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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

ÍNDICE

Origem existencial..........................................................................fls.7-8

Fundamento....................................................................................fls.9-10

Vínculo existencial.........................................................................fls.11

Orixás ............................................................................................fls.12-25

Classes de Orixás...........................................................................fls.26-37

Adjuntós.........................................................................................fls.37-39

Feituras ..........................................................................................fls.39-40

Religião..........................................................................................fls.40-41

Ylê..................................................................................................fls.41-42

Axé financeiro................................................................................fls.42

Hierarquia.......................................................................................fls.43-44

“Evolução e evolução”...................................................................fls.45-46

Tempo............................................................................................fls.47-48

Mitos..............................................................................................fls.49-52

Lendas............................................................................................fls.53-64

Materiais de uso religioso..............................................................fls.65-66

Limpezas espirituais.......................................................................fls.66-67

Calçamentos...................................................................................fls.67-68

Ecós................................................................................................fls.68-72

Opetés.............................................................................................fls.73-74

Colheita..........................................................................................fls.74-75

Ferramentas....................................................................................fls.75-76

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Ebó.................................................................................................fls.76-80

Erú..................................................................................................fls.80-81

Sacralização de animais.................................................................fls.81-83

Ervas...............................................................................................fls.83-84

Axorô.............................................................................................fls.85-88

Quaresma.......................................................................................fls.89-91

Axé de penas..................................................................................fls.91-92

Inhelas............................................................................................fls.92-93

Levantação.....................................................................................fls.93-94

Plantio............................................................................................fls.94-95

A magia do som.............................................................................fls.95-96

Roda de xirê...................................................................................fls.97-98

Balança..........................................................................................fls.99-100

Mesa de Ybedjis............................................................................fls.100-103

Saída de ecó..................................................................................fls.104-105

Ocupação......................................................................................fls.105-107

A chegada do Orixá......................................................................fls.107-108

Orixá Axere..................................................................................fls.108-109

Orixá Inxê.....................................................................................fls.110

Aforiba..........................................................................................fls.111-114

Alá.................................................................................................fls.114-115

Obé................................................................................................fls.115-118

Axé de búzios................................................................................fls.118-122

Entrega de axés.............................................................................fls.122-124

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Axé de fala....................................................................................fls.124-125

Mel e dendê...................................................................................fls.126-127

Moedas e búzios............................................................................fls.127-129

Acaçá.............................................................................................fls.129-130

Banha de Orí.................................................................................fls.130-131

Sabão da costa...............................................................................fls.131-132

Flores e frutas................................................................................fls.132

Quartinhas.....................................................................................fls.133

Assajéun........................................................................................fls.134

Orunmalé.......................................................................................fls.135-136

Ocutás, acutás e otás.....................................................................fls.136-140

Assentamentos..............................................................................fls.141

Orí.................................................................................................fls.141-144

Borí...............................................................................................fls.144-148

Cores.............................................................................................fls.148-149

Passeio..........................................................................................fls.149-150

Sunas.............................................................................................fls.150-155

Bolo...............................................................................................fls.155-159

Egun, egungum e babá egun.........................................................fls.160-162

Arroz com galinha.........................................................................fls.163-164

Axé dudu.......................................................................................fls.164-167

Considerações finais......................................................................fls.168

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EFAN - DEÍ
ÁFRICA DO BRASIL

Agô (licença), entre outras, as motivações para divulgar aqui estudos


sobre alguns fundamentos religiosos de uma Nação popularmente
conhecida como Batuque, são expor a visão compreensiva de um
Babalorixá em relação aos preconceitos gerais com bases sobre
julgamentos infundados em relação ao que na realidade é desconhecido
e/ou ignorado, tais como: assuntos sobre a religião de matriz africana
conhecida por Nação; pois se mal falarem dos feitos desta religião, ao
menos terão maiores esclarecimentos sobre o que dizem...

No mais ninguém é eterno, e que nossas experiências não sejam em


vão, tendo como proveito pontos e/ou contrapontos, mas que ao mínimo
sirvam de auxílio para as concretizações ideológicas do povo afro
brasileiro. Firmando ou ao menos demarcando os direitos na defesa dos
conhecimentos gerais como também individuais. Basta saber que somos
únicos com aspectos particulares em nós mesmos, para concluir que não há
verdade maior e mais pura que as forças regentes do universo. Sem
pretenciosidades em transmitir conhecimentos com base de serem únicos
em formas de seguimentos aos mesmos, desfazendo assim qualquer má
interpretação por parte do leitor como sendo as informações citadas neste
livro únicas formas de compreender e proceder dentro dos cultos de matriz
africana; mais precisamente são fundamentos aderidos e adotados de
acordo a cada casa de culto, pois a intenção não é defender ou criticar e sim
dissertar de um aspecto geral sobre a nossa religião, única, porém de
imensa pluralidade, sem causar divergências ou contestações, sejam elas de
formas diretas ou indiretas.

Antigamente e quanto mais distantes os tempos, mais notados eram


resultados diante dos cultos aos Orixás, os principais diferenciais da
atualidade é que em geral a fé era indiscutivelmente inabalável, e as formas
originais de "fazer" tinham magias por sí só, o que fica cada vez mais
distante das realidades atuais devido as adequações por maiores confortos e
praticidades.

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"... E ASSIM TROCAMOS AS ANTIGAS RECEITAS ONDE AS


MASSAS DE ACARAJÉ ERAM MOÍDAS EM PEDRAS DE
GENÉTICAS MILENARES QUE BATIDAS LIBERAVAM AXÉS DE
FOGO AO FAÍSCAREM, POR PRÁTICAS E MODERNAS RECEITAS
DE FAZÊ-LA BATIDA EM LIQUIDIFICADOR COM CERTIFICADOS
DE GARANTIAS ATÉ O PRÓXIMO ANO..."

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ORIGEM EXISTENCIAL

Quando tudo era apenas um, o universo era caos...

Olorum sem divisões não tinha formas, existia apenas o buraco negro.

Raízes hoje reverenciadas dentro do buraco (balé) em nossos cultos aos


rituais de balé por serem nossas origens, o próprio Egum.

Olorum é o nome de Deus utilizado pelo povo africanista, de forma


onipresente também está no homem; onisciente, não haveria faltas em saber
das falhas humanas; Deus só é imperfeito na consciência humana, justo
por ter criado o homem e junto dele ter formado as leis cármicas, caso não
houvessem homens não haveriam julgamentos sobre o criador, mas
onisciente, se assim não fizesse seria por sua vez uma fonte egoísta.... e
egoísmo é uma imperfeição. Onipotente, dividiu-se e multiplicou-se,
assumindo suas apresentações em Orixás que criam os homens,
multiplicando assim as formas de vida, não centralizando um único ponto
como responsável pela evolução da vida e suas diretrizes. Criou a sí
mesmo, e consigo todas as coisas.

Diante aos fundamentos afro-brasileiros assume Olorum aspecto de Deus


único e supremo, aderindo assim caráter monoteísta.

Do princípio até o infinito, Olorum delega as áreas da existência. Cada área


com seus propósitos.

Entre as infinitas e expansivas formas, como conexões, acessos, ruas,


cruzeiros, encruzilhadas e todos os caminhos, assumem aspectos
reverenciados em Bará;

Nos termos de base as matérias, tais como os minerais, metais e estruturas


de sustentações como a exemplo os ossos, é reconhecido como Ogum;

Nas apresentações imateriais como os espíritos, raios, ventos, sentimentos e


outras são chamados de Yansã/Oyá;

Em virtudes de equilíbrio como leis e verbos, fogo, trovão e som faz-se


Xangô;

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Meio a vida animal, as buscas e os aspectos de captações ele é Odé e


também é Otin;

Como reação, rumo, seguimento, progresso e audição é Obá;

Quando compreendido nas formas vegetais, flora, medicina e cura vêm


como Ossayn;

De formas a regenerar, limpar, afastar as adversidades, consumir... Abawo;


oculta-se

Completo e complementar, em fases iniciais e inocentes revelam-se como


formas Ybedjis;

De fontes a gerar, hidratar, conscientizar, em forma de beleza e saber é


representado nas águas doces por Oxum;

De caráteres maternos, originais, mentais, abrangendo e predominando é


seu axé materializado como os oceanos nas regências de Yemanjá;

De luz, pacificador, contínuo, universal, padrão, criador, pai e


misericordioso mostrasse o céu como Oxalá. Onde houver formas de
manifestações haverá Orixás, assim como onde houver Orixás haverá
partes de Deus.

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FUNDAMENTO

Ao dissertar sobre os fundamentos da religião fica nitidamente em


destaque que por mais simples que se resumam seus significados, suas
explicações de uma forma geral tramitam entre as linhas do compreensível
e do incógnito, visto que assim é a própria existência a doação de Olorum.

Porém ao longo dos anos, aqueles indivíduos que adquirem a confiança


dos mais experientes acabam somados a essa conquista as transmissões que
incentivam e orientam sobre os propósitos do fazer e seus significados,
conquistando assim os conhecimentos necessários para praticá-los e
futuramente repassar aos que buscam por suas orientações; ressalvo que
fundamentos são firmados como a razão de fazer, tendo maior importância
saber para então fazer que fazer para depois saber, já que a manipulação
ritual que geralmente emprega o desempenho alheio, sejam com despesas
de ordem financeira e/ou os demais importâncias como disponibilidades de
tempo e a fé dos envolvidos A religião e seus frutos devem servir como
resolução ou ao menos como apoio para as pessoas diante de um dilema,
jamais para agravar cituações, e para que isto aconteça é necessário que os
envolvidos em proceder com os trabalhos de religião tenham os
conhecimentos necessários para com os procedimentos a serem executados.

A força dos fundamentos está no aprendizado e no ensino que se


perpetuam dos antepassados a seus descendentes como os axés que de pais
e mães de santo são transmitidos aos seus filhos de santo, possibilitando
que os filhos sejam bons pais. As tradições de uma nação devem ser
preservadas a passos que não regridam a evolução de seu povo, assim não
deve uma aprendizagem pesar como obstáculos ao progresso do ser. Sendo
assim aprendido o fundamento são descartadas as dúvidas e os fatores
intuitivos já que os mesmos são opostos às propostas dos fundamentos e
seus saberes. Ser batuqueiro é cultuar os Orixás como a fonte da existência
e seu sustento, como também aceitar e compreender e praticar uma
filosofia que prega tanto os mais antigos quanto os mais novos iniciados
são eternos aprendizes; acredita-se que quanto maiores os graus de
sabedoria, mais presente se faz a consciência em que o aprendizado é uma
fonte inesgotável...

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Fundamentos não são e nem foram criados ou inventados, gerados


junto a criação do universo e traduzidos aos cultos africanas que através de
estudos naturais e aprendizado cotidiano o desmembraram e cultuaram
como Orixás.

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O VÍNCULO EXISTENCIAL

Tudo é interligado...

Olorum se fez em Orixás, assim permitindo originarem o plano físico e do


espírito se fez a matéria.

Ao integrarmos a sociedade conhecida como batuqueira (nação dos Orixás)


buscamos conhecimentos e aprendizados juntos a um Babalorixá, por ser
este um sacerdote por formação do culto aos Orixás. Cabendo ao
Babalorixá honrar, cumprir com os compromissos e votos de confiança
nele depositados; atenção dedicação e boa vontade ao administrar as
formas de ensino aos iniciados, onde os pré-requisitos mínimos são
conhecimentos e noções gerais de todas as práticas estabelecidas sobre
aspecto religioso, sejam gastronômicos, psicológicos, ideológicos,
litúrgicos e etc... Para seguir rumo a nossa formação dentro da religião
temos de ter consciência que é um aprendizado inesgotável e de infinitas
margens, nunca saberemos tudo e nosso cotidiano de amplas formas serão
em ensinar e ao mesmo tempo aprender. Ser batuqueiro é intimamente
assumir compromissos de aprendizados mútuos. São as incalculáveis
importâncias, virtudes, essências, habilidades, composições, significados,
utilidades, influências, atuações etc... Sobre as origens, ações e a respeito
de todos os elementos integrantes de nossos rituais; sejam alimentos, cores,
números, instrumentos, dias semanais, fases da lua, horários, locais e todo
contexto de maneira universal. Sempre existindo muita complexidade em
um único elemento, por menor e mais simples que aparente ser está ligado
de forma paralela à origem de tudo.

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ORIXÁS
O universo divinizado nas manifestações da natureza

Orixás são os vários e complexos aspectos de Olorum "divididos" por


características e formas de atuações espirituais, energéticas e físicas.

Respectivos a todos os elementos, sejam fogo, água, terra, ar ou em seus


derivados desdobramentos como árvores, pássaros, rios, gases e etc...

Formam setores regentes, responsáveis e interagentes por toda


existencialidade. Conscientes, porém neutros, agindo com bases formadas
sobre as leis de ação e reação, atuam juntamente ao livre arbítrio humano,
cabendo somente ao homem às escolhas que mais julgar convenientes.
Incorruptíveis são os elementos puros, tais como fogo, água, terra e ár.

Condenável é o ser imprudente... Que com o fogo que aquece, queima; com
o ar que respira, asfixia; com a água que hidrata, afoga e com a terra que
alimenta, polui.

Podemos encontrar os Orixás em tudo aquilo que existe aos nossos sentidos
como visão, audição, tato, olfato, paladar, intuição, sonhos e etc... É muito
além de tudo aquilo que podemos compreender;

Orixá é essência que permite que algo exista, tendo eles todas as formas
possíveis de ação espiritual, física e da forma que for; são estes encontrados
em todos os tipos de matéria, sejam matérias primas ou objetos, assim
sendo, para que algo exista em plenitude é preciso à junção de todos os
Orixás...

Em um exemplo bem simples posso dizer que em uma cozinha de religião


podemos encontrar panelas de barro, vidro ou metais;

Colheres de plástico, metálicas ou de madeira (colher-de-pau); e aí também


encontramos a diferença entre os Orixás, sabido que os materiais plásticos
derivam de petróleo que é um mineral oriundo da decomposição de fósseis
(sendo Xapanã um dos nomes dado por nós africanistas para o princípio de
toda decomposição, assim uma nomenclatura para se referir a uma forma
superior a existência humana); os materiais minerais e em especial os
metálicos pertencem a Ogum, os materiais de pedra pertencentes a Xangô,
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os materiais de madeira compostos pelas árvores que representam e são


representadas com nome Ossayn; como todos os outros elementos
precisam indispensavelmente dos elementos-Orixás primários que são
purificador ou Fogo ou Bará, Yansã/Oyá, Xangô e Oxalá...; procriador ou
água ou Bará, Odé, Otin, Oxum, Yemanjá e Oxalá...; existencial ou terra,
ou Bará, Ogum, Yansã/Oyá, Odé, Otin, Obá, Ossayn, Xapanã e Oxalá...;
Onipresente ou ar, ou Bará, Yansã/Oyá e Oxalá...; sabendo-se que todo e
qualquer Orixá-elemento original dividindo-se e completa-se com os
demais, formando assim adjuntos para um mesmo objetivo. Capaz de direta
ou indiretamente alterar os outros elementos, da mesma forma que água
pode alterar as propriedades da terra, que pode alterar o ar, que pode alterar
o fogo, que por sua vez pode alterar as propriedades da água e vice versa
continuamente.

Sendo assim, concluo que o elemento supremo e ao mesmo tempo


elemento "submisso" chamado Orixá, apesar de ser consciente por si só,
Santo e Puro, não é prejudicial de forma alguma, mas sim reagente a
energia que nele foi conscientemente e intencionalmente depositada por
nós, em outras palavras, é como dizer que os elementos fogo, água, terra, ar
e seus desdobramentos naturais bem utilizados só têm a nos favorecer, mas
empregados de maneiras errôneas acabam por certo apenar quem
inconsequentemente buscou lidar danosamente com estes elementos.
Temos de usar o bom senso ao administrar uma pedra para construir uma
fortaleza ou destruir uma. Seja grande como uma pedra ou pequeno como
pitadas de sal... Sejam bem administradas as manipulações, pois tênues são
os eixos entre equilíbrio e desequilíbrio.

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BARÁ
"Sem Bará não se faz nada."

Quando falamos em Orixá estamos nos referindo a vários aspectos do


nosso cotidiano material, espiritual e de toda forma existencial, em especial
quando se fala no Orixá Bará estamos sem dúvidas nos referindo princípio,
ativo, masculino, suas somas e desdobramentos;

Bará não é apenas espírito múltiplo-dividido, mas sim uma


complexidade de elementos e comportamentos, como a 2ª feira que permite
e iniciam os dias de movimento comercial, como as ruas, os cruzeiros, o
dinamismo, o modo como nós e a natureza interagimos, o princípio e o
inicio de tudo; a parte fundamental que permite que todas as outras
existam, e a partir dela se iniciam as estruturas de sustentação pertencentes
a Ogum e por consequência todas as demais etapas; Bará lá e aqui está
presente como um elo, desde o primeiro momento onde mesmo que
mentalmente se tenha tido a ideia de fazer algo, Bará é a iniciativa para que
algo exista, assim também digamos que nas partes emocionais Bará é o
motivo pelo qual todos os sentimentos são gerados, podemos afirmar que
esse Orixá também é responsável pela iniciativa e pré-existência, onde
existir qualquer coisa é certo que nela está Bará!

Dentro dos fundamentos africanos alguns dos símbolos que representam


Bará são:

Foice e gadanho, instrumento de corte o qual abre os caminhos quando em


mata, mesmo instrumento utilizado para renovar os caminhos, renovando
oque antes ali estava e permitindo um novo plantio e colheita.

Chave, cadeado e corrente, permitem ou não a passagem, guardam e


protegem algo.

Tridente, cabo com ponta na extremidade, seguido por mais duas pontas a
direita e esquerda nos remetem a lembrar de que sem Bará no existe
passado nem futuro, para que algo exista é preciso que de alguma forma
tenha base e eis aí o cabo/eixo do tridente representando a onipresença de

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Bará no presente e em tudo que existe; talvez seja essa uma das
ferramentas mais significativas do culto a esse Orixá, pois tendo um ponto
central e mais duas extremidades, representa também a parte neutra entre
positivo e negativo, firmando apenas o poder de execução.

Esferas de aço representam o princípio ativo, a existência sem depender de


outros elementos, como o chão, a terra, a base que pode existir sem
depender de outros, porem outros elementos não se sustentam sem a base.

Sineta, um instrumento que nos desperta para alguma nova ação, adverte.

Aguidar de barro, vasilhame feito do próprio chão.

Moedas, estas mesmas que são conduzidas a todos os lugares por onde
entram um ser humano, o ser existindo ou não a moeda continua a
"caminhar" com outros.

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OGUM
"Toda ação gera uma reação."

É a estrutura de tudo, responsável pelas partes físicas em geral, a partir


dele que se permite que as coisas tenham complexa utilidade e autodefesa,
Ogum aquilo que demarca os limites para que possamos aproveitar as
coisas de melhor maneira.

Esse Orixá é energia que nos fornece ânimo, forças e entre tantas
outras a objetividade para persistirmos em busca de nossas conquistas; e
também prenúncio de todos os limites ou sejam advertências independentes
de verbal, material, espiritual ou da ordem que sejam, comparando com o
nosso cotidiano podemos usar como exemplo o consumo de alimentos e
bebidas, naquele momento em que sentimos que devemos consumir ou
parar de consumir para mantermos o equilíbrio fisiológico sem chegarmos
a um mal-estar. Nos vale também relembrar que este o Orixá-ferramenta ou
de outra maneira falando, o Orixá regente das ferramentas, defesas e mão-
de-obra, são as "armas, armaduras" e táticas usadas em "lutas e batalhas"
do dia a dia, a energia que permite a existência a partir da execução e
concretiza as coisas que antes eram apenas projetos. Sendo assim me resta
dizer que ogum é a defesa em absoluta ação, seja a defesa física ou a defesa
de um ideal.

Cito aqui algumas das principais ferramentas e armas representativas de


Ogum:

Espada representa a ação e a defesa.

Escudo, sua permanência nos remete a proteção e bloqueio dos adversários.

Lança, armamento que permite interagir em batalhas com menor exposição


a maiores distâncias do perigo.

Bigorna, amparo que permite desenvolvimento do material a ser maleado.

Marreta e martelo, utilizados fixam e auxiliam a forjar os consecutivos.

Enxada, remove os detritos menos úteis permitindo um novo plantio e


safra.

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Ferradura serve de proteção aos cascos e também nos faz relembrar da


profissão dos ferreiros a qual é regida por Ogum.

YANSÃ/OYÁ
"O ar que alimenta o fogo é o mesmo que corroe o metal."

Yansã/Oyá é vínculo, o lado feminino, é o ato com que as coisas sem


forma e/ou despercebidas tenham existência, é magia, transformação, é
como o ar e o vento, que transitam entre tudo e um Orixá entre os outros;

Para sentirmos o ar é preciso que exista alguma forma se apresente


como vento, naturalmente ou conscientemente por nós, onde na verdade
não sentiremos o ar e sim o seu deslocamento... O vento. Ela é a ligação
entre os elementos, podemos indicá-la como química e em constante
metamorfose, é como uma mistura indecifrável e elemento indispensável
para a inicialização e conclusão de algo, aspectos que demarcam suas fortes
passagens com Bará; é aquilo que independente de vontades precisa existir.
Para que exista fogo, água e terra é preciso que haja ar, onde não houver o
elemento ar não haverá nenhuma vida! Ela é oque permite a interligação
entre as coisas, assim como a panela que ampara a água que é levada ao
fogo e permite que esta água seja aquecida; dentro de todo o panteão
africano cultuado dentro dos cultos de nação Yansão/Oyá é o único dos
Orixás que por ordem fica entre seus dois maridos, Ogum antecede
Yansã/Oyá que é sucedida por Xangô; Yansã/Oyá é início do amor, ela é a
paixão, é a força que permite a união ou separação das coisas, como corpo
e espírito.

Yansã/Oyá e suas ferramentas:

Aliança: Representa a união e compromisso.

Espada: A luta em busca da conquista.

Cálice: Símbolo de vitória e conquista.

Panela: Utensílio para a preparação de alimentos, a química de elementos.

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XANGÔ
“A justiça tarda, mas não falha”.

As palavras que melhor definem Xangô são justiça e equilíbrio, este


Orixá em especial rege o fogo e as leis, tanto as leis espirituais quanto
físicas.

Talvez esse seja o Orixá mais difícil de tentar descrever, já que ele
próprio é a maneira de expressão, a fala, músicas, os sons, as letras,
palavras, escritas, literaturas, cálculos, medidas, toda forma de expressão
existente; e dele dependemos para conquistar o aprendizado, pois é entre
erros e acertos que aprendemos a diferença entre o certo e o errado ; Xangô
é a justiça que nunca se permite abalar, é justo e "duro" como a pedra, não
se modifica nem abala em função dos outros elementos, mas sim utiliza de
sua imponência para o auxílio da execução dos outros elementos, por certo
é um dos elementos primogênitos da criação já que entre suas principais
essências está a firmeza; é como as medidas que se usam para construir
uma morada, cálculos que permitem ou não o equilíbrio para que esta se
mantenha erguida. A única forma de abrandar a justiça de Xangô sobre um
culpado é o arrependimento por parte do julgado e a misericórdia por parte
do juiz; Tendo assim a justiça como promotor e escrivão, a Mãe natureza
como advogada e a Misericórdia como desembargador.

A energia de Xangô em seus símbolos fundamentais:

Caneta, a serventia de registrar os fatos.

Livro representa as leis, elemento o qual guarda nossas atitudes.

Balança, elemento de medida para os "pesos" de prós e contras de ações.

Machado com lâminas e suas duas extremidades, representa a justiça para


todos os lados.

Gamela de madeira, a mesma madeira que alimenta o fogo.

Pilão o representante do atrito entre dois pedaços de madeira (pilão e mão


de pilão) como pré historicamente surgiam às primeiras fagulhas para
iniciar o fogo.

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ODÉ-OTIN/ODÉ E OTIN
“A união faz a força.”

Esse (s) é (são) um elemento(s) par(es) entre si, se completa(m) e ao


mesmo tempo se encontra(m) e forma(m) um mesmo ponto, é o sentimento
de encontro consigo mesmo; o ser em busca de alimento que ao encontrá-lo
sacia sua fome e se sente saciado, é o caçador em busca incansável pela
presa e ao mesmo tempo é a caça incansável de fugir do predador, são as
mudanças em que acabamos por adequar nossas "armas" e até nós
mesmo...são nossas intimidades divididas com mais ninguém, é nos
habituarmos para a sobrevivência mesmo que em solidão, como nas matas
caçar e em água pescar, embora as oportunidades sejam diferentes a
necessidade é a mesma;

A relação de Odé-Otin ou Odé e Otin com suas armas:

Arco e flecha, como Odé e Otin exercem funções sobre e com o outro,
indica o valor do companheirismo.

Bodoque, utensílio para atingir coisas distantes e para chegar ao alvo busca
o auxilio de um material a ser disparado.

Bolitas, da mesma maneira que servem como objeto recreativo também


serve como munição de bodoque.

Lança, instrumento de caça e pesca, tem utilidade tanto em terra quanto em


água.

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OBÁ
“O pior surdo é o que não quer ouvir”

Para entendermos melhor sobre este Orixá basta pensar em elementos


que nos favorecem da mesma forma seria estar em uma rua e cortar
caminhos tomando atalhos para chegar de maneira mais rápida ao destino
desejado; é mais fácil encontrar ruas e estradas longas do que encontrar
bons atalhos que facilitem nossa caminhada, e é também por esse motivo
que esse Orixá é tão pouco compreendido, pois é uma energia muito rara e
nenhum pouco fácil de entender e lidar. Elemento de percepção e captação,
dizer que para Obá é indispensável os sentimentos de Xangô é o mesmo
que diz que as orelhas não se desfazem do som; Obá ama Xangô da mesma
forma que os ouvidos amam os ritmos, os olhos podem ser indiferentes ao
som, já os ouvidos o farão de rei. É a força de uma paixão revolta em não
tolerar nem só em pensamento que o silêncio se faça presente! É a energia
que ocorre no encontro das forças opostas, como quando as águas salgadas
se encontram com os doces, efeito natural conhecido como pororoca.

Obá e a simbologia nas ferramentas:

Navalhas, aquilo que corta o indesejável.

Rolimã, a engrenagem de auxilio ao movimento e desenvoltura das outras


peças.

Roda, a possibilidade e facilidade para chegar ao destino desejado.

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OSSAYN
“Mente sã, corpo são”.

Ossayn é fonte revigorante aos demais elementos, é uma peça


indispensável para a evolução, preservação, revitalização e tantas outras
formas existenciais para as realizações; como as folhas que durante a noite
aspiram o gás carbônico para nutrir a árvore e de dia expiram oxigênio para
"alimentar" os animais; As folhas fabricam o ar, o mesmo ar que possibilita
a vida na água , as raízes evitam erosão da terra, a madeira que alimenta o
fogo... Assim estaria interligado e interligando todos os elementos,
somando virtudes a cada um deles. É o sentimento de abrir mão de seus
próprios interesses para auxiliar os que necessitam de algo, da mesma
forma que a natureza fornece os provenientes para a existência dos seres
vivos. Em algumas interpretações mitológicas ossayn é representado como
um homem de apenas uma perna, porém com maior desenvoltura para
caminhar e dançar que os demais, justamente por não ter uma parte e ser
representante da superação, assim como ás árvores que apesar de terem
apenas um tronco, possuem muitos galhos e folhas diferentes uma das
outras servindo suas propriedades para a cura das doenças e também
renovando suas folhas. O papel e a folha de papel com muitas utilidades,
entre elas base para escrever ou símbolo de valor monetário como o
dinheiro.

Ossayn e as ferramentas:

Muleta, auxilio ao indivíduo, suprindo as deficiências do físico e


permitindo maior liberdade.

Árvores, em especial o coqueiro, pois mesmo em terrenos áridos com


dificuldades para encontrar água ou se quer umidade o coqueiro pode
provir a água dentro do coco.

Bisturi, agulha, tesoura e todo tipo de ferramentas cirúrgicas com o óbvio


significado de cura das doenças.

Casco de cágados e tartarugas, pois embora sejam uns dos animais com
maior lentidão para se locomover se adaptam tanto a água quanto em terra,
além de serem animais com grandiosa longevidade.
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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

XAPANÃ
“Olho por olho e dente por dente”.

Da mesma forma que um ser humano tem por virtudes se manifestarem


através de palavras, gestos, sons e expressões, a natureza também tem esse
dom; é como a pele que reveste o corpo; antes do corpo ser prejudicado por
excessos de calor ou de frio é a pele que sofre as primeiras agreções;
embora queimada e bem tratada tenha as condições de se regenerar,
Xapanã são as chagas e feridas, como o corpo se manifestando perante
tratos inadequados, expondo-se e pedindo cuidados; Fisicamente falando
podemos usar simples exemplos do nosso cotidiano, como a escova que
limpa os dentes, como a escova de aço que e a lixa que dão polimento aos
metais enferrujados e oxidados dado a eles renovação, como a vassoura que
varre o chão lhe dando novas condições para outra vez serem admirados e
terem uma melhor reutilização. É o poder gerado pela decomposição, esta
que por sua vez consome os materiais dando espaço a novos elementos. Em
uma casa podemos dizer que a energia de Xapanã está ligada indiretamente
a todos os materiais e diretamente a todas as sobras de materiais que podem
servir de auxílio caso algum dos materiais já empregados sofram danos e
tenham de serem trocados, ou até mesmo para a inicialização ou
recomposição material de uma nova casa.

Xapanã e alguns de seus instrumentos:

Vassoura, Instrumento para afastar coisas indesejadas ao ambiente.

Gadanho, Instrumento de ceifa, que tem como utilidade cortar os vegetais


já sem utilidades dando espaço a um novo plantio.

Cruz, Símbolo de sacrifício, divisão e ao mesmo tempo junção e libertação


entre o físico e o espiritual.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

IBEDJIS
“Dois pensam melhor que um”.

Dois e os múltiplos, Ibedjis são todos aqueles elementos que se fazem


indispensáveis à fusão, aderências e conjuntos de outros para terem assim
suas utilidades; pontos em comum em polos opostos, carregando em si
elementos plurais, geram adaptações no equilíbrio como suplementos de
auxílio. São as novidades de todas as formas, é a ultima etapa ou que seja a
etapa mais recente a serviço da preservação para que todas as outras se
mantenham em boa forma.

Ferramentas dos Ibedjis:

Brinquedos, mamadeiras, bicos e todas as formas de diversão e utilidades


para crianças recém-nascidas, são os elementos que nos remetem a
inocência e a geração da vida; o primeiro dos estágios com a capacidade de
influenciar todos os seguintes passos de nossas vidas.

OXUM
“...Beleza da força/Força da beleza...”

Oxum é a força que gera, é o elemento responsável por formar...


Formas e formatos, é tudo aquilo que nos permite admirar algo, é a beleza e
seus matizes; o reflexo das águas, o brilho dos materiais, o reflexo da luz, o
contraste das nuances e tudo aquilo que permite-nos perceber as
diversidades entre as coisas. São os reflexos e lembranças de cada passo
por nós já dados, é o passo desencadeador para modificarmos nossos
passos anteriores dados em falso nos permitindo de melhores
aproveitamentos futuros. A primeira etapa para a existência física dos seres
vivos é a geração, fundamental é a água para o desenvolvimento dos
organismos vegetais e animais. Esse elemento responsável pelas diferentes
formas de apresentações e também responsável pela multiplicação pode-se
chamar de Oxum. Respectivamente de mesma forma são em geral os dias

23
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

de sábados, dias de festas, de enfeites, dias de um pré-descanso e projeções


para novamente refazer de melhor forma os dias da consecutiva semana
que inicia no amanhã.

Algumas das principais ferramentas de Oxum:

Espelho, objeto utilizado para a visão através do reflexo, com a capacidade


de nos mostrar as coisas atrás de nós mesmo que talvez sem seu auxílio
despercebidas, admiração, também permite que tenhamos visão de nós
mesmos, é símbolo ícone de vaidade e beleza.

Pente, utensílio de embelezamento, possibilitando novas formas aos


cabelos.

Perfumes, joias de ouro e douradas, símbolos de altivez, sedução e beleza.

Vasilhas de louça ou vidro nos vários tons de amarelo, material que tem
sua origem na areia e com suas cores relembrando o ouro.

YEMANJÁ
"Sozinho é grão, sustentando oceanos junto a seus irmãos."

Esse Orixá é tido como Mãe de todos os outros, justamente por


também ser símbolo de universalidade e igualdade importância entre todos,
de todos os elementos encontrados em nosso planeta podemos dizer que o
mais amplo em proximidade de comparação ao infinito, é por esse motivo
que quando queremos nos dirigir ao céu, infinito universo não palpável
recorremos ao infinito oceano para que interceda por nós junto a todos os
elementos, relembrando que os oceanos compõe a maior parte de nosso
planeta, formando o maior cemitério da terra, e uma das maiores fontes de
vida, diversidades, e riquezas planetárias. É também o poder dos
pensamentos, dos sonhos e de todas as formas mentais, consciência e
inconsciência; É o comum entre os elementos, a sabedoria que usa da
simplicidade nos direcionando rumo a humildade e seus desdobramentos
como a fraternidade e tantos outros geradores da união e integração.
Reconhecimento, perdão, reconciliação, paciência, humildade, sabedoria,

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

gratidão e compreensão são algumas das palavras melhor definem a


influência desse Orixá em nossas vidas.

Algumas das ferramentas representativas deste Orixá:

Leme e timão são instrumentos que nos permitem direcionar uma


embarcação.

Âncora, instrumento que permite a estabilidade para atracar a navegação,


oferecendo repouso à mesma.

Remos, força e impulso para navegar, também é um instrumento direcional.

Peixes, símbolo de vida, fartura, riqueza e progresso.

Joias de prata e prateados representam o valor da simplicidade.

OXALÁ
"Assim no Ayê como no Orun”.

Dentro do panteão africano este é o Orixá que mais se assemelha a


Olorum; Oxalá é paz, vida, criação, benção, início, meio, fim, clareza, luz e
acima de tudo é misericórdia; entre cruzeiros, minerais, ventos, pedras,
matas, atalhos, florestas, cemitérios, rios, mares e qualquer elemento
somente o céu é capaz de comportar a todos, e essa é a razão para fazer de
Oxalá o Orixá tido como o Pai e o Criador; Olorum fez Oxalá e Oxalá fez
os próximos; por serem Olorum o mais velho e Oxalá o consecutivo
ancião, assim nos faz crer que Olorum é o segredo para que o verbo se
fizesse existir, quanto a Oxalá é o segredo para se manter e permanecer na
existência. É essência de sabedoria, dizendo assim que o mais velho já
passou pelo caminho onde os mais novos ainda vão passar, foi ele quem fez
o caminho para Bará, os metáis para Ogum, os ventos para Yansã/Oyá, as
pedras para Xangô, as matas para Ode-Otim, a captação para Obá, as
árvores para Ossayn, a decomposição para Xapanã, os detalhes para
Ibedjis, as águas doces para Oxum, os oceanos para Yemanjá, com seu
hálito sagrado permitiu o inicio da vida.

Fogo, água, terra e ar, são todos estes elementos indispensáveis para a
sobrevivência.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

CLASSES E ORIXÁS

Partindo do princípio original os Orixás eram na África um único


ponto de referências sem classes, Bará era feito apenas Bará sem um nome
de classe, porém um mesmo assentamento era compreendido com as
funções de Ajelú, Adague, Lanã, Lodê, Légba... Ogun se iniciava por
Orixá, terminava por Ogun, do início ao fim do seu nome concluído e
completo por ser chamado como Orixá Ogun sem acréscimos tornava-se
abrangente aos elementos e atividades dele próprio; Oxum não era
classificada como jovem ou velha, como podendo exercer uma atividade e
se limitar a outras, respondia por todos os aspectos sociais de uma
determinada região, "era a dona do bairro"... Digamos que não era dividida
como Pandá, Demun, nem Olobá ou Docô... Mas tinha sim seus aspectos
unidos apenas em Oxum.

Mediante a ideologia das crenças africanistas, os Orixás eram


associados como regentes familiares, locais, assim cada tribo, cidade,
região e reino tinham seu Orixá principal de acordo a suas necessidades e
origens, podendo ser regente único ou plural agregando outros Orixás
"coadjuvantes"...

Assim cada região tinha seus costumes, tradições, fundamentos,


modos e disponibilidades compatíveis a cada local tais como seus típicos
Orixás e específicos rituais; os povos que tinham milho amarelo ofereciam
milho amarelo, já os que tinham o milho branco ofertaram o milho branco,
quem disponibilizava de um ofertava um tipo, quem dispunha de dois
ofertavam dois tipos, já os que não tinham milho e disponibilizavam de
feijão ofertaram feijão. As graças de cada localidade eram associadas as
bênçãos de seu Orixá padroeiro, oque deixava óbvio em que as terras de
Oxum as crenças seriam em que seu axé seria mais abundante nos
elementos ligados a este Orixá, assim da grande colheita que se destacava
nas cidades de Oxum estavam os milharais, fazendo dela a Senhora que
fornece o milho, e como os milharais vingariam em suas terras se

Fato é que se dá somente o que se tem quem junto a canjica tem tomate
pode dar canjica e tomate, quem junto a canjica tem salsa e não o tomate
poderá dar salsa e canjica.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

As comunidades com maiores disponibilidades de água ofertavam com


maiores abundâncias e frequências o milho cozido como axoxô ou canjica,
já as tribos com escassez de água faziam o abadô de milhos torrados e as
deburús(pipocas); as regiões dependentes da caça davam lugar de destaque
ao Orixá da caça onde em maior predominância o chamavam de Odé, as
tribos que tinham seus sustento vindos do rio exaltavam o Orixá das águas
doces, logo com a água vem a fertilidade e com ela Oxum; as tribos
envolvidas em guerras exaltavam Ogum como seu Senhor, cercados por
pedras e montanhas se tornavam devotos de um Orixá que chamariam de
Xangô, as localidades mais próximas ao mar reverenciavam o Orixá dos
oceanos por lhes sustentar e alimentar com seus frutos, dando a este o
nome de Yemanjá que traduzido a título yorubá significa a mãe dos filhos
peixes, o mesmo que aquela que gera os peixes; os vilarejos de
comerciantes rogavam a Bará com sua própria fé, que de lugar a região
poderia ser reverenciado de várias formas compatíveis as maneiras e
necessidades individuais de cada um...

Légba para trazer movimento... Lodê para que movimente a rua e traga
os clientes... Lanã para que tenhamos giros e trocas comerciais... Adague
para atrair os bons negócios... Ajelú para trazer a prosperidade...

Já as tribos com escassez de água e alimentos buscavam por agradar


um Orixá compreendido como violento, afinal quanto menos água e menos
provisões menor a saúde e maiores as doenças, assim algumas regiões o
reverenciavam como Xapanã e outras como Sapatá, mesma palavra, porém
com traços de dialetos diferenciados por regiões que com solos
frequentemente áridos tinham maiores disponibilidades de oferecer o que
vingava em suas terras, então a mais simples e "fácil" forma de lhe agradar
vinha dos cereais que conseguiam germinar mais rápido e dispensavam
grandes volumes de água, então para Xapanã ofertaram grãos de milho,
feijão, pipocas e amendoins ao Orixá declarado como o Orixá ligado às
doenças. Enquanto o povo regido por Oxum saudava "Yeyewo Oxum" que
traduzindo seria um rogo próximo a Oxum a mãe da prosperidade, o povo
de Xapanã evitava chamar seu sagrado nome por temerem que com ele
fosse invocado o axé do Orixá das epidemias que poderia colocar seus
olhos sobre as falhas de seu povo a serem julgados como merecedores de
adoecer espalhando assim uma cólera quando falavam de seu Orixá diziam
então "atotô(silêncio) abau(é perigoso)" surgindo assim uma das saudações

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

para Xapanã dizendo abau atotô; já o Orixá Xangô cultuado na rica e farta
cidade de Oyó recebe como agrado o amalá podendo ser feito com pirão de
farinha de mandioca, molho de tomates, carne bovina, de frango ou
camarões cozidos, folhas de carurú, repolho branco ou de mostarda
cozidas, quiabos refogados, podendo agregar e variar entre bananas,
carambolas e maçãs já que em Oyó haviam melhores condições para
cultivos agrícolas e pecuário somados a maiores recursos na gastronomia
local.

