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UNESP UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

CÂMPUS DE FRANCA
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

JUDICIALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS E IMPACTOS FINANCEIROS: A


MORADIA E O PRINCÍPIO DO MÍNIMO VITAL

NISHIMURA, Pedro Henrique Falaguasta


SOUZA, Mateus Gratão Fogassa de
COSTA, Paulo Henrique Illesca da
NASCIMENTO, Vinicius Alves do
SANTOS, Lucas Drabek dos

Resumo: Este artigo vem propor uma exposição de conflitos pertinentes aos impactos
financeiros que a judicialização excessiva, caracterizada ou não como ativismo judicial, exerce
dentro do aspecto orçamentário nacional. Para concretizar esse objetivo, busca-se
contextualizar inicialmente o aspecto do puro fenômeno da sobrecarga do judiciário, além do
aspecto da função social da propriedade, para então relacionar ambos os elementos com suas
consequências deficitárias na concretização do direito à moradia na tutela estatal. Explora-se,
dessa forma, uma intervenção judicial no regulamento orçamentário, que no assegurar de
direitos não atingidos em sua origem, acaba por gerar despesas adicionais não previstas pelo
legislativo, além de custas originadas pela pura manutenção dos órgãos judiciários afetados
pelo alto volume de processos e as despesas processuais em si, individuais de cada ação
efetivada, quando não possuem isenção prevista para o setor público. De tal modo, o texto se
orienta pela construção dos diversos fatores elencados que se relacionam, nas políticas públicas,
com uma previsão de despesas e atividade estatal pelo meio jurisdicional. Por fim, não há uma
conclusão irrigada de vícios puramente opinativos, a atuação dos magistrados na matéria
financeira do Estado se dá de forma a concretizar o próprio objetivo primordial constitucional
deste, quando é omisso. Tais ações, no entanto, indiscutivelmente afetam um equilíbrio
orçamentário que comumente já se encontra numa previsão deficitária.

Palavras-chave: Judicialização. Políticas públicas. Direito à moradia.


1. INTRODUÇÃO

Autoridade é algo diferente do poder. É o saber-se o que se deve fazer,


serenamente. Os romanos chamavam-na de auctoritas. Por isso – porque
os magistrados, para o serem, são os que mais dela necessitam – os
cidadãos a eles devem acatamento e respeito. A eles e a seus julgamentos
(EROS GRAU, 2012) 1.

O Poder Judiciário não se trata de uma obra individual do aparato estatal, mas trata
de consciência coletiva a qual trabalha na constante tentativa de garantir o pleno
funcionamento do Estado e julgar as questões pertinentes aos conflitos sociológicos que
um território soberano quanto ao Direito, acaba por gerar. O aumento, cada vez mais
evidente e anormal, do volume de ações e processos de forma geral, que se concentram
nessa esfera dos poderes constitucionais, não significa necessariamente uma simples
atividade irrestrita das magistraturas, assim como também não se baseia apenas em um mal
funcionamento ou algum erro epidêmico no Estado. Outros fatores como a omissão do
legislativo na concretização de direitos, o fenômeno sociológico cultural de preferência à
resolução de mérito em detrimento dos acordos de arbitragem ou mesmo a possibilidade
de autocomposição entre as partes, estão entre os diversos fatores que poderiam explicar a
sobrecarga no volume de processos que tramitam atualmente nos diversos tribunais do país.

Essa história de que o Supremo se expandiu excessivamente é uma lenda.


O Supremo tem pouquíssimas decisões que sequer tangenciaram a linha
de fronteira. É que há, aí, uma imprecisão interpretativa. O fenômeno que
existe no Brasil é o da judicialização. Por força de uma Constituição
abrangente, a sociedade e os atores políticos judicializam todas as
matérias (BARROSO, 2015) 2.

Ainda assim, as reais motivações da judicialização vivida no contexto político


brasileiro são apenas parte do contexto geral a ser analisado. Cada uma das decisões
tomadas nas ações de tutela do Estado, quando incumbem alguma ação a ser tomada por
este, revelam uma despesa adicional que deveria ser irrisória, mas pelo alt o volume de
ações de mesma natureza que tramitam e transitam em julgado, acabam afetando o
orçamento dos entes federativos em um grau muito além do previsto. Seja a provisão dos
remédios constitucionais, sejam os custos com os sistemas dos tribunais, seja a necessidade
de cada vez mais funcionários no ordenamento do Direito Público ou a ativação constante
dos oficiais de justiça; cada um destes fatores ressignifica o déficit público de forma
regular na atualidade. No entanto, aquelas consequências judiciais mais onerosas acabam

1
Artigo publicado originalmente no Estado de S. Paulo, edição 8/12/2012.
2
Entrevista ao blog “Os Constitucionalistas” dada pelo Ministro do STF Luís Roberto Barroso em 2015.
sendo as sentenças que movem as políticas públicas, nas quais há uma atuação
administrativa ainda mais evidente e até mesmo um pouco megalomaníaca que deve ser
realizada pelo Estado, quando julgadas procedentes.

