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CAMPINAS
2019
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CNPq, 169694/2017-8; CAPES
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8004-1827
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca do Instituto de Biologia
Mara Janaina de Oliveira - CRB 8/6972
A minha orientadora Profa. Dra. Wilma De Grava Kempinas, pelas inúmeras oportunidades,
confiança, aprendizado e inspiração. A senhora é a principal responsável pelo meu
crescimento intelectual, profissional e científico nos últimos cinco anos.
A Thamiris, minha melhor amiga e irmã por escolha, por tudo o que vivemos.
Compartilhamos trabalho e vida; você foi rocha nos momentos difíceis e trampolim nos
momentos de felicidade. Gratidão, admiração e amor por você.
A Cibele, pela mão sempre estendida, seja para o trabalho ou para um carinho reconfortante;
pelos anos de convívio fácil e muitos ensinamentos de vida e científicos compartilhados.
Aos demais integrantes do laboratório Reprotox, pela ajuda, torcida e companheirismo não só
nas tarefas diárias, mas também nas conversas sentimentais ou bobas, nos happy hour com
junk food e nas zoeiras incontáveis.
Ao Luiz, por compartilhar seu conhecimento, por me impulsionar para novos desafios e pela
parceria e paciência enquanto eu navegava em mares desconhecidos.
Ao Matheus, meu melhor amigo e encontro genuíno, por acompanhar toda essa jornada com
ouvidos atentos as minhas ideias e inseguranças; pelo incentivo constante e colo receptivo;
pela cumplicidade, compreensão e amor.
Ao José Eduardo, pelas risadas e duetos musicais sertanejos, além de todo o suporte técnico e
inúmeros salvamentos.
Ao Prof. Dr. Edson Antunes, que abriu as portas de seu laboratório, no qual fui muito bem
recebida.
Aos membros da banca, Dr. Wagner José Fávaro e Dr. André Sampaio Pupo, e Dra. Mary
Anne Heidi Dolder e Dra. Taiza Stumpp, por aceitarem meu convite e contribuírem para o
meu crescimento.
Walt Disney
Resumo
A obesidade é um grave problema de saúde e entre os tratamentos indicados, destaca-se a
farmacoterapia. Diversos medicamentos foram aprovados para este fim, entretanto, alguns
apresentaram sérios riscos, inclusive para o sistema reprodutor, e foram retirados do mercado.
Sabe-se que os receptores serotoninérgicos, como o 5-HT2C, desempenham um papel na função
sexual masculina. A lorcaserina, fármaco agonista seletivo do receptor 5-HT2C, foi liberada
recentemente como medicamento anorexígeno. Na literatura não existem dados sobre seus
efeitos no sistema reprodutor masculino e na ejaculação. Esse trabalho avaliou, em ratos adultos
Wistar, parâmetros reprodutivos, com ênfase sobre a qualidade espermática e mecanismos
ejaculatórios, utilizando a lorcaserina como agonista. O estudo foi desenvolvido em etapas.
Experimento I, piloto, com 4 grupos experimentais: controle (salina) e tratados com 0,5, 1 e 10
mg/Kg de lorcaserina nos ciclos de luz claro ou escuro, por 14 dias; Experimento II, com 4
grupos: tratados com lorcaserina, 10 mg/Kg por 60 dias e 30 mg/Kg por 30 dias, no ciclo claro,
e seus respectivos grupos controle. Experimento III, estudo farmacológico in vivo e in vitro, o
qual investigou os efeitos da lorcaserina na ejaculação. No experimento I não foram observadas
alterações na maioria dos parâmetros, exceto uma diminuição no ganho de peso corpóreo no
grupo tratado com 10 mg/Kg no ciclo claro e uma aceleração no tempo de trânsito dos
espermatozoides na região da cabeça/corpo do epidídimo no mesmo grupo no ciclo escuro. No
Experimento II houve uma diminuição no ganho de peso e no consumo de ração no grupo
exposto à lorcaserina por 30 dias. Este mesmo grupo apresentou diminuição no peso da vesícula
seminal cheia e vazia, bem como diminuição no número de espermatozoides e aceleração do
tempo de trânsito na região de cabeça/corpo do epidídimo. O grupo exposto a 10 mg/Kg
apresentou aumento no peso do fígado, diminuição no número de espermatozoides e aceleração
do tempo de trânsito na região da cauda do epidídimo. Não houveram alterações na morfologia
e contagem espermática nos testículos, bem como nos níveis de gonadotrofinas. Ambas
exposições causaram dano à motilidade espermática e apenas os animais tratados por 60 dias
apresentaram aumento na concentração de testosterona plasmática e intratesticular. No
Experimento III, a lorcaserina não afetou a contratilidade dos órgãos reprodutores in vitro. In
vivo, foi capaz de causar ejaculações completas sem estímulo sensorial no modelo anestesiado
e na avaliação de penile grooming, e melhorou o desempenho de animais sexualmente
experientes na cópula, diminuindo o limiar ejaculatório. Todos os resultados foram prevenidos
pelo antagonista SB 242084, indicando um papel crucial do 5-HT2C na ejaculação. Assim,
concluímos que a exposição de ratos à lorcaserina, além de apresentar efeitos no ganho de peso
e ingestão de ração, causou impacto direto sobre a reprodução, uma vez que sua utilização
esteve associada a facilitação ejaculatória. Esse trabalho contribui para a caracterização dos
efeitos da lorcaserina no sistema reprodutor masculino, para avanços na compreensão da
neurofisiologia e farmacologia da ejaculação, bem como fornece uma nova perspectiva de
tratamento para homens com ejaculação retardada.
Abstract
Obesity is a serious health problem and among the indicated treatments, pharmacotherapy
stands out. Several drugs were approved for this purpose, however, some presented serious
risks, including for the reproductive system, and were withdrawn from the market. It is known
that serotonergic receptors, such as 5-HT2C, play a role in male sexual function. Lorcaserin, a
selective 5-HT2C receptor agonist, has been released recently as an anorectic drug. In the
literature there are no data on its effects on male reproductive system and on ejaculation. This
study evaluated, in adult Wistar rats, reproductive parameters, with emphasis on sperm quality
and ejaculatory mechanisms, using lorcaserin as an agonist. The study was developed in stages.
