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EXISTE RACISMO
CAPÍTULO
NO BRASIL?
Em 1888, com a assinatura da Lei Áurea, a escravidão foi abolida legalmente
» Competências e do Brasil. No entanto, essa transformação legislativa não resultou em uma liber-
habilidades
dade digna e igualitária para a população até então escravizada.
CGEB6, CGEB7, CGEB9 e
CGEB10. O movimento abolicionista, no Brasil e em outras partes do mundo ocidental,
CECHSA1: EM13CHS101. defendia medidas que garantissem uma inclusão social digna e efetiva da popu-
CECHSA5: EM13CHS501, lação recém-liberta. Esses projetos conflitavam com as alas conservadoras da so-
EM13CHS502 e ciedade escravista. Assim, muitas questões abordadas na luta atual dos movi-
EM13CHS503.
mentos negros no Brasil ainda contêm elementos das pautas dos abolicionistas
CECHSA6: EM13CHS601,
do século XIX.
EM13CHS602 e
EM13CHS606. Essa perspectiva contradiz a teoria da democracia racial. Articulada pelo so-
CELT5: EM13LGG502. ciólogo brasileiro Gilberto Freyre (1900-1987), essa teoria trata da ideia de que,
CELT7: EM13LGG704. historicamente, no Brasil, sempre houve a convivência pacífica entre pessoas
CECNT3: EM13CNT302. brancas, negras e indígenas e, por isso, questões como racismo ou segregação
racial, quando existiram, foram brandas, se comparadas a de outros lugares onde
também houve escravidão.
A seguir, leia o trecho de uma letra de música que aborda algumas dessas
questões.
A carne
[…]
A carne mais barata do mercado é a carne negra
Que fez e faz história
Segurando esse país no braço, meu irmão
[…]
E esse país vai deixando todo mundo preto
1. Para você, a que se refere a palavra “carne” na letra da música? Explique suas
reflexões para a turma.
2. O segundo e o terceiro verso do texto podem ser associados à escravidão
moderna no Brasil. Como você os relacionaria com esse período histórico?
3. De acordo com as suas percepções, a letra da música contradiz ou concorda
com a teoria da democracia racial de Gilberto Freyre? Por quê?
4. Em sua opinião, o que é racismo? Como é possível caracterizá-lo? E como
podemos combatê-lo?
REFLEXÃO
Ao analisar as sociedades e seus modos de vida, os pesquisadores identificam Estruturalismo e pós-
processos e organizações que são chamados de estruturais. Essa expressão in- -estruturalismo
dica características e aspectos que sustentam e organizam a vida social de um A análise estruturalista
grupo, uma comunidade ou um povo. Por ser a base sobre a qual se desenvolvem faz parte do repertório de
as mais diversas manifestações culturais, as mudanças dos aspectos estruturais pesquisa das Ciências Hu-
de uma sociedade são complexas e, geralmente, não são bruscas: ocorrem no manas e Sociais desde a
tempo histórico, chamado de longa duração. publicação dos trabalhos
Considerando que os processos que formam o Brasil têm cerca de quinhentos do linguista suíço Ferdi-
anos de história e que o sistema escravocrata durou em torno de trezentos anos, nand de Saussure (1857-
-1913). A partir da década
é possível analisar a escravidão como uma estrutura da sociedade brasileira,
de 1960, esse método
oriunda do período colonial. Assim, mudar essa estrutura demanda esforço e
passou a ser revisado por
transformações nas formas de pensar e de agir, nos âmbitos público e privado e pensadores de diversas
nos níveis individual e coletivo. áreas do conhecimento. A
A assinatura da Lei Áurea é uma conquista importante nesse sentido. Contu- principal crítica dos cha-
do, sem a ação de todos os sujeitos sociais, a transformação não se torna efetiva mados pós-estruturalistas
e acabamos reproduzindo as lógicas escravistas. é que a análise sobre uma
No capítulo anterior, vimos uma dessas permanências escravocratas: a exis- sociedade não pode se
tência, ainda hoje, de iniciativas privadas – empresas particulares – que sub- restringir às suas estrutu-
metem pessoas a condições análogas à escravidão. Por outro lado, há uma ras, sem abordar suas
série de projetos e legislações que buscam coibir essa prática e conscientizar transformações e os indi-
víduos e grupos que con-
a população e as empresas de que se trata de um crime que atenta contra os
seguem romper com essas
direitos humanos.
estruturas. Michel Fou-
Neste capítulo, vamos aprofundar o debate sobre outra permanência escravo- cault, Gilles Deleuze, Jean
crata: o racismo estrutural. O texto a seguir, do jurista e filósofo Silvio Luiz de Al- Baudrillard, Judith Butler
meida, apresenta algumas reflexões sobre esse conceito. e Julia Kristeva são alguns
dos pensadores conside-
rados pós-estruturalistas.
