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Apostila

CÁLCULO DIFERENCIAL E INTEGRAL I

Fernanda Pereira

INSTITUTO DE TECNOLÓGICO DE AERONÁUTICA

Departamento de Matemática
Sumário

1 Background e notações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

2 Limite e continuidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
2.1 Os conceitos de limite e continuidade 3
2.2 Propriedades básicas sobre limites 6
2.3 Limites laterais e infinitos 11
2.4 Limite da função composta 18
2.5 Primeiro limite fundamental 22
2.6 O número de Euler 22
2.7 Teoremas importantes sobre funções contínuas 25
2.8 Funções exponenciais e logarítmicas 26

3 Derivada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
3.1 Reta tangente e o conceito de derivada 29
3.2 Taxas de variação e outras notações para derivada 33
3.3 Propriedades básicas sobre derivadas 35
3.4 Derivadas de ordem superior 38
3.5 Derivada da função inversa 38
3.6 Noção de diferenciabilidade 40
3.7 Regra da Cadeia 42
3.8 Derivação implícita 45
3.9 Taxas relacionadas 46

4 Aplicações de derivadas no estudo de funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49


4.1 Máximos e mínimos de funções 49
4.2 O Teorema do Valor Médio 51
4.3 Intervalos de crescimento e decrescimento 54
4.4 Concavidade e pontos de inflexão 56
4.5 Retas Assíntotas 60
4.6 Esboço de gráficos 63
4.7 Problemas de otimização 66
4.8 Regras de L’Hospital 70
4.9 Fórmula de Taylor com resto de Lagrange 76

5 Integral de Riemann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
5.1 Cálculo de áreas e o conceito de integral de Riemann 81
5.2 Propriedades básicas e funções integráveis 84
5.3 Primitivas e o Teorema Fundamental do Cálculo 87
5.4 Técnica da substituição 91
5.5 Integração por partes 93
5.6 Integrais de produtos de funções trigonométricas 95
5.7 Mudança de variável na integral 101
5.8 Técnica das frações parciais 106
5.9 Função dada por integral e 2º Teorema Fundamental do Cálculo 114
5.10 Curiosidade: primitivas não elementares 115

6 Integral imprópria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117


6.1 Integral imprópria de primeira espécie 117
6.2 Integral imprópria de segunda espécie 124

Referências bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129

Indíce remissivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131


Capítulo 1

Background e notações

Ao longo do texto, denotaremos por N = {1, 2, 3, . . .} o conjunto na dos números o naturais, Z =


{. . . , −2, −1, 0, 1, 2, 3, . . .} o conjunto dos números inteiros, Q = : a, b ∈ Z, b ̸= 0 o conjunto dos
b
números racionais e R o conjuntos dos números reais.
Dados a, b ∈ R, a < b, os intervalos que serão considerados no texto são os seguintes.

• Intervalo fechado:
[a, b] = {x ∈ R : a ≤ x ≤ b}.

• Intervalos semiabertos:

[a, b) = {x ∈ R : a ≤ x < b};


(a, b] = {x ∈ R : a < x ≤ b};
[a, +∞) = {x ∈ R : x ≥ a};
(−∞, a] = {x ∈ R : x ≤ a}.

• Intervalos abertos:

(a, b) = {x ∈ R : a < x < b};


(a, +∞) = {x ∈ R : x ≥ a};
(−∞, a) = {x ∈ R : x ≤ a};
(−∞, ∞) = R.

Neste texto, serão consideradas apenas funções reais cujos domínios são intervalos da reta real ou
uma união finita de tais intervalos, salvo menção contrária.
Dada uma função f : X ⊆ R → R, denotaremos D f = X o domínio de f , Im f = { f (x) : x ∈ X} a
imagem de f e G f = {(x, y) ∈ X × R : y = f (x)} o gráfico de f .
Quando for dada a definição de uma função sem explicitar o seu domínio, consideraremos que o
domínio é o maior subconjunto de R no qual a função fica bem definida.
Relembraremos aqui apenas mais dois conceitos sobre funções que serão usados no texto.
Uma função f : X ⊆ R → R é limitada se existem k1 , k2 ∈ R tais que k1 ≤ f (x) ≤ k2 para todo
x ∈ X, ou equivalentemente, se existe um número real k > 0, tal que | f (x)| ≤ k para todo x ∈ X.
Uma função f : X ⊆ R → R é monótona se ela satisfaz alguma das quatro condições a seguir.
2 Capítulo 1. Background e notações

• f é crescente:
para todos x, y ∈ X com x < y, tem-se f (x) ≤ f (y).

• f é estritamente crescente:

para todos x, y ∈ X com x < y, tem-se f (x) < f (y).

• f é decrescente:
para todos x, y ∈ X com x < y, tem-se f (x) ≥ f (y).

• f é estritamente decrescente:

para todos x, y ∈ X com x < y, tem-se f (x) > f (y).

Não entraremos em mais detalhes sobre funções por se tratar de um assunto do ensino médio. Para
este curso, é importante saber bem os conceitos de função injetora, sobrejetora, bijetora, inversível;
operações como soma, diferença, produto, quociente e composta de funções; e também conhecer os
gráficos das funções elementares: funções polinomiais mais simples (funções afins, quadráticas e
f (x) = x3 ), funções trigonométricas e trigonométricas inversas, funções exponenciais e logarítmicas.
Para revisão desses conceitos, recomendamos o estudo do Capítulo 2 de [Gui].
Capítulo 2

Limite e continuidade

O desenvolvimento teórico de grande parte do Cálculo foi feito utilizando a noção de limite. Por
exemplo, as definições de derivada e de integral de Riemann são estabelecidas através desse conceito.
Neste capítulo, estudaremos o conceitos de limite de função, assim como técnicas para seu cálculo
e a formalização de alguns outros conceitos envolvendo continuidade.

2.1 Os conceitos de limite e continuidade

Sejam f uma função e p um ponto do domínio de f ou uma extremidade de um dos intervalos que
compõem D f (neste caso o ponto p pode não estar no domínio de f ).
Informalmente, o limite de f (x) quando x tende a p, se existir, é um número real L tal que, quando
x está muito próximo de p, mas não necessariamente é igual a p, então f (x) está muito próximo de L.
Nesse caso, denota-se

lim f (x) = L.
x→p

O que usamos para medir a distância entre dois números reais é a métrica do módulo: a distância
d(x, y) entre x e y é dada por

d(x, y) = |x − y|.

Considere as seguintes possibilidades para o gráfico de f .


4 Capítulo 2. Limite e continuidade

Em cada um dos casos na figura anterior, você consegue dizer se existe e quem seria lim f (x)?
x→p

■ Exemplo 2.1.1 Considere f (x) = 12 (x + 1). Vejamos analiticamente como ter um palpite para
lim f (x). Analisemos como é a variação de f (x) quando x se aproxima de 2, sem ser igual ao próprio 2.
x→2

f (1, 9) = 1, 45; f (2, 1) = 1, 55;


f (1, 99) = 1, 495; f (2, 01) = 1, 505;
f (1, 999) = 1, 4995; f (2, 001) = 1, 5005;
f (1, 9999) = 1, 49995; f (2, 0001) = 1, 50005.

Também, sabendo que a função f é estritamente crescente, podemos deduzir que

se 1, 9 < x < 2, 1 então 1, 45 < f (x) < 1, 55;


se 1, 99 < x < 2, 01 então 1, 495 < f (x) < 1, 505;
se 1, 999 < x < 2, 001 então 1, 4995 < f (x) < 1, 5005;
se 1, 9999 < x < 2, 0001 então 1, 49995 < f (x) < 1, 50005.

Observe que as afirmações anteriores todas se enquadram na seguinte:

se 2−δ < x < 2+δ então 1, 5 − ε < f (x) < 1, 5 + ε,

com δ = 0, 1; 0, 01; 0, 001; 0, 0001; e ε = 0, 05; 0, 005; 0, 0005; 0, 00005; respectivamente. Ou equi-
valentemente,
x ∈ (2 − δ , 2 + δ ) ⇒ f (x) ∈ (1, 5 − ε, 1, 5 + ε).
Ou ainda,
|x − 2| < δ ⇒ | f (x) − 1, 5| < ε.
2.1 Os conceitos de limite e continuidade 5

Como nos interessa analisar o que acontece com f (x) quando x se aproxima de 2, mas sem ser
igual ao próprio 2, reescrevemos a expressão anterior da seguinte forma

0 < |x − 2| < δ ⇒ | f (x) − 1, 5| < ε.

Definição 2.1.2 Considere f uma função e p um ponto do domínio de f ou uma extremidade de


um dos intervalos que compõem D f . Seja L ∈ R. Dizemos que o limite de f (x), quando x tende a p,
é L, e denotamos
lim f (x) = L,
x→p

se, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que para todo x ∈ D f com

0 < |x − p| < δ tem-se | f (x) − L| < ε.

Observação 2.1.3 (i) O conjunto dos x ∈ D f tal que 0 < |x − p| < δ nunca é vazio pelo modo
em que consideramos D f (união finita de intervalos) e p (está em D f ou é uma extremidade
de um dos intervalos que compõem D f ).

(ii) Na Definição 2.1.2, δ pode depender de ε e p, mas não de x.

Definição 2.1.4 Sejam f uma função e p ∈ D f . Dizemos que f é contínua em p se

lim f (x) = f (p).


x→p

Se f é contínua em todo ponto de seu domínio, dizemos simplesmente que f é contínua.

Observação 2.1.5 A Definição 2.1.4 é equivalente a seguinte: dado ε > 0, existe δ > 0 tal que
para todo x ∈ D f com
|x − p| < δ tem-se | f (x) − f (p)| < ε.

■ Exemplo 2.1.6 Considere f (x) = c, onde c é uma constante real fixa. Mostremos pela definição que,
dado p ∈ R, lim f (x) = c. De fato, seja ε > 0. Tomando qualquer δ > 0, por exemplo δ = 1, temos
x→p

0 < |x − p| < 1 ⇒ | f (x) − c| = |c − c| = 0 < ε.

Em particular, lim f (x) = c = f (p) para todo p ∈ R, logo f é contínua. ■


x→p

■ Exemplo 2.1.7 Considere f (x) = x. Mostremos pela definição que, dado p ∈ R, lim f (x) = p. De
x→p
fato, seja ε > 0. Tomando qualquer δ = ε > 0 temos

0 < |x − p| < δ ⇒ | f (x) − p| = |x − p| < δ = ε.

Em particular, lim f (x) = p = f (p) para todo p ∈ R, logo f é contínua. ■


x→p

■ Exemplo 2.1.8 Considere



2, se x ≥ 1
f (x) = .
1, se x < 1
6 Capítulo 2. Limite e continuidade

Mostremos pela definição que não existe lim f (x). Para isso, dado um L ∈ R qualquer, temos que exibir
x→1
um ε > 0 tal que, qualquer que seja δ > 0, existe x ∈ D f = R com 0 < |x − 1| < δ mas | f (x) − L| ≥ ε.
De fato, tomando ε = 1/3 > 0, temos que para todo δ > 0, existem x1 ∈ (1 − δ , 1) e x2 ∈ (1, 1 + δ ), de
modo que 0 < |x1 − 1| < δ e 0 < |x2 − 1| < δ , mas | f (x1 ) − f (x2 )| = |1 − 2| = 1, logo não pode ocorrer
f (x1 ), f (x2 ) ∈ (L − 1/3, L + 1/3) = (L − ε, L + ε) (pois |L + 1/3 − (L − 1/3)| = 2/3 < 1). Assim, para
algum i ∈ {1, 2}, | f (xi ) − L| ≥ ε. ■


■ Exemplo 2.1.9 Considere f (x) = n
x, onde n ∈ N. Mostremos que f √ é contínua. Se n é par,

D f = [0, +∞). Se n é ímpar, D f = R. Vamos provar que se p ≥ 0, então lim n x = n p. O caso p < 0
x→p
(que pode ocorrer somente se n for ímpar) será visto adiante.
Caso p = 0. Dado ε > 0, tome δ = ε n > 0. Assim,
√ p √
n

0 < |x − 0| < δ ⇒ | n x − 0| = n |x| < δ = n ε n = ε.
√ √
n
Logo, lim n x = 0 = 0.
x→0
Caso p > 0. Observe que
√ √ √ √ √ √ √ √ √ √
x − p = ( n x)n − ( n p)n = ( n x − n p) (( n x)n−1 + ( n x)n−2 ( n p) + · · · + ( n x)( n p)n−2 + ( n p)n−1 ) .
| {z }
M
p √
Suponha |x − p| < , o que implica em particular que x > 0. Então M > ( n p)n−1 > 0. Logo,
2
√ √ |x − p| |x − p|
| n x − n p| = < √ .
M ( n p)n−1
np √ o
Assim, dado ε > 0, tome δ = min , ε ( n p)n−1 . Portanto,
2

√ √ |x − p| |x − p| δ ε( n p)n−1
0 < |x − p| < δ ⇒ | n x − n p| = < √ < √ ≤ √ = ε.
M ( n p)n−1 ( n p)n−1 ( n p)n−1
√ √
Logo, lim n x = n p. ■
x→p

2.2 Propriedades básicas sobre limites

Proposição 2.2.1 O limite lim f (x), se existir, é único.


x→p

Demonstração. Suponha lim f (x) = L1 e lim f (x) = L2 . Então, dado ε > 0, existem δ1 , δ2 > 0 tais
x→p x→p
que
ε
0 < |x − p| < δ1 ⇒ | f (x) − L1 | <
2
e
ε
0 < |x − p| < δ2 ⇒ | f (x) − L2 | < .
2
Considere δ = min{δ1 , δ2 }. Dado x0 ∈ D f tal que 0 < |x0 − p| < δ , temos
ε ε
|L1 − L2 | = |L1 − f (x0 ) + f (x0 ) − L2 | ≤ |L1 − f (x0 )| + | f (x0 ) − L2 | <
+ = ε.
2 2
Assim, provamos que para todo ε > 0, |L1 − L2 | < ε. A única maneira disso acontecer é se |L1 − L2 | = 0
(verifique), ou seja, L1 = L2 . ■
2.2 Propriedades básicas sobre limites 7

Proposição 2.2.2 — Propriedades operatórias dos limites. Sejam f e g duas funções tais que
lim f (x) = L e lim g(x) = M. Então:
x→p x→p

(i) lim ( f (x) ± g(x)) = L ± M;


x→p

(ii) lim ( f (x) · g(x)) = L · M;


x→p

f (x) L
(iii) se M ̸= 0, tem-se lim = ;
x→p g(x) M
(iv) lim | f (x)| = |L|.
x→p

Demonstração. Item (i). Vamos mostrar o caso da soma. Temos que mostrar que, dado ε > 0, existe
δ > 0 tal que
0 < |x − p| < δ ⇒ | f (x) + g(x) − (L + M)| < ε.
Observe que,

| f (x) + g(x) − (L + M)| = | f (x) − L + g(x) − M| ≤ | f (x) − L| + |g(x) − M|. (2.1)

Seja ε > 0. Como lim f (x) = L e lim g(x) = M, existem δ1 , δ2 > 0 tais que
x→p x→p

ε
0 < |x − p| < δ1 ⇒ | f (x) − L| < ;
2
ε
0 < |x − p| < δ2 ⇒ |g(x) − M| < .
2
Assim, tomando δ = min{δ1 , δ2 }, segue de (2.1) que, se 0 < |x − p| < δ , então
ε ε
| f (x) + g(x) − (L + M)| < + = ε.
2 2
O caso lim ( f (x) − g(x)) = L − M é análogo.
x→p

Item (ii). Temos que mostrar que, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que

0 < |x − p| < δ ⇒ | f (x) · g(x) − L · M| < ε.

Observe que,

| f (x) · g(x) − L · M| = | f (x) · g(x) − L · g(x) + L · g(x) − L · M|


≤ | f (x) − L| |g(x)| + |L| |g(x) − M|
≤ | f (x) − L| |g(x)| + (1 + |L|) |g(x) − M|. (2.2)

Seja ε > 0. Como lim f (x) = L e lim g(x) = M, existem δ1 , δ2 , δ3 > 0 tais que
x→p x→p

0 < |x − p| < δ1 ⇒ |g(x) − M| < 1; (2.3)


ε
0 < |x − p| < δ2 ⇒ |g(x) − M| < ;
2(1 + |L|)
ε
0 < |x − p| < δ3 ⇒ | f (x) − L| < .
2(1 + |M|)
8 Capítulo 2. Limite e continuidade

Observe que (2.3) implica que, se 0 < |x − p| < δ1 , então

|g(x)| = |g(x) − M + M| ≤ |g(x) − M| + |M| < 1 + |M|.

Assim, tomando δ = min{δ1 , δ2 , δ3 }, segue de (2.2) que, se 0 < |x − p| < δ , então


ε ε ε ε
| f (x) · g(x) − L · M| < (1 + |M|) + (1 + |L|) = + = ε.
2(1 + |M|) 2(1 + |L|) 2 2

Item (iii). Primeiramente, mostremos o caso particular:

1 1
M ̸= 0 ⇒ lim = .
x→p g(x) M

Temos que mostrar que, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que

|M − g(x)| 1 1
0 < |x − p| < δ ⇒ = − < ε.
|M| |g(x)| g(x) M

Seja ε > 0. Como lim g(x) = M ̸= 0, existem δ1 , δ2 > 0 tais que


x→p

|M|
0 < |x − p| < δ1 ⇒ |g(x) − M| < ; (2.4)
2
ε |M|2
0 < |x − p| < δ2 ⇒ |g(x) − M| < .
2
Observe que (2.4) implica que, se 0 < |x − p| < δ1 , então

|M| |M| 1 2
|g(x)| = |g(x) − M + M| ≥ |M| − |g(x) − M| > |M| − = ⇒ < .
2 2 |g(x)| |M|

Assim, tomando δ = min{δ1 , δ2 }, segue que, se 0 < |x − p| < δ , então

1 1 |M − g(x)| 1 ε |M|2 2
− = < · · = ε.
g(x) M |M| |g(x)| |M| 2 |M|

Por fim,
f (x) 1 1 L
lim = lim f (x) · = L· = .
x→p g(x) x→p g(x) M M

O item (iv) é mais simples de se verificar, e por isso será deixado como exercício. ■

Observação 2.2.3 A recíproca do item (iv) da Proposição 2.2.2 não é verdadeira (veja Exemplo
2.3.4), exceto se L = 0. Nesse caso,

lim | f (x)| = 0 ⇔ lim f (x) = 0 (verifique).


x→p x→p

Corolário 2.2.4 Se f e g são duas funções contínuas em p, e k é uma constante fixa, então f + g,
f
k · f e f · g são contínuas em p. Também, se g(p) ̸= 0, então é contínua em p.
g
2.2 Propriedades básicas sobre limites 9
   
2
■ Exemplo 2.2.5 Se p ∈ R, lim x = lim x · lim x = p2 .
x→p x→p x→p
 n
n
Mais geralmente, dado n ∈ N, verifica-se por indução que lim x = lim x = pn . Em particular,
x→p x→p
f (x) = xn é contínua. ■

■ Exemplo 2.2.6 Calculemos lim (x2 − 2x + 3).


x→−1
       
2 2
lim (x − 2x + 3) = lim x + lim (−2) · lim x + lim 3 = 1 + (−2)(−1) + 3 = 6.
x→−1 x→−1 x→−1 x→−1 x→−1

■ Exemplo 2.2.7 Toda função polinomial f (x) = a0 + a1 x + · · · + an xn é contínua. ■

x2 − x − 2
■ Exemplo 2.2.8 Vamos calcular lim 3 . Como f (x) = x2 − x − 2 e g(x) = x3 + x − 1 são
x→2 x + x − 1
contínuas e g(2) = 9 ̸= 0, temos
lim (x2 − x − 2)
x2 − x − 2 x→2 f (2) 0
lim 3 = 3
= = = 0.
x→2 x + x − 1 lim (x + x − 1) g(2) 9
x→2

p(x)
■ Exemplo 2.2.9 Toda função racional f (x) = , onde p(x) e q(x) são funções polinomiais, é
q(x)
contínua. De fato, D f = {x ∈ R : q(x) ̸= 0}. Logo, para todo a ∈ D f ,
lim p(x) p(a)
x→a
lim f (x) = = = f (a),
x→a lim q(x) q(a)
x→a

portanto f é contínua em a. ■

■ Exemplo 2.2.10 Seja 


2
 x −1,

se x ̸= 1
f (x) = x−1 .

 3, se x = 1
f é contínua em 1?
Solução. Observe que, para todo x ̸= 1,
x2 − 1 (x − 1)(x + 1)
f (x) = = = x + 1.
x−1 x−1
Logo,
lim f (x) = lim (x + 1) = 2 ̸= 3 = f (1).
x→1 x→1
Portanto f não é contínua em 1. ■

■ Exemplo 2.2.11 Determine, se existir, o valor de L ∈ R tal que



2
 x −1,

se x ̸= 1
f (x) = x−1

 L, se x = 1
10 Capítulo 2. Limite e continuidade

seja contínua.
Solução. f é contínua em todo x ∈ R \ {1} pois é uma função racional. Pelo Exemplo 2.2.10,
lim f (x) = 2, independente do valor de L. Logo, para que f seja contínua em 1, devemos ter L =
x→1
f (1) = lim f (x) = 2. ■
x→1

√ √
x− 3
■ Exemplo 2.2.12 Vamos calcular lim . Para todo x ̸= 3, temos
x→3 x − 3
√ √ √ √
x− 3 x− 3 1
= √ √ √ √ =√ √ .
x−3 ( x − 3)( x + 3) x+ 3

Logo, √ √

x− 3 1 1 3
lim = lim √ √ = √ = .
x→3 x − 3 x→3 x + 3 2 3 6

x3 − 5x + 2
■ Exemplo 2.2.13 Vamos calcular lim . Para todo x ̸= 2, temos
x→2 x2 − x − 2

x3 − 5x + 2 (x − 2)(x2 + 2x − 1) x2 + 2x − 1
= = .
x2 − x − 2 (x − 2)(x + 1) x+1

Logo,
x3 − 5x + 2 x2 + 2x − 1 7
lim = lim = .
x→2 x2 − x − 2 x→2 x+1 3

Teorema 2.2.14 — Teorema do Confronto (ou Sanduíche). Suponha que existe r > 0 tal que

f (x) ≤ g(x) ≤ h(x) para todos x com 0 < |x − p| < r.

Se lim f (x) = L = lim h(x), então lim g(x) = L.


x→p x→p x→p

Demonstração. Dado ε > 0, como lim f (x) = L = lim h(x), existem δ1 , δ2 > 0 tais que
x→p x→p

0 < |x − p| < δ1 ⇒ | f (x) − L| < ε ⇒ L − ε < f (x) < L + ε,

e
0 < |x − p| < δ2 ⇒ |h(x) − L| < ε ⇒ L − ε < h(x) < L + ε.
Tomando δ = min{δ1 , δ2 , r}, temos

0 < |x − p| < δ ⇒ L − ε < f (x) ≤ g(x) ≤ h(x) < L + ε ⇒ |g(x) − L| < ε.

Portanto, lim g(x) = L. ■


x→p

Corolário 2.2.15 Se lim f (x) = 0 e existem M, r > 0 tais que |g(x)| ≤ M para todos x com 0 <
x→p
|x − p| < r, então lim f (x)g(x) = 0.
x→p
2.3 Limites laterais e infinitos 11

Demonstração. Para todos x com 0 < |x − p| < r temos


| f (x)g(x)| ≤ | f (x)| · M ⇔ −M| f (x)| ≤ f (x)g(x) ≤ M| f (x)|.
Como lim f (x) = 0, tem-se lim | f (x)| = 0. Logo,
x→p x→p

lim −M| f (x)| = lim M| f (x)| = 0.


x→p x→p

Portanto, pelo Teorema do Confronto, lim f (x)g(x) = 0. ■


x→p

   
1 1
■ Exemplo 2.2.16 Mostremos que lim x sen = 0. De fato, sen ≤ 1 para todo x ∈ R \ {0}
x→0 x   x
1
e lim x = 0, logo, pelo Corolário 2.2.15, lim x sen = 0. ■
x→0 x→0 x

■ Exemplo 2.2.17 Mostremos que a função sen x é contínua.


π
Vamos precisar das seguintes propriedades: para todo 0 < x < , vale que 0 < sen x < x, e, para todo
2
π
− < x < 0, vale que x < sen x < 0. Em particular,
2
π
|sen x| < |x| ⇔ −|x| < sen x < |x|, para todo 0 < |x| < . (2.5)
2
De (2.5) e Teorema do Confronto, já segue que lim sen x = 0, donde segue que a função sen x é contínua
x→0
em x = 0. Mostremos agora que, dado p ∈ R, lim sen x = sen p. De fato, pela Fórmula de Prostaférese,
x→p

x− p x+ p x− p x + p (2.5) x − p
|sen x − sen p| = 2 sen cos = 2 sen cos ≤ 2 · 1 = |x − p|,
2 2 2 2 2
para todo 0 < |x − p| < π. Logo,
−|x − p| ≤ sen x − sen p ≤ |x − p| para todo 0 < |x − p| < π.
Como lim |x − p| = 0, segue do Teorema do Confronto que lim (sen x − sen p) = 0, mas isso equivale a
x→p x→p
dizer que lim sen x = sen p.
x→p

1
A partir desse exemplo, também conclui-se que a função cossec x = é contínua, pois é
sen x
quociente de funções contínuas. ■

2.3 Limites laterais e infinitos


Definição 2.3.1 Considere f uma função e p ∈ R tal que existe b ∈ R com (p, b) ⊆ D f . Seja L ∈ R.
Dizemos que f (x) tende a L quando x tende a p pela direita, e denotamos

lim f (x) = L,
x→p+

se, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que para todo x ∈ D f com

p < x < p+δ tem-se | f (x) − L| < ε.

Suponha agora que existe a ∈ R com (a, p) ⊆ D f . Dizemos que f (x) tende a L quando x tende a p
12 Capítulo 2. Limite e continuidade

pela esquerda, e denotamos


lim f (x) = L,
x→p−

se, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que para todo x ∈ D f com

p−δ < x < p tem-se | f (x) − L| < ε.

Observação 2.3.2 (i) Facilmente verifica-se, usando as definições, que

lim f (x) = L ⇔ lim+ f (x) = L = lim− f (x).


x→p x→p x→p

(ii) As propriedades de limites da Seção 2.2 (unicidade do limite, propriedades operatórias,


Teorema do Confronto) valem para os limites laterais, com as devidas modificações.

■ Exemplo 2.3.3 Seja


x2 ,

se x > 1
f (x) = .
2x, se x < 1
Tem-se
lim f (x) = lim+ x2 = lim x2 = 1,
x→1+ x→1 x→1
e,
lim f (x) = lim− 2x = lim 2x = 2.
x→1− x→1 x→1
Em particular, não existe lim f (x), pois os limites laterais são distintos. ■
x→1

|x|
■ Exemplo 2.3.4 Vamos estudar lim .
x→0 x
 x
 , se x > 0 
|x|  x 1, se x > 0
= = .
x  −x ,

se x < 0
−1, se x < 0
x
Logo,
|x| |x|
lim+ = lim+ 1 = lim 1 = 1 e lim− = lim− −1 = lim −1 = −1.
x→0 x x→0 x→0 x→0 x x→0 x→0
|x|
Portanto, não existe lim , pois os limites laterais são distintos.
x→0 x
|x|
Observe que existe lim = lim 1 = 1. Isso fornece um contra-exemplo para a
x→0 x x→0
Observação 2.2.3. ■

■ Exemplo 2.3.5 Seja  √


x − 2, se x > 4
f (x) = .
8 − 2x, se x < 4
Tem-se √ √
lim+ f (x) = lim+ ( x − 2) = lim ( x − 2) = 0,
x→4 x→4 x→4
e,
lim f (x) = lim− (8 − 2x) = lim (8 − 2x) = 0.
x→4− x→4 x→4
Portanto, lim f (x) = 0, já que os limites laterais existem e são iguais a 0. ■
x→4
2.3 Limites laterais e infinitos 13

Definição 2.3.6 Seja f uma função e suponha que exista a ∈ R tal que (a, ∞) ⊆ D f .

(i) Dado L ∈ R, dizemos que o limite de f (x), quando x tende a infinito é L, e denotamos

lim f (x) = L,
x→∞

se, dado ε > 0, existe K > 0 tal que para todo x ∈ D f com

x>K tem-se | f (x) − L| < ε.

(ii) Dizemos que o limite de f (x), quando x tende a infinito é infinito, e denotamos

lim f (x) = ∞,
x→∞

se, dado M > 0, existe K > 0 tal que para todo x ∈ D f com

x>K tem-se f (x) > M.

(iii) Dizemos que o limite de f (x), quando x tende a infinito é menos infinito, e denotamos

lim f (x) = −∞,


x→∞

se, dado N < 0, existe K > 0 tal que para todo x ∈ D f com

x>K tem-se f (x) < N.

Observação 2.3.7 (i) Os limites lim f (x) = ∞ e lim f (x) = −∞ não existem! Definimo-los
x→∞ x→∞
por ser um caso especial de não-existência, onde se tem ideia do comportamento da função e
pode-se fazer algumas operações com limites desse tipo.

(ii) Se existe b ∈ R tal que (−∞, b) ⊆ D f , analogamente define-se os limites anteriores para
x → −∞ (basta trocar “K > 0 e x > K” por “K < 0 e x < K”).

Observação 2.3.8 As propriedades de limites da Seção 2.2 (unicidade do limite, propriedades


operatórias, Teorema do Confronto) valem para os limites com x → ±∞ cujos resultados são números
reais (limites da forma lim f (x) = L ∈ R), com as devidas modificações.
x→±∞
14 Capítulo 2. Limite e continuidade

■ Exemplo 2.3.9 Mostremos que lim x = ∞.


x→∞
Dado M > 0, tomando K = M > 0, temos
x > K = M ⇒ f (x) = x > M.

1
■ Exemplo 2.3.10 Mostremos que lim = 0.
x→∞ x
1
Dado ε > 0, tomando K = > 0, temos
ε
1 1 1
x>K= ⇒ 0< <ε ⇒ < ε.
ε x x

1
■ Exemplo 2.3.11 Dado n ∈ N, temos lim n = 0, pois
x→∞ x
 n
1 1
lim = lim = 0n = 0.
x→∞ xn x→∞ x

Quando vamos calcular um limite para x → ∞, nos interessa o comportamento da função quando x
é “muito grande” (denota-se x >> 0). No caso de funções algébricas (somas, produtos e quocientes
de polinômios e raízes), não é difícil intuir o que acontece com tais limites. Veja os Exemplos 2.3.12,
2.3.19, 2.3.20.
x6 + 3x2 + 1
■ Exemplo 2.3.12 Calculemos lim . Quando x >> 0, x6 é muito maior que qualquer
x→∞ 3x6 + 2x5 + x − 5
múltiplo de x, x2 ou x5 (são desprezíveis perto de x6 ), pense por exemplo em x = 101000000000 . Assim,
quando x >> 0,
x6 + 3x2 + 1 x6 1
x6 + 3x2 + 1 ≈ x6 e 3x6 + 2x5 + x − 5 ≈ 3x6 ⇒ 6 5
≈ 6
= .
3x + 2x + x − 5 3x 3
1
Então já temos intuitivamente a noção que o limite dado é igual a . Um cálculo mais preciso seria:
3
3 1
6 1 + x34 + x16

x6 + 3x2 + 1 x 1 + x4 + x6
lim 6 = lim = lim
x→∞ 3x + 2x5 + x − 5 x→∞ x6 3 + 2 + 1 − 5 x→∞ 3 + 2 + 1 − 5

x x5 x6 x x5 x6
1+0+0 1
= = .
3+0+0−0 3

Definição 2.3.13 (i) Considere f uma função e p ∈ R tal que existe b ∈ R com (p, b) ⊆ D f .
Dizemos que o limite de f (x), quando x tende a p pela direita, é infinito, e denotamos

lim f (x) = ∞,
x→p+

se, dado M > 0, existe δ > 0 tal que para todo x ∈ D f com

p < x < p+δ tem-se f (x) > M.


2.3 Limites laterais e infinitos 15

(ii) Suponha agora que existe a ∈ R com (a, p) ⊆ D f . Dizemos que o limite de f (x), quando x
tende a p pela esquerda, é infinito, e denotamos

lim f (x) = ∞,
x→p−

se, dado M > 0, existe δ > 0 tal que para todo x ∈ D f com

p−δ < x < p tem-se f (x) > M.

(iii) Sejam f uma função e p um ponto do domínio de f ou uma extremidade de um dos intervalos
que compõem D f . Dizemos que o limite de f (x), quando x tende a p, é infinito, e denotamos

lim f (x) = ∞,
x→p

se, dado M > 0, existe δ > 0 tal que para todo x ∈ D f com

0 < |x − p| < δ tem-se f (x) > M.

Observação 2.3.14 (i) Os limites da Definição 2.3.13 não existem! Definimo-los por ser um
caso especial de não-existência, onde se tem ideia do comportamento da função e pode-se
fazer algumas operações com limites desse tipo.

(ii) Analogamente define-se os limites anteriores com resultado igual a −∞ (basta trocar “M > 0
e f (x) > M” por “N < 0 e f (x) < N”).

1
■ Exemplo 2.3.15 Mostremos que lim = −∞.
x→0− x
1
Dado N < 0, tome δ = − > 0. Assim,
N
1 1
−δ < x < 0 ⇒ < x < 0 ⇒ < N.
N x

Proposição 2.3.16 — Propriedades operatórias dos limites infinitos. (i) Se lim+ f (x) = 0 e
x→p
1
existe r > 0 tal que f (x) > 0 para todo x ∈ D f com p < x < p + r, então lim+ = ∞.
x→p f (x)
(ii) Se lim+ f (x) = 0 e existe r > 0 tal que f (x) < 0 para todo x ∈ D f com p < x < p + r, então
x→p
1
lim+ = −∞.
x→p f (x)
(iii) Se lim f (x) = ±∞ e lim g(x) = L ∈ R, então
x→p x→p

• lim [ f (x) ± g(x)] = ±∞;


x→p
• lim [ f (x) · g(x)] = ±∞ se L > 0;
x→p
• lim [ f (x) · g(x)] = ∓∞ se L < 0.
x→p
16 Capítulo 2. Limite e continuidade

Se L = 0, então lim [ f (x) · g(x)] é uma indeterminação.


x→p

1
(iv) Se lim f (x) = ±∞, então lim = 0.
x→p x→p f (x)
(v) Se lim f (x) = ∞ e lim g(x) = ∞, então lim [ f (x) + g(x)] = ∞.
x→p x→p x→p

(vi) Se lim f (x) = −∞ e lim g(x) = −∞, então lim [ f (x) + g(x)] = −∞.
x→p x→p x→p

(vii) Se lim f (x) = ∞ e lim g(x) = ∞, então lim f (x) · g(x) = ∞.


x→p x→p x→p

(viii) Se lim f (x) = −∞ e lim g(x) = ∞, então lim f (x) · g(x) = −∞.
x→p x→p x→p

(ix) Se lim f (x) = −∞ e lim g(x) = −∞, então lim f (x) · g(x) = ∞.
x→p x→p x→p

Demonstração. Vamos demonstrar os itens (i) e (vii). Os demais serão deixados como exercício.
Item (i). Seja M > 0. Temos que mostrar que existe δ > 0 tal que para todo x ∈ D f com
1
p < x < p+δ tem-se > M.
f (x)
1
Como lim+ f (x) = 0, para ε = , existe δ1 > 0 tal que
x→p M
1
p < x < p + δ1 ⇒ | f (x)| < .
M
Assim, tomando δ = min{δ1 , r}, temos
1 1
p < x < p+δ ⇒ f (x) = | f (x)| < ⇒ > M.
M f (x)

Item (vii). Seja M > 0. Temos que mostrar que existe δ > 0 tal que para todo x ∈ D f com

p < x < p+δ tem-se f (x)g(x) > M.

Como lim f (x) = ∞ e lim g(x) = ∞, existem δ1 , δ2 > 0 tais que


x→p x→p

0 < |x − p| < δ1 ⇒ f (x) > M;

0 < |x − p| < δ2 ⇒ g(x) > M.

Assim, tomando δ = min{δ1 , δ2 }, temos


√ √
0 < |x − p| < δ ⇒ f (x)g(x) > M · M > M.

Observação 2.3.17 (i) Os itens (i) e (ii) da Proposição 2.3.16 são válidos para limites laterais
à esquerda, com as devidas modificações.