Com a vinda dos escravos de várias tribos foram aqui reunidos nas
senzalas brasileiras, espalhados, separados e misturados no intuito de
dispersarem suas afinidades e a força deste povo, uniam-se uns aos outros
em busca de apoio mútuo que os permitiam maiores proximidades com sua
terra de origem ao serem deserdados de sua Mãe África, aqui integravam e
se união, juntos forjaram da religião um de seus maiores pontos de
resistência, misturaram-se tanto os dialetos internos da África como
gradativamente com eles a língua portuguesa quanto a junção de diversas
tribos africanas desde os porões dos navios negreiros até as senzalas que os
adotava como filhos escravos que entrelaçavam culturas uns aos outros,
além de seus próprios costumes... Interagiam transmitindo lendas, segredos,
rezas, receitas e etcs... Então Oxum que reinava na cidade de Ipondá sendo
a mesma Oxum que também era rainha da cidade de Yjimun e vice versa,
aqui ficou conhecida entre as partes que a compartilharam em prol de cada
tribo seguir com seus próprios fundamentos somados em uma mesma
nação, reverenciada pelos Ipondás como Oxum de Ipondá, pelos Yjimuns
como a Oxum de Yjimun e dos Karis a Oxum Yê(Mãe) Kari, que em terras
brasileiras se tornaram Oxum Pandá, Oxum Demun e Oxum Ieiê-Cari;
reunião-se e familiarizavam-se os yorubás a divulgar a seus descendentes
que por um lado Oxum era moça e rainha das águas doces que se banhava
entre as pedras de águas agitadas, Oxum Pandá o Orixá de Ipondá a ser
agradado com canjica amarela cozida e refogada com tomates picados, por
outro lado aprendiam com os Yjimuns que Oxum era a rainha de Yjimun,
uma senhora rainha das águas doces que se banhava em águas calmas
cercadas por vegetações, quanto o axé que mais lhe agradava era canjica
amarela refoga com salsa ou couve picada; estabelecendo aqui a união
entre povos vizinhos de diferentes tradições mas de um mesmo Orixá
iniciarem-se os cultos a mais de uma Oxum que de acordo a cada origem a
"classificavam" de uma forma semelhantes por um ponto mas peculiares

28
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

por outros, assim ocorreu como todos os outros Orixás que foram
agregados por classes e reunidos em uma mesma nação que longe de suas
cidades de origem buscavam forças em seus descendentes e ancestrais em
comum.

Os negros trazidos para cá faziam parte de um povo arrancado de suas


raízes, vieram chefes, príncipes, guerreiros, babalorixás e todos os
membros que na África formavam uma sociedade distinta dos graus mais
elevados aos mais comuns, em terras brasileiras eram humilhados,
destituídos de seus títulos e importâncias, convertidos em escravos que aqui
reuniram partes dessas várias raízes-origens e com elas plantaram a árvore
de seus conhecimentos religiosos que firmam os segmentos de suas
tradições fundando uma "filial" da África dentro do Brasil, assim
transformando uma religião africana singular ao Orixá de cada tribo de
origem em religião afro brasileira/de matriz africana que formavam uma
nação que reunia Orixás antes distintos e "distantes"(locais) em
interagentes entre si, somando forças e atributos tanto entre divindades
quanto a seus seguidores; a religião de matriz africana como árvore que de
casa para casa e terreno para terreno possuem folhas, flores e frutos de um
lado singulares e por outro plurais em relação aos de mais porém, sempre
mantendo as mesmas raízes, por nós herdadas e hoje conhecidas no sul do
Brasil como 'nação de Batuque' .

Classes de Orixás.
Subdivisões de um mesmo elemento

Classes são denominações utilizadas para com maiores precisões nos


direcionarmos as qualidades específicas de um mesmo Orixá, como no céu
distinguir o ponto nascente ou poente do sol, as partes onde está nublado ou
ensolarado.

Um dos aspectos mais comuns é falar das classes como se possuidoras de


faixas etárias, assim como um elemento existente em vários estágios/etapas
tais como recém nascidos, crianças, jovens, adultos, meia idade e anciãos.

Exemplificando:

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

 BARÁ (Seguimentos ligados aos caminhos/ruas).


·

 Bará Ajelú

Bará Ajelú em alguns de seus pontos de atuação pode ser compreendido


como os cruzeiros menores, (sejam interpretados nos sentidos de
movimento e tamanho tais como quantidades de ruas), conhecidos como
cruzeiros de "T", cruzeiros e encruzilhadas próximas às águas, sejam em
praias de águas doces ou salgadas; citado também como um Bará criança e
ligado aos Orixás de praia por ser a mesma um de seus pontos de atuação.

 ·Bará Adague

Nas sequências fundamentais, Bará Adague é associado a figura de um


meninino mais velho que Bará Ajelú; atua por sua vez em cruzeiros
fechados, com rua(s) sem saída ou encruzilhadas de mão única; é o Bará
que geralmente trabalha junto às classes de Orixás de salão, tais como
Ogum, Yansãn, Xangô e Ossayn.

 ·Bará Lanã

Este Bará é compreendido como jovem senhor, abrange aspectos de ligação


entre todos os tipos de caminhos, cruzeiros e encruzilhadas geralmente
abertos e de mão dupla, sendo assim um intermediário entre as classes de
Bará; normalmente atua com maior desenvoltura junto à Odé, Otin, Obá,
Ossayn e Xapanã, podendo acompanhar qualquer outro Orixás e suas
classes.

 Bará Lodê

É o mais velho e mais temperamental classe de Bará.

Quanto as outras principais e mais jovens classes de Bará como Ajelú,


Adague e Lanã acompanham e iniciam as atividades abrindo caminhos para
os Orixás, a classe de Bará Lodê se faz contrária as outras classes de Bará,

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

pois não acompanha e sim é acompanhada diretamente por Ogum Avagãn e


vezes por outras classes de Orixás de rua. Não responde apenas em
cruzeiros d'água, tendo este atuação em todos outros cruzeiros.

 OGUN (Os metais e a defesa).

 Ogun Avagãn

Avagãn é talvez a classe de Ogum mais incógnita, compreendido por


alguns como a classe mais nova e por outros como a classe mais velha; age
sobre os metais mais pesados como mercúrio, chumbo e ferro, atuando nas
estradas e defesas externas como estradas, matas, encruzilhadas de trilhos e
na parte central de cruzeiros/encruzilhadas onde atua diretamente com Bará
Lodê.

 Ogun Olobedé

Atua diretamente sobre os metais brutos e assim como todas as classes de


Ogum tem suas essências ligadas ao ferro; trabalha em função de
seguranças públicas. É uma classe velha do Orixá.

 Ogun Onira

Onira é o intermediário entre as classes do Orixá Ogum, posicionado como


Orixá das estratégias de batalha é associado ao aço. também atua nas
seguranças e defesas domiciliares e comerciais.

 Ogun Adiolá

Adiolá é a classe mais pacífica do Orixá da guerra, atuando assim na defesa


pessoal. responde junto aos Orixás Oxum e Yemanjá, abrangendo os metais
mais leves... Alumínio, cobre, prata, ouro e outros metais formam suas
guarnições. Ao certo não temos como definir a "idade" de um Orixá e em
Ogum isto se faz mais distante por ser ele um Orixá imprevisto como as
táticas e estratégias, representado também pelas cobras.
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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

 Yansã/Oyá

 Yansã e Oyá são dois nomes de um mesmo Orixá/elemento/Orixá.

Os nomes basicamente diferenciam apenas as principais atuações dos


ventos; a senhora Yansã são os ventos mais calmos como as brisas e a
menina Oyá são as manifestações mais tempestuosas. Gases auxiliares e
gases nocivos, distintos porém, cada um com seus devidos propósitos.

 XANGÔ (O fogo, a pedra e a justiça).

 Xangô Aganjú

Aganjú pode ser descrito como o fogo violento e incontrolável, chamas


ardentes dos períodos iniciais aos intermediários, em mãos carrega o poder
de executar as leis. Pedras e rochas próximas às águas.

 Xangô Agodô

A classe mais velha de Xangô é reconhecida por Agodô, é o poder de julgar


e prescrever as sentenças de ordem cármica e divina. As pedras em locais
secos, fogo nos graus intermediários para finais.

 ODÉ-OTIN/ODÉ E OTIN (Buscas e correspondências).


Assumem as formas de resumo, assim não agregando classes, resumem-se
como as apresentações e manifestações da vida animal. Odé-Otin/Odé e
Otin é/são fauna, Odé em relação ao homem apresenta-se como caça e Otin
nas formas de influência com o homem mostra-se como pesca...
Distinguem a vida animal apenas nos aspectos macho e fêmea como
complementares um ao outro. Ambos abrangem o amplo conceito da
natureza de forma a ser única.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

 OBÁ (comunicação, agilidade e progresso).


Obá é por sua vez o Orixá de vínculo intermediário ao encontro dos
opostos, favorecendo e somando forças a todos os lados; são as formações
práticas, regências de simplificação, abreviamentos, rotas, rumos e atalhos.
Intervém em todas as áreas da natureza, junto a todas classes de Orixás...
dos cruzeiros até os céus (de Bará à Oxalá) recebem as atuações de Obá nas
transições entre um estágio e outro. A roda da vida. Origem de conexão não
aceita divisão em classes.

 OSSAYN (Saúde, providência e valor).


Ossayn é representante da vida vegetal e por ela também representado; em
seu aspecto amplo e resumido, compreende-se em flora. Basicamente
aderindo apenas apresentações vegetais, em constante crescimento,
expansão e transformação, assim não dividindo-se em classes, pois se
assim fizessemos seriam inúmeras.

 XAPANÃ (Decomposição, regeneração e renovação).

 Xapanã Jubeteí

Jubeteí é a classe mais nova de Xapanã, detentor dos estágios recentes e


mais rápidos de decomposições e das doenças, tais como elementos
líquidos, úmidos e próximos as águas.

 Xapanã Belujá

Belujá é a fase intermediaria entre as classes de Xapanã, apresenta-se com


características já avançadas, antecedendo assim a classe de Sapatá e
sucedendo a classe de Jubeteí. É a passagem onde as doenças são
expostas/descobertas e a decomposição aduba a terra.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

 Xapanã Sapatá

Esta é a última manifestação classificatória de Xapanã, para chegar a esse


estágio já passou pelas outras classes, assumindo assim a fase terminal
deste Orixá; Sapatá em ponto negativo pode ser interpretado como
decomposição e degeneração de elementos vivos.

●○YBEDJIS●○(Dualidades, paralelos, integração).

São os Ybedjis a interação entre um e outro como o direito e esquerdo, a


junção natural, os resultados de somas e agregações; São originados entre
Xangô e Oxum, como os reflexos do fogo na água.

 OXUM(Sabedoria, beleza e doçura).

 Oxum Docô

Docô é a primeira e mais velha classe dos Orixás conhecidos como


"cabeças grandes", iniciando assim por Oxum a ala de Orixás de
mel/Orixás velhos que se estende por Yemanjá e encerra em Oxalá.

Forma a origem das águas doces, como os olhos d'água e as vertentes que
lentamente brotam formando as nascentes dos rios, cachoeiras e cascatas,
em forma de vapor envia águas para Oxalá que retornam em gotas de
chuva. É a fase da beleza madura como o ouro envelhecido.

 Oxum Olobá

Oxum Olobá são as infiltrações de água voltando a terra, é como a água


que se desprende dos materiais, sucede a fase intermediária e antecede
Oxum Docô; encontrada entre a terra e as águas como ouro e pedras
preciosas é a beleza oculta.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

 Oxum Demun

Representada e compreendida como as margens e o curso das águas, tem


maiores atuações nos trechos onde as águas e vegetações dividem o
mesmo espaço. É uma jovem senhora que com charme age como águas
correntes.

 Oxum Pandá

É Pandá a mais moça, vista com beleza jovial e sedutora, é agitada como as
quedas das águas e as correntezas mais fortes, é o curso natural que revela
o brilho do ouro.

 Yemanjá (Origem, vida, maternal).

 Yemanjá Bocí

Yemanjá Bocí é uma das primárias classes deste Orixá, são as


manifestações mais agitadas dos oceanos, as formações das ondas, suas
quedas e chegadas à beira da praia. É Yemanjá nova.

 Yemanjá Bomí

Bomí é intermediária entre as classes de Yemanjá, é moça e velha.

Atua como os repuxos e correntes marinhas, variando e interagindo formas


de acordo com os níveis do mar.

 Yemanjá Nanã/Nanã Borokun

Nanã é a classe mais afastada dos seres humanos, guardando os mistérios


dos oceanos, é o berço da vida marinha e as fases mais profundas e
obscuras dos oceanos; interagindo com Oxalá se apresenta como chuva. é
também vista como a classe mais desconhecida do Orixá Yemanjá, pois
acredita-se ao aproximar-se de Nanã não teremos retorno ao plano físico.
Acredita-se ser esta a Yemanjá mais velha e o Orixá dos fósseis.
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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

 OXALÁ (Pai, luz, misericórdia).

 Oxalá Obokun/Oxalá Bokun

Em aspectos gerais, originalmente Oxalá em todas suas classes é


patriarcal, assumindo aspectos de antecessor e mais velho que todos outros
Orixás. Obokun é Oxalá mais moço, o início do amanhecer, o despertar do
sol e também as nuvens mais carregadas. O céu das 00:00 às 06:00 horas,
onde céu e terra se encontram pela cerrações das nuvens.

 Oxalá Olokun

Oxalá na classe de Olokun nos transmite o sol com chuva, os horários da


manhã, estipulados pelas posições solares das seis horas até o meio-dia. É
quem rega terras e águas com as chuvas.

 Oxalá Dakun

Compreende-se como o ponto de meio-dia, onde o sol encontra sua posição


em pleno potencial, são traços de nuvens no céu. O momento de plena
iluminação a um hemisfério e escuridão ao oposto. Dakun é intermediário
entre os Oxalás, assim finalizando os novos e iniciando os velhos.

 Oxalá Jobokun

A classe velha de Oxalá é chamada de Jobokun, se revela nos momentos


em que o sol inicia suas etapas poente, das hr.:12:00 às 18:00. É um ancião
que vagarosamente se curva junto ao cair do sol. As classes mais novas
detêm as nuvens para assim aliviarem o peso das costas do velho, fazendo a
imagem de um límpido céu.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

 Oxalá Orunmylá

São os períodos em que o sol se despede e posiciona contrário à nossas


posições, temos a visão tomada pela escuridão. E assim brota Orunmylá,
das hr.:18:00 ás 06:00 Como oculta-se o sol surgem os segredos. Alguns o
cultuam como moço embora a grande maioria o considere como velho, faz-
se a fé sobre a crença e a crença sobre fé já que a Orunmylá cabem todos os
segredos e revelações; o aspecto de desconhecido e ao mesmo tempo
visível (incógnito) faz deste Oríxá o mais próximo a Olorum.

ADJUNTÓS.

UNIÃO DAS SUBDIVISÕES DE ELEMENTOS DIFERENTES

Adjuntós são as combinações/influências existentes entre Orixás


coadjuvantes a um Orixá principal, formando assim as partes de um mesmo
elemento, tais como raízes, tronco e copa formam a árvore. Basicamente
diferenciam-se por aspectos em ativos (-) e receptivos (+) que
frequentemente chamamos de Orixás Pais e Orixás Mães, para um melhor
entendimento é como posicionar uma mão junto ao fogo e outra junto à
água, a mão sobre o fogo terá proximidades ao Pai Xangô quanto à mão na
água estará mais próxima a Mãe Oxum, o elemento ativo será mais
repelente quanto ao passivo será mais receptivo; também podem ser
compreendidos como masculinos e femininos.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

1° ORIXÁ (principal/Orixá de cabeça).

2° Orixá (adjuntó principal/Orixá do corpo).

4° Orixá (adjuntó de passagem).

3° Orixá (passagem/Orixá das pernas).

Orixá Bará (adjuntó padrão/Orixá dos caminhos).

Usando a exemplo o Orixá/elemento Xangô/fogo como Orixá de principal:

Xangô-Yansã/Oyá:

Xangô Agodô adjuntó com Yansã(brisa), por ser Agodô e Yansã classes
mais velhas digamos que o adjuntó influencia de forma a manter aceso um
fogo brando;

Xangô Aganjú com Oyá(ventos), por serem Aganjú e Oyá as classes mais
joviais e ativas de Xangô e Yansã fazem um fogo ardente, vezes
incontroláveis.

Xangô-Obá:

Xangô adjuntó com Obá(conexão), tem atuação em transpor Xangô entre


os estágios de manifestações do fogo, Aganjú(inicial) e Agodô(final).

Xangô-Oxum:

Xangô Aganjú adjuntó com Oxum Pandá(água), são classes jovens de


Orixás... Como as pedras e rochas que sustentam as quedas das águas
formando as cachoeiras.

38
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Xangô Agodô adjuntó de Oxum Docô, classes mais velhas, como o lago
que embeleza cercando um vulcão que caso entre em plena atividade de
erupção revoltam as águas e tornam-se Aganjú com Pandá que ao
abrandarem voltam aos pontos de Agodô e Docô; tornando assim Agodô
com Docô um Xangô mais calmo até seu ápice ponto de ação.

Yansã/Oyá(raios)-Xangô, Obá(audição)-Xangô e Oxum(beleza)-Xangô

Exemplificando aqui a atuação de Yansã/Oyá, Obá e Oxum como Orixás


principais onde Xangô é adjuntó(coadjuvante):

Yansã é raio e Xangô se faz trovão; Obá é audição e Xangô se transmite em


som; Oxum é vaidosa e Xangô admirador.

FEITURAS

AS CONEXÕES, O VÍNCULO ENTRE OS PLANOS (MATERIAL E


ESPIRITUAL).

Partindo do princípio, como tudo no plano físico é iniciado por uns estágios
de formações, tornando aí o primeiro ponto que se encontram os elos
existentes entre espiritual e físico, todas as formas de vida assim como todo
plano material tem suas origens no espiritual... Aquilo que é material foi
espiritual; Fé, esta que permite a um indivíduo chegar a qualquer estágio
que for de ascensão a decadência moral e psicológicas, elevando ou
decaindo em graus motivacionais; de origem interna a fé não é algo
imposto e sim natural.

Acreditar no provável não passa de sabedoria, vezes uma falsa crença pode
ser conveniente aos aspectos humanos. Fé e crenças são formas diferentes...

Pode-se crer em elementos existentes ou não, quanto à fé nos permite crer


apenas no improvável aos outros, e justo onde existiria a maior lacuna de
todas está a certeza inabalável sobre algo. Fé é palavra singular e sem
plural, cada um tem a sua e todas as formas de fé carregam a mesma
riqueza ultrapassando qualquer outro sentimento.

39
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

É como saber que existem os verbos sem haverem palavras para descrevê-
los.

Motivados pela fé e em busca de suas origens divinas os homens buscam


auxílio e esclarecimentos, da fé se fez a busca e nas buscas por nossos
fragmentos perdidos no tempo encontramos a religião que nos aproxima e
une junto aos conhecimentos perdidos entre uma vida e outra. Confortando
assim nossas inseguranças... Iniciando neste ponto uma melhor canalização
por nossas buscas.

RELIGIÃO
A CONFIRMAÇÃO DA FÉ

Religião basicamente é uma forma de ser, um estado de espírito onde


temos fé em uma força superior e buscamos por seguir seus exemplos
através de doutrinas, tornando-nos assim menos distantes da perfeição.
Religião por si só é exercitar crenças e praticar a fé.

Assumir a religiosidade deve ser ato de amor e doação para com os


outros, servir como ferramenta de uma força superior.

Na genuína visão africanista tudo e todos possuem propósitos de


origem divina, não existindo um indivíduo sem positivas atribuições. Cada
um com seus propósitos e atribuições a caráter individual; individualmente
melhor desempenhando e destacando em determinadas funções. Para
encontrar-se com Deus não é necessário haverem religiões, porém uma
religião não segue apenas em orações, assumindo vínculos de aspectos
sociais.

Deus em si gerou-se, sem papel e sem caneta, fez-se apenas do verbo e


com ele todas as outras coisas; onde a fé não se torna palpável, mas pode
no plano físico e natural ser transmitida, de forma que chegue a todas as
classes sociais, das crianças aos velhos, dos menos aos mais instruídos,
sejam eles analfabetos ou pós-graduados, não havendo distinções de
gêneros ao culto espiritual. Não criamos um Deus de papel e sim fomos
criados por um Deus de universalização onde um grão de área formado por

40
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

ele tem valor tão grande quanto um oceano, porém cada um com seus
desígnios.

Ingênuas são as virtudes associadas às crianças por imitarem gestos,


falarem somente aquilo que ouvem e "lerem" os livros apenas pelas figuras.
Se assim for o homem será no mínimo desinteressado de si mesmo.

YLÊ
A CASA DE RELIGIÃO E SUAS ESTRUTURAS

A casa de religião a qual se frequenta sejam como clientes ou para


iniciar-se no culto aos Orixás quase que sempre é conhecida por indicações
de outras pessoas que lá frequentam, mas para nesta cumprir quais quer que
sejam as obrigações sempre e sem exceções deve ser escolhida por algum
tipo de empatia somada a confiança e seriedade transmitida pelo sacerdote
e seus frequentadores.

Embora muitas pessoas não tenham a mínima noção, uma casa de


religião é fundamentada desde os cruzeiros dispostos ao seu redor,
passando por ruas próximas e estendendo-se do pátio ao seu interior. Nos
cruzeiros mais próximos são feitos rituais aos Orixás de rua, tais como
arriar ebós, axés de frentes secas e despachos de ecós e águas de
quartinhas, do cruzeiro até a casa de santo se fazem "puxadas" com cereais,
pipocas, balas de mel, moedas e etc... no portão, portas, assoalho e pátio
são plantados assentamentos, levantações, ebós e também são calçados por
ecós de pátio; o piso é lavado com mierós as paredes sopradas por
assajéuns de quartinha, defumações se elevam em fumaças recebidas pelo
teto, seguranças contra demandas e opetés amparando as portas e saídas da
casa, e no quarto de santos encontramos os assentamentos do Orixá da casa
envolto pelos Orunmalés de seus filhos de religião somados os principais
elementos físicos de representação e atividade dos Orixás. Ao chegar e sair
em uma casa de religião os seus vinculados devem cumprir obrigações ao
templo, entre eles está o ato de na entrada do terreno saudar os Orixás de
rua ali assentados e ao adentrar na casa deve primeiramente se dirigir ao
quarto de santo, bater cabeça aos Orixás, seguindo por de forma

41
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

fundamentada e religiosa ao cumprimentar seu Babalorixá, e seus


padrinhos, rumo aos demais babalorixás presentes, a toda sua família
religiosa e cordialmente para com as visitas.

Deve-se sempre zelar e desempenhar para com os cuidados e


manutenções da casa seja elas de origens morais e materiais; pois a casa de
santo pode ser compreendida como sua segunda casa, mas será a primeira
casa de seus Orixás e de outras pessoas.

AXÉ FINANCEIRO

Diante aos fatores que agregam uma casa de religião assim como
qualquer outro templo, são mantidos mediante aquisições de verbas
originadas por trabalhos religiosos e sociais, na medida do possível somam-
se fundos e doações através de benefícios e doações, sejam elas vindas por
partes como clientes, filhos e simpatizantes a religião; dessas fontes
podemos distinguir com maiores assiduidade os clientes e os filhos da casa.

Clientes são os frequentadores do ylê que não tem por necessidades


criarem vínculos de obrigações com a casa de santo nem com seus
integrantes, em grande maioria se fazem presentes apenas para sanar
problemas particulares, não sendo assim ligados aos fundamentos da casa;
atuando diretamente no auxílio financeiro em função aos trabalhos e
serviços direcionados aos mesmos. Filhos de santo, são estes os principais
integrantes de formação estrutural e social a casa de santo, são os filhos os
principais responsáveis e envolvidos no cotidiano da casa de religião; sobre
as orientações diretas e reflexivas do Babalorixá cumprem obrigações e de
maneira menos diretas também providenciam valores de axés referentes a
suas feituras, mensalidades e em geral devem auxiliar sempre que possível
com as disponibilidades de mão de obra, também servem de ponte a
indicação de novos clientes e frequentadores. Relembrando que jamais um
valor financeiro deve ser substituído por um merecimento estipulado pelos
Orixás, axé não tem quantia!

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

HIERARQUIA

Nos dogmas da religião africanista não se fazem distinções de formas a


favorecer uns e desfavorecer outros. Seguimos por exemplos supremos o
panteão dos Orixás onde temos desde os recém-nascidos representados nos
Ybedjis até o mais velho ancião representado em Oxalá, temos o médico
saudável em Ossayn e o enfermo enfermeiro em Xapanã, temos os
moradores da rua em Bará Lodê e Ogun Avagãn e a rica beleza do ouro em
Oxum, representando e sendo representados em todos os aspectos, temos o
casal inseparável em Odé-Otin e o casal separado em Ogun e Yansã/Oyá, o
amor fogoso em Yansã/Oyá com Xangô e o amor revolto entre Xangô e
Obá, assim como o amor de forma universal em Mãe Yemanjá.

Basicamente os cargos hierárquicos são distintos apenas em


Babalorixá( sacerdote masculino)/Yialorixá(sacerdote feminino) do templo
e omorixás (iniciados no templo), o Babalorixá e Yialorixá também
chamados popularmente de pai e mãe de santo seguem em tratamentos de
igualdades para com os Orixás, sendo babás e Yiás igualmente cumprem
suas obrigações para com os cultos aos Orixás, todos independente de
estágios de iniciação são filhos de um Orixá, pois o Orixá é Pai de todos e
não o homem pai de um Orixá a constar por faltas de capacidades em criar
um Orixá visto que a realidade é oposta e é o Santo/Orixá pai da vida, onde
na verdade o título pai de santo apenas designa atividades e deveres da
mesma forma que oque vincula os pais adotivos/de criação ao seu filho é a
adoção/criação, permitindo então a possibilidade em serem pais de
adoção/criação, e da mesma forma o que vincula pais de santo a seus filhos
de santo é o Santo/Orixá, sendo assim está também no Orixá a
possibilidade em termos filhos de religião(iniciar adeptos) tanto quanto de
termos um pai ou uma mãe de santo a qual nos iniciará e conduzirá junto
aos ensinamentos religiosos, sendo assim é o Orixá que nos permite sermos
zelador e termos um zelador junto as normas do Orixá. Na compreensão
afro brasileira as hierarquias servem apenas para manter a disciplina e
mantendo disciplina se obtém o progresso, a final sem progresso não se
chega a lugar algum!

“A verdadeira vestimenta que difere os mais sábios dos menos experientes


são vistas nos momentos de cultos onde quanto mais importantes forem

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

diante aos Orixás mais descalços dançaram, pois é regra de Orixá que ao
dançar todos estejam de pés descalços e em contato com o chão. Temos
cargos que são designados por aptidões de acordo a nossos conhecimentos
e rituais de iniciação, quem tiver maior interesse nas áreas culinárias
envolve-se na cozinha, aos mais interessados na percussão ensina-se os
manuseio dos instrumentos rítmicos, aos mais ligados a decoração são
instruídos a organização física da casa e etc, cabendo a todos dividirem-se
para com as atividades de higienização e serviços gerais, sempre
acompanhados e instruídos pelo Babalorixá e Yalorixá o qual foi escolhido
para inicia-los cabendo ao mesmo sempre explicar os motivos e
fundamentações pelas quais são feitos tais procedimentos, tornando assim
um sacerdote exemplo presente, cabendo a ele cumplicidade a seus filhos
de santo que além de serem seus iniciados também serão seus irmãos da
mesma religião diante a visão dos Orixás; os fatores básicos e primordiais
param se tornar um verdadeiro praticante da religião é ter boas intenções,
disposição para aprender e força de vontade. Uma das maiores virtudes
notáveis a um futuro Babalorixá e Yalorixá são os esforços em
continuamente melhorar perspectivas, de modo a envolver os aspectos
coletivos a iniciarem-se em suas próprias atitudes, pois a sabedoria se inicia
através da reflexão onde independente de sabedoria sobre um determinado
ponto todos seguem um aprendizado infindável junto as leis dos Orixás,
sempre poderemos aprender mais, tanto país quanto filhos e uns com os
outros, a final religião vai além de preceitos... Religião é o modo de viver.”

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

"EVOLUÇÃO" E EVOLUÇÃO...

É lamentável que com o passar do tempo sejam percebidos cada vez


menos resultados eficazes em relação às necessidades das pessoas que
buscam orientações ou soluções para seus problemas através do culto aos
Orixás; em partes isso pode ser devido a busca por praticidades que
invadem as casas de santo e devastadamente desfazem tradições
fundamentais corrompendo o poder de axé pelos avanços da facilidade... A
constar por práticos exemplos as velas que hoje são de parafina colorida
eram no princípio de cera de abelhas e sebo, o mel era puro e hoje é com
açúcar, o azeite que era de puro dendê hoje é diluído em óleo de soja entre
outros, pipocas fritas em panelas de barro com o auxílio de colheres de pau
a mexer em sentido anti-horário estouravam em areia grossa ao fogo de
lenha... Como são as pipocas de hoje?

Acaçás feitos em processos onde as canjicas levavam de dois a 3 dias


de molho em água para serem moídas em pilão e depois de cozidas
formarem a massa são substituídos por "acaçás de minuto" onde água e
canjica são batidas em liquidificador para depois irem ao fogo, ou até
mesmo substituídos por um mingau de amido de milho cozido. As massas
de acarajés antes obtidas do feijão miúdo de molho em água para em
seguida ser triturado entre pedras hoje é substituída pela utilização de
farinhas para acarajés industrializadas ou processadas a maquina; ebós
congelados para serem descongelados no momento de uso como se caísse
em esquecimento que o amalá de Xangô é "alimento" ao Orixá do fogo,
senhor dos vulcões e do calor; as peças de barro que compunham materiais
para fixação de axé hoje são pintadas e envernizadas quando não
substituídas por bandejas, sacos e sacolas plásticas; colares de guia que
antes eram de louça hoje também "podem ser" acrílicos; o errôneo ato em
reproduzir algo que se viu realizar mas não se aprendeu assim fazendo sem
saber o que de fato está sendo feito; estas entre tantas outras novidades
entre passado e futuro que "agregam" um aspecto moderno as formas atuais
de culto.

Os interesses de modo geral costumam serem outros e os mais


agravantes é que os "pais de santo" da atualidade visam mais serem
"beneficiados" que auxiliarem para o bem estar da nação, há uma sede de

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

poder que busca por "liderança" a somarem quantias de filhos de santo que
lhes sirvam em mãos de obra sem custo enquanto o pai de santo cobra
custos tão elevados para iniciar uma pessoa que muitas vezes nos leva a
crer que o valor cobrado ultrapassa a "quantia" de axé, muitos desses
"líderes" de grupo se provalecem não somente da boa vontade mas também
da boa fé dos que estão ao seu redor, enquanto aos babalorixás mais antigos
compreendiam como maiores satisfações e gratificações o bom resultado de
suas ações a serem reconhecidas como sendo de bom axé; muitas vezes os
que deveriam servir de exemplo são os que mais deixam a desejar para com
os parâmetros de fidelidade ética e moral como religiosos, abusam da
ingenuidade dos leigos, menos experientes e "desfavorecidos" a ostentá-los
de certa forma como seus empregados.

Quanto mais passa o tempo menos disciplinas são transmitidas; não


desejar ser aluno pode ser considerado normal, mas para isso os indivíduos
tendem a ter de aprender e infelizmente nem todo mestre aceita ser
"superado” (equiparado) por um aluno; estão se formando muitos "mestres"
que geralmente nem podem dizer que efetivamente foram bons alunos, por
um curto período de iniciação e aprendizagens insuficientes a ponto de não
poderem transmitir conhecimentos necessários para seus filhos que amanhã
serão pais, a corrupção está presente também nas religiões, diplomas
comprados, Orixás "alugados", axés vendidos e poucos... Mas muito
poucos fundamentos compartilhados; como que se fossem celebridades a
espera de reconhecimento ao esquecer que estrelas são os Orixás.

Ao Orixá o indivíduo bem vestido é tão importante quanto o mais


humilde, o Orixá de cabeça do pobre é o mesmo Orixá de cabeça do rico
embora muitos ignorem o real valor da religião. O poder aquisitivo abre
portas para uns e fecha portas para outro, compram favoritismos e maiores
prestigioso, pois a grande maioria dos que se dizem país e mães de santo
esquecem de preservarem em suas casas o axé de merecimento, pois de
nada adiantam práticas e teorias aos que não são abençoados com a
vocação. Ser religioso não é visar status ou posição de destaque, nem
apenas participar de rituais e sim praticar a fé ao se entregar as crenças.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

... TEMPO...

... ...

Na cultura africana o tempo é algo ambíguo, talvez os elementos mais


complexos, pois existe para o Orí (alma) e é praticamente extinto para os
Orixás.

O orí segue o tempo em evolução, progresso e aprendizado, já o Orixá


transgride o tempo como o sol, a lua, o vento, a terra e todos outros
elementos naturais que fazem alusão à existência...

Os Orixás em seus elementos dançam demarcando em seus passos o


tempo, unem os homens de mãos dadas com o tempo a fim de enfrentarem
os desígnios cunhados no orí, porém por ele não são demarcados... É o
tempo que fala ao Orixá como em ritmos das ações dele próprio, e nos dias
de culto aos Orixás está entre e separando as pancadas do tambor; está
presente nos nascimentos, nos crescimentos, nas evoluções, nos
amadurecimentos, no envelhecimento, no decorrer de tudo é de todos;
tempo está em todo acontecimento, no início, no meio e no fim, o tempo
está na consciência. É mais vivo aos seres encarnados que aos
desencarnados. Ao tempo não existem pausas, seu axé (poder) é sempre
contínuo e segue empregado pelos Orixás como justiceiro nas leias de ação
e reação; tempo favorável a uns, desfavorável a outros e justo para todos
como as leis de Xangô.

Agora o tempo é presente, é passado e também é futuro; agrega,


separa, envelhece e renova, tempo são as oportunidades de refazer e as
oportunidades perdidas. Inicia-se com a vinda e para com a morte, curta e
longa, infinita em espaços cabendo apenas dentro de si.

Os homens o calculam em números que formam doze horas de dia com


12 horas de noite, com doze meses, com 12 signos, com doze Orixás; como
um Orixá que sempre esteve presente desde a criação do universo, após ser
assentado em vínculos com as iniciações religiosas de seu filho,
aparentemente deixando para trás seu posto natural e reverenciando
comemorações onde o tempo do Orixá está por fazer seu "1° ano" a

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

anteceder os próximos anos de assentamento; recebendo "ebó de


aniversário" de forma anual, converte um ano em um dia; após o axexé
(ritual realizado após o falecimento de um iniciado) onde se desligam e
despacham os assentamentos que em vida foram ligados ao agora falecido,
o Orixá retorna a suas essências eternas e infinitas a se "perderem" no
tempo.

O tempo em Odé é flecha de caça do chão atirada para o céu meio dia
no sol; de cima da árvore reta a terra é meia noite no sol; para a frente hs.:
18:00 no sol, para trás hs.: 06:00 no sol, porém a flecha é lançada por um
arco e para que possa lançar tem que ser algo invergavel e para ser assim
tem de ser flexível não estando em um ponto e outro e ao mesmo tempo
influenciando em um todo, é aí que entra Otin que ao jogar a lança de caça
também a utiliza para pescar formando Odé o tempo que segue, e Otin as
frações do tempo a seguir. O tempo inicial pode ser chamado como Oxalá
moço, quando o sol se ergue e com ele a rotina do despertar para um novo
dia; O tempo final pode ser interpretado como Oxalá velho, àquele que
passou pelo início e segue ao cair da noite, com o por do sol trás o repouso.
Segue o tempo em vice versa como senhor da razão.
Tão diferente é o tempo para os humanos quanto é para os Orixás, isto se
confirma quando notamos lavar nosso corpo algumas vezes ao dia quanto
as limpezas de espirituais ocorrem estipuladas por calendários e consultas
através do jogo de búzios, nas épocas de Omí-océ (limpeza de
assentamentos e ferramentas destinadas aos Orixás) que geralmente
ocorrem no máximo duas vezes ao ano; enquanto fazemos uma média em
torno de três refeições ao dia nossos assentamentos de Orixás recebem suas
confirmações de forma anual. Quanto nossos sentidos se movem sentido
horário os sentidos do Orixá seguem rumo anti horário, enquanto nossas
apresentações físicas não ultrapassam se quer um século as formas de
apresentações dos Orixás ultrapassam séculos, milênios e o tempo
incalculável nas árvores, nos metais, nas pedras e em todos os elementos
encontrados na natureza; nas estrelas, nos planetas onde o tempo se perde
no espaço nossos períodos são marcados pelo sol e pela lua, onde luz e
escuridão demarcam nossos dias.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

MITOS

Devido ao grande número de adeptos e frequentadores em nossa


religião somada as práticas de alguns dos nossos dirigentes mediante a
incompreensão ou não possuírem um saber aprofundado e preciso sobre os
fundamentos religiosos, usam então por substituir a veracidade por mitos;

Encontramos uma grande quantidade de mitos crescentes ao passar do


tempo, como por exemplo, dizer que o Orixá Bará Lodê não gosta de
vínculos de proximidades com as mulheres apenas por não simpatizar com
o sexo feminino... Mas afinal poderá uma parte de Olorum desfazer-se de
parte da sua própria criação???

Tornam-se assim mais fácil aos sacerdotes com menores formações


fundamentais dissipar informações distorcidas que buscarem as raízes das
fundamentações e transmitirem as fundamentações bases de cada ato
religioso.

A palavra Lodê ou Olodê tem por tradução do yorubá referências em


sua composição do prefixo 'OLO/LO' em Senhor e 'DÊ/DÉ' como o lado de
fora, a rua; assim como o Deus/Olorum é o Senhor do céu, Olodé ou Lodê
é o Senhor da rua, relembrando que as classes de Orixás são reflexivas a
vários aspectos que vão muito além dos diretos significados de traduções.

Sendo Bará Lodê também conhecido como "Modjibau Exú" ou


"mensageiro de hábitos noturnos", podemos facilmente exemplificar assim
o distanciamento direto não só das mulheres mas também de crianças nos
cultos a essa classe do Orixá Bará, já que em alguns aspectos da rua se
fazem compreensivos os perigos e armadilhas da noite sendo menos
agressivas aos homens que as mulheres.

Mas qual homem não veio de uma mulher?

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

OS BARÁS QUE NÃO GOSTAM DE ÁGUA

É com grande frequência que ouvimos dizer que os Barás em todas


suas classes tem quizilas e repúdios ao elemento água, se simplesmente
assim fosse como poderíamos ligar seus assentamentos com mierós (sumo
de ervas macerados em água), manter seus assentamentos com quartinhas
contendo água, assim como na execução de limpezas e trocas espirituais
ligadas à este Orixá o uso de assajéun (borrifo d'água contida em quartinha
de Orixá)???

