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INSTITUTO DE HISTÓRIA
RIO DE JANEIRO
2013
AS MÃOS NEGRAS DO CHAUFFEUR NELSON DA CONCEIÇÃO: FUTEBOL E
RACISMO NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO (1919-1924)
RIO DE JANEIRO
2013
ii
AS MÃOS NEGRAS DO CHAUFFEUR NELSON DA CONCEIÇÃO: FUTEBOL E
RACISMO NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO (1919-1924)
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________
(Prof. Dr. Victor Andrade de Melo – PPGHC-IH-UFRJ – Orientador)
_____________________________________________
(Prof. Dr. Flávio dos Santos Gomes, UFRJ)
_____________________________________________
(Prof. Dr. Cleber Augusto Gonçalves Dias, UFMG)
iii
Dedico esta pesquisa de monografia à
minha avó materna. Mulher de fibra, que
sempre soube me incentivar ao estudo.
iv
- Dizem que o jogo Vila x Vasco vae ser “roxo”!...
- “Roxo” nada rapaz; Vae ser é “preto”....1
1
Texto e imagem da revista O Malho, 22 de abril de 1922, p. 39.
v
Agradecimentos
À minha avó Georgina, que na alegria e na tristeza sempre esteve ao meu lado.
Aos meus pais, já falecidos, Genilza e Valmir.
Às minhas primas Rosana, Perla e Larissa, porque sempre foram fundamentais nos
momentos difíceis.
Ao meu orientador Prof. Dr. Victor Andrade de Melo.
Ao Prof. Ms. Ricardo Pinto dos Santos, Coordenador Geral do Centro de Memória do
Club de Regatas Vasco da Gama.
À Prof. Ms. Tatiana Mello, museóloga do Club de Regatas Vasco da Gama.
Ao Club de Regatas Vasco da Gama, motivo de alegrias, tristezas e conhecimento
histórico.
Ao Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.
Ao Sr. João Ernesto da Costa Ferreira, Vice-Presidente de Relações Especializadas do
Club de Regatas Vasco da Gama e ser humano de primeira grandeza.
Ao Sr. Carlos Jorge E. Pereira, diretor da Divisão Técnico-Desportiva do Club de
Regatas Vasco da Gama e grande vascaíno.
Ao Prof. Dr. João Manuel Casquinha Santos, grande incentivador desta pesquisa.
Ao Prof. Dr. Adílio Jorge Marques.
A todos os professores, estudantes e servidores do Instituto de História da UFRJ.
A todos que aqui não foram citados, mas que de alguma maneira contribuíram para
minha formação como ser humano do bem e historiador.
vi
Imagem do goleiro Nelson da Conceição, retirada da primeira página do jornal. Nelson
da Conceição já era bicampeão carioca (1923/1924).
O Imparcial, em 06 de abril de 1926, p. 1.
vii
RESUMO
viii
ABSTRACT
The present paper seeks to reflect about the situation of the black (black people) in the
First Republic of Brazil, raising football as an area of research. The black players faced
several obstacles, including racism, to play the most important football league in Rio de
Janeiro, that was dominated by the elite clubs. In this sense, we will discuss about
Nelson da Conceição, a black goalkeeper that played football in Rio on decade 10 and
20 of the 20th century. Nelson suffered racism from Liga Metropolitana de Desportos
Terrestres, the press and supporters of rival clubs of Club de Regatas Vasco da Gama,
the club where Nelson played from 1919 to 1928. Due his technical quality as athlete,
Nelson managed to overcome the strong obstacle of racism and became the first black
goalkeeper to win the Campeonato Carioca, in 1923.
ix
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 Fotografia da equipe do Vasco. Nelson da Conceição está ao centro da
fotografia ....................................................................................................................... 94
FIGURA 13 Imagem das seleções carioca e paulista em jogo válido pelo Campeonato
Brasileiro de Seleções de 1923 .................................................................................... 106
x
FIGURA 15 Goleiro Casemiro do Amaral defendendo a seleção brasileira ............ 108
FIGURA 21 Imagem do goleiro gaúcho Júlio Kuntz Filho (Kuntz), que atuou pela
seleção brasileira .......................................................................................................... 114
xi
SUMÁRIO
Introdução ....................................................................................................................... 1
ICONOGRAFIA ............................................................................................................ 94
xii
Introdução
Essa pesquisa se identifica como: “[...] uma história ‘temática’, que corresponde
também às habituais especializações das ciências sociais no estudo das sociedades: as
histórias política, econômica, social, etc. [...]” 5. Procura situar-se no âmbito da História
Social6. A temática do trabalho é a condição social do homem negro na cidade do Rio
2
A Manhã, 26 de maio de 1942, p. 11. Nota sobre a morte de Nelson da Conceição (1899-1942).
Enquanto jogador, Nelson atuou pelo Paladino FC, Engenho de Dentro AC, Club de Regatas Vasco da
Gama, Bangu AC e seleção brasileira de futebol. O auge da sua carreira de footboller foi, inegavelmente,
entre 1919 e 1926, quando atuava pelo Club de Regatas Vasco da Gama. Neste clube, conquistou o
Campeonato Carioca de 1923 e 1924, alem de alcançar à seleção carioca e seleção brasileira.
3
Termo popular utilizado para se referir ao Club de Regatas Vasco da Gama.
4
O termo se refere a alguma enfermidade crônica.
5
ARÓSTEGUI, Julio. A pesquisa histórica: teoria e método. Bauru, SP: Edusc, 2006. p. 474.
6
A concepção de História Social da pesquisa baseia-se na obra CARDOSO, Ciro Flamarion; GRIGNOLI,
Hector Perez. Os Métodos da história. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1983, 4ª edição.
1
de Janeiro da Primeira República. O objetivo desta pesquisa é refletir a respeito da
situação do negro na sociedade carioca da Primeira República, utilizando a figura de
Nelson da Conceição para elevar como espaço de pesquisa o futebol. O nosso objeto se
caracteriza pela busca do entendimento de quais eram as principais dificuldades
enfrentadas por jogadores negros que atuavam no futebol do Rio de Janeiro,
especificamente na Liga Metropolitana de Desportos Terrestres – LMDT e depois a
Associação Metropolitana de Esportes Athleticos – AMEA, tendo como base a história
do ex-goleiro Nelson da Conceição. Após a conquista do campeonato carioca de 1923
pelo Club de Regatas Vasco da Gama houve uma cisão no futebol carioca, os clubes da
elite7 (América, Botafogo, Flamengo e Fluminense) resolveram sair da LMDT e fundar
uma nova liga, a AMEA. O Vasco tentou participar efetivamente da AMEA, mas lhe
foram feitas algumas exigências, dentre elas a exclusão de 12 jogadores do primeiro e
segundo quadro. Nelson, junto de outros três jogadores, escapou do “corte”.
7
O conceito de elite utilizado nesta pesquisa é o de Victor Andrade de Melo, que trata desta parte da
sociedade e sua ligação com o esporte no final do século XIX e início do XX: “A elite é compreendida
não somente como os que detinham o poder econômico, mas também e principalmente o poder de
influenciar culturalmente o desenvolvimento da sociedade. Nesse caso, as elites seriam constituídas tanto
pelos proprietários dos meios de produção quanto pelo que pode ser chamado de setores médios ou
pequena burguesia. Inicialmente, as elites eram os nobres, políticos e aristocratas ligados à economia
agroexportadora. Posteriormente, também se deve considerar a ascensão de setores urbanos, como
militares, parte da intelectualidade e industriais”. MELO, Victor Andrade de. Cidade Sportiva:
primórdios do esporte no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Relume Dumará: FAPERJ, 2001. p. 17.
8
SANTOS, João Manuel Casquinha Malaia. Revolução Vascaína: a profissionalização do futebol e
inserção sócio-econômica de negros e portugueses na cidade do Rio de Janeiro (1915-1934). 2010. Tese
(Doutorado em História Econômica) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade
de São Paulo, São Paulo, 2010. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8137/tde-
26102010-115906/>. Acesso em: 2012-12-1. p. 429.
2
Desde o seu antigo clube, Engenho de Dentro AC, e principalmente nos
primeiros anos de Vasco, Nelson da Conceição sofria com considerações pejorativas
relacionadas ao seu ofício de condutor de veículos (chauffeur) e sua fala coloquial,
posições emitidas nos jornais e revistas da época. A pesquisa finaliza com a não
exclusão de Nelson da Conceição pela AMEA. Acreditamos que a exclusão não existiu
devido ao status que Nelson havia conquistado no futebol. Nelson alcançou um patamar
no futebol que lhe permitiu ser, inclusive, elogiado por parte da mesma imprensa que o
denegriu.
Nelson da Conceição, por ser negro, teria sido enxergado como um indivíduo
desprovido de moral ou uma postura social condizente com a prática do futebol12.
Constantemente, jornais da época referiam-se a Nelson desmerecendo sua profissão de
9
Utilizamos como conceitos de raça e racismo na pesquisa os apresentados por Stuart Hall: “‘Raça’ é
uma construção política e social. É uma categoria discursiva em torno da qual se organiza um sistema de
poder socioeconômico, de exploração e exclusão – ou seja, o racismo. HALL, Stuart. “Que ‘negro’ é esse
na cultura negra?”. In: HALL, Stuart. Da diáspora: identidade e mediações culturais. Belo Horizonte: Ed.
UFMG, 2003. p. 69.
10
APPIAH, Kwane Anthony. Na casa de meu pai: a África na filosofia da cultura. Rio de Janeiro:
Contraponto, 1997.
11
PEREIRA, Amilcar Araujo. O Mundo Negro: a constituição do movimento negro contemporâneo no
Brasil (1970-1995). Tese (Doutorado em História Social) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia,
Departamento de História da Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, 2010. p. 33. Disponível
em: < http://www.historia.uff.br/stricto/td/1254.pdf >. Acesso em: 2012-11-04.
12
Entendemos que não somente os indivíduos negros sofriam com as condições impostas pela LMDT e
depois AMEA para a prática do futebol. Embora a questão do racismo para com os indivíduos negros
estivesse presente na sociedade brasileira, os homens brancos pobres também eram vítimas de tais
medidas impeditivas. Desta forma, não havia uma exclusividade de medidas contra os indivíduos negros.
Contudo, como negros, na sua maioria, oriundos de camadas sociais menos favorecidas, utilizavam o
futebol como fonte exclusiva de renda e/ou se mantinham em profissões vistas pela elite como
incompatíveis com a prática do “nobre” futebol, sofriam mais explicitamente com as ações de restrição
das diretorias das ligas.
3
condutor de veículos, chauffeur, vista como essencialmente braçal e desprovida do uso
da inteligência, o que não deveria ser permitido para a prática do futebol amador.
13
O Imparcial, 28 de abril de 1916, p. 9.
14
MELO, Victor Andrade de. História Comparada do Esporte. Rio de Janeiro: Shape, 2007. p. 14.
15
JÚNIOR, Hilário Franco. A Dança dos Deuses: futebol, cultura e sociedade. São Paulo: Companhia
das Letras, 2007. p. 61.
16
FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. Volume1: O Legado da
raça branca. São Paulo: Ática, 1978.
4
Na ânsia de prevenir tensões racistas hipotéticas e de assegurar uma
via eficaz para a integração gradativa da “população de cor”,
fecharam-se todas as portas que poderiam colocar o negro e o mulato
na área de benefícios diretos do processo de democratização dos
direitos e garantias sociais. Em nome de uma igualdade perfeita no
futuro, acorrentava-se o “homem de cor” aos grilhões invisíveis do
seu passado, a uma condição sub-humana de existência e a uma
disfarçada servidão eterna.17
17
Idem, p. 253.
18
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 11.
19
CARVALHO, José Murilo de. Os Bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São
Paulo: Companhia das Letras, 2008. p. 161.
5
pela exclusão do direito ao voto. Todavia, daquela sociedade de “bestializados”20,
insurgia elementos que procuravam lutar contra aquela situação de submissão, tal como
a Revolta da Chibata (1910), cujo grande expoente histórico a nível de sujeito foi o
marinheiro negro João Cândido Felisberto. O negro era o principal alvo da ausência do
Estado e da sociedade quanto a sua condição social. O negro não era um cidadão
completo, era um “quase-cidadão”, configurando o seu isolamento social.
20
CARVALHO, 2008.
21
GOMES, Flávio dos Santos e CUNHA, Olivia Maria Gomes. Quase-cidadão: histórias e antropologias
da pós-emancipação no Brasil – Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007. p. 13.
22
FERNANDES, 1978. Op. cit. pp. 15 e 20.
23
CARVALHO, 2008. Op. cit.
6
Sul-Americano do mesmo ano, defendendo a seleção brasileira. A campanha do
selecionado brasileiro foi pífia, mas o goleiro vascaíno foi um dos poucos que
escaparam das críticas, sendo inclusive considerado como um dos que evitou uma
campanha ainda pior do que a realizada. Nelson saiu da condição de chauffeur24 para ser
um grande keeper, ídolo do Vasco e reconhecido por muitos como maior goleiro da
cidade do Rio de Janeiro na década de 1920.
Acreditamos que Nelson é um exemplo desse negro que “se fez”. Por intermédio
da sua qualidade como jogador de futebol foi reconhecido e conseguiu trilhar uma
carreira vitoriosa no futebol, chegando onde, até então, nenhum goleiro negro havia
conseguido chegar. No futebol carioca, os clubes da elite, por meio de sua liga, criavam
imposições e obstáculos para que clubes menos abastados, indivíduos de classes sociais
menos favorecidas e especificamente indivíduos negros não pudessem chegar ao
comando da liga ou serem campeões. Contudo, os jogadores negros, aos poucos, graças
a sua força e técnica, conseguiram construir o seu espaço.
24
A alcunha de chauffeur foi designada a Nelson da Conceição e explorada pelos jornais da época, como
forma de denegri-lo.
25
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 318.
26
ARÓSTEGUI, Julio. Op. cit., p. 481.
27
Idem, p. 484.
28
Idem, p. 491.
7
meramente a busca pela quantidade, mas, o processo de se fazer uso de um aparato
teórico-crítico para classificar e analisar o que dispomos. Quanto à
classificação/taxonomia das fontes acreditamos que:
29
Idem, p. 480.
30
Idem, pp. 492 e 494.
31
Idem, p. 493.
32
No acervo da Fundação Biblioteca Nacional estão disponibilizados edições do periódico O Paiz entre
os anos de 1884 a 1934. A primeira edição do periódico foi lançada no ano de 1884. De acordo com os
interesses de nossa pesquisa, nos limitaremos ao estudo do material referente ao período entre 1919 e
1924. O acervo do periódico encontra-se digitalizado e aberto à consulta via internet. Disponível em: <
http://memoria.bn.br/hdb/periodo.aspx>. Acessado em: 09 mai. 2013.
33
No acervo da Fundação Biblioteca Nacional, situada na cidade do Rio de Janeiro, consultado para a
pesquisa, estão disponibilizados edições do periódico O Imparcial entre os anos de 1912 a 1942. A
primeira edição do periódico foi lançada no ano de 1912. De acordo com os interesses de nossa pesquisa,
nos limitaremos ao estudo do material referente ao período entre 1919 e 1924. O acervo do periódico
8
Janeiro. Tinha sua seda na esquina da Rua 7 de Setembro com a Avenida Central atual
Avenida Rio Branco. Teve como fundador, o empresário João José dos Reis Júnior, o
conde de São Salvador de Matozinhos.
Jornal diário de grande circulação [...] Tido como o mais robusto
órgão governista da República Velha, foi um dos principais
formadores de opinião da sociedade brasileira, entre o fim do século
XIX e o começo do século XX. Durou até 18 de novembro de 1934,
quando foi fechado pela Revolução de 1930.34
9
Livro de atividades futebolísticas do Club de Regatas Vasco da Gama de 1916 a 1923,
uma importante fonte para a análise de vários fatores, como frequência de atuação dos
jogadores e dados estatísticos de um modo geral, como gols feitos e sofridos pela equipe
de futebol do Clube. Teremos o cuidado de não sucumbir ao discurso da instituição,
para não adotá-lo como uma verdade única e definitiva.
Desta forma, obtemos o seguinte quadro quanto à classificação das fontes que se
relacionarão com o objeto de nossa pesquisa:
35
Fonte: Recenseamento do Rio de Janeiro (Districto Federal) realizado em 20 de setembro de 1906. Rio
de Janeiro, Off. da Estatística, 1907-1908.