(ii) Nos itens (iii) a (ix) da Proposição 2.3.16, “x → p” pode ser substituído por “x → p+ ”,
“x → p− ”, “x → +∞” ou “x → −∞” que as propriedades continuam válidas.
2.3 Limites laterais e infinitos 17

Podemos pensar na Proposição 2.3.16 como uma “tabela de operações com infinitos”. Claro que,
formalmente, não faz sentido escrever ∞ + ∞ ou ∞ · ∞, pois ∞ não é um número, e sim apenas uma
notação usada para representar um comportamento de função. Mas, simbolicamente, tal tabela ajuda a
memorizar as propriedades, e por isso vamos descrevê-la a seguir.

Tabela de operações com infinitos


1 (v) ∞ + ∞ = ∞.
(i) = ∞.
0+
1 (vi) −∞ − ∞ = −∞.
(ii) − = −∞.
0
(iii) • ±∞ ± L = ±∞; (vii) ∞ · ∞ = ∞.
• ±∞ · L = ±∞ se L > 0;
• ±∞ · L = ∓∞ se L < 0. (viii) −∞ · ∞ = −∞.
1
(iv) = 0. (ix) −∞ · (−∞) = ∞.
±∞

Ressaltamos que as possíveis operações que não aparecem na tabela acima são indeterminações! Por
exemplo,

∞ 0 0
−∞ + ∞, −∞ − (−∞), 0 · ∞, , , 0 , ∞0 , 1∞ .
∞ 0

Quando ocorrer um destes casos, deve-se trabalhar algebricamente com a expressão da função de modo
a resultar em outra apresentação na qual se pode calcular o limite.
1
■ Exemplo 2.3.18 Mostremos que lim = ∞.
x−1
x→1+
Temos que lim+ (x − 1) = 0 e x − 1 > 0 para todo x > 1, assim o resultado segue da Proposição 2.3.16(i).
x→1
1
Analogamente, lim− = −∞. ■
x→1 x−1

x5 − 4x2 + 5
■ Exemplo 2.3.19 Vamos calcular lim . Quando x >> 0,
x→∞ 3x3 + 1
x5 − 4x2 + 5 x5 x2
x5 − 4x2 + 5 ≈ x5 e 3x3 + 1 ≈ 3x3 ⇒ ≈ = .
3x3 + 1 3x3 3
Usando que lim x2 = ∞, já temos intuitivamente a noção que o limite dado é igual a ∞. No entanto,
x→∞
isso precisa ser melhor justificado. De fato,
!
x5 1 − x43 + x55 1 − x43 + x55

x5 − 4x2 + 5 2
lim = lim  = lim x · .
x→∞ 3x3 + 1 x→∞ x3 3 + x13 x→∞ 3 + x13
!
1 − x43 + x55 1
Como lim x2 = ∞ e lim 1
= , segue da Proposição 2.3.16(iii) que
x→∞ x→∞ 3+ x3
3
x5 − 4x2 + 5
lim = ∞.
x→∞ 3x3 + 1
18 Capítulo 2. Limite e continuidade

Observe que, se pensássemos

lim (x5 − 4x2 + 5)


x5 − 4x2 + 5 x→∞
lim = ,
x→∞ 3x3 + 1 lim (3x3 + 1)
x→∞


ficaríamos com uma indeterminação do tipo . ■


9x5 + 3x + 1
■ Exemplo 2.3.20 Calculemos lim √ . Quando x >> 0,
x→∞ 3 8x9 + 3x4 + 2

√ √
5 5 9 4 9 9x5 + 3x + 1 9x5 3x5/2 3
9x + 3x + 1 ≈ 9x e 8x + 3x + 2 ≈ 4x ⇒ √ 3
≈ √
3
= 3
= 1/2 .
9 4
8x + 3x + 2 8x 9 2x 2x
1
Usando que lim √ = 0, já temos intuitivamente a noção que o limite dado é igual a 0. Justificando:
x→∞ x


q q
3 1
5
9x + 3x + 1 x 5/2 9 + x 4 + x 5 1 9 + x34 + x15 3
lim √ = lim q = lim · q = 0 · = 0.
x→∞ 3 8x9 + 3x4 + 2 x→∞ 3 3 3 2 x→∞ x1/2 3 3 2 2
x 8+ 5 + 9x x
8+ 5 + 9
x x

Observe que, se pensássemos



p
9x5 + 3x + 1 lim 9x5 + 3x + 1
lim √ = x→∞p ,
x→∞ 3 8x9 + 3x4 + 2 3
lim 8x9 + 3x4 + 2
x→∞


também ficaríamos com uma indeterminação do tipo . ■

2.4 Limite da função composta


Sejam f e g duas funções tais que Im f ⊆ Dg . Queremos analisar

lim g( f (x)).
x→p

Supondo que lim f (x) = a, será que


x→p

lim g( f (x)) = g(a)?


x→p

Isso obviamente só pode fazer sentido se a ∈ Dg , o que não ocorre necessariamente, pois o resultado de
um limite de uma função não precisa ser igual ao valor da função em algum ponto.
Ou então, poderíamos pensar u = f (x) como uma nova variável, e assim dizer que

lim g( f (x)) = lim g(u)?


x→p |{z} u→a
u

Veremos que a primeira pergunta tem resposta positiva se g for contínua em a. Já a segunda pergunta
terá resposta positiva se a ̸∈ Dg ou se f (x) ̸= a numa vizinhança de p. Em particular é esse o caso
quando f (x) é uma função injetora.
2.4 Limite da função composta 19

Teorema 2.4.1 Sejam f e g duas funções tais que Im f ⊆ Dg . Se lim f (x) = a e g é contínua em a,
x→p
então  
lim g( f (x)) = g lim f (x) = g(a).
x→p x→p

Demonstração. Temos que mostrar que dado ε > 0, existe δ > 0 tal que para todo
x ∈ Dg◦ f = D f com
0 < |x − p| < δ tem-se |g( f (x)) − g(a)| < ε.
De fato, dado ε > 0, existe δ1 > 0 tal que para todo u ∈ Dg com

0 < |u − a| < δ1 tem-se |g(u) − g(a)| < ε,

pois g é contínua em a. Agora, para δ1 , existe δ > 0 tal que para todo x ∈ D f com

0 < |x − p| < δ tem-se | f (x) − a| < δ1 ,

pois lim f (x) = a. Como u = f (x) ∈ Dg para todo x ∈ D f , concluímos que


x→p

| f (x) − a| < δ1 ⇒ |g( f (x)) − g(a)| < ε.

Corolário 2.4.2 Sejam f e g duas funções tais que Im f ⊆ Dg . Se f é contínua em p e g é contínua


em f (p), então g ◦ f é contínua em p. Em particular, composta de funções contínuas é uma função
contínua.

Demonstração. Pelo Teorema 2.4.1,


 
lim g( f (x)) = g lim f (x) = g( f (p)) = (g ◦ f )(p).
x→p x→p

Portanto g ◦ f é contínua em p. ■

■ Exemplo 2.4.3 p q √
lim x5 + 4x2 + 2 = lim (x5 + 4x2 + 2) = 7,
x→1 x→1

pois lim (x5 + 4x2 + 2) = 7 e g(u) = u é contínua em u = 7. ■
x→1
s
3 x3 + 1 x3 + 1
■ Exemplo 2.4.4 Considere o limite lim . A função f (x) = está definida para todo
x→−1 x+1 x+1
x ̸= −1 e
x3 + 1
lim = lim (x2 − x + 1) = 3.
x→−1 x + 1 x→−1

3
Como g(u) = u é contínua em u = 3, temos
s s
3
3 x +1 3 x3 + 1 √
3
lim = lim = 3.
x→−1 x+1 x→−1 x + 1


20 Capítulo 2. Limite e continuidade

■ Exemplo 2.4.5 A função cos x é contínua.


π 
Observe que cos x = sen − x para todo x ∈ R.
2
π
No Exemplo 2.2.17 mostramos que sen x é contínua. Como f (x) = − x também é contínua, a
2
afirmação segue do Corolário 2.4.2.
1 sen x
Desse exemplo também tiramos que as funções sec x = , tg x = e
cos x cos x
cos x
cotg x = são contínuas, pois são quocientes de funções contínuas. ■
sen x

Teorema 2.4.6 Sejam f e g duas funções tais que Im f ⊆ Dg . Suponha lim f (x) = a e lim g(u) = L.
x→p u→a
Se existe r > 0 tal que f (x) ̸= a para todo x ∈ D f com 0 < |x − p| < r, então

lim g( f (x)) = lim g(u) = L.


x→p u→a

Demonstração. Temos que mostrar que dado ε > 0, existe δ > 0 tal que para todo
x ∈ Dg◦ f = D f com
0 < |x − p| < δ tem-se |g( f (x)) − L| < ε.

De fato, dado ε > 0, existe δ1 > 0 tal que para todo u ∈ Dg com

0 < |u − a| < δ1 tem-se |g(u) − L| < ε,

pois lim g(u) = L. Agora, para δ1 , existe δ2 > 0 tal que para todo x ∈ D f com
u→a

0 < |x − p| < δ2 tem-se | f (x) − a| < δ1 ,

pois lim f (x) = a. Tomando δ = min{r, δ2 }, temos


x→p

0 < |x − p| < δ ⇒ 0 < | f (x) − a| < δ1 ⇒ |g( f (x)) − L| < ε.

Observação 2.4.7 Faremos algumas observações a respeito da hipótese

“existe r > 0 tal que f (x) ̸= a para todo x ∈ D f com 0 < |x − p| < r” (2.6)

que aparece no Teorema 2.4.6.

(i) Se a ̸∈ Dg , segue da hipótese Im f ⊆ Dg que f (x) ̸= a para todo x ∈ D f . Neste caso, (2.6) é
trivialmente satisfeita.

(ii) Se f (x) é uma função injetora, então f (x) = a no máximo para um valor de x (por exemplo, se
f é contínua em p, então a = f (p)). Assim, é possível exibir r > 0 tal que (2.6) seja satisfeita.

(iii) Se a ∈ Dg mas g não é contínua em a, então a hipótese (2.6) é necessária! Veja o exemplo a
seguir.
2.4 Limite da função composta 21
 
x + 1, se x ∈ R \ Q u + 1, se u ̸= 1
■ Exemplo 2.4.8 Sejam f (x) = e g(u) = .
1, se x ∈ Q 3, se u = 1
Temos lim f (x) = 1 e lim g(u) = 2. No entanto,
x→0 u→1

x + 2, se x ∈ R \ Q
g( f (x)) =
3, se x ∈ Q
donde vemos que não existe lim g( f (x)). Observe que g não é contínua em u = 1 e que f não satisfaz a
x→0
hipótese “existe r > 0 tal que f (x) ̸= 1 para todo x ∈ D f com 0 < |x − 0| < r”. ■


■ Exemplo 2.4.9 No Exemplo 2.1.9 mostramos que a função f (x) =

n
x, n ∈ N, é contínua em todo
n

p ≥ 0. Agora suponha n ímpar e p < 0. Vamos mostrar que lim x = p.n
x→p
√ √
Sendo p < 0, temos −p > 0. Logo, pelo Exemplo 2.1.9, lim n x = n −p. Assim, pelo Teorema 2.4.6,
x→−p
√ √ √ √ √
lim n −x = lim n u = n −p, pois lim (−x) = −p, lim n u = n −p e f (x) = −x ̸= −p para todo
x→p u→−p x→p u→−p
x ̸= p. Por fim, √ √ √ √ √
lim n
x = lim − n −x = − lim n −x = −( n −p) = n p.
x→p x→p x→p

(x4 − 2x + 3)4 − 16
■ Exemplo 2.4.10 Vamos calcular lim . Considere u = x4 − 2x + 3. Para todo
x→1 −x4 + 2x − 1
x ̸= 1, temos
(x4 − 2x + 3)4 − 16 u4 − 16
= .
−x4 + 2x − 1 2−u
u4 − 16
Como lim u = 2 e g(u) = não está definida em u = 2, temos pelo Teorema 2.4.6,
x→1 2−u
(x4 − 2x + 3)4 − 16 u4 − 16 (u − 2)(u + 2)(u2 + 4)
lim = lim = lim = −32.
x→1 −x4 + 2x − 1 u→2 2 − u u→2 2−u

Valem análogos do Teorema 2.4.6 para limites infinitos e no infinito. Vamos enunciar alguns casos
aqui, as demonstrações ficam a cargo do leitor.

Teorema 2.4.11 Sejam f e g duas funções tais que Im f ⊆ Dg .

(i) Se lim f (x) = ∞ e lim g(u) = L (ou ∞), então


x→p u→∞

lim g( f (x)) = lim g(u) = L (ou ∞).


x→p u→∞

(ii) Se lim f (x) = ∞ e lim g(u) = L (ou ∞), então


x→∞ u→∞

lim g( f (x)) = lim g(u) = L (ou ∞).


x→∞ u→∞

(iii) Se lim f (x) = a; lim g(u) = L; e, g é contínua em a, ou, existe K > 0 tal que f (x) ̸= a para
x→∞ u→a
todo x ∈ D f com x > K, então

lim g( f (x)) = lim g(u) = L.


x→∞ u→a
22 Capítulo 2. Limite e continuidade

(iv) Se lim f (x) = a; lim g(u) = ∞; e existe r > 0 tal que f (x) ̸= a para todo x ∈ D f com
x→p u→a
0 < |x − p| < r, então
lim g( f (x)) = lim g(u) = ∞.
x→p u→a

(v) Se lim f (x) = a; lim g(u) = ∞; e existe K > 0 tal que f (x) ̸= a para todo x ∈ D f com x > K,
x→∞ u→a
então
lim g( f (x)) = lim g(u) = ∞.
x→∞ u→a

2.5 Primeiro limite fundamental


O limite do exemplo a seguir é conhecido como (primeiro) limite fundamental. Intuitivamente, ele
nos diz que, para valores de x próximos de 0, sen x é aproximadamente igual
a x.
sen x
■ Exemplo 2.5.1 Mostremos que lim = 1.
x→0 x
π
Vamos precisar novamente das propriedades: para todo 0 < x < , vale que 0 < sen x < x < tg x, e,
2
π  π π
para todo − < x < 0, vale que tg x < x < sen x < 0. Em particular, para todo x ∈ − , \ {0},
2 2 2
temos
x 1 sen x
1< < ⇒ cos x < < 1.
sen x cos x x
sen x
Portanto, segue do Teorema do Confronto que lim = 1. ■
x→0 x

tg(x2 − 1)
■ Exemplo 2.5.2 Calculemos lim .
x→1 x−1
tg(x2 − 1) tg u
Primeiramente, vamos calcular lim 2 . Considere u = x2 − 1. Temos lim u = 0 e g(u) =
x→1 x − 1 x→1 u
não está definida em u = 0. Assim, pelo Teorema 2.4.6,

tg(x2 − 1) tg u 1 sen u
lim = lim = lim · = 1 · 1 = 1.
x→1 x2 − 1 u→0 u u→0 cos u u
Por fim,
tg(x2 − 1) tg(x2 − 1)
lim = lim 2 · (x + 1) = 1 · 2 = 2.
x→1 x−1 x→1 x − 1

2.6 O número de Euler


O objetivo desta seção é apresentar um número real que tem um papel importante no cálculo
diferencial e integral, conhecido como Número de Euler, representado pelo símbolo e. Existem algumas
maneiras de definir esse número, nós vamos apresentar sua definição como o limite de uma sequência.
Para isso, precisamos saber o que é uma sequência e limite de sequência. Como tais conceitos vão ser
estudados detalhadamente mais a frente, não vamos ser muito rigorosos neste momento.
Uma sequência é uma função que associa a cada número natural n um número real an . Denota-se

(an )n∈N ou (an ) ou (a1 , a2 , . . . , an , . . .).


2.6 O número de Euler 23

an é chamado termo geral da sequência e o conjunto {an : n ∈ N} é chamado de conjunto dos termos
da sequência.
1
■ Exemplo 2.6.1 an = é o termo geral da sequência
n

 
1 1 1
1, , , . . . , , . . . ,
2 3 n

 
1
cujo conjunto dos termos é :n∈N . ■
n

■ Exemplo 2.6.2 an = (−1)n é o termo geral da sequência

(−1, 1, −1, . . . , (−1)n , . . .) ,

cujo conjunto dos termos é {−1, 1}. ■

Grosseiramente, dizer que uma sequência (an ) converge a um número real L significa que quanto
maior o número natural n, mais próximo an fica de L. Denota-se lim an = L ou simplesmente lim an = L,
n→∞
pois “n → ∞” é o único tipo de limite que se tem interesse quando se trata de sequências. Conhecendo
a definição do limite de função lim f (x) = L, não é muito difícil deduzir a definição no caso de
x→∞
sequências. Basta apenas levar em consideração que o domínio da função não é um intervalo, ou união
de intervalos, e sim o conjunto dos números naturais N. A definição rigorosa será apresentada mais
adiante e não será necessária nesse momento. Quando existe L ∈ R tal que (an ) converge a L, dizemos
que (an ) é convergente. Assim como limite de função, o limite de uma sequência, quando existe, é
único.
Dizemos que uma sequência (an ) é limitada se existe k > 0 tal que |an | < k para todo n ∈ N.
Adiante vamos provar que toda sequência convergente é limitada, mas a recíproca não é verdadeira. O
que temos é a seguinte proposição, cuja demonstração também será apresentada posteriormente.

Proposição 2.6.3 Se (an ) é uma sequência limitada e crescente, isto é, an ≤ an+1 para todo n ∈ N,
então (an ) é convergente.

Tendo em mãos esses conceitos, podemos apresentar o número e. Considere a sequência cujo termo
geral é

1 n
 
an = 1 + .
n

Vamos mostrar que (an ) é uma sequência crescente e limitada, e portanto convergente. O número e é,
por definição, o limite dessa sequência.
Mostremos primeiro que an ≤ an+1 para todo n ∈ N, ou seja, (an ) é crescente. De fato, usando o
24 Capítulo 2. Limite e continuidade

Binômio de Newton,

n
n! 1
an = ∑ k!(n − k)! · nk
k=0
1 n(n − 1) 1 n(n − 1)(n − 2) 1 n(n − 1)(n − 2)(n − 3) 1
= 1+n· + · 2+ · 3+ · 4
n 2! n 3! n 4! n
n! 1
+ ··· + · n
n! n        
1 1 1 1 2 1 1 2 3
= 1+1+ 1− + 1− 1− + 1− 1− 1−
2! n 3! n n 4! n n n
   
1 1 n−1
+ ··· + 1− ... 1−
n! n n
      
1 1 1 1 2 1 1
< 1+1+ 1− + 1− 1− + 1− ·
2! n+1 3! n+1 n+1 4! n+1
      
2 3 1 1 n−1 1
· 1− 1− + ··· + 1− ... 1− +
n+1 n+1 n! n+1 n+1 (n + 1)n+1
n+1 (n + 1)n (n + 1)n(n − 1) (n + 1)n(n − 1)(n − 2)
= 1+ + 2
+ +
n + 1 2!(n + 1) 3!(n + 1)3 4!(n + 1)4
(n + 1) . . . 2 (n + 1)!
+ ··· + n
+
n!(n + 1) (n + 1)!(n + 1)n+1
= an+1 .

Logo, (an ) é crescente.


Mostremos agora que an < 3 para todo n ∈ N. Como an ≥ 2, seguirá que (an ) é limitada. De fato,
usando o Binômio de Newton novamente,

n n n
n! 1 (n − k)! n(n − 1) . . . (n − (k − 1)) 1
an = ·
∑ k!(n − k)! nk = 1 + ∑ k!(n − k)! · k
≤ 1 + ∑ .
k=0 k=1 | n
{z } k=1 k!
≤1

Como 2(k−1) ≤ k! para todo k ∈ N (isso pode ser facilmente provado por indução em k), tem-se

1
1n n
1 1− n 
1

an ≤ 1 + ∑ ≤ 1 + ∑ k−1 = 1 + 2 = 1 + 2 · 1 − n < 3.
k=1 k! k=1 2
1 2
1−
2
| {z }
<1

Logo, (an ) é limitada.


Como (an ) é crescente e limitada, existe L ∈ R tal que lim an = L.

Definição 2.6.4 O Número de Euler é definido por

1 n
 
e = lim 1 + .
n→∞ n

Observação 2.6.5 Como 2 ≤ an ≤ 3 para todo n ∈ N, tem-se 2 ≤ e ≤ 3. Mais adiante conseguire-


mos calcular uma aproximação mais precisa para o número e.
2.7 Teoremas importantes sobre funções contínuas 25

2.7 Teoremas importantes sobre funções contínuas


Nesta seção, apresentaremos alguns teoremas importantes sobre funções contínuas. Não faremos
as demonstrações, por utilizarem algumas ferramentas técnicas que não fazem parte de um curso de
cálculo e que não terão outras utilidades aqui. Tais demonstrações podem ser encontradas, por exemplo,
no livro [Gui] ou em bons livros de análise real.

Teorema 2.7.1 — do Valor Intermediário - TVI. Sejam f : I → R uma função contínua, onde I é
um intervalo, e a, b ∈ I com a < b. Se d ∈ R é um número entre f (a) e f (b), então existe c ∈ [a, b]
tal que f (c) = d.

Corolário 2.7.2 Se f : I → R é uma função contínua e não constante, onde I é um intervalo, então
Im f também é um intervalo.

Observação 2.7.3 O caso d = 0 no TVI é conhecido como Teorema de Bolzano.

Como aplicação do TVI, apresentamos o seguinte exemplo.


■ Exemplo 2.7.4 Mostremos que todo polinômio de grau ímpar com coeficientes reais tem ao menos
uma raiz real.
Seja p(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn um polinômio com n ímpar, a j ∈ R para todo j = 0, 1, . . . , n e an ̸= 0.
Observe que, para todo x ̸= 0, p(x) = an xn q(x) onde
a0 1 a1 1 an−1 1
q(x) = · n + · n−1 + · · · + · + 1.
an x an x an x
É fácil ver que lim q(x) = lim q(x) = 1.
x→∞ x→−∞
Vamos assumir que an > 0 (o caso an < 0 é análogo). Neste caso, lim an xn = ∞ e lim an xn = −∞.
x→∞ x→−∞
Logo,
lim p(x) = lim an xn · q(x) = ∞ e lim p(x) = lim an xn · q(x) = −∞.
x→∞ x→∞ x→−∞ x→−∞
Portanto, existem x1 , x2 ∈ R tais que p(x1 ) > 0 e p(x2 ) < 0. Pelo TVI, existe c ∈ R tal que p(c) = 0,
ou seja, c é raiz de p. ■

O próximo teorema será importante para a resolução de alguns problemas envolvendo máximos e
mínimos de funções.

Teorema 2.7.5 — de Weierstrass. Seja f : [a, b] → R uma função contínua. Então f é limitada e
assume valores máximo e mínimo, isto é, existem x1 , x2 ∈ [a, b] tais que

f (x1 ) ≤ f (x) ≤ f (x2 ) para todo x ∈ [a, b].

Corolário 2.7.6 Se f : [a, b] → R é uma função contínua, então existem c, d ∈ R, c < d, tais que
Im f = [c, d].

Observação 2.7.7 No Teorema de Weierstrass, se o intervalo que constitui D f não for fechado ou
a função f não for contínua, a conclusão pode ser falsa.
1
Por exemplo, seja f : (0, 2] → R definida por f (x) = . Neste caso, f não é limitada (para x
x
26 Capítulo 2. Limite e continuidade

próximo de 0, f (x) fica tão grande quando se queira). Observe que f é contínua, mas seu domínio
não é um intervalo fechado.
Outro exemplo: seja f : [0, 1] → R definida por f (x) = x se x ∈ [0, 1) e f (1) = 0. Neste caso,
f é limitada, mas não assume valor máximo (não existe x2 ∈ [0, 1] tal que f (x2 ) ≥ f (x) para todo
x ∈ [0, 1]). Observe que D f é um intervalo fechado, mas f não é contínua em x = 1.

A proposição a seguir é do tipo fácil de visualizar e aceitar geometricamente, mas não tão simples
de demonstrar rigorosamente.

Proposição 2.7.8 Seja f : I → R uma função contínua e injetora no intervalo I. Então f é monótona
e f −1 : Im f → I também é contínua no intervalo J = Im f .

■ Exemplo 2.7.9 A função f : [−1, 1] → [0, π] definida por f (x) = arccos x é contínua, pois g : [0, π] →
R dada por g(x) = cos x é contínua e injetora, Im g = [−1, 1] e g−1 = f .
h π πi
Analogamente, verifica-se que as funções arcsen : [−1, 1] → − , ,
 π π h π h2 π2 
arctg : R → − , , arcsec : [1, ∞) → 0, , arccossec : [1, ∞) → 0, ,
2 2 2 2
arccotg : R → (0, π) são contínuas (os intervalos das definições dessas funções podem mudar conforme
as escolhas do intervalos onde suas inversas são contínuas e injetoras). ■

Observação 2.7.10 Se D f na Proposição 2.7.8 não for um intervalo, a conclusão pode não ser
verdadeira.

x + 1, se x ∈ [0, 1)
Por exemplo, considere f : [0, 1) ∪ [2, 3] → R definida por f (x) = .
x, se x ∈ [2, 3]

−1 −1 y − 1, se x ∈ [1, 2)
Tem-se f contínua e injetora, mas f : [1, 3] → R é dada por f (y) =
y, se x ∈ [2, 3]
não é contínua em y = 2.

2.8 Funções exponenciais e logarítmicas


Ao longo desse texto, demonstramos que as funções polinomiais, racionais, radicais, trigonométricas
e trigonométricas inversas são contínuas. Dentre as funções elementares, nos resta basicamente analisar
as funções exponenciais e logarítmicas. Esse é o motivo desta breve seção.
Essas funções já foram estudadas no ensino médio, mas provavelmente √ não foi apresentada a
2
definição formal de uma potência por um número irracional, por exemplo 5 . Isso porque a definição
rigorosa de tais números passa por conceitos de análise real, envolvendo principalmente o fato de R ser
um corpo ordenado completo.
Também não entraremos em muitos detalhes aqui, mas ao menos temos um pouco mais de artifícios
para dizer que tais funções foram definidas de modo a serem contínuas.
Fixe um número real a > 0, a ̸= 1. Dado r ∈ Q, não é preciso muitas ferramentas para definir ar .
Então, já poderíamos definir f : Q → R por f (r) = ar . Queremos agora estender o domínio dessa
função para R, mas de maneira que f seja contínua. Será que isso é possível? Se sim, essa extensão é
única?
A pergunta sobre unicidade não é difícil responder. Pode-se demonstrar que, se duas funções
f , g : R → R são contínuas e satisfazem f (x) = g(x) para todo x ∈ Q, então f = g. A prova disso utiliza
o conceito de continuidade e o fato que todo intervalo da reta contém números racionais (Q é denso em
2.8 Funções exponenciais e logarítmicas 27

R).
Para provar a unicidade, também se utiliza o fato que Q é denso em R, por exemplo, dizendo que
para todo número real α, existe uma sequência (an ), com an ∈ Q para todo n ∈ N, tal que lim an = α.
Não iremos entrar mais mais detalhes agora, apenas enunciar o seguinte teorema.

Teorema 2.8.1 Considere um número real a > 0, a ̸= 1. Então, existe uma única função f : R → R
contínua tal que f (r) = ar para todo r ∈ Q.
Tal função é chamada de função exponencial na base a.

A função exponencial na base e terá um papel importante na parte do cálculo diferencial e integral.
A seguir, apresentamos mais alguns fatos sobre a função exponencial f (x) = ax .
Se a > 1:
• f é estritamente crescente (portanto injetora);

• Im f = (0, ∞), sendo 0 < f (x) < 1 se x < 0, f (0) = 1, f (x) > 1 se x > 0;

• lim f (x) = 0 e lim f (x) = ∞.


x→−∞ x→∞

Se 0 < a < 1:
• f é estritamente decrescente (portanto injetora);

• Im f = (0, ∞), sendo f (x) > 1 se x < 0, f (0) = 1, 0 < f (x) < 1 se x > 0;

• lim f (x) = ∞ e lim f (x) = 0.


x→−∞ x→∞

A partir das informações dadas, não é difícil fazer um esboço do gráfico de f .


Agora, o logaritmo será definido de modo a ser o inverso da exponencial. Sejam a > 0, a ̸= 1, e
β > 0 números reais. O logaritmo de β na base a é o único número real γ tal que aγ = β , e denota-se
γ = loga β .
A existência e unicidade do logarítmo γ são facilmente deduzidas pois a função f (x) = ax é
contínua, injetora e Im f = (0, ∞). Logo existe f −1 : (0, ∞) → R, também contínua. Sendo β > 0,
γ = f −1 (β ) é tal que aγ = f (γ) = β .
Portanto, a função logarítmica, que associa a cada x ∈ (0, ∞), o seu logaritmo na base a, loga x, é a
inversa da função exponencial f (x) = ax (logo é contínua).
A seguir, destacamos mais alguns fatos sobre a função logarítmica loga .
Se a > 1:
• loga é estritamente crescente;

• Im (loga ) = R, sendo loga x < 0 se 0 < x < 1, loga 1 = 0, loga x > 0 se x > 1;

• lim+ (loga x) = −∞ e lim (loga x) = ∞.


x→0 x→∞

Se 0 < a < 1:
• loga é estritamente decrescente;

• Im (loga ) = R, sendo loga x > 0 se 0 < x < 1, loga 1 = 0, loga x < 0 se x > 1;
28 Capítulo 2. Limite e continuidade

• lim+ (loga x) = ∞ e lim (loga x) = −∞.


x→0 x→∞

A partir das informações dadas, não é difícil fazer um esboço do gráfico de loga .
Devido a importância da base e, tem-se uma notação especial: dado x > 0, denota-se ln x = loge x.

 que já sabemos definir potência com expoente real, podemos considerar a função f (x) =
 Agora
1 x
1+ , que pode ser definida para x > 0 ou x < −1. Mostremos que
x

1 x
 
lim 1 + = e.
x→∞ x

1 n
 
Vamos usar o fato que lim 1 + = e. Dado x > 1, existe n ∈ N tal que
n→∞ n

1 1 1 1 1 1
n ≤ x < n+1 ⇒ ≥ > ⇒ 1+ ≥ 1+ > 1+ ⇒
n x n+1 n x n+1

1 n+1 1 x
     n
1
⇒ 1+ > 1+ > 1+ .
n x n+1
Daí,

1 n+1 n + 1 1 x
     n
1 n+1
n ≤ x < n+1 ⇒ 1+ > 1+ > 1+ . (2.7)
n n x n+1 n+2

n+1 n+1
Como lim = 1 = lim , segue que
n→∞ n n→∞ n + 2

1 n+1 n + 1
   n
1 n+1
lim 1 + = e = lim 1 + .
n→∞ n n n→∞ n+1 n+2

Quando x → ∞, também n → ∞. Então, segue de (2.7):

1 x
 
lim 1 + = e.
x→∞ x

Alguns livros também chamam este limite de (segundo) limite fundamental.


Como consequência também tiramos o seguinte limite.
1 x
 
■ Exemplo 2.8.2 Vamos mostrar que lim 1+ = e.
x→−∞ x
Considere u = −x − 1. Para todo x < −1, temos
−u−1  −u−1 
1 x u+1 u u+1 1 u u+1
     
1 u
1+ = 1− = = · = 1+ · .
x u+1 u+1 u u u u

Como lim u = ∞, temos pelo Teorema 2.4.11,


x→−∞

1 x u+1 u u+1
   
lim 1 + = lim · = e · 1 = e.
x→−∞ x u→∞ u u

Capítulo 3

Derivada

Neste capítulo, estudaremos o conceito de derivada de uma função, suas propriedades e aplicações
mais diretas. Basicamente, a derivada serve para analisar a taxa de variação da função, ou, mudanças de
comportamento em alguns fenômenos naturais. Também fornece ferramentas importantes para estudos
de máximos e mínimos de funções e esboços de gráficos.

3.1 Reta tangente e o conceito de derivada


Sejam f uma função e p ∈ D f . Queremos definir a reta tangente ao gráfico de f no ponto (p, f (p)).
Como tal reta deve passar pelo ponto (p, f (p)), ela fica unicamente determinada se dissermos qual
deve ser o seu coeficiente angular. Considere x ∈ D f \ {p} um ponto próximo de p.

A reta secante que passa por (p, f (p)) e (x, f (x)) tem coeficiente angular

f (x) − f (p)
mx = .
x− p
Observe que, quanto mais x se aproxima de p, mais essa reta secante se aproxima da reta tangente.
Portanto, a seguinte definição é natural.
30 Capítulo 3. Derivada

Definição 3.1.1 O coeficiente angular da reta tangente ao gráfico de f em (p, f (p)) é igual a

f (x) − f (p)
m = lim ,
x→p x− p
desde que esse limite exista.

Definição 3.1.2 Sejam f uma função e p ∈ D f . Dizemos que f é derivável em p quando o seguinte
limite existe
f (x) − f (p)
lim .
x→p x− p
df
Neste caso, tal limite é chamado de derivada de f em p, e será denotado por f ′ (p) ou (p).
dx
Se f é derivável em todos os pontos do seu domínio, dizemos que f é derivável.

Observação 3.1.3 (i) Se f é derivável em p, então fica bem definida a reta tangente ao gráfico
de f em (p, f (p)). Sua equação é dada por

y − f (p) = f ′ (p)(x − p).

Se f ′ (p) ̸= 0, também fica bem definida a reta normal ao gráfico de f em (p, ( f (p))). Sua
equação é dada por
1
y − f (p) = − ′ (x − p).
f (p)

(ii) Fazendo a mudança de variável h = x − p, tem-se

f (x) − f (p) f (p + h) − f (p)


lim = lim .
x→p x− p h→0 h
Ambos os limites costumam ser usados para o cálculo de derivadas. Apenas cuidado para não
f (x + h) − f (x)
se confundir ao calcular f ′ (x) = lim : neste limite a variável é h e x é uma
h→0 h
constante.

■ Exemplo 3.1.4 Sejam c ∈ R e f (x) = c (função constante). Mostremos que f ′ (p) = 0 para todo
p ∈ R. De fato,
f (x) − f (p) c−c
lim = lim = lim 0 = 0.
x→p x− p x→p x − p x→p

Também concluímos que a função constante é derivável. ■

■ Exemplo 3.1.5 Seja f (x) = xn , n ∈ N. Dado p ∈ R, para todo x ̸= p,


f (x) − f (p) xn − pn
= = xn−1 + xn−2 p + · · · + xpn−2 + pn−1 .
x− p x− p
Logo,
f (x) − f (p)
f ′ (p) = lim = lim (xn−1 + xn−2 p + · · · + xpn−2 + pn−1 ) = npn−1 .
x→p x− p x→p

Portanto f é derivável e f ′ (x) = nxn−1 para todo x ∈ R. ■

■ Exemplo 3.1.6 Determine uma equação da reta r tangente ao gráfico da função f (x) = x6 no ponto
de abscissa p = −2.
3.1 Reta tangente e o conceito de derivada 31

Solução. Primeiramente temos que determinar o coeficiente angular f ′ (−2) de r. Pelo exemplo anterior,
f ′ (x) = 6x5 . Logo, f ′ (−2) = −192. Portanto, uma equação da reta r é

y − 64 = −192(x + 2) ⇔ y = −192x − 320.

■ Exemplo 3.1.7 Mostremos que f (x) = |x| não é derivável em p = 0. De fato,



f (x) − f (0) |x| 1, se x > 0
= = .
x−0 x −1, se x < 0

Logo,

f (x) − f (0) f (x) − f (0)


lim+ = lim+ 1 = 1 e lim− = lim− (−1) = −1.
x→0 x−0 x→0 x→0 x−0 x→0

f (x) − f (0)
Portanto, não existe lim .
x→0 x−0
Observe que o gráfico de f apresenta um “bico” no ponto de abscissa 0, por isso não é possível definir
uma reta tangente em (0, f (0)). ■

Observação 3.1.8 Geometricamente falando, há três situações em que uma função f não é
derivável em um ponto p do seu domínio, que podem ser observadas no gráfico de f . São elas:

(i) f não é contínua em p;

(ii) G f apresenta um “bico” em (p, f (p));

(iii) A reta tangente ao gráfico de f em (p, f (p)) é vertical (portanto não se define seu coeficiente
angular).