Compreende-se que Bará é dinamismo, movimento, terra, a base de


todas as coisas e matérias, assim como os caminhos é um dos meios mais
próximos e semelhantes ao ser humano, já que por eles todos passam. É o
Orixá dos intercâmbios, das negociações, atividades comerciais, é
autônomo como a rua que o faz de seu próprio Senhor; aspectos estes
representados e manifestados em seus assentamentos que carregam total
individualidade a iniciar por seus ebós que não dividem com os de mais
Orixás e aí se diz que Bará come sozinho, onde a água depositada nas
quartinhas nunca atingem o limite máximo fazendo seu uso mas nunca em
excessos como a terra encharcada, assentado dentro de uma casinha
depositada no chão respectiva ao axé que permite base a todos outros
elementos somado ao aspecto de individualidade já que cada ser traça seu
próprio caminho, moedas correntes como o poder de comercializar, junto a
7 ponteiras que indicam as diferentes direções e oportunidades, carregando
chaves, cadeados e correntes com o poder de abrir ou fechar os caminhos,
podendo fazer da vinda a ida, da entrada a saída e vice versa. A água que se
faz em forma de chuvas, umidades, infiltrações e inundações são quem
complica, dificulta e até impede as atividades e principais pontos de
atuação de Bará, sejam das mais simples negociações até as mais
complexas construções; como dias de chuvas, enxurradas e alagamentos as
ruas se tornam intransitáveis, onde pessoas deixam de sair diminuindo os
fluxos das vias e dos comércios; estabelecimentos invadidos pela água ou
excesso de umidade que acabam por serem interditados e por sua vez até o
ponto de os moradores de rua "perderem o lar" indo de partida a novos
abrigos. Cancelam-se passos, caminhadas, passeios e passeatas... Em dias
de chuva as portas estão fechadas.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

CICLO MENSTRUAL

Seguidamente e de formas corriqueiras presenciamos expressões


proibitivas quanto a presença de mulheres em seus períodos menstruais
junto as atividades ritualísticas de obrigações aos Orixás; regra esta
estipulada sobre os fundamentos de feituras essenciais as diretrizes de
cultos na religião de matriz africana (Nação de batuque).

Temos por entendimento que o axorô/sangue (axé vital) divide-se em


três grupos, o axorô verde (sangue das folhas) extraído de folhas vegetais
maceradas em água, o axorô quente proveniente de aves e quadrúpedes e o
axorô frio referente aos peixes e ebís. Compreendemos que é através do
axorô que se tornam possível os atos religiosos africanistas de vincular
plano físico com plano espiritual, fazendo entre os dois um único ponto de
proximidade, sendo o axorô um elemento indispensável para a contenção
de axé. Nesta forma religiosa onde as diretrizes são estabelecidas nos
Orixás e pelos Orixás, estes que por sua vez zelam dos princípios básicos
aos mais complexos da vida nos permitem compreender que para o
equilíbrio da existência todas as coisas possuem dubiedade, assim como
temos o "positivo" também temos o "negativo", como temos o preto temos
o branco, assim como 'Orixá inteiro' temos o Egum e etc... Pois são os
opostos que permitem os contrastes e assim a percepção e sentido entre as
coisas, e entre elas está o livre arbítrio que nos permite fazer escolhas e
tomar atitudes cabiveis a cada indivíduo, o que nos faz seres individuais e
ímpares em relação aos outros; entre as regências dos Orixás encontram-se
a vida e entre as partes do Egun encontra-se a morte e nela tudo aquilo que
não mais é vital. Visando assim os resíduos menstrual sendo sangue
descartado portador de um óvulo morto faz-se repelido diante as funções e
atuações dos Orixás no organismo feminino, já que entre elas estão as
ações e reações dos organismos também somadas a geração da vida. Ficam
então restritas as participações de mulheres menstruadas diante os rituais
aos Orixás por nesse momento de ciclo menstrual serem portadoras de uma
fonte que desgasta o axé, porém livres para participarem dos cultos aos
Eguns por dentre inúmeras finalidades também conterem a função de
desligamentos de feituras assim como de axés.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

ORUNMYLÁ

Diante o entendimento sacerdotal sobre alguns fundamentos da religião


encontramos gôas (famílias religiosas) que seguem por "preservar
Orunmylá"; traduzindo... São restrições e abstinências na lida de culto a
esse Orixá e entre elas temos regras como a proibição do consumo de seus
ebós (alimentos) por mulheres, seja desde o manjar com calda de ameixas
até a carne dos animais ofertados ao mesmo Orixá. Encontramos também
restrições quanto aos contatos com seus assentamentos onde os iniciados
que não tiverem recebido axés de ligação com essa classe de Oxalá e seus
assentamentos, não podem se quer olhar para os assentamentos de
Orunmylá.A grande maioria dos Babalorixás e Yalorixás abstém-se em
apenas divulgar tais fundamentos sem ao menos saberem os porques de tais
medidas.

Originalmente as reuniões de cultos a esse Orixá tinham por intuitos


reunirem os homens das tribos africanas para que junto às consultas aos
jogos de Yfá-Orunmylá (oráculos) recebessem orientações de seus Orixás e
ancestrais para alcançarem melhores resoluções nas políticas sociais dos
povos locais. Durante essas reuniões os homens compartilhavam com
Orunmylá e entre sí bebidas e alimentos próprios a ocasião; onde aqueles
que não eram convidados não se faziam vinculados, mantendo-se alheios
aos segredos revelados neste culto preservado de forma fechada. Com o
passar do tempo Oxum flexibilizou estas regras impondo a Orunmylá e seu
povo para que as mulheres também pudessem participar e consultar através
da visão divina (axé de Orunmylá) onde em troca da visão Oxum retribuiria
em fertilidade aos reinos inférteis, devolvendo água as secas e alimento aos
famintos; o acordo foi estabelecido e Orunmylá junto a seus súditos
renderam a Oxum o título de Yalodè (trad. Yiá = mãe, lodè = rua ou do
lado de fora), a que faz oposição as tradicionais posições onde cabiam as
mulheres apenas a passividade e a submissão. As mulheres ganham novos
postos que vão muito além de seus lares e dos serviços domésticos, fazendo
de Yalodè esta expansão de conquistar igualdade entre os sexos, o valor da
independência feminina foi então gerado em Oxum, não por seus maridos e
sim por seus filhos que abrem espaços agregadores no culto a Orunmylá.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

LENDAS

Geralmente quando transmitimos fundamentos através de diálogos


tomamos frequentemente o hábito de agregar lendas, histórias que tem por
objetivo favorecer a compreensão de como as forças da natureza
influenciam a vida, convertem-se forças superiores em figuras humanas,
tais ações se perpetuaram com o passar do tempo na intenção de simplificar
as essências e traze-las para mais "próximo" a nossos vínculos cotidianos
assim transmitindo melhores efeitos de fixação e fácil "entendimento"
sobre vários aspectos assim transmitidos. Sendo os Orixás as origens e
representantes da vida, são eles os portadores de todas as raças; O Orixá é
Santo e Puro, presente em tudo e apresentado em todas formas... sendo
negro, branco, pardo, albino e miscigenado; humano, animal, vegetal,
mineral... Sintetizado como negro apenas por aspectos reflexivos as suas
origens onde primeiramente foram cultuados e também por quem
pioneiramente compreendeu parte de sua grandiosidade, afinal nada mais
justo que a vida encarnada em figura humana receba uma pele nas cores do
povo que nasceu no berço da vida, já que a origem da vida é a Mãe África
então que nossos Orixás sejam negros africanos.

"Para representar os caminhos... as portas, para as portas... o mensageiro;

para o ferro... as armas e as ferramentas... o guerreiro e o ferreiro;

para a união... o encontro... as alianças;

para o equilíbrio... as leis... o juiz;

para os animais... a fauna... o caçador;

para a audição... a orelha... o sentido;

para os vegetais... a flora... o médico;

para as doenças... a ferida... o enfermo;

para os dois... os pares... os múltiplos;

para os rios... o ouro... a beleza;

para o oceano... o barco... o remador;

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

para se mostrar Oxalá se faz em céu... o céu se revela em sol... em luz, em


visão e em olhos."

OBÁ x OXUM

Famosa é a lenda que conta sobre a cega paixão de Obá por Xangô,
fazendo de Obá a portadora de sentimentos e ações gerados por sua paixão
revolta devido à preferência de Xangô por suas outras duas esposas que são
Yansãn e Oxum, tal desequilíbrio a ponto de Obá ser ludibriada por Oxum
e mutilar-se fazendo de sua orelha um amalá (comida predileta de Xangô) e
ofertando-a ao seu amado que revoltado e enfurecido diante a tal ato acaba
por repudiar Obá e Oxum que se transformam em rios de águas conflitantes
ao encontrarem-se.

Sabendo-se que entre seus infinitos aspectos Xangô se faz em forma de


som, Obá se faz notar em audição e Oxum revela-se em intuição, Obá é
razão oposto de Oxum que é emoção, inicia-se o conflito logo onde as
coisas que se ouvem podem ser diferentes das verdades que pressentimos e
que nas sequências do tempo vem a tona em a verdade ser diferente sobre
oque foi ouvido. Revela-se que nas ausências do som os sentidos da
audição tornam-se desvalorizados. A oferta de Obá ao entregar sua orelha
para Xangô mostra a dedicação da captação dos sons, valorizando assim os
ritmos companheiros aos ouvidos, pois desmedida entregaria suas duas
orelhas se preciso fosse; porém entre outras funções traz o fator estético e
também são estruturas internas das orelhas, os ouvidos que nos permitem a
firmeza dos passos, os labirintos que serve de eixo ao equilíbrio ou que em
disfunções chamamos de labirintite (doença causadora de tonturas e
desequilíbrio).

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

XAPANÃ

Quando associamos Xapanã à figura de um homem doente, com o


corpo coberto de feridas e recoberto por uma roupa de palhas que nos
remete a imagem próxima a uma "vassoura ambulante", manifestamos que
suas vestes servem para a contenção das doenças assim como a vassoura
que tem por utilidade afastar as sujeiras, transmitidos aspectos também nas
representações por insetos como as mosca, mosquitos, barbeiros, larvas e
outros os quais além de serem transmissores de doenças como a dengue,
malária e doença de chagas, se fazem presentes em organismos em estado
de decomposição. O Orixá trazido para a forma humana tornou o divino em
humanizado, assim mais próximo a nossa "realidade", podendo sintetizar
na figura do "homem vassoura" ou homem da vassoura os principais
aspectos do Orixá Xapanã, aquele que atua diretamente afastando as
doenças, sejam de elas doenças físicas ou e espirituais. Assumindo também
o caráter de secreto e oculto já que a roupa que o cobre mantém seu rosto e
tronco preservados como um mistério. O Senhor da terra, a pele que reveste
o mundo, da pele que guarda nossos corpos das sujeiras; Senhor da bexiga
e do ânus que expelem os líquidos e sólidos já sem serventias ao
organismo; Senhor das feridas que regeneram os corpos debilitados e das
secreções que em busca de expelir elementos nocivos nos alertam de
infecções.

É quem nos livra das moléstias guardando dentro de sua roupa de


palhas a trombose, a meningite, a leptospirose, chagas, feridas, ínguas,
asma, bronquite, hidrocefalia, infarto, sarna, taquicardia, cegueira, HIV,
alergia, paralisia, hemorragia, cirrose, câncer, tumor, lepra, fratura, necrose,
psicopatia, malária, úlcera, tétano, raiva, hepatite, diabetes, leucemia, cárie,
derrame, reumatismo, artrite, artrose, anemia, surdez, cólicas, cobreiro,
herpes, piolho, pulga, carrapato, sanguessuga, frieira, febre, dermatite,
vírus, viroses, lombriga, tênia, epilepsia, medo, aflição, angústia, enfisema,
sofrimentos, pragas, todos os tipos de doenças e parasitas na manifestação
de um urro de dor. Abau!

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

A MULETA DE OSSAYN

Conscientes que Ossayn o Orixá da medicina em alguns de seus aspectos


surge em forma de vegetais e em lendas aparece como o "homem árvore", o
que seria então a muleta que acompanha este Senhor das matas e florestas?

Partindo do princípio que a muleta é um instrumento de auxílio, não


cabe a muleta sustentar a parte árvore de Ossayn, mas sim servir a sua parte
humana, homem que se mostra carente de uma perna, pois possui uma
única perna assim como o tronco das árvores as fazem completas e
perfeitas em seus aspectos de flora. Então é seu lado vegetal e superior que
auxilia as deficiências do corpo, tais como os galhos que nos cedem as
folhas e ervas para a cura de nossas doenças; os galhos e forquilhas são as
muletas que fazem parte de Ossayn, as árvores que de raízes e troncos e
galhos se fazem partes completas em Ossayn. É Ossayn o portador da
"muleta" que nos sustenta. À Ossayn são atribuídos também os contextos
financeiros, assim conhecidos também como o guardião das riquezas de
Oxum, pois suas árvores são também a matéria prima para o dinheiro, a
fonte da celulose que permite a fabricação de novas folhas... As células de
dinheiro. Senhor da longevidade que revela boa saúde, entre suas
representações físicas também estão os cágados e tartarugas que
semelhantes aos demais aspectos deste Orixá são integrantes a mais de um
reino, tanto em terra onde Ossayn se mostra em formas de árvores, quanto
nas águas como as algas no reino de Yemanjá e juncos nas águas doces
onde reina Oxum, sua representação segue também junto aos pássaros que
de árvores em árvores levam os segredos da flora espalhando sementes por
terra. Ossayn sempre seja bem dito como os pés que servem a nosso
socorro, sejam os pés frutíferos ou não, são eles que servem de nosso
apoio.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

BARÁ x OXALÁ

Contam algumas lendas que Oxalá gerou as formas de existência e


junto a vida gerou Bará que ao lado de seu criador aprendeu como construir
todas as obras; com a vinda do tempo Bará desafiou Oxalá a juntos
descobrirem qual dos dois seria o mais sábio, meio as disputas Oxalá
aproveita-se de um descuido oponente e apodera-se da cabaça a qual
continha as magias de Bará, compreendidos entre muitos um aspecto rival
entre ambos, Oxalá ganha a disputa. Descreve-se Bará como todas as
formas iniciativas as ações e atividades, Oxalá é compreendido como a
conclusão e o repouso, início e fim separados por meios;

Decifra-se que nada pode ser completo e equilibrado apenas em ações


e atividades, quando Oxalá apodera-se das magias de Bará é como dizer
que o descanso se faz necessário para seguir em frente; Dizer que Bará
aprendeu as obras junto a Oxalá é dizer que o Orixá da iniciativa é sabedor
dos aspectos relativos ao Orixá do repouso, ambos estão ligados, porém há
uma disputa rumo ao seguimento, onde por um lado agimos e atuamos em
momentos que poderíamos nos acomodar e em horas que optamos em
descanso que ao contrário poderia ser tempo produtivo. Bará assume a
segunda-feira iniciando a semana com as forças do movimento, abrindo e
reabrindo as portas, os caminhos, o movimento, o comércio e as atividades
em todos os contesto cotidianos antecedido e ao mesmo tempo sucedido
pelo domingo, o dia de Oxalá onde não há horário comercial, aproveita-se
o dia de lazer e para descanso em seguimento ao próximo dia. Bará é o
chão que tudo apara e Oxalá o céu que tudo ampara!

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Xapanã
O poder das forças ocultas.
O Senhor dos mistérios, o Pai da magia.

Em respeito e com respeito a esse Orixá pode-se previamente dizer que


quanto mais distantes os tempos, os sábios da religião mais faziam por
temerem a este Orixá, justo por terem conscientemente que não existem
verdades maiores e mais concretas que os próprios Orixás, sabedores de
que em Xapanã se guardam os segredos mais ocultos não faziam por
invocar ou citar seus nomes sagrados por quaisquer ocasiões, temerosos em
falarem principalmente os nomes Xapanã e/ou Sapatá que podem ser
compreendidos como variações de dialetos sobre mesmos aspectos que
carregam os mesmos significados sejam traduzidos em "Senhor da terra"
e/ou "lepra" fizeram de sua saudação às palavras "Abau" e "Atotô" as quais
podem ser interpretadas como perigo e silêncio.

As origens deste Orixá são vinculadas todas as ordens de malefícios,


cargas negativas, doenças, pragas materiais e rogadas, desgastes físicos e
psíquicos, os chamados "pesos" e demandas sejam espirituais ou não.
Independente de ordens e graus, não há como livrar-se de um ponto
negativo sem o auxílio de Xapanã; relembrando que as coisas não deixam
de existir, embora anuladas ou transmutadas possam sumir e assumir outras
apresentações, mas de uma forma ou outra hão de continuar existindo e
cabe a Xapanã que desfaça, decomponha recolha os males e origens
prejudiciais. Ao contrário dos outros Orixás, é figurado com o corpo todo
coberto, vestido com uma roupa de palha que nos remete a um de seus
instrumentos/símbolos de maior associação, a vassoura. A ele cabe a
exposição das doenças e coisas ocultas; Senhor da pele, o órgão de contato
direto que mais defende o corpo da poluição, Senhor do ânus e da bexiga
que expelem as impurezas do organismo. Limpeza e regeneração se
aproximam como boas referências ao citar Xapanã. Junto a Ossayn formam
as alianças da medicina, enquanto um limpa afastando as doenças o outro
cura trazendo a saúde.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

YEMANJÁ NANÃ E SAPATÁ

Xapanã dividindo seus mistérios com sua mãe Yemanjá Nanã sabiam
que nos fundos dos oceanos não faltavam belezas com que pudesse
presentear sua mãe, foi então que teve a ideia de transmitir as ostras parte
do seu segredo de axé que as permitiria transformar partículas de "sujeiras"
indesejadas em pérolas, sobe a pena de que se abrirem a boca na intenção
de revelar os segredos dessa magia serão junto a isso presenteadas com o
silêncio da morte; ficando assim apenas entre as ostras e Xapanã o poder de
gerar pérolas. É nas coisas fora de ordem que Xapanã reverte negatividade
para que diante da cura a enfermidade reverta-se em axé.

ODÉ

Ao resumir uma das principais lendas deste Orixá pode-se transmitir


que Odé saia diariamente da casa de sua mãe Yemanjá para passear na
floresta, até que um dia em visita a floresta Odé se perdeu meio a mata,
logo conheceu Ossayn e ambos se encantaram a viver na floresta, Yemanjá
convenceu Ogun a buscar seu irmão que estava perdido, ao encontrar o
irmão, Ogun foi surpreendido, pois na verdade Odé não queria voltar para a
casa, retornou Ogun sozinho para a casa de sua mãe.

Ao traduzir esta lenda temos que compreender Yemanjá como um dos


Orixás de origem a vida terrestre, Odé como a fauna, Ossayn como a flora
e Ogun como a civilização;

Na criação do universo a vida animal se fez junto a vegetal formando


ambos o reino das florestas, e os homens como civilizações (Ogun) fora
delas, iam a natureza domesticado os animais trazendo-os para junto de seu
convívio, sendo que o natural aos animais é a vida em seu habitat.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

AS 3 MULHERES DE XANGÔ

Xangô o Orixá rei (significado de justiça, legislação...) era casado com


Yansãn/Oyá, Obá e Oxum; como não dizer que possui três esposas se
Yansãn/Oyá é raio e Xangô trovão, Obá é audição e Xangô é som, Oxum
são cachoeiras onde Xangô são as pedras;

Quando Xangô é fogo Oyá é o ar que alimenta a combustão, quando Xangô


é julgamento Obá é à roda do destino, quando Xangô é vaidoso Oxum
carrega o reflexo da beleza.

Então Xangô vive cercado por estas três mulheres que o destacam e
favorecem.

Yansãn ou Oyá?

Yá = dividir, èsàn = nove, e assim acredito que da junção de Yá/Oyá +


èsàn tenha surgido o significado do nome Yansãn, a senhora que carrega o
posto de mãe dos 9 filhos nascidos mortos que em nossa realidade material
podem ser compreendidos com o parto/carma a nove apresentações do
mesmo espírito/Egun, correspondentes aos 9 oruns(planos espirituais)
citados como referências ao destino de evolução da alma após a morte
segundo como dizem algumas crenças yorubás.

O Orixá Oyá responsável por encaminhar (encarnação/"trazer") os


espíritos a apresentação física(existência/nascimento) ganhou de
Xangô(julgamento) o título de Yansãn como aquela que divide em 9 para
encaminhar(desencarnação/"levar") as almas a seu plano de merecimento;
Neste plano onde a "consciência" atual informa que o primeiro estágio é a
vida e o segundo é a "morte", Oyá pode ser tratada como a versão mais
nova deste Orixá a ser chamada Yansãn Oyá, quanto a segunda parte
retrata-se apenas como Yansãn, ambas são apresentações de um mesmo
Orixá compreendido como a rainha dos Eguns(almas/espíritos). Atuando ao
fixar o espirito ou liberta-lo da matéria, está Yansã/Oyá entre os vivos e os
mortos fazendo do cemitério um de seus reinos.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

OGUN

Diz à lenda que ao chegar a uma cidade procurando por seu filho, Ogun
deparou se com pessoas que agiam em silêncio, sem comunicações como
se estivessem a ignora-lo.

Revoltado com o ato que tomou como afronta sacou de suas armas em
aniquilar, devastando toda cidade de Irê; após estarem todos mortos chega
a cidade o filho que Ogun procurava, informando seu pai de que as pessoas
não o recepcionaram apenas porque era dia consagrado ao silêncio e assim
todos deviam cumprir com seus deveres. Após perceber o erro que cometeu
Ogun sucumbiu em arrependimento para dentro da terra se tornando um
Orixá.

Traduzindo a lenda, Ogun aqui representa o poder dos homens que


instituem a guerra e suas armas; a cidade representa a humanidade (velhos,
jovens, crianças...); o povo em silêncio representa a inocência em relação
as guerras; Ogun entrando para dentro da terra se assemelha a origem dos
metais em seu estado bruto e as riquezas da terra que geram a guerra entre
os povos.

》》》 OTIN >


Para atingirmos um alvo assim como para alcançarmos um objetivo, a
flecha e o pedregulho (ambos representam a ação) necessitam de um arco e
um bodoque (ambos significam os incentivos); sendo assim, podemos neste
caso compreender Odé como os objetos a serem disparados e Otin como os
arremessadores onde juntos um ao outro formam a mira em direção ao
alvo.

Segundo as lendas... Odé, Otin e Ossayn formam as estruturas das matas e


florestas. Ossayn, o médico das folhas representando a vida vegetal, os
caçadores Odé e Otin representantes da vida animal, formando assim fauna
e flora.

Seguindo as lendas... Odé era um solitário caçador que vivia na floresta


apenas com a companhia de Ossayn, foi meio ao desbravamento das matas
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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

e florestas que Odé encontrou a misteriosa Otin entre as magias


alucinógenas, ao se aproximar dela Odé o Orixá regente da
homossexualidade se permitia encantar com o axé da transformação, onde
desafloravam e surgiam Otin, seu lado feminino tão ou mais raro quanto as
espécies extintas ou em extinção, e juntos um ao outro surge Odé-Otin;
possibilitando Odé

"Ao desprender do braço de uma estrela do mar, a estrela se regenera e


nasce um novo braço, o braço desprendido também se regenera formando
uma nova estrela; como o brilho que chega do céu a terra mesmo após a
morte da estrela, e como toda ação natural é a manifestação do Orixá... aqui
podemos destacar a presença de Otin!"

Otin também é o nome de um rio em solo africano, assim como Oyá, Ogun,
Obá, Oxum e Yemanjá, mas vale lembrar que na cultura afro brasileira
tanto os rios como as demais fontes de água doce pertencem ao Orixá
Oxum, não é a nomenclatura de um local que faz o axé do Orixá. Embora
sejam possíveis feituras de obrigações em que Odé receba adjuntó com
outros Orixás que não sejam Otin, para Otin o único adjuntó seria Odé já
que ela depende dele.

Em seus assentamentos também são representados por um casal de vultos


em madeira, onde Odé é a figura do caçador e Otin a caçadora que carrega
um cântaro (jarro) sobre seu orí(o topo da cabeça, parte mais sagrada do
corpo), ação indicativa que sobre a "idéia" de Otin se sobressaem as
essências que a levam e trazem para junto do caçador; entre outros
fundamentos reproduzidos em distintas nações de batuque encontramos os
dois Orixás assentados em um único assentamento, podem ser encontrados
ambos assentados em okutás que se encaixam um ao outro, vultos de
madeira unidos na mesma base, as cores de ambos Orixás formando única
passagem(gomo) de guia imperial, a leitoa para ela e o leitão para ele, onde
as vezes ambos são servidos na mesma vasilha unindo axorô do macho
com a fêmea ou em raros casos onde ambos dividem um único porco.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

YBEDJIS

Ji... Dual, duplo, par... Presente em toda forma de integração, o equilíbrio


entre os lados, o ponto em comum entre lados distintos, o par entre os
ímpares, a união entre um e outro como as cores resultantes das somas
entre cores diferentes que juntas originam uma nova cor, dois em um,
resultados de dois e múltiplos...

Ybedjis, são dois (ou mais) em um... Ybedjis são dois Orixás que formam
um único Orixá, não dois pontos divididos e sim pontos de multiplicação;
estes Orixás juntos são puros e inocentes, "separados/desencontrados"
seguem com as mesmas virtudes, porém com distinção entre "masculino”
/ativo {"pólo negativo” (-)} e feminino “/receptivo {"pólo positivo"(+)},
podendo em partes serem descritos como o menino sendo o
espermatozoide e a menina sendo o óvulo, o encontro entre ambos (fusão)
forma o Ybedjis, ambos são o embrião... Quanto ao nascimento de gêmeos,
um tem regência predominante da menina/feminino quanto o outro é
predominante o Orixá menino/masculino, isto independente do sexo dos
recém nascidos já que na essência os Orixás não possuem gêneros sexuais.

Um dos merecidos aspectos/virtudes desses Orixás está no axé (força) dos


equilíbrios, dos encontros, das uniões, novidades, felicidades e outros...
Quando -1 lá = +1 aqui, quando +2 lá = -2 aqui, Ybedjis traduzem por si as
diferenças existentes dentro das igualdades, a minuciosidade que define um
dos outros, são indicação diferencial entre aparências...

Parecidos mas não iguais... DNA's, tons, impressões digitais são referências
aos Ybedjis.

Representam as divisões para novos encontros e as proximidades para


novos resultados, a parte menino (-) integra a ala dos Orixás de
frente/dendê podendo ser referenciado como Xangô Ybedji, já quando se
trata da parte menina (+) pode ser reverenciada como Oxum Ybedji que por
vez compreende o grupo de Orixás de praia/mel, são pontos diferentes (+ e
-) que unem mel e dendê como um novo axé, não "favorecendo" um para
"desfavorecer" o outro agregando mais mel ou mais dendê, mas sim em
igualdade ficam ambos a completar um ao outro... Medidas equivalentes
entre um e outro... Apresentados como multicoloridos em virtudes que
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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

carregam as cores de todos os Orixás, não é agregado apenas a cor preta


por ser ela a cor neutralizante enquanto os Ybedjis são axés vinculativos,
interconexões e a extensão de encontros entre elementos distintos; parte de
seus fundamentos são encontrados na reciprocidade de um para com o
outro, uma chupeta para o menino (vermelha, azul...) e outra (amarela,
rosa...) para a menina entre outros elementos respectivos de um para o
outro.

Para assentamentos de Ybedjis a um Orunmalé de mel geralmente são


assentados em recipientes de vidro ou louça, já para os Orunmalés de epô
geralmente são assentados em uma gamela de madeira podendo ser uma
gamela redonda. Duas partes que juntas se fazem completas, a iteração
entre as mãos, dois olhos e uma única imagem, a audição entre as orelhas, o
rumo que seguem dois pés, o direito e o esquerdo. Ybedji menino também
chamado de Xangô Ybedji são as consoantes, Ybedji menina também
especificada como Oxum Ybedji são as vogais, ambos são acentos, um ao
outro fazem sílabas que meio a brincadeiras formam palavras...

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

MATERIAIS DE USO RELIGIOSO

Diante as várias formas de praticar a religiosidade encontramos o manuseio


e manipulação de materiais assim como também reverenciar certos
elementos que fazem parte de nossas estruturas como bebidas e alimentos
as quais são interpretadas como bênçãos em nossos dias; fazem parte deste
contexto apenas materiais naturais descartando de todas as formas o uso de
sintéticos.

A função dos elementos materiais tais como potes, vasilhas, pós, sementes
e tantos outros artigos são ferramentas de auxílio para o culto, por suas
emanações de energia, desemprega e desencadeia funções não podendo
jamais um material ter mais importância ou destaque que a própria
natureza; são vinculados por suas origens materiais, como o barro do
aguidal de barro, dos metais as ferramentas de assentamento, das madeiras
as gamelas e os vultos, das canjicas o milho, da carne o animal, assim como
das ervas uma parcela do axé vegetal, e com elas despertamos as magias de
um todo o qual pertencem.

Como exemplos práticos temos em nosso cotidiano a energia estática


depositada nos pentes e escovas após o pentear dos cabelos, como as telhas
de argila que servem de forro para ebós de Yansãn em nossas buscas por
conquista de projetos como a aquisição de uma casa, alianças e
sociedades... Telha agregada aos demais elementos por conter o barro que
retirado do solo e influenciado em forma de matéria prima faz-se na
intenção de telhar uma residência, Deus criou o barro para sustentar as
bases do chão e por intermédio do manuseio oque era de baixo passou a ser
a cima, oque era abaixo dos pés passa acima da cabeça, aí está o axé, a
força invisível; ao ser unida ao telhado e sofrer influências do tempo como
sol, vento e chuva vira está mesma telha a através de magias nela
empregada a liberar uma emanação de axé diferente a que tinha quando
estava a venda. Não praticamos mágicas, praticamos sim a magia.

Vale ressaltar que o Orixá age de forma neutra, porém consciente a cada
ação a qual desemprega, o livre arbítrio nos permite diversas formas de lida
com o Orixá... Como as diferenças de bronzear ou escaldar o corpo diante
o sol, o tênue limite entre ações medidas ou errôneas que se revelam por

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

certo ou errado em nossa própria consciência, sempre é válido preservar a


si e aos outros já que cada ação gera uma reação, as exposições também
devem ser comedidas. Uma oração regada a fel não tem o mesmo sabor do
mel. Tudo se modifica à medida que é conduzido, pois da pedra lapidada se
fazem joias, polida se faz escultural, cortada se revela calçada, em lâmina
se mostra lápide, em tempo é fóssil e cobrindo o corpo é lápide; da árvore a
lenha, os móveis, a sombra e por manuseio imprudente permite o acidente.

O banho e o afogamento não estão na água, o aquecimento e a queimadura


não estão no fogo, o sustento e o soterramento não estão na terra, a
respiração e a asfixia não estão no ar, mas nos elementos naturais estão as
reações cabíveis a cada ação humana. Além desta vida existe o carma
carregado em anteriores e próximas vidas, não existindo um "lugar errado
ou hora errada" mesmo além da compreensão há um motivo para cada
situação.

LIMPEZAS ESPIRITUAIS

Todo e qualquer etapa de ligação com os vínculos aos Orixás deve ser
tomado diante a iniciativa de selecionar aquilo a serem direcionados, os
cereais como milho, feijão, amendoim selecionados, as verduras lavadas, os
legumes descascados e mesmo que para fazer um pedido ao plano superior
a mente tem de estar limpa; assim inicia-se o equilíbrio entre os lados
diferentes, desvinculando o prejudicial do neutro aproximam-se os homens
a seus Orixás.

Procedemos por organizar antes de fazer; Os materiais para as limpezas


espirituais se iniciam por ervas a serem empregadas em sumos, banhos,
chás, defumações e/ou forros que amparam um material a não ser
misturado as influências energéticas de outros, seguidos por ebós
agregados por outros materiais místicos como vassouras sejam de retalhos
ou ervas como carqueja ou guanxuma, velas de cores específicas a cada
propósito, feixes de varas de marmelo, cinzas de madeira, carvão e uma
variada lista de materiais e seguimentos naturais, cozidos, crus, sapecados
em fogo, untados, condimentos e etcs... O procedimento de limpar
espiritualmente visa afastar e neutralizar cargas e fluidos negativos e

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

desfavoráveis, gerar melhores condições, propiciar boa sorte, auxiliar na


regeneração das estruturas enfraquecidas e ajustar o equilíbrio até então
desequilibrado por forças opostas as ideais.

De acordo as necessidades, limpezas podem ser realizadas de forma


individual, coletiva e local como as realizadas em residências, lojas
comerciais e empresas. Os efeitos de uma limpeza espiritual pode de
imediato gerar "efeitos colaterais" aos pontos por ela direcionados, sejam
locais ou individuais, que geram sintomas ligeiramente passageiros e não
agravantes que geralmente ocorrem como sonolência, insônia, fadiga e
ansiedade... Efeitos compreendidos como normais logo após iniciarem os
ajuste das tensões que libertam os indivíduos da negatividade; é como
desfazer as amarras, quebrar as algemas, se libertar das correntes e do peso
carregado com os quais já estavam acostumados ou se acostumando, a ser
exemplificado como o desconforto e dormência do corpo ao caminhar após
um longo período de repouso, ou também como as dores musculares no
momento de descanso após exaustão de longo período exercendo esforço
físico.

CALÇAMENTOS

Basicamente os calçamentos são feitos em duas etapas, os chamados


calçamentos de rua (fora do templo) e os calçamentos de casa que
englobam desde obrigações plantadas no terreno do templo, seguranças de
portas, ecós até os calçamentos de ebós como os realizados na mesa de
quatro pés; as funções dos calçamentos são justamente potencializar os
axés preservando e multiplicando suas forças, são elementos
estabilizadores das vibrações internas e também como filtro das emanações
externas em relação as internas. a exemplo prático pode-se dizer que são
como os sinais ortográficos (vírgula, ponto, exclamação, parêntese,
reticências, acentos e etc...) que auxiliam na organização, transmissão do
melhor sentido, direcionando, vedando lacunas com o plano superior,
conectando um local a outro e barrando coisas duvidosas ou fora de nossos
anseios, excluindo assim toda e qualquer incógnita ou exclamação...

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Firmam, afirmam e reafirmam o propósito dos fundamentos aos quais são


ligados.

Sequencialmente os processos de calçamentos ocorrem no decorrer


posterior às limpezas espirituais locais, aonde após a limpeza do território
se vai à natureza bruta onde potencialmente encontram-se o axé dos Orixás
(cruzeiros, matas, praias e etcs..) para lá buscar o axé fundamental ao início
das obrigações de feituras, como reverências aos Orixás arriam-se ebós
nestes locais que em sequências terão suas forças invocadas dentro da casa
de religião, para que a partir desse ponto de vínculos os axés emanados nos
rituais internos tenham maiores fluências e exatidão, sempre relembrando
que o período abrangente de um calcamento de rua gira em torno de quatro
semanas a 32 dias para menos. Calçar um ritual qualquer que seja tem uma
importância igual ou superior a nivelar um piso por onde vamos caminhar,
evitando possíveis desníveis, o período de calçamentos é o projeto de todo
decorrer de uma obrigação de feituras os Orixás, dele depende o bom
desempenho e condições favoráveis às realizações de um ebó.

ECÓS

Basicamente os ecós são compostos a base de água, fazendo deste elemento


o primordial e mais abundante entre os demais, são feitos de acordo a cada
necessidade e por condimentos típicos a cada Orixá, onde a água é o
elemento de ligação entre as essências e seus valores ritualísticos. As
misturas de seus componentes fazem do líquido uma ferramenta
catalisadora e dinâmica, extremamente ativa com a funcionalidade de
captação as energias em desequilíbrio, estabilizando e canalizando as
cargas presentes no ambiente; de um a outro possuem grandes distinções
entre si, podendo variar de acordo a cada classe de Orixá, o que permite ou
não serem depositados em alguns locais e não em outros. Vamos aqui citar
os ecós mais comuns ao nosso dia a dia.

*Ecó para Bará (água, farinha de mandioca e azeite de dendê).

Tem por principal finalidade absorver as cargas opostas as necessidades de


um trabalho espiritual, abrir os caminhos e reverter situaçõess

68
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

desfavoráveis, é o ecó padrão a todas as ocasiões; antes de arriar ecó para


qualquer outro Orixá deve-se por fundamento arriar ecó para Bará. É
entregue nos cruzeiros, encruzilhadas e em últimos casos na rua e/ou do
lado de fora do portão.

*Ecó para Ogun (água, vinagre e açúcar).

Relembrando as origens, do vinho o vinagre e o açúcar retirado da cana


tem a mesma matriz do álcool e das aguardentes. Vinagre branco para as
classes de quarto de santo, podendo ser utilizado vinagre tinto ou vinho
tinto seco para Ogun Avagãn em casos de fortes demandas. Tem por
função defender o ambiente de aspectos de rivalidade, sejam eles físicos ou
espirituais.

*Ecó para Yansãn/Oyá (água, rosa vermelha, perfume, mel para dentro
de casa ou azeite de dendê para a rua. Pode ser usado para calcamentos
contra Eguns o ecó de água, cinzas de lenha e azeite de dendê).

Quando com mel destaca o poder da sedução, atração e boa freguesia, já os


com dendê servem para proteção espiritual.

*Ecó para Xangô (banana esmagada com mel, água, farinha de mandioca,
e por ultimo gotas de azeite de dendê).

Tem por conceitos conter qualquer forma de desequilíbrio, dando equilíbrio


como o mel e o azeite de dendê, assegurando o seguimento das obrigações,
geralmente é depositado abaixo do acento onde se tocam os tambores.

*Ecó para Odé (água de coco, farinha de mandioca, sete ou oito feijões
miúdos e mel).

O axé é repleto de coisas naturais, o feijão traz a fartura, tendo a água de


coco como representante das provisões do reino vegetal e o mel do reino
animal assegura a fartura. Sempre deve ser despachado no pátio da casa,
puxado do portão de entrada aos fundos.

69
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

*Ecó para Otin (água de coco, farinha de mandioca e melado).

Praticamente têm as mesmas finalidades do ecó de Odé somadas as


virtudes de trazer boas notícias, boas respostas e auxiliar no favorecimento
da cumplicidade em relação aos envolvidos nos atos, porém não se serve
ecó de Otin sem servir o ecó para Odé, pois ela não como nem bebe
sozinha.

*Ecó para Obá (água, sal grosso, açúcar cristal e gotas de azeite de dendê,
quando para serviços ligados ao amor e união coloca-se uma rosa cor de
rosa).

Tem por feições auxiliar nas respostas, decisões e reativação das coisas
estagnadas, como o desembocar das águas doces nas águas salgadas se faz
o duelo entre sal e açúcar para que logo as águas sejam um único oceano.

*Ecó para Ossayn (Folhas deste Orixá maceradas em água, farinha de


milho, mel e sete moedas correntes ou água, erva mate moída e azeite de
dendê).

O ecó com mel pode ser feito dentro de casa para atrair e assegurar a
prosperidade e a boa sorte, assim como também faz proteções a saúde e
resolução de problemas difíceis. Já o ecó com azeite tem por missão afastar
as más companhias sejam elas físicas ou espirituais.

*Ecó para Xapanã (água, pó de café e dendê; ou água com 7 ou nove


pedras de carvão e azeite de dendê).

Torrado é o pó do café assim como queimado é a pedra de carvão, repelem


os processos diretamente nocivos com formas inibidoras da decomposição
aos materiais carbonizados. Como o café se ainda fruto e a madeira se
apenas em tronco; serve como inibidor de perturbações, feitiçarias e magias
danosas. Faz-se indispensável para rituais ligados aos Eguns.

