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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE HISTÓRIA

WALMER PERES SANTANA

AS MÃOS NEGRAS DO CHAUFFEUR NELSON DA CONCEIÇÃO: FUTEBOL E


RACISMO NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO (1919-1924)

RIO DE JANEIRO
2013
AS MÃOS NEGRAS DO CHAUFFEUR NELSON DA CONCEIÇÃO: FUTEBOL E
RACISMO NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO (1919-1924)

WALMER PERES SANTANA

Monografia apresentada ao Instituto de História da


Universidade Federal do Rio de Janeiro como
requisito para a obtenção do título de Bacharel em
História.
Orientador: Prof. Dr. Victor Andrade de Melo

RIO DE JANEIRO
2013

ii
AS MÃOS NEGRAS DO CHAUFFEUR NELSON DA CONCEIÇÃO: FUTEBOL E
RACISMO NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO (1919-1924)

WALMER PERES SANTANA

Monografia submetida ao corpo docente do Instituto de História da Universidade


Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do
grau de Bacharel.

Aprovada em: ___/___/___

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________
(Prof. Dr. Victor Andrade de Melo – PPGHC-IH-UFRJ – Orientador)

_____________________________________________
(Prof. Dr. Flávio dos Santos Gomes, UFRJ)

_____________________________________________
(Prof. Dr. Cleber Augusto Gonçalves Dias, UFMG)

CONCEITO FINAL: ___________

iii
Dedico esta pesquisa de monografia à
minha avó materna. Mulher de fibra, que
sempre soube me incentivar ao estudo.

iv
- Dizem que o jogo Vila x Vasco vae ser “roxo”!...
- “Roxo” nada rapaz; Vae ser é “preto”....1

1
Texto e imagem da revista O Malho, 22 de abril de 1922, p. 39.

v
Agradecimentos

À minha avó Georgina, que na alegria e na tristeza sempre esteve ao meu lado.
Aos meus pais, já falecidos, Genilza e Valmir.
Às minhas primas Rosana, Perla e Larissa, porque sempre foram fundamentais nos
momentos difíceis.
Ao meu orientador Prof. Dr. Victor Andrade de Melo.
Ao Prof. Ms. Ricardo Pinto dos Santos, Coordenador Geral do Centro de Memória do
Club de Regatas Vasco da Gama.
À Prof. Ms. Tatiana Mello, museóloga do Club de Regatas Vasco da Gama.
Ao Club de Regatas Vasco da Gama, motivo de alegrias, tristezas e conhecimento
histórico.
Ao Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.
Ao Sr. João Ernesto da Costa Ferreira, Vice-Presidente de Relações Especializadas do
Club de Regatas Vasco da Gama e ser humano de primeira grandeza.
Ao Sr. Carlos Jorge E. Pereira, diretor da Divisão Técnico-Desportiva do Club de
Regatas Vasco da Gama e grande vascaíno.
Ao Prof. Dr. João Manuel Casquinha Santos, grande incentivador desta pesquisa.
Ao Prof. Dr. Adílio Jorge Marques.
A todos os professores, estudantes e servidores do Instituto de História da UFRJ.
A todos que aqui não foram citados, mas que de alguma maneira contribuíram para
minha formação como ser humano do bem e historiador.

vi
Imagem do goleiro Nelson da Conceição, retirada da primeira página do jornal. Nelson
da Conceição já era bicampeão carioca (1923/1924).
O Imparcial, em 06 de abril de 1926, p. 1.
vii
RESUMO

SANTANA, Walmer Peres. As mãos negras do chauffeur Nelson da Conceição:


futebol e racismo na cidade do Rio de Janeiro (1919-1924). Orientador: Victor Andrade
de Melo. Rio de Janeiro: UFRJ / IFCS / Instituto de História; 2013. Monografia
(Bacharelado em História).

O presente trabalho procura refletir a respeito da situação do negro na sociedade carioca


da Primeira República, elevando o futebol como espaço de pesquisa. Os jogadores
negros enfrentavam vários obstáculos, dentre eles o racismo, para poderem atuar na
principal liga de futebol do Rio de Janeiro, dominada pelos clubes da elite. Neste
sentido, abordaremos sobre Nelson da Conceição, goleiro negro que atuou no futebol
carioca nas décadas de 10 e 20 do século XX. Nelson sofreu com o racismo por parte da
Liga Metropolitana de Desportos Terrestres, da imprensa e de adeptos dos clubes rivais
ao Club de Regatas Vasco da Gama, clube em que Nelson atuou entre 1919 e 1928.
Devido a sua qualidade técnica como atleta, Nelson conseguiu sobrepor o forte
obstáculo do racismo e se tornar o primeiro goleiro negro campeão carioca, no ano de
1923.
Palavras- chave: História – futebol – racismo – negro – Nelson da Conceição

viii
ABSTRACT

SANTANA, Walmer Peres. As mãos negras do chauffeur Nelson da Conceição:


futebol e racismo na cidade do Rio de Janeiro (1919-1924). Orientador: Victor Andrade
de Melo. Rio de Janeiro: UFRJ / IFCS / Instituto de História; 2013. Monografia
(Bacharelado em História).

The present paper seeks to reflect about the situation of the black (black people) in the
First Republic of Brazil, raising football as an area of research. The black players faced
several obstacles, including racism, to play the most important football league in Rio de
Janeiro, that was dominated by the elite clubs. In this sense, we will discuss about
Nelson da Conceição, a black goalkeeper that played football in Rio on decade 10 and
20 of the 20th century. Nelson suffered racism from Liga Metropolitana de Desportos
Terrestres, the press and supporters of rival clubs of Club de Regatas Vasco da Gama,
the club where Nelson played from 1919 to 1928. Due his technical quality as athlete,
Nelson managed to overcome the strong obstacle of racism and became the first black
goalkeeper to win the Campeonato Carioca, in 1923.

Keywords: History – football – racism – black – Nelson da Conceição

ix
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 Fotografia da equipe do Vasco. Nelson da Conceição está ao centro da
fotografia ....................................................................................................................... 94

FIGURA 2 Fotografia da equipe do Club de Regatas Vasco da Gama no ano de


1921................................................................................................................................ 95

FIGURA 3 Fotografia da equipe de futebol do Club de Regatas Vasco da Gama no


ano de 1922 .................................................................................................................... 96

FIGURA 4 Imagem do goleiro Nelson da Conceição publicada na revista O


Malho.............................................................................................................................. 97

FIGURA 5 Fotografia da equipe de futebol do Club de Regatas Vasco da Gama no


ano de 1923 .................................................................................................................... 98

FIGURA 6 Fotografia da equipe de futebol do Vasco em amistoso interestadual no


ano de 1923 .................................................................................................................... 99

FIGURA 7 Publicidade do tônico “Fortifican”, no qual Nelson da Conceição foi


garoto-propaganda ....................................................................................................... 100

FIGURA 8 Fotografia do trio de defesa do Club de Regatas Vasco da Gama: Leitão,


Nelson e Mingote ......................................................................................................... 101

FIGURA 9 Imagem dos campeões cariocas de 1923 ............................................. 102

FIGURA 10 Capa do jornal O Imparcial no dia seguinte à conquista do título de


campeão carioca do Vasco .......................................................................................... 103

FIGURA 11 Imagem da seleção carioca e da seleção fluminense em jogo válido pelo


Campeonato Brasileiro de Seleções de 1923 ............................................................... 104

FIGURA 12 Imagem das seleções carioca e baiana no Campeonato Brasileiro de


Seleções, no ano de 1923 ............................................................................................. 105

FIGURA 13 Imagem das seleções carioca e paulista em jogo válido pelo Campeonato
Brasileiro de Seleções de 1923 .................................................................................... 106

FIGURA 14 Imagem de Nelson da Conceição na seleção brasileira ....................... 107

x
FIGURA 15 Goleiro Casemiro do Amaral defendendo a seleção brasileira ............ 108

FIGURA 16 Imagem do goleiro Joaquim Martins Ferreira atuando pela seleção


brasileira ...................................................................................................................... 109

FIGURA 17 Imagem goleiro Marcos pela seleção brasileira ................................... 110

FIGURA 18 Imagem do goleiro Dionísio defendendo a seleção brasileira em jogo


válido pela Taça Roberto Cherry ................................................................................. 111

FIGURA 19 Imagem do goleiro Ayrton ................................................................... 112

FIGURA 20 Imagem do goleiro Mesquita na seleção brasileira .............................. 113

FIGURA 21 Imagem do goleiro gaúcho Júlio Kuntz Filho (Kuntz), que atuou pela
seleção brasileira .......................................................................................................... 114

FIGURA 22 Imagem do goleiro Nelson da Conceição trajando o uniforme de goleiro


do Club de Regatas Vasco da Gama ............................................................................ 115

FIGURA 23 Imagem de uma charge Vasco x clubes da série A .............................. 116

TABELA DE JOGOS 1 1916 a 1918 .................................................................. 117

TABELA DE JOGOS 2 Ano 1919 sem o goleiro Nelson ................................... 118

TABELA DE JOGOS 3 Ano 1919 com o goleiro Nelson ................................... 119

TABELA DE JOGOS 4 Ano 1920 ...................................................................... 120

TABELA DE JOGOS 5 Ano 1921 ...................................................................... 122

TABELA DE JOGOS 6 Ano 1922 ...................................................................... 123

TABELA DE JOGOS 7 Ano 1923 ...................................................................... 124

xi
SUMÁRIO
Introdução ....................................................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 NELSON: O CHAUFFEUR (1919-1921)

1.1 Nelson: Um negro da Primeira República ............................................................... 13

1.2 Vasco: O Clube da colônia portuguesa e Nelson .................................................... 29

1.3 O Chauffeur ............................................................................................................. 35

CAPÍTULO 2 NELSON: O GRANDE KEEPER (1922-1924)

2.1 O Centenário da Independência, as teorias raciais e o futebol ................................ 51

2.2 O Primeiro Goleiro Negro Campeão Carioca .......................................................... 69

2.3 O grande keeper ....................................................................................................... 84

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 92

ICONOGRAFIA ............................................................................................................ 94

ANEXOS ..................................................................................................................... 117

FONTES ...................................................................................................................... 125

BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................... 126

SITES ........................................................................................................................... 129

xii
Introdução

Os funerais de Nelson Conceição


O Nelson, o guardião que tantas glórias esportivas colheu para o
Vasco da Gama, faleceu, anteontem no hospital Gafree Guinle.
Vítima de pertinaz moléstia e sem recurso, Nelson foi hospitalizado às
expensas do grêmio cruzmaltino, que toda assistência moral e material
prestou ao seu ex-defensor. O enterramento do saudoso jogador foi
efetuado ontem a tarde no cemitério S. Francisco Xavier2

No dia 24 de abril de 1942, o Club de Regatas Vasco da Gama (doravante neste


trabalho também chamado de Vasco) sofria duas derrotas, ambas ligadas ao esporte,
mais precisamente ao futebol. Uma derrota de fato ocorreu no gramado. O Vasco
perdeu pelo placar de 4 a 1 para o Fluminense, em partida válida pelo Campeonato
Carioca de 1942. A outra, mais importante e mais dolorosa no contexto histórico do
futebol cruzmaltino3, ocorreu num hospital. Internado numa cama de um quarto
particular do Hospital Graffrée e Guinle, sob as expensas do Vasco, falecia um homem
negro de “pertinaz moléstia”4. Quando jovem, no auge da sua força física e técnica, fora
um dos grandes goleiros da história do futebol brasileiro. Nelson da Conceição foi o
primeiro goleiro negro do Vasco (1919-1928), assim como foi o primeiro goleiro negro
a se tornar campeão carioca (1923), o primeiro goleiro negro da seleção carioca (1923)
e da seleção brasileira (1923). A pouco mais de quatro quilômetros do Estádio Vasco da
Gama, popularmente conhecido como Estádio de São Januário, Nelson deixava para
traz o seu passado vitorioso e suas grandes defesas. Todavia, a sua figura, a despeito do
descaso com a história do futebol brasileiro, será, por este trabalho, relembrada.

Essa pesquisa se identifica como: “[...] uma história ‘temática’, que corresponde
também às habituais especializações das ciências sociais no estudo das sociedades: as
histórias política, econômica, social, etc. [...]” 5. Procura situar-se no âmbito da História
Social6. A temática do trabalho é a condição social do homem negro na cidade do Rio

2
A Manhã, 26 de maio de 1942, p. 11. Nota sobre a morte de Nelson da Conceição (1899-1942).
Enquanto jogador, Nelson atuou pelo Paladino FC, Engenho de Dentro AC, Club de Regatas Vasco da
Gama, Bangu AC e seleção brasileira de futebol. O auge da sua carreira de footboller foi, inegavelmente,
entre 1919 e 1926, quando atuava pelo Club de Regatas Vasco da Gama. Neste clube, conquistou o
Campeonato Carioca de 1923 e 1924, alem de alcançar à seleção carioca e seleção brasileira.
3
Termo popular utilizado para se referir ao Club de Regatas Vasco da Gama.
4
O termo se refere a alguma enfermidade crônica.
5
ARÓSTEGUI, Julio. A pesquisa histórica: teoria e método. Bauru, SP: Edusc, 2006. p. 474.
6
A concepção de História Social da pesquisa baseia-se na obra CARDOSO, Ciro Flamarion; GRIGNOLI,
Hector Perez. Os Métodos da história. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1983, 4ª edição.

1
de Janeiro da Primeira República. O objetivo desta pesquisa é refletir a respeito da
situação do negro na sociedade carioca da Primeira República, utilizando a figura de
Nelson da Conceição para elevar como espaço de pesquisa o futebol. O nosso objeto se
caracteriza pela busca do entendimento de quais eram as principais dificuldades
enfrentadas por jogadores negros que atuavam no futebol do Rio de Janeiro,
especificamente na Liga Metropolitana de Desportos Terrestres – LMDT e depois a
Associação Metropolitana de Esportes Athleticos – AMEA, tendo como base a história
do ex-goleiro Nelson da Conceição. Após a conquista do campeonato carioca de 1923
pelo Club de Regatas Vasco da Gama houve uma cisão no futebol carioca, os clubes da
elite7 (América, Botafogo, Flamengo e Fluminense) resolveram sair da LMDT e fundar
uma nova liga, a AMEA. O Vasco tentou participar efetivamente da AMEA, mas lhe
foram feitas algumas exigências, dentre elas a exclusão de 12 jogadores do primeiro e
segundo quadro. Nelson, junto de outros três jogadores, escapou do “corte”.

O recorte temporal da pesquisa se estabelece de 1919 até 1924. Inicia com a


chegada de Nelson da Conceição ao Vasco. O jogador veio do Engenho de Dentro
Athletico Club (o então tricampeão da Liga Suburbana, 1916-1917-1918, maior liga dos
clubes do subúrbio) como resultado da política vascaína iniciada em 1919 de inserção
massiva de jogadores suburbanos nos seus quadros de futebol.

O time de jogadores profissionais do Vasco não preenchia os


requisitos da LMDT, nem da posterior AMEA. Pelo menos, não a
grande maioria desses jogadores vindos dos times formados nos
subúrbios do Rio de Janeiro, em ligas e clubes que não faziam
distinção entre seus atletas [...] Desbancar os clubes grandes do Rio
com aqueles jogadores e com os estádios absolutamente lotados em
todos os jogos foi o culminar de um longo processo iniciado em 1919,
com a montagem do time do Vasco, ainda na 2ª divisão, e a aplicação
de uma lógica diferente ao futebol da cidade.8

7
O conceito de elite utilizado nesta pesquisa é o de Victor Andrade de Melo, que trata desta parte da
sociedade e sua ligação com o esporte no final do século XIX e início do XX: “A elite é compreendida
não somente como os que detinham o poder econômico, mas também e principalmente o poder de
influenciar culturalmente o desenvolvimento da sociedade. Nesse caso, as elites seriam constituídas tanto
pelos proprietários dos meios de produção quanto pelo que pode ser chamado de setores médios ou
pequena burguesia. Inicialmente, as elites eram os nobres, políticos e aristocratas ligados à economia
agroexportadora. Posteriormente, também se deve considerar a ascensão de setores urbanos, como
militares, parte da intelectualidade e industriais”. MELO, Victor Andrade de. Cidade Sportiva:
primórdios do esporte no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Relume Dumará: FAPERJ, 2001. p. 17.
8
SANTOS, João Manuel Casquinha Malaia. Revolução Vascaína: a profissionalização do futebol e
inserção sócio-econômica de negros e portugueses na cidade do Rio de Janeiro (1915-1934). 2010. Tese
(Doutorado em História Econômica) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade
de São Paulo, São Paulo, 2010. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8137/tde-
26102010-115906/>. Acesso em: 2012-12-1. p. 429.

2
Desde o seu antigo clube, Engenho de Dentro AC, e principalmente nos
primeiros anos de Vasco, Nelson da Conceição sofria com considerações pejorativas
relacionadas ao seu ofício de condutor de veículos (chauffeur) e sua fala coloquial,
posições emitidas nos jornais e revistas da época. A pesquisa finaliza com a não
exclusão de Nelson da Conceição pela AMEA. Acreditamos que a exclusão não existiu
devido ao status que Nelson havia conquistado no futebol. Nelson alcançou um patamar
no futebol que lhe permitiu ser, inclusive, elogiado por parte da mesma imprensa que o
denegriu.

A hipótese do trabalho é que o ex-goleiro Nelson da Conceição sofreu racismo9


extrínseco10 da LMDT, de parte da imprensa e adeptos de clubes rivais ao Club de
Regatas Vasco da Gama. Explica-nos o historiador Amilcar Araújo sobre o conceito de
racimo extrínseco proposto por Appiah:

Para Appiah, os racistas extrínsecos ‘fazem distinções morais entre os


homens das diferentes raças, por acreditarem que a essência racial
implica certas qualidades moralmente relevantes. A base da
discriminação que os racistas extrínsecos fazem entre os povos é sua
crença em que os membros das diferentes raças diferem em aspectos
[como a honestidade, a coragem ou a inteligência] que justificam o
tratamento diferencial.’ 11

Nelson da Conceição, por ser negro, teria sido enxergado como um indivíduo
desprovido de moral ou uma postura social condizente com a prática do futebol12.
Constantemente, jornais da época referiam-se a Nelson desmerecendo sua profissão de

9
Utilizamos como conceitos de raça e racismo na pesquisa os apresentados por Stuart Hall: “‘Raça’ é
uma construção política e social. É uma categoria discursiva em torno da qual se organiza um sistema de
poder socioeconômico, de exploração e exclusão – ou seja, o racismo. HALL, Stuart. “Que ‘negro’ é esse
na cultura negra?”. In: HALL, Stuart. Da diáspora: identidade e mediações culturais. Belo Horizonte: Ed.
UFMG, 2003. p. 69.
10
APPIAH, Kwane Anthony. Na casa de meu pai: a África na filosofia da cultura. Rio de Janeiro:
Contraponto, 1997.
11
PEREIRA, Amilcar Araujo. O Mundo Negro: a constituição do movimento negro contemporâneo no
Brasil (1970-1995). Tese (Doutorado em História Social) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia,
Departamento de História da Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, 2010. p. 33. Disponível
em: < http://www.historia.uff.br/stricto/td/1254.pdf >. Acesso em: 2012-11-04.
12
Entendemos que não somente os indivíduos negros sofriam com as condições impostas pela LMDT e
depois AMEA para a prática do futebol. Embora a questão do racismo para com os indivíduos negros
estivesse presente na sociedade brasileira, os homens brancos pobres também eram vítimas de tais
medidas impeditivas. Desta forma, não havia uma exclusividade de medidas contra os indivíduos negros.
Contudo, como negros, na sua maioria, oriundos de camadas sociais menos favorecidas, utilizavam o
futebol como fonte exclusiva de renda e/ou se mantinham em profissões vistas pela elite como
incompatíveis com a prática do “nobre” futebol, sofriam mais explicitamente com as ações de restrição
das diretorias das ligas.

3
condutor de veículos, chauffeur, vista como essencialmente braçal e desprovida do uso
da inteligência, o que não deveria ser permitido para a prática do futebol amador.

NOVA LEI DO AMADORISMO APROVADA ANTE-HONTEM


Art. 31º - A Liga não reconhece a qualidade de amadores:
[...]
b) - Aos que tirarem os seus meios de subsistencia de qualquer
profissão braçal, considerando como taes, todas aquellas em que o
individuo depende inteiramente de seus poderes physicos, e não dos
recursos de sua inteligência: [...] condutores de vehiculos [...]13

Todavia, devido a sua qualidade técnica, Nelson da Conceição conseguiu


sobrepujar este racismo, se tornar respeitado e ter o reconhecimento da sua qualidade
como esportista, superando, ainda que parcialmente, a barreira da “cor”. Desta forma,
atingiu o prestígio que o fez escapar da exclusão realizada pela AMEA em 1924 a
vários jogadores vascaínos, devido as suas condições raciais ou sociais, algo que
afrontava os princípios democráticos propostos pela recém-criada república brasileira.

O futebol de um ponto de vista sociológico, para além do homem se lançar a


prática do esporte e do lazer, dentro do que também podemos chamar de “História das
práticas corporais institucionalizadas”14, de alguma forma dramatiza as características
da sociedade que o pratica.

Esporte de bacharéis num país caracterizado por gigantesca


desigualdade social, esporte de brancos em uma sociedade com
marcas ainda expostas do escravismo, esporte associado a ícones do
progresso e da industrialização numa economia essencialmente
agrária, o futebol tornou-se desde o início um dos ingredientes mais
importantes dos debates acerca da modernização do Brasil e da
construção de identidade nacional.15

Neste sentido, as implicações envolvidas com a questão do negro e suas


problemáticas, como a discriminação racial existente neste período da história brasileira
e velada pelo mito da democracia racial16, estavam, de alguma maneira, representadas
dentro e fora das “quatro linhas”.

13
O Imparcial, 28 de abril de 1916, p. 9.
14
MELO, Victor Andrade de. História Comparada do Esporte. Rio de Janeiro: Shape, 2007. p. 14.
15
JÚNIOR, Hilário Franco. A Dança dos Deuses: futebol, cultura e sociedade. São Paulo: Companhia
das Letras, 2007. p. 61.
16
FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. Volume1: O Legado da
raça branca. São Paulo: Ática, 1978.

4
Na ânsia de prevenir tensões racistas hipotéticas e de assegurar uma
via eficaz para a integração gradativa da “população de cor”,
fecharam-se todas as portas que poderiam colocar o negro e o mulato
na área de benefícios diretos do processo de democratização dos
direitos e garantias sociais. Em nome de uma igualdade perfeita no
futuro, acorrentava-se o “homem de cor” aos grilhões invisíveis do
seu passado, a uma condição sub-humana de existência e a uma
disfarçada servidão eterna.17

O futebol é uma expressão da sociedade, um local em que estão presentes


questões raciais, sociais, culturais, econômicas e políticas que resultam em tensões que
podem explodir ou serem aliviadas: “Parte inicialmente da cultura dominante, teve a ele
incorporados elementos populares oriundo da imigração e da própria herança
africana”.18 É preciso ter em mente que não existia apenas um futebol na cidade do Rio
de Janeiro e no Brasil em si, mas sim futebóis. A LMDT, e depois a AMEA, organizava
o futebol comandado pelos clubes da elite e tinha maior destaque nos jornais, ao atrair a
atenção maior do público, mas existiam outras ligas e formas distintas da prática do
esporte bretão, tal como o futebol praticado por clubes de menor poder econômico ou
prestígio social, as chamadas ligas suburbanas, que congregavam o maior número de
jogadores negros e brancos pobres, indivíduos das classes sociais menos favorecidas. O
futebol era praticado por toda a cidade, e experimentado de diferentes formas na capital
republicana.

A Primeira República (1889-1930) é concebida nesta pesquisa como um período


em que uma pequena parcela da sociedade brasileira gozava dos direitos concebidos
pelos princípios republicanos expostos em lei, enquanto a maior parte da população,
especificamente se tratando da cidade do Rio de Janeiro, encontrava-se em estado de
marginalização social e política.

Nossa República, passado o momento inicial de esperança de


expansão democrática, consolidou-se sobre um mínimo de
participação eleitoral, sobre a exclusão do envolvimento popular no
governo. Consolidou-se sobre a vitória da ideologia liberal pré-
democrática, darwinista, reforçada do poder oligárquico.19

Os negros, assim como as mulheres e os brancos pobres, eram alijados de


diversas formas na sociedade, fosse pelo racismo, pelo preconceito social ou de gênero,

17
Idem, p. 253.
18
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 11.
19
CARVALHO, José Murilo de. Os Bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São
Paulo: Companhia das Letras, 2008. p. 161.

5
pela exclusão do direito ao voto. Todavia, daquela sociedade de “bestializados”20,
insurgia elementos que procuravam lutar contra aquela situação de submissão, tal como
a Revolta da Chibata (1910), cujo grande expoente histórico a nível de sujeito foi o
marinheiro negro João Cândido Felisberto. O negro era o principal alvo da ausência do
Estado e da sociedade quanto a sua condição social. O negro não era um cidadão
completo, era um “quase-cidadão”, configurando o seu isolamento social.

A liberdade não foi restaurada; ao contrário, foi inventada e


experimentada por aqueles que não a conheciam. Por isso, o território
da liberdade é pantanoso e muitos dos sinais que sacralizaram a
subordinação e a sujeição tornaram-se parte de um ambíguo terreno no
qual ex-escravos e “livres de cor” tornaram-se cidadãos em estado
contingente: quase-cidadãos.21

O preconceito racial e a descriminação social que o negro sofria na Primeira


República era fruto do resquício de padrões de relações raciais da ordem escravocrata e
senhorial. Após a abolição, ele foi jogado em uma sociedade de classes e obrigado a se
fazer por si mesmo.

O liberto viu-se convertido, sumária e abruptamente, em senhor de si


mesmo, tornando-se responsável por sua pessoa e por seus
dependentes, embora não dispusesse de meios materiais e morais para
realizar essa proeza nos quadros de uma economia competitiva [...]
Em suma, a sociedade brasileira largou o negro ao seu próprio destino,
deitando sobre seus ombros a responsabilidade de reeducar-se e de
transformar-se para corresponder aos novos padrões e ideais de
homem, criados pelo advento do trabalho livre, do regime republicano
e do capitalismo.22

Nelson da Conceição, um negro dessa “república que não foi”23, jogador de


futebol, no ano de 1923, defendendo as cores do Club de Regatas Vasco da Gama, que a
partir de 1919 estabeleceu uma política de inserção massiva de indivíduos oriundos das
mais diversas camadas sociais, se tornou o primeiro goleiro negro campeão carioca, ao
lado de outros jogadores negros e brancos pobres, muitos deles analfabetos. Para se ter
uma ideia deste feito, entre 1906, início do que hoje conhecemos como Campeonato
Carioca, e 1922, nenhum jogador negro havia conseguido se sagrar campeão. Nelson
também foi convocado para a seleção carioca em 1923 e para a disputa do Campeonato

20
CARVALHO, 2008.
21
GOMES, Flávio dos Santos e CUNHA, Olivia Maria Gomes. Quase-cidadão: histórias e antropologias
da pós-emancipação no Brasil – Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007. p. 13.
22
FERNANDES, 1978. Op. cit. pp. 15 e 20.
23
CARVALHO, 2008. Op. cit.

6
Sul-Americano do mesmo ano, defendendo a seleção brasileira. A campanha do
selecionado brasileiro foi pífia, mas o goleiro vascaíno foi um dos poucos que
escaparam das críticas, sendo inclusive considerado como um dos que evitou uma
campanha ainda pior do que a realizada. Nelson saiu da condição de chauffeur24 para ser
um grande keeper, ídolo do Vasco e reconhecido por muitos como maior goleiro da
cidade do Rio de Janeiro na década de 1920.

Já Nelson era negro. Antes de se profissionalizar pelo Vasco


trabalhava como motorista, chauffeur, daí o apelido que carregou
durante a vida. Tinha dificuldade em escrever, morava nos subúrbios
e, pelas agruras da História, pouco mais se sabe sobre este que foi,
talvez, o primeiro grande ídolo negro do futebol carioca e,
possivelmente, brasileiro25.

Acreditamos que Nelson é um exemplo desse negro que “se fez”. Por intermédio
da sua qualidade como jogador de futebol foi reconhecido e conseguiu trilhar uma
carreira vitoriosa no futebol, chegando onde, até então, nenhum goleiro negro havia
conseguido chegar. No futebol carioca, os clubes da elite, por meio de sua liga, criavam
imposições e obstáculos para que clubes menos abastados, indivíduos de classes sociais
menos favorecidas e especificamente indivíduos negros não pudessem chegar ao
comando da liga ou serem campeões. Contudo, os jogadores negros, aos poucos, graças
a sua força e técnica, conseguiram construir o seu espaço.

A metodologia utilizada neste trabalho baseia-se na concepção de que a pesquisa


histórica é empírica, constituída por um “[...] processo que tem de estar orientado
estritamente a partir de instâncias metodológicas que vão além do empírico, a partir das
teorias, das hipóteses, das conjecturas [...]26. Logo, “A questão metodológica alude à
forma pela qual o historiador pode apresentar relatos e argumentações perfeitamente
articuladas em um discurso textual27. Entendemos como fonte “[...] todo aquele
material, instrumento ou ferramenta, símbolo ou discurso intelectual, que procede da
criatividade humana, através do qual se pode inferir algo acerca de uma determinada
situação social no tempo.” 28. A observação da história é a observação das fontes29, não

24
A alcunha de chauffeur foi designada a Nelson da Conceição e explorada pelos jornais da época, como
forma de denegri-lo.
25
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 318.
26
ARÓSTEGUI, Julio. Op. cit., p. 481.
27
Idem, p. 484.
28
Idem, p. 491.

7
meramente a busca pela quantidade, mas, o processo de se fazer uso de um aparato
teórico-crítico para classificar e analisar o que dispomos. Quanto à
classificação/taxonomia das fontes acreditamos que:

[...] podem ser aplicados critérios muito variados. É preciso encontrar


critérios de classificação que permitam referir-se globalmente a todas
as fontes possíveis, seja qual for sua precedência, suporte e aspecto,
mas, sobretudo, é preciso que tais critérios sejam úteis para algo que
resulta ser imprescindível em todo tratamento das fontes históricas:
sua avaliação. Daí que o recomendável seja precisamente o
estabelecimento de vários critérios classificatórios [...] [pois] facilita a
busca das fontes adequadas ao estudo determinadas situações
históricas, levando-se sempre em conta que o ideal de uma grande
pesquisa é o uso das mais variadas fontes possíveis e a confrontação
sistemática entre eles.30

Desta forma, para a classificação/taxonomia das fontes usadas na pesquisa, utilizaremos


quatro critérios propostos por Julio Aróstegui.