36
Fonte: Recenseamento do Brasil realizado em 1º de setembro de 1920. Rio de Janeiro: Typographia da
Estatística, 1922. A referida fonte, produção oficial do Estado Brasileiro, não apresenta apenas dados
estatísticos objetivos, também, lança mão de dados para compor textos explicativos sobre vários assuntos,
dentre eles a questão do negro na sociedade. Há a predominância do pensamento de “aryanização” do
Brasil.
37
Segundo Aróstegui: “[fontes diretas e indiretas] [...] podem ser interpretadas também como primárias
ou secundárias. Idem, p. 495.
38
Segundo Aróstegui, quanto ao critério intencional: “[...] chamamos aqui testemunhais as fontes que
procedem de um ato intencional e não testemunhais as fontes involuntárias [ ...] A fonte voluntária, a que
propriamente podemos chamar de testemunhal, é a fonte clássica [...] constituiu a memória oficial das
sociedades [...] É a que reflete, portanto, o conflito interno de toda sociedade [...] [a fonte involuntária]
Trata-se de todas aquelas marcas do homem que se conservaram sem que este se tenha proposto
conscientemente sua conservação como ‘testemunho histórico’.”. Idem, pp. 496 e 498. Em nossa
pesquisa, entendemos como fontes voluntárias as que resultam da intenção do homem em deixar
registrado determinado fato e/ou opinião sobre fato(s) como um objetivo histórico.
39
Segundo Aróstegui, quanto ao critério qualitativo, são culturais: “Fontes culturais são, portanto,
praticamente todas as existentes que não são fontes arqueológicas, todas aquelas escritas, faladas,
simbólicas ou audiovisuais que transmitem uma mensagem em linguagem mais ou menos formatizada.”.
Idem, p. 500.
40
Segundo Aróstegui, quanto ao critério quantitativo: “[...] entendemos por fonte seriada aquela, material
ou cultural, que é composta de muitas unidades ou elementos homogêneos, suscetíveis de serem
ordenados, numericamente ou não.”. Idem, p. 502. Em nossa pesquisa, entendemos como fonte seriada
toda fonte que, para além do período histórico que estudamos, fizesse parte de um conjunto maior e
homogêneo da mesma natureza.
10
O Paiz
Ata da Diretoria Fontes diretas Fontes voluntárias Fonte cultural Fonte seriada
do Club de
Regatas Vasco da
Gama, de 1º de
dezembro de 1920
a 03 de novembro
de 1921
Ata da Diretoria Fontes diretas Fontes voluntárias Fonte cultural Fonte seriada
do Club de
Regatas Vasco da
Gama, 10 de
novembro de
1921 a 08 de
novembro de
1922
Livro de Fonte indireta Fontes voluntárias Fonte cultural Fonte seriada
atividades
futebolísticas do
Club de Regatas
Vasco da Gama
de 1916 a 1923
Recenseamento Fonte indireta Fonte voluntária Fonte cultural Fonte seriada
do Rio de Janeiro
(Districto Federal)
realizado em 20
de setembro de
1906
Recenseamento Fonte direta Fonte voluntária Fonte cultural Fonte seriada
do Brasil
realizado em 1º de
setembro de 1920
11
obra do jornalista Mário Filho, O Negro no Futebol Brasileiro41, iremos buscar algumas
referências para entendermos melhor a atmosfera do futebol carioca do período.
41
A obra citada é tratada pela pesquisa como uma fonte literária. Para uma crítica sobre a obra O Negro
no Futebol Brasileiro, do jornalista Mário Filho, ler: HELAL, Ronaldo; SOARES, Antonio Jorge;
LOVISOLO, Hugo. Mídia, Raça e Idolatria: A invenção do país do futebol. Rio de Janeiro: Editora
Mauad, 2001. Esclarecemos que não tomamos a obra de Mário Filho como fonte da verdade, todavia
como uma referência para montarmos um quadro da situação dos jogadores negros no início do futebol na
cidade do Rio de Janeiro. Não tomamos sua obra como a verdade absoluta, todavia, uma das possíveis
verdades. Tomamos o cuidado para não sermos levados pelo caráter literário da obra, mas absorver o
possível do seu caráter histórico.
12
CAPÍTULO 1 NELSON: O CHAUFFEUR (1919-1921)
42
A Tribuna, 21 de agosto de 1923, p. 7.
43
O Imparcial, 22 de fevereiro de 1924, p. 10.
44
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 203.
13
das zonas rurais ou de outros países durante o processo de
imigração.45
45
SANTOS, João Manuel Casquinha Malaia. O processo de profissionalização do futebol no Rio de
Janeiro: nos subúrbios à Zona Sul. A inserção de negros, mestiços e brancos pobres na economia da
Capital Federal (1914-1923). Leituras de Economia Política. Campinas, v. 13, pp. 125-155, 2008. p.
128. Disponível em: < http://www.revistalep.com.br/index.php/lep/issue/view/13>. Acessado em: 12 dez.
2012.
46
GOMES, Flávio dos Santos e CUNHA, Olivia Maria Gomes. Quase-cidadão: histórias e antropologias
da pós-emancipação no Brasil: Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007. pp. 24-25.
47
FERNANDES, 1978. Op. cit., p. 15.
14
A Primeira República (1889-1930) pode ser caracterizada como um período de
forte exclusão política, social, racial e de gênero. Grande parte da população brasileira
ficava de fora do processo eleitoral (negros e brancos analfabetos e mulheres), que além
de tudo era fortemente marcado pela corrupção. A questão racial se insere também nos
resquícios de séculos de escravidão, no completo descaso com o negro, que adentrou na
sociedade republicana desfavorecido nas mais diversas relações interpessoais.
Como reflexos desses atritos sociais, ainda que existisse o mito da democracia
racial e a crença na paulatina absorção do negro na sociedade, desencadearam-se
revoltas populares, como a Revolta da Chibata (1910), e movimentos de valorização do
negro e sua defesa contra o racismo, como, por exemplo, a Frente Negra Brasileira
(1931-1937) e a Legião Negra (1932)49. A relação conflituosa do negro na república se
estendia para os mais diversos setores da sociedade.
48
CARVALHO, José Murilo de. A formação das almas: o imaginário da República no Brasil. São
Paulo: Companhia das Letras, 1990. p. 25.
49
GOMES, Flávio dos Santos. Negros e política (1888-1937). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. p. 12.
50
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 203.
15
Havia a real necessidade de sobreviver na ótica do trabalho assalariado, em face
as suas carências sociais e o descaso da sociedade. Os ex-escravos e seus descendentes
que migraram para os grandes centros urbanos somaram-se aos imigrantes, constituindo
uma massa trabalhadora que procurava dar conta do trabalho livre e o estilo de vida
moderno disseminado pela Europa..
51
Idem, p. 7.
16
definitivamente um novo estilo de vida adequado à velocidade do
novo momento. Afinal, quem chega primeiro não é mais um cavalo
que tem o homem como coadjuvante, mas um homem que conduz o
mais rápido possível, a partir do seu próprio esforço, um barco. No
turfe, sempre se divulga o nome e a vitória dos cavalos; já no remo, é
o nome dos remadores que ganha destaque. No turfe crack era o
cavalo; no remo eram os homens que conduziam a embarcação.52
Do remo, surgiram alguns clubes que figuram até os dias atuais como grandes
instituições do esporte nacional, como, por exemplo, o Club de Regatas do Flamengo
(1895) e o Club de Regatas Vasco da Gama (1898).
Todavia, se por um lado cada vez mais as pessoas eram atraídas para assistir aos
espetáculos esportivos, a prática desses esportes era bastante restrita. O crescimento dos
espectadores do turfe e principalmente do remo não implicava diretamente na
popularização em grande escala de praticantes. A prática do remo ou do turfe por parte
do trabalhador urbano das camadas sociais menos favorecidas esbarrava em alguns
obstáculos, desde a escassez de recursos para a compra dos materiais necessários até a
incompatibilidade socioeconômica e cultural com os estatutos dos clubes que detinham
o controle da prática esportiva institucionalizada.
52
MELO, Victor Andrade de. Cidade Sportiva: primórdios do esporte no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro:
Relume Dumará: Faperj, 2001. pp. 77-78.
53
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 26.
17
prefeito Francisco Pereira Passos, no início do século XX, foram vitais para
alavancarem a imagem e a economia da capital. A face velha e suja da cidade deveria
ficar com a monarquia.
18
Para além das largas avenidas, grandes obras de saneamento e reconfiguração do
centro da cidade, que tanto prejudicaram as camadas populares, o esporte estava na
pauta como um dos símbolos da modernidade, do mundo civilizado, que se queria para
a Capital.
Este esporte, que obteve a sua consolidação no século XX, é fruto do estilo de vida dos
indivíduos da sociedade industrial, em que o tempo se torna fundamental para a sua
organização:
56
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 25.
57
MALHANO, Clara; MALHANO, Hamilton. Memória Social dos Esportes: São Januário –
Arquitetura e História. Rio de Janeiro: Mauad: FAPERJ, 2002. p. 24.
19
cultural, em nível internacional. Também nesse período foram criados
rígidos códigos de postura, inclusive a regulamentação de
determinados esportes e, dentre eles, o remo e o futebol.58
[…] um time, formado por alguns dos altos funcionários das mais
diversas companhias inglesas que prosperavam na cidade e por sócios
do rio Cricket, jogou contra um time de brasileiros, alguns deles
sócios de outro clube de criket do Rio, o Paysandu. Oscar Cox, o
capitão do time dos brasileiros, enviou convites aos principais jornais
e revistas da cidade para a divulgação do evento. Conseguiu a
presença de jornalista de cinco periódicos, sendo quatro especializados
em esportes, o Brasil Athletico, a Semana Sportiva, o Correio do
Sport e o Brasil Nautico, e apenas um jornal de grande circulação, o
Correio da Manhã.60
58
MALHANO, Clara; MALHANO, Hamilton, 2002. Op. cit., p. 38.
59
Idem, p. 21.
60
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 34.
61
MALHANO, Clara; MALHANO, Hamilton, 2002. Op. cit., p. 44.
20
O fato de o esporte já haver se difundido em São paulo, a ponto de
poder ser disputado um campeonato em que os paulistas se sagraram
campeões, levou um grupo de vinte filhos das melhores famílias do
Rio de Janeiro a se reunir aos 21 dias do mês de julho de 1902 para
fundar o Fluminense Football Club.62
62
Idem.
21
paulatinamente o caráter amador fosse dando espaço a um futebol mais integrado às
práticas capitalistas, ou seja, um futebol mais “profissional”. Para além da estrutura
física dos estádios, o espetáculo do futebol carecia constantemente de se renovar e
fornecer ao público melhores “atores”.
63
ELIAS, Norbert; DUNNING, Eric. Deporte y Ocio en el processo de la civilizacion. Nova York:
Basil Blackwel Publisher Ltd., Oxford, 1986.p.247.
64
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 190.
22
levantado a taça em quatro oportunidades (1906, 1907, 1908, 1909), o Botafogo por
duas oportunidades (1907 e 1910). O título de 1907 foi para os tribunais, porque o
campeonato terminou empatado e não constava na regra os procedimentos mediante um
empate entre equipes65.
65
Apenas em 1996 foi decidido que o título seria dividido pelas duas equipes.
66
Associação de Football do Rio de Janeiro (1911).
67
Sport Club Mangueira, Cascadura Football Club, Club Athletico Meyer, Nacional Football Club, São
Christovão Football Club, Pedregulhense Football Club, Ouro Football Club, Aluminio Football Club,
Shoot Americano Football Club, Guarany Football Club, Recreativo Football Clud etc. SANTOS, 2010.
Op. cit. p. 49.
23
impostas aos associados e àqueles que pretendiam se associar. Eram
disposições impossíveis de serem cumpridas pelas camadas menos
abastadas, como não possuírem profissões braçais, serem
alfabetizados, serem convidados por outro associado e aprovados em
assembleia de sócios.68
A forma de pensar dos clubes da elite carioca, o esporte de modo geral, e neste
sentido o futebol, deveria ser formado por um tipo ideal de jogador. O chamado
sportmen era a síntese de elementos da moral e do bom costume.
Se tornar um sportmen resultaria em agregar bons valores que
serviriam como passaporte à moderna sociedade que emergia. Neste
caso, o ideal de sportmen esteve sempre relacionado aos filhos das
famílias ricas dos centros urbanos que carregavam condições e
valores, reais e simbólicos, bem definidos e, sobretudo, que
convergiam para a modernidade.69
68
Idem, p. 26.
69
SANTOS, Ricardo Pinto dos. Tensões na consolidação do futebol carioca, p. 184. In PRIORI, Mary
Del; MELO, Victor Andrade de. História do Esporte no Brasil: Do Império aos dias Atuais. São Paulo:
Editora UNESP, 2009.
24
esporte com maior atenção da imprensa, e os clubes passaram a se
beneficiar com essa popularização.70
O jornal O Paiz nos traz detalhes significativos, neste trecho, do que podemos
chamar crônica esportiva. Primeiro, a questão do público presente, afirmando que o
público do jogo era bastante numeroso. Ou seja, em partidas do subúrbio, havia tal
como na Liga Metropolitana, pessoas interessadas em ver uma partida de futebol. Ao
passo que este atraía bastantes pessoas, há de ser ter em mente a qualidade dos
jogadores, logo, do espetáculo em si.
70
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 54.
71
O Paiz, 02 de janeiro de 1919, p. 6.
25
marcante de mulheres no estádio, expressando que o futebol não era somente um
espetáculo voltado exclusivamente para o público masculino, mas que contemplava nas
sua arquibancadas um clima “democrático” que não se poderia enxergar naquelas
sociedade do lado de fora do estádio.
Infere-se, com a leitura das fontes, que as partidas do subúrbio possuíam grande
destaque no cenário esportivo carioca, a ponto de serem notícia nos grandes jornais de
circulação. As ligas do subúrbio apresentavam vários jogadores com qualidade técnica
muitas vezes maior do que os que atuavam na Liga Metropolitana, mesmo que as
equipes do subúrbio não pudessem competir em questão econômica.
72
O Imparcial, 22 de janeiro de 1919, p. 6.
26
CONFIANÇA A.C. X MAVILLES F.C.
Será, por certo, uma pugna renhida a que se vai verificar amanhã, no
campo da rua Silva Telles, no Andarahy, entre as bem trenadas
representações daquellas aggremiações filiadas á Liga Suburbana.
A posição de destaque da primeira na tabela do campeonato, dará
ensejo a que ambas procurem, na medida de seus recursos, sobrepujar
a contendora, sendo que, victoriosa, a do Confiança, se collocará
ainda em condições de conquistar o actual campeonato, porquanto, o
“leader” da tabela, o Engenho de Dentro, tem que medir forças em
dois matchs, que lhe faltam, com o Cascadura e o Dois de Junho.
Derrotado o Engenho de Dentro por um desses adversarios, ainda
obterá o Confiança a vantagem do empate, que, se se verificar,
permitirá um bellíssimo e sensacional encontro entre esses destemidos
clubs, para decisão da victoria.
Será, portanto, bem esperançado que o Confiança se apresentará á
lucta com o Mavilles, amanhã. […]73
O futebol já havia dominado o subúrbio, e este por sua vez, por intermédio de
seus jogadores, cada vez mais avançava sobre a principal liga carioca de futebol.
73
O Paiz, 18 de janeiro de 1919, p. 6.
74
O Paiz, 23 de fevereiro de 1919, p. 8.
27
E depois digam que a Suburbana não é o celeiro da Metropolitana.75
75
O Imparcial, 22 de março de 1919, p.9.
28
1.2 Vasco: O Clube da colônia portuguesa e Nelson
PROVA FINAL
PALMEIRAS X PROGRESSO
A lucta decisiva do torneio não foi das melhores.78
É possível que o jogo não tenha agradado porque o melhor embate do torneio havia
ocorrido na semifinal, entre o Vasco e o Palmeiras.
VASCO X PALMEIRAS
Dada a magnifica constituição dos quadros destes clubs, esta partida, a
ultima semi-final, foi, como se esperava, superior ao jogo Progresso x
Mackenzie.
Desde o inicio da pugna, a lucta é terrivel e sensacional; os players
empregam todos os seus esforços para conseguir o goal de Victoria.79
76
O Imparcial, 24 de março de 1919, p. 9.
