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Neste texto, o foco central é a questão do aborto.

Dou também conselhos a jovens


devotos. É também um texto um tanto auto-biográfico em que falo um pouco de mim.

Alguns devotos e discípulos, quando anos atrás escrevi alguns artigos de cunho moral e
social, me disseram que não gostavam que eu escrevesse este tipo de assuntos. Eu digo que
também não gosto. Preferiria não fazê-lo. O que eu faço com todo gosto é discorrer sobre o
conteúdo dos shastras. Alguns dizem que escrever sobre estes assuntos seculares não é
próprio de um sannyasi e que eu não deveria fazer isso. Quanto a isso eu digo que faço isso
por uma questão de “obrigação moral”. Faço, seguindo minha consciência e seguindo os
passos de meu mestre espiritual, Srila Prabhupada. Prabhupada em sua juventude militou no
movimento nacionalista na luta pela independência da Índia. Ele conhecia a política da Índia
com profundidade. Nas conversas com seus amigos, principalmente em Mumbai, ele mostra
que estava completamente a par do que acontecia em seu país no seu tempo. Alguns devotos
e devotas reagem com raiva e desgosto e não conseguem nem ler o que escrevo. Estes
condicionam sua consciência de Krishna à sua ideologia secular. E isso é, sem dúvida, um
perigo. E mostra imaturidade para lidar com assuntos sérios e inconvenientes da sociedade
moderna cheia de problemas.

O que eu escrevi em meus textos não é uma questão de mera opinião. Não. Fiz
questão de dar muitos argumentos e dados. Meu desejo é que os devotos e devotas de nosso
movimento tornem-se pessoas maduras e não se deixem levar pelo que os falsos líderes ateus
da sociedade mundana querem impingir a forma como se deve pensar e agir. Nós, devotos de
Krishna, somos livres. Temos nossa visão de mundo própria. É como Shukadeva Gosvami diz:
mukta-sanga – neste mundo onde todos estão enredados (sanga), os devotos estão livres
(mukta).

Rogo aos devotos para terem boa-vontade e tratem de considerar o que eu escrevo à
luz da consciência de Krishna e não à luz de ideologias ateístas cujo objetivo é manter o povo
sob controle e assim manter o poder político. Meu sonho é que nosso movimento seja
formado de pessoas conscientes e independentes e que não misturem a consciência de
Krishna com ideologias ateístas desencaminhadoras. Escrevo sobre estes temas para alertar os
devotos e protege-los. Oro a Krishna para que eu tenha inteligência e lucidez e não me desvie
da veracidade e da justiça.

“Conhecimento técnico da ilusão” – Comentários e análises

Purushatraya Swami

Hoje, ao ler o Srimad Bhagavatam tive uns insights que me deram muita felicidade, isto
porque, por intuição, já tinha chegado à mesma conclusão e isso foi confirmado pelo próprio
Senhor Krishna ao instruir Uddhava. A passagem em questão é do décimo primeiro canto, os
dois primeiros versos do capítulo dezenove, intitulado “A perfeição do conhecimento
espiritual”, onde Krishna diz o seguinte no primeiro verso: “A pessoa autorrealizada que
cultivou o conhecimento das escrituras até o ponto de atingir a iluminação e que está livre da
especulação impersonalista, compreendendo que o universo material não passa de mera
ilusão, deve entregar a Mim tanto esse conhecimento quanto o processo pelo qual o
alcançou”.

Neste verso, Krishna quer dizer que uma pessoa iluminada deve descartar todo o
conhecimento adquirido no reino de māyā, ou em outras palavras, deve “entregar” este
conhecimento a Ele para, assim, se concentrar exclusivamente na consciência de Krishna pura.
Hridayananda Majaraja, que compôs os significados desta parte do Srimad Bhagavatam,
designou muito apropriadamente este conhecimento secular que deve ser descartado como
“conhecimento técnico da ilusão”.

Podemos dar o seguinte exemplo: uma pessoa que contraiu uma doença, vai tratar de
saber tudo sobre a doença. Ela vai conversar com médicos, pesquisar na Internet e nas
publicações sobre saúde. Ela vai querer saber as causas da doença, suas complicações e
possibilidades de cura, quer saber o que a medicina tradicional e natural pode oferecer para a
cura, quais são as últimas pesquisas sobre essa doença específica, qual é a opinião de
diferentes médicos e depoimentos de pessoas curadas, etc. Em suma, essa pessoa vai se
tornar praticamente uma especialista sobre esta doença. Ao passar por todos os exames e
procedimentos, e seguir estritamente as prescrições médicas, esta pessoa afinal se curou. Ao
recuperar a saúde, todo o conhecimento que ela acumulou sobre a doença será devidamente
descartado, pois se trata de um “conhecimento técnico da ilusão”. Por um período de tempo,
este conhecimento foi importante e útil, mas depois se tornou obsoleto.