Afirma-se, em geral, que os direitos sociais demandam enormes


investimentos públicos, de forma que a interferência do Poder Judiciário
no orçamento, para a respectiva satisfação, poderia inviabilizar
economicamente o funcionamento do próprio Estado (...) Impende
assentar que não só os direitos sociais, como também os direitos
fundamentais de primeira geração, impõem custos ao Estado. Todas as
gerações (ou dimensões) de direitos fundamentais demandam receita para
a sua realização, posto que estabelecem, mesmo reflexamente, deveres
negativos e positivos para o Estado. (GRINOVER; WATANABE, 2012).

É nessa linha administrativa que o judiciário acabou por tomar atenção especial ao
direito à moradia previsto no Artigo 6º da Constituição Federal (BRASIL, 2015),
explorando principalmente sua característica extremamente abstrata e complexa dada a
carência textual sofrida por este fragmento de texto legal. Dessa forma, os tribunais
regionais e federais, assim como o STJ e o STF, buscaram apoio na função social da
propriedade, nos espaços em aberto de jurisprudências já consolidadas e em outras fontes
não primárias do Direito, em uma caminhada incessante para interpretar e concretizar o
direito à moradia digna do cidadão brasileiro, não se atentando com a mesma vividez p ara
os efeitos orçamentários que a construção de tantas decisões desenfreadas e
interdependentes, poderiam causar para a união indissolúvel dos Estados e Municípios e
do Distrito Federal como um todo.

2. POLÍTICAS PÚBLICAS
A condição social de parte da população brasileira é extensamente conhecida como
miserável, necessitando de atuação do Estado para garantir direitos sociais a essa parte da
população. Sendo que, a afirmação dos direitos sociais mostra-se fundamental para alcançar a
dignidade humana protegida pela constituição e retirar essas pessoas de estados impróprios para
o desenvolvimento pessoal. Desse modo, entendendo que nem todos os direitos fundamentais
gozam de verdadeira efetividade, as políticas públicas surgem como meios para garantir esses
direitos.
Como explica a professora Maria Paula Dallari políticas públicas pode ser definida
como um programa ou quadro de ação governamental, consistindo num conjunto de medidas
articuladas, em que o escopo é dar impulso, ou seja, movimentar a máquina do governo, no
sentido de realizar um objetivo de ordem pública ou, na ótica dos juristas, para concretizar um
direito. (BUCCI, 2006. p. 14).
No Brasil, as políticas públicas são divididas em quatro tipos diferentes. As
distributivas, que são construídas com o orçamento público e contemplam ações que fazem o
fornecimento dos serviços para a população por meio do Estado; as redistributivas que visam
reduzir a disparidade social; as políticas públicas regulatórias que criam, aprimoram ou
fiscalizam o cumprimento das leis que asseguram direitos e o bem da sociedade e; as
constitutivas que estabelecem as responsabilidades das esferas de poder
Ainda sobre a definição e importância das políticas públicas o professor Sérgio Resende
acrescenta:

[...] políticas públicas são diretrizes de interesse público primário, que


determinam programas de ação para os governantes e indicam linhas de
conduta para os governados, com vistas a ordenar e coordenar a realização de
fins econômicos, sociais e culturais relevantes para o governo da sociedade
civil pelo Estado por ela constituído e sustentado. (BARROS, 2012. p 31)

A partir dessas definições, constata-se como as políticas públicas são determinantes para
o setor público e para efetivar certos direitos fundamentais, sendo que, ao não haver satisfação
de tais direitos, há uma lesão, o que justifica a intervenção e controle do Poder Judiciário na
criação dessas políticas.

3. INTERFERÊNCIA JUDICIÁRIA
A partir da interpenetração dos poderes, concepção da interligação e da dependência dos
três poderes entre si, conclui-se que o poder Judiciário, na ausência do legislativo, pode possuir
uma participação mais ampla e direta na concretização dos valores e fins constitucionais.
O tema, além da polêmica ligada à capacidade do poder Judiciário decidir sobre temas
econômicos na garantia de direitos sociais, outra discussão se dá no âmbito do ativismo judicial,
que carrega com ele diferentes posições sobre sua essência, o ministro do STF Alexandre de
Moraes exemplifica diferentes posições sobre o assunto:

Não há dúvidas de que a eficácia máxima das normas constitucionais exige a


concretização mais ampla possível de seus valores e de seus princípios, porém,
em caso de inércia dos poderes políticos, devemos autorizar a atuação
subjetiva do Poder Judiciário (Luís Roberto Barroso), mesmo que isso
transforme o Supremo Tribunal Federal em um superlegislador, pois imune
de qualquer controle, que não seja a própria autocontenção (judicial restraint),
ou, devemos restringi-lo, para que não se configure flagrante desrespeito aos
limites normativos substanciais da função jurisdicional, usurpando, inclusive,
função legiferante (Elival da Silva Ramos). (MORAES, 2022. p. 872)
Entende-se que mesmo entre os doutrinadores do direito há um desentendimento sobre
o limite da atuação do judiciário em funções que tipicamente são designadas aos outros poderes.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho, no artigo O papel político do Judiciário na ordem
constitucional vigente referência à aceitação de uma designação de um papel político pelo Poder
Judiciário, “seja como ‘constituinte’ e ‘legislador’, seja como determinador de ações ou
políticas públicas” (FILHO, 2008). Considerando as informações acima, temos que não há um
consenso sobre a judicialização das políticas públicas. Porém, o mais comum é que o poder
Judiciário interfira quando não há alguma política pública necessária ou então para ajustar
alguns aspectos de alguma já definida.
Além disso, encontra-se o problema econômico, que não inclui somente as decisões
aferidas pelos tribunais superiores, mas de todo o poder Judiciário. Principalmente no que diz
respeito às garantias de direitos sociais, a visão de grande parte dos juristas é de que a política
pública serve de instrumento para garantir estes direitos. Sobre isso professor Virgílio Afonso
levanta o questionamento sobre a capacidade do judiciário decidir sobre esses assuntos,
ressaltando a saúde financeira do poder público, relacionando essas garantias e o equilíbrio
orçamentário do Estado:

Ao contrário do que ocorre com a realização e a proteção dos direitos


individuais, a realização dos direitos sociais, ao depender de enormes gastos
públicos, depende de decisões que extrapolam o simples raciocínio jurídico-
formal. Em um cenário de recursos escassos, no qual não há dinheiro
suficiente para resolver nem mesmo os principais problemas de saúde,
educação e moradia dos indivíduos - e essa é a realidade em quase todos os
países do mundo - é necessário que alguém tome a decisão sobre como e onde
os recursos públicos serão alocados (SILVA, 2008. p. 590)

A preocupação com o “custo dos direitos” e o impacto econômico deles passa a ser
seriamente debatido, o limite entre a tentativa de efetivar os direitos previstos na Constituição
e a possibilidade de o Estado arcar com o custo das medidas.

4. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE


Devidamente estabelecidos os conceitos introdutórios e abrangentes, a partir do presente
momento inicia-se o estudo de certas particularidades da temática que culminarão na análise do
recorte propriamente dito, seguida da tese desenvolvida. Neste momento, portanto, analisar-se-
á a função social da propriedade da forma que se segue: i) resgate histórico, abrangendo
brevemente o nascimento do Estado Liberal até as raízes da função social; ii) o entendimento
constitucional da função social e; iii) a análise de como esta é efetivada na concretude da
realidade, pautando o estudo no conceito de Plano Diretor e sua aplicação.

4.1 Resgate histórico


Para melhor compreensão, cabe introduzir o surgimento do Estado Liberal. Diversas
podem ser as concepções atreladas ao conceito de “liberalismo”. Atrelado à figura estatal, no
entanto, considera-se o ideal liberal como sendo aquele que inicialmente buscou embasar a
atividade estatal no modelo constitucionalista em seu sentido clássico, isto é, um movimento
político e jurídico que propunha/propõe a difusão de constituições escritas como forma de
limitação do poder.
As feições iniciais desse modelo estatal surgem como uma espécie de resposta ao
modelo absolutista advindo com o surgimento dos Estados nacionais modernos. O principal
fator de transição entre tais sistemas foi a influência do pensamento liberal fortalecido pela
corrente iluminista: se anteriormente Hobbes arguia em favor da necessidade do fortalecimento
de um Estado soberano, Locke tende a passar a figura do detentor da soberania para o
Parlamento e, posteriormente, Rousseau pregaria a importância de a soberania emanar do
próprio povo, inicialmente concentrada pela burguesia, mas que tendeu a democratização com
o decorrer do tempo3 (BARROSO, 2022).
A principal forma pela qual o Estado Liberal restringiria os abusos costumeiros do
sistema anterior seria pela implementação das denominadas liberdades negativas, liberdades
políticas e pela igualdade formal. As primeiras nada mais eram que formas de proteger esfera
privada do cidadão contra os atos do Estado, por meio da separação de poderes, da declaração
de direitos e da implementação de uma Constituição escrita. Quanto a liberdade política, cabe
a ressalva de que era extremamente restrita. Segundo a concepção liberal, apenas os detentores
de boas condições financeiras colaboravam para a manutenção das coisas públicas, por isso
somente eles votavam. Por fim, a igualdade formal previa unicamente a igualdade perante a lei.
Em sua aplicação, não pode ser discriminatória, as mesmas condições devem ser fornecidas
para todos. Considerando que a sociedade anterior a este princípio era estamental, a igualdade
formal, apesar de supérflua, contribuiu para superar certas diferenciações. (DUARTE NETO,
2023)