70
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

*Ecó para Oxum (água, duas gemas de ovos, oito moedas, farinha de
milho, mel, perfume e flores amarelas).

Os ecós de Oxum assim como dos outros Orixás podem ter variações de
acordo a cada nação e casa religiosa. Podendo ser feitos com água, moedas,
gemas, mel e perfume; água, farinha de milho, moedas, mel, perfume e
flores inteiras e/ou despetaladas; todos os materiais citados ou apenas
composto por alguns. Dentre tantos temos as gemas da fecundação, as
moedas da prosperidade, a farinha de milho para o sucesso, as flores com
axé de felicidade, a atração do perfume e a doçura do mel. Os ecós de
Oxum, Yemanjá e Oxalá são despachados nos fundos do pátio ou puxados
do portão principal aos fundos, de acordo aos preceitos de cada casa.

*Ecó para Yemanjá e Oxalá (água, mel, perfume e flores brancas).

Este ecó é utilizado para despertar a conscientização individual e a


harmonia em grupo, auxilia nos relacionamentos familiares, amizades,
abranda os pensamentos e permite clareza em todos os sentidos. Quando
somente para Oxalá podemos substituir perfume por talco branco na
intenção de destacar e aflorar a delicadeza, suavidade e passividade num
contexto geral; para Yemanjá Nanã não se utilizam perfumes, a vasilha
deve ser de barro cru (sem pinturas e sem verniz), água, mel, uma pequena
bola de argila fresca e 9 gotas de dendê. de acordo a alguns fundamentos
também podem ser feitos ecós aos Orixás de praia com os caldos
resultantes do cozimento da canjicas somados a mel e perfume, canjicas
amarelas quando para Oxum e canjicas brancas para Yemanjá.

*Ecó de Axorô (água e axorô)

O ecó de axorô também conhecido por ecó de sangue é feito durante o


ritual de sacralizações aos Orixás, onde ao desprender o axorô toma-se por
respinga-lo em um aguidar/vasilha contendo água, para que ao término da
liberação do axorô, sejam despachados na rua ou no pátio (a fundamentos
de cada Orixá) como uma saudação honrosa em memoria a todos que um
dia foram iniciados no culto a determinado Orixá, entregar o axorô de
forma sagrada é agradecer a vida. Assim como quando preciso for a
liberação do axorô em um ebó realizado diretamente na natureza (fora do
71
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

templo) o mesmo deve ser respingado na terra, já que o culto aos Orixás é
herança ancestral, vinculamos assim uma forma de respeito a nossas raízes.

*Ecó para Egun

Os Eguns possuem uma grande variedade de ecós específico a cada ritual


tais como ecós de arrisún, ecós de velório, ecós de calcamento, ecós de balé
e ecós para serviços com os mesmos. De ecós feitosos com mierós de ervas
de quebra (amargas), ecós com velas quebradas até ecós de fogo. Cinzas,
pós de carvão, colorau, pó de café, erva mate moída, pedras de carvão,
vinagre, azeite de dendê, bebidas alcoólicas, sal grosso, óleo de rícino e
farinha de mandioca são alguns dos materiais mais empregados nos cultos
aos Eguns; sempre depositados em vasilhas de barro, louça ou vidro...
Quebrados, lascados e/ou trincados.

A administração de magias deve ser feita apenas por iniciados na religião


que tenham ao mínimo o axé assentado e conhecimentos necessários a cada
situação, com a devida autorização de seus Babalorixás quando ainda não
liberados com o título de sacerdotes; pois a ordem de dispor os
ingredientes, dias para serem feitos e despachados, certas medidas como
quantias e quantidades dos materiais a serem empregadas, assim como as
avaliações, variações ocorridas no ecó e suas interpretações as reações
presentes cabem apenas aos religiosos, pois existem regras e proibições que
possibilitam ou não o bom resultado das fórmulas.

72
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

OPETÉS

O opeté é um dos grandes fundamentos nos cultos aos Orixás por seu poder
representativo, é utilizado desde os axés de frente ("oferendas"), serviços
até seguranças e calçamentos; na maioria dos casos é feito de batatas
inglesas descascadas, cozidas em água, amassadas e moldadas em formas
semelhantes a um cone, podendo também ser e terem outras formas como
arredondados, chatos, piramidais, em formas de pêra, porongo, pés,
corações, cabeças, mãos e etc... Seus ingredientes e temperos variam de
acordo a cada função e ocasião, podendo ser com ou sem cascas, de batatas
doces, canjicas cozidas e esmagadas, farinha de mandioca, farinha de milho
etc... São "temperados" de forma individual, mesmo que em uma ocasião
todos sejam de batatas inglesas e de formas cônicas, o primordial não são
os materiais e sim o axé que emanam, sendo rolados e polvilhados em pós,
como pó de carvão, pós de tijolo, colorau, pó de telha, pó de anil, erva mate
moído, café, terra, adornados por moedas, grãos e etc... Podendo ser estes
"temperos" compreendidos por complementares as ações e reações
espirituais.

Opetés servem de barreiras contra o inoportuno, são limitadores de


território espiritual sobre o material, preservando harmonia, equilíbrio e
proteção contra interferências e influencias opostas aos seguimentos locais,
representam despertam poder e a força, servindo de ícones aos principais
pontos de atuação desejada, canalizando o foco das energias em questão.
Transmutam, revertem e inibem energias e cargas negativas para que se
transformem ao positivo ou apenas fiquem nulas; servem como ímãs e
filtros que em seus amadurecimentos revelam suas ações contra as
demandas, com efeitos percebidos nas formas como afloram em bolor,
amolecer, enrijecer, desidratar, descolorir ou criar nova coloração.
Costumeiramente quando fazemos um ritual com maior período de
duração, envolvendo a comunidade religiosa e com visitações públicas,
tendo assim maiores emanações por vínculos e energias, fazemos a limpeza
espiritual do local e em seguida fazemos os calcamentos de opetés para que
ali se preserve o bom desenvolver das atividades em sequência; Forrados
por folhas de mamoneiro são depositados para Bará um opeté com dendê
na parte frontal da casa, seguindo ao meio do pátio um opeté rolado em
cinzas para Yansãn/Oyá e nos fundos outro com pó de carvão para Xapanã,
73
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

ferramentando os Orixás em nosso território para que Bará bloqueie as


perturbações mundanas, para que Yansãn/Oyá afaste as perturbações
espirituais e Xapanã neutralize magias e vibrações adversas ao culto. os
opetés podem ser posicionados e feitos a critério de cada casa, depositados
no pátio, na rua, próximos aos assentamentos dos Orixás de rua, acima das
portas, forro, plantados no chão, ocultos ou a exposição; assim como para o
auxílio de sanar um depressivo se soma a outros elementos uma cabeça de
canjica branca regada a mel para Yemanjá, para acalmar um hiperativo ou
rancoroso faz-se a cabeça de canjica branca com mel, abafada com algodão
para Oxalá... Quando possível liga-se a pessoa em questão através do axorô
escorrendo nos elementos e marcando as fontes da cabeça; para auxiliar nos
movimentos e giros comerciais deposita-se na porta principal do
estabelecimento um opeté piramidal cravejado por moedas, podendo ter
sementes e cereais, temperado a mel ou com mel e dendê; para receber
dívidas financeiras se faz um opeté de farinha de milho e mel, cobrindo o
fundo de um prato onde se marca a massa com as palma das mãos abertas,
agregam-se os nomes dos devedores e moedas; para reavivar a paixão e a
atração oferta-se junto a outros axés de Yansãn/Oyá um opeté de batata
doce em formato de coração com uma rosa vermelha cercado por rodelas
de batatas doces.

COLHEITA

A natureza e seus elementos são indiscutivelmente necessárias a vida, em


suas apresentações básicas tem o oxigênio que respiramos, o fogo que nos
aquece, a água que nos hidrata e a terra que nos sustenta, seguidos por suas
manifestações em desdobramentos como animais, minerais e vegetais.

Diante os princípios religioso de culto aos Orixás, devemos agir por


valorizar e honrar as vidas ao interpreta-la como um desígnio com funções
que muitas vezes ultrapassam a nossa racionalidade e entendimento devido
as presentes limitações em que nos encontramos em vida, onde nesse
espaço de passagem o orí (alma) permanece vinculada ao físico, um corpo
material; desta forma somos conduzidos a respeitar todo e qualquer

74
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

elemento natural como materialização das irradiações de um plano


superior.

Tudo está onde deve estar, nem uma folha se desprende de uma árvore sem
um devido propósito de origem divina.

Antes de recolher da natureza algo que a ela pertença devemos saudá-la


pedindo seu agô (licença), para que junto aos materiais possamos carregar
o axé dos mesmo sem que se desprendam no momento da colheita ou antes
do período adequado, preservando assim oque chamamos de essências do
Orixá. Antes de qualquer coisa a ser realizada pedimos agô ao Orixá Bará
pois é ele o propulsor do universo, em seguida saúda-se o Orixá
responsável por determinado reino, a exemplo se formos colher ervas
devemos então saudar Ossayn por ser ele o Orixá das folhas, em seguida
devemos saudar o Orixá específico/envolvido dentro de determinado reino,
pois além de Ossayn ser presente nos vegetais cada um deles carregam
essências ligadas a outros Orixás, se as folhas forem colhidas para
fundamentos de Ogun saúda-se também Ogum, a árvore envolverá um
fundamento para Odé-Otin, Obá e Xapanã estes também devem ser
saudados para despertarem os axés necessários e assim por diante.

FERRAMENTAS DE ORIXÁS

A princípio os homens carentes de uma concretização da fé formavam


símbolos e deles faziam sua religião, assim também ocorreu nos cultos de
matriz africana. Embora o Orixá não necessite de fetiches os homens que
os seguem fazem dos mesmos um material de apoio a seus ideais e crenças,
transfigurando propósitos superiores a suas atuações em formas palpáveis,
fazendo destas ferramentas/símbolos ligados/representantes dos axés
(forças) dos Orixás.

Com os axés de abrir e fechar os caminhos, surgiram as chaves que


representam Bará;de Ogun vieram os metais, dos metais vieram as forjas e
o poder sobre as armas e a guerra se fizeram espada nas mãos de Ogun; de
Yansãn/Oyá surgiram os ventos, para Yansãn se fez o leque que desloca o
ar e a espada de lâmina segmentada como raio a ser segurada pela

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

tempestade; com o surgimento da justiça coroada ela própria acima do bem


e do mal, carrega Xangô em suas mãos um machado de duas lâminas; do
animal para o caçador, do caçador ao arco e flecha nos comandos de Odé e
Otin; da evolução veio a roda e a revolução sob o poder de Obá; os galhos
se fizeram em bifurcações e com elas as muletas para Ossayn; da magia e
no poder de afastar o indesejável a vassoura foi entregue a Xapanã; no
poder do ouro, da beleza e dos reflexos das águas os espelhos, dos rios as
peneiras para o ouro pertencente a Oxum;das correntes marinhas surgiram
as âncoras, lemes e remos para Yemanjá; em passividade e velhice Oxalá
se apoiou em um cajado.

Ferramentas estas que entre muitas outras podem ser apresentadas


nas mãos dos Orixás enquanto se manifestam dançando como sinal de
portadores/manipuladores de poderes divinos ligados a diversos aspectos,
em seus assentamentos como confirmações de seus domínios e como
enfeites da casa de santo indicando as forças que ali se fazem presentes.

EBÓ

Praticamente toda estrutura de fundamentos religiosos de origem material é


sintetizada através dos ebós aos Orixás; ebó é o termo que generaliza e
abrange a todo alimento sagrado, comidas, bebidas e seus derivados, abadô,
acarajé, miãn-minhãn, amalá, omolokun, axoxó, acaçá, atãn entre outros
são os mais populares ebós oferecidos aos Orixás e servidos ao povo.

Ofertamos o ebó às divindades em virtude da fé, já que os alimentos são


partes e desdobramentos dos próprios Orixás que em axé materializado
permite-nos o sustento físico; o alimento que nos é fornecido no Orixá e
pelo Orixá é retribuído nas formas e maneiras que estão a nosso alcance,
que após sua preparação se compreende como ebó. Em todos os postos da
religiosidade fazemos com que o concebido e concedido através de axé seja
sagrado e valorizado retornando ao que há de maior, o próprio Orixá.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

De fato o sustento e a origem do ebó estão no Orixá, já sua preparação cabe


a nós... Cozinhar para o Orixá se tornar uma ciência divina onde para Ogun
o ferreiro, se assa a carne sobre as brasas como a forja dos metais, para
Yansãn a manifestação dos raios o feijão miúdo é moído em pedras como a
busca por fagulhas e faíscas que abençoam o preparo do acarajé, Xangô o
rei e o fogo tem seu amalá cercado por uma coroa feita de bananas e
depositado dentro da gamela de madeira que também alimenta o fogo, as
canjicas de Oxum o Orixá da fertilidade não recebem cravos Índia por
conterem substâncias abortivas, mas os mesmos cravos são quem
perfumam o doce de abóboras pertencente à Yansãn/Oyá por ser o Orixá
das seduções, das paixões e atrações; preparar e oferecer ao Orixá se faz
um ato de químicas a desencadear reações positivas e proveitosas em
nossas vidas, assim como sinal de convicção nas crenças; é prestar algo que
poderia ser nosso, materiais que serviriam a algumas de nossas
necessidades, sabedores que em devoção a um bem maior seremos
retribuídos e notados pelas forças superiores a quais quer que sejam nossas
dificuldades. Ao acender uma vela para o Orixá, não temos a pretensão em
iluminar a luz infinita, nem se quer orientar o onisciente, apenas ofertamos
nossa fé através da humildade contida em um ato simbólico de dedicação e
respeito, o principal se faz ao irradiar pensamentos as forças superiores,
pedindo que a luz se faça em nosso espírito a fim de repará-lo,
despertando-nos para a consciência do evitar o mal, pois uma vela por sí só
não é mais além que um pedaço de barbante e parafina. Materiais são
absolutamente dispensáveis as essências do Orixá, já que na divindade
cabem todas as formas de regência, porém são indispensáveis para a
materialização física e aos serem feitos de matéria. Do Orixá vem o
alimento e os ebós a ele depositados são feitos dos mesmos alimentos que
consumimos, prova de que são os Orixás que nos nutrem e sustentam e
jamais foi ou será ao contrário; ao arriar determinados ebós devemos nos
restringir do consumo dos elementos que os compõe, essa ação faz por
valorizar nossas devoções onde tais alimentos são dedicados apenas aos
Orixás. Já nos ebós servidos ao povo em dias de obrigações e festividades,
primeiro servimos os Orixás para que depois então sejam partilhados como
bênçãos entre adeptos e simpatizantes ao culto.

Citando alguns dos elementos e preparos mais comuns encontrados na


cozinha dos Orixás, temos os axés secos, frentes ou oferendas como se
queiram chamar... Nos axés de Bará encontramos as ligações diretas com a

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

terra e suas mutações, como os caminhos mais firmes aos passos... Que não
encontremos água nem lama ao passar, assim assando e torrando seus
ingredientes para retirar o líquido, regados por azeite de dendê que entre
outros aspectos age com repelente e impermeabilizante de água; assam-se
as batatas por serem representantes do chão, na transformação onde os
líquidos secam em vapor temos o estourar das pipocas, o opeté representa o
poder e a força dos caminhos... Cozido em água, mas que só toma forma
sólida e firmeza após o escoar do líquido, os milhos que quanto mais
distante for a classe do Bará em relação a praia mais torrados e escuros se
fazem. Como Ajelú sendo o Bará de praia também pode receber axoxó
(milho cozido) e o Bará Lodê por ser o mais distante d'água só recebe
abadô (milho torrado) mais torrado que as outras classes ficam em
evidências os contrastes entre as cores da areia e as cores da terra.

Nas costelas assadas para Ogun encontramos a semelhança do preparo com


a forja, do fogo as brasas e das brasas o fogo que temperam os metais e que
assam a preparam a carne, a proteção desempenho das armas e ferragens
aqui se fazem nos ossos que sustentam o corpo; assim como em sua bebida,
o atãn representante da união entre Ogum e Yansãn/Oyá, laranja e maçã, é
a maçã que oxida como os metais aos efeitos do ar, porém são as essências
encontradas em Ogun como na bebida que permitem a
fuga/"aproveitamento" da esposa assim como o ácido da laranja preserva a
oxidação da maçã. Nas pipocas de Yansãn/Oyá temos os efeitos
climáticos... Entre frio e calor, as estações climáticas, o estourar das
pipocas e o desabrochar das flores... A maçã do desejo e da paixão... as
batatas doces fritas em rodelas como alianças ou assadas concretizando
nossos desejos. No amalá de Xangô encontramos uma coroa de bananas
que destacam os aspectos simbólicos da realeza, as folhas de mostarda
picantes como o fogo que ao cozinhar perdem seu ardor para que o
julgamento seja misericordioso, a maçã ao centro destacando seus vínculos
com as paixões por Yansãn/Oyá, Obá e Oxum. Costela e chuleta de porco
nas frentes de Odé-Otin representam a caça, o macho e a fêmea, o caçador
e a caçadora. Representando o desenrolar do progresso, o rumo aos
objetivos temos as rodas/rodelas de abacaxi, a canjica amarela junto a salsa
como o encontro das águas doces com as águas salgadas, o feijão miúdo
como o atalho do caminho mais curto. Ossayn tem os vegetais e as folhas
como a couve, alface, mamoeiro, figos como ampolas de saúde, o opeté em
forma de cabaça associado à contenção de poções e elixires da cura.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Xapanã é representado nas chagas, no amendoim temos a pele que descasca


como feridas, o milho amarelo como as secreções, o feijão preto como a
gangrena e as pipocas como as bactérias que proliferam mais e mais junto
ao calor, são levados ao fogo para serem torrados como o sanar das feridas,
já sem líquidos e sem inflamação só tendem a regeneração. Ybedjis,
gêmeos com seus axés de dualidade, pares de doces e guloseimas da
mesma qualidade, duplas de pequenos brinquedos, a infância, novidades e
alegrias. O Orixá das águas doces recebe quindins em números pares, como
a doçura dos ovos, dos óvulos, da maternidade... Com dourado das pepitas
de ouro e o reluzir das águas doces se fazem as canjicas amarelas para
Oxum. Yemanjá, a dona da prata e Senhora das pérolas, aquela que tem o
piso de sua morada na areia do mar e o brilho de seu reino nos reflexos dos
sais e dos cristais tem seu brilho refletido na canjica branca, também
representada nos cocos como seus porta joias que guardam água lhe são
ofertadas cocos, cocadas e em merengues que de claras em neve e açúcar se
assemelham a espuma do mar. Oxalá, Orixalá por ser o Orixá do Orun
(Céu) tem sua imagem infinita refletida nos oceanos, revelando assim uma
proximidade em semelhanças com Yemanjá, igualdade, humildade, paz...
Tem seus ebós compostos em leveza e suavidade, destacando as cores
brancas, seja em canjicas brancas, cocadas que do coco carregam axés de
clareza, limpeza e pureza como as águas da chuva, ou em merengues leves
como as nuvens que decoram o céu. Quando ameixas pretas e secas
representam os olhos e a visão em Orunmylá. Todo ebó carrega um axé, e
todo axé faz parte de um segredo do além e maior a nossa compreensão por
isso possuem etapas e seguimentos; de acordo a cada fruta e função a
desempregar devem ser fatiadas, descascadas, cortadas em gomos ou
receber uma marcação feita com a lâmina de obé em seu topo fazendo a
formas de "+/x", já que o Orixá não se alimenta com a boca procedemos
assim para sermos abençoados com o melhor e mais fácil desprender do
axé das frutas; nas formas de cozinhar, assar, fritar e temperar, assim como
o "regar" dos ebós que geralmente são feitos com azeite de dendê, mel ou
azeite de dendê e mel, de acordo aos fundamentos ligados a cada classe de
Orixás... o azeite de dendê, óleo extraído do fruto do dendezeiro assim
como o mel possuem larga aplicação na culinária e nos cultos afro-
brasileiros. Na religião dos Orixás, são substâncias fortemente portadoras
de axé.

79
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Os pratos assumem estéticas próprias nas maneiras de servir, nas


organizações, nos acompanhamentos de pirões e farofas de farinha de
mandioca, molhos, doces e etc... As escolhas de utensílios, potes, vasilhas,
tigelas e pratos, sejam de barro, de madeira, de louça ou vidro, variam de
acordo a cada receita, dando assim maiores sentidos fundamentais aos axés
do ebó. Todas "manipulações" de magias tais como as ligadas as entregas
de ebós exigem invocações, sejam em palavras chaves, rezas, axés
cantados, saudações e etc...

ERÚ-EBÓ / ERÚ

O ebó erú, troca de vida ou simplesmente erú como mais são conhecidos,
consistem em reverenciar a vida e a morte através de um ebó... Através da
ligação dos alimentos são entrelaçados Orixás e Eguns em um mesmo
propósito/atuação.

São feitas então as junções de ebós para os Eguns com os ebós para os
Orixás, faz-se um banquete onde a vida e a morte sentam lado a lado, pois
entre esses dois planos estão os seres humanos, recebem a mesma toalha e
os mesmos pratos, servidos entre alimentos de todas as espécies e origens,
dos crus aos cozidos. É uma "mesa" com alimentos, bebidas, velas, flores,
utensílios, pombos, aves e até quadrúpedes ofertados aos ancestrais e
antepassados em busca das curas para o físico por meios do espiritual.

Entregues em tabuleiros, toalhas arriadas ao chão, balaios de vime ou


sacos de pano que geralmente são despachados em mato, praia ou
cemitério. Troca-se o prejudicial em uso por um descartado em boas
condições.

Espiritualmente entrega-se a parte prejudicada e em troca recebe-se uma


parte em bom estado, exemplificando seria como recolher os frutos
saudáveis de uma árvore recém-tombada; algumas de suas interpretações o
reverenciam como sendo um transplante espiritual/astral ligado às energias
desperdiçadas.

80
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

"Se Olorun não permitisse as trocas, não depositaria os remédios e as


curas encontradas na natureza, como assim também não seria possível o
germinar de uma semente após a decomposição de seu vegetal de origem,
podendo ser árvore, flor ou fruto" Conhecimentos sobre os dogmas, como
os modos e locais de "entrar e sair" se fazem sempre de suma importância,
pois certos procedimentos mal conduzidos e de precárias administrações
podem gerar uma "ida sem volta" para qualquer que sejam os envolvidos.
Todo ebó consiste por seguimentos do início ao fim, exigem um minucioso
estudo e aprendizado em saber diferir materiais e etapas de procedimentos.

SACRALIZAÇÃO DE ANIMAIS

Em contextos de culto aos Orixás a palavra sacrifício deve ser entendida


como em sua origem que do latim foi definida por "ofício sagrado", não
encarando nossas formas de ofertar como sacrifícios a entendimento
popular e sim em fazer sacro, sendo assim, sacralizar para que então algo
seja respeitado como sagrado; assim sacralizamos não somente os animais,
mas também os vegetais e minerais, na fé em que toda forma de existência
natural porte em si essências de Orixá, gerados por Olorun tornando-se
assim sagrada por conter seu próprio axé, só podendo ser corrompido a
profano o ser racional até os pontos atingidos pela consciência. Todo e
qualquer animal é considerado como sagrado, cada qual com suas
importâncias e axés. A origem em proceder por sacralizações está a
exemplos das leis naturais, em sí mesma a natureza se gera e alimenta, em
sua perfeição torna-se autossuficiente... Como suporte a vida, temos a
cadeia alimentar, vegetais que alimentam animais, vegetais e animais que
alimentam outros animais e os homens, "por último" os decompositores
que ao se alimentarem de todos os outros geram nutrientes aos
"primeiros"... Assim todas as formas de vida se interligam por relações
alimentares, compreendidas como um ciclo de axé que percorre todas as
formas de vida, axé (energia) o qual é chamado de axorô. Quando um
praticante da religião promove uma celebração festiva em prol de gratidão
a seus Orixás, são providenciados alimentos ao povo, assim se busca por
sacralizar os animais a serem preparados e em seguida compartilhados com
a comunidade religiosa, seus simpatizantes e pessoas carentes. Estipulam-

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

se os animais de acordo as correspondências de axé com os Orixás


homenageados, antes de compartilhar o alimento com a comunidade são
retiradas, deles as partes compreendidas como mais ligadas ao axé como o
axorô e as inhelas. Alguns dos pré-requisitos para a liberação de axorô é
que seu ritual seja executado por um sacerdote, o obé a ser empregado deve
ser de fio liso e extremamente afiado, o animal deve ser bem alimentado e
limpo a ser vestido com uma capa de tecido confeccionada com as cores do
Orixá ao qual está sendo sacralizado; antes do início do corte o sacerdote
apresenta o obé a todos os presentes pedindo agô (licença), onde é
retribuído pelos presentes com a palavra agô. O animal a ser conduzido por
iniciados prontos deve caminhar por vontade própria até o quarto de santo,
atraído por um prato contendo grãos de milho e um ramo de folhas verdes,
é induzido a dar uma volta completa ao redor da toalha estendida no chão
que por sua vez também é fundamentada com calçamentos em suas
extremidades.

A liberação do axorô deve ocorrer de forma rápida, precisa e com prática,


presando em agir com as medidas cabíveis evitando o sofrimento dos
animais. Basicamente os utensílios que amparam o axorô são previamente
preparados, a fim de fixarem o axé, caso haja respingos fora das vasilhas,
devem ser limpos os locais logo em seguida a fim de respeito com o axorô
em não desperdiçar tais elementos, sagrados a religião de matriz africana.

Um a um dos animais sacralizado são depositados na mesa e em


sequências finais recebem novamente determinados rituais, para serem
levantados a fim de seguirem aos preparos culinários.

Os couros são preparados para a confecção de tambores, a carne é


compartilhada com o povo assim como os miúdos são servidas como
sarrabulhos, as inhelas preparadas e depositadas como confirmações ao
axorô que por sua vez é devotado para os rituais de vínculo aos Orixás. Já
as pouquíssimas partes que sobram tem por utilidades em nutrir a terra.

Passados os prazos em que o axorô desprende todos seus nutrientes


elementares aos pontos de fixação são realizados os rituais de levantação
que de acordo ao axorô empregado levam um período de duração mínima
em 24 horas até um limite máximo de 8 dias que geralmente não
ultrapassam de 4 a 5 dias arriados, onde tudo é responsavelmente devolvido
a natureza.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

"Sacralizar ao Orixá é devolver a natureza a própria natureza..."

Atitudes contrárias a estas margens religiosas não passam de maus tratos


aos animais, crueldade e assassinato.

ERVAS

Dentro das essências das folhas são encontradas partes dos axés dos Orixás,
cada erva com seu Orixá e cada Orixá com/em suas ervas, mesmo que
todos vegetais pertençam ao axé de Ossayn assim como compõe a flora.

Sejam nas ervas maceradas em água para a formação de mierós;


esmagadas e /ou rasgadas, em infusões para beber ou para banhos, secas
para serem utilizadas em defumações, ou "simplesmente" apanhadas para
servirem de forro a algum ebó e etc... São sempre sagradas, indispensáveis
e primordiais a qualquer fundamento, feitura e iniciação, pois delas se
desenvolveram os outros axorôs, detentoras do sangue/axorô verde,
ancestral e necessário a todas as formas de vida.

Divididas em dois principais grupos, as ervas azedas ou amargas mais


utilizadas em feituras aos Orixás de guerra/secos e do dendê a exemplos a
carqueja, gervão e losna... Assim como as ervas doces ou de cheiro, mais
empregadas aos fundamentos para Orixás cabeças grandes/d'água e do mel,
como: alecrim, alfazema, manjericão... As ervas de direita ("azedos") são
detentoras predominantemente em axés que repelem a negatividade e seus
fatores como: afastar doenças, perturbações, desgastes... Já as ervas de
esquerda ("doces") tem a maioria de seus axés empregados em prol de
atrair a positividade e boa sorte... Propiciando saúde, calma, prosperidade...

Distintas entre suas propriedades e utilidades purificam, limpam,


revigoram, fortalecem, energizam e magnetizam elementos... Podendo ser
utilizadas sozinhas ou formando um conjunto de ervas que como todas as
essências são administradas com recomendações e também com restrições,
podendo até mesmo uma erva quebrar ou interferir nos efeitos de outras.

83
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Cabendo assim a um sacerdote, abranger os conhecimentos necessários


sobre suas manipulações, que podem além de simplesmente anularem as
forças umas das outras, causar efeitos colaterais a quem foi ligado com suas
influências; tais exemplos não podendo um filho de Oxum, Yemanjá ou
Oxalá ter a cabeça e seus assentamentos de eledá como borí e Orixá de
cabeça lavados com a erva espada de São Jorge, assim como não se devem
usar as folhas de pitangueira e bananeira entre outras em feituras de
elementos ligados a Bará; dentro do contexto ainda existem ervas padrões
que podem ser utilizadas em todos ou quase todos os fundamentos de
Orixás como as folhas de orô (boldo baiano), guiné e alevante.

Para colher uma folha basta arrancá-la do galho, porém aos conhecedores
dos fundamentos, nada se faz sem pedir licença as forças que o regem,
pede-se então o devido agô ao Orixá Ossayn, saudando a natureza, para que
não se colham apenas as folhas em seu físico, mas para que com ela venha
o axé, parte de sua alma, suas bençãos, a força sagrada de cada Orixá; em
destaque, deve-se ressaltar que nos fundamentos do culto aos Orixás as
ervas tem suas utilidades que além de litúrgicas servem como clínicas,
terapêuticas e gastronômicas.

Na intenção de fazer uma colheita mais abundante, procedemos em colher


as ervas ao entardecer, entre hs.:18:00 e 06:00 pois como Olorum tudo fez
com um propósito, assim, durante o dia os vegetais absorvem o gás
carbônico que revertem em oxigênio liberado durante os períodos noturnos,
em outras palavras de interpretações religiosas é dizer que Deus ao fazer os
vegetais ordenou que diante a luz solar absorvessem e com o por do sol
liberassem suas forças para suprir as necessidades do reino animal, dentre
elas o axé e entre ele os homens.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

AXORÔ
"O hálito de Olorum é vida, quanto o Axorô é sua saliva."

Axorô é o termo yorubá empregado ao elemento de vínculo a todos os seres


vivos, fato é que: sem sangue não se vive... Porém, é de extrema
importância ressaltar que; oque nos importa no meio religioso não são os
derramamentos de sangue e sim o axé encontrado no axorô, que por sua
vez é indiscutivelmente o mais ativo condutor das sagradas essências de
axés dos Orixás.

O sangue serve como veículo de axé, contensor do axorô e nele são


encontradas as emanações de axé, tanto que todos os elementos a serem
emanados com o axé de axorô de origem animal, devem antes ser
imantados com banha de orí entre outros preparativos para que não sejam
incrustados pela parte "física" do axorô, permitindo assim uma melhor
penetração, fixação e aproveitamento do axé que realmente interessa ao
culto.

Do sangue verde temos o axorô das ervas, que para os Orixás de praia são
encontrados nas ervas doces, e nas ervas amargas, quando para os Orixás
de guerra, sangue verde dissolvido (macerados) em água, assumem as
formas de mierós/amacís. Do sangue branco, temos o axorô extraído da
casca do ibí(lesma africana), que o guarda como uma ampôla interna ao
final do caracol. Do sangue vermelho temos o axorô frio dos peixes e o
axorô quente das aves, dos caprinos e suínos.

Dentro dos três principais grupos sanguíneos (verde, branco e vermelho)


temos ainda um subgrupo compreendido como de axés universais na
questão de servirem com axé a todos os Orixás... Por exemplo, do axorô
verde temos as ervas orô, guiné e alevante. Ervas estas que servem para
feituras a qualquer Orixá, assim como do axorô branco temos o ibí, do
axorô vermelho temos o frio dos peixes pintados e do quente o axorô dos
pombos brancos... Fatores estes que fazem do axorô universal uma
possibilidade padrão a maioria das feituras religiosas independente do
Orixá envolvido.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

*Pombos
O axorô extraído dos casais de pombos são geralmente mais utilizados
como axé de selagem as demais emanações de axorô, tornando-se assim
um dos últimos elementos nas sequências do axorô a ser utilizados, o axorô
do pombo cobrem todos outros axorôs... Já outros fundamentos seguem por
aplicar este axorô como uma espécie de revestimentos/estabilizador para
que então sejam empregados outros axorôs vermelhos de axés mais
"impactantes"; o pombo e a pomba portadores de axorô com polaridades
diferentes entre si, o axorô "macho"(-) somado ao axorô "fêmea"(+) geram
um elo de ligação aos originais permitindo conexões entre elementos
sucessores e antecessores, o ponto agregador entre distintos, é o axorô dos
pombos o propulsor das interações/interligações entre orí físico e orí
espiritual, o laço entre as partes dos adjuntós e etc...

* Ibí/Ebí
Os ebís (lesmas/caramujos nativos) são animais bissexuados, um único ebí
possui órgãos reprodutores tanto masculinos quanto femininos, podendo se
reproduzir com outro bissexuado em reprodução cruzada, onde o órgão
masculino fecunda o feminino do outro e ao mesmo tempo tem seu órgão
feminino fecundado pelo masculino do outro, ou sendo ele mesmo capaz de
se auto fecundar sem a necessidade de um parceiro para reprodução... é o
ebí um animal auto fecundo que de certa forma se assemelha ao axé do de
Oxalá (o Orixá da criação) por gerar a vida de forma autônoma, entre
outros aspéctos que fazem do axorô branco um elemento de axé universal e
abrangente as obrigações de cabeça aos filhos de todos Orixás, semelhante
ao axorô encontrado na junção do casal de pombos brancos.

No axorô dos ebís naturalmente encontram-se o "plasma hermafrodita" de


cargas assexuadas próximas à realidade da alma humana a ser revitalizada
por este axorô; a constar de tamanhas importâncias presente no ebí que
também é reconhecido com o termo 'boi de Oxalá'.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

* Peixes
Nos vínculos ritualísticos mais comuns onde é empregado o axorô frio
encontramos os peixes pitados que servem aos rituais de todas as classes de
Orixás e os jundiás que por sua vez são específicos apenas aos
fundamentos de Orixás de rua. O axorô frio sempre é empregado nas
sequências posteriores às obrigações de levantação do axorô de
quadrúpedes, ofertado por exercer justamente a função de "resfriar" o axorô
quente, em outras palavras é o mesmo que dizer que o axorô frio serve de
fixador das intensas emanações do axorô quente, portador de axé contensor
deve ser empregado como um conservador/conservante as propriedades do
axorô quente, evitando desprendimentos, desgastes e desperdícios
espontâneos aos axés antecessores.

O peixe é símbolo de rumos de boa sorte, progresso, fartura,


prosperidade, felicidades e realizações...

* Quadrúpedes
Dentro da religião as obrigações que envolvem a sacralização de
quadrúpedes são popularmente conhecidas como obrigações de "quatro
pés", envolvendo de formas mais comuns a utilização de cabritos, cabritas,
bodes, cabras, carneiros, ovelhas e suínos, para "portar" uma obrigação de
quatro pés o indivíduo tem de ser antes iniciado gradativamente com
obrigações de mierós (lavagem com axorô verde), mieró coberto (axorô de
aves diluído em axorô verde), seguida por aribibó (axorô de pombos),
obrigação de borí (axorô aves); para então após as anteriores etapas de
preparação e adaptação ser devidamente iniciado com ebós de 4 pés (axorô
de quadrúpedes)... O axorô de quadrúpedes assume caráter de legitimidade
para além das necessidades particulares, acima dos interesses pessoais, é
este elemento um selo de voto onde o iniciado assume papel de plenas
disposições como uma ferramenta a serviço dos Orixás.

É com axorô de quatro pés que se assentam os Orixás, não existem Orixás
assentados sem o emprego de axorô de quadrúpedes somados ao axorô de
aves e vise versa a ser confirmada nos rituais decorrentes a semana
posterior ao início dos assentamentos chamados de delogun, onde em uma
sequência de complementações aos axés são empregados o axorô frio (de

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

peixes) e novamente o de aves. Quando se remete a utilização de axorô


empregado aos assentamentos de Orixás pode-se simplificar em dizer que
os "4 pés" servem para assentar, os "peixes" (axorô frio) para "aliviar" e as
aves para ativar de forma externa o axé depositado nos assentamentos. Se
metaforicamente comparado a realidade das necessidades humanas, é como
dizer que o axorô de "quatro pés" com o de aves é uma refeição(nutrientes),
o axorô de peixes (frio) é a sobremesa (complementar) que antecede a
conclusão da refeição e o axorô das aves de confirmação (delogun/ofertado
no prato) são a iniciativa para uma nova jornada após as refeições.

* Meio 4 pés
O axorô obtido a partir da utilização de casais de galinhas d'angola, casais
de marrecos e casais de patos contém axés "mais intensos" que os obtidos
com o axorô das outras aves (galos e galinhas comuns) e "menos intenso"
que o axorô de quadrúpedes, tendo assim uma potência intermediária entre
as duas principais fontes de axorô utilizam-se os termos "meio quatro pés"
ou até mesmo "quatro pés de pena" embora não tenha um axé tão propulsor
quanto de quadrúpedes é utilizado como potencializadores das forças do orí
em obrigações feitas a cabeça, galinhas d'angola para o povo de Orixás de
dendê, marrecos para os filhos de Oxum e os patos para as pessoas de
Yemanjá e Oxalá, não possuindo axé completo.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

QUARESMA

Mediante os fundamentos africanistas os Orixás são a natureza e a natureza


são os Orixás, é por meio de um que chegamos ao outro, as manifestações
divinizadas da natureza se revelam em Orixá assim como as essências do
Orixá se manifestam em natureza, com bases neste contexto vamos aqui
explicar a ligação e os paralelos da quaresma católica, com a quarentena
nos cultos aos Orixás.

Visto que assim como para os animais existem os períodos naturais de


repouso para o próprio desenvolvimento como o sono e a gestação, aos
vegetais as fases onde as noites absorvem o gás carbônico, produzido pelos
animais e durante o dia liberam o oxigênio a ser absorvido pelos animais
necessário à seu próprio desenvolvimento, e a luz do dia liberam oxigênio
para os animais, vegetais que em sequência passam por etapas de floração
para que após este período surjam os frutos que ao atingirem a maturação
possam servir à nosso consumo, os astros também tem seus ciclos como as
fases da lua que se apresentam em plena escuridão quando nova ou total
luminosidade quando cheia, fazendo até com que o sol seja oculto quando
em eclipse, ao amanhecer com o nascer do sol e ao anoitecer com sua
partida; assim como o clima, a colheita também tem suas estações, as flores
da primavera e a queda das folhas no outono; o nível das marés cheias e
baixas; os períodos férteis e de ovulação das mulheres, seguido por ciclos
menstruais assim como para o homem surge a ereção, e aos demais animais
as épocas de acasalamento; ao recolhimento das formigas e a hibernação
dos ursos no inverno; ao adormecer e o despertar, sejam nos animais assim
como dos vulcões... Somado a todos outros inúmeros efeitos naturais que
demarcam os períodos de descanso/repouso são transmitidos em nossa
religião mediante alguns rituais preparatórios para um breve período de
resguardo não dos Orixás, mas sim de seus seguidores, demarcado como
período de recolhimento e pausa em determinadas atividades ligadas aos
cultos africanos. Caracteriza-se por limitar as ações de vínculos religiosos
dos pertencentes a religião e suas complexas formas de seguimento, mas
não aos abrangentes axés dos Orixás, desvinculando nesse período as

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

feituras e ebós de Orixás tais como obrigações de cabeça e assentamentos


aos mesmos, pois ao contrário seria como nascerem folhas no outono, o
raiar do sol em plena noite, como a desordem nas tradições/traduções das
leis e efeitos da natureza. Aderimos a quaresma não por termos qualquer
tipo de ligação ao catolicismo e suas crenças, mas sim pelos vínculos
presentes ao cotidiano de nossos ancestrais negros, escravos e religiosos
que oprimidos diariamente por escravagistas sabiamente uniram o período
de luto da religião de seus escravizadores ao período visto como a
renovação na religião a qual seguiam; já sofrendo abusos como
espancamento, torturas, assassinatos e tantas outras formas severas de
punições infundadas ou "fundadas" apenas por possuírem pele negra. Oque
não fariam seus carrascos que se encontravam em épocas de penitências, ao
notarem as comemorações africanistas em louvação a vida e aos seus
Orixás no período em que antecede o calvário, morte e luto do Deus
branco?