É possível atender, ao menos, a um critério básico quádruplo. As


fontes podem ser localizadas em uma classificação de acordo com os
critérios seguintes, expressões sem ordem de preferência:
CRITÉRIOS TAXONÔMICOS:
Posicional (fontes diretas ou indiretas)
Intencional (fontes voluntárias ou não voluntárias)
Qualitativo (fontes materiais ou culturais)
Formal-quantitativo (fontes seriadas ou não seriadas e não
seriáveis)31

Lançaremos mão de dois jornais de grande circulação na cidade do Rio de


Janeiro no recorte histórico estabelecido (1919-1924) como fontes diretas, cujas seções
de sports eram significativas no que se refere ao football: O Paiz (1884)32 e O Imparcial
(1912)33. O primeiro começou a circular em 1º de outubro de 1884, na cidade do Rio de

29
Idem, p. 480.
30
Idem, pp. 492 e 494.
31
Idem, p. 493.
32
No acervo da Fundação Biblioteca Nacional estão disponibilizados edições do periódico O Paiz entre
os anos de 1884 a 1934. A primeira edição do periódico foi lançada no ano de 1884. De acordo com os
interesses de nossa pesquisa, nos limitaremos ao estudo do material referente ao período entre 1919 e
1924. O acervo do periódico encontra-se digitalizado e aberto à consulta via internet. Disponível em: <
http://memoria.bn.br/hdb/periodo.aspx>. Acessado em: 09 mai. 2013.
33
No acervo da Fundação Biblioteca Nacional, situada na cidade do Rio de Janeiro, consultado para a
pesquisa, estão disponibilizados edições do periódico O Imparcial entre os anos de 1912 a 1942. A
primeira edição do periódico foi lançada no ano de 1912. De acordo com os interesses de nossa pesquisa,
nos limitaremos ao estudo do material referente ao período entre 1919 e 1924. O acervo do periódico

8
Janeiro. Tinha sua seda na esquina da Rua 7 de Setembro com a Avenida Central atual
Avenida Rio Branco. Teve como fundador, o empresário João José dos Reis Júnior, o
conde de São Salvador de Matozinhos.
Jornal diário de grande circulação [...] Tido como o mais robusto
órgão governista da República Velha, foi um dos principais
formadores de opinião da sociedade brasileira, entre o fim do século
XIX e o começo do século XX. Durou até 18 de novembro de 1934,
quando foi fechado pela Revolução de 1930.34

Durante o período de nossa pesquisa era o jornal mais vendido no Rio de


Janeiro, custava, tal como a grande maioria dos jornais, inclusive o O Imparcial, o valor
de $100 réis, passando para $200 réis em 1924. O esporte, e especificamente o futebol,
possuíam seus lugares cativos nas seções do jornal. A seção de esportes era denominada
“SPORTS: Turf, Foot-Ball, Rowing e Outros” em 1919, passando a ser denominado
“SPORTS: Foot-Ball, Turf, Rowing e Outros”, marcadamente após a realização do
Campeonato Sul-Americano de 1919. Provavelmente, uma demonstração da força e
popularização que o futebol alcançava. Geralmente as notícias da seção vinham em
páginas que variavam entre a 5 e a 9.
O jornal O Imparcial começou a circular em 1912, no Rio de Janeiro, cuja sede
era na Rua da Quitanda, nº59. Era mais voltado á cobertura de esportes, em reação ao O
Paiz. Chegava a dar quatro páginas para a sua seção “Vida Sportiva”, que passou a se
chamar na década de 20 de “VIDA DESPORTIVA”. Geralmente a seção se localizava
entre a página 6 e 11 do periódico. O maior enfoque nos esportes ficava marcado pelo
uso constante de imagens dos atletas de várias modalidades, inclusive na primeira
página do jornal, pelas descrições mais pormenorizadas de informações pertinentes ao
desporto e a abrangência em maior número de modalidades esportivas.
Na perspectiva de analisar a relação do clube com Nelson da Conceição,
trabalharemos com algumas fontes diretas, a documentação de clube, especificamente as
atas da diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama pertinentes ao período estudado:
Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, de 1º de dezembro de 1920 a 03
de novembro de 1921, e a Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 10 de
novembro de 1921 a 08 de novembro de 1922. Além destes materiais, utilizaremos o

encontra-se digitalizado e aberto à consulta via internet. Disponível em: <


http://memoria.bn.br/hdb/periodo.aspx>. Acessado em: 09 mai. 2013.
34
Acervo: Biblioteca Nacional. Disponível em: <http://hemerotecadigital.bn.br/artigos/o-paiz>. Acessado
em: 26 mai. 2013.

9
Livro de atividades futebolísticas do Club de Regatas Vasco da Gama de 1916 a 1923,
uma importante fonte para a análise de vários fatores, como frequência de atuação dos
jogadores e dados estatísticos de um modo geral, como gols feitos e sofridos pela equipe
de futebol do Clube. Teremos o cuidado de não sucumbir ao discurso da instituição,
para não adotá-lo como uma verdade única e definitiva.

Os recenseamentos, utilizados para a pesquisa são dois: o Recenseamento do Rio


de Janeiro (Districto Federal) realizado em 20 de setembro de 190635 e o
Recenseamento do Brasil realizado em 1º de setembro de 192036. O primeiro servirá
como fonte indireta, na extração de dados específicos com objetivos de comparação. O
segundo iremos além do uso comparativo, analisaremos o discurso contido na fonte, que
traz relatos significativos do modo como Estado, através de uma produção sua, pensava
o negro no contexto histórico pesquisado.

Desta forma, obtemos o seguinte quadro quanto à classificação das fontes que se
relacionarão com o objeto de nossa pesquisa:

Fontes Critério posicional Critério intencional Critério qualitativo Critério quantitativo

Periódicos Fontes diretas37 Fontes voluntárias38 Fontes culturais39 Fontes seriadas40


(jornais)
O Imparcial

35
Fonte: Recenseamento do Rio de Janeiro (Districto Federal) realizado em 20 de setembro de 1906. Rio
de Janeiro, Off. da Estatística, 1907-1908.
36
Fonte: Recenseamento do Brasil realizado em 1º de setembro de 1920. Rio de Janeiro: Typographia da
Estatística, 1922. A referida fonte, produção oficial do Estado Brasileiro, não apresenta apenas dados
estatísticos objetivos, também, lança mão de dados para compor textos explicativos sobre vários assuntos,
dentre eles a questão do negro na sociedade. Há a predominância do pensamento de “aryanização” do
Brasil.
37
Segundo Aróstegui: “[fontes diretas e indiretas] [...] podem ser interpretadas também como primárias
ou secundárias. Idem, p. 495.
38
Segundo Aróstegui, quanto ao critério intencional: “[...] chamamos aqui testemunhais as fontes que
procedem de um ato intencional e não testemunhais as fontes involuntárias [ ...] A fonte voluntária, a que
propriamente podemos chamar de testemunhal, é a fonte clássica [...] constituiu a memória oficial das
sociedades [...] É a que reflete, portanto, o conflito interno de toda sociedade [...] [a fonte involuntária]
Trata-se de todas aquelas marcas do homem que se conservaram sem que este se tenha proposto
conscientemente sua conservação como ‘testemunho histórico’.”. Idem, pp. 496 e 498. Em nossa
pesquisa, entendemos como fontes voluntárias as que resultam da intenção do homem em deixar
registrado determinado fato e/ou opinião sobre fato(s) como um objetivo histórico.
39
Segundo Aróstegui, quanto ao critério qualitativo, são culturais: “Fontes culturais são, portanto,
praticamente todas as existentes que não são fontes arqueológicas, todas aquelas escritas, faladas,
simbólicas ou audiovisuais que transmitem uma mensagem em linguagem mais ou menos formatizada.”.
Idem, p. 500.
40
Segundo Aróstegui, quanto ao critério quantitativo: “[...] entendemos por fonte seriada aquela, material
ou cultural, que é composta de muitas unidades ou elementos homogêneos, suscetíveis de serem
ordenados, numericamente ou não.”. Idem, p. 502. Em nossa pesquisa, entendemos como fonte seriada
toda fonte que, para além do período histórico que estudamos, fizesse parte de um conjunto maior e
homogêneo da mesma natureza.

10
O Paiz
Ata da Diretoria Fontes diretas Fontes voluntárias Fonte cultural Fonte seriada
do Club de
Regatas Vasco da
Gama, de 1º de
dezembro de 1920
a 03 de novembro
de 1921
Ata da Diretoria Fontes diretas Fontes voluntárias Fonte cultural Fonte seriada
do Club de
Regatas Vasco da
Gama, 10 de
novembro de
1921 a 08 de
novembro de
1922
Livro de Fonte indireta Fontes voluntárias Fonte cultural Fonte seriada
atividades
futebolísticas do
Club de Regatas
Vasco da Gama
de 1916 a 1923
Recenseamento Fonte indireta Fonte voluntária Fonte cultural Fonte seriada
do Rio de Janeiro
(Districto Federal)
realizado em 20
de setembro de
1906
Recenseamento Fonte direta Fonte voluntária Fonte cultural Fonte seriada
do Brasil
realizado em 1º de
setembro de 1920

A pesquisa se dividirá em dois capítulos. No primeiro capítulo abordaremos, por


meio da trajetória de Nelson da Conceição, as condições gerais do negro da cidade do
Rio de Janeiro na Primeira República, levantando alguns dados biográficos do ex-
goleiro e retratando o seu início no futebol. Trataremos da consolidação do futebol
como esporte de massa no Rio de Janeiro, absorvendo o espaço de outros esportes como
o remo e o turfe. Falaremos sobre a política do Vasco de inserção de negros e brancos
pobres na sua equipe principal de futebol, bem como a forte crítica vinda da imprensa
contra essa política, destacando que por traz do discurso entre amadorismo x
profissionalismo, existia racismo contra os jogadores negros, tanto dos jornais quanto da
LMDT. Os jornais expunham uma imagem pejorativa dos jogadores pobres, contudo as
maiores críticas caíam sobre os jogadores negros, tal como Nelson, que sofria com as
“denúncias” da sua condição de condutor de veículos, ou com a ridicularização de seu
modo de falar. Quanto à LMDT, buscaremos demonstrar a intenção de limitar a
inserção de jogadores negros no futebol que comandava. Além disso, com a ajuda da

11
obra do jornalista Mário Filho, O Negro no Futebol Brasileiro41, iremos buscar algumas
referências para entendermos melhor a atmosfera do futebol carioca do período.

No capítulo dois demonstraremos como gradualmente a postura pejorativa da


imprensa sobre Nelson vai se diluindo com as constantes demonstrações de técnica e
habilidade do jogador, culminado com o título do Campeonato Carioca de 1923 e sua
não exclusão pela AMEA, devido a sua consolidação como maior goleiro do Rio de
Janeiro. Trabalharemos também com as produções intelectuais que degradavam a figura
do negro e expunham explicitamente o racismo existente na sociedade brasileira.

No ano de 1922, Centenário da Independência, as teorias raciais demonstravam


como vários intelectuais brasileiros e o próprio Estado acreditavam na política de
“arienização” da sociedade brasileira. Neste mesmo ano, a despeito do aumento do
preconceito contra portugueses, o Vasco, um clube da colônia portuguesa, com um time
formado de negros e pobres, ganha o campeonato da 2ª divisão e no ano seguinte
desbanca os favoritos e se torna campeão logo no seu ano de estreia na 1ª divisão da
LMDT.

Nelson da Conceição se consolida como o grande goleiro da Capital Federal e


mesmo após a pífia campanha da seleção brasileira no Campeonato Sul-Americano de
1923, volta da Argentina consagrado pelas suas atuações. Para ambos os capítulos,
lançaremos mão, principalmente no que diz respeito ao futebol, de historiadores que se
debruçam sobre a pesquisa da história do esporte, como Victor Andrade de Melo, João
Manuel Casquinha Malaia Santos e Ricardo Pinto dos Santos, junto com outros autores
que já foram citados.

41
A obra citada é tratada pela pesquisa como uma fonte literária. Para uma crítica sobre a obra O Negro
no Futebol Brasileiro, do jornalista Mário Filho, ler: HELAL, Ronaldo; SOARES, Antonio Jorge;
LOVISOLO, Hugo. Mídia, Raça e Idolatria: A invenção do país do futebol. Rio de Janeiro: Editora
Mauad, 2001. Esclarecemos que não tomamos a obra de Mário Filho como fonte da verdade, todavia
como uma referência para montarmos um quadro da situação dos jogadores negros no início do futebol na
cidade do Rio de Janeiro. Não tomamos sua obra como a verdade absoluta, todavia, uma das possíveis
verdades. Tomamos o cuidado para não sermos levados pelo caráter literário da obra, mas absorver o
possível do seu caráter histórico.

12
CAPÍTULO 1 NELSON: O CHAUFFEUR (1919-1921)

1.1 Nelson: Um negro da Primeira República

Nelson da Conceição – (Goal Keeper) – Nasceu em 12 de agosto de


1899, em Nova Friburgo, Estado do Rio de Janeiro.42

Nelson da Conceição nasceu em 12 de agosto de 1899 na cidade de Nova


Friburgo, situada no estado do Rio de Janeiro, a 126 km da capital. Mudou-se para a
então Capital Federal, Rio de Janeiro, onde começou a disputar partidas oficiais de
futebol ainda muito jovem, com apenas 15 anos. Iniciou sua carreira futebolística em
1915, no Paladino Football Club (1914), clube filiado à Liga Metropolitana de Sports
Athleticos (LMSA). Em 1916 já atuava pelo Engenho de Dentro Athletico Club (1912),
onde se tornou tricampeão da Liga Suburbana, a maior de todas as ligas do subúrbio.
Nelson era pobre, tal como a única pessoa de sua família da qual dispomos de
informação, sua mãe Carlota Laura da Conceição43.

O futebol se configurou para Nelson como uma fonte de trabalho e renda, um


jogador de futebol que teve a sua qualidade reconhecida e através dela conseguiu obter
o seu sustento. Esta prática esportiva, no Rio de Janeiro, com o passar do tempo, tornou-
se mais um polo de trabalho, que saiu da sua origem elitista para a sua popularização
nas arquibancadas e nos gramados.

O futebol estava ajudando o negro a se familiarizar com esses novos


padrões e a se comportar dentro deles [trabalho livre, regime
republicano e capitalismo] A capacidade futebolística há muito vinha
servindo para a obtenção de bons empregos, mas a prática deste
esporte ia se tornando mais uma profissão, ainda que ilegal para as
ligas que controlavam o futebol de maior expressão nas maiores
cidades do país.44

A migração da população de cidades do interior do estado, bem como de outras


regiões do país e até do exterior para a capital da república foi um fenômeno marcante
no final do século XIX e início do século XX.

A cidade do Rio de Janeiro foi a que primeiro apresentou um


considerável crescimento industrial no início do século XX. Essa nova
dinâmica na economia da cidade atraiu um número grande de
trabalhadores para as zonas urbana e suburbana da cidade, oriundos

42
A Tribuna, 21 de agosto de 1923, p. 7.
43
O Imparcial, 22 de fevereiro de 1924, p. 10.
44
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 203.

13
das zonas rurais ou de outros países durante o processo de
imigração.45

A procura por melhores condições de vida, um trabalho para a própria


sobrevivência, fez com que milhares de pessoas se lançassem a sorte na “cidade
grande”, especialmente os negros ex-escravos e seus descendentes. A Abolição da
Escravatura (1888) apenas ratificou em papel um processo que já estava em percurso,
ou seja, a libertação em massa de cativos, fosse pela fuga ou por alforrias oferecidas
pelos donos de escravos:

O 13 de Maio redimiu 700 mil escravos, que representavam, a essa


altura, um número pequeno em comparação com o total da população,
estimada em 15 milhões de pessoas. [...] a libertação demorou demais
e representou o fim do último apoio à monarquia: os fazendeiros
cariocas da região do vale do Paraíba divorciaram-se, a partir de
então, de seu antigo aliado46

A libertação definitiva não forneceu garantias de uma sobrevivência


minimamente digna para os negros ex-cativos, que se somaram com a massa de negros
já em liberdade. Assim, não se buscou dar ao negro um sustentáculo que lhe
possibilitasse uma inserção menos traumática para a forma de trabalho livre:

A desagregação do regime escravocrata e senhorial operou-se no


Brasil, sem que se cercasse a destituição dos antigos agente de
trabalho escravo de assistência e garantias que os protegessem na
transição para o sistema de trabalho livre. Os senhores foram eximidos
da responsabilidade pela manutenção e segurança dos libertos, sem
que o Estado, a Igreja ou outra qualquer instituição assumissem
encargos especiais.47

A queda do Império e a emergência de um novo regime político, a República


(1889), não significou mudanças radicais para a situação do indivíduo negro. A
população negra se viu obrigada, por conta própria, a diminuir os prejuízo da espoliação
física e moral dos anos de escravidão.

45
SANTOS, João Manuel Casquinha Malaia. O processo de profissionalização do futebol no Rio de
Janeiro: nos subúrbios à Zona Sul. A inserção de negros, mestiços e brancos pobres na economia da
Capital Federal (1914-1923). Leituras de Economia Política. Campinas, v. 13, pp. 125-155, 2008. p.
128. Disponível em: < http://www.revistalep.com.br/index.php/lep/issue/view/13>. Acessado em: 12 dez.
2012.
46
GOMES, Flávio dos Santos e CUNHA, Olivia Maria Gomes. Quase-cidadão: histórias e antropologias
da pós-emancipação no Brasil: Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007. pp. 24-25.
47
FERNANDES, 1978. Op. cit., p. 15.

14
A Primeira República (1889-1930) pode ser caracterizada como um período de
forte exclusão política, social, racial e de gênero. Grande parte da população brasileira
ficava de fora do processo eleitoral (negros e brancos analfabetos e mulheres), que além
de tudo era fortemente marcado pela corrupção. A questão racial se insere também nos
resquícios de séculos de escravidão, no completo descaso com o negro, que adentrou na
sociedade republicana desfavorecido nas mais diversas relações interpessoais.

Apesar da abolição da escravidão, a sociedade caracterizava-se por


desigualdades profundas e pela concentração do poder. Nessas
circunstâncias, o liberalismo adquiria um caráter de consagração da
desigualdade, de sanção da lei do mais forte. Acoplado ao
presidencialismo, o darwinismo republicano tinha em mãos os
instrumentos ideológicos e políticos para estabelecer um regime
profundamente autoritário.48

Como reflexos desses atritos sociais, ainda que existisse o mito da democracia
racial e a crença na paulatina absorção do negro na sociedade, desencadearam-se
revoltas populares, como a Revolta da Chibata (1910), e movimentos de valorização do
negro e sua defesa contra o racismo, como, por exemplo, a Frente Negra Brasileira
(1931-1937) e a Legião Negra (1932)49. A relação conflituosa do negro na república se
estendia para os mais diversos setores da sociedade.

Recém saída do império e jogada em plena república, migrando do regime


escravocrata para o trabalho livre e assalariado, a população negra tinha que disputar o
espaço no mercado de trabalho livre com brancos pobres e imigrantes, no caso
específico da cidade do Rio de Janeiro, marcadamente os imigrantes portugueses. As
vagas de trabalho destinadas a esta significativa parcela da população brasileira eram as
mais precárias, com maior uso da força física, e com menos prestígio social. Assim,
buscavam ocupar postos de trabalho como operários em fábricas, jornaleiros, caixeiros,
motoristas particulares (chauffeurs), etc: “A população negra do Rio de Janeiro estava
basicamente como estavam os negros das grandes cidades do país. Em relação às
oportunidades de trabalho, se sujeitariam àquelas consideradas braçais, de menor
remuneração e estabilidade”.50

48
CARVALHO, José Murilo de. A formação das almas: o imaginário da República no Brasil. São
Paulo: Companhia das Letras, 1990. p. 25.
49
GOMES, Flávio dos Santos. Negros e política (1888-1937). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. p. 12.
50
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 203.

15
Havia a real necessidade de sobreviver na ótica do trabalho assalariado, em face
as suas carências sociais e o descaso da sociedade. Os ex-escravos e seus descendentes
que migraram para os grandes centros urbanos somaram-se aos imigrantes, constituindo
uma massa trabalhadora que procurava dar conta do trabalho livre e o estilo de vida
moderno disseminado pela Europa..

Na esteira do desenvolvimento e urbanização, o esporte surge como símbolo de


civilidade, um representante da modernidade que a Europa já experimentava e que
agora o Rio de Janeiro tomava parte com o seu desenvolvimento econômico. Cada vez
mais, o esporte se configurava para os trabalhadores a sensação de participar desse
mundo civilizado, como obter uma fonte de lazer, uma válvula de escape da vida
corrida, demarcada pelo relógio das fábricas, um estilo de vida cada vez mais frenético:

No Brasil uma grande massa de trabalhadores escravos, que ocupavam


majoritariamente trabalhos agrícolas, conseguiu liberdade apenas no
final do século XIX. Após a abolição, esses trabalhadores começaram
a se dirigir aos grandes centros urbanos para configurar, juntamente
com os imigrantes, um contingente de trabalhadores com capacidade
para consumir os mais variados produtos, dentre eles espetáculos
urbanos, como cinema, o teatro e as competições esportivas.51

No Rio de Janeiro, ao final do século XIX e início do século XX, o turfe e o


remo eram as práticas esportivas que mais atraíam a atenção do público, o que se pode
observar nos espaços dados a estes esportes nos jornais e revistas da época, embora
ainda pequeno se comparado à importância que o esporte iria adquirir nas décadas que
se seguiriam. O turfe possuía um viés mais aristocrático, o remo tendia a possuir um
pouco mais de popularidade, contribuindo para isto, o fato das conquistas partirem
unicamente do esforço empreendido pelo homem. Desta forma, o remo começou a
despontar como uma preferência entre massa de trabalhadores cariocas e do público de
um modo geral.

Se o turfe já significava um avanço na estrutura social carioca, o remo


incorpora perfeitamente a modernidade dos primeiros anos do século
XX. O moderno tinha relação com o indivíduo audaz, conquistador,
vencedor. O remo é o esporte do “exercício phisico”, termo-chave
sempre usado pelos que defendiam e propagavam as benesses dessa
prática. […] Não se tratava mais de colocar cavalos para correr, mas
sim de participar mais ativamente, de demonstrar no próprio corpo
saudável e forte os sinais dos novos tempos, de incorporar

51
Idem, p. 7.

16
definitivamente um novo estilo de vida adequado à velocidade do
novo momento. Afinal, quem chega primeiro não é mais um cavalo
que tem o homem como coadjuvante, mas um homem que conduz o
mais rápido possível, a partir do seu próprio esforço, um barco. No
turfe, sempre se divulga o nome e a vitória dos cavalos; já no remo, é
o nome dos remadores que ganha destaque. No turfe crack era o
cavalo; no remo eram os homens que conduziam a embarcação.52

Do remo, surgiram alguns clubes que figuram até os dias atuais como grandes
instituições do esporte nacional, como, por exemplo, o Club de Regatas do Flamengo
(1895) e o Club de Regatas Vasco da Gama (1898).

Todavia, se por um lado cada vez mais as pessoas eram atraídas para assistir aos
espetáculos esportivos, a prática desses esportes era bastante restrita. O crescimento dos
espectadores do turfe e principalmente do remo não implicava diretamente na
popularização em grande escala de praticantes. A prática do remo ou do turfe por parte
do trabalhador urbano das camadas sociais menos favorecidas esbarrava em alguns
obstáculos, desde a escassez de recursos para a compra dos materiais necessários até a
incompatibilidade socioeconômica e cultural com os estatutos dos clubes que detinham
o controle da prática esportiva institucionalizada.

Os esportes foram introduzidos no Brasil como aspecto do


desenvolvimento do mundo civilizado, portanto, deveriam ser
primeiramente praticados por membros da elite. As primeiras
tentativas de se estabelecerem práticas desportivas regulares no país
datam do final do século XIX, com a formação de clubes esportivos
nas principais cidades do país, principalmente no Rio de Janeiro, São
Paulo e no Rio grande do Sul. Os clubes eram associações civis sem
fins lucrativos, que se destinavam às práticas esportivas. Mas esses
clubes funcionavam como mais um dos muitos sinais delimitadores de
fronteiras entre a elite e as camadas populares.53

Os clubes e o esporte carioca de um modo geral se encaixavam na lógica da


Primeira República, um regime excludente na sua essência. Ou seja, enquanto a elite
tentava manter as camadas populares afastadas do controle, estas por sua vez buscavam
se adaptar e integrar nos setores da sociedade, na medida do possível.

As reformas urbanas empreendidas pela Presidência da República, com o


presidente Rodrigues Alves, e pela Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, com o

52
MELO, Victor Andrade de. Cidade Sportiva: primórdios do esporte no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro:
Relume Dumará: Faperj, 2001. pp. 77-78.
53
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 26.

17
prefeito Francisco Pereira Passos, no início do século XX, foram vitais para
alavancarem a imagem e a economia da capital. A face velha e suja da cidade deveria
ficar com a monarquia.

[...] passa-se crescentemente a se preocupar com que o Rio de Janeiro,


a capital do País, expressasse o sinal dos novos tempos, dos novos
intuitos econômicos, de uma suposta nova organização política (a
República). A cidade precisava ter uma nova aparência “civilizada”,
que levasse a população e os investimentos internacionais a
esquecerem o “mundo atrasado” da monarquia. O moderno estava
ligado ao progresso, à limpeza, ao embelezamento [...]54

Tais reformas ajudaram a consolidar as práticas esportivas como parte integrante


da vida carioca. O Rio de Janeiro precisava se remodelar e estar à altura das grandes
cidades europeias.

Em contrapartida, as reformas urbanas não levaram em consideração o bem estar


da maioria da população do centro da cidade e seus arredores. A parte da população
carioca que mais sofreu com as reformas foram as camadas mais pobres, que viviam em
pequenas construções no centro da cidade e foram despejadas e obrigadas e se
deslocarem para outros locais, como os bairros do subúrbio ou para os morros ao redor
da região central.

As vítimas são fáceis de identificar: toda a multidão de humildes, dos


mais variados matizes étnicos, que constituíam a massa trabalhadora,
os desempregados, os subempregados e os aflitos de toda espécie. A
ação do governo não se fez somente contra os seus alojamentos: suas
roupas, seus pertences, sua família, suas relações vicinais, seu
cotidiano, seus hábitos, seus animais, suas formas de subsistência e de
sobrevivência, sua cultura. Tudo, enfim, é atingido pela nova
disciplina espacial, física, social, ética e cultural imposta pelo gesto
reformador. Gesto oficial, autoritário e inelutável, que se fazia [...] ao
abrigo de leis de exceção que bloqueavam quaisquer direitos ou
garantias das pessoas atingidas. Gesto brutal, disciplinador e
discriminador, que separava claramente o espaço do privilégio e as
fronteiras da exclusão e da opressão.55

Não podemos precisar a data da chegada da família de Nelson ao Rio de Janeiro.


Mas, estando na cidade neste período conturbado na cidade, as chances são grandes de
que sua família tenha sido uma das milhares que sofreram as consequências do estado
repressor e de uma república exclusivista.
54
MELO, 2001,op.cit.p.70.
55
SEVCENKO, Nicolau. A Revolta da Vacina: mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo: Cosac
Naify, 2010.p.82.

18
Para além das largas avenidas, grandes obras de saneamento e reconfiguração do
centro da cidade, que tanto prejudicaram as camadas populares, o esporte estava na
pauta como um dos símbolos da modernidade, do mundo civilizado, que se queria para
a Capital.

O Projeto de Pereira Passos era de adequar a cidade ao seu papel de


Capital da República fazendo-a moderna e dentro dos padrões
higiênicos requeridos pela “civilização”. Neste sentido, os esportes se
encaixavam perfeitamente dentro de seu projeto civilizador. [...] 56

Porém, não seriam o turfe ou o remo os grandes símbolos da modernidade a que


se queria o Rio de Janeiro incluído. Este lugar estava guardado ao futebol. A despeito
das modalidades esportivas existentes até então, como os já citados turfe e remo, dois
esportes favorecidos neste período de reestruturação da cidade, um novo esporte
tipicamente inglês começava a tomar conta da juventude da elite carioca.

O futebol se tornaria um novo símbolo civilizador, uma nova forma de demarcar


espaços sociais no Rio de Janeiro reformado. Mas, com o passar dos anos, a sua
propagação faria com que se tornasse insuportável a resistência contra a inserção das
camadas mais populares neste esporte, até mesmo nas ligas organizadas pela elite.

A origem do futebol moderno advêm da Inglaterra, centro do desenvolvimento


industrial no século XIX:

Esse jogo de futebol de origem escocesa, que levava os desportistas a


se cotizarem para realizar uma partida ou match, e praticado até hoje
no País, veio, diretamente da Inglaterra, e durante muito tempo
predominou uma titulação técnica incidental, como scratch, team,
forward, center-half, beck, goal-keeper, corner, half-time, walk-over,
etc. Sem contar que a própria modalidade de esporte era denominada
football, e que os grupos de desportistas socialmente constituídos que
a praticavam intitulavam-se club.57

Este esporte, que obteve a sua consolidação no século XX, é fruto do estilo de vida dos
indivíduos da sociedade industrial, em que o tempo se torna fundamental para a sua
organização:

O século XX começou com o fim da Era Vitoriana, que levou a


burguesia inglesa a um certo apogeu social, econômico, político,

56
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 25.
57
MALHANO, Clara; MALHANO, Hamilton. Memória Social dos Esportes: São Januário –
Arquitetura e História. Rio de Janeiro: Mauad: FAPERJ, 2002. p. 24.

19
cultural, em nível internacional. Também nesse período foram criados
rígidos códigos de postura, inclusive a regulamentação de
determinados esportes e, dentre eles, o remo e o futebol.58

O futebol surge no Rio de Janeiro, de forma institucionalizada, no início do


século XX, através de membros da elite carioca, descendentes de ingleses, que o trazem
da Europa. Oscar Alfredo Cox é reconhecido, majoritariamente, por ter formalizado a
vinda do futebol para então Capital Federal:

Os registros oficiais do futebol carioca […] dizem que, no ano de


1897, Oscar Cox, estudante carioca, descendentes de ingleses,
retornava ao Rio de Janeiro, após concluir estudos na Suíça, e trazia
consigo o conhecimento de algumas regras da prática desse novo
esporte, do qual se tornara fervoroso adepto.59

De um modo geral, consagrou-se como a primeira partida de futebol que se realizou no


estado do Rio de Janeiro, o evento ocorrido na cidade de Niterói, em 22 de setembro de
1901, no Rio Cricket And Athetic Association:

[…] um time, formado por alguns dos altos funcionários das mais
diversas companhias inglesas que prosperavam na cidade e por sócios
do rio Cricket, jogou contra um time de brasileiros, alguns deles
sócios de outro clube de criket do Rio, o Paysandu. Oscar Cox, o
capitão do time dos brasileiros, enviou convites aos principais jornais
e revistas da cidade para a divulgação do evento. Conseguiu a
presença de jornalista de cinco periódicos, sendo quatro especializados
em esportes, o Brasil Athletico, a Semana Sportiva, o Correio do
Sport e o Brasil Nautico, e apenas um jornal de grande circulação, o
Correio da Manhã.60

Ainda em 1901 realizou-se um encontro entrem cariocas e paulistas, promovido


por Oscar Cox e Charles Miller:

Seus contatos com Charles Miller, em São paulo, os levariam ainda


neste ano de 1901, no dia 19 de outubro,a realizar a primeira partida
entre cariocas e paulistas, no campo do São Paulo Athletic Club. A
equipe carioca intitulava-se Rio Team, e os paulistas, São Paulo
Team.61

No ano seguinte foram criados os dois primeiros clubes destinados especificamente à


prática do esporte bretão: o Rio Football Club e o Fluminense Football Club. Deste
último, Oscar Cox foi um dos mentores para a sua criação:

58
MALHANO, Clara; MALHANO, Hamilton, 2002. Op. cit., p. 38.
59
Idem, p. 21.
60
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 34.
61
MALHANO, Clara; MALHANO, Hamilton, 2002. Op. cit., p. 44.

20
O fato de o esporte já haver se difundido em São paulo, a ponto de
poder ser disputado um campeonato em que os paulistas se sagraram
campeões, levou um grupo de vinte filhos das melhores famílias do
Rio de Janeiro a se reunir aos 21 dias do mês de julho de 1902 para
fundar o Fluminense Football Club.62

Em 17 de abril de 1904 era fundado o Bangu Athletic Club. O Bangu foi o


primeiro time derivado de uma fábrica na cidade do Rio de Janeiro, a Companhia
Progresso Industrial (1892), popularmente conhecida como “Fábrica Bangu”. Na
Europa, principalmente na Inglaterra, isto já ocorria desde o século XIX, como, por
exemplo, o Arsenal Football Club (1886), fundado por trabalhadores da Woolwich
Arsenal Armament Factory, e muitos outros. No Brasil, o processo de surgimento de
times de futebol através da união de trabalhadores estrangeiros com brasileiros nas
fábricas já existia, é o caso do Votorantin Athletic Club, fundado no ano de 1902 por
trabalhadores da Fábrica de Tecidos Votorantin, situada na cidade de Sorocaba/SP.
Para além da característica de ser o primeiro clube “de fábrica” do Rio de
Janeiro, ao Bangu é dado a primazia de ter sido o primeiro clube a escalar um jogador
negro em suas fileiras do futebol. Francisco Carregal, jogador negro e funcionário da
fábrica Bangu. Outros atletas negros também foram aproveitados para o time de futebol,
como forma de suprir as carências de posição quando estas não eram ocupadas por
ingleses ou seus descendentes.
O ineditismo de se escalar atletas negros não produziu uma política sistemática
de inserção maciça de jogadores negros ou brancos pobres. Entre idas e vindas na
primeira divisão das principais ligas cariocas que se sucederam ao longo do tempo, o
Bangu conquistou o seu primeiro título apenas no ano de 1933.
Em 1904 também surgiu o Botafogo Football Club, formado por membros de
prestigiadas famílias da zonal sul carioca, este clube rivalizaria na década de 10 e início
de 20 com o Fluminense para saber qual era o melhor da cidade. No dia 18 de setembro
de 1904 surgia no bairro da Tijuca o America Football Club que embora não fosse
localizado na zona sul, mas na zona norte, optou desde o início em se aproximar do
estilo praticado pelos clubes ricos do sul.