77
Torneio criado em 1916 pelos cronistas esportivos como forma de disseminar o futebol. Todos os jogos
eram realizados num único da e local, cada partida durava 20 minutos e além do critério do gol pró, havia
o número de escanteios a favor e menor número de faltas.
78
O Paiz, 24 de março de 1919, p. 7.
79
Idem.
80
O escanteio valia como critério de eliminação em caso de empate.
29
exclusivamente no primeiro apenas no segundo semestre, quando estreou numa partida
contra o S.C. Rio de Janeiro pelo campeonato da segunda divisão.
Isto era possível, embora não “caísse bem”, porque o Vasco era membro da
LMDT, enquanto o Engenho de Dentro da Liga Suburbana. Assim, a chamada Lei do
Estágio, ou seja, a obrigatoriedade do jogador de ficar um ano sem atuar quando trocava
de clube, com o objetivo de enfraquecer o interesse por troca de jogadores entre os
clubes, não se aplicava: “A vantagem de se trazer um jogador suburbano, era que ele
não pertencia a nenhum clube filiado à LMDT e, portanto, não havia que esperar o
período de um ano sem jogar, imposto pela famosa ‘Lei do Estágio’”81
81
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 209.
82
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 209.
30
Historicamente a migração portuguesa é marcante no Brasil. Desde o período
colonial, imperial e adentrando a república. No final do século XIX e inicio do século
XX o aumento do fluxo imigratório caracterizava o Rio de Janeiro como maior polo
aglutinador de colonos portugueses. Para se ter uma ideia, em 1920 a população da
cidade girava em torno de 1.157.873 habitantes, destes 172.338 eram portugueses. O
quadro a seguir demonstra, do ponto de vista da nacionalidade, a presença massiva dos
portugueses:
83
Recenseamento do Brasil realizado em 1º de setembro de 1920. Rio de Janeiro: Typographia da
Estatística, 1922, pp.50-61.
31
Os jovens membros da colônia portuguesa no Rio de Janeiro
convidaram Francisco Gonçalves do Couto Júnior, um rico
comerciante do bairro da Saúde, para financiar a grande empreitada.
Dois meses mais tarde, já com 250 sócios, ocorreriam alguns
desentendimentos relacionados à mudança de sede para reuniões
sociais do clube. Passaram-se, tralha doméstica e alguns sócios, para a
sede do Clube Dansante (sic) e Recreativo Estudantina Arcas
Comercial [...] Francisco Gonçalves do Couto Jr. Discordava da
aliança proposta pelos jovens mais agitados. [...] Optou por se retirar
do Club de Regatas Vasco da Gama e fundou o Clube de Regatas
Guanabara, levando consigo grande número de sócios que o
apoiavam.84
O futebol já era uma realidade para muitos clubes na segunda metade da década
de 10, inclusive para clubes surgidos inicialmente para o remo. O CR Boqueirão do
Passeio (1897) e o CR Icaraí (1895) já participavam do futebol, tal como o CR do
Flamengo que fundou o seu em 1912 e se sagrou bicampeão em 1914/15.
84
MALHANO, Clara; MALHANO, Hamilton, 2002. Op. cit., pp.35-36.
85
Idem, p. 46.
86
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 135.
32
A criação de um departamento de futebol no Vasco viria a se tornar realidade em
1915, sob a presidência de Raul da Silva Campos, após uma tentativa frustrada na
presidência de Marcílio Telles (1911). Raul Campos era um comerciante, tal como
muitos membros da colônia portuguesa, e um dos principais sócios destinados a fazerem
do Vasco um grande no futebol.
87
Idem, pp. 135-136.
88
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 138.
33
Os vascaínos não desistiram. Iniciar um novo esporte não é fácil, o clube já
havia passado por isso no remo e conseguiu se tornar uma grande expoente no esporte
náutico. Com as reformas dos estatutos da LMSA em 1917, o Vasco subiu de forma
compulsória à 2ª Divisão, permanecendo nesta até 1922, quando ascendeu à 1ª Divisão
da LMDT.
Contudo, é a partir de 1919 que o Vasco começa a construir uma base forte para
brigar pela ascensão rumo à divisão de elite do futebol carioca.
Neste contexto, Nelson e o Vasco se encontram. O clube dos portugueses foi atrás de
novos “atores”, na intenção de promover melhores espetáculos. Os vascaínos trazem o
goleiro Nelson do Engenho de Dentro e outros jogadores viriam de clubes do subúrbio
carioca, negros e brancos pobres, a integrar a equipe de futebol que se sagraria campeã
em 1923.
Cabe deixarmos claro que, a relação do jogador Nelson com o seu clube, o
Vasco, se caracterizou, ao nosso modo de ver, como uma relação profissional. Nelson
foi reconhecido pelo seu talento e sua técnica, não por uma questão de simpatia, raça,
cor ou qualquer sentimento cabível numa esfera social de amizade. A relação
estabelecida entre clube e atleta foi profissional.
89
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 168.
34
1.3 O Chauffeur
Vasco da Gama:
Chauffeur – Lamego e Cruz – Palhares, Faria e Quintanilha –
Pederneiras, Leão, Godoy, Esquerdinha e Antonico.90
Antes do início oficial pelo clube vascaíno, em partidas organizadas pela LMDT,
Nelson esteve presente também em partidas amistosas.
Esta foi a primeira vez que Nelson, atuando pelo Vasco, uma equipe da LMDT, é
chamado pela alcunha de Chauffeur num grande jornal do Rio de janeiro. Mesmo com a
90
O Imparcial, 04 de maio de 1919, p. 8.
91
Idem.
35
derrota, o jornal faz menção à qualidade técnica da equipe do Vasco, fazendo a ressalva
da necessidade de entrosamento.
A derrota passou a margem do que significou a partida e a referência do jornal à
atividade de trabalho do recém chegado goleiro vascaíno. O Vasco, ao retirar a base do
tricampeão suburbano Engenho de Dentro e agregá-la ao seu departamento de futebol
chamou a atenção do público que acompanhava o futebol, e a própria imprensa.
Em 23 de março, pelo Torneio Início, o Vasco foi apresentado como “scratch da
Liga Suburbana” pelo O Imparcial, enquanto Nelson é escalado normalmente. No dia
20 de abril, O Vasco disputou um amistoso contra o Palmeiras, outra equipe da 2ª
Divisão da LMDT. O jornal O Paiz indicou que o Vasco jogou sem o seu goleiro titular,
ao que tudo indica se refere a Nelson92.
O segundo match de foot-ball foi disputado entre os teams principaes
do Palmeiras A.C. e o C.R. Vasco da Gama [...]
O quadro palmeirense apresentou-se desfalcado de tres optimos
elementos, o mesmo acontecendo com o Vasco, que entrou sem o
arqueiro, extreando, no entanto Leão, antigo player do Bangú e
Andarahy93
92
Veremos que Nelson chega ao Vasco para ser goleiro do chamado primeiro quadro, nunca atuando
pelos quadros inferiores do Vasco.
93
O Paiz, 21 de abril de 1919, p. 8.
36
A victima foi medicada pela Assistencia e o “chauffeur” foi preso e
autuado pela polícia do 1º districto.94
94
O Imparcial, 25 de julho de 1919, p. 4.
95
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 150.
37
emergente da 2ª Divisão da LMDT, os periódicos começaram a dar as escalações do
Vasco com o termo Chauffeur no lugar do nome Nelson. Indicando, implicitamente, que
o referido jogador não dispunha das condições necessárias para desempenhar o futebol
na LMDT.
A informação mais explicativa que dispomos da origem da alcunha de Chauffeur
pelo goleiro Nelson da Conceição parte de um periódico do Club de Regatas Vasco da
Gama, que faz menção ao goleiro décadas após a sua morte, no ano de 1970: “Nelson da
Conceição, o goleiro, era um mulato forte, motorista de praça no Engenho de Dentro” 96
Com esta informação podemos supor que ao se transferir do Paladino para o Engenho
de Dentro, a Nelson ficou garantido um posto de chauffeur, como forma de atrair o
goleiro para a equipe suburbana. Este tipo de prática já era comum no futebol, ou seja,
atrair jogadores com oferta de emprego, como já citamos anteriormente.
Dificilmente encontraríamos um discurso explicitamente racista em jornais de
grande circulação. Contudo, a partir de uma análise baseada no modo de pensar de
grande parte da sociedade brasileira à época, especialmente as elites, percebemos que
por detrais do discurso da defesa do amadorismo e contra certos tipos de profissões,
estava à tentativa de privar indivíduos negros e brancos pobres da ascensão no esporte.
Sobre esta questão do modo de pensar da sociedade e principalmente das elites,
trabalharemos melhor no próximo capítulo deste trabalho.
Neste sentido, acreditamos que o racismo existia, mesmo que marcado pelo
preconceito com certos tipos de atividades da sociedade. Como já dissemos, os negros
possuíam grande dificuldade de se inserirem na sociedade republicana, a despeito de
uma elite negra e letrada que existia à época. Além disso, disputavam lugar com os
brancos pobres e imigrantes.
Logo, não é preciso constar a raça ou cor de pele diretamente como elemento
impeditivo. As exigências estabelecidas pela Liga e pelos clubes de elite excluíam
principalmente os indivíduos negros, ao passo que se exigia nos clubes altas taxas para
se tornar sócios, as chamadas joias e também altas mensalidades. Enquanto na Liga,
embora frustrada a tentativa de definir as atividades de jogadores que não seriam
permitidas, a proibição de jogadores analfabetos era uma forma de impedir que tanto
jogadores negros e brancos pobres pudessem atuar, afetando principalmente os negros.
96
Revista do Vasco: No Ano do Tri, nº2, p.62.
38
A ascensão cada vez maior dos jogadores negros dava mais e mais força aos
clubes de menor expressão, o que poderia desencadear o reequilíbrio de forças dentro da
Liga, na visão dos clubes de elite. Assim, com a posição radical contra determinadas
profissões, os clubes de elite procuravam atingir marcadamente indivíduos mais
humildes, na sua maioria negros e mulatos, mas também muitos brancos pobres.
Tratando especificamente de jogadores negros, esta postura privativa, se caracteriza de
forma mais cruel.
Uma medida utilizada pela Liga e os clubes de elite para evitar a ascensão
técnica e política dos clubes menos abastados no futebol foi a já referida Lei de Estágio.
Era evidente que não se queria um clube de menor expressão, tal como o Vasco o era no
futebol, adquirindo jogadores do subúrbio, mais baratos, que pudessem qualificar a sua
equipe, dando-lhe popularidade, logo maiores rendas com as partidas.
Desta forma, se não podemos afirmar categoricamente que a postura dos clubes
da elite e da LMDT era racista, ao passo que suas ações também atingia uma parcela de
indivíduos brancos pobres, podemos afirmar que a seleção de determinadas profissões
ou a classificação proibitiva de atividades ditas braçais, não por acaso, visava impedir
97
SANTOS, João Manuel Casquinha Malaia. O futebol na cidade do Rio de Janeiro: microcosmo dos
mecanismos de poder e exclusão no processo de urbanização das cidades brasileiras (1901-1933), p. 8.
XIX Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão. ANPUH/SP – USP. São Paulo, 08 a
12 de setembro de 2008. Disponível em:
<http://www.anpuhsp.org.br/sp/downloads/CD%20XIX/PDF/Autores%20e%20Artigos/Joao%20Manuel
%20C.%20Malaia.pdf>. Acessado em: 23 mai. 2013.
39
ou pelo menos dificultar que jogadores de futebol negros ou brancos pobres
conseguissem ascender até um clube da elite, ou que, algum clube pudesse fazer frente a
estes com jogadores de classe social inferior. Logo, o racismo não era explícito,
contudo, entrava disfarçado.
Assim, entendemos que o objetivo dos jornais de grande circulação, como O
Imparcial e O Paiz, na eminência da transferência de vários jogadores do clube mais
forte do subúrbio, o Engenho de Dentro, recheado de negros e brancos pobres, que
pouco ou nada sabiam ler, para um clube emergente da LMDT, o Vasco, era se
posicionar de forma contrária à transferência dos jogadores. Neste sentido, colocar a
alcunha de chauffeur como nome de Nelson era uma postura denunciativa. Acreditamos
também que a citação de chauffeur nas escalações e crônicas esportivas ao se referir ao
goleiro Nelson da Conceição, a partir de 1919 jogador do Vasco, era uma posição
marcadamente preconceituosa de parte dos meios de comunicação da época.
De um modo geral, os dois periódicos citados, davam maior destaque aos quatro
grandes clubes da elite. Notadamente, porque possuíam maior número de sócios e
torcedores. Com a evolução do departamento de futebol do Club de Regatas Vasco da
Gama, principalmente após a conquista do campeonato de 1923, o clube começou a
disputar espaço com os grandes clubes também nas seções esportivas. O jornal O Paiz
adotava uma linha mais indiferente ao tratar do Vasco ou de seus jogadores, não
mantinha uma linha de defesa. Por outro lado, o jornal O Imparcial se destacava pela
postura mais crítica à popularização da classe dos jogadores de futebol, questionando de
forma mais contundente as ações do clube e de seus jogadores. Outro exemplo de que a
“transação” entre Vasco e o Engenho de Dentro havia incomodado, encontramos na
coluna “DIZ-E POR AHI”, do jornal O Imparcial.
DIZ-E POR AHI...
[...] que por proposta do nosso amigo Francisco Marques da Silva, o
combinado Vasco da Gama x Engenho de Dentro vae disputar um
campeonato internacional na China. [...]
DR. MANOEL JOÃO98
98
O Imparcial, 29 de maio de 1919, p. 9.
40
O ditado popular “fazer um negócio da China”, ou seja, uma excelente
negociação, já era comum no período, como observamos nos exemplos abaixo. Com
notícias referentes a outros assuntos.
Producção de seda.
[...]
Estes algorismos falam eloquentemente desta industria chineza, que
póde ser um negocio da China para todo o mundo, menos para o
Estado, que custeia por esse preço [...]99
Neste sentido, ao fazer alusão à China, o jornal dava inícios de que o Vasco fez um
“bom negócio”.
Entre os jogos amistosos do início do ano em que as equipes mostravam seus
novos jogadores, como o Vasco o fez, até o começo do campeonato da LMDT ocorreu
um fato marcante para o futebol brasileiro, o Campeonato Sul-Americano, inédito em
campos brasileiros. Era uma grande oportunidade que o pais tinha para conquistar um
título de grande prestígio frente aos seus principais rivais, argentinos e uruguaios. O
campeonato foi realizado de 11 a 29 de maio.
O Brasil conseguiu a conquista do campeonato, vencendo o Uruguai na final, 1 a
0. O demorado e esperado gol foi marcado na prorrogação pelo craque mulato
Friedenreich. A sonhada conquista foi realizada no recém inaugurado “Stadium”, como
era publicado em alguns periódicos o Estádio das Laranjeiras, construído especialmente
para a disputa campeonato. Arnaldo Guinle, presidente do Fluminense (1916-1931) e da
Confederação Brasileira de Desportos (1916-1920), articulou a construção da grande
arena para seu clube. Os jogos levaram multidões ao “Stadium”. Nunca se tinha
presenciado nada parecido no futebol brasileiro.
O campeonato foi uma verdadeira festa, e a competição de futebol
superou todas as expectativas. Os registros de público do Campeonato
Sul-Americano são muito superiores aos dezoito mil da capacidade do
estádio. No próprio livro oficial da Confederação Brasileira de Futebol
(CBF, órgão que sucedeu a CBD) constam públicos superiores a vinte
mil espectadores em todos os jogos. Teriam sido 20 mil pagantes na
estréia vitoriosa por 6 a 0 contra o Chile, 21 mil na vitória por 3 a 1
contra a Argentina, 23 mil na primeira final contra os Uruguaios e 28
mil no segundo jogo contra os mesmos uruguaios. Segundo os
periódicos da época, os jogos tinham mais de 30 mil pagantes.100
99
O Paiz, 08 de maio de 1919, p. 5.
100
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 182.
41
O futebol como instrumento político, articulando o amor do público por aquele
esporte, se tornava pela primeira vez um objeto de construção de nacionalidade
inventada. Era uma vitória da nação101 brasileira através do futebol.
