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São Cristóvão
2020
TEREZA HORTENCIA DA SILVA AZEVEDO
Orientadora:
Profa. Dra. Marilene Batista da Cruz Nascimento
São Cristóvão
2020
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
CDU 377.8
TEREZA HORTENCIA DA SILVA AZEVEDO
Orientadora:
Profa. Dra. Marilene Batista da Cruz Nascimento
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________________
Profa. Dra. Marilene Batista da Cruz Nascimento (Orientadora)
Programa de Pós-graduação em Educação/Universidade Federal de Sergipe
_______________________________________________________________
Prof. Dr. Carlos Alberto de Vasconcelos
Programa de Pós-graduação em Educação/Universidade Federal de Sergipe
________________________________________________________________
Profa. Dra. Rita de Cácia Santos Sousa
Departamento de Educação/Universidade Federal de Sergipe
_______________________________________________________________
Profa. Dra. Rosana Carla do Nascimento Givigi
Programa de Pós-graduação em Educação/Universidade Federal de Sergipe
_______________________________________________________________
Profa. Dra. Simone Silveira Amorim
Programa de Pós-graduação em Educação/Universidade Tiradentes
São Cristóvão
2020
Dedico este trabalho à força maior, meu Deus, que
me guia, protege, ampara e sempre está em minha
vida, ofertando amor, sabedoria, apontando
caminhos, inclusive, o da resiliência, fundamental
para a realização desta pesquisa, quando o medo se
fez presente.
AGRADECIMENTOS
Agradeço inicialmente à força maior que me guia, meu Deus, por estar presente em
todos os momentos da elaboração desta dissertação.
À minha orientadora, Profa. Dra. Marilene Batista da Cruz Nascimento, pelos
ensinamentos e atos de generosidade, paciência e competência na condução das orientações,
destacando o quão é prazerosa a elaboração de estudos científicos. Meu abraço carinhoso e
orgulho-me de ter sido sua aluna e orientanda. Obrigada pela dedicação e por ter acreditado
em mim, quando eu mesma duvidava. A minha eterna gratidão!
À minha família pela atenção, apoio, estímulo e companheirismo.
Aos amigos, parentes e pessoas que, direta ou indiretamente, colaboraram com essa
conquista, em especial as amigas Ana Paula Cavalcante e Julita Lopes que me conduziram ao
caminho do mestrado.
Especial agradecimento aos amigos e parceiros de estudo Mateus Henrique, Mário
Jorge e Paula Tauana pelas experiências vivenciadas e aprendizagens coletivas.
À equipe diretiva, professores e demais profissionais que participaram deste estudo,
com certeza vocês foram determinantes.
Aos membros da banca, Prof. Dr. Carlos Alberto de Vasconcelos, Profa. Dra. Rita de
Cácia Santos Sousa, Profa. Dra. Rosana Carla do Nascimento Givigi e Profa. Dra. Simone
Silveira Amorim pelas valiosas contribuições neste estudo.
A minha eterna gratidão a todos e que os anjos de luz estejam sempre com vocês!
“A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém viu,
mas pensar o que ninguém ainda pensou sobre
aquilo que todo mundo vê”.
Arthur Schopenhauer
RESUMO
Esta investigação tem como objetivo geral analisar as contribuições do ensino colaborativo
para a prática pedagógica dos docentes da classe comum e da sala de recurso multifuncional
(SRM), cartografando as aprendizagens (re)construídas por esses profissionais no itinerário
formativo da escola municipal investigada. Defendo a ideia de que o ensino colaborativo
potencializa os conhecimentos, as habilidades, as atitudes e os valores dos professores à
ressignificação da práxis, com vistas à (re)construção das aprendizagens dos alunos com
deficiência (AcD). Esta pesquisa fundamenta-se na teoria da complexidade cuja ligação com o
objeto de estudo expressa formas de conceber o conhecimento e o ensino a partir de mudanças
teórico-práticas em favor de uma atitude transdisciplinar. Quanto à natureza dos dados, trata-
se de uma investigação qualitativa que utilizou fontes secundárias, como: livros, teses,
dissertações, artigos, leis, decretos, atos normativos, resoluções, relatórios, bem como
documentos disponibilizados pela escola envolvida. Adotei, ainda, a metodologia da
pesquisa-intervenção com o propósito de acompanhar os processos referentes às práticas
pedagógicas desenvolvidas pelos professores das classes comuns e da SRM, aplicando-se o
método de procedimento cartográfico para captar as singularidades dos movimentos da
atenção, a saber: rastreio, toque, pouso e reconhecimento atento que dialogam e transitam
entre si. O lócus foi uma unidade de ensino municipal, localizada em Aracaju/Sergipe, que
atende a 536 alunos, desses, 20 com deficiência. O corpo docente é composto por dois
professores do Atendimento Educacional Especializado (AEE) e 27 da educação infantil aos
anos iniciais do ensino fundamental. Participaram desta pesquisa um membro da equipe
diretiva, cinco professores da classe comum, dois do AEE e três técnicos da Secretaria
Municipal da Educação (Semed). Os dispositivos de produção de dados foram o diário de
campo, as conversas correntes, as memórias educativas e a entrevista semiestruturada,
analisados à luz das noções subsunçoras. Os resultados permitiram identificar as dificuldades
dos professores no desenvolvimento do fazer pedagógico no que concerne aos AcD, sejam
essas proporcionadas, dentre outros fatores, à formação continuada dissociada da teoria e
prática. Os docentes expressaram a importância das inter-relações entre o ensino colaborativo
e a práxis pedagógica na mediação do processo educativo para o fortalecimento da inclusão
escolar, onde a formação surge como uma oportunidade de reflexão-ação-reflexão entre os
profissionais das classes comuns e da SRM, levando à ressignificação de conhecimentos e de
diferentes aprendizagens a partir de experiências vivenciadas.
This research aimed to analyze the contributions of collaborative teaching to the educational
practice of teachers of the common class and of the multifunctional resource room (SRM),
mapping the learning (re) built by these professionals in the formative itinerary of the
municipal school. I defend from the idea that collaborative teaching enhances the knowledge,
skills, attitudes and values of teachers to the reframing of praxis, with a view to promoting
meaningful learning for students with disabilities (AcD). This research is based on the theory
of complexity where there is a connection with the object of study that expresses ways of
conceiving knowledge and teaching from theoretical-practical changes in favor of a
transdisciplinary attitude. As for the nature of the data, it is a qualitative investigation, using
secondary sources, such as: books, theses, dissertations, articles, laws, decrees, normative
acts, resolutions, reports, as well as documents made available by the school involved. The
intervention-research methodology was also adopted in order to monitor the processes related
to the pedagogical practices developed by the teachers of the common class and the SRM,
applying the method of cartographic procedure to capture the singularities of the movements
of attention, namely: tracking, touching, landing and attentive recognition that dialogue and
transit among themselves. The locus was a municipal school, located in Aracaju/Sergipe,
which has 536 students, 20 of them with disabilities. The staff is composed by two teachers
from the Specialized Educational Service (AEE) and 27 from early childhood education to the
early years of elementary school. A member from directive staff, 5 common classes teachers,
2 from AEE and 3 techniques from Municipal Secretary of Education. Instruments for data
production were field diary, current conversations, educational memories, and semi-structured
interview, which were analyzed in the light of sub-signifier notions. The results allowed to
identify the difficulties of the teachers in the development of the pedagogical practice in what
concerns the AcD, whether these are proportionate, among other factors, to continuing
education dissociated from theory and practice. The teachers expressed the importance of
interrelation between collaborative teaching and pedagogical praxis in the mediation of the
education process for the strengthening of scholar inclusion, where formation appears as an
opportunity for reflection-action-reflection among professionals of common classes and the
SRM, leading to the reframing of knowledge and different learnings from lived experiences.
( )
( )
LISTA DE FIGURAS
ENTRE O ESPECÍFICO
E O INDISSOCIÁVEL:
formação docente e
ensino colaborativo para
a inclusão escolar
1 INTRODUÇÃO: cartografando
as premissas do estudo.............25
2 ESTADO DO CONHECIMENTO:
formação e ensino colaborativo como ação
integradora para a inclusão escolar........44
3 DESENHO TEÓRICO-METODOLÓGICO
E (RE)CONSTRUÇÃO EMPÍRICA ............. 60
3.1 A constituição de um campo de pesquisa:
relações e método ............................................ 60
3.2 Entre a narrativa e o devir:
movimentos por múltiplos caminhos .............70
3.3 Parada para reconectar: o encontro
com os achados ................................................88
4 DESVELANDO OS (DES)CAMINHOS
TRILHADOS ..........................................98
4.1 Itinerâncias formativas: apropriações,
desafios e perspectivas ............................99
4.2 Práxis pedagógica:
um olhar reflexivo sobre a prática .......109
4.3 Aprendizagem e ensino colaborativo:
um caminho possível ..............................117
REFERÊNCIAS.................................128
APÊNDICES ......................................139
ANEXOS .............................................151
SUMÁRIO
1
Neste trabalho, adoto o conceito de qualidade da Unesco que se baseia em dois princípios: “[...] o primeiro
identifica o desenvolvimento cognitivo dos alunos como o objetivo explícito de todos os sistemas educacionais
[...]. O segundo enfatiza o papel da educação na promoção de valores e atitudes de cidadania responsável e no
provimento do desenvolvimento criativo e emocional”. (UNESCO, 2005, não paginado).
26
2
Nesta pesquisa, faço distinção entre prática pedagógica e educativa, tendo como referência os estudos de
Franco (2016). A primeira faz referência às formações, aos espaços-tempos escolares, organização do trabalho
docente, as parcerias e expectativas com a finalidade de concretização de processos pedagógicos. A segunda
contempla as práticas que ocorrem para concretização dos processos educacionais.
3
Prevista na LDBEN/1996 e no Plano Nacional da Educação-2014/2020 (PNE), a BNCC, aprovada em 22 de
dezembro de 2017, é um “[...] documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de
aprendizagens essenciais como direito das crianças, jovens e adultos no âmbito da Educação Básica escolar.”
(BRASIL, 2017, p. 4).
27
cursos de formação de docentes terão por referência a Base Nacional Comum Curricular”
(BRASIL, 1996, não paginado).
Entusiastas da BNC-Formação, a exemplo dos professores Mozart Neves Ramos,
Maria Helena Guimarães de Castro, Kátia Stocco Smole, entre outros, enfatizam que, enfim,
se tem no Brasil um documento delineador das diretrizes necessárias à formação de
educadores. Ao trazer um conjunto de competências e habilidades, pauta os currículos em
suas especificidades que visam ao atendimento da formação de professores que atuarão nas
distintas etapas da educação básica – educação infantil, ensino fundamental e ensino médio,
estabelecendo-se, assim, um perfil comum de docente para atender às necessidades do
conhecimento necessário ao século XXI. Ledo engano!