Nossas práticas erroneamente interpretadas como ofensivas, conflitantes,


demoníacas e opositoras ao Deus branco, calavam-se durante os 40 dias
que os sinos das igrejas não badalavam, apenas com intuito de preservar a
vida e a harmonia dos integrantes de suas comunidades que junto ao sábado
de aleluia católico iniciavam seu novo ano religioso (ano novo dos
batuqueiros), onde de fato os Orixás regentes do ano passado entregam o
ano para os próximos Orixás regentes. Surgindo assim na última semana da
quaresma (semana santa) o ritual de "mandar os Orixás para guerra",
fundamento o qual anuncia que estamos próximos a encerrar o período de
silêncio, já que neste ato as manifestações dos Orixás também se fazem em
silêncio para ao retornarem no sábado manifestam-se com os sons típicos a
cada um... Ao desenvolver do ritual de mandar os Orixás manifestados em
seus filhos, dançam segurando armas e ferramentas que melhor se
identificam a suas funções atuantes carregam nas costas um saco de pano
confeccionado com a cor específica a cada um, contendo suas oferendas de
frente, cozidos, crus, junto a sementes, cereais também associados a cada
Orixá; saem de costas pela porta principal... os cereais e mais provisões
indicam nossos pedidos de fartura e nova colheita para o ano que se
aproxima, que junto às chegadas do sábado de aleluia nos tragam axés de
boa sorte. Ao amanhecer do sábado, é feito o ritual de chamar os santos,
badalam-se todos os sinos e sinetas encontrados na casa de religião
indicando a quebra do silêncio e o despertar por completo. Ocorrendo na

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

mesma manhã a lavagem dos olhos com as águas da quartinha de Oxalá


Orunmylá, com propósitos em renovar nossas ações, trazendo mais clareza
aos sentidos possibilitando melhores passos no ano que se inicia. Os Orixás
manifestam-se em seus filhos, eles dançam com suas ferramentas não por
estarem em combate, mas sim por estarem prontos ao pleno retorno em
nossas atividades ligadas ao culto. Fundamentos como esses fortalecem
nossa fé e nossas ideologias de seguir com nossos rituais e ebós, pois se
não houvesse ciclos e períodos de reflexão como estes, não seriam
necessários os rituais de religião que confirmam e reafirmam nossos
vínculos espirituais; apenas resumir-se-iam em uma única feitura, como
assentamentos e nenhum seguimento sobre os mesmos, pois o axé seria
permanente de forma a não desgastar-se sem necessidade de confirmação
por intermédio de ebós (limpezas, banhos, trocas, erús e etc...).

AXÉ DE PENAS
COROAÇÃO DE EBÓ

Quando analisada em seu aspecto físico, se faz notável que ao criar as aves
Oxalá (a primeira parte de Olorun a se formar em Orixás) agraciou suas
penas com o axé da beleza e da impermeabilidade para que mesmo após o
mergulhar em água e apanhar chuva não sejam encharcadas sem poder
levantar voo, assim como mesmo voando não sejam prejudicadas pelas
ações dos raios solares; reverenciando assim a infinita sabedoria do criador
seguimos por ritualisticamente valorizar suas formas de criação,
reproduzindo sua onisciência em nossos rituais.

Em feituras de ebós aos Orixás como assentamentos, seguranças, feituras


de cabeça e em todo e qualquer ligação de axé através do axorô se fazem
indispensáveis às coroações com penas, justo por seus axés de aspectos
isolantes...

Nas sequências imediatas após as imantações de axorô, de acordo a


quantia numérica determinada ao axé de cada Orixá, são dispostas penas
das asas em sentido vertical ao seu redor em sentido anti-horário como o
fechar de um elo, finalizado com a cobertura total de plumas espalhadas em
seu centro circulado pelas penas laterais, podendo as plumas ser retiradas
91
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

das costas quando para Orixás que recebem animais machos, como
retiradas dos peitos quando para Orixás de aspectos femininos, podendo as
penas ao redor ter suas partes internas voltadas para dentro quando para
Orixás de aspectos masculinos como voltadas para fora quando para Orixás
que recebem animais fêmeas, podendo também as quantias de penas ser
duplicadas quando para um ebó à Orixá de cabeça, assim como também
para os Orixás dos Babalorixás donos da casa.

O axé de penas é feito para preservar o axé interno, e como barreira ao que
está do lado de fora, para que as forças depositadas no ebó permaneçam as
oscilantes emanações do axé ali recém-depositado, assim como para que
não sofra interferências externas vindas de outros pontos de energias como
as irradiadas por pessoas presentes durante os rituais que vão desde as
limpezas e calcamentos da casa, passando pela festa que recebe inúmeras
visitas até o momento da levantação de ebó; ficando neutras as emanações
externas como ciclo menstrual, consumo de bebidas alcoólicas, atos sexuais
e todos os tipos de cargas negativas.

INHELAS

Entre as remotas origens que fundamentaram os princípios de nossos


procedimentos religiosos, constam que para cada animal empregado nos
rituais de axorô, fossem após a sacralização separada suas partes de
maiores axés a serem também utilizadas como oferendas complementares
aos rituais de axorô, chamadas então essas partes como sendo inhelas, e
entre elas estão às cabeças, patas, pontas de pescoço e pontas das asas,
tetos, oveiras, testículos, moelas, fígados e os corações; a cabeça é sagrada
por comandar todas as ações, as patas e pontas das asas por trilharem os
caminhos, a ponta do pescoço por ser a parte por onde se libera o axorô, os
testículos por carregarem o axé dos machos como os tetos para as fêmeas a
gerar o leite como alimento que no caso das aves abre espaço as oveiras por
gerarem os ovos, as moelas e os fígados por terem ligação direta às
qualidades do sangue e o coração por ser o propulsor da circulação do
axorô por todo corpo.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

O passo que o axorô de quadrúpedes firma mais em assentar/ligar axé


junto ao plano físico, quanto o axorô das aves provém em revigorar o
espiritual, preparam-se as inhelas das aves para servirem como calçamentos
as obrigações assentadas junto as cabeças e patas dos quadrúpedes, sendo
inhelas como fígados, corações e rins dos quadrúpedes, preparados para
sarrabulhos servidos entre os alimentos de celebração.

LEVANTAÇÃO

O ritual de levantação assim como os de mais fundamentos tem grande


importância, singularidades e sequências, com início, meio e fim; sempre
relembrando que quaisquer que sejam os procedimentos fundamentais
variam de casa para casa de culto aos Orixás.

Inicia-se por levantar os axés secos, intercalados com os respectivos ebós


de axorô de cada Orixá, axé seco de Bará seguido por axorô de Bará, axé
de frente de Ogun seguido por axorô ao mesmo e assim conforme a ordem
de feituras aos Orixás. Onde primeiro retiram-se as penas ao redor da
coroação do axorô, para após serem retiradas as plumas de cobertura do
ebó, levantam-se os objetos/materiais depositados nas vasilhas tais como
fios de contas, joias, moedas, búzios, ferramentas, okutás e etc... Materiais
estes que de acordo as necessidades e aos costumes de cada casa podem ser
colocados de molho em uma bacia com água de quartinha para assim
desprenderem os excessos de axorô; independente dos materiais serem
repousados em água ou não, devem todos ser "polidos" com panos limpos e
brancos, após receberem um breve e delicado polimento são depositados
sobre um pano branco; quando vasilhas de assentamentos devem ser
previamente “polidas” com as plumas nelas contidas retirando os excessos
de axorô e temporariamente impermeabilizadas o axé para que se mantenha
fixado não sofrendo alterações ou desgastes no período em que estiver de
molho em água com a finalidade de aliviar os resíduos de axorô nelas
fixadas. Ao levantar os ebós, deve ser estes depositados em uma vasilha,
panela ou bacia previamente preparada e forrada com folhas de mamoneiro
a qual comporte todos os ebós a serem levantados. Seguindo os
procedimentos, levantam-se as inhelas, as frutas a serem cortadas com o

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

obé de feitura aliviando os axés latentes no obé, os doces secos, balas, bolo
e as flores a cobrir a levantação; após montar toda obrigação de levantação,
rega-se com mel e perfume.

Quando as obrigações realizadas envolverem ebós aos assentamentos dos


Orixás regentes do templo, assim como feituras de cabeça de filhos estas
levantações podem ser plantadas no pátio da casa; já quando forem apenas
ligadas aos Orixás de filhos e suas feituras podem ser entregues em água
correntes, ambos os procedimentos tem por finalidades retribuir a natureza
em forma de alimentos que por sua vez são perecíveis por total, a terra nos
fornece os axés que precisamos e a ela nós retribuimos, pois a mesma terra
que cria e alimenta também se cria e alimenta.

PLANTIO

Plantar uma obrigação consiste em um ritual tão importante como os


outros, além de serem complementares as estruturas fundamentais da casa
como um esteio territorial de culto aos Orixás, propiciando maiores
intensidades do axé local assim como equilíbrio de aspectos gerais.

Toda levantação, assim como o plantio deve ser realizado ou ao menos


acompanhado pelo Babalorixá/Yalorixá responsável pelas feituras ou
padrinho da casa, ou iniciado de confiança do responsável que tenha Orixás
assentados e noções básicas sobre estes fundamentos. Vale relembrar que
na mesma terra onde se plantam axés ligados aos Orixás, também se
exercem cultos aos Eguns, aos ancestrais, aos desencarnados; Por mais
simples que sejam os segmentos do plantio, formam a parte conclusiva das
etapas de assentamentos, assim selando as fases finais das feituras. Para os
Orixás cava-se redondo como o mundo e a vida, contrário se fosse para os
Eguns a serem cultuados no buraco quadrado. Ao plantar ebó de Orixá,
para abrir a boca da terra o pronto mais antigo pede agô e retira punhados a
serem jogados de lado, após abrir o buraco batiza-se o mesmo com água de
quartinha para demarcar o espaço que em seguida será regado com mel e
forrado com folhas de mamoneiro a preservar os axés, deposita-se então os
elementos da levantação, que serão novamente regados com mel e cobertos
com folhas de mamoneiro; antes de tapar o plantio por completo

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

depositam-se punhados de terra sobre o axé para que a partir de então a


terra possa se alimentar.

A MAGIA DO SOM

Entre tantos fundamentos do batuque, não temos como não fazer


referências a vibrações dos axés do som, elemento este sob o poder de
Xangô, justo por ser ele o Orixá regente das cadências, que formam a
sonoridade nos equilíbrios entre graves e agudos. Entre os instrumentos
mais utilizados nos cultos afro brasileiros, temos em maiores destaques a
sineta, o agogô, o agê e o tambor que seguem a vibrar junto as rezas
cantadas ecoando aos planos astrais a fim de retornarem divinizadas ao
nosso plano em emanações dos Orixás; todo e quaisquer que sejam os
instrumentos de percussão devem ser preparados("comer com o Santo")
antes de serem utilizado nos rituais de batuque aos Orixás, o manuseio de
cada instrumento exige um grau de iniciação respectivo ao seu axé, não
bastando saber tocar o ritmo mas sim sendo iniciado aos instrumentos com
o "axé de mão", com finalidades em transmitir axé junto aos instrumentos.

*Tambor
O tambor é formado por um cilindro oco (tubo) com suas duas
extremidades cobertas por uma membrana de couro esticado por cordas
transpassadas, comparativamente pode ter seu formato associado a
duplicidade do axé de Xangô, dois lados como o oxé (machado sagrado), a
balança de um eixo e dois pratos que nos remetem a dois sentidos, dois
planos paralelos unidos por um ponto em comum. Quando para saudar os
Orixás o tambor deve ser afinado esticando os couros a forma de cadências
agudas e médias graves quando percutidas com batidas manuais, de
vibrações percussivas contrárias se fazem os toques em rituais aos Eguns
onde o tambor deve ser "desafinado" a ponto de afrouxar os couros, o
chamado "tambor frouxo" que produz som grave abafado.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

*Agê

Agê é um instrumento geralmente usado como coadjuvante de marcação


(compasso) aos ritmos cadenciados pelo som dos tambores, constituído de
uma cabaça (porongo oco) cercada por uma rede de contas (miçangas), a
produção do seu som auxilia na demarcação do território ritual contra
energias adversas e sob as regências de Yansãn/Oyá e Xapanã para
dominar os Eguns.

*Agogô
Instrumento de metal em forma de "V" com dois cones (campânulas) de
tamanhos diferentes fixados em suas extremidades com a finalidade de
produzirem sons agudos e diferente de uma campânula para outra; Tocado
por uma baqueta originalmente de metal com propósitos em despertar os
axés dos Orixás para a guerra no sentido de que retribuam o incentivo de
maneira enérgica, suas batidas de metal com metal invocam o axé da
guerra. É um instrumento de Ogun, por ser ele o Orixá tanto dos metais
quanto da guerra.

*Sineta
A popular sineta é utilizada não somente nas rodas de dança
aos Orixás acompanhando e interligando os instrumentos, mas também
como instrumento padrão a qualquer ritual ligado ao culto, como
instrumento de conexão e despertar axé, é regido por Bará o Orixá
mensageiro.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

RODA DE XIRÊ

A roda de xirê, popularmente conhecida por roda de dança aos Orixás, é


um ritual formado por iniciados na religião, movimenta-se em sentido anti-
horário onde posicionam-se os adeptos um atrás do outro com as frentes
dos indivíduos presentes voltadas para as costas dos que estão a sua frente
formando assim uma roda de dança aos Orixás. Caminha-se contra o
tempo, com os pés descalços vinculando a terra com o homem em busca de
suas origens, deixando para trás todas as pretensões que não sejam a
própria fé.

O ato de dançar e ao mesmo tempo rezar aos Orixás, expressam nossos


desejos e necessidades de forma física e oral, através da nossa
espiritualidade; é um momento de concentração rumo às reflexões em
busca de melhoras e próprio aprimoramento do ser, a caminhada é em
busca de respostas junto a nossas origens; é interagir com o sagrado
momentaneamente entrelaçando o mundo das forças superiores ao mundo
humano.

Ao reproduzirmos partes representativas das apresentações de Olorun,


somos seguidos pelos Orixás que iniciam a chegar entre nós para assim
retribuírem de imediato com bênçãos que distribuem axé. Ao dançar em
louvação para que nossos caminhos sejam abertos, giramos os pulsos como
segurando uma chave que abre uma porta realizando e reafirmando as
coisas que somos merecedores, rezamos para que Bará, nos permita a boa
sorte ao caminhar da vida; dançando em luta e ao trabalho, fazemos gestos
onde nossas mãos estendidas como lâminas, toque a palma da outra mão
aberta, como o dividir do alimento e a espada que reagindo as demandas
nos defende dos adversários, e como forjando ferro; Yansãn/Oyá nos
permite dançar com os braços sem um rumo definido, onde os braços
deslocam o ar, nos sentidos que os ventos deste Orixá nos tragam coisas
boas e afaste as ruins, sem gestos pré definidos se faz livre como o vento;
rezando para Xangô dançamos com gestos onde levemente estendemos os
braços com as palmas das mãos abertas e voltadas para cima, na alternância
de subir uma mão ao descer da outra como o equilíbrio dos pratos de uma

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

balança junto aos pedidos de misericórdia diante nossas falhas humanas,


para Agodô os gestos são mais a frente do corpo e com as mãos fechadas
para que nossos passos além de equilibrados, sejam firmes como a rocha e
o cabo do oxé (machado duplo, símbolo da justiça divina); aos Orixás Odé
e Otin, dançamos com os dedos indicadores estendidos num vai e vem de
encontros entre ambos, como o posicionamento de mira e de uma
armadilha, como o arco de encontro as flechas, como a pedra posicionada
na funda/bodoque, rezamos em busca da fartura, da felicidade, das boas
notícias e no abater das negatividades; com a dança de Obá somos
influenciados pela rotação do mundo, gira o corpo e os punhos que se
sobrepõe simultaneamente, para que ao girar em frente tenhamos bom
rumo, e quando para trás em sentido de volta os problemas e dificuldades
sejam revertidos de forma positiva; manifestamos nossos pedidos a Ossayn
através de um ritmo cadenciado onde os braços acompanham os ritmos do
corpo como os galhos que acompanham as árvores, que possamos ter
alcance aos galhos com frutas e as folhas de cura; usando gestos onde as
mãos fechadas reproduzem posições e ritmos de varrer, rogamos a Xapanã
que com sua vassoura afaste as cargas negativas, doenças e as coisas sem
utilidades de nossas vidas; reproduzindo os ritmos de Oxum estendemos
uma das mãos como o pentear dos cabelos, enquanto a outra mão nos serve
de espelho que dança diante nosso rosto, convertem-se como o penerar nas
águas do rio em busca de riquezas, desejos de felicidade, equilíbrio
emocional e sentimental; os ritmos de Yemanjá são direcionados com as
mãos fechadas como o desempenho de um remador em águas calmas e as
vezes leves encontram-se como as ondas, no ir e vir das ideologias que
seguem com encontros e desencontros entre a razão e a emoção, pedimos
calma, serenidade, clareza e esclarecimentos; nas etapas conclusivas, rumo
ao finalizar da roda de xirê, o entoar das rezas estendem-se ao Orixá da
criação e Pai de todos, por ritmos e pancadas lentas, um intervalo marcado
por leves batidas de tambor intercaladas com breves pancadas altas...o rufar
da percussão revela apenas passos calmos, sem gestos, como o passar dos
anos e o envelhecer, sem pretensões além de agradecimentos, bênçãos e
axés de misericórdia sobre a vida, a roda é completamente coberta pelo alá
(pano branco)... Iniciados e simpatizantes dançam juntos, a harmonia de
confraternização se faz presente, olhares voltados para o centro da roda,
contemplam o Orixá Oxalá, que manifestado em dois de seus filhos se
apresenta jovial e ereto acompanhando e acariciando as costas de um velho

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Oxalá que vagarosamente caminha arcado e com os braços estendidos


como um convite para as bênçãos de um abraço paternal.

(°○•) KASÚN (•○°)

O AXÉ DA BALANÇA

A roda de balança ou ritual de Kasún, é formada apenas por pessoas que


tenham no mínimo obrigações de cabeça assentadas com axorô de
quadrúpedes (borí de quatro pés), podendo estes ser iniciados com Orixás
assentados, e/ou já terem atingido o estágio sacerdotal ou não, compreende-
se por ato de honra e fundamento religioso dar prioridades aos visitantes do
templo para que componham o ritual. Embora alguns rituais de kasún
sejam mais específicos, como os realizados para ebós a Bará Lodê, onde a
preferência é dada aos homens em sete e seus múltiplos, onde o kasún aos
Orixás de praia podem ser realizados com a junção de seus filhos de cabeça
em soma de 8 e seus múltiplos, onde o ritual é sucedido por axés cantados
aos mesmo Orixás, os padrões de balança são mistos, compostos por 6 e
seus múltiplos, e encerrado com o toque de alujá.

Já que tanto o ritual de kasún, como ritmo de alujá, 6 e seus múltiplos


carregam em seus axés a regência do Orixá Xangô. Visando ser a balança
um dos rituais que mais concentram axés, tornando-os emanações
oscilantes e intensas, que este ritual só deve ocorrer em prol das
sacralizações de quadrúpedes, já que uma obrigação segue parâmetros em
seus desdobramentos, que por vez tendem a serem por equivalências para
que não haja desequilíbrios de axé entre os polos (homens e Orixás), que o
ritual de kasún serve como eixo condutor de axé entre ambos.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

De mãos dadas com intuito de


preservar os axés dentro do círculo que se fecha, segue a dança em estágios
de passos à frente (sentido ao plano presente), atingir o centro da roda e em
seguida caminhando para trás (rumo a ancestralidade) onde ao mesmo
tempo todo o conjunto de participantes de mãos dadas até o fim do ritual
giram a roda gradativamente em sentido anti-horário como uma
conspiração que sobrepõe o axé acima do plano material abrindo espaço as
origens da existência aonde aos poucos vão se manifestando os Orixás em
seus filhos, como em confirmações aos ebós realizados, fato afirmativo em
dar prioridades para as visitas, pois a encalço de responder primeiramente
um Orixá não pertencente a casa não pode ser considerado o fundamento
da balança um ato "auto afirmativo".

MESA DE YBEDJIS

Embora possa ser considerado um ritual isolado dos outros em relação às


fundamentações religiosas da casa de santo, a mesa de Ybedjis carrega
propósitos tão complexos e importantes quanto os de mais rituais, a ponto
de um batuque grande (festa de 4 pés), só ser considerado de ritualísticas
totalmente completas após o ocorrer da mesa de Ybedjis como uma das
partes conclusivas da obrigação, o chamado "termômetro da obrigação";
podendo ocorrer o ritual de mesa aos Ybedjis de forma independente de
outras comemorações, sendo assim realizada a qualquer época do ano
conforme os critério e necessidades previstas pelo sacerdote de cada ylê
(casa de matriz africana).

100
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

De forma básica o fundamento da mesa de Ybedjis se inicia no serão onde


estes Orixás recebem o axé de axorô, os preceitos seguem na cozinha onde
com as carnes resultantes da sacralização aos Ybedjis é produzida a canja a
serem servidas as crianças participantes do ritual e após os de mais
presentes. Já os fundamentos em montar a mesa ocorre a partir do
momento onde dois iniciados prontos (com Orixás assentados) estendem no
chão do templo a toalha branca (alá) onde serão depositados os de mais
elementos a compor a fundamentação da mesa...Geralmente os materiais
indispensáveis/padrões são depositados na seguinte ordem, amalá e vela
(axé de Xangô/fogo, equilíbrio e providência...) no centro da mesa, bolo e
flores (axé de Oxum, realizações, felicidades, doçura, fartura...), duas
quartinhas geralmente dos Ybedjis ou Xangô e Oxum (potencializadores de
axé e símbolo da proximidade com determinados Orixás), indispensáveis
são doces de panela e doces em calda como o de abóbora e/ou batata
doce(axé de Yansã/Oyá, renovação...), figo (axé de Ossayn, saúde,
prosperidade...), pêssego(axé de Oxum, harmonia, tranquilidade...), sagú
(axé de Xapanã, compaixão, fraternidade), pudim de leite e ambrosia (axés
de Oxum, Yemanjá e Oxalá, calma, tranquilidade, realizações...), manjar de
coco com calda de ameixas (axé de Oxalá, em potencial axé de Oxalá
Orunmylá, visão, paz, resolução...), cremes, mousses e flans, seguidos estes
por doces secos como balas de banana (axé de Xangô e Ybedjis...) e outras,
pirulitos que representam pluralidades, fartura, doçura como os axés de
Bará, Odé, Otin e Ybedjis... Brigadeiros e pipocas doces (axés de Bará e
Xapanã, movimento, transformação, jovialidade...), corações de abóboras e
de batas doces ( axé de Yansã/Oyá, amor, união...), quindins (axé de Oxum,
fartura, felicidade, fertilidade...), merengues, suspiros e cocadas (axés de
Yemanjá e Oxalá, leveza, clareza, misericórdia...), gamela de frutas
respectivas aos axés de cada Orixá e representantes da fartura de Odé.
Tantos outros aqui citados ou não, podem ser substituídos, agregados ou
não variando aos fundamentos e costumes de cada casa. Após depositados
e organizados todos os elementos de axé sobre a mesa, procede-se por
acomodar as crianças sentadas em múltiplos de 6 (axé de Xangô), podendo
também ocorrer em múltiplos de 8 (axé de Oxum), quando a casa de santo
tiver como regente principal Orixás de praia (Oxum, Yemanjá e Oxalá), de
grávidas (quando houverem), das crianças mais novas as mais velhas a se
iniciar da cabeceira da toalha próxima ao quarto de santo, seguido no
sentido anti-horário a encerrar o mais velho ao lado do mais novo ou seja, o

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

último ao lado do primeiro (axé de Xangô, igualdade, pesos e medidas),


exceto quando houverem gêmeos, pois estes representantes dos axés dos
Ybedjis devem receber lugar de honra e serem sentados nas extremidades
da mesa (cabeceiras); as crianças a participarem sentadas ao redor da mesa
geralmente se limitam dos recém nascidos até crianças de 7 anos, de acordo
aos fundamentos da casa podem atingir o limite máximo de até 12 anos de
idade, mesmo que ao final da mesa todos os presentes na casa sejam
servidos com os mesmos elementos contidos na mesma, nem todos podem
participar devido a idade.

Após acender a vela, as crianças são sentadas uma a uma, quando a última
criança a compor o ritual de mesa for devidamente acomodada, são
iniciados os toques de tambor seguidos pelas cantigas ao Orixá Bará
(geralmente Ajelú, por ser esta a classe que acompanha os fundamentos aos
Orixás Ybedjis) e a partir de então os Orixás começam a se manifestar em
seus filhos, segue-se a cantar axés para Xangô, momento no qual é servida
a canja do primeiro ao último, após todos os pratos servidos com canja
estiverem diante das crianças, elas são instruídas a iniciar a alimentação ao
mesmo tempo e de forma simultânea iniciam a se alimentarem. Enquanto
uma criança não estiver saciada de canja, deve novamente ser servida, os
adultos que servem as crianças sempre caminham no sentido anti-horário
ao redor da mesa, dispondo os pratos com alimento pela direita da criança a
ser servida e retirando pela esquerda preservando assim o sentido anti-
horário, para levantar um prato arria-se outro a substituí-lo(como os pratos
da balança de Xangô, desce o mais pesado e sobe o mais leve exercendo a
justiça), preservando assim o equilíbrio de forma ritual; quando necessário
adultos e iniciados podem auxiliar as crianças, tanto sentando junto a
criança na mesa como consumindo os alimentos servidos as mesmas.

No período intermediário entre o consumo da canja (alimento


salgado/Ybedji menino/Xangô) e o consumo dos doces (Ybedji
menina/Oxum) são entoados os axés cantando aos Ybedjis, são recolhidos
os pratos após todas as crianças terem concluído o consumo da canja,
servem-se pequenas porções, dos doces de pratos que na mesma ordem são
servidos... Meio ao consumo dos doces é cantado os axés de Oxum,
encerradas as alimentações e levantados todos os pratos são cantados os
axés para Yemanjá seguidos por Oxalá, com as crianças ainda sentadas,
Oxum ou um de seus filhos inicia os rituais de dar mel na boca das

102
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

crianças, em seguida dar água da quartinha, as mãos das crianças devem ser
lavadas por Yemanjá, ou por um de seus filhos em água pura contida em
vasilha de louça branca, a sequência de tirar as mãos da vasilha são
amparadas e enxugadas por Oxalá ou um de seus filhos com uma toalha
branca.

Ao toque dos tambores em ritmos de alujá (batida sem canto e ritmo de


Xangô) os Orixás presentes juntos aos iniciados levantam as crianças de
forma a serem erguidas ao mesmo tempo ou da menor a maior que
permanecem em pé no mesmo lugar até todos serem levantados, uma atrás
da outra, formando uma roda ao redor da mesa, seguem caminhando a
completar uma volta em torno da mesa dando por encerrado o ciclo dos
inocentes.

Com auxílio dos Orixás manifestados, iniciam-se por recolher os


elementos antes dispostos sobre a mesa de forma que ao serem retirados
seguem na ordem em que os últimos a serem colocados serão os primeiro a
serem retirados, por último restam sobre a toalha as flores a serem
levantadas em dança e apresentações por Oxum, o amalá por Xangô que o
coloca acima da cabeça, após dançar e arriar o amalá no quarto de santo os
Orixás presentes dobram a toalha da mesa (alá) em forma semelhante a um
canudo a depositam nas costas de Xangô que dança o alujá segurando as
extremidades do alá a forma de o amparar sobre os ombros... o alá que
envolve Xangô indica a misericórdia junto ao julgamento. A conclusão do
ritual ocorre com a distribuição de doces e brinquedos realizada pelos
Orixás, que dançam manifestados em seus filhos. As sobras de alimentos
são distribuídas a disposição de todos os presentes em sinal de fartura,
confraternizações, igualdade... Quanto aos alimentos que restaram nos
pratos devem ser plantados no terreno ou despachados em praia ou
pracinha.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

SAÍDA DE ECÓ

Em dias de festa, após as louvações (danças e rezas cantadas) aos Orixás de


guerra também conhecidos como Orixás do dendê ou Orixás de frente, que
se iniciam em Orixá Bará, percorrendo outros 7 Orixás e encerrando o ciclo
do dendê em Xapanã, é momento de um rápido "intervalo" onde iniciam-se
os procedimentos para a saída dos ecós.

Nestes breves momentos de preparação todos os visitantes presentes


devem proceder por se abster de olhar os componentes que são arriados no
ponto central do salão, é desfeita a roda de dança permanecendo apenas os
Orixás a dançarem a volta dos elementos que em seguida serão
despachados, mediante as ordens do Babalorixá dono da casa os filhos
prontos e com mais tempo de iniciação auxiliam nos preparativos, dispondo
os determinados elementos na parte central do piso; neste período os de
mais presentes viram-se de costas para o ritual quanto os mais velhos
podem apenas desviar o olhar em forma de respeito e com finalidades de
evitar qualquer infortúnio por ordem das cargas atraídas e depositadas
nesse ritual. Então após as louvações á Xapanã (Orixá da limpeza) damos
sequências no procedimento também conhecido como 'fazer a rua'...
Enquanto os Orixás dançam o ecó (ao redor dos axés depositados no chão)
aos ritmos dos axés cantados de Bará, por ser ele o poder sobre os
caminhos se faz ele mesmo o Senhor do encaminhar, procedem por um a
um o borrifar com água da quartinha de Bará os materiais do ecó, para que
neles sejam depositadas todas as cargas de presença indesejadas aos rituais.
após encerrados os preceitos de chão, o ecó deve ser levantado e entregue
no cruzeiro para que as cargas nele depositadas sejam encaminhadas por
Bará.

Organizam-se os Orixás a pegar os elementos, procedem-se as preferências


para que Bará, Ogun, Yansãn / Oyá e Xapanã carregem até o cruzeiro ou
encruzilhada a quartinha, o ecó de Bará e o Abadô (frente seca) que

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

geralmente são entregues na mesma ordem ao chegarem ao cruzeiro


indicado pelos fundamentos da casa, ao voltarem do cruzeiro e entrarem no
pátio da casa de religião um Orixá de praia/mel, geralmente Oxum, que
estava por aguardar o retorno dos Orixás que foram fazer a rua, despacha
no pátio o ecó doce, preservando assim as estruturas cotidianas que
sustentam a casa, como saúde, progresso, prosperidade, harmonia e etcs...
Os Orixás retornam para dentro do salão e dançam as rezas que de Bará,
abrem vez para Ogun Avagãn, no sentido de que Ogun guarde o templo,
preservando-o limpo de influências opostas e livres de interferências
contrárias ao rito... Nesse momento as pessoas antes de costas retomam
suas posições de formas livres.

A saída de ecó pode ser entendida como o limitador ritual entre Orixás de
dendê e Orixás de mel, pois é após a sua conclusão que se percebe uma
acelerada "subida" dos Orixás de frente paralela as manifestações dos
Orixás de praia. Encerrados os procedimentos de ecó, iniciam-se as
louvações aos Orixás do mel... Dando assim sequência a noite de batuque
aos Orixás Oxum e Yemanjá a ser encerrada por Oxalá.

OCUPAÇÃO
ORIXÁ MANIFESTADO

O Orixá que rege o orí de um filho é parte de um todo em sua classe,


quando manifestado através da ocupação mental faz-se em forma de
fragmentos elementares.

Ex.:

Do fogo de Xangô (Orixá) desprende-se a labareda (classe), que desprende


uma fagulha (qualidade) que desprende uma faísca (sobrenome de vasilha),
que em formas de calor fragmentado (sobrenome de feitura) manifesta-se
em forma de energia sobre os comandos mentais de um filho ocupado por
Xangô;

Dos oceanos de Yemanjá (Orixá) forma-se a onda (classe), que desprende


gotas (qualidade) que desprende respingo (sobrenome de vasilha), que em

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

forma energética de fragmento de gotículas (sobrenome feitura) que em


fragmentos de uma raiz original manifesta-se possuindo domínios sobre as
ações mentais de um filho de Yemanjá. Seguindo a mente sobre os
comandos regentes as essências de cada Orixá, revelam-se em reações
corporais onde as Mães doces rolam as águas através das lágrimas, onde o
Orixá do fogo libera seu brando como os vulcões e trovões; sejam em
maneiras de expressões mais ágeis quando em Orixás de classes jovens ou
mais lentas quando em classes mais velhas, aspectos reflexivos aos
adjuntós e aos fundamentos de gôa.

Ao exemplo de Odé, o Orixá da caça que se manifesta com olhar


apreensivo, de gestos manuais como se portando armas de caça (cadeia
alimentar), reproduz um som da fauna para atrair a preza (seduções
instintivas ao reino animal/rituais de acasalamento).

São descargas de energia sobre os neurônios, estímulos cerebrais que


manifestados em um iniciado aderem ações compatíveis ao corpo, que com
exceções aos reflexos de essências originais como o som ou esfregar das
mãos devem ser ensinados a manifestarem-se através das linguagens
corporais como danças e gestos atuando como dispersores das emanações
de axé. Já que as primárias manifestações consistem em apenas possuir a
mente, então sob doutrinas moldamos e posicionamos em aspectos físicos,
é como conter fogo, água, terra e ar para que assumam formas contextuais a
nossos fundamentos. Assim em Ossayn, que em dança se apresenta com
uma perna, semelhante à flora; a Obá que auditiva dança com a mão
cobrindo uma das orelhas, destacando ser ela a contentora da audição ou ao
dançar gira os braços e o corpo indo e vindo feito roda e engrenagem, como
o progresso.

Podem dançar, falar e entre outros ampliar os sentidos de percepção; com


estímulos mentais abrangem todas as formas de ação da mente. Esse Orixá
que se manifesta de forma aparentemente completa ("Orixá inteiro") é na
verdade uma das confirmações das forças da natureza são os menores
fragmentos de Orixás, a apresentação menos complexa de um elemento
natural; próximos a descargas de energia viva a influenciar os comandos
neurológicos, podendo assim ultrapassar aspectos que limitam as
faculdades mentais, ampliando os níveis intelectuais da mente.
Relembrando que o ato de ocupação de um Orixá, trata-se da atuação direta
de um fragmento energético e puro sobre um elemento corrompido por

106
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

vícios terrenos, podendo assim gerar sobrecargas; cargas estas tendem a


serem empregadas para que evitem colapsos mentais e de sistema nervoso;
as formas de dissipações ocorrem através dos atos manifestados pelo corpo,
tais como gestos, danças, emissão de sons, sejam por fala ou característicos
ao Orixá. Ocorridos estes processos podemos avaliar que as energias
encontram-se estabilizadas.

A manifestação de um Orixá pode ser traduzida como confirmação aos


procedimentos rituais, uma confirmação as feituras, como um fazer de
nossa parte e uma aceitação por parte do divino ao se manifestar.

DAR CHEGADA/"QUEBRAR" O ORIXÁ

Logo após o Orixá apresentar-se ao universo em forma de manifestação


vinculada ao comando mental, concluindo ao ato final da apresentação a
ação de desfalecer a matéria por ele ocupada, é então que uma pessoa já
iniciada no culto atua em "dar a chegada" no Orixá. O ato de "desfalecer”,
conclui-se em frações de segundos onde o corpo inconscientemente
entrega-se em relaxar qualquer tipo de ação. Ao "quebrar/dar chegada" no
Orixá levemente bate-se na parte interna dos braços (paralela aos
cotovelos) flexionando-os sobre o peito a ficar cruzados em formas de um
"X", procedimento o qual tem finalidades de "ressuscitar" o corpo, seguido
por soprar os ouvidos para que ao captarem o deslocamento de ar enviem
estímulos ao cérebro e "ressuscitem" a mente, ligando um ao outro para que
sejam Orixá-mente-corpo, 3 em 1. Concluindo, são feitos tais
procedimentos após o Orixá se manifestar como fonte preventiva em uma
fase inconsciente de pré-manifestação preparando e equilibrando os canais
mentais para que não sofram alterações prejudiciais. Assim se faz a
"chegada" ao receber um Orixá como se fazem os procedimentos de
"subida" ao despachar para então sutilmente desligar as influências de
aspectos mentais.

Geralmente, e na grande maioria das vezes de acordo as necessidades


previstas pelo próprio Orixá manifestado, não o despachamos por
completo, permitindo assim uma manifestação através de um estágio de
atuação mais fragmentado que o "Orixá inteiro", então após desvincular a

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

maior fração do Orixá, o Orixá inteiro, apresenta-se "encostado" em forma


de Orixá-Axere.

AXERE

PROGRESSO REGRESSIVO/ATO REFLEXIVO

É vínculo de ações reflexivas inconscientes sobre memórias da consciência;


naturalmente como os reflexos do sol sobre as águas, acima está o sol e
mais próximo a nós está o sol em reflexo, no céu e ao mesmo tempo na
terra aquecendo as águas. Ao anoitecer despedem-se os raios solares, mas
nas águas seguem as temperaturas por ele alteradas.

... Apagou-se o fogo e dele sobrou calor...

Ao despachar o Orixá inteiro, sobraram reflexos divinos sobre suas


influências, cabe então ao Axere a atividade de abrandar e absorver por
completo os resquícios das emanações do Orixá inteiro, tendem a serem
absorvidas e "regressadas" até o ponto zero, como se ali nunca estivesse
(reflexos de esquecimento).

"Meio a um milharal temos noções básicas que momentaneamente estamos


cercados por uma plantação de milhos, sabe-se a localização... o país,
estado e município, talvez até o número do lote de terras... mas até que grau
podemos ter conhecimentos sobre oque está abaixo e até oque está mais
acima do terreno onde pisamos? Sustentados porque? Pedras, pedregulhos,
metais e pedras preciosas, petróleo ou sítios arqueológicos? A final oque
encontraríamos no oculto? Mais além, além mar, além terras... Os mistérios
ocultos pela natureza..."

Assume o axere (2° parte do Orixá manifestado) ações gestuais e de


linguagens que em certo ponto de vista assemelha-se a um comportamento
inocente e infantil, o desenrolar da fumaça de um cigarro que sobe
tilintando ao ar é por eles chamada de rabo de gato, quanto a brasa
oscilante é chamada de vaga lume, refrigerante escuro é reconhecido como
água suja, e refrigerante de cor amarelada passa a ser "xixi de vaca/gato",
desvinculados de nossas interpretações em relação a noções ao tempo
fazem da boa noite um bom dia, onde o até logo é transmitido em "até os
108
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

anos", justificam-se os atos por terem interpretações mais ligadas aos


aspectos naturais que humanos, usando os calçados em posições invertidas,
e o que era para a esquerda passa a ser a direita, entrelaçando um estado de
caráter entre divindade e humanidade, faz-se um humano-Orixá e um
Orixá-humano.

