Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Fundamentos de Matemática I
Trigonometria no
triângulo retângulo
Gil da Costa Marques
Hiparco (cerca 140 a.C.) recebeu o crédito por ter iniciado a trigono-
metria, ou melhor, ter introduzido, de forma indireta, o conceito de
seno de um ângulo. Hiparco era pesquisador no museu de Alexandria,
a primeira instituição científica financiada pelo poder público.
Transformou-se num dos maiores astrônomos da antiguidade. Sua
principal contribuição à matemática teve a influência da matemática
dos babilônios. Credita-se a ele a introdução, nos meios científicos
relevantes na época, da medida de ângulo proposta pelos babilônios.
Introduziu também a função seno utilizando o número 60.
Fundamentos de Matemática I
164 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 1
a Crd ( a ) a Crd ( a )
sen = → sen = 8.2
2 2R 2 120
Crd ( a ) = 2l 8.3
e utilizando o valor do raio, sem efetuar sua divisão em 60 partes, a função seno, definida a
partir da função corda em 8.2, pode ser escrita como:
a l
sen = 8.4
2 R
A rigor, Hiparco não estava introduzindo a função seno. Ele definia o que denominamos
seno de um ângulo. Tal definição é análoga àquela obtida a partir das relações métricas de
ângulos agudos num triângulo retângulo.
Hiparco gerou uma tabela de cordas. Essa tabela é muito semelhante a uma tabela dos senos,
desde que nos atenhamos a ângulos menores do que 180°. A fim de determinar a posição dos
corpos celestes, Hiparco teve a ideia de fazer a interpolação para gerar algo como a função corda.
Ptolomeu publicou, em sua obra O Almagesto, uma tabela de cordas para ângulos variando
dentro de intervalos de 0,5°.
Um triângulo é retângulo quando possui um ângulo reto, isto é, dois de seus lados são
perpendiculares. Esses lados são denominados catetos e aquele oposto ao ângulo reto é deno-
minado hipotenusa.
Para medir os ângulos de um triângulo retângulo utilizamos o grau como unidade de medida.
Você lembra?
1 grau é a medida do ângulo central obtido ao
dividir uma circunferência em 360 partes iguais.
Observamos que, como o ângulo reto tem 90° por medida, os outros dois ângulos de um
triângulo retângulo são complementares, ou seja, têm como medida de sua soma 90°.
a 2 + b2 = c 2 8.5
Fundamentos de Matemática I
166 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 1
cateto oposto
sen θ =
hipotenusa
a b
sen A =
= sen B 8.6
c c
cateto adjacente
cosθ =
hipotenusa
b a
cos A =
= cos B 8.7
c c
Convém observar que num triângulo retângulo só temos como definir senos e cossenos para
os ângulos agudos.
Exemplos
• Exemplo 1
A partir do triângulo equilátero ABC de lado l e do quadrado de lado a da Figura 8.6, preencha
as lacunas da tabela:
Seno
Cosseno
→ Resolução:
Observemos a Figura 8.6:
l2
h2 = l 2 −
4
de onde
l 3 l 3
h= ou h = − (não convém)
2 2
Portanto, temos que:
l
ACB cateto oposto 2 1
sen 30° = sen H CB = sen = = =
2 hipotenusa l 2
Fundamentos de Matemática I
168 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 1
e
l 3
ACB cateto adjacente h 3
= cos
cos 30° = cos H CB = = = 2 =
2 hipotenusa l l 2
bem como:
l 3
cateto oposto h 3
sen 60° = sen C BH = = = 2 =
hipotenusa l l 2
e
l
cateto adjacente 2 1
cos 60° = cos C BH = = =
hipotenusa l 2
3 1 2
Cosseno
2 2 2
Convém notar que sen 30° = cos 60° e cos 30° = sen 60° que, alias, é uma propriedade válida para
qualquer par de ângulos complementares, isto é sen α = cos (90° − α) e e cos α = sen (90° − α),
como adiante veremos.
Utilizando o teorema de Pitágoras (8.5), resulta de 8.8 que, para qualquer ângulo agudo
num triângulo retângulo, vale a relação:
A fim de poder estabelecer a Lei dos Senos e a Lei dos Cossenos, que são relações úteis
entre os lados e os ângulos de um triângulo qualquer, não necessariamente retângulo, podendo
ser acutângulo ou obtusângulo, vamos ampliar o conceito de seno e cosseno de um ângulo.
