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Dedicatória

Elle Kennedy, eu ficarei sem fazer nada com você. Nunca mais
vamos fazer um passeio de barco.
P.S.: Espero que nossos cães nunca sejam sequestrados. E cenouras
me deixam inchada.
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Aviso de Conteúdo
BULLSEYE é um DARK ROMANCE contendo temas adultos que
podem incomodar alguns leitores. Inclui forte violência, possíveis
gatilhos e algumas cenas obscuras e perturbadoras.
Este é o ponto sem volta porque agora, é hora de você renunciar ao
que sobrou de sua alma...
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Um par de botas de motoqueiro, tamanho quarenta e quatro. Uma


camiseta da Harley Davidson. Um jeans azul rasgado em ambos os
joelhos. Um moletom com capuz preto. Uma carteira de couro contendo
85 dólares. E uma corrente de prata com um medalhão de São Cristóvão.
— Aqui estão duzentos e cinquenta dólares, um mapa e três
camisinhas. Você tem alguém para buscá-lo?
Balançando a cabeça, pego os meus pertences espalhados no
longo balcão de madeira diante de mim.
— O ponto de ônibus mais próximo fica a 800
metros. – ele aponta por cima do ombro.
— Vou à pé. – eu respondo abruptamente, tirando
meu tênis branco e me libertando deste uniforme que tem
sido minha segunda pele há doze longos anos. Não ligo para
que a avó de alguém suspire a um metro de distância quando
ela vê minhas nádegas. Preciso tirar isso... de mim, porra.
— A pé para onde? As coisas mudaram desde que você foi preso.
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As pessoas não são como costumavam ser.
— Eu dou um jeito. – Meu jeans está um pouco largo na cintura, o
que não é surpresa. Você nem alimentaria seu cachorro com a merda que
eu tenho comido aqui. No entanto, a camiseta está apertada no meu peito
e braços. Botas e capuz ainda servem. A corrente é a última coisa que
coloco.
Pederson levanta uma sobrancelha incrédula e encolhe os ombros.
— Não diga que não avisei. Boa sorte, Bull. Você vai precisar.
Aceno com gratidão. Ele era o único guarda neste buraco do inferno
que realmente dava a mínima se eu vivesse ou morresse.
Não me incomodo em dar uma última olhada no local que foi minha
morada há mais de uma década, porque cada canto, cada fenda desse
maldito buraco estará gravada em minha memória enquanto eu viver.
Você não esquece Kinkora Correctional Facility, e com certeza isso não
esquece você. Metade dos criminosos estarão presos dentro de seis
meses após a soltura, porque é mais fácil lidar com a política dentro das
paredes do que a de fora.
As regras internas são fáceis:
1. Não confie em ninguém.
2. Não demonstre emoção.
3. Não seja dedo-duro.
Siga estas três regras simples e você se sairá bem.
O que é completamente estranho para mim e para os
meus companheiros antes de mim são as regras do lado de
fora. Eu quase esqueci as regras da sociedade, porque ao cumprir
pena, você cumpre uma lei completamente diferente. Por dentro, é a
sobrevivência do mais forte e, ao contrário da vida real, a diferença vai 9
custar sua vida.
Pederson pressiona um botão atrás do balcão, me concedendo minha
liberdade. Abro a porta de vidro e caminho em direção aos portões de
aço que se abrem lentamente. Os guardas me observam de perto. Posso
sentir o cheiro do medo deles. Eles não estavam tão atentos quando
fecharam os olhos na noite em que fui esfaqueado na minha cela, graças
a alguns idiotas supremacistas brancos que não gostaram de mim
chamando Hitler de filhinho da mamãe.
Mas isso foi no passado porque, ao contrário dos meus antecessores,
eu me recuso a me tornar uma estatística. Prefiro terminar minha própria
vida a ficar preso em uma cela de seis por oito novamente.
Uma vez que o portão está aberto, dou meus primeiros passos como
um homem livre.
Olhando da esquerda para a direita, vejo que Detroit não mudou
nada. Ainda é um terreno baldio onde os sonhos são destruídos.
Jogo o mapa e as camisinhas na terra e decido ir para o norte. Se
bem me lembro, há um hotel barato a alguns quilômetros de distância. A
estrada deserta representa minha liberdade há tanto tempo, então não
posso deixar de pensar que deveria sentir algo, qualquer coisa, por
estar caminhando por ela. Mas estou morto por dentro e não sinto
nada.
Refere-se a regra número dois da prisão.
Quanto mais longe eu ando, mais as coisas se tornam
isoladas. Tenho trinta anos e não tenho ideia de para onde
estou indo. Não apenas literalmente, mas também
metaforicamente. Não sei fazer nada, nenhum ofício e talentos
especiais. Era apenas um garoto punk que deveria ter estudado mais na
escola. 10
Se eu fosse mais parecido com meu irmão mais velho, Damian, eu
poderia ter sido um maldito astronauta agora. Não culpo meus pais pela
maneira como acabei, porque não foi culpa deles. Era minha. Eu tinha a
cabeça vazia e a usava repetidamente como o instrumento do diabo.
Sangue.
Muito sangue.
Engulo a memória que me atormenta toda vez que eu fecho os meus
olhos. Se eu vou sobreviver a isso, preciso aprender a sobreviver com
um olho aberto e outro fechado. É a única maneira de não voltar para
dentro.
A brisa fria me faz colocar o capuz por cima da cabeça raspada,
porque as nuvens negras à frente parecem zangadas. Momentos depois,
o céu se abre e dá um banho de mijo de anjo1 em todo meu corpo.
Acelero o ritmo quando vejo a placa de néon vermelha piscando do
Hudson's Hotel alguns quarteirões à frente.
Mesmo que o nome tenha mudado, ainda é a mesma espelunca
decadente de doze anos atrás. Nenhuma quantidade de tinta pode
retocar este buraco. Mas esta merda será minha casa até que eu possa
colocar meu plano em ação.
Então, lar, doce lar.
O sino acima da porta soa mal quando empurro a
madeira, feliz por entrar e sair desse clima bíblico. Atrás
do balcão branco da recepção está uma mulher de meia-
idade folheando uma revista enquanto fuma um charuto fino.

1 Mijo de anjo: é uma metáfora para a chuva.


Seus olhos azuis se erguem e encontram os meus. — Ei, querido.
Você está todo molhado. Você caminhou até aqui na chuva? 11
Assentindo, tiro o capuz da cabeça e passo a mão nos curtos cabelos
escuros do crânio.
Colocando a mão no bolso de trás, tiro uma nota de cem dólares. A
tatuagem de um crânio nas costas da minha mão chama sua atenção. —
Quantas noites posso ficar aqui com isso?
Suas unhas vermelhas são como garras enquanto ela puxa o dinheiro
esfarrapado em sua direção. Ela toca a nota e me olha com atenção. —
Você acabou de sair?
Eu aceno mais uma vez.
Ela deve ser capaz de sentir o cheiro de criminoso em mim. — Para
você, querido, isso vai te dar uma semana.
— Obrigado.
— Sem problemas. – ela enfia a mão no decote e tira um cartão de
visita branco amassado. — Se você precisar de alguma coisa, me ligue.
Ela se inclina sobre o balcão, segurando o cartão entre dois dedos.
Aceito e leio o nome.
Venus Bisset - Gerente.
— Eu agradeço. – digo, segurando o cartão.
— Ah, querido. – ela sussurra. — Com os olhos
bonitos como os seus, não hesite em me ligar. Dia ou
noite. – ela pisca os cílios postiços ridiculamente longos,
que parecem lagartas que sofreram mutação em suas
pálpebras.
— Obrigado, Venus.
— Obrigada, você. Eu nunca vi alguém com duas cores de olhos
diferentes antes. É como se o céu e o inferno estivessem lutando a sua 12
própria batalha pessoal, querendo conquistar o outro lado. – ela revela,
parecendo admirada com minha anomalia genética.
Seu olhar move do meu olho esquerdo, que é de um azul brilhante,
para o meu direito, que em qualquer dia pode parecer verde ou âmbar.
Sua atenção volta para a minha esquerda - o azul sempre parece vencer.
— Qual lado está ganhando? – ela pergunta enquanto eu coloco meu
capuz de volta na minha cabeça.
— Pergunte-me na próxima semana.
Ela sorri, lambendo os lábios pintados de vermelho antes de
vasculhar sua gaveta, que contém uma pilha de cartões-chave brancos.
— Vou registrar você. Qual é o seu nome?
Movendo as minhas botas, eu dou a ela o nome pelo qual eu sou
conhecido desde aquela noite. Mas esse nome também pode ser
comparável a quem eu me tornei. — Bullseye. Mas me chame de Bull.
— Não fala muito, não é?
Aceno bruscamente porque ela está certa: eu não preencho a lacuna
com bobagens. Falo apenas quando necessário.
— Vou garantir que você não tenha problemas. Eu não quero
problemas. – ela desliza a chave pela superfície, sem
perguntar sobre meu apelido.
— Nem eu. – Pego o cartão-chave, mas Venus dá um
tapa na minha mão. Minha mão instantaneamente se fecha
em um punho, e todo o meu corpo entra em modo de luta,
mas eu respiro fundo, controlando minha necessidade de
infligir dor.
— A máquina de gelo está ao virar do corredor, e todos os quartos
são para não fumantes. – Ninguém ousaria poluir este estabelecimento 13
honesto.
Ela me solta e sorri. — Aproveite sua estadia. Você está no quarto
quatorze. Se você precisar de mim, você tem meu número.
Instantaneamente, eu puxo minha mão de volta e a abro lentamente.
Venus parece indiferente ao meu comportamento estranho.
Com o cartão-chave em mãos, agradeço a Venus, antes de sair pela
porta. No momento em que estou do lado de fora, respiro fundo duas
vezes para subjugar os demônios que rugem dentro de mim. Ser tocado é
meu limite rígido. Não me toque, e não teremos problemas.
Não gosto que as pessoas fiquem na minha cola. Depois de ficar
dentro de si por tanto tempo, você esquece o toque de outro humano e
aprende a conviver com isso. E, depois de um tempo, comecei a gostar
disso. Gostei da solidão porque o toque conecta você com outra pessoa,
e isso é algo em que não estou interessado.
Recompondo-me, caminho pela passarela de concreto coberta. Meu
quarto é na penúltima porta à esquerda. Passo o cartão sobre o sensor e
espero por um bipe, permitindo-me entrar. Quando abro a porta, o
número quatro do meu quarto range e cai de repente, balançando de
um lado para o outro e pendurado de cabeça para baixo. Sua condição
de abandono revela o que estou fazendo assim que entro.
Sem mais delongas, entro no meu quarto e é
exatamente o que eu esperava - um quarto pequeno e
mobiliado de forma simples com um banheiro privativo.
Fechando e trancando a porta atrás de mim, tiro
minhas botas e ligo o aquecedor na parede. O tapete vermelho
está imundo e as queimaduras de cigarro dão uma dica de que
aqueles antes de mim não davam a mínima para a regra de não fumar.
Cruzo o quarto e entro no banheiro. Ligando a luz fraca, vejo que
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tenho uma combinação de chuveiro/ banheira, uma pia, um espelho e um
vaso sanitário. Alguns artigos de higiene pessoal baratos estão
cuidadosamente organizados no balcão de mármore rachado. Olhando
para o pequeno chuveiro, percebo que vou gostar muito disso. Ser capaz
de tomar um banho quente sem ter que olhar por cima do ombro,
preocupado em ser esfaqueado ou fodido por causa do sabonete, será
bom.
Tirando a roupa, penduro minhas roupas no gancho de prata e viro
para a água quente. O banheiro se enche instantaneamente de vapor. Não
me importando que a temperatura queime minha pele, eu entro sob o
jato, com o frio constante de meus ossos desaparecendo lentamente
enquanto viro meu corpo de um lado para o outro.
Ser privado dos prazeres simples da vida pode parecer injusto, mas
eu mereço. Eu mereço tudo.
Quando penso em como roubei de alguém os luxos simples do dia a
dia, de repente eu me sinto desprezado por esse pequeno fragmento de
felicidade. Não mereço a felicidade. Desisti desse direito quando cometi
o maior erro da minha vida.
Fechando os olhos com força, eu respiro através das memórias
enquanto abro a torneira para esfriar. Apoiando as minhas palmas na
parede de azulejos, deixo cair minha cabeça entre meus
braços abertos. A corrente de prata balança como um
pêndulo em volta do meu pescoço. Rezo para que a água
fria purificar meus pecados, mas nunca o faz. Isso apenas
destaca que não importa se eu estou livre ou atrás das
grades, estarei para sempre escravizado ao passado e ao que
tenho que fazer para alimentar os demônios dentro de mim.
Estarei para sempre preso no dia em que peguei uma arma e atirei
em um homem a sangue frio. No entanto, o único arrependimento que 15
tenho... é ter sido pego.

Graças à minha viagem pela estrada do sofrimento, estou inquieto e


não estou em um bom estado de espírito. Talvez eu pudesse conseguir
um pouco de xoxota para ajudar a me acalmar. Mas não estive com uma
mulher por muito tempo, provavelmente me envergonharia no momento
em que ela se despisse. Eu não estou aqui para isso. Tenho um trabalho a
fazer.
Afundar na minha autopiedade não está me fazendo bem, então
pego meu cartão-chave e coloco no bolso de trás da minha calça jeans
ainda úmida. Notei uma loja Goodwill alguns quarteirões acima. Vou
sair da tristeza e torcer para que esse sentimento de desespero vá
embora.
Não que isso aconteça. Mas talvez hoje seja diferente.
Está escuro e a chuva forte se transformou em uma garoa leve.
Mantendo minha cabeça baixa, eu caminho para a loja, não
interessado em encontrar problemas. Eu estou pensando em ficar
escondido nas sombras, porque não há como eu voltar
para dentro.
Dizem que a prisão muda um homem, e eles estão
certos. Aprendi isso rapidamente quando meu traseiro de
dezoito anos foi jogado na latrina dos depravados e
esperava-se que me defendesse sozinho.
Achei que era um mafioso, e minha boca inteligente iria me ajudar,
mas tudo o que me deu foram três costelas quebradas, dois olhos roxos e 16
um uso diferente para minha boca inteligente. Daquele dia em diante, os
laços com meu passado foram brutalizados e eu não era mais Cody
Bishop. Eu era o Bullseye. Um apelido que ganhei dos homens cruéis
que chamei de meus colegas de quarto quando souberam da minha
história.
Depois disso, o ingênuo aspirante a mafioso se tornou o idiota
insensível que sou hoje. A prisão me ensinou como mentir, trapacear e
roubar. Eu não estava interessado em ser a vadia de ninguém, então me
transformei de um adolescente desengonçado em uma máquina de luta
de quase dois metros e noventa quilos. Malhei quando tínhamos tempo
no pátio e quando fomos conduzidos de volta às nossas celas, fiz o que
pude no meu espaço de seis por oito.
O treinamento me manteve são. E foi a única coisa que me manteve
seguro. Mas não importa o quanto grande você seja, alguém é sempre
maior e pior. E o meu grande mal veio na forma de um neonazista
chamado Snow White. Ele ganhou o seu nome graças às drogas que
traficou antes de ser pego.
Eu, inconscientemente, esfrego a cicatriz de 15 centímetros que vai
do meu rim direito até o baço. Disseram-me que ser esfaqueado
dezessete vezes e sobreviver foi um milagre, mas eu não concordo.
Morrer teria sido a saída mais fácil. Mas sobreviver ao
lado de Snow e bandidos como ele me treinou para me
tornar quem sou hoje. E é alguém com quem você não
brinca.
Abro a porta de vidro da pequena e superlotada loja
Goodwill e vou para a seção de roupas masculinas. Eu não
preciso de muito, então pego o essencial. Depois que a
adolescente entediada registra minha compra, eu pago e, em
seguida, coloco todos os meus pertences na mochila que também
comprei. 17
— Tenha um bom dia. – ela diz roboticamente, embora esteja
escuro como breu lá fora. Detroit faz isso com as pessoas. Em pouco
tempo, todos os dias são iguais, tornando-se um dia longo, cansativo e
monótono.
O interesse da balconista é repentinamente aguçado, no entanto,
quando tiro meu capuz e coloco a jaqueta de couro preta que acabei de
comprar.
Ela não poderia ter muito mais do que dezoito anos, e eu revisito a
ideia de que talvez eu pudesse queimar um pouco de energia arranjando
uma boceta. Mas a ideia cai por terra quando um homem mais velho
entra na loja com os braços cheios de mercadorias. Ele para em seu
caminho quando me vê.
— Brandy, está tudo bem? – Seu olhar move entre nós.
— Sim, pai, está tudo bem. – ela responde, limpando a garganta,
parecendo envergonhada de ser pega olhando.
— Está bem então. – ele passa por mim e acena com a cabeça. —
Você tem tudo que você precisa?
Ele está fazendo um péssimo trabalho em disfarçar seu desgosto
por eu estar perto de sua amada Brandy. Mas não o culpo. Preciso me
acostumar com esses olhares de lado e ser tratado
como o criminoso tatuado que sou.
Colocando rapidamente a mochila no ombro, aceno
uma vez e saio da loja, me sentindo ainda pior do que
quando entrei.
Uma luz rosa cintilante à frente chama a minha atenção.
Se eu acreditasse em Deus, consideraria isso um sinal. Quando
chego ao prédio pintado de preto, olho para cima e vejo que a luz em
movimento indica que há Garotas, Garotas, Garotas dentro. Não há 18
necessidade de adivinhar o que é esse negócio com um nome como The
Pink Oyster2.
A aparência abandonada me dá esperança de que talvez eu encontre
quem estou procurando lá dentro. Parece que meu plano deve ser posto
em prática antes do que eu pretendia. Empurrando a pesada porta preta,
eu entro.
Flashes de cor vermelho e amarelo, e a forte luz estroboscópica
intermitente cruzam a névoa. A bola de discoteca espelhada acima do
palco lança flashes de luz nas paredes pretas. A loira seminua girando
em torno do poste prateado no palco confirma o que pensei ser verdade.
Passo por uma multidão de homens que estão assobiando na frente
do palco, jogando notas de um dólar na garota agora nua. Ela é muito
magra para o meu gosto, então vou até o bar.
— Budweiser. – grito para a bartender para ser ouvido por cima da
música de rock explodindo nos alto-falantes.
Ela acena com a cabeça, e não deixo de notar que ela me observa
com interesse enquanto abre minha garrafa de cerveja. — Dois dólares.
– ela coloca minha garrafa no bar, e dou a ela uma nota de cinco. —
Você é novo por aqui?
Eu aceno e pego minha cerveja.
Olhando ao meu redor, espero ver um rosto
familiar. Eu não vejo.
— Qual o seu nome? – ela pergunta, entregando-me
meu troco.

2The Pink Oyster: basicamente significa “Ostra rosa” e é uma conotação


sexual para boceta rosa.
— Bull. – eu respondo, colocando as notas no pote de gorjetas em
forma de molusco. 19
— Bem, Bull, bem-vindo ao The Pink Oyster. Eu sou a Lotus. Se
precisar de alguma coisa, venha me ver, ok? Sou dona deste excelente
estabelecimento e gostamos que cavalheiros como você sejam clientes
habituais.
— Obrigado. Vou manter isso em mente. – Lotus é uma bela loira
de quarenta e poucos anos. Não consigo ver nada além de bondade por
trás de seus olhos verdes. É um visual que eu não via há muito tempo.
— Você está procurando alguma companhia?
— Companhia? – eu levanto uma sobrancelha enquanto tomo um
longo gole da minha cerveja. Porra, ela tem um gosto bom. Mesmo que
eu não tivesse a idade legal para beber quando fui preso, isso não me
impediu de ficar bêbado quase todas as noites desde...
Afasto as memórias e me concentro na Lotus porque preciso manter
a cabeça fria para fazer isso.
— Sim. Não apenas minhas garotas são dançarinas brilhantes, mas
também companheiras fantásticas.
Lotus vê a minha confusão e sorri. — Não se preocupe. Este é um
negócio legal. Oferecemos algo extra nos quartos VIP. Nada ilegal,
entretanto. Apenas algum tempo extra individual com as garotas.
— Obrigado, mas tenho certeza de que garotas
bonitas como as suas estão fora do meu orçamento.
— Sem problemas. Se mudar de ideia, me avise.
Antes que eu tenha a chance de responder, as luzes já
fracas escurecem e a multidão vai à loucura.
— Vocês sabem que horas são? – diz o apresentador vestido de
cowboy. A multidão grita ansiosamente em resposta. — É a única, a 20
crème de le crème de Detroit... Tigerlily! – ele corre para fora dos
bastidores enquanto a maioria dos homens corre para a grade - os
assentos mais próximos do palco.
Eu me pergunto por que eles estão babando em si mesmos.
Virando em meu banquinho instável, eu me inclino contra o bar e
cruzo os braços, observando com interesse enquanto “Closer” do Nine
Inch Nails começa a tocar nos alto-falantes.
A música mudou muito desde que estive preso, mas essa música eu
conheço. É uma com o qual cresci.
O palco está coberto de preto e a escolha da música aumenta o
mistério. Mas quando vejo a cortina vermelha na parte de trás do palco e
uma esguia morena aparecendo, eu me inclino para frente. As luzes
estroboscópicas distorcem a sua forma, mas pelo que posso ver, estou
interessado.
Ela move seu corpo como uma verdadeira dançarina, em vez de
apenas usar o poste para dar a seus clientes um show enigmático. Esta
garota tem prática porque sabe dançar. Ela está em sincronia com o
ritmo, tornando cada movimento ágil um realce da música.
Seu minúsculo fio dental e a parte de cima do biquíni me
permitem ver seu corpo forte e tonificado.
Quando a música começa o refrão, ela se agarra ao
poste, revelando sua força, enquanto gira em torno dele,
usando apenas as pernas para se manter em pé. Ela escala
esse poste com a força e a velocidade de uma ginasta
olímpica e, quando ela se solta, cai de pé na frente do palco,
agachada.
Quando ela joga o cabelo comprido para trás e focaliza os olhos na
multidão, juro por Deus, o pau de todo cara fica em alerta. Um sorriso 21
malicioso aparece em seus lábios carnudos. Ela está ciente do efeito que
causa nessas ereções ambulantes. Movendo sedutoramente os quadris,
ela se detém lentamente.
Mesmo que eu esteja escondido em um canto escuro no fundo do
lugar, sinto como se ela estivesse olhando diretamente para mim. Mas
um bom artista faz isso - faz você sentir que eles estão atuando apenas
para você.
Tirando a parte de cima do biquíni vermelho brilhante, ela cobre
seus seios volumosos e naturais, apenas removendo as mãos no final da
música. Antes de o palco escurecer, eu tenho um vislumbre de seus
mamilos rosados e empinados. Puta... merda.
Dólares cobrem o palco e Tigerlily discretamente se inclina para
frente e recebe seus ganhos. Eu a vejo evitando sutilmente as mãos
maliciosas dos pervertidos na frente. Ela sorri e ignora seus comentários
grosseiros, mas obviamente a incomoda que ela seja vista como apenas
um rabo de saia.
— Mudou de ideia? – Lotus pergunta, enquanto tomo minha cerveja
de novo, observando Tigerlily.
— Talvez. Quanto? – eu limpo meus lábios com as costas da
mão.
— Ela é demais, lindo. – diz uma voz à minha
esquerda. — Eu também. Mas faria uma exceção para
você.
A loira que estava dançando no palco antes de
Tigerlily fica na minha frente. Ela está usando um vestido
azul curto em decote V que desce muito baixo na frente,
mostrando seus seios falsos. Ela não é feia, de forma alguma, mas
não estou aqui por bocetas, ao contrário de quem me rodeia.
— Olá, sou Tawny. Eu sou a garota número um da Lotus, não sou?
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– ela diz, olhando por cima do meu ombro para Lotus.
Lotus zomba de brincadeira em resposta, enquanto continua a servir
clientes sedentos.
Tawny sorri para mim, sem fazer segredo de que está me avaliando.
— Então, lindo, o que você acha?
— Obrigado, mas... – eu não tenho tempo para terminar a minha
frase, no entanto, porque antes que perceba, Tigerlily entra novamente
no lugar, usando um vestido vermelho que se agarra ao seu corpo bem
torneado como uma segunda pele. Agora que as luzes estão um pouco
mais fortes, posso vê-la melhor. Seu cabelo castanho é longo e
ondulado. Seus saltos monstruosos lhe dão alguma altura, mas sem eles,
ela é baixa.
Tawny se vira para ver o que chamou minha atenção e revira os
olhos. — Esqueça. Ela não quer clientes novos. E, além disso, acho que
ela ficará muito ocupada com Thumper.
Quando vejo a quem ela está se referindo, me pergunto se Thumper
perdeu o caminho para sua fraternidade. Ele está com uma jaqueta do
colégio e parece um universitário rico cuja mãe ainda o chama de
Querido.
Thumper está a cerca de cinco segundos de perder
um dedo porque Tigerlily está tentando se levantar de
seu colo. Seu grupo de minions idiotas está rindo
enquanto ele a agarra, pensando que seu aparente
desconforto é engraçado. Quando ele desliza a mão por
baixo de seu vestido, ela o empurra chocada e lhe dá um tapa
com força. Bom para ela. O cabeça de atum enrubesce e aperta seus
braços ao redor dela. 23
Mesmo que ela consiga lidar com isso, eu me levanto antes que
possa questionar o que diabos estou fazendo. Empurrando Tawny, vou
até o idiota. Já vi sua espécie muitas vezes antes. Mas nunca vi ninguém
como Tigerlily.
No momento em que chego à mesa, agarro seu bíceps e a puxo antes
que Thumper tenha a chance de dizer nada. Ela grita em protesto, mas
não tem escolha quando a empurro para trás. Thumper me encara. Este
cachorro não está feliz por eu ter levado seu brinquedo.
— Com licença. Eu e a Tigerlily estávamos conversando. – Seus
amigos estão em silêncio, esperando qualquer sinal de intervenção.
— Bem, vocês acabaram de conversar. – eu respondo calmamente.
Ele debocha, furioso. — Acabamos quando eu disser que acabamos.
– ele diz, levantando-se abruptamente e chutando a cadeira para trás.
Ele é alguns centímetros mais baixo do que eu, mas tenta compensar
estufando o peito. Eu não posso deixar de rir.
— Você tem mais alguma coisa que quer dizer a ele? – pergunto a
Tigerlily, com meus olhos nunca vacilando de Thumper.
— Não. – ela diz com amarga convicção.
Gosto de como ela não se encolhe de medo. Ela
não teve escrúpulos em dar um tapa em Thumper,
embora eu tenha certeza de que ela não tolera assustar os
clientes. O nome dela assume outro significado, e eu
decido que Tiger3 é um apelido mais adequado para ela.

3 Tiger: significa “tigresa” em inglês.


— Você ouviu a senhorita. – eu provoco. — Vocês acabaram.
— Quem diabos você pensa que é? – ele resmunga, contornando a
24
mesa e chegando perto do meu rosto.
Contanto que ele não me toque, isso não precisa acabar mal... para
ele. — Eu sou alguém que não agarra mulheres. Agora, você tem duas
opções. – eu levanto um dedo. — Um, você pode sentar e aproveitar o
show. – Então levanto outro dedo. — Ou dois, você pode desfrutar de
um passeio na parte de trás de uma ambulância. A escolha é sua.
Suas narinas inflam enquanto ele exala com raiva enquanto aperta a
mandíbula. Ele avalia se pode me enfrentar, mas mantenho minha
posição, nada intimidado por sua fumaça e olhar.
— Foda-se esse lugar! – ele finalmente diz, infantilmente movendo
a mão sobre a mesa e jogando todos os copos e jarras de cerveja no
chão.
Um copo fica de pé, e quando ele vai tirá-lo da mesa, agarro seu
antebraço e aperto com força. Ele olha para minha mão esquerda,
parecendo ler a palavra tatuada em meus dedos. Diz lobo. A mão direita
diz solitário.
— Você toca nesse copo e eu vou quebrá-lo na sua cabeça. –
Minha ameaça não é vazia.
Quando ele percebe que não estou brincando, ele arranca o braço
do meu aperto e me encara. — Vamos, pessoal. Vamos
embora. Este lugar é uma espelunca de qualquer forma.
E a cerveja deles tem gosto de mijo.
Thumper e seus amigos passam por mim, mas
permaneço firme, protegendo Tiger até que o último deles vá
embora.
Respiro fundo, depois me agacho para pegar o copo quebrado. Eu
não tenho ideia do que aconteceu comigo. Lá se vai a ideia de ficar 25
escondido nas sombras. A necessidade de proteger Tiger foi instintiva, e
não sei por quê. O que eu sei é que ela é perigosa e preciso ficar longe.
Doze longos anos de planejamento não serão jogados fora por uma
bela bunda.
No entanto, no momento em que ela se agacha ao meu lado, todos
os pensamentos de ficar longe desapareceram. — Oi. – Sua voz é doce
como algodão doce.
Eu encontro seus grandes olhos verdes e aceno.
— Obrigada pelo que você fez. Thumper é um idiota, mas ele é um
dos meus clientes que gosta de namorar. – Quando levanto uma
sobrancelha, ela esclarece: — Finjo que estou flertando com ele e ele me
dá uma gorjeta generosa. Eu posso cuidar de mim, mas obrigada. As
coisas estavam ficando um pouco fora de controle. – ela lambe os lábios
vermelhos brilhantes e eu imediatamente tenho o desejo de passar meu
polegar em sua boca, borrando seu batom perfeito e deixando-o em uma
bela bagunça.
Eu aceno de novo, não interessado em conversa fiada.
— Eu sou Tigerlily. Lily. – ela emenda rapidamente, estendendo
sua pequena mão.
Olhando para baixo, eu não a sacudo. — Bull.
Ela parece envergonhada e rapidamente puxa a mão
de volta.
— Levante-se daí. – Lotus exige, com as mãos nos
quadris enquanto fica de pé ao lado da mesa. Ela tem todo o
direito de estar irritada comigo por expulsar os seus clientes.
Obviamente, eu interpretei mal a situação. Thumper queria a
experiência de namorar, o que significa que ele queria que Tiger desse
cabo dele? Há muito de errado com essa imagem. 26
Com as mãos cheias de vidros quebrados, fico de pé e coloco os
cacos na mesa. Tiger também fica de pé.
— Desculpa. Eu vou embora. – digo para Lotus, enquanto ela me
observa de perto.
Ela levanta uma sobrancelha fina. — Você tem um lugar para estar?
— Não, mas achei que você gostaria que eu fosse embora. Acabou
de perder seu cliente pagante. – eu explico sem rodeios.
Quando ela balança a cabeça, me pergunto o que está acontecendo.
— Você acabou de fazer o que meu melhor segurança, Andre, deveria
ter feito.
— Ah é? – eu respondo, passando a mão sobre minha cabeça. — Eu
não sabia que você tinha um segurança trabalhando aqui.
— Exatamente o que quero dizer. – ela se queixa, tamborilando os
dedos contra a cintura. — Andre estava muito ocupado conversando
com algum beberrão para perceber que uma das garotas que ele é pago
para proteger estava sendo maltratada. – ela olha para o gigante que está
timidamente parado ao seu lado.
Imediatamente não gosto de Andre. Além do fato de que ele
parece um asqueroso seboso com seu rabo de cavalo
ralo e bigode preto, ele deixou a bola cair quando se
tratou de proteger alguém que confiava nele para mantê-
los seguros.
— Você quer um emprego? – Lotus pergunta
inesperadamente. Meus olhos e de Andre se arregalam.
— Um emprego? – pergunto, caso a tenha ouvido mal.
Ela acena com a cabeça, com seu rabo de cavalo loiro balançando
com o movimento brusco. — Sim. Parece que Andre precisa de ajuda. 27
Andre parece a poucos segundos de arrancar meus braços. — Não
quero passar por cima de ninguém. – Mas azar, porra. — Mas posso
começar amanhã.
— Ótimo. Entre por volta das cinco da tarde.
Fabuloso! Parece que meu plano de me misturar à sociedade surgiu
mais cedo do que eu pensava. Eu planejava ser um camaleão e aparentar
estar no caminho certo. Embora um emprego mais “respeitável”
provavelmente seja mais adequado, isso vai tirar minha agente do meu
pé. É um estratagema perfeito.
Minha vingança começa agora.
Enquanto Lotus joga o vidro em uma lata de lixo, eu digo: — Sabe,
posso consertar esta mesa para você. – eu coloco minha palma em cima
e balanço, mostrando a ela como está instável. Não pude deixar de notar
que este lugar precisa desesperadamente de manutenção. Eu quase caí de
bunda graças à banqueta instável.
Ela para no meio da missão, com seus lábios se formando em um
sorriso inclinado. — É bom com as mãos, não é?
Seu comentário pinga com insinuações, e não posso deixar de
sorrir. — Você não tem ideia.
Ela balança a cabeça dramaticamente. — Entre ao
meio-dia.
Sem mais nada a dizer, eu me viro e estou prestes a
voltar ao bar para terminar minha cerveja, até que percebo
que Tiger e Tawny estão me observando. De repente, me
sinto muito desconfortável.
Lotus percebe meu desconforto imediatamente. — Você quer ser
um Bird Dog aqui; você tem que se sentir confortável com as garotas. 28
Tawny? – ela olha para a loira atenta. — Você gostaria de levar Bull nos
fundos?
Bird Dog deve ser uma gíria para um segurança que cuida de tudo
que acontece "nos fundos".
— Sim, Lotus. – ela responde, sorrindo maliciosamente.
— O que acontece lá fora? – pergunto, não estou interessado em
surpresas.
Quando Tawny gradualmente se inclina para frente e sussurra em
meu ouvido: — Você vai ver. – eu prendo a respiração porque ela está
perto demais.
Antes que eu possa dizer obrigado, mas não, porque não vou a lugar
nenhum com Tawny, Tiger dá um passo à frente. — Lotus, deixe-me ir.
Tanto Lotus quanto Tawny viram em sua direção, visivelmente
atordoadas. — O que?
O rosa em suas bochechas sugere que ela está envergonhada ou
talvez ela é gostosa. Merda, se eu sei ler uma mulher. — Vendo que Bull
veio em meu auxílio, acho que devo a ele.
— Você não me deve nada. – eu resmungo, não interessado em
ser o caso de caridade de ninguém.
Seus olhos se suavizam, e eu imediatamente me
sinto um idiota por resmungar. — Eu ainda gostaria de
agradecer.
— Você pode me pagar uma cerveja. – eu tento me
virar, mas ela rapidamente agarra meu antebraço. O couro da
minha jaqueta range sob seu aperto enquanto contraio meu queixo.
Tiger vê meu desconforto por ser tocado e recua instantaneamente.
29
Quando ela o faz, eu respiro.
— Bem. Se você quiser ir com Bull, então vá. – diz Lotus, acenando
para nós. O clube está começando a ficar agitado e sei que a Lotus
precisa voltar ao bar.
Tawny cruza os braços sobre o peito. — Isso não parece justo. Foi
meu show há dois minutos.
Lotus faz um som de desaprovação. — Vá fazer uma pausa.
Tawny não fica feliz, mas, eventualmente, sai pisando duro.
Tiger sorri timidamente, colocando uma mecha de cabelo escuro
atrás da orelha. Quando ela gesticula com a cabeça para que eu a siga, eu
a olho com desconfiança. — Está tudo bem, Bull. Eu não vou morder.
O humor em sua voz me fez finalmente concordar.
Ela entende isso como sua deixa para mostrar o caminho. Eu sigo
sua bunda firme enquanto ela me guia pelo clube.
Caminhamos por um corredor iluminado apenas por lâmpadas
fluorescentes fracas. O cenário plano não revela muito. Tiger abre a
última porta à esquerda e entra. Assim que entro, vejo uma cadeira no
meio da sala iluminada por um holofote de um vermelho brilhante.
Esta deve ser a sala VIP. Portanto, um Bird Dog é
alguém que monitora as salas de dança privadas.
Tiger percebe que estou observando meus arredores e
sorri. — Veja, não é tão assustador, certo?
O júri ainda não decidiu.
— Sente-se. – ela direciona, apontando para a cadeira de aço.
Olho para ela com desconfiança. — Por quê?
— Apenas confie em mim. – ela tenta me empurrar para baixo, mas
30
meu braço estica e eu agarro seu pulso antes que ela possa fazer contato
comigo. Ela recua, mas seu olhar nunca desvia do meu. — Eu não vou te
machucar. Eu prometo.
Mas esse é o problema... não posso prometer que não vou machucá-
la.
Seus olhos estão cheios de nada além de determinação, então eu
lentamente a solto.
Nós dois ficamos parados, nos segurando, e eu gosto dela ainda
mais porque ela não parece estar com medo ou mesmo intimidada por eu
ser mais alto do que ela.
Por fim, sento-me e observo enquanto ela caminha até o canto da
sala e carrega algum dispositivo. Tenho certeza que é um iPod, mas
nunca vi um pessoalmente, então não posso dizer.
Ela pressiona alguns botões e as luzes diminuem. Eu mal posso ver
minha mão na frente do meu rosto, mas quando a sala muda para um
rosa profundo, Tiger brilha como uma árvore de Natal.
O cover de "Tainted Love" de Marilyn Manson ecoa a sala. Uma
música que eu reconheço. Observo com interesse enquanto ela se
move no ritmo da música, fechando os olhos e parecendo se perder na
batida.
Assim como quando a vi dançar pela primeira vez,
estou fascinado por como ela usa seu corpo como um
condutor. Ela vira as costas e abre o zíper baixo do
vestido. Uma vez que está para baixo, ela o tira e joga de
lado. Ela se vira e põe o cabelo sobre os ombros, revelando
um sutiã dourado que mal cobre seus seios fartos e redondos.
Ela anda sem fôlego até mim enquanto eu me inclino para trás na
minha cadeira, sem saber o que vem a seguir. 31
Sem hesitação, ela sobe no meu colo, mas paira sobre mim, usando
seus músculos para equilibrar seu peso. Ela imita o movimento de
envolver os braços em volta do meu pescoço, mas ainda não me toca.
Não gosto dessa intimidade, mas ela não me força a me aproximar.
Ela simplesmente se vira para que suas costas fiquem voltadas para a
minha frente. Meus braços estão rígidos ao meu lado, com minhas mãos
se fechando em punhos. Quando ela começa a mover seus quadris e
rebolar, eu quase perco o controle e desisto.
Eu entrelaço minhas mãos atrás do meu pescoço, observando-a me
dar uma dança erótica que não é realmente uma dança erótica porque ela
não está me tocando. Certamente, essa música vai acabar logo. Eu não
sei por quanto tempo serei capaz de ficar sentado aqui e não deixar os
demônios vencerem.
A sede de sangue e a vingança conduzem meus demônios, e tudo o
que eles querem fazer é causar dor, porque o sofrimento adora
companhia. Quero ver o mundo queimar comigo. Mas o monstro dentro
de mim sempre permaneceu. Ele estava apenas esperando o momento
certo para sair do inferno.
Conforme o ritmo aumenta, o mesmo acontece com os seus
movimentos, e não importa o quanto eu tente, não posso negar o fato
de que sua beleza me excita. Faz muito tempo que não
fico tão perto do corpo de uma mulher e esqueci como
suas curvas são suaves e flexíveis. E como cheiram bem.
Tiger cheira a flores de cerejeira.
Eu continuo respirando lentamente, tentando controlar
meu desejo. Mas quando ela gira e paira sobre mim, eu
resmungo baixo, incapaz de esconder meu desejo. Seu peito está
a centímetros do meu rosto e, de repente, viro meu rosto para o lado.
Mas com um dedo hesitante, ela deliberadamente o coloca sob meu
32
queixo, persuadindo-me a olhar para ela com um sorriso arrogante. Ela
desliza na pequena tatuagem sob meu olho direito, admirando a cruz
com interesse, pois tenho certeza de que não me pareço com um homem
religioso.
Não sei o que ela está fazendo, então quando ela pega minhas mãos
e as puxa para seu peito, eu quase salto da minha cadeira de surpresa.
No momento em que sinto os seus seios macios, minha ereção
pressiona contra ela, mas afasto meus quadris para longe, me sentindo
sufocado. Ela me surpreende quando ela arfa e começa a mover seus
quadris sobre meu pau. Ela ainda está pairando sobre mim, usando sua
força central impressionante, então está apenas seguindo os movimentos.
Suas mãos estão seguras sobre as minhas, incentivando-me a
acariciar seus seios. Quando sinto seus mamilos incharem sob minhas
mãos, nós dois gememos com a sensação. Eu me lembro de como eles
eram no palco. Mas independentemente de como ela pareça - e ela
parece fantasticamente - eu preciso acabar com isso. Agora.
Mas antes que eu saiba o que ela está fazendo, ela se precipita e me
beija.
Estou surpreso com a sensação desconhecida dos lábios de
alguém nos meus, e quando ela suavemente persuade
minha boca selada a abrir com sua língua quente, isso
traz o fato de que eu não beijo uma mulher desde que
tinha dezessete anos de idade.
Não sei o que pensei que sentiria, mas pela primeira
vez na minha vida, a sombra da raiva e da dor diminuiu por
um momento. Mas isso não dura. Isso nunca acontece.
Ela tem gosto de chiclete, mas por trás de sua doçura há uma
bondade que quero corromper. Quero enfiar minhas mãos em seus 33
longos cabelos e puxar - com força - até que ela se contorça, implorando
para que eu pare. Eu quero mordê-la, amarrá-la, marcá-la porque sua
pureza é contagiosa, e me pergunto se posso roubá-la para apagar a
mancha que sobrecarrega minha alma.
Quero vê-la implorar. Quero fazer ela sangrar.
Sou um monstro vil e indigno. Tiger sabe que não gosto de ser
tocado, então ela mantém distância. A maioria reconheceria sua
bondade, mas não sou a maioria. Quero explorar a fraqueza dela porque
gosto da dor.
Nem percebo que a música acabou porque estou dividido entre o
certo e o errado. Mas está feito. Acabado. Não há um herói em mim. E é
isso que alguém como Tiger merece.
Como uma borboleta, ela é tão linda, mas tudo que eu quero fazer é
arrancar suas asas.
Com isso como minha força motriz, viro meu rosto, cortando nossa
conexão. Tiger lê minha retirada em alto e bom som, embora esteja
confusa. Mas isso não é problema meu. Eu fico de pé, forçando-a a fazer
o mesmo.
— Obrigado pela dança. – Incapaz de me conter, eu lentamente
esfrego meu polegar em seus lábios macios, borrando
seu batom em sua boca - a boca que acabei de possuir.
Vê-la desarrumada é uma injeção de heroína para um
demônio como eu.
O tremor em seus lábios revela seu nervosismo, o que
apenas confirma o que preciso fazer.
— Eu vejo você por aí, querida.
Ela parece querer dizer algo, mas logo muda de ideia. Ela
simplesmente balança a cabeça e caminha nervosamente até onde deixou 34
cair o vestido, virando-se de costas para que possa vesti-lo.
Não há espaço para conversa fiada porque não me envolvo em
fingimentos. Este sou eu. Um bastardo de coração frio. Um animal
depravado. Minha história não termina com o Príncipe Encantado
salvando a princesa e vivendo feliz para sempre com ela porque... Eu
matei o maldito príncipe.
35

— Bom dia, olhos brilhantes. Você dormiu bem?


— Dormi. Obrigado, Venus. – eu respondo, olhando para o mapa da
cidade esfarrapado colado na parede.
Venus está vestida com um macacão rosa com uma peruca rosa
combinando. O lenço de seda que usa não consegue esconder o pomo de
adão. Não sei por que ela se preocupa com isso. Ela precisa ser dona
das coisas dela. Mas suponho que Detroit seja implacável com
desajustados como nós.
— Sabe se o ônibus ainda passa pela Oakland
Road? – pergunto, traçando meu dedo por uma linha
azul que atravessa o meio da cidade.
— Se bem me lembro, sim, ainda passa. Você vai
pegar o ônibus?
— Sim. Eu estava pensando nisso.
— Você não tem carro?
Balanço minha cabeça e encontro os seus olhos. — Não tenho
36
habilitação.
Ela se afasta, chocada. — Quantos anos você tinha quando foi
preso?
Esfrego minha nuca. — Tinha acabado de completar dezoito anos.
A pena a atinge. — Ah, lamento muito ouvir isso.
Ela não tem do que se desculpar. E é melhor ela parar de olhar para
mim com piedade nos olhos. — Não sinta. A cadeia provavelmente era o
melhor lugar para mim.
Ela se inclina no balcão, ouvindo atentamente. — O que você fez?
E aí está. A pergunta temida.
Tenho que me acostumar a dizer isso, então posso começar agora.
— Assassinato. – revelo francamente, observando seu rosto entristecer.
É melhor eu também começar a me acostumar com esse olhar.
Ela limpa a garganta após alguns segundos desconfortáveis. —
Bem, se alguém merece uma segunda chance, é você.
Ela me pega desprevenido com aquela resposta inesperada. Mas
ela não me conhece. E se conhecesse minha história e o que estou
planejando fazer, ela não seria tão rápida com essa
porcaria melindrosa.
— Voltarei mais tarde. – eu fecho a minha jaqueta de
couro. — Consegui um emprego.
— Ah, é? Onde?
— The Pink Oyster.
Ela sorri, balançando para trás em seu banquinho. — As garotas
simplesmente não conseguem ficar longe de você, não é? 37
Meus lábios se contraem em uma semelhança de um sorriso.
É outra manhã fria pra caralho, então eu deslizo o gorro cinza sobre
a minha cabeça e eu caminho o quilometro até o ponto de ônibus.
Felizmente, não tenho que esperar muito. É engraçado porque embora
não esteja em um ônibus há muito tempo, as imagens, sons e cheiros são
exatamente os mesmos.
Eu fecho meus olhos, relembrando a última vez. Foi com meu irmão
Damian, na noite do grande jogo. Ele poderia ter ido com amigos, mas
ele queria ir comigo.

"Vamos, fedelho. Vai ser divertido."


“Eu nem gosto de futebol.”
Damian riu. "Você vai quando ver as líderes de torcida."
Franzindo o rosto, respondi: “Que nojo. Garotas são estranhas."
"Isso é porque você acabou de fazer quinze anos. Dê alguns anos e
elas serão tudo, menos nojentas.” ele bagunçou meu cabelo quando
paramos em nossa escola para o grande jogo.
"Eu duvido."
“Confie em mim, esguicho. Você vai mudar de
ideia.”
Ele pegou sua mochila de ginástica e capacete. Meu
irmão, o quarterback.
38

Meus olhos se abrem quando o ônibus para lentamente. Afastando o


sono, vejo que estou a um quarteirão de onde quero estar. Nada mudou.
É exatamente como eu me lembro e ainda é tão deprimente quanto no
último dia em que estive aqui.
Uma leve camada de geada cobre a folhagem e até mesmo as flores
murcham no rigoroso outono. Parece que todo ser vivo quer esquecer
que existe aqui.
A grama é esmagada sob meus sapatos enquanto uma garoa leve
começa a cair. Mas não deixo que o clima me impeça de fazer algo que
desejo fazer há anos. Minha memória me falha, e caminho no piloto
automático até a última sepultura consecutiva que replica as anteriores e
posteriores. Mas esta consecutiva é especial.
É especial porque contém o túmulo do meu irmão.
— Ei, Damian. – eu me agachei.
Flores secas estão ao lado de sua lápide, e imediatamente me chuto
por não ter trazido flores frescas para ele. — Estou solto. Doze anos
insignificantes em comparação com uma vida inteira de inferno que
você suportou por minha causa.
— Não tenho notícias de minha mãe e meu pai há
mais de nove anos. Não que eu possa culpá-los, porque
disse a eles para ficarem longe. Se fosse eu e não você, as
coisas teriam sido melhores para todos. Se eu tivesse ido
direto para casa depois do jogo, as coisas teriam sido muito
diferentes. Para começar, você estaria vivo.
Suspirando, eu abaixei meus olhos, com vergonha. — Sinto muito,
mano. Eu sou a razão de você estar... morto. Nunca vou me perdoar pelo 39
que fiz.
— Você me salvou... literalmente, e consequentemente, morreu
porque é a porra de um herói. Você sacrificou sua vida para me salvar.
Mas minha vida não valeu o sacrifício. Nunca valerá.
— Mas não vou deixar sua morte ser em vão. Eu prometo. – eu juro,
segurando o pingente em volta do meu pescoço. Uma vez pertenceu a
Damian. Seu amuleto de boa sorte.
Este é o único lugar em que me permitirei sofrer. Permitir-me a
penitência que não mereço.
— Lamento que tenha sido você. Se eu pudesse trocar de lugar, o
faria em um piscar de olhos. Você sempre foi o bom e eu... – eu faço
uma pausa, olhando para o relógio de bolso tatuado nas costas da minha
mão. — Eu estava sempre esperando por algo melhor. Eu gostaria de ter
percebido que algo melhor era você.
Beijando meu dedo médio e indicador, eu os coloco na lápide de
mármore de Damian, antes de parar lentamente. — Eles vão pagar. Cada
um deles. E quando eles fizerem isso... nos encontraremos novamente.
Descanse em paz, irmão. Eu te amo.
Damian é a única pessoa que eu já disse que amava. Eu nem disse
isso para meus pais. Mas com ele, não éramos apenas
irmãos; nós éramos melhores amigos. Eu o admirava -
porra, todo mundo fazia. Todos queriam ser amigos dele.
Havia algo especial sobre ele, algo do qual todos queriam
fazer parte.
Esse algo especial foi tirado na noite em que ele foi
assassinado... graças a mim.
Sem mais nada a dizer, eu me viro e deixo meu irmão apodrecendo
na sepultura onde esteve nos últimos quatorze anos. Em minha mente, 40
ele é sempre jovem. Um garoto de dezessete anos que tinha toda a vida
pela frente antes de ser cruelmente roubado.
Meus punhos se fecham enquanto penso sobre o motivo disso, o
motivo pelo qual tanto a vida de Damian quanto minha vida mudaram
para sempre. Uma merda de decisão simples destruiu a vida de tantos,
mas não posso voltar atrás. O que foi feito nunca pode ser desfeito, e eu
tenho que viver com essa culpa pelo resto da minha péssima existência.
Mas prosperei com essa culpa desde que enterrei meu irmão. Só
uma coisa me manteve centrado: a vingança. E agora que estou solto...
queimem, filhos da puta, queimem.
Acabando com a nostalgia, eu espero no ponto de ônibus, não tenho
certeza quando ou se voltarei. Meus pais não me visitam há algum
tempo; o túmulo sem adornos do meu irmão é um sinal claro disso, o
que é uma mudança desde quando ele foi enterrado sob sete palmos.
Minha mãe ia me visitar todos os dias, e meu pai teve que arrancá-la
para voltar para casa.
Mas então ela voltou no dia seguinte, chorando e xingando o
universo por ter levado o filho errado.
Quando o ônibus para, subo os degraus, sentando em um banco
na parte de trás. Olhando pela janela, me pergunto onde estão meus
pais. A última vez que soube, eles estavam finalmente
se divorciando. Papai encontrou consolo em uma
mulher com metade de sua idade, e minha mãe a
encontrou feliz para sempre em seus frascos de remédios.
Mas não julgo. Porra, eu sou a razão de sua vida virar
uma merda. Antes de isso acontecer, éramos uma grande
família feliz. Damian era o filho de ouro, mas eu não estava com
ciúme. Eu só poderia desejar ser metade do homem que ele era.
Ele era o tipo de pessoa que ajudava idosos a atravessar a rua ou
41
cuidava de um pássaro com a asa quebrada. Eu preferia acabar com o
sofrimento do pássaro e rir dos velhotes que arrastavam os pés. Nós
éramos tão diferentes, mas Damian nunca me julgou. Ele me amava
independentemente de minhas falhas.
Meu reflexo me encara da janela suja do ônibus e, enquanto olho em
meus olhos incompatíveis, me pergunto se meu irmão me amaria agora.
Zombando, coloco esses sentimentos de lado porque não mereço amor.
Eu mereço ficar sozinho, assim como Damian está.
Quando o ônibus para em uma parada a poucos quarteirões do The
Pink Oyster, desço e caminho o resto do caminho, agradecido por Lotus
ter visto algo em mim que eu não. Vou fazer meu trabalho sem
problemas e me manter fora de confusões porque estou aqui por um
motivo. No entanto, quando empurro a porta dos fundos e vejo Andre
conversando com uma das garotas, sei que me manter fora de confusões
com esse idiota no meu pé vai ser difícil pra caralho.
Acenando um breve olá, caminho pelo clube, na esperança de
encontrar Lotus, para que eu possa manter a interação com Andre ao
mínimo. Ela está em uma pequena sala no corredor que serve como
seu escritório. A porta está aberta, mas bato mesmo assim.
— Oi, Bull. – diz ela, olhando para mim brevemente, antes de
retornar para a montanha de papelada na frente dela.
— Ei. Você tem alguma ferramenta que eu possa
usar?
Lotus aponta a mão para o canto da sala, onde vejo
uma caixa de ferramentas de metal e um kit de primeiros
socorros por perto. Parece que o escritório dela tem muitos
usos. Não querendo perturbá-la, eu entro rapidamente e pego o que
preciso. 42
Quando estou prestes a sair, Lotus bufa e joga a caneta na mesa
bagunçada. — Desisto. – ela resmunga, esfregando os olhos cansados.
— Por que isso não está somando?
Não sei se ela está falando comigo ou não, então presumo que não
esteja e continuo em direção à porta.
— Suponho que você não seja bom com números?
Eu paro no meio do caminho e viro por cima do ombro para olhar o
pedaço de papel rabiscado na frente dela. Ela parece meio esperançosa,
já que não a ignorei. Fazendo um cálculo rápido na minha cabeça, vejo
onde ela errou.
— Você não elevou aquele. – digo, olhando para os números na
página.
Acho que essas são os lucros do clube. Ou talvez esteja tratando dos
seus impostos. Como é que vou saber. Seja o que for, ela rapidamente
olha para as somas à sua frente e murmura em compreensão. — Puta
merda, você está certo.
— Claro, que estou certo. – eu argumento enquanto ela sorri. —
Muita coisa mudou desde que fui preso, mas matemática não é uma
delas.
Imediatamente me arrependo do meu excesso de
conversa, pois acabei de revelar que estive preso. Mas a
Lotus não vacila ou olha para mim com julgamento. Ela
apenas acena com um sorriso.
— Um pau para toda obra. Se você não tomar cuidado,
vou mandar você fazer minha contabilidade também.
— Estarei aqui se precisar de mim. – eu não demoro muito e
caminho para o clube. 43
Andre está se servindo de vodka de primeira, o que é uma
sacanagem total, porque duvido que tenha qualquer intenção de pagar
por isso. Não gosto de aproveitadores ou sovinas. A vida não é de graça.
Mas o ignoro e vou trabalhar testando a estabilidade das banquetas.
Elas estão todos instáveis, então abro a caixa de ferramentas e
procuro o que preciso. Segundos depois, uma enorme sombra se projeta
sobre mim, sugerindo que tenho uma plateia. Não mordo a isca porque
sei exatamente quem está à espreita.
Se esse idiota está procurando uma briga, ele está sem sorte. Não
importa o quanto queira chutar a bunda dele, não vou, porque me recuso
a desrespeitar Lotus dessa forma. Quando estou prestes a levantar a
banqueta e colocá-la no balcão, Andre bate a pata no balcão e me
bloqueia. Não vacilo enquanto levanto meus olhos lentamente. Nós nos
olhamos, e é evidente que ele tem a intenção de tornar minha vida um
inferno.
Ele não tem sorte que eu não dou a mínima?
Mastigando um palito de dente, ele tenta me intimidar enquanto me
encara. Sua tentativa é ridícula. Erguendo a banqueta, coloco-a no
balcão, independentemente da localização de sua mão.
Ele rapidamente a tira. — Parece que Lotus se
tornou uma vadiazinha. – ele provoca, removendo o
palito de entre os lábios moles.
Ignorando-o, coloco os olhos na altura da banqueta e
analiso as pernas.
— Você é surdo e estúpido? Estou falando com você. –
ele puxa o topo da banqueta, jogando-a no chão.
Respirando fundo duas vezes, me levanto calmamente, me
recusando a ceder. Andre aperta os punhos com um sorriso irônico, 44
esperando minha retaliação.
Ele vai esperar muito tempo.
Alcançando outra banqueta, repito a mesma ação que fiz com a
primeira. A perna irregular é mais evidente nesta banqueta, então
procuro na caixa de ferramentas uma pequena serra. Andre não gosta de
ser ignorado.
— Ouça, anormal. – ele cospe, felizmente mantendo suas mãos para
si mesmo. — Fique fora do meu caminho e não teremos problemas.
É evidente que ele não vai a lugar nenhum a menos que eu
responda, então dou um aceno rápido. — Está bom para mim.
Andre deve sentir como se eu estivesse desafiando sua posição de
cachorro dominante, o que é irônico, considerando que não quero tomar
parte nisso. Não estou interessado em ser alfa por causa dessa merda,
porque não há competição. — Você é um filho da puta estranho.
— Obrigado. – eu contra-ataco, voltando à minha procura dentro da
caixa de ferramentas. Ele se foi alguns segundos depois, mas não antes
de pegar uma garrafa de vodka.
Exalando lentamente, controlo minha raiva e me concentro em
consertar as banquetas do balcão. As pernas de madeira baratas são
fáceis de cortar e não demoro muito para nivelá-las.
Enquanto lixo as pernas antes de recolocar as tampas
para que fiquem estáveis, um cheiro de algo doce
impregna o ar.
Enxugando o suor da testa com as costas da mão, viro o
ombro para ver que não estou mais sozinho.
— Ei, lindo. – Tawny diz com um sorriso. Ela não faz segredo de
que está me fodendo com os olhos enquanto seus olhos azuis me 45
observam da cabeça aos pés.
Estou de jeans preto rasgado e uma camiseta branca com decote em
V, o que expõe a tatuagem em ambos os meus braços e também a no
meu pescoço. Tawny inclina a cabeça para ver melhor, mas vai ficar
procurando por um tempo. Minhas tatuagens são privadas. Não as deixei
para as pessoas bajularem ou fazerem perguntas. Eu as recebi como um
lembrete permanente do que fiz. E o que devo fazer para vingar meu
irmão.
Limpar minha garganta parece tirá-la de seu olhar boquiaberto.
— Terminou aqui? – ela pergunta, gesticulando com o queixo para
as banquetas.
— Quase. Por quê?
— Algumas luzes explodiram no camarim. Eu mesma as trocaria,
mas acabei de fazer as unhas. – Para confirmar suas afirmações, ela
mexe suas longas unhas rosa Barbie para mim.
Este é claramente um truque para me pegar sozinho, mas tenho um
trabalho a fazer. Quanto mais cedo Tawny souber que não estou aqui
para nada além disso, melhor será para nós dois. Então eu aceno. —
Certo.
O rosto de Tawny irradia. — Muito obrigada.
Faço um gesto para ela liderar o caminho.
Ela garante que o caminho seja liderado por ela
rebolando no short que está usando. Suas longas pernas
parecem amplificadas graças às botas de cowboy que ela usa.
Como observei ontem à noite, ela não é nada atraente, mas ela
simplesmente não faz isso por mim. Não tem nada a ver com sua
aparência, mas sim com o fato de que eu não teria que me esforçar para
isso. 46
Ela está basicamente servindo seus seios para mim em uma bandeja
de prata, mas não estou interessado. Nada na minha vida foi fácil, e
também não espero que as mulheres sejam.
O camarim é maior do que eu pensava. Ele tem quatro espelhos de
formatos diferentes presos às paredes, e cada espelho é delimitado por
luzes. As mesas estão cheias de cremes e maquiagem. Os encostos das
cadeiras têm penas coloridas enroladas em volta delas.
No canto da sala há armários. Mas, no que diz respeito aos
vestiários, não há nenhum. Não há nenhum lugar privado para as garotas
trocarem de roupa uma vez que seu número de dança acabou. É uma sala
comum onde não existe proteção contra o pudor.
Mais ou menos como os chuveiros na prisão.
— São essas luzes. – Tawny diz, interrompendo meus pensamentos.
Quando ela me passa uma caixa de lâmpadas, vejo onde algumas das
luzes nos espelhos explodiram.
Garantindo que nossos dedos não se toquem, pego a caixa e vou até
o primeiro espelho. Posso ver o reflexo de Tawny enquanto desligo o
interruptor e desparafuso a lâmpada. Ela é tudo menos tímida quando
me encara abertamente.
— Então seu nome é Bull? – ela pergunta, já que é
assim que Lotus se refere a mim.
Eu aceno em resposta.
— Você nasceu aqui, Bull? – Meu nome escorre de
sua boca como mel.
— Sim, infelizmente. – eu respondo, substituindo uma lâmpada. Só
faltam mais cinco. 47
— Eu também. Sempre pensei que estava destinada a coisas maiores
e melhores, mas aqui estou. – ela abre bem os braços. — Tentei ir para a
faculdade, mas não era para mim. Tirar a roupa deveria ser algo
temporário; no entanto, três anos depois, ainda estou aqui.
— Não há nada de errado em ser uma stripper. – eu declaro,
olhando para ela brevemente no espelho. — Os idiotas pensam que estão
no controle, mas não é você que está jogando dinheiro para eles.
— Eu nunca pensei sobre isso dessa forma. – ela reflete.
— Bem, agora você pode. – eu me movo para o próximo espelho e
desatarraxo a lâmpada. Assim que pego uma substituta, sinto e cheiro
Tawny atrás de mim. Eu viro e agarro seu pulso, impedindo-a no ar de
me tocar.
Seus lábios se contraem em um sorriso atrevido. Ela acha que isso é
um jogo, mas não é. — Uau, você tem reflexos de super-herói. Há algo
que você não está me contando? – ela provoca, piscando. — Com todos
esses músculos, você poderia facilmente ser o Superman.
Ela se inclina perto, perto demais, mas eu mantenho minha
posição. — Não sou o herói desta história, Tawny.
— Não quer ser meu cavaleiro branco? – ela pergunta, com seu
tom cheio de sarcasmo. Não tenho ideia do que isso
significa até ela esclarecer. — Alguém que pensa que
pode salvar uma dançarina de uma vida de strip-tease.
— Definitivamente, eu não. – eu dou risada.
— Então o que você é? – ela desafia, empinando seu
peito. Seus seios estão a poucos centímetros de mim, o que
significa que estão apenas centímetros perto demais.
Apertando meu pulso em seu pulso, abaixo meu rosto para o dela.
Ela respira fundo enquanto os seus dentes retos e brancos mordem 48
deliberadamente seu lábio inferior. — Eu sou o cara mau. – respondo
perigosamente baixo.
Não estou tentando ser melodramático. É a verdade. No entanto,
minhas palavras parecem apenas excitá-la ainda mais.
Suas pupilas dilatam e suas bochechas ficam vermelhas. — Gosto
de caras maus. – ela geme, respirando fundo.
Meus demônios rugem à superfície, exigindo que eu mostre a ela o
quanto ruim eu realmente posso ser. Mas eu os empurro bem fundo. Eu
não cago onde durmo. — Faça um favor a si mesma então... não goste
de mim.
Ela molha os lábios, pronta para falar, mas quando ouço uma voz
familiar, minha atenção se volta para a porta. Quando vejo quem entra,
memórias de quando a vi pela última vez me atingem, e aperto o pulso
de Tawny sem querer.
Tiger tem seu celular pressionado contra o ouvido, falando
alegremente com quem está do outro lado. — Vejo você mais tarde. Eu
te amo, querido. – Quando ela nos vê, no entanto, ela para no meio do
caminho, substituindo o sorriso por um o lábio superior tenso. Ela
está claramente confusa sobre o que acabou de acontecer.
Instantaneamente, solto Tawny, já que a interação
parecia bastante acalorada, e era, apenas não da
maneira que Tiger pensa. Quando ela se equilibra, ela
balança a cabeça, como se estivesse afastando a névoa. —
Ah, desculpe. Não achei que tivesse alguém aqui. Só
preciso pegar minha bolsa. Esqueci ontem à noite. Vou
deixar vocês sozinhos em um segundo. – diz ela em uma
respiração apressada.
Tawny permanece perto de mim parecendo se gabar. Imediatamente
dou três passos para longe. 49
Tiger passa por nós e segue direto para os armários. Ela gira o
botão, o que é um movimento amador, pois agora eu sei qual é a
combinação de sua fechadura.
1021.
Eu me pergunto qual é o significado? Talvez seu aniversário? Ou
talvez seja o aniversário da pessoa, ou melhor, o querido que ela acabou
de dizer que amava?
O que isso importa? Preciso parar de me fixar nela.
Rapidamente me viro e termino de recolocar as lâmpadas nos
espelhos enquanto Tawny se senta e acende um cigarro. As garotas não
têm conversa fiada, o que me faz pensar que elas não gostam uma da
outra. Quando a porta do armário bate, eu me olho no espelho, me
perguntando o que está acontecendo.
Tiger está de costas, então aproveito esta oportunidade para
observá-la desprotegida. Ela está com calça de ioga, uma camiseta larga
e os adorados Chucks. Seus longos cabelos estão presos em um coque
alto na cabeça. Quando ela se vira, vejo que seu rosto quase não tem
maquiagem, o que eu gosto.
Ontem à noite, tive o desejo inexplicável de limpar o batom
vermelho de sua boca. No entanto, não tive problemas
em devorar sua boca com ele. Meu pau pulsa com a
memória. Mas essa memória logo é substituída por dor e
sangue, e como eu queria corrompê-la, contaminá-la,
então não sou o único marcado com essa mancha em minha
alma.
Ela encontra meus olhos no espelho, mas é apenas por uma fração
de segundo antes de rapidamente me ocupar com a troca das lâmpadas. 50
Preciso ser mais cuidadoso. Ela é tóxica, o que só causará problemas...
para ela.
— Bem, até mais. – ela grita. É evidente que espera uma resposta.
Tawny solta um círculo de fumaça em resposta enquanto eu
simplesmente a ignoro. Um suspiro a deixa antes que ela saia pela porta.
Depois de alguns momentos de silêncio, Tawny presunçosamente
diz: — Você não estava brincando. Você realmente é o cara mau.
Porra, sim, eu sou.
Acabei de fazer um favor a Tiger. Ela só não sabe ainda. Agora, ela
pode ir para casa com seu querido, tão segura quanto pode estar, porque
eu, eu apenas faria seu castelo desmoronar.
51

— Um, dois, três. Um, dois, três. Os calcanhares devem tocar-se


com os dedos dos pés virados para fora. Ótimo, Jennifer. Agora afaste os
pés. Muito bom, Roberta. Um, dois, três. Abra bem os braços, mas não
os estique para trás.
A música sai suavemente dos alto-falantes enquanto ando pelo
pequeno estúdio de balé, ensinando as minhas alunas o básico do
balé.
É aqui que normalmente me sinto em paz, em
casa, mas hoje as minhas alunas de cinco anos têm mais
coordenação do que eu. Pulo em um jeté4, determinada a
escapar das lembranças que me atormentam desde que fui
sugada para o céu e o inferno.

