Você está na página 1de 98

IDÁTICOS

! | lemos aqui um estudo que


imula e ensina — ”
caminhos e meios para a Sivio SÁNCHEZ GAMBOA
prática dá pesquisa cientí
A publicáção des
tanto pelo original e denso
quadro que sistematiza quanto.
pelas lições metodológicas que
'neerra, será de grande |
importância c validade para
todos os pesquisadores e áreas
afins da Educação e, de módo PESQUISA EM EDUCAÇÃO
mais amplo, às Ciências métodos e epistemologias
Iumanas em geral. Todos
1º reimpressão — 2008
aque Acrem a mari
este estudo do Dre. Silvio
Sánchez Gamboa haverão de
constatar a clara certeza de sua
potencialidade reflexiva, de sua
Tigorosa estrutura expositiva,
de sua criteriosa urdicdura
interpretativa, de sua
.- esclarecida identidade política EM corodução total

e seu notável aleanec didático.


ES

Nunes, o Re
outono de 2006. E=.
ARGOS
ediiora univenhária
Chapecó, 2008
A.
UNOCHAPECO
DIVERSIDADE CRUUNTIÁALA REGIONAL DE Cla PEC)

REITOR: Gilberto Loiz Agnolin


Vice-ReITORA DE PESQUISA, EXTENSÃO
E POs-GraDUAÇÃO: faria Assunta Busato
VICE-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO: Gerson Roberto Rôwer
VICE-REITOR DE GRADUAÇÃO: Odilon Luiz Poli

370 Gamboa, Silvio Sánchez


| Gl92p Pesquisa cm educação: métodos e
epistemologias/Silvio Sánchez Gamboa. - -
' Chapecó: Argos, 2007.
: 193 p. :
: 1. Educação. 2. Epistemologia. T, Título:

CDD370
ISBN: 978-95-9999 1-71-0 Catalogação: Yara Menegatri CRB 14/448
Biblioteca Ceneral da Unochapecó

Eu sustento que a única finalidade da ciência está


[= em aliviar a miséria da existência humana.
ARGOS B. Brecht.
editor uncera Lane
Conselho Editorial: Elison Antonio Paim (Presidente); Priscila Casari (Vice),
Alessandra Machado; Alexandre Mauricio Matiello; Antonio Zanio;
Arlene Renk; Edilane Bertelli; Jacir Dal Magro; José Luiz Zambiasi;
Juçara Nair Wolf, Maria Assunta Busato; Maria dos Anjos Lopes Viella;
Monica Elass; Ricardo Brisolla Ravanello

Coordenadora: Monica Hass


Um

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos colegas do Departamento de Filosofia e


História da Faculdade de Educação da Universidade
Estadual de Campinas (UNICAMP) e ao Grupo de Estudos e

Pesquisas em Filosofia da Educação (Paidéia) por seu


constante estímulo à produção científica.
Aos editores da Cooperativa Editorial Magistério,
Alfredo Ayarza Bastidas e Ilse Patrícia Sánchez, pelo
apoio na publicação da edição espanhola e pela autorização
dada à tradução e à atualização dos textos, que permitiu
compor esta nova publicação.
À Márcia Chaves pelo significativo esforço tanto
na tradução como na revisão dos originais. Aos colegas
Joaquim Severino, pela apresentação incentivadora, e
César Nunes, pelos textos da orelha desta publicação.
SUMÁRIO

Apresentação
1

Introdução
15

Os métodos na pesquisa em educação:


uma análise epistemológica
23

Tendências da pesquisa em educação:


um enfoque epistemológico
45

Esquema paradigmático: um tnstrumento


para a análise da produção científica
63
À formação do pesquisador na educação e
as tendências epistemológicas
79

À pesquisa como estratégia de inovação educativa:


as abordagens práticas
97 '

À, construção do objeto na pesquisa educacional


125

À concepção de homem na pesquisa educativa:


algumas constatações APRESENTAÇÃO
141

À historicidade do objeto na pesquisa educacional


153

Interesses cognitivos na pesquisa educacional: Tenho muita satisfação em apresentar ao público brasileiro este
uma questão ética? relevante trabalho de Silvio Gamboa, construído como uma seleção de
165 textos produzidos por ele ao longo de sua trajetória científica e acadê-

Considerações finais
mica, na condição de estudioso da problemática educacional. Embora
183 produzidos em épocas é com finalidades diferentes, os trabalhos que
se transformaram nos capítulos deste livro se vinculam de modo per-
Referências
feitamente lógico, expressando a coerência da reflexão filosófica que o
185
autor vem desenvolvendo: uma constante preocupação com as ques-
tões epistemológicas que devem presidir a produção do conhecimento
no campo educacional. Para ele a pesquisa educacional não pode limi-
tar-se a ser mera aplicação mecânica de instrumentos, técnicas & pro-
cedimentos, a que tende a reduzir-se a tendência dominanté em nos-
sos meios acadêmicos. Seu posicionamento filosófico expressa a tese
de que todo método implica uma teoria da ciência, que, por sua vez, se .
lastreia numa teoria do conhecimento.
Mas, ao mesmo tempo, toda
teoria do conhecimento envolve necessariamente uma concepção. do * Cabe à Filosofia da Educação, tanto de uma perspectiva de toralidade .
real, um fundamento antológico. vucba, como de uma perspectiva da particularidade das várias ciências, des- |
"Trata-se, pois, de uma incursão sistemática no próprio cerne da * crever e debater a construção do objeto“educação” pelo sujeito huma-
Filosofia da Educação, debatendo uma temática de extrema relevância no. Cabe a ela, por assim dizer, a dupla missão de se justificar, ao

Pr.
não só para aqueles que, particularmente nos cursos de pós-graduação em É mesmo tempo em que rearticula os esforços da própria ciência, para
educação, desenvolvem pesquisas na área educacional com vistas à prepa- também se justificarem, avaliando e legitimando a atividade epistêmi-.
ração de suas dissertações ou teses, mas também para os pesquisadores ca como processo tecido no texto/contexto da realidade histórico-cul-
) sentores compromissados com o conhecimento da realidade educacional, - tural da humanidade,
' mediante investigações científicas. É, sem Soto uma tarefa imprescin- No seu momento epistemológico, a Filosofia da Educação inves-
te, pois, no esclarecimento das relações entre a produção do conheci-
tando os pressupostos epistemológicos envolvidos naprática «da a pesquisa.
p mento e o processo da educação. Por isso, cabe a ela enfrentar um espec-
Em que pese o risco de um reducionismo epistemologista, pre- tro bem amplo de questões nesse plano da proclução do saber, daquelas
sente em algumas tendências da Filosofia da Educação, entre nós, im- relacionadas com a natureza da própria subjetividade até aquelas que se
pôese reconhecer que a questão epistemológica se coloca efetivamente, encontram implicadas no mais modesto ato de ensino ou de * aprendiza-

intervenção da subjetividade, de pressupõe sernprere mediações subjeti- da educação. Com fito, estão
e emn pauta oso é esforços que têm sido desen-
vas. Tanto no plano de suas expressões teóricas como no de suas, realiza- volvidos com vistas à criação de um sistema de saber no campo da edu-
ções práticas, a educação envolve a própria
p subjetividade e suas produ- cação, de tal modo que se possa dispor de um corpo de conhecimentos
ções, exigindo do educador uma atenção específica e redobrada para fundados numa episterme, num saber rigoroso e consistente. Trata-se da
uúdar com essa situação. À atividadeda consciência é mediação impres- : questão da cientificidade para o campoededucacional.
cindível das atividades da educação, a experiência da vivência subjetiva Este livro é uma qualificada demonstração desta tarefa da Fi-
é condição inelutável de todo e qualquer saber sobre a condição humana loscfia da Educação, tanto mais valiosa por se tratar de uma reflexão
e sobre todos os aspectos em que ela se desdobra na efetividade do real. que nasce do acompanhamento da produção científica latino-america-
Mas, cle outro lado, a consciência é igualmente o lugar privilegiado das na, no campo da educação, particularmente daquela gestada nos pro-
ilusões, dos erros e da ideologia, tendo o alcance de sua atividade cons- gramas de pós-graduação. Dessa forma, contribui também para a ne-
tantemente ameaçado de ficar comprometido. cessária atenção que se deve prestarà prática científica dos progra-

Em decorrência de tal situação, a Filosofia da Educação preci- mas, em vista de se garantir sua qualidade, que implica, necessaria-
sa implementar uma reflexão propriamente epistemológica sobre a mente, um rigoroso proceder científico. À pós-graduação em educa-
natureza dessa experiência na sua manifestação na área educacional. ção, no Brasil, tornou-se um significativo espaçode formação de novos
dies

pesquisadores, bem Fomo


PESTUISACOTES, come deue Aprumora
aprimoramento UEde pronssionais
profissionais dada docên-
doceno
cia, exatamente
pela centralidade que neles ocupa a prática da pesquisa.
Além disso, a questão epistemológica não é discutida de forma
isolada. Silvio Gamboa aborda o assunto também no contexto da for-
mação do pesquisador, no contexto da inovação educacional, discutin-
do a relação da pesquisa com a prática. Também não deixa de traba-
lhar as referências antropológicas do conhecimento educacional, res-
saltando sua intrínseca condição histórico-social, e suas implicações
éticas.
Pela sua relevância, qualidade e pertinência, o presente livro
INTRODUÇÃO
merece leitura atenta e análise detida por parte dos pesquisadores e
demais profissionais da área educacional. Esse será seu-maior reco-
nhecimento.

Antônio Joaquim Severino, Esta obra reúne uma série de artigos publicados em várias re-
Feusp, agosto de 2006. vistas brasileiras e colombianas e também comunicações apresentadas
em congressos nacionais e internacionais, na Argentina, Brasil, Co-
lômbia, Chile, Cuba, México e Venezuela, que têm em comum o estu- '
do da problemática da pesquisa em ciências sociais e educação, a par-
tir da lógica e da epistemologia da produção científica.
À problemática sobre a pesquisa científica é amplamente tra-
tada na literatura especializada; no entanto, uma significativa percen-
tagem dos textos publicados sobre este tema geralmente se centraliza
em questões técnicas e metodológicas, na maioria das vezes tratadas
é ú
sob a ótica positivista, que, sendo uma das tendências predominantes
o aa:

na investigação educativa, considera inútil a discussão sobre os méto-


dos e as epistemologias, pois considera o tema relativamente esgotado,
ESA

uma vez que parece admitir um único método científico, aquele que
segue o estatuto da “ciência positiva”, os processos empírico-analíticos |
é as regras do discurso hipotético-dedutivo.
16 7

Falar da diversidade metodológica e das tendências epistemo- epistemologias. Nesse sentido, o subtítulo de “métodos e epistemoio-
lógicas, de diversas construções e lógicas que articulam métodos e epis-
temologias na pesquisa, assim como conflitos e crise de paradigmas pressa | nos métodos, ea
e 2 reflexão sobre sºsuas
sas articulações lógicas ecom os
científicos não somente discorda dessa visão positivista como também pressupostos epistemológicos. |
polemiza contra as hegemonias e os reducionismos técnicos, com base A maioria dos textos publicados sobre a investigação educativa
nas seguintes | teses: | | | pode ser classificada em três grupos: 1) INumerosos manuais que expli-
Frimeiro admitir a Pluralidade das abordagens e a diversidade de cam as técnicas da investigação indicando procedimentos e formas de
maneiras de ver e focalizar a problemática educativa, quebrando assim a elaboração de diversos instrumentos e diversos tipos de desenhos e es-,
pretendida hegemonia dde alguns | métodos que ganharam relativa hegemo- quemas de investigações e indicando modelos de apresentação de traba-
nia na recente trajetória da pesquisa educacional :na América Latina. lhos científicos. Tais características evidenciam o desconhecimeénto
de
Segunda: admitir a necessária relação lógica entre os proces- uma análise da produção científica e dos requisitos básicos da lógica eda
sos instrumentais (técnicas e metodologias) de investigação, os refe- 2) Algumas obras de elevado nível teórico-filosófico so-
epistemologia a.)
renciais teóricos e as concepções éêpistemológicas que lhes servem de bre a problemática do conhecimento, pouco acasíveis para estudantes e
pressupostos. 1
profissionais que se iniciam na investigação(3) Informes de resultados
O nexo entre métodos e suas bases episternológicas, como suge- de investigações que superficialmente assinalam as articulações básicas
te o título do livro, sintetiza uma relação mais ampla, que compreende a entre as técnicas, os métodos, as teorias e os pressupostos epistemológi-
articulação dos diversos elementos constitutivos de toda investigação cos e filosóficos que, por privilegiarem os resultados, apenas. indicam
científica, tais como técnicas, métodos, teorias, pressupostos epistemo- - > alguns. procedimentos e referenciais, porém não se detêm em refletir
lógicos, gnosiológicos e ontológicos. À articulação lógica de toda investi- sobre os processos e sobre a constituição do. conhecimento.
gação científica exige uma sequência de relações entre esses elementos Essas alternativas que a literatura oferece deixam em aberto a
que compõem o trabalho de investigação, sem os quais o processo de necessidade de obras que, sem deixar de lado os elementos técnico-
“elaboração do conhecimento científico será deficiente e sua qualidade instrumentais, os infegrem em uma reflexão sobre os fundamentos do...
será deficitária. Entendemos que esses elementos deverão estar, explíci- trabalho científico. Essas publicações pretendem analisar a prática da
ta ou imphLcitamente, presentes em todo trabalho científico, indepen- produção científica à luz dos requisitos lógicos e epistemológicos da
dente de seu maior ou menor grau de coerência e articulação. elaboração científica e suscitam reflexões mais profundas sobre as prá-
A necessária articulação lógica entre os diferentes elementos ticas do pesquisador em educação. Com essas intenções apresentamos
da investigação científica se expressa quando elucidamos uma prática esta série de trabalhos que se articulam em torno da análise da prática
concreta de investigação. Essa articulação pode ser sintetizada na re- da investigação e a reflexão crítica, buscando suas bases epistemológicas i
lação entre os métodos - elementos práticos da investigação — e os e filosóficas. São estudos que foram realizados tomando como base
elementos teóricos, estes sistermatizados no que chamamos aqui de
resultados e desdobramentos de estudos sobre a produção da pesquisa O primeiro capítulo contém o estudo pioneiro que gerou as
no contexto dos programas de pós-graduação em educação no Brasil. outras análises. É um resumo da dissertação de mestrado realizada
Partir de experiências e estudos localizados, tomando como na Universidade de Brasília, que estudou os métodos científicos pre-
objeto a produção concreta desenvolvida nas condições específicas da dominantes nas investigações produzidas nesse programa...
Uma pri-
consolidação da pós-graduação brasileira, oferece a vantagem de per- meira versão foi publicada na “Revista Educação e Sociedade” (1984).
mitir também análises concretas, de identificar dificuldades, vazios e Nesta oportunidade destacamos algumas justificativas para os estu-
desafios, assim como sugerir possíveis alternativas de superação, es- dos epistemológicos da produção científica em educação, sobre a di-
pecialmente quando o leitor desta publicação pode ser alguém que se versidade de caminhos encontrados na investigação educativa e so-
imcia no exercício da produção científica ou um pesquisador experien- bre os paradoxos que desafiam a prática da elaboração do conheci-
te que pretende se aprofundar na reflexão sobre a pesquisa entendida mento científico.
como dimensão fundamental do desenvolvimento da educação. O segundo capítulo justifica a relevância e pontua as dimen-
O livro congrega a tradução de duas publicaçõês em língua sões do campo de estudo da epistemologia, particularmente na com-
espanhola, que oferecem uma articulação em torno das alternativas preensão das tendências da produção científica. O texto foi inicial-

metodológicas e dos pressupostos epistemológicos!. Está organizado mente apresentado como conferência no Seminário Internacional so-
em dois grupos de capítulos; os três primeiros oferecem algumas con- bre Investigação Educativa e Inovação, organizado pela Corporação
cepções básicas de investigação educativa, métodos e epistemologias, Magistério e pela Universidade Del Bosque, em Bogotá, em 1998.
e definem as bases do instrumental utilizado na análise da produção de O terceir)capírulo expõe c instrumental utilizado na análise
investigações em educação; os demais capítulos apontam os resultados da produção científica, o qual tem sido aplicado em inúmeras investr-
de alguns estudos sobre as investigações educativas em alguns cursos gações e por diversos grupos de alunos de pós-graduação. Tal instru-
de pós-graduação em educação, enfocando as tendências epistemoló- mental ajuda a identificar as partes constitutivas da investigação em
gicas que orientam essas investigações, recuperando suas implicações educação e a reconstituir a lógica interna que, de forma mais ou menos
com relação às categorias filosóficas de homem, relação sujeito/objeto, coerente, toda investigação deve ter.
história e realidade e discutindo os problemas éticos que carrega a A partir dos temas básicos expostos nos primeiros capítulos, o
predução do conhecimento sobre a sociedade e a educação. livro dedica os demais capítulos à exposição e à reflexão sobre alguns
resultados da análise da prática da investigação e suas relações com as
teorias do conhecimento e com as visões de mundo que sustentam o

' À primeira publicação é “Fundamentos para la investigación educativa, presupuestos epistemológicos exercício da investigação.
que orientan al investigador” (Sánchez Gamboa, 2001). Dessa publicação foram traduzidos todos os O quarto capítulo aplica alguns resultados de nossa tese de dou-
capítulos, que aqui compõem os capítulos 1, 3, 4, 6, 7, 8 é 9. À segunda publicação é “Investigación
& innovación educativa” (Sánchez Gamboa, 2003), da qual foram traduzidos dois capítulos, que torado em Filosofia e História da Educação à formação do educador
compõem os capítulos 2 e 5 deste livro.
20

pesquisador”. Esse trabalho foi apresentado no Encontro Internacional perguntar-se sempre com qual teoria do conhecimento está trabalhando
Pedagogia 90 em Havana (Cuba), em 1990, e posteriormente exposto ' quando investiga. Os diferentes modelos de investigações se funda-
como aula magistral na Universidade Santa Maria de Caracas (Vene- mentam em diferentes concepções de objeto. Essa discussão é apre-
zuela). Sua primeira versão foi publicada na revista “Física e Cultura” sexto capítulo.
sentada no sexto Es
da Universidade Pedagógica Nacional da Colômbia (v. 1, n. 2, 1990). O dápítulo seguintê)aponta algumas comprovações sobre a
O «quinto capítulo discute a relação da pesquisa com a práti- articulação existentê entre as abordagens teórico-metodológicas utiliza-
ca. Dependendo da maneira de abordar o problema e da tradução das na investigação educativa e seus pressupostos filosóficos. As con-
dele em questões norteadoras e perguntas geradoras do processo de cepções de homem, de educação, de história e realidade, entre outros,
pesquisa, a sua relação com a prática e a aplicação de seus resulta- estão presentes de forma implícita em toda investigação educativa. Como
dos, essa relação se torna próxima ou distante e pode pautar estraté- elucidá-los? Como explicar essas concepções? Graças à recuperação
gias de inovação e transformação. Este capítulo foi apresentado como desses pressupostos foi possível ver os nexos entre os tipos de métodos
conferência no Seminário Internacional! sobre Investigação Educati- utilizados e seus desdobramentos filosóficos. As concepções de homem e
va e Inovação, organizado pela Corporação Magistério e a Universi- educação especificamente são abordadas no sétimo capítulo. Esse tra-
dade Del Bosque, em 1998. balho fai apresentado no II Simpósio sobre o Pensamento Filosófico La-
Em 19990, no IV Seminário Nacional sobre Investigação Edu- tino-Americario na Universidade Central de Las Villas (Cuba), em 1989.
cativa, organizado pela Universidade Pedagógica Nacional da Colôm- Outra das concepções de âmbito filosófico presente nas inves-
bia, apresentei a conferência “A construção do objeto na investigação tigações e que adquire diversas interpretações segundo o tipo de abor-
em Educação: enfoques epistemológicos”. Nessa oportunidade foi dis- dagem teórica é o conceito de tempo e de história, Consideramos que,
cutida a necessidade de revelar as teorias do conhecimento que funda- dado o caráter social e histórico dos fenômenos educativos, toda inves-
. mentam os métodos e as epistemologias. Defendi a tese da prática de tigação sobre à educação deveria considerar a historicidade do fenô-
uma teoria do conhecimento em toda investigação científica, da qual o ; entret anto, constatamos que, dependendo do método utilizado,
pesquisador deve ter consciência. Quando produzimos um conheci- ignora-s se, despreza-se ou ressalta-se esse atributo essencial dos fenô-
AAA
mento, construímos um objeto de conhecimento e estabelecemos uma menos sociais. . No (gitavo/ capítulo, defendemos essa tese e questiona-
relação gnosiológica com esse objeto. Quer dizer, criamos uma rela- mos as limitações de alguns modelos teóricos para expressar a histori-
ção cognitiva entre um sujeito e um objeto. Todo pesquisador deve cidade do fenômeno educativo. Essa reflexão foi apresentada no 1 Con-
gresso Ibero-Americano de História da Educação Latino-Americana,
realizado em Santa Fé de Bogotá, em setembro de 1992, e no Seminá-

? Essa tese foi defendida na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), em 1987, com tio de História da Educação, em um debate organizado pela Univer-
o título “Epistemologia da Pesquisa Educacional: estruturas lógicas e tendências teórico- sidade Nacional de Lujan de Argentina, em 1993.
metodológicas”.
22

A. questão dos paradigmas científicos ou, como preferimos cha-


má-los, das opções epistemológicas tem gerado estudos sistemáticos e
classificações que identificam as propriedades e diferenças dos enfo-
ques científicos modernos. Habermas elaborou uma tipologia do co-
nhecimento científico a partir dos interesses e pressupostos filosóficos
que comandam os processos cognitivos. Quando falamos de interes-
ses, de ortentações, ou de opções, entramos no amplo e controvertido
campo da ética. No nono tapítulo se discute a problemática ética da
investigação científica, "Fétomando a crítica à tese positivista, que, para
garantir a objetividade do processo científico, separa a ciência e a cons-
Os MÉTODOS NA PESQUISA EM EDUCAÇÃO:
ciência, os fatos e os juízos de valor, o conhecimento e os interesses
UMA ANÁLISE EPISTEMOLÓGICA
humanos. Perguntamos se existe uma dimensão ética na opção do pes-
quisador por uma determinada abordagem teórico-metodológica. Con-
sideramos que o pesquisador não é axiologicamente neutro; como ci-
dadão de uma determinada sociedade, como “ser político”, como ho- As revistas especializadas em educação vêm dedicando espaço
mem de sua época e também como sujeito da história, deve ter consciên- cada vez maior à análise da investigação realizada na área”. Há uma
cla clara dos interesses que comandam seu fazer investigativo; portan- : preocupação, entre outros aspectos, pelo grau de eficácia da investiga-
to, não deve poupar esforços para esclarecer as implicações filosóficas
ção em educação, sua utilidade, sua correspondência com as necessi-
e ideológicas de suas opções epistemológicas. Uma primeira versão : dades reais, 2 conveniência ou não de determinar prioridades de estu-
sobre essa discussão foi apresentada no VI Congresso Internacional de 'do, a importância de se edetectar nãose as investigações estão orientadas
it Maas Seia
Filosofia Latino-Americana realizado na Universidade de São Tomás na direção da conservação do status quo ou em direção da mudança das
de Bogotá, em 1990, e atualizada para a edição deste livro.
:| atuais «estruturas da sociedade... Hoje especialmente se questiona o tipo
Esperamos que o leitor siga com interesse esta sequência de de abordar
* de método utilizado nas investigações educativas e a forma
trabalhos inicialmente publicados como textos separados e aqui orga- os diferentes problemas; questiona-se a Lvestigação empírica por privi-
nizados em forma de livro, seguindo um fio condutor que articula suas legiar só algumas formas de investigar a multifacetária e contraditória
partes na unidade temática da investigação educativa e permite ao lei-
tor fazer um percurso em busca das articulações lógicas entre métodos
e epistemologias. Acreditamos que essas articulações sejam necessárias
3 Revistas como “Perspectivas” da UNESCO, “Cadernos de Pesquisa” da Fundação Carlos
para garantir o rigor lógico e a qualidade da produção científica na do CEDES, “Educação e Realidade” da UFRGS, “Revista
Chagas, “Educação e Sociedade”
área da educação e das ciências sociais. Brasileira de Estudos Pedagógicos” do INEP “Ciência e Cultura” da SBPC, entre outras.
24 25

realidade educativa, e coloca-se a necessidade de uma reflexão sobre o. “c)2 estudar as abordagens clássicas: e modernas das| ciências sociais,
contexto da investigação de onde se obtém seu sentido, modos diversos e divergentes de interpretar a realidade.

[...] estudos empíricos ou teóricos executados muitas vezes com à Uma primeira experiência de análise epistemológica sobre os *
maior das intenções podern mudar o sentido a partir da consciência métodos foi realizada sobre as pesquisas em educação da Universida-
dos pressupostos culturais, sociais, políticos ou individuais que se
de de Brasília (1974- 1981). Tal experiência se orientou pela seguinte
escondem sob a enganosa aparência dos fatos objetivos (Goergeên,
1981,p. 65). questão: quais são as abordagens metodológicas utilizadas nas investi-
gações de Pós-graduação em Educação da Universidade de Brasília e
Atrás das diferentes formas e métodos de abordar a realidade quais as implicações epistemológicas dessas abordagens? (Sánchez
educativa estão implícitos diferentes pressupostos que precisam ser. Gamboa, 1982).
desvelados. Nesse contexto, os estudos de caráter qualitativo sobre os A caracterização das abordagens implicou também a recupe-
métodos utilizados na investigação educativa e seus pressupostos epis- ração das articulações com as técnicas € os métodos utilizados, com
temológicos ganham significativa importância. delimitações teóricas relativas aos fenômenos privilegiados, ao núcleo
Um indicador da crise da Educação que, sendo mãe e berço do conceitual básico, às pretensões críticas com relação a outras teorias,
método científico, refere-se ao fato de ter aplicado pouco de si mesma a às ideologias de estereótipos, assim como as articulações com os pres-
— ,' Seus próprios assuntos, tais como a crise da sua natureza, do sen estatuto supostos lógico-epistemológicos, tais como concepções de ciência, de
epistemológico e do estudo do próprio método. Tais assuntos são deslo- validez da prova e de causalidade, com os pressupostos lógico-gnosio-
' cados para outros campos como a filosofia, a epistemologia e a gnosiolo- lógicos, tais como as formas de relacionar o sujeito e o objeto na inves-
gia. No caso específico do método, desde o ponto de vista da epistemolo- tigação e como os pressupostos ontológicos, relativos às concepções de
Bia, tem a ver com os caminhos e os instrumentos de fazer ciência. Um homem, de realidade e de história.
estudo epistemológico significa “um estudo crítico dos princípios, da hi-
pótese e dos resultados das diversas ciências, destinadas a determinar
sua origem lógica, sen valor é seus objetivos.” (Lalande, 1967, p. 298). Alguns conceitos básicos da análise
A epistemologia aplicada à investigação científica em educação tem como epistemológica dos métodos

papel fundamental questionar constantemente esta atividade.


Investigação
Um estudo epistemológico dos métodos na investigação edu- '
cativa, segundo Demo (1981p., 55), estaria preocupado em: a) Questio- Investigação vem do verbo látino Vassígio, que significa “seguir
nar a “cientificidade” — desses métodos — tida como científica; D) ques- “as
as pisadas””. Investigação significa a busca de algo apartir de vestígios.
tionar criticamente a construção do objeto científico; quais os temas Como 2 investigação constitui um processo metódico, é importante
pre-
feridos, pressupostos ideológicos, carências teóricas, vazios analíticos assinalar que o método ou modo, ou caminho de se chegar ao objeto, o
etc.;
26 27

tipo de processo para chegar a ele é dado pelo tipo de objeto e não o x.
FA o fazemos com base em um exercício concreto nesta área, buscando
t
contrário, como pode ser entendido quando o caminho ganha destaque, instrumentos analíticos na filosofia.

asa
É
dado o êxito de certos métodos em certos campos, chegando a ser priori- À epistemologia é uma palavra que designa a filosofia das ciên-

ss:
zado de tal maneira que o objeto fica descaracterizado (“desnaturaliza- cias, porém com um sentido mais preciso. Não é uma teoria geral do

E o od te,Er
do”), recortado ou enquadrado nos códigos restritos das metodologias. saber ou teoria do conhecimento que seria objeto da gnosiologia, nem é
um estudo des métodos científicos que seria objeto da metodologia, mas


Ste dia oa. rio
é parte da filosofia que se ocupa especialmente do estudo crítico da ciên-
Pesquisa da pesquisa em educação
cia em seu detalhamento prático, isto é, da ciência como produto e como *
processo; nesse sentido, é um estudo fundamentalmente a posteriori.
Segundo Vielle (1981), na literatura especializada encontra-se
Uma nova categoria da pesquisa educativa chamada “pesquisa das pes- O estudo sobre os problemas espistermológicos da pesquisa cien-
quisas”, que tem como finalidade classificar uma série de novos estu- tífica tem tomado diversas direções, especialmente a partir do Círculo

dos que pretendem refletir sobre a prática da pesquisa educativa. Tais de Viena (1927), quando surgiu um grupo de pesquisadores quese

estudos averiguam, dentre outras coisas, que tipo de pesquisa se reali- ocuparam profissionalmente dessas. questões. Carnap resgata a lógica
za, que tipós de conteúdos se desenvolvern, sua qualidade, sua utilida- Tndutival Popper parte da lógica dedutivà e da primazia do exame crí-

de etc.; entretanto, sobre os métodos utilizados até esse momento não tico e: estabelece uma primeira tiva de uma metateoria do método

se tinha registros. Gouveia (1976, p. 78) detecta este vazio e propõe científico. Piaget desenvolve a epistemologia genética, na qual consi-
l dera o conhecimento, não como um estado, mas como um “processo
“assinalar as tendências metodológicas que orientam as pesquisas na 1d Í
área considerada, e indicar os marcos teóricos que explícita ou implici- genético estrutural”, Bachelard se preocupa com uma reflexão sobre

tamente as inspiram”. Essas poucas referências já indicam a impor- as filosofias implícitas nas práticas científicas, e, com a introdução da
tância dos estudos de caráter epistemológico sobre as tendências me- noção de “ruptura epistemológica”, opõe-se às tradições positivistas,

todológicas na pesquisa educativa. reconhece que nos “fatos” há ciência mesclada de intuição de erros, de
pontos de vista e de ideologias. Kuhn afirma que a ciência não é acu-
mulativa, sua evolução se deve às revoluções científicas. À revolução
O problema epistemológico da pesquisa educativa científica consiste na mudança de um antigo paradigma ou matriz dis-
ciplinar por uma nova; a matriz velha se incrusta na nova. Essa rees-
Odiscurso epistemológico encontra na filosofia seus princípios : truturação representa o desenvolvimento das ciências. Na mudança
E na ciência seu objeto. Tem como função: não só resolver o problema .
de paradigma incluem-se elementos extra-científicos, como à propa-
geral das relações entre a filosofia e as ciências, mas também servir oe !
ganda e o proselitismo que o.novo paradigma utiliza para ganhar adep-
S
tos. Foucault procura um lócus para as ciências humanas entre as quais
tica concreta;1; portanto, “quando falamos de epistemologia da pesquisa
28 29

há uma relação estranha e indefinida em um espaço comurn; esta ati- quem trabalham ” (Brandão, 1981, p. 10). Numa outra perspectiva, a
tude de busca parte da arqueologia do saber e ajuda a questionar o que “pesquisa participante” ea “pesquisa-ação””pressupõem que o conheci-
está sotérrado, o que está por trás do exercício das ciências. Para a Esco- mento seja essencialmente um produto social, que se expande ou muda
la de Frankfurt, os pesquisadores necessitam interrogar-se
sobre o sig- continuamente, da mesma maneira que se transforma a realidade con-
- nificado da ciência que fazem; a ciência está integrada em um processo creta e como ato humano não está separado da prática; o objetivo último
social, econômico e político; é uma prática. social entre outras, marcada da pesquisa é a transformação dá realidade social e o melhoramento da
pela sociedade em que se situa e que reflete todas as suas ambigindades . vida dos sujeitos imersos nessa realidade.
e contradições. A Escola de Frankfurt propõe analisar a práfica científi-
ca não como uma atividade neutra, mas vinculada estreitamente aos in-

Aa
Lteresses; o conhecimento e o interesse estão interligados; a Epistemo- O problema doe método

sans
logia crítica pretende revelar essas Ligações (Ursua, 1981).
O método tradicionalmente é estudado como um capítulo da
Talpreocupação crítica com a ciência em geral também vem
lógica e se define como um 1 caminho para o ) conhecimento,
acontecendo com a pesquisa em educação, particularmente à partir
dos anos setenta. Os estudos sobre a pesquisa em educação têm iden-- | A pesquisa sobre o. método leva implícitas indicações de caráter gno-
i siológico, metafísico € ainda de concepção de mundo. Se o método é
tificado, por exemplo, que durante essa década predominou a influên-
cfetivamente um modo de aproximar-se da realidade, um caminho, à
cia das tendências baseadas nas concepções positívistas de ciência. Como concepção da realidade será determinante para o método. (Ferrater
Mora, 1971,
p. 905). '
alternativas a essa relativa exclusividade se apresentaram novas tendên-
Cias epistemológicas, dentre elas a “pesquisa participante” e a “pesqui-
Diferentes concepções de realidade determinam diferentes
sa-ação” que desenvolvem a crítica à perspectiva positivista. Em relação
métodos. No percurso histórico da filosofia termos muitos exernplos da
à essa perspectiva critica-se a preocupação por constatar, descrever, con- !
preocupação com o método e com a tomada de consciência sobre o
gelar e prever fatos, comportamentos humanos e sociais ou sistemas de e
próprio método. Exemplos como o do Organón de Aristóteles, a lógica
representação como se fossem objetos inanimados e distanciados do pes-.,
escolástica e de forma mais sistemática a partir de Descartes, que co-
quisador por meio dos instrumentos e das técnicas de pesquisa. Cotica-,
loca em primeiro plano a reflexão sobre o método, a questão do método
se a pretensão de se reduzir a complexidade do real à visão simplistae
é motivo de uma série de tensões que no século XX se situam
superficial de uma fotografia estática. À perspectiva analítica que fun-
damenta o positivismo conduz à separação, por um lado, dos que são. [...] entre a legitimidade lógica (Carnap, Reinchenbach, NageDea
investigados para serem conhecidos e dirigidos, e, por outro lado, dos reivindicação heurística (Flanson): entre a racionalização formal do
processo científico (verossimilitude de Popper, por exemplo) e con-
que investigam, produzem o conhecimento, determinam seu uso e “diri- textos normalizadores da atividade científica (por exernplo, paradig-
gem ao povo em seu próprio nome ou com fregilênciá em nome de para mas de Kuhn): entre teortas do método, em síntese e a iberdade de
jogo (Feyerabend) (Ursua, 1981, p. 108),
30
É 31
ES
7

Em determinados períodos do desenvolvimento das ciências, o : conhecimento a priori da realidade. Todo conhecimento científico per-
método é “fetichizado” e com ele também seu objeto; nesses casos tence às ciências formais (Lógica e Matemática) ou às ciências empí-
torna-se necessária a reflexão sobre este, questionando seus próprios ricas. À validez dos enunciados. científicos reside na lógica emna base
fundamentos. Interrogar os métodos utilizados na pesquisa científica é empírica. À demonstração matemática e a observação das ciências da
Empurca
: uma tarefa histórica da filosofia, que ajuda a tomar consciência dai im- natureza são,3,segundo esta corrente, o método ideal.
j portância e das limitações dos métodos, como também de suas ; impli- Ó positivismo jeonsideram- se positivistas doutrinas
as ' que têm
o
cações e contradições inerentes. “comovo objeto dá aconhecimento só aquele obtido mediante os dados dos
sentidos;s;nega-se a admitir outra realidade fora dos “fatos” é a pesqui-
sar outra coisaaque nãoão sejam as relações os “fatos”.
Tipologia dos métodos na pesquisa em educação — Recentemente, o positivismo lógico enfatiza como base do de-
FT

senvolvimento científico a exigência da exatidão e rigorosidade na teo-


Considerando as abordagens epistemológicas; Torres (1979)
ria das ciências. Para esta corrente, todo constructo teórico tem de ser
detectou quatro paradigmas ou lógicas, a saber: empirismo, formalis-
rigorosamente articulado, segundo as condições lógico-formais e tem
mo, voluntarismo e dialética objetiva. Goergen (1981) indica três t-
pos de métodos na pesquisa educativa: o fenomenológico — hermenêu- de referir-se à sua base observacional (Círculo de Viena). Já Popper,
+
tico — o empírico e o crítico; Burns (1981) distingue três modos de
que aparece neste contexto como crítico do Círculo de Viena, questio-
oo PS ” - oo PE
na o princípio da verificação empírica e propõe o princípio da “falsação
abordar o conhecimento: o lógico-positivista, o hermenêutico e o eríti-
co; Demo (1981) distingue em termos esquemáticos seis tipos especí- ou refutabilidade”, os enunciados científicos são “falseáveis” por meio

ficos de abordagens metodológicas, os quais, pela forma simplificada dos fatos e podem ser empiricamente refutáveis pela experiência.
Tanto o racionalismo crítico de Popper como o posttivismo ló-
de situá-los, utilizamos neste estudo para classificar as pesquisas obje-
to de nossa análise. Estas abordagens são: empirista, positivista, fun-
gico que ele critica têm sido submetidos a importantes objeções, que
mais adiante seserão analisadas.
cionalista sistêmica, estruturalista e dialética. O na:
PA OÓ funcionalismo: 3o conceito de função segundo Merton (1968)
O empirismo) é uma atitude ante a origem do conhecimento,
to,
opõe-se ao racionalismo e sustenta que a fonte do conhecer nãoé à se refere aquela consequência observada que se forma para a adapta-
a dado; caracteriza-se como um item,
razão ou o pensamento, senão a experiência (Locke e Hume, dentre
como uma1a contribuição par
para a manutenção de certos tipos de unidade
outros); todo empirismo tende a reduzir a experiência ao experimento
sensível. O empirismo alimenta a expectativa de lograr a ciência obje- em um sistema social. Pode-se distinguir dois tipos de investigação; a
tiva; o critério de cientificidade é a verificação a partir da observação funcional
e a funcionalista
empírica dos fatos; uma hipótese passa a ser tese depois de verificada.
Àcorrente empirista nega toda classe de metafísica entendida como Fc
32
33

acontecirnentos;/bD predizer os acontecimentos futuros e o)) servir de da funcionalidade parece excluir o conflito e as mudanças históricas.
base para a seleção de medidas de controle efetivas. À análise funcio- Parsons justifica tal tese quando afirma que “uma teoria
geral do pro-
nal surge como umamodificação daa“explanação teleológica” referida, cesso de mudança do sistema social não é possível neste estado atual
não à causa do acontecimento em estudo, mas aós fins que determinam do “conhecimento”, somente são possíveis as mudanças dentro do siste-
Seu curso. Oo significado explanatório do argumento contém duas par | ma. Excluem-se oos conflitos e as s mudançãs radicais
ra por fila dei ins-
tes: Exblanans Ypremissas) e siplanandum (conclusões), e busca demons- ama apl
a
trar Que-oefeito descrito no “axplanandum era de ser esperado, tendo em
vista determinadas circunstâncias antecedentes (C) e as leis gerais
(L) relacionadas ho explanans. Vejamos um exemplo:
“xo de “êmentos cofiponentes, direta ou indiretamente relacionados
Explanans LI,L2..Ln Leis gerais
em uma rede causal, de sorte que cada componente se relaciona, pelo
Cl, C2... Cn Afirmações de fatos particulares

Fist iae ss eaniado:


menos, com alguns outros de modo mais ou menos estável dentro de
(circunstanciais)
determinado período de tempo. ' (Buckley, 1970, p. 68).

