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Anacatástrofe

VII (VIII).
132. Passemos a falar da Anacatástrofe, ou retrocesso.
133. Cada acto tem o seu contraponto noutro acto.
134. O declinio indeterminado do mundo supõe um recuo
condicionado quer ao Absoluto quer à Nulitude.
135. As aparências são reparadas nas essências.
136. O aparente sentido único do tempo é compensando pelo
regresso interno às origens.
137. A decadência esconde o extase que a co-habita.
138. A relação Catástrofe/Anacatástrofe é a Homeostética.
139. Se a Nulitude é o fundo do Absoluto então toda a
degradação é relativa.
140. A aparência da degradação é o Mal. A reparação da
degradação é o Bem.
141. O sentimento de indegradável é o paradísiaco.
142. O sentimento de inalienável degradação é o inferno.
143. O sentimento de lenta reparação é o purgatório.
144. O sentimento de eterna insolubilidade é o limbo.
145. A Anacatástrofe propõe a aceleração do purgatório com
vista ao indegradável paradísiaco.
146. O infernal é necessário como afinação das capacidades
reparadoras e como co-produtor da complexidade galopante. O
infernal é dado como um modo suave de inferno, isto é, como
degradação reciclável.
147. Essa complexidade galopante é um efeito do retrocesso
através da Anacatástrofe.
148. Dessa complexidade nasce um efeito tranquilizador que se
assemelha à simplicidade.
149. Da mesma forma subsiste uma ânsia pela diversidade e
pela multiplicidade.

(tratado)

Em cada catástrofe há devolução (anacatástrofe, neguentropia).

(Babstract)

Toda a catástrofe supõe uma anacatástrofe - como se pode


pensar a queda sem a emergência, ou a emergência sem a
queda? (Bella Sofística, textos homeotétios iniciais)

queda = retorno = stasis (para compreender a artephysis e o


paradisíaco)
o dissimulacro é ao mesmo tempo degradação e anacatástrofe

em cada queda há um retorno e um anti-retorno

(da domesticação dos pensamentos)

A dádiva é catástrofe que reverte (anacatástrofe), entusiasmo


zoológico, descargas de adrenalina. Há uma mitologia
desmitologizante a que não somos insensíveis.

(da representação aumentada)

A queda é ascenção. A catástrofe é anacatástrofe, o oposto dela.


A catástrofe é metacatástrofe, está como se não fosse — depois
das catástrofes, na bonança da contemplação.

(dos mitos)

Desde 84 que o meu desejo de contrariar as normas mais


evidentes me levou a inventar um movimento que seria inverso
ao das catástrofes. Chamei-lhe “anacatástrofe” mas a
designação se calhar é errada. Com mais um bom número de
anos em cima continuo a achar que a vida mais do que
verdadeira é inversamente proporcional às induções que as
aparências nos parecem oferecer, quando o que as aparências
dizem claramente é: nada de induções, nada de estatísticas. Se
há alguma lei na natureza é a seguinte: a natureza gosta de
refutar tudo aquilo que sobre ela se possa constatar. A excepção
serve para fazer pairar um manto de irrealidade sobre a
mediocridade da lei. É a minha moral privada!

(entrevista 2)

Mas no meio do desalento apocalíptico dos anos 80, e para


além de algumas ideias que respondem aos temas post-
modernos (anacatástrofe versus catástrofe, a questão babélica,
etc.), há um esboço de uma teoria baseada nos vocabulos gregos
Métis/Kairós/Enthousiasmous e de outras inúmeras teorias
esboçadas e desenvolvidas em escritos transversais aos
manifestos (o corpus "babélico" e os cadernos "Doxa", assuntos
abordados também por Clara Brito).

(Krisis e Manifestos)

Vem isto a propósito ( Ai! Ai! Ai!) de um livro do Agemben


sobre S. Paulo. Livro recheado de meditações sobre o que os
homeostéticos, já lá vão um bom número de anos, chamaram
de anacatástrofe ou metacatástrofe.
Se o Tempo é catástrofe, e todo o acto creativo (mesmo a mais
doce demiurgia) implica uma violência, não co-existirá este
Tempo aparente com «outro Tempo», um tempo
essêncialmente doce, de recolhimento, de anulação das
aparências catastróficas, um Tempo que estando em qualquer
Tempo está no ínicio de si, numa secreta stasis. Será a amorosa
tendência centripta de Empédocles ou a Agapé paulina?

