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Universidade de São Paulo

Escola de Artes, Ciências and Humanidades


Programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional – PROFMAT

PMA5612 – Matemática Discreta – 1o¯ semestre de 2023


Professor: Dr. José Ricardo G. Mendonça

Lista de Exercı́cios – Análise combinatória & Princı́pio do pombal & Probabilidade

Though this be madness, yet there is method in ’t.


Polonius, in William Shakespeare, Hamlet, Ato 2, Cena 2

I. Permutações e combinações

1. Em cada um dos itens a seguir, determine:

(a) O número de diagonais de um polı́gono convexo de n lados;


Cada diagonal de um polı́gono de n lados conecta dois de seus n vértices. Podemos
escolher o primeiro vértice de n maneiras diferentes e o segundo vértice de n − 3
maneiras diferentes, pois o segundo vértice não pode ser nem igual ao primeiro
vértice nem a qualquer de seus vizinhos mais próximos à direita ou à esquerda.
Como uma diagonal AB = BA, concluı́mos que existem 12 n(n − 3) diagonais dis-
tintas em um polı́gono convexo de n lados. Em um quadrado, por exemplo, temos
1 1
2 · 4 · ( 4 − 3 ) = 2 diagonais distintas, enquanto num hexágono temos 2 · 6 · ( 6 − 3 ) =
9 diagonais distintas (verifique).
Outra maneira de resolver esse problema consiste em observar que existem (n2 )
maneiras de escolher dois vértices distintos de n possı́veis para formar um seg-
mento de reta, dos quais n correspondem aos lados do polı́gono, de forma que
restam (n2 ) − n = 12 n(n − 3) segmentos que correspondem às diagonais do polı́gono.
(b) Quantos números ı́mpares de 5 algarismos diferentes existem;
Números ı́mpares de 5 algarismos diferentes são da forma d4 d3 d2 d1 d0 com e d4 ̸= 0
e d0 ∈ {1, 3, 5, 7, 9}. No raciocı́nio combinatorial, preferimos começar a contagem
pelo elemento que possui a maior restrição, no caso d0 . Assim, d0 pode assumir
qualquer de 5 dı́gitos, após a escolha de d0 o dı́gito d4 pode assumir qualquer de
8 dı́gitos (d4 ̸= 0 e d4 ̸= d0 ) e daı́ d1 , d2 e d3 podem assumir, respectivamente,
quaisquer de 8, 7 e 6 dı́gitos, de forma que existem 5 · 8 · 8 · 7 · 6 = 13440 números
ı́mpares de 5 algarismos diferentes.
(c) O número de apostas distintas de 6 e de 7 números na loteria Mega-Sena;
(d) De quantas maneiras distintas podemos preencher uma prateleira com n livros
diferentes, cada um com k exemplares idênticos;
Temos um total de k + · · · + k = nk tomos que podem ser arranjados de (nk)!
maneiras distintas. Nem todos esses arranjos serão distintos, já que uma permutação

1
qualquer dos exemplares idênticos não altera a configuração. Assim, temos somente

(k + · · · + k)! (nk)!
=
k! · · · k! (k!)n

maneiras distintas de preencher a prateleira. Por exemplo, se temos 4 tı́tulos distin-


tos cada um com 8 exemplares idênticos (pense nos livros-texto de Cálculo 1, 2, 3 e
4 do H. L. Guidorizzi), temos (4 · 8)!/(8!)4 ≃ 1017 arranjos distintos para eles. Uma
pessoa que pudesse preparar uma configuração diferente por segundo levaria mais
de 3 bilhões de anos para preparar todas as configurações possı́veis!
Neste problema, podemos pensar nos livros diferentes como n letras e nas confi-
gurações como anagramas de uma palavra contendo cada uma das n letras k vezes.
(e) O número de maneiras de acomodar n pessoas em uma mesa redonda. (n − 1)!
Porque? Faça um desenho.

2. Quantos comitês podemos formar a partir de um grupo de 5 homens e 8 mulheres


contendo

(a) 2 homens e 4 mulheres;


Podemos escolher 2H (H para homem) de um total de 5H de (52) = 10 maneiras
diferentes e 4M (M para mulher) de um total de 8M de (84) = 70 maneiras diferentes,
de forma que podemos formar 10 · 70 = 700 comitês diferentes de 2H e 4M.
(b) 4 homens e 2 mulheres;
Pelo mesmo raciocı́nio existem (54)(82) = 5 · 28 = 140 comitês diferentes de 4H e 2M.
(c) um presidente (homem ou mulher), 2 homens e 3 mulheres.
Precisamos preencher as posições P+ HH + MMM (P para presidente). Primeiro
temos de escolher P dentre as 5 + 8 = 13 pessoas, independentemente de seu
gênero. Podemos fazer isso de 13 maneiras diferentes. Das 12 pessoas que sobram
precisamos escolher 2H e 3M. Se P ≡ H, podemos escolher 2H e 3M de (42)(83)
maneiras e temos então 13(42)(83) = 4368 comitês possı́veis. Já se P ≡ M, podemos
escolher 2H e 3M de (52)(73) maneiras diferente e neste caso ficamos com 13(52)(73) =
4550 comitês possı́veis. Como podemos formar ou um comitê com P ≡ H (para os
quais temos 4368 possibilidades) ou um comitê com P ≡ M (para os quais temos
4550 possibilidades), o número total de comitês possı́veis é 4368 + 4550 = 8918.
Alguns podem tentar “resolver” esse problema das seguintes maneiras. Para for-
mar um comitê de P+ HH + MMM, podemos escolher um presidente H e daı́ mais
2H e 3M de 5(42)(83) = 1680 maneiras ou escolher uma presidente M e daı́ mais 2H
e 3M de 8(52)(73) = 2800 maneiras, o que da um total de 4480 possı́veis comitês.
Essa “solução” é equivalente a escolher 3H e 3M e daı́ escolher um dos 3H para ser
presidente ou escolher 2H e 4M e daı́ escolher uma das 4M para ser presidente, de
onde obtemos 3(53)(83) + 4(52)(84) = 4480. A igualdade entre essas duas contagens
−1
advém da identidade k(nk) = n(nk− 1 ) (verifique). Outra maneira de “resolver” o
problema seria escolher 2H e 3M de (52)(83) = 560 maneiras diferentes e das 8

2
pessoas que restam (3H + 5M) escolher 1 para presidente, de onde obtemos 8 ·
560 = 4480 possı́veis comitês, como antes.
Ambos os raciocı́nios são equivocados; temos pelo menos dois problemas com essas
“soluções”. Primeiro, ao pré-selecionarmos 3H e 3M ou 2H e 4M para formar o
comitê e depois selecionar um presidente entre eles estamos ignorando a possibil-
idade de que alguma das pessoas que não foram pré-selecionadas possa assumir
a presidência, algo que em princı́pio poderia acontecer. Os pré-selecionados são
duplamente privilegiados: foram escolhidos para formar o comitê e ainda vão con-
correr à sua presidência! O outro problema é que as chances de ter um H ou M
na presidência devem ser, respectivamente, 5/13 ≃ 0.385 e 8/13 ≃ 0.615. Pela
primeira “solução” acima as chances seriam de 1680/4480 = 0.375 e 2800/4480 =
0.625, e pela segunda “solução” as chances seriam de 3/8 = 0.375 e 5/8 = 0.625.
Como se vê, os números não conferem.