Os clubes destinados à prática do futebol começaram a surgir em larga escala. A


procura de novas vitórias, êxitos e triunfos que reforçassem suas posições frente a
sociedade, desde os clubes mais ricos até os menos afortunados, contribuiu para que

62
Idem.

21
paulatinamente o caráter amador fosse dando espaço a um futebol mais integrado às
práticas capitalistas, ou seja, um futebol mais “profissional”. Para além da estrutura
física dos estádios, o espetáculo do futebol carecia constantemente de se renovar e
fornecer ao público melhores “atores”.

[...] la tendencia, em todos los niveles de participación pero de forma


más patente en el deporte de alto nivel, hacia uma cresciente
competitividad, seriedad en la participación y búsqueda de triunfos.
Dicho co otras palabras, la tendencia a que me refiro implica la
erosión gradual pero aparentemente inexorable de las actitudes,
valores u estructuras del deporte como “afición” y su correlativa
substituición por las actitudes, valores y estructuras “profesionales”,
sea cual sea el sentido de este término. Vista desde otro ángulo más,
se trata de la tendencia del deporte, em todos los países del mundo, a
dejar de ser uma instituición marginal y escassamente valorada para
convertirse em otra central y merecedora de um valor mucho más alto
[...]63

Neste sentido, a existência de esporte em crescente expansão, com retorno financeiro


compatível com salários ganhos por operários em fábricas ou maior, inserindo cada vez
mais indivíduos das mais variadas camadas sociais e que poderia inclusive dar prestígio
social, seria um potencial polo atrativo para os homens negros.

Progressivamente as práticas capitalistas começaram a tomar conta do futebol,


assim como já estava ocorrendo com a cidade em seus mais diversos setores. Os clubes
já vislumbravam a possibilidade de maior lucro com o aumento dos estádios, todavia o
grande investimento neste quesito viria na década seguinte, impulsionado pelo exemplo
do que ocorria no futebol inglês.

A lógica do capitalismo passava a se apoderar do futebol. Este,


transformado em espetáculo comercializável para multidões, passou a
conviver mais de perto em seus diversos setores com aspectos
inerentes ao desenvolvimento deste tipo de economia. As décadas de
1910 e 1920 foram períodos de decadência do regime político
oligárquico, de consolidação da economia comercial urbana e de
estímulos à indústria. O aumento da produção industrial e sua
diversificação pintavam com novas cores as grandes cidades
brasileiras.64

No início do futebol carioca Fluminense e Botafogo rivalizavam para saber


quem era o maior da capital no esporte bretão. Até 1910 o Fluminense já havia

63
ELIAS, Norbert; DUNNING, Eric. Deporte y Ocio en el processo de la civilizacion. Nova York:
Basil Blackwel Publisher Ltd., Oxford, 1986.p.247.
64
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 190.

22
levantado a taça em quatro oportunidades (1906, 1907, 1908, 1909), o Botafogo por
duas oportunidades (1907 e 1910). O título de 1907 foi para os tribunais, porque o
campeonato terminou empatado e não constava na regra os procedimentos mediante um
empate entre equipes65.

Após a resolução de alguns conflitos envolvendo clubes da elite, no futebol


carioca constituiu-se um quarteto de clubes que dominariam a principal liga de futebol
até o ano de 1922. Com o fim da dissidência do Botafogo, que havia criado uma nova
liga66. Além da criação do departamento de futebol do Clube de Regatas do Flamengo,
no ano de 1912, após um racha entre jogadores (sócios) do Fluminense, a partir de 1913
o futebol carioca pode contar com os estes dois mais o Fluminense e o América. Estava
formado o quarteto dos maiores e mais ricos clubes da cidade do Rio de Janeiro.
Se por parte da elite o futebol ganha prestígio a cada dia, por parte do subúrbio
não era diferente. Existia uma verdadeira onda de criação de clubes. No subúrbio
carioca, o surgimento de clubes de football também se tornou constante. Eram clubes
com menor poder aquisitivo, onde se encontravam vários jogadores negros e brancos
pobres.67
O futebol carioca era bastante fragmentado, dentro de uma mesma liga ou entre
ligas diferentes. A principal liga, entre 1919 até 1923, foi a Liga Metropolitana de
Desportos Terrestres (LMDT), substituta da LMSA desde as reformas dos estatutos de
1917. Dentro desta liga havia o que se pode configurar como uma pirâmide, em que no
topo estavam os quatro clubes mais ricos da cidade, todos na 1ª Divisão. Além do
comando da liga mais lucrativa da cidade, estes clubes possuíam em comum uma
cultura que buscava limitar a entrada de indivíduos das camadas populares nos seus
quadros sociais.
[...] esses clubes funcionavam como mais um dos muitos sinais
delimitadores de fronteiras entre a elite e as camadas populares.
Detentora do conhecimento e do capital necessário para a compra dos
instrumentos adequados para a prática dos diversos esportes, os
fundadores desses clubes da elite colocavam em seus estatutos
limitações para o ingresso como associado, como taxas extremamente
caras. Além das barreiras econômicas, outras sociais e culturais eram

65
Apenas em 1996 foi decidido que o título seria dividido pelas duas equipes.
66
Associação de Football do Rio de Janeiro (1911).
67
Sport Club Mangueira, Cascadura Football Club, Club Athletico Meyer, Nacional Football Club, São
Christovão Football Club, Pedregulhense Football Club, Ouro Football Club, Aluminio Football Club,
Shoot Americano Football Club, Guarany Football Club, Recreativo Football Clud etc. SANTOS, 2010.
Op. cit. p. 49.

23
impostas aos associados e àqueles que pretendiam se associar. Eram
disposições impossíveis de serem cumpridas pelas camadas menos
abastadas, como não possuírem profissões braçais, serem
alfabetizados, serem convidados por outro associado e aprovados em
assembleia de sócios.68

A forma de pensar dos clubes da elite carioca, o esporte de modo geral, e neste
sentido o futebol, deveria ser formado por um tipo ideal de jogador. O chamado
sportmen era a síntese de elementos da moral e do bom costume.
Se tornar um sportmen resultaria em agregar bons valores que
serviriam como passaporte à moderna sociedade que emergia. Neste
caso, o ideal de sportmen esteve sempre relacionado aos filhos das
famílias ricas dos centros urbanos que carregavam condições e
valores, reais e simbólicos, bem definidos e, sobretudo, que
convergiam para a modernidade.69

Abaixo dos clubes de elite, no que se refere à representação na Liga e o poderio


econômico e simbólico, estavam tanto os demais times da primeira divisão quanto os da
segunda e terceira. Estas duas últimas divisões contemplavam o maior número de
jogadores negros e pobres da Liga. Havia também as ligas do subúrbio, que
contemplavam grande quantidade de jogadores humildes e muitos negros. Logo, tanto
os demais clubes da principal liga do futebol carioca como o futebol suburbano era
constituído de jogadores que não se enquadravam no tipo ideal de jogador.
Enquanto a principal liga de futebol do Rio de Janeiro era comandada
economicamente e politicamente por quatro grandes clubes (América, Botafogo,
Flamengo e Fluminense), existiam outras ligas, especialmente no subúrbio carioca, onde
o futebol já dominava o apreço da população. Destaque para as duas maiores, a
Associação Athetica Suburbana e a Liga Suburbana de Football (1916), esta última,
sendo a maior entidade que regia o campeonato entre os clubes do subúrbio.
Com a popularização do esporte bretão nas duas primeiras décadas, o futebol se
consolidaria como o esporte mais popular do Rio de Janeiro na segunda metade da
década de 10 do século XX.
A segunda década do século XX marcaria a afirmação definitiva do
futebol como o esporte predileto do carioca e do brasileiro morador
dos principais centros urbanos do país. O futebol passava a ser o

68
Idem, p. 26.
69
SANTOS, Ricardo Pinto dos. Tensões na consolidação do futebol carioca, p. 184. In PRIORI, Mary
Del; MELO, Victor Andrade de. História do Esporte no Brasil: Do Império aos dias Atuais. São Paulo:
Editora UNESP, 2009.

24
esporte com maior atenção da imprensa, e os clubes passaram a se
beneficiar com essa popularização.70

O futebol já era popular nas arquibancadas e no gosto da população carioca, todavia os


grandes clubes resistiam à sua popularização entre os jogadores que formavam as
equipes.
No período de consolidação do futebol, Nelson da Conceição se sagrava
tricampeão da Liga Suburbana pelo time do Engenho de Dentro, o campeonato de 1918
terminou apenas em 1919. A liga do subúrbio recebia significativo destaque nos jornais,
em especial a fortíssima equipe do Engenho de Dentro:
RESULTADOS DE DOMINGO
O Engenho de Dentro derrota facilmente a équipe do Modesto pelo
score de 6x0.
Com uma má tarde e diante de numerosa assistencia, na qual
predomina o sexo gentil, com lindas “toilletes” multicores, realizou-se
domingo ultimo, no magnífico campo do Engenho de Dentro, o
esperado encontro do returno do campeonato da L. S. F., entre esses
valorosos e sympathicos clubs.
[…]
O Engenho de Dentro, seu valoroso e leal adversario, porque tem em
seus conjuntos elementos de real valor e que sabem com intelligencia
e calma aproveitar as falhas dos adversarios. O seu triangulo, formado
por Nelson, Goulart e Gonçalo é magnífico, não póde haver melhor na
Liga Suburbana, que por si só constitue uma barreira intransponível. O
trio é bom e a linha dianteira é ligeira e conta com optimos
jogadores.71

O jornal O Paiz nos traz detalhes significativos, neste trecho, do que podemos
chamar crônica esportiva. Primeiro, a questão do público presente, afirmando que o
público do jogo era bastante numeroso. Ou seja, em partidas do subúrbio, havia tal
como na Liga Metropolitana, pessoas interessadas em ver uma partida de futebol. Ao
passo que este atraía bastantes pessoas, há de ser ter em mente a qualidade dos
jogadores, logo, do espetáculo em si.

A questão da qualidade do espetáculo e dos atletas envolvidos, principalmente


na equipe do Engenho de Dentro, é realçada: “tem em seus conjuntos elementos de real
valor”. Com devido destaque ao trio defensivo, “Nelson, Goulart e Gonçalo”, deve-se
notar que neste primeiro momento Nelson aparece nas crônicas esportivas com o seu
primeiro nome, sem destaque para qualquer alcunha. Outra característica é a presença

70
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 54.
71
O Paiz, 02 de janeiro de 1919, p. 6.

25
marcante de mulheres no estádio, expressando que o futebol não era somente um
espetáculo voltado exclusivamente para o público masculino, mas que contemplava nas
sua arquibancadas um clima “democrático” que não se poderia enxergar naquelas
sociedade do lado de fora do estádio.

Infere-se, com a leitura das fontes, que as partidas do subúrbio possuíam grande
destaque no cenário esportivo carioca, a ponto de serem notícia nos grandes jornais de
circulação. As ligas do subúrbio apresentavam vários jogadores com qualidade técnica
muitas vezes maior do que os que atuavam na Liga Metropolitana, mesmo que as
equipes do subúrbio não pudessem competir em questão econômica.

O campeonato de 1918 não havia terminado, mas a forte equipe do Engenho de


Dentro tentou em vão ingressar na terceira divisão da Liga Metropolitana, pouco para
uma equipe que poderia bater de frente com os times da primeira divisão.

O ENGENHO DE DENTRO VAE FILIAR-SE À LIGA


METROPOLITANA
O respeitado campeão Engenho de Dentro, pertencente à Liga
Suburbana, vae pedir a sua filiação à 3ª Divisão da Liga
Metropolitana.
Esse club de Eugenio Pacopahyba possui jogadores afamados, como
sejam: Sebastião Pinheiro (Villa), que pertenceu ao São Christovão e
ao America, incontestavelmente um center-half extraordinario;
Mascate, um full-back de destaque (é o Chico Netto da Liga
Suburbana); Esquerdinha, um meia-esquerda temível, mais temível
que o próprio Néco, de São Paulo. Os demais elementos são tambem
excellentes.
O Engenho de Dentro, se entrar para a Metropolitana, só encontrará
sopas...mas só na divisão do Alfredo Abreu e do Luiz Meirelles!72

As expectativas eram grandes na medida em que o campeonato de 1918 chegava


ao fim, no início de 1919. A Equipe do Engenho de Dentro liderava o campeonato em
meados de janeiro, contudo ainda não era dado como certo a conquista do
tricampeonato:

LIGA SUBURBANA DE FOOTBALL


1ª DIVISÃO
Modesto x Dois de Junho
Confiança x Mavilles
Rio S. Paulo x Dramatico
Engenho de Dentro x Cascadura
[…]

72
O Imparcial, 22 de janeiro de 1919, p. 6.

26
CONFIANÇA A.C. X MAVILLES F.C.
Será, por certo, uma pugna renhida a que se vai verificar amanhã, no
campo da rua Silva Telles, no Andarahy, entre as bem trenadas
representações daquellas aggremiações filiadas á Liga Suburbana.
A posição de destaque da primeira na tabela do campeonato, dará
ensejo a que ambas procurem, na medida de seus recursos, sobrepujar
a contendora, sendo que, victoriosa, a do Confiança, se collocará
ainda em condições de conquistar o actual campeonato, porquanto, o
“leader” da tabela, o Engenho de Dentro, tem que medir forças em
dois matchs, que lhe faltam, com o Cascadura e o Dois de Junho.
Derrotado o Engenho de Dentro por um desses adversarios, ainda
obterá o Confiança a vantagem do empate, que, se se verificar,
permitirá um bellíssimo e sensacional encontro entre esses destemidos
clubs, para decisão da victoria.
Será, portanto, bem esperançado que o Confiança se apresentará á
lucta com o Mavilles, amanhã. […]73

O Engenho de dentro não permitiu ser alcançado por ninguém, manteve-se à


frente da tabela e pode comemorar a conquista do campeonato do ano anterior, o
terceiro consecutivo. A divulgação da conquista foi bastante tímida se comparado às
conquistas dos grandes clubes pela principal liga carioca. Embora dessem significativo
destaque aos campeonatos do subúrbio, o destaque era maior para os jogos da Liga
Metropolitana. Sabe-se, no entanto, que o Engenho de Dentro realizou uma grande
homenagem em comemoração à conquista do tricampeonato do subúrbio.

A FESTA SPORTIVA DE HOJE DO ENGENHO DE DENTRO A.C.


Solemnizando a conquista do título de campeão de 1918, da Liga
Suburbana de Foot-ball, o veterano e sympathico Engenho de Dentro
A.C. Promove hoje em seu vasto campo de sports, uma linda desta
sportiva, que certamente alcançará o exito esperado [...]74

O futebol já havia dominado o subúrbio, e este por sua vez, por intermédio de
seus jogadores, cada vez mais avançava sobre a principal liga carioca de futebol.

A SUBURBANA É NO FUTURO CAMPEONATO O CELLEIRO


DA METROPOLITANA
Para os sportmen que entendem que a entidade Suburbana não
preenche os fins progressivos do desenvolvimento sportivo da nossa
terra, como de quando em vez se propala nas rodas desportivas,
levamos ao conhecimento daquelles que de facto se interessam pelo
progresso do football, o escandaloso cado de suborno, de vantajosas
promessas de bons empregos, de gordas gorjetas que estão sendo
postas em prática aos jogadores da Suburbana para se filiarem aos
diversos clubes das três divisões da Metro. Já sobre a número superior
de 20 players que se transferiram com malas e bagagem para a
entidade da Rua Buenos Aires.

73
O Paiz, 18 de janeiro de 1919, p. 6.
74
O Paiz, 23 de fevereiro de 1919, p. 8.

27
E depois digam que a Suburbana não é o celeiro da Metropolitana.75

Nelson, como um jogador do subúrbio e com o reconhecido talento precisava apenas de


uma chance para demonstrar a qualidade do seu futebol nos gramados da primeira
divisão. Era questão de tempo, com a necessidade natural da procura por novos
jogadores, cada vez melhores, capazes de promoverem espetáculos que mais e mais
atraíssem a atenção das pessoas, logo mais lucro.

Um clube da segunda divisão da LMDT começou em 1919 a dar sinais que


estava disposto a ter os melhores jogadores possíveis, independentemente de liga ou
qualquer outro fator externo à técnica. Era a oportunidade de um jogador de excelente
técnica, como o goleiro Nelson da Conceição, adentrar novamente na principal liga da
cidade. Desta vez, com chances reais de futuras conquistas.

75
O Imparcial, 22 de março de 1919, p.9.

28
1.2 Vasco: O Clube da colônia portuguesa e Nelson

O Vasco estava assim constituido:


Nelson – Lamego e Cruz – Ferramenta, Palhares e Quintanilha –
Pederneiras, Walter, Aristides, Faria e Paulistinha76

Em 23 de março de 1919 realizou-se pela primeira vez o Torneio Initium


(Início)77 da 2ª Divisão da LMDT. O evento foi organizado pelo Palmeiras Athetico
Club (1911), em comemoração ao seu 8º aniversário de fundação, e patrocinado pela
Associação dos Chronistas Desportivos. As partidas foram realizadas no campo do
Botafogo F.C. (General Severiano). O Torneio Início servia com uma espécie de
apresentação dos times para o campeonato principal.

A competição foi vencida pelo aniversariante. Na final, o Palmeiras levou a


melhor sobre a equipe do Progresso, por 2 a 0. O jogo não agradou.

PROVA FINAL
PALMEIRAS X PROGRESSO
A lucta decisiva do torneio não foi das melhores.78

É possível que o jogo não tenha agradado porque o melhor embate do torneio havia
ocorrido na semifinal, entre o Vasco e o Palmeiras.

VASCO X PALMEIRAS
Dada a magnifica constituição dos quadros destes clubs, esta partida, a
ultima semi-final, foi, como se esperava, superior ao jogo Progresso x
Mackenzie.
Desde o inicio da pugna, a lucta é terrivel e sensacional; os players
empregam todos os seus esforços para conseguir o goal de Victoria.79

A equipe do Vasco foi derrotada no final por um escanteio cedido ao Palmeiras80.

A surpresa da competição foi o terceiro lugar do Vasco, recheado de jogadores


do subúrbio, recebendo inclusive a alcunha de “scratch da Liga Suburbana”. O Vasco
apresentava pela primeira vez o goleiro Nelson como defensor do seu gol. O goleiro
permaneceu no Vasco e no Engenho de Dentro simultaneamente, ficando

76
O Imparcial, 24 de março de 1919, p. 9.
77
Torneio criado em 1916 pelos cronistas esportivos como forma de disseminar o futebol. Todos os jogos
eram realizados num único da e local, cada partida durava 20 minutos e além do critério do gol pró, havia
o número de escanteios a favor e menor número de faltas.
78
O Paiz, 24 de março de 1919, p. 7.
79
Idem.
80
O escanteio valia como critério de eliminação em caso de empate.

29
exclusivamente no primeiro apenas no segundo semestre, quando estreou numa partida
contra o S.C. Rio de Janeiro pelo campeonato da segunda divisão.

Isto era possível, embora não “caísse bem”, porque o Vasco era membro da
LMDT, enquanto o Engenho de Dentro da Liga Suburbana. Assim, a chamada Lei do
Estágio, ou seja, a obrigatoriedade do jogador de ficar um ano sem atuar quando trocava
de clube, com o objetivo de enfraquecer o interesse por troca de jogadores entre os
clubes, não se aplicava: “A vantagem de se trazer um jogador suburbano, era que ele
não pertencia a nenhum clube filiado à LMDT e, portanto, não havia que esperar o
período de um ano sem jogar, imposto pela famosa ‘Lei do Estágio’”81

Através desta política de inserção de jogadores do subúrbio, o Vasco dava um


salto de qualidade no seu departamento de futebol. Não importava as regras formais e
informais que atravancavam a popularização e democratização do futebol dentro das
“quatro linhas”. Os vascaínos buscavam tornar o time uma potência, saindo de vez das
divisões inferiores e brigar futuramente pelo título de campeão da cidade.

O Vasco foi buscar os jogadores onde o custo/benefício era extremamente


vantajoso. Além de Nelson, do Engenho de Dentro vieram Alberto Quintanilha, capitão
do tricampeão suburbano, Aquiles Pederneiras e Aristides Baptista (Esquerdinha).
Outros dois jogadores, o defensor Lamego e o atacante Leão vieram do Mavilles, clube
ligado à fábrica do mesmo nome. 82 O Vasco começava a formar a base da equipe que
em 1923 revolucionaria o futebol carioca. Para esclarecermos a relação do goleiro
Nelson e o Vasco, faz-se necessário compreender um pouco melhor a respeito da
história do Club de Regatas Vasco da Gama e como se desenvolveu o futebol vascaíno.

O Club de Regatas Vasco da Gama foi fundado em 21 de agosto de 1898. Por


intermédio de uma reunião solene na sede da Sociedade Dramática Particular Filhos de
Talma, no bairro da Saúde, atual bairro da Gamboa, região central do Rio de Janeiro,
concretizou-se a sua criação. O clube, destinado à prática do remo, era mais uma
instituição que surgira como influência da numerosa colônia portuguesa erradicada na
capital da república.

81
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 209.
82
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 209.

30
Historicamente a migração portuguesa é marcante no Brasil. Desde o período
colonial, imperial e adentrando a república. No final do século XIX e inicio do século
XX o aumento do fluxo imigratório caracterizava o Rio de Janeiro como maior polo
aglutinador de colonos portugueses. Para se ter uma ideia, em 1920 a população da
cidade girava em torno de 1.157.873 habitantes, destes 172.338 eram portugueses. O
quadro a seguir demonstra, do ponto de vista da nacionalidade, a presença massiva dos
portugueses:

População da cidade do Rio de Janeiro pela nacionalidade83


1906 1920
Estrangeiros Portugueses Brasileiros Estrangeiros Portugueses Total
210.515 133.393 917.481 239.129 172.338 1.157.873

Dentre várias análises possíveis, destacamos que os portugueses, em 1920,


representavam 72% dos estrangeiros e 15% da população geral da cidade, em números
arredondados. Os números reforçam o que se via à época nas indústrias, nos comércios
e também no esporte, a presença e influência da colônia portuguesa na cidade do Rio de
Janeiro em suas mais diversas atividades. Podemos citar alguns exemplos: na indústria e
no comércio, a Câmara Portuguesa de Comércio e Indústria do Rio de Janeiro (1911);
na cultura, o Liceu Literário Português (1868) e o Real Gabinete Português de Leitura
(1837); no assistencialismo a Beneficência Portuguesa (1840); nos meios de
comunicação o próprio jornal O Paiz (1884), fundado pelo imigrante português João
José dos Reis Júnior, mais um dos milhares de comerciantes da colônia.

Neste sentido, o Vasco surgia como mais um reduto da enorme colônia


portuguesa erradicada na cidade do Rio de Janeiro. Marcadamente, voltado à prática
desportiva, inicialmente com o remo, e depois outras modalidades, como o tiro, a
ginástica, polo-aquático etc. Também fazia parte do clube as reuniões administrativas e
atividades de lazer entre os sócios da entidade.

Os primeiros anos foram de grandes dificuldades, não somente no campo


esportivos mas também no campo político e administrativo, que resultaram em algumas
cisões internas, a primeira delas com o seu primeiro presidente.

83
Recenseamento do Brasil realizado em 1º de setembro de 1920. Rio de Janeiro: Typographia da
Estatística, 1922, pp.50-61.

31
Os jovens membros da colônia portuguesa no Rio de Janeiro
convidaram Francisco Gonçalves do Couto Júnior, um rico
comerciante do bairro da Saúde, para financiar a grande empreitada.
Dois meses mais tarde, já com 250 sócios, ocorreriam alguns
desentendimentos relacionados à mudança de sede para reuniões
sociais do clube. Passaram-se, tralha doméstica e alguns sócios, para a
sede do Clube Dansante (sic) e Recreativo Estudantina Arcas
Comercial [...] Francisco Gonçalves do Couto Jr. Discordava da
aliança proposta pelos jovens mais agitados. [...] Optou por se retirar
do Club de Regatas Vasco da Gama e fundou o Clube de Regatas
Guanabara, levando consigo grande número de sócios que o
apoiavam.84

Enfrentado este e outros desafios, internos e externos, como as reformas


urbanas, o Vasco buscava se firmar no cenário esportivo. Em 1904 elegeu o primeiro
presidente negro de um clube carioca, o sócio Cândido José de Araújo, reeleito em
1905.

Com um bicampeonato de remo em 1905/06, o clube se consolidava como


grande expoente do esporte náutico, condição reafirmada com o tricampeonato de
1912/13/14. Neste período, o remo e outros esportes já perdera grande espaço para o
futebol. O prestígio do nobre esporte náutico nunca mais seria como de outrora: “Em
verdade, os campeonatos de remo atingiram seu máximo esplendor à época de Pereira
Passos [...]”85

O esporte bretão crescia a passos largos. A vinda em 1913 de uma equipe


portuguesa, reunindo um selecionado dos melhores players patrícios atiçou o desejo da
comunidade portuguesa do Rio de Janeiro em participar do futebol.

A partir dessa excursão, a colônia portuguesa se agitou. Os jogos dos


portugueses no Rio haviam levado milhares de membros da colônia
aos estádios. Logo foram surgindo mais clubes portugueses,
destinados à prática do futebol: o Lusitânia Esporte Clube, o Centro
português de Desportos, o Lusitano Futebol Clube.86

O futebol já era uma realidade para muitos clubes na segunda metade da década
de 10, inclusive para clubes surgidos inicialmente para o remo. O CR Boqueirão do
Passeio (1897) e o CR Icaraí (1895) já participavam do futebol, tal como o CR do
Flamengo que fundou o seu em 1912 e se sagrou bicampeão em 1914/15.

84
MALHANO, Clara; MALHANO, Hamilton, 2002. Op. cit., pp.35-36.
85
Idem, p. 46.
86
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 135.

32
A criação de um departamento de futebol no Vasco viria a se tornar realidade em
1915, sob a presidência de Raul da Silva Campos, após uma tentativa frustrada na
presidência de Marcílio Telles (1911). Raul Campos era um comerciante, tal como
muitos membros da colônia portuguesa, e um dos principais sócios destinados a fazerem
do Vasco um grande no futebol.

Raul Campos estava decidido a fazer no Vasco um time de futebol


capaz de rivalizar com os grandes do Rio e do Brasil, quem sabe do
mundo. E por isso, desde o início, parece que o clube não fez muita
questão de ter jogadores identificados com os players dos grandes
clubes cariocas. Cedo, o presidente percebeu que havia um batalhão
de excelentes jogadores nos subúrbios da cidade. Eram homens das
camadas menos abastadas, trabalhadores flutuantes numa cidade
marcada pelos baixos salários, pelo desemprego e pelo surgimento de
inúmeras oportunidades de trabalho fora do mercado tradicional e
formal da cidade.87

Neste sentido, o Vasco ingressava no futebol com a perspectiva de montar um grande


time. Para isto, não se privaria em utilizar quaisquer jogadores, independentemente de
classe social ou cor de pele.

O Vasco montou sua equipe de futebol com a vinda de sócios-jogadores do


Lusitânia Sporte Club (1913). No ano seguinte, o clube, sob a nova presidência de
Marcílio Telles e tendo como vice-presente Raul Campos, ingressou na 3ª Divisão da
LMSA.

[…] o Vasco não teve seu lugar garantido na 1ª Divisão da Liga


Metropolitana. O clube dos portugueses, poderoso campeão de regatas
da cidade, foi relegado para a última divisão, a 3ª, a mais baixa divisão
do futebol da LMSA. A Liga criou a 2ª Divisão para abrigar os times
mais pobres da cidade e conseguir conter os grandes clubes separados
dos clubes de negros e brancos pobres. Na 3ª Divisão, a situação era
ainda pior.88

Em 03 de maio de 1916 realizou a sua primeira partida oficial. A estreia não


entusiasmou. Uma sonora goleada de 10 a 1 para o Paladino F.C., no campo do
Botafogo F.C., na rua General Severiano. O primeiro e único gol vascaíno foi marcado
por Adão Antônio Brandão, um dos jogadores vindos do Lusitânia.

87
Idem, pp. 135-136.
88
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 138.

33
Os vascaínos não desistiram. Iniciar um novo esporte não é fácil, o clube já
havia passado por isso no remo e conseguiu se tornar uma grande expoente no esporte
náutico. Com as reformas dos estatutos da LMSA em 1917, o Vasco subiu de forma
compulsória à 2ª Divisão, permanecendo nesta até 1922, quando ascendeu à 1ª Divisão
da LMDT.

Contudo, é a partir de 1919 que o Vasco começa a construir uma base forte para
brigar pela ascensão rumo à divisão de elite do futebol carioca.

O ano de 1919 trouxe uma das maiores transformações na história do


futebol brasileiro [...] principalmente porque o time da colônia
portuguesa percebeu qual era a fórmula para o sucesso de uma equipe.
E a partir desse ano, vai brincar de futebol mais a sério.89

Neste contexto, Nelson e o Vasco se encontram. O clube dos portugueses foi atrás de
novos “atores”, na intenção de promover melhores espetáculos. Os vascaínos trazem o
goleiro Nelson do Engenho de Dentro e outros jogadores viriam de clubes do subúrbio
carioca, negros e brancos pobres, a integrar a equipe de futebol que se sagraria campeã
em 1923.

Cabe deixarmos claro que, a relação do jogador Nelson com o seu clube, o
Vasco, se caracterizou, ao nosso modo de ver, como uma relação profissional. Nelson
foi reconhecido pelo seu talento e sua técnica, não por uma questão de simpatia, raça,
cor ou qualquer sentimento cabível numa esfera social de amizade. A relação
estabelecida entre clube e atleta foi profissional.

89
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 168.

34
1.3 O Chauffeur

Vasco da Gama:
Chauffeur – Lamego e Cruz – Palhares, Faria e Quintanilha –
Pederneiras, Leão, Godoy, Esquerdinha e Antonico.90

O jovem Nelson da Conceição estreou no futebol do Club de Regatas Vasco da


Gama com 19 anos, pelo Torneio Início de 1919. Sua estreia oficial se daria meses
depois, aos 20 anos, no dia 07 de setembro, na vitória do Vasco por 2 a 0 sobre o Sport
Club Rio de Janeiro. A partida era válida pelo returno do campeonato da 2ª Divisão da
LMDT.

Antes do início oficial pelo clube vascaíno, em partidas organizadas pela LMDT,
Nelson esteve presente também em partidas amistosas.

