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Lembre-Se de Nos - Stupid Wife - Sodre N
Lembre-Se de Nos - Stupid Wife - Sodre N
PREPARAÇÃO DE TEXTO
Nathalia Brandão
Vitória Almeida
REVISÃO
Andréa Santos
Isabella Lazaroni
Ivan Souza
Jéssica Sampaio
DIAGRAMAÇÃO
Lara Design Editorial
[2021]
Todos os direitos reservados à SODRÉ || @horsinha
LEMBRE-SE DE NÓS, 1ª EDIÇÃO, EDITORA EUPHORIA, 2021
CNPJ: 39.317.627/0001-06
Contato: editoraeuphoria@gmail.com
Site: editoraeuphoria.com.br
Rio de Janeiro — RJ
Uma história de ficção que alcançou limites os quais eu nunca
imaginei serem possíveis. Serei eternamente grata a cada um de
vocês, carinhas. Muito obrigada, do fundo do meu coração, da
minha mente para os braços de vocês.
SODRÉ
Prólogo - Passado
05 de novembro, 2016 - DIAS ATUAIS
Capítulo 1 – Sonho Louco
Capítulo 2 – Encarando a realidade
Capítulo 3 - Egoísmo
Capítulo 4 - Carinha
Capítulo 5 - Diários
Capítulo 6 - Família
Capítulo 8 - Desejos
Passado – Camille Cruz
Capítulo 9 – Dor compartilhada
Capítulo 10 - Aniversário
Capítulo 11 - Recomeço
Capítulo 12 - Reconhecer
Capítulo 13 - Conexão
Capítulo 14 – Primeiro beijo
Capítulo 15 – Esperanças
Capítulo 16 – Lugar certo
Capítulo 17 - Familiar
Capítulo 18 – Um pedaço do seu coração
Capítulo 19 – Resposta óbvia
Capítulo 20 – Até quando resistir?
Capítulo 21 – Minha pessoa
Capítulo 22 – Dias melhores
Capítulo 23 – Tudo acontece por um motivo
Capítulo 24 – Cuidar dela
Capítulo 25 – Na alegria e na tristeza
Capítulo 26 – Feliz Natal
Capítulo 27 – O primeiro passo
Capítulo 28 – Ponto de paz
Capítulo 29 – O pedido dela
Capítulo 30 - Tudo
Capítulo 31 - Momentos
Capítulo 32 – Diversas sensações
Capítulo 33 – Uma lembrança
Capítulo 34 - Pronta
Capítulo 35 – Eu sou seu presente
Capítulo 36 – A escolha perfeita
Capítulo 37 – Gravidez dupla?
Capítulo 38 – Finalmente completas
Capítulo 39 – O grande dia
Capítulo 40 – Lembre-se de nós
Capítulo 41 – Esposa idiota
Agradecimentos
Prólogo - Passado
Se fosse possível adicionar ao dicionário uma nova definição
para idiota, eu, sem sombra de dúvidas, colocaria em letras
garrafais o nome daquela idiota: Luna.
Ou pode chamá-la apenas de “meu eterno carma”.
Você provavelmente deve estar se perguntando o motivo,
certo?
É bem simples: eu odeio tudo nela e sobre ela. Desde seu
jeito arrogante de falar até o modo de andar como se fosse dona do
mundo, principalmente por achar que as pessoas caem de amores
aos seus pés. Porém, a razão maior é que essa garota sempre
consegue encontrar um jeito de atormentar minha vida. A qualquer
lugar que vou, ela está lá. Às vezes, parece que me persegue, e
confesso que não ficaria surpresa se isso fosse verdade.
Talvez essa idiota seja obcecada por mim.
Ela não deve ter nada da vida para fazer além de me
perturbar. Isso deve diverti-la muito, pois desde que a idiota entrou
em minha vida, nunca mais tive sossego. Todos os dias, na escola,
parece um labirinto eterno, porque sempre tem a maldita Luna no
meu caminho.
Infelizmente, morar no mesmo lugar desde o meu nascimento
fez com que eu crescesse praticamente rodeada pelas mesmas
pessoas. É como entrar em um loop infinito: não importa aonde você
vá, sempre terá um conhecido seu.
Meus pais são do México, mas se mudaram para os Estados
Unidos antes mesmo de eu nascer. E para o meu azar, os pais da
dita cuja tiveram a brilhante ideia de fazer o mesmo quando Luna
ainda era um bebê. Diferente de mim, no entanto, ela não nasceu na
Inglaterra, cidade natal dos pais dela, e sim aqui mesmo, em Miami.
Tenho certeza de que, em breve, terei muitos cabelos
brancos por causa dessa pendeja.
— Eu gostaria de saber o que esse pobre taco te fez para ser
amassado com tanto ódio dessa forma — uma voz é ouvida de
repente, sendo seguida por alguns risinhos, mas meus olhos estão
focados naquele ser humano asqueroso rindo escandalosamente,
cercado de seus amigos idiotas. É incrível como ela consegue trazer
o meu pior à tona, e não é necessário muito esforço. Deve ser um
dom me deixar irritada com facilidade.
Solto uma lufada de ar e finalmente desvio meu olhar da
idiota. Fito o ser sentado a minha frente, encontrando minha irmã
gêmea, Belinda. Ela tem uma expressão divertida em seu rosto, tão
idêntico ao meu, e parece focar em algo. Resolvo olhar para o
mesmo lugar e faço uma careta ao me deparar com a bagunça que
havia feito. Merda!
— Estragando comida outra vez, Lil[1] ? — dessa vez é a
pessoa ao meu lado, minha melhor amiga, Vanessa, quem diz
alguma coisa.
Eu apenas reviro os olhos, ignorando-a, mas a careta em
meu rosto aumenta quando sinto meus dedos colarem. Excelente!
Além de ficar sem meu lanche, estou com as mãos sujas. E tudo
isso é culpa de quem? Daquela idiota dos infernos! Justo no dia que
a cantina do colégio resolveu colocar um pouco da culinária latina
no cardápio.
— Luna trancou a Camille no vestiário — minha queridíssima
irmã resolve confidenciar a Vanessa sobre o infeliz incidente de
mais cedo, quando a digníssima resolveu que seria muito divertido
me trancar dentro do vestiário sozinha e com as luzes apagadas.
Acabei me atrasando para a aula de História, porque demorou um
bom tempo até que alguém me encontrasse lá dentro.
Eu seria capaz de matar aquela garota com minhas próprias
mãos lentamente. Da mesma forma que fiz com o meu lanche,
poderia fazer no pescoço dela. Não me importaria de sacrificar meu
réu primário com um homicídio.
— Quantas vezes ela fez isso durante essa semana mesmo?
Eu apenas ouvia as duas zombando e rindo, enquanto
tentava tirar aquela nojeira das minhas mãos e pensava em diversas
maneiras de matar Luna.
— Acho que foram sete.
— Na verdade, contando a de hoje, foram oito.
— Luna está se tornando especialista em prender nossa
querida Camille nos lugares.
— Pobre irmã, sempre na hora e no lugar errado — Belinda
respondeu, e isso fez com que as duas voltassem a gargalhar.
Eu não estava a fim de me irritar ainda mais, tinha estourado
toda a minha cota de estresse com a idiota. Hoje foi só mais um dos
tantos dias que ela infernizou minha vida. Não é algo fora do
comum, para dizer a verdade. Minha única salvação é saber que as
férias de julho se aproximam e, pelo menos durante algum tempo,
ficarei longe dessa garota idiota.
— Vocês perceberam como o Noah parece ficar mais lindo a
cada dia?
Meu rosto se contorce automaticamente com o tom de voz
adocicado da minha melhor amiga ao dizer aquilo. Vanessa alimenta
uma paixonite pelo irmão da idiota há alguns anos, acho que uns
quatro, para ser mais exata. Não tenho nada contra o Noah, é um
garoto legal, que só deu azar de ser irmão da Luna. Não sei como
ele suporta conviver com aquela garota, deve ser horrível.
Mas, voltando ao assunto, tenho certeza de que ele desconfia
da paixonite de minha melhor amiga, porque Vanessa não consegue
esconder a cara de idiota toda vez que estamos no mesmo
ambiente.
Noah sempre foi muito divertido e simpático, e pelo fato de
que todos se conhecem desde sempre nesse colégio, os dois estão
em constante contato. Ainda assim, minha amiga quase morre
quando esse garoto se aproxima dela.
Quando ele estava comprometido, eu entendia o silêncio de
Vanessa, mas agora que nada a impede, continua sofrendo calada,
ao invés de simplesmente se declarar. É melhor arriscar do que
viver imaginando como teria sido.
Sinceramente, não entendo o porquê de as pessoas ficarem
agindo de maneira tão idiota quando estão apaixonadas, acho uma
besteira. Sendo bem sincera, toda essa coisa de amor é palhaçada.
Por outro lado, minha irmã foi determinada a ir atrás do que
queria: ela namora Rodrigo, o brasileiro recém-chegado. Para dizer
a verdade, não é tão recente assim, faz três anos que se mudou e
está aqui, no mesmo colégio que todo mundo.
Belinda se interessou quase que instantaneamente, assim
que o viu, e não demorou muito para começar a puxar assunto,
dizendo que adorava seu sotaque, entre outras coisas que prefiro
nem saber. Foi questão de poucos meses para eles começarem a
se envolver, e agora são um dos casais mais melosos que conheço.
Infelizmente. Eu quero morrer todas as vezes que eles começam a
se agarrar nos lugares. É constrangedor, e não adianta nada
reclamar, porque os dois continuam.
— Eu não entendo...
— Oh, meu Deus! Oh meu, Deus! — Vanessa corta minha
fala, completamente afobada. — Noah está vindo para cá. Ele está
vindo mesmo.
Seu rosto estava completamente vermelho, e parecia prestes
a entrar em colapso.
Não pude evitar fazer caretas de desgosto. Como disse
antes, as pessoas agem de forma tão idiota quando estão
apaixonadas...
Isso porque os dois cresceram juntos, imagine se ele fosse
novo na cidade, por exemplo. Vanessa é muito besta por esse
garoto, não tenho paciência.
— Pelo amor de Deus, Vanessa. Respire ao menos — peço,
agoniada, ao vê-la daquele jeito, e tudo somente porque o dito cujo
está vindo em sua direção. Será que ela irá morrer, caso ele sorria e
a cumprimente como sempre? Não é como se isso não acontecesse
todos os dias.
— Ele é lindo demais, eu não consigo.
Já completamente sem paciência para aquela cena ridícula,
apenas reviro os olhos e a ignoro. Belinda é a única que tem
paciência para lidar com essa criatura surtando por causa de um
garoto.
Coloco meus cotovelos sobre a mesa, apoio meu queixo
sobre as mãos, para observar as pessoas, e começo a ficar nervosa
quando noto que não apenas Noah está vindo em nossa direção,
mas meu cunhado Rodrigo também.
Era só o que faltava. Que delícia, estava precisando de uma
vela aqui mesmo!
Querendo me poupar de presenciar momentos
constrangedores, preparei-me para me levantar daquela mesa, mas
fui impedida ao notar uma presença repentina ao meu lado. Não
precisava nem me esforçar para saber quem era.
— Oi, Camies... Eu vim te fazer companhia, você sabe... pra
que você não fique sobrando — ela diz e abre um enorme sorriso,
apontando com a cabeça em direção aos pares ao nosso lado, que
parecem bem entretidos em alguma conversa idiota. — Muita gente
gostaria de estar no seu lugar, mas eu escolhi você. — E como
sempre, esse ser precisa mesmo abrir a maldita boca e cuspir esse
monte de lixo sonoro em cima dos outros.
Luna não se conforma em ser desagradável, ela tem sempre
que piorar tudo. São por atitudes como essa que não consigo
suportá-la. Queria fazê-la sumir da face da terra. Ela precisa mesmo
agir como se as pessoas fossem cair aos seus pés, apenas por
causa desse maldito sorriso e desses olhos verdes?
— Ok, primeiramente você não me escolheu, porque eu nem
sou uma opção sua. Shh! — Faço sinal para ela se calar, antes que
mais alguma idiotice saia daquela boca. — Não sou e nunca vou
ser, porque eu não quero.
— Camies, você está muito estressada hoje. Que tal darmos
uma volta e deixarmos esses quatro sozinhos?
— Não vou a lugar algum com você. Nem ao menos te
chamei para vir até aqui. Ninguém chamou. — Cruzo os braços e a
encaro com extremo deboche, antes de completar: — E só para
refrescar a sua memória: você não faz meu tipo, pode tirar esse
sorriso ridículo da cara.
Isso poderia abalar qualquer pessoa. Sim, qualquer uma,
mas eu sabia que ela nem daria importância. Não é a primeira vez
que lhe dou um fora, e Luna parece gostar disso.
Tento desviar meu olhar da idiota, mas me arrependo no
momento em que meus olhos pairam sobre minha irmã e meu
cunhado aos beijos. Eles nem se importam de estarmos no colégio
ou com todas as pessoas ao redor. Isso me deixa bem
desconfortável, porque é muito constrangedor.
— Você sabe que eu faço o tipo de todo mundo.
— Felizmente, minha mãe sempre disse que não sou todo
mundo. E eu não poderia ser mais grata a ela por isso.
Olho para a idiota, que não parece nem um pouco abalada
com os meus foras e continua sustentando aquele sorriso ridículo
em seu rosto. Será que essa garota caiu de cabeça no chão logo
depois que nasceu? Porque nada pode explicar sua falta de noção
para entender que não é bem-vinda.
— Minha sogra gosta de mim, e você sabe disso — ela diz,
com aquele ar grotesco de arrogância, e, então, sinto um braço
sobre meus ombros.
Meu corpo todo estremece de raiva.
— Você está louca? Não toque em mim com esses dedos
nojentos. Não te dei permissão.
Sei que provavelmente estou fazendo uma cena absurda,
mas não poderia me importar menos. Luna não tem vergonha na
cara, inferniza minha vida em uma hora e na outra quer agir como
se fôssemos próximas.
— Dedos nojentos? Você não diria isso se soubesse o que
eles são capazes de fazer.
Meus olhos quase saltam das órbitas e minhas bochechas
ficam doloridas na mesma hora. Com certeza, estou corada,
desacreditada que acabei de ouvir uma merda dessas. Realmente,
Luna consegue se superar todas as vezes.
— Você é asquerosa! — exclamo e rapidamente me levanto
para me afastar daquela criatura, antes que minha razão suma e
acabe acontecendo uma coisa da qual irei me arrepender depois.
Provavelmente, eu iria agredi-la ou algo parecido com isso.
Felizmente, consegui evitar aquela idiota pelo resto do dia, ou
teria cometido um crime de ódio direcionado. Não vejo a hora de
estar de férias, livre disso.
— Senha do quê?
Minha pergunta é respondida quando noto a frase “deslize
para desbloquear” bem no final da tela. Escorrego um dedo sobre o
local e uma caixinha aparece, abrindo também o teclado. Escrevo
os números que li na mensagem e a caixinha desaparece, dando
lugar a uma série de aplicativos. Eu sei que o telefone é meu, pois
na tela tem uma foto minha, com Louis ao meu lado, beijando minha
bochecha. Tem um pequeno ícone com um balão de fala e, em cima
dele, o número sete. Eu clico em cima e sou direcionada para o que
parecem ser mensagens. Acho muito curioso e prático esses novos
aparelhos celulares sem teclado. As coisas realmente mudaram nos
últimos anos.
Três mensagens de Mi suerte.
Uma de Big.
E por último, também, tem uma de Cópia malfeita.
— Cópia malfeita? Só pode ser a Belinda.
Tenho certeza de que é ela, lembro-me de que sempre dizia
isso quando nos apresentávamos para alguém. Eu nasci poucos
minutos antes dela, então ela é a cópia malfeita mesmo.
Decido abrir primeiro as mensagens de Mi suerte. Estava
curiosa.
— Pode entrar.
Respondo às leves batidas à porta, termino de colocar
minhas botas e saio do closet. Luna entra em meu quarto. Está
agasalhada com um sobretudo preto e usa uma touca beanie da
mesma cor.
— Vamos?
Concordo com a cabeça, vou em sua direção e termino de
abotoar minha jaqueta de cor verde-escura. É bem quente, o dia
está frio lá fora. Passo por Luna, e seu cheiro toma conta das
minhas vias nasais. Ela é sempre tão bem-perfumada, é impossível
não notar isso. Minha consulta com a psicóloga foi adiada para
quinta-feira, pois eu tive que ir ao hospital saber sobre o meu laudo
médico na segunda — fatídico dia que me deu a certeza de que
posso nunca me lembrar de nada. Isso ainda me apavora bastante.
Essa semana foi mais exaustiva do que a última, e tenho
muita coisa para conversar com a doutora Robertson. Preciso
conversar com alguém que vai apenas me ouvir. Às vezes, tudo o
que queremos e necessitamos é falar sem que alguém se sinta na
obrigação de responder algo. Nem sempre um desabafo precisa de
resposta. Na maioria das vezes, só precisa ser ouvido.
— Vanessa comentou algo com você sobre um jantar hoje à
noite? — pergunto a ela. Estamos a caminho do consultório quando
me lembro da mensagem que minha melhor amiga mandou hoje
cedo, logo depois do café da manhã.
— Sim. Ela me mandou uma mensagem. Nós vamos?
— Uh... sim...
Confirmo, mas soa como uma pergunta retórica. Quero dizer,
por que ela me perguntou isso? Não sou eu quem decido as coisas.
Ela é uma pessoa livre, certo? Não tenho o direito de dizer se ela
pode ou não ir a algum lugar. Luna tem algumas atitudes que me
confundem muito.
