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Paulo Kogos
1ª edição — fevereiro de 2023 — CEDET
Copyright © Paulo Kogos 2023
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Phone Number: (407) 745-1558
e-mail: cedetusa@cedet.com.br
Editor:
Thomaz Perroni
Capa:
Guilherme Conejo
Diagramação:
Virgínia Morais
Revisão de provas:
Luiz Fernando Alvez Rosa
Tamara Fraislebem
Conselho editorial:
Adelice Godoy
César Kyn d’Ávila
Silvio Grimaldo de Camargo
FICHA CATALOGRÁFICA
Kogos, Paulo.
O mínimo sobre anarcocapitalismo / Paulo Kogos
Campinas, SP: O Mínimo, 2023.
ISBN : 978-65-85033-07-7
1. Ciência política 2. Ideologias políticas
I. Autor II. Título
CDD 320 / 320.5
www.ominimoeditora.com.br
Reservados todos os direitos desta obra. Proibida toda e qualquer reprodução desta edição por
qualquer meio ou forma, seja ela eletrônica, mecânica, fotocópia, gravação ou qualquer outro
meio de reprodução, sem permissão expressa do editor.
Sumário
APRESENTAÇÃO
A ESSÊNCIA DO ANARCOCAPITALISMO
ECONOMIA DO ANARCOCAPITALISMO
NOTAS DE RODAPÉ
P ornãoquedecidiram
você abriu este livro? Os políticos, seus “representantes”, já
por você e por sua família sob qual regime deverão
viver? O seu interesse por este título já demonstra uma justa rebelião
contra aqueles que lhe negam o incentivo para exercitar o
discernimento sobre questões políticas e o direito de aplicar as
conclusões à sua própria vida. Quando as suas escolhas sobre com
quem se associar e a quem se submeter são nulificadas pela força
bruta de um tirano, pela esperteza de uma oligarquia ou pela
superioridade numérica das massas, resta a única escolha que ninguém
pode impedir:
Boa leitura!
A ESSÊNCIA DO ANARCOCAPITALISMO
Entretanto, quando o homem está sob o jugo dos maus governos que
o exilam na desordem através de leis injustas que, como nos lembra
Santo Agostinho, não são leis, ele deve urgentemente retornar à Pátria
da ordem. O anarcocapitalismo não é a filosofia política em si, pois
não versa sobre princípios e fins da vida em sociedade. É sim um
adendo a ela que, à luz de outras ciências como a sociologia e a
economia, auxilia o cidadão a discernir entre bem e mal, operação
essencial para que o animal político se distinga de meros bichos
gregários. As observações anarcocapitalistas são como o manual do
barco que nos leva de volta à ordem e não como a Bíblia que o
náufrago encontrará quando chegar em casa.
O anarcocapitalismo é o esforço
constante para se manter o mais à direita
possível no espectro político. Pode ser
definido como a preservação das justas
hierarquias e autoridades contra os
usurpadores, para que as sociedades
políticas mantenham sua função ordenada.
É necessário, a partir daqui, definir quais autoridades são justas. O
termo auctoritas, para os antigos romanos, aplicava-se à uma
liderança natural que emerge da reputação e do valor pessoal,
especialmente quando estes são empregados na preservação de
princípios e tradições. Por depender de virtudes como critério, serve
de mecanismo corretivo contra a corrupção do poder, evitando o
absolutismo de entidades contingentes e provando o ponto do filósofo
Alasdair MacIntyre de que são as leis inscritas na natureza das coisas,
e não os decretos humanos, que possuem vocação subversiva contra
sistemas falhos.
Para que os monarcas sirvam aos súditos, devem competir por eles,
do contrário não haverá critério para avaliar suas virtudes. Hoppe
comenta o conceito de elite natural, composta por indivíduos que se
sobressaem por suas qualidades técnicas e morais, sendo reconhecidos
espontaneamente como líderes aptos a proteger as autoridades que os
precedem. Deste processo orgânico resulta uma associação política
que não se reduz à dicotomia entre governantes e governados, mas, ao
contrário, é composta por diversos corpos intermediários, como
corporações, confrarias e aristocracias feudais, que protegem o
indivíduo e as justas autoridades contra a usurpação desordeira
perpetrada por um tirano ou pela turba (esta é ainda mais perigosa que
aquele, pois como nos lembra o escritor Antoine de Rivarol, o
soberano pode ser Marco Aurélio ou Nero, mas a multidão é sempre
Nero).
II. A virtude da justiça, que é a vontade constante e perpétua de dar a cada um o que lhe é de
direito.
III. A filosofia do direito, que é a investigação do que é justo pela sabedoria filosófica.
IV. A arte de prestar serviços de justiça, que, pela sabedoria prática, emprega recursos
escassos através de instituições adequadas para fazer valer o direito em circunstâncias
específicas.