A FESTA DE HONTEM, PROMOVIDA PELO S.C. RIO DE


JANEIRO
[...]
O segundo embate foi entre os valorosos Vasco da Gama x
Americano, este campeão da 2ª Divisão.
Os teams entraram e campo assim preparados:
Americano:
Vadinho – Laudelino e Renato – Priot, Baba e Gonçalo – Waldemar,
Lopez, Jaburú, Boboco e Othon.
Vasco da Gama:
Chauffeur – Lamego e Cruz – Palhares, Faria e Quintanilha –
Pederneiras, Leão, Godoy, Esquerdinha e Antonico.
A opinião, quase geral, era de que o club da Cruz de Malta fosse o
vencedor.
É que seu quadro principal possui effectivamente, vários elementos de
valor.
A victoria, porém, coube ao Americano, que se houve com galhardia e
demonstrou estar muito treinado.
O score foi de 4 a 1.
O Vasco o que necessita é de ensaios, em conjunto, pois com os
elementos que possue, ficará sendo uma semelhança de submarino...
O adversário terá que ficar sempre de sobre-aviso.
Os pontos do valoroso club do Riachuelo foram conquistados: um por
Waldemar, um por Jaburú, um por Boboco e outro por Baba.91

Esta foi a primeira vez que Nelson, atuando pelo Vasco, uma equipe da LMDT, é
chamado pela alcunha de Chauffeur num grande jornal do Rio de janeiro. Mesmo com a

90
O Imparcial, 04 de maio de 1919, p. 8.
91
Idem.

35
derrota, o jornal faz menção à qualidade técnica da equipe do Vasco, fazendo a ressalva
da necessidade de entrosamento.
A derrota passou a margem do que significou a partida e a referência do jornal à
atividade de trabalho do recém chegado goleiro vascaíno. O Vasco, ao retirar a base do
tricampeão suburbano Engenho de Dentro e agregá-la ao seu departamento de futebol
chamou a atenção do público que acompanhava o futebol, e a própria imprensa.
Em 23 de março, pelo Torneio Início, o Vasco foi apresentado como “scratch da
Liga Suburbana” pelo O Imparcial, enquanto Nelson é escalado normalmente. No dia
20 de abril, O Vasco disputou um amistoso contra o Palmeiras, outra equipe da 2ª
Divisão da LMDT. O jornal O Paiz indicou que o Vasco jogou sem o seu goleiro titular,
ao que tudo indica se refere a Nelson92.
O segundo match de foot-ball foi disputado entre os teams principaes
do Palmeiras A.C. e o C.R. Vasco da Gama [...]
O quadro palmeirense apresentou-se desfalcado de tres optimos
elementos, o mesmo acontecendo com o Vasco, que entrou sem o
arqueiro, extreando, no entanto Leão, antigo player do Bangú e
Andarahy93

As equipes empataram em 1 a 1. Em 27 de abril voltaram a se enfrentar, com vitória


vascaína por 2 a 1. No entanto, os jornais não forneceram a escalação. O jogo seguinte
do Vasco seria a derrota para o Americano, em que Nelson era citado pela alcunha de
Chauffeur.
O termo chauffeur se referia à época aos condutores particulares de automóveis.
Atualmente utilizamos o termo taxista. Servia também para designar a função de chofer,
semelhante aos dias atuais. Os chauffeurs, de um modo geral, não possuíam grande
prestígio na sociedade carioca. Esta função era marcada por ser designada a indivíduos
de baixa escolaridade, o que se somava ao baixo poder aquisitivo e a predominância de
pessoas negras. Os jornais da época diariamente colocavam alguma notícia com teor
crítico, menções a atropelamentos e por vezes comentários preconceituosos contra esta,
podemos classificar, classe.
O autos continuam atropelando
Hontem á tarde, quando passava na rua 1º de Março esquina de
Buenos Aires, o auto n.930, conduzido pelo “chauffeur” Luiz
Falhaber, atropelou o empregado da Light, José Rodrigues da Silva,
residente á estrada Portella n.332, ferindo-o nas costas, braços e perna.

92
Veremos que Nelson chega ao Vasco para ser goleiro do chamado primeiro quadro, nunca atuando
pelos quadros inferiores do Vasco.
93
O Paiz, 21 de abril de 1919, p. 8.

36
A victima foi medicada pela Assistencia e o “chauffeur” foi preso e
autuado pela polícia do 1º districto.94

Os indivíduos de classe social menos abastada desempenhavam atividades


caracterizadas por serem braçais e com baixo uso da intelectualidade. Dentre outros,
podemos citar também: os operários das fábricas, mecânicos, pescadores, etc. No
futebol amador carioca, teoricamente, o jogador deveria exercer uma função externa ao
futebol, não sendo o esporte o seu meio de sustento. Todavia, os indivíduos que
desempenhavam certas atividades sofriam preconceito pela classe dirigente da Liga.
A partir de 1917, a LMDT aprovou estatutos que dificultavam a inserção de
certos tipos de jogadores nas divisões da entidade. A entrada de jogadores negros e
brancos pobres era muito difícil na 1ª Divisão e mais ainda nos chamados grandes
clubes, os já citados América, Botafogo, Flamengo e Fluminense. Estes clubes
possuíam estatutos próprios que visavam delimitar claramente quem poderia ou não ser
associado, marcadamente voltados a indivíduos da elite.
Em 1916, uma tentativa frustrada da Liga de impor a chamada Lei do
Amadorismo representou esta posição preconceituosa. Nesta, algumas profissões eram
citadas e caso a pessoa a desempenhasse não estaria apta a jogar futebol. Dentre estas
profissões, estava a de condutor de veículos, ou seja, chauffeur. A lei não foi aprovada.
Os estatutos da LMDT aprovados em 1917 deixaram brechas, não especificou-se as
profissões que não eram aceitas. Apenas dizia que não poderiam ser registrados: “Os
que tirem os seus meios de subsistência de qualquer profissão braçal, considerada como
taes as que dependam exclusivamente de esfforços physicos”.95
Neste contesto, uma das profissões que dependeriam exclusivamente de esforços
físicos na lógica da época era o chauffeur. Uma profissão destinada a indivíduos de
baixa capacidade intelectual, logo, com pouco estudo, marcadamente destinada a
indivíduos de classe social baixa. Esta classe da sociedade era marcadamente formada
por indivíduos negros. Dentre eles, Nelson da Conceição.
Percebemos, com as fontes estudadas, que enquanto Nelson atuava pelo
Paladino ou até mesmo pelo Engenho de Dentro, os jornais de grande público, dentre
eles as nossas principais fontes O Imparcial e O Paiz, se referiam a Nelson pelo
primeiro nome. Contudo, a partir de 1919, com a ascensão de Nelson para um clube

94
O Imparcial, 25 de julho de 1919, p. 4.
95
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 150.

37
emergente da 2ª Divisão da LMDT, os periódicos começaram a dar as escalações do
Vasco com o termo Chauffeur no lugar do nome Nelson. Indicando, implicitamente, que
o referido jogador não dispunha das condições necessárias para desempenhar o futebol
na LMDT.
A informação mais explicativa que dispomos da origem da alcunha de Chauffeur
pelo goleiro Nelson da Conceição parte de um periódico do Club de Regatas Vasco da
Gama, que faz menção ao goleiro décadas após a sua morte, no ano de 1970: “Nelson da
Conceição, o goleiro, era um mulato forte, motorista de praça no Engenho de Dentro” 96
Com esta informação podemos supor que ao se transferir do Paladino para o Engenho
de Dentro, a Nelson ficou garantido um posto de chauffeur, como forma de atrair o
goleiro para a equipe suburbana. Este tipo de prática já era comum no futebol, ou seja,
atrair jogadores com oferta de emprego, como já citamos anteriormente.
Dificilmente encontraríamos um discurso explicitamente racista em jornais de
grande circulação. Contudo, a partir de uma análise baseada no modo de pensar de
grande parte da sociedade brasileira à época, especialmente as elites, percebemos que
por detrais do discurso da defesa do amadorismo e contra certos tipos de profissões,
estava à tentativa de privar indivíduos negros e brancos pobres da ascensão no esporte.
Sobre esta questão do modo de pensar da sociedade e principalmente das elites,
trabalharemos melhor no próximo capítulo deste trabalho.
Neste sentido, acreditamos que o racismo existia, mesmo que marcado pelo
preconceito com certos tipos de atividades da sociedade. Como já dissemos, os negros
possuíam grande dificuldade de se inserirem na sociedade republicana, a despeito de
uma elite negra e letrada que existia à época. Além disso, disputavam lugar com os
brancos pobres e imigrantes.
Logo, não é preciso constar a raça ou cor de pele diretamente como elemento
impeditivo. As exigências estabelecidas pela Liga e pelos clubes de elite excluíam
principalmente os indivíduos negros, ao passo que se exigia nos clubes altas taxas para
se tornar sócios, as chamadas joias e também altas mensalidades. Enquanto na Liga,
embora frustrada a tentativa de definir as atividades de jogadores que não seriam
permitidas, a proibição de jogadores analfabetos era uma forma de impedir que tanto
jogadores negros e brancos pobres pudessem atuar, afetando principalmente os negros.

96
Revista do Vasco: No Ano do Tri, nº2, p.62.

38
A ascensão cada vez maior dos jogadores negros dava mais e mais força aos
clubes de menor expressão, o que poderia desencadear o reequilíbrio de forças dentro da
Liga, na visão dos clubes de elite. Assim, com a posição radical contra determinadas
profissões, os clubes de elite procuravam atingir marcadamente indivíduos mais
humildes, na sua maioria negros e mulatos, mas também muitos brancos pobres.
Tratando especificamente de jogadores negros, esta postura privativa, se caracteriza de
forma mais cruel.
Uma medida utilizada pela Liga e os clubes de elite para evitar a ascensão
técnica e política dos clubes menos abastados no futebol foi a já referida Lei de Estágio.
Era evidente que não se queria um clube de menor expressão, tal como o Vasco o era no
futebol, adquirindo jogadores do subúrbio, mais baratos, que pudessem qualificar a sua
equipe, dando-lhe popularidade, logo maiores rendas com as partidas.

Em 1919, ano de grande popularização do futebol no Brasil por conta


da primeira grande conquista da Seleção Brasileira, o Sul-Americano
de 1919, foi criada pela LMDT uma nova lei, a Lei do Estágio. Por
essa nova determinação, jogadores que quisessem se transferir de um
clube para outro, teriam que jogar um ano nos segundos times do
clube. Visava inibir a troca desenfreada de jogadores que os clubes
operavam, trazendo jogadores das equipes mais modestas das divisões
inferiores da LMDT. Podemos perceber que a própria elaboração da
lei tinha como objetivo coibir uma prática comum entre os clubes e os
jogadores. O curioso é que os próprios clubes criadores das barreiras
ao acesso desses jogadores tinham jogadores nessas condições em
seus clubes. Uma minoria, é verdade, mas haviam. Sempre um
jogador negro, mulato, pobre, aparecia em meio aos scratches dos
principais times cariocas. O que se tentava com a lei do estágio é que
essa prática se disseminasse entre os clubes de menor expressão
dando-lhes a possibilidade de ameaçar o poderio da elite carioca no
futebol. Os clubes passaram, então, a direcionar seus olhos com mais
atenção ainda aos campos do subúrbio carioca.97

Desta forma, se não podemos afirmar categoricamente que a postura dos clubes
da elite e da LMDT era racista, ao passo que suas ações também atingia uma parcela de
indivíduos brancos pobres, podemos afirmar que a seleção de determinadas profissões
ou a classificação proibitiva de atividades ditas braçais, não por acaso, visava impedir

97
SANTOS, João Manuel Casquinha Malaia. O futebol na cidade do Rio de Janeiro: microcosmo dos
mecanismos de poder e exclusão no processo de urbanização das cidades brasileiras (1901-1933), p. 8.
XIX Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão. ANPUH/SP – USP. São Paulo, 08 a
12 de setembro de 2008. Disponível em:
<http://www.anpuhsp.org.br/sp/downloads/CD%20XIX/PDF/Autores%20e%20Artigos/Joao%20Manuel
%20C.%20Malaia.pdf>. Acessado em: 23 mai. 2013.

39
ou pelo menos dificultar que jogadores de futebol negros ou brancos pobres
conseguissem ascender até um clube da elite, ou que, algum clube pudesse fazer frente a
estes com jogadores de classe social inferior. Logo, o racismo não era explícito,
contudo, entrava disfarçado.
Assim, entendemos que o objetivo dos jornais de grande circulação, como O
Imparcial e O Paiz, na eminência da transferência de vários jogadores do clube mais
forte do subúrbio, o Engenho de Dentro, recheado de negros e brancos pobres, que
pouco ou nada sabiam ler, para um clube emergente da LMDT, o Vasco, era se
posicionar de forma contrária à transferência dos jogadores. Neste sentido, colocar a
alcunha de chauffeur como nome de Nelson era uma postura denunciativa. Acreditamos
também que a citação de chauffeur nas escalações e crônicas esportivas ao se referir ao
goleiro Nelson da Conceição, a partir de 1919 jogador do Vasco, era uma posição
marcadamente preconceituosa de parte dos meios de comunicação da época.
De um modo geral, os dois periódicos citados, davam maior destaque aos quatro
grandes clubes da elite. Notadamente, porque possuíam maior número de sócios e
torcedores. Com a evolução do departamento de futebol do Club de Regatas Vasco da
Gama, principalmente após a conquista do campeonato de 1923, o clube começou a
disputar espaço com os grandes clubes também nas seções esportivas. O jornal O Paiz
adotava uma linha mais indiferente ao tratar do Vasco ou de seus jogadores, não
mantinha uma linha de defesa. Por outro lado, o jornal O Imparcial se destacava pela
postura mais crítica à popularização da classe dos jogadores de futebol, questionando de
forma mais contundente as ações do clube e de seus jogadores. Outro exemplo de que a
“transação” entre Vasco e o Engenho de Dentro havia incomodado, encontramos na
coluna “DIZ-E POR AHI”, do jornal O Imparcial.
DIZ-E POR AHI...
[...] que por proposta do nosso amigo Francisco Marques da Silva, o
combinado Vasco da Gama x Engenho de Dentro vae disputar um
campeonato internacional na China. [...]
DR. MANOEL JOÃO98

A nota do jornal refere-se ao Vasco como um combinado Vasco-Engenho de Dentro e


de forma implícita indica que o presidente do clube, Francisco Marques da Silva, havia
feito um bom “negócio” ao adquirir os jogadores suburbanos, ao sugerir que o Vasco irá
jogar na China.

98
O Imparcial, 29 de maio de 1919, p. 9.

40
O ditado popular “fazer um negócio da China”, ou seja, uma excelente
negociação, já era comum no período, como observamos nos exemplos abaixo. Com
notícias referentes a outros assuntos.
Producção de seda.
[...]
Estes algorismos falam eloquentemente desta industria chineza, que
póde ser um negocio da China para todo o mundo, menos para o
Estado, que custeia por esse preço [...]99

Neste sentido, ao fazer alusão à China, o jornal dava inícios de que o Vasco fez um
“bom negócio”.
Entre os jogos amistosos do início do ano em que as equipes mostravam seus
novos jogadores, como o Vasco o fez, até o começo do campeonato da LMDT ocorreu
um fato marcante para o futebol brasileiro, o Campeonato Sul-Americano, inédito em
campos brasileiros. Era uma grande oportunidade que o pais tinha para conquistar um
título de grande prestígio frente aos seus principais rivais, argentinos e uruguaios. O
campeonato foi realizado de 11 a 29 de maio.
O Brasil conseguiu a conquista do campeonato, vencendo o Uruguai na final, 1 a
0. O demorado e esperado gol foi marcado na prorrogação pelo craque mulato
Friedenreich. A sonhada conquista foi realizada no recém inaugurado “Stadium”, como
era publicado em alguns periódicos o Estádio das Laranjeiras, construído especialmente
para a disputa campeonato. Arnaldo Guinle, presidente do Fluminense (1916-1931) e da
Confederação Brasileira de Desportos (1916-1920), articulou a construção da grande
arena para seu clube. Os jogos levaram multidões ao “Stadium”. Nunca se tinha
presenciado nada parecido no futebol brasileiro.
O campeonato foi uma verdadeira festa, e a competição de futebol
superou todas as expectativas. Os registros de público do Campeonato
Sul-Americano são muito superiores aos dezoito mil da capacidade do
estádio. No próprio livro oficial da Confederação Brasileira de Futebol
(CBF, órgão que sucedeu a CBD) constam públicos superiores a vinte
mil espectadores em todos os jogos. Teriam sido 20 mil pagantes na
estréia vitoriosa por 6 a 0 contra o Chile, 21 mil na vitória por 3 a 1
contra a Argentina, 23 mil na primeira final contra os Uruguaios e 28
mil no segundo jogo contra os mesmos uruguaios. Segundo os
periódicos da época, os jogos tinham mais de 30 mil pagantes.100

99
O Paiz, 08 de maio de 1919, p. 5.
100
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 182.

41
O futebol como instrumento político, articulando o amor do público por aquele
esporte, se tornava pela primeira vez um objeto de construção de nacionalidade
inventada. Era uma vitória da nação101 brasileira através do futebol.

FOOTBALL
SALVE FOOTBALLERS BRASILEIROS!
Depois de uma peleja emocionante, os nossos patricios lograram,
hontem, para o nosso paiz a supremacia do football no continente Sul-
Americano102

Terminada a grande festa esportiva e cívica promovida pelo selecionado nacional, o


campeonato da cidade se iniciaria, em junho. O campeonato transcorreria com grandes
tribulações, devido a gripe espanhola que assolava o Brasil naquele período, terminado
apenas no ano seguinte, com a morte de vários jogadores.

A estreia oficial de Nelson foi relatada de forma distinta entre o jornal O Paiz e
O Imparcial. O Paiz já trazia no dia do jogo uma nota falando da estreia do goleiro
Nelson: “No team do Vasco da Gama estréará hoje um novo arqueiro – Estreará hoje no
team do Vasco o keeper Nelson, antigo defensor do Engenho de Dentro”. 103 No dia
seguinte a vitoriosa estreia de Nelson com o time do Vasco, o jornal fez um grande
crônica do jogo, denotando a importância que o emergente time do Vasco começava a
ter. A atuação de Nelson mereceu destaque.
Pelo conjunto vencedor, temos a destacar:
Em primeiro plano, Palamone, que foi um verdadeiro heróe. Seguiu-se
o keeper Nelson, que defendeu com maestria, 17 shoots.104

A nota pela atuação de Nelson já evidenciava a importância que o goleiro teria


no time do Vasco de 1919 até 1927. No entanto, a chamada de Nelson da Conceição
pelo primeiro nome mudaria logo no jogo seguinte, contra o Americano.

Os quadros do Vasco da Gama e Americano que se vão bater – Ao que


parece, os quadros do C.R. Vasco da Gama e Americano que se vão
bater domingo serão os seguintes:

101
Trabalhamos com a concepção de nação segundo Benedict Anderson: “É imaginada porque até os
membros da mais pequena nação nunca conhecerão, nunca encontrarão e nunca ouvirão falar da maioria
dos outros membros dessa mesma nação, mas, ainda, assim, na mente de cada um existe a imagem da sua
comunhão.”. ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas: reflexões sobre a origem e a difusão
do nacionalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.p.25.
102
O Imparcial, 30 de maio de 1919, p. 1.
103
O Paiz, 07 de setembro de 1919, p. 10.
104
O Paiz, 08 de setembro de 1919, p. 9.

42
Americano – Vadinho; laudelino e Gonçalo – Denucci, Benedicto e
Adalberto – Jaburú, Anyalack, Waldemar, Queiroz e Jonathas.
Vasco da Gama – Chauffeur; - Palamone e Alcindo – Palhares,
Lamego e Quintanilha – Pederneiras, leão, Dutra, Aristides e
Antonico.105

Ou seja, O Paiz, assim como O Impacial, resolveu apontar para a profissão do jogador.
O jornal O Imparcial desde a estreia amistosa de Nelson no início do ano já
demonstrava uma postura mais agressiva. Não seria diferente quanto à estreia oficial do
goleiro.
O KEEPER CHAUFFEUR ESTÁ JOGANDO PELO VASCO DA
GAMA
Está fazendo parte do Vasco da Gama, em seu 1º team, o adestrado
keeper Nelson (Chauffeur) […]
Esse arqueiro estreou ante-hontem, contra o Rio de Janeiro.106

O Imparcial não deixou de destacar a qualidade do goleiro, chamando-o de “adestrado”.


Contudo, a referência à profissão exercida pelo jogador foi clara e taxativa. O fato de ter
levado tantos jogadores suburbanos, do melhor time do subúrbio, para dentro da Liga,
não agradou aos defensores do futebol aristocrático.
Uma forma que os jornais utilizavam para fazer voz a uma posição
preconceituosa contra os jogadores humildes, negros e brancos, era diálogos por meio
de telegramas fictícios. Assim, falava-se de tudo, desde a resultados de partidas até
denúncias de ações tidas à época contrárias ao sport. Geralmente quando se tratava de
jogadores suburbanos, os diálogos eram recheados de gírias e erros de português,
retratando a ignorância como característica marcante destes jogadores. Quando não se
fazia alusão à forma de falar, buscava-se delimitar o espaço pertencente à LMDT sendo
superior às ligas suburbanas.
Em dezembro, após o fim do campeonato da 2ª Divisão, em que o Vasco O
Imparcial por meio da coluna “PELO SEM FIO” retratava um diálogo fictício de
Nelson (Chauffeur):
CHAUFFEUR (Vasco) – Voce pensa que os schoots do pessoal da
Metropolitana são eguaes aos da Liga Suburbana? Os daqui são de
facto... - Nôno e Bahianinho.107

105
O Paiz, 25 de setembro de 1919, p. 8.
106
O Imparcial, 09 de setembro de 1919, p. 8.
107
O Imparcial, 17 de dezembro de 1919, p. 8.

43
Como podemos perceber na “conversa”, Nelson embora um bom goleiro e que atuava
na maior equipe da Liga Suburbana, ficou impressionado com os “schoots” dos
jogadores da LMDT. Implicitamente, podemos dizer, que indica a superioridade de uma
Liga frente à outra.
Acreditamos que a intenção das citações dos jornais, indicando a “profissão” de
Nelson foi uma tentativa de dificultar a inscrição jogador, fazendo-o passar pela
Comissão de Sindicância da LMDT, órgão da Liga responsável por fiscalizar os
jogadores quanto aos requisitos necessários para atuar e indicar os casos que
contrariassem os estatutos ao Conselho Superior108. Infelizmente os jornais não fazem
menção às dificuldades de inscrição do jogador.
Entendemos que a subjetividade da profissão nos estatutos da Liga, permitiu que
Nelson da Conceição não fosse vítima da Comissão de Sindicância da LMDT. Outra
principal causa de conflitos contra jogadores negros e brancos pobres era a questão do
analfabetismo. Isto, ao que nos consta, não foi um problema para Nelson.
Provavelmente o jogador era alfabetizado o bastante para poder assinar o próprio nome:
“o Nelson Conceição, que não parecia, mas sabia ler e escrever corretamente”109.
A partir de 1917 o analfabetismo se tornou principal instrumento utilizado pela
Liga para barrar jogadores.
A lei de 1916 especificava as profissões indesejadas, enquanto os
novos estatutos deixam essa questão em aberto, havendo nas duas a
possibilidade do Conselho Superior decidir pela questão. Os estatutos
de 1917 faziam referência clara ao analfabetismo, questão ausente na
lei de 1916. No entanto. Podemos perceber um caráter mais flexível
em relação às profissões dos jogadores nos novos estatutos [...]110

Se por um lado, a legislação da Liga vigente durante o ano de 1919, e perdurando pelos
anos seguintes a que se propõe o nosso trabalho, não impediu que Nelson atuasse pelo
Vasco. A imprensa continuou dando voz aos que defendiam um futebol carioca
segregacionista.
Além do “afrouxamento” das regras quanto à profissão, há outro elemento que
poderia ter contribuído para a aceitação de Nelson111 pela Liga e desistência dos jornais.

108
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 149.
109
FILHO, Mario. O negro no futebol brasileiro. Rio de Janeiro: Mauad, 2010, p. 132.
110
Idem, p. 150.
111
Nelson da Conceição enquanto atuou pelo Vasco, no período do amadorismo, era considerado um
empregado do comércio. Além das referências feitas pela obra O Negro no Futebol Brasileiro, ao se ferir
num jogo em 1927, o jornal O Paiz noticiou um ocorrência feita pela Polícia. Nesta, constava que Nelson
era funcionário do comércio: O Paiz, 18 de julho de 1927. Em outro periódico encontramos a seguinte

44
Um método executado pelo Vasco para burlar as exigências da Liga era dar aos
jogadores empregos de fachada em comércios de sócios vascaínos, enquanto eles iam
treinar futebol. Uma espécie de evolução à prática já comum entre os clubes da elite e
outros, que pagavam jogadores para se beneficiar de seu futebol.

À medida que o futebol se enquadrava dentro das práticas capitalistas,


a necessidade por bons jogadores obrigava os clubes a contar com um
ou outro jogador extraordinário, oriundo das camadas mais baixas da
sociedade. Algum dirigente do clube arrumava-lhe um bom emprego e
até ensinava o jogador a ler e escrever se fosse preciso. Jogadores de
qualidade aumentavam a possibilidade de vitórias e os grandes clubes
não se importavam com um ou dois craques de origem humilde em
seus times, mesmo que mulatos ou negros. Mas os dirigentes
vascaínos foram além dessa prática. Contrataram vários jogadores dos
pequenos clubes dos subúrbios cariocas e os profissionalizaram, sem
se importar com a cor ou com a condição social destes, mas apenas
com a sua qualidade como jogador.112

Configurava-se o chamado “amadorismo marrom”, ou seja, o amadorismo hipócrita, ao


se exigir mais de certos clubes do que outros, além de pregar um purismo no futebol que
não se aplicava.
A importância de Nelson para o Vasco fica evidenciada pela forma como entrou
no time e com a análise da sua frequência nos jogos. Nelson veio para o Vasco
diretamente para ocupar a vaga de goleiro titular. Uma “contratação” vital para as
pretensões do clube. Entre os jogos antes do campeonato da Liga e até a sua estreia,
quando Nelson ficou de fora do time, sequer atuou por outros quadros. Isto nos faz crer
que Nelson só atuaria no primeiro quadro113. Na verdade, até 1923, Nelson nunca atuou
por outro quadro do Vasco, sempre atuou pelo primeiro quadro, mesmo quando se
machucava Nelson retornava diretamente para o primeiro quadro114.
Em 1916 a média de gols sofridos do Vasco115 foi de 4,11, abaixou para 2,06 no
ano de 1917 e voltou a subir em 1918 para 2,87 gols por jogo. Nos sete jogos pelo

informação: “Nelson da Conceição (goal-keeper) – 24 annos, solteiro, empregado no commercio – Casa


Alberto – Praça da Republica.”. O Sport, 21 de agosto de 1923. O referido periódico não possui página.
112
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 5.
113
O termo “quadro” designava as divisões das equipes de futebol de um mesmo clube. O primeiro
quadro era a equipe principal do clube. No período estudado houve campeonatos de primeiro, segundo e
até terceiro quadro.
114
Livro de atividades futebolísticas do Club de Regatas Vasco da Gama de 1916 a 1923. Acervo: Centro
de Memoria do Club de Regatas Vasco da Gama.
115
O cálculo realizado se baseia numa conta simples feita pela divisão de números de gols sofridos por
número de jogos realizados. Na parte de Anexos deste trabalho há tabelas de jogos que ajudam a

45
campeonato de 1919, antes da estreia de Nelson, o Vasco havia sofrido 18 gols em 7
jogos116, uma média de 2,57 gols por jogo. Os goleiros Miguel Cavalier e Luiz Barroso
eram os que mais revezavam como goleiros do primeiro quadro. Nelson não atuava. A
partir do seu jogo de estreia por um campeonato da LMDT, Nelson se tornou titular
absoluto. O Vasco jogaria mais oito vezes, levando apenas 16 gols, uma média de 2 gols
por jogo.
A deficiência técnica da equipe não cabia mais a posição do goleiro. Contudo,
das outras posições da equipe. Não se deve atribuir totalmente a Nelson a melhora da
equipe em relação aos gols sofridos, mas o fato de Nelson raramente ficar fora das
partidas contribui para afirmarmos que ele foi vital para que, na parte defensiva, o
Vasco pudesse se estabilizar.
O Vasco terminou o Campeonato de 1919 na quinta posição117. A equipe do
Palmeiras, campeã do Torneio Início, levou o campeonato da 2ª Divisão. A equipe do
Fluminense se sagrava tricampeã carioca na 1º Divisão. Passado o ano de estreia de
Nelson, os jornais não utilizavam mais a alcunha Chauffer para se referir ao jogador.
Afinal, em nada surtiu efeito.
Nos anos de 1920 e 1921, Nelson junto ao Vasco permaneceu nas divisões
inferiores. A partir de 1920 não havia mais a lei do Estágio, estava criada a lei do Passe.
Assim, o caminho estava livre para os “borboletas”118.
DO PASSE E ESTAGIO NA METROPOLITANA
Na assembléa geral realizada ante-hontem, na Liga Metropolitana, foi
apresentada e julgada objeto de deliberação a seguinte proposta do Dr.
Ferreira Vianna Netto:
“Fica creada a lei do passe com relação à lei do estagio:
a) O jogador que requerer o passe e lhe fôr concedido pelo club de
que fez parte, não estará sujeito ao interstício;
b) Em caso contrario, isto é, sendo-lhe negado o passe, soffrerá o
interstício da lei, sem que possa recorrer para qualquer poder da Liga.
Sala das sessões, 7 de janeiro de 1920.119

Era uma libertação do jogador e ao mesmo tempo uma vitória para clubes “reveladores
de talento”. Inclusive para os clubes da elite, porque lucrariam muito ao poderem
reforçar suas equipes de futebol com jogadores de equipes menos abastadas.

visualizar os cálculos realizados, bem como os jogos de Nelson pelo Vasco entre 1919 e 1923. Ver
TABELA DE JOGOS 1 – 1916 a 1918, p. 117.
116
Ver TABELA DE JOGOS 1 a 7, pp. 117-124.
117
O Imparcial, 02 de janeiro de 1920, p. 8.
118
Termo utilizado para caracterizar jogadores que trocavam de clubes.
119
O Imparcial, 09 de janeiro de 1920, p. 6.

46
Contudo, a resistência a jogadores negros ainda era bem forte nos grandes
clubes. Enquanto, no Vasco, Nelson chegou para tomar conta da posição de goleiro da
equipe vascaína, outros jogadores negros sofriam:
CAFÉ COM LEITE...
Ao que se dizia hontem na Brahma, a directoria de um club da zona
sul, que faz parte da 1ª divisão da Liga, resolveu “patuscamente”120,
não pedir registro para seu jogador “goal-keeper” pelo facto de não ser
o mesmo “um pouquinho mais claro!”...
É boa essa!...
Comem a mensalidade do rapaz “que não é claro” e deixam de o
registrar por ser ele escuro!...
Anda mal o citado club procedendo dessa forma, pois, se quer ter
preconceitos deve-os ter quando aprovar as duas propostas de socios
novos e não depois.
Alem disso, quem sabe se esse jogador não virá a ser um
Friedenreich?121

Os dirigentes do Flamengo não queriam um goleiro “que não é claro”. O racismo era
evidente.
É preciso fazer referência à forma como o jornal tratou o caso. Não se expôs o
clube diretamente, o que indica que o racismo, tal como já dissemos, era “maquiado” o
máximo possível. Uma característica da época. Não condena diretamente o clube pela
sua prática em si. Todavia, se questiona a forma como o clube escolhe seus sócios.
Dando a entender que poderia haver uma seleção natural de jogadores brancos, desde
que fossem feitos na entrada destes como sócios. Ou seja, era preciso não aceitar sócios
negros para querer que um jogador negro não atuasse no futebol do clube. Lembrando
que os jogadores de futebol eram sócios dos clubes.
Enquanto isso, Nelson evoluía com o time do Vasco. No ano de 1920 ele e a
equipe vascaína terminaram em quarto lugar, a equipe do Carioca se sagrou campeã da
2ª Divisão122. As atuações de Nelson assombravam o público do futebol bretão. No
último jogo do campeonato, no empate de 3 a 3 do Vasco com a equipe do S.C.
Mackenzie, Nelson foi o destaque.

