a decisão da 3 a Turma do Superior Tribunal de Justiça, proferida nos
autos da Medida Cautelar n° 3.623-RJ, Rei. Min. Nancy Andrighi, j. em 12.06.2001, publicada
no DJU em 10.09.2001 (In: N E L S O N EIZIRIK. Sociedades Anônimas - Jurisprudência, v. I, l.
III, Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 184; 580; 1191; 1195; 1.200; e 1.215).
Era, como Ficou Após a Lei n° 9.457/97. São Raulo: Oliveira Mendes, 1998, p. 48-49; LUIZ
L E O N A R D O C A N T I D I A N O , "A Reforma da Lei das Sociedades por Ações", Revista Forense.
São Raulo: Ed. Forense, v. 340, outubro-dezembro, 1997, p 134; FÁBIO U L H O A COELHO.
Curso de Direito Comercial, v. 2, 6 a edição, São Fíaulo: Saraiva, 2003, p. 103; LESLIE
AMENDOLARA. Os Direitos dos Acionistas Minoritários. São Raulo: STS, 1998, p. 55.
1 559 Em sentido contrário, A L F R E D O L A M Y F I L H O . Temas de S.A. Rio de Janeiro: Renovar,
2007, p. 317-319; J O R G E L O B O , " D o Exercício do Direito d e V o t o das Ações Prefe-
renciais com Dividendo Diferenciado", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econô-
mico e Financeiro. São Paulo: Ed. Malheiros, v. 133, janeiro-março, 2004, p. 77-SO;
A R N O L D O W A L D , "Do Direito d e V o t o dos Titulares de Ações Preferenciais Após o
Decurso de Três Exercícios sem Pagamento de Dividendos", Revista dos Tribunais. São
Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 634, agosto, 1988, p. 10. Este autor manifestou
novamente a sua opinião em artigo denominado " D a Aquisição do Direito de Voto
pelas Ações Preferenciais por Falta de Pagamento dos Dividendos, Interpretação do
art. 111 e seu § I o da Lei 6.404/76", Revista de Direito Bancário, do Mercado de
Capitais e da Arbitragem. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 12, abril-junho,
2001, p. 41-42.
prioridade no reembolso do capital em caso de liquidação da compa-
nhia. Ao criar esta nova modalidade de vantagem patrimonial, o
legislador não a incluiu no texto do § I o , o que reforça a interpreta-
ção de que não teve a intenção de conferir às ações preferenciais
com dividendo majorado a possibilidade de adquirirem o direito de
voto no caso da não distribuição de lucros por prazo determinado
no estatuto, não superior a 3 (três) exercícios consecutivos.
Durante a tramitação do anteprojeto que resultou na segunda re-
forma da Lei das S.A. (Lei n° 10.303/2001), foi amplamente discutida
a possibilidade de se incluir no texto do § I o os titulares de ações prefe-
renciais com vantagens não consistentes em prioridade no recebimen-
to de dividendos fixos ou mínimos. O Deputado Emerson Kapaz, ao
relatar o substitutivo ao Projeto de Lei n° 3.115/1997, de autoria do
Deputado Luiz Carlos Hauly, propôs que o § I o passasse a ser aplicável
no caso de não pagamento de quaisquer dividendos às ações preferen-
ciais. No entanto, o referido substitutivo recebeu emendas visando a
suprimir a alteração proposta pelo Relator, a qual foi aceita por ele, con-
cluindo que "a obtenção de voto quando não houver distribuição de divi-
dendos só deve ser permitida às ações com dividendo fixo ou mínimo"15®.
A única interpretação possível do § I o é a de que os acionistas
titulares de ações preferenciais sem direito de voto, cuja vantagem
patrimonial não consiste no recebimento de dividendos fixos ou
mínimos, não adquirirão o direito de voto no caso de ficarem sem
receber dividendos por 3 (três) exercícios consecutivos.
Os titulares de ações preferenciais que tenham como vantagem
patrimonial a prioridade no reembolso do capital em caso de liquidação
da companhia, ou o direito ao recebimento do dividendo majorado1561,
1560 O Projeto de Lei n° 3.488/2008, de autoria do Deputado Leandro Sampaio, que tratava
especificamente da alteração do § I o do art. 111 da Lei das S.A., com o fim de eliminar da
redação original a expressão "dividendos fixos ou mínimos", foi vetado pelo Relator do
processo, Deputado Guilherme Campos, na Câmara dos Deputados.
não adquirirão o direito de voto, ainda que a companhia passe mais de
3 (três) exercícios sociais sem distribuir dividendos.
Caso a companhia regule em seu estatuto o direito ao recebi-
mento do dividendo obrigatório (artigo 202), que não se confunde
com o dividendo prioritário - fixo ou mínimo - , o seu não pagamento
por mais de 3 (três) exercícios igualmente não acarretará a aplicação
do § I o . Com efeito, o dividendo obrigatório não é equivalente ao
dividendo prioritário previsto no artigo 17, pois constitui um direito
assegurado a todas as espécies de ações, não podendo ser considera-
do, portanto, um privilégio das ações preferenciais.
É perfeitamente possível, assim, que numa mesma companhia,
algumas classes de ações preferenciais adquiram o direito de voto,
outras não. Por exemplo, a companhia X emite ações preferenciais de
3 (três) classes: A com direito a dividendo fixo de 8% (oito por cento)
sobre o valor do capital; B com direito ao dividendo mínimo de 3%
(três por cento) sobre o patrimônio líquido; e C com direito ao divi-
dendo majorado. Caso a companhia passe mais de 3 (três) exercícios
sem pagar quaisquer dividendos, adquirirão o direito de voto os titula-
res das preferenciais A e B, que têm direito a dividendos fixos e míni-
mos, respectivamente, mas não os da classe C, que não os têm.
Com relação ao prazo para a aquisição do direito de voto, a Lei
das S.A. é clara no sentido de que o estatuto poderá estabelecer o
prazo máximo de 3 (três) exercícios consecutivos. Norma estatutária
que eventualmente estabeleça prazo superior é inteiramente ineficaz,
por contrária a disposição legal expressa.
Como o direito de voto faz parte das prerrogativas de todos os
acionistas, a negação ou a restrição ao seu exercício deve ser objeto de
normas estatutárias claras e inequívocas. Assim, o estatuto deve ser
expresso a respeito do prazo, seguindo o máximo previsto na Lei das
S.A. ou estabelecendo um prazo menor. Na omissão do estatuto, ca-
racterizado o fato gerador da aquisição do direito ao voto - a não
distribuição de dividendos fixos ou mínimos o acionista pode
exercê-lo de imediato . Com efeito, a norma do § I o , no que se
1562
1565 NELSON EIZIRIK. Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 276-277.
1566 Ver os comentários ao art. 205 da Lei das S.A.
1567 Art. 2 o da Instrução CVM n° 358/2002, com as alterações introduzidas pelas Instruções
C V M n " 369/2002 e 449/2007.
O direito de voto é temporário, persistindo até o pagamento dos
dividendos fixos ou mínimos devidos ou, se forem cumulativos, até o seu
pagamento junto com os cumulativos em atraso. Embora temporário, o
direito de voto é pleno, não se aceitando qualquer tratamento discrimi-
natório com relação aos titulares das ações preferenciais votantes1568-1569.
Uma vez pagos os dividendos devidos cessa automaticamen-
te o direito de voto, sem a necessidade de atender-se a qualquer
formalidade. Tanto a aquisição como a cessação do direito de voto
decorrem da Lei das S.A., não de qualquer ato jurídico praticado
pelo acionista ou pela companhia.
A aquisição e a cessação do direito de voto pleno às ações
preferenciais com voto restrito obedecem em todos os seus aspec-
tos aos mesmos princípios aplicáveis às ações preferenciais sem
direito de voto, nos termos do § 2 o .
O § 3 o , por sua vez, prevê uma possibilidade de grande relevância
prática para projetos de maior vulto, que, por suas características, de-
mandam investimentos cujo retorno não ocorrerá no curto prazo, tor-
nando impossível, pois, o pagamento de dividendos: a de dispor o
estatuto que o prazo de 3 (três) anos somente passará a contar a partir
do término da implantação do empreendimento inicial da companhia.
Tal alternativa, por obrigar a todos os acionistas, confere maior
segurança do que aquela, muitas vezes utilizada, de se estabelecer em
acordo de acionistas que as partes somente aprovarão a distribuição
de dividendos após o término da implantação do empreendimento.
E conveniente que o estatuto estabeleça, com razoável precisão, a
data ou o exercício em que terminará a implantação do empreendimento
1570 O art. 5 o da Lei n° 8.021/1990 estabeleceu um prazo de 2 (dois) anos para que as
companhias adaptassem seus estatutos de forma a deles conslar apenas referência às ações
nominativas.
1 571 O Código Civil, nos arts. 904 e seguintes, regula os títulos ao portador, no entanto, no art.
903 ressalva os títulos regidos por lei especial, como ê o caso das ações, que somente
podem ser emitidas na forma nominativa.
1572 O art. 4o da Lei n° 8.021/1990 deu nova redação ao art. 20 da Lei das S.A., determinando
que "as ações devem ser nominativas".
As antigas ações ao portador, que não foram convertidas em
nominativas e enquanto não o forem, permanecem impedidas de
exercer quaisquer direitos perante a companhia.
1574 A r t 2°, inciso I, da Lei n° 6.385/1976, c o m a redação dada pela Lei n° 10.303/2001.
1575 Há, na doutrina, discussão sobre a natureza das ações escriturais, pois alguns autores não as
consideram como bens móveis. M O D E S T O C A R V A L H O S A . Comentários à Lei de Socieda-
des Anônimas, v. 1, 5 a edição, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 350, sustenta que "apesar da
natureza incorpórea, as ações escriturais - por criação legal (arts. 39 e 40) - podem ser objeto
de negócios cuja essência é a mobilidade do bem, como penhor e alienação fiduciária em
garantia."; E C B E R T O L A C E R D A TEIXEIRA e J O S É A L E X A N D R E TAVARES GUERREIRO. Das
Sociedades Anônimas no Direito Brasileiro, v. 1, São Paulo: José Bushatsky, 1979, p. 225,
entendem que "as ações (com exceção das ações escriturais) integram a categoria dos bens
móveis, sujeitando-se a disciplina do direito das coisas."; O S M A R BRINA C O R R Ê A LIMA, " O
Penhor de A ç õ e s de Companhias e a Bonificação de Ações", Revista dos Tribunais. São
Raulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 624, outubro, 1987, p. 262, fazendo referência a Caio
Mario da Silva Pereira, conclui que todas as ações, inclusive as escriturais, "são bens móveis
imateriais, enquadráveis naquela categoria prevista no art 48, II, do CC, segundo o qual são
considerados móveis 'os direitos de obrigação e as ações respectivas', já os certificados de
propriedade de ações são considerados coisas móveis. Nessa perspectiva, poderíamos concluir
que as ações escriturais, por não se fazerem representar por certificados, são bens móveis, mas
não são coisas móveis."
O penhor constitui-se pela transferência efetiva da posse de coisa
móvel, suscetível de alienação, que o devedor faz ao credor, em garantia
de seu débito1576. O que distingue o penhor civil do mercantil é a natu-
reza da obrigação a que o objeto do penhor serve de garantia, não ha-
vendo, além disso, diferenças relevantes entre as 2 (duas) modalidades1577.