Premissas > -* [as :


Í No sistemismo ocomponente mais importante é a organização
Explanandum E Juucuna. Conclusão Pecas É
dos elementos que permitem o controle próprio relativamente limutá-
vel do sistema. Nesse sentido, o todo é mais que a soma das partes, ele
A abordagem funcional tem se mostrado frutífera em certos organiza as partes. À visão sistêmica do mundo se centra na organiza-?
selado is
contextos biológicos e pouco nos contextos sociais; ademais, acusa in- ção e privilegia o aspecto relacional dos componentes de uma realida-.Í ij...
convementes no uso empírico dos termos-chave como “necessidade”, de; por exemplo, o homem aparece como uma peça na imensa maqui-:
“requisito funcional”, “adaptação” etc.
sed t

7
naria da organização social. s
- . - ' A
À investigação :funcionalista: moderna tem como base as Re- A metodologia sistêmica tem sido bastante utilizada nas orga-
gras do Método Sociológico de Durkheim (1972), quando privilegia. nizações empresariais, porque ajuda a explicar como essas organiza-
na análise o estabelecimento das causas no estudo das funções. “Deve- ções funcionam, se institucionalizam e subsistem. Dentro do esquema
se buscar a causa determinante de um fato social entre os fatos antece- “entrada-processo-saída” cabe tudo: homens, máquinas, edifícios,
dentes e não nos estados da consciência individual” (1972). Posterior- matéria-prima, produtos etc. À importância específica do sistemisseo
mente, Parsons (Ursua, 1981) descobre um esquema básico de funci- está na capacidade cde explicar como os sistemas se mantêm, como
onamento de alguns processos de socialização, chamado estrutural fun- resistem às mudanças; a mudança de um sistema a outro é um fenô-
cionalista. Segundo ele, os fenômenos acontecem dentro de normas in- meno não aceitável no sistemismo, o qual se confirma como um método
eis devido a uma estrutura básica, geral e comum, O pressuposto particularmente. adequado “à legitimação de sistema de poder porque
34 35

esconde sob sua dinâmica a circularidade do sistema: apenas se repete ; denomina concreto não é mais do que a síntese de múltiplas determi-
ou se confirma” (Demo, 1981, p. 241). nações mais simples, é o resuitado,no PENSAMento, de numerosos ele-
O estruturalismo? se o sistemiísmo acentua o fenômeno da orga-

nização, o estruturalismo acentua o fenômeno do intercâmbio, .da .co- concreto,. O concreto é concreto porque é a síntese, e a unidade do
municação e das relações. diverso É o resultado e não o ponto de partida. Para uma maior com-
preensão da dialética êé importante distinguir o concreto real, que é o
emo:
À noção de estrutura social não se refere à realidade empírica, mas aos
objeto real que se deve conhecer, e o concreto do pensamento, que é o
modelos construídos em conformidade com esta [.. ]. As relações
Sociais são a matéria-prima empregada para a construção dos mode- conhecimento daquele objeto real.
los que tornam manifesta a própria estrutura social. (Levi Strauss,
1970, p. 65). A construção do pensamento se daria, pois, da seguinte forma: parte-
se do empírico se passa pelo abstrato e se chega ao conereto. Diferen-
O estruturalismo não faz como o funcionalismo, que generali- temente, pois, da crença que caracteriza aó empirismo, ao positivismo
etc., (que confundem o concreto com e empírico) co o etonioéo ins
za sobre as observações particulares, mas busca o que
há em comum em ponto de partida senão o ponto de chegada do conhecimento. (Saviani,
todas as sociedades de diferentes tempos e espaços, busca uma invarian- 1980, p. 11).
te nas variantes, uma espécie de ordem das ordens, de inconsciente cole-
O concreto não é o dado empírico, é uma totalidade articulada,
tivo ou álgebra do cérebro. A história (Diacronia) seria apenas a realiza-
construída eem construção. Entretanto, alógica forma) tem por obje- *
ção das diferenças e das ordens; a estrutura não tem história.
to as leis que regem o pensamento enquanto pensamento, lógica das
O estruturalismo como método tem recebido algumas críticas,
: formas « como o seu nome indica; a' lógica dialética, 'em mudança, tem
especialmente das correntes históricas e humanistas. Sartre (1963) E
por objeto as leis que governam o real, podendo-se
p se chamar a lógica dos
sintetiza, em parte, essas críticas. Ele reclama do estruturalismo a lo-
conteúdos contemporaneamente; a dialética tem sido colocada pela
calização da história no nível da contingência. Negar a história é negar
escola de Frankfurt; para a “Teoria Crítica” (Horkheimer, Adorno,
a práxis, é substituir o movimento por uma sucessão de * “mobilidades”.
Marcuse, Habermas) o importante para o conhecimento é a crítica
Ao desacreditar a história e a práxis também se desacredita o homem,
(Razão Crítica) e o conceito dialético da totalidade (Razão Dialética). |
sujeito ativo da Dráxis e da história. |
A análise da sociedade só pode desenvolver-se na sua totalidade, A.
A dialética» existem muitos tipos de dialética, não nos interessa
tarefa da ciência está orientada para à crítica dos interesses e para a

dos
aqui estrear cadá” um deles. Limitar-nos-emos à dialética entendida.
emancipação do homem; não só questiona o que é ou como, senão o ;
como o método que nos permite conhecer a realidade concreta no seu para que se tem de fazer ciência.
dinam e nasismo
inter-relações. Marx, no “Método da Economia Po-
lítica” (1983), nos apresenta a dialética como o processo da constru-
ção do concreto do pensamento a partir do concreto real., O que se
36 37

Análise epistemológica dos métodos . um' lado uma missão essencialmente hermenêutica (interpretativa)e
de outro uma Função essencialmente crítica, crítica dos pressupostos
Para constatar e interpretar os mais Importantes pressupostos
” (Gadotti, 1980, p. 33). Por esta razão este estudo
do conhecimento.9.”
epistemológicos, implícitos nos métodos utilizados nas investigações,
incluí uma discussão sobre as contradições, os conflitos ou os parado-
foi utilizado como instrumento organizador um esquema paradigmáti- xos da prática da investigação educacional.
a 7 . . R R
co”. Esse esquema, construído com base em um primeiro projeto apre-
Em síntese, essa primeira experiência de análise epistemológi-
sentado por Bengoechea (1978), parte da concepção de paradigma
ca procurou, em primeiro lugar, detectar os métodos utilizados nas
| entendido como “lógica reconstituída”. A unidade básica da análise
í investigaçõese «sabre isto desvelar os. pressupostos teóricos, lógico-
“| paradigmática é sempre um processo de produção de conhecimentos,
epistemológicos, gnosiológicos e ontológicos que estão implícitos em
o qual se dá em todo processo de investigação e se supõe que “todo investigações — se-
cada um dos métodos. Depois de classificadas as
| processo de
de produção de conhecimentos Éé a manifestação de uma es- para a análise para-
| gundo ; o método utilizado, com ajuda do “esquema
digmática” —, foi possível realizar a interpretação, elaborando conclu-
sões parciais sobre cada método, logo, sobre esses resultados e agru-
pados em um só conjunto foi possível chegar a conclusões gerais sobre
O esquema 2 que : apresentamos no terceiro > capítulo, permite, à
as tendências da investigação na produção de um período em uma de-
maneira de uma “matriz disciplinar”, desvelar (processo hermenêuti- -.
: bi : , : .

terminada instituição ou programa de pós-graduação”.


co) os transfundos da prática investigativa, seus pressupostos teóricos, Tomando como primeiro exemplo a produção do Mestrado em
lógicos, gnosiológicos e ainda ontológicos. Educação da Universidade de Brasília (1974-1981), essas conclusões
Esta análise segue um processo hermenêutico-crítico. Depois
gerais podem ser resumidas assim: nãoexistem abordagens metodoló-
de esquematizar os conteúdos explícitos no referencial técnico, meto-
Bicas totalmente definidas ou puras, por |isso é comum que em muitas
dológico e teórico e interpretar, a partir dessas referências, os pressu-
investigações se encontrem “mescladas; para a classificação realizada
postos epistemológicos, são abordados criticamente os resultados do
aqui foi utilizada a “abordagem predominante, geralmênte explícita na
processo interpretativo, procurando outro nível de. pressupostos, os
parte correspondente à metodologia.
gnosiclógicos e os ontológicos, exigindo, para isso, a contribuição da rço das dissertações se situaram como
— Aproximadamente um terço
filosofia. Neste caso, a reflexão filosófica não pretende ficar na herme-
funcionalistas, o que é explicável em razão da porcentagem das mes-
nêutica; buscaria também uma dimensão crítica. “A filosofia tem de
mas que tratam de ternas sobre organização, administração, funcionamento

+ Esse primeiro estudo foi realizado sobre 75 dissertações de mestrado da Universidade de Brasília,
+
Uma apresentação mais detalhada do esquema paradigmático será apresentada no terceiro
capítulo deste livro. produzidas entre 1974 e 1981
38 39

e avaliação de sistemas educativos e que se situam na área de concen-.: estruturar ou sistematizar. Também, a realidade é considerada como
; : , : oa
tração predominante: Planejamento Educacional. As teorias sobre a fun- cenário ou circunstância; excepcionalmente é considerada dinâmica
ção de produção, o capital humano, teoria geral de sistemas, teorias de E ou contraditória.
facetas de Guttman são as mais utilizadas. De forma geral, as críti-
| cas se dirigem para os formalismos na educação, os sistemas fecha-
Discussão
: dos, à incongruência entre a lei e a realidade, a cópia acrítica dos
métodos e técnicas educacionais estrangeiras, o paternalismo, o le-
Além das verificações e interpretações antériores, a análise episte- |
: galismo & o economicismo na educação. Além dessas críticas bastan-
x
mológica nos permitiu descobrir uma série de paradoxos implícitos nos |
te comuns, há dissertações que não fazem nenhum tipo de cr sz
ica, f
inem citam nenhuma discussão sobre o tema estudado. Com respeito dos tornando-se necessária uma discussão, a qual organizamos a partir .o
métodos,
iaao interesse implícito, a maioria dos métodos
de pólos Ou pares em conflitos, detectados tanto no referencial teórico como | ço
| .se preocupa pelo ajuste
|'
ie pelo equilíbrio do sistema estudado (interesse técnico e prático se- na prática analisada. Esses pares são pontuados na seqiiência.
|
gundo Habermas).
Entre os pressupostos epistemológicos se destacam: a concep-
Teoria e método
í ção de causalidade entendida como uma relação entre as prernissas e as
conclusões, uma correlação de variáveis que se acompanham como uma
Toda investigação supõe um corpo teórico e este deve ter um
. relação insumo-produto, meio ambiente-sistema e como a explicação do
método que lhe seja apropriado; porém, a relação importante no procês-
« presente a partir de fenômenos passados, geralmente relacionados com
so da elaboração do conhecimento é desvirtuada pela mitificação dos
7 +, : a influência ou vigência de uma lei. À validade dos requisitos da prova se
métodos que são desvinculados dos contextos teóricos, ainda mais, quan-
" : reduz à validade dos instrumentos, à confiança nos modelos de análises
do estes são utilizados indiscriminadamente, à maneira de uma moda, e
-— escolhidos e à confiança no processo do raciocínio lógico.
2 teoria é reduzida a um corpo de definições, a um simples marco de
eo Os pressupostos ontológicos, entre os quais estão a concepção
referência ou a uma revisão bibliográfica superficial. Thiollent (1981)
de história, homem e realidade, se manifestam da seguinte maneira: a
| propõe, parasuperar estas tendências, que na formação dos investigado-
concepção de história é reduzida na maioria das dissertações a um
r três elementos: teorias educacionais,
ao menos
| res se devem combina
tempo conjuntural, relativo ao momento em que se faz a observação ou
| técnicas de investigaçãoe epistemologia sobre os métodos...
a coleta dos dados, uma espécie de eterno presente, preso a um código,

S
a um dado ou a uma faceta da realidade. A realidade se concebe predo- É

minantemente como estática, que está aí para ser conhecida, ou como


complexidade de variáveis possíveis de medir, entrelaçar, inter-relacionar,

í
4” 4o 41

Método e objeto não se podem limitar a relações entre magnitudes estáticas, pois essas
exigem abordagens mais amplas que considerem o tempo como pro-
O método, quando éé considerado como único critério de objeti- cesso e não só como um dado, uma data, uma variável ou faceta.
vidade, transfere o objeto a seus códigos, reduzindo-o, fotografando-o,
dissecando-o, ou dividindo-o em setores, facetas ou variáveis; em suma,
o inter-relaciona ou o sacrifica ao rigor lógico, À primazia do méto- Sujeito/objeto

do, seja como lógica da razão, controle da experiência, ou linguagem


lógico-matemática, pode levar à “desvirtualização” do objeto, quando . O conhecimento é o resultado da relação entre um sujeito cog-
este deveria ter a primazia ante o método, e a objetividade deveria se noscente e um objeto a ser conhecido. Do ponto de vista epistemológico
centrar no objeto e não, como o constatamos neste estudo, nos critérios as abordagens empíricas e positivistas privilegiam o objeto ou o fato,
de validez dos instrumentos, na exatidão dos registros, ou na definição | Fazendo desaparecer o sujeito em prol do registro. Essas abordagens À
operacional dos
e termos ou na rigidez do processo lógico racional. supõem que o objeto rereal e o objeto do conhecimento permanecern redu-
zidos à representação do primeiro sem permitir a interação do sujeito.

Supõem, também, que a relação sujeito/objeto acontece numa


Análise quantitativa e análise qualitativa relação de duplo empirismo entre um17indivíduo real e isolado (pesqui- | " :
sador) e um pedaço de realidade também real estática; entretanto, o
Muitas dissertações apresentam dados demais e análises de i| sujeito empírico é portador de uma
cultura, <de uma linguagem, de
Í .Sua relação
menos. À simples coleta e tratamento de dados não é suficiente, se faz | uma estrutura de pensamento e uma escala de valores;,
|
necessário resgatar a análise qualitativa para que a investigação se | com o o 2higto,. nesse se ntido, não é neutra. O sujeito e o objeto do co-
realize como tal e não fique reduzida a um exercício de estatística”.
uma terceira entidade chamada sensação, observação ou experimen-
tação, mas são dois aspectos de uma mesma realidade numa relação de
Tempo conjuntural e tempo processo unidade e de contradições dialéticas (Torres, 1979), ou como diz Sar-
tre “o experimentador faz parte do sistema 1experimental” nem objeti-
Na maior parte das dissertações analisadas predomina o tempo
vidade pura nem subjetividade pura, na unidadedo conhecido, objeto
curto ou conjuntural), expressando seu caráter a-bhistórico ao. reduzira
e sujeito se aliam irredutivelmente.
realidade a uma fotografia instantânea. Por outro lado, as ciências sociais
Nas ciências sociais como na educação tanto o investigador como
os investigados (grupo de anos, comunidade ou povo) são sujeitos; o :-

; Uma discussão mais ampla sobre essa questão encontra-se no livro “Pesquisa educacional:
quantidade-qualidade” (Sánchez Gamboa; Santos Filho, 2005). j clemento mediador entre “osos sujeitos. Numa relação dialógica e simpática,
como é o caso do processo da pesquisa. Esses sujeitos se encontram *
juntos ante uma realidade que lhes é comum e que os desafia para ser mais, mas como uma tomada de consciência
« dos processos dai investi-
conhecida e transformada. gação educativa, deve ser incluída nos diferentes níveis (iniciação ci-
entífica, mestrado e doutorado) da formação do pesquisador. .
A erítica do método segue sendo um dos papéis fundamentais . =

Sil
Í
À investigação como requisito acadêmico da losofia; sua presença é necessária no estágio atual da pesquisa em *

ivititio
ou como “trabalho humano”
educação que, num processo de reflexão sobre a prática e de aprofun-

Ss
damento qualitativo, pretende ampliar as linhas de “investigação so-

SBN
A prática da investigação tem as características do trabalho
bre as investigações”.
huma o, porém nas condições de Apenas cumprir um mero requisito
Se tomarmos os esforços da iniciação científica ea elaboração
de dissertações e teses, exigidos nos cursos de graduação e pós-gradu-

Neco
ação, como um “trabalho humano” e não como simples exercício aca-
i a ser
er repetido em outras pesquisas de teor apenas acadêmico. Nessas
dêmico, certamente é possível superar os diferentes desvios e condici-
; circunstâncias a pesquisa perde a capacidade de instrumento de co-
onantes que reduzem a capacidade de compreensão da problemática
nhecer a problemática da realidade à sua dimensão transformadora,
da realidade e a dimensão transformadora da pesquisa a um simples
como todo trabalho criativo deveria ter. !
exercício de repetição de um saber técnico, Tal reducionismo que des-
virtuaa tarefa fundamental de produzir novas respostas e acumulação
Outras considerações de massa crítica para a transformação da realidade precisa ser supera-
do em prol de um conhecimento que contribua para que nossos países
Finalmente, gostaria de destacar algumas Sugestões e, ainda, em desenvolvimento percorram seus caminhos de afirmação científi-
algumas questões que devem ser aprofundadas a partir desta primeira ca, econômica, política e cultural de que tanto necessitam.
experiência da análise epistemológica sobre os métodos na pesquisa
em educação.
Destacamos a importância de continuar, a discussão, sobre os 1“
métodos e suas implicações epistemológicas aqui iniciadas. É impor-
|
tante ter consciência dos métodos utilizados na investigação educativa
para superar a forma espontânea e acrítica como estes, muitas vezes
são utilizados desconhecendo suas implicações e pressupostos.
TENDÊNCIAS DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO:
UM ENFOQUE EPISTEMOLÓGICO

Introdução

Desde a década de oitenta, a literatura especializada em pes-


t
quisa educativa verm denunciando a redução tecnicista que invadiu a ;
prática da pesquisa educativa em educação. A partir dessa verificação
nos perguntamos: quais são as condições que facilitaram essa invasão?
Quais são as razões pelas quais se identifica como reducionismo técni-
co esse tipo de prática? Quais os resultados de tal invasão e tal reduci-,
onismo? Existe possibilidade de superar essa invasão? . Í |
Ao mesmo tempo em que se denunciava o reducionismo técni-
co surgiam os estudos epistemológicos sobre a investigação : educativa.
' Em que consistem esses estudos, quais são suas características e suas

contribuições? Que relações têm com à denúncia anterior é com as


: possíveis soluções pare os problemas da compreensão da investigação,
i científica em educação?
+

Com base nessas interrogações e a partir de um ponto de vista as razões que justificam este tipo de estudo e as possíveis contribui-
filosófico é ao mesmo tempo prático, organizamos nossa discussão da ções para a formação do investigador.
seguinte forma: na primeira parte apresentamos algumas condições Com a expansão da pesquisa educativa na América Latina —
que justificaram a gênesis do enfoque epistemológico e descrevemos particularmente com a implantação dos cursos de pós-graduação na
seus principais riscos. Em seguida, apresentamos suas estratégias de região, que incluem como requisitos para o título a elaboração de um
aplicação e, finalmente, sugerimos algumas situações práticas em que trabalho de pesquisa —, produz-se um aumento quantitativo de pes-
a abordagem epistemológica poderá ser útil. quisa, e com ele aparece a necessidade urgente de verificar .os elemen-
tos qualitativos dessa produção em expansão quantitativa. Pergunta-

mos, então, sobre seus riscos, suas tendências, a validez científica de


Por que as abordagens epistemológicas
seus resultados, a aplicabilidade de súas conclusões, seus critérios de
cientificidade, seus fundamentos etc.”
Segundo Bachelard (1989), quando o cientista realiza suas in-
Guiados por essa preocupação, a partir dos anos oitenta, al
:Í vestigações, além de intelaborar conhecimentos e produzir resultados,
guns estudos têm identificado problemas, tais como: o “formalismo(4.'
| elabora também uma filosofia. Em totoda prática explícita dos cientistas
1 êxiste uma filosofia implícita. Quando investigamos, não somente pro- acadêmico”, que alterou as motivações dos pesquisadores, pois seu in- -
BOaderms
teresse maior não é produzir novos conhecimentos e sim cumprir os
duzimos um diagnóstico sobre um campo problemático, ou elaboramos
requisitos para a obtenção de título e de progressões nas carreiras pro-!
respostas organizadas e pertinentes para questões científicas, mas cons- .
truímos uma maneira de fazer ciência e explicitamos uma teoria do
fissionais; de igual maneira surgem o “ritualismo metodológico”, os"
conhecimento. e uma filosofia, “Utilizamos uma forma de relacionar o “modismos teóricos”, o “reducionismo tecnicista” e o “ecletismo prag-""
mático”. Todos estes “ismos” são, possivelmente, resultantes da práti-
sweito e o objeto do conhecimento e anunciamos uma visão de mundo,
isto é, elaboramos, de maneira implícita ou oculta, uma epistemologia, ! ca superficial de uma pretendida produção científica e/ou da falta da

uma gnosiclogia e expressamos uma ontologia. compreensão dos fundamentos epistemológicos e das implicações filo-
!
sóficas das diversas formas de elaboração dos conhecimentos e dos
O estudo que analisa essas articulações entre o processo de
investigação científica e os pressupostos filosóficos, nos quais se em- diversos paradigmas científicos. À. forte influência dos manuais de pes-
quisa que “ensinam” técnicas faz aparecer a pesquisa científica como
basam, podermos denominar “epistemologia da pesquisa” ou, simples-
mente, de «“ o domínio de receitas para a coleta, organização, tratamento e apre--
“abordagem epistemo
ATA
lógica da pesquisa
7
”, como anuncia-
:
; |

mos no título deste capítulo. Como este tipo de análise é complexa, sentação dos dados, sem informar sobre as especificidades do trabalho:

pela quantidade « de elementos a considerar e pelas diversas formas de


organizá-los, vemo- nos obrigados a apresentar, em poucas páginas, al- E
7 Veja-se estudos de Vieile (1981), Lapatí (1981, 19947, Tedesco (1986) e Sánchez Gamboa
gumas das características das referidas análises, não sem antes indicar : (1996, 1997).
to,
48 49
e

científico sobre as diversas tendências da pesquisa, nem sobre os fun- Para conseguir um domínio confiável das técnicas, os investi- |
damentos epistemológicos e filosóficos da prática científica. gadores necessitam entender :suas relações com .os métodos e os proce- |
For outro lado, a partir dos anos noventa se intensifica a dis- dimentos, e destes comn os correspondentes. pressupostos teóricos e |
cussão sobre os modelos de pesquisa e sobre o conflito entre os paradig- epistemológicos, assim como perceber com clareza as implicações filo-
mas científicos*. Essa discussão tem se centralizado sobre os métodos de sóficas das diversas opções científicas. O êxito de uma pesquisa de £&:
pesquisa num intento de superar a concepção técnico-instrumental pre- qualidadee pode estar na articulação lógica desses elementos e no co-,
dominante nos referidos manuais de investigação. Novas disciphnas que nhecimento dos pressupostos e as implicações da abordagem episte-,
privilegiam a discussão sobre os fundamentos epistemológicos e filosófi- mológica que o pesquisador utiliza.
cos da pesquisa vêm substituindo os conteúdos sobre “técnicas estatísti- Sobre as abordagens epistemológicas existem variadas referên-
cas” e de “metodologia e de técnicas da investigação”. Essas novas dis- ' cias. Destacamos algumas delas: o conceito de abordagem epistero-
ciplinas, a julgar por seus títulos, |Já indicam outros conteúdos, Vejamos |ino Í| lógica deriva do termo epistemologia, que significa literalmente teoria
alguns: “fundamentos teóricos da pesquisa”, “epistemolegia da pes- | Ss 1 da ciência. At teoria da ciência, reconhecida também como metaciên-
quisa educativa”, “teoria do conhecimento”, “lógica da ciência”, “epis- | ' cia, surge depois de que foram criadas, para os casos mais específicos,
im
temologias modernas na pesquisa educativa” etc.
E ias palavras metamatemática e metalógica. À metaciência é um estudedo
À preocupação com as questões metodológicas, teóricas e epis- que vem a posteriori da prática científica e que tem por objeto a mesma,
temológicas tem como objetivo melhorar a formação do pesquisador, pois | interrogando-a à partir de um nível superior sobre seus princípios,
seus fundamentos
| seus mé
seus métodos,
fandámentos, seus d e seus cri itérios de
seus S resultados
A formação do pesquisador não pode restringir-se ao domínio de | E o Doo o AL
algumas técnica:
validade. Para superar essa visão restringida sobre a própria ciência, o
coleta, registro e tratamento dos. dados. Ás técni-
cas não são suficientes, nem constinuem em si mestras uma instância termo epistemologia registra uma ampliação de sentido na medida em
autônoma do conhecimento científico. Estas têm valor como parte
dos métodos. O método, ou o caminho do conhecimento é mais am-
que, apesar de referir-se ao conhecimento científico, sua análise se
plo e complexo. Por sua vez, um
um método é uma teoria de ciência em ' localiza num campo comum entre a filosofia e a ciência; 1880 significa
ação que implica critérios de cientificidade, concepções de objet
que a a análise da ciência se faz não a partir dos, limites da própria ciên-
| sujeito, maneiras de estabelecer essa relação cogriitiva e que nece;
| amente remetem a teorias de conhecimento £ a concepções filosóficas da ou de seus critérios. de validade, mas considerando outro nível de
: “do rea
real Essas diversas concepções dão suporte às diversas aborda-
gens Utilizadas nas construções científicas e na produção de conheci-
mentos. (Sánchez Gamboa, 1996, p.7). fa”. Neste sentido: |

* Vejam-se os trabalhos de Morin (1990, 1996), Lapatí (1994) e Sánchez Gamboa (1996).
* Veja-se o estudo de Blanché (1975) sobre as diferentes vias de construção da epistemologia.
CSS. 50. 1

Os estudos epistemológicos buscam na filosofia àSeus princípios e na


humanos que comandam os vários tipos de conhecimento. À relação
; ciência seu objeto e têm como função não só abordar os problemas
=. gerais das relações entre a filosofia e a ciência, senão que também servem entre “conhecimento e interesse” ' poderá ser revelada à medida que
como ponto de encontro entre estas. (Sánchez Gamboa, 1997, p. 65).
analisamos as articulações entre a prática científica e seus pressupos-
tos filosóficos.
No caso concreto da aplicação da análise epistemológicaàs ten-
Segundo essa perspectiva, Bachelard (1968) propõe que, em
dências da produção científica de uma determinada área do conheci-
vez de separar a filosofia da ciência, como querem os positivistas, faça-
mento assim se caracteriza:
se o caminho da reflexão sobre as filosofias implícitas nas práticas ex-
A análise epistemológica situa-se como análise conceitual de segunda plícitas dos científicos, com a finalidade de recuperar, para cada uma
ordem que questiona os fundamentos das ciências, os à processos de caminho da reflexão exi- f | í
das ciências, a filosofia que elas merecem. O eo
ge que a filosofia desempenhe sua função crítica com relação aos co- |)
de primeira ordem 1 oou factuais são próprias de cada ciênciaa específica). nhecimentos “científicos, os quais devem ser compreendidos sob todosf
à tarefa de segunda ordem procura revisar ou reintegrar nossa com-
preensão do que está em volta da pesquisa factual ou de primeira
o.os seus aspectos: lógico, ideológico, histórico, social etc. iÍ
ordem. (Sânchez Gamboa, 1997, p. 65). Nessa linha de pensamento, Fiaget (apud Japiassu, 1979) cri-
tica igualmente o positivismo por limitar o termo epistemologia ao co-
Quando nos referimos ao termo epistemologia da pesquisa edu- nhecimento científico; ele define epistemologia como sinônimo de teo-
cacional, significa que tomamos como objeto a produção do conheci- ria do conhecimento por considerá-la um domínio mais amplo, que : bmF
mento gerado como pesquisa científica na área de educação e a anali-
abarca o conhecimento em geral desde Seus primeiros níveis, não ape- ix
samos à luz das categorias filosóficas, utilizando para isso esquemas nas quando chega ao nível científico.
concettuais que propiciam o estudo das articulações entre os elemen- Piaget cons! idera a epistemologia como e estudo dos passos en--=—
co

tos constitutivos da investigação (técnicas, métodos, teorias, modelos tre os estados de um conhecimento menos e os estados mais desenvol
de ciência e pressupostos filosóficos). Neste caso, a abordagem episte-
“idos do mesmo, sejam estes estudos referidos ao desenvolvimento do
i mológica se caracteriza por analisar, de forma articulada, os aspectos conhecimento científico ou ao desenvolvimento do conhecimento nas
|; técnico-instrumentais para relacioná-los com os níveis metodológicos,
crianças, ou se relacionem com a psicologia genética ou à história das
i | teóricos e epistemológicos, e estes por sua vez, com os pressupostos
sai ciências. Essa concepção supõe que toda ciência está em desenvolivi-
| | gnosiológicos
ENOSIO!WgIc: e ontológicos
1COS relativos
Te à visão de realidade implícita na mento progressivo e indefinido e passa por estados sucessivos.
ipesquisa. Além de permitir essa análise, a abordagem epistemológica Habermas (1982) analisa a gênese da separação entre 2 filo-
ajudaa |recuperar, a partir dos pressupostos ontológicos, as implica- Í
+ sofia e a ciência e propõe uma reflexão que recupere as relações da
ções ideológicas presentes nos diversos paradigmas científicos que, se- | ciência com o processo histórico da sociedade e com a filosofia. Essa
Í
gundo Habermas (1983), constituem o campo complexo dos interesses | + |
reflexão permitirá reconquistar o papel crítico da teoria do conhecimento
"
52 E)

e devolver às ciências a capacidade de auto- reflexão e de inserção na mentos que se explicitam mutuamente nos oferece um conhecimento
totalidade social. o sobre as características não apenas de cada pesquisa em particular, mas
A partir das propostas anteriores, e considerando a articulação do movimento do pensamento que a sustenta e da tendência científica na
entre a filosofia e a ciência e a recuperação da produção científica incluída pesquisa ou das
qual se situa, Por sua vez, o estudo dastendêndacias
nos processos sociais e históricos que a determinam, podemos descrever em que
correntes de idéias que lhe dão suporte se faz possívelna medida
melhor algurrias das estratégias dos estudos epistemológicos. e. que
identificamos as características específicas que as estrutu ram ot- .
A análise epistemológica supõe acompreensão da obra cientí- ganizam as categorias especificamente. Fara uma melhor compreensão
fica como um todo lógico que articula diversos ; fatores, os quais lhe dão da relação entre os dois momentos descritos vejamos em seguida as ca-
unidade de. sentido, Essa unidade de sentido se produz em condições racterísticas de cada um deles.
histórico-sociais que a determinam e a caracterizam como única e como
parte do processo maior da produção do conhecimento humano. As-
sim, as;categoriascentrais da análise referem-se à relação-entre o lógi-, f À lógica da pesquisa em educação

co e o histórico. Em outras palavras, o trabalhoo científico


1cO (neste caso, | JN
=
A recuperação da lógica interna da pesquisa supõe a reconsti-
a pesquisa em educação) abrange conteúdos lógicos e históricos. O *
“<= Í
conteúdo ]lógico se refere à iculação. de noções e categorias que for-|
; mam úma “unidade de peénsamento ou uma estrutura interna mais ou | cessos26 da produção ddo conhecimento. “Suponhamos que todo processo !
: menos formalizada. Tal unidade não se apresenta fixa ou terminada,
| pois obedece a um procêsso de produção é de gênese, razão pela qual o m
| mento conteúdos flosóficos, lógicos, epistemológicos, teóri-
que inclui con
t a

* : lógico não pode estar separado. do. histórico.


| cos, metodológicos e técnicos.
Entendemos que estes conteúdos podem ser organizados por ní-
À unidade entre o lógico e o histórico é um importante princípio 1 eis de amplitude e por grau de explicitação, começando pelos fatores que
metodológico da construção do sistema de categorias, as quais devem se apresentam de forma explícita até recuperar aqueles que se encontram
refletir de forma específica toda a história de sua. formação e evolução.
(Sánchez Gamboa, 1996, p. 35). em forma de pressupostos (ou que estão implícitos). Nesse sentido, a abor-
dagem epistemológica poderá esclarecer as relações entre técnicas, méto-
No caso concreto da análise epistemológica da produção cien- dos, paradigmas científicos, pressupostos gnosiclógicos e ontológicos,
tífica em educação a inter-relação entre o lógico e o histórico se refere todos eles presentes, mais ou menos explícitos, em qualquer pesquisa
científica: Vejamosem detalhes esses níveis de amplitude:
. 7 O 5
a dois momentos específic os. No Primeiro procura-se a estrutura in-
-

terna implícita em toda pesquisa, a forma como define e articula seus Úa)récnic o- instrumental: refere-se aos processos de coleta, re-
o
« elementos constitutivos; no segundo recuperam-se as condições histó- gistro, organização, sistematização e tratamento dos dados e informações.
ricas que determinam essa produção. A integração destes dois mo-
E so