4Jeté significa atirado, lançado. Nesse passo, a bailarina joga a perna


energicamente (bem esticada) em determinada direção, levantando, ao
A música termina, me alertando que a aula de uma hora já chegou
ao fim. Fui poupada, o que nunca aconteceu antes. Independentemente 52
da merda que aconteceu na minha vida – e acredite, houve uma merda
importante – sempre fui capaz de me concentrar no momento em que
entrava nesta sala. Este é o lugar onde me sinto feliz.
Mas é claro que hoje é diferente, e isso é graças a… ele.
Ugh, foda-se... ele.
— Tudo bem, turma. Todas vocês se saíram tão bem. Vejo vocês na
próxima semana.
— Sim, Srta. Hope. – Minhas alunas correm para suas mochilas de
ginástica, conversando animadamente entre si, enquanto abro a porta. Os
pais entram correndo, ansiosos para ver seus filhos. Melanie Arnolds,
uma mãe que joga futebol com muito tempo e dinheiro disponível, vem
direto para mim, o que não é nenhuma surpresa, já que ela faz isso todas
as semanas. Embora eu a prefira muito mais que seu marido desprezível,
Derrick.
Ela é uma mãe que ronda, mas é uma mãe que também paga minhas
contas, então aguardo a inquisição com um sorriso. — Lillian. – ela grita
com um aceno de mão, tilintando suas pulseiras Tiffany. — Posso falar
com você por um segundo?
Não tenho ideia de por que ela formulou isso como uma
pergunta, já que não tenho voto sobre o assunto. Mas
eu apenas amplio meu sorriso. — Claro, Melanie. E,
por favor, me chame de Lily. – Só contei isso a ela nos

mesmo tempo, o outro pé e apoiando o corpo ora numa perna, ora em


outra. Este passo lembra o Tendu, mas com os pés elevados e de maneira
mais acelerada.
últimos três meses porque apenas uma pessoa pode me chamar desse
nome. Talvez um dia isso aconteça. No entanto, hoje não é esse dia. 53
Ela gesticula com os olhos que quer falar em particular, então eu a
agrado e caminhamos para o fundo da sala. Quando estamos encolhidas
num canto, ela puxa o brinco de pérola. — Sei que pareço uma chata,
mas realmente acho que Brenda se destacaria em uma aula diferente.
Abro a boca, mas logo a fecho quando Melanie revela que ainda não
terminou.
— Ela sabe todas as coreografias de cor. Ela pratica todos os dias.
Sei que você não tem permissão para ter favoritas, mas ela é claramente
sua melhor aluna. – ela pisca maliciosamente, como se estivéssemos em
algum clube secreto.
Não estamos.
E é por isso que tenho uma política de portas fechadas. Nenhum pai
pode entrar no meu estúdio por causa dos da Melanie Arnolds deste
mundo. Eles acreditam que seu filho é um prodígio do balé quando, na
realidade, são tão graciosos quanto um peixe de uma perna só.
Mas mostrando minha cara profissional, sorrio gentilmente. —
Brenda é excepcional e posso ver que ela está praticando, mas não
posso movê-la para o próximo nível até que ela faça os testes. Sei que
pode parecer injusto, mas não sou eu que faço as regras.
— Mas esta é a sua aula. – ela pressiona, franzindo
os lábios infundidos com Botox.
— Eu sei disso, mas a Sra. Everland é a diretora deste
instituto, e se eu quebrasse as regras, eu teria sérios
problemas. Sem falar no fato de que Brenda não está pronta.
Melanie se encolhe, seu rosto ficou em no modo vadia. — Ela é
melhor do que crianças com o dobro de sua idade. Não entendo por que 54
você está hesitando.
— Só quero o que é melhor para Brenda. Por favor, confie em mim.
Vou falar com a Sra. Everland, mas... – Não tenho chance de terminar a
frase, que teria sido “mas não vai fazer diferença”, antes de ser
interrompida.
Melanie bate palmas, com suas unhas amarelas brilhantes parecendo
garras, enquanto ela claramente pensa que me conquistou. — Ah, Lilian!
Você não vai se arrepender.
Eu já me arrependi.
Quando ela olha ao redor da sala e vira as costas, arqueio uma
sobrancelha, me perguntando o que diabos ela está fazendo. Observo
confusa enquanto ela pega sua bolsa Chanel e tira um maço de notas
novinhas de cem dólares. Essa confusão logo se transforma em ofensa
total.
— Aqui, pegue isso. Mime-se. Ela está realmente tentando... me
subornar? Subornar-me para que a filha de cinco anos dela possa subir
de nível? Isso seria cômico se ela não estivesse falando sério.
Dou um passo para trás, balançando a cabeça discretamente. —
Não, eu não poderia.
— Eu insisto. – ela tenta enfiá-lo na minha mão,
mas aperto com força, a segundos de tirar o botox de
suas bochechas.
— Obrigada, Melanie, mas não. – Ela olha para mim
como se eu tivesse acabado de falar uma palavra estrangeira,
o que, no mundo dela, provavelmente já disse, e essa palavra é
não.
— Tem certeza? Isso é um trocado para mim. – ela afirma
levianamente, me insultando ainda mais. 55
Seu “trocado” pagaria meu aluguel por um mês, mas não vou contar
isso a ela. Mas eu não preciso. Ela sabe. Todas essas mães e pais sabem
o que eu sou. É o que traça uma linha distinta entre nós.
Os ricos e os pobres.
E o fato de eu estar sendo persuadida a aceitar esse grande maço de
dinheiro de uma mãe cujo terninho de grife custa mais do que minha
caminhonete indica onde estou na escala social. Dou essa aula lidando
com pais pretensiosos e à noite tiro a roupa porque faço o que é preciso
para sobreviver.
Se isso fosse um conto de fadas, eu teria me formado no ensino
médio e ido para a Juilliard ou SAB, vivendo meu sonho de me tornar
uma bailarina de renome mundial. Mas a vida raramente corre como
planejado. Eu era uma criança ingênua com sonhos de adolescente. E
algo grande me fez crescer e me deixou com essa... essa vida de uma
desconhecida.
Piscando para segurar as lágrimas, suspiro de alívio quando Brenda
tenta dançar. Ela acaba esbarrando em uma barra.
— Oi, Brenda. – digo excepcionalmente alto, alertando Melanie
que sua filha está prestes a testemunhar sua mãe subornando sua
professora. Felizmente, Melanie entende a dica e enfia
o dinheiro de volta na bolsa.
Antes que Melanie tenha a chance de me encurralar
ainda mais, dou um passo para o lado e dou um tapinha na
cabeça de Brenda. — Você se saiu tão bem hoje. Estou
muito orgulhosa de vocês. Vejo você na próxima semana. –
ela dá seu sorriso desdentado enquanto peço licença e me despeço dos
pais e alunas restantes. 56
Quando todos eles vão embora, tranco a porta, vou até o iPod e
seleciono “Smells like Teen Spirit”, do Nirvana. As guitarras thrash
cruzaram o que antes era tranquilo estúdio de balé, trazendo-me vida.
Movo meu corpo no ritmo animado e, quando o refrão começa, eu me
solto.
Todas as minhas frustrações desaparecem enquanto eu suo minha
dor. Meu corpo dói quando salto alto, caindo na ponta dos pés. Viro-me
e viro-me, dando giros e mais giros, até que a sala gira diante de mim.
Mas isso não me impede. Isso apenas me encoraja a continuar.
Quanto mais tonta fico, mais longe aqueles olhos de cores diferentes
desaparecem – um beijo verde-mar do inferno.
Uma raiva cresce por toda parte, e eu a desconto em meu corpo
enquanto continuo a dançar um balé digno do diabo. Meu corpo é e
sempre foi um canal, e embora eu tenha uma cara inexpressiva perfeita,
quando danço, todas as emoções explodem em mim.
Danço com meu coração; foi isso que minha professora e a coisa
mais próxima que tenho de uma mãe, Avery Everland, me disse. Ela me
viu dançar pela primeira vez em minha casa no estacionamento de
trailers quando eu tinha seis anos. Eu não tinha treinamento e não
tinha ideia do que estava fazendo, mas isso não me impediu.
Dançar foi minha fuga. Era aqui que eu poderia
perseguir os demônios que assolavam minha alma.
Avery me salvou de me tornar uma estatística. Eu não
tinha dois centavos para gastar, graças à partida do meu pai
antes de eu nascer e à minha mãe estar muito ocupada em
encontrar um príncipe encantado em vez de se salvar.
Tenho um irmão mais velho, mas assim como meu pai, ele também
me abandonou. 57
Memórias de abandono passam diante de mim e grito de fúria,
punindo meu corpo porque é a única maneira de sentir. Meu coração
ameaça rasgar minhas costelas, mas isso seria tão ruim? Vinte e oito
anos de inferno podem terminar aqui e agora.
À medida que giro cada vez mais rápido, meus dedos cheios de
bolhas me imploram para terminar, mas não consigo. Só quando danço é
que me sinto livre, livre desta vida que não deu em nada como eu
pensava. A música chega ao fim e eu termino com uma sequência de
giros rápidos e estimulantes. Giros e giros, sempre fugindo, e quando a
última nota desaparece, enfrento a realidade, sem fôlego e exausta.
Minhas respirações sem fôlego enchem a pequena sala enquanto
paro um momento para recuperar o fôlego. Sempre me sinto mais viva
quando dou meu último passo, satisfeita por ter superado o passado. Mas
hoje o peso volta, e isso graças a alguém de quem definitivamente
preciso ficar longe.
Ele cheira a problemas, problemas com P maiúsculo, então por que
estou atraída por ele? Algo nele me atrai, um anseio profundo e carnal,
que me faz esquecer minha regra número um: seu coração só pode ser
partido se você permitir.
Faz anos que não tenho namorado porque os homens só me
machucam e depois vão embora. Todos, exceto um, e é
por isso que estou solteira e trabalho no The Pink
Oyster.
Suspirando, paro de ficar deprimida e pego minha
mochila. Tiro minhas sapatilhas de balé e calço meus tênis,
pronta para voltar para casa. O trajeto de Cleveland a Detroit é
longa, mas eu não faria de outra maneira.
Aqui ninguém sabe quem eu sou, nem mesmo Avery. Eu não a
colocaria em risco dessa forma. 58
Não posso arriscar que ninguém saiba o que faço à noite porque um
instituto de prestígio como a de Everland nunca sobreviveria a tal
escândalo. Não importa que eu seja a melhor professora desta escola ou
que eu trabalhe duro. Nada disso importa quando você ganha a vida
tirando a roupa.
Você é vista como uma vagabunda, uma cidadã de classe baixa, mas
desafio qualquer uma dessas mães pretensiosas a viver um dia no meu
lugar. Faço o que é necessário para sobreviver – sempre fiz – e não peço
desculpas. Eu não dou a mínima para o que alguém pensa de mim, mas
trabalhar em um estado diferente torna as coisas mais fáceis para... meu
filho, o amor da minha vida.
O irmão de Avery morava no mesmo estacionamento de trailers que
eu e, desde a primeira vez que nos conhecemos, ela me colocou sob sua
proteção e me transformou na mulher que sou hoje. Ela me ensinou tudo
o que sei, tudo porque viu algo especial em mim.
Quando ela passava pelo trailer, me levava ao estúdio dela. Essas
visitas foram a única coisa que me ajudou na minha infância. Eu varria o
chão e limpava os banheiros - tudo o que pudesse fazer para ajudar -
e, em troca, ela me pagava com aulas de balé.
Ela nunca me pediu para fazer as tarefas, mas eu queria porque
não queria ser uma aproveitadora. Ela me salvou de
uma vida inteira de dor. Ela me permitiu ser alguém
diferente de mim por algumas horas, longe da minha mãe
e longe de uma vida que só me causava dor.
Eventualmente, Avery mudou o seu estúdio de Detroit
para Cleveland, e é por isso que estou aqui. Ninguém jamais
me contrataria, considerando meu passado e minha falta de
experiência, mas como eu disse, eu devia tudo a Avery. Ela nunca se
casou e não teve filhos, então sou tudo o que ela tem. 59
Colocando minha mochila no ombro, apago as luzes e tranco o
estúdio. Minha caminhonete está estacionada no estacionamento dos
fundos, a uma curta caminhada ao redor do prédio. Mesmo assim,
certifico-me de que meu bastão e meu celular estejam no bolso da
jaqueta.
Ultimamente, não consigo afastar a sensação de que estou sendo
observada. Provavelmente estou apenas sendo paranoica, mas muita
merda aconteceu na minha vida para que eu seja descuidada, e é por isso
que não tenho ideia de por que o cara novo no trabalho está me irritando.
Só de pensar nele, minha pele fica arrepiada, mas isso logo se
espalha quando o calor toma conta de mim. Ele não teve problemas em
se aproximar de Tawny hoje, mas comigo, parece que ele não consegue
escapar rápido o suficiente.
A noite passada foi um exemplo perfeito disso.
Baixei a guarda – a única vez – e veja o que aconteceu. Ele fez o
que todos os outros idiotas fizeram: me jogou de lado. Gemendo com a
minha estupidez, lembro-me de como eram seus lábios macios contra os
meus. Eles eram cautelosos, quase tímidos, com o tremor revelando
que ele estava nervoso, o que certamente não combinava com sua
aparência.
Nunca vi alguém tão... imponente antes. Ele
assusta, mas me intriga ao mesmo tempo. Será porque
vejo um prisioneiro preso lá dentro, desesperado para se
libertar, assim como eu? Ele olha para mim como se eu
fosse quebrar, mas não vou. Posso cuidar de mim mesma.
Seu cabelo é curto, mas posso ver que é escuro. Seus
olhos são tão incomuns, mas no bom sentido, de um jeito que leva
você para o abismo do pecado. Seu nariz arrebitado só aumenta sua
arrogância, seus lábios são perversos e carnudos e seus caninos 60
ligeiramente mais longos contribuem para sua vibração animalesca.
Ele é alto, misterioso e cheira a sonho de gengibre. Ele está coberto
de tantas tatuagens, e tenho vontade de ver cada uma delas, esperando
que esclareçam quem é esse homem. Suas mãos e dedos estão tatuados,
assim como seus braços, que vi hoje com aquela camiseta branca justa
grudada em seu corpo musculoso como uma segunda pele.
A intrincada tatuagem em seu pescoço consiste em duas mãos
esqueléticas segurando cada lado de seu pescoço. Elas parecem estar
apertando sua garganta com força. Isso me faz pensar se isso está de
alguma forma conectado ao número romano, o número quatro em sua
nuca.
Tanta coisa nele me fascina, e é por isso que preciso ficar longe.
Independentemente de quanto bom tenha sido, eu não deveria tê-lo
beijado. Foi um erro, mas foi como se eu tivesse caído sob seu feitiço,
um feitiço que tenho certeza que ele nem sabe que lançou. Ele não tem
ideia do efeito que causa nos outros. Há um magnetismo nele que faz
todo mundo virar a cabeça no momento em que ele entra em uma sala.
Não me sinto ameaçada por ele. Deus sabe que eu deveria, mas
quando ele levantou em minha defesa sem pensar duas vezes, isso me
mostrou que por baixo de seu exterior duro há algo especial, algo
diferente.
Algo que quero.
Sua escuridão dança com a minha. Posso sentir isso.
Essa escuridão dentro de mim está piorando desde que
todos que eu amava me deixaram. Todo mundo tem uma cruz
para carregar, mas a minha parece ficar cada vez mais pesada a cada
passo que dou. 61
Então, quando o vi hoje tocando naquele abutre, Tawny, percebi que
preciso ficar longe de Bull. Não posso me permitir nenhuma distração.
Tenho um plano, e esse plano é economizar dinheiro suficiente para
tirar Jordy e eu de Detroit. Quero que ele tenha uma infância normal e
não tenha que lamentar a morte de um amigo. Quero que ele possa ir a
pé para a escola sem ser atacado por causa do dinheiro do almoço.
O dinheiro que Avery me paga mal cobre meu aluguel, e é por isso
que danço. O dinheiro é bom, o horário de trabalho gira em torno das
aulas de balé e das babás, e posso dançar. Não fui feita para trabalhar
das nove às cinco como escrava de algum chefe chauvinista porque não
obedeço às regras. Eu nunca obedeço.
Dançar é minha maneira de ser livre. E eu era até que Bull entrou na
minha vida e a virou de cabeça para baixo.
— Pare de ser tão idiota. – eu sussurro para mim mesma, enquanto
caminho até minha caminhonete. É uma caminhonete antiga, mas faz o
trabalho.
A luz do dia já deu lugar à noite. Acelero o passo, com as chaves
na mão, mas quando ouço uma garrafa rolar pelo chão, os cabelos da
minha nuca se arrepiam. Com o bastão na mão, corro até minha
caminhonete e a destranco rapidamente, antes de sentar
no banco do motorista. Então bato a porta e abaixo a
trava da maçaneta.
Depois de três tentativas, minha caminhonete
finalmente ganha vida. Quando acendo os faróis, meio que
espero que o bicho-papão apareça na minha frente. Colocando
a caminhonete em movimento, saio do estacionamento e me
concentro na rua e não no fato de que o bicho-papão me destruiu há
muito tempo. 62

O longo trajeto de volta para casa me fez pensar em meu irmão,


Christopher. Ele partiu alguns meses depois do nascimento de Jordy.
Embora ele nunca tenha me contado, eu sabia que minha gravidez partiu
seu coração.
Quando Jordy nasceu, prometi a mim mesma que o protegeria com
a minha vida. Eu tinha dezesseis anos e Christopher tinha vinte quando
dei à luz Jordy. Eu era mãe solteira, mas mesmo que o pai de Jordy
estivesse em cena, eu não contaria a Christopher quem ele era, porque
Christopher o teria matado.
O pai de Jordy, Michael, era o melhor amigo de Christopher. Eu era
jovem e estúpida, mas nunca me arrependi de ter engravidado ou de me
apaixonar. Jordy é a melhor coisa que já aconteceu comigo. E o mesmo
aconteceu com seu pai, até ele deixar a cidade.
Michael é o único homem que amei e, quando ele partiu, prometi
nunca mais ser vulnerável a esse tipo de sofrimento.
Estremecendo com as lembranças, vou
rapidamente para o camarim, já que meu turno
começou há quinze minutos. Odeio chegar atrasada,
mas tive que passar por lá e ver Jordy primeiro. Minha
vizinha, Erika, está cuidando dele.
Christopher garantiu que eu fosse alimentada,
frequentasse a escola e fosse bem cuidada quando nossa mãe
se casou novamente e se mudou para Las Vegas. Ela nos deixou
o trailer, o que libertou sua consciência de ter abandonado os filhos, mas
tive que sair do trailer depois que Christopher foi embora. Havia muitas 63
lembranças ali. Então me mudei para um pequeno apartamento de dois
quartos. O lugar não é luxuoso, mas fica perto da escola do Jordy.
Todos os dias acordo prometendo a mim mesma que esta vida não é
para sempre. Antes de trabalhar no The Pink Oyster, trabalhei em
qualquer emprego que pudesse para trazer uma renda para casa. Mas
nunca foi suficiente, e é por isso que dancei nos últimos nove meses.
O dinheiro é bom porque, ao contrário da maioria dos clubes, a
Lotus paga um salário. É pequeno, mas é um incentivo para ficar porque
é um salário constante. A taxa de sua casa é metade do que os outros
clubes cobram, e ela não cobra taxa fora do palco. Se não quisermos
trabalhar no palco e quisermos apenas fazer um lap dance5 na sala VIP
para ganhar mais dinheiro, então podemos. As gorjetas também não são
obrigatórias, por isso a Lotus não tem DJ.
Guardamos o que ganhamos e não devemos dar gorjeta aos
funcionários porque não há ninguém para quem dar gorjeta.
Basicamente, Lotus é a melhor chefe que eu poderia pedir e, quanto
à clientela, posso tratá-los como lixo, e eles sempre voltam para pedir
mais. É vantajoso para ambos.
— Você está atrasada. – Bae sorri para mim enquanto tira um
vestido dourado. — Eu cobri para você, então não se preocupe.
— Ah, obrigada. – eu pressiono meus lábios em
sua testa antes de correr para o meu armário. — Como
está lá fora?

5Lap dance ou dança no colo é uma dança erótica, comum em


clubes de striptease, onde a dançarina move-se sensualmente
com ou sem roupa chegando a sentar no colo do cliente, a
dançarina pode estar nua ou de roupa.
Bae veste um moletom e uma camiseta larga quando seu turno
termina. — O de sempre. – ela responde com um encolher de ombros. 64
— Cães no cio, mas cheios de Georges. Um cara realmente me pediu
para esmagar suas bolas com os saltos.
Nós dois estremecemos de aversão.
O mundo está cheio de pervertidos doentes, mas nós negociamos
porque a maioria são Georges – generosos que dão gorjetas. Bae e eu
demos a eles o que a maioria dos nossos clientes deseja: a experiência de
namorar. Contamos histórias de lances, enganando-os fazendo-os pensar
que são nossos cavaleiros brancos.
Nós damos isso a eles, e eles se acalmam - dando grandes gorjetas,
então prestamos mais atenção neles pelo resto da noite.
Striper não é sobre tirar suas roupas - é uma questão de estratégia.
Os homens confundem Bae com uma florzinha delicada porque tem
apenas um metro e meio e pesa quase nada. Mas ela é ágil como uma
tigresa. E quanto a mim, eu danço pra caramba, seguindo meu lema de
que menos é mais, e eles me dão grandes gorjetas.
Isso é tudo sobre a agitação. Eles acham que estão no controle, mas
não estão. Somos nós que os enganamos.
Jogando minha mochila no chão, tiro a calça jeans e o suéter.
Tomei banho antes de vir para cá, mas ainda me sinto suja no
momento em que tiro o sutiã e a calcinha. Quando
visto meu uniforme – porque é assim que todas as
roupas que uso neste lugar são – eu me torno Tigerlily.
Esta noite, vou dançar “Rock You Like A Hurricane”
do Scorpions. Nunca me refiro ao que faço como strip-
tease. Sim, eu tiro a roupa, mas não sou stripper. Eu sou uma
dançarina que por acaso tira a roupa.
Raramente danço música pop porque não tem a mesma sensação de
uma música de rock. As canções de rock são cheias de angústia, paixão 65
e sexo. E como não faço sexo há muitos e muitos anos, pelo menos
posso me sentir sexy quando estou no palco.
— Você conheceu o novo segurança? – Bae pergunta, abanando o
rosto enquanto visto meu top rendado azul bebê e calcinha combinando.
Isso é um pouco picante para mim, já que normalmente não uso
nada totalmente transparente, mas apenas a menção de Bull, já que sei
que é a quem Bae está se referindo, me faz querer esfregar tudo o que
tenho - não literalmente - na cara dele. Ainda não entendo o que me
incomoda nele, mas nesse palco vou mostrar a ele quem manda.
Ontem à noite, quando ele me ignorou como nada, e ainda hoje
neste camarim, ele realmente me irritou. É evidente que ele não gosta de
ser tocado, por isso dei um air dance nele. Pensei que estava sendo legal
e respeitando seus limites, mas então ele vai e joga isso na minha cara
ao ficar na cara com Tawny.
Foda-se ele.
— Terra para Lily. – Bae brinca, estalando os dedos na minha
frente.
— Sim, eu o vi. Ele parece outro idiota tatuado com um peso no
ombro.
— Um peso em seu ombro muito musculoso e
largo. – ela corrigi, rindo quando reviro os olhos.
Procurando na minha nécessaire, eu rapidamente
passo óleo em mim. Em seguida, aplico meu pó, para que
meu corpo brilhe. Minha maquiagem consiste em sombra
prateada com glitter, cílios postiços, base impecável e lábios
vermelhos brilhantes.
Pressionando os lábios, retiro o elástico do cabelo e balanço-o.
Quando me olho no espelho, um sorriso diabólico aparece em minha 66
boca. Pareço selvagem e feroz. Pareço no controle.
Os homens lá fora podem pensar que são meus donos, mas não são.
Eu os possuo... todos eles, exceto um.
Jogando minhas coisas no armário, começo a me alongar e a me
aquecer porque nunca subo no palco despreparada. Não posso me
permitir nenhum ferimento. Depois que meus músculos estão relaxados,
calço meus saltos azuis brilhantes de quinze centímetros e sorrio para
Bae.
— Como estou?
— Deus ajude todos os homens lá fora. – ela responde, sorrindo. —
Embora eu tenha certeza de que apenas um homem precisa de toda a
ajuda que puder conseguir.
Arqueio uma sobrancelha, confusa.
Seu sorriso fica ainda maior. — Ouvi o novo segurança perguntando
se você viria hoje à noite.
— É? – eu respondo, surpresa.
— Sim, é por isso que perguntei se o conheceu. Eu me perguntei
se talvez fosse ele quem acabasse com sua seca. – ela brinca. Bae sabe
da minha “seca” porque ela é a coisa mais próxima que
tenho de uma amiga.
— Ugh. – eu franzo meu rosto, jogando um aplicador
de brilho labial para ela enquanto ela se abaixa e ri. —
Prefiro permanecer celibatária pelo resto da minha vida.
Muito obrigada.
— Ah-ha. – ela responde, sem acreditar em mim. — Ele é tão...
grande. Eu me pergunto se o pa... 67
Felizmente, Ricky, o apresentador, anuncia meu nome, encerrando
uma conversa que não tenho intenção de terminar.
— Continuaremos esta conversa mais tarde. – Bae ri quando bato na
bunda dela no caminho para fora da porta.
A caminhada em direção à cortina é uma descarga de adrenalina
para mim. Eu gosto de me apresentar porque me perder na música, na
dança, é quando me sinto mais viva. Quando a música começa, estalo o
pescoço de um lado para o outro e balanço os braços.
A expectativa é a melhor parte. Eu não saio imediatamente. Deixei
esses animais esperarem. Este é o meu show, então vou quando estiver
pronta... que é agora.
Abrindo a cortina, saio para as luzes brilhantes, vitoriosa enquanto
desfilo no palco. Os assobios dos homens na grade me fazem sorrir.
Mostre-lhes um pouco de peito e bunda, e estarão prontos para gastar
suas economias. As notas instantaneamente enchem o palco, apenas
consolidando meu ponto de vista.
Eu me movo no ritmo da música, usando cada parte do meu
corpo como arma. O poste é um adereço essencial para o meu show
porque seu formato é a analogia perfeita para o que todos aqueles
idiotas lá embaixo gostariam que eu fizesse com o pau
deles.
Em seus malditos sonhos.
Subo com facilidade, antes de girar e virar de cabeça
para baixo. Enganchando meu tornozelo no mastro, seguro-o
com uma mão e empurro minha pélvis algumas vezes em
sincronia com a música, fazendo com que os assobios soem altos ao meu
redor. 68
Ainda não consigo acreditar que esses idiotas consomem essa
merda.
Continuo minha coreografia, apontando os dedos dos pés enquanto
estendo meu corpo para fora usando meu núcleo. Se alguém nesta
plateia tivesse alguma ideia, poderia ver minha formação em balé, mas
não se importam. Eles só se importam em me ver nua.
A raiva me percorre e eu giro rapidamente. Cada um deles é igual a
todos os outros homens da minha vida: olham para mim como se eu não
passasse de um brinquedo. Deslizando ferozmente, eu caio na beira do
palco, agachada.
Quando uma mão se estende para frente, tentando me tocar, eu
imediatamente recuo e danço longe do seu alcance. Este não é um
zoológico. As luzes estroboscópicas começam a piscar e eu me movo
como se estivesse possuída. A multidão enlouquece enquanto rasgo o
tecido fino do meu top e jogo a roupa para o público.
Estou prestes a cobrir meus seios, mas quando um flash de azul
brilhante com um toque de verde âmbar brilha diante de mim, paro de
repente, expondo-me para ele. Não tenho ideia de onde ele estava,
mas agora está a poucos metros do palco. Os homens estão fora de
seus assentos, gritando alto enquanto me observam com fervor, e é
por isso que ele está tão perto. Ele está apenas fazendo
seu trabalho.
Mas quando aqueles olhos incompatíveis me comem
viva enquanto ele esfrega dois dedos tatuados nos lábios
macios, quero acreditar que ele está aqui porque também
sente essa pulsação elétrica entre nós. Minha pele fica
iluminada pela carranca selvagem espalhada por seus lábios curvados
porque ele parece perigosamente irritado. 69
O olhar só me incita a dançar mais rápido, movendo o corpo com
confiança. Bull logo se vira, encarando o público, o que me faz
comemorar em triunfo. Sua submissão é minha vitória, e termino o set,
sem fôlego, coberta de suor e com um sorriso malicioso de vencedora.
O palco fica coberto de escuridão antes que a sala entre em
pandemônio.
— Poooorra! – Ricky grita, entrando no palco enquanto as luzes e a
música de fundo voltam. — Dê à minha garota Tigerlily outra salva de
palmas!
Os homens salivando fazem o que lhe pede enquanto me inclino
para frente, com o braço em volta dos seios para pegar meu dinheiro. Há
tanto verde espalhado por toda parte que Ricky se abaixa para me ajudar
a juntar tudo. Assim que pego uma nota de vinte, uma mão suada e
indesejada agarra meu antebraço.
Nem tenho a chance de me mover porque uma sombra negra desliza
friamente para frente e dobra o pulso do meu abusador. O homem grita e
imediatamente me solta. Olho nos olhos de Bull e cada fibra do meu
corpo percebe sua presença.
— Obrigada. – digo brevemente.
Ele apenas acena com a cabeça em resposta,
ficando de guarda enquanto recebo meus ganhos.
Quando termino, corro rapidamente pela cortina, onde
posso finalmente respirar novamente.
70

— Tem certeza de que deveríamos estar aqui? – Meu melhor amigo


Gary Buchanan pergunta, enquanto nos agachamos, permanecendo
escondidos pelas árvores.
— Sim, agora pare de ser tão idiota e vamos embora.
Gary está certo; não deveríamos estar aqui. Já passou do toque de
recolher, mas o que meus pais não sabem não irá prejudicá-los.
Nós aproximamos da fogueira escaldante,
certificando-nos de ficar abaixados porque este lugar é
proibido para dois garotos metidos como nós.
Os Titans, time de futebol do meu irmão, venceram a
final, graças a Damian marcar um touchdown faltando três
segundos para o fim do tempo. Meu irmão, o herói da cidade,
salvou o jogo, o que não é nenhuma surpresa, e para
comemorar, todos foram ao Pinnacle Point, um ponto de encontro local
na floresta para os veteranos. 71
A festa está a todo vapor. A cerveja flui livremente e inúmeras
garotas se aglomeram ao redor de Damian. Ele não está interessado
nelas, entretanto, porque está namorando sua namorada, Lyndsay, há
dois anos. Eles realmente são nojentos com a maneira como olham um
para o outro com olhares apaixonados. Mas o que eu saberia sobre o
amor? Eu nunca beijei uma garota.
Gary e eu estávamos muito interessados em andar de bicicleta para
prestar atenção em qualquer garota. Mas isso mudou no momento em
que Damian me arrastou para seu estúpido jogo de futebol hoje à noite, e
vi uma líder de torcida morena com um lindo sorriso.
Não sei o nome dela, por isso estou aqui. Eu quero descobrir.
Damian me avisou sobre as líderes de torcida e ele estava certo. Eu
sempre poderia perguntar quem ela é, mas quero fazer isso sozinho.
Sempre vivi na sombra do meu irmão, o que nunca me incomodou antes,
mas descobrir quem é a garota misteriosa sozinho parece um passo em
direção à masculinidade.
Sei que isso é ridículo, mas seria ainda mais ridículo se meu irmão
apresentasse seu irmão mais novo à mulher dos seus sonhos.
Com isso como minha mentalidade, nos aproximamos,
observando a cena que se desenrola. As pessoas se beijam ao redor do
fogo, enquanto outras dançam, riem e se divertem.
Observo a área, na esperança de ver minha líder de
torcida. Eu vejo.
— Lá está ela! – murmuro, dando uma cotovelada nas
costelas de Gary.
Ele grita, pulando para longe de mim. — Sim, e daí? O
que você vai fazer? Você não pode falar com ela. Seus pais vão te
deixar de castigo por uma semana se descobrirem que você está aqui.
Devíamos ter uma festa do pijama na minha casa. 72
Ele tem razão.
Meus pais são um pouco severos comigo porque não sou o filho de
ouro como Damian. Não faço o que me mandam. Suponho que você
possa me chamar de ovelha negra ou de rebelde da família, mas não me
importo. Damian não me delataria, mas sei que ele me faria sentir
culpado por desobedecer aos meus pais. Sua honestidade iria passar para
mim, e então eu acabaria cedendo, contando a eles o que fiz.
Então nem é preciso dizer que ele não pode me ver.
A líder de torcida ainda está de uniforme, conversando com um
grupo de garotas. Encontrando coragem, ando em direção a ela. Gary
fica atrás de mim, sendo meu sentinela. Damian está do outro lado do
campo, então acho que estou seguro por enquanto.
Não sei como isso é feito, mas decido pegar uma página do livro do
meu irmão e usar uma de suas falas. Quando paro a poucos metros delas,
ela se vira e olha para mim com grandes olhos azuis.
— Olá, linda. – digo com confiança, sorrindo.
Suas amigas sorriem, abafando o riso com as mãos.
— Oi. – ela finalmente responde, tomando um gole de sua bebida
em um copo azul.
— Vi você sendo líder de torcida esta noite. No
jogo. – acrescento estupidamente, porque onde mais ela
estaria torcendo?
Mas mantenho a calma.
— Ah, incrível. – Preciso entender a dica, mas não
consigo. Eu quero ser o único desta vez; aquele que brilha.
— Então, posso ter seu número?
Todas as suas amigas gargalham alto enquanto Gary geme,
73
insinuando que esta está sendo considerada a pior tentativa de sedução
da história.
Eu deveria abortar, mas não posso. — Meu nome é Cody. Cody
Bishop.
De repente, elas param de rir, desta vez com a boca aberta por outro
motivo. — Seu irmão é Damian Bishop? – Uma das garotas pergunta.
Porra.
Isso não é o que eu queria. Eu queria fazer isso por meu próprio
mérito e não por causa de quem é meu irmão. Mas eu aceno, mesmo
assim.
A líder de torcida, cujo nome eu nem sei, sorri, olhando por cima do
meu ombro. — Me passa seu celular.
— Sonya! – Uma das amigas repreende com uma risadinha. — Ele
é muito novo.
Um nome. Finalmente. Sonya, minha rainha.
Procuro meu celular em minha calça jeans e o entrego a ela. Ela
aceita com um sorriso torto. Quando ela digita seu número, não
consigo acreditar na minha sorte. A amiga dela olha com os olhos
arregalados enquanto me sinto como Hércules.
Isto é, até Sonya me devolver meu celular e dizer:
— Você pode dar meu número para seu irmão?
Ofegante como um peixe fora d'água, de repente sinto
como se ela tivesse me dado um chute no saco. Não sei o que
dizer, então aceno com a cabeça como uma maricas. — Claro.
— Obrigada, Cody. – Sonya se inclina e beija minha bochecha. O
beijo é casto, pois é evidente que ela sente pena de mim porque viver à 74
sombra de Damian Bishop é como ser eclipsado pelo sol.
Ela rapidamente recua, gritando, e não tenho ideia do porquê disso,
até que alguém puxa meu bíceps e me vira. Ele se eleva sobre mim e me
levanta com facilidade, então estamos cara a cara.
— Solte-me, filho da puta! – digo um palavrão, tentando me
libertar.
Ele ri em resposta. — O que você está fazendo aqui, garoto? Já não
passou da sua hora de dormir?
— Vá se foder. – eu cuspo na cara dele, o que tem o efeito desejado
quando ele me deixa de pé. Instantaneamente, dou uma joelhada nas
bolas dele. Quando ele chia e se inclina, eu dou um soco no rosto dele.
De repente estou com muita raiva.
Posso ser magro, mas sou briguento e sei brigar. Damian falaria
sobre isso, mas não sou Damian, porra – não sou perfeito como ele.
Os amigos aproveitadores do cara vêm correndo, com os punhos
erguidos e prontos para a batalha. Gary não ajuda em nada enquanto
corre e se esconde atrás das garotas. Estou em menor número, quatro
para um, mas de repente me sinto vivo. Esta briga é minha, minha,
não de Damian.
E esse fato me estimula a seguir em frente
enquanto arrasto um cabeça-oca. Ele cai no chão com
um baque. Antes que eu perceba, há uma agitação de
punhos e eu ataco qualquer coisa que esteja no meu
caminho. Estou movendo com pura adrenalina e ignoro os
gritos ao meu redor. É um caos absoluto.
No exato momento em que dou uma joelhada na cara de algum
idiota, ouço uma garrafa quebrar e depois vejo sua ponta serrilhada 75
vindo em minha direção. Eu pulo para trás, com os braços levantados. O
cara que dei uma joelhada nas bolas está em busca de vingança. Eu
nunca tiro os olhos dele enquanto ele me cerca.
— É muita areia para o teu caminhão, não acha? Procurando a
garota mais bonita daqui. – Esse idiota é definitivamente o líder. Ele tem
olhos negros sem alma, olhos que nunca esquecerei. Ele também tem
uma pequena tatuagem de um tubarão azul na lateral do pescoço.
— Deixe-o em paz! – Alguém que suponho ser Sonya grita.
Esses idiotas não frequentam nossa escola. Eu os reconheceria se o
fizessem. Percebo que me meti em alguma situação séria e, agora que a
adrenalina passou, de repente estou com medo. Assim que o bastardo
avança em minha direção, ele é jogado para o lado com força brutal.
Viro o queixo para ver Damian corpulento, pronto para enfrentar
qualquer um. — Escolha alguém do seu tamanho, escória! – ele grita,
com os braços bem abertos como a porra de um super-herói.
Os caras correm para frente, dando alguns socos, antes que Damian
os jogue para o lado como formigas. Assistindo com os olhos
arregalados, não posso acreditar que meu irmão os está enfrentando e
vencendo. Eu ajudei, mas ele torna minha tentativa ridícula.
— Vá à merda, idiota! – grito ao lado, torcendo
por meu irmão.
Quando os quatro idiotas percebem que perderam,
eles fogem com o rabo entre as pernas como os covardes
que são. Ganhei minha primeira luta. Bem, mais ou menos.
Damian se vira para mim com aquele olhar de irmão mais
velho. — Para casa, agora.
— Ah, vamos lá, mano. Vamos comemorar a sua surra com uma
cerveja. 76
Sonya ri, o que me faz pensar que talvez eu tenha meia chance. Mas
quando Damian limpa o sangue do lábio com as costas da mão, lutando
para ficar de pé, percebo que é melhor levar nós dois para casa. — Tudo
bem. Mas você vem comigo.
Espero que ele discuta, mas ele balança a cabeça, encolhendo-se.
Ele definitivamente vai ter um olho roxo pela manhã.
Lyndsay se oferece para vir conosco, mas Damian balança a cabeça.
— Você fica, querida. Todos os seus amigos estão aqui. Me ligue
quando você chegar em casa.
— Tem certeza? – ela pergunta, mordendo o lábio inferior.
Isso é tão Damian. Pensando nos outros.
— Sim. Além disso, preciso levar o Fedelho para casa. – ele olha
para mim incisivamente enquanto lhe arregalo os olhos. Ele acabou de
arruinar minhas chances com Sonya. Ninguém quer ficar com um
“Fedelho”.
Damian e Lyndsay se beijam enquanto finjo engasgar.
Sonya sorri para mim antes de murmurar: — Ligue para mim. –
Bem, talvez eu estivesse errado. Parece que esta noite acabou de se
tornar a melhor da minha vida.
Damian bagunça meu cabelo antes de começarmos
a subir lentamente a colina até onde ele estacionou sua
caminhonete. Ele está instável, revelando que está
sofrendo, mas não diz uma palavra.
— Quer que eu dirija? – sugiro. É o mínimo que posso fazer, visto
que ele salvou minha bunda de ser cortada em queijo suíço. 77
Damian enfia a mão no bolso da jaqueta do time, tirando as chaves.
— Não conte para a mamãe. – ele brinca, enquanto sorrio.
O terreno é denso de árvores e, embora este seja o atalho,
provavelmente teria sido mais fácil se nós tomássemos o caminho.
Caminhamos devagar enquanto Damian tenta recuperar o fôlego.
— Então, a doce Sonya Teller, hein?
Quando não respondo, ele me cutuca nas costelas de brincadeira. —
Eu te disse, líderes de torcida...
Mas nunca saberei o que ele iria dizer porque num segundo ele está
parado ao meu lado e no outro estou suspenso no ar.
Instantaneamente, eu o chuto, mas é inútil. Algum idiota está com
os braços em volta da minha cintura, me mantendo prisioneiro enquanto
três de seus amigos emergem da escuridão e atacam Damian.
— Não! – grito, tentando me libertar, mas é inútil. O cara tem um
forte controle sobre mim. Sinto cheiro de cerveja e maconha em seu
hálito fétido. — Solte-me.
— Desculpe, não posso fazer isso. É hora de você se tornar um
homem.
Logo reconheço esses bastardos como os quatro
que nos atacaram antes. Mas, ao contrário de antes, eles
pegaram Damian ferido de surpresa. Eles o atacam,
chutando-o nas costelas, no rosto, no estômago – sempre
que podem. Ele tenta combatê-los, mas eles dão uma
joelhada tão forte no nariz dele que ele se quebra com a força.
Ele cai de costas, com falta de ar. Ele está muito machucado.
Observo impotente, incapaz de fazer qualquer coisa, enquanto
78
espancam meu irmão sem sentido, incapaz de fazer qualquer coisa além
de me contorcer com todas as minhas forças.
O líder ri quando Damian estende a mão para ele, tentando em vão
combatê-lo. — Não é tão difícil agora, não é, quarterback?
— Deixe-o em paz! – grito, me debatendo violentamente contra o
homem que está me segurando contra o peito. Ele é um filho da puta
grande e forte que tem cerca de cem quilos a mais que eu.
Damian geme, rastejando na terra enquanto começa a rastejar
lentamente para longe de seus três agressores. A visão me mata porque
ele parece muito fraco. Mas não lhe mostrarão a mesma misericórdia
que ele demonstrou. O líder fica na frente dele, abre o zíper da calça
jeans preta e começa a mijar na cabeça de Damian.
— Seu idiota! Pare com isso! – eu me debato, com a intenção de
matar.
Um deles pressiona a bota nas costas de Damian para impedi-lo de
se mover, enquanto outro cai de joelhos, dobra o pulso de Damian para
trás com um estalo e arranca o anel de campeonato de seu dedo. Não é
suficiente que eles o estejam degradando e quebrando; eles têm que
roubar dele também.
Eles riem histericamente às custas do meu irmão.
Três contra um dificilmente é justo, mas não há justiça
nesta situação.
— Obrigado pelo meu anel. – zomba o cara que o
pegou de Damian, colocando o anel no dedo médio. —
Gosto da sua jaqueta. Sempre quis ser quarterback. Mas eles
disseram que eu era muito pequeno. Não tão pequeno agora, não é,
idiota? 79
— Segure-o. – ordena o líder ao cara que o está segurando. Ele faz o
que lhe é mandado. Ele puxa o cabelo de Damian, forçando-o para trás
em um ângulo doentio. Damian geme, coberto de sangue e mijo.
Depois que o zíper é fechado, o líder vem por trás dele e arranca a
jaqueta dele. Ele então joga para o idiota que pegou o anel de Damian.
Agora que roubaram dele e o espancaram, certamente nos deixarão
em paz. Mas eles não deixam. O líder dá um soco tão forte na mandíbula
de Damian que vejo um de seus dentes voar pelo ar e cair na terra.
— Não! – grito sem parar, tentando freneticamente me libertar. O
idiota que me segura apenas me agarra com mais força, rindo enquanto
observa seus amigos espancarem violentamente meu irmão.
O ladrão e o líder da matilha se revezam para socá-lo até que seu
queixo caia no peito. Um pouco de sangue escorre de sua boca, sujando
a terra de vermelho. A luz da lua reflete algo brilhante: o medalhão de
São Cristóvão de Damian.
Ele nunca tira. Ele chama isso de amuleto da boa sorte. Mas agora
não é nada além de outra coisa que eles podem roubar. O líder
arranca-o do pescoço flácido, quebrando a corrente. Ele acena para
seu amigo que o segura, que empurra Damian de volta no chão.
Ele cai em uma pilha, ofegante.
A visão é minha ruína. Damian está sendo ferido por
minha causa... e eu me recuso a aceitar essa realidade.
Algo tão feroz me domina e bato minha cabeça para
trás, acertando o rosto do idiota. Um grito de dor o abandona
e eu caio no chão. Eu luto para ficar de pé, com as minhas
pernas inúteis se transformando em gelatina, mas finalmente
encontro o equilíbrio e corro em direção a Damian.
— Não... Fedelho, não. – ele avisa sem fôlego, estendendo a mão
80
quebrada, mas não escuto. É hora de salvá-lo. Estou tão absorto em
chegar até ele que não vejo isso acontecendo antes que seja tarde
demais.
Do nada, alguém vem em minha direção, com uma pedra na mão,
pronto para acabar com minha existência miserável de uma vez por
todas. Não tenho tempo para me mover. Estou encurralado, preso. Eu
me preparo para a morte, mas não sinto nada. Talvez já esteja morto.
Quando nada acontece, abro lentamente os olhos e me encontro na
mesma posição em que estava, mas não entendo o que estou
testemunhando. O líder fica imóvel diante de mim, com a pedra na mão,
sangue escorrendo dos dedos. Um sorriso sinistro franze seus lábios
enquanto ele olha para o chão.
Sigo seu campo de visão e vejo... não, por favor, Deus, não.
Há uma calma antes da tempestade, uma calma que me permite
observar uma visão que meu cérebro se recusa a processar porque não há
como. Diante de mim está meu irmão, mas algo está muito errado. Um
grito horripilante sai do meu peito e é o chamado para despertar que eu
precisava. Isso dá o pontapé inicial no começo do fim.
— Damian? – digo, sem saber se o que estou vendo é verdade.
Mas quando um vermelho brilhante mancha a terra
abaixo dele, sei que isso está realmente acontecendo.
— Ah, meu Deus. – A terra levanta quando corro até
ele, empurrando os quatro idiotas para fora do caminho.
Ficando de joelhos, eu o embalo contra meu peito, e meu
estômago embrulha quando seu corpo fica mole. — Damian,
você pode me ouvir?
Ele pisca os olhos rapidamente, mas não fala. Ele parece estar em
choque. 81
— Alguém ligue para o 911! – grito tão alto que minhas cordas
vocais rasgam. — Por favor! – eu perdi meu celular na confusão.
Afasto o cabelo loiro de sua testa e minha mão fica vermelha
brilhante. Não entendo o porquê. Eu o abraço perto de mim, mas minha
camiseta branca de repente fica manchada de um vermelho brilhante.
Levantando-o gentilmente, sinto o vômito subindo quando vejo um
buraco na parte de trás de sua cabeça – um buraco que foi feito pelo
filho da puta que ainda segura a arma na mão.
Encontro seus olhos sem vida e faço uma promessa, aqui e agora, de
que vou encontrá-lo e dar-lhe o mesmo destino. — Ainda acha que é
melhor do que eu, lindo garoto? – ele grita, cuspindo em mim e em meu
irmão. O insulto final antes de ele atirar a pedra para um de seus amigos.
O filho da puta que segurou meu irmão como um cachorro segura a
pedra, com os olhos arregalados. Ele parece estar preso em uma névoa.
— Por favor. – eu imploro. — Chamem uma ambulância. Meu irmão
está morrendo. Por favor, ajudem-no.
Agora que a gravidade do que eles fizeram foi processada, ele
parece estar em choque. — Jaws? – ele finalmente diz.
Mas Jaws, o líder, balança a cabeça. Sua tatuagem agora faz todo
o sentido. — Você quer ir para a prisão? É isso? Fique
à vontade e chame a maldita polícia. Diga a eles o que
você fez. – Jaws enfia a mão no bolso e oferece seu
celular. — Sua vida terminará... assim como a dele. – Não
há nada além de ódio quando ele olha para Damian.
Olho de um lado para o outro entre eles, implorando para que
mostrem misericórdia, mas no final, o medo sempre vencerá. 82
Como o covarde que é, ele foge noite adentro, deixando o local de
um acidente, deixando meu irmão morrer. Logo todos seguem o
exemplo, sendo Jaws o último a ir.
Suas palavras de despedida me mudarão para sempre porque ele
está certo. — A culpa é tua, garoto. – ele escapa livre para a escuridão,
mesmo sendo culpado de assassinato.
Não posso persegui-lo. Estou indefeso, ou melhor, inútil porque a
culpa é minha.
— Voltem aqui! Vou encontrar vocês, seus filhos da puta! Eu vou
matar vocês! Eu prometo! Vocês estão todos mortos! – A saliva cobre
meu queixo enquanto embalo meu irmão, embalando-o contra meu
peito. — Damian, eu sinto muito. Por favor, não morra.
Minhas lágrimas escorrem pelo rosto de Damian enquanto o abraço
com força. Olhando para o céu sem estrelas, grito para o universo,
implorando para que alguém tenha misericórdia do meu irmão porque
ele não merece morrer. Se alguém merece morrer, sou eu.
Se eu não o seguisse. Se eu tivesse ficado na casa de Gary, nada
disso teria acontecido.
— Sinto muito. – repito várias vezes, embalando o meu irmão
ofegante. Estou coberto pelo sangue dele: é grudento e
quente e me dá vontade de vomitar.
Tento estancar o sangramento na parte de trás de sua
cabeça colocando a mão sobre a ferida aberta, mas tudo
que sinto é mingau. Percebo que o mingau é o cérebro dele.
Aquele bastardo abriu seu crânio.
— Prometo a você que vou ficar bem. Só por favor, não morra. –
imploro a Damian, olhando em seus olhos. — Eu te amo, mano. Não me 83
deixe. Por favor, por favor, não me deixe.
Sua corrente de prata está a poucos metros de distância, deixada
caída no chão enquanto os covardes fugiam noite adentro. Com um
braço, estico e o alcanço, precisando de toda a sorte que puder encontrar.
Meu irmão não vai morrer. Ele é forte. Um maldito super-herói.
Veja o que fez. De alguma forma, espancado e quebrado, ele encontrou
forças para se levantar e me proteger. Se não fosse ele intervindo,
ficando na minha frente e recebendo o golpe que era destinado a mim,
eu seria o único deitado neste chão frio, sangrando. Alguém como
Damian não morre, nem aos dezessete anos, nem com toda a vida pela
frente. A vida não é tão cruel. Não é?
No entanto, quando ouço Lyndsay soltar um lamento histérico,
percebo que sim, a vida é cruel pra caralho. Ela levou embora meu
irmão. Tirou a única pessoa que não merecia morrer.
Olhando para baixo lentamente, olho nos olhos sem vida do meu
irmão porque ele está morto... morto... por minha causa.

Eu me endireito, coberto de suor.


Alcançando freneticamente o abajur de cabeceira, eu o
acendo, dando um suspiro de alívio quando percebo onde estou.
Foi apenas um sonho ou, mais precisamente, o pesadelo que me
atormentou nos últimos quatorze anos. 84
Passando a mão pelas mechas curtas do meu cabelo, tiro os
cobertores e sento na beira da cama. Segurando meu rosto, abaixo a
cabeça e respiro fundo, sentindo o medalhão de Damian queimar contra
minha pele.
A morte de Damian deu início ao fim da minha família.
Assim que os paramédicos chegaram, confirmaram o que eu sabia
ser verdade. A causa da morte de Damian foi um traumatismo
contundente na cabeça - também conhecido como a porra de uma pedra
que abriu seu crânio como um melão. A polícia veio logo em seguida,
colhendo os depoimentos de todos, mas ninguém quis ajudar porque não
viu o assassinato propriamente dito. Além disso, eles estavam correndo
assustados.
Os caras que invadiram a festa eram conhecidos de alguns, mas
ninguém estava disposto a apontar o dedo. A arma do crime poderia ter
sido qualquer uma das centenas de pedras espalhadas. Assim, sem
provas ou relatos de testemunhas oculares confiáveis, e com um crime
como o do meu irmão acontecendo quase todos os dias em Detroit, o
caso permaneceu sem solução.
Ninguém foi acusado, o que significa que ninguém foi punido por
matar meu irmão. Onde estava a justiça nisso? Contei várias vezes à
polícia como eles eram, mas sem nome - já que o
apelido Jaws não era suficiente - e sem pistas concretas,
Damian era apenas mais uma estatística.
Os policiais me viam apenas como mais um pirralho
qualquer.
Minha mãe teve um colapso mental enquanto meu pai se
fechava para qualquer emoção. Eles me disseram que estava tudo
bem e que não era minha culpa, mas quando baixaram meu irmão em
seu túmulo, seu caixão branco mantendo o seu corpo quebrado, ficou 85
claro que desejavam que fosse meu cadáver que eles estavam enterrando
e não o do meu irmão.
Minha mãe e meu pai nunca mais foram os mesmos depois disso.
Eles pareciam se odiar, culpando um ao outro pela morte de Damian
quando, na verdade, deveriam ter me culpado. Mas eles não fizeram
isso. Eles fizeram algo pior. Eles esqueceram que eu existia.
Mas isso me estimulou a fazer o que a polícia não fez. Eu
encontraria aqueles idiotas e os faria pagar.
Pelas informações que tive, eles pertenciam a uma gangue. Então
fui para as ruas, procurando por eles. Mas eu era um estranho, um garoto
rico e privilegiado que estava invadindo um lugar ao qual não pertencia.
Durante meses procurei por eles, mas ninguém quis falar. Era como se
eles tivessem desaparecido no ar.
Desesperado e tão cheio de culpa, me envolvi com drogas, álcool,
garotas – qualquer coisa para anestesiar a dor. Abandonei a escola e
andei com o grupo errado de pessoas que eram tão fodidas quanto eu.
Cobri meu corpo com tatuagens e piercings porque a dor me fez sentir
alguma coisa, mas eu ainda estava morto por dentro.
Queria expor os pecados na minha pele, para que todos pudessem
ver o que eu tinha feito.
Mudei-me, invadindo qualquer lugar, sem me
importar se viveria ou morreria. Eu estava tão sozinho,
mas eu merecia. Damian sempre estaria sozinho, então
jurei que estaria também.
Por dois malditos anos, eu mal estava vivo, flutuando
dentro e fora da vida como um estranho em minha própria
pele. Eu não via meus pais há meses e, embora eles fingissem
sentir minha falta, estava claro que eu apenas servia como um lembrete
de tudo que eles perderam. Quando fui embora, eles nunca perguntaram 86
se eu voltaria.
Uma noite, fui comprar maconha quando os cabelos da minha nuca
se arrepiaram. Eu não sabia por que, mas quando me virei e olhei por
cima do ombro, foi como se tivesse ganhado vida pela primeira vez em
dois anos.
Eu o vi. O idiota covarde que participou da morte do meu irmão. Eu
nunca iria esquecê-lo - seu rosto estava queimado em minha alma. Eu
pedi ajuda a ele e, em troca, ele fugiu. Ele teve a chance de se redimir,
mas agora estava sem sorte. Ele pode não ter batido no meu irmão, mas
todos tiveram um papel na sua morte.
Lembrando-me da minha promessa de matá-lo e dos paramédicos
retirando o cadáver do meu irmão dos meus braços, fui animado por um
fogo que não sentia há muito tempo. Eu tinha dezessete anos, dois dias
antes de me tornar um adulto oficial, mas já era adulto muito antes de
completar dezoito anos.
Não sabia como fazer a dor constante ir embora. Eu não sabia como
consertar até que o vi.
Naquele momento, eu sabia o que tinha que fazer.
Na minha opinião, eu acreditava que olho por olho tornaria tudo
melhor. Eu salvaria o casamento dos meus pais e
vingaria a morte do meu irmão. Ao matar esse idiota,
acreditei que as coisas voltariam a ser como eram.
Fiquei obcecado e decidi saber as idas e vindas de um
dos homens que mataram meu irmão.
Ele trabalhava no turno da noite em uma loja de
conveniência, o que era perfeito. Eu poderia realizar minha
vigilância nas sombras, onde era o meu lugar. Durante duas semanas, eu
o persegui e, quando fiquei pronto, comprei uma arma na rua, para que 87
ninguém pudesse rastreá-la até mim.
Não estava chapado ou bêbado quando parei no beco atrás da loja.
Eu estava calmo. Esperei que ele levasse o lixo para fora, como fazia
todas as noites antes das 2 da manhã. Quando a porta dos fundos se
abriu e ele saiu carregando o saco de lixo preto no ombro, percebi que
este era o meu momento, o meu momento de vingar Damian.
Saí das sombras, tirei a arma da jaqueta e apontei. Seu crachá dizia
Lachlan. No começo ele ficou confuso, mas quando me viu, ele sabia...
ele sabia que seu dia havia chegado.
O saco de lixo caiu no chão enquanto ele implorava por sua vida.
Ele caiu de joelhos, implorando que eu o perdoasse pelo que ele fez. Ele
disse que foi um acidente, que não tinha intenção de machucar meu
irmão, mas era tarde demais: suas desculpas não significavam nada para
mim.
Ele viveu dois anos que Damian não viveu, e isso foi dois anos a
mais. Já era tempo.
Perguntei-lhe onde estava Jaws, mas negou saber do seu paradeiro.
Isso só acelerou o inevitável porque eu sabia que ele estava mentindo.
Engatilhei a arma e coloquei o dedo no gatilho, mas quando ele
começou a chorar e mijar na calça, uma voz que eu não ouvia há
muito tempo me implorou para não fazer isso. Isso não
o traria de volta; isso só pioraria as coisas. Mas o que
era pior do que viver esta vida sem meu irmão?
Mas aquela voz pertencia ao meu irmão, e foi como
se ver o assassino de alguma forma o trouxesse de volta à
vida.
A voz me disse para perdoar Lachlan porque Damian o fez. Ele
aceitou sua morte e agora era a minha vez de fazer o mesmo. 88
Cada centímetro do meu corpo retaliou, desesperado por
derramamento de sangue e vingança. Mas quando eu olhei nos olhos de
Lachlan, percebi que não seria melhor do que ele se tirasse sua vida. Eu
estava tão perdido, mas sabia que não era um assassino.
Se fizesse isso, não haveria como voltar atrás e nem amanhã. Mais
uma vez, as palavras de sabedoria de Damian me salvaram.
Assim que tirei o dedo do gatilho, Lachlan colocou a mão no bolso
com um sorriso. Instantaneamente, visões de sangue, o sangue quente e
espesso de Damian me invadiram, e minha mente paranoica me viu em
um túmulo bem próximo ao do meu irmão. Eu não hesitaria novamente.
Apontando a arma, disparei uma vez sem emoção. Foi a primeira
vez que disparei com uma arma, um alvo perfeito direto no meio do
peito. Lachlan piscou uma vez antes de cair para frente com um baque.
Sua mão estendida segurava uma caixa de veludo preto, caixa que mais
tarde descobri que continha um anel de noivado.
Atirei nele porque pensei que ele estava pegando uma arma, mas na
verdade ele queria me agradecer por poupar sua vida, porque ele tinha
uma vida inteira planejada com alguém especial. Mas estraguei tudo
no momento em que atirei nele a sangue frio.
Aquela noite foi a primeira e única vez que ouvi a
voz de Damian, um sinal claro de que não me chamava
mais de irmão. Então, naquela noite, Cody Bishop
também morreu e Bullseye nasceu.
89

Não tinha dormido e, depois de reviver um pesadelo que gostaria de


esquecer, levantei-me no meio da noite e corri oito quilômetros. Eu me
senti remotamente melhor, mas não importa o quanto cansado estivesse,
eu sabia que a insônia me dominava e não me deixava.
Não dormi muito na prisão e quando dormi foi sempre com um olho
aberto. Parece que não mudou muita coisa. Mas não posso deixar Franca
Brown estar ciente desse fato, porque se ela não perceber uma
mudança, ou sentir um cheiro de depravação em mim, ela não terá
problemas em me jogar de volta na prisão. E não posso deixar isso
acontecer porque tenho trabalho a fazer.
Quatorze anos atrás, prometi matar aqueles filhos da
puta. E eles já estão mortos. Eles simplesmente não
sabem disso ainda.
A única informação que obtive na prisão foi que Jaws era
o chefão desta cidade e um filho da puta temido. Os outros
dois eram apenas seus lacaios, o que significa que são os elos mais
fracos. Eu os encontrarei e eles me levarão até ele. 90
A especialidade de Jaws eram armas e drogas, e ele tinha uma queda
por strippers, e foi por isso que não pude acreditar na minha sorte
quando encontrei o The Pink Oyster e me ofereceram um emprego. Eu
tenho olhos por dentro agora. Se a coceira dele precisar ser coçada,
ficarei feliz em coçá-la com uma espingarda de cano serrado.
Durante doze anos, vivi e respirei apenas uma coisa: vingança, e
agora está se concretizando. O plano é simples: encontrar aqueles filhos
da puta e não ser pego. Como eu disse, não vou voltar a ser preso de
jeito nenhum. Uma vez feito isso, e eu tiver vingado meu irmão, vou
deitar ao lado dele, onde é o meu lugar.
Porém, Franca, minha agente de condicional, não pode saber desse
plano, então me concentro, pois tenho um encontro com o destino em
quinze minutos.
Depois de tomar banho, fazer a barba e parecer um escoteiro com
camisa branca barata, calça preta e suspensórios, peguei o ônibus para o
centro da cidade. Franca queria que nos encontrássemos em algum
restaurante. A ideia de se misturar com civis é tão dolorosa quanto
parece, mas não quero sugerir que algo esteja errado.
Preciso convencer Franca de que estou abraçando minha
liberdade abraçando vovós, acariciando cachorrinhos e outras merdas
assim. Não quero que ela saiba que estou planejando
maneiras de assassinar e matar lentamente. Embora eu
não tenha muita ideia de por onde começar, sei que
preciso de dinheiro para mudar isso.
É incrível a merda que as pessoas fazem por causa de
dinheiro. Não tenho nada a perder e tudo a ganhar, e pretendo
cavar fundo até encontrar uma pista. Mas nesta cidade o
dinheiro fala, e é por isso que The Pink Oyster tem sido minha salvação
- o disfarce perfeito para ganhar algum dinheiro e dar o pontapé inicial. 91
Mesmo que Andre seja um idiota e Tawny não consiga entender,
trabalhar lá é tolerável. Lotus e as outras garotas são legais, mas quanto
a Tiger... minhas bochechas incham enquanto expiro em frustração.
Ainda estou indeciso sobre ela. Ela me confunde. Duas noites atrás,
quando a vi dançar, quase perdi a cabeça. Ela mexe comigo, e o filho da
puta pervertido dentro de mim quer mexer com ela... com muita força.
Um gemido frustrado me deixa enquanto esfrego as duas mãos no
crânio, querendo dar um soco na minha própria bunda. Isso precisa
parar. A última vez que fiquei obcecado por uma garota, as coisas não
terminaram bem para ninguém. E tenho a sensação de que agora não
seria diferente.
Abrindo a porta do restaurante, gemo porque Franca já está aqui.
Ela está adiantada. Sentada em uma mesa vermelha nos fundos, ela olha
o cardápio, franzindo os lábios rosados de um lado para o outro. Os
caras na cabine em frente a ela não escondem que estão olhando para
ela. Se eles soubessem que estavam fodendo com os olhos com a
encarnação do diabo.
Franca está na casa dos trinta. Ela é peituda, loira e deu aos caras
do Kinkora algum material de espancamento, incluindo os guardas.
Mas sua boa aparência não me enganou. Ela é uma espertinha sem
filtro e não tem tempo para brincar.
Por baixo daquele blazer preto, sei que ela está
usando calor e não terá problemas em me espancar até a
morte se eu não responder às suas perguntas
adequadamente. Ela pode parecer delicada e fofinha, mas é
a porra da rainha do gelo, e é por isso que foi designada para
mim.
Sentando-me do outro lado da mesa, olho para os caras perto de
mim, sugerindo que é hora de eles colocarem a língua de volta na boca. 92
Eles devem ser capazes de sentir o cheiro do criminoso em mim, porque
logo voltam para qualquer besteira que estavam discutindo enquanto
tomavam café e suco de laranja. Esse absurdo trivial nunca fará sentido
para mim. Quem tem tempo para bater papo?
Franca claramente não. Ela nem levanta os olhos para me
cumprimentar, embora saiba que estou aqui.
Eu me sento ereto, esperando que ela fale, porque tudo isso é um
jogo de poder para ela. Mesmo que eu não esteja mais lá dentro, ela quer
garantir que eu ainda saiba quem manda. Como se eu pudesse esquecer.
Posso estar fora, mas nunca serei um homem livre.
Depois de dois minutos, ela abaixa o cardápio e sorri. Não é uma
visão acolhedora.
— Olá, Cody.
— E aí. – eu respondo. Ela sabe que não uso mais esse nome, e é
por isso que o usou. Essa pessoa morreu na noite em que meu irmão
morreu. Cody nunca teria coragem de fazer o que fiz ou o que pretendo
fazer. Cody era jovem e fraco, mas Bull, ele está cheio de sede de
sangue e ódio.
Se este fosse um momento de Oprah, tenho certeza que ela diria
que Cody Bishop ainda estava trancado lá no fundo.
Mas esta é a vida real, e tudo que sou é Bull – o
assassino de sangue frio em busca de vingança.
— Ficou longe de problemas?
— Claro.
Franca empurra os óculos de aro preto pelo nariz, gostando muito da
brincadeira. — Você tem um lugar para morar? 93
— Ainda não. Vou ficar no Hudson's Hotel. – Antes que ela tenha a
chance de perguntar se alguém pode responder por mim, enfio a mão no
bolso e deslizo o cartão de Venus sobre a mesa. — Ligue para ela e
verifique.
Ela pega o cartão de visita e o coloca no bolso interno do blazer. Ao
fazer isso, vejo seu coldre de ombro. — E o trabalho?
Concordo com a cabeça, cruzando friamente os dedos sobre a
barriga enquanto me inclino para trás na cabine. — Trabalhando no The
Pink Oyster.
Ela levanta uma sobrancelha. — O clube de strip?
— Ah, você sabe disso? – eu sorrio.
Ela lambe o lábio superior. — Eu sei. Só não pensei que você
estaria rebolando a bunda tão cedo depois da prisão. Achei que você
ficaria feliz em dar um tempo.
Inalando, não deixo o comentário dela me afetar. Penso no quadro
geral. — Estou trabalhando como segurança. – eu esclareço. — E estou
ajudando a consertar o lugar.
— Não é surpresa, aquele lugar é uma merda. – afirma ela,
pegando seu chá de hortelã.
Uma garçonete vem até a mesa, enche minha
xícara de café e depois desaparece tão rápido quanto
chegou. Eu a invejo como gostaria de poder fazer o
mesmo.
Assim que Franca termina de tomar seu chá, ela pega o
saco de papel marrom perto dela e o desliza em minha direção.
Olho para ele com desconfiança.
— Preciso de uma amostra de urina. – ela explica levianamente. —
94
Tenho que ter certeza de que você não está se metendo em problemas e
que está limpo. Estar perto de boceta, álcool e drogas não é o ideal, mas
você está trabalhando, então vou te dar uma folga.
Se ela está esperando que eu lhe agradeça, ela estará esperando até
que sua casa, o inferno, congele.
Quando agarro a parte superior do saco, ela coloca os dedos sobre
os meus. Cada parte de mim fica tensa. Franca apenas sorri, satisfeita
com meu desconforto. — Não estrague tudo, Bull. Você recebeu uma
sentença mais leve por causa de suas circunstâncias e idade. E o fato de
você ter aceitado o acordo judicial. Quero dizer, a primeira vez que você
disparou uma arma, você matou alguém. – ela me lembra sem rodeios.
Não preciso de um lembrete. Fui pego porque um policial de folga
estava dentro da loja de conveniência, comprando pizza de pepperoni e
Pepsi. Quando ele ouviu o tiro, ele veio correndo para o beco e me
pegou ali, assustado, com a arma quente na mão. Eu estupidamente
compartilhei com ele o fato de que disparei sem querer minha arma ao
matar um cara, e foi por isso que recebi uma sentença mais leve. Se é
uma bênção ou uma maldição, ainda não decidi.
— Mas não pense nem por um segundo... – continua Franca,
interrompendo minhas lembranças. — Que vou pegar leve com você.
Nunca se esqueça de quem segura suas bolas.
Todos os termos da minha liberdade condicional
serão esquecidos se ela não tirar a porra das mãos de
mim.
— Se você não seguir as regras, vou te foder. Estamos entendidos?
– O olhar que ela me dá revela que ela está falando sério. 95
— Ah, estamos entendidos. – respondo, sem ser intimidado por ela.
— Agora, você poderia gentilmente... tirar sua mão da minha, porra. Por
favor?
Não estou perguntando. Estou avisando a ela. Ela pode estar no
comando, mas prefiro morrer que me encolher de medo como um idiota.
Ela não vai ficar no meu caminho.
É o olhar definitivo, mas ela eventualmente cede.
Sem perder um segundo, levanto, levando o saco comigo. Indo até o
banheiro, percebo que tenho um problema - um grande problema - e esse
problema é Franca Brown.

Felizmente, Franca não demorou quando dei a ela minha palavra e


mijei. Ela disse que me veria em breve. Não gosto disso, mas enquanto
eu a mantiver no escuro, ela não terá nada contra mim.
Frustrado e sentindo necessidade de quebrar alguma coisa, resolvi
fazer um piercing. Antes de ser preso, eu era todo perfurado.
Decidindo começar aos poucos, coloquei um piercing
na narina esquerda. Não faço as coisas pela metade, e é
por isso que furei meu tragus6, cartilagem, concha
externa e rook em ambas as orelhas.
Fiquei sem tempo porque precisava chegar no trabalho,
mas prometi ao perfurador que voltaria para perfurar os dois

6Tragus é uma pequena saliência localizada no ouvido externo.


Sua função é esconder e proteger o canal auditivo externo.
mamilos, minha língua e, claro, meu pau. Essa dor era diferente de tudo
que eu havia sentido antes, e é por isso que quero fazer isso de novo. 96
Ver Franca hoje me deixou inquieto. Puta merda, preciso desabafar
antes de explodir. Quando abro a porta e esbarro em Tiger, minha
sensação de explosão é amplificada dez vezes.
Instantaneamente, estendo a mão, segurando seus braços para que
ela não caia de bunda. Não deixo de notar os arrepios em sua pele macia.
Ela olha para mim por baixo de seus longos cílios.
— O... obrigada. – ela gagueja, com os olhos fixos nos meus.
— Sem problemas. – respondo, ainda segurando-a com força.
Este deveria ser o momento em que eu a soltaria, mas fisicamente
não posso. Prefiro cortar as mãos a parar de tocá-la, coisa que não deixo
de compreender a importância. — O que você está fazendo hoje? Você
não deveria estar trabalhando.
Quando sua boca se abre, demonstrando sua surpresa por eu estar
ciente de seu horário, eu rapidamente a solto. Eu me sinto como um
maldito stalker, então vou me virar, mas ela me impede quando avança e
agarra meu pulso.
Apertando a mandíbula, suprimo as vozes na minha cabeça para
machucá-la. — Gosto dos seus piercings. – diz ela com uma
respiração apressada. — E seus suspensórios.
Abro, mas logo fecho a boca porque não tenho
ideia do que dizer. Ela está tentando uma pequena
conversa? Ou pior ainda... bate-papo?
Em resposta, resmungo e aceno com a cabeça,
movendo sutilmente meu pulso para fora da mão dela. Ela
parece irritada de repente, com suas bochechas brilhando em
um vermelho profundo. Seus olhos mudam de verdes para irritados em
um nanossegundo. 97
Lotus caminha até nós, interrompendo uma conversa que
provavelmente teria terminado mal para... mim. Tiger me testa com
aqueles lábios franzidos enquanto ela olha através de mim. Meu pau
pulsa instantaneamente porque, caramba, ela não tem medo de mim...
mas deveria ter.
— Ah, que bom, você está aqui. Eu queria ligar para o seu celular,
mas percebi que não tenho o seu número. – diz Lotus, indiferente ou
ignorando a vibração estranha entre Tiger e eu.
— Não tenho um. – respondo, mantendo meus olhos fixos em Tiger.
Em resposta, ela estufa o peito e coloca as mãos nos quadris pequenos,
me desafiando.
Que merda, por que ela está me provocando?
— Você não tem celular ou número? – Lotus pergunta caso ela
tenha tido um lapso de audição.
A pergunta dela me fez acabar rapidamente com esse olhar, porque
não quero que Tiger saiba o motivo pelo qual não tenho celular. A Lotus
sabe que fui preso, mas não quero que todos saibam da minha vida.
Quanto menos pessoas souberem sobre mim, melhor.
— Ambos. – respondo friamente com um encolher de ombros,
concentrando-me na Lotus. Posso sentir os olhos de
Tiger sobre mim.
Ela está caminhando em uma linha muito perigosa.
— Não sou escrava da tecnologia. Eu gosto disso. Mas
preciso que minha equipe, especialmente meus seguranças,
sejam acessíveis. Tenho um celular antigo em meu escritório
que você pode usar.
Embora isso seja muito generoso, balanço a cabeça. Não gosto de
pegar coisas porque quase sempre há amarras. E eu não quero nenhum 98
compromisso. — Obrigado, mas não. Se for esse o caso, comprarei um
com meu próximo salário.
— Ah, falando nisso... venha comigo. – Antes que eu tenha a
chance de falar alguma coisa, Lotus está caminhando em direção ao seu
escritório.
Essa é uma dica a seguir e também uma maldita desculpa para ficar
longe da Tiger, que parece estar a segundos de arrancar minhas bolas.
Não sei o que fiz para irritá-la, mas o visual combina com ela. Eu sabia
que ela poderia se virar sozinha, mas, puta merda, ela é uma fera. Outra
razão pela qual preciso ficar longe.
Não recuo diante de um desafio e, se Tiger não tomar cuidado, mais
cedo ou mais tarde, morderei a isca. E se isso acontecer, vou quebrá-la –
pedaço por pedaço.
Rapidamente sigo Lotus, passando por Tiger sem dizer uma palavra.
Ela não se mexe quando nossos corpos se tocam, o que apenas inflama
essa fome interior.
Lotus me espera em seu escritório quando entro e gesticula para que
eu feche a porta. Eu fecho.
— Outro dia, eu não estava brincando quando disse que deixaria
você minha contabilidade. – diz ela, indo direto para a
matança. — Já tenho o suficiente para fazer e você
estaria me fazendo um grande favor. Eu pagarei a você, é
claro, por todas as coisas extras que estiver fazendo por
aqui.
Cambaleio, refletindo sobre sua proposta. — Você mal
me conhece. – Não estou fazendo nenhum favor a mim
mesmo, mas preciso saber por que ela me confiou sua contabilidade
depois de tão pouco tempo. 99
— Sei o suficiente. – ela responde, abrindo a gaveta da mesa e
acendendo um cigarro. — Então, o que você diz?
Não tenho ideia de por que ela está depositando fé em mim, mas
acabo concordando. — OK.
Ela sorri, soprando um circulo de fumaça. — Ótimo. Suponho que
você não gostaria de começar agora?
Arqueando uma sobrancelha, me pergunto por que ela está com
tanta pressa. Os alarmes soam, mas por algum motivo, não vejo a Lotus
como uma ameaça. — Apenas me diga o que você precisa.
Ela se afasta da mesa, com as rodas da cadeira arrastando no chão.
— Eu quero isso tudo. – responde ela, selando esta parceria com quatro
palavras simples.