3. (a) Quantos anagramas a palavra matematica possui?


(b) Quantos anagramas da palavra exercicio possuem todas as vogais juntas e todas as
consoantes juntas?

4. Duas retas paralelas são marcadas uma em n pontos e outra em k pontos distintos.

(a) Quantos triângulos diferentes podemos formar usando esses pontos?


(b) Quantos quadriláteros diferentes podemos formar usando esses pontos?

5. O teorema fundamental da aritmética garante que todo número inteiro n ⩾ 2 pode ser
escrito na forma n = p1a1 · · · pkak , onde os pi são números primos e os expoentes ai ⩾ 1.
Por exemplo, 588 = 22 · 31 · 72 . Determine o número de divisores de n.
Todo número d = pe11 · · · pekk com 0 ⩽ ei ⩽ ai , i = 1, . . . , k é um divisor de n, pois
n p1a1 · · · pkak
= e1 a1 −e1
ek = p 1 · · · pkak −ek ∈ N.
d p1 · · · pk
Podemos escolher os expoentes e1 , . . . , ek de (1 + a1 ) · · · (1 + ak ) maneiras diferentes, que
é, portanto, o número de divisores de n. Por exemplo, 48 = 24 · 31 possui (1 + 4) · (1 + 1) =
10 divisores, a saber, 1, 2, 3, 4, 6, 8, 12, 16, 24 e 48; cada um desses números pode ser
escrito na forma 2e1 · 3e2 com e1 = 0, 1, 2, 3 ou 4 e e2 = 0 ou 1.

6. Quantas combinações de 4 objetos tomados de 3 em 3 com possı́veis repetições existem?


Rotulando os objetos de a, b, c e d, liste todas essas combinações.

7. (a) Quantas soluções inteiras não negativas existem para a equação x + y + z = 16?
Podemos ver o número 16 como a quantidade de “bolas” a serem distribuı́das entre
as “urnas” x, y e z.(a) Pictoricamente temos

| ·{z
· · ◦} | |◦ ·{z
· · ◦} | |◦ ·{z
· · ◦} .
x y z

(a) Argumentos envolvendo bolas (distinguı́veis ou indistinguı́veis entre si) e urnas são muito usados em análise
combinatória nos mais variados contextos. Veja, por exemplo, N. L. Johnson e S. Kotz, Urn Models and Their
Application: An Approach to Modern Discrete Probability Theory (Wiley: New York, 1977).

3
Considerando cada bola e cada barra como um sı́mbolo independente, temos 16 +
3 − 1 = 18 posições onde colocar as 3 − 1 = 2 barras, como por exemplo em

◦◦ | |◦ ◦{z
|{z} ◦ ◦ ◦} | |◦ ◦ ◦ ◦{z
◦ ◦ ◦ ◦ ◦} ou |{z} | |◦ ◦ ◦ ◦ ◦ ◦{z
◦ ◦ ◦ ◦ ◦ ◦ ◦} | |{z}
◦◦◦.
x=2 y=5 z=9 x=0 y=13 z=3

O número de maneiras diferentes de escolher 2 posições diferentes para as barras


dentre as 18 posições possı́veis é dado por (18
2 ) = 153, que é o número de soluções
inteiras não negativas da equação x + y + z = 16. Generalizando para um número
arbitrário n de variáveis e k de bolas, vemos que o número de soluções inteiras não
negativas para a equação x1 + · · · + xn = k é dado por (n− 1+k n−1+k
n − 1 ) = ( k ).
(b) Quantas soluções inteiras positivas existem para a inequação x + y + z + t < 14?
Soluções inteiras positivas significa que devemos ter x, y z, t ⩾ 1. Como sabemos
resolver a equação quando as variáveis são não negativas, fazemos as transformações
a = x − 1, b = y − 1, c = z − 1 e d = t − 1, de forma a obtermos as variáveis
não negativas a, b c, d ⩾ 0 que devem satisfazer a inequação a + b + c + d < 10.
Podemos reescrever essa inequação na forma a + b + c + d = k com 0 ⩽ k < 10.
O número de soluções de cada uma dessas equações é dado por (4−1k +k) = (3+k k).
Assim, o número total de soluções para a inequação original é dado por
  9      
3+k 3+k 3+9+1 13
∑ = ∑ = = = 715 soluções,
0⩽ k<10
k k=0
3 3+1 4

onde usamos o resultado do exercı́cio II.5 para efetuar a soma.


Outra maneira de resolver este exercı́cio consiste em introduzir uma variável auxil-
iar e ⩾ 1 e reescrever a inequação a + b + c + d < 10 na forma a + b + c + d = 10 − e.
Obviamente essa equação é equivalente à equação a + b + c + d + e = 9 com e ⩾ 0
e seu número de soluções vale (5−5−1+1 9) = (13
4 ) = 715, exatamente como antes.
(c) Quantas soluções inteiras não negativas existem para a inequação x + y + z ⩽ 21?
Observação: números inteiros não negativos são maiores ou iguais a zero, enquanto números
inteiros positivos são estritamente maiores que zero.

8. (a) Quantas sequências binárias de comprimento 8 possuem exatamente 4 zeros?


Os zeros ocupam 4 das 8 possı́veis posições e isso pode ser feito de (84) = 70
maneiras diferentes.
(b) Quantas sequências binárias de comprimento 15 possuem mais zeros do que uns?
Com 15 bits não é possı́vel haver empate entre o número de zeros e uns. Por
simetria, portanto, metade das sequências possuem mais zeros do que uns e metade
possue mais uns do que zeros, de forma que o número procurado vale 215 /2 =
16384. Outra maneira de obter esse resultado é somar o número de configurações
com 8, 9, . . . , 15 zeros, (15 15 15
8 ) + ( 9 ) + · · · + (15), que obviamente vale o mesmo que
(15 15 15 15 15 15 15
7 ) + ( 6 ) + · · · + ( 0 ), e como ( 0 ) + ( 1 ) + · · · + (15) = 2 pelo teorema binomial,
segue a mesma conclusão que antes.

4
(c) Quantas sequências binárias de comprimento n possuem exatamente ⌊n/2⌋ zeros?
Observação: A notação ⌊ x⌋ indica o maior inteiro menor ou igual a x.