As DCN n.˚ 2/2019 e a BNC-Formação apresentam lacunas irreparáveis para a
profissão da docência. A Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação
(ANPEd), em outubro de 2019, lançou o texto “Uma Formação Formatada”, cujas páginas
retratam um posicionamento crítico às propostas apresentadas. Essas críticas envolvem o fato
desses documentos considerarem tão somente as experiências e as teorias educacionais
internacionais, em detrimento do pensamento brasileiro. A análise da ANPEd faz uma
analogia entre o processo de formação de professores e a atualização dos sistemas de
informática. A comparação enfatiza que os docentes precisam ter seus “discos rígidos”
atualizados, impondo “[...] às licenciaturas uma ‘formatação’ nos modelos e experiências,
decorrentes de recente reformulação curricular, liberando ‘dados apagados’ para receber a
inculcação das ‘competências e habilidades’” (ANPEd, 2019b, não paginado).
Essas destacam o insucesso da educação brasileira a partir de índices, apontando como
fatores relacionados à atuação e à formação do profissional do ensino, negligenciando a
centralidade da condição social dos licenciados e do alunado da rede pública brasileira. A
BNC-Formação não evidencia as diretrizes que norteiam a formação continuada de
professores, enfatizando a organização curricular, a carga horária e a avaliação nas
instituições. Além disso, não há clareza quanto aos caminhos da formação para a profissão
docente no campo da educação especial.
Segundo o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diferença (LAPED), da
Universidade Estadual de Campinas, a área da educação especial sofreu retrocessos quando se
reporta à inclusão escolar. O primeiro, em 2017, quando sob o pretexto de atualizar a Política
Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI), o MEC
desconsiderou as contribuições de pesquisadores, instituições de ensino superior e sociedade
civil para reformulação dessa política. O segundo refere-se à BNCC que, no texto final,
28
4
Beyer (2013) não distingue na prática e conceitualmente os termos integração e inclusão escolar, divergindo
dos autores inclusivistas que os diferenciam. O primeiro entendido como permanência para o sucesso à deriva
das individualidades e o segundo um chamamento às instituições à responsabilidade. Nesta dissertação, adoto o
termo inclusão escolar em detrimento da palavra integração.
5
O uso equivocado do termo “sistema”, utilizado frequentemente no âmbito educacional, configurando-se como
sinônimo de rede e se reportando ao conjunto de instituições federais, escolas estaduais e municipais, tem
suscitado debates para que se tenha uma proposta efetiva de um Sistema Nacional de Educação. Políticas
públicas fragmentadas, descontinuidade das reformas educacionais e, consequentemente, a desarticulação
institucional dos sistemas de ensino entre si, isto é, a falta de uma efetiva participação em regime de
colaboração dos três níveis organizacionais da federação, leva ao não atendimento de uma proposta de
“sistema educacional” consolidada e efetiva, onde as normatizações preconizadas em âmbito nacional,
seguidas pelas diretrizes, bases e o alcance das metas estipuladas para todo o país, são desenvolvidas por
29
para implantação dos sistemas educacionais inclusivos. O inciso III, do art. 208, reporta-se
que “[o] dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de: III -
atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência6, preferencialmente na
rede regular de ensino” (BRASIL, 1988, não paginado).
O processo de inclusão até a década de 1980 não alcançou relevantes resultados em
razão do movimento de integração exigir, dos alunos oriundos de escolas ou classes especiais,
uma amoldagem às rotinas das salas de aula, aos métodos de ensino, ao currículo da escola
sem as adaptações para a promoção da aprendizagem, interferindo na permanência dos AcD,
assim como a desarticulação entre professores da salas especiais e comuns, com pouca
formação para contribuir no processo educativo (GLAT, 2011).
No início da década de 1990, com os movimentos em defesa dos direitos sociais das
minorias, ocorreram uma série de conferências internacionais7 que visavam à ampliação do
acesso e da qualidade da educação para todas as pessoas, culminando com proposta de uma
educação inclusiva. Em 1994, em prol de uma Educação para Todos, o Brasil participou da
Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, sendo um dos países
signatários da Declaração de Salamanca, considerada um dos principais documentos mundiais
voltados para a inclusão social, na qual, com representantes de 92 países e 25 organizações
internacionais, reafirmaram o
preferencialmente na rede regular de ensino, reiterando o direito dos AcD. Dada a relevância
do tema, a referida legislação dedica o Capítulo V à Educação Especial, onde define no artigo
58, essa modalidade como “[...] de educação escolar oferecida preferencialmente na rede
regular de ensino, para educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento
ou superdotação”8 (BRASIL, 1996, não paginado).
As iniciativas legais apresentadas na Constituição Federal (CF) de 1988 e na LDBEN/
1996 levaram a elaboração das Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação
Básica, instituídas pela Resolução n.º 2/2001/CNE, com fundamento no Parecer CNE/CBE n.º
17/2001, que normatiza a Educação Especial9 e definem ações técnico-científicas,
pedagógicas e administrativas, constituindo-se como um dispositivo norteador para
organização dos sistemas de ensino, estabelecendo a matrícula para AcD em classes comuns
em qualquer etapa ou modalidade da educação básica, na perspectiva de uma educação com
qualidade. A organização dos alunos em escolas regulares vai além da matrícula em classes
convencionais, visto que requer serviços de apoio pedagógico especializado, professores das
classes comuns e da educação especial com formação e especialização, respectivamente,
assim como uma atuação colaborativa entre professores (BRASIL, 2001a).
Em 2008, com as orientações advindas da Convenção Internacional sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e
ratificada pelo Brasil, por meio do Decreto n.º 6.949, de 25 de agosto de 2009, foi lançada a
PNEEPEI10, que delineia as ações das políticas públicas e fornece o embasamento teórico
para as discussões concernentes ao AEE, tendo como objetivo
8
As Diretrizes Operacionais para Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica modalidade
Educação Especial define alunos com deficiência aqueles que à longo prazo, possuem restrições física,
intelectual, mental ou sensorial. Os transtornos globais do desenvolvimento são especificados para alunos com
autismo clássico, síndrome de Asperger, síndrome de Rett, transtorno desintegrativo da infância (psicoses) e
transtorno invasivos sem especificações, ou seja, alunos que apresentam alterações no desenvolvimento
neuropsicomotor, comprometimento nas relações sociais, na comunicação ou estereotipias motoras. Os
educandos que apresentam elevadas competências intelectuais, de liderança, psicomotora, artes e criatividade,
isoladas ou combinadas são definidos com altas habilidades ou superdotação. (BRASIL, 2009b).
9
Educação especial é uma modalidade de ensino que tem como objetivo assegurar recursos e serviços
educacionais especiais, de forma complementar e suplementar, promovendo a educação escolar e o
desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em
todas as etapas e modalidades da educação básica. (BRASIL, 2001a).
10
Documento constituído de sete capítulos foi elaborado pelo grupo de trabalho integrado por pesquisadores de
diversas universidades públicas do Brasil, nomeados pela Portaria Ministerial n.º 555, de 5 de junho de 2007,
prorrogada pela Portaria nº 948, de 09 de outubro de 2007. (BRASIL, 2008).
31
11
Para elaboração do diagnóstico do PNE 2001-2010, referente a educação especial, foram utilizados dados
estatísticos de 1998, tendo em vista a precariedade de informações para análise profunda da realidade.
(BRASIL, 2001b).
32
12
Cappelini (2009) define educação inclusiva como um paradigma educacional como o objetivo de promover o
desenvolvimento e a aprendizagem de todos, rompendo com a exclusão de qualquer minoria, (sejam índios,
negros, deficientes, LGBTQIA+, entre outras), respeitando as diferenças culturais, sociais e individuais.
33
Para Beyer (2013, p. 56), “[não] há como propor uma educação inclusiva, onde
‘literalmente’ se joguem crianças com [deficiência] nas salas de aula regulares, quando o
professor não tem uma formação que lhe possibilite lidar com tais alunos.” Aponto um
descompasso entre o proposto na legislação e o almejado, enquanto viabilidade operacional
do sistema escolar, seja público ou particular, no que tange a formação de professores. A
diversidade das salas de aula da escola regular requer do professor a ressignificação de
conceitos, formação diferenciada, suporte operacional e interdisciplinar.
Estudos de Martins (2012) destacam a importância da formação permanente,
denominando-a de continuada, como um dos fatores a serem considerados para o alcance dos
objetivos da inclusão escolar. Não se afasta, porém, nesta pesquisa, a relevância também, da
formação inicial e em serviço no processo constitutivo para a superação das desigualdades
escolares. Para uma maior aproximação no que concerne aos conceitos dos processos
formativos citados anteriormente, apresento as definições de formação inicial, continuada e
em serviço, sendo a primeira um processo institucional que proporciona o exercício da
profissão e o registro profissional; a segunda assume a perspectiva da formação como
processo, podendo ser originada a partir da iniciativa dos interessados e acompanha o tempo
profissional dos sujeitos, e a terceira acompanha o tempo e o desenvolvimento profissional
dos sujeitos no espaço do trabalho (CUNHA; ISAIA, 2006).
Destaco as inquietações e as pesquisas de Capellini (2004), Mendes (2016), Zerbato
(2014) e Vilaronga (2014) acerca da concepção do professor perante a inclusão escolar; a
ausência de interação entre os professores da classe comum e do AEE, esse ofertado na Sala
de Recursos Multifuncionais (SRM), como também o fortalecimento da inclusão escolar na
proposta de colaboração, levando em consideração a idiossincrasia da prática pedagógica
desenvolvida no cotidiano e, consequentemente, a formação continuada na perspectiva do
ensino colaborativo13. Especificamente, essas pesquisadoras têm enfatizado, em seus estudos,
as contribuições desse tipo de ensino no saber fazer dos educadores das salas comum e da
SRM, visando refletir e compreender o planejamento coletivo, no processo de ensinar e
aprender, como também no procedimento avaliativo de um grupo heterogêneo de estudantes.
A educação especial, na perspectiva da educação inclusiva, é um tema que acompanho
e despertei interesse desde o ano de 1998 quando me graduei em Pedagogia pela Faculdade
Pio Décimo. No ano seguinte, procurei me aprofundar, iniciando, na mesma faculdade, uma
13
Neste estudo, adoto o modelo de bidocência em que o coensino e o ensino colaborativo têm o mesmo
significado, de acordo com os estudos de Mendes, Vilaronga e Zerbato (2018).