Experiment I, a pilot, with 4 experimental groups: control (saline) and treated with 0.5, 1 and
10 mg/Kg lorcaserin in light or dark light cycles for 14 days; Experiment II, with 4 groups:
treated with lorcaserin, 10 mg/Kg for 60 days and 30 mg/Kg for 30 days, in the light cycle, and
their respective control groups. Experiment III, a pharmacological study in vivo and in vitro,
which investigated the effects of lorcaserin on ejaculation. In experiment I, no changes were
observed in most of the parameters except a decrease in body weight gain in 10 mg/Kg group
in light cycle and an acceleration in the transit time of spermatozoa in the caput/corpus region
of the epididymis in the same group in dark cycle. In experiment II, there was a decrease in
weight gain and food intake in the group exposed to lorcaserin for 30 days. This same group
showed a decrease in seminal gland weight, as well as a decrease in the number of spermatozoa
and acceleration of transit time in the caput/corpus region of the epididymis. The group exposed
to 10 mg/Kg had an increase in liver weight, a decrease in the number of spermatozoa and an
acceleration of transit time in the cauda region of the epididymis. No changes were observed in
morphology and sperm count in the testes, such as gonadotrophin levels. Both exposures caused
damage to sperm motility and only animals treated for 60 days showed an increase in plasma
and intratesticular testosterone concentration. In experiment III, lorcaserin did not affect the
contractility of the reproductive organs in vitro. In vivo, it was able to cause complete
ejaculations without sensory stimulation in the anesthetized model and in the evaluation of
penile grooming, and improved the performance of sexually experienced animals in copulation,
reducing the ejaculatory threshold. All results were reversed in the presence of SB 242084
antagonist, indicating a crucial role of 5-HT2C on ejaculation. Thus, we conclude that the
exposure of rats to lorcaserin, besides having effects on weight gain and food intake, had a
direct impact on reproduction, since its use may be associated with ejaculatory facilitation. This
study contributes to the characterization of the effects of lorcaserin in male reproductive system,
for advances in the understanding of neurophysiology and pharmacology of ejaculation, as well
as provides a new perspective of treatment for men with delayed ejaculation.
Sumário
Introdução ................................................................................................................................. 14
1. Sistema Reprodutor Masculino ........................................................................................ 14
1.1 Ejaculação ................................................................................................................... 18
2. Anorexígenos .................................................................................................................... 21
3. Lorcaserina....................................................................................................................... 22
Justificativa ............................................................................................................................... 25
Objetivos................................................................................................................................... 26
Materiais e Métodos ................................................................................................................. 27
Resultados................................................................................................................................. 39
Experimento I – piloto .......................................................................................................... 39
Experimento II ...................................................................................................................... 51
Experimento III ..................................................................................................................... 58
Experimento III.1 – Experimentos funcionais de contração in vitro ................................ 58
Experimento III.2 – Ejaculação em modelo experimental anestesiado ............................ 64
Experimento III.3 – Ejaculação em ratos não anestesiados e sexualmente inexperientes 66
Experimento III.4 – Ejaculação in copula de ratos sexualmente experientes ................... 68
Discussão .................................................................................................................................. 71
Conclusão ................................................................................................................................. 77
Referências ............................................................................................................................... 78
Apêndices ................................................................................................................................. 86
Anexos ...................................................................................................................................... 88
14
Introdução
1. Sistema Reprodutor Masculino
O sistema reprodutor masculino (Figura 1) é responsável pela produção, emissão e
direcionamento do sêmen, além da produção de esteroides. Nos mamíferos, ele é composto
pelas gônadas (testículos), vias espermáticas e as glândulas anexas (Dangelo & Fattini, 2011).
Há alguns anos, o estudo do impacto de compostos químicos nesse sistema tornou-
se uma importante ferramenta para compreender o fenômeno de infertilidade masculina
evidenciado, especialmente, pela diminuição da qualidade espermática ao longo das últimas
décadas. Embora por vezes existam dificuldades na translação de resultados, as investigações
em modelos experimentais animais contribuem significativamente para o entendimento dos
processos envolvidos neste fenômeno (Creasy, 1997).
Os testículos (Figura 3), órgãos localizados no escroto, são revestidos por uma
membrana fibrosa - a túnica albugínea - e divididos em duas regiões: tubular e intersticial
(Johnson et al., 2015). É no interstício, composto também por vasos sanguíneos e linfáticos e
macrófagos, que as células de Leydig produzem testosterona, o principal hormônio masculino
(Junqueira & Carneiro, 2017; Russel et al., 1990). A testosterona é responsável não só pelas
características sexuais secundárias, como aparecimento de pelos e mudanças na voz, mas
também por arquitetar a espermatogênese. A região tubular é formada por túbulos seminíferos
contorcidos, onde ocorrerá a espermatogênese. Estes túbulos são envoltos por uma lâmina
basal, tecido conjuntivo e células mioides ou peritubulares, que participam no processo contrátil
lento e rítmico dos túbulos seminíferos, auxiliando na movimentação dos espermatozoides e do
fluido testicular. Internamente, estes túbulos são formados pelo epitélio germinativo que
contém as células de Sertoli e células germinativas (Junqueira & Carneiro, 2017; Russel et al.,
1990).
16
diretamente na porção prostática da uretra através dos dúctulos prostáticos. Além de auxiliar na
viabilidade espermática, o conteúdo prostático dissolve o plug ejaculatório produzido pelos
fluidos da vesícula seminal, tornando o sêmen liquefeito por um período mais longo (Guyton,
2011; Johnson, 2001).
1.1 Ejaculação
Em homens, o ciclo sexual é divido em várias fases: surgimento da libido, ereção,
excitação sexual, emissão, expulsão e orgasmo (Motofei, 2007). Em ratos, o comportamento
sexual do macho também pode ser descrito em etapas. Na fase de iniciação, o rato examina o
ambiente a fim de determinar se este está seguro e se há uma fêmea receptiva, na fase de estro
do ciclo estral. Durante a fase pré-copulatória, o animal exibe comportamentos exploratórios,
especialmente aproximando-se, seguindo e cheirando a fêmea. A ocorrência de uma monta
marca a transição da fase pré-copulatória para a fase copulatória. Neste estágio, uma série de
sucessivas montas e intromissões (seguidas por autoestimulação genital), conduz, geralmente,
à ejaculação (Veening & Coolen, 2014).
Na ejaculação, os sistemas nervosos somático e autônomo atuam em conjunto
causando emissão seminal, a secreção das glândulas acessórias, e a expulsão, projeção forçada
do esperma através de contrações rítmicas dos músculos estriados perineais, especialmente o
músculo bulboesponjoso, associada a contração do colo da bexiga que impede o refluxo do
sêmen (Giuliano, 2011).