Fiquei preso nesta mesa por horas, verificando tudo duas vezes.
A Lotus me deixou em paz porque Tiger estava aqui hoje porque o
clube estava fechado para um evento privado: o aniversário de 40
anos da Lotus.
Ela convidou todo mundo e qualquer um, que é
outro motivo pelo qual ela quis me ligar antes de eu
chegar. Ela queria me avisar que eu não trabalharia esta
noite por si só. Mas parece que, embora não seja necessário
como segurança, Lotus me colocou para trabalhar na
contabilidade. E depois de examiná-la, posso entender por que
ela precisa de outro par de olhos para lhe dizer o que ela sabe ser
verdade. 100
As coisas não estavam batendo porque ela não queria. Mas não há
como adoçar a verdade – a Lotus está falida.
O dinheiro que ela ganha mal cobre suas contas. As garotas pagam a
ela uma péssima taxa de casa para dançar aqui, e ela não se preocupa
com taxas fora do palco. As garotas podem fazer o que quiserem. Ela
também lhes paga uma taxa por hora, o que é inédito nesta indústria, a
menos que você seja uma estrela pornô ou uma dançarina conhecida.
Para ter lucro, ela terá que cortar tudo.
A música toca no clube junto com as vozes animadas dos clientes.
Há muita energia para o meu gosto, daí a razão pela qual a Lotus quis
me ligar. Pessoas, socialização e música pop não são minha praia. Estou
feliz por estar escondido da festividade e pretendo ir embora em breve.
Estou debruçado sobre a mesa, anotando tudo quando a porta se
abre e Lotus cambaleia com uma garrafa de vodka pendurada nos dedos.
Depois de duas tentativas, ela finalmente fecha a porta. Recostando-me
na cadeira, espero que ela fale.
Ela soluça antes de cair na cadeira na minha frente. — Quanto
ruim é isso?
Suspirando, jogo a caneta sobre a mesa e encolho os ombros. —
É ruim, mas tenho a sensação de que você já sabia
disso.
Ela toca o nariz, apontando o dedo em minha direção.
— Você me pegou.
— Se sabia como as coisas estavam ruins, por que se
incomodou em me pedir para dar uma olhada em sua
contabilidade? – eu estou curioso sobre os motivos dela.
Ela toma um longo gole de vodka, enxugando os lábios com as
costas da mão. Quando a garrafa está vazia, ela a rola pelo chão. — 101
Porque eu queria ter certeza de que não estava faltando nada, e quando
vi como você era bom com números, pensei que você seria capaz de ver
algo que eu não vi. Mas parece que não estava faltando nada. Estou sem
dinheiro, não é?
— Sim. – respondo sem pausa. Se ela queria que eu suavizasse o
golpe, ela escolheu o homem errado.
Uma pequena risada a deixa, mas cheia de tristeza. — Ah, Bull, o
que eu vou fazer? – ela coloca o rosto nas mãos.
Se eu tivesse coração, este seria o momento em que diria alguma
besteira para fazê-la se sentir melhor. Mas apenas olho para o ar.
— Não posso vender este lugar. Ninguém compraria. Mal está de
pé. Você viu em que estado está. Como posso competir com o Blue
Bloods? Eles têm um show de pingue-pongue, pelo amor de Deus! – ela
se senta ereta, balançando a cabeça em derrota.
— O que há de tão especial no Blue Bloods? – pergunto, fazendo
uma nota mental para avaliar o lugar.
— Para começar, o lugar não está desmoronando. Porém, Carlos
tem tantas garotas trabalhando para ele que elas farão qualquer coisa,
e quero dizer qualquer coisa, por gorjetas. A competição é dura. Eles
funcionam como um clube de cavalheiros, mas não é
segredo que se você quisesse seu pau chupado ou
quisesse agredir uma das garotas, a gerência ficaria feliz
em fechar os olhos.
Agarro os braços da cadeira embaixo de mim. Parece
um lugar onde Jaws prosperaria. — Por que diabos alguém
iria querer trabalhar lá?
— Porque elas têm muito medo de ir embora. – explica Lotus. —
Este negócio está cheio de pervertidos doentes e perigosos, caso você 102
não tenha notado. Mas eu queria que meu clube fosse diferente. Eu
queria que minhas garotas tivessem poder enquanto trabalhavam aqui, e
não escravas às besteiras sexistas que temos que suportar porque temos
boceta e peitos.
Amém.
— Mas acho que não tenho escolha. Se eu não conseguir... – ela
olha para mim, esperando que eu preencha o espaço em branco.
Olhando para as notas rabiscadas ao meu lado, digo: — Vinte e um
mil trezentos e setenta e dois dólares e seis centavos.
Ela suspira. — Se eu não conseguir vinte e um mil trezentos e
setenta e dois dólares e seis centavos, poderei dar adeus aos meus
sonhos. Sem falar que minhas garotas ficarão desempregadas. Aquele
idiota do Carlos está circulando por aqui como um tubarão. Ele pode
sentir o cheiro de sangue, ou mais especificamente, ele pode sentir o
cheiro de Tigerlily.
Minha coluna enrijece como uma vara. — O que isso deveria
significar?
Lotus inclina a cabeça ligeiramente, claramente atordoada pela
minha súbita necessidade de dar um soco em alguma coisa. Eu não
posso evitar. Tudo sobre esse idiota do Carlos me
deixa ansioso por uma briga.
— Ele quer que Lily trabalhe para ele e já faz algum
tempo. Ele prometeu pagar a ela uma taxa ridiculamente
alta para dançar lá e não tocará nas gorjetas dela. Ele não
cobrará dela uma taxa de casa ou fora do palco. E não espera
que ela dê gorjetas. Ela terá o seu próprio camarim. Qualquer
coisa para selar o acordo. Basicamente, ele está se oferecendo
para pagar a ela uma porrada de dinheiro para trabalhar lá.
— Ela não irá porque é leal. Mas se eu for forçada a vender ou
103
fechar este lugar, ela não terá escolha. Encontrar trabalho nesta cidade
que pague o suficiente para sobreviver é quase impossível.
— Você poderia mudar seu fornecedor de bebidas. Aumente a taxa
da casa. Pare de pagar às garotas uma taxa por hora e deixe-as
sobreviver com as gorjetas, que é o que a maioria dos clubes de strip faz.
Aproveite as dicas deles. – sugiro, folheando o bloco de notas. —
Escrevi uma lista de coisas que você poderia fazer para ajudar a diminuir
a dívida.
— Não posso fazer isso com minhas garotas. Além disso, se eu fizer
tudo isso, conseguirei manter este lugar funcionando?
Com o dinheiro que está entrando atualmente e o que está saindo
para despesas, isso pode ajudar a pagar parte do que ela deve, mas em
relação ao lucro, ela não verá isso tão cedo.
— Também pensei. – diz Lotus, lendo minha expressão. — Eu
vendo ou...
— Ou? – pergunto, meu interesse despertou.
Ela faz um som de desaprovação, como se estivesse avaliando o
quanto deveria compartilhar. — Ou eu poderia usar o lugar para outra
coisa além de se despir.
— Como? – eu persuadi, não gostando do som
disso.
— Um cliente que conheço bem está procurando um
lugar para administrar seu… negócio. Ele precisa que seja
discreto porque bem... –Sua pausa a denuncia, mas eu não era
leviano. Eu apenas espero que ela diga.
— Porque… é um ringue do submundo de luta.
Bem, porra, não esperava que ela dissesse isso. A luta no submundo
104
pode me apresentar a alguns personagens obscuros. Perfeito.
— Ele não precisaria usar o clube com frequência. Ele disse que
talvez duas vezes por mês porque se move para não ser detectado. Mas o
dinheiro que ofereceu para me pagar, Bull, me livraria das dívidas em
alguns meses. Eu disse não. É muito arriscado. Mas agora, talvez eu não
tenha escolha.
— Esta noite foi uma provação. – ela revela, passando a língua no
lábio superior. — Eu queria ver o que aconteceria se eu fechasse o clube
para um "evento privado". Decidi fazer um test drive e ver o que
aconteceria quando recusássemos clientes. Foi melhor do que o
esperado. Todos queriam saber o que havia de tão importante aqui
dentro. Você sabe o que acontece quando diz a alguém para não tocar
em alguma coisa?
Eu me recosto na cadeira. — Eles querem tocar nisso. – respondo,
percebendo que ela não tomou essa decisão por capricho. A Lotus
pensou bem nisso.
— Exatamente. – ela diz animadamente. — Eu poderia oferecer o
clube a ele, fechando-o algumas vezes por mês. O mistério excitaria
os clientes. Talvez isso dê uma nova vida ao lugar. Não sei. Preciso
fazer alguma coisa.
Eu entendo o raciocínio dela, mas isso não é
Hollywood. Um clube de luta local aqui em Detroit está
procurando problemas. Ela disse que é do submundo, e o
fato de seu amigo se mudar de um lugar para outro é
inteligente para eles, mas se forem pegos aqui no clube de
Lotus, é a bunda dela que está em risco.
Ela será presa.
— Não preciso dizer que essa é uma ideia estúpida. – digo sem
105
rodeios. — Mas se você está fazendo isso, não posso estar aqui. Minha
agente da condicional vai ter coragem e eu voltarei para a prisão.
Lotus franze a testa, como se estivesse apenas se lembrando da
realidade de que fui castrado pelo estado. — Merda, me desculpe. Eu
não pensei.
Mas eu aceno para ela. — Está tudo bem. Só preciso que saiba que
estou fora. E eu estarei. Mas isso não significa que não possa observar
de longe.
— Nada está definido, mas se eu prosseguir, avisarei você. – diz ela
rapidamente. — Não quero que você se meta em problemas.
Aceno com gratidão, mas estou furioso por ter chegado a esse
ponto. Os idiotas corporativos e gananciosos da América atacam
novamente. Os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais
pobres. Onde está a justiça nisso?
— Vá lá fora e tome uma bebida comigo. Só faço quarenta anos
uma vez. – diz ela, tentando aliviar o clima.
De pé, não vejo sentido em arrastar isso, então decido ir embora.
— Estarei aqui amanhã.
Lotus rapidamente levanta da cadeira e abre a
gaveta da mesa. Ela deixa de lado alguns papéis e pega
um celular preto. — Aqui, pegue.
Olho para ele, balançando a cabeça.
Antes que eu tenha a chance de recusar novamente, ela
agarra minha mão e o coloca na palma da minha mão. — Eu
insisto.
Este lugar está à beira da falência e esta mulher está me dando um
celular. A gentileza dela me confunde porque já faz muito tempo que 106
não experimentei algo parecido.
De repente, desconfiado dessa sensação de “calor” na boca do
estômago, aceno com a cabeça e enfio o celular no bolso. — Obrigado.
Não espero por nenhuma outra porcaria sentimental enquanto vou
até a porta e a abro. Mas então paro quando Lotus diz: — Carlos está lá
fora. Não dá para não notá-lo.
O comentário dela me fez perguntar casualmente: — Você não sabe
se algum cara chamado Jaws veio aqui, não é?
Ela parece refletir sobre a questão, antes de responder: — Não me é
familiar.
Não querendo levantar qualquer suspeita, aceno com a cabeça. Só
porque ela não o conhece não significa que não venha aqui. Eu preciso
ficar aqui. É a melhor chance que tenho.
Quando saio para o corredor, passo pelas massas que vagam pelo
corredor, desesperado para dar o fora daqui antes que eu sufoque. O
clube fica lotado enquanto os festeiros usam o palco como pista de
dança. As luzes estroboscópicas piscam no ritmo da dance music
tocando nos alto-falantes, dificultando a visão.
Quando estou prestes a passar por um casal se beijando na minha
frente porque estão bloqueando minha saída, algo no
canto da sala chama minha atenção. Cada parte do meu
corpo está me dizendo para ignorar isso, mas não posso
porque essa coisa é Tiger e algum nojento que está muito
perto dela.
Eles estão sentados em uma cabine, o que é bastante
inofensivo, mas quando ele se inclina ainda mais para sussurrar
em seu ouvido, tenho vontade de arrancar sua língua. Observo com
interesse enquanto ela se afasta, com a boca entreaberta, atordoada. 107
Seu namorado dá um sorriso convencido, enquanto eu cerro os
punhos. A vontade de bater em alguma coisa me domina.
Tiger de repente cai na gargalhada, pegando sua bebida, mas o
canudo não acerta sua boca. Depois de três tentativas, ela finalmente
consegue acertar. Olhando mais de perto seu comportamento
desajeitado, não há dúvida de que ela está bêbada, bêbada com algum
idiota que parece o rei do estupro.
Olhando para seu grupo, ele tem dois homens flanqueando sua
frente enquanto outro homem está atrás da cabine. Eles definitivamente
estão guardando armas sob suas jaquetas. Quando o estuprador coloca o
braço na parte de trás do couro, relaxando como se fosse da realeza,
aposto que este é Carlos.
Lotus disse que não dá para não notá-lo. Além do fato de ele parecer
um idiota completo em sua camisa branca desabotoada, revelando suas
correntes de ouro e pelo escuro em seu peito, e o bando de homens
alegres que o cercam, como ele está basicamente babando em Tiger
confirma meus pensamentos.
Ele está olhando para ela como se ela fosse sua próxima refeição,
e o que Lotus disse sobre ele ser um tubarão parece resumir
perfeitamente esse idiota. Ele não está interessado que ela
simplesmente trabalhe para ele. Ele está interessado
nela mesma, o que o colocou na minha maldita lista.
Não sei por que isso me incomoda, mas incomoda. E
antes que eu saiba o que estou fazendo, estou andando em
direção à dupla com os olhos no prêmio. Tiger está ocupada
demais bebendo sua bebida para perceber minha chegada, mas
os macacos de Carlos instantaneamente ficam em posição de sentido.
Um deles me impede de avançar mais quando ele bate a palma da
108
mão no meu peito. Sem nenhuma preocupação, olho para seus dedos e
depois volto para ele. Parece que um olhar pode valer mais que mil
palavras enquanto ele lentamente se retira do meu espaço pessoal.
Carlos está ciente da minha presença, mas como qualquer predador,
ele observa e analisa.
— Tem algum assunto aqui? – Um cachorro treinado me pergunta.
Em resposta, eu sorrio. No entanto, é tudo menos acolhedor. — Eu
deveria ser o único a perguntar isso a você. Você não é bem-vindo aqui.
Saiam.
O idiota olha para o seu lacaio, claramente confuso com minha
franqueza. Então decido esclarecer qualquer mal-entendido. — Vocês
podem sair pela porta por conta própria. – explico calmamente,
encarando os dois com um olhar enquanto aponto por cima do ombro em
direção à saída. — Ou posso quebrar as duas pernas.
Uma mistura de emoções passa entre eles, mas na linha de frente
está a raiva por eu falar com eles dessa maneira. — Quem diabos você
pensa que é? – diz o cara careca que está a cinco segundos de perder
um dedo se me tocar novamente.
— Você consegue guardar segredo? – eu respondo levemente,
dando-lhes uma falsa sensação de segurança. Logo
destruo o refúgio deles, já que estou farto de falar.
Colocando minha boca em formato de concha, me inclino
e abaixo minha voz uma oitava. — Eu sou o Batman.
Eles ficam surpresos com a minha resposta, mas seus
egos não me permitem dar a última palavra, especialmente
quando estou fazendo eles de bobos e suas patéticas tentativas
de me intimidar. Os dois enfiam a mão nas jaquetas em busca das armas,
mas são parados rapidamente quando Carlos coloca as mãos em seus 109
ombros.
Ele fica acima deles enquanto a cabine está em um nível mais alto e
fixa seus olhos nos meus.
É um ódio mútuo instantâneo enquanto Carlos me avalia. Minha
raiva se levanta, desafiando-o a parar de se esconder atrás de seus
homens como uma vadia e lutar comigo. Mas homens como Carlos não
sujam as mãos. Eles têm dinheiro e poder suficientes para subornar
outros para que façam o trabalho sujo por eles.
Ele convence os homens a se afastarem, permitindo que ele fique
cara a cara comigo. Seus astutos olhos castanhos me observam de perto,
procurando uma fraqueza que ele possa explorar. Mas ele está olhando
na direção errada.
— O que está acontecendo? – Tiger diz com um insulto. Quando ela
se levanta para ver qual é a comoção, nossos olhares se cruzam e sua
boca se abre. — Ah, é você.
Quero repreendê-la pela companhia que mantém, mas eu não
demonstro nenhuma emoção. Isso acabará mal para nós dois se eu fizer
isso.
— Vamos, vou levar você para casa. – afirmo, já que isso não
está em discussão.
Ela está me dando tontura pela maneira como
cambaleia, insinuando que está muito mais bêbada do que
eu pensava. Carlos acompanha nossa conversa com
interesse porque ainda não faz ideia de quem eu sou.
Quando Tiger continua olhando para mim como se
estivesse testemunhando a segunda vinda de Cristo, tento
alcançar seu braço, mas ela recua, desequilibrando-a. Ela se estabiliza
segurando o topo da cabine. 110
— Eu disse que vou levar você para casa. – repito perigosamente
devagar.
— E eu digo vá se foder. – ela responde rapidamente, cruzando os
braços sobre o peito em desafio.
Pisco uma vez porque sou pego de surpresa por seu atrevimento.
Os lábios de Carlos se curvam.
Primeira falha, filho da puta.
— Se esta é a sua frase de efeito, sugiro que tente uma tática
diferente.
Tanto meu rosto quanto o de Tiger ficam confusos com a sugestão
dele. — A única coisa que ele sabe pegar é pereba da Tawny. E quem
mais estiver se atirando nele. – Tiger cospe fogo, antes de rir
histericamente. — Eu disse pereba.
Que porra é essa? Tawny? Pereba? Estou tão confuso.
— Tudo bem, já chega. – Ela está claramente embriagada e precisa
ficar longe de filhos da puta como Carlos.
Eu marcho para frente, pronto para levá-la aos chutes e gritos se
for preciso, mas quando um dos homens tenta me
agarrar, eu rapidamente dou uma cotovelada no nariz
dele. Ele esmaga com o impacto e ele solta um grito. Em
minha defesa, eu o avisei.
O movimento foi tão rápido que seu parceiro está com
a mão no pau e parece não acreditar que isso tenha
acontecido. Mas quando seu amigo segura seu rosto, com
sangue vermelho brilhante escorrendo por seus dedos, não há dúvida de
que eu quebrei a porra do nariz dele. 111
Tiger arfa, com os olhos arregalados, enquanto Carlos fica parado,
inflexível. Se eu não soubesse, diria que ele ficou impressionado. Passo
por ele, subindo as duas escadas e entrando na cabine.
Tiger ainda está imóvel, mas quando me aproximo dela, ela recua,
apontando o dedo para mim. — Quem você pensa que é? – Parece ser a
pergunta que está na boca de todos esta noite. — Você mal fala comigo
e, quando finalmente o faz, é para me repreender por me divertir. Dane-
se.
— Se está se divertindo com esse idiota, então realmente precisa
sair mais. Não vou falar de novo para você. – eu aviso, dando a ela uma
última chance de obedecer.
Mas eu deveria saber que nada é fácil quando se trata dessa mulher.
— Falar-me? Não, não. – ela estende a mão e sacode um dos meus
suspensórios com o dedo indicador. Ele bate contra meu peito com um
som agudo. — Você não pode mandar em mim, amigo. – ela cambaleia
para frente e me empurra. Bem, acho que era isso que estava tentando
fazer porque olhei para as palmas das mãos dela, que ainda estão
firmemente pressionadas em meu peito.
Meu corpo reage exatamente como eu esperava: quero comê-la
viva.
É uma reação instintiva quando agarro seu pulso,
mas em vez de apertar, de repente fico hipnotizado pelas
batidas de seu pulso e inconscientemente esfrego meu
polegar sobre sua pele macia. O toque só parece provocá-la
ainda mais.
Ela molha os lábios rosados, lembrando-me de como pareciam
quando os pressionou contra os meus. Quando seus olhos verdes 112
brilham, ela desperta meus demônios que sussurram palavras doces em
meu ouvido, implorando para que eu a mutile por ter uma língua tão
solta.
Imagens de Tiger de joelhos diante de mim enquanto eu a castigo
inundam meu cérebro. Quero fazer coisas desprezíveis e deploráveis
com ela, mas essa não é a parte mais fodida. Quero contaminá-la das
formas mais depravadas, e acho que... ela quer que eu faça isso.
Ela não tem medo de mim, mas quero que ela tenha. Sua rebelião
me incendeia e faz algo que nunca pensei que fosse possível novamente:
me faz sentir vivo.
Incapaz de me conter, olho abertamente para ela, dando-lhe uma
visão de dentro do meu mundo escuro. Vou corromper e poluir qualquer
pureza porque é isso que faço. Eu destruo. Mas posso prometer que farei
isso enquanto me sinto bem.
— Ah, Deus. – ela chora, segurando minha camisa entre os dedos.
Internamente, estou batendo no peito como a porra de um homem
das cavernas, porque seu apelo é música para minha alma corrupta.
Ela fica com um tom rosa encantador, apenas acariciando ainda
mais meu ego. Isso dura cerca de três segundos antes que seu rosa
doce fique branco e depois um verde doentio. Eu sei o
que está acontecendo, mas é tarde demais.
Os gemidos de Tiger não eram porque ela havia
caído sob meu feitiço. Não, foi porque ela estava pedindo
a intervenção divina para parar de vomitar em cima de
mim. Mas Deus não pode ajudar nenhum de nós porque,
depois que ela termina de vomitar, ela limpa a boca com as
costas da mão, olha para mim timidamente e desmaia imediatamente.
113
114

A primeira coisa que noto é que estou envolta em uma bolha de


pecado com um cheiro delicioso. A segunda coisa é que não tenho ideia
de onde estou. Gemendo, tento abrir os olhos, mas eles parecem estar
sobrecarregados de chumbo.
Meu cérebro está uma bagunça absoluta e não consigo me lembrar
de qual é a última coisa que me lembro. A única coisa de que tenho
certeza é que estou deitada contra algo macio que cheira a zimbro e
um toque de especiarias. Eu quero rolar nisso porque
cheira tão bem.
Não me lembro de ter usado um sabão em pó novo,
então me pergunto o que é essa fragrância. Agitando-me
em meio à confusão, tento lembrar a última vez que senti
o cheiro. Um calor se espalha sobre mim antes de se
transformar em pavor.
Ah, merda.
Ignorando cada músculo do meu corpo que protesta, eu me
115
endireito, afastando o cabelo bagunçado do rosto. Meu coração está na
garganta enquanto observo freneticamente meu ambiente desconhecido.
Onde diabos estou?
Outro pensamento me invade.
Jordy.
Tirando os cobertores, estou prestes a pular da cama, mas noto duas
coisas: não estou sozinha e não estou usando nenhuma roupa. Um abajur
acende, o que me faz gritar.
Aperto o cobertor contra o peito, pronta para lutar pela minha vida,
mas quando vejo quem está diante de mim, não sei se fico aliviada ou
apavorada. Bull está sentado em uma poltrona surrada no canto do
quarto, fazendo o papel de abajur perfeitamente.
Sentado casualmente com o tornozelo cruzado sobre o joelho, ele
me observa com aqueles malditos olhos diabólicos. Seus dedos estão
unidos na frente dos lábios. Não sei por que estou aqui, mas quando
percebo onde estou, meu estômago embrulha. Estou em um quarto de
hotel, barato, com Bull sentado a poucos metros de distância.
A última coisa que me lembro é... porra.
Ainda estou de sutiã e calcinha, mas onde estão
minhas roupas? Mais importante ainda, por que estou
num quarto de hotel com um homem que só traz
problemas?
No entanto, tudo isso pode esperar.
— Onde está meu celular? – Parece que gargarejei cacos de vidro,
mas ele me ouviu em alto e bom som. Ele aponta com a cabeça em 116
direção à mesa de cabeceira.
Pulo sobre ele, desbloqueando-o com dedos instáveis. Estou prestes
a ligar para Erika, mas quando vejo uma série de mensagens, inclino a
cabeça, confusa. Esfregando os olhos para ter certeza de que não estou
vendo coisas, leio uma troca de mensagens do meu celular para o de
Erika.

Onde você está?


Você queria que eu alimentasse Jordy?
Você está bem?

Quando a mensagem não foi respondida, Erika enviou outra série de


mensagens, perguntando se Jordy deveria ficar na casa dela, até que
finalmente alguém respondeu.

Tiger está trabalhando até tarde. Sim, para todas as suas


perguntas. Ela está bem.

Curto e gentil - sem adivinhar quem respondeu em


meu nome, porque eu estava muito ocupada me perdendo
em vez de ser uma boa mãe.
Recostando-me na cabeceira da cama, passo a mão pelo
rosto, além de desapontada com meu comportamento na noite
passada. Eu deveria ter tomado apenas uma bebida, mas isso se
transformou em dez quando o homem do momento me fez sentir uma
merda mais uma vez. 117
Envio rapidamente uma mensagem para Erika, agradecendo por
cuidar de Jordy e também avisando que estarei em casa em breve. Deixo
de fora como devo encontrar minhas roupas primeiro. Jogando meu
celular na mesa de cabeceira, reuni coragem para olhar para Bull, cuja
cara de paisagem ainda está imutável.
— Onde estão minhas roupas?
Ele aponta para o banheiro, mas não fala. Seu silêncio só provoca
minha ira.
— Por que estou aqui? Neste hotel barato com você? – No momento
em que a pergunta me escapa, fico pálida antes de começar a corar.
Não é preciso ser um gênio para somar dois mais dois. Eu estou
quase nua em um quarto de hotel com o homem com quem tive uma
estranha química sexual desde o momento em que nos conhecemos.
Particularmente não gosto dele, e ele certamente não gosta de mim, o
que é a receita perfeita para sexo ardente e raivoso.
— Ah, Deus. – murmuro, cobrindo meu rosto com as palmas das
mãos, indiferente ao fato de não estar mais coberta. O que isso
importa? Ele viu tudo ontem à noite.
— Nós…? – eu nem tenho coragem de perguntar se dormimos
juntos. — Não acredito que depois de praticamente ser
freira durante anos, Eu finalmente tenho sorte em um
buraco de merda, e nem consigo me lembrar disso. Por
favor, me diga que tomamos cuidado?
Omiti minha próxima pergunta, que seria: "Fui boa?"
— Posso ser um bastardo fodido e sádico que gosta de alguma coisa
estranha... – A voz dele sempre foi tão suave? — Mas a necrofilia não é 118
uma delas.
— O que? – Finalmente descubro o meu rosto, arqueando uma
sobrancelha.
Quando ele se levanta da poltrona e se levanta, prendo a respiração.
Ele se aproxima, parando ao pé da cama. — Você está sem roupa porque
vomitou em cima dela. E eu. Você está aqui porque não tenho ideia de
onde você mora e não ia mexer em suas coisas. Esse buraco de merda é
onde estou hospedado no momento.
Ele lambe o lábio superior, cruzando os braços musculosos sobre o
peito largo. — E não, nós não fizemos sexo.
Bem, puta merda. Ele respondeu todas as minhas perguntas, mas
ainda tenho mais mil. Isso é o máximo que ele já falou comigo, então
não abuso da sorte. De repente, me sinto a maior idiota do mundo por
vários motivos.
— Me desculpe por ter chamado esse lugar de buraco de merda. –
eu peço desculpas porque acabei de insultar a casa dele. — Obrigada por
cuidar de mim. Eu estava um caos ontem à noite. Eu estou tão
envergonhada.
— Você não deveria ter bebido tanto, especialmente perto de
idiotas como Carlos.
Ele tem razão. Em ambas os casos.
Quero dizer a ele que o motivo pelo qual fiz isso foi a
maneira como ele me tratou. A maneira como me
desconsidera me provoca de maneiras que não consigo
explicar. E sempre que nos tocamos, ele deixa evidente que
prefere nadar num tanque cheio de piranhas.
Não sei por que ele me irrita: ele simplesmente me irrita.
Pensar na nisso me faz lembrar quanta pele estou exibindo
119
atualmente. Não tive problemas com minha nudez antes porque pensei
que ele tinha visto tudo ontem à noite. Mas agora que sei a verdade,
percebo que o que ele fez foi realmente muito cavalheiresco e, em troca,
acusei-o de contaminar meu estado inconsciente e revelei o fato de que
sou virgem novamente.
Isto não pode ficar pior.
— Jordy é seu... gato? – ele pergunta, trazendo à tona o fato de que
sou uma péssima mãe.
Claro, ele pensaria que eu tinha um gato. Que tipo de mãe deixa o
filho sozinho enquanto se embebeda com homens estranhos?
De repente, lembro-me da resposta dele a Erika. Ele me chamou de
Tiger. Suponho que seja a abreviação do meu nome artístico, mas Tiger
e Bull – isso só pode levar ao desastre.
Balançando a cabeça rapidamente, envolvo o cobertor firmemente
em volta de mim, antes de sair da cama com cuidado. — Sim, ele é meu
gato. – Não sei por que simplesmente menti. Suponho que não estou
pronta para contar que tenho um filho com alguém que acabei de
conhecer – independentemente desta estranha ligação que temos.
— E sou uma péssima mãe por deixá-lo com minha amiga. É
melhor ir para casa. Porém, a questão de não ter roupa
pode atrapalhar minha saída.
Bull suspira antes de caminhar até a cômoda. Ele
nem sabe que está desenvolto. Este homem irradia
arrogância. Ele tira um moletom e uma camiseta do AC/DC
muito famosa. — Aqui.
Sem outra escolha, eu me arrasto, garantindo que não caia de bunda,
e pego suas roupas. Nossos dedos se tocam, mas abafo meu gemido. — 120
Obrigada novamente. – Quero desesperadamente perguntar por que ele
veio me resgatar ontem à noite, mas não pergunto.
Sinto-me diminuída em sua presença enquanto ele me mantém
prisioneira com um olhar intenso. — Posso te fazer uma pergunta?
— Dois minutos atrás, pensei que tínhamos nos entretidos, então
você não precisa pedir permissão. – provoco levemente.
Mas quando Bull levanta uma sobrancelha, parecendo confuso com
a minha provocação, eu esclareço: — Claro que pode.
— O que Carlos sussurrou em seu ouvido?
Franzo o nariz porque não tenho ideia do que ele me disse, porque
tenho certeza de que foi a merda de sempre. Mas quando Bull parece se
agarrar à minha resposta, vou fundo e lembro. — Ele perguntou o que
seria necessário para eu trabalhar para ele.
Bull contrai a mandíbula.
— Eu disse a ele que não vou deixar a Lotus. Ela tem sido boa
comigo e eu nunca faria isso com ela. Quando eu disse não, ele se
ofereceu para me comprar um carro. Minha resposta foi algo como
não sou uma prostituta. E a resposta dele foi que minha garota nunca
poderia ser uma prostituta. – eu reviro os olhos porque sua fala cafona
ainda me dá vontade de vomitar.
Carlos não escondeu que quer que eu dance em seu
clube e também foi muito franco sobre como isso não é a
única coisa que ele quer. Lotus não pode expulsá-lo
porque ele é um cliente pagante quando vem me ver dançar.
Eu só o agrado porque ele me deixa gorjetas ridículas.
Ele me vê como um peão, então eu jogo.
Mas nunca cairia em suas besteiras. Ele me promete carros, dinheiro
e meu camarim particular em seu clube Blue Bloods. Mas homens como 121
Carlos são colecionadores e eu sou apenas um troféu que ele quer
acrescentar à sua coleção.
Ele poderia me prometer o mundo, e ainda assim não faria
diferença. Ele não desperta um desejo profundo dentro de mim, onde
acho impossível respirar quando está perto. Mesmo que eu não namore
há muito tempo, sei quando me sinto atraída por alguém, e
definitivamente não me sinto atraída por Carlos.
No entanto, o homem parado na minha frente, me observando de
perto, desperta algo que nunca senti antes. Não entendo minha resposta a
ele. Não sei nada sobre ele, mas isso me intriga ainda mais. Estou tão
acostumada com os homens olhando na minha cara o tempo todo, mas
com Bull é diferente.
Eu me pergunto por que ele está morando aqui. O que aconteceu
com a casa dele? Não consigo afastar a sensação de que está escondendo
algo monumental, algo que o transformou nesta criatura às vezes tímida,
sempre brutal.
Tanta coisa está acontecendo por trás daqueles olhos incompatíveis,
olhos que não consigo parar de olhar porque parece que ele está
lutando contra o bem e o mal. Claro e escuro. Eu me pergunto qual
lado acabará vencendo.
Dando um pequeno passo à frente, ele olha para
mim, analisando minha linguagem corporal com o que
parece ser inexperiência. Às vezes, ele parece tão...
ingênuo em relação aos acontecimentos do mundo. Eu sei
que ele sentiu algo quando o beijei. Sua ereção era um sinal
claro disso.
Mas na maioria das vezes, minha presença parece repulsá-lo.
Estou tão confusa, e seus olhos são a analogia perfeita de como me
122
sinto. Eu gosto e o odeio ao mesmo tempo; ambos os lados lutando pelo
domínio um sobre o outro. O júri ainda não decidiu qual lado vencerá.
— Seus olhos são realmente algo. – digo estupidamente em voz alta,
apanhada pelo feitiço deles. Quando percebo o que acabei de dizer, abro
a boca, pronta para voltar atrás, mas decido não fazer isso.
Posso reconhecer essa tensão estranha e tangível entre nós. E quero
que ele também.
Seu peito sobe e desce continuamente, com o ritmo quase me
embalando em um sono satisfeito. O que há nele que me suga para este
abismo escuro?
— Algo como o quê? – ele pergunta, com sua respiração ofegante
mesmo quando estou a poucos minutos de ficar sem ar.
Embora eu esteja bem embrulhada, de repente me sinto nua. Nunca
me senti mais exposta do que agora, o que é muito, já que tiro a roupa
quase todas as noites. Mas a maneira como Bull me observa, aguardando
minha resposta, me deixa exposta diante dele.
E naquele momento, percebo que estou em apuros.
Sem nada a perder, lambo os lábios antes de responder: —
Algo... especial.
Ele suspira profundamente, sem revelar nada. Mas
não espero que ele faça isso.
Sem mais nada a dizer, me viro e vou até o banheiro.
Quando fecho a porta, pressiono as costas contra ela e solto
o que parece ser a respiração que estou prendendo desde que
nos olhamos pela primeira vez. Não sei o que está acontecendo
entre nós, mas sei que gosto disso. Eu gosto muito.
123

Bato na porta de Erika, me sentindo a pior mãe do mundo. Ela se


abre e, quando vejo minha vizinha, ofereço timidamente o ramo de
flores que comprei para ela. Elas estão murchas, mas foi tudo que
consegui encontrar na loja da esquina.
Ela as aceita com um sorriso torto. — Entre.
Começo minha caminhada de vergonha, me sentindo ainda pior
quando viro o corredor e vejo Jordy sentado de pernas cruzadas no sofá,
comendo uma tigela de cereal com o filho de Erika, Patrick, que tem a
mesma idade. Eles estão assistindo TV e não percebem que estou aqui.
— Oi, querido. – digo, esperando que minha culpa não apareça. Isso
acontece.
— Ei, mãe. – responde Jordy, olhando para mim brevemente antes
de retornar ao programa que está passando na TV. É assim que nossas
conversas costumam ser ultimamente. Ele está com tanta raiva de mim e
não sei por quê.
Erika está ao meu lado, olhando para minhas roupas largas com
um sorriso confuso. — Você quer um café? Acabei de
fazer.
Erika tem salvado vidas. Ela cuida de Jordy quando
minhas babás se atrasam ou nem aparecem. Patrick e
Jordy se tornaram melhores amigos e Erika não esconde
que gostaria que seguíssemos seus passos.
Mas mal tenho tempo para ser amiga de mim e do meu
filho, muito menos da minha vizinha. Além disso, se por acaso
nos tornássemos amigas, eu teria que contar a verdade a ela. Ela não
sabe que eu sou stripper. Ninguém sabe. Ela acha que eu trabalho no 124
turno da noite em um Walmart no centro da cidade, entre as aulas de
balé.
É assim que vivo minha vida: uma mentira. Eu me distancio de
todos, até mesmo de Avery, porque é mais fácil assim.
— Eu gostaria de poder, mas tenho muito o que fazer hoje. É meu
único dia de folga. – Isso não é mentira.
Depois de tomar banho, pensei que Jordy e eu poderíamos ir ao
cinema. Não tivemos tempo suficiente de mãe e filho, e embora ele ache
que é ridículo quando eu o subornar com o último filme dos Vingadores
e quaisquer lanches que ele quiser, sei que ele vai ceder.
Erika balança a cabeça com um sorriso, o que me faz sentir uma
merda por não querer passar mais tempo com ela. — Vamos, Jordy.
Vamos para casa.
Ele resmunga baixinho, mas eventualmente se levanta e vai pegar
suas coisas.
Espero que ele pare de perder tempo, mas suponho que, como pré-
adolescente, ele não tem noção de tempo. Quando finalmente aparece,
agradeço a Erika e me despeço de Patrick. Quando Jordy e Pat dão
um aperto de mão estranho de gângster, fico pálida porque esse é o
motivo pelo qual quero dar o fora de Detroit.
Jordy está prestes a sair, mas limpo a garganta,
dando-lhe “o olhar”. Ele lê alto e claro. — Obrigada, Sra.
Howard, por me deixar passar a noite.
— Claro, querido, você é bem-vindo a qualquer hora.
Colocando minha mão no ombro de Jordy, dou um sorriso
de agradecimento a Erika e saímos do apartamento dela. Meu
apartamento fica no final do corredor do dela. Assim que abro a porta,
imediatamente quero me enrolar debaixo dos cobertores e dormir o dia 125
todo.
Mas tive tempo suficiente ontem à noite, quando fiquei bêbada e
acordei em um quarto de hotel.
Deixando esses pensamentos de lado, entro na cozinha, desesperada
por um café. Enquanto coloco o bule no fogo, chamo Jordy, que foi para
seu quarto. — Que tal irmos ver o novo filme dos Vingadores hoje? Vai
ser divertido.
— Claro. – ele responde, muito menos entusiasmado do que eu.
Mas está tudo bem. Pelo menos ele concordou.
Ser mãe solteira tem sido difícil. Tentei ao máximo estar ao lado
dele, mas sem família ou amigos, ele teve que crescer rápido. Quando
olho para ele, não posso deixar de me sentir culpada por roubar-lhe a
infância; nas muitas noites em que fui forçada a trabalhar até tarde, ele
teve que se defender sozinho.
Sempre tive vizinhos e Avery que me ajudaram, mas não foi o
mesmo com Jordy. Eu sei que, de certa forma, ele me despreza, me
culpando pela partida de seu pai. O pai dele era o amor da minha vida,
um homem bom que eu só conseguia amar em segredo.
Eu estava louca pelo melhor amigo do meu irmão, mas eles eram
opostos. Nunca entendi como eles eram amigos, mas
suponho que crescer pobre cria um vínculo como
nenhum outro. Eu tinha apenas dezesseis anos quando
descobri que estava grávida. Mas pela primeira vez na
minha vida fiquei feliz porque Michael queria ter o bebê.
Ele disse que contaria a Christopher sobre nós porque não
queria mais que fôssemos um segredo. Mas ele logo provou
ser outra decepção na vida, porque eu ainda não estava grávida de seis
semanas quando ele nos deixou. 126
Ele saiu sem dizer uma palavra e até hoje não tenho ideia de onde
ele está.
Fiquei com o coração partido, mas não pude compartilhar isso com
Christopher. Não importa que eu fosse agora uma mãe solteira, eu nunca
trairia Michael como ele fez comigo. Quando começou a aparecer minha
barriga de gravidez, o modo protetor do irmão mais velho de
Christopher entrou em ação, exigindo que eu lhe contasse quem era o
pai.
Mas eu nunca contei. E depois de um tempo, Christopher parou de
perguntar.
Só conheci alguns de seus amigos porque ele era muito protetor
comigo. Ele raramente me perdia de vista, mas as vezes que fazia isso
era quando eu podia ficar sozinha com Michael.
Não sabia o que ele fazia tarde da noite, mas imaginei que não era
bom, principalmente quando eu estava limpando sangue e só Deus sabe
o que mais estava em suas roupas. Mas não julguei. Todos nós tínhamos
nossas falhas. E é assim que me lembro do meu irmão.
Ele não era perfeito, mas era tudo que eu tinha neste mundo.
Então, quando ele também me deixou, uma pequena parte de mim foi
com ele. Ficar grávida mudou nosso relacionamento.
Eu era sua irmã mais nova, a pessoa que ele protegia,
mas ter um filho mudou isso. Não éramos mais só nós.
Eu o machuquei. Eu também o traí agindo pelas suas
costas. Tudo o que ele fez foi tentar melhorar minha vida
e, em troca, me apaixonei por seu melhor amigo quando
sabia que isso o machucaria. Vivo com essa culpa todos os
dias da minha vida.
Embora eu não saiba onde ele está, continuo esperando que ele volte
para minha vida e me deixe compensar isso. 127
Eu sei que Jordy está sentindo falta de uma figura masculina em sua
vida, e é por isso que ele está agindo mal. Seus psicólogos confirmaram
isso. Ele foi expulso de cinco escolas diferentes por brigas, intimidação
e vandalismo, entre outras coisas.
Seu psicólogo o diagnosticou com TDAH. E a razão pela qual ele
odeia tanto a escola é porque ele é disléxico. Não posso culpá-lo por
estar frustrado porque as crianças podem ser cruéis. Eu trabalho muito
porque, embora a escola particular onde ele está matriculado seja menor
e atenda melhor às suas necessidades, não é barata.
Nem suas sessões de terapia, nem suas aulas particulares.
Não posso pagar por todas isso servindo mesas. E não tenho outras
qualificações além do meu amor pela dança. Tudo o que faço, faço por
Jordy, porque quando olho em seus olhos azuis, tudo que vejo olhando
para mim é seu pai inteligente, engraçado e gentil, que não machucaria
ninguém. Ele era perfeito.
Mas sou tudo menos perfeita e não posso deixar de me culpar pela
forma como Jordy se tornou. Meus genes poluíram o grupo genético,
não o de Michael. E passarei o resto da minha vida compensando isso
para meu filho. Não vou permitir que ele viva a mesma infância que
eu.
Quando Jordy entra na cozinha, enxugo
rapidamente a lágrima solitária com as costas da mão.
Não quero que ele me veja chorar.
— A que horas é o filme? – ele pergunta, caindo em
uma cadeira da cozinha. Ele está vestindo roupas dois
tamanhos maiores que ele e tem uma bandana vermelha
enrolada na cabeça. Ele se parece com o que seu tio costumava ser.
Desligando a chaleira, pego o café instantâneo. — Cerca de duas
128
horas. – respondo. — Mas não vamos a lugar nenhum com você vestido
assim.
— Assim como? – ele repreende, esticando o lábio inferior.
— Como um aspirante a gangster.
— Eu sou um gangster. – diz ele com orgulho enquanto a colher
treme na minha mão.
— Nesta casa, você é Jordan Hope. Agora vá se trocar.
— Mãe! – ele reclama, mas isso não está em discussão.
Quando vê que estou falando sério, ele vai para seu quarto,
resmungando baixinho. Se minha mãe tivesse feito isso com
Christopher, nossas vidas teriam sido muito diferentes. Mas vivendo e
apreendendo, e não cometerei os mesmos erros que ela cometeu.

O filme foi ótimo e o dia de mãe e filho foi um sucesso total.


Quando encontramos um dos amigos de Jordy no shopping, ele
implorou para ir até sua casa jogar o último videogame
e fazer uma festa do pijama. Só concordei porque a
mãe do amigo dele estava lá e disse que estava tudo bem.
Ser pais é uma questão de equilíbrio, e eu não quero
dar muita liberdade ao meu filho como minha mãe fez com
Christopher e eu, mas também não quero ser uma mãe
superprotetora.
Assim que cheguei em casa, eu caí, absolutamente exausta. A única
coisa que me acorda é uma batida na porta. Gemendo, procuro o relógio 129
na mesa de cabeceira e vejo que já passa das dez. Quem diabos está
batendo na minha porta a esta hora da noite?
Tirando os cobertores, ando na ponta dos pés pelo apartamento.
Quando chego à porta da frente, olho pelo olho mágico, mas não vejo
ninguém lá fora. Estou me perguntando se sonhei, mas decido abrir um
pouquinho a porta para ter certeza.
Destrancando a porta, abro lentamente, mas mantenho a corrente no
lugar. Ao espiar pela fresta, vejo uma pequena caixa de presente com
uma fita rosa na frente da minha porta. Ficando de joelhos, alcanço a
abertura e arrasto a caixa para dentro.
Assim que a porta é fechada e trancada novamente, viro a caixa,
mas não há cartão nem endereço do remetente. A curiosidade leva a
melhor sobre mim e volto para o meu quarto. Sentada na ponta da cama,
desembrulho cuidadosamente a caixa meticulosamente embrulhada.
A caixa de veludo azul parece cara e, quando a abro, os brincos de
diamante apenas confirmam meus pensamentos. Dentro há um pequeno
cartão e, embora o que está escrito nele não seja muito, é o suficiente.

Apenas o melhor para minha garota.


~C

Há apenas uma pessoa cujo nome começa com C e


que pensa que sou a namorada dele. Maldito Carlos.
Os brincos são lindos e seu brilho praticamente reflete o
arco-íris por todo o ambiente, mas prefiro ser eclipsada na
escuridão do que ser comprada assim. Esta é apenas uma chance de
mostrar sua riqueza, esperando que eu finalmente ceda.
Mas eu não sou uma prostituta. Este presente caro e suas promessas
130
de cuidar de mim apenas parecem aprofundar a linha entre nós. Ele acha
que pode me comprar porque sou pobre e ele é, bem, ele é um idiota que
precisa ser colocado em seu lugar.
Não tenho ideia de como ele sabe onde eu moro, e se ele acha que
deixar presentes na minha porta é fofo, ele está sem sorte.
Entrando em ação, arranco meu pijama e visto meu jeans. Estou
prestes a vestir um suéter, mas a camiseta do AC/DC de Bull chama
minha atenção. Arrependidamente, tirei-a quando tomei banho hoje mais
cedo, mas agora, corro para pegá-la e, no momento em que a coloco na
cabeça, respiro fundo, porque tudo que consigo sentir é o cheiro dele.
É muito grande, então dou um nó e uso no estilo Daisy Duke7.
Lembro-me de como ele estava ontem à noite, com suspensórios,
calça preta e camisa branca de botões com as mangas arregaçadas,
expondo seus antebraços tonificados e tatuados. Parecia que ele comeu
um hipster no café da manhã e roubou suas roupas.
Uma vez que estou com meus tênis e moletom preto, pego minhas
chaves, apenas para perceber que minha caminhonete ainda está no
trabalho. Bull deve ter pegado um Uber ou táxi de volta para o hotel
comigo. Meu plano para acabar com Carlos é colocado em pausa, mas
quando olho para meu reflexo no espelho, ou mais
precisamente, quando olho para a camiseta de Bull, sou
subitamente atingida por uma onda de adrenalina.

7Daisy Duke é uma personagem fictícia, interpretada por


Catherine Bach, da série de televisão americana The Dukes of
Hazzard.
Ele nunca desistiu de uma briga antes e eu também não.
Enquanto estou saindo pela porta da frente, chamo um Uber, que
131
felizmente chega segundos depois de eu pegar o elevador para descer. O
motorista não gosta de socializar, o que me convém muito bem. Envio
uma mensagem para a mãe do amigo de Jordy, que confirma que os
garotos estão se divertindo.
É uma noite chuvosa em Detroit, mas espere um mês ou mais e a
neve começará. Assim que o Uber me deixa no trabalho, felizmente sem
fazer perguntas, coloco o capuz e abaixo o rosto, querendo permanecer
incógnita.
Minha caminhonete está estacionada nos fundos, então apresso
meus passos quando uma das fracas luzes da rua se apaga. A área
normalmente não é bem iluminada, então agora é quase impossível ver a
sua frente. O vento sopra ao meu redor.
Assim que dou a volta na parede de tijolos e vejo a minha
caminhonete, suspiro de alívio, mas isso dura pouco, porque quando
percebo o que está acontecendo, já é tarde demais. Não tenho chance de
lutar ou gritar. Sou levantada do chão e uma mão cobre minha boca
enquanto um agressor desconhecido me arrasta em direção ao beco.
Eu me contorço loucamente, chutando e me debatendo com gritos
abafados, mas meu agressor, que tenho certeza que é um homem, ri
de minhas tentativas de fugir. Seu humor supera meu medo repentino,
e eu o mordo com tanta força que sinto gosto de
sangue. Ele grita de dor, tirando a mão da minha boca
por uma fração de segundo, e isso é todo o tempo que
preciso. Eu grito tão alto que meus ouvidos machucam,
mas o som é minha passagem para a liberdade.
Ele se atrapalha, tentando me silenciar, mas seu pânico
me permite mover o pé para trás e acertar sua canela. Seu joelho
flexiona e ele diminui seu aperto em volta de mim. Instantaneamente, eu
me liberto, encontrando o equilíbrio no chão molhado. 132
Ando apenas meio metro antes que o idiota agarre meu cabelo e
empurre minha cabeça para trás em um ângulo doloroso. Luto como
uma gata selvagem, tentando me virar e atingir qualquer parte do corpo
que posso alcançar, mas caio de joelhos em agonia quando ele me dá um
soco no rim.
Ofegante, aperto minhas costas, com meu corpo doendo. Quero me
encolher como uma bola porque dói muito. Mas não vou me render.
Com um grito, viro de joelhos, preparada para dar um soco nas bolas
dele, mas ele envolve a mão em minha garganta, me forçando a ficar de
pé.
Dou um tapa em sua mão porque seu aperto é tão forte que não
consigo respirar. Mas quando ele aperta mais, parece que é isso que ele
quer. Ele está me sufocando.
Ele está usando uma máscara de esqui, então sua identidade está
oculta, o que me faz pensar que porra fiz com ele. Seus olhos parecem...
familiares. Mas não sei onde os vi antes. Eu estava certa? Alguém estava
me observando o tempo todo?
Estou sendo sufocada até a morte em um estacionamento por um
agressor desconhecido. Recuso-me a aceitar isso como meu destino.
Eu me movo, esperando atingi-lo, mas quanto
mais eu luto, mais ar preciso. E como estou sendo
sufocada, ar é algo que não tenho. Começo a entrar em
pânico; meus olhos se arregalam enquanto agarro
freneticamente a mão em volta da minha garganta.
Em resposta, ele me levanta do chão.
Tenho certeza de que meu pescoço está prestes a quebrar e as
lágrimas começam a cair. Eu não estou triste; Estou com tanta raiva que 133
chegou a esse ponto. Outra estatística, dirão as notícias, porque recebi o
que merecia. É assim que este mundo é fodido.
— Por favor... não. – eu imploro, tossindo e balbuciando enquanto
ofego por ar. — Eu tenho... um filho.
Mas ele apenas pressiona minha traqueia com mais força.
Jordy estará sozinho. Se eu morrer, ele não terá ninguém. Isto não
pode acabar assim. Inferno, não.
Minhas pernas são fortes, graças a toda a dança, então estabilizo
minha respiração e dou um chute. Eu atinjo algo sólido e o ar de repente
retorna aos meus pulmões. Apoiada nas mãos e nos joelhos, inspiro
rapidamente, desesperada para encher os pulmões privados de oxigênio.
Dou-me um momento de alívio e estou prestes a lutar pela minha
vida, mas quando olho para cima, vejo algo que não faz sentido. Meu
agressor não é mais o caçador – ele agora é a caça.
O tempo passa em câmera lenta enquanto observo uma força feroz
comparável a um furacão desaba com fúria como nenhuma outra sobre
meu agressor. Ele cambaleia para trás, tentando ficar de pé, mas meu
furacão não permite.
Em rápida sucessão, ele dá um soco nas costelas e no estômago
do meu agressor, depois repete em ambos os lados. É
uma agitação de punhos, e piscar me impede de
testemunhar o ataque porque é muito rápido. No entanto,
quando meu salvador se vira para mim, o ar é sugado de
meus pulmões por outro motivo.
Não consigo respirar porque meu salvador é Bull.
Chegando a uma posição instável, assisto ao lado enquanto Bull dá
uma surra no meu agressor. O cara tenta atingi-lo, mas Bull é rápido 134
demais. Ele se abaixa e desvia, com seus lábios curvando em um sorriso
debochado. É a primeira vez que o vejo sorrir.
Ele está atraindo o cara para lutar com ele. É como se ele estivesse
começando a briga.
Algo brilhante reflete a luz da lua antes que Bull coloque o pé no
joelho do cara, quebrando sua rótula. Ele cai no chão com um baque
ensurdecedor, gritando de dor. Ele implora por misericórdia, mas Bull
não mostra nenhuma enquanto prende o cara no asfalto, segurando seu
ombro e acertando seu rosto uma e outra vez.
A máscara de esqui não é uma armadura e, em pouco tempo, o
homem para de se mover. Mas isso não impede Bull. Ele continua a
bater nele, os sons são um vazio oco, que revira meu estômago. Ele é
brutal, frenético, uma visão de destruição e dor.
— Bu... – eu tento falar, mas sinto como se minhas cordas vocais
estivessem em carne viva. Mas mesmo se eu pudesse falar, não acho que
seria capaz de impedir Bull. Ele não ficará satisfeito até que este homem
esteja morto.
Por mais que ele mereça, não posso viver com isso na
consciência, então, cambaleando, manco em direção a Bull. A cabeça
do homem pende de um lado para o outro por causa dos socos
ferozes. Ele não resiste mais porque acho que está
desmaiado.
No momento em que Bull está prestes a desferir o
punho, eu o agarro no ar. Ele resmunga, virando para ver
quem se atreve a impedi-lo, mas quando vê que sou eu, pisca
uma vez.
— Ele teve o suficiente. – eu resmungo em um sussurro.
Os lábios de Bull se curvam, pronto para lutar comigo como um
135
cachorro protegendo seu osso, mas sem pensar demais, deslizo minha
mão em direção à dele e entrelaço nossos dedos. O sangue quente
escorre entre meus dedos, mas eu só aperto com mais força.
— Ele terá suficiente quando parar de respirar. – ele diz com
veneno. Ele fortalece nossa conexão, com o fogo queimando por trás de
seu olhar.
— Por favor, não faça isso. Deixe a polícia cuidar dele.
Pelo canto do olho, vejo um pequeno grupo de pessoas amontoadas
de lado. Sem dúvida, a polícia já foi chamada.
Bull me observa atentamente, como se estivesse testemunhando
algo que nunca viu antes. Não sei o que é, mas me faz tremer toda.
Com nossos dedos ainda entrelaçados, ele balança a cabeça uma
vez. — Não posso estar aqui quando eles fizerem isso.
Não sei por que isso acontece, mas não me importo. — Minha
caminhonete está aqui.
Bull contrai a mandíbula como se estivesse mais uma vez lutando
contra o céu e o inferno. Ele olha para o homem imóvel como se
estivesse paralisado pela visão. Quando seus ombros estremecem ao
respirar fundo, sei que ganhei.
Interrompendo nossa conexão, ele levanta
lentamente. — Vamos.
Quero desesperadamente ver quem é esse covarde
mascarado, mas quando a rua está iluminada com luzes azuis
e vermelhas que se aproximam, essa é a nossa deixa para sair.
Bull vira rapidamente, mas cambaleia para a esquerda. Nós dois
ficamos intrigados com o movimento porque não foi ele quem foi 136
espancado até ficar inconsciente até que eu observo seu corpo e grito. —
Ah, meu Deus! Você foi esfaqueado!
Com um dedo trêmulo, aponto para seu torso.
A atenção de Bull se concentra na faca de prata que se projeta ao
seu lado. — É só um arranhão. – afirma ele, encolhendo os ombros.
— Um arranhão? – murmuro, com a bile subindo quando ele toca a
ferida e seus dedos ficam vermelhos.
— Sim, eu estou bem. Onde está sua caminhonete?
Meus olhos estão grudados na faca empalada em seu lado. — Você
precisa ir para o hospital. – A histeria começa a aumentar. Eu estava
cheia de adrenalina, mas agora que passou, estou a segundos de perdê-la.
— Eu sinto muito. Isto é minha culpa.
Meus joelhos flexionam e estou prestes a cair no chão. Mas isso não
acontece porque com um movimento equilibrado, Bull envolve uma mão
grande na minha nuca enquanto a outra segura minha cintura. Esta é a
primeira vez que ele me toca sem vacilar.
Nossos rostos estão a centímetros de distância, e tão perto dele,
eu o observo. Ele é robusto, selvagem, dominante, mas não sinto
medo. — Nunca peça desculpas por algo que não é sua
culpa.
Minha boca abre e fecha inutilmente porque não
consigo construir uma frase coerente.
— Agora, me dê suas chaves. Vou dirigir.
O barulho das sirenes da polícia fica mais alto, e esse é
todo o sinal de alerta de que preciso. Lambendo os lábios
nervosamente, afirmo com confiança renovada: — Ninguém dirige
minha caminhonete. E você foi esfaqueado, caso tenha esquecido. 137
Os lábios de Bull se curvam em uma espécie de sorriso, e a visão
mexe profundamente dentro de mim. — Então vamos dar o fora... Tiger.
Minha cabeça balança e começamos uma caminhada rápida em
direção à minha caminhonete. Nossos rostos estão voltados para baixo,
disfarçando quem somos, mas quando Bull passa pelo homem no chão,
ele contrai a mandíbula. Sei que não tirar a máscara de esqui o está
matando, e se sua fúria não estivesse atrapalhando seu julgamento, ele
provavelmente teria feito isso antes de deixá-lo inconsciente. Mas agora,
para fazer isso, Bull teria que revelar sua identidade aos curiosos. E ele
claramente não quer fazer isso.
Depois de me atrapalhar com o zíper da minha mochila, finalmente
pego minhas chaves. Destrancando minha porta, entro no lado do
motorista antes de gemer de dor absoluta enquanto estendo a mão no
console do meio para abrir a porta de Bull. Ele entra, parecendo não se
incomodar com a faca espetada em sua lateral.
Minha caminhonete demora para dar partida, mas assim que o motor
liga, saio correndo do estacionamento, com a percepção do que acabou
de acontecer me atingindo com força. Minhas mãos tremem tanto que
agarro o volante com mais força para manter o controle.
Bull se recosta na cadeira, respirando fundo pelo nariz. Ele deve
estar com dor. E quando bato no meio-fio porque meus
olhos estão nele e não na rua, ele geme alto.
— Ah Deus, me desculpe.
— Pare de se desculpar. – ele diz com uma respiração
ofegante. — Aonde você vai?
— Para o hospital. – respondo com voz rouca, grata pelo trânsito
estar tranquilo. 138
— Não, nenhum hospital. Leve-me de volta para o hotel. – ele
argumenta.
— Você está louco? – exclamo com um suspiro ofegante, movendo
minha atenção para frente e para trás entre ele e a rua. — Seu nome
combina perfeitamente com você. Você é teimoso como um touro!
Ele geme de frustração, arqueando a cabeça para trás para se apoiar
no encosto de cabeça. — Eu sou teimoso? – ele discute. — Por que você
é tão teimosa, mulher?
— Hum, em primeiro lugar, não me chame de mulher. Esta não é a
Idade da Pedra.
— Devidamente anotado. – ele responde, parecendo, Deus me livre,
satisfeito com minha resposta.
— E estou levando você para o hospital porque foi esfaqueado!
— Sim, eu sei. Posso sentir isso. – Seus lábios se contraem. — Não
há necessidade de continuar me lembrando.
Ele está fazendo piadas?
Esta noite fica cada vez mais louca a cada minuto.
— Sem hospital.