3
A influência filosófica citada e ilustrada culminou diretamente em processos revolucionários. O pensamento de
Locke foi crucial para a eclosão e para estabelecer os objetivos da Revolução Inglesa, bem como nota-se a
importância de ideais rousseaunianos para a ascensão das Revoluções Francesa e Americana.
Tal modelo vigorou pacificamente até o início do século XX, época em que ideais
socialistas, principalmente de bases marxistas, ganharam força no âmbito global. Com o
advento de uma corrente que propunha saídas às fragilidades do modelo liberal 4, houve cada
vez mais o fortalecimento de teses socialistas e de sindicatos trabalhistas para embasar a
reivindicação. Nesse cenário, começa a surgir certas características que intrinsecamente
compõem o ideal de um Estado Social, que visava, principalmente, superar a manutenção
burguesa e o conceito meramente formal de igualdade provenientes do Estado Liberal. Nesse
viés, a acepção “social” refere-se nada mais que “à correção do individualismo clássico liberal
pela afirmação dos chamados direitos sociais e realização de objetivos de justiça social”
(SILVA, 1999, p. 119).
O documento historicamente considerado como marco do constitucionalismo social,
modelo típico desse novo Estado em ascensão, foi a Constituição de Weimar de 1919.5 Entre
suas inumeráveis inovações, começou-se a falar na denominada função social da propriedade.
Em seu artigo 153, § 2º, temos que “A propriedade impõe obrigações. Seu uso deve constituir,
ao mesmo tempo, um serviço para o mais alto interesse comum”, prevendo até mesmo a
expropriação mediante indenização, para a satisfação do bem comum. O que se observa,
portanto, é a inversão da lógica anteriormente liberal da propriedade: se antes seu direito visava
proteger um bem individual, agora passa a zelar também pela coletividade. Em outras palavras,
o direito à propriedade deixa de possuir um fim em si próprio e passa a se sujeitar ao interesse
comum.

4.2 Função social na Constituição Federal de 1988


Devidamente traçado o panorama histórico, visando elucidar o contexto de surgimento
da ideia de função social da propriedade, cabe agora analisar como esta se manifesta na atual
Constituição da República Federativa do Brasil.
Em primeiro momento, cabe ressaltar que, consoante ao previsto pelo Art. 170, III,
CF/88, a função social da propriedade é princípio da ordem econômica nacional, de modo a
zelar pelos ditames da justiça social. Sabe-se que os princípios constitucionais nada mais são

4
Fragilidades essas que começaram a ganhar feição com o advento da Primeira Revolução Industrial. Por meio de
jornadas exaustivas, apropriação salarial por parte dos patrões, condições insalubres de trabalho e emprego de mão
de obra infantil, observou-se a desumanização do trabalhador em prol de uma ordem econômica. Em outras
palavras, o empregador explorava ao máximo o trabalhador, com o fito de aumentar a produção e, por conseguinte,
a margem de lucro. Para Marx, o capital produtivo, a medida em que cresce, seria direcionado para o emprego e
aperfeiçoamento de maquinarias, que ocasionaria na maior concorrência entre os trabalhadores e, pela lógica do
próprio sistema capitalista, acarretaria a contração salarial dos próprios. (MARX, 1982)
5
A norma é considerada o marco do constitucionalismo social, pois teve ampla repercussão mundial, dado o
cenário eurocêntrico em que estava inserida, e também por apresentar em seu texto medidas de caráter geral, isto
é, que permitiam que inúmeras outras populações se identificassem e buscassem adotá-las. (PINHEIRO, 2006)
que a condensação de valores previamente estabelecidos em uma sociedade. É justamente nesse
sentido que fala-se que princípios prescrevem uma obrigação em grau variado. A depender do
condicionamento fático e do condicionamento jurídico, há a imposição de algo em graus
diferentes. Em outras palavras, princípios tendem a uma certa relativização, podem se impor ou
serem subjugados por outros a depender do caso em questão (DUARTE NETO, 2023).
É o que se nota no caso da função social. Ao mesmo tempo em que é garantido ao
proprietário questões como a livre iniciativa, ainda no caput do referido artigo, por exemplo, a
vontade individual pode perecer perante a coletiva, pela força principiológica atribuída a função
social, casos que serão posteriormente analisados.
Apresentado isto, cabe analisar agora o previsto pelo art. 5º, XXIII, da supracitada
norma. Em seu texto, lê-se que “a propriedade atenderá sua função social”. Relevante pontuar
que, conforme o título e capítulo em que se insere, o referido texto enquadra a função social da
propriedade como um direito, bem como um dever. É direito, pois assegura aos cidadãos que
seus interesses serão sobrepostos aos interesses individuais – como citado alhures, o interesse
coletivo prevalece. Paralelamente, é dever, pois demanda que o proprietário assegure as
medidas para garantir tal objetivo. Nesse âmbito, justamente por se manifestar também como
uma obrigação, a norma suprema do ordenamento prevê sanções àquele que descumpri-la,
questão abaixo analisada.