Posso observar essa dinâmica na minha caminhada espiritual na consciência de


Krishna. Numa fase de minha vida como devoto, eu pensei da seguinte maneira: “Já que estou
estudando a filosofia dos Vedas, acho que seria interessante conhecer também alguma coisa
da filosofia ocidental para poder fazer uma comparação com a filosofia que estou me
dedicando”. Depois de alguma pesquisa no Google e Youtube e leitura de alguns livros,
procurei entender, em linhas gerais, superficialmente, o pensamento de alguns filósofos como
Aristóteles, Platão, os Escolásticos, a filosofia moderna iniciada por Descartes, alguma coisa de
Kant, Hegel, Marx, e outros mais modernos como Kierkegaard, Heidegger e parei por aí.
Cheguei à conclusão que não valia a pena me aprofundar muito mais neste “conhecimento
técnico da ilusão”. Este conhecimento foi devidamente descartado. As noções básicas que
pude assimilar já eram suficientes para entender, de modo geral, a posição da filosofia védica
diante destas filosofias que tratam deste mundo de māyā.

Numa outra fase de minha vida, já como sannyasi e mestre iniciador, cheguei à
conclusão que deveria entender um pouco mais sobre a personalidade humana, pois estava
agora lidando com problemas pessoais de devotos e devotas que se aproximavam de mim com
seus próprios problemas. Dizer simplesmente, “cante Hare Krishna”, na maioria dos casos não
seria suficiente para aliviar o devoto das pressões psíquicas que estava experimentando. Um
devoto amigo muito erudito me deu indicações por onde poderia iniciar minha pesquisa. Pelas
leituras, compreendi alguma coisa sobre a Psicanálise e fiquei curioso em saber por que
grandes psicólogos como Jung e Adler, por exemplo, desligaram-se de seu mestre Freud por
não concordarem com a obsessiva opinião de considerar a libido como causa de todas as
neuroses e psicoses. Foi na psicologia humanista de Carl Rogers, Abraham Masllow e,
principalmente, Viktor Frankl que mais me identifiquei. Diferentemente da Psicanálise que se
preocupa exclusivamente com a cura, a psicologia humanista, além da cura, mostra como a
pessoa pode avançar e evoluir para chegar a patamares superiores de consciência. Aprendi
com Carl Rogers que o terapeuta tem que entrar em total empatia com o paciente. Isto tem
me ajudado a ouvir melhor os devotos. Aprendi com Masllow qual é o nível mais elevado de
sanidade psíquica humana. E de Viktor Frankl, através de sua valiosa psicologia, a Logoterapia,
a psicologia da busca pelo sentido da vida, pude perceber que esta psicologia tem certa
afinidade com o processo da consciência de Krishna. Assim como descrevi no parágrafo
anterior, este saber também faz parte do “conhecimento técnico da ilusão”. Depois que eu
incorporei em minha consciência alguns conceitos afins ao processo da consciência de Krishna
e que seriam úteis em minha pregação e eficientes para o aconselhamento aos devotos, eu
simplesmente não preciso mais deste conhecimento.
Em vários versos na Bhagavad-gita e na Uddhava-gita, Krishna nos mostra a diferença
entre jñāna e vijñāna, o conhecimento recebido e o conhecimento interiorizado, ou no jargão
da consciência de Krishna – o conhecimento das escrituras (jñāna) e a compreensão espiritual
realizada (vijñāna). No estado de vijñāna, a pessoa tem posse definitiva do conhecimento, já é
parte da segunda natureza da pessoa. Uma terceira fase de conhecimento ocorre quando o
conhecimento realizado chega ao ponto de ser capaz de ser transmitido a outros. Vejo que
poucos devotos do movimento têm desejo de se tornarem pregadores. Para isso ser realizado,
exige-se dedicação constante ao estudo das escrituras.