Quando ele se recusa a sair do hospital, viro à


esquerda e vou para o hotel. — Depois que você me
deixar, você precisa ir para o hospital, no entanto. Você
está ferido.
Todo o meu corpo escolhe este momento para sofrer
espasmos de dor, mas ignoro isso, e seu autoritarismo, e balanço
a cabeça com firmeza. — Não, eu não vou deixar você. Você tem sido...
– Mordo o lábio, pois ele sabe o que tem sido. 139
— Bela camiseta. – diz ele, enquanto mantenho os olhos à frente,
envergonhada. Seguimos o resto do curto trajeto até o hotel em silêncio.
Quando entro no estacionamento, estaciono em frente ao quarto
dele. Desligo o motor e abro rapidamente a porta para ajudá-lo. Mas ele
já está mancando para seu quarto. Eu corro atrás dele, sem fôlego e em
agonia, mas disfarço isso porque não sou eu quem está com uma faca no
torso.
Quando Bull abre a porta, ele manca até o banheiro enquanto fecho
e tranco a porta atrás de mim. Não sei qual é o protocolo certo aqui.
Devo ligar para alguém?
Encosto-me na porta, mordendo a unha do polegar nervosamente.
Quando Bull sai do banheiro com insumos nas mãos, fico pálida.
— Consegue pegar qualquer bebida alcoólica que tenha no frigobar?
– Quando simplesmente olho para ele com os olhos arregalados, ele
acrescenta: — Por favor.
Movendo no piloto automático, faço rapidamente o que ele pede.
São duas garrafas de uísque e uma garrafa de vodka. Eu pego as três.
Ele cai na ponta da cama, jogando as toalhas e o kit de costura no
colchão. Quando vejo o kit, cubro a boca para conter a náusea.
— Deixe-me levá-lo ao hospital. – imploro, pois
não há como ele conseguir se costurar novamente com a
agulha e a linha frágeis.
Ele me ignora e, em vez disso, gesticula com a cabeça
em direção ao álcool.
Minhas pernas estão tremendo quando vou até a cama e a entrego
para ele. Ele aceita e joga no colchão. — Se estiver enjoada ou prestes a 140
desmaiar, é melhor ir embora agora.
— Por quê? – grito, de repente me sentindo instável.
— Porque vou tirar esta faca. – ele responde como se estivéssemos
discutindo o tempo.
— Ah, meu Deus! – Começo a andar pelo quarto, entrelaçando as
mãos atrás do pescoço.
Bull me dá tempo para processar o inevitável, mas balanço minha
cabeça animadamente e vou em frente. — Vai ficar tudo bem. – digo em
voz alta, mais para mim do que para Bull. Eu tive um bebê, pelo amor de
Deus. O que pode ser pior do que isso?
Respirando fundo três vezes, aceno rapidamente. — Ok, faça isso.
Bull exala bruscamente, com uma mão apoiando a carne sob o
ferimento enquanto a outra segura o cabo da faca. Aqueles olhos focam
nos meus e, de alguma forma, eles me dizem que tudo ficará bem. Ele
está prestes a tirar uma faca do corpo e é ele quem me conforta.
Minha paixão por esse homem só cresce.
— Um. – ele inspira, pensativamente me dando uma contagem
regressiva.
— Dois. – grito, incapaz de desviar o olhar de seus
dedos ensanguentados segurando o cabo. Minha boca
está aberta, no meio de dizer três, mas Bull não me dá
chance porque ele rapidamente puxa a faca e a deixa cair
no chão com um baque ensurdecedor.
— E trê... três. – gaguejo, precisando falar antes de
desmaiar.
Bull rapidamente pega a toalha e a coloca sobre o ferimento
enquanto cambaleio. Há tanto... sangue. A toalha branca logo fica 141
encharcada de um vermelho brilhante. Bull olha casualmente para baixo,
esperando pacientemente que o sangramento pare.
Ele respira uniformemente pelo nariz, mas quando se mexe e se
encolhe um pouco, vê-lo com dor me faz esquecer meu enjoo e corro
para a cama. Sentada perto dele, lentamente estendo a mão para remover
sua mão.
Seu corpo fica tenso, mas ele me permite tocá-lo. — Pare de se
preocupar comigo. Estou bem.
Ignorando-o, retiro delicadamente a toalha do ferimento, mas não
consigo ver nada porque sua camisa está no caminho. — Tire a camisa.
– exijo, sem sequer pensar duas vezes sobre o meu pedido.
Ele hesita. A tensão tangível que preenche o quarto certamente me
sufocará. Precisando dizer alguma coisa, meus lábios se transformam em
um pequeno sorriso. — Você me viu sem roupa. Agora é minha vez.
A distância entre nós de repente estala com uma carga elétrica que
sinto até os dedos dos pés.
Sua hesitação me faz molhar os lábios porque de repente estou
com sede, mas a água não vai saciar a sede que sinto. Com os olhos
fixos em mim, ele alcança a parte de trás da cabeça e agarra a parte de
trás do colarinho enquanto expõe lentamente
centímetro após centímetro glorioso de pele tatuada.
É demais, muito rápido, mas eu não consigo desviar
o olhar. Estou paralisada por seu peito forte e musculoso,
e abdômen definido que oscila quando ele vira e joga a
camisa no chão. Ele está coberto de tatuagens, e quando digo
coberto, quero dizer que não sobrou muita pele para pintar.
A obra de arte parece enfatizar sua cintura cônica e seu músculo V
bem definido. É um banquete visual enquanto observo cada centímetro 142
tonificado dele, querendo nada mais do que analisar cada tatuagem. Mas
quando um rastro vermelho escorre de um pequeno buraco em sua
lateral, paro de ficar boquiaberta e rapidamente pego a toalha limpa.
Pressionando-a sobre seu ferimento, não tenho coragem de olhar para
ele, pois não confio no olhar em meus olhos.
O quarto fica em silêncio, nossa respiração alta é o único som que
preenche o pequeno quarto. Não sei quanta pressão aplicar. — Estou
machucando você? – pergunto suavemente. Usando meu cabelo como
escudo, ainda não consigo olhar para ele.
— Não. – ele responde em um tom semelhante ao meu.
Assentindo, continuo pressionando a toalha em seu ferimento,
desejando saber o que dizer. A toalha não está tão encharcada quanto a
primeira, o que me faz torcer para que o sangramento tenha diminuído.
Olho para o kit de costura na cama, com meu estômago embrulhando.
Quando Bull se move ligeiramente, não consigo evitar o suspiro que
me escapa. — O que aconteceu? – pergunto antes que eu possa me
conter. Mesmo sob suas tatuagens, a grande cicatriz na lateral do corpo é
claramente visível. Quando olho mais de perto, porém, essa não é a
única cicatriz que ele tem. Ele tem muitas. A que está na sobrancelha
esquerda sempre me deixou curiosa.
Quando não responde, olho para ele por baixo dos
cílios, prendendo a respiração. — Vida. – ele
finalmente responde, me incendiando com uma palavra e
o peso de mil libras.
Minha pele fica arrepiada quando ele envolve os dedos
em meu pulso. Não sei o que ele está fazendo até que
gentilmente tira minha mão do ferimento. Prestando atenção,
percebo que o sangramento parou, mas o corte vermelho e raivoso ainda
está bem aberto. 143
Engolindo em seco, não me atrevo a respirar enquanto ele pega a
pequena garrafa de uísque e abre a tampa. Ele toma um gole e depois me
oferece um. Eu balanço minha cabeça. Ele derrama o álcool restante
sobre o ferimento, fechando os olhos brevemente.
Provavelmente seria mais fácil no banheiro, mas tenho a sensação
de que nós dois precisamos estar sentados para ver o que vai acontecer a
seguir. Bull abre o kit de costura e, com os dedos ensanguentados,
começa a passar o fio pelo buraco da agulha.
Seus dedos estão firmes enquanto tenho que sentar nos meus para
parar de tremer.
Ele abre outra garrafa de uísque e, desta vez, joga a garrafa inteira.
Quando termina, ele inala e junta a carne ao redor da ferida. Quando ele
está prestes a perfurar a pele com a agulha, eu avanço, colocando minha
mão sobre a dele.
— Deixe-me. – eu ofereço. Sinto que isso é algo que preciso fazer.
Bull parece quase... fascinado por nos tocarmos, e não sei por que
isso acontece. Seu sangue mancha a nós dois e, embora a maioria
sinta repulsa pela visão, parece excitá-lo. Mas estabeleci há muito
tempo que Bull não é como a maioria.
Com um aceno de cabeça, ele me permite tirar a
agulha de sua mão. Levantando-me da cama,
gradualmente fico de joelhos diante dele. Algo escuro o
domina, mas essa escuridão me anima. Ele tem todas as
fibras do meu corpo sob comando.
Concentrando-me, perfuro suavemente sua pele e olho
para ele. — Diga-me se você precisa que eu pare.
— Não vou precisar. – Não há nada de arrogante em sua resposta.
Sua franqueza é sincera. Com um aceno firme, acalmo meus dedos 144
trêmulos e perfuro sua pele.
O suspiro escapa de mim e não dele, pois ele está imóvel, como se
não tivesse sido perfurado mais uma vez. Pensando que isso é
semelhante a um band-aid, puxo o fio e perfuro sua carne mais uma vez.
Costuro-o com cuidado, garantindo que o espaço seja pequeno entre
cada um.
Cada vez que a agulha penetra sua carne, minha náusea aumenta,
mas a reprimo. Seu corpo está quente ao toque e derrete o frio dos meus
ossos. Em pouco tempo, eu estou queimando por muitos motivos
diferentes. Sua fragrância exclusiva é amplificada dez vezes. Eu me
concentro para reprimir meu gemido.
Estou quase terminando, orgulhosa de meus esforços para não
desmaiar ou vomitar, mas quando o abdômen tonificado de Bull oscila
enquanto ele parece inseguro por um segundo antes de se inclinar para
frente, percebo que posso desmaiar por um motivo totalmente diferente.
Se não fosse pelo meu estado, eu teria perdido, mas parece uma carícia
de amante quando Bull cautelosamente segura uma mecha do meu
cabelo entre os dedos.
Ele desliza suavemente as pontas dos dedos sobre meus cabelos,
como se sentisse algo pela primeira vez. Faço uma pausa, sem saber o
que está acontecendo. — Seu cabelo... cheira a flores
de cerejeira. – ele finalmente declara no que parece
admiração, quebrando o silêncio.
— É o meu sham... shampoo. – gaguejo, incapaz de
encontrar seus olhos. Quando não diz mais nada, continuo a
costurá-lo. Ele não solta meu cabelo.
Não tenho ideia de como consegui manter a mão firme, mas assim
que o ferimento está fechado, dou um nó no fio e corto com a tesoura. 145
Apoiando-me nos calcanhares para observar meu trabalho, meu cabelo
escorrega dos dedos de Bull.
— Tudo pronto. – afirmo, finalmente encontrando coragem para
olhar para ele. — Ainda acho que você precisa consultar um médico.
— Vou ficar bem. – ele repreende, pegando a vodka e me
oferecendo. Dessa vez eu aceito. Bebo metade e entrego o resto para ele.
Ele aproveita o tempo para saboreá-la, com seu pomo de adão
predominante movendo enquanto a bebida desliza por sua garganta. Não
consigo evitar e caio na tentação, inclinando a cabeça para observar suas
tatuagens. Todo o seu peito está tatuado com um pedaço detalhado do
que parecem ser os quatro cavaleiros do apocalipse cavalgando em uma
floresta árida com árvores vazias e retorcidas. Abaixo de suas costelas e
abdômen há uma cena diretamente do inferno.
Há homens meio esqueléticos, meio vivos, montados em cavalos
com espadas erguidas, preparados para a batalha. Ao longo da intrincada
arte jaziam homens destroçados, mortos ou implorando por misericórdia.
Mas nada é misericordioso nessa tatuagem. Ele tem o que parece ser o
olho que tudo vê em um triângulo no meio do peito. O olho me segue.
O mesmo acontece com os olhos da coruja que ele pintou no
antebraço direito. Sempre alerta, sempre observando.
Seu bíceps direito tem uma ampulheta. O relógio
de bolso que ele tatuou nas costas da mão me faz pensar
qual é o seu fascínio pelo tempo. E no bíceps esquerdo,
ele tem quatro ases. Porém, em sua tatuagem, os
tradicionais naipes de cartas são substituídos por imagens
que devem significar algo para ele.
Há o que parece ser um leão, um diamante verde, uma mulher
vendada e um tubarão azul. O leão tem uma cruz tatuada no canto onde 146
deveria estar a imagem do traje. Não tenho ideia do que isso significa,
mas quanto mais olho e descubro as imagens escondidas sob a obra de
arte, mais curiosa fico.
Não consigo ver suas costas, mas pelo pequeno vislumbre que vi,
também estão cobertas. Ele tem todas as peças desse quebra-cabeça
complexo pintadas na pele, e tudo que quero fazer é estudar cada uma
delas. O medalhão de prata de São Cristóvão que ele usa no pescoço é
apenas mais um enigma. Bull não me parece uma pessoa religiosa, então
me pergunto qual é o significado disso para ele.
— Não acho que esta noite foi um ataque aleatório. – Bull diz, me
tirando do meu olhar boquiaberto. — Ele teria roubado alguma coisa.
Ou tentaria estuprar você.
Engulo em seco com sua franqueza porque ele está certo. Em
nenhum momento durante o ataque pensei que ele quisesse roubar minha
bolsa ou minha virtude. Ele estava em busca de sangue.
Ainda estou de joelhos e perdida em pensamentos quando, com um
toque hesitante, Bull se abaixa e segura minha garganta suavemente.
Com as pontas dos dedos, ele acaricia meu pescoço lentamente, onde
tenho hematomas se formando pelas mãos que tentaram tirar minha
vida. — Ele estava tentando matar você. – afirma ele, perigosamente
baixo.
Permaneço perfeitamente imóvel, sem ousar
respirar, pois estou totalmente intoxicada por este
momento, por ele.
Bull pode sentir a batida constante do meu pulso, que
começa a bater cada vez mais rápido enquanto me examina
mais de perto. — Existe alguém que quer você morta?
— Acho que não. – respondo, com as minhas bochechas vermelhas
traindo minha resposta a ele. 147
— Pensar assim não vai resolver. É a diferença entre a vida e a
morte. – Seu aperto em mim aumenta, enfatizando seu aviso.
A linha entre o prazer e a dor começa a ficar confusa, mas não me
movo. A maneira como me toca é hipnótica e esqueço tudo, menos essa
sensação, que não faz sentido. — Não faço ideia. Mas ultimamente
tenho sentido como se alguém estivesse me observando. – explico com
uma respiração acelerada.
— Por quanto tempo?
— Não muito. – respondo, odiando o quanto irreverente pareço, mas
é a verdade. Não sei há quanto tempo, porque desde que Christopher
partiu, sempre estive olhando por cima do ombro.
— Algum cliente ou ex-namorado que você irritou e que gostaria de
acertar contas?
Ele acaricia meu pulso com o polegar, seu olhar nunca desvia do
meu enquanto espera minha resposta. Mas ser assim com ele me fez
esquecer meu próprio nome. Faz muito tempo que não sinto isso e não
sei o que pensar ou como reagir à forma como meu corpo, todo o meu
ser responde a ele.
Não faz o menor sentido porque mal o conheço. Mas senti essa
atração inegável desde o primeiro momento em que o
vi no clube. Ele guarda segredos profundos e obscuros,
mas isso só me atrai mais profundamente.
— Não. Não tenho problemas com ninguém que
justifique meu ataque. – eu finalmente respondo. Decido
omitir o fato de que seus olhos pareciam familiares porque
nem consigo lembrar como eles eram.
Bull acena bruscamente antes de retirar a mão. Sinto imediatamente
falta do toque dele. — Você precisa ser cuidadosa. Vou ficar de olho no 148
clube. Você deveria contar a Lotus.
A realidade entra em ação e percebo que ainda estou ajoelhada entre
as pernas de Bull. Incapaz de me conter, meu olhar se desvia para frente
de sua calça jeans preta. Memórias de sua ereção pressionada contra
mim me fazem levantar rapidamente porque, ao contrário de Bull, não
consigo esconder minhas emoções.
— Obrigada por vir em meu socorro mais uma vez. Se não fosse por
você... – eu esfrego os braços, sentindo um arrepio repentino tomar
conta de mim.
— Não há necessidade de me agradecer. – ele repreende, parando
quando algo muda dentro dele. Não sei por que agradecer a ele o irritou,
mas irritou.
Por um breve momento, seus muros foram abaixados, e o que vi me
deixou sem fôlego, mas eles foram erguidos novamente, e o bastardo
indiferente e de coração duro está de volta. Eu não gosto desta versão.
Não sei o que vai acontecer porque agora que está costurado e estou
tão bem quanto posso, considerando o que aconteceu, é hora de ir para
casa. Essa tensão estranha permanece no ar porque se Bull me pedisse
para passar a noite aqui, não sei o que diria.
A maioria dos homens tentaria tirar vantagem
desta situação, mas Bull não. Eu o respeito por isso,
mas por outro lado, também me sinto o patinho feio.
Os homens costumam se jogar aos meus pés, mas
ainda nem sei se Bull gosta de mim. E quando ele fica no
meio do quarto, basicamente me mostrando a porta, tomo isso
como uma confirmação de que tudo o que sinto é unilateral.
Ele é apenas mais um idiota. Um que preciso esquecer.
— Vejo você no trabalho. – Tento esconder a emoção da minha voz.
149
De repente, as paredes se fecham sobre mim e pego minha bolsa,
marchando em direção à porta. No entanto, Bull dá um passo para a
esquerda, bloqueando minha saída.
Meu peito sobe e desce rapidamente quando sou provocada por
diversos motivos. Irritada, aborrecida, enfurecida, confusa... excitada.
Preciso sair daqui. Mas não vou a lugar nenhum, graças ao gigante
parado na minha frente.
Ele casualmente cruza os braços sobre o peito ainda nu, me
observando. Sempre observando. — Você parece... – ele faz uma pausa,
procurando a palavra certa antes de decidir. — Zangada. Você está?
Zombando, não posso acreditar que ele está me perguntando isso.
Quanto sem noção ele pode ser? — Estou bem. – eu estou muito longe
de estar bem, mas prefiro morrer do que contar isso a ele.
Tento passar por ele, mas ele se move comigo, frustrando minha
fuga. — Posso chamar Venus e perguntar se há algum quarto disponível
se você quiser ficar aqui?
Pisco uma vez, atordoada. Ele está realmente me propondo ficar
em outro quarto? A ideia de ficar no mesmo quarto que eu é tão
repulsiva? E quem diabos é Venus? — Isso não é necessário. Sua
virtude está segura comigo. Eu estou indo para casa.
— Você está com raiva de mim. – diz ele, como se
tivesse acabado de resolver o maior mistério do mundo.
— Não brinca. Saía. – Mais uma vez tento passar por
ele, mas ele é construído como uma merda de tijolos e não se
move.
— Por que está zangada? Você não pode ficar aqui, então pensei...
Ah, que coragem.
150
— Faça-me um favor e não pense sempre que estou envolvida.
Obrigada, ou não, já que quando agradeci, parecia que eu tinha acabado
de mandar você se foder, o que provavelmente deveria ter dito porque...
Sou interrompida no meio do discurso e em um segundo estou
furiosa, e no próximo, minhas costas são empurradas contra a porta com
Bull me mantendo prisioneira. Suas mãos estão em cada lado da minha
cabeça. Empurro a porta, apenas para ser empurrada de volta.
— O que está errado? – ele tem a ousadia de perguntar, a
centímetros do meu rosto. Mas não permito que essa proximidade me
distraia.
Ficando na ponta dos pés, olho para ele com nada além de despeito.
— Está seriamente me perguntando isso? – Quando ele não responde, é
evidente que sim. — Não sei qual é o seu problema. Você não tem sido
nada além de um idiota comigo desde que nos conhecemos. Não sei o
que fiz para te irritar, mas não gosto de ser tratada dessa maneira.
— Tratada de que maneira? Você está com raiva porque quer passar
a noite comigo? – ele parece sinceramente confuso, mas não me
importo. É hora de ele ficar confuso.
— Ah, se enxerga! – exclamo, com minha paciência diminuindo.
— Não quero passar a noite com você.
— Excelente. – ele responde com firmeza, me
insultando ainda mais.
— Sim, excelente. Ótimo. Perfeito. Agora saia do meu
caminho para que eu não tome mais o seu precioso tempo.
— Tiger...
— Meu nome é Lily. – eu resmungo, interrompendo-o. — Sei que
você provavelmente só me vê como uma prostituta, rebolando a bunda 151
por dinheiro, mas sou muito mais do que isso.
— Eu não acho isso. – ele repreende. Claramente ofendido, ele está
inflando as narinas, mas dane-se.
— Não me importo com o que um idiota como você pensa de mim.
– Ele contrai a mandíbula, mas eu continuo. — Não somos amigos e
nunca seremos. Nunca vi você sorrir. Você tem cara de vadia em
repouso permanentemente, mas no seu caso, você é um desgraçado.
Ele franze aqueles lábios pecaminosos, refletindo sobre minha
explosão que veio do nada. Espero que ele prove que estou errada e me
mostre que o que sinto não é imaginado e funciona nos dois sentidos.
Quero que me reconheça como alguém especial porque, pelo menos uma
vez na vida, quero ser o destino de alguém e não apenas à disposição.
Mas ele não faz isso. Ele é apenas mais um idiota que preciso
esquecer.
— O que é cara de vadia em repouso? – ele pergunta, fazendo-me
sentir uma idiota.
Apesar de qualquer obsessão que sinto por ele, prometo a mim
mesma aqui e agora nunca mais permitir que esse homem leve a
melhor sobre mim.
De pé, desconsidero sua aversão por intimidade e
pressiono meu peito contra o dele. Quando ele recua, eu
me alegro. — Não importa. Você não importa. Agora
saía.
A respiração pesada de Bull sopra mechas de cabelo do
meu rosto. Ele mal está se segurando. Não sei se ele quer
brigar ou me foder, mas não fico por aqui para descobrir.
Empurro seu peito, sem olhar para trás enquanto viro a maçaneta da
porta e deixo seu tipo de problema para trás. 152
Bull acabou de me fazer um favor. Então por que me sinto tão vazia
por dentro?
153

Lendo a descrição de cara de vadia em repouso no Google pela


terceira vez, não sei se fico insultado ou me divirto por Tiger pensar isso
de mim.
A noite passada foi estranha, para dizer o mínimo. Por um lado, por
que diabos ela estava vestindo minha camiseta?
Assim que ela saiu bufando, tomei um banho – um banho frio.
Sua língua afiada e sua necessidade constante de me desafiar mal me
fizeram aguentar. Ela está brincando com fogo e sabe disso. Mas isso
não a impede. Na verdade, isso a estimula.
Não a assusto. Eu a enfureço, algo com o qual não
tenho nenhuma experiência. Perto dela, sinto-me como
um cego cuja visão está voltando lentamente. Não queria
estender a mão e tocar seu cabelo, mas tudo sobre essa
mulher me deixa curioso. É como se eu estivesse vivenciando
tudo pela primeira vez. E suponho que de certa forma, sim.
Quando preso, você se adapta às imagens e sons sombrios. Você
fica institucionalizado e a violência, os gritos noturnos tornam-se sua 154
norma. Ainda me lembro do rangido dos sapatos dos guardas enquanto
caminhavam pelos corredores. E o zumbido da luz que nunca se
apagava. Lembro de tudo, mas o que não lembro é como ser normal.
Então, quando me ofereci para chamar Venus, não foi porque não
queria que Tiger ficasse comigo. Foi porque era exatamente isso que eu
queria. E isso não pode acontecer.
Tiger é uma distração; uma que não posso pagar. Estou aqui para
me vingar, não para me divertir. Alguém está atrás dela, e se eu não a
tivesse ouvido gritar ontem à noite, aquele filho da puta a teria matado.
E isso me enfurece mais do que deveria.
Não posso me envolver com os problemas dela. Já tenho o
suficiente. Mas ficar longe dela está sendo mais difícil do que eu
pensava. Seu toque subjuga e provoca meus demônios, tudo ao mesmo
tempo. Isso nunca aconteceu antes.
Seu pequeno corpo pressionado contra o meu não deveria ser tão
bom, mas foi. O fato de nossa conversa ter sido acalorada e ela estar me
xingando só me fez querer puni-la ainda mais. A dor é o que me excita,
e cada vez que Tiger me prova que consegue se virar sozinha, a
necessidade de discipliná-la só fica mais forte.
Não sou o mocinho, sei disso, e estar perto de Tiger só prova o
quanto ruim posso realmente ser. Provo isso para ela e
para mim, porque nunca posso perder de vista o que
sou.
— Lembre-me por que me preocupo.
Balançando a cabeça, levanto os olhos do celular e vejo Lotus
parada na porta do banheiro, segurando duas garrafas de cerveja. Ela 155
parece péssima.
Estive aqui consertando torneiras e vasos sanitários com vazamento.
Guardo meu celular no bolso, lavo as mãos e aceito a cerveja que ela
está segurando. — Incomodar-se com o quê? – pergunto, bebendo minha
Budweiser.
— Com tudo isso. – ela gesticula com as mãos para o clube. —
Andre está doente durante a semana, então você está bem para trabalhar
nos turnos dele?
— Sem problemas. – Esperamos que ele nunca mais volte.
— E Lily não virá por alguns dias. – ela acrescenta. — Sei sobre
ontem à noite. Eu disse a ela para levar todo o tempo que precisasse.
Isso me deixa sem minha melhor garota, mas este lugar já tem sérios
problemas. Então, o que é outro drama?
Ela não menciona meu envolvimento, o que me faz adivinhar que
Tiger não revelou que eu estava lá.
Algo permanece em sua língua, e quando fecha a porta, insinuando
que quer privacidade, acho que tem algo a ver com o que discutimos
na outra noite. — Eu queria que você soubesse que liguei para meu
amigo. Nada é definitivo... – diz ela rapidamente. — Mas preciso
pensar neste lugar.
— Você não me deve uma explicação, Lotus. Este
é o seu clube. Você faz o que quiser. – afirmo sem
rodeios. — Agradeço o aviso, no entanto.
Ela toma um gole de cerveja, avaliando o que dizer. —
Sei que você não pode estar aqui por causa das condições de
sua liberdade condicional. Você é honesto, sem sacanagem, e eu gosto
disso. Estou feliz por ter seguido meu instinto. 156
Arqueio uma sobrancelha, confuso.
Ela esclarece um momento depois. — Meu instinto me disse para
dar uma chance a você, porque por trás de tudo isso... – ela usa o dedo
para apontar para cima e para baixo no meu corpo. — Existe um bom
homem.
Antes que eu tenha a chance de argumentar que ela está muito,
muito errada, ela sorri. — Você pode não ver, mas eu vejo. Talvez um
dia você também veja. Venha me ver quando terminar. É dia de
pagamento. – ela vira para onde veio, me deixando sem palavras.
Embora aprecie o que ela disse, ela está errada. Tão errada. Ela não
tem ideia de até aonde irei para encontrar aqueles filhos da puta e acabar
com isso de uma vez por todas. Sacrificarei qualquer coisa, qualquer um,
para conseguir o que quero.
Algo coça abaixo da superfície, mas não sei o que é. Seja o que for,
reprimo profundamente, assim como faço com essa obsessão que tenho
por Tiger. As tatuagens nas juntas dos dedos são um lembrete do que eu
sou.
Um lobo solitário, pronto para destruir qualquer coisa que esteja
no meu caminho.

Os banheiros estão consertados, mas precisam


desesperadamente de um pouco de pintura. Os rabiscos nas
paredes datam da década de 80. Eu sei que a Lotus não pode se
dar ao luxo de fazer isso. Ela não pode se dar ao luxo de fazer
nada. Este lugar irá falir em alguns meses se as coisas não mudarem.
Enquanto caminho em direção ao escritório da Lotus, ouço algumas
157
vozes dentro do clube. Uma delas é da Lotus, então estou prestes a virar
o corredor, mas o que ouço me faz parar de repente. Ela parece estar
falando de negócios.
— Não posso ser presa, Stevie. Se eu fizer isso, você tem que me
prometer que isso não acontecerá.
— Lotus, nós dois perderemos se isso acontecer. – Um homem que
presumo ser Stevie diz.
Lotus hesita antes de responder: — Suponho que você esteja certo.
— Olha, vai ser fácil. Vamos ajudar um ao outro. Você precisa de
dinheiro e eu preciso de um clube. Eu prometo; tudo ficará bem. Venho
fazendo isso há anos e nenhuma vez fui preso. Eu sou esperto. A
localização nunca é a mesma. Nós nos movimentamos para manter os
policiais longe de nós.
Decidindo dar uma espiada em quem é Stevie, eu espio
silenciosamente pela porta e vejo Lotus conversando com um homem
em um terno chamativo. Ele parece um empresário sem alma no meio de
uma transação.
No entanto, o outro homem, que está de costas para mim, evoca
algo sombrio, algo selvagem em mim. Minhas palmas começam a
coçar e de repente tenho um déjà vu. Tudo é
intensificado. Minha respiração é amplificada. O
sangue pulsa em minhas veias.
Como um grande filho da puta, não há dúvida de que
ele é o segurança de Stevie. Não acredito em Deus, em
fantasmas ou em qualquer coisa que não possa ver, mas vejo
aquele idiota. Quando você está preso, você imediatamente
percebe de quem gosta e de quem não gosta, e há algo nesse filho da
puta que eu não gosto. 158
Não posso ir lá porque tenho o elemento surpresa ao meu lado, mas
preciso ver o rosto dele. Só me senti assim uma outra vez, então preciso
ter certeza de que estou apenas alucinando, e ele não é um deles.
— Kong. – Tawny diz com um sorriso malicioso ao entrar no bar.
O segurança tem nome, mas ainda não tem rosto. Ele se vira na
direção dela, mas não consigo ver nada, graças ao ângulo. Quando ele
fala, porém, não preciso de um rosto porque aquela voz... está gravada
em minha alma.
— Ei, doçura. Está com uma boa aparência.
Tawny diz algo em resposta, mas não ouço nada. É como se meu
cérebro estivesse desligado de qualquer outro estímulo, porque tudo o
que ele consegue processar é que, a poucos metros de distância, está o
homem que me assombrou nos últimos quatorze anos.
O homem que me segurou e me forçou a assistir meu irmão ser
espancado até não restar nada está aqui, e ele tem um nome... Kong. Ele
foi o músculo que me conteve quando eu era mais jovem, e ele é o
músculo agora. Mas a diferença é que não sou mais jovem e tenho
meus próprios músculos.
A vontade de matá-lo onde ele está é quase insuportável, mas
respiro fundo pelo nariz para me acalmar. Para garantir
que não voltarei a ser preso, tenho que observar e
aprender. Eu tenho que ser inteligente.
Cerrando os punhos ao meu lado, vejo Tawny flertar
com esse filho da puta, e ele retribuir. Quando ela passa por
ele e aperta seu bíceps, tenho uma ideia que não irá falhar.
Nunca acreditei em sorte ou destino, mas talvez Tawny possa mudar
isso. 159
Farei o que for preciso para conseguir o que quero. Se Tawny sabe
quem é Kong, então terei que usá-la de todas as maneiras que puder.
Parece que Jaws e Kong têm uma queda por clubes de strip. Eu me
pergunto se os dois têm uma queda por Tawny?
Lotus encerra a reunião, não querendo que Tawny saiba por que
Stevie e Kong estão aqui. — Vai ficar para o show? – Tawny pergunta a
Kong, o que confirma que ela o conhece porque ele é um cliente.
— Esta noite não, doçura. Outra hora, no entanto. – ele se inclina
para frente para sussurrar algo em seu ouvido, e quando o faz... eu
finalmente vejo.
Ele.
"Desculpe, não posso fazer isso. É hora de você se tornar um
homem."
Suas palavras ficaram em minha mente por quatorze anos. Como
pode uma única frase ter o poder de arruinar a vida de alguém? Mas
aconteceu, e agora é hora de retribuir o favor.
Preciso de toda a minha força para não ir lá e esfaquear Kong na
jugular. Mas tudo no devido tempo. Ele já está morto. Enquanto eu...
nunca me senti mais vivo.

Deixar Kong ir embora foi uma das coisas mais difíceis


que já tive que fazer na minha vida. Eu não queria nada mais
do que acabar com ele onde ele estava. Mas minha vingança
chegará e, quando isso acontecer, será dolorosa e lenta. Para que isso
aconteça, porém, preciso de Tawny. 160
Ela parece muito amigável com ele, o que significa que ela pode
preencher as lacunas. Preciso saber toda e qualquer informação que ela
tenha sobre ele. Pelo que parece, a Lotus concordou em trabalhar com
Stevie, o que significa que verei Kong muito em breve.
Mas preciso de vantagem antes que isso aconteça. Então, quando
ouço os saltos de Tawny batendo no corredor, coloco meu plano em
ação. Agarrando a garrafa de cerveja que roubei de algum idiota no
clube, derramo-a deliberadamente na frente da minha camiseta. Quando
Tawny se aproxima, rapidamente rolei a garrafa sob os armários e tiro a
camiseta pela cabeça, para que, quando ela entrar no camarim, eu esteja
sem camisa.
Estou de costas para ela enquanto me ocupo procurando uma toalha
na prateleira. No momento em que seus saltos param de ecoar, respiro
em vitória.
— Ah, oi. – ela diz em voz baixa.
Virando-me por cima do ombro, aceno brevemente, não querendo
que ela sinta que algo está errado. — Ei. Desculpe, irei embora em um
segundo. Algum idiota derramou cerveja em mim. Eu estava
procurando uma toalha.
Pegando uma toalha, começo a enxugar meu peito.
Minha camiseta está jogada no encosto de uma cadeira.
Tawny entra no camarim, observando cada movimento
meu. Antes de ser preso, muitos me disseram que eu era
bonito. Eu acreditei na palavra deles.
Pela maneira como Tiger me devorou ontem à noite, o
que me deixou confuso, e agora Tawny, parece que não perdi
meu apelo. Mas nada disso importa para mim. É apenas um meio
para um fim. Usarei tudo o que puder para conseguir o que quero. E
nada ficará no meu caminho. 161
Assim que estou “seco”, encontro o olhar caloroso de Tawny. —
Como vão as coisas por lá?
Conversar sobre amenidades não é minha praia, mas não posso
andar com armas em punho, embora eu quisesse muito, literalmente.
Tawny deve ter acabado de sair de um baile particular porque está
de vestido, o que significa que ela fará uma pausa em breve.
— Está tudo bem. A plateia está devagar esta noite, o que significa
que as gorjetas também estão. – ela responde, passando o dedo pela
minha camiseta. — Sua camiseta está encharcada.
— Eu sei. – respondo, passando a mão pelo cabelo.
— Você sempre pode ficar sem camiseta. – ela sugere com um
sorriso torto enquanto admira meus bíceps. — Eu não me importaria.
Caiu que nem um patinho.
— O cara com quem você estava conversando hoje pode não
concordar.
Tawny nunca deveria jogar pôquer porque ela não tem
capacidade de mascarar suas emoções. — Quem? Kong? – ela
pergunta com um deboche brincalhão. Ela está fingindo se fazer de
boba, mas está emocionada por eu ter notado.
Encolhendo os ombros casualmente, cruzo os braços
sobre o peito. — Esse é o nome dele?
— Sim, Kong, embora seu nome verdadeiro seja
Ethan Da Silva. Mas não diga a ele que te contei isso. Ele tem
uma imagem a defender.
E o bastardo tem nome.
— Como você o conheceu?
162
Tawny molha os lábios. — Ele já vem aqui há algum tempo. Ele dá
gorjetas muito boas. A maioria dos homens casados faz isso. –
acrescenta ela com uma piscadinha. — Eles acham que se derem uma
grande gorjeta, isso de alguma forma desculpará o fato de seu pau estar
duro para alguém que não seja sua esposa.
— Como você sabe todas essas coisas sobre ele?
Ela caminha em minha direção enquanto permaneço rígido. — Eu
sei um monte de coisas. – ela responde sedutoramente, passando a unha
no meu bíceps.
Isso está saindo dos trilhos. Preciso redirecionar isso. — Aposto que
você não sabe onde ele trabalha. Onde ele treina. Com quem anda. – eu
acrescento para garantir.
Este é um teste, e Tawny passou com louvor. — Aposto que sim.
Por que você está tão interessado nele, afinal?
Desviando do comentário dela, agarro seu pulso, mas em vez de
afastá-la, arrasto-a em minha direção. Suas pupilas dilatam enquanto
suas bochechas ficam vermelhas. — Queria saber se ele é concorrente
ou não. Isso é tudo.
Um suspiro escapa dela. — Ah, sério? Não achei
que você estivesse interessado em jogar o jogo.
Ah, estou tão interessado em jogar. Só não do jeito
que ela pensa.
— O que lhe deu essa impressão? – pergunto friamente.
— Achei que você estivesse interessado em Lily. – ela
explica. No momento em que Tawny diz o nome de Tiger, é
como se eu estivesse encharcado com um balde de água gelada.
O que estou fazendo ou, mais precisamente, o que estou preparado
163
para fazer, de repente parece um movimento idiota. Não é preciso ser
um gênio para perceber o interesse de Tawny por mim. Se ela me fizer
uma proposta e, em troca, me der tudo o que tem sobre Kong, terei
prazer em transar com ela até a próxima semana.
Ela não parece o tipo de garota que gosta de relacionamentos, mas
mesmo se fosse, estaria sem sorte. Não sou alguém de felizes para
sempre. Sem compromisso está bom para mim, mas algo me incomoda
no fundo da minha mente, e essa coisa é Tiger.
Não tenho consciência. Ficarei feliz em foder a família de Kong,
incluindo cachorro e gato, mas a ideia de Tiger descobrir sobre Tawny e
eu me faz sentir... culpa? É isso que é esse sentimento? Sinceramente
não sei por que nunca senti isso antes.
Como produto de um sistema de justiça que me ensinou como
desligar as minhas emoções para sobreviver, este é um território novo
para mim. Tawny quer foder comigo, mas Tiger... o que ela quer? Não
sei.
Ela está apenas sendo legal comigo... me deu pontos porque ela é
uma boa pessoa? Ou ela tem um motivo oculto? Mas o mais
importante, por que diabos me importo? Não me importo com nada
nem com ninguém há muito tempo. Esse sentimento é estranho e sinto
que estou prestes a enlouquecer.
Balançando a cabeça, preciso dar o fora dessa, e é
por isso que levo Tawny em direção à parede e a
pressiono contra ela. Seu pânico logo se transforma diante
dos meus olhos.
— Só estou interessado em me divertir. – respondo ao comentário
dela. Mas por hora, quero dizer cortar Kong em pedacinhos enquanto ele 164
ainda está vivo.
Tawny, entretanto, não percebe minha perversão. — Ele trabalha
como segurança pessoal. Ele treina na academia do Gumbo. – ela sorri.
— Digamos apenas que ele passa mais tempo na academia do que em
casa.
Não tenho ideia de como ela sabe disso, nem me importo, mas
acabou de me dar meu bilhete dourado. E quando ela se aproxima,
olhando para mim por baixo dos cílios postiços, fica evidente que ela
quer pagamento.
— Viu, eu disse que sei de coisas. – ela sussurra, com seu olhar
caindo para minha boca. — Que tal eu mostrar o que mais sei?
Esse era o preço que eu sabia que teria que pagar, mas quando ela se
equilibra na ponta dos pés e pressiona os lábios nos meus, paraliso. Cada
músculo do meu corpo fica tenso e não no bom sentido. Seus lábios são
como tentáculos e ela está em toda parte, me forçando a me abrir para
ela de todas as maneiras possíveis.
Não há absolutamente nenhum esforço da minha parte, mas Tawny
não percebe enquanto geme em minha boca, sua língua penetrando
cada vez mais fundo. Ela pressiona seu peito contra o meu, tentando
me persuadir a retribuir.
Mas não há como isso acontecer.
É ela quem está presa com as costas pressionadas
contra a parede, mas de repente me sinto preso. Quando
ela coloca os braços em volta do meu pescoço, eu gemo,
mas não é de excitação. É por precisar ficar longe dela.
Ela é demais, muito grudenta, muito calorosa, muito desesperada,
me beijando loucamente, mas não sinto nada, nada diferente de quando 165
eu... puta merda. O único outro beijo com o qual posso comparar é
aquele que compartilhei com Tiger. Pensando em seus lábios carnudos,
corpo macio e cheiro delicioso, respondo de uma forma que me
surpreende.
Eu beijo Tawny também.
Embora não sejam os lábios dela que quero, meu corpo se lembra de
como Tiger parecia e ansiava por um orgasmo. Deslizando os dedos
pelos cabelos de Tawny, as últimas palavras de Tiger ditas para mim
ganham vida e meu desejo se transforma em fúria.
"Não importa. Você não importa."
Mesmo que ela esteja certa, não consigo impedir que esse vazio
dentro de mim fique cada vez maior. E ajo da única maneira que
conheço, da única maneira que me condicionei a me comportar.
Meu aperto no cabelo de Tawny aumenta, lidando com esse peso
morto apodrecendo dentro de mim. Eu puxo, puxando sua cabeça para
trás em um ângulo estranho, mas continuo a beijá-la. Ela mordisca meu
lábio e minha língua, então mordo a dela... com força.
Ela geme, rendendo-se com muita facilidade, o que me entedia.
Eu quero um desafio. Ela me permite beijá-la sem remorso,
dominando seus lábios e corpo da maneira que eu
quiser. Sua língua entra e sai da minha boca, tentando
duelar com a minha, mas não é concorrente. Seu gosto,
sua boca, ela... ela não é o que, quem eu quero. Ela é
como vodka aguada, e quando percebo por que isso
acontece, resmungo de raiva, prendendo-a ainda mais contra
a parede.
Ela não desperta uma fome carnal dentro de si, nem faz o que eu
achava impossível... ela não me faz sentir. Tiger, no entanto… faz. Não 166
sei o que ela me faz sentir, mas pelo menos é alguma coisa. Estou morto
por dentro; não vamos me confundir com outra coisa senão um homem
que vive com um único propósito na vida. Mas desde que a conheci,
Tiger me fez sentir algo diferente desse vazio que me atormentou por
quatorze malditos anos.
Droga. Quero beijos chiclete, não esse abraço sem graça.
— Ah, porra, desculpe! Eu não sabia... – Uma voz atordoada me
traz de volta ao agora, e eu interrompo meu beijo com Tawny.
Ela geme, tentando encostar o nariz no meu. Mas não acaricio ou
abraço. Eu nem beijo. Mas os olhos arregalados e a boca aberta de Bae
revelam que sou mentiroso.
Imediatamente deixei Tawny ir, sentindo nada além de nojo de mim
mesmo. Ela, por outro lado, parece vitoriosa. Quando vejo seus lábios
vermelhos e inchados, os lábios que acabei de contaminar, a necessidade
de fugir quase me sufoca. Não me preocupo em dizer adeus a nenhuma
das mulheres enquanto caminho em direção à porta. Posso parecer
distante, mas quando saio, abaixo a cabeça de... vergonha.
Vergonha.
Outra sensação que não sentia há muito tempo.
167

Por três malditos dias, segui esse filho da puta. E por três malditos
dias, tive que me impedir de atropelá-lo com a caminhonete que peguei
emprestada da Lotus. Ainda não tenho minha habilitação, mas vou
corrigir isso em breve.
Lotus tem sido muito generosa e me pagou mais do que deveria.
Acho que pode ser suborno, mas ela não tem nada com que se
preocupar. Não sou dedo duro. Além disso, estou ocupado planejando
maneiras de matar Kong. Há tantos anos que sonho com este
momento e agora que a realidade está ao meu alcance,
sinto-me como uma criança numa loja de doces.
Esfaqueamento. Tiro. Enforcamento. Afogamento.
Dissecação… enquanto ainda estava vivo. As
possibilidades são infinitas. A morte de Lachlan foi
misericordiosa. Ele não sofreu o suficiente. Mas eu aprendi.
Ele foi um teste. E agora sou um mestre em todas as coisas
torturantes e sangrentas.
Entre meus turnos de trabalho, vim aqui para a academia do Gumbo
ou segui Kong para o trabalho. Stevie não estava brincando quando disse 168
que se movimentava. Ele nem parece ter um local fixo para seu
escritório. Mas ele é inteligente. Uma operação em movimento é difícil
para a polícia encontrar, o que me faz pensar.
Preciso de um local para matar.
Não posso exatamente levar Kong de volta ao hotel. Venus é chata
sobre fumar nos quartos. Imagino que não ficaria muito impressionada
com membros decepados na banheira e respingos de sangue nas paredes.
Mas edifícios abandonados são comuns em Detroit. Só preciso encontrar
o caminho certo.
É necessário muito planejamento, por isso coloco meu bloco de
notas apoiado no volante enquanto detalho tudo o que precisa ser feito.
Com “Don’t Be Cruel” de Elvis tocando suavemente no rádio, anoto
possíveis locais e datas para tudo isso acontecer.
O Gumbo’s tem janelas amplas, o que me permite olhar e ficar de
olho em Kong. Não quero que ele me veja, então mantenho a vantagem.
O elemento surpresa é o ingrediente chave para garantir que tudo corra
bem.
Manter-me ocupado, fazendo o que faço de melhor, tem sido uma
distração bem-vinda. Depois do incidente com Tawny, fiquei quieto.
Tiger ainda não voltou. Eu seria um mentiroso se não admitisse que
queria saber onde ela está ou como está. E se ela ainda
está com raiva de mim.
Isso ainda é tão estranho para mim. Planejar um
assassinato é mais fácil do que lidar com o que quer que
seja... esse sentimento está em meu estômago sempre que
penso em Tiger.
Quanto a Tawny, ela acha que estou me fazendo de difícil. Mas não
estou jogando. Quando ela tentou me beijar novamente, deixei claro que 169
isso não iria acontecer. Se ela não entendeu a dica quando lhe contei
isso, então não era problema meu.
Olhando para a página à minha frente, gemo quando vejo que
escrevi sem querer o nome de Tiger em vez de Kong. Isso precisa parar.
Preciso de um plano, e quando vejo Kong caminhando até sua enorme
caminhonete, este é um exemplo perfeito do porquê.
Eu nem percebi que ele saiu.
Anotando rapidamente a hora em meu diário, abaixando no banco,
não querendo que ele me veja. Estou estacionado do outro lado da rua,
mas não posso ser descuidado. Ele joga sua mochila de ginástica na
porta traseira e está prestes a caminhar até o lado do motorista, mas
então para.
Ele inclina a cabeça para olhar embaixo do pneu traseiro.
Arrastando-me para poder ver melhor, observo enquanto ele se abaixa e
pega algo pequeno, preto e fofo. Um gatinho. Seus dentes brancos
brilham no escuro enquanto ele levanta o gatinho no ar.
A imagem me dá um arrepio, pois já fui aquele gatinho.
A princípio, acho que talvez Kong tenha uma queda por gatos,
mas quando ele coloca o gatinho de volta no pneu e pega algum tipo
de barra de proteína de sua bolsa de ginástica, fica
claro o que ele pretende fazer.
Ele quebra um pedaço da barra e coloca perto do
gatinho. A coisa magricela come a oferenda com alegria,
sem perceber que esta é sua última refeição, pois não há
dúvida de que Kong planeja atropelá-lo com sua caminhonete.
Agarro o volante, respirando fundo pelo nariz.
A coisa é minúscula, indefesa e à mercê desse filho da puta. Sou
atingido por imagens daquela noite, de quando eu também era pequeno, 170
indefeso e à mercê desse filho da puta igual a esse gatinho. Mas não sou
mais indefeso.
— Não. – resmungo, fechando os olhos e dizendo a mim mesmo
que salvar aquele gatinho não é problema meu. Mas também não era
problema de Lachlan quando ele poderia ter ajudado meu irmão, mas
não o fez. Ele fugiu. Como um idiota sem coragem.
E serei o mesmo se não ajudar a bola de pelo.
— Filho da puta. – eu xingo baixinho enquanto abro a porta da
caminhonete e corro pela rua. Quando a caminhonete de Kong ganha
vida, acelero o passo e, antes que ele tenha a chance de dar ré, arranco o
gatinho de debaixo do pneu traseiro.
Os faróis de freio de Kong ficam vermelhos, assim como sua raiva
quando ele estaciona a caminhonete e desce. — Que porra é essa, idiota?
Você tem um desejo de morte? – ele diz, com os braços bem abertos.
Sim, eu queria que você estivesse morto.
Ele se aproxima de mim enquanto paraliso. Nem consigo respirar.
Depois de todos esses anos, estou cara a cara com um dos assassinos
do meu irmão e estou segurando a porra de um gatinho... o que é o
estratagema perfeito. Isso pode funcionar a meu favor.
— Desculpe, cara, essa bola de pelo é meu vale-
refeição, e quando digo refeição, quero dizer de boceta.
– digo grosseiramente, estendendo o gato. Ele ronrona em
apoio.
Diga a palavra mágica – boceta – para qualquer idiota e
vocês se tornarão instantaneamente melhores amigos. Kong
me olha, cruzando os braços sobre o peito. Ele está me
avaliando. Sou amigo ou inimigo? Ou, mais importante, ele já me viu
antes? 171
Ele me observa de perto, olhando nos meus olhos, a única coisa que
teria me delatado. Mas graças à lente azul que uso, sou como todo
mundo agora. Devo passar no teste dele.
— Sua vadia está dando golpe baixo em você também? – ele diz
como se fôssemos amigos em algum clube secreto.
— Não é sempre assim? – eu rio e reviro os olhos.
Tawny disse que Kong passa mais tempo na academia do que em
casa, e acho que ela sabe disso porque ele a trouxe aqui para se exercitar
de uma maneira diferente. Ele claramente não tem respeito pelas
mulheres, e é por isso que decidi usar essa desculpa.
— Uma porra de juramento, irmão. Eu sou o Kong. – ele estende a
mão. Cada músculo do meu corpo exige que eu quebre seu pulso, assim
como seu amigo fez com Damian.
Mas é por causa disso que aperto a mão dele. Seu aperto de mão é
firme, emanando as vibrações de testosterona. Ele quer se estabelecer
como alfa. Ele pode estabelecer o que quiser, porque quando isso for
feito, eu serei o alfa quando acabar com a porra da sua vida.
— Tommy. – respondo, dando-lhe o nome mais genérico que
consigo pensar.
— Você é novo por aqui? Eu não vi você antes.
— Sim. Acabei de me mudar de Seattle. A mãe do
meu filho morava lá, então, você sabe, eu me separei.
Kong gargalha porque, aparentemente, abandonar a
família é motivo de riso. A necessidade de acabar com ele é
muito tentadora. Eu não confio em mim mesmo. Mas agora não
é a hora. — É melhor eu ir. Boceta está esperando. – digo.
Assim que vou virar, ele me para. — Se você precisar trabalhar, me
172
ligue. Meu chefe está sempre procurando... talentos como você.
Talentos. Ele quer dizer lutadores. E assim, um plano é traçado.
— Parece que seu chefe é um homem inteligente.
Kong caminha até a porta traseira e enfia a mão na mochila. Eu fico
perfeitamente imóvel. Quando ele mostra um cartão branco, eu aceito.
Olhando para ele, encontro apenas um número impresso nele. — É aí
que você pode me encontrar... por enquanto.
Eles não apenas mudam de local com frequência, mas também
mudam de número de telefone.
— Ok. Obrigado, Kong. Eu te vejo por aí. – E eu quero dizer cada
palavra.
Sem me demorar, viro-me e desço a rua. Não consigo entrar na
minha caminhonete porque esse gatinho é para uma garota que mora por
aqui. E também não quero que ele saiba o que eu dirijo. Viro a esquina,
ouvindo o barulho desagradável de seu motor.
Quando a noite desaparece, suspiro de alívio e me encosto em
uma parede de tijolos. A adrenalina percorre meu corpo, e não me
lembro de ter me sentido tão vivo assim, o que é irônico,
considerando o que pretendo fazer com Kong.
Ele me deu força. Se eu lutar, ganho sua confiança.
E ganhar a confiança dele me permite descobrir o
paradeiro dos outros dois idiotas. Lotus só será um
problema se descobrir, mas não o fará. Somente quando eu
ganhar a confiança dele é que irei atacar. A justiça poética por
trás disso é tentadora demais para deixar passar.
O gatinho mia, me lembrando de que ele ainda está aqui. Não
preciso mais dele, então o coloco no chão. — Obrigado por me ajudar lá 173
atrás.
Mas ele olha para mim, antes de esfregar a cabecinha em meu
tornozelo. — Que porra você está fazendo? Eu não tenho comida. Xô.
Vá, seja livre.
Mas ele não se move.
Não sei o que ele quer, mas não é problema meu. — Sobrevivência
do mais forte, Fluffball8.
Saio pela rua, mas quando ouço outro miado, olho por cima do
ombro e vejo o gatinho me seguindo. — Qual o problema, cara? Você
está perdido?
Ele simplesmente caminha em minha direção e se senta ao meu
lado. Nem gosto de gatos. Quero dizer, o que eles fazem além de dormir,
cagar, comer e exigir atenção em seus termos? Meu celular toca e,
quando vejo que é Lotus, arqueio uma sobrancelha.
Não devo trabalhar por mais algumas horas, pois estou trabalhando
no turno da noite. — E aí? – eu atendo, me perguntando o que há de
errado.
Eu instantaneamente ouço vaias e idiotas barulhentos ao fundo.
— Desculpe ligar, Bull. Sei que você só começará daqui a algumas
horas.
— E aí?
Sua pausa é toda a resposta que preciso. — É a Lily...
— Estarei aí em dez minutos. – Desligo antes mesmo
que ela tenha a chance de terminar a frase.

8 Fluffball: significa bola de pelo em inglês.


Olhando para a bola de pelos aos meus pés, gemo antes de pegá-lo
pela nuca. — É apenas uma noite. 174
Com o gato a tiracolo, corro até minha caminhonete, pronto para
salvar outra pessoa.

Não tendo ideia do que os gatos comem, deixo a bola de pelo na


caminhonete com um pouco de carne seca e água. Retiro minha lentes
de contato porque não quero denunciar nada. O clube está lotado, o que
é bom para a Lotus. Quanto a mim, torna impossível passar por cima dos
idiotas bêbados que estão gritando por Bae no palco.
Eu os empurro para o lado e vou direto para Lotus, que está atrás do
bar. Quando me vê, ela aponta com a cabeça em direção aos camarins
enquanto continua servindo cerveja. Não tenho ideia do que vou
encontrar, então acelero o passo e corro pelo corredor.
Praticamente entro na sala, pronto para qualquer cenário. No
entanto, quando vejo Tiger sentada no sofá com os joelhos encostados
no peito e o rímel escorrendo lágrimas pretas pelo rosto, percebo que
estou pronto para tudo, menos isso.
Eu paro, sem saber o que diabos está acontecendo.
Tiger levanta os olhos e, quando me vê, enxuga
rapidamente as lágrimas com as costas da mão. Eu fico
olhando para ela, que nem um babaca, porque que porra
devo dizer? Talvez eu tenha me precipitado quando Lotus
ligou. Eu simplesmente não pensei, o que novamente – uma
coisa de principiante. A necessidade de chegar aqui anulou o
bom senso, o que foi ruim para mim, porque agora pareço um idiota.
— Seu gato morreu? – eu deixo escapar, antes de me xingar.
175
Tiger franze os lábios inchados em confusão, o que é uma resposta
razoável, porque por que diabos eu perguntei isso a ela? Não sei o que a
aborreceu. A morte do gato dela parece ser uma causa provável.
Enxugando os olhos novamente, ela balança a cabeça. — Não, meu
gato não morreu.
— Ah. Quer outro? – pergunto, com as palavras fluindo de mim
como diarreia verbal.
Ela continua olhando para mim como se eu tivesse enlouquecido.
Mas estou aqui, fiz isso. Ainda aqui estou.
Encontrando coragem, ando em direção a ela lentamente, com meus
pés me mostrando o dedo do meio, já que não tenho controle sobre meus
movimentos. — Eu estava. – faço uma pausa, decidindo deixar de lado o
fato de que estava planejando o assassinato de um homem. — Saindo
para correr e encontrei um gato. Eu realmente não sei o que você deveria
fazer com um, então, você sabe, pensei que se o seu estivesse morto,
você poderia ficar com este.
Ela pisca uma vez enquanto me pergunto se pareço tão estúpido
quanto me sinto.
Algo avassalador paira no ar. Na prisão, este era
um sinal claro de que uma briga estava prestes a
começar. Mas no mundo real, com Tiger, não sei o que
isso significa.
— Você não deveria fazer nada com eles. – ela
responde, fungando. — Eles são gatos. Eles dirão quando
quiserem alguma coisa.
— É bom saber. – digo, me movendo.
Seus olhos vermelhos me penetram. Ela parece tão... indefesa. Tão
176
triste. Estou tão confuso com tudo isso.
— Você é tão desajeitado socialmente. – ela declara, e eu apenas
encolho os ombros em resposta. — É como se você estivesse vivendo
em um planeta diferente.
Se ela soubesse metade.
— Uma pessoa normal perguntaria por que estou chorando.
— Nunca afirmei ser normal. – respondo sem hesitação.
Ela bufa, soprando o cabelo de seu rosto. — E o que eu
responderia... – diz ela, me ignorando. — É que a minha vida está
arruinada.
Quando ela enterra o rosto nas mãos e os ombros começam a
tremer, olho para a saída, desesperado para fugir. Eu não lido bem com
emoções. Não sei como. Estou quebrado. Então fico no meio da sala,
observando-a chorar, e quando ela levanta lentamente o queixo, tudo que
quero fazer é provar suas lágrimas.
— Você ouviu o que eu disse? – ela pergunta furiosamente. —
Minha vida está arruinada!
— Pare de ser tão melodramática. – afirmo porque posso lidar
com a raiva dela. Não posso confortá-la como um ser
humano normal, mas posso provocá-la porque quando
ela levanta e vem até mim, algo lindo nasce diante dos
meus olhos.
— Melodramática! – ela grita, me empurrando no peito.
— Seu idiota! Se você soubesse metade disso, não seria tão
rápido em julgar. Mas você provavelmente não se importa, já que está
muito ocupado com Tawny! 177
Ela está de salto alto, o que a coloca sob meu queixo, mas ela não
deixa a diferença de altura intimidá-la. Seus olhos verdes se estreitam.
Seu peito incha com sua raiva ofegante. Fico ereto e indiferente,
esperando pelo próximo movimento dela.
— Você vai mesmo ficar aí parado e não dizer uma palavra?
— Você parece estar dizendo o suficiente por nós dois.
— Ugh! – ela geme, com seu ódio por mim me deixando duro. —
Como você pode ser um bastardo tão insensível comigo, mas com ela…
Sua pausa me faz dar um passo à frente, pressionando-nos de frente
para frente. — Com ela o quê? – O calor do corpo dela queima minhas
roupas.
— Mas com ela, você... você a beija, porra! Não tente negar. Bae
me disse que ela encontrou você e Tawny se beijando.
— Não ia negar. – respondo friamente, pondo fim ao seu discurso
retórico.
A boca de Tiger abre e logo fecha. — De qualquer forma, não
importa. – ela confessa, passando a mão pelo rosto exausto. — Tem
um idiota aqui que pode estragar tudo para mim. Depois do ataque e
agora isto, estou começando a achar que é hora de
aceitar a oferta de Carlos.
Inferno, não. Isso não irá acontecer. Aqui, posso
observá-la.
Sua admissão me fez ranger os dentes. — Quem?
Ela franze os lábios em confusão. — O que?
Não tenho tempo para isso. — Quem está aqui?
— Um cara. – ela responde com um pequeno encolher de ombros.
178
— Qual cara? – pergunto, com minhas narinas infladas. Sua evasão
não está ajudando minha súbita necessidade de matar alguma coisa.
Ela deve ser capaz de ler minha impaciência porque me dá o que eu
quero. — E... eu ensino balé para crianças. – ela espera que eu processe
suas informações. Eu aceno uma vez. — O pai de uma das minhas
alunas está aqui para uma despedida de solteiro. Ele sempre flertou
comigo, mas deixei claro que isso nunca vai acontecer.
Ela engole em seco, o rosa sutil em suas bochechas fica vermelho
brilhante enquanto desvia o olhar. — Ele me viu dançando e, quando
terminei, pediu uma dança particular. Eu recusei. A Lotus concordou
comigo dizendo não. Mas ele ameaçou contar a todos na escola de balé o
que eu fazia se não...
Agarrando seu queixo, inclino seu rosto em direção ao meu. — Se
você não fizer o que? – pergunto, saboreando o tremor em seus lábios.
— Foder com ele. – ela finalmente responde, parecendo humilhada
por esse idiota. E ela tem todo o direito de fazer isso.
— Como ele é? – Minha voz é suave, mas por dentro uma raiva
está começando a crescer.
— Eu... – ela hesita, balançando a cabeça.
— Diga-me. – eu pressiono, segurando seu queixo
com mais força.
— Bull, não. – ela implora. Mas é tarde demais.
Respirando alto pelo nariz, seguro sua bochecha e fixo os
olhos nela. — Então me ajude, Deus. – eu paro um momento
para me recompor. — Se você não me disser quem ele é, eu vou matar
todos os filhos da puta neste lugar até encontrá-lo. 179
Um pequeno suspiro escapa de seus lábios entreabertos quando ela
percebe que minha ameaça não é vazia. — Ele está vestindo uma camisa
branca. Colete vermelho. E calça preta.
Sua gagueira revela que ela está com medo de mim. Ótimo. — Viu,
isso não foi tão difícil agora, foi?
Posso não entender a emoção, mas entendo a violência.
— O que vai fazer? – ela pergunta, com sua pele fria como gelo sob
minha mão. De repente fico hipnotizado pelos fios de seu cabelo
enquanto eles tocam as pontas dos meus dedos. — Bull?
— Cuidar do seu problema. – respondo, inclinando a cabeça quando
seus olhos verdes começam a lacrimejar.
— Por quê? Por que você se importa? – ela funga as lágrimas, mas é
tarde demais. Eu as vi e quero reivindicar cada uma.
Com um toque cauteloso, enxugo uma lágrima perdida com o
polegar. — Porque... ninguém faz você chorar... – Sua boca se abre. Ela
parece... tocada. Isto é, até eu cortar nossa conexão, apenas para colocar
o polegar na boca. Sua tristeza salgada é uma droga potente para um
demônio como eu.
— Exceto eu. – concluo, o que significa cada
palavra. Ela fica sem palavras enquanto saio do
camarim e entro no clube.
Não demoro muito para encontrar o idiota em
questão. Ele está sentado com um grupo de idiotas que
joga notas de dólar no palco. Tawny está dançando e, quando
me vê, seus olhos brilham. Eu gostaria que eles não fizessem
isso.
Ignorando-a, marcho até o idiota, bato em seu ombro e grito em seu
ouvido: — Tigerlily lhe deve uma dança. Venha comigo. 180
Sua cabeça balança para cima e para baixo e ele se levanta
rapidamente, bebendo o resto da cerveja. Ele dá high-five com um de
seus amigos, que faz um gesto grosseiro e imaturo com o dedo
percorrendo um círculo que ele fez com o polegar e o indicador da outra
mão.
A vontade de espancá-lo até deixá-lo sem sentido só aumenta.
Ele me segue enquanto o conduzo pelo clube, desconsiderando
Tawny, que parou de dançar para ver para onde estou indo. Enquanto
caminhamos pelo corredor e entramos em uma das salas de dança
privadas, decido que não vou matá-lo; Só vou machucá-lo um pouco.
— Onde está aquela provocadora de pau? – ele pergunta, olhando
ao redor da sala em busca dela. — Ela deixou meu pau tão duro todos
esses meses desfilando com aquele tutu. É hora de ela pagar.
OK. Eu retiro o que disse. Vou machucá-lo muito.
Fecho a porta e tranco-a, selando seu destino. Quando ele se vira
por cima do ombro para dizer alguma coisa, ponho fim à sua fala quando
lhe dou um soco direto no nariz. Ele cambaleia dois passos para trás,
gritando enquanto segura o nariz sangrando.
— Que porra é essa, cara? – ele chora por entre os dedos.
— Eu ia te fazer a mesma pergunta. – zombei,
andando em direção a ele. — Que porra você está
fazendo ameaçando uma das minhas garotas?
Ignoro o fato de que acabei de me referir a Tiger como
minha e me concentro no motivo pelo qual o idiota ainda está
respirando.
— E... me desculpe. – ele balbucia, com as mãos cobertas de
sangue. 181
A visão me dá muito prazer e atraio a violência para o fundo dos
meus pulmões. — Tarde demais.
Avanço, rindo quando ele usa a cadeira frágil como barricada entre
nós. — Eu tenho dinheiro. Muitos dele! – ele chora, apenas piorando as
coisas para si mesmo.
Ele vasculha o bolso da calça com uma das mãos enquanto a outra
cuida do nariz sangrando, então aproveito a oportunidade para mostrar a
ele o que acho de sua oferta. Colocando minha bota contra a beirada da
cadeira, empurro a cadeira para frente e o trilho de metal superior se
conecta às suas bolas.
Ele chia, caindo no chão de joelhos.
Chuto a cadeira para longe, precisando de um campo de batalha
aberto. Ele foge de joelhos, mas o chuto na parte inferior das costas. Ele
cai de bruços. — Por favor. – ele implora, mas seus apelos significam
nada para mim.
Quando ele tenta se levantar, coloco minha bota no meio de sua
coluna, com a intenção de esmagá-lo como a barata que ele é. —
Você vai esquecer que viu Lily aqui esta noite. Estamos entendidos?
— Sim! – ele grita, se contorcendo.
— Não acredito em você. – pressiono suas costas
com mais força, deixando uma marca de bota
empoeirada em seu colete imaculado.
— Eu juro! Não vou contar a ninguém. Por favor,
deixe-me ir.
Ele está implorando. Que covarde.
No entanto, de repente estou fixado em um cheiro que desperta essa
escuridão interior: flores de cerejeira. — Você acha que é melhor do que 182
eu, é isso?
O babaca está voltado para a porta, a porta trancada por onde Tiger
acabou de entrar graças à chave que ela segura. Ele levanta o pescoço e,
quando a vê, se debate com raiva.
— Eu não acho... eu sou. – ele resmunga, encontrando suas bolas na
porra da hora errada.
Eu rio, balançando a cabeça diante de sua estupidez.
Tiger tranca a porta atrás dela enquanto ela entra na sala, ficando na
frente do idiota. Ela encontra meus olhos, e fico totalmente sem palavras
por sua beleza selvagem. Ela vai fazê-lo pagar. — Você queria que eu
chupasse? Não foi isso que você disse no meu ouvido?
Em resposta, pressiono sua coluna. — Responda a ela.
— Tudo bem! Porra! – ele grita, em pânico enquanto estende as
mãos em sinal de rendição. — Sim, mas eu estava brincando.
Tiger ri, cruzando os braços sobre o peito. — Farei um acordo com
você. Vou chupá-lo quando você fizer isso.
Meu coração explode em um bilhão de pedaços macabros quando
ela levanta o queixo dele com a ponta do salto agulha apenas para
enfiá-lo em sua boca. Ela não é gentil e força o sapato
na garganta dele. Ele engasga, batendo, mas ela apenas
franze os lábios em desagrado.
— O que há de errado, Derrick? Não gosta quando a
situação é o contrário? – Ah, meu Deus. Linda e
engraçada... estou perdido.
Ela continua pressionando-o com o sapato enquanto ele
engasga, com seus apelos abafados apenas tornando essa cena
perturbada ainda mais perfeita. Eu a observo abertamente, incapaz de
desviar o olhar desta mulher feroz e implacável. Ela encontra meus 183
olhos e algo passa entre nós.
É uma confusão escura e distorcida – e quero sufocar isso com as
próprias mãos.
Tiger tira o pé enquanto Derrick tosse loucamente. — Peça
desculpas à senhorita. – eu resmungo, sentindo suas vértebras estalarem
sob minha bota. — Diga a ela que você não vai incomodá-la novamente.
— Desculpe! Não vou contar a ninguém que vi você aqui.
— Eu não acredito em você. O que você acha, Tiger?
O apelido dela escapar de mim, mas em vez de me arrepender do
descuido, algo inesperado acontece – eu sorrio, porra. Minhas bochechas
realmente doem porque a sensação parece estranha em mim. Não
consigo me lembrar da última vez que sorri.
Mas isso não importa porque nunca esquecerei esse momento.
Ela bate no queixo como se estivesse pensando profundamente. —
Não, Bull, eu não.
— Jesus Cristo! – Derrick grita. — Vocês dois estão fodidos.
Tiger olha para mim e sorri, encolhendo os ombros com
indiferença. — Suponho que sim.
Algo lento dentro de mim começa a deslizar e
envolver meu coração amortecido. Ele aperta com força,
me deixando sem fôlego, mas quando Tiger se agacha e
agarra Derrick pelos cabelos, forçando sua cabeça para
trás em um ângulo doloroso, percebo que estou com falta de
ar por causa dela.
Eu sabia que ela tinha temperamento, mas vê-lo florescer diante de
mim é outra coisa. 184
— Você vai dizer a Melanie para se afastar e me deixar dar aula. E
você vai esquecer que me viu aqui, entendeu? Porque se você não... –
ela para, enfiando a mão no bolso em busca de uma calcinha de renda.
Ela as gira no dedo. — Terei algumas palavras incriminatórias de minha
autoria.
O idiota acabou de ser enganado.
— Tudo bem, ok. Não vou contar a ninguém! – ele exclama, se
contorcendo loucamente.
Somente quando ela suspira de vitória é que diminuo a pressão nas
costas dele. Mas quando ele se levanta e cospe na cara dela, decido
esclarecer qualquer confusão em defesa dela. Sem hesitar, eu o puxo e
dou um soco nas costelas, no estômago e, por último, quebro seu nariz
pela segunda vez.
Quando ele uiva de dor, tentando me dar um soco, eu desfiro um
golpe superior que o nocauteia.
Tanto Tiger quanto eu assistimos sem emoção enquanto ele se
contorce, com sangue escorrendo de seu nariz. Infelizmente, ele ainda
está respirando.
A adrenalina da luta vibra através de mim, e é preciso toda a
força de vontade para não agarrar Tiger e jogá-la
contra a parede. Seu peito sobe e desce rapidamente,
traindo sua excitação. Com um corpo inconsciente e
sangrando entre nós, nunca me senti mais conectado com
outro humano do que agora.
Ela me olha por baixo dos cílios, o rosa em suas
bochechas insinuando sua excitação pelo que acabamos de
fazer. Nunca a confundi com nada além de feroz, mas puta merda, esta
noite... sua necessidade de vingança cantou para a minha. 185
A Tiger é selvagem. E a escuridão dela dança com a minha.
— O que acontece agora? – ela pergunta suavemente, mas não há
nada de terno em sua aparência. Ela está ganhando vida na minha frente.
Quero tanto tocá-la, mas não confio em mim mesmo. Eu vou rasgá-
la em dois. Então eu inalo, subjugando o demônio por enquanto. —
Você vai lá e não permita que ninguém faça você se sentir inútil nunca
mais. Por baixo dessa falsa postura... – eu toco o corpo inerte de Derrick.
— Está um covarde fraco e patético. Mas você, você é real. Nunca
esqueça isso. Nunca perca de vista quem você é. E o que você quer.
Ela lambe os lábios nervosamente, despertando essa fome.
— Alguém só pode fazer você se sentir uma merda se você permitir.
– Ela parece prender a respiração quando digo uma palavra final, mas
poderosa. — Não permita.
O crepitar estático entre nós contrai cada parte de mim. Mas
eventualmente, com um aceno de cabeça, ela se vira. Dou um passo à
frente, cedendo aos demônios, e eu a pego desprevenida enquanto
pressiono meu peito em suas costas.
Sua respiração presa e corpo trêmulo a traem. E é lindo pra
caralho.
Estendendo minha mão, sussurro em seu ouvido:
— Deixe a calcinha.
Ela faz o que digo antes de sair correndo porta afora,
deixando-me com essa estranha sensação de... sentimento.
186