4.3 Políticas urbanas


Consoante ao regido pelo art. 182, § 1º, da Constituição Federal, cabe ao denominado
Plano Diretor estabelecer as diretrizes da política de planejamento e desenvolvimento do meio
urbano cuja cidade consta mais de vinte mil habitantes. Nesta toada, não bastasse a previsão
pelo parágrafo seguinte, é coerente associar que cabe ao referido conjunto de normas
estabelecer às exigências fundamentais que garantem o cumprimento ou não da função social
da propriedade urbana. Deste modo, dentro do meio urbano, é o Plano Diretor que possui a
força de fazer valer a função social da propriedade, cabendo à Constituição ditar as sanções6
para seu descumprimento e os respectivos casos de ocorrência.
Para melhor compreensão da análise das sanções, cabe apresentar as hipóteses nas quais
a Carta Magna fornece liberdade ao Poder Público municipal de exigir do proprietário o uso
dado como adequado de solo não edificado, subutilizado ou não utilizado. Em caso de
negligência perante o ordenado, sucumbirá, sucessivamente, ou parcelamento ou edificação

6
Resgatando o mencionado anteriormente: se se trata de uma exigência, devem existir sanções previstas para um
suposto descumprimento, a fim de dar caráter coercitivo ao texto normativo.
compulsória, ao imposto progressivo sob a propriedade predial e territorial e, por fim, à
desapropriação, que, neste caso, ocorrerá mediante indenização por títulos de dívida pública.7
Como visto, as hipóteses anteriores referem-se as sanções impostas mediante
descumprimento da função social. Todavia, cabe a ressalva que ainda que respeitados os
ditames da função social, o proprietário pode sofrer com a desapropriação. Mediante o art. 5º,
XXIV, da Constituição, haverá desapropriação se, seguindo os termos regidos por lei, ocorrer
questão de necessidade ou utilidade pública, ou interesse social.
Embasando-se pelo decreto-lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, em seu art. 5º, observa-
se as hipóteses em que cabe alegar necessidade ou utilidade pública. Ainda que lê-se “utilidade”
em seu caput, costuma-se entender que algumas das hipóteses abarcadas são as denominadas
necessidade públicas. Via de regra, a diferenciação reside no grau de urgência da
desapropriação: enquanto esta é imprescindível, aquela, ainda que necessária, sugere que não
haverá prejuízos severos se não ocorrer de imediato (SALLES, 2006). São as hipóteses em que
cabe a desapropriação:

a) a segurança nacional; b) a defesa do Estado; c) o socorro público em caso


de calamidade; d) a salubridade pública; e) a criação e melhoramento de
centros de população, seu abastecimento regular de meios de subsistência; f) o
aproveitamento industrial das minas e das jazidas minerais, das águas e da
energia hidráulica; g) a assistência pública, as obras de higiene e decoração,
casas de saúde, clínicas, estações de clima e fontes medicinais; h) a exploração
ou a conservação dos serviços públicos; i) a abertura, conservação e
melhoramento de vias ou logradouros públicos; a execução de planos de
urbanização; o parcelamento do solo, com ou sem edificação, para sua melhor
utilização econômica, higiênica ou estética; a construção ou ampliação de
distritos industriais; j) o funcionamento dos meios de transporte coletivo; k) a
preservação e conservação dos monumentos históricos e artísticos, isolados
ou integrados em conjuntos urbanos ou rurais, bem como as medidas
necessárias a manter-lhes e realçar-lhes os aspectos mais valiosos ou
característicos e, ainda, a proteção de paisagens e locais particularmente
dotados pela natureza; l) a preservação e a conservação adequada de arquivos,
documentos e outros bens moveis de valor histórico ou artístico; m) a
construção de edifícios públicos, monumentos comemorativos e cemitérios;
n) a criação de estádios, aeródromos ou campos de pouso para aeronaves; o)
a reedição ou divulgação de obra ou invento de natureza científica, artística
ou literária; p) os demais casos previstos por leis especiais.8

Por fim, considera-se como interesse social a finalidade que visa o desenvolvimento
social do país, como a reforma agrária. Como é notório, tais hipóteses nada mais são do que
desdobramentos da supremacia do interesse coletivo sobre o individual.

7
Art 182, § 4º, I, II e III, CF/88
8
Decreto-lei nº 3.365/41
5. A JUDICIALIZAÇÃO DO ACESSO À MORADIA
Após definida a questão da judicialização em si, é preciso compreender a questão
específica do acesso à moradia. Isso porque é preciso considerar as especificidades da situação
da garantia ao acesso às moradias de forma geral. Dessa forma, é necessário a análise dos pontos
favoráveis e contrários a essa judicialização.