Há a célebre frase evangélica: « se não vos fizerdes meninos não


entrareis no reino dos céus». Esta frase, lida correctamente, é
menos uma apologia da «naiveté» do que a invocação de uma
disponibilidade humilhativa. Nesta leitura estou a ser um pouco
eckartiano. Temos que descer aos bas fonds, ao húmus. O rabi
Jesús invoca a capacidade de permanecer na despossessão que o
mais baixo dos baixos torna acessível, na condição proletária, de
absoluta não-propriedade, quer na carne quer na psique, quer
no espírito. É dessa insignificância que a experiência se torna
desmesuradamente rica.

Algo parecido disseram S. Paulo e… Nietzsche! «é por isso, diz


o apóstolo, que eu me contento nas fraquesas, nos ultrajes, nas
dificuldades, nas perseguições e nas preocupações com o
Messias: de facto, quando sou fraco então sou poderoso», ou «o
poder realiza-se na fraquesa!». Também Lao-Tsé escreveu:
«aceitar os males do reino é ser monarca do Universo»!
Mas é Benjamin que tem o maior rasgo «homeostético» quando
anotou o seguinte:«a natureza é messianica precisamente
porque ela é caduca e o ritmo dessa caducidade messianica é a
felicidade!». Ao contrário de Adorno, ou de Stendhal a
felicidade é dada: não é só promessa (ou resguardo), nem nada
de inviável ou inacontecível. A promessa não é relegada para
pura hipótese a ser negada com arrogante argumentação. A
felicidade (o sukha) , e não o dukha (infortúnio/dôr) budista, é
o que nos é dado. A matéria não conhece a dôr, e uma pedra
quando se parte não é vítima de um movimento doloroso. A
dor é uma consequência das prudências da complexidade
biológica, o que o homem pode inverter. Mas estas são questões
que para já não são chamadas…

É na experiência artistíca, na creatividade, e não na


contemplação (que é impotente para transformar as formas)
que a felicidade é dada como qualquer coisa concreta. A teoria
supõe a sua possibilidade, mas as teorias são feitas de
prtudências e reservas. Além disso há um temor de que a
felicidade a invada expoliando-a de seguida. A felicidade exige
essa expoleação, essa expropriação, e a suspensão da libido que
faz mover a produtividade teórica.

(manifestos 2003)
Recordo-me que a leitura de Borges, de Plotino e de Adorno
por volta de 1981 criou em mim um gosto pelo delirio
conceptual. Como no poema: «metacatástrofe de excesso
enigmático» ( o termo «metacatástrofe» ou «anacatástrofe» é do
domínio homeostético, e quer dizer que há algo que é a
inversão das catástrofes, um pouco como a «neguentropia»). Ou
ainda «Pavão zero». O neutro e o nulo como algo
transbordante? A confusão voluntária que gosto de estabelecer
entre imagens e conceitos desagradará a um wittegensteiniano,
buscando clareza, ordem ou jogos, na linguagem. Mas quando
o jogo é precisamente o cruzamento de jogos, a provocação da
mestiçagem estamos perante os estéreis mas gloriosos
gongorismos, dando-se um preciosismo metafórico em que os
conceitos não passam de objectos metamorficos. Estes são
cozinhados com os efusiantes fumos da desordem.

(Nietszche e bué da fixe)

Especularmente vem... Como um deus sobrevoando num


raid!... Cataclismos sísmicos... mas histriónicos! Penso noutra
coisa muito neo-lógica e fora disto tudo: “anacatástrofe”!

(no labirinto de babel)


51. Quando o tantrika habita no vib-ratio ele liberta o fluxo da
criação/retorno (catástrofe/anacatástrofe), goza da liberdade
plena e é mestre das rodas das energias.

(tradução do Spandakatika)

Aprofundar o gozo das deusas da metacatástrofe — Cauda


Pavonis!
(prelúdio triúnico)

As dialéticas melodias da deídade propõe a anacatástrofe — há


que virar as casacas das catástrofes e recozer o mundo de novo.

