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Introdução
As expressões “ordem” e “distribuição metódica” que sublinhamos no texto em epígrafe
são por demais sugestivas. O codificador da Doutrina Espírita, judiciosamente
caracterizado como “o bom senso encamado”,(2) certamente teve a preocupação de
apresentar a obra fundamental da Codificação Espírita dentro de
uma sistemática que fosse, ao mesmo tempo, filosófica, lógica e didaticamente
muito bem estruturada.
Fornecer subsídios para uma análise cuidadosa da Tábua das Matérias,
isto é, do índice de O Livro dos Espíritos (L.E.), com o objetivo de explicitar
uma lógica subjacente à ordem e à distribuição metódica
das matérias, constitui o propósito principal deste nosso trabalho.
Apresentaremos nossa análise de O Livro dos Espíritos em duas etapas.
Na primeira etapa, daremos uma visão da estrutura geral da obra, levando em
consideração a sua divisão em quatro partes (ou livros). Isto é, apresentaremos
argumentos que justificam essa divisão em quatro partes.
De fato, foi provavelmente essa divisão que deu origem ao Pentateuco
Espírita. As outras quatro obras fundamentais nasceram como um
desenvolvimento de cada uma das partes de O Livro dos Espíritos.
Na segunda etapa, discutiremos cada uma das quatro partes, procurando mostrar
de que forma se pode visualizar uma estrutura interna subjacente a cada uma
delas. A partir dessa estrutura interna pode-se justificar a ordem proposta por
Kardec para os capítulos constituintes da obra. Considere, por exemplo, a
segunda parte “Do Mundo Espírita ou Mundo dos Espíritos”. Como justificar a
ordem apresentada para os seus onze capítulos?
Não temos a intenção – e, na verdade, nem podemos tê-la – de passar a idéia
de que a estrutura que estamos propondo para a obra O Livro dos Espíritos seja
aquela pensada por Kardec. Pretendemos tão somente desenvolver conceitos
formados na Codificação Kardequiana, na esperança de fornecer contribuições para
o estudo da estrutura lógica da monumental obra O Livro dos Espíritos.
Cabe manter sempre presente a assertiva de Kardec:
“O homem que julga infalível a sua razão está bem perto do erro.” (3)
A ESTRUTURA DE O L/VRO DOS ESPÍRITOS
“Como meio de elaboração, o Espiritismo procede exatamente da mesma forma que
as ciências positivas, aplicando o método experimental. Fatos novos se
apresentam, que não podem ser explicados pelas leis conhecidas: ele os
observa, compara, analisa, e, remontando dos efeitos às causas, chega à
conclusão, depois, deduz-lhes as conseqüências e busca as aplicações
úteis. ” – Allan Kardec (4)
Não é nosso propósito discutir o método científico utilizado por Allan
Kardec. A “Excelência metodológica do Espiritismo” – a tese de que o Espiritismo
ajusta-se perfeitamente aos critérios modernos para a caracterização de uma
ciência – foi criteriosamente explorada por Chibeni, em vários artigos
publicados na revista Reformador. (5)
As quatro fases, que sublinhamos no texto de Kardec, acima, sobre o meio de
elaboração do Espiritismo, podem ser utilizadas para abstrairmos uma forma
didática de apresentação de uma doutrina de caráter científico. Deve ficar
claro, desde agora, que não estaremos propondo um método científico de
elaboração do Espiritismo. Estaremos apenas sugerindo uma forma,
didaticamente adequada, para a apresentação (ou exposição) da Doutrina Espírita.
A primeira fase, Fatos Novos se apresentam, sugere que, primeiramente,
deve ser definido ou escolhido o objeto a ser estudado. Escolhe-se o universo ou
o domínio a ser examinado. Delimita-se o campo de atuação da
ciência em estudo.
A segunda fase, Observação, Comparação e Análise, sugere que se deve,
a partir da escolha anteriormente realizada, apresentar uma análise detalhada
do universo ou do domínio a ser estudado. Nessa análise, todos os conceitos
fundamentais são explicitados, tendo em vista a formulação das leis.
A terceira fase, Formulação das Leis, sugere que leis reguladoras do
universo em exame devem ser formuladas levando-se em conta a análise apresentada
na segunda fase. Desta forma, todos os conceitos necessários para uma melhor
compreensão das leis formuladas já foram apresentados na segunda fase.
A quarta fase, Dedução das conseqüências e busca de aplicações úteis,
sugere o que se pode obter da aplicação das leis formuladas sobre os indivíduos
do domínio.
Podemos agora formular a seguinte estrutura didática geral para O Livro dos
Espíritos:
Cada uma das partes de O Livro dos Espíritos deu origem às outras quatro
obras fundamentais:
Parte primeira “Das causas primárias” – A Gênese, os Milagres e as Predições
segundo o Espiritismo (1868).
Parte segunda “Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos” – O Livro dos
Médiuns (1861).
Parte terceira “Das Leis Morais” – O Evangelho Segundo o Espiritismo
(1864/1865).
Parte quarta “Das esperanças e consolações” – O Céu e o Inferno ou a Justiça
Divina Segundo o Espiritismo (1865).