Para tal, introduzimos as seguintes identidades:
cos90° = 0 8.11
Fundamentos de Matemática I
170 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 1
Consideremos, em primeiro lugar, a Lei dos Senos a qual estabelece que, num triângulo
ABC qualquer, vale a seguinte relação:
a b c
= = = 2r
sen A sen B sen C
onde a, b, c indicam as medidas dos lados opostos aos ângulos de vértices A, B, C, respectiva-
mente e r é o raio da circunferência circunscrita ao triângulo.
Considerando um triângulo ABC qualquer, inscrito numa
circunferência de raio r, a partir do vértice B podemos encontrar,
na circunferência, um ponto diametralmente oposto D; ligando D
a C, formamos um novo triângulo BCD retângulo em C, pois o
é inscrito numa semicircunferência.
ângulo BCD
Os ângulos de vértices em A e D são inscritos na circunferência
e determinam o mesmo arco BC , logo têm a mesma medida.
Figura 8.7: Triângulo ABC qualquer,
inscrito numa circunferência de raio r. Agora, no triângulo retângulo BCD, temos:
= a
sen D
2r
de onde
a
sen A =
2r
ou seja,
a
= 2r
sen A
b c
= 2r e = 2r
sen B
sen C
a b c
Logo, podemos concluir que: = = = 2r
sen A sen B sen C
Consideremos agora a Lei dos Cossenos, a qual estabelece que, num triângulo ABC,
qualquer, valem as seguintes relações:
a 2 = b2 + c 2 − 2bc cos A
b2 = a 2 + c 2 − 2ac cos B
c 2 = a 2 + b2 − 2ab cos C
onde a, b, c indicam as medidas dos lados opostos aos ângulos de vértices A, B, C, respectivamente.
Vamos provar apenas a primeira das relações e isso será suficiente, pois as três são análogas.
Analisemos as três possibilidades para o ângulo A (agudo, obtuso e reto).
a. A é um ângulo agudo.
Seja CH a altura do triângulo ABC, relativa ao lado AB. O triângulo AHC é retângulo e pelo
Teorema de Pitágoras,
b2 = h2 + m2
a2 = h2 + n2
b2 − m2 = a2 − n2
Eliminando n obtemos:
b2 − m 2 = a 2 − ( c − m )
2
Fundamentos de Matemática I
172 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 1
Seja CH a altura do triângulo ABC, relativa ao lado AB. O triângulo CHA é retângulo e
assim, pelo teorema de Pitágoras,
b2 = h2 + m2
a2 = h2 + (m + c)2
Eliminando h, temos:
b2 − m2= a2 − (m + c)2
a2 = b2 + c2 + 2cm
m
Mas = cos H AC = cos(180° − A) = − cos A , ou seja,
b
m = − b.cos A
Logo,
a2 = b2 + c2 − 2bc.cos A.
c. A é um ângulo reto.
Este caso é o próprio teorema de Pitágoras, pois cos A = 0.
• Exemplo 2
1. Determine o valor de x no triângulo abaixo.
a.
Figura 8.10:
O triângulo dado.
→ Resolução:
Aplicando a Lei dos Senos ao triângulo da Figura 8.10, temos:
100 x
=
sen 120° sen 45°
3 2
e, como sen 120° = sen 60° = e sen 45° = temos:
2 2
100 2 100
= x = 6
3 3
b.
Figura 8.11:
O triângulo dado.
→ Resolução:
Aplicando a Lei dos Senos ao triângulo ABC da Figura 8.11, temos:
100 x
=
sen 30° sen 45°
Fundamentos de Matemática I
174 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 1
c.
Figura 8.12:
O triângulo dado
→ Resolução:
Aplicando a Lei dos Cossenos ao triângulo ABC da Figura 8.12, temos:
x2 = 16 + 25 − 2.4.5.cos 60°
1
ou seja, como cos 60° = , temos:
2
x2 = 21
ou seja,
x = 21
→ Resolução:
Consideremos a Figura 8.13.
Sabemos que a área do triângulo é dada por
c⋅h
S=
2
h
Também temos sen A = .
b
E, pela Lei dos Cossenos,
Figura 8.13: O triângulo ABC.
a2 = b2 + c2 − 2bc.cos A
ou seja,
b2 + c 2 − a 2
cos A =
2bc
2 2
2S b + c − a
2 2 2
2S
Ou seja, + = 1, pois h = .