O VASCO EMPATA COM O MACKENZIE POR 3X3

120
O termo se refere ao jogado Ary Patusca. No ano de 1919, Ary Patusca saiu dos Santos F.C. para ser
jogador do Flamengo. Atuou na derrota deste para o Fluminense, por 3 a 1, em 24 de maio de 1919. De
forma abrupta, Ary Patusca saiu do clube da Zona Sul e retornou para São Paulo, pedindo demissão como
sócio/jogador do Flamengo. Neste sentido, o termo “patuscamente” tem uma conotação de ação rápida e
sem justificativas. O Imparcial, de 24 de maio a 24 de agosto de 1919.
121
O Imparcial, 10 de janeiro de 1920, p. 7.
122
O Imparcial, 10 de janeiro de 1921, p. 7.

47
No campo do S. Christovão A. Club foi effectuado hontem o match
entre os sympathicos e valorosos C.R. Vasco da Gama e S.C.
Mackenzie [...]
A peleja foi sensacional, notadamente em ambos os quadros
disputantes preparo e technica, o que concorreu bastante para o
completo brilhantismo da pugna [...]
Do Vasco, estiveram assombrosos, o goal-keeper Nelson, e o fullback
C. Cruz.123

A importância de Nelson para a estabilidade da equipe vascaína era mais uma


vez confirmada. Sua falta pode ter contribuído muito para o futuro da equipe no
campeonato. Até então, o Vasco liderava o campeonato, a derrota tirou da equipe
vascaína a tranquilidade e pontos preciosos.
O HELLENICO DERROTA O VASCO, POR 3X2
Uma surpreza, o match de hontem entre os teams do Vasco da Gama e
Hellenico. Embora este ultimo houvesse treinado bastante e seja
possuidor de um optimo conjunto, a todos se afigurava que o encontro
terminaria com a Victoria do Vasco, o “leader” da tabella. Além do
mais, o Hellenico, nestes últimos tempos, vinha sendo perseguido por
uma “guigne”124 formidavel, que, mesmo nos matches mais ffracos, o
não largava.
Por isso, a Victoria do quadro vascaíno era tida como favas contadas.
O Hellenico, porém, não se intimidando com os boatos, entrou firme
em campo, disposto a levar de vencida o seu antagonista ou a vender
bem caro a sua derrota. E assim aconteceu.125

Nos 16 jogos em que Nelson atuou pelo campeonato da 2ª Divisão de 1920, o Vasco
levou 23 gols, média de 1,43 por partida. Entre sua estreia e a última partida de 1923,
em confrontos válidos pelo campeonato da cidade, o jogo contra o Hellênico seria o
único em que Nelson desfalcaria a equipe vascaína.
A ausência do goleiro se explica por questões físicas, após partida contra o Ríver
F.C., em que o Vasco venceu por 5 a 0: “O jogo foi violento, salientando-se na
brutalidade [...]126. Na 1ª Divisão, o Flamengo conseguiu quebrar a sequência do
Fluminense, e sagrou-se campeão.
Em 1921 o campeonato da Liga Metropolitana sofreu mudanças. A 1ª Divisão
foi dividida em duas séries, A e B. Clubes emergentes como o Vasco ficaram na série B
da 1ª Divisão, enquanto os clubes grandes, da elite, ficaram na série A da 1ª Divisão.

123
O Imparcial, 27 de dezembro de 1920, p. 8.
124
Provavelmente o termo se equivale ao que hoje denomina-se “zica”, no jargão popular do futebol.
Equivale a má sorte.
125
O Imparcial, 06 de setembro de 1920, p. 9.
126
O Imparcial, 30 de agosto de 1920, p. 8.

48
A GRANDE ASSEMBLÉA DE HONTEM, NA L.
METROPOLITANA
Foi approvado o parecer sobre as séries A e B[...]
Realizou-se, hontem, a noite, a grande assembléa da Liga
Metropolitana, para dsicutir o parecer da comissão de informações
sobre as séries A e B, composta cada qual de 7 clubs.
[...]
Sendo approvado por vinte e sete votos contra cinco.
[...]
As séries ficaram assim constituídas:
Primeira divisão
Série A
America, Andarahy, Bangú, Botafogo, Flamengo, Fluminense e São
Christovão.
Série B
Carioca, Villa Isabel, Palmeiras, Mangueira, Vasco, Mackenzie e
Americano.127

Com esta medida, diminuía-se a quantidade de clubes da 1ª Divisão de fato, ou seja, a


série A. Em 1920 os clubes que realmente brigavam pelo título de campeão da 1ª
Divisão eram 10, com a divisão em séries passaram a ser sete em cada série.
Assim, o campeão da série B, deveria enfrentar o último colocado da série A.
Em caso de vitória sobre o último colocado da série A, o campeão da série B
conseguiria alcançar o tão almejado dos principais times do futebol carioca. Com isto,
ao diminuir para sete, o número de clubes, acreditamos que elitizava-se ainda mais um
grupo que possuía quatro grandes clubes. Sendo muito difícil que um deles caísse de
série.
O campeão da série B da 1ª Divisão foi a equipe do Villa Izabel128. O Vasco
terminou na terceira colocação, tendo Nelson participado de todos os jogos. Foram 12
jogos, com 17 gols sofridos. Uma média de 1,41 gols por jogo, a menor da história do
clube no futebol. Na série A, o Flamengo tornou-se bicampeão carioca ao derrotar o
América por 2 a 1129. Mesmo com a redução de clubes, o que facilitaria a vida dos
grandes, o Fluminense terminou em último na série A e se viu obrigado a disputar uma
partida eliminatória contra o Villa Izabel, campeão da série B. O Fluminense venceu por
3 a 1 e permaneceu na série A, escapando do que seria um vexaminoso rebaixamento130.
As expectativas eram as melhores para o ano seguinte para Nelson e o Vasco.
Afinal, o clube nunca tinha chegado tão próximo da ascensão definitiva. O ano de 1922

127
O Imparcial, 01 de março de 1921, p. 12.
128
O Imparcial, 29 de agosto de 1921, p. 3.
129
O Imparcial, 05 de setembro de 1921, p. 3.
130
O Imparcial, 08 de setembro de 1921, p. 9.

49
seria marcante em diversos aspectos para o Rio de Janeiro e para o Brasil de um modo
geral. No aspecto político-nacional o Brasil completaria cem anos de Independência e
no esporte, o Campeonato Sul-Americano retornaria ao país. Todavia, nem tudo seria
motivo de comemoração. A data histórica foi marcada pelo aumento de uma postura
preconceituosa em relação aos imigrantes portugueses. No futebol, o preconceito contra
jogadores negros continuava presente, inclusive em produções oficiais do Estado.
Na contramão de todas as dificuldades, Vasco e Nelson ascenderiam pela
primeira vez ao grupo de elite do futebol carioca.

50
CAPÍTULO 2 NELSON: O GRANDE KEEPER (1922-1924)

2.1 O Centenário da Independência, as teorias raciais e o futebol

Mais uma prova de que o futebol era jogo de branco. Nenhum clube
com um mulato, com um preto no time, tinha sido campeão de 6 a 22.
Só o escrete brasileiro, com Friedenreich. Friedenreich, porém, tinha
pai alemão, não queria ser mulato.131

A citação acima, da obra histórico-literária do jornalista Mário Filho, nos ajuda a


entender um pouco sobre a configuração do campeonato do Rio de Janeiro até 1922. Os
grandes clubes que reinavam sobre o futebol carioca não desenvolveram uma inserção
em massa de jogadores negros e brancos pobres no futebol, mesmo que dispusessem de
um ou outro jogador “menos claro” nas suas fileiras de futebol, não os colocavam em
quadros principais quando campeões: “O mulato e o preto eram, assim, aos olhos dos
clubes finos, uma espécie de arma proibida. Não um revólver, uma navalha. Se nenhum
grande clube puxasse a navalha, os outros podiam continuar lutando de florete.”.132
O Vasco de Nelson inicia o campeonato da série B de 1922 disposto a entrar de
uma vez por todas no grupo dos melhores times do Rio. Para isso, ele vai atrás de um
grande técnico, o uruguaio Ramon Platero. Este, treinava o Flamengo, que acabara de
ser bicampeão em 1921 e já havia treinado a equipe do Fluminense, no título tricolor de
1919. O treinador aceita o convite, mas fica como treinador das duas equipes.
A estreia do Vasco foi contra o Palmeiras A.C., com uma goleada por 4 a 0 no
estádio do Botafogo, em General Severiano. O Vasco entrou em campo com Nelson,
Mingote e Leitão; Nolasco, Braulio e Arthur; Dutra, Torterolli, Claudionor, Paschoal e
Negrito. O destaque da partida ficou por conta da numerosa torcida vascaína.
VASCO DA GAMA X PALMEIRAS A. CLUB
Para apreciar o fraquíssimo encontro hontem realizado entre as
deseguaes esquadras do Vasco da Gama e do Palmeiras A.C.,
affluiram ao campo da rua General Severiano a enorme legião de
associados do club de regatas e a diminuta torcida da sociedade
visitante.
[...]
No emtanto, a despeito de tão desinteressante pugna, a torcida
vascaina estava renitente, formidavel, assombrosa mesmo [...]133

131
FILHO, 2010. Op. cit., p. 119.
132
Idem, p. 120.
133
O Imparcial, 17 de abril de 1922, p. 3.

51
O “exímio arqueiro Nelson” pouco sofreu com os ataques palmeirenses, aguardava-se
os próximos jogos que de fato testariam as forças do conjunto vascaíno.
O certo é [...] que não se póde ainda avançar um juízo seguro sobre o
valor da equipe de Santa Luzia134, pois o adversário que tinha pela
frente não ofereceu ensejo para isto.
Aguardemos os futuros encontros com o Villa e com o Carioca [...]135

O próximo jogo seria contra a fortíssima equipe do Villa, as expectativas para o


jogo eram grandes. Nelson, um dos principais destaques do Vasco, teve sua imagem
reproduzida pelo periódico O Malho, com o título: “FIGURAS DO SPORT”. A forma
física do goleiro dava destaque as suas características de negro, de forma exagerada.
Abaixo da imagem vinha uma inscrição como fala em forma de gíria: “Nelson, o ‘bão’
da série B...”. Além disso, acima da imagem de Nelson havia um diálogo fictício, que
fazia referência aos jogadores negros das duas equipes:
- Dizem que o jogo Vila x Vasco vae ser “roxo”!...
- “Roxo” nada rapaz; Vae ser é “preto”....136

O ano de 1922 ficou marcado pela comemoração do Centenário da


Independência. Todavia, foi também testemunha de alguns acontecimentos que
poderiam servir de base para ações que visassem atingir indivíduos de classe menos
abastadas, especialmente os negros. Foi lançado o Recenseamento do Brasil, documento
oficial do Estado Brasileiro que visava mapear a sua população. Bem como, estabelecer
critérios, até mesmo raciais, para a mesma.
O conteúdo do material, marcadamente favorecia o fenótipo do homem branco
em detrimento do negro. O documento é claro quanto à intenção de “aryanização
progressiva da população”. Podemos enxergar um possível projeto de “aryanização” do
Brasil, constituído na da 2ª parte do Recenseamento, cujo nome é Evolução da Raça :
SEGUNDA PARTE
EVOLUÇÃO DA RAÇA
SUMMARIO
[...]
XII – Evolução dos typos regionais no sentido da aryanização
progressiva,
[...]
XIV – Instabilidade dos typos mestiços; tendência para a clarificação
dos mestiços; apuramento da raça;

134
O termo Santa Luzia faz referência à sede administrativa do Vasco à época. Sede de Santa Luzia – Rua
Santa Luzia, n.250, Centro.
135
O Imparcial, 17 de abril de 1922, p. 3.
136
O Malho, 22 de abril de 1922, p. 39. Ver FIGURA 4, p. 97.

52
XV e XVI – O phenomeno da aryanização progressiva da nossa
população. Dados estatísticos que a demonstram.
[...]
estas duas raças inferiores [negros e índios] só se fazem agentes da
civilização, isto é, somente concorrem com elementos eugênicos para
a formação das classes superiores, quando perdem a sua pureza e se
cruzam com o branco.
[...]
Os elementos inferiores que formam o nosso povo, estão sendo, pois,
rapidamente reduzidos, a) pela situação estacionária da população
negra; b) pelo augmento continuo dos affluxos aryanos neste últimos
tempos [imigração europeia]; c) por um conjunto de seleções
favoraveis, que asseguram, em nosso meio, ao homem de raça branca
condições de vitalidade e fecundidade superiores aos homens das
outras raças. 137

O documento revela o interesse dos homens do Estado na “purificação racial” do


Brasil, inclusive citando dados estatísticos que comprovariam tal fenômeno utilizando
as três raças (brancos, negros e índios), como taxa de natalidade, mortalidade,
expectativa de vida e números totais da população de cada raça, segundo a obra138:

ANNOS Brancos Mestiços Pretos


1835............. 845.000 628.000 1.987.000
1872............. 3.818.403 3.833.015 1.970.509
1890............. 6.302.198 4.638.495 2.097.426

ANNOS Brancos % Negros % Indios % Mestiços %


1872............. 38.1 19.7 3.9 38.3
1890............. 44.0 14.6 9.0 32.4

Se tratando do esporte, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB)


publicou o Diccionario Historico, Geographico e Ethnografico do Brasil. No verbete
“DESPORTOS” a fórmula descrita para o sucesso que o futebol tinha alcançado e que
nenhum outro esporte havia conseguido, evidencia o racismo presente na tentativa de
definir uma “essência racial” para o futebol brasileiro:

137
Recenseamento do Brasil realizado em 1º de setembro de 1920. Rio de Janeiro: Typographia da
Estatística, 1922, pp. 312, 329-340.
138
Idem, pp. 334-343.

53
A mocidade brasileira, até então, sujeita a um ascetismo pleno de
vícios e sentimentalismo, começou a interessar-se pelos jogos
ingleses, especialmente pelo cricket. Contudo não se apresentara,
ainda, a formula desportiva capaz de operar o milagre de uma
transformação necessária e profunda nos hábitos, na educação da
mocidade.
Para tanto fora mister uma fórma de desporto mais assimilável, mais
adaptável aos caracteres ingênitos, physicos, psychicos, da mocidade
brasileira, entre os quaes avultavam a nervosidade latina e a
combatividade indígena.
Estava reservado este papel ao futebol [...]
Para tanto fora mister uma fórma de desporto mais assimilável, mais
adaptável aos caracteres ingênitos, physicos, psychicos, da mocidade
brasileira, entre os quaes avultavam a nervosidade latina e a
combatividade indígena.
Estava reservado este papel ao futebol [...]139

O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) foi fundado em 21 de


outubro de 1838, na cidade do Rio de Janeiro. O grêmio carioca se caracterizou como o
principal e mais influente dos chamados Institutos Históricos e Geográficos, “Guardiões
da História Oficial”, no contexto brasileiro:

Criado logo após a independência política do país, o estabelecimento


carioca cumpria o papel que lhe fora reservado, assim como aos
demais institutos históricos: construir uma história da nação, recriar
um passado, solidificar mitos de fundação, ordenar fatos buscando
homogeneidades em personagens e eventos até então dispersos140

O IHGB se propunha em ser um local formado por homens que desenvolveriam


um trabalho técnico-científico, mas nos seus quadros prevalecia a posição social do
indivíduo. Nos quadros da instituição, o presidente, sujeito que personificava a
instituição, era uma figura ilustre da sociedade, assim como a grande maioria pertencia
a pessoas ilustre da sociedade carioca e brasileira, especialmente da política. Enquanto
os nomes técnicos e intelectuais ficavam a cargo dos secretários e oradores.

O recém-fundado estabelecimento apresentava uma composição


interna bastante reveladora de uma das fortes características do
instituto, que se manteria durante toda a sua vigência, qual seja, um
tipo de recrutamento que se pautava mais por determinantes sociais do
que pela produção intelectual [...]

139
IHGB, Diccionario Historico, Geographico e Ethnografico do Brasil: Introducção Geral. Imprensa
Nacional, Rio de Janeiro, 1685p, 1922, p. 413.
140
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O Espetáculo das Raças: Cientistas, Instituições e Questão Racial no
Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 99.

54
Coube, portanto, aos presidentes, enquanto políticos influentes, e aos
secretários e oradores, como intelectuais respeitados, o papel de
imprimir ao IHGB sua principal feição: a de um estabelecimento
voltado para uma produção unificadores e estreitamente vinculada à
interpretação oficial, fosse ela qual fosse141

No que tangia a questão racial das produções do IHGB, a antropóloga Lilian


Moritz Schwarcz nos esclarece que:

Antropologia e etnologia são disciplinas que assumem importância


crescente dentro da Revista do IHGB, passando inclusive a construir
um campo separado de atuação. Quanto à questão racial, difunde-se
uma postura dúbia, na medida em que um projeto de centralização
nacional implicava também pensar naqueles que ficariam excluídos
desse processo, ou seja, negros e indígenas.
As posições acerca desses dois grupos não eram, no entanto, idênticas.
Com relação à população negra vigorava uma visão evolucionista
mais determinista no que se refere ao “potencial civilizatório dessa
raça” [...]
Porém, se imperava uma percepção fatalista quanto à integração dos
negros, os indígenas provocavam opiniões variadas, tanto que era
possível acomodar no interior do IHGB, seja uma perspectiva positiva
e evolucionista, seja um discurso religioso católico, seja uma visão
romântica, em que o indígena surgia representado enquanto símbolo
da identidade nacional.142

Podemos inferir que numa visão evolucionista de escala racial, social e


civilizatória, o homem branco estaria sempre no topo. Este, seguido de longe pelo
indígena e por último o negro. Observamos tal fato no trecho acima citado sobre o
futebol, na visão dos homens do IHGB.

[...] a imagem do indígena era a de um elemento redimível mediante a


catequese, que o retiraria de uma situação “bárbara e errante” para
inseri-lo no interior da civilização, entendida pelo instituto como
processo eminentemente branco. Nesse aspecto, a mesma postura
teórica se mantém para a população negra: ainda que participasse de
um “estado ainda mais inferior”, não lhes era retirado a humanidade.
Era sempre um modelo evolucionista racial monogenista que
predominava, coerente com a marcada influência católica no local143

No futebol, havia casos cada vez mais constantes de sucesso individual, de


cracks negros ou mulatos como Friedenreich, e de equipes formadas por jogadores

141
Idem, pp. 101 e 108.
142
Idem, p. 111.
143
Idem, p. 112.

55
negros, como a própria equipe vascaína. A questão técnica do jogador e da equipe, para
o sucesso do clube no futebol, crescia cada vez mais com a necessidade das vitórias:
“[...] os indivíduos da chamada ‘gran fina sociedade’ não davam mais conta frente à
necessidade de vitórias nos desafios esportivos e, com isso, necessitavam de membros
de outros grupos sociais que possibilitassem a vitória nas partidas e torneios”144.
Jogadores como Nelson, poderiam não agradar a muitos pela sua cor de pele ou
condição social, marcadamente aos adeptos dos demais clubes. Todavia, suas defesas o
tornava cada vez mais uma unanimidade.
Voltando ao campeonato de 1922, a equipe vascaína não suportou as investidas
do forte time adversário e saiu derrotada por 1 a 0. A despeito da derrota para o Villa
Izabel, a torcida do Vasco demonstrava outra vez a sua força, indicando que a
quantidade de adeptos do Clube da Cruz de Malta já não cabia nos acanhados estádios
da série B.
VILLA ISABEL X VASCO DA GAMA
Uma enorme multidão movimentou-se hontem, para assistir á renhida
peleja que se realizou no aprazível e longínquo campo situado no
interior do Jardim Zoologico, entre as possantes esquadras do Villa
Isabel e Vasco da Gama. Esse encontro que durante a semana foi o
assumpto prediletcto das rodas desportivas, vinha sendo aguardado
com grande ansiedade sob todos os pontos de vista justificada, pois é
tradicional o enthusiasmo que sempre desperta a luta entre esses dois
queridos e dignos grêmios rivaes.145

O Vasco repetiu a escalação do jogo anterior. Três jogadores escaparam da


crítica e foram fundamentais para que não houvesse um placar mais delatado em prol do
time do Jardim Zoológico:146 “A nosso ver, unicamente ao triangulo final – Mingote,
Leitão e Nelson – deve o Vasco não ter sido derrotado por maior score [...]”147. Mais
uma vez Nelson demonstrava o seu valor, inclusive nas derrotas. A derrota não assustou
e não impediria as pretensões do Vasco, configurando-se como a única em todo o
campeonato.
O terceiro jogo foi com o S.C. Mackenzie. O Vasco de Nelson deu a volta por
cima, se recuperando da derrota na rodada anterior para o Villa, vencendo por 3 a 0.
Mais uma vez, o goleiro Nelson estava entre os destaques da emergente equipe
144
SANTOS, Ricardo Pinto dos. Tensões na consolidação do futebol carioca, p. 195. In PRIORI, Mary
Del; MELO, Victor Andrade de. História do Esporte no Brasil: Do Império aos dias Atuais. São Paulo:
Editora UNESP, 2009.
145
O Imparcial, 24 de abril de 1922, p. 4.
146
Alcunha da equipe do Villa Izabel.
147
O Imparcial, 24 de abril de 1922, p. 4.

56
vascaína, assim como a torcida vascaína. Ao Vasco, já era dado a alcunha de scratch:
“A assistência fez um barulho infernal, com cantigas, palmas, réco-réco, o diabo. Tudo
isto porque o scratch está vencendo de três a zero.”148.
Após as três primeiras partidas o Vasco teria um técnico por completo. Ramon
Platero e o Vasco conseguiram um acordo e o treinador uruguaio optou pelo Vasco. O
treinador disse que em caso de igualdade de condições entre Vasco e Flamengo, optaria
pelo primeiro.
[...] 1º Diretor de Desportos Terrestres pede a palavra para
informar que o nosso entraineur de foot-ball Ramon Platero foi
intimado pelo Club de Regatas Flamengo a optar por um dos
dois clubes para dedicar a sua atividade profissional e que em
igualdade de condições dava a preferencia ao Club.149

Dizia Ramon Platero que, no Flamengo, recebia 900$00 mensais e possuía multa
rescisória de 2:000$000150. O Vasco igualou o valor mensal e aumentou para 3:000$000
a multa rescisória. O treinador ainda ficaria com os juros do valor que seria depositado
em um banco. Assim dizia as condições do contrato firmado:
[...] Primeira: O Sr. Ramon Platero obriga-se a prestar exclusivamente
ao CR. Vasco da Gama seus serviços profissionais, mediante
ordenado mensal de novecentos mil reis (R$900$000), pago por mês
vencido.
[...]
Sétima: Para garantia do determinado na condição [ilegível], sexta, o
Sr. R. Platero depositará á ordem do C.R.V. Gama em um Banco ou
Estabelecimento de Crédito, a quantia de R$3:000$000 (Três contos
de reis), cabendo, porém, ao mesmo os juros que o mencionado
deposito obtiver.

A decisão do treinado em ficar com o Vasco parece não ter agradado a diretoria
do Flamengo, que desdenhou de Ramon Platero:

PLATERO FOI DISPENSADO PELO FLAMENGO


A directoria do Club de Regatas Flamengo, em sua ultima reunião,
resolveu dispensar os serviços do “entraineur” Ramon Platero, em
vista do seu descaso pelos serviços que lhe estavam affectos.151

148
O Imparcial, 02 de maio de 1922, p. 3.
149
Transcrição feita da Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 8 de maio de 1922.
150
Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 8 de maio de 1922.
151
O Imparcial, 19 de maio de 1922, p. 7.

57
A situação era bastante significativa. Um dos melhores treinadores do Rio de Janeiro
resolveu deixar o atual bicampeão da cidade para treinar uma equipe emergente da série
B. Isto demonstra a disposição diretoria do Vasco em alçar o clube à série A da 1ª
Divisão.
Neste sentido, a diretoria do Vasco tentava conseguir deixar seu campo à rua
Moraes e Silva, na Tijuca, em condições adequadas para a realização de jogos do porte
da série B. Enquanto mandante no ano de 1992, o Vasco atuava no campo do Botafogo,
pagando aluguel pela locação do estádio152. A diretoria do clube conseguiu o
empréstimo do antigo campo do Sport Club Rio de Janeiro em 1921, iniciando uma
série de reformas na perspectiva de tê-lo no campeonato de 1922, lucrando com o
afluxo da já imensa torcida vascaína. A adequação do mesmo somente foi possível no
mês de junho, com o campeonato já em andamento153.
As boas expectativa que giravam em torno do Vasco de Nelson começaram a
sofrer com uma ameaça, o analfabetismo. Eis um dos motivos para não podermos
afirmar que somente jogadores negros sofriam com as condições impostas pelos grandes
clubes que coordenavam a Liga e por parte da imprensa. Embora, como já dissemos, o
analfabetismo atingisse majoritariamente os indivíduos negros, por razões históricas,
muitos brancos pobres também se enquadravam nesta categoria.
Assim, um dos jogadores contratados para reforçar a equipe do Vasco no ano de
1922 seria perseguido durante toda a temporada. Leitão, alcunha dada a Albanito do
Nascimento154, atuava pela equipe do Bangu, onde era titular do primeiro time desde
1917155. Em 1922, ao se transferir para o Vasco deveria optar pelo Vasco. Para isto, o
jogador era obrigado a fazê-la de próprio punho, provando que sabia ler e escrever, ou
seja, não era analfabeto. Leitão fez a opção em 22 de março.
LEITÃO E BRAULIO OPTARAM PELO VASCO
Compareceram hontem, á noite, á Liga Metropolitana, onde optaram
pelo Vasco, os players Leitão e Braulio, este center-half do Andarahy
e aquelle back, do Bangú.156

O fato de ser ou não analfabeto se tornava bastante subjetivo de acordo com os


interesses envolvendo o futebol da época. A inscrição de Leitão foi contestada devido a
152
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 262.
153
Idem, p. 263.
154
ROCHA, José da Silva. Club de Regatas Vasco da Gama – Histórico. Rio de Janeiro: Grafica
Olímpica Editora. 1975, p. 323.
155
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 251.
156
O Imparcial, 23 de março de 1922, p. 12.

58
sua grafia, criando um problema que acompanharia o Vasco até o mês de outubro. Em
março, a diretoria recebeu um comunicado da LMDT, pedindo a regularização do
jogador. Já dando o entender que ele foi considerado analfabeto, pela subjetividade da
Liga Metropolitana.
Liga M.F. Terrestres [...] pedindo que estejamos dispostos a agir junto
dos nossos jogadores de football para que até 30 de junho [ilegível]
vão cumprir o disposto nos seus estatutos, artos. 67 e 104, que se
assumem em provar que sabem ler e escrever.157

O uso da questão do analfabetismo era uma arma poderosa para impedir a


inscrição de jogadores de futebol, prejudicando, marcadamente, os mais humildes.
Mario Filho nos ajudar a entender como isto poderia ser para o jogador.
Muito jogador sabia assinar o nome se perturbava. O caso de Leitão.
Quando era do Bangu, a Liga não se incomodou com ele. Bastou e ir
para o Vasco, teve de assinar a papeleta de inscrição na frente de Célio
de Barros, então presidente da Liga Metropolitana. Célio Barros não
tirando os olhos de cima de Leitão, Leitão suando frio, parecia que
não ia acabar nunca de encher a papeleta. E sabia assinar o nome,
sabia rabiscar as suas coisinhas.158

Leitão era um homem branco. Não se enquadra na questão do preconceito contra


indivíduos negros. Mas, num país marcado por séculos de escravidão e desgaste físico,
moral e mental dos indivíduos negros, de fato, os “quase-cidadãos” eram os que mais
sofriam. A Constituição vigente no período era uma fortíssima base para tomadas de
decisões, como as da Liga.
Art 70 - São eleitores os cidadãos maiores de 21 anos que se alistarem
na forma da lei.
§ 1º - Não podem alistar-se eleitores para as eleições federais ou para
as dos Estados:
1º) os mendigos;
2º) os analfabetos;159

Elucida-nos o historiado José Murilo de Carvalho:


A exclusão de 80% da população do direito político do voto já é um
indicador do pouco que significou o novo regime em termos de
participação. O quadro agravava-se se examinarmos o uso que a

157
Transcrição feita da Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 8 de maio de 1922.
158
FILHO, 2010. Op. cit., p. 131.
159
Constituição Federal de 1891. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao91.htm> Acessado em 06 de
dezembro de 2012.

59
população fazia da franquia existente, isto é, o número de fluminense
que se alistavam e realmente votavam nas eleições republicanas.160

O “Caso Leitão” ficaria “guardado” durante a temporada, voltando à tona em


agosto. Após a vitória contra a equipe do S.C. Mackenzie, o Vasco emplacou uma
sequência invicta de seis jogos, com cinco vitórias e um empate. Já pelo returno da
campeonato o Vasco voltaria a enfrentar o Villa Izabel, líder do campeonato e seu maior
rival naquele ano. A vitória era fundamental.
SERIE B
VASCO DA GAMA X VILLA ISABEL
É esta uma luta sensacional para hoje.
Vasco e Villa são os dois mais possantes candidatos ao cobiçado título
de campeão da serie a que pertencem.
O Villa ainda não sofreu nenhuma derrota e vae á frente de seu
adversário de hoje, três pontos.
[...]
Hoje, o conjunto da Cruz de Malta vae disposto a tirar a “revanche”.161

O Vasco venceu a equipe do Jardim Zoológico por 2 a 1.

Dado o pontapé inicial, e entrando em atividade as turmas


contendoras, ficou desde logo evidenciado o perfeito estado de treino
em que ambas se achavam, notadamente a do Vasco, que, sabíamos,
durante a semana havia se entregado a um entreinement methodico e
severo.162

O jornal chama a atenção para a questão do treino, um outro ponto de evolução


constante no futebol. A preocupação com a parte física e tática dos jogos aumentava:
“Com o treinador uruguaio no comando, o regime de treinamentos do Vasco mudou
completamente. Platero introduziu no Vasco algo que já fazia no Fluminense, porém
sem a adesão de todos os jogadores: a concentração”163.Contudo, na equipe do Vasco,
formada por “operários da bola”, a tática da concentração cairia como uma luva.

Na sequência do campeonato, Nelson e a equipe vascaína conquistaram mais


quatro vitórias contra as equipes do Mackenzie, Mangueira, Americano e Carioca. No
mês de julho, a população ficou em estado de alarme com a Revolta dos 18 do Forte de
Copacabana. Movimento contrário à eleição do presidente Artur Bernardes. O futebol
não parou. O América F.C. se tornaria o campeão da série A da 1ª Divisão, eternizando

160
CARVALHO, 1987. Op. cit., p. 85.
161
O Imparcial, 04 de junho de 1922, p. 8.
162
O Imparcial, 05 de junho de 1922, p. 4.
163
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 260.

60
a alcunha de “Campeão do Centenário”. O título veio com a vitória sobre o São
Christovão, em 16 de julho164.

A equipe vascaína chegou ao último jogo dependendo apenas de suas forças para
conquistar o primeiro título da história do futebol do clube. O jogo era contra o
Palmeiras, que o Vasco já havia goleado na estreia. A importância do jogo era notória.

Na série B, o Vasco, se conseguir vencer o Palmeiras, terá o


campeonato assegurado. Em caso de empate e sendo vencedor o Villa
contra o Carioca (jogo suspenso) ambos empatarão o campeonato.
Em caso de derrota do Vasco, o almejado título caberá ao Villa Izabel.
O jogo, pois, entre o Palmeiras e o Vasco é o mais importante da tarde
de hoje.165

O Vasco venceu a partida por 5 a 0, e Nelson, um dos “empregados do


comércio”166, se tornou o primeiro goleiro campeão pelo Club de Regatas Vasco da
Gama. O clube conquistou a posse temporária da chamativa e bem confeccionada Taça
Constantino167, instituída pela Liga Metropolitana. A taça deveria ter a sua posse
perpétua disputada entre 1922 e 1924, por meio do somatório de pontos das equipes no
primeiro, segundo e terceiro quadro. As equipes da série A também disputavam o
referido troféu168.

Os vascaínos já haviam conquistado o campeonato do segundo e terceiro


quadro, mas era preciso que o primeiro quadro desse a verdadeira glória aos vascaínos.
O time era formado por Nelson, Mingote e Leitão; Nolasco, Braulio e Arthur; Paschoal,
Pires, Claudionor, Torterolli e Fernandes.