Felizmente, ou infelizmente, sou uma pessoa antenada. Procuro entender o mundo em


que vivo, principalmente procuro entender a realidade do país em que habito. Somente me
atrevo de emitir pensamentos em forma escrita ou oral de assuntos que foram devidamente
comprovados, analisados e refletidos. O fato é que, com o avanço da Kali-yuga, o panorama
aqui vai se tornando cada vez mais sombrio. Nosso país, a despeito da beleza cênica e da
abundância de recursos naturais, é uma nação condenada ao fracasso devido à perda dos
valores morais de grande parte das lideranças do povo – políticos, governantes e pessoas
influentes na sociedade, como professores, artistas e jornalistas. Poucos se salvam. Não
podemos generalizar, pois existem sim exceções, pessoas íntegras. Com estas eu procuro me
identificar. Mas tais pessoas são uma minoria e dificilmente conseguem interferir para reverter
o processo de degradação de nossas instituições e, consequentemente, de nosso povo. O
resultado é que temos um povo de mau karma. Algumas pessoas de boa índole lutam
tenazmente e, a duras penas, conseguem reter algum avanço de agendas malignas, como o
caso do aborto.

No meu caso, não tenho nenhum interesse em discutir política, economia e gestão
pública. Quero me manter à distância desses tópicos estritamente mundanos e altamente
tóxicos. Meu único interesse é tratar de analisar e alertar aos devotos sobre o perigo que nos
ronda. A tensão entre a sanidade espiritual e as forças degradantes da sociedade é o que
tecnicamente é chamado de “guerra cultural”. É no meio desta guerra que vivemos hoje em
dia.

Há cinco anos, escrevi alguns artigos sobre temas referentes à “guerra cultural” dos
quais possuia plena informação. Antes de descartar esses conhecimentos, como já tinha feito
com outros temas gerais sem uma ligação direta com a consciência de Krishna, resolvi passar
este conhecimento aos devotos, pois dificilmente eles poderiam ter acesso a estas
informações através da mídia e das universidades. Eram informações que revelavam como
nossos estudantes têm sido manipulados por uma ideologia ateísta de origem comunista que
visam dividir a sociedade com fins de obter pleno poder político.

Em pleno regime militar, foi publicada a obra do filósofo marxista Antonio Gramsci que
estava preso na Itália. Nesta obra, Cadernos do Cárcere, era traçada a estratégia da introdução
da ideologia marxista nas universidades e, na sequência, na classe política, na mídia, nos meios
artísticos e sindicatos. Estabeleceu-se a ideologia do “pensamento único”. A universidade
deixou de ser um local de debate de ideias para se tornar um centro de doutrinação desta
ideologia. Ai de quem pensasse diferente... Muitos aderiram bovinamente esta ideologia, pois
era (e ainda é) o único meio para ter oportunidades no meio acadêmico, como bolsas,
mestrado, doutorado, docência, publicação de teses, aparelhamento de órgãos
governamentais, etc. Outra estratégia de Gramsci foi a “ocupação de espaços”. Todos os
conselhos regionais foram cooptados pelos fiéis desta ideologia. Não é necessário dizer que o
sucesso foi total. Foi tudo dominado.
Muitos jovens desta época exibiam em suas camisetas as faces de Mao e Che Guevara.
Mao saiu de cena ao ser desqualificado como o maior genocida da história do mundo. Mas
Che, com sua única glamorosa foto, estava onipresente no meio estudantil e afins. Todos se
tornavam “revolucionários” simplesmente por vestir uma camiseta com sua cara.
Recentemente, a “ficha caiu”; o herói revolucionário foi, por fim, desmascarado como um
assassino sanguinário que desfrutava da morte, além de ser um monstro homofóbico e racista,
e o que dizer, transfóbico. Era conhecido como “porco fedorento”, pois considerava o banho
como uma prática burguesa. Essa é nossa juventude que idolatra falsos heróis, ditadores
sanguinários e terroristas como Mariguela, e, atualmente, mesmo depois de todas as
inconcebíveis atrocidades, não consideram os militantes do Hamas como terroristas.
Consideram o Hamas como grupo político e os judeus como genocidas, pois lutam para salvar
seu povo dos terroristas. Esta é a nova versão do nazismo. Quem pensa assim está vivendo a
meio de uma doença moral coletiva.

No campo da imoralidade, somos campeões. É só ver o que passa nos diretórios do


departamento de Humanas nas universidades federais e estaduais, que são antros de drogas e
sexo livre misturados com slogans revolucionários. Tudo isso fruto de uma filosofia bem
embasada propagada pelos filósofos da Escola de Frankfurt. Com sua “teoria crítica”, a
proposta desses filósofos era destruir todos os valores da sociedade. Os estudantes, artistas,
os drogados e bicho-grilos seriam os protagonistas dessa “revolução”. Com a destruição de
todos os valores da sociedade, surgiria das cinzas uma sociedade completamente livre das
amarras morais e da religiosidade. Isso, para jovens que se negam a receber uma orientação
adequada, soa como néctar. Não existe o Bem absoluto e o Mal absoluto, tudo é relativo. Não
existe moralidade nem imoralidade. Tudo é permitido. Descrevi anteriormente sobre este
fenômeno sociológico com detalhes.

