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Num futuro distópico, a população vive numa sociedade onde as pessoas se avaliam

umas às outras com até cinco estrelas numa aplicação denominada “Happy Life”,
influenciando a população na sua maneira de ser e viver, impossibilitando coisas
simples como entrar num centro comercial ou poder andar em transportes públicos.

Santiago é um rapaz de 24 anos que vive obcecado com o que as pessoas acham de si e
tem atualmente um índice de pontuação de aproximadamente 4.2. Ele mora com o seu
irmão mais novo na periferia de uma cidade no Centro, numa casa antiga e com poucas
condições que pertencia aos seus pais que pereceram num acidente de automóvel à 5
anos atrás. Ângelo, o seu irmão, vive despreocupado com o que os demais pensam de si
e possui uma pontuação muito inferior à de Santi.
Santiago ambiciona mudar-se para uma casa luxuosa e viver uma vida tranquila na
capital, coisa que conseguiria facilmente se possuísse uma pontuação acima de 4.5,
dado que a partir daí recebe um desconto considerável, mas os seus esforços constantes
para subir no índice têm falhado e, segundo os seus cálculos. só atingiria a pontuação
necessária daqui a 18 meses.
Numa quarta-feira de outono, Santi acorda sobressaltado depois de ter tido um
pesadelo com os seus pais. No fim de se vestir, vai tomar o pequeno-almoço e beber o
seu habitual chá de menta. Quando termina vê um recado em cima da bancada:

“Visto que estás de férias esta semana, vai ao supermercado comprar aqueles
cereais que o teu maninho adora e o resto das coisas que estão nessa lista ao teu lado,
porque quando acordei a minha pontuação tinha diminuído, pois, ontem, avaliei a Laura
com 5 estrelas, é que os pais dela divorciaram-se e então metade dos “amigos” dela
avaliaram-na com 1 ou 2 estrelas e ela não tinha as 3 estrelas necessárias para andar de
autocarro, por isso, depois da escola não me vão deixar entrar no supermercado. Odeio
este mundo em que vivemos!”

Santiago vai à loja muito aborrecido, mas quando passa alguém por ele finge que
aquele é o dia mais feliz da vida dele, na esperança de que a sua pontuação suba.
Quando regressa a casa vai ao computador e vê um e-mail de Sara, a sua melhor amiga
de infância de pontuação 4.8 a convidá-lo para o casamento. Santi vê uma oportunidade
de subir a sua pontuação e responde-lhe a agradecer e a confirmar a sua presença, já a
pensar num discurso emotivo e hipócrita que lhe permita subir a pontuação.
Tinha chegado o dia do casamento e no dia anterior o rapaz já tinha ligado ao corretor
do apartamento em Lisboa a reservar o imóvel, apesar de ainda não ter a pontuação
necessária para o desconto de 35%.
Depois de beber o seu chá de menta enquanto avalia as pessoas na “Happy Life”, Santi
faz as malas e parte para o casamento no Porto, despedindo-se de Ângelo que o avisara
de que não era boa ideia já ter reservado o apartamento sem ter garantias de que iria sair
da Festa com uma pontuação superior ou igual a 4.5.
Quando chegou à estação de comboios, a rececionista disse-lhe que o comboio tinha
tido problemas e que a viagem fora cancelada, Santi ficou aborrecido mas acabou por se
resignar e perguntou-lhe se não havia mais nenhuma vaga para hoje, ao que a
rececionista lhe respondeu que era necessário uma pontuação de 4.2; muito exaltado por
ir faltar ao casamento por uma pequena percentagem, o rapaz agora furioso começou a
usar uma linguagem imprópria na estação até que chamaram a segurança e o
expulsaram.
Depois disto, ele vai a um café perto da estação lanchar e percebe que tem 2.8 estrelas.
Ao vê-lo assim, uma senhora de cabelos brancos e possuidora de uma pontuação de 1.8
aproxima-se de Santi, senta-se à sua frente e conta-lhe a sua história: a história de uma
pessoa que tal como Santi se importava com as pontuações e que tivera uma pontuação
de 4.9 anteriormente, coisa que mudou quando a sua irmã faleceu devido a um cancro,
mas isso só aconteceu pois o hospital só tinha uma cama, reservada para pessoas com
4,5 ou mais estrelas. No fim de trocarem ideias a velhinha ofereceu boleia a Santi, e
assim foram os dois na sua caravana velha e enferrujada partindo para o Norte.
Recém-chegado ao seu destino, Santi vai apressado, visto que já vai atrasado e recebe
uma chamada de Sara a dizer-lhe que escusava de ir ao casamento, dado que só entram
pessoas com pontuação superior a 3.5. Já muito irritado, aluga uma mota antiga, uma
vez que não tem condições para melhor do que aquilo e segue para o casamento.
Seguidamente passa a segurança, onde encontra uma arma, invade o casamento e
ameaça os convidados com a pistola que encontrara; em seguida, critica a sociedade em
que vive e insulta os noivos, rapidamente os guardas chegam e levam-na para a prisão.
No final, Santiago o antigo 4.2 popular do bairro encontra-se sem a “honra” de avaliar
e ser avaliado, pois os detidos não têm acesso à aplicação; abandonado num cubículo,
Santiago sente-se mais livre do que em toda a sua vida, não obstante ao facto de estar
preso, está livre do inferno que era a sua vida antigamente.

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