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Maio de 1968: você sabe o que foi esse movimento social?

“Maio de 68” é uma expressão que se refere a um conjunto de eventos ocorridos no mundo na década de
60. No entanto, o movimento de fato teve início no mês de Março em uma universidade nos arredores de Paris. De
modo geral, jovens de diversos países, influenciados pelo movimento estudantil francês e com motivações variadas,
resolveram questionar as estruturas sociais em que viviam. Entre esses questionamentos estavam: a Guerra Fria, a
bipolaridade política, as corridas armamentista, nuclear e espacial, o capitalismo e o processo de globalização do
capital sem compromisso com qualquer cor de bandeira (por meio das chamadas multinacionais).

Início do movimento
Como dito, “Maio de 68” é uma expressão que se refere ao um conjunto de reivindicações iniciadas pelos
jovens em diversos países pelo globo. O movimento teve início no mês de Março em uma universidade em Paris,
onde foram realizados vários debates universitários, ocupações, atos públicos, discursos, assembleias e protestos de
rua. Esses acontecimentos caminharam para um enfrentamento direto com a polícia francesa, questionando
assuntos como o núcleo familiar, a moral, questões ligadas a gênero e sexualidade, as leis, o dinheiro, a religião,
entre outros.
As reivindicações eram reflexos da sociedade global, pois as categorias universitárias ao lado de outras
camadas sociais se mobilizaram em torno de objetivos políticos como a democratização, defesa das liberdades
individuais ou coletivas e a denúncia contra as guerras. Portanto, podemos dizer que as lutas universitárias de 1968
ocorreram durante um período de tempo no quais vários outros eventos históricos marcantes aconteciam e
asseguravam a ideia de que as estruturas sociais da época eram pesadas, antigas, opressoras e desiguais.
Para entendermos a crítica a essas estruturas e a motivação da rebelião estudantil precisaremos de uma
retrospectiva histórica.

O contexto histórico
Como sabemos, conflitos mundiais ocuparam quase toda a primeira metade do século XX (1914-1945). A
Primeira Guerra Mundial (1914-1918) aterrorizou o mundo e, apesar de não ser possível à época imaginar um
cenário pior, um conflito ainda mais violento e de proporções inimagináveis deixou a humanidade desconsolada: a
Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Nesse sentido, as duas grandes guerras fortaleceram o pessimismo global de
um terceiro conflito trágico para todos.
Não é a toa que no contexto da Guerra Fria (1947-1991), durante o auge do enfrentamento ideológico entre
os Estados Unidos e a URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas), houve mais momentos em que uma nova
guerra traumática parecia novamente estar muito próxima. Essa sensação de insegurança, bem como os fatos
ocorridos, era vistos como fruto da insensatez humana proporcionada pelos adultos da época e representou o início
da insatisfação dos jovens estudantes.
Neste cenário, divisões profundas começaram a acontecer. Os protagonistas daquela geração estavam em
confronto aberto com os valores dominantes da sociedade, que não mais representavam suas ideias, vontades e
visões de mundo.

O dia 10 de maio de 1968


O movimento iniciado em Paris teve como primeiro e principal ator o movimento estudantil, pois iniciou-se
de debates na esfera acadêmica. Assim, no dia 10 de maio de 1968, um grupo de pelo menos 20 mil estudantes
franceses ergueu barricadas feitas de carros virados, carteiras e outros móveis destruídos no Quartier Latin, a região
central de Paris.
A divisão física criada pelos destroços de longos dias de protestos e de enfrentamento com a polícia
representava a separação de gerações, das concepções de moral e dos costumes entre conservadores e liberais,
além também da separação entre ideais capitalistas e socialistas. A massa de universitários tinha sede de
modernidade e se mostrava cada vez mais insatisfeita em relação a uma sociedade incapaz de atender a seus anseios
por prosperidade, justiça e liberdade.
Havia à época, uma confusão de acontecimentos – conquistas e derrotas entre diversas classes sociais, os
discursos políticos e ideais revolucionários –, mas, todos acabavam com um ponto em comum: mudar a sociedade.
Nem os capitalistas nem os socialistas deram conta do significado e dos efeitos das revoltas, que se tornaram um
símbolo da esperança de que um movimento popular poderia transformar a realidade.