De minha parte, estes dois temas do “conhecimento técnico da ilusão” já foram


devidamente descartados. Muitos devotos, inclusive jovens, tiraram proveito das minhas
informações sobre estes temas. Isso demonstrou que estava 100% certo em passar essas
informações para a sociedade de devotos. Alguns devotos e devotas reagiram furiosamente,
pois acharam muito estranho um sannyasi tratar desses assuntos e me criticaram dizendo que
eu só teria direito de falar sobre o Srimad Bhagavatam. Já outros reagiram negativamente,
pois os temas que apresentei não fazia parte da “cartilha” ideológica do “pensamento único”
em que foram doutrinados nas escolas e faculdades. O que não está nos cânones da ideologia,
não pode nem sequer ser questionado. Isso é um comportamento completamente histérico e
irracional e, sobretudo, de total imaturidade intelectual. Um devoto tem que ser mente aberta
para poder entender a realidade. Não pode ser levado pelo pensamento das massas. Fui
xingado e ofendido. Organizaram lista para me denunciar. Isso mostra que, mesmo dentro de
nosso movimento, esta ideologia ateísta prevalece. A pergunta que fica: é esta ideologia
compatível com a consciência de Krishna? Vamos examinar isso.

A ideia que o pessoal do “pensamento único” tem, fruto de intensa propaganda e


doutrinação, é que sua ideologia é do Bem. Quem pensa diferente está do lado do Mal. Isso é
uma infantilidade que talvez impressione adolescentes, se bem que nós vemos “doutores” e
pessoas inteligentes pensando assim. Defendemos as minorias, dizem: LGBTQI+, negros,
índios, MST, maconheiros, viciados em crack, mas esquecem da maioria, os pobres. É muita
hipocrisia. É óbvio que estes temas são completamente antagônicos à consciência de Krishna.
Temos que estar bem conscientes de Krishna para não sermos cooptados pela onda de paixão
e ignorância que é o ambiente da política partidária.

No meu caso, sinto-me protegido pela pregação. Tenho pregado a consciência de


Krishna tão intensamente, a ponto de abalar minha saúde, como agora, no momento, em que
estou me recuperando para nova temporada de pregação. Pela graça de Krishna e inspiração
de Prabhupada tenho tocado na alma das pessoas com minha pregação. Várias pessoas têm
vindo a mim para dizer o quanto minhas palavras foram responsáveis pela transformação em
suas vidas. E isto não tem preço que pague. Meu envolvimento direto na pregação é minha
dívida com Prabhupada por ter iluminado minha consciência com o conhecimento da
Bhagavad-gita, Srimad-Bhagavatam, Caitanya-caritamrita, Bhakti-rasamrita-sindhu, Sri
Ishopanishad, e outros livros e dado o exemplo em sua própria vida.

Vou tratar agora de outro tema da “guerra cultural” que é o maior perigo que nosso
movimento está passando. Escrevi, há um pouco mais de um ano, dois artigos que abordavam
os temas: “A destruição da família” e “Somos conservadores ou progressistas?” No primeiro
artigo mostrei, com muitas evidências, como a “engenharia social”, no intuito de manipular o
comportamento humano no sentido de conter a expansão da população mundial, criou o
feminismo radical (meu corpo, minhas regras) e a luta pela liberação do aborto. Uma mulher
feminina verdadeira assim definiu o feminismo e que viralizou na Internet: “O feminismo faz
enxergar os filhos como um peso, a maternidade como um castigo, o homem como um rival, o
assassinato de bebês como um direito e a libertinagem como uma conquista”. Toda esta saga
de controle populacional passando pelas grandes fundações (Rockefeller e Ford) culminou na
fundação da ONU que, até hoje não resolveu nenhum conflito entre nações, mas avança cada
vez mais na propagação da “agenda progressista” e “pautas identitárias”. As agendas
progressistas da ONU tratam de introduzir, de fora para dentro, em nosso país, o que os
progressistas consideram de “avanço civilizatório”: liberação do aborto e das drogas, ideologia
de gênero, sexualização infantil, pedofilia consentida, direitos especiais para minorias, racismo
reverso, e outras absurdidades. O grande entrave para que a onda progressista se estabeleça
definitivamente na sociedade são as duas instituições tradicionais: a família e a religião. Todo
um esforço midiático e político tentam minar a autoridade destas duas instituições naturais da
sociedade. A não ser pela resistência de alguns políticos virtuosos, respaldados pela grande
maioria conservadora da sociedade brasileira, todas estas pautas que degradam a sociedade já
teriam se efetivado. Esta é a “guerra cultural” do momento nesta Kali-yuga.