9. (a) Mostre que p números zero e q ⩾ p − 1 números um podem ser concatenados sem
que dois números zero fiquem juntos de (q+p 1) maneiras diferentes;
Vamos representar uma sequência de p dı́gitos 0 e q ⩾ p − 1 dı́gitos 1 sem dois
dı́gitos 0 juntos por
1 · · 1} 0 |1 ·{z
| ·{z · · 1} 0 |1 ·{z
· · 1} 0 |1 ·{z
· · 1} ,
n1 n2 ··· n p+1

com n1 + n2 + · · · + n p+1 = q. Nas “caixas” 1 e p + 1 pode haver qualquer número


de dı́gitos 1, n1 ⩾ 0 e n p+1 ⩾ 0, mas as “caixas” de 2 a p devem conter pelo
menos um dı́gito 1 cada, ni ⩾ 1, i = 2, . . . , p. Podemos uniformizar essas variáveis
colocando ℓ1 = n1 , ℓi = ni − 1, 2 ⩽ i ⩽ p, e ℓ p+1 = n p+1 . Agora todos os ℓi ⩾ 0
e ficamos com a equação ℓ1 + ℓ2 + · · · + ℓ p+1 = q − ( p − 1) para resolver. Essa
equação possui ( p+1−p1++1q−−(1 p−1)) = (q+p 1) soluções, como querı́amos demonstrar.
(b) Mostre que o número f (n) de sequências binárias de comprimento n que não pos-
suem dois números zero juntos é dado por f (0) = 1, f (1) = 2 e f (n) = f (n − 1) +
f (n − 2) para n ⩾ 2;
Temos somente uma sequência binária válida (que não possui dois zeros juntos) de
comprimento 0, a sequência vazia (que é única), de forma que f (0) = 1. Para n = 1
temos duas sequências válidas, 0 e 1, e daı́ f (1) = 2. Para obter f (n) para n ⩾ 2
dividimos as sequências válidas em dois tipos: as que começam com 0 e as que
começam com 1. O número de sequências válidas de comprimento n que começam
com 1 é dado por f (n − 1), pois toda sequência válida de comprimento n − 1 da
origem a uma sequência válida de tamanho n pela anexação do dı́gito 1 a ela,

| {z · ·}· → 1011010
011010 | {z · ·}· e também {z · ·}· → 1101110
|101110 | {z · ·}· .
n−1 n−1 n−1 n−1

Já as sequências válidas de comprimento n que começam com 0 são necessaria-


mente do tipo 01 · · · , isto é, são formadas por um 0 anexado às sequências de
comprimento n − 1 que começam com 1. Como o número de sequências válidas
de comprimento n − 1 que começam com 1 é dado por f (n − 2), concluı́mos que o
número de sequências válidas de comprimento n que começam com 0 é dado por
f (n − 2). Assim, o número de sequências válidas de comprimento n é dado por
f ( n ) = f ( n − 1 ) + f ( n − 2 ).
(c) Comparando os resultados dos itens (a) e (b), mostre que
⌊ 21 (n+1)⌋ 
n−p+1

f (n) = ∑
p=0 p

e que a função f (n) definida por esse somatório de fato observa as relações
f (0) = 1, f (1) = 2 e f (n) = f (n − 1) + f (n − 2).(b) Na expressão acima, a notação
⌊ x⌋ indica o maior inteiro menor ou igual a x.
(b) Os números f (n) são conhecidos como números de Fibonacci, devido ao seu aparecimento no tratado Liber Abaci,

5
Uma sequência binária de comprimento n que não possui dois zeros juntos pode
conter n dı́gitos 1 e 0 dı́gitos 0 ou n − 1 dı́gitos 1 e 1 dı́gito 0 ou n − 2 dı́gitos 1 e 2
dı́gitos 0 e assim sucessivamente até ⌊ 21 (n + 1)⌋ dı́gitos 1 e n − ⌊ 12 (n + 1)⌋ dı́gitos
0 (não podemos ter menos dı́gitos 1 do que dı́gitos 0). Do item (a) sabemos que o
número de sequências binárias de p dı́gitos 0 e q ⩾ p − 1 dı́gitos 1 sem dois dı́gitos 0
juntos é dado por (q+p 1), e daı́ concluı́mos que o número f (n) de sequências binárias
de comprimento n que não possuem dois zeros juntos é dado por

⌊ 12 (n+1)⌋ 
n−p+1

f (n) = ∑ .
p=0 p

Essa identidade nos fornece uma interessante fórmula para os números de Fibonacci
Fn+2 = f (n) em termos dos coeficientes binomiais.

II. Coeficientes binomiais(c)

O binómio de Newton é tão belo como a Vénus de Milo.


O que há é pouca gente para dar por isso.
óóóó — óóóóóóóóó — óóóóóóóóóóóóóóó
(O vento lá fora).
Álvaro de Campos (Fernando Pessoa), 1935

1. Mostre que calcular aproximadamente expressões do tipo (n ± 1)k , n ≫ 1, k ⩾ 1 usando o


teorema binomial é moleza. Use a técnica para calcular aproximadamente 95 e 116 .

2. Determine para que valores de k, 0 < k < n, o coeficiente binomial (nk) é máximo.

3. Demonstre a identidade hexagonal

n−1 n−1
       
n n+1 n+1 n
= .
k−1 k+1 k k k+1 k−1

Justifique o nome dado à identidade.


Escrevendo os produtos do lado esquerdo da identidade explicitamente temos

n−1 (n − 1)!
   
n n+1 n! (n + 1)!
= · · .
k−1 k+1 k (k − 1)!(n − k)! (k + 1)!(n − k − 1)! k!(n + 1 − k)!

de Leonardo de Pisa, o Fibonacci, em 1202, embora eles já fossem conhecidos em diversas culturas desde muito
antes. Os primeiros números de Fibonacci são F0 = 0, F1 = 1, F2 = 1, F3 = 2, F4 = 3, F5 = 5 etc. (Fn = Fn−1 +
Fn−2 ), de forma que nosso f (n) = Fn+2 . Os números de Fibonacci possuem inúmeras propriedades matemáticas,
das mais mundanas às mais arcanas, e vêm fascinando gerações de curiosos há séculos. De fato, existe até uma
respeitosa publicação dedicada aos números de Fibonacci, a The Fibonacci Quarterly (ISSN: 0015-0517). Uma
discussão abrangente dos números de Fibonacci pode ser encontrada no excelente livro-texto de R. L. Graham,
D. E. Knuth e O. Patashnik, Concrete Mathematics, 2a. ed. (Reading: Addison-Wesley, 1994), Seção 6.6.
(c) Oestudante interessado em coeficientes e identidades binomiais deve consultar o livro-texto de R. L. Graham,
D. E. Knuth e O. Patashnik, Concrete Mathematics, 2a. ed. (Reading: Addison-Wesley, 1994), Capı́tulo 5, ou ainda
J. Riordan, Combinatorial Identities (New York: Krieger, 1979), para um tratamento mais avançado.

6
Claramente, os numeradores nos dois lados da identidade são os mesmos, e precisamos
somente encontrar (caso seja possı́vel) um rearranjo dos denominadores que leve à sua
parte direita. Preservando a forma dos termos para melhor identificá-los obtemos

(n − 1)! n−1
   
n! (n + 1)! n n+1
· · = .
k!(n − k − 1)! (k − 1)!(n + 1 − k)! (k + 1)(n − k)! k k−1 k+1

A disposição desses coeficientes binomiais no triângulo de Pascal forma um hexágono:

n−1 n−1
   

  k−1   k  
n n n
k−1   k   k+1
n+1 n+1
k k+1

Um dispositivo mnemônico para a identidade hexagonal consiste em reparar que basta


trocar todos os sinais “explı́citos” de seu lado esquerdo para obter seu lado direito.