— Tudo bem. Vou chegar um pouco mais tarde hoje. Estou
atolada com algumas coisas no trabalho. Tudo bem se o Noah te
buscar?
Fico curiosa para questioná-la sobre algumas coisas. Nós
nunca conversamos sobre o trabalho dela nem faço ideia de como
ela se sustenta, mas me calo e apenas concordo com a cabeça.
Sempre há momentos em que não sei como agir corretamente com
a Luna. Tudo ainda é muito confuso e estranho.
O caminho até o consultório é tranquilo. Apesar dos
momentos constrangedores e esquisitos, não é mais tão ruim ficar
sozinha na presença dela. Estou começando a acreditar que a rotina
de convivência realmente pode mudar minha opinião sobre Luna.
Chegamos rápido e, como de costume, entramos juntas no prédio.
Seu olhar esteve sobre mim algumas vezes, mas eu apenas ignorei.
Ela tem uma coisa que prefiro evitar a todo momento.
— Boa tarde. A doutora Robertson está esperando por você,
Camille.
— Boa tarde, Aurora. Muito obrigada. — Sorrio para a
simpática secretária da minha psicóloga e viro-me para Luna, que,
sorridente, acena para Aurora. Ela desvia o olhar para mim,
esperando que eu diga algo. — Até mais tarde.
— Até... Tem dinheiro para o táxi na sua bolsa. Qualquer
coisa, é só me ligar.
— Tudo bem.
— Tchau, Aurora.
— Tchau, senhora Jacobs.
Elas se despedem e Luna vai embora. Suspiro, virando-me
em direção à porta da sala da minha psicóloga, e aceno mais uma
vez para Aurora, antes de bater à porta e ser recebida pela doutora
Robertson. Seu enorme sorriso de sempre está ali, presenteando-
me com sua aura boa.
— Camille! Entre, estava esperando você.
— Oi, doutora Robertson... Obrigada.
— Já disse que você pode me chamar de Annie — ela me
repreende, mas seu tom de voz é divertido. — Sente-se. Aceita
alguma bebida? Tenho suco, água, café...
— Não. Estou bem, obrigada.
Sento-me na minha habitual cadeira, em frente a ela.
— E, então... conte-me sobre a sua semana. Como foi a
consulta com o médico?
— Terrível. — Suspiro longamente. O coração aperta todas
as vezes que me lembro da triste notícia. — Ele disse que minhas
chances de não me lembrar de nada são bem altas. Acho que só
um milagre pode me ajudar.
— Você não pode perder as esperanças, Camille. Mesmo
que suas chances de sucesso sejam poucas, ainda assim, você
pode acreditar e lutar por isso.
— Eu sei, mas é muito difícil.
— Tenho certeza que sim. Não posso dizer que sei como é,
porque eu não faço ideia de como seja essa situação, mas você
precisa sempre focar no futuro.
— Estou tentando, mesmo. Só que é tão complicado... —
Levo minhas mãos até meus cabelos e enfio os dedos entre os fios,
puxando-os levemente. A pequena fisgada que sinto em meu couro
cabeludo não é nada, se comparada à dor em meu coração. —
Como isso foi acontecer justo comigo?
— Sabe, Camille, tem coisas na vida que acontecem sem um
motivo certo. De vez em quando, algo ruim é o melhor caminho para
algo bom. Precisamos cair, se quisermos aprender a ficar de pé.
Erros sempre são educativos.
Suas palavras me fazem pensar bastante. Tudo o que
acontece na nossa vida pode não parecer que deveria acontecer,
mas, no final, tem uma razão. Pode ser complicado entender as
dificuldades, porém, sem elas, como aprenderíamos a viver?
Ter tudo com facilidade não nos ensina nada, viver em um
mar de rosas é só enganação. A vida vai muito além de só nascer,
crescer e morrer. Passamos por dificuldades e obstáculos. Temos
que enfrentar monstros diariamente, mas isso é necessário para que
possamos evoluir como seres humanos.
Afinal, só se vive uma vez, e ninguém deveria desperdiçar a
única chance.
— Mamãe?
Volto a mim mesma quando ouço o chamado do meu filho.
Com um sorriso no rosto, desvio o olhar do mural de fotos e olho em
sua direção. O pequeno está parado na porta do escritório, com
uma expressão de confusão tão fofa, que sinto vontade de mordê-lo.
— Entre, carinha. Por que está assim?
— Eu acho que a mommy não está normal.
Louis coça a cabeça, bagunçando os cabelos e reforçando
ainda mais a careta em seu rosto. Não resisto e abaixo-me para
ficar da sua altura e mordê-lo.
— Coisa mais fofa da minha vida.
— Ouch, mamãe — ele resmunga, tentando se soltar de mim
quando o seguro pela cintura e mordo sua bochecha. — Para, por
favor, mamãe.
Solto uma risadinha e beijo seu rosto, antes de soltá-lo.
— O que sua mommy está fazendo para te deixar assim?
— Ela está lá na cozinha, saltitando e cantando aquela
música.
Não posso evitar rir de sua careta e da forma que a imitou.
Louis sempre fica assim quando Camille começa a cantar músicas
em espanhol. Ele nunca se deu bem com o idioma e desistiu de
aprendê-lo, mesmo depois de muita insistência de minha esposa.
Camille ficou triste pelo pequeno não querer aprender sua língua
materna, mas também nunca o forçou.
— Deve ser felicidade — falo de forma displicente, mas,
então, me dou conta de que sua alegria pode ser por causa de
ontem. Meu coração parece inflar dentro do peito, tamanha a minha
emoção. Como se o mundo tivesse parado por alguns segundos,
um estalo em minha cabeça me faz pensar se... — Sua mãe está
cantando Olhos lindos?
— Sim, mamãe. A senhora sabe como ela ama essa música.
Mal espero meu filho terminar de falar e saio em direção à
cozinha. Meu coração está tão acelerado que pareço ter corrido
uma maratona. Estou completamente desacreditada do que ele me
contou, mas quando chego à cozinha, não sou capaz de expressar
minha surpresa ao ouvi-la realmente cantar aquela canção. Meus
olhos e meus ouvidos parecem não acreditar.
— Seus olhos, verdes como as árvores do jardim... Em volta
de nós nada além do nosso amor... Estou em busca de felicidade e
paz, e sei que nos seus braços vou encontrar todo o sentido... Às
vezes me pego sorrindo sozinha, então eu me pergunto o que fez
comigo... — Minha boca se abre em descrença. Não acredito que
esteja realmente acontecendo. — Dios mio, Luna. ¿Estás loca por
verte así?
— Como... como você se lembra dessa canção?
Camille suspira, recompondo-se do susto.
— Eu não sei, para ser sincera. Simplesmente acordei hoje
cedo e não consegui parar de cantarolar...
Nem espero que ela termine de falar: atravesso a cozinha e,
sem mais nem menos, a abraço com força. Sei que devo parecer
louca, mas não posso evitar a emoção que toma conta de mim.
— É claro que me abraçar é bom, mas pode me explicar o
motivo? Está tudo bem? — Camille brinca, e seu tom de voz é leve
e divertido. É muito bom vê-la assim outra vez, após as últimas
semanas. Sinto que estamos realmente tendo um recomeço.
— Você sempre cantou essa música para mim, desde o
nosso primeiro ano de namoro. É a única canção que sabe tocar no
violão, e eu só fui saber disso no dia do nosso casamento. — Meus
olhos ficam levemente cheios de água. O coração já não me
obedece mais e continua disparado. Ela me olha, parecendo
realmente surpresa. Imagine como estou. — Você a cantou para
mim depois da nossa dança. Essa música se tornou parte da nossa
história. Então, virou algo seu. Todas as vezes que ficava muito feliz,
acabava cantando-a pelos cantos.
Sinto minha garganta arranhar de leve, tamanho é o meu
esforço para não chorar. Camille me olha, fascinada com o que
acabo de dizer e realmente surpresa, e eu vejo em seu rosto como a
notícia a abalou.
— Isso quer dizer... É sério?
— Muito! Não consigo expressar o tamanho da minha
felicidade. Você acaba de se lembrar de algo do seu passado
esquecido. Isso é realmente incrível.
— Meu Deus! Eu me lembrei de algo involuntariamente. —
Camille leva as mãos à cabeça e segura seus cabelos, andando de
um lado para o outro, desnorteada, sem acreditar. Imagine como eu
estou me sentindo. — Luna, será que...?
— Eu não sei. Precisamos conversar com o seu médico, mas
acho que isso é um bom sinal. Pode ser que sua memória esteja
voltando aos poucos.
Dessa vez, é ela quem me abraça, e eu rapidamente retribuo,
amando tê-la agarrada a mim com tanto carinho. Sinto-me como no
passado, quando tudo estava bem. Estou com as esperanças
renovadas, minha alma leve, e sinto que tudo pode, finalmente,
entrar nos eixos. Depois da tempestade, vem a calmaria, certo?
Lembro-me momentaneamente de suas palavras no dia
anterior ao que ela acordou desmemoriada: “Vamos enfrentar tudo o
que vier pela frente juntas. Nunca se esqueça de que dentro de mim
é você quem habita.”
Não tinha entendido o motivo dela ter olhado em meus olhos
e dito aquilo, mas hoje penso que, talvez, de alguma forma, ela
estivesse me preparando para o que aconteceria.
Recordar-me de suas palavras, logo após se lembrar de algo
do seu passado, me faz ter mais esperanças de que tudo se acerte
e de que nosso amor reviva, porque sei que continua dentro dela, só
precisa ser encontrado outra vez.
Nada nesse mundo me faz mais feliz que amá-la e ser amada
por ela. Observar minha esposa sempre foi uma das coisas que
mais amei fazer, durante todos esses anos juntas, até mesmo antes
de tê-la comigo. Quando era mais nova, desde a primeira vez que a
vi, meu passatempo favorito tornou-se observá-la. Infernizar a vida
dela nunca foi minha real intenção, e por algum motivo, ela
despertou uma antipatia por mim, que impossibilitava qualquer
aproximação minha. Ou seja: uma garota completamente intocável
para mim, pelo menos de maneira correta. Todas as vezes que
tentei estabelecer a paz entre nós duas, acontecia alguma coisa ou
alguém conseguia atrapalhar. O tempo foi passando e vivíamos no
eterno ritmo de cão e gato.
Era muito difícil ter que disfarçar meus sentimentos por ela,
mas sendo sincera, não sei como ela nunca percebeu quão
apaixonada eu sempre fui. Mesmo que fosse muito divertido tirá-la
do sério diariamente, eu me imaginava passeando de mãos dadas
com ela e beijando aquela boca linda.
Hoje, anos depois, continuo gostando de observá-la — de
modo diferente, obviamente —, e meu amor só aumenta. É como
se, aqui dentro do meu peito, o sentimento fosse renovado a cada
parcela de tempo. Mesmo nos momentos mais difíceis, sempre
consegui encontrar algum tipo de conforto e esperança. No fundo,
sinto que tudo vai ficar bem.
— Mommy?
Ouço o chamado de meu filho e desvio o olhar de sua mãe
para olhá-lo. Eles estão sentados no chão da sala, distraídos com
diversas folhas de papel em branco e lápis de cor espalhados. Nada
pode ser mais perfeito do que passar um momento assim. Ainda
que eu esteja ocupada no computador, organizando coisas do meu
trabalho, a companhia deles me traz certa paz. Só não estou
participando da diversão porque estou realmente atarefada, com um
projeto enorme que pretendo finalizar antes do Natal. Será uma das
coisas mais lindas e especiais que já fiz. São quase dois anos de
trabalho. O curioso é poder finalizá-lo justamente agora, depois de
tudo o que aconteceu. Parece mesmo que o destino tem seus
caminhos certos.
— Oi, filho.
Camille para de rabiscar alguma coisa em sua folha e olha
para o pequeno, com um enorme sorriso em seu rosto. Eu amo esse
brilho em seu olhar todas as vezes que observa o nosso filho. O
amor deles sempre me encantou.
— Eu queria pedir um favor.
— Pode pedir, meu pequeno.
— Pode me ensinar espanhol? Eu acho que agora
conseguirei aprender.
O brilho em seus olhos parece aumentar assim que ouve as
palavras do carinha. Ouvir aquilo parece iluminá-la.
Estou surpresa com o pedido, mas nosso filho é um garoto
muito esperto, sabe como isso sempre foi importante para ela. E
depois dos últimos acontecimentos, acredito que esse pedido tenha
a ver com uma tentativa de ajudá-la com suas lembranças e de
reforçar a ligação dos dois.
Desde que contamos a ele sobre a amnésia de Camille, Louis
tem ficado mais próximo dela. Nós dois sempre fomos muito
apegados, mas a paixão por ela também é enorme. Estou feliz por
ele entender como Camille precisa de nós.
— Vai ser um prazer, filho.
Ela estica sua mão direita e bagunça os cabelos do pequeno.
Louis abre um enorme sorriso e volta a desenhar, feliz. Alegro-me
com essa interação dos dois. Pode parecer pouca coisa, mas, para
mim, esses momentos são gigantescos. Não existe nada no mundo
que me faça mais feliz do que estar perto da minha família. Eu sei
que juntos iremos passar por essa dificuldade que a amnésia nos
trouxe.
Vai nos fortalecer, e juntos seremos imbatíveis.
Eu estou cheia de esperança.
Imagino que coisas assim devam ser normais e não fico tão
assustada quanto no início de tudo, mas, ainda assim, é impossível
não sentir vergonha. Luna parece despertar o meu lado mais
safado, e isso, de certa forma, mexe com minha autoestima. Pelas
respostas dela, parece que sempre me colocava para cima, mesmo
que com pouco.
Um pequeno sorriso surge em meu rosto, mas, ao mesmo
tempo, minhas bochechas ficam vermelhas e quentes, tamanha a
minha timidez ao imaginar o que devemos ter feito na noite citada.
Largo o telefone para me levantar da cama. Chega de ficar
vendo essas coisas, preciso procurar o que fazer. Não vou passar o
dia todo deitada, procrastinando.
Entro no closet, para pegar uma roupa, e quando estou
procurando uma calcinha, noto que em uma das prateleiras tem
uma foto minha e de Luna. Não a tinha visto antes, mas agora sorrio
ao vê-la. Parecemos bem mais novas. Pego a foto emoldurada e
percebo que tem algo escrito com letras desenhadas. Obviamente,
não deve ter sido eu quem escreveu.
— Mãe! Não!
Gritos e gargalhadas me despertam na manhã. Solto um
resmungo, piscando algumas vezes, para focalizar minha visão.
Com grunhidos e mais resmungos, levanto-me da cama para
descobrir o motivo dessa zona, e logo tenho minha resposta, ao
entrar no quarto do meu filho e ver a seguinte cena: Luna de pé,
com ele preso entre suas pernas.
— O que vocês estão fazendo?
Recosto-me no batente da porta, bocejando brevemente,
antes de focar minha atenção nas duas crianças que moram
comigo. Eles rapidamente viram em minha direção ao ouvirem
minha voz, e quase solto uma gargalhada ao ver Louis com os
cabelos totalmente bagunçados e com o rosto vermelho.
— Mommy, me salva!
— Ela não vai te salvar, carinha.
Ele me olha com o olhar suplicante, e Luna bagunça ainda
mais seus cabelos e se abaixa, enchendo-o de cócegas. Louis se
debate inutilmente, tentando se soltar do aperto da mãe.
— Por favor, mommy, me salva!
Aproximo-me dos dois, rindo dos pedidos de socorro de
Louis, e Luna, não o perdoando, continua com cócegas.
— Chega, Lu, deixa ele.
Coloco minhas mãos na sua cintura e dou um leve aperto,
fazendo-a instantaneamente soltar o pequeno. Louis cai para a
frente, no chão, e rola para longe dela. Eu rio dele quando se ergue,
pois seus cabelos estão como um ninho de pássaros.
— Sorte sua que ela te salvou.
— Pare de implicar com ele.
As minhas mãos ainda estão na sua cintura de Luna, que se
vira para mim e sorri, erguendo as suas, em forma de rendição.
— Eu já arrumei as nossas malas. Olhe para ver se quer
levar algo diferente. O carinha também arrumou as coisas dele.
Tomamos café e saímos logo em seguida, ok?
— Tudo bem. Cariño, voy a darme una ducha.
— Sí, señora, mommy. — Seu espanhol carregado de
sotaque me faz rir, mas tem evoluído bastante com minha ajuda. Eu
sugeri a Luna que o colocássemos em um curso, mas ela disse que
seria bom que aprendesse comigo, pois aumentaria nossa ligação.
Estou gostando muito de dividir isso com meu filho. Desde pequena,
meus pais nunca deixaram minhas irmãs e eu nos esquecermos de
nossas raízes. Mesmo que tenhamos crescido longe de nosso país,
sempre seremos mexicanas e temos orgulho disso. Nada apaga
nossa história.
Terminamos de arrumar tudo e descemos para tomar café.
Aproveito para avisar a Belinda que estou prestes a sair. Ela parece
animada com essa viagem, e não faço ideia do motivo, ou talvez
faça. Minha irmã gêmea certamente é uma das que mais apoia Luna
e eu, e parece genuinamente feliz ao nos ver cada vez mais juntas.
Enfim, saímos de casa, rumo ao aeroporto, depois de
Luna pedir um carro pelo aplicativo, pois não viajaríamos em um dos
nossos, por motivos óbvios.
Louis é o mais animado entre nós, parece realmente amar os
Jacobs.
— Carinha, se lembrou de trazer seu switch?
— Sim, mamãe, eu nunca esqueço.