Dias atrás, assistimos o abominável voto da relatora ministra do STF, Rosa Weber, em
favor da descriminalização do aborto até 3 meses. Sua biografia ficou manchada de sangue. Ela
foi alertada por especialistas de que um embrião de 3 meses já tem batimento cardíaco,
função cerebral, membros definidos, inclusive com impressão digital definida e DNA individual.
Mesmo assim optou pelo assassinato. Se deixarem o STF legislar, o que não é sua atribuição,
outros ministros seguirão o voto da relatora. A sociedade precisa se posicionar para barrar
esses abusos. Minha humilde opinião é que nosso movimento deveria ser um baluarte na luta
contra o aborto ao declarar abertamente e oficialmente nossa posição. Será que esta nossa
indefinição é favorável à pregação? Afinal de contas, uma parcela de nossa pregação é dirigida
a pessoas de mentalidade progressista. Esse pragmatismo tem um preço. Qual é o preço? A
insignificância de nosso movimento diante de pessoas de bem da sociedade. De fato, nosso
movimento está impregnado de mentalidade progressista, vide as reações quando escrevi o
texto “Somos conservadores ou progressistas?”.

Antes do último pleito presidencial, eu aconselhei aos devotos: “Não votem em


candidatos pró-aborto. Se o candidato que se opõe a isto não lhe agrada, votem em branco,
mas não maculem teu karma”. Não tenho nenhum dado em mãos, mas desconfio que muitos
devotos e devotas não seguiram este conselho e ofereceram seu apoio a um mitômano
psicopata. “É do Bem”, “O amor venceu”, diziam. No entanto, o que vemos a seguir é ódio,
vingança, violência, abuso e retrocesso. Vergonha. Não vou aqui entrar nos detalhes. Apesar
de ter prometido aos evangélicos não recorrer à pauta do aborto, o ministério da Saúde deste
governo, na resolução 715/23 que, ao invés de tratar exclusivamente de melhorar o sistema de
saúde, trata de redução da idade até 14 anos para hormonização para mudança de sexo e
liberação do aborto. Isso é nosso Brasil. O relativismo moderno tem banalizado a condição
humana. Aqui no Brasil, a esquerda, composta por vários partidos, está dividida: de um lado, a
esquerda “casca grossa” – de bandeira vermelha, socialista, sindicalista, anti-privatizações,
aparelhadora de ministérios e estatais para acomodar a companheirada, gulosa quanto a
impostos, internacionalista e aliada a ditaduras sanguinárias. Do outro lado, uma esquerda fiel
seguidora da agenda progressista da ONU e das pautas identitárias. Ambas as linhas apoiam
abertamente a liberação do aborto.

O povo em geral é uma vítima fácil da estratégia de degradar nossa sociedade.


Somente um exemplo: a rede social Tiktok, de origem chinesa, onde os adolescentes e jovens
da geração perdida passam horas do seu dia buscando matar o tédio, é um dos mais potentes
meios para degradar as pessoas. Lá se encontra, além de todo tipo de imoralidades com
crianças e adultos, vídeos de automutilação e suicídio de adolescentes, e as mais absurdas
coisas. É o plano da China de degradar o Ocidente para conquista-lo. Os seguintes países já
baniram o Tiktok: Austrália, França, Holanda, Nova Zelândia, Índia, Reino Unido, Canadá,
Taiwan e Estados Unidos. Mas nós não nos preocupamos com nossas crianças, adolescentes e
jovens. Temos hoje uma geração inteira perdida. O Tiktok gera um vício como qualquer droga.
Que nossos pais devotos cuidem de seus filhos. No Rio de Janeiro, por exemplo, tem legiões de
jovens semi-alfabetizados que não servem para nada na vida. Suas únicas opções são o tráfico
e o assalto à mão armada para patrocinar seu vício.

A verdade é que todo este “lixo” são “conhecimentos técnicos da ilusão”. Seguindo as
instruções de Krishna a Uddhva, devem ser sumariamente descartados. De minha parte, já
cumpri meu dever de alertar os devotos e devotas e não tenho nenhum desejo de voltar a
estes temas. Muitos devotos consideraram meus escritos como posicionamento político. Esta
não foi nem é minha intenção. Eu sempre votei nulo e hoje em dia nem voto. Eu trato de
valores – valores que são compatíveis e não compatíveis com a consciência de Krishna. Outros
me acusam de estar dividindo os devotos. Não estou dividindo, estou dando ensinamentos e
instruções para que os devotos possam enfrentar e se defender de Maya e adotar a
consciência de Krishna como ela é. Não sou de apontar o dedo para ninguém. Muitos daqueles
que me criticam, tenho minhas dúvidas se estão realmente cumprindo com as dezesseis voltas
de japa e seguindo os quatro princípios que prometeram na iniciação. Mesmo assim, não nego
refúgio e orientação a ninguém. Eu só peço sanidade intelectual e boavontade.