Os três exemplos a seguir ilustram tais situações.

x2 ,

se x ≥ 3
■ Exemplo 3.1.9 Seja f (x) = . Observe que f não é contínua em p = 3. Mostre-
x + 2, se x < 3
mos que f não é derivável em p = 3. De fato, se x > 3,

f (x) − f (3) x2 − 9
= = x + 3.
x−3 x−3
Logo,
f (x) − f (3)
lim+ = lim+ (x + 3) = 6.
x→3 x−3 x→3

E, se x < 3,
f (x) − f (3) x − 3
= = 1.
x−3 x−3
Logo,
f (x) − f (3)
lim− = lim− 1 = 1.
x→3 x−3 x→3

f (x) − f (3)
Portanto, não existe lim . ■
x→3 x−3
32 Capítulo 3. Derivada

1, se x ≥ 1
■ Exemplo 3.1.10 Seja f (x) = . Observe que f é contínua, mas seu gráfico apresenta
x3 , se x < 1
um “bico” em p = 1. Mostremos que f não é derivável em p = 1. De fato, se x > 1,
f (x) − f (1) 1 − 1
= = 0.
x−1 x−1
Logo,
f (x) − f (1)
lim+ = lim+ 0 = 0.
x→1 x−1 x→1
E, se x < 1,
f (x) − f (1) x3 − 1
= = x2 + x + 1.
x−1 x−1
Logo,
f (x) − f (1)
lim = lim− (x2 + x + 1) = 3.
x→1− x−1 x→1

f (x) − f (1)
Portanto, não existe lim . ■
x→1 x−1
√3
■ Exemplo 3.1.11 Seja f (x) = x. Observe que f é contínua e seu gráfico não apresenta nenhum
“bico”, mas a “reta tangente” em (0, f (0)) seria vertical. Mostremos que f não é derivável em p = 0.
De fato, √
f (x) − f (0) 3
x 1
lim = lim = lim √ = ∞.
x→0 x−0 x→0 x x→0 3 x2

f (x) − f (0)
Portanto, não existe lim . ■
x→0 x−0

■ Exemplo 3.1.12 Seja f (x) = sen x. Mostremos que f é derivável e f ′ (x) = cos x.
Primeiramente relembramos a fórmula que descrevea diferença de senos como produto de senos e
h 2x + h
cossenos: sen(x + h) − sen x = 2 · sen · cos . Daí, para todo x ∈ R,
2 2

2 · sen h2 · cos 2x+h sen h2 · cos 2x+h


 
′ sen(x + h) − sen x 2 2
f (x) = lim = lim = lim h
h→0 h h→0 h h→0
2
!
sen 2h
 
2x + h
= lim h · lim cos = 1 · cos x = cos x.
h→0
2
h→0 2

■ Exemplo 3.1.13 Seja f (x) = cos x. Mostremos que f é derivável e f ′ (x) = −sen x para todo x ∈ R.
Primeiramente relembramos a fórmula  que descreve
 a diferença de cossenos como produto de senos:
h 2x + h
cos(x + h) − cos x = −2 · sen · sen . Daí, para todo x ∈ R,
2 2

−2 · sen h2 · sen 2x+h sen h2 · sen 2x+h


 
′ cos(x + h) − cos x 2 2
f (x) = lim = lim = − lim h
h→0 h h→0 h h→0
2
!
sen h2
 
2x + h
= − lim h · lim sen = −1 · sen x = −sen x.
h→0
2
h→0 2

3.2 Taxas de variação e outras notações para derivada 33

■ Exemplo 3.1.14 Seja f (x) = ex . Mostremos que f é derivável e f ′ (x) = ex para todo x ∈ R.
eh − 1
Primeiramente vamos calcular lim . Considere u = eh − 1. Então,
h→0 h
eh − 1 u 1 1
= = = .
h ln(1 + u) 1 ln(1 + u)1/u
ln(1 + u)
u
Como lim u = 0 e u ̸= 0 para todo h ̸= 0, tem-se
h→0

eh − 1 1 1 1
lim = lim =  = = 1.
h→0 h u→0 ln(1 + u)1/u ln e
ln lim (1 + u)1/u
u→0

Portanto, para todo x ∈ R,

ex+h − ex eh − 1 eh − 1
f ′ (x) = lim = lim ex · = ex · lim = ex .
h→0 h h→0 h h→0 h

1
■ Exemplo 3.1.15 Seja f (x) = ln x. Mostremos que f é derivável e f ′ (x) = para todo x ∈ (0, ∞).
x
 
ln(x + h) − ln x 1 x+h 1 h
lim = lim · ln = lim · ln 1 + .
h→0 h h→0 h x h→0 h x
h
Considere u = . Temos
x
 
1 h 1 1
· ln 1 + = · ln(1 + u) = · ln(1 + u)1/u .
h x ux x
Como lim u = 0 e u ̸= 0 para todo h ̸= 0, tem-se
h→0
   
′ 1 h 1 1/u 1 1/u 1 1
f (x) = lim · ln 1 + = lim · ln(1 + u) = · ln lim (1 + u) = ln e = .
h→0 h x u→0 x x u→0 x x

3.2 Taxas de variação e outras notações para derivada


É natural pensar em variação como mudança em relação ao tempo. No entanto, diversas situações
envolvendo outras variáveis podem ser tratadas da mesma maneira. Por exemplo, na economia pode-se
querer estudar a variação do custo C(x) da produção de x unidades de um produto; na meteorologia
pode-se querer estudar a variação da pressão atmosférica P(h) em relação a altura h.
O conceito de derivada está relacionado com o estudo da taxa de variação. Veja os exemplos a
seguir.
■ Exemplo 3.2.1 Considere um objeto se movendo ao longo de uma linha reta com sua posição
no instante t descrita de acordo com a função posição s(t). No intervalo de tempo entre t e t + ∆t,
o deslocamento do objeto foi ∆s = s(t + ∆t) − s(t). Assim, sua velocidade média nesse intervalo
é
34 Capítulo 3. Derivada

deslocamento ∆s s(t + ∆t) − s(t)


velocidade média = = = .
tempo decorrido ∆t ∆t

Quando ∆t é bem pequeno, próximo de zero, a velocidade média no intervalo [t,t + ∆t] fica próxima
da velocidade do objeto no instante t. Portanto, define-se a velocidade (instantânea) v(t) do objeto no
instante t por

s(t + ∆t) − s(t)


v(t) = lim
∆t→0 ∆t

desde que esse limite exista. Ou seja, a velocidade v(t) = s′ (t) é a derivada da função posição.

■ Exemplo 3.2.2 A área A de um quadrado em função do comprimento ℓ de um dos seus lados é dada
pela fórmula A(ℓ) = ℓ2 . Para entendermos como A(ℓ) varia quando ℓ varia, considere uma pequena
variação ∆ℓ do comprimento e sua variação correspondente da área ∆A = A(ℓ + ∆ℓ) − A(ℓ).

Observe na figura que ∆A é uma faixa estreita ao redor de dois dos lados do quadrado. Daí, intuitiva-
mente, a taxa de variação da área é da ordem de 2ℓ. De fato, ∆A = 2ℓ ∆ℓ + (∆ℓ)2 , Assim, a taxa de
variação média nesse intervalo é
∆A
= 2ℓ + ∆ℓ.
∆ℓ
∆A
Fazendo ∆ℓ tender a zero, lim = 2ℓ. Logo, fica coerente definir que a taxa de variação (instantânea)
∆ℓ→0 ∆ℓ
é dada por
∆A A(ℓ + ∆ℓ) − A(ℓ)
taxa de variação = lim = lim = A′ (ℓ) = 2ℓ.
∆ℓ→0 ∆ℓ ∆ℓ→0 ∆ℓ

Definição 3.2.3 Seja y = f (x) uma função. Se x varia de x a x + h, temos a variação (também
chamada de incremento) ∆x = (x + h) − x = h, e a variação correspondente em y, ∆y = f (x + h) −
f (x). O quociente das variações
∆y f (x + h) − f (x)
=
∆x h
é chamado de taxa média de variação de y em relação a x no intervalo [x, x + h]. Fazendo h tender a
3.3 Propriedades básicas sobre derivadas 35

zero, temos a taxa (instantânea) de variação de y em relação a x:

∆y f (x + h) − f (x)
lim = lim = f ′ (x)
h→0 ∆x h→0 h
desde que esse limite exista.
Há diferentes notações para derivadas que costumam ser utilizadas, cada qual no contexto em que
se torna mais simples e intuitivo o seu uso. Por exemplo, Leibniz introduziu a notação

dy ∆y f (x + ∆x) − f (x)
= lim = lim
dx ∆x→0 ∆x ∆x→0 ∆x
ao pensar em distâncias infinitesimais, por ser o limite de diferenças de incrementos. Vale ressaltar que
dy
o quociente é apenas uma notação, e não deve ser encarado como uma divisão! Essa notação será
dx
conveniente quando estudarmos a Regra da Cadeia, pois facilita na memorização da fórmula e causa
menos confusão ao se calcular derivadas que envolvem mais de uma variável. Mas essa notação é um
pouco desajeitada quando queremos calcular o valor númerico da derivada em um ponto específico
x = p:  
dy dy
ou .
dx x=p dx x=p
A notação que apresentamos inicialmente, f ′ (x), é devido a Newton e se aplica bem para grande parte
dos assuntos estudados no Cálculo I. Algumas notações existentes para a derivada da função y = f (x)
são:
dy df d
f ′ (x), , y′ , , f, Df, Dx f , ẏ, f˙.
dx dx dx

3.3 Propriedades básicas sobre derivadas

Proposição 3.3.1 Se f é derivável em p ∈ D f , então f é contínua em p.

f (x) − f (p)
Demonstração. Como f é derivável em p, existe f ′ (p) = lim . Mostremos que lim f (x) =
x→p x− p x→p
f (p). De fato, para todo x ∈ D f \ {p}, tem-se

f (x) − f (p)
f (x) − f (p) = · (x − p).
x− p
Logo,
f (x) − f (p)
lim ( f (x) − f (p)) = lim · (x − p) = f ′ (p) · 0 = 0.
x→p x→p x− p
Portanto,
lim f (x) = f (p).
x→p

Observação 3.3.2 A recíproca da Proposição 3.3.1 não é verdadeira. Os Exemplos 3.1.7 e 3.1.10
ilustram casos de funções contínuas que não são deriváveis.
36 Capítulo 3. Derivada

Proposição 3.3.3 — Regras de Derivação. Sejam f e g duas funções deriváveis em p e c ∈ R


uma constante. Então, as funções f + g, c f e f · g são deriváveis em p, e valem:

(i) ( f + g)′ (p) = f ′ (p) + g′ (p);

(ii) (c f )′ (p) = c f ′ (p);

(iii) ( f · g)′ (p) = f ′ (p)g(p) + f (p)g′ (p) (Regra do Produto);


 ′
f f f ′ (p)g(p) − f (p)g′ (p)
(iv) se g(p) ̸= 0, então é derivável em p, e, (p) = (Regra do
g g (g(p))2
Quociente).

Antes de apresentarmos a demonstração, vamos ilustrar geometricamente a Regra do Produto.


Suponha, neste caso, que f (x) e g(x) são positivas e crescentes. Considere o retângulo de lados f (x)
e g(x). Então, o produto f (x)g(x) é exatamente o valor da área do retângulo. Queremos analisar
a taxa de variação dessa área A(x). Após o incremento ∆x, temos as variações correspondentes
∆ f = f (x + ∆x) − f (x) e ∆g = g(x + ∆x) − g(x).

Assim, o incremento na área é

∆A = ∆ f · g(x) + f (x) · ∆g + ∆ f · ∆g

Logo, a taxa média de variação é


∆A ∆ f ∆g ∆ f
= · g(x) + f (x) · + · ∆g.
∆x ∆x ∆x ∆x
∆f ∆g
Fazendo ∆x tender a zero, lembrando que lim = f ′ (x) e lim = g′ (x) e que lim ∆g = 0 (pois
∆x→0 ∆x ∆x→0 ∆x ∆x→0
g é contínua, já que é derivável), tem-se
∆A
lim = f ′ (x)g(x) + f (x)g′ (x).
∆x→0 ∆x

Demonstração da Proposição 3.3.3. Os itens (i) e (ii) são simples de se verificar usando a definição
de derivada, e por isso são deixados como exercício.
3.3 Propriedades básicas sobre derivadas 37

Vamos demonstrar o item (iii). Observe que

f (x)g(x) − f (p)g(p) f (x)g(x) − f (p)g(x) + f (p)g(x) − f (p)g(p)


=
x− p x− p
f (x) − f (p) g(x) − g(p)
= g(x) + f (p) .
x− p x− p

Como f e g são deriváveis em p, existem os limites que definem f ′ (p) e g′ (p). Além disso, segue que
g é contínua em p. Assim,

f (x)g(x) − f (p)g(p)
( f · g)′ (p) = lim
x→p x− p
     
f (x) − f (p) g(x) − g(p)
= lim lim g(x) + lim f (p) lim
x→p x− p x→p x→p x→p x− p
′ ′
= f (p)g(p) + f (p)g (p).

Vamos provar agora o item (iv). Primeiramente, mostremos que


 ′
1 g′ (p)
(p) = − .
g (g(p))2
De fato,
1 1 g(p) − g(x)

g(x) g(p) g(x)g(p) g(x) − g(p) 1
= =− .
x− p x− p x − p g(x)g(p)
Usando que g é derivável em p e, em particular, contínua em p, tem-se
1 1
 ′ −
g′ (p)
  
1 g(x) g(p) g(x) − g(p) 1
(p) = lim = − lim lim =− .
g x→p x− p x→p x− p x→p g(x)g(p) (g(p))2
1 f
Por fim, basta utilizar o item (iii) para o produto f · = . ■
g g

■ Exemplo 3.3.4 Toda função polinomial f (x) = a0 + a1 x + · · · + an xn é derivável. Sua derivada é


dada por

f ′ (x) = (a0 )′ + a1 (x)′ + a2 (x2 )′ + · · · + an (xn )′ = a1 + 2a2 x + · · · + nan xn−1 .

■ Exemplo 3.3.5 Seja f (x) = x3 ex . Determine f ′ (0).


Solução. Pela Regra do Produto, f ′ (x) = (3x2 )ex + x3 ex = (3x2 + x3 )ex . Logo, f ′ (0) = 4. ■

■ Exemplo 3.3.6 Seja f (x) = x−n , n ∈ N. Determine f ′ (x).


1
Solução. Usando a Regra do Quociente para f (x) = , tem-se
xn
−nxn−1
f ′ (x) = = −nx−n−1 .
x2n

38 Capítulo 3. Derivada
sen x
■ Exemplo 3.3.7 A função f (x) = tg x = é derivável. Sua derivada é dada por
cos x

(sen x)′ cos x − sen x(cos x)′ cos2 x + sen2 x 1


f ′ (x) = 2
= 2
= = sec2 x.
cos x cos x cos2 x

3.4 Derivadas de ordem superior


Sejam f uma função e D ⊆ D f o conjunto dos pontos onde f é derivável. Podemos definir uma
nova função g = f ′ : D → R, que associa a cada x ∈ D, g(x) = f ′ (x). Tal função é chamada função
derivada de f , ou derivada de 1ª ordem de f .
Se D f ′ for ainda uma união finita de intervalos, podemos novamente considerar a função derivada
de f ′ , que é chamada de derivada de 2ª ordem de f e será denotada por f ′′ .
Analogamente, define-se, para n ∈ N, a derivada de ordem n de f , e denota-se por f (n) . É usual
adotar as notações f ′ , f ′′ , f ′′′ e f (n) para n ≥ 4.
Definição 3.4.1 Seja f uma função. Dado n ∈ N, dizemos que f é de classe Cn em D, e denotamos
f ∈ Cn (D), onde D ⊆ D f , se f admite todas as suas derivadas até ordem n e são contínuas, em cada
ponto de D. Se D = D f , dizemos apenas que f é de classe Cn . Dizemos que f é de classe C∞ em D,
e denotamos f ∈ C∞ (D), se f admite todas as suas derivadas de todas as ordens, em cada ponto de
D. Se D = D f , dizemos apenas que f é de classe C∞ .

■ Exemplo 3.4.2 Seja f (x) = 5x3 − 6x + 1. Para todo x ∈ R, tem-se

f ′ (x) = 15x2 − 6, f ′′ (x) = 30x, f ′′′ (x) = 30, f (n) (x) = 0 para todo n ≥ 4.

Em particular, f é de classe C∞ . ■

■ Exemplo 3.4.3 Seja f (x) = cos x. Para todo x ∈ R, tem-se

f ′ (x) = −sen x, f ′′ (x) = − cos x, f ′′′ (x) = sen x, f (4) (x) = cos x.

Facilmente verifica-se por indução que, para todos n ∈ N e x ∈ R,




 −sen x, se n ≡ 1 mod 4;
− cos x, se n ≡ 2 mod 4;

f (n) (x) =

 sen x, se n ≡ 3 mod 4;
cos x, se n ≡ 0 mod 4.

Em particular, f é de classe C∞ . ■

3.5 Derivada da função inversa


Teorema 3.5.1 — da Função Inversa. Seja f uma função inversível com inversa g = f −1 . Se f é
derivável em p, com f ′ (p) ̸= 0, e g é contínua em q = f (p), então g é derivável em q e

1 1
g′ (q) = = .
f ′ (g(q)) f ′ (p)
3.5 Derivada da função inversa 39

Demonstração. Como f ′ (p) existe e é não nulo, temos


1 1 u− p
= = lim .
f ′ (p) f (u) − f (p) u→p f (u) − f (p)
lim
u→p u− p
Para todo x ∈ Dg , x ̸= q, tem-se

g(x) − g(q) g(x) − g(q)


= .
x−q f (g(x)) − f (g(q))
Fazendo u = g(x), como g é contínua em q, tem-se lim u = g(q) = p. Além disso, sendo g inversível, g
x→q
é injetora, logo g(x) ̸= g(q) para todo x ̸= q. Portanto,
g(x) − g(q) u− p 1
g′ (q) = lim = lim = ′ .
x→q x−q u→p f (u) − f (p) f (p)

Observação 3.5.2 (i) No Teorema da Função Inversa, se o domínio de f for um intervalo,


então pela Proposição 2.7.8, a inversa de f já será uma função contínua. Neste caso, as únicas
hipóteses a se considerar são: f é derivável em p e f ′ (p) ̸= 0.

(ii) O Teorema da Função Inversa não afirma nada a respeito da derivada de g no ponto q = f (p)
se f ′ (p) = 0. A priori, teríamos que verificar pela definição se existe, ou não, g′ (q) neste caso.
Geometricamente é fácil visualizar o que ocorre nesta situação: f ′ (p) = 0 implica que a reta
tangente ao gráfico de f em (p, f (p)) é horizontal. Como o gráfico de g = f −1 é uma reflexão
do gráfico de f em relação a reta y = x, teria-se um caso de reta tangente vertical em (q, g(q)),
que sabemos ser um caso de não existência da derivada.
Adiante, quando estudarmos a Regra da Cadeia, poderemos provar facilmente que, de fato,
não existe g′ (q) se f ′ (p) = 0.


■ Exemplo 3.5.3 Considere g(x) = n
x, n ∈ N, cujo domínio é [0, ∞) se n é par e R se n é ímpar.
A função g é a inversa de f (y) = yn . Como f é injetora, derivável e f ′ (y) = nyn−1 ̸= 0 para todo y ̸= 0,
segue do Teorema da Função Inversa que g é derivável em todo x ̸= 0 = f (0). Além disso,
1 1 1 1
g′ (x) = = √ = x n −1 para todo x ̸= 0.
f ′ (g(x)) n
n( x) n−1 n

■ Exemplo 3.5.4
 Considere g(x) = arcsen x, x ∈ [−1, 1]. A função g é a inversa de

 
f (y) = sen y, y ∈ − π2 , π2
. Como f é injetora, derivável e f (y) = cos y ̸= 0 para todo y ∈ − π2 , π2 ,
segue do Teorema
 da Função Inversa que g é derivável em (−1, 1) (exclui-se -1 e 1 pois −1 = f − π2
e 1 = f π2 ). Além disso,
1 1
g′ (x) = = para todo x ∈ (−1, 1).
f ′ (g(x)) cos(arcsen x)

p para g (x) não é a mais agradável
A expressão obtida  para se fazer contas, por isso vamos melhorá-la.
2 π π
Como cos y = 1 − sen y para todo y ∈ − 2 , 2 , temos
q q p
cos(arcsen x) = 1 − sen (arcsen x) = 1 − (sen(arcsen x))2 = 1 − x2 .
2
40 Capítulo 3. Derivada

Portanto,
1
g′ (x) = √ para todo x ∈ (−1, 1).
1 − x2

π π

■ Exemplo 3.5.5 Considere g(x) = arctg x, x ∈ R. A função g é a inversa
 de f (y) = tg y, y ∈ − 2 , 2 .
Como f é injetora, derivável e f ′ (y) = sec2 y ̸= 0 para todo y ∈ − π2 , π2 , segue do Teorema da Função
Inversa que g é derivável e
1 1
g′ (x) = = para todo x ∈ R.
f ′ (g(x)) sec2 (arctg x)

Novamente vamos melhorar a expressão obtida para g′ (x). Como sec2 y = 1 + tg2 y, temos

sec2 (arctg x) = 1 + tg2 (arctg x) = 1 + (tg(arctg x))2 = 1 + x2 .

Portanto,
1
g′ (x) = para todo x ∈ R.
1 + x2

3.6 Noção de diferenciabilidade


Nesta seção, apresentaremos o conceito de diferenciabilidade, e veremos que ele é equivalente ao
de derivabilidade. Tal conceito será trabalhado mais fortemente no cálculo de várias variáveis. Aqui,
no estudo de funções de uma variável, este conceito nos permitirá verificar que, se uma função f for
diferenciável num ponto p, então a reta tangente ao seu gráfico em (p, f (p)) é uma “boa” aproximação
para o gráfico de f , em pontos de abscissas próximas a p.
Definição 3.6.1 Sejam f uma função e p ∈ D f . Dizemos que f é diferenciável em p se existem
m ∈ R e uma função E p : D f → R contínua em p, com E p (p) = 0, tais que

f (x) = f (p) + m(x − p) + E p (x)(x − p) para todo x ∈ D f .

Observação 3.6.2 Na definição anterior, já podemos observar que, se f é diferenciável em p,


como E p é contínua em p e satisfaz E p (p) = 0, então lim E p (x) = E p (p) = 0. Em particular, E p (x)
x→p
fica tão próximo de zero quanto se queira, para x próximo de p. O mesmo ocorre com (x − p). Daí,
para x próximo de p,
f (x) ≃ f (p) + m(x − p)
que é a equação de uma reta.

Teorema 3.6.3 Sejam f uma função e p ∈ D f . Então, f é diferenciável em p se, e somente se, f é
derivável em p.
Neste caso, m = f ′ (p).

Demonstração. Suponha f diferenciável em p. Então, existem m ∈ R e uma função


E p : D f → R contínua em p, com E p (p) = 0, tais que

f (x) = f (p) + m(x − p) + E p (x)(x − p) para todo x ∈ D f .


3.6 Noção de diferenciabilidade 41

Logo, para todo x ∈ D f \ {p},


f (x) − f (p)
= m + E p (x).
x− p
Portanto,
f (x) − f (p)
lim = lim (m + E p (x)) = m + E p (p) = m + 0 = m.
x→p x− p x→p

Ou seja, f é derivável em p e f ′ (p) = m.


Reciprocamente, suponha f derivável em p. Então, existe

f (x) − f (p)
f ′ (p) = lim .
x→p x− p

Considere E p : D f → R definida por



 f (x) − f (p)
− f ′ (p), se x ∈ D f \ {p};
E p (x) = x− p
0, se x = p.

Pela definição de E p , E p (p) = 0 e tem-se

f (x) = f (p) + f ′ (p)(x − p) + E p (x)(x − p) para todo x ∈ D f .

Resta mostrar que E p é contínua em p, isto é, lim E p (x) = E p (p) = 0. De fato,


x→p
 
f (x) − f (p)
lim E p (x) = lim − f (p) = f ′ (p) − f ′ (p) = 0.

x→p x→p x− p

Portanto f é diferenciável em p, com m = f ′ (p). ■

Pelo teorema anterior, se f é derivável em p, então para todo x ∈ D f ,

R(x) = E p (x)(x − p) = f (x) − ( f (p) + f ′ (p)(x − p)),

ou seja, R(x) é exatamente o erro que se comete ao aproximar a curva y = f (x) (gráfico de f ) pela reta
tangente y = f (p) + f ′ (p)(x − p). Mais ainda, quando x se aproxima de p, esse erro R(x) vai para zero
“mais rápido” que x − p, pois
R(x)
lim = lim E p (x) = 0.
x→p x − p x→p

Além disso, a reta tangente ao gráfico de f em (p, f (p)) é a única reta passando por esse ponto que
aproxima o gráfico de f de modo que, quando x tende a p, o erro tenda a zero mais rápido que x − p. De
fato, sejam y = f (p) + m(x − p) uma reta que passa por (p, f (p)) e Rm (x) = f (x) − ( f (p) − m(x − p))
o erro cometido na aproximação. Então,
 
Rm (x) f (x) − f (p)
lim = lim − m = f ′ (p) − m ̸= 0
x→p x − p x→p x− p

se m ̸= f ′ (p).
Mais adiante, quando estudarmos a Fórmula de Taylor, veremos como calcular um valor aproximado
para R(x). Também veremos como aproximar uma função f , que seja (n + 1)-vezes derivável, por um
polinômio de grau n.
42 Capítulo 3. Derivada

3.7 Regra da Cadeia


Nesta seção, aprenderemos como derivar uma função h(x) = g( f (x)) que é a composta de outras
duas funções f e g deriváveis, para as quais conhecemos expressões de suas derivadas f ′ e g′ .
Considere h(x) = cos(5x). Comparada com a função g(x) = cos x, o argumento de h(x) varia 5
vezes mais rápido que o de g(x), então é natural pensar que a derivada de h, que é a taxa de variação de
h em relação a x, seja 5 vezes a derivada de g. De um modo geral, pensando na derivada como taxa de
variação, também temos essa intuição: a taxa de variação de h(x) = g( f (x)) em relação a x, deve ser a
taxa de variação de g(y) multiplicada pela taxa de variação de f (x). É exatamente isto que nos diz a
Regra da Cadeia.

Teorema 3.7.1 — Regra da Cadeia. Sejam f e g duas funções tais que Im f ⊆ Dg . Considere
p ∈ D f = Dg◦ f . Se f é derivável em p e g é derivável em f (p), então g ◦ f é derivável em p e vale

(g ◦ f )′ (p) = g′ ( f (p)) · f ′ (p).

Demonstração. Como g é derivável em f (p), temos que g é diferenciável em f (p). Logo, existe uma
função E f (p) : Dg → R contínua em f (p), com E f (p) ( f (p)) = 0, tal que

g(y) = g( f (p)) + g′ ( f (p))(y − f (p)) + E f (p) (y)(y − f (p)) para todo y ∈ Dg .

Em particular, para y = f (x), temos

g( f (x)) = g( f (p)) + g′ ( f (p))( f (x) − f (p)) + E f (p) ( f (x))( f (x) − f (p)) para todo x ∈ D f .

Logo, para todo x ∈ D f \ {p}, vale

g( f (x)) − g( f (p)) f (x) − f (p) f (x) − f (p)


= g′ ( f (p)) + E f (p) ( f (x)) . (3.1)
x− p x− p x− p

f (x) − f (p)
Como f é derivável em p, existe f ′ (p) = lim . Também temos que f é contínua em p (pois
x→p x− p
é derivável) e E f (p) é contínua em f (p), logo lim E f (p) ( f (x)) = E f (p) ( f (p)) = 0. Portanto, segue de
x→p
(3.1),
(g ◦ f )(x) − (g ◦ f )(p)
lim = g′ ( f (p)) f ′ (p) + 0 · f ′ (p) = g′ ( f (p)) f ′ (p).
x→p x− p
Logo, g ◦ f é derivável em p e vale (g ◦ f )′ (p) = g′ ( f (p)) f ′ (p). ■

A Regra da Cadeia fica mais fácil de ser memorizada quando usamos a notação de Leibniz: sejam
y = f (x) e z = g(y). Então,

dz dy dz
(g ◦ f )′ (x) = , f ′ (x) = , g′ (y) = .
dx dx dy

Com essa notação, a Regra da Cadeia fica

dz dz dy
= · ,
dx dy dx

que pode ser vista como “cancelando o dy” nas duas frações da direita, apenas para fins de memorização!
3.7 Regra da Cadeia 43

■ Exemplo 3.7.2 Determine a derivada de f (x) = sen(x3 ).


dz
Solução. Usando a notação de Leibniz, sejam y = x3 e z = sen y. Queremos f ′ (x) = . Pela Regra da
dx
Cadeia,
dz dz dy
= · = cos y · 3x2 = 3x2 cos(x3 ).
dx dy dx

■ Exemplo 3.7.3 Determine a derivada de f (x) = (3x4 − 2x + 1)5 .


Solução. Poderíamos até expandir a potência (3x4 − 2x + 1)5 e derivar o polinômio resultante, mas isso
daria uma conta grande! Então vamos usar a Regra da Cadeia. Sejam
4 5 ′ dz
y = 3x − 2x + 1 e z = y . Queremos f (x) = . Temos,
dx
dz dz dy
= · = 5y4 · (12x3 − 2) = (60x3 − 10) (3x3 − 2x + 1)4 .
dx dy dx

2
■ Exemplo 3.7.4 Determine a derivada de f (x) = ex +1 · sen x.
Solução. Aqui teremos que usar a Regra do Produto e a Regra da Cadeia. Temos,
2 +1 2 +1 2 +1 2 +1 2 +1
f ′ (x) = (ex )′ sen x + ex (sen x)′ = (x2 + 1)′ ex sen x + ex cos x = ex (2x sen x + cos x).

■ Exemplo 3.7.5 Sejam g uma função derivável e f (x) = g(2x7 − 4x5 ). Sabendo que g′ (−2) = 4,
calcule f ′ (1).
Solução. Pela Regra da Cadeia,

f ′ (x) = g′ (2x7 − 4x5 ) · (2x7 − 4x5 )′ = g′ (2x7 − 4x5 ) · (14x6 − 20x4 ).

Logo,
f ′ (1) = g′ (2 · 17 − 4 · 15 ) · (14 · 16 − 20 · 14 ) = g′ (−2) · (−6) = −24.

■ Exemplo 3.7.6 Considere a função f (x) = xx . Temos que f (x) = ex ln x é a composta das funções
g(y) = ey e h(x) = x ln x. Sabemos que Dg = R, Dh = (0, ∞) e g e h são deriváveis. Então, pela Regra
da Cadeia, f = g ◦ h é derivável em (0, ∞). Além disso,
 
′ ′ ′ 1
y
f (x) = g (y) · h (x) = e · 1 · ln x + x · = ex ln x (ln x + 1) = xx (ln x + 1).
x

■ Exemplo 3.7.7 Determine a derivada de f (x) = 3x .


Solução. Temos que f (x) = ex ln 3 é a composta das funções g(y) = ey e h(x) = x ln 3. Pela Regra da
Cadeia,
f ′ (x) = g′ (y) · h′ (x) = ey · ln 3 = ln 3 · ex ln 3 = ln 3 · 3x .

44 Capítulo 3. Derivada

■ Exemplo 3.7.8 Seja α ∈ R uma constante. Considere f (x) = xα , x ∈ (0, ∞). Já vimos que, se
α = n ∈ Z \ {0}, então f ′ (x) = nxn−1 (Exemplos 3.1.5 e 3.3.6). Essa regra também se aplica se n = 0.
Vamos mostrar que também vale f ′ (x) = αxα−1 no caso geral α ∈ R.
De fato, f (x) = eα ln x . Logo, pela Regra da Cadeia,
α
f ′ (x) = eα ln x · (α ln x)′ = xα · = αxα−1 .
x

Os três exemplos anteriores são casos particulares do seguinte exemplo.


■ Exemplo 3.7.9 Sejam g e h duas funções deriváveis num mesmo conjunto D, com g(x) > 0 para todo
x ∈ D. Considere a função f (x) = g(x)h(x) = eh(x) ln g(x) , x ∈ D. Então, f é uma composta de funções
deriváveis, portanto f é derivável e vale

f ′ (x) = eh(x) ln g(x) · (h(x) ln g(x))′ = g(x)h(x) · (h(x) ln g(x))′ .

No Teorema da Função Inversa, vimos uma expressão para determinar a derivada da função g = f −1
num ponto q = f (p), desde que f ′ (p) ̸= 0:
1 1
g′ (q) = = .
f ′ (g(q)) f ′ (p)
Podemos deduzir, de maneira simples, a expressão anterior a partir da Regra da Cadeia, tornando assim
desnecessária sua memorização. Temos que x = (g ◦ f )(x) para todo x ∈ D f , pois g é a inversa da f .
Então, supondo que f e g são deriváveis, segue da Regra da Cadeia que

1 = (x)′ = (g ◦ f )′ (x) = g′ ( f (x)) · f ′ (x) para todo x ∈ D f .

Em particular, para x = p, se f ′ (p) ̸= 0,


1
1 = g′ ( f (p)) · f ′ (p) ⇒ g′ ( f (p)) = .
f ′ (p)
Observe que o Teorema da Função Inversa ainda tem sua relevância, pois ele garante, sob suas hipóteses,
que f −1 é derivável em f (p). Já a Regra da Cadeia só pode ser aplicada quando já sabemos que ambas
as funções da composição são deriváveis nos respectivos pontos.
Vamos usar a Regra da Cadeia para demonstrar a proposição a seguir, que foi comentada na
Observação 3.5.2(ii).

Proposição 3.7.10 Seja f uma função inversível com inversa g = f −1 . Se f é derivável em p e


f ′ (p) = 0, então g não é derivável em f (p).

Demonstração. Suponha, por absurdo, que g é derivável em f (p). Como f é derivável em p, segue da
Regra da Cadeia que g ◦ f é derivável em p e

(g ◦ f )′ (p) = g′ ( f (p)) · f ′ (p) = g′ ( f (p)) · 0 = 0. (3.2)

Por outro lado, (g ◦ f )(x) = x para todo x ∈ D f , ou seja, g ◦ f é a função identidade, que é derivável e

(g ◦ f )′ (x) = 1 para todo x ∈ D f .

Em particular, para x = p, (g ◦ f )′ (p) = 1, contradizendo (3.2). Portanto g não é derivável em f (p). ■


3.8 Derivação implícita 45

■ Exemplo 3.7.11 Seja n ∈ N. A função g(x) = n
x não é derivável em x = 0.
De fato, g é a inversa de f (y) = yn , que é inversível, derivável e satisfaz f ′ (0) = 0. Logo, segue da
Proposição 3.7.10 que g não é derivável em 0 = f (0). ■

3.8 Derivação implícita


Até agora, estudamos funções da forma y = f (x), onde y é expresso diretamente através de alguma
fórmula algébrica envolvendo as funções elementares em termos de x. No entanto, existem vários
problemas em que y aparece definida como uma função de x por meio de uma equação

F(x, y) = 0

em que nem sempre é possível “isolar” y em função de x, ou existe mais uma maneira de fazer esse
isolamento, dependendo dos intervalos em que se está interessado.
Definição 3.8.1 Considere uma equação nas variáveis x e y

F(x, y) = 0.

Dizemos que essa equação define implicitamente y = f (x) se, existe um intervalo I tal que para todo
x ∈ I,
F(x, f (x)) = 0.

