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03 - Obstáculos à caminhada missionária da Igreja Atos 4.

1 a 31

O Evangelista Lucas relata parte da história do início da igreja e sua expansão e, com isso, fez
teologia. Com sua narrativa, deixa pistas para que se possa entender melhor a igreja e sua missão.
Então, muito mais do que saber datas, eventos e nomes de pessoas, podemos perceber os
princípios teológicos, éticos e morais envolvidos, descobrindo assim caminhos melhores para a
caminhada da igreja hoje.

• No Evangelho e em Atos, Lucas mostra que Deus é soberano e age para cumprir seu plano
de resgatar o ser humano da maldição do pecado.
• Ele mostra que a igreja é divina e dependente da soberania de Deus, mas é também humana
e, como tal, sujeita a defeitos, fracassos temporários e erros.
• O texto-base deste estudo engloba os capítulos 3 a 7 e também o 12. O cap. 3 mostra o
milagre que gera a reprovação do Sinédrio. Aqueles líderes tinham mandado matar Jesus.
Como ele poderia estar vivo e fazendo milagres? No cap. 5 há o registro de um evento
chocante dentro da igreja: vaidade e mentira juntaram-se e levaram um casal à morte. A
seguir (cap. 6), vemos que a igreja teve outro problema: algumas viúvas pobres não estavam
recebendo o alimento que deveriam receber. Para resolver a questão, foram eleitos ministros
específicos para cuidar dos necessitados. Um deles, Estevão, homem cheio de fé e poder
nas palavras, acabou sendo apedrejado por falar e agir em nome de Jesus. Já no cap. 12, é
possível ver como a perseguição tornou-se dramática.
• Os eventos focalizados neste estudo mostram que na comunidade dos salvos estão
mescladas a ação divina e a ação humana. Por isso, a Escritura nos diz que a igreja é o
Corpo de Cristo. Isso quer dizer que, para o mundo ver Jesus hoje, tem de olhar para a igreja,
pois, nela, o Espírito de Deus e as pessoas formam uma unidade.
• A ação missionária depende de pessoas, mas não pode ser uma ação apenas individualista.
A missão deve ser cumprida pelo povo de Deus como comunidade, e não só por pessoas,
isoladamente. A caminhada missionária da igreja é a caminhada de um povo.
• Os textos indicados nas leituras da semana mostram alguns dos obstáculos enfrentados pela
igreja em sua caminhada. Mostram também como ela reagiu. Podemos classificar esses
obstáculos como externos e internos.

LIÇÕES DO TEXTO

Às 3 horas da tarde, Pedro e João foram ao templo orar, e um milagre aconteceu. Um


paralítico, coxo de nascença, com mais de 40 anos de idade, foi curado em nome de Jesus,
o Nazareno. A multidão se ajuntou, Pedro pregou o seu segundo sermão e a igreja cresceu
para cinco mil membros.
A reação do Sinédrio foi imediata. Uma igreja cheia do Espírito atrai as almas para Jesus e a
oposição do mundo. As autoridades prenderam e ameaçaram os apóstolos. Contudo, longe
de calarem sua voz, eles anunciaram ainda com mais intrepidez o nome de Jesus.

1. Obstáculos externos enfrentados pela Igreja


• Inveja (4.2 e 5.17) – Ao povo, a atitude de amor e comunhão dos primeiros cristãos era muito
simpática (4.32-37 e 5.12-16). Isso fazia com que a autoridade dos líderes judaicos fosse
questionada. Aqueles mesmos que condenaram Jesus, perdiam a confiança do povo. Essa
confiança era agora transferida para os cristãos. Daí o sentimento de inveja deles. A inveja é
um veneno que produz morte;
• (4.2) E interessante que, embora formassem o grupo que mais se opôs a Jesus durante o
seu ministério, em Atos, os fariseus quase ficam amigáveis com a igreja, ao passo que os
saduceus (que não figuram nos Evangelhos até os últimos dias de Jesus) se tornam os
líderes da oposição.

Viram os apóstolos como hereges e agitadores. Por consequência, eles ficaram ressentidos com o
que os apóstolos estavam ensinando ao povo.

Eles transformaram a casa de Deus num covil de salteadores e numa praça de comércio. Já
estavam estremecidos com Jesus desde que este virou as mesas dos cambistas (Mt 21.12-15). O
ensino de Jesus era uma ameaça para eles.

• A plenitude do Espírito (4.31) manifesta-se através da unidade espiritual e do amor solidário.


A plenitude do Espírito se evidencia tanto nos atos como nas palavras, tanto no serviço como
no testemunho, tanto no amor pela família como na proclamação ao mundo.

Crentes cheios do Espírito têm o coração aberto e o bolso também. O amor não consiste naquilo
que falamos, mas no que fazemos. A comunhão passa pelo compartilhar. A unidade da igreja
transformou-se em solidariedade. Pessoas eram mais importantes do que coisas, pois os crentes
adoravam a Deus, amavam as pessoas e usavam as coisas.