“bt Metodológico: faz alusão aos passos, procedimentos é ma- devemos dar maior importância às informações recolhidas com critérios
neiras de abordar e tratar o objeto investigado. quantitativos ou qualitativos, dependendo dos objetivos da pesquisa e
so Teóricos, entre os quais citamos: os fenômenos educativos e dos interesses que orientam a elaboração do conhecimento.
sociais privilegiados, núcleos conceituais básicos, pretensões críticas a Se quisermos conhecer, por exemplo, os perfis dos alunos e os
outras teorias, tipo de mudança proposta, autores citados etc. ; professores de umama escola ou se quisermos saber o que eles pensam,
o) Epistemológicos: referem-se aos critérios de “cientificida-
de”, como concepção de ciência, concepção dos requisitos da prova ou Ênfase a uma ou a outra 1 estratégia de pesquisa.
validez, concepção de causalidade etc. ” — (primeiro caso parece suficiente a aplicação de um ques-
Fara o
5) Grnosiológicos: correspondem ao entendimento que o pes- tionário com pergádias de múltipla escolha e um quadro de respostas
quisador tem do real, o abstrato e o concreto no processo da pesquisa previamente definidas. No Segundo caso um questionário aberto não-
científica; o que implica diversas maneiras de abstrair, conceituar, clas- estruturado, uma entrevista, UM seminário, um grupo focal, uma pes-
sificar e formalizar, ou seja, diversas formas de relacionar o sujeito & O quisa participante, sem categorias prévias de análise, certamente po-
objeto da pesquisa e que se refere aos critérios sobre a “construção do derão oferecer melhores informações. Para or Primeird caso pode-se
objeto” no processo de conhecimento. m análise de con-
utilizar um tratamento estatístico; para osegundo, Tia
; “D Ontológicos: referem-se a concepções de homem, da socie- teúdo. No primeirô caso não são necessárias informações sobre os con-
dade) “da história, da educação e da realidade, que se articulam na vi- textos sociais e culturais, apenas um questionário bem elaborado e um

são de mundo implícita em toda produção científica. Esta visão de bom tratamento estatístico para cruzar informações. No segundo caso
mundo (cosmovisão) tem uma função metodológica integradora e to- é importante conhecer o quadro social e cultural de referência para
talizadora que ajuda a elucidar os outros elernentos de cada modelo ou interpretar as verbalizações e os conteúdos dos relatos, dos gestos e
paradigma (Sánchez Gamboa, 1997, p. 66). dos símbolos utilizados. No, primeiro são conhecidas as características
Se tomarmos esses níveis de abrangência. e os aplicarmos à aná- dos alunos e dos professores; têndo como interesse predominante o
lise de uma tese, à produção de uma instituição ou centro de pesquisa conhecimento para um melhor controle técnico dos mesmos. No sê-
ou aos resultados científicos sobre uma problemática em um determi- gundo predomina ointeresse pela comunicação e a interação. "
nado período de tempo, podemos identificar a construção de uma lógi- o— meira desquisa revela uma visão de mundo que se
Assim, a primeira
ca própria, que articula diversos elementos que aparenternente se apre- reflete nos dados Empíricos e pretensamente objetivos, na descrição,
sentam desconexos uns dos outros. Por exemplo: podemos identificar no perfil gráfico ou na “fotografia” dos sujeitos investigados. À segun-
diversas técnicas ou instrumentos de coleta de dados e supor que esses da pesquisa manifesta uma visão fenomenológica de mundo, um min-
têm validade própria, pois são úteis para essa função. À medida que os do que se esconde atrás das palavras, das manifestações verbais, dos
articulamos com as abordagens teórico-metodológicas constatamos que significados, dos gestos, das maneiras de atuar etc., um mundo em que
so 7

os elementos subjetivos e intersubjetivos constituem a essência dos fe- descreve os paradigmas teóricos vigentes na América Latina nas últi-
nômenos investigados. Como vemos nesses dois exemplos, para a ela- mas décadas:
boração de uma pesquisa não é suficiente a seleção de uma técnica ou
Até fins dos anos sessenta, os paradigmas dominantes eram os que
à utilização de um instrumento se estes não se articulam de maneira
hoje podernos classificar de convencionais: q funcionalismo (ao que
lógica com os outros fatores que compõem a pesquisa. Podemos utili- se poderia atribuir o enfoque de “sisternas' por seus pressupostos
zar todas as técnicas possíveis, mas os resultados obtidos com cada sociológicos), a teoria do capita! humano e o empirismo metodológi-
co. Ao final dos anos sessenta, entram na pesquisa ssócio-educativa
uma dessas pesquisas terão maior importância ou significado depen- latino-americana novas correntes: as teorias reprodutivistas £france-
dendo, em última instância, da visão de mundo e do interesse que mo- 7 sas (Bourdieu/Passeron e Baudelot/Establet), as teorias: do conflito
* de cunho marxista expostas pela escola de Frankfurt
ou por autores
tiva o conhecimento. Para podermos articular esses dois níveis (o téc- estadunidenses e — em menor grau — a nova sociologia da educação de
nico e.o ontelógico), necessitamos recuperar os níveis intermediários Bernstein. (Lapatí, 1994, p. 47).
(metodológico, teórico, epistemológico e gnosiológico). .
Pelos exemplos anteriores podemos ver que os modelos ou pa-
radigmas da investigação não permanecem como estruturas fixas ou
O histórico na pesquisa como quadro de categorias onde podemos alocar as diferentes pesqui-
sas. Esses modelos se transformam com a prática da pesquisa e evoluem
À preocupação dos pesquisadores por estas articulações lógi- ao longo de um mesmo período. À pesquisaepi
epistemológica, uma vêz que
cas tem gerado um grande número de tipos, comojá vimos no capítulo
identifica esses modelosou paradigmas (método lógico), busca compre- ;
anterior, que identificam esses modosde articulação na forma de mo-
ender suas transformações, recuperando informações sobre sua evolu-
delos qu paradigmas. Vejamos alguns exemplos: Ta tes (1979) consta- À
ção, sua decadência, sua crise, suas limitações, suas formas de divulga-:
ta quatro paradigmas ou lógicas do saber: empirismo, formalismo, vo-
ção, sua aceitação pela comunidade científica etc. (método histórico).
luntarismo e dialética objetiva. Burns (1981) distingue três modos de Este tipo de análise histórica utiliza informações sobre as con-.
abordar o conhecimento: o lógico-positivista, o hermenêutico e o críti-
diçõesda produção do conhecimento. Essas informações se referem às
co. Goergen (1981) menciona três tipos de métodos na pesquisa edu-
políticas de ciência e tecnologia, às correntes de pensamento, à inter-
cativa: o fenomenológico-hermenêutico, o empírico e o crítico. Demo politico-pedagógicos
| ferência dos orientadores e tutores, aos projetos
(1981) distingue seis tipos específicos de abordagens metodológicas:
dos centros de pesquisa, aos recursos financeiros utilizados, à dedica-
empirismo, positivismo, funcionalismo, sistemismo, estruturalismo e i
ção exclusiva à investigação, ao predomínio de modelos ou paradig-
dialética. Nos estudos que realizamos sobre a produção dos cursos de
i mas, aos modismos teóricos ou metodológicos, ao acesso a fontes, 2
pós-graduação em educação nas universidades brasileiras ( nchez i
i novas bibliografias, à integração do projeto a grupos de pesquisa etc.
Gamboa, 1996) classificamos as abordagens em empírico-analíticas,
Í| Todos esses fatores influenciam na construção do conhecimento. Por-
fenornenológico-hermenêuticas e crítico-dialéticas. Lapatí (1994) assim
tanto, umai análise histórica ajudará a revelar as articulações lógicas que
ae eo
e) 59

foram construídas e resultaram em uma determinada forma de fazer por elas serem mais explícitas e de menor extensão. Finalmente, que
ciência, traçando suas características próprias. Se essas característi devemos pensar na visão de mundo ordenadora de nossa prática científi-
cas formam um perfil comum com outras pesquisas Eroduzidas no ca, por ela ser mais ampla e menos explícita; e assim sucessivamente
escolher cada fator e depois articulá-lo coerentemente para obter uma
pesquisa com a lógica interna bem fundamentada. Total engano. À lógi-
tro dev um mesmo ; modelo ou paradigma epistemológico. - ca à qual nos referimos é uma lógica reconstituída a posteriori. É o resul-
Podemos também afirmar que num período de dez anos, por tado da análise realizada sobre as pesquisas já elaboradas e que devido a
exemplo, predominou o paradigma funcionalista nas pesquisas reali- - determinadas condições conseguiram construir tal articulação.
zadas nos programas de pós-graduação em educação de um determina- À partir desta articulação podermos tipificar a pesquisa dentro
do país. Igualmente, podemos verificar que tal modelo deixou de ser de um determinado modelo ou paradigma. Este mesmo processo não
predominante e, por diversas razões ou circunstâncias, as quais a análise À
pode servir para orientar os projetos. Não é conventente fixar a q
histórica tratará de revelar, foi substituído por outros parídigmas
com
maior capacidade de desenvolvimento. Têmos, assim, na recuperação do 'queo método que será utilizado será o fenomenológico ou oo dialético,
histórico novos elementos para constatar um movimento de transforma- " que o paradigma epistemológico é o funcionalista ou o reprodutivis-
ção da produção científica e das tendências dessa transformação. & é intenção antecipada e representa um erro grave. Tais definições

uma banca examinadora deverá cobrar a devida coerência com os mo-


Algumas recomendações delos clássicos ou os autores mais conhecidos, inibem a criatividade e a
liberdade do pesquisador. Por outro lado, querer traçar o caminho,
Uma vez apontadas algumas das características da abordagem !
| antes de definir os pontos de partida e de chegada, de conhecer as
epistemológica e indicadas algumas das suas contribuições no estudo
e | condições do trajeto, os recursos €.os. meios, é, como diz a expressão
das tendências da produção do conhecimento, podemos destacar algu-
ç ! popular, * “colocar a carroça na frente dos bois””,
mas recomenda,dações.
Um projeto de pesquisa, como veremos no quarto capítulo, deve
Em: “primeiro lugar, alertamos sobre as limitações da aborda-
considerar, fundamentalmente, a problemática que se pretende pesquisar.
gem epistemológica. Uma dessas se refere à sua utilização. Quando
Deve elaborar questões pertinentes e traduzi-las a uma pergunta-síntese,
discutimos sobre as articulações lógicas dos fatores que integram uma
E, num segundo momento, deve indicar as formas de obter respostas
“boa investigação” e sobre os níveis de extensão de cada um deles,
parece que temos diante de nós uma camisa de força que deve servir
de parâmetro e de guia para a elaboração dos novos projetos. Parece,
" À expressão espanhola “ensillar antes de craer jas bestias” também expressa essa reversão do
igualmente, que teremos que definir, em primeiro lugar, as técnicas, processo.
Gra
60 sl

para essa pergunta (fontes de informações, formas de coletar dados, e A abordagem epistemológica pode ser importante na organi-
maneira de sistematizá-los) e indicar um horizonte interpretativo dos zação de um universo de pesquisas que produzem resultados sobre
resultados dessa busca. Nesse sentido, o investigador não necessita uma mesma problemática. Nesse sentido, as análises epistemológicas
enunciar, nos projetos, os paradigmas epistemológicos ou as abor buscam superar os “estados da arte” tradicionais. Os balanços conse-
gens teórico-metodológicas que irá utilizar. Entretanto, não negamos | guidos através de uma análise epistemológica, não só permitem identi-
que o conhecimento das características das diferentes abordagens, re- : ficar os temas estudados, as bibliografias ou os autores consultados,
veladas nos estudos epistemológicos sobre pesquisas já elaboradas, | como levam a aprofundar os problemas e questões que geraram o co-
certamente ajudará na seleção de estratégias para compreender me- nhecimento, 2 elucidar os métodos, as estratégias os conflitos teóricos
lhor o problema que se investiga, e paradigmáticos e o confronto des resultados; também permitem re- .
Um bom escritor antes de elaborar suas novelas lê muitas ou- velar os vazios Cconcettuais, a limitação ou1 extensão das categorias e as
tras, encanta-se, deleita-se e asàs aprecia com cuidado. De igual | manei- ; perspectivas hhistóricas de uma ciência em particular.

ra, umn pesquisador, antes de elaborar seu projeto, deve ler outras pes- Igualmente, uma análise epistemológica sobre um universo de
quisas, para identificar seus principais elementos, recuperárseus mé- pesquisas poderá revelar as implicações filosóficas e ideológicas que,
todos e estratégias, descobrir suas rotas ocultas, revelar seus pressu- em alguns casos, limitam a criatividade e a capacidade heurística das
postos e estruturas básicas. Lê e relê outras pesquisas para compreen- teorias é dos métodos.
der os resultados e avaliar suas limitações e implicações. A abordagem Por fim, a abordagem epistemológica ffunciona como um exer-
epistemológica oferece um instrumental! para realizar essa leitura cui- cício ddee vigilância. permanente. Vigilância * para Perceber o Ânespera-
dadosa da pesquisa. |
Tedo pesquisador, por mais original e precoce que seja, precisa chelard, 1989). Isto é,5, vigilância para revisar permanentemente os li-
realizar uma leitura diferenciada (leitura epistemológica) de outras mites do próprio conhecimento e, assim, abrir novos ho izontes para o
pesquisas. Sem dúvida, trata-se de uma maneira de se familiarizar com desenvolvimento. do conhecimento humano.
a produção científica, c que consegue com a leitura crítica de outras
pesquisas, relatórios de investigação ou teses.
É conveniente que os centros e grupos de pesquisa realizem
periodicamente balanços de sua produção. Além de outras formas de
avaliação, as análises epistemológicas permitem identificar as tendên-
clas dessa produção, revelar seus métodos, teorias e paradigmas cien-
tíficos predominantes, assim como sua evolução ao longo de um perío-
do. Essas análises contribuem, também, na elaboração de estudos com-
parados entre períodos e entre centros ou grupos de estudo.
ESQUEMA PARADIGMÁTICO:
UM INSTRUMENTO PARA À
ANÁLISE DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA

Buscando novas categorias para classificar as investigações na


educação, Vielle (1981) propõe a inclusão de um novo campo que cha-
mou de “Pesquisa da Pesquisa” e que,

Consiste em projetos encaminhados a avaliar a orientação, prioridades,


condições de produção e difusão, metodologias, procedimentos e estraté-
gjas da investigação educativa. Seu resultado vem dado por conhecimen-
tos acerca dos processos da investigação educativa. (Vielle, 1981, p. 338).

Com a rápido aumentoda produção científica, especialmente a


partir da criação e consolidação dos cursos de pós-graduação na Amé-
rica Latina, surge a necessidade de estudar a qualidade dessa produ-
ção. Algumas das possíveis análises se referem à qualidade, à eficácia,
aos temas tratados, às técnicas e
à utilidade,às diferentes orientações,

fundamentam a investigação.
Dentro desta série de preocupações parece que a questão do
método é prioritária. O método é encarado frequentemente como uma
6s

questão puramente técnica que tem a ver com formas de coletar dados, das-chamadasnaturais e exatas, que quando aplicados às análises de
construir questionátios, selecionar amostras, organizar informações etc.; segunda ordem ou metacientíficas se tornam inadequados. Para supe-
no entanto, es métodos dentro de um contexto menos técnico mais
e rar essas dificuldades esses estudos recorrem a outro tipo de instru-
; epistemológico se referem aos diversos modos como se constróia reali-
| dade, às diferentes Maneiras como nos aproximamosdo objetodo conhe- q vétipos, metáforas e esquemas conceituais ou paradigmas.
i cimento. Isto quer dizer que a questão do método exige análises mais Black (1977), por exemplo, propõe o modelo que define como ; ,. .-
complexas e não se reduz apenas à parte instrumental da pesquisa. uma maneiraa peculiar de conseguir uma inserção. intelectual quando o.o
í Para entender os métodos utilizados na Investigação científica é
t
i necessário reconstruir os elementos que o determinam e as relações que ar aa simples representação do pensamento 1imediato.
mos superar f
í estes têm com outras dimensões implícitas nos processos de produção do O modelo busca reproduzir a realidade, conservando funda-
i| conhecimento, tais como as técnicas, os Instrumentos de aquisição, or- mentalmente certas proporções relativas ao original, serve para evitar
ganização e análise de dados e informações e as concepções epistemoló- as implicações E limitações ligadas a uma linguagem ou qualquer outra
| gleas e filosóficas nas quais se fundamentam os processos de : investiga- de símbolos que explicitamente representam a teoria. Em ou-
forma
ão;
| dimensões essas que supõem uma articulação entre si, uma coerên- tras palavras, o modelo se utiliza, como um substituto, de outra possi-
ela interna e uma lógica própria, que por estarem implícitas no. processo bilidade disponível: a de tomar diretamente a teoria científica. Em|:[Ei
ida elaboração da pesquisa precisam ser reveladas ou reconstitiádas. geral, quando as palavras nos falham, recorremos à analogia e à metá- |
Perante essa necessidade, e dada a inexistência de um instru- fora; aqui o modelo funciona como o tipo mais geral de metáfora ou |
e
. mental apropriado para esse tipo de análise, surgiram o desafio e a como uma metáfora mantida e sistemática (Metáfora Radical ou Roo É V

H
busca de um instrumento que permitisse reconstruir a lógica interna Metaphors).
que ajuda a decifrar e explicitar os fundamentos de cada enfoque teó- Segundo Black (1977) existem vários modelos que, dependen-;
do de uma progressiva complexidade, podem ser classificados em mo-!
É
a rico-metodológico utilizado na pesquisa científica. As bases para esse
:; instrumento foram procuradas nos referenciais da epistemologia. delos de escala (miniaturas ou iconográficos), analógicos, matemát!;
|
cos, teóricos é conceituais. Esses últimos, mais complexos, são chama
A NO
dos de “arquétipos” e são considerados como modelos implícitos, subi
Modelo, mapa, arquétipo,
mergidos e atuantes em cada teoria é em cada autor, algo assim coma
esquema conceitua! ou paradigmo?
a analogia básica ou a metáfora radical que serve de marco último de
referência ou como pressuposto essencial de uma teoria. '
Os estudos de caráter epistemológico, que têm como objetivo a
análise
das teorias e dos processos científicos, deparam-se com as limita- O: arquétipo; por não ser explícito, tem o perigo de ser utilizado
ções dos instrumentos utilizados pelas próprias ciências, especialmente de forma abstrata e genérica. Quanto 1mais persuasivo for o arquétipo |
[e 67

tradições coerentes de investigação científica [...] fonte de instrumentos


[...] princípio organizador capaz de governar a própria percepção f...]
submetido à exigência da experiência e à análise crítica da Lvestigação. um novo modo de ver e de revelar enigmas [...], permitindo ver seus
Os conceitos de arquétipo, metáfora radical, modelo implícito, de uma nova forma [...] determinantesde. grandes. áreas
componentes
analogia básica, nos aproximam da idéia de um instrumento que facili- de experiência [...]” (Másterman, 1979, p. 77). Dentre os vários sen-
tidos colocados no livro de Kuhn, alguns são próximos ao nosso projeto.

nt
te a reconstrução dos elementos implícitos que constituem a lógica

à
| internade uma teoria ou de um determinado enfoque metodológico. A idéiade paradigma entendida como conceito anterior das teorias e
Outra perspectiva nesta busca de bases para um instrumental que gera uma sériede instrumentos e métodos reconhecidos para a
epistemológico para a análise da produção científica é encontrada em comunidade científica como válidos na solução. de enigmas nos parece
Ryan (1977, p. 134). O autor nos diz que, nas ciências sociais, existe a concepção mais próxima da construção que pretendemos.
por trás de toda teoria uma série de Cestruturas conceituais” que atuam Por outro lado, à noção de paradigma não pode ser entendida
como “uma terminologia concordante a partir da qual as teorias po- com o mesmo sentido nas ciências físicas e naturais que nas ciências
dem ser construídas”, algo assim como um “produto pré-histórico ou humanas. Másterman adverte que |
pró-teoria”. Essa “estrutura conceitual” éz produzida no mesmo pro-
Na atual situação global! nas ciências psicológicas, sociais e da infor-
cesso de formação das teorias, tanto que podemos supor que. “as estru- mação existe uma ciência multiparadigmática. Longe de não haver
turas conceituais são teorias cujos autores temem afirmá-las enquanto paradigma tem pelo contrário excesso de paradigmas. (IMásterman,
1979, p. 90).
homens ou enquanto trabalho perdido”. Esse conceito de “estrutura
conceitual”, entendida como modelo básico ou esquema implícito, tam- A multiplicação de paradigmas nas ciências humanas, assim
bém nos oferece bases para o instrumental analítico que procuramos. como a frequente substituição dos mesmos (antigos por novos), pro-
No delineamento desse instrumental podemos tomar também porciona uma visão mais ampla e global que a visão rígida, formal e
a contribuição de Kubn (1975), que introduz na literatura científica o precisa das ciências exatas. Essa multiplicação de paradigmas exige a
conceito de “Paradigma” para explicar o processo histórico das ciências. presença de maior número de elementos extra-científicos, tals como
Segundo ele, as ciências avançam através de revoluções que se dão propaganda, proselitismo, modismos etc., para conseguir o pretendido
quando a “ciência normal” não explica todos os fenômenos descober- “consenso” da comunidade científica que dará suporte à sua pretendi-
tos, então surge a crise desse modelo, fazendo-se necessária a constru- da racionalidade.
ção de um novo modelo ou paradigma que substituirá o antigo. Essa | À noção de paradigma como estrutura lógica com propriedade
mudança de paradigma exige uma nova estruturação da ciência. de concretismo e seqiiência analógica que envolve uma linguagem es-
O conceito de paradigma tem em Kuhn vários sentidos! O pa- pecializada antecipa o uso de teorias e métodos e é semelhante aos
radigma pode ser entendido como “modelo do qual procedem as e às estruturas conceituais.de Ryan. Nessa linha
arquétipos de Black
es
68 o

de semelhanças é analogias, podemos nos referir à matriz que Bengo- As transformações mais importante s.nio
. desenvolvi mento da i
echea e colaboradores (1978) construíram e denominaram “Esquema ciência resultam não da invenção de novas técnicas. de tratamento, de :
para a análise Paradigmática”, utilizando-o para clárificar os pressupos- informações, mas de novas maneiras de ver essas informações. Às
tos metateóricos das grandes teorias sociológicás & que, em nosso caso, mudanças mais importantes se expressam em novas teorias e essas,
serve de base para a construção do instrumento que nos permitirá anali- por sua vez, surgem de novos esquemas conceituais ou de novos enfo-
sar os enfoques teórico-metodológicos da pesquisa em eduçação. ques epistemolégicos.
Por trás das diferentes formas de ver, focalizar e investigar O
real existe a construção de uma totalidade em que, segundo Kostk, já
Esquema paradigmático
está implícita a noção de realidade.
: Pe ; - -
“Esquema Paradigmático”, como é denominado o instru- Precisamente porquea realidade é um todo estruturado que se desen-
a“
O
volve e se produz, o conhecimento dos faros, ou do conjunto de açon-
mento que construímos, supõe o conceito de paradigma, entendendo
fecimentos da realidade, vem. a ser,o lugar que ocupar na totalidade
este como uma lógica reconstituídaou maneira de organizar os. diver- desta realidade [...] se a realidade — no pensamento dialético — é um
sos recursos utilizados no ato da produção de conhecimentos. Por isso conheecimento da realidade, consiste não na adição sistemática de uns
fatos a outros e de uns conceitos a outros senão num processo de
consideramos que à unidade básica da análise paracigmática corres- concreção, que precede do todo às partes e das partes ao todo. (Kosik,
ponde à lógica de um processo de produção de conhecimentos presen- 1989, p. 42).
te em todo processo de investigação científica. Isso supõe que
Neste processo de correlação, em que os fatos e os conceitos
Tedo processo de produção de conhecimento é a manifestação de uma
entram em movimento recíproco, produz-se a concretização. À con-
“e pensamento (qualquer que se ja O grau de estruturação e
cretização se constrói em toda pesquisa ou produção de conhecimen-
mológicos, teóricos, merodelógicos e técnicos que implicam: sempre tos e nela se encontram implícitos muitos elementos articulados que |
modos de trabalhar e de omitir. (Bengoechea et al., 1978, p. 76).
podemos explicar através do “esquema paradigmático”,
Estes elementos podem ser organizados em diferentes níveis :
ou grupos de Pressupostos. Vejamos aqueles que consideramos os mais | +;
basicamente aa noção de totalidade concreta, entendida como o modo de
importantes: Pa Pao
ver produzido pela mudança de Gestaít (Kuhn, 1975), ou como um “qua-
O. Primeiro nível. 9 básico, se refere à lógica reconstituída entre |
dro geral que organiza as informações e lhes dá sentido” (Alves, 1983,
a pergunta (P) - a resposta LR. O ponto de partida de todo processo de À
pesquisa está na elaboração da pergunta. À pergunta (P) se processa a
: Psicologia de Gestal nos diz que a percepção é o atoo pelo
qual organiza- partir do mundo da necessidade que se traduz em indagações e questões
que see qualificam em perguntas claras, distintas e concretas.
: mos as informações soltas e isoladas em totalidades significativas.
70 7l

Na elaboração da resposta (R) se integram diversos níveis de : O esquema paradigmático busca recuperar a lógica essencial
complexidade, que identificamos assim: e uma
da pesquisa científica: a relação básica entre uma perguata (P)
a Nível técnico refere-se aos instrumentos e passos operacio- resposta (RR).
A constr uçãoque veremos detalhadamente no |
da pergunta,
toseas15 informações sobre o real; Damóvel metodológico, refere-s:
-seàs. -se concreto (situado, datado e
num problema,
quinto capítulo, erigina
maneiras como são organizados os processos do conhecimento o ní- ativo). O problema é traduzido, reduzido ou racionalmente “apreendi-
vel teóricos refere-se aos referenciais explicativos ou compreensivos do” em forma de indagações e de questões que ganham clareza e pos-
utilizados na abordagem dos fenômenos estudados; esse nível se refe- sibilidade de serem respondidas quando elaboradas em forma de per-
re, também, ao núcleo conceitual básico utilizado ou desenvolvido, aos guntas (claras e específicas). Uma vez formuladas as perguntas que ;
autores privilegiados, às críticas ou polêmicas com relação a outras orientam o processo de pesquisa (momento do projeto), são produzi- :
teotias, aos graus de explicitação e articulação de categorias com cor- das as respostas (momento da realização da pesquisa).
rentes e tendências de pensamento ou doutrinas científico-filosóficas | E Concluída a pesquisa e apresentada em forma de relatório,
suas relações com interesses ou ideologias predominantes; D pressu-
SAN 1
monografia de iniciação científica, dissertação ou tese e tida como obra
postos epistemológicos; refere-se às concepções de causalidade, de si- científica, essa poderá ser. submetida a uma análise epistemológica.
Ência e critériosde validação dos requisitos da prova científica; e) Nesse caso, a recuperação da sua estrutura (lógica reconstitu-
supostos gnosiológicos; refere-se às maneiras de abstrair, generalizar, ída) supõe que tal produção, caracterizada como pesquisa científica,
conceituar, classificar, formalizar ou, em termos gerais, às maneiras deverá desenvolver a lógica entre a pergunta que sintetiza suas inda-
de conceber o objeto e de relacioná-lo com o sujeito no processa cogni- gações e questões sobre o problema abordado e as respostas.
tivo; 9 pressupostos ontológicos: fazem referência a categorias gerais
que abrangem, dentre outras, as concepções de homem, de sociedade,
de história e de realidade (espaço, tempo e movimento), isto é, catego-
nas que exprime
a cosmovisão
m que o pesquisador, o grupo de pesquisa
ou comunidade cicientífica tecem no momento de realizar o processo de
formular perguntas e procurar respostas para os problemas ou fend-
menos abordados.
O “esquema paradigmático”, que será apresentado a seguir,
nos permite explicar os elementos anteriormente indicados e revelar
(processo interpretativo) os pressupostos da prática investigativa ex-
pressos nos relatórios de pesquisa, nas teses ou trabalhos científicos.
ro
72 73

Esquema Paradigmático Na elaboração das respostas. foram definidas fontes e utilizados


Í À lógica reconstituída
instrumentos e técnicas paraza coleta, o registro, a organização, siste-
Relação dialética entre Pergunta (P) e Resposta (R)

[o PE€DR matização e o tratamento dos dado bre o referido problema ou, fenô-
meno investigado. De igual maneira, pressupõe-se que em todo pro-
1 A CONSTRUÇÃO DA PERGUNTA
cesso de construção do conhecimento (respostas a perguntas específi-
Mundo da necessidade = Problema *d* Indagações múltiplas
cas) devam ser requeridas formas e técnicas de análises dos dados e
Quadro de questões *X
informações coletadas em função da elaboração da resposta ao proble-
Pergunta
ma abordado na referida pesquisa. —
2 A CONSTRUÇÃO DA RESPOSTA
Tal nível de articulação, que denominamos de nível técnico, não! V E:
Nivel Técnico: fontes, técnicas de coleta, organização, sistematização
e tratamento de dados e informações
esgota o processo nem se explica separado de outras dimensões que i

articulam e ponderam instrumentos e técnicas de coleta e análise. Neste


Nível Metodológico: * abordagem e processos da pesquisa: formas de caso, supõe-se um nível mais ; complexo que abrange o anterior e que se
aproximação ao objeto (delimitação do todo, sua refere aos passos, procedimentos, estratégias e maneiras de abordar o:
relação com as partes) e (desiconsideração dos
contextos objeto investigado. À esse grau de articulação lógica denominamos não1!j
!
“vel
metodológico.
Nível Teórico: fenômenos privilegiados, núcleo conceitual básico, Supõe-se que em toda pesquisa se privilegiam certas teorias.
autores e clássicos cultivados, pretensões críticas,
tipo de mudança proposta
Entende-se por teoria a “construção intelectual que aparece como re- |
sultado do trabalho científico-filosófico (ou ambos).” (Ferrater Mora,
1
Nível Epistemológico: concepção de causalidade, de validação da prova . 1971, p. 776). Diferentes construções intelectuais têm surgido e de
científica e de ciência (critérios de cientificidade) diferentes maneiras, muitas delas são privilegiadas e se impõern como
constitutivos de paradigmas, amplamente aceitos pela comunidade ci-
IPressupostos Gnosiológicos: maneiras de abstrair, generalizar, conceituar, entífica. Cada enfoque metodológico dá privilégio a certas teorias com
classificar e formalizar, ou maneiras de
as quais se integra corno partes constitutivas de uma mesma lógica ou
relacionar o sujeito e o objeto.
Critérios de construção do cbjeto científico maneira de pensar sobre um determinado fenômeno, a partir dissoé
! possível falar de uma abordagem teórico- metodológica.
Pressupostos Ontológicos: categorias abrangentes e complexas,
Cada enfoque também leva implícita certa forma de ligação
concepção de Elomem, de Educação e
Sociedade, concepções de realidade entre o conhecimento desenvolvido e o interesse, entre o pensamento, -:,
Lo (Concepções de espaço, tempo e movimento)
Suas raízes, suas origens e motivações. Nesse sentido, toda ciência,
(COSMOVISÃO)
r tem |
e de pensar,
enquanto encerra um tipo determinado de filosofa
74

=.
o
Suas raízes econômicas, sociais, políticas e ideológicas; em outras. pa-- teoria sua capacidade de ser provada pela experiência, seja através da
lavras,a ciência não é pura nem neutra. Haberrnas (1983) distingue “verificação” ou da “falsação”; outros confiam no processo puramente
três tipos de conhecimento com base nos interesses humanos que co- formal da dedução; outros se imitam à demonstração ou à correlação
mandam o processo científico. À cada um desses ; tipos corresponde um entre as premissas e as conclusões; outros fundamentam a prova na
interesse cognitivo: ao processo. êmpírico- analítico corresponde um intuição da verdade de uma proposição etc,
interesse técnico de controle; ao proces he menêutico: correspande 7
geo existe -impÉ ita uma concepção
um interesse prático-comunicativo; ao processo sistemático
so da ação
Y
tado
; para pressa um 1 conjunto dede : conhecimentos e de investigações que
c tem um!
oe domínio da natureza, o segundo ppara à relação dos homens entre si e grau de unidade, de generalidade e é suscetível de conduzir a conelu+
O terceiro para a própria liberação do gênero humano. sões concordantes que resultam de relações objetivas; estas se desco-
Dentre os. pressupostos. epistemológicos” “temos o conceito de brem gradualmente e se confirmam por métodos definidos. Existem
Pr
causalidade, que se entende como antecedente ou conjunto de antece- muitas concepções de ciência, seja como uma “invenção”, como um

' dentes cujo conseqiente é invariável e incondicionalmente chamado conjunto de métodos e conhecimentos, cujo objetivoé alcançar propo- .
de efeito; a causalidade
pode ser entendida como uma ação que um ser &
sições gerais, sistemáticas e& coerentes, sujeitas a leis fas; o
como ativi : :
exerce diretamente sobre. o. outro (causa eficiente de Aristóteles), como
uma relação lógica e de dedução lógica (Descartes), como oposta às nhecimento «e:
c attude valorativa
v diante de uma 1 realidade, descobrindo, "

dO
leis
ou como suposto que não pode ser. observado (Comte), como per- suas contradições etc. (Goergen, 1981).

bra
manência ou equivalência de certas magnitudes, como relação, condi- Vejamos agora alguns dos pressupostos gnosiológicos, tais como
ção ou lei fundamental (Stuart-Nill) etc. Supõe-se que cada enfoque maneiras de abstrair, que significam as formas de separar, selecionar
metodológico privilegia certas concepções de causalidade. um conjunto de elementos comuns. Tem a ver com o essencial, o ne-
A validação dos requisitos da prova se refere à operação que cessário, o geral que existe captado nas percepções sobre as coisas,
conduz a justificar que o procedimento realizado é científico e verda- sobre os processos, os fatos etc. Esse conceito está estreitamente rela-
deiro. Os processos científicos podem ser metodologicamente prova- cionado com a maneira de generalizar,
dos, e é nisto que se distingue o discurso científico dos demais discur- A generalização permite reconhecer caracteres comuns entre e
sos. Em oposição ao contexto da descoberta, situação não metodológi- vários objetos também comuns que se reúnem em um conjunto, Con-
ca do nascimento das teorias, o contexto da justificação exige métodos ceituar significa. a compreensão dos caracteres comuns ou o conheci-

pelos quais provamos o processo que utilizamos para averiguarmos se


este eventualmente nos conduz ou não ao conhecimento da realidade. ; Classifica siguiica ordenar segundo certas relações que se querem :
Alguns autores centram sua atençãona prova ceu “teste” dos os objetos em um certo número de conjuntos
pôr em evidência, repartir
instrumentos utilizados, outros aceitam como credencial de qualquer
76 77

parciais coordenados e subordinados. Os anteriores processos condu-”, segundo


Athos. sua ossituação, seja como centro
O EXemento| |
DEde um processo, como > elemento
zeém à formalização de uma estrutura ou modelo. secundário em um sistema de produção. como resultado de uma inter- | |
Formaliza) faz referência à construção. de uma relação entre os

s
deterimi nadas estruturas ou sistemas. ouu situado em: classes Sociais opos-|
Cada a enfoque metodológico tem
te uma maneiraespecial de con- tas de onde uns são 1 explorados e outros exploradores. Todo enfoque tem. :
ceber estes processos lógico- gnosiológicos, segundo a maneira de re- ummffipo de homem” de igual maneira, adota uma forma de entender al í|
organização desses homens, quer dizer, uma concepção de sociedade.
— .
acionar f. real com o abstrato e o concreto. Isto nos leva 2 descobrir
diferentes mangiras de relacionar o sujeito e o objeto no processo de AÀ concepção de fealidade ou de mundo (cosmovisão) depende
conhecimento. em grande medida da própria história de cada pesquisador: À concepção f
SN E Ca,
Entre os principais ipressupostos ontológicos teremosas con- de mundo se apresenta cormo um conjuntode intuições, não só em deter-|
cepções dede homem, história e realidade. - minadas teorias mais desenvolvidasmas, também condiciona toda a ci-/*
A distóris como conhecimento de diferentes estados realiza- Encia e, ainda mais, Abrange formas normativas, Fonvertendo-se em cri-!|
dos, não nseessáriamente passa
5 o, por um “objeto qualquer do conhe-
cimento, um povo, uuma instituição, um grupo, um indivíduo etc., ou tal que está intimamente ligada : ao,> problema .central da Filosofia. "
como série de estados pelos quais tem passado a humanidade.
Cada Existem muitas concepções de mundo determinadas pela psi-:
enfoque tem sua própria concepção de história. Para alguns a história cologia individual, pelas. classes sociais, pelos valores dominantes na |
se reduz a um dado conjuntural, por exemplo, ao momento em que se sociedad. las formações sociais, pelos movimentos históricos etc. |
Por exemplo, na história da filosofia duas grandes cosmovisões têm
Pa

observa o fenômeno ou se coletam dados; para outros a história é en-


tendida como um processo que envolve o fenômeno ou como u on- marcado sua evolução. Por um lado o: (materialismo e por outro o; údea- :
texto no qual se situa; para outros como um processo que explica à lismo, que propõem diferentes visões de realidade. Num predomina o:
atual situação do objeto; outros vêem a história como um processo de formalismo estático, no outro predominam a dinâmica e à contradição; |
desenvolvimento e de superação das contradições e conflitos inerentes uma tendência se fundamenta no método metafísico e na lógica for-
PP”
ao próprio fenômeno estudado etc. Uns dão importância destacada à mal; a outra no método e na lógica dialética; um aceita a primazia do!
história (tudo é história), outros qualificam de “historicismo”a sim-- espírito sobre a matéria e outro da matéria sobre à consciência; um
ples extrapolação dos dados presentes ou a situação dos mesmos em tende ao equilíbrio perfeito ou à estática definitiva, o outro tende ao
momentos diferentes. p[ÚQ— N contínuo movimento e à evolução constante; um defende a manutenção
O conceito de homem : É um elemento sempre presente..nos en- ou o “incremento” do atual estado das coisas e o outro a transformação,
foques metodológicos: “Cada enfoque dá determinada importância à inovação € a2 mudança radical das situações vigentes.
78

O esquema paradigmático que temos proposto aqui e que já foi


aplicado em algumas experiências de análises da investigação educativa
(ver Sánchez Gamboa, em análises das teses de pós-graduação em Edu-
cação, 1982, 1987 e 2005) está ainda em construção e está sofrendo um
7
processo de aperfeiçoamento, na medida em que está sendo aplicado a H

outras análises. E possível que com estudos maisSs avançados e algumas

: análises no campo da epistemologia da pesquisa, não apenas no campo


da educação, mas em outros campos do conhecimento científico.
À FORMAÇÃO DO PESQUISADOR NA
EDUCAÇÃO E AS TENDÊNCIAS EPISTEMOLÓGICAS

