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Caracterização de Materiais 209

6.3. Microscopia óptica


O microscópio óptico continua a ser uma das ferramentas mais importantes no estudo da
microestrutura, apesar da evolução de microscópios de electrões sofisticados, microscópio
electrónico de varrimento (SEM) e de transmissão (TEM). No entanto, estes dois últimos
métodos de observação devem ser utilizados em conjunto com o microscópio óptico, em
vez de o substituírem.
O microscópio óptico é formado por dois sistemas ópticos distintos e separados - a
objectiva e a ocular - cujo propósito primário, quando apropriadamente utilizados em
conjunto, é revelar detalhes de um objecto que são demasiado pequenos para serem
observados a “olho nu” ou com o auxilio de uma lupa. A relevância e clareza com que
estes detalhes são observados depende, em larga escala, das correcções aberracionais e
outros defeitos ópticos para os quais a objectiva e a ocular devem estar corrigidas.

6.3.1. Princípio do microscópio


Um microscópio óptico é, como o próprio nome indica, um instrumento óptico que utiliza
luz visível para produzir uma imagem ampliada de um objecto (ou amostra) que é
projectada na retina do olho ou num sistema de imagem.
Um microscópio metalográfico, quando comparado com um microscópio utilizado para
estudos biológicos, difere na forma como a amostra é iluminada, devido à impossibilidade
da radiação visível se propagar através de uma amostra metalográfica, por mais fina que
esta possa ser. Os microscópios podem ainda ser de platina invertida (figura 6.7).

Figura 6.7 - Esquerda: microscópio de platina invertida. Direita: microscópio de luz


reflectida/transmitida
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Figura 6.8 - Configuração de um microscópio de luz transmitida/reflectida.

Como ilustrado na figura 6.8, um feixe de luz horizontal, proveniente de uma fonte de luz
adequada, é divergido através de um vidro reflector plano através da objectiva do
microscópio, para incidir sobre a superfície da amostra. É, então, reflectida uma certa
quantidade de luz pela amostra, esta luz reflectida passa outra vez através da objectiva e
vai formar, uma imagem aumentada da área iluminada, chamada “imagem real primária”.
Esta imagem é reproduzida na ocular - pois a imagem intermédia está localizada no ponto
focal da ocular - que funciona como uma lupa, fornecendo uma imagem mais ampliada,
mas virtual, que é vista pelo olho humano.
A dimensão da imagem primária depende da distância relativa à qual se encontram o
objecto e a imagem da objectiva; e a distância exacta à qual se encontra a imagem depende
da distância focal da objectiva e da distância entre o plano da amostra e o ponto focal da
frente da objectiva.
A refracção dos raios luminosos quando passam de um material opticamente denso para
um material menos denso a partir de um ângulo crítico, !c, os raios luminosos passam a ser
difractados (figura 6.9).
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Figura 6.9 - Esquema de difracção/reflexão da luz, "’>".

6.3.2. Refracção dos raios luminosos nas lentes


Para se compreender a óptica dos microscópios é necessário descrever algumas
propriedades básicas das lentes finas e simples. Uma lente fina tem uma espessura que é
essencialmente negligenciável, e simples significa que se tem um única lente com duas
superfícies de refracção. O plano principal e o plano focal de uma lente estão definidos
como sendo os planos dentro da lente e na imagem focada, respectivamente, onde os raios
ou extensões dos raios se intersectam e reúnem fisicamente. Assim para uma lente simples
positiva que recebe um feixe de luz colimado, o plano na lente em que as extensões dos
raios incidentes e emergentes se interceptam é chamado o plano principal e o plano em que
os raios se interceptam para formar a imagem é o plano focal.
O termo lente é o nome comum dado a um componente de vidro ou plástico transparente,
normalmente de diâmetro circular, que tem duas superfícies primárias que são polidas de
uma forma específica para produzirem convergência ou divergência da luz que passa
através do material.
Existem dois tipos diferentes de lentes:
a. lentes convergentes ou positivas - que são mais grossas no centro e que concentram
os raios luminosos;
b. lentes divergentes ou negativas - que são mais finas no centro e divergem os raios
luminosos.
Se um feixe de luz paralelo ao eixo óptico passar através de um sistema de lentes
convergentes, ele é concentrado para um ponto único (como nas objectivas), com as lentes
divergentes o raio diverge como se fosse originado num ponto único (figura 6.10). Em
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ambos os casos, este ponto é conhecido como foco e a distância entre este ponto e a lente é
a distância focal.

Figura 6.10 - Efeito das lentes positivas e negativas.

A distância focal diminui com o aumento da curvatura da superfície das lentes (figura
6.11).

Figura 6.11 - Efeito da curvatura das lentes na distância focal.