Não faço ideia do que estão conversando, mas nem presto
muita atenção, porque agora estamos dentro do avião, e eu sempre
tive pavor de voar. Louis está sentado na última poltrona, Luna, ao
seu lado, e eu, na poltrona do corredor. Minhas mãos estão suando,
só quero conseguir dormir e acordar quando estivermos em Miami.
— Quer tomar um remédio pra dormir? — Luna me
questiona, parecendo ler meus pensamentos. É claro que ela sabe
do meu pavor de aviões, conhece-me de forma absurda.
— Eu aceito, nunca fui fã de aviões.
— Eu sei. Louis também tem medo, mas o videogame portátil
o distrai sempre. — Ela aponta com a cabeça para o lado, enquanto
busca o remédio para mim dentro de sua bagagem de mão. Inclino-
me para a frente e vejo o pequeno com headphones, vidrado na tela
de um aparelho eletrônico. — Por um segundo, pensei ter
esquecido, mas aqui está. Ele te faz dormir rápido.
— Não vai se importar se eu dormir e te deixar sozinha?
— Sempre que viajamos de avião é assim, estou
acostumada. Inclusive, sinto-me melhor se você dormir, porque
assim sei que estará bem. — Ela faz sinal para uma aeromoça e
pede um copo de água. — Além do mais, tenho algumas coisas do
trabalho para resolver.
— Tem certeza?
— Aqui está a água, senhora.
— Obrigada — agradeço, pego o copo e tomo o comprimido,
antes de virar todo o líquido em minha boca. Satisfeita, entrego o
copo vazio à moça e encosto em minha poltrona.
— Absoluta, pode dormir tranquila. Logo, estaremos em
Miami.
Luna sorri para mim, e eu concordo com a cabeça, fechando
os meus olhos para esperar o sono vir. Não sei em quanto tempo
exatamente eu adormeci, mas tenho certeza de que não demorou
muito. Quando torno a abrir os olhos, acabamos de pousar.
— Parece que eu acabei de dormir — murmuro, sentindo-me
sonolenta ao me levantar da poltrona. Luna acorda Louis que, em
algum momento, dormiu sobre o colo dela. Nós três terminamos de
arrumar tudo, antes de desembarcarmos para buscar nossa
bagagem. Levamos pouca coisa, porque será apenas um final de
semana. Só espero que seja um final de semana tranquilo.
— A previsão garantiu um tempo firme, mas você conhece
bem Miami, sabe como é.
— O tempo é louco aqui... e abafado.
— Quer me dar o casaco?
— Eu o levo, obrigada. — Retiro a peça quente e o seguro
em meu braço. Louis vai à frente, agitado demais para andar ao
nosso lado. — Seus pais sabem sobre a minha amnésia?
— Sim. Justamente por isso, pediram que eu a trouxesse
aqui. Era para termos vindo antes, mas é difícil conseguir um
espaço na agenda dos dois.
— Ainda trabalham?
— Os Jacobs nunca descansam. Isso fica para depois da
morte.
— Vovô!
O grito de Louis chama a minha atenção, e não demoro a
encontrar o motivo de sua animação. Mark Jacobs está vestido
informalmente, com uma bermuda de tecido fino na cor azul e uma
camisa de botões branca. Simples, mas, como sempre, elegante.
Lembro-me de tê-lo visto poucas vezes. Usava ternos de grife, e
seus cabelos, antes escuros, estão grisalhos hoje. Luna se parece
muito com ele, sempre achei os dois semelhantes.
— Meu garotinho, que saudade!
Ele se agacha no chão, sem se importar com nada além de
poder abraçar o neto. É perceptível que eles se adoram, e isso me
agrada. Mark conversa brevemente com o pequeno e logo se
levanta, para nos dar as boas-vindas.
— Olá, papai, a sua benção — Luna diz de maneira formal,
mas com todo o afeto que eu sei que tem. Mark sorri e a puxa para
um forte abraço.
— Deus te abençoe, filha. Senti sua falta. — Os dois se
afastam, e então, a atenção dele é para mim. Sorrio, meio sem jeito,
estendendo minha mão para cumprimentá-lo. — Camille Jacobs, é
um prazer rever você.
O nome me causa uma estranheza momentânea, mas
continuo com meu pequeno sorriso. Ele nos ajuda a carregar as
nossas coisas, e seguimos em direção à luxuosa SUV prata dele.
Louis está radiante e monopoliza toda a atenção do avô, enquanto
Luna e eu ficamos lado a lado. Sinto-me melhor assim, com a
presença dela.
— Você está bem? — questiono à Luna quando já estamos
dentro do carro, indo em direção à casa dos Jacobs. Louis está na
frente com o avô, e não param de falar nem um segundo sequer.
Isso me dá a chance de conversar com Luna em particular.
— Sim, sim. Você está?
— Um pouco nervosa, confesso.
Ela sorri de lado e segura minha mão, puxando-a para seu
colo, o que me faz me sentir melhor.
— Fique tranquila, meus pais adoram você. Falo
sinceramente.
Quando, enfim, chegamos à casa dos Jacobs, minha primeira
impressão é de choque, e a segunda é de curiosidade. Como
conseguem viver, apenas os dois, em uma casa tão grande?
Descemos do carro, e logo um rapaz alto e loiro se aproxima
para nos cumprimentar e pegar nossas coisas. Luna se coloca ao
meu lado, e juntas caminhamos em direção à porta, que logo é
aberta, e por ela, a elegante e radiante Ana Jacobs aparece.
Diferente de Mark, eu vi a senhora Jacobs muito mais vezes em
minha antiga escola, pois ela costumava ser mais presente.
— Meu amor!
— Vovó!
Louis corre em direção à avó, que se abaixa para abraçá-lo
com força. Esse carinho dos pais de Luna com meu filho me deixa
muito feliz. Eu o amo tanto, que vê-lo receber carinho de pessoas
que também o amam me aquece o coração.
— Benção, mãe.
— Deus te abençoe, minha filha. — Ana sorri largamente
para Luna e abre os braços, recebendo-a em um aconchegante
abraço. Quando se afastam, a matriarca Jacobs olha em minha
direção, abrindo o mesmo sorriso fraternal. — Camille Jacobs, que
prazer revê-la!
Aparentemente, o meu sobrenome adicional realmente é
muito bom de ser pronunciado. Mas conhecendo um pouco mais
sobre os pais de Luna, sei bem que o Jacobs é motivo de muito
orgulho entre todos. E a julgar pela quantidade de coisas minhas
que levam esse nome, acredito que eu também tenha sido envolvida
por esse sentimento com o passar dos anos.
— Mommy, vamos ver o Duke, vamos! — Louis pede
desesperadamente, logo que adentramos a casa.
Mal tenho tempo de olhar em volta, porque meu filho sai me
puxando para longe de todos. Ouço Luna pedir a ele que tome
cuidado, enquanto o acompanho, sem saber quem exatamente é
esse Duke. Por fim, descubro que Duke é um enorme e brincalhão
cachorro peludo. Louis gosta muito do animal, pois corre pelo
gramado com um enorme sorriso, sendo seguido pelo carinhoso
cão. Eu observo a cena, extremamente encantada com o meu
pequeno.
— Ele é apaixonado por bichos. — Mark surge, de repente,
ao meu lado, trazendo consigo um copo que deve ser de uísque,
enquanto olha, visivelmente apaixonado, para seu neto. Ele
realmente ama o carinha.
— Estou vendo que sim. Filho, cuidado para não se
machucar.
— Eles sempre brincam assim, fique tranquila. Duke é muito
dócil e ama o rapazinho ali — Mark me tranquiliza ao perceber
minha preocupação, e sinto-me aliviada, pois não quero que meu
filho acabe se machucando. — Como estão as coisas entre vocês?
— Quem?
— Minha filha e você. A Luna me contou o que aconteceu. Eu
lamento estarmos tão longe e não termos feito uma visita antes. Os
dias estão muito corridos.
— Sem problemas, senhor...
— Você é da família, Camille. Não precisa dessa formalidade,
sempre nos tratamos informalmente. Pode me chamar de Mark, à
vontade.
— Desculpe, Mark. É muito estranho tudo isso, estou me
adaptando aos poucos. A Luna e eu estamos nos dando bem, para
ser sincera. No início, foi complicado, mas agora acredito que
estamos no caminho certo.
— Isso é ótimo. Minha filha te ama muito, sabe disso?
— Sei...
Meu estômago embrulha levemente, e não sei dizer se é
nervosismo, por causa do olhar dele sobre mim, ou por ter noção do
amor que Luna sente por mim. É confuso, na verdade, são tantas
coisas acontecendo ao mesmo tempo. Por vezes, sinto como se
estivesse familiarizada com a minha rotina, e então, do nada, tudo
fica estranho outra vez.
— Luna pediu que eu não a pressionasse, e espero não estar
fazendo isso. Eu me preocupo com ela, sabe? Minha filha acha que
o fato de ser ocupado, desde sempre, influenciou o meu sentimento
por ela, mas a amo muito, assim como amo o Noah. Meus filhos são
tudo para mim, não suportaria vê-los sofrer.
— Eu jamais faria a Luna sofrer. Gosto dela cada vez mais.
Mark sorri, terminando de beber o uísque logo em seguida.
Ele olha para Louis, outra vez, e fica em silêncio durantes alguns
segundos, antes de voltar a falar:
— Vejo, em seu olhar, o sentimento que tem por ela. Não
tente reprimi-lo, porque as coisas vão se acertar.
— Camies, quer tomar um banho e descansar? — Luna
surge de repente, como um anjo enviado para me salvar daquela
conversa desconcertante. Ela ainda está usando as mesmas
roupas, apenas tirou a camisa de mangas longas e ficou com uma
de mangas curtas.
— Sim, isso seria ótimo. Com licença, Mark.
— Fique à vontade, Camille. Você está em casa.
Somente aceno com a cabeça, acompanhando Luna até
dentro de casa outra vez. Finalmente, tenho a oportunidade de olhar
em volta e analisar o ambiente, extremamente elegante e luxuoso.
Parecem adorar coisas caras, de boa qualidade, e não parecem ter
medo de gastar.
— Meu pai ficou enchendo você de perguntas?
— Um pouco, mas não foi nada demais.
— Tem certeza? — Ela parece preocupada, e isso me faz
sorrir, porque gosto desse jeito protetor dela.
— Sim.
— Ótimo! Eu conversei com os dois para que não a
sobrecarreguem. Esse é o seu quarto, coloquei suas coisas aqui.
— Como assim o meu quarto? Não vamos ficar juntas?
— Ah... eu pensei que, sei lá, você queria ficar sozinha.
— Luna, estamos dividindo a mesma cama todos os dias,
quando estamos em casa. Por que eu faria isso aqui? Existe alguma
regra na casa dos seus pais? — Reviro os olhos e solto uma
risadinha, empurrando-a pelos ombros. Luna também ri, divertindo-
se com meu comentário. Vou até a minha mala para pegar uma
trouxa de roupas, pois preciso urgentemente de um banho e me
deitar.
— Você quer que eu traga minhas coisas para cá?
— Pensei que tivesse deixado isso claro. — Sorrio e pisco
para ela, antes de fechar a porta do banheiro. Recosto-me nela e
suspiro, lembrando-me dos acontecimentos desta manhã e do quão
familiar é conviver com Luna. Chega a ser engraçado ter essa
noção, pois nunca imaginei que poderíamos ficar assim, mas eu
gosto da sensação.
Vazia e quebrada.
Essas duas são as definições perfeitas para definir como os
meus dias têm sido. Para ser sincera, eu nem sei se comecei a me
sentir assim agora ou há mais tempo. Tudo começou a se perder em
algum momento que não faço ideia de quando foi.
Eu estava perdendo-a. Tínhamos tantos problemas
acumulados, não sabia como poderia salvar o nosso casamento.
Tentei de todas as formas que pude, mas Camille se fechava e
ficava na defensiva sempre que eu parecia chegar perto do centro
do problema. Desejei tantas noites que tudo pudesse voltar ao
normal, só não imaginava que ela acabaria perdendo a memória.
Por que isso aconteceu justo agora? Não que eu esteja
reclamando, pois estamos conseguindo reconstruir algo que
tínhamos perdido. Mas acontece que eu me lembro de tudo o que
aconteceu. Ela pode ter esquecido dentro dela, em algum lugar, mas
aqui, na minha mente, tudo continua vivo e dói. Dói como o inferno,
porque sei que a perderia se não tivesse acontecido o que
aconteceu. Dói, porque sei que talvez nunca possa alegrá-la da
mesma forma que ela me alegrou quando gerou o nosso filho.
Não consigo dar um filho à minha esposa, o que faz eu me
sentir uma merda de mulher. É o meu sonho, sempre foi, e mesmo
que no passado coisas tenham me feito duvidar disso, eu ainda
mantenho o desejo de ser mãe dentro de mim. Era o sonho dela me
ver grávida também, sempre foi.
Sinto uma vontade absurda ao me lembrar da primeira vez
que tentamos ter um filho. Camille parecia tão animada e ansiosa no
início, mas com o tempo, as coisas começaram a ficar estranhas.
Não parecia mais uma vontade, e sim uma obrigação. Fui perdendo,
aos poucos, a vontade de gerar aquela criança, e quando a
inseminação deu errada, eu fiquei, de certa forma, aliviada. Mas
então, meses depois, resolvemos tentar de novo. Deu certo, até
certo ponto. Eu desejei tantas vezes que desse errado, para que ela
pudesse parar de me cobrar como estava cobrando. Eu o perdi
antes de completar um mês, foi um aborto espontâneo, da mesma
forma que os dois seguintes também foram, contando com esse
último.
Penso que estou sendo castigada por ter desejado tanto que
o primeiro não viesse. Estou apavorada agora, não sei se tenho
forças para tentar novamente. Nem sei se sou capaz de conseguir
gerar uma criança, e não faço ideia de como as coisas com a
Camille vão ser, porque tudo está bem agora, mas, de repente, algo
pode mudar e nós voltarmos ao início de tudo.
— Podemos conversar?
Eu volto a minha atenção para ela, que está entrando no
quarto, depois de tomar o seu banho. O cheiro dela toma conta do
ambiente e me conforta. Tudo nela sempre me acalmou com
facilidade.
— O que quer conversar?
— Quero saber como está se sentindo. De verdade. — Ela
sobe na cama, aproximando-se de mim. Camille pega uma de
minhas mãos que estava sobre o meu colo, segurando-a com as
dela. — Estou respeitando o seu espaço, mas não aguento ver você
sofrendo em silêncio. Compartilhe comigo.
Eu encaro o seu rosto e vejo o brilho de afeto refletido nele. O
mesmo brilho que ela sempre carregou ao olhar para mim. Sei que a
sua mente ainda se lembra de mim, mesmo que esteja no
subconsciente, escondido.
— A cada dia, me sinto um pouco melhor, mas ainda estou
quebrada. Queria tanto que tivesse dado certo dessa vez.
— Eu sabia da sua gravidez? Digo, antes de tudo que
aconteceu comigo.
Respiro fundo antes de responder. Eu tinha tomado a decisão
sozinha quando pensei que as coisas poderiam se acertar, mas não
fazia ideia de tudo que ainda aconteceria.
— Não. Eu tomei essa atitude sozinha, era para ser uma
surpresa.
— Por quê? Hm, olhe, não me leve a mal, mas preciso
entender. Sei que não estávamos bem.
— Sim, não estávamos, mas tudo parecia, aos poucos, voltar
ao normal. Sei que tomei uma atitude precipitada, tenho total
consciência disso agora. Somos casadas, ter um filho requer muita
responsabilidade, e principalmente por sermos um casal de
mulheres. Podemos tomar todas as prevenções e decidirmos o
momento certo de ter mais uma criança.
— Isso é verdade.
— Mas queria tanto te provar e provar para mim mesma que
eu podia, sabe? Os primeiros testes, feitos há dois meses, deram
errado. Já tinha desistido quando comecei a sentir enjoos no final do
mês passado. Resolvi fazer um teste de sangue para ter certeza, e
então, veio o resultado: positivo. — Pauso quando lembranças
antigas me invadem. Lembro-me do primeiro aborto, quando Camille
chorou tanto a ponto de perder o fôlego. Ela me viu quebrada e
mudou aos poucos suas atitudes. Eu a vi sofrer comigo,
entendendo, da melhor forma, que ela sentia a minha dor. Então, ela
decidiu que teríamos uma família, mesmo que para isso fosse
preciso mudar os seus planos. — Tudo deu errado outra vez por
minha culpa. Eu devo ter algum problema.
— Luna, pare com isso. Estou implorando, pare de se culpar.
Às vezes, coisas acontecem e deixam de acontecer. Assim é a vida.
— Ela segura o meu rosto com as mãos, fazendo-me encará-la.
Uma lágrima escorre, e o seu dedo polegar rapidamente a seca. —
Talvez não fosse o melhor momento para termos outro filho. Olhe
tudo o que aconteceu. Consegue imaginar como seria, para mim, ter
mais essa responsabilidade, sem nem ter consciência sobre?
Suas palavras me fazem refletir muito sobre a atitude que
tomei. Realmente, eu não pensei direito nas consequências,
principalmente com toda essa confusão da amnésia. Eu deveria ter
esperado e conversado com ela. E se tivéssemos nos separado?
Como seria para outra criança entender o que estava acontecendo?
— Eu fui muito irresponsável ao tomar essa atitude.
— Um pouco, mas porque tomou essa decisão sozinha, sem
me deixar ciente. Não faço ideia de como funciona um casamento,
estou aprendendo algo novo todos os dias, mas acredito que tudo
deva ser compartilhado, principalmente algo tão importante.