FOOTBALL
SALVE FOOTBALLERS BRASILEIROS!
Depois de uma peleja emocionante, os nossos patricios lograram,
hontem, para o nosso paiz a supremacia do football no continente Sul-
Americano102
A estreia oficial de Nelson foi relatada de forma distinta entre o jornal O Paiz e
O Imparcial. O Paiz já trazia no dia do jogo uma nota falando da estreia do goleiro
Nelson: “No team do Vasco da Gama estréará hoje um novo arqueiro – Estreará hoje no
team do Vasco o keeper Nelson, antigo defensor do Engenho de Dentro”. 103 No dia
seguinte a vitoriosa estreia de Nelson com o time do Vasco, o jornal fez um grande
crônica do jogo, denotando a importância que o emergente time do Vasco começava a
ter. A atuação de Nelson mereceu destaque.
Pelo conjunto vencedor, temos a destacar:
Em primeiro plano, Palamone, que foi um verdadeiro heróe. Seguiu-se
o keeper Nelson, que defendeu com maestria, 17 shoots.104
101
Trabalhamos com a concepção de nação segundo Benedict Anderson: “É imaginada porque até os
membros da mais pequena nação nunca conhecerão, nunca encontrarão e nunca ouvirão falar da maioria
dos outros membros dessa mesma nação, mas, ainda, assim, na mente de cada um existe a imagem da sua
comunhão.”. ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas: reflexões sobre a origem e a difusão
do nacionalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.p.25.
102
O Imparcial, 30 de maio de 1919, p. 1.
103
O Paiz, 07 de setembro de 1919, p. 10.
104
O Paiz, 08 de setembro de 1919, p. 9.
42
Americano – Vadinho; laudelino e Gonçalo – Denucci, Benedicto e
Adalberto – Jaburú, Anyalack, Waldemar, Queiroz e Jonathas.
Vasco da Gama – Chauffeur; - Palamone e Alcindo – Palhares,
Lamego e Quintanilha – Pederneiras, leão, Dutra, Aristides e
Antonico.105
Ou seja, O Paiz, assim como O Impacial, resolveu apontar para a profissão do jogador.
O jornal O Imparcial desde a estreia amistosa de Nelson no início do ano já
demonstrava uma postura mais agressiva. Não seria diferente quanto à estreia oficial do
goleiro.
O KEEPER CHAUFFEUR ESTÁ JOGANDO PELO VASCO DA
GAMA
Está fazendo parte do Vasco da Gama, em seu 1º team, o adestrado
keeper Nelson (Chauffeur) […]
Esse arqueiro estreou ante-hontem, contra o Rio de Janeiro.106
105
O Paiz, 25 de setembro de 1919, p. 8.
106
O Imparcial, 09 de setembro de 1919, p. 8.
107
O Imparcial, 17 de dezembro de 1919, p. 8.
43
Como podemos perceber na “conversa”, Nelson embora um bom goleiro e que atuava
na maior equipe da Liga Suburbana, ficou impressionado com os “schoots” dos
jogadores da LMDT. Implicitamente, podemos dizer, que indica a superioridade de uma
Liga frente à outra.
Acreditamos que a intenção das citações dos jornais, indicando a “profissão” de
Nelson foi uma tentativa de dificultar a inscrição jogador, fazendo-o passar pela
Comissão de Sindicância da LMDT, órgão da Liga responsável por fiscalizar os
jogadores quanto aos requisitos necessários para atuar e indicar os casos que
contrariassem os estatutos ao Conselho Superior108. Infelizmente os jornais não fazem
menção às dificuldades de inscrição do jogador.
Entendemos que a subjetividade da profissão nos estatutos da Liga, permitiu que
Nelson da Conceição não fosse vítima da Comissão de Sindicância da LMDT. Outra
principal causa de conflitos contra jogadores negros e brancos pobres era a questão do
analfabetismo. Isto, ao que nos consta, não foi um problema para Nelson.
Provavelmente o jogador era alfabetizado o bastante para poder assinar o próprio nome:
“o Nelson Conceição, que não parecia, mas sabia ler e escrever corretamente”109.
A partir de 1917 o analfabetismo se tornou principal instrumento utilizado pela
Liga para barrar jogadores.
A lei de 1916 especificava as profissões indesejadas, enquanto os
novos estatutos deixam essa questão em aberto, havendo nas duas a
possibilidade do Conselho Superior decidir pela questão. Os estatutos
de 1917 faziam referência clara ao analfabetismo, questão ausente na
lei de 1916. No entanto. Podemos perceber um caráter mais flexível
em relação às profissões dos jogadores nos novos estatutos [...]110
Se por um lado, a legislação da Liga vigente durante o ano de 1919, e perdurando pelos
anos seguintes a que se propõe o nosso trabalho, não impediu que Nelson atuasse pelo
Vasco. A imprensa continuou dando voz aos que defendiam um futebol carioca
segregacionista.
Além do “afrouxamento” das regras quanto à profissão, há outro elemento que
poderia ter contribuído para a aceitação de Nelson111 pela Liga e desistência dos jornais.
108
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 149.
109
FILHO, Mario. O negro no futebol brasileiro. Rio de Janeiro: Mauad, 2010, p. 132.
110
Idem, p. 150.
111
Nelson da Conceição enquanto atuou pelo Vasco, no período do amadorismo, era considerado um
empregado do comércio. Além das referências feitas pela obra O Negro no Futebol Brasileiro, ao se ferir
num jogo em 1927, o jornal O Paiz noticiou um ocorrência feita pela Polícia. Nesta, constava que Nelson
era funcionário do comércio: O Paiz, 18 de julho de 1927. Em outro periódico encontramos a seguinte
44
Um método executado pelo Vasco para burlar as exigências da Liga era dar aos
jogadores empregos de fachada em comércios de sócios vascaínos, enquanto eles iam
treinar futebol. Uma espécie de evolução à prática já comum entre os clubes da elite e
outros, que pagavam jogadores para se beneficiar de seu futebol.
45
campeonato de 1919, antes da estreia de Nelson, o Vasco havia sofrido 18 gols em 7
jogos116, uma média de 2,57 gols por jogo. Os goleiros Miguel Cavalier e Luiz Barroso
eram os que mais revezavam como goleiros do primeiro quadro. Nelson não atuava. A
partir do seu jogo de estreia por um campeonato da LMDT, Nelson se tornou titular
absoluto. O Vasco jogaria mais oito vezes, levando apenas 16 gols, uma média de 2 gols
por jogo.
A deficiência técnica da equipe não cabia mais a posição do goleiro. Contudo,
das outras posições da equipe. Não se deve atribuir totalmente a Nelson a melhora da
equipe em relação aos gols sofridos, mas o fato de Nelson raramente ficar fora das
partidas contribui para afirmarmos que ele foi vital para que, na parte defensiva, o
Vasco pudesse se estabilizar.
O Vasco terminou o Campeonato de 1919 na quinta posição117. A equipe do
Palmeiras, campeã do Torneio Início, levou o campeonato da 2ª Divisão. A equipe do
Fluminense se sagrava tricampeã carioca na 1º Divisão. Passado o ano de estreia de
Nelson, os jornais não utilizavam mais a alcunha Chauffer para se referir ao jogador.
Afinal, em nada surtiu efeito.
Nos anos de 1920 e 1921, Nelson junto ao Vasco permaneceu nas divisões
inferiores. A partir de 1920 não havia mais a lei do Estágio, estava criada a lei do Passe.
Assim, o caminho estava livre para os “borboletas”118.
DO PASSE E ESTAGIO NA METROPOLITANA
Na assembléa geral realizada ante-hontem, na Liga Metropolitana, foi
apresentada e julgada objeto de deliberação a seguinte proposta do Dr.
Ferreira Vianna Netto:
“Fica creada a lei do passe com relação à lei do estagio:
a) O jogador que requerer o passe e lhe fôr concedido pelo club de
que fez parte, não estará sujeito ao interstício;
b) Em caso contrario, isto é, sendo-lhe negado o passe, soffrerá o
interstício da lei, sem que possa recorrer para qualquer poder da Liga.
Sala das sessões, 7 de janeiro de 1920.119
Era uma libertação do jogador e ao mesmo tempo uma vitória para clubes “reveladores
de talento”. Inclusive para os clubes da elite, porque lucrariam muito ao poderem
reforçar suas equipes de futebol com jogadores de equipes menos abastadas.
visualizar os cálculos realizados, bem como os jogos de Nelson pelo Vasco entre 1919 e 1923. Ver
TABELA DE JOGOS 1 – 1916 a 1918, p. 117.
116
Ver TABELA DE JOGOS 1 a 7, pp. 117-124.
117
O Imparcial, 02 de janeiro de 1920, p. 8.
118
Termo utilizado para caracterizar jogadores que trocavam de clubes.
119
O Imparcial, 09 de janeiro de 1920, p. 6.
46
Contudo, a resistência a jogadores negros ainda era bem forte nos grandes
clubes. Enquanto, no Vasco, Nelson chegou para tomar conta da posição de goleiro da
equipe vascaína, outros jogadores negros sofriam:
CAFÉ COM LEITE...
Ao que se dizia hontem na Brahma, a directoria de um club da zona
sul, que faz parte da 1ª divisão da Liga, resolveu “patuscamente”120,
não pedir registro para seu jogador “goal-keeper” pelo facto de não ser
o mesmo “um pouquinho mais claro!”...
É boa essa!...
Comem a mensalidade do rapaz “que não é claro” e deixam de o
registrar por ser ele escuro!...
Anda mal o citado club procedendo dessa forma, pois, se quer ter
preconceitos deve-os ter quando aprovar as duas propostas de socios
novos e não depois.
Alem disso, quem sabe se esse jogador não virá a ser um
Friedenreich?121
Os dirigentes do Flamengo não queriam um goleiro “que não é claro”. O racismo era
evidente.
É preciso fazer referência à forma como o jornal tratou o caso. Não se expôs o
clube diretamente, o que indica que o racismo, tal como já dissemos, era “maquiado” o
máximo possível. Uma característica da época. Não condena diretamente o clube pela
sua prática em si. Todavia, se questiona a forma como o clube escolhe seus sócios.
Dando a entender que poderia haver uma seleção natural de jogadores brancos, desde
que fossem feitos na entrada destes como sócios. Ou seja, era preciso não aceitar sócios
negros para querer que um jogador negro não atuasse no futebol do clube. Lembrando
que os jogadores de futebol eram sócios dos clubes.
Enquanto isso, Nelson evoluía com o time do Vasco. No ano de 1920 ele e a
equipe vascaína terminaram em quarto lugar, a equipe do Carioca se sagrou campeã da
2ª Divisão122. As atuações de Nelson assombravam o público do futebol bretão. No
último jogo do campeonato, no empate de 3 a 3 do Vasco com a equipe do S.C.
Mackenzie, Nelson foi o destaque.
120
O termo se refere ao jogado Ary Patusca. No ano de 1919, Ary Patusca saiu dos Santos F.C. para ser
jogador do Flamengo. Atuou na derrota deste para o Fluminense, por 3 a 1, em 24 de maio de 1919. De
forma abrupta, Ary Patusca saiu do clube da Zona Sul e retornou para São Paulo, pedindo demissão como
sócio/jogador do Flamengo. Neste sentido, o termo “patuscamente” tem uma conotação de ação rápida e
sem justificativas. O Imparcial, de 24 de maio a 24 de agosto de 1919.
121
O Imparcial, 10 de janeiro de 1920, p. 7.
122
O Imparcial, 10 de janeiro de 1921, p. 7.
47
No campo do S. Christovão A. Club foi effectuado hontem o match
entre os sympathicos e valorosos C.R. Vasco da Gama e S.C.
Mackenzie [...]
A peleja foi sensacional, notadamente em ambos os quadros
disputantes preparo e technica, o que concorreu bastante para o
completo brilhantismo da pugna [...]
Do Vasco, estiveram assombrosos, o goal-keeper Nelson, e o fullback
C. Cruz.123
Nos 16 jogos em que Nelson atuou pelo campeonato da 2ª Divisão de 1920, o Vasco
levou 23 gols, média de 1,43 por partida. Entre sua estreia e a última partida de 1923,
em confrontos válidos pelo campeonato da cidade, o jogo contra o Hellênico seria o
único em que Nelson desfalcaria a equipe vascaína.
A ausência do goleiro se explica por questões físicas, após partida contra o Ríver
F.C., em que o Vasco venceu por 5 a 0: “O jogo foi violento, salientando-se na
brutalidade [...]126. Na 1ª Divisão, o Flamengo conseguiu quebrar a sequência do
Fluminense, e sagrou-se campeão.
Em 1921 o campeonato da Liga Metropolitana sofreu mudanças. A 1ª Divisão
foi dividida em duas séries, A e B. Clubes emergentes como o Vasco ficaram na série B
da 1ª Divisão, enquanto os clubes grandes, da elite, ficaram na série A da 1ª Divisão.
123
O Imparcial, 27 de dezembro de 1920, p. 8.
124
Provavelmente o termo se equivale ao que hoje denomina-se “zica”, no jargão popular do futebol.
Equivale a má sorte.
125
O Imparcial, 06 de setembro de 1920, p. 9.
126
O Imparcial, 30 de agosto de 1920, p. 8.
48
A GRANDE ASSEMBLÉA DE HONTEM, NA L.
METROPOLITANA
Foi approvado o parecer sobre as séries A e B[...]
Realizou-se, hontem, a noite, a grande assembléa da Liga
Metropolitana, para dsicutir o parecer da comissão de informações
sobre as séries A e B, composta cada qual de 7 clubs.
[...]
Sendo approvado por vinte e sete votos contra cinco.
[...]
As séries ficaram assim constituídas:
Primeira divisão
Série A
America, Andarahy, Bangú, Botafogo, Flamengo, Fluminense e São
Christovão.
Série B
Carioca, Villa Isabel, Palmeiras, Mangueira, Vasco, Mackenzie e
Americano.127
127
O Imparcial, 01 de março de 1921, p. 12.
128
O Imparcial, 29 de agosto de 1921, p. 3.
129
O Imparcial, 05 de setembro de 1921, p. 3.
130
O Imparcial, 08 de setembro de 1921, p. 9.
49
seria marcante em diversos aspectos para o Rio de Janeiro e para o Brasil de um modo
geral. No aspecto político-nacional o Brasil completaria cem anos de Independência e
no esporte, o Campeonato Sul-Americano retornaria ao país. Todavia, nem tudo seria
motivo de comemoração. A data histórica foi marcada pelo aumento de uma postura
preconceituosa em relação aos imigrantes portugueses. No futebol, o preconceito contra
jogadores negros continuava presente, inclusive em produções oficiais do Estado.
Na contramão de todas as dificuldades, Vasco e Nelson ascenderiam pela
primeira vez ao grupo de elite do futebol carioca.
50
CAPÍTULO 2 NELSON: O GRANDE KEEPER (1922-1924)
Mais uma prova de que o futebol era jogo de branco. Nenhum clube
com um mulato, com um preto no time, tinha sido campeão de 6 a 22.
Só o escrete brasileiro, com Friedenreich. Friedenreich, porém, tinha
pai alemão, não queria ser mulato.131
131
FILHO, 2010. Op. cit., p. 119.
132
Idem, p. 120.
133
O Imparcial, 17 de abril de 1922, p. 3.
51
O “exímio arqueiro Nelson” pouco sofreu com os ataques palmeirenses, aguardava-se
os próximos jogos que de fato testariam as forças do conjunto vascaíno.
O certo é [...] que não se póde ainda avançar um juízo seguro sobre o
valor da equipe de Santa Luzia134, pois o adversário que tinha pela
frente não ofereceu ensejo para isto.
Aguardemos os futuros encontros com o Villa e com o Carioca [...]135
134
O termo Santa Luzia faz referência à sede administrativa do Vasco à época. Sede de Santa Luzia – Rua
Santa Luzia, n.250, Centro.
135
O Imparcial, 17 de abril de 1922, p. 3.
136
O Malho, 22 de abril de 1922, p. 39. Ver FIGURA 4, p. 97.
52
XV e XVI – O phenomeno da aryanização progressiva da nossa
população. Dados estatísticos que a demonstram.
[...]
estas duas raças inferiores [negros e índios] só se fazem agentes da
civilização, isto é, somente concorrem com elementos eugênicos para
a formação das classes superiores, quando perdem a sua pureza e se
cruzam com o branco.