■ Exemplo 3.8.2 A equação


x 2 + y2 − 4 = 0
define implicitamente as duas funções
p p
y = f (x) = 4 − x2 e y = g(x) = − 4 − x2

para todo x no intervalo [−2, 2]. ■

Estamos interessados calcular a derivada de uma função dada implicitamente, mesmo sem poder
expressar y = f (x) diretamente. Isso será possível derivando ambos os lados da equação F(x, y) = 0 em
relação a x, tendo em mente que y é uma função que depende de x, e usando a Regra da Cadeia. De um
modo geral, ao usar esse método, obtemos uma expressão para y′ que depende de x e y. A parte sobre
quando e porque uma equação define implicitamente uma função que é derivável, será vista no cálculo
de várias variáveis, em um dos teoremas mais importantes do cálculo diferencial: o Teorema da Função
Implícita. Aqui no Cálculo I, iremos sempre supor que a função dada implicitamente é derivável.
■ Exemplo 3.8.3 Sabendo que a equação

xy2 + ln(x2 + y2 ) − x − 1 = 0 (3.3)

define implicitamente uma função derivável y = f (x) > 0 numa vizinhança de x = 0, calcule f ′ (0).
Solução. Derivando a equação (3.3) em relação a x, sabendo que y é uma função de x, obtemos,
1
1 · y2 + x · (2yy′ ) + · (2x + 2yy′ ) − 1 = 0
x2 + y2
 
2y 2x
⇔ 2xy + y′ = 1 − y2 − .
x2 + y2 x2 + y2
46 Capítulo 3. Derivada

Para calcular f ′ (0), precisamos substituir x = 0 na equação acima. Observe que também vamos
precisar saber quem é y = y(0) = f (0). Para isso, façamos x = 0 na equação inicial, pois sabemos que
(x, y) = (0, f (0)) satisfaz (3.3):

0 · y2 + ln(0 + y2 ) − 0 − 1 = 0 ⇒ ln(y2 ) = 1 ⇒ y2 = e ⇒ y = ± e.
√ √
Como estamos interessados em y > 0, vamos considerar a solução (0, e), ou seja, f (0) = e. Portanto,
 √  √
2 e ′ 0 ′ e(1 − e) (1 − e) e
0+ f (0) = 1 − e − ⇒ f (0) = √ = .
0+e 0+e 2 e 2

■ Exemplo 3.8.4 Mostre que a equação

y3 + y = x (3.4)

define implicitamente uma única função y = f (x) em toda a reta R. Supondo que f é derivável,
determine a equação da reta tangente ao gráfico de f no ponto de abscissa x = 2.
Solução. Não é difícil ver que a função g(y) = y3 + y é estritamente crescente em R (em particular
injetora), contínua, lim g(y) = ∞ e lim g(y) = −∞. Então, para cada x ∈ R, pelo Teorema do Valor
y→∞ y→−∞
Intermediário, existe y ∈ R tal que g(y) = x. Tal y é único pois g é injetora.
Ou seja, para cada x ∈ R dado, existe um único y ∈ R tal que o par (x, y) é solução da equação (3.4).
Definindo f (x) = y para todo x ∈ R, temos que y = f (x) é dado implicitamente pela equação inicial, já
que (x, f (x)) satisfaz (3.4), e tal função é única.
Para determinar a reta tangente, precisamos conhecer f (2) e f ′ (2). Substituindo x = 2 em (3.4), ficamos
com a equação polinomial y3 + y − 2 = 0. Testando as possíveis raízes racionais, vemos que y = 1 é
uma solução. Como g(y) = y3 + y é injetora, tal solução é única. Portanto f (2) = 1. Agora, derivando
(3.4) implicitamente em relação a x, temos

1 1 1
3y2 y′ + y′ = 1 ⇒ f ′ (x) = 2
⇒ f ′ (2) = 2
= .
3( f (x)) + 1 3( f (2)) + 1 4

Portanto, a equação da reta tangente ao gráfico de f no ponto de abscissa x = 2 é dada por

1 x 1
y − f (2) = f ′ (2)(x − 2) ⇔ y − 1 = (x − 2) ⇔ y = + .
4 4 2

3.9 Taxas relacionadas


O objetivo desta curta seção é ilustrar mais uma classe de problemas que podem ser resolvidos
utilizando a Regra da Cadeia: o de taxas relacionadas. A ideia aqui é calcular a taxa de variação de
uma grandeza em termos da taxa de variação de outra, que pode ser computada mais facilmente. Para
fazer isso, escrevemos uma equação que relacione ambas (e as variáveis envolvidas) e a derivamos,
usando a Regra da Cadeia.
■ Exemplo 3.9.1 Está sendo bombeado ar para dentro de um balão esférico de modo que seu volume
aumenta a uma taxa de 100 cm3 /s. Quão rápido o raio do balão está aumentando quando o diâmetro for
50 cm?
3.9 Taxas relacionadas 47

Solução. Primeiramente, vamos dar nomes as variáveis envolvidas no problema: sejam V o volume e r
do balão. Expressaremos a variável tempo por t.
As taxas de variações do volume e raio são as derivadas dessas funções em relação ao tempo. Segundo
a hipótese do problema:
dV
= 100 cm3 /s.
dt
A pergunta é: quanto vale
dr
no instante em que r = 25 cm?
dt
Temos duas grandezas envolvidas no problema: o volume e o raio do balão esférico. Sabemos que elas
se relacionam pela equação
4
V = πr3 .
3
Por fim, pela Regra da Cadeia,
dV dV dr dr
= = 4πr2 .
dt dr dt dt
Logo,
dr
100 = 4πr2 .
dt
Quando r = 25:
dr dr 1
100 = 4π · 252 ⇒ = cm/s.
dt dt 25π

■ Exemplo 3.9.2 Dois lados paralelos de um retângulo aumentam a uma velocidade de 4 cm/seg,

enquanto os outros dois lados diminuem, de tal modo que o retângulo resultante permanece com área
constante de 100 cm2 . Qual é a velocidade com que o perímetro varia quando o comprimento do lado
que aumenta é de 20 cm?
Solução. Sejam x o comprimento do lado que aumenta e y o comprimento do lado que diminui. O
perímetro do retângulo é dado por P = 2(x + y) e sua área é A = xy = 100 cm2 . Todas as variáveis
estão variando em função do tempo t. Por hipótese,
dx
= 4 cm/seg.
dt
A pergunta é: quanto vale
dP
no instante em que x = 20 cm?
dt
Derivando as equações do perímetro e área em relação a t, temos
 
dP dx dy dA dx dy
=2 + e = y + x = 0.
dt dt dt dt dt dt
dx
Quando x = 20, temos y = 5. Substituindo na última equação, junto com = 4, temos
dt
dy dy
4 · 5 + 20 =0 ⇒ = −1.
dt dt
Portanto,
dP
= 2(4 − 1) = 6 cm/seg.
dt

Capítulo 4

Aplicações de derivadas no estudo de


funções

Neste capítulo, veremos como utilizar as derivadas em aplicações mais profundas. Aprenderemos
como o estudo das derivadas de uma função fornece ferramentas para conhecermos o comportamento
do seu gráfico, em particular nos ajudam a localizar os seus valores máximos e mínimos, o que tem
diversas aplicações práticas. A chave para muitos desses procedimentos é o principal teorema do
cálculo diferencial: o Teorema do Valor Médio.

4.1 Máximos e mínimos de funções

Definição 4.1.1 Sejam f uma função e p ∈ D f . Dizemos que

(i) p é ponto de máximo absoluto ou global de f se

f (x) ≤ f (p) para todo x ∈ D f ;

(ii) p é ponto de mínimo absoluto ou global de f se

f (x) ≥ f (p) para todo x ∈ D f ;

(iii) p é ponto de máximo relativo ou local de f se existe δ > 0 tal que

f (x) ≤ f (p) para todo x ∈ D f ∩ (p − δ , p + δ );

(iv) p é ponto de mínimo relativo ou local de f se existe δ > 0 tal que

f (x) ≥ f (p) para todo x ∈ D f ∩ (p − δ , p + δ ).

Se p é ponto de máximo absoluto, mínimo absoluto, máximo local ou mínimo local, então f (p) é
chamado de valor máximo absoluto, valor máximo local, valor mínimo absoluto, valor mínimo local
de f , respectivamente. Em qualquer um desses quatro casos, dizemos que p é um ponto extremo de
f.
50 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

■ Exemplo 4.1.2 As funções f (x) = x2 e g(x) = |x| têm um ponto de mínimo absoluto em x = 0, pois
f (x) ≥ 0 = f (0) e g(x) ≥ 0 = g(0) para todo x ∈ R. ■

■ Exemplo 4.1.3 Seja f (x) = cossec x. Lembre que D f = {x ∈ R : x ̸= kπ, k ∈ Z}. A função f tem

infinitos pontos de mínimos e máximos locais, a saber:


π
x= + 2kπ, k ∈ Z, são pontos de mínimos locais,
2
e

x= + 2kπ, k ∈ Z, são pontos de máximos locais.
2
Nenhum desses pontos são extremos absolutos. Os valores máximo e mínimo de f (locais) são 1 e −1,
respectivamente. Veja na figura a seguir o gráfico de f .

Veremos como o estudo da derivada de uma função nos ajudará a determinar seus pontos extremos.
Para o primeiro resultado que vamos apresentar, precisaremos da definição a seguir.
Definição 4.1.4 Sejam f uma função e p ∈ D f . Dizemos que p é um ponto interior de D f , e
denotamos p ∈ (D f )◦ , se existe um intervalo aberto I ⊆ D f , com p ∈ I. No nosso caso, em que D f
é uma união finita de intervalos, p é ponto interior de D f se, p não é uma das extremidades dos
intervalos cuja união compõem f .
4.2 O Teorema do Valor Médio 51

Proposição 4.1.5 Sejam f uma função e p ∈ (D f )◦ um ponto extremo de f . Se f é derivável em p,


então f ′ (p) = 0.

Demonstração. Suponha, sem perda de generalidade, que p seja um ponto de máximo local. Então,
existe δ > 0 tal que

f (x) ≤ f (p) para todo x ∈ D f ∩ (p − δ , p + δ ).

Daí,
f (x) − f (p) f (x) − f (p)
≥0 para todo x ∈ D f ∩ (p − δ , p) ⇒ lim− ≥ 0,
x− p x→p x− p

e,
f (x) − f (p) f (x) − f (p)
≤0 para todo x ∈ D f ∩ (p, p + δ ) ⇒ lim+ ≤ 0.
x− p x→p x− p

f (x) − f (p) f (x) − f (p)


Como f é derivável em p, f ′ (p) = lim− = lim+ . Daí, segue que f ′ (p) =
x→p x− p x→p x− p
0. ■

Observação 4.1.6 (i) A recíproca da proposição anterior não é verdadeira em geral. Por
exemplo, se f (x) = x3 , então f ′ (x) = 3x2 e f ′ (0) = 0, mas 0 não é ponto extremo de f , pois
f (x) > 0 para todo x > 0 e f (x) < 0 para todo x < 0.

(ii) p ∈ D f pode ser um ponto extremo de f somente se,

• p ∈ D f \ (D f )◦ , ou,
• se p ∈ (D f )◦ , então f ′ (p) = 0 ou f não é derivável em p.

Definição 4.1.7 Sejam f uma função e p ∈ D f . Dizemos que p é um ponto crítico de f se não
existe f ′ (p), ou, caso contrário, f ′ (p) = 0.

4.2 O Teorema do Valor Médio

Antes de apresentarmos o Teorema do Valor Médio (TVM), vamos precisar do seguinte teorema,
que na verdade é um caso particular do TVM.

Teorema 4.2.1 — de Rolle. Seja f : [a, b] → R uma função contínua em em [a, b] e derivável em
(a, b) tal que f (a) = f (b). Então, existe c ∈ (a, b) tal que f ′ (c) = 0.

Antes de demonstrar esse teorema, observe na figura a seguir exemplos de gráficos de funções que
ilustram o Teorema de Rolle. Tenha em mente que se f ′ (c) = 0, então a reta tangente ao gráfico de f
em (c, f (c)) é horizontal.
52 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

Demonstração do Teorema de Rolle. Como f é contínua no intervalo fechado [a, b], pelo Teorema de
Weierstrass, existem x1 , x2 ∈ [a, b] tais que

f (x1 ) ≤ f (x) ≤ f (x2 ) para todo x ∈ [a, b].

Se {x1 , x2 } = {a, b}, isto é, x1 e x2 são os extremos do intervalo [a, b], então f (a) = f (x) = f (b) para
todo x ∈ [a, b]. Logo f é uma função constante, e portanto f ′ (x) = 0 para todo x ∈ [a, b].
Se x1 ou x2 está em (a, b), por exemplo x1 , então x1 é um ponto interior de D f , logo, pela Proposição
4.1.5, f ′ (x1 ) = 0. ■

Observação 4.2.2 Se alguma das hipóteses do Teorema de Rolle for suprimida, ele não é verdadeiro
em geral. Por exemplo, se f : [−1, 1] → R é dada por f (x) = |x|, então f é contínua em [−1, 1],
f (−1) = f (1) = 1 mas f não é derivável em todos os pontos de (−1, 1) (pois não é derivável em 0).
Nesse caso, não existe c ∈ (−1, 1) tal que f ′ (c) = 0.

Teorema 4.2.3 — do Valor Médio - TVM. Seja f : [a, b] → R uma função contínua em em [a, b] e
f (b) − f (a)
derivável em (a, b). Então, existe c ∈ (a, b) tal que f ′ (c) = .
b−a

Geometricamente, f ′ (c) é o coeficiente angular da reta r tangente ao gráfico de f por (c, f (c)), e,
f (b) − f (a)
é o coeficiente angular da reta s secante por (a, f (a)) e (b, f (b)). Então, o TVM diz que,
b−a
existe c ∈ (a, b) tal que a reta r é paralela a reta s.
4.2 O Teorema do Valor Médio 53

Demonstração do Teorema do Valor Médio. Considere a função auxiliar g : [a, b] → R definida por
 
f (b) − f (a)
g(x) = f (x) − (x − a) + f (a) .
b−a
Então g é contínua em [a.b], pois é soma de funções contínuas em [a.b], e g é derivável em (a, b), pois
é soma de funções deriváveis em (a.b). Observe também que g(a) = 0 = g(b). Assim, pelo Teorema
de Rolle, existe c ∈ (a, b) tal que g′ (c) = 0. Temos,
f (b) − f (a) f (b) − f (a) f (b) − f (a)
g′ (x) = f ′ (x) − ⇒ 0 = g′ (c) = f ′ (c) − ⇒ f ′ (c) = .
b−a b−a b−a

Como uma primeira aplicação do TVM veremos o seguinte exemplo.


■ Exemplo 4.2.4 Mostre que, dados a, b ∈ R, a < b, vale

|sen b − sen a| ≤ |b − a|.

De fato, a função f (x) = sen x é contínua e derivável em R, logo é contínua em [a, b] e derivável em
(a, b). Pelo TVM, existe c ∈ (a, b) tal que
sen b − sen a
cos c = f ′ (c) = ⇒ |sen b − sen a| ≤ | cos c| |b − a| ≤ |b − a|,
b−a
pois | cos c| ≤ 1 para todo c ∈ R. ■

Uma outra consequência do TVM, cuja demonstração será deixada como exercício, é a seguinte
proposição.

Proposição 4.2.5 Se f ′ (x) = 0 para todo x num intervalo I, então existe uma constante c ∈ R tal
que f (x) = c para todo x ∈ I.

O teorema a seguir é outro corolário do Teorema de Rolle, apesar de ser uma generalização do
TVM. Ele será usado mais como uma ferramenta técnica para demonstrar outros resultados do que em
aplicações diretas.

Teorema 4.2.6 — do Valor Médio Generalizado. Sejam f , g : [a, b] → R duas funções contínuas
em [a, b] e deriváveis em (a, b). Então, existe c ∈ (a, b) tal que

f ′ (c)(g(b) − g(a)) = g′ (c)( f (b) − f (a)).


54 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

Demonstração. Considere a função auxiliar h : [a, b] → R definida por

h(x) = f (x)(g(b) − g(a)) − g(x)( f (b) − f (a)).

Então, g é contínua em [a, b], pois é soma de funções contínuas em [a, b], e g é derivável em (a, b),
pois é soma de funções deriváveis em (a, b). Observe também que h(a) = f (a)g(b) − g(a) f (b) = h(b).
Agora, basta aplicar o Teorema de Rolle para h. ■

4.3 Intervalos de crescimento e decrescimento


A derivada de uma função pode nos ajudar a identificar os intervalos onde a função é crescente e
decrescente. Tendo em mente que o coeficiente angular (inclinação) da reta tangente ao gráfico de f no
ponto (x, f (x)) é f ′ (x), veja a figura a seguir.

Proposição 4.3.1 Seja f : I → R uma função contínua no intervalo I e derivável em I ◦ .

(i) Se f ′ (x) > 0 para todo x ∈ I ◦ , então f é estritamente crescente em I.

(ii) Se f ′ (x) < 0 para todo x ∈ I ◦ , então f é estritamente decrescente em I.

Demonstração. Provaremos o item (i). Sejam x1 , x2 ∈ I com x1 < x2 . Temos que mostrar que f (x1 ) <
f (x2 ). Como [x1 , x2 ] ⊆ I, temos que f é contínua em [x1 , x2 ] e derivável em (x1 , x2 ). Pelo TVM, existe
c ∈ (x1 , x2 ) tal que
f (x2 ) − f (x1 ) = f ′ (c)(x2 − x1 ).
Como c ∈ (x1 , x2 ) ⊆ I ◦ , temos por hipótese f ′ (c) > 0. Também x2 − x1 > 0, portanto f (x2 ) − f (x1 ) > 0,
donde segue que f (x1 ) < f (x2 ).
A demonstração do item (ii) é análoga. ■
4.3 Intervalos de crescimento e decrescimento 55

■ Exemplo 4.3.2 Determine os intervalos de crescimento e decrescimento da função


x2
f (x) = .
x2 − 1
Solução. Primeiro observe que D f = R \ {−1, 1} e f é derivável em todos os pontos do seu domínio.
Tem-se
2x(x2 − 1) − x2 2x 2x
f ′ (x) = 2 2
=− 2 .
(x − 1) (x − 1)2
Assim,

f ′ (x) = 0 ⇔ x = 0;
f ′ (x) > 0 ⇔ x ∈ (−∞, −1) ∪ (−1, 0);
f ′ (x) < 0 ⇔ x ∈ (0, 1) ∪ (1, ∞).

Logo, a derivada de f ′ é positiva nos intervalos (−∞, −1) e (−1, 0), e negativa nos intervalos (0, 1) e
(1, ∞). Portanto, pela Proposição 4.3.1, f é estritamente crescente nos intervalos (−∞, −1) e (−1, 0] e
f é estritamente decrescente nos intervalos [0, 1) e (1, ∞).
Costuma-se usar um diagrama que resume o sinal da derivada e intervalos de crescimento de f :

A figura a seguir é um esboço do gráfico de f .

Cuidado: f não é estritamente crescente em (−∞, 0] ∩ D f ! Se x ∈ (−∞, −1), então f (x) > 0, e se
x ∈ (−1, 0), então f (x) < 0. A Proposição 4.3.1 só tira conclusões em intervalos, e não união de
intervalos como (−∞, 0] ∩ D f = (−∞, −1) ∪ (−1, 0). ■

Proposição 4.3.3 Sejam f : (a, b) → R uma função contínua e p ∈ (a, b). Suponha f derivável em
(a, p) ∪ (p, b).

(i) Se f ′ (x) > 0 para todo x ∈ (a, p) e f ′ (x) < 0 para todo x ∈ (p, b), então p é um ponto de
56 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

máximo de f em (a, b).

(ii) Se f ′ (x) < 0 para todo x ∈ (a, p) e f ′ (x) > 0 para todo x ∈ (p, b), então p é um ponto de
mínimo de f em (a, b).

Demonstração. Provaremos o item (i). Como f ′ (x) > 0 para todo x ∈ (a, p) e f é contínua em (a, p],
pela Proposição 4.3.1, f é estritamente crescente em (a, p]. Logo,

f (x) ≤ f (p) para todo x ∈ (a, p].

Também, f ′ (x) < 0 para todo x ∈ (p, b) e f contínua em [p, b) implica f estritamente decrescente em
[p, b). Logo,
f (x) ≤ f (p) para todo x ∈ [p, b).
Portanto, concluímos que f (x) ≤ f (p) para todo x ∈ (a, b), donde segue que p é um ponto de máximo
de f em (a, b).
A demonstração do item (ii) é análoga. ■

1 √
■ Exemplo 4.3.4 Mostre que − < ln x < 2 x para todo x > 0. Conclua que
x
ln x
lim = 0.
x→∞ x
1 1 1
Solução. Mostremos primeiro que f (x) = ln x + > 0 para todo x > 0. Observe que f ′ (x) = − 2 .
x x x
Logo, f ′ (x) < 0 para todo x ∈ (0, 1) e f ′ (x) > 0 para todo x ∈ (1, ∞). Portanto 1 é um ponto de mínimo
de f em (0, ∞). Daí,

1
ln x + = f (x) ≥ f (1) = 0 + 1 > 0 para todo x > 0.
x
√ 1 1
Agora, mostremos que g(x) = ln x − 2 x < 0 para todo x > 0. Observe que g′ (x) = − √ . Logo,
x x
g′ (x) > 0 para todo x ∈ (0, 1) e g′ (x) < 0 para todo x ∈ (1, ∞). Portanto 1 é um ponto de máximo de g
em (0, ∞). Daí,
1
ln x − √ = g(x) ≤ g(1) = 0 − 2 < 0 para todo x > 0.
x
Por fim, para todo x ≥ 1, √
ln x 2 x 2
0≤ < =√ .
x x x
2 ln x
Como lim √ = 0, pelo Teorema do Confronto, lim = 0. ■
x→∞ x x→∞ x

4.4 Concavidade e pontos de inflexão


Lembre que, se f é uma função derivável num ponto p, então a reta tangente ao gráfico de f em
(p, f (p)) tem equação
Tp (x) = f (p) + f ′ (p)(x − p).
A seguir vamos definir o conceito de concavidade de função, que basicamente vai no dizer as partes do
gráfico de f que ficam “acima” das retas tangentes ou “abaixo” das mesmas.
4.4 Concavidade e pontos de inflexão 57

Definição 4.4.1 Seja f : I → R uma função contínua no intervalo I e derivável em I ◦ . Dizemos


que f tem a concavidade para cima em I se, para todo p ∈ I ◦ ,

f (x) > f (p) + f ′ (p)(x − p) = Tp (x) para todo x ∈ I \ {p}.

Dizemos que f tem a concavidade para baixo em I se, para todo p ∈ I ◦ ,

f (x) < f (p) + f ′ (p)(x − p) = Tp (x) para todo x ∈ I \ {p}.

Definição 4.4.2 Sejam f uma função e p ∈ D◦f com f contínua em p. Dizemos que p é um ponto
de inflexão de f se existe (a, b) ⊆ D f tal que p ∈ (a, b), f é derivável em (a, p) ∪ (p, b) e f tem
concavidades contrárias em (a, p) e (p, b).

Proposição 4.4.3 Seja f : I → R uma função contínua no intervalo I e duas vezes derivável em I ◦ .

(i) Se f ′′ (x) > 0 para todo x ∈ I ◦ , então f tem a concavidade para cima em I.

(ii) Se f ′′ (x) < 0 para todo x ∈ I ◦ , então f tem a concavidade para baixo em I.

Demonstração. Provaremos o item (i). Seja p ∈ I ◦ . Temos que mostrar que

f (x) > f (p) + f ′ (p)(x − p) para todo x ∈ I \ {p}.

Considere a função g(x) = f (x) − f (p) − f ′ (p)(x − p). Observe que g é contínua em I e derivável em
I ◦ . Além disso, para todo x ∈ I ◦ , g′ (x) = f ′ (x) − f ′ (p). Como f ′′ (x) > 0 para todo x ∈ I ◦ , temos que
f ′ é estritamente crescente em I. Logo,

g′ (x) < 0 para x < p e g′ (x) > 0 para x > p.

Portanto, g é estritamente descrescente em {x ∈ I : x < p} e g é estritamente crescente em {x ∈ I : x > p},


ou seja, p é um ponto de mínimo global de g em I. Como g(p) = 0, segue que g(x) > 0 para todo
x ∈ I \ {p}. Daí,
f (x) > f (p) + f ′ (p)(x − p) para todo x ∈ I \ {p}.
A demonstração do item (ii) é análoga. ■

Observe que, se f ′′ (x) > 0 num intervalo indica que f ′ (x) (coeficiente angular da reta tangente)
é uma função crescente nesse intervalo. Geometricamente, isso significa que as retas tangentes ao
gráfico de f giram no sentido anti-horário quando x varia da esquerda para direita. Analogamente, se
58 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

f ′′ (x) < 0, as retas tangentes giram no sentido horário. Os pontos de mudanças de concavidade são os
pontos de inflexão.

x5 2x3
■ Exemplo 4.4.4 Considere a função f (x) = − x4 − + 6x2 − 7x. Analise f quanto a concavidade
5 3
e pontos de inflexão. Faça um esboço do gráfico de f usando isso e outras ferramentas já estudadas,
como limites, intervalos de crescimento e decrescimento, pontos de máximos e mínimos.
Solução. O domínio de f é todo R e f é de classe C∞ em R. Tem-se f ′ (x) = x4 − 4x3 − 2x2 + 12x − 7
e f ′′ (x) = 4x3 − 12x2 − 4x + 12. Para facilitar a análise do sinal de f ′′ , vamos fatorá-la. Procurando por
raízes racionais, facilmente encontra-se que −1, 1, 3 são as raízes de f ′′ . Assim,

f ′′ (x) = 4(x + 1)(x − 1)(x − 3).

Daí, é fácil ver que f ′′ (x) > 0 para −1 < x < 1 e x > 3 e f ′′ (x) < 0 para x < −1 e 1 < x < 3. Fazendo
um esquema em diagramas:

Pela Proposição 4.4.3, f tem a concavidade para cima em (−1, 1) ∪ (3, ∞) e a concavidade para baixo
em (−∞, −1) ∪ (1, 3). Daí, também concluímos que −1, 1 e 3 são os pontos de inflexão de f .
Vamos agora procurar as raízes f ′ (x), que são os candidatos a pontos de máximos e mínimos
de f , e também fatorar f ′ (x) para facilitar a análise do sinal. Testando as possíveis raízes racionais
de f ′ , vemos que 1 é uma raiz de f ′ . Efetuando a divisão de f ′ (x) por x − 1, obtemos f ′ (x) =
(x − 1)(x3 − 3x2 − 5x + 7). Procurando por raízes racionais de x3 − 3x2 − 5x + 7, encontra-se que 1
é raiz novamente. Daí, f ′ (x) = (x − 1)2 (x2 − 2x − 7). Por fim, usando a fórmula de Bháskara para
x2 − 2x − 7, concluímos que
√ √
f ′ (x) = (x − 1)2 (x − (1 − 2 2))(x − (1 + 2 2)),
4.4 Concavidade e pontos de inflexão 59
√ √ √ √
donde conclui-se que f ′ (x) > 0 para x < 1−2 2 e x √> 1+2 2 e√f ′ (x) < 0 para 1−2 2 < x < 1+2 2.
Portanto √ f é estritamente
√ crescente em (−∞, 1 − 2 √ 2] e [1 − 2 2, ∞) e estritamente decrescente em
[1 − 2 2, 1 + 2 √ 2]. Também concluímos que 1 − 2 2 é o único ponto de máximo local de f (não
é global) e 1 + 2 2 é o único ponto de mínimo local de f (não é global). Observe que, apesar de
f ′ (1) = 0, o ponto 1 não é ponto extremo de f (é de inflexão).
Para o esboço do gráfico também é conveniente calcular lim f (x) e lim f (x). Deixamos como
x→∞ x→−∞
exercício verificar que lim f (x) = ∞ e lim f (x) = −∞.
x→∞ x→−∞
Por fim, para deixar o esboço um pouco mais preciso, é interessante calcular o valor de f em alguns
pontos específicos, ou ao menos determinar se são positivos ou negativos, como nos pontos de máximos
e mínimos, pontos de inflexão e no x = 0 (para vermos onde G f corta o eixo y). Também é interessante,
caso não seja muito difícil, determinar mais ou menos onde ficam as raízes da função, isto é, os valores
de x tais que f (x) = 0 (para vermos onde G f corta o eixo x).

Veremos mais detalhes sobre esboços de gráficos na Seção 4.6. ■

Proposição 4.4.5 Sejam f : I → R uma função de classe C2 no intervalo I e p ∈ I ◦ um ponto de


inflexão de f . Então f ′′ (p) = 0.

Demonstração. Usaremos o seguinte exercício de continuidade, cuja demonstração é deixada a cargo


do leitor: se g(p) > 0 e g é contínua em p, existe um intervalo aberto J contendo p tal que f (x) > 0
para todo x ∈ J ∩ Dg . Tal fato também é conhecido como Teorema da Conservação do Sinal.
Suponha, por absurdo f ′′ (p) ̸= 0. Sem perda de generalidade, suponha f ′′ (p) > 0. Como f ′′ é contínua,
pelo Teorema da Conservação do Sinal, existe um intervalo aberto (a, b) contendo p, que já podemos
supor (a, b) ⊆ I (se não o fosse bastaria considerar um intervalo menor contido em (a, b)), tal que
f ′′ (x) > 0 para todo x ∈ (a, b). Logo, pela Proposição 4.4.3, f tem a concavidade para cima em (a, b),
o que é absurdo pois p ∈ (a, b) é ponto de inflexão. ■

Observação 4.4.6 (i) A recíproca da Proposição 4.4.5 não é verdadeira em geral. Por exemplo,
a função f (x) = x4 , tem f ′′ (x) = 12x2 > 0 para todo x ∈ (−∞, 0) ∪ (0, ∞). Logo f tem a
concavidade para cima em R. Nesse caso, f ′′ (0) = 0 e 0 não é ponto de inflexão.

(ii) Os candidatos a pontos de inflexão de uma função f são tais que f ′′ (p) = 0 ou não existe f ′′ (p).
√ 2
Por exemplo, se f (x) = 3 x, então p = 0 é um ponto de inflexão de f , pois f ′′ (x) = − √
3 5
>0
9 x
para todo x < 0 e f ′′ (x) < 0 para todo x > 0, mas f não é derivável em 0, logo não existe
60 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

f ′′ (0).

A proposição a seguir não será tão utilizada para os nossos propósitos, pois geralmente quando
formos procurar pontos de inflexão de uma função f também estaremos interessados no estudo da
concavidade de f , e assim encontraremos os pontos de inflexão ao analisar o sinal de f ′′ . Mas, ela pode
ser útil em alguns casos que é difícil determinar os intervalos em que f ′′ é positiva ou negativa.

Proposição 4.4.7 Sejam f : I → R uma função de classe C3 no intervalo I e p ∈ I ◦ tal que f ′′ (p) = 0.
Se f ′′′ (p) ̸= 0, então p é ponto de inflexão de f .

Demonstração. Sem perda de generalidade, suponha f ′′′ (p) > 0. Como f ′′′ é contínua, pelo Teorema
da Conservação do Sinal, existe um intervalo aberto (a, b) contendo p, que já podemos supor (a, b) ⊆ I,
tal que f ′′′ (x) > 0 para todo x ∈ (a, b). Logo, f ′′ é estritamente crescente em (a, b). Como f ′′ (p) = 0,
segue que f ′′ (x) < 0 para x ∈ (a, p) e f ′ (x) > 0 para x ∈ (p, b). Portanto, f tem a concavidade para
baixo em (a, p) e a concavidade para cima em (p, b), logo p é ponto de inflexão. ■

Proposição 4.4.8 Sejam f : (a, b) → R uma função de classe C2 e p ∈ (a, b) tal que f ′ (p) = 0.

(i) Se f ′′ (p) > 0, então p é um ponto de mínimo local de f .

(ii) Se f ′′ (p) < 0, então p é um ponto de máximo local de f .

Demonstração. Exercício. ■

4.5 Retas Assíntotas


Definição 4.5.1 Sejam f uma função e p um ponto de D f ou extremidade de um dos intervalos
que compõem D f . Dizemos que a reta x = p é uma assíntota vertical para o gráfico de f se
lim+ f (x) = ±∞ ou lim− f (x) = ±∞.
x→p x→p

Definição 4.5.2 Seja f : (a, ∞) → R uma função. Dizemos que a reta y = mx + n é uma assíntota
para o gráfico de f , para x → ∞, se

lim ( f (x) − (mx + n)) = 0.


x→∞

Se m = 0, dizemos que a assíntota é horizontal e, se m ̸= 0, dizemos que a assíntota é oblíqua.

Analogamente define-se assíntota para o gráfico de f para x → −∞.


4.5 Retas Assíntotas 61

Vamos descrever um procedimento para procurar as possíveis retas assíntotas oblíquas e horizontais.
Observe que, se lim ( f (x) − (mx + n)) = 0, então para x >> 0 (x muito grande),
x→∞

f (x) mx + n n
f (x) ≈ mx + n ⇒ ≈ = m+
x x x

f (x)
que tende a m quando x tende a infinito. Assim, para se ter um palpite para m, calcula-se lim . Se
x→∞ x
f (x)
esse limite existir, toma-se m = lim , então calcula-se lim ( f (x) − mx), que se existir, será o valor
x→∞ x x→∞
de n, e então tem-se a reta assíntota para x → ∞. Mas atenção: a existência de

f (x) f (x) − mx
m = lim ⇒ lim =0
x→∞ x x→∞ x

sen x
não implica na existência de lim ( f (x) − mx). Por exemplo, lim = 0 mas não existe lim (sen x −
x→∞ x→∞ x x→∞
0 · x).
2x3
■ Exemplo 4.5.3 Seja f (x) = 2 . Procuraremos as retas assíntotas para x → ±∞. Temos,
x +1

f (x) 2x2 2
lim = lim 2 = lim = 2.
x→±∞ x x→±∞ x + 1 x→±∞ 1 + 12
x

Agora,

−2x −2
lim ( f (x) − 2x) = lim = lim = 0.
x→∞ x→±∞ x2 + 1 x→±∞ x + 1x

Logo, y = 2x é assíntota para o gráfico de f para x → ±∞.


62 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

p
■ Exemplo 4.5.4 Seja f (x) = 9x2 + 3x + 1. Procuraremos as retas assíntotas para
x → ±∞. Temos,
q
x 9 + 3x + x12
r
f (x) 3 1
lim = lim = lim 9+ + 2 = 3
x→∞ x x→∞ x x→∞ x x

e
q
−x 9 + 3x + x12
r
f (x) 3 1
lim = lim = lim − 9 + + 2 = −3.
x→−∞ x x→−∞ x x→−∞ x x

Agora temos que calcular lim ( f (x) − 3x) e lim ( f (x) + 3x). Observe que
x→∞ x→−∞


p
2
9x2 + 3x + 1 + 3x
f (x) − 3x = ( 9x + 3x + 1 − 3x) · √
9x2 + 3x + 1 + 3x
9x2 + 3x + 1 − 9x2
= √
9x2 + 3x + 1 + 3x
3x + 1
= q
x 9 + 3x + x12 + 3x
3 + 1x
= q .
9 + 3x + x12 + 3

1 1
Logo, lim ( f (x) − 3x) = e y = 3x + é assíntota para o gráfico de f para x → ∞. Analogamente,
x→∞ 2 2
1 1
verifica-se que lim ( f (x) + 3x) = − e portanto y = −3x − é assíntota para o gráfico de f para
x→−∞ 2 2
x → −∞.
4.6 Esboço de gráficos 63

4.6 Esboço de gráficos


Nesta seção, elaboraremos um roteiro com todas as ferramentas estudadas até agora que são úteis
para esboçar o gráfico de uma função. Também faremos alguns exemplos.
Dada uma função f , sugerimos o seguinte roteiro.

(1) Explicitar o domínio de f e os conjuntos dos pontos em que f é contínua e derivável.

(2) Determinar os intervalos de crescimento e decrescimento de f e seus pontos de máximos e


mínimos.

(3) Estudar a concavidade de f e determinar seus pontos de inflexão.

(4) Identificar, se houverem, simetrias da função (função par, ímpar, periódica).

(5) Calcular os limites laterais de f em p nos casos:

(i) p ∈
/ D f mas p é extremo de um dos intervalos que compóem D f ;
(ii) p ∈ D f mas f não é contínua em p.

(6) Calcular os limites para x → ±∞, quando for o caso (intervalos ilimitados compõem o domínio).

(7) Determinar, se existirem, retas assíntotas para o gráfico de f .

(8) Determinar ou localizar as raízes de f .