A ginástica leva aos súbitos, ao emergir — retorno como vinco


de anacatástrofes.

(sublimaquia)
Metacatástrofe

O meu Novo não é a catástrofe, mas o para-além-da-catástrofe:


a catástrofe é o revivalismo da catástrofe, como dado, surge nos
anais do óbvio, da fragmentação, do Nada, do mundo de
Adorno. A metacatástrofe e o acto, suprimem essa exaustão de
intelecto a querer desligar-se, a performar-se para conclusão
anterior. O poder do improvável, do que não se fará, que se
deixa para que fique feito (Almada) é melhor.

..............................
Metacatástrofe de excesso enigmático
enigma que regressa como arredores,
enigma que é de si mesmo o festim.

..................................................
Na terminologia insistiamos em termos ôcos e pomposos como
Metacatástrofe, o que queria dizer, mais ou menos, uma
catástrofe às arrecuas.

A explosão que se adivinha no desenrolar das acções é


simulacro de hecatombe, ou nem simulacro, mas metacatástrofe
do excesso enigmático. Ao tempo das profanações a inculcação
de interditos opõe uma ressacralização cheia de preciosismos,
uma alfabetização, uma produção de formas cujo carácter tenha
acessibilidades quer de ordem prática, quer de ordem poética.

(suma homeostética)

E o que é a artephysis ((a natura renaturata)) ?

a) é a mixórdia a proliferar em equilíbrios e excepções, isto é, o


movimento em que as simbioses conduzem a metamorfoses de
metamorfoses!

b) é a zona erógeno-vegetal-animal do pensamento onde se


processa toda a criação (na sua glória lírica e épica, dependendo
dos modos em que os planos são filmados).

c) é a glândula onde a complexidade encontra as suas imagens


genésicas ou primordiais — festim do parto da grande deusa
que nada tem a esconder.

d) é o fruto maduro do espontaneo pretenciosismo que acabará


por se tornar simpático e digerível com a adequação perfeita a
uma sociedade de budas e outros deuses inadaptados.

e) é o que se expande em metacatástrofes poligenésicas,


caosgenéticas e acasogenéticas.
f) é, quiçá, a superestrutura que cede o lugar à poliestrutura !

g) é a Civilização (com a sua propensão para a denegação) que


se desagrega e reconstrói em focos civilizacionais glocais
interactuantes e entusiastas (Eureka!)!

h) é o lirismo aberto e plural (a virose da moda-doxa?)


processado ao nivel multiforme e hiper-complexo
(renascimento de cómicas cloacas locais em diálogo delirante
umas com as outras), e não a individualização uniformizadora
de consumidor passivo na era da globalização niveladora.

i) é a inflação da inflexão (crescendo de pontos de ruptura e de


manobras de diversão com retórica e oratória).

j) é a concretização da arteficção, uma metáfora cuja imagem é


um falanstério estético (filosófico-ecologista!) em parte
anarquista e selvagem.

k) é o modo de produção da natureza que por sua vez produz a


arte que produz a natureza(um anel recursivo hiperprodutivo).
Não há diferença entre as duas (a natureza é artista e a arte é
natural).

(Canibalismo e vegetalização)
A importância da assimetria/dissimetria, da mistura, do
negativo, leva à criação de novos interditos (e da própria
novidade): proibir é orquestrar esquecimentos — mas será que
algo se perde? Será que a memória do “essencial” não fica
inscrita para sempre no fundo do pensamento? O esquecimento
é um parênteses no tempo. O que se esquece será rememorado.
A paródia, o exagero, o desregramento, a infracção, etc., são na
sua inevitabilidade a inscrição da metacatástrofe que renova.

(da inscrição)

catástrofe/simulacro = metacatástrofe/dissimulacro

Acontecimento/ Inacontecimento/Anacontecimento

O acontecimento é um termo central deleuziano


O inacontecimento designa o neutro anestésico (o bhraman)
O anacontecimento é metacatástrofe e dissimulacro, inversão e
ocultação
METACATÁSTROFES

Há no ar há já algum tempo a ideia redentora de que


caminhamos para uma catástrofe «invejável», para um grande
suicídio planetário. Os indícios sustentam todos essa intuição
amigável que consola as nossas fadigas. E as capacidades de
regeneração do planeta não parecem apontar noutro sentido.
Confesso que o credo nas Metacatástrofes é aparentemente
estúpido, tenho porém a convicção de que para cada catástrofe
existe uma Metacatástrofe maior dissimulada. Isto é, o
elemento paradisíaco (ou simplificadamente bíblico) é cada vez
mais evidente sob múltiplas formas, sobretudo no avanço da
complexidade, nos modos mais sensíveis de percepção, na
infantilização, na indeterminação dos eventos, na flexibilidade
hierárquica, etc.

