Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Espécies de Cecropia Da Amazônia
Espécies de Cecropia Da Amazônia
C. C. BergC*)
( ' ) — Dedicado aos estudantes do primeiro curso do INPA em Botânica Tropical, em Manaus (1973-1975), pelo
Sr. Preguiça.
("") — Instituto for Systematic Botany, Utrecht, Netherlands.
— 1 4 9
ACTA A M A Z Ô N I C A 8(2) : 149-182. 1978
e do gênero asiático Poikilospermum (que in- nhas e terras baixas adjacentes, c a . 70 espé-
clui Conocephalus anteriormente distinto, con- cies já foram descritas, quase todas por Cua-
forme Chew Wee-Lek, 1963) em geral come- trecasas (principalmente em 1945, 1956), que
çam sua vida como epífitas. Seus pequenos pretende revisar o gênero como também os
frutos t ê m um endocarpo recoberto por peque- gêneros relacionados, Coussapoa e Pourouma.
nas excrecencias envolvidas por uma camada O número total de espécies de Cecropia,
mucilaginosa, que é (freqüentemente) expeli- na Amazônia brasileira, será, sem dúvida,
da pelo perianto. Isto está aparentemente re maior do que 15 — o número de espécies tra-
lacionado com o modo de v i d a . A s espécies tadas neste trabalho. Algumas das coleções
do gênero monotípico Pourouma e do gênero desta área não puderam ser descritas com se-
africano Myrianthus são muitas vezes peque- gurança. A coleção Prance ef al. 10437 do
nas árvores, nos estratos inferiores, de lugares Território de Roraima (localidade indicada no
abertos ou perturbados das matas pluviais. mapa 2 com uma interrogação), provavelmen-
Elas t ê m frutos relativamente grandes, envol- te, pertence a uma espécie ainda não descrita;
vidos por um perianto um tanto suculento. Os eu vi outra coleção desta mesma espécie pro-
membros de Cecropia e do gênero africano veniente da Venezuela (Estado de Bolivar), a
Musanga são (em geral) árvores em forma de qual foi talvez incorretamente referida como
candelabro das vegetações secundárias, bor- C. angulata Bailey. A coleção Egler 1018, Pará,
das de matas, matas ciliares, e t c . e produ- rio Tapajós (localidade dada no mapa I com
zem frutos pequenos (tuberculados) implanta- uma interrogação) combina em diversos ca-
dos em infrutescencias um tanto suculentas. racteres com C. concolor, mas difere pela pre-
Como as Cecropia, a espécie comum dos ter- sença de 13 segmentos foliares (') .
renos baixos da África Ocidental e Centrai, A s espécies conhecidas da Bolívia, Peru,
A/í. cecropioides, aparece em clareiras. Em al- Colômbia e Venezuela, como também do Bra-
gumas regiões da África ( e . g . de Cameron), sil Central, podem ocorrer ocasionalmente nas
onde a Cecropia foi introduzida, os dois gêne- regiões limítrofes da Amazônia brasileira. A l é m
ros podem ocorrer lado a lado. Musanga tem do mais, novas espécies podem ser encontra-
apenas duas espécies, uma espécie de terreno das nas regiões pouco exploradas.
baixo, amplamente distribuída, M. cecropioides,
Os nomes científicos, baseados em mate-
e uma espécie de montanha, com uma área
rial coletado na Amazônia brasileira, podiam
r e s t r i t a . Isto é um tanto surpreendente, se
ser empregados ou colocados em sinonímia.
considerar a especiação exuberante de Cecro-
C. scabra Martius é a única exceção: a cole-
pia. Retendo uma grande uniformidade na
ção típica desta espécie é m i s t a , consistindo
maicria das estruturas, o gênero se diversifi-
de uma folha de um espécime jovem de Pou-
cou em muitas espécies nas regiões monta-
rouma cecropiifolia ou P. guianensis e uma
nhosas e nas terras baixas, onde mostra a
inflorescência pertencente à C. u/e/.
maior variabilidade em sua ecologia, pelo me-
nos se se levar em conta as espécies em re-
giões particulares. A l é m disso, as áreas de HÁBITO
distribuição de muitas espécies parecem ser
restritas. Isto causa concentrações vicárias de A s Cecropia freqüentemente f o r m a m árvo-
espécies, em que cada concentração parece res mais ou menos distintamente candelabri
ter espécies ecologicamente mais ou menos formes, cuja estrutura foi descrita por Hallé
diferentes e complementares & Oldeman (1970). Apenas C. ulei apresenta
árvores não ramificadas até 5-6m de altura.
O gênero Cecropia compreende, possivel- C. ficifolia apresenta árvores ramificadas, que
mente, mais de 100 espécies e parece estar normalmente alcançam a mesma altura, em-
centralizado na região andina, de cujas monta- bora algumas possam tornar-se mais alta (até
( 1 ) — Além disso, a coleção Rodrigues, Pires & da Silva 184, proveniente do Amazonas, rio Uaupés (localidade
dada com uma interrogação no mapa 3) não pode ser colocada com segurança em nenhuma das espécies
até aqui reconhecidas para a Amazônia brasileira.