É incrivelmente assustador como essa mulher é sensata e
inteligente. A forma que ela consegue me fazer enxergar as coisas
sempre me deixa fascinada. Eu tive uma atitude irresponsável,
porque a amo muito, tanto que sou incapaz de medir o quanto.
Como posso explicar o que Camille significa para mim? Eu
sempre a amei, e depois que ela me deu o nosso filho, passei a
amá-la ainda mais. O que sinto pode ser considerado, por alguns,
uma dependência, talvez uma obsessão, e para outros, uma doença
que precisa ser curada. Como explicar um sentimento tão
gigantesco em palavras, que nem sentindo sou capaz de entender?
Eu arranco o meu coração do peito por ela, se for preciso.
Todas as vezes que pensei em desistir dela, algo maior me
mantinha, porque eu sabia, sempre soube que estaríamos juntas no
final. Imaginar uma vida sem ela me quebra por dentro.
Eu nunca quis ser a esposa idiota dela, então, por mais que
me doesse, eu desistiria dela. Se para ser feliz ela precisasse estar
longe de mim, eu a deixaria livre. Sempre prezei o seu bem e
sempre hei de prezar. Camille é um dos meus maiores bens. Tudo o
que conquistamos juntas não seria nada se eu a perdesse. O nosso
filho e ela são o meu lar, sempre vou desejar estar com eles, não
importa onde, e vou querer o que for melhor para os dois.
— Eu deveria ter considerado todo o nosso cenário antes de
tomar aquela decisão. Mas queria tanto, quero tanto. Quero dizer,
não sei mais. — Ela suspira e acaricia o meu rosto, abrindo um
sorriso tão bonito que acabo retribuindo. É incrível a capacidade que
essa mulher tem de acalmar o meu coração.
— Não pense no futuro, vamos viver o presente e deixar as
coisas acontecerem. Eu prometi que não vou sair do seu lado,
apenas peço que não me afaste. Mesmo que as coisas fiquem ruins,
quero estar com você, como sempre esteve comigo. Não faço isso
como tentativa de pagar tudo o que já fez por mim, mas como a sua
esposa, que deve agir como tal.
— Na alegria e na tristeza — sussurro, abaixando a cabeça,
e ela se inclina e beija a minha testa. Fecho os olhos para apreciar o
contato. Beijos na testa devem ser considerados os mais puros, a
maior demonstração de respeito e cuidado que existe nesse mundo.
Amo beijos na testa.
— Eu estou com você e permanecerei aqui.
Sei que, independentemente de qualquer coisa, Camille e eu
sempre estaremos juntas na alegria e na tristeza, na saúde e na
doença, até que a morte nos separe.
Capítulo 26 – Feliz Natal
O dia amanheceu bonito, mas não pelo tempo em si: está
nevando um pouco e bastante frio. Existem outros motivos para ele
ter nascido assim. Todos parecem animados, fizeram um grupo no
aplicativo de mensagens e estão, desde cedo, combinando como
será a nossa ceia. Estarão presentes literalmente todos, até mesmo
os meus pais e os de Luna virão. Natal sempre é momento de
passar com a família, não importa se são seus parentes ou amigos
que te acolhem.
— Meu bem, conseguiu encontrar o resto dos enfeites? —
Luna entra em nosso quarto de repente. Continuo olhando através
da janela e apenas a olho por cima do meu ombro. Sorrio em sua
direção, chamando-a com as mãos. — O que está fazendo? Pensei
que quisesse terminar de arrumar tudo logo. — Ela brinca e solta
uma gargalhada; eu fecho os olhos para apreciar o som.
Está sendo maravilhoso vê-la cada vez melhor. Temos
conversado todos os dias, o que está ajudando bastante na
recuperação. Luna confidenciou que sentia muita falta de dialogar
comigo. Estou me esforçando para deixá-la o mais confortável
possível, e tem funcionado. O brilho no olhar dela confirma isso.
— Seus olhos estão lindos esta manhã — comento,
encantada. O habitual verde deu lugar a um azul bem claro e
cristalino.
Luna franze o cenho, fazendo suas bochechas ficarem ainda
mais evidentes.
— Eu pensei que eles fossem lindos todos os dias.
— São, idiota arrogante. — Reviro os olhos e tento me
afastar, mas Luna me impede, segurando em minha cintura com
força. Ela me olha, e eu sei que vai me beijar, mas não faço nada
para impedi-la. — Continua sendo idiota.
— Vou precisar te dar mais beijos, então — ela murmura,
antes de voltar a grudar as nossas bocas, e eu suspiro, derretendo-
me em seus braços.
Luna afunda os dedos em minha lombar ao sugar a minha
língua para dentro de sua boca, e eu movimento os meus lábios
lentamente. Sou viciada nesses beijos lentos e intensos, parece que
sinto tudo o que ela sente.
— Pode dar quantos beijos quiser — murmuro, perdida e
totalmente rendida em seus braços. Ela sorri e volta a me beijar na
mesma intensidade, só que menos lentamente.
— Parece que o nosso casal favorito resolveu aproveitar a
véspera de Natal de uma forma profana.
— Será que podemos gravar e colocar em algum site de
beijos pornográficos?
— Eu acho que deveríamos criar um exclusivo para elas.
— Concordo totalmente.
Quatro vozes diferentes são ouvidas de repente. Minha
primeira reação é afundar o rosto no pescoço de Luna, que
rapidamente me envolve em um abraço protetor, mesmo que esteja
rindo. Eu me afasto ao ouvir as risadas, e estou prestes a soltar
algum xingamento, mas o meu queixo quase despenca ao ver não
apenas Vanessa, Nayara e Belinda, mas a minha irmã mais nova
também.
— Sofia! — exclamo rapidamente, afastando-me de Luna
para chegar a ela. Minha irmã, de quem eu ainda mantinha uma
imagem pequena e infantil, abre um enorme sorriso para me receber
em um abraço. Nossos corpos se colidem, e eu fecho os olhos,
apreciando o carinho e o calor que o seu abraço tem. — Meu Deus,
como você está grande!
— Grande, linda e muito gostosa — ela se gaba e balança os
seus longos cabelos, que são tão compridos que batem na cintura.
Sem a largar, eu a analiso o máximo que posso. Sofia ficou
bem mais alta que Belinda e eu, herdou a altura do nosso pai, e os
seus traços são mais fortes que os nossos também.
— Senti sua falta — ela diz.
— Eu... Nossa, estou sem palavras. Você se tornou um
verdadeiro mulherão.
Finalmente nos afastamos, e eu posso, enfim, terminar de
analisá-la. Realmente, o sangue mexicano é milagroso. O corpo
dela está simplesmente impecável, sem falar de sua beleza
completa, um verdadeiro mulherão. Não sei se consigo me
acostumar a vê-la assim, ao invés do habitual, quando era apenas
uma garotinha inocente.
— Você sempre reage dessa forma quando a encontra
depois de muito tempo — Belinda se intromete e sai levando Sofia
em direção à porta.
Faço um bico, desolada, mas nenhuma das duas se importa.
Duas ingratas.
— Vamos, Vanessa, deixe as duas aproveitarem um pouco
mais — Nayara diz, levando consigo a minha melhor amiga, mas,
antes de sair, Vanessa para na porta e faz um sinal obsceno com os
dedos e a língua. Eu abro a boca, espantada, porém nem deveria
estar surpresa.
— Ficou chocada com o tamanho da sua caçula?
— Demais. Acho que a bunda dela é maior do que a minha.
— Olho para a minha esposa, mas a pervertida não me olha de
volta, o seu olhar está de encontro à minha parte traseira. — Luna!
— O quê?
— Você é sonsa.
— Só você pode encarar a minha bunda agora?
Os meus olhos quase saltam das órbitas, e rapidamente eu
abaixo a cabeça, sem graça e com o rosto corado. Ela nunca perde
a oportunidade de citar as vezes que eu seco o seu corpo.
— Já disse que é tudo seu, sinta-se à vontade — adiciona.
— Muito sonsa! — devolvo.
Ela sorri e cola o seu corpo ao meu, segurando em minha
cintura primeiramente, mas logo as suas mãos deslizam para trás.
— Luna...
— Eu gosto quando você fala o meu nome assim. — Ela sorri
de forma cafajeste e se inclina, levando a boca até o meu ouvido. —
Adoro mulher brava. — O sussurro gostoso, ao pé do meu ouvido,
me causa arrepios, e eu fecho os olhos por reflexo. É incrível como
ela consegue mexer comigo de maneira tão fácil. Demoro alguns
minutos a reagir, mas finalmente tomo uma atitude ao me afastar.
Preciso raciocinar, fica difícil com ela tão próxima a mim.
— Vamos descer e terminar de arrumar tudo, as pessoas já
estão chegando.
— Você quem manda, patroa. — Ela bate continência para
mim, e eu reviro os olhos, antes de me virar para sair do quarto.
Mantenho um sorriso no rosto, porque as idiotices dela me deixam
assim.
O que posso fazer se tenho uma esposa idiotamente
adorável?
O meu plano inicial era arrumar tudo, antes que todo mundo
chegasse, para ter um momento divertido com a minha família, mas
foi muito bem-vinda a ajuda das meninas. Afinal, continuou sendo
um momento familiar, mas com mais pessoas que o comum. Elas
são família de qualquer forma.
— Vamos subir para tomar banho?
Estou analisando a árvore de Natal quando a Luna chega à
sala, abraçando-me por trás e colocando seu queixo sobre o meu
ombro. Sorrio, colocando as minhas mãos por cima das dela, em
minha barriga, e inclino a cabeça um pouco para trás.
— Vamos. Elas foram se arrumar?
— Sim. Precisamos ir logo, porque até o carinha perdeu o
próprio banheiro.
— Mas ele tomou banho? Podemos colocá-lo em nosso
quarto.
— É uma boa ideia. Vá na frente que vou buscá-lo, antes que
as suas irmãs mudem a roupa dele.
Subimos as escadas, rindo, e cada uma vai para um lado.
Rapidamente, eu tomo o meu banho. O meu vestido está separado
no closet, com os acessórios e as sandálias. Luna fez questão de
deixar tudo nosso arrumado, para que apenas precisássemos tomar
banho e nos vestir. Ela realmente pensa em tudo. Depois do meu
banho, Louis toma o dele e se arruma no banheiro mesmo.
— Você acha que eu fico bem com essa cor? — questiono
Luna, que está pegando roupas íntimas para tomar banho, depois
que Louis terminar o dele. Ela para, por um segundo, e me olha de
cima a baixo. Seu olhar queima a minha pele.
— A minha garota favorita na minha cor favorita.
— Sua cor favorita não é a preta? — Ergo uma sobrancelha,
encarando-a, sem entender. Luna sempre foi a maior fã da cor preta
que existe neste mundo. Lembro-me de que ela parecia viver em um
eterno luto quando estudávamos na mesma escola.
— Vermelha é a minha nova cor favorita, mas somente se
você estiver usando.
O meu rosto esquenta um pouco, e desvio o meu olhar,
ouvindo a sua risada divertida. Ela simplesmente adora me deixar
sem jeito, seja com elogios ou com flertes repentinos.
— Você não perde a oportunidade, não é?
— Com você? Nunca. — Ela para atrás de mim e apoia uma
das mãos em minha cintura, inclinando-se para deixar um beijo na
minha bochecha. — Vou tomar meu banho e conferir se elas não se
mataram.
Concordo com a cabeça e a observo sair do closet. Depois
que ela sai, eu termino de me arrumar. Estou terminando a minha
maquiagem quando o reflexo da aliança em meu dedo chama a
minha atenção. Geralmente eu não a reparo, estou tão acostumada
com esse acessório que até me esqueço. É uma aliança fina, com
uma listra repleta de diamantes, muito bonita por sinal, e deve ter
sido cara.
Não me dou conta de que estou sorrindo, até ouvir outras
vozes me provocando:
— Você não foi capaz de evitar, mesmo depois de se
esquecer dela.
— Como ela poderia? A Luna é a mulher dos sonhos de
qualquer um.
Viro-me para Belinda e Sofia, e as duas me encaram, com
sorrisos em seus rostos. Mesmo que sejam provocações, sei que
elas estão felizes por mim, pois conheço esses olhares. Eu as olho
de cima a baixo, admirada com a beleza das mulheres que tanto
amo.
Eu ainda estou chocada com o tamanho da minha irmã mais
nova.
— Estou bonita?
— Essa é uma resposta óbvia — Sofia responde de imediato
e revira os olhos. O meu queixo quase cai com o seu jeito atrevido,
lembrando bastante a minha melhor amiga. O que Vanessa fez com
a minha pequena irmã?
— Eu disse que você iria se surpreender com essa cobrinha
— Belinda diz e solta uma gargalhada, divertindo-se com a minha
expressão de espanto. — Mas, sim, você está linda. Tenho certeza
de que, nesta noite, a Luna não escapa.
— Belinda...
— Vocês ainda... — Sofia começa a falar, mas se cala e olha
para o lado de fora, voltando a olhar para mim e fechando a porta do
closet atrás de si. — Vocês duas ainda não foderam?
— Sofia?! Que tipo de linguajar é esse?
Minha irmã mais nova revira os olhos outra vez, cruzando os
braços ao recostar-se nas prateleiras da esquerda.
— Desculpe, eu deveria dizer fazer amor? Ou fizeram sexo
gostosinho, ou...
— Chega! Chega! — peço desesperadamente, colocando as
mãos sobre os meus ouvidos. — Quando foi que você se tornou
isso?
— Me tornei o quê? Uma adulta que faz sexo?
— Pra mim, chega. Isso é demais! — Ergo as minhas mãos e
rapidamente saio do closet, ouvindo as risadas das minhas irmãs
atrás de mim. Não sei quanto tempo levarei para me acostumar com
a caçula sendo tão... desse jeito. Meu Deus! Ela disse que faz sexo.
Eu não acredito que alguma pessoa safada tenha tirado a pureza da
minha pequena.
— Por que você está com essa expressão? — Luna sai do
banho com seu roupão branco, enquanto desembaraça os cabelos
com a escova. Eu a olho, apavorada, e caminho em sua direção
para esconder o rosto em seu pescoço.
— Minha irmã faz sexo.
Luna solta uma risadinha, alisando as minhas costas com
uma das mãos.
— Bom, ela é casada e tem filhos. Você acha que eles foram
feitos como?
Afasto-me de Luna e a fuzilo com o olhar.
— Não estou falando da Belinda.
Ela olha para trás e depois para mim, finalmente entendendo
o motivo de todo o meu pavor. A sua expressão se retorce, e sei que
está prestes a rir, mas se contém.
— Bom, ela é uma mulher adulta agora, amor. É comum.
— Obrigada, cunhada. Eu acho que a minha amada irmã
precisa de um choque de realidade. Sexo é maravilhoso.
— Pare de falar isso, pelo amor de Deus! — exclamo, sem
nem a encarar. Todas estão rindo, divertindo-se com o meu pequeno
surto, mas não consigo achar graça nenhuma. Eu dormi com a
imagem pura da minha pequena e acordei com essa versão adulta,
sem escrúpulos. O mundo não é mais o mesmo.
Elas finalmente me dão trégua quando Luna diz que
terminará de se arrumar. Ouvimos a campainha tocar e saímos, as
três, do quarto para receber os convidados.
De pouco a pouco, todos vão chegando.
Ver os meus pais fez eu me sentir ainda mais feliz. Sinto
saudade de conviver com eles, mas estou entendendo que a vida
adulta é assim mesmo. Os pais de Luna chegaram animados. Noah
os trouxe, pois ficarão hospedados na casa dele. Ficariam aqui, mas
o quarto de hóspedes será dos meus pais. Eu prefiro assim, odiaria
que a Ana e a Luna acabassem se desentendendo.
E por falar na minha sogra.
— Camille.
— Ana — eu a cumprimento com um aceno de cabeça. Estou
com uma taça de vinho na mão, enquanto observo todos andando
pela sala, divertindo-se e contando histórias engraçadas. O Natal
sempre foi uma das minhas festas favoritas de fim de ano, e agora
não está sendo diferente.
— Será que podemos conversar um pouco, longe de todo
esse barulho?
Penso em arrumar uma desculpa para escapar dessa
conversa, mas algo me diz para acompanhá-la. Concordo com a
cabeça e indico a escada, para irmos até o meu quarto.
— Eu acredito que ninguém vai nos atrapalhar aqui. — Fecho
a porta atrás de nós e caminho até a cama, sentando-me na
beirada. — Sente-se comigo.
Ana sorri e senta-se de frente para mim.
— Como ela está? — Franzo o cenho, e Ana suspira,
nervosa, passando as mãos pelos cabelos perfeitamente
arrumados. — Luna. Conversamos esses dias, mas ela não está se
abrindo totalmente para mim. Eu acompanhei os abortos anteriores
e sei quão abalada a minha filha ficou. Quero saber a verdade: você
acha que ela está melhor?
— Sim. A cada dia, mais ela volta ao normal. — Respiro
fundo e abro um pequeno sorriso. Ana não parece muito confiante,
eu conheço a aflição no olhar de uma mãe preocupada. Sei que
mesmo com seu jeito difícil, ela ama muito a filha que tem. —
Estamos tentando continuar a nossa vida. Tivemos diversas
conversas, e eu sugeri que ela buscasse uma ajuda profissional,
para ter um acompanhamento melhor.
— De verdade? Nossa, isso é ótimo! O Mark tentou
convencê-la algumas vezes a buscar ajuda de um profissional, mas
a Luna sempre foi muito teimosa e tem essa coisa de querer segurar
o mundo todo com as mãos.