(9) Determinar o valor de f em alguns pontos convenientes.

x2 − 1
■ Exemplo 4.6.1 Faça um esboço do gráfico da função f (x) = .
3x2 + 1
Vamos seguir o roteiro.
(1) Como 3x2 + 1 > 0 para todo x ∈ R, tem-se D f = R. Também, f é contínua e derivável em todo R.
(2) Para todo x ∈ R,
2x(3x2 + 1) − (x2 − 1)6x 8x
f ′ (x) = = .
(3x2 + 1)2 (3x2 + 1)2
64 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

Daí, vemos que f ′ (x) < 0 para todo x < 0 e f ′ (x) > 0 para todo x > 0. Portanto, f é estritamente
decrescente em (−∞, 0] e estritamente crescente em [0, ∞). Além disso, 0 é o único ponto extremo de
f , que é um ponto de mínimo global.
(3) Para todo x ∈ R,

8(3x2 + 1)2 − 8x · 2(3x2 − 1)6x 8(3x2 + 1) − 8x · 12x 8 − 72x2 8(1 − 9x2 )


f ′′ (x) = = = = .
(3x2 + 1)4 (3x2 + 1)3 (3x2 + 1)3 (3x2 + 1)3
     
1 1 1 1
Daí, vemos que f ′′ (x) > 0 para todo x ∈
−∞, − ex∈ ′′
, ∞ e f (x) < 0 para todo x ∈ − , .
3  3  3 3
1 1
Portanto f é tem a concavidade para cima em −∞, − e , ∞ e f tem a concavidade para baixo
  3 3
1 1 1 1
em − , . Também, concluímos que − e são os pontos de inflexão de f .
3 3 3 3
(4) Observe que f (x) = f (−x) para todo x ∈ R, ou seja, f é uma função par. Logo, o seu gráfico é
simétrico em relação ao eixo y.
(5) Não se aplica. Daqui já concluímos que o gráfico de f não possui reta assíntota vertical.
1 − x12 1
(6) lim f (x) = lim 1
= . Daqui já concluímos que o gráfico de f possui assíntota horizontal
x→±∞ x→±∞ 3 +
x2
3
1
y = para x → ±∞.
3
(7) Já vimos em (6) que o gráfico de f possui assíntota horizontal para x → ±∞, então não precisamos
mais procurar por assíntotas oblíquas.
(8) f (x) = 0 ⇔ x2 − 1 = 0 ⇔ x = ±1.
Observe também que f (x) > 0 em (−∞, −1) ∪ (1, ∞) e f (x) < 0 em (−1, 1).
(9) É interessante calcular f (0), para ver onde o gráfico de f corta o eixo y, e também determinar (ao
menos aproximadamente) quanto vale f nos pontos extremos e de inflexão. Temos,
   
1 1 2
f (0) = −1 e f − =f =− .
3 3 3

y
1
3
Gf
x
−1 − 13 1 1
3

− 32

−1

1
p
3
■ Exemplo 4.6.2 Faça um esboço do gráfico da função f (x) = 3x2 − x3 = (3x2 − x3 ) 3 .
4.6 Esboço de gráficos 65

(1) D f = R e f é contínua. Também, f é derivável em todo x ∈ R tal que 3x2 − x3 ̸= 0, ou seja, f é


derivável em R \ {0, 3}.
(2) Para todo x ∈ R \ {0, 3},
1 2 2x − x2
f ′ (x) = (3x2 − x3 )− 3 (6x − 3x2 ) = p .
3 3
(3x2 − x3 )2
Daí, vemos que f ′ (x) < 0 para todo x < 0 e x > 2 (x ̸= 3) e f ′ (x) > 0 para todo 0 < x < 2. Portanto, f
é estritamente decrescente em (−∞, 0), (2, 3) e (3, ∞) e estritamente crescente em (0, 2). Além disso, 0
é o único ponto de mínimo local de f e 2 é o único ponto de máximo local de f .
(3) Para todo x ∈ R \ {0, 3},

2 2 6x − 3x2
(2 − 2x)(3x2 − x3 ) 3 − (2x − x2 ) · ·
3 (3x2 − x3 ) 13
f ′′ (x) = p 3
(3x2 − x3 )4
(2 − 2x)(3x2 − x3 ) − 2x2 (2 − x)2
= p3
(3x2 − x3 )5
−2x2
= p
x2 3 x4 (3 − x)5
2
= p .
3
x4 (x − 3)5

Daí, vemos que f ′′ (x) < 0 para todo x ∈ (−∞, 0) e x ∈ (0, 3) e f ′′ (x) > 0 para todo x ∈ (3, ∞). Portanto,
f é tem a concavidade para baixo em (−∞, 0) e (0, 3)) e f tem a concavidade para cima em (3, ∞).
Também, concluímos que 3 é o único ponto de inflexão de f .
(4) Não vemos nenhuma simetria mais imediata para f .
(5) Não se aplica. Daqui já concluímos que o gráfico de f não possui reta assíntota vertical.
r
3 3
(6) lim f (x) = lim x · − 1 = −∞ e lim f (x) = ∞.
x→∞ x→∞ x x→−∞

f (x)
(7) lim = −1 e lim ( f (x) + x) = lim ( f (x) + x).
x→±∞ x x→±∞ x→±∞
Portanto, a reta y = −x é assíntota para o gráfico de f para x → ±∞.
(8) f (x) = 0 ⇔ x = 0 ou x = 3.

(9) f (0) = 0, f (2) = 3 4 ∼
= 1, 6 e f (3) = 0.
66 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

4.7 Problemas de otimização

Uma das principais aplicações de derivadas é o estudo de máximos e mínimos de funções. Na vida
prática, diversos problemas envolvem maximizar ou minimizar funções, o que são conhecidos como
problemas de otimização. Por exemplo, na indústria e nos negócios em geral se deseja maximizar o
lucro e minimizar os custos. Ao se projetar um veículo, procura-se maximizar sua eficiência. Nesta
seção, veremos alguns exemplos de tais problemas.
De maneira geral, os procedimentos utilizados serão os seguintes.

(1) Nomear as variáveis envolvidas no problema. Se o problema tiver natureza geométrica, faça um
esboço da situação.

(2) Determinar a função f a ser otimizada (maximizada ou minimizada) e seu domínio (intervalo de
interesse). Algumas vezes será necessário usar relações entre as variáveis para transformar f em
uma função de uma variável.

(3) Os candidatos a pontos extremos de f em (D f )◦ são os pontos críticos de f . Então, exibimos o


conjunto X ⊆ (D f )◦ dos pontos p em que não existe f ′ (p) ou que f ′ (p) = 0.

(4) Se D f = [a, b] for um intervalo fechado, e f for contínua, o Teorema de Weierstrass garante que
f assume valor máximo e valor mínimo. Nesse caso, comparamos os valores de f (p) para p ∈ X
e f (a) e f (b) (que podem ser pontos extremos sem serem pontos críticos), e observamos quais
são os valores máximos e mínimos de f .

(5) Se D f é um intervalo aberto, f pode ou não assumir valores máximo e mínimo. Neste caso, uma
das estratégias possíveis é analisar o crescimento e decrescimento da função nas vizinhanças
dos pontos em X, para determinar quais são os pontos de máximo e mínimo locais, e a partir da
comparação do valor da f em tais pontos, determina-se os valores máximos e mínimos de f , se
existirem.

■ Exemplo 4.7.1 Uma lata cilíndrica será produzida para armazenar 1 litro de óleo. Determine as
dimensões da lata, de modo que a quantidade de material para sua fabricação seja mínima.
Solução. Sejam r o raio da base da lata e h a altura da lata, em centímetros. Para que a quantidade de
material seja mínima, devemos minimizar a área da superfície lateral da lata.
4.7 Problemas de otimização 67

A área de cada uma das tampas da lata é igual a πr2 , e a área do cilindro lateral da lata é igual a 2πrh.
Portanto, a área total da lata é
A(r, h) = 2πr2 + 2πrh.

Como o volume da lata deve ser igual a 1 litro, que equivale a 1000 cm3 , temos a relação

1000
πr2 h = 1000 ⇒ h = . (4.1)
πr2

Logo, queremos minimizar a função

1000 2000
A(r) = 2πr2 + 2πr 2
= 2πr2 + .
πr r

Quanto ao domínio de A, por se tratarem de medidas, temos h, r ≥ 0. Mas, a relação πr2 h = 1000 já
implica r, h > 0 (não queremos lata sem volume). Não há limite máximo para r, pois qualquer que seja
r > 0, existirá um h > 0 satisfazendo (4.1). Daí, DA = (0, ∞). Observe que A é uma função derivável e

2000 4(πr3 − 500)


A′ (r) = 4πr − = .
r2 r2

Tem-se
r
′ 3 3 500
A (r) = 0 ⇔ πr − 500 = 0 ⇔ r = .
π
r
500
3
Assim, r = é o único ponto crítico de A e o único candidato a ponto de máximo ou mínimo
π r r
′ 3 500 ′ 3 500
de A. Observe que A (r) < 0 para r < e A (r) > 0 para r > . Portanto, A é estritamente
r # π "r !π r
3 500 3 500 3 500
decrescente em 0, e estritamente crescente em , ∞ . Logo, r = é ponto de
π π π
mínimo global de A. Em particular confirmamos que o problema dado tem solução. A altura da lata
desejada é
r r r
1000 1000 3 109 3 4 3 500
h= = 2 = = 10 · = 2· = 2r.
πr2 π 500 3
 π · 52 · 104 π π
π
r
3 500
Assim, as dimensões da lata com menor quantidade de material são r = e
q π
h = 10 · 3 π4 = 2r, ou seja, o mínimo de A ocorre quando a altura da lata é igual ao diâmetro da
base. ■

■ Exemplo 4.7.2 Determine a área do maior retângulo que pode ser inscrito num semicírculo de raio
r > 0.
Solução. Vamos considerar o semicírculo no plano centrado na origem:

x2 + y2 = r, y ≥ 0. (4.2)

Assim, o retângulo inscrito tem dois vértices sobre o semicírculo e outros dois no eixo x.
68 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

Seja (x, y) o vértice do retângulo que está no primeiro quadrante. Então o retângulo tem lados de
comprimento y e 2x e sua área é dada por

A(x, y) = 2xy.

Segue da relação (4.2) que y = r2 − x2 . Portanto,
p
A(x) = 2x r2 − x2

e seu domínio é DA = [0, r]. Para todo x ∈ [0, r),


p −2x 2(r2 − 2x2 )
A′ (x) = 2 r2 − x2 + 2x √ = √ .
2 r 2 − x2 r 2 − x2
Logo,
r
A′ (x) = 0 ⇔ r2 − 2x2 = 0 ⇔ x = √ .
2

Este é o único ponto crítico de A em DA = (0, r). Agora,
r
r2
 
r r
A(0) = 0 = A(r) e A √ = 2√ r2 − = r2 .
2 2 2
r
Daí, √ é o ponto de máximo global de A, e a área máxima do retângulo inscrito é r2 .
2
Outra solução possível, mais simples, seria a seguinte. Seja θ o ângulo da figura:

Então, a área do retângulo inscrito é dada por

A(θ ) = (2r cos θ )(r sen θ ) = r2 sen(2θ ),


h πi
com DA = 0, . Como 0 ≤ sen(2θ ) ≤ 1, o máximo de A ocorre quando sen(2θ ) = 1, ou seja,
2
π π π 
2θ = o que implica θ = . A área máxima é A = r2 . ■
2 4 4
4.7 Problemas de otimização 69

■ Exemplo 4.7.3 Uma caixa sem tampa será feita recortando-se quadrados iguais de cada canto de um
pedaço de papelão retangular medindo 30 cm x 16 cm e dobrando-se os lados para cima. Determine o
comprimento dos lados dos quadrados a serem recortados para resultar na caixa com o maior volume
possível.

Solução. A altura da caixa será x, a largura 30 − 2x e a profundidade 16 − 2x (todas as medidas em


cm). Observe que 0 < x < 8. O volume da caixa então será

V (x) = x(16 − 2x)(30 − 2x) = 4x3 − 92x2 + 480x.

Derivando, tem-se
V ′ (x) = 12x2 − 184x + 480.
10
Daí, V ′ (x) = 0 se, e somente se, x = 12 ou x = . Mas 12 ∈
/ (0, 8) = DV , logo o único ponto crítico
3
10
de DV é p = . Deixamos como exercício a verificação de que p é um ponto de máximo global de V ,
3
19600
e portando é a medida procurada. Neste caso, o volume da caixa será V (p) = ≃ 725, 9 cm3 . ■
27
■ Exemplo 4.7.4 Um arame de comprimento L é cortado em dois pedaços, sendo um dobrado em

forma de quadrado e o outro em forma de círculo. Como deve-se cortar o arame para que a soma das
áreas englobadas pelos dois pedaços seja: (a) máxima? (b) mínima? (Assuma que também é permitido
não cortar o arame e usá-lo todo para formar somente o quadrado ou o círculo.)
Solução. Seja x o comprimento do pedaço do arame que será usado para formar o quadrado, 0 ≤ x ≤ L.
Então, o comprimento do círculo será L − x. Se r é o raio desse círculo, tem-se 2πr = L − x, ou seja,
L−x
r= . A soma das áreas das duas regiões é dada por

L−x 2
 x 2  
A(x) = +π .
4 2π

Logo,
x 2π x x − L (π + 4)x − 4L
A′ (x) = − 2 (L − x) = + = .
8 4π 8 2π 8π
4L 4 4L
Daí, A′ (x) = 0 se, e somente se, x = . Como 0 < < 1, temos que p = ∈ (0, L) = D◦A
4+π 4+π 4+π
é o único ponto crítico de A. Poderíamos simplesmente calcular A(p), A(0) e A(L) e comparar os
valores para descobrir os pontos de máximo e mínimo globais de A. Mas como não é difícil analisar
o sinal de A′ , faremos isso. Observe que A′ (x) < 0 para x < p e A′ (x) > 0 para x > p. Assim, A é
70 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

estritamente decrescente em [0, p] e estritamente crescente em [p, L], ou seja, p é um ponto de mínimo
global de A. Agora, basta analisar A(0) e A(L) para descobrir o valor máximo de A. Temos,

L2 L2 L2
A(0) = π = e A(L) = .
4π 2 4π 16
Como A(0) > A(L), temos que 0 é o ponto de máximo global de A. Portanto a soma das áreas é máxima
quando o arame é usado somente para formar círculo. ■

4.8 Regras de L’Hospital


A Regra de L’Hospital é uma ferramenta poderosa para o cálculo de limites onde ocorrem indeter-
0 ∞
minações do tipo ou .
0 ∞
Teorema 4.8.1 — Regras de L’Hospital. Sejam f , g funções deriváveis em (p − r, p + r) \ {p},
r > 0, com g′ (x) ̸= 0 para todo x ∈ (p − r, p + r) \ {p}.

(i) Suponha lim f (x) = 0 = lim g(x). São válidas as seguintes afirmações:
x→p x→p

f ′ (x) f (x)
• se lim = L ∈ R, então lim = L;
x→p g′ (x) x→p g(x)

f ′ (x) f (x)
• se lim ′ = ±∞, então lim = ±∞.
x→p g (x) x→p g(x)

(ii) Suponha lim f (x) = ∞ ou −∞, e, lim g(x) = ∞ ou −∞. São válidas as seguintes afirmações:
x→p x→p

f ′ (x) f (x)
• se lim ′
= L ∈ R, então lim = L;
x→p g (x) x→p g(x)

f ′ (x) f (x)
• se lim ′ = ±∞, então lim = ±∞.
x→p g (x) x→p g(x)

Observação 4.8.2 (i) O teorema anterior também é válido para limites laterais ou infinitos,
com as devidas modificações no intervalo em que as hipóteses precisam ser satisfeitas.

(ii) A recíproca do teorema anterior não é verdadeira em geral. Por exemplo, se


1
f (x) = x2 sen e g(x) = x, então
x
f (x) 1
lim = lim x sen = 0
x→0 g(x) x→0 x

pois é o produto de uma função limitada com outra que tende a zero. Mas,

f ′ (x)
      
1 2 1 −1 1 1
lim = lim 2x sen + x cos = lim 2x sen − cos
x→0 g′ (x) x→0 x x x2 x→0 x x

não existe.

No caso particular em que f ′ e g′ são contínuas em p e g′ (p) ̸= 0, é fácil verificar o primeiro caso
de (i). Observe que neste caso, em particular, f e g são contínuas em p, e portanto lim f (x) = f (p) =
x→p
4.8 Regras de L’Hospital 71

0 = lim g(x) = g(p). Além disso,


x→p

f (x) − f (p) f (x) − f (p)


lim
f ′ (x) f ′ (p)
x→p x− p x− p f (x) − f (p) f (x)
lim = ′ = = lim = lim = lim .
x→p g′ (x) g (p) g(x) − g(p) x→p g(x) − g(p) x→p g(x) − g(p) x→p g(x)
lim
x→p x− p x− p
A demonstração do caso geral das Regras de L’Hospital é bem mais trabalhosa e será apresentada no
final dessa seção. Veremos agora exemplos de aplicações.
ex − e−x
■ Exemplo 4.8.3 Determine lim .
x→0 sen x
Solução. Observe que, se fossemos calcular o quociente dos limites, estaríamos com uma indetermina-
0
ção do tipo . Além disso,
0
(ex − e−x )′ ex + e−x 2
lim = lim = = 2.
x→0 (sen x)′ x→0 cos x 1
ex − e−x (ex − e−x )′
Logo, pela Regra de L’Hospital, lim = lim = 2. ■
x→0 sen x x→0 (sen x)′

ln x
■ Exemplo 4.8.4 Determine lim .
x→∞ x

Solução. Se fossemos calcular o quociente dos limites, estaríamos com uma indeterminação do tipo .

Aplicando a Regra de L’Hospital, obtemos
ln x 1/x 1
lim = lim = lim = 0.
x→∞ x x→∞ 1 x→∞ x

tg x − x
■ Exemplo 4.8.5 Determine lim .
x→0 x3
0
Solução. Se fossemos calcular o quociente dos limites, estaríamos com uma indeterminação do tipo .
0
Temos,
(tg x − x)′ sec2 x − 1
lim = lim
x→0 (x3 )′ x→0 3x2
0
que é outra indeterminação do tipo . Derivando novamente,
0
(sec2 x − 1)′ 2 sec2 x tg x
lim = lim
x→1 (3x2 )′ x→0 6x
0
que é ainda uma indeterminação do tipo . Mas, esse último limite não é difícil calcular usando o
0
primeiro limite fundamental:
2 sec2 x tg x 2 1 sen x 1 1
lim = lim · 3
· = ·1·1 = .
x→0 6x x→0 6 cos x x 3 3
Logo, aplicando a Regra de L’Hospital duas vezes seguidas, temos
tg x − x (tg x − x)′ (sec2 x − 1)′ 1
lim = lim = lim = .
x→0 x3 x→0 (x3 )′ x→1 (3x2 )′ 3
72 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

(2 sec2 x tg x)′
Observe que, poderíamos ter derivado novamente e em seguida tentar calcular o limite,
(6x)′
mas nesse caso ficaria uma conta mais trabalhosa do que usar o limite fundamental, como fizemos. ■

ex
■ Exemplo 4.8.6 Determine lim n , onde n ∈ N é fixo.
x→∞ x

Solução. Se fossemos calcular o quociente dos limites, estaríamos com uma indeterminação do tipo .

Aplicando a Regra de L’Hospital sucessivamente n vezes, obtemos
ex ex ex
lim = lim = · · · = lim = ∞.
x→∞ xn x→∞ nxn−1 x→∞ n!

Isso mostra que a função exponencial tende a infinito “muito mais rápido” do que qualquer função
potência (funções polinomiais). ■

■ Exemplo 4.8.7 Determine lim x ln x.


x→0+
Solução. Se fossemos calcular o produto dos limites, estaríamos com uma indeterminação do tipo
0 · (−∞). A este tipo de indeterminação não se aplica a Regra de L’Hospital. Mas podemos rearranjar a
0 ∞
função de modo a resultar em uma indeterminação do tipo ou . Por exemplo,
0 ∞
ln x
lim+ x ln x = lim+
x→0 x→0 1/x

que é uma indeterminação do tipo . Pela Regra de L’Hospital

(ln x)′ 1/x
lim+ x ln x = lim+ = lim = lim (−x) = 0.
x→0 x→0 (1/x)′ x→0+ −1/x2 x→0+
Observe que, se fizéssemos a mudança
x
lim+ x ln x = lim+
x→0 x→0 1/ ln x
0
teríamos uma indeterminação do tipo , em que também poderia ser aplicada a Regra de L’Hospital.
0
No entanto, a expressão resultante nesse caso seria mais complicada, então é importante observar qual
mudança resulta na forma mais simples. ■

■ Exemplo 4.8.8 Determine lim (sec x − tg x).


x→ π2 −

Solução. Se fossemos calcular a diferença dos limites, estaríamos com uma indeterminação do tipo
∞ − ∞. A este tipo de indeterminação não se aplica a Regra de L’Hospital. Mas podemos rearranjar a
0 ∞
função de modo a resultar em uma indeterminação do tipo ou . Por exemplo,
0 ∞
1 − sen x
lim− (sec x − tg x) = lim−
x→ π2 x→ π2 cos x
0
que é uma indeterminação do tipo . Pela Regra de L’Hospital,
0
1 − sen x (1 − sen x)′ cos x
lim− (sec x − tg x) = lim− = lim− ′
= lim− = 0.
x→ π2 x→ π2 cos x x→ π2 (cos x) x→ π2 sen x


4.8 Regras de L’Hospital 73

■ Exemplo 4.8.9 Determine lim (1 + x)cotg x .


x→0
Solução. Este é um caso de indeterminação do tipo 1∞ , em que não se aplica a Regra de L’Hospital.
Seja
f (x) = ln(1 + x)cotg x = cotg x · ln(1 + x).
Temos,
ln(1 + x)
lim cotg x · ln(1 + x) = lim
x→0 x→0 tg x
0
que é uma indeterminação do tipo . Pela Regra de L’Hospital,
0
(ln(1 + x))′ 1/(1 + x) 1
lim f (x) = lim ′
= lim 2
= lim = 1.
x→0 x→0 (tg x) x→0 sec x x→0 (1 + x) sec2 x

Por fim, a função g(y) = ey é contínua em y = 1. Portanto,

cotg x lim ln(1 + x)cotg x


lim (1 + x)cotg x = lim eln(1+x) = e x→0 = e1 = e.
x→0 x→0

Gostaríamos de chamar a atenção a dois pontos que costumam ocorrer com frequência entre os
f (x)
alunos. O primeiro é para não se confundir ao aplicar a Regra de L’Hospital a uma função . Nesse
g(x)
caso, devemos derivar o numerador e denominador da fração:

f ′ (x)
g′ (x)

e NÃO derivar o quociente ′


f ′ (x)g(x) − f (x)g′ (x)

f (x)
= .
g(x) g(x)2
O segundo é: cuidado ao aplicar a Regra de L’Hospital indiscriminadamente! Nem sempre ela funciona
bem ou, em alguns casos, é muito mais simples usar outra técnica para resolver o limite. Por exemplo,
o limite
4x5 + 2x2 + 1
lim 5
x→∞ 3x + x4 − 3x − 2

é uma indeterminação do tipo e pode ser resolvido aplicando a Regra de L’Hospital 5 vezes

consecutivas. No entanto é mais simples colocar x5 em evidência no numerador e denominador e obter

4x5 + 2x2 + 1 4 + x23 + x15 4


lim = lim = .
x→∞ 3x5 + x4 − 3x − 2 x→∞ 3 + 1 − 34 − 25 3
x x x

Outro exemplo é o limite √


x2 + 1
lim
x→∞ x

que também é uma indeterminação do tipo . Se tentarmos aplicar a Regra de L’Hospital:

√ 2x
2 ′ √
( x + 1) 2 x2 + 1 = lim √ x
lim = lim
x→∞ (x)′ x→∞ 1 x→∞ x2 + 1
74 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

e então, derivando novamente o numerador e denominador desse último limite, voltamos ao limite
original. Ou mesmo se escrevermos

x 1 1
lim √ = lim √ = √
x→∞ 2
x +1 x→∞ 2
x +1 x2 + 1
lim
x x→∞ x
voltamos ao problema de calcular o limite original. Poderíamos resolver esse limite fazendo:
√ r r
x2 + 1 x2 + 1 1 √
lim = lim = lim 1 + = 1 + 0 = 1.
x→∞ x x→∞ x2 x→∞ x2

Demonstração das Regras de L’Hospital. Começamos com o item (i) lim f (x) = 0 = lim g(x). Defina
x→p x→p

 
f (x), se x ∈ (p − r, p + r) \ {p} g(x), se x ∈ (p − r, p + r) \ {p}
F(x) = e G(x) = .
0, se x = p 0, se x = p

Segue das hipóteses do Teorema 4.8.1 que F e G são contínuas em (p − r, p + r) e deriváveis em


(p − r, p + r) \ {p}, com F ′ (x) = f ′ (x) e G′ (x) = g′ (x) para todo x ̸= p. Mostremos, primeiramente,
que
f (x) f ′ (x)
lim+ = lim+ ′ .
x→p g(x) x→p g (x)

Seja x ∈ (p, p + r). Como F e G são contínuas em [p, x] e deriváveis em (p, x), pelo Teorema do Valor
Médio Generalizado, existe cx ∈ (p, x) tal que

F(x) − F(p) F ′ (cx ) f (x) f (x) − 0 f ′ (cx )


= ′ ⇔ = = ′ . (4.3)
G(x) − G(p) G (cx ) g(x) g(x) − 0 g (cx )

Observe que a hipótese g′ (x) ̸= 0 para todo x ∈ (p − r, p + r) \ {p} implica g(x) ̸= 0, pois, pelo TVM,
existe c ∈ (p, x) tal que

G(x) − G(p) = G′ (c)(x − p) ⇔ g(x) = g′ (c)(x − p) ̸= 0.

Observe também que, se x → p+ , como cx ∈ (p, x), temos cx → p+ também.


f ′ (x)
Supondo lim = L ∈ R e tomando lim+ em (4.3), obtém-se
x→p g′ (x) x→p

f (x) f ′ (cx )
lim+ = lim+ ′ = L.
x→p g(x) x→p g (cx )

f (x) f ′ (x)
Analogamente, prova-se que lim− = lim− ′ = L.
x→p g(x) x→p g (x)
f ′ (x)
Supondo agora que lim = ±∞, também conclui-se a partir de (4.3) que
x→p g′ (x)

f (x) f ′ (cx )
lim+ = lim+ ′ = ±∞
x→p g(x) x→p g (cx )

e no mesmo para o limite lateral a esquerda de p.


4.8 Regras de L’Hospital 75

Provemos agora o item (ii) lim f (x) = ±∞ e lim g(x) = ±∞. Em particular, podemos supor
x→p x→p
f (x) ̸= 0 ̸= g(x) em (p − r, p + r) \ {p}. Dados x, b tais que p < x < b < p + r, aplicando o TVM
Generalizado em [x, b], segue que existe cx ∈ (x, b) tal que
f (b) g(b)
f (x) − f (b) f ′ (cx ) f (x) 1 − f (x) f ′ (cx ) f (x) f ′ (cx ) 1 − g(x)
= ′ ⇒ · = ′ ⇒ = ′ · . (4.4)
g(x) − g(b) g (cx ) g(x) 1 − g(b) g (cx ) g(x) g (cx ) 1 − f (b)
g(x) f (x)

Suponha
f ′ (x)
lim = L ∈ R. (4.5)
x→p g′ (x)

f (x) f ′ (x)
Mostraremos, pela definição, que lim+ = L. Seja ε > 0. Por (4.5), temos que ′ é limitada
x→p g(x) g (x)
numa vizinhança a direita de p. Assim, existem δ1 , M > 0 tais que
f ′ (x)
p < x < p + δ1 ⇒ < M.
g′ (x)
Além disso, segue novamente de (4.5) que existe 0 < δ2 < δ1 tal que
f ′ (x) ε
p < x < p + δ2 ⇒ ′
−L < .
g (x) 2
Fixando b ≤ p + δ2 , para todo p < cx < b, temos
f ′ (cx ) f ′ (cx ) ε
<M e −L < . (4.6)
g′ (cx ) ′
g (cx ) 2
Por outro lado, segue da hipótese lim f (x) = ±∞ e lim g(x) = ±∞ que
x→p x→p

1 − g(b)
g(x)
lim f (b)
= 1. (4.7)
x→p+ 1− f (x)

Logo, existe 0 < δ < δ1 tal que

1 − g(b)
g(x) ε
p < x < p+δ ⇒ f (b)
−1 < . (4.8)
1− 2M
f (x)

Por (4.4), (4.6) e (4.8), temos que, se p < x < p + δ , então


 
g(b)
f (x) ′
f (cx )  1 − g(x)
−L = · − 1 + 1 − L
g(x) g′ (cx ) 1 − f (b) f (x)
g(b)
f ′ (cx ) 1 − f ′ (cx )
g(x)
≤ · − 1 + −L
g′ (cx ) 1 − g′ (cx )
f (b)
f (x)
ε ε
< M· + = ε.
2M 2
f (x) f (x)
Portanto, lim+ = L. Analogamente, mostra-se que lim− = L.
x→p g(x) x→p g(x)
76 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

Suponha agora
f ′ (x)
lim = ∞.
x→p g′ (x)

Então, dado K > 0, existe δ1 > 0 tal que

f ′ (x)
p < x < p + δ1 ⇒ > K + 1.
g′ (x)

Fixando b ≤ p + δ1 , para todo p < cx < b, temos

f ′ (cx )
> K + 1.
g′ (cx )

Também, segue de (4.7) que existe 0 < δ < δ1 tal que

1 − g(b)
g(x) 1 1 − g(b)
g(x) 1
p < x < p+δ ⇒ f (b)
−1 < ⇒ f (b)
> 1− .
1− K +1 1 − f (x) K +1
f (x)

Por (4.4), temos que, se p < x < p + δ , então


g(b)
f ′ (cx ) 1 − g(x)
 
f (x) 1
= ′ · > (K + 1) 1 − = K.
g(x) g (cx ) 1 − f (b) K +1
f (x)

f (x) f ′ (x) f (x)


Portanto, lim+ = ∞. O caso lim+ ′ = −∞ ⇒ lim+ = −∞ é análogo, e também os casos
x→p g(x) x→p g (x) x→p g(x)
em que x → p− . ■

4.9 Fórmula de Taylor com resto de Lagrange


Os polinômios são funções simples de se trabalhar do ponto de vista computacional, pois envolvem
apenas somas e produtos. A fórmula de Taylor nos dá uma ferramenta para aproximar funções deriváveis
por polinômios. O resto é o erro que se comete nessa aproximação. Existem diversas apresentações
para o resto da Fórmula de Taylor, aqui apresentaremos o resto de Lagrange.

Teorema 4.9.1 — Fórmula de Taylor com resto de Lagrange. Sejam f uma função n + 1 vezes
derivável no intervalo I, n ≥ 0, e x0 ∈ I. Então, para cada x ∈ I, existe x̄ no intervalo aberto de
extremos x e x0 tal que

f (n) (x0 ) f (n+1) (x̄)


f (x) = f (x0 ) + f ′ (x0 )(x − x0 ) + · · · + (x − x0 )n + (x − x0 )n+1 .
n! (n + 1)!

O polinômio

f (n) (x0 )
Pn (x) = f (x0 ) + f ′ (x0 )(x − x0 ) + · · · + (x − x0 )n
n!

é chamado de polinômio de Taylor de grau n em torno de x0 . O resto


4.9 Fórmula de Taylor com resto de Lagrange 77

f (n+1) (x̄)
Rn (x) = (x − x0 )n+1
(n + 1)!

é o erro obtido ao se aproximar f pelo polinômio Pn .

Observação 4.9.2 (i) A aproximação da função f pelo polinômio de Taylor é “boa” quando
o resto Rn (x) é “pequeno”. Assim, quanto mais próximo está x de x0 , menor é o módulo do
1
termo (x − x0 )n+1 . Também, quanto maior o valor de n, menor o fator . A partir daí,
(n + 1)!
para se estimar o erro, temos que analisar o fator f (n+1) (x̄).

(ii) A fórmula de Taylor não descreve explicitamente x̄, apenas sabemos é um número real entre
x0 e x, e, cada x̄ depende de x. Mas, se conseguirmos um limitante máximo para | f (n+1) (x)|
no intervalo entre x e x0 , podemos obter um limitante para o erro cometido na aproximação de
f pelo polinômio Pn .

(iii) O Teorema do Valor Médio é o caso particular n = 0 do Teorema 4.9.1.

(iv) O caso n = 1 do Teorema 4.9.1 está ligado com o conceito de diferenciabilidade visto na
Seção 3.6 e nos fornece uma expressão para o erro

R1 (x) = Ex0 (x)(x − x0 )

cometido ao aproximarmos f pela função afim que define sua reta tangente em (x0 , f (x0 )). De
fato, se f é derivável em x0 , então f é diferenciável em x0 , daí existe uma função Ex0 : I → R
contínua em x0 , com Ex0 (x0 ) = 0 tal que

f (x) = f (x0 ) + f ′ (x0 )(x − x0 ) + Ex0 (x)(x − x0 ) para todo x ∈ I.

Pelo Teorema 4.9.1, se f é duas vezes derivável, para cada x ∈ I, existe x̄ entre x e x0 tal que
′′
f (x̄)
f (x) = f (x0 ) + f ′ (x0 )(x − x0 ) + (x − x0 )2 .
2!
Comparando as duas igualdades, vemos que
′′
f (x̄)
Ex0 (x) = (x − x0 ).
2!

Demonstração do Teorema 4.9.1. Fixe x, x0 ∈ I, x ̸= x0 . Defina as funções Fx , Gx : I → R por

f (n) (t)
Fx (t) = f (x) − f (t) − f ′ (t)(x − t) − · · · − (x − t)n
n!
e
(x − t)n+1
Gx (t) = .
(n + 1)!
Observe que Fx e Gx são deriváveis, pois f e funções polinomiais o são. Em particular, são contínuas
no intervalo fechado de extremos x e x0 e deriváveis no intervalo aberto de extremos x e x0 . Pelo TVM
Generalizado, existe x̄ no intervalo aberto de extremos x e x0 tal que

Fx′ (x̄)(Gx (x) − Gx (x0 )) = G′x (x̄)(Fx (x) − Fx (x0 )). (4.9)
78 Capítulo 4. Aplicações de derivadas no estudo de funções

Temos,

2 f ′′ (t) f ′′′ (t) 3 f ′′′ (t)


Fx′ (t) = − f ′ (t) + f ′ (t) − f ′′ (t)(x − t) + (x − t) − (x − t)2 + (x − t)2
2! 2! 3!
f (4) (t) f (n) (t) f (n+1) (t)
− (x − t)3 + · · · + (x − t)n−1 − (x − t)n
3! (n − 1)! (n)!
f (n+1) (t)
= − (x − t)n
n!
e
(x − t)n
G′x (t) = − .
n!
Logo

f (n+1) (x̄) (x − x̄)n


Fx′ (x̄) = − (x − x̄)n e G′x (x̄) = − . (4.10)
(n)! n!

Substituindo (4.10) em (4.9) e observando que Gx (x) = 0 = Fx (x), temos

f (n+1) (x̄) (x − x0 )n+1


 
n
− (x − x̄) · − =
n! (n + 1)!
!
(x − x̄)n ′ f (n) (x0 )
= f (x) − f (x0 ) − f (x0 )(x − x0 ) − · · · − (x − x0 )n
n! n!

donde segue que

f (n) (x0 ) f (n+1) (x̄)


f (x) = f (x0 ) + f ′ (x0 )(x − x0 ) + · · · + (x − x0 )n + (x − x0 )n+1 .
n! (n + 1)!

■ Exemplo 4.9.3 Usando um polinômio de Taylor de ordem 2, determine um valor aproximado para
ln(1, 03). Avalie o erro, em módulo, cometido nessa aproximação.
Solução. Vamos usar o polinômio de Taylor de ordem 2 da função f (x) = ln x em torno de x0 = 1.
Temos,
1 1
f ′ (x) = e f ′′ (x) = − 2 ⇒ f ′ (1) = 1 e f ′′ (1) = −1.
x x
Assim,
′′
′ f (1) 1
P2 (x) = f (1) + f (1)(x − 1) + (x − 1)2 = (x − 1) − (x − 1)2 .
2! 2
Logo, para x próximo de 1,

0, 032
f (x) ≈ P2 (x) ⇒ ln(1, 03) ≈ P2 (1, 03) = 0, 03 − = 0, 02955.
2
Agora vamos avaliar o erro cometido nessa aproximação. Pela Fórmula de Taylor, exite 1 < x̄ < 1, 03
tal que
f ′′′ (x̄)
f (1, 03) = P2 (1, 03) + (0, 03)3 .
3!
4.9 Fórmula de Taylor com resto de Lagrange 79
2
Como f ′′′ (x) = e 1 < x̄ < 1, 03, temos
x3
2 2
1 < x̄3 < 1, 033 ⇒ 3
< 3 < 2 ⇒ | f ′′′ (x̄)| < 2.
1, 03 x̄
Portanto,

f ′′′ (x̄) 0, 000027


| ln(1, 03) − 0, 02955| = | f (1, 03) − P2 (1, 03)| = (0, 03)3 < 2 · = 0, 00009.
3! 6

Então, o erro é menor que 10−4 . ■


Capítulo 5

Integral de Riemann

Neste capítulo, estudaremos o conceito de integral (de Riemann), suas propriedades, aplicações e
técnicas para o seu cálculo. A origem da integral foi a formalização da ideia do cálculo de áreas de
regiões planas delimitadas por gráficos de funções, via aproximações por áreas de retângulos. Também,
veremos uma ferramenta muito poderosa do cálculo, que relaciona integral e derivada: o Teorema
Fundamental do Cálculo.