[...]
Os elementos inferiores que formam o nosso povo, estão sendo, pois,
rapidamente reduzidos, a) pela situação estacionária da população
negra; b) pelo augmento continuo dos affluxos aryanos neste últimos
tempos [imigração europeia]; c) por um conjunto de seleções
favoraveis, que asseguram, em nosso meio, ao homem de raça branca
condições de vitalidade e fecundidade superiores aos homens das
outras raças. 137
137
Recenseamento do Brasil realizado em 1º de setembro de 1920. Rio de Janeiro: Typographia da
Estatística, 1922, pp. 312, 329-340.
138
Idem, pp. 334-343.
53
A mocidade brasileira, até então, sujeita a um ascetismo pleno de
vícios e sentimentalismo, começou a interessar-se pelos jogos
ingleses, especialmente pelo cricket. Contudo não se apresentara,
ainda, a formula desportiva capaz de operar o milagre de uma
transformação necessária e profunda nos hábitos, na educação da
mocidade.
Para tanto fora mister uma fórma de desporto mais assimilável, mais
adaptável aos caracteres ingênitos, physicos, psychicos, da mocidade
brasileira, entre os quaes avultavam a nervosidade latina e a
combatividade indígena.
Estava reservado este papel ao futebol [...]
Para tanto fora mister uma fórma de desporto mais assimilável, mais
adaptável aos caracteres ingênitos, physicos, psychicos, da mocidade
brasileira, entre os quaes avultavam a nervosidade latina e a
combatividade indígena.
Estava reservado este papel ao futebol [...]139
139
IHGB, Diccionario Historico, Geographico e Ethnografico do Brasil: Introducção Geral. Imprensa
Nacional, Rio de Janeiro, 1685p, 1922, p. 413.
140
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O Espetáculo das Raças: Cientistas, Instituições e Questão Racial no
Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 99.
54
Coube, portanto, aos presidentes, enquanto políticos influentes, e aos
secretários e oradores, como intelectuais respeitados, o papel de
imprimir ao IHGB sua principal feição: a de um estabelecimento
voltado para uma produção unificadores e estreitamente vinculada à
interpretação oficial, fosse ela qual fosse141
141
Idem, pp. 101 e 108.
142
Idem, p. 111.
143
Idem, p. 112.
55
negros, como a própria equipe vascaína. A questão técnica do jogador e da equipe, para
o sucesso do clube no futebol, crescia cada vez mais com a necessidade das vitórias:
“[...] os indivíduos da chamada ‘gran fina sociedade’ não davam mais conta frente à
necessidade de vitórias nos desafios esportivos e, com isso, necessitavam de membros
de outros grupos sociais que possibilitassem a vitória nas partidas e torneios”144.
Jogadores como Nelson, poderiam não agradar a muitos pela sua cor de pele ou
condição social, marcadamente aos adeptos dos demais clubes. Todavia, suas defesas o
tornava cada vez mais uma unanimidade.
Voltando ao campeonato de 1922, a equipe vascaína não suportou as investidas
do forte time adversário e saiu derrotada por 1 a 0. A despeito da derrota para o Villa
Izabel, a torcida do Vasco demonstrava outra vez a sua força, indicando que a
quantidade de adeptos do Clube da Cruz de Malta já não cabia nos acanhados estádios
da série B.
VILLA ISABEL X VASCO DA GAMA
Uma enorme multidão movimentou-se hontem, para assistir á renhida
peleja que se realizou no aprazível e longínquo campo situado no
interior do Jardim Zoologico, entre as possantes esquadras do Villa
Isabel e Vasco da Gama. Esse encontro que durante a semana foi o
assumpto prediletcto das rodas desportivas, vinha sendo aguardado
com grande ansiedade sob todos os pontos de vista justificada, pois é
tradicional o enthusiasmo que sempre desperta a luta entre esses dois
queridos e dignos grêmios rivaes.145
56
vascaína, assim como a torcida vascaína. Ao Vasco, já era dado a alcunha de scratch:
“A assistência fez um barulho infernal, com cantigas, palmas, réco-réco, o diabo. Tudo
isto porque o scratch está vencendo de três a zero.”148.
Após as três primeiras partidas o Vasco teria um técnico por completo. Ramon
Platero e o Vasco conseguiram um acordo e o treinador uruguaio optou pelo Vasco. O
treinador disse que em caso de igualdade de condições entre Vasco e Flamengo, optaria
pelo primeiro.
[...] 1º Diretor de Desportos Terrestres pede a palavra para
informar que o nosso entraineur de foot-ball Ramon Platero foi
intimado pelo Club de Regatas Flamengo a optar por um dos
dois clubes para dedicar a sua atividade profissional e que em
igualdade de condições dava a preferencia ao Club.149
Dizia Ramon Platero que, no Flamengo, recebia 900$00 mensais e possuía multa
rescisória de 2:000$000150. O Vasco igualou o valor mensal e aumentou para 3:000$000
a multa rescisória. O treinador ainda ficaria com os juros do valor que seria depositado
em um banco. Assim dizia as condições do contrato firmado:
[...] Primeira: O Sr. Ramon Platero obriga-se a prestar exclusivamente
ao CR. Vasco da Gama seus serviços profissionais, mediante
ordenado mensal de novecentos mil reis (R$900$000), pago por mês
vencido.
[...]
Sétima: Para garantia do determinado na condição [ilegível], sexta, o
Sr. R. Platero depositará á ordem do C.R.V. Gama em um Banco ou
Estabelecimento de Crédito, a quantia de R$3:000$000 (Três contos
de reis), cabendo, porém, ao mesmo os juros que o mencionado
deposito obtiver.
A decisão do treinado em ficar com o Vasco parece não ter agradado a diretoria
do Flamengo, que desdenhou de Ramon Platero:
148
O Imparcial, 02 de maio de 1922, p. 3.
149
Transcrição feita da Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 8 de maio de 1922.
150
Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 8 de maio de 1922.
151
O Imparcial, 19 de maio de 1922, p. 7.
57
A situação era bastante significativa. Um dos melhores treinadores do Rio de Janeiro
resolveu deixar o atual bicampeão da cidade para treinar uma equipe emergente da série
B. Isto demonstra a disposição diretoria do Vasco em alçar o clube à série A da 1ª
Divisão.
Neste sentido, a diretoria do Vasco tentava conseguir deixar seu campo à rua
Moraes e Silva, na Tijuca, em condições adequadas para a realização de jogos do porte
da série B. Enquanto mandante no ano de 1992, o Vasco atuava no campo do Botafogo,
pagando aluguel pela locação do estádio152. A diretoria do clube conseguiu o
empréstimo do antigo campo do Sport Club Rio de Janeiro em 1921, iniciando uma
série de reformas na perspectiva de tê-lo no campeonato de 1922, lucrando com o
afluxo da já imensa torcida vascaína. A adequação do mesmo somente foi possível no
mês de junho, com o campeonato já em andamento153.
As boas expectativa que giravam em torno do Vasco de Nelson começaram a
sofrer com uma ameaça, o analfabetismo. Eis um dos motivos para não podermos
afirmar que somente jogadores negros sofriam com as condições impostas pelos grandes
clubes que coordenavam a Liga e por parte da imprensa. Embora, como já dissemos, o
analfabetismo atingisse majoritariamente os indivíduos negros, por razões históricas,
muitos brancos pobres também se enquadravam nesta categoria.
Assim, um dos jogadores contratados para reforçar a equipe do Vasco no ano de
1922 seria perseguido durante toda a temporada. Leitão, alcunha dada a Albanito do
Nascimento154, atuava pela equipe do Bangu, onde era titular do primeiro time desde
1917155. Em 1922, ao se transferir para o Vasco deveria optar pelo Vasco. Para isto, o
jogador era obrigado a fazê-la de próprio punho, provando que sabia ler e escrever, ou
seja, não era analfabeto. Leitão fez a opção em 22 de março.
LEITÃO E BRAULIO OPTARAM PELO VASCO
Compareceram hontem, á noite, á Liga Metropolitana, onde optaram
pelo Vasco, os players Leitão e Braulio, este center-half do Andarahy
e aquelle back, do Bangú.156
58
sua grafia, criando um problema que acompanharia o Vasco até o mês de outubro. Em
março, a diretoria recebeu um comunicado da LMDT, pedindo a regularização do
jogador. Já dando o entender que ele foi considerado analfabeto, pela subjetividade da
Liga Metropolitana.
Liga M.F. Terrestres [...] pedindo que estejamos dispostos a agir junto
dos nossos jogadores de football para que até 30 de junho [ilegível]
vão cumprir o disposto nos seus estatutos, artos. 67 e 104, que se
assumem em provar que sabem ler e escrever.157
157
Transcrição feita da Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 8 de maio de 1922.
158
FILHO, 2010. Op. cit., p. 131.
159
Constituição Federal de 1891. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao91.htm> Acessado em 06 de
dezembro de 2012.
59
população fazia da franquia existente, isto é, o número de fluminense
que se alistavam e realmente votavam nas eleições republicanas.160
160
CARVALHO, 1987. Op. cit., p. 85.
161
O Imparcial, 04 de junho de 1922, p. 8.
162
O Imparcial, 05 de junho de 1922, p. 4.
163
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 260.
60
a alcunha de “Campeão do Centenário”. O título veio com a vitória sobre o São
Christovão, em 16 de julho164.
A equipe vascaína chegou ao último jogo dependendo apenas de suas forças para
conquistar o primeiro título da história do futebol do clube. O jogo era contra o
Palmeiras, que o Vasco já havia goleado na estreia. A importância do jogo era notória.
164
O Imparcial, 17 de julho de 1922, p. 1.
165
O Imparcial, 23 de julho de 1922, p. 8.
166
Fazendo menção à já citada política do Club de Regatas Vasco da Gama em dar postos no comércio
para seus jogadores. Enquanto, na verdade, eles estavam voltados à prática do futebol.
167
Sobre a Taça Constantino: “[...] originária do artesanato português rico de habilíssimos joalheiros no
lavor da prata e metais preciosos constituía oferta dos produtores dos afamados vinhos
CONSTANTINO”. ROCHA, 1975. Op. cit., p. 329.
168
O Imparcial, 31 de março de 1922, p. 7.
169
O Imparcial, 24 de julho de 1922, p. 1.
61
A torcida do Vasco comemorou com muito entusiasmo a conquista do clube, que
desde 1916 lutava em prol de glórias no esporte bretão. Fizeram uma carreata com
direito a vários automóveis, provavelmente havia alguns chauffeurs.
NOTAS DO DIA
OS VASCAINOS FAZEM UMA PASSEATA
Hontem á noite, realizou-se nesta capital, uma grande passeata
organizada pelo Club de Regatas Vasco da Gama.
Festejavam assim os valentes defensores da cruz de malta, a victoria
obtida no campeonato da serie B.
O cortejo compunha-se de grande numero de automóveis e
apresentava um lindo aspecto. Durante a sua passagem foram os
valentes vascaínos saudados por grande numero de pessoas.170
A festa descrita acima pelo jornal O Paiz demonstra um pouco do patamar que o futebol
havia alcançado, lembra, inclusive, ao estilo de comemoração em forma de carreata
utilizado até os dias atuais. Com as devidas diferenças históricas.
O Vasco já havia enfrentando por vários dias denúncias a respeito suborno de jogadores
rivais. Em contrapartida, acusava outros clubes de pagarem jogadores para atuarem com
mais “vontade” contra a equipe vascaína172.
170
O Paiz, 24 de julho de 1922, p. 2.
171
O Imparcial, 22 de agosto de 1922, p. 10.
172
SANTOS, 2010. Op. cit., pp. 267-269.
62
As denúncias não foram confirmadas: “Nunca passaram, porém, de alegações
vagas [...]”173. Os pontos retirados foram o do jogo contra o Carioca F.C., realizado em
16 de julho e ganho pelo Vasco por 8 a 3. A notar que o Conselho Superior retirou os
pontos em reunião no dia do aniversário do clube de Santa Luzia. Um presente.
Exije-se, apenas, pela letra “h”, do art. 66; dos estatutos, que o
candidato saiba ler e escrever, e que não esteja abaixo do nivel moral
do amadorismo. Nada mais. Não se fazem resticções. Não se exije que
o candidato “saiba ler e escrever bem”, ou “muito bem”, mas, apenas,
que saiba “ler e escrever”. E isso Albanito provou firmando as suas
declarações.174
173
O Imparcial, 22 de agosto de 1922, p. 10.
174
O Imparcial, 24 de agosto de 1922, p. 10.
175
FILHO, 2010. Op. cit., p. 99.
63
pensar, diremos apenas que Albanito Nascimento não é analfabeto,
não se podendo como tal considerar quem escreve de seu próprio
punho uma “opção composta de quatro ou cinco linhas.”176
176
O Imparcial, 02 de outubro de 1922, p. 6.
177
SANTOS, João Manuel Casquinha Malaia Santos. “Jogos Olympicos do Rio de Janeiro” no
Centenário de 1922: olhares sobre a política de um projeto de unificação e celebração da nação através do
esporte, p. 1. XXVI SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA - ANPUH: 50 anos. Disponível em:
<http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300899445_ARQUIVO_JoaoMCMalaiaSantosAnp
uh2011.pdf>. Acessado em: 12 dez. 2012.
178
Idem, p. 7.
64
5º Campeonato Sul Americano de Football
Salve BRASIL campeão de 1922!
O valoroso scratch brasileiro impõe-se brilhantemente importante
certâmen, não obstante a negliencia e fraqueza dos dirigentes do
desporto nacional179
CAMPEONATO DE 1922
Na prova eliminatória, o S. Christovão e o Vasco empataram por 0x0.
Para hontem a Liga Metropolitana determinou a realização da prova
eliminatória entre o primeiro colocado na serie B da 1ª divisão e o
ultimo colocado na serie A.
[...]
Se a partida muito deixou a desejar na parte techinica, isso se deu
apenas por culpa dos dois quadros disputantes. Foi mesmo uma
partida completamente falha de techinica. Basta dizer que o jogo mais
productivo, que é o feito por bolas centradas, esse não vimos ser
praticado durante toda a pugna. Apenas umas duas ou três bolas destas
observamos hontem.180
Nelson, o grande goleiro da série B, salvou o Vasco de uma possível derrota no fraco
embate da eliminatória.
179
O Imparcial, 23 de outubro de 1922, p. 1.
180
O Paiz, 06 de novembro de 1922, p. 5.
181
Idem.
65
Com o empate havia a expectativa de um jogo desempate entre as equipes.
Contudo, o “caso Leitão” retornou. Com a justifica de que o jogador Albanito
Nascimento não se inscreveu no prazo de 30 dias antes da partida, o São Christovão foi
nomeado o vencedor do jogo. O América foi considerado o Campeão do Centenário,
não precisando enfrentar a temida equipe de Nelson.
Leitão havia sido obrigado a fazer uma nova inscrição, “opção”, para regularizar
algo que já estava mais do que regularizado. Ele o fez no dia 04 de novembro, um dia
antes do match contra o São Christovão. Segundo as regras da Liga, os jogadores
somente poderiam atuar 30 dias após a “opção”. Alegando a desobediência à regra,
deram a vitória ao São Christovão. O Vasco recorreu.
Ordem do Dia
Dada a palavra ao Sr. Secretario Geral para comunicar o resultado do
jogo do 1º team com o S. Christovão A. Club “0x0” mas que a
Directoria da Liga M.D. Terrestres, em sua sessão de 6 do corrente
julgou como venedor o ultimo club, alegando não ter o jogador
Albanito Nascimento os 30 dias regulamentares de inscripção, após a
sua nova opção, feita na noite de 4 do corrente. Achando tal decisão
ilegal resolveu-se recorrer daquele acto para o Conselho Superior da
Liga M.D.T. por uma unanimidade.184
A torcida do Vasco era grande, mas a sua oposição se fazia presente. Afinal, um
time campeão com negros, a começar pelo goleiro, e brancos analfabetos, não agrava
182
Por um erro de digitação o jornal escreveu “hontem” se referindo ao dia 07 de novembro de 1922.
Todavia, a referida sessão da Liga ocorreu em 06 de novembro de 1922.
183
O Imparcial, 08 de novembro de 1922, p. 7.
184
Transcrição feita da Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 08 de novembro de 1922.