A formação do pesquisador tem sofrido diversas influências ao


A SA) : :
e
longo das últimas trêsAu décadas. Num primeiro momento se intensifi-
cou o treinamento técnico do pesquisador, dando ênfase ao corheci-
mento doss procedimentos estatísticos e aos desenhos experimentais e
quase- experimentais; Hoje existe maior preocupação com os aspectos
metodológicos, teóricos | e epistemológicos. da investigação. Com a in-
tenção de identificar melhor essa mudança de preocupação e de recu-
perar as relações entre os aspectos técnicos, metodológicos, teóricos e
epistemológicos e as formas como são articulados entre si, tomamos os
resultados de um estudo sobre a pesquisa educativa no Brasil para
tecer algumas reflexões sobre a formação do pesquisador. Essa forma-
ção não deve considerar apenas a competência técnica, deve também
considerar outros aspectos relacionados com o método e os pressupos-
tos teóricos e epistemológicos nos quais se fundamentam os processos
da investigação.O propósito de formar pesquisadores de maior grau
80 Fo

de capacitação exige o conhecimento desses elementos e pressupostos *, entre os níveis de graduação e pós-graduação motivada pelo critério
& a articulação lógica entre eles. De igual maneira, o pesquisador deve de restringir a pesquisa aos “mais aptos” neste último nível; de igual
conhecer as diversas formas de articulação lógica dos enfoques episte- maneira, à separação entre º ensino ea pesquisa, entre a transmissão -
meológicos ou abordagens metodológicas para saber o alcance de suas a produção do conhecimento, as primeiras centralizadas nos cursos de
opções e avaliar as implicações e limitações dos modelos de investiga- graduação e as segundas nos programas de pós-graduação.
ção utilizados. Entre os requisitos e rituais que um aluno de pós-graduação tem
O sistema de formação do pesquisador em educação no Brasil que passar para ser considerado “pesquisádor”, além de cursar So
se situa inicialmente nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu (mes- nas da área de especialização ou concentração, deve cursar outras rela-
trado e doutorado, Lei 5540/68, Parecer do Conselho Federal de Edu- cionadas com os “Métodos e Técnicas da Pesquisa”, “Técnicas Estatís- ”
cação 77/69). Deacordo com essa legi lação, imposta desde 1968 com. ticas”, “Seminários de Projetos”, “Desenhos de Pesquisa” etc. e defen
a conhecida Reforma Universitária, o ensino Superior foi dividido em der sua dissertação ou tese diante de tima banca examinadora. | |
três níveis: o primeiro nível, o ensino básico! onde o estudante define Falando especificamente da investigação na educação, esta se
Suas aspirações acadêmicas e profissionais; segundo nível, a gradua- desenvolveu e se consolidou a partir «de 1970 nos cursos de pós-gradu-
ção, onde o estudante adquire conhecimentos em uma área de especi- ação criados segundo o modelo. norte- “americano, com treinamento de
alização e se familiariza com os instrumentos de sua futura profissão. professores e pesquisadores nos Estados Unidos por meio de convêni-
os entre algumas universidades desse país e o governo brasileiro, co-
Somente no terceiro nível, a pós-graduação, ele obtém experiência de
pesquisador científica necessária à elaboração de uma tese original nhecido como “Acordos MEC-USAID”, efetuados entre 1964e
para alcançar o grau de Mestrado ou Doutorado. (Brasil, INEP, 1968, financiados pela Aliança para o Progresso, Banco Mundial, BID
Rev. Bras. de Est. Ped. 1972, p. 212).
et, situação essa que se repete em outros países da América Latina.
A opção pelo modelo. norte-americano levou a uma progressiva depen-
À pesquisa é colocada como objetivo principal da pós-gradua-
São Stricto Sensu por ser considerada o instrumento para desenvolver a dência cultural imposta de fora e que obedece aos interesses expansio-
capacidade de pensar e criar, reservada aos mais aptos. Derivam daí o nistas que condicionaram a autonomia da universidade, Segundo Fer-

papel e a importância que a dissertação de mestrado e a tese de douto- nandes, essa intervenção, que pretendeu desintegrar o padrão brasi-
rado têm para a aquisição dos respectivos títulos e a razão pela qual a leiro de escola superior existente até 1968 e adaptá-lo aos requisitos
investigação constitui pedra angular dos programas de pós-gradua- educacionais de uma sociedade competitiva e de massas,
São. Como conseqúência dessa normalização, o estudante só será con- [...] forma parte dos processos desencadeados e controlados a partir de
siderado pesquisador depois de passar por uma série de requisitos e fora, que organizam o espaço econômico, sócio-cultural e político do
mundo sub-capitalista para o novo estilo de dorminação das nações hege-
níuais que o elevarão à categoria de doutor. A normalização e a burocra-
mônicas e principalmente das superpotências (Fernandez, 1979, p. 116).
tização trazem algumas ambigúidades para a pesquisa, como a distância
82 83

Por outro lado, a expansão dos cursos de pós-graduação, que de algumas comprovações e alguns resultados, sugerir mudanças na
inicialmente estava vinculada a uma política de ampliação do capitalis- formação do investigador em educação. Um exemplo desses estudos
mo na América Latina eàs necessidades conjunturais do mercado de se refere ao realizado sobre a produção dos cursos de pós-graduação
trabalho para cobrir os níveis superiores da hierarquia social & organi- em Educação no Estado de São Paulo entre 1971 e 1984, que analisou
zação do Estado, também possibilitou a manifestação de uma “massa
502 dissertações e teses desenvolvidas nas cinco universidades que
.« crítica” que revela as relações de interesse implícitas nas condições do ofereciam esses programas de pós-graduação".
desenvolvimento científica e tecnológico dependente. Os cursos de pós- Neste capítulo nos referimos aos resultados dessa pesquisa. Tais
graduação se tornam também o lugar privilegiado para sistematizar as
à : . eo : o : .
resultados são fruto de uma análise epistemológica na qual utilizamos
alternativas mais radicais contra as políticas sociais e educacionais, e como categoria metodológica fundamenta! a relação entre o lógico e o
deles surgem importantes propostas de mudança. Apesar
da legisla- histórico. O estudo lógico pretendeu reconstituir os modelos episte-
ção vigente não ser favorável a isso, grande parte da produção desses mológicos predominantes nas pesquisas, caracterizando-as de acordo
cursos contribuiu para aguçar a crítica social, política e.ideológica e, com os níveis de articulação explícitos (níveis técnico-metodolégico,
teórico e epistemológico) e de pressupostos implícitos (enosiológicos e
danças nas atuais condições
o sociais, políticas ee culturais.
ontológicos). O estudo histórico buscou elucidar as tendências desses
Desde 971) produção dos programas de pós-graduação vem modelos ou paradigmas epistemológicos, recuperar as condições his-
crescendo rapidamente. Diante dessa expansão quantitativa surgem
tóricas, sociais, políticas, administrativas e acadêmicas etc. que expli-
muitas perguntas, entre as, quais, aquelas que questionam sua qualida- cam a trajetória dessa endências epistemológicas. .
de, as tendências temáticas, teóricas, metodológicas e epistemológicas
" ON a organização deste capítulo serão expostos em primeiro lu-
que orientam essas pesquisas; de igual maneira se questionam as rela-
gar os resultados dos estudos lógicos; posteriormente, a recuperação
ções dessas tendências com os vários momentos históricos que a socie- histórica da produção e finalmente algumas conclusões ou recomenda-
dade e a educação passaram nas últimas décadas e como evoluiu a
cões relativas à formação do pesquisador em educação.
formação do investigador educacional nesse período.
Será possível que novas abordagens teórico-metodológicas e
itendências epistemológicas indiquem ou expressem novas maneiras de
fazer ciência, novas concepções de educação, novas noções de homem,
de sociedade e novas visões de mundo? Como esses elementos são apro-
veitados na formação de pesquisadores em educação e na busca de
uma maior qualidade da investigação produzida na área?
Estas preocupações motivaram estudos de.caráter epistemoló- !! Na época da conclusão da pesquisa (1987), 40% dos cursos de mestrado e 60% dos cursos de
gico que têm como objetivo investigar a pesquisa educativa e, a partir doutorado em educação de todo o Brasil situavam-se no estado de São Paulo.
84 EE

Reconsttiuindo a lógica dos capítulo), levando em conta os níveis de articulação (técnico, metodo-
modelos de pesquisa lógico e teórico) e a partir «destes os pressupostos epistemológicos e
filosóficos (gnosiológicos e ontológicos), foi possível confrontar as ló-
Um dos objetivos que orientaram os estudos sobre a produção
Bicas reconstituídas das três ; grandes tendências”.
daa investigação emn educação consiste em identific : diversos para
Com relação aocnável técnico, podemos. constatar que as pesqui-
sas classificadas como. riço-analíticas utilizam técnicas de registro
e tratamento de informações marcadamente quantitativas. As infor-
mações são recolhidas por meio de instrumentos estruturados (testes
padronizados, questionários estruturados, guias de observação etc.),
cadores dedicados àà “pesquisa. A melhor forma de identificar essa
essas ten-
permitindo o tratamento estatístico e a apresentação dos resultados
dências seria analisando as teses e dissertações ; produzidas. nos centros
através de esquemas cartesianos, gráficos estatísticos ou quadros de
correlações. As investigações classificadas como fenomenológico-her-
Seguindo fe] “exemplo dod universo de pesquisas produzidas no
menêuticas privilegiam técnicas não-quantitativas, como entrevis-
estado de São Faulo podemos identificar várias vertentes epistemoló-
s :
tas não- estruturadas, relatos de vida, estudos de caso, relaro de expe-
Bicas, que podem ser classificadas em trêsa grandes grupos: asempíti- PENN
| DOS

n Friências etc. Às investigações classificadas como cetítico- dialética ut


co-analíticas, as Ffenomenológico- hermenêuticas e as crítico-dialéticas.
— lizam, todavia, das técnicas anteriores, estratégias conhecidas como
A classificação anterior é fruto de um processo de verificação
“investigação-ação”, “investigação militante” e algumas formas de “in-
de algumas hipóteses de trabalho a partir de propostas encontradas na
vestigação participante” e técnicas historiográficas.
literatura especializada e confrontadas com as informações recolhidas 2 SO Ea ; ;
!
Com relação ací ável metodológico, consideramos que, por meio
com cs professores orientadores e coordenadores dos cursos estuda-
i desta reconstrução das lógicas de cada modelo epistemológico, vamos
dos. À denominação desses três grandes grupos ou tendências obede-
i expondo aquilo que podemos chamar de abordagem metodológica, que
ce às especificações. utilizadas nas mesmas investigações e consagra-
fundamenta as técnicas utilizadas, pois acreditamos que as técnicas
das na linguagem especializada para denominar as correntes mais ge-
são formas de operacionalizar essas abordagens, e estas, por sua vez,
tais que articulam, em nível dos fundamentos epistemológicos, carac-
são teorias em ação e se especificarão melhor quando, no nível episte-
terísticas técnicas, metodológicas e teóricas diferenciadas. À manifes-
mológico €e gnostológico, apresentemos as várias maneiras de conceber
tação dessas características e sua articulação lógica com os pressupos-
tos epistemológicos e filosóficos nos quais se fundamentam são coloca-
das no transcurso deste capítulo. ma. 2 Remeto o leitor à outros trabalhos que explicam essa lógica reconstituída: Bengoechea e colabo-
Agrupando os resultados da:análise epistemológica, segundo radores, “La investigácion empírica y razionamento dialéctico” (Revista Mexicana de Ciencias
Políticas y Sociales, 1978, p. 73-95) e Sánchez Gamboa, “Esquema Paradigmático: um instru-
um roteiro denominado “Esquema Paradigmâático” (ver terceiro mento para a análise da produção científica”, terceiro capítulo deste livro.
EVANS

o objeto é o papél do sujeito no processo do conhecimento. Nesse sen-


ciência, na objetividade do mérodo científico e na imparcialidade do

tido, o método é considerado como a maneira de se relacionar o sujeito


pesquisador,
que garante a não-interferência de juízos de valor segun-

e o objeto, ou como o caminho do conhecimento que o sujeito cognos-


do a perspectiva positivista de ciência.
cente realiza ante o objeto que o desafia. Em térmos gerais, considera-
mos que as abordagens metodológicas se identificam com as categori- necessidade de que à investigação revele e denuncie ass ideologias sub-
as em que inicialmente classificamos as investigações; isto é, as abor- jacentes ou ocultas, decifre os pressupostos implícitos em discursos,
dagens empírico-analíticas, fenomenológico-hermenêuticas e crítico- textos, leis, comunicações, ou expresse as contradições, os conflitos, os
Interesses antagónicos ef. uÚúÚúÚÂÚÂÚÂNÂNÃNÃÀNÃ
dialéticas. Os métodos são tomados como pontos de partida para recu- SN
perar a lógica que articula os outros níveis teóricos, epistemológicos e
'Com relação ao nível epistemológica e especificamente com rela-
ção às noções de causalidade que são trabalhadas nas diferentes abor-
os pressupostos | filosóficos. Isto é, a partir do nível metodológico é mais
fácil recuperar progressivamente os outros níveis e, a partir destes, os dagens constatamos que o primeiro grupo confere prioridade à relação
pressupostos filosóficos. causal nas suas formas mais clássicas, pois as causas são consideradas
DD
Com relação ao bável teórico) podermos constatar que e. primeiro: Os eixos centrais da explicação científica. À causalidade pode ser con-
grupo, as abordagens “empírico-analíticas, privilegia autores clássicos cebida como uruma relação causa-efeito, estímulo-resposta, variável 1n-
do positivismo e da ciência analítica; seu fundamento teórico aparece em dependente, variável dependente (pesquisas experimentais ou empiri-

forma de revisões bibliográficas sobre o tema objeto de estudo, privilegia cistas); ou considerada como concomitância, correlação de variáveis
ntos (pesquisas positivistas); entendida como
a definição de constructos, variáveis, lista de termos utilizados para garan-
causas organizadas em sistemas de entrada, de processo, de controle e
tr um úmico sentido. e limitar a interpretaçã ao 2o0s parâmetros objetivos
da linguagem formal utilizada. Às pesquisas do segundo e do terceiro de saída (pesquisas sistêmicas); ou como causa final, o “para quê”, o

grupo apresentam maior ênfase nas referências teóricas, seja pela ne- telos, o propósito, a finalidáde, ou a função de um determinado fato,
cessidade de definir de forma ampla o universo da interpretação e a sujeito ou personagem (pesquisas funcionalistas).
As outras abordagens também trabalham com o conceito de
abertura para a polissemia (pesquisas fenomenológico-hermenêuticas),
seja pela necessidade de assegurar mais informações para as análises causalidade, porém “entendida como relação entre fenômeno e essên-
cia, entre o todo 8 as partes, entre variantes E invariantes, entre texto e
* contextualizadas a partir de um prévio referencial teórico, fundado no
materialismo histórico (pesquisas crítico-dialéticas). contexto (fenomenológicos); ou como uma inter-relação entre os fenô-
Dentro do mesmo nível teórico encontramos as pesquisas que menos (princípio da interdependência universal), inter-relação do todo
se diferenciam pelo tipo de crítica desenvolvida. O primeiro grupo com as partes e vice-versa, a relação lógica entre a tese,a antítese e a
exclui, em sua maioria, qualquer tipo de crítica, debate ou polêmica. síntese etc. (dial ticos).
Essa exclusão se ampara na pretendida neutralidade axiológica da A éoncepção de ciência no primeiro grupo está relacionada com a
concepção de causalidade. Conhecer os fenômenos por suas causas,
Re
88 89

explicá-las pelos antecedentes on condicionantes é um dos objetivos da feriomencologia não confia na percepção imediata do objeto, pois esta só
ciência.
12nC) À Sracionalidade científica exige: um processo hipotético-dedu-
Ipotenco decu- nos proporciona as aparências. No entanto, a partir delas é possível, atra-
tivo que se fundamenta em dados de origem empírica, na formulação vés da interpretação, descobrir a essência dos fenômenos.
de hipóteses, na comprovação ou “falsação” das mesmas, geralmente As abordagens dialéticas, à semelhança
das analíticas, não re-
: por meio de demonstração matemática e em conclusões ou decluções nunciam a origem empírica e objetiva do conhecimento, nem a distin-
: lógicas, a partir dos dados e das comprovações anteriores. Estas abor- ção entre fenômenoe essência como o faz a fenomenologia. Nesse sen-
dagens seguem os procedimentos aplicados fundamentalmente nas tido, realiza uma síntese entre os elementos de outras abordagens. O
ciências naturais e tratam o objeto como um todo previamente delimi- processo do : cimento parte do real objetivo percebido através de
tado, isolado e dissecado. Esse todo é dividido em partes ou variáveis, categorias abstratas para chegar à construção do concreto no pensa-
todas elas se referem ao mesmo objeto e como tal podem ser relaciona- mento. À própria ciência é uma construção histórica, e a investigação
das entre si.
científica é um processo contínuo incluído no movimento
das forma-
ções sociais, uma forma desenvolvida da relação ativa entre o homem e
Às variáveis, a um nível de maior organização metodológica, são rela-
cionadas entre si, obedecendo a delineamentos (designs) previamen- a natureza, na qual o homem como sujeito constrói a teoria e a prática,
te selecionados. Nesses casos, o uso de hipóteses que estabelecem as O pensar e o atuar, num processo cognitivo-transformador da nature-
relações entre as variáveis tem um papel fundamental na organização
da investigação. À partir dessas hipóteses — que em sua formulação za. Resumindo:
seguem as regras da lógica dedutiva (processo hupotético-dedutivo),
a pesquisa concluzirá à confirmação ou não (validação ou “falsação”) Enquanto a concepção analítica tem a causalidade como eixo da expli-
dessas hipóteses. Essa confirmação é conclusiva e como tal não pode cação científica e a fenomenologia-hermenêutica tem a inferpretação
ir mais além dos dados recolhidos é controlados, nem dos “construc- como fundamento da compreensão dos fenômenos, a dialética consi-
tos" previstos nas premissas (neutralidade axtológica), sob pena de dera a ação corno a categoria epistemológica fundamental. (Sánchez
cair em apreciações subjetivas ou especulações que a invalidaria. (Sán- Garmboa, 1989, p. 102).
chez Gamboa, 1989, p. 99).
e o, .
EM - PERA —= -
Ostpressmpostos grosiológicasse referem às concepções de objeto.
Para a fenomenologia a ciência consiste na compreensão dos
e de sujeito € a sua rela ocesso do conhecimento. Diferentes
fenômenos em suas várias manifestações, na elucidação dos pressu-
concepções de objeto e de sujeito geram diferentes caminhos dessa
postos, dos mecanismos ocultos, das implicações, dos contextos nos
relação. As abordagens aqui apresentadas se diferenciam fundamen-
quais se fundamentam os fenômenos. À compreensão supõe a inter-
talmente nessas concepções. À ciência empirico-analítica centraliza o
pretação, quer dizer, revelar o sentido ou .os sentidos, os significados
processo no objeto, a fenomenologia no sujeito, a dialética no processo,
que não se dão imediatamente, razão pela qual necessitamos da herme-
Uma pretende a “objetividade”, a outra a “subjetividade” e a terceira :
nêutica, da indagação, do esclarecimento das fases ocultas que se escon-
a “concretude”. Os “Pressupostos Gnosiológicos” que se referem às
dem atrás dos fenômenos. Ao contrário da ciência empírico-analítica, a concepções de objeto e sujeito e a sua relação no processo cognitivo se
Ser
a
90

diferenciam segundo as abordagens. Às empírico-analíticas privilegiam objeto, ciência etc. Nesse sentido a visão de mundo pode ser entendida
a “objetividade”, quer dizer, o processo cognitivo centralizado no obje- como uma percepção organizada da realidade que omenta a produção

to. Às abordagens fenomenológicás centralizam O processo no sujeito, da investigação e organiza os diversos elementos implícitos que cons-

neste sentido, privilegiam a subjetividade. A “concretude”; privilegia- troem a prática cotidiana do pesquisador.

da pelas abordagens dialéticas se constrói na síntese dos anteriores. o À semelhança da concepção de história, duas grandes tendên-

concreto se constrói através de um processo que se origina na percep- cias aparecem nas investigações analisadas: aquela que privilegia uma

ção empírico-objetiva, passa pelo abstrato de características subjet- visão“fxista” funcional, pré-definida e pré-determinada da realidade, e - “

vas, até construir uma síntese convalidada no próprio processo do co- outra que expressa uma visão dinâmica e conflitiva da realidade.

nhecimento. As investigações com preocupação sincrônica concebem os fe-


A partir desses pressupostos, foi possível identificar nas tnaves- nômenos inseridos num contexto, num cenário, dentro de um sistema

tigações estudadas algumas concepções mais amplas que designamos ou macrossistema, expondo a visão estática de modelos funcionalistas,

como “pressupostos ontológicos” entre os quais está à concepção de estruturalistas ou positivistas que privilegiam a concepção ontológica

homem, de história e de realidade. e do mundo, fundada


no princípio de identidade e na tese do universo
Nas abordagens empírico-analíticas, a noção de: homem)está ordenado e sujeito a leis permanentes. |

relacionada com concepções tecnicistas e funcionalistas; nas fénome- Às pesquisas diacrônicas se articulam com a visão dinâmica da

nológicas com a visão existencialista de homem e nas dialéticas o ho- realidade e as noções ontológicas de “mundo inacabado” e “universo em
mem é concebido como ser social e histórico determinado por contex- construção” e entendem a importância de perceber os fenômenos edu-

tos econômicos, políticos e culturais e ao mesmo tempo como um ser cativos em seu devir e em seu processo histórico, utilizando categorias
transformador desses contextos. fundadas na lógica dialética e no movimento e conflito de contrários.
AÍ história como categoria gnosiológica inerente aos pressupos- Apesar de essas diferentes visões se apresentarem muitas ve-
tos mais gerais e atributo da concepção ontológica de realidade também zes de forma implícita, constroem-se através da incidência de deter-

se apresenta em forma diferenciada segundo as abordagens. Nas inves- minadas condições históricas, que expressam motivações e interesses
tigações analisadas, destacam-se duas grandes concepções: por um lado, pessoais, maneiras de organizar e confeccionar projetos acadêmicos.

aquela que utiliza uma visão sincrônica presente nas investigações em- Essa, diversidade de enfoques é também o resultado de decisões admi-

pírico-analíticas e nas fenomenológicas com orientação mais estrutura- nistrativas e políticas que influenciam os cursos ou centros de pós-

lista; por outro lado, outras investigações expressam uma visão diacrôni- graduação nnos s quais é produzida a investigação. Nesse sentido, é Per

ca, principalmente naquelas que utilizam abordagens. dialéticas.


Como categoria mais ampla, a visão de mundo ou cosmovisão é iidicarmos alguns dados que ajudam a compreender as condições his-

um pressuposto fundamental que elucidaa tógica das várias aborda- tóricas da produção.

gens e se relaciona com as visões de história, de homem, de suieito,


3
E

Recuperação histórica No segunão período, e devido a um processo de democratiza-


ção da sociedade e de maior liberdade acadêmica, surge a possibilida-
Ituras de pensamento. de de utilizar referenciais Ffenomenológicos para compreender a pro-
definidas e coerentes, nem see apresentam como permanentes. .Essas op- blemática da , educação.
ções têm uma trajetória ao longo das etapas das investigações. Dividindo o No terceiro período, a Literatura: anteriormente censurada —

período estudado (1971-1984) em três grandes etapas, podemos iden- comoas obras “Elássicas
€ do marxismo — cormeça a ser lida, e as referên-
tificar as tendências em uma trajetória e podermos resumir assim: as cias do materialismo histórico dialético podem ser utilizadas na análise
abordagens empirico-analíticas predominantes naa primeira etapa da prática educacional das relações entre educação e sociedade e dos
0971 1976) foram diminuindo progressivamente na segunda etapa conflitos da escola capitalista.
177- 1980), até chegarem a Índices menores na terceira etapa MO98 r Esta mudança de referências teóricas leva à busca de novos méto-

tam como alternativa na primeira 1 etapa diminuem igualmente nna se- formado o pesquisador que se dedica à educação. Algumas dessas mudan-
Bunda € terceira etapas. Às investigações erítico- dialéticas, que re- ças se expressam em reformulações dos currículos dos cursos de pós-gra-
, si ; se
presêntam somente 2% na primeira etapa, Vão progressivamente duação. Novas disciplinas são incluídas, tais como “Fundamentos flosófi- ;
aumentandoaté chegarero a 12% no último período, cos e episternológicos da pesquisa”, para superar a visão reducionista dos! Rs.
O desenvolvimento da pesquisa empírico-analítica foi assegu- métodos e técnicas. Nestas novas disciplinas se discutern as diferentes ºFE se E
rado através de professores e orientadores formados dentro dessa tra- tendências de pesquisa. Surge uma nova bibliografia, superando os manu- | +
dição e fundamentalmente por intermédio da disciplina “técnicas e ais tradicionais e estudando os novos modelos metodológicos, como a pes-
métodos «da investigação”, que, utilizando manuais importados, davam quisa qualitativa, a pesquisa ação e a pesquisa participante.
ênfase ààs técnicas quantitativas fundamentadas nas concepções analí- Especificamente a preocupação com os fundamentos episte-
ticas: de ciência e nas regras do método positivista. mológicos da investigação motiva vários estudos e publicações com esta
Essa situação se deve às condições históricas de dependência temática”?
científica e tecnológica indicadas na primeira parte deste trabalho, que Nessa fase de desenvolvimento dos programas de pós-gradua-
influenciam o modelo de pós-graduação que predomina na universida- ção, os modelos de pesquisa e as linhas de pensamento nos quais se
de brasileira. Essa dependência foi maior naí (primeira etapa. PFosteri-
ormente, devido à presença de professores formados” especialmentetema
Europa, surgem alguns modelos alternativos que, criticando o para- '! Algumas publicações apresentam a problemática epistemológica da investigação na educação e
nas ciências humanas. Essas publicações estão substituindo os tradicionais manuais de técnicas e
digma reducionista das abordagens crítico-analíticas, propõem novas,
métodos nos cursos que preparam os novos pesquisadores. Corno exemplos dessas publicações
maneirasde se investigar na educação. existem: “Metodologia Científica em Ciências Sociais" de Demo (1981) e “Metodologia da
Pesquisa Educacional” de Fazenda e colaboradores (1989).
Eb

fundamentam parecem mais bem definidos e permitem um debate mais * À presença de várias opções epistemológicas na: produção ci-
profundo no interior dos cursos de pós-graduação e dos centros de in- entífica em educação enriquece a dinâmica da produção, permite uma
vestigação. Nesse contexto, o modelo vinculado à solução conservadora melhor definição metodológica e uma maior profundidade na reflexão
da reforma universitária, impostana década dos anos 60, foi sendo supe- sobre a problemática educativa. Na conjuntura dos programas de pós-
rado, ao mesmo tempo em que surgem novas propostas que pretendem graduação nos anos 80, essas opções são tratadas como modismos teó-
desenvolver modelos mais apropriados à realidade brasileira. rico-metodológicos, devido à pouca clareza que os investigadores pa-
reciam ter sobre seus pressupostos epistemológicos e filosóficos. Nes-
se contexto ganhava importância para a formação dos educadores de-
Conclusões”
dicados à investigação o estudo aprofundado da epistemologia da pes-
quisa, visando a mais esclarecimentos sobre as visões de mundo e os
interesses cognitivos que comandavam as práticas da pesquisa em edu-
cada dia maior de pesquisas que
q têm como fundamentos teórico-filo-
cação (Habermas, 1982).
sóficos a fenomenologia e o materialismo histórico, As pesquisas feno-
A problemática anteriormente exposta se deve, entre outras
menológicas e dialéticas tidas como alternativas, apesar de serem rela-
coisas, à falta de uma formação filosófica mais sólida, especialmente
tivamente novas no contexto da produção em pesquisa educacional,
em nível universitário e secundário. Essa carência se torna ainda mai-
vêm contribuindo para a formação de uma “massa crítica” que quest-
or com a ausência da filosofia no currículo da formação do pesquisador
ona os reducionismos “metodológicos e técnicos, e para a recuperação
em nível de pós-graduação. À necessidade de dar maior atenção à for-!
dos contextos sociais, as condições históricas dos fenômenos educati-
mação filosófica do pesquisador se justifica na medida em que os fura!)
vos e os fundamentos epistemológicos da produção de conhecimentos
ros pesquisadores precisam adquirir fundamentos para assimilar con-
sobre a educação.
teúdos relacionados com a teoria do conhecimento, os processos cien-
O interesse crescente que os educadores têm por conhecer a
tíficos e os fundamentos epistemológicos da pesquisa.
À inclusão da : é
prática pedagógica, as relações da escola com o todo social, as contra-
Blosofia na formação do pesquisador deve propiciar também a discus-
dições sociais que se manifestam na luta pela escola democrática etc.
são ampla e aberta sabre as diferentes correntes de pensamento pre-
vêm criando a necessidade de novas abordagens que permitam esse
sentes na epistemologia moderna. À falta da formação flosófica reduz
conhecimento. Nesse sentido, as abordagens dialéticas se afirmam como
mo
a problemática da pesquisa científica a uma simples questão de opções
métodos alternativos, não obstante seu pouco crescimento no contexto
técnicas relacionadas à seleção de alguns encaminhamentos, fórmulas
dos países da América Latina. Essa limitação, devido às condições
ou receitas, apresentadas nos tradicionais manuais de pesquisa. Esses
políticas de repressão e de censura, exige para sua superação o estudo —
“reducionismos” poderão ser superados intensificando a formação filo-
cuidadoso dos referenciais do materialismo dialético e histórico e de
sófica dos educadores e principalmente sua formação epistemológica,
sua recente evolução.
Tr
ES

À PESQUISA COMO ESTRATÉGIA DE INOVAÇÃO


EDUCATIVA: AS ABORDAGENS PRÁTICAS

Introdução

Por que os resultados das pesquisas educativas se tornam difí-


ceis de aplicar? Por que os caminhos entre estes e sua aplicação aos
processos educativos encontram tantos obstáculos? Quais seriam as
possíveis relações entre os resultados da pesquisa e os problemas por
ela analisados?
Considerando a ausência de um estatuto epistemológico das
ciências da educação, torna-se impossível a presença da pesquisa bási-
ca nesta área. Restaria apenas a pesquisa aplicada? Muitas pesquisas
acadêmicas do tipo tese de grau ou de pós-graduação cumprem exclu-
sivamente com o requisito para obter a titulação e, por conseqiiência,
não revelam nenhum interesse em aplicar os resultados à problemática
estudada, Outras pesquisas buscam interpretar a realidade educativa
de diversas maneiras; no entanto, pouco ou nada contribuem para trans-
formá-la.
98 93

erguntamo-nos, então, sobre as condições da pesquisa educa- Um terceiro momento de nossa discussão se situa no campo
tiva que dificultam a aplicação dos seus resultados na prática pedagó- aberto da polêmica sobre o estatuto científico das ciências da educa-
gica. Igualmente perguntamos sobre a possibilidade de um tipo de ção. Pensamos que na elaboração da teoria pedagógica sobre as práti-
pesquisa que supere as distâncias entre o diagnóstico dos problemas e cas educativas a pesquisa se coloca em um lugar privilegiado como
as práticas inovadoras em educação. dinamizadora destas tensões e como ingrediente crítico das transfor-
As pesquisas devem obter resultados que propiciem a inovação mações, tanto de uma como de outra. À teoria pedagógica deve mudar
ou a transformação educativa? Se considerarmos a hipótese afirmati- com a prática, e a prática poderá se transformar com a reflexão. Nos
va, qual é a pesquisa que gera inovações ou que contribui com a mu- dois processos, fazem-se necessárias a problematização, a sistemarti-
dança, a renovação ou a transformação dos processos educativos? zação de questões pertinentes e a elaboração de perguntas-síntese. À
Pretendemos neste capítulo aporitar alguns indicadores desta dinâmica se desenvolve à medida que elaboramos respostas para estas
problemática, como também qualificar, de maneira mais acentuada, as perguntas, Sem pesquisa não realizamos o movimento crítico da trans-
perguntas que orientam a discussão sobre as relações entre pesquisa e formação da prática e da teoria.
inovação educativa. Finalmente e à maneira de síntese, sugerimos algumas pistas
Iniciamos essa discussão considerando as dificuldades mais para sistematizar esta discussão e colocamos algumas interrogações
comuns encontradas nos projetos de pesquisa". Em segundo lugar, que poderão gerar outras pesquisas sobre a pesquisa educativa.
nossa discussão transita pelas abordagens teórico-metodológicas, par-
tindo da premissa da dificuldade de relacionar os resultaclos da pes-
quisa com a prática educativa. Essa dificuldade se deve, entre outros Os projetos de pesquisa

fatores, aos pressupostos epistemológicos de algumas abordagens que


As primeiras dificuldades relacionadas à aplicação dos resulta-
inibem ou bloqueiam tal relação. Considerando a possibilidade da re-
dos da pesquisa às práticas educativas são encontradas nos próprios
lação entre pesquisa e ação educativa, procuramos identificar as con-
projetos de pesquisa, relacionadas, fundamentalmente, com a falta de
dições que permitem articular os resultados da pesquisa e os processos
compreensão do próprio conceito de projeto.
de inovação. Consequentemente, caracterizaremos as abordagens que
Que se entende por projeto de pesquisa? Na conceituação dos
colocam a prática e a ação como eixo central da investigação.
termos, como no próprio processo da sua elaboração, predomina o en-
tendimento cotidiano de um propósito ou plano de atividades. Uma

+ Essas observações sobre os projetos de pesquisa foram elaboradas a partir de análises de planos
porcentagem alta dos projetos de pesquisa apresentados como traba-
de pesquisa apresentados como requisito de ingresso aos programas de pós-graduação em educa- lhos universitários pecam pela falta de explicitação das categorias re-
ção na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); Federal de Santa Maria (UFSM); da
Amazônia (UNAMA); do Contestado (UnC) e Pontifícia Universidade Católica de Campinas feridas aos termos “projetos” e “pesquisa”. Para os educadores e ad-
(Puc-Campinas), onde analisei e assessorei projetos nos programas de pós-graduação e lecionei
nas disciplinas de Fundamentos da Pesquisa Educativa, Epistemologia da Pesquisa em Educação,
ministradores, o termo projeto tem se vulgarizado de tal maneira que
Teoria do Conhecimento e Seminários de Pesquisa, durante os anos de 1990 a 1998,
ee
100 101

pode ser confundido com o plano de curso, disciplina, aula ou plano de biologia, uma nova organização do currículo, novas formas de gestão
atividades extracurriculares, referidas a uma semana cultural ou a ativida- ou participação da comunidade são objetivos que se referem a ações
des desportivas. As atividades quase sempre são “programadas” de forma meodificadoras e não a atividades de pesquisa. São objetivos pedagógi-
espontânea, sem um diagnóstico prévio das condições reais da ação, das co-administrativos e não objetivos de pesquisa.
possibilidades de inovação ou do potencial de otimização dos processos e Essa contaminação conduz à ilusão do poder da pesquisa. À
dos sujeitos participantes. O conceito de diagnóstico é abordado ou supos- pesquisa só se refere a uma parte do processo de conhecer para modi-
to na visão sincrética dos gestores, professores ou administradores. ficar ou transformar. Concretamente, corresponde ao diagnóstico so-
À instrução e as diversas atividades pedagógicas são previstas bre o qual se definem processos de ação. Quando tomamos o projeto
sem um diagnóstico rigoroso dos elementos integrantes da ação, por de pesquisa como um projeto de intervenção, fazemos uma inversão
exemplo, sem um conhecimento mais organizado e sistematizado dos dos processos. Colocamos “a carroça na frente dos bois”. Pensamos
alunos, de suas condições, de suas reais necessidades e potencialida- primeiro nas possíveis recomendações ou desdobramentos da pesquisa
des, de suas prévias habilidades e níveis de conhêcimento, e assim ela- antes de pensar nos objetivos centrais, queremos chegar às conclusões
boramos planos e projetos pedagógicos com a ilusão de sempre produ- antes de realizar a pesquisa. Neste sentido, esclarecemos que os pro-
zir mudanças, transformações, intervenções, modificações de condu- jetos de pesquisa se assemelham aos diagnósticos exaustivos e rigoro-
tas ou de processos cognitivos. Sem esse diagnóstico rigoroso, conso- sos sobre uma problemática e à compreensão cuidadosa de um proble-
mern-se e implementam-se novas teorias pedagógicas, novos métodos, ma. Uma vez alcançado o nível do conhecimento que permite compre-
novas técnicas, novos sistemas de educação, novos planos nacionais, ender e explicar uma realidade concreta, é possível, a seguir, indicar
novos currículos. Contarminados por essas concepções de projeto, limi- algumas alternativas de ação para responder à problemática analisada.
tados à organização formal da intervenção, da modificação, da altera- A indicação de algumas ações, à maneira de sugestões ou recomenda-
ção ou da inovação, são elaborados os projetos de pesquisa. Facilmente ções, não deve ser a preocupação central da pesquisa.
se confunde projeto pedagógico, administrativo ou político com proje- Um excelente diagnóstico do problema oferece, em si mesmo,
to de pesquisa. O projeto, nesses casos, é tomado como um plano de melhores recursos de implementação de ações que superem ou trans-
ação ou de intervenção sobre uma realidade educativa, mas sem um formem sua situação. Muitas vezes, são imprevisíveis os desdobra-
prévio diagnóstico. Este é esquecido ou suposto; no entanto, a nosso mentos e o potencia! heurístico de um bom diagnóstico. À pertinência
entender, o diagnóstico é um fator essencial em qualquer plano de ação. e a eficiência das possíveis ações sobre um campo problemático de-
Níuitos projetos são ineficientes por falta de um bom diagnóstico. pendem de uma rigorosa pesquisa ou de um cuidadoso diagnóstico so-
Alguns títulos de pesquisa e alguns objetivos dos projetos con- bre essa situação. Em outras palavras, uma pesquisa qualitativamente
firmam essa compreensão; por exemplo: propor um novo método de bem elaborada oferece melhores condições e conhecimentos mais
ensino de matemática, uma nova estratégia para o aprendizado da seguros, os quais servirão de base para planos de ação mais eficientes.
102