Falando um pouco de mim: aos 78 anos, apesar de não ser um tipo muito forte, tenho
conseguido, de maneira geral, manter alguma estabilidade em minha saúde. Depois de
inúmeras caminhadas e andanças, meu joelho acendeu a luz vermelha. Daqui pra frente,
paríkrama em Govardhana, esquece. Não sou, nem de leve, uma pessoa amargurada. Não sei
se realmente mereço, mas a realidade é que, agora na tal velhice, estou vivendo a melhor fase
em minha vida. Não posso me queixar. Tenho me sentido produtivo. Procuro extrair a
felicidade na consciência de Krishna. Mesmo viajando bastante, tenho encontrado
tranquilidade para continuar produzindo material escrito. Estou satisfeito também com o
resultado de minha pregação. Estou sentido que o público vem reagindo bem ao meu discurso.
É uma sensação muito especial quando existe uma empatia entre o orador e a audiência. Sou
muito sensível quanto a isto. Outro fator que tem valorizado bastante minha vida tem sido as
amizades com muitos devotos e devotas que tenho cultivado ao longo dos tempos, assim
como as novas amizades que surgem em todos os lugares que visito, tanto aqui no Brasil,
quantos em outros países e, também, na Índia. Definitivamente, isto não preço. Isto enriquece
tremendamente a vida. Estendo também esta amizade aos meus discípulos e discípulas. Este é
meu sentimento sincero. Tem um caso interessante do ex-Bk. Lula, o qual éramos amigos
antes de ser devoto. Na verdade, a primeira vez que entrei num templo Hare Krishna nós
estávamos juntos. Neste ano, depois de 47 anos, ele foi iniciado por mim como Dharmaraja
Das. Durante todos esses anos, ele esteve ocupado por conta da família e outros assuntos, mas
nunca se afastou um milímetro da consciência de Krishna. A preocupação dele era, caso fosse
iniciado por mim, como seria a nossa relação? Iria ter que mudar? Eu garanti a ele que nossa
relação não teria que mudar absolutamente nada. Nossa relação seria como sempre foi: de
confiança, ajuda mútua e informal. Ele então aceitou ser iniciado. Em Goura Vrindávana é meu
refúgio. Acho que não estou aqui por acaso, pois sempre, mesmo antes de me tornar devoto,
almejava viver em contato com a natureza. Paramatma me encaminhou para lá. Quero aqui
registrar que Goura vive hoje um dos melhores momentos de sua história, graças à postura
madura e vaishnava dos membros da comunidade. Estamos aqui experimentando um período
de grande harmonia e empenho de todos os membros da comunidade, e o resultado tem sido
um evidente crescimento orgânico de nossos projetos. Os programas espirituais em nosso
bonito templo são simples, mas, pelo menos a mim, muito inspiradores. Nada como a japa no
brahma-muhurta no templo. Ah...! Os festivais em Goura... São únicos. Fazem um diferencial.
Recebemos regularmente um bom número de visitantes que saem encantados com o
ambiente espiritual de Goura. Isso valoriza cada vez mais a missão de Srila Prabhupada. Outro
empreendimento que está acontecendo aqui em Goura é a iniciativa de um grupo de
discípulos que está tratando de construir uma casa para mim perto do templo. Não vou dar os
nomes para evitar que eu omita alguém. Isto tem me tocado no fundo do coração. Vou me
esforçar para tentar retribuir tamanha generosidade por parte de meus discípulos e discípulas.
Apesar dessas coisas favoráveis que estão acontecendo em minha vida, existe ainda um foco
de tristeza. Isso vai ser comentado abaixo.