O instrumento de penhor deve ser levado a registro e qualquer
um dos contratantes pode fazê-lo. O penhor ou caução de ações, para
ser eficaz perante a companhia, deve ser averbado no "Livro de Re-
gistros de Ações Nominativas" (artigo 100, inciso I, alínea T'); no
caso das ações escriturais, constitui-se pela averbação do respectivo
instrumento nos livros da instituição financeira, a qual será anotada
no extrato da conta de depósito fornecido ao acionista (artigo 39).
Este artigo declara que o penhor da ação não impede o acionista
de exercer o direito de voto. O direito de voto não constitui um dos
direitos essenciais do acionista1578. Com efeito, o estatuto pode limi-
tá-lo ou mesmo suprimi-lo. Não admitindo, em regra, a dissociação
entre o direito de voto e a ação (exceto no caso dos acordos de voto e
do usufruto de ações)1579, a Lei das S.A. estabelece o princípio de que
a propriedade da ação é requisito para o exercício do direito de voto.
Esta é a razão pela qual, no caso do penhor, o exercício do di-
reito de voto cabe, em princípio, ao devedor pignoratício1580. O di-
reito de voto continua, portanto, a ser de titularidade do proprietário
da ação empenhada, não operando o penhor a sua transferência para
o credor pignoratício. Isso ocorre porque a Lei das S.A. não reco-
nhece no penhor de ações uma alienação.
inadimplemento da obrigação garantida. Mesmo sem essa caução das ações de controle, os
maiores credores de uma sociedade em situação financeira difícil podem assumir o contro-
le de facto, impondo condições para a renovação de empréstimos ou a reforma de dívidas,
tais como a reorganização empresarial e o remanejamento da administração social."
1584 C A R L O S F U L G Ê N C I O D A C U N H A P E I X O T O . Sociedades por Ações. v. 2, São Raulo:
Saraiva, 1972, p. 367, observa que "estas convenções não só devem restringir aos interes-
ses diretos do credor, como se coadunar aos direitos da sociedade e não ofender os
impostergáveis do acionista." TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE. Sociedades por Ações...,
v. II, p. 72, entende que "é fora de dúvida, que não valeria a cláusula ou convenção, que
proibisse o acionista de votar nas deliberações da assembleia geral ordinária, sem o con-
sentimento do credor, ou que obrigasse o acionista a votar nesse ou naquele sentido, em
qualquer outra assembleia geral. Não valeria a proibição, no primeiro caso, porque, na
assembleia geral ordinária, os interesses sociais predominam sobre quaisquer outros. Não
valeria no segundo, porque a lei só permite cláusulas ou convenções, que discriminem as
matérias sobre as quais não poderá manifestar-se o acionista, pelo voto, sem prévio consen-
timento do credor."
1585 MODESTO CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, v, 2, 4 a edição,
São Paulo: Saraiva, 2008, p. 437.
1586 MODESTO CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas..., v. 2, p. 114.
O aumento de capital pode ocasionar a diluição, ainda que justi-
ficada, da participação do acionista que não subscreve as novas ações
emitidas15S7, ocasionando uma redução da garantia. Assim, em prin-
cípio, é lícita a exigência de prévio consentimento do credor para de-
liberação relativa a essa matéria. Na hipótese de sua eventual recusa,
esta deve ser fundamentada de modo a demonstrar que haverá dilui-
ção na participação do acionista devedor no patrimônio social com o
conseqüente desfalque na garantia de seu crédito.
O devedor - proprietário das ações - poderá, no instrumento de
constituição de penhor, acordar quais as matérias a serem deliberadas
em assembleia geral que necessitarão do consentimento do credor,
mas não poderá, nesse documento, outorgar procuração para que ele
vote nas assembleias gerais com as ações empenhadas. Nada impede,
no entanto, que a procuração seja outorgada ao credor caso a caso e
desde que contenha a expressa orientação de voto do devedor1588.
Ainda que a redação do parágrafo único não seja explícita, à
alienação fiduciária da ação aplicam-se rigorosamente os mesmos
princípios acima expostos. O devedor mantém o direito de voto e
pode haver no contrato previsão de consentimento do credor para
determinadas matérias. No silêncio do contrato, conserva o deve-
dor íntegro o seu direito de voto.
1589 O art. 1.390 do Código Civil estabelece que o usufruto pode recair em 1 (um) ou mais
bens, móveis ou imóveis, em um patrimônio inteiro, ou parte deste, abrangendo-lhe, no
todo ou em parte, os frutos e utilidades.
1590 PONTES DE MIRANDA. Tratado de Direito Privado, t. XIX, 3 a edição, São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1983, § 2.253, p. 13-16.
1591 Ver os comentários ao art. 40 da Lei das S.A.
1 592 A R N O L D O WALD, "Do Regime Jurídico do Usufruto de Cotas de Sociedade de Responsa-
bilidade Limitada e de Ações de Sociedades Anônimas", Revista de Direito Mercantil,
Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 77, janeiro-
março, 1990, p. 7.
ações, que poderá ser exercido pelo nu-proprietário até 10 (dez) dias
antes do vencimento do prazo e, se ele não o fizer, pelo usufrutuário
(artio-o 171, § 5o); e (iv) a que estabelece que a companhia pagará
dividendos à pessoa que, na data do ato de declaração do dividendo,
estiver inscrita como proprietária ou usufrutuária da ação (artigo 205).
A questão da titularidade para o exercício do direito de voto das
ações gravadas com usufruto é das mais controversas no âmbito do
direito societário. A Lei das S.A., seguindo o que dispunha o artigo
84 do Decreto-Lei n° 2.627/1940, exige o prévio acordo entre o pro-
prietário e o usufrutuário para que seja exercido o direito de voto, no
instrumento de constituição do usufruto ou em outro documento,
inclusive em acordo de acionistas. O voto será livremente pactuado:
poderá ser exercido por uma das partes em todas as matérias, ou em
algumas delas pelo nu-proprietário e em outras pelo usufrutuário.
O artigo 40 prevê a averbação do usufruto no livro próprio, sendo
de todo recomendável que se averbe também o acordo entre proprie-
tário e usufrutuário relativo ao exercício do direito de voto.
Ao exigir o prévio acordo das partes, impedindo o exercício do
direito de voto na sua ausência, a Lei das S.A. levou em consideração
o conflito de interesses que pode existir entre usufrutuário e nu-pro-
prietário: o primeiro desejoso de receber dividendos e o segundo inte-
ressado no reinvestimento dos lucros nas atividades empresariais.
A posição do legislador nacional é singular e reflete o dissídio
no direito comparado: em algumas legislações, o voto cabe ao nu-
-proprietário; em outras ao usufrutuário; em outras, ainda, a ambos,
atribuindo-se ao usufrutuário o voto em assuntos administrativos e
ao nu-proprietário nos demais1S93.
159/ A C V M , no forecer CVM/SJU n° 005/1980, emitiu opinião no sentido de que "o direito de
voto da ação gravada com usufruto, se não for regulado no ato da constituição do gravame,
somente poderá ser exercido mediante prévio acordo entre o proprietário da ação e o
usufrutuário (art. 114 Lei n" 6.404/76). Na ausência de prévio acordo, se ocorrer dissensão
entre nu-proprietário e usufrutuário, as ações gravadas terão seu direito de voto suspenso."
T R A J A N O D E M I R A N D A VALVERDE. Sociedades por Ações. v. II, 2° edição, Rio de Janeiro:
Forense, 1953, p. 75, ao comentar o art. 84 do Decreto-Lei n° 2.627/1940, afirmou que o
nu-proprietário e o usufrutuário poderão estipular o que entenderem sobre o direito de
voto e se não chegam a um acordo, nenhum deles terá qualidade para exercer o voto. De
acordo com esse autor, o "legislador partiu da hipótese mais simples: a de que ambos,
proprietário e usufrutuário, estão interessados no funcionamento normal da sociedade e,
por conseguinte, hao de encontrar sempre uma fórmula de conciliação para a defesa dos
seus direitos. Se o conflito estala, somente o Judiciário poderá resolvê-lo."
Deve-se, em tais ocasiões, fazer todo o esforço para preservar os
votos, tendo em vista o interesse social no seu exercício, mediante inter-
pretação sistemática que privilegie a verdadeira intenção das partes1598.
O acordo entre nu-proprietário e usufrutuário pode ser verbal ou
tácito, ou seja, não precisa estar contido em instrumento formal Ine-
xistindo ajuste por escrito, é fundamental verificar o comportamento
das partes nas atividades sociais e no exercício de seus direitos. Assim,
se o usufrutuário recebe durante vários anos os dividendos, sem opor
qualquer ressalva ao direito de voto exercido pelo acionista nu-proprie-
tário, pode-se inferir a existência de um acordo tácito entre eles, sendo
legítimas as deliberações sociais tomadas com tais votos1599.
Quando o usufruto abrange a totalidade dos direitos, econômi-
cos e políticos, considera-se que o usufrutuário equipara-se ao acio-
nista, mantendo o nu-proprietário a titularidade de alguns direitos
futuros, como o de subscrever aumentos de capital e de consolidar a
propriedade plena no momento da extinção do usufruto, assumindo a
posição de fideicomissário em relação às ações1600-1601.
Dessa forma, é nulo, por não satisfazer o requisito essencial do
negócio jurídico, o usufruto constituído sobre a ação com declaração de
que abrange apenas o exercício do direito de voto, pois é da essência do
1598 Determina o art. 112 do Código Civil que: "Nas declarações de vontade se atenderá mais
à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem".
1599 L U I Z G A S T Ã O PAES DE BARROS LEAES. Pareceres..., v. 2, p. 1.367.
1 600 A R N O L D O WALD, "Do Regime Jurídico do Usufruto de Cotas de Sociedade de Responsa-
bilidade Limitada e de Ações de Sociedades Anônimas", Revista de Direito Mercantil,
Industrial, Econômico e Financeiro..., v. 77, p. 11.
1 601 Sobre o exercício do direito de voto pelo usufrutuário, FÁBIO K O N D E R COMPARATO,
"Usufruto Acionário e Quase-Usufruto. Limites aos Direitos do Usufrutuário". In: Ensaios e
Pareceres de Direito Empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 88, assinala que, no
usufruto acionário, "como observou Ascarelli, ainda que o exercício do direito de voto
compita unicamente ao usufrutuário, não se pode impedir ou dificultar o comparecimento
do nu-proprietário acionista à Assembleia Geral, onde poderá se manifestar, tomar parte
nas discussões e, até mesmo, lavrar o seu protesto. O reconhecimento desse direito de
comparecimento, como ressaltou, torna praticamente mais difícil o abuso no exercício do
voto, pelo usufrutuário."
usufruto o direito do usufrutuário aos frutos da coisa gravada1602. No usu-
fruto constituído sobre a ação, o único fruto é o dividendo. O voto não é
fruto da ação, é exercício de direito nela contido como instrumento para
que o acionista contribua para a formação da vontade social.