5.1 Cálculo de áreas e o conceito de integral de Riemann

Suponha que f : [a, b] → R é uma função contínua e positiva. Queremos determinar a área A da
região delimitada pelo gráfico de f , eixo x e retas x = a e x = b.

Apresentaremos a ideia que será usada para definir tal área, usando as somas de Riemann. Primeira-
mente, vamos dividir o intervalo [a, b] em 5 subintervalos [xi−1 , xi ],
i = 1, . . . , 5, onde a = x0 < x1 < x2 < x3 < x4 < x5 = b. Em cada um deles, tome
ci ∈ [xi−1 , xi ] aleatoriamente. Para cada i = 1, . . . , 5, considere Ai a área do retângulo com base
∆xi = xi − xi−1 e altura f (ci ).
82 Capítulo 5. Integral de Riemann

Então Ai = f (ci )∆xi e uma primeira aproximação para a área A seria


5
A ≈ A1 + A2 + A3 + A4 + A5 = ∑ f (ci )∆xi .
i=1

Melhorando essa ideia, se dividirmos o intervalo [a, b] em n subintervalos, com n grande, e considermos
as somas das áreas dos retângulos, teremos uma aproximação ainda melhor.

Observe que quando n aumenta, os tamanhos ∆xi diminuem. Quanto menores os tamanhos ∆xi (e maior
n), melhor é a aproximação da área A como a soma das áreas dos retângulos. A ideia para definir a área
A é considerar o “limite” das somas das áreas dos retângulos quando todos os ∆xi tendem a zero (o
que implica n → ∞). O valor da área A, será a definição da integral de Riemann (ou integral definida)
Z b
f (x) dx. Vamos agora formalizar tais conceitos.
a

Definição 5.1.1 Uma partição P de um intervalo [a, b] é um conjunto finito


P = {x0 , x1 , x2 , . . . , xn } onde a = x0 < x1 < x2 < · · · < xn = b. Resumidamente, denotaremos

P : a = x0 < x1 < x2 < · · · < xn = b.

Uma partição P divide o intervalo [a, b] em n subintervalos [xi−1 , xi ], i = 1, 2, . . . , n. Denotaremos


por ∆xi = xi − xi−1 o comprimento do intervalo [xi−1 , xi ] e max ∆xi = max{∆x1 , . . . , ∆xn } o maior dos
comprimentos dos subintervalos da partição.
5.1 Cálculo de áreas e o conceito de integral de Riemann 83

Definição 5.1.2 Sejam f : [a, b] → R uma função e P : a = x0 < x1 < x2 < · · · < xn = b uma
partição. Escolhendo arbitrariamente ci ∈ [xi−1 , xi ], i = 1, . . . , n, o número
n
∑ f (ci )∆xi = f (c1 )∆x1 + f (c2 )∆x2 + · · · + f (cn )∆xn
i=1

é chamado de soma de Riemann de f relativa à partição P e aos números ci ’s.

Agora, vamos dar uma definição formal para o limite das somas de Riemann quando max ∆xi tende
a zero.
Definição 5.1.3 Sejam f : [a, b] → R uma função e L um número real. Dizemos que as somas de
Riemann de f tendem a L quando max ∆xi tende a zero, e escrevemos
n
lim ∑ f (ci )∆xi = L
max ∆xi →0 i=1

se, dado ε > 0, existe um δ > 0, que só depende de ε mas não da escolha dos ci ’s, tal que
n
∑ f (ci )∆xi − L <ε (5.1)
i=1

para toda partição P de [a, b] com max ∆xi < δ .


Tal número L quando existe é único (verifique) e é chamado de integral (de Riemann) de f em [a, b].
Nesse caso, denota-se Z b n
f (x) dx = L = lim ∑ f (ci )∆xi ,
a max ∆x →0
i i=1

e diz-se que f é integrável em [a, b]. Também costuma-se denominar


Z b
f (x) dx (5.2)
a

por integral definida de f em [a, b]. Em (5.2) função f (x) é chamada de integrando, o “x” em “dx”
é chamado de variável de integração e a e b são chamados de limites de integração.

n
Observação 5.1.4 (i) Apesar da notação lim
max ∆x →0
i
∑ f (ci )∆xi , tal limite não depende das par-
i=1
tições consideradas para as somas de Riemann, nem da escolha dos ci ’s. Observe em sua
definição que, para existir o limite, dado ε > 0, tem que existir δ > 0 tal que, para toda partição
de [a, b] satisfazendo max ∆xi < δ , vale (5.1) independente da escolha dos ci ’s. Ou seja, a
única condição sobre as partições que é relevante ao limite é que max ∆xi “fique pequeno”
(tenda a zero).

(ii) Existem outros conceitos de integral, como o de integral de Stieltjes, integral de Lebesgue,
e suas teorias. Neste texto, trabalharemos apenas com o conceito de integral de Riemann, e
por isso omitiremos o adjetivo “de Riemann” e nos referiremos apenas como integral para
Z b
f (x) dx.
a

Calcular uma integral usando a definição é, em geral, uma tarefa muito complicada! Faremos um
exemplo de um caso simples a seguir, mas depois veremos propriedades e técnicas que facilitarão o
84 Capítulo 5. Integral de Riemann

cálculo de integrais.
■ Exemplo 5.1.5 Seja c ∈ R. Considere a função f : [a, b] → R constante, f (x) = c.
Dada uma partição
P : a = x0 < x1 < x2 < · · · < xn = b,
e escolhidos ci ∈ [xi−1 , xi ], como f (ci ) = c para todo i = 1, . . . , n, a soma de Riemann é dada por
n n n
∑ f (ci )∆xi = ∑ c∆xi = c ∑ ∆xi
i=1 i=1 i=1

= c((x1 − x0 ) + (x2 − x1 ) + · · · + (xn−1 − xn−2 ) + (xn − xn−1 )) = c(xn − x0 ) = c(b − a).


Ou seja, toda soma de Riemann é constante igual a c(b − a). Logo,
Z b n
c dx = lim ∑ f (ci )∆xi = maxlim c(b − a) = c(b − a).
a max ∆x →0
i i=1 ∆x →0 i

Definição 5.1.6 Seja f : [a, b] → R uma função integrável. Se f (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b],
define-se a área da região delimitada pelo gráfico de f , eixo x e retas x = a e x = b por
Z b
Área = f (x) dx.
a
Z b
Se f (x) ≤ 0 para todo x ∈ [a, b], então a área dessa região é dada por − f (x) dx.
a

Por convenção, define-se


Z a Z a Z b
f (x) dx = 0 e f (x) dx = − f (x) dx (a < b).
a b a

5.2 Propriedades básicas e funções integráveis

Proposição 5.2.1 Sejam f , g funções integráveis em [a, b] e k uma constante. Então:

(i) f + g é integrável em [a, b] e


Z b Z b Z b
( f (x) + g(x)) dx = f (x)dx + g(x) dx;
a a a

(ii) k f é integrável em [a, b] e


Z b Z b
k f (x) dx = k f (x) dx;
a a

(iii) | f | é integrável em [a, b] e


Z b Z b
f (x) dx ≤ | f (x)| dx;
a a
5.2 Propriedades básicas e funções integráveis 85

(iv) se f (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b], então


Z b
f (x) dx ≥ 0;
a

(v) se c > b e f é integrável em [b, c] (por hipótese f já o é em [a, b]), então f é integrável em
[a, c] e
Z c Z b Z c
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a b

Observação 5.2.2 O caso particular k = −1 em (ii) nos dá


Z b Z b
− f (x) dx = − f (x) dx.
a a

Daí, junto com (i) segue que


Z b Z b Z b
( f (x) − g(x)) dx = f (x) dx − g(x) dx.
a a a

Por fim, se f (x) ≤ g(x) em [a, b], é fácil concluir, usando (iv) que
Z b Z b
f (x) dx ≤ g(x) dx.
a a

Z b
Observe que não foi descrita nenhuma propriedade a respeito de f (x)g(x) dx, diferentemente de
a
limite e derivada de produto de funções. De fato, não há uma regra geral, simples de se descrever, e
essa é a grande dificuldade no cálculo de integrais. Adiante veremos diversas técnicas que auxiliarão
nesta tarefa, cada qual aplicada num contexto mais específico.

Demonstração da Proposição 5.2.1. (i) Para demonstrar esse item, basicamente se usa que o limite da
soma é a soma dos limites:
Z b n
( f (x) + g(x)) dx = lim ∑ ( f (ci ) + g(ci ))∆xi
a max ∆x →0 i i=1
!
n n
= lim ∑ f (ci )∆xi + ∑ g(ci )∆xi
max ∆xi →0 i=1 i=1
n n
= lim ∑ f (ci )∆xi + lim ∑ g(ci )∆xi
max ∆xi →0 i=1 max ∆xi →0 i=1
Z b Z b
= f (x) dx + g(x) dx.
a a

No entanto, o conceito de limite de somas de Riemman não é o mesmo de limite de função, e para
limite de somas de Riemman não foi demonstrada essa propriedade. Então, vamos fazer a demonstração
rigorosa aqui. Seja ε > 0. Temos que exibir δ > 0 tal que

n Z b Z b 
∑ ( f (ci ) + g(ci ))∆xi − a
f (x) dx +
a
g(x) dx <ε (5.3)
i=1
86 Capítulo 5. Integral de Riemann

para toda partição P de [a, b] com max ∆xi < δ . Observe que
n Z b Z b 
∑ ( f (ci ) + g(ci ))∆xi − f (x) dx + g(x) dx ≤
a a
i=1

n Z b n Z b
≤ ∑ f (ci )∆xi − f (x) dx + ∑ g(ci )∆xi − g(x) dx
i=1 a i=1 a

e, como f e g são integráveis em [a, b], existem δ1 , δ2 > 0 tais que


n Z b
ε
∑ f (ci )∆xi − f (x) dx < ∀ partição P com max ∆xi < δ1
i=1 a 2
e
n Z b
ε
∑ g(ci )∆xi − a
g(x) dx <
2
∀ partição P com max ∆xi < δ2 .
i=1
Tomando então δ = min{δ1 , δ2 } > 0, vale (5.3).
A demonstração dos demais itens será deixada a cargo do leitor. ■

O próximo teorema não será demonstrado por envolver conceitos técnicos que fogem do escopo de
um curso de cálculo I. Sua demonstração pode ser encontrada nos apêndices de [Gui] ou em livros de
análise real.
Teorema 5.2.3 Se f : [a, b] → R é contínua, então f é integrável.

A seguir, daremos uma condição necessária (mas não suficiente) para uma função ser integrável.
Será importante ter esta propriedade em mente quando formos estudar integrais impróprias.

Proposição 5.2.4 Se f : [a, b] → R é integrável, então f é limitada.

Z b n
Demonstração. Seja L = f (x) dx = lim ∑ f (ci )∆xi . A ideia por traz dessa demonstração é a
a max ∆xi →0 i=1
propriedade que se o limite das somas de Riemann de uma função existe, então ela é limitada. Mas,
como o conceito de limite de somas de Riemman não é o mesmo de limite de função, vamos fazer a
demonstração rigorosa aqui.
Como f é integrável em [a, b], por definição, para ε = 1, existe δ > 0 tal que toda partição P de [a, b]
com max ∆xi < δ satisfaz (5.1). Fixe uma partição nessas condições
P : a = x0 < x1 < x2 < · · · < xn = b
 b−a b−a
por exemplo, tomando n > e ∆xi = . Então, qualquer que seja a escolha dos ci ∈ [xi−1 , xi ],
δ n
temos
n
∑ f (ci )∆xi − L < 1. (5.4)
i=1

Vamos provar que, para todo i = 1, . . . , n, f é limitada em [xi−1 , xi ]. Daí seguirá que f é limitada em
[a, b]. Segue de (5.4) que

n n
| f (ci )∆xi | − ∑ f (c j )∆x j − L ≤ f (ci )∆xi + ∑ f (c j )∆x j − L < 1
j=1 j=1
j̸=i j̸=i
5.3 Primitivas e o Teorema Fundamental do Cálculo 87

n
⇒ | f (ci )∆xi | < 1 + ∑ f (c j )∆x j − L .
j=1
j̸=i

Agora, fixando c j para todo j ̸= i, temos uma constante limitando | f (ci )∆xi | (lembre que ∆xi também
está fixo). Como a desigualdade acima vale para todo ci ∈ [xi−1 , xi ], segue que f é limitada em
[xi−1 , xi ]. ■

Observação 5.2.5 A recíproca da proposição anterior não é verdadeira em geral. Veja o exemplo a
seguir.

■ Exemplo 5.2.6 Considere a função f : [0, 1] → R definida por



1, se x ∈ Q
f (x) = , x ∈ [0, 1].
0, se x ∈
/Q

Observe que f é limitada, pois 0 ≤ f (x) ≤ 1 para todo x ∈ [0, 1]. Mostremos que f não é integrável.
De fato, dada uma partição P : a = x0 < x1 < x2 < · · · < xn = b, temos
n 
1, se c ∈ Q ∀ i = 1, . . . , n
∑ f (ci )∆xi = 0, se cii ∈/ Q ∀ i = 1, . . . , n .
i=1

n
Logo, concluímos que não existe lim
max ∆x →0
i
∑ f (ci )∆xi , pois todo intervalo [xi−1 , xi ] contém pontos
i=1
racionais e irracionais, e tal limite não pode depender da escolha dos ci ’s. ■

Agora, enunciaremos uma generalização do Teorema 5.2.3. Não é o resultado mais geral possível
nesta direção, mas esta versão atenderá nossas necessidades neste curso.

Teorema 5.2.7 Se f : [a, b] → R é limitada e descontínua em apenas uma quantidade finita de


pontos de [a, b], então f é integrável.

5.3 Primitivas e o Teorema Fundamental do Cálculo


O Teorema Fundamental do Cálculo estabelece uma conexão entre o cálculo diferencial e o cálculo
integral. A grosso modo, esse resultado dirá que derivar e integrar são “operações inversas” uma da
outra. Também, a partir dele, poderemos calcular de maneira simples uma grande classe de integrais.
Antes de apresentarmos-lo, precisaremos do conceito de primitiva de uma função, que será abordado
inicialmente nesta seção.
Definição 5.3.1 Seja f : I → R uma função definida no intervalo I. Uma primitiva (ou antiderivada)
de f em I é uma função F : I → R derivável tal que

F ′ (x) = f (x) para todo x ∈ I.

x3
■ Exemplo 5.3.2 Considere f (x) = x2 , x ∈ R. A função F : R → R dada por F(x) = é uma primitiva
3
de f , pois F ′ (x) = f (x) para todo x ∈ R.
x3
Observe que, para qualquer constante c ∈ R dada, a função G(x) = + c também é uma primitiva de
3
f. ■
88 Capítulo 5. Integral de Riemann
1
■ Exemplo 5.3.3 Considere f (x) = , x ̸= 0.
x
A função G1 : (0, ∞) → R dada por G1 (x) = ln x é uma primitiva de f em (0, ∞).
Já a função G2 : (−∞, 0) → R dada por G2 (x) = ln(−x) é uma primitiva de f em (−∞, 0).
Resumidamente, escrevemos que a função F(x) = ln |x| é uma primitiva de f em R \ {0}. ■

Para demonstrar o próximo resultado, usaremos o seguinte exercício de derivadas, cuja demonstra-
ção é um corolário do Teorema do Valor Médio: se f ′ (x) = 0 para todo x num intervalo I, então existe
uma constante c ∈ R tal que f (x) = c para todo x ∈ I.

Proposição 5.3.4 Sejam f : I → R uma função definida no intervalo I e F uma primitiva de f em I.


Então, uma função G : I → R é uma primitiva de f se, e somente se, existe uma constante c ∈ R tal
que G(x) = F(x) + c para todo x ∈ I.

Demonstração. Suponha que G : I → R é uma primitiva de f . Então,


G′ (x) = f (x) = F(x) ∀ x ∈ I ⇒ G′ (x) − F ′ (x) = 0 ∀ x ∈ I ⇒ (G − F)′ (x) = 0 ∀ x ∈ I.
Logo, existe uma constante c ∈ R tal que (G − F)(x) = c para todo x ∈ I. Ou seja, G(x) = F(x) + c
para todo x ∈ I.
A recíproca é de verificação direta. ■

Pela Proposição 5.3.4, se f admite uma primitiva F, então todas as primitivas de f são da forma
F(x) + c, c ∈ R.
Denota-se por Z
f (x) dx = F(x) + c, c constante
a família de todas as primitivas de f , também chamada de integral indefinida de f .
Não é difícil verificar que, se f e g admitem primitivas num intervalo I e k ∈ R, então
Z Z Z Z Z
k f (x) dx = k f (x) dx e ( f (x) + g(x)) dx = f (x) dx + g(x) dx em I.

■ Exemplo 5.3.5 Já vimos que


1
Z
dx = ln |x| + c, x ̸= 0, c constante.
x

Z
■ Exemplo 5.3.6 Seja α ∈ R \ {0} fixo. Determine eαx dx.

eαx
Solução. Como (eαx )′ = αeαx , é fácil ver que F(x) = é uma primitiva de f (x) = eαx em R.
α
Portanto,
eαx
Z
eαx dx = + c, c constante.
α

Baseado no que já vimos de derivadas das funções elementares, listamos aqui algumas primitivas
imediatas (considere c constante):
5.3 Primitivas e o Teorema Fundamental do Cálculo 89

Z
xα+1
Z
α
x dx = + c, (α ∈ R \ {−1}); sec x tg x dx = sec x + c;
α +1 Z
1 cossec2 x dx = −cotg x + c;
Z
dx = ln |x| + c, x ̸= 0;
x Z
Z
x
e dx = e + c; x cossec x cotg x dx = −cossec x + c;
1
Z Z
sen x dx = − cos x + c; dx = arctg x + c;
1 + x2
1
Z Z
cos x dx = sen x + c; √ dx = arcsen x + c;
1 − x2
Z
1
Z
sec2 x dx = tg x + c; −√ dx = arccos x + c.
1 − x2

Z
Observação 5.3.7 Quando for dado f (x) dx = F(x) + c sem especificar o intervalo, pode-se
Z
considerar o que for conveniente. Por exemplo, temos sec2 x dx = tg x + c, e queremos trabalhar
 π π
numa vizinhança de x = 0, então consideramos I = − , , mas se quisermos trabalhar numa
  2 2
π 3π
vizinhança de x = π, consideramos I = , .
2 2

Teorema 5.3.8 — Teorema Fundamental do Cálculo. Se f é uma função integrável em [a, b] e


F é uma primitiva de f em [a, b], então
Z b
f (x) dx = F(b) − F(a).
a

Demonstração. Considere uma partição


P : a = x0 < x1 < x2 < · · · < xn = b
de [a, b]. Como F : [a, b] → R é uma primitiva de f , então F é derivável e F ′ (x) = f (x) em [a, b].
Aplicando o TVM para F em cada [xi−1 , xi ], existem ci ∈ [xi−1 , xi ] tal que
F(xi ) − F(xi−1 ) = F ′ (ci )(xi − xi−1 ) = f (ci )∆xi , i = 1, . . . , n. (5.5)
Assim,
n n
∑ f (ci )∆xi = ∑ (F(xi ) − F(xi−1 )) = F(b) − F(a).
i=1 i=1
Como f é integrável, existe
Z b n
f (x) dx = lim ∑ f (ci )∆xi
a max ∆x →0
i i=1
e esse limite não depende da escolha dos ci ’s. Logo, dada a partição P, escolhendo os ci ’s como em
(5.5), temos,
Z b n
f (x) dx = lim ∑ f (ci )∆xi = maxlim (F(b) − F(a)) = F(b) − F(a).
a max ∆x →0
i i=1 ∆x →0 i


90 Capítulo 5. Integral de Riemann

Na prática, utiliza-se a notação:

F(b) − F(a) = [F(x)]ba

para apresentar a expressão da primitiva, e não somente os seus valores nos extremos.
Z 2
■ Exemplo 5.3.9 Determine (x3 − 5x + 1) dx.
0
x4 5x2
Solução. A função F(x) = − +x é uma primitiva de f (x) = x3 −3x +1 em [0, 2], e f é integrável
4 2
pois é contínua. Então, pelo Teorema Fundamental do Cálculo,
2
x4 5x2
Z 2 
3 16 20
(x − 3x + 1) dx = − +x = − + 2 − 0 = −4.
0 4 2 0 4 2

■ Exemplo 5.3.10 Calcule a área da região delimitada pelas curvas y = 4 − x2 e y = x + 2.


Solução. Primeiro fazemos um esboço das curvas, para identificar a região.

y = x+2
4

y = 4 − x2

x
−2 1

Para determinar os pontos de interseção das curvas, igualamos as equações:

4 − x2 = x + 2 ⇔ x2 + x − 2 = 0 ⇔ x = −2 ou x = 1.

Portanto, a área procurada é dada por


Z 1 Z 1 Z 1 Z 1
2 2
(4 − x ) dx − (x + 2) dx = (4 − x − (x + 2)) dx = (−x2 − x + 2) dx.
−2 −2 −2 −2

x3 x2
A função F(x) = − − + 2x é uma primitiva de f (x) = −x2 − x + 2 em [−2, 1], e f é integrável
3 2
pois é contínua. Logo, pelo Teorema Fundamental do Cálculo,
 3 1
x2
Z 1
2 x 1 1 8 4 9
(−x − x + 2) dx = − − + 2x = − − +2− + +4 = .
−2 3 2 −2 3 2 3 2 2

5.4 Técnica da substituição 91
√ 3π
■ Exemplo 5.3.11 Calcule a área da região delimitada pelas curvas y = sen x, y = − x e x = ,
2
x ≥ 0.
Solução. Primeiro fazemos um esboço das curvas, para identificar a região.

x
1 π 3π
2
−1 y = sen x


y=− x

Para determinar a área, dividimos a região em duas: onde a função f (x) = sen x é positiva e negativa.
Assim, vemos que a área pedida é dada por
Z 3π Z 3π
! Z 3π Z 3π
√ √ 2 √
Z π Z π 
2 2 2
sen x dx − − x dx + − − x dx + sen x dx = sen x dx + x dx.
0 0 π π 0 0

A função F(x) = − cos x é uma primitiva de f (x) = sen x e f é integrável pois é contínua.
2x3/2
A função G(x) = é uma primitiva de g(x) = x1/2 e g é integrável pois é contínua.
3
Logo, pelo Teorema Fundamental do Cálculo,
" # 3π r
2 3π 3/2
3π 3π 3/2 2
√ 3π 3
 
2x
Z Z 3π
2 2
sen x dx + 2
x dx = [− cos x]0 + = 0+1+ −0 = 1+ .
0 0 3 3 2 2
0

Nas próximas seções veremos algumas técnicas que auxiliarão no cáculo de primitivas e integrais
mais complexas.

5.4 Técnica da substituição


Teorema 5.4.1 Sejam f : I → R e g : J → R tais que g é derivável no intervalo J com Im g ⊆ I e f
tem primitiva F no intervalo I. Então F ◦ g : J → R é primitiva de ( f ◦ g)g′ em J, ou seja,
Z
f (g(x))g′ (x) dx = F(g(x)) + c, c constante.

Demonstração. Pela Regra da Cadeia,

[F(g(x))]′ = F ′ (g(x))g′ (x) = f (g(x))g′ (x).

Para facilitar a memorização, pode-se pensar u = g(x) como uma nova variável, assim
du
= g′ (x) ⇒ du = g′ (x)dx, e portanto
dx
92 Capítulo 5. Integral de Riemann
Z Z

f (g(x))g (x) dx = f (u) du = F(u) + c = F(g(x)) + c.

Mas atenção: se fizer a substituição u = g(x), não se esqueça de fazer tal substituição novamente no
final para exibir a resposta em função de x.
Z
■ Exemplo 5.4.2 Determine x2 cos(x3 ) dx.

Solução. Se u = x3 , então du = 3x2 dx. Logo,


1 1 1 sen(x3 )
Z Z Z
x2 cos(x3 ) dx = 3x2 cos(x3 ) dx = cos u du = sen u + c = + c, c constante.
3 3 3 3

ln x
Z
■ Exemplo 5.4.3 Determine dx.
x
1
Solução. Se u = ln x, então du = dx. Logo,
x
ln x u2 (ln x)2
Z Z
dx = u du = + c = + c, c constante.
x 2 2

Z
■ Exemplo 5.4.4 Determine tg x dx.
sen x
Solução. Como tg x = , se u = cos x, então du = −sen x dx. Logo,
cos x
sen x 1
Z Z Z
tg x dx = − − dx = − du = − ln |u| + c = − ln | cos x| + c
cos x u
= ln | cos x|−1 + c = ln | sec x| + c, c constante.

Z p
■ Exemplo 5.4.5 Determine x5 1 + x2 dx.

Solução. Se u = 1 + x2 , então du = 2x dx. Observe que


u = 1 + x2 ⇒ x2 = u − 1 ⇒ x4 = (u − 1)2 = u2 − 2u + 1.
Logo,
Z p 1
Z p 1
Z
√ 1
Z
x5 1 + x2 dx = x4 1 + x2 2x dx = (u2 − 2u + 1) u du = (u5/2 − 2u3/2 + u1/2 ) du
2 2 2
 
1 2 7/2 4 5/2 2 3/2 1 2 1
= u − u + u + c = (1 + x2 )7/2 − (1 + x2 )5/2 + (1 + x2 )3/2 + c, c constante.
2 7 5 3 7 5 3

Há duas maneiras de se calcular uma integral definida usando substituição. A primeira delas é
determinar uma primitiva para o integrando, e em seguida aplicar o Teorema Fundamental do Cálculo.
Por exemplo, a partir do Exemplo 5.4.2,

sen(x3 ) sen(π 3 ) sen(π 3 )
Z π 
2 3
x cos(x ) dx = = −0 = .
0 3 0 3 3
Outro método, geralmente mais prático, consiste em alterar os limites de integração ao mudar a variável,
conforme o teorema a seguir.
5.5 Integração por partes 93

Teorema 5.4.6 Sejam f : [a, b] → R e g : [c, d] → R tais que g([c, d]) ⊆ [a, b]. Se g é derivável, g′
e f são contínuas e F : [a, b] → R é uma primitiva de f , então
Z d Z g(d)

f (g(x))g (x) dx = f (u) du = F(g(d)) − F(g(c)).
c g(c)

Demonstração. Segue do Teorema 5.4.1 e do Teorema Fundamental do Cálculo. ■

Z 1/3
x
■ Exemplo 5.4.7 Calcule √ dx.
0 1 − 4x2
Solução. Se u = 1 − 4x2 , então du = −8x dx. Quando x = 0, u = 1, e, quando x = 1/3, u = 5/9. Logo,
Z 1/3 Z 1/3
1 5/9 1
Z 5/9
x 1 −8x 1
Z
√ dx = − √ dx = − √ du = − u−1/2 du
0 1 − 4x 2 8 0 1 − 4x 2 8 1 u 8 1
√ ! √
1  √ 5/9 1 2 5 1 5
=− 2 u 1 =− −2 = − .
8 8 3 4 12
Observe que dessa forma, substituindo os limites de integração, não foi necessário fazer a substituição
u = 1 − 4x2 após calcular a primitiva em função de u. ■

■ Exemplo 5.4.8 Sejam r > 0 e f uma função ímpar e contínua em [−r, r]. Mostre que
Z r
f (x) dx = 0.
−r

Solução. Como f é ímpar, tem-se f (−x) = − f (x) para todo x ∈ [−r, r]. Fazendo a substituição u = −x,
então du = −dx. Quando x = −r, u = r, e, quando x = r, u = −r. Logo,
Z r Z −r Z r Z r
f (x) dx = f (−u) (−du) = f (−u) du = − f (u) du.
−r r −r −r
Z r Z r
Como f (x) dx = f (u) du, temos
−r −r
Z r Z r Z r Z r
f (x) dx = − f (x) dx ⇒ 2 f (x) dx = 0 ⇒ f (x) dx = 0.
−r −r −r −r
Z r
Tente visualizar geométricamente o porquê de f (x) dx = 0. ■
−r

5.5 Integração por partes


Teorema 5.5.1 Sejam f , g : I → R deriváveis no intervalo I. Se f ′ g tem primitiva no intervalo I,
então f g′ tem primitiva em I e
Z Z

f (x)g (x) dx = f (x)g(x) − f ′ (x)g(x) dx. (5.6)

 Z 

Demonstração. Basta derivar f (x)g(x) − f (x)g(x) dx . Deixamos os detalhes a cargo do leitor.

94 Capítulo 5. Integral de Riemann

Para fins de memorização da fórmula (5.6), pode-se pensar: u = f (x), v = g(x), du = f ′ (x) dx e
dv = g′ (x) dx. Assim, tem-se
Z Z
u dv = uv − v du.

Z
■ Exemplo 5.5.2 Determine x sen x dx.

Solução. Vamos usar a integração por partes. Para isso, precisamos escolher f e g′ . Temos que priorizar
escolhas que nos levem a integrais mais simples de se calcular. Considere f (x) = x e g′ (x) = sen x.
Então f ′ (x) = 1 e g(x) = − cos x. Assim,
Z Z Z
x sen x dx = x · (− cos x) − 1 · (− cos x) dx = −x cos x + cos x dx = −x cos x + sen x + c,

c constante. ■

Z
■ Exemplo 5.5.3 Determine arctg x dx.
Solução. Não sabemos integrar, mas sabemos derivar arctg x. Então, para aplicar a integração por
1
partes, nossa única opção é considerar f (x) = arctg x e g′ (x) = 1. Assim, f ′ (x) = e g(x) = x.
1 + x2
Logo,
1 x
Z Z Z
arctg x dx = (arctg x) · x − x · 2
dx = x arctg x − dx
1+x 1 + x2
x
Z
Para resolver dx, fazemos a substituição u = 1 + x2 . Assim, du/dx = 2x e temos
1 + x2
x 1 1 1 1
Z Z
2
dx = du = ln |u| + c = ln(1 + x2 ) + c, c constante.
1+x 2 u 2 2
Portanto,
1
Z
arctg x dx = x arctg x − ln(1 + x2 ) + c, c constante.
2

Z
■ Exemplo 5.5.4 Determine ex cos x dx.

Solução. Considere f (x) = ex e g′ (x) = cos x. Então f ′ (x) = ex e g(x) = sen x. Assim,
Z Z
x x
e cos x dx = e sen x − ex sen x dx. (5.7)

Aplicando novamente a integração por partes,


Z Z Z
x x x x
e sen x dx = e (− cos x) − e (− cos x) dx = −e cos x + ex cos x dx. (5.8)

Substituindo (5.8) em (5.7), temos


Z  Z  Z
e cos x dx = e sen x − −e cos x + e cos x dx = e sen x + e cos x − ex cos x dx,
x x x x x x

daí
ex
Z Z
2 ex cos x dx = ex (sen x + cos x) ⇒ ex cos x dx = (sen x + cos x) + c, c constante.
2

5.6 Integrais de produtos de funções trigonométricas 95
Z
■ Exemplo 5.5.5 Determine x2 ex dx.

Solução. Considere f (x) = x2 e g′ (x) = ex . Então f ′ (x) = 2x e g(x) = ex . Assim,


Z Z Z
x2 ex dx = x2 ex − 2xex dx = x2 ex − 2 xex dx.

Aplicando novamente a integração por partes,


Z Z
xex dx = xex − ex dx = xex − ex + c1 , c1 constante.

Portanto,
Z
x2 ex dx = x2 ex − 2(xex − ex + c1 ) = x2 ex − 2xex + 2ex + c, c constante.

Também podemos aplicar a técnica da integração por partes diretamente a uma integral definida,
como descreve o teorema a seguir.

Teorema 5.5.6 Sejam f , g : [a, b] → R funções de classe C1 . Então,


Z b Z b
f (x)g′ (x) dx = [ f (x)g(x)]ba − f ′ (x)g(x) dx.
a a

Demonstração. Como f , g são de classe C1 , temos que f ′ , g′ , f , g são contínuas e, portanto, integráveis.
Logo, f g′ + f ′ g é integrável. É fácil ver que f g é uma primitiva para f g′ + f ′ g. Agora, pelo Teorema
Fundamental do Cálculo,
Z b
( f (x)g′ (x) + f ′ (x)g(x)) dx = [ f (x)g(x)]ba
a

donde segue o teorema. ■

Z 1/2
■ Exemplo 5.5.7 Determine arcsen x dx.
0
1
Solução. Considere f (x) = arcsen x e g′ (x) = 1. Então f ′ (x) = √ e g(x) = x. Logo,
1 − x2
Z 1/2 Z 1/2
1/2 x
arcsen x dx = [x arcsen x]0 − √ dx
0 0 1 − x2

5.6 Integrais de produtos de funções trigonométricas


Nesta seção, apresentaremos alguns exemplos de integrais envolvendo produtos (e potências) de
funções trigonométricas. As soluções envolvem ambas as técnicas estudadas até aqui: substituição e
integração por partes.
Relembramos a seguir algumas identidades trigonométricas que nos serão úteis.

• Identidades Fundamentais:

sen2 a + cos2 a = 1 e tg2 a + 1 = sec2 a.


96 Capítulo 5. Integral de Riemann

• Produtos de senos e cossenos em função de somas:

1
sen a cos b = (sen(a − b) + sen(a + b)); (5.9)
2
1
cos a cos b = (cos(a − b) + cos(a + b)); (5.10)
2
1
sen a sen b = (cos(a − b) − cos(a + b)). (5.11)
2
Em particular,

1 cos(2a) 1 cos(2a)
cos2 a = + e sen2 a = − . (5.12)
2 2 2 2
Z
■ Exemplo 5.6.1 Determine cos2 x dx.
Solução. A maneira mais simples de resolver é usando (5.12). Assim,
Z  
1 cos(2x) x sen(2x)
Z
2
cos x dx = + dx = + + c, c constante.
2 2 2 4

Mas também poderia ser resolvido usando integração por partes. Nesse caso,
Z Z Z
cos2 x dx = sen x cos x + sen2 x dx = sen x cos x + (1 − cos2 x) dx
Z
= sen x cos x + x − cos2 x dx.
Z
Logo, 2 cos2 x dx = sen x cos x + x, e daí

1 x x sen(2x)
Z
cos2 x dx = sen x cos x + + c = + + c, c constante.
2 2 2 4

Z
■ Exemplo 5.6.2 Determine cos3 x dx.
Solução. Temos Z Z Z
cos3 x dx = cos2 x cos x dx = (1 − sen2 x) cos x dx.

Fazendo u = sen x, então du = cos x dx. Logo,

u3 sen3 x
Z Z
2
(1 − sen x) cos x dx = (1 − u2 ) du = u − + c = sen x − + c, c constante.
3 3
Mas também poderia ser resolvido usando integração por partes. Fazendo f (x) = cos2 x e g′ (x) = cos x,
então f ′ (x) = −2 cos x sen x e g(x) = sen x e daí
Z Z
cos3 x dx = cos2 x sen x + 2 cos x sen2 x dx
Z
2
= cos x sen x + 2 cos x(1 − cos2 x) dx
Z Z
= cos2 x sen x + 2 cos x dx − 2 cos3 x dx.
5.6 Integrais de produtos de funções trigonométricas 97

Logo,
Z Z
3 2
3 cos x dx = cos x sen x + 2 cos x dx = cos2 x sen x + 2 sen x + c, c constante,

e portanto
1 2
Z
cos3 x dx = cos2 x sen x + sen x + c, c constante.
3 3

As mesmas ideias apresentadas nos dois exemplos anteriores podem ser usadas para potências de
seno e potências mais gerais de cosseno. Resumindo,
Z
• cosn x dx:

se n for ímpar, faça u = sen x e use cos2 x = 1 − sen2 x;


1 cos(2x)
se n for par, use cos2 x = + para diminuir as potências de cossenos.
2 2
Z
• senn x dx:

se n for ímpar, faça u = cos x e use sen2 x = 1 − cos2 x;


1 cos(2x)
se n for par, use sen2 x = − para diminuir as potências de senos.
2 2

Pode-se provar por indução as seguintes fórmulas de recorrências, para n ∈ N, n ≥ 2:

1 n−1
Z Z
cos x dx = cosn−1 x sen x +
n
cosn−2 x dx
n n

e
1 n−1
Z Z
senn x dx = senn−1 x cos x + senn−2 x dx.
n n

Vejamos, a seguir, mais dois exemplos envolvendo senos e cossenos.