Atuando de maneiras reflexivas onde o senso assume sentidos contrários a


lógica; transmite-se ao falar "errado", costumeiramente trocando os verbos
por seus antônimos; sim quer dizer não, preto quer dizer branco. Acredita-
se assemelhar as percepções de Olorum, o conhecedor do infinito, aquele
que não tem início nem fim, não fazendo distinções comparativas em
valores...

Mediante as realidades sempre ativas do Orixá, acordar e dormir assumem


sentidos mais próximos à palavra desacordar, o nadar torna-se peixe, carros
viram carroças, a casa vira ninho, e os verbos tem os tempos inversos como
oque é futuro passa a ser passado, pois tudo é mais e tudo é menos, cada
coisa a seu propósito. Não faz diferenças entre um ser rico ou um ser pobre,
percebe valores iguais a um velho experiente ou em um inocente recém-
nascido, onde o grande pode ser pequeno e o maior pode ser o menor.

É evolução regressiva como andar de costas, rumo a um objetivo, mas


oposto à lógica, como uma corretiva regressão da mente... Resgatando e
reformulando pensamentos para preencherem as lacunas da consciência
sobre os períodos em que o físico era comandado pelo inconsciente,
permitindo que após a mente voltar ao estado consciente não faltem
registros sobre os períodos ocupados pelo Orixá. Preservam-se os valores
incalculáveis como respeito, fé, tolerância, igualdade simultaneamente,
descartando os sentimentos viciosos como vaidade, egoísmo e outros diante
do culto aos Orixás.

Civilizações foram dizimadas, exploradas, escravizadas e sofridas em


função das explorações de recursos naturais a suas terras; então julga-se
mais prudente acreditar que abaixo de nossos pés não tenham ouro,
diamantes e qualquer formas vinculativas, aprisionáveis ou corruptíveis ao
ser humano. Perpetuando a fé inconsciente para a igualdade entre todos.
Assumem características individuais como as classes de Orixás fundidas as
particularidades humanas.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

ORIXÁ INXÊ
O ÚLTIMO ESTÁGIO DA OCUPAÇÃO

Visto o Orixá que classificado em três tempos físicos, divide-se em estar


Orixá-inteiro, como o presente, apresentação Orixá-axere, como o passado
ou em sua última forma de se apresentar manifestado em forma de inxê, o
Orixá-inxê como o futuro ou Orixá no Egun como também é mais
conhecido. Embora não se façam obrigações de cabeças a essa forma de
apresentação do Orixá, segue o mesmo em apresentar-se manifestado como
a 3° parte da ocupação de um Orixá ao que não se vinculam o ato de
"quebrar/dar chegada".

Representante dos restos mortais da natureza, o estágio onde o plano físico


desprendeu-se da vida e sobrou apenas o material sem vida e sem a
interação de estímulos... Não falam, não cantam, não dançam, não
gesticulam assim como um elemento morto se tornam apenas suscetível as
interações e alterações de origens externas. Os braços levemente balançam
para frente e para trás como elementos soprados e carregados ao vento, o ir
e vir dos braços interagem como ferramentas de Yansã/Oyá que embalados
despertam movimento ao ar, e o ar a eles. Manifestam-se os Inxês durante
os rituais de desligamentos, tais como arisúns, missas e todas as formas de
culto aos Eguns.

110
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

AFORIN-AFORIBA

Aforin-aforiba, mais conhecido como dança de aforiba ou foriba é um


ritual regido por Ogun e Yansãn/Oyá, manifestados em seus filhos de
cabeça, este casal de Orixás dançam em duelo empunhando espadas um
contra o outro. Reproduzindo ações rítmicas as rezas cantadas e o entoar
dos tambores, Yansãn/Oyá (ar) e Ogun (metais), com espadas em punho
entram em batalha desferindo golpes um contra o outro (armas estas
originadas e forjadas em Ogun), meio a batalha Yansãn/Oyá inicia seu
encanto para seduzir seu marido Ogun, meio a luta Yansãn/Oyá percebe
que não teria como derrotar o Orixá das guerras e estratégias apenas com
golpes de luta corporal, já que estes também são regidos por Ogun; faz
então uso de uma rosa vermelha para dissipar seu axé de sedução em seu
"parceiro-rival" que envolvido pelas essências do sentimento abre guarda e
acaba embriagado por sua "rival-companheira" que o convida para beber,
meio a bebedeira, dançam, onde Ogun bebe e Yansãn/Oyá apenas manipula
a bebida como se estivesse bebendo, mas na verdade faz com que Ogun
beba pelos dois. Pelas mãos da mulher ele acaba perdendo suas
propriedades de ação e resume-se apenas aos domínios dela que aproveita-
se do estado "desorganizado" do "marido-oponente" pra fugir com Xangô e
dele fazer seu segundo marido.

Revelam-se os Orixás como elementos da natureza, em amplas e


dinâmicas ações divinas e divinizados atuando e ao mesmo tempo
interagindo um com todos e todos com um; fazendo de Yansãn/Oyá o ar
que possibilita os desgastes dos metais em Ogum, e ao mesmo tempo
alimentando o fogo em Xangô. Os choques entre as espadas indicam as
agressões que Yansãn/Oyá faz aos metais tais como a ferrugem e a
oxidação; as garrafas de bebida contendo atãn (bebida de Ogun composta
por frutas próprias aos Orixás Ogun e Yansãn/Oyá adicionadas ao xarope
de groselha e água) ou de acordo as feituras podendo conter ecó de Ogun
(água, açúcar e vinagre) desempenham neste ritual o papel dos agentes
químicos que auxiliam para a corrosão dos metais; a rosa que Yansãn/Oyá
apresenta a Ogun representa a paixão, a flor que derruba as espadas. a
mulher que abandona um homem, para fugir com o outro pelo fogo da
paixão, com a cumplicidade do ar com o fogo. Ao final do ritual de aforiba,

111
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

faz-se o ato em "dar chegada quebrando" o Orixá Ogun, assim o


desvinculando das partes embriagadas para que retome sua presença como
Orixá inteiro.

"Em aforiba de rosa branca, espadas não batem e Xangô não dança".

O ESPELHO, A PENEIRA E O PERFUME


O poder do abebé

O abebé, popularmente conhecido por espelho, é um fundamento


tão misterioso quanto às águas mais profundas; ligado à Oxum e
Yemanjá como mais são vistos na religião, sejam em gravuras,
pinturas, assentamentos, danças e representações onde aparecem
como instrumento amparado pelas mãos desses Orixás,
assemelham-se ao reflexo e ao brilho das águas, revelando-nos
que além da beleza/"vaidade" de Oxum, estão os poderes dessas
duas Mães d'água.
Oxum, contendo em suas mãos o espelho de ouro, cravejado por
pedras preciosas como o poder de reger as águas doces, Yemanjá
o espelho de prata com gravações semelhantes aos frutos do mar,
cravejado por conchas indica que o domínio sobre os oceanos está
em suas mãos; assim como seus cabelos longos, cacheados e
ondulados que as duas mostram-se a pentear, como tendo em
mãos os domínios sobre as ondas.
Manusear o espelho também consiste no poder de refletir a luz
focando seu feixe rumo a iluminar as coisas obscuras, quando
Oxum e Yemanjá dançam manifestadas em seus filhos, miram-se
nas costas do espelho refletindo nele apenas as imagens das
pessoas ao seu redor, como o olhar para fora de quem mora no
fundo das águas a mirar oque está do lado de fora; é ela que nos
faz perceber a importância da individualidade, que cada beleza
112
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

tem suas próprias formas e que cada ser tem seu valor...
Interpretadas como Oxum a dona da sabedoria e Yemanjá sendo a
senhora dos pensamentos, se faz notável o gesto de nossas
imagens em seus espelhos, é a mãe que abre mãos de sua vaidade
para focar em seus filhos, é a luz por ele refletida em nossos
passos que se fazem em bênçãos e axés, para que tenhamos a
sabedoria suficiente em nossas reflexões, e que através dos
pensamentos tenhamos clareza e melhores resoluções em nossas
vidas.

OLOMÍ OXUM
Axé do perfume

Como o axé cantado onde os Orixás de praia dançam a segurar espelhos e


vidros de perfume...

...OLOMÍ OXUM... Traduzido em "...Oxum a senhora das águas e


senhora das águas dos rios..."

É a água que hidrata, com água se geram as folhas, as flores e as frutas,


com seu aflorar e amadurecer liberam suas fragrâncias e essências que
encantam o ar, fazendo também suas interligações de axé com Yansãn/Oyá
a rainha dos ventos, surgindo entre elas o leque e o perfume. Com o
perfume espalhado/exalado ao ar desabrocham os axés refletidos entre
Yansãn/Oyá e Oxum... o perfume é tempero-ferramenta do amor, da
atração, da sedução, do desejo; também é com o perfume que atraímos o
axé de felicidade.

113
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

YEYÊ KARI, YEYÉWÔ KARIÔ


O PODER DO OURO

O poder de Oxum está nos rios, na sabedoria, na maternidade, nos


sentimentos e estende-se muito além de todos eles...

Em meio ao rufar dos tambores e seus ritmos ouvimos a reza que canta...
"...yeyê kari yeyéwô kariô, Oxum kariô kariô kariô..." traduzida em "... mãe
da região, mãe da fortuna da região..." vemos no centro do salão Oxum
segurando uma peneira de palha dançando entre as pessoas e Orixás como
a peneirar o ouro e com breve gestos de mover das mãos para o centro e
para fora da peneira estende o ouro a seus filhos; é ela a mãe que ensina a
seus filhos que o sucesso vem através dos merecimentos e dos esforços.

Ao compartilhar, Oxum mostra em seus gestos o poder da solidariedade,


onde chora por seus filhos para que eles tenham êxito, a peneira deixa
escapar "o sem valor" para que tenhamos o importante em nossas mãos,
indica que deixemos para trás as coisas que não nos auxiliam e/ou
atrapalham com exercício a sabedoria que nos revela o valor em nós
mesmos, libertos das teias que nos prendem somos então capazes atingir os
nossos objetivos. Dispondo cada elemento em seus devidos lugares... ar aos
pássaros, água aos peixes e terra para as sementes.

ALÁ

Dentre todos os rituais executados nas cerimônias africanistas, este


fundamento que consiste em estender suspenso sobre a roda de
batuque/roda de rezas e danças, um pano branco (alá), é o único dos
preceitos que ultrapassa o nível das cabeças dos presentes, abençoando a
todos os presentes, pois diferencial aos demais rituais, este é o único em
que podem participar todos os presentes sem maiores distinções, sejam
prontos, iniciados ou apenas simpatizantes, vestidos a caráter religioso ou
com traje civil, dos recém nascidos aos anciãos. É um dos elementos do

114
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Orixá Oxalá, o pano branco é como a roupa do criador da vida, o axé da


igualdade, humildade, paz, origem e ancestralidade cabível ao Pai de todos.

Inicia-se o ritual de estender o alá no entoar das rezas de Oxalá,


preferencialmente esta missão cabe aos filhos deste Orixá ou aos filhos de
Orixás chamados cabeças grandes (Oxum, Yemanjá e Oxalá). O Alá indica
que os rituais festivos estão chegando ao fim.

O momento de recolher o alá é marcado nas passagens onde se encerram


as rezas de Oxalá velho e iniciam os contigos para Oxalá moço o qual
segura o alá e o carrega nas costas como o poder de sustentar o céu, assim
como o axé da vida que após o amadurecimento em um plano reinicia-se
em nova jornada, o qual após apresentar o alá deposita-o no quarto de
santo. Ecerrada a obrigação de alá não descem mais Orixás a terra, apenas
retornam à suas origens já que cobrindo a tudo e a todos o branco do alá
faz-se universal, neutralizante e misericordioso sobre qualquer falha
involuntária ocorridas nos períodos de obrigação aos Orixás. É o olhar de
Deus sobre a terra, a bandeira da paz e a sincronia entre os mundos.

OBÉ
A ferramenta de ligação / O axé de Ogum

Obé é a forma religiosa e de origens yorubá com que nos referimos a um


dos principais instrumentos ligados aos cultos de Orixás, a faca utilizada
nos rituais de batuque é denominada de obé de santo.

Dividem-se basicamente em quatro principais obés que são:

*Obé de Bará, o qual tem como funcionalidade fazer as obrigações ligadas


ao Orixá Bará em suas classes de quarto de santo, assumindo assim a
característica de Bará como o individual, pois come com seu próprio obé.

*Obé de serviço, é o 2° obé de Bará ou o obé do segundo Bará a ser


assentado com o qual tem por finalidades executar todos os tipos de
trabalhos e serviços, sejam eles feitos fora ou na casa de religião, porém
não feituras de Orixás, porém assume caráter de obé padrão por ter
utilidade em quase todas as finalidades que não sejam ligadas diretamente a
115
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

assentamentos de Orixás e feituras de iniciados; realizam trocas,


seguranças pessoais, domiciliares e empresariais; também é conhecido
como obé de feitiços.

*Obé de cabeça, o obé feito junto ao assentamento de Ogum, já que a cada


Orixá cabem regências distintas em elementos e formas de ação, pois se um
único Orixá exercesse completa atuação em todos os aspectos não se fariam
os demais em Orunmalé, cabendo somente a Ogum o Orixá da guerra às
lidas e manuseios sobre as armas, ferramentas e metais.

Assentamentos de obés, assim como tarefas divide apenas com seu irmão
Bará, cabendo aos dois às execuções de tarefas ao Orixá do pai-de-santo. É
o obé do Orixá da casa, o obé de fazer filhos e assentar Orixás, só têm
direitos a sair de dentro da casa de religião quando em rituais de feituras
rumo à outra casa de religião de filhos e/ou afilhados do Babalorixá.
Tomando por exemplo, seria pouco conveniente um Babalorixá filho de
Orixá de rua ter de levar o obé de rua para dentro de casa em razões de
feituras de filhos e após devolvê-lo-ia aos assentamentos de rua.

*Obé de Lodê, tem por fundamentos assentar e executar funções de feituras


para Bará Lodê e Ogum Avagãn já que o contrário das outras classes, aqui
é o Ogum quem acompanha e é dependente do Bará.

*Obé de Avagãn, exerce funções ligadas diretamente a demandas, atuando


em resolver casos como soltura de inocentes, apreensão de culpados e
foragidos. Nos casos em que não se possui Obé de Egum ou outros Orixás
de rua como Obé de Dirãn ou Timboá (Orixás Oyás de rua), é
desempenhado por ele as respectivas funções.

*Obé de Egum, originalmente era um obé de Orixá que após o falecimento


de seu filho e rituais de desligamentos de Orunmalé foi ligado as
obrigações de balé, assim ficando de herança a um iniciado no culto aos
Eguns.

As facas utilizadas para as feituras de obés devem ser pontiagudas, com


corte a fio liso e sem serras, seguindo as linhas de padrões aos
assentamentos dos Orixás. Assim sendo compostas por cabos em materiais
de origem mais naturais possíveis, tais como ossos, chifres, madeiras e
metais que preservando suas características naturais auxiliam como elos
condutores de energia e magnetismo entre mão as ligações; diferentes dos

116
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

cabos sintéticos, plásticos e acrílicos que de certa forma exercem funções


isolantes de energias.

Alguns adeptos fazem-se contrários as feituras de obés com cabos de


chifres e ossos por interpretarem de alguma forma ter esses materiais
vínculos aos Eguns. Basta dizer que Ogum é Orixá defesa e estrutura
representadas em suas oferendas de costelas assadas e manifestado em
forma de dentes e ossos, então para renegar cabos de tais materiais não
poderíamos ter assentamentos adornados por chifres e junto deveríamos
desossar as costelas assadas para os ebós de frente a esse Orixá.

Obé é um dos fundamentos mais significativos, é o instrumento fruto da


árvore genealógica, o filho recebe seu obé pelo axé do obé do pai, o pai
recebe o seu obé pelo axé de obé de seu pai, que foi dado por seu pai e em
origens que rumam aos fundadores da religião, seguem os fundamentos de
ligações que interligam os obés fazendo de um o pai do próximo pai e
assim até os futuros pais.

Ao exercer atividades com o obé se faz importante lembrar que é uma


ferramenta e ao mesmo tempo uma arma, assim como toda arma e
ferramenta merecem cuidados e destrezas ao serem manuseados. Torna-se
fundamental segurar o cabo com firmeza e correr o fio por completo até
suas extremidades, formando assim uma liberação precisa e uniforme;
deste fundamento surgiu a famosa e antiga frase que costumeiramente
ouvimos diante aos rituais das casas mais antigas: "-Que minha mão seja
leve."

... Para que a caminhada dos iniciados vinculados ao ritual seja em passos
equilibrados.

Ex.:

Corte leve de uma ponta a outra, (axé contínuo).

Corte em zig-zag, (axé disperso).


117
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Enquanto o axé contínuo segue por toda a lâmina do obé de uma


extremidade a outra, o axé em ziguezagues faz um frenético; podem-se dar
sequências ao axé contínuo, nos momentos onde com auxílio do obé se
direciona o axorô em movimentos de "circular" no sentido anti-horário para
"fazer" ou em horário para desfazer o axé presente nos objetos a serem
emanados por axorô, liga-se e vincula-se(vinda) ao Orixá, desliga-se e
desvincula-se (ida) ao Egun.

O AXÉ DE ORUNMYLÁ
Jogo de búzios / A comunicação entre os mundos

São formas de manifestações da natureza vinculadas a elementos de ações


interagentes e intermediários entre homem é Orixá; a natureza carrega em
si o poder de se manifestar; ao vermos as copas das árvores sem folhas,
com folhas secas e espalhadas pelo chão e ao vento, concluímos ser início
de outono; ao notarmos mudanças como o aflorar dos botões e exalar de
fragrâncias florais, notamos ser primavera; seja a lua cheia que anuncia a
elevação das marés; ao cair do sol e escurecer do céu prevemos que se faz
por entardecer rumo à noite; sejam em temperaturas climáticas, em nuvens,
na forma do amanhecer onde os mais sábios e mais antigos saberiam como
seriam os próximos dias, sol ou chuva... e com essas manifestações
fundaram-se o axé de búzios.

Os fundamentos ritualísticos para vincular as percepções do homem junto


às ações e reações dos Orixás iniciam-se após o pôr do sol, quando a luz
repousa é hora de tornar os sentidos mais aguçados além das formas que os
olhos podem captar. Como os animais de hábitos noturnos, de pouca visão,
mas de muita percepção. Sendo visão equivalente a audição, olfato, tato e
paladar para que sequencialmente abram espaços para um sentido além,
tornando assim o indivíduo mais vulnerável e suscetível aos sentidos
mentais como a clarividência.

Basicamente o ritual de forma padrão consiste em ligar os búzios aos


sentidos receptivos e perceptivos de um iniciado para que sejam
respondidos e confirmados através dos Orixás nos jogos de búzios.

118
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Vincula-se o axorô de uma ave preta representante do oculto, de uma ave


branca representando as revelações, e um casal de pombos que exercem
papel de onipresença, ligando o iniciado (matéria e espírito) à Orunmylá
(Divindade) através dos búzios (interligação). Após todos os materiais
terem descansado ao sumo de ervas e serem untados com banha de orí e
mel, libera-se o axorô da ave preta sobre os olhos fechados vinculando o
oculto entre o leitor de búzios e o Orixá, em seguida libera-se o axorô da
ave branca sobre os olhos abertos para que se estendam os axés de ligação
a visão e revelação sobre as coisas ainda ocultas, finalmente liberam-se os
axorôs do casal de pombos brancos para estabelecer vínculos entre os
segredos e as revelações; após cobrem-se de penas os materiais de feituras
representantes do axé para que sejam preservados e segundos antes do raiar
do sol lavam-se os olhos do iniciado com água da quartinho de Oxalá
Orunmylá, para que junto ao nascer do dia venha a luz portadora das
respostas necessárias; após alguns dias recorrentes ao ritual se aliviam as
penas do material ligado aos olhos que se encontra depositado no quarto de
santo, a fim de concluir a primeira etapa deste axé.

A confirmação dos Orixás ocorre dias depois, onde a beira da praia


arriam-se as obrigações já aliviadas somadas a ebós para Orunmylá junto a
pedidos e agradecimentos pela nova forma de visão... Para que tenha visão
ampla e infinita como as águas, que subam aos céus como perguntas e
desçam as respostas como a chuva.

Depois de concluídos os fundamentos de praia e retornados a casa de santo


o iniciado bate cabeça e com os búzios do iniciado o Babá/Yalorixá joga
confirmando ou não a liberação dos Orixás para que o filho inicie sua
jornada como leitor de búzios, caso recebam o agô (licença) é hora então
do filho iniciado receber a confirmação a seus olhos, onde a primeira
jogada é do filho jogando para o seu Babá/Yalorixá.

119
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

É chegado então o momento de montar o jogo de búzios, estende-se uma


toalha branca (infinito) e sobre ela dispõem-se a guia imperial que é
representante de todos os Orixás (universo), duas favas que ao iniciar o
jogo são entregues nas mãos do consulente, a sineta que desperta os
vínculos de comunicação, uma moeda posicionada de forma central
(representante do indivíduo em questão), que pode ter mais 4 dispostas a
seu redor porém mais próximas a guia (fogo, água, terra e ar), geralmente 8
ou 16 búzios dispostos ao redor da moeda central como se apontando para a
mesma.

De fora para dentro temos a guia, quatro moedas, os búzios e a moeda


central.

Após os elementos serem posicionados em seus devidos lugares, inicia-se


tocando a sineta sobre a passagem da guia representante de Bará e segue-se
por todas as no mínimo 12 passagens de Bará até Oxalá, chamando-os nas
devidas ordens para que se façam em respostas diante nossos sentidos
ligados ao fundamento do jogo de búzios, após, com as palmas das mãos
estendidas ligeiramente "cobrem-se" os búzios pedindo agô a Orunmylá e
levando as pontas dos dedos na testa com as extremidades tocando a base
do "olho espiritual" onde momentaneamente a visão física é limitada na
palma das mãos para que se liguem as respostas a nossa visão espiritual,
novamente "cobrem-se" os búzios e em forma de bênçãos beija-se a ponta
dos dedos com novas reverências a Luz de Olorum depositada em
Orunmylá para que em um breve juramento de honrar a verdade somente
os olhos guiem a boca do leitor de búzios.

Após reverenciar entregamos as favas nas mãos da pessoa para que captem
as emanações individuais e tragam maior legibilidade ao leitor de búzios,

120
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

pegam-se os búzios entre as duas mãos posicionadas como em oração,


contendo os búzios, bate-se ao lado direito da mesa e externo a guia,
saudando os ancestrais, o lado masculino e ativo (-) do universo,
sequencialmente se faz ao lado esquerdo para saudar a ancestralidade, o
lado feminino e receptivo (+)... Elevam-se as mãos sobre a moeda ao centro
da mesa e friccionam as palmas para imantar energeticamente os búzios
nelas contidos, ativando assim as ligações presentes ao momento. Abrem-
se as mãos para que caiam os búzios revelando sempre a primeira jogada
sobre as regências de Bará, por ser ele o mais próximo aos humanos e o
requisitado como mensageiro que abre ou fecha os caminhos, o elemento
comum a todas as conexões, o eixo entre os homens e os Orixás, é ele
quem se manifesta por primeiro permitindo ou não a consulta aos outros
Orixás; caso diga que não e feche a resposta dos búzios, não se insiste.
Indica que a pessoa em questão está em pleno ciclo menstrual, drogada,
recentemente praticou relação sexual ou está para desencarnar em muito
breve e não há nada a fazer.

Caso Bará se manifeste em forma positiva seguem-se as jogadas de búzios


junto às perguntas feitas por parte do consulente. As caídas são lidas nas
somas e posições marcadas pelos búzios em relação aos outros
componentes do jogo e a si mesmos, sejam também por exporem seus lados
abertos ou fechados da concha, somados a clarividência e ao sopro dos
Orixás; perguntas e "respostas" indicativas por meio do consulente servem
como "muletas" que auxiliam o leitor do jogo a seguir por linhas de
maiores interesses do consulente, também é válido ressaltar, que as
previsões lidas no jogo de búzios podem ser completamente alteradas com
o tempo já que tudo depende das ações do consulente... Após ler o jogo e
informar sobre possíveis viagens, propostas e outros assuntos, o consulente
receberá as previsões sobre as tendências a decorrer, mas cabe somente a
pessoa em questão seguir em esforços para se realizar ou não.

Previsão e precisão carregam aspectos diferentes entre sí, e tudo depende


do merecimento (esforço/desempenho) particular. Da mesma forma que
para receitar um remédio antes o médico deve examinar o paciente, o
babalorixá consulta os búzios para depois orientar o consulente.

Vontade pode ser lida como oposta a força de vontade, querer é algo, ter é
outro e merecer é a maior evolução.

121
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Assim como todo e qualquer axé recebido, como o axé de obés e o axé de
búzios, antes de ganhar o axé é preciso cumprir os preceitos de assentar os
Orixás vinculados ao axé.

ENTREGA DE AXÉS
O DIPLOMA DO BABALORIXÁ

Após o iniciado ter cumprido as devidas obrigações de assentamentos a


seus Orixás e concluir seu Orunmalé, tendo sete anos de aprendizagem
religiosa, podendo ser o período abreviado ou prolongado de acordo aos
conhecimentos adquiridos, déficits, necessidades e desígnios por parte dos
planos superiores, é chegada a hora da formatura que se faz por entregar os
Axés de obés e yfás como aval de apronte, pronto no sentido de poder atuar
como novo pai ou mãe de santo. O axé entregue é uma simbologia
apresentada ao público como a representação da hereditariedade espiritual.

Toda e qualquer cerimônia de entregas de axés, exige por normas


religiosas/fundamentos serem entregues durante os períodos de festividades
religiosas em comemorações aos ebós de quadrúpedes aos Orixás, onde as
casas de religião abrem as portas e dispõe grande receptividade para com as
visitas de integrantes de outras casas de religião, parentes religiosos,
clientes e simpatizantes ao culto; tornando o público visitante como
testemunhas das feituras e entregas de axés para que mais além também
possam divulgar a veracidade sobre os fatos ocorridos. A partir de 32 dias
após assentados e apresentados os axés (período conhecido como descanso
dos axés) o novo sacerdote pode iniciar suas atividades como Babalorixá
(pai-de-santo) ou Yalorixá (mãe-de-santo).

122
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

(Acima, foto da entrega de axés do Babalorixá Branco d'Oxalá. a direita da foto sua
madrinha de orí, Yalorixá Janaina de Xapanã Sapatá; a esquerda sua madrinha de axés,
Yalorixá Raquel de Oxun Docô e ao centro o Babalorixá Luiz de Xangô Agodô,
responsável pelas feituras e entregas de axés).

Ajoelham-se os iniciados que recebem em mãos a bandeja contendo os


axés de búzios e dois obés que indicam liberdade para fazer trabalhos
religiosos e também feituras de filhos, com os axés em mãos recebem um
breve discurso seguidos por votos de felicidades e uso consciente para os
devidos fins, caminham carregando a bandeja de joelhos ou em pé de
acordo a cada casa, amparados pelo sacerdote e seus respectivos padrinhos
que segurando uma vela acesa dançam ao ritmo dos tambores como
exemplo em guiar seus afilhados junto aos desígnios dos Orixás, no entoar
dos axés cantados para Bará são apresentados a porta do salão dos Orixás
para que o novo axé seja expansivo, seguem a caminhar da porta rumo ao
quarto de santo sob os axés cantados para Ogum o Orixá dos Obés, por
último entoam-se os axés para Orunmylá onde seguem em caminhada e o
iniciado ajoelhado na parte central do salão tem a bandeja e seus olhos
tocados pelos Orixás e Baba/Yalorixás presentes num ato de aval comum a
todos. Somos portadores de uma força interior que se encontra no orí, antes
de chegar a qualquer lugar devemos reverenciar Bará, isto é como sair do
centro da encruzilhada e tomar um dos caminhos a volta, saúda-lo é

123
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

caminhar. A religião é uma faculdade que se inicia, mas que nunca se


conclui.

AXÉ DE FALA
O AVAL AOS ORIXÁS

Após determinado período que geralmente é superior a dois anos de


chegada do Orixá, onde foi comprovado ao Pai ou Mãe de santo através de
resultados cotidianos a veracidade em relação à ocupação de um Orixá em
seu filho de santo, toma-se por procedência liberar a manifestação do Orixá
através da voz pertencente ao filho ocupado, para que assim possa auxiliar
diretamente os Baba/Yalorixá nos preceitos ocorridos dentro da casa de
religião, além de cantar axés e oferecer palavras precisas e de conforto aos
fiéis.

Para um Orixá receber o axé de fala são necessários alguns requisitos


como o filho ter as obrigações mínimas de assentamentos de Bará e Xangô
somados ao próprio Orixá de cabeça com seus principais adjuntós.
Apresentar destreza, cumplicidade e fundamentação, mesmo que ainda sem
fala pode se referir em gestos e ações, já que do axé de fala em diante o
Orixá manifestado assume o papel fundamental em ser um dos "braços
direitos" do Babalorixá, confirmando e/ou advertindo/retificando o pai de
santo. Meio as festividades de ebós de quatro pés aos Orixás cabe ao Orixá
a ganhar fala, manifestar-se nos axés entoados aos Orixás Xangô ou Odé,
um por ser o regente dos sons como a fala e o outro por ser o regente dos
alimentos; ao parar dos axés cantados o Babalorixá faz um breve discurso
falando sobre o tempo de chegada do Orixá e explanando sobre as
motivações que o levaram a liberar a fala do Orixá, na sequência seleciona
testemunhas para o ato reservado somente a Orixás que já tenham fala e
Babalorixás que geralmente são mais antigos entre os presentes; ao cantar
da reza do Babalorixá seguem para uma peça reservada onde encontram-se
os ingredientes complementares para a entrega do axé de fala, que podem
ser formados por toda espécies e qualidades de alimentos ligados sem
exceções a todos Orixás, tanto sólidos quanto líquidos, formados por
origem natural do reino animal e vegetal a serem ingeridos pelo Orixá que
124
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

vezes podem ser crus, cozidos, assados, fermentados, incandescentes, em


combustão e até em outros estados físicos que variam de acordo aos
costumes de cada casa religiosa.

Durante as entregas complementares a liberação da fala, os Orixás que se


manifestam em seus filhos começam a ocupá-los e finalmente
compartilhando dos ingredientes da fala, depois de concluído o consumo
dos elementos o Babalorixá pergunta aos Orixás manifestados e em seguida
aos Babalorixás e Yalorixás presentes se estão de acordo a dar liberação
para que então o Orixá fale, caso não concordem providenciam-se por
agregar mais "alimentos/elementos" para que o Orixá os consuma até o
momento que todos concordem na liberação. Assim voltam para o salão
dançando o axé cantado ao Orixá da casa, o sacerdote apresenta o Orixá ao
público com honras por ter cumprido os preceitos, e agora diante de todos
novamente pergunta as testemunhas uma a uma se aprovam a liberação da
fala, visto que sim cabe ao Orixá apresentar-se falando seu nome e
cantando o axé de assentamento do seu Bará, seguido por seu axé e subindo
na reza cantada do Orixá do sacerdote. Optamos sempre por preservar
palavras ao falar cobre a composição dos ingredientes deste axé, só saberá
quem fez, quem testemunhou e quem comeu. Não cabe aos seres humanos
julgarem o Orixá, mas sim serem julgados por ele.

"DE AXÉ DE FALA NÃO SE FALA!"

...

125
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

MEL E DENDÊ

Tanto o mel quanto o azeite de dendê são elementos fundamentais para as


manutenções ritualísticas que envolvem as formas físicas de cultuar os
Orixás; de acordo as necessidades de cada ebó e feitura podem ser
utilizadas de maneiras isoladas ou a serem combinados...

mel e epô como mais é conhecido o azeite de dendê, além de serem


condutores de axé, também servem como principais referências que
abrangem os únicos dois grupos de Orixás existentes, os Orixás de mel
(Oxum, Yemanjá e Oxalá) e os Orixás de epô (Bará, Ogun, Yansã/Oyá,
Xangô, Odé, Otin, Obá, Ossayn e Xapanã)... Embora alguns Orixás possam
de acordo aos fundamentos particulares a cada casa receber oferendas que
além de azeite levem mel como nos fundamentos para Bará Ajelú, Xangô,
Odé, Otin e Ossayn... estes continuam pertencentes as classes de Orixás de
epô, já que o ponto de principais distinções entre o povo do mel e o povo
do dendê é justamente o fato de que os Orixás de frente/guerra sempre
recebem azeite de dendê enquanto os Orixás cabeças grandes/velhos
recebem apenas o mel; podem ocorrer raras exceções como nos casos dos
Ybedjis cultuados de acordo as instruções de cada sacerdote, onde estes
Orixás gêmeos não se separam, o menino (Orixá de frente) é assentado
junto a menina (Orixá de praia), ocorrendo que de forma direta ou indireta
o assentamento que combina ambos acaba por também comportar tanto mel
quanto dendê, gerando um axé de fusão onde masculino/fogo (dendê) de
encontro ao feminino/água (mel) geram um novo elemento, que ao mesmo
tempo de guerra é também considerado pacífico. A extração do azeite de
dendê ocorre com a prensa dos frutos do dendezeiro antes selecionados do
cacho da palmeira de dendê, assim de origem totalmente vegetal; já o mel é
fabricado ao regozijar das abelhas que se alimentam do pólen das flores
depositando o mel em favos de cera também produzidos pelas mesmas,
uma ação resultante da ação animal sobre o vegetal; a fabricação do dendê
explora os frutos vegetais através da mão de obra, já o mel estocado nos

126
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

favos de cera encontrados nas colmeias, exige apenas ações naturais como
a colheita do pólen e a produção do mel exercido apenas pelas abelhas.

Os Orixás secos (epô) são representados pelo azeite, por ser um elemento
ícone de ação, que além de ser considerado um material quente também
não é solúvel (repelente e impermeável) a água, aspecto semelhante ao
caráter que define esses Orixás por serem guerreiros, extremamente ativos
e contrários as atividades pacíficas que englobam os Orixás d'água. Os
Orixás de praia se fazem representados no mel, pois contrários ao dendê, o
mel que além de ser um elemento compreendido como frio também carrega
características como doces receptivas e solúveis; enquanto o azeite revela
agilidade e leveza, o mel se mostra mais lento e pesado, misturando-se e até
emergindo em água.

MOEDAS E BÚZIOS

Cwaurim, cauri, cimbo, jimbo, zimbo e o famoso búzio são vários nomes
de uma concha pertencente a um molusco, também podendo ser
compreendida como o esqueleto do mesmo.

As cochas foram empregadas como moedas correntes tanto na África


como no Brasil, não somente por negros, mas também por europeus, em
destaque os portugueses que aqui chegavam exportando as moedas-
búzios/cauris, com a principal finalidade de negociar escravos nas feiras
africanas; já na África os negros depositavam suas conchas-moedas junto
aos altares/assentamentos/locais de cultos aos seus Orixás como em forma
de devoção e adoração.

Levadas as conchas e recebidos os negros, vezes trocado um tonel de


conchas-moedas por um navio repleto de negros, fazendo desta moeda uma
forma materializada do câmbio de tráfico negreiro.

Junto a crescente exportação das conchas que inundaram o mercado e as


vias comerciais, com o tempo os búzios foram perdendo seu valor de troca,
127
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

que em torno das primeiras décadas do séc. XIX (ano 1800 a +/-1830) não
portavam mais valores de trocas comerciais, outros itens assumiram o papel
de moeda de troca, assim como dos pagamentos com sal surgiram os
salários... Vieram o açúcar, fumo, cacau, couro e uma série de elementos
agregavam em sí valores monetários e poder de trocas comerciais; tornando
o porte dos búzios como sinal/símbolo de riquezas da terra que ao passar
dos anos tiveram as substituições de seus valores nas moedas cunhadas em
metais e mais recentes transmitidos nas impressões de células de papel.

A moeda por sua vez é um material visto como itinerante por circular
praticamente em todos os lugares e ambientes... Ruas, becos, caminhos,
estradas, avenidas, veículos, parques, praças, cemitérios, hospitais, bancos,
bancas, comércios, bolsas, bolsos e etc... Todo caminho transitável pode ser
percorrido pela moeda.

É símbolo de axé que de mão em mão, vai de rua em rua, de bairro em


bairro, de cidade a cidade e de valores correspondentes em outras moedas
de outros países;

Passeiam a pé, de bicicleta, de moto, de carro, de barco, trem, navio e


avião;

Simbolizam a transição, mediante os fundamentos de Orixá perdem o valor


financeiro ressaltando apenas o axé e o poder de presença universal, as
moedas correntes passam a vez para as moedas antigas, já que ambas tem
o mesmo valor, optamos por preservar os valores das moedas correntes a
serem empregadas para seus devidos fins, onde o dinheiro perde total
sentido valorizando apenas as virtudes impagáveis.

As semelhanças entre as antigas moedas metálicas e os búzios é que ambos


já tiveram valores monetários de compra e venda hoje se encontram fora do
mercado de trocas; as diferenças entre elas é que as moedas cunhadas em
metal foram produzidas nas mãos humanas tornando-se moedas do ayiê
(plano terrestre), quanto aos búzios foram criados pelas mãos de Olorun em
Oxalá servindo como moedas do orun (plano celestial).

Moedas e búzios são elementos de fundamentos abrangentes a todas as


obrigações de assentamentos, o jogo de búzios é basicamente constituído
por uma moeda que vem a representar uma situação ou indivíduo, quanto
os búzios lançados em seu torno trazem as posições favoráveis a ser

128
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

tomada para uma resolução e boa sorte, nos assentamentos de borí a moeda
representa o universo individual a cada orí quanto os búzios posicionados
em sua volta são números representativos de axé do Orixá eledá de cada
iniciado nas obrigações de borí, nos assentamentos de Orixá encontramos
um círculo de búzios intercalados com moedas ambos de acordo as contas
numéricas de cada Orixá, quando intercalados seguem como uma corrente
que entrelaça o plano material com o espiritual confirmando os axés do
assentamento que por sua vez tem por significados unir dois planos
vinculando o Orixá com o cotidiano; quando um búzio é sobreposto acima
de uma moeda é indicativo que o sobrenatural se faz superior às leis
naturais, como a proteção divina; empregados nas confecções de fios de
contas, guias, adornos como brincos, anéis, colares, braceletes,
tornozeleiras e pulseiras servem como amuletos, um ponto de axé que para
nós africanistas assume valores além de ornamentais, são ícone de
referências à ancestralidade de todo nosso povo como símbolo de uma só
nação, a fé.

Em todo seu histórico os búzios podem ser compreendidos como símbolos


representantes de axé, força, poder, fortuna, prosperidade, proteção,
resistência, confirmação, união e todo tipo de boa sorte.

ACAÇÁ

Acaçá é o fundamento em comum as feituras de todos os Orixás, feito da


pasta de milho branco moído e cozido em água, onde na sequência este
mingau quente deve ser enrolado em folha de bananeira previamente
sapecada ao fogo que a permite maior resistência e flexibilidade ao
envolver a massa, somente após a massa esfriar, assim se solidificando
embrulhada na folha de bananeira podem ser consideradas acasá. O acasá
está associado ao sopro de Olorun, seu fundamento representa a vida, a
existência e a pureza imaculada como a massa branca envolta (protegida)
na folha de bananeira.

Comparado a uma parte do corpo, pode-se dizer que acaçá seria o coração.
Só pode ser retirado da folha ("desenformado") no momento de

129
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

complementar o ebó de um Orixá, tornando-se assim também um dos ebós


do Orixá Oxalá.