Ademais, o nu-proprietário e o usufrutuário, conforme acima
exposto, podem acordar o exercício do direito de voto, pois o usufru-
tuário tem interesse legítimo em participar das deliberações sociais.
O usufrutuário de ações pode, em alguns casos, ser considerado
"acionista controlador", ao apresentar-se como titular de direitos de
voto que lhe asseguram, de modo permanente, a maioria das delibe-
rações da assembleia geral e o poder de eleger a maioria dos adminis-
tradores da companhia, e usar efetivamente seu poder para dirigir as
atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da compa-
nhia. A Lei das S.A. inclui no conceito de acionista controlador -
constante do artigo 1 1 6 - 0 usufrutuário que exerce o direito devoto1603.
1 604 PAUL DAVIES. Cower and Davies: Principies of Modern Company Law. 7"' edition, United
Kingdom: Sweet and Maxwell, 2003, p. 393.
1605 REINIER K R A A K M A N , PAUL DAVIES, H E N R Y H A N S M A N N , G E R A R D H E R T I C , K L A U S
H O P T , H I D E K I K A N D A and E D W A R D R O C K . The Anatomy of Corporate Law - A
Comparative and Functional Approach. New York: Oxford University Press, 2007, p. 101.
Em nosso sistema de direito societário verifica-se idêntica ori-
entação. A Lei das S.A. admite a contratação entre o acionista con-
trolador e a companhia, desde que em condições equitativas, sem
favorecimento (artigo 117, § I o , alínea "f"). No grupo de sociedades
"de fato" podem ser realizadas operações entre companhia controla-
dora e controlada, desde que em condições estritamente comutativas,
ou com pagamento compensatório adequado (artigo 245). Também
o administrador pode contratar com a companhia, se em condições
razoáveis ou equitativas, idênticas as que prevalecem no mercado ou
em que a companhia contrataria com terceiros (artigo 156, § I o ).
Dessa forma, não são proibidas nem condicionadas à autorização
de qualquer órgão as negociações entre o acionista controlador ou o
administrador e a companhia, desde que concluídas em bases equitati-
vas, semelhantes às que ocorreriam em contratos com terceiros.
O direito de voto deve ser exercido no interesse da compa-
nhia. Prevalece o interesse social sobre o interesse individual dos
acionistas. Embora os objetivos dos acionistas possam ser diver-
sos e mesmo conflitantes, o acionista vota na condição de mem-
bro de determinada comunidade acionária, não com vistas ao
atendimento de interesses que a ela são estranhos. Havendo even-
tual conflito entre o interesse do acionista enquanto sócio e do
acionista enquanto terceiro, o primeiro deve ser privilegiado.
O acionista não é obrigado a votar, nem a comparecer à assem-
bleia geral; mas, se comparece e vota, tem o dever de fazê-lo visando
ao interesse da companhia. Trata-se, assim, de um direito-fimção, li-
mitado à consecução do objeto social1606.
Ainda que os interesses dos acionistas ao longo da existência da
companhia sejam distintos e mesmo conflitantes, eles têm, enquanto
1610 MARCELO LAMY REGO, "Direito de Voto". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões
Pedreira (Coord.). Direito das Companhias, v. I, Rio de Janeiro: Forense, p. 418.
a deliberação assemblear, mediante a qual se manifesta o interesse
social, não se pode, a não ser quando expressamente estabelecido na
Lei das S.A., negar ao acionista a possibilidade de exercê-lo.
Nas 3 (três) hipóteses anteriormente mencionadas, o voto do acio-
nista é vedado. Se exercido, será tido como viciado, desde que presente a
"prova de resistência" da deliberação, consistente no fato de ter sido o
voto determinante para a formação da maioria1611. Caracterizado o vício
do voto, tendo ele sido decisivo para que se formasse a maioria, a delibe-
ração é anulável1612; não cabe a sanção de nulidade, uma vez que se en-
contram em jogo unicamente interesses dos acionistas e tal remédio (a
anulabilidade) não compromete a estabilidade dos atos societários1613.
A proibição de voto não importa em impedimento de compare-
cer à assembleia e discutir as matérias postas para deliberação. O im-
pedimento é de voto, ratione materiae, não de comparecimento e
manifestação de opinião sobre as matérias objeto da ordem do dia.
Ademais, as ações do acionista impedido são contadas para o número
mínimo de ações necessário à instalação da assembleia, uma vez que
não se confunde o quorum de instalação com o voto1614.
A primeira hipótese de proibição do voto, de acordo com o § I o ,
ocorre na assembleia que delibera sobre o laudo de avaliação de bens do
acionista, com os quais deseja concorrer para o capital social. Há uma
presunção absoluta de que o acionista, no caso, não tem isenção para
votar, quer na escolha dos peritos, quer no laudo por eles elaborado.
Tal vedação visa a preservar a realidade do capital, impedindo o
acionista de utilizar o seu direito de voto para aprovar laudo que possa
1617 Sobre esse assunto, ver a decisão proferida pela 5° Câmara de Direito Privado do Tribunal
de justiça do Estado de São Paulo, no julgamento da Apelação Cível n° 85.120-1, Rei. Des.
Ralpho Waldo, j. em 07.05.1987, In: Revista dos Tribunais. São Fàulo: Ed. Revista dos
Tribunais, v. 624, outubro, 1987, p. 76-80.
1618 O art. 82 do Decreto-Lei n° 2.627/1940 assim dispunha: "o acionista não pode votar nas
deliberações da assembleia geral relativas ao laudo de avaliação dos bens com que concor-
rer para a formação do capital social, nem nas que venham a beneficiá-lo de modo
particular". Já o Art. 95 do mesmo diploma legal dispunha que: "responderá por perdas e
danos o acionista que tendo em uma operação interesses contrários ao da sociedade, votar
deliberação que determine com o seu voto a maioria necessária". E G B E R T O L A C E R D A
T E I X E I R A . Das Sociedades por Q u o t a s de Responsabilidade Limitada - atualizado de
acordo com o Novo Código Civil, atualizadores Syllas Tozzini e Renato Berger. 2" edição,
São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 176, critica a sua redação, observando que: "Terá o
legislador, a nosso ver, andado mais acertadamente não apadrinhando a distinção sutil e
perigosa entre 'benefício particular' e 'interesses contrários aos da sociedade•' porque na
verdade os dois vícios podem facilmente confundir-se, modalidades que são do 'auto-
contrato' ou 'contrato consigo mesmo'".
1 619 RENATO V E N T U R A RIBEIRO. Direito deVoto nas Sociedades Anônimas. São Paulo: Quartier
Latin, 2009, p. 369.
sua condição de acionista, mas que rompe o princípio da igualdade
entre os acionistas. Tal vantagem pode ser outorgada estatutariamen-
te, mas o acionista beneficiário não pode votar, pois ela lhe trará be-
nefícios "particulares", não conferidos aos demais acionistas1620. Se a
sociedade resolve atribuir uma bonificação a determinado acionista,
ele não poderá votar naquela deliberação, pois ela estará a beneficiá-
-lo de modo particular, quebrando a regra de igualdade entre todos os
acionistas1621. Da mesma forma, constituem exemplos de benefícios
particulares: a concessão de opções de compra ou partes beneficiárias, a
criação de planos de aposentadoria, e outras hipóteses em que se ca-
racterize o favor a determinados acionistas, mas não a outros.
Assim, há benefício particular quando o tratamento dado a
determinado acionista não é equitativo, ainda que admitido pelo
estatuto social1622, daí decorrendo a proibição absoluta de voto para
o acionista beneficiário1623.
votante, em seu juízo de valor, se verificar na situação de conflito. (...) A questão fulcral é
que, havendo, como havia, interesse da coligada externa e indiretamente de sua controla-
da e ora apelante na celebração do contrato, essa deveria ter se abstido de votar, com o que
teria evitado a materialização do conflito." Em nova mudança de posição, a C V M , no
julgamento do Processo Administrativo C V M n° RJ 2009/13179, em que foi Relator o
Diretor Alexsandro Broedel Lopes, j. em 09.09.2010, voltou a se manifestar no sentido de
que o conflito seria formal. Nesse julgamento foi vencido o Dir. Eli Loria, que entendeu
que o conflito de interesses só pode ser verificado após a realização da assembleia e
mediante prova do prejuízo ocasionado à companhia.
1 627 N E L S O N EIZIRIK. Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p.72.
ilegitimidade, o que contraria o princípio legal de que a companhia
pode contratar com o acionista, inclusive o controlador, desde que em
condições equitativas (artigo 117, § I o , alínea "f"). Assim, deve ser de-
monstrado que o interesse do acionista apresenta um conflito efetivo
com o interesse social, não meramente hipotético ou eventual.
Ademais, o acionista pode, em situação de conflito de interes-
ses, votar no interesse da sociedade, ou por razões altruístas, ou por-
que, dada a relevância de sua participação acionária, obterá maior
benefício privilegiando o interesse da companhia do que o seu indi-
vidual. Em tal hipótese, evidentemente, o voto é regular. Por que,
então, vedá-lo previamente à sua manifestação?
Assim, a Lei das S.A., ao mencionar genericamente o "inte-
resse conflitante", está se referindo a uma situação de conflito subs-
tancial, na qual o acionista vota privilegiando o seu interesse e
sacrificando o interesse social, o que somente pode ser verificado
posteriormente, mediante a análise do mérito da deliberação e o
seu impacto sobre os negócios sociais.
Ê o fato de o acionista votar visando a obter vantagem indivi-
dual a que não faz jus, aliado ao dano atual ou potencial para a com-
panhia que caracteriza o conflito de interesses capaz de determinar
o impedimento de voto do acionista1628.
Portanto, o ato ilícito fica caracterizado quando o acionista exer-
ce o direito de voto em situação de conflito substancial com a compa-
nhia, o que somente pode ser apurado mediante um exame do
conteúdo da deliberação e das suas conseqüências para a sociedade.
Para a anulação da deliberação é indispensável a demonstração (i)
do conflito de interesses; (ii) da prova do dano, atual ou potencial, sofrido
SEÇÃO IV
ACIONISTA CONTROLADOR
Deveres
"Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natu-
ral ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de
voto, ou sob controle comum, que:
1 629 Sobre esse assunto, ver A L F R E D O S É R G I O L A Z Z A R E S C H I NETO. Lei das Sociedades por
Ações Anotada. São Raulo: Saraiva, 2010, p. 174.
1630 T R A J A N O D E M I R A N D A VALVERDE. Sociedades por Ações..., v. II, p. 69.
b) usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e
orientar o funcionamento dos órgãos da companhia.
CARACTERIZAÇÃO D O A C I O N I S T A C O N T R O L A D O R
1 633 O Código Civil, no art. 1.098, inciso I, segue o mesmo conceito de controle estabelecido
na Lei das S.A., ao dispor que é controlada a sociedade de cujo capital outra sociedade
possua a maioria dos votos nas deliberações dos cotistas ou da assembleia geral e o poder
de eleger a maioria dos administradores.
1 634 Nesse sentido, FÁBIO K O N D E R C O M P A R A T O e C A L I X T O S A L O M Ã O FILHO. O Poder de
Controle na Sociedade Anônima. 4 a edição, Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 39 e 89-103;
G U I L H E R M E D O R I N G C U N H A PEREIRA. Alienação do Poder de Controle Acionário. São
Paulo: Saraiva, 1995, p. 14; R I C A R D O FERREIRA D E M A C E D O . Controle Não Societário.
Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 123 e seguintes.
1635 O art. 249 da Lei das S.A. trata da influência dominante - muito embora não tenha citado
essa expressão - ao determinar na alínea "a" do parágrafo único que a C V M poderá expedir
normas sobre as sociedades cujas demonstrações devam ser abrangidas na consolidação e
"determinar a inclusão de sociedades que, embora não controladas, sejam financeira ou
administrativamente dependentes da companhia."
1 636 A Lei n° 11.941/2009, ao alterar o § 1 o do art. 243 das. Lei das S.A., introduziu, em nosso
regime societário, o conceito de "influência significativa" para definir que "são coligadas as
sociedades nas quais a investidora tenha influência significativa"• No § 4 o - por ela
acrescentado ao art. 243 ~ determinou que "há influência significativa quando a investido-
ra detém ou exerce o poder de participar nas decisões das políticas financeira ou operacional
da investida, sem controlá-la" e no § 5 o - também por ela acrescentado ao art. 243 -
estabeleceu que "é presumida a influência significativa quando a investidora^ for titular de
20% (vinte por cento) ou mais do capital votante da investida, sem controlá-la".
Assim, o "controle externo" não decorre do exercício do direito de
voto, mas de fatores exógenos, como, por exemplo, de relações contra-
tuais. O endividamento, em alguns casos, pode representar um meca-
nismo jurídico de transferência, para a credora, da direção dos negócios
da devedora1637-1638. A Lei das S.A., inclusive, ao regular o voto das
ações empenhadas (artigo 39) determinou, expressamente, que é lícito
estabelecer no contrato que o acionista não poderá, sem o consenti-
mento do credor pignoratício, votar em certas deliberações (artigo 113,
caput). A mesma regra foi prevista para o titular das ações alienadas
fiduciariamente (artigo 40), ao estabelecer a Lei das S.A que o credor
não poderá exercer o direito de voto e que o devedor somente poderá
fazê-lo nos termos do contrato (artigo 113, parágrafo único). Portan-
to, o credor pignoratício e o garantido por alienação fiduciária da ação
poderão, conforme as disposições sobre acordo de voto constantes do
contrato, assumir uma posição dominante na companhia, agindo como
verdadeiros "controladores". Nessas hipóteses, o controlador não é
acionista da companhia, mas um terceiro que tem uma "influência
dominante" e exerce o poder de controle ab extra1639.
O "controle externo", exercido mediante situações fáticas ou vín-
culos contratuais não previstos na Lei das S.A., não se caracteriza como
controle acionário. Assim, da sua configuração, não decorre qualquer
conseqüência na esfera do direito societário, muito menos a responsa-
bilidade pela eventual infração a qualquer das modalidades de abuso de
poder previstas na Lei das S.A. (artigo 117, § l0)1640-1641^5-0.
1644 A Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, ao tratar do art. 116, menciona expressamente
que a caracterização do acionista controlador pressupõe, além da maioria dos votos, o efetivo
exercício do poder de controle. O Regulamento de Listagem do Novo Mercado da BM&FBovespa
define o poder de controle como aquele efetivamente utilizado de dirigir as atividades sociais
e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia, de forma direta ou indireta, de fato ou
de direito e estabelece que "há presunção relativa de titularidade do controle em relação à
pessoa ou ao grupo de pessoas vinculado por acordo de acionistas ou sob controle comum
('grupo e controle') que seja titular de ações que lhe tenham assegurado a maioria absoluta dos
votos dos acionistas presentes nas três últimas assembleias gerais da companhia, ainda que não
seja titular das ações que lhe assegurem a maioria absoluta do capital votante."
1 645 De acordo com a decisão do Colegiado da C V M no julgamento do Processo Administrativo
C V M n° RJ 2005/4069, Rei. Dir. Pedro Oliva Marcilio de Sousa, j. em 11.04.2006, a
identificação do exercício do poder de controle está relacionada aos critérios de continuida-
de, estabilidade e permanência. Consta, ainda, dessa decisão que em razão do requisito da
permanência, "vencer uma eleição ou preponderar em uma decisão, não é suficiente. E
necessário que esse acionista possa, juridicamente, fazer prevalecer sua vontade sempre que
desejar (excluídas por óbvio, as votações especiais entre acionistas sem direito a voto ou de
determinada classe ou espécie, ou mesmo a votação em conjunto de ações ordinárias e
preferenciais, quando o estatuto estabelecer matérias específicas). Por esse motivo, em uma
companhia com ampla dispersão ou que tenha um acionista, titular de mais de 50% das ações,
que seja omisso nas votações e orientações da companhia, eventual acionista que consiga
preponderar sempre, não está sujeito aos deveres e responsabilidades do acionista controlador,
uma vez que prepondera por questões fáticas das assembléias, não preenchendo o requisito
da alínea 'a'do art. 116, embora preencha o da alínea 'b'. Esse acionista seria considerado, para
determinação de sua responsabilidade, como um acionista normal (sujeito, portanto, ao regime
do art 115)."
MODALIDADES DE CONTROLE ACIONÁRIO
1 646 N E L S O N EIZIRIK. Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 234.
1647 N E L S O N E I Z I R I K , A R I Á D N A B. G A A L , F L Á V I A P A R E N T E e M A R C U S D E FREITAS
HENRIQUES. Mercado de Capitais - Regime Jurídico. 2'1 edição, Rio de Janeiro: Renovar,
2008, p. 379.
1 648 Nesse mesmo sentido, manifestou-se o Colegiado da C V M na decisão proferida no Proces-
so Administrativo C V M n° RJ2001/7547, Rei. Dir. Wladimir Castelo Branco Castro, j. em
16.07.2002.
também chamado "controle gerencial", no qual não se identifica a
1 J 1649 1650_1651
figura do acionista controlador
No modelo de "controle pulverizado", a direção efetiva dos
neo-ócios sociais é realizada por administradores profissionais, mem-
bros do conselho de administração e da diretoria, no exercício de
suas funções legais e estatutárias, sem que exista um bloco de ações
que assegure o poder de controle.
Para tanto, a companhia emite apenas ações com direito de voto,
podendo ainda restringir, estatutariamente, o número máximo de votos
de cada acionista, ou grupo de acionistas, nas deliberações da assem-
bleia geral (por exemplo, em 5% do capital social) independentemente
1 651 Para uma análise das companhias listadas no segmento especial do N o v o Mercado vs. a
existência de acionista controlador, ver ER1CA G O R C A , "Changing the Paradigm of Stock
Uwnersrup: from Concentrated Towards Dispersed Ownership? Evidence from Brazil and
Consequences for Emerging Coutries". In: American Law & Association Annual Meetings.
rear 2U08, paper 76, disponível em: <http://law.bepress.com/alea/18th/art76>.
da participação acionária por eles detida, o que é permitido pela Lei das
S.A.1652. Assim, mesmo que determinado acionista possua participa-
ção acionária de 15% (quinze por cento), por exemplo, não poderá vo-
tar com mais de 5% (cinco por cento) do capital social.
No modelo de "controle pulverizado", nenhum acionista tem
condições de, em caráter permanente, eleger a maior parte dos admi-
nistradores e impor a sua vontade nas deliberações da assembleia ge-
ral da companhia, não existindo, assim, os elementos exigidos por
este artigo para a caracterização do acionista controlador1653.
Trata-se de modelo dominante nos Estados Unidos e no Reino
Unido, países onde se verifica, nas grandes companhias, uma separa-
ção entre propriedade e controle. Em tais empresas, dada a grande
dispersão das ações no mercado, o "controle" (não acionário, ou "ge-
rencial") é exercido de fato pelos administradores (managers), que não
detêm lotes significativos de ações. Já nos demais países europeus, na
maioria das companhias ainda ocorre o controle acionário.
Também são traços característicos do modelo de controle pul-
verizado: (i) a existência de um conselho de administração cujos
membros são efetivamente independentes; e (ii) uma relativa pas-
sividade dos acionistas, que quase não participam nas decisões sobre
os negócios sociais16S4.
Em nossa prática de Direito Societário, algumas companhias que
adotam o modelo de controle pulverizado têm introduzido em seus
1 655 EBITDA é a abreviação de "earnings before interest, taxes, depreciation and amortization",
lambem c o n h e c i d o c o m o L A J I D A (lucros anles de juros, impostos, depreciação e
amortização).
1656 Sobre esse assunto, ver o Memorando dos Diretores da C V M , Marcos Barbosa Pinto e
Otávio Yazbek, de 14.04.2008, e o Relatório de Análise da Audiência Pública n° 03/2009.
1 657 M O D E S T O C A R V A L H O S A e ERICA C O R G A , em Estudo Jurídico denominado "Apresenta-
ção à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre a regulação das cláusulas estatutárias
poison pills no direito brasileiro", elaborado em 30.01.2009, observam que "aquilo que o
mercado brasileiro tem denominado de poison pills, não é o mesmo instituto jurídico
correspondente às poison pills no direito norte-americano. Para o mercado brasileiro, as ditas
poison pills constituem uma variação da oferta obrigatória de aquisição de controle já
tipificada no artigo 254-A da Lei das S.A. (...) a denominada poison pill brasileira exige,
semelhantemente, a obrigação de realização de oferta pública aos demais acionistas sem
que, no entanto, tenha havido a alienação do controle societário propriamente dita,
Além das cláusulas de proteção à dispersão acionária, algumas
companhias com controle pulverizado introduziram em seus estatutos
regra impondo penalidades aos acionistas que (i) descumprirem a obri-
gação estatutária de realização de oferta quando adquirirem participa-
ção acionária superior a determinado percentual, ou seja, o acionista ou
grupo de acionistas infratores ficam sujeitos a ter suspenso, por delibe-
ração da assembleia geral, o exercício de determinados direitos conferi-
dos pelas ações de sua propriedade, inclusive o devoto, conforme permite
a Lei das S.A.1659; e (ii) votarem favoravelmente à supressão ou à alte-
ração das cláusulas de poisou pills, caso em que deverão realizar oferta
pública para a aquisição das ações dos demais acionistas.
Essa última penalidade configura uma verdadeira "cláusula pé-
trea", sendo ilegal, na medida em que, praticamente, impede o acionis-
ta de exercer o direito de voto em consonância com o interesse social,
ao impor-lhe sanção draconiana. Nesse sentido, manifestou-se, tam-
bém, a Comissão de Valores Mobiliários ao firmar o entendimento de
que a aplicação da cláusula pétrea não se compatibiliza com os princí-
pios e normas da Lei das S.A., em especial com os artigos 115, 121,
122, inciso I, e 129, e que, por essa razão, não aplicaria penalidades aos
acionistas que votassem pela supressão ou alteração da cláusula pétrea,
ainda quando não realizassem a oferta pública prevista nos estatutos1660.
bastando que seja atingido um número percentual de ações definido no estatuto social,
adquiridas em diversas operações de compra e venda, que não configuram alienação do
poder de controle."
1658 Estudo de ERICA G O R G A , "Changing the Paradigm of Stock Ownership: from Concentrated
Towards Dispersed Ownership? Evidence from Brazil and Consequences for Emerging Coutries".