Uma exceção deste critério de discriminação entre o projeto comum confunde e, na maioria das vezes, denuncia nossa forma de
de pesquisa e o projeto de intervenção (pedagógica, administrativa ou pensar. Pensamos a partir de temas já dados ou de abstrações ou cate-
política) se dá na pesquisa-ação, que articula esses dois projetos, razão gorias comuns, carregadas de generalidades e de sentidos comuns.
pela qual essa pesquisa exige condições específicas para sua realiza- Nesse contexto, vale a pena advertir que não se investigam temas,
ção. Uma delas se refere à conjuntura política para implementar essa investigam-se problemas. Uma vez realizada a pesquisa sobre um deter-
intervenção. Para poder articular diagnóstico é intervenção, é neces- minado campo problemático, um trabalho posterior consiste em locali-
sário que o mesmo grupo tenha, nesse momento, o poder político de zar a pesquisa dentro de um universo de palavras-chave ou ternas,
decidir e atuar: Quando essas condições não estão presentes, por exem- Essa tarefa de classificação é a posteriori e será realizada, considerando
plo, em uma pesquisa de um aluno de pós-graduação que pretende um sistema de organização bibliográfica, e muitas vezes reservada a
elaborar sua tese a partir da análise do currículo de uma escola, onde um bibliotecário. Por outro lado, a pesquisa se refére à busca de res-
possivelmente tem pouca ou nenhuma inserção, seria difícil articular postas para um problema, seja do campo empírico ou teórico, e prima
seu plano de pesquisa com as ações modificadoras desse currículo. Qual por uma perspectiva aberta de possibilidades e respostas. Quando a
é o seu poder político para alterar o currículo dessa escola? Neste caso, pesquisa está demasiadamente controlada dentro de uma determinada
é possível realizar um excelente diagnóstico e a partir do mesmo suge- temática, ou fica presa dentro de um sistema de categorias, seus resul-
rir possíveis ações inovadoras, tados, em vez de clarear os problemas, lançam mais confusão, e as
Outra dificuldade encontrada nos projetos se refere aos objeti- dificuldades se tornam maiores, ocultando e impedindo sua compreen-
vos intrínsecos da pesquisa. Geralmente, quando se fala em projetos são. Essa situação resulta da confusão de problema com tema.
de pesquisa se pergunta sobre os temas que serão estudados. Às res- Confirmamos: pesquisam-se problemas, e não temas.
postas são assim enunciadas: “o tema de minha pesquisa é sobre a Outra dificuldade se refere à elaboração dos próprios projetos.
educação especial”, ou “meu projeto é sobre o ensino de geografia”, Muitos deles contêm afirmações, frases categóricas, declarações de fé
“meu trabalho é sobre a formação do mestre”, “minha tese aborda a e generalizações irrestritas que dão a impressão de ter tudo já explica-
gestão dernocrática da escola pública”. Essas respostas indicam uma do e que o conhecimento sobre um problema já está concluído.
falta de compreensão dos processos da pesquisa; uma vez mais se colo- Em fal caso, se os conteúdos se referem ao campo das afirma-
ca “a carroça diante dos bois”; antes de realizar a pesquisa, esta já ções e a redação não oferece nenhum espaço para a dúvida, a pergun-
havia sido classificada num campo ternático, ou previamente defini- ta, a suspeita ou a lupótese, então, por que realizar uma pesquisa se
mos o tema ou o setor da biblioteca onde o trabalho será localizado ou tudo já tem sido afirmado? Se o conhecimento já está elaborado, então,
classificado. Entendemos que numa tentativa de delimitação ou espe- para que pesquisar? Nesse sentido, recomendamos que na redação dos
cificação do campo de estudo se utiliza de forma inapropriada o con- projetos predominem as formas interrogativas e as expressões que iden-
ceito “tema”, tema da pesquisa. Entendemos que essa linguagem tifiquem a postura questionadora do pesquisador e a característica
105
104

hipotética do projeto. Neste contexto, qualquer afirmação deve estar .: A segunda parte do projeto, relativa ao contexto da resposta,

identificada com alguma fonte, outra investigação ou outro autor. Uma deve indicar as fontes onde encontrar soluções para as questões colo-

vez citadas essas afirmações, convém explicitar a dúvida e o caráter cadas (fontes documentais, vivas, população, sujeitos informantes, even-
relativo das afirmações contidas nessas citações; dessa forma; caberá tos observados etc.), formas e instrumentos de coleta de informações,
à nova pesquisa confirmar tais hipóteses ou conseguir novos resultados dados, índices, indicadores etc. úteis para a elaboração da resposta.
ou elaborar novas respostas para os problemas, casos ou situações con- Deve assinalar formas de organizar e sistematizar essas informações e

cretas abordadas em cada nova pesquisa. Na redação dos projetos é apresentar um quadro de referências, perspectivas teóricas, categori-
prudente evitar qualquer afirmação pessoal. as ou núcleos conceituais à luz do qual vão se interpretar os resultados.
Consideramos que um bom projeto deve conter, fundamental- Tais referências permitem elaborar, de forma ampla e compreensível,
mente, a identificação de um quadro problemático (situação proble- a resposta à pergunta-síntese que orienta a pesquisa, Além dessas partes,
ma), indicadores dessa situação, uma série articulada de questões que e geralmente colocadas entre elas, também é necessário especificar as
"orientam à busca de respostas para esse problema. Essas questões de- justificações e os objetivos da pesquisa. |
ver ser de tal forma articuladas que possam se traduzir em uma per- Complementam o projeto as referências utilizadas e a biblio-

gunta exaustiva. Numa pergunta-síntese, uma & não várias, pois do grafia a ser consultada. Tanto as referências como a bibliografia de-
contrário terfamos não uma, mas várias pesquisas, comprometendo monstram o grau de preparação do projeto e indicam uma aproxima-
assim o rigor da própria investigação”. ção com a problemática a ser estudada, realizada através de uma pri-
Esta primeira parte do projeto (contexto da pergunta) repre- meira revisão bibliográfica sobre outras pesquisas que trabalham a
senta sua parte mais significativa. Istoé, não existe pesquisa sem uma mesma problemática e que podem fornecer estratégias de pesquisa
definição do problema, das questões e da pergunta-síntese. Em função como possíveis categorias de análise. Essa bibliografia pode ser orga-
da pergunta e da sua clareza, obteremos respostas válidas ou pertinen- nizada por núcleos temáticos, tais como: bibliografia sobre o tema es-
tes. Na medida em que a pergunta é consistente e clara, obteremos tudado, bibliografia sobre a relação escola ou comunidade, sobre a for-
respostas consistentes e claras. Às perguntas confusas, insignificantes mação do professor, sobre o papel político do educador etc. A biblio-
e óbvias correspondem a respostas com as mesrmnas características. grafia anexa que será consultada e ampliada durante o desenvolvimen-
to da pesquisa servirá de referência para a elaboração das categorias
ou núcleos teóricos que formam o marco ou horizonte interpretativo
1 Quando temos várias perguntas qualificadas sobre um mesmo problema, dependendo das dos resultados.
condições técnicas, como recursos financeiros, instalações & um grupo de pesquisadores, temos a
Reafirmarnos: pesquisam-se problemas, e não temas. Um pro-
possibilidade de organizar as perguntas-síntese de tal mangira que correspondam 2 subprojetos de
uma pesquisa grupal, institucional ou interinstitucional. Porém, quando apenas temos um pesqui- jeto de pesquisa se refere a um diagnóstico exaustivo e rigoroso de
sador e a pesquisa está limirada a um calendário rígido e a prazos limitados pelas normas de um
programa de pós-graduação, teremos que delimitar o projeto a uma pergunta qualificada e perti- uma problemática. O problema constitui o eixo central do projeto de
nente e delimitar as fontes para garantir a viabilidade do projeto.
106 107

pesquisa. Todo projeto de pesquisa expressa fundamentalmente um" quadro de questões e uma pergunta-síntese. À parte relativa à previsão
problema, questões sobre esse problema e a formulação de uma per- da resposta (contexto da resposta) é menor, e fica reduzida à metodolo-
gunta-síntese, numa segunda parte, o projeto deve prever ou indicar gia (definição de fontes, instrumentos de coleta, organização e sistema-
as possibilidades e estratégias para elaborar as respostas. Em forma tização de informações e dados), a previsão de resultados esperados ou
de síntese, podemos falar que o esquema básico do processo de pesqui- hipótese. Já no relatório a parte relativa à pergunta ficará resumida a
sa se reduz à relação lógica entre pergunta e resposta. uma introdução ou capítulo inicial que apresentará o problema, os obje-
tivos alcançados e a metodologia seguida. A parte relativa à resposta
| PERGUNTA
será mais abrangente no relatório e deverá conter, distribuídas em capí-
O esquema básico de um projeto de pesquisa pode ser simpli- tulos, as formasde obter, organizar, sistematizar os resultados e de trans-
ficado na relação simples de uma pergunta qualificada e pertinente formá-los na resposta. Deverá conter também as discussões sobre os
sobre uma problemática e alguns indicadores sobre a possível resposta resultados e a interpretação da resposta e as conclusões.
a essa pergunta. Considerando as premissas anteriores, o projeto de pesquisa por
Uma vez realizada a pesquisa, os resultados, a interpretação e si mesmo não faz referência às possíveis ações sobre os problemas ou
à síntese dos mesmos que devem compor a resposta, seu significado e fenômenos estudados ou sobre a qualidade dessas ações, não diz se essas
pertinência serão apresentados num informe, relatório ou no corpo in- são ou não inovadoras. No entanto, uma vez realizada a pesquisa e con-
formativo de uma dissertação ou tese. Esses dois documentos (projeto siderado o tipo de abordagem e a qualidade do diagnóstico resultante do
e relatório) estão inter-relacionados; no entanto, as proporções são di- processo, é possível ter desdobramentos que propiciem ações não só ino-
ferentes, como podemos visualizar no esquema a seguir: vadoras, mas que poderão gerar processos transformadores desses fenô-
Relação Pergunta/Resposta (P/Rj Contexto da pergunta Cahtexto da resposta menos, assim como, também, possíveis ações de controle e de manuten-
Frojeco Problema Questões Pergunta Metodologia é ção dos mesmos, ou seja, propondo conservar suas características, ou
resultados
esperados
equilibrar as possíveis disfunções diagnosticadas. Por exemplo, projetos
Relatório (dissertação qu tese) Pergunta Resultados Discussão Resposta que conduzem a resultados descritivos de um fenômeno dado (perfil
do professor, do aluno, caracterização das escolas, identificação de li-
(introdução e ] (capítulos) (capítulos) (conclusões)
metodologia)
nhas de poder) têm pouca ou nenhuma perspectiva de mudança; pro-
jetos que buscam identificar relações entre agentes de ação e estrutu-
No projeto em que a pergunta tem maior proporcionalidade ras de poder têm maior perspectiva de inovação na medida em que
que a resposta (contexto da pergunta) devem ser explicitados o pro- revelam uma dinâmica oculta que sugere alterações ou modificações
blema, a situação problema (espaço, tempo e movimento), indicadores ao interior das relações ou estruturas identificadas no diagnóstico.
é sintornas. Tal problema deve ser traduzido em indagações múltiplas,
Em
108 109

Por outro lado, projetos que levam a resultados que identificarh Começamos pela própria concepção de problema. Uma situa-
conflitos, contradições, forças em tensão e conjunturas de ação suge- - ção ou um fenômeno é ou não problemático segundo um quadro com-
rem ações transformadoras, além de um simples ajuste ou equilíbrio e preensivo, geralmente denominado teoria, ou segundo uma determi-
além das atividades renovadoras. : nada maneira de organizar os elementos que compõem esse quadro ou
Em relação à perspectiva de aplicabilidade dos resultados e às a forma de articular as partes que constituem o fenômeno. Isto é, o
perspectivas de mudança da pesquisa educativa Lapatí (1994) afirma, problema é problema numa determinada ordem de coisas. Um proble-
com base em estudos realizados no México (1977) sobre: o problema ma é problema dentro de uma teoria específica. Uma pedra é proble-
da eficácia da pesquisa educativa, que não basta assinalar a falta de ma dentro do sapato, pode não sê-lo fora dele. Por exemplo, um aluno
vinculação orgânica entre instituições de pesquisa educacional e os ativo e participativo pode gerar problemas de disciplina e converter-se
agentes de decisão política ou a falta de divulgação dos resultados das no aluno-problema no contexto de uma concepção tradicional da educa-
pesquisas, mas; ção, em que a relação pedagógica está centralizada no professor falante
e “verbalista”, que estabelece normas verticais de conduta e exige uma
E provável que uma boa proporção dos estudos de qualidade que se
produzem cheguem ao conhecimento dos agentes de decisão interes- paciente receptividade dos alunos. O mesmo aluno será o “modelo ideal”
sados. Forém os próprios projetos, raras vezes, incluem considers- numa perspectiva escolanovista, em que são priorizadas a atividade, a
ções ou estratégias destinadas à implantação efetiva de seus resuita-
dos. (Lapatí, 1994, p. 35). participação, a palavra dos alunos; neste caso, o aluno-problema estará
identificado com o isolamento, a passividade e o silêncio.
Discutir sobre essas estratégias implícitas nos projetos, sobre Nesse sentido, para ampliar nossa discussão sobre a relação
os diferentes tipos de perspectivas de mudança e sua relação com os entre pesquisa e inovação educativa, é pertinente nos determos sobre
tipos de abordagens da pesquisa nos leva a outro campo da discussão alguns indicadores das relações entre o tipo de abordagem e seu po-
que apresentaremos a seguir. tencial de inovação ou de transformação. Se relacionarmos esta noção
de problema aos projetos de pesquisa, podemos considerar que alguns
problemas são formulados a partir de concepções teóricas nas quais a
Às abordagens da prática e da ação educativa ação ou a prática não são consideradas ou não fazem parte do quadro
de referência do problema estudado. No caso contrário, alguns pro-
Os projetos de pesquisa que consideram como eixo central os
blemas partem da consideração da ação ou da prática como parte es-
problemas ou campos problemáticos sobre os quais se formulam ques-
sencial do quadro de referência que compreende o fenômeno ou pro-
tões organizadas em torno de uma pergunta-síntese contêm especifi-
blema pesquisado. Por exemplo, problemas relacionados ao desconhe-
cações relacionadas com os tipos de abordagens teórico-metodológicas
cimento do tipo de aluno que assiste a uma escola sugerem respostas
sobre os quais se sustentam, Vejamos essas especificações.
que se traduzem numa descrição ou um perfil (sem resto) do aluno.
110 11

Identificam características, porém não tipos de relação; identificam: A primeira das atividades que produz um nível reduzido de
hábitos e costumes, porém nenhum tipo de atividade; poder indicar mudança é a Aomeóstase, que propõe uma atividade restaurativa para
interesses, porém não oferecem indicadores das motivações e das con- conseguir o equilíbrio normal em um sistema educacional já estabele-
dições de ação. Neste caso, esses modelos descritivos e estáticos ofere- cido e é guiada por normas e técnicas de rotina. Às mudanças propos-
cem poucas perspectivas de ação, e muito menos de uma ação qualifi- tas são pequenas e remediáveis, exigem novas informações, além das
cada como inovadora, devido fundamentalmente ao fato de não consi- informações de rotina e, algumas vezes, informações específicas de
derarem esse elemento dentro do quadro de referência, cujo problema diferente índole. A pesquisa consistirá em diagnosticar esses peque-
central era o desconhecimento do perfil do aluno. nos desequilíbrios ou na identificação da parte podre da maçã, ou do
Outros indicadores podem ser tomados de Braybroocoke setor conflitivo para o qual são necessárias informações específicas.
(1963), que utiliza um esquema classificatório para tipilficar as condi- O segundo tipo de atividade busca o mcrementalismo e term como
ções e os graus de mudança implícitos na tomada de decisão, e que propósito a contínua e normal evolução ou o melhoramento do sistema.
adaptamos aqui para tipificar o grau de mudança proposta na pesquisa Esta proposta é apoiada por um julgamento experimentado e numa
educativa, informação estruturada e usada ad doc. O incrementalismo está destina-
O quadro a seguir ajuda a explicar esses diferentes tipos de do a manter o equilíbrio normal e exige informações de rotina com
mudanças, entre os quais podemos situar as propostas inovadoras de baixa amplitude.
acordo com o tema central da discussão abordada neste capítulo. As mudanças do tipo seomovilismo indicam uma atividade ino-
Vejamos na continuação a matriz que ilustra essa tipificação. vadora, procuram a invenção, a prova e a definição de soluções para
problemas significativos. Essa inovação está baseada num conhecimento
Tipos de mudança
Alta 1) Homeósrasis; 4) Metamorfismo; "
relativamente pequeno, assim como um volume e uma extensão res-
Atividade: restaurativa. Atividade: utópica.
tringida de informações; entretanto, a mudança é grande, motivada
Propósito: manutenção
por uma espécie de nova visão, de novos sentidos, por outra maneira de
técnica e Propósito: mudança radícal.
controle de qualidade. Bases: recria do salto qualizaiivo.
Bases: modelos técnicos e controle de organizar informações Já existentes. Inovar exige uma consciência nova,
outras formas de articulação dos sentidos, novas perspectivas, uma
qualidade.
Compreensão ou
amplitude — da espécie de explosão do conhecimento diante de situações críticas, uma
informação
reordenação dos elementos ou das partes constitutivas. À pesquisa se
Baixa — | 2) Incrementalismo:
refere a estudos exploratórios e heurísticos, a uma reestruturação pro-
3) Neomovilismo: —
Atividade: crescimento. Arividade: inovadora.
Propósito: contínuo ruelhoramento. Propósito: invenção e renovação, gressiva e regulada do sisterna analisado.
Bases: pesquisa estruturada. Bases: pesquisa de novos significados.
As mudanças do tipo metamorfose indicam uma atividade utó-
Fequena Grande

Grau de mudança
pica para produzir uma modificação completa no sistema estudado;
La us

fundamenta-se no pleno conhecimento de como são os efeitos deseja- . As relações entre abordagens e tipo de mudanças propostas já
dos também na teoria de salto qualitativo. Exigem informações nume- — foram constatadas em outros, estudos; vejamos essas relações na análise
rosas e de amplitude maior, relacionadas com os entornos e contextos de uma mostra da pródução dos programas de pós-graduação no Brasil:
nos quais se situamos fenômenos ou os sistemas estudados. Trata-se
Relacionando as abordagens com o tipo de atividade e de mudanças
de um conhecimento produzido e que se caracteriza por identificar os propostas, encontramos um elevado índice de correlação entre abor-
conflitos e a dinâmica das mudanças. O caráter crítico desse conheci. dagens empiristas-pósitivistas e propostas de mudança ern nível téc-
“ nico, como atividades restauradoras do equilíbrio do sistema ou fenô- .
mento faz referência a critérios de inter-relação com a totalidade social meno estudado (Aomeóstase); entre abordagens funcionalistas e pro-
e histórica na qual se situa; por exemplo, o sistéma educativo e cultu- postas de atividades em busca de um novo equilíbrio ou um melhora-
mento do sistema estudado (incrementalisimo); entre abordagens es-
ral. À mudança esperada se realiza em função do meio social e cultura! trutural-fenomenológicas e propostas de ações inovadoras (neonsovi-
& por força de seus determinantes. Neste caso, o sistema educativo se lísmo); entre abordagens crítico-dialéticas e propostas de transfor-
mações “utópicas' desejando mudanças fundamentais no fenômeno
transforma na medida em que se transformam também a cultura e a
estudado (metamorfose). (Sánchez Gamboa, 1997, p. 72).
sociedade. Para compreender esse tipo de mudança profunda, é ne-
cessário um volume grande de informações sobre essas inter-rela- Por outro lado, o potencial de mudança depende da extensão e
ções, especificamente sobre a dinâmica social dentro da qual a educa- da quantidade de “massa crítica” que as informações recolhidas ofere-
ção registra a mudança. cem. Ássim, temos abordagens que não oferecem questionamentos,
A partir da matriz anterior, podemos traçar as características nem elaboram informações que resultem num diagnóstico profundo ou
das abordagens que contemplam as ações inovadoras e transformado- que identifiquem um conflito. As abordagens podem diferenciar-se
ras como parte essencial do universo de referência, isto é, que conside- por um determinado interesse crítico que orienta tanto a formulação
ram a educação como uma ação ou uma prática e a pesquisa educativa
dos problemas como a busca de respostas.
como um diagnóstico sistemático, minucioso e compreensivo sobre as
diversas formas dessa ação. Nesse sentido, Stenhouse afirma: “À pes- Foi possível encontrar, por exemplo, desde a total falta de elementos
críticos, ou apenas a crítica, até a falta de recursos financeiros para
quisa é educativa no grau em que pode relacionar-se com a prática da ampliar o atual sistema educativo, presente nas teses consideradas
educação” (1985, p. 42). Assim, a pesquisa, entendida como “Uma erupiristas, passando pela crítica à distância entre meios e fins, encon-
tradas nas abordagens funcionalistas; e passando, também, pela crí-
indagação sistemática e mantida, planejada e autocrítica, submetida à tica à transmissão de sentidos acabados ou unívocos nos textos didá-
crítica pública e às comprovações empíricas onde estas resultem ade- ticos, encontrada nas abordagens consideradas fenomenológico-her-
menêuticas, até as críticas à escola capitalista, à falsa neutralidade da
quadas” (Stenhouse, 1985, p. 41), deverá oferecer respostas que indi- ciência e dos métodos, encontrada nas teses consideradas dialético-
quem estratégias de ação, inovadoras ou transformadoras, de acordo críticas. (Sánchez Gamboa, 1997, p. 72).
com o tipo de mudança proposta, a quantidade e a amplitude das infor-
mações recolhidas, sistematizadas e organizadas e, fundamentalmen- Em razão do anterior, podemos deduzir que a possibilidade que
te, segundo o tipo de abordagem teórico-metodológica utilizada. um estudo tem de oferecer considerações e estratégias de aplicação e
lia 115

definição da qualidade da ação sugerida depende do tipo e grau de mesmas concepções de ternpo e de história, que fazern' parte da com-
interesse crítico que orienta a pesquisa e, por sua vez, do tipo, volume preensão do ambiente onde o fenômeno fem sentido, se tornam parte
e extensão das informações recolhidas e organizadas como resposta do cenário ou “tópicos” de uma descrição ampla e compreensiva. Quan-

PY
pergunta geradora da investigação. Este interesse crítico se refere à do se pretende recuperar o contexto histórico, faz-se referência às cir-
maneira de abordar os fenômenos, seja isolando-os e separando-os de cunstâncias temporais que rodeiam o fenômeno, o qual, como essên-
seus contextos ou inserindo-os neles, nesse caso, recuperando ou não cia, permanece. Variam apenas suas manifestações, suas figuras e seus
informações sobre esses contextos e sobre o grau de inter-relação com ambientes. É na composição dessas variações que o tempo e o contexto
os fenômenos estudados. histórico adquirem sentido. Desta forma, a história se reduz a um tópico
For exemplo, em relação à maneira de abordar os fenômenos, do contexto, uma vez que não se admite a transformação essencial do
as pesquisas orientadas pelos modelos positivistas fazem um recorte fenômeno, isto é, nega-se sua “historicidade” (Sánchez Gamboa, 1996a,
de cada fenômeno, delimitando-o e separando-o do contexto. Às variá- 1996b). À partir desses pressupostos, podermos deduzir que o tipo de
veis relacionadas com os entornos — denominadas variáveis “interveni- mudança proposto pelas abordagens fenomenológicas consiste em uma
entes” — são controladas, mantendo-as invariáveis e permanentes, ou inovação que tem a ver com os novos ambientes, os novos tempos; uma
são ignoradas, isolando os fenômenos de seu ambiente natural, colo- nova visão de fenômeno, uma nova articulação do sentido, uma nova es-
cando-os em câmaras de experimentação, onde o ambiente e os con- truturação dos entornos; novas roupas, novas caras, novas figuras, po-
textos são controlados. Nesse sentido essas abordagens são não-críti- rém, preservando as essências e as estruturas básicas.
cas (Saviani, 1984). Já à dialética considera os fenômenos em permanente transfor-
Diferentemente do modelo anterior, as abordagens crítico-dia- mação, sendo determinados pela sua “historicidade”. Para serem com-
léticas, assim como as fenomenológicas, partilham o princípio da con- preendidos é necessário revelar sua dinâmica e suas fases de transfor-
textualização. Isto é, os fenômenos devem ser estudados considerando mação. Neste sentido, as fases mais desenvolvidas são a chave para
seus entornos, seus ambientes naturais, os contextos onde se desenvol- compreender as menos desenvolvidas e vice-versa. Na evolução do
vem e têm sentido. Nesse sentido, essas abordagens podem ser consi- homem, a anatomia do macaco é a chave para entender a anatornia do
deradas críticas. No entanto, as abordagens dialéticas dão prioridade homem. Segundo o método da economia política, a forma de produção
às categorias de temporalidade (tempo) e historicidade (gênese, evo- escravista é a chave para a compreensão da economia capitalista, e
lução e transformação), diferentemente das abordagens fenomenoló- vice-versa, pois são formas diferentes de um mesmo processo de de-
gicas, que para explicar o fenômeno dão ênfase à categoria espaço (lo- senvolvimento, uma contendo elementos explicativos da outra (Marx,
calização em seu meio ambiente natural e/ou cultural). 1983). Complementando essas relações, para a dialética materialista
Na fenomenologia são decisivas as categorias espaciais topos. À. todo fenômeno deve ser entendido como parte de um processo histórico
situação dos fenômenos em seus contextos é tão importante que as maior. No caso da educação, suas transformações estão relacionadas com
1i6 117

as transformações culturais e sociais. Sua dinâmica depende das mu- capaz de resistir às forças repressivas e desmobilizadoras e favoreça à
danças sociais. Essas mudanças são quantitativas e qualitativas, na preparação de novas ações, buscando fortalecer os movimentos eman-
medida em que se acumulam forças e tensões que produzem transfor- cipadores. Os educadores que pretendem desenvolver essas ações trans-
mações radicais e estruturais (metamorfoses). Para poder compreen- formadoras devem ter recursos teóricos para realizar análises de con-
der essas mudanças, necessitamos de uma massa grande de informa- juntura e orientar com clareza as ações educativas apropriadas para
ções e uma extensão maior delas, pois para compreender as inter-rela- cada fase do desenvolvimento da sociedade. As ações educativas sepa-
ções sociais e as dinâmicas de tempos longos é preciso recuperar dados radas da dinâmica social serão abortadas e se afogarão ante as reações
que permitam ver o movimento histórico, a gênese e a transformação de outros setores da estrutura social. Convertem-se em aventuras ou
dos fenômenos. Como resultado da pesquisa teremos uma “massa crí- em focos de ação revolucionária incapazes de gerar, por si só, algum
tica” de informações que permitirão uma compreensão da dinâmica e tipo de transformação.
das estratégias de ação.
A partir destas formas de considerar os contextos, desdobram-
Por uma compreensão da pedagogia
se conceituações relacionadas com as teorias pedagógicas críticas. O como ciência da ação educativa
fenômeno da educação exige ser considerado em suas relações com o
econômico, o social e o cuitural. À compreensão da educação exige que Se retomarmos a afirmação de Stenhouse, “A pesquisa é edu-
se recuperem informações sobre a dinâmica social na qual se inclui e cativa no grau em que pode relacionar-se com a prática da educação”.
tem sentido; em outras palavras, é necessário compreender 2 dinâmica (1985, p. 42), temos uma pista para trazer nossa discussão sobre a
da sociedade onde os processos educativos se realizam e adquirem sen- pesquisa ao campo das ciências da educação. Supõe-se aqui o caráter
tidos. Às visões não-críticas dispensam ou ignoram a relação da edu- prático da educação, porém nem todas as abordagens a consideram a
cação com a sociedade e buscam sua explicação no interior do próprio partir desse atributo essencial.
fenômeno escolar. Nas abordagens críticas, dada a primazia das rela-
Eu considero a pesquisa em educação a pesquisa realizada dentro do
ções entre educação e sociedade, as ações possíveis no campo educati- .
projeto educativo e enriquecedor da empresa educativa. Existe, desde
vo se realizam em função da sociedade com a qual estabelece intera- logo, na história, a filosofia, a psicologia e a sociologia, uma pesquisa
ções. Essas interações serão tanto mais transformadoras quanto maior sobre a educação, efetuada desde o ponto de vista das disciplinas que,
acaso incidentalmente, realiza uma contribuição à empresa educativa.
o grau de articulação com outras formas da organização social (movi- Caberia dizer que esta é pesquisa educativa só no sentido que Durl-heim
mentos da sociedade civil, organizações de classe, partidos políticos, falou de uma pesquisa suicida. (Stenhouse, 1985, p. 42).

sindicatos etc.). A articulação desses movimentos pode constituir uma


As ciências da educação por falta de um estatuto epistemológi-
conjuntura favorável para a transformação dos sistemas educativos, à
medida que a correlação de forças permita acumular uma massa crítica
co próprio sofrem diversas crises, dentro das quais identificamos as
relacionadas com sua condição de ciências aplicadas. Condição que
es
118 2)

segundo Stenhouse as têm levado ao suicídio. O fenômeno educativo ou ações. Neste circuito, a educação é considerada como ponto de par-
tem constituído objeto de estudo de várias ciências: da biologia, psico- tida e ponto de chegada. Reatiza-se, assim, um processo de compreen-
logia, sociologia, filosofia, história, economia, lingilística etc. Dessa for- são da educação que retorna para a educação, isto é, se pretende uma
Ima, os conhecimentos sobre os fenômenos educativos resultam da apli- compreensão de e para a educação (Schimied-Kowarzilk, 1983). Esse
cação de teorias ou categorias elaboradas antes nessas disciplinas espe- retorno ao ponto de partida será mais rico e compreerisivo. Tal concep-
cíficas e aplicadas, posteriormente,. à educação. Produz-se, assim, um ção toma como base a estreita relação dialética entre a “teoria e a prá-
processo circular de elaboração do conhecimento, que torna camo ponto tica”. Segundo a filosofia da práxis, só entendemos a teoria como “teo-
de partida a teoria de uma ciência (básica), passa por um campo de ria de uma prática” e vice-versa, a prática sempre é “prática de uma
aplicação — neste caso, a educação é tomada como ponto de passagem ou teoria”. A teoria é entendida como a compreensão da prática. É elabo-
como pretexto — e retorna à teoria, confirmando a hipótese ou verifican- rada a partir da prática, e, uma vez analisada e compreendida, deve
do sua “aplicabilidade”. À esse processo podemos denominar “colonia- voltar sobre esta em forma de estratégias de ação. Desta maneira, cum-
lismo epistemológico”, pois o campo da educação é invadido por várias pre-se um circuito em que o conhecimento parte da prática e volta
ciências básicas que aplicam nele suas teorias e seus métodos. Essas sobre ela mesma, estabelecendo, dessa forma, um critério de verdade
ciências se transformam, então, em ciências aplicadas à educação. que exige uma tensão dialética entre esses dois pólos contrários. Uma
A partir desse diagnóstico, podemos redefinir a educação como teoria é válida à medida que transforma a prática, e a prática também
um campo de pesquisa com características próprias é como ponto de é verdadeira à medida que transforma a teoria. Dessa relação dialética
partida dos processos do conhecimento para, dessa forma, superar a surge o princípio da validade do conhecimento como fonte de transfor-
concepção de campo colonizado, de ponto de passagem ou de pretexto mação da realidade: “conhecer para transformar”."é
para aplicar ou provar hipóteses das ciências-mãe. De acordo com os exemplos anteriores, o novo campo episte-
Tal hipótese sugere a redefinição dos pontos de partida e de mológico das ciências da educação deve ser construído tomando como
chegada do conhecimento, alterando o circuito do entendimento, o qual ponto de partida ou como objeto as práticas educativas. Para sua com-
deve iniciar-se no campo da educação. Por exemplo, no caso da hustó- preensão recebe a contribuição das teorias originárias de diversas tra-
ria, deve partir dos atos, eventos e ações, das práticas educativas. Para dições científicas, como a filosofia, a sociologia, 2 psicologia, a pedago-
elaborar a compreensão e explicação dos mesmos, podemos recorrer gia, a história e todas as ciências que oferecem seus recursos e concur-
às contribuições teóricas e metodológicas oferecidas pela história e pelas sos para a compreensão da educação. Tais contribuições se articulam
demais ciências (caráter multidisciplinar da proposta). No entanto, o sobre o eixo da prática.
procêsso não termina na interpretação e na compreensão das ações ou
práticas à luz das diversas teorias e metodologias. Esse processo retor-
naria ao ponto de partida, isto é, ao campo da educação, racionalizando 's Nesse sentido, a rese número onze de Marx (1983) sobre Feuerbach é significativa: “As Blosofias
têm interpretado a realidade de diferentes maneiras, o que importa é transformá-la."
mudanças nas práticas educativas ou potencializando novos atos, eventos
120 121

O caráter multidisciplinar do novo campo epistemológico con-' , “colonizam” o campo educativo através de processos de ajuste e aco-
sidera, igualmente, a diversidade e a variabilidade concretas de cada modação sem maiores perspectivas inovadoras. Uma alternativa para
comunidade, sociedade, região ou país, que são, na maioria dos casos, superar o “colontalismo epistemológico” e essa condição de “ciências
plurinacionais e multilingitistas, submetidas à permanentes mudanças aplicadas” consiste na redefinição das ciências da educação como ciên-
e a profundas transformações. cias da ação e a pedagogia como uma teoria da prática educativa. Nesse
sentido, o circuito do conhecimento deve definir como objeto empírico o
ponto de partida, a prática concreta dos educadores nas atuais condições
Algumas pistas a seguir
de seu exercício profissional. À. partir dessas condições deve ser com-
: preendida e explicada, de tal maneira que essa compreensão da prática
Depois de haver percorrido algumas instâncias em que encon-
seja também geradora de novas práticas (compreensão para a prática).
tramos indicadores da relação entre pesquisa e inovação educativa,
Assim, as contribuições da pesquisa educacional estão mais próximas da
seja no campo dos projetos, das abordagens teórico-metodológicas ou
ação na medida em que são entendidas como componentes necessários
no campo polêmico das ciências da educação, indicamos algumas pis-
de uma unidade conceitual: a “práxis humana”, na qual toda teoria cons-
tas que poderão nos conduzir a uma maior compreensão dessa relação.
ttui a racionalização de uma prática e toda prática o desenvolvimento
No casoda pesquisa da educação escolar, afirmamos a partir
concreto de uma teoria (Sánchez Gamboa, 1995).
de Stenhouse que “serão os professores que em definitivo mudarão o
Os projetos de pesquisa partem da problematização dessa prá-
mundo da escola, entendendo-a” (1985, p. 4). Para entendê-la, eles ne-
tica. À transformação do problema em questões exige um processo de
cessitam investigar sua dinâmica e diagnosticar suas possibilidades de
qualificação da pergunta-síntese, a previsão das fontes e formas de
mudança. Fortanto, devem procurar abordagens que considerem a ação
organizar os resultados e a construção das respostas, Se tomarmos como
como categoria básica da compreensão do fenômeno educativo e que
eixo do processo do diagnóstico as práticas educativas concretas, a prá-
permitam elaborar estratégias para 2 aplicabilidade dos resultados da
tica pedagógica, a prática social, a prática política etc., necessitamos
pesquisa. Essa aproximação lógica entre os pontos de partida (as práti-
optar por abordagens que considerem, segundo Morin (1990, 1996),
cas educativas), o desenvolvimento da pesquisa centralizada na compre-
a complexidade dos fenômenos incluídos nessas problemáticas. À. ação,
ensão dessa prática e o ponto de chegada, que é a mesma ação (compre-
igual à prática, não pode ser abordada como um fenômeno sirmples ou
ensão de e para a prática), nos permitirá definir melhor as estratégias de
separada dos outros, pois suas características envolvem numerosos e
intervenção. Assim, a pesquisa se converterá num instrumento efici-
variados elementos inter-relacionados entre si e situados sempre em
ente para a ação inovadora ou transformadora da educação.
contextos também complexos que dinamizam a sua interação. O ensi-
Se nos situarmos no conflitivo campo epistemológico das ciên-
no não pode ser entendido como um fenômeno isolado e separado do
cias da educação, urge buscar saídas para a crise de identidade das
aprendizado, dos sujeitos desses processos, dos professores € alunos,
ciências aplicadas que, originárias de campos teóricos diferentes,
122 123

das disciplinas, do currículo, da escola, da comunidade e da sociedade, : mento e crescimento, todas elas oferecem poucas informações para a
das condições econômicas, sociais e culturais. compreensão dessas situações críticas.
Se considerarmos que todo conhecimento, para ser válido, deve Às atividades inovadoras supõem pesquisas compreensivas que
ser convalidado na prática (teoria da práxis), para compreender a com- considerem os contextos e os horizontes de sentido. As abordagens eco-
plexidade dos problemas educativos, as exigências serão mais rigoro- lógicas, etnográficas e fenomenológicas, por exemplo, oferecem melho-
sas e demandarão abordagens teórico-metodológicas apropriadas. res recursos para elaborar as novas visões, a reestruturação de campo e
Voltando ao ponto de partida de nossa reflexão, 18to é, ao víncu- a construção dos novos sentidos que exigem uma ação inovadora.
lo entre a pesquisa e à inovação educativa, podemos finalizar, desta-
cando algumas idéias centrais: a ação-inovadora significa uma mudan-
ça relativamente profunda, intencional e duradoura, com poucas pos-
sibilidades de ocorrência frequente. À inovação implica uma perspec-
tiva inovadora, uma nova visão sobre a realidade que sê pretende mu-
dar; supõe uma nova maneira de organizar os fatores integrantes dos
processos de ação. De acordo com as perspectivas indicadas anterior-
mente (matriz de Braybroocoke, 1963, e as constatações de Sánchez
Gamboa, 1997), as ações inovadoras supõem investigações e diagnós-
ticos sobre situações críticas, caracterizadas por uma reorganização
do conhecimento já elaborado, sem exigir grande quantidade de infor-
mações novas. Seu caráter inovador está na nova visão e na reestrutu-
ração dos elementos integrantes da realidade analisada. À identifica-
ção dessas situações críticas supõe situá-las num universo maior, loca-
lizá-las num contexto de sentido, recuperando informações sobre elas.
Em razão dessas necessidades, nem todas as abordagens conduzem a
resultados para o conhecimento dessas situações críticas. Por exem-
plo, as abordagens empirico-analíticas que segmentam e recortam os
objetos de estudo, separando-os de seus contextos, assim corno os mo-
delos funcionalistas que diagnosticam desajustes ou disfunções e que
exigem ações de manutenção ou medidas restauradoras do equilíbrio,
ou os modelos “incrementalistas” que exigem atividades de melhora-
À CONSTRUÇÃO DO OBJETO
NA PESQUISA EDUCACIONAL