Se duas lentes de diferentes tipos forem combinadas, o sistema resultante pode ser
convergente ou divergente, dependendo do poder das lentes utilizadas. Quando, partir de
um ponto, um raio viaja paralelo ao eixo óptico, então é refractado em direcção ao foco. Se
um segundo raio viajar a partir do mesmo ponto e passar através do centro da lente, não vai
ser reflectido e vai intersectar o primeiro raio no local onde a imagem se forma.
Um microscópio ou uma lupa produz uma imagem do objecto em que o microscópio ou a
lupa se encontram focados. Uma lente simples bi-convexa, como ilustrada na figura 6.12,
permite que a imagem seja obtida no olho humano, como se se encontrasse a uma distância
de cera de 25 cm (distância de referência ou tradicional ou convencional).
De modo a compreender o funcionamento das lentes do microscópio, devem rever-se
alguns princípios básicos da formação da imagem através de uma lente.
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Figura 6.12 - Obtenção de uma imagem através de uma lupa.

Lentes convergentes
Dependendo da localização do objecto em relação ao foco da lente, a imagem pode ser real
ou virtual, e ou ampliada ou reduzida. Algumas das condições principais que descrevem
relações entre objecto-imagem encontram-se a seguir descritas, sendo a a distância entre a
lente e o objecto e f a distância focal.

a. Imagem real e reduzida (ex. fotocópia) a > 2f


Quando o objecto se encontra entre o infinito e duas vez a distância focal, a imagem
formada é real, invertida e reduzida. Quanto mais próximo do infinito, mais reduzida será a
imagem (figura 6.13).

Figura 6.13 - Objecto colocado a uma distância superior a 2F.


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b. Imagem real do mesmo tamanho do objecto a = 2f


O objecto encontra-se a duas vezes a distância focal, neste caso a imagem obtida será real,
invertida e de igual tamanho ao objecto original (figura 6.14).

Figura 6.14 - Objecto colocado a uma distância igual a 2F.

c. Imagem real e ampliada (ex. fotomicrografia) 2f > a > f


Se o objecto se encontrar entre o foco e duas vezes a distância focal, a imagem real obtida
é invertida e ampliada. Será tanto mais ampliada quanto mais próximo do foco se encontrar
o objecto (figura 6.15). Este é o sistema para a produção da primeira imagem real no
microscópio.

Figura 6.15 - Objecto colocado entre F e 2F.

Até este ponto todas as imagens formadas são reais, ou seja, sempre que a > f as imagens
formadas são reais.
d. Objecto colocado no foco a = f
No caso limite do objecto se encontrar sobre o foco, vamos ter uma imagem reproduzida
no infinito (figura 6.16), desta forma nenhuma imagem pode ser projectada num écran.
Esta condição pode ser utilizada para a determinação da distância focal de uma lente, se
pensada ao contrário: feixes de luz paralelos provenientes de uma “distância infinita” do
objecto convergem na distância focal da lente. Este é o caso da formação de imagem num
telescópio.
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Figura 6.16 - Objecto colocado sobre F.

e. Imagem virtual e ampliada (ex. lupa) a < f


Quando o objecto se encontra entre o foco e a lente, não é obtida uma imagem real, mas
uma imagem virtual, isto é, uma imagem que não pode ser capturada num écran, não
podendo ser fotografada. Neste caso, a imagem forma-se do mesmo lado do objecto. A
imagem será tanto maior quanto mais próximo do foco estiver o objecto. A lente é
ampliadora e os raios luminosos convergem para formar uma imagem real na retina (figura
6.17).

Figura 6.17 - Objecto colocado entre F e a lente.

Para a formação da imagem final no microscópio são utilizadas várias destas relações. No
caso da objectiva focada na amostra, a imagem obtida é real e ampliada, o que significa
que o objecto se encontra colocado a uma distância entre f e 2f, e claro quanto mais perto
do foco estiver o objecto maior será a ampliação. A função da ocular é de ampliar a
imagem primária formada pela objectiva e em conjunto com o sistema de lentes do olho,
produzir uma imagem intermédia real e ampliada na retina. Assim, o objecto da ocular
encontra-se a a < f, resultando numa imagem virtual e ampliada que não pode ser focada
num ecran ou capturada com uma câmara.
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No entanto, quando se coloca o olho atrás da ocular para examinar a imagem, o sistema
ocular-olho produz uma imagem secundária na retina, que o cérebro interpreta como uma
imagem virtual colocada a cerca de 25 cm do olho. A percepção visual de uma imagem
virtual é comum nos sistemas ópticos. Por exemplo, “vêm-se” imagens virtuais quando se
utilizam lupas ou quando nos olhamos no espelho.
Se se percorrer o percurso da imagem mais exaustivamente, a primeira lente do
microscópio é a que se encontra mais próximo do objecto a ser examinado, e por esta razão
chamada, objectiva. A luz proveniente de uma fonte (interna ou externa) passa através de
um condensador, que forma um cone de luz bem definido que é concentrado no objecto
(amostra). A luz passa através da amostra ou é reflectida na amostra e entra na objectiva,
que projecta uma imagem da amostra real, invertida e ampliada num plano fixo no interior
do microscópio chamado plano intermédio de imagem (figura 6.18). Este plano
normalmente está colocado cerca de 10 mm abaixo do corpo do microscópio, numa
localização específica no diafragma interno fixo da ocular. A distância entre o plano focal
da objectiva e o plano da imagem intermédia é chamada a distância óptica do tubo.