2a 2b
1 0 m ) . A s outras espécies, em geral, formam 1971), são a fonte principal de alimento das
árvores de tamanho médio, que podem às ve- formigas Azteca, que vivem em Cecropia. Es-
zes ou freqüentemente atingir 30m de altura tes corpúsculos, ocasionalmente, são coleta-
(como em C. distachya) • Árvores adultas e dos por outros animais como pequenos pássa-
árvores que crescem em lugares inundados ros e abelhas; porém, em regra, só são cole-
normalmente produzem raízes-escoras. As es- tados quando ocorrem formigas nas árvores.
pécies da várzea (C. lati folia e C. membraná- Nas partes jovens, podem-se encontrar
cea) em geral formam raízes aéreas ao nível glândulas em forma de pérolas. Estas peque-
mais alto das águas, que se podem transformar nas estruturas hialinas, oblongóides, raramente
em raízes-escoras. foram observadas na natureza, porém, são
Uma característica distinta do gênero muito comuns em plántulas cultivadas em es-
Cecropia, mas com pouco valor taxonómico, t u f a s . Estas estruturas também poderiam ser
são os sulcos, que aparecem na parede dos coletadas, possivelmente por formigas (cf
compartimentos internodais ocos dos caules e Rettig 1904; Wheeler, 1942).
ramos. Eles partem da insersão do pecíolo Embora indumentos característicos pos-
para cima, formando especialmente na parte sam ser úteis para distinguir espécies, elas
superior (geralmente próxima ao nó seguinte) podem mostrar ampla variação na mesma es-
uma perfuração muito fina, denominada pros- p é c i e . Por esta razão o emprego destes carac-
toma. teres não é f á c i l .
INDUMENTO INFLORESCENCIA
( 2 ) — Endocarpos lisos ocorrem nas duas espécies da várzea C. latiloba e C. membranácea, e em C. palmata.
Fig. 4 — Flores femininas e estigmas de espécies de Cecropia da Amazônia.
O conhecimento das relações entre Cecro- Com exceção de C. sciadophylla, árvores
pia e formigas agressivas que ferram ( t a x i s ) , adultas das espécies amazônicas de Cecropia
principalmente do gênero Azteca, originou-se observadas no campo, estavam em geral ha-
da observação de que as formigas habitam os bitadas por formigas Azteca, e nas outras es-
compartimentos ocos dos caules (que permi- pécies a presença de triquílios bem desenvol-
tem a entrada desses insetos pelas pequenas vidos indica a possibilidade de uma futura
perfurações da parede) e alimentam-se, prin- ocupação por f o r m i g a s . Entretanto, a maioria
cipalmente, dos corpúsculos müllerianos for- dos espécimes mostrava danos por herbívoros,
necidos pela Cecropia. A s vantagens deste às vezes sérios, principalmente quanto à " p r e -
relacionamento para a formiga são óbvios. Mas g u i ç a " , que vive quase inteiramente de folhas
qual é a compensação para a Cecropia? A pri- de Cecropia.
meira hipótese desenvolvida (por Müller, 1880 Espécimes ocupados por formigas f o r a m
e Schimper, 1888) tentou explicar que a im- encontrados cheios de c i p ó s . Diferenças sig-
portante função desempenhada pelas formigas nificativas não foram encontradas entre as es-
é impedir ou reduzir o ataque de herbívoros, pécies normalmente habitadas por formigas e
particularmente, as formigas cortadeiras. Uma C. sciadophylla, com respeito ao supercresci-
segunda hipótese tentou explicar que a função mento de trepadeiras.
das formigas é reduzir o supercrescimento das
trepadeiras sobre as árvores de Cecropia (cf. ECOLOGIA
Jansen. 1 9 6 9 ; 1973) .
A s espécies vistas nas cercanias de Ma-
A importância da ocupação de Cecropia naus são; C. sciadophylla, C. purpurascens, C.
pelas formigas Azteca f o i , às vezes, superes- distachya, C. palmata, C. concolor, C. ulei, C.
timada. A partir de diversos estudos (referi- latiloba e C. membranacea. Uma espécie não
dos acima), parece claro que as formigas po- vista, porém uma única vez coletada perto de
dem reduzir tanto o dano por herbívoros como. Manaus, é C. ficifolia, que é comum na parte
possivelmente, o supercrescimento dos cipós; ocidental da bacia amazônica. Nas áreas não
porém, as vantagens para a Cecropia parecem mexidas, ao norte de Manaus, foram encontra-
ser desproporcionais às vantagens oferecidas das 3 espécies: C. sciadophylla, C. purpuras-
às formigas Azteca. As formigas, poderiam cens e C distachya. As árvores de C. dis-
ter outras funções na defesa da Cecropia, por tachya, freqüentemente, atingem 25-30m de al-
exemplo, contra ataques por f u n g o s . Em espé- tura e chegam, muitas vezes, a se parecer com
cimes criados em estufas, nos quais os cor- os verdadeiros componentes das matas altas
púsculos müllerianos não são colhidos, os de terra f i r m e . Sua presença aí é devida a cla-
triquílios formam bons substratos para fungos. reiras naturais, o que se pode concluir em vista
QUADRO I — Número de cromossomos encontrados em ponta de raízes de algumas espécies de Cecropia culti-
tivadas no Jardim Botânico de Utrecht.