Nos torneios dos segundos terceiros quadros, obteve o Vasco a mesma


invejável actuação, levantando, por conseguinte, o campeonato das
três categorias.
Addicione, pois, o sympathico club de Santa Luzia mais este padrão
de glorias ás innumeras que até hoje tem colhido e continue sempre
trilhando a linha recta de suas gloriosas tradições [….]169

164
O Imparcial, 17 de julho de 1922, p. 1.
165
O Imparcial, 23 de julho de 1922, p. 8.
166
Fazendo menção à já citada política do Club de Regatas Vasco da Gama em dar postos no comércio
para seus jogadores. Enquanto, na verdade, eles estavam voltados à prática do futebol.
167
Sobre a Taça Constantino: “[...] originária do artesanato português rico de habilíssimos joalheiros no
lavor da prata e metais preciosos constituía oferta dos produtores dos afamados vinhos
CONSTANTINO”. ROCHA, 1975. Op. cit., p. 329.
168
O Imparcial, 31 de março de 1922, p. 7.
169
O Imparcial, 24 de julho de 1922, p. 1.

61
A torcida do Vasco comemorou com muito entusiasmo a conquista do clube, que
desde 1916 lutava em prol de glórias no esporte bretão. Fizeram uma carreata com
direito a vários automóveis, provavelmente havia alguns chauffeurs.

NOTAS DO DIA
OS VASCAINOS FAZEM UMA PASSEATA
Hontem á noite, realizou-se nesta capital, uma grande passeata
organizada pelo Club de Regatas Vasco da Gama.
Festejavam assim os valentes defensores da cruz de malta, a victoria
obtida no campeonato da serie B.
O cortejo compunha-se de grande numero de automóveis e
apresentava um lindo aspecto. Durante a sua passagem foram os
valentes vascaínos saudados por grande numero de pessoas.170

A festa descrita acima pelo jornal O Paiz demonstra um pouco do patamar que o futebol
havia alcançado, lembra, inclusive, ao estilo de comemoração em forma de carreata
utilizado até os dias atuais. Com as devidas diferenças históricas.

Porém, a alegria de Nelson e de seus companheiros durou pouco. O “caso


Leitão” ressurgia.

O CONSELHO DA 1ª DIVISÃO DA L.M. COMMETTE UMA


ILLEGALIDADE
Foram demarcados os pontos do Vasco no match contra o Carioca
A politicalha nefasta que, por muito tempo, imperou na Liga
Metropolitana, ameaçando até, por mais de uma vez, a existência
dessa agremiação parece ter ressurgido.
Não satisfeitos alguns elementos com a conquista nobre e leal do
campeonato da serie B da 1ª divisão pelo Vasco da Gama, entraram a
mover uma guerra de descredito ao Glorioso pavilhão do Cruz de
Malta, appellando para todos os recursos menos lícitos, com o fito
único e exclusivo de lhe arrancar o tão cobiçado titulo de campeão.
[...] sob o fundamento de que o quadro vencedor continha um jogador
– Albanito Nascimento – que não preenchia todos os requisitos
legaes.171

O Vasco já havia enfrentando por vários dias denúncias a respeito suborno de jogadores
rivais. Em contrapartida, acusava outros clubes de pagarem jogadores para atuarem com
mais “vontade” contra a equipe vascaína172.

170
O Paiz, 24 de julho de 1922, p. 2.
171
O Imparcial, 22 de agosto de 1922, p. 10.
172
SANTOS, 2010. Op. cit., pp. 267-269.

62
As denúncias não foram confirmadas: “Nunca passaram, porém, de alegações
vagas [...]”173. Os pontos retirados foram o do jogo contra o Carioca F.C., realizado em
16 de julho e ganho pelo Vasco por 8 a 3. A notar que o Conselho Superior retirou os
pontos em reunião no dia do aniversário do clube de Santa Luzia. Um presente.

A subjetividade de ser ou não analfabeto estava levando o caso à frente. Afinal,


Leitão já havia feito a inscrição de próprio punho. Ao que parece, ela foi contestada
devido à sua qualidade de escrita.

Exije-se, apenas, pela letra “h”, do art. 66; dos estatutos, que o
candidato saiba ler e escrever, e que não esteja abaixo do nivel moral
do amadorismo. Nada mais. Não se fazem resticções. Não se exije que
o candidato “saiba ler e escrever bem”, ou “muito bem”, mas, apenas,
que saiba “ler e escrever”. E isso Albanito provou firmando as suas
declarações.174

Novamente lançamos mão da obra de Mário Filho para ajudar a visualizar a


situação em que o jogador se encontrava na hora da inscrição:

Na hora de assinar a súmula via-se logo a diferença. Os acadêmicos de


medicina do Flamengo, escrevendo o nome depressa, os operários do
Carioca levando toda a vida para garatujar o nome. Alguns suando
frio, tremendo, achando que nunca seriam capazes de assinar o nome
na frente de todo o mundo.175

No final, valeu o resultado em campo. Nelson pode novamente comemorar o


título. A subjetividade do analfabetismo que ora foi contra o Vasco, voltou a seu favor.
Em 02 de outubro, o Conselho Superior da LMDT confirmou o título vascaíno, dando
fim ao que intitularam “O Caso Vasco da Gama”. A importância do caso se configura
pela matéria que tomou uma página completa do jornal O Imparcial com o parecer do
relator do Conselho Superior. Com direito a imagem da equipe campeã.

O CASO VASCO DA GAMA


O parecer do relator do Conselho Superior da Liga Metropolitana dos
Desportos Terrestres approvado unanimemente
[...]
O seu registro foi, portanto, regular, bom, legal, dele se originando um
facto jurídico perfeito, impossível de ser annullado [...]
[...]
Sem entrar na discussão do que seja analfabetismo deante das
correntes doutrinarias, nem querer estender-se sobre o nosso modo de

173
O Imparcial, 22 de agosto de 1922, p. 10.
174
O Imparcial, 24 de agosto de 1922, p. 10.
175
FILHO, 2010. Op. cit., p. 99.

63
pensar, diremos apenas que Albanito Nascimento não é analfabeto,
não se podendo como tal considerar quem escreve de seu próprio
punho uma “opção composta de quatro ou cinco linhas.”176

O “caso Leitão”, ou melhor, o “Caso Vasco da Gama”, aparentemente, havia terminado.

No mês de outubro, um grande campeonato para o Brasil já estava acontecendo,


o Campeonato Sul-Americano. O torneio fazia parte de uma festa ainda maior, tendo
eventos em outros estados como São Paulo, Bahia e Pernambuco:

O Campeonato Sul-Americano de 1922, conhecido como “Jogos


Desportivos do Centenário”, ou os “Jogos Olympicos do Rio de
Janeiro”, como constava no “Programa das Festas do Centenario”, foi
uma realização dentro de uma série de eventos em comemoração ao
centenário da independência do Brasil.177

O Campeonato Sul-Americano de 1922 teve como principal palco o Estádio das


Laranjeiras, especialmente construído para o evento de 1919. Neste, o maior estádio do
Rio de Janeiro receberia mais investimentos para poder suprir as necessidades da grande
festa de seleções nacionais.

O envolvimento do governo om o projeto dos Jogos do Centenário foi


muito maior do que quando o Brasil sediou pela primeira vez a
competição internacional de 1919. Arnaldo Guinle se apressou em
colocar o Fluminense mais uma vez à frente da empreitada. Epitácio
Pessoa, “sócio honorário” do Fluminense, facilitou a obtenção de
‘obrigações até a quantia de 5 mil conto de réis [5.000:000$000]’,
mais do que o dobro do investimento da competição anterior. Para se
ter uma ideia do que representava esse valor, vale dizer que
representou 5% de todas as despesas do governo durante o centenário,
calculado aproximadamente em 1000 mil contos de réis
[100.000:000$000].178

No campo, a arbitragem era questão de polêmica. Argumentando está sendo


prejudicada, a seleção Uruguai abandonou o torneio. Criou-se um conflito que somente
se resolveria no ano seguinte, quando os uruguaios sediariam e venceria o torneio.
Neste, o Brasil sagrou-se campeão vencendo a seleção paraguaia em jogo de desempate.
Anunciava O Imparcial em tom crítico:

176
O Imparcial, 02 de outubro de 1922, p. 6.
177
SANTOS, João Manuel Casquinha Malaia Santos. “Jogos Olympicos do Rio de Janeiro” no
Centenário de 1922: olhares sobre a política de um projeto de unificação e celebração da nação através do
esporte, p. 1. XXVI SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA - ANPUH: 50 anos. Disponível em:
<http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300899445_ARQUIVO_JoaoMCMalaiaSantosAnp
uh2011.pdf>. Acessado em: 12 dez. 2012.
178
Idem, p. 7.

64
5º Campeonato Sul Americano de Football
Salve BRASIL campeão de 1922!
O valoroso scratch brasileiro impõe-se brilhantemente importante
certâmen, não obstante a negliencia e fraqueza dos dirigentes do
desporto nacional179

Terminado o campeonato de seleções sul-americanas, as atenções dos amentes


do futebol carioca se voltaram para o embate entre Vasco e São Christovão. O primeiro,
campeão da série B. O segundo, último colocado da série A. Caso o Vasco vencesse,
disputaria com o América, o título de campeão da cidade, podendo ganhar inclusive a
alcunha de “Campeão do Centenário”. Uma das inusitadas regras do futebol carioca ao
longo da história.

O embate entre as duas equipes terminou em empate de 0 a 0, sofrendo forte


crítica pela qualidade do match.

CAMPEONATO DE 1922
Na prova eliminatória, o S. Christovão e o Vasco empataram por 0x0.
Para hontem a Liga Metropolitana determinou a realização da prova
eliminatória entre o primeiro colocado na serie B da 1ª divisão e o
ultimo colocado na serie A.
[...]
Se a partida muito deixou a desejar na parte techinica, isso se deu
apenas por culpa dos dois quadros disputantes. Foi mesmo uma
partida completamente falha de techinica. Basta dizer que o jogo mais
productivo, que é o feito por bolas centradas, esse não vimos ser
praticado durante toda a pugna. Apenas umas duas ou três bolas destas
observamos hontem.180

Nelson, o grande goleiro da série B, salvou o Vasco de uma possível derrota no fraco
embate da eliminatória.

Dos dois quadros, o que se fez jogo mais aproximado do football


association, foi o S. Christovão. Mas o que teve mais “chance” foi o
Vasco.
Entretato, quer-nos parecer que, dos dois, o que esteve mais próximo
da victoria foi o São Christovão. Quem viu as duas bolas perdidas
pelo São Christovão, quando todos já esperavam a queda das redes do
Nelson, não póde deixar de concordar connosco.181

179
O Imparcial, 23 de outubro de 1922, p. 1.
180
O Paiz, 06 de novembro de 1922, p. 5.
181
Idem.

65
Com o empate havia a expectativa de um jogo desempate entre as equipes.
Contudo, o “caso Leitão” retornou. Com a justifica de que o jogador Albanito
Nascimento não se inscreveu no prazo de 30 dias antes da partida, o São Christovão foi
nomeado o vencedor do jogo. O América foi considerado o Campeão do Centenário,
não precisando enfrentar a temida equipe de Nelson.

O S. CHRISTOVÃO VENCEDOR DO JOGO DE DOMINGO


CONTRA O VASCO DA GAMA
ASSIM, DELIBEROU, HONTEM182,
LIGA METROPOLITANA
Reunida, hontem, em sessão, a directoria da Liga Metropolitana de
Desportos Terrestres resolveu considerar o S. Christovão vencedor da
eliminatória de domingo ultimo contra o Vasco da Gama. E isso
porque, examinando a summula desse importante prelio, descobriu
aquella directoria que o player vascaino Albanito Nascimento, não
tinha condições de registro.
Em virtude dessa decisão não mãos se baterão os aludidos clubs em
match de desempate, como se esperava. E o campeão do Centenario já
poderá dormir sobre os louros da sua victoria, sem pesadelos...183

Leitão havia sido obrigado a fazer uma nova inscrição, “opção”, para regularizar
algo que já estava mais do que regularizado. Ele o fez no dia 04 de novembro, um dia
antes do match contra o São Christovão. Segundo as regras da Liga, os jogadores
somente poderiam atuar 30 dias após a “opção”. Alegando a desobediência à regra,
deram a vitória ao São Christovão. O Vasco recorreu.

Ordem do Dia
Dada a palavra ao Sr. Secretario Geral para comunicar o resultado do
jogo do 1º team com o S. Christovão A. Club “0x0” mas que a
Directoria da Liga M.D. Terrestres, em sua sessão de 6 do corrente
julgou como venedor o ultimo club, alegando não ter o jogador
Albanito Nascimento os 30 dias regulamentares de inscripção, após a
sua nova opção, feita na noite de 4 do corrente. Achando tal decisão
ilegal resolveu-se recorrer daquele acto para o Conselho Superior da
Liga M.D.T. por uma unanimidade.184

A torcida do Vasco era grande, mas a sua oposição se fazia presente. Afinal, um
time campeão com negros, a começar pelo goleiro, e brancos analfabetos, não agrava

182
Por um erro de digitação o jornal escreveu “hontem” se referindo ao dia 07 de novembro de 1922.
Todavia, a referida sessão da Liga ocorreu em 06 de novembro de 1922.
183
O Imparcial, 08 de novembro de 1922, p. 7.
184
Transcrição feita da Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 08 de novembro de 1922.

66
muitos adeptos de um futebol, digamos, elitista. O cronista “PERIGOSO”185 do jornal O
Imparcial, em sua coluna “DRIBBLANDO...”, traduz o sentimento dos que torciam
contra o grêmio vascaíno. O aludido cronista faz brincadeira jocosa com a situação
vascaína. Contudo, também dá indícios da audácia do Vasco e sua vontade em ser um
dos grandes no futebol carioca, e “ganhar o mundo”.

DRIBBLANDO...
[...]
A viagem do grêmio da Cruz de Malta que pojectava á Europa, caso
“ensorasse” o S. Christovão e depois o America, foi, á ultima hora,
transferida para outro centenário...
Pelo menos foi o que ouvimos do Albertino Moreira186.187

Neste sentido, acreditamos que o empate do Vasco também serviu para expor
outro marcante elemento da sociedade carioca no ano de 1922. Em vários setores da
sociedade se viu um aumento do preconceito contra a imagem do imigrante português.
Afinal, se completava cem anos da independência político-administrativa de Portugal. A
reação contrária ao imigrante dependia de sua condição social, recaía especialmente
sobre o imigrante português pobre188.

No esporte, e neste caso no futebol, como parte da sociedade, podemos dizer, foi
testemunha deste fato. O Vasco com uma grande torcida e grande parte dela de
indivíduos da colônia portuguesa de uma camada mais humilde, representava o
“inimigo”, o “atraso”. Soma-se a isto, a composição da equipe vascaína, marcadamente
formada por negros e brancos pobres, e muitos analfabetos como o Leitão. E os que
sabiam ler e escrever “um pouco” como Nelson. Este, que não caiu nas garras da Liga
porque após a sua inscrição em 1919 não trocou de clube. Logo, não precisou passar
novamente pela tortuosa situação189.

185
O cronista Raul Loureiro assinava como “PERIGOSO” sua coluna “DRIBBLANDO” no jornal O
Imparcial. SANTOS, 2010. Op. cit., p. 217.
186
Membro do departamento de Desportos Terrestres do Club de Regatas Vasco da Gama no ano de
1922. ROCHA, 1975. Op. cit., p. 311.
187
O Imparcial, 07 de novembro de 1922, p. 9.
188
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 112.
189
Para auxiliar na compreensão sobre o que o Vasco de Nelson estava causando, citamos o “ódio
destilado” de um colunista do Correio da Manhã, após o empate entre Vasco e São Christovão:
Continuando a oração – dizíamos – que seria natural que se esperasse a victoria do S. Christovão,
natural por todos os motivos. Pois bem, a fama do Vasco chegou a taes culminancias, á proporções tão
elevadas, que a crença geral era de que jamais o Vasco poderia deixar de vencer. Estava quase
decretada a victoria. Muito portuguez perdeu muito dinheiro em aposta, e só perdeu porque não entende

67
As relações dos bastidos do futebol resolveram as questões que deveriam ser
definidas em campo. Como nos informa O Paiz, o São Christovão: “NÃO VENCEU
NO CAMPO MAS GANHOU NA LIGA”190. O Vasco reagiu e conseguiu reverter a
situação, entrando para a série A, que teria 8 clubes no ano de 1923. O aumento de
clubes na série A, inclusive, já estava em debate desde o início do ano191. O São
Christovão não foi rebaixado192.

A mudança de posição a Liga talvez possa ser entendida por esta informação
dada pelo O Paiz, que identifica a força que o clube possuía com a sua torcida cada vez
maior, logo, mais lucrativa:

A RENDA DO MATCH ELIMINATORIO


Segundo nos informam, a prova eliminatória, entre o Vasco x São
Christovao rendeu cerca de cinco contos de réis.
A ser verdade, fica mais uma vez demonstrado que a torcida do Vasco
da Gama é um facto.193

O Vasco de Nelson entraria pela primeira vez no grupo das grandes equipes do
futebol carioca. Local em que estes reinavam absoluto desde 1906. Na temporada de
1922, o goleiro disputou todos os jogos do Vasco pelo campeonato. Somando a partida
eliminatória, foram 12 jogos, com 10 gols sofridos. Uma média de somente 0,76 gols
por jogo. Para a grande atuação da defesa, Nelson tinha ao seu lado o branco e pouco
instruído Mingote e o “analfabeto em escrita”, mas “doutor em futebol”, Leitão. Assim,
Nelson, tal como a equipe do Vasco, evoluía campeonato após campeonato.

de football, ou entende que no football só ganha quem quer ganhar. Correio da Manhã, 06 de novembro
de 1922, p. 3.
190
O Paiz, 09 de novembro de 1922, p. 6.
191
O Imparcial, 29 de março de 1922, p. 7.
192
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 272.
193
O Paiz, 08 de novembro de 1922, p. 6.

68
2.2 O Primeiro Goleiro Negro Campeão Carioca

COMPLETOU 24 ANNOS, FEZ 24 PONTOS E VENCEU UM


CAMPEONATO
O dia de ante-hontem foi um grande dia para um grande keeper
vascaino.
Nelson, o sympathico jogador do Vasco da Gama, ante-hontem
completou 24 primaveras; o seu quadro marcou 24 pontos e
conquistou de modo brilhante o campeonato carioca.
Sobre este feito, no reservado de socios do Botafogo F.C. vimos,
domingo, uma linda “torcedora” vascaína comentar com alegria o
grande dia de Nelson, que é, sem dúvida, o melhor keeper de nossos
campos.194

O ano de 1923 foi especial em todos os sentidos para Nelson, para o Vasco e
para o futebol carioca. De uma só vez, Nelson se tornaria o primeiro goleiro negro a ser
campeão carioca, a defender a seleção carioca e a seleção brasileira. Nelson já havia
conquistado status de ídolo para a torcida do Vasco. A citação acima, vemos um
testemunho do sucesso de Nelson e do futebol entre as mulheres. No caso, de uma
torcedora vascaína eufórica.

A base do time do Vasco durante o campeonato de 1923 foi: Arlindo (Arlindo


Pacheco); Arthur (Arthur Medeiros Ferreira); Bolão (Claudionor Corrêa); Cecy (Silvio
Moreira); Leitão (Albanito Nascimento); Mingote (Domingos Passini); Negrito (Alípio
Marins); Nelson (Nelson da Conceição); Nicolino (João Baptista Soares); Paschoal
(Paschoal Silva Cinelli); Torterolli (Nicodemes Conceição)195196. De uma forma
clássica, a escalação era esta: Nelson, Leitão e Mingote; Nicolino, Bolão e Arthur;
Paschoal, Torterolli, Arlindo, Ceci e Negrito.

O goleiro Nelson197, como já dissemos, veio do Engenho de Dentro. Arlindo já


havia atuado em equipes como o Villa Izabel, America e Botafogo, ou seja, um

194
O Paiz, 14 de agosto de 1923, p. 9.
195
ROCHA, 1975. Op. cit., p. 349.
196
O Imparcial, 02 de março de 1923, p. 8.
197
Nelson da Conceição, mesmo após sua saída do Vasco em 1928, continuou sócio do Club de Regatas
Vasco da Gama. Em 21 de julho de 1929, Nelson defendia as cores do Bangu. Para atuar pelo Bangu
contra o Vasco, no citado dia, em jogo válido pelo Campeonato Carioca de 1929, Nelson enviou um
ofício ao Vasco. Com o objetivo de consultar a possibilidade de enfrentar seu antigo clube. Haja vista,
que era sócio do Vasco. O clube concedeu a licença ao goleiro, sem que este perdesse seus direitos
associativos. Isto, ao nosso modo de ver, denota uma boa relação mantida entre o atleta e o clube, após
sua saída como atleta. Diario Carioca, 21 de julho de 1929, p. 9.

69
experiente “borboleta”. Arthur veio do Hellenico. Bolão198, ou Claudionor Corrêa, era
jogador do Bangu. Leitão, como já dissemos, foi jogador do Bangu. Mingote veio do
Pereira Passos F.C.. Negrito, capitão do Vasco em 1923, veio do Lapa Football Club.
Nicolino veio do Andarahy. Do S.C. Rio de Janeiro, Paschoal veio jogar no Vasco. Por
último, Torterolli. O atleta veio do Cattete F.C., mas fazia parte do time do Engenho de
Dentro, ao lado de Nelson. Contudo, não teve a mesma ascensão do goleiro199.

Nelson e os demais jogadores vascaínos constituíam uma equipe que


“representava” a sociedade brasileira, especialmente a carioca na República Velha:

[...] estava muito mais próxima de ser reconhecida em campo pelas


camadas mais baixas da sociedade do que um time cheio de
advogados, médicos, engenheiros e estudante das mais diversas
faculdades, quase todos brancos e com sobrenomes distintos, muitas
vezes estrangeiros.200

Dos onze jogadores que compunham a base de 1923, quatro eram negros: Nelson,
Bolão, Cecy e Nicolino. Os dois últimos tidos como analfabetos. Os demais sete
jogadores eram brancos “à brasileira”, mestiços. Destes: Leitão, Mingote, Paschoal e
Torterolli eram acusados de analfabetismo.201
Os dirigentes vascaínos pegaram esses jogadores e os profissionalizaram,
transformando-os em verdadeiros “operários da bola”. Indo de acordo com a lógica
capitalista cada vez mais instituído no futebol e nos demais setores da sociedade
brasileira à época.
Eram homens que faziam com que mais uma engrenagem do mundo
capitalista tomasse forma dentro da cidade, homens que encaravam a
relação profissional do trabalho dos jogadores de sua equipe, pois
estes recebiam salários para se dedicar exclusivamente a atividades
que executavam melhor do que as outras pessoas.202

Nelson e seus companheiros vindos das camadas populares da sociedade


desestabilizariam um sistema que mantinha homens “gran finos” dominando os

198
Claudionor Corrêa se inseriria para sempre no quadro social do clube. Anos mais tarde ser tornaria
Diretor de Desportos Terrestre. Cargo que exercia em 1934, quando o Vasco conquistou o seu 4º
Campeonato Carioca. Titulo este que veio com uma equipe formada por um trio formidável de jogadores
negros: Domingos da Guia, Fausto e Leônidas. O Bolão, alcunha que possuía desde a sua infância, se
tornou Grande Benemérito do Club de Regatas Vasco da Gama. Documento do Conselho Deliberativo do
Club de Regatas Vasco da Gama: 19/01/1945 a 12/09/1944, 17 de janeiro de 1944.
199
SANTOS, 2010. Op.cit., pp. 217-283.
200
Idem, pp. 283-284.
201
Idem, p. 283.
202
Idem.

70
principais títulos das principais ligas do futebol carioca. Os dirigentes e jogadores dos
grandes clubes, membros das camadas dominantes, da elite, se viram obrigados a perder
para uma equipe de negros e brancos analfabetos, pertencente a um clube da colônia
portuguesa e com uma imensa torcida das mais diversas camadas da sociedade.
O futebol proporcionou visibilidade a um grupo de indivíduos que
eram até então invisíveis. As classes populares, apesar dos limites,
operaram com muita sagacidade sobre seus problemas e alcançaram
resultados valiosos no cenário social a partir do futebol. Isso tudo se
deu a partir de muitas tensões e, fundamentalmente por isso, este
esporte se tornou tão significativo para a história do Brasil.203

Neste sentido, podemos enxergar a importância do player. Nelson era um goleiro


profissional, valorizado por seu clube e pela sua torcida. Nas atas do clube podemos
encontrar os indícios dessa valorização. O goleiro chegava a receber 232$000204205, em
espaço temporal inferior a um mês, antes de começaram os jogos do campeonato da
Liga. Mais do que o salário mensal de um operário no Rio de Janeiro, “em contas de
farmácia”206.
Em disputa por jogos do campeonato, Nelson poderia ganhar pelo menos
200$000207 por partida. Citando como exemplo, no mês de julho de 1923, o Vasco
enfrentou, na sequência, as equipes do Flamengo, do América e do Fluminense. A título
de comparação, em 1922 os operários de construção civil ganhavam: 199$999
(pedreiro), 180$000 (carpinteiro) e 173$333 (pintor). Em 1923: 212$499 (pedreiro) e
199$999 (carpinteiro)208. Desta forma, Nelson poderia ganhar em uma única partida
mais do que o salário mensal de um carpinteiro da construção civil. Com a sequência
dos referidos três jogos, isto equivaleria a 600$000. Infelizmente esbarramos na
ausência de fontes para um melhor detalhamento da vida esportiva de Nelson.
O Vasco não era o único a fazer pagamento aos seus jogadores para
desenvolverem o seu futebol dentro de campo, tão pouco, na busca de novos e melhores

203
SANTOS, Ricardo Pinto dos. Tensões na consolidação do futebol carioca, p. 211. In PRIORI, Mary
Del; MELO, Victor Andrade de. História do Esporte no Brasil: Do Império aos dias Atuais. São Paulo:
Editora UNESP, 2009.
204
Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 08 de março a 05 de abril de 1922.
205
Os valores gastos com Nelson basicamente se referem ao mês de março de 1922. A equipe disputou
um único amistoso, no dia 12 de março de 1922. Venceu o Villa Izabel por 1 a 0. O primeiro jogo do
Vasco pelo campeonato somente se daria no dia 16 de abril de 1922.
206
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 256.
207
FILHO, 2010. Op. cit., p. 123.
208
LOBO, Eulalia Maria L. e STOTZ, Eduardo Navarro. Flutuações cíclicas da economia, condições de
vida e movimento operário – 1880 a 1930. Revista Rio de Janeiro. Niterói, vol1, n°1, set/dez, 1985. p.
82.

71
jogadores para montar equipes capazes de fazer um espetáculo para um público cada
vez mais exigente. Era prática já disseminada, das mais diversas maneiras, no futebol
carioca na década de 20. Inclusive, feita pelos clubes da elite. A defesa do amadorismo
estava mais ligada à tentativa dos clubes de elite em manter o seu status quo: “Na
realidade, pretendia-se a exclusividade da prática e da organização do futebol por parte
da elite”209.
Contudo, o Vasco levou isto ao extremo, marcadamente profissionalizando e
especializando o indivíduo como jogador profissional. Neste sentido, criou a
possibilidade para que um jogador negro como Nelson ascendesse no futebol e se
tornasse um ídolo do futebol carioca na década de 20 do século XX. Da mesma forma,
outros jogadores negros como Nelson aproveitaram a chance de usufruir do futebol
como meio de sustento.
Um apontamento interessante pela valorização do jogador por parte do clube se
refere às premiações dadas aos seus atletas. Destoando, ao que parece, com clubes
consagrados do futebol carioca. Após o título da série B e entrada na série A da 1ª
Divisão do campeonato da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres, Nelson e mais
40 jogadores, de todos os quadros do futebol, foram condecorados pelo clube.
O C.R. VASCO DA GAMA VAE PREMIAR 41 JOGADORES,
CAMPEÕES DE 1922
A digna directoria do glorioso Club de Regatas Vasco da Gama, que
no anon passado levantou os torneios dos primeiros, segundos e
terceiros teams da série B, da 1ª divisão, preparou para hoje uma
brilhante vesperal, que será realizada nos salões do Club Gymnastico
Portuguez.
O motivo principal dessa reunião, que terá um cunho solemne, é a
entrega das medalhas de ouro especialmente feitas para esse fim, aos
seus jogadores, que tão brilhantemente alcançaram o titulo de
campeão do Centenario, para o glorioso pavilhão da Cruz de Malta.
O gesto da dirctoria do Vasco é digno de ser imitado por alguns clubs,
que ainda devem aos seus jogadores, medalhas de campeonatos
conquistados há cinco, seis e sete anos passados210.
Eses prêmios, que sendo conferidos aos 41 socios do grêmio da Cruz
de Malta, servirão de estimulo aos seus conquistadores, que ainda para
o futuro não regatearão esforços para alcançar novas glorias.
Os jogadores que vão receber medalhas de ouro são os seguintes:
Nelson da Conceição [...]211

209
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 142.
210
Se calcularmos pelos anos, veremos que nos sete anos anteriores, América (1916-1922), Fluminense
(1917-1918-1919) e o Flamengo (1920-1921) foram os campeões.
211
O Imparcial, 01 de abril de 1923, p. 9.

72
Com este estímulo, o Vasco de Nelson começaria o campeonato de 1923. O
estádio para os jogos do Vasco seria o maior da cidade, o campo do Fluminense212. A
primeira partida foi contra o Andarahy. O resultado final foi um empate em 1 a 1, no dia
15 de abril., no estádio do Botafogo, à rua General Severiano. Por ter usado um jogador
de forma irregular, João Martins, o “Joaozinho”, o Andarahy perdeu os pontos da
partida213. Esta situação se desenrolaria por todo campeonato, contudo, o Vasco ganhou
os pontos.
O time saiu na capa do O Imparcial. O número de torcedores no evento foi
“colossal”.
VASCO X ANDARAHY
Effectuou-se hontem, á tarde, na magnifica praça de sports da rua
General Severiano, o match de campeonato entre os quadros do Vasco
da Gama e do Andarahy.
O jogo que era esperado com interesse entre os adeptos dos clubs
disputantes, foi premiado por uma colossal assistência, que encia o
vasto campo do Botafofogo F.C.214

Nelson foi um dos destaques da equipe do Vasco, tal como o seria durante toda a
temporada: “O team jogou bem, principalmente no final da peleja. [...] Negrito e Nelson
portaram-se bem [...]”.
Alguns jogadores vascaínos sofreriam com as perseguições da Liga durante o
campeonato, principalmente os jogadores Cecy, Nicolino e Torterolli.
TELÊ, CECY E NICOLINO TIVERAM OS SEUS REGISTROS
CASSADOS
A directoria da Liga Metropolitana, em sua sessão secreta de ante-
hontem, á noite, cassou o registros dos conhecidos players Telê, meia-
direita do Andarahy; Cecy, ex-defensor do Villa Isabel, e Nicolino,
tambem do Andarahy, por serem analphabetos.
[...]
TORTEROLLI NÃO SABE TAMBEM O A.B.C.?
Ao que fomos informados, a directoria da entidade carioca, em uma
reunião de ante-hontem, á noite, cassou tambem o registro do
excelente forward Torterolli, pertencente á equipe principal do Vasco
da Gama, por ser inimigo da literatura...215

Estes jogadores já haviam atuado em outras equipes, inclusive na 1ª Divisão.


Não entraremos em detalhes sobre estes casos, especialmente porque nos cabe
entender o caso de Nelson. Contudo, acreditamos que isto ajuda a compreender um

212
O Imparcial, 03 de abril de 1923, p. 7.
213
O Imparcial, 24 de maio de 1923, p. 12.
214
O Paiz, 16 de abril de 1923, p. 2.
215
O Imparcial, 17 de março de 1923, p. 7.