In: American Law & Association Annual Meetings..., identificou 84 companhias sem acionis-
ta controlador majoritário, das quais 47 se utilizam de cláusulas de poison pills; 5 6 % das
companhias sem acionista controlador majoritário, listadas nos segmentos de Governança
Corporativa do Novo Mercado da BM&FBovespa se utilizam de cláusulas de poison pills;
3 6 % das companhias sem acionista controlador majoritário, listadas nos segmentos de
Governança Corporativa do Novo Mercado da BM&FBovespa se utilizam de cláusulas de
poison pills apenas do tipo "A"; apenas 4 companhias, dentre as 47 que possuem cláusulas de
poison pills, u t i l i z a m apenas as do tipo "B"; e 1 4 , 3 % das c o m p a n h i a s utilizam
concomitantemente os tipos "A" e "B".
1 659 Ver os comentários ao art. 120 da Lei das S.A.
A conjugação da elevada dispersão acionária com a introdução
de normas estatutárias destinadas a evitar o surgimento de uma nova
maioria política permanente na companhia faz com que a direção
efetiva dos negócios sociais seja realizada pelos administradores pro-
fissionais, membros do conselho de administração e da diretoria, no
exercício de suas funções legais e estatutárias, sem que exista um
bloco de ações que assegure o poder de controle.
Como não existe, nas companhias com controle pulverizado, a
figura do acionista controlador, não são aplicáveis os dispositivos da
Lei das S.A. que tratam da sua responsabilidade (artigos 116, pará-
grafo único, e 117), da alienação do controle acionário (artigo 254-A),
bem como do procedimento de votação em separado para eleição de
membros do conselho de administração (artigo 141, § 4 o ).
O fato de não se aplicarem as disposições referentes à respon-
sabilidade dos controladores não significa que os acionistas e de-
mais grupos que possam ser atingidos pelos atos praticados pela
companhia — os denominados stakeholders — fiquem sem qualquer
proteção frente a abusos praticados pela sociedade sob controle ge-
rencial. Nestas hipóteses, a responsabilidade civil e administrativa
deverá recair sobre os administradores que conduzem as atividades
sociais, com fundamento nos artigos 153 a 159.
C O N T R O L E E ASSEMBLEIA GERAL
1674 Sobre esse assunto, ver L U I Z L E O N A R D O C A N T I D I A N O . Reforma da Lei das S.A. Comen-
tada. Rio de janeiro: Renovar, 2002, p. 126.
1 675 Ver a Instrução C V M n° 358/2002, com as alterações introduzidas pelas Instruções CVM n'N
369/2002 e 449/2007.
1676 M O D E S T O C A R V A L H O S A e N E L S O N EIZIRIK. A Nova Lei das S/A. São Raulo: Saraiva,
2002, p. 207-209.
1677 Ver, também, o art. 13 da Instrução C V M n° 358/2002 e as alterações que lhe foram
introduzidas pelas Instruções C V M n " 369/2002 e 449/2007.
A R T . 1 1 7 - A LEI DAS S / A COMENTADA
Responsabilidade
"Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causa-
dos por atos praticados com abuso de poder.
1689 Ver decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, proferida no julgamento da
A p e l a ç ã o C í v e l n° 2 0 0 1 . 0 0 1 . 1 0 2 9 6 , Rei. D e s . Mauro Fonseca Pinto Nogueira, j. em
28.08.2001.
1690 Voto do Ministro Moreira Alves, no Recurso Extraordinário n° 113.446-RJ, relatado por ele
mesmo, j. em 14.10.1988, In: N E L S O N EIZIRIK. Sociedades Anônimas - Jurisprudência...,
p. 132.
1 691 O s membros do C o i e g i a d o da C V M , e m alguns processos sancionadores, analisam os
danos concretos ou "potenciais" causados pela conduta do controlador; em outros, não
consideram necessário demonstrar os danos, passando ao largo da questão. Embora o
abuso de poder do controlador seja invocado em vários processos sancionadores, a juris-
prudência administrativa da C V M sobre a matéria ainda não possibilita a identificação de
orientações consistentes e uniformes.
se evitar a violação da lei, não para dotar a minoria de um poder
soberano, impedir a marcha normal dos negócios sociais1692.
MODALIDADES DE ABUSO DE PODER DE CONTROLE ACIONÁRIO
1 692 Ver decisão da 4 o Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo no julgamento do A g r a v o Regimental n° 1 0 5 . 0 6 0 - 4 / 5 - 0 1 , Rei. Des. Barbosa
Pereira, j. em 17.12.1998.
1693 A Exposição de Motivos n° 196, de 24.06.1976, ao tratar do § 1 o do art. 117 da Lei das
S.A., informou que a relação dele constante trata de "modalidades mais freqüentes de
exercício abusivo do poder pelo controlador" e que o "Projeto não exclui outras hipóteses,
que a vida e a aplicação da lei se incumbirão de evidenciar."
1 694 Sobre esse assunto, ver P E D R O A . BATISTA MARTINS, "Responsabilidade de Acionista
Controlador - Considerações Doutrinária e Jurisprudencial", Revista de Direito Bancário e do
Mercado de Capitais. São Raulo: Ed. Revista dos Tribunais, v. 27, janeiro-março, 2005, p. 42-63.
1 695 L U I Z G A S T Ã O PAES D E B A R R O S LEÃES, "Conflito de Interesses". In: Estudos e Parece-
res sobre Sociedades Anônimas. São Paulo: RT, 1989, p. 16, observa que ocorre o
ab uso de direito quando o agente desconsidera "a finalidade social para a qual o
direito subjetivo foi concedido" ou quando ele o "exerce sem qualquer interesse
legítimo. O abuso de direito ê, em suma, um desvio no seu exercício regular, seja por
faltar ao titular legítimo interesse para exercê-lo daquele modo; seja porque a sua
destinação econômica e social tenha sido frustrada."
o Ministério Público, legitimado para propor a ação, demonstrar a
lesão ao interesse ou à economia nacional, bem como os danos con-
cretos causados pelo comportamento abusivo1696.
O abuso de poder consistente em orientar a companhia para fim
estranho ao objeto social ocorre quando o acionista controlador vota
em assembleia geral ou orienta a atuação dos administradores no sen-
tido de desviar os negócios da companhia para outros fins, não pre-
vistos estatutariamente como integrantes de seu objeto social1697.
Tal modalidade de abuso - desvio do objeto social - não se
confunde com a alteração estatutária do objeto social, objeto de de-
liberação válida pela assembleia geral, e da qual pode decorrer, por
parte dos acionistas dissidentes, o exercício do direito de recesso
(artigos 136, inciso VI, e 137).
A modalidade também prevista na alínea "a", consistente em levar a
companhia a favorecer outra sociedade em prejuízo da participação dos
acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, é das mais
relevantes, ocorrendo muitas vezes na prática dos negócios, particularmen-
te em grupos de sociedades "de fato", nos quais não há, como nos grupos
de direito, uma convenção de grupo (artigo 265). A administração geral do
grupo de direito pode adotar legitimamente medidas contrárias ao interes-
se dos acionistas minoritários de cada companhia que o integra, desde que
previstas na convenção (artigo 276). Já no caso dos "grupos de fato" (ex-
pressão não utilizada na Lei das S.A.), as sociedades integrantes encon-
tram-se vinculadas apenas por meio de participação acionária, mediante
relação de controle ou de coligação, sem uma convenção de grupo, preser-
vando cada companhia sua plena autonomia, sem qualquer subordinação
aos interesses gerais do grupo ou da sociedade controladora1698.
Estado de São Raulo, Rei. Des. Ruiter Oliveira, j. em 23.06.1998; e Decisão do Colegiado
da C V M no julgamento do Inquérito Administrativo C V M n" 04/1999, Rei. Dir. Norma
Parente, j. em 17.04.2002.
1699 N E L S O N E I Z I R I K , A R I Á D N A B. G A A L , F L Á V I A P A R E N T E e M A R C U S D E FREITAS
HENRIQUES. Mercado de Capitais - Regime Jurídico..., p. 390.
1 700 N E L S O N EIZIRIK. Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 130 e
seguintes.
equitativa se o resultado da operação, para a companhia controlada, for
menos vantajoso do que seria caso tivesse sido tomada por uma pessoa
independente, sem qualquer conflito de interesses. D e acordo com o
segundo teste (o fairness test), a decisão será tida como ilegítima se o
resultado da operação for menos vantajoso para a companhia do que o
verificado em outras, realizadas no mercado por partes independentes1701.
Tais testes são particularmente relevantes quando as companhias en-
volvidas têm administradores comuns iinterlocking directors)\ em tal si-
tuação é necessário examinar se os negócios seriam celebrados ainda
que não houvesse nenhuma relação entre as partes envolvidas1702.
O acionista controlador e os administradores das companhias
devem considerar não apenas se o negócio será equitativo, mas
também se a operação está atendendo aos melhores interesses das
sociedades envolvidas.
Assim, pode ficar caracterizada a responsabilidade do acionista
controlador se ficar demonstrado que o negócio: (i) ocorreu fora dos
padrões geralmente adotados no mercado em operações semelhan-
tes; (ii) não foi realizado de forma a atender aos melhores interesses
da companhia; e (iii) não teria sido concluído se as partes fossem
independentes ou não interessadas 1703 .
1701 R O B E R T C . C L A R K . Corporate Law. Boston: Litlle, Brown and Company, 1986, p. 147
e seguintes.
1702 R O B E R T W. H A M I L T O N . The Law of Corporations in a Nutshell. St. Paul: West Group,
2 0 0 0 , p. 4 8 6 - 4 8 8 .
A norma visa a proteger os diversos interesses que podem ser
afetados pela atuação do acionista controlador: os dos acionistas mi-
noritários, os dos empregados e os dos investidores da companhia.
A liquidação de companhia próspera, assim como as diversas
modalidades de reestruturação societária - transformação, incorpora-
ção, fusão ou cisão não podem ser realizadas se de interesse exclu-
sivo do acionista controlador, em prejuízo dos demais acionistas,
empregados e investidores.
Aplicam-se os mesmos princípios e testes acima enunciados,
tendo em vista a apuração do caráter comutativo da operação. Parti-
cularmente no caso de operação de reestruturação societária entre
companhia controladora e controlada, ou companhias sob controle
comum, é fundamental perquirir sobre o atendimento ao interesse
social das companhias envolvidas, estabelecendo a Lei das S.A. pro-
teção adicional aos acionistas minoritários em operações de incor-
poração, incorporação de ações e fusão (artigo 264).
Quando a operação é realizada entre sociedade controladora e
controlada, não se verifica o caráter bilateral que assegura os inte-
resses dos minoritários das companhias envolvidas, visto que o mes-
mo acionista controlador decide pelos 2 (dois) lados da operação,
daí justificando-se o regime especial — determinado pela Lei das
S.A. - de proteção dos minoritários1704.
Em tal hipótese, a legitimidade da operação decorrerá de seu ca-
ráter comutativo, se forem atendidos os interesses de todas as socie-
dades envolvidas, sem a geração de benefícios econômicos indevidos
para o acionista controlador. Para reduzir o risco da responsabilidade,
é recomendável a apresentação de estudo que demonstre as vanta-
gens econômicas e financeiras da operação para as sociedades envol-
vidas, como a redução de custos, a ocorrência de sinergias na integração
das atividades, a possibilidade de captar mais facilmente recursos no
mercado de capitais, o aumento na capacidade de competição, etc.
