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Bernardino Coelho da Silva

Com Einstein, numa mesa de bar!


Se os fatos não se encaixam na teoria, modifique os fatos.
 (Albert Einstein)

Um dia desses, tive a oportunidade de conversar longamente com um amigo - por menos
crível que seja - sobre Albert Einstein e um pouco sobre a Teoria da Relatividade, de
uma forma um tanto mais filosófica, o requerido para o momento. Afinal de contas
estávamos em um bar; eu tomando cerveja e ele, cachaça.

Primeiro, vamos dar ao meu amigo o nome de Rafael. Ele tem cerca de 30 anos, nunca
trabalhou e estudou poucos anos, mas é muito inteligente e "sintonizado", pelo que é
possível a gente entabular um bom papo com ele, mesmo estando, quase sempre, um
tanto alto. Na mesma mesa do Rafael estava sentado seu pai, também bebendo pinga - e
também alcóolatra - e sua mãe, que conseguiu deixar o vício. Eu, como sempre, estava
em pé - também é vício - e ia entre o balcão onde bebia e a mesa do Rafael e de seus
pais. Ele estava muito inchado e, pelo jeito não o teremos muito mais entre nós!

E foi este o fio condutor que nos levaria a Einstein. Disse a Rafael que o via, naquele dia
um pouco melhor, mas que ele estava caminhando célere para a morte, do que eu não o
condenava, porque cada um faz da vida o que quer. Mas fiz-lhe saber que achava estar
sendo muito egoísta em dar fim à própria vida, quando tinha tantas pessoas que
gostavam dele, especialmente sua mãe, que deixara de beber para tentar se redimir diante
do filho e passar, talvez, a ser um exemplo positivo. Como ele escutou calado e senti que
lhe bateu fundo a minha provocação animei a continuar o papo e este se encontrou com
Einstein. Afinal, como o Rafael me disse ao final, "boteco também é cultura".

Mas eu relembrava a Rafael a trajetória de Einstein depois de formado em Física, com a


pretensão de ser um professor na disciplina. Ele, que nunca fora considerado um aluno
exemplar durante seu período de estudos acadêmicos, teve grande dificuldade, depois de
formado, em conseguir um emprego. Como professor não foi aceito, mas conseguiu,
com a ajuda do pai de um amigo, um emprego no Escritório de Patentes da Suíça. Sem
entrar muito em detalhe sobre o trabalho que Einstein fazia como "Examinador
Assistente", vale ressaltar que muito de seus trabalhos se relacionava a questões sobre a
transmissão de sinais elétricos e sincronização eletromecânica do tempo, dois problemas
que viriam aparecer em suas "elucubrações mentais" que o levariam a desenvolver
teorias radicais a respeito da natureza da luz e sobre o espaço e o tempo. 

Segundo consta, Einstein passava boa parte do tempo, no Escritório de Patentes, olhando
o nada. Literalmente, "viajando". Em um desses seus devaneios mentais, Einstein
imaginou uma pessoa caindo do alto teto do prédio em frente à sua janela. E, como se o
visse em um elevador, Einstein imaginou o homem "flutuando" e logo ele relacionaria
esta sua "visão" com a maçã de Isaac Newton. Ora bolas, por mais que tivesse Newton
como seu ídolo, Einstein viu naquela sua percepção algo que discordava com o que o
"mestre" falava. Afinal, deveria ter algo que nos empurra em direção ao solo e não uma
mera força da gravidade que nos atraia, como na percepção de Newton para a queda da
maçã. Mas a Teoria da Relatividade, que Einstein publicou em 1905, viria em
contrapondo ao conceito separado de espaço e tempo de Newton, com o conceito de
espaço-tempo, vistos como uma entidade geométrica unificada.

De acordo com Einstein, aquele homem, do seu imaginário, somente cairia porque
"recebia um empurrão" do espaço, já que nesse primeiro momento Einstein deixou de
lado os efeitos da gravidade, que só viria a aparecer na Teoria Geral da Relatividade,
publicada por ele, 10 anos depois em que os efeitos da gravidade seriam integrados a
esta que seria uma teoria mais ampla e que resolveria uma "marreta" introduzida por
Einstein na Teoria Especial da Relatividade. Aí sim, ficava completa a noção de tempo-
espaço curvo que, de forma grosseira, "empurraria" o homem que escorregava do
telhado em frente à sua janela.

Papo pesado para boteco? Nem tanto, porque muita gente ficou de "ouvido em pé", com
a gente costuma falar. E, depois de muita lorota, conclui para o Rafael: você está agora
diante de duas opções e não tem outra. Ou você vai resistir a ser atraído pela força que o
álcool exerce sobre você ou vai ser empurrado para a morte.

E aí, a gente volta ao papo inicial...

Rafael, com certo esforço em não chorar, me disse: boteco também é cultura! Depois
deste, passei vários dias sem encontrá-lo novamente, mas fica a lição também para
outros que estão, neste momento de crise, às vezes desesperados. Nós temos a opção de
nos deixar sucumbir pelos problemas ou sermos agentes de resistência e mudança.
Mesmo atraídos ou, de certa forma, empurrados, ainda somos donos de nosso destino e
não uma mera maçã...

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