4. Use o teorema binomial (seja criativo!) para calcular as seguintes somas:


 2  2  2
n n n
(a) + +···+ ;
0 1 n
Vamos expandir o produto (1 + x)n (1 + x)n pelo teorema binomial:
n  
n i n n j n n   
 
n n n n i+ j
(1 + x) (1 + x) = ∑ x ∑ x =∑∑ x .
i =0
i j=0
j i =0 j=0
i j

Vemos que o coeficiente do termo xn na soma dupla acima vale


   n    n  2
n n n n n
∑ i j = ∑ i n−i = ∑ i ,
i + j=n i =0 i =0

isto é, exatamente a soma que queremos calcular, donde concluı́mos que seu valor
é dado pelo coeficiente do termo xn do polinômio (1 + x)n (1 + x)n = (1 + x)2n .
Expandindo esse polinômio pelo teorema binomial obtemos
2n  
2n 2n i
(1 + x) = ∑ x,
i =0
i

2 2 2
de forma que (n0 ) + (n1 ) + · · · + (nn) = (2n
n ). Verifique esse resultado para valores
pequenos de n, por exemplo n = 4 ou 5.
É possı́vel dar uma interpretação combinatorial para a identidade acima. Suponha
que queremos escolher n elementos dentre 2n elementos da seguinte maneira: primeiro
escolhemos k elementos de um subconjunto de tamanho n (por exemplo, {1, . . . , n})
e depois escolhemos n − k elementos do conjunto complementar de 2n − n = n
n 2
elementos (por exemplo, {n + 1, . . . , 2n}). Podemos fazer isso de (nk)(n−n
k) = ( k )
maneiras diferentes. Como k pode variar de 0 a n, pela regra da soma podemos
2 2 2
fazer isso de (n0 ) + (n1 ) + · · · + (nn) maneiras diferentes, que deve corresponder

7
ao número de combinações de tamanho n que podemos formar a partir de 2n el-
ementos, isto é, a (2n
n ). Esta interpretação combinatorial nos permite obter, mutatis
mutandis, uma expressão mais geral conhecida como identidade de Vandermonde,
  r   
n+m n m
= ∑
r k=0
k r−k

para quaisquer m, n, r ⩾ 0 com r ⩽ m, n. A identidade obtida anteriormente neste


exercı́cio é um caso particular da identidade de Vandermonde com r = m = n.
 2  2  2
n n n n
(b) − + · · · + (−1) ;
0 1 n
Considere a expansão binomial de (1 − x)n (1 + x)n e proceda como no item (a).
     
n n n
(c) + + + · · ·, n par;
0 2 4
     
n n n
(d) + + + · · ·, n ı́mpar.
1 3 5
Para resolver os itens (c) e (d) considere a soma das séries dos dois exercı́cios (isto é,
resolva os dois ao mesmo tempo!) e trate o caso de n par ou ı́mpar separadamente.

Em somas deste tipo, a identidade de de Moivre (cos θ + i sin θ )n = cos nθ + i sin nθ


frequentemente é útil pela escolha de um θ apropriado. Por exemplo (prove!),
     
n n n 1 n 2nπ 
+ + +··· = 2 + 2 cos .
0 3 6 3 3

5. Mostre que (kk) + (k+k 1) + · · · + (k+k n) = (k+k+n+1 1). Essa identidade aparece na dedução do
número de k-combinações de n objetos com repetições.

6. Mostre que 12 + 22 + · · · + n2 = 16 n(n + 1)(2n + 1) pelos seguintes métodos:

(a) Mostre que (k+3 2) − (3k ) = k2 e some sobre k;


A identidade é trivial: (k+3 2) − (3k ) = 3!1 [(k + 2)(k + 1)k − k(k − 1)(k − 2)] = k2 .
Somando o lado esquerdo dessa identidade de 1 a n obtemos
n h   i n   n   n   n  
k+2 k k+2 k k+2 k
∑ − = ∑ −∑ = ∑ −∑ ,
k=1
3 3 k=1
3 k=1
3 k=1
3 k=3
3

pois (13) = (23) = 0. Deslocando o ı́ndice do segundo somatório do lado direito da


expressão acima ficamos com
n   n   n   n−2      
k+2 k k+2 k+2 n+1 n+2
∑ −∑ = ∑ −∑ = + ,
k=1
3 k=3
3 k=1
3 k=1
3 3 3

e como (n+3 1) + (n+3 2) = 61 n(n + 1)(2n + 1), o resultado está demonstrado.


(b) Mostre que (2k ) + (k+2 1) = k2 e some sobre k usando o resultado do exercı́cio II.5.

8
7. Mostre por indução matemática em m que
m    
n n  m+1 n
∑ k 2 −k = 2 m+1 .
k=0

Repare que sem o termo ( n2 − k) multiplicando o somando do lado esquerdo, a soma


resultante (que corresponde à soma parcial de uma linha do triângulo de Pascal) não
pode ser calculada de forma fechada; compare com o exercı́cio II.5).(d)

8. Mostre que (kj )(ki) = ( ij)(kj− i


−i ) para todo i ⩽ k ⩽ j e que, portanto,

j   
j k
∑ (−1)k k i
= 0.
k =i

Temos   
j k j! k!
= · .
k i k!( j − k)! i!(k − i )!
Cancelando k!, multiplicando e dividindo o lado direito da equação por ( j − i )! e
rearranjando os termos segue imediatamente que

( j − i )! j−i
     
j k j! j
= · = .
k i i!( j − i )! (k − i )!( j − k)! i k−i
Usando essa identidade reescrevemos a soma dada como
j j j
j−i j−i
         
k j k k j j k
∑ (−1) k i = ∑ (−1) i k − i = i ∑ (−1) k−i
.
k =i k =i |{z} k =i
não depende de k

Quando k vai de i até j, k − i vai de 0 até j − i, de maneira que podemos reescrever a


última soma acima na forma
j      j−i   j −i
k j−i k −i j − i
   
k j k j i j
∑ (−1) k i = i ∑ (−1) k − i = (−1) i ∑ (−1) k − i .
k =i k −i = 0 k −i = 0

Chamando agora k − i = ℓ obtemos finalmente


j −i j −i
j−i j−i
   
k −i
∑ (−1) = ∑ (−1) ℓ
= ( 1 − 1 ) j −i = 0
k −i = 0
k−i ℓ=0

pelo teorema binomial, e o resultado está demonstrado.


n n
9. Mostre que se an = ∑ (nk) bk para todo n ⩾ 0, então bn = ∑ (−1)n+k (nk) ak . Essa é uma
k=0 k=0
fórmula de inversão envolvendo coeficientes binomiais. Dica: Substitua a expressão para
bk na expressão para an (tomando cuidado para não confundir os ı́ndices) e efetue a soma
dos produtos obtidos com auxı́lio do resultado do exercı́cio II.6.