Portanto, a ocorrência de uma ejaculação é resultado de uma complexa resposta
fisiológica, a qual é regulada pelo gerador espinal da ejaculação (GEE) localizado na medula
espinal lombossacral e formado, em parte, por uma população de interneurônios na região
central cinzenta dos níveis lombares L3-5. Este gerador recebe as informações sensoriais, que
podem envolver estímulos somatossensoriais, viscerais, proprioceptivos, relacionados à
temperatura e/ou nocivos, e coordena os mecanismos viscerais e somatomotores que culminam
na ejaculação. A maioria dos estímulos sensoriais ocorrem via nervo pudendo e nervo dorsal
do pênis (NDP). Por sua vez, o GEE está sob controle de influências supraespinais, tanto
inibitórias quanto facilitatórias, originadas de áreas do tronco encefálico, mesencéfalo e
hipotalâmica (Figura 4) (Veening & Coolen, 2014).
Os órgãos viscerais envolvidos na ejaculação recebem tanto inervação simpática,
quanto parassimpática. Os corpos celulares dos neurônios pré-ganglionares simpáticos que
inervam a pelve estão localizados na coluna de células intermédiolaterais e no núcleo central
19
dorsal (NCD) dos segmentos lombar e torácico inferior (T13-L2, em roedores). Os neurônios
pré-ganglionares parassimpáticos localizam-se na coluna de células intermédiolaterais dos
segmentos sacrais superiores, denominados núcleos parassimpáticos sacrais (NPS). A ativação
de ambos os nervos simpáticos e parassimpáticos estão associados a emissão seminal (Veening
& Coolen, 2014).
Os eferentes motores, especialmente os motoneurônios pudendais localizados na
medula espinal lombossacral, também estão envolvidos no reflexo ejaculatório. Estes são
responsáveis por inervar os músculos perineais estriados, incluindo os músculos
isquiocavernoso e bulbocavernoso e os esfíncteres externo uretral e anal, e a contração rítmica
desses músculos causa a expulsão do sêmen (Veening & Coolen, 2014).
2. Anorexígenos
A obesidade, quinto mais comum fator de risco para morte, é um grave problema
de saúde pública que consiste em um acúmulo anormal de gordura consequência de um
desequilíbrio no balanço energético. Esta condição médica complexa deixou de atingir apenas
países desenvolvidos, tornando-se uma epidemia global, e tem acometido um maior número de
pessoas em todo o mundo a cada ano (Kakkar & Dahiya, 2015; Patel, 2015; Tan et al., 2005).
Antes associada apenas à adultos, essa doença já apresenta impacto em crianças e adolescentes
e estima-se que em 2050 mais da metade da população de homens e mulheres e 25% das
crianças serão obesas (Nooijen et al., 2016; Kumar & Kelly, 2017; Kakkar & Dahiya, 2015).
Acredita-se que os principais fatores para o desenvolvimento rápido e exacerbado
dessa condição sejam a urbanização e o crescimento econômico, os quais levaram a uma
mudança no estilo de vida humano, que incluem diminuição da atividade física e dietas
hipercalóricas (Kakkar & Dahiya, 2015), e a predisposição genética (Kumar & Kelly, 2017;
Garaulet et al., 2010; Narayanaswami & Dwoskin, 2017).
Além de causar impactos econômicos e sociais, a obesidade está relacionada a
síndrome metabólica e aumento da ocorrência de importantes enfermidades como diabetes,
doenças cardiovasculares, acidente vascular encefálico (AVC), hipertensão, dislipidemias e
câncer (Kakkar & Dahiya, 2015; Patel, 2015; Câmara et al., 2017; Tan et al., 2005; Christopher
et al., 2016).
A perda de peso é determinante no combate aos efeitos da obesidade. A primeira
opção de tratamento para o excesso de gordura é a mudança do estilo de vida, que consiste em
uma conciliação entre dieta, atividade física e mudanças de comportamento. Embora seja mais
saudável e capaz de prevenir além de tratar a doença, este método esbarra no comprometimento
dos pacientes. Para aqueles que desejam resultado imediato, a cirurgia bariátrica aparenta uma
oportunidade, pois é eficiente na perda de peso e capaz de eliminar os riscos importantes
associados ao acúmulo de gordura, como diabetes e doenças cardiovasculares.
Entretanto, este é um método invasivo, caro, com altos riscos e indicado apenas para pacientes
22
com obesidade extrema e que não reagiram a outros tratamentos, como a mudança de estilo de
vida (Patel, 2015; Kakkar & Dahiya, 2015; Narayanaswami & Dwoskin, 2017).
Diante das limitações das opções relatadas acima, a farmacoterapia mostrou-se uma
alternativa para auxiliar na perda de peso e diversos medicamentos foram aprovados nas últimas
décadas para esta finalidade. Esses fármacos, em sua maioria de ação neural em vias de
regulação do balanço energético, podem ser indicados para tratamentos de curta e longa
duração. Contudo, após um período de utilização, algumas dessas drogas apresentaram graves
riscos e foram retiradas do mercado (Patel, 2015; Kakkar & Dahiya, 2015; Narayanaswami &
Dwoskin, 2017; Christopher et al., 2016).
A sibutramina, por exemplo, é um fármaco anti-obesidade que inibe a recaptura
neuronal de serotonina e noradrenalina (Padwal & Majumdar, 2007), neurotransmissores
relacionados com a modulação do apetite. Dessa forma, seu mecanismo de ação causa a perda
de peso aumentando a saciedade e a termogênese (Choi et al., 2011). Contudo, esse
medicamento teve sua comercialização proibida em diversos países da Europa e nos Estados
Unidos após constatarem um aumento no risco cardiovascular (Choi et al., 2011; Bellentani et
al., 2011). Além de causar impacto no sistema cardiovascular, a sibutramina apresentou efeitos
no sistema reprodutor masculino. A administração de sibutramina gerou diminuição do peso de
órgãos como epidídimo, próstata e vesícula seminal, diminuição do número de espermatozoides
e tempo de trânsito espermático na cauda do epidídimo, diminuição da fertilidade e da qualidade
espermática e aumento da contratilidade do epidídimo (Bellentani et al., 2011; Borges et al.,
2013).
Outro medicamento proibido após graves efeitos adversos é a fenfluramina. Sua
eficácia está relacionada ao aumento da concentração de serotonina nas sinapses cerebrais
através de diferentes mecanismos: aumentando a liberação deste neurotransmissor pelos
terminais pré-sinápticos, inibindo sua recaptação e também aumentando a transmissão
serotoninérgica, estimulando diretamente os receptores 5-HT2. Entretanto, seu agonismo no
receptor 5-HT2B foi o responsável por causar disfunção valvular em indivíduos que fizeram uso
contínuo da droga em combinação com a fentermina (Wurtman & Wurtman, 2018; Khorrasani
et al., 2015; Halpern & Halpern, 2015).