A percepção do Metacatastrófico exige uma especialização, um


dom, ou uma militância, em face da chacota alheia.

As Metacatástrofes são o oposto da legitimação. Desfazem as


leis. Não procuram o dharma (nazi) como no Mahabharata, e
não se contentam com a inconsistência budista. É a Doxa que
se torna evidente: a plenitude das pequenas coisas, o magnífico,
o exuberante, o esplendor. A Paradoxa nega e esclarece a Doxa.
Mas esse assunto já foi dito noutro lado.
(Do Dissimuacro)

EINAI/MÉ EINAI/MÉ/MÈDEN — O Ser surge como uma


resposta Meta-catastrófica a um Logos que se confunde com a
luta, o movimento e a diluição das formas noutras formas. A
experiência do Ser tem que ser entendida como uma
experiência de meditação-vivência na imagem de uma esfera
luminosa, indissociável das outras vivências ilusóriamente
catastrófica. O ser é um enigma, tal como é enunciado no início
de um poema homeostético: metacatástrofe de excesso enigmático.
É claro que a plasticidade do ser como verbo dá conta da sua
função de cópula (e aqui diríamos que o verbo ser é o próprio
Eros, daí a "deusa" insistir em meditar nele) e de garantia do
topos. O ser é o que faz o lugar. Nas línguas semitas a ideia de
ser não consegue ser estática, dado que o tempo está dividido
entre o acabado e inacabado, e o próprio deus se define, não
como pessoa (não existe necessáriamente um sujeito), mas
como predesposição: serei o que serei. O ser parménidiano é
imóvel, e é nisso que se assemelha às práticas yoguicas de
concentração num ponto.

(léxico grego-homeostético)
Esta Novidade não é a catástrofe, mas (preparem os binóculos!)
o para-além-da-catástrofe.

A catástrofe é o revivalismo blasé da catástrofe.

A catástrofe, como efeito hiperreal, surge em circunstâncias


periféricas, muito depois de todos os sintomas terem sido
escondidos atrás da porta.

Muita fragmentação, muito Nada, muito Adorno de Alterne-


de-Baixo.

A metacatástrofe em acto, suprime essa exaustão de intelecto a


querer desligar-se das evidências, a performar-se para conclusão
anterior.

O poder do improvável já está farto de mudar o mundo!

(no Labirinto de Babel)

E as vacas sagradas desabavam assim por desdizer do caos


musical dos antecismos e das metacatástrofes – há algo
epidermamente mímico nesta lógica de assimilação das legiões
de percursores como se uma catarata fosse despejada
súbitamento dentro da nossa cabeça. Percebemos que os ilustres
mortos que nos precederam nos fazem menos eternos e mais
longevos.

O reverso do firmamento, o reverso quer do caos, quer da


ordem pré-establecida - a metacatástrofe, isto é a complexidade
como o que é paradisíaco! Mas os mitos enganaram-nos
duranto muito tempo ao confeccionarem para o mundo ínicios
demasiado frios e despovoados.

A Artephysis (notas)

O velho metamórfico principio de Lavoisier - «nada se perde,


nada se ganha, tudo se transforma»... e arrefece... e se degrada...
e se complexifica... e se fragmenta... e se suja... principio
metamorfico... (reformismo? transreformismo?)

Entropia – catastrofismo, decadentismo, conformismo,


cepticismo, nihilismo (desperdício da potência).

Neguentropia – há porém casos em que a degradação se


transforma e se organiza em informação e em vida nova – é o
estranho progresso da complexidade como situação local,
elitista, intensa, hipersensível – tímidas excessões no deserto
tenebroso daquilo que imaginamos que é o universo?
Metacatástrofe – maximizar a complexidade dos universos
como um processo inesperado e natural – levar a criatividade a
um paroxismo consciente em todas as coisas.