Sei que prometi a mim mesma que nunca mais o deixaria levar a
melhor sobre mim, mas não consigo ficar longe.
Eu tentei. Eu realmente tentei. Mas depois da noite passada, parece
que esta pode ser uma batalha perdida. Eu sei que não deveria querê-lo,
mas isso não me impede de procurá-lo.
Assistir Bull repreender Derrick daquela forma desencadeou algo
dentro de mim. Na maior parte, mantive o meu temperamento sob
controle, mas quando me soltei ontem à noite, em vez
de me conter como fiz no passado, foi o sentimento
mais libertador que tive em anos.
As regras da sociedade nos impedem de agir de
acordo com nossas emoções mais profundas e sombrias.
Mas essas regras não se aplicam ao Bull. Ele chama isso do
jeito que vê, e eu admiro sua atitude séria. Não sei nada sobre
ele, mas não posso deixar de sentir que este mundo em que vivemos é
algo estranho para ele. 187
Ele às vezes é tão ingênuo – como se fosse um alienígena avaliando
nosso planeta pela primeira vez.
Quando Bae me contou que ela o encontrou e Tawny se beijando,
fiquei furiosa. Não entendi por que ele faria isso. Tawny não parece ser
o “tipo” dele porque alguém como Bull não tem um “tipo”. Sua
tatuagem de Lobo Solitário o descreve perfeitamente, o que me fez
adivinhar que ele estava usando Tawny.
Não sei por quê, mas me recuso a acreditar que seja algo mais do
que um movimento estratégico. Ele simplesmente apareceu do nada.
Quero saber a história dele, e é por isso que estou na porta dele,
segurando dois copos de café.
Deixei Jordy na escola antes de vir para cá. Não tenho nenhum
plano. Só sei que estou no lugar certo. Estou prestes a bater, mas sou
pega de surpresa quando a porta se abre e sou confrontada com uma
visão que deveria ser ilegal tão cedo pela manhã.
Bull está diante de mim sem camisa.
Felizmente, ele está de moletom preto, embora fique baixo em
sua cintura estreita. A corrente de prata que ele usa fica pendurada
entre seus peitorais musculosos. Acho que ele não tira. Quando
coloco minha língua de volta na boca, ofereço-lhe um
copo de café antes de passar por ele.
Felizmente, sua cama desfeita está vazia de Tawny
ou de qualquer outra pessoa, exceto um gatinho preto e
fofo encolhido em uma bola satisfeita em seu travesseiro.
Sentada ao pé da cama, tomo um gole de café, observando-o
fechar a porta. Antes que ele tenha a chance de falar, eu cheguei na
frente. 188
— O que você fez com Derrick? – A ideia de ele voltar para a casa
de Melanie Arnolds, espancado e machucado, me faz sorrir, mas
escondo minha alegria atrás da borda do copo de café.
— Eu cuidei disso. – ele finalmente responde, olhando para mim de
perto. Seu cabelo cresceu um pouco mais e me pergunto como ele ficaria
com ele comprido.
Revirando os olhos, pergunto: — O que isso significa?
Seu suspiro de frustração me diverte além das palavras. É bom saber
que posso irritá-lo, porque ele com certeza me irrita.
Enquanto tomo meu café, ele pergunta: — Qual é o seu número? –
O que resulta em queimaduras de terceiro grau na minha língua.
— Para que você quer meu número? – eu balbucio, por causa do
café quente que soprei, graças à pergunta dele.
Cruzando os braços sobre o peito largo e tatuado, ele arqueia uma
sobrancelha escura. — Você sempre questiona tudo?
— Sim. – respondo, brincando com ele. — Especialmente
quando algum homem estranho pede meu número.
Bull acena com a cabeça, esfregando o rosto em pensamento. —
Ótimo. Você deveria. – ele finalmente diz. — Você
perguntou o que eu fiz com Derrick. Então eu ia te
mostrar.
Eu engulo em seco.
— Onde está seu celular?
Ele aponta com a cabeça para a mesa de cabeceira.
Inclinando-me sobre os lençóis e cobertores torcidos, ignoro o
quanto bom eles cheiram enquanto alcanço o celular. Estou prestes a 189
passar para ele, mas paro quando ele diz: — Coloque seu número. Não
há senha.
Pisco uma vez, chocada com a confiança dele em mim. Ele não
parece ser o tipo de pessoa que confia facilmente, então isso é um
grande problema. Mas não querendo fazer barulho, vou aos contatos
dele. Espero ver uma lista de números de familiares e amigos, mas fico
surpresa e também entristecida ao ver que sou, de fato, seu primeiro
contato.
Com dedos desajeitados, coloquei meu nome, número e endereço
antes de jogar o celular para ele. Ele o pega com uma das mãos com seus
reflexos felinos. Ele desliza em seu celular, sem revelar nada, antes que
meu celular apite, alertando-me sobre uma mensagem de texto.
Colocando o café entre as pernas, vasculho minha bolsa e, quando
vejo o que está na tela, engasgo antes de cair na gargalhada. A calcinha
de renda, que vejo em meu celular, agora está ao meu lado, graças a Bull
atirando-a em minha direção.
— Acho que renda combina com ele. – brinca Bull, referindo-se à
foto que me enviou de Derrick vestindo apenas calcinha. Ele está de
quatro com uma das garotas atrás dele, no meio da flagelação. Para
garantir, ele está usando uma mordaça de bola.
— Há alguma garantia caso ele reclame. Ele não
vai, no entanto. Eu conheço caras como ele. Eles se
preocupam mais consigo mesmos e com suas preciosas
reputações. Você vai ficar bem.
Minha mão treme porque essa é a coisa mais legal que
alguém já fez por mim, e sei o quanto isso é uma bagunça,
considerando o contexto. Mas Bull sempre salvou minha pele
quando não era necessário. Quero agradecer a ele, mas da última vez que
fiz isso, as coisas deram errado. E quando a Lotus lhe ofereceu este 190
celular, ele ficou claramente desconfortável. Ele não gosta de ficar em
dívida com as pessoas. Além do seu orgulho, sinto que há outra razão
para isso.
Então aceno com a cabeça, colocando meu celular de volta na bolsa.
De repente, tenho uma ideia.
— Você vai dar um passeio comigo?
Ele arqueia uma sobrancelha, com a suspeita nublando sua
expressão. — Para onde?
Decidindo usar suas palavras com ele, pergunto: — Você sempre
questiona tudo?
E em resposta, ele faz o mesmo. — Sim. Especialmente quando
alguma mulher estranha me pede para dar um passeio com ela.
Não posso deixar de sorrir enquanto faço aspas. — Você me viu
nua, Bull. Não sou uma "mulher estranha”.
No entanto, quando ele lambe o lábio superior enquanto me devora
da cabeça aos pés, coloco as mãos no colo, de repente desejando ter
usado outra frase.
Ele caminha lentamente em minha direção, inclinando-se e
sussurrando em meu ouvido: — Não vi você
completamente nua.
Engolindo o nó na garganta, respondo: — Poucas
pessoas fizeram isso. E é verdade. Eu nunca tiro todas as
minhas roupas. Os looks que uso não deixam muito à
imaginação, mas o retalho de tecido que cobre a minha
dignidade faz toda a diferença. Quanto a outro homem me ver
nua, a última vez que fiz sexo eu estava bêbada e estava escuro. Não foi
meu melhor momento. 191
Uma respiração alta deixa Bull, com o seu hálito quente me
queimando viva.
Ele se afasta, parando a centímetros do meu rosto. Seus lábios estão
tão próximos dos meus que bastaria eu me mover um pouco e eu poderia
experimentar aquela boca pecaminosa novamente. Mas não me movo.
Agarro os lençóis embaixo de mim e meço minha respiração o melhor
que posso.
— OK.
— OK? – pergunto com a voz rouca.
Bull assente, observando o meu rosto tão de perto que não ouso
respirar. — Vou dar um passeio com você. – ele esclarece, enquanto
minha cabeça balança inutilmente.
Observo enquanto ele procura uma camiseta branca na cômoda e a
coloca pela cabeça. Cobrir toda aquela pele tatuada deveria ser crime.
Sem pensar, ele tira o moletom, me dando uma visão gloriosa do que
está guardando por baixo da cueca boxer preta.
Suas duas pernas também estão fortemente tatuadas, mas ele não
me dá a chance de admirá-las por muito tempo porque está vestindo
jeans pretos rasgados segundos depois. Não escondo o fato de que o
estava olhando para ele, porque qual seria o sentido?
Bull tem essa habilidade de ler as pessoas. Ele pode
não saber, mas posso ver quando ele olha para os outros e
para mim. Ele avalia todos, catalogando tudo o que pode
sobre eles, sobre seu ambiente – assim como qualquer
predador faz.
Ele calça meias e amarra as botas de motociclista, depois pega um
moletom preto com capuz. 192
Não posso deixar de notar que ele não tem nenhum pertence. De
onde quer que ele tenha se mudado, ele não trouxe muita coisa com ele.
A falta de bens, bem como a falta de contatos no celular, me deixam
com muitas dúvidas. Não tenho uma vida social em desenvolvimento,
mas pelo menos tenho alguns números no meu celular.
— Preparada? – Bull pergunta, adiando as minhas teorias da
conspiração por enquanto.
Pegando meu café, dou um tapinha na cabeça do gatinho preto. Ele
mal se move, muito confortável em sua nova casa.
— Tchau, Fluffball.
Olho para Bull e sorrio. — Fluffball? Esse é o nome dele?
Bull levanta os ombros. — Acho que sim. Dei a ele muitas
oportunidades para ir embora, mas ele não vai.
— Acho que ele gosta de você. – eu afirmo, me posicionando.
Bull parece surpreso, mas também enojado com a minha sugestão
enquanto curva os lábios. — Então sinto pena dele.
Ele não está procurando nenhuma simpatia. Ele está falando
sério. Ele claramente não vê o que faço quando olho para ele. Não
tenho chance de corrigi-lo antes que ele continue.
— Vamos nessa. – diz ele, colocando seu moletom.
Assentindo, eu o sigo porta afora. Entramos na minha
caminhonete e pegamos a estrada.
A música do rádio preenche o silêncio enquanto Bull
parece contente em olhar pelo para-brisa. Mantenho meus
olhos na estrada, que é mais difícil do que parece. Sinto-me
atraída por Bull de maneiras que não entendo. Ele não compartilhou
nada sobre si mesmo comigo, mas espero que isso mude muito em 193
breve.
— Isso dói? – Bull pergunta depois de um longo período de
silêncio.
— O que dói? – pergunto, mantendo meus olhos para frente.
— Seu pescoço. Você ainda tem hematomas de quando... – ele para,
deixando a frase inacabada.
Instantaneamente, toco o lado da minha garganta onde as mãos
daquele bastardo quase arrancaram minha vida. Se não fosse por Bull,
eu odiaria pensar onde estaria. — Não mais.
— Você denunciou à polícia?
Balançando a cabeça, volto meu foco para a estrada.
— Por que não?
Apertando o volante, encolho os ombros. — Eles farão muitas
perguntas e, além disso, uma stripper sendo atacada não está no topo de
sua lista de prioridades. – Embora eu não me veja como uma stripper,
não importa o que eu diga, a polícia só vai pensar que é algum cliente
que irritei porque não fiz uma punheta nele por baixo da mesa.
Também não queria denunciar por causa da forma como Bull
respondeu quando eu disse a ele que a polícia estava
chegando.
Ele estava envolvido, então se eu denunciar, eles vão
fazer perguntas a ele, e não quero envolvê-lo em mais
nenhuma das minhas merdas depois de tudo que ele fez por
mim.
— Você não está preocupada que ele volte?
— Claro que estou, por isso estava pensando em falar com Carlos.
Um ranger enche a caminhonete. Eu não falo sobre isso.
194
— Não quero deixar a Lotus, mas você está certo quando disse que
ele estava em busca de sangue. Ele me conhecia, mas a questão é: por
que ele iria me querer morta?
Precisando de uma mudança de ritmo, pergunto: — Você tem
irmãos? Tenho um irmão, mas ele foi embora há anos. Então somos só
eu e, hum, Jordy. – Meu filho, não gato, acrescento silenciosamente.
Algo muda no ar.
Bull não responde, e quando penso que ele não responderá, ele diz:
— Não. Eu não tenho.
Esse é definitivamente um assunto delicado para ele, então não
pressiono. — E os seus pais?
— O que tem eles? Não falo com eles há anos. Minha mãe
encontrou conforto em remédios prescritos. Enquanto meu pai encontrou
seu feliz para sempre em uma mulher com metade de sua idade. Mas eu
não os culpo.
— É? – pergunto por que eles não parecem pais muito solidários.
Eu deveria saber.
— Todo mundo tem seus motivos, Tiger. Todos nós lidamos com
a vida de maneira diferente.
Isso realmente não responde à minha pergunta, mas
decido deixar para lá porque, quando viro à esquerda em
uma estrada de cascalho deserta, preciso de um momento
para me recompor. Faz muito tempo que não venho aqui,
mas os sentimentos que este lugar evoca em mim são os
mesmos.
Os trailers estão deteriorados e mal estão em pé, mas os enfeites
caseiros como gnomos, vasos de plantas e sinos de vento sugerem que, 195
independentemente de sua condição degradada, eles são a casa de
alguém – assim como já foi a minha.
Continuo dirigindo até chegar ao último trailer à direita. É óbvio
que ninguém mora mais aqui. A porta aberta, presa por apenas uma
dobradiça, balança ao vento e todas as janelas, exceto uma, estão
quebradas. Estaciono a caminhonete e desligo o motor, incapaz de fazer
contato visual com Bull.
Abrindo a porta, vou até a frente da minha caminhonete e fico na
frente da minha casa. Este trailer foi onde fui criada e onde meus sonhos
morreram. As únicas boas lembranças que associo a este lugar são as
que envolvem Jordy.
Quando penso em minha mãe e nos perdedores aproveitadores que
ela trouxe para cá, cerro os punhos ao meu lado. Depois de alguns
minutos, Bull fica ao meu lado. Ele não diz uma palavra, mas tudo bem
porque vim aqui para exorcizar meus demônios e também os dele.
— É engraçado como quando eu era mais jovem, este lugar era todo
o meu mundo. Parecia tão grande, mas agora vejo o que é: nada.
Ele ainda não fala.
— Não é o que você esperava? – pergunto, incapaz de esconder a
ironia do meu tom. Quero que Bull veja que, sejam
quais forem os segredos que ele guarda, eu posso lidar
com isso. Não sou uma princesa que precisa de proteção,
ao contrário de ele vir em meu auxílio repetidamente.
— Sou a última pessoa a julgar. – ele finalmente diz.
Engolindo o nervosismo, confesso: — Trouxe você aqui porque
queria compartilhar uma parte de mim com você. E espero que um dia 196
você faça o mesmo.
Não estou esperando nada em troca, mas já deveria saber que devo
esperar o inesperado sempre que Bull estiver envolvido. — E se você
não gostar do que vê? – ele pergunta honestamente.
Virando a cabeça, olho para ele, realmente olho para ele, e vejo que
por baixo de seu exterior duro está um homem quebrado. — Gostei do
que vi até agora.
Ele encontra meus olhos com nada além de pura confusão nos dele.
— Por quê?
— Por que eu gosto de você? – pergunto, chocada e triste com sua
incerteza.
Ele acena com a cabeça uma vez, com a mandíbula contraída.
Suspirando, volto minha atenção para o trailer. — Porque você é a
primeira pessoa que me tratou como um ser humano e não como uma
coisa. Não sei nada sobre você, mas quero saber. Sei que você quer que
eu tenha medo de você... mas não tenho.
— Você deveria ter. – diz ele com grande sinceridade. — Não
sou uma boa pessoa. – Mas o seu aviso cai em ouvidos surdos.
Decido compartilhar com ele algo que não tenho
feito com muitas pessoas. — Somos iguais, Bull. –
Antes que ele tenha a chance de discutir ou zombar,
continuo. — Tanto cautelosa quanto com medo de deixar
alguém entrar. Não sei qual é o seu motivo ou quais
segredos você guarda, mas o meu é... Jordy não é meu gato.
Enchendo os pulmões de ar, confesso: — Jordy é meu
filho.
Não me arrependo de compartilhar isso com Bull. Depois de ver sua
lista de contatos, acho que Bull precisa de um amigo. E os amigos 197
compartilham entre si coisas como os filhos. Não espero nada em troca,
mas é bom compartilhar isso com ele.
— É por isso que estive pensando na oferta de Carlos. Não só o
dinheiro extra ajudaria, mas sou tudo o que Jordy tem. Não tenho ideia
de quem é meu pai. Minha mãe e meu irmão podem muito bem estar
perdidos para mim. Se algo acontecesse comigo, Jordy ficaria sozinho. –
eu esfrego os braços, gelado pelo vento forte e também pela ideia de
meu filho ser órfão.
— Ele é toda a minha vida e tudo que faço é por ele. Tenho dois
empregos porque a escola dele não é barata. Odeio não poder passar
mais tempo com ele, mas quero sustentá-lo de uma forma que minha
mãe não fez comigo.
Agora que me abri, não consigo parar de compartilhar.
— Jordy é um... garoto difícil. Quando meu irmão foi embora, isso
afetou nós dois. Christopher nunca foi um santo, mas foi bom para mim.
Jordy nunca conheceu seu pai, Michael, então Christopher era o único
homem em sua vida. Sei que Jordy idolatra o pai, embora não o conheça.
É difícil competir com um fantasma.
— O que aconteceu com o pai de Jordy? – Bull pergunta quando
finalmente respiro.
Engolindo minha tristeza, respondo: — Ele foi
embora. Não tenho ideia de onde ele está. Quando contei
a ele que estava grávida, ele ficou muito feliz, mas foi
tudo besteira. Uma semana depois, Christopher me disse
que ele saiu da cidade.
Cerrando os punhos, afasto as lágrimas. — Ele nem teve
coragem de se despedir. Eu tinha dezesseis anos, estava grávida
do melhor amigo do meu irmão e estava sozinha. Jordy quer saber quem
é o pai dele, mas como você diz ao seu filho que o pai dele era um 198
perdedor aproveitador que não era homem o suficiente para ficar por
perto?
Deixo marcas nas palmas das mãos de tanto cerrar as mãos. Esta é a
primeira vez que conto isso a alguém. Bae sabe o básico, mas não entrei
em detalhes porque nunca me senti confortável em compartilhar isso
com ninguém... até agora.
— Mas suponho que não valia a pena ficar por aqui. – sussurro com
pesar. — Sou uma solitária por opção. Quanto menos pessoas eu deixar
entrar na minha vida, menor será a chance de me machucar. Tenho
alguns amigos, mas mesmo assim perdi a faculdade e todas as coisas que
os adolescentes fazem porque estava criando um filho. Se o pai de Jordy
não tivesse ido embora, não consigo deixar de pensar em como minha
vida teria sido diferente. Eu teria seguido meus sonhos de estudar dança
e frequentar alguma escola de luxo? Minha professora, e agora chefe,
parece pensar que eu tinha potencial para chegar tão longe. Mas tudo
isso teve que ser adiado porque, em vez disso, optei por ter meu filho.
As lágrimas que tentei tanto conter passam pelas comportas. —
Você se acha uma pessoa má, mas no fundo somos todos maus. Tarde da
noite, quando estou deitada na cama, não consigo deixar de me
perguntar se tomei a decisão certa. – sussurro, envergonhada. — Eu
amo muito Jordy. Mas a pessoa que sou agora,
comparada com quem pensei que seria, é muito
diferente. Às vezes, sinto como se existissem duas
versões de mim. E não sei de quem gosto mais. Que tipo
de pessoa, que tipo de mãe isso faz de mim?
— Que tipo de irmã eu sou por agir pelas costas do meu
irmão quando sabia que isso iria machucá-lo? Ele fez tudo por
mim e agradeço dormindo com seu melhor amigo.
Olhando para baixo, me escondo atrás do cabelo porque tenho
vergonha de confessar tais verdades. Eu não culparia Bull se ele nunca 199
mais falasse comigo. Mas o que ele faz em seguida faz meu coração -
meu coração intocado e mutilado - bater um pouco mais rápido.
Gentilmente abrindo meus dedos, ele coloca uma pedra na minha
palma. — Isso faz de você humana. Retome sua vida. É sua e de mais
ninguém.
Olhando para nossa união, com sua mão sobreposta à minha, caio
ainda mais sob seu feitiço. Como alguém pode abalar tudo pelo que
trabalhei tanto, sem conserto?
Apertando minha mão, ele interrompe nossa conexão enquanto
aperto a pedra. Este trailer aprisiona minhas memórias dentro de suas
paredes enferrujadas. É hora de libertá-las.
Com um grito gutural, atiro a pedra, quebrando a única janela que
resta. O som libera algo sombrio e sinistro dentro de mim, e eu grito.
Procurando freneticamente o chão, pego outra pedra, não contente até
quebrar o resto da janela.
Depois de quebrada, uma força imparável me faz juntar pedra após
pedra e jogá-las uma por uma no trailer. Cada vez que ouço o baque
ensurdecedor do metal, uma pequena parte de mim se costura de volta
à minha alma.
Estou coberta de suor, a adrenalina me percorre,
mas não consigo parar. Cada golpe me faz gritar de
vitória, e as palavras de Bull fazem todo o sentido. Isto é
minha vida. Ninguém mais além da minha. Desejar uma
vida melhor não me torna uma péssima pessoa. Isso me
torna humana.
Com um último arremesso, abro um buraco na frágil
parede de metal. O sangue jorra em minhas veias, e atualmente
sou um fio elétrico enquanto me viro sem fôlego para olhar para Bull.
Ele fica à margem sem um pingo de julgamento refletido naqueles olhos 200
incríveis.
Ele me aceita como sou e, ao contrário da maioria, não espera nada
em troca.
Estou possuída enquanto marcho até ele e seguro sua camiseta em
minhas mãos. Ele não vacila. Ele é alto, permitindo-me pegar o que eu
quero. — Por que você beijou Tawny? – murmuro, agarrando-o com
mais força.
Seus lábios se curvam em um sorriso torto. — Ela é apenas um
meio para um fim.
— Então o que eu sou? – Sou claramente uma masoquista e quero
saber tudo. — Você me beijou. Sou apenas um meio para um fim
também?
Bull lambe o lábio superior, latente diante de mim e confessando
ferozmente: — Não sei o que você é.
— Você gosta dela? Tawny? – eu acrescento, de repente precisando
fazer algo com a boca além de beijar Bull.
— Não. – ele responde sem rodeios.
— E eu? Você gosta de mim?
O ar chia entre nós, mas agradeço a queimação.
— Gosto da ideia de ver você implorar... ver você
amarrada... ver você sangrar. – ele conclui, enquanto
engulo o nó na garganta.
— E você se sente assim em relação a Tawny?
— Não. Eu não.
Eu não entendo, mas Bull se move com violência da mesma forma
que a maioria faz com amor. Mas se esse é o preço que tenho que pagar 201
para me aproximar dele, para continuar com essa sensação de estar...
viva, então farei isso. Eu quero tudo isso.
— E se eu quiser isso? – pergunto, aproximando cada vez mais
perto dos portões do inferno enquanto me perco em seus olhos.
— Cuidado com o que você deseja. Não sou o Príncipe Encantado
da sua história.
— Não quero o Príncipe Encantado. Caso você não tenha notado,
não sou a princesa que precisa ser resgatada. – eu o desafio a lutar
comigo.
— Vou quebrar você. – ele avisa, e não há nada de melodramático
em sua afirmação. É uma promessa.
— Não acredito em você. – eu desafio, ficando na ponta dos pés
para nos olhar nos olhos.
Os braços de Bull estão rígidos ao seu lado. Ele está me permitindo
tocá-lo, descontar nele minhas frustrações, e isso me fortalece além das
palavras. Se eu fizesse isso com qualquer outro homem, ele teria perdido
o controle no momento em que joguei duro. Mas não Bull.
Ele está calmamente constituído, sem demonstrar nenhuma
emoção, enquanto sou um monte de nervosismo. Estar tão perto dele
faz com que cada fibra do meu corpo lateje de vontade,
necessidade, desejo. Eu nunca senti essa... fome carnal
antes. É viciante e, como uma viciada, quero mais, mais,
mais.
Quando ele colocar as cartas na mesa, tenho certeza de
que cumprirei suas promessas.
— Se você está procurando diversão, então posso fazer isso. Se
você quer que alguém... – ele faz uma pausa, antes de sorrir. — Foder 202
com você e lamba sua boceta até você gritar por mais, então posso ser
esse homem. Posso te agredir se você quiser, fazer você implorar. – Meu
coração acelerado quase cai no chão. — Posso ser o que você quiser que
eu seja. Simplesmente não posso ser seu para sempre. Faço o que quero,
quando quero. Eu não sou dado a romances. Esse é quem eu sou. Não
tente me consertar porque eu estava quebrado há muito tempo.
Meu rosto franze porque se isso era para me assustar, aconteceu
exatamente o oposto. Não há promessas vazias, nem confusão sobre o
que é isso, sobre o que ele é. Qualquer mulher sã partiria com a
dignidade intacta, mas eu não. Seu aviso só me provoca.
Mas não tenho chance de falar porque o celular dele toca, cortando a
perigosa eletricidade entre nós. Instantaneamente, eu o soltei, permitindo
que ele pegasse o celular no bolso de trás. Quando ele atende, percebo
que ele mantém a conversa curta, desligando a ligação em poucos
instantes.
— Eu tenho que ir.
— É? – eu respondo, escondendo minha decepção. Eu esperava que
continuássemos de onde paramos. Mas a ligação simplesmente
estragou o clima.
Quero perguntar quem foi, mas não pergunto. — OK. Eu levo
você de volta.
Ele acena com a cabeça e se dirige para a
caminhonete. Sua urgência me faz pensar para onde ele
está indo. E o mais importante, quem ligou. Quero
perguntar, mas decido não abusar da sorte.
Bull é um homem complexo e, como uma mariposa pela
chama, sou atraída por sua escuridão. Antes de conhecê-lo, eu
nem sabia que essas depravações estavam dentro de mim. Mas elas
estão. Elas me excitam. Elas me fazem sentir viva. 203
Não há como voltar atrás agora.
204

Kong me ligou com um endereço. Foi muito fácil.


Mandei uma mensagem para ele esta manhã para dizer que estava
interessado no que quer que seu chefe estivesse oferecendo. Eu sabia
quais eram os termos, mas me fiz de bobo quando ele me contou os
detalhes do que eu deveria fazer.
Há uma luta esta noite em algum bairro deserto a cerca de uma
hora de distância. As regras eram simples: lutar e vencer. Pelo meu
trabalho, eu receberia mil dólares. Se eu ganhasse,
receberia o dobro disso. Kong me disse que esta era
apenas uma taxa básica. A cada luta e vitória, a quantia
aumentava. Mas o dinheiro não é meu motivador – vê-lo
morto é.
Então eu concordei.
Liguei para Lotus e disse a ela que não estaria lá esta noite. Eu disse
que estava doente. Eu odiava mentir, mas esta é minha chance de 205
colocar meu plano em ação. Perder não é uma opção. Quanto mais
vitórias, mais perto estou de ganhar a confiança de Kong.
Preciso saber quem são os outros dois idiotas com quem ele fugiu.
O que acontece com um predador de sucesso é que ele analisa o
ambiente ao seu redor e se familiariza com todas as variáveis para
garantir que, quando atacar, o faça com eficiência e habilidade.
Não há espaço para erros. Ou distrações.
Agarrando o volante, sigo o GPS, recusando-me a pensar nela – de
novo.
Tiger é uma distração, perigosa. Hoje, foi necessário todo o controle
que eu tinha para não ceder à tentação e cumprir as coisas que prometi.
Era para assustá-la, dar-lhe uma ideia de quem eu sou e o que faria com
ela.
Eu esperava que ela fugisse. Ela não fez isso.
Levar-me para a casa de sua infância e me contar sobre sua vida e
seu filho foi sua maneira de tentar se conectar comigo. Por alguma razão
desconhecida, ela gosta de mim. Eu não sei por quê. Ela vê algo em
mim que eu não vejo.
Estou tentando ao máximo mantê-la longe das minhas merdas,
mas parece que ela não quer ficar longe. Nunca poderei
contar a ela o que planejei, então não parece justo
começar nada com ela, porque ela pode se machucar. Mas
estou achando cada vez mais difícil lutar contra esses
impulsos dentro de mim.
Quando o GPS informa que o destino fica a alguns
quarteirões de distância, fico grato por poder agir de acordo com
esses impulsos de uma maneira diferente. Estou ansioso para fazer
alguém sangrar. 206
Estacionando minha caminhonete, olho para o armazém
abandonado à minha frente. Não há ninguém por perto. Trancando a
porta, coloco o capuz sobre a cabeça e mantenho o queixo voltado para
baixo enquanto caminho até a cerca de aço. Tem um pequeno buraco
cortado. Abaixando-me, passo por ele e observo o que está ao meu
redor.
O armazém está escuro, sugerindo que não há ninguém lá dentro.
Mas o exterior deserto é apenas uma fachada para o que realmente está
acontecendo lá dentro ou, mais especificamente, o que está acontecendo
dentro do porão à prova de som. Abro a porta destrancada com o ombro,
certificando-me de fechá-la atrás de mim.
Kong foi um pouco vago em suas instruções: entre pela porta do
escritório principal. Olhando da esquerda para a direita e dos três
andares, gostaria que ele tivesse sido um pouco mais específico, porque
vejo cerca de trinta portas que poderiam ser classificadas como o
escritório principal.
Mas sei que isso foi feito com intenção. Ele não vai me dar de
comer com colher, então este é um teste – um teste no qual não
pretendo falhar. Não vou dar sorte, esperando tropeçar na porta certa.
Vou usar meus sentidos.
Fechando os olhos, ouço atentamente as vibrações,
as responsáveis por nos dar a sensação de que estamos
sendo observados. Respiro fundo, vasculhando o cheiro
de lixo mofado em busca de qualquer sinal de vida.
Tarde da noite, quando você estiver preso atrás das
grades, usar todas as habilidades à sua disposição ajudará a
salvar sua vida. Aprendi isso da maneira mais difícil. Mas
aprendi e uso esse conhecimento para sentir a pulsação da energia…
Peguei vocês.
207
Abrindo os olhos, me concentro em uma porta no segundo andar.
Não tenho ideia de como um cômodo do segundo andar pode levar ao
porão, mas estou prestes a descobrir enquanto subo a escada enferrujada.
Quando chego à porta em questão, abro-a com cautela, mas fico
surpreso ao ver que não há porta lá dentro. É apenas uma sala vazia com
uma janela escura.
Removo o capuz e observo os arredores, recusando-me a acreditar
que estou errado. Raramente estou errado, especialmente quando se trata
de coisas como esta.
Caminhando vigilantemente para dentro, inclino a cabeça,
observando o chão de madeira. A superfície é plana, sem bordas
elevadas que sugiram um alçapão, de modo que apenas sai da janela.
Está rígido quando tento abri-la, mas eventualmente cede.
Ao abri-la, encontro um andaime que permite o acesso a um
pequeno prédio atrás do armazém principal. A única maneira de chegar
lá é através do armazém, o que é uma jogada inteligente. Saindo pela
janela, desço do andaime e pulo no chão.
Ainda não há barulho, mas quando entro no prédio e encontro
dois homens corpulentos guardando uma porta de metal, sei que as
coisas estão prestes a ficar reais. Eles param de falar e
me olham de perto.
— Eu sou o Tommy. – afirmo sem rodeios. — Se
existe algum aperto de mão secreto, eu não sei. Então não
perca meu tempo e me deixe entrar.
Não estou com disposição para vinte perguntas.
Um dos caras fala em um walkie-talkie antes de concordar. — Kong
está esperando por você. 208
Ele destranca a porta, permitindo-me entrar. Atitude amadora da
parte deles, pois não me revistaram. Mas eu passo por eles. Os rugidos
barulhentos do que me espera lá embaixo me fazem impenetrável
enquanto desço as escadas sem pressa.
Quando desço o degrau final, vejo um espaço muito maior do que
eu pensava. Cerca de trezentos homens e mulheres cercam dois
combatentes cobertos de suor e sangue. Ambos são de tamanho médio e
me pergunto se Kong os recrutou também.
Não há um ringue. Apenas um círculo de espectadores fervorosos
cercando os homens, ávidos por derramamento de sangue. A multidão se
mistura com pessoas de todas as classes sociais, pois parece que não há
discriminação quando se trata de ver alguém sangrar por dinheiro.
Kong está encostado na parede dos fundos, observando atentamente.
Não vejo Stevie, o que me leva a acreditar que ele é mais um homem
dos bastidores. Jaws também não está aqui. Não consigo esconder minha
raiva por esse fato. Passando pela multidão gritando, sigo em direção a
Kong. Ainda preciso de toda a minha força de vontade para não
esfaqueá-lo onde ele está. Mas eu controlo minha ira, lembrando-me
do bem maior.
— Ei. – digo com um aceno de cabeça.
Kong sorri, descruzando os braços. — Puta merda.
Você encontrou o lugar. Estou impressionado. A maioria
não chega até aqui.
— Eu não sou a maioria. – respondo com inteligência.
— Posso ver isso. Você estará pronto em alguns minutos. Você
pode se trocar lá. – ele aponta com o queixo em direção aos banheiros. 209
Não perco um segundo e ando em direção a eles porque ficar perto
dele por muito tempo alimenta o inferno furioso dentro de mim.
Mantenho os olhos para frente, mas, de repente, os cabelos da
minha nuca se arrepiam. Virando-me por cima do ombro, observo os
arredores, mas não reconheço nenhum rosto, então continuo minha
caminhada em direção aos banheiros. Quando entro, vejo um pequeno
vestiário à esquerda. Eu normalmente não me incomodaria, mas de jeito
nenhum vou lutar com meu rosto exposto. É muito arriscado. Se Franca
farejar algo ilegal, ela vai fritar minha bunda.
Tirando minhas botas e meias, deixo cair minha mochila no banco e
procuro minhas coisas. Tirando a calça jeans, coloquei um short de
ginástica e uma blusa de manga comprida com capuz. Meu rosto não é a
única coisa reconhecível. Preciso cobrir o máximo que puder do meu
corpo.
Caminhando até a pia, abro a torneira fria e encho um copo de água.
Jogando no rosto e na cabeça, me olho no espelho rachado. Este
momento definirá tudo e dará início à minha vingança.
Apoiando na pia, dou a mim mesmo um discurso estimulante. —
Não estrague tudo. – A medalha em meu pescoço capta a luz fraca.
Está na hora.
Colocando o colar sob minha blusa, pego o
protetor facial com desenho de caveira e o posiciono
sobre meu rosto, garantindo que fique sob meus olhos.
Uma vez colocado, coloco o capuz. Prendo as mãos com
fita adesiva, cerrando-as em punhos para garantir que tenho
folga suficiente. Parando por um momento, admiro meu novo
uniforme, gostando muito mais deste do que daquele que usei por doze
anos. 210
Os dentes alongados na minha máscara parecem ferozes, como se eu
estivesse a segundos de comer meu oponente vivo. E suponho que de
certa forma, sim. Estalando o pescoço de um lado para o outro, eu pulo
no local para me aquecer. Todo o meu corpo está ansioso por uma briga
porque cada respiração que Kong respira é como cuspir no túmulo do
meu irmão.
O pensamento me faz contrair a mandíbula.
Um som alto soa do lado de fora, sugerindo que a luta acabou. É
minha hora de brilhar.
— Tommy? – Kong grita ao abrir a porta do banheiro. Ele vira o
corredor e, quando me vê com todo o meu traje, ele sorri. — Puta que
pariu. Você vai aniquilar Jacko.
Não discuto porque ele está certo. Meu corpo está vibrando com
energia violenta.
Sigo Kong porta afora, excluindo todos os estímulos externos e me
concentrando no cara careca que parece uma casa de tijolos. Ele fica
parado no meio da sala, desferindo uma rápida sucessão de socos no
ar. Ele é rápido, mas pesado.
A multidão se separa, permitindo-nos passar. Muitas notas estão
sendo trocadas a torto e a direito. Não sei quem é o
favorito, mas não me importo. Quando chego a poucos
metros de Jacko, passo por Kong e o jogo começa.
Jacko está pronto e vai para a defesa, mas não vou
lutar de forma justa. Não há justiça no que tenho que fazer.
Eu avanço, batendo meu punho em sua mandíbula. Ele
cambaleia para trás, balançando a cabeça para dissipar a névoa, mas não
lhe dou clemência. 211
Estou em cima dele como um pit bull, desferindo uma combinação
de socos nas costelas, na barriga e depois no rosto. Atinjo em qualquer
parte dele que posso. Ele tenta se defender, mas sou uma força feroz e
não vou parar. Cada vez que bato nele, a multidão explode em aplausos,
expondo seu amor pelo derramamento de sangue.
O pandemônio é uma droga para mim, e continuo cercando-o,
atacando e acertando tudo que posso enquanto ele tenta me bater. Ele
está sangrando devido a um corte acima do olho e da boca, mas isso não
o detém.
Parabéns a ele.
Eu me abaixo quando ele tenta me bater, mas o bastardo me pega de
surpresa e me chuta nas costelas. Ainda estou dolorido por ter sido
esfaqueado, então cambaleio para trás, sem fôlego, o que é ruim porque
Jacko se lança para frente e me dá um soco no rosto. O idiota consegue
dar um soco e minha visão fica embaçada.
— Vamos, sua fada. Você vai brigar ou chupar meu pau?
Sua calúnia repulsiva me incita, e logo me recupero, cercando-o
com os punhos erguidos.
Estamos dançando um tango mortal, pois o elemento surpresa
para mim desapareceu enquanto Jacko aprende meus
movimentos. Nossos olhos estão fixos, observando o
outro de perto, porque um movimento errado nos custará
caro. Jacko dá um passo à frente, tentando me dar um
soco, mas eu me abaixo e acerto seu flanco rapidamente.
Um suspiro de dor o deixa, mas ele logo se recupera e me
chuta mais uma vez, desta vez, no estômago. Sou impelido para
trás, apenas para ser empurrado de volta para o “ringue” por
espectadores ansiosos que não ficarão satisfeitos até que um de nós 212
morra.
Jacko me dá um soco na têmpora, no nariz e depois no queixo. Ele
tenta acertar minhas costelas, mas pulo para trás com um sorriso
malicioso. O sangue espirra do meu nariz no concreto, mas a multidão
não consegue me ver sangrar, graças à bandana no meu rosto.
Ele cospe, e uma mancha vermelha mancha o chão. Ele está ferido.
A visão é realmente linda para um demônio como eu. Faço contato
visual rápido com Kong, que está assistindo atrás da multidão. Ele é um
filho da puta alto, então ele se destaca, mas quando vejo seu sorriso
vitorioso, pensando que ele ganhou por minha causa... estou possuído
por uma fúria que quer matar qualquer um que esteja no meu caminho.
Jacko vem até mim com um rugido, mas uso minha raiva para
desferir uma combinação de socos que faz Jacko cambalear para trás. Eu
avanço, atingindo qualquer parte de seu corpo que posso, porque a cada
golpe, fico cada vez mais perto de ver Kong morto.
Dou um soco no rosto de Jacko, arrancando dois dentes, e quando
ele cai para frente, desfiro um soco que o faz voar alto. Ele cai de costas
com um baque e, antes que possa se levantar, eu caio em cima dele,
prendendo-o no chão enquanto soco seu rosto repetidas vezes.
Sua cabeça pende, mas eu não paro. A carne macia parece o
paraíso sob meus punhos. Ele para de lutar, insinuando
que está desmaiado, mas ainda não paro. Só consigo
pensar em Damian. Como ele foi humilhado, espancado e
machucado sem motivo. Ele morreu porque quatro filhos
da puta decidiram brincar de Deus.
Não me importo com quem tenho que usar e abusar para conseguir
o que quero, e quando olho nos olhos de Kong, tudo que quero é vê-lo 213
pagar.
Com um golpe final, eu acerto o rosto de Jacko antes de me levantar
lentamente e sem fôlego. Meu corpo está tremendo enquanto a
adrenalina percorre através de mim. Jacko não vai se levantar tão cedo, o
que deixa a multidão louca. Alguém me dá um tapinha nas costas, mas
eu o afasto, pronto para quebrar a porra da mão dele.
Olho para meus punhos cerrados e instáveis, e a fita antes branca
agora está manchada de vermelho brilhante. Isso é tudo que sei para
sobreviver: sangue e dor.
— Porra! – Kong grita para ser ouvido por cima da multidão
maníaca enquanto corre em minha direção. — Você é um filho da puta
assustador.
Ele não sabe nem metade disso.
— Aqui. – ele enfia a mão no bolso e discretamente enfia um maço
de dinheiro na palma da minha mão. — Há mais de onde isso veio. Eu
vou te ligar. Os corretores vão adorar você.
Não me preocupo em ficar por aqui porque este primeiro passo é
suficiente por enquanto. Kong apenas me vê como cifrões. Ele aposta
no cavalo certo e eu o enriqueço. Mal sabe ele que está apostando no
cavalo errado.
Embolsando o dinheiro, abro caminho no meio da
multidão, à procura de Jaws, mas então uma jovem com
joias sofisticadas aparece no meu caminho, bloqueando-
me. Seus lábios vermelhos formam um sorriso torto e ela
sussurra em meu ouvido: — Vamos foder.
Sua franqueza me pega de surpresa, e não posso negar que a vitória
me deixou animado e pronto para extravasar. Ela parece a filha de um 214
pai rico que perdeu o caminho de casa, então brinco com a ideia. Não
existem promessas vazias. Nós dois sabemos o que é isso.
Mas não sou seu fantoche ou um brinquedo inflável para ela se
divertir. E além disso, ela não faz nada para apaziguar esse latejar no
meu pau porque ele anseia por outra pessoa.
Quando estou prestes a recusar, um flash rosa chama minha atenção.
Focando à frente, vejo as costas de uma mulher enquanto ela abre
caminho no meio da multidão. Ela usa uma peruca cor de algodão doce
cortada em chanel. Não sei por que, mas sua urgência faz soar o alarme
e, sem pensar, vou atrás dela – o predador em mim adora a perseguição.
Quando a aglomeração me vê chegando, ela se separa rapidamente.
Eles me viram lutar. Eles não gostam de ser pegos no fogo cruzado. Para
ela, porém, ninguém se move, o que me permite alcançá-la rapidamente.
Ela está quase na escada, fazendo com que eu acelere os passos. Ela não
pode fugir.
Mas quando algum idiota tenta me parabenizar, bloqueando meu
caminho, ele deixa o cordeirinho assustado escapar. Eu o empurro para o
lado, continuando a perseguição, antes que essa mulher escorregue
por entre meus dedos. Ela dá dois passos de cada vez, e tudo que
consigo ver é que ela está usando óculos escuros grandes demais para
o rosto.
Ela está claramente tentando disfarçar sua aparência,
e o fato de estar fugindo de mim me faz pensar por quê. O
mistério faz a adrenalina subir através de mim, e não
demora muito até que eu a siga de perto.
Ela se atrapalha com a maçaneta, mas, eventualmente, sai
pela porta, quase batendo nos dois idiotas que ocupam a entrada
do andar. Eles tentam agarrá-la, mas se atrapalham porque ela é ágil e
graciosa como uma... dançarina. 215
Puta que pariu.
Estou atrás dela, com cada parte de mim latejando de necessidade.
Ela vira à esquerda, que é o caminho errado. O caçador que há em mim
saboreia seu acidente e, quando vê que o corredor é um beco sem saída,
ela abre a porta mais próxima e entra em busca da segurança de uma
sala.
Ela tenta freneticamente fechar a porta, mas sou muito rápido e
agarro a porta, empurrando-a para abri-la. Ela cambaleia para trás com a
força, quase caindo de bunda. Bato a porta, prendendo nós dois. Quando
ela percebe que está emboscada, ela gira, virando as costas para mim.
Seus pequenos ombros sobem e descem rapidamente enquanto ela
respira fundo. Estamos ambos disfarçados, ambos escondendo quem
realmente somos. Preciso vê-la para garantir que ela é real. Com três
passos acelerados, estou do outro lado da sala, segurando seu braço.
Ela treme violentamente, recusando-se a se virar.
— Por que está aqui? – resmungo, mas minha pergunta permanece
sem resposta. Seu silêncio me enfurece ainda mais. — Responda-me!
— Vá se foder! – ela responde ferozmente.
Ela não quer brincar. Bem, que pena, porque eu
gosto – se ela soubesse o quanto quero brincar com ela.
Ela se recusa a me encarar, então, sem escolha, tiro
sua peruca. Quando uma cascata de cabelos castanhos e
macios cai em suas costas e o cheiro das flores de cerejeira
me atinge, amaldiçoo o dia em que nossos caminhos se
cruzaram.
Suas mãos tentam freneticamente cobrir o cabelo, mas é tarde
demais. Eu sei quem ela é, então agora a questão é: o que farei? 216
— Você me seguiu? – pergunto de costas para ela, o que me irrita,
pois ela ainda se recusa a me encarar. — Isso não vai acabar bem para
você se continuar me ignorando. Responda a minha pergunta.
Silêncio.
Estou respingado de sangue, com meu rosto protegido por uma
ameaçadora bandana de esqueleto, e ela ainda não tem medo de mim. A
coragem dela é tão potente que não consigo respirar.
— Vire-se. – exijo, e o tremor em seus ombros me dá uma dose da
droga mais intoxicante. — O que você quer de mim?
Mesmo que não responda, isso não me impede de fazer perguntas.
— Você quer que eu te machuque? É isso? Faça-me entender o que
você quer porque só posso lhe oferecer dor! – eu exclamo, meus punhos
ensanguentados são uma confirmação disso.
Este tratamento silencioso está alimentando meus demônios; eles
exigem que eu a faça pagar.
— Tudo bem, faça do seu jeito então. Talvez eu encontre alguém
que queira falar comigo.
É um gatilho para ela e funciona como um encanto.
Ela vira com tanta força que a respiração fica
presa na minha garganta. Observo enquanto ela tira os
óculos escuros, expondo aqueles olhos verdes selvagens.
Ela me dá a porra de um segundo para processar o que
vejo antes de vir até mim e arrancar minha proteção facial.
Só posso imaginar o que ela vê porque o sangue pegajoso
que cobre minha pele é minha pintura de guerra. Mas ela não
recua. Ah, não, Tiger não se encolhe diante do medo. Ela não recua –
ponto final. 217
Ela fica na ponta dos pés e pressiona seus lábios nos meus.
Minha boca se abre, precisando de um segundo para me atualizar,
mas isso é tudo que preciso antes de eu beijar ela até o fim. Cada parte
de mim dói porque nada é gentil em seus beijos, mas a dor só aumenta
essa depravação dentro de mim.
Ela me morde, arranhando minha camiseta, enquanto agarro seus
longos cabelos. Nossas línguas duelam, recusando-nos a nos render um
ao outro porque ambos queremos ser alfa. Eu a levo em direção à
parede, batendo-a contra ela enquanto pressiono meu peito contra o dela.
Ela geme em minha boca, chupando minha língua e mordendo meu
lábio inferior, e tudo que sinto é chiclete. O beijo é frenético e selvagem,
e não consigo parar. Quero devorá-la viva. Seus longos cabelos parecem
seda sob meus dedos, o que me faz lembrar que a estou tocando com
mãos sujas.
Interrompendo o beijo, eu olho nos olhos dela. — Por que você está
aqui?
Meu sangue pinta seu rosto, que acaricia o homem das cavernas
dentro dela. Eu a marquei, mas não é o suficiente. Com três dedos,
esfrego lentamente meu sangue em sua boca e bochechas. Agora ela
parece a porra da guerreira que é.
Tiger lambe os lábios, sem dúvida sentindo o gosto
metálico que deixei para trás. — Eu não sei. – ela
finalmente fala.
— Então você me seguiu?
Ela balança a cabeça lentamente.
— Por quê? Eu não entendo. Ajude-me a entender. – eu não sei por
que ela perderia tempo com alguém como eu. 218
Ela simplesmente segura meu rosto e encolhe os ombros. — Não
tenho as respostas.
— Então o que você quer?
Seu peito empurra contra o meu enquanto ela respira fundo. E com
uma simples palavra, ela rouba a minha. — Você.
Não sei o que dizer. Ou fazer. Ou… sentir.
— Cada vez que vejo você com outra mulher, esse... monstro sai de
dentro de mim. E não sei por quê.
— Você não é o monstro. Eu sou. Sou eu quem está coberto com o
sangue de outro homem. – Para provar meu ponto de vista, levanto o
punho sangrando. — Você me viu espancá-lo até deixá-lo quase morto.
Só parei porque não é por ele que estou aqui. Tenho um objetivo e todos
são descartáveis. Até você. – acrescento, observando sua garganta
esbelta mover enquanto ela engole.
É quando ela deveria sair da sala e nunca mais olhar para trás.
Acabei de dar a ela um cartão para sair da prisão. Não espero que ela
fique por aqui, quem esperaria? Não tenho nada, nada para oferecer a
ela. Um mundo cheio de dor é tudo o que posso prometer.
Espero calmamente que ela vá embora. Mas ela
não vai.
Com um suspiro, ela começa a desenrolar a fita que
prende minhas mãos. Ela não olha nos meus olhos, mas
em vez disso se ocupa em livrar a lembrança sangrenta da
minha pele. Depois de desenrolar a fita, ela segura meu
queixo hesitantemente e vira meu rosto para ver meus
ferimentos.
— Isso dói? – ela pergunta. Balanço a cabeça, sem saber o que
diabos está acontecendo. 219
Ela passa o polegar sobre meus lábios, me acariciando suavemente.
Ela parece estar pensando. Esperamos que ela perceba que grande erro
isso é. — Qual é seu objetivo? – ela pergunta suavemente, com seus
dedos deslizando muito perto da minha garganta.
Agarrando seu pulso, eu a impeço de me tocar porque isso foi longe
demais. — Isso não é da sua conta. – resmungo porque ela nunca poderá
saber – nunca.
— Por que você estava lutando esta noite? Por que escondeu o seu
rosto? Seus olhos? O que você está escondendo? – ela pergunta,
concretizando o que eu tenho que fazer. — Do que você está fugindo?
— Só porque compartilhou algo comigo não significa que teremos
uma conversa franca durante o café. E a razão para isso é… eu não tenho
coração.
Ela lambe os lábios rapidamente. Ela está nervosa. Ótimo. — Não
acredito em você.
— Bem, você deveria. – afirmo, a centímetros de seu rosto. — Você
quer ver algo em mim que não existe.
Antes que ela tenha a chance de responder, eu a viro ferozmente,
de modo que suas costas fiquem pressionadas contra mim. Nossos
reflexos ecoam no espelho sujo à nossa frente. Ela está
tremendo toda.
— Vê isso? – eu resmungo, olhando para a nossa
imagem sangrenta no espelho. — Nada além de uma
concha vazia.
— O que aconteceu com você?
— Você não quer saber. – respondo em advertência.
— Você não é mau. Posso ver isso por trás dos seus olhos.
220
Mas eu a interrompi. Isso já foi longe demais. A única maneira de
impedir isso é machucá-la. Ela é intrometida e inteligente e, mais cedo
ou mais tarde, descobrirá o que fiz e o que pretendo fazer. — Eu sou
mau, Tiger. – ela não parece acreditar em mim. Então é hora de mostrar
a ela o quanto ruim posso ser.
Segurando seu cabelo, inclino sua cabeça para o lado e mordo sua
nuca, alimentando o diabo dentro de mim. Ela chora, mas não recua.
Enquanto chupo sua carne macia e deliciosa, alcanço a frente de sua
calça jeans e desabotoo o botão de cima.
A visão é quase demais.
Uma respiração ofegante enche seus pulmões e, ao expirar, deslizo
meus dedos em sua calcinha. Seu sexo é quente, nu e... molhado. Com
nada além de pura posse, enfio dois dedos em sua boceta escorregadia.
Sua boca se abre com a intrusão, e seu corpo se agarra ao meu redor. Ela
não está pronta para mim, mas seu grito de dor alimenta minha
escuridão. Ela parece incrível.
— Não me confunda com nada além disso. – eu começo a tocá-
la, dentro e fora, dentro e fora. Ela se contorce, gemendo, mas eu
chupo seu pescoço, apenas enterrando meus dedos mais fundo.
— Ah, Deus. – ela fecha os olhos com força.
— Vou usar você porque posso. Porque você me
deixou.
Para provar meu ponto, a estico bem, ignorando o
quanto apertada ela é. Sei que a estou machucando, mas esta é
a única maneira de fazê-la ouvir.
Ela se move comigo, arqueando-se suavemente ao meu toque
enquanto ofega suavemente. Se eu não soubesse, diria que ela estava 221
gostando disso. Mas deixo esse pensamento doentio de lado.
Lambendo sua garganta lentamente, movo meus dedos, ganhando
velocidade. Tiger geme, tentando mover seus quadris, me persuadindo a
dar um pouco de atenção ao seu clitóris, mas estou mantendo-a
prisioneira de todas as maneiras possíveis. Meu pau está duro, muito
duro, mas isso não é uma questão de gratificação. Trata-se de punição.
Trata-se de mostrar à Tiger quem eu sou.
— Você está tentando preencher a lacuna em sua pequena família, é
isso?
Seus olhos se abrem, com a chama consumindo o verde. Ótimo, ela
está com raiva. Posso lidar com isso. — Como você ousa.
— Talvez Michael não quisesse ficar preso a uma mulher carente?
Você não tem o melhor histórico com pessoas por perto.
Finalmente sucumbindo às suas exigências, esfrego seu clitóris,
dando-lhe uma amostra, porque isso é tudo que ela conseguirá. —
Você... me deixa... doente. – ela ofega, com um pouco de arrepios
cobrindo sua pele.
— Ótimo. – elogio, continuando o ritmo implacável dos meus
dedos. Posso não fazer isso há muito tempo, mas o corpo dela foi
feito para mim. Outra razão pela qual preciso que isso
pare.
Ela quer me dizer para ir para o inferno, mas não
pode. Ela encontra meus olhos e observamos os estranhos
que usam nossos rostos, olhando para nós enquanto
masturbo sua boceta apaixonadamente.
— Toda a sua família foi embora. Se sua própria família não
consegue amar você, o que isso diz sobre você? 222
Seu lábio inferior treme, abrindo um buraco em mim, mas
persevero. Se não fizer isso, vou simplesmente arrastá-la comigo. E não
farei isso com ela. Isto é para o bem dela.
Somando-se aos insultos, eu sorrio. — Mas é isso que você queria,
não é? Quero dizer, você praticamente implorou por isso desde que nos
conhecemos.
Seus lindos olhos verdes se enchem de lágrimas, lágrimas que eu
instiguei porque sou um bastardo cruel que destrói tudo que toco.
— Vá se foder. – ela se debate contra mim em uma tentativa meio
desesperada de fugir. Em resposta, esfrego círculos em seu clitóris com
fervor.
Ela não quer se sentir assim por mim, mas ela sente. É preciso toda
a minha força de vontade para que meu rosto e corpo não traiam minha
resposta a ela. Ela está me irritando e preciso que isso pare. Ela me faz
querer coisas que não mereço.
Então começo a masturbá-la a uma velocidade punitiva, cada vez
mais fundo, à medida que esfrego também o seu clitóris. Eu me perco
nos pequenos gemidos que passam por seus lábios entreabertos. A
visão de nós refletidos no espelho me agrada mais do que gostaria de
admitir. Estou me punindo e também a ela.
— Isso é exatamente o que estou fazendo, querida.
– respondo presunçosamente, com minha indiferença
tendo o efeito desejado. — Não é isso que você queria que
eu fizesse esse tempo todo?
— Eu te odeio. – Suas palavras são vazias.
Meu corpo supera o dela, com seu corpo flexível se curvando ao
meu toque. Ela deveria sentir repulsa, e sei que na maior parte, ela sente, 223
mas uma parte pequena e depravada dela gosta disso. Ela gosta de mim,
independentemente do que ela diga.
— Você pode me odiar... – sussurro em seu ouvido. — Mas sua
boceta certamente não.
Uma lágrima escorre por seu rosto, que é o que eu queria,
independentemente do peso em meu peito. — Por que você é tão
malvado?
— É tudo que sei ser. – confesso com amargura. — Esse é quem eu
sou.
Irritado com o que devo fazer, sou implacável enquanto penetro seu
corpo ferozmente e, com uma fome selvagem, chupo e mordo sua pele
macia. Ela estremece e um soluço sai de sua boca quando ela goza
violentamente em torno dos meus dedos.
Estou paralisado pela imagem no espelho - suas bochechas estão
coradas, seu cabelo bagunçado e seu corpo se contorce contra mim,
aceitando tudo que eu dou, porque quando ela goza, ela sabe o que é
isso. Ela sabe o que acabei de fazer.
Mesmo que os tremores ainda destruam seu corpo, eu retiro meus
dedos de sua boceta, instantaneamente sentindo falta do calor. Ela cai
para frente com um gemido, mas nunca tira os olhos de
mim enquanto coloco meus dedos, os mesmos que
estavam dentro dela segundos atrás, em minha boca. Seu
gosto é como um soco no meu plexo solar – a droga mais
potente.
Esfregando seu perfume em meus lábios, chupo meus dedos, quase
cedendo. Mas eu não deixo isso transparecer. Eu não acabei. 224
— Não admira que ele não tenha ficado por aqui... sua torta de maçã
parece muito melhor do que o gosto que tem. – As palavras tremem em
meu rosto quando ela vira, me dando um tapa forte.
— Nunca mais fale comigo. – Seu peito arfa, e o rubor em seu
corpo é por minha causa. Mas as lágrimas dela também.
Ela passa por mim, pegando a peruca e os óculos do chão. Ela corre
para a porta, com os pés batendo pelo chão. Quando ela abre a porta e
me deixa sozinho no quarto, percebo que esta é a primeira vez em muito
tempo que não quero estar.
225

— Podemos falar?
Perdida na minha cabeça, um lugar onde estive nos últimos dias,
levanto os olhos da minha mesa e vejo Avery parada na porta. — Claro.
Você nunca precisa me perguntar isso.
Quando ela entra e fecha a porta atrás de si, sei que o que quer
que ela queira discutir não pode ser bom. Esta semana pode ir para o
inferno.
— Lily, estou vendendo.
— Vendendo o quê? – pergunto, observando
enquanto ela se senta na minha frente.
— O estúdio. – ela esclarece, enquanto eu quase
engasgo.
— O que? Por quê? – eu consigo murmurar.
Ela nervosamente ajusta seu broche de bailarina de cristal. — É
hora de se aposentar. Não consigo mais acompanhar... 226
— Deixe-me ajudar. – interrompo, incapaz de aceitar suas palavras
como verdade. — Vou trabalhar mais. Farei o que for preciso.
Ela sorri, mas conheço Avery há quase toda a minha vida. Sei
quando ela está decidida. — Não é tão simples assim. Ninguém quer
mais aprender balé. As crianças podem se tornar bailarinas assistindo ao
Youtube. Mal consigo manter este lugar funcionando.
Que mundo muito triste em que vivemos. — Eu não sabia. Há algo
que eu possa fazer?
Ela balança a cabeça tristemente. — Falei com uma corretora de
imóveis. Ela acha que posso conseguir um bom preço pelo prédio. Está
em um bairro promissor. Provavelmente vão demolir e fazer
apartamentos.
Meu coração aperta com a perspectiva. — Então você não venderia
o estúdio como está? Quero dizer, talvez outra pessoa possa assumir o
controle? Uma pequena parte de mim espera que talvez isso não precise
ser tão ruim. Talvez alguém possa simplesmente comprá-lo. Terei um
novo chefe, mas tudo bem. Posso conviver com isso com a perspectiva
de ver um lugar que chamo de minha segunda casa ser demolido para
dar lugar a outro maldito arranha-céu.
Mas Avery suspira, pondo fim a essa fantasia. —
Encontrar um comprador vai levar tempo. E... – Sua
pausa me faz arquear uma sobrancelha. — Isso é algo
que eu não tenho muito.
— O que quer dizer? – pergunto, com meu coração
apertando. Eu não entendo.
Quando as lágrimas enchem os seus olhos, tudo desmorona. —
Acontece que aquela tosse que não passava era na verdade mais séria do 227
que eu pensava.
Quando continuo olhando para ela, com os olhos arregalados, ela
esclarece: — Tenho câncer de pulmão, Lily. Os médicos dizem que
tenho um, dois anos, se tiver sorte.
— O que? – Embora possa ouvi-la em alto e bom som, meu cérebro
se recusa a processar o que ela diz. — Não. Isso não é po... possível.
Avery é a pessoa mais saudável que conheço. Ela nunca fumou um
dia em sua vida. Deve haver algum erro.
— Não queria dizer nada até ter certeza. Mas vi meu médico na
semana passada. Sinto muito por não ter te contado antes. – ela torce as
mãos enrugadas na frente do corpo, enquanto de repente sinto que não
consigo respirar. — Eu só estava tentando encontrar o momento certo.
— Por favor, não se desculpe. Sou eu quem está arrependida. Eu
deveria ter ido com você. Se não estivesse tão perdida na minha cabeça,
teria visto que algo estava errado. — Então você está vendendo porque
precisa? Não porque você quer?
Ela acena com tristeza. — Este lugar é meu lar. Adorei trabalhar
aqui, trabalhar com você. Eu simplesmente não consigo... – Quando
seu lábio inferior treme, eu levanto da cadeira e envolvo meus braços
ao redor dela.
— Ah Deus. Sinto muito, Avery. – ela soluça no
meu ombro, agarrando-me com toda a força. — Estou
aqui para você. Eu prometo. Faremos isso juntas.
Estou tentando ser forte por ela porque é isso que ela
tem sido para mim. Quando minha própria mãe me deixou, ela
assumiu o papel sem pensar duas vezes. Agora é minha vez de apoiá-la.
— Deixe tudo comigo, certo? 228
Ela segura firme, balançando a cabeça rapidamente. — Você não
está sozinha nisso. Você me salvou uma vez. E agora é hora de fazer o
mesmo.
Ela não responde, mas, em vez disso, permite que a console porque
somos uma família. E eu farei qualquer coisa para proteger minha
família. Às vezes, a vida apresenta oportunidades invisíveis e, embora
assustadoras, você precisa dar um salto de fé.
Agora é um desses momentos.

Lotus se recosta na cadeira, me ouvindo detalhar minha situação


atual. Quando termino, expiro porque não queria parar no meio da
minha história. Eu estava com medo do que ela diria porque quando sua
pele rosada habitual empalideceu, eu sabia que estava arrancando seu
coração.
Ela leva um minuto para digerir tudo. — Lamento muito saber
sobre Avery. Eu sei que ela é como uma mãe para você.
Concordo com a cabeça em gratidão, mas me
preparo para o que está por vir.
— Não posso igualar o que Carlos está oferecendo a
você, Lily. Sinto muito. Este lugar mal sobrevive do jeito
que está. Se eu tivesse favoritas, não seria justo com as
outras garotas. Há algo que eu possa dizer para fazer você
ficar? Tenho um plano. – ela revela. — Só preciso de um pouco de
tempo. 229
— E isso é algo que não tenho. – afirmo com tristeza. — Nem
consideraria isso se não estivesse desesperada. Você tem sido tão boa
comigo, mas tenho que pensar na minha família.
— O que aconteceu no estacionamento também afetou sua decisão?
Balançando a cabeça, estremeço, pensando nas mãos do meu
agressor em volta da minha garganta. — Sim. Simplesmente sinto que é
hora de seguir em frente. Mata-me fazer isso, mas todos esses fatores
ajudaram a tomar minha decisão.
Lotus franze a testa, parecendo para lá de exausta.
Sinto-me uma vadia ingrata, mas com tudo o que aconteceu – o
ataque, Derrick sabendo onde trabalho, a saúde de Avery e o filho da
puta cujo nome me recuso a dizer, parece que agora é a hora de mudar.
Não quero trabalhar para sempre em um clube de strip-tease e, se
conseguir ganhar dinheiro suficiente para comprar o estúdio de Avery,
não precisarei fazer isso. Ela está vendendo porque precisa, mas se eu
tiver condições de comprá-lo, ela poderá ficar lá o tempo que quiser.
Ela explicou que os médicos sugeriram que ela tentasse alguns
tratamentos experimentais, mas eles não são baratos. Mesmo com as
economias dela, não cobriria metade do custo, e é por isso que ela
precisa vender. Só preciso do suficiente para um
pagamento inicial e espero que o banco me empreste o
resto.
Tenho uma boa conta poupança, mas quero mais e
rápido.
Avery está cansada. Eu estava muito envolvida em meu
próprio drama para ver isso. Mas agora que sei o que está errado,
farei tudo ao meu alcance para tornar a vida dela o mais fácil possível.
Ser funcionária é muito mais simples do que ser proprietária. E é hora de 230
ajudar a tornar a vida de Avery mais simples.
— Quando você vai embora?
— A partir de agora. – digo, odiando que minha decisão tenha
prejudicado a Lotus.
— Porra. – ela suspira, pegando a garrafa de vodka que está à sua
frente. — Presumo que você já ligou para Carlos?
Eu concordo.
Antes de vir para cá, liguei para garantir que Carlos e eu estávamos
na mesma página. Não precisava da coisa chique que ele me prometeu.
Só precisava de mais dinheiro e queria ter certeza de que não teria que
pagar nada a ele para dançar lá – sem gorjetas, taxas fora do palco ou
taxas de casa. Eu disse a ele quais eram as minhas condições e que iria
perguntar primeiro à Lotus. Se ela não conseguisse igualar o que ele
estava oferecendo, então eu trabalharia para ele.
Ele foi arrogante porque sabia que ela não conseguiria. Odeio fazer
isso, mas estou de mãos atadas.
— Deve ser eu. Andre se demitiu esta manhã. E agora você. – diz
Lotus, servindo-se de um copo grande de vodka.
— Ele se demitiu? – Não consigo esconder minha
surpresa.
Ela balança a cabeça enquanto toma um gole de sua
bebida. — Sim. Disse que seu talento não estava sendo
apreciado, seja lá o que isso signifique, porque ele não tem
talento.
Agora me sinto uma idiota ainda maior. — Sinto muito, Lotus. Eu
realmente sinto. Para que conste, sou eu, não você. – A frase clichê 231
explica perfeitamente essa situação.
Não querendo prolongar o inevitável, levanto-me e vou esvaziar
meu armário. Não quero fazer barulho. Antes de me virar para sair,
Lotus me deixa com algumas palavras de sabedoria. — Não se deixe
enganar por ele, Lily. Há uma razão além do seu talento para que ele
queira você. O Pink Oyster sempre será a sua casa.
É por isso que respeito e amo tanto a Lotus. Fui eu quem a deixou, e
aqui está ela, me oferecendo conselhos e uma segunda chance caso as
coisas com Carlos não deem certo. — Obrigada, e não vou. – respondo,
dando-lhe um pequeno sorriso antes de sair pela porta.
Escondo minhas lágrimas porque não vou embora porque odeio meu
trabalho – estou saindo porque quero melhorar a vida das pessoas que
amo. Não há ninguém no vestiário, o que é um alívio. Quero fugir sem
nenhuma despedida.
Não demoro muito para colocar tudo o que possuo em uma mochila
pequena e, quando fecho a porta do armário, uma sensação de nostalgia
me domina. Eu era tão ingênua quando comecei aqui. Tanta coisa
aconteceu desde aquele dia. Mas você vive e aprende, e sou eu
fazendo as duas coisas.
Dando uma última olhada no camarim, não me arrependo quando
viro as costas e saio pela porta. Meu celular toca e, sem
olhar para onde estou indo enquanto procuro em minha
mochila, esbarro direto em uma parede. No entanto, a
parede cheira a zimbro e pecado.
Olhando para cima, amaldiçoo todos os deuses que estão
olhando para mim, pois eles estão claramente rindo às minhas
custas. Memórias de quando o vi pela última vez, de quando ele
colocou os dedos em mim, dentro de mim, me atingem, e eu chuto
minha bunda, mais uma vez, por realmente ter perdido meu tempo com 232
ele.
Achei que por baixo das camadas de Bull havia um homem
incompreendido. Mas parece que fui eu quem entendeu mal, porque o
que você vê é o que você obtém, e o que recebi foi claramente um idiota.
Mas fui a maior idiota por não ter visto isso antes.
Tento passar por ele, mas ele dá um passo para a esquerda,
bloqueando meu caminho. Reprimindo minha raiva, arqueio uma
sobrancelha, perguntando silenciosamente que porra ele está fazendo.
Ele não fala, o que me enfurece ainda mais. A última vez que estivemos
juntos, parecia que ele não conseguia parar de falar.
A lembrança dele me dizendo que sou uma perdedora desesperada e
impossível de ser amada ainda me machuca profundamente. Mas me
recuso a mostrar a ele que estou magoada.
Seus olhos astutos observam o conteúdo da minha bolsa aberta. Se
eu não soubesse, diria que ele realmente se importava comigo. — Onde
você está indo?
— Não é da sua conta. Saía. – Mais uma vez, tento passar por ele,
mas ele se mantém firme.
— Então está tudo bem para você me espionar? – ele diz,
chamando a atenção para os leves hematomas em seu
rosto. — Mas não posso te fazer uma pergunta?
Brincando com ele, eu respondo: — Eu lhe dei todas
as respostas e, em troca, você as jogou na minha cara.
Além disso, acho que fui bem clara na última vez que te vi.
No entanto, caso você precise de um lembrete, nunca mais
fale comigo.
Passo por ele, mas ele segura meu bíceps, o que me enfurece.
Afastando-me de seu aperto, empurro seu peito, desequilibrando-o. — 233
Nunca mais coloque as mãos em mim. – ele deve ser capaz de ver minha
raiva porque levanta lentamente as mãos em sinal de rendição. Uma
visão que nunca vi antes. Mas é muito pouco, muito tarde.
— Você é patético. Você age como durão, mas no fundo você está
com medo. Você acha que não sou digna de amar, mas é você quem nem
consegue amar a si mesmo. Você é um maldito covarde.
Estou esperando por alguma resposta espertinha, mas não recebo
nada.
— E para que conste, eu não quero transar com você. – eu franzo
meu lábio, com repulsa. — Tudo que eu queria era ser sua amiga.
Seu pomo de adão move enquanto ele engole profundamente.
Espero que ele engasgue.
— Adeus, Bull. Eu diria que foi divertido, mas isso é uma mentira
total. Sua masturbação desajeitada já foi esquecido.
Não lhe dou tempo para dizer uma palavra porque, quando passo
por ele, ele se move dessa vez. Saindo do clube com a cabeça erguida,
não olho para trás. E é bom.