3. Lorcaserina
A fim de ampliar as alternativas farmacológicas frente a urgente necessidade de
novos medicamentos para controle da obesidade - especialmente após a extensa proibição de
23
Visto que a lorcaserina exerce baixa atividade nos receptores 5-HT2A e 5-HT2B,
relacionados a alucinações e efeitos cardiovasculares, respectivamente, este fármaco oferece
menos riscos quando comparado aos agonistas de serotonina não seletivos aprovados
anteriormente. Portanto, o Belviq® é eficaz contra a obesidade e mais seguro (Kakkar &
Dahiya, 2015; Christopher et al., 2016; Weissman et al., 2017).
Diante de sua recente aprovação e estudos que demonstram sua segurança e eficácia
(Christopher et al., 2016; Greenway et al., 2016) relacionados a sua aplicação anti-obesidade,
a lorcaserina tem sido alvo de novos estudos investigando outras ações como controle de fumo
(Shanahan et al. 2016) e consumo de cocaína (Banks & Negus, 2017; Gerak et al., 2016). Abdel-
Latif e colaboradores (2017) constataram que o tratamento com lorcaserina em ratas fêmeas em
diferentes doses (5, 10 e 30 mg/Kg) por 28 dias causou alterações no ciclo estral, na histologia
24
ovariana e uterina e nos níveis hormonais. Entretanto, são inexistentes os relatos do impacto
deste fármaco no sistema reprodutor masculino e de sua ação sobre a ejaculação.
25
Justificativa
A alarmante prevalência do excesso de gordura na população mundial e sua
associação com doenças graves, estimulou a liberação e uso extensivo de inúmeros
medicamentos como método de controle da obesidade. Entretanto, a maioria destes fármacos,
principalmente de ação neural, promoveram preocupantes efeitos adversos, inclusive alterações
no sistema reprodutor, impactando a fertilidade masculina. A recente liberação da lorcaserina
está acompanhada da esperança de que seu mecanismo de ação seletivo no receptor 5-HT2C não
esteja associado a importantes efeitos colaterais. Contudo, é interessante ressaltar a contribuição
deste receptor para o processo ejaculatório. Diante da relevância do combate a obesidade e dos
danos que outras drogas, inclusive de influência serotoninérgica, causaram no sistema
reprodutor masculino, justifica-se a realização de um estudo experimental, em ratos, sobre o
impacto do tratamento da lorcarserina em parâmetros reprodutivos masculinos. Além disso,
investigar o papel do receptor 5-HT2C na ejaculação, por meio da lorcaserina.
26
Objetivos
Este estudo teve como objetivo avaliar as possíveis alterações em parâmetros
reprodutivos de ratos adultos Wistar, causadas pelo tratamento em diferentes doses e períodos
com a lorcaserina. Além disso, analisar o papel do receptor 5-HT2C na ejaculação, utilizando a
lorcaserina como agonista.
Objetivos específicos:
- Investigar os efeitos da lorcaserina sobre o peso corpóreo e o consumo de ração
dos animais durante o período de tratamento;
- Investigar os possíveis efeitos tóxicos da lorcaserina sobre o sistema reprodutor
masculino, com ênfase na espermatogênese e qualidade espermática;
- Investigar os efeitos da lorcaserina sobre a contratilidade de órgãos reprodutores;
- Investigar a função do receptor 5-HT2C em diferentes modelos experimentais para
ejaculação.
27
Materiais e Métodos
Animais
Experimentos I e II
Ratos adultos (90 dias de idade, pesando aproximadamente 300g) e fêmeas adultas
(60 dias de idade, pesando aproximadamente 200g) da linhagem Wistar, provenientes do
Biotério Central da UNESP de Botucatu, foram mantidos no Biotério de Pequenos Mamíferos
do Departamento de Morfologia do Instituto de Biociências da UNESP de Botucatu, em
condições controladas de luminosidade (12 horas de luz/12 horas de escuro) e temperatura
(média de 23ºC). Os animais receberam água à vontade e ração para roedores previamente
pesada.
Os animais utilizados neste experimento foram mantidos de acordo com os
Princípios Éticos em Experimentação Animal, adotados pelo Conselho Nacional de Controle
de Experimentação Animal - CONCEA. O projeto está sob protocolo número 1005 junto à
Comissão de Ética em Experimentação Animal do Instituto de Biociências de Botucatu.
Experimento III
Ratos adultos (90 dias de idade, pesando aproximadamente 300g) e fêmeas adultas
(60 dias de idade, pesando aproximadamente 200g) da linhagem Wistar, provenientes do
Biotério Central da UNICAMP (CEMIB), foram mantidos no Biotério do Departamento de
Farmacologia da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP, em condições controladas de
luminosidade (12 horas de luz/12 horas de escuro) e temperatura (média de 23ºC). Os animais
receberam água e ração para roedores à vontade.
Os animais utilizados neste experimento foram mantidos de acordo com os
Princípios Éticos em Experimentação Animal, adotados pelo Conselho Nacional de Controle
de Experimentação Animal – CONCEA. O projeto está sob protocolo número 4888-1/2018
junto à Comissão de Ética em Experimentação Animal da UNICAMP.
Delineamento Experimental
Experimento I – piloto
28
Experimento II
Os ratos, previamente pesados, foram distribuídos em 4 grupos experimentais (n=6
a 8/grupo), controle e tratado com 10 mg/Kg por 60 dias e controle 2 e tratado com 30 mg/Kg
por 30 dias. O tratamento se iniciou no dia pós-natal (DPN) 90. Os animais do grupo tratado
receberam lorcaserina diariamente, via gavagem, diluída em solução fisiológica (veículo),
enquanto os ratos do grupo controle receberam apenas o veículo. Os animais foram
eutanasiados no DPN 120 ou 150 para as avaliações espermáticas e dosagens hormonais.
Experimento III
Ratos sem nenhum tratamento foram submetidos a protocolos descritos adiante para
análise da reatividade farmacológica in vitro, avaliação da ejaculação em modelo experimental
anestesiado, comportamento sexual, penile grooming e ambulação.
Parâmetros Avaliados
Dosagens Hormonais
Avaliações Espermáticas
31
Motilidade Espermática
Imediatamente após a eutanásia, os espermatozoides foram coletados da cauda
epididimária direita e diluídos em 2mL de meio de cultura HTF modificado com gentamicina
(Spectrun 90126). Uma alíquota de 10 μL foi transferida para a câmara de Mackler e no
microscópio de contraste de fase (aumento de 20x), 100 espermatozoides foram analisados e
classificados em:
Tipo A: espermatozoides móveis progressivos.
Tipo B: espermatozoides móveis não progressivos.