34
14
A nomenclatura sala de recurso foi utilizada até a regulamentação do artigo 60 da LDBEN/1996. No ano de
2008, a partir da publicação do Decreto n.º 6.571/2009 passa a ser denominada SRM. O Decreto n.º
7.611/2011 revoga o anterior, mas se manteve a denominação. (BRASIL, 2009d).
15
O termo desenvolvimento atípico é utilizado para caracterizar pessoas com deficiência ou com prejuízo no
acompanhamento do processo de ensino e aprendizagem, mesmo que não esteja relacionado a uma causa
orgânica específica, mas que requer um código de comunicação diferenciado do usado pela maioria dos
estudantes. (CALLONERE; SIDNEI; HÜBNER, 2011).
35
16
“Aprendizagem significativa é aquela em que ideias expressas simbolicamente interagem de maneira
substantiva e não-arbitrária com aquilo que o aprendiz já sabe. Substantiva quer dizer não-literal, não ao pé-da-
letra, e não-arbitrária significa que a interação não é com qualquer id[e]ia prévia, mas sim com algum
conhecimento especificamente relevante já existente na estrutura cognitiva do sujeito que aprende.”
(MOREIRA, 2010, p. 2).
17
O GEES, criado em 2017, tem como líder a Profa. Dra. Marilene Batista da Cruz Nascimento,
(DEDI/PPGED/UFS) e como vice-líder a Profa. Dra. Josevânia Teixeira Guedes. Esse grupo desenvolve
pesquisas nas linhas de Formação de Professores: saberes e práticas na educação básica; Pedagogia
36
Este estudo tem como objetivo geral analisar as contribuições do ensino colaborativo
para a prática pedagógica dos docentes da classe comum e da sala de recurso multifuncional
(SRM), cartografando as aprendizagens (re)construídas no itinerário formativo da escola
municipal investigada. Para tanto, delimitei os seguintes objetivos específicos: a) identificar
as concepções (ideias, opiniões) dos pesquisados sobre o ensino colaborativo; b) descrever as
práticas pedagógicas desenvolvidas nas classes comuns e na SRM; e c) compreender os
fatores intervenientes do ensino colaborativo em relação às práticas desenvolvidas com os
AcD.
Defendo a ideia de que o ensino colaborativo contribui para a superação das
dificuldades enfrentadas pelos professores no atendimento dos AcD em classes comuns e
SRM, potencializando conhecimentos e habilidades, atitudes e valores que lhes permitam
(re)construir sua prática pedagógica, com vistas a promover uma aprendizagem significativa
para o aluno com deficiência, como para aqueles que não necessitam de AEE.
Esta pesquisa justifica-se, ainda, pela conjuntura atual da política de educação
especial, com destaque para formação de professor, visto que o atendimento às exigências da
educação inclusiva requer mudanças nos currículos e nas formas de avaliação, que não devem
ser considerada apenas para atendimento à obrigatoriedade de legislação específica, mas
devem levar à reflexão na busca de uma articulação entre as práticas pedagógicas dos
profissionais das classes comuns e da SRM, de forma a explorar e estimular as
potencialidades dos estudantes, adotando trabalho educativo interativo, interdisciplinar e
inclusivo, a fim de proporcionar uma aprendizagem com qualidade para os AcD, como para
aqueles que não necessitam de AEE.
Fundamento também a relevância desta dissertação pela contribuição para àqueles que
direta ou indiretamente estão envolvidos com o tema, já que, de acordo com levantamentos
realizados no site e no Ambiente Virtual de Aprendizagem do Ministério da Educação
(AVAMEC), as últimas edições dos programas de formação continuada para professores em
educação especial, seja presencial ou à distância, foram ofertadas como política pública
nacional, em 2010. Afinal, ampliar as oportunidades educacionais e melhorar a qualidade do
ensino, na perspectiva da inclusão escolar, é um desafio posto aos educadores frente às
necessidades de mudanças de atitudes em relação às dessemelhanças e, consequentemente, ao
repensar das ações pedagógicas nas classes comuns e no AEE, visando ao alcance e respeito
das diferenças individuais dos alunos.
Ancorada nas contribuições de Morin (2003a, 2003b, 2006, 2007, 2008, 2013), este
estudo fundamenta-se na teoria da complexidade onde há uma ligação com o objeto de
38
estudo: formação docente, ensino colaborativo e práticas pedagógica nas classes comuns e na
SRM na educação básica, na perspectiva de que, sendo a práxis uma atividade consciente e
transformadora, “[...] precisamos de uma cultura que nos permita abrir-se aos diferentes tipos
de conhecimento.” (MORIN, 2007, p. 27). Essa teoria apresenta-se como uma referência que
expressa formas de conceber o conhecimento e o ensino a partir de mudanças conceituais em
favor de um olhar contextualizado dos saberes quando do desenvolvimento da prática
pedagógica transdisciplinar.
Quanto à natureza dos dados, esta investigação é qualitativa por ser “[...] uma
modalidade investigativa que se consolidou para responder ao desafio da compreensão dos
aspectos formadores/formantes do humano, de suas relações e construções culturais, em suas
dimensões grupais [...] ou pessoais” (GATTI; ANDRÉ, 2008, p. 4), que contempla a
complexidade da formação docente na direção do ensino colaborativo na educação básica de
Aracaju/Sergipe.
Trata-se, ainda, de uma pesquisa de campo por apresentar-se como um processo de
investigação que visa “[...] conseguir informações e/ou conhecimentos acerca de um
problema, para o qual se procura uma resposta, [...] descobrir novos fenômenos ou as relações
entre eles.” (MARCONI; LAKATOS, 2003, p. 184). Tem-se como lócus uma escola
localizada em Aracaju, estado de Sergipe, atendendo a 536 alunos, desses, 20 com
deficiência. O corpo docente é composto de duas professoras que fazem o AEE na SRM e 27
professores nas classes comuns da educação infantil aos anos iniciais do ensino fundamental.
Antes de adentrar nessa unidade de ensino, realizei uma pesquisa teórica, de cunho
bibliográfico, utilizando fontes secundárias das bases de dados da Biblioteca Digital de Teses
e Dissertações (BDTD) e das reuniões científicas nacionais da ANPEd, nas quais mapeei
teses, dissertações e artigos, além leituras de livros, leis, decretos, atos normativos,
resoluções, bem como documentos disponibilizados pela escola envolvida com vistas a
subsidiar a produção de dados e apropriação do objeto deste estudo.
Cabe mencionar também que, na área desta investigação e pela relação que deve ser
construída com os sujeitos envolvidos, adotei a pesquisa-intervenção como procedimento de
produção de dados, oportunizando uma imbricação no campo, criando práticas, dispositivos
constituindo-se como potencial de análise (GALVÃO; GALVÃO, 2017). Isso significa que
foi possível interagir, interpretar e (re)construir sentidos e significados.
No escopo da pesquisa-intervenção, fundamentei-me no método de procedimento
cartográfico, emergindo do “[...] do princípio do rizoma que atesta, no pensamento, sua força
performática, sua pragmática: princípio inteiramente voltado para uma experimentação
39
18
Território na cartografia vai além do campo a ser pesquisado, constituindo-se como um ethos que sinaliza
modos de expressão, sentidos, movimentos e processos no estilo de habitar. (SOUZA; FRANCISCO, 2016).
19
Entendida, aqui, como “[...] um elemento constitutivo da observação participante: o pesquisador encontra
pessoas e fala com elas à medida que participa das atividades pertinentes, pede explicações, solicita
informações, procura indicações etc.” (MACEDO, 2004, p. 172).
40
(2015), “[através] da atenção ao toque, a cartografia procura assegurar o rigor do método sem
abrir mão da imprevisibilidade do processo de produção do conhecimento, que constitui uma
exigência positiva do processo de investigação ad hoc”.
Em seguida, vivenciei o terceiro movimento, o pouso, que incluiu a revisão teórica
presente em todas as fases deste estudo, em uma compreensão dialógica entre teoria e prática,
visando ao olhar detalhado para uma (re)configuração do campo observado por meio dos
dispositivos das memórias educativas e entrevistas semiestruturadas. Nessa rede complexa de
interlocução, realizei um itinerário formativo em serviço, contando com os professores das
salas comuns e da SRM, com a carga horária de 12 horas, tendo como tema educação
inclusiva e ensino colaborativo.
O reconhecimento atento, último movimento, surgiu como ponto de intersecção entre
a percepção e a memória, resultando na (re)construção de uma memória educativa que “[...]
permite recuperar narrativamente as múltiplas experiências formativas que norteiam a história
de vida de um adulto e de um saber construído ao longo do tempo” (PAULO; ALMEIDA,
2006, não paginado), por parte dos sujeitos pesquisados, na perspectiva do alcance de um
novo olhar sobre a formação continuada em serviço e o ensino colaborativo.
Nesta investigação, o método cartográfico possibilitou que eu focasse na variação
atencional com movimentos entrelaçados em redes complexas e de interlocuções, fundando-se
na ideia de um território existencial com possibilidades de apropriação do fato ou fenômeno
estudado, ou seja, a formação docente e as práticas educativas nas classes comuns e na SRM
na concepção do ensino colaborativo. Tive, então, um percurso contínuo voltado para o que
afeta a subjetividade, entendida como um sistema complexo e heterogêneo, na busca por
conexões a partir das múltiplas linhas e do plano das forças que se unem e atuam
concomitantemente, constituídas não só pelo sujeito, mas pelas relações que ele estabelece e
que incidiu tanto em mim, como pesquisadora quanto no objeto deste estudo (KASTRUP,
2015).
Aproveito para registrar o procedimento de análise adotado, as noções subsunçoras,
por entender que “[...] a leitura interpretativa dos dados se dá – às vezes, por várias
oportunidades – [aparecendo] significados e acontecimentos, recorrências, índices
representativos de fatos observados, contradições profundas, relações estruturadas,
ambiguidades marcantes.” (MACEDO, 2009, p. 99). Esse tipo de análise permitiu meu
“mergulho no mar aberto”, metaforicamente, quando imergi no campo escolhido como lócus,
com a intenção de explorar detalhes e movimentos de cada espaço, levando-me a emergir a
partir de reflexões relacionadas à fundamentação epistemológica, bem como da observação de
41
fatos com a certeza de que, em cada momento, os dados construídos foram confrontados com
uma nova situação empírica.
No direcionamento proposto por Macedo (2009), esse mergulho conduziu-me,
também, para a construção de estruturas analíticas de interpretação, com a apreensão refinada
e inclusão dos fatos assistidos, tendo a preocupação de que haja o distanciamento de uma
fragmentação do conjunto de enunciados. Foi a partir desse exame minucioso, da distinção
dos elementos significativos, da codificação do corpus e do reagrupamento das estruturas de
interpretação que se procedeu a sistematização textual, em suas relações e conexões para
construção das noções subsunçoras, observando o contexto, as realidades culturais e
históricas, num processo de organização e síntese que levou a produção de uma meta-análise e
uma nova interpretação de conceitos relacionados à formação docente e ao ensino
colaborativo (ver figura 2).