[…] Em uma sociedade em que Eles não reivindicam o fim
Valdir de Oliveira/Fotoarena
Racismo sem
querer, de Pedro
Leite. Esta história
em quadrinhos
mostra algumas
frases que
evidenciam a
naturalização do
racismo contra
pessoas negras.
[…] o pós-abolição deve ser visto como um campo de disputas, e não como
uma realidade dada, uma herança inexorável da escravidão. É verdade que os ne-
gros já entraram em campo em posição de desvantagem em relação aos brancos,
com o placar lhes sendo muitas vezes desfavorável, mas nem sempre eles perde-
ram. Com engenhosidade, versatilidade e usando armas de diversos tipos e cali-
bres, os negros selaram conexões diversas, travaram alianças ambivalentes, capi-
talizaram as possibilidades e frestas do sistema, fizeram escolhas, negociaram suas
identidades e lealdades até conseguirem reverter o placar e ganhar o jogo […].
Não se trata aqui de negar a famigerada opressão racial no Brasil […], mas de real-
çar a necessidade imperiosa de lançar luzes em formas alternativas e criativas de
vida, resistência e agenciamentos. O protagonismo negro no pós-abolição é uma
área de estudos e pesquisas em franca expansão. […]
Domingues, Petrônio. Fios de Ariadne: o protagonismo negro no pós-abolição. Anos 90, v. 16,
n. 30, p. 240-241, 2009. Disponível em: https://www.seer.ufrgs.br/anos90/article/
view/18932/11021. Acesso em: 2 abr. 2020.
Ilustrações: ID/BR
MARIELLE FRANCO,
JUÍZA DIZ QUE RÉU NÃO
VEREADORA DO PSOL, É
PARECE BANDIDO POR TER ASSASSINADA NO CENTRO
“PELE, OLHOS E DO RIO APÓS EVENTO COM
CABELOS CLAROS” ATIVISTAS NEGRAS
Folha de S.Paulo, 1o mar. 2018. Esta manchete é um indício de racismo de El País, 15 mar. 2018. Esta manchete aborda o feminicídio de Marielle
uma representante do Poder Judiciário, responsável por defender os Franco, vereadora negra eleita pelo município do Rio de Janeiro em 2018.
direitos dos cidadãos e promover a justiça.
Estados Unidos /
Cuba Porto Rico Antilhas Holandesas Peru / Nova Granada
Brasil (colônia (colônia e Guiana (colônias Venezuela Argentina (Colômbia) /
espanhola) espanhola) holandesas) Equador
Fonte de pesquisa: FGV – CPDOC. O fim da escravidão. In: Atlas histórico do Brasil. Disponível em: https://atlas.fgv.br/
marcos/o-fim-da-escravidao/mapas/linha-do-tempo-do-fim-da-escravidao-nas-americas. Acesso em: 8 abr. 2020.
a) Quanto tempo se passou entre a abolição da escravidão no Haiti, o primeiro país a revogá-la, e a
abolição no Brasil?
b) Se a linha do tempo fosse organizada em um ranking com os países que mais cedo aboliram a
escravidão, qual posição o Brasil ocuparia?
c) O que isso pode indicar sobre o sistema escravista em nosso país? Anote sua resposta no caderno.
3 Durante um discurso em Oakland, nos Estados Unidos, em 1979, a filósofa e professora Angela
Davis afirmou: “Numa sociedade racista, não adianta não ser racista, nós devemos ser antirracistas”.
Com base no que você estudou, como você justificaria a frase de Davis, relacionando-a ao racismo
estrutural? Escreva sobre isso no caderno e depois leia suas ideias para os colegas.
4 Observe a imagem da página 27. Quais elementos dela evidenciam o racismo estrutural no momen-
to histórico retratado? Liste os elementos no caderno, explicando a relação deles com o racismo.
5 (Enem)
A luta contra o racismo, no Brasil, tomou um rumo contrário ao imaginário nacional e ao consenso cien-
tífico, formado a partir dos anos 1930. Por um lado, o Movimento Negro Unificado, assim como as demais
organizações negras, priorizaram em sua luta a desmistificação do credo da democracia racial, negando o
caráter cordial das relações raciais e afirmando que, no Brasil, o racismo está entranhado nas relações so-
ciais. O movimento aprofundou, por outro lado, sua política de construção de identidade racial, chamando
de “negros” todos aqueles com alguma ascendência africana, e não apenas os “pretos”.
guimArães, A. S. A. Classes, raças e democracia.
São Paulo: Editora 34, 2012.