32
Morfologia Espermática
Para avaliação da morfologia espermática, 100 µL da amostra contendo HTF com
espermatozoides dispersos no meio de cultura provenientes da cauda do epidídimo direito
perfurada para liberação dos espermatozoides durante a análise da motilidade espermática, foi
adicionada a solução de formolsalina. As amostras foram mantidas a 4°C até o momento da
análise, quando foram feitos esfregaços em lâminas histológicas e 100 espermatozoides por
animal foram avaliados em microscópio de contraste de fase no aumento de 400X (Seed et al.,
1996).
As anormalidades morfológicas foram classificadas em duas categorias:
anormalidades de cabeça (sem curvatura característica e cabeça isolada) e anormalidades de
cauda (isolada, enrolada, quebrada ou dobrada) (Filler, 1993).
Os espermatozoides também foram classificados quanto à presença ou ausência da
gota citoplasmática.
Ratos Wistar machos adultos (90 dias de idade) foram anestesiados com uretano
(1,5 g/Kg, intraperitonial) e a veia jugular direita e a artéria carótida esquerda foram canuladas
para injeção de drogas e registro da pressão arterial, respectivamente. Os músculos
bulboesponjosos foram expostos através de incisão no escroto e um par de eletrodos de prata
foi inserido no músculo bulboesponjoso ventral lateral direito (BSP) (McKeena & Nadelhaft,
1986) e conectado a um sistema de aquisição PowerLab (ADInstruments) para o registro
eletromiográfico (ganho 1000, freqüência de aquisição 1000Hz, filtro bandpass 5-1000Hz).
Adicionalmente, os órgãos sexuais acessórios masculinos foram expostos através de uma
incisão transversal no abdômen. O DD foi amarrado na intersecção entre a região epididimal e
a cauda do epidídimo e preso com fio de algodão a um transdutor de força sob 15 mN de tensão
para o registro isométrico do desenvolvimento de tensão. A VS esquerda foi canulada com uma
cânula de polietileno preenchida com óleo mineral para o registro das variações de pressão
intraluminal.
Os ratos foram distribuídos nos seguintes grupos: lorcaserina (0,1 mg/kg,
intravenosa), lorcaserina (0,3 mg/kg, intravenosa), lorcaserina (0,6 mg/kg, intravenosa) e
lorcaserina (1,0 mg/kg, intravenosa). Visto que o veículo utilizado para a dissolução de
lorcaserina (NaCl 0.9%, salina) não é capaz de induzir ejaculações neste modelo experimental
(resultados obtidos em nosso laboratório e Kozyrev et al., 2016) um grupo tratado somente com
veículo não foi incluído. Entretanto, para demonstrarmos a ausência de efeito do veículo nos
resultados apresentados a seguir, a atividade da VS, DD e BSP foi registrada após a
administração de salina (0,2 ml, intravenosa) nos ratos dos diferentes grupos de tratamento.
Após o período de 30 minutos de estabilização, ratos dos diferentes grupos
receberam veículo (0,2 ml, intravenosa) e a pressão da VS, tensão do DD e atividade elétrica
do BSP foram registrados continuamente por um período de 30 minutos. Após o período de
observação dos efeitos do veículo, os ratos receberam lorcaserina em uma das diferentes doses
especificadas acima e a atividade da SV, DD e BSP foi registrada por 1 hora (Figura 5).
Comportamento sexual
Ratos Wistar machos adultos (90 dias de idade) foram treinados para o
comportamento sexual durante quatro semanas consecutivas (uma avaliação por semana) e
divididos em três grupos de acordo com o tipo de ejaculação: sluggish (0-1 ejaculação/30min),
normal (2-3 ejaculações/30min) e rápido (4 ou mais ejaculações/30min) (Pattij et al., 2005).
Estes animais sexualmente experientes foram tratados com veículo (NaCl 0,9%, salina,
gavagem), lorcaserina (1, 4 ou 10 mg/Kg, gavagem), SB 242084 (0,3 mg/Kg, intraperitoneal)
ou com tratamento combinado de lorcaserina 4 mg/Kg (gavagem) + SB 242084 0,3 mg/Kg
(intraperitoneal) 30 minutos antes das análises. No grupo lorcaserina + SB 242084 o antagonista
foi administrado 15 minutos antes da lorcaserina. Para a observação do comportamento sexual,
os ratos machos foram colocados em caixas de acrílico transparente, medindo 44x31x16 cm,
15 minutos antes da introdução de uma fêmea adulta ovariectomizada estimulada
hormonalmente. Os animais foram observados no período escuro do ciclo com auxílio de
lâmpada vermelhas. Durante os 30 minutos subsequentes os seguintes parâmetros foram
37
Ovariectomia
Ratas Wistar fêmeas adultas (60 dias) foram anestesiadas com ketamina e xilazina
(70 mg/Kg ket + 15mg/Kg xil, intraperitonial) e ambos ovários foram removidos após incisões
(1,5 – 2,0 cm) laterodorsais bilaterais. O músculo e a pele foram suturados separadamente com
linha de sutura e as ratas foram utilizadas nos experimentos de análise do comportamento
copulatório 15 dias após a cirurgia.
A receptividade sexual foi induzida através da administração subcutânea de
benzoato de estradiol (20 µg/rata) e progesterona (1 mg/rata) dissolvidos em óleo de milho 52h
e 4 h antes dos testes, respectivamente (Agmo, 1996). As ratas foram utilizadas nos diferentes
testes em intervalos de sete dias.
Ratos Wistar machos adultos inexperientes (90 dias de idade) foram tratados com
veículo (NaCl 0,9%, salina, gavagem), lorcaserina (1, 4 ou 10 mg/Kg, gavagem), SB 242084
(0,3 mg/Kg, intraperitoneal) ou com tratamento combinado de lorcaserina 4 mg/Kg (gavagem)
+ SB 242084 0,3 mg/Kg (intraperitoneal) imediatamente antes das análises. No grupo
38
Análise Estatística
Resultados
Experimento I – piloto
O ganho de peso e consumo de ração dos animais do experimento I estão
apresentados nas Figuras 1 e 2, respectivamente. Observa-se que os ratos do grupo exposto à
dose de 10mg/Kg de lorcaserina no ciclo claro apresentaram menor ganho de peso quando
comparado ao grupo controle. Entretanto, não houve diferença estatística no ganho de peso
entre os grupos expostos à lorcaserina no ciclo escuro e no consumo de ração em ambas
exposições.
Figura 1: Ganho de peso dos animais do experimento I, expostos à lorcaserina no ciclo claro
(A) e escuro (B). Valores expressos como média ± EPM. *p<0,05 (ANOVA seguido por teste
de Tukey).
Figura 2: Consumo de ração dos animais do experimento I, expostos à lorcaserina no ciclo claro
(A) e escuro (B). Valores expressos como média ± EPM. (ANOVA seguido por teste de Tukey).