Z
■ Exemplo 5.6.3 Determine sen5 x cos2 x dx.
Solução. Quando temos uma potência ímpar de seno ou cosseno, é possível fazer a substituição e ficar
com um cálculo mais simplificado. Nesse caso,
Z Z Z
sen5 x cos2 x dx = sen4 x cos2 x sen x dx = (1 − cos2 x)2 cos2 x sen x dx.

Fazendo u = cos x, então du = −sen x dx. Logo,


Z Z Z
2 2 2 2 2 2
(1 − cos x) cos x sen x dx. = − (1 − u ) u du = − (1 − 2u2 + u4 )u2 du

u3 2u5 u7 cos3 x 2 cos5 x cos7


Z
=− (u2 − 2u4 + u6 ) du = − + − +c = − + − + c,
3 5 7 3 5 7
c constante. ■
98 Capítulo 5. Integral de Riemann
Z
■ Exemplo 5.6.4 Determine sen2 x cos4 x dx.
Solução. Quando só temos potências pares de seno e cosseno, fazer a substituição não é o melhor
caminho. Nesse caso, podemos usar diretamente as identidades (5.12), obtendo

1 cos(2x) 2
Z 
 
1 cos(2x)
Z
2 4
sen x cos x dx = − + dx
2 2 2 2
1 cos(2x) cos2 (2x)
Z   
1 cos(2x)
= − + + dx
2 2 4 2 4
1 cos(2x) cos2 (2x) cos3 (2x)
Z  
= + − − dx,
8 8 8 8

e então calcula-se essas integrais com potências de cossenos (até terceira). Ou, podemos usar a
1
identidade sen x cos x = sen(2x) na integral inicial:
2
Z  2
1
Z
sen2 x cos4 x dx = sen(2x) cos2 x dx
2
1
Z
= sen2 (2x) cos2 x dx
4
Z  2
(5.9) 1 1
= (sen x + sen(3x)) dx
4 2
1
Z
= (sen2 x + 2 sen x sen(3x) + sen2 (3x)) dx
16
1
Z
(5.11)
= (sen2 x + cos(2x) − cos(4x) + sen2 (3x)) dx,
16
e então calcula-se essas integrais de cossenos e segundas potências de senos. Deixamos os demais
detalhes a cargo do leitor. Aos interessados, a resposta final deve ser
x 1 1 1
Z
sen2 x cos4 x dx = + sen(2x) − sen(4x) − sen(6x) + c, c constante.
16 64 64 192

Para integrais envolvendo potências de tangente e secante, podemos empregar estratégias semelhan-
tes as utilizadas para senos e cossenos. Para as substituições, é necessário lembrar que

(tg x)′ = sec2 x e (sec x)′ = sec x tg x.

Lembre também que, pelo Exemplo 5.4.4,


Z
tg x dx = ln | sec x| + c = − ln | cos x| + c, c constante.
Z
Será necessário conhecer sec x dx. Então, vejamos o próximo exemplo.
Z
■ Exemplo 5.6.5 Determine sec x dx.
Solução. Apresentaremos duas maneiras para resolver esse problema. A primeira, um pouco engenhosa,
é multiplicar o numerador e denominador no integrando por sec x + tg x:
sec x + tg x sec2 x + sec x tg x
Z Z Z
sec x dx = sec x dx = dx.
sec x + tg x sec x + tg x
5.6 Integrais de produtos de funções trigonométricas 99

Então, fazemos a substituição u = sec x + tg x, du = (sec x tg x + sec2 x) dx. Daí,

sec2 x + sec x tg x 1
Z Z
dx = du = ln |u| + c = ln | sec x + tg x| + c, c constante.
sec x + tg x u

Outro modo seria:


1 1 cos x cos x cos x
Z Z Z Z Z
sec x dx = dx = dx = dx = dx.
cos x cos x cos x cos2 x 1 − sen2 x
Então, fazemos a substituição u = sen x, du = cos x dx. Daí,

cos x 1
Z Z
dx = du.
1 − sen2 x 1 − u2
Aqui, reescrevemos  
1 1 1 1
2
= + .
1−u 2 1−u 1+u
Esse tipo de artifício será estudado mais geralmente com a técnica das frações parciais. Com isso,

1
Z Z
sec x dx = du
1 − u2
1 1 1 1
Z Z
= du + du
2 1−u 2 1+u
1 1
= − ln |1 − u| + ln |1 + u| + c
2 2
1 1
= − ln |1 − sen x| + ln |1 + sen x| + c
2 2
1 |1 + sen x|
= ln +c
2 |1 − sen x|
1 (1 + sen x)2
= ln +c
2 1 − sen2 x
r
(1 + sen x)2
= ln +c
cos2 x
1 + sen x
= ln +c
cos x
= ln | sec x + tg x| + c, c constante.

Relembramos agora a primitiva imediata


Z
sec2 x dx = tg x + c, c constante

e a quase imediata
Z Z
tg2 x dx = (sec2 x − 1) dx = tg x − x + c, c constante.

Z
■ Exemplo 5.6.6 Determine tg3 x dx.
100 Capítulo 5. Integral de Riemann

Solução. Temos,
Z Z Z Z
tg3 x dx = tg x (sec2 x − 1) dx = tg x sec2 x dx − tg x dx.
Z
Para calcular tg x sec2 x dx, fazemos u = tg x, então du = sec2 x dx, assim

u2 tg2 x
Z Z
tg x sec2 x dx = u du = +c = + c, c constante.
2 2
Segue daí, junto com o Exemplo 5.4.4,
tg2 x
Z
tg3 x dx = − ln | sec x| + c, c constante.
2

Z
■ Exemplo 5.6.7 Determine sec3 x dx.

Solução. Faremos integração por partes. Considere f (x) = sec x e g′ (x) = sec2 x. Então, f ′ (x) =
sec x tg x e g(x) = tg x. Assim,
Z Z
sec3 x dx = sec x tg x − sec x tg2 x dx
Z
= sec x tg x − sec x(sec2 −1) dx
Z Z
3
= sec x tg x − sec x dx + sec x dx

Logo, Z Z
3
2 sec x dx = sec x tg x + sec x dx
Segue daí, junto com o Exemplo 5.6.5,
1 1
Z
sec3 x dx = sec x tg x + ln | sec x + tg x| + c, c constante.
2 2

Z
■ Exemplo 5.6.8 Determine tg4 x sec6 x dx.
Solução. Quando temos uma potência par de secante, é possível fazer a substituição u = tg x e ficar
com um cálculo mais simplificado. Nesse caso, du = sec2 x dx, e temos
Z Z
tg4 x sec6 x dx = tg4 x (sec2 x)2 sec2 x dx
Z
= tg4 x (tg2 x + 1)2 sec2 x dx
Z
= u4 (u2 + 1)2 du
Z
= (u8 + 2u6 + u4 ) du
u9 2u7 u5
= + + +c
9 7 5
tg x 2 tg x tg5 x
9 7
= + + + c, c constante.
9 7 5

5.7 Mudança de variável na integral 101
Z
■ Exemplo 5.6.9 Determine tg3 x sec5 x dx.
Solução. Quando temos uma potência ímpar de tangente e uma potência maior ou igual a 1 de
secante, é possível fazer a substituição u = sec x e ficar com um cálculo mais simplificado. Nesse caso,
du = sec x tg x dx, e temos
Z Z
tg3 x sec5 x dx = tg2 x sec4 x sec x tg x dx
Z
= (sec2 x − 1) sec4 x sec x tg x dx
Z
= (u2 − 1)u4 du
Z
= (u6 − u4 ) du
u7 u5
= − +c
7 5
sec7 x sec5 x
= − + c, c constante.
7 5

As mesmas ideias apresentadas nos dois exemplos anteriores podem ser generalizadas. Também,
pode-se provar por indução as seguintes fórmulas de recorrências, para n ∈ N, n ≥ 2:

tgn−1 x
Z Z
tgn x dx = − tgn−2 x dx
n−1

secn−2 x tg x n − 2
Z Z
secn x dx = + secn−2 x dx.
n−1 n

5.7 Mudança de variável na integral

Z na integral se parece bastante com a da substituição u = g(x),


A técnica de mudança de variável
que é usada para integrais do tipo f (g(x))g′ (x) dx, onde trocamos du = g′ (x) dx. A diferença aqui,
Z
é que queremos fazer uma mudança de variável u = g(x) numa integral f (x) dx onde não aparece
du
explicitamente = g′ (x) no integrando. Nesse caso, precisaremos que a mudança u = g(x) seja
dx
uma função inversível, com inversa ϕ derivável. Então, explicitamos x = ϕ(u), para então realizar a
“substituição inversa” Z Z
f (x) dx = f (ϕ(u))ϕ ′ (u) du
e obter uma nova integral em função da variável u. Na prática, muitas vezes escreveremos diretamente
x = ϕ(u), descrevendo a variável dada em função da nova, diferentemente do que ocorria ao usar a
substituição.
Essa técnica será muito usada com mudanças de variáveis trigonométricas (e suas inversas), a
fim de eliminar raízes quadradas do integrando, que são expressões difíceis de integrar em geral. Por
exemplo, em Z p
4 − x2 dx
102 Capítulo 5. Integral de Riemann

se fizermos a mudança x = 2 sen θ (neste caso é mais comum nomear por θ a nova variável), então
p p q √
4 − x2 = 4 − 4 sen2 θ = 4(1 − sen2 θ ) = 4 cos2 θ = 2| cos θ |.

dx
Como = 2 cos θ ou dx = 2 cos θ dθ , tal mudança resultaria em

Z p Z
2
4 − x dx = 2| cos θ | 2 cos θ dθ
Z Z
que é igual a 4 cos2 θ dθ ou − 4 cos2 θ dθ dependendo se no intervalo considerado tem-se
cos θ ≥ 0 ou cos θ ≤ 0.

Teorema 5.7.1 Sejam I, J intervalos, f : I → R, ϕ : J → I bijetora, com ϕ derivável e ϕ ′ (u) ̸= 0


para todo u ∈ J. Se ( f ◦ ϕ)ϕ ′ admite primitiva F, então F ◦ ϕ −1 é uma primitiva de f em I, ou seja,
Z Z
f (ϕ(u))ϕ ′ (u) du = F(u) + c ⇒ f (x) dx = F(ϕ −1 (x)) + c.

dx
Z
Na prática: fazemos a mudança x = ϕ(u) na integral f (x) dx, calculamos = ϕ ′ (u) e substituí-
du
mos dx = ϕ ′ (u) du, resultando na primeira integral da equação acima.

Demonstração. Por hipótese, F é derivável e

F ′ (u) = f (ϕ(u))ϕ ′ (u). (5.13)

Como ϕ é derivável no intervalo J com ϕ ′ (u) ̸= 0 em J, pelo Teorema da Função Inversa ϕ −1 é


derivável em I. Logo, F ◦ ϕ −1 derivável, e, pela Regra da Cadeia, para todo x ∈ I,

(F(ϕ −1 (x)))′ = F ′ (ϕ −1 (x))(ϕ −1 )′ (x)


(5.13)
= f (ϕ(ϕ −1 (x)))ϕ ′ (ϕ −1 (x))(ϕ −1 )′ (x)
= f (x)(ϕ(ϕ −1 (x)))′
= f (x)(x)′
= f (x) · 1 = f (x).

Portanto, F ◦ ϕ −1 é uma primitiva de f em I. ■

1
Z
■ Exemplo 5.7.2 Determine √ dx.
9 + x2
π π  π π
Solução. Faremos a mudança x = 3 tg θ , − < θ < . No intervalo J = − , temos que
2 2 2 2
dx
ϕ(θ ) = 3 tg θ é bijetora e = 3 sec2 θ ̸= 0. Daí, dx = 3 sec2 θ dθ . Como

p p q √
9 + x2 = 9 + 9 tg2 θ = 9(1 + tg2 θ ) = 9 sec2 θ = 3| sec θ | = 3 sec θ ,

1
pois sec θ = > 0 em J, temos
cos θ
1 1
Z Z Z
√ dx = 3 sec2 θ dθ = sec θ dθ = ln | sec θ + tg θ | + c, c constante.
9 + x2 3 sec θ
5.7 Mudança de variável na integral 103
x
Agora, devemos exibir a resposta final em função da variável x. Como x = 3 tg θ , temos tg θ = e
r 3
p x 2
sec θ = 1 + tg2 θ = 1 + (lembre que sec θ > 0 em J). Portanto,
9
r r !
1 x2 x x2 x
Z
√ dx = ln 1 + + + c = ln 1+ + + c, c constante.
9 + x2 9 3 9 3

Z p
■ Exemplo 5.7.3 Determine x2 − 2x − 3 dx.
Solução. Temos, Z p Z q
x2 − 2x − 3 dx = (x − 1)2 − 4 dx.
π  π
Faremos a mudança x−1 = 2 sec θ , 0 < θ < . No intervalo J = 0, , temos que ϕ(θ ) = 2 sec θ +1
2 2
dx
é bijetora e = 2 sec θ tg θ ̸= 0. Daí, dx = 2 sec θ tg θ dθ . Como,

q p q p
(x − 1) − 4 = 4 sec θ − 4 = 4(sec2 θ − 1) = 4 tg2 θ = 2 |tg θ | = 2 tg θ ,
2 2

pois tg θ > 0 em J, temos


Z q Z Z Z
(x − 1) − 4 dx = 2 tg θ · 2 sec θ tg θ dθ = 4 tg θ sec θ dθ = 4 (sec2 θ − 1) sec θ dθ
2 2

Z Z
=4 sec3 θ dθ − sec θ dθ .

Pelo Exemplo 5.6.7,


1 1
Z
sec3 θ dθ = sec θ tg θ + ln | sec θ + tg θ | + c, c constante.
2 2
Logo, Z q
(x − 1)2 − 4 dx = 2 sec θ tg θ + 2 ln | sec θ + tg θ | − 4 ln | sec θ + tg θ | + c

= 2 sec θ tg θ − 2 ln | sec θ + tg θ | + c, c constante.

r final em função√da variável x. Como x − 1 = 2 sec θ , temos sec θ =


Agora, devemos exibir a resposta
x−1 p (x − 1)2 x2 − 2x − 3
e tg θ = sec2 θ − 1 = −1 = (lembre que tg θ > 0 em J). Portanto,
2 4 2
√ √
x−1 x2 − 2x − 3 x−1 x2 − 2x − 3
Z p
x2 − 2x − 3 dx = 2 − 2 ln + +c
2 2 2 2

1 p
2
x − 1 + x2 − 2x − 3
= (x − 1) x − 2x − 3 − 2 ln +c
2 2
1 p p
= (x − 1) x2 − 2x − 3 − 2 ln x − 1 + x2 − 2x − 3 + 2 ln 2 + c
2
1 p p
= (x − 1) x2 − 2x − 3 − 2 ln x − 1 + x2 − 2x − 3 + c1 ,
2
c1 constante. ■
104 Capítulo 5. Integral de Riemann

Em resumo, utiliza-se com mais frequência as mudanças de variáveis trigonométricas para eliminar
raiz quadrada do integrando:

• para eliminar a2 − x2 , faz-se x = a sen θ , e utiliza-se 1 − cos2 θ = sen2 θ .

• para eliminar a2 + x2 , faz-se x = a tg θ , e utiliza-se 1 + tg2 θ = sec2 θ .

• para eliminar x2 − a2 , faz-se x = a sec θ , e utiliza-se sec2 θ − 1 = tg2 θ .

Para não se confundir, fique atento aos domínios√das funções: o domínio de a2 − x2 é o intervalo
[−a, a], e ocorre −a 2 2
√ ≤ a sen θ ≤ a; o domínio de a + x é R, assim como a imagem de a tg θ ; por
fim, o domínio de x2 − a2 é (−∞, −a] ∪ [a, ∞), como a imagem de a sec θ .
1
Z
■ Exemplo 5.7.4 Determine √ dx.
x x3 − 1
1 √
Solução. O domínio da função f (x) = √ é o intervalo (1, ∞). Faremos a mudança u = x3 − 1,
3
x x −1
u ∈ J = (0, ∞). Precisaremos também descrever sua inversa x = ϕ(u) para substituir na integral. Temos,
p p3
u = x3 − 1 ⇒ u2 = x3 − 1 ⇒ x = u2 + 1 = (u2 + 1)1/3 .

Daí,
dx 2u 2u
= 2/3
̸= 0 ∀ u ∈ J ⇒ dx = du.
2
du 3(u + 1) 3(u + 1)2/3
2

Logo,
1 1 2u 2 1
Z Z Z
√ dx = 2 1/3 2 2/3
du = 2
du
x x3 − 1 (u + 1) u 3(u + 1) 3 u +1
2 2 p
= arctg u + c = arctg x3 − 1 + c, c constante.
3 3

Como consequência do Teorema 5.7.1 e Teorema Fundamental do Cálculo, temos o corolário a


seguir para integral definida.

Corolário 5.7.5 Dada f : [a, b] → R, seja ϕ : [c, d] → [a, b] bijetora, derivável com
ϕ ′ (u) ̸= 0 para todo u ∈ [a, b]. Se ( f ◦ ϕ)ϕ ′ é integrável e tem primitiva F em [c, d], então f é
integrável em [a, b] e
Z b Z ϕ −1 (b)
f (x) dx = f (ϕ(u))ϕ ′ (u) du = F(ϕ −1 (b)) − F(ϕ −1 (a)).
a ϕ −1 (a)

Antes de apresentar o próximo exemplo, gostaríamos de fazer uma observação, que será utilizada
com frequência.

Observação 5.7.6 Se f é integrável em [a, b] e F : [a, b] → R é uma função contínua em [a, b]


e derivável em (a, b) com F ′ (x) = f (x) para todo x ∈ (a, b) (F é primitiva de f em (a, b)), então
também vale Z b
f (x) dx = F(b) − F(a).
a
Para verificar isso, basta observar na demonstração do Teorema Fundamental do Cálculo que é
5.7 Mudança de variável na integral 105

utilizado o Teorema do Valor Médio, onde não seria necessário exigir que F fosse derivável nas
extremidades dos intervalos aplicados.

Z 1p
■ Exemplo 5.7.7 Determine 1 − x2 dx.
0
π
Solução. Faremos a mudança x = sen θ , 0 ≤ θ ≤ . Vamos resolver primeiramente encontrando a
√ 2 h πi
2
primitiva de f (x) = 1 − x e aplicando o Teorema Fundamental do Cálculo. No intervalo J = 0,
2
dx h π
−1
temos que ϕ(θ ) = sen θ é bijetora e = cos θ ̸= 0 para todo θ ∈ 0, . Observe que ϕ (x) =
dθ h π 2
arcsen x não é derivável em x = 1. Mas, para θ ∈ 0, temos,
2
Z p Z p Z Z
1 − x2 dx = 1 − sen2 θ · cos θ dθ = | cos θ | cos θ dθ = cos2 θ dθ =

θ sen(2θ ) θ 1 1 1 p
= + + c = + sen θ cos θ + c = arcsen x + x 1 − x2 + c,
2 4 2 2 2 2
1 1 p √
c constante. Daí, a função F(x) = arcsen x + x 1 − x2 é uma primitiva de f (x) = 1 − x2 em
2 2
[0, 1). Observe que F é contínua em [0, 1], mas não é derivável em x = 1. Ainda assim, pela Observação
5.7.6, vale que
Z 1p  1
2
1 1 p 2
π
1 − x dx = arcsen x + x 1 − x = .
0 2 2 0 4

Outra maneira, seria utilizar diretamente o Teorema 5.4.6 (da substituição na integral definida) no
π
caminho inverso. Se x = sen θ , então dx = cos θ dθ . Quando θ = 0, x = 0, e, quando θ = , x = 1.
2
Assim,
Z 1p Z π/2 p Z π/2
1 − x2 dx = 1 − sen2 θ · cos θ dθ = | cos θ | cos θ dθ ,
0 0 0
h πi
como cos θ ≥ 0 em 0, , temos
2
 π/2
θ sen(2θ )
Z π/2 Z π/2
2 π
| cos θ | cos θ dθ = cos θ dθ = + = .
0 0 2 4 0 4

Dessa maneira, não foi necessário retornar a variável x. ■

Observação 5.7.8 No Teorema 5.4.6:


Z b Z d
f (x) dx = f (g(u))g′ (u) du
a c

a substituição x = g(u) não precisa ser inversível! O que precisa é g′ ser contínua e g(c) = a e
g(d) = b.
Na integral indefinida, será percebida a necessidade de inversibilidade da mudança de variável
após o cálculo da primitiva, ao retornar para a variável inicial.
106 Capítulo 5. Integral de Riemann

5.8 Técnica das frações parciais


A técnica das frações parciais é utilizada para o cálculo de integral de funções racionais

p(x)
f (x) = , p(x), q(x) polinômios.
q(x)

Basicamente, ela consiste em decompor a função racional como soma outras funções racionais mais
simples (frações parciais), que conseguimos integrar com os métodos estudados anteriormente. Por
exemplo,
1 3 x2 + 3x + 7 x2 + 3x + 7
+ 2 = = ,
x + 2 x + 1 (x + 2)(x2 + 1) x3 + 2x2 + x + 2
então, revertendo o processo anterior, podemos calcular

x2 + 3x + 7 1 1
Z Z Z
dx = dx + 3 dx = ln |x + 2| + 3 arctg x + c.
x3 + 2x2 + x + 2 x+2 1 + x2

p(x)
Em geral, é possível escrever a função racional f (x) = como soma de frações parciais quando
q(x)
o grau de p(x) for menor que o grau de q(x). Quando o grau de p(x) for maior ou igual que o grau de
q(x), efetuamos a divisão de p(x) por q(x), obtendo um quociente s(x) e um resto r(x), tais que

p(x) = s(x)q(x) + r(x),

onde r(x) = 0 ou o grau de r(x) é menor que o grau de q(x). Logo,

p(x) r(x)
f (x) = = s(x) + , (5.14)
q(x) q(x)

r(x)
onde s(x) é um polinômio (fácil de integrar) e é uma função racional cujo numerador tem grau
q(x)
menor que o denominador (onde poderemos aplicar a técnica das frações parciais). Por exemplo, se

5x3 − x2 + 22x − 1
f (x) = ,
x2 + 4
com grau do numerador igual a 3, maior que o grau do denominador que é igual a 2, efetuando a divisão

5x3 − x2 + 22x − 1 x2 + 4
− 5x3 − 20x 5x − 1
− x2 + 2x − 1
x2 +4
2x + 3

obtemos
2x + 3
5x3 − x2 + 22x − 1 = (5x − 1)(x2 + 4) + (2x + 3) ⇒ f (x) = (5x − 1) + , (5.15)
x2 + 4
estando na forma (5.14). A integral indefinida dessa função será calculada no Exemplo 5.8.7.
Outra etapa que será importante no método das frações parciais é fatorar o denominador q(x) o
máximo possível. Pode-se mostrar que todo polinômio com coeficientes reais pode ser escrito como
5.8 Técnica das frações parciais 107

produto de fatores lineares (da forma ax + b) ou fatores quadráticos irredutíveis (ax2 + bx + c com
b2 − 4ac < 0). Por exemplo, se

q(x) = 3x5 + 7x4 + 9x3 + 5x2 − 4x − 4

1 2 4
procurando pelas possíveis raízes racionais ±1, ±2, ±4, ± , ± , ± , encontraríamos as raízes −1 e
  3 3 3
2 2
. Efetuando a divisão de q(x) por 3(x + 1) x − = 3x2 + x − 2,
3 3

3x5 + 7x4 + 9x3 + 5x2 − 4x − 4 3x2 + x − 2


− 3x5 − x4 + 2x3 x3 + 2x2 + 3x + 2
6x4 + 11x3 + 5x2
− 6x4 − 2x3 + 4x2
9x3 + 9x2 − 4x
− 9x3 − 3x2 + 6x
6x2 + 2x − 4
− 6x2 − 2x + 4
0

obtemos
3x5 + 7x4 + 9x3 + 5x2 − 4x − 4 = (x + 1)(3x + 2)(x3 + 2x2 + 3x + 2).
Em seguida, observarmos que −1 também é raiz de s(x) = x3 + 2x2 + 3x + 2, e após efetuar a divisão
de s(x) por x + 1, obtemos

x3 + 2x2 + 3x + 2 = (x + 1)(x2 + x + 2),

onde esse último fator quadrático não tem raízes reais. Portanto,

q(x) = 3x5 + 7x4 + 9x3 + 5x2 − 4x − 4 = (x + 1)2 (3x + 2)(x2 + x + 2)

é sua a fatoração “máxima” possível.


Vamos dividir a apresentação dos teoremas envolvendo frações parciais em quatro casos, depen-
dendo dos fatores que aparecem no denominador. Não demonstraremos tais teoremas, pois são provas
trabalhosas e que envolvem ferramentas de álgebra. Ao enunciar o teorema em cada caso, já vamos
p(x)
assumir que a função racional é tal que o grau de p(x) é menor que o grau de q(x).
q(x)

CASO 1. O denominador q(x) é um produto de fatores lineares distintos


Nesse caso, q(x) tem todas as raízes reais com multiplicidades iguais a 1. Supondo q(x) mônico e
de grau n ∈ N, existem a1 , a2 , . . . , an ∈ R (raízes de q(x)) distintos tais que

q(x) = (x − a1 )(x − a2 ) · · · (x − an ).

Teorema 5.8.1 Existem constantes A1 , A2 , . . . , An tais que

p(x) A1 A2 An
= + +···+ . (5.16)
q(x) x − a1 x − a2 x − an
108 Capítulo 5. Integral de Riemann
Ai
Z
Para calcular dx, fazemos u = x − ai , donde du = dx, assim
x − a1
Ai 1
Z Z
dx = Ai du = Ai ln |u| + c = Ai ln |x − ai | + c,
x − a1 u
c constante. Então,
p(x) A1 An
Z Z Z
dx = dx + · · · + dx = A1 ln |x − a1 | + · · · + An ln |x − an | + c,
q(x) x − a1 x − an
c constante.

Observação 5.8.2 Se q(x) tem grau n ∈ N e não é mônico, mas possui n raízes distintas, vale um
análogo ao Teorema 5.8.1, com a diferença que nem todos os denominadores do lado direito de
(5.16) serão mônicos, podem ser fatores lineares da forma ax + b.

3x2 − 6
Z
■ Exemplo 5.8.3 Determine dx.
2x3 + 5x2 − 3x
Solução. Podemos trabalhar com denominador mônico ou não. Para o primeiro caso, reescrevemos

3x2 − 6 1 3x2 − 6
Z Z
dx = dx.
3 2
2x + 5x − 3x 2 x3 + 52 x2 − 32 x
Então,  
5 2 3
3 1
q(x) = x + x − x = x x − (x + 3).
2 2 2
Pelo Teorema 5.8.1, existem constantes A, B,C tais que

3x2 − 6 A B C
5 2 3
= + 1
+ .
3
x + 2x − 2x x x − 2
x + 3

Para determinar as constantes A, B,C, efetuamos a soma do lado direito da equação acima, transfor-
mando em uma única fração, e igualamos a fração do lado esquerdo:

A x − 12 (x + 3) + Bx(x + 3) +Cx x − 21
 
A B C
+ 1
+ =
x x− 2 x+3 x3 + 52 x2 − 32 x
5A
(A + B +C)x2 + C
x − 3A

2 + 3B − 2 2
= 5 2 3
x3 + 2x − 2x
3x2 − 6
=
x3 + 25 x2 − 32 x

A última igualdade implica que



5A 2 C 3A
(A + B +C)x + + 3B − x− = 3x2 − 6,
2 2 2
ou seja, 
 A + B +C = 3


 5A
 C
+ 3B − = 0 .
 2 2
3A


− = −6


2
5.8 Técnica das frações parciais 109

Obrigatoriamente o sistema linear anterior tem solução (A, B,C), pois o Teorema 5.8.1 garante a
existência de tais constantes. Nesse caso, a única solução é

A = 4, B = −3, C = 2.

Portanto,
3x2 − 5 4 −3 2
5 3
= + 1
+ .
x3 + 2 x2 − 2 x x x − 2 x + 3
Daí,

3x2 − 6 4 −3 2 1
Z Z Z Z
dx = dx + dx + dx = 4 ln |x| − 3 ln x − + 2 ln |x + 3| + c,
x3 + 52 x2 − 23 x x x − 12 x+3 2

c constante. Logo,

3x2 − 6 1 3x2 − 6 3 1
Z Z
dx = 5 2 3
dx = 2 ln |x| − ln x − + ln |x + 3| + c,
2x3 + 5x2 − 3x 2 3
x + 2x − 2x 2 2

c constante.
Outra possibilidade, é decompor

q(x) = 2x3 + 5x2 − 3x = x(2x − 1)(x + 3)

e então determinar constantes A1 , A2 , A3 tais que

3x2 − 6 A1 A2 A3
3 2
= + + .
2x + 5x − 3x x 2x − 1 x + 3
Nesse caso, A1 = 2, A2 = −3 e A3 = 1, e a conclusão final seria

3x2 − 6 3
Z
3 2
dx = 2 ln |x| − ln |2x − 1| + ln |x + 3| + c,
2x + 5x − 3x 2
c constante. ■

1
Z
■ Exemplo 5.8.4 Determine √ dx.
x
e +1

Solução. Fazemos u = ex + 1. Assim,

ex = u2 − 1 ⇒ x = ln(u2 − 1).

Daí,
dx 2u 2u
= 2 ⇒ dx = 2 du.
du u − 1 u −1
Substituindo a nova variável na integral dada, temos

1 1 2u 1
Z Z Z
√ dx = · du = 2 du.
ex + 1 u u2 − 1 u2 − 1

Como u2 − 1 = (u − 1)(u + 1), escrevemos

1 A B A(u − 1) + B(u + 1) (A + B)u + (B − A)


= + = = .
u2 − 1 u+1 u−1 u2 − 1 u2 − 1
110 Capítulo 5. Integral de Riemann

Resolvendo a igualdade polinomial (A + B)u + (B − A) = 1 (que equivale a um sistema linear 2 × 2),


1 1
tiramos que A = − e B = . Logo,
2 2
1 1 1 1 1 1 1
Z Z Z
du = − du + du = − ln |u + 1| + ln |u − 1| + c.
u2 − 1 2 u+1 2 u−1 2 2
Portato,
1 1
Z Z
√ dx = 2 2 −1
du = − ln |u + 1| + ln |u − 1| + c
x
e +1 u
√ √
= − ln( ex + 1 + 1) + ln( ex + 1 − 1) + c,
c constante. ■

CASO 2. O denominador q(x) é um produto de fatores lineares, alguns repetidos


Nesse caso, q(x) tem todas as raízes reais, algumas com multiplicidades maiores que 1. Sejam
a1 , a2 , . . . , ak ∈ R as raízes distintas de q(x) e mi ≥ 1 a multiplicidade de ai . Então, supondo q(x)
mônico,
q(x) = (x − a1 )m1 (x − a2 )m2 · · · (x − ak )mk .
O teorema das frações parciais nesse caso é parecido com o do Caso 1, com a diferença que, para cada
Ai
fator (x − ai )mi , ao invés de uma única fração parcial , irão aparecer mi frações parciais:
x − ai
Ai1 Ai2 Aimi
+ +···+
x − ai (x − ai )2 (x − ai )mi

Teorema 5.8.5 Existem constantes Ai j , i = 1, . . . , k, j = 1, . . . , mi , tais que

k   k mi
p(x) Ai1 Ai2 Aimi Ai j
=∑ + 2
+ · · · + m
= ∑ ∑ j
. (5.17)
q(x) i=1 x − ai (x − ai ) (x − ai ) i i=1 j=1 (x − ai )

Se j > 1, fazendo u = x − ai , du = dx, temos

Ai j 1 u− j+1 Ai j
Z Z Z
dx = Ai j du = Ai j u− j du = Ai j +c = + c,
(x − ai ) j uj 1− j (1 − j)(x − ai ) j−1
c constante.
2x3 + 3x + 1
Z
■ Exemplo 5.8.6 Determine dx.
(x − 1)3 (x + 1)
Solução. Pelo Teorema 5.8.5, existem constantes A, B,C, D tais que

2x3 + 3x + 1 A B C D
3
= + + 2
+ .
(x − 1) (x + 1) x + 1 x − 1 (x − 1) (x − 1)3
Efetuando a soma do lado direito da equação acima, transformando em uma única fração, temos

2x3 + 3x + 1 A(x − 1)3 + B(x − 1)2 (x + 1) +C(x − 1)(x + 1) + D(x + 1)


=
(x − 1)3 (x + 1) (x − 1)3 (x + 1)
(A + B)x3 + (−3A − B +C)x2 + (3A − B + D)x + (−A + B −C + D)
=
(x − 1)3 (x + 1)
5.8 Técnica das frações parciais 111

Igualando os numeradores, caímos no sistema linear




 A+B = 1
−3A − B +C = 0


 3A − B + D = 3
−A + B −C + D = 1

que obrigatoriamente tem solução (A, B,C, D), pois o Teorema 5.8.5 garante a existência de tais
constantes. Nesse caso, a única solução é
1 3
A= , B= , C = 3, D = 3.
2 2
Portanto,
1 3
2x3 + 3x + 1 2 2 3 3
3
= + + 2
+ .
(x − 1) (x + 1) x + 1 x − 1 (x − 1) (x − 1)3
Logo,

2x3 + 3x + 1 1 1 3 1 1 1
Z Z Z Z Z
dx = dx + dx + 3 dx + 3 dx
(x − 1)3 (x + 1) 2 x+1 2 x−1 (x − 1)2 (x − 1)3
1 3 3 3
= ln |x + 1| + ln |x − 1| − − + c,
2 2 x − 1 2(x − 1)2

c constante. ■

CASO 3. O denominador q(x) contém fatores quadráticos irredutíveis, nenhum dos


quais se repete
p(x)
Se q(x) tem o fator ax2 + bx + c, onde b2 − 4ac < 0, então a expressão para terá um termo
q(x)
Ax + B
(5.18)
ax2 + bx + c
p(x)
A, B constantes. O teorema das frações parciais nesse caso garante que se decompõe como uma
q(x)
soma do tipo (5.17), referente a parte dos fatores lineares de q(x), mais uma parcela da forma (5.18)
para cada fator quadrático irredutível de q(x).
Para integrar a fração (5.18), vamos separá-la em duas parcelas, uma das quais ficará um polinômio
de grau 1 no numerador, facilitando a aplicação da técnica de substituição, e a outra ficará apenas uma
constante no numerador. Vamos fazer com um exemplo para ilustrar
3x + 4
Z
dx
2x2 − 2x + 1
Como a derivada do denominador é 4x − 2, vamos ajeitar para aparecer esse termo no numerador:
3 3 11
3x + 4 4 (4x − 2) + 2 + 4 3 4x − 2 2
= = · + (5.19)
2x2 − 2x + 1 2x2 − 2x + 1 4 2x2 − 2x + 1 2x2 − 2x + 1
Fazendo u = 2x2 − 2x + 1, temos
3 4x − 2 3 1 3 3
Z Z
· 2 dx = du = ln |u| + c = ln |2x2 − 2x + 1| + c.
4 2x − 2x + 1 4 u 4 4
112 Capítulo 5. Integral de Riemann

Para integrar o segundo fator em (5.19), vamos colocar o coeficiente líder do denominador em evidência
e também completar o quadrado:
11
11 1 11 1
Z Z Z
2
dx = 1
dx = dx. (5.20)
2
2x − 2x + 1 4 2
x −x+ 2 4 1 2
+ 14

x− 2

1
Agora, fazemos u = x − , du = dx, e ficamos com a integral
2
11 1 11 4 11 2
Z Z Z
1
du = 2
du = du
4 2
u +4 4 (2u) + 1 2 (2u)2 + 1

11 11
= arctg (2u) + c = arctg (2x − 1) + c.
2 2
c constante.
Pode ser útil memorizar:
1 1 x
Z
dx = arctg + c.
x2 + d 2 d d

■ Exemplo 5.8.7 Vamos calcular a integral indefinida de

5x3 − x2 + 22x − 1
f (x) = ,
x2 + 4
que aparece no início dessa seção. Como o grau do numerador é maior que o grau do denominador, é
necessário efetuar a divisão antes de aplicar a técnica das frações parciais. Por (5.15),
2x + 3
f (x) = (5x − 1) + .
x2 + 4

Fazendo u = x2 + 4, du = 2x dx, logo


1
2x + 3 2x 3 1 3
Z Z Z Z Z
2
dx = dx + dx = du + dx =
x2 + 4 2
x +4 2
x +4 u 2 x 2