Bernard Charlot
20
Vosgerau e Romanowski (2014, p. 168-169), no artigo Estudos de Revisão: implicações conceituais e
metodológicas, apontam diversos autores que utilizam nomenclaturas variadas para denominar revisão de
literatura: “[...] levantamento bibliográfico (MORAIS; ASSUMPÇÃO, 2012; SANTOS, 2013); revisão de
literatura (MIRANDA; FERREIRA, 2009); revisão bibliográfica (FRANÇA; MATTA; ALVES, 2012); estado
da arte (ISOTANI et al., 2009); revisão narrativa (ELIAS et al., 2012); estudo bibliométrico (SILVA;
HAYASHI, 2013); revisão sistemática (DEPAEPE; VERSCHAFFEL; KELCHTERMANS, 2013); revisão
integrativa (SOBRAL; CAMPOS, 2012); meta-análise (KYRIAKIDES; CHRISTOFOROU;
CHARALAMBOUS, 2013); metassumarização (SANDELOWSKI; BARROSO; VOILS, 2007) e síntese de
evidências qualitativas (TONDDDEUR et al., 2011)”.
45
21
Distribuição dos grupos de trabalho da ANPEd : GT02 – História da Educação; GT03 – Movimentos Sociais,
sujeitos e processos educativos; GT04 – Didática; GT05 – Estado e Política Educacional; GT06 – Educação
Popular; GT07 – Educação de crianças de 0 a 6 anos; GT08 – Formação de Professores; GT09 – Trabalho e
Educação; GT10 – Alfabetização, Leitura e Escrita; GT 11 – Política e Educação Superior; GT12 – Currículo;
GT13 – Educação Fundamental; GT14 – Sociologia da Educação; GT15 – Educação Especial; GT16 –
Educação e Comunicação; GT17 – Filosofia da Educação; GT18 – Educação de Pessoas Jovens e Adultas;
GT19 – Educação Matemática; GT20 – Psicologia da Educação; GT21 – Educação e Relações Étnico-Raciais;
GT22 – Educação Ambiental; GT23 – Gênero, Sexualidade e Educação; GT24 – Educação e Arte.
49
incluindo os duplicados, selecionei 33 estudos, dos quais oito foram teses e 25 dissertações.
Estas compuseram o corpus que me propus a analisar, na perspectiva de delinear saberes
(re)construídos, bem como evidenciar discussões acerca das temáticas formação docente,
ensino colaborativo e práticas educativas nas classes comuns e na SRM (ver gráfico 1).
Ressalto que, dos documentos analisados, 90,9% são pesquisas oriundas de diversas
universidades situadas na região Sul e Sudeste, com destaque para a Universidade Federal de
São Carlos, em São Paulo, com maior número de estudos. Levanto a hipótese de que esse fato
se dá pela existência de um Programa de Pós-graduação em Educação Especial, tendo como
uma das linhas de pesquisa, Produção Científica e Formação de Recursos Humanos em
Educação Especial. Constatei, assim, escassos os estudos na temática formação docente e
ensino colaborativo em outras regiões, inclusive, no Nordeste.
Sabendo que a estruturação de pesquisas acadêmicas tem como consequência saberes
(re)construídos que podem variar de acordo com cada investigação, delineei um roteiro para
análise das produções selecionadas que vai além de uma leitura célere, pois foca nos
fundamentos teórico-metodológicos que subsidiaram o entendimento de conteúdo, a
significação das relações percebidas e compreendidas a partir do como e do porquê da
realização de cada estudo (ver figura 4).
51
A PNEPEEI preconiza que todos AcD devem estar matriculados em classes comuns e
receber apoio pedagógico por meio do AEE. no turno inverso à sua escolarização. Busquei,
também nos estudos publicados, localizar o campo de abrangência das pesquisas em questão
(ver gráfico 2).
O lócus investigativo dos estudos sinaliza para as escolas públicas com um percentual
de 74,41% (32), 20,94% (09) em instituições de ensino superior (IES) e 4,65% (02) em
instituições privadas sem fins lucrativos (IPSFL). Suponho que o significativo número de
52
A definição das funções de cada profissional provoca reflexões, visto que os desafios
quanto ao fazer pedagógico na inclusão dos alunos com deficiência, requerem clareza de
participação, de modo que o processo de aprendizagem se efetive em complementariedade aos
conhecimentos inerentes a cada docente. Afirmo existir, ainda, barreiras a serem ultrapassadas
no tocante à formação, ao desenvolvimento das competências e ressignificação de crenças e
valores educacionais.
No que tange aos objetivos gerais que fundamentaram as pesquisas selecionadas,
agrupei-os por tema, a saber: a) investigar a percepção dos professores da classe comum,
tendo o ensino colaborativo como possibilidade de (re)significação das práticas pedagógicas
54
É relevante destacar a opção pela pesquisa colaborativa na maioria dos estudos. Esse
tipo de investigação parte das manifestações sociais e históricas com escolhas teórico-
metodológicas que passam a se expressar como colaborativa, crítica de colaboração e
pesquisa-ação (IBIAPINA, 2016), concebendo redes colaborativas de aprendizagem, em que se
constroem tentativas de mudanças a partir de reflexões e estudos dos grupos envolvidos. Assim,
defendo que a opção por esse tipo de pesquisa visa
Nesse caminho, emergiram também as pesquisas que articulam teoria e prática, sujeito
e objeto, a exemplo da pesquisa-intervenção que, segundo Rocha e Aguiar (2003), estabelece
relação dinâmica e determina os próprios caminhos do estudo, visando à construção, ação e
transformação coletiva, ou seja, favorece mudanças para os sujeitos que dela participam.
Embora haja vários temas relacionados à educação passíveis de serem investigados, nessa
22
Não foi possível identificar a classificação da pesquisa quanto aos procedimentos de coleta de dados
diretamente em 14 produções. Entretanto, como se tratava de pesquisas de campo, adotei esse termo para
quantificá-las.
57
23
O termo práxis é utilizado a partir do entendimento de que a atividade humana transforma tanto a realidade
natural como o ser humano em um processo de autotransformação. (SCHMIDT; RIBAS; CARVALHO, 2003).
60
[Eu] pensava que nós seguíamos caminhos já feitos, mas parece que não os
há. O nosso ir faz o caminho.
C. S. Lewis
está sempre presente algo que nasce, se desenvolve, se contradiz.” (ROMAGNOLI, 2009, p.
167)
Nessa perspectiva, a base epistemológica que iluminou a trajetória deste estudo se deu
à luz da teoria da complexidade, que me proporcionou perceber ações, sentidos, movimentos
implícitos na ação docente, as relações e inter-relações com a sociedade contemporânea e
saberes que não dão conta das múltiplas questões do cotidiano escolar. Assim,
Para Alves e Pereira Filho (2019, p. 144), a inclusão escolar pelo princípio sistêmico
organizacional “[...] possibilita compreender que os sujeitos, relações e fenômenos só existem
enquanto se relacionam uns com os outros e, nessa relação recursiva e espiralada,
desenvolvemo-nos.” É a demanda contemporânea à procura de um novo olhar para o sujeito e
o sistema, já que cada um possui suas próprias finalidades e determinações, não podendo
perder a harmonia no processo de interação.
Apresentando-se como cada parte da totalidade das informações do objeto
representado, no princípio hologrâmico, não só a parte está no todo, como o todo está inscrito
nas partes de um sistema organizacional, pois [...] cada um de nós, como indivíduos, traz a
presença da sociedade da qual fazemos parte. A sociedade está presente em nós por meio da
linguagem, da cultura, de suas regras, normas etc.” (MORIN; CIURANA; MOTTA, 2003, p.
34).
O circuito retroativo, rompe com a casualidade linear e permite o conhecimento dos
processos autorreguladores, em que a causa age sobre o efeito e o efeito sobre a causa,
permitindo a autonomia organizacional do sistema. As retroações negativas atuam como
estabilização do sistema e as positivas são a rupturas da regulação desse, que devem ser
balizadas para que se possa tentar compreender um fenômeno, um fato, as nuances da
formação docente e do ensino colaborativo na perspectiva da inclusão escolar. Encontro nesse
princípio as atividades pedagógicas desenvolvidas em uma escola inclusiva, onde o professor
da classe comum possa ter reações ou desdobramentos ao que foi planejado, levando à
re(significação) do saber fazer.
O quarto princípio, do circuito recursivo, representa o processo de causa e efeito cuja
unidade complexa não é linear e sim produtora e causadora daquilo que lhe deu origem,
podendo a casualidade gerar sucessivos resultados. Tem-se o exemplo da sociedade como um
produto de interação entre os indivíduos, que cria um sistema organizacional com qualidades
próprias, como a linguagem e a cultura, pois o que “[...] considera o fenômeno social, são as
interações entre indivíduos que produzem a sociedade; mas a sociedade, com sua cultura, suas
normas, retroage sobre os indivíduos humanos e os produz” (MORIN, 2003, p. 119). A
sociedade e os indivíduos nada seriam se não dispusessem de formação, da linguagem e da
cultura.
No contexto escolar, Sá (2019) exemplifica esse princípio a partir das políticas
públicas educacionais com normatizações, regras, propostas de ações, desencadeando
movimentos que, compreendidos pelos sistemas de ensino, geram reflexos suscitam
64
docente pudesse atender às necessidades do processo educacional ofertado aos AcD. Rocha e
Uziel (2008) apresentam como objetivo dessas pesquisas desnaturalizar o cotidiano,
modificando a natureza, crença e valores da realidade coletiva, particularmente, daquilo que é
intrínseco ao mundo material e concreto.
O acompanhamento do processo proposto na pesquisa-intervenção foi realizado pelo
método de procedimento cartográfico, cujo objetivo é “[...] desenhar a rede de forças à qual o
objeto ou fenômeno em questão se encontra conectado, dando conta de suas modulações e de
seu movimento permanente”. (BARROS; KASTRUP, 2009, p. 57). Esse método está ligado
às concepções do problema de pesquisa, aos objetivos a serem alcançados referentes aos
movimentos das práticas pedagógicas desenvolvidas nas classes comuns e na SRM e às
implicações da formação docente na aplicação do ensino colaborativo na escola cartografada.