73
pouco como Nelson e seus companheiros tiveram que lidar a todo o momento com a
desconfiança, a acusação e a ridicularizarão por parte da Liga e da imprensa carioca.
Estavam sempre sob suspeita e na constante iminência de serem punidos.
A REUNIÃO DO CONSELHO DA 1ª DIVISÃO
[...]
Outros representantes intervêm, todos frisando a violência do
presidente da Liga e, dizem, que manterão o seu acto, o que resultará
na não aprovação dos jogos em que o Vasco da Gama tome parte este
anno.216

A despeito das adversidades, o segundo jogo seria contra o Botafogo. O primeiro


contra um dos grandes quatro grandes à época. A equipe de Nelson venceu por 3 a 1, no
estádio do adversário. O destaque foi mais para os desfalques da equipe do Botafogo,
que acabaria por ter de lutar contra o rebaixamento, do que para o fato daquele time de
“suburbanos” ter conseguido uma boa vitória. O Vasco de Nelson “triumphou sobre o
Botafogo”.
BOTAFOGO X VASCO DA GAMA
Os onze animosos e esforçados rapazes que tiveram, hontem, a
incumbencia de defender as côres do Botafogo F.C., obtiveram muito
resistindo, como fizeram, á possante equipe vascaína.217

O match seguinte seria o mais difícil até o momento, Nelson e seus


companheiros enfrentariam o Flamengo. Os clubes eram velhos conhecidos no remo, o
Vasco já havia levado o campeonato sete vezes, o Flamengo três. Mas, no futebol, as
coisas eram bem diferentes. O Vasco era uma equipe emergente, com grande torcida,
seu grande ídolo era um goleiro negro e possuía um plantel recheados de negros e
brancos analfabetos, e disputava pela primeira vez o campeonato da Liga entre os clubes
mais ricos da cidade. O Flamengo já possuía quatro títulos.
Com a vitória de 3 a 1 sobre os tetracampeões da cidade, o Vasco se colocava de
vez como um dos candidatos ao título.
FLAMENGO X VASCO DA GAMA
No seu aprazível “ground” da rua Paysandú o C de R. do Flamengo
enfrentou hontem, pela primeira vez no actual campeonato da cidade,
um dos seus sérios concorrentes ao cobiçado titulo de campeão da
Metropolitana.
Foi ele o C de R. Vasco da Gama.218

216
O Imparcial, 11 de maio de 1823, p. 9.
217
O Imparcial, 23 de abril de 1923, p. 1.
218
O Imparcial, 30 de abril de 1923, p. 1.

74
Com a vitória sobre dois grandes, os rivais e a imprensa começavam a olhar o Vasco de
um modo diferente. O time ganhou a fama de invencível. Os dois próximos jogos
seriam contra América e Fluminense, mais dois dos grandes clubes da Liga.
No dia 13 de maio de 1923 completavam-se 35 anos do fim do regime de
escravidão da mão de obra negra no Brasil. Os jornais faziam alusão à data. No jornal O
Paiz, o personagem homenageado foi José do Patrocínio, um dos líderes negros na luta
pela abolição, “PATROCINIO – O VERBO FEITO REVOLUÇÃO”, dizia na capa do
referido jornal. Uma referência, devidamente explicada no corpo do texto, à luta de
vários homens através da escrita e da fala para que se pusesse fim à escravidão.
Nos gramados cariocas, o revolucionário era Nelson. Com grande atuação, seu
time venceu o “Campeão do Centenário” por 1 a 0. Arlindo marcou o gol da vitória.
Todavia, Nelson foi o grande nome do jogo. Com suas defesas impediu que as redes
vascaínas balançassem. Igualmente, Nelson foi indicado como um jogador fundamental
para as últimas conquistas vascaínas.
E fechando o triangulo final vem Nelson, o arqueiro formidável, que
tem dado ao seu club dias de gloria.
Foi, sem dúvida, o melhor elemento do seu quadro. Sempre atento e
vigilante, não houve bola que lhe atravessasse em frente ás traves a
que lhe não se atirasse para devolvel-a aos seus companheiros.
Arlindo e Nelson são os dois heroes da tarde de hontem, aos quaes o
Vasco deve a sua brilhante victoria.219

A vitória vascaína foi concretizada no estádio do América, à rua Campos Salles.


O estádio, como os outros da cidade, parece que estava ficando pequeno par receber
tantas pessoas que queriam ver aquele Nelson e os “cracks analphabeticos”.

Apezar de estarem muito augmentadas as installações do glorioso


campeoão do centenário, desde cedo todas as localidades se achavam
tomadas; muito antes mesmo do inicio do jogo preliminar era difícil a
conquista de um canto de onde se pudesse assistir ao combate, que
prometia ser empolgante.220

O último grande a ser enfrentado seria o Fluminense. Pela primeira vez no


campeonato o Vasco jogaria no grande estádio da Capital, no “Stadium”, estádio da rua
Guanabara221. O Vasco de Nelson, com sua caminhada imbatível, não estava agradando
muita gente: “O Vasco, não há duvida, contra os nossos mais afamados conjuntos tem

219
O Imparcial, 14 de maio de 1923, p. 2.
220
Idem.
221
Conhecido popularmente, na atualidade, como Estádio das Laranjeiras.

75
tido alguma sorte. É que encontrou todos fora de forma e desfalcados dos seus melhores
elementos.”. A cada jogo colocavam as expectativas no adversário, com a perspectiva
de conseguir sobrepujar o “team” vascaíno: “Hoje, porém, o Vasco var enfrentar um
adversário bem preparado e possante. Conseguirá abatel-o?”.
Não. A equipe do Vasco venceu por 1 a 0 o Fluminense, maior campeão da
Liga. A “sorte” e o bom futebol faziam com que os quatros clubes da elite caíssem um a
um. Nelson, mais uma vez era destaque: “[...] Nelson, o keeper admirável, a quem o
Vasco deve inquestionavelmente a sua victoria de hontem.”222. Assim, Nelson, jogo a
jogo, conquistava a admiração dos outros, além dos vascaínos.
O Vasco enfrentou mais dois adversários antes do fim do primeiro turno, venceu
o Bangu e o São Christovão, ambos por 3 a 2. Terminou a primeira parte do
campeonato sem derrotas, com todos os pontos conquistados223. Uma charge publicada
no jornal O Paiz ajuda a perceber o efeito que o time de Nelson estava causando. Eram
dois personagens, um representava o Vasco, o outro personagem representava os clubes
demais clubes da série A:
COISAS DO FOOTBALL
VASCO – Então, amigos, tenho atropelado alguma coisa a “escripta”
de vocês?
CLUBS DA SERIE A – Maldita hora em que concorremos para o
aumento da série...224

Diziam “maldita hora”, mas poderia ser uma ajuda divina. O então presidente do
clube, Antonio da Silva Campos era acusado de “mandinga” religiosa, com sua fé em
Nossa Senhora das Vitórias225. Os jogadores também levavam as suas “medalhinhas”.

COISAS DO FOOTBALL
No football há mesmo coisas interessantes.
O Vasco, com as medalhas no pescoço de Nossa Senhora da Victoria
ainda não perdeu neste campeonato [...]226

Simultaneamente ao descrédito e insinuação de sorte, a qualidade do time era


reconhecida, mesmo com as devidas doses de elogios. O fato era: o Vasco de Nelson
havia derrotado todos os grandes clubes do Rio de Janeiro. As comemorações tomavam

222
O Imparcial, 21 de maio de 1923, p. 2.
223
Cada vitória valia dois pontos e o empate valia um ponto.
224
O Paiz, 08 de junho de 1923, p. 8. Ver FIGURA 23, p. 116
225
O Imparcial, 22 de maio de 1923, p. 9.
226
O Imparcial, 23 de maio de 1923, p. 9.

76
a cidade: “[...] os automóveis de praça, parecia que só havia chauffeur português,
vinham tocando buzina por ai afora, anunciando mais uma vitória do Vasco.”227

O returno começaria contra o mesmo Andarahy, o público esperado era grande:


“O campo da rua Prefeito Serzedello será pequeno para conter a multidão que lá affluirá
hoje, para assistir á sensacional pugna entre o club local e o Vasco da Gama, até agora
invencível”.228. O Vasco venceu por 3 a 1. Nelson, assim como em todos os outros
jogos, estava entre os destaques: “Dos visitantes, destacaram-se Nelson, Claudionor,
Negrito e Cecy [...]”229.

A partida do returno contra o Botafogo foi realizada no estádio do Fluminense.


No dia 1º de julho, o Vasco conquistava mais uma vitória. O time jogou bem e ganhou a
difícil partida com a atuação vital do seu goleiro negro.

A ACTUAÇÃO DOS TEAMS


Do Vasco da Gama, todos, em geral, jogaram bem e com vizivel
empenho de se não deixarem abater.
Nelson, como sempre, esteve firme nas suas pegadas, que não foram
poucas. A ele muito devem os vascaínos o resultado da tarde de
hontem.230

As esperanças dos que não gostavam de Nelson e companhia estavam depositadas em


algum dos grandes que ainda tivesse forças para destronar aqueles negros e brancos
“doutores em futebol.

O próximo jogo seria contra a equipe do Flamengo, a única com chances


matemáticas de tirar o título das mãos dos vascaínos. Na cidade, os amantes do esporte
bretão esperavam ansiosos pela partida.

A sensacional pugna Vasco da Gama x Flamengo


Sem duvida alguma, a partida de hoje, a travar-se no stadium do
Fluminense já pela colocação dos concorrentes, que pelo valor de cada
uma das esquadras, será a mais importante do presente campeonato.
De um lado, em completa forma, temos o “onze” vascaíno, até agora
sem uma derrota, encorajado pelas suas victorias precedentes e
possuindo uma defesa bem organizada. De outro, o Flamengo, o
sympathico campeão de mar e terra senhor de um jogo apreciável e
com três pontos apenas perdidos na tabela da Metropolitana, o que

227
FILHO, 2010. Op. cit., p. 122.
228
O Imparcial, 24 de junho de 1923, p. 11.
229
O Imparcial, 25 de junho de 1923, p. 13.
230
O Imparcial, 02 de julho de 1923, p. 3.

77
importa adeantear que o titulo máximo ainda lhe póde vir ás mãos,
bastando somente para tanto um pouco de “chance”.231

Em 08 de julho, o Vasco de Nelson conheceu a sua única derrota no


campeonato, pelo placar de 3 a 2. A partida representou a rivalidade de um lado, de
todos aqueles que se identificavam com o Vasco de Nelson e, do outro, todos aqueles
que se identificavam com os clubes da elite carioca. O público presente no estádio foi
recorde.

Há uma semana que, em todos alreulos desta cidade, em outra coisa se


não falava. O encontro Vasco x Flamengo era motivo obrigatório de
todas as conversas. E o delírio chegou a tal ponto que avultadas
apostas foram fechadas entre os mais apaixonados adeptos dos dois
clubs. Dahi a explicação natural da colossal assistência que affluiu,
hontem, á bela praça de desportos da rua Guanabara.
Jamais se viu mesmo tanta gente num jogo de football.
Os proprios matches dos campeonatos sul-americanos não o
excederam nesse particular. Porque, sem exagero, para mais de 35.000
pessoas enchiam as vastas dependências do tricolor, na bela tarde de
hontem. A aglomeração foi tanta que ainda em meio do jogo dos
segundos teams, o povo das archibancadas se viu na contingencia de
invadir o campo, por se sentir, talvez, sem ar...232

A derrota do time vascaíno realçou o sentimento anti-lusitano, indicando que


não somente irritava a origem dos jogadores vascaínos, negros e pobres como Nelson,
brancos e igualmente pobres como Leitão. O sucesso de um clube da imensa colônia
portuguesa no Rio de janeiro também não agradava.

Haja vista o que ante-hontem sucedeu com a victoria do Flamengo


sobre o Vasco.
Este, invencível até então, foi sobrepujado lealmente por um
adversário destemido e valoroso.
Os torcedores da partida de ante-hontem, depois da victoria do rubro-
negro, transformaram a nossa cidade em theatro de scenas bem
desagradáveis.
Formado grupos, ou apinhados em automóveis, vinham fazendo
desatinos e menosprezando aquelles que foram derrotados.
[...]
Vimos passar em frente á nossa redação, um grupo bem numeroso,
levando em sua frente um estandarte, com ditos ofensivos e com um
tamanco dependurado!
E logo atraz, aquelle aluvião de torcedores, cantando e provocando a
laboriosa e grande colônia portuguesa de nossa bela capital.

231
O Imparcial, 08 de julho de 1923, p. 12.
232
O Imparcial, 09 de julho de 1923, p. 2.

78
Isso não é correto, e antes de mais nada é incivil e grosseiro.[...]233

Uma luz que surgia no final do túnel para os que viam em Nelson e nos
“analphabeticos” vascaínos uma deturpação no modus operandi do futebol carioca. Os
defensores do futebol carioca “amador” mantinham a chance de não ver um chauffeur
campeão. Nos afirma o historiador João Malaia:

A derrota para o Flamengo foi o máximo para a imprensa carioca, pois


provava que a receita do Vasco não era infalível e que seu time podia
ser batido. E a equipe rubro-negra que bateu o Vasco era uma legítima
representante do “futebol amador”. Seus “amadores”, na maioria
gaúchos e paulistas, haviam saído de suas cidades de origem por
“amor” ao Flamengo, e pelos empregos arranjados pelos diretores do
clube.234

É provável que muitos chauffeurs estivessem lá no estádio da Rua Guanabara


para torcer pelo grande goleiro Nelson. Este, que escapou as críticas pela derrota. Sem
ele, ela poderia ter vindo muito mais dolorosa para todos aqueles adeptos da falange
vascaína: “Do Vasco da Gama, o vencido, Nelson foi o heroe da tarde [..]235.

A partida seguinte seria contra o América. Era preciso uma vitória para não
permitir que o título escapasse. Demonstrando grande força de vontade, a turma
vascaína esqueceu a derrota e sobrepujou a equipe rubra por 2 a 1. Nelson, ao que
parece, fazia com que seu nome fosse uma unanimidade.

COMO ACTUARAM OS TEAMS


Do vencedor, Nelson foi a figura de mais destaque. Fez optimas
defesas. Valeu por meio team. Leitão, Mingote e Claudionor tambem
merecem francos elogios pela sua actuação.236

O último grande a ser enfrentado seria o Fluminense. Era, talvez, a última


chance de uma nova derrota vascaína. Todavia, para alegria dos chauffeurs, operários,
comerciantes portugueses e outros, o Vasco venceu por 2 a 1. Com a derrota do
Flamengo para o Bangu, o Vasco manteve a diferença para este segundo colocado em

233
O Paiz, 10 de julho de 1923, p. 9.
234
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 310.
235
O Imparcial, 09 de julho de 1923, p. 2.
236
O Imparcial, 23 de julho de 1923, p. 2.

79
três pontos. Nelson mais uma vez teve grande atuação: “Nelson e Ramos actuaram bem,
fazendo defesas seguras e magistraes”237.

O grande dia estava chegando. Pela primeira vez na história do futebol carioca
um goleiro negro poderia se tornar campeão da mais rica liga da cidade. Mais do que
isso. Pela primeira vez um jogador negro teria o gosto de ganhar dos clubes mais ricos
da cidade e se tornar campeão da cidade. A data do jogo contra o São Christovão , que
valia o título, não poderia ser mais significativa para Nelson. Embora os jornais não
chamassem a atenção para este feito diretamente, com o exposto acima, percebesse que
aquele time havia revolucionado o futebol carioca na década de 20.

No dia 12 de agosto de 1923, Nelson completaria 24 anos e ajudaria o Vasco a


ganhar o título de campeão da cidade pela maior liga do Rio de Janeiro. Na eminência
da festiva data para Nelson e todos os vascaínos, o goleiro recebeu homenagens do seu
clube e de torcedores. A citação a seguir foi publicada no jornal O Imparcial, assinada
por um amigo de Nelson, que se intitulou “BOM CENTRO”. De forma descontraída,
descrevendo um engraçado “programa de festividades”, este amigo de Nelson, ao
homenageá-lo, nos explica um pouco como era a relação entre Nelson, seus amigos de
time, com o clube e a torcida.

NOTA OFF-SIDE
NELSON FAZ ANNOS HOJE
A data de 12 de agosto é de intenso jubilo para todos os adeptos do
glorioso club de Regatas Vasco da Gama, porque assignala o natalício
do seu sympathico keeper vascaino, Nelson da Conceição, o
assombroso da “série A”, que hoje conquista mais uma linda victoria
para o invencível team da sua preciosa vida.
Sportman muito querido por todos os vascaínos, o Nelson tem paixão
rara pela gloriosa camisa da Cruz de Malta, que há bastante tempo
vem defendendo com galhardia e dedicação.
Muitas festas estão para hoje projectadas em honra do “guarda rede
vascaíno”.
O programma está assim constituído:
Ás 8 horas – Sermão na A Capella pelo reverendíssmo Narciso
Bastos, que terá como auxiliares os conhecidos e veteranos
reverendos, Albertino e Rodrigues.
Ás 9 – Lindo discurso na rua Moraes e Silva, pelo Dr. Godoy que
provará que o Nelson não é “peludo” como dizem!...
Ás 11 – Exhibição dos Campeões do concurso de belleza, Leitão e
Jupira.
Ás 12 – Lauto almoço de 500 talheres no melhor Restaurante chinez
que houver.

237
O Paiz, 30 de julho de 1923, p. 2.

80
Depois disso não conseguimos saber a continuação do vasto
programma, que dizem seguirá por ahi afôra...
Muitos presentes tambem o Nelson vae receber, sendo alguns de real
valor.
Ao romper da manhã de hoje, no campo da rua Moraes e Silva, irá
tocar a banda de musica do mafuá de Engenho de Dentro.
Ao querido amigo Nelson, desejo muitas e muitas victorias para team
da sua festejada vida.
BOM CENTRO. [...]238

Dentre as “festividades” do aniversariante estava a conquista do campeonato de


1923. Com uma vitória por 3 a 2 sobre o São Christovão, no campo do Botafogo, em
General Severiano239, o Vasco de Nelson foi campeão: “O Vasco da Gama, abatendo o
São Christovão por 3x2, levanta brilhantemente o campeonato carioca de 1923240.

Nelson era reconhecido o melhor goleiro do futebol carioca. O rapaz negro de 24


anos, que nasceu em Nova Friburgo, se mudou com a família para o Rio de Janeiro em
busca de melhoria de vida, encontrou no futebol a seu espaço de subsistência. Devido as
suas condições técnicas e não a sua cor de pele, teve o seu talento reconhecido e fez
parte de uma equipe montada para levar o Club de Regatas Vasco da Gama ao mesmo
patamar dos grandes clubes cariocas: “Os rapazes do Vasco se levantavam para dar o
seu grito de liberdade e celebravam a vitória da sua profissionalização, a conquista de
um espaço significativo no seio da sociedade carioca e importantes ganhos
econômicos”241.

A última partida seria contra o Bangu, no estádio da rua Ferrer. Já campeão, o


Vasco de Nelson empatou em 2 a 2. As comemorações prosseguiam. Os chauffeus,
como já indicamos, se identificavam como sendo membros mais humildes das camadas
sociais cariocas, e como muitos deveriam ser adeptos do Vasco e fãs de Nelson,
resolveram homenagear team:

Informa um vespertino:
“Sabemos que os chauffeurs adeptos do Vasco pretendem homenagear
o campeão da cidade, indo incorporados a Bangú, no dia do jogo final,

238
O Imparcial, 12 de agosto de 1923, p. 25.
239
O jogo não se realizou no campo Estádio das Laranjeiras, porque o Fluminense jogava no mesmo dia
contra a América.
240
O Imparcial, 13 de agosto de 1923, p. 2.
241
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 311.

81
afim de conduzir para a cidade todos os jogadores e associados do
grêmio da Cruz de Malta.”242

O Vasco de Nelson terminou o campeonato com 11 vitórias, 2243 empates e


apenas 1 derrota. A equipe sofreu 19 gols em 14 jogos, média de 1,35 por partida. Era
um feito para uma equipe que acabara de chegar no espaço dos grandes clubes da
cidade. A legião de fãs do goleiro estava em festa, o goleiro recebia homenagens.

UMA HOMENAGEM AO KEEPER NELSON CONCEIÇÃO


O ardoroso vascaino J. Pinto acaba de confeccionar um retrato a óleo
do grande keeper Nelson Conceição.
O retrato, que é em tamanho natural, vai ser oferecido ao club.244245

Para se ter uma ideia da importância que a imagem do goleiro negro vascaíno
havia alcançado, nos jornais Correio da Manhã, de 14 de março de 1923 e no A Noite,
de 13 de março de 1923, foi publicado uma propaganda de um suplemento alimentar. O
“garoto propaganda” era o goleiro Nelson. Uma propaganda semelhante, do mesmo
suplemento, foi repetida após o título vascaíno, pelo jornal O Imparcial.

Vasco da Gama
Certifico que tenho obtido muito bons resultados com o uso do
“Fortifican”, sentindo-me sempre bem disposto para os jogos.
Considero-o, pois, um dos melhores tônicos musculares.
(a) Nelson da Conceição.
Rio de Janeiro, 24 de Maio de 1923
Firma reconhecida pelo tabellião Parelo e Costa.
Assim se exprime o valoroso e querido keeper do invencível campeão
C.R. Vasco da Gama a respeito do “Fortifican” o melhor tonico da
actualidade.
O “Fortifican” dá força, saúde e vigor e encontra-se nas boas
pharmacias e no deposito á rua Maranguape 28.246

Acreditamos que isto seja um fator demonstrativo da importância crescente do


futebol. O uso da figura de um goleiro negro, ídolo de uma equipe cada vez mais forte e
com imensa torcida, sendo usada como propaganda, poderia ser considerado um indício

242
O Imparcial, 18 de agosto de 1923, p. 11.
243
Colocamos o empate do contra a equipe do Andarahy, porque o Vasco ganhou os pontos, mas
manteve-se o resultado da partida a título de estatística.
244
O Paiz, 30 de agosto de 1923, p. 8.
245
Após pesquisa feita no acervo do Club de Regatas Vasco da Gama não encontramos o referido quadro.
Provavelmente, devido ao descaso com a história da instituição, este material se perdeu com o tempo.
246
O Imparcial, 28 de agosto de 1923, p. 11.

82
do futebol se tornando um grande negócio. É possível que Nelson seja o primeiro atleta
negro do futebol carioca a servir como “garoto-propaganda”.

Acreditamos ser bastante significante que numa sociedade carioca, como já


tentamos demonstrar, extremamente conflituosa na questão racial e social, que acabara
de adota como paixão um esporte nascido na elite, tenha como um dos grandes ídolos
deste esporte, um goleiro negro. Dois goleiros, com bastante fama na época, eram
Marcos Carneiro de Mendonça (Marcos) e Júlio Kuntz Filho (Kuntz). Os dois eram
brancos e defendiam clubes da elite carioca. Nelson da Conceição conseguiu chegar ao
mesmo patamar técnico destes dois goleiros. Contudo, defendia um clube emergente no
futebol, atuava numa equipe cheia de jogadores negros e brancos pobres, analfabetos ou
semianalfabetos. Nelson era um dos “doutores em futebol”.

83
2.3 O grande keeper

FORAM CORTADOS 12 JOGADORES DO VASCO


A comissão organizadora da Amea resolveu em sessão de ante-
hontem cortar 12 jogadores do team do Vasco da Gama, sendo sete do
1º quadro e cinco do segundo.
Os jogadores da principal equipe vascaína que escaparam do “corte”
foram Nelson, Mingote, Paschoal e Torterolli. Como se vê o baque é
grande[...]247

O fim do campeonato de 1923 daria início às convocações para a seleção carioca


que disputaria o 2º Campeonato Brasileiro de Seleções, e para a seleção brasileira, que
disputaria o 6º Campeonato Sul-Americano. Antes destas competições, o Vasco
disputaria o primeiro encontro interestadual de sua história. A partida seria contra o
heptacampeão América, de Minas Gerais.

Jogo Minas x Rio


O CAMPEÃO CARIOCA JOGARÁ AMANHÃ EM BELLO
HORIZONTE
Promovido pelo Centro Beneficente da Colonia Portugueza de Bello
Horizonte, na capital do Estado de Minas Geraes, realizou-se amanhã
uma importante partida de footbal, entre os quadros representativos do
America F.C., hepta campeão mineiro e do C.R. Vasco da Gama,
campeão carioca.
Este match, que é em disputa de rica taça de prata, é esperado com
ansiedade em Bello Horizonte.248

O jornal é bem claro, o Vasco representava o Rio de Janeiro, a Capital Federal, e Nelson
estava lá como o grande goleiro do futebol carioca. Alguns jornais como O Paiz e O
Imparcial enviaram representantes para cobrir o evento, demonstrando a importância do
embate.
A equipe de Nelson venceu por 2 a 1. O Vasco, recheado de negros, contrastava
com os jogadores brancos dos grandes vencedores de Minas.
O Vasco, campeão carioca, em Bello Horisonte, venceu o America,
campeão mineiro, por 2x1
BELLO HORIZONTE, 2 (Serviço especial d’ ‘O Imparcial!) –
Perante uma assistência numerosíssima realizou-se hoje o encontro
ansiosamente esperado entre os valorosos Vasco da Gama, campeão
carioca e o America, campeão mineiro.249

O goleiro Nelson, como sempre, foi um dos destaques: “BELLO HORIZONTE, 2


(Serviço especial d’ ‘O Imparcial’) – O keeper Nelson confirmou a fama de que veio

247
Jornal do Brasil, 01 de abril de 1924, p. 13.
248
O Paiz, 01 de setembro de 1923, p. 9.
249
O Imparcial, 03 de setembro de 1923, p. 2.

84
precedido, pois agiu assombrosamente.[...]”250. O talento de Nelson já havia
ultrapassado os limites do estado, em pouco tempo ultrapassaria os limites do país.
As atuações de Nelson no campeonato da LMDT lhe proporcionaram ser
convocado para a seleção carioca que disputaria o Campeonato Brasileiro de Seleções
de 1923. Em 07 de outubro, pela primeira vez na história um goleiro negro entrava em
campo para defender as cores da cidade do Rio de Janeiro. O resultado foi uma vitória
fácil por 4 a 1 sobre a equipe fluminense251: “Os cariocas, sem dificuldades, levaram os
fluminense de vencida pelo score de 4x1 [...]”252. Nelson foi um dos melhores em
campo: “Palamone e Nelson produziram jogo eficiente, como de habito”253.
Na segunda partida, em 21 de outubro, outra vitória do scratch carioca, 2 a 0
sobre os baianos254. Desta vez, apenas Nelson era o representante do Vasco. Na final,
em 28 de outubro, uma derrota de 4 a 0 para os atuais campeões, a seleção paulista. No
time titular, mais uma vez, apenas Nelson pertencia ao campeão carioca. Na reserva
estavam os outros três convocados: Paschoal, Bolão e Torterolli. A meritocracia não
parecia ser critério totalmente adotado como padrão para a convocação dos que
deveriam ser os melhores jogadores cariocas em 1923. Segundo o jornalista Mário
Filho: “Até mesmo os brancos do Vasco foram postos de lado”255. Poderiam não levar
os brancos ou os outros negros, mas a qualidade de Nelson o convocava.
O Campeonato Sul-Americano de 1923 foi disputado no Uruguai. A
Confederação Brasileira de Desportos (CBD) reatou relações com a Associação
Uruguaya de Football após os incidentes de 1922, quando a seleção uruguaia abandonou
o campeonato que era realizado no Brasil256. A CBD recebeu inúmeras críticas dos
jornais devido a sua postura de conciliação. Contudo, o scratch brasileiro foi
convocado.
Três jogadores do Vasco foram chamados para integrar a equipe nacional no
campeonato de Montevidéu: Nelson, Paschoal e Torterolli257. Os clubes paulistas não
apoiaram a seleção. A Confederação Brasileira de Desportos (CBD) completou a
seleção com jogadores fluminenses, como Soda e Amaro, e Mica do Botafogo, da

250
O Imparcial, 03 de setembro de 1923, p. 2.
251
Formada por demais jogadores de cidades do Estado do Rio de Janeiro.
252
O Imparcial, 08 de outubro de 1923, p. 2.
253
Idem.
254
O Imparcial, 22 de outubro de 1923, p. 3.
255
FILHO, 2010. Op. cit., p. 129.
256
O Imparcial, 06 de novembro de 1923, p. 10.
257
O Imparcial, 04 de novembro de 1923, p. 9.

85
Bahia. A bordo do pequeno paquete “Zoolandia” os jogadores partiram para o
Uruguai258.
Nelson da Conceição foi o primeiro goleiro negro da Seleção Brasileira259260. A
estreia oficial de Nelson foi em solo uruguaio, em 11 de novembro de 1923261. O
resultado foi uma derrota por 1 a 0 para a seleção paraguaia.262 Enfraquecida, a
campanha da seleção foi péssima, três derrotas em três jogos: Paraguai, Argentina e
Uruguai.
O desempenho de Nelson foi um dos poucos pontos positivos do scratch
brasileiro.
O TRIANGULO BRASILEIRO FOI O MELHOR DO
CAMPEONATO
Dos quatro triângulos que participaram no 6º campeonato sul-
americano, o melhor, segundo informações que recebemos de
Montevidéo, foi o da equipe brasileira.
Nelson Conceição, Sylvio Serpa (Allemão) e Orlando Pennaforte,
constituíram o triangulo de ouro do certâmen de Montevidéo.
Em todos os tres matches, estes tres valorosos e destemidos jogadores
brasileiros demonstraram o seu estupendo jogo, empolgando
constantemente as grandes assistencias.
A estes tres jogadores cariocas deve o quadro brasileiro não ter sido
vencido por grandes scores. Houve partidas em que os tres footballers
brasileiros, sustentaram por 90 minutos de jogo, as fortes cargas dos
adversários, mantendo ou obrigando a estes, um trabalho intenso, para
a conquista de um goal.
Ao triangulo de ouro do sul-americano os nossos parabéns.263

De chauffeur para ser um dos jogadores que formaram o triângulo de ouro” da seleção
brasileira, salvando-a de goleadas humilhantes, foi um grande salto na vida esportiva de
Nelson, fruto de sua qualidade técnica.

258
O Imparcial, 07 de novembro de 1923, p. 7.
259
O Paiz, 1º de novembro de 1923, p. 8.
260
Foram pesquisados todos os goleiros que disputaram jogos pela seleção brasileira masculina de
futebol, de 21 de julho de 1914, data do primeiro jogo oficial da seleção brasileira, até o último jogo antes
da estreia do jogador Nelson da Conceição, 29 de outubro de 1922. Buscamos imagens que
comprovassem que Nelson da Conceição fosse o primeiro goleiro negro da seleção brasileira. No total,
sete atletas haviam atuado em jogos pela seleção brasileira na posição de goleiro. São eles: Ayrton
(Fluminense); Casemiro (Mackenzie); Dionísio (Ypiranga/SP); Ferreira (América/RJ); Kuntz
(Flamengo/RJ); Marcos (Fluminense/RJ); Mesquita (Portuguesa/SP). Nenhum destes atletas citados, ex-
goleiros da seleção brasileira de futebol masculino, era negro. Ver na parte de Iconografias deste trabalho
as FIGURAS 14 a 21.
Site: < http://www.rsssfbrasil.com>. Acessado em: 12 dez. 2012.
261
Site: < http://www.rsssfbrasil.com>. Acessado em: 12 dez. 2012.
262
Idem.
263
O Paiz, 27 de novembro de 1923, p. 8.