Esta agora é a parte mais delicada. Espero que eu tenha boa compreensão por parte
de todos vocês. Dias atrás, um casal de discípulos rompeu comigo. Fui cancelado. São
discípulos muito queridos que, por 10 anos ou mais, temos trabalhado juntos, tivemos muito
contato e resultados excelentes. Muitas vezes me hospedei em sua casa. Em um whatsapp
recente, o devoto declarou-se que estava “desnorteado” com meus escritos de 1 ano atrás. No
Ratha-yatra de São Paulo, ao cumprimenta-los, recebi um “haribol” com desdém, como que
me cancelando. Isto me machucou. Não vou aqui julgá-lo. Este não é meu feitio. Quero, no
entanto, entender esta reação, visto que simplesmente emiti minha opinião sobre temas
importantes baseados em fatos. Eles, certamente, devem ter sofrido ansiedades antes de ter
chegado ao ponto deste rompimento. Sugeri um diálogo, mas foi recusado. Por que não
conversar? Antes deste, tive também outros casos de discípulos se afastando. Em Belo
Horizonte, duas devotas, também muito queridas, cujo relacionamento era muito amistoso e
cooperativo, sumiram. Gostaria de retomar o contato com elas. Tive outros casos de casais se
rebelando contra meus escritos, mas, depois de uma conversa franca, puderam compreender
minha intenção e o relacionamento voltou ao normal. Fico aqui pensando: que ideologia é
essa que se torna suficientemente forte para justificar o rompimento corpóreo de uma relação
saudável entre almas espirituais, estritamente dentro dos preceitos da consciência de Krishna?
Definitivamente, as força dessa ideologia só pode ter vindo de Maya.

Como já mencionei, aos 78 anos de idade, estou muito atento aos rumos da sociedade
civil e da influência que está exercendo na nossa pequena sociedade de devotos. Ao contrário
destes jovens discípulos, começando suas vidas conjugais e enfrentando os desafios de se
manter com seus trabalhos, eu tive uma vida muito intensa. Saí de casa aos 16 anos, aos 22
viajei pelo mundo com dinheiro no bolso. Formei-me duas vezes em curso superior e tive
outros dois incompletos. De 1968 a 1976, quando me tornei devoto, convivi intensamente no
Rio de Janeiro, minha cidade natal, na contracultura, o maior movimento cultural em pleno
regime militar, e pude ver o que era realmente o submundo carioca naquela época. Embora
vendo como é realmente a natureza humana, algo dentro de mim dizia: não vou me degradar.
E aí Prabhupada me salvou. Ao me render ao movimento aos 31 anos, “entrei de cabeça” na
distribuição de livros. Fiz muita austeridade. Fui o sétimo entre os melhores distribuidores de
livros do mundo em 1977. Em 1978, fiz minha primeira viagem à Índia. Fui presidente de
templo no Rio, em São Paulo, em Nova Gokula e Brasília. Em 1984, viajei por toda Índia – fiz o
percurso da viagem de Caitanya Mahaprabhu descrito no Sri Caitanya-caritamrita. Em 1985,
tomei sannyasi em Mayapur. Em 1989, estive pregando na China e Filipinas. Estive em
Vrindávana, de 1990 a 1998. Passei 4 meses sozinho tomando conta dos aposentos de
Prabhupada no templo Radha Damodara. Fiz muito estudo e austeridades na Índia. Comecei a
iniciar discípulos em 1995. Trabalhei, por anos, na tradução completa da gramática de
sânscrito de Jiva Gosvami, Sri Harinamarita-vyakarana, junto com meu amigo Yadu, que já
faleceu. Sou a única pessoa no mundo que possui a cópia dessa gramática em inglês, que
nunca foi publicada. Durante este período em Vrindávana, me especializei nas filosofias
vaishnavas das quatro sampradayas – Vishistaadvaita, Dvaita, Svabhavika bhedaabheda,
Shuddhaadvaita e Acintya bhedaabheda. Dei dois cursos sobre este assunto no VIHE, Instituto
de Educação Superior de Vrindávana. Em 1998, voltei ao Brasil.

Quer dizer, não sou este velhinho perdido no tempo, vivendo o passado. Tenho certa
experiência de vida que posso usar para orientar os devotos e devotas mais jovens. Não sou
disciplinador nem aponto o dedo para ninguém. Procuro entender a mentalidade dos jovens
de hoje para poder instruir meus discípulos. Em vários assuntos, vou na contramão da História,
pois, como todo mundo pode ver, esta sociedade ateísta e imoral dos dias de hoje está
caminhando a passos largos para o abismo. Os jovens, em geral, não percebem isso e acham
que tudo o que é moderno é um “avanço civilizatório”. Que o que é tradicional é retrógrado.
Expliquei isso no artigo “Somos conservadores ou progressistas?”. Meu dever é alertá-los
contra os perigos e a enganação. A mídia e a universidade escondem os fatos que eu
denunciei. Aqueles que recebem as informações através da televisão (Globo News, Jornal
Nacional, Band, etc.) e por blogs financiados só vão ter informações carimbadas do governo e
nunca terão uma informação verdadeira. Por não terem estas informações, os jovens ficam
“desnorteados”, isto é, perdem o Norte. É daí que surgem essas desavenças.