A cartografia é um método formulado por Deleuze e Guatarri (1995) que tem como
princípio o modelo descritivo de rizoma, contrapondo-se a uma raiz arborescente, estratificada
e fixada em um só ponto, a uma ordem com começo e fim, requerendo “[...] um
posicionamento do cartógrafo de modo flexível e reflexivo frente ao que possa vir no contexto
em que se situa a pesquisa em desenvolvimento” (SANTOS, 2018, p. 25). Nesse paradigma,
qualquer ponto pode ser conectado a outro, em uma rede móvel de fluxos, constituindo-se de
relações subjetivas que interagem na perspectiva de colocar a ciência em constante
movimento de transformação, por meio de práticas originais de investigação, na tentativa da
(re)construção do conhecimento diante das várias complexidades entre o que se é e o que se
pode vir a ser.
O método cartográfico apresenta-se, nesta pesquisa, como procedimento de produção
de dados por possibilitar a habitação em um território, integrando o campo a ser pesquisado
sem receitas e fórmulas tomadas como regra, mas com a viabilidade de traçar metas durante o
percurso, mapeando caminhos que compõem uma rede, a partir de quatro variações da
atenção que fazem parte do trabalho do cartógrafo, as quais apresento na figura 8.
68
Na chegada à escola fui recepcionada por um dos membros da equipe diretiva, Lucia
Penvensie, momento em que me apresentei e explanei sobre o objetivo desta pesquisa.
Utilizando da conversa corrente e do diário de campo, dispositivos utilizados no rastreio, fui
apresentada aos dados de matrícula que, em 2019, atendia a 533 crianças na faixa etária de
zero a 14 anos e desses, 20 AcD e em atendimento na SRM. Duas professoras desenvolvem
suas atividades pedagógicas nessa sala e 27 nas classes comuns, incluídos nesse quantitativo
os professores de Educação Física.
Concomitante a nossa conversa, fui conhecer a unidade de ensino que é composta por
dois pavimentos com 15 salas de aula, área verde, parque infantil, banheiros adequados para
educação infantil, ensino fundamental e adaptados para AcD, quadra coberta, refeitório,
cozinha, biblioteca, laboratório de informática, sala de professores, sala de diretor e secretaria.
O passeio pela escola deu-se na hora do recreio, onde encontramos a professora Jill
Pole que estava a observar seus alunos enquanto lanchavam. Fui apresentada por Lúcia
Penvensie, quando expliquei da pesquisa e observei através das minhas lentes caleidoscópicas
71
uma criança com transtorno do espectro autista (TEA), sendo acompanhada por cuidadora de
educação especial24. Aproveitei a ocasião e procurei saber da professora como era o fazer
pedagógico, tendo uma criança com TEA na classe comum:
Por ser uma criança, às vezes, agitada, não consegue permanecer em sala de
aula por muito tempo e quando está presente tenho dificuldade em realizar as
atividades pedagógicas com ele e os demais alunos, além do que, não recebi
formação específica para o desenvolvimento de práticas educativas que
atendam a necessidade desses casos. (Conversa corrente/Diário de campo da
pesquisadora).
[...] alunos com deficiência matriculados na sua classe, [faz a inserção] nas
atividades, mas reconhece a dificuldade devido ao número significativo de
alunos na turma com especificidades diversas, e tendo que conduzir a aula
com uma atenção especial para aqueles com comprometimento cognitivo.
Exemplificou a complexidade da prática pedagógica, a partir de uma aluna
cadeirante, com paralisia cerebral, que entende todos os movimentos e
comandos, e, enquanto docente, não consegue desenvolver atividades
durante a aula que atenda às necessidades dessa criança. Ressalta as lacunas
da formação inicial, assim como continuada, especificamente em serviço
para mitigar a carência do saber fazer pedagógico. (Conversa
corrente/Diário de campo da pesquisadora).
24
A Semed dispõe de cuidadores de educação especial, serviços terceirizados para atendimento às crianças com
deficiência que apresentam limitações motoras e/ou outras, as quais acarretam dificuldades de caráter
permanente ou temporário na execução das atividades básicas diárias. Esse profissional desenvolve atividades
não pedagógicas.
72
Para atender aos objetivos das ações atreladas ao AEE, professores e escola podem se
organizar de forma coletiva. Cada docente gerencia o tempo, seja o de ensinar, planejar,
divertir-se, dormir, acordar, trabalhar, brincar, exercitar-se, nada fazer. Somente a ele cabe a
responsabilidade desse gerenciamento em sala de aula, visto que “[...] o tempo não é neutro,
pois envolve decisões particulares de cada profissional para atingir os objetivos esperados. É
nessa perspectiva que podemos presenciar tempos desencontrados, [..] poupados, [...]
desperdiçados e [...] enrijecidos em sala de aula”. (XAVIER, 2013, não paginado).
Observei que, devido às atribuições diversas que o professor enfrenta e o ritmo
frenético do dia a dia motivado pela complexidade do mundo contemporâneo, não lhe é
proporcionado momentos suficientes para apontar e discutir ações e resultados da
aprendizagem dos alunos. Nesse cenário, emergem situações com efeitos adversos oriundas
de políticas públicas descontínuas e que não atendem ao cotidiano das escolas, a exemplo das
mudanças nas DCN e da política de formação de professores, em que é dada a esses
74
A defesa por um currículo funcional foi feita pela professora Polly Plummer para
auxiliar o processo educativo dos AcD, visto que o adotado na escola é padronizado e está
dentro de uma caixinha. Esse tipo de proposta curricular tem como característica ensinar as
habilidades de forma significativa para a vida, é necessário “[..] enxergar o ser humano [...]
para além das limitações verbais, motoras ou comportamentais.” (BRITO, 2018, p. 77).
As professoras Suzana e Leta, em um discurso unívoco, descreveram a inclusão como
utopia, que nenhum profissional consegue dar conta de 33 alunos, sendo três com diferentes
deficiências: TEA, transtornos específicos da aprendizagem e psicótico. Acreditam que a
inexistência de uma relação de afeto entre os AcD e os ditos “normais” não colabora com o
processo de inclusão, reforçando o discurso de Polly Plummer no sentido de que o currículo
proposto pela escola é um dificultador para os professores das classes comuns.
Descrever a experiência vivida nesses encontros em que circularam discursos antes
silenciados, multiplicidades de vozes, evidenciando conflitos, contradições, desejos por uma
reinvenção ou ressignificação da prática pedagógica foi um desafio. A partir dos registros do
meu diário de campo destaquei no conjunto das falas dos professores e durante os
movimentos vivenciados, palavras que estão imbricadas é uma realidade complexa, que me
tocaram e exigiu atenção.
75
É nesse processo rizomático no qual qualquer ponto pode ser conectado a outro, em um
No processo rizomático em que qualquer ponto pode ser conectado a outro, em uma
rede móvel de fluxos, se constituiu-se o conjunto de relações subjetivas e material,
76
configurando-se como um mapa em constante mudanças que norteia e indica caminhos, mas
requer novos traços, em uma tentativa da (re)construção do conhecimento diante da
complexidade do saber fazer docente, na perspectiva da inclusão escolar dos AcD.
Encontros podem conduzir a novos caminhos, extrapolar a imaginação, as formas de
ser, ouvir e falar. Estar imbuída na construção coletiva do conhecimento tornou-me sensível
às falas, às atitudes e aos gestos. Assim, retornei ao campo onde tive a oportunidade de
participar de uma aula com dois AcD, uma com TEA, grau leve, e um adolescente com
dificuldades na comunicação oral, mas sem diagnóstico definido. E sigo com as minhas
descobertas...
As salas estavam dispostas com carteiras em filas, estando os dois AcD nas
últimas cadeiras. A aula de Matemática, especificamente sobre múltiplos e a
explanação, estava sendo realizada no quadro branco. Meu olhar caminhava
por toda sala e me alegrava com a interação das crianças com o conteúdo, ao
mesmo tempo que me afligia vê-las apenas copiando o que estava exposto,
sem nenhuma interação. Na aula de Língua Portuguesa, a professora leu uma
história e solicitou que todos prestassem atenção, pois, ao final da leitura,
fariam uma resenha. Dado o recreio, todos saíram para o lanche e no retorno
ensaiaram para a culminância das atividades do ano letivo, que seria um
recital de poesias. Durante o ensaio não houve a participação dos AcD. Após
o término da aula, perguntei sobre o processo avaliativo dessas crianças. A
professora relatou que houve avanços no aprendizado, apenas realizando a
socialização deles com os colegas. Observei que não há uma preocupação
com o aprendizado em si, mas com a permanência em sala de aula. (Diário
de campo da pesquisadora).
entendendo que a solução dos problemas não vem de uma “receita pronta”, mas do
aprendizado e das experiências vivenciadas. O itinerário formativo foi desenvolvido com 12
horas25, em Nárnia, em três encontros, ocorrendo nos dias 21 de dezembro de 2019, 23 de
janeiro e 14 de março de 2020, nos quais foram abordadas as seguintes temáticas:
apresentação da pesquisa; inclusão escolar e ensino colaborativo; discussão coletiva sobre os
fatores para o ensino colaborativo e saberes docentes; atividades teórico-práticas sobre casos
de ensino, práticas inclusivas e o ensino colaborativo.
O primeiro momento ocorreu em um sábado de planejamento escolar com
participação de 11 professores, sendo 10 deles da classe comum e um da SRM, e a gestora da
escola. Depois da apresentação pessoal, adentrei nos objetivos da pesquisa e expliquei sobre o
itinerário formativo. Essa etapa foi sequenciada pela apresentação de cada um dos docentes,
como eles se sentiam em fazer parte de Nárnia que tem um número expressivo de crianças
com deficiência. Nem todos tinham AcD em suas classes, mas não deixaram de emitir
opiniões, o que enriqueceu as discussões (ver figura 10).
25
Inicialmente, o itinerário formativo teria a carga horária total de 20 horas. No entanto, considerando o contexto
da pandemia fez-se necessária a redução.
79
ENSINO
COLABORATIVO
precisa que haja uma afinidade no saber fazer pedagógico, atrelado ao compromisso
profissional.
No tocante ao conteúdo a ser trabalhado, estratégias de ensino e expertise dos
professores, as argumentações referiram-se à formação continuada, na qual a prática não deve
estar dissociada da teoria. Não ficaram de fora os fatores concernentes à estrutura
organizacional, mas pouco se discutiu pois, segundo os participantes, Nárnia já apresenta uma
organização que promove a inclusão escolar.
A literatura sobre o ensino colaborativo, baseada nos estudos de Keefe, Moore & Duff
descritos por Mendes, Vilaronga, Zerbato (2018), propõe quatro tipos de saberes para a
implantação e manutenção das relações do coensino: conhecer a si mesmo; conhecer seu
parceiro; conhecer os alunos; conhece sua profissão (ver figura 13).
durante as atividades, os professores acharam pertinente a proposta dos quatro saberes, uma
vez que preconizam oportunidades de desenvolvimento pessoal e profissional.