II. Lei Natural: a porção da Lei Eterna participada à razão humana e que é o componente
normativo (do qual procedem deveres) que a natureza das coisas nos impõe.
III. Lei Divina Positiva: revelada por Deus para ordenar a conduta dos homens à beatitude,
que é seu fim último. Um exemplo são os 10 Mandamentos.
IV. Lei Humana: normas criadas pelos homens para ordenar a vida do cidadão às virtudes na
vida política, sendo válidas somente quando em conformidade com a Lei Natural.
Notemos que
É preciso, contudo,
Santo Tomás de Aquino afirma que para que qualquer ato seja
virtuoso, é necessário que seja voluntário, estável e firme. Assim
sendo, embora a moral possa exigir medidas discricionárias em
situações de caos iminente, a arbitrariedade não pode ser o
fundamento da civilização. Esta só se define como tal na
indissociabilidade entre ordem, justiça e liberdade, e o mesmo vale
para os meios permanentes de zelar por sua integridade física, que
devem ser livre-concorrenciais.
Decorre desta lei que, num livre mercado, haverá a tendência de que
os recursos escassos sejam alocados de forma a melhor satisfazer as
finalidades mais urgentes da sociedade, embora isso dependa das
virtudes dos agentes econômicos em discernir desejo de utilidade e
meios adequados de meios inadequados. Não há, como propôs Adam
Smith, uma mão invisível que regula o mercado, mas sim um
mecanismo de lucros e prejuízos que incentiva o indivíduo à
prudência, definida por Santo Tomás de Aquino como a razão reta no
agir.
O Estado faz pior que gerar e proteger monopólios. Ele gera escassez
artificial, como é o caso da chamada propriedade intelectual, que na
verdade é monopólio intelectual. Mentir sobre a autoria de um livro
ou invenção de fato configura fraude, por isso é justo exigir créditos,
mas não royalties, afinal o artista ou inventor não pode reivindicar
direitos de propriedade sobre técnicas e conceitos ou sobre o material
alheio usado na reprodução de uma obra.
PATERNALISMO X CARIDADE
São Bento de Núrsia, pai do monasticismo ocidental, desenvolveu
uma regra de vida para os monges pautada pelo equilíbrio,
regularidade e adequada atribuição da função de cada coisa,
contribuindo para a íntima aliança entre fé e razão que caracterizou o
pensamento medieval, da filosofia de Santo Anselmo da Cantuária às
inovações dos mosteiros cistercienses no campo da hidráulica. O
resultado foi o primeiro grande irrompimento industrial da história.
Não uso o termo revolução industrial pois ela é sempre resultante do
acúmulo de capital e conhecimento ao longo das eras.
Isto vale para tradições, bons valores e laços sociais, que são
substituídos pela total dependência de instituições governamentais
cada vez mais centralizadoras e anti-subsidiárias, que são financiadas
pela inflação. Esta, por sua vez, é a causa econômica do que Zygmunt
Bauman chamou de modernidade líquida, uma sociedade onde a
angústia e a ansiedade levam as pessoas a viverem a esmo sem raízes.
E a causa da inflação é o Estado, que uma vez existindo vai
necessariamente se intrometer com o dinheiro.
APLICAÇÕES SETORIAIS DO
ANARCOCAPITALISMO
O primeiro é a
unidade tecnológica,
definida por Rothbard como a quantidade mínima de um recurso que
viabilize sua utilização, incluindo a inviolabilidade dos recursos
acessórios necessários para tanto. Uma empresa de radiodifusão, por
exemplo, ao apropriar-se de uma faixa do espectro eletromagnético
em um dado território, requererá a inviolabilidade das faixas de
frequência adjacentes para que não haja interferência. A aplicação
deste conceito ao espaço aéreo fornecerá parâmetros ao mercado
sobre a quantidade de espaço que os aviões requerem para operar sem
que imponham ou sofram riscos ou perturbações inaceitáveis.
O segundo é o conceito de
ordem espontânea,
cunhado pelo polímata Michael Polanyi, para o qual, uma vez que nos
atenhamos a princípios absolutos como justiça e verdade, um livre
mercado permitirá a coordenação do conhecimento tácito (informal)
disperso entre seus participantes no sentido de produzir um grau de
ordem superior a qualquer arranjo central.
URBANISMO
Até mesmo alguns ferrenhos opositores do estatismo no nível das
nações defendem monopólios governamentais na administração das
cidades. A necessidade de planejamento urbano estatal é uma falácia
que se torna mais arraigada quanto mais perdemos de vista a origem
espontânea das cidades na história.