• Ameaças – Pedro e João foram presos e tiveram de se apresentar diante do Sinédrio que os
ameaçou (4.21). Foram ordenados expressamente a não falarem mais em Jesus (4.18). No
decorrer da história do Cristianismo, há muitos exemplos das ameaças que os cristãos têm
sofrido – perda de bens, prisão, tortura, retaliações, etc.;
• (4.18) O Sinédrio se opõe aos pregadores e à pregação. Ameaça os pregadores e proíbe a
pregação. Os membros do Sinédrio estão constrangidos com a intrepidez de Pedro e João e
impotentes diante do poder do nome de Jesus.
• (4.21) O Sinédrio se viu encurralado porque a verdade dos fatos estava contra eles. Os
apóstolos incultos e iletrados não recuaram diante de suas arrogantes ameaças. O povo dava
mais crédito ao que via e ouvia da parte dos apóstolos do que às suas prepotentes ameaças.
O milagre irrefutável desarticulou toda a ação desses líderes insolentes.

• Perseguições, prisões e morte – Pedro, João, outros apóstolos (4.18,29), Estêvão e Tiago
foram presos, sendo alguns deles punidos com a morte. Os inimigos não ficaram somente
nas ameaças, mas passaram a práticas mais duras como a prisão e morte de cristãos. A
reação da igreja a todos esses obstáculos foi orar, não para que as perseguições acabassem,
mas para que eles, cientes da soberania de Deus, se mostrassem dignos e ousados para
enfrentar qualquer ameaça (4.24-30). No caso de Estêvão, além da oração (4.24-31 e 12.5),
verificamos outra reação da igreja: amor e perdão (7.60). Orando, reconhecendo a soberania
divina, amando e perdoando, obtiveram forças da parte do Espírito Santo para enfrentar as
dificuldades (4.31).
• (4.29) A igreja pede poder para testemunhar a Palavra de Deus com toda a intrepidez.
• Em resposta a essa oração sincera e unânime, a casa onde estavam reunidos tremeu e os
discípulos tornaram-se mais inabaláveis, pois ficaram cheios do Espírito Santo e, com
intrepidez, anunciavam a palavra de Deus. O aposento em que estavam os discípulos tremeu
como se houvesse um terremoto. Este era um dos sinais que indicavam uma teofania no
Antigo Testamento (Ex 19.18; Is 6.4), e teria sido considerado um indício da resposta divina
à oração. O sentido, portanto, é que Deus mostrou que estava presente e responderia à
oração. Mais uma vez, o Espírito Santo veio sobre os discípulos, e estes receberam a
confiança que pediram, para falarem bem a palavra de Deus.

2. Obstáculos internos enfrentados pela Igreja

Os obstáculos internos são os que mais prejudicam a caminhada missionária. Já se disse que
o sangue dos mártires é a semente que faz brotar e crescer uma igreja vigorosa. Ameaças,
perseguições e morte fazem com que a igreja tome posições, enfrente o perigo, una forças e
busque a presença de Deus. Os obstáculos internos, no entanto, nem sempre são claros e
objetivos; aparecem dentro da própria comunidade, com muitos disfarces. A igreja nem sempre
percebe. Há alguns casos referidos nos textos:

• Ressentimento e inveja – (4.2 e 5.17) – Pode parecer estranho que se comece com o
mesmo assunto e versículos já apresentados acima para mostrar obstáculos externos.
Embora os cristãos dos primeiros tempos tivessem abandonado muitas práticas dos
judeus, na verdade, não viam a si próprios como proponentes de uma nova religião. Para
eles, o Messias prometido, apresentado no Antigo Testamento, era Jesus. Os demais
judeus agiram com relação aos cristãos como se fossem apenas uma dissidência.
Quando vemos os judeus expressando ressentimentos e invejas, eles o fazem contra o
seu próprio povo, isto é, pessoas que professavam a mesma fé no mesmo Deus.
Infelizmente, dentro da igreja mesmo, encontramos esses sentimentos que se opõem à
mensagem do evangelho e se tornam um terrível obstáculo à caminhada missionária. A
situação estava tão presente no início da igreja que o apóstolo Paulo chegou a dizer que
havia aqueles que pregavam o evangelho por discórdia, desavença e competição (Fp
1.17).