Nos dois últimos encontros do itinerário formativo desenvolvi atividades teórico-
práticas26. Os participantes, diante de dois casos de ensino, fizeram relatos de situações
vividas na escola com AcD para fomentar discussões e provocar análises e interpretações,
considerando as perspectivas dos diferentes professores, visto que
[o] caso de ensino é uma produção rica, pois carrega uma potencialidade de
suscitar maior envolvimento dos professores, um expressivo rigor intelectual
que estimularia a articulação de conhecimentos teóricos e práticos, que serve
de grande auxílio para oportunizar o exercício de pensar como um professor
procederia, em determinadas situações de ensino. (RABELO, 2016, p. 94).
Após os relatos dos casos de ensino, percebi nos discursos alguns pontos que foram
retomados durante as discussões. O primeiro foi sobre as avaliações diagnósticas
multidisciplinares que não chegam ao conhecimento dos professores das classes comuns,
apenas para o da SRM. Na opinião deles, essas informações deveriam chegar a todos,
inclusive, à equipe escolar, porque, assim, poderiam ocorrer ações positivas nas intervenções.
A conversa fluiu para a prática pedagógica, onde surgiram defesas para um ensino
baseado apenas nas atividades da vida diária (AVD); adaptações de material que sejam
estimulantes para o aluno; diálogos com o professor de AEE para aplicação de metodologias
que auxiliem no desenvolvimento de habilidades e autonomia do aluno para a vida; atividades
adaptadas de acordo com a criança; construção de um ambiente harmonioso para proporcionar
o andamento das atividades ofertadas.
Finalizadas as atividades, chamou-me a atenção o entendimento de cada profissional
quanto à realização de uma prática pedagógica conjunta com o professor do AEE, visto ser
fundamental na mediação do processo educativo, mesmo estando distante da realidade, devido
a fatores como dupla jornada, não valorização da profissão, estrutura das escolas precárias,
entre outros. Os saberes do ensino colaborativo devem ser trabalhados para além da adoção do
modelo.
O último movimento do cartógrafo, o reconhecimento atento, constituiu-se da
materialização desta pesquisa e da retomada ao objeto de estudo, ensino colaborativo e a
formação de professores na inclusão em uma escola da rede pública da educação básica, onde
dediquei-me ao conjunto de dados produzidos, visto que a variação de atenção “[...] tem como
26
No terceiro encontro, especificamente, os dados foram produzidos por meio das memórias educativas e
entrevistas semiestruturadas.
83
característica nos reconduzir ao objeto para destacar seus contornos singulares. A percepção é
lançada para imagens do passado conservadas na memória [...]. (KASTRUP, 2015, p. 45-46).
O caminhar trilhado na construção desta pesquisa, via diferentes dispositivos para
produção de dados, como: diário de campo, conversas correntes, memórias educativas e
entrevistas semiestruturadas, constituíram-se de sentidos e significados, e, provocaram em
mim, em um só tempo, sentimentos de estranheza, familiaridade, inquietações e entusiasmo,
sendo fundamentais para a formação das lembranças.
escola, enfim, tudo que vi e ouvi, permitiram a (re)construção das memórias, lembranças e
recordações.
Esse movimento também me reportou às práticas pedagógicas no AEE, aos AcD, no
que tange à insegurança, à falta de conhecimento no saber fazer em sala de aula ou ao
currículo direcionado às necessidades desses discentes. As dificuldades dos professores em
realizar atividades na sala de aula com os AcD, na maioria das vezes, foram justificadas por
não conseguirem a atenção que esses alunos necessitam, tendo em vista o quantitativo de
matriculados em uma única turma. Noto que esses docentes são cobrados e responsabilizados,
unicamente, pelas aprendizagens desses alunos, como se eles não fizessem parte de um
sistema de ensino.
A SRM que exerce importância significativa no atendimento ao AcD, tem sua função
limitada em razão da oferta ocorrer no contraturno, o que inviabiliza a continuidade das
atividades específicas no desenvolvimento cognitivo desses alunos. Isso ocorre devido ao
distanciamento entre os professores da classe comum e da SRM em planejar ações conjuntas,
dado que trabalham em turnos diferentes, assim como à indisponibilidade dos pais em
retornar à escola em outro horário pelas diversas atribuições postas no dia a dia.
O significado da palavra inclusão escolar ressoa em vários sentidos de acordo com as
vivências e as experiências individuais, permitindo construções subjetivas que envolveram
sentimentos de desprazer, angústia, impotência e desconhecimento. Em sentido, a inclusão
revelou-se como utopia, está longe de ser alcançada, muito se tem a caminhar para se efetivar.
Os dilemas e desafios da prática pedagógica dos professores no atendimento às tarefas
diárias do AcD, levam os pesquisados a apontarem a necessidade de outro profissional com
conhecimento em educação inclusiva na classe comum para mediar as atividades, assim como
a exigência da implantação de um currículo específico, porque o apresentado na escola não
atende, na maioria das vezes, àqueles alunos com comprometimento cognitivo ou motor.
No que tange à formação docente, percebi a vontade de aprofundamento na temática
inclusão escolar, sendo essa em serviço, e onde a teoria, não estivesse dissociada da prática.
Os discursos enraizados, culturalmente repetidos de que a formação ainda não é suficiente
para o desenvolvimento da prática, se contrapõe a um absenteísmo quando da oferta, seja na
escola seja em espaços promovidos pela Semed. As falas apontadas nos dispositivos de
produção de dados não explicitam as razões para o absenteísmo que ocorre no programa de
formação continuada da rede municipal de ensino de Aracaju, denominado Horas de Estudo.
No que se refere à prática pedagógica emergiram memórias nas quais a valorização do
conhecimento teórico é inversamente proporcional à necessidade de manuais que auxiliassem
85
TEORIA DA COMPLEXIDADE
Analisar as contribuições do ensino colaborativo para a prática pedagógica
dos docentes da classe comum e da SRM, cartografando as aprendizagens
semiestruturada
QUESTÃO DE PESQUISA 1
Como os professores das classes comuns e
da SRM desenvolvem suas práticas
pedagógicas relacionadas aos alunos do
AEE?
QUESTÃO DE PESQUISA 2
Quais as implicações da formação docente
para a aplicação do ensino colaborativo
nessa instituição?
Paisagem
sociocultural
Sentidos
Bacias Significados
Bacias
semânticas semânticas
Interpretação
fenômeno
Inclusão escolar
Formação Itinerâncias
formativas
Práxis pedagógica
Ensino colaborativo
Prática Pedagógica
Aprendizagens e ensino
colaborativo
Gestão educacional
FORMAÇÃO DOCENTE
ITINERÂNCIAS
FORMATIVAS TEORIA E PRÁTICA
REDE DE
APOIO
RECONSTRUÇÃO DO
CONHECIMENTO
APRENDIZAGENS E TEÓRICO -
ENSINO METODOLÓGICO
GESTÃO COLABORATIVO
O ESPECÍFICO E O
INDISSOCIÁVEL
APROPRIAÇÃO
PRÁTICA
MEDIAÇÃO
PRÁXIS
PEDAGÓGICA EMPATIA
EXPERIÊNCIAS
[...] em sua formação inicial uma base teórica sólida sobre as diferentes
áreas de atuação da educação escolar, dentre elas os conhecimentos sobre as
características da criança com [deficiência] e seu processo de ensino-
aprendizagem, a fim de que ele seja capaz, na prática, de contribuir para o
sucesso no processo de aprendizagem desse aluno. (DEIMLING, 2013, p.
246).
Nessa linha de pensamento, Vitaliano e Manzini (2010) apontam para uma formação
inicial que proporcione aos professores assumir a inclusão dos alunos AcD, a partir do
planejamento e da organização da sala de aula, do material didático, das sequências e
ritmos na realização das atividades, de modo a contemplar as diferenças apresentadas em sala
de aula. Desse modo, as referências sobre a formação inicial de professores em curso de
licenciatura não podem ser negligenciadas das demandas apresentadas pela educação básica,
sendo a graduação compreendida como preparação profissional que precisa estar em constante
aproximação de estudos e experiências recentes. (CRUZ; GLAT, 2014).
Evidentemente, disciplinas que proporcionassem suporte teórico-metodológico
relacionados à escolarização de pessoas com deficiência não estiveram presentes
na graduação de docentes que adentraram nas IES nos cursos de Pedagogia ou
licenciaturas de algumas pesquisadas, conforme registram os relatos.
Hoje penso que é fundamental que o curso de pedagogia, além dos cursos de
licenciatura tenham disciplinas e especializações na área da educação
inclusiva e haja um leque de disciplinas obrigatórias que abordem a temática,
pois se não é fácil enfrentar uma sala de aula com alunos ditos “normais”,
imagine com alunos necessitados de atenção especial e você não saber o que
fazer.” (JILL POLLY).
Para tanto, a formação inicial não é a redentora dos problemas e desafios que a prática
pedagógica apresenta no cotidiano das escolas, mas destaco que disciplinas ofertadas em
momentos distintos perdem a riqueza em relação aos saberes, pois a conexão do
conhecimento se dá das partes para o alcance do todo, o que é necessário para atender a
complexidade da educação inclusiva.
Afirmo, embasada no princípio sistêmico organizacional descrito por Morin (2003b),
que não há a possibilidade de conhecer o todo sem conhecer as partes, nem conhecer as partes
sem conhecer o todo. Compreendo que durante o processo formativo inicial deve ser
proporcionado aos futuros professores saberes integrados, com um alcance transdisciplinar,
para uma conectividade entre didáticas, métodos, metodologias, planejamento, teorias e
práticas, estrutura de funcionamento, entre outros, em que o conhecimento das partes seja um
todo que envolva a educação inclusiva, em prol de uma prática pedagógica para a
escolarização do AcD.
Os relatos sinalizam para a necessidade de uma (re)significação da formação inicial,
mas reafirmo, que essa não se encerra nos cursos de graduação seja em pedagogia ou
licenciaturas, ela se estende na escola, na continuidade de estudos e pesquisas junto às IES,
num processo de alimentação e retroalimentação do saber. Nesse sentido, a formação de
professores enquanto política pública de governo deve ser pautada, levando em consideração
a formação inicial e continuada e, consequentemente, a valorização dos profissionais da
educação, visando uma educação de qualidade para todos.