— Aqui está ela. Minha beleza. – Carlos abre os


braços, colocando sobre o encanto, enquanto eu reviro os
olhos.
— Pare com essa merda. – eu afasto seus braços de mim,
não estou interessada em abraçar meu novo chefe.
Ele ri em resposta. — Deixe-me mostrar seu camarim e então você
poderá assinar seu contrato. 234
A ideia de um contrato me assusta, mas era a única maneira de
Carlos concordar com o que eu queria.
Blue Bloods é como passar da classe econômica para a primeira
classe. Posso entender por que o lugar é famoso entre os pervertidos de
Detroit e do exterior. O Pink Oyster era mais o estereótipo do clube de
strip-tease sombrio e decadente, mas o Blue Bloods é tudo menos isso.
Este lugar parece um clube de campo onde acabaram de adicionar
um palco com um poste de stripper. Há mesas espalhadas por todo o
clube com postes de stripper presos no centro. Isso significa que mais de
uma dançarina está na pista ao mesmo tempo.
Pinturas elegantes adornam as paredes e um lustre está pendurado
acima do palco principal. A decoração elegante transmite uma vibração
de prestígio e classe alta. Posso imaginar que isso permite que a clientela
justifique vir aqui.
Não há estigma associado a este lugar porque não é um clube de
strip-tease – é um "clube de cavalheiros". Mas duvido que algum dos
clientes seja assim.
Seguindo Carlos pelo corredor com carpete vermelho, vejo
algumas salas privadas. Não sei quantas meninas trabalham aqui, mas
a julgar pelo tamanho, ouso dizer muitas. Eu realmente
deveria ter feito minha lição de casa, mas a verdade é
que não teria feito diferença.
Estou aqui por um motivo, e esse motivo é ganhar
dinheiro rápido.
— Este é o seu camarim. – Quando ele abre uma porta e
vejo uma sala decorada com os melhores móveis e meu
banheiro privativo, rio porque com certeza ele está brincando. Mas
quando ele gesticula para eu entrar, percebo que não está. 235
— Este é o meu camarim? Como de ninguém além do meu? –
pergunto, passando por ele e olhando ao redor da sala com admiração.
— Sim, claro que é. Eu te disse, nada além do melhor para você.
Puta merda.
Olhando boquiaberta para o pequeno lustre e o sofá de veludo
macio, vejo que ele não estava brincando. A penteadeira tem um grande
espelho acoplado. Existem lâmpadas ao redor da borda. É adequado para
qualquer artista.
Há uma prateleira na parede onde posso pendurar minhas roupas.
Bem como estantes. A porta do banheiro está aberta e, quando vejo que
tem chuveiro, não consigo deixar de gritar de animação. — Isto é
incrível. Obrigada. – digo, incapaz de acreditar que este é meu camarim.
Eu apenas sonhei com algo assim. Sim, a sala era um acontecimento
onde eu faria balé, mas este é um vice-campeão impressionante.
Carlos vem por trás de mim e agarra meus bíceps. Permito que ele
me toque porque não consigo sentir nenhuma decadência por enquanto.
— De nada. Vou deixar você à vontade. Tem certeza de que está bem
para trabalhar esta noite?
— Sim. – Não há um momento a perder.
Jordy vai passar a noite na casa de Patrick. Eu
queria ter certeza de que ele estava bem em ficar na casa
de Erika novamente. Quando ele praticamente me
empurrou porta afora, percebi que estava mais do que bem.
Expliquei que trabalharia em turnos extras nos próximos
meses, mas prometi que seria apenas temporário, e é.
Quando conseguir dinheiro suficiente, eu acabo com esta vida.
Comprar o instituto não é só por Avery, é por mim também. Eu não 236
percebi o quanto queria isso até que tive a oportunidade.
É uma carreira sobre a qual não preciso mentir. Pela primeira vez
em muito tempo, tenho esperança.
Garantirei que Avery seja bem cuidada e não suportará sua doença
sozinha. Ela não tem muito tempo, o que significa que trabalharei dia e
noite para tornar precioso cada momento que lhe resta.
Carlos me vira, então fico de frente para o espelho, e nós dois
olhamos para o meu reflexo. — Você sabe o que eu vejo?
Balanço minha cabeça lentamente.
— Uma estrela. – ele revela. — Bem-vinda ao lar.
Sorrindo, agradeço o comitê de boas-vindas, mas sutilmente
encolho os ombros. Para que isso funcione, ele precisa manter as mãos
para si mesmo, porque nada acontecerá entre nós.
Ele percebe meu afastamento, mas algo em seu comportamento é
quase arrogante. Talvez ele pense que ganhou? Mas não há vencedores
aqui. Apenas pessoas tentando sobreviver.
Ele me deixa sozinha, permitindo que eu absorva tudo isso.
Tenho minhas roupas na bolsa, mas quando caminho até o cabideiro,
percebo que minhas roupas parecem trapos comparadas
com as que Carlos quer que eu use. Elas são
promíscuas, mas ainda elegantes o suficiente para manter
os clientes adivinhando como eu sou por baixo delas.
Deixei claro para Carlos que não ficaria totalmente
nua e ele concordou - por enquanto. Eu realmente não sei por
que ele tem sido tão complacente, mas suponho que só há uma
maneira de descobrir. Movendo os cabides ao longo do trilho, escolho
uma roupa pronta para brilhar. 237

Liguei para Jordy para ter certeza de que ele estava bem. Ele estava
bem. Era eu quem não estava bem. Não posso deixar de me sentir uma
péssima mãe. Trabalhar todas essas horas extras tira tempo dele. Mas
lembro a mim mesma que é apenas temporário.
Uma batida na porta interrompe minha piedade e rapidamente
enxugo as lágrimas dos olhos. — Entre.
A porta se abre e uma jovem enfia a cabeça para dentro. — Oi. Meu
nome é Kath, mas meu nome artístico é Dallas.
— Oi, Kath. – digo, parando.
Quando vê a roupa que escolhi, ela assobia. — Caralho. Posso ver
por que Carlos está se gabando de você.
Sorrio, ajustando o vestidinho preto que parece ter sido desenhado
por Freddy Kruger. Há cortes por toda parte, revelando muita pele,
mas a magia da fita dupla-face garante que não haja contratempos. —
Esperemos que ele não mude de ideia quando me ver dançar. Como
está lá fora?
Kath fecha a porta, o que me leva a acreditar que
quer privacidade. — O lugar pode parecer chique, mas
acredite, no momento em que qualquer homem entra em
um lugar onde estão mulheres seminuas, ele se transforma
em uma promessa de fraternidade.
Não posso deixar de rir.
— Carlos colocou você na mesa três para aprender o básico. Estou
dançando na sua frente. Se você tiver algum problema, é só me avisar. 238
Você estará dançando no palco principal em pouco tempo. – Eu
instantaneamente gosto de Kath. Ela parece sincera e, nesta indústria,
isso é difícil de encontrar.
— Você está pronta?
Assentindo, eu me borrifo uma última vez com meu perfume
favorito e calço meus saltos monstruosos.
— Temos alguns minutos de sobra. Mas o Chefão não gosta que
ninguém se atrase.
— Diga ao Carlos para tomar um comprimido para relaxar. – eu
provoco, mas quando Kath balança a cabeça, percebo que há muito mais
nessa história.
— Carlos é o gerente, a cara do clube, mas não é o chefe nem o
dinheiro por trás deste lugar.
Isso é novidade para mim.
Kath abana dramaticamente suas bochechas coradas. — Ninguém
sabe o nome dele, mas o Chefão combina perfeitamente com ele.
Penso em outro homem cujo o nome também combinava
perfeitamente com ele. Bull… Bull era cheio de si. Mas me recuso a
manchar meu novo futuro pensando nele.
Eu me pergunto por que Carlos nunca mencionou
isso para mim.
— Ele mal está por perto, preferindo ficar nos
bastidores, o que é uma pena, porque está muito bem. – ela
morde as juntas dos dedos de brincadeira.
— Bem, estou evitando os homens, então se ele está aqui ou não,
não faz diferença para mim. 239
A amargura em meu tom sugere um motivo para minha aversão pelo
sexo oposto, mas Kath não insiste por enquanto. Saímos do meu
camarim e caminhamos pelo corredor. As luzes diminuíram e a música
dançante que ecoa na sala principal indica que os negócios estão a todo
vapor.
Meu coração está batendo descontroladamente; Estou nervosa por
me apresentar em um novo clube. A realidade do que estou fazendo me
atinge e de repente questiono minha decisão. Eu fiz a coisa certa?
Agora não é hora de me questionar, porque quando Kath abre a
cortina de veludo vermelho e pega minha mão, não somos mais Lily e
Kath, somos Tigerlily e Dallas. O local está lotado, o que surpreende já
que ainda é relativamente cedo. Mas me alimento da energia do ar
porque, ironicamente, esses idiotas são minha passagem para sair daqui.
Dallas me acompanha até minha mesa e sorri. Parece que minha
companhia esta noite é um grupo de homens comemorando uma
despedida de solteiro. Não é nenhum segredo que homens comemorando
o fim de uma era para seus amigos resultam em ótimas gorjetas. Então,
quando um deles se levanta e me oferece a mão para me ajudar a subir
na mesa, aceito com um sorriso sensual.
Embora eu deteste dançar música pop, encontro o ritmo e me
solto, atraindo instantaneamente os homens. Eles se
sentam eretos, me observando de perto enquanto uso
meu corpo para seduzi-los. Com o álcool e os bons
momentos fluindo livremente, o mesmo acontece com o
dinheiro. Os homens enfiam a mão nos bolsos e disfarço
minha surpresa ao ver seus grandes maços de dinheiro presos
com clipes de ouro. Em vez de notas de dólar, eles jogam notas
de dez e vinte aos meus pés. Parece que todo mundo aqui é George.
A visão me faz esquecer por que estou aqui, e quando olho nos
240
olhos famintos dos homens ao meu redor, eles logo substituem o azul e
verde do maldito. Bull é parte da razão pela qual estou aqui e, de certa
forma, devo agradecê-lo.
Se ele não fosse tão idiota, eu não teria ido embora, mas quando
vejo a pilha de notas de vinte na mesa, fico feliz por tê-lo conhecido,
porque ele me fez perceber meu verdadeiro valor.
Nos próximos vinte minutos, dou ao meu público um show que eles
nunca esquecerão. Para eles, sou intocável. Uma deusa perfeita. E neste
momento, eu sou. Esqueço meus problemas e o fato de que tenho
sentimentos, sim, sentimentos, por alguém que me vê como nada. Mas
não mais. Cansei de ser a segunda.
Quando a música termina, os homens se levantam e batem palmas
ruidosamente enquanto os assobios dos lobos atingem os meus ouvidos.
Comparada com as mesas ao redor, a minha está coberta com uma
grande quantia de dinheiro, sugerindo que fui um sucesso. Dou um
aceno atrevido aos homens enquanto Carlos diz que eu não deveria
juntar minhas gorjetas como uma prostituta comum. E eu gosto disso.
Mas quando alguém me oferece a mão para me ajudar a descer da
mesa, e eu fixo os olhos nele, minha nova confiança despenca. É o
Andre. E parece que ele trabalha aqui também.
Não querendo estragar a fachada, sorrio e aceito
sua mão. Ele não diz nada para mim, mas não precisa. O
fato de ele ter hematomas desbotados no rosto e seu nariz
parecer ter sido quebrado recentemente é o que fala.
Assim que meus pés tocam o chão, arranco minha mão de
Andre e caminho pelo clube. Cada parte de mim está tremendo
porque de repente me lembro de quando olhei naqueles olhos
antes. Abro a cortina de veludo vermelho e mascarei minha histeria até
mergulhar na segurança do meu camarim. 241
Batendo a porta, me inclino contra ela, ofegando alto e pressionando
a mão sobre meu coração acelerado. Sou transportada de volta ao tempo
em que meu coração batia tão descontroladamente quanto agora... e essa
foi a noite em que fui atacada.
Naquele momento, os olhos do meu agressor pareciam familiares.
Ignorei isso, mas agora percebo que deveria ter ouvido meu instinto.
Meu agressor era conhecido por mim. Eu simplesmente não sabia disso
até agora.
Meu agressor mascarado finalmente tem um nome, e esse nome é
Andre. Então agora, a questão que me depara é… por quê?
242

Meu plano deveria ser simples: encontrar os homens que mataram


meu irmão e fazê-los pagar. Um pagou com a vida e outro está a
caminho de sofrer o mesmo destino, porque descobri que posso ser
bastante charmoso quando quero.
Não demorou muito para eu conquistar Kong.
Nós dois queríamos algo um do outro - ele queria que eu o
tornasse rico, e eu, eu o queria morto. Nós dois precisávamos um do
outro para satisfazer nossos desejos. É uma pena para ele não viver o
suficiente para ver seus sonhos se tornarem realidade.
Tomar uma bebida com o assassino do meu irmão é
tão estúpido quanto parece. Mas para conseguir o que
quero, preciso ser um camaleão, e é por isso que estou
sentado em um bar sombrio no centro da cidade, esperando
por Kong. Já se passaram duas semanas desde que venci
minha primeira luta e, desde então, venci mais quatro.
Meus oponentes têm sido uma competição patética, ou talvez não,
porque sempre que vejo Kong, uma raiva toma conta de mim e é como 243
se eu estivesse possuído. Preciso destruir tudo que estiver no meu
caminho. E quando ele entra no bar, esses sentimentos assassinos me
derrubam, mas pego minha cerveja, precisando de algo para fazer além
de estrangulá-lo com as mãos.
Ele acena para a garçonete bonita, insinuando que quer o de sempre,
seja lá qual for a merda. — Hércules. – ele brinca enquanto se senta à
minha frente na cabine.
Esse apelido é aquele que ele deu para mim como se fôssemos
amigos. Cada vez que ele usa, eu quero arrancar sua língua e fazê-lo
comer, mas engulo e sorrio.
— E aí, irmão. – Me mata referir-me a ele dessa forma, mas seu
duplo sentido é feito com intenção. É por causa do meu irmão que estou
aqui.
— Desculpe, estou atrasado. Você tem sorte de não ser mais casado.
– ele se vira por cima do ombro, de olho na garçonete.
— Porra. – respondo, mantendo minha história de deixar minha
família para trás em Seattle. — As vadias só servem para uma coisa.
Kong cai na gargalhada enquanto a bile sobe. — Amém.
A garçonete coloca uma garrafa de cerveja na mesa, sorrindo
quando Kong lhe dá uma gorjeta de vinte. —
Mantenha-as vindo, querida.
Ela balança a cabeça timidamente enquanto Kong
verifica sua bunda enquanto ela se afasta. — O que eu
faria com um pedaço de torta de cereja como esse. – ele
murmura, lambendo os lábios grossos.
Eu rio em resposta, mas estou longe de rir por dentro.
— Obrigado por me encontrar. Eu queria falar com você.
Concordo com a cabeça, insinuando para ele continuar.
244
— O Chefe está impressionado com você. E eu também. Ele quer
você na equipe dele, em tempo integral.
— O que isso significa? – pergunto, recostando-me casualmente na
cabine.
Kong olha em volta, certificando-se de que ninguém está ouvindo.
— A próxima luta está marcada em algum clube de strip-tease de merda.
The Pink Oyster. – Eu mantenho a calma. — Você sabe disso?
— Não. – respondo calmamente.
Kong toma um longo gole de cerveja antes de se inclinar sobre a
mesa. — Sei disso muito bem. O chefe está com problemas financeiros e
se ofereceu para ajudá-la.
Mantendo minha expressão impassível, pergunto: — O que isso
significa?
— A vadia estúpida não tem ideia. – ele ri enquanto aperto minha
garrafa de cerveja. — O Chefe tem planos para aquele lugar. Ele vai
investir e ajudá-la a sair das dívidas, mas, na realidade, está fazendo
isso porque precisa de um negócio para ajudar a manter suas contas
legais.
Aquele idiota filho da puta.
— Parecerá que ele dirige um negócio legítimo,
mas, na realidade, é o estratagema perfeito para o seu
dinheiro sujo. Ninguém vai saber. Ele a manterá como
sócia porque ela não levantará suspeitas nos federais. A luta
é apenas uma desculpa para ele fazer uma proposta a ela.
— Se a polícia descobrir sobre a lavagem de dinheiro, ela também
cairá. – Minha voz está calma, mas mal consigo me segurar. 245
— Na verdade, só ela cairá. Ele será um sócio silencioso e, se
alguma coisa acontecer, garantirá que tudo recaia sobre ela.
O couro range embaixo de mim enquanto meu corpo vibra de raiva
absoluta.
— O que foi? – Kong pergunta desconfiado, no meio de um gole de
cerveja.
Preciso me recompor. Se eu não fizer isso, a Lotus pagará. — Nada.
Queria saber se essa dona era solteira?
O rosto de Kong relaxa e ele sorri. Isso foi por muito pouco. Preciso
colocar minha cabeça, não meu coração, no jogo.
— Seja como for. – ele continua, enxugando a cerveja dos lábios
com as costas da mão. — O Chefe vai vir assistir você lutar. Ele quer
dar uma olhada no clube também. Ele pode fazer de você um homem
muito rico. Todo o dinheiro e boceta que você poderia desejar estão ao
seu alcance. Confie em mim. Seja o que for que ele lhe ofereça, você
seria estúpido se dissesse não.
Ele olha para mim com aqueles olhos opacos, esperando que eu
lhe agradeça.
Tenho um papel a desempenhar, então aceno com
a cabeça. — Obrigado por me contar tudo isso. Não
quero ser pego de surpresa quando o conhecer.
— Não tem problema, mano. Além disso, será
divertido juntar-se a você. As strippers que trabalham lá
têm grandes problemas com o papai e farão qualquer coisa
por uma gorjeta. – Quando ele mexe as sobrancelhas e diz. —
Uma garota lá, Tigerlily, puta merda, ela é uma putinha tagarela
que precisa de boas maneiras. – eu bato meus dois punhos na mesa, o
que vira minha garrafa e derrama cerveja toda sobre a superfície. 246
Kong recua para não acertar nada nele, mas eu permaneço
perfeitamente imóvel.
Não posso mais fazer isso. Eu não posso fingir. Preciso matar esse
verme como agora. Mas me concentro, lembrando-me do panorama
geral. A regra número dois da prisão é o que me ajuda.
— Que porra é essa, cara? – ele xinga, enxugando a camisa branca
porque algumas gotas perdidas o atingiram.
O casal à nossa frente discretamente me olha de lado. Preciso me
acalmar. Mas não posso. Kong não tem o direito de falar o nome dela.
Sim, tudo que fiz foi machucá-la desde o momento em que nos
conhecemos, mas ela é minha para fazer o que quiser.
Minha? Puta merda, estou com um problema.
Mas é muito tarde. Já tentei negar e não consigo. Sei que ela me
odeia, mas seu ódio só me faz querer mais dela. Não a vejo desde que
ela saiu do The Pink Oyster, mas isso não significa que não tenha
pensado nela todos os malditos dias.
Eu sabia que ela era perigosa, mas isso está quase sendo perigoso
para minha saúde.
Com Kong ainda olhando para mim, contraio a
mandíbula e penso em pé. — Minha ex era stripper, só
isso. É um assunto delicado para mim.
— Desculpe, eu não sabia. – diz Kong, parecendo
acreditar na minha mentira.
A garçonete limpa rapidamente a bagunça que fiz e serve
mais duas cervejas.
— Está tudo bem. Ela fodeu todos os meus amigos. Ela disse que o
garoto é meu, mas quem sabe. – Encolhendo os ombros, pego minha 247
cerveja e tomo um gole muito necessário. Minha boca fica subitamente
seca e percebo que estou cheio de sede e que apenas uma amostra matará
minha sede.
— Isso é difícil. Malditas mulheres. – diz Kong balançando a
cabeça.
Esta é a entrada que eu precisava. — Porra, eu quase… matei um
dos meus amigos que estava transando com ela. Acabei perdendo o
controle.
Kong encolhe os ombros. — Isso acontece, cara.
— Isso já aconteceu com você? – pergunto baixinho, inclinando-me
sobre a mesa para que ele possa me ouvir.
Ele demora, mas, seja saboreando a cerveja ou a pergunta, eu não
tenho muita certeza. — Sim. – ele confessa, então eu continuo
investigando.
— Alguma garota transou com seus amigos também?
Algo toma conta de Kong, como se ele estivesse revivendo uma
memória, e eu sei qual. — Não, não isso. Algum idiota pensou que
ele era melhor que nós.
— Nós? – pergunto, encarando-o com os olhos
estreitados.
— Sim. Mas nós lhe ensinamos uma lição.
— O que você fez?
É isso; tudo se resume a isso.
— Nós o matamos. – declara Kong com uma risadinha. Sua risada é
às custas do meu irmão. Esse covarde vai pagar. 248
— Puta merda. – eu assobio, recostando-me na cadeira antes de agir
por instinto e o atingir. — Por que eles não estão lutando pelo seu chefe?
Eu sou um pouco comparado a eles.
Kong ri como se eu tivesse acabado de dizer algo engraçado. —
Não somos os garotos delinquentes que costumávamos ser. Meus
amigos estão em posições altas agora. Eles fazem com que outras
pessoas façam o trabalho sujo por eles.
— Você ainda os vê? – eu tento não parecer muito desesperado, mas
esta é a minha chance de descobrir quem eles são.
Kong balança a cabeça. — Não. Estamos todos ocupados. – diz ele
prontamente, criando sinais de alerta. — Mas esse incidente nos unirá
para sempre.
Inferno, sim, vai.
— Jaws, Hero, Scrooge e eu crescemos juntos. Maldito miserável.
Mas mostramos para todos aqueles idiotas mauricinhos. Somos nós que
estamos rindo agora. Bem, todos menos um.
Cerro os punhos embaixo da mesa, sem me atrever a interromper
sua viagem pela estrada da memória. Eu preciso de um nome. Dê-me
a porra de um nome. Eu sei quem é o Jaws. Quem é o filho da puta
que eu matei? Logo descobrirei quem.
— O Hero está morto. Pobre filho da puta. Foi
morto a tiros trabalhando em uma loja de conveniência.
Ele foi pego em alguma guerra de gangues. Essa era a
palavra na rua. Mas é isso que ele ganha por virar as costas
aos irmãos.
A adrenalina está bombeando através de mim e estou tão irritado
que sinto que vou explodir. Quando estou prestes a perguntar onde estão 249
seus amigos, Kong balança a cabeça, voltando ao presente. — Escute-
me, puta merda. Falando como uma maldita mulher. Vou pegar um
pouco de vodka para nós. Estou com vontade de ficar fodido.
Não pressiono porque não quero levantar suspeitas.
Ele se levanta, enfiando a mão no bolso em busca da carteira. Sua
mão treme, insinuando que sua história ainda o afeta até hoje. É a única
coisa que teremos em comum. Cambaleando ele abre a carteira,
revelando algo, que de repente me desequilibra.
Observo Kong caminhar até o bar, com a carteira na mão, a carteira
que contém uma foto de duas crianças pequenas que imagino serem
dele. Eu me pergunto quais são seus nomes e se eles são bons garotos.
Seus sorrisos sugerem que são felizes.
Algo fervilha ao meu redor, um zumbido suave, que eventualmente
me deixará louco se eu não matar a fonte. Agarrando minhas coxas,
aperto com força, recusando-me a permitir que esse sentimento estranho,
que se poderia dizer ser culpa, atrapalhe o caminho da justiça. Mas isso
é ridículo. Eu não sinto culpa. Eu não sinto... ponto final.
Minha vingança certamente arruinará suas vidas para sempre, e a
bile sobe com esse pensamento. Mas não posso, não vou deixar
ninguém ficar no meu caminho. Não importa seus sorrisos felizes ou
o fato de eu saber que eles existem, o inevitável
acontecerá: matarei o pai deles.
E ninguém vai me impedir.
Eu não deveria estar aqui. Eu também não deveria ter ficado bêbado
com o homem que vou matar em duas semanas. Mas o álcool ajudou a 250
relaxar o Kong, e ele contou os detalhes de quando lutarei no The Pink
Oyster. Duas semanas, o que significa que ele tem duas semanas de
vida. E tenho duas semanas para descobrir onde Jaws e Scrooge estão
escondidos.
Este filho da puta respirou demais. É hora de ele encontrar seu
destino. Eu poderia ter acabado com ele esta noite, mas quando se calou
em sua narrativa, eu sabia que teria que pressionar mais quando ele não
estava completamente bêbado.
Não posso permitir que Kong e Stevie fodam a Lotus dessa maneira.
Na noite da luta, vencerei e, quando todos tiverem saído, matarei Kong.
Eu precisava de um local para matar. E agora encontrei um. De qualquer
maneira, o local estará ensanguentado por causa das lutas, então a Lotus
não fará perguntas quando eu desinfetar o local quando terminar.
Conheço o layout do clube e convencerei Lotus a me deixar cuidar
de tudo na noite da luta, garantindo que ela se esconda, e então terei o
lugar só para mim.
Quanto a Stevie, ainda não tenho certeza do que fazer com ele. Meu
problema não é com ele, mas não posso recuar e deixá-lo fazer isso
com a Lotus. The Pink Oyster é seu sustento.
Mas vou lidar com um drama de cada vez, porque quando
cambaleio para o único lugar onde não deveria estar, é
óbvio que não estou com disposição para tomar
decisões.
Os seguranças são um bando de maricas, pois estou
claramente perdido, mas o dinheiro fala. Coloco algumas
notas de cem dólares nos bolsos de suas camisas e recebo
tratamento VIP enquanto uma garota com um vestido de vinil
vermelho me acompanha para dentro do clube escuro.
A música pop tocando nos alto-falantes aumenta a pulsação nas
251
minhas têmporas, então faço um desvio até o bar, perdendo minha
acompanhante no meio do caminho. O lugar está lotado, e eu espero
atrás de alguns atletas idiotas que ficam cutucando uns aos outros de
excitação como se tivessem cinco anos de idade.
Minha paciência já acabou, e quando estou a poucos minutos de ir
embora porque isso é uma... má... porra... de ideia, sinto isso antes
mesmo de saber o que diabos está acontecendo. A guerra dentro de mim
se acalma, e o barulho se torna um zumbido suave – algo que só
acontece quando...
As luzes diminuem e a multidão ecoa em assobios e aplausos. Os
atletas na minha frente se viram, insinuando que o show está prestes a
começar. Não preciso me virar. Eu sei o que verei. Mas sou masoquista
e estar aqui prova isso.
A introdução icônica abafa a horrível música pop, abrindo caminho
para “Pour Some Sugar on Me” de Def Leppard. Virando lentamente,
me preparo para sua entrada, mas quando ela abre as cortinas de veludo
vermelho e marcha confiante para o palco, percebo que não me preparei
para merda nenhuma porque, puta merda, Tiger é a porra da rainha.
Instantaneamente, minha fome aumenta e a necessidade de tocá-
la me deixa atordoado. Mas continuo escondido nas sombras
enquanto a observo naquele palco com uma confiança
renovada. Ela está vestindo um macacão neon
minúsculo que tem um V na cintura. As tiras cobrem seus
seios, mas isso é tudo. Sua parte de baixo é um short
minúsculo que acentua sua cintura esbelta. Ela parece
muito mais magra do que quando a vi pela última vez.
Seu cabelo comprido está cacheado e sua maquiagem é forte: cílios
postiços grossos e grandes lábios vermelhos, e assim como aconteceu na 252
primeira vez que nos conhecemos, tenho vontade de borrar seu batom.
Mas, ao contrário daquela primeira vez, algo está diferente nela. Ela
parece... quase mais forte, como se a mulher que me mostrou compaixão
já tivesse partido há muito tempo.
Ela é diferente e, quando envolve o corpo no poste, vejo o que é.
Quando ela dançou no The Pink Oyster, ela o fez porque adorava
dançar. Mas agora ela está fazendo isso por outro motivo.
Dinheiro.
Ainda não consigo tirar os olhos dela, mas sua paixão, seu amor
pela dança se foi, e ela é apenas uma stripper enigmática que quer
ganhar dinheiro rápido. Ela parece completamente anulada.
Os homens a devoram toda, porém, jogando todas as suas
economias no palco enquanto ela gira contra o poste.
Seus movimentos não são mais graciosos; eles estão com raiva.
Seus olhos estão opacos e carecem do fogo, carecem da paixão que fez
de Tiger quem ela era. Ela está muito chateada, e isso é reflexivo quando
ela desce de costas e desliza pelo palco.
Um idiota pensa que ele está no melhor momento de sua vida,
mas Tiger logo cagará em seus sonhos eróticos quando ela o
convence a seguir em frente com um movimento de
seu dedo.
Então, Deus me ajude, se ela sentar em seu colo,
Stevie, ou como diabos você quiser chamar, porque tudo
isso significa uma coisa - ele levando-a ser um animal
selvagem quando estiver no palco - eu vou levá-lo a
selvageria com meus punhos.
Ele cai no truque, inclinando-se em direção a ela, apenas para ela
pressionar o salto alto contra seu peito para detê-lo. Sua boca se abre, 253
sem saber o que fazer, mas este é o show de Tiger; sempre foi. Ela
empurra seu peito com tanta força que ele cai para trás na cadeira.
A multidão enlouquece e ela incentiva o barulho enquanto abre as
pernas e move os quadris no ar. Algum idiota tem coragem de se inclinar
no palco e colocar alguma coisa no cós do short. Parecem ser algumas
notas de cem dólares.
A música termina com Tiger deitada de costas e os homens
levantados, assobiando alto, enquanto fico olhando com os olhos
arregalados.
Que porra eu acabei de assistir?
Ela rapidamente se levanta e sai pela cortina no fundo do palco.
Uma mulher de biquíni dourado pega as gorjetas de Tiger antes de sair
do palco também.
— Com licença? – Meu olhar abobado é interrompido quando uma
bela jovem se aproxima de mim. Ela está usando um vestido curto verde
que não deixa muito para a imaginação.
— E aí. – eu aceno com a cabeça, me perguntando o que ela quer.
Quando ela dá um passo à frente e sussurra em meu ouvido o que
ela quer, que é me chupar, percebo que não estou bêbado o suficiente
para essa merda.
— Não, obrigado, querida. Vá encontrar um
universitário bonito.
Sorrindo, ela faz exatamente isso quando dá um
tapinha no ombro do atleta na minha frente.
Passo por ele e seu grupo de amigos e peço três doses de
vodka, que bebo em rápida sucessão, antes de pedir um uísque. A
vodka não faz nada para acalmar a coceira interna. Nada fará isso,
exceto uma coisa. 254
— Mais mil dólares para um encontro com Tigerlily. – No momento
em que ouço o nome dela, tenho vontade de bater a cabeça do cara, que
está ao meu lado, contra o bar.
Seu amigo idiota, que parece gostar de buracos gloriosos, encolhe
os ombros. — Isso é muito dinheiro. Você gostaria que a boceta dela
fosse forrada de ouro por esse tipo de dinheiro.
— Não é só na boceta dela que estou interessado.
O aviso de Lotus vem à mente e quase perco a cabeça onde estou.
“Eles funcionam como um clube de cavalheiros, mas não é segredo
que se você quisesse que seu pau fosse chupado ou quisesse agredir uma
das garotas, a gerência ficaria feliz em fechar os olhos.”
Tomando meu uísque, sinalizo para o barman que quero outro. —
Que pena, rapazes. – afirmo calmamente para os caras ao meu lado.
Eles não têm ideia do que estou falando até que eu seja bem claro.
— Tigerlily estará fora do horário de trabalho pelo resto da noite.
Talvez até pelo resto da porra do ano.
O filho da puta, que ousou falar sobre Tiger como se fosse uma
prostituta, abre a boca, mas logo a fecho.
— Se você chegar perto dela, vou descobrir onde
você mora e vou cortar a porra da sua garganta enquanto
você dorme. – E eu quero dizer cada palavra.
Ele e o amigo trocam olhares preocupados antes de
fugirem com o rabo entre as pernas.
— Conte a todos os seus amigos! – grito, colocando as mãos em
volta da boca. 255
A bartender olha para mim e sorri. — Ela é sua amiga? – ela
pergunta, colocando minha bebida na minha frente.
Tirando uma nota de vinte, balanço a cabeça. — Não.
Ela franze a testa, claramente confusa, mas não pressiona.
Com meu uísque na mão, afasto qualquer um que esteja no meu
caminho, na missão de encontrá-la. Eu não deveria estar aqui, já
estabelecemos isso, mas agora que estou, não posso sair sem respostas.
Preciso saber por que diabos ela se vendeu.
Este lugar parece um labirinto, então decido me aventurar pelo
longo corredor e tentar a sorte. O idiota disse que havia a possibilidade
de um encontro cara a cara com Tiger. Imagino que qualquer uma das
portas que saem do corredor possa ser a sorte grande.
Homens bêbados ficam encostados nas paredes, apalpando mulheres
que riem ligeiramente, quando, na verdade, deveriam estar dando
joelhadas nas bolas desses idiotas desprezíveis. Bebendo meu uísque,
sintonizo-me com o que está ao meu redor porque, mesmo estando
bêbado, ainda posso senti-la.
A presença dela me chama, assim como desde o início, mas, ao
contrário de então, não posso mais ignorá-la. Não tenho certeza no
que estou me metendo, mas quando caminho pelo
corredor elegante, agradeço tudo o que ela está prestes
a dar.
Abrindo a penúltima porta à direita, dou aos meus
olhos um momento para se adaptarem à escuridão, mas
quando isso acontece, um sorriso malicioso surge em meus
lábios. — Desculpe, cara, porta errada. – eu rio quando vejo um
empresário com a calça nos tornozelos enquanto ele está sendo açoitado
por uma garota vestida de couro. 256
Ele grita, horrorizado, enquanto dou uma piscadinha sob aplausos
para ela.
Fechando a porta, inspiro, parando por um momento para me
concentrar em Tiger e apenas nela. As flores de cerejeira florescem um
segundo depois. Atravessando o corredor, sei que estou certo, pois cada
parte de mim está latejando de fome. Sem hesitar, viro friamente a
maçaneta da porta e me aventuro a entrar.
A luz do corredor me permite ver uma visão que apenas alimenta
esse fogo fora de controle que queima por dentro. Tiger está dançando
para uma baleia que está prestes a perder uma mão se ele não a tirar da
bunda dela. Ela está dançando no colo dele, mas para de repente quando
se concentra na porta ou, mais especificamente, em mim. E quando ela o
faz, fica claro que as coisas estão prestes a ficar complicadas.
Nossa troca não é repleta de felicidade pelo reencontro de dois
amigos. É cheio de vontade de destruir o outro porque nunca fomos
amigos.
A baleia bufa e olha por cima do ombro para me repreender. —
Espere sua vez, amigo.
Em resposta, bebo meu uísque, saboreando a queimação. Quando
termino, com os olhos ainda fixos em Tiger, resmungo:
— Saia.
— O que? – ele pergunta, irritado por eu ter acabado
de interrompê-lo. Mas como se ele tivesse uma chance.
— Saia. – repito baixo, sorrindo quando Tiger
lentamente se levanta de seu colo. Ela está usando um vestido
preto transparente decorado com um caminho de diamantes que
funciona como um roteiro para seus seios e boceta.
Ela nunca quebra o contato visual comigo. O jogo começou.
257
— Você não pode simplesmente entrar aqui. – ele se levanta
abruptamente, revelando uma semi-automática, que é como agitar uma
bandeira vermelha na frente de um touro furioso. Mãe do Céu, se ela
desse a ele um oral, eu ficaria feliz em arrancar seu pau e dá-lo para
comer.
Mas continuo calmo. Por agora.
— Acabei de fazer isso. – respondo friamente.
O insignificante abre, mas logo fecha a boca. Ele deve ser capaz de
ver que não é páreo para mim. — Foda-se isso. Quero meu dinheiro de
volta.
Ele pega sua jaqueta do sofá de couro vermelho e tenta passar por
mim. Permaneço firme, agarrando o seu braço de bolacha. — Sem
reembolso. Agora saia.
Ele não discute e se liberta antes de fazer uma saída dramática.
Quando ele bate a porta, o ar denso envolve meu pescoço com as mãos e
se recusa a soltá-lo.
Uma música pop que parece Britney Spears cantando sobre tudo
que é tóxico resume perfeitamente esse momento, e é por isso que
Tiger não desliga. Ela usa isso como seu hino enquanto
caminha em minha direção, com seu olhar nunca
desviando do meu.
Ela para a centímetros de distância.
Meu coração começa a acelerar e não sei por quê. Nunca
senti isso antes. No entanto, quando ela estreita os olhos
ferozes e olha para mim como se eu não fosse nada, finalmente entendo
por que estou aqui. 258
Preciso me concentrar no meu jogo final e só há uma maneira de
fazer isso. Preciso tirá-la no meu sistema. E tenho certeza que ela sente o
mesmo.
— A única coisa real sobre a sua apresentação esta noite foi a
música. – afirmo, saboreando a raiva dela florescendo diante de mim.
Ela pisca uma vez, com o vermelho em suas bochechas acariciando
o monstro dentro de mim.
— Como ousa vir aqui e me insultar? – ela resmunga, balançando a
cabeça lentamente.
— Você se insultou. Há quanto tempo a baleia está aqui? Parece que
ele tem um cartão de fidelidade. – Baleia é quem gasta muito e
praticamente mora nas salas VIP.
Ela não responde minha pergunta. — Achei que tinha sido clara.
Que parte de nunca mais falar comigo você não entende?
— Você é melhor que isso. – Aponto na direção do palco,
ignorando-a. — Você é melhor que isso. – eu sacudo um de seus cachos
com o dedo.
Em resposta, ela dá um tapa na minha mão. — Melhor do que o
quê?
— Melhor do que a lotação esgotada que vi no
palco. – respondo, sem pausa, porque quero dizer cada
palavra. Esta não é quem ela é, e preciso saber por que
isso acontece.
Colocando as mãos nos quadris, ela sorri, mas é o tipo de sorriso
que vai roubar sua alma. — Aqui, posso ser o que eles precisarem e ficar 259
rica fazendo isso.
— Esta não é você. – Estar tão perto dela é como um soco no
estômago. Ela parece e cheira deliciosa, e quero dar uma grande
mordida.
— Como você sabe? – ela desafia, arqueando uma sobrancelha. —
Eu era eu e veja onde isso me levou.
Touché.
— Dancei porque adorava, e sabe onde isso me deixou? Quebrada e
mal cobriu os custos. Por que se preocupar em tentar quando isso é
fácil? Eles não querem talento; eles querem me ver nua. Eles me tratam
como um brinquedo... assim como todo mundo faz.
Esta é uma facada intencional porque o que ela uma vez me disse,
sobre mim, não se aplica mais.
"Você é a primeira pessoa que me tratou como um ser humano e
não como uma coisa." Eu me pergunto o que ela pensa de mim agora?
— Isso é o que eles querem, e é fácil para eu fingir porque não
preciso sentir.
— Então você prefere ser tratada como uma prostituta? É isso? –
pergunto, terminando meu uísque e jogando o copo por
cima do ombro.
— Não sou uma prostituta. – ela resmunga entre os
dentes. Mas eu a irritei e não há como voltar atrás agora.
— Você não é? – pergunto, cruzando os braços sobre o
peito. — Você diz que não, mas o que vi esta noite prova que
Carlos comprou você.
Ela arfa, tocando o brinco de diamante em sua orelha.
— E você me chama de covarde. – concluo com desgosto. — É
260
preciso conhecer outro... Tiger.
É a calmaria antes da tempestade por cerca de cinco segundos antes
que ela dê um tapa no meu rosto. Movo meu queixo de um lado para o
outro porque ela consegue dar um golpe.
— Não era isso que você queria? O que sempre fui para você? Uma
prostituta? – ela chora, com os braços abertos.
— Não me use como desculpa. Isso tudo é por sua conta. Assuma
suas decisões, assim como eu fiz as minhas.
A pulsação latejante na lateral de seu pescoço trai sua raiva e...
excitação porque justamente quando penso que ela está prestes a me dar
um tapa novamente, ela se lança para frente e agarra meu cabelo.
Cresceu um pouco mais e ela consegue usá-lo como rédeas enquanto
puxa minha cabeça para trás.
Eu não me movo. Eu deixei ela me maltratar porque mereço. Isso é
vingança. — Certo, tudo bem. Você quer que eu seja a dona das minhas
decisões, então sou eu a dona delas.
Ela pressiona seus lábios nos meus e me beija até a morte. Ela
devora minha boca, mas não a beijo também. Não importa o quanto
eu queira, eu não quero. A falta de esforço da minha parte a enfurece.
Um suspiro gutural a deixa quando ela interrompe
o beijo, apenas para me empurrar em direção à cadeira.
Eu vou de boa vontade. Eu não vou lutar com ela... por
enquanto. Ela me empurra para baixo e eu sento,
observando enquanto ela monta em meu colo. Seus dedos
frenéticos se atrapalham com a fivela do meu cinto, mas ela
finalmente consegue abri-la.
Quando ela abre o botão superior da minha calça jeans e desabotoa
o zíper, eu a encaro intensamente nos olhos. — Pegue. – eu desafio 261
firmemente, cruzando os braços atrás das costas. — É isso que vai fazer
você se sentir melhor?
Ela quer me usar, me tratar como nada, assim como fiz com ela.
O tremor de seus lábios vermelhos faz meu pau pulsar – o bastardo
traidor.
— Isso fará com que você pare de se enganar? – Assim como fiz
quando nos conhecemos, esfrego meu polegar em sua boca e borro seu
batom. Um gemido a deixa. — Vá em frente, assuma essas decisões...
mas acredite em mim, você não vai gostar das consequências.
Meu aviso a provoca ainda mais. — Eu serei a juíza disso porque
esta decisão... – ela enfia a mão na minha calça e agarra meu pau. — É
uma que eu acho que vou gostar. Bastante.
Rangendo os dentes, me recuso a ceder e nunca quebro o contato
visual com ela quando começa a acariciar meu pau flácido. Não importa
o quanto eu queira retribuir, não o faço. Eu a quero tão agitada e cega
pela raiva que ela abandone esse disfarce e permita que seu verdadeiro
eu brilhe.
Ela me diz que está fazendo isso por dinheiro, mas não acredito
nela. Há uma razão pela qual ela deixou o The Pink Oyster. E quando
viro o rosto com um suspiro, parecendo impassível em
suas manobras para me usar, chego mais perto da
verdade.
— Porra. – ela resmunga, masturbando meu pau mais
rápido.
Se não fosse pela emoção que a traiu, eu cederia. Mas
mantenho a calma, recusando-me a olhar para ela porque, se o
fizer, não serei capaz de me controlar. Ela interpreta minhas ações como
desinteresse por ela. 262
— Você não me conhece. Não sabe de nada. – ela chora,
masturbando meu eixo rapidamente. — Tudo o que você fez desde que
nos conhecemos foi me fazer sentir uma merda.
— Então por que diabos você está masturbando meu pau como se
não se cansasse? – pergunto porque, caramba, as mãos dela são como
uma dose da droga mais potente do mundo.
— Porque quero que você saiba como é ser tratado como nada! Eu
me abri com você porque pensei que você fosse diferente. Compartilhei
coisas pessoais sobre mim, coisas que nunca contei a ninguém antes
porque eu gostava de você.
Eu paraliso instantaneamente. Ainda não entendo o porquê.
— Patético, certo? – Sua voz falha, dando lugar a tigresa que eu sei
que está enterrada sob as camadas de coisas falsas.
— Gosto de alguém que nem gosta de mim. Alguém que achou
minha torta de maçã... nojenta. – diz ela, fazendo com que me sinta um
completo bastardo porque seu sabor delicioso ainda me assombra à
noite.
— Nunca prometi nada a você. – afirmo, mas está ficando cada
vez mais difícil manter meu desejo em segredo.
— Eu sei! – Sua pequena mão se atrapalha, mas
ela nunca interrompe o ritmo, e cada movimento me leva
cada vez mais perto do inferno. — Mas pensei que talvez
quando me conhecesse, as coisas mudariam. Que talvez
alguém me visse por mim.
O tremor em sua voz, sua tristeza é um soco em minha
maldade, porque sua dor, seu sofrimento a tornam real. Meu pau
começa a endurecer e, pela primeira vez na vida, não luto contra isso.
Tiger está muito perdida em sua tristeza para perceber que estou
263
respondendo a ela e continua. — Mas você é como todo mundo. Você
joga. Bem, parei de jogar. Alguém que amo, alguém que me apoiou
durante toda a minha vida precisa de mim, e agora é a minha vez de
apoiá-la.
— Vou balançar minha bunda e ser a piranha que esses idiotas
querem, porque isso me deixa mais perto de dar o fora daqui. Só preciso
de dinheiro suficiente para comprar o instituto de balé para que Avery
possa se concentrar em melhorar. Porque ela vai... – Quando ela funga, é
o meu fim, e faço algo que não faço há muito tempo: me rendo. — Ela
vai melhorar. Ela tem que melhorar.
Virando meu rosto lentamente, encontro seus olhos, me afogando
em suas lágrimas. — Quem é Avery?
Minha voz parece trazê-la de volta ao agora, e quando ela percebe o
que está acontecendo, aquela boca pecaminosa se abre em completa
surpresa. Suas lágrimas grossas escorrem em seus lábios e, incapaz de
me conter, me inclino para frente e as lambo vagarosamente do contorno
de sua boca.
Ela chora baixinho, um arrepio a balança no meu colo.
— Quem é Avery? – eu repito, mordendo o lábio inferior.
Ela geme, com seus movimentos desacelerando.
— Ela... ela é tudo para mim. Minha professora, em
todos os sentidos da palavra. – Meu pau pulsa em sua
mão porque mal consigo me segurar. — Ela me ensinou
como dançar. Ela me ensinou como amar. Ela é a coisa
mais próxima que tenho de uma mãe, e ela está doente.
A confissão dela apenas alimenta esse momento entre nós. Não sei o
que está acontecendo, mas é tão bom. 264
— Saí do The Pink Oyster porque precisava do dinheiro, mas
também precisava... – ela treme quando me acaricia da base às pontas.
— Eu precisava me afastar de... você.
Agarrando a cadeira embaixo de mim, eu a aperto com tanta força
que ela geme sob a pressão. Mas a sua admissão é música para a minha
alma maculada. É o que eu queria ouvir desde que a conheci.
— Por quê? – pressiono, mal me segurando enquanto movo meus
quadris, encorajando-a a me agarrar com mais força e me acariciar mais
rápido.
Ela faz.
— Você me assusta... – ela confessa, me deixando em frenesi. —
Mas não da maneira que você pensa. – Antes que eu tenha a chance de
questioná-la, ela começa a se esfregar no meu pau. Eu tenho a mão dela,
a boceta dela em mim, e acho que nunca serei capaz de soltá-la.
— Você me assusta por causa da maneira como me faz sentir. – ela
revela enquanto arqueio minha cabeça para trás, a segundos de gozar em
sua mão. — Faz muito tempo que não sinto isso. Eu sei que você está
escondendo algo, algo que te consumiu e fez de você a pessoa que
você é. E mesmo que você me faça duvidar de tudo que eu pensava
que sabia, não consigo parar de pensar em você. E
quando, por um segundo, eu não o faço, você
simplesmente aparece, deixando tudo em desordem.
Achei que ficar longe de você ajudaria, mas não ajudou.
Eu só quero você... mais.
— Por quê? – pergunto novamente, sem entender nada
disso.
Ela encolhe os ombros, com sua inocência me alimentando. — Por
que o sol nasce? Por que o céu é azul? Eu não sei... eu simplesmente sei. 265
Mesmo sabendo que não deveria... eu quero. – ela conclui com tristeza.
Não aguento mais. Vim aqui em busca de respostas e as consegui.
Eu também vim aqui para outra coisa. Eu não sabia o que era, mas agora
sei. E eu quero isso. Muito... porra...
Agarrando seu pulso, eu a impeço de me masturbar, porque quando
eu gozar, não será na mão dela. — Você está prestes a ir para a cama
com o diabo. Você pode lidar com isso?
Preciso que ela seja a inteligente. Preciso que ela pare com isso
porque não posso. Mas quando ela concorda, ela sela nossos destinos.
— Vou quebrar você. – eu prometo, e não quero dizer isso apenas
no sentido físico.
Mas Tiger não vacila.
— Eu... – ela lambe os lábios. — Eu quero que você faça isso. – E
essa é toda a permissão que preciso.
Ela gosta de ter medo. Minha tigresa feroz e perversa.
Quero saboreá-la, mas não posso. Se eu não me enterrar dentro
dela nos próximos cinco malditos segundos, vou gozar. De pé, levo
Tiger comigo, levantando-a do meu colo e persuadindo-a a envolver
as pernas em volta da minha cintura.
Ela observa com olhos arregalados e excitados
enquanto eu nos conduzo em direção ao sofá. Sem aviso,
jogo-a no couro e fico diante dela. Meu zíper está na
metade e agora que estou de pé, ela pode ver meu pau
claramente.
Ela rapidamente se apoia nos cotovelos, tentando escapar,
mas é tarde demais. Não há como voltar atrás agora. — Faz muito
tempo que não faço isso. – ela confessa, com um rubor se espalhando
por sua pele macia. 266
Sua admissão me agrada mais do que deveria.
Olhando para mim com aqueles olhos grandes e inocentes, eu
desmorono. — Nem eu. – declaro, o que resulta em suas sobrancelhas
subindo até o couro cabeludo.
Quero apreciá-la, quero mesmo, mas não consigo. As vozes
danificadas dentro da minha cabeça não me deixam. Não sei “fazer
amor” porque que porra é amor? Eu posso foder, mas amor... eu não
posso.
— De quatro. – ordeno, tirando as botas e as meias.
Ela me observa como um coelhinho assustado, mas quando fico
imóvel, esperando, ela faz o que é pedido.
Lentamente, ela se vira e encara as almofadas com a bunda para
cima. Sua respiração ofegante indica que ela está nervosa, e deveria
estar. Chegando por trás dela, passo a mão por sua espinha. Um gemido
escapa dela quando seguro sua linda bunda.
Seu vestido sobe, expondo sua pequena calcinha preta. Está no
caminho. Com um puxão forte, eu a arranco dela, mas o que vejo...
puta merda. Dou um passo para trás, precisando de um ou dois
segundos.
Sua boceta rosa está nua e sua bunda é firme e
redonda. Eu quero dar uma mordida. Meu pau lateja,
desesperado por me perder nesta perfeição, desesperado
por silenciar o monstro dentro de mim. Soltando minha
calça jeans, me aproximo e deslizo dois dedos em sua boca.
Ela os chupa, sabendo o que quero. Sua língua faz círculos
ao redor deles, e quando ela morde suavemente, eu gemo porque é
exatamente o que quero. Uma vez molhados, alcanço seu quadril e enfio
meus dedos em um calor que nunca mais quero abandonar. 267
Sua boceta me acolhe profundamente, me sugando para o abismo.
Ela geme, estremecendo em torno dos meus dedos. Estou surpreso ao
encontrá-la já molhada. Dentro e fora, começo a mover e, em seguida,
circulo seu clitóris com meu polegar. Ela move contra mim, gemendo
quando não mostro piedade e a estico bem.
Eu não aguento isso. Eu preciso entrar. — As camisinhas estão lá. –
ela gagueja, apontando para uma tigela sobre a mesa. Fico enojado por
estar ao meu alcance, mas estou muito nervoso para perguntar se ela já
utilizou o conteúdo desta tigela antes.
Com os dedos ainda profundamente enterrados, estendo a outra mão
e abro a tampa, pegando uma embalagem dourada. Trazendo-a à boca,
rasgo a embalagem e, sem pausa, rolo-a no meu pau. Tirando os meus
dedos para fora da sua boceta, agarro-lhe os quadris e lentamente puxo-a
para trás para o meu pau.
Centímetro por centímetro, ela me leva para dentro dela, e
centímetro por centímetro, eu morro uma pequena morte. Ela é tão
apertada, tão incrivelmente apertada, e sinto seus músculos se esticando,
ajustando-se ao meu tamanho.
— Ah, Deus. – ela geme, agarrando o topo do sofá com uma mão
enquanto apoia a outra contra a parede para se apoiar.
Seus apelos alimentam minha corrupção, e a
penetro, um gemido gutural me escapa. A força a
empurra para frente.
Estou tão profundamente dentro dela; Preciso de um
momento para processar esta realidade surreal. Faz muito
tempo que não estou com uma mulher. Esqueci como parecem,
esqueci como têm a capacidade de transformar um homem em
selvagem. Isso é um maldito êxtase. 268
Agarrando seus quadris, começo a fodê-la com força. Ela move
contra mim, gemendo e se contorcendo. Cada vez que eu saio, seu corpo
estremece, recebendo-me de volta enquanto eu a penetro. Sua boceta me
suga, o calor, a suavidade são uma droga para mim. Eu não consigo o
suficiente. Coloco meu pé no sofá para penetrá-la em um ângulo mais
profundo.
— Porra! – ela grita, ainda rasgando o sofá em pedaços.
Pelos sons que emana dela, ela parece estar se divertindo, mas algo
toma conta de mim e me pergunto se estou fazendo certo. Duvido que o
ato de foder tenha mudado desde que fui preso, mas me pergunto se está
bom. Com certeza está bom para mim.
Não consigo evitar. As dificuldades da vida alimentam minha
depravação porque gosto de infligir dor. Isso me tira do sério. Nunca fui
santo, sempre pecador. E minha Tiger é o mesmo.
Ela me acompanha estocada por estocada, voltando para mim
enquanto eu a penetro. Não me canso e enrolo seus longos cabelos em
volta do meu punho, puxando sua cabeça para trás. Ela geme, ficando
relaxada enquanto cravo meus dedos em sua cintura e continuo a
fodê-la até perder os sentidos.
Estou a tendo, possuindo-a, e ela me permite.
Paralisado pela visão do meu pau penetrando em sua
boceta, diminuo meu ritmo, observando a maneira como
nos unimos como um só. Ela é linda, em todos os lugares.
E não posso deixar de sentir que estou contaminando essa
beleza.
Agarrando sua bunda, eu a abro e gemo quando ela afunda
em meu pau, gemendo em êxtase absoluto. — Ah, Bull. – ela
geme, desesperada para que eu preste atenção em seu clitóris, mas não
presto. Eu não quero que isso acabe nunca. 269
Ela cai sobre os cotovelos e levanta a bunda mais alto no ar. Quase
gozei ali mesmo porque estou tão profundamente dentro dela que não sei
onde termino e ela começa. Ela é tão flexível, seu corpo de dançarina é
ágil e forte.
Continuo fodendo ela, com cada movimento me sugando
profundamente. Nesse estágio, Tiger está mole, entregando tudo o que
tem para mim. Estou tão tenso com sua submissão e bato em sua bunda
com força. A marca vermelha da mão que deixo é apenas mais um passo
mais perto da minha morte. Ela alcança entre as pernas e começa a
esfregar o clitóris. Eu dou um tapa, extraindo sua gratificação.
— Por favor. – ela geme. — Deixe-me gozar.
— Não até você me dizer que vai voltar para o The Pink Oyster. –
Minha voz está cheia de desejo e isso me surpreende. Já faz muito tempo
que não me importo com nada.
— Não.
Sua recusa me fez descontar em sua bunda enquanto batia nela
novamente. Ela avança com a pressão, mas ainda não cede.
— Tiger, não me faça machucar você.
— Você não vai. – ela desafia, o que faz meus
demônios rugirem à superfície, prontos para provar que
está errada. Mas estou aprendendo que minhas ameaças
apenas a estimulam. Ela gosta do perigo, do medo – isso a
excita.
Entrelaçando meus braços nos dela, eu a puxo para cima.
Mantendo as mãos dela atrás dela, eu a brutalizo da maneira
mais deliciosa. Ela está presa, com a inclinação de sua coluna
acentuando sua bela bunda suculenta. Imagens de profanação me
atingem e fico possuído enquanto fodo ela sem pedir desculpas. 270
Nossos corpos estão escorregadios e os ruídos são primitivos. Tiger
está assumindo o controle de minha mente, corpo e alma. Estou fodido -
de todas as maneiras literais que existem.
— Você está indo embora daqui. Essa noite.
— Vá... se... foder. – Antes que eu tenha a chance de repreendê-la
novamente, ela arqueia as costas e move os quadris, antes de bater em
mim e me mostrar quem diabos está comandando esse show. — A única
coisa que farei esta noite é... gozar.
Ela joga a cabeça para trás, com o cheiro de flores de cerejeira me
envolvendo, antes de Tiger gritar e um tremor que sinto até minhas bolas
balançar seu corpo. Ela fode meu pau, com sons de prazer saindo de
seus lábios.
De repente, é demais, porque o conhecimento de que ela goza por
minha causa - de eu causar prazer, não dor - me leva ao limite, e com
duas estocadas rápidas, gozo em ondas de carnalidade absoluta. Isso não
para, e meu corpo vibra com tanta força que deixo marcas na pele de
Tiger enquanto a agarro antes de tirar.
Estou sem fôlego, grudento e meu corpo é um fio elétrico, mas
quando Tiger afasta o cabelo para o lado e olha para mim por cima do
ombro, é como uma onda elétrica direto para o meu
coração. Suas bochechas coradas e o olhar saciado em
seus olhos me fazem desistir rapidamente. Ela parece...
feliz, feliz por minha causa.
À medida que as paredes começam a se fechar sobre
mim, sei que preciso me separar.
Tirando a camisinha, jogo-a na lata de lixo e visto minha calça
jeans. Não consigo sair daqui rápido o suficiente. Posso sentir os olhos 271
de Tiger em mim, mas ela não diz uma palavra. Este é um movimento
totalmente idiota, mas não consigo respirar. Eu preciso de ar. Não sei o
que há de errado comigo.
— Obrigado. – eu consigo dizer enquanto pego minhas botas, sem
nem me preocupar em calçá-las antes de sair pela porta.
Corro pelo corredor, ignorando os olhares de todos porque estou a
segundos de enlouquecer. Viro o corredor e, quando esbarro na única
pessoa que nunca esperei ver, a confusão do que acabei de fazer me
atinge.
O maldito Andre está aqui e claramente está trabalhando no clube.
Normalmente não me importaria, mas algo sobre ele estar aqui me
incomoda. No entanto, posso lidar com isso amanhã. Agora preciso ir.
Passando por ele, desço os degraus da frente e, no momento em que
meus pés tocam a calçada, respiro novamente.
272

Não estava esperando um buquê. Ou chocolates. Mas eu estava


esperando algo... mais.
Já se passou uma semana desde que Bull entrou no trabalho, me
irritou além das palavras, mais uma vez, e então me deu o melhor
orgasmo da minha vida. Eu sei que foi errado. Quer dizer, eu estava com
raiva dele. Eu sempre estou. Mas algo tão errado parecia tão certo, e
não consigo explicar por que isso acontece.
Ele saiu correndo da sala porque estava com medo.
Eu deveria estar brava, mas não estava. Ao sair
daquele jeito, ele me mostrou que também sente o que
quer que seja. Ele me afastou esse tempo todo e preciso
saber por quê.
Eu acreditava que ceder ao que queria desde que coloquei
os olhos nele pela primeira vez teria me permitido seguir em
frente, mas isso não aconteceu. Fiquei com mais perguntas. Pensei
que ele pelo menos faria o check-in, mas não o fez, e é por isso que
estou sentada na minha caminhonete no estacionamento do Hudson’s 273
Motel.
Estou estacionada do lado de fora do quarto dele há dez minutos e,
embora cada parte de mim esteja gritando para simplesmente ir embora,
abro a porta e respiro fundo. Está congelando, mas minhas mãos
começam a suar enquanto ando em direção ao quarto dele.
Uma mulher, independente do frio, com vestido justo com estampa
de chita sai do quarto ao lado do dele, com um desentupidor na mão.
Quando me vê, paraliso instantaneamente, sentindo como se tivesse sido
pega fazendo algo errado. — Posso ajudar? – ela pergunta, arqueando
uma sobrancelha desconfiada.
— Eu, estou aqui para ver um amigo. – eu consigo dizer.
— Bull? – ela pergunta, fechando a porta.
Eu aceno rapidamente.
— Ele não é o garoto popular desta manhã?
— O que você quer dizer?
— Uma mulher está lá com ele agora. – ela aponta para o quarto
dele com um sorriso. — Ela tinha algemas, então você sabe... ele
pode demorar um pouco.
Minhas bochechas coram por vários motivos
diferentes.
— Não que eu possa culpá-la. – ela abana o rosto
dramaticamente. — Nada além de problemas segue
homens como ele.
— E eu não sei? – murmuro baixinho.
Ela cai na gargalhada. — Tenha cuidado, querida. Ele é tóxico…
mas da melhor maneira possível. Eu sou Venus. Administro este lugar. – 274
ela oferece a mão, resolvendo o mistério de quem ela é.
Bull a mencionou quando se ofereceu para ligar para ela e ver se ela
tinha algum quarto vago para eu ficar. Naquele momento, pensei que ele
estava sendo rude. Mas agora vejo que ele estava com seu jeito estranho
e socialmente desajeitado, tentando ser legal.
— É um prazer conhecer você, Venus. Eu sou Lílian.
— Bem, senhorita Lily, nós, garotas, temos que ficar juntas quando
se trata de homens assim. – ela aponta o polegar para o quarto quatorze.
— Boa sorte.
Não posso deixar de sorrir porque gosto instantaneamente de Venus.
Ela não é de conversa fiada e, neste mundo, isso é uma mudança
revigorante. Meu bom humor não dura, porque quem diabos está no
quarto do Bull?
Com apenas uma maneira de descobrir, vou até a porta dele e bato
nela com força. Quando não abre, continuo batendo o punho na madeira.
Pelo menos um deles não está algemado, então alguém pode abrir essa
maldita porta.
Assim que penso em chutá-la, a porta é aberta e diante de mim
está um Bull irritado. Preciso de um momento para processar o que
vejo, porque sua cara de vadia em repouso está correta;
porém, embora na maioria dos dias ele pareça
indiferente, o que o torna o mestre da cara de vadia em
repouso, esta manhã ele está realmente irritado.
Para alguém que deveria estar no meio de uma
brincadeira pervertida, ele não parece estar se divertindo. O
fato me agrada além das palavras.
— O que você está fazendo aqui? – ele diz, passando a mão pela
cabeça. Seu cabelo cresceu desde que o conheci, e a cor escura apenas 275
enfatiza o brilho de seus olhos únicos.
— Olá para você também. – respondo, tentando passar por ele, mas
ele bate a mão na porta, impedindo-me de entrar em seu quarto.
— Agora não é um bom momento. Você precisa ir.
— Muito grosseiro? – Eu, mais uma vez, tento passar por ele, mas
ele permanece firme e eu bato direto em uma parede de músculos.
Minha respiração acelerada denuncia o que estar tão perto dele está
fazendo comigo. Imagens dele atrás de mim, segurando minha cintura
enquanto pegava o que eu dei livremente me fizeram molhar os lábios
nervosamente.
— Podemos conversar depois? Estou meio que no meio de alguma
coisa. – diz Bull, interrompendo minha viagem pela estrada da memória.
Tenho certeza que sim, e é por isso que empurro seu peito e entro
em seu quarto, me preparando para chicotes e correntes. Eu não vejo
nada disso. O que vejo é uma mulher bem vestida encostada na cômoda,
longe da dominatrix que eu imaginava.
Eu paraliso, sem ter certeza do que acabei de encontrar.
Um suspiro frustrado deixa Bull antes de fechar a porta.
A mulher não perde tempo e estende a mão. —
Olá, sou Franca Brown. E você é?
Caminhando em direção a ela, eu a agito. — Lily. –
Seu aperto é firme e prático, e me pergunto quem ela é.
Ela é linda, de uma forma assustadora.
— Lillian do que?
— Lillian Hope. – respondo, sentindo de repente a necessidade de
dar meu nome completo. 276
— Como você conhece Bull?
Parece que Franca não acredita em conversa fiada. — Trabalhamos,
trabalhamos juntos. – eu corrijo.
Bull está ao meu lado, de braços cruzados. Franca não está aqui
porque ele pediu.
— Trabalhando? Você trabalhou no The Pink Oyster?
Concordo com a cabeça, sentindo de repente como se estivesse sob
interrogatório.
— Você fica despida? – ela pergunta, inclinando a cabeça para o
lado.
A raiva toma conta de mim porque sua pergunta está cheia de
julgamento. — Não, eu dancei. – respondo, nem um pouco intimidada
por ela.
— Então é uma stripper? – ela está fazendo isso para me irritar?
— Não. – afirmo com firmeza, colocando as mãos nos quadris. —
Sou uma dançarina.
Pelo canto do olho, noto Bull escondendo sutilmente um sorriso
por trás da palma da mão.
Franca franze os lábios, sem apreciar minha
atitude. — Quando você parou de trabalhar no The Pink
Oyster?
Agora estou realmente sob investigação, ao que parece.
— Por que isso é da sua conta?
Franca não gosta quando a situação é o contrário. — Porque tudo
que envolve Bull é da minha conta. 277
Bull contrai a mandíbula, o único sinal de que ele está inquieto.
— Por quê? O que você é? A mãe dele?
Era para ser uma piada, mas a piada é minha quando Franca
responde sem pausa: — Não, na verdade sou a agente de condicional
dele.
Minha confiança despenca quando sinto que ela acabou de me
encharcar com um balde de água fria.
Agente de condicional... isso significaria que Bull está em liberdade
condicional, o que significa que ele estava... na prisão.
Que porra é essa?
Franca não me dá chance de me recuperar da bomba que acabou de
lançar. — É meu trabalho garantir que ele não se meta em problemas e
sou muito boa no meu trabalho, Srta.
Concordo com a cabeça inutilmente, ainda tentando levantar meu
queixo do chão.
— O que se diz nas ruas é que existe uma organização de lutas
ilegais operando bem debaixo do meu nariz. Eu queria ter certeza de
que Bull não sabia de nada sobre isso, porque se soubesse, as coisas
poderiam acabar muito mal para ele.
— Eu disse que não. – diz ele, sem se preocupar em
esconder sua irritação. Mas ele está mentindo. Ele com
certeza sabe porque estava lutando nisso.
Isso explica por que ele escondeu o rosto atrás daquela
máscara. Ele não poderia expor sua identidade porque sua
bunda estaria em risco se ele fosse pego. É tão perigoso que me
faz adivinhar que ele está fazendo isso por dinheiro. Eu o vi lutar. Ele é
bom. É dinheiro fácil para ele. 278
Mas parece tão arriscado. Não consigo afastar a sensação de que ele
está fazendo isso por outro motivo. Posso teorizar mais tarde, no
entanto.
— E eu lhe disse que vou sair da sua frente quando você me contar
onde estava na noite do dia dois do mês passado. Sei que você ligou
dizendo que estava doente. Então, onde você estava? – Franca o encara
com um olhar desafiador.
Ela não acredita nele.
A respiração de Bull não altera e ele está perfeitamente imóvel, mas
o que sei agora explica muita coisa. Às vezes, parecia que ele era de
outro planeta porque não tinha noção das coisas do dia a dia. Ele é
socialmente desajeitado por um motivo, e isso porque ele esteve na
prisão, onde só posso imaginar que ser social demais significava ser
morto.
E ele vai voltar para lá se alguém não lhe der um álibi, porque no
dia dois ele estava lutando.
— Ele estava comigo. – afirmo com confiança.
Franca pisca uma vez, incapaz de esconder a surpresa. — Tem
certeza?
Balançando a cabeça casualmente, não quero
parecer muito ansiosa ao responder: — Sim, claro. Ele
esteve comigo a noite toda. Não é mentira porque eu
estava com ele.
Franca enfia a mão no bolso interno da jaqueta, tirando
um pequeno bloco de notas e uma caneta. — E o que você fez?
— Meu filho teve uma festa do pijama com um amigo, então
convidei Bull. Assistimos alguns filmes, fomos dormir. Nada muito 279
emocionante.
Franca anota tudo, mas a pressão firme de seus lábios indica que ela
não está feliz com o que contei. — Então foi tudo o que você fez?
Não sei por que tenho esse instinto de protegê-lo, mas quando me
lembro de todas as vezes em que ele me protegeu, percebo que é porque
ele esteve ao meu lado. E agora é hora de retribuir o favor. — Uma
dama nunca conta.
Franca arqueia uma sobrancelha arrogante, me vendo como nada
além de uma prostituta, ao que parece, porque minha ocupação justifica
tal julgamento. Já é hora de agir como tal.
— Mas se você realmente precisa saber... ele, aspas, me fodeu a
noite toda. Fecha aspas. Sinta-se à vontade para escrever isso. – Aponto
para seu pequeno bloco de notas com um sorriso sarcástico.
Bull dá uma risadinha quando Franca fecha seu bloco de notas,
enfurecida. — É tudo por agora. Entrarei em contato, Srta. Hope.
— Sem problemas. Vou tirar a roupa na maioria dos dias, então se
precisar de mim, é melhor ligar primeiro. – Cruzo os braços sobre o
peito. Ela não é nada para mim, e não vou ficar parada e permitir que
alguém me faça sentir uma merda pelo que faço para viver.
Franca não aprecia minha atitude. — Vejo você
em breve. – ela diz a Bull, que acena com a cabeça. —
Eu vou embora.
Não ouso me mover e só quando a porta se fecha é
que respiro novamente.
O quarto emana uma tensão silenciosa. De repente, fico
com pernas moles e caio na ponta da cama. Fluffball se encolhe
ao meu lado. Dou um tapinha nele, precisando de um momento para
organizar meus pensamentos antes de poder olhar Bull nos olhos. 280
— Por que fez isso? – Sua pergunta está cheia de confusão
completa.
Respirando fundo, eu olho para ele por baixo dos meus cílios. — Os
detalhes técnicos podem estar um pouco errados, mas eu estava com
você.
— Esses detalhes técnicos de que você fala... – ele cruza lentamente
os braços sobre o peito largo. — Podem causar muitos problemas.
Encolhendo os ombros, me apoio nas mãos, desesperada para
discutir algo muito mais importante. — Você não me disse que estava na
prisão.
Sua mandíbula está tensa. Mas ele deve ser capaz de ver minha
determinação. — Não é exatamente um começo de conversa.
— Suponho que não, mas explica muita coisa.
— É? – ele pergunta desconfiado.
Assentindo, respondo: — Na maioria das vezes, parece que você é
de um planeta diferente. Agora eu sei por quê. Quanto tempo você
ficou na prisão?
Sei que é uma pergunta pessoal, mas fizemos sexo, então acho
que posso perguntar isso sem me sentir uma
bisbilhoteira.
Bull aperta os bíceps e depois descruza os braços. —
Doze anos.
Ele não quer dar mais detalhes, mas continuo
pressionando. — O que você fez?
Ele me olha diretamente nos olhos e, sem pausa, revela
inexpressivamente: — Eu matei alguém. 281
Meu rosto de repente fica quente, meu corpo inteiro queima da
cabeça aos pés. É lento no começo, mas quando processo o que Bull
acabou de compartilhar, imagino minha carne pegando fogo.
Não há como esconder meu horror pelo que acabei de ouvir. Bull
me disse que ele era mau, mas eu não achava que esse pecado envolvia
tirar a vida de outra pessoa.
— Ainda quer jogar vinte perguntas? – ele zomba, mas por trás de
seu sarcasmo, posso ouvir o desgosto em sua voz. Há mais nesta
história, mas sempre há com Bull.
— Eles mereceram isso? – pergunto baixinho, sem saber por que
isso faz diferença. Ele matou alguém. Essa deveria ser minha deixa para
ir embora e não olhar para trás. Mas não, e isso é porque penso em todas
as vezes que ele me salvou.
Sim, isso é algo enorme, mas isso define quem ele é? Eu não acho
que isso aconteça. Ele nunca me julgou e darei a ele o mesmo respeito.
Bull estreita os olhos e me pergunto o que vê. — Sim, ele mereceu.
E se eu pudesse voltar, eu o mataria novamente.
Eu queria honestidade, e Bull simplesmente me entregou isso.
Não sei como me sentir. Sei que deveria estar com
medo, enojada, mas não estou. O que isso diz sobre
mim? — Por que você o matou?
Bull balança a cabeça, virando o rosto. Ele estava
esperando que eu fugisse e me escondesse? Ele está
enganado se estava. — Por que alguém faz alguma coisa?
Sem saber o que ele quer dizer, observo com a respiração
presa enquanto ele caminha lentamente em minha direção. —
Autorrealização. – ele para a poucos metros de distância, analisando
cada centímetro de mim. — Vingança. – ele se inclina para frente, tão 282
impossivelmente perto, apenas para dar um tapinha em Fluffball antes
de se virar e me olhar nos olhos. Estamos quase cara a cara. — Amor. –
ele finalmente conclui.
— O que ele fez pra você? – sussurro, com o meu lábio inferior
tremendo.
Os olhos de Bull abaixam para minha boca e, com um sorriso
malicioso, ele responde: — Não foi o que ele fez comigo. Foi o que ele
fez com alguém que eu amava.
Seu raciocínio agora faz sentido. Não pretendo entender porque não
conheço a história completa, mas, neste caso, dois erros fazem um
acerto? Assassinato nunca é a resposta. No entanto, por que não olho
para Bull como um assassino, porque é isso que ele é?
— Por que está lutando? – pergunto, incapaz de afastar a sensação
de que tudo isso está conectado. — É uma violação da sua liberdade
condicional.
Bull me surpreende quando segura meu queixo com firmeza. Ele
não é rude. Ele está provocando. — Você é inteligente demais para o seu
próprio bem.
Mantenho a minha posição, recusando-me a ser intimidada. Eu
conheço seus segredos, bem, alguns deles. Não sei o
que poderia ser pior do que o que ele acabou de me
dizer. — Então você pode muito bem me contar a
verdade porque vou descobrir o que você está fazendo.
Bull respira fundo, como se estivesse respirando para
se acalmar. — Talvez outro dia. – ele passa o polegar pelo
meu queixo e depois me solta.
Sentando sobre minhas mãos para impedi-las de tremer, sussurro:
— Você sente algum remorso por matar aquele homem? 283
— Não. – ele responde, parando.
— Você... você... mataria de novo? – Emendando, preciso conhecer
todos os lados desta história complexa.
Ele pondera sua resposta, mas sei sua resposta antes mesmo que ele
responda. — Sim.
Arfando, não sei o que dizer ou pensar. Esta é uma virada de jogo;
esse é o motivo para eu ir embora e nunca mais voltar. Pedi honestidade
e Bull me deu isso. Agora é minha escolha o que fazer com essas
informações.
Quando meu olhar se volta para o relógio na cômoda de cabeceira,
de repente percebo que só há uma escolha a fazer. — Merda! Eu tenho
que ir.
Dando um pulo, verifico meu corpo, me perguntando onde coloquei
minhas chaves. Bull suspira, mas se afasta, abrindo caminho até a porta.
Quando percebo sua expressão pensativa, rapidamente recuo. — Estou
atrasada para o trabalho. – esclareço, pois não quero que minha saída
pareça que estou correndo para as montanhas. — Tenho uma aula de
balé.
Ele acena com a cabeça, mas não parece acreditar em mim.
— Você quer vir assistir? – Não tenho ideia do
que me deu para perguntar isso a ele, mas é tarde demais
para rescindir o convite.
Espero que ele diga não, mas quando ele reflete sobre
a oferta e eventualmente concorda, não consigo esconder a
surpresa do meu rosto. — É para crianças em idade pré-
escolar. Só para você saber.
Bull não parece incomodado por ficar entediado até a morte
enquanto pega sua jaqueta de couro do encosto de uma cadeira. — 284
Vamos então.
Minhas entranhas dão um pequeno salto porque ninguém jamais
demonstrou interesse em minha dança antes. Os poucos caras com quem
namorei se desligaram brevemente sempre que eu falava sobre trabalho.
Este é um território novo para Bull e para mim.
Encontrando minhas chaves no lugar mais óbvio – minha bolsa –
saio pela porta, não querendo que minha felicidade apareça. Isso não é
grande coisa. Ele está vindo porque pedi. Não é um encontro. Ele
acabou de me dizer que mataria de novo, pelo amor de Deus. Preciso
parar com a fantasia de felizes para sempre.
Venus está empurrando um carrinho pelo corredor. Quando ela vê
Bull e eu, ela me dá um aceno atrevido. Se ela soubesse o que realmente
estava acontecendo no quarto dele.
Quando estamos na caminhonete, piso no acelerador algumas vezes
porque minha caminhonete precisa de um pouco de amor e carinho no
tempo frio. Ela dá a partida depois de três tentativas, e estou entrando na
rodovia. O rock soa baixinho no rádio, parecendo amplificar o silêncio
dentro da caminhonete.
— Há quanto tempo Andre trabalha no seu clube? – Não é
exatamente o início de conversa que eu esperava, mas é algo que
quero discutir com ele.
— Ele estava lá quando comecei. – eu revelo,
mantendo os olhos na estrada.
— O que está errado?
Bull pode me ler como um livro.
Apertando o volante, respiro fundo, esperando que isso me dê ar
suficiente para confessar minhas verdades. — Eu acho... acho que foi ele 285
quem me atacou naquela noite.
Há um silêncio mortal.
Arrisco uma rápida olhada em sua direção para garantir que ele
ainda está vivo.
— Por quê? – É sua pergunta simples.
— Lembro-me de pensar que os olhos do meu agressor pareciam...
familiares. Quando vi Andre no Blue Bloods, reconheci onde os tinha
visto antes.
— Filho da puta. – Bull xinga baixinho, com seu punho cerrando
em sua coxa. — Eu deveria ter tirado a máscara de esqui dele.
Não deixo de perceber seu arrependimento. — O que acha que isto
significa? Por que ele faria isso? Não fiz nada que pudesse fazê-lo
querer me matar. – Logo selo meus lábios quando percebo o que acabei
de dizer.
Depois do que Bull revelou, decido reduzir ao mínimo a conversa
sobre assassinato.
— Isso significa que Carlos fará de tudo para que você trabalhe
no clube dele.
— O que? – pergunto em descrença.
Quando ele não responde, faço um som de
desaprovação. — Você não pode estar falando sério? –
Mas é mais do que óbvio que ele está. — Isso não faz
sentido. Sim, Carlos está me perseguindo. Mas chegar a
esses extremos para me recrutar é ridículo.
— Funcionou, não foi?
Estou prestes a discutir, mas ele está certo.
Embora o ataque não tenha sido o fator decisivo, teve um papel
286
importante na minha decisão de partir.
— Andre quase me matou. – digo, tirando a imagem da minha
mente. — Você viu isso.
— Carlos claramente quer que você fique com medo.
Virando-me para olhá-lo brevemente, posso ver que ele não me dirá
nada. Ele não é o único que consegue ler a linguagem corporal.
— O que você sabe sobre Carlos? – ele pergunta.
Os brincos queimam minha carne porque nunca tive a chance de
devolvê-los ao Carlos. Decidi usá-los porque no Blue Bloods, quando
você se veste como uma dançarina da classe alta, você é tratada dessa
maneira.
— Ele é apenas mais um idiota rico que gosta de pensar que é dono
das pessoas. Por quê?
— Tenha cuidado perto dele. Algo está errado em toda essa
situação. Eu simplesmente não sei o que é. Ainda.
— Ainda? – Olho para ele e balanço a cabeça. — Por favor, não.
Eu preciso do dinheiro. É só por alguns meses. – acrescento quando
ele não parece abalado. Omiti o fato de ter assinado um contrato de
um ano.
— E não está curiosa para saber por que Carlos
tomaria as medidas que ele tomou?
Refletindo sobre sua pergunta, mantenho meus olhos
para frente, com medo do que verei nele. — Claro que estou.
Mas às vezes... você tem que pensar em como suas ações
afetarão outra pessoa.
Estou esperando que Bull brigue comigo, mas recebo exatamente o
oposto. 287
Ele não diz uma palavra.