— É realmente teimosa, mas sabe ouvir quando eu converso
com ela. Tenho um jeito especial de fazê-la entender as coisas.
— Você sempre soube lidar melhor com ela do que eu, que
sou a mãe dela. — Ana desvia o olhar, encarando um ponto fixo
qualquer, perdida em pensamentos. Eu a deixo pensar um pouco,
pois sinto que ela quer contar alguma coisa ou desabafar. —
Sempre tentei ser uma boa mãe para os meus dois filhos, dando de
tudo do bom e do melhor, trabalhando dia e noite, quase sem parar,
para que nada faltasse em casa.
— Você é uma ótima mãe, Ana.
Ela solta um riso sem qualquer resquício de humor, negando
com a cabeça. Quando volta a me olhar, os seus olhos refletem uma
dor profunda.
— Tenho sido uma boa mãe para o Noah, porque ele nunca
me contrariou. Sempre foi um bom menino, obedecendo, sem
questionar, seguindo todos os passos que desejei. Mas Luna nunca
abaixou a cabeça, nem para mim nem para o pai dela, sempre
impondo as próprias opiniões.
— Ela tem gênio forte.
— Muito. Esse sempre foi um dos impasses que tivemos
durante o crescimento dela. Nunca consegui entender como pôde
largar um bom futuro para seguir um devaneio. Um hobby.
— Desculpe-me, Ana, mas estou convivendo com a sua filha
todos os dias, eu vejo como ela é feliz fazendo o que gosta. Não é
um hobby, é o trabalho dela, é a vida dela. A Luna está seguindo um
sonho de infância.
Pensei que estava exagerando, interrompendo-a, mas ao vê-
la sorrir, fico um pouco confusa. Ela está feliz ou vai me bater?
— Gosto de saber que você a defende. Sempre me perguntei
se minha filha conseguiria encontrar uma boa pessoa. Confesso que
tive muitos preconceitos quando ela nos contou que gostava de
mulheres. Tivemos uma briga horrível, foi a primeira vez que a vi
chorar tanto. Luna sempre guardou tudo para si, e vê-la tão
quebrada mexeu comigo, mas eu não fiz nada. Estava com tanta
raiva, pensando no que tinha feito de errado na criação dela, cega
por pensamentos arcaicos e atitudes que herdei do meu pai...
Ana pausa durante alguns segundos, com os olhos fechados,
aparentemente com uma luta interna.
— Comecei a aceitá-la depois que ela nos apresentou a
você. Um dos meus maiores medos sempre foi que alguém a
machucasse por gostar de mulheres. Eu me preocupava,
imaginando se ela encontraria uma pessoa boa, com visão de futuro
e capaz de aguentar tudo o que a sociedade joga em cima de
pessoas homossexuais.
— Confesso ter pensado que você não gostava de mim.
Digo, agora, quando encontrei vocês em Miami.
Ana nega com a cabeça e sorri.
— Tivemos muitas conversas, Camille. Você me encontrou
uma vez chorando, por causa dela, e iniciamos ali um tipo de
amizade à parte, além de você ser a minha nora. Comecei a
enxergar o relacionamento de vocês como um relacionamento
qualquer, sem diferenças. Eu sentia que você cuidava bem da
minha filha.
— Eu nunca seria capaz de destruir a felicidade dela.
— Sabe de uma coisa engraçada? Você sempre dizia algo
parecido com isso todas as vezes que eu falava sobre. Mas o intuito
dessa conversa é que sinto que estou me afastando demais da
minha filha, preciso recuperar a nossa relação.
— Você quer ajuda para entendê-la?
— Muita. — Respiro fundo, inclino-me para deixar a taça
vazia no chão, volto a ficar sentada e me aproximo para segurar as
suas mãos.
— Depois que tudo isso se normalizar, converse com ela,
mas esteja disposta a ouvi-la. Você, melhor do que ninguém, sabe
que a Luna precisa se expressar. Eu acredito que essa conversa
fará muito bem a vocês duas.
Ana concorda com a cabeça, puxando-me para um forte
abraço repentino. Tenho certeza de que essa conversa entre as
duas resolverá muitas questões que não estão ao meu alcance.
Espero mesmo que elas possam resolver as diferenças de uma vez
por todas.
— Luna aprontava demais quando era mais nova. Lembro-
me de uma vez que cheguei em nossa casa e a encontrei enrolada
com ataduras.
— Como assim? Por quê?
Ana começa a me contar coisas do passado de Luna, muitas
histórias divertidas. É perceptível que, apesar dos problemas, ela
ama muito a filha que tem. E mesmo que não diga em voz alta, tem
orgulho da mulher que ela se tornou.
— Disse que queria se tornar uma múmia, que estava
cansada dos seres humanos e não queria mais ser um deles.
Eu gargalho, imaginando a cena da Luna pequena, com cara
de brava, toda enrolada em ataduras, dizendo isso. Não é muito
difícil criar essa imagem.
— Oi? Está tudo bem por aqui?
E por falar nela, olhamos para trás, apenas para ver a curiosa
Luna entrar lentamente no quarto, sem entender o que está
acontecendo. Ana rapidamente se levanta da cama, indo em direção
à filha. Um sorriso nasce em meu rosto com a cena.
— Eu amo você, minha filha. Lembre-se sempre disso. —
Ana segura o rosto de Luna e beija a sua testa. A minha esposa tem
uma expressão confusa e me olha como se perguntasse o que está
acontecendo. Eu apenas faço um sinal com as mãos.
— Eu também amo a senhora, mãe — ela diz, ainda meio
confusa, mas o brilho no olhar é intenso, mesmo de longe, o que me
deixa muito feliz.
— Vou deixá-las sozinhas e ir atrás do meu marido, antes
que ele acabe com todo o vinho. — Ela se afasta de Luna e olha
para mim. — Obrigada.
— Disponha.
Ana acena mais uma vez para nós, antes de finalmente se
retirar do quarto. Eu sorrio e me ponho de pé, indo até a Luna, que
está mais confusa do que tudo. Coloco os meus braços em volta de
seu pescoço, chegando perto o suficiente de sua boca para beijá-la.
— O que eu perdi?
— Segredos entre sogra e nora. — Ela faz um bico tão
adorável, com o cenho franzido, que não resisto e a encho de
beijos. Luna não me rejeita, mas ainda está confusa e curiosa. —
Deixe de ser fofoqueira. Logo você saberá do que se trata.
— Por que não posso saber agora?
Encosto os meus lábios nos dela para sussurrar, com os
meus olhos abertos, encarando os dela:
— Porque eu não quero. — Balanço as minhas sobrancelhas
várias vezes ao me afastar. Luna revira os olhos e solta uma lufada
de ar, demonstrando toda a sua derrota. — Vamos voltar lá pra
baixo, nossa família deve estar procurando por nós.
Entrelaço os nossos dedos e a levo para fora do quarto.
Estamos quase na chegada quando ela para de repente. Viro-me,
curiosa, para questioná-la, mas antes que possa, tudo que sinto é o
meu corpo sendo empurrado contra uma das paredes e as suas
mãos em meu rosto, e logo em seguida, a sua boca toma a minha.
Fecho os olhos, apreciando o toque macio de sua boca na minha.
Os seus lábios acariciam os meus devagar, enquanto ela usa a
língua, para entrelaçar a minha, e as mãos para acariciar o meu
rosto. Estou entregue, totalmente nas mãos dela, como tenho
estado desde que voltamos aos bons termos.
— Você continua sendo a minha sorte.
O meu sorriso é tão largo, ao ouvir isso, que minhas
bochechas doem. Ela sorri da mesma forma, e o meu coração está
acelerado. Ouço as vozes das pessoas no andar de baixo, mas
nada poderia atrair tanto a minha atenção quanto a mulher que está
na minha frente. Como posso explicar todas as sensações que ela
me causa?
Retiro as mãos dela do meu rosto, para que eu possa segurar
o dela. Luna fecha as pálpebras para apreciar o carinho que faço
com os meus polegares, então fico nas pontas dos pés para beijar-
lhe a testa.
— Eu estou cada vez mais apaixonada por você — confesso.
Luna paralisa durante alguns segundos, mas a sua reação
seguinte me faz gargalhar, quando ela me abraça com tanta força
que chega a me erguer um pouco do chão. Evito que ela me pegue
no colo, porque não pode pegar peso ainda, mas ela não se
importa. Se não sou eu para tomar conta dessa mulher, nem sei.
Poderíamos ter ficado horas e horas ali, nesse momento só
nosso. Não foi a primeira vez que eu disse estar apaixonada por ela,
mas todas parecem a primeira. Gosto de poder aproveitar os
carinhos que trocamos, mas infelizmente temos muitas visitas, e
elas estão nos chamando, ou melhor, gritando os nossos nomes,
para descermos. Com sorrisos nos rostos e as mãos juntas,
voltamos para o andar de baixo, voltando a fazer companhia à
nossa família.
O resto da noite e a ceia foram perfeitos. Por mim, eles
ficariam conosco a noite toda, mas, aos poucos, cada um foi
sentindo sono e se despedindo, com a promessa de que voltariam,
no dia seguinte, para trocarmos os presentes.
Os meus pais subiram. Eu imaginei que Sofia fosse dormir
aqui, mas ela preferiu ir com a nossa irmã. Tenho uma leve
impressão de que ela está fugindo de mim, mas não sei o motivo.
Será que sou tão superprotetora e chata?
— Deita um pouco aqui comigo, mamá? — Louis pede, assim
que se deita na cama, erguendo o cobertor e me dando um espaço
em sua cama, para que eu possa me deitar ao seu lado. Luna foi
tomar banho e verificar se os meus pais estão confortáveis, e eu
fiquei encarregada de botar o nosso filho para dormir.
— Gostou de hoje?
— Muito! Foi incrível todo mundo junto. Eu amo quando os
meus primos vêm brincar comigo.
Eu sorrio para meu pequeno, beijando os seus cabelos, ao
aconchegá-lo em meus braços. Ele deita a cabeça em meu peito e
suspira.
— E amanhã tem muito mais. Se quiser, podemos chamar o
Toni e o Harry para passarem a semana aqui, que tal?
— Sim! Sim! Sim! — Ele se agita e balança a cabeça
freneticamente, e eu acabo rindo de sua animação. Louis realmente
gosta dos primos.
— Tudo bem, mas agora você precisa dormir, para ter
energia amanhã.
Ele concorda, com um som nasal, e volta a se aconchegar
em mim. Alguns minutos se passam, eu espero ter certeza de que
ele dormiu, e quando penso que sim, o movimento de sua cabeça
chama a minha atenção. Louis se afasta e olha para mim.
— Mommy? Um dia, eu vou ganhar um irmãozinho? Todo
mundo tem, até o Toni vai ganhar um irmão novo.
A sua pergunta quase me faz perder o ar, e paro durante
alguns segundos. Luna e eu ainda não conversamos com ele sobre
quais serão os nossos passos, mas contamos que ela acabou
perdendo um bebê. Louis é uma criança sentimental, é notável que
ele deseje ter um irmão, e eu entendo isso.
— Filho, as coisas são complicadas. Ter uma nova criança
traz muita responsabilidade, e a sua mãe e eu estamos
reconstruindo o que temos. Você sabe, não é?
— Sim, mommy. Mas...
— Eu entendo o seu desejo, sei que um irmão faz falta para
você, mas promete que não falará isso na frente da sua mãe?
— Não vou falar isso na frente da mamãe, mas vocês podem
pensar com carinho? Eu prometo que serei o melhor irmãozinho do
mundo. — Louis junta as mãos e me encara com os olhos de pidão.
O meu coração se aperta, e o puxo para mim, envolvendo-o em
meus braços.
— Vai dar tudo certo, carinha. Eu sei que vai ser um ótimo
irmão, porque você é um bom garoto. Boa noite, meu amor.
— Boa noite, mommy.
O assunto se encerra, e em alguns minutos, ele acaba
realmente pegando no sono. Levanto-me com cuidado, para não o
acordar, e apago as luzes antes de sair de seu quarto. O silêncio em
casa me dá a garantia de que todos foram se deitar, inclusive a
Luna. Preciso de um banho urgente.
Entro no quarto com cautela e a vejo deitada na cama, de
costas para a porta. Não sei se está dormindo, mas parece que sim.
Tomo todo o cuidado para entrar no closet e pegar um pijama, para
vestir depois do banho. Quando saio do banheiro outra vez,
visualizo Luna, aparentemente pensativa, sobre a cama.
— Acordou?
— Nunca vou poder dar um irmão para o meu filho. Sempre
fiz de tudo para que nada faltasse a ele, mas infelizmente uma das
coisas que ele mais quer sou incapaz de dar.
— Você...
Rapidamente, me aproximo da cama, espantada por ela
saber o que conversei, há pouco, com o nosso filho. Sua expressão
me quebra o coração, porque sinto, apenas olhando para ela, a dor
que está cravada em seu peito. Queria poder arrancar tudo de ruim
que ela possa estar sentindo.
— Eu acabei ouvindo, sem querer, quando fui procurar você.
Sinto-me tão incapacitada. Tão...
— Luna, pare com isso. Fique tranquila, nós conversamos
sobre isso.
Ela puxa os cobertores com certa violência e se põe de pé,
surpreendendo-me ao ficar cara a cara comigo. O seu olhar raivoso
me deixa nervosa, mas sei que tudo isso é apenas reação
automática à dor que está dentro dela.
— Ficar calma? Como eu posso ficar calma quando o meu
filho quer ter um irmão e pensa que não tivemos ainda por escolha,
e não por que eu sou inútil e incapaz de manter uma criança dentro
de mim? — Luna está exaltada e subindo o tom de voz. Eu sei que
ela está descontrolada e machucada, mas não quero que ninguém
acorde por causa dessa discussão sem cabimento.
— Ok, abaixe esse tom de voz e vamos conversar com
calma.
— Para o inferno você com essa calma. Será que não
consegue entender como me sinto? Estou quebrada, destruída, e
saber que o meu filho deseja tanto isso quanto eu faz com que me
sinta ainda pior. Eu sou inútil de verdade.
— Você não é e sabe disso. Vou pedir de novo para abaixar o
tom de voz, não precisa se exaltar. Os meus pais estão aqui, o
nosso filho está aqui, e eles não precisam ouvi-la. Não há
necessidade de um momento constrangedor.
— Você não entende, Camille. Não faz ideia de como isso
está sendo pra mim. — Ela vira de costas, com as mãos nos
cabelos, puxando alguns fios, como se isso pudesse acalmá-la.
— Meu amor...
— Não me chame assim, por favor! Eu não mereço isso. Não
mereço você, só sirvo para destruir tudo em que toco.
— Pare de falar besteira.
Ela se vira para mim outra vez, com suas narinas infladas e a
respiração acelerada. Ergo a minha postura, para mostrar-lhe que
nenhuma grosseria será capaz de impedir que conversemos
tranquilamente.
— Não é besteira, Camille, é a maldita verdade!
— Cale a boca.
— Não me mande calar a boca, escute a porra da verdade
que está na sua frente. Eu sou... — Cubro a sua boca com as
minhas mãos, para impedi-la de continuar falando tanta coisa idiota
sem motivo. Ela tenta retirá-las, mas a encaro de maneira firme.
— Cale essa maldita boca. Pare de falar tanta besteira, sua
idiota.
Luna finalmente retira minhas mãos de sua boca e me encara
com a mesma expressão que a minha.
— Não vou calar nada. É melhor que você ouça tudo.
Com a minha paciência quase se esgotando, por conta da
teimosia dela, resolvo fazer a única coisa possível capaz de fazê-la
realmente calar a boca: seguro a sua nuca com ambas as mãos e a
puxo. Ela até tenta lutar contra, mas nossos lábios entram em
contato, e isso parece acalmá-la instantaneamente. Em outra
ocasião, essa seria a pior forma de acabar com uma discussão,
mas, neste momento, é a única maneira possível.
Forço a língua contra a sua boca e a invado, tomando os
seus lábios para mim como se me pertencessem de forma literal.
Estou marcando meu território, mostrando, com atitude, que não
desejo deixá-la se rebaixar e que não desistirei, mesmo que ela
tente me obrigar a isso. Luna finalmente se rende e agarra a minha
cintura, puxando-me contra o seu corpo.
— Idiota — eu murmuro, depois de um tempo, e ela sorri e
volta a me beijar. Luna anda para trás, levando nós duas à cama.
— Sua idiota. — A voz rouca me faz arrepiar.
Ela se senta na cama e me puxa para o seu colo, colocando
as mãos em minha cintura. Faço força para que ela se deite e me
ajeito em cima dela, sorrindo ao me abaixar e grudar os nossos
corpos outra vez. Luna suspira, alisando as minhas costas até
chegar à minha bunda, que ela aperta com força, arrancando-me
um gemido baixo. Meu corpo está esquentando, a respiração dela
batendo contra a minha pele, tudo se unindo para mexer com o meu
psicológico.
— Você me deixa maluca — murmuro. — Precisamos dormir.
Ela abre os olhos na hora e me encara como se eu fosse
louca.
— Dormir agora?
Respiro fundo antes de me levantar de cima dela. Preciso me
afastar, preciso voltar a raciocinar e me controlar. Ela não pode fazer
esforço, e eu não quero machucá-la sem querer. Deito-me ao seu
lado, evitando olhar para ela.
— Deita aqui, venha.
Luna bufa e se enfia debaixo das cobertas, aproximando-se
de mim.
— Você me deixou toda molhada e vai dormir. Eu não
acredito.