De acordo com o modelo desenvolvido no terceiro capítulo e


que denominamos de Esquema Faradigmático, os diferentes elemen-
tos que compõem a pesquisa podem ser organizados segundo o nível
de complexidade, considerando das técnicas e instrumentos — sua for-
ma mais explícita e concreta — que permitem manipular e operaciona-
lizar a pesquisa, até as concepções ontológicas que — como formas Im-
plícitas e abstrafas — orientam e servem de fundamento filosófico para
à construção de um novo conhecimento. Os níveis técnicos, metodoló-
gicos e teóricos podem ser articulados dentro de diversas lógicas re-
constituídas ou abordagens epistemológicas. De igual maneira, as di-
versas abordagens se sustentam em diferentes teorias do conhecimen-
to constituídas nos pressupostos gnosiológicos que revelam pressupos-
tos ontológicos relativos à visão de mundo implícita em toda produção
científica. Neste capítulo trataremos da relação entre os pressupostos
egnosiológicos, as abordagens epistemológicas e as teorias da educação
utilizada na pesquisa educacional.
Ses
126 127

.Os pressupostos gnosiológicos epistemológicas. Isto é, se levarmos em conta os três enfoques que
analisamos podemos supor que as abordagens empírico-analíticas pri-
Os pressupostos se referem às maneiras de abstrair, conceitu-
vilegiam a objetividade, ou seja, o processo cognitivo centralizado no
ar, formalizar, classificar e generalizar, ou em termos gerais, às manei-
objeto; as abordagens fenomenológicas centralizam o processo no su-
ras de conceber o objeto e de estabelecer as relações com o sujeito.
jeito, neste sentido, privilegiam a subjetividade, e as abordagens críti-
Em cada enfoque epistemológico se tem uma maneira especial
co-dialéticas privilegiam a relação entre o sujeito e o objeto, a síntese
de conceber os processos lógicos necessários para construir o objeto do
entre o subjetivo e o objetivo”.
conhecimento. Entretanto, em cada enfoque definem-se formas de
b) Com relação ao entendimento do objeto separado do seu en-
delimitar os campos de observação, de tratar informações, de elaborar
torno ou inserido em contextos trabalhamos com a hipótese de diferen-
segiências lógicas e de construir uma interpretação sobre a realidade
tes modelos de investigação que se diferenciam na forma de delimitar,
observada. Isso nos leva a descobrir diferentes maneiras de relacionar
separar, ou relacionar os fenômenos com seus entornos. Na perspecti-
o sujeito com o objeto. Como essa temática aborda um dos problemas
va analítica procura-se separar o objeto de seu contexto e controlar as
mais importantes da história da filosofia, relacionada com a questão do
interferências das variáveis externas (intervenientes). já as aborda-
conhecimento, neste capítulo indicamos apenas alguns supostos rela-
gens compreensivas precisam dos contextos como fatores determinan-
cionados com a pesquisa educativa e que estão sendo ampliados no
tes do próprio fenômeno, sem os quais é impossível o próprio processo
decorrer dos estudos sobre os fundamentos da pesquisa educacional.
da compreensão e da elaboração do conhecimento que supõe a recupe-
A problemática da relação cognitiva entre o sujeito e o objeto,
ração dos sentidos, na medida em que os fenômenos se localizam num
um campo específico da Filosofia, não é estranha à pesquisa educacio-
cenário e num jogo de significados, dados pelo contexto cultural onde
nal; pelo contrário, em toda pesquisa se supõem, dentre outros pressu-
acontece a relação cognitiva (fenomenologia e etnografia). Às formas
postos: a) a primazia do objeto ou do sujeito, ou mesmo a ênfase da
do conhecimento se diferenciam na medida em que os entornos são
relação entre eles; b) a consideração ou não de recortes ou rupturas do
levados em conta nas formas de delimitar o objeto, isolando-os dos
objeto com relação ao seu contexto ou entorno; é c) a compreensão do
seus contextos ou relacionando-os com eles, de tal maneira que estes
objeto do conhecimento como um todo e suas articulações com suas
determinam e caracterizam a existência do próprio objeto. Entretanto,
partes constituintes. Desdobram-se dessas considerações concepções
as concepções que consideram os entornos ou contextos variam. Estes
teóricas sobre os fenômenos educativos, como também diversos méto-
dos de construção do conhecimento sobre os mesmos.
a) Com relação à primazia do sujeito ou do objeto podernos tra-
1 À construção do concreto privilegiada pelas abordagens crítico-dialéticas é elaborada na síntese
balhar com a seguinte hipótese: os pressupostos gnosiológicos que se
das dimensões objetivas e subjetivas. O concreto é construído por meto de um processo que se
referem às concepções de objeto, sujeito e à relação entre eles no origina na percepção empírico-objetiva, passa pela abstração de características subjetivas para,
com base nos precessos anteriores, construir uma síntese no pensamento, o concreto no pensamen-
processo cognitivo diferenciam-se segundo as diferentes abordagens to (Marx, 1983, p. 2138-226).
128 129

podem ser entendidos como variáveis externas ou intervenientes (ana- - e a interpretação do sujeito. O conceito de produção do objeto se torna
lítica), como espaço, cenário, tela de fundo ou lócus da percepção (fe- mais claro, pois em tese não existem objetos, existem realidades empí-
nomenologia) ou como o conjunto de condições materiais concretas ncas que o sujeito percebe. Quando o sujeito percebe uma determina-
determinantes das características da construção do objeto (dialética). da realidade faz uma leitura dela segundo seus interesses, de acordo
c) Com relação à compreensão do objeto do conhecimento como com uma ótica determinada e uma perspectiva de interpretação. O
um todo e suas articulações com as suas partes constituintes, em cada resultado dessa relação não é igual ao fenômeno empírico observado,
tendência epistemológica temos uma diferente forma de ser abordado não É a simples cópia ou imagem lida ou percebida pelo sujeito. O
esse todo e a sua relação com as partes. Neste sentido, as abordagens resultado é uma síntese desta relação, é uma construção que podernos
empírico-anatíticas supõem um todo previamente limitado e isolado de chamar de objeto. Como veremos mais adiante, o mesmo sujeito tam-
seus contextos, por exemplo, um universo ou população com caracte- bém se constrói nesta relação, pois tanto a percepção sensível se modi-
rísticas empíricas definidas, passíveis de serem divididas em partes ou fica durante o processo, como o sujeito curioso e indagador que existia
variáveis. As partes, nesse exeruplo, podem ser constituídas pelos mem- antes da sensação e da percepção é transformado com o processo do
bros ou indivíduos do universo de observação, ou por diversas variá- conhecimento. O sujeito sofre significativas metamorfoses. Parece que
veis relativas a essa totalidade, tais como idade, sexo, escolaridade, a relação cognitiva é um acontecimento entre duas entidades incorn-
origem geográfica, nível socioeconômico etc. pletas ou inacabadas que sofrem transformações no processo do co-
Este todo, sem ser previamente definido ou delimitado, pode nhecimento. Ou seja, tanto o sujeito como os objetos se constroem e se
ser recuperado ou ser o resultado (a pasteríori) de uma elaboração rea- transformam. Nessa perspectiva, tanto o todo como as partes que de-
lizada pelo sweito em um contexto cultural e social específico, a partir limitam o objeto também são relativas. Dependem do tipo de recortes
de manifestações, indicadores, expressões ou sintomas, de um fenô- de análises e compreensões realizadas. Um todo pode ser parte de um
meno determinado. Essas formas ou manifestações externas que es- outro todo maior, mais abrangente. Por exemplo, o fenômeno educati-

conderm a totalidade podem ser entendidas como partes integrantes vo numa determinada pesquisa pode ser limitado à experiência da sala
que se articulam em um mesmo sentido. Ou seja, esse todo escondido de aula. Essa experiência pode ser tomada como um todo constituído,
por trás das formas se recupera à medida que se articulam tais indica- dentre outros fatores, por alunos, professor, currículo, conteúdo, mé-

dores ou partes. todo de ensino, técnicas de aprendizagem, de avaliação etc. Entretan-


Outra forma de entender o todo, no caso da dialética, supõe to, numa perspectiva compreensiva essa mesma expertência da sala de
uma construção que tem como base dados empíricos sobre uma dada aula pode constituir parte de um todo maior, como é o projeto pedagó-
realidade ou um determinado fenômeno; por meio da sensação e da gico da escola, de um determinado sisterna educacional, e um projeto
percepção do sujeito essas informações e dados são lidos e interpreta- de sociedade. Nesse caso, a sociedade é entendida como um todo mai-
dos. O todo resulta do processo de articulação entre os dados objetivos or e mais amplo que integra a educação, a escola e as experiências de
sala de aula como partes do social.
130 13i

AD A z
A dinâmica de transformação do todo em partes e das partes dão suporte à análise ou interpretação dos problemas abordados nessa
em todo se faz possível na medida em que os fenômenos se relacionam pesquisa. Essa correspondência, embora necessária para à manuten-
entre s1, de tal maneira que o mesmo fenômeno pode ser entendido ção da qualidade, não é causal. Isto é, uma teoria pedagógica não de-
como uma totalidade composta de partes, e ao mesmo tempo parte em termina mecanicamente os pressupostos gnosiológicos da pesquisa, nem
relação a um todo mais complexo e amplo e o todo em relação a suas estes induzem uma determinada teoria. Entretanto, se considerarmos
partes constitutivas. as tendências epistemológicas da pesquisa educacional na América
Fssa dinâmica se justifica no princípio de inter-relação univer- Latina nas últimas décadas, de acordo com Tedesco (1986), é possível
sal do materialismo histórico, segundo o qual nenhum fenômeno está identificar três paradigmas: o liberal, o economicista e o enfoque críti-
isolado, pelo contrário, insere-se numa rede de contextos e determi- co-reprodutivista. As diferenças mais significativas entre eles se refe-
nantes progressivamente mais amplos e complexos. Nesse sentido, rem à vinculação da educação com a realidade social. Os paradigmas
nenhum fenômeno pode ser considerado um todo autônomo, isolado ou liberal e economicista procuram explicar a educação como fenômeno
separado de uma totalidade maior que é a própria realidade, que por ser autônomo, como formadora de indivíduos e cidadãos, de capital huma-
histórica não se esgota na percepção presente. À sociedade interpretada no ou recursos humanos. Os enfoques crítico-reprodutivistas repre-
como um todo complexo e com limites progressivamente mais amplos, sentam uma mudança na compreensão dos fenômenos educativos. À
em suas condições atuais, é apenas parte da sua totalidade histórica. educação deixa de ser considerada fenômeno individual que se explica
Suas características atuais são apenas conjunturais, manifestações e for- em si mesmo para ser considerada um fenômeno fundamentalmente
mas que correspondem a um período limitado e que faz parte da sua social. Em conseqiência, o conhecimento do fenômeno educativo exi-
permanente transformação. O presente, como qualquer outro período, ge a sua compreensão inserido no contexto da sociedade.
só tem sentido como parte da listória concreta da sociedade. À socie- De acordo com Saviani (1984), conceber a educação como re-
dade atual é apenas uma etapa da história da humanidade. lativamente autônoma e explicável em si mesma É próprio das teorias
não-críticas, diferentemente das teorias críticas que consideram a re-
lação educação e sociedade como base explicativa das duas entidades.
Pressupostos gnosiolágicos Segundo os enfoques críticos, a educação não pode ser compreendida
e teorias da educação
come fenômeno separado da sociedade; de igual maneira, a formação e
a reprodução da sociedade não se explicam sem considerar os proces-
Um dos indicadores da qualidade da produção da pesquisa em
sos educativos. Em outras palavras, podemos afirmar que enquanto os
educação se refere, dentre outros fatores, à articulação lógica entre as
primeiros consideram essencial a relação da educação com a socieda-
concepções de objeto e sujeito implícitas na pesquisa (nível gnosiológi-
de, para a explicação dos problemas educacionais, os segundos a con-
co) e as teorias da educação que são utilizadas ou desenvolvidas e que
sideram desprezível. Saviani explica assim essas diferenças:
C |
| : 132 133

|
í
Tomando como critério de criticidade a percepção dos condiciona-
educacional. Por exemplo, nas teorias denominadas crítico-reproduti-
mentos objetivos, denominarei as teorias do primeiro grupo de “teo-
nas não-críticas' já que encaram a educação como autônoma e buscam vistas (Saviani, 1984; Tedesco, 1986) a intervenção do entorno e dos
compreendê-la a partir dela mesma, Inversamente, aquelas do se- determinantes socioeconômicos é tão marcante que a educação e a es-
gundo grupo são críticas uma vez que se empenhar em compreen-
dera educação remetendo-a sernpre a seus condicionantes objetivos, cola apenas os reproduzem. À educação se realiza em função da soci-
isto é, aos determinantes sociais, vale dizer, à estrutura sócio-econô- edade que a determina unidirecionalmente.
mica que condiciona a forma de manifestação do fenômeno educativo
(Saviani, 1984, p. 99. Já as teorias crítico-dialéticas atribuem um status específico e
um valor diferenciado à educação na relação com a sociedade, de tal
Dependendo da abordagem, esses contextos são ou não consi- maneira que, dependendo da conjuntura, a educação pode ser um agente
derados. Em tese, as pesquisas de corte analítico, que delimitam sua transformador da sociedade. Ao mesmo tempo em que a sociedade
observação a um universo ou população, por exemplo, uma escola ou determina os processos educativos, também é dinamizada pelas ações
um grupo de escolas, um curso, um grupo de alunos, de professores, educativas “libertadoras” ou “transformadoras”. Tais ações serão tan-
uma rede de ensino ou um sistema educativo, buscam explicar estes to mais transformadoras quanto melhor articuladas estejam com ou-
fenômenos identificando suas partes, suas variáveis e a relação entre tras ações provenientes de outras formas de organizações sociais (mo-
as mesmas. Pará garantir um maior rigor científico e a explicação pre- vimentos da sociedade civil, organizações de classes, partidos políticos
tendida essas observações delimitadas, registradas e dimensionadas, etc.), constituindo desta forma uma conjuntura favorável às transfor-
sobre fatores previamente definidos, são controladas para que não in- mações à medida que as correlações de forças apontem para a mesma
terfiram (variáveis externas) e não alterem os resultados. Essa manei- direção de mudança.
ra de tratar e delimitar os fenômenos se identifica com as teorias não- As abordagens fenomenológicas e estruturalistas, por exemplo,
críticas, pois anula a possibilidacie da compreensão da educação em interpretar os fenômenos à luz de seus entornos e das estruturas ocul-
sua relação com a sociedade, como parte da mesma, evitando identifi- tas. Os textos têm sentido nos contextos. À escola e a educação podem
car seus determinantes socioeconômicos, supostamente externos ao ser compreendidas, não pelas aparências ou pelo currículo expresso ou
fenômeno educativo. aparente; o significado maior se encontra no currículo oculto, nos va-
Às teorias críticas consideram os entornos e os contextos. Po- lores, nas ideologias, nos mecanismos de poder implícitos nas relações
rém, a concepção de contexto difere de uma abordagem para outra, pedagógicas. À educação está fortemente determinada pelos mecanis-
assim como no entendimento do todo e das partes. Se considerarmos mos ocultos, pelas estruturas de poder, sociais e econômicas e pelos
que em toda pesquisa se trabalha com as categorias de contexto-todo- valores dominantes. De acordo com esse marco teórico, existe uma
partes (elementos que ajudam a identificar diversas maneiras de cons- articulação entre o fenômeno é seu entorno. Não existe uma oposição
truir os objetos), podermos indagar de que maneira se articulam essas ou contradição entre a educação e a sociedade, já que existe uma relação
categorias gnosiológicas nas diversas abordagens utilizadas na pesquisa de continuidade e de reprodução. Se o entorno é alterado, o fenômeno
134 135

ganha novos sentidos. Alterando-se o contexto altera-se também o sen- « internas, do conflito entre suas próprias partes, que resultam na con-
tido do texto. Modificando o palco e o cenário, o personagem adquire formação de uma nova sociedade. Neste sentido, a educação tem sua
novas funções e figuras, no entanto sua essência é mantida. O caminho especificidade, que pode ser contrária à estrutura social dominante e ter
contrário parece impossível, por isso a determinação é unilateral, do a possibilidade de ser gestora de mudança e de transformação dessa
entorno para o todo, do todo para as partes. Neste sentido, à educação sociedade e não apenas reprodutora do social, como defendem as teo-
e à escola só resta reproduzir a sociedade, suas estruturas, seus valo- rias crítico-reprodutivistas.
res, suas ideologias. À educação em si mesma é incapaz de gerar mu-
danças na sociedade.
À importância dada ao entorno e aos determinantes ocultos nos Pressupostos gnosiolégicos
enfoques fenomenológicos nos leva a propor a hipótese da identifica- e métodos de pesquisa
ção destes enfoques da pesquisa com as teorias critico-reprodutivistas.
De igual maneira, leva-nos a identificar as teorias crítico-dialéticas
Os pressupostos gnosiológicos se referem às concepções do ob-
com as abordagens fundadas no materialismo histórico. Às teorias crí- jeto e do sujeito e da relação entre eles no processo do conhecimento,
e
tico-dialéticas admitem uma especificidade do fenômeno educativo, como fei visto anteriormente; existem diferentes concepções de objeto

ou seja, não aceitam a identidade da educação com o entorno social, de sujeito e consequentemente diversas maneiras de entender a relação.
nem admitem as reproduções simples do social, podendo ser a educa- Essas diversidades de concepções geram diferentes caminhos ou méto-

ção uma parte diferenciada, e como tal oposta às estruturas e aos inte- dos de conhecimento. Continuando a análise das três abordagens que
resses dominantes da sociedade. Podemos identificar estas teorias com tornamos como exemplo, podemos trabalhar com as seguintes hipóteses:
Tais abordagens têm diferenças fundamentais na construção
as abordagens de pesquisa que denominamos também de dialéticas,
pois, além de admitirem uma inter-relação dinâmica entre os fenôme- do objeto e, como conseqitência, significativos desdobramentos mefo-

nos e os entornos, dependendo do princípio da inter-relação universal, delógicos. Às maiores diferenças não estão nas diferentes técnicas de
também admitem que as partes, dependendo do nível de análise, sejam coleta e tratamento de dados e informações ou na utilização de dife-
consideradas como um todo específico e contraditório em relação a um rentes referenciais teóricos, mais ou menos semelhantes, de acordo

todo maior. À parte não é idêntica ao todo, também não é sua prolon-
com a necessidade de coerência exigida em cada pesquisa e ao rigor da
gação, ela pode ser diferente e paradoxalmente ser a negação, a oposi- lógica interna do paradigma de pesquisa utilizado. Sua maior diferen-
ção e a semente de transformação desse todo maior, apesar de não ça se encontra na concepção do objeto, na maneira como este é enten-

perder sua pertencia para esse todo. À tese anterior se fundamenta nos dido e compreendido pelo sujeito. Essas diferentes concepções de ob-
princípios da contradição e da negação da negação que explicam as trans- jeto trazem como conseqiiência a elaboração de diversos caminhos do
formações históricas da sociedade a partir de suas próprias contradições conhecimento. Nesse caso, consideramos uma relação intrínseca entre
os métodos e os pressupostos gnosiológicos. O método não se explica
156 137

por si mesmo,-pois depende da definição de pontos de partida


e pontos: resposta) indica esse caminho que deve ser percorrido. O entorno ou
de chegada, No caso dos métodos do conhecimento, depende
do sujei- | contextos (variáveis independentes) são abandonados, separados ou
to, de suas intenções .é interesses em relação ao objeto
e da maneira controlados. O caminho é percorrido na direção do todo às partes. Dessa
como o sujeito enxerga o objeto, se está delimitado ou
rigorosamente forma, pretende-se explicar o fenômeno.
separado dos entornos ou imbricado com contextos que determ
inem seu - As abordagens fenomenológico-hermenêuticas desenvolvem o
sentido, ou se é produto de condições materiais históricas determ
inan- processo começando pela parte (o símbolo, o gesto, a expressão, a pa-
tes. Depende do sentido dado aos dados empíricos que coletam
os, já que lavra, a frase, o texto, ou seja, as diversas formas concretas de mani-
podem ser válidos em si mesmos ou podem ser tomados
apenas como festação do fenômeno) e caminham em direção da recuperação pro-
indicadores e indícios de uma essencialidade que se esconde
atrás desses gressiva do todo (por exemplo, a palavra na frase, a frase no parágrafo,
dados; depende também do entendimento do abjeto, se
este é tomado o parágrafo no texto e o texto no contexto). O conhecimento se realiza
como fato empírico e presente já dado ou como fenômeno em
construção quando captamos o significado dos fenômenos e desvelamos seus ver-
e como produto de um processo de transformação perman
ente. dadeiros sentidos, recuperando (de forma também rigorosa) os con-
Os métodos, além de recuperarem ou não esses entorno
s, dife- textos onde cada manifestação se articula com outras expressões, for-
renciam-se na maneira de Inter-relacionar o todo com
as partes e na mando um todo compreensivo. Conhecer é compreender os fenômenos
maneira de organizar o percurso entre essas dimensões.
Se o processo em suas diversas manifestações e nos contextos onde se expressam.
toma como ponto de partida o todo e caminha em
direção à parte, ou Para conseguir isto, o sujeito deve intervir com a interpretação e pro-
faz o caminho contrário, das partes para o todo. Essas
articulações e curar a articulação dos sentidos, das estruturas básicas, das essências
processos nos identificam diversos caminhos, fundamenta
dos em dife- nas diversas manifestações dos fenômenos (gestos, palavras, sinais,
rêntes concepções de objeto e em diversas teorias do
conhecimento. textos, monumentos, fragmentos etc.)"*. Interpretar não significa for-
Vejamos algumas situações opondo as categorias explica
r e com- mular aleatória ou espontaneamente apreciações ou significados com
Dreender, que manifestam duas maneiras diferentes de definir,
delimi- base nas motivações ou caprichos particulares do investigador. Inter-
tar e constituir objetos na investigação. Às abordagens empíri
co-ana- pretar, segundo os princípios da hermenêutica, exige recuperar rigo-
líticas delimitam o objeto de estudo tomando-e como
um todo separado rosamente os contextos onde os fenômenos têm sentido. Interpretar
e 1sclado do contexto. Uma vez delimitado o todo e definid
o como o exige recuperar os cenários, os lugares ou palcos onde as manifestações
Universo empírico de observação, o processo caminha em
direção das dos atores têm sentido; requer também a constituição de um horizonte
partes que o integram (método analítico); identifica as
partes (variá-
veis) e as relaciona entre si, seguindo os princípios da causali
dade. À
nomenclatura utilizada para identificar essa causalidade
como Variá- técnicas abertas
veis independentes (causa e estímulo) e variáveis depend 1 Para conseguir essa manifestação ou revelação, o investigador necessita utilizar
entes (efeito bi que permitam o descobrimen to profundo dos sentidos (técnicas qualitativas, relatos, entrevistas
abertas, observação participante etc.).
138 139

interpretativo que permita articular diversas manifestações num qua-, : determinações que constituem o fenômeno, objeto da investigação.
dro compreensivo. Nesse sentido, investigações etnográficas, por exem- Quando falamos de síntese de múltiplas determinações nos referimos à cons-
plo, exigem a localização dos fenômenos observados em seus ambientes trução do objeto determinado pelos contextos, quer dizer, pelas condi-
culturais, dentro dos quais as expressões ou discursos têm validade. O ções materiais e históricas que permitem sua existência e sua manifes-
caminho do conhecimento implica traçar um percurso das partes ao todo tação como fenômeno. Na reelização deste processo caminhamos do
e deste ao contexto, caminho contrário ao realizado pela analítica que vai empírico concreto (todo sincrético) ao abstrato (categorias diversas de
do todo delimitado e separado do contexto para as partes. análises) e deste ao concreto no pensamento”. Esse concreto no pen-
As abordagens crítico-dialéticas, assim como as fenomenclógi- samento, que se refere ao conhecimento propriamente dito, constitui
cas, compartilham o princípio da recuperação do contexto. Entretan- um todo novo que resulta do processo da inter-relação entre um objeto
to, diferentemente das abordagens fenomenclógicas que para compre- em construção e um sujeito também em construção. Neste caso, cami-
ender o fenômeno dão ênfase à categoria espaço (situando em seu meio nhamos do todo às partes e destas ao todo situado e determinado pelos
ambiente natural e/ou cultural o cenário, o lugar, o contexto geográfi- contextos. Este caminho é diferente do analítico, que despreza o con-
co), a dialética coloca a ênfase nas categorias da temporalidade (tem- texto e caminha do todo para as partes, e do fenomenológico, que ca-
po) e na historicidade (origem, evolução, transformação) para explicar minha das partes ao todo e deste todo aos contextos. À dialética inclui
e compreender o fenômeno. Nesse sentido, a preocupação com o tem- a dinâmica do caminho de volta, do todo às partes e das partes ao todo.
po significa que para a compreensão de um fenômeno é preciso articu- Dá-se 20 contexto uma ênfase fundamental, pois os fenômenos depen-
lar as diferentes fases de sua evolução, de tal maneira que as mais dem dos contextos da produção, que determinam sua existência, e dos
desenvolvidas são a chave da explicação das menos desenvolvidas contextos da interpretação, que determinam seu conhecimento. O eixo
e
vice-versa. Segundo o método da economia política, a anatomia condutor do método de investigação consiste na recuperação dos pro-
do
macaco É a chave da anatomia do homem e a economia escravista cessos de construção dos fenômenos, e nesse processo as técnicas his-
é a
chave da economia capitalista e vice-versa, numa relação histórica toriográficas ganham importância, já que permitem recuperar não ape-
en-
tre o presente (supostamente a fase mais desenvolvida) e o passado nas os contextos geográficos e espaciais, mas, fundamentalmente, os
(fase menos desenvolvida). processos de transformação dos fenômenos, sua origem e suas fases de
O conhecimento se constrói com base no empírico presente. À evolução. A historiografia se torna indispensável para recuperar a his-
partir da percepção dele, num primeiro momento, elaboramos uma toricidade e o devir histórico dos fenômenos.
imagem sincrética do todo, quer dizer, partimos de um todo sincrético
caminhamos buscando suas partes constitutivas por meio de análises e
a partir delas recuperamos o todo por meio da síntese que expressa
num
segundo momento uma dimensão mais rica e complexa das múltiplas 1? Mais explicações sobre essas categorias podem ser encontradas em Kopnia
(1978), Kosik
(1975) e Sánchez Gamboa (1987, 1989).
es
146

As hipóteses aqui levantadas sobre a relação entre pressupos-


tos gnosiológicos, teorias educativas e métodos de investigação pre-
tendem sugerir discussões e estudos mais completos sobre as teorias
do conhecimento que fundamenta-os m diferentes enfoques da pesqui-
sa educativa. Entendemos que em toda forma de investigar existe um
enfoque epistemológico dando-lhe fundamento, e que todo paradigma
epistemológico se embasa numa teoria do conhecimento. Deduzimos
daí que a formação do pesquisador em educação deve ter uma base
filosófica, uma preparação sólida em epistemologia e um domínio dos
fundamentos da teoria do conhecimento.
À CONCEPÇÃO DE HOMEM NA
PESQUISA EDUCATIVA: ALGUMAS CONSTATAÇÕES

Algumas das preocupações da pesquisa filosófica se centrali-


zam na procura dos pressupostos que dão suporte às diversas práticas
científicas, na busca dos fundamentos lógicos dos métodos científicos
e na comprécnsão dos processos da construção lógica dos conceitos,
que integrados entre si constituem as teorias, as quais, por sua vez, são
as bases para a construção de modelos científicos ou filosóficos. Com a
recuperação desses pressupostos e a revelação das bases que funda-
mentam os modelos científicos, a investigação filosófica contribui com
uma qualificada cota crítica para o crescimento das ciências e uma
melhor realização da prática investigativa. Os pesquisadores, cientes
dos pressupostos e das implicações dos métodos e das teorias que uti-
lizam, sem dúvida, terão a oportunidade de exercer uma saudável au-
tocrítica sobre seu trabalho investigativo e poderão ponderar melhor o
resultado de suas pesquisas com as contribuições da filosofia.
[42 t43

No campo específico da filosofia da educação, recentemente


À relação entre o lógico e o histórico nos permitiu identificar as
surgiram na América Latina os estudos interessados na análise e
relações entre níveis de articulação (técnicas, métodos e teorias) e pres-
compreensão da produção científica na educação. Esses estudos de
supostos (epistemológicos, gnosiológicos e ontológicos) e recuperar as
caráter epistemológico e filosófico pretendem; entre outros aspectos,
condições históricas dessas construções lógicas da elaboração da prá-
identificar as tendências da investigação, assim como revelar os pres-
tica da pesquisa em educação.
supostos epistemológicos e filosóficos que implicitamente dão consis-
No lógico procuramos reconstruir a estrutura interna das aborda-
tência lógica a essas tendências”. i
gens epistemológicas encontradas no universo estudado. As abordagens
Com essa preocupação realizamos alguns estudos sobre a in-
foram classificadas em três grandes matrizes ou paradigmas: as empírico-
vestigação na educação produzida nos programas de pós-graduação
analíticas, as fenomenológico-hermenêuticas e as crítico-dialéticas, No
no Brasil. Esses estudos permitiram identificar as tendências mertodo-
histórico se procurou elucidar as especificidades das várias abordagens.
lógicas da investigação educativa desenvolvida em tais programas. À
À classificação anterior é fruto de um processo de verificação
partir dos métodos utilizados, procuramos identificar as concepções
de algumas hipóteses de trabalho a partir de propostas encontradas na
epistemológicas que orientam a construção do objeto da investigação,
literatura especializada no estudo das tendências científicas da produ-
os processos e estratégias, os critérios da cientificidade, as noções de
ção nas ciências humanas e sociais (Habermas, 1983)”. À denomina-
causalidade e de ciência, assim como os pressupostos epistemológicos
ção dessas tendências obedece a especificações utilizadas nas mesmas
e filosóficos implícitos nessas opções epistemológicas.
pesquisas e consagradas no vocabulário especializado para denominar
Com a ajuda de um instrumento chamado “Esquema Paradig-
as correntes mais gerais que articulam, em nível dos fundamentos epis-
mático” (ver terceiro capítulo), foi possível recuperar os nexos entre
temológicos, características técnicas, metodológicas e teóricas dife-
as técnicas de registro é a análise dos dados, as abordagens metodoló-
renciadas. À elucidação dessas características e sua articulação lógica
glCcas, as teorias, as concepções epistemológicas e os pressupostos filo-
com os pressupostos filosóficos nos quais se fundamentam já foram
sóficos, permitindo identificar a matriz epistemológica na qual se situa
trabalhadas por autores identificados com a escola de Frankfurt e apli-
cada investigação,
cados ao estudo das tendências do currículo (Domingues, 1986) e da
Uma vez reconstituída essa lógica, procuramos agrupar as pes-
pesquisa educativa (Sánchez Gamboa, 1987).
quisas por tendências epistemológicas e por meio de um estudo histó-
rico, recuperar as condições da construção dessas lógicas que identifi-
cam as várias tendências da investigação na educação.
* Segundo Habermas (1983), existem três enfoques básicos da pesquisa: o empirico-analítico, o
histórico-hermenêutico e o dialético, que correspondem aos três tipos de interesses humanos que
orientam a produção do conhecimento científico, o técnico de controle, o dialógico de consenso e
o crítico emancipador. À esses três enfoques correspondem três conjuntos lógicos: ao conjunto
?º Entre esses estudos temos Feldens (1983), Gouveia (1985), Mello (1983). Essa preocupação trabalho-técnica-informação escá subjacente o enfoque empírico-analítico; ao conjunto lingua-
também se apresenta no âmbito latino-americano, Tedesco (Revista Latino-Americana de Estados gem-consenso-interpretação está subjacente o enfoque histórico-hermenêntico, e ao conjunto po-
Educativos, v. XV, 1. 2), Zubieta e Parra (apud Níelio, 1985). der-emancipação-crítica está subjacente o enfoque dialético.
144 145

Na especificidade do tema deste trabalho, limitar-nos-emos a: O homem é entendido como sujeito de experimento, identificado
explicar os resultados destes estudos epistemológicos no que se refere
com dados numéricos & variáveis que podem ser representadas num per--
às concepções do homem em cada uma das correntes que traspassam a
fl ou num esquema cartesiano. O homem é um código, um sujeito de
investigação, elucidando os determinantes históricos que podem
ajudar processos pédagógicos que adquire hábitos e toma atitudes, é considera-
a compreender a formação dessas tendências, e conseqiienteme
nte do como indivíduo que evolui e que é capaz de aprender e conhecer.
dessas concepções. Posteriormente, destacaremos a importância
que Outro grupo de pesquisadores concebe o homem em relação a suas fun-
tem a crescente ampliação da concepção marxista de homern e alguns
ções sociais, tais como: cidadão que precisa de formação; trabalhador
paradoxos planejados em torno da progressiva utilização das
aborda” diversificado em categorias funcionais e níveis hierárquicos de ocupa-
gens dialéticas no estudo da problemática educacional e, finalmente,
ção, renda e condições de vida: professor, aluno, científico, profissional
apresentar algumas reflexões, a modo de conclusão.
etc. Também é concebido como recurso humano, o input num processo |
educativo ou produtivo, como funcionário que desempenha papéis ou
cargos (variável de processo); como resultado de sistemas educacionais
O homem nos tendências epistemológicas
(variável de saída ou ouípur). O homem também É considerado como
indivíduo determinado por supra-sistermas sociais, culturais e políticos.
Cada uma das abordagens epistemológicas encontradas na aná-
Em pesquisas identificadas com teorias funcionalistas, o homern
lise da produção científica em educação se identifica com pressup
ostos
é identificado como um ser que assume papéis entendidos como unida-
filosóficos. Os pressupostos filosóficos foram divididos em duas dimen-
des culturais de conduta ou “matrizes de identidades”, tais como profes-
sões: gnosiológicas, que se referem à maneira como são concebidos
e sor, aluno, pai de família, administrador, líder, chente etc. Também é
relacionados o objeto e o sujeito no processo cognitivo, e os pressup
ostos
apresentado como vítima de sistemas econômicos e políticos e preso a
ontológicos, que se referem às categorias mais amplas que fundam
en- funções dentro de estruturas burocráticas. O homem pode ter diversos
tam as diferentes opções epistemológicas, tais como as concepç
ões de papéis na história, seja como conquistador, poderoso senhor, ou como
homem, história e realidade; concepções que revelam a cosmovi
são con-
conquistado, impotente e escravo. Esses papéis que o homem desempe-
tida nas formas de produzir o conhecimento. Tais concepções
muitas
nha são de caráter social, como dão a entender as seguintes expressões:
vezes são explicitadas e se correlacionam com os pressupostos
gnosio- o homem é um ser social, indivíduo vinculado a grupos sob influências de
lágicos e com as teorias utilizadas em cada pesquisa analisada.
ritos, protocolos, representações, idéias e modos de comportamento. O
Vejamos as principais concepções de homem segundo cada abor-
homem para formar-se necessita ser educado e socializado.
dagem.
O segundo grupo de investigações, classificado como fenomeno-
As pesquisas identificadas nas abordagens empírico-analíticas
lógico-hermenêutico, se identifica com noções de homem relacionado com
apresentam as seguintes concepções:
o interesse dialógico e de comunicação.
147