A ESTRUTURA DIDÁTICA DE CADA UMA DAS PARTES DE O LIVRO DOS ESPÍRITOS
A estrutura didática da 1a. parte “Das Causas Primárias”
Deus, “a causa primária de todas as coisas”, dá origem aos dois elementos
gerais do universo: Espírito (“princípio inteligente do universo”) e matéria
(“agente, intermediário com o auxílio do qual e sobre o qual atua o Espírito”).
Da ação do Espírito sobre a matéria, segundo a lei divina, surge a criação.
Dentre todas as criações destaca-se a criação dos seres vivos, cuja vida é um
efeito devido à ação de um agente (princípio vital) sobre a matéria”. “Esse
agente, sem a matéria, não é vida, do mesmo modo que a matéria não pode viver
sem esse agente.” (O Livro dos Espíritos, pergs.1, 22, 23 e 63).
Parte Primeira:
Das Causas Primárias
1° Capítulo: De Deus
2° Capítulo: Dos Elementos Gerais do Universo
3° Capítulo: Da Criação
4° Capítulo: Do Princípio Vital
A Estrutura da 2a. Parte: “Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos”
Os Espíritos constituem o “mundo dos Espíritos ou das inteligências
incorpóreas”. O mundo corporal e o mundo dos Espíritos “são independentes;
contudo, é incessante a correlação entre ambos, porquanto um sobre o outro
incessantemente reagem” (O Livro dos Espíritos, perg. 86). Sendo o Espírito o
elemento inteligente comum aos dois mundos, corporal e espiritual, ele pode ser
encontrado em 6 (seis) estados ou situações possíveis, com respeito a esses dois
mundos:
1° – Em trânsito do mundo espiritual para o corporal, isto é, em processo de
encarnação;
2° – Em trânsito do mundo corporal para o espiritual, ou seja, em processo de
desencarnação;
3° – Vivendo no mundo espiritual como Espírito;
4° – Vivendo no mundo corporal como Espírito encarnado (ou alma);
5° – Estando no mundo corporal e ao mesmo tempo interferindo no mundo
espiritual;
6°- Estando no mundo espiritual e ao mesmo tempo interferindo no mundo
corporal.
O Espírito é o elemento inteligente que atua nos dois lados da vida (corporal
e espiritual), portanto, ele deve ser estudado em primeiro lugar. O primeiro
capítulo intitula-se “Dos Espíritos”.
O 1° estado descrito acima é estudado no capítulo II “Da encarnação dos
Espíritos”.
O 2° estado é analisado no capítulo III “Da volta do Espírito, extinta a vida
corpórea, à vida espiritual”.
Esses dois processos, encarnar e desencarnar, dão origem às diversas vidas do
Espírito. Essas diversas vidas são examinadas no capítulo IV “Da pluralidade das
existências”. Como a lei da Pluralidade das Existências constituiu um dos
princípios mais importantes da Codificação Espírita, cabe estabelecer as bases
seguras de sua fundamentação, o que será feito no capítulo V “Considerações
sobre a pluralidade das existências”.
O 3º estado, a vida do Espírito no mundo espiritual, é estudado no
capítulo VI “Da vida espírita”.
O 4º estado, a vida do Espírito no mundo corporal, é analisado no
capítulo VII “Da volta do Espírito à vida corporal”.
O 5° estado, vivendo no corpo e interferindo no
mundo espiritual, constitui o capítulo VIII “da emancipação da Alma”.
O 6° estado, vivendo no mundo espiritual e interferindo no mundo corporal,
constitui o capítulo IX “Da intervenção dos Espíritos no mundo corporal”.
Os seis estados possíveis – encamar, desencarnar, viver no mundo corporal,
viver no mundo espiritual, estar no corpo e, ao mesmo tempo, atuar no mundo
espiritual, viver no mundo espiritual e, ao mesmo tempo, interferir no mundo
corporal – dão origem às missões e ocupações dos Espíritos, apresentadas no
capítulo X. “Das ocupações e missões dos Espíritos”.
Esta ação constante do princípio inteligente nos dois lados da vida, corporal
e espiritual, vem demonstrar que “tudo em a Natureza se encadeia por elos que
ainda não podeis aprender”. “Se observa a série dos seres, descobre-se que eles
formam uma cadeia sem solução de continuidade, desde a matéria bruta até o homem
mais inteligente”. (O Livro dos Espíritos, perg. 604 e item XVII da Introdução,
respectivamente).
Para estabelecer que esta cadeia – resultado da ação recíproca dos dois
mundos, corporal e espiritual (ou dos dois princípios, Espírito e matéria) – se
estende, no mundo corporal, para além dos seres humanos, Kardec apresenta o
décimo primeiro e último capítulo da Segunda parte: “Dos três reinos.”
“Já não dissemos que tudo em a Natureza se encadeia e tende para a unidade?
Nesses seres, cuja totalidade estais longe de conhecer, é que o princípio
inteligente se elabora, se individualiza pouco a pouco e se ensaia para a vida,
conforme acabamos de dizer. É, de certo modo, um trabalho preparatório, como o
da germinação, por efeito do qual o princípio inteligente sofre uma
transformação e se torna Espírito”. (O Livro dos Espíritos, perg. 607)