40
Figura 3: Motilidade espermática dos animais do experimento I, expostos à lorcaserina no ciclo claro. Valores expressos como mediana e intervalos
interquartílicos. (Kruskall Wallis seguido por teste de Dunn).
Figura 4: Motilidade espermática dos animais do experimento I, expostos à lorcaserina no ciclo escuro. Valores expressos como mediana e
intervalos interquartílicos. (Kruskall Wallis seguido por teste de Dunn).
46
Figura 5: Dosagens hormonais dos animais do experimento I, expostos à lorcaserina nos ciclos
claro (A) e escuro (B). Valores expressos como média ± EPM. (ANOVA seguido por teste de
Tukey).
Figura 6: Estagiamento dos túbulos seminíferos dos animais do experimento I, expostos à lorcaserina nos ciclos claro (A-D) e escuro (E-H). Estágio
I-VI (A e E), VII-VIII (B e F), IX-XIII (C e G) e XIV (D e H). Valores expressos como mediana e intervalos interquartílicos (Kruskall Wallis
Figura 7: Histopatologia do testículo dos animais do experimento I, expostos à lorcaserina nos ciclos claro (A) e escuro (B). Valores expressos
como mediana e intervalos interquartílicos (Kruskall Wallis seguido por teste de Dunn).
50
Figura 8: Fotomicrografias das principais anormalidades encontradas na histopatologia do testículo dos animais do experimento I, expostos à
lorcaserina nos ciclos claro e escuro. Aumento de 20x. Acidofilia (setas inteiras), degeneração (*) e vacuolização (#). Int = interstício e Ep =
epitélio.
51
Experimento II
Os resultados referentes ao ganho de peso e consumo de ração dos animais do
experimento II estão apresentados nas Figuras 9 e 10, respectivamente. Nota-se que os ratos do
grupo exposto à dose de 30mg/Kg de lorcaserina por 30 dias apresentaram menor ganho de
peso e menor consumo de ração quando comparado ao grupo controle. Entretanto, não houve
diferença estatística nessas análises entre os grupos expostos à lorcaserina por 60 dias.
Figura 9: Ganho de peso dos animais do experimento II, expostos à lorcaserina por 30 (A) e 60
(B) dias. Valores expressos como média ± EPM. *p<0,05 (Teste t de Student).
Figura 10: Consumo de ração dos animais do experimento II, expostos à lorcaserina por 30 (A)
e 60 (B) dias. Valores expressos como média ± EPM. *p<0,05 (Teste t de Student).
Figura 11: Motilidade espermática dos animais do experimento II, expostos à lorcaserina por 30 (A) e 60 (B) dias. Tipo A: espermatozoides móveis
com movimento progressivo. Tipo B: espermatozoides móveis sem movimento progressivo. Tipo C: espermatozoides imóveis. Valores expressos
como mediana e intervalos interquartílicos. *p<0,05 (Teste Mann-Whitney).
56
Figura 12: Dosagens hormonais dos animais do experimento II, expostos à lorcaserina por 30 (A) e 60 (B) dias, respectivamente. Valores expressos
como média ± EPM. *p<0,05 (Teste t de Student).
58
Experimento III
Experimento III.1 – Experimentos funcionais de
contração in vitro
A noradrenalina, serotonina e lorcaserina induziram contrações de maneira
concentração-dependente na CE, DDe, DDp e VS. As curvas concentração-resposta in vitro dos
órgãos reprodutores com noradrenalina, serotonina e lorcaserina dos animais do experimento
III estão apresentados nas Figuras 13a e b e os resultados referentes à potência e Emax destes
agonistas nestes órgãos estão apresentados na Tabela 10. A contração à serotonina, agonista
endógeno de alta eficácia dos receptores serotoninérgicos, representou cerca de 42, 45, 24 e
12% da contração máxima à noradrenalina na CE, DDe, DDp e VS, respectivamente. A
lorcaserina induziu contrações de pequena magnitude (de 8 a 41% da Emax da serotonina, 3 a
17% da Emax da noradrenalina dos diferentes tecidos) com potência e resposta máxima
reduzida em comparação aos outros agonistas.
As curvas concentração-resposta in vitro destes mesmos órgãos com serotonina e
SB 242084 estão na Figura 14 e suas potências e Emax estão na Tabela 11. Nota-se que a
presença do SB 242084, não foi capaz de alterar o perfil de contração promovido pela
serotonina na cauda do epidídimo e na vesícula seminal. Entretanto, no ducto deferente, tanto
na parte epididimal, quanto na parte prostática, a incubação do SB 242084 30nM não reduziu a
potência da serotonina.
59
Figura 13a: Curvas concentração-resposta da CE e DDe com noradrenalina, serotonina e lorcaserina in vitro dos animais do experimento III.
60
Figura 13b: Curvas concentração-resposta do DDp e VS com noradrenalina, serotonina e lorcaserina in vitro dos animais do experimento III.
61
CE DDe DDp VS
5-HT Emax 5,09 ± 0,62 7,51 ± 0,86 2,27 ± 0,43 1,77 ± 0,39
pD2 6,00 ± 0,27 5,66 ± 0,23 6,70 ± 0,53 7,49 ± 0,90
CE DDe DDp VS
Lorcaserina Emax 0,65 ± 0,14 0,90 ± 0,17 1,63 ± 0,35 0,64 ± 0,13
pD2 6,13 ± 0,80 4,03 ± 0,35 3,90 ± 0,32 5,39 ± 0,83
Valores expressos como média ± EPM.
CE DDe DDp VS
5-HT + SB 242084 3nM Emax NA 43,45 ± 2,16 8,30 ± 1,43 NA
pD2 NA 6,40 ± 0,15 5,76 ± 0,41 NA
CE DDe DDp VS
5-HT + SB 242084 30nM Emax 77,22 ± 4,69 50,11 ± 9,46 9,51 ± 1,36 15,72 ± 1,67
pD2 6,02 ± 0,16 5,70 ± 0,46 5,54 ± 0,30 5,03 ± 0,17
Valores expressos como média ± EPM. NA: Não avaliado.
62
Figura 14: Curvas concentração-resposta dos órgãos reprodutores com serotonina na presença
do SB 242084.
Figura 15: Curvas concentração-resposta da CE, DDe, DDp e VS para determinar a resposta a estímulo de campo elétrico in vitro dos animais do
experimento III.
64
Figura 16: Fotos dos registros da atividade da VS, DD e BSP dos animais do experimento III, no modelo anestesiado, e do sêmen e plug seminal
coletados após ejaculação (G). Setas inteiras indicam ejaculação; cabeças de seta indicam a administração de lorcaserina; circunferência indica a
administração do SB 242084; *: emissão seminal; # expulsão.