5.1 Pontos Favoráveis


5.1.1 Direito Social À Moradia
É importante ressaltar inicialmente o direito social à moradia, que é reconhecido como
parte do “mínimo existencial”, ou seja, “o conjunto de bens e utilidades básicas (...)
imprescindíveis para uma vida com dignidade (...)” (SANTOS, 2014, p. 133). Logo, conforme
estipulado no Artigo 6º da Constituição, a moradia é considerada um dos direitos sociais
essenciais, juntamente à educação, saúde, alimentação, trabalho e outros. Essa abordagem da
constituição enfatiza a necessidade de assegurar um lar digno para todos os indivíduos.

Sendo assim, a garantia do direito à moradia está intrinsecamente ligada à noção de


dignidade humana, visto que o acesso a um ambiente habitacional adequado é fundamental para
a realização plena do ser humano. Logo, a moradia não se resume apenas a um espaço físico,
mas abrange também o sentimento de pertencimento e identidade, contribuindo para a formação
de comunidades saudáveis e coesas.

5.1.2 Função Social Da Propriedade


Assim como estabelecido previamente, de acordo com tal princípio a propriedade deve
atender a um propósito social, visando o desenvolvimento social do país, ou seja, não deve ser
utilizada exclusivamente para fins individuais, mas também para contribuir com o bem-estar
coletivo. Nesse sentido, a judicialização do acesso à moradia pode ser vista como um
mecanismo para assegurar que a propriedade cumpra sua função social, especialmente quando
há casos de desigualdades no acesso à moradia.

5.1.3 Finalidade do Estado

Principalmente baseado no princípio da justiça fiscal, umas das finalidades que o Estado
deve exercer é a de “(…) propiciar à sociedade o bem comum. Nos termos do artigo 3° da
Constituição Federal (…) significa que se deve assegurar o desenvolvimento social e
econômico e reduzir as desigualdades, pois o Brasil é um estado democrático social.”
(MORAES, 2022, p. 54). Logo, seria necessário adotar medidas que favorecessem a equidade
e reduzissem a desigualdade.

5.2 Pontos Contrários


5.2.1 Reserva do possível
A reserva do possível é um conceito jurídico que reconhece as limitações práticas
enfrentadas pelos governos ao implementar plenamente todos os direitos fundamentais em
determinadas circunstâncias (FILHO, 2022, p. 273). Isso porque, devido a restrições
financeiras, técnicas e organizacionais, nem sempre é possível garantir imediatamente todos os
direitos fundamentais de forma plena e irrestrita. Dessa forma, a reserva do possível atua como
um critério que permite ao Estado priorizar e distribuir seus recursos de maneira razoável e
proporcional, considerando a capacidade financeira e operacional do governo e levando em
conta as demandas e necessidades da sociedade como um todo.

5.2.2 Limites da atuação judicial


Os limites da atuação judicial referem-se às restrições impostas ao Poder Judiciário no
exercício de suas funções, a fim de preservar o equilíbrio e a separação dos poderes, evitando
o abuso de poder (FILHO, 2022, p. 177). Essa ideia é fundamentada pelos autores que são
contrários parcialmente ou totalmente contra a judicialização, sob o viés de que a separação dos
três poderes deve ser respeitada de forma mais vigorosa. Dentre esses autores, assim como
citado anteriormente, Elival Ramos acredita na restrição no Judiciário para evitar desrespeito
aos limites normativos da função jurisdicional. Já Virgílio Afonso se preocupa com a questão
orçamentária da judicialização e seus altos custos, assim como é tratado no caso da
judicialização excessiva.

5.3 Ponderação dos fatores favoráveis e adversos


Em uma análise inicial, a priorização do direito à moradia é amplamente considerada
devido à sua classificação como direito fundamental e à necessidade do Estado de buscar o bem
comum. No entanto, a implementação prática dessa prioridade enfrenta dificuldades
consideráveis, principalmente quando considerado a questão da reserva do possível e sua
importância no orçamento público. Nesse contexto, a judicialização, principalmente quando
excessiva, acarreta um ônus significativo para o Estado, dificultando sua capacidade de
resolução eficiente do problema, devido aos impactos financeiros que ela gera