66
muitos adeptos de um futebol, digamos, elitista. O cronista “PERIGOSO”185 do jornal O
Imparcial, em sua coluna “DRIBBLANDO...”, traduz o sentimento dos que torciam
contra o grêmio vascaíno. O aludido cronista faz brincadeira jocosa com a situação
vascaína. Contudo, também dá indícios da audácia do Vasco e sua vontade em ser um
dos grandes no futebol carioca, e “ganhar o mundo”.
DRIBBLANDO...
[...]
A viagem do grêmio da Cruz de Malta que pojectava á Europa, caso
“ensorasse” o S. Christovão e depois o America, foi, á ultima hora,
transferida para outro centenário...
Pelo menos foi o que ouvimos do Albertino Moreira186.187
Neste sentido, acreditamos que o empate do Vasco também serviu para expor
outro marcante elemento da sociedade carioca no ano de 1922. Em vários setores da
sociedade se viu um aumento do preconceito contra a imagem do imigrante português.
Afinal, se completava cem anos da independência político-administrativa de Portugal. A
reação contrária ao imigrante dependia de sua condição social, recaía especialmente
sobre o imigrante português pobre188.
No esporte, e neste caso no futebol, como parte da sociedade, podemos dizer, foi
testemunha deste fato. O Vasco com uma grande torcida e grande parte dela de
indivíduos da colônia portuguesa de uma camada mais humilde, representava o
“inimigo”, o “atraso”. Soma-se a isto, a composição da equipe vascaína, marcadamente
formada por negros e brancos pobres, e muitos analfabetos como o Leitão. E os que
sabiam ler e escrever “um pouco” como Nelson. Este, que não caiu nas garras da Liga
porque após a sua inscrição em 1919 não trocou de clube. Logo, não precisou passar
novamente pela tortuosa situação189.
185
O cronista Raul Loureiro assinava como “PERIGOSO” sua coluna “DRIBBLANDO” no jornal O
Imparcial. SANTOS, 2010. Op. cit., p. 217.
186
Membro do departamento de Desportos Terrestres do Club de Regatas Vasco da Gama no ano de
1922. ROCHA, 1975. Op. cit., p. 311.
187
O Imparcial, 07 de novembro de 1922, p. 9.
188
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 112.
189
Para auxiliar na compreensão sobre o que o Vasco de Nelson estava causando, citamos o “ódio
destilado” de um colunista do Correio da Manhã, após o empate entre Vasco e São Christovão:
Continuando a oração – dizíamos – que seria natural que se esperasse a victoria do S. Christovão,
natural por todos os motivos. Pois bem, a fama do Vasco chegou a taes culminancias, á proporções tão
elevadas, que a crença geral era de que jamais o Vasco poderia deixar de vencer. Estava quase
decretada a victoria. Muito portuguez perdeu muito dinheiro em aposta, e só perdeu porque não entende
67
As relações dos bastidos do futebol resolveram as questões que deveriam ser
definidas em campo. Como nos informa O Paiz, o São Christovão: “NÃO VENCEU
NO CAMPO MAS GANHOU NA LIGA”190. O Vasco reagiu e conseguiu reverter a
situação, entrando para a série A, que teria 8 clubes no ano de 1923. O aumento de
clubes na série A, inclusive, já estava em debate desde o início do ano191. O São
Christovão não foi rebaixado192.
A mudança de posição a Liga talvez possa ser entendida por esta informação
dada pelo O Paiz, que identifica a força que o clube possuía com a sua torcida cada vez
maior, logo, mais lucrativa:
O Vasco de Nelson entraria pela primeira vez no grupo das grandes equipes do
futebol carioca. Local em que estes reinavam absoluto desde 1906. Na temporada de
1922, o goleiro disputou todos os jogos do Vasco pelo campeonato. Somando a partida
eliminatória, foram 12 jogos, com 10 gols sofridos. Uma média de somente 0,76 gols
por jogo. Para a grande atuação da defesa, Nelson tinha ao seu lado o branco e pouco
instruído Mingote e o “analfabeto em escrita”, mas “doutor em futebol”, Leitão. Assim,
Nelson, tal como a equipe do Vasco, evoluía campeonato após campeonato.
de football, ou entende que no football só ganha quem quer ganhar. Correio da Manhã, 06 de novembro
de 1922, p. 3.
190
O Paiz, 09 de novembro de 1922, p. 6.
191
O Imparcial, 29 de março de 1922, p. 7.
192
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 272.
193
O Paiz, 08 de novembro de 1922, p. 6.
68
2.2 O Primeiro Goleiro Negro Campeão Carioca
O ano de 1923 foi especial em todos os sentidos para Nelson, para o Vasco e
para o futebol carioca. De uma só vez, Nelson se tornaria o primeiro goleiro negro a ser
campeão carioca, a defender a seleção carioca e a seleção brasileira. Nelson já havia
conquistado status de ídolo para a torcida do Vasco. A citação acima, vemos um
testemunho do sucesso de Nelson e do futebol entre as mulheres. No caso, de uma
torcedora vascaína eufórica.
194
O Paiz, 14 de agosto de 1923, p. 9.
195
ROCHA, 1975. Op. cit., p. 349.
196
O Imparcial, 02 de março de 1923, p. 8.
197
Nelson da Conceição, mesmo após sua saída do Vasco em 1928, continuou sócio do Club de Regatas
Vasco da Gama. Em 21 de julho de 1929, Nelson defendia as cores do Bangu. Para atuar pelo Bangu
contra o Vasco, no citado dia, em jogo válido pelo Campeonato Carioca de 1929, Nelson enviou um
ofício ao Vasco. Com o objetivo de consultar a possibilidade de enfrentar seu antigo clube. Haja vista,
que era sócio do Vasco. O clube concedeu a licença ao goleiro, sem que este perdesse seus direitos
associativos. Isto, ao nosso modo de ver, denota uma boa relação mantida entre o atleta e o clube, após
sua saída como atleta. Diario Carioca, 21 de julho de 1929, p. 9.
69
experiente “borboleta”. Arthur veio do Hellenico. Bolão198, ou Claudionor Corrêa, era
jogador do Bangu. Leitão, como já dissemos, foi jogador do Bangu. Mingote veio do
Pereira Passos F.C.. Negrito, capitão do Vasco em 1923, veio do Lapa Football Club.
Nicolino veio do Andarahy. Do S.C. Rio de Janeiro, Paschoal veio jogar no Vasco. Por
último, Torterolli. O atleta veio do Cattete F.C., mas fazia parte do time do Engenho de
Dentro, ao lado de Nelson. Contudo, não teve a mesma ascensão do goleiro199.
Dos onze jogadores que compunham a base de 1923, quatro eram negros: Nelson,
Bolão, Cecy e Nicolino. Os dois últimos tidos como analfabetos. Os demais sete
jogadores eram brancos “à brasileira”, mestiços. Destes: Leitão, Mingote, Paschoal e
Torterolli eram acusados de analfabetismo.201
Os dirigentes vascaínos pegaram esses jogadores e os profissionalizaram,
transformando-os em verdadeiros “operários da bola”. Indo de acordo com a lógica
capitalista cada vez mais instituído no futebol e nos demais setores da sociedade
brasileira à época.
Eram homens que faziam com que mais uma engrenagem do mundo
capitalista tomasse forma dentro da cidade, homens que encaravam a
relação profissional do trabalho dos jogadores de sua equipe, pois
estes recebiam salários para se dedicar exclusivamente a atividades
que executavam melhor do que as outras pessoas.202
198
Claudionor Corrêa se inseriria para sempre no quadro social do clube. Anos mais tarde ser tornaria
Diretor de Desportos Terrestre. Cargo que exercia em 1934, quando o Vasco conquistou o seu 4º
Campeonato Carioca. Titulo este que veio com uma equipe formada por um trio formidável de jogadores
negros: Domingos da Guia, Fausto e Leônidas. O Bolão, alcunha que possuía desde a sua infância, se
tornou Grande Benemérito do Club de Regatas Vasco da Gama. Documento do Conselho Deliberativo do
Club de Regatas Vasco da Gama: 19/01/1945 a 12/09/1944, 17 de janeiro de 1944.
199
SANTOS, 2010. Op.cit., pp. 217-283.
200
Idem, pp. 283-284.
201
Idem, p. 283.
202
Idem.
70
principais títulos das principais ligas do futebol carioca. Os dirigentes e jogadores dos
grandes clubes, membros das camadas dominantes, da elite, se viram obrigados a perder
para uma equipe de negros e brancos analfabetos, pertencente a um clube da colônia
portuguesa e com uma imensa torcida das mais diversas camadas da sociedade.
O futebol proporcionou visibilidade a um grupo de indivíduos que
eram até então invisíveis. As classes populares, apesar dos limites,
operaram com muita sagacidade sobre seus problemas e alcançaram
resultados valiosos no cenário social a partir do futebol. Isso tudo se
deu a partir de muitas tensões e, fundamentalmente por isso, este
esporte se tornou tão significativo para a história do Brasil.203
203
SANTOS, Ricardo Pinto dos. Tensões na consolidação do futebol carioca, p. 211. In PRIORI, Mary
Del; MELO, Victor Andrade de. História do Esporte no Brasil: Do Império aos dias Atuais. São Paulo:
Editora UNESP, 2009.
204
Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 08 de março a 05 de abril de 1922.
205
Os valores gastos com Nelson basicamente se referem ao mês de março de 1922. A equipe disputou
um único amistoso, no dia 12 de março de 1922. Venceu o Villa Izabel por 1 a 0. O primeiro jogo do
Vasco pelo campeonato somente se daria no dia 16 de abril de 1922.
206
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 256.
207
FILHO, 2010. Op. cit., p. 123.
208
LOBO, Eulalia Maria L. e STOTZ, Eduardo Navarro. Flutuações cíclicas da economia, condições de
vida e movimento operário – 1880 a 1930. Revista Rio de Janeiro. Niterói, vol1, n°1, set/dez, 1985. p.
82.
71
jogadores para montar equipes capazes de fazer um espetáculo para um público cada
vez mais exigente. Era prática já disseminada, das mais diversas maneiras, no futebol
carioca na década de 20. Inclusive, feita pelos clubes da elite. A defesa do amadorismo
estava mais ligada à tentativa dos clubes de elite em manter o seu status quo: “Na
realidade, pretendia-se a exclusividade da prática e da organização do futebol por parte
da elite”209.
Contudo, o Vasco levou isto ao extremo, marcadamente profissionalizando e
especializando o indivíduo como jogador profissional. Neste sentido, criou a
possibilidade para que um jogador negro como Nelson ascendesse no futebol e se
tornasse um ídolo do futebol carioca na década de 20 do século XX. Da mesma forma,
outros jogadores negros como Nelson aproveitaram a chance de usufruir do futebol
como meio de sustento.
Um apontamento interessante pela valorização do jogador por parte do clube se
refere às premiações dadas aos seus atletas. Destoando, ao que parece, com clubes
consagrados do futebol carioca. Após o título da série B e entrada na série A da 1ª
Divisão do campeonato da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres, Nelson e mais
40 jogadores, de todos os quadros do futebol, foram condecorados pelo clube.
O C.R. VASCO DA GAMA VAE PREMIAR 41 JOGADORES,
CAMPEÕES DE 1922
A digna directoria do glorioso Club de Regatas Vasco da Gama, que
no anon passado levantou os torneios dos primeiros, segundos e
terceiros teams da série B, da 1ª divisão, preparou para hoje uma
brilhante vesperal, que será realizada nos salões do Club Gymnastico
Portuguez.
O motivo principal dessa reunião, que terá um cunho solemne, é a
entrega das medalhas de ouro especialmente feitas para esse fim, aos
seus jogadores, que tão brilhantemente alcançaram o titulo de
campeão do Centenario, para o glorioso pavilhão da Cruz de Malta.
O gesto da dirctoria do Vasco é digno de ser imitado por alguns clubs,
que ainda devem aos seus jogadores, medalhas de campeonatos
conquistados há cinco, seis e sete anos passados210.
Eses prêmios, que sendo conferidos aos 41 socios do grêmio da Cruz
de Malta, servirão de estimulo aos seus conquistadores, que ainda para
o futuro não regatearão esforços para alcançar novas glorias.
Os jogadores que vão receber medalhas de ouro são os seguintes:
Nelson da Conceição [...]211
209
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 142.
210
Se calcularmos pelos anos, veremos que nos sete anos anteriores, América (1916-1922), Fluminense
(1917-1918-1919) e o Flamengo (1920-1921) foram os campeões.
211
O Imparcial, 01 de abril de 1923, p. 9.
72
Com este estímulo, o Vasco de Nelson começaria o campeonato de 1923. O
estádio para os jogos do Vasco seria o maior da cidade, o campo do Fluminense212. A
primeira partida foi contra o Andarahy. O resultado final foi um empate em 1 a 1, no dia
15 de abril., no estádio do Botafogo, à rua General Severiano. Por ter usado um jogador
de forma irregular, João Martins, o “Joaozinho”, o Andarahy perdeu os pontos da
partida213. Esta situação se desenrolaria por todo campeonato, contudo, o Vasco ganhou
os pontos.
O time saiu na capa do O Imparcial. O número de torcedores no evento foi
“colossal”.
VASCO X ANDARAHY
Effectuou-se hontem, á tarde, na magnifica praça de sports da rua
General Severiano, o match de campeonato entre os quadros do Vasco
da Gama e do Andarahy.
O jogo que era esperado com interesse entre os adeptos dos clubs
disputantes, foi premiado por uma colossal assistência, que encia o
vasto campo do Botafofogo F.C.214
Nelson foi um dos destaques da equipe do Vasco, tal como o seria durante toda a
temporada: “O team jogou bem, principalmente no final da peleja. [...] Negrito e Nelson
portaram-se bem [...]”.
Alguns jogadores vascaínos sofreriam com as perseguições da Liga durante o
campeonato, principalmente os jogadores Cecy, Nicolino e Torterolli.
TELÊ, CECY E NICOLINO TIVERAM OS SEUS REGISTROS
CASSADOS
A directoria da Liga Metropolitana, em sua sessão secreta de ante-
hontem, á noite, cassou o registros dos conhecidos players Telê, meia-
direita do Andarahy; Cecy, ex-defensor do Villa Isabel, e Nicolino,
tambem do Andarahy, por serem analphabetos.
[...]
TORTEROLLI NÃO SABE TAMBEM O A.B.C.?
Ao que fomos informados, a directoria da entidade carioca, em uma
reunião de ante-hontem, á noite, cassou tambem o registro do
excelente forward Torterolli, pertencente á equipe principal do Vasco
da Gama, por ser inimigo da literatura...215
212
O Imparcial, 03 de abril de 1923, p. 7.
213
O Imparcial, 24 de maio de 1923, p. 12.
214
O Paiz, 16 de abril de 1923, p. 2.
215
O Imparcial, 17 de março de 1923, p. 7.
73
pouco como Nelson e seus companheiros tiveram que lidar a todo o momento com a
desconfiança, a acusação e a ridicularizarão por parte da Liga e da imprensa carioca.
Estavam sempre sob suspeita e na constante iminência de serem punidos.
A REUNIÃO DO CONSELHO DA 1ª DIVISÃO
[...]
Outros representantes intervêm, todos frisando a violência do
presidente da Liga e, dizem, que manterão o seu acto, o que resultará
na não aprovação dos jogos em que o Vasco da Gama tome parte este
anno.216
216
O Imparcial, 11 de maio de 1823, p. 9.
217
O Imparcial, 23 de abril de 1923, p. 1.
218
O Imparcial, 30 de abril de 1923, p. 1.
74
Com a vitória sobre dois grandes, os rivais e a imprensa começavam a olhar o Vasco de
um modo diferente. O time ganhou a fama de invencível. Os dois próximos jogos
seriam contra América e Fluminense, mais dois dos grandes clubes da Liga.
No dia 13 de maio de 1923 completavam-se 35 anos do fim do regime de
escravidão da mão de obra negra no Brasil. Os jornais faziam alusão à data. No jornal O
Paiz, o personagem homenageado foi José do Patrocínio, um dos líderes negros na luta
pela abolição, “PATROCINIO – O VERBO FEITO REVOLUÇÃO”, dizia na capa do
referido jornal. Uma referência, devidamente explicada no corpo do texto, à luta de
vários homens através da escrita e da fala para que se pusesse fim à escravidão.