MEIO-AMBIENTE
Toda objeção ambiental a uma filosofia política deve ter os seres
humanos como único objeto de consideração moral, tal como nos
ensina Santo Tomás de Aquino, afinal animais e plantas não possuem
alma imortal capaz de contemplar o Criador. Além disso, pode-se
constatar racionalmente que a natureza humana, sendo comum a todos
os indivíduos, possibilita a harmonia dentro da espécie humana.
Porém se, por esta mesma natureza, dependemos da exploração de
outras espécies, esta harmonia será comprometida por qualquer
restrição que se imponha contra o direito de qualquer ser humano
explorar a natureza como melhor lhe convier desde que não agrida
seus semelhantes.
Suponha que haja, em uma galáxia tão distante que até mesmo a luz
emitida por ela seja inalcançável, um planeta com as mais belas
paisagens povoadas por um colorido caleidoscópio de flores e por
uma fauna de exuberância idílica. Eis que ele é atingido por raios
gama de uma supernova e se torna um deserto inóspito. Se as belezas
do planeta jamais poderiam ser contempladas pela mente racional, que
diferença faz sua destruição? Não seria o mais ínfimo incremento de
bem-estar de um humano moribundo mais valioso que todas as
florestas e arrecifes daquele longínquo corpo celeste?
O bem-estar humano é o fundamento de
toda consideração ambiental legítima.
A poluição pode nos afetar diretamente, seja ela química ou física
(sonora, luminosa). Entretanto, nas faculdades de economia, não se
ensina que a agressão de poluidores contra indivíduos inocentes é
errada, e sim que o direito do poluidor dependerá de quanto ele agrega
ao Produto Interno Bruto. Os economistas estatistas criam modelos
totalmente infundados para justificar que poluidores ricos e poderosos
possam violar impunemente a saúde e a propriedade privada do pobre.
O monopólio estatal dos serviços de justiça agrava o problema, pois
viabiliza economicamente o lobby das grandes corporações junto a
órgãos regulatórios enquanto as protege contra processos por
particulares.
no anarcocapitalismo, os
empreendedores se veriam obrigados a
cooperar na preservação da oferta dos
recursos ao invés de se digladiarem
judicialmente pelo direito de extrair o
máximo possível.
A privatização dos recursos naturais é a única forma de preservar
espécies ameaçadas e toda a “biblioteca genética” da qual a
humanidade pode dispor para a cura de doenças e novos produtos em
geral. Galinhas são mortas aos bilhões mensalmente, mas não correm
risco de extinção pois são propriedade privada das granjas, cujos
donos tratam de fazê-las procriar. Elefantes e rinocerontes, por outro
lado, correm risco devido à proibição de sua exploração econômica
privada. O marfim de suas presas continua tendo valor, mas o
incentivo para preservá-los é tolhido por leis que impedem a criação
de reservas privadas de caça.
SAÚDE
Não deveria haver uma sessão sobre saúde neste livro pelo mesmo
motivo pelo qual não deveria haver uma sobre rodinhos de tirar água
da pia. Serviços de saúde não são um direito mas uma mercadoria
como outra qualquer exceto pelo fato de que sua regulação confere
poderes brutais aos regimes totalitários. O direito legítimo à saúde é
um direito negativo, ou seja, o de não tê-la subtraída mediante
agressão. O suposto direito positivo à saúde (o de obrigar alguém a
fornecê-la) o contradiz, já que implica em ameaçar a integridade física
de pagadores de impostos.
EDUCAÇÃO
Dizia Bastiat que todos os monopólios são detestáveis, mas o da
educação é disparadamente o pior. Do libertário de esquerda Thomas
Hodgskin, que constatou que ser educado pelo Estado é pior que não
receber educação, ao conservador Olavo de Carvalho, que se dizia um
anarquista educacional, praticamente todos os intelectuais com algum
grau de honradez se opuseram ao controle estatal da educação. Neste
quesito, argumentos econômicos como gastos exorbitantes, aumento
de impostos e ineficiência gerencial, embora corretos, são
secundários.
Tudo fica mais fácil, porém, se você fortalecer o tecido social ao seu
redor. Seja temperante e evite o hedonismo (vida pautada pela busca
de prazer). “Vós, irmãos, fostes chamados à liberdade. Não abuseis,
porém, da liberdade como pretexto para prazeres carnais. Pelo
contrário, fazei-vos servos uns dos outros pela caridade”, lemos em
Gálatas 5, 13.