Há, hoje, disputa entre igrejas para ver qual é a melhor, qual tem a melhor música, qual tem
o maior templo, qual aparece mais tempo na TV, qual tem mais dons, etc. Uns criticam os
outros; e isso gera inveja e ressentimento. São sentimentos que matam, interiormente, tanto
a pessoa que os alimenta, quanto a comunhão cristã; enfim, mata a própria missão;

• Acepção de pessoas – As viúvas dos helenistas (gregos) eram mulheres que viveram,
talvez nasceram, longe da terra dos judeus e aprenderam a cultura e a língua gregas. Já
no fim da vida, viúvas, retornavam para a terra de seus antepassados, onde deveriam
ser aceitas e cuidadas, como a lei de Moisés exigia. Mas, infelizmente, isso não
aconteceu. Há aqui não um simples esquecimento, mas uma demonstração de
preconceito contra um grupo social diferente. Os judeus viam os romanos como um povo
sem Deus e opressor. Os gregos eram tidos como um povo de vasta cultura, mas sem o
Deus verdadeiro, por isso, inferior. Portanto, aquelas mulheres, mesmo sendo cristãs,
mas que conviveram com romanos e gregos, teriam se tornado impuras, na concepção
dos cristãos judeus. Parece que esse não foi um fato isolado, pois, na Epístola de Tiago,
vemos a recorrência do fato (veja Tg 2);
• Três foram as tentativas de impedir o avanço da igreja primitiva. Já vimos as duas
primeiras: perseguição (At 4) e infiltração (At 5). Agora, veremos a terceira, a distração
(At 6).

Já que Satanás não conseguiu derrotar a igreja de fora para dentro por meio da perseguição,
nem de dentro para fora por meio da corrupção, tenta agora desviar o foco de sua liderança
para o serviço das mesas.

• (6.1) As viúvas dos helenistas, aqueles convertidos que vieram da dispersão e não
falavam o hebraico, começaram a ser esquecidas na distribuição diária. A injusta
distribuição dos recursos gerou murmuração na igreja.
• Os orgulhosos judeus de fala aramaica tratavam com desprezo os judeus
estrangeiros.
• (6.3). Mas, irmãos, escolhei dentre vós sete homens de boa reputação, cheios do
Espírito e de sabedoria, aos quais encarregaremos deste serviço.

• Mentira e vaidade – Ananias e Safira mentiram sobre a quantia do dinheiro (5.1-11).


Infelizmente, a mentira faz parte da sociedade humana. Não deveria ser assim na igreja.
A mentira gera morte, normalmente não tão rápida como a desse casal. Gerando morte,
dor e tristeza, a mentira prejudica a caminhada missionária da igreja. Ananias e Safira
mentiram. Não havia exigência em dar tudo; aliás, não havia exigência em dar nada, mas
havia neles vaidade, desejo de aparecer. Barnabé e outros haviam vendido seus bens e
se tornaram benquistos (4.32-37). O casal queria ter o carinho e respeito da comunidade,
comunidade, mas sem renúncia. Não era o amor que os movia, mas a vaidade;
• O gesto de desprendimento de Barnabé despertou a admiração dos crentes. No meio
daquele entusiasmo, Ananias e Safira, membros da igreja de Jerusalém, cobiçaram a
mesma honra.

Até ali tudo tinha sido glorioso na vida da igreja, mas Satanás estava furioso e armava um
estratagema. Como não conseguiu destruir a igreja de fora para dentro, por meio da perseguição,
agora se infiltra na igreja para atacá-la de dentro para fora, por meio da hipocrisia.

Literalmente este texto diz: “Ananias, como é que Satanás encheu o teu coração para falsificar o
Espírito Santo?”. O pecado dele não foi apenas mentir ao Espírito Santo, mas tentar falsificar o
Espírito Santo, buscando representar sua fraudulenta ação como divinamente inspirada.

• Ananias não teria cometido nenhum pecado se não vendesse sua propriedade; ou se
vendesse e não desse nada ou só a metade. Seu pecado foi dar parte, dizendo que estava
dando tudo. Seu pecado foi mentir ao Espírito e enganar a igreja.

Queriam o crédito e o prestígio da generosidade sacrificial, sem terem de arcar com as


inconveniências. Assim, a motivação do casal, ao dar, não era aliviar os pobres, mas inflar o próprio
ego.

• O Senhor julga o pecado com severidade no início de um novo período na história da


salvação. Logo depois que o tabernáculo foi erguido, Deus matou Nadabe e Abiú por
tentarem apresentar fogo estranho ao Senhor (Lv 10). Também providenciou a execução de
Acã por desobedecer a ordens depois que Israel havia entrado na Terra Prometida (Js 7).
• Convivência entre ricos e pobres – Desde o início, o problema da convivência entre
ricos e pobres se impunha. Barnabé e outros cristãos venderam os bens para benefício
dos mais pobres. Eles queriam cumprir a Lei de Moisés e o grande mandamento de Jesus
sobre o amor ao próximo. A Bíblia ensina que a modéstia e a partilha devem fazer parte
da vida de fé (I Jo 3.13-18). Ananias e Safira demonstraram que não tinham entendido
esse princípio, e ainda viviam segundo os padrões do mundo. A punição severa
registrada em Atos é um indicativo de que o problema é grave e deve ser enfrentado com
determinação (Tg 2.1-9).

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