(d) Graham,Knuth & Patashnik (v. nota (b)), p. 166, reparam que essa situação é matematicamente semelhante à das
2 2
integrais −a ∞ xe− x dx e −a ∞ e− x dx: a primeira parece mais complicada mas sua integração é muito simples,
R R

enquanto a segunda parece mais simples mas é impossı́vel de se calcular de forma fechada (exceto quando a = ∞).

9
10. A partir da comparação dos coeficientes de xr dos dois lados da identidade (1 + x)n+m =
(1 + x)n (1 + x)m , demonstre a identidade de Vandermonde
  r   
n+m n m
= ∑ .
r k=0
r−k k

Essa identidade também pode ser obtida a partir do seguinte argumento combinatorial.
Considere um grupo formado por n homens e m mulheres. De quantas maneiras difer-
entes podemos formar um comitê contendo r membros? A resposta imediata é (n+r m).
Como cada comitê de r membros pode ser formado por r − k homens e k mulheres de
(r−n k)(mk) maneiras diferentes com k = 0, 1, . . . , r, obtemos a identidade de Vandermonde.

11. Um grupo de 2n pessoas se move no plano a partir da origem (0, 0). Todos os dias cada
pessoa se move por uma unidade de distância. No primeiro dia, metade delas se move
para o leste e metade se move para o norte. Todos os dias, cada grupo se divide em
dois subgrupos iguais e um subgrupo continua se movendo para o leste e o outro para o
norte, e assim sucessivamente. Determine a posição das pessoas após n dias.

III. Desigualdades aritmética e geométrica

1. Mostre que as seguintes desigualdades valem para qualquer conjunto de números reais
x1 , x2 , . . . , xn > 0,
1 √ x + x2 + · · · + xn
⩽ n x1 x2 · · · xn ⩽ 1 ,
1 1 1 n
+ +···+
x1 x2 xn
com igualdade valendo somente quando x1 = x2 = · · · = xn . Em outras palavras, a
média harmônica de n números positivos é menor que sua média geométrica que, por
sua vez, é menor que sua média aritmética. Dica: Considere a função convexa f ( x) =
− log(1 + x), para a qual vale
x1 + x2  f ( x1 ) + f ( x2 )
f < ,
2 2
x1 + x2
já que é o ponto médio do segmento [ x1 , x2 ] (faça um gráfico).(e)
2
2. Mostre que para todo conjunto de números reais x1 , x2 , . . . , xk ⩾ 0 e de números inteiros
m1 , m2 , . . . , mk > 0 vale a desigualdade
m1 x1 + m2 x2 + · · · + mk xk mk 1/(m1 +m2 +···+mk )
⩾ xm 1 m2
1 x2 · · · xk .
m1 + m2 + · · · + mk
Em particular, quando m1 + m2 + · · · + mk = 1, temos m1 x1 + m2 x2 + · · · + mk xk ⩾
mk
xm 1 m2
1 x2 · · · xk . Essas desigualdades são úteis em probabilidade e estatı́stica.

(e) Uma função f : R → R é dita convexa se e somente se f ((1 − a) x + ay) < (1 − a) f ( x) + a f ( y) para todo real x, y e
todo a ∈ [0, 1]. Uma condição suficiente para f ser convexa é que ela tenha uma segunda derivada não negativa,
f ′′ ⩾ 0, isto é, ela é “côncava para cima”. A interpretação geométrica é que f está sobre ou acima de qualquer uma
de suas tangentes.

10
Partindo da desigualdade aritmética-geométrica
a1 + a2 + · · · + an √
⩾ n a1 a2 · · · an ,
n
coloque m1 números ai iguais a x1 , m2 números ai iguais a x2 , e assim sucessivamente até
colocar mk números ai iguais a xk , e como m1 + m2 + · · · + mk = n, segue a desigualdade
procurada. O resultado vale igualmente quando os números mi > 0 são reais.

3. Sejam a1 , a2 , . . . , an os termos de uma progressão aritmética. Mostre que


√ √
n a1 + an
a1 an ⩽ a1 a2 · · · an ⩽ .
2
√ √n n+1
Mostre que, em particular, essas desigualdades implicam que n ⩽ n! ⩽ .
2
Dica: Mostre primeiro que em qualquer progressão aritmética cuja razão de progressão
não é zero, o produto de dois termos equidistantes dos termos extremos é tanto maior
quanto mais próximos esses termos estiverem do termo médio.

IV. Princı́pio do pombal

1. Mostre que se você der n tiros em m < n pombos e não errar nenhum tiro, pelo menos
um pombo vai acabar com mais do que um buraco de bala. (O nome pigeonhole principle
em inglês para esse princı́pio matemático provavelmente advém dessa observação ).

2. Tendo eliminado os pombos de seu telhado, você decide dar 50 tiros num alvo quadrado
de 70 cm de lado e não erra nenhum. Mostre que pelo menos dois tiros atingiram o alvo
a menos de 15 cm de distância um do outro.
Dividindo o quadrado em células de tamanho 10 × 10 cm2 , ficamos com 49 células. Como
são 50 tiros, pelo menos uma célula vai tomar 2 tiros. Dentro de cada célula a distância

máxima entre dois pontos quaisquer é de 10 2 cm ≃ 14,1 cm < 15 cm.

3. Dados 5 pontos quaisquer sobre uma esfera, mostre que é possı́vel dividi-la em dois
hemisférios fechados de tal forma que um deles contém pelo menos 4 dos pontos dados.

4. Mostre que em qualquer lista de n números inteiros positivos existem pelo menos dois
elementos cuja diferença entre eles é divisı́vel por n − 1.
Vamos denotar os n números por a1 , . . . , an . Tomando o módulo desses números em
relação a n − 1 obtemos os restos r1 = a1 mod (n − 1), . . . , rn = an mod (n − 1), todos
contidos no intervalo inteiro 0 ⩽ ri ⩽ n − 2. Assim, temos n números para colocar
em n − 1 classes de equivalência, de forma que pelo menos dois deles, digamos ai e a j ,
devem pertencer à mesma classe. Escrevendo esses números como ai = ki (n − 1) + ri e
a j = k j (n − 1) + r j e subtraindo um do outro obtemos

a j − ai = (k j − ki )(n − 1) + (r j − ri ) = (k j − ki )(n − 1),

já que r j = ri , e vemos que a j − ai é divisı́vel por n − 1, como querı́amos demonstrar.

11
5. Seja A uma sequência formada pelas 26 letras do alfabeto latino em qualquer ordem.

(a) Mostre que A possui pelo menos uma subsequência de 4 ou mais consoantes con-
secutivas;
(b) Supondo que A comece com uma vogal, mostre que A possui pelo menos uma
subsequência de 5 ou mais consoantes consecutivas.

6. Mostre que em uma festa com n ⩾ 2 pessoas existem pelo menos duas pessoas com
exatamente o mesmo número de conhecidos, assumindo que a relação de familiaridade
é simétrica e não-reflexiva (se a conhece b então b conhece a, a ̸= b). Este exemplo
é oriundo da teoria dos grafos, com as pessoas no lugar dos vértices e as relações de
familiaridade no lugar das arestas do grafo.