bc
2 bc c
Multiplicando e dividindo por 2 a primeira fração, temos
2 2
4S b + c − a
2 2 2
+ =1
2bc 2bc
ou seja,
(4S)2 + (b2 + c2 − a2)2 = (2bc)2
de onde resulta
16S2 = (2bc)2 − (b2 + c2 −a2)2
Uma vez que o segundo membro é uma diferença de quadrados, podemos escrever
16S 2 = [2bc − (b2 + c2 − a2)].[2bc + (b2 + c2 − a2)]
ou ainda,
16S 2 = [a2 − (b2 + c2 − 2bc)].[(b2 + c2 + 2bc)] − a2]
isto é,
16S 2 = [a2 −(b − c)2].[(b + c)2 − a2]
Novamente, fatorando as diferenças de quadrados,
16S 2 = [a + b − c]. [a − b + c].[b + c + a].[b + c − a]
ou
a+b−c a−b+c a+b+c b+c−a
S2 = ⋅ ⋅ ⋅
2 2 2 2
a+b+c
Como p = é o semiperímetro, temos
2
S 2 = (p − c).(p − b).p.(p − a)
ou
S = ( p − c ).( p − b). p.( p − a )
Fundamentos de Matemática I
176 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 1
cateto oposto
tgθ = 8.14
cateto adjacente
Temos assim que, num triângulo retângulo, como o da Figura 8.3, definimos a tangente dos
ângulos A e B
, em termos dos catetos do triângulo retângulo:
a b
=tg A = tg B 8.15
b a
Definimos também a cotangente de um ângulo agudo num triângulo retângulo como sendo
o quociente do cateto adjacente pelo cateto oposto ou o inverso da tangente do mesmo ângulo:
1 cateto adjacente
cotg θ = = 8.16
tg θ cateto oposto
b a
=cotg A = cotg B 8.17
a b
Definimos ainda o valor da secante de um ângulo agudo num triângulo retângulo como o
inverso do cosseno do mesmo ângulo. Temos, pois, em termos dos lados do triângulo:
hipotenusa
sec θ = 8.18
cateto adjacente
c c
=sec A = sec B 8.19
b a
hipotenusa
cossec θ = 8.20
cateto oposto
c c
cossec A =
= cossec B 8.21
a b
Conclui-se que, num triângulo retângulo, podemos definir diferentes valores associados a
ângulos agudos, valores esses que são quocientes entre as medidas dos lados do triângulo.
Fundamentos de Matemática I
178 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 1
Figura 8.18: Determinação da altura do monte por triangulação: tgθ = h/d ou h = d × tgθ.
Na Figura 8.19 está representada a configuração de uma estrela, vista da Terra em duas
posições diametralmente opostas no seu movimento de translação e o Sol. A paralaxe estelar é
o desvio aparente da estrela em relação às estrelas de
fundo. O ângulo de paralaxe é p. As posições aparentes
da estrela podem ser registradas em imagens da região
do céu, obtidas em épocas diferentes. As paralaxes são
diminutas. Ou seja, são medidas em segundos de arco.
Por exemplo, a estrela mais próxima do Sol, a Próxima
Centauro (e de grande paralaxe, portanto) tem paralaxe
de meros 0,77 segundo de arco (2 décimos-milésimo
de grau). Estrelas mais distantes têm paralaxes menores
ainda.Tendo em vista a dificuldade experimental de
distinguir pontos muito próximos, esse método é
bastante limitado. Figura 8.19: Paralaxe estelar.
Experimente escrever essas distâncias em km, você vai ter que escrever muitos dígitos!
Um parsec = 206265 U.A. Uma unidade astronômica, por sua vez, é equivalente a 1,49 · 108 km.
• Exemplo 3
1. Na Figura 8.20 está representado um morro entre
dois pontos A e B. Um teodolito colocado no ponto
C consegue mirar tanto A quanto B, informando que
o ângulo ACB = 135°. Sabendo que CA = 100 m
e que CB = 75 m, pede-se determinar a distância
entre A e B.
Fundamentos de Matemática I
180 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 1
→ Resolução:
Pela Lei dos Cossenos, temos:
(AB)2 = (AC)2 + (BC)2 − 2AC.BC.cos 135°
2
Como cos 135° = − cos 45° = − então
2
(AB)2 ≅ 26231,6 de onde AB ≅ 161,96 m.
→ Resolução:
Em primeiro lugar, sabendo que a soma dos ângulos de um triângulo é Figura 8.21: Encontrar
180o, determinamos o ângulo A = B AC = 20°. a distância entre A e B.
Pela Lei dos Senos, temos:
300 AB
=
sen 20° sen 85°
de onde temos
300.sen 85°
AB =
sen 20°
Glossário
Acutângulo: Todos os ângulos são agudos.
Parsec: Distância produzida por uma paralaxe anual média de um segundo de arco.