6. IMPACTOS ECONÔMICOS DA JUDICIALIZAÇÃO EXCESSIVA


A judicialização excessiva acarreta sérias consequências para a economia brasileira,
desencadeando um cenário preocupante. Atualmente, o Poder Judiciário enfrenta um acúmulo
alarmante de mais de 100 milhões de processos em tramitação9 e tempo médio de 4 anos e três
meses até o julgamento10. Além disso, estudos realizados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV)
revelaram que a maioria da população encara a justiça no Brasil como demorada, cara e
parcial11. Essa desconfiança e sobrecarga do sistema judiciário promove uma sensação
generalizada de insegurança para a atividade econômica do país.
Em evento realizado pela CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) o
procurador-geral da República, Augusto Aras, destacou a importância de um Poder Judiciário
mais preventivo no contexto econômico, que atue de maneira mais eficiente. Ele ressalta a
necessidade de um sistema judiciário capaz de estimular o mercado interno e ser
suficientemente ágil para não prejudicar o desenvolvimento do empreendedorismo e a
implementação de políticas públicas.12
A visão de Aras reflete a compreensão de que um Judiciário atuante desempenha um
papel fundamental na promoção de um ambiente favorável aos negócios e ao crescimento
econômico. Ao ser mais proativo, o Poder Judiciário pode contribuir para a prevenção de
litígios, evitando assim a sobrecarga do sistema e a morosidade na resolução de disputas. Isso
é particularmente relevante em um contexto econômico, onde a agilidade e a segurança jurídica
são elementos essenciais para o desenvolvimento sustentável.
Aras destaca a importância de uma justiça preventiva, ou seja, um Judiciário que seja
capaz de antecipar problemas e intervir de maneira a evitar conflitos e prejuízos ao mercado.
Essa abordagem proativa pode envolver, por exemplo, a adoção de medidas para fomentar a
mediação e a conciliação, facilitando a resolução extrajudicial de disputas comerciais.
Ao mencionar o estímulo ao mercado interno, Aras reconhece a importância de um
ambiente jurídico estável e favorável aos negócios. Um Poder Judiciário ágil e eficiente
contribui para a segurança jurídica, fornecendo confiança aos empreendedores e investidores.
Isso, por sua vez, pode incentivar o crescimento econômico, o aumento da produtividade e a
geração de empregos (LEAL, 2010).
Um exemplo positivo desse tipo de abordagem é o projeto "Destrava", executado pelo
judiciário, que busca dar continuidade a obras que estavam paralisadas e já haviam acumulado

9
Dados produzidos pela revista Justiça em números, 2022
10
Dados produzidos pela revista Justiça em números, 2020
11
Estudo da Imagem do Judiciário Brasileiro, 2019
12
Ideias retiradas do vídeo sobre a palestra “A repercussão econômica da judicialização excessiva” em 2022
um custo de mais de 200 bilhões de reais (MELO, 2020). Esse tipo de intervenção judicial visa
evitar o desperdício de recursos públicos e maximizar o retorno dos investimentos realizados.
Obras paralisadas acarretam um aumento dos custos, uma vez que sua interrupção implica em
despesas adicionais, como a manutenção de equipamentos e a remobilização de mão de obra.
Além disso, a paralisação prolongada pode levar à deterioração dos materiais e da infraestrutura
já construída, exigindo reparos e gastos extras quando a obra for retomada.
Nesse contexto, a iniciativa do Poder Judiciário em destravar essas obras se mostra
fundamental. A retomada dos projetos evita o desperdício de recursos já investidos até aquele
momento, além de contribuir para a conclusão das obras e a entrega dos benefícios previstos à
população. Ao impulsionar a continuidade desses empreendimentos, o Judiciário atua de forma
preventiva, evitando prejuízos econômicos e sociais decorrentes da paralisação prolongada.
Ademais, a conclusão das obras paralisadas também pode gerar impactos econômicos
positivos, como a geração de empregos, o estímulo à cadeia produtiva e o fortalecimento do
setor de construção civil. A retomada desses projetos representa um aproveitamento eficiente
dos recursos já investidos, promovendo a efetividade das políticas públicas e o desenvolvimento
econômico.
Apesar dos esforços empreendidos, ainda existem problemas significativos. Segundo
levantamento realizado pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção, há mais de 51 mil
ações relacionadas a vícios construtivos em imóveis da faixa 1 do Programa Minha Casa Minha
Vida, tramitam na Justiça Federal. Além disso, há mais de 13,7 mil acórdãos em segunda
instância nos Tribunais Regionais Federais, aguardando julgamento (NAKAMURA, 2021).
Esse fenômeno de sobrecarga do judiciário impacta diretamente o direito à moradia, que
é um direito fundamental reconhecido pelo Brasil desde 1948, firmado na Declaração Universal
dos Direitos Humanos (DUTH, 1948). Desde então, o direito à moradia é considerado um
direito humano universal, no qual todas as pessoas devem ter acesso, independentemente de sua
condição socioeconômica. Assim, caracteriza-se como um direito que está intrinsecamente
ligado à dignidade humana e ao exercício pleno da cidadania.
Em nosso ordenamento jurídico, a Constituição Brasileira aborda o tema da habitação,
embora não de maneira detalhada. A Constituição estabelece que é competência da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios "promover programas de construção de moradias
e melhorias nas condições habitacionais e de saneamento básico" (BRASIL, 1988). Essa
responsabilidade compartilhada entre os diferentes entes federativos reflete a importância
atribuída ao direito à moradia no país.
Além disso, a Constituição Federal em seu artigo 157 também delimita que o salário
mínimo deve atender às necessidades básicas, como moradia e alimentação. Isso ressalta a
importância da moradia adequada como um componente essencial para o bem-estar e a
qualidade de vida dos cidadãos.
No entanto, apesar dos avanços normativos, o Brasil ainda enfrenta grandes desafios na
garantia do direito à moradia adequada para todos os seus cidadãos. Segundo o Relatório de
Impacto TETO Brasil 2021, o país possui atualmente 5,8 milhões de famílias sem casa ou
vivendo em condições precárias de moradia (TETO, 2021). Essa situação evidencia a urgência
de ações concretas e efetivas para garantir o direito à moradia adequada para todos os cidadãos
brasileiros.
A sobrecarga do judiciário, nessa temática, pode atrasar a resolução de litígios
relacionados à moradia, prolongando o tempo necessário para a implementação de políticas
públicas voltadas à habitação e para a solução de casos individuais de vulnerabilidade
habitacional. Isso ressalta a importância de um sistema judiciário ágil e eficiente, capaz de lidar
de forma rápida e justa com questões relacionadas ao direito à moradia.
Em resumo, o direito à moradia adequada é um direito fundamental reconhecido
internacionalmente e assegurado pela Constituição Federal de 1988. Porém, a sobrecarga do
judiciário pode impactar negativamente a garantia desse direito, dificultando o acesso à moradia
digna para milhões de cidadãos. É fundamental que sejam adotadas medidas para fortalecer o
sistema judiciário, agilizar a resolução de disputas relacionadas à moradia e promover políticas
públicas efetivas que garantam o direito à moradia adequada para todos os cidadãos brasileiros.