O movimento pelo mundo


Maio de 1968 nutriu pelo mundo diversos ideais. Assim, foi seguido por sindicatos de trabalhadores, por
artistas e intelectuais – acabando, por fim, se espalhando ao redor do mundo.
Nos EUA, fortaleceu o movimento pela defesa dos direitos civis dos negros, de mulheres e de homossexuais
e a revolta negro-americana depois do assassinato de Martin Luther King Jr. As lutas também se desenvolveram no
país no contexto da rejeição à Guerra do Vietnã. Afinal, em várias universidades, era denunciado o recrutamento de
estudantes em projetos de pesquisa encomendadas por fornecedores de material bélico e por isso se questionava o
papel acadêmico no fortalecimento da indústria bélica-militar.
Já na América Latina se conectou a luta dos estudantes e dos trabalhadores. Por exemplo, no México, tais
grupos reivindicavam por mudanças políticas no país, que desde 1929 estava nas mãos do PRI (Partido
Revolucionário Institucional). As mobilizações chegaram a reunir mais de 180 mil pessoas reivindicando por maiores
liberdades civis e a punição de casos de repressão policial.
Outro exemplo foi o Brasil, que desde 1964 vivenciava uma ditadura militar. Assim, o movimento deu força
aos opositores do regime autoritário. Além disso, os movimentos estudantis e seus membros, artistas e intelectuais,
se uniram na Passeata dos Cem Mil – o marco da reação da sociedade contra o regime, a censura, a violência e a
repressão às liberdades no país.
Em outros países como na China (1966-1969) fortaleceu a Revolução Cultural chinesa, que foi um período de
transformações políticas e sociais desencadeado por Mao Tsé-tung. Já na Alemanha, a contestação estudantil foi
organizada pelo SDS (Sozialisticher Deutscher Studentbund), cujo líder Rudi Dutschke sofreu um atentado em abril de
1968. O movimento fez uma crítica ao sistema educacional. Assim, apresentou propostas de uma universidade crítica
discutindo problemas como o imperialismo, as revoluções socialistas, psicologia e sociedade (sexualidade e
dominação, medicina desumana, crítica à psicologia acadêmica).

Fontes do movimento
Os eventos de Maio de 1968 em Paris partiram de demandas estudantis, exigindo reformas no sistema
educacional francês. A expansão do movimento se deu de forma veloz e alcançou uma greve geral de trabalhadores
que balançaria o país e o governo de Gaulle, general que completava dez anos no poder.
A presidência de Gaulle era vista por muitos jovens como uma ditadura disfarçada e os trabalhadores se
sentiam descontentes frente aos problemas sociais enfrentados diariamente. Essa seria uma das grandes diferenças
nas pautas dos movimentos: afinal, enquanto as vontades estudantis eram filosóficas e simbólicas, as pautas
operárias eram concretas, como por exemplo, a redução das jornadas de trabalho e aumento salarial. Mas, o que
unia todos os grupos era a oportunidade de se tornarem agentes de suas próprias histórias.
Frases como “Abaixo a sociedade de consumo”, “A ação não deve ser uma reação, mas uma criação”, “A
barricada fecha a rua, mas abre a via”, “Corram camaradas, o velho mundo está atrás de você”, “A imaginação toma o
poder”, “Sejam realistas, exijam o impossível”, “A poesia está na rua”, “Abraça o teu amor sem largar tua arma” e
muito mais são exemplos dos sonhos, concretos ou simbólicos, que tornaram-se pichações pelos muros da capital
francesa.

Os reflexos nos dias atuais


O movimento francês de 1968 ficou conhecido como “o ano que nunca acabou”, pois foi o estopim para uma
grande revisão de valores pela geração dos anos 60, chamados de baby boomers. Assim, a herança de maio de 1968
pode ser vista como uma revolução social e comportamental, mais do que uma revolução política. O movimento
iniciado por estudantes franceses contribuiu para diversas transformações políticas, morais, artísticas e
comportamentais na época. Os questionamentos, reivindicações, protestos e embates deram visibilidade e tornaram
os ideais de 1968 contemporâneos.
A partir dele surgiram brechas para defender as liberdades civis democráticas, a liberdade sexual, a causa da
luta feminista, os direitos dos imigrantes e outras minorias, a igualdade entre negros e brancos, homossexuais e
heterossexuais, o consumo consciente, o papel dos meios de comunicação e sua importância social, entre outros
feitos.
Houve influência direta também nos sindicatos, grêmios estudantis, grupos de teatro, coletivos de cinema,
música, histórias em quadrinhos, e formas de expressão e comunicação oral em locais improvisados abertos ao
público. As ideias de participação desses jovens e suas diversidades mostraram um caminho possível para a gestão
da política e para vários outros setores da sociedade.
Com o movimento, a vida cotidiana, os relacionamentos interpessoais, a visão do mundo, os gostos e
aversões se modificaram, e, até hoje a sua influência pode ser sentida desde a pauta dos debates políticos que estão
acontecendo agora até as roupas que vestimos, as noticias que lemos, as redes sociais que possuímos, os ideais que
acreditamos e podemos expressar.

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