Adquira ainda técnicas que permitam que você ganhe e conserve seu
dinheiro com o máximo de autonomia e privacidade possível. O
libertário de esquerda Samuel Konkin III discorre sobre os conceitos
de contra-economia e agorismo. O primeiro refere-se à prática de
atividades pacíficas proibidas pelo Estado com intuito subversivo e o
segundo à defesa política de uma sociedade baseada em trocas
voluntárias, a ser implementada mediante técnicas de contra-
economia. Apesar dos erros crassos do agorismo konkiniano, como
incentivar atividades imorais e considerar os atuais traficantes como
potenciais libertadores, algumas técnicas agoristas podem ser
extremamente valiosas à causa da contra-revolução anarcocapitalista.
Um exemplo são as criptomoedas, cuja natureza técnica propicia a
preservação dos valores contra a sanha confiscatória estatal. Contudo,
não caia na armadilha da salvação pela tecnologia, pois ela também
pode ser usada para o mal, como no caso do transumanismo
(movimento que prega a modificação do corpo humano). Exemplos
adicionais de agorismo legítimo incluem a redução do consumo, a
priorização de empresas locais e a reserva pessoal de metais preciosos
como o ouro, reduzindo assim o imenso poder financeiro e cultural
dos bancos e corporações lobistas e fortalecendo a poupança
individual, familiar e local.
Se o poder político cair nas suas mãos por qualquer motivo, faça
como Santa Isabel de Aragão, rainha de Portugal, que encarou seu
coroamento como um meio dado por Deus para realizar boas obras.
Em O que deve ser feito, Hoppe recomenda especialmente a
ocupação de espaços na política local,
como um município, de forma a viabilizar
um corpo político intermediário
concretamente anarcocapitalista.
Ao mesmo tempo, o autor recomenda o boicote social e a remoção
física de elementos revolucionários negando a eles o acesso às
comunidades assim restauradas.
Faça a sua parte, por menor que seja, mas com virtude heróica. Seja
quem Deus quer que você seja, dizia Santa Catarina de Siena, e
incendiará o mundo.
As leis humanas justas, por si só, não tornam o homem justo, mas as
injustas podem levar até mesmo as pessoas de reta intenção, como nos
lembra o ensaísta Henry David Thoreau, a se tornarem agentes da
injustiça. A falha em praticar a desobediência civil pode,
frequentemente, configurar uma cooperação ilícita com o mal.
a. Imediata: quando a cooperação é com o ato imoral em si, não podendo se dar de forma
indiferente. É sempre ilícita. Exemplo: um instrumentador de uma clínica de homicídio
intrauterino (aborto), mesmo que ele seja contra este sacrifício de bebês às forças do
inferno.
b. Mediata: quando a cooperação cria condições que propiciam o ato, podendo ser:
ii. Remota: quando a conexão material-temporal com o ato é tênue. Será lícita quando todas
as condições abaixo forem cumpridas:
2. Há retidão de intenção.
3. A finalidade boa não é pretendida pelo cooperador como consequência do mal decorrente
da ação imoral com a qual ele coopera (pois seria uma forma de utilitarismo).
4. O mal que o cooperador deseja evitar é suficientemente grave para justificar sua
cooperação com uma ação imoral.
O patriota deve lutar para libertar seu povo das amarras do Estado. O
desmantelamento da estrutura burocrática estatal deve acontecer
mediante uma transição ordeira para a iniciativa privada. A
previdência social, por exemplo, é um grande esquema ponzi
(investimento fraudulento no qual o retorno dos entrantes antigos
advém da entrada de novos e não de produtividade real) que
desencoraja a poupança e o fortalecimento das famílias. Uma forma
de liquidá-lo com a devida contenção de danos é abrir o capital dos
ativos estatais leiloando-os aos investidores privados dispostos a
assumi-los. A receita levantada seria então distribuída pro rata aos
aposentados e pessoas em vias de se aposentar (com prioridade para
os mais velhos) trazendo-se a previsão de fluxo de pagamentos a valor
presente e levando-se em conta a perspectiva deflacionária decorrente
de uma concomitante desestatização da moeda, o que economizaria
recursos já que a deflação é a melhor forma de aposentadoria.
Por fim, lembre-se que a luta é árdua e que a vitória prometida não
pertence a este mundo. Não deposite esperanças em líderes terrenos
nem em sistemas políticos ou econômicos. Lemos em Salmos 145, 3:
“Não coloqueis nos poderosos a vossa confiança, são apenas homens
nos quais não há salvação”. Combata o bom combate e guarde a fé em
Deus até o fim da corrida. Como escreve meu tio-bisavô, o professor e
poeta Álvaro de Magalhães:
Imita no combate o ímpeto do mar. Porfia, solitário. E sobrepõe na
vida, à glória de vencer, a honra de lutar.
NOTAS DE RODAPÉ
1 Ao longo do livro, usarei “Estado” com letra maiúscula para me referir à governança
monopolista, aquela que não reconhece autoridade que a preceda, e portanto, por definição,
corrompida.