Você está na página 1de 5

A 9ª Sinfonia de Beethoven e a

Maçonaria
Eduardo José Gomes

No ano de 2004 nasceu entre mim e o valoroso Irmão Gilmar Fernandes


da Silva, da Loja Mensageiros da Liberdade, a idéia da criação de um trabalho
para harmonia (três CDs), para ser utilizado em nossas lojas. Acontece que
esse projeto nascente, foi abraçado também pelo Grande Oriente do Estado de
Goiás, que ansiava solucionar um dos problemas mais freqüentes em nossas
sessões: a harmonia (principalmente em iniciações, elevações e exaltações).

Incumbido da organização do material, embrenhei-me ainda mais em um


trabalho de pesquisa musical que já vinha realizando há algum tempo.

Na minha concepção, existem dentro do nosso universo musical, obras


que transcendem e muito os limites do comum. São fortes, densas,
misteriosas. Ouvindo-as em circunstâncias apropriadas parece que podemos
tocá-las. Têm corpo, alma e coração! Foi entre essas maravilhas que
procuramos buscar as que estivessem mais próximas dos nossos preceitos, que
sobrelevam principalmente a união, a fraternidade e a integração entre os
povos.

Conhecido por todos os maçons é a prática da utilização de músicas


instrumentais na maior parte dos nossos trabalhos, mas devemos saber
também que não há nada que impeça o uso de vocais, desde que adequados
aos nossos usos e costumes.

¨Ode To Joy¨, ou ¨Ode à Alegria¨, estava entre as músicas selecionadas,


porém, por se tratar de uma música com vocal, e não sendo o idioma utilizado
o nosso vernáculo, busquei maiores detalhes sobre a obra, o que foi
relativamente difícil pela escassez de informações e de pessoas com
conhecimento acerca do assunto. Por intermédio de um amigo, dono de um
¨sebo¨ e perito no assunto, descobri que a música que eu já admirava era
muito melhor e com uma história mais abrangente do que eu concebia até
então. A ¨Ode à Alegria¨ era apenas uma das partes da 9ª Sinfonia de
Beethoven, tida como a mais importante de suas obras. Mas a pesquisa tinha
que continuar, pois era necessário se chegar até a sua tradução para saber o
que havia nela de maçônico.

Na seqüência da minha investigação outra surpresa: os versos do poema,


que compõe a ¨Ode à Alegria¨ estão no 4º e último movimento da 9ª Sinfonia,
e não eram de Beethoven, e sim do seu conterrâneo Friederich Von Schiller,
importante poeta, dramaturgo e filósofo alemão. Após conhecer o poema de
Schiller em 1792, Beethoven, que tinha na alma o ideário da liberdade e do
amor pela humanidade, absolutamente fascinado, decidiu inserir em sua arte
aquela peça, quem sabe de inspiração divina, que acabara de ler.

Em fevereiro de 1824, depois de 32 anos, estavam musicados os difíceis


versos de Schiller, e um Beethoven já praticamente surdo, fazia nascer a sua
obra-prima, que Brahms retratou com as seguintes palavras: "ouví-la é como
escutar atrás de si o ressoar dos passos de um gigante".

Mas e a tradução? O que tem a ¨Ode à Alegria¨ e a ¨Nona¨ a ver com a


Maçonaria? Eu vos respondo: ABSOLUTAMENTE TUDO! A música e os
versos, que vão infra-citados e traduzidos, são uma verdadeira exaltação à
fraternidade humana e nos faz vislumbrar no futuro um mundo onde seremos
um só povo!

Minhas indagações prosseguiam. Schiller não era maçom e Beethoven,


apesar da controvérsia entre estudiosos, também não o era, ou pelo menos não
existe nenhum documento conhecido que comprove o fato. Mas, a principal
novidade dessa peregrinação por informações para detectar pontos em comum
dessa obra com a Ordem, eu exponho agora: Os versos de ¨An Die Freude¨ ou
Ode à Alegria foram feitos por Schiller para um amigo. Detalhe: seu amigo
era maçom e o poema era para ser recitado em sua loja. Confesso que esse
dado me causou uma impressão profundamente forte, fazendo com que eu
passasse a observar que as mais grandiosas ações humanas parecem inspiradas
pela Sublime Instituição mesmo quando são implementadas por profanos.

Abaixo, o poema traduzido:

Ode à Alegria
(An Die Freude)

Oh amigos, mudemos o som!


Entoemos algo mais prazeroso Ela nos deu beijos e vinho e
E alegre! Um amigo leal até a morte;
Deu força para a vida aos mais
Alegria, formosa centelha divina, humildes
Filha do Elíseo, E ao querubim para se erguer
Ébrios pelo fogo entramos diante de Deus!
Em teu santuário celeste!
Alegremente, como seus sóis
Tua magia volta a unir corram
O que o costume rigorosamente Através do esplêndido espaço
dividiu. celeste
Todos os homens se irmanam Se expressem, irmãos, em seus
Ali onde teu doce vôo se detém. caminhos,
Exultantes como o herói diante da
Quem já conseguiu o maior tesouro vitória.
De ser o amigo de um amigo,
Quem já conquistou uma mulher Alegria, formosa centelha divina,
amável Filha do Elíseo,
Rejubile-se conosco! Ébrios pelo fogo entramos
Mesmo aquele que conquistou Em teu santuário celeste!
apenas uma alma,
Uma única alma em todo o mundo. Enviem um beijo ao mundo todo!
Mas aquele que falhou nisso Mundo, você sente a presença do
Que fique chorando sozinho! seu Criador?
Pois milhões se abatem diante dele!
Da alegria bebem todos os seres
No seio da Natureza: Abracem-se milhões!
Todos os bons, todos os maus, Porque Irmãos, além do céu
Seguem seu rastro de rosas. estrelado
Deve haver um Pai Amado!

Conforme podemos observar nos versos acima não há a menção a


supremacia de uma nação sobre a outra, ou de um credo, ou de uma raça. Há
sim, a glorificação de um ideal supremo que não enxerga fronteiras para a
fraternidade humana. Nesse mundo, onde visionários como Schiller e
Beethoven nos colocam, não há espaço para querelas ultra-nacionais,
religiosas, patrimonialistas ou segregacionais.

Um só povo, uma só nação! Pode não ser hoje, pode não ser breve, mas
eu acredito!

Nós devemos acreditar!

Você também pode gostar