Ressalto ainda, que muito se tem a caminhar para o alcance do fortalecimento do
processo formativo de professores, mas, infelizmente, esse percurso está sofrendo uma
descontinuidade devido às novas diretrizes para formação de professores, denominada de
BNC-Formação (BRASIL, 2019) que vem na contramão da proposta construída em 2015,
apontando hoje um retrocesso quanto à participação democrática das instituições formadoras e
entidades representativas dos professores e estudantes nesse processo.
Reafirmo o termo contramão, pois as novas diretrizes estão pautadas em concepções
orientadas por competências e habilidades; apresentam-se a partir de uma visão tecnicista,
assim como reducionista, visto que compreendem a formação dissociada da teoria e prática;
corroboram com a fragmentação da formação inicial e continuada, deixando clara a não
priorização dos processos reflexivos acerca do fazer pedagógico, o que contribui para a
precarização do trabalho do professor. Concomitante a todos esses aspectos elencados está a
desprofissionalização da carreira docente. Esse contexto, leva-me a Nóvoa (2009), quando
afirma que a educação na complexidade do mundo contemporâneo expira incertezas e
103
Desse modo, é na correlação de forças entre comunidade escolar e poder público que
as condições para a formação em serviço poderão se apresentar e envolvam além de recursos
didáticos e estrutura física adequada dos prédios escolares, proposta pedagógica que reflita as
especificidades das escolas, sobretudo àquelas com atendimento aos AcD.
A disseminação da internet e dos cursos on-line constitui-se parte considerável da
autoformação dos professores, requerendo estudos que analisem esse fenômeno cada vez mais
crescente, seja pela comodidade na administração do tempo pessoal, ou pelos custos
financeiros, em geral mais baixos. Sobre isso, Maciel (2001, p. 1) alerta:
Meu desespero foi tamanho quando pisei nas salas de aula pela primeira vez.
Lembro do “surto” que tive numa aula na universidade, pois me deparei com
uma realidade para a qual não me sentia nem um pouco preparada. (JILL
POLLY).
[...] aconteceu tem mais de 10 anos, não existia, eu não vou dizer que usei
uma prática inclusiva, não tinha uma formação, eu fui pela intuição, o que
dava certo eu continuava, o que não dava eu ia excluindo (MABEL).
[...] eu acho que ainda existe assim, uma necessidade [...], um
aprofundamento maior na formação e na prática do dia a dia do professor.
(MARGARIDA).
[...] o curso de Magistério, me oportunizou uma vasta experiência prática,
porém deixou a desejar no que se refere a conteúdos teóricos. Importante
ressaltar que no tocante a educação inclusiva a grade curricular do curso não
contemplava nenhuma disciplina (POLLY PLUMER).
Não poderia iniciar uma discussão sobre práxis pedagógica sem antes esclarecer a
distinção entre prática e práxis. O senso comum tende a tomar essas as palavras como
sinônimos, quando possuem sentidos próprios. Por prática, entende-se a ação imediata e em
resposta a situações do cotidiano, o que costumo chamar de pragmatismo. A práxis é a ação
110
prática, pois tem a função de ampliar o saber pelas funções que exerce. Para o autor o saber
docente define-se como “[...] um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos
coerente, de saberes oriundos da formação profissional, dos saberes das disciplinas, dos
currículos e da experiência”
Nesse sentido, destaco para análise dos relatos das pesquisadas, os saberes
experienciais, porque traduzem os conhecimentos específicos produzidos a partir das
vivências no cotidiano da sala de aula e do seu meio, os quais expressam o saber fazer e o
saber ser, na perspectiva de capturar aspectos que ajudem a compor o exercício da docência
desses profissionais.
[...] existe também professores que não se identificam e que não querem de
jeito nenhum, existe sim isso dentro da escola e a gente precisa ter muito
jogo de cintura, precisa ter muito diálogo. (LÚCIA PEVENSIE).
Não tenho alunos com deficiência e confesso que se tivesse não me sinto
preparada para essa situação, pois não tive formação suficiente para
desenvolver minha prática na sala de aula para tal situação. (JILL POLLY).
[...] observo o comportamento do aluno e dos responsáveis, depois trabalho a
socialização, mantenho a rotina, até o momento não precisei adaptar
atividades diferenciadas, as atividades adaptadas eu usei com todos os alunos
para haver a integração entre eles. Não sigo um método, mas procuro ouvir
com o coração as necessidades de cada aluno. (HELENA).
[...] eu não vou dizer que usei uma prática inclusiva, não tinha uma
formação, eu fui pela intuição, o que dava certo eu continuava, o que não
dava eu ia excluindo. (ALBERTA).
A minha prática na sala de aula precisou mudar, mas de uma certa forma
fluiu, [...] começou a mandar bilhetinhos e relatar fatos da vida dele.
(LETA).
Colocar-se no lugar do outro é o que tem definido a palavra empatia, como se fosse
possível o ser humano transportar-se para sentir na forma e intensidade o que o outro sente.
Ainda que usada metaforicamente, Galery (2018) nos alerta sobre o narcisismo que está por
trás dessa metáfora, escamoteando nossa dificuldade em ver o outro como diferente em
expectativas, desejos, habilidades e que percebê-las só é possível quando me relaciono com o
outro. Dito isto, complementa:
[a] empatia serve para “desobjetificar” o outro, para vê-lo como sujeito e
para que o coloquemos, simbolicamente, fora de nós. Ela é essencial para
que possamos compreender o outro como um ser autônomo, não como um
mero reflexo de nós mesmos. Essa compreensão é essencial para que
percebamos a diferença. (GALERY, 2018, não paginado).
Os relatos que despontaram dos pesquisados que atuam com AcD indicam
dificuldades na formação, a ponto de se sentirem impotentes diante das demandas da sala de
aula e, talvez por isso, alguns desses relatos expressem uma rejeição preconceituosa desses
alunos em suas classes, me levando ao entendimento que “[...] a exclusão escolar manifesta-se
das mais diversas e perversas maneiras, e quase sempre o que está em jogo é a ignorância do
aluno diante dos padrões de cientificidade do saber escolar”. (MANTOAN, 2003, p. 13).
114
Sem dúvida, os relatos das professoras expressam uma diversidade de fatores que
intervêm em suas práticas e na aprendizagem dos alunos, especialmente do AcD. A
necessidade de interação com os colegas docentes é dificultada pela sobrecarga de trabalho,
reafirmando um problema crônico na carreira docente no país, conforme se verifica na fala de
Jill Polly. A falta de formação e a quantidade de alunos AcD na sala regular, alguns dos quais
com deficiência severa, são situações que impactam sobremaneira na intervenção pedagógica
e, consequentemente, na aprendizagem dos AcD, além de contribuir para transformar a escola
num depósito dessas crianças e jovens (MABEL; MARGARIDA; PENVENSIE). A
elaboração do planejamento, conforme se infere das falas de Suzana e Eva, ocorre de modo
solitário e direcionado ao AcD, demonstrando desarticulação entre docentes que atuam,
especificamente, com AEE e, desses, com os professores das salas regulares.
Transformar a escola, em que tempos e espaços de aprendizagem sejam inclusivos,
exigem mudanças de paradigmas, em cujos sistemas de ensino e a comunidade escolar devem
116
[...] procurei fazer a aula mais integrada com o aluno, modifiquei a forma de
sentar, de arrumar as carteiras para que ele fosse incluído dentro daquele
grupo, passava por todas as carteiras, não só pela dele, fazia uma pausa no
que eu podia e sempre na dele, e foi assim que eu consegui aproximar ele de
mim. (ALBERTA).
[...] ele desenvolveu uma boa metodologia. O depoimento dele ele disse
que: até tinha melhorado mais o trabalho dele com os outros alunos, não só
com os alunos inclusos, mas ajudou muito na metodologia para alcançar os
outros alunos também ditos como normais. (HELENA).
Infiro, assim, que os professores no cotidiano da prática pedagógica, não adotam aulas
padronizadas, homogeneizadas, pois entendem que os AcD não aprendem da mesma forma.
Assm, o desafio dos professores é de proporcionar mudanças organizativas na classe comum
para proporcionar um ambiente propício à aprendizagem e que respeite a heterogeneidade da
turma.
Nesse contexto, os eixos que emergiriam da noção subsunçora práxis pedagógica
sinalizam dificuldades e desafios que os docentes pesquisados expressaram, bem como
percepções, sentimentos e concepções acerca do seu saber ser e saber fazer. As condições
para o exercício da docência, o confronto dos saberes, que constituíram suas experiências em
27
Entende-se por pseudoinclusão a figuração do estudante com deficiência na classe comum e não efetivamente
incluído no processo de aprender. (MIRANDA; GALVÃO FILHO, 2012).
117
sim, em tensões que precisam ser mediadas por um competente trabalho de gestão nas
unidades de ensino. Segundo Mendes, Vilaronga, Zerbato (2018), essa atitude colaborativa
retira o professor do seu isolamento para inseri-lo no conjunto de todos os profissionais
envolvidos na aprendizagem dos alunos, de outro modo, o fracasso da escolarização dos AcD
é inevitável.
Além disso, a instituição do ambiente colaborativo para o alcance da inclusão
escolar requer uma rede de apoio da qual fazem parte o sistema de ensino e a família
acrescido de fatores que devem ser objeto de diálogo entre a dupla de profissionais da classe
comum. Segundo Mendes, Vilaronga e Zerbato (2018), esses fatores são conteúdo a ser
ensinado, estratégia de aprendizagem, expertise dos professores, empatia na parceria, tempo
compartilhado de ensino e de parceria, apoio administrativo da escola, organização dos
estudantes em sala, idade ou nível de escolaridade dos alunos e compromisso dos docentes.
Aliás, cabe apresentar os sentimentos e as percepções de como essa rede de apoio e os fatores
que podem interferir no ensino colaborativo se apresentam:
Embora a escola possua professor de AEE, portanto, com formação específica, ele
não atua nas classes comuns, o que inviabiliza a interação durante o processo ensino e
aprendizagem. O desejo expresso nos relatos, do mediador atuando em conjunto desde o
planejamento à execução, é o caminho apontado para suprir a lacuna existente nas condições
atuais de exercício da prática pedagógica junto ao AcD.
Dentre os princípios fundamentais que pautam a educação no Brasil, destaco nesse
momento, para fins da análise dos relatos que estão por vir, a gestão democrática, partindo da
premissa de que todos os indivíduos estão envolvidos no processo educativo, pois contribuem
significativamente para a transformação social e para a igualdade e equidade do acesso e
permanência na escola, havendo assim,
122
A escola não tem estrutura de receber aluno com tal dificuldade, a escola não
tem financiamento, a escola não tem é o pessoal humano pra lidar com a
aquela necessidade, então, acaba que a criança entra na escola, fica na escola
meio, como se a escola fosse um depósito pra receber aquelas crianças de
qualquer jeito. (LÚCIA PEVENSIE).