7. Suponha que cada ponto do plano (!) seja pintado de azul ou vermelho. Mostre que para
qualquer valor real d > 0 existem dois pontos separados exatamente pela distância d que
possuem a mesma cor. Dica: Considere um triângulo equilátero.

8. Mostre que todo número inteiro positivo n possui pelo menos um múltiplo diferente
de zero formado somente pelos dı́gitos 0 e 1 e encontre um desses múltiplos para os
números 19 e 113. Você consegue pensar em um algoritmo que encontra esses múltiplos
sem apelar para a força bruta, isto é, sem testar a divisibilidades de zilhões de números
que sabemos de antemão que não vão dar em nada? Dicas: (i) O caso n = 1 é trivial; para
k
n ⩾ 2, escreva todos os n + 1 números uk = ∑ 10i para 0 ⩽ k ⩽ n, isto é, u0 = 1, u1 = 11,
i =0
. . . , un = 11 · · · 1 (n + 1 dı́gitos 1); (ii) Como só existem n possı́veis restos da divisão de
um número qualquer por n, pelo princı́pio do pombal pelo menos dois números ui e
u j > ui possuem o mesmo resto da divisão por n (veja o exercı́cio III.4); (iii) Se ui e u j
possuem o mesmo resto da divisão por n, então sua diferença u j − ui > 0 é um múltiplo
de n que também é uma soma de potências distintas de 10 de coeficientes 0 ou 1.

12
V. Probabilidades

1. Dados dois eventos quaisquer A e B, verifique usando somente propriedades de con-


juntos que P( A ∪ B) = P( A) + P( B) − P( A ∩ B) e que P( A ∩ B) ⩾ P( A) + P( B) − 1
(desigualdade de Bonferroni).
Vamos escrever A ∪ B = A ∪ ( A ∩ B), isto é, A ∪ B é a união de uma parte que é “somente
A” (A) e de outra que é “somente B” (A ∩ B)—desenho um diagrama de Venn. Como
essas duas partes são disjuntas,

P( A ∪ B) = P( A ∪ ( A ∩ B)) = P( A) + P( A ∩ B).

Da mesma forma, B = ( B ∩ A) ∪ ( B ∩ A), de onde obtemos

P( B) = P( B ∩ A) + P( B ∩ A) ⇒ P( B ∩ A) = P( B) − P( B ∩ A).

Substituindo essa expressão para P( B ∩ A) na primeira expressão obtemos finalmente

P( A ∪ B) = P( A) + P( B) − P( A ∩ B).

A desigualdade de Bonferroni advém da observação que A ∪ B ⊆ Ω para quaisquer dois


conjuntos A e B, e daı́

P( A ∩ B) = P( A) + P( B) − P( A ∪ B) ⩾ P( A) + P( B) − 1.

Faça um desenho—por exemplo, dois retângulos A e B dentro de um retângulo maior


Ω—para interpretar essa desigualdade.

2. Uma pesquisa (IBOPE, 2015) mostrou que 79% de todos os brasileiros se consideram
religiosos (acima da média mundial, que é de 63%), enquanto outra pesquisa (CNI,
2015) mostrou que 74% deles nunca fizeram compras online. Mostre que o percentual de
brasileiros que se consideram religiosos e nunca fizeram compras online é maior que 50%.

3. Um comitê de 5 pessoas deve ser escolhido aleatoriamente a partir de um grupo de 5


homens e 10 mulheres.

(a) Encontre a probabilidade de que o comitê seja formado por 1 presidente (homem
ou mulher), 2 homens e 2 mulheres;
(b) Encontre a probabilidade de que o comitê seja formado somente por mulheres.

4. Uma urna contém n − 1 bolas brancas e 1 bola preta. Se k ⩽ n bolas são retiradas da
urna, qual é a probabilidade de que a bola preta esteja entre elas?

5. Uma mão de pôquer com 3 cartas de mesmo valor (uma trinca) e 2 cartas de outro valor
(uma dupla) se chama full house. Qual é a probabilidade de que um jogador receba
inicialmente um full house em sua mão?
Supondo que temos um baralho padrão de 52 cartas (13 cartas, 4 naipes), podemos escol-
her 5 cartas quaisquer de (52
5 ) maneiras diferentes. No baralho temos 4 cartas de mesmo

13
valor para cada valor possı́vel (4 ases, 4 reis, 4 setes etc.). Dessa forma, podemos escolher
um par de cartas de mesmo valor de 13(42) maneiras diferentes. Uma vez escolhido esse
par, podemos escolher a trinca de 12(43) maneiras diferentes. Assim, a probabilidade de
receber um full house na mão vale
   
4 4
13 · 12
2 3 6
  = ≃ 0,144%,
52 49 · 17 · 5
5

ou seja, aproximadamente 1 chance em 700.

6. Uma sala de aula possui n ⩾ 3 alunos.

(a) Com que probabilidade pelo menos 2 alunos fazem aniversário no mesmo dia?
(b) Qual é o valor de n para o qual a probabilidade de dois aniversários coincidirem é
de pelo menos 50%?

7. Considere as malhas de interruptores da Figura 1. A primeira malha da figura (malha


em paralelo) possui um número n arbitrário de interruptores. Cada interruptor em cada
uma das malhas pode falhar com probabilidade p igual e independentemente. Encontre
a probabilidade de que haja um caminho fechado entre os terminais a e b em cada malha.

a b

a b

a b

Figure 1: Malhas de interruptores do exercı́cio V.7.

14
8. Considere o experimento aleatório de lançar uma moeda honesta repetidamente e contar
o número de lançamentos efetuados até se obter uma cara.

(a) Determine o espaço amostral Ω do experimento;


(b) Encontre a probabilidade de que a primeira cara apareça no k-ésimo lançamento;
(c) Encontre a probabilidade de que a primeira cara apareça em um lançamento par.

9. Mostre que a probabilidade condicional P( A | · ) satisfaz os axiomas de uma função


probabilidade.

10. Encontre P( A | B) para os casos em que A ∩ B = ∅, A ⊂ B e B ⊂ A.

11. Suponha que 3 cartas iguais sejam pintadas uma de preto em ambos os lados, uma de
vermelho em ambos os lados, e uma de preto de um lado e de vermelho no outro lado. As
cartas são misturadas em um chapéu e uma delas é escolhida aleatoriamente e colocada
sobre a mesa. Se o lado de cima da carta escolhida é vermelho, qual é a probabilidade de
que seu outro lado seja preto?

12. Duas cartas são retiradas ao acaso de um baralho regular (52 cartas, 4 naipes). Qual é a
probabilidade de que ambas sejam um ás?