Todo o meu corpo reage à sua frase, e imagens começam a
surgir. Seguro a respiração, porque sei que acabarei arfando, e
pode ser que isso faça algo despertar dentro dela. Então, com todo
o resto de controle que me resta, eu apenas me viro de costas para
ela e apago a luz do meu abajur. Luna faz o mesmo e me puxa para
ela. Temos dormido assim, juntinhas, sempre.
Estou tentando pegar no sono, mas sinto a respiração dela
bater de leve em minha nuca. Luna afasta os meus cabelos para
encostar o rosto ali. Não que seja algo fora do comum, porque ela
tem feito isso todos os dias, mas agora parece que um incêndio foi
iniciado dentro de mim, por causa desse contato. Fecho os meus
olhos com força, engolindo saliva.
O silêncio do quarto é rompido apenas pelas nossas
respirações: a dela, calma; a minha, cada vez mais agitada. Fecho
os olhos e até balanço a cabeça, para tentar acabar com os meus
pensamentos, mas tudo conspira contra mim.
Luna enfia a mão por debaixo da blusa do meu pijama e
acaricia o meu abdômen devagar. Sua palma quente quase me faz
gemer, e quando ela aperta nos pontos certos, todo o meu corpo se
arrepia.
Isso deveria ser comum, como tem sido nos últimos dias.
Luna é muito carinhosa, principalmente quando vamos dormir,
porque é o momento em que estamos a sós, e ela pode me dar toda
a atenção. Mas cada toque e aperto dela em minha pele fazem uma
pulsação dolorosa aumentar entre as minhas pernas. Alguma coisa
toma conta do meu corpo, porque nem percebo o momento exato
em que seguro a mão dela e lentamente arrasto para baixo,
ultrapassando a barreira do meu short e da calcinha de algodão que
estou usando.
O corpo dela fica tenso atrás de mim, mas não demora a
tomar uma atitude e mexer os dedos devagar, para cima e para
baixo, fazendo círculos lentos sobre o meu clitóris enrijecido.
Levo uma das mãos para trás, segurando os seus cabelos,
puxando-os, ao senti-la lamber e beijar a minha nuca, enquanto
continua me masturbando de uma maneira tão deliciosa. Por que eu
demorei tanto a deixá-la fazer isso?
— Ah... Hm… — Gemidos incoerentes me escapam, e tudo
aumenta quando ela separa as minhas pernas e desliza os dedos
até a minha entrada, recolhendo a minha lubrificação natural e
voltando ao clitóris. Tenho que enfiar o rosto no meu travesseiro
para não gemer alto.
— Caralho, tão molhada — ela murmura, arfando, ao girar os
dedos em meu clitóris. Eu ofego e me surpreendo quando, de
repente, sinto um tapa certeiro no ponto rígido e pulsante.
— AH!
Dessa vez, é impossível segurar o gemido alto, e eu só
espero que ninguém tenha escutado nada. Acontece que é uma
sensação de dor e prazer tão gostosa, que simplesmente não me
controlo. Luna usa seu joelho para separar as minhas pernas e
erguer uma delas, deixando o caminho livre para me tocar da
melhor forma.
Sinto uma sensação gostosa subir pelas minhas coxas e
parar no pé da barriga. Fecho os olhos com força e agarro os
cabelos dela, no momento que estremeço e sinto as minhas
paredes internas pulsarem freneticamente. Luna não para ao ver
que estou gozando, continua me masturbando com rapidez e me dá
outro tapa quando eu falo seu nome baixinho.
— Você gozando é uma delícia — ela murmura e retira a mão
do meio das minhas pernas. Eu estou mole e fraca, sentindo-me um
pouco sonolenta. Ouço sons de estalos no ouvido e tenho
consciência de que ela está provando o meu gosto, o que quase me
faz gemer outra vez. Que mulher é essa?
— O que acabou de acontecer? Nossa!
Luna solta uma risadinha e volta a me abraçar, colocando o
queixo em meu ombro.
— Eu acho que te dei um orgasmo delicioso.
— Muito delicioso. — Volto a levar a mão para trás e acaricio
os cabelos dela. Luna beija a minha bochecha e se aconchega em
mim. — Eu tinha razão quanto à sua habilidade com as mãos.
— Isso porque você ainda nem viu tudo que eu posso fazer
com elas.
Abro os olhos na mesma hora e viro o rosto o máximo que
posso, para encará-la. Ela sorri e se estica para me beijar.
— Mal posso esperar para ver tudo que elas podem fazer.
Ela não diz mais nada e voltamos à posição inicial. Ficamos
em silêncio, e acredito que dentro de alguns minutos vamos dormir.
Ao menos eu sei que vou.
— Feliz Natal, minha princesa.
Sorrio com o jeito carinhoso pelo qual me chama e seguro a
sua mão em minha barriga, trazendo-a para que eu possa beijá-la.
— Feliz Natal, meu amor.
Capítulo 27 – O primeiro passo
Estou na cozinha com os meus pais, e estamos preparando
um café da manhã reforçado, pois a minha irmã e a família dela
estão vindo tomar o desjejum conosco. Minha mãe ficou
encarregada de fazer as melhores panquecas que existem em todo
o mundo — somente as da minha avó ganham delas. Papai está
ajudando e, ao mesmo tempo, preparando outras coisas. Para ser
sincera, eu estou, boa parte do tempo, apenas observando os dois.
Eles são adoráveis quando cozinham juntos.
— Bom dia, família linda — uma voz rouca, de quem acaba
de acordar, toma conta da cozinha. Olho para ela e sorrio, sendo
rapidamente correspondida. Luna vai em direção à minha mãe e
segura em sua cintura, beijando-lhe o topo da cabeça.
— Bom dia, nora maravilhosa.
— Bom dia, minha sogra favorita.
— Mas você só tem uma, que eu saiba — resmungo, e as
duas acabam rindo, ignorando a minha leve revolta totalmente.
Luna se direciona, dessa vez, ao meu pai, e eles trocam um
caloroso abraço. É impossível manter a minha postura de quem está
com raiva, porque ela parece tão bem e alegre.
— Bom dia, sogro perfeito.
— Veja só quem acordou bem-humorada hoje. Bom dia, nora.
— Realmente, acordou muito animada. — Viro-me um pouco
sobre o banco e abro os braços para ela. — Bom dia, meu amor.
O sorriso dela fica maior ainda ao me ouvir. Ela se abaixa, e
trocamos um rápido beijo, finalizado com muitos selinhos.
— Bom dia, rainha da minha vida.
— E essa felicidade toda? — sussurro, impedindo-a de se
afastar de mim quando entrelaço as minhas pernas em sua cintura.
Luna sorri, sem jeito, e espia atrás dela, onde meus pais estão.
Provavelmente, para conferir se eles estão prestando atenção. —
Isso tudo é por causa do Natal? — Sorrio de forma cínica,
envolvendo o seu pescoço com os meus braços.
— Você sabe muito bem o motivo, sonsa — ela fala baixo,
preocupada com a possibilidade de meus pais a ouvirem, o que me
faz rir um pouco, mesmo estando sem jeito por me lembrar do que
fizemos de madrugada. — A madrugada foi maravilhosa!
Os meus olhos descem para a sua boca, e eu sinto como se
toda a água do meu corpo fosse drenada. Inclino-me para beijá-la,
mas algo, ou melhor, alguém, me impede.
— Fazendo safadezas na frente dos nossos pais agora,
Camille? — a minha irmã gêmea idiota diz, fazendo-me
automaticamente corar e me lembrar de que estamos realmente
exagerando. Luna dá uma risadinha nervosa e se solta de mim.
— Depois, ela dá chiliques por saber que eu faço certas
coisas. Bom dia, família — Sofia completa o comentário de nossa
irmã, passando direto por mim para ir até os nossos pais. Reviro os
meus olhos e fico de pé para cumprimentar os meus sobrinhos.
— Oi tia, bom dia — Serena é a primeira a me cumprimentar,
extremamente animada.
— Bom dia, pequena. Cadê o Harry?
— Subiu para o quarto do Louis. Esse garoto está ficando
mal-educado agora — Rodrigo diz com ar de riso, ao também
chegar à cozinha. — Bom dia, cunhada. Bom dia, sogros lindos.
Todos se cumprimentam e ajudam na arrumação da mesa
para o café da manhã. Belinda preparou um bolo de laranja em casa
e o trouxe. Isso me deixa preocupada, porque quando éramos mais
novas, ela mal sabia fritar um ovo.
Olhando para eles, animados e rindo, enquanto conversam,
não existe algo melhor que eu possa escolher, além de um
momento como este. A minha família sempre foi tudo para mim,
estou feliz por estar recuperando o contato com todos, pois sei que
a Camille de antes andava bastante afastada. Recuperar os laços
tem sido uma das coisas mais importantes para mim nos últimos
dias. Isso me ajuda muito a lidar com a minha falta de memória. Ter
pessoas que eu amo ao meu lado sempre foi gratificante, e agora
ainda mais. Observando-os espalhados pela sala de casa, enquanto
conversam, brincam e esperam para trocar os presentes... O meu
coração está em festa. É muito bom estar cercada de quem só quer
o nosso bem, não é?
— Eu quero pedir um minuto de atenção a todos vocês. Por
favor! — Vanessa se pronuncia de repente, levantando-se do sofá e
abrindo o sobretudo que está usando. Um sorriso nasce em meu
rosto, pois tenho a noção do que dirá. — Acredito que não seja
surpresa para alguns, mas será principalmente para os meus sogros
e para o meu marido, que está meio desconfiado nos últimos dias,
mas não chegou em mim para perguntar.
— Amor, você...? — Noah se levanta do chão, onde estava
sentado, brincando de UNO com as crianças. O seu rosto está
estampado de incredulidade, e os olhos claros brilham de longe. O
meu olhar é desviado para Luna ao meu lado, que está tensa,
apesar do sorriso em seu rosto.
— Sim, amor. E sim, família. O clã Hansen-Jacobs vai ganhar
um novo ou uma nova integrante, porque eu estou grávida
Todos comemoram ao mesmo tempo, ficando de pé para
cercar os mais novos pais da família. Noah segura Vanessa no ar e
a enche de beijos. Volto a olhar para Luna, que derrama lágrimas
silenciosas. Parte o meu coração vê-la desse jeito, embora eu saiba
que está feliz por eles. Aproximo-me rapidamente dela e a puxo
para os meus braços, envolvendo-a com firmeza. Ouço-a fungar em
meu pescoço, apertando a minha cintura com as mãos.
— Esse deveria ser o seu presente também. Eu tinha tanta,
tanta coisa planejada para dizer.
— Meu amor… — Enfio as mãos em seus cabelos,
acariciando o couro cabeludo com carinho. Sei que não podemos
evitar que os nossos familiares façam anúncios como esse, mas
entendo a dor que está sentindo. Luna é muito cautelosa ao planejar
qualquer coisa e sempre se abala quando algo dá errado,
principalmente nesse caso, em que ela fez de tudo para dar certo.
Infelizmente, não era o momento.
— Eu sinto tanto. Tanto. Quebra meu o coração. — Seu tom
de voz embargado me quebra o coração da mesma forma.
Fecho os olhos e respiro profundamente, apertando-a contra
mim. Olho em volta para ter certeza de que ninguém esteja nos
vendo, e realmente não estão, apesar de notar o olhar cauteloso e
preocupado de Ana sobre nós duas. Eu faço um sinal para ela e
depois volto a atenção para a mulher em meus braços, que continua
com o rosto em meu pescoço, fungando baixinho e sussurrando
coisas que não sou capaz de compreender.
— Vamos dar uma volta. Venha.
Ela não hesita em atender meu pedido, e de mãos dadas,
saímos da sala, passando pela cozinha para irmos até a porta que
nos leva ao quintal.
Luna olha para o céu, assim que chegamos ao lado de fora.
Está começando a chover, uma chuva congelada que, em breve,
formará mais neve no chão.
— Desculpe-me por tirar você de lá. É tudo tão difícil!
— Não fique se desculpando, eu a entendo totalmente, assim
como todos.
— Não quero estragar o momento feliz de ninguém.
— Você jamais faria isso. — Vou para a frente dela e seguro
o seu rosto, fazendo-a me encarar. Os olhos estão avermelhados,
assim como a ponta de seu nariz. — Entendeu? O seu irmão sabe
que está feliz, e eu tenho certeza de que ele também entende a sua
dor neste momento.
— Entendo mesmo — uma terceira voz surge de repente.
Luna olha para trás, e eu faço igual, ao soltar o seu rosto.
Deparamo-nos com o Noah chegando até nós. — Quero me
desculpar por ter ativado algum gatilho relacionado a isso. Você,
melhor do que ninguém, sabe o quanto eu a amo e a protejo de
qualquer coisa neste mundo.
— Não se desculpe, meu irmão. Eu sabia que seria assim no
começo, só preciso aprender a lidar.
— Estou aqui com você, minha princesa. Ouviu bem? — Ele
para na frente dela e segura o seu rosto, encarando-a firmemente.
— Sua dor dói em mim também, sempre fomos assim. Se eu
pudesse arrancá-la de dentro de você e pegá-la para mim, eu o
faria.
— Eu sei disso, Tico.
Noah abre um sorriso ao ser chamado pelo apelido íntimo
dos dois. Eles se chamavam de Tico e Teco quando eram mais
novos. Eu achei fofo, como o meu BigBig e Lil com a Vanessa.
— Não era para ser agora. Você já teve informações
suficientes para saber que tudo acontece no momento certo. —
Noah olha para mim durante alguns segundos, e eu imagino que ele
esteja se referindo a coisas relacionadas a mim, a ela e ao nosso
relacionamento também. — Eu mesmo não imaginava ser pai de
novo. Vanessa nunca quis outro filho. Eu estava desconfiado, mas
ela sempre foi tão cuidadosa que eu nem cogitei ser verdade.
— Ela estava apavorada quando me contou — comento,
lembrando-me do dia em que conversamos, e ela me falou da
gravidez. Ele sorri e concorda com a cabeça, então volta a olhar
para a irmã.
— Eu estou aqui com você, sempre estarei. Nunca, em
hipótese alguma, se esqueça disso.
Eles se abraçam com força, Noah a ergue do chão e a
mantém em seus braços. Ficam assim durante algum tempo, até
que ele a coloque no chão.
— Obrigada.
— Não precisa agradecer, é para isso que os irmãos servem.
— Eles fazem um toque de mão divertido, e me dou conta de que é
o mesmo que Louis e ela fazem. Deve ser algo entre eles. — Vou
deixar as duas sozinhas e garantir que ninguém atrapalhe.
Eu sorrio em agradecimento, e ele me retribui e acena, antes
de se virar e sair, entrando na sala, onde todos estão. Luna passa
as mãos em seu rosto, antes de se virar. Ela já não está mais triste,
e eu fico grata por meu cunhado ter vindo animá-la.
— Venha aqui me dar um beijo — ela me chama, e eu não
me faço de rogada, indo rapidamente em sua direção para beijá-la.
Luna segura em minha cintura, e eu passo os braços por trás de seu
pescoço, colando a minha boca à sua, dando início a um lento beijo.
Sinto as suas mãos tocarem as minhas costas, apertando o ponto
certo. Esse beijo está carregado de sentimentos, e eu consigo sentir
todos ao mesmo tempo, mesmo sem saber explicá-los.
Estamos perdidas em uma bola particular, trocando olhares e
sorrisos apaixonados. O tempo frio deixa os olhos de Luna com um
tom azul lindo demais. Eu acho incrível como eles mudam conforme
a iluminação ou a temperatura do ambiente. Confesso que estou
cada vez mais apaixonada por cada detalhe dessa mulher.
Ela mantém as mãos em minha cintura, com uma pegada
firme que me faz quase derreter em seus braços. Ela sabe como me
pegar. Eu acaricio seu rosto, retirando alguns fios teimosos de
cabelo, que insistem em cair sobre os seus olhos e quase me
impedem de apreciar o rosto da mulher mais linda que tenho o
prazer de admirar.
— Filha? Posso falar com você um instante? — Dessa vez,
quem surge onde estamos é a Ana, fazendo com que a gente se
afaste e olhe em sua direção. A minha sogra caminha até nós, com
as mãos dentro dos bolsos de seu grosso sobretudo.
— Claro que pode, mamãe.
— Eu vou deixá-las a sós. — Faço menção de sair para dar-
lhes privacidade, mas sou impedida por Luna, que segura os meus
punhos, e por Ana, que faz um sinal com as mãos para que eu
permaneça.
— Você é família, não tem motivo para sair e não ouvir o que
direi. Inclusive, acho que também pode ser bom para você o que
vou falar.
Luna entrelaça nossos dedos e me puxa um pouco mais para
perto de si.
— Pode falar, mamãe.
Ana toma uma respiração profunda, antes de relaxar a
postura, abaixando os seus ombros, como se estivesse retirando
peso de cima deles e derrubando alguma barreira dentro de si
mesma.
— Filha, eu sei que nunca fui uma mãe tão boa quanto
deveria ser e que você merece. — Luna faz menção de interrompê-
la, mas Ana a impede, cobrindo a boca da minha esposa. — Eu não
sou hipócrita, sei do que estou falando. Sempre tentei dar o meu
melhor, até mesmo ao Noah, porque nem com ele consegui ser
perfeita. Sei também que sempre peguei mais leve com seu irmão,
porque ele nunca me contrariou, e nós raramente discutimos. O que
quero que você saiba é que, apesar de não ter sido a mãe mais
carinhosa e atenciosa do mundo, meu coração sempre quebrou
quando o seu foi quebrado. Eu te coloquei no mundo, então mesmo
que eu nunca... Mesmo com esse jeito torto de demonstrar, sempre
desejei que só acontecessem coisas boas na sua vida.