"c) promover alteração estatutária, emissão de valores mobiliários
ou adoção de políticas ou decisões que não tenham por fim o inte-
resse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas minoritá-
rios, aos que trabalham na empresa ou aos investidores em valores
mobiliários emitidos pela companhia".
1715 ALBERTO XAVIER. Administradores de Sociedades. São Paulo: RT, 1979, p. 107; NELSON
EIZIRIK. Temas de Direito Societário..., p. 112.
1716 ALFREDO LAMY FILHO. Temas de S.A. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 288.
1717 D e acordo com o arl. 177, § 1 o , inciso VII, do Código Penal, o acionista controlador
poderá responder como coautor em ação penal, se aprovar ou fizer aprovar contas irregu-
lares do administrador. Determina esse dispositivo que incorrem na pena de reclusão, de 1
(um) a 4 (quatro) anos, se o fato não constitui crime contra a economia popular, "o diretor,
gerente ou fiscal que, por interposta pessoa, ou conluiado com acionista, consegue a
aprovação de conta ou parecer".
Assim, por exemplo, se a companhia tem por objeto a produção
de ligas metálicas e o controlador subscreve ações em aumento de
capital com maquinário destinado à produção de tecidos, fica carac-
terizado o abuso do poder, pois tais bens são estranhos ao objeto social.
Por outro lado, há casos em que o bem entregue pelo controlador a
título de integralização do capital é, por exemplo, uma máquina que
pode ser utilizada pela companhia no desenvolvimento de suas ativi-
dades sociais e o aumento de capital pode ser considerado abusivo,
uma vez que a companhia pode não necessitar, naquele momento, de
expandir a sua capacidade de produção, ou então, a máquina, por ra-
zões técnicas, não atende aos interesses da companhia1719.
E m alguns casos, os bens objeto da integralização do capital,
por parte do acionista controlador, não estão diretamente relacio-
nados ao objeto social, mas são compatíveis com o interesse social
e, por isso, não se caracteriza o abuso 1720 .
De acordo com o § 2 o , também responde solidariamente com o
acionista controlador o administrador ou membro do conselho fiscal que
praticar atò ilegal. O administrador não é pessoalmente responsável pe-
las obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato
regular de gestão; responde, porém, civilmente, pelos prejuízos que cau-
sar, quando proceder (i) dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa
ou dolo; e (ii) com violação da lei ou do estatuto (artigo 158, capui).
Os membros do conselho fiscal também respondem pelos da-
nos decorrentes de omissão no cumprimento de seus deveres e de
A C O R D O DE ACIONISTAS
1 727 Nos Estados Unidos, os acordos de acionistas são utilizados basicamente em companhias
fechadas, conforme R O B E R T C. C L A R K . Corporate Law. Boston: Little, Brown and Company,
1986, p. 763 e seguintes.
1940, ainda que em algumas companhias seus acionistas firmassem
acordos, a falta de disciplina legal não lhes conferia maior seguran-
ça. A Lei das S.A. não só supriu a omissão legislativa como também
regulou com bastante propriedade a matéria, permitindo a utiliza-
ção do acordo como instrumento dotado da necessária flexibilidade
e eficácia para conciliar os interesses dos acionistas signatários.
O acordo de acionistas constitui um contrato celebrado entre
acionistas de determinada companhia visando à composição de seus
interesses individuais e ao estabelecimento de normas de atuação na
sociedade, harmonizando seus interesses próprios ao interesse social.
Embora disciplinado na Lei das S.A., o acordo de acionistas é um
contrato, submetido, assim, às normas comuns de validade dos negócios
jurídicos de direito privado. Como negócio jurídico, requer, para sua vali-
dade, agentes capazes — acionistas de uma mesma companhia - , objeto
lícito e forma escrita1728. A sua inclusão na disciplina societária objetivou
apenas estabelecer os pressupostos necessários a que tais contratos sejam
observados pela companhia e produzam efeitos perante terceiros.
Na interpretação do acordo de acionistas, 2 (dois) princípios funda-
mentais do direito obrigadonal devem ser priorizados: (i) autonomia da
vontade; e (ii) obrigatoriedade da convenção. A autonomia da vontade
apresenta-se sob duplo aspecto: a liberdade de contratar, que constitui a
faculdade de concluir ou não determinado contrato; e a liberdade contra-
tual, que é a possibilidade de as partes estabelecerem o conteúdo do con-
trato. Já o princípio da obrigatoriedade da convenção, limitado apenas
pela escusa do caso fortuito, da força maior e da imprevisão1729, significa
que as partes devem fielmente cumprir o pactuado, como se fosse lei, do
1723 O Código Civil, no art. 104, determina que: "A validade do negócio jurídico requer: I -
agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita
ou não defesa em lei."
1729 Consta do art. 393 do C ó d i g o C i v i l que: "O devedor não responde pelos prejuízos
resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles
responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato
necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir."
qual decorre importante conseqüência: a relatividade das obrigações, que
alcançam apenas e tão somente os contratantes. Não há, em princípio,
normas de ordem pública aplicáveis, mesmo no caso de o acordo versar
sobre ações de companhia aberta, uma vez que são apenas os interesses
patrimoniais dos acionistas contratantes que estão em jogo.
Os acionistas são inteiramente livres para convencionar ou não o
acordo, assim como para estabelecer o seu conteúdo, uma vez que a Lei
das S.A. não esgota a relação de matérias que dele podem constar, os
limites são apenas a licitude do objeto e a conformidade ao interesse
social. O pactuado entre as partes - e somente entre elas — deve ser
fielmente seguido, o que justifica a previsão legal de sua execução espe-
cífica. Assim, na interpretação dos acordos de acionistas devem ser
enfatizados (i) o cumprimento das obrigações pactuadas, já que o fo-
ram livremente; e (ii) a aplicação de seus termos apenas às partes con-
tratantes, exceto no caso do acordo de controle, que pode gerar efeitos
para outras companhias, "em cascata", mais adiante analisados.
Apenas os acionistas da companhia podem ser partes no contrato,
sejam titulares de ações ordinárias ou de ações preferenciais. A qualidade
de acionista, para os efeitos da aplicação deste artigo, deve ser compreen-
dida de modo extensivo, abrangendo, também, o usufrutuário a quem
tenha sido atribuído o direito de voto 1730 - 1731 . O acordo pode ter 2 (duas)
ou mais partes, 2 (dois) ou mais centros de interesse, cada um deles cons-
tituído por vários sujeitos. É comum que acordos sejam firmados por
distintos "grupos" de acionistas, integrados cada um por diversos sujeitos.
O acordo de acionistas possui natureza acessória em relação ao es-
tatuto social; embora celebrado entre os acionistas, sua eficácia depende
da existência da pessoa jurídica, em cuja esfera ocorrerá sua execução. Na
Consta do § 2° do art. 177 do Código Penal que: "Art. 177. § 2°. Incorre na pena de
detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, o acionista que, a fím obter vantagem
para si ou para outrem, negocia o voto nas deliberações da assembleia geral."
Também verificamos, na prática dos negócios, acordos firmados
entre o controlador e minoritários tidos como "estratégicos", medi-
ante os quais o primeiro obriga-se a não votar em determinadas ma-
térias sem a concordância prévia do minoritário, que passa a ter um
direito de veto a respeito de tais deliberações.
Há também acordos firmados apenas entre acionistas minoritá-
rios - os "acordos de defesa" - visando ao exercício conjunto de deter-
minados direitos que exigem um percentual mínimo de participação
acionária para o seu exercício, como o voto múltiplo, a exibição judi-
cial de livros e a eleição de membro para o conselho fiscal.
Podem ainda os acordos de voto estabelecer determinados objeti-
vos a serem alcançados pelos signatários, votando eles sempre naquele
sentido, como, por exemplo: eleger administradores independentes e
com sólida reputação; maximizar a distribuição de dividendos; ou privi-
legiar a política de reinvestimento na companhia. Tratando-se de com-
panhia aberta, os órgãos de administração deverão, no relatório anual,
informar à assembleia geral as disposições do acordo que tratam da
política de reinvestimento dos lucros ou de distribuição de dividendos
disciplinados em acordos nela arquivados. Tal informação é relevante
para o processo de tomada de decisão dos investidores sobre a compra
ou venda dos valores mobiliários emitidos pela companhia.
Não há restrições ao elenco de matérias que podem ser discipli-
nadas no acordo de voto, sendo necessário, porém, que elas constem
expressamente do ajuste, uma vez que não se admite os acordos de
voto em aberto, que implicariam, na prática, em alienação do direito
de voto dos minoritários pactuantes do acordo.
Também seria nula a cláusula mediante a qual os acionistas se
obrigassem a exercer o direito de voto para aprovar as propostas da ad-
ministração da companhia, pois implicaria renúncia prévia a conhece-
rem e discutirem tais matérias, votando no sentido determinado por
terceiros - os administradores ficando caracterizada uma transferên-
cia do exercício do direito de voto para quem não é acionista1738.
O interesse social deve ser preservado tanto nos termos do acordo
como na sua execução, o qual não é incompatível com o interesse co-
mum dos acionistas convenentes. Assim, presume-se que a orientação
adotada na reunião prévia está em consonância com o interesse social
Por outro lado, o acordo de voto não serve como escusa para o seu
integrante votar contra o interesse social1739. Da mesma forma, o acio-
nista que integra o bloco de controle é responsável pelos atos causados
com abuso do poder de controle1740. Em qualquer das situações, exime-se
de responsabilidade o acionista que vota contra a deliberação ilegal ou
abusiva tomada na reunião prévia, deixando consignada sua posição na
ata. Ainda que suas ações sejam utilizadas para integrar o bloco do
acordo, não pode ser tido como responsável por eventuais abusos prati-
cados contra a sua vontade. Idêntica é a situação do administrador que,
por força do deliberado em reunião prévia, é obrigado a votar ou decidir
naquele sentido; deixando ele consignada sua divergência exime-se de
responsabilidade pessoal (artigo 158, § I o ).
Os signatários do acordo também podem, ficando caracteri-
zado erro, fraude ou qualquer outro vício na reunião prévia, buscar
a anulação da deliberação adotada. Não lhes cabe, porém, pleitear
a anulação da deliberação tomada na forma do acordo por dela
discordar por razões pessoais ou negociais.
L 1 . ACORDO DE CONTROLE
1738 ALFREDO LAMY FILHO e JOSÉ L U I Z BULHÕES PEDREIRA, "Acordo de Acionistas Sobre
Exercício do Direito deVoto". In: Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.).
A Lei das S.A.: (pressupostos, elaboração, aplicação) ..., v. II, p. 295.
1 739 Ver os comentários ao art. 115 da Lei das S.A.