Como categoria ontológica, a concepção de homem, nas inves- O homem é considerado nas investigações identificadas como
tigações fenomenológico-hermenêuticas, tem maior espaço com rela- critico-dialéticas como um ser social, no sentido do indivíduo incluído
ção às anteriores (empirico-analíticas) e sua referência ao conceito de no conjunto das relações sociais. Dependendo da formação social na
homem é mais explícita. As concepções mais frequentes definem o qual se situa e da correlação de forças existente, o homem se converte
homem como “ser-no-mundo”, “ser-com-outros” e “ser-inacabado”. em força de trabalho, mão-de-obra, especialista, capital humano, su-
O homem “ser-no-mundo” significa que ele está relacionado essenci- jeito capaz de transformar a realidade, ator e criador da história etc.
almente com sua terra, ser situado e “datado”, indivíduo em contínua Apesar de ser histórica e socialmente determinado, também é capaz
interação com seu meio. O homem é um ser de relações. O homem de tomar consciência de seu papel histórico, de educar-se por meio das
situado no mundo se encontra no mundo com outros. Existe como ser- ações políticas e de liberar-se através da prática revolucionária.
aí, como experiência vivida, como “situacionalidade” e como “ser-com- Outras investigações reafirmam a concepção do homem como
outros”. É intersubjetividade, pessoa com uma história de vida que agente ativo, capaz de participar, afirmar sua palavra, criar, assumir
participa na comunidade e em sua cultura, na interação constante com seus projetos num contexto histórico-social. Considera-se também como
Outras pessoas, essencialmente social, que necessita. desenvolver atitu- ser transformador da natureza através do trabalho, criador e constru-
des como a dialogicidade e a solidariedade. tor do ambiente social no qual vive. O homem não só é objeto determi-
O homem também é concebido como encarnação do “fenôme- nado pelas situações socioeconômicas, produto de sua própria existên-
no humano” inacabado, o homem é pura possibilidade, é um ser aberto cia e das condições históricas, como também é sujeito a quem cabe
à própria experiência de chegar a ser plenamente ele em sua relação modificar e transformar a realidade.
com o mundo e com os demais homens; não é o que “está ali” senão o As concepções de homem, localizadas nos diferentes modelos
que “está sendo”. de investigação, nos indicam uma relação entre estes e os seus pressu-
O homem é concebido também como possuidor e como caren- postos ontológicos, entendidos como categorias mais amplas, quase
te; possuidor da fala para pronunciar as coisas para denominá-las e sempre implícitas, que se situam no campo da arqueologia da investi-
dar a elas significados. Com o poder da palavra o homem enche o mun- gação educativa. A. concepção de homem é, especialmente nas investi-
do de significados. O homem é um ser carente, semicoisa, limitado gações educativas, um desses pressupostos básicos que estão “presen-
pela condição de estar situado em condições socioeconômicas, cultu- tes” em todo trabalho intelectual que toma a educação como objeto de
rais é históricas e por ser objeto de controles sociais, normalizado por suas análises.
leis e delimitado por códigos jurídicos. Como podemos deduzir, a concepção de homem predominante
O terceiro grupo de investigações classificadas como crítico- nas pesquisas empírico-analíticas, que identifica um homem funcio-
dialéticas apresenta, entre seus pressupostos filosóficos, diversas con- nal, organizado dentro de sistêmas ou esquemas cartesianos, ou redu-
cepções do homem que podem ser resumidas assim: zido a uma matriz de variáveis, é diferente da concepção do homem
148 149

dialógico e comunicativo e fundador de sentidos e significados


das in- ; res-e revelando a problemática da ideologia, do poder e de uma escola
vestigações fenomenológico-hermenêuticas, e igualmente
é diferente controlada pelos interesses das classes daminantes.
do homem e ao mesmo tempo resultado dos Processos sociais
e frans- Essas mudanças de interesses na pesquisa, em alguns casos,
formador da sociedade e construtor da história, identi
ficado predomi- estão vinculadas à trajetória de vida de alguns educadores que, forma-
nantemente nas investigações crítico-dialéticas.
dos numa tradição positivista ou fenomenológica, percebem que o mo
As opções epistemológicas anteriores e suas respectivas
con- terialismo histórico também pode dar subsídios para o estudo do fenô-
cepções do homem não aparecem como estruturas de
pensamento de- meno educativo, permitindo elucidar suas relações com a sociedade e
FLinidas e coerentes, nem permanecem num dado períod
o aqui analisa- ajudar a compreender a dinâmica das contradições das formações so-
do; essas opções têm sua trajetória, como podemos
constatar nas duas ciais e da educação nelas inserida.
últimas décadas. As abordagens empírico-analíticas predo
minaram na Os textos de Marx, Engels, Gramsci, Kosik, Sánchez Váz-
primeira fase do período analisado (1970- 1930). Esse
predomínio se quez e Manacorda foram progressivamente adaptados na bibliografia
deve à formação dos docentes e orientadores dentro 1 & 1 CATA: ] =
dessa tradição e a .
b á: S 1Ca, 7 ES P ecialm ênte em
É
áreas ua filoso 1a E história a educação.
5
aprendizagem da investigação dentro dos parâme
tros do método posi-
tivista; tal situação é produto da importação cultural,
da composição
do corpo docente formado no exterior e da iimposição de À concepção marxista do homem:
um modelo de
pós-graduação que favorecia a transposição de paradigmas alguns paradoxos
predormi-
nantes em alguns dos países capitalistas desenvolvidos.
Essa importação foi progressivamente criticada, e novos A tendência crescente das investigações dialéticas desenvolve
mo-
delos foram sendo adaptados ou foram surgindo segund progressivamente uma concepção marxista do homem e a partir desta
o as necessida-
des teóricas e metodológicas da problemática estudada. se conceitua uma educação crítica, formadora de um homem novo,
'Às abordagens fenomenológico-hermenênticas e critico-dialét capaz de construir uma sociedade mais justa e livre. Entretanto, por
icas
Surgem como alternativas, questionando 2 relativa hegem ser uma abordagem nova no âmbito da investigação educativa na Amé-
onia da ciência
analítica e ganhando progressivo espaço nos centros rica Latina, e particularmente nos países que sofreram violentas inter
de investigação.
À investigação dialética surge questionando os métodos venções militares, e devido, dentre outros motivos, à censura oficial
tradi-
cionais de investigação e os “reducionismos” das aborda contra o marxismo, seu desenvolvimento apresenta algumas dificaida-
gens anterio-
res e propondo uma nova concepção de investigação des em relação à definição e aplicação dos pressupostos epistemológi-
a partir do mate-
rialismo histórico. Esta nova proposta se justifica na cos e filosóficos, como podemos constatar na descrição relacionada com
necessidade de das como
estudar a educação escolar, explicando as relações entre os conceitos de homem, presente nas investiga
1 ções classifica
igaçõ 1
educação e
sociedade, entre teoria e prática no exercício profissional critico-dialéticas.
dos educado-
150 IS)

Se por um lado existe a necessidade de abordar a educação em ; uma determinada abordagem está a visão de mundo do investigador,
sua relação com a dinâmica e as contradições da sociedade dividida em que lhe permite organizar os diferentes elementos e pressupostos que
classes, por outro lado as referências teóricas que ajudarão na sua com- integram a lógica da pesquisa e relacionar os processos do conheci-
preensão são pouco claras, na medida em que, por exemplo, a teoria mento e os interesses que os orientam. As verificações anteriores su-
marxista e a abordagem dialética de investigação sofrem as mais vari- gerem reflexões sobre os pressupostos filosóficos e, em última instân-
adas versões. Existem leituras positivistas, estruturalistas e fenome- cia, sobre a visão de mundo, isto é, sobre os nexos entre conhecimento
nológicas do marxismo. Os investigadores dificilmente vão às fontes e, e interesse que dão suporte a uma ação investigadora mais consistente.
num período de profundas mudanças conceituais, utilizam como refe- Essas reflexões permitem definir melhor as alternativas e as opções
rência de seus estudos a versão que está na moda. teórico-metodológicas que os pesquisadores assumem, na medida em
Alguns investigadores anunciam a importância do método dialé- que elucidam para quer, para que tipo de homem e em função de que
fico e manifestam sua intenção de utilizá-lo, mas, no trajeto da investiga- tipo de sociedade realizam suas pesquisas.
ção, desenvolvem análises que, a não ser por algumas citações de Marx O interesse crescente dos pesquisadores por compreender e
ou de autores tidos como críticos, não diferem em nada dos modelos explicar a ação educativa, as relações da escola com o todo social e as
positivistas ou funcionalistas predominantes nas fases anteriores. contradições sociais que se manifestam nas lutas por erradicar a mar-
ginalidade, a exclusão e as estruturas de exploração, e em consequên-
cia por conquistar novos patamares de igualdade e de Justiça social e
Conclusões por construir uma escola democrática e de qualidade para todos, tem
exigido a busca de novas referências teóricas e novas abordagens me-
A existência de várias abordagens da investigação, assim como
todológicas que permitam a elaboração dos conhecimentos que darão
de diferentes e contraditórias concepções de homem, sinaliza que os
suporte a tais transformações. O marxismo € a dialética se afirmam
modelos tradicionais estão sendo questionados e os pesquisadores es-
como teoria e método com significativa capacidade heurística, dada
tão assumindo atitudes que refletem as várias concepções de mundo
sua proximidade com o interesse transformador. Falta, no entanto, maior
identificados com as várias classes existentes na sociedade.
profundidade teórica, pois as pesquisas analisadas que revelam a utili-
À crítica crescente no interior dos centros de pesquisa, assim
zação de algumas categorias do marxismo são questionadas, na maio-
como a distinção progressiva de linhas de pensamento e de opções epis-
ria das vezes, por falta de rigor metodológico e de compreensão dos
temológicas, expressa o caráter conflitivo dos interesses que orientam
pressupostos epistemológicos e filosóficos nos quais pretendem se fun-
e dinamizam a pesquisa científica na educação,
damentar.
No processo de elucidação das várias abordagens da pesquisa,
os pressupostos filosóficos, e entre esses a concepção de homem, têm
uma função esclarecedora e geradora de interrogações. Por trás de
ses

À HISTORICIDADE DO OBJETO
NA PESQUISA EDUCACIONAL

Os fenômenos educativos por sua natureza social se tornam


também históricos, e, nesse sentido, é que se supõe que toda investiga-
ção em educação trabalhe necessariamente com a historicidade de seu
objeto. Entretanto, a pesquisa educacional, dependendo da aborda-
gem teórico-metodológica utilizada, nem sempre destaca esse atributo
da historicidade, pelo contrário, esquece-se de registrá-la, ou a enco-
bre ou a ignora totalmente. Tratar das formas como a pesquisa educa-
tiva aborda ou não essa característica essencial do fenômeno educaci-
onal é. uma questão para a historiografia, esta entendida não apenas
como a organização e sistematização do conhecimento histórico (livros
de história) e como crítica epistemológica e ideológica da produção
científica em História, mas também como estudo crítico da temporali-
dade e a historicidade em outros campos do conhecimento humano.
Com o objetivo de desenvolver esse novo papel! da historiogra-
fia buscamos, por meio de uma análise epistemológica, as formas como
[--.] até porque é dela que vem sua matéria-prima. Assim é que os
a pesquisa educacional trata a historicidade de seu objeto. Partimos do
historiadores das mais diversas tendências, freqlientemente, utilizam
pressuposto de que em toda pesquisa científica que aborda um fenê- de modo indiscriminado o termo historiografia para indicar o con-
meneo real seja este uma instituição, um grupo humano, uma experiên- junto ou os conjuntos ae obras de história para referir-se a um “ma-
peamento', a um listado, ou qualquer outra forma de ordenamento
cia, um acontecimento, ou o resultado de um Processo, um fato, um dessas obras, assim como para denominar o estudo eferuado a partir
produto, uma manifestação política, uma lei, norma ou diretriz etc.; de uma forma de ordenamento (Warde, 1990, p. 4).

sempre trabalharemos com um a priori fundamenta! do real, a catego-


na “tempo” e com uma maneira de apreensão deste. A discrepância aparece na variedade conceitual que o própnro

O tempo pode ser entendido como um registro, uma data, uma termo sugere. Para os historiadores ligados à concepção positivista, a
variável, um elemento de contexto, ou como uma categoria fundamen- historiógrafia é entendida como o conjunto de escritos de história e o
tal para à explicação e a compreensão do real (temporalidade) ou como estudo sistemático desse conjunto. O estudo do conhecimento já pro-
um atributo essencial da realidade que se transforma permanentemente duzido deve seguir as mesmas regras que orientam a produção desse
(a historicidade). 7 conhecimento. Isto é, no conhecimento do objeto, no estudo sobre os
Com a intenção de aprofundar as questões sobre a temporali- resultados e processos desse conhecimento, para manter o critério de
dade e a historicidade dos fenômenos educativos, organizamos nossa objetividade, são vedadas as inferências ou deduções não contidas no
reflexão em três etapas: na primeira, tentamos justificar um novo campo próprio objeto. Dessa maneira, a historiografia se torna um “reflexo
de ação para a historiografia; na segunda, apresentamos alguns resul- espetacular”, “um álbum fotográfico” ou um “museu arqueológico” da
tados da busca de formas como a pesquisa em educação vem abordan- própria história.
do a temporalidade e a historicidade do objéto e, finalmente, destaca-
Para uma história concebida nos moldes do presentismo croceano —
mos algumas questões que esperamos que movam o debate e motivem cade não cabern os atributos científicos da objetividade e da universa-
lidade — [...] (e) se a história como desenvolvimento dos aconteci-
novos estudos.
mentos só se apresenta através do pensamento, à historiografia não
pode ser senão a consciência que a história adquire de si mesma.
Warde, 1990, p. 4).

Um novo campo para a historiografia


Fara os historiadores dos “Annates” (Fevre, Bloch e outros),
Warde (1990), ensaiando uma historiografia da educação, con- que concebem a história mais além das fronteiras estreitas da divisão
sidera que entre os historiadores, preocupados com a relação entre das ciências, buscando uma ciência unitária que revele as leis gerais
história e lustoriografia, há o consenso de não existir discrepância quanto do movimento e permita explicações e compreensões dos fenômenos a
à dependência da historiografia com relação à história, partir da história dos próprios fenômenos, a historiografia assume a
função de crítica epistemológica e/ou ideológica. Warde, apesar de dis-
cordar parcialmente da Escola dos “Annales”, concorda com a proposta
156 157

de uma historiografia como crítica epistemológica e também ideológi- . postos gnosialógicos). De igual maneira, na forma de conceber e relaci-
ca. “A. historiografia deve questionar a história como conhecimento e onar o sujeito e o objeto, estamos reproduzindo uma concepção do real.
como ideologia.” (Warde, 1990, p. 8). À recuperação da inter-relação entre os pressupostos epistemológicos e
Para avançar nessa proposta, podemos entender que a historio- enosiológicos com as concepções do real (categorias ontológicas) ajuda a
grafia como crítica epistemológica e ideológica não só abordaria as obras revelar as implicações filosóficas e ideológicas de um determinado mo-
de história sobre um fenômeno dado, mas também as formas como a delo de investigação científica e permite elucidar as profundas relações
investigação científica, inclusive a histórica, trata a historicidade dos fe- entre conhecimento e interesse (Habermas, 1982).*º
nômenos. Entendemos que à medida que ampliamos o campo das aná- Nesse sentido, podemos deduzir que a historiografia, entendi-
kises, estamos ensaiando também um novo papel para a historiografia. da como crítica epistemológica, na medida em que recupera os pressu-
Nosso ensaio se fundamenta no pressuposto de que toda pesqui- postos gnostológicos e ontológicos, se torna também crítica ideológica,
sa que aborda fenômenos histórico-sociais, como a educação, trabalha como foi sugerido anteriormente.
fundamentalmente com categorias relacionadas com a existência do real, Para desenvolver a crítica epistemológica e ideológica como
como tempo, espaço e movimento. De igual maneira, pressupormos que, uma função da historiografia da educação, podemos indagar em toda
segundo os modelos conceituais utilizados e os processos metodológicos investigação em educação sobre suas formas de abordar a temporaii-
percorridos, os pesquisadores trabalham, seja de forma explícita ou im- dade e a historicidade do objeto. Portanto, é pertinente perguntar so-
plícita, com algumas categorias que fazem referência à temporalidade e bre as concepções de tempo e história que são utilizadas na pesquisa
ao caráter histórico do objeto. O pesquisador explícita ot implicitamen- educacional, dado o caráter histórico-social dos fenômenos educativos.
te trabalha com concepções de tempo e história. Sem dúvida, nem todas
as abordagens teórico-metodológicas privilegiam essas categorias. To-
davia, é possível que as principais diferenças entre essas formas de ela- À historicidade do objeto
na Pesquisa Educacional
borar conhecimentos estejam precisamente nas diversas maneiras de
abordar a ternporalidade e a historicidade dos objetos estudados.
Em pesquisas anteriores sobre a produção das pesquisas em
Na análise da produção científica em educação, quando proce-
educação (Sánchez Gamboa, 1982, 1987, 1996) podemos encontrar
demos a recuperação das categorias epistemológicas, encontramos di-
recursos para elaborar algumas respostas para as questões anteriormente
'versas formas de articulação lógica entre as abordagens teórico-meto-
dológicas e seus pressupostos gnosiológicos. Na reconstituição da lógi-
ca, como vimos nos capítulos anteriores, os processos científicos supõem
2 Como resultado desse processo de explicação se apresentam valiosos argumentos contra 2
critérios de verificação ou validação (pressupostos epistemológicos) e
precendida neutralidade dos métodos e das teorias científicas, contra as teses que defendem a
que se sustentam numa determinada teoria do conhecimento (pressu- separação entre os valores e a ciência e contra a chamada “neutralidade axiológica”, que justifica
qualquer falta de compromisso do pesquisador com a problemática que ele estuda.
159
158

Na preocupação pela descrição do fenômeno em seu imediatis-


apresentadas. Nésses estudos tentamos identificar as diversas abordagens .;
teórico-metodológicas utilizadas na pesquisa educacional e a partir delas mo empírico, os estudos de tipo survey ou levantamento e as Investiga-

procuramos elucidar os pressupostos epistemológicos e gnosiológicos que ções experimentalistas que registram situações de “pré-teste” e “pós-

a sustentam e a definem. Constatamos nas três grandes epistemologias teste” “se limitam a oferecer uma visão geral e instantânea de um de-
modernas identificadas como empírico-analíticas, fenomenológico-herme- terminado assunto, como se uma máquina fotográfica o houvesse re-

nêuticas e critico-dialéticas diversas maneiras de elaborar a categoria tempo gistrado em determinado momento.” (Liidke; André, 1986, p. 6). Es-

e de abordar a historicidade dos fenômenos nelas estudados: ses estudos apresentam o retrato ou perfil do fenômeno, do educador,

Na recuperação dos pressupostos gnosiológicos buscamos elu- do aluno, do administrador, da escola, da universidade, ou registram,

cidar seus nexos com as categorias de ordem ontológica, que se refe- em estudos mais complexos, gráficos que relacionam dois ou mais mo-
rem às concepções de sociedade, homem e educação, dada a especifi- mentos da percepção do fenômeno na situação experimental. Regis-
cidade das investigações analisadas (dissertações e teses dos progra- tra-se o instante em que se faz a coleta da informação, ou a data em
mas de pós-graduação em educação). Analisamos também as catego- que se aplica o questionário ou se faz a entrevista. Fixa-se esse presen-

rias de tempo, história e concepção de realidade, querendo elucidar a te e dele elabora-se um perfil, uma descrição ou um gráfico que de-
monstra a relação de variáveis. Nas pesquisas mais complexas é possí-
concepção de historicidade do objeto e as implicações filosóficas e ide-
ológicas que se vinculam à visão de mundo, que de forma implícita se vel registrar os fenômenos em vários presentes colocando o ternpo como
expressa em toda cbra científica (Goldmann, 1979). variável. Isto acontecê nos delineamentos de séries temporais que se
A história, tomada como categoria gnosiológica Inerente à con- caracterizam pela “presença de um processo periódico de medidas num
cepção ontológica de realidade, marca a diferença entre as aborda- grupo ou indivíduo e a introdução de uma mudança experimental nes-
gens. No universo de pesquisas estudadas destacam-se duas grandes sa série temporal de medidas.” (Campbell; Stanley, 1979, p. 67).
concepções: de uma parte, aquela que tem uma preocupação sincrôni-
As pesquisas com abordagens fenomenológicas, mais preocu-
ca (do grego sygtronos e do latim synchronu: sem tempo), compartilhada padas com a estrutura básica ou a essência invariável dos fenômenos e
pelas pesquisas com abordagens empírico-analíticas e fenomenológi- menos com suas variantes; mais com a estrutura simbólica que com os
cas (estruturalistas)?º. Por outra parte, aquela que tem preocupação sintomas (acontecimentos); mais com o sentido oculto que com o sen-

diacrônica (do grego dia-kronos: através do tempo), compartilhada por tido manifesto, ou que explica as variantes, acontecimentos, sentidos

algumas pesquisas com abordagens fenomenológicas (existencialistas manifestos, como tendo origem nas essências (invariáveis, estruturas e

e hermenêuticas) e dialéticas. sentidos ocultos), essas pesquisas têm como paradigma comparativo a
radiografia que revela a estrutura interna, traspassando a aparência
fenomênica. Outras investigações que pretendem interpretar as diver-

? Segundo Viet (1973), um significativo percentual de pesquisa fenomenológica está fortemente


sas manifestações do fenômeno à luz dos contextos buscam recuperar
influenciado pelo estruturalismo.
160
161

ou reeditar o “contexto histórico” como telão de fundo ou como deta- de contexto, uma referência ou uma “informação auxiliar”. Na pers-
lhes descritivos do cenário onde ocorre o fenômeno. pectiva da dialética, dada sua preocupação com a diacronia, pode ser
As duas tendências, mantendo suas diferenças em outros ele- comparada ac filme no sentido da preocupação com o registro do mo-
mentos epistemológicos, se assemelham em sua preocupação sincrôni- vimento, a evolução e a dinâmica dos fenômenos.
ca. Tanto as ciências da compreensão (fenomenologia) como a ciência A concepção da realidade ou de visão de mundo, como catego-
empírico-analítica (preocupada com as leis gerais: ciências nomotéti- ria mais geral e de maior alcance, é um pressuposto fundamental que
cas) se identificam na preocupação sincrônica, as duas deixam eluci- elucida a lógica implícita nas diferentes abordagens epistemológicas.
dar essa maneira de abordar o tempo (chrónos). Segundo Goldmann (1979, p. 14-17), a visão de mundo como instru-

À preocupação sincrônica, que aparece na articulação dos documen-


mento conceitual de trabalho científico permite compreender a produ-
tos em um universo de fatos estruturados, se elucida nas ciências do ção humana como um todo coerente em si mesmo e ao mesmo tempo
espírito no processo de seleção factual pela compreensão, porém sem
como uma obra situada na realidade viva e histórica que determina a
a preocupação pela elaboração de leis gerais do acontecer histórico, se
integra no âmbito da preocupação da ciência empírico-analítica: na formação desse conjunto coerente; por outro lado, elucida os nexos
preocupação por uma descrição da realidade estruturada, assumindo com as condições sociais e históricas dessa proclução, mostrando os
2 mesma postura teórica. (Habermas, 1983, p. 302).
interesses, as preocupações, as diversas influências culturais, teóricas
e políticas que os homens vivos — investigadores — tiveram nas situa-
A preocupação diacrônica se apresenta em algumas pesquisas
ções concretas de seu trabalho, A. visão de mundo se coloca então como
fenomenológicas existencialistas que nas análises privilegiam a exis-
uma categoria que elucida o nexo entre conhecimento e interesse,
tência viva e dinâmica à essência realizada, definida ou pré-definida.
Na recuperação dos nexos entre a concepção de história e a
Também se apresenta essa preocupação em algumas investigações
concepção de realidade também podemos identificar duas grandes ten-
hermenêuticas que colocam o fio condutor da interpretação na “estru-
dências: aquela que privilegia uma visão dinâmica e conflitiva a partir
tura encarnada”, no acontecer, na “existencialidade” dos fenômenos
das categorias materialistas de conflito e de movimento e aquela que
ou na presença do “símbolo encarnado”. Essa preocupação diacrônica
prefere uma visão essencialista, “fixista”, funcional, pré-definida e pré-
É mais intensa nas investigações dialéticas que consideram a história
como eixo da explicação e da compreensão científica e tem na ação determinada da realidade.
As pesquisas com preocupação sincrônica concebem os fenô-
uma das principais categorias epistemológicas.
menos estudados enquanto colocados num cenário, num ambiente en-
A ação é, em sua “concretude”, o critério de verificação da
volvente, ou contexto mais amplo, ou entendidos como sistemas dentro
relação cognitiva e a prova da coincidência das leis do ser e do pensar.
IA Trio

de um macrossistema, ou dentro de condições que os “circunstanciam”,


A história, na dialética, não é como nas investigações empírico-analíri-
O fenômeno, fato, ou objeto, é previamente situado, isolado, dissecado e
cas, um dado acidental ou secundário, uma variável denominada “tem-
fai

separado de seu contexto (variáveis intervenientes que devem ser


po” ou “data” ou, como na teoria estruturalista, um dado circunstancial
162 163

Algumas conclusões e outras quesiões


controladas para que não alterem o experimento); o contexto também
é fixo, seja este entendido como tela de fundo, ambiente externo, ou
Os fenômenos educacionais, considerando seu caráter social e
cenário. Desde outras perspectivas, o real é percebido como totalidade
presente, universo de significados, fonte de múltiplos sentidos, univer- histórico, devem ser abordados levando em conta sua historicidade.

so oculto, que aparece e ao mesmo tempo se esconde; porém, que fun- Mas a pesquisa científica, dependendo da abordagem teórico-meto-
damentalmente está aí, mais ou menos estático. Os fenômenos estão aí dológica utilizada, nem sempre considera essa característica.
A historiografia da educação, como crítica epistemológica e
para serem compreendidos. Apesar de que adquiram “movimento” no
conflito das interpretações, eles são a manifestação de uma essência ideológica, deve discutir permanentemente esses paradoxos da pes-
permanente (ou invariável). quisa e revelar as implicações filosóficas e ideológicas implícitas nos

AÀ visão anterior é criticada frequentemente pelas pesquisas modelos de investigação científica, no tocante às formas de abordar a

com preocupação diacrônica. Às críticas se referem à visão homogê- historicidade dos fenômenos educativos.
nea e não conflitiva da sociedade (realidade mais amplã), e a visão
A historicidade dos fenômenos educativos não é só objeto da histó-
estática dos modelos positivistas, funcionalistas e estruturalistas, que ria; outras formas de elaboração científica deverão considerar esse atribu-

privilegiam a concepção ontológica do mundo, fundada no princípio de to essencial dos fenômenos; do contrário, caberia questionár 6 recorte ou o
identidade e que opta pela descrição do universo ordenado, sujeito a esquecimento que nega ou silencia essa característica essencial do real.

leis permanentes. As investigações com preocupação diacrônica, pelo A formação de pesquisadores em educação deve considerar
contrário, coincidem com a visão dinâmica da realidade e as noções essas questões relacionadas à discussão dos métodos e das abordagens
ontolégicas do “mundo inacabado” e “universo em construção” e estão epistemológicas. É possível produzir pesquisas qualitativamente mais
preocupadas com a percepção dos fenômenos em sua transformação e significativas, na medida em que sejam consideradas essas questões de'

em sua história. caráter gnosiclógico é ontológico que permitem esclarecer as implica-

À preocupação com a clescrição, a análise, a especificidade e a ções filosóficas e ideológicas do trabalho científico.

interpretação dos fenômenos, utilizando para isso categorias fundadas Como desenvolver essas preocupações e aprofundar essas ques-

na lógica formal, no raciocínio hipotético dedutivo e nos princípios da tões? Tratar da historicidade dos fenômenos não pode ser assunto -ex-
identidade e da não-contradição, se opõe à preocupação com a dinâmi- clusivo da História. É, possível que outras formas de elaboração cien-
ca dos fenômenos, a transformação da natureza e a história do homem, tífica assumam esse papel, abrindo caminhos para a interdisciplinarie-

que utiliza categorias fundadas na lógica dialética e nos princípios do dade? No diálogo permanente entre as ciências, caberia à historiogra-
movimento e da luta de contrários, fia questionar as outras áreas do conhecimento sobre a historicidade
dos fenômenos? Qual é o espaço para esse diálogo? Qual a função da
epistemologia nesse importante debate? Teremos aí algumas interro-
gações para promover a discussão e motivar novos estudos.
INTERESSES COGNITIVOS NA
PESQUISA EDUCACIONAL: UMA QUESTÃO ÉTICA?”

O presente .capítulo pretende expor algumas reflexões no âm-


bito da Ética e da Filosofia da Educação, centralizando a discussão
num dos campos mais dinâmicos da educação: a pesquisa educacional.
Não pretendemos defender uma tese ou dar resposta às questões le-
vantadas neste campo da pesquisa, mas propor uma reflexão que nos
permita qualificar melhor a seguinte indagação: os interesses cogniti-
vos, presentes nos diferentes enfoques epistemológicos que orientar a
pesquisa na educação, podem ser abordados como uma questão ética?
Em primeiro lugar, situaremos a reflexão dentro de uma expe-
riência concreta de análise sobre a produção científica em educação,
ou de uma pesquisa sobre a pesquisa educacional. Em segundo lugar,

** Uma primeira versão deste capítulo foi apresentada no VI Congresso Internacional de Filosofia
Latino-Americana: “Etica na América Latina”, em Bogotá, na Universidade de Santo Domingo
(24 a 29 de junho de [990).
PERTO
167

faremos referência à contribuição de Habermas (1982) sobre os enfo- pesquisador durante o percurso de construção do conhecimento sobre
ques básicos da ciência e sua relação com os interesses cognitivos. Num a educação, considerando que sua problemática, por ser social, política
terceiro momento, veremos como esses enfoques da ciência se apresen- e ideológica, não é neutra nem está livre de conotações valorativas. Pelo
tam na pesquisa educacional. E, finalmente, exporemos algumas ques- contrário, a problemática educacional está carregada de elementos axio-
tões para serem discutidas e aprofundadas em estudos posteriores. lógicos, de concepções filosóficas de homem, de sociedade e visões de
Como consequência desta exposição esperamos mostrar alguns mundo que a transformam num carmpo de intermináveis controvérsias e
problemas relacionados com o compromisso social e político, e conseqiien- que exigem dos profissionais que a ela se dedicam uma postura ou uma
temente ética, do cientista, delinear a seguir algumas perspectivas de es- atitude comprometida, a favor ou não dos valores e das decisões que
tudo e de reflexão consideradas importantes para a formação do pesquisa- estão em jogo nessa complexa problemática da educação atual.
dor em educação. Tais perspectivas se referem particularmente à sua pre- À análise dessas posturas ou atitudes nos leva a indagar sobre
ocupação com as questões éticas inerentes ao seu fazer científico. os elementos éticos nelas implícitos. Essa indagação adquire maior
Com a criação dos programas de pós-graduação em Educação importância na medida em que questiona a separação entre ciência e
na América Latina, a produção de pesquisas nesta área vem aumen- valores, a pretensa objetividade do método científico e a propagada
tando progressivamente. Esse crescimento quantitativo, como afirma- neutralidade axiológica do pesquisador.
mos nos capítulos anteriores, exige seu redimensionamento qualitati- As opções metodológicas, teóricas e epistemológicas, muitas
vo. Com o objetivo de resgatar os elementos qualitativos das pesquisas, vezes adaptadas inconscientemente pelo pesquisador, levam implicações
têm surgido estudos que pretendem analisar, entre outros aspectos, as éticas importantes. Essas implicações se relacionam com os pressupos-
tendências teórico-metodológicas e os enfoques epistemológicos des- tos filosóficos (gnosiológicos e ontolágicos) que, em última análise, ex-
sas produções, sua contribuição para o desenvolvimento teórico das pressam a visão de mundo impressa pelo pesquisador no processo de
ciências da educação, a aplicação dos resultados das pesquisas, a pro- construção de conhecimentos ou no exercício do fazer científico,
dutividade dos centros de pesquisa etc. Os estudos que abordam as questões éticas da ciência focali-
Os estudos que pretendem explicar os enfoques epistemológi- zam as relações entre “moral e ciência”, “ciência e valores”, “verdade
cos que erientam as pesquisas em educação, além de constatar a pre- e bondade”, “ciência e consciência”, “ética e episteme” etc., direcio-
sença de diversas tendências, expressam a preocupação em recons- nam suas discussões, quase que exclusivamente, sobre a aplicação e a
truir os interesses cognitivos que, de acordo com cada uma dessas ten- utilização dos resultados da ciência. Averiguam se tais resultados não
dências, orientam o processo de investigação. atentam contra valores predominantes na sociedade, se estes estão vol-
Tendo em conta as contribuições de Habermas (1980) sobre 2 tados para diminuir a miséria das populações e favorecem os interesses da
relação “conhecimento e interesse”, podemos levantar algumas questões maioria; isto é, esses estudos estão preocupados com a aplicação dos resul-
relacionadas às atitudes, às posturas e aos compromissos assumidos pelo tados da ciência e com a utilização dos conhecimentos já produzidos.
168
169

Poucos estudos se dedicam a discutir as questões dos valores, da mo- condições materiais históricas e os interesses e valores, sociais que pos-
ral, da consciência no próprio processo da construção da ciência e nas sibilitaram a elaboração de cada pesquisa e o desenvolvimento teórico
decisões é opções no percurso da elaboração do conhecimento científ;- e prático de cada ciência.
co. Por isso nos atrevemos a perguntar se além de uma ética da ciência A construção de conhecimentos é um processo complexo que
aplicada não existe a possibilidade de uma ética do fazer científico! Se articula diversos elementos, inclusive pressupostos epistemológicos e
é possível identificar as dimensões éticas inerentes ao mesmo processo filosóficos. Esses elementos, como já vimos nos capítulos anteriores,

de produção do conhecimento e implícitas nas opções epistemológicas, podem ser organizados em diferentes níveis, tais como: a) técnico:
nas maneiras como o pesquisador aborda, trata ou constrói o objeto do instrumentos, técnicas de coleta e tratamento de dados e informações;

conhecimento, especialmente quando esse objeto é constituído por fe- b) metodológico: procedimentos, estratégias e maneiras de abordar os
nômenos humanos e sociais, ou por experiências e práticas sociais que problemas e os objetos de investigação; c) epistemológicos: relaciona-
implicam a presença de sujeitos individuais ou coletivos. dos com as concepções de ciência, de causalidade, de prova científica,