66
Figura 17: Número de ejaculações (A) e latência até a primeira ejaculação (B) dos animais do
experimento III, no modelo anestesiado. Valores expressos como média ± EPM (ANOVA
seguido por teste de Tukey) *p<0,05.
Figura 18: Penile grooming (A e B) e ambulação (C) dos animais do experimento III. Valores expressos como média ± EPM (ANOVA seguido
por teste de Tukey) *p<0,05.
68
Figura 19: Ambulação dos animais sexualmente experientes do experimento III. Valores
expressos como média ± EPM (ANOVA seguido por teste de Tukey) *p<0,05.
SEGUNDA EJACULAÇÃO
Lorcaserina (mg/kg)
Veículo 1,0 4,0 10 SB& Lor 4,0+ SB@
LMI (s) 235,8 ± 13,2 275,5 ± 10,0 289,9 ± 17,0 275,6 ± 13,9 235,8 ± 14,3 274,8 ± 11,2
NI (s) 5,4 ± 0,3 4,3 ± 0,5 3,3 ± 0,4* 3,6 ± 0,5* 5,1 ± 0,7 5,4 ± 0,2
LE (s) 223,9 ± 51,1 320,1 ± 84,6 249,0 ± 52,7 192,7 ± 47,1 233,7 ± 44,0 142,0 ± 28,5
LMI: latência para a primeira monta ou intromissão; NI: número de intromissões necessárias para a primeira/segunda
ejaculação; LE: latência até a ejaculação.
& SB 242084 0,3 mg/kg; @Lorcaserina 4,0 mg/kg + SB 242084 0,3 mg/kg.
Valores expressos como média ± EPM de 10-15 animais/grupo. *p<0.05 (ANOVA+Newman-Keuls versus grupo Veículo).
71
Discussão
A obesidade, um dos principais fatores de risco para morte, apresenta um
crescimento alarmante em sua frequência a cada ano e atinge todas as faixas etárias,
independentemente do país de origem. Essa doença possui grave impacto econômico e social,
além de estar relacionada a outras importantes enfermidades, como câncer e doenças
cardiovasculares. (Kakkar & Dahiya, 2015; Patel, 2015; Nooijen et al., 2016; Kumar & Kelly,
2017)
Diante desse cenário e da ineficácia de outros tratamentos como a mudança de
hábitos e cirurgia bariátrica, diversos medicamentos anorexígenos de ação neural foram
aprovados nas últimas décadas a fim de conter o avanço e consequências da obesidade. (Kakkar
& Dahiya, 2015; Patel, 2015; Christopher et al., 2016). Contudo, vários apresentaram uma série
de graves efeitos adversos, inclusive no sistema reprodutor, e alguns tiveram sua
comercialização proibida. (Nojimoto et al., 2009; Bellentani et al., 2011; Borges et al., 2013;
Vieira et al., 2013; Ramos et al., 2016; Santos et al., 2016; Ayala et al., 2018)
Frente a urgente necessidade de novos medicamentos para controle da obesidade, a
lorcaserina, um fármaco agonista do 5-HT2C, foi liberada recentemente. Devido a sua
seletividade, a indústria farmacêutica reforça seu potencial na perda de peso e destaca que os
danos, comparados aos dos fármacos não-seletivos utilizados anteriormente, são menores.
(Kakkar & Dahiya, 2015; Patel, 2015; Christopher et al., 2016; Greenway et al., 2016;
Weissman et al., 2017). Dessa forma, são necessários estudos para investigar os efeitos adversos
dessa droga, especialmente no sistema reprodutor.
Visto que a literatura não apresentava nenhum trabalho relacionado com o tema, foi
realizado um projeto piloto para estudo de dose/resposta da droga, no qual os animais foram
expostos à lorcaserina por 14 dias em diferentes fases do fotoperíodo. Esta decisão foi tomada
a partir da descrição de Jackson e colaboradores (1997) de que a maior parte da ingestão
alimentar dos animais ocorre durante o período escuro.
Os animais tratados com a maior dose, de 10 mg/Kg/dia, apresentaram uma
diminuição no ganho de peso corpóreo no ciclo claro. Por outro lado, no ciclo escuro, houve
uma aceleração no tempo de trânsito dos espermatozoides na região da cabeça/corpo do
epidídimo. Embora várias análises tenham sido realizadas com estes animais e o material
72
coletado, acreditamos que a ausência de efeito, benéfico ou prejudicial, justifica-se pelas baixas
doses de tratamento e curto período de exposição à lorcaserina.
Diante dos resultados mais expressivos no ciclo claro, especialmente relacionados
ao peso corpóreo, e da farmacocinética do medicamento, o qual possui meia vida plasmática de
11 horas e pode ser administrado independentemente dos alimentos, (Christopher et al., 2016),
optamos por realizar o experimento no ciclo claro. Além disso, resultados publicados por
Abdel-Latif e colaboradores (2017) que demonstraram que o tratamento com lorcaserina em
ratas fêmeas em diferentes doses (5, 10 e 30 mg/Kg) causou alterações no ciclo estral, na
histologia ovariana e uterina e nos níveis hormonais, auxiliaram na determinação das doses que
foram utilizadas no experimento. Portanto, o delineamento experimental envolveu uma
exposição aguda de 30 dias à uma alta dose do fármaco (30 mg/Kg), e uma exposição crônica,
de 60 dias, abrangendo toda a espermatogênese, à uma dose baixa efetiva do fármaco.
Nossos resultados demonstraram que o tratamento com lorcaserina por 30 dias
promoveu diminuição do ganho de peso corpóreo e também a redução do consumo de ração.
Tais efeitos estão possivelmente relacionados à ação anorexígena do fármaco, que atua
regulando o balanço energético e a saciedade. (Patel, 2015; Christopher et al., 2016). Entretanto,
não houve diferença significativa nesses parâmetros no tratamento crônico por 60 dias. Abdel-
Latif e colaboradores (2017) também não observaram diferença entre os grupos controle e
tratado com diferentes doses de lorcaserina na variação percentual do peso corporal. Esse
bloqueio na perda de peso pode estar associado à dessensibilização do receptor 5-HT2c. Os
receptores serotoninérgicos são acoplados à proteína G e a dessensibilização atua como um
importante mecanismo celular que modula o funcionamento destes. Ou seja, apesar da presença
contínua do agonista, a intensidade da resposta celular diminui com o tempo. (Cheng et al.