Se tudo se tornou um ready-made, e se os ready-mades foram


amestrados e transformados de anti-arte em arte, então o
allready-made que é o mundo dissolve a antiga lógica que
separava (e opunha?) tekné e physis. A arte já é na sua auto-
determinação natureza, e a natureza, na sua inter-determinação
já não se deixa de pensar e re-produzir senão como arte, como
capacidade de se expandir (e poluir? e reciclar?) tecno-
poéticamente.

(pré-homeostética rew)

Caçar é saber calar intencionalidades.


É dar conta das premissas mutantes, das metacatástrofes nos
interstícios, numa arte de enredar a vítima.

Importa nunca saber quando finda. O acabamento é promissor


de morte. E a perfeição é um sintoma de culpa. Toda a obra de
arte, ou texto, prefere o inacabamento original.

O tema recorrente é o inesperado. Ou as morfologias


interstíciais de obsceno.
As dádivas dos deuses disfarçam-se de protótipos envenenados.

Marcados pela mancha nefasta do retorno, os poetas sentem-se


atractores. Lançam redes pregnantes de metacatástrofes.
Mascaram o invisível para que se torne palpável.

(uma certa euforia teórica)

Alquimista Cornudo (O) — Autor de vários livros poéticos


relacionados com a alquimia, e cuja identidade teima em não se
revelar. Faz parte do círculo (de difícil acesso) dos
homeostéticos. A sua filosofia parece ser a de um gnosticismo
invertido, em que a cada catástrofe corresponde uma sua
inversão (ou, o desfrute do metacatastrófico,) e ao exílio o sabor
do paradisíaco.

KATHARSIS/KATASTROPHÉ/METAKATASTROFE
— Há um poema que começa assim Metacatástrofe de excesso
enigmático/ enigma que regressa como arredores,/enigma que é de si
mesmo o festim. A ideia de catastrofismo governou os anos 80, e
foi popularizada por uma não-leitura de René Thom, o eco
dóxico das suas teorias matemáticas respeitantes à emergência
das formas (vêr entrada Metacatástrofe). O catártico é sempre
sensível. A hamartia que pede a catástrofe deriva da
espectralização e dos jogos de espectros daí derivados. Escreve
surpreendentemente Almada Negreiros: É precisamente por o
homem não ter cumprido o cogniscível que cai em transcendência, e
em transcendência não há catarsis, desligaram-se-lhe a alma, o
espírito e o corpo, reina nele o mental em tirano. A catarsis do belo é
a terceira vez que o homem é parido; a primeira pela mulher; a
segunda com intervenção do parteiro Sócrates (maiêutica); a terceira
em que o próprio se dá à luz, nu e simples como da primeira vez (a
sagrada) três umbilicais serão cortados até que o próprio fique livre,
os dois últimos só podem ser cortados pelo próprio. É infinitament
emais fácil entrar no cognoscível do que sair depois de se ter servido
dele um homem. Apenas a catársis tem este poder. E com catársis
entramos no belo.

Metacatástrofe — Reconstrução natural do estado paradisíaco


sem nenhum esforço. O que está para lá das catástrofes ou das
morfologias. What is more original than any kind of beginning
Pulsão desfragmentaria. Provavelmente o mesmo que
criatividade. Este léxico surgiu como antídoto ao tom
catastrofista e neo-decadentista dos anos 80 do século XX. Tem
que ser equacionado no ambito da interrelação entre a teoria
das catatástrofes (de René Thom, com as suas sete fórmulas), o
anacatastrofismo (como se existisse um tempo paralelo e
simétrico onde os acontecimentos se dão à rectaguarda), e o
metacatastrofismo (como perspectiva neo-Parmenidiana, em
que o Ser ou o absoluto são sempre contemporâneos e não são
sensíveis a qualquer alteração entrópica). O número da
metacatástrofe é o do apocalipse (666) ao contrário, sendo
assim o 999.

(léxicos)

O que a arte implanta é o neguentrópico, o metacatastrófico, o


paraíso carnal-filosofal.
(Mestres são Monstros)

O que a arte implanta é o neguentrópico, tropical, morno, difuso,


embevecido da pasmaceira. Plantas no jardim neguentrópico, o
metacatastrófico, o paraíso carnal-filosofal com o des-espelhamento
de Abelardo. Deus não gosta de se ver ao espelho.