13. Mostre que se A e B são eventos independentes, então os pares de eventos A e B, A e B,


e A e B também são independentes.
Sempre podemos escrever A = ( A ∩ B) ∪ ( A ∩ B) para quiasque dois conjuntos A e B
de Ω. Daı́, P( A) = P( A ∩ B) + P( A ∩ B), pois A ∩ B e A ∩ B são disjuntos. Como por
hipótese A e B são independentes, P( A ∩ B) = P( A) P( B) e daı́

P( A ∩ B) = P( A) − P( A) P( B) = P( A)[1 − P( B)] = P( A) P( B),

o que mostra que se A e B são independentes, então A e B também são independentes.


Obviamente, trocando os papeis de A e B vemos imediatamente que o mesmo vale para
A e B (as expressões são simétricas em A e B). Finalmente,

P( A ∩ B) = P( A ∪ B) = 1 − P( A ∪ B) = 1 − [ P( A) + P( B) − P( A ∩ B)] =
= 1 − P( A) − P( B) + P( A) P( B) = [1 − P( A)][1 − P( B)] = P( A) P( B),

de forma que se A e B são independentes, então A e B também são independentes.

14. Seja o espaço amostral Ω = { A, B, C }, com P( A) = p, P( B) = q e P(C ) = r. Repetimos


indefinidamente o experimento aleatório de observar resultados em Ω. Assumindo que
experimentos sucessivos são independentes, encontre a probabilidade de que o evento
A ocorra antes do evento B.

15. O exame de Papanicolaou é um procedimento usado para detectar alterações nas células
do colo do útero que podem indicar a presença de um câncer. Para mulheres que pos-
suem esse câncer, existe 16% de probabilidade do exame resultar em falso negativo,
enquanto para mulheres que não possuem o câncer existe 19% de probabilidade do

15
exame resultar em falso positivo. No Brasil, em 2023 a incidência dessa forma de câncer
é de 13,25 casos a cada 100 mil mulheres.(f) Qual é a probabilidade de que uma mulher
seja portadora de câncer do colo do útero caso seu exame de Papanicolaou tenha dado
resultado positivo?
Segundo os dados do problema, a probabilidade do exame de Papanicolaou resultar em
falso negativo vale P(−| C ) = 16%, donde P(−| C ) = 84%, enquanto a probabilidade do
exame resultar em falso positivo vale P(+| C ) = 19%, donde P(+| C ) = 81%. Queremos
calcular a probabilidade P(C |+) de que uma mulher seja portadora de câncer do colo do
útero caso seu exame de Papanicolaou tenha dado resultado positivo. Pela identidade
de Bayes temos que

P(+| C ) P(C )
P(C |+) P(+) = P(+| C ) P(C ) ⇒ P(C |+) = .
P(+)

Dados epidemiológicos indicam que, no Brasil, P(C ) = 13,25/100.000 = 0,01325%, e


podemos calcular a probabilidade P(+) em termos da probabilidade total

P(+) = P(+| C ) P(C ) + P(+| C ) P(C ) = 81% · 0,01325% + 19% · 99,98675%

Dessa forma, a probabilidade procurada vale

P(+| C ) P(C ) 81% · 0,01325%


P(C |+) = = ≃ 0,000565
P(+) 81% · 0,01325% + 19% · 99,98675%

Esse número significa que de cada um milhão de resultados positivos no exame de


Papanicolaou, apenas 565 indicam real presença de câncer de colo do útero, o que lança
dúvidas sobre a efetividade do teste. De nossa análise fica claro que a razão de sua
ineficácia reside na relativa baixa incidência da doença (0,01325% da população femi-
nina) e das elevadas taxas de falsos negativos (16%) e falsos positivos (19%) do teste.
Para melhorar a confiabilidade do teste deve-se procurar reduzir sua probabilidade de
resultados falso positivos, pois P(C |+) → 1 conforme P(+| C ) → 0.

(f) Fonte:
M. de O. Santos, F. C. da S. de Lima, L. F. L. Martins, J. F. P. Oliveira, L. M. de Almeida, M. de C. Cancela,
“Estimativa de incidência de câncer no Brasil, 2023–2025”, Rev. Bras. Cancerol. [Internet], vol. 69, n. 1, art. e-213700
(2023). DOI: 10.32635/2176-9745.RBC.2023v69n1.3700.

16
VI. Divertissement: Aproximações racionais
A formulação do princı́pio do pombal costuma ser atribuı́da ao matemático alemão Peter
Gustav Lejeune Dirichlet (1805–1859),(g) que em 1842 utilizou-o para mostrar que para qual-
quer número real r e qualquer número inteiro positivo N existem números inteiros p e q com
0 < q ⩽ N tais que | r − p/q | < 1/qN.(h) A aproximação de um número real r por um
número racional com propriedades ótimas é conhecida como aproximação diofantina.(i) Em seus
trabalhos posteriores, Dirichlet se referia ao princı́pio do pombal como Schubfachprinzip, ou
“princı́pio da gaveta”, em alemão. Vamos enunciar e demonstrar o teorema de Dirichlet:
Teorema (Dirichlet, 1842). Sejam r um número real e N um número inteiro positivo quaisquer.
Então existem números inteiros p e q com 0 < q ⩽ N tais que | r − p/q | < 1/qN.
Demonstração. As partes fracionárias (resı́duos mod1) dos números rk, 0 ⩽ k ⩽ N, formam
um conjunto de N + 1 números em [0, 1). Se dividirmos o intervalo [0, 1) em N subintervalos
iguais, pelo princı́pio do pombal pelo menos um subintervalo vai conter dois resı́duos difer-
entes, sejam eles ri = rki − ni e r j = rk j − n j com k j > ki . Como os dois resı́duos pertencem
ao mesmo subintervalo, | (rk j − n j ) − (rki − ni ) | < 1/ N, e tomando p = n j − ni e q = k j − ki
obtemos dois inteiros p e q com 0 ⩽ q ⩽ N tais que | r − p/q | < 1/qN. ■
O teorema de Dirichlet não fornece um método para a construção de aproximações diofantinas
para um dado número real. O método clássico para a construção de tais aproximações é o das
frações contı́nuas, que são frações (possivelmente infinitas) da forma

1
[ a0 ; a1 , a2 , . . .] = a0 + ,
1
a1 +
a2 + · · ·

onde geralmente se assume que todos os elementos ai , i ̸= 0, são inteiros positivos.(j)


Embora o resultado de Dirichlet não pareça grande coisa à primeira vista, ele possui aplicações
profundas em matemática e, portanto, em ciência da computação. Por exemplo, o resul-
tado de Dirichlet permitiu a Joseph Liouville (1809–1882) provar pela primeira vez, em 1844,
que números transcendentais existem e construir explicitamente uma famı́lia deles na forma

(g) Há
evidências de que o princı́pio do pombal já fosse conhecido anteriormente, cf. B. Rittaud e A. Heeffer, “The
pigeonhole principle, two centuries before”, The Mathematical Intelligencer, v. 36, n. 2, pp. 27–29 (2014).
(h) G.
Lejeune Dirichlet, “Recherches sur les formes quadratiques a coefficients et a indérteminées complexes”,
Journal für die reine und angewandte Mathematik (Crelle), v. 24, pp. 291–371 (1842), em especial §13; G. Lejeune
Dirichlet, “Verallgemeinerung eines Satzes aus der Lehre von den Kettenbrüchen nebst einigen Anwendungen
auf die Theorie der Zahlen”, Bericht über die zur Bekanntmachung geeigneten Verhandlungen der Königlich Preussischen
Akademie der Wissenschaften zu Berlin (1842), pp. 93–95.
(i) A análise diofantina trata das soluções inteiras para equações algébricas e das aproximações racionais para números

reais. O nome vem de Diofanto de Alexandria, matemático grego do século III que por volta do ano 250 d. C.
escreveu o tratado Aritmética sobre questões dessa natureza.
(j) Exposições
didáticas detalhadas sobre frações contı́nuas aparecem em A. Ya. Khinchin, Continued Fractions (New
York: Dover, 1997) e R. L. Graham, D. E. Knuth e O. Patashnik, Concrete Mathematics, 2a. ed. (Reading: Addison-
Wesley, 1994), Seções 4.5 e 6.7.