Figura 6.18 - Esquema da obtenção da imagem através de um microscópio.


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A ocular que se encontra na parte superior do tubo, é o componente óptico mais afastado
da amostra. O posicionamento da ocular é tal que amplia a imagem real projectada pela
objectiva. O observador vê esta imagem secundariamente ampliada como se esta se
encontrasse a 25 cm do olho, sendo que esta imagem aparece como se encontrasse na base
do microscópio. A distância do topo do tubo de observação ao limite da objectiva é de
cerca de 160 mm num sistema com tubo de comprimento finito. Esta distância é conhecida
como o comprimento mecânico do tubo.

Lentes divergentes
a. imagem virtual e reduzida
Um objecto colocado na frente da lente é reproduzido como uma imagem virtual, reduzida
e não invertida (figura 6.18).

Fig. 6.18 - Objecto colocado entre F e 2F.

6.3.3. Abertura ou velocidade das lentes


A velocidade das lentes é indicada pelo valor f, que é dado pela razão entre a distância
focal (F) e o diâmetro máximo de um feixe paralelo que pode passar através da lente (#)
F
f$ eq. 6.1
#

Normalmente, a máquina ou microscópio tem uma diafragma de abertura de forma a


controlar o diâmetro do feixe de luz que passa através do qual se pode modificar o valor da
abertura. Alguns valores típicos de abertura são: 1.4; 2; 2.8; 4; 5.6; 8; 11; 16; 22.
De notar que quanto menor for o valor numérico da abertura, maior será a quantidade de
luz que pode passar e maior será a resolução da lente.
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6.3.4. Defeitos ópticos nas lentes (aberrações)


As lentes simples têm superfícies esféricas, que estão associadas a muitos defeitos ópticos
intrínsecos, chamados aberrações, que distorcem a imagem de várias formas. De modo a
minimizar estes defeitos, utilizam-se combinações de vidros com diferentes propriedades
ópticas e lentes convergentes e divergentes, tendo raios de curvatura, espessuras e
diferentes distâncias entre elas. Mesmo assim é impossível eliminar completamente os
defeitos das imagens.
Dos três sistemas ópticos essenciais do microscópio: objectiva, ocular e sistema de
iluminação, a objectiva é provavelmente a parte óptica mais crítica quanto à qualidade da
imagem observada.
As objectivas de um microscópio podem ser divididas em quatro grupos gerais,
acromáticas, semi-apocromática (fluorite), apocromática e macroacromáticas (especiais
para utilização com luz ultra-violeta). Os três primeiros grupos distinguem-se pelo desenho
da objectiva, e pelo grau de erros ópticos e outros defeitos aberracionais para que foram
corrigidas as objectivas.
Alguns dos erros mais comuns, são de seguida apresentados. Os diferentes defeitos podem
ser classificados como monocromáticos, que não podem ser prevenidos, mesmo quando é
utilizada luz monocromática, e cromática, que é encontrada quando se utiliza luz branca,
ou qualquer luz com diferentes comprimentos de onda. Das três maiores classes de erros na
lente, duas estão associadas com a orientação das ondas e planos focais em relação ao eixo
do microscópio. Estes incluem erros no eixo como a aberração cromática e esférica, e os
erros fora do eixo como o coma, o astigmatismo e a curvatura de campo.
Uma objectiva ideal produz uma imagem simétrica limitada pela difracção de um padrão
de um ponto num objecto infinitamente pequeno. O plano de imagem é geralmente
localizado a uma distância fixa da objectiva num meio com um determinado índice de
refracção. As objectivas oferecidas pelo mercado têm graus de aberração e outras
imperfeições extremamente baixos, desde de que seja escolhida a objectiva correcta para a
função e que seja utilizada de acordo com as recomendações do fabricante. Deve ser
enfatizado que as objectivas não são feitas para ser perfeitas, mas são desenhadas para
terem determinadas especificações dependendo da sua utilização, dimensões e custo.

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