BANHA DE ORÍ

Na visão africanista a banha de orí é elemento sagrado e consagrado ao


Orixá Oxalá também chamado de Orixalá, pois o nome já diz Orí é cabeça.

Originalmente a banha de orí era extraída de uma árvore com o mesmo


nome, vegetal chamada de árvore de orí, manteiga que popularmente em
terras brasileiras ficou conhecida como manteiga de Karité, produto
nomeado pela castanha fruto o qual se extrai a manteiga que atualmente
também é muito utilizada na fabricação de cosméticos nutrientes para a
pele e para os cabelos; árvores centenárias nativas das savanas africanas
que podem ultrapassar até 300 anos de idade, encontradas em Costa do
Marfim, Ghana, Nigéria, Senegal, Guiné como também em Camarões,
Sudão, Uganda e Congo, locais estes que a tratam como árvore sagrada
associando sua manteiga com detentora de propriedades místicas. Com as
adequações e costumes regionais conduzidos por localizações geográficas,
influências climáticas e dificuldades comerciais nos cabe dizer que alguns
materiais empregados em procedimentos religiosos tiveram de ser
substituídos por outros mais próximos e semelhantes possíveis aos
originais, para que não houvessem grandes choques nas estruturas
litúrgicas ou simplesmente uma lacuna espiritual, assim aconteceu com a
banha de orí que atualmente comercializada em grande maioria tem por
suas bases o sebo de carneiro ou menos comum o sebo de capivara
assumido assim correspondências similares e covalentes as fórmulas
originais.

A banha de orí recebe maiores destaques por ser um elemento que facilita
a infiltração do axé, como as forças encontradas nos mierós e nos axorôs,
são um salientador e fixador do axé sobre os materiais; atenuante das
barreiras que distinguem a matéria do espírito, utilizado para vulnerabilizar
os pontos onde irão ser plantados os fundamentos característicos a cada
propósito permitindo melhor fluidez das emanações direcionadas.

130
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Sejam nas preparações de feitura de orí(cabeça) ou de assentamentos a


todo e qualquer Orixá, lá está a banha de Orí.

SABÃO

Geralmente as pessoas entram em disfunções sobre fundamentos, vezes


alegam serem detentores de um elevado grau de conhecimento como em
menosprezar a sabedoria alheia, infelizmente a maioria se limita a
discussões sobre assuntos que na verdade variam de nação para nação e que
outras vezes variam também dentro de uma mesma nação cultuada em
casas diferentes, sem se darem por conta que estão a se envolver em
assuntos alheios sem muitas vezes haver uma preocupação de relação
íntima como a análise das coisas as quais estão de fato envolvidos. É fácil
encontrarmos adeptos entre eles pais e mães de santo hostilizar os
procedimentos que diferem de seus conhecimentos, pode-se até dizer que
as contestações ocorrem de uma forma quase que geral, porém ao fazer
uma análise individual mais íntima fica evidente que desconhecem os
propósitos fundamentais aos quais os próprios são submetidos.

Tem ou tiveram suas cabeças lavadas com sabão da costa, sabão de coco,
untadas com banha de orí entre outros, mas e aí? Se não dominam os
conhecimentos nem por coisas que são ligadas ao seu próprio orí (cabeça)
estarão aptos a criticar seus próximos?

O sabão africano comercializado se tornou conhecido como sabão da costa


por ser originalmente importado da região costa da África, antigamente
feito às maneiras artesanais, sem corantes e sem conservantes, eram macios
a pontos de serem maleáveis e de fácil dissolução, porém hoje é em grande
parte industrializado; seus ingredientes variam pouco, compostos por
resinas vegetais, cinzas de madeiras apropriadas, cinzas de cacau, óleo de
palma, casca de banana, mel, ervas maceradas e até algumas sementes. Já o
sabão de coco possui sua base essencial ao axé por conter o óleo de coco.
Ambos os sabões são utilizados juntos para fins de anular/desligar o axé
individual como nos casos de lavagens de cabeça e obrigações de
assentamentos que feitos em uma casa de religião pelas mãos de
determinado Babalorixá, ingressando em uma nova casa e nas mãos (sob

131
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

cuidados) de outro Babalorixá, são então lavados os iniciados e utensílios


ligados à religião com a finalidade de trocar o axé de mão referente ao
antigo sacerdote para o atual.

FLORES E FRUTAS

Resumindo a importância das flores assim como das frutas nos


procedimentos vinculados aos Orixás, pode-se dizer que ambas possuem
prioridades como os aromas e doçuras naturais que repelem as cargas
negativas, cada flor assim como cada fruta, embora tenham fundamentos
próximos são distintas umas das outras.

Entre os exemplos mais comuns, encontramos essências de atração e


sedução das pitangas e o desejo e sensualidade nas maçãs sob axé de
Yansã/ Oyá; a abundância somada à força das águas e a fartura das
sementes da melancia sob a regência de Yemanjá; no coco encontramos a
limpidez da água e a clareza do branco de Oxalá; na delicadeza e perfume
do pêssego encontramos axé de Oxum, também no mamão que doce e
repleto de sementes se assemelham ao interior do útero e seus óvulos que
também são regidos por este Orixá; as uvas pretas, associadas ao sangue e a
Xapanã.

Nas flores temos a rosa vermelha símbolo da paixão nas regências de


Yansã, a rosa amarela rica como o amor de uma Mãe Oxum, as rosas do
legítimo e ilimitado amor de Obá, as rosas brancas para Yemanjá como o
amor imaculado e fraternal que une a todos como uma Mãe em comum.

Flores e frutas acompanham os rituais mais comuns como complementos a


todas as obrigações, desde um xirê (ritual de doutrina restrito aos membros
da casa) a um batuque grande (festa decorrente as sacralizações de
quadrúpedes), assim como de rituais de borí a assentamento de Orixás são
utilizadas como representantes da felicidade, prosperidade, harmonia e todo
tipo de boa sorte... Compõe ebós, decorações, banhos e etcs...

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

QUARTINHAS

Quartinhas são elementos indispensáveis as obrigações de feituras e


assentamentos, contentoras de águas sagradas, assim como todo e qualquer
elemento empregado na religião possuem características individuais e
recebem seus devidos preparos antes de serem utilizadas como
componentes rituais, tais como o curtir junto ao sumo de ervas específicas a
cada quartinha e ao axorô ofertado a cada Orixá; geralmente são feitas de
barro e as vezes de louça quando para Orixás de praia. Exercem funções
difusoras, permanentes e constantes, sejam pelas naturais ações de
evaporação, pelo borrifar em forma de assajéun, pelo salpicar da água com
as mãos, pela soma de suas águas em banhos, macerar de ervas, limpezas
de materiais sagrados, batizados de locais, indivíduos e etc... Auxiliando
como condutoras dos axés ligados aos assentamentos dos Orixás, quando
feitas de barro conduzem com maiores fluidez e quando em louça fazem
por emanações mais sutis.

Servindo de elo entre o panteão das divindades e nossas vidas, as


quartinhas também podem indicar os graus de nossas necessidades,
carências espirituais e atuações vibratórias entre os dois mundos... Caso a
quartinha de um Orixá consuma água muito mais rapidamente que as outras
quartinhas, revelando assim um ritmo acelerado em relação as demais,
pode ser um indício de que a atuação de determinado Orixá ligado a esta
quartinha está fluindo com maiores intensidades que o normal, cabe então a
consulta do jogo de búzios para melhor interpretação do significado desta
ação chamada de "sede do Orixá"; já se o fato fosse uma súbita rachadura
ou estouro "natural" da quartinha, podemos compreender que a frente estão
por vir maiores demandas referentes aos aspectos respectivos ao axé de
cada Orixá.

Já que a quartinha é a ligação entre os planos, mediante as "causas


impossíveis" podemos fazer pedidos a forma de o som de nossas preces
vibrarem em seu interior, fala-se com a boca próxima as bordas da
quartinha para que uma palavra tenha mais poder.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

ASSAJÉUN

Assajéun de quartinha, o borrifar da água sagrada consiste em com a boca


conter uma quantia suficiente da água depositada em uma quartinha para
então borrifar com um sopro, fazendo assim uma leve neblina direcionada;
sejam como complementos para limpezas espirituais do corpo, ou de locais
como comércios e residências, sempre se faz no sentido de despachar o
peso e as cargas negativas, anulando e encaminhando as energias contrárias
de retorno à seus pontos de origem; Faz-se então sempre no sentido de
dentro para fora, dos fundos para a frente e de cima para baixo quando por
quartinhas de Orixás azedos (Orixás de dendê), assim como nos sentidos
contrários pode ser feito nas sequências para os Orixás doces (Orixás de
mel).

Como todas as práticas religiosas, das mais simples as mais complexas


estas exigem iniciação e conhecimento, tais como em fazer assajéun com a
pessoa posicionada de frente, de costa e novamente de frente de uma
pessoa enfeitiçada por grandes malefícios e/ou perturbações espirituais,
podemos quebrar a magia que a envolve, ou em fazer assajéun apenas com
borrifos com posição de frente a frente em um enfermo convalescente, pois
ao borrifá-lo quando de costas, voltado para a rua e/ou saída, uma pessoa
que tenha grandes debilidades físicas e espirituais podemos
embalar/deslocar seu espírito para Ykú, agravar seu estado de saúde e até
despachá-la ao óbito.

Entre as formas de assajéun temos o sopro de perfumes ligado ao axé de


felicidades que geralmente são realizados pelos próprios Orixás
manifestados; temos também os assajéuns a seco feitos ao soprar punhados
de cinzas peneiradas ou talco depositados sobre a palma da mão e soprados
ao vento com função de afastar os Eguns pouco evoluídos e que por hora
possam vir a nos atrapalhar. Podendo ser feito ao redor do corpo de uma
pessoa com as cinzas e o talco ao ar livre, nas portas de saída somente com
o talco, no portão da rua e do lado de fora com cinzas em sentidos de saída,
a direita e esquerda. Assajéun é ir de auxílio ferramentando o ar em busca
de socorro. Assajéun é como o vento se alimenta, fortifica e nos fortalece.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

ORUNMALÉ
A SAGRADA FAMÍLIA

Orunmalé é o seguimento adicional dos assentamentos de Orixás, são como


a família de um Orixá de cabeça; agregam axés junto ao Orixá principal de
cada iniciado; em estágios de um iniciado receber seus axés de obé e yfá se
faz necessário ter assentados no mínimo uma classe de cada Orixá, classe
esta estipulada pela classe do Orixá de cabeça, são como adjuntós
secundários e de complemento ao adjuntó principal de cada indivíduo.

Exemplificando, podemos dizer que em um Orunmalé onde o regente é


Oxum Pandá (primeira e mais jovial passagem de Oxum) as classes de
Orixás a serem assentados como "família Pandá" devem assumir classes e
qualidades mais próximas possíveis deste Orixá de água, assim geralmente
carregando características joviais e ligadas à praia. Seus cruzeiros de praia
serão seguros por Bará Ajelú por ser ele o possuidor dos axés de cruzeiros
próximos as águas; a classe de Ogun mais próxima as defesas marinhas e
também predominante ao zelar por metais preciosos tais como ouro e prata
é Ogun Adiolá; entre a maturidade de Yansãn e a jovialidade de Oyá se faz
de Oyá a mais próxima de Oxum Pandá; Xangô Aganjú pode ser
interpretado como uma pré fase de Xangô Agodô quanto Agodô pode ser
visto como a pós fase de Aganjú, um mais jovem e outro mais velho,
Aganjú se expande em pedras a beira das águas enquanto Agodô reina em
pedras de mato, então segue-se por Aganjú; como já sabemos Odé, Otin,
Obá e Ossayn não são classificados, revelam-se seus segredos de qualidade
com reverências ao axé de Oxum Pandá; mais jovem e decompositor das
matérias em água vem Xapanã Jubeteí com Oxum Pandá, que no caso de
Oxum Demun será Xapanã Belujá; as correntezas mais fortes e joviais nas
fases das águas quando doces são Oxum Pandá e quando em oceano são
Yemanjá Bocí; as fases onde o céu vem carregado de chuvas que
alimentam e agitam as águas doces e salgadas são Oxalá Bokun.
Resumindo, nas classes Ajelú, Adiolá, Oyá, Aganjú, Jubeteí, Bocí e Bokun
é que geralmente fornecem maior sustentação aos elementos próximos dos
Axés de Oxum Pandá.

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Já se for tratar de Oxum Docô (última e mais velha passagem do Orixá


Oxum) seu Orunmalé iria variar em classes tais como de Oyá, que passa a
ser assumido por Yansãn; Agodô assume o lugar de Aganjú; Xapanã
Jubeteí é substituído por Xapanã Sapatá; Yemanjá Bomí, Olobomí ou Nanã
fazem os cuidados do mar para Oxum Docô... isto de acordo com o
adjuntó principal pois se o adjuntó for cabeça de Oxum Docô com corpo de
Xapanã Sapatá logo sua Yemanjá será Nanã, quando for corpo de Xapanã
Belujá ou Xangô Agodô a Yemanjá geralmente será Bomí, Já nos casos
onde o corpo for Oxalá Jobokun quem assume posto de Yemanjá de
Orunmalé é a classe Olobomí. Manifestados em uma festa de santo
confirmam seus Orunmalés, enquanto os Orixás classificados como jovens
chegam ao mundo e dançam instantaneamente vigorosos aos ritmos de
percussão mais agitados enquanto as classes mais velhas surgem nos toques
menos cadenciados e movendo-se fragilmente como verdadeiros anciãos
seguindo por sentarem-se reunidos lado a lado nos chamados bancos de
praia.

OKUTÁS, ACUTÁS E OTÁS

Okutá, acutá ou otá são nomes diferentes de um mesmo elemento


sagrado. Okutá é a pedra onde são feitos os assentamentos aos Orixás; são
seixos encontrados em águas correntes.

Preservando os principais e fundamentais seguimentos de matriz


africana permanecem em seu estado natural como moldados nas mãos de
Olorun durante a criação do plano físico, é a natureza pura e incorruptível
feito Santo. Cada Orixá possui um ocutá com características diferentes aos
outros, porém, quando se tratam de ocutás regidos por um específico Orixá
dentre suas classes em grande maioria possuem alguns traços semelhantes,
quando para as classes novas de Orixás geralmente são mais lisos e de
aparências "mais leves" que os ocutás ligados às classes mais velhas, que
por sua vez assumem características mais marcadas como sulcos, furos,
dobras e rugas; para os Orixás de dendê (Orixás secos) encontramos várias
formações de seixos, mais quadriculados, porosos ou lisos em tons escuros,
já aos Orixás de mel (Orixás de praia) as pedras são mais arredondadas,

136
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

lisas e algumas vezes tem aparências vitrificadas, leitosas e/ou translucidas


assumindo tons mais claros que podem formar variantes de uma mesma cor
ou mais em um único ocutá.

"Vieram os vegetais, os animais e os homens... foram-se e todos irão, mas


aqui permanece a pedra, antes de sua idade até após a idade dos próximos!"

O okutá é o coração, a vida, energia latente e ponto principal de um


assentamento.

De exemplo temos os ocutás de Bará que geralmente são associados a


formas piramidais, pontiagudos com base mais larga que as outras
extremidades, a forma notada na pedra fala por si... Indica que a base é
necessária a todas as estruturas, como o chão, a terra, o piso, o solo, que
sempre devemos tomar cuidados e sermos prudentes ao iniciar qualquer
ação e atividade, pois se as bases não forem sólidas e adequadas não
teremos sucesso, como as tentativas de comportar algo grande em uma base
menor; apontado para cima indica atividade e presença que também se faz
como na ereção masculina já que seu axé também é ligado à sexualidade e
ao pênis. Sem Bará não se faz nada, a contar com as feituras de ocutá, não
se assentam outros Orixás sem primeiro assentar Bará.

Os ocutás de Ogun, do Senhor da guerra, assemelam-se a formas que


nos fazem relembrar cabeças de cobra, ferramentas de ferreiro e até
lâminas de armas; em algumas nações são adotados por assentar Ogun
apenas em ferramentas, tais como uma serpente de ferro, obé (faca),
marreta, enxada, lança, bigorna...

Os acutás de Yansãn/Oyá geralmente são redondos/esféricos como o


círculo da atmosfera ao redor da terra, distintos de todos os outros não
possuem um ponto demarcado como frente, tendo assim uma frente padrão
em toda sua forma como o vento que não se revela em formas visuais,
tornando-se um elemento uniforme; utilizam-se também acutás em
formatos que nos lembram batatas doces, maçãs, acarajés e corações pois
diante a interpretação religiosa aos mesmo nos remetem aos principais axés
deste Orixá.

Os okutás são elementos gerados como fragmentados naturais ligados


aos axés dos Orixás por carregarem as suas essências puras e intocadas,
137
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

preservadas no axé do tempo como as passagens das eras, mas não


podemos esquecer que alguns dos domínios do Orixá Xangô são
encontrados justamente nas pedras e rochas, muitas delas originadas nos
resfriamentos das lavas cuspidas por Xangô durante as erupções
vulcânicas, seus acutás possuem formas semelhantes e imagens de duplas
extremidades geralmente arredondadas como as lâminas de um oxé
(machado), tambor, livro, gamela; vezes mais compridos assumindo
semelhanças a uma caneta, pena de escrever, língua ou banana, e assim
como um julgamento entre prós e contras, o okutá pode assumir duas
frentes como a igualdade, eixo entre dois lados de uma balança.

Odé-Otin assim como Ossayn tem seus assentamentos cultuados em


vultos de madeira, porém na grande maioria das nações se fazem
indispensáveis seus assentamentos em acutás, mesmo com o entendimento
que os elementos de madeira representam as ligações com Ossayn por ser o
Pai das árvores e com Odé-Otin por serem os vegetais primordiais para a
vida animal ligada à Odé e Otin, os portadores dos axés da fauna, fazendo
dos vultos/bonecos esculpidos em madeira apenas uma ferramenta
coadjuvante ao ocutá que geralmente tem formas de arco e ponta de flecha,
frutas mais encontradas semelhantes ao coco; vezes tem aspectos rajados,
malhados e naturalmente coloridos como as pigmentações dos animais
silvestres.

Quase sempre os ocutás de Obá são associados como tendo as formas


e voltas iguais às de uma orelha, algumas vezes assumem semelhanças com
a imagem de uma lâmina de fio reto, curvado ou quadriculado como em
uma navalha.

Os okutás de Ossayn geralmente são de formas semelhantes a um pé, a


base física de sustentação ao corpo, comparável simbolicamente a saúde
que nos permite a caminhada rumo aos outros ramos; estudos recentes
como a reflexologia podal revelam que nos pés são encontrados pontos
ligados a saúde de todo corpo, assim como oque sustenta a árvore é a raiz;

Xapanã, Senhor da terra e zelador das doenças quase sempre adere


ocutás similares às formas de chagas e feridas, de aparências purulentas,
perfurados, repleto de cavidades, formas torcidas, irregulares, naturalmente
esburacadas semelhantes as partes de algo tomado por bicheiras, as

138
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

passagens naturalmente cavadas na terra, encontradas nas estruturas


internas de um formigueiro ou cupinzeiro.

Os Ybedjis por serem mais novos que quaisquer outras classes de


Orixás são representadas por vultos de madeira, a madeira por mais velha
que seja nunca será mais madura que a pedra, pois segundo antigos
fundamentos africanos ao "partir" de um gêmeo se faz por honras sua
representação em imagem esculpida; dos dois se assentam um casal de
ocutás gêmeos e arredondados, de formas extremamente semelhantes e
menores em relação aos outros okutás; quando existirem diferenças nos
ocutás, notam-se em pequenos traços, onde um é levemente mais
arredondado como uma menina e outro levemente mais comprido como um
menino.

Os ocutás de Oxum geralmente assumem variações nos tons amarelo


quanto mais velhas as classes mais escuras as tonalidades; de estruturas
arredondadas, destacam-se por semelhanças com seios, gemas, quindins,
pepitas, espelhos e frutos de águas doces.

Yemanjá a rainha do mar, por sua vez tem parte do seu axé encontrado
nos ocutás cristalizados e cristais de estruturas semelhantes ao sal, pedras
de tons claros como a lua, brancos, azuis como o mar e seus matizes; de
aparências semelhantes aos peixes, às conchas e outros frutos marinhos ou
com elementos ligados a navegação como os traços de embarcações.

Geralmente e quase que sempre Oxalá escolhe os okutás de cores bem


claras, brancos como o leite e alguns possuindo grande transparência como
as águas, de formas ovais e arredondadas, facilmente os identificaram por
terem formatos semelhantes ao crânio, cabeça, rosto, olhos, cérebro e ovo;
já os com formato de olhos geralmente são utilizados para assentamentos
de Oxalá Orunmylá, que por sua vez abrange dos ocutás mais claros,
brancos e lisos aos mais escuros, pretos e tortuosos.

Nos Orixás cabeças grandes/de praia/do mel (Oxum, Yemanjá e


Oxalá) as diferenças entre as classes são mais explícitas que aos outros
Orixás, ficando assim quase que evidentes as diferenças entre os mais
novos e os mais velhos, a exemplo de Oxalá moço que agrega ocutás ovais
e lisos como a casca de um ovo e Oxalá velho que abrange os ocutás mais
enrugados como o rosto de um ancião.

139
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Os ocutás são posicionados em suas vasilhas onde a sua volta são


dispostas as ferramentas de assentamentos referentes a cada Orixá, assim
como para as árvores temos os frutos, para as estrelas temos o céu, como
para o mar temos o horizonte, para o nascer do sol temos o leste e ao se por
temos oeste, como o lado revelado e o lado oculto da lua, como aos
extremos dos eixos do nosso planeta temos polo norte e polo sul e etc... Os
ocutás também têm suas apresentações particulares; aumentando seu
tamanho, conhecido como o crescimento do Ocutá do Orixá o qual quando
ocorre de forma muito acelerada e abundante pode nos fazer por tomar as
devidas providências para que o mesmo seja depositado em um recipiente
maior; encontramos ocutás que com o passar dos anos vão amadurecendo,
materializando axé que geram outros pequeninos ocutás iguais ou muito
semelhantes aos seus aspectos, que como em um parto brotam fixos ou
desprendidos a suas extremidades, chamados estes de filhotes que
geralmente nascem nos assentamentos de Orixás mães como Oxum,
Yemanjá e mais raros são os nascidos junto a Oxalá; são posicionados em
seus assentamentos demarcados por uma posição sempre única referente a
sua base que o permite melhor equilíbrio e por rosto/face mais conhecido
como a 'frente do ocutá' que permanece voltada sentido a rua.

Preserva-se o fundamento de 'frente do Orixá/ocutá' para que ao


cumprirmos obrigações tais como após os rituais de ebós o acomodar os
assentamentos nas devidas posições possamos ser mais bem agraciados,
que os sentidos para nós estejam voltados como os olhos de Olorum,
preservar é manter o axé e suas vibrações direcionadas como devem estar,
pois os acutás e seus assentamentos são pontos magnéticos escolhidos por
seus respectivos Orixás de atuação. Na maioria dos casos a frente do ocutá
é notada por ser o ponto mais baixo, estreito ou em destaque de sua
estrutura física. Nem todas as pedras servem como vidas/vivas a comportar
o axé de um Orixá.

A pedra, a árvore, o rio quando visto por legítimos adeptos da religião


deixam de ser apenas material, são saudados, louvados, cultuados,
adorados, sobre tudo respeitados e preservados como manifestações divinas
e sagradas, toda forma natural é interpretada como a materialização de
fragmentos de axé encontrado nos poderes dos Orixás.

140
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

ASSENTAMENTOS

O assentamento é o conjunto sagrado onde repousa okutá, a vasilha


que o guarnece, serve de recipiente aos objetos suportes da força, o axé
assentado do Orixá. Assentamento é a base palpável do axé de cada Orixá,
estabelecido assim pela própria divindade, que receberá a oferenda de
ligação ao nosso plano através do axorô a ser liberado sobre seus pertences
simbólicos. A origem dos objetos tais como vasilhas, ferramentas, guias e
adornos estão ligados ao caráter de cada Orixá a ser assentado. A formação
e união dos assentamentos de todos os Orixás respectivos a um iniciado
chama-se Orunmalé, fazendo um elo com o plano divino, estabelecido
como ponto central de conexão e referência de atuação entre os homens e
divindades.

ORÍ

Orí é a essência individual a cada ser humano, o orí de um ser é seu


instinto coordenador seja de forma consciente ou inconsciente, composto
por orí físico (memória, pensamento, ações, sentimentos presentes e
sentidos ) e orí espiritual (identidade do espirito, experiências de outras
vidas em todas formas e sua ancestralidade/alma), da junção entre estes
dois hemisférios do orí se forma a existência humana e os encargos
racionais, a obrigação de "alimentar"/reforçar o orí, conhecida como fazer
ebó de orí, ou mais conhecida como borí aproxima estas duas dimensões
paralelas, formando um único ponto entre os dois elos, este ponto de
141
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

encontro entre ser físico e espiritual, é nossa apresentação e representação


central, o ponto cercado pelo axé do Orixá; conjunção a qual
denominamos de eledá como um todo, e nossos futuros vínculos para com
a religião. Fazendo do borí o primeiro e talvez até o mais intenso dos votos
do indivíduo para com os aspectos espirituais, é o nascer para o africanismo
e como africanista, a pessoa borida passa a ter obrigações e deveres com a
religião e sua comunidade. Reforços de borí devem ser feitos
periodicamente todos os anos, com uma data estipulada em celebrar o
aniversário de borí, também são feitos próximos ou a cada nova
etapa/graduação religiosa como receber ou fazer assentamentos de Orixás
para si ou para filhos, ao receber ou entregar axés de obé e yfá, abrir casa
sua de religião...

Orí é a fonte de axé pertencente à cada um, é a força interior, orí


fortalecido é o que nos cura assim como desgastado e enfraquecido é oque
nos infortuna com doenças, orí saudável é vida equilibrada quanto orí
desequilibrado é desordem pessoal.

As manifestações mais "perceptíveis" deste elemento ocorrem nos


impulsos refletidos e fornecidos em nosso semi-consciente através da
intuição, instinto, pressentimos, presságios e de efeitos como o dejavú,
como um saber sem saber como se sabe e a percepção de já conhecer algo,
algum... ou alguém mesmo os vendo pela "primeira vez"; pois de fato em
nossa apresentação atual, é novo mas em vidas passadas já nos foi de
alguma forma apresentado; como as breves reflexões de telepatia em saber
o que por outro será feito ou expressado.

Orí é a parte imortal que compõe todo e cada ser humano, seu ponto
canal é cultuado no topo da cabeça, onde nas crianças recém-nascidas
chamamos de fontelas ou moleira; crianças e animais percebem os efeitos
espirituais por não terem o orí físico poluído, limpas são as linhas entre
matéria e espírito... Pois aqueles que agem cientes de seu livre arbítrio são
motivados não só por instintos próprios mais em função dos demais
perdendo assim a pureza em notar o espiritual.

142
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

"Quando a cabeça não pensa o corpo padece..."

Somos filhos de todos os Orixás, porém um entre os outros se faz


específico ao equilibrar nossas necessidades, assumindo assim o ponto
mais próximo e elevado a cada orí de acordo as prioridades necessárias ao
carma individual.

Uma divindade está ali para auxiliar na execução dos desígnios


ancestrais e só poderá tomar atitudes conforme o aval de Orí, logo é
possível notar mais uma vez a livre escolha do indivíduo; Orí guarda o
passado, presente e parte do futuro de cada ser; cada indivíduo possui seu
único orí... Assim como os Orixás também os possuem em prol de
autenticar suas funções de ação sobre seus domínios, porém o orí de um
Orixá é apenas espiritual se diferenciando dos encarnados que por sua vez
possuem também o orí físico ligado a roupa de passagem, o corpo. O orí de
um ser humano é seu guardião pessoal mais legítimo, pois enquanto um
Orixá é Pai de vários filhos, o orí tem apenas um foco que gira em torno
dos interesses que acercam seu único protegido.

A extrema importância de realizar as obrigações de orí está no fato de


o borí ajustar, equilibrar, manter os pensamentos e reflexos mentais em
seus devidos lugares, é borí o estabilizador entre as partes do orí, a pré-
iniciação na cabeça de um iniciado, seja a cabeça preparada e ajustada para
então nas futuras obrigações receber os preceitos de ligação com diretas
emanações do Orixá individual a cada orí sem sofrer complicações,
desequilíbrios e disfunções por falhas de estabilidades, sincronia ou
sobrecargas entre ambos, uma cabeça não amadurecida pode diante do axé

143
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

se tornar uma cabeça perdida, limpam-se, revestem-se e organizam-se seus


compartimentos para que então seja capaz de suportar e comportar o Orixá.
Assim com os devidos preparos e materiais assenta-se o orí diante aos
rituais chamados de assentamento de borí, trazendo boas ideias e soluções
resgatadas nas experiências e sabedorias inconscientes de outras
reencarnações, propiciando assim maiores graus de compreensão e
realizações em nossas fases atuais; além da lei de atração mútua onde o
bem atrai o bem... Bons pensamentos coisas positivas e pensamentos
negativos coisas ruins.

Bará intermedia homens e Orixás, Orixás intermediam homens e


Olorum, Orí intermedia o homem com sua própria identidade desde a fase
ancestral para que se encontre consigo mesmo em qualquer lugar e
situação... Na cabeça dos homens mora a essência que guia ou desnorteia
os passos, na cabeça dos homens repousam os segredos de suas origens, de
seu passado e de todo destino particular, elemento ligado a Orunmylá, na
cabeça dos homens vive orí.

BORÍ

Borí acima de tudo é o culto ao orí de cada pessoa, tomar esta


obrigação é comungar de nossas origens ancestrais com os Orixás,
sacralizar a cabeça, é o elixir revigorante do indivíduo e sua genética astral
com o todo e com o universo, propiciando assim a harmonia e plenitude
nos contextos abrangentes da existência e da vida. Podemos dizer que o
assentamento de orí é a impressão digital da alma, a parte, única e
totalmente individual de todos e qualquer outro elemento fazendo de nós e
de nossos Orixás peças singulares entre as formas de existência; no borí são
mantidos, contidos e tratados todos os vínculos pessoais do mais simples
aos mais complexos e secretos, desde a realidade até para o além dela,
ultrapassando as linhas racionais e da compreensão humana, pois tal zelo
somente cabe aos infinitos aspectos do Orixá de cada pessoa.

144
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

É preciso borir-se para então de acordo aos fundamentos ser ligado aos
elementos religiosos de culto aos Orixás, tais como os aprontamentos de
formação religiosa rumo à formação sacerdotal; em outras palavras, é dizer
que se faz preciso o despertar e preparar do próprio espírito para então
termos o efetivo alcance as ferramentas ligadas a ancestralidade, e entre
elas nós mesmos, pois verdadeiramente adentrar no campo religioso não
nos faz superiores a ninguém e a nada mas sim para servirmos e não para
sermos servidos, diante as virtudes divinas a humildade é padrão de maior
alcance a qualquer aspecto.

Transmutado em formas físicas e de aspectos básicos assenta-se o borí


em manteigueira/cremeira de louça branca, depositado em seu centro uma
moeda cercada por uma quantia de búzios referente ao número axé do
Orixá regente do orí a ser assentado e acompanhado por uma quartinha da
cor do Orixá eledá, o guardião do orí. São lavados em mierós (ervas
maceradas) específicos a cada orí, podendo conter ervas do próprio Orixá
ou as mesmas somadas aos Orixás adjuntós; depois de imersos por período
necessário os materiais são secos em pano branco, e próximo ao momento
de borir são imantados com banha de orí e passam a ser montados dentro
da manteigueira, recebem uma leve camada de mel; de acordo a cada nação
ou necessidade pode-se forrar o fundo da manteigueira com uma fina
camada de algodão que por sua vez representa suavidade entre os vínculos
do orí.

A moeda geralmente é escolhida a caráter do sexo de nascimento do


indivíduo, representa a apresentação física de cada um, quando nascido
masculino terá a cunha do rosto/cabeça de um homem, quando feminino
terá a cunha de uma cabeça/rosto de mulher; os búzios em quantidades
significativas ao Orixá formam um círculo protetor ao redor da moeda onde
apontam para a imagem do rosto que representa o orí, tendo a função de
assimilar a alma da pessoa guarnecida por seu Orixá; a manteigueira
resguarda os elementos de ações diretas do exterior a cabeça, mantendo
assim a intimidade do orí com o Orixá não podendo ninguém além do
Orixá ter o infinito alcance, ver ou saber o que há de mais íntimo e secreto
nas faculdades mentais de seu filho protegido, é como a cabeça que guarda
as memórias e pensamentos individuais; a banha de orí facilita a penetração
do axé e o mel com o doce poder de abrandar conduz a força sagrada entre

145
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

todos os elementos desse assentamento; como todo e qualquer elemento


sagrado de utilidades ao culto africano os materiais utilizados na feitura de
borí são lavados e postos em mierós de ervas para purificação dos mesmos,
em progresso a resgatar suas essências originais.

Junto à pré-iniciação purifica-se também o corpo da pessoa que


durante a semana prestará obrigação ao orí deve restringir-se de relação
sexual, ingestão de bebidas alcoólicas, alguns alimentos, assim como evitar
brigas, discussões, não frequentar lugares como hospitais, cemitérios,
praticar jogos de azar e etc... De acordo a regra fundamental de cada casa
de religião este período pode estender-se tanto antes quanto após a
obrigação; no dia da feitura ou reconfirmação de orí como nos casos de
quem já o tenha assentado deve-se proceder com o banho de ervas na
pessoa a borir-se assim como a administração de ebós de descarrego
(limpezas espirituais) para que no momento em que se iniciem os preceitos
de borí até o "término" desta feitura a pessoa encontre-se o mais
desvinculado possível dos vícios de âmbitos terrenos e mais próxima às
origens espirituais para com maior facilidade ser irradiada pelas emanações
de seu Orixá.

Depois de realizadas as preparações iniciais de limpezas individuais,


limpam-se então as demais pessoas presentes e a casa de religião, seguido
pelo sacerdote e/ou padrinho de orí em posicionar o iniciado de forma a se
sentar dentro do quarto de santo, frente a frente com os Orixás ali
assentados; untam-se alguns pontos do corpo a ser borido tais como a fonte
de orí (topo central da cabeça), fontes, peito, costas, peito dos pés com
banha de orí na função de vulnerabilizar os chacras vitais ao africanismo
para que recebam as energias emanadas pelos Orixás particulares a cada
um ao alimentar orí, de acordo a formação de cada sacerdote os mesmos
pontos podem ser imantados com mel ou de acordo a cada caso podendo

146
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

também ser usado o azeite de dendê para fixar as propriedades do axé neles
direcionados para uma maior estabilidade entre as partes físicas e
imateriais.
Do início preparativo ao final do ritual de borí pode o padrinho ou alguma
pessoa de confiança do sacerdote, que por sua vez tenha feituras de
obrigações plurais ou de graus mais elevados ao que está por borir-se
assumir o papel de padrinho de vela; após sentar o iniciado, se segura uma
vela branca ou da cor do Orixá-eledá em altura superior a cabeça,
indicativo que a força do ancestral é superior ao individual, recorrendo ao
mesmo com intuito de firmar as bênçãos rumo a clarear os pensamentos e
iluminar os passos. Iniciam os rituais de ligar o orí com seu assentamento...
o sacerdote apresenta o obé pedindo agô aos presentes na cerimônia assim
como no quarto de santo aos Orixás, entoam-se o axé de ciência/segredo
cantado as rezas de orí da pessoa, através do axorô são feitos os vínculos
entre os planos..."borí-orí-borí/orí-borí...", enquanto no decorrer de liberar
o axorô, o responsável pela feitura invoca o Orixá guardião daquela cabeça;
entre os elementos de vínculos de orí com borí se faz indispensável o axorô
de um casal de pombos brancos ou da cor do Orixá-eledá, por
representarem a universalidade, de sexualidades distintas entre si e tendo
seus axorôs interligados geram uma emanação não portadora de gênero
sexual, assemelhando-se como as essências do orí já que a alma não é
homem nem mulher; quando completo apenas com aves canta-se o axé de
ciência do orí também conhecido como reza de quarto de santo ou com
aves e quadrúpedes onde se canta o axé de assentamentos, também
conhecido por reza de salão que devem ser estipulados de acordo ao Orixá
de cada cabeça por ser através do Orixá que podemos ter alcance ao orí;
quando realizado somente com aves tem por finalidades fortalecer orí, o
físico e a pessoa; já quando for borí com quadrúpedes é feito não só o
revigorar do orí com o plano físico mas sim do orí com o espiritual,
podendo então junto a essa obrigação assentar o Orixá de cabeça em seu
okutá, vínculo o qual sugere maiores compromissos e deveres do iniciado
para com o universo religioso e seu todo.

Depois de ocorridos passo a passo os vínculos de revitalização do orí,


partimos para as etapas finais em coroar a cabeça e os assentamentos com o
axé de plumas e penas, como após o plantio fazer a cobertura para a
proteção da semente, atos finalizados com o momento onde o padrinho
canta o axé de seu Orixá amarrando e fixando a trunfa(pano branco ou da

147
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

cor do Orixá) para a contenção dos elementos ritualísticos depositados no


orí de seu afilhado; postos e cargos onde o pai/mãe-de-santo pode ser
compreendido como o genitor quanto ao padrinho cabe o papel de parteiro,
do pai e mãe que do sangue geram a vida dando a luz, onde o padrinho
veste o recém nascido preparando-o para a nova vida/jornada. Ao finalizar
canta-se o axé do Orixá do sacerdote onde o recém borido bate cabeça aos
Orixás assentados no quarto de santo, ao sacerdote e ao padrinho que o
apresentam a alguns pontos de fundamentação do ylê como porta, quarto de
santo e tambor. Após os dias de recolhimento é feito a levantação do ebó e
a obrigação de passeio.

O assentamento de borí é o elo individual a cada ser, quanto os cultos


aos Orixás são coletivos podendo os assentamentos de Orixás ter sequência
permanecendo aos cuidados de um sucessor ou sendo feitos os despachos
pós-morte (arisún) de seu filho no decorrer de uma semana do falecimento,
borí é um assentamento tão particular as essências de cada alma que se faz
como a única obrigação que acompanha um iniciado desde seu nascimento
religioso até o fim de sua vida, onde a representação natural do orí físico
(corpo) recebe ritual de desligamento com a vida terrena sendo quebrado o
assentamento de borí depositado abaixo ou ao lado do travesseiro para ser
sepultado junto ao corpo presente, nunca servindo como herança religiosa
pois a cada um cabe seu próprio destino.

CORES

As cores se destacam em evidência como características aos axés


empregados, quando se procura apaziguar envolve-se Oxalá o Orixá do
branco, para saúde o verde e o branco como a resolução da saúde em
Ossayn o até o branco e verde representantes das riquezas vegetais, para a
infinidade do pensamento o azul das águas de Yemanjá; o multicolorido
dos Ybedjis como uma renovação; o preto que algumas vezes se torna
hostilizado pela falta de conhecimentos, ao contrário que muitos pensam,
não é negativa, mas sim uma cor de absorção e captação, por isso não deve
ser utilizada em obrigações de cabeça tais como em panos de cabeça a
cobrir o orí é suas obrigações... Enquanto o branco para Orunmylá reflete a

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

luz, o preto absorve a luz como para transmitir a sabedoria é necessário


recebe-la. Já para Xapanã se distinguem o vermelho relativo ao perigo e o
preto como absorvente das negatividades; vermelho e branco para Xangô
como guerra e paz em direção a execução da justiça que condena ou
absolve; atenção, ação e excitação se unem a serem representadas pela cor
vermelha consagrada ao Orixá Bará; a sabedoria, o ouro, o brilho, a gema,
a maternidade se desdobram em tons de amarelo para Oxum, dos mais
escuros a mais velha aos claros a mais moça e etcs... Cores são irradiações,
significados, desígnios e traduções. De acordo as questões e respectividade
paralelas podem unir cores, amarelo com verde para Oxum com Ossayn,
Verde com amarelo para Ossayn com Oxum, vermelho com amarelo para
Bará com Oxum, amarelo com vermelho para Oxum com Bará, amarelo e
vermelho para Oxum com Xangô, amarelo e branco para Oxum com Oxalá,
amarelo com preto para Oxum com Xapanã. As cores traduzem os
significados e fundamentos existentes nos fios de contas, velas, roupas,
flores, frutas, adereços, turbantes...