17

L a = ∑ a−k! , com a um número inteiro qualquer diferente de 0 e ±1.(k) Alguns anos mais
k=1
tarde, em 1874, Georg Cantor (1845–1918) mostrou que os números transcendentais não são
enumeráveis—isto é, que a maioria esmagadora dos números reais é transcendente! —, in-
troduzindo, de passagem, um novo método para construir esses números.(l) Demonstrar
que determinado número ou famı́lia de números é transcendental é uma questão difı́cil em
matemática, embora tanto as técnicas desenvolvidas nas tentativas quanto os eventuais números
encontrados possuam diversas aplicações teóricas e práticas em potencial.(m)
O teorema de Dirichlet encontra uma interessante aplicação em aritmética em ponto flutuante.
Vamos primeiro estabelecer o seguinte fato: se r = a/b é um número racional, então existe
um intervalo aberto ao redor de r que não contém nenhuma aproximação racional para r
com denominador igual a b. Pode-se ver isso reparando que se p/q ̸= r, com p e q ̸= 0
números inteiros, então | qa − pb | ⩾ 1, de onde segue que | qr − p | ⩾ 1/b. Dessa forma,
enquanto o teorema de Dirichlet afirma que números irracionais podem ser aproximados por
números racionais tão bem quanto se queira (basta tomar q suficientemente grande), o mesmo
não pode ser feito para números racionais; obviamente não estamos considerando aproximar
o número racional por ele próprio. Como os números em ponto flutuante usados para repre-
sentar números reais nos computadores são necessariamente racionais (possuem um número
finito de dı́gitos), esse é um assunto do maior interesse no design de hardware, por exemplo,
floating-point units (FPUs), e de software. Por exemplo, se queremos representar no computa-
dor um número real r resultante de determinado cálculo, ele deve ser arredondado para um
número em ponto flutuante de n bits. Tomando q = 2n+1 , estabelecemos um intervalo ao redor
de r no qual nenhum número a meio caminho entre dois números com precisão de n bits pode
estar. O design de um hardware ou algoritmo que efetua uma aproximação para r que caia
dentro do intervalo excluı́do garante então que o valor aproximado obtido para r é o melhor
valor representável pela máquina.
As relações do teorema de Dirichlet com outras áreas da matemática e da ciência da com-
putação são discutidos nos livros de Mark Kac e Stanislaw M. Ulam, Mathematics and Logic:

(k) J.Liouville, “Mémoires et communications des membres et des correspondants de l’Académie” e “Nouvelle
démonstration d’un théoréme sur les irrationalles algébriques, inséré dans le Compte rendu de la dernière séance”,
Comptes Rendus des Séances de l’Académie des Sciences, v. XVIII, n. 20, pp. 883–885 e pp. 910–911 (1844).
(l) G.
Cantor, “Ueber eine Eigenschaft des Inbegriffes aller reelen algebraischen Zahlen”, Journal für die reine und
angewandte Mathematik, v. 77, pp. 258–262 (1874).
(m) Números reais são chamados de algébricos quando podem ser obtidos como solução de uma equação algébrica
(uma equação polinomial) contendo apenas coeficientes racionais, caso contrário eles são chamados de transcen-

dentais. O fato de um número ser algébrico nada tem a ver com o fato dele ser racional: 2, por exemplo,
é irracional mas é algébrico, pois é raiz da equação polinomial x2 − 2 = 0. Por outro lado, todo número
transcendental é irracional, uma vez que todo número racional é obviamente algébrico (se x =√p/q ∈ Q então
ele é raiz da equação algébrica qx − p = 0). Os números π, a constante de Gelfond-Schneider 2 2 e a constante
de Champernowne 0,123456789101112 . . ., construı́da pela concatenação dos números inteiros, são exemplos de
números transcendentais. Também sabemos que os números de Liouville generalizados L a = ∑∞ k!
k=1 a , com
a um número algébrico no intervalo (−1, 1), são transcendentais. Por outro lado, até hoje não se sabe se a
 n 
constante de Euler-Mascheroni, dada por γ = lim ∑ 1k − ln n ≃ 0,57721 56649 . . ., é um número algébrico
n→∞ k=1
ou transcendental; na verdade, não se sabe sequer se γ é um número racional ou não!

18
Retrospect and Prospects (New York: Praeger, 1968), em particular na Seção 1.3, e Peter Mark-
stein, IA-64 and Elementary Functions: Speed and Precision (Upper Saddle River: Prentice-Hall,
2000), em particular na Seção 6.3. O livro de Kac e Ulam, dois gigantes da matemática pura
e aplicada do século XX, oferece um interessantı́ssimo passeio pelos mais diversos assuntos
matemáticos, do princı́pio do pombal ao teorema de Gödel, através de exemplos em lógica, teo-
ria das probabilidades elementar, álgebra linear, cálculo numérico, teoria dos jogos e teoria da
informação. O segundo texto, de uma série de manuais profissionais da Hewlett-Packard, de-
talha a implementação em nı́vel de processador (no caso, o IA-64 da Intel, também conhecido
como Itanium) de algoritmos matemáticos básicos como os de divisão e de extração de raı́zes
quadradas em ponto flutuante. Um dos avanços mais interessantes obtidos recentemente nessa
área foi a descoberta do fast inverse square root, um algoritmo capaz de calcular uma excelente

aproximação para 1/ x de um número em ponto flutuante até quatro vezes mais rapidamente
que uma simples divisão! Esse método veio a público pela primeira vez no código-fonte do
jogo Quake III Arena, de 1999, como parte de algoritmos de iluminação e traçado de raios.
O aluno interessado deve consultar o artigo da Wikipedia ⟨https://en.wikipedia.org/wiki/
Fast inverse square root⟩ (acessado em 5 jun. 2023). Nesse artigo pode-se perceber claramente
como o conhecimento de geometria analı́tica elementar (o cálculo da norma de um vetor),
cálculo diferencial (o método de Newton para extrair raizes quadradas), matemática discreta
(representação de números) e um pouco de hacking são aspectos igualmente importantes nas
aplicações da matemática à programação.

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