Luna está tensa ao meu lado, provavelmente ouvindo coisas
nunca ditas pela própria mãe, que é muito fechada.
— Todos os anos que trabalhei, por dias e noites, quase sem
descanso, foram apenas para dar tudo de bom e de melhor a você e
ao seu irmão. Sei que coisas materiais não substituem um abraço,
uma demonstração de afeto ou de preocupação. Hoje sei disso.
Falhei ao priorizar outras coisas antes de vocês, achando ser
suficiente o que eu já dava.
Ela se aproxima de Luna e toca o rosto da filha, olhando de
maneira carinhosa. Lembro-me de ter visto esse olhar afetuoso
apenas direcionado aos netos e ao Mark.
— Agora, eu a olho e vejo uma mulher quebrada, tentando
consertar os trincados que todos esses anos causaram ao seu
coração, o que me parte ao meio, porque não posso proteger você
dessa dor. Eu nunca soube ser carinhosa, porque fui criada assim,
diferente do seu pai, que sempre foi mais aberto, mas eu amo vocês
dois com todo o meu coração. Você, Luna, sempre foi e sempre
será a minha princesinha. Posso não entender algumas das suas
escolhas, mas tenho orgulho da mulher que você se tornou. Uma
mulher forte, com uma família linda, que luta pelo que quer e não
tem medo de errar e recomeçar.
A minha esposa chora sem qualquer tipo de vergonha, assim
como a Ana. Acredito que este seja o momento mais emotivo que as
duas já tiveram. Confesso que eu mesma estou mexida, e a
conversa nem é comigo.
— Eu quero que saiba que estou aqui, de verdade, minha
filha. O meu colo está aqui para você se refugiar, se for preciso. —
Ela desvia o olhar para mim e sorri de maneira amável. — Vocês
duas. Porque, apesar de ser a minha nora, Camille, eu a considero
como uma filha. Você sempre cuidou e continua cuidando tão bem
da minha menina, não tem como ser diferente. Sou grata por ela ter
encontrado alguém tão especial. Você, filha, saiba que, a partir de
agora, farei de tudo para ser melhor. Prometo ouvi-la mais e tentar
entendê-la, sem julgamentos. Isso é uma promessa.
Ana mal termina de falar e sente a colisão do corpo de Luna
contra o seu. Ela solta a minha mão para abraçá-la. Presenciar esse
momento de mãe e filha me faz tão feliz, como se a minha alma
estivesse sendo lavada. Eu sei o quanto elas precisavam dessa
conversa, e mesmo que ainda tenha muita coisa para ser resolvida
entre as duas, esse foi o primeiro passo. Eu realmente acredito que
tudo tem alguma razão para acontecer. Todos estão se acertando de
alguma forma.
O restante da noite não poderia ser melhor. Todos ficam
ainda mais alegres quando voltamos para dentro, e Luna está
radiante, brincando e se divertindo, sem ficar nem um minuto sequer
em algum canto. Isso me deixa alegre e muito satisfeita, porque me
parte o coração vê-la reclusa.
Aos poucos, eles começam a ir embora. Os meus pais vão
dormir na casa de Belinda desta vez, restando apenas os pais de
Luna, que ficam um pouco mais, até irem para a casa de Noah,
mesmo que tenhamos insistido para que dormissem aqui. Pelo visto,
todos se juntaram para nos deixar sozinhas, pois Nayara levou o
nosso filho com ela.
— Você também teve a sensação de que eles queriam nos
deixar a sós? — pergunto, assim que Luna entra no banheiro, onde
estou de pé em frente à pia, retirando os meus acessórios. Estou
usando apenas lingerie, como ela.
— Que bom que não fui a única a ter essa sensação. — Ela
solta uma risada, e eu acabo rindo também. — Sabia que você
também tinha percebido que estavam armando algo para nós duas,
mas confesso que gostei da ideia de ficar sozinha com a minha
mulher. Vai tomar banho primeiro?
Mordo o lábio inferior, ao ouvir a sua pergunta, olho para o
meu reflexo no espelho e, depois, de rabo de olho, visualizo o box.
Abaixo a minha cabeça durante poucos segundos, e um pequeno
sorriso surge em meus lábios ao ter uma ideia. Sei que
provavelmente ficarei bastante tímida, mas não existe nada que me
impeça de sugerir isto a ela.
— Por que não tomamos juntas?
Luna olha, na mesma hora, para mim, e eu não a estou
encarando, a vejo pelo reflexo do espelho. Quase sorrio com a
reação dela, acho adorável o modo como ela reage a mim. Isso faz
com que a minha autoestima fique nas alturas.
— Eu acho perfeito — sua voz não passa de um sussurro
rouco e provocante. Sabia que ela não perderia a chance de
reverter a situação. Luna se aproxima de mim e para atrás do meu
corpo, com as mãos em meus ombros. Ela alisa os meus braços
lentamente para baixo e, depois, sobe até as minhas costas,
parando no fecho do sutiã. — Posso?
— Sim — respondo de imediato, hipnotizada pelo olhar dela
no reflexo do espelho. Luna rapidamente abre o meu sutiã,
deixando-o solto em meu corpo, e sem desviar o olhar do meu,
começa a tirar a peça lentamente. Engulo saliva, sentindo um
arrepio gostoso quando os seus dedos tocam o meu corpo.
— Sempre ficarei fascinada com a sua beleza — ela
murmura, enquanto se ajoelha aos meus pés, segurando a barra da
minha calcinha. Fecho os olhos momentaneamente e sinto uma
insegurança que não me impede de sentir confiança. Não somente
nela, mas em mim mesma. — Você é a mulher mais linda do
mundo.
Luna sobe lentamente, arrastando as mãos pelo meu corpo.
Fecho os olhos quando ela gruda em mim, acariciando a minha
barriga dessa vez. Eu sei que os seus toques são a forma silenciosa
dela de me elogiar e me dar confiança. Está funcionando, porque
sinto crescer, dentro de mim, algo parecido com poder, e a certeza
de que posso fazer o que eu quero e que não preciso me
envergonhar. Não é qualquer pessoa aqui comigo, é a minha
esposa, a mulher com quem escolhi passar o resto dos meus dias.
— Você nem deixou eu te despir.
— Novas oportunidades surgirão, princesa. Venha! — Ela
estende a mão, levando-me para o box, abre a porta e me deixa
passar, para entrar logo em seguida. Luna liga o chuveiro e mexe
nos registros para deixar a temperatura no ponto certo.
— Eu acho que você podia me fazer uma massagem, sabe?
Estou me sentindo dolorida — comento casualmente, enquanto
entro, aos poucos, debaixo da grande cortina de água. Luna solta
uma risadinha, acompanhando-me debaixo da ducha.
— Será um prazer. O que você me pede que eu não faça?
Como de costume, coloco os meus braços em cima de seus
ombros para abraçar o seu pescoço.
— Posso pedir qualquer coisa?
— Qualquer coisa — ela responde e se inclina, beijando o
meu queixo lentamente, e eu fecho os olhos para apreciar o contato.
Adoro quando a sua boca está em mim.
— Quero um beijo, então.
Luna nem diz mais nada, somente encosta a boca na minha
e me beija. Lentamente, como sempre é o início dos nossos beijos,
para, então, acelerar gradativamente. Suas mãos apertam a minha
cintura com força, puxando-me contra ela. Este contato dos nossos
corpos nus me faz gemer e estremecer ao mesmo tempo. Sei que
deveria ser rotineiro, mas para mim é mais uma coisa nova. E eu
gosto da sensação.
Ficamos nos beijando, até que, enfim, decidimos tomar
nossos banhos. Não deveríamos ter molhado os cabelos, mas foi
impossível. Luna fez questão de me ensaboar, dizendo estar
recompensando-me pelos dias que a tive de banhar. Eu,
obviamente, não perdi a chance de fazer o mesmo com ela, e assim
foi o resto do banho. Saímos juntas, trocando sorrisos e beijos,
enquanto nos enxugávamos. Voltamos ao quarto, e a primeira coisa
que ela faz é ligar e aumentar a lareira, deixando o clima mais
agradável.
— Não coloque a blusa, apenas o short. Vai ser melhor para
a massagem — ela pede, e eu concordo com a cabeça, deixando a
blusa sobre a cama, antes de me deitar de bruços. Suspiro ao sentir
o cheiro do creme que ela usa, e Luna sobe na cama e se senta
sobre as minhas coxas.
— Eu acho que você sabe como eu gosto, então só vai com
tudo.
Enfio as minhas mãos debaixo do travesseiro e deito a
cabeça de lado, com um sorriso no rosto, esperando a massagem
começar, pois sei que será incrível. Luna se movimenta sobre mim,
e quase salto de susto ao sentir a sua respiração em meu ouvido.
— Eu sei fazer tudo o que você gosta mesmo — seu sussurro
me faz fechar os olhos com força e pressionar as coxas uma contra
a outra. Maldita mulher que sabe mexer comigo. Ela realmente me
conhece e sabe que pode tocar nos meus pontos fracos sem pena.
Luna se afasta de novo e espalha o creme sobre as minhas
costas, dando início à massagem em seguida. Como eu já
esperava, ela realmente sabe como eu gosto. Não demoro muito a
me sentir relaxada e sonolenta.
— Não tenho forças nem para vestir a minha blusa —
murmuro, meio grogue, quando a massagem chega ao fim, e
permaneço imóvel na mesma posição, tendo a sensação de que
dormirei a qualquer momento. Luna solta uma risadinha, e não faço
ideia do que ela está fazendo, só ouço seus passos pelo quarto e
percebo as luzes sendo apagadas.
— Durma assim, eu prefiro — ela diz ao finalmente voltar
para a cama, deitando-se ao meu lado. — Venha, eu faço você
dormir rapidinho.
Sinto as suas mãos em minha cintura e deixo que ela me vire
na cama, puxando-me contra o seu corpo. Viro a minha cabeça um
pouco para trás e questiono baixinho:
— Vai me fazer dormir rápido, fazendo-me gozar de novo? —
A minha pergunta parece pegá-la desprevenida, pois sinto que as
suas mãos perdem a firmeza no meu corpo durante alguns
segundos, mas então, ela volta a me segurar com força, grudando o
corpo no meu rapidamente e levando a boca até a minha orelha.
— Você quer?
Minha resposta para a sua pergunta é somente um aceno de
cabeça. Mesmo estando realmente sonolenta, sei que vai ser
gostoso da mesma forma.
Luna não perde tempo dessa vez, vai direto ao ponto,
ultrapassando a barreira do meu short, sentindo-me, sem qualquer
barreira, pois não coloquei calcinha quando me vesti.
— Já está toda molhada — sussurra em meu ouvido,
enquanto rodeia a minha entrada, recolhendo a minha lubrificação
natural. Mordo o lábio e pressiono os olhos, afastando bem as
minhas pernas, para que ela consiga me tocar livremente. Luna
passa a outra mão por debaixo do meu corpo e aperta os meus
seios da melhor forma que consegue, e isso dobra o tesão que
estou sentindo.
— Você realmente sabe do que eu gosto — minha voz
grogue denuncia o meu estado catatônico. Seguro os seus cabelos
e, dessa vez, não contenho os gemidos quando ela começa a me
masturbar com tanta maestria, tocando os lugares certos que me
deixam louca. Ela gira os dedos sobre o meu clitóris, pressionando-
o algumas vezes, e deixa aqueles tapas deliciosos sobre ele, que o
fazem pulsar rapidamente. Estou enlouquecendo. Ela desliza os
dedos para baixo, recolhe mais do meu líquido, volta a subir e
continua os movimentos perfeitos.
Eu perco o controle do meu quadril quando
inconscientemente começo a rebolar em seus dedos, agarrando os
seus cabelos com ainda mais força, enlouquecendo com a forma
como ela me toca e com a sua voz rouca dizendo coisas sujas ao pé
do meu ouvido. Não sabia que eu gostava de ouvir sacanagem
nessas horas até ouvi-la me dizer.
Um alto gemido escapa de mim quando chego ao ápice,
estremecendo contra o seu corpo, gozando tão gostoso que me
sinto escorrer abundantemente. Luna dá um último tapa em minha
boceta, antes de virar o meu corpo e beijar a minha boca.
O beijo está delicioso e fica ainda melhor quando ela se
afasta um pouco e coloca os dedos molhados, com meu prazer, em
minha boca. Não recuso, os chupo e os lambo, retirando cada
resquício meu deles. Luna ofega contra mim e volta a me beijar
outra vez, segurando o meu queixo com força.
— Preciso limpar você — ela diz rapidamente, e eu imagino
que se levantará da cama, mas, ao contrário, tira as cobertas e
desce pelo meu corpo, puxando o meu short para o lado. Neste
momento, o meu corpo se retrai um pouco. Talvez seja vergonha,
mas, ao mesmo tempo, estou tão excitada ainda que faço qualquer
coisa que ela queira.
Luna finalmente encosta a sua boca na minha área mais
sensível, e quase solto fogos de artifício internos. Se com os dedos
ela é boa, com a boca é impecável.
A sua primeira lambida me faz curvar as costas sobre a
cama, então a sinto puxar mais o tecido do meu short para ter
acesso à minha entrada, que está com uma grande concentração do
que foi o meu orgasmo. As minhas mãos automaticamente vão para
os seus cabelos, a pressiono contra mim e, gemendo, digo o seu
nome alto e em bom tom.
Luna ergue uma perna minha para ter um acesso melhor, me
lambe inteira e, então, chega ao clitóris, movimentando a língua de
um jeito que eu nem imaginava ser possível alguém fazer tão rápido
quanto ela.
Mesmo que tenha acabado de gozar, sinto que terei outro
orgasmo. Os gemidos saem livremente, e eu a pressiono contra
mim, sem me importar com a força usada. Ela mexe a língua em
toda a minha boceta, chupando e lambendo cada parte, deixando-
me ainda mais louca.
— Nossa! — murmuro, quase sem voz, sentindo a boca seca.
Ela finalmente se dá por satisfeita e, com um último beijo sobre o
meu clitóris sensível, se afasta e coloca o meu short no lugar. Estou
mole e satisfeita.
— Essa boceta é gostosa demais. Senti falta de provar você.
O fogo da lareira me permite ver o seu rosto quando a
encaro. Luna está ao meu lado, olhando para o meu rosto, com um
enorme sorriso. Eu sorrio da mesma forma, puxando-a para um
beijo apaixonado.
— Vou dormir como uma verdadeira princesa, a Bela
Adormecida.
Luna gargalha da minha fala, cobrindo as duas, antes de me
puxar para os seus braços.
— Durma, minha princesa. Eu estarei aqui amanhã de
manhã, quando acordar.
Que sorte a minha, não é?
Capítulo 28 – Ponto de paz
O dia seguinte não poderia ter amanhecido melhor. Quando
olho através da janela, vejo que a neve diminuiu consideravelmente
e acredito ser possível ir à rua. Quero dar uma volta, estou cansada
de ficar em casa. A minha esposa continua dormindo, então tenho
muito cuidado ao sair da cama para fazer a higiene matinal, antes
de sair do quarto e preparar o nosso café da manhã, que será
levado à cama para ela. Minha mulher merece ser mimada.
— Não acredito que você se levantou antes de eu acordar
você — resmungo ao voltar ao quarto e me deparar com a cama
vazia e a porta do banheiro aberta. Ouço o som da descarga e,
então, da torneira da pia. Em seguida, ela sai do banheiro, com o
rosto amassado e os cabelos levemente bagunçados. Como
consegue ser linda até mesmo assim?
— Inclusive, precisamos conversar sobre o fato de você se
levantar da cama e me deixar sozinha — ela também resmunga,
ainda meio grogue, caminhando de volta à cama e jogando-se nela.
Rio do seu jeito rabugento. Antes ela nem reclamava, mas
agora, que estamos cada vez mais próximas de novo, a sua
liberdade para fazer reclamações voltou. Deixo a bandeja com o
café sobre a mesinha de canto, subindo no colchão e chegando
mais perto.
— Eu fui preparar o nosso café da manhã, ranzinza.
— Pois você acabou de ser perdoada. — Ela rapidamente
ergue a cabeça, com um enorme sorriso em seu rosto, e como se
fosse ativado, o seu estômago faz um barulho alto. — Viu? O Junior
também concorda comigo.
— Melhor alimentarmos esse monstrinho, antes que ele nos
coma — brinco e solto uma gargalhada. Em seguida, viro-me para
pegar a bandeja, a coloco entre nós duas e, quando olho para ela, a
vejo com uma expressão sem-vergonha no rosto. — O que foi?
— Ele não pode te comer, mas eu posso.
— Luna! — exclamo, horrorizada com o seu comentário, e ela
cai sobre a cama, gargalhando, divertindo-se.
— Desculpe, eu estou brincando, mas não podia perder a
piada.
— Tome aqui. Coma e pare de falar besteira. — Pego uma
torrada e passo um pouco de geleia de morango, levando até ela,
que rapidamente abre a boca para recebê-la. — Ocupe sua boca
com isso, e chega de piadas.
Ela faz o sinal de rendição, enquanto mastiga, soltando um
gemido, aprovando o sabor que está em sua boca. Fico satisfeita
por ela ter gostado da geleia que eu mesma tive o trabalho de fazer.
— Eu amo essa sua geleia. Camies?
— Hm?
Como uma torrada também, deliciando-me com essa
maravilha. Eu sou uma ótima cozinheira mesmo, tenho orgulho dos
meus dons culinários. E se eu não amasse tanto a dança, com
certeza seria uma chef de cozinha.
— Quero mais, por favor.