1 740 Ver os comentários ao art. 117 da Lei das S.A.
caput deste artigo, o exercício do poder de controle, institucionalizan-
do e conferindo mais eficácia a uma modalidade de ajuste que já vi-
nha sendo firmado antes de sua vigência. O acordo de controle congrega
os acionistas que, em conjunto, compõem o bloco de controle, ou seja,
detêm quantidade de ações que lhes asseguram o poder de eleger a
maioria dos administradores e a preponderância nas deliberações da
assembleia geral, bem como usam tal poder para dirigir os negócios
sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia1741.
Trata-se de uma modalidade de acordo de voto, visando ao exer-
cício do controle comum; para tanto, os convenentes formam um
bloco de ações e, em reuniões prévias, decidem como votarão, em
conjunto, no exercício do poder de controle.
Grande parte dos acordos de controle ocorre nas companhias
que apresentam o controle compartilhado1742, nas quais nenhuma
das partes, isoladamente, pode exercer o poder de controle, mas, so-
mando as suas participações acionárias e votando em conjunto, ca-
racterizam-se como um bloco de controle. E m companhias que
apresentam tal modalidade de controle, usualmente a escolha dos
membros do conselho de administração ou da diretoria não é deci-
dida por maioria dos votos na reunião prévia, mas cada parte do
acordo tem o poder de indicar um ou mais administradores, que
serão eleitos pelo grupo controlador, como um bloco.
Também pode ocorrer que as deliberações em reunião prévia confi-
ram eficácia ao exercício do poder de controle sobre um grupo de socie-
dades de fato, "em cascata", pelos órgãos sociais das sociedades sob controle.
No acordo de voto, seja ou não para o exercício do controle,
usualmente é indicado um síndico, representante da comunhão,
como mandatário dos integrantes do acordo, para proferir o voto
1743 Nos lermos do disposto no parágrafo único do art. 686 do Código Civil, o mandato é
irrevogável quando constituir meio de cumprir uma obrigação contratada.
1 744 Ver os comentários ao art. 126 da Lei das S.A.
1 745 M O D E S T O C A R V A L H O S A e N E L S O N EIZIRIK. A Nova Lei das S/A. São fòulo: Saraiva,
2002, p. 223.
1 746 M O D E S T O CARVALHOSA. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, v. 2, 4 a edição,
São Paulo: Saraiva, 2008, p. 540.
BB. A C O R D O S DE B L O Q U E I O
I I . 1 . A C O R D O SOBRE C O M P R A E V E N D A DE A Ç Õ E S
1750 Aplicam-se os arts. 462 a 465 do Código Civil, que assim dispõem: "Art. 462. O contrato
preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a
ser celebrado. Art. 463. Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no
artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das
partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que
o efetive. Parágrafo único. O contrato preliminar deverá ser levado ao registro competente.
Art. 464. Esgotado o prazo, poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da
parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isto se
opuser a natureza da obrigação. Art. 465. Se o estipulante não der execução ao contrato
preliminar, poderá a outra parte considerá-lo desfeito, e pedir perdas e danos."
1751 CARLOS A U G U S T O DA SILVEIRA LOBO, "Acordo de Acionistas". In: Alfredo Lamy Filho e
José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito das Companhias ..., v. I, p. 469. Aplicam-se os
arts. 427 e seguintes do Código Civil, que assim dispõem: "Art. 427. A proposta de
contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do
negócio, ou das circunstâncias do caso. Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta: 1 - se,
feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-Se também
presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante; II -
se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta
S I . 2 . A C O R D O S DE PREFERÊNCIA
ao conhecimento do proponente; III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a
resposta dentro do prazo dado; IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhe-
cimento da outra parte a retratação do proponente. (...)"
Tratando-se de companhia aberta, as ações deverão ser adquiridas em Bolsa de Valores e
somente de acionistas que não integrem o bloco de controle. Ver os comenlários ao art. 30
da Lei das S.A.
Também há acordos em que se prevê que, além do direito de
preferência, os acionistas, caso não o exerçam, têm o direito de venda
conjunta com o alienante {tag along). Assim, por exemplo, se o acio-
nista A recebe uma proposta de compra de um terceiro, deverá ofere-
cer aos demais integrantes do acordo - B, C e D - o direito de
preferência para comprarem, nas mesmas condições, suas ações. B, C
e D, se não quiserem exercer o direito de preferência, poderão vender
em conjunto com A suas ações para o terceiro, usualmente estabele-
cendo a cláusula do rateio, caso a proposta não contemple todas as
ações integrantes do acordo. Pode ainda o acordo prever que a parte
vendedora tem o direito de obrigar os demais convenentes a vender
as suas ações (drag along); a inserção da cláusula deve ser objeto de
cuidadosa análise, não sendo conveniente sua inclusão no acordo
quando os acionistas integrantes fizerem investimentos de vulto na
companhia, pois, nesse caso, poderão ser obrigados a alienar suas ações
a preços não compensatórios.
Existem ainda acordos, firmados intuitu personae, normalmen-
te em companhias fechadas, nos quais se estabelece que qualquer
das partes somente pode vender suas ações a terceiro não vetado
pelos demais signatários. Cláusula de tal natureza somente é legíti-
ma se não deixar a parte vendedora ao inteiro arbítrio das demais; a
recusa à entrada de terceiro deve ser fundamentada, mediante crité-
rios objetivos, previamente estabelecidos no acordo, para que não se
caracterize a condição potestativa1753.
Podem ainda os acordos estabelecer a cláusula de compra ou venda
no caso de impasse [buy or sell), mediante a qual, havendo divergên-
cia séria entre os signatários, qualquer um deles pode declarar, nos
termos do acordo, que deseja comprar as ações do outro, por um pre-
ço determinado, podendo o outro vender ou comprar pelo mesmo
1 753 O Código Civil Italiano, em seu art. 2.355-bis, admite a cláusula desde que, em caso de
veto, seja aceita a compra por preço justo.
preço. Tal modalidade de cláusula, útil para a resolução de conflitos
que impeçam a permanência das partes no acordo, é de difícil execu-
ção em companhias abertas, uma vez que pode acarretar a alienação
do controle, com a obrigatoriedade de promover oferta pública para
aquisição das ações dos acionistas minoritários1754. Assim, sua utili-
zação é recomendável apenas no caso de companhias fechadas.
EXECUÇÃO ESPECÍFICA
1 757 O art. 466-B do Código de Processo Civil, incluído pela Lei n° 11.232/2005, assim dispõe:
"Se aquele que se comprometeu a concluir um contrato não cumprir a obrigaçao, a outra
parte, sendo isso possível e não excluído pelo título, poderá obter uma sentença que
produza o mesmo efeito do contrato a ser firmado".
1758 O art. 461 do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n° 8.952/1994, assim
dispõe: "Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou nao razer,
O juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinara
providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. :> A
Obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ouse impossível
a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente. (...)"•
1759 SÉRGIO BERMUDES. As Reformas do Código de Processo Civil. 3' edição, Rio de Janeiro:
Saraiva, 2010, p. 126.
P R A Z O DE V I G Ê N C I A E D E N U N C I A
Com relação ao prazo, pode o acordo ser firmado: (i) por pra-
zo indeterminado; ou (ii) com prazo determinado em função de
termo ou condição resolutiva.
Com a inclusão do § 6 o pela Lei n° 10.303/2001, ficou expresso
que, se houver termo ou condição resolutiva, o acordo somente pode
ser denunciado segundo as suas estipulações. O termo pode ser certo,
quando fixada a data de sua vigência; ou incerto, quando depender de
um evento, que não se sabe quando ocorrerá. A condição resolutiva,
enquanto não se realizar, mantém em vigor o negócio jurídico. No pri-
meiro caso, o acordo existirá até a data de seu termo: fixado em 10 (dez)
anos, por exemplo, extingue-se alcançado seu termo. No segundo caso,
de termo incerto, o acordo permanecerá vigente enquanto o evento
não ocorrer, sendo mais comuns os casos de ajustes fixados enquanto
estiverem vivos os signatários ou enquanto não for extinta a sociedade.
Com relação à condição resolutiva, vigorará o acordo enquanto
ela não se verificar; sobrevindo ela, extingue-se o acordo1760. Assim,
por exemplo, pode o acordo de exercício do poder de controle dispor
que, enquanto as partes, em conjunto, controlarem a companhia, ele
vigerá. No mesmo sentido, pode o acordo de voto prever que, en-
quanto as partes mantiverem uma participação acionária acima de
determinado percentual, o acordo permanecerá em vigor.
Ou seja, no caso do acordo fixado com prazo determinado, ele
será extinto quando de seu término. Se o termo for incerto, vigorará
até a ocorrência do evento que o vincula, e, quando sujeito à condição
1760 O s arts. 127 e 128 do Código Civil assim dispõem: "Art. 127. Se for resolutiva a condição,
enquanto esta se não realizar, vigorará o negócio jurídico, podendo exercer-se desde a
conclusão deste o direito por ele estabelecido. Art. 128. Sobrevindo a condição resolutiva,
extingue-se, para todos os efeitos, o direito a que ela se opõe; mas, se aposta a um negócio
de execução continuada ou periódica, a sua realização, salvo disposição em contrário,
não tem eficácia quanto aos atos já praticados, desde que compatíveis com a natureza da
condição pendente e conforme aos ditames de boa-fé".
resolutiva, até que ela se verifique. Tanto no termo incerto como na
condição resolutiva, embora não haja prazo determinado, existe um
tempo de duração determinável.
No caso do acordo por prazo indeterminado, existe grande con-
trovérsia doutrinária e jurisprudencial sobre a possibilidade de sua re-
silição unilateral, sem causa, ou seja, mediante a denominada "denúncia
vazia". Num primeiro momento, entendeu-se que, como o acordo de
acionistas constitui um contrato e como é juridicamente impossível a
vinculação eterna dos signatários, qualquer deles, a qualquer tempo,
poderia denunciá-lo. Posteriormente, e esta é hoje a corrente majori-
tária, passou-se a exigir a "denúncia cheia", ou seja, mediante justa
causa, visando à preservação do pacto firmado e à manutenção da
estabilidade dos negócios jurídicos1761-1762.
Ora, a questão somente pode ser resolvida satisfatoriamente se
atentarmos para o tipo de acordo de acionistas em discussão. Tra-
tando-se de um acordo de voto ou de exercício do poder de controle,
típico contrato plurilateral, em que se manifesta a ajfectio societatis,
não cabe a "denúncia vazia", uma vez que os signatários compro-
meteram-se a envidar esforços e colaborar para alcançar objetivo
comum, vinculado ao interesse social. Ademais, em tais casos, os
acionistas seguidamente investem recursos de vulto no empreendi-
mento, dedicam a ele seu tempo, não fazendo sentido que um deles
1761 Rara uma análise das 2 (duas) correntes, na doutrina e na jurisprudência: JOSÉ VVALDECY
L U C E N A . Das Sociedades Anônimas - Comentários à Lei (arts. I o a 120). v. I, Rio de
Janeiro: Renovar, 2009, p. 1.148 e seguintes; MARIA ISABEL D E ALMEIDA ALVARENGA,
"Impossibilidade de Resilição Unilateral de Acordo de Acionistas por Prazo Indeterminado",
Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Malheiros,
v. 108, outubro-dezembro, 1997, p. 186-196.