[...] não podemos negar que tanto as escolas públicas quanto as privadas não
estão preparadas no sentido amplo desse direito que é o de aprender e não
apenas ter um lugar para fazer socialização. Então, nós professores, a direção
da escola, a secretaria e o governo, todos temos responsabilidade em
fazermos com que haja [...] a inclusão escolar. (LETA).
Na escola temos a realização do planejamento pedagógico e [...] é discutido
e feito junto com todos da escola. A gestão da escola é muito envolvida com
as questões da inclusão e está sempre atenta para resolver todos os
problemas. (JILL POLLY).
A escola promove encontros constantes para o planejamento e nesses
momentos discutimos os problemas do dia a dia da escola, as dificuldades
pedagógicas que cada professor está enfrentando na sala de aula e
procuramos soluções para muitas delas, mas muitas vezes não encontramos
respostas sozinhos e aí percebemos a necessidade de outras ajudas
vindas principalmente da própria secretaria de educação, do governo e,
também, da família dos nossos alunos. A gestão da escola é muito atenta aos
problemas da inclusão e está sempre querendo resolvê-los. (MABEL).
123
Fecha-se um ciclo entre tropeços, idas e vindas, trabalho, estresse do dia a dia, noites
encurtadas para dar conta dos afazeres, lazer limitado, encontros familiares adiados e tantas
outras questões suspensas para alcançar o objetivo proposto: o mestrado. Cansada? Sim, mas
ao mesmo tempo aliviada, permeada de felicidade pela certeza de mais um dever cumprido e
de uma vitória conquistada. Os apontamentos, as conversas e os encontros ocorridos no
mundo de Nárnia levaram-me a reflexões que, nas entrelinhas, por mais delimitadas,
proporcionaram ensinamentos atemporais em um processo (re)constituído, porque somos
inacabados, incompletos.
Esta investigação, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da
UFS, abordou a formação docente e o ensino colaborativo na inclusão em uma escola pública
da rede municipal. O comprometimento acadêmico direcionou-me para uma jornada de pistas,
aprendizagens e sentidos, com temáticas envolventes, tal qual, as histórias do mundo de
Nárnia, pondo a acreditar que é possível superar desafios e contribuir para transformações no
processo educativo.
O caminho trilhado iniciou-se com uma pesquisa teórica, de levantamento, do tipo
estado do conhecimento, em que realizei um mapeamento das teses e dissertações, utilizando
fontes secundárias nas bases de dados da BDTD e ANPEd, com o objetivo de compreender as
inter-relações entre o ensino colaborativo como ação integradora à inclusão escolar, cujos
resultados apontaram para a emergência de uma (re)significação no processo formativo, com
vistas ao atendimento dos AcD.
A teoria da complexidade iluminou a trajetória, favorecendo a apropriação de sentidos,
os movimentos implícitos na ação docente, as relações e inter-relações com a sociedade e a
diversidade de saberes que devem ser mobilizados, visando à compreensão da multiplicidade
das demandas da escola. O método cartográfico possibilitou a habitação no território
pesquisado, conduzindo-me por rotas, desvios, ações imprevisíveis, a partir dos movimentos
de atenção: rastreio, toque, pouso e reconhecimento atento, nos quais apliquei como
dispositivos de produção de dados o diário de campo, as conversas correntes, as memórias
educativas e a entrevista semiestruturada.
A construção da estrutura analítica de interpretação dos dispositivos se deu à luz das
noções subsunçoras, em que, no esforço de organização e síntese, construí argumentos,
baseados na compreensão dos elementos significativos evidenciados pelos docentes das
classes comuns e da SRM. A relevância e a densidade dos fatos foram compreendidas por
125
porque a prática específica, hoje posta nesse tipo de sala, não atende às necessidades da
inclusão escolar.
A forma como o atendimento aos AcD está estruturada na rede municipal de ensino
concorre para distorções na concepção da bidocência. Para cada sala de aula com AcD, há um
profissional de apoio com a função prioritária de assistir às questões de mobilidade e outras
relacionadas a limitações físicas. Embora a exigência de formação desse profissional de apoio
seja de ensino médio, verificou-se a existência de graduandos e graduados em diversas áreas.
Essa realidade pode explicar a necessidade de que alguns docentes da classe comum
expressam ao reivindicar o compartilhamento da docência com esses profissionais,
transferindo para eles o papel do professor do AEE que atua em turno contrário no
atendimento individualizado.
Há, por outro lado, o entendimento de que é com o professor do AEE que a bidocência
pode se concretizar e, para isso, se faz necessário o tempo para o planejamento coletivo, bem
como para a (re)construção de saberes, definições de papéis e responsabilidades, utilização de
diferentes metodologias e didáticas, respeito às individualidades e aos estilos pessoais de
ensino. Reitero a necessidade de a formação continuada ocorrer em serviço para que os
profissionais da bidocência estejam juntos: desde o planejamento à prática pedagógica. O
sistema de ensino pode rever o modelo atual em que os docentes da educação especial e da
classe comum possam atuar em um mesmo turno, na perspectiva de garantir a aprendizagem
dos AcD.
Os resultados desta investigação sinalizaram que o ensino colaborativo é um desejo e
tem o reconhecimento da sua importância para promoção da inclusão escolar, sendo
necessário que haja (re)significação da prática pedagógica, visto que, atualmente, está voltada
para um atendimento complementar ou suplementar no contraturno, em que os AcD são de
responsabilidade somente do professor da SRM.
Este estudo foi, ainda, marcado por algumas dificuldades, a exemplo da minha
vinculação à época com a Semed, o que pode ter inibido algumas críticas e sentimentos; o
tempo para realizar as conversas correntes devido ao horário dos professores, registros na
hora do recreio para não atrapalhar as aulas e, nesse mesmo momento, alguns professores
tinham outras atividades. Outro aspecto limitador foi o dia para realização do itinerário
formativo, devido à indisponibilidade de participação, por conta de outros vínculos
empregatícios. Essas condições, contudo, não comprometeram a finalização desta pesquisa.
Por fim, as memórias e as falas das pesquisadas fizeram emergir questões que apontam
para uma rede entrelaçada e determinante para a efetivação de uma proposta pedagógica
127
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dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e n.º 11.494, de
20 de junho 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
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132
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scielobr/pdf/rbla/2013nahead/aop2413.pdf. Acesso em: 10 nov. 2019.
Ilustríssima Senhora
Secretária Municipal da Educação de Aracaju
Rua Wilson Rocha, 844 – Bairro Grageru
Aracaju – Sergipe
Prezada Secretária,
Cordialmente,
XXXXXXXXXXX
CPF: XXXXXXXXXXXX
Diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental XXXXXXXXX
142
Eu, Tereza Hortencia da Silva Azevedo, que realizarei a pesquisa intitulada: “ENTRE O
ESPECÍFICO E O INDISSOCIÁVEL: formação docente e ensino colaborativo para a
inclusão escolar”, sob orientação da Profa. Dra. Marilene Batista da Cruz Nascimento,
declaro que:
XXXXXXXXXXXXXXX
Diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental XXXXXXXXXXX
144
Você está sendo convidado(a) a participar de uma pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-
graduação em Educação da Universidade Federal de Sergipe, por intermédio da mestranda
Tereza Hortencia da Silva Azevedo, devidamente assistida pela sua orientadora Profa. Dra.
Marilene Batista da Cruz Nascimento.
1. Título da Pesquisa:
2. Objetivos:
Geral:
Analisar as contribuições do ensino colaborativo para a prática educativa dos docentes da
classe comum e sala de recurso multifuncional, cartografando as aprendizagens
(re)construídas por esses profissionais na escola investigada.
Objetivos específicos:
▪ Identificar as concepções (ideias, opiniões) dos pesquisados sobre o ensino colaborativo.
▪ Descrever as práticas pedagógicas desenvolvidas nas classes comuns e na SRM.
▪ Compreender os fatores intervenientes do ensino colaborativo em relação às práticas
desenvolvidas com os AcD.
3. Descrição dos procedimentos: Trata-se de uma pesquisa qualitativa, quanto à natureza dos
dados, com enfoque na pesquisa intervenção. Utilizar-se-á o diário de campo, entrevistas
semiestruturada, memórias educativas e realização de curso de formação em serviço para os
professores das classes comuns e da SRM, responsável pelo atendimento educacional
especializado (AEE) na produção de dados, com carga horária de 12 horas, tendo como tema
o ensino colaborativo. Usar-se-á fontes secundárias, como: leis, projetos, decretos, atos
normativos, resoluções, relatórios, bem como documentos disponibilizados pela escola
envolvida na investigação. Por fim, aplicar-se-á o método cartográfico apoiado nos quatro
movimentos: rastrear, pousar, tocar e reconhecer que não são lineares, mas dialogam e
transitam entre si no processo cartográfico, dando ao tema desta dissertação uma concepção
política epistemológica.
11. Quanto à indenização: Não há danos previsíveis decorrentes da pesquisa, não tendo
qualquer compensação financeira.
13. Os participantes que aceitarem colaborar com a pesquisa receberão uma via deste termo
assinada por todos os envolvidos (participantes e pesquisadora).
A pesquisadora responsável, os sujeitos da pesquisa, quando for o caso, devem rubricar todas
as folhas do TCLE, apondo também suas assinaturas na última página do referido Termo.
146
Em caso de aceite deste convite para participar e contribuir com a pesquisa, a assinatura
deverá ser concedida neste termo.
___________________________________________________
Assinatura do(a) Voluntário(a)
____________________________________________________
Assianatura da Pesquisadora Responsável
147
A produção da memória educativa revela-se como uma atividade privilegiada para aqueles
que têm a oportunidade de deparar-se com sua elaboração durante a formação, uma vez que
esta corrobora à ressignificação da práxis. Esse dispositivo propõe uma viagem ao passado,
por meio da trajetória docente para que haja um resgate na memória do tempo, dos episódios,
das situações, das pessoas e dos processos da experiência vivida.
28
A memória educativa deve registrada em um texto narrativo, no mínimo, com duas laudas manuscritas ou
digitada e ser redigido na 1ª pessoa do singular (eu).
148
8. Que práticas inclusivas (ações, atividades, estratégias, metodologias) você tem utilizado
ao longo da sua trajetória profissional?
9. Como você avalia o compromisso/comprometimento dos(as) colegas docentes no tocante
à inclusão na escola? Há empatia entre vocês? Vocês planejam juntos(as)? Há tempo para
se discutir as situações de aprendizagem dos alunos com deficiência coletivamente?
10. Que tipo de apoio você recebe da gestão e/ou da coordenação pedagógica para trabalhar
com os estudantes com deficiência?
149