Nos gramados cariocas, o revolucionário era Nelson. Com grande atuação, seu
time venceu o “Campeão do Centenário” por 1 a 0. Arlindo marcou o gol da vitória.
Todavia, Nelson foi o grande nome do jogo. Com suas defesas impediu que as redes
vascaínas balançassem. Igualmente, Nelson foi indicado como um jogador fundamental
para as últimas conquistas vascaínas.
E fechando o triangulo final vem Nelson, o arqueiro formidável, que
tem dado ao seu club dias de gloria.
Foi, sem dúvida, o melhor elemento do seu quadro. Sempre atento e
vigilante, não houve bola que lhe atravessasse em frente ás traves a
que lhe não se atirasse para devolvel-a aos seus companheiros.
Arlindo e Nelson são os dois heroes da tarde de hontem, aos quaes o
Vasco deve a sua brilhante victoria.219
219
O Imparcial, 14 de maio de 1923, p. 2.
220
Idem.
221
Conhecido popularmente, na atualidade, como Estádio das Laranjeiras.
75
tido alguma sorte. É que encontrou todos fora de forma e desfalcados dos seus melhores
elementos.”. A cada jogo colocavam as expectativas no adversário, com a perspectiva
de conseguir sobrepujar o “team” vascaíno: “Hoje, porém, o Vasco var enfrentar um
adversário bem preparado e possante. Conseguirá abatel-o?”.
Não. A equipe do Vasco venceu por 1 a 0 o Fluminense, maior campeão da
Liga. A “sorte” e o bom futebol faziam com que os quatros clubes da elite caíssem um a
um. Nelson, mais uma vez era destaque: “[...] Nelson, o keeper admirável, a quem o
Vasco deve inquestionavelmente a sua victoria de hontem.”222. Assim, Nelson, jogo a
jogo, conquistava a admiração dos outros, além dos vascaínos.
O Vasco enfrentou mais dois adversários antes do fim do primeiro turno, venceu
o Bangu e o São Christovão, ambos por 3 a 2. Terminou a primeira parte do
campeonato sem derrotas, com todos os pontos conquistados223. Uma charge publicada
no jornal O Paiz ajuda a perceber o efeito que o time de Nelson estava causando. Eram
dois personagens, um representava o Vasco, o outro personagem representava os clubes
demais clubes da série A:
COISAS DO FOOTBALL
VASCO – Então, amigos, tenho atropelado alguma coisa a “escripta”
de vocês?
CLUBS DA SERIE A – Maldita hora em que concorremos para o
aumento da série...224
Diziam “maldita hora”, mas poderia ser uma ajuda divina. O então presidente do
clube, Antonio da Silva Campos era acusado de “mandinga” religiosa, com sua fé em
Nossa Senhora das Vitórias225. Os jogadores também levavam as suas “medalhinhas”.
COISAS DO FOOTBALL
No football há mesmo coisas interessantes.
O Vasco, com as medalhas no pescoço de Nossa Senhora da Victoria
ainda não perdeu neste campeonato [...]226
222
O Imparcial, 21 de maio de 1923, p. 2.
223
Cada vitória valia dois pontos e o empate valia um ponto.
224
O Paiz, 08 de junho de 1923, p. 8. Ver FIGURA 23, p. 116
225
O Imparcial, 22 de maio de 1923, p. 9.
226
O Imparcial, 23 de maio de 1923, p. 9.
76
a cidade: “[...] os automóveis de praça, parecia que só havia chauffeur português,
vinham tocando buzina por ai afora, anunciando mais uma vitória do Vasco.”227
227
FILHO, 2010. Op. cit., p. 122.
228
O Imparcial, 24 de junho de 1923, p. 11.
229
O Imparcial, 25 de junho de 1923, p. 13.
230
O Imparcial, 02 de julho de 1923, p. 3.
77
importa adeantear que o titulo máximo ainda lhe póde vir ás mãos,
bastando somente para tanto um pouco de “chance”.231
231
O Imparcial, 08 de julho de 1923, p. 12.
232
O Imparcial, 09 de julho de 1923, p. 2.
78
Isso não é correto, e antes de mais nada é incivil e grosseiro.[...]233
Uma luz que surgia no final do túnel para os que viam em Nelson e nos
“analphabeticos” vascaínos uma deturpação no modus operandi do futebol carioca. Os
defensores do futebol carioca “amador” mantinham a chance de não ver um chauffeur
campeão. Nos afirma o historiador João Malaia:
A partida seguinte seria contra o América. Era preciso uma vitória para não
permitir que o título escapasse. Demonstrando grande força de vontade, a turma
vascaína esqueceu a derrota e sobrepujou a equipe rubra por 2 a 1. Nelson, ao que
parece, fazia com que seu nome fosse uma unanimidade.
233
O Paiz, 10 de julho de 1923, p. 9.
234
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 310.
235
O Imparcial, 09 de julho de 1923, p. 2.
236
O Imparcial, 23 de julho de 1923, p. 2.
79
três pontos. Nelson mais uma vez teve grande atuação: “Nelson e Ramos actuaram bem,
fazendo defesas seguras e magistraes”237.
O grande dia estava chegando. Pela primeira vez na história do futebol carioca
um goleiro negro poderia se tornar campeão da mais rica liga da cidade. Mais do que
isso. Pela primeira vez um jogador negro teria o gosto de ganhar dos clubes mais ricos
da cidade e se tornar campeão da cidade. A data do jogo contra o São Christovão , que
valia o título, não poderia ser mais significativa para Nelson. Embora os jornais não
chamassem a atenção para este feito diretamente, com o exposto acima, percebesse que
aquele time havia revolucionado o futebol carioca na década de 20.
NOTA OFF-SIDE
NELSON FAZ ANNOS HOJE
A data de 12 de agosto é de intenso jubilo para todos os adeptos do
glorioso club de Regatas Vasco da Gama, porque assignala o natalício
do seu sympathico keeper vascaino, Nelson da Conceição, o
assombroso da “série A”, que hoje conquista mais uma linda victoria
para o invencível team da sua preciosa vida.
Sportman muito querido por todos os vascaínos, o Nelson tem paixão
rara pela gloriosa camisa da Cruz de Malta, que há bastante tempo
vem defendendo com galhardia e dedicação.
Muitas festas estão para hoje projectadas em honra do “guarda rede
vascaíno”.
O programma está assim constituído:
Ás 8 horas – Sermão na A Capella pelo reverendíssmo Narciso
Bastos, que terá como auxiliares os conhecidos e veteranos
reverendos, Albertino e Rodrigues.
Ás 9 – Lindo discurso na rua Moraes e Silva, pelo Dr. Godoy que
provará que o Nelson não é “peludo” como dizem!...
Ás 11 – Exhibição dos Campeões do concurso de belleza, Leitão e
Jupira.
Ás 12 – Lauto almoço de 500 talheres no melhor Restaurante chinez
que houver.
237
O Paiz, 30 de julho de 1923, p. 2.
80
Depois disso não conseguimos saber a continuação do vasto
programma, que dizem seguirá por ahi afôra...
Muitos presentes tambem o Nelson vae receber, sendo alguns de real
valor.
Ao romper da manhã de hoje, no campo da rua Moraes e Silva, irá
tocar a banda de musica do mafuá de Engenho de Dentro.
Ao querido amigo Nelson, desejo muitas e muitas victorias para team
da sua festejada vida.
BOM CENTRO. [...]238
Informa um vespertino:
“Sabemos que os chauffeurs adeptos do Vasco pretendem homenagear
o campeão da cidade, indo incorporados a Bangú, no dia do jogo final,
238
O Imparcial, 12 de agosto de 1923, p. 25.
239
O jogo não se realizou no campo Estádio das Laranjeiras, porque o Fluminense jogava no mesmo dia
contra a América.
240
O Imparcial, 13 de agosto de 1923, p. 2.
241
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 311.
81
afim de conduzir para a cidade todos os jogadores e associados do
grêmio da Cruz de Malta.”242
Para se ter uma ideia da importância que a imagem do goleiro negro vascaíno
havia alcançado, nos jornais Correio da Manhã, de 14 de março de 1923 e no A Noite,
de 13 de março de 1923, foi publicado uma propaganda de um suplemento alimentar. O
“garoto propaganda” era o goleiro Nelson. Uma propaganda semelhante, do mesmo
suplemento, foi repetida após o título vascaíno, pelo jornal O Imparcial.
Vasco da Gama
Certifico que tenho obtido muito bons resultados com o uso do
“Fortifican”, sentindo-me sempre bem disposto para os jogos.
Considero-o, pois, um dos melhores tônicos musculares.
(a) Nelson da Conceição.
Rio de Janeiro, 24 de Maio de 1923
Firma reconhecida pelo tabellião Parelo e Costa.
Assim se exprime o valoroso e querido keeper do invencível campeão
C.R. Vasco da Gama a respeito do “Fortifican” o melhor tonico da
actualidade.
O “Fortifican” dá força, saúde e vigor e encontra-se nas boas
pharmacias e no deposito á rua Maranguape 28.246
242
O Imparcial, 18 de agosto de 1923, p. 11.
243
Colocamos o empate do contra a equipe do Andarahy, porque o Vasco ganhou os pontos, mas
manteve-se o resultado da partida a título de estatística.
244
O Paiz, 30 de agosto de 1923, p. 8.
245
Após pesquisa feita no acervo do Club de Regatas Vasco da Gama não encontramos o referido quadro.
Provavelmente, devido ao descaso com a história da instituição, este material se perdeu com o tempo.
246
O Imparcial, 28 de agosto de 1923, p. 11.
82
do futebol se tornando um grande negócio. É possível que Nelson seja o primeiro atleta
negro do futebol carioca a servir como “garoto-propaganda”.
83
2.3 O grande keeper
O jornal é bem claro, o Vasco representava o Rio de Janeiro, a Capital Federal, e Nelson
estava lá como o grande goleiro do futebol carioca. Alguns jornais como O Paiz e O
Imparcial enviaram representantes para cobrir o evento, demonstrando a importância do
embate.
A equipe de Nelson venceu por 2 a 1. O Vasco, recheado de negros, contrastava
com os jogadores brancos dos grandes vencedores de Minas.
O Vasco, campeão carioca, em Bello Horisonte, venceu o America,
campeão mineiro, por 2x1
BELLO HORIZONTE, 2 (Serviço especial d’ ‘O Imparcial!) –
Perante uma assistência numerosíssima realizou-se hoje o encontro
ansiosamente esperado entre os valorosos Vasco da Gama, campeão
carioca e o America, campeão mineiro.249
247
Jornal do Brasil, 01 de abril de 1924, p. 13.
248
O Paiz, 01 de setembro de 1923, p. 9.
249
O Imparcial, 03 de setembro de 1923, p. 2.
84
precedido, pois agiu assombrosamente.[...]”250. O talento de Nelson já havia
ultrapassado os limites do estado, em pouco tempo ultrapassaria os limites do país.
As atuações de Nelson no campeonato da LMDT lhe proporcionaram ser
convocado para a seleção carioca que disputaria o Campeonato Brasileiro de Seleções
de 1923. Em 07 de outubro, pela primeira vez na história um goleiro negro entrava em
campo para defender as cores da cidade do Rio de Janeiro. O resultado foi uma vitória
fácil por 4 a 1 sobre a equipe fluminense251: “Os cariocas, sem dificuldades, levaram os
fluminense de vencida pelo score de 4x1 [...]”252. Nelson foi um dos melhores em
campo: “Palamone e Nelson produziram jogo eficiente, como de habito”253.
Na segunda partida, em 21 de outubro, outra vitória do scratch carioca, 2 a 0
sobre os baianos254. Desta vez, apenas Nelson era o representante do Vasco. Na final,
em 28 de outubro, uma derrota de 4 a 0 para os atuais campeões, a seleção paulista. No
time titular, mais uma vez, apenas Nelson pertencia ao campeão carioca. Na reserva
estavam os outros três convocados: Paschoal, Bolão e Torterolli. A meritocracia não
parecia ser critério totalmente adotado como padrão para a convocação dos que
deveriam ser os melhores jogadores cariocas em 1923. Segundo o jornalista Mário
Filho: “Até mesmo os brancos do Vasco foram postos de lado”255. Poderiam não levar
os brancos ou os outros negros, mas a qualidade de Nelson o convocava.
O Campeonato Sul-Americano de 1923 foi disputado no Uruguai. A
Confederação Brasileira de Desportos (CBD) reatou relações com a Associação
Uruguaya de Football após os incidentes de 1922, quando a seleção uruguaia abandonou
o campeonato que era realizado no Brasil256. A CBD recebeu inúmeras críticas dos
jornais devido a sua postura de conciliação. Contudo, o scratch brasileiro foi
convocado.
Três jogadores do Vasco foram chamados para integrar a equipe nacional no
campeonato de Montevidéu: Nelson, Paschoal e Torterolli257. Os clubes paulistas não
apoiaram a seleção. A Confederação Brasileira de Desportos (CBD) completou a
seleção com jogadores fluminenses, como Soda e Amaro, e Mica do Botafogo, da
250
O Imparcial, 03 de setembro de 1923, p. 2.
251
Formada por demais jogadores de cidades do Estado do Rio de Janeiro.
252
O Imparcial, 08 de outubro de 1923, p. 2.
253
Idem.
254
O Imparcial, 22 de outubro de 1923, p. 3.
255
FILHO, 2010. Op. cit., p. 129.
256
O Imparcial, 06 de novembro de 1923, p. 10.
257
O Imparcial, 04 de novembro de 1923, p. 9.
85
Bahia. A bordo do pequeno paquete “Zoolandia” os jogadores partiram para o
Uruguai258.
Nelson da Conceição foi o primeiro goleiro negro da Seleção Brasileira259260. A
estreia oficial de Nelson foi em solo uruguaio, em 11 de novembro de 1923261. O
resultado foi uma derrota por 1 a 0 para a seleção paraguaia.262 Enfraquecida, a
campanha da seleção foi péssima, três derrotas em três jogos: Paraguai, Argentina e
Uruguai.
O desempenho de Nelson foi um dos poucos pontos positivos do scratch
brasileiro.
O TRIANGULO BRASILEIRO FOI O MELHOR DO
CAMPEONATO
Dos quatro triângulos que participaram no 6º campeonato sul-
americano, o melhor, segundo informações que recebemos de
Montevidéo, foi o da equipe brasileira.
Nelson Conceição, Sylvio Serpa (Allemão) e Orlando Pennaforte,
constituíram o triangulo de ouro do certâmen de Montevidéo.
Em todos os tres matches, estes tres valorosos e destemidos jogadores
brasileiros demonstraram o seu estupendo jogo, empolgando
constantemente as grandes assistencias.
A estes tres jogadores cariocas deve o quadro brasileiro não ter sido
vencido por grandes scores. Houve partidas em que os tres footballers
brasileiros, sustentaram por 90 minutos de jogo, as fortes cargas dos
adversários, mantendo ou obrigando a estes, um trabalho intenso, para
a conquista de um goal.
Ao triangulo de ouro do sul-americano os nossos parabéns.263
De chauffeur para ser um dos jogadores que formaram o triângulo de ouro” da seleção
brasileira, salvando-a de goleadas humilhantes, foi um grande salto na vida esportiva de
Nelson, fruto de sua qualidade técnica.
258
O Imparcial, 07 de novembro de 1923, p. 7.
259
O Paiz, 1º de novembro de 1923, p. 8.
260
Foram pesquisados todos os goleiros que disputaram jogos pela seleção brasileira masculina de
futebol, de 21 de julho de 1914, data do primeiro jogo oficial da seleção brasileira, até o último jogo antes
da estreia do jogador Nelson da Conceição, 29 de outubro de 1922. Buscamos imagens que
comprovassem que Nelson da Conceição fosse o primeiro goleiro negro da seleção brasileira. No total,
sete atletas haviam atuado em jogos pela seleção brasileira na posição de goleiro. São eles: Ayrton
(Fluminense); Casemiro (Mackenzie); Dionísio (Ypiranga/SP); Ferreira (América/RJ); Kuntz
(Flamengo/RJ); Marcos (Fluminense/RJ); Mesquita (Portuguesa/SP). Nenhum destes atletas citados, ex-
goleiros da seleção brasileira de futebol masculino, era negro. Ver na parte de Iconografias deste trabalho
as FIGURAS 14 a 21.