86
Durante o Campeonato Sul-Americano, a seleção brasileira disputou contra a
seleção do Paraguai o segundo jogo válido pela disputa da taça Presidente Rodrigues
Alves264, ou Taça Rodrigues Alves. Em 1922, a seleção brasileira havia vencido por 3 a
1 no primeiro confronto entre as referidas seleções. Em 21 de novembro de 1923, a
seleção brasileira tornou a vencer a seleção paraguaia, desta vez por 2 a 0.
[...]
Aos onze footbollers brasileiros, que tão bela figura fizeram hontem,
as nossas sinceras felicitações.
O povo carioca, hontem, mais uma vz, demonstrou não ter
abandonado os nossos patrícios ao sul do continente. Desde ás 16
horas começou o povo a estacionar em frente á nossa redação. Devido
ao grande atraso do telegrapho, somente ás 15 horas e meia é que
pudemos informar o que se passava no campo do Parque Central.
Quando foi conhecido o resultado do match, o povo ovacionou com
enthusiasmo o team brasileiro.265

A campanha da seleção em território dos vizinhos sul-americanos não foi boa,


mas Nelson conseguiu se sobressair. A excursão ainda teve uma parada na Argentina
para disputa da tradicional Copa Rocca, com uma vitória para cada seleção pelo mesmo
placar 2 a 0. Além de uma sonora goleada de 9 a 0 em partida amistosa contra um
combinado uruguaio.
Em seu retorno, Nelson recebeu homenagens, uma delas a alcunha de keeper
internacional, bem diferente dos tempos em que era chamado de chauffeur. O goleiro
gerava grande expectativa para o seu primeiro jogo após o regresso da seleção.
O GRANDE FESTIVAL DE HOJE, NO STADIUM DO
FLUMINENSE F.CLUB
O sensacional match entre o campeão Vasco da Gama e o scratch da
Escola de Guerra
[...]
Como já dissemos, o quadro campeão será o mesmo que obteve os
grandes triumphos da temporada finda, quando uma só vez foi
abatido. Elle terá o concurso do grande Nelson, que vae
definitivamente reaparecer depois do seu regresso do Rio da Prata, e
cuja rentrae tanto interesse está despertando aos nossos sportsmen.266

Era apenas uma partida amistosa, mas que tinha um tom especial devido o retorno do
grande Nelson.

264
O Imparcial, 27 de outubro de 1922, p. 7.
265
O Paiz, 22 de novembro de 1923, p. 8.
266
O Imparcial, 30 de dezembro de 1923, p.12.

87
No mês de dezembro, o futebol carioca já vivia tempos de crise. A revolta dos
clubes da elite ocorreu pela conquista do campeonato mais rico da cidade, com uma
brilhante campanha, de um time formado pelas classes mais baixa da sociedade carioca
do Vasco de Nelson. Além disso, mais uma vez, um dos grandes clubes quase foi
rebaixado. O Botafogo teve que jogar a partida eliminatória para escapar do descenso.
Em resposta à mudança de paradigmas empreendida pelo Vasco de Nelson, os
clubes grandes romperam com a LMDT e fundaram uma nova entidade, a Associação
Metropolitana de Esportes Athleticos (AMEA), em 1º de março de 1924. Os clubes
fundadores eram: América, Botafogo, Flamengo, Fluminense e o Bangu. Diz-no o
historiador João Malaia: “[...] a nova AMEA era na verdade uma liga anti-Vasco, ou
anti-qualquer tipo de associação que podesse usar o modelo vascaíno para galgar
posição maiores dentro do futebol do Rio.”267.
O Vasco, assim como outros clubes, fez o pedido de filiação à nova entidade,
sendo a princípio aceito. Contudo, os estatutos da AMEA demonstraram as reais
intenções da entidade, ou seja, impedir a ascensão de clubes como o Vasco. Entre 31 de
março e 1º de abril a imprensa divulgou que doze jogadores do Vasco não foram aceitos
pela nova entidade, sendo que sete jogadores eram do primeiro quadro. Logo, apenas
quatro, dos onze jogadores do time principal, escaparam do “corte” após a análise de
suas inscrições pela AMEA268.

[..] Quanto á syndicancia de athletas, a directoria da A.M.E.A., julgou-


se com direito de impedir que 12 associados do C.R. Vasco da Gama,
tivessem seu registro. Assim é que, sete deles, pertenciam ao 1º team
do campeão de 1923, ficando apenas quatro seguintes da equipe
principal desse clube: Paschoal, Torterolli, Nelson e Mingote.269

Nelson, Paschoal e Torterolli não estavam na lista. Estes jogadores tinham


defendido a seleção carioca e a seleção brasileira. Apenas Mingote, um dos mais
brancos da equipe, destoava. Acreditamos que a qualidade e o reconhecimento de
Nelson frente ao meio esportivo impediram que seu nome estivesse entre os doze
jogadores excluídos. Para ajudar nesta posição, indicamos que nos seus estatutos a

267
SANTOS, 2010. Op. cit., p. 323-324.
268
Outros periódicos como os jornais Gazeta de Noticias e Jornal do Brasil, em suas edições de 1º de
abril de 1924 publicaram a respeito do assunto.
269
O Paiz, 31 de março de 1924, p. 2.

88
AMEA previa que motoristas não poderiam ser considerados aptos a serem jogadores
amadores.
CAPITULO IX
Da inscripção dos amadores, suas formalidades e requisitos
[...]
Art.65 – Não poderão porém, ser inscriptos:
[...]
10 – os que exerçam profissão ou emprego subalternos, taes como de
continuo, servente, engraxate e motorista;270

Desta forma, Nelson não era mais um chauffeur qualquer, ou simplesmente um atleta
negro. Afinal, ele acabara de defender a seleção carioca e a seleção brasileira. A
qualidade técnica de Nelson como jogador o impediu de ser excluído.
Em resposta à exclusão de seus atletas e a imposições que deixariam o clube
inferiorizado frente aos direitos dos clubes fundadores, o então presidente do Vasco,
José Augusto Prestes, enviou um ofício à AMEA, em 07 de abril de 1924, endereçado
ao seu presidente, Arnaldo Guinle. O Vasco sentenciava que não abriria mão de seus
jogadores para fazer parte da nova entidade. Desta forma, rompeu com a AMEA. Em
trecho do Officio n.261, o presidente vascaíno assim se pronunciava em nome da
instituição:
[...]
Quanto á condição de eliminarmos doze dos nossos jogadores das
nossas equipes, resolveu, por unanimidade, a directoria do C.R. Vasco
da Gama não a dever aceitar, por não se conformar com o processo
por que foi feita a investigação das posições sociaes desses nossos
consócios, investigação levada a um tribunal onde não tiveram nem
representação, nem defesa.
[...]
São esses doze jogadores, jovens, quase todos brasileiros, no começo
da sua carreira, e o acto publico que os póde macular, nunca será
praticado com a solidariedade dos que dirigem a casa que os acolheu,
nem sob o pavilhão que eles com tanta galhardia cobriram de glórias.
[...]271

Há indícios de que a tomada de decisão da diretoria do clube agradou grande


parte do seu quando de sócios.
FELICITAÇÕES RECEBIDAS PELO CLUB DE REGATAS
VASCO DA GAMA

270
O Imparcial, 04 de abril de 1924, p. 11.
271
O Paiz, 16 de abril de 1924, p. 8. Publicação do ofício emitido pela diretoria do Club de Regatas
Vasco da Gama em 07 de abril de 1924 pedindo a sua desfiliação da AMEA. No dia anterior, 15 de abril,
o jornal O Imparcial já havia publicado o referido ofício (O Imparcial, 15 de 1924, p. 11).

89
Têm chegado á séde social do Vasco da Gama innumeros telegramas
de seus socios, felicitando-o por sua resolução tomada em face dos
últimos acontecimentos na A.M.E.A.272

Em reunião realizada no dia 15 de abril273, o Conselho Deliberativo do clube emite


ofício apoiando a tomada de decisão da diretoria do clube274. O Vasco rompeu com a
AMEA e retornou para a LMDT275. Agindo desta forma, o clube preferiu ficar com seus
jogadores a dobrar-se as intenções conservadoras dos clubes grandes.
Em resposta ao ofício do dirigente vascaíno, o presidente da AMEA, responde
com outro ofício dizendo que:
[...] Finalmente, dissemos a V.Ex. que embora estivéssemos prontos a
atender aos reclamos do vosso club a este respeito, alimentávamos a
esperança de que, para o futuro, ele fizesse todos os esforços para
constituir equipes genuinamente portuguezas, porquanto ao nosso ver,
não havia em nosso meio outra colônia capaz de apresentar melhores
elementos que a portugueza para uma demonstração sportiva das
verdadeiras qualidade desta nobre raça secular. [...]276

Segundo o historiador Ricardo Pinto dos Santos:


[...] esse debate em que se envolveram o Vasco da Gama e a Amea
tornou-se relevante para o futebol. A partir deste momento, as
questões de raça versus moralidade, amadorismo versus
profissionalismo, começavam a produzir efeitos que não mais se
encerravam nos pequenos clubes.277

Neste sentido, ao defender os seus jogadores, o Vasco também defendia aqueles que,
mesmo não sendo excluídos, já tinham passado por constrangimentos inerentes ao
modus operandi dos clubes da elite e das ligas do período na cidade do Rio de Janeiro.
Com o retorno do Vasco à LMDT, Nelson se tornou bicampeão carioca. Em
1925, o Vasco retornaria a AMEA com seus jogadores e o modus operandi que
implementara no seu departamento de futebol. Por questões de recorte temporal não
entraremos nas questões envolvidas a partir deste período. No entanto, voltamos a

272
O Paiz, 10 de abril de 1924, p. 8.
273
O Paiz, 17 de abril de 1924, p. 8.
274
Não encontramos o referido ofício nas publicações dos jornais O Paiz e O Imparcial. Contudo, este
referido ofício encontra-se reproduzido no jornal Gazeta de Noticias, em sua edição de 17 de abril de
1924, p. 8.
275
O Paiz, 18 de abril de 1924, p. 10.
276
O Paiz, 19 de abril de 1924, p. 11. O jornal O Imparcial publicou o referido ofício em sua edição de
18 de abril de 1924, p. 8.
277
SANTOS, Ricardo Pinto dos. Tensões na consolidação do futebol carioca, p. 207. In PRIORI, Mary
Del; MELO, Victor Andrade de. História do Esporte no Brasil: Do Império aos dias Atuais. São Paulo:
Editora UNESP, 2009.

90
indicar que a qualidade de Nelson fez com que ele fosse aceito pelo meio esportivo,
inclusive, pela elite que coordenava as maiores liga da época. A própria imprensa que
antes o havia denunciados, tecia elogios às suas atuações e a sua pessoa. Nelson ganhou
a alcunha de keeper internacional que o acompanhou até sua morte em 1942.
Na eminência do início do campeonato de 1926, o jornal O Imparcial colocou
uma foto de capa da imagem do grande Nelson, indicando-o como um crack do
campeonato. A imagem era Nelson como ele realmente era, sem diálogos fictícios de
cunho pejorativo ou sua imagem tendo destaque para certos aspectos físicos que
caracterizavam-no como negro. Um contraste sensível pela forma como ele fora
retratado pelo mesmo periódico em 1919 e também pelo o jornal O Paiz.

91
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O nosso trabalho teve como temática as condições sociais do homem negro na


cidade do Rio de Janeiro da Primeira República. Como objetivo, buscamos refletir as
dificuldades enfrentadas por jogadores negros que atuavam na principal liga de futebol
do Rio de Janeiro. Escolhemos um jogador de futebol deste período que acreditamos ser
um exemplo, dentre outros, de sucesso, a despeito das barreiras sociais e raciais que
existiam.
Como hipótese central deste trabalho, acreditávamos que Nelson sofria racismo
extrínseco da principal liga de futebol da época, de parte da imprensa e de adeptos de
clubes rivais. Inferimos que Nelson sofria de fato com racismo extrínseco, devidamente
disfarçado. Um racismo velado, identificado na denúncia de sua profissão de chauffeur,
indicações jocosas de sua maneira de falar e seu aspecto físico. Nelson sofreu com
racismo e este se tornou visível, cremos, a partir do momento em que passa para um
clube emergente no futebol e paulatinamente cresce com este clube.
Dizemos isto, porque, encontramos pequenos indícios do racismo, do
preconceito que o goleiro teve que vencer. Nelson não era o único a sofrer com
preconceito por ser negro ou por ser humilde, provavelmente outros sofreram muito
mais do que Nelson. Todavia, não visamos medir graus de sofrimento, apenas indicar
que Nelson foi um dos que sofreram com esta mácula da sociedade carioca e brasileira.
Nelson da Conceição, indivíduo negro, saiu de uma cidade no interior do estado
do Rio de Janeiro em busca de melhoria de vida. Através do seu talento, conseguiu
sobrepujar as dificuldades típicas de um jogador negro pobre no período. De grande
campeão do subúrbio, se tornou ídolo de um clube que se tornava grande, o Club de
Regatas Vasco da Gama. Nelson ajudou este clube a ser um dos grandes no futebol,
com sua técnica e sua dedicação. Da mesma forma, aproveitou a oportunidade surgida e
se profissionalizou, de maneira não oficial. Encontrou no futebol, com o seu talento, a
sua técnica, o seu meio de sobrevivência. Para isto, estabeleceu uma relação profissional
com seu clube, sendo devidamente ressarcido pelo seu bom desempenho em campo.
Em 1928, Nelson saiu do Vasco e foi jogar na equipe do Syrio Libanêz/RJ278. O
substituto no Vasco foi outro goleiro negro, Jaguaré. No ano seguinte, Nelson foi atuar

278
O Imparcial, 07 de junho de 1928, p. 8.

92
na equipe do Bangu, onde ficou até 1929. Os anos se passaram e Nelson voltou ao
Engenho de Dentro/RJ279, atuou como treinador deste clube.

279
Diario de Noticias, 10 de novembro de 1936, p. 23.

93
ICONOGRAFIA
FIGURA 1 - Fotografia da equipe do Vasco. Nelson da Conceição está ao centro da
fotografia.

Em pé, um combinado Engenho de Dentro-Mackenzie, provavelmente no ano de 1919.


Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

94
FIGURA 2 - Fotografia da equipe do Club de Regatas Vasco da Gama no ano de 1921.

O goleiro Nelson da Conceição está ao centro, posando ao lado de seus companheiros


de time.
Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

95
FIGURA 3 - Fotografia da equipe de futebol do Club de Regatas Vasco da Gama no
ano de 1922.

O goleiro Nelson da Conceição está deitado no gramado, próximo à bola.


Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

96
FIGURA 4 - Imagem do goleiro Nelson da Conceição publicada na revista O Malho.

Destaque às características de sua negritude e a uma provável forma coloquial de fala e


escrita do goleiro, e de outros jogadores e torcedores dos clubes da 2ª Divisão da
LMDT.
O Malho, 22 de abril de 1922, p. 39.
Acervo: Biblioteca Nacional.

97
FIGURA 5 - Fotografia da equipe de futebol do Club de Regatas Vasco da Gama no
ano de 1923.

Partida válida pelo campeonato da LMDT de 1923.


Vasco 3x2 Botafogo/RJ – Estádio das Laranjeiras, 01/07/1923.
Da esquerda para a direita (Em pé): Nicolino, Torterolli, Leitão, Cecy, Bolão, Negrito,
Arlindo, Arthur, Mingote e Paschoal. O goleiro Nelson está deitado.
Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

98
FIGURA 6 - Fotografia da equipe de futebol do Vasco em amistoso interestadual no
ano de 1923.

Amistoso Interestadual entre a equipe do Vasco, campeã do Rio de Janeiro, e a equipe


do América/MG, campeã de Minas Gerais. Estádio do América, Belo Horizonte/MG,
02/09/1923.
Dos jogadores do Vasco, da esquerda para a direita (Em pé): Nicolino, Bolão, Paschoal,
Pires, Cecy, Arthur, Mingote, Leitão, Torterolli e Negrito. O goleiro Nelson está
agachado.
Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

99
FIGURA 7 - Publicidade do tônico “Fortifican”, no qual Nelson da Conceição foi
garoto-propaganda.

O Imparcial, 28 de agosto de 1923, p. 11.


Acervo: Biblioteca Nacional.

100
FIGURA 8 - Fotografia do trio de defesa do Club de Regatas Vasco da Gama: Leitão,
Nelson e Mingote.

Da esquerda para a direita: Leitão, Nelson e Mingote.


Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

101
FIGURA 9 - Imagem dos campeões cariocas de 1923.

Da esquerda para a direita, o goleiro Nelson da Conceição é o primeiro.

Revista da Semana, 01 de setembro de 1923, p. 17.

Acervo: Biblioteca Nacional.

102
FIGURA 10 - Capa do jornal O Imparcial no dia seguinte à conquista do título de
campeão carioca do Vasco.

A equipe do Vasco está acima da equipe do São Christovão, ao lado das duas equipes há
imagem de parte do público presente ao jogo.

O Imparcial, 13 de agosto de 1923, p. 1.

Acervo: Biblioteca Nacional.

103
FIGURA 11 - Imagem da seleção carioca e da seleção fluminense em jogo válido pelo
Campeonato Brasileiro de Seleções de 1923.

Seleção carioca 4 a 1 seleção fluminense. Estádio das Laranjeiras.

O Malho, 13 de outubro de 1923, p. 40.

Acervo: Biblioteca Nacional.

104
FIGURA 12 - Imagem das seleções carioca e baiana no Campeonato Brasileiro de
Seleções, no ano de 1923.

Seleção carioca 2 a 0 seleção baiana. Estádio das Laranjeiras.

A Seleção Carioca está à esquerda. Nelson é o sétimo, da esquerda para a direita.

O Malho, 27 de outubro de 1923, p. 30.

Acervo: Biblioteca Nacional.

105
FIGURA 13 - Imagem das seleções carioca e paulista em jogo válido pelo Campeonato
Brasileiro de Seleções de 1923.

Seleção carioca 0 a 4 seleção paulista. Estádio das Laranjeiras.

O Malho, 03 de novembro de 1923, p. 29.

Acervo: Biblioteca Nacional.

106
FIGURA 14 - Imagem de Nelson da Conceição na seleção brasileira.

Brasil 1 a 2 Argentina - Campeonato Sul-Americano de 1923.

Da esquerda para a direta, Nelson é o primeiro que está agachado. Nelson foi o primeiro
goleiro negro da seleção brasileira.

Correio da Manhã, 04 de dezembro de 1923, p. 6.

Acervo: Biblioteca Nacional.

107
FIGURA 15 - Goleiro Casemiro do Amaral defendendo a seleção brasileira.

Da esquerda para a direita, Casemiro é o segundo homem que está em pé.

Brasil 2 a 4 Argentina. Campeonato Sul-Americano de 1917 – Uruguai, 03/10/1917.

Imagem disponível em:

<http://www.iffhs.de/?29dad5a85ad4a85bd52bd855285fdcdc3bfcdc0aec7482eda0a409
> Acessado em: 07 jun. 2013.

108
FIGURA 16 - Imagem do goleiro Joaquim Martins Ferreira atuando pela seleção
brasileira.

A equipe brasileira é a primeira de cima para baixo. Da esquerda para a direita, Ferreira
é o quarto.

Brasil 0x0 Dublin/URU

Estádio de General Severiano/RJ, 07/01/1917.

Imparcial, 08 de janeiro de 1917, p. 1.

Acervo: Biblioteca Nacional.

109
FIGURA 17 - Imagem goleiro Marcos pela seleção brasileira.

Imagem da seleção brasileira campeão do Campeonato Sul-Americano de 1919. O


Goleiro Marcos Carneiro de Mendonça (Marcos) é o primeiro, de cima para baixo.

O Paiz, 30 de maio de 1919, p. 5.

Acervo: Biblioteca Nacional.

110
FIGURA 18 - Imagem do goleiro Dionísio defendendo a seleção brasileira em jogo
válido pela Taça Roberto Cherry.

A equipe brasileira é a primeira de cima para baixo. Da esquerda para a direita, Dionísio
é o sexto homem.

Brasil 3 a 3 Argentina. Estádio das Laranjeiras, 1º de junho de 1919.

Gazeta de Noticias, 02 de junho de 1919, p. 3.

Acervo: Biblioteca Nacional.

111
FIGURA 19 - Imagem do goleiro Ayrton.

Goleiro Ayrton atuando pelo Fluminense F.C.. O referido goleiro atuou pela seleção
brasileira uma única vez, em amistoso contra a seleção argentina, no dia 06 de outubro
de 1920. A seleção brasileira perdeu por 3 a 1, em Buenos Aires.

Jornal das Moças, 13 de maio de 1920, p. 21.

Acervo: Biblioteca Nacional.

112
FIGURA 20 - Imagem do goleiro Mesquita na seleção brasileira.

Da esquerda para a direita, dos homens que estão em pé, Mesquita é o quarto homem. A
imagem se refere ao jogo Brasil 3 a 1 Paraguai, válido pela Taça Rodrigues Alves. O
evento ocorreu no Campo do Floresta/SP, no dia 29/10/1922.

Correio Paulistano, 01 de novembro de 1922, p. 1.

Acervo: Biblioteca Nacional.

113
FIGURA 21 - Imagem do goleiro gaúcho Júlio Kuntz Filho (Kuntz), que atuou pela
seleção brasileira.

O Imparcial, 05 de setembro de 1921, p. 3.

Acervo: Biblioteca Nacional.

114
FIGURA 22 - Imagem do goleiro Nelson da Conceição trajando o uniforme de goleiro
do Club de Regatas Vasco da Gama.

O Imparcial, 06 de abril de 1926, p. 1.

Acervo: Biblioteca Nacional.

115
FIGURA 23 - Imagem de uma charge Vasco x clubes da série A

O Paiz, 08 de junho de 1923, p. 8.

116
ANEXOS

TABELAS DE JOGOS 280

TABELA DE JOGOS 1 – 1916 a 1918

CAMPEONATO Nº DE JOGOS GOLS SOFRIDOS MÉDIA DE GOLS


SOFRIDOS

LMSA – 1916 09 37 4,11

LMSA – 1917 16 33 2,06

LMDT – 1918 16 46 2,87

280
As tabelas de jogos foram formuladas com informações retiradas: do Livro de atividades futebolísticas
do Club de Regatas Vasco da Gama de 1916 a 1923, da Revista do Vasco: No Ano do Tri, nº2, pp.65-68;
dos periódicos O Paiz e O Imparcial; ASSAF, Roberto; MARTINS, Clovis. História dos Campeonatos
Cariocas de Futebol 1906/2010. Rio de Janeiro: Maquinária, 2010; e do site Netvasco. Disponível em:
<http://www.netvasco.com.br/jogosvasco/jogos/0000.shtml>. Acessado em: 12 dez. 2012. A pesquisa
realizada foi referente ao período temporal de 1916 a 1923.

117
TABELA DE JOGOS 2 – Ano 1919 sem o goleiro Nelson

Jogos válidos pela 2º Divisão da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres – LMDT


no ano de 1919

Antes da estreia oficial de Nelson da Conceição pelo campeonato da LMDT

DATA 1º QUADRO GOLEIRO 2º QUADRO GOLEIRO

08/06/1919 Vasco 5x6 S.C. Mackenzie Ary Correa Vasco 0x0 Miguel
S.C. Cavalier
Mackenzie

22/06/1919 Vasco 8x2 Ríver F.C. Miguel Vasco 6x0 Ibsen de


Cavalier Ríver F.C. Castro

13/07/1919 Vasco 4x4 S.C. Rio de Janeiro Luiz Vasco 6x2 Miguel
Ferreira S.C. Rio de Cavalier
Barroso Janeiro

20/07/1919 Vasco 6x1 Esperança F.C. Luiz Vasco 4x4 Miguel


Ferreira Esperança Cavalier
Barroso F.C.

03/08/1919 Vasco 2x2 Progresso F.C. Luiz Vasco 7x1 Miguel


Ferreira Progresso Cavalier
Barroso F.C.

10/08/1919 Vasco 4x3 Palmeiras A.C. Luiz Vasco 2x4 Miguel


Ferreira Palmeiras Cavalier
Barroso A.C.

31/08/1919 Vasco 4x0 S.C. Brasil Luiz - -


Ferreira
Barroso

Nº de jogos do Vasco: 7 Vitória: 4 Derrota: 1 Empate: 2

Média de gols sofridos do Vasco: 2,57 gols por jogo

118
TABELA DE JOGOS 3 – Ano 1919 com o goleiro Nelson

Jogos válidos pela 2º Divisão da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres – LMDT


1919

DATA 1º QUADRO GOLEIRO

07/09/1919 Vasco 2x0 S.C. Rio de Janeiro NELSON DA CONCEIÇÃO

28/09/1919 Vasco 3x3 Americano F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

09/11/1919 Vasco 2x0 Ríver F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

30/11/1919 Vasco 1x2 Progresso F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

07/12/1919 Vasco 0x2 Americano F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

14/12/1919 Vasco 2x4 Palmeiras A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

21/12/1919 Vasco 3x2 Esperança F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

28/12/1919 Vasco 2x3 Mackenzie NELSON DA CONCEIÇÃO

Nº de jogos do Vasco: 8 Vitória: 3 Derrota: 4 Empate: 1

Nº de jogos do goleiro Nelson pelo Vasco: 8 Vitória: 3 Derrota: 4 Empate: 1

Média de gols sofridos do Vasco com Nelson atuando: 2,0 gols por jogo

119
TABELA DE JOGOS 4 – Ano 1920

Jogos válidos pela 2º Divisão da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres – LMDT


1920

DATA 1º QUADRO GOLEIRO

18/04/1920 Vasco 4x2 Americano F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

02/05/1920 Vasco 2x1 S.C. Rio de Janeiro NELSON DA CONCEIÇÃO

16/05/1920 Vasco 4x0 S.C. Brasil NELSON DA CONCEIÇÃO

30/05/1920 Vasco 0x2 S.C. Mackenzie NELSON DA CONCEIÇÃO

13/06/1920 Vasco 6x3 Esperança F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

20/06/1920 Vasco 3x0 Hellênico A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

27/06/1920 Vasco 2x1 Ríver F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

04/07/1920 Vasco 4x1 Progresso F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

08/08/1920 Vasco 1x2 S.C. Rio de Janeiro NELSON DA CONCEIÇÃO

29/08/1920 Vasco 5x0 Ríver F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

05/09/1920 Vasco 2x3 Hellênico A.C. Miguel Cavalier

10/10/1920 Vasco 2x3 Americano F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

24/10/1920 Vasco 3x1 Progresso F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

31/10/1920 Vasco 1x0 Esperança F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

07/11/1920 Vasco 1x2 Carioca F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

19/12/1920 Vasco 0x2 Carioca F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

26/12/1920 Vasco 3x3 S.C. Mackenzie NELSON DA CONCEIÇÃO

Nº de jogos do Vasco: 17 Vitória: 10 Derrota: 6 Empate: 1

120
Nº de jogos do goleiro Nelson pelo Vasco: 16 Vitória:10 Derrota: 5 Empate: 1

Média de gols sofridos do Vasco com Nelson atuando: 1,43

121
TABELA DE JOGOS 5 – Ano 1921

Jogos válidos pela 2º Divisão da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres – LMDT

1921

DATA 1º QUADRO GOLEIRO

03/04/1921 Vasco 2x0 Palmeiras A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

17/04/1921 Vasco 1x4 Villa Izabel F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

22/05/1921 Vasco 4x2 S.C. Mackenzie NELSON DA CONCEIÇÃO

05/06/1921 Vasco 0x0 Carioca F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

12/06/1921 Vasco 2x2 Americano F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

26/06/1921 Vasco 1x2 S.C. Mangueira NELSON DA CONCEIÇÃO

03/07/1921 Vasco 3x2 Villa Izabel F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

17/07/1921 Vasco 2x3 Carioca F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

24/07/1921 Vasco 4x0 S.C. Mangueira NELSON DA CONCEIÇÃO

07/08/1921 Vasco 5x1 S.C. Mackenzie NELSON DA CONCEIÇÃO

21/08/1921 Vasco 1x1 Palmeiras A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

28/08/1921 Vasco 2x0 Americano F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

Nº de jogos do Vasco: 12 Vitória: 6 Derrota: 3 Empate: 3

Nº de jogos do goleiro Nelson pelo Vasco: 12 Vitória: 6 Derrota: 3 Empate: 3

Média de gols sofridos do Vasco com Nelson atuando: 1,41

122
TABELA DE JOGOS 6 – Ano 1922

Jogos válidos pela série B da 1º Divisão da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres


1922

DATA 1º QUADRO GOLEIRO

16/04/1922 Vasco 4x0 Palmeiras A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

23/04/1922 Vasco 0x1 Villa Izabel F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

30/04/1922 Vasco 3x0 S.C. Mackenzie NELSON DA CONCEIÇÃO

14/05/1922 Vasco 2x1 Carioca F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

21/05/1922 Vasco 1x1 Americano F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

28/05/1922 Vasco 2x1 S.C. Mangueira NELSON DA CONCEIÇÃO

04/06/1922 Vasco 2x1 Villa Izabel F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

25/06/1922 Vasco 3x0 S.C. Mackenzie NELSON DA CONCEIÇÃO

02/07/1922 Vasco 4x2 S.C. Mangueira NELSON DA CONCEIÇÃO

09/07/1922 Vasco 2x0 Americano F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

16/07/1922 Vasco 8x3 Carioca F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

23/07/1922 Vasco 5x0 Palmeiras A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

05/11/1922 Vasco 0x0 São Cristóvão A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

Nº de jogos do Vasco: 13 Vitória: 10 Derrota: 1 Empate: 2

Nº de jogos do goleiro Nelson pelo Vasco: 13 Vitória: 10 Derrota: 1 Empate: 2

Média de gols sofridos do Vasco com Nelson atuando: 0,76

123
TABELA DE JOGOS 7 – Ano 1923

Jogos válidos pela 2º Divisão da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres – LMDT

1923

DATA 1º QUADRO GOLEIRO

15/04/1923 Vasco 1x1 Andarahy A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

22/04/1923 Vasco 3x1 Botafogo F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

29/04/1923 Vasco 3x1 C.R. Flamengo NELSON DA CONCEIÇÃO

13/05/1923 Vasco 1x0 América F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

20/05/1923 Vasco 1x0 Fluminense F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

03/06/1923 Vasco 3x2 Bangu A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

10/06/1923 Vasco 3x2 São Cristóvão A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

24/06/1923 Vasco 3x1 Andarahy A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

01/07/1923 Vasco 3x2 Botafogo F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

08/07/1923 Vasco 2x3 C.R. Flamengo NELSON DA CONCEIÇÃO

22/07/1923 Vasco 2x1 América F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

29/07/1923 Vasco 2x1 Fluminense F.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

12/08/1923 Vasco 3x2 São Cristóvão A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

19/08/1923 Vasco 2x2 Bangu A.C. NELSON DA CONCEIÇÃO

Nº de jogos do Vasco: 14 Vitória: 11 Derrota: 1 Empate: 2

Nº de jogos do goleiro Nelson pelo Vasco: 14 Vitória: 11 Derrota: 1 Empate: 2

Média de gols sofridos do Vasco com Nelson atuando: 1,35

124
FONTES

1. Manuscritas

Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, de 1º de dezembro de 1920 a 03


de novembro de 1921. Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

Ata da Diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, 10 de novembro de 1921 a 08 de


novembro de 1922. Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

Livro de atividades futebolísticas do Club de Regatas Vasco da Gama de 1916 a 1923.


Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

2. Recenseamentos

Recenseamento do Rio de Janeiro (Districto Federal) realizado em 20 de setembro de


1906. Rio de Janeiro, Off. da Estatística, 1907-1908.

Recenseamento do Brasil realizado em 1º de setembro de 1920. Rio de Janeiro:


Typographia da Estatística, 1922.

3. Periódicos

A Manhã, 1942. Acervo: Biblioteca Nacional.

A Tribuna, 1923. Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.

Correio da Manhã, 1922 a 1923. Acervo: Biblioteca Nacional.

Correio Paulistano, 1922. Acervo: Biblioteca Nacional.

Diario de Noticias, 1936. Acervo: Biblioteca Nacional.

Jornal das Moças, 1920. Acervo: Biblioteca Nacional.

Jornal do Brasil, 1924. Acervo: Biblioteca Nacional.

O Imparcial, 1919 a 1924. Acervo: Biblioteca Nacional.

O Malho, 1922 a 1923. Acervo: Biblioteca Nacional.

O Paiz, 1919 a 1924. Acervo: Biblioteca Nacional.

O Sport, 1923. Acervo: Centro de Memória do Club de Regatas Vasco da Gama.


125
BIBLIOGRAFIA
ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas: reflexões sobre a origem e a
difusão do nacionalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

APPIAH, Kwane Anthony. Na casa de meu pai: a África na filosofia da cultura. Rio de
Janeiro: Contraponto, 1997.

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