1+ 2

3 x
= ln(x2 + 4) + arctg + c.
2 2
Daí,
5x3 − x2 + 22x − 1 2x + 3
Z Z Z
2
dx = (5x − 1) dx + dx =
x +4 x2 + 4
5 3 x
= x2 − x + ln(x2 + 4) + arctg + c,
2 2 2
c constante. ■

CASO 4. O denominador q(x) contém fatores quadráticos irredutíveis, alguns repetidos


Se q(x) tem o fator (ax2 + bx + c)k com multiplicidade k, onde b2 − 4ac < 0, então, ao invés de
Ax + B p(x)
uma única fração parcial 2 , a expressão para terá uma soma
ax + bx + c q(x)

A1 x + B1 A2 x + B2 Ak x + Bk
+ +···+ (5.21)
ax2 + bx + c (ax2 + bx + c)2 (ax2 + bx + c)k
5.8 Técnica das frações parciais 113

p(x)
Ai , Bi constantes. O teorema das frações parciais nesse caso garante que se decompõe como uma
q(x)
soma do tipo (5.17), referente a parte dos fatores lineares de q(x), mais uma soma da forma (5.21) para
cada fator quadrático irredutível de q(x), contando sua multiplicidade.
Ai x + Bi
Para integrar uma fração parcial da forma , separamos essa fração como soma de
(ax2 + bx + c)i
duas outras, onde a primeira fica simples de fazer a substituição u = ax2 + bx + c e a outra fica com
uma constante no numerador, seguindo as ideias de (5.19) e (5.20). Para a última parcela, caíremos
numa integral da forma
1
,
((x + d)2 + 1)i
onde faremos uma mudança de variável x + d = tg θ se i > 1. Ilustraremos no exemplo a seguir.
x3 − 2x2 + 1
Z
■ Exemplo 5.8.8 Determine dx.
(x2 + 2x + 2)2
Solução. O fator quadrático no denominador do integrando é um polinômio irredutível de grau 2, pois
não tem raízes reais. Então, existem constantes A, B,C, D tais que

x3 − 2x2 + 1 Ax + B Cx + D
= +
(x2 + 2x + 2)2 x2 + 2x + 2 (x2 + 2x + 2)2
(Ax + B)(x2 + 2x + 2) +Cx + D
=
(x2 + 2x + 2)2
Ax3 + (2A + B)x2 + (2A + 2B +C)x + (2B + D)
= .
(x2 + 2x + 2)2

Daí, 

 A=1
2A + B = −2


 2A + 2B +C = 0
2B + D = 1

cuja solução é
A = 1, B = −4, C = 6, D = 9.
Portanto,
x3 − 2x2 + 1 x−4 6x + 9
= + .
(x2 + 2x + 2)2 x2 + 2x + 2 (x2 + 2x + 2)2
Se u = x2 + 2x + 2, du = (2x + 2) dx. Logo, escrevemos
1
x−4 2 (2x + 2) −5
2
= 2
+ 2
x + 2x + 2 x + 2x + 2 x + 2x + 2
e,
6x + 9 3(2x + 2) 3
= + .
(x2 + 2x + 2)2 (x2 + 2x + 2)2 (x2 + 2x + 2)2
Agora integramos cada parcela.
1
2 (2x + 2) 1 1 1 1
Z Z
dx = du = ln |u| + c1 = ln(x2 + 2x + 2) + c1
x2 + 2x + 2 2 u 2 2
e
3(2x + 2) 1 3 3
Z Z
dx = 3 du = − + c2 = − 2 + c2 .
(x2 + 2x + 2)2 u2 u x + 2x + 2
114 Capítulo 5. Integral de Riemann

Para as duas parcelas restantes, reescrevemos x2 + 2x + 2 = (x + 1)2 + 1. Daí,


−5 1
Z Z
2
dx = −5 dx = −5 arctg (x + 1) + c3
x + 2x + 2 (x + 1)2 + 1
e
3 1
Z Z
dx = 3 dx.
(x + 2x + 2)2
2 ((x + 1)2 + 1)2
Agora, fazemos x + 1 = tg θ , então dx = sec2 θ dθ . Assim,

1 sec2 θ sec2 θ
Z Z Z Z
3 dx = 3 dθ = 3 dθ = 3 cos2 θ dθ =
((x + 1)2 + 1)2 (tg2 θ + 1)2 sec4 θ
 
3 sen (2θ ) 3θ 3
= θ+ + c4 = + sen θ cos θ + c4 .
2 2 2 2
Para voltar a variável x, usamos que θ = arctg (x + 1). Além disso,
1
x + 1 = tg θ ⇒ (x + 1)2 = tg2 θ = sec2 θ − 1 ⇒ sec2 θ = (x + 1)2 + 1 ⇒ cos2 θ = ,
(x + 1)2 + 1
logo,
x+1 x+1
sen θ cos θ = tg θ cos2 θ = 2
= 2 .
(x + 1) + 1 x + 2x + 2
Portanto,
1 3θ 3 3 3 x+1
Z
3 dx = + sen θ cos θ + c4 = arctg (x + 1) + + c4 .
((x + 1)2 + 1)2 2 2 2 2 x2 + 2x + 2
Juntando tudo, temos

x3 − 2x2 + 1 x−4 6x + 9
Z Z Z
dx = dx + dx =
(x2 + 2x + 2)2 2
x + 2x + 2 (x2 + 2x + 2)2
1
2 (2x + 2) −5 3(2x + 2) 3
Z Z Z Z
= dx + dx + dx + dx
x2 + 2x + 2 2
x + 2x + 2 (x + 2x + 2)2
2 (x2 + 2x + 2)2
1 3 3 3 x+1
= ln(x2 + 2x + 2) − 5 arctg (x + 1) − 2 + arctg (x + 1) + 2
+c
2 x + 2x + 2 2 2 x + 2x + 2
1 7 3x − 3
= ln(x2 + 2x + 2) − arctg (x + 1) + 2
+ c,
2 2 2(x + 2x + 2)
c constante. ■

5.9 Função dada por integral e 2º Teorema Fundamental do Cálculo


Sejam f : I → R uma função contínua no intervalo IZe fixe a ∈ I. Para cada x ∈ I, f é integrável
x
no intervalo entre a e x (pois f é contínua), então existe f (t) dt. Assim, podemos definir a função
a
F : I → R por Z x
F(x) = f (t) dt.
a
O 2º Teorema Fundamental do Cálculo, que enunciaremos a seguir, nos diz que a função F dada pela
integral de f é uma primitiva de f em I.
5.10 Curiosidade: primitivas não elementares 115

Teorema 5.9.1 — 2º Teorema Fundamental do Cálculo. Sejam f : I → R uma função contínua


no intervalo I e a ∈ I. Então, a função dada por,
Z x
F(x) = f (t) dt, x ∈ I,
a

é uma primitiva de f em I, isto é, F ′ (x) = f (x) para todo x ∈ I.

A demonstração desse teorema utiliza o Teorema do valor médio para integrais, e não será feita
aqui. Ela pode ser encontrada no livro [Gui2].
Z x
1
■ Exemplo 5.9.2 Seja F(x) = 4
dt. Determine F ′ (x).
1 1+t
1
Solução. Observe que o domínio de f é R, pois f (t) = é contínua em R. Pelo 2º Teorema
1 + t4
Fundamental do Cálculo, Z x ′
′ 1
F (x) = 4
dt = f (x),
1 1+t

Logo,
1
F ′ (x) = para todo x ∈ R.
1 + x4

Z x2
3
■ Exemplo 5.9.3 Seja G(x) = dt. Determine G′ (x).
1 1 + t4
Solução. Observe que G(x) = F(x2 ), onde
Z x
3
F(x) = dt.
1 1 + t4
Pela Regra da Cadeia,
G′ (x) = F ′ (x2 )(2x).
3
Como F ′ (x) = , temos
1 + x4
3 6x
G′ (x) = · 2x = para todo x ∈ R.
1 + x8 1 + x8

5.10 Curiosidade: primitivas não elementares


Nesse curso, trabalhamos com as chamadas funções elementares, que são aquelas que conseguimos
descrever através de uma fórmula (somas, produtos, quocientes, compostas) envolvendo funções
polinomiais, radicais, trigonométricas e suas inversas, exponenciais e logarítmicas. Vimos que derivada
de função polinomial é um função polinomial, derivada de função trigonométrica é trigonométrica,
derivada das trigonométricas inversas envolvem funções racionais e radicais, derivada de exponencial
é exponencial e derivada de função logarítmica é função racional. Além disso, temos fórmulas para
derivar soma, produto, quociente e composta de funções deriváveis. Daí é fácil concluir que derivada
de função elementar é uma função elementar.
Quando se trata de integração, a situação é bem mais complicada. A começar pelo fato de que
existem muitas funções elementares cujas integrais não podem ser expressas por uma função elementar!
116 Capítulo 5. Integral de Riemann
2
Um dos exemplos mais conhecidos é o da função f (x) = ex , que é contínua, portanto integrável
em qualquer intervalo. Pelo 2º Teorema Fundamental do Cálculo, a função dada por
Z x
2
F(x) = et dt
0

é uma primitiva de f . Então, sabemos que f é integrável e admite primitiva, que sabemos expressar
como uma função dada por integral, mas não é possível expressar primitiva de f como função elementar.
Quando estudarmos séries de Taylor, poderemos expressar a função F como uma série, que basicamente
é um “polinômio de Taylor de grau infinito”.
Outros exemplos de primitivas que não podem ser expressas como função elementar são:
ex 1 sen x 1
Z Z Z Z Z p Z
sen(x2 ) dx, dx, dx, dx, 1 − x3 dx, √ dx,
x ln x x 1 − x4
Z
2
Z
√ Z Z Z p
e−x dx,
3
sen x dx, cos(ex ) dx, cos(x2 ) dx, 1 + x2 dx, etc.
Capítulo 6

Integral imprópria

Z b
No Capítulo 5 estudamos integral de Riemann f (x) dx, para função f definida no intervalo [a, b].
a
Neste capítulo, estenderemos esse conceito para o de integral imprópria. Essa extensão pode ser feita
de duas maneiras. O primeiro deles será para intervalos ilimitados:

[a, ∞), (−∞, b], (−∞, ∞),

e será chamado de integral imprópria de primeira espécie. O segundo, envolve algumas sutilezas, e
antes de mencioná-lo, gostaríamos de relembrar alguns resultados chaves para integral de Riemann:

• Proposição 5.2.4: se f : [a, b] → R é integrável, então f é limitada.

• Teorema 5.2.7: se f : [a, b] → R é limitada e descontínua em apenas uma quantidade finita de


pontos do seu domínio, então f é integrável.

A integral imprópria de segunda espécie envolve funções definidas num intervalo limitado [a, b], em
que existe uma descontinuidade num ponto c ∈ [a, b] tal que f é ilimitada em [a, b] \ {c}. Ressaltamos
que, nesse caso, a diferença em relação a integral de Riemann está no fato da função integranda ser
ilimitada, e não apenas por ser descontínua (em virtude do Teorema 5.2.7).

6.1 Integral imprópria de primeira espécie


Definição 6.1.1 (i) Seja f uma função integrável em [a,t] para todo t > a. Define-se
Z ∞ Z t
f (x) dx = lim f (x) dx. (6.1)
a t→∞ a

(ii) Seja f uma função integrável em [t, b] para todo t < b. Define-se
Z b Z b
f (x) dx = lim f (x) dx. (6.2)
−∞ t→−∞ t

As integrais impróprias de primeira espécie (6.1) e (6.2) são ditas convergentes se os respec-
tivos limites que as definem existem (e são finitos). Caso contrário, elas são ditas divergentes.
118 Capítulo 6. Integral imprópria

(iii) Seja f : R → R é uma função integrável em [a, b] para todos a < b. Define-se
Z ∞ Z c Z ∞
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx,
−∞ −∞ c
Z ∞ Z c
onde qualquer c ∈ R pode ser usado. A integral f (x) dx é dita convergente se f (x) dx
Z ∞ −∞ Z ∞ −∞
e f (x) dx são ambas convergentes. Caso contrário, f (x) dx é dita divergente.
c −∞

As integrais da definição anterior podem ser interpretadas como áreas, desde que
Z f seja uma função ∞
não negativa. Por exemplo, no caso (i), se f (x) ≥ 0, então a integral imprópria f (x) dx é o limite
Z t a

das áreas A(t) = f (x) dx quando t → ∞.


a

y = f (x)
x
a t

1
Z ∞
■ Exemplo 6.1.2 Determine dx.
1 x2
Solução. Temos
Z t
1 1
Z ∞
2
dx = lim dx.
1 x t→∞ 1 x2
Como, para todo t > 1,
Z t  t
1 1 1
2
dx = − = − + 1,
1 x x 1 t
segue que  
1 1
Z ∞
dx = lim − + 1 = 1
1 x2 t→∞ t
e a integral imprópria dada é convergente. ■

1
Z ∞
■ Exemplo 6.1.3 Determine dx.
1 x
Solução. Temos
Z t
1 1
Z ∞
dx = lim dx.
1 x t→∞ 1 x
Como, para todo t > 1,
Z t
1
dx = [ln x]t1 = lnt,
1 x
segue que
1
Z ∞
dx = lim lnt = ∞
1 x t→∞

e a integral imprópria dada é divergente. ■


6.1 Integral imprópria de primeira espécie 119

Exercício. Verifique que 


 ∞, se p ≤ 1
1
Z ∞ 
dx = 1 .
1 xp  , se p > 1
p−1

1
Z ∞
■ Exemplo 6.1.4 Determine dx.
0 1 + x2
Solução. Temos
Z t
1 1
Z ∞
π
dx = lim dx = lim [arctg x]t0 = lim arctgt = .
0 1 + x2 t→∞ 0 1+x 2 t→∞ t→∞ 2
Também concluímos que a integral imprópria dada é convergente. ■

Z ∞
■ Exemplo 6.1.5 Determine e−x dx.
0
Solução. Temos
Z ∞ Z t t
e−x dx = lim e−x dx = lim −e−x 0 = lim (−e−t + 1) = 1.

0 t→∞ 0 t→∞ t→∞

Também concluímos que a integral imprópria dada é convergente. ■

Z ∞
■ Exemplo 6.1.6 Determine e−x dx.
−∞
Solução. Temos
Z ∞ Z 0 Z ∞
e−x dx = e−x dx + e−x dx
−∞ −∞ 0
Z 0
= lim e−x dx + 1
t→−∞ t
0
lim −e−x t + 1

=
t→−∞
= lim (−1 + e−t ) + 1 = ∞.
t→−∞

Portando, a integral imprópria dada é divergente. ■

Z ∞
2
■ Exemplo 6.1.7 Discuta a convergência de 2xex dx.
−∞
Solução. Temos
Z ∞ Z 0 Z ∞
x2 x2 2
2xe dx = 2xe dx + 2xex dx. (6.3)
−∞ −∞ 0

Observe que
Z 0 Z 0 Z b Z b
x2 x2 a2 x2 2 2
2xe dx = lim 2xe dx = 1 − e , e, 2xe dx = lim 2xex dx = eb − 1.
a a→−∞ a 0 b→∞ 0

Logo,
Z 0 Z b
2 2
lim 2xex dx = −∞ e lim 2xex dx = ∞.
a→−∞ a b→∞ 0
120 Capítulo 6. Integral imprópria

Como as integrais do lado direito de (6.3) divergem, concluímos que a integral imprópria dada é
divergente.
Z ∞
2
Cuidado: ∞ − ∞ é uma indeterminação! Nem sempre ∞ − ∞ = 0 e é errado dizer que 2xex dx =
−∞
0. Porém, se o processo não for feito como em (6.3), poderia-se erroneamente concluir:

Z ∞ Z t h 2 it
2 2 2 2
2xex dx = lim 2xex dx = lim ex = lim (et − et ) = lim 0 = 0.
−∞ t→∞ −t t→∞ −t t→∞ t→∞

Algumas vezes estaremos interessados em saber apenas se uma integral imprópria é convergente
ou divergente, não importando o seu valor exato. Para essa situação, temos alguns critérios que nos
ajudam a estabelecer a convergência ou não, sem precisar calcular (às vezes nem é possível) a integral.
Antes de apresentarmos o primeiro critério, é necessário fazer uma observação.

Observação 6.1.8 Se f uma função integrável em [a,t] para todo t > a e f (x) ≥ 0 em [a, ∞), então
a função Z t
F(t) = f (x) dx
a
é crescente em [a, ∞). De fato, se a ≤ t1 < t2 , então
Z t2 Z t1 Z t2
F(t2 ) − F(t1 ) = f (x) dx − f (x) dx = f (x) dx ≥ 0.
a a t1

Uma consequência de F ser crescente, que é simples de aceitar intuitivamente, mas um pouco
técnica de se demonstrar, é que lim F(x) existe ou é infinito, dependendo se F é uma função limitada
t→∞ Z ∞
ou não. Ou seja, a integral imprópria f (t) dt converge se, e somente se, existe M > 0 tal que
Z x a
f (t) dt ≤ M para todo x > a.
a

Teorema 6.1.9 — Critério da Comparação. Sejam f (x), g(x) duas funções integráveis em [a,t]
para todo t > a tais que

0 ≤ f (x) ≤ g(x) para todo x ≥ a. (6.4)


Z ∞ Z ∞
(i) Se g(x) dx é convergente, então f (x) dx é convergente.
a a
Z ∞ Z ∞
(ii) Se f (x) dx é divergente, então g(x) dx é divergente.
a a

Pensando em termos de área é fácil aceitar que o teorema é verdadeiro: se a área sob a curva
y = g(x) for finita, então a área sob a curva inferior y = f (x) também será finita. Se a área sob a curva
y = f (x) for infinita, então a área sob a curva superior y = g(x) também será infinita.
6.1 Integral imprópria de primeira espécie 121

g(x)
f (x) x
a

Demonstração. Por (6.4), para todo t > a,


Z t Z t
0≤ f (x) dx ≤ g(x) dx.
a a
Z ∞
Supondo (i), g(x) dx = L é convergente. Como a função
a
Z t
G(t) = g(x) dx
a

é crescente em [a, ∞) (Observação 6.1.8), temos


Z ∞
G(t) ≤ lim G(t) = g(x) dx = L.
t→∞ a

Portanto, Z t Z t
0≤ f (x) dx ≤ g(x) dx ≤ L para todo t > a.
a a
Z ∞
Pela Observação 6.1.8 novamente, f (x) dx é convergente.
a
O item (ii) é consequência de (i). ■

O Critério da Comparação também é válido para integrais impróprias na forma (6.2).


sen x + 2
Z ∞
■ Exemplo 6.1.10 Discuta a convergência de √ dx.
1 x
Solução. Para todo x ≥ 1,
1 sen x + 2 3
−1 ≤ sen x ≤ 1 ⇒ 1 ≤ sen x + 2 ≤ 3 ⇒ √ ≤ √ ≤√ .
x x x
1 sen x + 2
Z ∞ Z ∞
Como √ dx diverge, segue do Critério da Comparação que √ dx diverge. ■
1 x 1 x
Z ∞
2
■ Exemplo 6.1.11 Discuta a convergência de e−x dx.
0
Solução. Para todo x ≥ 1,
2
x2 ≥ x ⇒ −x2 ≤ −x ⇒ e−x ≤ e−x . (6.5)

Observe que
Z ∞ Z 1 Z ∞
2 2 2
e−x dx = e−x dx + e−x dx,
0 0 1
122 Capítulo 6. Integral imprópria
Z 1
2 2
e, e−x dx é um número real, pois se trata de uma integral de Riemann (e−x é contínua em [0, 1],
0 Z ∞
2
portanto integrável). Logo, a integral dada converge se, e somente se, e−x dx converge.
1
Z ∞
Vimos no Exemplo 6.1.5 que e−x dx converge. Logo, segue de (6.5) e do Critério da Comparação
Z ∞ 1 Z ∞
2 2
que e−x dx converge. Portanto, e−x dx é convergente. ■
1 0

O critério a seguir é uma consequência do Critério da Comparação, sua demonstração será deixada
como exercício.
Teorema 6.1.12 — Critério da Comparação no Limite ou Quociente. Sejam
f , g : [a, +∞) → R, integráveis em [a, b] para todo b > a, com f (x) ≥ 0 e g(x) > 0 para todo
x ≥ a. Se
f (x)
lim = L ∈ R, L ̸= 0,
x→∞ g(x)

então Z ∞ Z ∞
f (x) dx converge se, e somente se, g(x) dx converge.
a a

3x + 2
Z ∞
■ Exemplo 6.1.13 Discuta a convergência de √ dx.
2 x5 − 1
Solução. Quando x >> 0 (x muito grande),
3x + 2 3x 3 3
3x + 2 ≈ 3x e x5 − 1 ≈ x5 ⇒ √ ≈ 5/2 = 5/2−1 = 3/2 .
x5 − 1 x x x
3x + 2
Z ∞
Assim, intuitivamente √ dx terá o mesmo comportamento, quanto a convergência, de
2 x5 − 1
3
Z ∞
dx. Para comprovar isso vamos usar o Critério da Comparação no Limite. Considere
2 x3/2
3x + 2 3
f (x) = √ e g(x) = .
x5 − 1 x3/2

Temos f (x) ≥ 0 e g(x) > 0 para todo x ≥ 2. Além disso,


   
5/2 2 2
x 3+ 3+
f (x) 3x + 2 x3/2 x x
lim = lim √ = lim r = lim r = 1 ̸= 0.
x→∞ g(x) x→∞ x5 − 1 3 x→∞ 1 x→∞ 1
5/2
3x 1− 5 3 1− 5
x x
3
Z ∞
Como dx converge, pois 3/2 > 1, segue do Critério da Comparação no Limite que a integral
x3/2 2
dada converge. ■

Z ∞ Z ∞
Definição 6.1.14 Dizemos que a integral imprópria f (x) dx converge absolutamente se | f (x)| dx
a a
é convergente.

Os critérios que vimos até agora só se aplicam a funções não negativas. Quando não é esse o caso,
podemos analisar a integral com o módulo no integrando e, se possível, utilizar o resultado a seguir.
6.1 Integral imprópria de primeira espécie 123

Z ∞
Proposição 6.1.15 Se a integral imprópria f (x) dx é absolutamente convergente, então ela é
a
convergente.

Demonstração. Para todo x ≥ a,

−| f (x)| ≤ f (x) ≤ | f (x)| ⇒ 0 ≤ f (x) + | f (x)| ≤ 2| f (x)|.


Z ∞
Supondo que | f (x)| dx converge, segue do Critério da Comparação que
a
Z ∞
( f (x) + | f (x)|) dx converge.
a

Como f (x) = ( f (x) + | f (x)|) − | f (x)|, segue que


Z ∞
f (x) dx converge.
a

cos x
Z ∞
■ Exemplo 6.1.16 Discuta a convergência de dx.
1 x2
Solução. Para todo x ≥ 1,
cos x | cos x| 1
0≤ 2
= 2
≤ 2.
x x x
1 cos x
Z ∞ Z ∞
Como dx converge, segue do Critério da Comparação que dx converge. Ou seja, a
1x2 1 x2
integral dada é absolutamente convergente, o que implica convergente. ■

Observação 6.1.17 A recíproca da Proposição 6.1.15 não é verdadeira! Veja os dois exemplos a
seguir.

sen x
Z ∞
■ Exemplo 6.1.18 Prove que dx é convergente.
1 x
Solução. Temos,
Z t
sen x sen x
Z ∞
dx = lim dx.
1 x t→∞ 1 x
sen x
Z
A integral dx não pode ser expressa como função elementar. Mesmo assim, podemos aplicar a
x
integração por partes para cair numa outra em que conseguimos analisar a convergência. Temos, para
todo t ≥ 1,
Z t h cos x it Z t cos x Z t
1 cost cos x
· sen x dx = − − 2
dx = − + cos 1 − 2
dx.
1 x x 1 1 x t 1 x

Logo,
Z t Z t
sen x sen x cost cos x
Z ∞
dx = lim dx = − lim + cos 1 − lim dx
1 x t→∞ 1 x t→∞ t t→∞ 1 x2
cost cos x
Z ∞
= − lim + cos 1 − dx.
t→∞ t 1 x2
124 Capítulo 6. Integral imprópria
1 cost cos x
Z ∞
Como lim = 0 e cost é limitada, temos lim = 0. Além disso, pelo Exemplo 6.1.16, dx
t→∞ t t→∞ t 1 x2
é convergente. Portanto,

sen x cos x
Z ∞ Z ∞
dx = cos 1 − dx é convergente.
1 x 1 x2

|sen x|
Z ∞
■ Exemplo 6.1.19 Prove que dx é divergente.
1 x
Solução. Para todo x ≥ 1,

sen2 x |sen x|
−1 ≤ sen x ≤ 1 ⇒ 0 ≤ sen2 x ≤ |sen x| ⇒ 0 ≤ ≤ .
x x
Agora, observe que

sen2 x
Z t Z t  Z t Z t
1 cos(2x) 1 cos(2x)
dx = − dx = dx − dx.
1 x 1 2x 2x 1 2x 1 2x

cos(2x)
Z ∞
Procedendo de maneira análoga ao Exemplo 6.1.18, verifica-se que dx = L ∈ R é conver-
1 2x
1 1
Z ∞
gente (exercício). Temos que dx = ∞, pois sabemos que essa integral diverge e ≥ 0 em [1, ∞)
1 2x 2x
(Observação 6.1.8). Portanto

sen2 x 1 cos(2x)
Z ∞ Z ∞ Z ∞
dx = dx − dx = ∞ − L = ∞
1 x 1 2x 1 2x

|sen x|
Z ∞
é divergente. Por fim, pelo critério da comparação, dx é divergente. ■
1 x

6.2 Integral imprópria de segunda espécie

Antes de apresentar a definição de integral imprópria de segunda espécie, vamos ilustrar geometri-
camente a situação. Suponha que f é uma função contínua e positiva num intervalo limitado [a, b) e
tem assíntota vertical x = b, ou seja, lim− f (x) = ∞.
x→b

y = f (x) x=b

x
a t b
6.2 Integral imprópria de segunda espécie 125
Z b Z t
A integral imprópria de segunda espécie f (x) dx é o limite das áreas A(t) = f (x) dx quando
a a
t→ b− .Ou seja, será a área delimitada pelo gráfico de f e eixo x, a ≤ x < b, que engloba uma “região
infinita na direção vertical” (enquanto a integral imprópria de primeira espécie engloba uma “região
infinita na direção horizontal”).

Definição 6.2.1 (i) Seja f : [a, b) → R uma função integrável em [a,t] para todo t ∈ [a, b) e não
limitada em [a, b). Define-se
Z b Z t
f (x) dx = lim− f (x) dx. (6.6)
a t→b a

(ii) Seja f : (a, b] → R uma função integrável em [t, b] para todo t ∈ (a, b] e não limitada em (a, b].
Define-se
Z b Z b
f (x) dx = lim+ f (x) dx. (6.7)
a t→a t

As integrais impróprias de segunda espécie (6.6) e (6.7) são ditas convergentes se os respecti-
vos limites que as definem existem (e são finitos). Caso contrário, elas são ditas divergentes.

(iii) Seja f : [a, c) ∪ (c, b] → R uma função integrável em [a,t) e (u, b] para todos t ∈ [a, c) e
u ∈ (c, b], f não limitada em [a, c) ∪ (c, b]. Define-se
Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c
Z b Z c Z b
A integral f (x) dx é dita convergente se f (x) dx e f (x) dx são ambas convergentes.
a Z b a c

Caso contrário, f (x) dx é dita divergente.


a

Z 2
1
■ Exemplo 6.2.2 Determine √ dx.
0 x
Solução. Temos
Z 2 Z 2
1 1
√ dx = lim √ dx.
0 x t→0+ t x
Como, para todo t > 0,
Z 2
1  √ 2 √ √
√ dx = 2 x t = 2 2 − 2 t,
t x
segue que
Z 2
1  √ √ √
√ dx = lim 2 2 − 2 t = 2 2
0 x t→0+

e a integral imprópria dada é convergente. ■

Z 2
1
■ Exemplo 6.2.3 Determine dx.
0 x
Solução. Para todo t > 0,
Z 2
1
dx = [ln x]t2 = ln 2 − lnt.
t x
126 Capítulo 6. Integral imprópria

Logo,
Z 2 Z 2
1 1
dx = lim+ dx = lim+ (ln 2 − lnt) = ∞
x 0 t→0 t x t→0
e a integral imprópria dada é divergente. ■

Exercício. Verifique que, para todo b > 0,


 1−p
Z b
1  b

, se 0 < p < 1
dx = 1− p .
x p
0 
se p ≥ 1

∞,

Z 3
1
■ Exemplo 6.2.4 Determine √ dx.
0 9 − x2
Solução. Para todo 0 ≤ t < 3,
Z t
1 h  x it t 
√ dx = arcsen = arcsen .
0 9 − x2 3 0 3
Logo,
Z 3 t
1 1 t 
Z
π
√ dx = lim− √ dx = lim− arcsen = arcsen 1 =
0 9 − x2 t→3 0 9 − x2 t→3 3 2
e a integral imprópria dada é convergente. ■

Z 3
1
■ Exemplo 6.2.5 Estude a convergência de dx.
0 x−1
1
Solução. Observe que f (x) = apresenta uma descontinuidade infinita em 1 ∈ [0, 3], isto é, f não
x−1
está definida em x = 1 e lim+ f (x) = ∞ (ou lim− f (x) = −∞), o que implica que f não é limitada numa
x→1 x→1
vizinhança de 1 (ou que x = 1 é uma assíntota vertical para f ). Deste modo, a integral dada é uma
integral imprópria, e,
Z 3 Z 1 Z 3 Z t Z 3
1 1 1 1 1
dx = dx + dx = lim− dx + lim+ dx.
0 x−1 0 x−1 1 x−1 t→1 0 x−1 u→1 u x−1
Como
Z 1 Z t
1 1
dx = lim− dx = lim− [ln |x − 1|]t0 = lim− (ln |t − 1| − ln | − 1|) = −∞,
0 x−1 t→1 0 x−1 t→1 t→1

temos que a integral dada é divergente.


Cuidado: Se não fosse observada a descontinuidade infinita em x = 1, e confundido a integral dada
com uma integral de Riemann, poderia-se erroneamente concluir:
Z 3
1
dx = [ln |x − 1|]30 = ln 2 − ln 1 = ln 2.
0 x−1

Z 1
sen x
■ Exemplo 6.2.6 A integral dx é imprópria?
0 x
sen x
Solução. A função f (x) = é contínua em (0, 1]. No entanto, f não está definida em x = 0. Só isso
x
não responde se a integral dada é imprópria ou não, pois poderíamos definir um outro valor qualquer
6.2 Integral imprópria de segunda espécie 127

para a função em 0, e função com uma quantidade finita de descontinuidades em um intervalo fechado
é integrável se for limitada (Teorema 5.2.7). O que vai definir se aqui se trata de uma integral imprópria
ou de Riemann é se f é limitada ou não em (0, 1]. Temos,
sen x
lim = 1,
x→0+ x
logo f é limitada em (0, 1] (não tem assíntota vertical x = 0), portanto a integral dada não é uma
integral imprópria. ■

Também são válidos critérios da comparação e comparação no limite para integrais impróprias de
segunda espécie. Apresentaremos os enunciados, sem as demonstrações, que são totalmente análogas
aos critérios para integrais de primeira espécie.

Teorema 6.2.7 — Critério da Comparação. Sejam f , g : [a, b) → R funções não limitadas,


integráveis em [a,t] para todo t ∈ [a, b). Suponha que

0 ≤ f (x) ≤ g(x) para todo x ∈ [a, b).


Z b Z b
(i) Se g(x) dx é convergente, então f (x) dx é convergente.
a a
Z b Z b
(ii) Se f (x) dx é divergente, então g(x) dx é divergente.
a a

Teorema 6.2.8 — Critério da Comparação no Limite ou Quociente. Sejam


f , g : (a, b] → R funções não limitadas, integráveis em [c, b] para todo c ∈ (a, b], com f (x) ≥ 0 e
g(x) > 0 para todo x ∈ (a, b]. Se

f (x)
lim = L ∈ R, L ̸= 0,
x→a+ g(x)
então Z b Z b
f (x) dx converge se, e somente se, g(x) dx converge.
a a

Z 1
1
■ Exemplo 6.2.9 Discuta a convergência de √ dx.
0 1 − x4
Solução. Para todo 0 ≤ x < 1,
p p 1 1
x4 ≤ x2 ⇒ 1 − x4 ≥ 1 − x2 ≥ 0 ⇒ 1 − x4 ≥ 1 − x2 ≥ 0 ⇒ 0 ≤ √ ≤√ .
1−x 4 1 − x2
Z 1
1
Como √ dx converge (veja Exemplo 6.2.4), segue do Critério da Comparação que a integral
0 1 − x2
dada converge. ■

sen(x2 )
Z 1
■ Exemplo 6.2.10 Discuta a convergência de dx.
0 x5/2
sen(x2 )
Solução. Como lim = 1, quando x ≈ 0, temos que sen(x2 ) ≈ x2 . Daí,
x→0 x2
sen(x2 ) x2 1 1
5/2
≈ 5/2
= 5/2−2 = 1/2 .
x x x x
128 Capítulo 6. Integral imprópria

sen(x2 )
Z 1 Z 1
1
Assim, intuitivamente dx terá o mesmo comportamento, quanto a convergência, de dx.
x5/2
0 0 x1/2
Para comprovar isso vamos usar o Critério da Comparação no Limite. Considere

sen(x2 ) 1
f (x) = e g(x) = .
x5/2 x1/2
Temos f (x) ≥ 0 e g(x) > 0 para todo x > 0. Além disso,

f (x) sen(x2 ) sen(x2 )


lim = lim 5/2 x1/2 = lim = 1 ̸= 0.
x→∞ g(x) x→∞ x x→∞ x2
Z 1
1
Como dx converge, pois 1/2 < 1, segue do Critério da Comparação no Limite que a integral
0 x1/2
dada converge. ■

Define-se integral imprópria de segunda espécie absolutamente convergente de modo análogo à


integral imprópria de primeira espécie. Também é válido que, se a integral imprópria de segunda
espécie é absolutamente convergente, então ela é convergente.
Referências Bibliográficas

[Gui] H. Guidorizzi, Um curso de cálculo. Vol. 1, 5ed., Rio de Janeiro: LTC, 2001.

[Gui2] H. Guidorizzi, Um curso de cálculo. Vol. 2, 5ed., Rio de Janeiro: LTC, 2001.
Índice Remissivo

Antiderivada, 87 de 2ª espécie, 125


divergente, 117, 125
Concavidade indefinida, 88
para baixo, 57 Intervalo, 1
para cima, 57 aberto, 1
Critério fechado, 1
da Comparação, 120, 127 semiaberto, 1
da Comparação no Limite, 122, 127
do Quociente, 122, 127 Limite, 5
das Somas de Riemann, 83
Derivada, 30 fundamental, 22
da função inversa, 38 fundamental (segundo), 28
Função infinito, 15
contínua, 5 lateral, 11
crescente, 2 no infinito, 13
de classe C∞ , 38 Número de Euler e, 24
de classe Cn , 38
decrescente, 2 Partição de um intervalo, 82
derivada (de 1ª ordem), 38 Polinômio de Taylor, 76
derivada de 2ª ordem, 38 Ponto
derivada de ordem n, 38 crítico, 51
derivável, 30 de inflexão, 57
diferenciável, 40 de máximo relativo ou local, 49
elementar, 115 de máximo absoluto ou global, 49
estritamente crescente, 2 de mínimo absoluto ou global, 49
estritamente decrescente, 2 de mínimo relativo ou local, 49
implícita, 45 extremo, 49
integrável, 83 interior, 50
limitada, 1 Primitiva, 87
monótona, 1 Primitivas imediatas, 88
Fórmula de Taylor, 76
Regra
Integral da Cadeia, 42
de Riemann, 83 de L’Hospital, 70
definida, 83 do Produto, 36
imprópria do Quociente, 36
absolutamente convergente, 122 Reta
convergente, 117, 125 assíntota
de 1ª espécie, 117 horizontal, 60
oblíqua, 60 do Confronto, 10
vertical, 60 do Valor Intermediário, 25
normal, 30 do Valor Médio, 52
tangente, 30 do Valor Médio Generalizado, 53
Fundamental do Cálculo, 89
Soma de Riemann, 83 Fundamental do Cálculo (2º), 115
Taxa de variação, 35 Valor
Teorema máximo de função, 49
da Função Inversa, 38 mínimo de função, 49
de Bolzano, 25 Velocidade instantânea, 34
de Rolle, 51
de Weierstrass, 25 Área, 84

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