Olho para ela, que está fazendo cara de cachorro pidão, e
reviro os olhos.
— Vou ter que dar comida a você na boca agora?
— Sim.
— Está muito folgada.
— Você é a minha esposa, um dos seus trabalhos é me
mimar.
Mesmo tendo reclamado, eu não deixo de alimentá-la, porque
a minha intenção é mimá-la mesmo, e que ela se aproveite disso.
Luna realmente merece todo esse tratamento, pela mulher incrível
que mostra ser cada vez mais.
— Folgada.
— Linda.
— Não fale de boca cheia.
Embora eu quisesse mimá-la, ela fez questão de retribuir o
cuidado, dando-me coisas na boca e enchendo-me de beijos. Sou
apaixonada demais por esse jeito carinhoso dela. Nunca imaginei
que Luna pudesse ser assim, e entendo a Camille do passado ter se
apaixonado por ela. A cada dia, mais eu descubro quão
companheira e protetora ela é, além de ser boa mãe também.
— Podemos aproveitar o dia para sair. O que acha? Estou
cansada de ficar reclusa em casa.
— Você leu a minha mente, ia perguntar agora mesmo se
quer passear. Preciso sair um pouco dessa casa.
— Então, vamos tomar um banho e nos arrumar. Vou levar
você a um lugar especial.
— Outro cantinho nosso? — questiono, começando a tirar as
minhas roupas para tomar o meu banho. Ela me segue de perto, e
um sorriso travesso surge no meu rosto quando penso em um plano
maldoso.
— Sim, senhora.
Fecho a porta atrás de mim e a ouço mexer na maçaneta
para abri-la. Seguro a risada, terminando de tirar as minhas roupas.
— Camille?
Não respondo, entro no box para tomar o meu banho. Do
lado de fora, ela resmunga algumas coisas, e acabo rindo ao
imaginar a sua expressão contrariada, pois sei que o desejo dela é
tomar banho comigo de novo. Mas a vida não é fácil, certo? Eu não
vou facilitar tanto para ela.
Tudo bem, talvez um pouco.
— Nayara mandou alguma mensagem para você? Ela nem
respondeu a minha — pergunto-lhe, depois de verificar as
mensagens no meu celular. Para ser sincera, nenhuma outra
pessoa me respondeu, nem mesmo no grupo que fizeram. Isso é
estranho.
— Sim, mais cedo. — Olho para Luna, que está atenta ao
retrovisor, enquanto tira o carro da garagem. Estou incrédula por
saber que estou sendo ignorada. — Não fique com essa cara. Ela
apenas avisou que hoje teremos o dia só nosso e que ninguém
falará conosco.
— Eles sabem que estamos bem agora, certo?
— Sim.
— Qual a finalidade disso tudo, então?
Luna solta uma risadinha, deixando-me confusa.
— Eu tenho certeza de que as nossas amigas e as minhas
cunhadas esperam que a gente tenha feito amor.
— Que fofo, você falando que fazemos amor. — Sorrio, toda
rendida, colocando a minha mão sobre a perna dela. Luna sorri,
olha para mim, durante alguns segundos, e em seguida, retira a
mão do volante para segurar a minha, levando-a até a sua boca
para beijar o dorso dela.
— Sempre fizemos amor. Desde o início, e até quando o
fazemos com força, cheias de vontade, com muitos tapas e
xingamentos.
— Ok, não se empolgue, sua safada.
Ela ri quando dou um tapinha em seu ombro.
— Você gosta de mim assim ou esqueceu que ontem quem
veio para cima de mim foi a senhorita?
— Luna Jacobs.
— Nossa, fazia tempo que você não me chamava assim. Eu
até me arrepiei, olhe aqui os meus braços. Deu tesão.
— Puta merda, desisto de você. Fique quieta, antes que eu
saia desse carro e volte para casa.
Ela não diz mais nada, mantendo a atenção na estrada. Não
tem como me estressar com essa mulher, não sei como a minha
versão do passado conseguia. Talvez seja o fato de que estou
“convivendo” pela primeira vez.
O caminho demora um pouco, mas logo chegamos a um
lugar muito bonito.
— Só para você saber: todas as vezes que viemos aqui, essa
sempre foi a sua reação. É bonito, não é?
— Demais! Posso descer?
— Claro, meu amor — ela responde, e eu não espero outro
comentário dela para sair do carro, sentindo a brisa gelada bater
contra o meu corpo, bagunçando os fios soltos do meu cabelo.
Estou encantada com a vegetação, que, mesmo coberta por uma
camada de neve, continua linda. O lago congelado deve ser muito
bonito no verão.
— Estou apaixonada — murmuro quando sinto a presença
dela atrás de mim. Luna me envolve com uma manta grossa e
abraça o meu corpo. Impossível não sorrir e olhar para trás, selando
os nossos lábios. Ela cuida tão bem de mim, sou muito grata por
isso.
— Venha, tem um lugar onde sempre ficamos. — Ela nos
guia por uma ponte de madeira que passa sobre o lago congelado.
Eu olho tudo à minha volta, apaixonada pelo ambiente. É
simplesmente de tirar o fôlego, estou encantada. Demora um pouco,
mas chegamos a uma árvore enorme, que fica no alto de um
pequeno morro. Luna indica onde precisamos subir e cobre o chão
com o cobertor que havia trazido.
— Que vista maravilhosa! — comento, admirada, sentando-
me sobre o cobertor e apreciando a vista privilegiada que temos do
enorme lago. Luna coloca as coisas que trouxemos no chão e se
senta ao meu lado, fazendo-me erguer um lado da manta para que
ela fique aquecida comigo.
— Muito bonito aqui. Quando descobri esse lugar, durante
uma sessão de fotos, sabia que você ficaria tão apaixonada quanto
eu.
— Espero que o tempo não esfrie tanto, quero ficar o resto do
dia aqui. Nós podemos?
— Claro, meu amor. Trouxemos coisas para comer e estamos
quentinhas, podemos ficar o quanto quiser.
Luna passa uma perna por trás de mim e me puxa para o seu
peito, envolvendo-me em seus braços. Deito a minha cabeça em
seu ombro e continuo admirando tudo à nossa volta, encantada e
agradecida por estar aqui, vivendo isso com ela. Não acho que
posso pedir alguém melhor.
— Você sempre diz que eu sou a sua sorte, mas acredito que
a minha sorte é ter você comigo. Não sei se outra pessoa faria tudo
o que faz por mim, se estivesse em seu lugar, pelo menos não com
tanta dedicação.
— Não tenho como explicar o bem que você sempre me fez.
Se nunca desisti de nós, foi porque, no início de tudo, você
acreditou em mim como ninguém, apoiando-me sempre, erguendo-
me a todo o momento, para que eu nunca desistisse.
— Isso é com relação às suas escolhas de trabalho e
faculdade? — Viro-me em seus braços para conseguir encará-la. Eu
gosto de conversar olhando nos olhos da pessoa, é estranho não ter
esse contato.
— Boa parte, sim. Foi complicado quando eu decidi mudar de
curso, sabe? Minha mãe surtou. Não me lembro de outro período
em que tivemos tantas discussões quanto naquela época.
— Foi assim que terminamos a escola?
— Sim. Eu fiz meio período de Direito e não quis mais,
parecia que outra pessoa estava vivendo a minha vida. Era tão
errado, sabe? — Ela suspira, fechando os olhos momentaneamente.
Provavelmente está se lembrando desse período complicado. —
Você sempre me defendeu como pôde, mas teve um momento que
nunca vou esquecer: a minha mãe, como sempre, nunca mediu as
palavras para me desanimar a seguir outro rumo que não fosse o
seu desejado; essa foi uma das brigas mais estressantes que
tivemos, e você não aguentou presenciar sem dizer nada.
— Eu sempre defendi você dela?
Luna solta uma risadinha, inclinando-se para beijar a minha
testa rapidamente, e eu sorrio, acariciando a sua barriga por cima
do casaco que ela está usando.
— Sempre. Naquele dia, eu senti que podia contar com você
para tudo, porque disse que teria orgulho de se casar com uma
mulher como eu, futura fotógrafa de renome e esposa exemplar, e
ainda que seríamos felizes. Você pode imaginar que a minha mãe
ficou tão chocada que nem teve palavras para responder. Eu acho
que ela não imaginou que você seria capaz de enfrentá-la, porque
geralmente as pessoas têm medo de fazer isso.
— Confesso que estou feliz por saber disso. Não me
alegraria nem um pouco saber que estava presente, ouvindo
absurdos sobre você, e não a defendi. Sempre vi o relacionamento
dos meus pais como um espelho, sempre soube o quanto o meu
bisavô não suportava o meu pai, por ele defender a minha mãe das
suas reclamações. Acho que companheirismo é isso também, sabe?
Estar ao lado da pessoa e se levantar por ela. Ninguém vai abrir a
boca para dizer algo de ruim sobre você e não me escutará de volta.
— Você fica linda me defendendo, sabia? — Luna segura o
meu rosto e sela os nossos lábios várias vezes, e eu sorrio,
adorando o ato carinhoso. — Sempre gostei desse seu jeito protetor,
comigo e com o Louis, defendendo-nos de qualquer coisa. Eu sabia
que você era a mulher certa desde o início.
O tom azulado de seus olhos está parecendo mais vívido
com o brilho de admiração refletindo neles. Neste momento, tenho
uma sensação, dentro de mim, muito natural e familiar. Eu tenho
certeza de que é o meu subconsciente lembrando que, à minha
frente, está a mulher com quem decidi passar o resto da minha vida.
— O que será que a Camille adolescente pensaria da Camille
adulta, que é cada vez mais apaixonada por você e tem orgulho de
ser casada também?
— Ela, com certeza, surtaria — Luna brinca, fazendo-nos rir,
imaginando uma cena como essa. Tenho certeza de que a minha eu
adolescente ficaria maluca ao saber disso, porque não suportava
nem conviver no mesmo ambiente, imagine pensar em passar a
vida toda ao seu lado.
— Nunca pensei que me casaria e desejaria viver um
romance. Apesar de admirar o relacionamento dos meus pais, eu
jamais imaginei ser capaz de passar o resto dos meus dias ao lado
de uma pessoa.
— Eu sei disso. Foi muito difícil conquistar o seu coração.
— Hoje, só tenho uma coisa em mente.
— O quê?
Levo minha mão até a sua nuca, segurando-a com as pontas
dos dedos e o polegar, pressionando o seu queixo. Luna olha para a
minha boca automaticamente, não consegue se controlar muito
mesmo.
— Ainda bem que você insistiu em mim. Por isso, eu nunca
deixarei de estar ao seu lado. Sei que não podemos prever o que
vai acontecer, mas quando penso no futuro, hoje só o imagino ao
seu lado.
Minhas palavras parecem emocioná-la, fazendo lágrimas
brilharem em seus olhos. Luna permanece paralisada, surpresa e
emocionada demais com a minha confissão. Eu sorrio antes de me
inclinar, unindo as nossas bocas em um beijo repleto de carinho e
paixão.
Eu realmente não desejo mais ninguém.
Quando era mais nova, o meu pai disse algo sobre os
príncipes encantados. Lembro-me até hoje de suas palavras:
“Príncipes encantados não existem na vida real. Os garotos não vão
abrir a porta do carro para você, não vão comprar flores nem
respeitar os seus sentimentos. O que a maioria deles quer, hoje em
dia, é qualquer oportunidade de tirar a sua virgindade.” Lembro-me
de passar a odiar os contos de fadas desde então, apesar de nunca
ter tido interesse por homens; o meu interesse maior sempre foi por
mulheres. Não entendia, no início, e levei anos para aceitar isso. O
período de aceitação é complicado e confuso, você fica dividida
entre o certo e o errado, imaginando o que os outros vão pensar e
como vão reagir.
Por um tempo, eu tive tanto medo disso que, apesar de não
me interessar por garotos, via a minha irmã e esperava pelo meu
príncipe encantado. Além de querer provar ao meu pai que eles
existiam, sim, e que era possível encontrar uma pessoa decente. Eu
não esperava que ele estivesse tão certo: os príncipes encantados
não existem, mas as princesas encantadas, sim. Eu encontrei a
minha, que, mesmo não sendo perfeita, está ao meu lado em todos
os momentos e sabe cuidar de mim e do nosso filho. Estou me
descobrindo cada vez mais apaixonada por ela, não existe nada
melhor do que isso. Além do mais, por que eu iria querer outra
pessoa, se minha esposa é tão carinhosa e cuidadosa? Quem
precisa de príncipe encantando, tendo a Luna como companheira de
vida? Ela tem conseguido despertar o meu lado bom, e é uma
sensação tão incrível como ela me faz sentir. Gosto da pessoa que
estou me tornando ao lado dela. Eu não preciso de pessoas
perfeitas, só preciso dela, com todas as suas imperfeições. É a
única pessoa com quem quero passar o resto dos meus dias. Luna
é muito mais do que apenas minha esposa, ela é o meu ponto de
paz.
É um menino.
Outro menino na nossa casa. Quando a doutora Gomes nos
diz que teremos mais um homem, o nosso filho fica extremamente
animado, imaginando vários momentos com o seu irmão. Luna e eu
estamos felizes também, embora eu achasse que dessa vez seria
uma menina, mas estou feliz de qualquer forma. Ele será muito
amado.
— Mamães! — Louis nos chama de repente, quando já
estamos no carro, voltando para casa, depois da consulta. Tudo
está bem com o nosso garoto, e em alguns meses, ele estará
conosco, enchendo-nos de alegria.
— Sim, pequeno — eu lhe respondo e olho para trás,
enquanto minha esposa foca a estrada e apenas lança um olhar,
através do retrovisor, em direção a ele. Meu filho mexe em seus
cabelos longos de forma nervosa, ansioso. Isso me desperta a
curiosidade.
— Já escolheram um nome para o meu irmãozinho?
Um pequeno sorriso surge em minha boca, então olho para
Luna e a vejo abrir o mesmo sorriso.
— Você tem alguma sugestão, carinha?
Louis alisa uma mão na outra e confirma com a cabeça.
Estou ainda mais curiosa para saber por que ele está tão nervoso.
— O que as senhoras acham de Gabriel? — ele questiona,
receoso, sem saber se daremos uma resposta positiva. O carro dá
uma leve travada, e eu desvio o olhar para a minha esposa, notando
que ela ficou surpresa, a ponto de quase frear o carro. Minha mente
rapidamente busca e encontra o motivo daquele pedido, e o meu
coração se enche de amor por saber que Louis quer homenagear o
seu melhor amigo, que hoje está no céu.
— Eu acho perfeito, meu amor.
— Sério? — Sua surpresa nítida me faz abrir um sorriso, e eu
me estico para pegar uma de suas mãos e fazer um carinho.
— Claro, meu amor. Não é, Luna? — Olho para a minha
esposa e noto que está emocionada, mas abre um enorme sorriso e
concorda com a cabeça.
— Eu acho Gabriel um nome perfeito.
Os meses que se seguem são exatamente desta forma. Eu
felizmente paro de ter insônias no meu sexto mês de gestação, o
que deixa Luna provavelmente muito aliviada, por não ficar tão
cansada, e, ao mesmo tempo, tranquila por saber que me sinto
melhor. Ela se preocupa muito comigo. Eu continuo sendo mimada e
muito cuidada pelos meus dois amores.
Neste momento ou em breve, acontecerá o que esperamos
há muito tempo. As minhas contrações estão cada vez mais
intensas e doídas, e Luna está angustiada por me ouvir gemer de
dor, mas se concentra na direção, enquanto estamos indo ao
hospital, onde darei à luz. Espero que o parto não seja tão
demorado quanto o primeiro, pois foram demoradas nove horas até
o nascimento do meu pequeno, pelo que fiquei sabendo por meio
das histórias que a minha esposa contou.
— Finalmente, conheceremos o nosso anjo Gabriel — Luna
diz, com a mão apoiada em minha coxa, fazendo carícias para me
deixar mais calma. Em sua voz, identifico um sorriso bobo, que vejo
em seu rosto quando a olho.
Sim, meu amor. Finalmente vamos conhecê-lo.
São longas horas, sete horas e meia para ser mais exata.
Minha esposa fica ao meu lado o tempo todo, dando-me carinho e
apoio, e quando ouvimos o choro do nosso filho, é como se a vida
estivesse ganhando um sentido novo. Luna chora. Eu choro. Acho
que até mesmo os enfermeiros choram com toda a nossa emoção.
Parecemos duas crianças choronas, mas como poderia ser
diferente?
O sentimento de ser mãe é inexplicável, e mesmo o
conhecendo, acaba se tornando ainda mais intenso, porque estou
vivenciando isso outra vez. Eu acho que quando temos um filho e
depois outro, esse sentimento de proteção, amor e afeto é dobrado
e continua crescendo, conforme a família vai aumentando. Segurá-
lo em meus braços e olhar o seu rostinho, tão lindo e extremamente
branco, com tantos cabelos, me faz derramar ainda mais lágrimas
de alegria.
Minha esposa segura uma câmera, registrando os momentos,
como ela gosta.
— Ele parece mesmo um anjo. Nosso pequeno anjo! —
minha voz está embargada, e Luna se aproxima, usando os
polegares para secar as minhas lágrimas. Parece que nada ao
nosso redor existe, além de nós três. Ela olha para o nosso
pequeno, tão apaixonada quanto eu, e acaricia sua bochecha com
carinho.
— É o mais novo amor da minha vida — ela murmura, por
trás da máscara que está usando, e ficamos assim, as duas
babando o nosso pequeno filho.
Sinto a água cada vez mais fria e decido que está na hora de
sairmos.
— Outra?