PASSEIO

O passeio é o ritual onde depois de concluídas as obrigações internas a


casa de religião, levam-se os presos (pessoas que cumprem ebó aos seus
Orixás) para conhecerem um pouco da história afro brasileira em sua
região. É realizado em um dos primeiros dias após o ritual de levantação do
ebó, que demarca as etapas conclusivas ao término das obrigações de
assentamento aos Orixás;

Pela manhã que geralmente é de uma 2° feira os presos em jejum saem


acompanhados de seu Babalorixá rumo ao mercado público, a igreja (Nossa
Senhora do rosário ou das dores) e a praia do gasômetro por serem esses
locais ícones ligados a história dos escravos aqui chegados.

Da África foram trazidos por navios negreiros, construíram o mercado


público, a igreja das dores e também a igreja do rosário que em seus porões
abrigava os negros aqui chegados. O passeio é uma homenagem aos
ancestrais e antepassados que aqui plantaram sua religião; Nos portões e
ponto central do mercado são depositadas moedas correntes como forma de

149
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

agradecimento, nas igrejas são feitas orações em sinal de fé e respeito em


relação a outras religiões e a história, como os laços marcados pelo
sincretismo, nas águas são entregues flores como gratidão. O passeio acima
de tudo é um envolvimento cultural ligado à religião, onde iniciados são
representantes de vários axés que se encontra em um mesmo ponto, onde
várias casas de religião com diferenças entre si fazem um mesmo trajeto
em comum, mercado, igreja e praia representam um ponto de encontro,
algo em comum, a comunidade, a fé no Orixá trazida por aqueles que
fundaram a religião de matriz africana no sul do Brasil, traduzindo em
filhos de uma mesma mãe, a Mãe África.

Ao sair do centro histórico da cidade, seguem-se rumo às casas de


outros Babalorixás ligados aos iniciados, como padrinhos, amigos e
parentes de religião que os receberam no quarto de santo, após baterem
cabeça aos Orixás o dono da casa oferta água da quartinha do Orixá como
quebra do jejum, seguem rumo a cozinha da casa de santo onde recebem o
café da manhã como a representarem a trajetória dos negros saciando suas
necessidades no encontro com os Orixás. Em terras distantes de suas
origens era através da fé, dos Orixás e da religião que os negros
encontravam conforto espiritual e resistência como um povo.

Retornam para a casa de santo as quais pertencem, batem cabeça,


bebem água do Orixá; o Pai de santo leva um a um na porta da casa e os
apresenta para a rua invocando os Barás e Orixás de rua para que protejam
e guiem os iniciados para o melhor caminho, após ser apresentada a rua
estão liberados a suas atividades cotidianas e podem seguir para suas casas.

SUNAS

A suna de um Orixá é o nome de assentamento (feituras) conhecido


também como "segredo", a suna faz do assentamento um culto ao Orixá de
nome único e individual dentro de um ylê/casa de santo, é também a
primeira parte do sobrenome do Orixá que o torna único dentro de sua
gôa/parentes religiosos, quando a suna é agregada ao sobrenome de família
que se estende as heranças dos sobrenomes de seus ancestrais e ancestrais
de seus ancestrais torna-se único no planeta.

150
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Cada assentamento de Orixá possui sua própria suna que de acordo as


tradições preservadas em cada casa de religião podem variam em
composições e formas a serem extraídas. Os Orixás pertencentes a um
mesmo Orunmalé (família de Orixás assentados a um iniciado) podem
possuir uma mesma suna gerada pelo Orixá de cabeça do Orunmalé oque
evidência que todos estão unidos e vinculados por um Orixá principal, ou
como é mais comum nas casas de matriz africana cada Orixá assentado
mesmo que pertencentes ao mesmo Orunmalé revelem sunas diferenciadas.
Um nome de Orixá por "extenso" fica como:
'ORIXÁ+CLASSE+QUALIDADE+SUNA+SOBRENOME...' que de
acordo a outros fundamentos pode-se subtrair a QUALIDADE,
permanecendo apenas 'ORIXÁ+CLASSE+SUNA+SOBRENOME...'.

A classe assim como a suna são estipuladas pelo próprio Orixá, a suna
por sua vez pode ser referente as atividades, abrangências, desígnios,
propósitos, preferências e fatores que envolvem o orí de um iniciado as
feituras de seus Orixá.

A suna carrega entre seus principais sentidos diferenciar/especificar


Orixás mesmo quando de uma mesma classe; quando um babalorixá invoca
um Orixá por classes podem assim responder vários Orixás da mesma
classe, porém quando as classes são invocadas junto as sunas a "chamada"
é feita de forma direta a um específico Orixá ligado a um determinado
orunmalé, orí e pessoa; trazem também as raízes mais profundas de cada
Orixá, algo que se torna para além da complexidade.

Bará (Orixá) Lanã (classe) Tobí (qualidade extraída da suna do Bará de


quem o assenta) + Bomí (suna própria) + sobrenome (varia de acordo ao
Orixá principal do babalorixá responsável pelas feituras desse Orixá).

Traduzindo...

Bará = Obá (rei) + ará (corpo) = rei do corpo

Lanã = ala/ele/olo (variações do yorubá que designam senhoria) + onã.


(caminhos) = senhor dos caminhos

Tobí = t (de/da) + obí (grande/crescente) = do crescimento.

Bomí = bo (guardião/guardiã) + mí (meu) = meu guardião.


151
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Muitas e tantas palavras do yorubá para cá foram transformadas...

Funmílayó(yorubá) para fumilaió("aportuguesado") que significa aquele ou


aquela que traz felicidades.

Yánquí para Inguí; com tradução em aquele que se divide.

Baýíomi que de nascido para trazer realizações passou a Bí-omí


preservando o mesmo significado.

Oní que significa rei para Ogun se faz Onire (rei da cidade de Ire), para
Xangô Onibolá(rei afortunado) já para Oxalá se pode usar Onifan.

Oxalá Alufan, Oxalá Elefan, Oxalá Efam, Oxalá Efam-deí, Oxalá Orifan...

As sunas ou sobrenomes de Orixás como são mais conhecidas,


formam-se sobre os fundamentos de Orunmalé principal a cada casa de
religião; suas égides são fundadas em confirmar as procedências religiosas
a cada feitura de Orixás.

Após a classe do Orixá iniciam-se as sunas/segredos, 1° por uma


qualidade equivalente ao nome dos Orixás do Orunmalé do Babalorixá ou
Yalorixá, seguida por um nome particular a cada feitura de cabeça
escolhido pelo Orixá individual a cada filho e "finalizado" pelo Axé de
Bandeira tornando assim o nome do Orixá do Babalorixá/Yalorixá o
sobrenome final das sunas dos Orixás de seus filhos. Demarcando assim as
origens hierárquicas ligadas as famílias religiosas e suas genealogias nos
cultos às matrizes africanas.

Ex.:

OXUM Pandá - Demí OLOBOMÍ Efam... teve suas feituras assentadas nas
raízes onde OXUM Demun - Taladê DEMÍ Orocí pertencente ao
Orunmalé do Orixá OXALÁ Dakun - Mocosé EFAM Yákerê que por sua
vez teve suas feituras assentadas sob o Axé de um Babá/Yalorixá o qual
pertence a Yemanjá de nome Yákerê que em sua família de Orixás é
acompanhada por um assentamento de Oxalá de nome Mocosé.

152
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

SUNAS 1° Babalorixá(antecessor)avô 2° Babalorixá(intermediário)pai 3° Babalorixá(sucessor)fil


ho

ORIXÁ Classe+Qualidade+Nome de fe Classe+Qualidade+Nome de feit Classe+Qualidade+Nome


ituras uras de feituras
+ sobrenome de bandeira... + Daré(sobrenome de bandeira).. + sobrenome de bandeira..
. .

...Classe+nome do Orunmalé feit ...Classe+nome do Orunmalé feitor ...Classe+nome do Orunmal


or(raízes) (raízes) é feitor (raízes)+Suê+ sobre
+nome de feituras +nome de feituras nome do feitor...
+ sobrenome do feitor... + Daré...

1° Bará ...Classe+Qualidade+Daré Adague+Daré+Aguidê+Daré... Lanã+Aguidê+Tolá+Suê


(Cabeça de Orunmalé)+Sobre (Orixá de Bandeira).
nome

2° Bará ...Classe+Qualidade+BÍ Ajelú+Bí+Omí+Daré


+ sobrenome...

Ogum ...Classe+Qualidade+ADIÔ Adiolá+Adiô+Lecí+Daré Onira+Lecí+Peremí+Suê


+ sobrenome...

Yansã ...Classe+Qualidade+ODÁ Yansã-Oyá+Odá+Bemí+Daré Yansã+Bemí+Funiké+Suê


+ sobrenome...

Xangô ...Classe+Qualidade+DEÍ Aganjú+Deí+Luá+Daré Aganjú+Luá+Omí+Suê


+ sobrenome...

Odé ...Qualidade+KÁ-OLOFÁ Odé+Olofá-dé+Daré Odé+Idé-Burú+Suê


+ sobrenome...

Otin ...Qualidade+OFÁ-BEMÍ Otin+Dé-ocí+Daré Otin+Burú-mí+Suê


+ sobrenome...

Obá ...Qualidade+FUNMY Obá+Funmy+Suê+Daré Obá+Suê+Agorô+Suê


+ sobrenome... (Cabeça de Orunmalé). (Orixá de Bandeira).

Ossayn ...Qualidade+GUÉ Ossayn+Gué+Ossí+Daré Ossayn+Ossí+Gué+Suê


+ sobrenome...

Xapanã ...Classe+Qualidade+OBÍ Sapatá+Obí+Ocô+Daré Jubeteí+Ocô+Taió+Suê


+ sobrenome...

Menino(-/♂)"Xangô"
Ybedjis Deí-Omí+Daré Luá-Demí+Suê
Menina(+/♀)"Oxum"

Omí-Deí+Daré Demí-Luá+Suê

Oxum ...Classe+Qualidade+MIRÊ Pandá+Mirê+Mobomí+Daré Pandá+Mobomí+Demí+Suê


+ sobrenome...

153
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Yemanjá ...Classe+Qualidade+YEMÍ Bocí+Yemí+Afalomí+Daré Bocí+Afalomí+Domí+Suê


+ sobrenome...

Oxalá ...Classe+Qualidade+EFAM Bokun+Efam+Alufan+Daré Olokun+Alufan+Oní+Suê


+ sobrenome...

O fundamento em formar os sobrenomes/sunas de Orixás é um dos


fundamentos que merecem grandes destaques diante aos rituais, cabendo os
segredos de cada Orixá somente ao Babalorixá e ao filho-de-santo
representado/representante nas individuais feituras aos Orixás.

*Orixá + QUALIDADE, indica a família de origem às feituras, é também o


nome representante/representado nos filhos até o momento de fazerem suas
feituras de assentamentos.

*Orixá + NOME, revelam o nome particular do Orixá, ligado a cada


iniciado, que futuramente assumem o papel de qualidades nos Orixás
assentados a seus filhos, com exceção do Orixá de cabeça do pai-de-santo
(Orixá de bandeira) que será o sobrenome(último nome) dos Orixás de seus
filhos.

*Orixá + SOBRENOME, faz-se do sobrenome de Orixá o nome do


Babalorixá responsável por determinada feitura de santo, o nome do pai
assume o sobrenome dos filhos.

Sendo assim, preservam-se as qualidades mesmo que um iniciado se


desvincule a casa de santo, pois são essas que confirmam suas procedências
de feituras que só poderão ser substituídas caso junto a troca de casa hajam
as trocas físicas de seus assentamentos, mais específicos ocutás de Orixás,
iniciando assim do "ponto zero";

O nome do Orixá deve seguir ligado ao iniciado enquanto em sua


cabeça pertencer à mesma classe de Orixá, já que possíveis são as
mudanças de qualidades e sobrenomes, trocar o nome seria o mesmo que
trocar o Orixá de cabeça; Sobrenome existirá enquanto o iniciado estiver
sobre o axé de determinado Babalorixá, como os negros que ao serem
escravizados recebiam de sobrenome os nomes de seus senhores, mudando
a cada troca de casa de religião ou em caso de falecimento do Babalorixá,
onde após os rituais de desligamentos todos os Orixás começam a se

154
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

governar e o sobrenome do Orixá assentado como bandeira passa a ser


apenas qualidade, assim cada forma e ato de feitura agregam suas formas
específicas em distinguir particularidades individuais referentes a cada
iniciado e seus Orixás.

BOLO

Mediante as manifestações festivas aos Orixás, celebrações de tempo


de feituras como aniversários de borí e assentamentos... Providenciam-se
no mínimo um bolo por toque aos Orixás, sejam os rituais de mesa de
Ybedjis, quinzenas secas como são conhecidos os toques onde são feitos
apenas doces sem os vínculos de axorô, quinzena onde sacralizaram-se
apenas aves, batuque grande quando foi realizado ebó de 4 pés... Desde um
xirê(roda de dança) á entregas de axés lá tem de estar o bolo; a quantia de
bolos a serem agregados aos rituais partem de um bolo para o Orixá do
reino(dono da casa) e variam de acordo ao número de filhos a
comemorarem as datas de preceitos a suas obrigações.

O bolo como todos os outros elementos vinculados aos cultos de Orixá,


exerce grande fundamento e significado, a exemplo.:

*Farinha (axé de fartura, progresso, concretização...)

*Ovos (axé de felicidade, saúde, multiplicação...)

*Leite (axé de clareza, resolução...)

*Água (axé de pureza, sabedoria, vida...)

*Açúcar (axé de doçura, harmonia...)

*Sal (axé de força, equilíbrio, prosperidade...)

*Fermento (axé de crescimento, sucesso...)

*Óleo/gordura (axé de proteção, resolução...)

155
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

A cada recheio busca-se por acentuar os fundamentos referentes aos


Orixás homenageados, como morangos para Yansãn/Oyá, abacaxi para
Obá, amendoim para Xapanã, ovos moles e fios de ovos para Oxum, coco
para Yemanjá, ameixas para Oxalá e etc... Assim também são pré-
estipulados pelos fundamentos de ewó (quizilas) que Xangô não recebe
laranja, Obá não recebe gemas, Oxum não recebe abacaxi, Oxalá não aceita
amendoim e etcs... As coberturas e decorações do bolo geralmente variam
de acordo as cores e elementos ligados a cada Orixá.

Bolos para borí e em comemorações de Orixás com tempo de


assentamento inferiores há uma década devem ter apenas um andar
(degrau), a partir do 11° ano de assentamento o bolo de Orixá pode conter 2
andares(degraus) que a critério pode aumentar mais um andar(degrau) a
cada década de assentamento... De 1 a 10 anos, bolo de um andar; de 11 a
20 anos, dois andares; 21 a 30 anos 3 andares... o elevar de
andares(degraus) não se faz obrigatório, podendo um Orixá assentado a
décadas ser representado por um bolo de apenas um andar ou até mesmo
apresentar o bolo com um andar a mais somente no ano em que vem a ser
comemorado uma próxima década. O que categoricamente pode ser contra
indicado é elevar um andar acima dos padrões correspondentes a cada
década.

Outro fator importante são as colocações das velas comemorativas, a


vela tem como maiores significados a gratidão, a proteção, a humildade,
mas acima de todos está a fé; até completar a primeira década (do 1° ao 10°
ano) de assentamento de Orixá, as velas são de formato numérico, ao
agregar mais andares no bolo com finalidades de indicar o número de
décadas às velas numéricas podem ser substituídas por unidades de velas
sem números; 11 anos, dois andares e uma vela; 12 anos, dois andares e
duas velas; 23 anos, 3 andares e 3 velas... Em torno das rezas entoadas para
Oxum o iniciado junto a seu sacerdote, padrinho de santo, pessoa de
vínculos com o Orixá vem a auxiliar com a apresentação do bolo,
Babalorixás presentes são convidados a acender as velas, onde se
manifestam alguns Orixás, já os bolos de borí não são apresentados; ao
final das apresentações alguns dos Orixás apagam a vela na boca como se
junto ao fogo engolido sejam alimentados pela fé representada na vela.

A primeira fatia deve ser cortada da base do bolo (1°degrau = 1°s


passos) e de baixo para cima a ser depositada no quarto de santo, como

156
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

sinal de gratidão a vida que temos e a importância de nossas origens. Além


dos bolos comemorativos temos os bolos secos que geralmente são
cortados em quadrados, por sua vez também é um alimento de axé muito
valoroso, bolos de chocolate sob os axés de Xangô e Xapanã despertam o
axé da alegria, energia e realização; o bolo de milho com os axés de Oxum
atraem fartura e felicidade, bolo de milho (Oxum) com erva doce(Ossayn)
auxiliam a preservar e multiplicar fartura, fortuna, saúde... o bolos ingleses
agregados aos axés de Bará como potencializadores de todas formas de
axés. Importante ressaltar que todo bolo é servido tanto aos Orixás quanto
as pessoas, sendo ele também importante entre os ingredientes que
compõem as levantações de ebó aos Orixás.

Nossa religião é absolutamente fundamentada em todos os atos e


aspectos, dentre eles temos entre as formas de apresentação individuais
temos o axó, a roupa para religião e não de religião, até porque nós é que
somos iniciados e religiosos e não uma vestimenta. Antigamente e digamos
que em prol de preservar maciçamente os fundamentados nossos
fundadores zelavam apenas por um aspecto principal onde deveríamos ter
uma vestimenta exclusiva para as cerimônias e celebrações religiosas, não
se faziam modelos, mas sim distinções entre as origens naturais a cada
indivíduo, o sexo masculino vestido por calças enquanto as saias
representam o sexo feminino. Os mais antigos tinham mais conhecimentos
e menos axós, importavam-se com a ordem, onde bastavam as roupas
estarem limpas e organizadas, sem pretensões de se fazerem notar por
quantas vezes trocariam os modelos ou estampas de panos mas sim
aproveitavam os períodos religiosos a dedicarem-se integralmente como
devotos.

De que nos servem a humildade em nos abaixarmos diante os axés


cantados como reverências a nossos ancestrais fundadores se não fazemos
por seguir ao menos os fundamentos ou ensinamentos mais básicos
valorizando suas posturas e os genuínos ensinamentos?

Independente de como são ou eram os primordiais fundamentos e


culturas externas, ligadas a outros países e continentes vale sempre lembrar
que não somos lá e sim aqui, não somos África e sim Brasil, assim
concretizando em ramificações religiosas que nos qualificam como afro-
brasileiros; feitos aqui têm de seguir o que aqui foi adequado. Os
verdadeiros gestos são de caráter íntimo e não em apresentações coletivas;

157
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

as menores ações são responsáveis pelas maiores mudanças. Fundamentos


foram firmados para agregar aspectos e somar forças, não para serem
burlados.

Toda ação dentro de uma religião deve ou ao menos deveria carregar


um propósito assim como um fundamento, bem mais em uma religião na
qual as feituras através do plano físico são ligadas a superioridade do plano
sobrenatural; as maneiras de praticar a religiosidade africana refletem em
seu comportamento uma ligação de forma geral e abrangente como em
seguir os exemplos da natureza em busca de se fazerem mais próximos
possíveis ao contato divino; de certa forma ficam nítidas as diferenças
naturais entre o masculino e o feminino como o macho e a fêmea,
geralmente a fêmea é perceptivelmente distinta quando reparados os
indícios, gerando filhotes é notada no volume de sua barriga, por ser menor
que o macho, por se posicionar a baixo e/ou a frente durante um
acasalamento e etc...

Já o macho é quase que sempre distinto por ser maior, por marcar
território, por buscar o alimento enquanto a fêmea zela por seus filhotes,
perante certo entendimento Olorum destinou espermatozoides ao polo
negativo (ativo) e óvulos ao polo positivo (receptivo). No inverno as
árvores apresentam suas folhas menores, no verão maiores, no outono sem
folhas e na primavera com flores, não se apresentam de tais formas por
questões estéticas ou preferenciais como o sol que nasce de um lado do
horizonte e repousa por outro, por maior que seja um rio ele se inicia por
uma nascente, como por mais frondosa que seja uma árvore seu início foi
com o germinar de pequeno broto, suas purezas só as permitem assim
serem e estarem de acordo as próprias condições estipuladas pelo clima da
própria natureza.

Assim também se traduzem as vestimentas rituais empregadas na


religião afro brasileira, os homens vestem calças e as mulheres vestem
saias; cada fio de contas tem seu significado e sua cor simbólica a ponto de
confirmarem os graus de iniciação de um iniciado. Uma guia (fio de
contas) para iniciados com aribibó é usada sozinha; com obrigações de borí
contém apenas um fio, porém são feitas duas uma para o Orixá principal
que deve ser maior e outra para o Orixá adjuntó; uma guia que varia de 5 a
8 fios (de acordo ao Orixá) e seus múltiplos para obrigações com axorô de
quadrúpedes, guia com as cores de todos os Orixás a serem separadas por

158
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

no mínimo 12 passagens da cor do santo de cabeça entre elas assim


identificando ser um Babalorixá de determinado Orixá... as posições com
as quais são utilizadas também traduzem parte do caminho religioso do
iniciado, cruzando o peito na altura do coração (da esquerda pra direita),
cruzando o peito da direita para a esquerda ou para a frente como um colar,
podem estes posicionamentos indicar governo por motivo de falecimento
do babalorixá, governo com o babalorixá ainda vivo, ter um babalorixá e
etc... Também os panos de cabeça dizem muito sobre um iniciado, com nó
transpassado na altura da testa, com as pontas soltas para trás ("rabo de
galo"), com duas abas laterais ("baiana), com apenas uma aba, são
organizações que revelam se o Orixá de cabeça é masculino, feminino, de
guerra, de paz... Seguindo pela forma de bater cabeça, onde o iniciado bate
cabeça primeiro dos lados e depois de frente ou primeiro de frente e depois
com os lados revela ser filho de Orixá masculino ou feminino; muito além
das traduções há uma infinidade de seguimentos cada um com suas origens
e diretrizes indicativas de uma margem que possibilita enaltecer o
existencial para suas origens, como de filhos para com seus pais e adeptos
com seus Orixás ao ponto de dançarmos cantando as rezas de louvação e
reproduzindo gestos ligados as atividades dos Orixás. Tudo como
representação de comunhão.

As formas de culto e todas suas diretrizes estão por completas no


Orixá, coube ao homem a função de compreendê-las, com consenso e ética
pratica-la; no momento religião e religiosos devemos por nos portar de
formas refletidas aos planos superiores, onde deixamos de lado todas as
formas excessivas e de origem egocêntrica; perdendo todo e qualquer
direito em tomar decisões como sendo nós mesmos os fundamentos
originais. Não cabe a nós os atos de trocar canjica por feijão, nem o branco
por vermelho, não cabem a nós formas de inovações, reinvenções e
renovações aos conceitos já criados, pois o que já foi fundado não se adapta
a um novo fundador. Mas quando assim for então surgirá uma "nova
nação".

159
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

EGUN

A palavra Egun serve como referências padrões ao nos referirmos a


qualquer espírito desencarnado, sendo alma desencarnada é Egun, sendo a
alma encarnada é orí; quanto ao que em vida foi iniciado no culto aos
Orixás será um Egungun e quando for um sacerdote será um Babá Egun.
Importante lembrar que a alma/espírito na compreensão de nossa matriz é o
próprio orí, que após a morte se faz por completo em toda sua consciência e
noção de outras vidas que antes eram limitados pelo estágio de encarnado e
bloqueado pelas leis carmicas, estágio de transição onde o orí se encontra
liberto das limitações e imposições presentes no plano físico. Quanto aos
Orixás ligados ao falecido iniciado, tem seus assentamentos devolvidos a
natureza, por serem seus pontos de origem, permanecendo como santos,
porém sendo homenageados juntos aos rituais de Eguns já que o orí pelo
qual zelavam agora também é Egun. Tornando a palavra Egun uma palavra
chave e em comum a toda forma de existência já não mais presente em
forma física/material.

Ex.:

Em vida do iniciado seus Orixás de adjuntó("principais") sendo Bará


Adague Aguidê, Ogun Onira Oní e Yansãn Oyá Ladê(principal/cabeça) em
morte são desligados de seus assentamentos subtraindo as propriedades de
Bará, Ogun e Yansãn; as classes que determinam suas funções abrem
espaço a Egun, então Adague, Onira e Oyá agora são convertidos em Egun
e não mais em classes... Aguidê, Oní e Ladê agora são Egun Aguidê, Egun
Oní e Egun Ladê, podendo assim o orí(espírito/alma) do falecido ser
invocado através da ligação com os Orixás que o guiavam, invocando por
Egun Aguidê-oní-ladê ou em outros casos apenas como Egun Ladê que ao
ser Egum ligado ao sacerdócio é invocado como Babá Egun Aguidê-oní-
ladê ou Babá Egun Ladê, tanto pais(babalorixás) quanto mães de
santo(Yalorixás) falecidos são tratados como Babá Egun, por Egum ser a
manifestação do orí sem parte física, assim sem distinções de sexo. O
Egun(espírito) só pode ser chamado por aqueles que souberem o
segredo(sobrenome) do Orixá.

160
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Embora todos os Orixás tenham significâncias imprescindíveis nos


cultos aos Eguns, Bará, Yansã/Oyá, Xangô e Xapanã recebem merecido
lugar em destaque por entre outras atuações ser Bará o senhor das conexões
que acompanha todo e qualquer orí, Yansã/Oyá por ser responsável a
encaminhar o orí(alma), o julgamento de Xangô em relação ao
merecimento do orí em ser cultuado ou não, e Xapanã por ser o fator
decompositor de toda e qualquer matéria ligando-o diretamente ao
desligamento.

Os cultos aos Eguns ocorrem geralmente uma vez ao ano para as casas
que possuem assentamento de balé (a casa dos Eguns) a fim de homenagear
e prestar agradecimentos através de oferendas a seus ancestrais, visando
sempre que após a morte o espírito do falecido é desprendido do físico
seguindo sua missão espiritual em outros planos, porém, podendo os
mesmos ser invocados a terra para o nosso auxílio. O culto aos Eguns é
realizado para que através dessa conexão entre os planos sejamos
abençoados e orientados pela sabedoria desse único ponto portador de
várias e tantas vidas (reencarnações) trazendo para junto de nossas dúvidas
as respostas adquiridas através dos Eguns e suas experiências vividas.
Enquanto o Orixá é designado a cumprir seu axé universal, o Egun atua
para além da vida orientando seus descendentes e suas comunidades; sendo
assim quando encarnado, em vida deveria ter uma postura a servir de
exemplo e/ou auxílio a sua comunidade, contrário aos que em vida foram
suicidas, homicidas, pedófilos, estupradores... Todo ou qualquer indivíduo
que não honrou sua vida ou as demais vidas é compreendido como de
espírito atrasado, estes não devem e nem podem ser cultuados como Egun
já que não são ligados ao valor da vida, fazendo-se desnecessários inclusive
proceder com rituais de axexê/aresún (desligamento) para com esses já que
foram desleais as naturezas de sua religião, atos compreendidos como
contrários tanto aos Orixás quanto a Olorun.

Os Eguns são cultuados e homenageados de forma singular quando em


vida eram integrantes da comunidade que o presta cultos, são servidos seus
alimentos e bebidas preferidas junto a tantos outros elementos ofertados
como aves, flores, perfumes e tecidos entre outros, paralelamente de formas
plurais onde são homenageados todos os ancestrais de forma geral,
alimentos, bebidas, cigarros, arroz com galinha entre outras oferendas de
aspectos abrangentes a várias preferências. Egun é cultuado "in

161
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

memoriam", onde seu culto é individual durante o período que existirem


pessoas vivas que de fato o conheceram e o carregam na memória como
sendo um indivíduo, com a morte de todos seus conhecidos em vida passa
do estágio singular para o plural até as prévias de uma nova reencarnação
caso esta ocorra, que não ocorrerá com menos de 3 gerações após sua
partida, ou a seguir apenas como um ancestral em seu plano definido a
escolha de Orunmylá. Quando a terra gerar um novo filho, junto da geração
se forma o orí e caso este orí pertença a Yansã Oyá Ladê... Assim retorna o
Orixá ao orí de um filho.

Ao nosso entendimento santos católicos podem ser compreendidos como


Eguns de tamanha evolução a ponto de alcançarem seu próprio culto.

162
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

ARROZ COM GALINHA

Dentre os principais ebós da culinária religiosa afro brasileira (cozinha


de batuque) encontramos os banquetes servidos aos Eguns que variam de
ebós específicos a religião somados a todos outros tipos de alimentos, dos
crus aos cozidos, tudo que a boca come; dentre todos ebós temos a
galinhada (arroz com galinha) muito conhecido e famoso aos adeptos do
culto aos Orixás por ser um alimento de consumo proibido fora dos rituais
de axexê(fúnebres).

Nas crenças de matriz africana todo e qualquer elemento tem uma


correspondência com outros, uma simbologia ou ao menos um significado
além das tradicionais percepções populares, e assim foram traduzidos
também os alimentos cozidos com arroz;

Em determinados pontos de compreensão o arroz pode ser comparado


tanto em sua anatomia quanto em seu axé com a força das larvas de
decomposição... Visando os fundamentos batuqueiros ficam em evidências
que nos cultos aos Eguns são cultuados apenas ancestrais que ao mínimo
tiveram iniciações com rituais de borí (axorô de aves), outros iniciados que
em vida tiveram seus Orixás assentados, e em merecidos destaques aqueles
que tiveram as honras de iniciarem filhos e assentar Orixás aos mesmos
transmitindo os fundamentos a perpetuarem sua nação como herança após
sua morte, recebendo o póstumo título de Babá Egun(Egun de pai/Egun de
Babalorixá). Sendo as aves empregadas tanto nos mais "simples" quanto
nos mais "complexos" rituais de vínculos individuais para com os Orixás
como também nos rituais de culto aos Eguns foram elas destinadas ao
fundamento de juntamente com o arroz servirem como um dos principais
ebós a servirem os Eguns, se tornando um prato padrão em rituais de axexê
onde após oferendar o axorô das aves nos rituais de balé (local de culto aos
mortos) é preparado o arroz com galinha a ser compartilhado com os
presentes que ao se alimentarem fazem deste ato uma cerimônia aos que "já
se foram", comendo a morte, comemorando a vida presente e também a
futura após o desligamento físico.

Assim como existe a morte dos vegetais entre os fundamentos da


culinária de matriz africana temos o arroz com couve, para a morte animal
temos como um de seus correspondentes o arroz com linguiça e entre os
163
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

doces temos o arroz de leite que assim como os outros ebós carrega em si
uma sequência de fundamentos da terra que nos cria e nos consome como a
vida possibilita a morte e a morte sustenta a vida.

AXÉ DUDU

Das partículas de Olorun viemos todos nós, vieram os Orixás em todas


as forças e formas necessárias ao sustento do universo, do homem veio o
livre arbítrio e com ele o tomar de seus próprios destinos... Podendo optar
entre direita ou esquerda, luz ou escuridão, certo ou errado, cabendo a
consciência de cada indivíduo o que julgar por melhores procedimentos
para com sua realidade. O criador fez o metal em Ogun para que o homem
tivesse ferramentas a seu auxílio, dele o homem fez as armas que tanto
pode auxiliar em sua vida quanto prejudicar a vida do próximo; de Xangô
fez a pedra para o sustento e a firmeza de suas estruturas; o homem
projetou a pedra sobre seu semelhante e derrubou outro homem; em Oxum
transformou se em água para hidratar e limpar, o homem sem prudência
afogou...

O fogo para aquecer e iluminar, a maldade do homem o levou a incendiar e


queimar...

O Criador junto a suas criações nos fornecem o sustento para a vida e


para a evolução tanto em formas físicas quanto espirituais, mas
infelizmente o egoísmo, egocentrismo, vaidade e os interesses torpes do
caráter humano desvirtuam os próprios passos rumos opostos aos encontros
consigo mesmo na fonte da vida.

A citar temos a pólvora de origem chinesa criada por acidente em


resultado de alquimistas que buscavam a fórmula do elixir para a longa
vida ou até para a vida eterna no século IX, onde os homens uniram salitre,
pó de carvão e enxofre compondo a pólvora para com seus efeitos
pirotécnicos alegrar e enfeitar o lazer de seu povo; por volta do século X
vieram homens oportunistas para através da inteligência alheia alcançarem
seus objetivos e entre eles os propósitos militares... E da alegria chinesa
164
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

fizeram as armas de fogo e os explosivos, oque era felicidades nas mãos de


uns converteu-se em tristezas pelas mãos de outros. Infelizmente assim
também foram feitos em todas as religiões, onde temos os legítimos fiéis
que lutam a favor da expansão e concretização da fé, como também temos
os falsos fiéis que buscam apenas por explorar a fé alheia e alcançar seus
próprios objetivos.

Fundada a magia branca seus adversários fundaram a magia negra e


assim se fez dentro da religião de matriz africana, onde ao estudar os
segmentos religiosos de uma forma geral pode-se facilmente notar seus
opostos...

Entre o remédio e o veneno ficaram os homens capazes de fazer com que


as únicas diferenças entre eles sejam as doses e suas administrações.

Do branco alá surgem as bênçãos do céu, onde Oxalá é senhor que de


seu reino envia a misericórdia a terra, o pano branco que nas obrigações
aos Orixás assume caráter de pureza e resolução pode ser revertido a seus
sentidos contrários quando diante aos preceitos for substituído por uma
napa(pano) preta retirada de um guarda chuva descartado no lixo. O alá
recebe cuidado de preservação enquanto o guarda chuva foi descartado em
lixo, um é totalmente branco e o outro totalmente preto, um emana as
bênçãos dos céus quanto outro barra a chuva e o sol sendo elas algumas das
emanações vindas do mesmo lugar, um exerce a representação da luz e da
paz quanto outro a tristeza, o luto e o escuro... Diante as concepções
religiosas um é visto como instrumento a favor da luz, quanto o outro atua
a favor das sombras.

Esses rituais assim como os de ordens ligadas os Orixás tem seus


devidos preceitos e materiais, pois como toda a magia possui suas regras,
símbolos e invocações, porém o lado negativo por sua vez se faz oposto ao
positivo...

O obé de feituras tem fio liso, quanto a faca de dano deve ser enferrujada,
podendo ter alguma falha na lâmina, cabo quebrado ou lascado;

165
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Os locais de feitura representam a vida... Sejam nas águas o em lugares


secos, para o dano se fazem em aterros sanitários (lixões), cemitérios,
covas...

Para amargurar os efeitos do mel o maldoso depositou o fel...

Para o positivo depositam-se em superfícies planas, já para o negativo são


suspensos ou em lugares íngremes como lombas e ladeiras as vezes
próprios a saírem rolando...

Para forrar ebó de defesa utilizam-se folhas como as de mamoneiro,


bananeira e/ou amorim, quanto para demandar o forro pode ser jornal,
papelão, sacos plásticos pretos e de lixo;

As moedas são trocadas por alfinetes, agulhas, pregos e lâminas


enferrujadas;

Pensamentos positivos dão lugar a emanações de pensamentos negativos;

Contra as ervas de feitura, as ervas daninhas, tóxicas e urticantes;

Contra o mel e o dendê vem o enjoativo óleo de rícino;

A doçura das frutas é trocada pelo ardor das pimentas;

Direito passa a ser esquerdo, como destro a canhoto;

Velas coloridas são substituídas por velas pretas;

O organizado adere aspectos de ponta-cabeça;

O corte contínuo passa a ser em ziguezagues;

Desvinculam o perfume e agregam o podre;

Para o bem entrega-se, para o mal atira-se;

Rezas são substituídas por pragas rogadas;

Contra os elos inteiros, os cacos de vidro;

Ignora-se o vital e louva-se a mortes;

O ebó arriado frio, passa a fervendo;

O animal saudável pelo doente;

166
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

Oposto as pétalas, os espinhos;

Onde deve ir cozido vai o cru;

A água é trocada por vinagre;

De assado, passa a torrado;

Completo, a incompleto;

O talco é pó de carvão;

Bondade em maldade;

Do verso ao inverso;

Axé e dano.

Praticar os rituais danosos é seguir rumo contrário as essências e


legitimidade da nação de batuque e dos Orixás, pois a prática dos axés
dundún agem de formas opostas as leis naturais gerando desequilíbrios,
desconfortos e malefícios sobre a vida da vítima enfeitiçada, assim como o
desgaste de axé individual ao orí de quem o pratica devido as emanações da
mente podendo gerar futuros infortúnios, onde semelhantes se atraem, água
com água, fogo aderindo fogo, terra comportando terra e ar carregando ar...
Fazendo válidos estes procedimentos apenas diante a uma reação bem
avaliada em atuar como em legítima defesa.

A final, quem busca o mal a frente acaba o encontrando.

167
Efan-deí, O livro dos batuqueiros

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Inevitavelmente com as qualidades de um Babalorixá somadas ao amor


incondicional no culto aos Orixás, com fé inabalável sobre os fundamentos
da religião e paixões infinitas pelo esclarecimento de modo geral entreguei-
me ao destino onde meio aos jogos de búzios me encontrei entre canetas,
lápis, papéis e anotações sobre rituais do cotidiano de uma casa de santo, as
quais foram selecionadas a fim de serem expostas ao público interessado
em assuntos que por vezes são considerados como mais internos as práticas
religiosas de matriz africana; Heis que os piores erros estão na más
intenções quanto os melhores acertos estão nas boas intenções, não é o
segredo que fortalece o axé, do contrário, é o conhecimento; prova notável
temos ao observar o egoísmo disfarçado por parte de alguns adeptos em
manter as coisas recolhidas para si com propósitos de serem eles próprios
detentores do saber em pró de sanar ou auxiliar nas questões pendentes; são
os fatos sem explicação que geram os mitos, é o desconhecimento que
enfraquece a verdade, sabendo quais os padrões assim como suas
importâncias e de seus complementos é que se conquista a segurança e a
significância em fazê-los indispensáveis para obter um bom resultado.

Ao registrar por escrito uma visão que em termos pode ser lida como
um ponto de vista exposto de maneiras públicas se faz importante a
consciência sobre os prós e contras de uma publicação, e assim foi feito,
entre escritas e correções foram escolhidos os termos e explicações de
formas traduzidas a compreensão do escritor a simplificarem seu
entendimento em âmbitos gerais; assim não foram as palavras
minuciosamente estudadas, enquanto uns cultuam o Orixá como Ossayn,
outros o chamam de Ossanha, uns falam Emanjá, outros dizem Iemanjá
quanto outros escrevem Yemanjá, sendo assim a pretensão deste livro é
transmitir informações e não corrigir meniras particulares aos grupos. Vale
relembrar que nossa religião foi trazida por escravos analfabetos que
falavam dialetos com que variavam em sons de acordo a região de origem,
preservando-se de forma oral e sem registros escritos, podendo assim
ocorrer um breve respaldo em relação as pronúncias e formas de escrever.

31 de Julho de 2015

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Efan-deí, O livro dos batuqueiros

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