CONCLUSÃO

No dia 27 de abril do ano de 2021, foi discutida em plenário, pelo Supremo Tribunal
Federal, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental de número 588, proposta
pelo Governo da Paraíba “contra decisões judiciais do Tribunal Regional do Trabalho da
13ª Região que determinaram o bloqueio, penhora e liberação de valores da Companhia
Estadual de Habitação Popular – CEHAP/PB”13. De forma resumida, esse julgado tomou
por resultado um efeito contrário ao que vem sido até então aqui comentado, no qual o
Judiciário julgou procedente o pedido do Governo da Paraíba, suspendendo as decisões do
TRT da 13ª Região e determinando a imediata liberação das verbas subtraídas dos cofres
públicos. Nesse caso, tanto a Advocacia-Geral da União, quanto a Procuradoria-Geral da

13
Texto retirado diretamente do inteiro teor do acórdão da ADPF 588, Paraíba.
República afirmaram que o Tribunal Regional da Paraíba estava violando o princípio da
legalidade orçamentária, já que não seria função do poder judiciário “determinar a retirada
de recursos financeiros de uma programação orçamentária para outra, ou de um órgão para
outro”. Observa-se certa ironia no destino final desse processo, o judiciário, que acabaria
de uma forma ou de outra, isto é, na primeira ou na última instância, decidindo um impacto
financeiro no orçamento público.

O CEHAB, como afirmado pelo próprio Sr. Ministro Luís Roberto Barroso em seu
voto no acórdão referente à ADPF 588, presta serviço público na execução de uma política
habitacional, visando garantir a concretização do direito à moradia digna àqueles
hipossuficientes no âmbito econômico. A possibilidade julgada inicialmente pelo TRT, que
seria a realocação dos recursos da Companhia de Habitação Popular, para o pagamento de
dívidas trabalhistas, acabaria por afetar uma parcela social de alta vulnerabilidade: aquela
que é público-alvo das políticas habitacionais. Tal situação foi reconhecida pelo relator e
devidamente respondida através da aplicação do princípio da eficiência da administração
pública, com objetivo de proteger as prioridades sociais da gestão estatal.

Por fim, este caso foi apenas uma visão concreta de possíveis impactos financeiros
que se encontraram e ainda estão presentes tramitando no judiciário. O contexto geral, que
vem da função social, trespassa o direito à moradia e encontra parte do seu fim nas políticas
públicas, como dito na introdução deste artigo, não tem caráter explicitamente benéfico ou
maléfico, possuindo complexidade muito aquém dos puros princípios primários do Direito,
seja este na seara constitucional ou financeira, procurando apoio na ambientação
sociológica, política e cultural. Deve-se mesmo criticar de forma aberta a concretização da
dignidade humana por motivos puramente econômicos, lembrando que os próprios
princípios que regem o orçamento permitem despesas para a atuação constitucional do
Estado? Por outro lado, deveria o Estado simplesmente permitir que o Judiciário tome total
controle do orçamento, violando o princípio da legalidade de forma não necessariamente
regulada? Não há aqui, as respostas para tais perguntas. Na verdade, talvez estas sejam
perguntas que nunca poderiam ser definitivamente respondidas no contexto atual. A
judicialização excessiva traz efeitos, tanto sociais quanto financeiros, que não podem ser
mensurados com exatidão, apenas se pode afirmar que existem e determinar, na medida da
abstração existente e possível, quais são, quantificando e qualificando de forma
extremamente limitada.
REFERÊNCIAS

___; ADPF 588 / PB – PARAÍBA, ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE


PRECEITO FUNDAMENTAL. Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO. Julgamento:
27/04/2021. Órgão julgador: Tribunal Pleno;

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