2016; Gergs et al., 2017)
Sabe-se que um importante indicativo de efeito tóxico no sistema reprodutor é a
alteração do peso dos órgãos reprodutores. (Clegg et al., 2001). Os animais tratados com 30
mg/Kg de lorcaserina apresentaram diminuição do peso absoluto e relativo da vesícula seminal
cheia e vazia. Essas observações estão possivelmente relacionadas à ação do receptor 5-HT2c
na ejaculação, uma vez que a vesícula seminal é uma das principais responsáveis pela produção
da parte líquida do sêmen. (Stafford et al., 2006; Yonezawa et al., 2008; Kierszenbaum, 2016).
A ativação desses receptores pelo medicamento aumentou o número de emissões seminais e/ou
ejaculações e pode ter impactado drasticamente a atividade desse órgão, causando a
modificação em seu peso. É importante ressaltar que as emissões seminais estão envolvidas não
só no comportamento sexual, mas também no penile grooming, que acontece na ausência da
73
fêmea. Neste mesmo grupo também foi possível observar um aumento no peso relativo do rim
e da adrenal. Tais resultados indicam que, mesmo com a diminuição do peso corpóreo, esses
órgãos mantiveram-se intactos e em funcionamento adequado. Em contrapartida, o grupo
tratado com 10 mg/Kg de lorcaserina apresentou aumento no peso absoluto e relativo do fígado,
órgão responsável pela metabolização do fármaco, (Christopher et al., 2016), indicando uma
possível toxicidade. Neste mesmo grupo, o peso relativo da adrenal evidenciou uma diminuição
mascarada pelo peso corpóreo no peso absoluto desse órgão.
O estudo de parâmetros espermáticos, como motilidade, morfologia e contagem
fornece informações sobre a toxicidade de um composto químico sobre o sistema reprodutor,
bem como sobre a fertilidade. (Seed et al., 1996). A exposição aguda e crônica à lorcaserina
não provocou alterações na morfologia e contagem espermática no testículo. Entretanto, ambas
exposições causaram danos à motilidade espermática e alterações na contagem espermática no
epidídimo. O aumento da porcentagem de espermatozoides imóveis e móveis com movimento
não-progressivo e diminuição de espermatozoides móveis com movimento progressivo
evidenciam um transtorno durante o processo de maturação espermática que ocorre durante a
passagem dos espermatozoides pelo epidídimo. O número de espermatozoides absoluto e
relativo diminuídos na região de cabeça/corpo no tratamento de 30 dias e região da cauda na
exposição de 60 dias também indicam que a função de estoque foi prejudicada. Visto que houve
uma aceleração do trânsito espermático na região de cabeça/corpo no tratamento de 30 dias e
região da cauda na exposição de 60 dias, podemos inferir que os gametas masculinos não
tiveram tempo suficiente no órgão para adquirir suas características férteis, impactando a
motilidade, bem como para configurar uma reserva espermática.
As gonadotrofinas são hormônios produzidos pela hipófise anterior que atuam nas
gônadas e possuem função essencial na reprodução, especialmente na gametogênese e produção
de hormônios esteroides. (Gilbert et al., 2018). A testosterona, que é fundamental para
espermatogênese, é um hormônio esteroide produzido pelas células de Leydig no testículo e
sua produção é regulada pelo hormônio folículo estimulante (FSH) e hormônio luteinizante
(LH). Um dos mecanismos de controle da síntese e liberação de testosterona é realizado pelo
LH, através da indução da liberação de 5-HT das células de Leydig por meio de uma via
dependente de AMPc, que promove a secreção do fator liberador de corticotropina, o qual inibe
a produção de andrógenos nas células de Leydig. (Jiménez-Trejo et al., 2012). Alterações nos
níveis de secreção desses hormônios estão relacionadas à danos no sistema reprodutor
masculino e fertilidade. (Yu et al., 2018). Neste protocolo experimental o tratamento com
lorcaserina em ambas exposições não impactou a secreção de FSH e LH. Contudo, na exposição
74
Estes dados contribuem com a hipótese de uma ação pró-ejaculatória dos receptores
5-HT2C na medula espinal lombossacral, sugerindo a existência de uma via excitatória 5-HT
descendente, além da via inibitória massivamente descrita, emergindo como um novo alvo
farmacológico e de estudo para mecanismos ejaculatórios. Ainda, a facilitação da ejaculação
em ratos sluggish, os quais constituem um modelo experimental para ejaculação retardada
(Pattij et al., 2005), fornecem uma nova perspectiva de aplicação da lorcaserina, um fármaco
de uso clínico com segurança comprovada, no tratamento de ejaculação retardada para o qual
não há terapêutica farmacológica efetiva (Gray et al., 2018). Neste contexto, a recente descrição
da estrutura dos 5-HT2C e 5-HT2B fornece ferramentas importantes para a síntese racional de
novos fármacos com melhor seletividade e, possivelmente, maior segurança cardiovascular
(Peng et al., 2018; McCorvy, et al., 2018).
Ademais, é válido destacar que embora os efeitos pró-ejaculatórios da lorcaserina
foram relevantes em todos os modelos experimentais, não há relatos de facilitação da ejaculação
nos ensaios clínicos do fármaco. Isso deve-se, provavelmente, a abordagem inespecífica do
tema nos questionários utilizados.
77
Conclusão
Assim, podemos concluir que a exposição de ratos à lorcaserina, além de apresentar
efeitos no ganho de peso e ingestão de ração, causou impacto direto sobre o comportamento
sexual masculino, uma vez que sua utilização pode estar associada a facilitação ejaculatória. É
válido destacar que essa ação pró-ejaculatória em diferentes modelos experimentais está
intimamente relacionada ao receptor 5-HT2C e pode estar associada aos efeitos negativos deste
medicamento no sistema reprodutor masculino, evidenciados pela diminuição no peso da
vesícula seminal, aceleração no tempo de trânsito espermático no epidídimo e prejuízo no
processo de maturação espermática. Ademais, a ausência de influência sobre a contratilidade
da musculatura lisa dos órgãos reprodutores indica que o mecanismo de ação da lorcaserina na
ejaculação não envolve mecanismos periféricos. Por fim, diante da facilitação ejaculatória e dos
danos à dinâmica espermática promovidos por este fármaco, é importante investigar os efeitos
da lorcaserina na fertilidade masculina. Este trabalho contribui para a caracterização dos efeitos
da lorcaserina no sistema reprodutor masculino, para avanços na compreensão da
neurofisiologia e farmacologia da ejaculação, bem como fornece uma nova perspectiva de
tratamento para homens com ejaculação retardada.
78
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86
Apêndices
87
Figura 1: Evolução do desempenho dos animais durante os treinamentos de aquisição de experiência sexual. LMI: latência para a primeira monta
ou intromissão; NM: número de montas; NI: número de intromissões necessárias para a primeira/segunda ejaculação; LE: latência até a ejaculação;
PR: período refratário.
88
Anexos
89
90