À análise dos interesses cognitivos que orientam 2 pesquisa critérios de cientificidade; d) nível filosófico: pode ser discriminado
educacional, a partir de uma experiência concreta de produção crentí- em: 1) pressupostos gnosiológicos, que se referem às maneiras de cons-
fica na área, pode nos ajudar a qualificar essas indagações. truir o objeto, conceber o sujeito e de estabelecer relações entre s1, e 2)
pressupostos ontológicos, que se referem a categorias mais amplas e
implícitas como concepções de homem, sociedade, história e realidade
Interesses cognitivos e (visão de mundo).
enfoques básicos da ciência Esses últimos níveis, o epistemológico e o filosófico, que eluci-
dam e explicitam os anteriores, se referem às motivações, aos interes-
O processo de produção da ciência não se reduz somente à
ses, aos valores implícitos que orientam e comandam o processo cogni-
aplicação de determinadas técnicas, ao desenvolvimento de procedi-
tivo. Sem a recuperação desses elementos é impossível compreender o
mentos previamente definidos, à aplicação ou assimilação de algumas
desenvolvimento da ciência e a elaboração dos conhecimentos científi-
teorias já postuladas. Os conhecimentos científicos não se elaboram cos. O resgate das dimensões epistemológicas e filosóficas e dos pres-
mecanicamente, aplicando elementos já prontos e acabados, eles se
supostos gnosiológicos e ontológicos nos permite reconstituir os inte-
constroem com a participação intensa do investigador, sujeito do pro-
resses cognitivos que, embora difusos entre as múltiplas determina-
cesso cognitivo. Também não é uma construção solitária e individual. ções do complexo exercício de fazer ciência, se encontram presentes
É fundamentalmente uma produção social e histórica na qual partici-
como eixos centrais que conduzem e orientam co processo de pesquisa.
pam muitos outros cientistas e pesquisadores, por meio da experiência Entre os processos da elaboração de conhecimentos científicos e os
acumulada pela própria história da ciência e da tecnologia, de tal ma-
interesses que orientam esses processos existem nexos que podem ser
neira que é o resultado de um longo processo, em que se refletem as
170 71
revelados por meio da recuperação dos pressupostos. Elabermas (1982, Quando 9 interesse prático de consenso motiva a investigação,
1983) orienta suas reflexões para a compreensão desses nexos quando a atividade pesquisada é projetada para auxiliar a interpretação € a
se propõe estudar a relação conhecimento e interesse, organizando as tra- interação dos sujeitos, 1sto é, para revelar as formas de comunicação e
dições científicas em três enfoques básicos, aos quais correspondem interação, para compreender a intersubjetividade em relação a possíveis
determinados interesses cognitivos. significados das ações, os discursos, os gestos, os ritos, os textos etc., e
Segundo Habermas (1983), podemos identificar três enfoques para propiciar normas de atuação entre os homens e os grupos humanos.
básicos da pesquisa: o empíirico-analítico, o histórico-hermenêutico e Quando o interesse crítico emancipador orienta a pesquisa, a
o critico-dialético”, que correspondem aos três tipos de interesses atividade intelectual reflexiva é organizada para desenvolver a crítica
humanos que orientam a produção do conhecimento científico: o téc- e alimentar a práxis que transforma o real e libera o sujeito dos dife-
nico de controie, o dialógico de consenso e o crítico emancipador. À rentes condicionantes.
esses três enfoques correspondem três conjuntos lógicos: ao conjunto Esses interesses básicos da pesquisa também se apresentam
trabalho-técnica-informação está subjacente o enfoque empírico-ana- nos diferentes tipos de enfoques científicos ou tendências epistemoló-
lítico, ao conjunto linguagern-consenso-interpretação está subjacente gicas da pesquisa social e educativa.
o enfoque histórico-hermenêutico e ao conjunto poder-emancipação- O enfoque empírico-analítico, que tem sua origem e seu de-
crítica está subjacente o enfoque dialético. senvolvimento mais significativo nas ciências naturais e exatas, utiliza
Essa classificação se fundamenta na proposição de que o pen- técnicas predominantemente quantitativas. Essas técnicas garantem a
samento humano não pode separar-se das três dimensões fundamen- objetividade dos dados de origem empírica. Os procedimentos utiliza-
tais da vida humana: o trabalho, a linguagem e o poder. Essas dimen- dos permitem delimitar o objeto como totalidade fática, por meio de
sões se relacionam com os três tipos de interesses humanos: o técnico y técnicas de laboratório, desenhos experimentais, instrumento de ob-
4
de controle, o prático de consenso e o crítico emancipador*. servação e de registro, é possível isolá-lo, dissecá-lo ou congelá-lo. O
Quando o interesse técnico e de controle motiva a investiga- objeto, uma vez definido, delimitado (como um todo empírico), isclado
ção, esta é planejada para prover informações que permitam manipu- e dissecado, é dividido nas suas partes ou variáveis (processo analíri-
lar e controlar os objetos investigados, por meio de processos também co). Busca-se o maior número de informações possíveis, o controle
controlados e objetivados. rigoroso das variáveis por meio de quantificações ou formalizações
matemáticas, identificam-se causas e efeitos, mederm-se as inter-rela-
ções entre suas partes constitutivas, elaboram-se descrições mais per-
** Outros autores oferecem classificação para os enfoques epistemológicos modernos, por exemplo, feitas e organizam-se e cruzam-se informações, de tal maneira que
Piaget (1973), Louy (1976), Goldmann (1979) e Bruyne é colaboradores (1980).
permitam manipular melhor o objeto. Isto é, buscam-se as melhores con-
** Habermas (1982, p. 217) define como intereésse as oricntações básicas vinculadas a certas
condições fundamentais da produção e da autoconstiruíção possível da espécie humana: trabalho, dições possíveis para conseguir o máximo de manipulação e controle
interação e poder. Para o leitor interessado em obter mais informações, sugerimos o estudo das
obras de Habermas, especialmente aquelas que se referem ao nexo “conhecimento € interesse”. sobre o objeto ou fenômeno, dividindo-o progressivamente em partes
173

menores (maior número de vartáveis). Esse controle será mais efetivo buscando compreender os processos de sua transformação, suas con-
na medida em que a capacidade, o poder e a sofisticação das técnicas tradições e potencialidades de mudança. O homem conhece para trans-
ou instrumentos modernos permitam maiores divisões e maior número formar. O conhecimento tem sentido quando revela as alienações, as
de informações sobre as variáveis ou partes constitutivas (dividir para opressões e as misérias da atual fase de desenvolvimento da humanida-
controlar). Certamente, o interesse que orienta esses processos é o de, questiona ériticamente os determinantes econômicos sociais e lusté-
técnico de controle. ricos e dá potencialidade à ação transformadora. O conhecimento crítico
O enfoque histórico-hermenêutico, mais utilizado nas ciências do mundo e da sociedade e a compreensão de sua dinâmica transforma-
humanas e sociais, concebe o real como fenômeno “contextualizado”, dora propiciam ações (práxis) emancipadoras. À práxis elevada à cate-
se preocupa pela capacidade humana de produzir símbolos para co- goria epistemológica fundamental se transforma em critério de verdade
municar significados; por isso o processo cognitivo se realiza por meio e de validez científica. À práxis significa reflexão e ação sobre uma reali-
de métodos interpretativos, Os fenômenos não são isolados ou analisa- dade, buscando sua transformação. Transformação orientada para a
dos, são compreendidos e interpretados através de um processo de re- consecução de maiores níveis de liberdade do indivíduo e da humani-
cuperação de contextos de significados ou de horizontes de interpreta- dade em seu devir histórico (interesse crítico emancipador).
ção. Qutro pressuposto básico deste tino de investigação é o predomí-
nto dos elementos subjetivos, próprios da interpretação. O eixo central
do conhecimento não está no objeto, mas sim no sujeito que interpreta, Enfoques científicos na pesquisa educacional
que conhece, que dá sentido ao mundo e aos fenômenos. O critério de
verdade não reside na pretendida objetividade (ser fiel ao objeto); a Diante da necessidade de assegurar conhecimentos sobre a
verdade é o resultado do consenso intersubjetivo da comunidade cien- : produção de investigações em educação, desenvolvemos alguns estu-
tífica ou dos membros do grupo ao qual o fenômeno se revela ou se dos de caráter epistemológico pretendendo conhecer os enfoques ci-
manifesta. Seu caráter relativo (é verdade para esse grupo) se faz ain- entíficos que orientam essa produção”. Identificamos três grandes
da mais relativo quando o consenso acontece num determinado mo- enfoques epistemológicos que denominamos empírico-analíticos, fe-
mento, ou em um contexto ou cenário. histórico específico (é verdade nomenológico-hermenêuticos e crítico-dialéticos, os quais aglutinam as
para um determinado grupo num determinado momento; em outro diversas correntes metodológicas utilizadas nas pesquisas analisadas.
momento o contexto é outra verdade, outro o significado). Daí por que A presença desses enfoques depende de condições que ultrapassam os
este enfoque se denomina também “historicismo”, ou histórico-her- limites de uma área específica do conhecimento e uma determinada
menêutico. Certamente o interesse que comanda esses processos
cognitivos é o prático de consenso. ,
O enfoque crítico-dialético busca apreender o fenômeno em
2? Ver Sánchez Gamboa (1987, 1989).
seu devir histórico e em suas inter-relações com outros fenômenos,
174 175

região ou país, depende da influência das grandes correntes do pensa- Neste tipo de pesquisas o conceito de homem que está subja-
mento que como grandes matrizes da ciência contemporânea contri- cente se expressa por meio de categorias tecnicistas e funcionalistas
buem para o desenvolvimento dos diversos modelos científicos. À pes- identificando-o com os papéis que desempenham: administrador, le-
quisa educacional, devido ao seu caráter interdisciplinar e multipara- gislador, supervisor, professor, aluno, recurso humano, input, produto
digmático, não pode estar alheia a essa influência. de um processo, output.
À classificação e a denominação das tendências obedecem à As pesquisas fenomenológico-hermenêuticas utilizam predo-
terminologia mais utilizada no âmbito das próprias pesquisas -analisa- minantemente técnicas qualitativas que permitem a intersubjetivida-
das e que, além de ser empregada na Literatura especializada, se apro- de e a manifestação dos sujeitos incluídos na pesquisa, tals como en-
xima das categorias elaboradas por Habermas (1982) para identificar trevistas abertas, histórias de vida, discursos, opiniões e depoimentos.
os enfoques básicos da ciência contemporânea. O método interpretativo, próprio desta abordagem, permite o jogo
As pesquisas classificadas como empirico-analíticas utilizam pre- polissêmico, o discurso circular orientado à compreensão dos fenôme-
dominantemente técnicas quantitativas e análises estatísticas para a coleta nos em suas diversas manifestações. Os objetos da pesquisa (palavras,
e tratamento dos dados; têm como critério de cientificidade a racionalida- símbolos, gestos, atos, discursos, percepções, conceitos sobre a escola,
de técnico-instrumental. Dentro deste enfoque o objeto é delimitado, re- o currículo, a avaliação, a disciplina, as leis educativas etc.) são inter-
duzido a categorias numéricas e controlado através de sistemas de variá- pretados, procurando captar o significado desses fenômenos e revelar
VEIS, esquemas cartesianos e térmos “parafrásicos”. À concepção de ciên- seu sentido, ou seus sentidos, dentro dos diferentes contextos em que
cla se identifica com processos hipotético-dedutivos e com a busca de rela- se manifesta o fenômeno. À compreensão dos fenômenos implica ne-
ções de causalidade que expliquem os fatos ou os objetos. A escola, o cur- cessariamente a recuperação dos contextos de significação ou os hori-
tículo, os alunos, os professores, a legislação educativa, os conteúdos didá- zontes de interpretação. À palavra se entende no texto e o texto no
ticos etc. são tratados como “coisas”, dados empíricos, fatos objetivos; são contexto, sendo este último o que revela seu verciadeiro significado.
delimitados, “descontextualizados” e divididos em sistemas de variáveis Para os enfoques hermenêuticos, a inferpretação e à cormpre-
(partes constitutivas do objeto) e representados em perfis, códigos, histo- ensão são indispensáveis dentro da necessidade que os homens têm de
gramas, quadros de freqúências ou de correlações. se comunicar. O interesse cognitivo que orienta as investigações feno-
A formalização numérica das informações e dos dados adquiri- menológico-hermenêuticas é a comunicação. Conhecer os fenômenos
dos por meio de “técnicas objetivas”, previamente provadas ou testa- significa compreendê-los, algo diferente de manipulá-los ou controla-
das, permite um maior controle sobre o objeto, que no caso concreto los, mais ainda tratando-se dos fenômenos humanos.
de alunos, professores e outros agentes educativos não necessitam Neste enfoque científico a pretendida objetividade da ciência
“manifestar-se”, apenas responder um fest, uma indagação, um questio- empíirico-analítica é conseguida através da intersubjetividade ou do
nário ou ser rigorosamente observados e cuidadosamente registrados. consenso dos agentes comprometidos ou relacionados com a produção desse
conhecimento. É. notória a mudança de enfoque da relação sujeito-objeto,
176 17

nesta abordagem o sujeito é privilegiado, isto é, o processo é centrali- * Nas pesquisas dialéticas, o homem é concebido como ser social
zado no sujeito. e histórico, que, embora determinado por contextos econômicos, polí-
Nas investigações fenomenológico-hermenêuticas, como vimos ticos e culturais, é seu criador e transformador. De acordo com o enfo-
no oitavo capítulo, as concepções de homem expressam a visão exis- que crítico-dialético, o conhecimento da realidade, do mundo, das di-
tencialista. O homem é concebido como projeto, ser inconcluso, ser de nâmicas sociais e a ação transformadora dos homens se orientam para
relações, “diatógico”, ser-no-mundo, ser-com-outros, ser situado e a obtenção de maiores níveis de liberdade, adquiridos através de per-
“datado”, fonte de sentido, sujeito transcendente que confere sentido manentes lutas e da superação das contrádições sociais. A história dos
ao mundo e às coisas. homens assim o dernonstra. O interesse cognitivo predominante neste
As pesquisas classificadas como crítico-dialéticas utilizam téc- tipo de enfoque é o crítico-emancipador.
nicas historiográficas dentro das referências do materialismo histórico
ou estratégias que abordam a ação e a prática, como algumas modali-
dades de pesquisa-ação e pesquisa participante. À ciência é entendida Pesquisa científica e ética

como um produto soctal histórico, um fenâmêno em contínua evolução,


incluída no movimento das formações sociais e determinada pelos in- Os interesses cognitivos, identificados nas opções episternológi-
teresses e conflitos da sociedade na qual se produz. O critério de cien- cas, indicam diferentes maneiras de construir, analisar, constituir ou com-

tificidade radica na prática histórica (passada) ou a ser desenvolvida preender o objeto e diversas maneiras do sujeito posicionar-se frente a ele.

(futura), a explicação e a compreensão de objeto se obtêm na medida Os interesses de controle técnico, prático-comunicativo, ou cri-
em que recuperamos sua gênesis e seu desenvolvimento. Os fenôme- tico-emancipador se expressam durante os processos da pesquisa por
nos se explicam pela história dos próprios fenômenos. meio de opções técnicas, metodológicas, epistemológicas e filosóficas.
Ante o quadro anterior perguntamos, em primeiro lugar, se
A inter-relação entre o sujeito e o objeto é definida como “con-
cretude” ou “concreticidade” que se constrói como síntese da relação esta problemática estaria dentro do âmbito da ética, particularmente

cognitiva entre o sujeito e o objeto, como uma forma que integra a dentro da temática “ética e ciência”,

objetividade pretendida pela ciência empírico-analítica e a subjetivi- A respeito sabemos que a ética é uma ciência prática”, cujo

dade, predominante nas pesquisas tenomenológico-hermenêuticas. objeto de estudo é constituído por “um tipo de atos humanos: os atos
Os objetos são concebidos em seu devir como fenômenos mu-
tantes, inter-relacionados e em constantes processos de mudança.
Têmas como a relação educação/sociedade, as contradições da escola O da
2 Schimied-Kowarzik (1983) considera a ética, a polínca e a pedagogia dências práncas
capitalista, a ação educativa, a prática docente, a prática libertadora, o moral, bá
ação, diferentes das ciências básicas e aplicadas, O objeto dessas ciências da ação é 0 ato
no seu OA
ato pedagógico ou educativo e o ato político, respectivamente. São os atos
nexo teoria-prática em educação, história das tendências pedagógicas seu complexo suceder, que são o motivo principal dos estudos dessas ciências
s não os “fa
que seriam objeto da história ou de outras ciências.
etc. são objetos de estudo. passados, dissecados e registrados,
es
179
178

conscientes e voluntários dos indivíduos que afetam outros indivíduos, . Sobre o papel moral do homem de ciência, perguntamos se o
determinados grupos sociais ou a sociedade no seu conjunto.” (Sán- caráter ético exigido para o cientista parte das atitudes exigidas de
chez Vázquez, 1986, p. 14). De acordo com a definição anterior, sur- forma geral a todos os homens, como a busca da verdade, a honestidade,
gem algumas considerações relacionadas com o caráter livre e consci- o desinteresse pessoal e a crítica à falsidade, inclui outras exigências
ente da moral. O ato moral se caracteriza por ser realizado por convic- específicas de seu “que-fazer”. Essa exigência estaria relacionada com
ção íntima e não de uma rmmaneira mecânica externa ou impessoal. sua consciência social, política e filosófica, isto é, com os valores pró-
Os pesquisadores geralmente trabalham com processos implí- prios da visão de mundo que possui; em outras palavras, é possível
citos, os quais se organizam em modelos, desenhos, ou planos, que, exigir dele posturas e atitudes conseqiientes com a compreensão das
uma vez definidos, se desenvolvem quase que mecanicamente, sem relações entre os processos científicos e os interesses cognitivos que
uma reflexão consciente dos presstipostos é as implicações desses me- orientam tais processos.
canismos. Por isso, querer vincular os processos investigativos a um Por outro lado, delimitar a ética ao uso da ciência, ou apenas à
ato livre é consciente termina por questionar a própria “especificidade ciência aplicada, significaria que a questão moral das ciências se situa
da ética. Não podemos concluir, por exemplo, que o investigador que à posteriori dos processos de investigação; isto supõe uma concepção de
opta por métodos técnicos de controle para manipular populações de ciência axiologicamente neutra. Posição bastante questionada no âm-
alunos, professores etc. realmente tenha essa intenção e por isso pode- bito da epistemologia contemporânea e no contexto das discussões atuais,
ríamos denunciá-los por “reificar” ou “coisificar” os sujeitos, ou ma- sobre a participação ativa do sujeito, com toda sua carga de valores e
nipular os homens. pressupostos, na construção do pretendido conhecimento objetivo. Esse
Outra consideração importante se refere ao tratamento que a sujeito, que elabora o conhecimento, é ao mesmo tempo investigador,
ética vern dando ao papel moral do hornem de ciência e à utilização dos cientista, cidadão, homem de seu tempo, vinculado a um determinado
resultados das pesquisas científicas. grupo social com interesses e valores culturais específicos, condições
Com relação ao primeiro aspecto, o cientista deve apresentar inerentes das quais não se pode separar quando se realiza uma pesqui-
uma série de qualidades morais que garantam o objetivo essencial de sa”, Perguntamos se para superar a ilusão dos procedimentos científi-
sua atividade, a saber: a busca da verdade, a honestidade intelectual, a cos “axiologicamente neutros” podemos pensar na possibilidade de in-
crítica à falsidade etc. (Sánchez Vázquez, 1986, p. 88). clizir entre as questões éticas da ciência os próprios procedimentos cien-
Com relação ao segundo aspecto, “o uso da ciência pode trazer tíficos; podemos pensar em uma ética não a posteriori, mas relacionada
grandes bens ou espantosos males para a humanidade.” (Sánchez Váz-
quez, 1986, p. 88). Neste caso, o cientista não deveria permanecer
indiferente perante as consequências sociais de seu trabalho e da utili-
zação que se faz de suas invenções. 2º À questão da neutralidade da ciência É amplamente discutida por Merleau-Ponty (1967),
Habermas (1973), Bourdieu e Chauderon (1975) e Japiassu (1975).
Te
189 181

com os processos científicos, com as técnicas, os métodos, as aborda- e políticas do fazer científico. À opção por uma determinada técnica, um
gens epistemológicas utilizadas durante a pesquisa científica? método, uma abordagem episternológica leva, quase sempre e de forma
Outra consideração importante se refere à possibilidade de inconsciente, a atitudes e posturas ante o mundo, à história, ao homem, à
superar o grau de inconsciência ou de ignorância metodológica dos sociedade, dos valores, aos interesses dominantes etc. Novas formas mais
investigadores, pois muitos deles utilizam procedimentos regidos por conscientes levam a posturas mais críticas ante as concepções implícitas
modelos científicos ou paradigmas epistemológicos, sem estarem cons- nos modelos de ciência e nos paradigmas que usamos.
cientes dos pressupostos filosóficos e das implicações sociais, políticas Na medida em que o investigador adquire consciência dessas
ou ideológicas inerentes a esses modelos ou paradigmas. implicações é possível recuperar a dimensão. ética dos processos clen-
Pensarnos que incluindo na formação do investigador estudos tíficos que realiza. Com a formação filosófica e epistemológica do in-
sobre os pressupostos epistemológicos e filosóficos que fundamentam vestigador é possível não só recuperar a consciência do método, mas
os diferentes modelos científicos podemos resgatar a “consciência do também facilitar outras discussões éticas, tais como: investigar para
método” (Lalande, 1967, p. 298) ou superar a “ignorância metodoló- quê, para quem, em relação a que tipo de sociedade, com que visão
Bica” e a “falsa consciência” que desvincula conhecimento e interesse histórica etc.
(Habermas, 1983, p. 310). Os atos humanos em geral e o fazer científico, em particular,
têm um “telos”, um “para quê” que o “ator” deve vislumbrar com a
maior clareza possível.À conquista dessa “elucidação” será consegui-
Conclusões da na medida em que se reflete sobre esses atos. Refletir não é um ato
isolado e encerrado dentro dos limites da subjetividade do ator, nem
Superar a “inconsciência do método”, como disse Bachelard,
dentro das fronteiras pragmáticas da ciência objetiva e separada das
ampliar a “vigilância epistemológica” sobre os processos científicos, demais dimensões humanas. Tomar consciência do fazer científico, isto
proposta por Bachelard, e traspassar 2 “ignorância metodológica” e a é, torná-lo um “que-fazer”, exige romper as fronteiras estreitas da
“falsa consciência” sobre os processos do conhecimento, como denun- separação analítica, que dá prioridade às partes diante do todo, e dis-
cia Habermas, significa resgatar a dimensão ética do ato de investigar tancia a ciência da reflexão filosófica e ética. Essa tomada de consci-
e colocar o problerna da ética e a ciência e da relação “ciência-consci- ência também reclama o resgate dos nexos com o todo social histórico
ência”, não como um assunto & posteriori, mas como uma questão ur-
e a recuperação das ligações entre as ciências € a reflexão interdisci-
gente que deve ser assumida como uma atitude consciente “dentro” do plinar. Em outras palavras, é necessário superar a visão da ciência como
próprio processo científico.
campo autônomo ou auto-referente, ou como atividade “nobre e desinte-
Para conseguir essa nova dimensão é necessário incluir na for-
ressada”, cuja função primordial seria romper com o mundo das sombras,
mação do pesquisador a discussão profunda e crítica sobre os pressu-
postos episternológicos e filosóficos e das possíveis implicações ideológicas
182

das ideologias, do conhecimento vulgar, das crenças tradicionais, dos


valores, do saber popular etc.
Entender a ciência em seus nexos com o todo social histórico
implica reconhecê-la como uma construção social e, portanto, vincula-
da a interesses dominantes e/ou conflitantes, a intenções, a posturas
políticas ideológicas, a valores etc., os quais estão inerentes aos pro-
cessos de construção da própria ciência. Nesse sentido, ignorá-los ou
separá-los artificialmente conduz à “inconsciência” dos procedimen-
tos ou à “falsa consciência” que separa o conhecimento do “interesse”,
situação essa que soros chamados a superar, CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na fase atual do desenvolvimento da pesquisa educativa, que
se caracteriza pela profusão de abordagens teórico-metodológicas, de
onde as possibilidades de opções epistemológicas são muitas, é urgen-
te a elucidação dos pressupostos de cada abordagem, a busca de seus
fundamentos epistemológicos e filosóficos e maior a responsabilidade Como o leitor pode apreciar, esta publicação não é um manual
por esclarecer as correspondentes implicações sociais e políticas de de pesquisa e sim um ensaio que oferece algumas contribuições para
cada opção. De igual maneira, é premente a necessidade de reflexões aprofundar nos fundamentos epistemológicos e filosóficos da Pesquisa
sobre as atitudes e posturas éticas do pesquisador em educação. Educacional.
Talvez sua importância e a força das reflexões aqui expostas
estão no ponto de partida, a prática da investigação científica. À análi-
se dessa prática nos conduz à busca da lógica que organiza os diversos
elementos do trabalho científico.
A pesquisa educacional não se reduz a uma série de instru-
mentos, técnicas e procedimentos. Estes constiruem parte do método
científico. O método ou caminho do conhecimento é mais amplo e com-
plexo; por sua vez, um método é uma teoria de ciência em ação que
implica critérios de cientificidade e de rigor da prova científica. De
igual maneira, toda teoria de ciência se afirma numa teoria do conhe-
cimento, onde as concepções de objeto, sujeito e sua mútua relação se
184

explicitam entre si. Na mesma sequência de complexidade não existe


uma teoria do conhecimento sem uma ontologia, sem uma concepção
do real, sem uma cosmovisão. |
Concluindo, podemos defender a hipótése da inexistência de
um trabalho de pesquisa desligado de uma visão de mundo. O cientista
trabalha com pressupostos teórico-filosóficos que orientam seu fazer,
e, na medida em que os sisternatize, reflita sobre suas implicações e
torne consciência deles, seu trabalho será mais rico e articulado.
Essa visão articulada dos principais elementos que compõem o
processo Investigativo não se adquire na primeira pesquisa, nem lendo REFERÊNCIAS
manuais e estudando apenas metodologias da investigação científica;
adquire-se na prática da pesquisa e na busca de horizontes de signifi-
cação e dos fundamentos epistemológicos e filosóficos dessa prática. À
visão articulada dos diversos elementos constitutivos da pesquisa se
ALVES, R. Filosofia da Ciência. São Paulo: Brasiliense, 1983.
constrói através da autocrítica e da reflexão rigorosa, radical e global
da prática científica. Os resultados e as reflexões aqui apresentados BACHELARD, G. Epistemologia. Barcelona: Ed. Anagrama, 1989,
pretenderam andar pelos atalhos da reflexão a partir da prática da
: . Epistemologia, trechos escolhidos. De Dominique Lecourt. Rio
pesquisa educativa. de Janéiro: Zahar Eckitores, 1983.
Espero que estes registros contribuam para o despertar da “vi-
. O novo espírito científico. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1968.
. gilância epistemológica” sobre o exercício da pesquisa, à qual estamos
convocados, nós os que tomamos a pesquisa como uma forma de co- BENGOECHEA, 8. et al. La investigación empírica y razonamiento dialéctico.
nhecer a realidade que nos circunda para compreendê-la. E a partir Revista Mexicana de Ciencias Políticas y Sociales, México, (93-94),
p. 73-95, 1978.
dessa compreensão fazer possível sua transformação, com o objetivo
de diminuir a miséria da existência humana. BLACK, M. Modelos y metáforas. Madrid: Tecnos, 1977.

BLANCHÉ, R. A epistemologia. Rio de Janeiro: Martins Fontes, 1975.

BOURDIEU, E; CHAUDERON, J. El oficio del Sociólogo. México:


Siglo XXI, 1975.

BRANDÃO, C. (Org.). Pesquisa participante. São Paulo: Brasiliense, 1981.


136 187

BRASIL. MEC, Inep, Editorial, Revista Brasileira de Estudos Pedagó- DURKHEIM, E. As Regras do Método Sociológico. São Paulo: Nacio-
gicos, Brasília, 1972. nal, 1972.

BRAYBROOCOKE, C. Estrategy of decision. New York: Free press, 1963. ETGES, N. Avaliação dos Cursos de Pós-graduação na UFRGS. Educação &
Realidade, Porto Alegre, (1), p. 45-60, 1981.
BRUTNE, P. et al. Dinâmica da pesquisa em Ciências Sociais. Rio de
Janeiro: Francisco Alves, 1980. FAZENDA, L (Org.). Metodologia da Pesquisa Educacional. São Pau-
lo: Cortez, 1989.
BUCKLEY, W. La Sociologia y la Teoria Moderna de los Sistemas
Buenos Alres: Amorrortu, 1970. FELDENS, M. da G. E Alternativas Metodológicas para a Pesquisa em Edu-
cação: reflexões e questionamentos. Ciência e Cultura, SBPC, São PFaulo, 10
BURNS, R. Educación para el Desarrollo y Educación para la paz. Perspecti- (35), p. 1521-1526, 1983.
vas, UNESCO, París, (2), p. 138-140, 1981.
FERNANDEZ, F. Universidade Brasileira, Reforma ou Revolução.
CAMPBELL, D.; STANLEY, j]. Delineamentos Experimentais e São Paulo: Alfa-Omega, 1979.
Quase-experimentais de Pesquisa. São Paulo: Pedagógica e Universitária,
1979. FERRATER MORA, J. Diccionario de Filosofía. Buenos Aires: Surame-
riçcana, 1971.
CEPTULIN, A. A Dialética Materialista. São Paulo: Alfa-Omega, 1982.
FRANCO, M. L. E B. Por que o conflito entre tendências metodológicas não é
CROCE, B. La Historia como Hazana de la Libertad, México: Fondo falso. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, (66), p. 75-80, 1988.
de Cultura Económica, 1971.
GADOTTI, M. Educação e poder. São Paulo: Cortez; Autores Associados,
CUNHA, L. A. Os (Des) Caminhos da Pesquisa na Pós-Graduação em Educa- 1980.
ção. In: CAPES, Seminário sobre Produção Científica nos Programas
de Pós-Graduação em Educação, 1979, Brasília, Departamento de Docu- GATTI, B. Pós-Graduação e Pesquisa em Educação no Brasil, 1978-1981. Ca-
mentação e Divulgação, 19739. p. 3-24. dernos de Pesquisa, São Paulo, (44), p. 3-17, 1983.

CUPANI, A. À Hermenêutica ante o Positivismo. Manuscrito, Carpinas, GOERGEN, E Pesquisa em Educação: sua função crítica. Educação e Socie-
UNICAMP IX (1), p. 75-100, 1986. dade, São Paulo, (9), p. 63-96, 1981.

DE LANDSHEERE, G. La Recherche en Education dans le monde. GOLDMANN, L. Dialética e cultura, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
Paris: PÚUF, 1986.
GOUVEIA, A. À Pesquisa sobre Educação no Brasil de 1970 para cá. Cader-
DEMO, P. Metodologia Científica em Ciências Sociais. São Paulo: Atlas, nos de Pesquisa, São Paulo, (19), p. 75-79, 1976.
1981.
. Algumas reflexões sobre a pesquisa Educacional no Brasil. Cadernos
DOMINGUES, J. L. Interesses humanos e paradigmas curriculares. Revista de Pesquisa, São Paulo, (55), p. 63-67, 1985.
Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, 67 (156), p. 351-66, 1986.
. Orientações teórico-metodalógicas da Sociologia da Educação no Brasil.
Cadernos de Pesquisa, São Paulo, (55), p. 63-67, 1985.
189
168
Rio de Janeiro: Tempo Bra-
LEVISTRAUSS, C. Antropologia Estrutural.
. Algumas reflexões sobre a pesquisa educacional no Brasil. Revista Bra- :
sileiro, 1970.
sileira de Estudos Pedagógicos, Rio de Janeiro, 60 (136), p. 495-500, 1974.
o: Paz e
LOWY, M. Método Dialético e Teoria Política. Rio de Janeir
HABERMAS, J. Conhecimento e interesse. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. Terra, 1975.

- Erkenntnis und Interesse. Frankfurt am Nain: Subrkamp Verlag, LÚDKE, M.; ANDRÉ, M. D. A. Pesquisa em Educação:
abordagens qua-
1973.
litativas. São Paulo: Epu, 1986.
—. Conhecimento e interesse. São Paulo: Abril Cultural, 1983. p. - Ideologia e Ciências Sociais. São Paulo: Cortez, 1986.
278-312. (Coleção Os Pensadores).
Política. Lo: . Contribuição à
MARX, K. O método da economia p. 218-232.
HEMPEL, C. A lógica da análise funcional. Revista Brasileira de Geo- : Martins Fonte s, 1983.
crítica da economia política. São Paulo
grafia, Rio de Janeiro, na. 8, n. 38, p. 130-160, 1972.
igma. In: LAKATOS, 1; MUS-
MASTERMAN, M. À Natureza do Parad
Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, 38(2), p- nvolvimento do conhecimento.

. GRAVE, A. (Orgs.). À crítica € o dese
130-140, 1976. São Paulo: Cultrix, 1979. p. 72-108.

JAPIASSU, N. Introdução ao pensamento epistemológico. Rio de Ja- Cadernos de Pesquisa, São


MELLO, G. A. Pesquisa Educacional no Brasil.
neiro: Francisco, 1979.
Faulo, (46), p. 67-72. 1983.
JAPIASSU, H. O mito da neutralidade científica. Rio de Janeiro: Lmago, 1975. . Educação na América Latina, São Paulo
: Cortez, 1985. p. 173-186.

O. V. À dialética como lógica e teoria do conhecimento. Rio e Fenomenologia. São


KOPNIN, MERLEAU-PONTY, M. Ciências do Homem
de Janeiro: Civilização Brasileira, 19738. Paulo: Ed. Saraiva, 1973.

KOSIK, K. Dialética do concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989. The structure of behavior. Boston: Beacon
Press, 1967.

- Dialética do concreto e teoria política. Rio de Janeiro: Paz e MERTON, R. N. Social theory
and Social-Structure. New York:
The
Terra, 1975. :
Free Prex, 1968.

T A Estrutura das revoluções científicas. São Paulo Perspecti- to complexo. Lisboa: Instituto Pi-
KUHN, MORIN, E. Introdução ao pensamen
vas, 1975. aget, 1990,

A. Vocabulario Técnico y Científico de la Filosofía. Bue- lexidade. Lisboa: Publica-


LALANDE, . O problema epistemológico da comp
nos Ares: Áteneo, 1967. 1996.
ções Europa-América,
México: Fundo de os Aires: Paidós, 1967.
LAPATÍ, P La investigación educativa en México. PARSON, T. Ensayos de teoria sociológica. Buen
Cultura Económica, 1994,
a. Barcelona: Ariel, 1973.
PIAGET, J. Psicologia y Epistemologi
. Acerca de la influencia de la investigación educativa. Perspectiva,
UNESCO, París (3), p. 329-336, 1981.
fes

190 191

— Lógica y Conocimiento Científico. Buenos Aires: Proteo, 1973. —. Fundamentos para la Investigación Educativa: presupuestos
epistemológicos que orientan al investigador Santafé de Bogotá: Cooperativa
- Logique et Connaissance Scientifique: nature et methodes de Editorial Magisterto, 2001. p. 143.
L'Epistemologie. Faris: Gallimard, 1967.
- Globalização, Pós-modermidade e Educação: os desafios para o novo
ROJAS, RF. L La concepción marxista del hombre en la historia de la pedagogia: notas século. In: LOMBARDI, J. C. (Org.). Globalização, pós-modernidade e
para su estudio. Revista Cubana de Educación Superior, v: VI, n. 2, p. 3-10, 1986. educação. 2. ed. Campinas: Autores Associados, 2003. p. 79-106

RYAN, A. Filosofia das Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Francisco Alves, Las categorias de tiempo e historicidad en los actuales enfoques de la
1977. : historiografia educativa en Brasil. Tn: CUCUZZA, Hector Ruben (Org.). Es-
toria de la educación en debate. Buenos Aires: Ed. Mião y Davila, 1996.
SÁNCHEZ GAMBOA, S. Investigación educativa: um enfoque epistemológi-
co. In: COMBESSIE, J. C.; SÁNCHEZ GAMBOA, 8. et al. Investigación e . Retomando o debate sobre a pedagogia do movimento. In: CHAVES,
innovación educativa. Santafé de Bogotá: Cooperativa Editorial Magisté- M. (Org). Pedagogia do Movimento: diferentes concepções. 2. ed. Ma-
rio, 2003. p. 57-76. ceió: Edufal, 2004. p. 07-10.

. A Dialética na Pesquisa em Educação: elementos de contexto. In: — (Org). Pesquisa Educacional: quantidade-qualidade. 5. ed. São
FAZENDA, I. (Org.). Metodologia da Pesquisa Educacional. São Pau- Paulo: Cortez, 2002.
lo: Cortez, 1989.
- A Dialética na Pesquisa em Educação: elementos de contexto. In;
. À pesquisa na Construção da Universidade: o compromisso com a FAZENDA, 1. Metodologia da Pesquisa Educacional. 9. ed. São Paulo:
aldeia num mundo globalizado. In; LOMBARDI, José Claudinei (Org.). Pes- Cortez, 2004. p. 9i-115.
quisa em Educação, História, Filosofia e Temas Transversais. 2. ed.
Carnpinas: Áutores Associados, HISTEDEBR, 2000. p. 77-93. . A produção dos doutorados em Educação do Estado de São
Paulo: questões epistemológicas e gnosiológicas (1986-2004). 2005. Relatório
. Alternativas metodológicas en el ejercicio de la investigación educati- de Pesquisa. FE/Unicamp, Campinas. 2005.
va. Educação e Sociedade, São Paulo (19), p. 91-111, 1984.
; CHAVES, M.; TAFFAREL, C. (Orgs.). Prática Pedagógica e
. Análise Epistemológica dos Métodos na Pesquisa Educacio- produção do Conhecimento na Educação Física & Esporte e Lazer.
nal. 1982. Dissertação (Mestrado em Educação) — UnB, Brasília, 1982. Maceió: EdUFAL, 2003. p. 25-44.

. Às condições da produção científica em educação: do modelo de áreas ; SANTOS FILHO, J. C. Pesquisa Educacional: quantidade-qua-
de concentração aos desafios das linhas de pesquisa. Educação Temática Di- dade. São Paulo: Cortez, 2005.
gital, ETD, Faculdade de Educação, Unicamp, v. 4, n. 2, p. 78-83, jul. 2003.
o ; SANTOS FILHO, José Camilo. Investigación Educativa: can-
. Epistemologia da pesquisa em educação. 1987. Tese (Doutora- tidad-cualidad. Santafé de Bogotá: Cooperativa Editorial Megisterio, 1997. (Co-
do em Educação) — Unicamp, Campinas, 1987. lección Mesa Redonda).

. Epistemologia da pesquisa em educação. Campinas: Praxis, 1996. SÁNCHEZ VASQUEZ, A. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1936.
p. 153. Disponível em: <www. geocitles.com/grupoespisteduc>. Acesso em: 25
jul. 2006. SARTRE, J. E Problemas de Método. Bogotá: Ediciones Estrategia, 1963.
192 193

SAVIANI, D. Escola e Democracia. São Paulo: Cortez, Autores Associados, ” ZUBIETA, L.; PARRA, S. R. La investigación educativa en Colombia: nuevos
1984. rumbos. In: MADEIRA, F; MELO, G. N. Educação na América Latina:
os modelos teóricos e a realidáde social. São Paulo: Cortez, 1985. p. 173-186.
« Las teorias de la educación y el problema de la marginalidad en Amé-
rica Latina. Revista Colombiana de Educación, CIUE, Universidad Peda-
Bógica Nacional, Bogotá, n. 13, I semestre, p. 9-33, 1984.

- Educação: do senso comum à consciência filosófica. São Paulo: Cor-


tez, Autores Associados, 1980.

SCHIMIED-KOWARZIK, W. Pedagogia Dialética. São Paulo: Cortez,


1983:

STENHOUSE, L. La investigación con base de la enseãanza. Madrid:


Morata, 1985. :

TEDESCO, J. B. Paradigmas da Investigação Sóeio-Educativa. Revista La-


tino-Americana de Estudos Educativos, México, v. XV, n. 2, p. 11-41,
1985.

TEDESCO, J. C. Los paradigmas de la investigación educativa. Revista Co-


lombiana de Educación, CIUP, Universidad Pedagógica Nacional, Bogotá,
n. 18, 1I semestre, p. 7-35, 1986.

THIOLLENT, M. Crítica Metodológica, Investigação Social e En-


quete Operária. São Paulo: Polis, 1981

TORRES, C. A Práxis Educativa de Paulo Freire. São Paulo: Loyola,


1979,

URSUA LEZAUN, N. (Org.). Filosofia de la Ciencia y Metodologia


Crítica. Bilbao: Desclée de Brourver, 1981, |

VIELLE, T. P El Impacto de la Investigación en el Campo Educacional. Pers-


pectivas, UNESCO, París, (3), p. 337-352, 1981.

VIET, J. Métodos Estruturalistas em Ciências Sociais. Rio de Janeiro:


Tempo Brasileiro, 1973.

WARDE, M J. Contribuições da Eistória para a Educação. Em Aberto, Bra-


sília: INEB, ano TX, n. 47, jul /set. 1990.
Tírulo Pesquisa em educação: métodos e epistemologias

Auror Silvio Sánchez Gamboa

Assistente editorial THilario junior dos Santos

Assistente administrativo Neli Ferrari

Secreraria Alexandra Fatima Lopes de Souza

Divulgação Josué Carvalho

Projeto gráfico é diagramação Roumise Blezus

Capa Ronise Biezus e fakeline Mendes Ruviaro

Preparação dos originais Jakeline Mendes Ruviaro

Revisão Jakeline Mendes Ruviaro


Débora Vivien
Juliane Fernanda Kuhe

Formato 16 X 23 cm

Tipologia CaslonOldFaceBT e Futura BK BT


entre 7 é 15 pontos

Papel Capa: Cartão Supremo 350 g/mº


Miolo: Pólen Sof 80 g/mº

Número de páginas 193

Tiragem 800

Publicação julho/2007

N" Impressão e acabamento Gráfica e Editora Pallorri - Santa Maria (RS)


Argos - Editora Universitária - UNOCHAPECÓ
Av. Attilio Fontana, 591-E - Baiero Efapi - Chapecó (SC) - 89809-000 - Cana Postal 747
Fone: (49) 3321 8218 - argos(&unochapeco.edu.br - www.unochapeco.adu.br/argos

Você também pode gostar