Site: < http://www.rsssfbrasil.com>. Acessado em: 12 dez. 2012.
261
Site: < http://www.rsssfbrasil.com>. Acessado em: 12 dez. 2012.
262
Idem.
263
O Paiz, 27 de novembro de 1923, p. 8.
86
Durante o Campeonato Sul-Americano, a seleção brasileira disputou contra a
seleção do Paraguai o segundo jogo válido pela disputa da taça Presidente Rodrigues
Alves264, ou Taça Rodrigues Alves. Em 1922, a seleção brasileira havia vencido por 3 a
1 no primeiro confronto entre as referidas seleções. Em 21 de novembro de 1923, a
seleção brasileira tornou a vencer a seleção paraguaia, desta vez por 2 a 0.
[...]
Aos onze footbollers brasileiros, que tão bela figura fizeram hontem,
as nossas sinceras felicitações.
O povo carioca, hontem, mais uma vz, demonstrou não ter
abandonado os nossos patrícios ao sul do continente. Desde ás 16
horas começou o povo a estacionar em frente á nossa redação. Devido
ao grande atraso do telegrapho, somente ás 15 horas e meia é que
pudemos informar o que se passava no campo do Parque Central.
Quando foi conhecido o resultado do match, o povo ovacionou com
enthusiasmo o team brasileiro.265
Era apenas uma partida amistosa, mas que tinha um tom especial devido o retorno do
grande Nelson.
264
O Imparcial, 27 de outubro de 1922, p. 7.
265
O Paiz, 22 de novembro de 1923, p. 8.
266
O Imparcial, 30 de dezembro de 1923, p.12.
87
No mês de dezembro, o futebol carioca já vivia tempos de crise. A revolta dos
clubes da elite ocorreu pela conquista do campeonato mais rico da cidade, com uma
brilhante campanha, de um time formado pelas classes mais baixa da sociedade carioca
do Vasco de Nelson. Além disso, mais uma vez, um dos grandes clubes quase foi
rebaixado. O Botafogo teve que jogar a partida eliminatória para escapar do descenso.
Em resposta à mudança de paradigmas empreendida pelo Vasco de Nelson, os
clubes grandes romperam com a LMDT e fundaram uma nova entidade, a Associação
Metropolitana de Esportes Athleticos (AMEA), em 1º de março de 1924. Os clubes
fundadores eram: América, Botafogo, Flamengo, Fluminense e o Bangu. Diz-no o
historiador João Malaia: “[...] a nova AMEA era na verdade uma liga anti-Vasco, ou
anti-qualquer tipo de associação que podesse usar o modelo vascaíno para galgar
posição maiores dentro do futebol do Rio.”267.
O Vasco, assim como outros clubes, fez o pedido de filiação à nova entidade,
sendo a princípio aceito. Contudo, os estatutos da AMEA demonstraram as reais
intenções da entidade, ou seja, impedir a ascensão de clubes como o Vasco. Entre 31 de
março e 1º de abril a imprensa divulgou que doze jogadores do Vasco não foram aceitos
pela nova entidade, sendo que sete jogadores eram do primeiro quadro. Logo, apenas
quatro, dos onze jogadores do time principal, escaparam do “corte” após a análise de
suas inscrições pela AMEA268.
267
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 323-324.
268
Outros periódicos como os jornais Gazeta de Noticias e Jornal do Brasil, em suas edições de 1º de
abril de 1924 publicaram a respeito do assunto.
269
O Paiz, 31 de março de 1924, p. 2.
88
AMEA previa que motoristas não poderiam ser considerados aptos a serem jogadores
amadores.
CAPITULO IX
Da inscripção dos amadores, suas formalidades e requisitos
[...]
Art.65 – Não poderão porém, ser inscriptos:
[...]
10 – os que exerçam profissão ou emprego subalternos, taes como de
continuo, servente, engraxate e motorista;270
Desta forma, Nelson não era mais um chauffeur qualquer, ou simplesmente um atleta
negro. Afinal, ele acabara de defender a seleção carioca e a seleção brasileira. A
qualidade técnica de Nelson como jogador o impediu de ser excluído.
Em resposta à exclusão de seus atletas e a imposições que deixariam o clube
inferiorizado frente aos direitos dos clubes fundadores, o então presidente do Vasco,
José Augusto Prestes, enviou um ofício à AMEA, em 07 de abril de 1924, endereçado
ao seu presidente, Arnaldo Guinle. O Vasco sentenciava que não abriria mão de seus
jogadores para fazer parte da nova entidade. Desta forma, rompeu com a AMEA. Em
trecho do Officio n.261, o presidente vascaíno assim se pronunciava em nome da
instituição:
[...]
Quanto á condição de eliminarmos doze dos nossos jogadores das
nossas equipes, resolveu, por unanimidade, a directoria do C.R. Vasco
da Gama não a dever aceitar, por não se conformar com o processo
por que foi feita a investigação das posições sociaes desses nossos
consócios, investigação levada a um tribunal onde não tiveram nem
representação, nem defesa.
[...]
São esses doze jogadores, jovens, quase todos brasileiros, no começo
da sua carreira, e o acto publico que os póde macular, nunca será
praticado com a solidariedade dos que dirigem a casa que os acolheu,
nem sob o pavilhão que eles com tanta galhardia cobriram de glórias.
[...]271
270
O Imparcial, 04 de abril de 1924, p. 11.
271
O Paiz, 16 de abril de 1924, p. 8. Publicação do ofício emitido pela diretoria do Club de Regatas
Vasco da Gama em 07 de abril de 1924 pedindo a sua desfiliação da AMEA. No dia anterior, 15 de abril,
o jornal O Imparcial já havia publicado o referido ofício (O Imparcial, 15 de 1924, p. 11).
89
Têm chegado á séde social do Vasco da Gama innumeros telegramas
de seus socios, felicitando-o por sua resolução tomada em face dos
últimos acontecimentos na A.M.E.A.272
Neste sentido, ao defender os seus jogadores, o Vasco também defendia aqueles que,
mesmo não sendo excluídos, já tinham passado por constrangimentos inerentes ao
modus operandi dos clubes da elite e das ligas do período na cidade do Rio de Janeiro.
Com o retorno do Vasco à LMDT, Nelson se tornou bicampeão carioca. Em
1925, o Vasco retornaria a AMEA com seus jogadores e o modus operandi que
implementara no seu departamento de futebol. Por questões de recorte temporal não
entraremos nas questões envolvidas a partir deste período. No entanto, voltamos a
272
O Paiz, 10 de abril de 1924, p. 8.
273
O Paiz, 17 de abril de 1924, p. 8.
274
Não encontramos o referido ofício nas publicações dos jornais O Paiz e O Imparcial. Contudo, este
referido ofício encontra-se reproduzido no jornal Gazeta de Noticias, em sua edição de 17 de abril de
1924, p. 8.
275
O Paiz, 18 de abril de 1924, p. 10.
276
O Paiz, 19 de abril de 1924, p. 11. O jornal O Imparcial publicou o referido ofício em sua edição de
18 de abril de 1924, p. 8.
277
SANTOS, Ricardo Pinto dos. Tensões na consolidação do futebol carioca, p. 207. In PRIORI, Mary
Del; MELO, Victor Andrade de. História do Esporte no Brasil: Do Império aos dias Atuais. São Paulo:
Editora UNESP, 2009.
90
indicar que a qualidade de Nelson fez com que ele fosse aceito pelo meio esportivo,
inclusive, pela elite que coordenava as maiores liga da época. A própria imprensa que
antes o havia denunciados, tecia elogios às suas atuações e a sua pessoa. Nelson ganhou
a alcunha de keeper internacional que o acompanhou até sua morte em 1942.
Na eminência do início do campeonato de 1926, o jornal O Imparcial colocou
uma foto de capa da imagem do grande Nelson, indicando-o como um crack do
campeonato. A imagem era Nelson como ele realmente era, sem diálogos fictícios de
cunho pejorativo ou sua imagem tendo destaque para certos aspectos físicos que
caracterizavam-no como negro. Um contraste sensível pela forma como ele fora
retratado pelo mesmo periódico em 1919 e também pelo o jornal O Paiz.
91
CONSIDERAÇÕES FINAIS
278
O Imparcial, 07 de junho de 1928, p. 8.
92
na equipe do Bangu, onde ficou até 1929. Os anos se passaram e Nelson voltou ao
Engenho de Dentro/RJ279, atuou como treinador deste clube.
279
Diario de Noticias, 10 de novembro de 1936, p. 23.
93
ICONOGRAFIA
FIGURA 1 - Fotografia da equipe do Vasco. Nelson da Conceição está ao centro da
fotografia.
94
FIGURA 2 - Fotografia da equipe do Club de Regatas Vasco da Gama no ano de 1921.
95
FIGURA 3 - Fotografia da equipe de futebol do Club de Regatas Vasco da Gama no
ano de 1922.
96
FIGURA 4 - Imagem do goleiro Nelson da Conceição publicada na revista O Malho.
97
FIGURA 5 - Fotografia da equipe de futebol do Club de Regatas Vasco da Gama no
ano de 1923.
98
FIGURA 6 - Fotografia da equipe de futebol do Vasco em amistoso interestadual no
ano de 1923.
99
FIGURA 7 - Publicidade do tônico “Fortifican”, no qual Nelson da Conceição foi
garoto-propaganda.
100
FIGURA 8 - Fotografia do trio de defesa do Club de Regatas Vasco da Gama: Leitão,
Nelson e Mingote.
101
FIGURA 9 - Imagem dos campeões cariocas de 1923.
102
FIGURA 10 - Capa do jornal O Imparcial no dia seguinte à conquista do título de
campeão carioca do Vasco.
A equipe do Vasco está acima da equipe do São Christovão, ao lado das duas equipes há
imagem de parte do público presente ao jogo.
103
FIGURA 11 - Imagem da seleção carioca e da seleção fluminense em jogo válido pelo
Campeonato Brasileiro de Seleções de 1923.
104
FIGURA 12 - Imagem das seleções carioca e baiana no Campeonato Brasileiro de
Seleções, no ano de 1923.
105
FIGURA 13 - Imagem das seleções carioca e paulista em jogo válido pelo Campeonato
Brasileiro de Seleções de 1923.
106
FIGURA 14 - Imagem de Nelson da Conceição na seleção brasileira.
Da esquerda para a direta, Nelson é o primeiro que está agachado. Nelson foi o primeiro
goleiro negro da seleção brasileira.
107
FIGURA 15 - Goleiro Casemiro do Amaral defendendo a seleção brasileira.
<http://www.iffhs.de/?29dad5a85ad4a85bd52bd855285fdcdc3bfcdc0aec7482eda0a409
> Acessado em: 07 jun. 2013.
108
FIGURA 16 - Imagem do goleiro Joaquim Martins Ferreira atuando pela seleção
brasileira.
A equipe brasileira é a primeira de cima para baixo. Da esquerda para a direita, Ferreira
é o quarto.
109
FIGURA 17 - Imagem goleiro Marcos pela seleção brasileira.
110
FIGURA 18 - Imagem do goleiro Dionísio defendendo a seleção brasileira em jogo
válido pela Taça Roberto Cherry.
A equipe brasileira é a primeira de cima para baixo. Da esquerda para a direita, Dionísio
é o sexto homem.
111
FIGURA 19 - Imagem do goleiro Ayrton.
Goleiro Ayrton atuando pelo Fluminense F.C.. O referido goleiro atuou pela seleção
brasileira uma única vez, em amistoso contra a seleção argentina, no dia 06 de outubro
de 1920. A seleção brasileira perdeu por 3 a 1, em Buenos Aires.
112
FIGURA 20 - Imagem do goleiro Mesquita na seleção brasileira.
Da esquerda para a direita, dos homens que estão em pé, Mesquita é o quarto homem. A
imagem se refere ao jogo Brasil 3 a 1 Paraguai, válido pela Taça Rodrigues Alves. O
evento ocorreu no Campo do Floresta/SP, no dia 29/10/1922.
113
FIGURA 21 - Imagem do goleiro gaúcho Júlio Kuntz Filho (Kuntz), que atuou pela
seleção brasileira.
114
FIGURA 22 - Imagem do goleiro Nelson da Conceição trajando o uniforme de goleiro
do Club de Regatas Vasco da Gama.
115
FIGURA 23 - Imagem de uma charge Vasco x clubes da série A
116
ANEXOS
280
As tabelas de jogos foram formuladas com informações retiradas: do Livro de atividades futebolísticas
do Club de Regatas Vasco da Gama de 1916 a 1923, da Revista do Vasco: No Ano do Tri, nº2, pp.65-68;
dos periódicos O Paiz e O Imparcial; ASSAF, Roberto; MARTINS, Clovis. História dos Campeonatos
Cariocas de Futebol 1906/2010. Rio de Janeiro: Maquinária, 2010; e do site Netvasco. Disponível em:
<http://www.netvasco.com.br/jogosvasco/jogos/0000.shtml>. Acessado em: 12 dez. 2012. A pesquisa
realizada foi referente ao período temporal de 1916 a 1923.
117
TABELA DE JOGOS 2 – Ano 1919 sem o goleiro Nelson
08/06/1919 Vasco 5x6 S.C. Mackenzie Ary Correa Vasco 0x0 Miguel
S.C. Cavalier
Mackenzie
13/07/1919 Vasco 4x4 S.C. Rio de Janeiro Luiz Vasco 6x2 Miguel
Ferreira S.C. Rio de Cavalier
Barroso Janeiro
118
TABELA DE JOGOS 3 – Ano 1919 com o goleiro Nelson
Média de gols sofridos do Vasco com Nelson atuando: 2,0 gols por jogo
119
TABELA DE JOGOS 4 – Ano 1920
120
Nº de jogos do goleiro Nelson pelo Vasco: 16 Vitória:10 Derrota: 5 Empate: 1
121
TABELA DE JOGOS 5 – Ano 1921
1921
122
TABELA DE JOGOS 6 – Ano 1922
123
TABELA DE JOGOS 7 – Ano 1923
1923
124
FONTES
1. Manuscritas
2. Recenseamentos
3. Periódicos
APPIAH, Kwane Anthony. Na casa de meu pai: a África na filosofia da cultura. Rio de
Janeiro: Contraponto, 1997.
ARÓSTEGUI, Julio. A pesquisa histórica: teoria e método. Bauru, SP: Edusc, 2006
DAMATTA, Roberto. A bola corre mais que os homens. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.
GOMES, Flávio dos Santos e CUNHA, Olivia Maria Gomes. Quase-cidadão: histórias
e antropologias da pós-emancipação no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007.
GOMES, Flávio dos Santos. Negros e política (1888-1937). Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 2005.
126
HOBSBAWM, Eric J. Era dos Extremos: o breve século XX 1914-1991. São Paulo:
Companhia das Letras, 2008.
HOBSBAWM, Eric J. Mundos do trabalho: novos estudos sobre história operária. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 2008.
JÚNIOR, Hilário Franco. A Dança dos Deuses: futebol, cultura e sociedade. São Paulo:
Companhia das Letras, 2007.
LOBO, Eulalia Maria L.; STOTZ, Eduardo Navarro. Flutuações cíclicas da economia,
condições de vida e movimento operário – 1880 a 1930. Revista Rio de Janeiro.
Niterói, vol1, n°1, set/dez, 1985.
MELO, Victor Andrade de. Cidade Sportiva: primórdios do esporte no Rio de Janeiro.
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MELO, Victor Andrade de. História Comparada do Esporte. Rio de Janeiro: Shape,
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PRIORI, Mary Del; MELO, Victor Andrade de. História do Esporte no Brasil: Do
Império aos dias Atuais. São Paulo: Editora UNESP, 2009.
ROCHA, José da Silva. Club de Regatas Vasco da Gama – Histórico. Rio de Janeiro:
Grafica Olímpica Editora. 1975.
127
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microcosmo dos mecanismos de poder e exclusão no processo de urbanização das
cidades brasileiras (1901-1933). In: XIX Encontro Regional de História: Poder,
Violência e Exclusão. ANPUH/SP – USP. São Paulo, 08 a 12 de setembro de 2008.
Disponível em:
<http://www.anpuhsp.org.br/sp/downloads/CD%20XIX/PDF/Autores%20e%20Artigos/
Joao%20Manuel%20C.%20Malaia.pdf>. Acessado em: 23 mai. 2013.
128
SITES
129