A juventude moderna segue consciente ou inconscientemente a tendência do


momento, chamada “cultura woke”. Muitos não devem nem ter ouvido falar sobre isso, mas,
mesmo sem saber, seguem o padrão da modernidade. Algumas características dos que
adotam a “cultura woke” são as seguintes: eles são limpinhos, inteligentinhos, geralmente
veganos e atraídos pelas atividades zen. São jovens casais, sejam héteros ou homo afetivos
que querem ser livres e não querem assumir a responsabilidade de ter filhos. Levam uma vida
doméstica organizada. Para suprir a afetividade dentro do casamento pela falta de filhos,
adotam e convivem intimamente com cães ou gatos. É comum entre os rapazes adotarem
trejeitos e badulaques femininos. Existe um processo de feminização entre a classe masculina
jovem.

No entanto, a “cultura woke” tem um veneno. Está intimamente associada com as


“pautas identitárias”, a saber, liberação das drogas e do aborto, ideologia de gênero, política
de cancelamento, racismo reverso, incentivo á homossexualidade, sexualização precoce, cotas
raciais e transexuais, mudança de linguagem para incluir pessoas não-binárias,
desencarceramento, apropriação cultural, cultura de cancelamento, cultura do “politicamente
correto”, etc. Toda esta porcaria que é importada dos Estados Unidos. Os brasileiros são os
maiores imitadores do pior que existe neste grande país democrático onde a liberdade de
expressão é absoluta, tanto do lado do Bem quanto do Mal. Só imitam o que tem de pior. Não
somente eu, mas vários devotos e devotas sérios do movimento, que estão se esforçando em
seguir estritamente o padrão estabelecido por Srila Prabhupada, estão apreensivos ao
detectarem sinais de que influência de Maya esteja se infiltrando no movimento. Será que o
movimento irá sobreviver diante da influência contrária aos princípios eternos da consciência
de Krishna?

Ao escrever estes textos eu já antevia reações contrárias. Sabia que os devotos iriam
estranhar este tipo de abordagem da realidade nua e crua deste mundo. Fui censurado e
ofendido. Mas estava preparado e não permiti ser afetado pelos arroubos de indignação de
devotos despreparados e imaturos. Alguns são pessoas boas, mas são alienados e não estão
acostumados a esse tipo de análise e desconhecem completamente estes temas. Outros
agiram com certa malícia. Posicionaram-se como puristas da consciência de Krishna para me
atacar e, assim justificar seu engajamento à uma ideologia materialista e opções políticas
completamente antagônicas à consciência de Krishna. É minha postura valorizar os devotos
por sua devoção sincera à Krishna. Não aponto o dedo para ninguém. Suportei calado todas as
ofensas que foram dirigidas a mim. Por me manter fixo com Prabhupada, não fui afetado por
todos os ataques que sofri. Tinha minha consciência tranquila por ter cumprido meu dever.
Neste atual texto estou aberto para dialogar com qualquer devoto ou devota que tenha
interesse por esclarecimentos.

Para terminar este longo texto, deixarei aqui algumas perguntas aos devotos e devotas
que têm alguma devoção a Krishna e reverenciam a Srila Prabhupada. Estás cantando as
dezesseis voltas de japa do maha-mantra Hare Krishna e seguindo os quatro princípios
regulativos que tu prometeste seguir na hora da iniciação? Se sim, parabéns, você está
conectado e o futuro de tua vida espiritual é promissor. Se não, analisa bem a vida que estás
levando e usa toda tua inteligência e vigor para dar uma reviravolta a fim de retomar a prática
saudável da consciência de Krishna. Prabhupada deu o exemplo do copo d’água: o copo cheio
é consciência de Krishna plena; na medida em que o copo esvazia o ar (Maya) toma conta do
espaço. É triste ver um devoto ou devota ser dominado por Maya. Qual é tua participação no
movimento? Estás pregando? Para quem? Para os devotos ou para o público? Não estás
pregando? Estás participando no templo? Estás contribuindo para o movimento? Estás
apoiando aqueles que estão pregando? Ou estás completamente a parte? Estás lendo os livros
de Prabhupada? Já leste todo o Srimad Bhagavatam? E o Sri Caitanya-caritamrita? Estás feliz
na consciência de Krishna? O que é que estás te afetando dentro do movimento? Ainda
conservas o desejo de ser um bom/boa devoto/a? É o teu plano sair desta vida em consciência
de Krishna? Estás te preparando para isso? Sair desta vida em consciência de Krishna – esta é a
vitória final. Srila Prabhupada ki jay!

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