Minhas alunas ficam distraídas em um dia bom. Seja uma mosca na


parede ou as fitas nas sapatilhas de balé, ensinar crianças em idade pré-
escolar é difícil. Adicione um bad boy tatuado e posso muito bem estar
ensinando sozinha.
— Mandy. – eu bato palmas levemente, tentando chamar a atenção
dela. Mas seus grandes olhos azuis estão focados em Bull, que está
sentado no canto da sala.
Eu ia deixá-lo do lado de fora para esperar com as mães e os pais,
mas quando eles voltaram a atenção para ele, decidi salvá-lo dos olhares
de julgamento e permiti que ele entrasse. Ele ficou sentado em silêncio,
mas senti seus olhos em mim. Cada movimento, cada respiração – ele
reuniu todos eles.
Olhando para o relógio na parede, decido terminar a aula alguns
minutos mais cedo porque hoje foi uma perda de tempo. As crianças
não paravam de olhar para Bull. Aposto que elas nunca
viram alguém como ele antes. Seus pais não se
associariam com alguém como ele. Nem fariam isso
com alguém como eu se soubessem o que faço além de
ensinar balé para seus filhos.
— Todo mundo se saiu muito bem hoje. Vejo vocês na
próxima semana. – Desligando a música, abro a porta e me
preparo para a debandada dos pais.
Enquanto estou arrumando a sala, Pamela, uma das mães, vem até
mim. Já sei o que ela vai dizer antes de abrir a boca. — Lily, posso falar 288
com você bem rápido?
— Claro. – respondo, recolhendo as fitas de arco-íris do chão.
— Não quero parecer rude, mas quem é esse homem? – ela tenta ser
discreta enquanto gesticula com a cabeça em direção a Bull. Ela falha
miseravelmente.
— Esse é meu amigo. – digo, levianamente.
— Ah. Bem, alguns pais e eu estávamos nos perguntando se talvez
ele não devesse estar na sala quando você estiver ensinando.
Recolhendo o último pedaço de fita, olho-a diretamente nos olhos.
— Por que não?
Seus olhos se arregalam quando fica surpresa com minha franqueza.
— Ele estava, hum, distraindo as crianças. – ela nem tem coragem de me
dizer a verdade.
— Pamela, elas ficam distraídas com o ar. Elas são crianças. Elas
vivem suas vidas distraídas.
Ela nervosamente puxa suas pérolas. — Ele parece um criminoso.
– ela sussurra por trás da mão, finalmente revelando seus verdadeiros
sentimentos. Tecnicamente, ele é, mas decido não compartilhar esse
fato.
Olhando por cima de sua cabeça, olho para Bull,
que está sentado calmamente, mas está ciente do que está
acontecendo. — Você não deve julgar um livro pela capa.
– Embora eu esteja, e essa capa esteja me incendiando.
Voltando minha atenção para ela, sorrio docemente. —
Quero dizer, o que a sua capa diz sobre você? – Não escondo
minha avaliação de seu rosto tenso e cheio de Botox e lábios infláveis.
Ela lê o claro foda-se e se vira bufando.
289
Eu não ligo. Quando eu substituir Avery, este lugar vai mudar. Será
uma escola de elite para qualquer um. Todos serão bem-vindos.
A sala logo fica vazia, mas não antes de Kylie, uma das minhas
alunas favoritas, ir até Bull e falar com ele. Tenho que silenciar minhas
risadas atrás da palma da mão porque ele parece tão indisposto que ela
está falando com ele. Quando ele responde algo a ela, ela sai correndo,
segurando a mão do pai. Ele sorri para mim ao sair pela porta.
Quando estamos sozinhos, fecho a porta e abro as persianas. —
Desculpe se isso te aborreceu. – digo levemente, de repente precisando
preencher o silêncio.
— Não aconteceu. – responde Bull, recostando-se e cruzando o
tornozelo sobre o joelho. Ele parece estar me dizendo a verdade. Será
que ele é um fã de balé enrustido?
— O que Kylie disse para você? – pergunto, parando no meio da
sala.
Algo está acontecendo por trás daqueles olhos hipnóticos. — Ela
perguntou se meus desenhos desaparecem. – Quando franzo os lábios
em confusão, Bull olha para seu braço tatuado. Ele tirou a jaqueta de
couro, então seus braços ficam à mostra enquanto veste uma camiseta
branca.
Kylie estava se referindo às tatuagens dele. — E o
que você disse? – pergunto, rindo.
Bull encolhe os ombros. — Eu disse a ela que era tinta
invisível e só ela conseguia ver porque era a melhor bailarina
da turma.
Minha risada logo desaparece porque não esperava que ele dissesse
algo tão... gentil. 290
Agora é a vez dele fazer perguntas. — O que a mãe de família de
plástico disse para você?
Minha interação não foi tão agradável quanto a dele. — Ah, nada. –
eu tento apelar, mas Bull consegue adivinhar.
— Ela está certa. Eu não deveria estar aqui.
— Como você sabia? – pergunto com admiração. Não era como se
ele pudesse ler os lábios dela porque Pamela estava de costas para ele.
Sim, o que ele me disse hoje muda as coisas, mas eu não estava
colocando minhas alunas em risco. Ele nunca iria machucá-las. Seu
comentário para Kylie apenas confirma isso.
— Porque alguém como ela vê alguém como eu como nada além de
lixo.
— Bem, ela pode ir se foder. – respondo, saindo em sua defesa. —
É por isso que este lugar mal está de pé. O balé não deveria ser apenas
para aqueles que acham que têm direito a isso. Deveria ser para todos. E
será quando eu assumir.
A expressão impassível de Bull está em jogo, então ele me pega
de surpresa quando diz: — Dance para mim.
A minha não é porque ele me pegou
completamente desprevenida. — Dançar para você?
Bull assente uma vez, passando os dedos pela barba
espessa.
— Você me viu dançar. – afirmo, com as minhas
bochechas esquentando.
Mas não é isso que Bull está pedindo. — Dance porque você quer,
não porque você precisa. – ele se recosta na cadeira, indicando que o 291
chão é meu.
De repente estou nervosa, mas não sei por quê. Balé é meu lugar
feliz. Mas com Bull sentado a poucos metros de distância, com os lábios
curvados em uma inclinação diabólica, temo que meu lugar feliz esteja
prestes a ser contaminado pelo diabo. Mesmo assim, vou até o iPod e
escolho uma música que parece adequada para Bull e para mim.
Parada na frente dele, espero a introdução começar e, quando isso
acontece, danço como se um monstro estivesse atrás de mim. Escolhi
“Animals” do Maroon 5, não uma música tradicional para fazer uma
coreografia de balé, mas tudo que preciso é de uma batida para me
perder.
Incorporo todos os passos do balé que aprendi ao longo dos anos,
mas agito os passos com alguns movimentos contemporâneos. Quando
danço, sou a bateria, as guitarras e o baixo, usando cada som e ritmo
como uma extensão do meu corpo.
Levantando os braços, faço uma pirueta, ficando na ponta dos pés
enquanto uso as sapatilhas de ponta. Cada parte de mim dói, mas dói
muito, refletindo o que sinto por Bull. Dançar para ele é como dançar
diante de um público de milhares de pessoas.
A adrenalina percorre através de mim, animando meu corpo
como se eu estivesse possuída. E de certa forma,
suponho que sim. Quando se trata de Bull, algo me
domina e não sei o que é. Uma entidade estranha entra em
mim, jogando o bom senso ao vento.
Posso sentir os seus olhos sobre mim, observando-me de
perto enquanto executo um balé exclusivamente para ele.
Dançar para ele me dá uma sensação inexplicável de confiança.
Ele já me viu dançar antes, mas isso é diferente. Isto é quem eu
realmente sou. Não consigo me esconder atrás do meu balé porque todas 292
as emoções confusas explodem em mim.
Termino a coreografia com os braços levantados na quinta posição.
Minha respiração está ofegante e estou coberta de suor, o que apenas
alimenta essa energia pulsante dentro de mim. Encontrando os olhos de
Bull, espero que ele diga alguma coisa, mas em vez disso, ele se levanta
lentamente.
Ele caminha em minha direção com um passo lento e confiante, e eu
reprimo meu desejo e espero pelo que vem a seguir. Quando está ao meu
alcance, ele para, inclinando a cabeça para o lado, devorando cada
centímetro de mim. Ele exala enquanto desata o elástico em volta do
meu coque. Meu cabelo cai solto, caindo em volta do meu rosto corado
enquanto minha respiração não diminui.
Passando os dedos pelo meu cabelo, ele puxa minha cabeça para
trás, expondo todo o meu pescoço para ele. De repente me sinto como se
fosse sua próxima refeição. E é exatamente isso que eu sou.
Ele nos leva até a barra e me gira violentamente. Não preciso pensar
nem respirar quando ele me inclina sobre a barra e fica de joelhos atrás
de mim. Seus dedos movem habilmente enquanto ele levanta minha
saia transparente, afasta minha malha e enterra o rosto entre minhas
pernas.
Gritando, tento escapar porque estou toda suada,
mas Bull me mantém prisioneira quando lambe meu
sexo com uma lambida quente. Gemendo, esqueço a
minha timidez e me perco na sensação dele devorando
minha carne molhada.
Sua boca e língua movem em uníssono, me devorando
com uma possessão selvagem. Ele enfia a língua profundamente,
gemendo quando balanço de volta em seu rosto, sem controlar meu
corpo porque já faz muito tempo que alguém caiu em cima de mim. 293
Agarrando minhas pernas, ele as abre, me abrindo ainda mais.
Minha malha está no caminho, mas a barreira só torna o que
estamos fazendo ainda mais quente. Inclinando-me para frente, minha
coluna se curva, concedendo a Bull acesso total ao meu corpo. A
aspereza de sua barba aumenta a sensação de ser consumida de dentro
para fora.
Eu apoio seu rosto, meu corpo tremendo a cada movimento de sua
língua. Sua boca é macia e dura enquanto ele se move de um lado para o
outro, para cima e para baixo, esfregando meu perfume nele. A barra
range sob meu peso enquanto busco desesperadamente minha liberação.
Bull se aproxima de mim e começa a esfregar meu clitóris através
do tecido fino da minha malha. A sensação intensificada me faz ofegar.
Sem contato direto, ele aperta meu corpo ainda mais do que já está. Ele
continua me fodendo com a boca enquanto circula meu clitóris.
Eu nunca vim por aqui antes. Claro, alguns caras me atacaram, mas
isso é outra coisa. Eu não sabia que gostava dessa... maldade até estar
com Bull.
Ele está em toda parte, mas ainda não é suficiente. Eu quero mais.
— Ah, meu Deus. – eu ofego, não reconhecendo minha própria voz.
Sua língua e seus dedos são implacáveis, me
brutalizando até que eu implore para que ele me faça
gozar. Não aguento mais e contraio os músculos,
gemendo enquanto olho meu reflexo no espelho. Minhas
bochechas estão coradas e meus olhos estão animados
com uma luz que nunca vi antes.
Bull de repente se afasta e eu caio na barra com um
gemido frustrado. Antes que eu possa questionar o que ele está
fazendo, ele se posiciona atrás de mim. Seu rosto está molhado com os
meus fluídos, e eu imediatamente me lembro do que ele me disse na 294
última vez que me provou.
Ele percebe meu recuo e lambe os lábios com um gemido baixo e
saciado, provando que, afinal, gosta do meu gosto. — Você ainda quer
que eu quebre você? – ele ousa, referindo-se à sua admissão na noite
passada.
Concordo com a cabeça maliciosamente em resposta, encontrando
seus olhos no espelho. Se a noite passada foi uma amostra do que ele é
capaz, então quero mais... mais... mais. Essa maldade me ajuda a
expulsar os fantasmas do meu passado e me permite ser... livre.
Ele sorri, uma visão que não vejo com muita frequência, o que é
uma pena, porque está envolta em puro pecado. — Você gosta quando
eu te machuco, não é? A dor, o medo, isso te tira do sério.
Chegando a uma posição instável, eu ignoro a sua pergunta,
envergonhada de qual será minha resposta, porque ele está certo.
Quando ele me machuca, me ameaça, isso me faz sentir viva.
Observo cada movimento seu enquanto ele pega um pedaço de fita.
A fita de seda vermelha é como um aviso intermitente, sugerindo que
este é o ponto sem volta. Ele puxa uma vez, a varinha se soltando da
fita com facilidade. Ele lentamente desvenda o comprimento,
esticando-o firmemente nas mãos.
— Tire a roupa. – ele ordena, e não há nada
negociável em sua exigência.
Mesmo que ele tenha me visto quase nua e estado
dentro de mim, isso é outra coisa. É muito mais pessoal e
confrontador. Um a um, sem brilho ou fantasias para se
esconder. De costas, me atrapalho com o prendedor da saia, acabando
por abrindo-a, e ele cai aos meus pés. 295
Nunca quebrando o contato visual com ele, lentamente puxo para
baixo as alças da minha malha rosa. O tecido se acumula acima dos
meus seios enquanto rapidamente fico com medo e não quero ir mais
longe. Bull não se move. Ele simplesmente fica parado, enrolando
lentamente a fita em volta do punho.
Uma parte de mim sabe que se eu der esse passo final, estarei
perdida para sempre nesses sentimentos. Não me sinto tão exposta desde
Michael. Ele tirou minha virgindade com suavidade e amor, e mesmo
que eu não seja mais virgem, de repente parece minha primeira vez. E de
certa forma, é.
Não estive com alguém de quem... me importo desde ele, e quando
me perco no céu e no inferno que só Bull pode me oferecer, percebo que
me importo com Bull. Mais do que deveria. Ele tem sido franco, não me
prometendo nada. Mas isso, agora, isso é suficiente. Não importa o que
ele diga, não importa o quanto tente me assustar, ele vem até mim,
repetidamente, provando que também sente o que quer que seja.
Tenho sentimentos inexplicáveis por alguém que tirou a vida de
outra pessoa. Não, isso não define Bull, mas mostra quem ele é.
Então, a questão é: o que farei?
Deixando de lado o que é certo ou errado, engancho meus dedos
no tecido da minha malha e a retiro do meu corpo,
expondo meus seios. A expressão voraz de Bull me dá
coragem para enrolar a malha o resto do caminho.
Deixando isso de lado, fico só com minhas sapatilhas
de ponta.
Ficar de costas para ele torna isso um pouco mais fácil,
mas Bull pode ver claramente minha frente refletida no espelho.
Seus olhos observam cada centímetro de mim, e quando ele esfrega dois
dedos no lábio inferior, meus mamilos endurecem instantaneamente. 296
Inclinando ligeiramente a cabeça, ele baixa o olhar cada vez mais
até a junção entre minhas coxas. Sim, ele sentiu o que está escondido ali,
mas nunca me viu assim antes. Imediatamente noto uma protuberância
pressionando seu zíper.
Quando pressiono meus lábios, o rubor em minha pele trai minha
resposta a ele. Precisando fazer algo para esconder meu rubor, tento me
curvar discretamente para tirar minhas sapatilhas, mas Bull balança a
cabeça, um sorriso pecaminoso aparecendo em seus lábios, me
impedindo.
— Deixe-as.
Ele dá um passo à frente, fita na mão, olhos brilhantes. Agarro-me à
barra, precisando me ancorar antes de desaparecer. Bull para a
centímetros das minhas costas, elevando-se sobre mim enquanto me
devora da cabeça aos pés. Não consigo parar de tremer enquanto
aguardo seu próximo movimento.
Quero tão desesperadamente que ele me toque.
Ele desliza os dedos pelos meus braços, espalhando arrepios
uniformemente pela minha pele. Lambo meus lábios secos, incapaz
de silenciar minha respiração alta. No entanto, quando ele para nos
meus pulsos, prendo a respiração.
Bull não diz uma palavra enquanto guia meus
braços para trás antes de enrolar a fita em volta dos meus
pulsos. Estou sendo amarrada cada vez mais, e quando ele
reforça minha prisão com um laço apertado, meu coração
começa a bater em um ritmo ensurdecedor.
Observando-o no espelho em busca de qualquer sinal do que vem a
seguir, me preparo para a maldade total quando um sorriso malicioso se 297
abre de uma bochecha a outra. Seus caninos mais longos enfatizam suas
ações predatórias enquanto ele agarra meu bíceps e me gira.
Cara a cara, com as mãos atadas, estou preso de todas as maneiras
possíveis, e quando o olhar de Bull se volta para o meu sexo, sou sua
cativa voluntária. Eu quero tanto beijá-lo, então, usando o que Deus me
presenteou, fico na ponta dos pés, o que me deixa na mesma altura
daqueles lábios curvados.
Sua arrogância é sufocante, tirando meu fôlego, então decido que é
justo roubar a dele. Pressionando meus lábios nos dele, saboreio-o com
um sabor novo, porque esse beijo é algo novo. Não deixo de perceber
que todos os beijos que compartilhamos são aqueles que instiguei, mas
com este, sob a fome, sob a necessidade de nos devorarmos por inteiro,
há uma saudade, um chamado para a alma um do outro.
O fato só me fez beijá-lo com mais força.
Ele passa os dedos pelo meu cabelo, puxando descontroladamente,
mas a pressão é perfeita. Nos beijamos sem desculpas, tentando triunfar
um sobre o outro, mas no final Bull vence. Ele me guia pela sala, com
nossos lábios e línguas nunca perdendo o ritmo quando ele encontra a
cadeira no canto.
Sentando nela, ele me puxa para seu colo, onde sua
impressionante ereção me toca enquanto monto nele.
Quero tocá-lo, passar as mãos nele, mas não consigo.
Um gemido frustrado me deixa. Ele morde meu lábio
inferior, sugando-o delirantemente devagar antes que ele
solte.
Tento beijá-lo novamente, mas ele vira o rosto. Ele é tão
frustrantemente lindo.
Ele se abaixa e agarra meu tornozelo, puxando-o de volta para
apoiar em sua coxa. Ele repete a mesma ação do outro lado. Minhas 298
pernas agora estão bem abertas sobre seu colo. Sou ágil, graças ao meu
treinamento de balé, e Bull parece gostar da minha flexibilidade
enquanto seu olhar cai entre as minhas coxas.
Ele desliza dois dedos em minha boca, me encorajando a girar
minha língua em torno deles. Uma vez que estão molhados, eles se
libertam antes que ele os enfie em meu sexo. Eu grito, a intrusão é quase
demais. Estou dolorida desde ontem à noite, mas supero a dor e me
concentro nos dedos de Bull enquanto eles entram e saem de mim.
Observo com ansiedade enquanto ele me toca vagarosamente, com
suas mãos tatuadas dominando meu corpo enquanto eu me rendo. Ele
leva o seu tempo, aproveitando meus gemidos porque quando me
arqueio ao seu toque, ele diminui a velocidade.
— Bull... – eu gemo, desesperada para que ele vá mais rápido e pare
de deslizar pelo meu centro necessitado. Puxo a fita em volta dos meus
pulsos, mas ela está bem presa.
Perdendo... entrego o controle, depois de ter sido a responsável por
todos esses anos, é totalmente inebriante.
Ele continua a me torturar, sentindo prazer em me ver implorar.
Mas ele não permanece inalterado. Posso ver a maneira como seus
olhos se dirigem para meus seios e me curvo, na esperança de que ele
nos tire do sofrimento e coloque um na boca.
Mas ele não o faz, e não entendo por quê.
— Não posso tocar em você. – eu suspiro, movendo
meus quadris enquanto ele penetra lentamente em mim. —
Mas você pode me tocar. Por toda parte.
Não sei por que, mas sinto que ele está pedindo permissão. Ele
nunca teve problemas antes, mas agora parece quase cauteloso. 299
— Não. – ele grita, com a mandíbula contraída. Ele aumenta o ritmo
de seus dedos.
— Por que não? – pergunto, com minha respiração ofegante.
Quando ele não responde, seu silêncio me irrita.
— Sou sempre a primeira a iniciar um beijo. Você percebe isso? Se
não fosse pela sua ereção pressionando contra mim, eu diria que fui a
única afetada por você me tocar.
Dentro e fora. Dentro e fora, ele move os dedos, me punindo... que é
exatamente o que eu quero.
— Nem sei o seu nome. – eu expresso meus pensamentos em voz
alta. Usar um pseudônimo o ajuda a lidar com quaisquer demônios que o
atormentam?
— Por que saber meu nome faz diferença? Você sabe o que é isso.
— Não, na verdade, eu não. Diga-me. Você pode falar com meu
corpo, mas não pode falar comigo. Por que não? – Em resposta, ele
esfrega o polegar no meu clitóris, evocando um gemido.
Mas preciso me concentrar.
— Então, o que você quer de mim? Uma amiga de
foda? É isso? – Meu palpite parece enfurecê-lo, e ele
desconta no meu sexo.
Movendo contra sua mão, continuo a inquisição
porque sua punição é tão boa.
— O problema de um amigo de foda é que você realmente
tem que transar com ele. Tudo o que você fez foi me irritar,
ah... – suspiro quando ele aperta meu clitóris. — Enfim. – eu concluo,
recusando-me a deixar isso passar. 300
Um gemido selvagem escapa dos lábios de Bull, já que ele não me
permite um momento de alívio, antes de enfiar seus dedos em mim
profundamente. — Acredite, o sentimento é mútuo. – ele afirma
acaloradamente, estreitando os olhos.
— Bom, estou feliz por estarmos na mesma página. – Seu toque é
eletrizante, e eu quero tanto gozar. Não importa o quanto frustrada ele
me deixe, não posso deixar de sentir que há uma razão para ele não me
deixar chegar perto.
— Quando eu conseguir o que quero de você, isso estará acabado.
Acabado.
— Não poderia estar mais de acordo. – ele responde, me punindo
ainda mais com os dedos.
— Ótimo. Talvez eu aceite a oferta de Carlos, afinal. Sim, eu disse
isso. Não, não estou falando sério, mas tem o efeito desejado.
Bull vibra embaixo de mim, me lembrando de um vulcão pouco
antes de explodir. E ele dá um golpe.
Um gemido feroz escapa quando ele tira os dedos de mim. Não
tenho tempo para protestar porque, em segundos, ele está
desabotoando o botão e depois o zíper da calça jeans. — Está bem
então. Você só quer que eu te foda? Tudo bem.
Eu esperava isso. Inferno, eu comecei, então levanto
meus quadris, aguardando minha punição, e quando ela
chega, me arrependo de não ter feito isso antes. Bull crava
os dedos na minha cintura, me pendurando sobre seu pau. —
É isso que você quer?
Ele se esfrega na minha entrada, me provocando. — Quero que você
crie coragem e pare de fugir. Você está dentro ou está fora. Não vou 301
aceitar que você ultrapasse a linha com um pé de cada lado. Sei que você
também sente isso. – digo, reprimindo meu desejo.
Ele está com raiva de mim, furioso na verdade, o que é bom. Isso
significa que ele se importa. Isso significa que estou certa.
— Por que eu? Por que continua voltando quando nem consegue me
beijar? Diga-me! – eu choro, desesperada para finalmente descobrir a
verdade.
E funciona.
Bull aperta a mandíbula, com as narinas infladas como se ele
estivesse prestes a me despedaçar. — Porque estou com uma bagunça da
cabeça! – ele grita, deixando marcas em minha carne enquanto agarra
meus quadris. — Eu quebro tudo que toco, e o pior é que… eu nem me
importo. Preciso machucar você para me sentir normal. Quanto fodido é
isso?
Não me atrevo a me mover.
— Eu tenho que amarrar você e te foder por trás, porque é isso que
me deixa excitado. Eu me alimento da sua inocência. Quero
corrompê-la e quero que você me deixe, porque isso pode apagar essa
escuridão dentro de mim. Não quero tocar em você porque não
quero... poluí-la com minha doença, Tiger.
Não sei o que esperava, mas certamente não era
isso.
— Bull, você não está doente. – Mas ele não me
permite dar desculpas para ele.
— Pare com isso! Esta não é uma história em que a
heroína transforma o vilão em herói. Nunca serei isso. É tarde
demais para isso. Estou morto por dentro. O que fiz... o que tenho que
fazer para silenciar as vozes dentro da minha cabeça determinou meu 302
destino. E estou bem com isso.
Independentemente da sua perspectiva sombria, posso sentir a sua
dor e a confusão escondida sob as camadas de ódio. Bull me disse que
tem um objetivo, e o que ele acabou de revelar é que esse objetivo é
literalmente apenas isso – acabar com outra vida.
Mas, por quê?
— Como isso vai melhorar as coisas? – pressiono, suspensa sobre
ele.
Com um toque deliberado, ele segura minha garganta, apertando
suavemente. — Eu nunca disse que queria algo melhor... só quero ver
todos eles mortos.
Sua admissão era o que eu queria, confirmando o que eu sabia ser
verdade. A confirmação deveria ser minha passagem para sair daqui,
mas não é. Isso só me faz desejá-lo ainda mais.
Sem hesitar, sem pensar demais no fato de que ele não está usando
nenhuma proteção, movo meus quadris e sento em seu pau. Bull tenta
freneticamente sair, mas não deixo. Eu aperto meus músculos e
começo a mover meus quadris.
Ele geme, ainda segurando minha garganta enquanto me movo
contra ele.
Usando minha força central, me levanto e desço
novamente nele. Para trás e para frente, de um lado para o
outro, girando e girando, eu movo meu corpo em um
frenesi, extraindo meu prazer de Bull. Ele me permite pegar
o que quero, encontrando-me estocada após estocada.
Inclinando a cabeça para trás, aprecio a forma como seus dedos me
seguram com força, segurando-o, ancorando-o em mim. Seus gemidos 303
de prazer alimentam meu desejo e eu acelero o ritmo. Sem minhas mãos,
eu uso meu corpo, desesperada para mostrar a Bull que isso é mais do
que apenas uma aventura para mim.
— Ah, porra. – ele geme quando giro meus quadris, levando-o mais
fundo.
Algo tão pecaminoso não deveria parecer assim, tão certo. Não sei
por que o universo trouxe Bull para minha vida, mas não posso negar a
atração inegável que sinto por ele. Não importa o que ele diga, isso não
muda o que sinto, e sinto, eu sinto.
— Se está com a cabeça confusa, precisando me machucar para se
sentir normal, então o que isso diz sobre mim o fato de eu... – Curvo as
costas, arqueando-me para trás o máximo que posso, porque o ângulo é
de êxtase. — Que eu permito isso? Eu tenho todos esses... sentimentos
por sua causa. E não sei o que fazer a respeito.
Pronto, eu disse.
Bull murmura, agarrando meus pulsos amarrados e me atacando
com gemidos apaixonados. Nossos movimentos são enlouquecidos,
cheios de desejo indomável. Ele disse que não sente, mas não acredito
nele. Sei que ele sente isso. E continuarei a forçá-lo a sentir porque
não vou desistir disso.
— E o que acontece quando você quebrar
também? – ele geme, com as mãos em volta da minha
garganta e pulsos. Ele se inclina para frente e coloca um
mamilo na boca.
Saltando contra ele, fecho os olhos e desisto. — Eu não...
quebro facilmente. – grito, estremecendo enquanto explodo em
um milhão de pedaços. — Você está certo... a dor... o medo... eu gosto
disso. Faz-me sentir viva. 304
Meu orgasmo é tão violento que não consigo respirar rápido o
suficiente. Mas quem precisa de ar quando Bull pressiona os lábios na
minha boca aberta, me beijando rudemente e me pegando de surpresa.
Choro em sua boca, com meu corpo convulsionando porque é demais.
Ele continua a me penetrar, devorando meu sexo e minha boca.
Ele está incrivelmente quente, e quando um gemido saciado lhe
escapa, sei que ele finalmente gozou também. Ele sai de dentro de mim,
jorrando seu esperma em meu abdômen.
Estamos ambos sem fôlego, com o calor de nossos corpos
incendiando o outro. Mas quando finalmente gozo, percebo o que ele
fez. E ele também.
— Pronto. – ele ofega, liberando minha garganta e pulsos. — Porra,
eu beijei você primeiro.
Sim, ele fez isso, e agora estou com muitos problemas.
305

Nunca esperei que isso fosse fácil, mas eu tinha um plano. Era tudo
em que conseguia pensar quando estava preso. Mas ficar sentado no
escuro, em um lugar onde não deveria estar, revela que meus planos
foram desviados para outra coisa. Sim, ainda pretendo arrancar de Kong
o que preciso antes de encerrar sua existência miserável na próxima
semana. Isso não mudou. Mas o que mudou é isso... algo que eu... sinto
por Tiger.
É por isso que estou sentado no apartamento de Andre, esperando
que ele volte para casa, para que ele possa me contar
que jogo Carlos está jogando. Há mais nisso. Eu sei
isso. Duvido que ele vá aos extremos só porque está atrás
de uma bunda... não importa o quanto perfeita essa bunda
seja.
Se Tiger estiver em perigo, pretendo descobrir o porquê.
E quando a porta se abre, a oportunidade bate à porta. Andre
acende a luz, verificando a sua correspondência, alheio à minha
presença. Estou em uma poltrona reclinável de couro que mudei para
que fique no meio da sala. Um taco de beisebol está no meu colo. 306
Não acredito que esse cara seja um segurança. Ele é tão estúpido.
Ele leva vinte segundos inteiros para perceber que algo está errado. Ele
para de repente quando me vê. Eu aceno meus dedos em resposta.
— Acho que é hora de conversarmos um pouco.
Andre olha freneticamente ao redor da sala em busca de uma arma.
Outro movimento de novato.
— Sei que foi você quem atacou Lily. – Dizer o nome dela parece
muito errado. Quando ele abre a boca, levanto a mão para detê-lo. —
Não estou aqui para discutir esse fato. Estou aqui porque quero saber por
quê. O que Carlos quer dela?
Andre dá uma risadinha. — Você teve coragem de invadir minha
casa e me acusar de atacar uma colega.
— Não estou te acusando de nada porque sei que você fez isso.
Então, a questão agora é: por quê? – A madeira range sob minha palma
enquanto agarro o taco de beisebol, fazendo uma careta inexpressiva. —
Desta vez, não estou apenas com os punhos. Isso será muito mais fácil
para você se apenas responder à minha pergunta.
— Foda-se. Vou chamar a polícia. – ele ameaça, com o celular na
mão. Mas eu considero seu blefe.
— Vá em frente. – Levanto-me lentamente. —
Tenho certeza de que eles ficarão interessados em saber
que você atacou uma mulher, quase matando-a no
processo. Então fique à vontade.
Andre pondera sobre minha resposta. Ele não vai chamar
a polícia. Ele é tão culpado quanto eu. Só há uma coisa que ele
pode fazer.
Virando rapidamente, ele tenta correr – tão previsível. Ele não
consegue andar meio metro antes de cair de bruços sem fôlego, graças 307
ao taco de beisebol que usei como dardo. Sua cabeça gorda era o alvo, e
eu acertei a porra do alvo. Eu não falho, lembra?
Ele se mexe freneticamente, mas as suas mãos e pernas são
completamente inúteis porque estou em cima dele antes que ele tenha
chance de gritar. Agarrando seu rabo de cavalo, puxo sua cabeça para
trás. Quando ele se contorce, eu bato minha bota em suas costas. —
Você está apenas tornando as coisas mais difíceis para você.
— Vá se foder! – ele diz, com suas tentativas de se libertar são
inúteis. Ele está realmente se envergonhando.
— Diga-me por que você a atacou. – pressiono, caso ele tenha
esquecido por que estou aqui.
— Não vou dizer merda nenhuma, aberração. – Parece que ele não
fez isso. Ele só quer me provocar.
Suspirando, pego o taco de beisebol. — Como quiser.
Ao contrário de Andre, eu não brinco. E ele aprende isso da maneira
mais difícil quando balanço o taco de beisebol atrás de mim, quebrando
seu tornozelo.
Um momento de silêncio, então um grito de dor o deixa enquanto
um sorriso satisfeito se abre em meu rosto. — Então, pronto para
conversar?
— Seu filho da puta! Filho da puta! – ele berra,
torcendo-se, tentando escapar. Eu apenas pressiono minha
bota com mais força.
— Resposta errada. – Estou prestes a quebrar seu outro
tornozelo, frustrando qualquer sonho que ele possa ter que
exija o uso dos dois pés, mas ele finalmente decide seguir minhas regras.
— Está bem, está bem! – ele grita, levantando as mãos em sinal de
308
rendição. — Carlos me pagou ci... cinco mil dólares para assustá-la.
— Assustá-la? Filho da puta, você quase a matou! – exclamo,
pressionando suas vértebras.
Ele geme, incapaz de respirar. — Eu não achei que ela iria revidar.
As coisas saíram do controle.
— Besteira! – grito, sem acreditar em uma palavra. — Lily é uma
porra de uma mulher temperamental. Você sabe disso.
Quando ele responde com silêncio, decido mantê-lo falando. Eu
quebrei o outro tornozelo dele.
Ouvir os ossos quebrando alimenta minha alma e inclino meu rosto
em direção ao céu, exalando.
— Tudo bem! – ele chora, decidindo agora que quer conversar. —
Eu deveria agredi-la para que ela ficasse com medo e aceitasse a oferta
de Carlos. Mas aquela puta merecia! Eu não pude resistir.
Ah, meu Deus... esse covarde tem um desejo de morrer. Posso lidar
com isso mais tarde. Ele não é bom para mim morto – por enquanto.
— Por que Carlos lhe pagou esse dinheiro?
— Ele tem grandes planos para ela. – ele revela,
deixando meu sangue frio.
— O que isso significa?
— Isso significa que há mais coisas acontecendo
naquele clube do que você pensa. Alguém a quer. Carlos é
apenas o mensageiro.
— Quem? Dê-me um nome. – eu resmungo entre os dentes.
— Não sei! – ele grita, se debatendo descontroladamente quando
bato o taco de beisebol no chão a centímetros de seu rosto. — Isso é 309
tudo que eu sei. Juro! Carlos me disse para fazer isso por ele e ele me
daria um emprego.
Refletindo sobre sua confissão, infelizmente acredito nele. Carlos
não vai confiar em um oportunista como Andre. Ele o contratou porque
Andre não pareceria deslocado, conhecendo a agenda de Tiger. O
dinheiro fala com bandidos como Andre.
Então, acabando com essa sujeira, o libero, observando-o suspirar
de alívio. No entanto, se pensa que é isso, então está muito enganado.
Arrastando o taco atrás de mim, paro na frente dele. Ele olha para mim
com os olhos arregalados.
— Você não vai contar a ninguém o que aconteceu. Quando
perguntarem, você diz que caiu da escada. Estamos entendidos?
Ele balança a cabeça, trêmulo.
— Saberei se você estiver mentindo, e se algum mal acontecer a
Lily, juro por Deus. – eu fico de joelhos na frente dele com um sorriso
sinistro. — Vou quebrar todos os outros ossos do seu corpo.
— Não vou contar, cara. Tudo bem. Apenas me dê meu celular
para que eu possa ligar para alguém. – ele agarra seu celular, que está
do outro lado da sala.
Mas isso não está acontecendo.
Parando, vou até o celular dele, pego-o e, enquanto
ele suspira de alívio, abro a janela e jogo-o para fora.
— Ei! – ele grita, batendo o punho no chão. — Você
não pode simplesmente me deixar aqui.
— Sim, posso. – respondo, caminhando em direção à porta.
— Por favor, não consigo andar. – ele implora, esperando simpatia.
Tudo o que ele recebe em resposta é uma risada. 310
— Estou ciente disso. Esse foi o ponto de quebrar seus tornozelos. –
respondo, abrindo a porta. — Agora você pode rastejar como a maldita
cobra que você é.
Batendo a porta, aprecio seus gritos que me seguem para fora do
prédio. Entro na minha caminhonete, jogando meu taco no chão. Preciso
de um minuto para processar tudo o que Andre acabou de desembuchar.
Tiger está em perigo. Isso eu sei. Só não sei por quê. Quem a quer? E o
que eles querem com ela?
Ela não pode chegar perto daquele lugar até eu descobrir o que
diabos está acontecendo. É muito perigoso. Se ela precisar de dinheiro,
eu darei a ela. Não tenho muito, mas se continuar lutando...
Um pensamento de repente me invade. Só comecei a lutar para
chegar perto do Kong. Nunca foi sobre dinheiro. Claro, isso suavizou o
inevitável, mas não foi o decisivo. Preciso tirar minha cabeça da areia.
Agarrando o volante, respiro fundo algumas vezes, desesperado
para resolver esta tempestade interior. — Isso não faz parte do plano. –
murmuro para mim mesmo, mas dizer isso em voz alta não muda o que
sinto. Esta é a razão pela qual eu a afastei.
— Droga. – A caminhonete ganha vida enquanto vou em direção
ao apartamento dela.
No caminho até lá, raciocino comigo mesmo que
vou apenas avisá-la e não exigir que ela nunca mais volte
àquele lugar. Mas quem estou enganando? Isso vai se
transformar em uma briga de gritos, que resultará em sexo.
É o que sabemos.
Meu celular toca. Olhando para ele, vejo que é uma mensagem da
Lotus me pedindo para chegar mais cedo. Eu sei do que se trata. Stevie 311
marcou a luta para a próxima semana. A adrenalina corre através de mim
porque o tempo está correndo para Kong. Ele é um homem morto.
Algo que Tiger me disse está em minha mente. Tem acontecido
desde que ela me disse isso pela primeira vez em sua caminhonete.
“Às vezes... você tem que pensar em como suas ações afetarão
outra pessoa.”
A ação de eu matar Kong afetará seus filhos porque eles ficarão sem
o pai. Acabar com sua vida já demorou muito para acontecer, mas não
parece justo que as escolhas do pai idiota os afetem dessa forma.
— Filho da puta, concentre-se. – eu bato a mão no volante, sem
precisar esquecer por que estou aqui.
Felizmente, o complexo de apartamentos de Tiger aparece e,
embora eu não tenha ligado, decido visitá-la bem rápido. Quando ela
colocou seu número no meu celular, ela também adicionou seu
endereço, então imaginei que fosse um convite para uma visita.
Estacionando a caminhonete, entro no prédio dela e pego o elevador
até o andar dela. Tantas portas se ramificam no longo corredor,
fazendo minha claustrofobia aumentar. Eu não poderia viver assim,
tendo vizinhos que conhecem a minha vida.
Isso me lembra a prisão.
Quanto mais me aproximo da porta de Tiger, só
confirmo meus pensamentos, porque é óbvio, pelas vozes
elevadas dentro de seu apartamento, que ela está
discutindo com alguém. Paro do lado de fora da porta dela,
ouvindo atentamente o que está acontecendo.
— Você não pode simplesmente continuar matando aula porque não
tem vontade de ir! Você sabe quanto custa para mandá-lo para lá? 312
— Tudo bem, eu não irei. Problema resolvido. – A voz mais jovem
sugere com quem ela está discutindo. Eu definitivamente não deveria
estar aqui.
Vou me virar, mas quando a porta dela é aberta, é tarde demais.
— Quem diabos é você, inseto? – pergunta alguém que tenho
certeza que é filho de Tiger.
Isso não vai cair bem.
— Bull? – Ainda de costas, fecho os olhos e xingo baixinho.
Suspirando, viro para encarar Tiger e aceno com a cabeça. — E aí.
O garoto que está na frente dela é mais velho do que eu pensava.
Talvez com dez ou onze anos, ele está vestido com jeans largos e uma
camiseta com estampa de grafite. Seus olhos azuis instantaneamente me
consideram uma ameaça.
— Quem é? – ele pergunta a Tiger, que empalidece. Eu não deveria
estar aqui.
Ela limpa a garganta. — Jordy, ele é apenas alguém com quem
trabalho.
Estou instantaneamente na sua maldita lista.
Garoto inteligente. Pena que sua mãe não sente o
mesmo. — Ah, então você é o cafetão dela?
É preciso muito para me chocar, mas esse pequeno
delinquente conseguiu.
A boca de Tiger se abre enquanto Jordy olha para mim.
— Perdão! Como você ousa falar comigo desse jeito? – Tiger
exclama, com suas bochechas ficando vermelhas. 313
— Para que preciso da escola? – Jordy pergunta. — Você foi para a
escola e isso não lhe fez nenhum bem. Você tira a roupa para trabalhar.
Não acho que você foi para a escola para isso.
— Isso não é verdade. – Mas a hesitação de Tiger trai suas mentiras.
— Tanto faz, mãe. Sei que você não trabalha no Walmart. Eu não
sou uma criança, então pare de me tratar como uma. Não admira que
Papai e Tio Chris tenham deixado você. – Ela estende a mão para ele,
mas é tarde demais. — Vou jogar videogame no Clark's.
— Você não vai a lugar nenhum. Você está de castigo para o resto
da vida. – Quando ela está prestes a persegui-lo, ele passa por mim e eu
recuo com as mãos levantadas porque não sei o que fazer. Não é minha
função intervir, mas cada parte de mim está exigindo que eu agarre esse
espertinho pela nuca e o faça pedir desculpas à mãe.
Correndo pelo corredor com o skate debaixo do braço, ele
desaparece no elevador segundos depois.
— Eu vou embora. – Aponto o meu polegar para trás de mim, mas
Tiger corre e se joga em meus braços, derrotada.
Ela se aninha em meu peito, chorando, enquanto fico rígido com
os braços ao lado do corpo. Sei que deveria consolá-la, mas
simplesmente não consigo. Eu sinto que sou
responsável por todo esse show de merda. A melhor
coisa que posso fazer é ir embora, mas ela não deixa.
— Entre. – Não é uma pergunta. Então eu a sigo até o
apartamento depois que ela se afasta do meu corpo.
O lugar é acolhedor e bem decorado. Há pinturas abstratas
nas paredes e fotos de Jordy sobre a lareira. Há também a foto de
uma jovem bailarina que presumo ser Tiger com uma senhora que a olha
com amor. Poderia ser Avery? 314
Tiger entra na cozinha e se serve de uma caneca de café. Assim que
sua caneca está cheia, ela vai até o freezer e tira uma garrafa de vodka.
Em vez de servir o café, ela abre a tampa e toma um gole da garrafa.
Sento-me à mesa da cozinha e espero ela falar.
— Não sei mais o que fazer com ele. – diz ela, enxugando os lábios
com as costas da mão. — Eu tentei o meu melhor. Tentei mesmo. Ele
simplesmente me odeia. – ela toma outro gole.
— Posso te perguntar uma coisa?
Ela assente.
— Você acha que seu filho age assim porque não tem pai? – Não há
julgamento em meu tom. Estou honestamente interessado no que ela tem
a dizer.
— Tem sido difícil para ele. Tem sido difícil para nós dois. – ela
diz, tirando nervosamente o rótulo da garrafa. — Jordy não sabe muito
sobre seu pai. Embora ele tenha parado de perguntar sobre ele.
— Você algum dia contará a ele toda a história?
Quando ela balança a cabeça, não consigo esconder minha
surpresa.
— Isso não vai adiantar nada. Eu... amava o pai
dele. Muito.
Ela dizer essas palavras faz algo em meu interior. Eu
sinto como se ela tivesse me dado um soco no estômago.
— A vida era diferente para mim quando ele estava por perto.
Nosso caso de amor pode ter sido a portas fechadas, mas ninguém nunca 315
me fez sentir como ele.
De repente, desejo manter minha maldita boca fechada.
— Ele era meu herói. Meu Príncipe Encantado. Não quero que
Jordy pense mal dele porque ficou com medo.
— Com medo? Ele abandonou você quando você estava grávida.
Isso se chama ser covarde. – eu corrijo, querendo encontrar esse idiota e
espancá-lo até deixá-lo sem sentido.
— Não quero alguém que me dê metade do coração. – Levando a
garrafa aos lábios, ela conclui: — Eu quero tudo. – antes que sua
garganta esbelta engula a vodka que ela bebe.
A visão, suas palavras, me deixam inquieto.
Embora eu preferisse ter qualquer outra conversa além desta, não
consigo parar de pensar no que minhas ações afetarão os filhos de Kong.
Eles também se transformarão em jovens problemáticos? Em breve, eles
crescerão sem pai, graças a mim.
Precisando mudar de assunto, pergunto: — Por que ele acha que
você é uma prostituta?
Tiger balança a cabeça. — Não sei. Não há como ele descobrir. A
escola dele é praticamente dirigida por freiras, então
não esbarrei com nenhuma delas no meu trabalho.
Trabalho em Cleveland porque é longe o suficiente para
que ninguém que eu conheça vá a um clube de strip em
Detroit. Exceto Derrick. Você não acha? – ela diz como
uma reflexão tardia.
— Alguém no balé tratou você de maneira diferente?
Ela pondera minha pergunta antes de responder: — Não.
— Então não foi ele.
316
— Então quem? – ela questiona, apoiando o quadril contra a
bancada enquanto continua a beber a garrafa de vodka.
Pensando em onde eu estava antes de vir para cá, suspiro, desejando
não ter que contar a ela quando já está se sentindo uma merda. — Fui
ver Andre.
Ela engasga com a boca cheia de vodka, batendo no peito para
ajudá-la a descer. — O que? – ela murmura, com os olhos lacrimejando.
— Fui na casa dele, não no seu trabalho, então acalme-se.
— Que parte de "por favor, não" você não entende? – ela exclama
com um suspiro.
— Por favor e não são palavras com as quais eu não estou
familiarizado. – respondo, recostando-me na cadeira.
Ela arregala os olhos. — Ah, Deus. O que você fez?
— Nada. Tudo. – acrescento com um encolher de ombros casual. —
Apenas perguntei a ele por que ele atacou você. Ele me contou o que eu
já sabia. Carlos estava por trás disso. Ele queria que você corresse
assustado. E funcionou.
— Isso não faz sentido. – ela balança a cabeça em
confusão.
— Ele disse que Carlos é apenas o mensageiro e que
outra pessoa quer você. Isso faz algum sentido para você?
— Não. – ela responde, franzindo o nariz. — Quem é
essa outra pessoa?
— Não faço ideia. Andre não disse.
Ela suspira, parecendo refletir sobre o que acabei de revelar. Decido
dar a ela mais o que pensar. 317
— Foi por isso que quebrei os tornozelos dele.
Seu suspiro se transforma em um chiado enquanto ela respira fundo.
— O que você quer dizer? Isso é uma gíria que eu não conheço, certo?
Balanço a cabeça com firmeza e respondo sem rodeios: — Não.
Significa que quebrei os dois tornozelos dele com meu taco de beisebol.
— Ah, meu Deus. – Sua mão treme quando ela leva a garrafa aos
lábios.
Não sei qual é o problema. — Ele tem sorte de ser a única coisa que
quebrei.
— Bull, você não pode sair por aí quebrando os tornozelos das
pessoas.
— Por que não? – pergunto, genuinamente curioso. — Ele não teve
problemas em quase matar você.
Ela abre, mas logo fecha a boca. — Isso é tão confuso. Não sei mais
o que está acontecendo.
Foda-se se eu sei, então encolho os ombros.
— Por que você quebrou os tornozelos de Andre? – ela pergunta
em voz baixa.
— Porque ele mereceu. – eu respondo sem pensar.
— Você vai se meter em muitos problemas se não
parar de vir em meu socorro. Sua agente de condicional
deixou isso claro. – ela lambe os lábios antes de acrescentar:
— Mas obrigada. Ninguém nunca quebrou os tornozelos de
alguém por mim antes.
Foi isso que eu fiz? Eu fiz isso por ela?
Meu ódio por aquele idiota do Andre é pessoal. Mas eu não poderia
318
me importar comigo mesmo. No entanto, quando descobri que foi ele
quem machucou Tiger, ele se tornou o inimigo público número um e
machucá-lo era inevitável.
Quebrar seus ossos foi apenas um castigo por colocar as mãos em
Tiger.
O calor sobe pelo meu pescoço e não gosto disso. — É melhor eu ir
embora. A Lotus me pediu para chegar mais cedo.
— Ah, claro. – ela diz, mas parece desapontada por eu estar indo
embora.
Levantando-me rapidamente, vou me virar, mas ela estende a mão e
agarra meu braço. Olhando para seus dedos, não recuo. Estou me
acostumando com ela me tocando. Mais motivos para ir embora.
— Por que você veio aqui? Não que eu esteja infeliz por você ter
vindo, mas houve algum motivo? – Posso ver a esperança em seus olhos.
Ela está otimista de que isso é mais do que deveria ser... e é.
Mas não posso lidar com isso agora.
— Você precisa ficar longe daquele clube. – respondo, evitando
sua pergunta. Sua decepção me alimenta. — Mas a decisão é sua.
Você conhece os riscos.
Minha atitude indiferente está longe do que estou
sentindo por dentro. Se ela for trabalhar, serei forçado a
persegui-la nas sombras.
Ela me solta, teimosamente ficando ereta. — Obrigada
por me avisar, mas você está certo, a decisão é minha, então é
melhor eu me arrumar. Não quero me atrasar. Agora, se você
me der licença, preciso arrastar meu filho de volta para casa.
Maldita seja ela. Por que ela não escuta? O que será necessário para
319
ela se submeter? Não sei o que é isso entre nós. Só sei que sempre que
ela me desobedece, ela provoca o demônio interior.
Ando lentamente para frente, forçando-a a cambalear para trás até
que ela esbarre desajeitadamente na bancada. Ela olha para mim por
baixo daqueles longos cílios, uma mistura de excitação e medo pulsando
através dela.
Alcançando lentamente atrás dela, pego a vodka da bancada e levo a
garrafa aos lábios. A queimação é exatamente o que preciso, então
saboreio cada gota. Tiger me observa, com o peito subindo e descendo,
agarrando a bancada atrás dela.
Depois de beber a garrafa até secar, coloco-a de volta na bancada.
Enxugando os lábios com as costas da mão, eu aceno. — Obrigado pela
bebida.
— Não se preocupe. – ela responde, limpando a garganta.
A tensão silenciosa que paira entre nós me deixa inquieto pra
caralho. Não sei se devo brigar com ela ou transar com ela. — Tome
cuidado. Ou não. – eu rapidamente recuo com um encolher de
ombros. — Como quiser. Faça o que você quiser.
Os lábios de Tiger se erguem em um sorriso torto, me
surpreendendo. De pé, ela responde: — É melhor você
tomar cuidado... você não gostaria que ninguém
pensasse que você realmente se importa.
Ela e aquela língua afiada.
Segurando seu queixo entre o polegar e o indicador,
inclino seu rosto em minha direção e olho carrancudo. Em
resposta, ela ri. Malditas risadas. — Por que você me desafia
constantemente? 320
— Porque é muito fácil não fazer isso. – Não tenho chance de
responder porque ela pressiona os lábios nos meus, engolindo minhas
palavras.
Enfiando meus dedos em seus cabelos macios, beijo a esperteza de
seus lábios, odiando o quanto preciso disso. O quanto preciso dela. Ela
envolve os braços em volta da minha nuca, gemendo em minha boca
quando nossas línguas lutam para serem alfa. No entanto, não é uma
porra de uma competição. Ela sabe disso. Eu sei isso. Mesmo assim, ela
me desafia porque, aparentemente, é muito fácil não fazer isso.
— Talvez eu devesse tornar isso difícil para você então. – digo perto
de seus lábios. — Talvez eu deva amarrar você? Te ensinar uma lição
punindo essa sua bunda gostosa? Isso parece fácil?
Em resposta, um tremor balança seu corpo, me estimulando.
— Fazer você implorar de joelhos? – Mordo seu lábio inferior...
com força. — Vendada. E amarrada. Nunca me confunda com nada
além do animal depravado que sou. – Quando sinto o gosto da dor
metálica afiada, gemo de prazer.
E a Tiger também.
— Nunca se esqueça… nada é fácil para mim. – Segurando sua
bunda, eu a levanto e a coloco na bancada. Beijando-a
ferozmente, ela finalmente se rende, gemendo ao meu
toque.
Ela abre as pernas, me acolhendo de perto, e aceito o
que ela oferece porque quero muito. Nós nos beijamos sem
desculpas, a suavidade e o calor de sua boca me fazendo
esquecer tudo, menos isso. Agarrando o topo de suas coxas, eu a
arrasto para frente, então ela fica pressionada contra meu peito.
Cedendo à tentação repentina, lentamente seguro sua bochecha com
321
um toque destreinado, colocando-a em uma posição onde posso dominá-
la, mas há algo quase... íntimo nisso. Beijar Tiger sempre foi quente,
mas esse beijo está repleto de outra coisa.
A fome selvagem está carregada de posse, e a necessidade de
reivindicá-la me sufoca. Nunca me senti assim por ninguém antes, e algo
acontece... meu coração, a massa amortecida, começa a bater mais
rápido. Bate com uma paixão que nunca bateu antes.
Interrompendo nosso beijo, Tiger abre lentamente os olhos febris. O
rubor em sua pele sugere o que eu sempre soube que era verdade:
estamos encrencados. Isto era inevitável. Agora o problema que enfrento
é: que porra devo fazer?
— Não baixe a guarda. Nunca.
Ela assente rapidamente. — Eu não vou.
Ela parece pesar sobre algo e revela o que quando pergunta
reservadamente: — Como era a prisão?
— Fácil, comparado a estar aqui. – E é a verdade honesta.
Sem mais nada a dizer, passo o polegar pelo lábio inferior
carnudo antes de colocá-lo na boca. Seus beijos com gosto de chiclete
serão a minha morte.

— Falei com Stevie. No próximo sábado, isso vai


acontecer. – Lotus balança para frente e para trás em seu
assento, me deixando enjoada com todos os seus movimentos bruscos.
Balançando a cabeça casualmente, cruzo os braços sobre o peito. —
322
Eu cuidarei disso.
Ela para de balançar – graças a Deus – e olha para mim como se eu
tivesse acabado de falar com ela em suaíli9. — O que você quer dizer?
Você não pode estar aqui porque...
Mas eu a interrompi. — Deixe-me me preocupar com isso. Você tira
a noite de folga. Na verdade, ainda melhor. Vá embora no fim de
semana. Só não diga ao seu amigo que estou aqui. – Se ela deixar
transparecer que trabalho aqui, isso vai estragar tudo.
— Bull, não posso deixar você fazer isso. É um risco muito grande
para você. – Não há nada além de gratidão em seu tom, o que consolida
o que tenho que fazer. De jeito nenhum vou deixar aquele idiota, Stevie,
foder com ela. Fazemos isso do meu jeito.
— Você se arriscou comigo quando não deveria. A meu ver, devo a
você.
— Você não me deve nada. – ela altera, balançando a cabeça. —
Você é uma boa pessoa. Eu sabia disso desde o momento em que te
conheci.
Eu realmente gostaria que as pessoas parassem de dizer isso para
mim. Se ela soubesse o que eu pretendia fazer quando o local
estivesse vazio, não seria tão rápida em me elogiar.
— Eu cuido disso, certo? Só não se preocupe com o
lugar. Quando você voltar, será como se nada tivesse

9É uma das línguas oficiais do Quênia, de Ruanda, da


Tanzânia e de Uganda, embora os seus falantes nativos, os
povos suaílis.
acontecido. – E eu quero dizer isso. Será como se Kong nunca tivesse
existido. 323
Ela passa a mão pelo rosto exausto e acena com a cabeça. — OK.
Contanto que você tenha certeza. Me dá paz de espírito saber que você
está aqui.
— Não se preocupe. – Vou sair, mas ela me impede.
— Bull… não seja como eu. Quarenta e vivendo com
arrependimento. Nunca casei nem tive filho porque sempre pensei que
havia tempo. Mas acredite em mim, nunca haverá tempo suficiente. O
que quer que você esteja pensando... não hesite. Faça isso.
Se ela percebesse o que estava me dando permissão para fazer, não
acho que seria tão rápida com a conversa estimulante. Mas agradeço a
ideia, no entanto.
— Não deixe ninguém atrapalhar o que você quer, Lotus. – digo,
antes de sair de seu escritório, dando a ela meu próprio discurso
encorajador.
Ainda é cedo, mas decido começar meu turno e repassar meus
planos. Preciso ter certeza de incapacitar Kong rapidamente, para que
ele não possa fugir. Vou atraí-lo com bebidas e mulheres de graça.
Não haverá nenhum dos dois.
Assim que ele baixar a guarda, atacarei e estarei um passo mais
perto de vingar meu irmão.
Passo as próximas horas avaliando possíveis rotas de
fuga, pois preciso ter certeza de que meu plano está
perfeito. Kong parece um gritador, então terei que
amordaçá-lo imediatamente.
Ricky anuncia uma nova dançarina, interrompendo os
meus pensamentos assassinos. Eu não a vi antes. Olhando para o
relógio atrás do bar, vejo que Tawny deveria estar lá em cima. Faço
contato visual com Ricky, que encolhe os ombros. 324
A última vez que a vi, ela estava com um velho sinistro que queria
um lap dance. Mas isso foi há mais de uma hora.
Atravessando o clube, ando pelo corredor, indo direto para a sala
que Tawny gosta de usar para suas danças particulares. Não me
preocupo em bater e entrar pela porta, e o que vejo me deixa vermelho –
literalmente.
Tawny está deitada no meio do chão, coberta de sangue. Ela está
gemendo, com seu corpo quebrado tremendo com gemidos sem fôlego.
Ela está viva. Correndo para onde ela está, fico de joelhos e olho para o
dano infligido a ela. Seu rosto está inchado, espancado sem piedade.
— Tawny! – eu exclamo, balançando suavemente seu ombro. Seu
corpo está mole.
Ela está deitada de lado, então a sento lentamente, apoiando-a
contra meu peito. — Quem fez isto para você?
Ela começa a soluçar, desabando sobre mim.
— Se não me contar quem fez isso, não posso ajudá-la. – pressiono,
olhando para o vestido dela. Ainda está intacto. Quem fez isso não
estava atrás de sexo. Ele estava atrás de outra coisa.
— Você. – ela empurra entre respirações sofridas.
— Eu o quê? – pergunto, segurando-a com força
enquanto sua cabeça pende para o lado.
— Ele estava atrás de… você. – ela finalmente revela.
— Ele perguntou se eu conhecia você. Eu disse sim, sim. Ele
disse que tinha uma mensagem para você. E então ele
começou... me bater.
Minha mandíbula contrai e algo selvagem me domina. — Que
mensagem? 325
Tawny está chorando incontrolavelmente e com razão. Mas ela
precisa me dizer o que aquele filho da puta quer. — Tawny. – eu
imploro, sacudindo-a levemente.
Inclinando-se para mim, ela funga: — Ele disse... eles estão
vigiando você.
Não tenho ideia de quem, mas o que sei é que qualquer pessoa
associada a mim está em perigo. Meu sangue gela quando penso em
Tiger.
Quero fazer-lhe tantas outras perguntas, mas levá-la a um hospital é
mais importante. — Vamos, Tawny. Estou levando você para o hospital.
Ela está desmaiada, então a levanto, embalando-a contra meu peito.
Indo pela porta dos fundos, evito qualquer atenção, não querendo que a
notícia se espalhe, já que a Lotus não precisa de mais problemas.
Enquanto coloco Tawny no banco traseiro da minha caminhonete, me
pergunto quanto sangue terei que derramar para me vingar.
Isso deveria ser simples. Mas eu já deveria saber que nada nunca é.
326

Está na hora.
Tudo se resume a isso.
Eu não dormi. Estou muito tenso. Mas não preciso dormir. Só
preciso que o assassino do meu irmão esteja morto.
As rosas vermelhas que coloquei ao lado do túmulo de Damian são
um símbolo de paz. Sei que se ele estivesse vivo, estaria me
implorando para não fazer isso. Mas ele não está. — Sinto muito,
mano. – eu nem sei mais por que estou buscando absolvição.
Tiger me mandou mensagens de texto durante a
semana, mas não respondi. Não posso. Não depois do
que aconteceu com Tawny. Suas mensagens são
suficientes para eu saber que ela está bem. Por agora.
Eu deveria ter sido mais forte e permanecido escondido.
Agora ela é um maldito alvo. Quem me conhece é. É por isso
que não há espaço para erros esta noite. Assim que a luta
terminar, torturarei Kong e arrancarei dele tudo o que preciso. Ele não
falará facilmente; portanto, tenho que garantir que meus métodos para 327
fazê-lo falar sejam eficazes.
Assim que souber onde estão Jaws e Scrooge, ficarei nas sombras.
Decidi sair do The Pink Oyster porque será muito perigoso para a Lotus
se eu ficar. Enviarei a ela uma carta anônima, informando o que Stevie
planejou. Não quero delatar, mas não vou permitir que aquele idiota a
use dessa maneira.
Quanto ao Tiger… estou fazendo o que deveria ter feito desde o
início. Vou deixá-la sozinha.
O vento ecoa ao meu redor, criando um clima sinistro para o que
está por vir. Mas não estou nervoso. Estou calmo. Agarrando o
medalhão em volta do pescoço, me despeço do meu irmão, ignorando a
dor que sinto, sabendo o quanto decepcionado ele ficaria com minhas
decisões.
O trajeto até o The Pink Oyster me dá tempo para pensar no plano
que elaborei. Existem três saídas no clube e todas estarão bem trancadas.
Embebedar Kong seria a maneira mais fácil de subjugá-lo, mas preciso
dele com a mente lúcida, então isso significa que terei que agredi-lo...
muito. Ele pode lutar, mas não sou mais uma criança.
Apertando o volante, me olho no espelho retrovisor, meus olhos
combinando, olhos tão parecidos com os do meu irmão, olhando para
mim. Está na hora de ir.
Estacionando a caminhonete nos fundos, certifico-
me de que ninguém está olhando quando passo uma
grossa corrente de aço nas maçanetas laterais e traseiras e
as tranco com cadeado. Reforços extras estão em vigor. O
lugar é como uma maldita cidade fantasma, está tão silencioso.
Lotus vai passar a noite com sua irmã em Chicago. Eu disse a ela
para não se preocupar com nada, mas vou verificar para garantir que está 328
tudo bem. Não quero que ela apareça sem avisar.
Há uma placa na porta da frente indicando que esta noite é um
evento privado, então mando uma mensagem para Kong dizendo que
estou aqui. Ele aparece um momento depois. — Mano. – ele diz,
segurando minha mão e me puxando para bater os ombros com ele como
se fôssemos amigos.
— E aí. – respondo, continuando com a farsa. Não falta muito. Ele
me conduz para dentro, antes de trancar a porta atrás de mim.
Vejo que eles mudaram as mesas e cadeiras, limpando o chão. —
Então esta é a pocilga. – diz Kong, abrindo bem os braços.
Concordo com a cabeça, reprimindo a vontade de arrancar sua
língua.
— Agora, isso não é legal. – diz uma voz à minha esquerda. —
Você está insultando meu investimento.
Olhando por cima do ombro, vejo Stevie com um sorriso
presunçoso. Ele caminha até nós, me oferecendo a mão. — Tommy. Eu
ouvi muito sobre você. Eu sou Stevie.
Apertando sua mão com firmeza, eu aceno, continuando falando
ao mínimo.
— Kong atestou você, o que não acontece com
frequência. Preciso de outro homem na minha equipe.
Interessado?
— Talvez. – respondo. Cruzando os braços sobre o
peito, eu o agrado. — O que tem pra mim?
— Gosto de você. – Stevie diz entre risadas. — Um homem
que sabe o que quer. Você é o melhor lutador que já vi em muito
tempo. Quero você na minha folha de pagamento permanentemente.
Você luta por mim, ganhando dinheiro para mim, e eu te recompenso 329
com todo o dinheiro, boceta e drogas que você possa desejar.
Tudo, exceto um, me interessam.
— Que tipo de drogas?
— O que quiser, mas a minha especialidade é pura cocaína
colombiana. Se lutar não lhe interessar, bem, há muitas outras
oportunidades para você.
O sorriso malicioso de Stevie sugere que ele acredita que estou
quieto porque estou impressionado com ele se gabando. Eu não estou.
— Claro, estou dentro. – Espero que isso tire Stevie do meu pé.
— Boa escolha. – ele elogia, mas a piada é ele. — Este lugar será
nosso disfarce para todo o maldito dinheiro que estamos prestes a
ganhar.
Stevie é um empresário envolvido em muitos negócios, ao que
parece. Drogas, brigas ilegais e sabe-se lá o que mais. Ele é o grande
mal do submundo. O mesmo acontece com Jaws. Deve haver uma
conexão aqui. Só não sei o que é isso... ainda.
— Mal posso esperar. – respondo. — Onde posso me aquecer?
— Vamos, vou te mostrar. – Kong gesticula com a cabeça,
abrindo caminho em direção ao camarim.
Seguindo-o, não posso deixar de sentir que isto é
uma caminhada no corredor da morte. Ele merece um
pedido especial? Um último desejo antes de ser
condenado à morte? Quando as lembranças do que ele fez
comigo e com Damian passam diante dos meus olhos, percebo
que o último desejo desse filho da puta foi viver nos últimos quatorze
anos. 330
É agora que o tempo chega ao fim.
Quando entramos no camarim, jogo minha mochila no chão e finjo
observar o que me rodeia. O celular de Kong toca e ele atende. Ele
rapidamente vira as costas e começa a falar baixinho com quem está do
outro lado.
Ele não fala baixo o suficiente, no entanto.
— Ouça sua mãe, Yasmin. Papai está trabalhando até tarde. – Pausa.
— Sim, prometo que vou colocar você na cama amanhã.
Mas não, ele não vai porque amanhã... ele estará morto.
Algo muda dentro de mim e envolve minha garganta com a mão. Eu
ignoro esse sentimento, porque ele não tem o direito de estar aqui. Isso
foi decidido por ele.
Deixo Kong sozinho, dando-lhe tempo para conversar com a filha,
porque será a última vez que ele fará isso. Acabei de conceder a ele seu
último desejo... ele simplesmente não sabe disso.