1 762 Solução intermediária - e interessante - é aventada por A R N O L D O VVALD, " D o
Descabimento de Denúncia Unilateral de Pacto Parassocial que Estrutura o Grupo Societário",
Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: Ed. Revista
dos Tribunais, v. 81, janeiro-março, 1991, p. 20, ao propor que o signatário de acordo por
prazo indeterminado que desejar desvincular-se deve encetar previamente um esforço de
negociação, para evitar que sua retirada caracterize abuso de direito; caso não se chegue a
um entendimento, devem ser fixados prazos compatfveis com os interesses das partes,
tendo em conta a duração que o contrato já teve.
possa, a qualquer momento, por uma tecnicalidade jurídica, perder uma
posição de integrante do bloco de controle ou de minoria significativa
Já no caso de acordo para a compra ou venda de ações, exercício
do direito de preferência e qualquer outro em que não se manifeste a
comunhão de escopo, inexistindo termo certo ou tempo de duração
determinável, não se pode obrigar a parte a permanecer vinculada a um
ajuste bilateral que restringe o seu direito de dispor das ações, pela eter-
nidade. Assim, qualquer das partes pode retirar-se unilateralmente, con-
tinuando o contrato vigente com relação aos demais signatários. Caso
eles tenham feito investimentos consideráveis para a execução do acor-
do, a denúncia unilateral somente produzirá seus efeitos após o decurso
de prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos1763.
Mediante a aplicação do mesmo raciocínio, pode-se chegar a
uma solução razoável da questão referente à possibilidade de se resol-
ver o acordo por quebra da a f f e c t i o societatis.
Quando o acordo não versa sobre voto ou exercício do poder de
controle, não está presente, em princípio, o dever de colaboração
para se alcançar uma finalidade comum. Assim, não cabe resolução
por quebra de a f f e c t i o , no caso inexistente, mas apenas rescisão se
uma das partes não cumprir sua obrigação, ou denúncia unilateral,
se for o ajuste por prazo indeterminado.
Já quando o acordo for caracterizado como um contrato plurilate-
ral, presente a comunhão de escopo, o dever de colaborar para que se
logre um objetivo comum, demonstrado o rompimento da affectio, com
a conseqüente impossibilidade de convivência entre as partes, cabe a
1 763 A propósito, o C ó d i g o Civil no art. 473 dispõe que: "Art. 473. A resilição unilateral, nos
casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notifi-
cada à outra parte. Parágrafo Único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das
partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral
só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos
investimentos." Ver também: E V E L Y N B A L A S S I A N O , "Acordo de Acionistas: Possibilidade
de Resilição Unilateral e suas Restrições", Revista Trimestral de Direito Civil. São Paulo: Ed.
fedma, v. 30, abril-junho, 2007, p. 27 e seguintes.
sua resolução, seja por prazo determinado ou não. Com efeito, a exis-
tência de sérias desavenças entre os signatários, particularmente quan-
do versa o acordo sobre o exercício do poder de controle, pode trazer
conseqüências negativas para a gestão da companhia, atuando a sua
permanência contra o interesse social, não em seu favor.
Com efeito, quando se constata que o acordo não mais cumpre o
seu objetivo de regular, harmonicamente, o controle compartilhado
entre os signatários, trazendo a discórdia, com efeitos danosos para a
companhia, cabe a sua dissolução1764.
Ainda que a dinâmica empresarial possa por vezes exigir solu-
ções rápidas, a necessária segurança jurídica buscada pelas partes ao
firmarem o acordo impõe que sua denúncia somente possa ocorrer
pela via judicial ou arbitrai. Admitir a denúncia extrajudicial, fundada
na infração ao dever de colaboração, significaria excepcionar indevi-
damente o princípio da obrigatoriedade da convenção1765.
Se as partes realizaram investimentos consideráveis, o que segui-
damente ocorre em acordos para o exercício do poder de controle, deve-se
ponderar o interesse de uma das partes de libertar-se do vínculo com o
da outra de recuperar os investimentos feitos, aplicando-se, por analo-
gia, o disposto no artigo 473, parágrafo único, do Código Civil.
E X E C U Ç Ã O INTERNA CORPOMS- §§ 8O E 9O
1 764 ALEXANDRE DE M. WALD, "Acordo de acionistas e Interesses Sociais". In: Amoldo Wald
e Rodrigo Garcia da Fonseca (Coord.). A Empresa no Terceiro Milênio: Aspectos Jurídicos.
São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005, p. 91.
1765 Em sentido contrário, importante precedente da 4'1 Turma do Superior Tribunal de Justiça,
no julgamento do Recurso Especial n" 388.423-RS, Rei. Min. Fernando Gonçalves, j. em
13.05.2003, publicado no DJU em 04.08.2003, publicado na Revista Trimestral de Direi-
to Civil. Rio de Janeiro: Ed. Padma, v. 23, jullio-setembro, 2005, p. 141-152, com comen-
tários de M A U R Í C I O MOREIRA M E N D O N Ç A DE MENEZES, "Resolução de Acordo de
Acionistas com Base na Quebra da Afíeclio Societatís", Revista Trimestral de Direito Civil.
Rio de Janeiro: Ed. Padma, v. 23, julho-selembro, 2005, p. 153-167.
acionistas, reconhecendo a eficácia, diante da sociedade, dos chama-
dos "acordos de voto em bloco" ( p o o l i n g agreements da prática contra-
tual norte-americana). Tal conceito foi desenvolvido nos Estados Unidos
como uma forma de se obrigar os acionistas acordantes a exercer o voto
num sentido único, a ser determinado em conformidade com procedi-
mento estabelecido no próprio acordo. Para tal finalidade, os conve-
nentes formam um bloco de ações que deverá adotar um sentido
uniforme para os votos a serem por eles proferidos nas assembleias,
assim como pelos administradores eleitos em virtude do acordo, nas
reuniões dos órgãos de que participem. Não há qualquer limitação legal
no que respeita à forma que se determinará o sentido do voto em bloco,
porém usualmente os acionistas convencionam que votarão de acordo
com o decidido pela maioria das partes integrantes do acordo.
O acordo de voto em bloco geralmente disciplina o procedimen-
to da "reunião prévia", órgão deliberativo interno do acordo, a cujas
decisões todos os convenentes ficam vinculados. Assim, na reunião
prévia os contratantes decidem como votarão com todas as ações
integrantes do acordo de controle nas assembleias gerais, ainda que
alguns deles não concordem com o sentido do voto 1766 .
C o m o não há disciplina legal da reunião prévia, recomenda-se
que o acordo de acionistas que a institua regule detalhadamente o seu
funcionamento, em todos os aspectos relevantes: convocação; ordem
do dia; procedimento de contagem dos votos; matérias que podem
ser objeto de maiorias especiais ou de direito de veto; procedimentos
a serem adotados caso haja empate nas deliberações; organização,
secretariado e presidência das reuniões; representação nas assembleias
dos integrantes do acordo. E conveniente que se evite, ao máximo, a
criação de situações de impasse nas deliberações da reunião prévia,
principalmente quando se trata de acordo para o exercício do poder
1778 N E L S O N EIZIRIK, "Interpretação dos §§ 8° e 9 o do Art. 118 da Lei das S/A", Revista de
Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Fàulo: Ed. Malheiros, v. 139,
julho-setembro, 2005, p. 155. No mesmo sentido: JOSÉ WALDECY LUCENA. Das Socieda-
des Anônimas - Comentários à Lei (arts. 1° a 120) ..., v. I, p. 1.164; P A U L O C E Z A R
A R A C Ã O , "A Disciplina do Acordo de Acionistas na Reforma da Lei das Sociedades por
Ações (Lei n° 10.303, de 2001)". In: Jorge Lobo (Coord.). Reforma da Lei das Sociedades
Anônimas - Inovações e Questões Controvertidas da Lei n° 10.303, de 31.10.2001 ...,
p. 373; MIGUEL T O R N O V S K Y , "Acordos de Acionistas sobre o Exercício do Poder de
Controle", Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro ..., v. 127, p.
100; CARLOS A U G U S T O DA SILVEIRA LOBO, "Acordo de Acionistas". In: Alfredo Lamy
Filho e José Luiz Bulhões Pedreira (Coord.). Direito das Companhias ..., v. I, p. 446.
1 779 NELSON EIZIRIK. Temas de Direito Societário ..., p. 32. Em sentido contrário: J O Ã O L A U D O
C A M A R G O e MARIA ISABEL D O P R A D O BOCATER, "Conselho de Administração: seu
Com efeito, o atual § 9 o obriga o presidente do conselho de
administração ou o diretor presidente a não computar o voto profe-
rido pelo conselheiro ou pelo diretor em desacordo com o direcio-
namento de voto dado pelo bloco de controle, bem como permite
ao conselheiro ou diretor eleito em virtude do acordo votar pelo ad-
ministrador ausente ou abstinente. Assim, a cláusula que vincula os
administradores aos termos do acordo deixou de ter caráter acessó-
rio, passando a ser vinculativa para a companhia, que deverá obser-
vá-la nas reuniões do conselho de administração e da diretoria.
A observância às disposições do acordo pelos administradores
constitui conseqüência do reconhecimento do poder de controle
como matéria nele constante e que vincula a sociedade. De modo
geral, o poder de controle é exercido primeiro nos órgãos de admi-
nistração, depois na assembleia geral; com efeito, é nas instâncias
administrativas que são tomadas deliberações fundamentais para a
companhia, para serem diretamente implementadas ou para sua pro-
posição à assembleia geral. Dessa forma, seria inócuo o acordo que
disciplinasse o poder de controle sem vincular a atuação dos admi-
nistradores eleitos pelos integrantes do bloco de controle.
Não existe incompatibilidade entre o dever de independência
do administrador, previsto no § I o do artigo 154, e o acatamento
das decisões adotadas em reunião prévia, uma vez que os acordos de
voto em bloco devem visar à consecução do interesse social; ade-
mais, é do interesse da companhia que o poder de controle seja exer-
cido de f o r m a coerente e h a r m ô n i c a . A s s i m , não pode o
F u n c i o n a m e n t o e P a r t i c i p a ç ã o de M e m b r o s I n d i c a d o s por A c i o n i s t a s Minoritários e
Preferencia listas". In: Jorge Lobo (coord.). Reforma da Lei das Sociedades Anônimas - Inova-
ções e Q u e s t õ e s Controvertidas da Lei n° 10.303, de 31.10.2001. Rio de Janeiro: Forense,
2 0 0 2 , p. 3 9 2 - 3 9 4 ; P A U L O F E R N A N D O C A M P O S S A L L E S D E T O L E D O , "Modificações
Introduzidas na Lei das Sociedades por Ações, quanto à Disciplina da Administração das
Companhias". In: Jorge Lobo (Coord.). Reforma da Lei das Sociedades Anônimas - Inovaçoes
e Questões Controvertidas da Lei n° 10.303, de 31.10.2001. Rio de Janeiro: Forense, 2002,
p. 4 2 6 - 4 2 8 .
administrador eleito pelo bloco de controle obstruir o exercício do
poder de controle estabelecido no acordo.
"ACORDOS EM CASCATA"
REPRESENTAÇÃO DE A C I O N I S T A RESIDENTE
o u DOMICILIADO NO EXTERIOR
SEÇÃO V I I
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