(novela grega)

carnibalism — more sublime than sublimity


dissimulation — more secretely strategic than any secret global
war
pornoecology — more sexual than sex
abduction — more changeble than change
tenderism — more intense than passion
obsolety — more conscient of obsolescence than any
avantguard
metacatastrophe — more original than any kind of beginning
unfinishtelism — more unfinished than ever
extrarreality — more strange than the real

(diário pastiche)

Parménides pode parecer refutativo, e surgir como um anti-


Heraclito — vale a pena fazer a negação consequente do que
escreveu Heraclito e tentar perceber as consequências, que
podem levar a Parménides, a Antifonte, ou, modernamente, ao
poeta português Alberto Caeiro (que Tabucchi traduziu
numaantologia na Adelphi), mas para aceitar estes dois últimos
teríamos que opor o Ser ao Logos, no sentido em que o É se dá
precisamente onde o Logos perde a unidade e falha, ou onde a
eclosão existe porque a harmonia oculta é desnecessária.
Diremos que o príncipio destes três autores é meta-
catastrofista. Isto é, situam a verdade no espaço da consciência,
simultâneo à experiência das catástrofes, mas que a ilusiona/
desilusiona (as vê como Apatê). Assim o ser coincide e
"descoincide" com a physis, mas jamais é a sua negação. A
negação não é dada na natureza, nem nos animais. A negação é
uma invenção tardia que se aplica na linguagem. O mais
parecido com a negação é o pseudos, uma sensação de
inadequação ou de ilusão nas conjecturas que fazemos. Por isso
nos devemos desviar de qualquer pensamento que se construa a
partir de termos que denotem a negação.

(ficções conceptistas)

Para que o metacatastrófico se desvende, a serpente tem que


largar muitas peles — não basta morder-se a cauda — e logo se
percebe que o que habita o Labirinto, o caos, cujo nome é
Minotauro, é a estrela que dança de Frederico: Astérion, o que
dançará a dança do grou com Ariadne, no nocturno recinto de
cada Creta.

(Minotauro ensaio/comunicação Llansol)

Numa perspectiva anular a catástrofe dissolve-se porque tudo


encontra o seu ponto de retorno — no círculo não há príncipio
nem fim. O Eterno Retorno nietszchiano, assim como a
concepção hindú (vidé Michel Angot) não podem considerar
um príncipio e um fim, dado que a cada momento tudo
principia e finda, sendo que voltará a repetir-se. A catástrofe, a
metacatástrofe e a anacatástrofe encontram-se constantemente.
Segundo Angot há géneses que são contemporâneas de
pralayas, da dissolução de certos mundos. Isto leva a considerar
os fenómenos sob diversos pontos de vista.

De um modo completamente diferente a física moderna


considera que a existência e a consistência das coisas resulta da
entropia, da dissipação da potência, de uma irremediável perda,
de uma progressima degradação da energia forte que se vai
solidificando e esfriando em coisas. A coisificação é um
arrefecimento, e é esse arrefevimento, e não a plenitude do Ser,
da potêncua, que garante a existência. Assim, o Ser, para se
realizar tem que se enfraquecer, degradar, dispensar, dar — é
isso que constitui a gratituidade. A metacatástrofe e a
anacatástrofe são os aspectos visíveis dessa gratituidade, a que
no jargão místico se chama a Graça, a kharis.

(a roda e o espelho)
Citações de outros/interpretações

Se atribuirmos ao conceito "catástrofe", frequentemente


utilizado na teoria homeostética, as ideias de ruptura,
transformação, imprevisibilidade, a "inversão das
catástrofes" (metacatástrofe), procura instaurar um equilíbrio
entre o acto de captação dos referentes dispersos e a selecção
dos mesmos. “Existe uma espécie de oralidade que nos
persegue, um desejo de performance, de memória activa,
ritual...”. “Metacatástrofe” significará a capacidade de controlar
o caos e será, portanto, parte dum sistema ordenador existente
no processo criativo.

(in Clara Brito, Homeostética, tese de mestrado)

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