O grito da multidão alimenta esta escuridão dentro


de mim.
Violência.
Sangue.
É o que preciso para sobreviver.
Quando ouço o som de um osso quebrando, inclino meu rosto em
direção ao teto e inalo em triunfo. Não há som igual. Meu oponente cai 331
no chão, gritando de dor enquanto segura o braço quebrado. Pelo menos
ele não está chorando como os outros dois homens com quem lutei esta
noite.
Está feito. Finalmente.
As pessoas tentam me parabenizar, mas eu as afasto. Não estou aqui
para elogios. Assim que entro no camarim, entrelaço as mãos atrás do
pescoço e respiro fundo. Posso sentir o sangue bombeando por todo o
meu corpo. Ironicamente, não me lembro de ter me sentido tão vivo.
— Que porra você tomou esta noite? Puta merda! Você destruiu
todos eles. – Ainda não, não destruí.
Virando-me para Kong, dou-lhe um meio sorriso. — Só quero ficar
bêbado e conseguir alguma boceta. Esses idiotas estão no meu caminho.
Toma uma bebida comigo quando todos forem embora?
Não, não é uma opção.
— Posso ou não ter alguma companhia feminina em breve. – digo,
na esperança de adoçar o acordo.
Kong esfrega as mãos. — Você me ganhou com boceta.
— Esvazie o clube. Vou me trocar. – Virando-me, abro o zíper da
minha mochila, não querendo que meu entusiasmo
apareça.
Assim que ele sai, respiro lentamente porque
finalmente está acontecendo. Tirando minhas roupas
suadas e ensanguentadas, coloco meu uniforme: camisa
branca, calça preta, gravata preta, suspensórios pretos e
Converse. Este é um motivo de comemoração, então eu queria
me vestir adequadamente.
Alcançando minha corrente, eu passo o dedo pelo medalhão,
recusando-me a me sentir culpado por minha decisão. Colocando-o, noto 332
que meu celular acende dentro da minha mochila. É uma mensagem de
Tiger. Não me preocupo em ler porque preciso manter minha cabeça no
jogo.
Tenho tudo que preciso na minha mochila, então jogo-a por cima do
ombro, verifico as saídas laterais e dos fundos para garantir que ainda
estão trancadas e depois saio para o clube vazio.
Depois que as lutas terminam, ninguém fica por perto. Não se trata
de socialização. Isto é sobre dinheiro. E uma vez que não há mais
dinheiro para ganhar, não há necessidade de as pessoas ficarem. Stevie
saiu no meio da luta. Ele viu o suficiente.
Pelo que ele acredita, ele adicionou outro lacaio à sua equipe. Ele
está muito enganado porque está prestes a perder dois. Kong está atrás
do bar, servindo-se de um pouco de uísque.
— Vou esperar pelas garotas. Elas apenas mandaram uma
mensagem. Elas não estão longe.
Kong levanta o copo em saudação. Será a última bebida que ele
tomará.
Minhas mãos tremem de alegria enquanto tranco a porta da
frente. Quatorze anos se resumiram a este momento. Depois de tirar
minha lente de contato, deslizo a faca serrilhada sob a
cintura, na parte inferior das costas. É tudo que preciso.
Isso vai ficar sangrento.
Assobiando, aproveito o tempo e volto para o clube.
Na minha cabeça, imaginei esse momento com armas em
punho, e assim que esse idiota desse seu último suspiro, um
pedaço de mim retornaria. Mas, na realidade, eu poderia matá-
lo repetidas vezes e ainda assim não seria suficiente.
As costas de Kong estão para mim enquanto ele observa as bebidas
333
nas prateleiras. — Este lugar pode ser uma merda... – diz ele, enquanto
olho para ele. — Mas com certeza tem uma boa bebida. O que você vai
querer? Uísque? Vodka?
Parando atrás dele, saboreio o silêncio. Vai se assim. — Sua cabeça.
Kong se vira para mim, e eu dou a ele um segundo, uma porra de
segundo, para processar quem eu sou, e quando ele olha nos meus olhos
incompatíveis, ele sabe... o ceifador está aqui.
Ele instantaneamente pega a arma em seu coldre, mas eu o golpeio e
lhe dou um soco bem no nariz. Ele cambaleia dois passos para trás,
segurando o rosto sangrando. Não lhe dou tempo para recuperar o
equilíbrio enquanto lhe dou um soco nas costelas e depois no estômago.
Ele está ofegante e, quando tenta se levantar, dou um chute em sua
rótula, quebrando-a. Um grito de dor escapa quando ele cai no chão.
Sem hesitar, agarro sua gola e começo a arrastá-lo pelo clube.
Ele tenta agarrar qualquer coisa que possa alcançar, mas suas mãos
estão escorregadias, graças ao sangue que as cobre. O rastro vermelho
brilhante alimenta minha devassidão enquanto o carrego escada
acima.
— Por quê? – ele grita, com saliva cobrindo seu queixo. — Que
porra fiz para você?
Podemos jogar vinte perguntas depois. Agora,
preciso amarrar esse filho da puta nesse poste. Jogando-o
contra ele, ele tenta se levantar, mas não vai a lugar
nenhum, e deixo isso claro quando pressiono minha bota em
sua rótula quebrada.
Ele grita de dor e já está prestes a desmaiar.
Jogo minha mochila no chão e procuro as braçadeiras. Puxando seus
braços para trás, eu aperto seus pulsos para que ele fique bem preso ao 334
poste. Ele tenta se levantar, mas o joelho quebrado não suporta seu peso.
Ele permanece sentado.
Agachando-me na frente dele, sorrio com o que vejo. Ele está
quebrado, amarrado e sangrando. Isto apenas começou.
— Isso só vai acabar de uma maneira para você. – revelo
severamente. — Então, sugiro que você responda às minhas perguntas e
não farei com que isso doa... muito.
— Foda-se. – Olhando ferozmente, ele cospe um pouco de sangue.
Suspirando, me posiciono lentamente e permito que ele veja quem
eu realmente sou. — Resposta errada.
Estou tentado a quebrar todos os ossos do corpo dele, mas preciso
que ele seja coerente. Eu preciso de respostas.
— Estou procurando por você há quatorze anos. Então pode
imaginar minha surpresa quando você quase caiu no meu colo. Alguns
podem dizer que foi o destino? – eu balanço minha cabeça. — Mas não
acredito nisso porque por que diabos eu estava fadado a te conhecer na
noite em que você... – Inalando, eu me firmo. — Na noite em que
você matou meu… irmão.
Os olhos de Kong se arregalam e o reconhecimento surge diante
dele.
— Sei que pareço muito diferente. Não o filho da
puta magrelo que você conteve tão facilmente quando os
seus amigos espancaram, humilharam e mataram meu
irmão. – afirmo, estalando as juntas dos dedos porque quero
tanto socar ele.
— O que foi que você me disse? Consegue se lembrar? – pergunto,
batendo no meu queixo. 335
— Não me lembro de nada. Você pegou o homem errado! – Kong
grita, puxando suas restrições.
— Kong. – digo, balançando a cabeça. — Ou devo chamá-lo de
Ethan Da Silva? Esse é o seu nome, não é? – Agradeço silenciosamente
a Tawny por deixar escapar essa informação.
Sua mandíbula contrai. — Esse não sou eu, cara. Eu juro! – Suas
mentiras não o levarão a lugar nenhum.
Arregaçando a manga da minha camisa, mostro a ele minha
tatuagem. O diferencial de quatro ases. — Você vê isso? – digo,
apontando para a mulher vendada. — Este é você. A justiça será dada
com justiça, sem medo. Naquela noite, você me segurou, mas em vez de
me vendar... você me forçou a assistir... me forçou a ver seus amigos
destruírem meu irmão.
Kong engole, preso no passado.
— Cada um deles é para seus amigos. – Aponto para o diamante
verde, que era a pedra do anel de campeonato de Damian. — Isto é para
o idiota que roubou do meu irmão. Quebrar o pulso não foi suficiente.
Ele teve que roubá-lo também. – Eu passo para o leão. — Isto é para
o maldito covarde que teve a chance de salvar meu irmão, mas não o
fez. Um leão é corajoso, leal, algo que esse idiota não
era.
Kong percebe que falei sobre ele no passado.
— É por isso... – sorrio. — Que acabei com sua vida
patética. Hero, ou devo dizer Lachlan, não morreu como
herói. Ele morreu chorando, implorando por sua vida enquanto
mijava na calça.
— Você matou o Hero? – ele pergunta, com os olhos arregalados.
Um dos termos do meu acordo judicial era que minha identidade nunca 336
fosse divulgada.
— Sim. – respondo sem pausa. — Você vê esta cruz aqui? – Aponto
para a pequena cruz preta onde deveria estar o terno. — Eu consegui
isso depois que ele caiu de joelhos e então atirei direto na porra do
coração dele.
Kong balança a cabeça descontroladamente. — Seu filho da puta!
Não! Você me enganou!
Prosperando com sua dor, eu continuo. — Eu o encontrei, assim
como encontrei você. Eu não mostrei nenhuma piedade quando ele
implorou. Por que eu deveria? Ele não mostrou nada ao meu irmão. E
isso deixa o último membro da sua pequena gangue.
O tubarão azul tem sido uma lembrança permanente do que sempre
foi destinado.
— Isso é autoexplicativo. Jaws foi o filho da puta que pegou aquela
pedra e abriu a cabeça do meu irmão. Sim, todos vocês tiveram um
papel na morte dele, mas Jaws foi quem deu o golpe final. – digo com
nada além de ódio.
— Então agora você vai me dizer onde ele e Scrooge estão.
Kong não pronunciou uma única palavra. Sua surpresa é clara.
Ele achava que éramos amigos de verdade? — Não te
vou dizer nada. – ele resmunga. — Você vai me matar
de qualquer maneira, então por que eu te contaria alguma
coisa?
Suspirando, não sei se estou feliz ou irritado por ele ter
decidido ser difícil, porque agora serei forçado – e uso essa
palavra levianamente – a machucá-lo.
Avançando lentamente, fico fora de alcance, olhando para Kong. —
Diga-me por quê. – exijo. Quando ele permanece calado, piso em seu 337
joelho. — Diga-me por que nós?
Seus gritos alimentam os demônios e eu pego minha faca. Sem
hesitar, avanço e o apunhalo no flanco. É só um corte, mas sei que dói
demais. Sua camisa branca começa a ficar manchada de vermelho
brilhante.
— Quando atirei no seu amigo, fui para a prisão e, durante esse
tempo, aprendi com os melhores. – revelo, observando-o se debater
loucamente, tentando se libertar. — Eu sei como torturar você por horas.
Eu sei onde cortar, onde machucar você para mantê-lo vivo. Posso fazer
isso a noite toda.
Assim que avanço, mais uma vez, ele balança a cabeça
freneticamente. — Ok, ok, tudo bem! – ele grita, puxando as suas
restrições. — Vou te contar o que sei!
Uma parte de mim está triste por ele ter se submetido tão
facilmente.
— Jaws está aqui. Em Detroit. Ele é o dono da porra da cidade,
cara! Stevie e ele são rivais.
Sua admissão me fez arquear uma sobrancelha. — Então por que
diabos você está trabalhando com Stevie?
Ele lambe os lábios ensanguentados. — Porque
Jaws não precisava mais de mim. Ele e Scrooge são
figurões agora e não deixarão ninguém atrapalhar.
Quando não consegui fazer um trabalho que eles queriam
que eu fizesse, fui jogado fora como lixo. Não importava
que fossemos amigos desde que éramos crianças. Ofereci-me
para trabalhar para Stevie porque precisava da proteção dele.
— Jaws não começaria nada com ele porque ele quer passar
despercebido. Contanto que Stevie não interfira em seus negócios, não 338
há problema.
Franzo meu lábio, enojado. Pensei que ele era a força bruta. Parece
que me enganei porque ele é um maldito maricas.
— Isso é tudo que sei. Juro! Não estou mais no círculo íntimo deles.
— Que trabalho eles queriam que você fizesse?
— Jaws queria que eu matasse seu sobrinho. – ele revela, o que me
faz pensar por quê. — Ele tem um estranho… fascínio pela irmã.
— O que diabos isso significa?
— Isso significa o que você acha que significa! – ele exclama. —
Jaws é um filho da puta doente. Ele não se importa com quem diabos
você é... se ele quer você, ele tem você.
— E quanto ao Scrooge? O que ele faz?
— Ele é o dinheiro. Ele é intocável. Jaws é o cérebro. Juntos, eles
são uma força mortal imparável. Esqueça essa vingança. Você não vai
vencer. – diz ele, estremecendo quando tenta se mover.
— Dê-me nomes. – Ignoro seu conselho.
Ele balança a cabeça. — Isso é tudo que estou lhe dizendo! Eles
podem ter me perseguido, mas não estou disposto a
denunciá-los.
Normalmente, eu aplaudiria sua lealdade. Ninguém
gosta de informantes. Mas agora, o silêncio dele está me
irritando. A violência parece não funcionar, então decido
tentar outro método. — Você vai proteger esses idiotas depois
da forma como eles trataram você? Não admira que eles não
tivessem utilidade para você. Você é fraco. Mas sei o que vai fazer você
falar. 339
Ficando de joelhos, eu o encaro com nada além de puro ódio. — O
que seu filho e sua filha pensarão quando eu fizer com eles o que você
deveria ter feito com o sobrinho de Jaws?
Esta é a única vez que recebo uma resposta de Kong. — Seu filho
da puta! Não toque neles! – ele tenta violentamente se libertar.
— Dê-me seus nomes e não serei forçado a fazer isso. – Aponto a
faca em sua direção, indicando que a escolha é dele.
— Não posso. – ele começa a chorar. A visão me enerva.
— Não posso determinar o destino de seus filhos. – eu fico de pé,
dando crédito a Kong enquanto ele tenta me chutar. — Tudo que quero
são os nomes deles. Eu cuidarei do resto.
— Cara, por favor. Fui bom com você. – ele tem a audácia de dizer.
Rindo sinistramente, começo a andar na frente dele. — Bom para
mim? Eu fui útil para você. Isso foi tudo. Uma transação comercial em
ambos os lados.
— Não, não foi para mim! Eu pensei que éramos amigos.
— Amigos? – eu rio, ainda andando. — Não quero ser seu
amigo. Os amigos que você manteve são a razão de você estar aqui,
implorando por sua vida. Por que eles fizeram isso?
— Não sei! – ele grita. O ar começa a formar bolhas.
Uma tempestade se aproxima. — Não há razão.
Simplesmente aconteceu! Éramos jovens entediados.
Sua resposta é como cuspir no túmulo de Damian.
Atacando, eu dou um soco no queixo dele. Sua cabeça cai para
trás, acertando o poste.
— Entediado? – exclamo, chutando-o no estômago. — Se você
estivesse entediado, poderia ter feito um milhão de outras coisas! Mas 340
em vez disso, você escolheu matar alguém que não merecia morrer!
Kong está com falta de ar, pois tenho quase certeza de que uma
costela rompeu seu pulmão. Mas ainda não terminamos.
— Você me disse…
Mas Kong não me permite terminar. Ele preenche as lacunas,
selando seu destino para sempre. — É hora de você se tornar um
homem. – ele ofega, repetindo as palavras que me disse há quatorze
anos. — Foi o que eu disse. E parece que você fez. Os nomes deles
são…
Sua cabeça pende para o lado. Ele está prestes a desmaiar. — Não,
você não vai! – eu o agarro pelo pescoço, forçando-o a ficar acordado.
— Diga-me!
Um gargarejo escapa de seus lábios. — Benjamim Solomon e…
— E quem? – grito, apertando ainda mais sua garganta.
— Jaws é…
Ele tem três malditos segundos para falar antes que eu corte sua
maldita garganta. — Filho da puta! Jaws é quem? Me de um nome!
— Eu não posso, cara. – ele ofega, com lágrimas escorrendo pelo
canto dos olhos. — Só não machuque minha família.
Eles são apenas crianças. – Ele não vai falar. Sua
lealdade seria admirável, mas apenas acelerou sua morte.
Queria ser paciente e torturá-lo até que ele
desembuchasse, mas não posso mais fazer isso.
Alcançando minha faca, olho-o nos olhos e grito: — Meu irmão
também. E eu também. – E com isso, enfio a lâmina direto em seu 341
coração. Eu tenho o que vim buscar aqui.
Nossos olhares nunca vacilam enquanto vejo a vida dele se esvaindo
lentamente. Eu gostaria que com cada respiração ele pudesse dar vida a
Damian, mas não é assim que funciona. Às vezes, coisas acontecem.
Não há uma razão para o que aconteceu com Damian. Ele estava no
lugar errado, na hora errada, o que só torna tudo ainda pior. Sua morte
foi em vão.
Mas tenho um motivo para matar os dois participantes restantes. Eu
sei quem eles são. Eles estão mortos, porra.
Kong leva cerca de dois minutos antes de dar seu último suspiro. A
cada segundo, respiro com ele, ficando mais forte à medida que sua
fraqueza alimenta minha força. Alguém pode sentir remorso, mas eu
não. Meu único arrependimento é não poder infligir mais dor.
Quando ele fica imóvel, arranco a lâmina de seu peito e passo-a em
sua camisa, deixando um rastro vermelho em seu rastro. Inalando,
inclino meu rosto para o céu enquanto uma sensação de paz toma conta
de mim. Eu me senti assim apenas uma vez antes.
No entanto, quando um suspiro abafado soa atrás de mim, meu
paraíso logo se torna um inferno. Virando-me para olhar por cima do
ombro, olho para os gentis olhos verdes, interrompendo minha
euforia.
342

— Bu... Bu... Bull? – Minha voz é estranha porque, neste momento,


a vida como a conheço foi destruída sem possibilidade de reparo.
Embora o que estou vendo seja claro como o dia, não posso aceitar
isso como verdade. Deve haver outra razão para Bull estar diante de
mim com uma faca ensanguentada na mão e um homem morto a seus
pés. Mas não existe. O homem está morto por causa de Bull.
Tapando minha boca, engulo meu vômito. Minha histeria pode
esperar. Preciso dar o fora daqui. Virando rápido
demais, perco o equilíbrio e quase caio de bunda.
Quando vejo o que escorreguei, um grito vigoroso escapa
de mim.
Sangue.
— Porra! – Bull avança furiosamente, mas coloco uma
mão trêmula na minha frente, implorando para que ele pare.
— Por favor, não me machuque. Não vou contar a ninguém.
Ele para, dominado pela melancolia. — Eu nunca te machucaria. –
343
Quando não respondo, ele acrescenta sinceramente: — Você sabe disso,
certo?
Mas eu não sei. Eu não sei de nada. — Por favor, deixe-me ir.
— Você não é minha prisioneira. Você está livre para ir. – diz ele,
abaixando lentamente a faca no palco e levantando as mãos
ensanguentadas em sinal de rendição.
A visão ficará gravada em minha memória para sempre.
Quero perguntar a ele por quê, mas isso ainda importa? Ele acabou
de matar um homem... outro homem. Eu preciso me afastar dele.
Definitivamente.
— Tiger, você acredita em mim, não é? – ele entrelaça as mãos atrás
do pescoço, implorando que eu acredite nele. Mas não posso.
Virando, corro pelo clube, com imagens de Bull me derrubando
como uma gazela na selva, me levando a correr para salvar minha vida.
Abro a porta da frente e corro em direção à minha caminhonete. No
momento em que entro, travo a porta e espero Bull sair.
Ele não sai.
Minhas mãos tremem tanto que não consigo colocar a chave na
ignição. Eu respiro fundo. Assim que elas param de
tremer, ligo minha caminhonete e entro na rodovia.
Dirijo no piloto automático, quase sem piscar, com muito
medo de reviver o que acabei de testemunhar.
Fui ao The Pink Oyster porque queria saber por que Bull
estava me ignorando. Quando vi que o local estava fechado
para um evento privado, entrei com a chave que ainda tinha.
Agora sei por que ele está desaparecido. Ele estava muito ocupado
planejando o assassinato de alguém. Eu não sei quem foi. Seu queixo
estava voltado para baixo. Mas o pouco de sangue escorrendo de seus 344
lábios sem vida era um sinal claro de que ele estava morto.
Enquanto aperto o volante, lágrimas escorrem pelo meu rosto
porque não sei o que fazer. Uma pessoa normal iria à polícia, mas
mesmo assim, depois de tudo que acabei de ver, não posso fazer isso
com ele. Algo está seriamente errado comigo.
Acreditei nele quando ele disse que não me machucaria. Quanto
trágico é isso?
Estacionando no Blue Bloods, mal tenho tempo de estacionar minha
caminhonete porque vou ficar gravemente doente. Abrindo a porta, eu
suspiro lá fora, querendo dissipar esse sentimento interior, mas não
consigo.
A doença que sinto não é algo que eu possa eliminar. Isso vai
apodrecer dentro de mim enquanto eu mantiver seu segredo.
O ar fresco me acalma um pouco, então desligo o motor e entro.
Não vou trabalhar esta noite, mas não posso ir para casa. Não quero que
Jordy me veja assim. Não quero que Jordy saiba que a mãe dele tem…
sentimentos por um assassino.
Mantendo a cabeça baixa, corro rapidamente para o meu
camarim. Uma vez lá dentro, me encosto na porta e apoio minha
cabeça nela. Preciso organizar meus pensamentos.
Acabei de ver uma pessoa morta, morta pelo
homem que permiti que me tocasse repetidas vezes.
Alcançando meu bolso de trás com dedos trêmulos, pego
meu celular. Só há uma coisa a fazer.
— 911, qual é a sua emergência? – A atendente está
esperando, esperando que eu finalmente faça a coisa certa.
Preciso dizer a ela que há um cadáver no The Pink Oyster e que seu
assassino é Bull. Abro a boca, mas de repente não consigo falar. 345
"Eu nunca te machucaria."
As palavras de Bull se repetem, assombrando minha decisão porque
simplesmente não consigo. Se eu chamar a polícia, Franca irá jogá-lo de
volta na prisão, onde permanecerá pelo resto da vida. A ideia de nunca
mais vê-lo, de nunca mais sentir isso, me faz encerrar rapidamente a
ligação.
É egoísta e moralmente errado, muito errado, mas prefiro lidar com
essa culpa eterna do que ser a única a delatar Bull. Eu sabia que ele era
perigoso, caramba, ele até me disse que era. Mas eu realmente nunca
acreditei nisso... até agora.
Deslizando pela porta, eu me encolho e puxo os joelhos em minha
direção, abraçando-os contra o peito. Embora minha mente esteja
acelerada, de uma coisa tenho certeza: nunca mais poderei ver Bull. Não
importa o quanto eu queira lutar contra isso, não vou.
Meu celular toca sem parar. Mas eu ignoro isso. Eu sei quem é.
Não sei quanto tempo fico sentada no chão, olhando para o nada.
Cada minuto, cada segundo, tudo se transforma em uma confusão
colossal, e tudo que me resta é minha total estupidez me encarando.
Penso em todas as vezes que permiti que ele me tocasse, em como
gostei e em como queria mais.
Aquelas mãos me levaram ao auge do prazer e da
dor, e mesmo quando a linha começou a ficar confusa,
nunca foi suficiente. Suas mãos me trouxeram de volta à
vida, mas para outra pessoa... ele sufocou a vida dela.
Como alguém pode ser tão perverso - em todos os sentidos da
palavra?
Passando a mão pelo rosto, enxugo as lágrimas e decido me
refrescar antes de ir para casa. Parando, vou até o banheiro e evito o 346
espelho. Não preciso disso para saber que estou uma merda.
Jogando um pouco de água no rosto, enxáguo a boca, desejando
poder lavar a sensação dos lábios de Bull nos meus. Mas não posso. Ele
está impresso em cada parte de mim.
Suspirando, pego a toalha, precisando dar o fora daqui. Mas quando
a porta se abre, fugir não é mais uma opção. Eu corro para pegar a única
arma ao meu alcance: uma pequena lixa de unha prateada. Bull está do
outro lado da sala em três passos longos, parando na porta do banheiro
enquanto eu estendo trêmula a lixa de unha na minha frente.
Ele olha para a arma com uma carranca profunda.
Não consigo controlar o tremor que assola meu corpo, mas firmo
minha mão. — Saia daqui. Liguei para a polícia.
Meu aviso cai em ouvidos surdos. Ele avança e eu instantaneamente
recuo até minha bunda bater na parede. Espero que ele me desarme, mas
ele não o faz. Ele para a centímetros de distância e lentamente levanta
ambas as mãos em sinal de rendição. — Por favor, por favor, deixe-me
explicar.
Fui pega completamente desprevenida porque seu pedido contém
apenas sinceridade. Eu deveria gritar por ajuda porque nada que ele
possa dizer desculpará o que vi. Mas meu coração, o
maldito traidor, implora que eu ouça o que ele tem a
dizer.
Ele interpreta meu silêncio como submissão. —
Aquele homem que eu… matei. – Sua pausa faz meu lábio
inferior tremer. — Ele mereceu. Ele e três de seus amigos
mudaram minha vida quando eu tinha quinze anos. Eles são a
razão de eu ser do jeito que sou. Ou talvez eles tenham
desencadeado quem eu sempre me tornaria.
A lixa de unha treme na minha mão.
347
— Eles tiraram a única pessoa que realmente me entendia. Eles
mataram alguém que não merecia morrer. – ele revela, abaixando o
queixo enquanto seu peito começa a subir e descer perigosamente lento.
— Quatorze anos atrás, eles emboscaram a mim e ao meu irmão. O
idiota que matei; ele era a força bruta. Ele me segurou enquanto eu
observava seus três amigos espancarem, humilharem e, eventualmente,
matarem meu irmão de dezessete anos, abrindo sua cabeça com a porra
de uma pedra.
Lágrimas grudam em meus cílios. Tento afastá-las.
— Fui para a prisão porque encontrei um deles dois anos depois e
matei-o a tiro. Um maldito alvo perfeito direto em seu coração.
Um suspiro atordoado me deixa; o mistério por trás de seu apelido
foi revelado.
— Fui preso por doze anos por matar um dos assassinos do meu
irmão. Mas a prisão não me modificou. Não me arrependi. – ele afirma,
levantando lentamente o queixo para encontrar meus olhos arregalados.
— Isso só me deu tempo para planejar minha vingança. Imaginei
todas as maneiras pelas quais faria aqueles que machucaram meu
irmão pagarem.
— Dois já foram, faltam dois. – ele pronuncia,
balançando a cabeça uma vez. — Antes de eu acabar
com sua vida patética esta noite, ele me disse quem são os
dois restantes. Agora, só preciso encontrá-los e garantir
que recebam a mesma punição que seus outros dois
amigos. Isto é sobre vingança. Sempre foi.
Ele puxa para baixo a gola da camisa, expondo a pele tatuada sobre
seu coração, antes de pegar minha mão. Quando sua mão segura a 348
minha, uma sensação de medo e excitação me invade. Ele leva a lixa de
unha até o peito e me obriga a cravar a ponta em sua carne.
Tento recuar, mas ele me segura com força.
— Você pode fazer o que quiser comigo, mas tudo que peço é que
me deixe terminar isso. Quando eu matar os responsáveis por ferir
Damian, então não terei mais razão para viver.
— Bull, não! – eu tento freneticamente me afastar, mas ele continua
a forçar minha mão até que, eventualmente, um pouco de sangue escorre
do ferimento que ele me forçou a criar.
Seu olhar nunca deixa o meu. — Mereço morrer. Esta noite, roubei
o pai de dois filhos e, embora estivesse bem ciente do fato, isso não me
fez mudar de ideia. Não tenho coração, Tiger. – diz ele, revelando por
que fez a pergunta na minha cozinha sobre Jordy ter crescido sem pai.
Mas sua pergunta contradiz sua afirmação. Se ele não tivesse
coração... ele não se importaria. Mas ele tem. Ele pode não perceber,
mas percebo. É por isso que não chamei a polícia. É por isso que
permito que minhas lágrimas caiam.
— Sinto muito por fazer você chorar. – diz ele com pesar.
Mas eu balanço minha cabeça, confundindo-o. — Essas lágrimas
não são por mim… essas lágrimas são por você.
Seus lábios se abrem e seu aperto em mim diminui,
permitindo que eu solte a lixa de unha, que cai no chão.
— Sou eu quem está arrependido. Não consigo nem
imaginar o que você passou. Você era apenas uma criança.
Você e... Damian. – Ele fecha os olhos com força. — Ambos
eram. Não estou desculpando o que você fez... mas eu entendo.
Que Deus me fulmine, mas eu entendo isso. Não há certo ou errado
nesta situação. Não tolero tirar uma vida, mas as circunstâncias não são 349
pretas e brancas.
E diante de mim, um azul-âmbar ganha vida quando ele abre os
olhos. — Entende? – ele pergunta, balançando a cabeça lentamente.
Com um toque hesitante, coloco minha mão em sua bochecha. —
Sim. Se alguém machucasse alguém que eu amasse, eu também iria
querer vingança. E a maneira como seu irmão sofreu... ah, meu Deus,
Bull, sinto muito que você tenha passado por isso. Quem são os outros
homens?
Ele resmunga, virando o rosto para interromper nosso toque. Mas
não vou deixá-lo escapar, não desta vez. Agarrando seu queixo, eu o
forço a olhar para mim. — Diga-me. O problema dos segredos é que
eles não são segredos se você contar a alguém. Deixe-me ser esse
alguém.
— Por quê? – ele questiona, com o desespero pesado nessas duas
palavras. — Por que você iria querer se meter nas minhas merdas?
Depois de tudo que acabei de contar...
Mas não o deixo terminar. — É por causa do que você me disse que
eu quero saber. Você não é um assassino de sangue frio.
— Então o que eu sou? – ele pergunta, me implorando para
esclarecer isso.
— Você é humano. – concluo, usando suas
palavras para ele.
Bull se vê apenas como um monstro. Ele não é. Ele
está agindo com base na única emoção que prova que ele é
tudo menos um vilão: o amor. Seu amor por Damian o levou a
fazer coisas terríveis. Mas ele felizmente sacrificou sua vida
para garantir que a morte de seu irmão não ficasse impune.
Dois erros fazem um acerto? Talvez esta seja a exceção à regra?
350
Sinceramente, não sei.
— Eu machuco tudo que toco. Eu machuquei você. – acrescenta ele,
afastando-se do meu aperto com raiva.
— Sim, você fez, mas também me fez sentir bem. Não apenas
fisicamente, mas emocionalmente também. Desde o primeiro momento
em que nos conhecemos, você me protegeu. Você não precisava. Mas
você fez. Se isso não prova que você é uma boa pessoa... então deixe-me
mostrar o que vejo.
Bull fica rígido, com os punhos cerrados ao lado do corpo.
Implacável, envolvo meus dedos em torno de seu pulso e puxo sua mão
para meu peito, colocando-a sobre meu coração acelerado. — Cada vez
que está perto de mim, não consigo respirar o suficiente com rapidez
suficiente. Você me deixa sem fôlego com sua brutalidade porque vive a
vida sem remorso. – Sua mandíbula fica tensa enquanto ele lentamente
abre o punho e coloca a mão no meu peito, sobre o meu coração. —
Você está aqui com um propósito. Embora a maioria esteja tropeçando
na vida, você sabe o que quer. Sim, não é convencional, mas mostra a
sua lealdade, a sua força para com quem você ama.
— Você me diz que está morto por dentro, mas como pode estar?
Você está fazendo tudo isso para garantir que seu irmão nunca seja
esquecido. Você sacrificou sua vida para honrar à
memória dele. Esses homens tiraram algo de você.
Entrelaçando nossos dedos, eu olho nos dele,
percebendo que meus sentimentos por ele são mais
profundos do que eu pensava. — Eu só poderia desejar esse
tipo de lealdade. Esse amor.
Minhas bochechas esquentam porque uma parte de mim deseja que
Bull me demonstre esse tipo de dedicação. 351
— Para onde vamos daqui? – ele pergunta, apertando ainda mais.
Suspirando, rezo pela minha alma pelo que estou prestes a dizer. —
Eu não vou impedir você. Você fará o que precisa.
Sua respiração constante revela que ele está pensando sobre o que
acabei de declarar. — E você concorda em ter isso em sua consciência?
— Minha consciência ficou manchada há muito tempo. – revelo,
pensando no que fiz com Christopher. Se eu não seguisse meu coração,
as coisas teriam sido muito diferentes. Na época, pensei que meu amor
fosse inquebrável, mas como fui ingênua.
— Preciso ficar longe de você. – Bull confessa, segurando minha
garganta e passando o polegar sobre meu pulso acelerado.
— Eu sei. – respondo, odiando como isso deve acabar. Só porque
não vou atrapalhar sua justiça não significa que posso ficar parada e vê-
lo caçar dois homens com alegria, não importa o quanto eles mereçam.
— Eu nunca esperei sentir…
— Sentir o quê? – sussurro, lambendo meus lábios.
Ele inspira, liberando a mão sobre meu coração. — Sentir...
qualquer coisa. – ele esclarece sinceramente, o que me toca de uma
forma que não deveria. — Obrigado.
— Pelo que? – pergunto, com minha pele ganhando
vida enquanto ele continua acariciando meu pescoço.
— Por ver algo em mim que nunca verei. – E este é
nosso encerramento. Bull está acabando com algo que poderia
ter sido maravilhoso. Mas nunca será por causa do que ele tem
que fazer.
— Quem são os outros homens? – pressiono. Não sei por que isso
importa. Simplesmente importa. Talvez seja disso que preciso para meu 352
próprio encerramento.
Bull desliza os dedos por trás da minha nuca e me puxa em sua
direção. Nossos lábios estão a centímetros de distância. — Como eu,
todos nós usamos pseudônimos. Esta noite, matei Kong. – ele revela,
enquanto meu coração aperta e o mundo se inclina, me desequilibrando.
— Amanhã, eu mato Scrooge e… – Mas todas as suas palavras se
transformam em uma espiral de destruição porque não pode ser assim.
As paredes começam a se fechar sobre mim e minha pele fica
subitamente quente. Eu não consigo respirar. Deve haver algum erro.
Mas não há, e Bull confirma isso quando completa todo esse show
horrível. — Jaws. – ele conclui, enquanto suspiro, desesperada por ar.
— Tiger?
Tento me soltar, mas ele me agarra com força. De certa forma, estou
grata porque a sala começa a girar violentamente e a náusea aumenta.
Mas reprimo isso. Tenho mais uma pergunta. Uma pergunta é a razão
pela qual eu me senti tão conectada com Bull esse tempo todo.
Simplesmente não sabia disso... até agora. — São três. – sussurro,
implorando que haja algum erro. — Quem foi o quarto?
Bull arqueia uma sobrancelha, mas pressiono minha mão sobre a
dele, apertando seus dedos. — Quem foi o outro
homem que você matou? O homem por quem você foi
preso?
Tudo se resume a isso. Por favor, Deus, que haja
algum erro. Por favor, não deixe que seja ele. Mas no
fundo, sempre soube que ele nunca me abandonaria. Ele
nunca nos abandonaria por escolha. Suas escolhas foram tiradas dele. E
agora eu sei porque… 353
— O nome dele era Lachlan… Hero era seu apelido. – confessa
Bull, consolidando o fato de que o universo é uma vadia cruel e sádica
que estava apenas ganhando tempo, esperando que eu pagasse minhas
dívidas.
Uma única lágrima escorre pela minha bochecha. O que eu fiz? Já
dormi com o inimigo, o homem que destruiu minha vida... e gostei...
muito.
— Tiger? O que está errado? Fale comigo. – Mas não posso. É tarde
demais para conversar. O dano já foi feito.
Ou assim pensei, pois parece que este é apenas o começo... do fim.
Bull olha por cima da minha cabeça, com seus olhos brilhando com
fogo. — Você. – ele consegue gritar entre os dentes.
Não preciso me virar para saber quem está atrás de mim. Mas este é
o meu castigo por tudo o que fiz.
Bull me solta e eu lentamente olho por cima do ombro, juntando as
mentiras. Diante de mim está o homem que partiu, partiu porque eu o
traí.
Diante de mim está meu irmão... Christopher... ou, como a
maioria o conhece... Jaws.
354

É demais, muito rápido, e preciso de um momento, um maldito


momento, porque parado a poucos metros de mim está o homem que
arruinou minha vida. Ele parece muito diferente de quando o vi pela
última vez. Longe dos segmentos de gangster. Ele agora está vestido
com um terno caro e ouro. Ele sempre exalou poder, mas agora está no
topo da porra da cadeia alimentar.
Não posso fazer nada além de encará-lo, imaginando como vou
matá-lo... e matá-lo lentamente.
Mas meus pensamentos assassinos são
interrompidos bruscamente quando Tiger treme,
alcançando o topo de uma cadeira para evitar cair de
bunda.
Que porra está acontecendo?
— Senti sua falta. – diz o filho da puta docemente. Ele
com certeza não está falando comigo, o que significa... que ele
conhece Tiger. Mas como? — Estou feliz que você gostou dos brincos
que comprei para você. 355
Seus dedos levantam trêmulos até os ouvidos, surpresos.
Eu me lanço para frente, pronto para arrancar seu baço e fazer
perguntas mais tarde, mas Tiger agarra meu bíceps, me impedindo.
Respirando, observo seu aperto semelhante a um torno. Ela tem três
segundos para me soltar. Mas quando olho em seus olhos com o coração
partido, percebo que vou precisar de muito mais do que três segundos.
— Não. – ela sussurra, balançando a cabeça.
Eu não entendo o que está acontecendo. Ela logo me atualiza.
— Ele é meu... me... meu...
— Irmão. – O idiota preenche as lacunas com um sorriso.
Embora eu tenha ouvido os dois em alto e bom som, é como se eles
tivessem falado comigo em outro idioma. Esse filho da puta, o homem
que tirou tudo de mim, é sangue do seu sangue? Certamente, a vida não
é tão cruel?
Mas eu não deveria ter esperado nada menos.
— Ele é seu irmão? – pergunto a ela, incapaz de aceitar isso
como verdade. Quando ela não responde, agarro seu pulso. —
Responda-me!
Abaixando o queixo, ela balança a cabeça
lentamente, escondendo-se atrás do cabelo.
Meu coração faz algo que só senti uma vez antes: foi
quando Damian morreu em meus braços. Quebra. Quebra
porque, mais uma vez, alguém de quem gosto é tirado de
mim.
— Seu irmão? Seu maldito irmão! – grito, de repente precisando
colocar a maior distância possível entre nós. Eu me afasto de seu aperto 356
porque está me queimando vivo.
Ela esfrega os braços, com pequenos arrepios a atormentando. Ela
parece ter desligado. Quero consolá-la, mas não posso. Como posso?
— Tiger, droga! Fale comigo!
— Por favor. – ela chora, balançando a cabeça, incapaz de olhar
para mim. Estou assustando ela, que é o que sempre quis. Não quero isso
agora, mas é tarde demais. Tarde demais.
— Lillian, vá para meu escritório. – diz Jaws suavemente, enfiando
a mão no bolso e tirando um molho de chaves. Observo com os olhos
arregalados enquanto ele caminha lentamente em direção a ela e
descruza seus braços antes de colocar as chaves em sua palma.
— Está lá em cima. Diga à segurança para levá-la.
Uma possessividade feroz toma conta de mim. Quero que ela diga a
ele para ir para o inferno. Lutar como a mulher forte que sei que ela é.
Mas ela não luta. Ela funga com um aceno de cabeça e, no piloto
automático, sai pela porta.
Jaws espera alguns instantes e depois fecha a porta, prendendo-
nos em uma jaula. Quero matá-lo, sufocá-lo com minhas próprias
mãos, mas ele está armado. Eu não chegaria nem um metro antes que
ele colocasse uma bala em mim... assim como fiz com
o amigo dele.
— Você cresceu, garoto.
De repente, a morte é um preço que estou disposto a
pagar. A última vez que ele me chamou de garoto foi quando
as suas mãos ficaram sujas com o sangue do meu irmão.
— Sim, eu cresci. – respondo, mal me controlando. — Seu amigo,
Kong, viu o quanto. Essa foi a última coisa que ele viu antes de eu 357
esfaqueá-lo no coração.
Os lábios de Jaws se contraem antes que comece a rir roucamente.
— Eu deveria agradecer por levar meu lixo para fora. – ele afirma
calmamente.
Não estou surpreso que ele não derrame uma lágrima por seu amigo.
— Você pode me agradecer dizendo onde está seu outro amigo.
Jaws friamente coloca as mãos nos bolsos. — Você me encontrou,
ou devo dizer, nós nos encontramos. Você claramente não precisa da
minha ajuda.
Ele tem razão. O elemento surpresa desapareceu graças ao fato de
eu estar dormindo com a irmã dele. De todas as mulheres, por que ela?
— O que você quer? – eu cansei de fingimentos. Esse idiota está
aqui por um motivo. Eu tenho valor para ele. Se não estivesse, já estaria
morto.
— Sem preliminares? – ele brinca, com seus dentes retos e brancos
brilhando com um sorriso sarcástico.
— Sua irmã já realizou isso. – eu respondo rapidamente,
saboreando sua súbita mudança de comportamento.
Ele queria seu sobrinho morto porque tem uma
obsessão doentia por Tiger, mas por que ele esperou
tanto para voltar para a vida dela?
— Cuidado. – ele avisa, contraindo a mandíbula. Não
acredito que não vi as semelhanças entre Tiger e ele. Eu
estava fora do meu melhor jogo porque estava muito
ocupado... sentindo.
Droga. Isso não pode acontecer novamente.
— Independentemente do fato de ela não conseguir manter as
358
pernas fechadas, ela ainda é minha irmã.
— A irmã que você abandonou. – digo, indo em sua defesa.
— Ela merecia isso. – ele rebate sem sentir. — Essa é a punição
dela por foder com meu melhor amigo.
Então parece que ele sabe.
Tiger pensou que ele estava alheio a ela se esgueirando, mas não
estava. Ele estava sempre dois passos à frente. — Você sabia?
— Claro, eu sabia. – ele zomba com raiva. — Eu também sei o que
aconteceu com o Príncipe Encantado dela.
Há muito mais nesta história complexa. E estou prestes a descobrir
quanto.
— O problema de Lillian é que ela é uma romântica incurável. Ela
também é ingênua. Mas parece que você já faz meu trabalho sujo há
algum tempo.
— O que diabos isso significa? – eu deveria acabar com esse idiota.
Agora. Mas não posso. O que a Tiger tem a ver com isso?
— Isso significa. – diz Jaws, virando o rosto. — O homem em
quem você atirou... era o meu melhor amigo. O melhor
amigo que estava transando com minha irmã mais nova
e não teve o bom senso de usar camisinha e a engravidou
daquele pequeno bastardo.
O sangue é drenado do meu corpo. Eu não consigo
falar.
— Você não somou dois mais dois? – ele zomba com um
sorriso. — Você matou a alma gêmea dela. – Uma frase nunca
soou tão suja. — Você me fez um favor. Eu mesmo o teria matado no
momento em que descobri que ela estava grávida. Mas você chegou 359
primeiro do que eu.
“Ele era meu herói. Meu Príncipe Encantado." Agora percebo que
Tiger quis dizer isso no sentido literal, porque o homem em quem atirei
era Hero... o pai de Jordy e o amor de sua vida.
Sou a razão pela qual a vida dela virou uma merda. Ah, meu maldito
Deus. E ela sabe. Ela sabe que fui eu quem atirou e matou o homem que
ela amava. Eu tirei o pai do Jordy. Ela também sabe que não tenho
remorso pelas minhas ações. Nossos caminhos se cruzaram há muito
tempo. Nós simplesmente não sabíamos disso. Até agora.
Eu preciso explicar. Mas o que digo? Ela sabe a verdade. Para onde
vamos daqui?
— Eu disse a ela que ele fugiu porque aquele traidor não merecia
uma despedida de herói. Eu queria que ela pensasse que ele era o
canalha mentiroso e traidor que ele, de fato, era.
— Eu sabia que ela estava fodendo com o Hero. Só não queria
acreditar que qualquer um deles me trairia dessa maneira. Mas o show
acabou quando ela engravidou do filho dele. – Ele resmunga, se
firmando. — Como ele ousa colocar as mãos e o pau no que é meu!
— Filho da puta, se você se importava tanto com ela, por que
diabos você a abandonou? – grito, preparado para
matá-lo repetidas vezes por tudo o que ele fez.
— Esse é o castigo dela por amá-lo, amá-los, mais do
que a mim. Ela queria ser adulta, então eu a tratei como
tal. Ela claramente não precisava de mim quando estava
dormindo com ele pelas minhas costas. – ele responde
cruelmente, enquanto seguro minha náusea. Ele está doente. —
Mas eu a quero de volta. Ela pagou suas dívidas. Eu a quero ao meu
lado, onde ela pertence. 360
Por cima do meu maldito cadáver…
— Isso chega um pouco tarde demais. Ela está tirando a roupa para
sustentar a si mesma e ao filho, seu sobrinho, que você queria morto. –
revelo, porque ele não é o único com um ás na manga.
— Ah, parece que Kong permaneceu um maricas até o fim. – Jaws
não se incomoda com o que eu sei.
— Vamos acabar com isso, certo? – digo rispidamente, não estou
interessado em conversa fiada. Preciso encontrar Tiger e explicar. Me
incomoda que ela seja minha principal prioridade no momento; no
entanto, posso questionar meus motivos mais tarde.
— Nós dois queremos alguma coisa. – diz Jaws uniformemente. —
Podemos nos beneficiar um com o outro.
Duvido muito disso. Mas estou ouvindo.
— O que se diz na rua é que você é próximo de Stevie, então é
simples. Você vai trabalhar para mim agora. Esta é a entrada que eu
estava esperando.
Zombando, eu balanço a cabeça, incrédulo. — Já ouvi algumas
besteiras na minha época, mas isso é demais. Por que diabos
trabalharia para você? Quero você morto, idiota. E
pretendo fazer isso assim que você parar de me
aborrecer com seus enigmas.
Jaws tem a audácia de rir. Isto é apenas um jogo para
ele. — Você pode tentar, mas tenho algo que você quer.
— Ah, sim, e o que é isso?
— O amor da minha irmã.
Cerrando os punhos, inspiro lentamente. — Estou ouvindo. – É por
isso que eu não queria me envolver com ninguém. Laços emocionais 361
significam garantias, e Jaws tem um monte disso. Já machuquei Tiger
uma vez, como posso fazer isso de novo?
— Stevie confia em você, e agora que Kong está morto, ele
precisará de alguém para ocupar seu lugar. Esse alguém será você.
É como se meu equilíbrio estivesse desequilibrado. Cada vez que
Jaws fala, ele se afasta cada vez mais da ordem natural do mundo.
— Você vai se aproximar dele e aprender tudo o que há para saber
sobre o negócio dele. Esta cidade só tem espaço para um alfa, e esse sou
eu. Quero suas drogas, seu ringue de luta e o clube. O Pink Oyster é uma
competição, uma péssima competição, visto que meu clube é uma 7-Up
Factory, mas mesmo assim é uma competição, com meu investimento.
Sem mencionar que está em um imóvel de primeira linha. Já faz algum
tempo que estou olhando para aquele lugar. Acho que é hora do Blue
Bloods se expandir.
— Drogas, strippers, é tudo dinheiro fácil para mim. Quanto mais
eu tenho, mais ganho. Este é um negócio inteligente.
Jaws é dono do Blue Bloods? Isso significa que ele saberia onde
Tiger estava o tempo todo. E só agora ele está saindo do esconderijo.
Carlos não estava por trás do ataque dela – era o maldito Jaws. Ele
quer que sua irmã trabalhe aqui, não porque queira reacender o
relacionamento deles, mas porque ela lhe renderá
dinheiro.
Isso é muito baixo. Ele poderia tê-la ajudado
financeiramente e emocionalmente, mas em vez disso,
continuou a puni-la por algo que ela fez quando era
adolescente. Ele sempre esteve à espreita nas sombras, mas
agora emergiu porque quer algo de nós dois.
Tiger disse que sentiu como se alguém a estivesse observando.
Agora sei quem. 362
— Eu quero tudo. – ele afirma sem pausa. — E quando eu conseguir
tudo... quero a cabeça dele na porra de uma bandeja.
— Não trabalho para ninguém, especialmente para você. – digo,
avançando, sem me importar quando ele saca a arma. — Não sou um
informante, então é melhor você me matar agora.
— Quem disse alguma coisa sobre ser um informante? É simples.
Basta ganhar a confiança deles e se infiltrar em suas operações. Isso é
tudo.
Agarro o cano e pressiono o cano sobre o coração. Mas vou topar o
blefe dele. Ele precisa de mim. Ele quer se livrar da concorrência e,
como Kong não era homem o suficiente para isso, agora está recrutando.
— Eu faria isso, mas no momento você tem mais valor para mim
vivo do que morto. Além disso, você não sai de mãos vazias.
— Você não tem nada, nada que eu queira! – grito, cego pela minha
raiva.
— Na verdade, sim. – ele contradiz, retirando lentamente a arma do
meu peito.
Isso deveria ser um sinal de... confiança?
Inferno. Porra.
Isso acaba agora.
Eu dou um soco no queixo dele. O som nauseante
alimenta minha fúria interior, e dou uma cotovelada no
nariz dele. Ele cambaleia para trás, o que é tudo que preciso.
Subo em cima dele, prendendo-o no chão. Repetidamente,
meus punhos atingem seu rosto, mas não importa o quanto eu bata nele,
ainda não é o suficiente. 363
Se eu acabar com ele agora, o que isso fará com Tiger? Já arruinei a
vida dela matando o homem que ela amava. Minha necessidade de
vingança é a razão pela qual ela está se despindo, a razão pela qual a
vida dela não saiu do jeito que ela queria, do jeito que ela merecia.
E Jaws sabe disso.
Sua risada gargarejante me ridicularizam. — O que há de tão
engraçado, filho da puta? – eu o puxo pela gola de sua camisa
ensanguentada, pressionando-nos nariz com nariz.
— Você se acha um grande jogo, mas ainda é o garotinho assustado
que conheci.
Levanto meu punho, pronto para acabar com isso de uma vez por
todas, mas paro quando Jaws coloca algo que quero mais do que
vingança em risco.
Tiger.
— Você trabalha para mim. Caso contrário, acho que é hora de
encontrar meu sobrinho.
Meu punho treme no ar.
— Ele já está a meio caminho de se tornar um delinquente, então
tudo que ele precisa é de um pouco de orientação de
seu querido tio. Não vai demorar muito. Ele acreditou
em mim quando eu disse que sua mãe era prostituta. Não
há lealdade aí. Ele se ressente dela.
O mistério de quem disse para Jordy que Tiger era uma
prostituta foi revelado. Jaws esteve muito mais perto do que
imaginávamos.
— Eu disse a ele para não contar à mãe que eu estava de volta, e ele
não contou. Não demoraria muito para eu tirá-lo dela para sempre. 364
— Você não ousaria. – eu desafio, mas é evidente que ele faria e o
fez.
— Você realmente acha que quero um garoto ranhento que seja a
cara de seu pai traidor perto de mim? Não. Mas ele é um meio para
atingir um fim.
Incapaz de suportar vê-lo, eu o jogo no chão e me levanto
abruptamente. Ele ri, limpando o lábio ensanguentado com as costas da
mão.
— O que ela fez para você? – pergunto, incrédulo nesta teia
emaranhada em que estou preso. — Ela fodeu com seu melhor amigo?
Supere isso.
E aí está, eu vejo. Um tique abaixo do olho direito. Parece que Tiger
é ambos os nossos pontos fracos.
— Não vou permitir que você me chantageie com ela. Vou contar
tudo a ela. Tenho certeza que ela ficará interessada em saber que você
mentiu para ela esse tempo todo. Há quanto tempo você a observa?
Ele não está incomodado com a minha ameaça. — No início, eu
não dava a mínima para o que ela fazia. Ela fez suas escolhas. Já era
hora de ela viver com elas. Mas quando ela começou a fazer strip-
tease, ela interferiu nos meus negócios. E não posso
permitir que isso aconteça.
— Ela era um máximo, mas quando a vi... digamos
apenas, a nostalgia bateu. Senti falta da minha irmã mais
nova. Mas ela já não era tão... – ele lambe os lábios. —
Garotinha.
Cerro os punhos.
— Então diga a ela o que você quer, mas nós dois sabemos que ela
não vai acreditar em você. Você matou o pai do filho dela e, por sua vez, 365
destruiu a vida dela. – afirma ele levianamente.
— Quando ela perguntar por que não contei a verdade, direi o que
ela quer ouvir. Eu estava apenas fazendo o papel de irmão mais velho,
tentando protegê-la da dor de saber que o amor de sua vida estava morto.
— Ela não é estúpida. Ela vai ver através de suas besteiras. – Minha
afirmação carece de convicção porque não posso ter muita certeza.
— Talvez ela faça isso, e é por isso que tenho um plano B. O filho
dela. – Sentando-se, ele agarra o lado do corpo, estremecendo. — Você
pode fazer o que eu quiser ou farei com que ele pague pela sua falta de
cooperação. Os policiais não pensariam duas vezes se um garoto
delinquente desaparecesse. Imagine o que isso faria com minha irmã?
Ela precisaria do ombro do irmão mais velho para chorar, sem dúvida.
Esse idiota pensou em tudo. Ou faço o que ele diz ou destruo a vida
de Tiger... de novo. Ele tem garantias entre ela e Jordy.
— Se eu fizer o que você quer, o que eu ganho?
Seus olhos brilham em um tom verde tortuoso. — Minha palavra de
que nenhum mal acontecerá à minha irmã e ao seu bastardo.
— Isto não é suficiente. – Balanço minha cabeça com firmeza. Eu
sei que isso me torna um filho da puta egoísta, mas preciso de
garantias de que esses covardes vão pagar. — Quero
que você e Scrooge paguem suas dívidas. Só então eu
irei... – Deus me perdoe. — Concordarei.
Jaws lambe o sangue dos lábios. — Tudo bem.
— Quais são os termos? – pergunto, precisando colocar
minha cabeça no jogo. As regras mudaram.
— Você se aproxima de Stevie, garantindo que ele o contrate para
ser seu segurança agora que Kong se foi. – Sua voz está cheia de alegria 366
com o fato. — Quero saber tudo sobre a organização das lutas. Isso é
dinheiro fácil para mim. Não posso perder apostando no cavalo certo. –
ele se refere a mim. — Descubra o que puder sobre seus outros
negócios. De onde ele recebe suas remessas. Quanto. Quero saber tudo
que existe.
— Incentive-o a comprar The Pink Oyster. Eu mesmo ia abordar
Lotus, mas a vadia não será tão complacente comigo. Stevie pode roubar
o clube. É melhor ter dinheiro no meu bolso do que no dela.
— Como você sabe tudo isso? – pergunto, me perguntando quantas
pessoas ele tem trabalhando para ele.
— Meu objetivo é conhecer as idas e vindas das pessoas que são
úteis para mim. Eu descobri sua pequena aventura com minha irmã, não
foi? Não pude acreditar na minha sorte quando fiz minha pesquisa e
descobri quem você era - dois coelhos, uma cajadada só. Foi como se o
destino nos unisse mais uma vez.
É preciso toda a minha força de vontade para não dar uma cabeçada
nele.
— Fiquei feliz por permanecer nas sombras e permitir que Carlos
cuidasse disso, mas quando você entrou no mundo dela e ela não
conseguiu ficar longe, bem, não foi uma coincidência. Foi o destino.
Eu vejo o jeito que ela olha para você. Ela gosta de
você. E você gosta dela. Você devia se envergonhar. As
emoções deixam você fraco. – Há um pesar em seu tom.
Ele poderia estar falando por experiência própria? —Você
deveria saber disso. É realmente uma justiça poética para
vocês dois.
Seu comentário me tira do eixo. Preciso atrapalhar isso porque só
consigo lidar com uma confusão de cada vez. 367
— Qual é o seu problema com Stevie?
Ele sorri, mas nada é agradável no gesto.
— Essa é uma história para outro dia. Tudo o que você precisa saber
por enquanto é que quero que ele pense que está por cima quando eu
tirar tudo dele... assim como ele fez comigo.
Isso é pessoal. Ele está procurando um bode expiatório – e eu me
encaixo no perfil.
Ele faz sua lista de tarefas parecer tão simples, mas o que ele está
pedindo vai contra tudo o que defendo. Um maldito informante. Mas eu
o agrado.
— Eu faço tudo isso; você deixa Tiger e Jordy em paz?
Ele acena com a cabeça uma vez. — Sim. Nem um fio de cabelo de
suas cabeças será tocado. Ah, e este acordo significa que você a deixa
em paz. Você está morto para ela. Estamos entendidos? Certifique-se de
que ela não suporte ver você. Se ela chegar perto de você, ou vice-versa,
será a última coisa que ela fará.
— E você e Scrooge? E quanto às suas cabeças? – pergunto,
inspirando e expirando alto.
— Prometo a você uma luta justa. – ele responde,
o que me faz vibrar violentamente. — Quando tudo
estiver acabado, lutaremos de homem para homem. Sem
armas. Sem truques. O melhor homem pode ganhar. – ele
está claramente confiante de que vencerá, mas subestima
minha raiva e o fato de que posso sentir o cheiro de besteira a
quilômetros de distância.
Nunca haverá uma luta justa.
— Justa? Não há justiça nesta situação! Como é justo o que você fez
368
ao meu irmão?
— Quase não me lembro dele, então não sei o que você quer que eu
diga. – Seu comentário despreocupado é mais um insulto para Damian.
Eu não posso fazer isso. Não posso fazer um acordo com o diabo.
Como posso trabalhar com ele, sabendo o que faço? Mas se eu não fizer
isso... Tiger pagará. E a morte de Damian nunca será vingada porque
Jaws vai me matar. Tudo isso teria sido em vão.
Minhas mãos estão atadas. Minha vingança vale mais para mim do
que ela? Eu poderia acabar com ele aqui e agora. Ele está ferido e não
demoraria muito para eu prendê-lo e sufocá-lo até a morte. Mas ele veio
aqui armado – em todos os sentidos da palavra.
— Eu poderia matar você agora mesmo. – aviso, falando sério com
cada palavra.
— Você poderia. – ele diz, imperturbável. — Mas se meus amigos
não tiverem notícias minhas, não vai acabar bem para minha irmã.
Acabar é a palavra-chave na frase. Não preciso de um diagrama de
Venn: ou faço o que ele diz ou ele acabará com a vida dela tão
facilmente quanto acabei com o pai do filho dela.
— Se você é tão poderoso, faça você mesmo. Stevie não é difícil
de encontrar! – digo, irritado.
— Eu poderia... – ele franze os lábios pensativo. —
Mas não quero nenhuma alternativa. Não é bom para os
negócios. Nem Scrooge. Ele tem uma família em que
pensar. Mantenha seus amigos por perto e seus inimigos
mais perto, como dizem. Além disso, é mais divertido assim.
Isso não faz sentido, mas estou farto desse idiota. Preciso de tempo
para pensar. E preciso ver Tiger. 369
Jaws sempre esteve dois passos à frente. Preciso me atualizar. Mas
antes de ir, quero saber uma coisa que me atormenta há quatorze anos.
— Por quê? – Essas duas palavras carregam muita emoção. Ele diz
que não se lembra, mas está mentindo. Ele sabe que pode fazer isso
porque farei qualquer coisa por vingança.
Ele me promete uma luta justa porque me deve isso. E vou garantir
que não perderei.
Jaws sorri, com um sorriso de vencedor. Ele sabe que ganhou.
Acabei de vender minha alma ao diabo. Com um encolher de ombros
casual, ele responde calmamente: — Por que não?
E é isso. Não há luz no fim do túnel. Sem resolução. Eles mataram
meu irmão porque puderam. E prometo aqui e agora que farei o mesmo.
Isto é apenas o começo.
— Você conseguiu um acordo.
Ele se alegra com a vitória. — Eu possuo você agora.
Mas antes que ele tenha a chance de comemorar, dou uma
joelhada em seu queixo, nocauteando-o. A visão de seu corpo sem
vida não ajuda em nada apaziguar meus demônios. Mas servirá... por
enquanto.
— Eu não pertenço a ninguém.
Esse “acordo” me dá tempo para traçar outro plano,
porque assim que ele não tiver mais utilidade para mim,
ele se livrará de mim. Nunca haverá uma luta “justa” porque
isso significaria que ele é honrado. E isso é algo que ele não é.
É melhor eu ser um homem infiltrado, reunindo munição suficiente
para derrubar um império, do que um homem morto. 370
Abrindo a porta calmamente, encontro a sala ladeada por quatro
seguranças. Claro, ele tem reforços, e é por isso que não é a hora dele –
por enquanto.
— Leve-me até ela. – eu exijo, passando por eles. Quando um deles
tenta me impedir, dou uma cotovelada em seu rosto.
Sou um fio desencapado e ninguém vai me impedir.
— Lá em cima. Última porta à esquerda. – diz um deles, claramente
não interessado em acabar como seu amigo.
Sem perder tempo, subo as escadas, subindo dois degraus de cada
vez. O andar de cima está isolado, mas quando os dois seguranças me
veem chegando, eles rapidamente removem a corda. Meu olhar está
focado na última porta à esquerda e nada mais. Eu não tenho um plano
de jogo. Tudo que sei é que preciso vê-la.
Entrei pela porta, observando freneticamente a sala em busca de
Tiger. Não preciso procurar muito. Ela está sentada atrás da enorme
mesa de madeira de Jaws. Quando ela me vê, seus olhos se arregalam e
ela se levanta rapidamente, usando a cadeira como uma barricada
entre nós. — Por favor, não.
Mas não posso. Se eu não tocar nela, tenho medo que ela fuja. —
Seu irmão é o idiota que matou Damian. – eu revelo
com uma respiração apressada, precisando soltar.
Ela balança a cabeça freneticamente.
— É verdade. – persisto, empurrando a cadeira para
fora do meu caminho. Ela recua, batendo na estante atrás dela.
Ela está presa como um coelhinho assustado. Normalmente,
nada me agradaria mais. Mas agora não.
Seus olhos inconstantes se dirigem para a porta. Ela está petrificada.
Instantaneamente, paro, levantando as mãos em sinal de rendição.
371
Devo a ela toda a verdade antes de destruí-la. — Uma vez você me
perguntou qual era meu nome. É Cody, Cody Bishop. Quando eu tinha
quinze anos, quatro homens mataram meu irmão. Um deles era seu
irmão e o outro era... – Ela fecha os olhos, com lágrimas escorrendo pelo
rosto. Mas preciso que ela saiba tudo.
— O outro era Lachlan, ou Hero. Ele era o homem que você amava?
Ele é o pai de Jordy?
O ar está tão denso que mal consigo respirar.
— Lily, por favor, me responda.
É a primeira vez que uso o nome dela e tem o efeito desejado.
Com os movimentos mais lentos, ela abre os olhos e parte a porra
do meu coração, um coração que eu nem sabia que poderia quebrar
novamente. — Sim. – ela sussurra, consolidando essa confusão de uma
vez por todas.
Naquele momento, eu pensei que encontrar Kong era uma
coincidência, e o universo estava finalmente me dando uma chance. Mas
agora sei que ele conhecia The Pink Oyster porque conhecia
pessoalmente uma das dançarinas – ele sabia que Tiger era irmã de
Jaws. Talvez ele tenha encorajado Stevie a abrir um negócio com a
Lotus como um foda-se para Jaws.
Mas suponho que nunca saberei.
— Você disse que o nome dele era Michael? Eu não
entendo.
Tiger funga, com um olhar de nostalgia surgindo nela. —
Michael Jordan era seu jogador de basquete favorito. Foi aí que
cheguei ao nome de Jordan. – ela revelou. — Quando ele ligava,
não podia chamá-lo pelo nome porque não queria que Christopher
soubesse com quem eu estava falando. Então eu o chamava de Michael. 372
O nome simplesmente pegou.
Sua nostalgia, porém, está prestes a ser arruinada pela verdade.
— Na noite em que meu irmão morreu… ele, seu amado Michael,
era quem poderia ter chamado uma ambulância. Seu irmão deu a ele a
escolha, mas ele escolheu errado. Ele fugiu como um maldito covarde,
deixando Damian morrer. Embora não tenha sido ele quem desferiu o
golpe fatal, foi seu irmão quem fez isso. Ele segurou meu irmão como se
ele não passasse de um cachorro raivoso.
— Pare. – ela implora, mas eu não paro. Ela merece a verdade...
finalmente.
— Scrooge quebrou o pulso e depois roubou o seu anel de
campeonato. Hero pressionou a bota na coluna de Damian, enquanto seu
irmão mijava nele. Kong me segurou, deixando-me indefeso enquanto
os observava. Quando seu irmão abriu a cabeça de Damian, ele me
matou também. Todos eles fizeram isso.
— Então, quando encontrei Hero. – eu disse inexpressivo para ela.
— Não tive problemas em acabar com a vida dele.
— Ele mudou depois disso. Eu sabia que algo tinha acontecido.
Ele não era como eles. – diz ela, me enfurecendo.
— Estou feliz que foi necessária a morte do meu
irmão para transformá-lo em seu Príncipe Encantado!
Ela vira o rosto, magoada, mas eu não me arrependo.
O único arrependimento que tenho é deixá-la entrar.
— Ele ia pedir você em casamento. – revelo, sem
emoção, enquanto um suspiro atordoado a deixa. — Quando
atirei nele, ele estava enfiando a mão no bolso para me mostrar
seu anel de noivado, para me agradecer por poupar sua vida. Eu não era
de sentimentos, no entanto. Ele tirou isso de mim. 373
— Ah, meu Deus. – ela chora, abafando seus gritos com a mão.
— Então talvez você esteja certa. Talvez ele tenha mudado. Mas
essa mudança ocorreu às custas do meu irmão. – Não consigo impedir
que o veneno seja escapado. Preciso machucá-la porque estou com raiva,
com muita raiva. Ela está no caminho da minha vingança.
Mas não estou com raiva dela – estou com raiva de mim mesmo por
ser tão fraco. Se eu tivesse lutado mais com ela, todos estariam mortos.
Mas agora tenho que sacrificar tudo que aprendi para mantê-la segura.
Eu já a destruí uma vez antes. Eu não posso fazer isso de novo.
— Michael tinha pavor de Jaws. Ele não queria...
Mas eu avanço, segurando seu queixo com força. — Não se atreva a
dar desculpas para ele! Assustado ou não, ele deveria ter feito a coisa
certa. Mas não fez isso. E ele pagou com a vida. E o mesmo acontecerá
com seu irmão.
— Eu imploro, não o machuque. Christopher é tudo que tenho...
— Então sinto pena de você, Tiger. – digo rispidamente,
encarando-a com nada além de puro desgosto enquanto ela implora
por sua vida. Se ao menos ela soubesse o que ele pensava dela. —
Você não teve problemas em fechar os olhos antes de
saber quem era.
Seu lábio inferior treme quando ela olha para baixo,
envergonhada. — Tudo é diferente agora.
— Você tem razão. Isso é. Seu irmão, ele é o inimigo. E
você também será se ficar do lado dele.
— Ele é sangue do meu sangue. – ela raciocina, selando isso para
sempre. Esta é a última vez que sentirei algo novamente. 374
Soltando-a, pressiono os meus lábios nos dela, adquirindo-a,
possuindo-a e devorando-a porque ela é minha. Ela sempre será. Ela
arfa, então envolve os braços em volta do meu pescoço, me beijando
violentamente. Passo meus dedos por seus longos cabelos, guardando o
cheiro e o sabor dela na memória, porque esta é a última vez. Nosso
beijo de despedida.
Nossas línguas colidem em uma união frenética, incapazes de
acompanhar o que nossos corpos querem dizer. Ela é a única pessoa por
quem estou disposto a sacrificar tudo – e para fazer isso, tenho que
machucá-la. Para mantê-la segura, preciso que ela me odeie. É a única
maneira.
Seus pequenos gemidos e a maneira como ela se contorce em torno
de mim, independentemente do que ela sabe, me mostram que o que ela
sente por mim é mais do que apenas uma aventura casual. E eu sinto o
mesmo. Eu me perguntei se ela significava mais para mim do que
vingança, e a resposta é sim. Ela significa.
"Deixe-a ir." Aquela voz. Eu senti falta dessa voz. Mas suponho que
posso ouvir agora porque finalmente, pela primeira vez na vida, estou
fazendo a coisa certa.
Com um último beijo, faço o que Damian diz... deixo-a ir.
Seus olhos se abrem, sem saber por que parei.
Beijando a ponta do seu nariz, seguro seu rosto, me
odiando mais do que já me odeio. — Eu vou matar seu
irmão. E eu vou... matar você também se você ficar no
meu caminho.
Ela pisca uma vez, ficando pálida e doentia. — O quê?
Não há emoção em meus olhos. Desapareceu. E duvido que algum
dia volte. 375
Eu cambaleio para trás quando ela me empurra para longe dela. Eu
silenciosamente elogio minha garota impetuosa. Eu sabia que ela estava
lá. Ela só precisava de um empurrãozinho.
— Lembro-me de pensar que nada poderia ser pior do que quando
você me disse que matou alguém. Esse alguém acabou sendo o único
homem que amei. Mas eu estava errada. Nós terminamos. Se você
chegar perto de mim ou do meu filho, eu vou te matar, porra.
Eu a aplaudo lentamente. — Experimente, querida. Atreva-se.
— Você arruinou minha vida e então ameaça me matar. Eu deveria
contar a Franca o que você fez.
Sua ameaça é vazia. Ela não faria isso. Não importa o quanto ela
gostaria de pensar que poderia, ela não o fará. Foi por isso que ela não
chamou a polícia quando me encontrou coberto de sangue.
— Faça o que você tem que fazer e eu farei o mesmo.
Ela não recua quando dá um tapa no meu rosto. — Você não tem
chance contra Christopher.
— Veremos. – eu desafio com um sorriso, movendo meu queixo
de um lado para o outro.
Tudo que há de bom dentro de mim, o que há de
bom por causa dela, é levado embora, deixando para
trás a escuridão que carrego há quatorze anos.
— Seu irmão não é um cara legal. – eu aviso,
desejando poder contar a ela tudo o que sei. Mas qual seria o
sentido? Ela não quis ouvir. Afinal, eu sou o bicho-papão. Eu
sou o homem que destruiu a vida dela.
— Nem você. – ela responde, desafiando-me a argumentar. Mas eu
não argumento. 376
— Eu nunca disse que era. – digo sem expressão.
Sua expressão endurece enquanto ela se recompõe. Cada parte de
mim espera que ela lute, lute por mim. Preciso que ela seja a única. Por
mais egoísta que isso seja, não posso ser aquele que vai embora. Mas
Tiger prova quem tem mais coragem. — Que vergonha por não ouvir.
Isso não vai acontecer de novo.
Ela passa por mim, com uma nova confiança correndo em suas
veias. Esta é ela reivindicando sua vida de volta, pondo fim a uma era de
dúvidas. Ela se via como alguém indigno de amor porque todos a
deixaram para trás. Mas agora que Jaws está de volta e ela sabe a
verdade sobre Lachlan, ela percebe que é digna.
Ela sempre foi.
Ela olha para mim como se eu não fosse nada, e eu sou. O que fiz
com ela, com seu filho, desmascara o monstro dentro de mim. E eu
gosto. Essa depravação me faz sentir vivo.
Fiquei órfão de três filhos e, se pudesse escolher... faria de novo.
Posso estar na cama com o diabo, mas o final valerá a pena.
— Se você me der licença, é hora de contar a verdade ao meu
filho. Já é hora de contar a ele tudo sobre o pai dele, que não nos
deixou, mas, em vez disso, morreu como vítima
inocente por sua causa. – E aí está... ódio.
Finalmente.
— Ele nunca será inocente. Nunca esqueça isso.
— Ninguém é. – ela responde com fúria. — Mas com Christopher
de volta, podemos tentar ser uma família novamente. 377
— Você pode tentar. – eu condescendente com um sorriso.
— Vá para o inferno.
— Já estive lá, fiz isso. – digo com um encolher de ombros. — Não
valeu a pena.
Lágrimas de raiva queimam seus olhos, e é com isso que ela me
deixa enquanto sai furiosa pela porta. Quando a porta se fecha atrás dela,
respiro fundo, reprimindo a vontade de correr atrás dela.
Depois de me acalmar um pouco, dou a volta na mesa e me sento
atrás dela. Passo o dedo pela superfície lustrada, assobiando para toda
essa riqueza que vou gostar de queimar até o chão. Pegando o telefone,
disco um número, pronto para dar início a esse show de merda agora
mesmo.
— Ei, Stevie. Más notícias. – digo quando ele atende. — Kong
pediu demissão. Algo sobre Jaws querendo todo o seu sangue. Ele quer
o seu império, cara.
E observe a teia que eu crio.
De alguma forma, pensei que matar Kong me faria sentir melhor.
Mas tudo o que foi feito foi piorar muito as coisas. Suponho que com
cada ação há uma consequência, e esta é a minha.
Matando Kong mudou o curso de tudo, mas suponho
que seja o caso quando você rouba a vida de alguém.
Justiça poética, dirão alguns. Eu não deveria ter
pensado que seria tão fácil.
— Porra. – ele xinga, com o pânico claro em seu tom.
Este é o momento em que entro e salvo o dia. — Agora que você
está abatido, que tal me deixar mostrar o que a força brutal de verdade 378
faz?
— Você quer o emprego dele?
— A meu ver, você não tem escolha. Você precisa de proteção. Eu
preciso de dinheiro. – Recostando-me na cadeira, coloco os pés sobre a
mesa e cruzo os tornozelos casualmente. — Então o que você diz?
— Venha me ver amanhã. Vou te mandar uma mensagem com o
endereço.
Eu desligo. O trabalho é tão bom quanto o meu.
Não deveria ser tão fácil, mas é.
Agarrando o medalhão em volta do pescoço, finalmente me sinto
em casa. Este é um passo mais perto de conseguir o que quero, porque o
mundo é uma selva e somos todos apenas malditos animais - nós somos
Tubarão, Touro e Tigresa, e estamos prontos para destruir uns aos
outros.

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